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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
CENTRO DE HUMANIDADES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA
MARIA POLYANNE ANDRADE DE ALCANTARA
O LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA E O TRATAMENTO DADO ÀS
CATEGORIAS TEMPO, ASPECTO E MODALIDADE: UMA ANÁLISE
HISTÓRICO-COMPARATIVA ENTRE AS DÉCADAS DE 1970, 1980, 1990 E 2000
FORTALEZA
2010
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MARIA POLYANNE ANDRADE DE ALCANTARA
O LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA E O TRATAMENTO DADO ÀS
CATEGORIAS TEMPO, ASPECTO E MODALIDADE: UMA ANÁLISE HISTÓRICO-
COMPARATIVA ENTRE AS DÉCADAS DE 1970, 1980, 1990 E 2000
Dissertação submetida à Coordenação do Programa
de Pós-Graduação em Linguística, da Universidade
Federal do Ceará, como requisito parcial para
obtenção do grau de Mestre em Linguística.
Área de concentração: Linguística Aplicada.
Orientadora: Profa. Dra. Márluce Coan
FORTALEZA
2010
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Liber, libertas.
Tamanho da ficha 7,5 x 12,5
Ficha Catalográfica elaborada por:
Laninelvia Mesquita de Deus Peixoto Bibliotecária CRB-3/794
Biblioteca de Ciências Humanas UFC
A319 Alcantara, Maria Polyanne Andrade de
O livro didático de língua portuguesa e o tratamento dado às categorias
tempo, aspecto e modalidade [manuscrito]: uma análise histórico-comparativa
entre as décadas de 1970, 1980, 1990 e 2000 / por Maria Polyanne Andrade de
Alcantara. 2010.
215 f.: il. ; 30 cm.
Cópia de computador (printout(s)).
Dissertação (Mestrado) Universidade Federal do Ceará, Centro de
Humanidades, Programa de Pós-Graduação em Linguística, Fortaleza (CE),
2010.
Orientação: Profª Drª Márluce Coan.
Inclui bibliografia.
1-LÍGUA PORTUGUESA - MODALIDADE. 2-LÍNGUA PORTUGUESA TEMPO
VERBAl. I Coan, Márluce, orientador. II - Universidade Federal do Ceará. Centro de
Humanidades, Programa de Pós-Graduação em Linguística. III Título.
CDD(22ª ed.) 469.5
MARIA POLYANNE ANDRADE DE ALCANTARA
O LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA E O TRATAMENTO DADO ÀS
CATEGORIAS TEMPO, ASPECTO E MODALIDADE: UMA ANÁLISE HISTÓRICO-
COMPARATIVA ENTRE AS DÉCADAS DE 1970, 1980, 1990 E 2000
Dissertação submetida à Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Linguística, da
Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em
Linguística. Área de concentração: Linguística Aplicada.
Aprovada em: 12 /04/2010
BANCA EXAMINADORA:
_______________________________________
Profa. Dra. Márluce Coan
Universidade Federal do Ceará (UFC)
Orientadora
_______________________________________
Profa. Dra. Maria Alice Tavares
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
1ª Examinadora
_______________________________________
Profa. Dra. Rosemeire Monteiro-Plantin
Universidade Federal do Ceará (UFC)
2ª Examinadora
_______________________________________
Profa. Dra. Ana Célia Clementino Moura
Universidade Federal do Ceará (UFC)
Suplente
Aos meus pais e meus heróis, Graça e Poly,
de quem herdei a paixão pelos livros .
À Ana Lina (in memorian),
pela lutadora que foi.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por sempre guiar o meu caminho e por ter me dado sabedoria para concluir
este trabalho.
À minha mãe, por suas palavras de força e fé, que me encorajaram a seguir em frente.
Agradeço pela torcida, pelo amor e pela proteção. Agradeço, ainda, por me ensinar a lutar e
acreditar em meus ideais.
Ao meu pai, o maior colaborador deste sonho, que trabalhou incansavelmente para que
nada me faltasse. Sem sua força e benção, a caminhada teria sido mais árdua.
Aos meus irmãos: Cristina, Lina e Fernando. Em especial, à Lina, que me auxiliou na
finalização da coleta de dados.
À minha querida orientadora, Profa. Dra. Márluce Coan, pelo seu compromisso e sua
competência. Agradeço a orientação tão sábia. Sua confiança, paciência, incentivo e estímulo
foram fundamentais para que eu chegasse até o fim.
Aos pequenos: Ana Beatriz, Pedro Lucas, Tobias e Daniel, pelos momentos de alegria
que me proporcionaram, por cada sorriso e brincadeira. Agradeço por terem entendido, no seu
mundo infantil, que eu precisava terminar minha “tarefinha”.
À Deyviane e Juliana, pessoas que me acompanham desde o início da graduação e a
quem muito estimo. Agradeço pela força e pelo ombro amigo.
À Jeane, Natália e Ednardo, amigos que conquistei no Mestrado e com quem
compartilhei momentos de alegria e de angústia. Obrigada pela amizade e cumplicidade.
Às minhas afilhadas, Jocélia e Angélica, pessoas com quem posso sempre contar.
Obrigada por cada palavra de incentivo e por acreditarem em mim.
Ao Alexandre, pelo carinho e apoio, por compreender a minha ausência e por
tranquilizar-me nos momentos mais difíceis.
Aos amigos eternos, James e Wesclei, pela presença constante em minha vida.
A todos os professores do PPGL/ UFC, pelas contribuições.
À CAPES, pelo apoio financeiro com a manutenção da bolsa de auxílio.
Aos funcionários da Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel, pelas
informações concedidas e pela presteza com que me ajudaram.
Muito obrigada a todos aqueles, que direta ou indiretamente, colaboraram para a
realização de mais um sonho.
“As difíceis batalhas estão reservadas somente
para quem tem uma coragem exemplar”.
(São Francisco de Assis)
RESUMO
O objetivo central desta pesquisa é avaliar como as categorias Tempo, Aspecto e Modalidade
são abordadas, no estudo do verbo e dos advérbios de tempo e de modo, pelos autores de
livros didáticos de Língua Portuguesa, nas séries do Ensino Fundamental e nas séries do
Ensino Médio. Compararam-se livros didáticos de quatro décadas, 1970, 1980, 1990 e 2000, a
fim de se verificar o estudo dessas categorias ao longo do tempo. Ao todo, foram analisados
28 livros didáticos. Sob o aparato do Funcionalismo e da Sociolinguística, elaborou-se um
roteiro com questões referentes a Tempo, Aspecto e Modalidade. Alguns documentos oficiais
foram tomados, também, como base: Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD) e Programa Nacional do Livro do Ensino Médio
(PNLEM). De modo geral, os resultados mostram que, nos livros analisados, prevalece o
estruturalismo e o objetivo maior é fazer o aluno memorizar a conjugação dos verbos, sem
refletir sobre seus usos e/ou funções, além de estudá-los de forma descontextualizada, o
mesmo ocorrendo com os advérbios. Nas quatro décadas, os autores dos livros didáticos
apresentaram, algumas vezes, integral ou parcialmente as categorias e, outras vezes, não
trabalharam com a marcação de Tempo, Aspecto e Modalidade. Esta pesquisa é relevante para
a reflexão sobre as mudanças que ocorreram ou não ocorreram, no tocante ao estudo dos
verbos e advérbios, e para a elaboração de livros didáticos de Língua Portuguesa.
PALAVRAS-CHAVE: Tempo, Aspecto, Modalidade, Livro Didático.
ABSTRACT
The main purpose of this research study is to evaluate how the categories Tense, Aspect and
Modality are approached, in the analysis of the verb and adverbs of tense and mood, by
authors of textbooks of Portuguese language in the Elementary school and in the High School.
Textbooks from four decades, 1970, 1980, 1990 e 2000 were compared in order to analyze the
study of these categories throughout the time. As a whole, 28 textbooks were analyzed. Under
the apparatus of the Functionalism and the Sociolinguistics, a report was elaborated with
questions referring to Tense, Aspect and Modality. Some official documents were taken, also,
as a basis: National Curriculum Parameters (in Portuguese, PCNs), National Textbook
Program (in Portuguese, PNLD) and National High School Textbook Program (in Portuguese,
PNLEM). The general results show that the Estruturalism remains in the analyzed books, and
the major aim is to make the student memorize the verb inflections without reflecting about
their uses and/or their functions, besides studying them as well as adverbs in a
decontextualized way. In the four decades, at times, the authors of the textbooks fully or
partially presented the categories, and, some other times, they did not work with Tense,
Aspect and Modality. This research is relevant to reflect about changes, which either have
occurred or did not occur regarding to the analysis of verbs and adverbs, as well as to the
development of textbooks of Portuguese Language.
KEYWORDS: Tense, Aspect, Modality, Textbook.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Gráfico 1: respostas às questões sobre Tempo, propostas no roteiro de análise Ensino
Fundamental ......................................................................................................................... 110
Gráfico 2: respostas às questões sobre Tempo, propostas no roteiro de análise Ensino
Médio ..................................................................................................................................... 111
Gráfico 3: respostas positivas, negativas e parciais para a categoria Tempo ao longo das
décadas................................................................................................................................... 115
Gráfico 4: respostas às questões sobre Aspecto, propostas no roteiro de análise Ensino
Fundamental ......................................................................................................................... 140
Gráfico 5: respostas às questões sobre Aspecto, propostas no roteiro de análise Ensino
Médio .................................................................................................................................... 140
Gráfico 6: respostas positivas, negativas e parciais para a categoria Aspecto ao longo das
décadas................................................................................................................................... 143
Gráfico 7: respostas às questões sobre Modalidade, propostas no roteiro de análise Ensino
Fundamental .......................................................................................................................... 161
Gráfico 8: respostas às questões sobre Modalidade, propostas no roteiro de análise Ensino
Médio ..................................................................................................................................... 161
Gráfico 9: respostas positivas, negativas e parciais para a categoria Modalidade ao longo das
décadas................................................................................................................................... 164
Quadro 1: coleções didáticas da década de 1970 ................................................................... 71
Quadro 2: coleções didáticas da década de 1980 ................................................................... 71
Quadro 3: coleções didáticas da década de 1990 ................................................................... 71
Quadro 4: coleções didáticas da década de 2000 ................................................................... 72
Quadro 5: quadro ilustrativo dos conteúdos linguísticos, a respeito de verbo e advérbio
Ensino Fundamental ................................................................................................................ 74
Quadro 6: quadro ilustrativo dos conteúdos linguísticos, a respeito de verbo e advérbio
Ensino Médio ........................................................................................................................... 77
Quadro 7: roteiro para analisar os livros didáticos ................................................................ 78
Quadro 8: abordagem da categoria Tempo por década Ensino Fundamental..................... 81
Quadro 9: definições de verbo e advérbio para os autores dos livros do Ensino Fundamental ..
................................................................................................................................................. 82
Quadro 10: definição de locução verbal para os autores de 1970 e 1980 .............................. 95
Quadro 11: abordagem da categoria Tempo por década Ensino Médio......................100
Quadro 12: definições de verbo e advérbio para os autores dos livros do Ensino Médio ... .....
............................................................................................................................................... 101
Quadro 13: definições de adjunto adverbial para os autores dos livros do Ensino Médio .. .....
............................................................................................................................................... 107
Quadro 14: exemplos de atividades dos livros didáticos, de 1970 a 2000........................... 112
Quadro 15: abordagem da categoria Aspecto por década Ensino Fundamental ............... 116
Quadro 16: noções de pretérito perfeito e pretérito imperfeito para os autores dos livros do
Ensino Fundamental .............................................................................................................. 119
Quadro 17: as formas nominais, segundo os autores dos livros do Ensino Fundamental de
1970 a 2000 ........................................................................................................................... 123
Quadro 18: abordagem da categoria Aspecto por década Ensino Médio ......................... 132
Quadro 19: abordagem da categoria Modalidade por década Ensino Fundamental ......... 144
Quadro 20: definições de Modo verbal para os autores dos livros do Ensino Fundamental .
............................................................................................................................................... 145
Quadro 21: abordagem da categoria Modalidade por década Ensino Médio ................... 154
Quadro 22: definições de Modo verbal para os autores dos livros do Ensino Médio ......... 155
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 14
2. O LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA E O ENSINO DAS
CATEGORIAS TEMPO, ASPECTO E MODALIDADE ................................................. 18
Apresentação .......................................................................................................................... 18
2.1. Os documentos oficiais: PCNs, PNLD, PNLEM .......................................................... 18
2.2. Algumas pesquisas sobre livro didático ........................................................................ 21
Considerações finais do capítulo .......................................................................................... 26
3. AS CATEGORIAS TEMPO, ASPECTO E MODALIDADE (TAM) .......................... 27
Apresentação .......................................................................................................................... 27
3.1. Tempo .............................................................................................................................. 27
3.2. Aspecto ............................................................................................................................. 37
3.3. Modalidade ...................................................................................................................... 49
3.4. Tempo, Aspecto e Modalidade Orientação Funcionalista ....................................... 60
3.5. Tempo, Aspecto e Modalidade Orientação Sociolinguística .................................... 63
Considerações finais do capítulo .......................................................................................... 67
4. METODOLOGIA .............................................................................................................. 69
Apresentação .......................................................................................................................... 69
4.1. Tipo de pesquisa ............................................................................................................. 69
4.2. Descrição do corpus ........................................................................................................ 69
4.3. As coleções didáticas ....................................................................................................... 71
4.3.1. Resumo das coleções ..................................................................................................... 72
4.3.1.1. Ensino Fundamental ................................................................................................... 72
4.3.1.2. Ensino Médio .............................................................................................................. 75
4.4. Procedimentos metodológicos ........................................................................................ 78
Considerações finais do capítulo .......................................................................................... 80
5. ANÁLISE DAS CATEGORIAS TEMPO, ASPECTO E MODALIDADE NOS
LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA PORTUGUESA ...................................................... 81
Apresentação .......................................................................................................................... 81
5.1. Tempo .............................................................................................................................. 81
5.1.1. O tratamento dado à categoria Tempo pelas coleções do Ensino Fundamental ............ 81
5.1.2. O tratamento dado à categoria Tempo pelas coleções do Ensino Médio ...................... 99
5.1.3. Tempo: um estudo histórico de 1970 a 2000 ............................................................... 110
5.2. Aspecto ........................................................................................................................... 116
5.2.1. O tratamento dado à categoria Aspecto pelas coleções do Ensino Fundamental ........ 116
5.2.2. O tratamento dado à categoria Aspecto pelas coleções do Ensino Médio .................. 132
5.2.3. Aspecto: um estudo histórico de 1970 a 2000 ............................................................. 140
5.3. Modalidade .................................................................................................................... 144
5.3.1. O tratamento dado à categoria Modalidade pelas coleções do Ensino Fundamental .. .....
............................................................................................................................................... 144
5.3.2. O tratamento dado à categoria Modalidade pelas coleções do Ensino Médio ............ 154
5.3.3. Modalidade: um estudo histórico de 1970 a 2000 ....................................................... 161
Considerações finais do capítulo ........................................................................................ 164
6. CONCLUSÕES ................................................................................................................ 166
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 172
7.1. Livros didáticos analisados .......................................................................................... 177
ANEXOS .............................................................................................................................. 180
14
1. INTRODUÇÃO
Por muito tempo, a escola priorizou o ensino prescritivo de gramática, que valida
apenas a abordagem, em sala de aula, da norma padrão. Como relata Faraco (2007), somente
nos anos 1970, começaram debates substanciais acerca da falta de relação entre as teorias
linguísticas e o ensino de língua. Até a década de 1960, predominou uma ideia conservadora
(língua homogênea) sobre a língua no ensino. As teorias linguísticas entraram nos currículos
de Letras na década de 1960 e, desde então, a heterogeneidade linguística foi posta em pauta.
Houve um grande conflito entre as teses descritivistas e o caráter normativo da Gramática
Tradicional. Gregolin (2007) observa que, na década de 1970, surgiu a lei 5692/71, chamada
de Guias Curriculares, os quais apresentavam ideias tradicionais da gramática normativa
misturadas às ideias da ―teoria da comunicação‖
1
, estabelecendo as diretrizes e bases para o
ensino de 1º e 2º graus. Ainda nos anos 1970, o Instituto Nacional do Livro (INL)
2
desenvolve
o Programa Nacional do Livro Didático para o Ensino Fundamental (Plidef)
3
e, no final dessa
década, o INL é substituído pela Fundação Nacional do Material Escolar (Fename).
Nos anos 1980, com a abertura política (fim da ditadura) e as mudanças sociais que
vinham acontecendo no Brasil, não se poderia desprezar mais a heterogeneidade da língua,
visto que a população que a usa é diversificada, por isso, a concepção de ngua na escola
sofreu uma transformação ao perceber-se, conforme Gregolin (2007), que a Gramática
Tradicional não era o único caminho para o ensino da língua. Nesse período, surgiu um
documento chamado Novas Propostas para o Ensino de Língua Portuguesa, criado pela
Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. A base desse novo documento tem caráter
sociolinguístico. No entanto, diz Gregolin (2007), houve um equívoco, nessa época, em
pensar-se que a gramática deveria ser totalmente desprezada. Às ideias da Sociolinguística
somaram-se as da Linguística Textual, passando o texto a ser utilizado como centro nas salas
de aula. Na década de 1980, a Fundação de Assistência ao Estudante (FAE) substitui a
Fename e incorpora o Plidef. Com a edição do decreto 91542, de 19/08/85, o Plidef cede
lugar ao Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), destinado ao Ensino Fundamental, e
os professores passam a ter participação na escolha dos livros didáticos.
1
Neste período, a escola distorceu a proposta de Jakobson, que passou a ser incluída nos manuais didáticos,
aponta Gregolin (2007).
2
Órgão criado pelo Estado, em 1929, para legislar sobre políticas do livro didático.
3
Todas as informações referentes ao livro didático, nestes primeiros parágrafos, tiveram como fonte o sítio do
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) http://www.fnde.gov.br, tópico ―Livro Didático‖.
15
A década de 1990 representou um grande ―salto‖ para o ensino de língua, quando a
língua passou a ser ensinada em uma perspectiva discursiva. Nesse panorama, foram criados
os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), fundamentados, segundo Gregolin (2007),
em uma ideologia discursiva e sociointeracionista. Nessa mesma época, os livros incluídos no
PNLD passam por uma avaliação pedagógica e são excluídos aqueles que contêm erros
conceituais ou os induzem e aqueles que contêm qualquer tipo de preconceito ou
discriminação.
Gregolin (2007, p. 69-70) diz que: ―[...] de um primeiro momento de ênfase na
comunicação durante a ditadura militar, com a abertura política passamos à sociolinguística,
à textualidade e à discursividade‖. Apesar de tantas discussões a respeito do ensino, muitos
problemas perduram até hoje, afirma a autora, mas com ganhos para os envolvidos no ensino,
como a consciência de que a língua deve ser ensinada sob o pilar discursivo. Em 2004, através
da resolução nº 38 do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), é publicado
o Programa Nacional do Livro do Ensino Médio (PNLEM) e o livro didático é universalizado
para os alunos do Ensino Médio das escolas públicas brasileiras. Inicialmente, os livros do
Ensino Médio foram distribuídos apenas para os alunos da 1ª série das regiões Norte e
Nordeste e, posteriormente, estendeu-se a distribuição para as outras regiões e séries. Na
década atual, o PNLD passou a distribuir dicionários de Língua Portuguesa para todos os
alunos do Ensino Fundamental, mudando, mais tarde, a sistemática de distribuição e
fornecendo acervos de dicionários para todas as escolas públicas.
Considerando-se esse contexto, o mergulho histórico na análise dos livros didáticos
torna-se fundamental, principalmente, para entendermos as mudanças que aconteceram e as
que ainda precisam acontecer, até mesmo porque os livros didáticos continuam a ser o
principal instrumento de ensino para o professor. Esta pesquisa, ao fazer um percurso
histórico da década de 1970 até a atualidade, poderá acrescentar muito às pesquisas existentes
sobre livro didático. A nossa análise está pautada na comparação entre as décadas, buscando
observar as mudanças que foram ocorrendo nos livros didáticos, principalmente, após a
inclusão da Linguística nos currículos de Letras, a fim detectar lacunas e viabilizar a reflexão
referente ao trabalho com análise linguística.
O objetivo central desta pesquisa é avaliar como as categorias Tempo, Aspecto e
16
Modalidade são abordadas, no estudo do verbo e do advérbio
4
, pelos autores de livros
didáticos de Língua Portuguesa, nas séries do Ensino Fundamental e nas séries do Ensino
Médio. As categorias Tempo, Aspecto e Modalidade têm sido mais estudadas nessas classes e
manifestam-se principalmente por elas, por isso, selecionamos para a nossa pesquisa o verbo e
o advérbio. Temos como objetivos específicos analisar se o autor:
- diferencia tempo verbal de tempo cronológico;
- mostra que a marcação de Tempo pode ser dada por verbos, advérbios ou pelo
contexto;
- trabalha a variação entre formas verbais para codificar um mesmo tempo;
- considera os usos/ funções da categoria Tempo;
- trabalha os valores semânticos de Aspecto;
- diferencia o uso do perfeito e do imperfeito;
- trabalha usos/ funções dos auxiliares aspectuais;
- explora os sufixos marcadores de Aspecto;
- diferencia Modo de Modalidade;
- trabalha os usos/ funções dos auxiliares modais.
Para isso, buscamos subsídios no espaço teórico do Funcionalismo e da
Sociolinguística. Utilizaremos essas duas teorias porque ambas estudam a língua em uso,
considerando situações reais de comunicação, como mostra o estudo de Tavares (2003).
Portanto, a função de um elemento é considerada em relação ao sistema linguístico e em
relação ao seu contexto de uso, dessa forma, a estrutura gramatical depende do uso que se faz
da língua.
Quanto à metodologia empregada no trabalho, basear-nos-emos em um roteiro com
questões referentes a Tempo, Aspecto e Modalidade na perspectiva do Funcionalismo e da
Sociolinguística. Analisamos 28 livros didáticos, divididos entre as décadas consideradas.
Construímos nosso corpus a partir de algumas seções dos livros didáticos, em que
percebemos a marcação das categorias em estudo, sobretudo verbos e advérbios. Partimos da
hipótese geral de que os autores de livros didáticos abordam, de maneira parcial e não
4
Focamos a análise nos advérbios de tempo e modo.
17
reflexiva, as categorias de Tempo, Aspecto e Modalidade, embora os livros tenham
incorporado mudanças no decorrer das décadas.
Vejamos, agora, como os capítulos deste trabalho se organizam. O primeiro capítulo,
que tem como título: O livro didático de Língua Portuguesa e o ensino das categorias
Tempo, Aspecto e Modalidade, trata da utilização e importância dos livros didáticos no
ensino de Língua Portuguesa, tomando por base documentos como os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs), o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), o
Programa Nacional do Livro do Ensino Médio (PNLEM) e algumas pesquisas sobre o livro
didático. O segundo capítulo, cujo título é As categorias Tempo, Aspecto e Modalidade,
aborda as categorias Tempo, Aspecto e Modalidade na visão do Funcionalismo e da
Sociolinguística. No capítulo intitulado Metodologia descrevemos a metodologia empregada,
expondo o corpus, as coleções didáticas selecionadas e os procedimentos metodológicos
utilizados. O quarto capítulo Análise das categorias Tempo, Aspecto e Modalidade nos
livros didáticos de Língua Portuguesa traz a análise dos livros didáticos. Faremos
comparações entre as séries do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, considerando o
período de 1970 a 2000. Depois, veremos como se deu o estudo de cada categoria nos livros,
fazendo um percurso histórico ao longo das décadas.
Desejamos, com esta pesquisa, compreender o processo pelo qual os livros didáticos
passaram ao longo dos anos, para suscitar reflexões acerca do trabalho com as categorias
Tempo, Aspecto e Modalidade e contribuir na elaboração de material didático de ensino de
Língua Portuguesa.
18
2. O LIVRO DIDÁTICO DE LÍNGUA PORTUGUESA E O ENSINO DAS
CATEGORIAS TEMPO, ASPECTO E MODALIDADE
Apresentação
Neste capítulo, com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), no
Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), no Programa Nacional do Livro do
Ensino Médio (PNLEM), em Ilari (1997), Bagno (2007), Moura (2004), Rodrigues (2005),
Campos (2006) e Pontes (2009), trataremos da importância e utilização do livro didático na
sala de aula e do ensino das categorias Tempo, Aspecto e Modalidade.
2.1. Os documentos oficiais: PCNs, PNLD, PNLEM
O ensino de Língua Portuguesa vem sendo alvo de profundas críticas algumas
décadas. Faraco (2007, p. 40) afirma que ―[...] a intervenção dos lingüistas nos debates sobre
o ensino de português tem trazido contribuições pedagógicas interessantes‖, como, por
exemplo, a construção de uma pedagogia da leitura. Algumas mudanças já estão sendo
efetivadas, principalmente, depois da publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCNs), em 1997, como o trabalho com gêneros discursivos, em vez de considerar,
exclusivamente, o texto literário. Contudo, no tocante aos conhecimentos linguísticos, o
ensino segue, por vezes, a tradição gramatical, o que é refletido nos conteúdos dos livros
didáticos de Língua Portuguesa. Nos PCNs (1998), muito do Funcionalismo, que estuda a
língua em uso e que pressupõe um ensino de gramática pautado na reflexão e não na
memorização de nomenclaturas. Da mesma forma, a Sociolinguística mostra-se presente
nesses documentos, sobretudo, os conceitos de variação e letramento. Como exemplo,
observemos o trecho a seguir, referente a algumas habilidades que o aluno deve adquirir no
processo de análise linguística:
No processo de análise lingüística, espera-se que o aluno:
. constitua um conjunto de conhecimentos sobre o funcionamento da linguagem e
sobre o sistema lingüístico relevantes para as práticas de escuta, leitura e produção
de textos;
. aproprie-se dos instrumentos de natureza procedimental e conceitual necessários
19
para a análise e reflexão lingüística (delimitação e identificação de unidades,
compreensão das relações estabelecidas entre as unidades e das funções discursivas
associadas a elas no contexto);
. seja capaz de verificar as regularidades das diferentes variedades do Português,
reconhecendo os valores sociais nelas implicados e, conseqüentemente, o
preconceito contra as formas populares em oposição às formas dos grupos
socialmente favorecidos [grifo nosso] (PCNs, 1998, p. 52).
[Na prática de análise linguística] Além da escuta, leitura e produção de textos,
parece ser necessária a realização tanto de atividades epilingüísticas, que envolvam
manifestações de um trabalho sobre a língua e suas propriedades, como de
atividades metalingüísticas, que envolvam o trabalho de observação, descrição e
categorização, por meio do qual se constroem explicações para os fenômenos
lingüísticos característicos das práticas discursivas. Por outro lado, não se podem
desprezar as possibilidades que a reflexão lingüística apresenta para o
desenvolvimento dos processos mentais do sujeito, por meio da capacidade de
formular explicações para explicitar as regularidades dos dados que se observam a
partir do conhecimento gramatical implícito. (PCNs, 1998, p. 78).
O Funcionalismo e a Sociolinguística podem trazer contribuições para o ensino de
Língua Portuguesa e para o estudo das categorias Tempo, Aspecto e Modalidade (TAM) nas
salas de Ensino Fundamental e Médio, motivo que nos levou a trabalhar com essas teorias.
Embora os PCNs (1998) tenham incorporado alguns aspectos de teorias linguísticas e
os professores tentem aplicar tais aspectos em sala de aula, como mostram pesquisas na área
(por exemplo, as que apresentaremos na seção 2.2), a incorporação por parte dos livros
didáticos parece mais lenta. No entanto, o Guia de Livros Didáticos para o Ensino
Fundamental e para o Ensino Médio tem auxiliado o professor de Língua Portuguesa, bem
como de outras disciplinas, a avaliar o livro didático que ele tem em mãos. O Programa
Nacional do Livro Didático
5
(PNLD) foi elaborado para analisar coleções didáticas
destinadas ao Ensino Fundamental, enquanto que o Programa Nacional do Livro do Ensino
Médio (PNLEM), criado somente em 2004, avalia as obras do Ensino Médio.
O PNLD/2008 (2007) e o PNLEM/2009 (2008) apresentam alguns requisitos
metodológicos básicos que o livro didático precisa atender. São eles:
explicitação da sua proposta metodológica: através da abordagem dos preceitos
básicos que lhe caracterizam, permitem identificá-la e compreender o seu alcance;
realização das opções teórico-metodológicas assumidas: que devem estar
presentes, de forma coerente, nas atividades de leitura, produção textual, práticas orais e
reflexão sobre a língua e a linguagem;
5
O PNLD iniciou com outra nomenclatura, em 1929 Instituto Nacional do Livro (INL). Desde então, foi se
aperfeiçoando até que, em 1996, os livros inscritos passaram por uma avaliação pedagógica.
20
mobilização e desenvolvimento do maior número possível das capacidades
básicas do pensamento crítico e autônomo (compreensão, memorização, análise, síntese,
formulação de hipóteses, planejamento, argumentação): essas capacidades devem abranger as
mais diversas atividades sobre a língua e a linguagem;
deve apresentar articulação pedagógica entre os diferentes volumes que integram
uma coleção;
deve contribuir para a percepção das relações entre o conhecimento construído e
suas funções na vida social: uma vez que as práticas sociais e culturais em que todo falante
está inserido devem ser consideradas.
Esses requisitos determinam a escolha ou não de um livro didático. São eliminados os
livros que apresentam inconsistência conceitual (os livros didáticos devem estar isentos de
erros e/ou de formulações que induzam a erros), incoerência e inadequação metodológicas (os
livros didáticos devem explicitar com clareza a concepção de ngua e de ensino-
aprendizagem que seguem). O PNLD/2008 (2007)
6
observa vários critérios
7
que são decisivos
para a aprovação de um livro didático, dentre eles, o que diz respeito à reflexão sobre a língua
e a linguagem e construção de conhecimentos linguísticos interessa-nos de modo particular,
visto que analisaremos o tratamento dado às categorias Tempo, Aspecto e Modalidade. O
trabalho com os conhecimentos linguísticos precisa subsidiar o desenvolvimento da
proficiência oral e escrita e permitir que o aluno analise os fatos da língua. Assim, é dever do
livro didático em relação aos conteúdos e atividades referentes aos tópicos linguísticos:
Subsidiar as demais atividades com um aparato conceitual capaz de abordar
adequadamente a estrutura, o funcionamento e os mecanismos característicos dos
gêneros e tipos de texto explorados;
Estar relacionado a situações de uso;
Considerar e respeitar a diversidade linguística, situando as variedades urbanas
de prestígio nesse contexto;
Estimular a reflexão e propiciar a construção e sistematização dos conceitos
abordados (PNLD/2008, 2007, p. 15).
Segundo o PNLD/2008 (2007), o tipo de tratamento didático dado aos conteúdos
linguísticos pelas obras aprovadas corresponde, em sua maioria, à tradicional abordagem
6
Os critérios eliminatórios e classificatórios do PNLEM/2009 (2008) são semelhantes aos do PNLD/2008
(2007).
7
Os demais critérios são relativos: ao trabalho com a linguagem oral, ao manual do professor e aos aspectos
gráficos editoriais.
21
transmissiva (75%)
8
. A metodologia transmissiva acredita que o aluno aprende um conteúdo
a partir da assimilação de informações, noções e conceitos que são organizados pelo professor
e/ou pelos materiais didáticos.
Em relação aos livros do Ensino Médio, o resultado não foi diferente. Embora o
PNLEM/2009 (2008) não apresente resultados em números como o PNLD/2008 (2007), pelas
resenhas das obras pode-se perceber que os conhecimentos linguísticos são abordados com
base na perspectiva tradicional. Segundo o PNLEM/2009 (2008), há uma tentativa dos autores
de redimensionar o ensino da gramática normativa, saindo do nível da frase para o domínio
do texto e do discurso, mas acabam utilizando o texto como pretexto para atividades de
identificação de funções sintáticas, delimitação e classificação de orações, segmentação
mórfica e identificação das classes de palavras. O PNLEM/2009 (2008) mostra que grande
parte das obras apresenta distorções e inconsistências teórico-descritivas quanto aos
conteúdos linguísticos.
Com base no PNLD/2008 (2007) e no PNLEM/2009 (2008), pudemos notar a
primazia da tradição gramatical. Por isso, é importante fazer uma avaliação dos livros
didáticos ao longo dos últimos quarenta anos, a fim de verificar que mudanças ocorreram.
2.2. Algumas pesquisas sobre livro didático
Ilari (1997) fala das reformas no ensino de Língua Portuguesa a partir da década de
1960, quando a Linguística foi introduzida nos currículos de Letras como disciplina
obrigatória. O autor acredita que a reforma que a Linguística trouxe para o ensino, ainda, não
foi totalmente apreendida pela escola, pois os professores continuam focalizando o ensino da
terminologia gramatical e os exercícios escritos, esquecendo de incluir elementos típicos da
expressão falada e fazendo com que os usos linguísticos na escola permaneçam, muitas vezes,
artificiais ―[...] como se o aprendizado fosse para a escola, não para a vida‖ (ILARI, 1997, p.
103). Desse modo, Ilari (1997) afirma que o livro didático é o veículo mais importante das
8
O PNLD/2008 (2007) detectou 4 tendências metodológicas nas coleções aprovadas: transmissiva;
construtivo-reflexiva, quando o aluno é levado a refletir sobre determinado assunto para depois inferir, através
de uma análise orientada pelo professor e/ou pelo livro didático, o conhecimento pretendido; vivencial, o aluno
aprende vivenciando o conteúdo em situações escolares; uso situado, o conteúdo ensinado é socialmente
contextualizado. Nas atividades de construção de conhecimentos linguísticos, apareceram apenas a transmissiva
e a construtivo-reflexiva.
22
ideias que tomaram corpo na Linguística moderna e diz:
É sabido que o professor secundário atua numa dependência muito grande em
relação ao livro didático; por isso o livro didático é um meio potencial de
renovação do ensino e um espelho bastante fiel da prática corrente. Se
examinarmos os livros didáticos mais recentes, e os compararmos com os que se
editavam há vinte anos, notaremos algumas diferenças óbvias [...]. Mas é fácil
perceber que essas diferenças são na maioria das vezes o resultado de uma
concessão à moda, o que é prontamente confirmado pelo fato de que o objetivo
principal continua sendo o ensino da nomenclatura gramatical [grifo nosso] (ILARI,
1997, p. 105-106).
Essa observação de Ilari (1997) é confirmada pelo resultado da avaliação dos livros
didáticos pelo PNLD/2008 (2007) e pelo PNLEM/2009 (2008): a maioria dos livros prioriza a
abordagem tradicional ao tratar dos conhecimentos linguísticos. Ilari (1997) explica que essa
situação não é somente de responsabilidade dos autores de livros didáticos, uma vez que
muitos têm formação científica e longa prática pedagógica. As razões seriam também
comerciais e editoriais, pois, segundo Ilari (1997, p. 106), as editoras pressionam o autor a
produzir ―livros aceitáveis‖ para o professor, pois
[...] os editores sabem que o livro aceitável é o que não inova: de fato, o professor
secundário não tem habitualmente condições de formação e de trabalho para atuar
como agente de inovação; aceita a dependência do livro didático, mas exige em
contrapartida um livro didático que ele possa dominar completamente [...].
O motivo para essa atitude de ―submissão‖ ao livro didático do professor deve-se a
questões salariais e burocráticas, que não lhe permitem planejar e avaliar o trabalho que
desenvolve. Conforme Ilari (1997), o momento de ―real decisão‖ do professor é a escolha do
livro didático e esta é feita, na maioria das vezes, sem a consideração dos verdadeiros
interesses dos alunos. Por isso, o autor afirma que se torna difícil haver mudanças no ensino
de Língua Portuguesa: o ensino não muda porque está intrinsecamente ligado ao livro
didático, o livro didático não muda porque quer acompanhar um ensino a que o professor
tornou-se submisso. Nesse sentido, o papel da Linguística aplicada ao ensino deixa de ser
científico e pedagógico e passa a ter aspectos de uma política educacional.
Bagno (2007) dedica um capítulo para falar dos livros didáticos e toca em um ponto
fundamental: a variação linguística, presente também nos PCNs, no PNLD e no PNLEM.
Bagno (2007) observa que o tratamento da variação nos livros didáticos ainda é problemático,
embora reconheça que muitos autores tenham uma vontade verdadeira de combater o
preconceito linguístico. Contudo, ―[...] a falta de uma base teórica consistente e, sobretudo, a
confusão no emprego dos termos e dos conceitos prejudicam muito o trabalho que se faz
23
nessas obras em torno dos fenômenos de variação e mudança‖ (BAGNO, 2007, p. 119).
Um dos problemas apontados pelo autor é o fato de os livros didáticos associarem a
variação às variedades rurais, regionais e de pessoas não-escolarizadas. É um problema,
porque passa a falsa ideia de que os falantes urbanos e escolarizados não variam a sua língua.
Um dos exemplos que Bagno (2007) dá é a grafia de tirá para o verbo tirar, em uma tentativa
de reproduzir o falar ―caipira‖. No entanto, o apagamento do R final dos verbos no infinitivo
independe da região ou classe social do indivíduo. Da mesma forma, usar a forma perifrástica
ou sintética ou mesmo o presente mais um advérbio de tempo para expressar futuro são
características de todas as variedades linguísticas do Brasil.
Outro problema presente nos livros didáticos são atividades que pedem ao aluno para
―passar para a norma culta‖ textos do Chico Bento, por exemplo. Segundo Bagno (2007, p.
123):
A graça do personagem está precisamente no seu linguajar, na sua visão de mundo
característica da cultura rural, no seu apreço pela vida do campo, entre outros
aspectos. Se existe um trabalho pedagógico interessante a ser feito com o Chico
Bento, é precisamente o de valorizar as diferenças socioculturais que o personagem
tenta encarnar. Mais interessante seria, talvez, [...] discutir com os alunos a não-
fidelidade da transcrição que aparece nas tirinhas.
Atividades dessa natureza colaboram para aumentar o preconceito linguístico, porque
o reconhecimento da diferença e depois é feita a ―correção‖ da fala ―errada‖ do
personagem. Se pedíssemos a um aluno para colocar no Tempo ―correto‖ os exemplos:
(1) [...]
Meu amor o que você faria?
Se só te restasse um dia
Se o mundo fosse acabar?
Me diz o que você faria?
[...]
Andava pelado na chuva
Corria no meio da rua [...]
9
.
(2) Alô?
9
[grifo nosso] Canção: O que você faria/ Composição: Lenine e Paulinho Moska. A canção completa pode ser
encontrada em: <http://letras.terra.com.br>.
24
Alô! Queria falar com o Miguel...
Ele não está. Quer deixar recado?
Não. Ligo outra hora
10
.
(3) Quando você vai entregar o trabalho?
Entrego o trabalho amanhã
11
.
Perderíamos uma discussão muito rica sobre a variação e a correlação forma-função.
Bagno (2007) sugere que se trabalhe com variedades reais, a partir de documentários,
programas jornalísticos, arquivos disponíveis na internet, investigação das origens regionais e
sociais dos próprios alunos e da fala urbana escolarizada.
No intuito de auxiliar os professores a terem uma visão crítica e reflexiva em torno dos
livros didáticos, Bagno (2007) propõe um roteiro para avaliar a adequação do tratamento
dado, pelos livros didáticos, aos fenômenos de variação e mudança linguísticas. As perguntas
vão desde saber se o livro trata da variação linguística até saber se o livro se limita às
variedades rurais e/ou regionais, desprezando casos como (1), (2) e (3) acima mencionados,
casos de variação morfossintática. Entre outros questionamentos, Bagno (2007) busca saber se
o livro didático separa os termos ―norma-padrão‖ (prescrita pela gramática) e ―norma culta‖
(variedades prestigiadas), visto que eles não podem ser confundidos
12
; se há coerência entre o
que o livro didático diz sobre variação e a aplicação desta nos exercícios de gramática; e se o
livro menciona a existência da variação entre fala e escrita.
Trabalhos acadêmicos sobre Tempo, Aspecto e Modalidade (e variação linguística),
nos livros didáticos, demonstram como essas categorias têm sido ensinadas. Moura (2004),
por exemplo, analisou livros do 6º e 7º anos do Ensino Fundamental das coleções: Português:
leitura, produção, gramática, de Leila Lauar Sarmento (2002) e Português: linguagens, de
William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães (2002), utilizados, respectivamente, em
uma escola particular e duas escolas estaduais do município de Nova Esperança (Noroeste do
10
Exemplo de própria autoria.
11
Idem.
12
Assim como Bagno (2007), não estamos concebendo os termos ―norma-padrão‖ e ―norma culta‖ como
sinônimos. A norma- padrão corresponde ao modelo idealizado de língua ―certa‖ presente nas gramáticas;
enquanto a norma culta diz respeito ao uso real da língua, em situação de formalidade, pelos falantes com alto
prestígio social. No entanto, Bagno (2007) chama a atenção para o uso do adjetivo culto (em oposição à popular)
que pode sugerir que os não falantes da norma culta não possuem cultura, usam uma norma inculta. Portanto,
propõe a substituição de norma culta por variedades prestigiadas.
25
Paraná). A autora constatou uma abordagem estruturalista prevalecendo no estudo dos verbos,
além de o texto ser usado como pretexto para o ensino de Tempo, Aspecto e Modalidade, ou
seja, o texto é usado para identificação da classe dos verbos, com o objetivo de retirar as
formas verbais flexionadas em determinado Tempo, Modo, Número, Voz, Pessoa.
Rodrigues (2005), em estudo da variação linguística nos livros didáticos de Língua
Inglesa do Ensino Médio, concluiu que há pouca ou nenhuma referência à variação linguística
no tocante ao trabalho com o texto, com o vocabulário e com o conteúdo gramatical, bem
como, raramente, os livros associam a forma linguística ao contexto discursivo. O autor
escolheu, aleatoriamente, dois livros didáticos adotados em escolas de Fortaleza no ano de
2004: Compact english book, de Wilson Liberato (1998) e Globetrotter, de Marcelo
Baccarin Costa (2001). Ele trabalhou com livros didáticos por considerá-los instrumentos
importantes para o desenvolvimento das aulas. Se todas as línguas variam, o livro didático,
como ferramenta de apoio, deve contemplar as diversas variedades da língua.
Campos (2006) investigou a fraseologia dos verbos try e like, para confrontar os dados
com a prescrição de uso adotada pelo livro didático de Língua Inglesa. A autora utilizou o
corpus BNC (British National Corpus), de falantes nativos de inglês britânico. A sua
finalidade foi demonstrar como dados reais podem auxiliar o ensino de língua estrangeira,
pois o livro analisado apresentava textos adaptados, portanto, não autênticos. A pesquisa de
Campos (2006) concluiu que os livros didáticos não se baseiam em dados reais da língua, ou
seja, em dados extraídos de corpora, todavia, aponta que é imprescindível o uso de dados
empíricos para um estudo mais realista da linguagem.
Pontes (2009) fez uma análise contrastiva entre os livros didáticos de Língua
Portuguesa (Novo diálogo, de Eliana Santos Beltrão e Teresa Gordilho (2004); Português:
linguagens, de William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães (2004)) e Língua
Espanhola (Vale!, de Adda-Nari M. Alves e Angélica Mello (2005); Hacia el español: curso
de lengua y cultura hispánica, de Fátima Cabral Bruno e Maria Angélica Mendonza (2004)),
para verificar o tratamento dado ao Tempo, Aspecto e Modalidade. O seu estudo mostrou que
os livros de Língua Portuguesa e os de Língua Espanhola (Ensinos Fundamental e Médio)
exploram apenas a estrutura morfológica do verbo e apresentam definições superficiais e
restritas, por desconsiderarem o contexto de uso e os efeitos de sentido dos Tempos e Modos
verbais, utilizando frases isoladas para exemplificação. Quanto ao Aspecto, os livros didáticos
limitam-se à diferenciação entre os pretéritos perfeito e imperfeito.
26
O PNLEM/2009 (2008) afirma que o livro didático serve como apoio pedagógico para
o professor, dando-lhe sugestões de como trabalhar os conteúdos em sala de aula, não se
constituindo como único ou melhor meio para o professor seguir. Por isso, é importante que o
professor adeque o livro às reais necessidades de seus alunos e o aproveite da melhor forma,
não sendo totalmente dependente dele. Como afirma Mateus (2002, p. 5): ―o professor é o
piloto que conhece os mares mas necessita muitas vezes de uma luz que o impeça de tropeçar
nos rochedos‖. O livro didático pode ser essa luz, contudo, é preciso rever as políticas
educacionais que regem nossas escolas, a fim de que esse instrumento una, de maneira
efetiva, teoria e prática no tratamento dos conhecimentos linguísticos e se aproxime da
realidade social e cultural do aluno.
Considerações finais do capítulo
A consulta aos PCNs, ao PNLD e ao PNLEM auxiliaram na elaboração do roteiro de
análise, apresentado mais à frente no capítulo de Metodologia. Autores como Ilari (1997) e
Bagno (2007) e as pesquisas desenvolvidas a partir de dados de livros didáticos, mostrados
neste capítulo, ajudaram-nos a ter um olhar mais crítico e minucioso perante os livros
didáticos. Visando a uma discussão mais eficaz, quando da análise dos livros didáticos,
trataremos, a seguir, das categorias Tempo, Aspecto e Modalidade.
27
3. AS CATEGORIAS TEMPO, ASPECTO E MODALIDADE
Apresentação
No presente capítulo, apresentaremos e discutiremos as bases teóricas que regem esta
pesquisa, no que diz respeito às categorias Tempo, Aspecto e Modalidade. Na primeira seção,
trataremos do Tempo, com base em Reichenbach (1947), Givón (1984), Côroa (2005) e Ilari
(2001); na segunda seção, sobre o Aspecto, Vendler (1967), Givón (1984, 2005), Corôa
(2005) e Costa (2002) embasarão nossa discussão e, na terceira seção, trataremos da
Modalidade, fundamentando-nos em Givón (1984, 1995, 2005), Almeida (1988) e Neves
(2006).
3.1. Tempo
A noção de Tempo, em Língua Portuguesa, é dada pela distinção entre presente,
passado e futuro, no entanto, ―nem sempre um determinado tempo verbal corresponde à
definição que a gramática tradicional lhe atribui‖ (MOURA, 2004, p. 57). Por exemplo, ao
proferir ―Vou à sua casa amanhã‖, o falante usou a forma do presente, mas o advérbio de
tempo amanhã confere o sentido de futuro ao enunciado. Portanto, o Tempo, neste caso, é
marcado pelo advérbio.
Givón (1984) definiu o Tempo como ―pontos em uma sequência‖, com as noções de
precedência e subsequência. O autor mostra dois pontos fundamentais envolvidos na
concepção de Tempo: a sequencialidade uma sucessão de pontos, que ocupam uma posição
fixa na ordem linear e ponto de referência correspondente ao tempo de fala, que é ancorado
no falante. O ponto de referência é o eixo do tempo, em que o passado estaria localizado antes
e o futuro, depois desse eixo, como no diagrama abaixo
13
:
13
Cf. Givón (1984, p. 273).
passado
futuro
eixo do
tempo
(presente)
28
Assim, Givón (1984) afirma que o eixo do tempo pode ser absoluto (agora), em que o
momento do enunciado é o centro ou relativo (então), quando é fixado por outros
significados, como advérbios de tempo ou pela referência a outros eventos. Para exemplificar,
pensemos em um enunciado como: Estudei muito para a prova. A ação de estudar ocorreu
antes do momento da fala, portanto, o Tempo é absoluto, apoiando-se na dêixis, em que o
ponto de referência é o falante. em: ―Quando você chegou eu tinha terminado a tarefa
14
, o Tempo é relativo-absoluto, pois chegar e terminar são fatos ocorridos antes do ponto
dêitico da enunciação, sendo que terminar é anterior a chegar. Portanto, neste enunciado,
dois pontos de referência temporal: o momento da enunciação e o fato de chegar (ponto de
referência secundário).
Reichenbach (1947), ao tratar de tempos verbais, afirma que estes determinam tempo
com referência ao ponto temporal do ato de fala. O autor chama o ponto temporal de
momento de fala (MF). As três indicações antes do momento de fala, simultâneo ao
momento de fala e posterior ao momento de fala fornecem apenas três tempos (passado,
presente e futuro), porém, o número de tempos verbais é maior, por isso, nós precisamos de
uma interpretação mais complexa. O autor como exemplo: Peter had gone (Peter tinha
ido), em que a expressão de Tempo se refere a dois eventos, cujas posições são determinadas
em relação ao momento de fala. Reichenbach (1947) denominou esses dois pontos temporais
de momento do evento (ME) e momento de referência (MR). Dessa maneira, o momento
do evento do exemplo é o tempo quando Peter foi. E o momento de referência está localizado
entre o momento do evento e o momento de fala. Graficamente, temos:
ME MR MF
O autor chega a fórmulas envolvendo esses três momentos. Apresentaremos, abaixo,
as combinações possíveis para o Inglês
15
, mostradas pelo autor
16
:
14
Exemplo de Costa (2002, p. 18).
15
As iniciais E, R e S significam, respectivamente: event (momento do evento), reference (momento de
referência) e speech (momento de fala). A direção do tempo é representada como a direção da seta, da esquerda
para a direita. A tradução dos exemplos foi feita de forma literal, podendo não haver correspondência no
Português.
16
Cf. Reichenbach, 1947, p. 290.
29
A seguir, Reichenbach (1947) apresenta as noções de duração e repetição adicionadas
a alguns tempos, que ele chamou de tenses extended (tempos estendidos)
17
:
As combinações feitas por Reichenbach (1947) não se aplicam, diretamente, a uma ou
outra língua natural, mas servem para caracterizar os tempos de várias línguas. Veremos a
seguir como Corôa (2005) aplicou os três momentos de Reichenbach (1947) ao Português.
Corôa (2005) baseia-se nos três pontos temporais propostos por Reichenbach (1947): o
momento de fala (MF), o momento do evento (ME) e o momento de referência (MR). O
momento da fala liga-se ao ato da comunicação e à pessoa do discurso; o momento do evento,
tempo em que se realiza o predicado, é o que se manifesta mais concretamente pelo fato de
possuir um referente definido; o momento de referência é o mais afastado do ato de
comunicação, é um sistema fixo através do qual se pode definir simultaneidade, anterioridade
ou posterioridade. Assim, os Tempos do indicativo poderiam ser representados como
18
:
presente: ME, MF, MR => Carlinhos trabalha no IBC; pretérito mais-que-perfeito: ME
17
Cf. Reichenbach, 1947, p. 290.
18
Nas combinações, as vírgulas representam simultaneidade e os traços, precedência ou posterioridade. Todos os
exemplos são de Corôa (2005). A autora considerou somente o indicativo, porque é o modo em que a categoria
temporal aparece mais nítida e livre de influências modais.
30
MR MF => Eu (já) escrevera a carta quando ele me telefonou; pretérito imperfeito: ME,
MR MF => Carlinhos trabalhava no IBC; pretérito perfeito: ME MF, MR => Ele se
afogou e não pude socorrê-lo; futuro do presente: MF, MR ME => O garoto virá mais
cedo; futuro do pretérito: MR MF ME => O garoto viria mais cedo
19
.
Para a autora, o presente gramatical não se resume ao MF, mas a uma fração de tempo
que inclui o MF. O tempo presente não indica necessariamente contemporaneidade com o
momento da enunciação, o advérbio de tempo é o responsável por representar a
simultaneidade. No entanto, Corôa (2005) lembra que, apesar disso, não nada que
descaracterize o presente como uma forma que tem o ME e o MF simultâneos. Os exemplos
clássicos de presente são os que descrevem hábitos ou ocorrem no momento da enunciação.
Há, também, o presente gnômico, que corresponde aos provérbios ―Água mole em pedra
dura tanto bate até que fura‖ e o presente de verdades atemporais ―A terra gira em torno do
sol‖ (CORÔA, 2005, p. 45). O caso especial de uso do presente é o chamado ―presente
histórico‖, como se fosse possível ao falante retornar ao passado e presenciar o evento no
momento da enunciação ―Em 1940 eclode a guerra e Ted vai para o fronte‖ (CORÔA, 2005,
p. 45).
As formas de pretérito relatam eventos, estados ou processos acontecidos, sendo
subdivididos em: perfeito, imperfeito e mais-que-perfeito. O mais-que-perfeito é um Tempo
relativo, porque precisa de um ponto de referência. Quanto ao imperfeito, Corôa (2005) diz
que esse Tempo não limita o evento realizado (ou que está se realizando) no passado, o
imperfeito não obriga que o evento acabe antes do MF, portanto, o evento é não-limitado.
com o perfeito, ocorre o contrário.
A respeito das formas de futuro, a autora fala da ligação da futuridade com a
Modalidade. Embora ateste isso, Corôa (2005) não pretende investigar o caráter modal das
formas de futuro. No tempo futuro, o ME será sempre precedido pelo MF. O futuro do
presente atesta um evento que se realiza depois do MF (em um tempo que virá). O futuro do
pretérito atesta um evento que não ocorreu, mas que era previsto em um tempo antes do MF.
Por exemplo, em ―O garoto viria mais cedo‖, a vinda do garoto foi vista como futura em
algum momento antes do MF. Para esclarecer seu ponto de vista, Corôa (2005) usa o discurso
indireto: (1) José disse: “Virei mais cedo” / (2) José disse que viria mais cedo. Na segunda
19
Cf. Corôa (2005, p. 57-58)
31
sentença, é considerado algo que José falou antes de (2) ser proferida: o evento ―José dizer
algo‖ é o MR e precede o MF.
Ilari (2001), ao abordar a expressão linguística do Tempo, na Língua Portuguesa, diz
que, inicialmente, é preciso atentar para o fato de que não correspondência biunívoca (um
para um) entre os recursos expressivos e os conteúdos expressos. Entre os exemplos dados
pelo autor, citamos a forma verbal do presente do indicativo
20
:
(4) X faz anos hoje.
(5) X faz anos o mês que vem.
(6) Em 1834, Dom Pedro completa 15 anos e torna-se elegível para o trono imperial
pela lei recém-aprovada.
A forma verbal de presente pode indicar fatos presentes (4), fatos futuros (5) ou fatos
passados (6). Ainda, em relação à falta de biunivocidade, o autor fala que a forma utilizada
para expressar Tempo pode assumir outros valores, como abaixo
21
:
(7) Agora eu era o herói e meu cavalo só falava inglês.
(8) a. Finalmente, um pouco antes das quatro da manhã, a criança dormiu (=
adormeceu), e os pais puderam descansar um pouco.
b. A criança dormiu (= esteve dormindo) das quatro da manhã até a tarde do dia
seguinte.
No exemplo (7), o pretérito imperfeito do indicativo foi usado não para denotar tempo
passado, mas para remeter à fantasia, um mundo de faz-de-conta, típico uso modal. Nos
exemplos em (8), o uso do pretérito perfeito do verbo dormir mostra duas interpretações
distintas para as tantas diferenças de Aspecto. Ilari (2001) afirma que nem sempre é possível
separar valores autenticamente temporais das expressões linguísticas de seus valores
aspectuais e modais. O autor lembra, também, que o estudo do Aspecto e do Modo passa,
necessariamente, pelo estudo do Tempo. Ilari (2001) reconhece o Tempo no plano do mundo,
ou seja, lugar em que são registrados fatos com determinadas relações cronológicas. Portanto,
20
Exemplos de Ilari (2001, p. 9).
21
Exemplos de Ilari (2001, p. 9-10).
32
os tempos verbais são vistos como formas em que o verbo se conjuga para indicar, entre
outras coisas, Tempo.
Ao tratar de Tempo, Ilari (2001) considera os três momentos estruturais de
Reichenbach (1947), assim como fez Corôa (2005). O autor diz que a proposta de
Reichenbach (1947) responde a duas exigências de apelo intuitivo:
a) Em primeiro lugar, fornece instruções para situar o ‗momento de evento‘, isto é,
para localizar no tempo a ação expressa pelo verbo. E esse é, intuitivamente, o
objetivo último do uso dos tempos verbais.
b) Em segundo lugar, ao levar sistematicamente em conta o ‗momento de fala‘,
confirma a intuição corrente de que o fundamento direto ou indireto da interpretação
das formas verbais flexionadas em tempo é a dêixis, isto é, a referência à própria
situação da enunciação [...] (ILARI, 2001, p. 14-15).
Ilari (2001), no entanto, julga ser mais adequado fazer uma análise em termos de
períodos ou lapsos de tempo, em vez de ―momentos‖, por causa do próprio conceito de
momento. Ilari (2001) afirma que a proposta de Reichenbach (1947) não estabelece relação
imediata entre o MF e o ME, mas reconstrói essa relação por meio do MR. O MR, segundo
ele, é importante para explicar o papel dos adjuntos de tempo e para entender algumas
determinações temporais que a sentença sofre no co-texto, isto é, ―[...] à falta de indicações
mais específicas, dadas por exemplo pelos adjuntos de tempo, o co-texto anterior fixa
geralmente o momento de referência da oração seguinte [...]‖ (ILARI, 2001, p. 15). Para
exemplificar, o autor compara as três sentenças seguintes
22
:
(9) Hoje faço trinta anos.
(10) Ontem fiz 30 anos.
(11) Amanhã, terei completado 30 anos.
Em (9) e (10), o advérbio indica o ME, sendo que em (9) há coincidência com o MF,
enquanto que, em (10), isso não ocorre. Ao observarmos a sentença (11), vemos que o ME
(amanhã) é posterior ao MF. Em todos os casos, para Ilari (2001), o advérbio é o MR. Assim,
Ilari (2001) conclui que os adjuntos adverbiais fixam o MR da oração em que se incluem, não
havendo certeza da generalização dessa afirmação, porque sentenças como: X tinha
chegado às 7 de ontem, que podem ter interpretação ambígua, em relação à aplicação do
adjunto. A primeira é que ―às 7 de ontem, a chegada de X era um fato passado‖; a segunda é
22
Cf. Ilari (2001, p. 16-17)
33
que ―em algum momento do passado, a chegada de X era um fato passado, acontecido às 7 de
ontem‖. Isso ocorre não em sentenças com verbo no mais-que-perfeito, mas em todos os
tempos que diferem MR e ME. Ilari (2001) constrói duas hipóteses:
(12) Qualquer adjunto se aplica indiferentemente ao tempo de evento ou ao tempo
de referência, sendo possíveis ambigüidades com aqueles morfemas verbais que
supõem uma diferença entre ambos.
(13) A ambiguidade da aplicação do adjunto a ME ou MR afeta aquelas formas
em que MR e ME são diferentes.
(ILARI, 2001, p. 18-19)
Essa discussão acima é essencial para compreendermos os adjuntos adverbiais que
localizam um evento no tempo (valores não durativos e não iterativos dos morfemas verbais
de tempo), que, segundo Ilari (2001), sempre corresponderiam ao MR ou ME. Quando os
tempos verbais co-ocorrem com adjuntos, aqueles assumem outros valores que não o seu
valor básico
23
:
(14) Em 1939, Hitler invade a Áustria
24
.
(15) Amanhã eu estudo isso.
O presente do indicativo foi usado, em (14), com o valor de presente histórico. Em
(15), o valor é de futuro. Às vezes, o verbo pode operar sobre o adjunto, modificando o seu
valor:
(16) Agora, o paciente já não sentia dores, só um leve cansaço.
O adjunto agora, em (16), indica um momento passado. Desse modo, Ilari (2001) fala
de valores temporais que se aplicam ao morfema verbal quando isolado; e em valores
aplicados ao morfema verbal quando acompanhado de um advérbio.
Para localizar eventos no tempo, o autor trata, ainda, das perífrases de tempo. As
perífrases verbais são constituídas por um verbo auxiliar, conjugado em uma das flexões de
Tempo, Modo e Pessoa disponíveis, e uma base verbal, isto é, verbo de sentido pleno (ou
principal, nos termos das gramáticas normativas) em uma das formas não conjugadas ou
23
Estamos considerando como valor básico do tempo verbal exemplos como: Eu estudo, em que a forma verbal
é de presente; como na sentença não há outro elemento que indique o contrário, afirmamos que o valor de toda a
sentença é de presente. Assim, neste caso, o presente assume o valor básico indicado nas gramáticas normativas:
simultaneidade ao MF.
24
Os exemplos de (14) a (16) são de Ilari (2001, p. 24-25).
34
nominais (infinitivo, gerúndio, particípio). São exemplos:
(17) a. Devo partir amanhã.
b. Acabo de ler este romance.
c. Estou observando as formigas.
d. Vou atender o telefone daqui a pouco.
e. Tenho que terminar meu relatório.
f. Tenho ouvido falar dele
25
.
O autor adota alguns critérios para o reconhecimento de auxiliares de Tempo, uma vez
que as gramáticas normativas apresentam as perífrases com ter e haver como tempos à parte.
Tradicionalmente, três critérios para classificar como tempos compostos as perífrases com
ter + particípio passado: 1) a perífrase pode ser substituída por uma forma simples (tinha
feito/ fizera)
26
, havendo equivalência semântica; 2) o verbo ter possui sentidos diferentes
quando usado como verbo principal (eu tinha um paletó marrom) ou como auxiliar (eu tinha
visto muitas fraudes); 3) o auxiliar ter e a base verbal designam uma única ação, atribuída a
um único sujeito (tenho invejado muitos vizinhos diferente de tenho muitos vizinhos
invejados). No entanto, esses critérios servem para diferenciar os usos de ter como verbo
auxiliar e verbo transitivo. Para Ilari (2001), a presença do verbo ter, em uma sentença,
influencia a interpretação temporal desta, causando um efeito regular que aparece, por
exemplo, na comparação de farei e terei feito: o fato descrito por uma sentença com o
auxiliar ter num tempo verbal qualquer aparece como passado em relação ao tempo em que se
localizaria, se aquele morfema de tempo fosse aplicado à base verbal‖ (ILARI, 2001, p. 29).
O autor trata, também, das construções acabar de + infinitivo; ir + infinitivo; dever,
ter que, haver de + infinitivo. Segundo Ilari (2001), é preciso observar duas questões: a
distinção de um uso verbal pleno e um auxiliar para o verbo; o efeito causado na interpretação
de uma sentença pela presença do auxiliar, visto que muitos auxiliares não-temporais. Ele
caracteriza as perífrases, mostrando os seus valores temporais: acabar (conclusão de uma ação
25
Exemplos de Ilari (2001, p. 28).
26
Todos os exemplos deste parágrafo são de Ilari (2001).
35
O menino acabou o mingau/ passado recente O menino acabou de comer o mingau); ir
(usado com adjunto adverbial de lugar aonde Aonde você vai? Vou fechar a porta/ usado
com adjunto adverbial facultativamente presente, indicando procedência Marco Polo foi [de
Veneza] até Cantão); dever, ter que, haver de (esses auxiliares atribuem ao valor temporal
diferentes tipos de Modalidade e têm a capacidade de indicar que o ME é posterior ao MR
Amanhã, o médico deve chegar por volta das 9 ou que ME = MR são posteriores a MF).
Ilari (2001) conclui que os valores temporais podem advir de três contextos oracionais:
a) aqueles em que o tempo do verbo é a única especificação temporal; b) aqueles em que
ocorrem adjuntos de Tempo; c) aqueles em que ocorrem auxiliares.
As noções sobre Tempo, apresentadas até agora, podem ajudar o aluno a compreender
como se dá a marcação de Tempo na Língua Portuguesa, que não é dada apenas pela
desinência modo-temporal da forma verbal. Observemos os exemplos abaixo
27
:
(18) Em 1914 eclode a Primeira Guerra.
(19) Eclode a Primeira Guerra.
Tanto em (18) quanto em (19), o tempo verbal é o presente. No entanto, a sentença
(19) causaria estranhamento ao ouvinte nos dias atuais, pois não apresenta uma medida de
Tempo, necessitando de um contexto maior. A sentença (18) tem como momento de
referência o ano de 1914 e, portanto, poderia ser proferida no momento presente sem provocar
surpresa. Desse modo, com essa diferenciação, o repertório linguístico do aluno se ampliaria,
que o tempo verbal é um (presente) e o tempo cronológico é outro (o evento ocorreu em
algum momento antes da fala). casos em que os dois tempos podem coincidir, como
quando alguém diz: ―Leve o guarda-chuva. Chove‖. Imaginemos que a frase foi proferida no
momento em que chovia e o ouvinte estava de saída.
Outro ponto importante da categoria Tempo, que não pode ser esquecido na sala de
aula, é que um mesmo tempo verbal pode assumir várias funções ou ser representado por mais
de uma forma, casos como os exemplos (1), (2) e (3), retomados aqui:
(1) [...]
Meu amor o que você faria?
27
Exemplos de Corôa (2005, p. 40).
36
Se só te restasse um dia
Se o mundo fosse acabar?
Me diz o que você faria?
[...]
Andava pelado na chuva
Corria no meio da rua
[...]
(2) Alô?
Alô! Queria falar com o Miguel...
Ele não está. Quer deixar recado?
Não. Ligo outra hora.
(3) Quando você vai entregar o trabalho?
Entrego o trabalho amanhã.
Em (1) e (2), temos o pretérito imperfeito assumindo funções que não são as
prototípicas (básicas): a de futuro do pretérito e a de presente, respectivamente. No primeiro
caso, há uma construção hipotética (se só te restasse um dia/ se o mundo fosse acabar?), o que
permite, no vernáculo, que o futuro do pretérito seja substituído pela forma imperfeita,
segundo Silva (1998)
28
, Bagno (2007) e Dias (2007)
29
. No segundo caso, o pretérito
imperfeito não denota passado (não se quer mais falar com Miguel), esse tempo verbal
constitui um meio polido conversacional de efetuar um pedido, conforme Searle (2002). Já em
(3), temos mais de uma forma (perífrase, presente) para representar uma mesma função
(futuro).
-se que o estudo dos Tempos verbais não pode ser feito dissociado da situação
comunicativa, senão os alunos estarão limitados a reconhecer as desinências modo-temporais
e nomeá-las.
28
Silva (1998) analisou a alternância entre o pretérito perfeito e o futuro do pretérito na fala de Florianópolis.
29
Dias (2007) estudou a variação do pretérito imperfeito e do futuro do pretérito em construções condicionais.
37
3.2. Aspecto
O Aspecto refere-se ao desenvolvimento interno de uma situação, ao seu Tempo
interno. Nos livros didáticos, podemos perceber alguma referência a Aspecto no tratamento
dos pretéritos perfeito e imperfeito, mas a abordagem é feita em frases isoladas, como no
exercício abaixo:
3.
30
Leia as frases:
O dono da casa não encontrou o pichador, pois ele já tinha fugido.
Abandonou a bebida e tornou-se outra pessoa.
Desde jovem, freqüentava as reuniões do clube e visitava os amigos.
Ele tentava instalar a antena no telhado, mas a chuva não deixou.
Em qual delas a forma verbal destacada expressa a noção de:
a) ação interrompida por outra ação? c) ação contínua, que se repete?
b) ação ocorrida antes de outra ação? d) ação concluída?
(CEREJA e MAGALHÃES, 2002a, p. 229)
Porém, a noção de Aspecto não se reduz a Aspecto gramatical. Traços semânticos,
também, devem ser levados em consideração, como telicidade, dinamicidade, duratividade,
habitualidade, iteratividade, entre outros. Com base nesses traços, surge a noção de perfectivo
e imperfectivo.
Givón (2005) considera a aspectualidade como sendo outro elemento da perspectiva
temporal, que está associado aos marcadores gramaticais de Tempo. Na visão de Givón
(1984), o Aspecto durativo não constrói um evento como tendo os limites inicial e terminal.
Em contraste, o Aspecto pontual constrói um evento como tendo tais limites. O ponto de
referência localiza o evento no tempo, dando a posição relativa dos dois limites. Segundo o
autor, na duratividade, falta o limite terminal porque o evento/estado está localizado no meio
do eixo do tempo, portanto, ainda, não chegou ao fim. Por outro lado, o limite inicial pode
estar ausente. Ele afirma que, na lógica pura dos termos, um evento no meio da ocorrência
deve ter um começo, contudo, remoto no passado. Senão, não existiria um evento, mas um
estado permanente.
O contraste entre perfectivo (completo, compacto, bem-delimitado) e imperfectivo
(durativo, difuso, não-delimitado) envolve o limite terminal dos eventos, bem como a relação
deles no eixo do tempo. Quanto à terminação de um evento, para ele ser considerado
30
O número corresponde ao número da questão no livro didático.
38
perfectivo, precisa ter sido completado/ terminado/ realizado, isto é, ter um limite terminal no
eixo do tempo. Um evento é imperfectivo quando o limite terminal não está presente no eixo
do tempo. Em relação ao ponto de referência, o eixo do tempo fica no ponto final de um
evento perfectivo ou onde o ponto final seria construído caso o evento fosse limitado por um
evento imperfectivo. Givón (1984) afirma, ainda, que o Aspecto mais comum do imperfectivo
é o durativo/ contínuo e a categoria mais comum associada com o perfectivo é o passado.
Em Givón (2005), encontramos duas subdivisões do perfectivo: o preterit codifica
eventos passados que são relevantes no momento em que ocorreram e os eventos apresentam-
se em sequência; e o perfect representa eventos que ocorreram em um momento anterior e
são relevantes posteriormente, ou seja, eventos cuja relevância está ancorada no tempo de
fala, como o exemplo dado pelo autor: ―context Would you like something to eat now?,
response Thanks, I’ve already eaten‖/ contexto Você gostaria de comer algo agora?,
resposta Obrigado, eu comi/jantei (GIVÓN, 2005, p. 158). O fato de o falante ter
jantado teve relevância diante da pergunta do outro. Para o preterit, teríamos: ―context
What did you do then?, response I ate dinner‖/ contexto O que você fez então?, resposta
Eu jantei (GIVÓN, 2005, p. 158). O fato de ter jantado não tem relevância no momento atual.
Vendler (1967), ao tratar do Aspecto, divide os verbos em quatro tipos, de acordo com
um esquema de tipos de verbos
31
: atividade o evento dura todo o tempo da ação;
accomplishment dentro de um determinado período de tempo, ocorre a realização do
evento; achievment a realização do evento é pontual, ocorre em um momento; estado
os eventos duram longos períodos de tempo.
Para o autor, um evento como correr ou empurrar uma carroça é uma atividade, pois,
se alguém estava realizando uma dessas atividades e parou no próximo instante de tempo, será
verdade que correu ou empurrou a carroça. Porém, correr uma milha, desenhar um círculo ou
escrever uma carta são accomplishments, visto que, se alguém realiza um desses eventos e
para no próximo momento, pode não ser verdadeiro que tenha realizado tais eventos. Quem
para a corrida de uma milha, não correu uma milha; quem para o desenho de um círculo, não
o desenhou e quem para a escrita de uma carta, também não a fez. Vendler (1967) afirma que
enquanto correr ou empurrar uma carroça não precisam de um ponto terminal, correr uma
31
Os termos achievment e accomplishment serão mantidos na língua original para preservar a distinção entre
eles, pois os mesmos significam realização, sendo uma pontual e outra com delimitação do período de tempo,
respectivamente.
39
milha, desenhar um círculo ou escrever uma carta têm um ―clímax‖, que deve ser alcançado
se a ação é o que afirmou ser.
Alcançar o cume de uma montanha trata-se de um achievment. O autor usa este
exemplo para diferenciar os verbos accomplishments dos verbos achievments. Se um homem
levou três horas para alcançar o cume de uma montanha, não significa que o alcance do cume
teve a duração de três horas. As três horas correspondem à subida da montanha até o alcance
de seu cume. No entanto, se uma pessoa escreveu uma carta (accomplishment) em uma hora,
significa dizer que a escrita da carta teve a duração daquela hora. Por isso, os achievments têm
realização pontual e os accomplishments têm a realização do evento em um determinado
período de tempo, ou seja, é possível delimitar a ação.
Quanto aos estados, Vendler (1967) aponta verbos como amar, conhecer, saber. Uma
pessoa não poderia amar, conhecer ou saber deliberadamente ou cuidadosamente, tampouco
ser acusada ou responsabilizada por amar, conhecer ou saber. Desse modo, os estados não
podem ser qualificados como ações. Para os estados, Vendler (1967) faz, ainda, a distinção
entre estados específicos e estados genéricos. Dirigir táxi (profissão) driving a cab é um
estado específico, pois, em alguns momentos, o motorista ―realmente‖ dirige o seu táxi. Por
outro lado, governar um país (cargo) ruling a country é um estado genérico, porque um
governante (ruler) nunca se envolve em uma atividade específica de governar um país,
enquanto que dirigir táxi é uma atividade específica de um motorista de táxi (cabdriver).
Coan (2003) chama a atenção para essa tipologia verbal quadripartida de Vendler
(1967). Em princípio, poderia parecer que o autor pretende apenas categorizar os verbos:
[...] entretanto, Verkuyl (1972) e Dowty (1972-79) referem-se à essa tipologia como
servindo à classificação de significados sentenciais e não apenas dos verbos; assim,
sujeito, objeto, tempo verbal e advérbios temporais exercem função em determinar a
que classe uma expressão pertence (apud Moens, 1987). Pudemos, então, notar que
aspecto é uma categoria que compõe a significação das formas verbais, mas que
pode ter seus traços básicos alterados em função da conjugação da forma verbal com
outras categorias gramaticais no discurso (COAN, 2003, p. 104).
Relacionando os traços de dinamicidade e telicidade à proposta de Vendler (1967),
segundo Peres (1993 apud Coan, 2003), temos: accomplishments (+ dinâmico, + terminativo),
achievments (- dinâmico, + terminativo), atividades (+ dinâmico, - terminativo) e estados (-
dinâmico, - terminativo).
Enquanto o Aspecto diz respeito ao tempo inerente ao processo, sendo propriedade
40
apenas da sentença e não se referindo ao tempo da enunciação, o Tempo (tempus) é o tempo
do processo, pertencendo à sentença e à enunciação (CORÔA, 2005). Corôa (2005) observa
que, em português, a distinção entre pretérito perfeito e imperfeito se dá não pelo fato de
que, no perfectivo, o evento é contemplado a partir de seu término ou de suas consequências
e, no imperfectivo, o evento é surpreendido em pleno desenvolvimento, mas pela oposição
entre tempo dêitico (ancorado no momento de fala) e tempo não-dêitico (ancorado em um
momento de referência diferente do momento de fala).
uma preocupação de Corôa (2005) em distinguir Aspecto (aspekt) de modo de ser
da ação (aktionsart). Termos que, segundo ela, trazem confusão por serem usados como
sinônimos nas línguas românicas. A autora classifica o Aspecto como categoria gramatical e o
modo de ser da ação como categoria léxico-semântica. Para exemplificar, Corôa (2005, p. 66)
apresenta as seguintes sentenças:
(20) Acabei de ler Vidas Secas.
(21) Li Vidas Secas.
Tanto em (20) quanto em (21), a ação foi completada. Em (20), a ação foi completada
através de uma perífrase, recurso lexical, tratando-se do modo de ser da ação. Em (21), o
pretérito perfeito caracterizou a completude da ação, um recurso gramatical ou morfológico,
nesse caso, temos a noção de Aspecto.
O Aspecto é caracterizado, por Corôa (2005), como o desenvolvimento dos eventos de
um estado inicial para um estado final. Segundo ela, o Aspecto é identificado como duração
por causa da propriedade que os eventos têm de se ―estender‖ por certo período de tempo, por
mínimo que seja esse tempo. No entanto, a noção de duração do Aspecto está para além de
uma representação linear de Tempo, a noção de duração precisa ser melhor caracterizada. O
mais relevante no Aspecto não é a oposição momentâneo (pontual)/durativo, mas a oposição
perfectivo (concluso)/imperfectivo (inconcluso). Assim como os verbos russos, diz a autora,
no português, os verbos perfectivos são limitados e os imperfectivos, ilimitados. No
perfectivo, podemos indicar o começo e o fim do processo, porém, o mesmo não ocorre com o
imperfectivo. Para exemplificar, a autora apresenta as seguintes sentenças: (a) Ele se afogava
e eu não podia salvá-lo/ (b) Ele se afogou e eu não pude salvá-lo. A primeira sentença (a)
não implica a morte da pessoa, enquanto a segunda (b) sim, pois, se ―cancelarmos‖ a
41
possibilidade de morte na segunda sentença, teríamos a seguinte contradição: (b‘) Ele se
afogou e eu não pude salvá-lo, quando os salva-vidas chegaram e o salvaram. No entanto,
para a sentença (a) é possível tal correlação: (a‘) Ele se afogava e eu não podia salvá-lo,
quando os salva-vidas chegaram e o salvaram. Isso acontece, porque, na sentença (b)
(perfeito), os limites são percebidos, conhece-se o resultado da ação pela enunciação.
Contudo, os limites de (a) (imperfeito) não são explicitados e, portanto, como não se pode
delimitar o fim do processo, não podemos inferir que a pessoa vista pelo outro morreu.
Apesar de o Aspecto ser comumente associado aos pretéritos perfeito e imperfeito, o
presente e as formas nominais do verbo podem apresentar noções aspectuais. Corôa (2005)
mostra o gerúndio como inconcluso (imperfectivo), o particípio como concluso (perfectivo) e
o infinitivo sem Tempo, Aspecto ou Modo, que a forma infinitiva guarda a significação
verbal. Para o presente, Corôa (2005, p. 72) exemplifica a noção aspectual do seguinte modo:
(22) Escrevo em uma tarde de verão.
(23) Amanhã, levanto-me cedo e faço logo isso.
(24) Carlinhos trabalha no IBC.
(25) A terra gira em torno do sol.
(26) Vou para a escola de ônibus.
Embora todos os exemplos estejam no presente, podemos identificá-los com o
Aspecto. Em (22), percebemos o Aspecto imperfectivo, com a noção de cursividade, pois a
ação está em pleno desenvolvimento. A forma de presente em (23) indica futuro e não
simultaneidade entre o momento de fala e o momento do evento. A sentença (24) mostra o
não-limite da ação e, em (25) e (26), notamos hábitos ou repetição da ação. Por estes
exemplos, Corôa (2005) quer reconhecer o valor aspectual do presente, que nem sempre
expressa simultaneidade entre MF e ME. Para que essa relação seja verdadeira, MF = ME,
precisamos recorrer a adjuntos temporais como ―já‖, ―agora‖ etc.
A interpretação aspectual, conforme Corôa (2005), deve considerar a quantificação
dos subeventos de um evento. O subevento
32
corresponde aos estados intermediários de um
32
Corôa (2005) considerou o conceito de SUBEVENTO de Goldsmith e Woisetschlaeger (1982).
42
evento, incluindo os estados inicial e terminal. Dessa forma, Corôa (2005, p. 74) apresenta as
sentenças abaixo:
(27) José arquivava as cartas.
(28) José arquivou as cartas.
A sentença (28) mostra que todos os subeventos do evento de arquivar as cartas
foram concluídos. Trata-se do Aspecto perfectivo. Em contraste, em (27), o evento ainda está
em pleno desenvolvimento, Aspecto imperfectivo. A autora justifica essa consideração
dizendo que, em (27), há ao menos um subevento do evento arquivar as cartas que dura no
tempo t (tempo de realização daquele evento). Portanto, ―[...] é possível um subevento, ou
mais de um, não estar em t: fica aberta a possibilidade de que a ação tenha começado ou não
dentro do intervalo de tempo especificado, t [...]‖ (CORÔA, 2005, p. 74).
Vale ressaltar, também, o Aspecto progressivo. Para Corôa (2005), as formas
progressivas não se ligam diretamente à duração, uma vez que as formas progressivas dizem
respeito à maneira de descrever o evento e não à duração deste evento, é uma visão do
processo em si sem relação com o momento da enunciação. Para exemplificar, a autora
apresenta as seguintes sentenças:
(29) Carlinhos trabalha no IBC.
(30) Carlinhos está trabalhando no IBC.
Em (30), a forma progressiva está trabalhando passa a ideia de que o evento trabalhar
ocorre simultaneamente à enunciação. Contudo, fazendo um paralelo com os exemplos (31) e
(32), as conclusões são outras:
(31) Carlinhos trabalha no IBC desde 1965.
(32) Carlinhos está trabalhando no IBC desde 1965.
Em (31) e (32), a duração do evento é igual, embora (31) esteja no presente e (32) na
forma progressiva. Desse modo, caso (29) e (30) se referissem a uma descrição de Carlinhos
ou a notícias dadas sobre Carlinhos (que não é visto muito tempo), então, (29) conduz a
uma noção mais estável do emprego de Carlinhos, algo mais duradouro do que (30) transmite:
43
um emprego provisório, menos estável. À vista disso, Corôa (2005) afirma que a noção de
duração não é indicada somente pela forma progressiva.
Costa (2002) refere-se a Tempo e Aspecto como categorias temporais, uma vez que
ambos têm por base referencial o tempo físico. No entanto, diferem-se do ponto de vista
semântico: Tempo tempo externo, localização do fato enunciado em relação ao momento da
enunciação, de modo geral, são as noções de presente, passado e futuro e suas subdivisões;
Aspecto tempo interno, noções de duração, instantaneidade, começo, desenvolvimento e
fim, isto é, tempo decorrido dentro dos limites do fato. Para essa diferença se tornar mais
clara, a autora opõe os exemplos:
(33) Caminhei muito.
(34) Estive caminhando por muito tempo.
Em (33), a ação de caminhar ocorreu antes do MF, portanto, há marca de Tempo, pois
está ancorada na dêixis, cujo ponto de referência é o falante. Em (34), além da expressão de
Tempo (passado, em relação ao MF), o falante quer mostrar o desenvolvimento da ação.
Costa (2002, p. 20) diz que:
O falante chama a atenção para o tempo interno ao fato; é como se víssemos o
tempo se escoando, como se ele se concretizasse no espaço. Assim, enquanto a
categoria de Tempo trata o fato enquanto ponto distribuído na linha de tempo, a
categoria de Aspecto trata o fato como passível de conter frações de tempo que
decorrem dentro dos seus limites.
Além dessa característica (não-referência à localização no tempo), Costa (2002) diz
que o traço [+ durativo] das entidades de segunda ordem
33
(processos, atividades, estados),
por meio de seus lexemas, é essencial para atualizar a categoria de Aspecto. Lexemas que não
portam esse traço tendem a restringir a atualização do Aspecto. Ainda, para atualizar a
categoria, Costa (2002) afirma ser necessário que o fato verbal esteja no singular. A autora
não se baseia nas gramáticas normativas, que colocam as três primeiras pessoas do verbo
como o número singular e as três últimas como expressão do plural. Costa (2002) toma por
Número verbal a repetição ou não do fato verbal, dando a oposição semelfactivo (o fato
verbal ocorre apenas uma vez, singular) x repetido (iterativo ou frequentativo, plural). Por
33
Costa (2002) chamou de entidades de segunda ordem os acontecimentos, os processos, os estados e outros
tipos de ocorrências que podem ser localizadas no tempo (não existem, acontecem). As de primeira ordem são as
localizadas no espaço (existem, são objetos físicos). As de terceira ordem não se localizam no tempo nem no
espaço, são abstratas (proposições).
44
exemplo, saltitar (verbo iterativo para as gramáticas normativas) representa repetição do fato
verbal expresso por saltar (semelfactivo). Portanto, Costa (2002) restringe o Aspecto ao
Número singular, desconsiderando a iteratividade como uma das noções aspectuais, pois, para
ela, fatos iterativos se sucedem na linha do tempo, não se referindo necessariamente à
constituição temporal interna. Trata-se de fatos distribuídos no tempo e não de tempo interno
ao fato.
Após caracterizar o Aspecto, Costa (2002) fala da distinção entre perfectivo e
imperfectivo. O perfectivo é o fato enunciado como global, sem marcação de sua
temporalidade interna. O imperfectivo marca a temporalidade interna do fato, ou expressando
cursividade, ou as fases inicial, intermediária e final, ou estados resultativos. Ela mostra
alguns equívocos em relação a essa distinção, que consistem em atribuir ao perfectivo e
imperfectivo as seguintes características: perfectivo de curta duração, com limite, pontual
ou momentâneo, acabado; imperfectivo longa duração, duração ilimitada, durativo, não-
acabado. Para ela, o problema está em não se poder generalizar esses traços para todos os
casos, por isso, não servem para definir a categoria.
Em primeiro lugar, se compararmos dois fatos, em que um deles é visto de forma
global e o outro tem a sua marcação temporal interna mencionada, a impressão que temos é
que o fato referido globalmente é mais curto, podendo ser percebido como pontual, ao
contrário do outro, que é não-pontual. O mesmo ocorre com os limites. O fato que é global
terá seus limites inicial e final marcados, enquanto o outro não terá necessariamente essa
marcação, conforme Costa (2002). Por exemplo
34
: (a) Correu água durante todo o dia (forma
perfectiva global, pontual, com limite)/ (b) Ficou correndo água durante todo o dia (forma
imperfectiva marcação da temporalidade interna do processo de correr, não-pontual, sem
limite). A autora considera o imperfectivo o verdadeiro atualizador do Aspecto no Português,
portanto, identificá-lo apenas como durativo é deixar de lado a distinção aspectual básica,
pois a duração é uma das formas de expressão do imperfectivo. O imperfectivo, também,
expressa fases internas e estado resultante.
Outro equívoco é afirmar que o perfectivo se refere a fatos acabados e o imperfectivo,
a fatos inacabados. Costa (2002) fala que o perfectivo não mostra qualquer dos pontos
constitutivos de seu ―tempo interno‖, apresentando o fato como completo, com princípio,
34
Exemplos de Costa (2002, p. 31).
45
meio e fim. A autora completa:
Realmente, se se considera um fato como acabado ele é acabado em relação a quê?
se pode considerá-lo acabado em relação ao ponto dêitico, ao presente, portanto.
Daí, a noção de acabado ter mais relação com o Tempo do que com Aspecto. Todo
perfectivo implica necessariamente que o fato que se expressa seja visto como um
todo no qual se inclui o ponto terminal. Mas isso não implica dizer que todo
perfectivo refere fatos acabados, porque, se assim fosse, o perfectivo seria privativo
do tempo passado (COSTA, 2002, p. 33).
Costa (2002) finaliza dizendo que formas perfectivas no presente e no futuro, pelas
quais o fato é referido como um bloco, e não se pode afirmar que um fato futuro está acabado.
Logo, não é adequado afirmar que o perfectivo se refere a fatos acabados, senão o perfectivo
seria exclusivo do tempo passado.
Ao considerar o perfectivo como a forma não-marcada para as nuances da constituição
temporal interna e o imperfectivo como a forma marcada, menos previsível, Costa (2002, p.
38) diz que ―marcar a categoria de Aspecto em português significa, em última instância,
imperfectizar o enunciado‖ e que a imperfectividade pode ser atualizada por lexemas,
morfemas ou perífrases.
Os lexemas que portam a marca aspectual (verbos, alguns advérbios, adjetivos,
algumas conjunções) podem trazer a constituição temporal interna do fato referida, como
crescer, progredir, desenvolver, refletir e outros verbos que se referem a processos, atividades
ou estados. Os morfemas derivacionais (afixos) também atualizam o Aspecto, mas
restringem-se aos sufixos. Os prefixos não são considerados marcadores aspectuais, nem pelas
gramáticas normativas nem pelos linguistas. Costa (2002), tomando por base o estudo de
Soares (1984)
35
, afirma que verbos, como amanhecer e ressoar, têm no seu significado um
componente semântico aspectual, contudo, esses morfemas são pouco produtivos em
Português, em termos derivacionais. Costa (2002, p. 41) exemplifica os sufixos marcadores de
Aspecto:
-EAR: cabecear, folhear
-ECER: amanhecer
-EJAR: gotejar, branquejar
-ICAR: bebericar
-ITAR: saltitar
-ILHAR: dedilhar
-INHAR: escrevinhar
-ISCAR: chuviscar, mordiscar
35
SOARES, M. A. B. P. A semântica do aspecto verbal em russo e em português. Rio de Janeiro,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1984. Tese de Doutorado, mimeogr.
46
Os três últimos verbos (escrevinhar, chuviscar e mordiscar), segundo ela, não
apresentam marca aspectual, visto que a ideia acrescentada pelo sufixo se aproxima mais da
categoria de Grau: escrevinhar diminuição; chuviscar, mordiscar pouca intensidade.
Bebericar e saltitar denotam diminuição e iteração, com a oposição iterativo x semelfactivo.
Os outros verbos podem portar o traço [+ durativo] no seu significado.
Costa (2002), fundamentando-se em Soares (1984), diz que esses morfemas não têm
uso frequente na atualidade. Os morfemas mais utilizados, hoje em dia, que acrescentam a
noção de processo ao verbo, são ECER (emagrecer, amadurecer, esclarecer), IFICAR
(solidificar, modificar, eletrificar) e IZAR (enfatizar, realizar, utilizar). O sufixo IZAR é o
mais produtivo deles para expressarmos a passagem de alguma coisa por algum processo:
informatizar, inicializar, problematizar, colorizar, entre outros.
Quanto ao tempos verbais que atualizam o Aspecto, Costa (2002) ênfase às formas
que marcam imperfectividade no Português: gerúndio, particípio, pretérito perfeito composto
e pretérito imperfeito (do indicativo e do subjuntivo). O gerúndio e o particípio não informam
sobre o momento do enunciado em relação ao momento da enunciação, ―mas referem de uma
determinada forma o tempo físico, uma vez que o gerúndio expressa processo e o particípio
expressa estado como resultado de um processo‖ (COSTA, 2002, p. 44). O gerúndio denota
imperfectividade em curso e voz ativa e o particípio, imperfectividade resultativa e voz
passiva.
O pretérito perfeito composto é o único Tempo composto, de acordo com Costa
(2002), que pode portar traço de imperfectividade. Nos Tempos simples, é o pretérito
imperfeito que porta esse traço. Para considerar o pretérito perfeito composto como expressão
da imperfectividade, é preciso analisar o seu valor semântico (de continuidade ou iteração) no
enunciado. Observemos alguns exemplos de Costa (2002, p. 47):
(35) Nestes últimos três anos, tenho tido muito sucesso.
(36) Muitos estrangeiros têm vindo aqui.
(37) Você sabe que eu tenho mantido o regime até hoje.
(38) Tenho feito feira semanalmente.
47
Em (35), interpretação ambígua quanto aos valores iterativo e durativo. Em (36), é
o lexema verbal que sugere interpretação iterativa, enquanto que, em (38), é o complemento
verbal (feira) que assegura esse valor. No exemplo (37), a interpretação é durativa. Para Costa
(2002), a iteração não pode ser considerada expressão aspectual, porque os enunciados
iterativos não dispõem de constituição temporal interna.
O pretérito imperfeito indica continuidade ou iteração no passado. A relação de
acabado x não-acabado para os pretéritos perfeito e imperfeito, respectivamente, torna-se
importante aqui. Dizer que um fato não acabou no imperfeito seria afirmar que o fato verbal
se iniciou no passado e perdura até o presente, contudo, segundo Costa (2002), essa é a noção
transmitida pelo pretérito perfeito composto. O valor de imperfectividade, no pretérito
imperfeito, é atribuído pela noção de duração.
O Aspecto verbal é, também, evidenciado pelas perífrases. Os verbos de ligação
quando associados ao gerúndio (imperfectivo em curso) e particípio (imperfectivo resultativo)
formam as perífrases. Além dos verbos de ligação, funcionam como auxiliares aspectuais:
começar (a), ir e acabar (de). Costa (2002) utilizou esses verbos para mostrar a conjugação
aspectual‖, por exemplo: leio/ começo a ler; li/ comecei a ler; tenho lido/ tenho começado a
ler; lerei/ vou ler/ começarei a ler/ vou começar a ler... Os verbos ser, estar, ficar, permancer,
andar e continuar, a autora chamou de estativos; começar (a), ir e acabar (de) foram
considerados para a construção de perífrases imperfectivas de fase inicial, intermediária e
final.
A atualização do Aspecto, ainda, -se pelos circunstanciais temporais, que são:
advérbios (41), locuções adverbiais (39)(40), conjunções (Todas as casas são iguais e o
pessoal vai modificando à medida que tem condições de modificar
36
) e formulações
oracionais (Eles vão devagar
37
). Para o nosso estudo, interessa-nos somente os dois primeiros.
A marca aspectual, nesses circunstanciais, está inserida no item lexical. Costa (2002)
classifica os circunstanciais em: temporais propriamente ditos; pontuais; de frequência e
durativos. Os circunstanciais temporais propriamente ditos se referem ao tempo cronológico,
por exemplo
38
:
(39) Nós estamos em agosto.
36
Cf. Costa (2002, p. 85).
37
Cf. Costa (2002, p. 85).
38
Cf. Costa (2002, p. 81).
48
(40) Porque eu fiz feira sexta-feira passada, hoje já não vou.
(41) Eu agora estou plantando rosas.
Esses circunstanciais não expressam a estrutura temporal interna do fato e, por si sós,
não expressam a imperfectividade, mas podem aparecer em um enunciado com forma verbal
do imperfectivo, como em (39) e (41). Os circunstanciais pontuais dizem respeito à ocorrência
momentânea, como de repente e logo com formas perfectivas. Os circunstanciais de
frequência marcam a periodicidade e regularidade das ocorrências. No caso destes
circunstanciais, devemos levar em consideração, como mencionamos, que a iteração não
constitui uma possibilidade aspectual para a autora. Vejamos os exemplos dados por Costa
(2002, p. 83):
(43) Depois tentei de novo.
(44) Esses mil casos que todo mundo conta que estão acontecendo a cada dia na
cidade.
(45) Sempre fui louca por cavalo.
Costa (2002) afirma que o circunstancial de novo, em (43), expressa mera repetição,
não constituindo iteração. Ela não considera a imperfectividade como marca para esse caso. Já
(44)
39
, embora o circunstancial a cada dia expresse iteração, pode enquadrar-se na
imperfectividade, uma vez que é utilizado em concomitância com perífrase imperfectiva. Em
(45), há marca de habitualidade (sempre), com valor perfectivo.
Os circunstanciais durativos expressam o período compreendido pelo desenvolvimento
do fato verbal. São eles que representam a imperfectividade por si sós, seja reforçando o
Aspecto quando juntos com formas imperfectivas ou imperfectivizando enunciados com
formas verbais perfectivas. São exemplos:
(46) Minha mãe passava o dia todo dando esse chá a ela.
(47) Eu tentei, inclusive, por algum tempo, usar a macrobiótica...
39
Costa (2002) não considera a iteratividade como uma possibilidade aspectual. Porém, na sentença (44), o
circunstancial a cada dia ocorre com a perífrase imperfectiva estão acontecendo, portanto, o fato verbal é
considerado como um processo e parece incluir-se na imperfectividade.
49
(48) Devagarzinho a gente vai olhando.
Costa (2002) conclui dizendo que os circunstanciais temporais podem ou não indicar
Aspecto; os pontuais combinam-se com formas perfectivas; os durativos definem claramente
a imperfectividade; nos casos em que aparecem a forma verbal perfectiva e um circunstancial
imperfectivo, ou vice-versa, prevalece a marca imperfectiva. Costa (2002) termina sua
discussão sobre Aspecto falando da atualização da categoria por meio de substantivos e
adjetivos, que, por ora, não nos interessa.
Os autores apresentados serão muito importantes para analisarmos o tratamento dado
ao Aspecto no livro didático. Não é suficiente o aluno saber que o pretérito perfeito se refere a
ações concluídas e o pretérito imperfeito, a ações habituais. É preciso analisar esses pretéritos
dentro de textos, a fim de compreender como se deu o desenvolvimento da ação,
classificando-a como télica, durativa, menos dinâmica, cursiva, habitual, iterativa etc., a partir
da oposição perfectivo/imperfectivo. Além disso, o estudo do Aspecto pode auxiliar o
professor a lidar com o assunto.
3.3. Modalidade
As Gramáticas Tradicionais de Língua Portuguesa apresentam três Modos verbais:
indicativo, subjuntivo e imperativo. A eles são atribuídas as noções de certeza, incerteza e
ordem/pedido, respectivamente. No entanto, nem sempre essas noções advêm da forma
verbal, como, por exemplo, em Acho que passei. A ideia de incerteza é transmitida por um
verbo de significação plena: achar e não pelo Modo indicativo, que, tradicionalmente, denota
―certeza‖. Assim, é necessário distinguir Modo de Modalidade.
Almeida (1988) diz que o Modo verbal revela a atitude mental do falante, ou seja, fora
do Tempo e do Aspecto, o processo verbal aponta para a participação do sujeito falante. Por
isso, o autor inclui o Modo em uma categoria mais ampla: a Modalidade. Conforme Coan
(2003), Modo é uma categoria morfológica do verbo com função modal, que envolve
paradigmas verbais (indicativo, subjuntivo, imperativo); Modalidade é uma categoria
semântica, expressando-se pela forma morfológica, lexical, semântica, via entonação (que
torna possível, por exemplo, diferenciar uma ordem de um pedido na linguagem oral). Neves
50
(2006) considera que a Modalidade é, por um lado, um conjunto de relações entre locutor,
enunciado e realidade objetiva, portanto, é difícil falar em enunciados não-modalizados. De
outro, a Modalidade é uma categoria automática, pois o falante marca de alguma forma o seu
enunciado em termos de verdade do fato expresso, fixando determinado grau de certeza sobre
essa marca.
Na abordagem funcionalista, a Modalidade é entendida no contexto comunicativo. O
Modo verbal escolhido pelo falante nem sempre indica que sua atitude é de certeza, incerteza
ou ordem/pedido. Vejamos os exemplos
40
:
(49) Estou certo de que você passará na prova (futuro do presente do indicativo).
(50) É certo que você passe na prova (presente do subjuntivo).
(51) Acho que você não passou na prova (pretérito perfeito do indicativo).
(52) Duvido que você passe na prova (presente do subjuntivo).
(53) Você vai estudar e passar na prova de sábado (perífrase indicativa de futuro do
presente).
As sentenças (49) e (50), apesar de os Modos serem diferentes, denotam certeza. Esta
é evidenciada pelo adjetivo certo. Da mesma forma, (51) e (52) expressam incerteza, por
causa dos verbos de significação plena achar e duvidar. Em (53), valor de ordem nas
formas verbais (estude, passe), embora elas não estejam no imperativo.
Givón (2005) afirma que, pela tradição lógica, a Modalidade assinala os seguintes
valores de verdade para a proposição: verdade necessária => conhecimento não contestado
Na verdade, tem faltado o esforço intelectual para a produção de conhecimento sobre aquilo
que aparece como novo (PESSOA, 2007, p. 368), verdade factual => conhecimento
asseverado como real lamento que a misteriosa moça não me tenha esperado (NEVES,
2006, p. 158), verdade possível => conhecimento asseverado como irreal É possível que a
história se repita (NEVES, 2006, p. 172) ou falsidade => conhecimento asseverado como
falso Saci Pererê chegou aqui.
40
Os exemplos são de própria autoria, com base em Moura (2004).
51
Segundo Givón (2005), para a tradição linguística mais recente, a estrutura modal
codifica a atitude do falante em relação à proposição. No entanto, para ele, a atitude do falante
não incide somente sobre a proposição, mas, também sobre a atitude do ouvinte em relação à
proposição, bem como em relação ao falante. Givón (1995, 2005) diz que por ―atitude do
falante‖ devem-se entender dois tipos de julgamentos sobre a oração/proposição e sobre o
estado de crença e intencionalidade do ouvinte: julgamento epistêmico assuntos de verdade,
probabilidade, certeza, crença ou evidência e julgamento deôntico (valorativo) assuntos de
desiderabilidade, preferência, intento, habilidade, obrigação, manipulação ou poder.
Redefinindo a Modalidade em termos comunicativos, Givón (1995, 2005) constata
quatro Modalidades proposicionais epistêmicas, que ele contrapõe com a tradição lógica:
Quadro 3: Modalidades epistêmicas
(GIVÓN, 1995, p. 114; 2005, p. 150)
Conforme o autor, a tradição lógica trata a Modalidade como uma propriedade de
proposições isoladas do contexto comunicativo natural, enquanto que a interpretação
pragmático-comunicativa das quatro Modalidades a Modalidade em termos de estados
epistêmicos e metas comunicativas dos dois participantes (falante e ouvinte) na transação
comunicativa. Na pressuposição, a proposição assume ser verdadeira mediante acordo prévio,
segundo a convenção culturalmente compartilhada. Em relação à asserção realis, a proposição
é fortemente asseverada como verdadeira e, embora o falante tenha fortes razões para
defender sua crença, a dúvida do ouvinte é considerada procedente. Na asserção irrealis, a
proposição é fracamente asseverada como possível, provável ou certa (sub-modos
epistêmicos) ou como necessária, desejada ou indesejada (sub-modos deônticos). Quanto à
NEG-asserção, a proposição é fortemente asseverada como falsa. Dessa forma, o autor define
as Modalidades realis e irrealis em termos cognitivos e comunicativos: cognitivamente de
verdade lógica para a certeza subjetiva; comunicativamente do sentido orientado para o
falante para o sentido interativo, socialmente negociado.
Givón (1984) ressalta a ligação entre a Modalidade e o Tempo. O passado e o presente
Tradição lógica
Equivalente comunicativo
Verdade necessária
Pressuposição
Verdade factual
Asserção realis
Verdade possível
Asserção irrealis
Não-verdade
NEG-asserção
52
são Tempos realis (fato). O futuro, por sua vez, é um Tempo irrealis. Exemplificando
41
:
a. Passado: Joe cut a log/ Joe corta a lenha (asserção do fato).
b. Presente: Joe is cutting a log/ Joe está cortando a lenha (asserção do fato).
c. Futuro: Joe will cut a log/ Joe cortará a lenha (asserção de possibilidade).
(GIVÓN, 1984, p. 285)
Orações complexas, afirma Givón (1984), são irrealis quanto à Modalidade. Orações
como: If Joe catches a whale, then.../ Se Joe pescar uma baleia, então... (oração
condicional); Go catches a whale!/ pescar uma baleia! (imperativo); Joe wanted to catch a
whale/ Joe quis pescar uma baleia (complementos de verbos modais não implicativos); Mary
told Joe to catch a whale/ Mary disse a Joe para pescar uma baleia (complementos de verbos
manipulativos não implicativos); Mary thought that Joe caught a whale/ Mary pensou que
Joe pescou uma baleia (complementos de verbos cognitivos não factivos)(GIVÓN, 1984, p.
286). Porém, quando as orações complexas combinam-se com o tempo passado, impõem a
Modalidade realis, por exemplo: Because Joe caught a whale, he.../ Porque Joe pescou uma
baleia, ele... (orações adverbiais com porque); The man who caught a whale yesterday left/ O
homem que pescou uma baleia ontem saiu (orações relativas); It is Joe who caught a whale/
Foi Joe quem pescou uma baleia (orações clivadas); Mary forced Joe to catch a whale/
Mary forçou Joe a pescar uma baleia (complementos de verbos implicativos e
manipulativos)‖ (GIVÓN, 1984, p. 287), entre outras.
Neves (2006) afirma que as noções de ―necessidade‖ e ―possibilidade‖ são
consideradas, tradicionalmente, como subtipos das Modalidades. Essas noções dividem-se em
subcategorias modais: alética, epistêmica, deôntica, volitiva (ou bulomaica) e disposicional.
A Modalidade alética, ou lógica, diz respeito às noções de verdade e/ou falsidade das
proposições. A verdade passa a ser necessária ou possível. A Modalidade alética toma como
parâmetro o mundo ontológico, que se sobrepõe à atitude do sujeito, portanto, está mais
próxima do objeto. Vejamos os exemplos abaixo de Neves (2006, p. 159):
(54) A água pode ser encontrada em estado sólido, líquido ou gasoso.
(55) Mas, se a Terra é uma bola e está girando todo dia perto do sol, não deve ser
verão em toda a Terra?
41
As traduções são literais e podem não ter correspondência com a Língua Portuguesa.
53
O enunciado (54) mostra possibilidade alética; o (55), necessidade alética. Ambos
avaliam a realidade a partir de um estado de coisas. Por não considerar o conhecimento e o
julgamento do falante, a Modalidade alética não serve para investigar ocorrências nas línguas
naturais, restringindo-se às investigações lógicas.
A Modalidade epistêmica, segundo Neves (2006), está relacionada com a necessidade
e a possibilidade epistêmicas. Essa Modalidade refere-se à fonte do conhecimento e o falante
pode ou não estar comprometido com ela. Exemplo:
(56) Deve chover hoje à tarde.
Conforme Neves (2006), a modalização epistêmica manifesta-se: no extremo da
certeza, precisão (57); no extremo da não-certeza, imprecisão (58), como mostram os
exemplos
42
:
(57) Tratava-se exatamente do fóssil completo do arqueoptérix, um bicho emplumado,
de 35 centímetros de comprimento.
(58) Porque certamente não o fizeram sem culpa e culpa gera melancolia.
Quando o falante usa modalizadores do possível, quer diminuir a sua responsabilidade
pelo que é dito
43
:
(59) À noite a lua vem da Ásia, mas pode não vir, o que demonstra que nem tudo neste
mundo é perfeito.
A Modalidade deôntica enquadra-se no eixo da conduta, ou seja, relaciona-se com as
noções de obrigação, permissão e proibição. O traço lexical [+ controle] ligado ao falante
condiciona o uso da Modalidade deôntica. Neves (2006, p. 160) apresenta os seguintes
exemplos:
(60) Primeiro eu vou mostrar ao senhor a baixada. eu posso arranjar um animal
para Ricardo, com Benedito da Olaria. Almoçamos aqui. Depois do almoço, Ricardo pode ir
com a gente.
42
Os exemlos (57) e (58) são de Neves (2006, p. 172-173).
43
Exemplo de Neves (2006, p. 179).
54
(61) Ângela, é preciso tomar cuidado e não exagerar: você não deve estragar Mário.
Em (60), temos a possibilidade deôntica. O auxiliar modal poder dá ideia de permissão
(pode ir) e não-obrigação (posso arranjar). Em (61), o enunciado expressa necessidade
deôntica. O adjetivo em posição predicativa (é preciso) denota obrigação, enquanto que o
auxiliar modal (dever) acompanhado da negação é uma proibição.
Neves (2006) relaciona as Modalidades volitiva e disposicional com significados
deônticos, respectivamente, necessidade deôntica e possibilidade deôntica. A volitiva
expressa desejos do falante (Desta vez o título deve ser nosso)
44
e a disposicional refere-se à
disposição, habilitação, capacidade do falante (Os reimplantes são completados. A Criatura,
mesmo renga, pode andar)
45
. Dessa forma, a autora diz que divergências em se considerar
essas duas Modalidades como tipos da modalização linguística.
A autora afirma que há dois grandes tipos de Modalidade: a epistêmica (conhecimento
e crença) e não-epistêmica (permissão, obrigação e proibição), esta inclui a deôntica
(obrigação) e a dinâmica (volição e habilidade ou capacidade). Assim, Neves (2006) aponta
quatro Modalidades tradicionais: epistêmica, dinâmica, deôntica e alética, esquematizando as
relações entre elas da seguinte forma:
(NEVES, 2006, p. 163)
No processo de produção do enunciado, essa organização indica
46
:
a) a Modalidade epistêmica é orientada para o sujeito da enunciação;
b) a Modalidade dinâmica é orientada para o sujeito do enunciado;
44
Exemplo de Neves (2006, p. 160).
45
Exemplo de Neves (2006, p. 161).
46
Entende-se aqui enunciação como a cena enunciativa e enunciado como produto da enunciação.
55
c) a Modalidade deôntica é orientada para o predicado da enunciação, implicando o traço [+
controle];
d) a Modalidade alética é orientada para o predicado do enunciado.
Fazendo-se uma leitura vertical, vemos que os modais dinâmicos e aléticos levam aos
epistêmicos e deônticos, respectivamente. De acordo com a autora, ―a relação vertical entre os
epistêmicos e os dinâmicos nasce do fato de que os primeiros são pressupostos para os outros,
do ponto de vista pragmático: alguém crê que alguém fará algo, porque está capacitado para
isso‖ (NEVES, 2006, p. 163). A relação entre os aléticos e os deônticos é semelhante, pois a
necessidade lógica determina a lei moral. Na visão horizontal, os epistêmicos e os deônticos
afetam o mundo do dizer e os dinâmicos e os aléticos afetam o mundo referente.
Segundo Neves (2006), a Modalidade pode ser expressa
47
:
- por um verbo modal: Ele deve passar na prova;
- por um verbo de significação plena (indicadores de opinião, crença e saber), como nos
exemplos (51) Acho que você não passou na prova e (52) Duvido que você passe na prova;
- por um advérbio: Provavelmente ele passará na prova;
- por um adjetivo em posição predicativa, como em (49) Estou certo de que você passará na
prova e (50) É certo que você passe na prova;
- por um substantivo: Tenho certeza de que você será aprovado;
- pelas próprias categorias gramaticais (Tempo/Aspecto/Modo) do verbo da proposição: João
acreditava que retornaria logo;
- por expedientes puramente sintáticos: unipessoalização, que se alterna com a pessoa do
singular e minimiza a participação do falante Eu sei que é tarde, mas é preciso estudar
para essa prova; intercalação de orações em pessoa, que produz o efeito contrário ao da
unipessoalização Essa prova é importante, mas eu acho que já é muito tarde;
- por meios prosódicos (modalizadores por excelência das elocuções orais, como a
entonação).
47
Os exemplos são de própria autoria.
56
A autora ressalta que as mesmas formas verbais podem ser usadas para manifestar as
Modalidades epistêmicas e deônticas. É o contexto que vai diferenciar o significado:
(62) Agora você pode ir embora, escravo
48
.
(63) O simbolismo das zonas pode ir mais adiante, porém é necessário que se tenha
mais cautela.
Em (62), pode ir significa permissão (valor deôntico). Em (63), pode ir significa
possibilidade epistêmica.
Almeida (1988) estabelece como tipos de Modalidade, no sentido mais amplo:
modalidades objetivas existência ou não-existência (Paulo chegou/ Luís não realizou o
trabalho)
49
, necessidade e obrigatoriedade (Antônio devia comparecer ao escritório e não o
fez), (im)possibilidade e probabilidade (Rivelino pode jogar contra o São Paulo e, em razão
disso, o resultado pode ser favorável ao Corinthians); modalidades subjetivas volição e
desejo (João quer dançar um tango), ordem ou proibição (Saiam pelas portas do fundo/ Não
pise na grama), dúvida ou certeza (Talvez faça uma viagem no próximo mês/ Vou fazer uma
viagem no próximo mês).
Quando um falante, diz Almeida (1988), faz uso de uma expressão como É possível
que chova, com base nas nuvens que ele vê no céu, uma possibilidade objetiva. Porém, se
o falante faz uso da mesma expressão em um dia de sol, apenas com base na sua intuição, ou
seja, ele é o autor do julgamento, a possibilidade é subjetiva: Vou levar o guarda-chuva, é
possível que chova. Por isso, para o autor, é importante distinguir essas duas Modalidades.
Almeida (1988) concentra-se somente na necessidade e na possibilidade
50
.
Para o Português, Almeida (1988) considera as seguintes noções de obrigatoriedade:
obrigação moral dever de consciência; obrigação material necessidade natural, física,
biológica ou fisiológica; obrigação lógica leis do pensamento, raciocínio lógico,
premeditação. É amplo o uso desta Modalidade, sobretudo nas perífrases, em que aparece o
infinitivo mais os auxiliares modais ter, haver, dever, precisar e necessitar. Almeida (1988)
considerou para o seu estudo apenas o ter e o haver.
48
Os exemplos (62) e (63) são de Neves (2006, p. 179).
49
Todos os exemplos deste parágrafo são de Almeida (1988, p. 13).
50
Almeida (1988), apoiando-se em Benveniste (1965), considera a necessidade e a possibilidade como
fundamentais e, por não poder detalhar cada tipo de modalidade no espaço de um artigo, optou apenas por essas.
57
Inicialmente, Almeida (1988) opõe as construções perifrásticas ter de + infinitivo e
ter que + infinitivo. A primeira construção expressa mais obrigação material (64) e obrigação
lógica (65) e menos obrigação moral (66), como nos exemplos
51
:
(64) E os homens teriam de vir à superfície encher o peito de ar.
(65) Você pode ser escritor disse à noite (...) mas tem de estudar primeiro.
(66) Tia Ciata cantava o nome do santo que tinham de saudar.
Já na segunda construção, ter que + infinitivo, com valor de necessidade, predomina a
obrigação moral (67) e lógica (68) sobre a obrigação material (69):
(67) Você tem que me jurar que, nunca, nunca, tentará isso!
(68) Vamos que uma destiladora se encrenca. Tem que vir gente especializada...
(69) Tive que me internar numa casa de saúde, e então foi preciso amputar...
Almeida (1988), também, opõe os usos de haver de + infinitivo e haver que +
infinitivo. A primeira perífrase, segundo o autor, tem maior extensão de uso para expressar
obrigatoriedade. Essa perífrase pode traduzir obrigação externa (imposição (70), obrigação
íntima (71), obrigação moral (72), obrigação lógica (73)
52
:
(70) Passados alguns anos e, aparecendo um dia um casamento, o pai da moça decidiu
que ela havia de aceitar.
(71) Quem tem autoridade, quem ensina, é que sabe o que há de ensinar.
(72) O senhor há de cumprir a palavra que deu há sete anos.
(73) É doida mesmo!... censurava Augusta. Meter-se na pândega sem conta da roupa
que lhe entregaram... Assim há de ficar sem nenhum freguês.
A perífrase haver que + infinitivo tem uso reduzido. Conforme Almeida (1988, p.
18), esta perífrase expressa, impessoalmente, a ideia de necessidade:
51
Exemplos (64) a (66) são de Almeida (1988, p. 15).
52
Exemplos (70) a (73) são de Almeida (1988, p. 17)
58
(74) Há que distinguir, em primeiro lugar, dois setores: o externo e o interno.
Depois de mostrar as perífrases acima para a expressão de obrigatoriedade/
necessidade, Almeida (1988) passa a tratar da possibilidade e da probabilidade. A
possibilidade é dependente ou independente do sujeito falante, portanto, há uma possibilidade
subjetiva e uma possibilidade objetiva. A possibilidade objetiva, relacionada com as
condições gerais determinadas por uma ordem de realidade ou normalidade, pode ser
53
: lógica
(quando não envolver contradição em face da razão), física (quando satisfizer as condições
gerais da experiência; quando não contrariar nenhum fato ou lei estabelecida
empiricamente; quando interpretar um fato como mais ou menos provável) ou moral (quando
não contradisser nenhuma norma ou lei psicológica ou sociológica). A possibilidade
subjetiva pode ser: física ou psíquica-moral. A probabilidade surge como um caso da
possibilidade. Os verbos dever e poder são, no Português, os que mais servem para expressar
possibilidade e probabilidade. Almeida (1988) limitou-se a trabalhar com poder.
A inserção de um sintagma verbal em enunciados assertivos, negativos ou
interrogativos, em que entra o auxiliar poder e o verbo principal no infinitivo, leva a diversas
variantes que devem ser acrescentadas às potencialidades sêmicas do próprio auxiliar.
Nos enunciados assertivos, o processo é inerente ao sujeito gramatical e a
possibilidade decorre da capacidade física ou moral ou pode denunciar o que está em
potência
54
:
(75) O alemãozinho levou um tabefe de estilo. Onde entrou todo o muque de que pôde
dispor na hora o Aristodemo.
(76) Eu sou o último homem que ainda pode pensar, porque aceitei o sacrifício de
espancamentos e ultrajes [...].
Em (75), há a possibilidade de força física, que Aristodemo tinha em potencial naquele
momento. Em (76), a possibilidade decorre da capacidade moral, faculdade de pensar.
A possibilidade não inerente ao sujeito pode ser dividida em objetiva (Só o metrô pode
resolver, disse o doutor) e subjetiva (...casei minha filha, consolidei minha fortuna, posso
53
Cf. Almeida (1988, p. 18).
54
Exemplos (75) e (76) são de Almeida (1988, p. 19-20).
59
morrer em paz), conforme Almeida (1988, p. 20).
Os enunciados negativos, com perífrase poder + infinitivo, são de dois tipos: negação
acidental (negação da possibilidade) A mamã objetou que não podíamos gastar num dia o
dinheiro de que dispúnhamos por uma semana (ALMEIDA, 1988, p. 21); negação
essencial (impossibilidade) Eu não podia fugir, sentia as pernas tremerem (ALMEIDA,
1988, p. 21). A perífrase poder + infinitivo apresenta, ainda, uma variação: a possibilidade da
negação pode indicar uma probabilidade (Mas a verdade pode não ser verossímil).
Por último, Almeida (1988) apresenta os enunciados interrogativos. Estes podem
alterar o valor da perífrase, da possibilidade para a impossibilidade ou vice-versa
55
:
(77) Posso eu pensar noutra coisa que nisto não seja?
(78) De que poderia falar na conferência?
(79) Margarida, já estamos noivos, agora eu posso te dar um beijo?
Em (77), a negação da possibilidade; em (78) dúvida da possibilidade; em (79),
aparece uma dúvida atenuada, como meio de pedir permissão. Pelo que expõe Almeida
(1988), fica confirmado que, de fato, o Modo verbal faz parte de uma categoria mais ampla, a
Modalidade, que se manifesta, principalmente, no verbo.
Sabendo-se que nem sempre os Modos verbais indicativo, subjuntivo e imperativo
indicam, necessariamente, uma atitude de certeza, incerteza e ordem/pedido, seria importante
o autor do livro didático diferenciar Modo de Modalidade. Para isso, o contexto discursivo
deve ser considerado e a linguagem não pode ser estudada em frases isoladas, é necessário
observar a língua em uso, o posicionamento do falante na interação. Os livros didáticos de
língua estrangeira, por exemplo, dão atenção especial aos verbos modais, trazendo capítulos
específicos para tratá-los. A título de ilustração, consideramos os verbos modais can, could,
may, might, must do inglês que são usados para expressar probabilidade e possibilidade
(“What’s that?” “I don’t know it can be a plane” ―O que é aquilo?‖ ―Eu não sei pode/
deve ser um avião; The pill could reduce the risk of diabetes A pílula pode reduzir o risco
de diabetes; It may be her boyfriend Pode ser o namorado dela; It might be a birthday party
Poderia ser uma festa de aniversário; That must be Robert. He always calls at six, and it’s
55
Exemplos (77) a (79) são de Almeida (1988, p. 22-23).
60
six now Deve ser Robert. Ele sempre telefona às seis e são seis agora)
56
.
3.4. Tempo, Aspecto e Modalidade Orientação Funcionalista
O Funcionalismo, conforme Cunha, Oliveira e Martelotta (2003), concebe a língua
como um instrumento de comunicação, isto é, propõe-se a estudar a língua em uso. Portanto, a
função de um elemento é considerada em relação ao sistema linguístico e em relação ao seu
contexto de uso, dessa forma, a estrutura gramatical depende do uso que se faz da língua.
Considerando a língua como um instrumento de interação social, o Funcionalismo examina
―[...] a capacidade que os indivíduos têm não apenas de codificar e decodificar expressões,
mas também de usar e interpretar essas expressões de uma maneira interacionalmente
satisfatória‖, como afirma Neves (1997, p. 15).
Uma vez que, na visão funcionalista, é preciso correlacionar forma e significado
dentro do contexto de uso, esta teoria embasará a nossa análise do tratamento dado ao
complexo Tempo, Aspecto e Modalidade (doravante TAM) dentro dos livros didáticos, visto
que as categorias TAM podem ter sentido perante a atitude do falante na situação
comunicativa. Ao Funcionalismo interessam as várias funções que uma forma codifica. Por
exemplo, a forma de pretérito imperfeito pode assumir a sua função básica (indicar ação
habitual/contínua Aquela senhora estranha sempre passava por nossa rua ou ação que
acontecia e foi interrompida por outra Eu me preparava para sair, quando o telefone tocou),
a função de presente para atenuar pedidos (Queria [quero] um favor seu) ou a função de
futuro do pretérito em construções hipotéticas (Se eu pudesse, eu comprava um carro).
Segundo Givón (1991), a ideia de que há uma correlação de um para um entre forma e
função é idealizada. Primeiro, porque a ambiguidade está excessivamente presente na
gramática e segundo, por causa da mudança diacrônica. Em relação a esta última, o autor
afirma que existem dois pontos importantes a serem considerados: o início da mudança, em
que encontramos o alargamento das funções de uma construção (uma forma para representar
várias funções) para dar conta de novos contextos funcionais; e o final do ―período de vida‖
de construções gramaticais, quando a morfologia é ―desgastada‖ (eroded) pelos processos
56
Baseamo-nos em: FUSCOE, K.; GARSIDE, B.; PRODROMOU, L. Attitude: sudent‘s book 3. San Antonio,
Mexico: Macmillan, 2007. Os exemplos pertencem às páginas 41, 49 e 68.
61
fonológicos, assim, construções que foram usadas para serem estruturalmente distintas são,
agora, neutralizadas. Pensar na não-arbitrariedade da relação entre forma-função (100% de
iconicidade) é, igualmente, idealizado, visto que a não-arbitrariedade do código gramatical
esinterligada a uma medida considerável de mais simbólico, menos icônico (portanto, mais
arbitrário).
Essas idealizações, afirma Givón (1991), levam a duas críticas dos não-funcionalistas,
que ele chamou de ―funcionalismo ingênuo‖: a) o Funcionalismo é inviável, que alguns
pares forma-função são realmente arbitrários para Givón (1991), essa crítica tem base no
Platonismo ingênuo: todas as relações forma-função são não-arbitrárias ou o Funcionalismo é
empiricamente vácuo; outro fato é o de que muitos, ainda que sem intenção, quanto à base
funcional da estrutura gramatical, têm expectativas de tudo ou nada; b) os funcionalistas se
satisfazem em práticas circulares e ad-hoc, assumindo a iconicidade ou motivação funcional
para encontrar o seu objeto de pesquisa Givón (1991) diz que essa crítica se refere ao modo
de operar dos funcionalistas, contudo, é infundada, pois, fazendo uma analogia com o código
biológico, percebe-se que, nas relações biológicas de forma-função, alguns elementos
estruturais não podem ser emparelhados com algumas funções específicas de modo óbvio, isto
é, não há 100% de iconicidade.
Considerando-se as premissas do Funcionalismo, o ensino de Língua Portuguesa deve
voltar-se para o uso efetivo da língua, para a situação real de comunicação. Segundo Antonio
(2006, p. 1052-1053):
Muitos conceitos transmitidos pelos professores misturam critérios ou deixam de
lado aspectos importantes. Os conteúdos selecionados, em geral a partir do livro
didático empregado, trabalham unicamente com ensino de metalinguagem
gramatical, e não com a função dos elementos lingüísticos na construção de sentido
do texto. [...] no modelo funcionalista, o ensino de gramática pressupõe que o aluno
reflita sobre as escolhas que tem à sua disposição ao formular seus enunciados, e
não memorize nomenclatura gramatical ou se detenha em análise de enunciados fora
de seu contexto de uso.
Por isso, seguiremos o viés funcionalista, a fim de analisar como os autores dos livros
didáticos têm tratado as categorias Tempo, Aspecto e Modalidade, se enfatizando a função
delas em um contexto de uso ou detendo-se em aspectos formais. Os principais pontos que
enfocaremos na análise das categorias nos livros são: diferença entre tempo verbal e tempo
cronológico; marcação de Tempo pelo verbo, advérbio ou contexto; uso de tempos verbais em
tipos/ gêneros textuais; tempos verbais e adjuntos adverbiais para localizar eventos no tempo;
funções de uma forma verbal; noções semânticas do Aspecto; uso do perfeito e do imperfeito;
62
papéis do particípio e do gerúndio na expressão aspectual; usos/ funções dos auxiliares
aspectuais; sufixos marcadores de Aspecto; correlação entre o Modo e o contexto de uso;
diferença entre Modo e Modalidade; efeitos de sentidos determinados pela escolha de certas
formas verbais; Modalidade e posicionamento do falante; usos/ funções dos auxiliares
modais; uso do advérbio para expressar Modalidade. Ao verificar esses pontos nos livros
didáticos, queremos observar o uso/ função das categorias, visto que, em um ensino
significativo de gramática, de acordo com Antonio (2006), o aluno deve refletir sobre o uso
efetivo da língua. Acreditamos que esses itens ajudam o aluno a ver aplicabilidade no estudo
de TAM, sobretudo nos verbos e advérbios.
Para Neves (2002), um ensino eficiente da língua implica produzir e propiciar a
reflexão sobre o funcionamento da linguagem, pois, partindo do uso, chega-se aos sentidos
que se quer produzir. Para a produção de sentidos, é necessário que as escolhas e os arranjos
que o falante faz estejam em conformidade com a situação de interação. A autora afirma que,
nas reflexões em sala de aula, deve-se contemplar todas as situações de interação: formais/
informais; língua falada/ língua escrita; relação simétrica/ relação assimétrica, porque a
produção de sentidos está em função dessas situações. Neves (2002) considera que falar e
escrever bem significa ser bem-sucedido na interação.
Corôa (2006), semelhante a Neves (2002), diz que a língua é um trabalho de
construção de sentidos, de identidades. Baseando-se nos PCNs, a autora enuncia que a
língua não é uma estrutura pronta e autônoma, mas um fenômeno de linguagem que envolve
práticas sociais e discursivas. Dessa forma, o ensino de Língua Portuguesa, seguindo esse
ponto de vista interacional, concebe a língua como um veículo comunicativo, capaz de fazer o
falante aderir a papéis sociais. Por isso, o professor, conforme Corôa (2006, p. 149), tem de
aprender a lidar com ―[...] os desvios, com os imprevistos, com o movimento, com a
incompletude, seja da norma linguística seja da interação discursiva e social‖.
De acordo com Cunha, Oliveira e Martelotta (2003), o modelo funcionalista supera a
atitude prescritiva no ensino de Língua Portuguesa e abre espaço para a abordagem reflexiva.
Assim, a estrutura gramatical depende do uso que se faz da língua, concomitante à situação
comunicativa. Portanto, pensar a língua e a gramática, na visão dos autores, consiste em
apreendê-las nas circunstâncias e nos contextos específicos de uso.
Como a Gramática Tradicional não contempla a maleabilidade da língua, compete aos
63
professores mudarem a perspectiva de seu trabalho, cujo objetivo não é, nas palavras de
Cunha, Oliveira e Martelotta (2003), a correção das formas linguísticas, contudo, a sua
adequação ao contexto comunicativo. Muitas vezes, falta material didático apropriado em que
o professor possa apoiar-se (por exemplo, os livros didáticos, em sua maioria, trabalham com
a prescrição gramatical).
O Funcionalismo, conforme Cunha, Oliveira e Martelotta (2003, p. 92), ―assume
maior relevância diante da ainda pouco expressiva produção de material didático para ensino
de língua materna orientada pela recente perspectiva‖. Esta corrente teórica pode auxiliar os
alunos do Ensino Fundamental a desenvolver a competência comunicativa, em um trabalho de
reescrita de textos, em que acrescentar, retirar, deslocar ou transformar termos da sequência
textual faz o aluno aprender a ―manipular não a estrutura discursiva, mas também os
sentidos, os conteúdos por ela veiculados, desenvolvendo [...] sua capacidade de percepção
dos artifícios ou recursos de linguagem a que todos estão submetidos numa comunidade
lingüística‖ (CUNHA; OLIVEIRA; MARTELOTTA, 2003, p. 93). Os alunos do Ensino
Médio devem, também, produzir e revisar textos, mas aprofundarão a reflexão com atividades
em que percebam a atribuição de sentido, marcas de intertextualidade, recursos de
pressuposição, efeitos de inversão de ordem, ou seja, explorarão a funcionalidade dos
múltiplos recursos linguísticos.
Conceber a ngua em uma perspectiva funcional, além de dar relevo ao ensino de
Língua Portuguesa, pode ser um caminho para a produção de novos materiais didáticos, em
que predominem as circunstâncias pragmático-discursivas. No caso desta pesquisa, daremos
importância à relação função > forma no tratamento das categorias TAM.
3.5. Tempo, Aspecto e Modalidade Orientação Sociolinguística
A Sociolinguística estuda a relação língua-sociedade, ou seja, a língua é vista em seu
uso real. Segundo Bagno (2007), assim como os falantes estão em constante mudança, a
língua está sujeita a transformações. Bagno (2007, p. 39) declara ainda: ―a grande mudança
introduzida pela Sociolingüística foi a concepção de língua como um ‗substantivo coletivo‘:
debaixo do guarda-chuva chamado LÍNGUA, no singular, se abrigam diversos conjuntos de
realizações possíveis dos recursos expressivos que estão à disposição dos falantes‖.
64
Além do Funcionalismo, seguiremos, também, a Sociolinguística, já que esta investiga
as várias formas (variantes) para uma mesma função (variável). Por exemplo: a função de
futuro pode ser representada pela forma de presente (Chego amanhã), por uma forma
perifrástica (Vou chegar amanhã) ou pela forma sintética de futuro do presente (Chegarei
amanhã). Considerando os mesmos pontos para a análise das categorias, citados na seção
anterior, a Sociolinguística auxiliar-nos-á a examinar se os autores dos livros didáticos
relevam a língua em uso na abordagem do Tempo, do Aspecto e da Modalidade.
Um dos princípios fundamentais de investigação sociolinguística, de acordo com
Labov (2003), diz respeito ao fato de que não falantes de estilo único. Para o autor, todo
falante apresenta alguma variação nas regras fonológicas e sintáticas, conforme o contexto
imediato em que ele está inserido. As mudanças no estilo estão correlacionadas com a atenção
dada à fala e decorrem de certos condicionamentos: relação entre o falante e o interlocutor,
contexto social escola, trabalho, casa, vizinhança, igreja e tema da conversa.
A mudança de estilo dos falantes não se trata de caos linguístico. Como enfatiza
Labov (2003), a variação é condicionada por alguns fatores. Por muito tempo, a variação foi
associada aos usos da população rural, pobre e analfabeta. Essa visão foi rompida pelo
princípio da heterogeneidade ordenada, trazido por Weinreich, Labov e Herzog (2006)
57
, uma
vez que conceber a língua como um sistema heterogêneo (há regularidade na variação) é
condição essencial para o estudo da mudança linguística. Segundo Labov (2008, p. 21)
58
:
[...] não se pode entender o desenvolvimento de uma mudança linguística sem levar
em conta a vida social da comunidade em que ela ocorre. Ou, dizendo de outro
modo, as pressões sociais estão operando continuamente sobre a língua, não de
algum ponto remoto no passado, mas como uma força imanente agindo no presente
vivo.
Para Labov (2008), à medida que a posição social do falante muda, o seu
comportamento linguístico também muda. Assim, a interação social tem papel fundamental
no processo de mudança. O estudo da variação social oferece comprovação empírica para
resolver análises estruturais alternativas no nível funcional, que o tratamento quantitativo
dado às variantes linguísticas permite estudar detalhadamente mudanças em progresso. Labov
(2008) apresenta três estágios pelos quais passam as variantes e que podem explicar a
mudança linguística: origem quando há variação em uma ou mais palavras na fala de um ou
57
Tradução de Weinreich, Labov e Herzog (1968).
58
Tradução de Labov (1972).
65
mais indivíduos; propagação a mudança é adotada por inúmeros falantes, passando a
variante inovadora a se opor à forma mais antiga; término quando uma das variantes triunfa
e a mudança alcança regularidade.
As formas linguísticas em processo de mudança sofrem dois tipos de forças sociais:
pressões vindas de baixo ou seja, ―abaixo do nível da percepção consciente‖, essas pressões
atuam sobre sistemas linguísticos inteiros, em resposta a motivações sociais relativamente
obscuras; pressões vindas de cima correção social explícita de formas linguísticas
individuais. Por exemplo, a hipercorreção: Houveram problemas por lá/ Houve problemas
por lá‖
59
(LABOV, 2008, p. 155) o falante usa (conscientemente) o verbo haver, no plural,
por considerar a forma correta e apropriada para estilos formais.
Introduzir a Sociolinguística no ensino não é tarefa das mais fáceis. O estudo e o
conhecimento da Sociolinguística melhoram a qualidade do ensino de Língua Portuguesa,
segundo Cavalcante (2006), uma vez que trabalha com a realidade linguística dos usuários
dessa língua. Cavalcante (2006) afirma que é preciso associar as práticas de linguagem aos
diversos gêneros textuais (orais e escritos), a fim de que o aluno compreenda que as
variedades linguísticas têm seus contextos de uso. Entendemos que seja fundamental o
trabalho das categorias TAM dentro de tipos/ gêneros textuais, tanto para o aluno aplicar o
seu conhecimento, quanto para produzir seus textos de forma consciente e reflexiva.
Bortoni-Ricardo (2004, p. 42) diz que ―[...] diante da realização de uma regra não-
padrão pelo aluno, a estratégia da professora deve incluir dois componentes: a identificação
da diferença e a conscientização da diferença‖. No entanto, o desconhecimento da regra
utilizada pelo aluno pode dificultar a identificação, principalmente, se o professor também a
utiliza. A conscientização torna-se importante para que o aluno aprenda a monitorar o seu
estilo. Por exemplo, a variação nas formas verbais pode não ser percebida de imediato por ser
utilizada por todos os falantes, porém, é fundamental a conscientização dos usos variáveis de
TAM para a adequação às diversas práticas discursivas.
Para Bortoni-Ricardo (2005), a variação linguística cumpre duas finalidades: (a)
ampliar a eficácia da comunicação; (b) marcar a identidade social do falante. A variação
amplia a eficácia da comunicação, porque o falante tem à sua disposição inúmeras formas
para construir seu enunciado. A variação marca, também, a identidade social do falante, uma
59
Exemplos dos tradutores de Labov (2008).
66
vez que ela é motivada por diferentes aspectos da identidade social (sexo, idade, região, grupo
étnico, religioso etc.). Ainda, em relação à segunda finalidade, Bortoni-Ricardo (2005) afirma
que os falantes selecionam as regras de seu repertório linguístico para aproximarem-se do
grupo ao qual querem pertencer. Bortoni-Ricardo (2005, p. 182), tratando da variação
linguística em sala de aula, diz:
A pergunta que deveríamos fazer, então, não é se as escolas são veículo eficiente de
transmissão da língua-padrão, mas, sim, especificamente, se as escolas contribuem
para que os alunos adquiram os estilos formais da língua. Para responder a essa
pergunta, a pesquisa da sociolingüística educacional precisa concentrar-se na
linguagem usada em sala de aula.
No entanto, ressalta a autora, não se pode restringir a observação à descrição dos
traços linguísticos superficiais da linguagem da escola. É necessário explorar a conversa, as
práticas sociais e os processos intelectuais, a fim de descobrir como se influenciam em sala de
aula e como influenciam a educação.
Silva (2004) aponta como um dos motivos para os professores não colocarem em
prática princípios teóricos da Sociolinguística, Psicolinguística e Teorias do Discurso, por
exemplo, a falta de material pedagógico adequado para apoio além de segurança e/ ou poder
para introduzir inovações; condições mínimas de trabalho. A autora explica que os avanços
teóricos, nas propostas de prática pedagógica de ensino da língua, levaram à aceitação de que
a língua falada, em sua natural variação, deve ser a base inicial do ensino. Silva (2004)
acredita que, no processo de alfabetização, já se criaram alguns suportes que contribuem para
o respeito do conhecimento linguístico que o aluno traz antes de entrar na escola. Isso ocorre,
porque os anos escolares iniciais não são adequados para o ensino de uma gramática, que
tenha por objetivo expor a organização estrutural da língua.
Bagno (2007) julga como ilusão conceber a língua como algo homogêneo. A língua,
na concepção sociolinguística, é heterogênea, variável, instável e está sempre se
transformando. O autor compara a língua ao curso de um rio, que nunca para de correr, as
suas águas estão em constante agitação. Também, não é possível, segundo Bagno (2007),
afirmar que a língua está registrada inteiramente nos dicionários e nas gramáticas. Na
verdade, a variação e a mudança são os estados naturais da língua. Entender a língua como
heterogênea, sujeita a mudanças, implica em um tratamento adequado da variação linguística
em sala de aula. Além disso, o autor reafirma o princípio postulado por Weinreich, Labov e
Herzog (2006): a variação é ordenada, uma vez que é condicionada por diversos fatores.
67
Para Bagno (2009), a separação rígida entre fala e escrita provocou uma situação
desastrosa no ensino de Língua Portuguesa: que a língua escrita merecia ser estudada e
analisada. A fala foi deixada de lado, por ser considerada caótica. Atualmente, os estudos
linguísticos modernos conseguiram sanar essa separação e colocar a língua falada como ponto
de partida da investigação da linguagem. As orientações curriculares oficiais (especialmente,
os PCNs), argumenta o autor, exigem que se trabalhem os gêneros textuais (orais e escritos)
na escola, isso faz com que se evite dar atenção exclusiva ao modelo de língua certa, baseado
na literatura consagrada. Ainda, documentos como o PNLD e o PNLEM, para aprovar um
livro didático, determinam que este deva conter atividades que propiciem o desenvolvimento
da oralidade.
Vimos o quanto é importante trabalhar a variação linguística em sala de aula. A
Sociolinguística concebe a ngua como heterogênea, por isso, o ensino de língua materna
deve partir do uso. Ao analisarmos as categorias TAM, observaremos se os autores dos livros
didáticos atentam para as várias formas usadas para marcá-las e se consideram o contexto de
interação. Conforme Camacho (2006, p. 69), a tarefa fundamental da pedagogia da língua
materna é ―[...] despertar a consciência do aluno para a adequação das formas às
circunstâncias do processo de comunicação‖. Os pressupostos da Sociolinguística orientarão o
estudo de TAM, permitindo-nos avaliar como os autores dos livros didáticos têm contribuído
para a reflexão e análise da língua.
Considerações finais do capítulo
Para o Tempo, falamos dos três pontos temporais de Reichenbach (1947): momento da
fala, momento do evento e momento de referência, os quais muitos autores brasileiros
consideram para tratar do Tempo. Além disso, mostramos as noções de tempo relativo X
tempo absoluto; o uso de advérbios para marcar eventos no tempo; as perífrases de tempo;
indo adiante da Gramática Tradicional que prioriza a desinência modo-temporal do verbo para
a marcação de Tempo.
Para o Aspecto, consideramos as noções aspectuais de duratividade, habitualidade,
dinamicidade etc., a diferença entre perfectivo e imperfectivo; a quadripartição verbal de
Vendler (1967); os auxiliares aspectuais; os sufixos marcadores de Aspecto; as formas
68
nominais.
Para a Modalidade, abordamos a distinção entre Modo e Modalidade; noções modais,
como probabilidade, necessidade, obrigatoriedade, volição; auxiliares modais; sentidos
atribuídos ao discurso pela Modalidade.
A discussão aqui apresentada sobre Tempo, Aspecto e Modalidade sob a égide do
Funcionalismo e da Sociolinguística contribuiu para a elaboração dos três blocos contidos no
roteiro de análise, que será apresentado no capítulo seguinte: Metodologia.
69
4. METODOLOGIA
Apresentação
Este capítulo trata da descrição da metodologia empregada para a realização desta
pesquisa. Inicialmente, apresentaremos o tipo de pesquisa utilizada, em seguida,
descreveremos o corpus e, por fim, falaremos das coleções didáticas e dos procedimentos
metodológicos adotados.
4.1. Tipo de pesquisa
Para analisar como os autores dos livros didáticos tratam das categorias de Tempo,
Aspecto e Modalidade, partiremos da pesquisa de natureza descritiva, de cunho qualitativo.
Na pesquisa descritiva, conforme Andrade (2003, p. 124), ―os fatos são observados,
registrados, analisados, classificados e interpretados‖, uma de suas características ―[...] é a
técnica padronizada da coleta de dados, realizada [...] através de questionários e da
observação sistemática‖. Para o levantamento de dados, observamos a exploração dos itens
gramaticais (no que diz respeito aos verbos e advérbios), incluindo as atividades gramaticais e
as de exploração do texto, somente quando essas traziam questões referentes ao trabalho com
a gramática (no que diz respeito aos verbos e advérbios), às vezes, tomando o texto como
pretexto. Depois, submetemos os dados a um roteiro de análise, especificado na seção 4.4
abaixo.
4.2. Descrição do corpus
O nosso corpus foi constituído de livros didáticos de Língua Portuguesa, dos Ensinos
Fundamental II e Médio, pertencentes às décadas de 1970, 1980, 1990 e 2000. Consideramos
70
dois critérios
60
para a seleção de nossa amostra.
O primeiro se deu a partir dos estudos de Leão (2007), Silva e Amâncio (2007),
Ribeiro (2008) e Brito (2009), que fizeram um levantamento dos livros mais utilizados nesse
período no ensino brasileiro.
Leão (2007) selecionou as principais escolas (5 escolas) estaduais por região no
município de Santa Maria. Após essa seleção, a autora visitou as escolas e entrevistou as
Coordenadoras Pedagógicas para localizar os livros didáticos do 6º ano (5ª série) que serviram
de apoio/ suporte no período de 1970 a 2000. As Coordenadoras consultaram os Planos
Pedagógicos das escolas e indicaram os livros. Silva e Amâncio (2007) entrevistaram seis
professores do Mato Grosso, que trabalharam entre as décadas de 1960 a 2000. Por meio do
depoimento dos professores, as autoras conseguiram informações sobre os títulos utilizados
no período delimitado. Ribeiro (2008), tendo em vista que os estudos linguísticos avançaram
significativamente a partir de 1970, analisou um livro didático usado por uma escola
particular da região central de Várzea Grande, no ano letivo de 2006. Brito (2009) fez um
estudo da obra Português: linguagens.
O segundo critério levou em consideração a disponibilidade dos livros didáticos na
Biblioteca Pública Governador Menezes Pimentel (Fortaleza-CE). A Biblioteca Pública
contém livros didáticos das mais variadas décadas, por isso, foi o local escolhido para a coleta
de dados. Porém, nem sempre foi possível encontrar as coleções completas ou com o mesmo
ano de publicação. Quando isso ocorreu, substituímos os livros faltantes por outros,
respeitando os critérios de seleção.
Para a realização desta pesquisa, trabalhamos com 28 livros didáticos: um livro por
série, sete para cada década. A partir dessa escolha, fizemos uma análise histórico-
comparativa, a fim de averiguar como o estudo das categorias Tempo, Aspecto e Modalidade
foi/ está sendo feito nos livros didáticos e, consequentemente, nas salas de aula.
60
Inicialmente, tentamos conseguir informações, por meio da Secretaria de Educação do Estado do Ceará
(SEDUC), a respeito de quais livros foram usados em Fortaleza-CE nas décadas citadas. Como não registro
na SEDUC, entramos em contato com o Ministério da Educação e Cultura (MEC), via e-mail, que também não
guarda este tipo de registro. Posteriormente, buscamos informações no Colégio Liceu do Ceará, terceira escola
mais antiga do Brasil, que, igualmente, não tem qualquer dado. Por fim, fizemos uma pesquisa informal com
pessoas que estudaram ou lecionaram nas décadas de 1970, 1980 e 1990 (visto que 2000, por ser a década atual,
como saber que livros são utilizados). Mostramos uma lista, contendo o nome de algumas coleções dessas
décadas, e ninguém foi capaz de reconhecer ou informar qualquer livro adotado na época.
71
4.3. As coleções didáticas
As coleções didáticas analisadas foram:
a) Década de 1970:
Quadro 1: coleções didáticas da década de 1970.
Nível de Ensino
Nome da coleção
Autor(es)
Série/Volume
Ano
Editora
Fundamental
Estudo dirigido de
português: 1º grau
Reinaldo M.
Ferreira
5ª série
6ª série
8ª série
1977
1974
1975
Ática
Comunicação e expressão em
português: 1º grau
Jairo F. Martins
7ª série
1974
Editora
do Brasil
Médio
Caminhos da linguagem:
área de comunicação e
expressão: 2º grau
Marisa Lajolo;
Haquira Osakabe
e Francisco Platão
Savioli
Vol. 1 a 3
1977
Ática
b) Década de 1980:
Quadro 2: coleções didáticas da década de 1980.
Nível de Ensino
Nome da coleção
Autor(es)
Série/Volume
Ano
Editora
Fundamental
Linguagem, leitura e
produção de texto:
comunicação e expressão em
língua nacional: 1º grau
Heitor Megale e
Marilena
Matsuoka
5ª a 8ª séries
1983
FTD
Médio
Língua e literatura: segundo
grau
Carlos E. Faraco e
Francisco de
Moura
Vol. 1 e 2
Vol. 3
1985
1986
Ática
c) Década de 1990:
Quadro 3: coleções didáticas da década de 1990.
Nível de Ensino
Nome da coleção
Autor(es)
Série/Volume
Ano
Editora
Fundamental
Português: palavras & idéias
José de Nicola e
Ulisses Infante
5ª e 6ª séries
7ª série
8ª série
1996
1990
1995
Moderna
Médio
Língua, literatura & redação
José de Nicola
Vol. 1 a 3
1991
Scipione
d) Década de 2000:
72
Quadro 4: coleções didáticas da década de 2000.
Nível de Ensino
Nome da coleção
Autor(es)
Série/Volume
Ano
Editora
Fundamental
Português: linguagens
William R. Cereja
e Thereza A. C.
Magalhães
6º e 7º anos (5ª
e 6ª séries)
8º e 9º anos (7ª
e 8ª séries)
2002
2006
Atual
Médio
Português: linguagens: ensino
médio
William R. Cereja
e Thereza A. C.
Magalhães
Vol. 1 a 3
2005
Atual
4.3.1. Resumo das coleções
4.3.1.1. Ensino Fundamental
Da década de 1970, foram analisados três volumes da coleção Estudo dirigido de
português: grau (5ª, e séries), de Reinaldo Mathias Ferreira (1977, 1974, 1975)
61
; e
um volume da coleção Comunicação e expressão em português: grau (7ª série), de Jairo
F. Martins (1974). Os livros da coleção Estudo dirigido de português são divididos em duas
grandes partes: textual e complementação gramatical. Na parte textual, além do texto, sete
blocos de atividades, assim divididos: I Estudo das ideias; II Estudo do vocabulário e das
expressões; III Estudo da composição; IV Recapitulação gramatical; V Trabalho oral;
VI Trabalho escrito; VII - Trabalho de pesquisa. Nem sempre aparecem os sete blocos. O
texto é apresentado como pretexto para o estudo de gramática, pois dele são tiradas frases
para serem trabalhadas nos vários blocos, especialmente, nos blocos II e IV. Os conteúdos
linguísticos estão mesclados nas diversas atividades ao longo dessa primeira parte. Na parte
referente à complementação gramatical, o autor traz sempre uma gravura, uma sentença sobre
esta e um comentário a respeito para introduzir um assunto gramatical, por exemplo, verbo,
advérbio, sujeito, etc.
No livro da coleção Comunicação e expressão em português, o autor trabalha de
forma semelhante à coleção supracitada, sendo que a explanação gramatical é feita dentro de
cada capítulo, diferentemente da outra coleção que traz uma seção separada. Em cada
61
Dada a dificuldade de encontrar obras deste período, foram analisados volumes de anos diferentes, disponíveis
na Biblioteca Pública Estadual Menezes Pimentel e em sebos, o que se repetiu com outras coleções. Não foi
possível localizar o livro da 7ª série da coleção Estudo dirigido de português, por isso, optamos por
Comunicação e expressão em português: 1º grau.
73
capítulo, o autor apresenta um texto e atividades divididas em alguns blocos: I Mensagem
do texto; II Teste de observação; III Vocabulário e expressão do texto; IV Construções
do texto; V Revisão; VI Parte gramatical (contendo o tema a ser abordado: substantivo,
adjetivo, verbo, etc.); VII Ortografia; VIII Comunicação e expressão oral; IX
Comunicação e expressão escrita. Além desses blocos, o autor apresenta, ao final de cada
capítulo, a seção ―Leia mais um pouco‖ com um texto complementar. Às vezes, o autor
trabalha, a partir desse texto, algumas atividades; outras vezes, o texto é somente para leitura.
Da década de 1980, foi analisada a coleção Linguagem, leitura e produção de texto:
comunicação e expressão em língua nacional, de Heitor Megale e Marilena Matsuoka (1983).
Cada livro da coleção de a série divide-se em quatro unidades temáticas
62
, ou seja, cada
unidade é introduzida por um assunto que objetiva englobar tematicamente os textos nela
apresentados. Os livros trazem bastantes textos, embora estes sejam apenas pretexto para o
estudo da linguagem. O trabalho com a gramática dá-se dentro de cada capítulo e os conceitos
vão sendo construídos por meio de exercícios, então os autores definem o que é verbo,
advérbio, substantivo, adjetivo etc., como veremos nas próximas seções.
Da década de 1990, foi analisada a coleção Português: palavras & idéias, de José de
Nicola e Ulisses Infante (1996 e séries; 1990 série; 1995 série). Os livros
estão divididos em doze capítulos, cada um tratando de um tema linguístico: concordância
nominal, classes gramaticais, frase e oração etc. Ao longo dos capítulos, os autores propõem
atividades com o texto (Vamos trabalhar o texto), atividades linguísticas (Vamos praticar)
após explanação do tema e outras atividades ao final dos capítulos (de redação, de pesquisa e
lúdicas). Segundo os próprios autores, no exemplar do professor, os volumes privilegiam o
trabalho com o texto, porém, percebe-se o contrário. Os autores, ainda, afirmam que os
volumes da e séries valorizam um tratamento prático dos conceitos relativos à Língua
Portuguesa, ou seja, sem grandes teorias ou definições, os autores pretendem fazer o aluno
conhecer conceitos fundamentais da língua, enquanto que a sistematização da gramática está
reservada para a 7ª e a 8ª séries.
Da década de 2000, a coleção analisada foi Português: linguagens, de William Cereja
e Thereza Magalhães (6º ano (5ª série) e ano (6ª série) 2002; ano (7ª série) e 9º ano (8ª
62
Os temas trazidos nas coleções de 1980 e 2000 são variados: fantasia, quem sou eu, viagens, ser diferente,
conflitos amorosos, adolescência, valores morais etc.
74
série) 2006)
63
. Os livros estão divididos em quatro unidades, com três capítulos cada uma.
Ao final de cada unidade, aparece um capítulo especial chamado Intervalo, que ―[...] retoma e
aprofunda sob diferentes enfoques e linguagens o tema trabalhado na unidade e é organizado
de maneira a ‗quebrar‘ a estrutura do próprio livro e do andamento das aulas‖ (CEREJA;
MAGALHÃES, 2002a, p. 2)
64
. Cada capítulo apresenta cinco seções: Estudo do texto, Lendo
textos do cotidiano, Produção de texto, Para escrever com adequação (ou expressividade) e A
língua em foco. Esta última seção trata do trabalho linguístico, seção da qual retiramos a
maior parte dos dados.
A análise dos dados foi feita da seguinte forma: foram selecionadas atividades e
explanações a respeito das categorias Tempo, Aspecto e Modalidade em todo o livro,
especialmente, em partes referentes ao estudo dos verbos e advérbios. Vejamos, abaixo, os
principais conteúdos
65
linguísticos dos livros didáticos, de onde coletamos a maior parte dos
dados:
Quadro 5: quadro ilustrativo dos conteúdos linguísticos, a respeito de verbo e advérbio Ensino Fundamental.
Década/Série
6º ano (5ª série)
7º ano (6ª série)
8º ano (7ª série)
66
9º ano (8ª série)
1970
67
- Verbo (conceito,
modos, tempos);
- Elementos do
verbo;
- Formas verbais
primitivas e
derivadas;
- Verbos
auxiliares;
- Advérbio.
- Formas compostas
do verbo;
-Verbos irregulares;
- Vozes do verbo.
- Advérbio;
- Adjunto adverbial;
- Vozes verbais;
-Verbos irregulares.
- Nesta série, não
uma seção específica
para o verbo ou para
o advérbio.
1980
- Ter/ haver;
- Verbo
(conceito);
- Conjugação
verbal.
- Advérbio;
-Locução adverbial;
- Modos verbais;
- Tempos verbais;
- Conjugação
verbal;
- Formas nominais
- Verbo (modo e
tempo revisão);
- Vozes do verbo;
- Verbos
abundantes;
-Verbos irregulares;
- Conjugação das
- Adjunto adverbial;
- Verbos irregulares;
- Advérbio.
63
A lei 11.274, de 06/02/2006, estabeleceu a ampliação para nove anos do Ensino Fundamental. Até 2010,
prazo final de implementação, poderão coexistir os dois sistemas. Portanto, as séries do Ensino Fundamental
analisadas, 5ª a 8ª, na Dissertação, equivalem, conforme a lei, a: 5ª série = ano; 6ª série = 7º ano; 7 série =
ano; série = ano. Manteremos as duas nomenclaturas para nos referirmos às obras de 2000 e quando
tratarmos de todos os volumes de 1970 a 2000. Entre parênteses encontrar-se-á a nomenclatura antiga: 6º ano (5ª
série); ano (6ª série); ano (7ª série); ano (série). Para as décadas de 1970 a 1990, utilizaremos os
termos antigos.
64
O número da página refere-se ao manual do professor no final do livro.
65
Só listamos aqueles conteúdos referentes a verbo e advérbio.
66
Este livro não pertence à coleção Estudo dirigido de português, mas à coleção Comunicação e expressão
em português. Muitos dados apareceram nas seções Construções do texto e Revisão.
67
O trabalho com os verbos e advérbios apareceu, ainda, nas seções Estudo do vocabulário e das expressões,
Recapitulação gramatical, presentes na primeira parte dos livros.
75
do verbo.
formas irregulares.
1990
68
-Verbo (conceito);
- Advérbio.
- Verbo, a palavra
no tempo;
- Locução verbal;
- O verbo na
oração;
- O verbo haver;
- Adjunto adverbial.
- Verbo (locução
verbal, a estrutura
das formas verbais);
- As flexões verbais
(número, pessoa,
tempo, modo, voz);
- As conjugações
verbais;
- Os verbos
auxiliares;
- Advérbio;
- Adjunto adverbial.
- As unidades
significativas do
verbo.
2000
69
-Verbo (conceito);
- Conjugações;
- Flexão dos
verbos (número e
pessoa, modo,
tempo);
- Os tempos
verbais (presente,
pretérito, futuro);
- Modelos de
conjugação
verbal;
- O advérbio.
- A estrutura do
verbo;
- Formas nominais
do verbo;
- Verbos regulares e
irregulares;
- Locuções verbais;
- O modo
subjuntivo: tempos
do subjuntivo,
verbos regulares no
subjuntivo, verbos
irregulares no
subjuntivo.
- Vozes do verbo;
- O modo
imperativo:
formação do modo
imperativo.
- Nesta série, não
uma seção específica
para o verbo ou para
o advérbio.
4.3.1.2. Ensino Médio
Todas as coleções do Ensino Médio têm como fio condutor a literatura. Os autores
seguem a cronologia dos estilos de época nas unidades, ou seja, em cada unidade é estudado
um movimento literário.
Da década de 1970, foi analisada a coleção Caminhos da linguagem: área de
comunicação e expressão, grau, de Marisa Lajolo, Haquira Osakabe e Francisco Platão
Savioli (1977 ano; 1978 e anos). Os livros da coleção são divididos em várias
unidades de linguagem e literatura. As unidades não contêm capítulos. Os tópicos gramaticais
e literários não foram separados de forma rígida, ora os autores tratam da gramática ora da
literatura. Os livros têm uma sequencialidade, ou seja, cada volume dá continuidade ao outro.
No primeiro volume, os autores centram-se sobre: o papel social e individual da linguagem,
68
Alguns dados foram coletados de partes referentes ao trabalho com o texto.
69
Coletamos dados, também, das seções Estudo do texto, Produção de texto, Para escrever com expressividade/
adequação/ coesão e coerência, A categoria linguística na construção do texto.
76
suas funções; os mecanismos da língua, seus componentes; amostragem da variabilidade da
linguagem e a noção de norma. No segundo volume, os autores privilegiam: as classes da
língua, sua relação com o pensamento; a noção de discurso, seus tipos básicos; o problema da
significação e os recursos de estilos mais gerais. No terceiro volume, os autores retomam a
noção de variação e norma e tratam: da relação entre cultura e dialeto regional; da relação da
linguagem verbal com algumas manifestações expressivas não verbais e da linearidade ou não
do discurso verbal. Dentro desses temas, os autores incluem as unidades de literatura e as
unidades de linguagem. Quando abordam os conhecimentos linguísticos, não trabalham com
textos.
Da década de 1980, foi analisada a coleção Língua e literatura: segundo grau, de
Carlos Emílio Faraco e Francisco Marto Moura (1985 1º e 2º anos; 1986 3º ano). Os livros
contêm várias unidades, que são subdivididas em quatro seções: Texto e Estudo do texto;
Literatura; Gramática e Redação. Assim como na coleção de 1970, os autores trabalham com
uma sequencialidade. O primeiro volume aborda as funções da linguagem e figuras de
linguagem para introduzir a literatura. Além disso, na seção Gramática, os autores tratam de
regência e concordância verbais. O segundo volume é destinado às classes gramaticais. O
terceiro volume discute a estrutura das palavras, concordância nominal, termos da oração,
período. Os autores inserem, ainda, testes de vestibulares.
De 1990, trabalhamos com a coleção Língua, literatura & redação, de José de
Nicola (1993). Cada volume se divide em capítulos, com as seguintes seções: Literatura,
Revisão gramatical, Redação e Exercícios e testes. No volume um, os autores enfatizam a
comunicação e a linguagem; alguns aspectos linguísticos (línguas falada e escrita, línguas
culta e popular, línguas especiais, gíria, regionalismos); acentuação; ortografia e estrutura das
palavras. No volume dois, os autores se voltam para o trabalho com as classes de palavras,
tratando cada uma separadamente, e com os termos da oração. No volume três, privilegiam os
períodos simples e compostos; revisão de concordância, regência e funções do que e do se;
uso do infinitivo e figuras de linguagem. Os autores acrescentam exercícios e testes de
vestibulares.
Português: linguagens, de William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães
(2005) foi a coleção selecionada para a década de 2000. Os livros se dividem em quatro
unidades, que se subdividem em capítulos. Os capítulos trazem seções de Literatura (A
linguagem do movimento literário; Do texto ao contexto; Capítulos sobre autores; Diálogos
77
com... o Quinhentismo, a poesia romântica, o romance de 20 etc.); Produção de texto
(Trabalhando o gênero, Produzindo o gênero em estudo, Avalie o seu texto, Escrevendo com
expressividade/ coerência/ coesão); Língua: uso e reflexão (Construindo o conceito,
Conceituando, Exercícios, A categoria gramatical na construção do texto, Semântica e
interação e Intervalo no final de cada unidade, propostas de projetos). No volume um, os
autores trabalham a língua e as variedades linguísticas; gêneros textuais; sons e letras; divisão
silábica; acentuação; estrutura das palavras. No segundo volume, os autores tratam de cada
classe de palavras separadamente e de termos da oração. O último volume centra-se no
período composto; na pontuação; na concordância; na regência e na colocação pronominal.
A maior parte dos dados, de 1970 a 2000, foi coletada dos livros do segundo ano, visto
que estes abordam as classes gramaticais especificamente. Abaixo, listamos os principais
conteúdos
70
linguísticos encontrados nos livros do Ensino Médio relacionados ao verbo e ao
advérbio:
Quadro 6: quadro ilustrativo dos conteúdos linguísticos, a respeito de verbo e advérbio Ensino Médio.
Década/Série
1º ano
71
2º ano
3º ano
1970
- As funções da
linguagem: ação e contato;
- Componentes da ngua:
sintático e semântico;
- Componentes da língua:
Pragmático;
- Adjuntos.
- A classe dos verbos:
conceituação e subclasses;
- A classe dos verbos:
categorias;
- A classe dos advérbios.
- Nesta série, não uma
seção específica para o verbo
ou para o advérbio ou que faça
menção a um deles.
1980
- Funções da linguagem.
- Classes gramaticais;
- Verbo: conceito,
classificação, flexão;
- Tempos primitivos e
derivados;
- Advérbio.
- Estrutura das palavras;
- Processos de formação das
palavras;
- Termos acessórios da oração:
adjunto adverbial.
1990
- Funções da linguagem;
- Estrutura das palavras.
- Classe de palavras;
- O verbo: definição, estrutura,
flexão;
- O verbo: formas nominais,
verbos auxiliares;
- O verbo: tempos primitivos e
derivados, as conjugações;
- O verbo: classificação dos
verbos;
- O advérbio: definição,
classificação, graus do
advérbio;
- Termos acessórios da oração:
o adjunto adverbial.
- O período simples: termos
acessórios adjunto adverbial;
- Emprego do infinitivo.
70
Coletamos dados, também, do trabalho com o texto e com a produção de texto.
71
Nesta série, os autores, de 1970 a 2000, não tratam diretamente de verbo e advérbio, mas as unidades/
capítulos listados fazem alguma relação com o uso das categorias Tempo, Aspecto e Modalidade.
78
2000
- Introdução à semântica;
- Estrutura das palavras.
- O verbo: conceito, locução
verbal, flexão dos verbos,
formas nominais dos verbos,
classificação dos verbos,
conjugações, formação dos
tempos simples, formação dos
tempos compostos;
- O advérbio: conceito, valores
semânticos dos advérbios e
das locuções adverbiais;
- Termos ligados ao verbo:
adjunto adverbial.
- Nesta série, não uma
seção específica para o verbo
ou para o advérbio ou que faça
menção a um deles.
4.4. Procedimentos metodológicos
Para coletar os dados, observamos diretamente os livros didáticos. Registramos
72
,
através de anotações, todas as explanações e atividades sobre verbos e advérbios, assinalamos
a numeração das páginas para melhor mostrar os exemplos e escrevemos detalhes das
imagens, quando houve necessidade. Após fazer a seleção das partes que interessam ao nosso
estudo, aplicamos um roteiro com perguntas, dividido em três blocos, para analisar e
interpretar os dados. O roteiro foi elaborado com base nos pressupostos teóricos adotados
nesta pesquisa. Apresentamos a seguir o roteiro:
Quadro 7: roteiro para analisar os livros didáticos.
I. Tempo
O autor do livro didático:
a) faz distinção entre tempo verbal e tempo cronológico?
b) explica que o Tempo pode ser marcado por verbos, advérbios ou pelo contexto?
c) explora o uso de tempos característicos em alguns gêneros e tipos textuais
73
?
d) ressalta a relação entre os tempos verbais e os adjuntos adverbiais para localizar eventos no tempo?
e) mostra que uma forma verbal pode ter mais de uma função?
II. Aspecto
O autor do livro didático:
a) leva em consideração noções como duratividade, habitualidade, telicidade, iteratividade, dinamicidade,
entre outras?
72
A Biblioteca Pública não faz empréstimo dos livros do setor de Obras Gerais, onde se encontram os livros
pesquisados, nem permitia fotocopiar as obras até o término da coleta, ainda que para fins de pesquisa. A coleta
de dados consistiu em um trabalho de anotações detalhadas dos livros. Estes foram observados página a página.
73
Como tipo textual, estamos considerando: a narração, a descrição e a dissertação ou argumentação. Segundo
Marcuschi (2002, p. 27), ―quando se nomeia um certo texto como ‗narrativo‘, ‗descritivo‘ ou ‗argumentativo‘,
não se está nomeando o gênero e sim o predomínio de um tipo de seqüência de base‖. Os tipos não ocorrem
independentemente dos gêneros, um mesmo gênero pode realizar vários tipos textuais. São exemplos de gêneros:
o conto, a carta, a propaganda, a crônica, o artigo, a fábula, o seminário, o ensaio, a receita etc. Para Marcuschi
(2002, p. 20), ―os gêneros textuais são fenômenos históricos, profundamente vinculados à vida cultural e social,
[...] contribuem para ordenar e estabilizar as atividades comunicativas do dia-a-dia. São entidades sócio-
discursivas e formas de ação social incontornáveis em qualquer situação comunicativa‖.
79
b) diferencia o uso do perfeito e do imperfeito?
c) mostra o papel do particípio para expressar o aspecto conclusivo?
d) ressalta o aspecto progressivo do gerúndio?
e) trabalha os usos/funções dos verbos auxiliares aspectuais (começar, acabar de...)?
f) explora os sufixos marcadores de Aspecto (como -ear: cabecear; -ecer: envelhecer; -ejar:
pestanejar...)?
III. Modalidade
O autor do livro didático:
a) associa os Modos indicativo, subjuntivo e imperativo à certeza, incerteza e ordem, respectivamente?
Ou correlaciona os Modos ao contexto de uso?
b) diferencia Modo de Modalidade?
c) evidencia os efeitos de sentido provocados pela escolha de determinadas formas verbais?
d) faz ligação entre a Modalidade e o posicionamento do falante?
e) trabalha os usos/funções dos verbos auxiliares modais (dever, poder, ter que...)?
f) mostra que a Modalidade pode ser expressa pelo advérbio?
No primeiro bloco, sobre o Tempo, examinaremos como esta categoria é tratada pelos
autores dos livros didáticos. Partimos da hipótese de que para que o aluno compreenda a
marcação de Tempo na Língua Portuguesa, é preciso que ele reflita sobre a língua e seus
marcadores temporais (verbos, advérbios, contexto), ou seja, aprenda a diferenciar o tempo
verbal do tempo cronológico, observe a temporalidade nos gêneros e tipos textuais, entenda os
usos/funções dos tempos e a variação linguística nos tempos verbais. Além disso, um tempo
pode ser expresso por mais de uma forma, conforme demonstrado por pesquisas
variacionistas, ou uma forma pode representar várias noções temporais, segundo mostram
pesquisas de cunho funcionalista. É importante e necessário trabalhar essas correlações em
sala de aula.
No segundo bloco, sobre o Aspecto, buscamos saber como são trabalhadas as noções
aspectuais nos livros didáticos. Refletindo a constituição temporal interna dos enunciados, o
Aspecto deveria fazer parte da discussão sobre verbos e advérbios nos livros didáticos, para
que o aluno aprendesse, por exemplo, o papel dos pretéritos perfeito e imperfeito e
compreendesse os usos/funções dos auxiliares aspectuais.
No último bloco, sobre Modalidade, desejamos analisar como esta categoria tem sido
conceituada, qual sua abrangência e meios de expressão
74
nos livros didáticos. A nossa
hipótese é a de que os autores dos livros restringem a Modalidade aos Modos verbais,
deixando de lado o fato de que todo enunciado é caracterizado por uma Modalidade. Além
disso, é essencial o estudo dos usos/funções dos auxiliares modais.
74
Na nossa pesquisa, só nos interessa, como meios de expressão da Modalidade, o verbo e o advérbio.
80
Ao final da análise das categorias, faremos um resumo do tratamento dado a cada uma,
no Ensino Fundamental e no Ensino Médio, por meio de gráficos. Os gráficos têm apenas fins
ilustrativos. Não queremos ―medir‖ quem trabalhou melhor ou pior, mas o quanto de
respostas positivas e negativas obtivemos. A porcentagem (0% a 100%) está associada
diretamente às perguntas do roteiro, que são cinco no bloco I e seis nos blocos II e III: se
respondermos sim para as cinco ou seis perguntas do roteiro, marcaremos 100% para a década
no gráfico; se respondermos sim para duas ou três perguntas, marcaremos no gráfico: 40% ou
50% e, assim, sucessivamente. Consideramos a resposta como parcial, quando o autor
trabalhou de modo restrito ou apenas apresentou indícios no livro didático.
Considerações finais do capítulo
Neste capítulo, apresentamos todas as coleções analisadas (e o resumo delas) e o
roteiro que guiou a nossa coleta e análise dos dados. Mostramos, ainda, como se deu o
processo de coleta, por meio de anotações, e o que nos levou a selecionar estes livros e não
outros. A seguir, apresentamos a análise dos livros didáticos, a partir do roteiro proposto.
81
5. ANÁLISE DAS CATEGORIAS TEMPO, ASPECTO E MODALIDADE NOS
LIVROS DIDÁTICOS DE LÍNGUA PORTUGUESA
Apresentação
Com base no roteiro proposto no capítulo de Metodologia, este capítulo objetiva
analisar dados coletados de 28 livros didáticos de Língua Portuguesa, das décadas de 1970,
1980, 1990 e 2000. Trataremos, de forma separada, de cada categoria em estudo, analisando-
as nos livros do Ensino Fundamental e nos livros do Ensino Médio, a partir de comparações
entre as décadas. Por fim, evidenciaremos, de uma maneira global, como o Tempo, o Aspecto
e a Modalidade (doravante TAM) foram abordados ao longo das décadas.
5.1. Tempo
Trataremos, nesta seção, da categoria Tempo. Inicialmente, falaremos dos livros
didáticos do Ensino Fundamental e, depois, dos livros do Ensino Médio, pertencentes às
décadas de 1970, 1980, 1990 e 2000.
5.1.1. O tratamento dado à categoria Tempo pelas coleções do Ensino Fundamental
Iniciaremos nossa análise apresentando o quadro 8, referente ao Ensino Fundamental,
que, de forma geral, responde as perguntas sobre o Tempo:
Quadro 8: abordagem da categoria Tempo por década Ensino Fundamental.
COLEÇÕES
1970
1980
1990
2000
I TEMPO. O autor do livro didático:
a) faz distinção entre tempo verbal e tempo
cronológico?
Não
Não
Não
Sim
b) explica que o Tempo pode ser marcado
por verbos, advérbios ou pelo contexto?
Não
Apenas dá
indícios
Apenas dá
indícios
De forma
restrita
c) explora o uso de tempos característicos
em alguns gêneros e tipos textuais?
Não
Não
De forma
restrita
Sim
d) ressalta a relação entre os tempos
De forma
82
Antes de discutirmos os itens acima, vejamos como os autores conceituam verbo e
advérbio:
Quadro 9: definições de verbo e advérbio para os autores dos livros do Ensino Fundamental.
DÉCADAS
1970
1980
1990
2000
VERBO
VERBO é a palavra
que varia em modo,
tempo e pessoa e
apresenta-se nas
formas nominais
(FERREIRA, 1977, p.
197).
―Palavras que indicam
ação, estado ou
fenômeno da natureza
são chamadas VERBOS‖
(MEGALE;
MATSUOKA, 1983a, p.
67).
Verbo é a palavra que
indica ação,
acontecimento, estado,
mudança de estado ou
fenômeno da natureza‖
(NICOLA; INFANTE,
1996a, p. 107).
Verbos são palavras
que exprimem ação,
estado, mudança de
estado e fenômenos
metereológicos, sempre
em relação a
determinado tempo‖
(CEREJA;
MAGALHÃES, 2002a,
p. 211).
ADVÉRBIO
―[...] advérbio é uma
palavra ou expressão
modificadora que
indica lugar, tempo,
modo, afirmação,
negação, intensidade,
dúvida‖ (FERREIRA,
1977, p. 238).
―ADVÉRBIO
palavra que modifica:
a) verbo (exprime-lhe
uma circunstância);
b) adjetivo
(intensifica-o);
c) um outro advérbio
(intensifica-o)‖
(MARTINS, 1974, p.
36).
―Estas palavras que
indicam circunstâncias
de tempo, lugar,
afirmação, negação,
dúvida, modo e
intensidade chamam-se
advérbios. O advérbio
modifica o sentido do
substantivo, do verbo, do
adjetivo ou de um outro
advérbio‖ (MEGALE;
MATSUOKA, 1983b, p.
31).
Advérbio é a palavra
que modifica o verbo,
acrescentando-lhe uma
circunstância (lugar,
tempo, modo, negação,
afirmação, dúvida,
intensidade). O
advérbio de intensidade
pode modificar o
verbo, o adjetivo ou
outro advérbio‖
(NICOLA; INFANTE,
1996a, p. 109).
Advérbio é a palavra
que indica as
circunstâncias em que
se a ão verbal‖
(CEREJA;
MAGALHÃES, 2002a,
p. 246).
Notamos que, apesar da diferença de mais de vinte anos, os autores trazem definições
semelhantes, embora possamos constatar uma mudança no trabalho com TAM ao longo das
décadas.
Quanto à diferença entre tempo verbal e tempo cronológico, primeira pergunta do
roteiro, somente os autores de 2000 levam em conta essa distinção. Os demais autores, de
1970 a 1990, não fazem nenhuma menção a essa diferença. Conforme Cereja e Magalhães
(2002b, 2006d), nos livros do 7º ano (6ª série) e do 9º ano (8ª série):
verbais e os adjuntos adverbiais para
localizar eventos no tempo?
Não
Não
restrita
Sim
e) mostra que uma forma verbal pode ter
mais de uma função?
Não
Não
De forma
restrita
Sim
83
O emprego do presente no lugar do passado nas narrativas constitui uma técnica
muito usada pelos escritores. O tempo verbal, nesse caso é chamado de presente
histórico ou presente narrativo.
A técnica do emprego de presente histórico ou presente narrativo tem por
finalidade dar maior dinamismo à narrativa, envolver o leitor, fazendo-o sentir mais
próximo dos acontecimentos da história.
Assim, é comum o narrador começar a narrativa empregando os verbos no pretérito
perfeito ou no pretérito imperfeito do indicativo e passar a utilizar o presente para
relatar com maior ênfase o momento culminante da história e, no final, retomar o
emprego do tempo passado. [7º ano]
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 41)
Época em que se passa a história
A época em que se passa a história constitui o pano de fundo para o enredo. No
conto ―Pausa‖, a época é a atual. Nem sempre, porém, a época em que se passa a
história narrada coincide com aquela em que ocorre sua publicação.
Tempo cronológico
É o tempo que transcorre na ordem natural dos fatos do enredo. É o tempo
relacionado ao enredo linear, ou seja, à ordem em que os fatos ocorrem. Chama-se
cronológico porque pode ser medido em horas, meses, anos, séculos. No conto
―Pausa‖, os fatos acontecem no período de um dia (um pouco mais de doze horas).
Tempo psicológico
É o tempo que transcorre numa ordem determinada pela vontade, pela memória ou
pela imaginação do narrador ou de um personagem. De acordo com esse tempo, os
fatos podem ou não aparecer em uma ordem linear, isto é, coincidente com a do
tempo cronológico. No conto de Moacyr Scliar que foi lido não existe tempo
psicológico. [9º ano]
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006d, p. 107-108)
Essas partes encontram-se no tópico Produção de texto. Ao referirem-se ao presente
histórico, no livro do ano (6ª série), os autores demonstram que nem sempre o tempo
gramatical, no caso o presente, representa o que a forma indica (simultaneidade com o
momento de fala). O mesmo vale para o que os autores falam no livro do 9º ano (8ª série), em
que é clara a posição deles a respeito da diferença entre tempo verbal e tempo cronológico.
Abaixo, mostramos as atividades que os autores trazem a respeito do assunto:
1.
75
Leia o trecho a seguir do texto ―Teseu contra o Minotauro‖, e depois reescreva-
o, fazendo uso do presente histórico. Inicie seu texto usando o passado, escolha um
trecho para usar o presente histórico e, ao finalizá-lo, empregue novamente o
passado. Quando terminar, leia os dois textos o original e o seu e compare-os.
O herói ficou entusiasmado. Obrigado, grande deusa! disse quando se viu sozinho.
E pela manhã, quando o colocaram no Labirinto, amarrou o fio na entrada, conforme
Ariadne lhe havia dito, e prosseguiu, desenrolando o novelo. O caminho dentro do
labirinto era interminável e inimaginavelmente confuso. Ora ia por lá, ora por aqui,
ora voltava para trás, depois de novo para frente, e pela direita, pela esquerda, para
cima e para baixo... E assim Teseu caminhou por muito tempo até que, de repente,
onde menos esperava, viu o Minotauro diante de si! A luta com a fera
imediatamente teve início.
2. Escreva uma anedotinha que você conheça, empregando o presente histórico.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 41)
75
Os números, que constam nos exemplos, correspondem ao número da questão no livro didático.
84
1. Escolha um dos inícios de conto
76
a seguir e continuidade à história,
empregando o tempo cronológico.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006d, p. 109)
No exemplar do professor, os autores dão a seguinte instrução para as questões sobre o
presente histórico acima: ―Professor: as respostas são pessoais e é conveniente compará-las
oralmente. É importante lembrar os alunos de que o presente histórico não pode ser usado
aleatoriamente, pois é uma técnica que tem por objetivo envolver o leitor‖ (CEREJA;
MAGALHÃES, 2002b, p. 41). Observe que os autores ressaltam a função do presente
histórico: ―envolver o leitor‖, como se fosse possível a este retornar ao momento da
enunciação. Apesar de considerarem tal distinção, Cereja e Magalhães (2002a, 2002b, 2006c,
2006d) apresentam muitas questões para o aluno reconhecer o tempo verbal:
1. Complete as frases, empregando em um dos três tempos do pretérito os verbos
indicados:
a) Naquela época ele sempre ao clube, depois não mais. (ir)
b) Eu sempre ajudar, mas ela nunca . (procurar, aceitar)
c) Ontem, quando elas , que um ladrão na casa. (chegar, notar, entrar)
d) Há pouco, alguém você pelo alto-falante. que fosse até a recepção. (chamar,
querer)
e) Quando ele a estação, o trem já . (chegar, partir)
f) Depois que a chuva , o movimento nas ruas . (passar, recomeçar)
g) Nós já , quando a campainha . (dormir, tocar)
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 229)
No entanto, foram os autores que mais trouxeram mudanças para o ensino de TAM,
um exemplo é a questão abaixo:
2. Leia esta tira
77
:
Na tira, Angeli constrói humor opondo dois tempos verbais.
a) Quais são esses tempos verbais?
b) Que sentido tem, na tira, o verbo era?
c) Que tipo de crítica é feita às pessoas nesses quadrinhos?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 229)
Questões como a acima ajudam os alunos a verem a funcionalidade dos tempos
verbais, utilizando-os para criar sentidos em um texto (como usar o imperfeito em um texto
para expressar discrição Queria te perguntar o que aconteceu naquela noite). No exemplo,
foram trabalhados os usos do presente e do pretérito imperfeito para dar o sentido de que a
vítima já tinha se afogado.
Interessante observar que para a segunda pergunta do roteiro (o autor do livro didático
76
Ver contos no anexo 1.
77
Ver tira no anexo 2.
85
explica que o Tempo pode ser marcado por verbos, advérbios ou pelo contexto?), os autores
de 1980 e 1990 trabalham algumas questões em que se pode notar a marcação de Tempo, que
não diretamente pelo tempo verbal. Vejamos:
6. Levando em conta a vida de Veridiano, reescreva as frases, preenchendo os
espaços com os verbos dos parênteses:
a) Veridiano (chegar)... ao Brasil rosado e risonho, há alguns anos.
b) O primeiro emprego que (conseguir)... naquele ano (ser)... o de copeiro.
c) Depois de economizar dinheiro para mudar de emprego, (despedir-se)..., com
certa emoção, do 1º emprego.
d) Agora, (sair)... de tamanco empurrando sua máquina pela rua.
e) Hoje, um silvo característico o (anunciar)...
(MEGALE; MATSUOKA, 1983b, p. 73-74)
(MEGALE; MATSUOKA, 1983b, p. 86)
Megale e Matsuoka (1983b) apresentam a questão e o quadro acima no livro da 6ª
série. É o único exemplo que aparece em todo o livro (portanto, único na coletânea), por isso,
consideramos que os autores apenas dão indícios de que a marcação temporal é dada por
verbos, advérbios e pelo contexto. Destacamos essa questão, porque os autores não pedem o
tempo verbal, contudo, o aluno é capaz de conjugar os verbos pelo contexto. No quadro, os
autores realçam a locução adverbial neste momento e os advérbios ontem e hoje com itálico.
Acreditamos que esse realce não foi à toa, mas um modo de enfatizar que o advérbio,
também, indica Tempo. Na frase: Neste momento, os noivos saem da igreja, podemos
afirmar que o momento é presente pela locução adverbial. A forma verbal é de presente do
indicativo, porém, a depender do advérbio e do contexto, pode revelar outro tempo.
Nicola e Infante (1996b), no livro da série, no trabalho com o texto, trazem apenas
uma questão que remete ao segundo item do roteiro (marcação de Tempo por verbos,
advérbios ou pelo contexto). O texto é um poema de Mário Quintana (―O Circo, o Menino e a
Vida‖), que se divide em duas partes: a primeira diz respeito ao momento passado e a
segunda, ao momento presente. Abaixo, colocamos o trecho do poema e a questão:
[...]
Agora não sei esperar mais nada
Desta nem da outra vida.
[...]
(Mário Quintana)
Os tempos verbais são:
Presente: indica um fato que acontece no momento em que se fala.
Exemplo: Neste momento, os noivos saem da igreja.
Pretérito: indica um fato anterior ao momento em que se fala.
Exemplo: Ontem, o limpa-vidros levou muito arroz para casa.
Futuro: indica um fato que ainda vai acontecer.
Exemplo: Amanhã, Manuel recolherá os papéis da rua.
86
4. Qual é a palavra que inicia o trecho da poesia que se refere ao momento presente?
Essa palavra dá nome a algum ser ou indica uma circunstância de tempo?
(NICOLA; INFANTE, 1996b, p. 9)
No livro da série, Nicola e Infante (1990) mostram uma questão em que o aluno
deverá conjugar os verbos de acordo com o contexto:
5. Reescreva as frases abaixo, substituindo os asteriscos pelos verbos nos parênteses
no tempo verbal que julgar correto:
a) Aniceto de Castro não (*) dinheiro para casar com Mercedes, (*) quarenta anos
atrás. (ter, haver)
b) ―O amor (*) um grande laço.‖ (ser)
c) Carlos Drummond de Andrade (*) um dos poetas brasileiros de maior destaque.
(ser)
d) Mercedes (*) passando na rua, quando encontrou Castrão. (estar)
e) Castrão e Mercedes não se reconheceram, porque (*) passado muito tempo desde
a última vez que (*) juntos. (ter, estar)
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 90)
Essas duas questões foram as únicas encontradas na coleção do Ensino Fundamental,
portanto, de forma semelhante à coleção de 1980, os autores só dão alguns indícios.
Na coleção de 2000, os autores não explicam que o Tempo pode ser marcado por
verbos, advérbios ou pelo contexto, todavia, trabalham isso em várias questões. Exemplos são
as questões a seguir, retiradas dos livros do 6º (5ª série) e do 7º anos (6ª série):
2. Os fatos apresentados em uma história acontecem em determinado tempo e lugar.
a) No conto O Chapeuzinho Vermelho, em que lugares ocorrem os fatos?
b) Nos textos narrativos, o tempo é marcado por palavras e expressões como no dia
seguinte, ontem, ao meio-dia, depois, etc. Que expressão do parágrafo do texto
indica tempo?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 82)
3. Em seu caderno, complete as frases seguintes, empregando o verbo indicado no
tempo adequado ao contexto. Veja o exemplo:
poder
Talvez eu possa pagar esta conta hoje.
Se eu pudesse, pagaria esta conta hoje.
Quando eu puder, pagarei esta conta.
a) trazer
Talvez eles os ingredientes.
Se eles os ingredientes, nós faremos os salgadinhos.
Quando eles os ingredientes, nós faremos os salgadinhos.
b) fazer
Talvez nós uma festa de aniversário.
E se nós uma festa em seu aniversário?
Quando nós uma festa em seu aniversário, você poderá convidar todos os seus
amigos.
c) dizer
Tomara que ela finalmente sim.
Se ela finalmente sim, poderíamos acampar com nossos amigos.
Quando ela finalmente sim, poderemos acampar.
d) caber
Espero que todos os livros nesta estante.
87
Se todos os livros nesta estante, nós não teríamos que encaixotar alguns.
Se todos os livros nesta estante, nós não teremos que encaixotar alguns.
e) saber
Talvez ele alguma coisa sobre esse assunto.
Se ele alguma coisa sobre esse assunto, poderia discuti-lo.
Quando ele alguma coisa sobre esse assunto, poderá discuti-lo.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 63-64)
Por priorizarem a marcação de Tempo pela forma verbal, é que dissemos que os
autores de 2000 mostram que o Tempo pode ser marcado, também, pelo advérbio ou pelo
contexto de modo restrito.
Passemos ao item (c) do roteiro, que se refere ao uso de tempos característicos em
alguns gêneros e tipos textuais. Os autores de 1970 e 1980 não mostram, em seus livros
didáticos, qualquer evidência que possamos apontar como exemplo para esse item. Os autores
de 1990 trabalham, restritamente, esse aspecto, enquanto que, nos livros de 2000, os autores
exploram o Tempo e seu uso em gêneros e tipos textuais em todas as séries.
Nicola e Infante (1990), no livro da 7ª série, apresentam as seguintes questões:
1. Todos os verbos do texto encontram-se na mesma forma. Em que forma estão?
2. Você percebe alguma relação entre o conteúdo do texto e os verbos na forma em
que estão? Explique.
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 72)
As questões acima não exploram o Tempo, porém, observamos a tentativa dos
autores de estudarem o verbo no texto. O texto a que eles se referem é uma canção (―Cio da
terra‖) de Milton Nascimento e Chico Buarque de Holanda, em que predomina o uso do
infinitivo. Nicola e Infante (1990) chamam a atenção para a função dessa forma na canção.
Ainda, no livro da 7ª série, encontramos mais uma questão:
1. As propagandas, em geral, usam o verbo no imperativo como uma forma de
interferir no comportamento do consumidor. Analise o anúncio
78
abaixo e responda:
a) Em que modo e pessoa estão os verbos?
b) A palavra leve é utilizada de forma ambígua no anúncio. Embora esteja
funcionando como verbo (levar), sugere-nos outra significação. Qual é ela?
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 92)
Essa questão nos dá, também, indícios de que os autores querem trabalhar o uso dos
verbos nos gêneros textuais. No livro da 5ª série, Nicola e Infante (1996a) trazem uma questão
interessante, em que o Tempo poderia ter sido associado ao gênero textual (crônica). No
entanto, os autores quiseram que o aluno apenas identificasse o Tempo, colocando a função
78
Ver anúncio no anexo 3.
88
em segundo plano:
4. Os verbos sempre apresentam uma idéia de tempo, indicando-nos se o fato está
acontecendo (momento presente), se o fato aconteceu (momento passado) ou se o
fato ainda acontecerá (momento futuro). O texto ―O afogado‖ [de Fernando Sabino]
apresenta quase todos os verbos em que tempo?
(NICOLA; INFANTE, 1996a, p. 108)
Em Cereja e Magalhães (2002a, 2002b), livros de (5ª série) e anos (6ª série),
podemos citar algumas questões que mostram a preocupação dos autores de relacionar o
Tempo com o gênero:
7. Leia o trecho do conto a seguir e observe as palavras e expressões destacadas:
Essas palavras e expressões confirmam que os fatos ocorrem no presente ou no
passado?
8. Os contos maravilhosos costumam ser iniciados pela expressão Era uma vez...
a) Na sua opinião, essa expressão indica tempo preciso, determinado, ou tempo
impreciso, indeterminado?
b) O conto O Chapeuzinho Vermelho não é iniciado por Era uma vez, mas por
Havia... Se você fosse contar a alguém esse conto, você poderia começar com a
expressão Era uma vez? Nesse caso, como ficaria?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 87)
2. Observe as formas verbais empregadas nos títulos
79
.
a) Em que tempo e modo verbal elas estão?
b) A maioria dos títulos das matérias jornalísticas apresenta verbos, usados quase
sempre nesse tempo verbal. Levante hipóteses: Por que é adotado esse recurso?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 148)
A marcação de Tempo, em alguns gêneros e tipos textuais, não é trabalhada nas
explanações, exceção para o ―presente histórico‖, do qual falamos anteriormente. Na questão
acima, sobre os títulos das matérias jornalísticas, os autores não deixaram de lado a função. O
aluno deve identificar o Tempo e o Modo verbal, todavia, ele é convidado a levantar hipóteses
sobre o uso desse tempo (presente do indicativo). É um meio simples e eficiente para lidar
com o uso do Tempo, em textos, na sala de aula. Contudo, na questão abaixo, presente no
livro do 6º ano (5ª série), os autores pedem apenas para os alunos identificarem em que tempo
está o verbo:
79
Os títulos são: ―Quadrilha saqueia condomínio/ Dengue é problema na América Latina/ Vaticano envia
documentos antigos ao Brasil/ TV Cultura assume opção pelos jovens/ Temperaturas sobem à tarde‖ (CEREJA;
MAGALHÃES, 2002b, p. 147).
Havia, numa cidadezinha, uma menina que todos achavam muito
bonita. A mãe era doida por ela e a avó ainda mais. Por isso, a avó
mandou fazer um pequeno capuz vermelho que ficava muito bem na
menina. Por causa dele, ela ficou sendo chamada em toda parte de
Chapeuzinho Vermelho‖.
89
2. Na parte verbal do anúncio
80
, a conjugação do verbo comprar é propositalmente
interrompida, na 3ª pessoa do singular, pelo surgimento de outro verbo: agradecer.
a) Em que tempo e modo verbal estão conjugados esses verbos?
b) Observe a parte do anúncio em que o pronome ela aparece com grande destaque.
A quem esse pronome se refere na expressão ela agradece?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 218)
No livro do 8º ano (7ª série), Cereja e Magalhães (2006c) abordam os tipos de
discurso, no tópico Para escrever com expressividade
81
. Ao falarem da passagem do discurso
direto para o discurso indireto, os autores mostram as alterações que ocorrem nos verbos, nos
pronomes e advérbios. Reproduziremos, abaixo, somente a parte referente aos verbos:
VERBOS
Discurso direto
Discurso indireto
Verbo no presente do indicativo
O impostor afirmou:
Suspeito de todos.
Verbo no imperfeito do indicativo
O impostor afirmou que suspeitava de
todos.
Verbo no pretérito perfeito do
indicativo
A esposa confirmou:
Meu marido não esteve em casa
ontem.
Verbo no mais-que-perfeito do
indicativo
A esposa confirmou que seu marido
não estivera (tinha estado) em casa no
dia anterior.
Verbo no futuro do presente
O rapaz garantiu:
Eu levarei as compras para o senhor
daqui a pouco.
Verbo no futuro do pretérito
O rapaz garantiu que levaria as
compras para ele dali a pouco.
Verbo no presente do subjuntivo
Não quero que venha mais aqui, em
minha casa disse-lhe o vizinho.
Verbo no imperfeito do subjuntivo
O vizinho disse-lhe que não queria que
ele viesse mais ali, em sua casa.
Verbo no imperativo
Faça-me um favor. Não espalhe
pediu-lhe a vítima.
Verbo no imperfeito do subjuntivo
A vítima pediu-lhe que ele lhe fizesse
um favor. Não espalhasse.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006c, p. 43)
Nos exercícios, Cereja e Magalhães (2006c) pedem aos alunos para passarem alguns
enunciados do discurso direto para o indireto e vice-versa, fazendo as adaptações necessárias.
Ainda, na mesma série, em uma das partes de Produção de texto, cujo tema é a crítica (ou
resenha crítica), aparece a seguinte atividade:
5. Observe a linguagem empregada no texto
82
:
a) Em que tempo estão as formas verbais, predominantemente?
b) Que tipo de variedade linguística foi empregada?
c) A que tipo de público se destina a crítica?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006c, p. 60)
80
Ver anúncio no anexo 4.
81
Neste tópico, os autores tratam de aspectos expressivos da língua, como, por exemplo, a versificação, o
discurso citado, o valor estilístico da coordenação, da subordinação, da pontuação, do tempo histórico na
narrativa etc.
82
O texto a que eles se referem é ―Esses doutores emocionam sem chantagear‖, de Luiz Zanin Oricchio,
publicado no jornal O Estado de São Paulo, 23/9/2005. Ver anexo 5.
90
Na referida questão, o objetivo é somente identificar o tempo predominante, o motivo
pelo qual esse tempo é empregado não é enfatizado. O mesmo ocorre no livro do ano (8ª
série), quando Cereja e Magalhães (2006d) tratam do gênero conto
83
:
8. Observe a linguagem do conto lido [―Tentação‖, de Clarice Lispector].
a) Que tipo de variedade linguística foi empregada?
b) Que tempo verbal predomina no conto lido?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006d, p. 88)
Nas questões propostas, acima, pelos autores de 1990 e 2000, foram mencionados os
gêneros: canção, propaganda, crônica, conto maravilhoso, matérias jornalísticas, anúncio,
crítica (ou resenha crítica). Dependendo da situação comunicativa, o falante escolherá o
gênero mais adequado. Por exemplo, se queremos persuadir o interlocutor a consumir
determinado produto ou tomar alguma atitude, fazemos uso do gênero propaganda; se
desejamos ―[...] orientar o leitor de um jornal ou revista, estimulando-o ou desestimulando-o a
consumir um objeto cultural, isto é, um livro, um filme, um concerto de música clássica, um
show de rock ou de outro tipo de música, uma exposição de artes plásticas, etc.(CEREJA;
MAGALHÃES, 2006c, p. 59), usamos a resenha crítica. Segundo Cereja e Magalhães (2002a,
p. 11), no Manual do Professor: ―[...] o conhecimento e o domínio dos diferentes tipos de
gêneros textuais, por parte do aluno, não apenas o preparam para eventuais práticas
linguísticas, mas também ampliam sua compreensão da realidade, apontando-lhe formas
concretas de participação social como cidadão‖. Daí a importância do ensino de produção
textual (ou de redação) não se restringir ao ensino tradicional dos três tipos textuais: narração,
descrição e dissertação. Ao usar gêneros textuais, o aluno, além de lançar mão de estratégias
discursivas, precisa empregar diversos recursos linguísticos, como o uso de TAM. Por isso, é
fundamental que os autores de livros didáticos não se limitem a pedir o Tempo predominante
no gênero e/ou tipo textual, mas leve o aluno a refletir sobre a finalidade do uso daquele
Tempo no texto e o que a escolha/ mudança de um Tempo provoca no leitor.
O próximo item do roteiro remete à relação entre os tempos verbais e os adjuntos
adverbiais para localizar eventos no tempo. Como vimos no quadro 9, os autores consideram
o Tempo como uma das circunstâncias expressas pelo advérbio. A função sintática dos
advérbios e locuções adverbiais é a de adjunto adverbial, portanto, é importante que os
autores salientem o papel dos adjuntos adverbiais para localizarem eventos no tempo.
Martins (1974) assim fala do adjunto adverbial no livro da 7ª série:
83
O tempo predominante no conto é o pretérito imperfeito.
91
Os advérbios ou quaisquer expressões com valor adverbial (circunstancial) exercem
na oração a função sintática de adjunto adverbial. As circunstâncias que o adjunto
adverbial expressa são muitas [...]. Mas podemos resumi-las em três grandes tipos:
espacial (E), quando indica lugar; temporal (T); nocional (N), quando não indica
nem lugar nem tempo.
(MARTINS, 1974, p. 52)
Nas atividades, a intenção do autor é a simples identificação do ―tipo‖ de adjunto
adverbial. Como se fosse suficiente o aluno olhar para uma lista e apontar, em sentenças, as
circunstâncias para compreender a função do adjunto adverbial.
Megale e Matsuoka (1983d), no livro da série, dizem: Advérbio e locução
adverbial exercem função de adjunto adverbial. Calculo que não (adv. adj. adv.) chegarei a
tempo (loc. adv. adj. adv.)‖ (MEGALE; MATSUOKA, 1983d, p. 64). Semelhante a Martins
(1974), os autores só exploram a classificação e identificação dos adjuntos adverbiais.
Nicola e Infante (1996b, 1990) tratam do adjunto adverbial nos livros da e da
séries. Vejamos o que eles dizem: Adjunto adverbial é o termo da oração que indica uma
circunstância do verbo. Os adjuntos adverbiais de intensidade podem se referir também a um
adjetivo ou a um advérbio. O adjunto adverbial é sempre representado por advérbios ou
locuções adverbiais(NICOLA; INFANTE, 1996b, p. 203). Apesar de os autores apontarem
o Tempo como um circunstancial do advérbio, acrescentam algo que merece atenção:
Como o tempo é fundamental nesse texto
84
, observe ainda que alguns verbos vêm
acompanhados de palavras que reforçam a localização temporal.
antes de irem dormir...‖ eram...‖
A palavra sempre também acrescenta à fala uma circunstância temporal. Aliás,
voltando ao texto: você percebeu que todas as maneiras mudaram (deixaram de ser
simples), menos o amor e suas dores, sempre as mesmas.
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 140)
Vamos analisar uma passagem do poema de Cora Coralina:
“Criança no meu tempo de criança,
não valia mesmo nada.”
Temos, nos versos acima, alguns termos que indicam circunstâncias. Por exemplo, o
termo no meu tempo de criança localiza no tempo a afirmação que está sendo
feita. Note, ainda, que esse termo tem valor de um advérbio.
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 143)
Pelo exposto acima, vemos que os autores falam que os adjuntos adverbiais localizam
eventos no tempo. Porém, consideramos uma abordagem restrita, visto que, em nenhum
84
O texto a que os autores se referem é ―Tão simplesmente‖, de Mário Quintana. Ver anexo 6.
ADJUNTO ADVERBIAL: termo acessório da oração que, expressando
circunstância, modifica um verbo, um adjetivo, um advérbio, ou todo um
enunciado.
92
momento, trabalharam a função nos exercícios, pedem, simplesmente, para os alunos
classificarem os adjuntos adverbiais:
3. Pense no significado de cada frase e classifique o adjunto adverbial destacado.
Modelo: Eu trabalho das 8 às 18 horas.
adjunto adverbial de tempo
a) ―Trabalho não é vergonha, é só maldição.‖ (Guimarães Rosa)
b) Irei ao cinema com você.
c) Passará as férias na Bahia.
d) Viajará de avião.
e) O mendigo morreu de frio.
f) O Carnaval será em fevereiro.
g) Estudou muito para a prova.
h) ―Todo dia ela faz tudo sempre igual.‖ (Chico Buarque)
i) Ele chegou sorrateiramente.
(NICOLA; INFANTE, 1996b, p. 204)
Cereja e Magalhães (2002b) apresentam, também, questões como a de Nicola e Infante
(1996b):
1. Nestas frases de Jô Soares, indique a circunstância expressa pelos adjuntos
adverbiais destacados:
a) ―O bom astronauta vive no mundo da lua‖.
b) ―Nada mais saudável do que uma boa dieta entre as refeições‖.
c) ―Adorava andar de navio. Só não gostava do oceano‖.
d) ―O barbeiro sim, vive por um fio‖.
e) ―O ângulo reto tem 90 graus à sombra‖.
f) ―A orquestra era tão ruim que as pessoas só dançavam nos intervalos‖.
g) ―A pessoa sabe que está ficando realmente surda quando não consegue ouvir
nem elogios‖.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 246)
Os autores definem o adjunto adverbial como ―o termo que indica as circunstâncias
em que se a ação verbal‖ (CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 246). Encontramos
algumas atividades significativas na coleção Português: linguagens, que ressaltam essa
relação entre os tempos verbais e os adjuntos adverbiais para localizar eventos no tempo. No
livro do 6º ano (5ª série), embora Cereja e Magalhães (2002a) não trabalhem o adjunto
adverbial propriamente dito, demonstram interesse em fazer o aluno notar os adjuntos
adverbiais, como demonstram as questões seguintes:
2. Observe a legenda de cada um dos quadrinhos
85
.
a) A que classe gramatical pertencem as expressões sete da manhã, meio-dia e as
outras que aparecem nos quadrinhos?
b) Qual o valor semântico dessas expressões, ou seja, que tipo de circunstância elas
informam?
c) Qual é o período de tempo que a tira retrata?
4. Imagine como seria essa tira sem as legendas.
85
Ver quadrinhos no anexo 7.
93
a) Sem elas, seria possível saber o que aconteceu com Ozzy?
b) Sem elas, a tira teria a mesma graça? Por quê?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 248)
Os autores tentam enfatizar o papel das locuções adverbiais no texto, cuja função
sintática é a de adjunto adverbial, por isso, apesar de não trabalharem essa noção no 6º ano (5ª
série), os autores não deixam de lado a importante relação dos adjuntos adverbiais com os
tempos verbais para expressar o Tempo. As referidas questões exemplificam uma das
possibilidades de se trabalhar a marcação de Tempo com os alunos. No 7º ano (6ª série),
encontramos algumas questões que ressaltam a função dos adjuntos adverbiais:
5. Faça você também um poema empregando vários adjuntos adverbiais do mesmo
tipo. Sugerimos o par ontem e hoje, que permite comparar o passado e o presente.
Se quiser, brinque com as situações, mostrando as vantagens que tinha quando bebê
e as desvantagens de ter crescido; ou as vantagens de ser filho único e as
desvantagens de ter mais irmãos; e assim por diante. Se preferir, escolha outros
adjuntos ou pares de adjuntos. Ao terminar, dê um título ao seu texto.
1.
86
O anúncio
87
é quase todo constituído por adjuntos adverbiais.
a) Identifique-os e classifique-os.
b) Que tipo de adjunto adverbial predomina no texto?
c) Que relação entre esse tipo de adjunto adverbial e o tipo de serviço que o
Shoptime presta?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 248)
Pudemos confirmar isso na orientação que eles dão ao professor: ―Professor, vale a
pena estimular os alunos neste exercício, pois eles estarão operando o conceito de adjunto
adverbial de forma criativa, o que é garantia de aprendizagem‖ (CEREJA; MAGALHÃES,
2002b, p. 248). Cereja e Magalhães (2002a, 2002b, 2006c, 2006d) não exploram esse assunto
nas explanações, nos exercícios. Contudo, no livro do ano (8ª série), quando falam das
orações adverbiais dizem:
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006d, p. 98)
Observe que os autores dão relevância às noções estabelecidas pelas orações
86
As questões estão em seções diferentes na mesma página. Seguimos a ordem em que aparecem.
87
Ver anúncio no anexo 8.
Para que servem as orações adverbiais
As orações adverbiais estabelecem relações lógicas e coesivas importantes na
construção do sentido de um texto. Servem para inserir noções de tempo,
finalidade, condição, concessão ou, ainda, para estabelecer comparação,
concomitância ou relações de causa e conseqüência entre dois fatos.
Embora orações adverbiais sejam comuns na fala, alguns dos seus tipos
aparecem mais freqüentemente em textos escritos de acordo com a variedade
padrão da língua e com certo grau de elaboração de idéias.
94
adverbiais
88
para construir sentidos no texto e ressaltam, ainda, a variação entre a fala e a
escrita de acordo com a variedade padrão da língua e o grau de monitoramento da fala pelo
indivíduo, ou seja, a atenção dada à fala. Esse trecho do livro é de suma importância, uma vez
que envolve o papel do indivíduo na sociedade. Bortoni-Ricardo (2004) afirma que todo
falante alterna estilos monitorados, que demandam atenção e planejamento, e estilos não-
monitorados, que são interações espontâneas. Portanto, Cereja e Magalhães (2006d), ao
comentarem a respeito de algumas orações adverbiais que são comuns na fala e de outras
frequentes na escrita, mostram que o falante, a depender da situação (mais formal, menos
formal) em que está envolvido, monitorará o uso das orações adverbiais. Dessa forma, o
indivíduo estabelece relações sociais pela linguagem ao tomar consciência de quem é seu
interlocutor, de qual é o tema da conversa, do ambiente onde está, para passar de uma
conversa mais séria para uma brincadeira, por exemplo, e inserir noções, por meio do uso de
orações adverbiais, de tempo, finalidade, condição, concessão etc. Merece destaque a questão
a seguir em que orações adverbiais são utilizadas em um anúncio:
3. O enunciado verbal, cruzado com as imagens, contém os argumentos que visam a
convencer o consumidor a adquirir o produto
89
. Observe as orações que compõem o
enunciado verbal.
a) Como se classifica a oração ―como um relógio‖?
b) E a oração ―enquanto o pequeno fica parado‖?
c) Relacione o enunciado verbal com os dois relógios e conclua: qual é o argumento
principal do anúncio?
d) Qual é a importância das orações subordinadas adverbiais para a construção desse
argumento?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006d, p. 99)
Os autores enfatizam a função da oração subordinada adverbial para dar sentido a esse
anúncio. É um ótimo exemplo de atividade para se trabalhar a Sociolinguística na sala de aula.
A oração enquanto o pequeno fica parado influi, diretamente, na interpretação do anúncio e,
consequentemente, na aceitação do produto pelo consumidor. O indivíduo, ao produzir o
anúncio, pensou no tipo de público que quer atingir, no meio de circulação do anúncio (jornal,
revista, outdoor...) e que recursos linguísticos usar para convencer o consumidor, nesse caso,
o uso de orações adverbiais. Portanto, ocorreu elevado grau de monitoração estilística no
anúncio, a fim de se atingir o objetivo: vender o produto.
Iremos, agora, para o último item do roteiro sobre o Tempo: o autor do livro didático
88
Cereja e Magalhães (2006d, p. 92) definem a oração subordinada adverbial como ―aquela que tem valor de
advérbio (ou locução adverbial) e exerce, em relação ao verbo da oração principal, a função de adjunto
adverbial‖.
89
Ver anúncio no anexo 9.
95
mostra que uma forma pode ter mais de uma função? Não evidências nos livros de 1970 e
1980 de que os autores trabalhem a correlação forma-função. Apenas notamos a abordagem
das locuções verbais (ou formas compostas para Ferreira (1974)), em que os autores poderiam
ter exercitado os efeitos de sentido provocados pelas formas simples e compostas:
Quadro 10: definição de locução verbal para os autores de 1970 e 1980.
DÉCADAS
1970
1980
LOCUÇÃO VERBAL
Ferreira (1974) mostra, por meio de
muitos quadros, o modelo de conjugação
dos verbos compostos. Estes, segundo o
autor, são formados por um verbo auxiliar
mais um outro verbo qualquer.
Locução verbal é a combinação de duas ou
mais formas verbais: verbo auxiliar com
infinitivo, gerúndio ou particípio do verbo
principal. Apenas o verbo auxiliar é
flexionado em pessoa, número, tempo e modo.
Exemplos:
Quero encontrar um diamante.
v. aux. v. princ.
Tinha participado da busca‖.
v. aux. v. princ.
(MEGALE; MATSUOKA, 1983c, p. 178)
Os autores não estão preocupados com a função das formas verbais, querem que o
aluno ―aprenda‖ a fazer as substituições: da forma composta para a forma simples e vice-
versa. Há, ainda, outro problema. Em um dos exemplos dados por Megale e Matsuoka
(1983c): Quero encontrar um diamante, a locução verbal é formada por um verbo principal
mais uma oração. Em Tinha participado da busca, é possível fazer a substituição: tinha
participado = participara, há um verbo modal mais um verbo principal. Os autores não
explicam a diferença. Nos exercícios, os autores de 1970 e 1980 trazem questões como:
5) Empregue nas lacunas a forma correta do verbo que aparece indicado nos
parênteses no pretérito mais-que-perfeito composto do subjuntivo:
a) Se vós ______ a laranjeira, ela teria aceitado o governo universal das árvores
(consultar)?
b) Se tu ______ mais cedo, não ouvirias a recusa da figueira (partir, auxiliar: haver)
9) Conjugue em seu caderno os seguintes verbos em todas as formas compostas,
usando o auxiliar haver: iludir, ser.
(FERREIRA, 1974, p. 182)
13. Retire a locução verbal das frases:
a) Temia falar de frente com a mãe.
b) Ele se acostumara a manter com o pai um silêncio respeitoso.
c) A mãe contava um caso qualquer que tinha se passado na ausência do marido.
d) O menino não ouvia, ela própria ria do que estava contando.
e) O pai parou de mastigar.
f) O pai andava fechado no seu mundo.
g) Ela buscou apoiar-se no marido.
h) Estava só prestando atenção no caso que a senhora contava.
i) Prestava atenção no caso que a senhora estava contando.
(MEGALE; MATSUOKA, 1983c, p. 178)
96
O trabalho é, exclusivamente, com a forma. Em nenhum momento, foi mostrado o
quanto essas formas influem na interpretação das sentenças em que ocorrem. Há diferenças de
uso entre as formas simples e as compostas, por exemplo: tenho amado/ amei; se eu houvesse
partido/ se eu partisse; tinha vendido/ vendera; tinha passado/ passara etc. É interessante
analisar com o aluno essas diferenças e qual a intenção do falante ao escolher uma ou outra
forma, para ajudá-lo na produção de textos.
Nicola e Infante (1990), também, não enfatizam a função das formas verbais. Contudo,
no livro da 7ª série, os autores mostram duas questões que merecem destaque:
10. ―Eu era tão criança
E ainda sou
Dê os tempos das formas verbais destacadas.
11. Como você interpreta esse jogo verbal mencionado na questão anterior?
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 153)
Nas questões, temos o pretérito imperfeito versus o presente, que os autores chamam
de ―jogo verbal‖. Em resposta à questão, no exemplar do professor, os autores enunciam: ―o
jogo temporal dos verbos realça a idéia de que ele ainda mantém a esperança e os sonhos da
infância: ‗E ainda sou/ Querendo acreditar que o dia vai raiar‘‖ (NICOLA; INFANTE, 1990,
p. 20
90
). Em toda a coleção, são os únicos exemplos que podemos apontar.
em Cereja e Magalhães (2002a, 2002b, 2006c), diversos exemplos nos livros do
ano (5ª série) ao ano (7ª série). Vejamos, abaixo, exemplos do livro do ano (5ª série),
em que, aparentemente, os autores não tencionam mostrar a relação forma-função, mas
somente mais uma das formas do verbo:
Dois ou mais verbos com valor de um formam uma locução verbal. Por exemplo:
vai ficar, está falando, deve sair.
Observe a correspondência:
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 211)
Você brincou de detetive? É muito divertido e requer que aprendamos alguns
truques. Por exemplo, usar tinta invisível. Vosabe como fazer tinta desse tipo? É
só seguir estas instruções:
90
A página é do Manual do Professor, no início do livro.
Ficarei em casa hoje à noite.
verbo
Vou ficar em casa hoje à noite.
locução verbal
Você vai precisar de:
- suco de limão;
- papel branco;
- um palito ou um pincel
fino.
97
Tinta invisível
Coloque o suco de limão em um potinho. Cuidado para não deixar cair em sua pele,
porque o suco limão pode causar manchas.
Molhe o pincel ou o palito no suco e escreva o recado no papel branco. Entregue a
mensagem a um amigo. Para ler, ele vai ter de aproximar o papel de uma lâmpada
acesa, até que o calor faça as letras aparecerem.
a) Reconheça os modos em que estão as formas verbais destacadas.
b) A forma vai precisar, utilizada no texto do quadro lateral, é uma locução verbal.
Que forma verbal simples (de uma única palavra) corresponde a essa locução?
c) A que modo pertence essa locução verbal ou essa forma verbal simples?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 215)
No início do livro do ano (5ª série), os autores tratam da variação linguística de
forma geral. Ao falarem de locução verbal, deveriam ter aproveitado a oportunidade para
dizer que este, também, é um exemplo de variação, pois deram embasamento para tal fim e
não apenas fazer o aluno conhecer a locução verbal e descobrir a forma simples que a
substitui.
No livro do 7º ano (6ª série), Cereja e Magalhães (2002b) falam, claramente, da
variação linguística nas formas verbais, quando tratam dos verbos irregulares no subjuntivo.
Exemplo disso é a questão a seguir, em que os autores opõem as variantes presente e futuro
do presente e as variantes futuro do presente e futuro do subjuntivo:
2. Na linguagem oral, é comum empregarmos um tempo verbal no lugar do outro.
No 1º quadrinho
91
, a forma verbal faço corresponde ao presente do indicativo.
a) De acordo com a variedade padrão da língua, em que tempo o verbo fazer deveria
estar?
b) se o verbo fazer fosse empregado nesse tempo verbal, como ficariam as frases do
2º quadrinho?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p.63)
Os autores dizem, ainda, para o professor
92
: ―Embora a correlação entre o futuro do
subjuntivo e o futuro do presente seja a mais recomendada na variedade padrão, o emprego do
presente no lugar do futuro é inteiramente aceitável‖ (CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p.
63). O mesmo ocorre com a questão a seguir, cujas variantes são o pretérito imperfeito e o
futuro do pretérito:
3. Observe os verbos destacados nestes versos
93
: ―Se esta rua fosse minha,/ eu
mandava ladrilhar‖.
a) Classifique-os quanto ao tempo e ao modo.
b) Entre esses tempos verbais não uma correspondência rigorosa. Reescreva os
versos, colocando os verbos nos tempos e modos exigidos pela variedade padrão da
91
Ver quadrinho no anexo 10.
92
Orientação contida no exemplar do professor.
93
Ver poema completo no anexo 11.
98
língua.
c) Em que outras estrofes se verifica a mesma falta de correlação entre os tempos
verbais?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 65)
Outra questão interessante apareceu no livro do ano (7ª série). Os autores dão um
exemplo do presente exercendo a função de futuro:
2. Observe o emprego dos verbos nesta frase:
Se eu precisar pagar, eu pago.‖
a) Em que tempo e modo estão as formas verbais precisar e pago?
b) No contexto, a forma verbal pago tem um valor semântico diferente daquele que
lhe é comum. Ela expressa uma ação que está ocorrendo no presente ou que ainda
vai ocorrer no futuro?
c) De que outro modo poderíamos dizer o mesmo enunciado, sem alteração de
sentido?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006c, p. 18)
Atividades como a acima são importantes para o aluno não ver a funcionalidade da
língua, mas, também, para perceber que nem sempre é possível identificar o Tempo somente
pela forma verbal, é preciso considerar o contexto. No exemplo acima, o presente foi usado
com valor de futuro.
Os autores de 1970 e 1980 priorizam, demasiadamente, a forma. Para trabalharem o
Tempo, os autores apresentam vários quadros com modelos de conjugação, que, muitas vezes,
são confusos, como podemos observar:
VERBO
Modos
indicativo
Tempos
Subdivisões
presente
pretérito
imperfeito
perfeito
mais-que-perfeito
futuro
do presente
do pretérito
subjuntivo
presente
pretérito
imperfeito
futuro
imperativo
afirmativo
negativo
Formas
nominais
infinitivo
impessoal
pessoal
gerúndio
particípio
(FERREIRA, 1977, p. 198)
Indicativo presente
1ª conjugação
2ª conjugação
3ª conjugação
terminações
And- -o
(radical) -as
terminações
Receb- -o
(radical) -es
terminações
Divid- -o
(radical) -es
99
-a
-amos
-ais
-am
-e
-emos
-eis
-em
-e
-imos
-is
-em
(MEGALE; MATSUOKA, 1983b, p. 87)
Esses são apenas dois dos inúmeros quadros que os autores mostram. Os alunos
precisam saber como os verbos se conjugam, no entanto, é necessário que eles exercitem a
função dos tempos verbais, especialmente, em suas produções textuais. Os autores de 1970 e
1980, ao trabalharem com muitos quadros e pedirem para os alunos conjugarem os verbos ou
reconhecerem a partir dos modelos o Tempo e o Modo nos exercícios, tornam o estudo do
verbo sem funcionalidade. Alguns exemplos:
3) Escreva nos parênteses o número correspondente ao tempo ou modo: presente do
indicativo (1); presente do subjuntivo (2); imperativo afirmativo (3); imperativo
negativo (4):
a) Estudai, crianças!
b) Não apague a luz.
c) Ele apaga a luz mais tarde.
d) Não andes muito.
e) Cantem com alegria, meninos.
f) Não entremos já.
g) Todos desejam do fundo do coração
que ganhes aquele prêmio.
h) Cantas muito bem.
Atenção: Somando os números dos
parênteses, o resultado deve ser 23. Confere?
(FERREIRA, 1977, p. 211)
8. Conjugue os verbos falar, correr, invadir no futuro do presente do indicativo,
aplicando aos radicais as terminações dadas nos modelos.
(MEGALE; MATSUOKA, 1983b, p. 138)
Pelas questões acima, o aluno só exercitará os elementos formais sem entender a
aplicabilidade de usar o verbo no texto. Na subseção seguinte, discutiremos como foi o
trabalho com o Tempo, de 1970 a 2000, nos livros didáticos do Ensino Médio.
5.1.2. O tratamento dado à categoria Tempo pelas coleções do Ensino Médio
Considerando-se o tratamento dado à categoria Tempo no Ensino Médio, chegamos às
seguintes respostas:
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
_______
soma:
100
Quadro 11: abordagem da categoria Tempo por década Ensino Médio.
Muitas das respostas foram dadas com base nos livros do 2º ano, já que são os
volumes em que os autores focam a sistematização da gramática. Nas outras séries, os autores
tratam de aspectos mais gerais da linguagem e suas funções. Enquanto nos livros do Ensino
Fundamental, os autores diferem bastante na apresentação dos tópicos linguísticos (por
exemplo, alguns autores trabalham o verbo e suas flexões no ano (5ª série) e outros
trabalham as flexões na série seguinte), no Ensino Médio, os autores aproximam-se muito:
1970 a 2000, tratam de verbo e advérbio no livro do ano, especificamente, trabalham
conceito, flexões, usos.
Como fizemos para o Ensino Fundamental, mostraremos a seguir um quadro com os
conceitos de verbo e advérbio, segundo os autores do Ensino Médio:
COLEÇÕES
1970
1980
1990
2000
I TEMPO. O autor do livro didático:
a) faz distinção entre tempo verbal e
tempo cronológico?
Não
Sim
Não
Sim
b) explica que o Tempo pode ser marcado
por verbos, advérbios ou pelo contexto?
Não
Não
Não
De forma
restrita
c) explora o uso de tempos característicos
em alguns gêneros e tipos textuais?
De forma
restrita
Apenas dá
indícios
De forma
restrita
De forma
restrita
d) ressalta a relação entre os tempos
verbais e os adjuntos adverbiais para
localizar eventos no tempo?
Não
Não
Não
De forma
restrita
e) mostra que uma forma verbal pode ter
mais de uma função?
Não
Não
Sim, mas
não é
exercitado
Apenas dá
indícios
101
Quadro 12: definições de verbo e advérbio para os autores dos livros do Ensino Médio.
DÉCADAS
1970
1980
1990
2000
VERBO
―Em todas as frases, você
pode notar que são
palavras como ‗chover‘,
‗alegrar-se‘, ‗ser‘ e ‗estar‘,
que lhe permitem enunciar
processos, atribuí-los a um
sujeito, atribuir ao sujeito
um estado, uma qualidade.
As palavras que podem
cumprir tais papéis
pertencem à classe dos
verbos. Seu traço mais
comum é a possibilidade
de, com elas, o locutor
perfazer um ato de
atribuição (LAJOLO;
OSAKABE; SAVIOLI,
1978b, p. 24).
―Palavra que indica ação,
estado ou fenômeno.
Finfilóquia saiu./
Emengarda é generosa./
Choveu torrencialmente
ontem à tarde.
(FARACO; MOURA,
1985b, p. 153)
Verbo é a palavra
variável que indica
uma ação, um estado,
um fenômeno da
natureza. Ao contrário
do nome, o verbo tem
sempre um aspecto
dinâmico, indicando
um processo
devidamente localizado
no tempo (NICOLA,
1993b, p. 93).
Verbos são
palavras que
exprimem ação,
estado, mudança de
estado e fenômenos
meteorológicos,
sempre em relação a
determinado tempo‖
(CEREJA;
MAGALHÃES,
2005b, p. 143).
ADVÉRBIO
―[...] o advérbio pode
cumprir os seguintes
papéis: a) assinalar as
circunstâncias de modo,
tempo e lugar do processo
verbal; b) afirmar ou
anular o processo verbal e
seus modificadores; c)
intensificar, para mais ou
menos, o processo verbal e
seus modificadores, bem
como a qualidade ou
estado expresso pelo
adjetivo‖ (LAJOLO;
OSAKABE; SAVIOLI,
1978b, p. 65).
―Palavra que modifica o
verbo, o adjetivo ou o
próprio advérbio,
indicando-lhe uma
circunstância‖
(FARACO; MOURA,
1985b, p. 221).
Advérbio é a palavra
que basicamente
modifica o verbo,
acrescentando-lhe uma
circunstância (ad
prefixo que indica
proximidade; advérbio,
literalmente, é a
palavra que
acompanha, modifica o
verbo)‖ (NICOLA,
1993b, p. 168).
Advérbio é a
palavra que indica as
circunstâncias em
que se a ação
verbal‖ (CEREJA;
MAGALHÃES,
2005b, p. 172).
Os autores do Ensino Médio conceituam verbo e advérbio da mesma forma que os
autores do Ensino Fundamental. Cereja e Magalhães (2005b) apresentaram as mesmas
definições presentes na coleção do Ensino Fundamental. Lajolo, Osakabe e Savioli (1978), na
definição de verbo, diferem dos outros autores quando falam de processo e de ato de
atribuição (consiste em atribuir um sujeito ao verbo). Como exemplos de processo, os autores
apresentam: João se alegrou/ Chove/ João é/ está alegre (LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI,
1978b, p. 23). Quanto aos advérbios, os autores de 1970 chamam de função (papel) do
advérbio as circunstâncias expressas por ele, o fato de modificar ou intensificar o processo
verbal. Os autores, de 1970 a 2000, no Ensino Médio, não aprofundaram os conceitos nos
exercícios, como veremos na discussão de Tempo, Aspecto e Modalidade.
Para a primeira pergunta do roteiro: o autor do livro didático faz distinção entre tempo
102
verbal e tempo cronológico?, respondemos positivamente para as coleções de 1980 e 2000,
que fazem isso de modo claro, conforme definições abaixo. Os autores de 1970 e 1990 não
deram nenhum indício de que consideram essa diferença.
No volume do ano, Faraco e Moura (1985a), ao apresentarem os elementos da
narrativa, assim falam do Tempo:
Observe:
No dia seguinte bateu visita na casa da família novata.‖
Um dia, voltando da roça por uma vereda...‖
A esse tempo marcado pelo relógio, de caráter objetivo, -se o nome de tempo
cronológico.
Outras vezes, o narrador não se preocupa com o tempo objetivo em que ocorreu
determinado fato. Penetra na consciência da personagem, vasculhando o tempo
subjetivo, aquele que varia de pessoa para pessoa e que não pode ser marcado
materialmente. É o tempo psicológico.
Observe:
―Que horas seriam? Ninguém podia viver no tempo, o tempo era indireto e por sua
própria natureza sempre inalcançável‖ (Clarice Lispector).
(FARACO; MOURA, 1985a, p. 110-111)
Comparemos as definições de tempo cronológico e tempo psicológico de Faraco e
Moura (1985a) com as de Cereja e Magalhães (2005b), no livro do 2º ano:
Tempo cronológico
É o tempo que transcorre na ordem natural dos fatos no enredo, do começo para o
final. Está ligado ao enredo linear, ou seja, à ordem em que os fatos ocorrem.
Chama-se tempo cronológico porque pode ser medido em horas, meses, anos,
séculos. No conto ―Uma vela para Dario‖, os fatos acontecem no período de cinco
horas.
Tempo psicológico
É o tempo que transcorre numa ordem determinada pela vontade, pela memória ou
pela imaginação do narrador ou personagem. É característico de enredo não linear,
ou seja, do enredo em que os acontecimentos estão fora da ordem natural.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 140)
A segunda pergunta: o autor do livro didático explica que o Tempo pode ser marcado
por verbos, advérbios ou pelo contexto?, levou-nos a uma resposta parcial apenas para a
década de 2000. O Ensino Médio é um nível propício para se trabalhar essa noção, que os
alunos têm certo amadurecimento, principalmente, em relação à leitura de textos literários,
mas os autores não o fazem. Cereja e Magalhães (2005), tratando do Tempo nas narrativas
dizem:
No conto ―Uma vela para Dario‖, de Dalton Trevisan, o narrador faz referência ao
tempo em que ocorrem os fatos por meio do emprego de marcadores temporais
assim que, ainda, agora, a essa hora, duas horas, há muitos anos, três horas depois
e de formas verbais no passado vinha, diminuiu, [foi] escorregando, rodearam,
estava morrendo. Esses elementos são indícios do tempo de duração da história e
permitem medir o período em que os fatos transcorreram: a agonia de Dario durou
103
duas horas; depois de morto, fazia três horas que o corpo dele aguardava o rabecão.
A época em que se passa a história, pode ser indicada por marcadores temporais,
como, por exemplo, ―Era no tempo do Império‖, ou por outros tipos de indícios. Em
―Uma vela para Dario‖, a época é a atual, pois o texto faz referência ao rabecão,
carro que leva os cadáveres de indigentes para o necrotério ou para o cemitério.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 140)
Está claro que, para os autores, a marcação de Tempo -se, também, por outros
elementos, que não o verbo. Em outra unidade, depois de tratarem do adjunto adverbial, os
autores apresentam as seguintes questões, na seção Os termos ligados ao verbo na construção
do texto:
Leia este poema, de Vinícius de Morais:
Poética (I)
De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.
A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O oeste é meu norte.
Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem.
Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
Meu tempo é quando.
Cativo: preso, escravo.
(Antologia poética. 21 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1982)
1. Como o próprio nome do poema sugere, o texto é metalingüístico. Dizemos que a
poética de um autor, além do conjunto de suas obras, consiste também no conjunto
de temas, procedimentos estéticos e visão de mundo que elas expressam. No caso do
poema lido, o eu lírico empenha-se em descrever como é viver poeticamente. Para
isso, faz uso de duas noções essenciais: o tempo e o espaço. Qual dessas noções
predomina:
a) na 1ª estrofe? b) na 2ª estrofe? c) na 3ª estrofe? d) na 4ª estrofe?
6. As duas últimas estrofes retomam as estrofes anteriores e preparam para a
finalização do poema, que se dá nos dois últimos versos. Observe os tempos verbais
e os adjuntos adverbiais empregados nos versos: ―Eu morro ontem‖ e ―Nasço
amanhã‖.
a) coerência entre a noção temporal expressa pelos tempos verbais e a expressa
pelos adjuntos adverbiais?
b) Que alterações poderiam ser feitas nos verbos para que houvesse coerência?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 278-279)
Observe que o poema mostra várias locuções adverbiais e advérbios, que indicam
Tempo. Os autores chamam a atenção do aluno para esse fato, reconhecendo o advérbio (ou
locução) como marcador de Tempo. Além disso, os autores destacaram os versos: Eu morro
104
ontem; Nasço amanhã, em que o tempo verbal e a noção temporal expressa pelo advérbio
diferem, provocando uma quebra de expectativa e reforçando o sentido que o poeta quer
passar: ―ser poeta é ser contrário a toda ordem existente [...]‖, ―as contradições entre o eu
lírico e as dimensões de tempo e espaço decorrem do fato de que, para o poeta, não se pode
definir o que é indefinível: a poesia‖ (CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 279). Os autores
pedem que o aluno faça alterações nos versos. Trabalhar essas alterações, em sala de aula, é
importante para que o aluno perceba a correlação entre tempo verbal e advérbio para marcar o
Tempo: Eu morro ontem => Eu morri ontem/ Eu morro hoje; Nasço amanhã => Nascerei
amanhã/ Nasço hoje. Em toda a coleção, foram os únicos exemplos encontrados, por isso,
consideramos uma abordagem restrita.
Vamos ao terceiro tópico: o autor do livro didático explora o uso de tempos
característicos em alguns gêneros e tipos textuais? O trabalho é restrito nas quatro décadas.
Falando da narração, no livro do 2º ano, os autores Lajolo, Osakabe e Savioli (1978b)
afirmam que os verbos criam uma realidade dinâmica na narração. No exemplar do professor,
os autores apontam como finalidade da unidade: ―levar o aluno a reconhecer e a manipular o
encadeamento cronológico e lógico, típico do discurso narrativo, que se fundamenta na classe
dos verbos‖ (LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978b, p. 107). Os autores trazem um
pequeno texto para explicar como a realidade dinâmica se constrói: o personagem (menino)
recebe a notícia de que ganhará mais um irmão; o menino fica com ciúme; a mãe lhe promete
que será padrinho; o menino sentiu a responsabilidade e chorou de alegria. Dessa forma, os
autores explicam que um encadeamento entre os enunciados: um enunciado se relaciona
sempre com os anteriores e com os posteriores. E mais:
[...] os enunciados que consideramos essenciais no desenvolvimento do texto podem
ser ligados por partículas do tipo ―então‖, ―daí‖, ―depois‖, etc.:
―Disseram pro menino que vinha mais um irmão‖,
daí
―menino ficou com uma pontinha de ciúme‖,
daí
―a mãe prometeu que ele ia ser o padrinho do que ia nascer‖,
então...
A possibilidade de você colocar tais partículas entre os enunciados mostra que existe
uma dependência temporal entre eles: um enunciado é conseqüência do anterior,
no tempo. A progressão temporal que se estabelece entre os enunciados constitui a
maneira mais corrente pela qual uma língua possibilita uma narração.
[...] entre os enunciados existem determinados elementos que, por serem demasiado
conhecidos, o autor não julgou necessário explicitar. Vopode, portanto, pensar
que:
1 ―disseram pro menino que vinha mais um irmão‖,
leva o menino a pressentir a perda do privilégio das atenções, e, por isso,
2 ―menino ficou com uma pontinha de ciúme‖.
105
Vemos assim que existe um relacionamento forte entre os enunciados 1 e 2, que
poderia ser resumido da seguinte forma:
a) anunciar (ao menino);
b) (o menino) pressentir;
c) (o menino) enciumar-se.
―Anunciar‖ provoca ―pressentir‖ que provoca ―enciumar-se‖. Há, portanto, 3
processos conseqüentes nesse pequeno trecho; se você atentar para o encadeamento
desses enunciados, você vai perceber que uma classe de palavras sobre as quais
se assenta tanto o encadeamento de ações quanto a relação de conseqüência e a
dependência temporal: é a classe dos verbos, observável em ―anunciar‖,
―pressentir‖, ―enciumar-se‖. Esta classe constitui o suporte do discurso narrativo.
(LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978b, p. 108-109)
Notamos que os autores não especificam o tempo verbal predominante na narração,
mas falam da dependência temporal que é manifestada pelo verbo. Esse foi o único exemplo
encontrado. Os autores não trazem exercícios. Na coleção de 1980, no ano, os autores
apresentam um indício:
5. No 8º e 9º parágrafos
94
, existe uma série de hipóteses no passado.
a. Quais os verbos que demonstram isso?
b. Em que tempo estão esses verbos?
(FARACO; MOURA, 1985a, p. 67)
Essa questão pode, ainda, ser associada à Modalidade, que o tempo referido é o
futuro do pretérito do indicativo, tempo da hipótese/ possibilidade. Em 1990, podemos
citar dois exemplos. O primeiro, presente no livro do ano, diz respeito ao tempo
predominante no poema ―Cântico do calvário‖, de Fagundes Varela
95
:
3. Qual o recurso lingüístico usado pelo poeta para invocar a presença do filho
morto? Qual o tempo verbal dominante na poesia?
(NICOLA, 1993b, p. 92)
Outro exemplo consta do livro do ano e é semelhante ao que Cereja e Magalhães
(2006c) trouxeram no livro do ano (7ª série), sobre a passagem do discurso direto para o
discurso indireto:
Discurso direto
Discurso indireto
- verbo no presente do indicativo:
Não bebo dessa água afirmou a
menina.
- verbo no pretérito imperfeito do
indicativo:
A menina afirmou que não bebia
daquela água.
- verbo no pretérito perfeito:
Perdi meu guarda-chuva disse ele.
- verbo no pretérito mais-que-perfeito:
Ele disse que tinha perdido seu
guarda-chuva.
- verbo no futuro do indicativo:
Ele confessou:
- verbo no futuro do pretérito:
Ele confessou que iria ao jogo.
94
O texto a que os autores se referem é: ÉLIS, B. Noite de São João. In: ______. Seleta. 2. ed. Rio de Janeiro:
José Olympio, 1976, p. 35-39. Ver anexo 12.
95
Ver poema no anexo 13.
106
Irei ao jogo.
- verbo no imperativo:
Aplaudam! ordenou o diretor.
- verbo no pretérito imperfeito do
subjuntivo:
O diretor ordenou que aplaudíssemos.
(NICOLA, 1993c, p. 131)
Os autores mostram, pelo quadro, os tempos usados no discurso, quando direto ou
indireto. Cereja e Magalhães (2005b), no livro do ano, apresentam, exatamente, o mesmo
quadro do livro do 8º ano (7ª série). Outros exemplos são:
7. Observe a linguagem do conto
96
lido.
a) Que tipo de variedade lingüística foi empregada?
b) Que tempo verbal predomina?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 135)
6. Como a maioria dos gêneros ficcionais, a crônica pode ser narrada no presente ou
no pretérito.
a) Que tipo de tempo verbal predomina na crônica
97
em estudo?
b) Que efeito de sentido a escolha desse tempo verbal confere ao texto?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005c, p. 72)
6. Observe a linguagem empregada no texto
98
.
a) Que variedade lingüística predomina: a variedade padrão formal ou informal?
b) Qual o tempo verbal predominante?
c) Em que pessoa se coloca o autor da carta?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005c, p. 170)
Das três questões acima, a primeira consta do livro do ano e as demais, do livro do
3º ano. Nos exemplos citados, a questão que aparece na página 72 do livro do 3º ano é a única
que, além da identificação do tempo verbal predominante, ressalta a função. Na década de
2000, a abordagem é, também, restrita. Os autores, de 1970 a 2000, poderiam ter ampliado o
estudo do Tempo considerando gêneros e tipos textuais, principalmente, Cereja e Magalhães
(2005a, 2005b, 2005c) que propõem um estudo de gramática contextualizado e inovador.
Como comentamos na subseção anterior, é interessante abordar o uso de TAM nos gêneros e
tipos textuais. No Ensino Médio, pudemos observar o Tempo sendo trabalhado na narração,
no poema, na crônica e no conto. No entanto, não houve um aprofundamento desse trabalho e,
na maioria das atividades, os autores pediram a identificação do tempo predominante. Já
que os autores focam bastante a literatura, poderiam estudar o Tempo nos gêneros literários.
O próximo item do roteiro refere-se à relação entre os tempos verbais e os adjuntos
adverbiais para localizar eventos no tempo. Observemos como os autores definem o adjunto
adverbial:
96
Conto ―Noite de almirante‖, de Machado de Assis. Ver anexo 14.
97
Crônica ―A última crônica‖, de Fernando Sabino. Ver anexo 15.
98
Carta de um leitor, retirada do jornal O Estado de São Paulo, 1º/6/2004. Ver anexo 16.
107
Quadro 13: definições de adjunto adverbial para os autores dos livros do Ensino Médio.
DÉCADAS
1970
1980
1990
2000
ADJUNTO ADVERBIAL
Vamos definir o adjunto
adverbial:
- quanto à relação: são
elementos ligados ao
verbo, ocorrendo, às vezes,
que se liguem a um outro
advérbio ou a um adjetivo;
- quanto à forma:
precedidos ou não de
preposição;
- quanto ao valor:
fornecem determinações
circunstanciais ao verbo,
indicam a maneira como se
realiza o processo verbal,
intensificam negativa ou
positivamente processos,
maneiras ou qualidades
(LAJOLO; OSAKABE;
SAVIOLI, 1977a, p. 199).
Adjunto adverbial:
a) Indica circunstância
para o verbo.
b) Intensifica o adjetivo
ou o próprio advérbio.
c) É representado por
advérbio ou locução
adverbial (FARACO;
MOURA, 1986c, p. 210).
É o termo da oração
que indica uma
circunstância do verbo,
ou intensifica o sentido
de um adjetivo, de um
verbo ou de outro
advérbio. Equivale
sempre a um advérbio
(recordando que o
advérbio modifica o
verbo, o adjetivo e o
próprio advérbio)
(NICOLA, 1993b, p.
287).
Adjunto adverbial
é o termo que indica
as circunstâncias em
que se a ação
verbal (CEREJA;
MAGALHÃES,
2005b, p. 277).
Vemos que os autores enfatizam as circunstâncias expressas pelos adjuntos
adverbiais e a função sintática. Somente Cereja e Magalhães (2005c), de modo restrito, dão
certa importância à função:
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005c, p. 154)
O mesmo quadro aparece no livro do 9º ano (8ª rie). Os autores falam da construção
de sentidos em um texto a partir das noções semânticas dos adjuntos adverbiais
99
. O único
exemplo em que podemos afirmar que os autores ressaltam a função é a questão abaixo,
citada antes:
6. As duas últimas estrofes retomam as estrofes anteriores e preparam para a
finalização do poema, que se dá nos dois últimos versos. Observe os tempos verbais
e os adjuntos adverbiais empregados nos versos: ―Eu morro ontem‖ e ―Nasço
amanhã‖.
a) coerência entre a noção temporal expressa pelos tempos verbais e a expressa
pelos adjuntos adverbiais?
99
Aqui vale a mesma discussão feita à p. 93 da Dissertação.
Para que servem as orações adverbiais
As orações adverbiais estabelecem relações lógicas e coesivas importantes na
construção do sentido de um texto. Servem para inserir noções de tempo,
finalidade, condição, concessão ou, ainda, para estabelecer comparação,
concomitância ou relações de causa e conseqüência entre dois fatos.
Embora orações adverbiais sejam comuns na fala, alguns dos seus tipos
aparecem mais freqüentemente em textos escritos de acordo com a variedade
padrão da língua e com certo grau de elaboração de idéias.
108
b) Que alterações poderiam ser feitas nos verbos para que houvesse coerência?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 278-279)
Analisemos o último tópico do roteiro: o autor do livro didático mostra que um tempo
verbal pode ter mais de uma função? Vale destacar que os autores, de 1970, 1990 e 2000,
tratam da variação linguística de forma geral. Comecemos analisando as coleções de 1970 e
1980, para as quais respondemos ―não‖. Em cada coleção, identificamos uma questão, em
que se poderia trabalhar a correlação forma-função, porém, a intenção dos autores é opor
língua padrão e língua não-padrão:
Na conjugação dos verbos ocorrem inúmeros desencontros entre o padrão culto e o
popular. [...]
Seguem algumas frases com uma lacuna. Entre parênteses ocorrem duas formas
verbais, das quais você deve escolher a que estiver de acordo com o padrão culto.
1. Ele não ______ na questão. (interviu, interveio)
2. Se ele não se ______, não conseguirá resultado algum. (antepor, antepuser)
3. Se você ______ o resultado, procure informar-se. (ver, vir)
4. Enquanto não ______ os preços, nenhum progresso se fará. (contermos,
contivermos)
5. Ele ainda não ______ o dinheiro. (reouve, reaveu)
6. Não havíamos ______ a vela. (acendido, aceso)
7. O navio estava ______ nas águas. (submergido, submerso)
8. Não tínhamos _____ o carro. (seguro, segurado)
(LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978c, p. 53)
5. Alguns autores modernos não seguem as normas prescritas pela gramática. Leia
este trecho de Ignácio Loyola Brandão:
SAGRADO DEVER
Menino, tira o dedo do nariz. Menino, não e a mão na boca. Menino, não coma
doce antes do almoço. Vai fazer a lição de casa. Sai daí. Vai dormir. Isto é conversa
de gente grande. Não amole os outros. Não chupe o dedo. Não suje a roupa. Não
rabisque a parede. tomar banho. Não fica andando com esses moleques. Não
suba no muro. Não brinca n‘água com esse calor...
LOYOLA BRANDÃO, Ignácio. Sagrado dever. In: ______. Cabeça de segunda-
feira. 1. ed. Rio de Janeiro: Codecri, 1983, p. 13.
a. Se nos basearmos apenas nas regras previstas pela gramática normativa, o texto
apresenta incorreção. Qual?
b. Essa incorreção foi intencional por parte do autor? Por quê?
c. Passe as formas verbais tira, põe, vai, sai, fica, brinca para a pessoa do
singular do imperativo afirmativo ou negativo, conforme está no texto.
(FARACO; MOURA, 1985b, p. 170)
Faraco e Moura (1985b) não trabalham o Tempo, mas o Modo imperativo. No entanto,
quisemos ilustrar como os autores tratam a norma linguística. Nicola (1993b), abordando o
Tempo no ano, mostra as funções dos tempos dos Modos indicativo e subjuntivo.
Reproduzimos, abaixo, somente as funções do presente e do futuro do pretérito do
indicativo
100
:
presente: emprega-se o presente do indicativo para assinalar:
100
Escolhemos apenas dois tempos para ilustrar.
109
a) um fato que ocorre no momento em que se fala: ―Eles estudam silenciosamente.‖
(Usa-se, também, uma forma composta: ―Eles estão estudando silenciosamente‖.
Nesse caso, torna-se mais nítido que a ação se passa no exato momento em que se
fala.)
b) uma ação habitual: ―Corro todas as manhãs‖.
c) uma verdade universal (ou tida como tal): ―O homem é mortal‖; ―A mulher ama
ou odeia, não há outra alternativa‖.
d) fatos passados; usa-se o presente em lugar do pretérito para dar maior realce à
narrativa: ―Em 1748, Montesquieu publica a obra O espírito das leis... o
chamado presente histórico ou narrativo.)
e) fatos futuros não muito distantes, ou mesmo incertos; nesse caso, substitui o
futuro: ―Amanhã vou à escola‖; ―Qualquer dia eu te telefono‖.
futuro do pretérito: emprega-se o futuro do pretérito do indicativo para assinalar:
a) um fato futuro em relação a outro fato passado: ―Eu jogaria se não tivesse
chovido‖.
b) um fato futuro, mas duvidoso, incerto: ―Seria realmente agradável ter de sair?‖
c) um fato presente; nesse caso, o futuro do pretérito indica polidez e às vezes ironia:
Daria para fazer silêncio?!‖
(NICOLA, 1993b, p. 97-98)
Infelizmente, os autores não trabalham essas funções em exercícios. Seria bem
interessante, que os alunos tiveram acesso à informação. Em Cereja e Magalhães (2005b),
encontramos dois exemplos que nos dão indícios de trabalho com a função do tempo verbal:
1. Leia esta tira
101
:
Observe o tempo e o modo dos verbos empregados na frase do terceiro balão da tira.
a) A correlação entre os tempos verbais está de acordo com a variedade padrão
formal da língua portuguesa?
b) Na mesma frase, uma palavra característica da linguagem coloquial.
Identifique-a.
c) Reescreva a frase, adequando-a à variedade padrão formal da língua.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 154)
Na tira, foi empregado o pretérito imperfeito do indicativo (no lugar do futuro do
pretérito) com o pretérito imperfeito do subjuntivo. Em vez de apenas pedir ao aluno para
reescrever a frase, os autores poderiam trabalhar a função do pretérito imperfeito versus
futuro do pretérito na fala/ escrita. Outro exemplo é:
1. Leia os dois textos seguintes e responda às questões propostas.
a) Qual é a intenção do falante em cada uma das frases interrogativas nesses
contextos?
b) Substituindo o imperfeito do subjuntivo por outro tempo verbal, transforme as
frases interrogativas dos dois textos em outras de sentido equivalente.
101
Ver tira no anexo 17.
Num domingo de sol, à tarde, uma turma de meninos e meninas conversa
preguiçosamente na praça, sem decidir o que fazer. De repente, um deles diz:
E se fôssemos passear de bicicleta ou nadar no clube?
Pai e filho discutiam sobre um problema qualquer. O filho, teimoso, falava sem
parar. O pai, já muito bravo e cheio, diz:
E se você fechasse a boca e fosse para o seu quarto?
110
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 157)
O imperfeito do subjuntivo foi usado para fazer uma sugestão e dar uma ordem nas
sentenças, respectivamente. Nessa questão, temos frases interrogativas, mas a intenção do
falante não é inquirir o outro.
A seguir, resumiremos o que foi discutido sobre o Tempo nos níveis Fundamental e
Médio, através de gráficos.
5.1.3. Tempo: um estudo histórico de 1970 a 2000
Graficamente, podemos resumir o que foi dito até aqui sobre o Tempo da seguinte
forma:
Gráfico 1: respostas às questões sobre Tempo, propostas no roteiro de análise Ensino Fundamental.
111
Gráfico 2: respostas às questões sobre Tempo, propostas no roteiro de análise Ensino Médio
102
.
Esses gráficos servem apenas para ilustrar como os autores, de 1970 a 2000,
trabalharam a categoria Tempo nos livros didáticos do Ensino Fundamental e do Ensino
Médio. Os gráficos não têm fim estatístico. A porcentagem (0% a 100%) está associada
diretamente às perguntas do roteiro, apresentado no capítulo de metodologia.
No Ensino Fundamental, tivemos respostas sim somente para a década de 2000 (80%),
sendo que as décadas de 1980 e 1990 mostraram 20% e 80% de trabalho parcial,
respectivamente. No Ensino Médio, as décadas de 1980, 1990 e 2000 são equivalentes em
respostas positivas: 20% para cada uma. Nesse nível de ensino, prevaleceu o trabalho parcial:
décadas de 1970, 1980 e 1990 20%; década de 2000 80%. O resultado para o Ensino
Médio surpreendeu, uma vez que, nesse nível, os conhecimentos linguísticos são
aprofundados, portanto, o percentual de respostas sim deveria ser mais alto. Se compararmos
as décadas de 1990 e 2000, nos dois níveis de ensino, que se trata de coleções dos mesmos
autores
103
, notamos que, no Ensino Fundamental, foi feito um estudo muito mais reflexivo do
Tempo do que no Ensino Médio.
Analisando as coleções no decorrer das décadas, com base em Reichenbach (1947),
Givón (1984), Côroa (2005) e Ilari (2001), autores nos quais nos fundamentamos para
elaborar o bloco I do roteiro, observamos que, em 1970 e 1980, prevalece a tradição
gramatical. Os autores expõem muitos conceitos, classificações, quadros-modelo de
conjugações e, nos exercícios, usam frases isoladas. Exceção para a coleção do Ensino Médio
102
No gráfico 2, estamos considerando a porcentagem de 0% a 100%. Como nenhum dos dados atingiu os
100%, o gráfico vai até 80%.
103
Em 1990, na coleção do Ensino Fundamental, José de Nicola fez co-autoria com Ulisses Infante.
112
de 1970, que apresenta conceitos mais voltados para a reflexão, contudo, a obra carece de
textos e prioriza, igualmente, a forma. Em 1990 e 2000, a abordagem tradicional, também,
predomina, porém, os autores dão passos significativos, com algumas atividades de
reflexão sobre o uso do Tempo e, em 2000, os autores trazem algumas questões relacionadas a
situações de uso. Equiparando as quatro décadas e os níveis de ensino, vejamos o quadro
abaixo, que apresenta exemplos de atividades formais:
Quadro 14: exemplos de atividades dos livros didáticos, de 1970 a 2000.
DÉCADAS
1970
1980
1990
2000
ENSINO FUNDAMENTAL
2. Ache a flexão do
verbo e, por ela, dê-lhe
o tempo, modo, pessoa
e número. Faça como
está mostrando a forma
pedirás e veja as
flexões na página 208.
Pedirás (ped ir irás)
futuro do presente
indicativo pessoa: tu.
Trataremos/ Víamos/
Abastecereis/ Ouvindo/
Dáveis/ Continuásseis/
Pareceríeis/ Deixáreis/
Deixareis/
Morrêssemos
[...]
(MARTINS, 1974, p.
81)
9. Conjugue os verbos
cantar, rebater, dividir
no futuro do pretérito do
indicativo, aplicando aos
radicais as terminações
dadas nos modelos.
(MEGALE;
MATSUOKA, 1983, p.
138)
2. Conjugue todos os
verbos presentes no texto
no presente do indicativo
e no pretérito perfeito do
indicativo.
(NICOLA; INFANTE,
1990, p. 76)
2. Nos textos abaixo,
identifique os verbos que
estão no futuro do
presente e os que estão
no futuro do pretérito:
a) ―Será assim, amiga:
um certo dia estando nós
a contemplar o poente
sentiremos no rosto, de
repente, o beijo leve de
uma aragem fria‖
(Vinícius de Morais)
b) ―Se eu fosse um
padre, eu citaria os
poetas, rezaria seus
versos, os mais belos,
desses que desde a
infância me embalaram‖
(Mário Quintana).
[...] (CEREJA;
MAGALHÃES, 2002, p.
231)
ENSINO MÉDIO
Nos seguintes
enunciados separe os
verbos de processo dos
verbos de ligação:
a) Ele anda depressa.
b) Ele anda sozinho.
c) A multidão
permaneceu muda.
d) Ele permaneceu em
casa.
[...]
(LAJOLO;
OSAKABE; SAVIOLI,
1978, p. 25)
104
3. Indique o tempo, o
modo, a pessoa e o
número dos verbos
destacados no texto
abaixo:
―Agora que ela decidira
ir embora tudo renascia.
Se não estivesse tão
confusa, gostaria
infinitamente do que
pensara no cabo de duas
horas: bem, as coisas
ainda existem (Clarice
Lispector).
(FARACO; MOURA,
1985, p. 155)
4. pessoa, número,
tempo e modo da forma
verbal destacada em ―...
que não fiz‖.
(NICOLA, 1993, p. 148)
4. Complete as frases,
empregando no futuro
do pretérito os verbos
indicados:
a) Se ela trouxesse as
chaves, nós entrar no
salão. (poder)
b) Se eles deixassem,
vocês as cartas.
(escrever)
c) Eu o convite, se
pudesse. (aceitar)
d) Se nós disséssemos
isso, certamente eles se
. (ofender)
(CEREJA;
MAGALHÃES, 2005, p.
146)
104
Na coleção Caminhos da Linguagem, os exercícios são poucos e não questões de conjugação,
identificação ou classificação do verbo.
113
Os livros analisados datam de 1974 a 2006, temos um intervalo de tempo de 32 anos.
Mesmo assim, atividades semelhantes. A diferença é que, em 1990 e 2000, os autores
procuram trabalhar o Tempo (bem como outras categorias) em textos e, em algumas
atividades, ressaltam a função, embora o texto seja, por vezes, um pretexto para o ensino de
gramática. Cereja e Magalhães (2002, 2005, 2006), no Ensino Fundamental, expõem mais
questões de uso/ função do que no Ensino Médio. Neste nível, as questões são muito mais
prescritivas. Pelo gráfico, observamos que houve uma inversão em 2000: no Ensino
Fundamental, 80% das respostas foram positivas e 20% foram parciais; no Ensino Médio,
20% das respostas foram positivas e 80% foram parciais. Essa inversão talvez se explique
porque os autores de 2000, bem como os das outras décadas, no Ensino Médio, tenham como
fio condutor de seu trabalho a literatura. Temas linguísticos são tratados, especificamente, no
2º ano. Dessa forma, a literatura se sobrepõe ao ensino de língua, enquanto os autores
poderiam trabalhar o uso de TAM, por exemplo, na literatura, ou seja, não separar
rigidamente língua e literatura.
Um trabalho consistente da categoria Tempo deve prezar alguns pontos: (a) diferença
entre tempo verbal e tempo cronológico; (b) marcação temporal por verbos, advérbios ou
contexto; (c) tempos verbais característicos de alguns gêneros/ tipos textuais; (d) relação entre
os tempos verbais e os adjuntos adverbiais para localizar eventos no Tempo; (e) funções
expressas pelo tempo verbal. Esses itens estão presentes no roteiro que propomos.
No Ensino Fundamental, somente Cereja e Magalhães (2006) diferenciam tempo
verbal de tempo cronológico. No Ensino Médio, os autores Faraco e Moura (1985) também
consideram essa diferença e, novamente, Cereja e Magalhães (2005) mostram a distinção no
livro do ano. Os quatro autores tratam de tempo cronológico, na seção de Produção de
texto dos livros didáticos, ao falarem da narração. Se os autores não relevarem essa diferença,
consequentemente, não levarão em conta que o Tempo pode ser marcado, além do verbo, por
advérbios ou ser inferido pelo contexto, como nos exemplos (4), (5) e (6) que citamos no
capítulo 3 e que estão reproduzidos abaixo
105
:
(4) X faz anos hoje.
105
Exemplos de Ilari (2001, p. 9).
114
(5) X faz anos o mês que vem.
(6) Em 1834, Dom Pedro completa 15 anos e torna-se elegível para o trono imperial
pela lei recém-aprovada.
Nos três exemplos, a forma verbal é de presente e indica: fato presente (4), fato futuro
(5) e fato passado (6). Somente em (4) o tempo verbal coincide com o tempo cronológico.
Como afirma Ilari (2001), não correspondência biunívoca (um para um) entre os recursos
expressivos e os conteúdos expressos, quando tratamos da expressão do Tempo na Língua
Portuguesa. Por isso, é importante a consideração do ponto de referência e do momento em
que se realiza o evento, além do momento de fala (REICHENBACH, 1947; GIVÓN, 1984).
Foi possível encontrar algumas questões nos livros didáticos de 1980 a 2000 que
mostram o advérbio interferindo na marcação de Tempo, sendo que os autores de 1980 e 1990
trabalharam isso de forma bem mais restrita e apenas no Ensino Fundamental. A exploração
de tempos característicos em alguns gêneros e tipos textuais foi trabalhada por todos os
autores do Ensino Médio, ainda que restritamente, e pelos de 1990 e 2000 no Ensino
Fundamental. O trabalho consiste, geralmente, em identificar o tempo verbal predominante no
texto. Somente Cereja e Magalhães (2002, 2005, 2006) apresentam algumas questões que
instigam o aluno a pensar sobre a intenção do escritor ao usar determinado tempo.
Quanto à relação entre os tempos verbais e os adjuntos adverbiais para localizar
eventos no tempo, os tempos verbais assumem outros valores quando co-ocorrem com
adjuntos adverbiais, como é o caso dos exemplos (5) e (6) acima, segundo Ilari (2001). Os
autores dos livros didáticos, como vimos nas subseções anteriores, dão ênfase para as
circunstâncias expressas pelo advérbio, mas sem ressaltar que, por exemplo, um advérbio
como amanhã pode alterar o tempo de uma sentença, mesmo que o tempo verbal não seja o
futuro. Encontramos algumas questões nos livros de 1990 e 2000.
No que se refere à correlação forma-função, Nicola (1993), no livro do ano,
mostrou as funções exercidas pelos tempos do Modo indicativo e do Modo subjuntivo.
Porém, não exercitou. Os autores de 1970 e 1980, até mesmo por priorizarem o
reconhecimento e a conjugação das formas verbais, não trabalham com a função. Cereja e
Magalhães (2002, 2005, 2006) foram os autores que mais exploraram esse ponto,
115
principalmente, no Ensino Fundamental. Os autores do Ensino Médio, de 1970 a 2000, falam
de variação linguística (léxico, dialetos, regionalismos) em alguns capítulos de seus livros,
mas apenas os de 2000 relacionam a variação com o verbo. No Ensino Fundamental, Cereja e
Magalhães (2002, 2006) tratam da variação linguística de forma geral, contudo, encontramos
algumas questões referentes à variação verbal. Geralmente, a variação nas formas verbais
aparece quando os autores falam de locução verbal. Podemos ilustrar o trabalho com o Tempo
nos Ensinos Fundamental e Médio, da seguinte forma:
Gráfico 3: respostas positivas, negativas e parciais para a categoria Tempo ao longo das décadas.
Pelo gráfico 3, notamos que as respostas positivas aumentaram de 1970 para 2000 e as
negativas diminuíram. Isso mostra que os autores de livros didáticos têm se empenhado em
fazer um trabalho expressivo com a categoria Tempo. Conhecer a estrutura do verbo e do
advérbio é importante, todavia a forma precisa ser trabalhada com a função, senão o aluno não
aplicabilidade no que estuda. Pelos gráficos, vemos uma evolução no tratamento dado à
categoria Tempo a partir da década 1990 no Ensino Fundamental (gráfico 1). No Ensino
Médio (gráfico 2), as décadas de 1980 e 1990 mostraram-se semelhantes e, na década atual, o
trabalho é, ainda, parcial. No geral (gráfico 3), o estudo tem se mostrado significativo a partir
de 1990. Segundo o PNLD/2008 (2007), o trabalho com os conhecimentos linguísticos deve
mobilizar e desenvolver diversas capacidades e competências envolvidas na reflexão sobre a
língua e a linguagem. Nossa análise mostrou que os livros do Ensino Fundamental, das
décadas de 1990 e 2000, desenvolvem algumas dessas capacidades e competências no
tratamento da categoria Tempo. O PNLEM/2009 (2008, p. 19) diz que:
O livro destinado ao ensino médio tem múltiplos papéis, entre os quais se destacam:
(i) favorecer a ampliação dos conhecimentos adquiridos ao longo do ensino
fundamental; (ii) oferecer informações capazes de contribuir para a inserção dos
alunos no mercado de trabalho, o que implica a capacidade de buscar novos
conhecimentos de forma autônoma e reflexiva; e (iii) oferecer informações
116
atualizadas, de forma a apoiar a formação continuada dos professores, na maioria
das vezes, impossibilitados, pela demanda de trabalho, de atualizarem-se em sua
área específica.
Os livros do Ensino Médio cumprem, parcialmente, esses papéis, no que diz respeito
ao trabalho com a categoria Tempo. Note, pelo gráfico 2, que deveríamos ter mais respostas
sim para esse nível.
5.2. Aspecto
Nesta seção, apresentaremos, para o Ensino Fundamental e para o Ensino Médio,
respostas às questões sobre o Aspecto, conforme roteiro proposto no capítulo de Metodologia,
seção 4.4.
5.2.1. O tratamento dado à categoria Aspecto pelas coleções do Ensino Fundamental
Observaremos o quadro 15, referente ao tratamento da categoria Aspecto no Ensino
Fundamental:
Quadro 15: abordagem da categoria Aspecto por década Ensino Fundamental.
COLEÇÕES
1970
1980
1990
2000
II ASPECTO. O autor do livro didático:
a) leva em consideração noções como
duratividade, habitualidade, telicidade,
iteratividade, dinamicidade, entre outras?
Não
Não
De forma
restrita
De forma
restrita
b) diferencia o uso do perfeito e do
imperfeito?
Não
De forma
restrita
De forma
restrita
De forma
restrita
c) mostra o papel do particípio para
expressar o aspecto conclusivo?
Não
Não
De forma
restrita
De forma
restrita
d) ressalta o aspecto progressivo do
gerúndio?
De forma
restrita
Não
De forma
restrita
De forma
restrita
e) trabalha os usos/funções dos verbos
auxiliares aspectuais (começar, acabar de...)?
Não
Não
De forma
restrita
De forma
restrita
f) explora os sufixos marcadores de Aspecto
(como -ear: cabecear; -ecer: envelhecer; -
ejar: pestanejar...)?
Só trata dos
sufixos
Só trata dos
sufixos
De forma
restrita
Só trata dos
sufixos
A primeira pergunta diz respeito ao trabalho com noções como duratividade,
117
habitualidade, telicidade, iteratividade, dinamicidade etc. Só foi possível dar uma resposta
parcial para as décadas de 1990 (5ª série) e 2000 (6º ano (5ª série) e ano (6ª rie)). Em
1970, no livro da série, o autor apresenta uma questão em que poderia ter abordado essas
noções:
4. Faça modificações, orientando-se pelo modelo:
Modelo a) O padre voltou a afirmar isso.
O padre afirmou novamente isso.
O padre reafirmou isso.
b) O matuto voltou a plantar tudo.
c) Tornei a ver minha terra natal.
d) Tornaremos a fazer o trabalho.
e) Voltarás a contar a história?
(MARTINS, 1974, p. 33)
Na questão acima, percebemos a repetição do evento expressa pelos verbos voltar e
tornar, pelo advérbio novamente e pelo prefixo re. No entanto, a intenção de Martins (1974)
é que o aluno realize modificações na forma verbal, sem atentar para o sentido. A questão
encontra-se na seção Construções do texto. Nicola e Infante (1996a) trazem somente uma
questão:
10.
106
Os verbos também exprimem a duração do ato, da ação. Na frase: E continuo
vendo pelos olhos do motoqueiro fantasma, temos:
a) uma indicação do início da ação.
b) uma indicação do término da ação.
c) uma indicação de que a ação já está concluída.
d) uma indicação de que a ação está ocorrendo, sem fazer referência ao início e ao
término.
e) uma indicação de que a ação está se intensificando.
(NICOLA; INFANTE, 1996a, p. 108)
A noção ressaltada pelos autores é a duratividade. Em toda a coleção, não outras
atividades que focalizem as noções aspectuais. Cereja e Magalhães (2002a), para o ano (5ª
série), trazem três questões, uma na seção A língua em foco
107
e as outras na seção Linguagem
e interação
108
, respectivamente:
3. Leia as frases:
O dono da casa não encontrou o pichador, pois ele já tinha fugido.
Abandonou a bebida e tornou-se outra pessoa.
Desde jovem, freqüentava as reuniões do clube e visitava os amigos.
Ele tentava instalar a antena no telhado, mas a chuva não deixou.
Em qual delas a forma verbal destacada expressa a noção de:
a) ação interrompida por outra ação? c) ação contínua, que se repete?
b) ação ocorrida antes de outra ação? d) ação concluída?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 229)
106
Ver gravura no anexo 18.
107
Nesta seção, os autores trabalham a gramática.
108
Neste tópico, os autores ampliam a abordagem do conteúdo gramatical.
118
2. O presente do indicativo geralmente indica um tipo de ação que está ocorrendo no
momento que se fala. Porém, às vezes, esse tempo pode ter outro sentido.
Observe esta frase:
―– Subo no ponto mais alto do circo e mergulho no meio do picadeiro‖.
a) As ações de subir e mergulhar estão ocorrendo no momento em que o homem
está falando?
b) Caso não, o que justifica o emprego desse tempo verbal?
4. No texto verbal da parte lateral do anúncio
109
, várias vezes é empregado o
pretérito imperfeito do indicativo: falava, tinha, apertava, enforcava. Ao repetir
tantas vezes o pretérito imperfeito, que idéia o anunciante tem a intenção de
transmitir?
a) ação concluída b) ações simultâneas c) polidez d) tempo impreciso e) ação
repetida
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 234)
As questões acima destacam as noções de telicidade (acabado/ não acabado), repetição
(iteratividade) e duratividade. Em duas das três questões, os autores pediram apenas a
identificação do que a ação expressa. Em uma, Cereja e Magalhães (2002a) solicitam a
justificativa (... o que justifica o emprego desse tempo verbal?) do emprego do tempo verbal
(o presente do indicativo). O presente ideia de repetição à sentença: subo e mergulho
sempre que quiser. Outras questões estão presentes no livro do 7º ano (6ª série):
2. Leia as frases:
Qual dessas frases:
a) indica um fato acabado?
b) exprime o firme propósito de realizar alguma coisa?
c) exprime uma ação duradoura?
3. Leia as frases:
Qual dessas frases:
a) exprime a certeza de que algo será realizado num futuro próximo?
b) indica uma ação que se realiza progressivamente?
c) indica uma ação concluída recentemente?
5. Suponha que você queira comunicar à sua mãe que o curso de inglês está caro,
empregando o verbo custar nesta frase: ―Mãe, o curso de inglês (custar) muito
caro‖. Mostre como ficaria essa frase, se você quisesse indicar que esse fato:
a) sempre acontece;
b) está acontecendo no momento em que você fala;
c) vai acontecer.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 49-50)
109
Ver anúncio no anexo 19.
Hei de comprar a bicicleta dos meus sonhos.
Estou lendo um livro superinteressante: O dia do coringa, de Jostein Gaarder.
Eu já havia terminado minha lição, quando meus primos chegaram.
Oi, Léia. Olha! Acabei de pintar este quadro.
Pra quem fica, tchau! Vou dormir!
E a porta foi se abrindo, foi se abrindo e... Aaaai! Um fantasma!!!
119
São ressaltadas as noções de telicidade, duratividade, progressividade, repetição. É
interessante que o aluno reflita como o sentido da frase muda, dependendo do emprego da
forma verbal, como na última questão citada: (a) Mãe, o curso de inglês custa muito caro (b)
Mãe, o curso de inglês está custando muito caro; (c) Mãe, o curso de inglês custou muito
caro; (d) Mãe, o curso de inglês vai custar/ custará muito caro. O emprego do presente, em
(a), indica duração do evento (sempre acontece); em (b), a perífrase está custando passa a
ideia de que o evento custar ocorre simultaneamente à enunciação; o uso do pretérito perfeito,
em (c), não indica somente que o evento é passado, mas que acabou de acontecer; em (d), a
perífrase de futuro ou a forma simples de futuro do presente informa que o evento ainda vai
acontecer. Essas observações são pertinentes para que o aluno, no momento em que for
produzir seu texto, use as formas verbais para construir vários sentidos, de acordo com a sua
intenção. Questões como essa servem, também, para que o aluno perceba que as formas de
presente, passado e futuro não marcam somente o Tempo.
Para a segunda pergunta sobre Aspecto: o autor do livro didático diferencia o uso do
perfeito e do imperfeito?, observemos o quadro a seguir, que mostra como os autores
conceituam os pretéritos perfeito e imperfeito:
Quadro 16: noções de pretérito perfeito e pretérito imperfeito para os autores dos livros do Ensino Fundamental.
DÉCADAS
1970
1980
1990
2000
PRETÉRITO PERFEITO
X
PRETÉRITO IMPERFEITO
Ferreira (1977)
apresenta o perfeito
e o imperfeito como
subdivisões do
pretérito, sem
explicar a diferença
entre eles. O autor
somente mostra,
por meio de
quadros, como se
conjugam.
―O pretérito
imperfeito expressa
um tempo anterior ao
atual, mas não
concluído; e o
pretérito perfeito, um
passado concluído‖
(MEGALE;
MATSUOKA,
1983b, p. 86).
No pretérito perfeito,
―[...] o verbo indica
simplesmente um fato
acabado em
relação ao momento
presente‖. No
pretérito imperfeito,
―[...] temos um fato
que era presente em
relação a outro fato
passado‖ (NICOLA;
INFANTE, 1990, p.
60).
O pretérito perfeito
―transmite a idéia de
uma ação
completamente
concluída‖; o pretérito
imperfeito ―transmite a
idéia de uma ação
habitual e contínua‖ e
―também pode
transmitir a idéia de
uma ação que vinha
acontecendo, mas foi
interrompida por outra
ação‖ (CEREJA;
MAGALHÃES,
2002a, p. 227-228).
Os autores de 1980 a 2000 fazem a oposição: fato concluído versus fato não concluído
(contínuo, habitual) para caracterizar o perfeito e o imperfeito, oposição criticada por Costa
(2002), uma vez que não se pode generalizar esses traços para todos os casos. Segundo a
autora, o perfectivo o marca a temporalidade interna do fato, apresentando-o como
120
completo, com início, meio e fim. Isso faz com que a noção de ―acabado‖ seja atribuída ao
perfectivo. No perfectivo, o fato é visto como global e nele se inclui o ponto terminal. Como
formas perfectivas no presente e no futuro, o se pode dizer que todo perfectivo se refere
a fatos acabados, senão o perfectivo seria exclusivo do tempo passado. Costa (2002) afirma
que o imperfectivo marca a temporalidade interna do fato, portanto, caracterizá-lo como
―durativo‖ ou ―habitual‖, é desprezar que o imperfectivo expressa, também, fases internas e
estado resultante.
Chama a atenção o trabalho com o perfeito e o imperfeito na década de 1970. Ferreira
(1974, 1977) faz um estudo com muitos quadros
110
, como se bastasse o aluno ―olhar‖ para um
modelo e aprender (e entender) tudo sobre a funcionalidade do verbo. Ferreira (1977)
apresenta o perfeito e o imperfeito como subdivisões do pretérito, sem explicar a diferença
entre eles, principalmente, de uso. Mais à frente, ao mostrar os elementos constituintes do
verbo, nota-se que o autor está mais preocupado em fazer o aluno reconhecer de que forma (s)
o verbo aparece. Vejamos um exercício:
1) Indique, em seu caderno, a desinência do infinitivo impessoal, a vogal temática, o
tema, o radical e a terminação de cada um dos seguintes verbos:
mandar bater admitir votar
perder iludir queimar corrigir
cobrar olhar vender partir
rebater pisar abrir estudar
(FERREIRA, 1977, p. 201)
O aluno, em questões como esta, reconhecerá os elementos formais sem, no entanto,
entender o sentido expresso pelo verbo no contexto.
Os pretéritos perfeito e imperfeito, ainda, são mencionados no estudo das formas
primitivas e derivadas. O ―perfeito‖ é classificado como forma primitiva para formar o
pretérito mais-que-perfeito do indicativo, o pretérito imperfeito do subjuntivo e o futuro do
subjuntivo; o ―imperfeito‖, por sua vez, aparece como forma derivada do ―infinitivo
impessoal‖. O autor mostra quadros com as desinências pessoais do pretérito perfeito e de
outros tempos e vários gráficos com as formas derivadas do presente, do pretérito e do
infinitivo. Nas atividades, o autor pede que o aluno conjugue alguns verbos (de , e
conjugações), conforme os gráficos, ou que identifique em frases o Tempo e o Modo.
Megale e Matsuoka (1983b) apresentam as questões abaixo, ao tratar dos pretéritos
110
Ver exemplos nos anexos 20 e 21.
121
perfeito e imperfeito:
5. Observe:
a) Hoje, ninguém mais brinca na rua.
b) Antigamente, as crianças brincavam tranqüilas na rua.
c) Ontem, ele brincou o dia inteiro dentro de casa.
6. Responda:
a) Em que frase o verbo brincar indica tempo presente?
b) Em que frase o verbo brincar indica uma ação passada, mas não concluída?
c) Qual forma do verbo indica uma ação passada, concluída?
7. Reconheça os tempos (presente, pretérito imperfeito e pretérito perfeito) dos
verbos:
a) Estudo as lições.
b) Estudava as lições.
c) Estudei as lições.
d) Fazemos o exercício.
e) Fazíamos o exercício.
f) Fizemos o exercício.
g) Bato à máquina.
h) Batia à máquina.
i) Bati à máquina.
j) Ouço as explicações.
l) Ouvia as explicações.
m) Ouvi as explicações.
(MEGALE; MATSUOKA, 1983b, p. 86-87)
O objetivo dos autores é o reconhecimento das formas de perfeito e imperfeito. Como
eles não relacionam as formas ao uso, consideramos o trabalho restrito. Nicola e Infante
(1990), igualmente, atentam somente para a forma:
9. ―o amor subiu na árvore‖
O verbo indica uma ação que está se realizando, que já se realizou ou que se
realizará? Nesse caso, em que tempo está o verbo? Passe o mesmo verso para os
outros dois tempos verbais básicos.
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 63)
3. Compare os seguintes fragmentos:
João amava Teresa‖
―João foi para os Estados Unidos‖
a) Dê o tempo em que se encontra cada um dos verbos destacados.
b) Cada uma das formas verbais em destaque designa a duração do processo
indicado pelo verbo. Qual delas indica um fato passado e já concluído? Qual indica
um fato passado contínuo, permanente, habitual?
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 97)
A questão (3) do livro didático, acima citada, merece destaque, visto que a questão
trabalha fragmentos do poema ―Quadrilha‖, de Carlos Drummond de Andrade. O poeta
utilizou vários recursos para dar ritmo ao poema, um deles é o uso constante do pretérito
imperfeito na primeira parte (João amava Teresa que amava Raimundo/ que amava...) e do
pretérito perfeito na segunda parte do poema (João foi para os Estados Unidos, Teresa para o
convento,/ Raimundo morreu..., Maria ficou...,/ Joaquim suicidou-se... e Lili casou...).
122
Portanto, em uma questão como essa, não se pode simplesmente pedir que o aluno identifique
o pretérito perfeito e o imperfeito e os associe a um fato acabado e a um fato contínuo, que
a intenção de Carlos Drummond de Andrade é, com o uso desses pretéritos, realçar o ritmo do
poema que remete à quadrilha junina, em que as pessoas formam uma corrente e trocam,
constantemente, de parceiros. O poema ―Quadrilha‖ serviu para reforçar o tema (encontros e
desencontros) do capítulo para que os alunos produzam um texto sobre o assunto. Os autores
reconhecem o sentido do poema, como mostra a questão a seguir, mas não associam o poema
com os usos dos tempos verbais:
7. No dicionário ―Aurelião‖, encontramos a seguinte explicação:
Quadrilha: dança de salão, de origem francesa, de caráter alegre e movimentado, na
qual tomam parte diversos pares.
Lembramos, ainda, que quadrilha é a denominação de uma dança popular, típica de
festas juninas. Você percebe alguma relação entre essas danças e a poesia de
Drummond? Explique.
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 97)
Cereja e Magalhães (2002a), depois de definirem os pretéritos (e os demais tempos),
apresentam questões como:
1. Leia este texto:
Monteiro Lobato
José Monteiro Lobato nasceu em 18 de abril de 1882, em Taubaté (SP) e é
considerado um dos maiores escritores brasileiros de literatura infanto-juvenil. Seus
personagens e sua fantasia continuam atuais, agradando crianças e adolescentes que
os conhecem nos livros, na tevê e nas diversas produções teatrais que não deixam de
ser produzidas em todo país. Era advogado, mas gostava de pintar quadros e
escrever para pessoas de todas as idades. De seus 34 livros publicados, 17 foram
feitos para crianças e adolescentes. Na internet: http://www.lobato.com.br/
(, nº 49)
a) Identifique o tempo das formas verbais destacadas no texto.
b) Se o texto está falando de um escritor que viveu no passado, por que no texto
verbos que estão no presente?
(CEREJA e MAGALHÃES, 2002, p. 232)
Embora os autores foquem apenas a estrutura, o trazem questões como: ―conjugue
os verbos amar, comer e dormir em todos os tempos e modos‖, como vemos nos livros de
1970. Não atividades que enfoquem o uso dos dois pretéritos. Nesse ponto, os autores de
1970 a 2000 assemelham-se.
Os próximos pontos
111
a serem discutidos são: o autor do livro didático: (c) mostra o
papel do particípio para expressar o aspecto conclusivo?; (d) ressalta o aspecto progressivo
do gerúndio?. Podemos dar uma resposta parcial para os autores de 1990 e 2000. Antes de
111
Discutiremos os itens (c) e (d) juntos, porque os autores dos livros didáticos tratam das formas nominais em
conjunto e, portanto, repetiríamos os exemplos.
123
falar de cada década, vejamos o quadro:
Quadro 17: as formas nominais, segundo os autores dos livros do Ensino Fundamental de 1970 a 2000.
DÉCADAS
1970
1980
1990
2000
FORMAS NOMINAIS
―[...] o verbo às vezes
pode funcionar como
nome (substantivo,
adjetivo). Quando isso
ocorre, dizemos que o
verbo está nas formas
nominais, que são:
a) gerúndio:
encontrando, correndo,
partindo.
b) particípio:
encontrado, corrido,
partido.
c) infinitivo
impessoal: encontrar,
correr, partir. [...]
d) infinitivo pessoal:
encontrar, correr,
partir. [...]‖
(FERREIRA, 1977, p.
197)
―5. Observe o modelo e
faça o mesmo:
vida viver vivendo
vivido
a) luta; b) leitura;
c)sabedoria; d) percurso;
e) redução; f) amor; g)
corrida; h) trabalho; i)
viagem.
As três formas escritas
na frente dos
substantivos são as
formas nominais do
verbo. Nos exercícios
anteriores elas foram
substituídas por
substantivos, indicaram
uma função adverbial ou
funcionaram como
adjetivos. Por isso são
chamadas nominais:
assumem funções de
nome (MEGALE;
MATSUOKA, 1983b, p.
159).
―Os verbos apresentam
três formas que se
caracterizam por
exercerem também
funções de nomes (isto é,
de substantivos, adjetivos
e advérbios). Essas
formas são chamadas,
por isso mesmo, de
formas nominais. Outra
característica das formas
nominais é que elas não
apresentam indicação de
tempo e modo. As
formas nominais são o
infinitivo, o gerúndio e
o particípio(NICOLA;
INFANTE, 1990, p. 46).
―As formas nominais
dos verbos são aquelas
que podem
desempenhar também a
função de um nome.
Formas nominais do
verbo são formadas
pelo tema (radical +
vogal temática)
acrescido das
desinências: -r: para o
infinitivo: pensar,
beber, dormir; -do:
para o particípio:
pensado, bebido,
dormido; -ndo: para o
gerúndio: pensando,
bebendo, dormindo
(CEREJA;
MAGALHÃES, 2002b,
p. 43).
Segundo Costa (2002), as formas nominais de gerúndio e particípio atualizam as
categorias de Aspecto e Voz: gerúndio (processo) expressa perfectividade em curso e voz
ativa; particípio (estado, como resultado de um processo) expressa imperfectividade
resultativa e voz passiva.
Ferreira (1974, 1975, 1977) limita-se a falar da estrutura ao tratar das formas
nominais:
Para obter as formas nominais, observe isto:
(FERREIRA, 1977, p. 215)
1) gerúndio: substitui-se a desinência do infinitivo impessoal (-r) por ndo
(desinência do gerúndio).
2) particípio: substitui-se a desinência do infinitivo impessoal (-r) por do
(desinência do particípio).
Observação: na conjugação, a vogal temática se modifica para i (vendido,
corrido etc.).
3) infinitivo pessoal: acrescentam-se as desinências pessoais com as seguintes
modificações:
a) E depois da desinência do infinitivo na 2ª pessoa do singular e 3ª do plural;
b) na 2ª pessoa do plural usa-se a desinência DES.
124
O autor não aborda, especificamente, as formas nominais nas atividades, mas podemos
notar, na primeira parte do livro (parte textual), no item denominado ―Estudo do vocabulário e
das expressões‖, questões, como a abaixo, em que se poderia trabalhar a categoria Aspecto:
2) Na linha 18 [do texto], encontramos a palavra aterrado. Explique seus
significados nestas frases:
a) ―Ficou aterrado: o telégrafo errara ao transmitir ‗1 ou 2 macacos‘, transmitira
‗1002 macacos‘!‖
Aterrado é __________________________________.
b) O fundo do quintal foi aterrado para que se obtivesse o nível desejado.
Aterrado é __________________________________.
c) Quando chegamos ao aeroporto, o avião ainda não tinha aterrado.
Aterrado é __________________________________.
(FERREIRA, 1977, p. 38)
Esta seria uma oportunidade de fazer uma reflexão sobre os diferentes usos do
particípio, além da reflexão do sentido expresso pelo contexto. O gerúndio não apareceu em
questões desse tipo. No entanto, encontramos uma questão interessante no livro da série,
que nos levou a responder de ―forma restrita‖ apenas para o trabalho com o aspecto
progressivo do gerúndio. Na questão, o autor considera a ideia de vagarosidade
(progressividade) expressa pelo gerúndio:
4) A autora
112
, para transmitir a idéia de vagarosidade do guarda, faz uso freqüente
da locução verbal de gerúndio. Veja:
―vai subindo a rua‖ (linha 11)
―vai caminhando‖ (linha 12)
―vai andando‖ (linhas 14 e 29)
Use do mesmo expediente para descrever a movimentação lenta de um ônibus no
centro da cidade.
(FERREIRA, 1975, p. 33)
Megale e Matsuoka (1983a, 1983b, 1983c, 1983d) não atribuem, também, noção
aspectual ao particípio e ao gerúndio. Os autores trabalham a forma em questões como as
reproduzidas abaixo e findam o tratamento das formas nominais:
1. Observe:
a) Viver é lutar. = A vida é luta.
b) Lendo este texto de Graciliano Ramos, aprendi como era o Brasil dos fins do
século passado. = Enquanto lia este texto de Graciliano Ramos, aprendi como era o
Brasil dos fins do século passado.
c) Nos sítios percorridos atualmente pelo caminhão, deslocava-se o carro de boi.
2. Responda:
a) Qual das frases foi reescrita tendo dois verbos substituídos por dois substantivos?
Que verbos e substantivos são esses?
b) Em que frases substantivo seguido de adjetivo? Qual é esse substantivo e
adjetivo?
c) Em que frase o verbo foi substituído por uma expressão indicadora de tempo?
112
O texto trabalhado no capítulo foi o conto ―Anjo da noite‖, de Cecília Meireles. Ver anexo 22.
125
Aponte este verbo e esta expressão.
5. Observe o modelo e faça o mesmo:
vida viver vivendo vivido
a) luta; d) percurso; g) corrida;
b) leitura; e) redução; h) trabalho;
c) sabedoria; f) amor; i) viagem.
(MEGALE; MATSUOKA, 1983b, p. 158-159)
Nicola e Infante (1990, 1995, 1996a, 1996b) são os autores que merecem destaque por
falarem dos aspectos conclusivo e progressivo na explanação das formas nominais, porém,
não trabalham essas noções nos exercícios, por isso, respondemos, no roteiro, que se trata de
um trabalho restrito:
GERÚNDIO
O gerúndio indica um processo verbal em desenvolvimento e sua função aproxima-
se das desempenhadas pelo advérbio e pelo adjetivo.
Morrendo, José apresentaria uma falsa solução para o seu problema.
Gerúndio indicando condição, função de advérbio.
A noite, esfriando, desce lentamente.
Gerúndio com função de adjetivo, isto é, a noite, que está ficando fria.
PARTICÍPIO
O particípio, ao contrário do gerúndio, indica uma ação concluída, acabada. Por
indicar um estado, desempenha funções de adjetivo e, nesse caso, apresenta as
flexões comuns ao adjetivo.
Encostado em uma parede nua, José pensava.
Encostada em uma parede nua, Maria pensava.
Encostados em uma parede nua, José e Maria pensavam.
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 46-47)
Os únicos exercícios que encontramos, nessa parte do livro, não incluem o gerúndio:
2. O amar é sofrido.
Na oração acima, as palavras destacadas desempenham funções de que classes
gramaticais?
3. Amar e sofrido, tomadas isoladamente, são formas nominais. Classifique-as.
4. Dê o particípio dos verbos amar, gostar, partir e sumir.
5. Observando atentamente as respostas da questão anterior, você pode concluir que
o particípio dos verbos da primeira conjugação apresenta que terminação? E os da
segunda e terceira?
6. Alguns verbos apresentam duas formas para o particípio (são chamados verbos
abundantes). Por exemplo, o verbo aceitar tem as formas aceitado e aceito. o
particípio dos seguintes verbos:
a) entregar c) ocultar e) acender g) prender
b) matar d) soltar f) eleger h) corrigir
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 47)
Cereja e Magalhães (2002b), ao contrário de Nicola e Infante (1990), trabalham as
126
noções aspectuais do particípio e do gerúndio nos exercícios, mas não na explanação das
formas nominais. citamos esses exercícios, quando falamos do primeiro item do roteiro, as
questões correspondem às páginas 49 e 50 do livro do ano (6ª série). Abaixo,
reproduziremos apenas uma delas:
2. Leia as frases:
Qual dessas frases:
a) indica um fato acabado?
b) exprime o firme propósito de realizar alguma coisa?
c) exprime uma ação duradoura?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 49)
Na questão, os autores associam fato acabado (aspecto conclusivo) à terceira sentença,
em que aparece a forma de particípio: havia terminado e ação duradoura (aspecto
progressivo) à segunda sentença, que contém a forma de gerúndio: estou lendo. Essa atividade
encontra-se no mesmo capítulo, em que os autores tratam das formas nominais, no tópico
Linguagem e interação (tópico para ampliar a abordagem gramatical). Por isso, acreditamos
que a intenção dos autores é relacionar o particípio com o aspecto conclusivo e o gerúndio
com o aspecto progressivo.
Passemos à pergunta seguinte do roteiro: o autor do livro didático trabalha os usos/
funções dos verbos auxiliares aspectuais (começar, acabar de...)? Ferreira (1977)
considera os auxiliares ser, estar, ter e haver. Os autores de 1980 a 2000 não trabalham os
usos/ funções dos auxiliares aspectuais, mas os consideram.
Ferreira (1977) apresenta uma gravura em que um homem levanta um armário
pequeno de cozinha e olha para as ferramentas no chão. A partir da gravura, o autor fala de
trabalhos que necessitam de auxílio e, assim, define os verbos auxiliares:
Os verbos nem sempre podem resolver sozinhos certos problemas que surgem.
Quando isso acontece, surgem os auxiliares (exatamente como o caso de Cipriano),
que são também verbos. Esses verbos chamam-se auxiliares porque frequentemente
são empregados acompanhando outros verbos. São verbos auxiliares: ser, estar, ter,
haver. Nem sempre, no entanto, os verbos auxiliares acompanham outros verbos.
Podem às vezes aparecer sozinhos. Nesse caso, deixam de ser auxiliares.
(FERREIRA, 1977, p. 225)
Em seguida, mostra a conjugação das formas e apresenta questões como esta:
1) Empregue no presente do subjuntivo os verbos dos parênteses nas pessoas
Hei de comprar a bicicleta dos meus sonhos.
Estou lendo um livro superinteressante: O dia do coringa, de Jostein Gaarder.
Eu já havia terminado minha lição, quando meus primos chegaram.
127
indicadas:
a) Quero que __________ aqui. (estar tu)
b) É necessário que eu __________ paciência. (ter eu)
c) Espero que ele __________ calmo. (estar ele)
d) Quero que vocês não __________ ridículos. (ser vocês)
e) Talvez __________ razão. (ter nós)
f) Desejo que hoje __________ todas as aulas. (haver 3ª pessoa)
(FERREIRA, 1977, p. 229)
Martins (1974), autor do livro da série da década de 1970, apresentou somente uma
questão em que vemos uma possibilidade de o autor ter trabalhado o auxiliar aspectual acabar
de. O aluno deverá fazer as substituições usando o auxiliar acabar de: acabei de fazer o que
mandaste; acabei de encontrar o Rui na esquina; Sim. Acabou de chegar:
1) Modifique:
Modelo a) O que vira há pouco era esquisito.
O que acabara de ver era esquisito.
b) Fiz agorinha mesmo o que mandaste.
c) Encontrei neste instante o Rui na esquina.
d) Alô! O Carlos está?
Sim. Chegou não faz dois segundos.
(MARTINS, 1974, p. 133)
Megale e Matsuoka (1983c), como mencionamos na seção sobre Tempo, quando
falam de locução verbal, mostram alguns auxiliares, além de ter, haver, ser e estar.
Percebemos auxiliares aspectuais em uma questão que citamos na seção anterior e retomamos
abaixo:
13. Retire a locução verbal das frases:
a) Temia falar de frente com a mãe.
b) Ele se acostumara a manter com o pai um silêncio respeitoso.
c) A mãe contava um caso qualquer que tinha se passado na ausência do marido.
d) O menino não ouvia, ela própria ria do que estava contando.
e) O pai parou de mastigar.
f) O pai andava fechado no seu mundo.
g) Ela buscou apoiar-se no marido.
h) Estava só prestando atenção no caso que a senhora contava.
i) Prestava atenção no caso que a senhora estava contando.
(MEGALE; MATSUOKA, 1983c, p. 178)
Nicola e Infante (1996b) mostram que não desprezam auxiliares aspectuais, como
andar e começar. Notamos isso, quando os autores explanam a locução verbal e, entre os
exemplos, apresentam estes: ―a moça anda bebendo muito café; a moça começou a beber
muito café‖ (NICOLA; INFANTE, 1996b, p. 148). Nos exercícios, os autores trabalham os
usos/ funções dos auxiliares ter e ser:
5. Que idéia exprime o verbo auxiliar na seguinte locução verbal?
O trem está partindo.
a) passividade
128
b) obrigatoriedade
c) continuidade da ação
d) desenvolvimento da ação
6. Que idéia exprime o verbo auxiliar na locução verbal?
Ele está estudando todo final de semana.
a) passividade
b) obrigatoriedade
c) continuidade da ação
d) desenvolvimento da ação
7. Que idéia exprime a seguinte locução verbal?
O café foi transportado de navio para a Europa.
a) passividade
b) obrigatoriedade
c) continuidade da ação
d) desenvolvimento da ação
(NICOLA; INFANTE, 1996b, p. 151)
Cereja e Magalhães (2002b), no livro do 7º ano (6ª série), mencionam o auxiliar
acabar de. Como citamos, nesta seção, as questões (páginas 49-50 do livro do ano (6ª
série)), retomaremos apenas as sentenças: Oi, Léia. Olha! Acabei de pintar este quadro
(questão 3 do livro, página 49); acabou de acontecer(questão 5 do livro, página 50). Pelos
exemplos, vimos que os autores, de 1980 a 2000, levam em conta alguns auxiliares
aspectuais, todavia, não ressaltam a função, por isso, é uma abordagem restrita.
Quanto ao último item sobre Aspecto: o autor do livro didático explora os sufixos
marcadores de Aspecto (como -ear: cabecear; -ecer: envelhecer; -ejar: pestanejar...)?, os
autores de 1970 e 1980 apresentam, apenas, os sufixos ear e iar, ao tratarem dos verbos
irregulares. Os autores de 1990 e 2000 trabalham outros sufixos. Contudo, nenhum autor
evidenciou a marca aspectual dos verbos que carregam esses sufixos.
Ferreira (1974) mostra como se conjugam os verbos terminados em EAR, tomando
como exemplo o verbo passEAR. O autor diz que a regra servirá para conjugar verbos como:
apear, bambolear, bloquear, cambalear, cear, folhear, golpear, nomear, pentear, semear etc.
Depois da conjugação de passear, o autor chama a atenção do aluno para o acento tônico, que
pode recair no radical do verbo (forma rizotônica) ou na desinência (forma arrizotônica). Nos
exercícios, pede que o aluno conjugue o verbo passear nos Modos subjuntivo e imperativo,
colocando R na frente das formas rizotônicas e A para as formas arrizotônicas. Apresenta os
verbos terminados em IAR (odIAR, medIAR, anuncIAR, incendIAR ...) e o verbo DAR,
para seguir com os verbos de 2ª e conjugações: caber, dizer, fazer, perder, pôr, acudir, cair,
cobrir, possuir, entre outros. Assim como foi feito com o verbo passear, com estes outros, o
autor também mostra o modelo de conjugação e algumas restrições como: verbos como
129
caber e perder não podem ser conjugados no modo imperativo ou no futuro do presente e, no
futuro do pretérito, verbos como dizer perdem a sílaba ze, além de apresentar outros verbos
que se conjugam como os mostrados: dizer bendizer, condizer, desdizer [...]; fazer
desfazer, refazer, perfazer [...]; pôr contrapor, antepor, expor [...]. O exercício 1 exemplifica
a proposta do autor:
1) Escreva nas linhas pontilhadas a segunda pessoa do singular do imperativo
afirmativo dos seguintes verbos:
sorrir
...................
desdizer
...................
rever
...................
perfazer
...................
encobrir
...................
9) Conjugue, apenas na pessoa do plural, o verbo recompor nos seguintes tempos
e modos:
imperativo afirmativo pretérito imperfeito do indicativo pretérito mais-que-perfeito
do indicativo
__________________ ______________________ _______________________
(FERREIRA, 1974, p. 198-199)
Ferreira (1974), ainda, priorizando a forma, fala das modificações na escrita/
pronúncia de alguns verbos regulares: estourar, frouxar, louvar, ousar, roubar não perdem o
ou na conjugação e a pronúncia do o é fechada; fechar, espelhar, gracejar, vexar a pronúncia
do e é fechada. Depois, apresenta alguns verbos do Hino Nacional:
―Gigante pela própria natureza,
És belo, és forte, impávido, colosso,
E o teu futuro espelha essa grandeza‖.
O verbo que apareceu termina em elhar no infinitivo. Por isso você dirá espelha
com e fechado, rimando com orelha.
(FERREIRA, 1974, p. 200)
O aluno precisa saber dessas modificações que ocorrem na escrita/ pronúncia de
alguns verbos, todavia, antes ele necessita ver sentido naquilo que estuda. O exemplo de parte
do Hino Nacional é uma das poucas vezes, senão uma exceção, em que o autor mostra um
verbo dentro de um contexto maior que a frase.
Megale e Matsuoka (1983d), a respeito dos verbos terminados em ear e iar, dizem:
(MEGALE; MATSUOKA, 1983d, p. 108-109)
Os verbos terminados em ear trocam o e por ei nas formas rizotônicas. Esta
irregularidade ocorre nas três primeiras pessoas do singular e 3ª do plural do
presente do indicativo e do subjuntivo. Assim, estas pessoas do imperativo
também são irregulares.
Cinco verbos terminados em iar mudam o i em ei nas formas rizotônicas. São
eles: mediar; ansiar; incendiar; odiar; remediar.
130
Os autores, nas atividades, pedem que os alunos atentem para o Tempo, o Modo e a
Pessoa, em que os verbos terminados em ear e iar sofrem irregularidade. Apresentam
questões como:
6. Forme o imperativo afirmativo e negativo do verbo passear a partir do presente
do indicativo e do subjuntivo:
Presente indicativo
Presente subjuntivo
passeio
passeie
7. Forme o imperativo afirmativo e negativo do verbo ansiar a partir do presente do
indicativo e do subjuntivo:
Presente indicativo
Presente subjuntivo
anseio
anseie
(MEGALE; MATSUOKA, 1983d, p. 108-109)
Nicola e Infante (1995), quando abordam os prefixos e os sufixos, nominais e verbais,
não tratam somente de ear e iar, pois o objetivo é falar dos morfemas, no entanto, não
relacionam com o Aspecto. Observemos os exercícios:
1. Dê os morfemas que formam cada uma das palavras abaixo:
a) encantávamos c) anoitecer e) gatinhas
b) desencantássemos d) gatas f) engatinhar
3. Observe o modelo e forme substantivos a partir de verbos.
Realizar realização
a) divulgar c) nomear
b) captar d) alterar
9. Observe o texto que acompanha a ilustração
113
abaixo e depois responda às
questões.
a) No Dicionário Eletrônico Aurélio temos:
transviar. [De trans- + via + ar².] V.t.d. 1. Desviar do dever; corromper, seduzir,
desencaminhar, extraviar.
Explique cada elemento que forma a palavra transviar, dando-lhe o significado.
b) O mesmo dicionário registra duas classes gramaticais para a palavra transviado.
Transviado. [Part. De transviar] Adj. e s. m. Bras. Diz-se de, ou aquele que se
desviou dos padrões éticos e sociais vigentes.
No texto que acompanha a ilustração acima, a palavra transviado desempenha a
função de que classe gramatical? Justifique.
c) Indique, no texto, outra palavra com as mesmas características gramaticais de
transviadas.
d) O dicionário apresenta cinco significados para o sufixo nominal al:
al. [Do lat. ale.] Suf. Nom. = ‗relação‘, ‗pertinência‘; ‗coleção‘, ‗quantidade‘;
‗cultura de vegetais‘: genial (<lat. Geniale), setorial; areal, pantanal; arrozal,
bananal.
Com quais desses significados o sufixo al aparece em ―make-up tribal‖?
(NICOLA; INFANTE, 1995, p. 18-19)
113
Não reproduzimos a imagem, porque ela não interfere na compreensão da questão.
131
Nas questões, encontramos os sufixos: -ecer (anoitecer), -inhar (engatinhar), -izar
(realizar), -ear (nomear), -iar (transviar). Portanto, foram os únicos autores que consideramos
que exploram os sufixos marcadores de Aspecto, de forma restrita. Os autores poderiam ter
trabalhado a função desses sufixos e não apenas a identificação dos morfemas.
Cereja e Magalhães (2006d), falando da estrutura e formação das palavras, citam como
exemplo de afixos: entardecer. Os autores tratam, como Nicola e Infante (1995), de afixos
nominais e verbais, porém, o trabalho com as formas verbais é pouco, resume-se a mostrar
questões para indicar o radical, a vogal temática e o tema. Não pudemos identificar, como
fizemos com os autores de 1990, mais do que o sufixo aspectual ecer. Exemplo:
6. Indique os itens em que o elemento mórfico destacado está incorretamente
analisado:
a) manobr ista sufixo
b) históri a desinência nominal (gênero)
c) re avaliá sse mos prefixo, desinência verbal modo-temporal (imperfeito do
subjuntivo), desinência verbal número-pessoal (1ª pessoa do plural)
d) sufoc a m vogal temática
e) tinta s desinência verbal número-pessoal (1ª pessoa do plural)
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006d, p. 159)
Conforme Costa (2002), verbos como amanhecer, cabecear, folhear, gotejar,
branquejar e dedilhar contêm o traço [+durativo] e ECER, IFICAR e IZAR são os
morfemas derivacionais mais frequentes na Língua Portuguesa. Um trabalho interessante para
se fazer em sala de aula é apresentar várias sentenças com verbos que tenham esses sufixos e
analisar, a partir deles, a passagem gradativa de um estado a outro, um processo em curso,
expressão de imperfectividade, em vez de apenas trabalhar o que muda na forma de um verbo
irregular ou, simplesmente, apresentar os elementos mórficos.
Para finalizar a análise do Aspecto, gostaríamos de salientar duas questões que
encontramos no livro de 1990:
2. Em ―Amor é bicho instruído‖ temos um estado permanente ou circunstancial?
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 63)
3. Leia atentamente as duas frases abaixo e indique qual delas se refere a um estado
permanente e qual se refere a um estado circunstancial, passageiro.
a) Ele estava alegre.
b) Ele é alegre.
(NICOLA e INFANTE, 1996, p. 107)
Essas questões, se tivessem sido exploradas pelos autores, contribuiriam para
aumentar a competência discursiva do aluno, auxiliando-o a construir sentidos na produção de
132
texto. Costa (2002) afirma que os verbos de ligação ser e estar funcionam como auxiliares
aspectuais. Alguns predicadores (geralmente adjetivos) podem ser empregados com ser ou
estar, como na questão acima, e outros só admitem um dos dois (Ele é um homem baixo/ *Ele
está um homem baixo
114
). O verbo estar, na frase ele estava alegre, atribui ao fato verbal um
período de vigência, é temporalmente limitado. Portanto, mostra a estrutura temporal interna
desse fato como ―em curso‖. Já o verbo ser, em amor é bicho instruído e ele é alegre,
expressa estado permanente, por isso, a estrutura temporal interna não é tomada como
referência.
A seguir, veremos como a categoria Aspecto foi tratada no Ensino Médio.
5.2.2. O tratamento dado à categoria Aspecto pelas coleções do Ensino Médio
O quadro 18 mostra as respostas obtidas para a categoria Aspecto no Ensino Médio:
Quadro 18: abordagem da categoria Aspecto por década Ensino Médio.
COLEÇÕES
1970
1980
1990
2000
II ASPECTO. O autor do livro didático:
a) leva em consideração noções como
duratividade, habitualidade, telicidade,
iteratividade, dinamicidade, entre outras?
De forma
restrita
De forma
restrita
De forma
restrita
Não
b) diferencia o uso do perfeito e do
imperfeito?
Sim
Não
Sim
De forma
restrita
c) mostra o papel do particípio para
expressar o aspecto conclusivo?
Não
Não
Sim
Sim
d) ressalta o aspecto progressivo do
gerúndio?
Não
Não
Sim
Sim
e) trabalha os usos/funções dos verbos
auxiliares aspectuais (começar, acabar
de...)?
Não
Não
Não
Não
f) explora os sufixos marcadores de
Aspecto (como -ear: cabecear; -ecer:
envelhecer; -ejar: pestanejar...)?
Não
Só trata dos
sufixos
Não
Não
Para a primeira pergunta: o autor do livro didático leva em consideração noções como
duratividade, habitualidade, telicidade, iteratividade, dinamicidade, entre outras?, na coleção
de Cereja e Magalhães (2005a, 2005b, 2005c), não evidenciamos nada que pudesse mostrar o
trabalho com essas noções. De 1970 a 1990, os autores trabalharam de modo restrito.
Merece destaque o livro do ano, de Lajolo, Osakabe e Savioli (1978b). Dos 28
114
Exemplo de Costa (2002, p. 52).
133
livros didáticos analisados, foram os únicos autores que, ao explanarem o verbo, citaram o
Aspecto como uma de suas categorias, além do Tempo, Modo, Voz, Número e Pessoa. Os
autores, em uma das unidades do livro, tratam das categorias verbais. No exemplar do
professor, dizem que a finalidade da unidade é: ―treinar o aluno no reconhecimento e emprego
da pessoa, número, tempo, aspecto, modo e voz verbais‖ (LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI,
1978b, p. 30). As categorias verbais, segundo os autores, provocam alterações no verbo, de
acordo com o uso que fazemos dele. Por ―usos do verbo‖, os autores entendem:
Um verbo apresentado em sua generalidade, como ―correr‖, pode ser compreendido
como um simples processo, sem nenhuma utilização particular, ao passo que dizer
―eu corro‖ implica necessariamente em que o processo está sendo atribuído a um ser
humano ―eu‖ e que acontece num tempo determinado, que é o presente. As
categorias do verbo são as especificações que o seu uso, numa situação concreta de
fala, necessariamente acrescenta ao processo geral (LAJOLO; OSAKABE;
SAVIOLI, 1978b, p. 30).
Lajolo, Osakabe e Savioli (1978b) afirmam que o Aspecto é a categoria que modula o
tempo, isto é, a maneira pela qual se considera a realização do verbo. Notamos o trabalho com
as noções aspectuais em apenas uma questão. Colocamos, em itálico, as respostas encontradas
no exemplar do professor:
Para fixar melhor a importância dos verbos auxiliares, tente indicar que acréscimo
eles trazem em relação aos verbos principais, comparando os enunciados de cada
grupo:
1) Eu já tinha terminado a lição quando ele chegou.
Eu já terminei a lição.
Indica anterioridade do processo de “terminar” em relação ao processo de
“chegar”.
2) Você está chegando muito atrasado no emprego.
Você chega atrasado no emprego.
Só pode ser atribuído caráter habitual com o acréscimo de “sempre”, “muitas
vezes”, “habitualmente’.
3) Pode acontecer um novo desabamento.
Acontecerá um novo desabamento.
Situa o processo no futuro e dá a ele caráter de possibilidade (hipótese).
Explicitamente no futuro [segunda sentença], tem-se uma certeza (afirmação).
(LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978b, p. 29)
Faraco e Moura (1985b) só trazem, também, uma questão, em que explicitam a
dinamicidade. Os autores usam um fragmento do livro O Cortiço, de Aluísio Azevedo.
Vejamos:
1. Releia o primeiro parágrafo. A cada parte do corpo de Rita Baiana corresponde
uma ação. Preencha corretamente as lacunas, conforme o modelo:
a. ilhargas: rebolando
b. cabeça: _________
c. dedos: __________
d. pernas: _________
134
e. braços: _________ e _________
2. Os verbos que você transcreveu têm caráter:
( ) estático ( ) dinâmico
(FARACO; MOURA, 1985b, p. 188)
Nicola (1993b), na explicação sobre verbo, refere-se ao aspecto dinâmico deste. Nas
atividades, o autor não exercita isso. O autor diz: Verbo é a palavra variável que indica uma
ação, um estado, um fenômeno da natureza. Ao contrário do nome, o verbo tem sempre um
aspecto dinâmico, indicando um processo devidamente localizado no tempo‖ (NICOLA,
1993b, p. 93).
Os autores reconhecem a categoria Aspecto, mas não exploram, profundamente, suas
noções semânticas. Quanto à segunda pergunta do roteiro: o autor do livro didático diferencia
o uso do perfeito e do imperfeito?, os autores de 1970 e 1990 diferenciam bem esses usos,
embora os livros careçam de exercícios. Cereja e Magalhães (2003a, 2005b, 2005c)
distinguem parcialmente e, em 1980, os autores não falam do perfeito e do imperfeito.
Lajolo, Osakabe e Savioli (1978b) apresentam duas sentenças: (a) Quebrava os vidros
da sala; (b) Quebrei os vidros da sala e dizem:
Um dos enunciados é empregado para dizer que o processo de quebrar foi acidental
no passado (enunciado ____), ao passo que o outro explicita que o processo foi
habitual no passado (enunciado ____). A forma verbal destinada a expressar que o
processo foi acidental no passado é chamada de pretérito perfeito; a que é destinada
a expressar que o processo foi habitual no passado é chamada de pretérito
imperfeito. [...] O passado pode, portanto, ser encarado de formas distintas: como
acabado (acidental) ou como não acabado (habitual), como anterior ou não a um
outro processo no passado. Esta categoria que modula o tempo é chamada aspecto
[...] (LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978b, p. 32).
Apesar de atribuírem ao perfeito e ao imperfeito fatos acabados e não acabados,
característica insuficiente, segundo Costa (2002), os autores não se limitam aos pretéritos.
Lajolo, Osakabe e Savioli (1978b) explicam que o Aspecto também se manifesta no presente
e no futuro:
Vejamos o caso do presente:
Quebro o vidro da sala.
Estou quebrando o vidro da sala.
A frase é composta de uma forma verbal que indica a realização e o término da
ação de quebrar. A 2ª frase indica simplesmente que esse processo está ocorrendo.
Da mesma forma, o futuro pode ser percebido de formas distintas segundo a maneira
pela qual se encaram os processos. Observe os enunciados:
Quebrarei o vidro.
Terei quebrado o vidro.
A distinção entre eles é semelhante àquela existente entre o perfeito e o imperfeito
no passado: em um se assinala a conclusão do processo:
135
―___________________________‖; em outro, não:
―___________________________‖. Ao mesmo tempo, é possível perceber-se que
enquanto ―negarei‖ é uma forma que apenas assinala a ocorrência de um processo no
futuro, em ―eu terei negado‖ coloca-se o futuro como alguma coisa anterior a um
outro processo, igualmente no futuro. É o caso de ―Quando você vier (futuro) eu
terei saído (futuro anterior ao futuro)‖ (LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978b,
p. 32-33).
Os autores atribuem às formas simples do presente (quebro) e do futuro (quebrarei) a
noção de acabado, enquanto que para as formas compostas do presente (estou quebrando) e
do futuro (terei quebrado é não acabado porque está no futuro: quando você vier, [já] terei
quebrado o vidro) associam a noção de não acabado. Portanto, reconhecem que essas noções
não são exclusivas das formas de pretérito.
Consideramos que Nicola (1993b) faz, também, essa distinção, porque o autor não
restringe as funções dos pretéritos perfeito e imperfeito às noções de acabado e não acabado:
pretérito imperfeito: emprega-se o pretérito imperfeito do indicativo para
designar:
a) um fato passado contínuo, permanente, habitual: ―Ele andava à toa‖, ―Nós
vendíamos sempre fiado‖.
b) um fato passado, mas de incerta localização no tempo; é o que ocorre, por
exemplo, no início das fábulas, lendas, histórias infantis: ―Era uma vez...‖
c) um fato presente em relação a outro fato passado: ―Eu estudava quando ele
chegou‖.
pretérito perfeito: emprega-se o pretérito perfeito do indicativo para referir um
fato ocorrido, concluído: estudei a noite inteira‖. Usa-se a forma composta para
indicar uma ação que se prolonga até o momento presente: Tenho estudado toda
as noites‖.
(NICOLA, 1993b, p. 97)
Como comentamos na seção sobre o Tempo, Nicola (1993b) apresenta as funções dos
tempos do Modo indicativo e do Modo subjuntivo. Da mesma forma que Lajolo, Osakabe e
Savioli (1978b), Nicola (1993b) não trabalha as funções em exercícios.
Cereja e Magalhães (2005b) distinguem o perfeito e o imperfeito da seguinte maneira:
pretérito perfeito: transmite a idéia de uma ação completamente concluída:
Eu joguei bola ontem.
pretérito imperfeito: transmite a idéia de uma ação habitual ou contínua ou que
vinha acontecendo, mas foi interrompida por outra:
Ele sempre me visitava ao domingos. (ação contínua)
Nós fechávamos a porta quando as visitas chegaram. (ação interrompida).
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 144)
Por restringirem-se a ações concluídas e habituais, a abordagem dos autores é restrita.
Nos exercícios, o reconhecimento do Tempo é a prioridade:
136
Leia a anedota a seguir e responda às questões 2 e 3.
Dois camaradas se encontram quando estão passeando com seus cachorros na rua.
Um deles, muito convencido, diz:
O meu cachorro consegue ler!
O outro, mais convencido ainda:
Eu já sabia. O meu me contou!
2. Reconheça o tempo em que estão as formas verbais sublinhadas na anedota.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 146)
As próximas perguntas do roteiro referem-se ao aspecto conclusivo do particípio e ao
aspecto progressivo do gerúndio. Não evidências, nos livros de 1970 e 1980, de que os
autores ressaltem esses aspectos.
Nicola (1993b), no livro do 2º ano, quando trata das formas nominais, afirma:
Em Chorando, a moça despediu-se‖, o gerúndio aproxima-se da função do
advérbio; é o que ocorre na maioria dos casos, embora o gerúndio também
apresente funções semelhantes às dos adjetivos, como em ―Meu polegar está
doendo”. Nesse caso, o gerúndio exprime uma ação em desenvolvimento.
Em Terminada a aula, conversaremos‖, notamos que o particípio indica uma ação
concluída e que, por exprimir um estado, desempenha uma função semelhante à
do adjetivo. Em determinados contextos, o particípio se confunde com o adjetivo:
―Era um homem sofrido”. Nesse caso, podemos flexionar a palavra sofrido
exatamente como um adjetivo.
(NICOLA, 1993b, p. 116)
Pelas definições de particípio e gerúndio, percebemos que o autor aponta como uma
das funções do particípio a indicação de uma ação concluída e do gerúndio, a indicação de
uma ação em desenvolvimento. Nas atividades, Nicola (1993b) trabalha, sutilmente, as
funções do particípio e do gerúndio:
A lição de poesia
1.
Toda a manhã consumida
como um sol imóvel
diante da folha em branco:
princípio do mundo, lua nova.
[...]
nem no meio-dia iluminado,
cada dia comprado,
do papel, que pode aceitar,
contudo, qualquer mundo.
2.
A noite inteira o poeta
em sua mesa, tentando
salvar da morte os monstros
germinados em seu tinteiro.
Monstros, bichos, fantasmas
de palavras, circulando,
urinando sobre o papel,
sujando-o com seu carvão.
Carvão de lápis, carvão
da idéia fixa, carvão
da emoção extinta, carvão
consumido nos sonhos.
3.
A luta branca sobre o papel
que o poeta evita,
luta branca onde corre o sangue
de suas veias de água salgada.
[...]
E as vinte palavras recolhidas
as águas salgadas do poeta
e de que se servirá o poeta
em sua máquina útil.
Vinte palavras sempre as mesmas
de que conhece o funcionamento,
a evaporação, a densidade
menor que a do ar.
137
(MELO NETO, João Cabral de. In: Poesia crítica. Rio de Janeiro, José Olympio,
1982, p. 40-1)
4. Aponte dois gerúndios presentes no texto. Que tipo de ação exprime o gerúndio
com relação ao tempo?
9. O particípio dos verbos transitivos em geral exprime idéia de passividade. O
particípio dos verbos intransitivos exprime idéia de atividade. Explique por quê.
(NICOLA, 1993b, p. 167-168)
Cereja e Magalhães (2005b) definem o particípio e o gerúndio semelhantemente a
Nicola (1993b):
O gerúndio transmite a idéia de que ação verbal está em curso; desempenha, assim,
as funções exercidas pelo advérbio e pelo adjetivo. Observe:
Chegando afinal à terra do futuro esposo, eis que ele saiu de casa e veio andando
ao seu encontro‖.
O particípio transmite a idéia de que o processo da ação verbal chegou ao fim; pode
desempenhar a função de um adjetivo e, nesse caso, concorda em gênero e número
com o substantivo a que se refere.
A jovem não escolhera, foi escolhida.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 147)
Os autores apresentam uma questão interessante a respeito do uso do particípio e do
gerúndio no texto:
Leia o texto a seguir e responda às questões de 2 a 4.
Juntando tudo, Virgínia fez uma bola e atirou-a no cesto. Meu Deus, que distante lhe
parecia aquele tempo. Aquela gente. Bruna casada com Afonso e com uma filha
começando a fazer perguntas. Otávia prometendo para breve uma exposição de
pintura. Natércio aposentado, cada vez mais casmurro. Mais fechado. Letícia
famosa, segundo Bruna sugeriu. Conrado enfurnado na chácara, tocando piano e
criando pombos... Na casa, em lugar de Frau Berta, ficara uma portuguesa chamada
Inocência. Sim, tudo mudara e ficara longe.
(Lygia Fagundes Telles)
3. O gerúndio é uma forma nominal que exprime a idéia de que a ação verbal está
ocorrendo naquele momento, enquanto o particípio transmite a idéia de que o
processo verbal chegou ao fim.
a) Que personagens, citadas no texto, dão ao leitor a idéia de estarem estabilizadas,
numa situação definitiva? Qual dessas formas nominais é empregada em referência à
condição dessas personagens?
b) Que personagens, ao contrário, dão ao leitor a idéia de que estão ativas, em
permanente ação? Qual dessas formas nominais é empregada em referência a essas
personagens?
c) Que formas nominais são empregadas para caracterizar a personagem Conrado?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 157-158)
Na questão, os autores ressaltam o uso do particípio para caracterizar a situação
(definitiva) em que se encontram determinados personagens: Bruna casada; Natércio
aposentado, fechado e o uso do gerúndio para expressar a atividade de alguns personagens: a
filha de Bruna começando a fazer perguntas; Otávia prometendo uma exposição de
138
pintura. O personagem Conrado é caracterizado por ambas as formas: enfurnado na chácara;
tocando piano; criando pombos. Mais do que saber as desinências das formas nominais de
particípio (-do) e de gerúndio (-ndo), o aluno precisa compreender para que elas são
empregadas em um texto. Por isso, respondemos positivamente à questão para as décadas de
1990 e 2000, considerando-se os livros de Nicola (1993a, 1993b, 1993c) e Cereja e
Magalhães (2005a, 2005b, 2005c).
Nenhum dos autores, de 1970 a 2000, trabalha usos/ funções dos verbos auxiliares
aspectuais (começar, acabar de...), penúltimo item do roteiro. Não há nada que nos mostre ao
menos um tratamento parcial.
Em relação ao último item: o autor do livro didático explora os sufixos marcadores de
Aspecto (como ear: cabecear; -ecer: envelhecer; -ejar: pestanejar...)?, somente Faraco e
Moura (1985b) focam os sufixos ear e iar ao tratarem dos verbos irregulares. A intenção
dos autores é ensinar como se conjugam esses verbos. Vejamos exemplos dos exercícios, que
objetivam a conjugação correta:
5. Assinale a alternativa em que há erro:
a. ( ) Sabemos que você anseia por uma boa colocação no torneio.
b. ( ) Espero que vós anuncieis logo o casamento.
c. ( ) Os cientistas criam muitas cobras.
d. ( ) Esperamos que você remedie a situação.
e. ( ) O rosto dele irradiava uma felicidade infinita.
7. Conjugue:
Incendiar pres. ind.
Odiar pres. subj.
Hastear pres. ind.
(FARACO; MOURA, 1985b, p. 178-179)
Os autores, quando estudam os processos de formação de palavras, dão como um dos
exemplos o verbo anoitecer, em que aparece o sufixo aspectual ecer. Mas os autores
enfatizam a estrutura nas atividades, como é o caso da questão a seguir, portanto, a exploração
é restrita:
2. Utilizando o processo da parassíntese, forme palavras derivadas de:
a. pátria:
b. grande:
c. fraco:
d. alma:
e. mole:
139
(FARACO; MOURA, 1986, p. 61)
Concluindo, queremos ressaltar exercícios com os verbos ser e estar, que estão
presentes nos livros de 1970 e 2000. Lajolo, Osakabe e Savioli (1978b, p. 152) dão os
seguintes exemplos: (a) A casa é limpa e alva; (b) A casa está limpa e alva. Os autores dizem
que, em (a), o verbo ser atribui qualidades definidoras à casa, enquanto que, em (b), as
qualidades são momentâneas (verbo estar). Os autores usam os exemplos para falar da
natureza estática da descrição, em oposição à realidade dinâmica da narração. Segundo eles, a
realidade construída com o verbo ser é imprecisa, como se fosse para sempre, em definitivo.
Com o verbo estar ocorre o contrário. Outros exemplos dados pelos autores: (c) A rua é suja.
Esgotos à vista. As pedras são mal dispostas. As casas, imundas; (d) A rua está suja. Esgotos
à vista. As pedras estão mal dispostas. As casas estão imundas. Lajolo, Osakabe e Savioli
(1978b) afirmam que, em (c), ocorre apenas a fixação de um momento, não de algo essencial
àquela realidade. Portanto, ―imunda‖ é um estado em que essa rua determinada encontra-se
por um tempo qualquer. Em (d), ―imunda‖ é um estado temporário acidental. Conforme os
autores:
Afirmar que na descrição não uma evolução interna que favoreça a
transformação, não significa que não haja movimento no interior da realidade
construída. A realidade como um todo é que é estática, e o movimento que
porventura haja nela é um movimento contínuo, que não provoca evolução interna
(LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978b, p. 152).
Cereja e Magalhães (2005a) apresentam a seguinte questão:
4. Compare estes pares de frases:
Bingo é um poodle que ganhei de meu tio. Bingo é faminto hoje!
Bingo está um poodle que ganhei de meu tio. Bingo está faminto hoje!
Como você pode observar, o emprego adequado dos verbos ser e estar ocorre em
situações especiais.
a) Das frases acima, quais são aceitáveis em nossa língua?
b) Comparando as circunstâncias em que um e outro verbo são utilizados, conclua:
Quando se empregam os verbos ser e estar?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005a, p. 128)
Assim como Lajolo, Osakabe e Savioli (1978b), os autores de 2000 querem apresentar
o estado inerente que o verbo ser atribui ao sujeito e o estado circunstancial do sujeito dado
pelo verbo estar. Como já falamos, ao tratar do Aspecto no Ensino Fundamental, os verbos ser
e estar marcam o limite do fato verbal: ser estado permanente; estar estado limitado, tem
um período de vincia. Trabalhar esses verbos faz o aluno entender seus usos/ funções
dentro do texto.
140
Na próxima seção, discutiremos, de maneira geral, como foi o tratamento do Aspecto,
ao longo das décadas, nos dois níveis de ensino.
5.2.3. Aspecto: um estudo histórico de 1970 a 2000
Na discussão de Aspecto, seguimos Vendler (1967), Givón (1984, 2005), Corôa
(2005) e Costa (2002). A partir desses autores, buscamos analisar nos livros didáticos: noções
semânticas aspectuais, diferença de uso entre o perfeito e o imperfeito, papel do particípio e
do gerúndio, usos/ funções dos auxiliares aspectuais e sufixos marcadores de Aspecto. Os
gráficos 4 e 5 representam o resultado da análise da categoria Aspecto nos livros didáticos
dos Ensinos Fundamental e Médio:
Gráfico 4: respostas às questões sobre Aspecto, propostas no roteiro de análise Ensino Fundamental.
Gráfico 5: respostas às questões sobre Aspecto, propostas no roteiro de análise Ensino Médio.
141
No Ensino Fundamental, não obtivemos nenhuma resposta sim, enquanto que o
trabalho parcial mostrou-se significativo a partir de 1970. A quantidade de respostas
negativas foi diminuindo de 1970 a 2000. No Ensino Médio, a abordagem parcial foi a
mesma em todas as décadas. As respostas positivas oscilaram entre 1970 e 2000
115
: 16,66%
1970; 0% 1980; 50% 1990; 33,34% 2000. Se compararmos as respostas sim nos dois
níveis de ensino, notamos que os autores do Ensino Médio trabalharam mais a categoria
Aspecto. Mas, se compararmos as respostas parciais, os autores do Ensino Fundamental
trabalharam de forma mais expressiva: 16,66% 1970; 16,66% 1980; 83,34% 1990;
83,34% 2000, que trataram de mais pontos, ainda que parcialmente. No Ensino Médio, o
trabalho parcial corresponde a 16,66% em todas as décadas.
O Aspecto não é uma categoria que os autores incluam, claramente, na discussão de
verbos e advérbios. Exceção para Lajolo, Osakabe e Savioli (1978b), que tratam do Aspecto
como categoria do verbo. Nos demais livros, pudemos encontrar algumas atividades em que
foi percebida uma abordagem da categoria. Quanto às noções semânticas aspectuais, as que
mais apareceram nos livros foram: duratividade, repetição, habitualidade e dinamicidade,
embora de uma forma restrita. No Ensino Fundamental, somente os autores de 2000
consideraram essas noções. No Ensino Médio, ocorreu o contrário, somente os autores de
2000 não consideraram as noções.
A diferença de uso entre o perfeito e o imperfeito é feita, de fato, pelos autores de
1970 (Ensino Médio), ao falarem que as noções de acabado e não acabado podem ser
associadas a outros tempos além dos pretéritos, e pelo autor de 1990 do Ensino Médio,
quando mostra as funções dos tempos verbais. Os autores, de 1970 a 2000, nos dois níveis de
ensino, geralmente, atribuem aos dois pretéritos as noções de acabado e não acabado. Como
diz Givón (1984), o Aspecto mais comum do imperfectivo é o durativo/ contínuo e o
perfectivo está associado, comumente, ao passado. Costa (2002) mostra que não se pode
restringir o perfectivo e o imperfectivo a fatos acabados e inacabados e Corôa (2005) ressalta
que outras formas, além dos pretéritos perfeito e imperfeito, podem apresentar as noções de
perfectividade e imperfectividade. Por isso, excetuando-se Lajolo, Osakabe e Savioli (1978b)
e Nicola (1993b), os autores dos livros didáticos, restritamente, diferenciam o uso do perfeito
e do imperfeito.
115
As porcentagens são aproximadas: 6 perguntas = 100%.
142
Ao falarem das formas nominais, os autores dos livros didáticos deixam de lado a
marca aspectual dessas formas. Observamos, no Ensino Fundamental, apenas alguns
exercícios que trabalham a progressividade (gerúndio) e a conclusão da ação (particípio) em
1970 (apenas uma questão com o gerúndio), 1990 e 2000. Nas mesmas décadas, no Ensino
dio, os autores tanto exploram os aspectos conclusivo e progressivo na explanação de
particípio e gerúndio, quanto nos exercícios. É importante levar para a sala de aula a discussão
do papel dessas formas nominais, o que ajudaria os alunos na produção de textos, sobretudo,
narrativos, considerando-se o desenvolvimento ou a conclusão de uma ação através do uso
dessas formas.
A marca aspectual trazida por alguns auxiliares aparece de modo restrito nos livros
do Ensino Fundamental de 1990 e 2000 e nenhuma vez no Ensino Médio. Alguns verbos de
significação plena, na função de auxiliares, como começar, acabar de, continuar, andar, viver
etc., denotam as noções aspectuais de inceptividade (começo do evento), término, cursividade
e habitualidade, por exemplo. O aluno, conhecendo a função desses auxiliares, ampliará a sua
competência discursiva ao usá-los seja na fala ou na escrita
116
: (a) Vofez o exercício?/
Comecei a fazer agora; (b) Alô! O Miguel está?/ Acabou de chegar; (c) O João está
bem?/ Ele continua lutando contra o câncer; (d) Sabe o Joaquim?/ Sei. O que tem?/
Vive/ Anda falando de você. O falante poderia simplesmente dizer: (a) Faço agora/ Estou
fazendo; (b) Sim. Está; (c) Ele luta contra o câncer; (d) Fala (muito) de você, porém, mais do
dar uma resposta ao interlocutor, ao usar os auxiliares aspectuais expressa início de evento
(a), término de evento (b), desenvolvimento do evento (c) e hábito (d).
Em relação aos sufixos marcadores de Aspecto, alguns sufixos podem, sozinhos,
denotar as noções semânticas aspectuais: chuviscar = chover pouco; saltitar = dar saltos
pequenos e frequentes; pestanejar = abrir e fechar os olhos rapidamente; cabecear = dar
impulsos com a cabeça; envelhecer = tornar-se velho etc. Infelizmente, os autores limitam-se
a apresentar os sufixos, sem exercitar suas funções.
O estudo do Aspecto, nos livros didáticos analisados, confirma o que diz Costa (2002,
p. 8):
O Aspecto é uma categoria lingüística não muito cortejada pelos estudiosos do
português, fora do âmbito acadêmico. Uma pessoa pode, pelo menos no Brasil, ir até
o fim de sua formação escolar, inclusive universitária, sem nunca ter-lhe ouvido
116
Exemplos hipotéticos de própria autoria.
143
qualquer referência diferentemente do que se passa com muitas outras categorias,
como o Gênero, o Número, a Voz, o Tempo, o Modo, a Pessoa.
Assim como no estudo do Tempo, foi surpreendente que, no Ensino Médio, não haja
uma ampliação significativa no tratamento da categoria Aspecto. Observemos o gráfico 6 a
seguir, que resume o trabalho nos dois níveis de ensino:
Gráfico 6: respostas positivas, negativas e parciais para a categoria Aspecto ao longo das décadas.
Enquanto que para a categoria Tempo (gráfico 3), estão bem definidos o aumento e a
diminuição das respostas positivas, parciais ou negativas, para o Aspecto é diferente.
Observamos que as respostas negativas, apesar de diminuírem a partir de 1990, continuam
aparecendo na década de 2000, no gráfico do Tempo, elas desaparecem. Pudemos dar
respostas sim desde a década de 1970, porém elas caem em 1980, aumentam
significativamente em 1990 e decrescem em 2000. Merece destaque o trabalho parcial, que
vai crescendo desde 1970, o que demonstra a tentativa de os autores abordarem mais questões
aspectuais, embora de forma ainda restrita. Tanto no Ensino Fundamental (gráfico 4), quanto
no Ensino Médio (gráfico 5), a abordagem do Aspecto pelos autores de 1990 e 2000 foi
semelhante.
O Aspecto mostra a constituição temporal interna dos fatos verbais, ou seja, exprime a
ação verbal no seu começo, no seu curso, no seu fim, na sua frequência etc. Estudar o Aspecto
na sala de aula é dar oportunidade ao aluno de conhecer e aplicar outros recursos linguísticos
(sufixos aspectuais, auxiliares aspectuais, formas nominais e tempos verbais) na construção
textual.
144
5.3. Modalidade
Nesta seção, discutiremos a Modalidade, referente ao bloco III do roteiro.
Apresentaremos considerações para as coleções didáticas do Ensino Fundamental e do Ensino
Médio.
5.3.1. O tratamento dado à categoria Modalidade pelas coleções do Ensino Fundamental
Vamos ao quadro 19, que diz respeito à Modalidade nos livros didáticos do Ensino
Fundamental:
Quadro 19: abordagem da categoria Modalidade por década Ensino Fundamental.
COLEÇÕES
1970
1980
1990
2000
III MODALIDADE. O autor do livro didático:
a) associa os Modos indicativo, subjuntivo e
imperativo à certeza, incerteza e ordem,
respectivamente? Ou correlaciona os
Modos ao contexto de uso?
Somente
associa os
Modos às
noções de
certeza,
incerteza e
ordem.
Somente
associa os
Modos às
noções de
certeza,
incerteza e
ordem.
Somente
associa os
Modos às
noções de
certeza,
incerteza e
ordem.
Somente
associa os
Modos às
noções de
certeza,
incerteza e
ordem.
b) diferencia Modo de Modalidade?
Não
Não
Não
De forma
restrita
c) evidencia os efeitos de sentido
provocados pela escolha de determinadas
formas verbais?
Não
Não
Não
Sim
d) faz ligação entre a Modalidade e o
posicionamento do falante?
Não
Não
Não
Sim
e) trabalha os usos/funções dos verbos
auxiliares modais (dever, poder, ter que...)?
De forma
restrita
Não
De forma
restrita
De forma
restrita
f) mostra que a Modalidade pode ser
expressa pelo advérbio?
Não
Não
Não
Não
A primeira pergunta do bloco III é sobre o conceito de Modo para os autores, se os
autores associam os Modos indicativo, subjuntivo e imperativo às noções de certeza,
incerteza e ordem ou ao contexto de uso. Olhando para o quadro 20, percebemos que os
autores definem o Modo de maneira muito semelhante:
145
Quadro 20: definições de Modo verbal para os autores dos livros do Ensino Fundamental.
DÉCADAS
1970
1980
1990
2000
MODO
MODO significa
maneira. Podemos
dizer as coisas de
modo seguro, firme,
categórico; de modo
inseguro,
demonstrando
dúvida; ou de modo
autoritário,
imperativo, exigente.
Conheça os verbos
nos diversos modos:
1) Modo indicativo,
quando nos
expressamos de modo
seguro, ______. Eu
encontro a cumbuca.
2) Modo subjuntivo,
quando nos
expressamos de modo
inseguro,
demonstrando _____.
Talvez eu encontre a
cumbuca e corra à
casa de compadre.
3) Modo imperativo,
quando nos
expressamos de modo
autoritário, ______.
Compadre, feche toda
a casa‖ (FERREIRA,
1977, p. 197).
―Há três modos
verbais: indicativo,
subjuntivo e
imperativo. O
indicativo exprime um
fato, uma ação certa.
Exemplo: Veridiano
mudou de emprego. O
subjuntivo exprime ima
fato, uma ação
possível. Exemplo:
Talvez a vida de
Veridiano melhore. O
imperativo exprime um
pedido, uma ordem ou
um conselho. Exemplo:
Amole esta faca para
mim‖ (MEGALE;
MATSUOKA, 1983b,
p. 73).
―Os modos verbais são: o
indicativo, que indica
um fato real, uma
certeza; o subjuntivo,
que indica dúvida,
incerteza, hipótese, e o
imperativo, que indica
ordem, desejo, apelo‖
(NICOLA; INFANTE,
1990, p. 61).
Modos são ―[...] diferentes
formas de expressar nossas
intenções por meio dos
verbos [...]. Indicativo: é o
modo da certeza,
empregado para expressar
que algo seguramente
acontece, aconteceu ou
acontecerá. [...]
Subjuntivo: é o modo da
dúvida, utilizado para
indicar a possibilidade de
algo vir a acontecer. [...]
Normalmente, é
empregado depois de
verbos que dão idéia de
ordem, proibição, desejo,
vontade, pedido, condição.
[...]. Imperativo: é o
modo pelo qual se
expressa uma ordem ou
um pedido. [...] Às vezes, a
ordem é expressa de forma
mais delicada [...]: ‗Pode
ajudar‘. A frase tem uma
clara intencionalidade
imperativa, pois ela
corresponde a dizer ‗Está
bem, ajude’” (CEREJA;
MAGALHÃES, 2002a, p.
214).
Apesar de Ferreira (1977) referir-se ao ―Modo‖ como a forma de expressão do falante,
não faz diferença entre o Modo e a Modalidade. Os exercícios apresentam questões como a
abaixo:
3) Escreva nos parênteses o número correspondente ao tempo ou modo: presente do
indicativo (1); presente do subjuntivo (2); imperativo afirmativo (3); imperativo
negativo (4):
a) Estudai, crianças!
b) Não apague a luz.
c) Ele apaga a luz mais tarde.
d) Não andes muito.
e) Cantem com alegria, meninos.
f) Não entremos já.
g) Todos desejam do fundo do coração
que ganhes aquele prêmio.
h) Cantas muito bem.
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
( )
_______
soma:
146
Atenção: Somando os números dos
parênteses, o resultado deve ser 23. Confere?
(FERREIRA, 1977, p. 211)
O enfoque está o tempo todo na ―forma‖, o uso da língua não é posto como centro, por
exemplo, muitas vezes, o falante usa um tempo do indicativo, porém, o contexto nos ideia
de ―imperativo‖ ( João, o que está fazendo aí?/ - Estou consertando a bicicleta./ Preciso
falar com você. Pode vir aqui? [Venha aqui!]). O exercício confirma a prioridade atribuída à
forma, o aluno deve apenas ―olhar‖ para o verbo e classificá-lo, deixando de lado advérbios
como não, mais tarde, já, muito, bem e verbos como desejar, que podem influenciar, às vezes,
mais do que a forma verbal, o sentido da frase (por exemplo: João, preciso falar com você.
Venha aqui mais tarde o falante dá uma ordem, mas permite que o ouvinte a cumpra em um
outro momento; João, desejo que voltes logo. Podes ligar sempre o falante impõe a sua
vontade ao outro).
Os autores de 1980 priorizam, também, a forma, como no exemplo abaixo:
4. Escreva o modo dos verbos grifados:
a) Leio este livro.
b) Lê este livro.
c) Talvez leia este livro.
d) Cumpre a tua obrigação.
e) Talvez consigamos vencer.
f) Não conseguimos acertar.
g) Despediu-se da madame.
h) Fale a verdade.
i) Talvez seja o amolador.
j) Recolha os papéis.
(MEGALE; MATSUOKA, 1983b, p. 73)
Em 1990, encontramos questões do tipo:
10. Aponte no texto dois exemplos de verbos no modo imperativo.
11. Aponte no texto dois exemplos de verbos no modo indicativo.
12. No texto, temos algum verbo no modo subjuntivo? Em caso afirmativo, aponte-
o.
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 63)
As questões acima de Nicola e Infante (1990) só se diferenciam dos autores de 1970 e
1980 pelo trabalho com o texto. Nicola e Infante (1990) basearam-se no poema ―O amor bate
na aorta‖, de Carlos Drummond de Andrade. Ferreira (1977) e Megale e Matsuoka (1983b)
trabalharam com frases isoladas. Contudo, Nicola e Infante (1990) usaram o texto para que o
aluno procure verbos nos Modos indicativo (suspende, tira, bate, ronca, adoçam, pulou...),
subjuntivo (―o amor seja como for‖) e imperativo (―Meu bem, não chores; meu amor, não te
147
atormentes‖). Não é pedido o sentido que esses Modos dão ao texto, no qual predomínio
do Modo indicativo. Cereja e Magalhães (2002a) trabalham, igualmente a Nicola e Infante
(1990), com textos, porém, incorrem nas mesmas questões de identificação e classificação. O
texto acaba sendo pretexto para o estudo do verbo, indo contra a proposta dos autores, contida
no Manual do Professor. Observemos os exemplos, um deles citado na seção sobre o
Tempo:
Você brincou de detetive? É muito divertido e requer que aprendamos alguns
truques. Por exemplo, usar tinta invisível. Vosabe como fazer tinta desse tipo? É
só seguir estas instruções:
Tinta invisível
Coloque o suco de limão em um potinho. Cuidado para não deixar cair em sua pele,
porqu o suco limão pode causar manchas.
Molhe o pincel ou o palito no suco e escreva o recado no papel branco. Entregue a
mensagem a um amigo. Para ler, ele vai ter de aproximar o papel de uma lâmpada
acesa, até que o calor faça as letras aparecerem.
a) Reconheça os modos em que estão as formas verbais destacadas.
b) A forma vai precisar, utilizada no texto do quadro lateral, é uma locução verbal.
Que forma verbal simples (de uma única palavra) corresponde a essa locução?
c) A que modo pertence essa locução verbal ou essa forma verbal simples?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 215)
3. Calvin
117
é um menino muito preguiçoso, principalmente para fazer as lições. Mas
será que o Calvin do futuro se arrepende do que o Calvin do passado deixou de
fazer? Vejamos:
a) Baseando-se na roupa e nos óculos, identifique o Calvin do presente, o do passado
e o do futuro.
b) Várias vezes o modo imperativo é empregado no texto. Por que isso ocorre?
Identifique dois verbos no imperativo.
c) Por que o Calvin do futuro mostra preocupação, caso a lição não seja feita até as
8h30?
d) Identifique o tempo (do modo indicativo) das seguintes formas verbais
empregadas na tira: estamos, deveria, fiz, será.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 233)
A ―receita da tinta invisível‖ serviria para os alunos verificarem o emprego do Modo
imperativo em receitas, mas os autores apenas pedem o reconhecimento do Modo. No
trabalho com a tirinha é que os autores chamam a atenção do aluno para o porquê de o
imperativo estar sendo usado: Várias vezes o modo imperativo é empregado no texto. Por que
isso ocorre? Identifique dois verbos no imperativo.
Pelo que os autores apresentam sobre o Modo, já podemos chegar à resposta da
segunda pergunta: o autor do livro didático diferencia Modo de Modalidade?. Os autores dos
117
Ver tira no anexo 23.
Você vai precisar de:
- suco de limão;
- papel branco;
- um palito ou um pincel
fino.
148
livros de 1970 a 1990 não consideram essa diferença. Nos livros de 2000, os autores não
mostram a diferença explicitamente, todavia, em alguns exercícios e explicações, notamos, de
forma restrita, que os autores levam em conta a Modalidade. Vejamos:
1. Calvin
118
utiliza o futuro do pretérito em duas situações. Ele poderia empregar os
verbos no presente, mas escolheu o futuro. Compare:
Eu Gosto de saber. Eu gostaria de saber.
Você pode sugerir algo? ―Você poderia sugerir algo?
a) Qual dos tempos verbais demonstra mais educação para com o interlocutor?
b) No balão, Calvin diz: estou procurando por algo que possa arremessar a
carga de 25 kilos de neve...‖ Por que ele empregou o presente do subjuntivo nessa
situação?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 250)
O modo imperativo é autoritário?
O modo imperativo, dependendo da situação e do tom de voz usado pelo locutor,
pode dar a impressão de autoritarismo. Para evitar essa conotação, costumamos
empregar alguns elementos modalizadores, isto é, expressões como por favor, por
gentileza, tenha a bondade, etc. Outra forma de modalizar a ordem é empregar o
verbo no infinitivo, mas com valor de imperativo, como, por exemplo: ―Não fumar‖
em vez de ―Não fume‖.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006c, p. 105)
Na questão com a tira de Calvin, os autores perguntam: qual dos tempos verbais
demonstra mais educação para com o seu interlocutor? e dão como sugestão a resposta
119
:
―O futuro do pretérito transmite a impressão de maior educação e refinamento da linguagem.
Professor: Na lingüística o uso desse tipo de recurso é chamado de modalização(CEREJA;
MAGALHÃES, 2002a, p. 250). Quanto ao imperativo, os autores falam de ―elementos
modalizadores‖(por favor, por gentileza, tenha a bondade etc.), ou seja, elementos usados
com a forma verbal no imperativo que evitam a ideia de autoritarismo. Esses são alguns
exemplos de que os autores diferenciam Modo de Modalidade. Ao responder as próximas
perguntas do roteiro, mostraremos mais exemplos.
Dando seguimento ao roteiro, a próxima pergunta é: o autor do livro didático
evidencia os efeitos de sentido provocados pela escolha de determinadas formas verbais?
Somente Cereja e Magalhães (2002a, 2002b, 2006c, 2006d) ressaltam esse aspecto.
Acabamos de citar um exemplo de Cereja e Magalhães (2002a), em que o personagem
da tirinha, Calvin, usa o futuro do pretérito para modalizar o enunciado, isto é, com a intenção
de ser polido. Os autores trazem, também, uma questão, em que mostram o pretérito
imperfeito sendo usado com o mesmo sentido do futuro do pretérito na tirinha referida:
118
Ver tira no anexo 24.
119
Tivemos acesso ao exemplar do professor.
149
2. Por sugerir educação, polidez na forma de pedir algo a alguém, o pretérito
imperfeito é, às vezes, usado no lugar do presente, considerado muito ―seco‖ e
direto. Em qual das frases seguintes o pretérito imperfeito tem esse tipo de emprego?
a) Sempre pedia um livro e lia um pouco antes de dormir.
b) Não acreditava que seu cartão da loteria estivesse premiado.
c) A senhora podia me ajudar? Será que dava para segurar este pacote um
pouquinho?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 233)
Essas duas questões (da tirinha e a acima) estão no livro do 6º ano (5ª série). Ainda, na
mesma série, outra questão que chamou a atenção foi:
6. No último quadrinho
120
, aparecem os amigos citados.
a) Que modo verbal é utilizado em ―Beija! Beija! Beija!‖?
b) O uso desse modo verbal entender que os amigos queriam ou não queriam o
namoro de Suriá e Felipe?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 251)
Os autores querem mostrar, no exercício acima, a razão de os falantes usarem a forma
imperativa: ―O uso do imperativo, que expressa pedido, é a prova de que eles queriam o
namoro de Suriá e Felipe
121
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 251). No livro do ano
(6ª série), aparecem as seguintes atividades:
3. Compare estas frases:
―Um herói muito famoso é Artur, um rei lendário, que teria vivido na Inglaterra no
século 5.‖
Um herói muito famoso é Artur, um rei que viveu na Inglaterra no século 5.
a) Qual delas transmite a idéia de que o fato realmente aconteceu?
b) Qual delas transmite a idéia de que o fato pode ter acontecido, mas não há certeza
quanto a isso?
c) Na frase que transmite a idéia de um mundo possível, que palavras são
responsáveis pela noção de possibilidade?
4. Releia este trecho do texto:
―Diz a lenda que ele e seus companheiros, os cavaleiros da Távola Redonda,
venceram muitos inimigos.‖
Conforme podemos observar, as vitórias do Rei Artur e dos cavaleiros da Távola
Redonda são apresentadas fazendo parte de um plano imaginário, possível. Que
expressão desse trecho é responsável por introduzir o leitor nesse plano?
5. Identifique, nas frases que seguem, as palavras, expressões ou trechos que situam
o leitor em um mundo hipotético:
a) ―Se essa rua fosse minha, eu mandava ladrilhar.‖
b) ―Era um a vez uma bela menina órfã que se chamava Youkiko.‖ (Heloísa Prieto)
c) Vamos supor que você fosse um herói... O que você faria?
d) É possível que os pagamentos dos funcionários saiam até o dia 5.
e) A falta de chuvas neste ano pode trazer problemas para a lavoura e para o
abastecimento de energia.
f) Tomara que o dinheiro para comprar tudo, senão teremos de devolver algumas
mercadorias no caixa.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 58-59)
120
Ver tira no anexo 25.
121
Resposta do exemplar do professor.
150
Nas questões, Cereja e Magalhães (2002b) evidenciam os efeitos de sentidos
provocados pelo uso do auxiliar ter no futuro do pretérito do indicativo (teria vivido
incerteza e possibilidade) e do pretérito perfeito do indicativo (viveu certeza); pelo uso de
certas expressões: ―lendário‖, ―diz a lenda‖, ―se essa rua fosse minha‖, ―era uma vez‖,
―vamos supor, fosse, faria‖, ―é possível, saiam‖. Isso mostra que noções de certeza, incerteza/
dúvida/ possibilidade/ hipótese e ordem/ pedido não são transmitidas, exclusivamente, por
verbos nos modos indicativo, subjuntivo e imperativo. Os autores dizem ainda:
Quando falamos ou escrevemos, podemos nos referir ao mundo real, concreto, e
também a um mundo hipotético, isto é, a um mundo imaginário, em que certas
coisas poderiam ter acontecido ou podem vir a acontecer.
Quando em uma narração se diz que ―Para ser um herói, é preciso enfrentar
perigos‖, o ouvinte ou leitor é levado a pensar que a condição de herói da
personagem é ainda uma hipótese, uma possibilidade.
Da mesma forma, a afirmação ―Artur, um rei lendário, que teria vivido na Inglaterra
no século 5‖ dá a entender que existe a possibilidade, mas falta comprovação de que
o rei Artur viveu na Inglaterra no século 5. Essa falta de certeza, nesse caso, decorre
do uso das expressões teria vivido e lendário.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 58)
As questões e a explicação anteriores estão na seção de Produção de texto, cujo
assunto é A construção de mundos hipotéticos pela linguagem. Cereja e Magalhães (2002b)
salientam a Modalidade epistêmica, por meio do tempo verbal e de algumas expressões. Com
isso, o aluno perceberá que, dependendo da forma como se expressa, mudará o sentido do que
diz, como nas três questões citadas há pouco. Na explicação, os autores destacam que a noção
de possibilidade é indicada por várias formas e não somente pelo Modo subjuntivo, como é
colocado pelas gramáticas tradicionais.
No livro do 8º ano (7ª série), há vários exemplos envolvendo, principalmente, o uso do
Modo imperativo. Apresentaremos, a seguir, apenas duas questões para ilustrar:
7. No último parágrafo, o narrador admite que pode ter tido adolescência. E afirma:
―Seja como for, seja como tenha sido, bem que gostaria de dizer: eu, adolescente?
Estou fora, meu‖.
a) A forma verbal gostaria está no futuro do pretérito do indicativo. O que ela
expressa quanto à existência da ação verbal: certeza, vida ou possibilidade, ou
ordem ou pedido?
b) Ao empregar esse tempo verbal, o narrador leva a sério a hipótese de não ter tido
adolescência. Por quê?
c) O que bonés de abas viradas, reggaes, tênis de cano alto, etc. representam para ele
hoje?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006c, p. 81)
Na língua existem várias formas de indicar ao ouvinte ou leitor que se fala de um
mundo hipotético, possível.
151
6. Observe as formas verbais empregadas no enunciado
122
.
a) Que modo verbal predomina no texto?
b) Em que pessoa elas estão?
c) Com que finalidade o anunciante emprega esses verbos nesse modo verbal e nessa
pessoa?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006c, p. 108)
Nas questões são ressaltados os valores do futuro do pretérito, para expressar
possibilidade e do Modo imperativo, para estimular o interlocutor a comprar um presente.
Todas as atividades apresentadas ajudam o aluno a perceber que, dependendo da forma verbal
empregada, do sentido geral do contexto, da intencionalidade e do uso de algumas expressões,
modificamos o sentido do que falamos e mesmo que usemos uma forma do Modo indicativo,
por exemplo, podemos denotar pedido, noção tipicamente expressa pelo imperativo. É
importante dizer, também, que os autores levam em conta verbos de significação plena para
expressar a Modalidade: ―O sentido dos verbos dos quais o verbo no subjuntivo depende
quase sempre está ligado a uma idéia de ordem, proibição, desejo, pedido, súplica. É o caso,
por exemplo, dos verbos desejar, duvidar, implorar, negar, ordenar, pedir, proibir, entre
outros‖ (CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 60).
Megale e Matsuoka (1983b) apresentam questões em que poderiam ter evidenciado os
sentidos expressos pela Modalidade, mas se prendem à forma, quando tratam do Modo
subjuntivo:
3. Observe:
a) Desejo que isto volte a acontecer.
b) Se não chovesse, poderíamos sair.
c) Quando nos permitirem, discutiremos.
4. Reescreva novamente apenas os verbos que exprimem desejo, possibilidade,
hipótese para responder:
a) Qual deles está no presente?
b) Qual deles está no futuro?
c) Um deles está no imperfeito. Qual é?
(MEGALE; MATSUOKA, 1983b, p. 149)
Da mesma forma, para a pergunta: o autor do livro didático faz ligação entre a
Modalidade e o posicionamento do falante?, os autores de 2000 fazem, nos livros do
ano (5ª série), do ano (6ª série) e do ano (7ª série). Analisemos: ―É comum haver nos
textos de opinião expressões como eu penso que, do meu ponto de vista, é preciso que,
minha sugestão é, na minha opinião, etc.‖ (CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 241). Essa
explanação está na seção Produção de texto, no ano (5ª série), que trata de textos de
opinião. Depois, os autores dão algumas instruções para o aluno produzir um texto de opinião,
122
Ver anúncio no anexo 26.
152
em uma delas dizem:
b) Escreva um pequeno texto de opinião sobre o assunto a que cada pergunta se
refere, procurando dar razões que convençam o leitor sobre seu ponto de vista.
Empregue a variedade padrão da língua, expressando-se de forma clara e precisa, e,
se necessário, utilize expressões como é preciso, eu acho que, etc. Quando seu
texto ficar pronto, a ele um título, como Eu também dou meus palpites ou Eu
opino, ou outro que você prefira.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 242)
As expressões mostradas pelos autores: eu penso que‖, ―do meu ponto de vista‖, ―é
preciso que‖... fazem o falante se comprometer ou não com o que diz. No ano (6ª série) e
no ano (7ª série), Cereja e Magalhães (2002b, 2006c), falando de textos de opinião e da
crítica, apresentam as questões:
6. Os textos de opinião geralmente apresentam uma linguagem com certas
características, como o uso da pessoa e o emprego de expressões como eu acho,
na minha opinião, concordo, discordo, etc. Em quais desses textos:
a) fica claro o uso da 1ª pessoa?
b) são empregadas expressões como eu acho, discordo, na minha opinião?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 85)
6. O texto expressa a opinião do crítico que avalia o objeto cultural. Assim, a crítica
pode ser mais pessoal, o que ocorre quando o autor se coloca no texto de forma
explícita, empregando expressões como Na minha opinião, Eu acho que, Eu penso
que, etc., ou pode ser impessoal, o que acontece quando o autor se coloca de forma
indireta, empregando a 3ª pessoa. A crítica em estudo é pessoal ou impessoal?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006c, p. 60)
A intenção dos autores é enfatizar a linguagem usada em textos de opinião e na crítica,
mas afirmam que as expressões supracitadas dão ―pessoalidade‖ ao discurso. Por isso,
respondemos a pergunta do roteiro positivamente.
Quanto ao trabalho com os usos/ funções dos auxiliares modais (dever, poder, ter
que...), respondemos: em 1970, o trabalho é restrito; em 1980, os autores não tratam dos
modais; em 1990, o trabalho é restrito e, em 2000, os autores consideram os modais, mas não
seus usos/ funções.
Martins (1974) mostra uma única questão, no livro da 7ª série, em que atribui a
necessidade ao verbo ter e o desejo ao verbo haver:
7) Modifique, empregando ter ou haver, conforme haja caráter de necessidade ou
desejo:
Modelo a) O bonde seguirá (necessidade).
O bonde tem de seguir.
b) Estudarei, pois as sabatinas vêm aí (necessidade.)
c) Ficarei bom, se Deus quiser (desejo).
d) Pousaremos aqui, pois estamos cansados (necessidade).
153
e) Vocês ficarão mais uns dias, tenho certeza (desejo).
f) Ele virá, fique tranqüilo (desejo).
(MARTINS, 1974, p. 66-67)
Em 1990, Nicola e Infante (1996b), falando de locução verbal, apresentam um
exemplo com um auxiliar modal: ―A moça poderá beber café? (NICOLA; INFANTE,
1996b, p. 148). Os autores dizem que o auxiliar poder indica a possibilidade de se realizar a
ação no tempo futuro, ou seja, enfatizam a função. Em uma única questão, Nicola e Infante
(1996b) trabalham o uso/ função do auxiliar ter:
4. Que idéia exprime o verbo auxiliar na seguinte locução verbal?
Tenho de estudar bastante para a prova.
a) passividade
b) obrigatoriedade
c) continuidade de ação
d) desenvolvimento de ação
(NICOLA; INFANTE, 1996b, p. 151)
O auxiliar indica, na questão acima, obrigatoriedade. No livro da série, os autores
abordam os principais auxiliares: ser, estar, ter e haver, com quadros-modelo de conjugação.
Nos exercícios, dão relevância à forma:
5. Reescreva as frases abaixo, substituindo os asteriscos pelos verbos entre
parênteses no tempo verbal que julgar correto:
a) Aniceto de Castro não (*) dinheiro para casar com Mercedes, (*) quarenta anos
atrás. (ter, haver)
b) ―O amor (*) um grande laço.‖ (ser)
c) Carlos Drummond de Andrade (*) um dos poetas brasileiros de maior destaque.
(ser)
d) Mercedes (*) passando na rua, quando encontrou Castrão. (estar)
e) Castrão e Mercedes não se reconheceram, porque (*) passado muito tempo desde
a última vez que (*) juntos, (ter, estar)
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 90)
Embora Cereja e Magalhães (2002b) apresentem questões em que aparecem os
auxiliares modais ter que, dever, precisar, poder, não explicam a função deles. São exemplos:
4. Faça de acordo com o exemplo:
Eu terei que ouvi-la. (nós/eles)
Nós teremos que ouvi-la.
Eles terão que ouvi-la.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 48)
5. Retire duas locuções verbais das falas da personagem Susanita
123
, a menina loira.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 69)
7. Nos textos de opinião, são empregados freqüentemente verbos e locuções verbais
para exprimir como o locutor gostaria que as coisas fossem. Entre esses verbos e
locuções verbais incluem-se deve ser, preciso ficar, poderia estar, preciso ter.
identifique nos textos exemplos desse tipo de expressões.
123
Ver tira no anexo 27.
154
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 85)
Quanto ao último item do roteiro: o autor do livro didático mostra que a Modalidade
pode ser expressa pelo advérbio?, não encontramos nada que evidenciasse tal questão nos
livros de 1970 a 2000. É necessário exercitar os usos modais manifestados pelos advérbios
com os alunos. Advérbios como talvez e os terminados em mente podem atribuir a ideia de
possibilidade ao enunciado (Os rapazes ainda não chegaram. Talvez estejam muito
atarefados (FERREIRA, 1977, p. 240); Todo esse barulho é feito propositalmente
(FERREIRA, 1977, p. 241)), entre outros exemplos. O advérbio, ainda, transmite ideia de
ordem, exigência, autoritarismo do falante: quero isto agora/ (quero presente do
indicativo; enunciado valor imperativo).
5.3.2. O tratamento dado à categoria Modalidade pelas coleções do Ensino Médio
O quadro a seguir apresenta as respostas obtidas para as coleções do Ensino Médio,
sobre a Modalidade:
Quadro 21: abordagem da categoria Modalidade por década Ensino Médio.
COLEÇÕES
1970
1980
1990
2000
III MODALIDADE. O autor do livro didático:
a) associa os Modos indicativo, subjuntivo e
imperativo à certeza, incerteza e ordem,
respectivamente? Ou correlaciona os
Modos ao contexto de uso?
Somente
associa os
Modos às
noções de
certeza,
incerteza e
ordem.
Somente
associa os
Modos às
noções de
certeza,
incerteza e
ordem.
Somente
associa os
Modos às
noções de
certeza,
incerteza e
ordem.
Somente
associa os
Modos às
noções de
certeza,
incerteza e
ordem.
b) diferencia Modo de Modalidade?
Não
Não
Não
Não
c) evidencia os efeitos de sentido
provocados pela escolha de determinadas
formas verbais?
De forma
restrita
Apenas dá
indícios
De forma
restrita
De forma
restrita
d) faz ligação entre a Modalidade e o
posicionamento do falante?
De forma
restrita
De forma
restrita
De forma
restrita
Não
e) trabalha os usos/funções dos verbos
auxiliares modais (dever, poder, ter que...)?
De forma
restrita
Não
Não
Não
f) mostra que a Modalidade pode ser
expressa pelo advérbio?
Não
Não
Não
Não
Para a primeira pergunta: o autor do livro didático associa os Modos indicativo,
subjuntivo e imperativo à certeza, incerteza e ordem, respectivamente? Ou correlaciona os
Modos ao contexto de uso?, chegamos à resposta de que os autores, de 1970 a 2000,
associam os Modos às respectivas noções. Abaixo, o quadro 22 expõe a definição de Modo
155
para os autores:
Quadro 22: definições de Modo verbal para os autores dos livros do Ensino Médio.
DÉCADAS
1970
1980
1990
2000
MODO
―Essa categoria, que
engloba as atitudes
do locutor diante do
processo é a categoria
do modo. Esta
categoria
compreende, no
português, três modos
distintos: o
indicativo (onde se
afirma ou se nega a
atribuição de um
processo); o
subjuntivo (onde se
subordina a
atribuição à
possibilidade, à
necessidade, à
dúvida) e o
imperativo (onde se
subordina a
atribuição à ordem,
ao pedido)‖.
(LAJOLO;
OSAKABE;
SAVIOLI, 1978b, p.
33)
―Indica atitude da
pessoa que fala em
relação ao fato que
enuncia. três
modos:
1) Indicativo: indica
um fato certo.
Ele saiu de casa.
2) Subjuntivo: indica
um fato possível.
É possível que ele saia
de casa.
3) Imperativo: indica
uma ordem, um
conselho, um pedido.
Saia já!
(FARACO; MOURA,
1985b, p. 154)
A flexão de modo
indica as diversas
atitudes do falante com
relação ao fato que
enuncia. Veja, por
exemplo, as diferentes
atitudes em:
eu amo/ eu amei
A atitude do falante é de
certeza, o fato é ou foi
uma realidade. Essa
atitude caracteriza o
modo indicativo.
se eu amasse/ quando eu
amar
A atitude, agora, é de
incerteza, de vida;
exprime uma condição,
uma possibilidade. Essa
atitude caracteriza o
modo subjuntivo.
ame você/ não ame
As duas formas verbais
exprimem uma ordem,
um desejo, uma vontade.
É o modo imperativo.
(NICOLA, 1993b, p. 95)
Modo
- Indicativo: É o modo da
certeza, o que expressa
algo que seguramente
acontece, aconteceu ou
acontecerá: Eu leio todos
os dias.
- Subjuntivo: É o modo da
dúvida, o que expressa a
incerteza, a possibilidade
de algo vir a acontecer:
Meus pais querem que eu
leia todos os dias.
- Imperativo: É o modo
geralmente empregado
quando se tem a finalidade
de exortar o interlocutor a
cumprir a ação indicada
pelo verbo. É o modo da
persuasão, da ordem, do
pedido, do conselho, do
convite: Leia todos os dias,
nem que seja um pequeno
texto! (CEREJA;
MAGALHÃES, 2005b, p.
144)
Todas as definições estão nos livros do ano. Cereja e Magalhães (2005b)
conceituam o Modo de forma semelhante ao que fizeram na coleção do Ensino Fundamental.
Os demais autores citam ―atitude do falante‖ e, nisso, diferem-se dos autores dos livros do
Ensino Fundamental. Porém, nos exercícios, só focam a identificação dos Modos:
1) Considere o verbo no infinitivo: abrir as janelas. Formule frases:
a) afirmando ou negando:
b) fazendo um pedido:
(LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978b, p. 34)
4. Partindo da frase Ir ao cinema, formule duas orações, colocando o verbo ir nos
modos pedidos e empregando a 1ª pessoa do singular:
a) Indicativo
b) Subjuntivo
O verbo ir, na frase a, indica um fato ______ (certo provável) e na frase b, indica
um fato ______ (certo provável).
(FARACO; MOURA, 1985b, p. 155)
4. Dê pessoa, número, tempo e modo da forma verbal destacada em ―...que não fiz”.
(NICOLA, 1993b, p. 148)
156
1. Leia esta tira
124
:
Identifique na tira:
a) um verbo empregado no modo subjuntivo;
b) uma locução verbal;
c) dois verbos empregados no modo imperativo
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 146)
Embora sejam livros do Ensino Médio, as questões que os autores apresentam não são
reflexivas. Nenhum dos autores diferencia Modo de Modalidade, segundo ponto do roteiro.
Quanto ao próximo ponto: o autor do livro didático evidencia os efeitos de sentido
provocados pela escolha de determinadas formas verbais?, encontramos exemplos nas quatro
décadas.
Lajolo, Osakabe e Savioli (1977), explanando a função apelativa ou conativa,
afirmam:
Ao dizer ―Conheça você também a obra desse grande autor brasileiro‖, o
anunciante
125
está realizando um ato, o de aconselhá-lo à leitura. O mesmo caso
ocorre quando alguém diz sente-se (ou, queira sentar-se). A pessoa que assim fala
não está querendo, por exemplo, dizer que a cadeira próxima a você é grande,
pequena, ou está quebrada. Não está lhe dando informações. Está atuando sobre
você para levá-lo a tomar uma atitude concreta. Está realizando um ato que é o de
convidá-lo a sentar-se. Em ambos os casos (―conheça... brasileiro‖; ―sente-se‖) a
pessoa que fala está preocupada em atuar sobre você, em provocar-lhe uma resposta
determinada. Esta poderá ser uma outra frase ou um ato. No caso da propaganda, por
exemplo, poderá ser uma frase (―Não tenho dinheiro para comprar livros‖ ou ―não
tenho tempo para ler‖, etc.) ou um ato (ir a uma livraria e comprar algum livro de
Machado de Assis). No segundo caso, sua resposta poderá ser sentar-se, ou dizer:
―Não, obrigado, estou bem de pé‖. (LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1977, p. 56-
57)
Ao abordarem essa função da linguagem, os autores mostram que o falante, ao utilizar
certas formas verbais, atua sobre o outro, ou seja, provoca uma atitude. Essa parte está no
livro do 1º ano e foi o único caso encontrado, portanto, a abordagem é restrita.
Faraco e Moura (1985a), tratando, também, da função apelativa ou conativa, falam do
efeito de sentido provocado pelo Modo imperativo. Os autores trabalham as seguintes
questões:
2. Em que modo estão as formas verbais: use e não dispense?
3. As respostas que você deu às questões anteriores demonstram que:
124
Ver tira no anexo 28.
125
Ver anúncio no anexo 29.
MULHER, USE O SABONETE X.
Não dispense X: ele a tornará tão bela quanto as estrelas de cinema.
157
a. ( ) o emissor descreve uma mulher;
b. ( ) o emissor compara todas as mulheres às estrelas de cinema;
c. ( ) o emissor dirige-se à mulher fazendo-lhe um apelo. Por isso, procura influir
no comportamento do receptor.
4. Pode-se dizer que toda a composição constitui:
a. ( ) um elogio;
b. ( ) uma dedicatória;
c. ( ) uma descrição;
d. ( ) um apelo.
(FARACO; MOURA, 1985a, p. 27-28)
Na coleção de 1980, este exemplo, por isso, os autores abordam a questão do
roteiro de maneira restrita. Da mesma forma que os autores de 1970 e 1980, Nicola (1993a)
assim discorre sobre a função apelativa ou conativa:
Quando a intenção do emissor é influenciar o destinatário, quando a mensagem es
centrada no destinatário em forma de ordem, apelo ou súplica, temos a função
apelativa ou conativa da linguagem. Os verbos no imperativo, o uso de vocativos e
a segunda pessoa (tu/ vós, você/ vocês) são marcas gramaticais da função conativa.
(NICOLA, 1993a, p. 36)
Os exemplos, de 1970 a 1990, estão nos livros do ano. O objetivo dos autores é
tratar da função apelativa, mas, ao comentarem sobre o uso de verbos no imperativo,
ressaltam o efeito provocado pelo uso desse Modo: apelar, suplicar, pedir, ordenar,
especialmente, em propagandas/ anúncios. Já Cereja e Magalhães (2005a) trabalham os
efeitos de sentido provocados pela escolha de determinadas formas verbais em exercícios e
em todas as séries do Ensino Médio. Vejamos as questões do livro do 1º ano:
5. Compare as frases seguintes quanto ao sentido:
Eu mandei o pintor acabar logo o serviço.
Eu pedi ao pintor que acabasse logo o serviço.
a) Qual é a diferença de sentido entre elas?
b) Qual das frases demonstra educação e respeito no trato com as pessoas?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005a, p. 128)
4. Observe as formas verbais destacadas nestas frases:
―Não substitua o remédio receitado por outro‖
―Não mude a dose receitada.‖
―Não perca a hora de tomar o remédio‖.
―Não abandone o tratamento no meio‖.
―Não deixe de voltar ao médico para avaliação‖.
a) Em que modo estão as formas verbais substitua, mude, perca, abandone e deixe?
b) Essas formas verbais são compatíveis com os objetivos do texto da campanha
comunitária? Justifique.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005a, p. 176)
Primeiramente, os autores opõem os verbos de significação plena: mandar denota
autoritarismo; pedir forma polida. Depois, trabalham o imperativo, que, na campanha
comunitária, é usado para persuadir, aconselhar o interlocutor. No livro do ano, os autores
158
ressaltam, também, o efeito provocado pelo imperativo em propagandas/ anúncio
126
:
6. O anúncio publicitário é um gênero textual do grupo dos gêneros argumentativos,
pois tem a finalidade de convencer o leitor a consumir determinado produto ou
aderir a certa idéia. A linguagem geralmente se adapta ao perfil do público e
freqüentemente apresenta verbos no imperativo ou no presente do indicativo.
a) No anúncio
127
em estudo, que tipo de variedade lingüística foi empregado?
b) Nas frases ―Não leve essa idéia para dentro da sua casa‖ e ―Diga não ao trabalho
infantil doméstico‖, que modo verbal foi empregado?
c) Com que intenção o anunciante empregou esse modo verbal?
d) Na frase da parte superior do anúncio, o verbo está empregado no infinitivo
colocar. Como ficaria a frase, caso o anunciante optasse por empregar o imperativo?
e) Levante hipóteses: por que o anunciante optou pela forma infinitiva, no texto
principal do anúncio, em vez do imperativo?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 343)
No ano, os autores exercitam, ainda, o imperativo, mas apresentam uma questão de
uso do futuro do pretérito do indicativo:
3. Observe que, considerando-se o mundo hipotético, várias orações (por exemplo,
―Seria mais tolo ainda [...]‖. ―Seria menos higiênico‖, ―Iria a mais lugares [...]‖, etc.)
descrevem a forma ideal de vida, de acordo com a ótica do autor.
a) Em que tempo e modo estão as formas verbais dessas orações?
b) O que esse tempo e modo verbais expressam semanticamente nesse contexto?
c) Como forma de justificar suas projeções hipotéticas, o autor introduz em alguns
trechos flashes do passado e relata o modo como viveu. Identifique no parágrafo
uma oração subordinada adverbial causal que cumpre o papel de justificar as
projeções hipotéticas do autor.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005c, p. 154)
7. O modo empregado nas locuções verbais é o imperativo, que pode expressar
ordem, conselho, pedido ou persuasão.
a) Nesse contexto
128
, o que ele expressa?
b) Compare a fala da cobra no último quadrinho à sua fala no quadrinho. Elas são
coerentes entre si?
c) Considere o contexto em que é feita a advertência da cobra em relação à
colocação pronominal. Por que ela provoca humor?
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005c, p. 328)
Observamos que os autores, de 1970 a 2000, trabalham muito o uso do Modo
imperativo. No Ensino Médio, os autores exploram o gênero propaganda/ anúncio, em que
esse Modo é usado para convencer o interlocutor. Explanações e exercícios como os
apresentados, anteriormente, auxiliam o aluno a compreender a função de determinado Modo,
ao invés de decorar como se conjuga o verbo nos Modos indicativo, subjuntivo e
imperativo.
A próxima pergunta do roteiro é: o autor do livro didático faz ligação entre a
126
Ver anexo 30.
127
Ver anúncio no anexo 31.
128
Ver tira no anexo 32.
159
Modalidade e o posicionamento do falante? Respondemos de forma restrita para as décadas
de 1970 a 1990. Não aparece nenhuma evidência desse ponto nos livros de 2000.
Os autores de 1970 comparam os seguintes enunciados: (a) Ele quebrou o vidro; (b)
Que ele quebre o vidro, a responsabilidade é dele; (c) É possível que ele quebre o vidro; (d)
Quebre o vidro, se tem coragem (LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978b, p. 33). E dizem:
Cada uma das formas assumidas pelo verbo quebrar nesses enunciados tem a
função clara de distinguir atitudes em relação ao processo expresso por ele. Coloque
diante de cada uma das atitudes abaixo, o(s) enunciado(s) correspondente(s)
extraído(s) da relação acima:
a) negação ou afirmação de um processo: ______________________________.
b) possibilidade ou hipótese de um processo: ____________________________.
c) ordem, pedido: __________________________________________________.
(LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978b, p. 33)
Apesar de os autores falarem da atitude assumida pelo falante, através do uso do verbo
nos três Modos verbais, eles não tratam do grau de comprometimento do falante perante o
enunciado. Portanto, classificamos como restrito o trabalho dos autores.
Faraco e Moura (1985a) trazem o texto ―Uma morena‖
129
, de Caio Fernando Abreu, e
a seguinte questão, que indícios da ligação entre a Modalidade e o posicionamento do
falante:
5. No texto predomina:
a. ( ) a objetividade, uma vez que a personagem emite julgamentos e pontos de
vista impessoais;
b. ( ) a subjetividade, já que a personagem emite julgamentos e pontos de vista
bastante pessoais.
(FARACO; MOURA, 1985a, p. 20)
Os autores poderiam ter pedido os elementos que dão subjetividade ao texto. A
intenção é trabalhar a função emotiva ou expressiva da linguagem, que revela opiniões e
emoções do falante.
Em 1990, Nicola (1993a) aborda a mesma função da linguagem e apresenta alguns
elementos que indicam essa função: interjeição, pessoa do singular, alguns sinais de
pontuação (reticências, ponto de exclamação). Observemos o que afirmam:
Quando a intenção do emissor é posicionar-se em relação ao tema que está
abordando, é expressar seus sentimentos e emoções, sempre resulta um texto
subjetivo, escrito em primeira pessoa. Dessa forma, o texto transforma-se num
espelho do ânimo, das emoções, do estado, enfim, do emissor. Nesse caso, trata-se
129
Ver texto no anexo 33.
160
da função emotiva ou expressiva da linguagem.
(NICOLA, 1993a, p. 34)
Os autores mostram uma canção para exemplificar a função emotiva e poderiam ter
aproveitado para explicar o quanto o emissor se compromete, qual o seu posicionamento
frente ao que diz:
Preciso aprender a ser
Ah! Se eu te pudesse fazer entender
Sem teu amor, eu não posso viver
Que sem nós dois, o que resta sou eu
Eu assim tão só
E eu preciso aprender a ser só
Poder dormir sem sentir teu calor
E ver que foi só um sonho e passou
[...]
(VALLE, Marcos & VALLE, Paulo Sérgio. In: MAIA, Tim. A arte de Tim Maia.
LP Polyfar, 2494 635, 1982, L. 2, f. 3.)
(NICOLA, 1993a, p. 35)
O autor da canção faz uso dos verbos modais poder e precisar, que denotam
(im)possibilidade/ necessidade. Não há outros exemplos na coleção que demonstrem essa
abordagem.
Para as duas últimas perguntas do roteiro: o autor do livro didático trabalha os usos/
funções dos verbos auxiliares modais (dever, poder, ter que...)?; o autor do livro didático
mostra que a Modalidade pode ser expressa pelo advérbio?, não encontramos evidências nos
livros didáticos que nos dessem uma resposta positiva. Exceção para os autores de 1970, e
apenas para a primeira pergunta (usos/ funções dos auxiliares modais), que trataram,
restritamente, desses auxiliares:
1 Eu tinha saído.
2Eu terei saído.
3Irá chover amanhã.
4Poderá chover amanhã.
5Tu deves sair.
Em todos esses enunciados você observa que uma combinação de verbos. De
acordo com sua compreensão de cada um dos enunciados, qual dos verbos
combinados é absolutamente indispensável para a manutenção do sentido de cada
uma das frases?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
De fato, são os verbos chover e sair que sustentam o sentido do predicado do
enunciado onde aparecem. São, como você pode ver, a _________ palavra da
combinação onde ocorrem. Esse tipo de verbo forma a classe dos verbos principais
em oposição à subclasse dos verbos auxiliares que ampliam o sentido dos
principais. Assim, em:
―Eu tinha saído‖, o verbo ter contribui para precisar que o processo de sair
aconteceu antes de um momento passado (Eu tinha saído quando você chegou);
―Eu terei saído‖, o verbo ter contribui para precisar que o processo de sair foi
161
anterior a um momento no futuro (Eu terei saído quando você chegar);
―Irá chover amanhã‖, o verbo ir indica que o processo de chover ocorrerá num
momento futuro àquele em que se está falando;
―Poderá chover‖, o verbo poder indica que o processo de chover não é certo, mas
possível;
―Deves sair‖, o verbo dever indica que o processo de sair constitui-se numa
obrigação a ser cumprida pelo interlocutor.
(LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1978b, p. 28)
A seguir, observaremos como foi o tratamento da Modalidade nos níveis Fundamental
e Médio, usando gráficos.
5.3.3. Modalidade: um estudo histórico de 1970 a 2000
Abaixo, visualizamos os gráficos 7 e 8, que apresentam as respostas sobre a
Modalidade, ao longo das décadas, nos níveis Fundamental e Médio:
Gráfico 7: respostas às questões sobre Modalidade, propostas no roteiro de análise Ensino Fundamental.
Gráfico 8: respostas às questões sobre Modalidade, propostas no roteiro de análise Ensino Médio.
162
No Ensino Fundamental, obtivemos 33,34% de respostas positivas na década de 2000,
enquanto, no Ensino Médio, não tivemos nenhuma. As respostas negativas diminuíram de
1990 para 2000 no Ensino Fundamental, mas aumentaram, progressivamente, no Ensino
Médio: 50% 1970; 66,66% 1980; 66,66% 1990; 83,34% 2000. Comparando os
resultados da Modalidade com os do Tempo e do Aspecto, notamos que as respostas
negativas diminuíram, significativamente, de 1970 a 2000 na abordagem do Tempo e do
Aspecto, tanto no Ensino Fundamental quanto no Ensino Médio, o que não ocorreu para a
Modalidade. As respostas parcialmente oscilaram no Ensino Fundamental (16,66% 1970;
0% 1980; 16,66% 1990; 33,34% 2000) e reduziram no Ensino Médio (50% 1970;
33,34% 1980; 33,34% 1990; 16,66% 2000). Mesmo na década atual, os resultados não
foram expressivos, o que demonstra que a Modalidade é deixada em segundo plano, no estudo
do verbo e do advérbio, pelos autores dos livros didáticos.
O bloco do roteiro de análise sobre a Modalidade foi elaborado com base em Givón
(1984, 1995, 2005), Almeida (1988) e Neves (2006). A partir desses autores, destacamos
como pontos principais para trabalhar a Modalidade: correlação entre os Modos verbais e o
contexto de uso; diferença entre Modo e Modalidade; efeitos de sentido provocados pela
escolha de determinadas formas verbais; ligação entre a Modalidade e o posicionamento do
falante; usos/ funções dos auxiliares modais e marcação da Modalidade pelo advérbio.
Todos os autores dos livros didáticos, de 1970 a 2000, associam os Modos verbais às
noções de certeza, incerteza e ordem/ pedido. Porém, como vimos no capítulo 3, na visão
funcionalista, a Modalidade é compreendida no contexto comunicativo, isto é, a forma
verbal em determinado Modo não é suficiente para expressar certeza, incerteza, ordem ou
pedido. Se pedíssemos a um aluno que identificasse a que Modo pertencem as formas
destacadas em: Estou chateada com a Lia. Será que devo ir à sua festa?/ Acho que você
não deveria ir, sem dúvida, ele responderia que o Modo é indicativo. No entanto, levando em
conta o contexto, percebemos que o verbo achar pode denotar a ideia de dúvida, assim como o
futuro do pretérito, que diz respeito a um fato incerto no futuro. Portanto, a forma é de
indicativo, mas o significado é de dúvida, ideia que é associada ao Modo subjuntivo.
Infelizmente, os autores dos livros não destacaram tal questão, importante para os alunos
perceberem a razão de estudarem os Modos.
Em relação à diferença entre Modo e Modalidade, somente os autores dos livros do
Ensino Fundamental de 2000 fazem a diferenciação, mas de forma implícita. A Modalidade
163
corresponde à atitude do falante frente ao que diz e tem natureza semântica. O Modo, de
natureza morfológica, é um dos meios de marcar a Modalidade. Cereja e Magalhães (2002a,
2006c) apresentam questões, por exemplo, com o futuro do pretérito e com o Modo
imperativo mais elementos modalizadores para atenuar um pedido. Por essas e outras
atividades que mostram a atitude do falante, seja pelo uso de determinado tempo ou Modo
verbais ou por meios de algumas expressões (eu acho que..., na minha opinião...), como
vimos no capítulo de análise, percebemos que os autores de 2000 (Ensino Fundamental),
restritamente, tratam da Modalidade.
Quanto aos efeitos de sentido provocados pela escolha de determinadas formas
verbais, isso é mais perceptivo nos livros de 2000, tanto no Ensino Fundamental quanto no
Ensino Médio. Os autores de 1970 a 1990 ressaltam tal questão nos livros do Ensino
Médio, concentrando-se no uso do Modo imperativo, principalmente, em anúncios/
propagandas, em que esse Modo é usado para convencer o interlocutor.os autores de 2000,
além de enfocar o uso do Modo imperativo, tratam do uso de verbos de significação plena, do
uso do futuro do pretérito, do uso do pretérito imperfeito ou mesmo do presente do indicativo
e do uso do Modo subjuntivo, para provocar atenuação de pedidos ou criar mundos
hipotéticos por meio da linguagem.
O posicionamento do falante perante o que diz é mostrado através: de expressões
como eu penso que, do meu ponto de vista, é preciso que, na minha opinião (autores de
2000 Ensino Fundamental); do uso dos três Modos verbais (autores de 1970 Ensino
Médio); uso do Modo imperativo função emotiva da linguagem (autores de 1980 e 1990
Ensino Médio). O trabalho dos autores é restrito, pois, apesar de falarem de julgamentos e
opiniões emitidos pelo falante por meio desses usos, não enfatizam o grau de
comprometimento, se é maior ou menor, quando se utilizam tais meios.
Os usos/ funções dos auxiliares modais ficaram em segundo plano para os autores dos
livros. Alguns autores (1970, 1990 e 2000) consideram modais como dever, ter que, poder e
precisar, contudo não trabalham a função desses auxiliares. O objetivo dos autores é exercitar
a forma e o conceito de verbos auxiliares. Da mesma forma, a marcação da Modalidade pelo
advérbio não é comentada por nenhum autor de livro didático. O uso de advérbios no
enunciado pode transmitir as noções semânticas de certeza, incerteza ou ordem/ pedido:
Estou preocupado, a Amanda deveria ter chegado. Será que ela vem?/ Certamente, ela
virá à festa ou Talvez ela venha à festa; Alô?/ Alô? Amanda? Onde você está?/ Estou
164
dirigindo./ Só falta você. Venha até a festa agora!.
Para resumir os resultados obtidos, para os dois níveis de ensino, chegamos ao gráfico
abaixo:
Gráfico 9: respostas positivas, negativas e parciais para a categoria Modalidade ao longo das décadas.
Vemos que respostas sim, só foram obtidas a partir de 2000 e, ainda, de forma mínima.
Houve um decréscimo das repostas negativas, passando de 66,66% em 1970, 83,34% em
1980, 75% em 1990 para 58,34% em 2000, redução mínima se compararmos com a categoria
Tempo (0% em 2000) e Aspecto (33,2% em 2000). A abordagem parcial da Modalidade foi
próxima em 1970 e 2000 (33,34% e 25%, respectivamente). Entre as três categorias, o Tempo
foi o mais trabalhado de forma significativa pelos autores, sendo a Modalidade a menos
trabalhada. No Ensino Médio, a Modalidade não foi explorada de maneira mais expressiva.
Um dos motivos para esse resultado pode ser o fato de haver mais pesquisas, no Brasil, sobre
o Tempo (e também sobre o Aspecto) nas décadas passadas (1970, 1980, 1990) do que sobre
a Modalidade, que tem sido bastante estudada na década atual.
Estudar a Modalidade, para além do Modo verbal, é fundamental para que o aluno não
limite o seu conhecimento aos Modos indicativo, subjuntivo e imperativo, associando-os às
noções de certeza, incerteza ou ordem/ pedido, respectivamente. Como discutimos, não
uma relação de um para um entre os Modos e as noções semânticas.
Considerações finais do capítulo
165
Neste capítulo, vimos como as categorias Tempo, Aspecto e Modalidade foram
tratadas pelos autores dos livros didáticos de 1970 a 2000. Discutimos as categorias em cada
nível de ensino e, depois, apresentamos, de modo global, como se deu a abordagem delas ao
longo das décadas, ilustrando com gráficos. A seguir, faremos as conclusões da pesquisa.
166
6. CONCLUSÕES
Nesta pesquisa, objetivamos mostrar como os autores de livros didáticos tratam as
categorias Tempo, Aspecto e Modalidade. Para isso, selecionamos livros didáticos de Língua
Portuguesa usados nas décadas de 1970, 1980, 1990 e 2000. Para a nossa análise,
consideramos a marcação das três categorias no uso do verbo e do advérbio. A seleção dos
livros foi baseada em dois critérios: (a) pesquisas que apresentaram os principais livros
utilizados, no período, pelas escolas brasileiras; (b) disponibilidade desses livros na Biblioteca
Pública Governador Menezes Pimentel (Fortaleza-CE).
Seguindo o viés do Funcionalismo e da Sociolinguística, teorias que concebem a
língua em seu uso e nas situações de interação, bem como reconhecem a sua heterogeneidade,
elaboramos um roteiro de análise dividido em três blocos: um sobre Tempo, um sobre
Aspecto e um sobre Modalidade.
No bloco sobre o Tempo, buscamos analisar se o autor do livro didático considerou a
diferença entre tempo verbal e tempo cronológico; se explicou que o Tempo pode ser inferido,
também, pelo uso de advérbios e pelo contexto; se explorou a categoria Tempo nos tipos/
gêneros textuais; se mostrou a relação dos adjuntos adverbiais com os tempos verbais para
marcar a temporalidade dos eventos e se trabalhou a função das formas verbais (uma forma >
mais de uma função; uma função > mais de uma forma).
No bloco sobre o Aspecto, verificamos se o autor do livro didático releva as noções de
telicidade, habitualidade, dinamicidade, duratividade, entre outras noções semânticas; se
diferencia o uso do perfeito e do imperfeito; se mostra os papéis do gerúndio e do particípio
para expressar os aspectos progressivo e conclusivo, respectivamente; se trabalha os usos/
funções dos auxiliares aspectuais, assim como os sufixos marcadores de Aspecto.
No bloco sobre a Modalidade, quisemos observar se o autor do livro didático
correlaciona o Modo verbal ao contexto de uso; se explica que diferença entre Modo e
Modalidade; se ressalta os efeitos de sentido provocados pelas escolhas que o falante faz e
pelo seu posicionamento frente ao que diz; se trabalha os usos/ funções dos auxiliares modais
e o uso de advérbios na expressão da Modalidade.
A partir desses pontos, analisamos cada livro, comparando cada nível de ensino e
167
década. Ao longo das décadas, algumas mudanças são perceptíveis claramente nos livros
didáticos, como a apresentação gráfica e o trabalho com textos. Nos livros de 1970 e 1980,
são poucas as cores e ilustrações; em 1990 e 2000, os autores trazem bastantes ilustrações
(gravuras, gráficos, quadrinhos, tirinhas, recortes de jornais e revistas, propagandas...), que
colaboram com a execução das atividades e alcance dos objetivos, além de títulos e subtítulos
ficarem em evidência com tamanhos e formas diferentes. De acordo com o PNLD/ 2008
(2007) e o PNLEM/ 2009 (2008), o projeto gráfico-editorial tem sua importância, pois auxilia
na compreensão e enriquecimento dos textos, na localização de informações e no descanso
visual quando os textos são longos. O trabalho com os textos é notado na década de 1980,
mas de forma superficial. Nas atividades linguísticas, são utilizadas frases que estão no texto
para que os alunos identifiquem e classifiquem as classes gramaticais. Nas décadas de 1990 e
2000, encontramos, ainda, exercícios dessa natureza, mas foi possível identificar questões que
trabalham a funcionalidade da ngua a partir do texto apresentado. Principalmente, em 2000,
em que são explorados diversos gêneros textuais.
No entanto, nosso objetivo foi observar o tratamento dado ao Tempo, ao Aspecto e à
Modalidade no estudo do verbo e do advérbio. As mudanças em relação a esse tratamento não
foram tão fáceis de perceber como as acima mencionadas. Os autores de 1970 e 1980
priorizam, demasiadamente, a forma, explorando nomenclatura (do verbo e do advérbio),
apresentando vários quadros com modelos de conjugação, além de exercícios de mera
classificação, identificação e conjugação das formas. No Ensino Médio, pudemos identificar
um trabalho significativo em alguns pontos (como o trabalho com: as noções semânticas do
Aspecto; a diferença de uso entre o perfeito e o imperfeito; os efeitos de sentido provocados
pelas escolhas que o falante faz e pelo seu posicionamento frente ao que diz; os auxiliares
modais), porém, parcialmente. Foram as décadas para as quais obtivemos o maior número de
respostas negativas para as perguntas do roteiro, tanto no Ensino Fundamental quanto no
Ensino Médio.
Os autores de 1990 e 2000, embora tenham como prioridade a forma (exposição de
conceitos, uso de nomenclatura, aplicação da teoria em exercícios), não trabalham,
exaustivamente, as conjugações e as classificações. Os autores abrem espaço para um
estudo reflexivo e voltado para o uso da língua os de 1990, de forma bem restrita; os de
2000 buscam analisar o funcionamento das estruturas linguísticas na construção do texto.
Nessas décadas, obtivemos um número significativo de respostas de um trabalho parcial com
168
as categorias Tempo, Aspecto e Modalidade, nos dois níveis de ensino. Apesar de as
categorias serem tratadas parcialmente, em relação à maioria dos pontos analisados nos livros,
isso demonstra que os autores se preocupam em motivar o aluno a refletir sobre o uso de
determinados recursos linguísticos, reflexão que o auxiliará na produção de texto.
O Tempo foi a categoria explorada (todos os itens do roteiro) de maneira mais
expressiva nas décadas de 1990 e 2000. Nas décadas de 1970 e 1980, o trabalho limita-se ao
aprendizado das conjugações. Contudo, a diferença entre tempo verbal e tempo cronológico
precisa ser mais explorada em atividades, assim como a marcação de Tempo por verbos,
advérbios e pelo contexto, além de haver necessidade de os autores tecerem comentários e
darem exemplos. Se trabalham esses itens nas atividades, é importante que explanem também.
No tocante aos gêneros e tipos textuais (mais explorados na década de 2000), o uso do
Tempo, enquanto recurso linguístico, deve ser mais ressaltado. O trabalho com os adjuntos
adverbiais de tempo deve abranger a função de localizar eventos no tempo. Alguns autores
abordam essa questão, mas não exercitam; outros exercitam, todavia, não trazem
considerações no tópico de análise linguística. O mesmo ocorre com a correlação forma-
função, que é explorada em exercícios (principalmente, em 2000), no entanto, ao tratarem de
variação linguística, os autores não comentam a respeito da variação entre as formas verbais.
Quanto ao Aspecto, no Ensino Fundamental, somente alguns itens (diferença de uso
entre o perfeito e o imperfeito; aspecto conclusivo do particípio) foram salientados pelos
autores de 1970 e 1980 e todos os itens pelos autores de 1990 e 2000 (parcialmente); no
Ensino Médio, os autores (nas quatro décadas) trabalharam, parcial e positivamente, os itens:
noções semânticas aspectuais; uso do perfeito e do imperfeito; aspecto conclusivo do
particípio e aspecto progressivo do gerúndio; alguns auxiliares aspectuais. As noções
aspectuais que mais apareceram, em atividades, no Ensino Fundamental foram:
progressividade, repetição, duratividade, continuidade, telicidade; no Ensino Médio:
telicidade, habitualidade, dinamicidade. Essa categoria foi pouco trabalhada nos dois níveis de
ensino. Por alguns exercícios, notamos que os autores reconhecem a categoria Aspecto, mas
não exploram, profundamente, suas noções semânticas. É algo a ser mudado. Em relação aos
pretéritos perfeito e imperfeito, os alunos são levados a apenas perceberem a diferença de
conjugação e a reconhecerem tais pretéritos no Ensino Fundamental; no Ensino Médio, em
1970 e 1990, é dada relevância à diferença de uso entre eles, mas sem exercícios, em 1980,
não indícios e, em 2000, é trabalhado superficialmente. Outro ponto a ser revisto pelos
169
autores de livros didáticos. As noções aspectuais expressas pelo gerúndio e particípio ou os
autores destacam nas explicações ou nos exercícios, somente os autores de 2000, no Ensino
Médio, tanto explicam quanto exercitam. Pontos que ficaram a desejar em todos os autores
foram: os auxiliares aspectuais e os sufixos marcadores de Aspecto.
A Modalidade foi a categoria menos evidenciada pelos autores. Mesmo na década
atual, não pudemos perceber um trabalho significativo. O resultado para essa categoria é
preocupante, uma vez que a Modalidade corresponde à atitude do falante na situação de
interação. A mudança que, de fato, necessita ocorrer é no trabalho com essa categoria, que é
ressaltada nos livros didáticos de ngua estrangeira. Os autores continuam a associar os
Modos indicativo, subjuntivo e imperativo à certeza, incerteza e ordem, sem considerar o
contexto de uso. A diferença entre Modo e Modalidade só pôde ser identificada nos livros dos
autores de 2000 e, ainda, parcialmente. Os efeitos de sentido provocados pela escolha de
determinadas formas somente são mostrados, em exercícios, pelos autores de 2000 no Ensino
Fundamental e no Ensino Médio; nas outras décadas, apenas no Ensino Médio, identificamos
um trabalho restrito quando os autores abordam as funções da linguagem. O mesmo ocorre
com a relação entre a Modalidade e o posicionamento do falante. O uso/ função dos auxiliares
modais e a expressão da Modalidade por meio de advérbios foram deixados de lado. Mais
questões que precisam ser desenvolvidas nos livros didáticos.
A falta de equilíbrio entre explanação de um tema linguístico e exercícios sobre o
mesmo, levou-nos a dar respostas parciais ou negativas para as perguntas do roteiro nas três
categorias: ou os autores explanam o tema e não exercitam ou exercitam e não explanam ou
fazem os dois superficialmente. Se há o destaque de uma das categorias em estudo nas
atividades, por exemplo, por que não considerá-la na explicação do tópico linguístico
130
? Isso
merece ser revisto pelos autores.
Pelo que foi apresentado, nesta Dissertação, sugerimos que os autores de livros
didáticos (e os professores) tragam exercícios em que os alunos possam reconhecer a variação
das formas verbais e relacioná-la à situação comunicativa, por exemplo, quando usar a
perífrase verbal, a forma simples de futuro do presente ou o presente do indicativo para
expressar futuro (em situações mais ou menos formais). É imprescindível trabalhar a análise
linguística em textos, não retirando frases destes para que o aluno mude a conjugação verbal
130
Como tópico linguístico, estamos considerando: verbo, advérbio, adjuntos adverbiais...
170
ou reconheça e classifique o advérbio, mas para que ele reflita como o texto foi construído a
partir do uso das categorias TAM, por quais formas (verbos, advérbios, sufixos, auxiliares...)
essas categorias estão representadas e como o uso delas influi na interpretação do texto. Esse
trabalho com textos é uma oportunidade de apresentar para o aluno os mais diversos gêneros
textuais (além da observação de que sequência tipo textual está dentro do gênero) e
explorar, por exemplo, os efeitos de sentido provocados pela escolha de tempos e modos pelo
falante, assim como o seu posicionamento perante o que diz; o uso do imperativo com marcas
de atenuação ou asseveração, como utiliza o verbo (também sufixos marcadores de Aspecto,
auxiliares aspectuais) para exprimir progressividade, habitualidade, dinamicidade,
duratividade etc. Pode-se, ainda, trabalhar textos em que apareçam: verbos com sufixos
marcadores de Aspecto para que o aluno perceba as noções semânticas que eles denotam;
auxiliares modais e aspectuais para exercitar seus usos/funções; os pretéritos perfeito e
imperfeito para que o aluno note a diferença de uso. Também, os livros carecem de atividades
em que o Tempo (e o Modo) seja inferido pelo contexto ou pelo uso de advérbios de tempo, o
que ajuda o aluno a entender a aplicabilidade do verbo e do advérbio.
A nossa pesquisa poderá contribuir para a produção de material didático apropriado ao
ensino de Língua Portuguesa, visto que apontamos alguns aspectos que devem ser explorados
no trabalho com as categorias TAM, a partir de situações reais de uso da ngua, pois o aluno
precisa saber utilizar verbos e advérbios nessas situações, variando seu estilo de acordo com a
sua intenção, além de conhecer a estrutura. Pelo percurso que fizemos, da década de 1970 à
década de 2000, é possível apontar o que precisa ser melhorado ou abordado pelos autores dos
livros (como citamos acima). Queremos provocar reflexões a respeito da abordagem, das
referidas categorias, feita pelos autores dos livros didáticos no estudo do verbo e do advérbio.
Sabendo que esta pesquisa não finda aqui e que muito o que dizer, para futuros
trabalhos, propomos analisar se o uso de TAM é condicionado pelo tipo de texto (observar,
nos livros, a parte referente ao trabalho com interpretação de textos); como os autores
trabalham a produção de texto, envolvendo a escrita de diversos gêneros e o uso de TAM;
verificar se os autores de livros didáticos mencionam algum tipo de relação entre sociedade
ou características sociais do indivíduo e uso de TAM. São apenas alguns tópicos de análise
que podem ser subsidiados pelo Funcionalismo e pela Sociolinguística.
De forma indireta, essa pesquisa atingirá os professores de Língua Portuguesa, que
terão a oportunidade de avaliar o material que têm em mãos no dia-a-dia de sala de aula.
171
Afinal, o livro didático é o principal instrumento de trabalho do professor, por isso, é preciso
que os docentes saibam selecioná-los e utilizá-los, analisando aspectos conceituais,
metodológicos e éticos, como orientam os programas oficiais do livro didático.
172
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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______. Português: linguagens, 8º ano. v. 3. 3. ed. São Paulo: Atual, 2006c.
178
______. Português: linguagens, 9º ano. v. 4. 3. ed. São Paulo: Atual, 2006d.
______. Português: linguagens: ensino médio. v. 1. 5. ed. São Paulo: Atual, 2005a.
______. Português: linguagens: ensino médio. v. 2. 5. ed. São Paulo: Atual, 2005b.
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FERREIRA, R. M. Estudo dirigido de português: 1º grau, 5ª série. São Paulo: Ática, 1977.
______. Estudo dirigido de português: 1º grau, 6ª série. São Paulo: Ática, 1974.
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comunicação e expressão: 2º grau. v. 1. São Paulo: Ática, 1977a.
______. Caminhos da linguagem: área de comunicação e expressão: grau. v. 2. São
Paulo: Ática, 1977b.
______. Caminhos da linguagem: área de comunicação e expressão: grau. v. 3. São
Paulo: Ática, 1978.
MARTINS, J. F. Comunicação e expressão em português: 1º grau, 7ª série. v. 3. São Paulo:
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MEGALE, H; MATSUOKA, M. Linguagem, leitura e produção de texto: comunicação e
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expressão em língua nacional: 1º grau, 5ª série. v. 1. São Paulo: FTD, 1983a.
______. Linguagem, leitura e produção de texto: comunicação e expressão em língua
nacional: 1º grau, 6ª série. v. 2. São Paulo: FTD, 1983b.
______. Linguagem, leitura e produção de texto: comunicação e expressão em língua
nacional: 1º grau, 7ª série. v. 3. São Paulo: FTD, 1983c.
______. Linguagem, leitura e produção de texto: comunicação e expressão em língua
nacional: 1º grau, 8ª série. v. 4. São Paulo: FTD, 1983d.
NICOLA, J. Língua, literatura & redação. v. 1. 2. ed. São Paulo: Scipione, 1993a.
______. Língua, literatura & redação. v. 2. 2. ed. São Paulo: Scipione, 1993b.
______. Língua, literatura & redação. v. 3. 2. ed. São Paulo: Scipione, 1993c.
______; INFANTE, U. Português: palavras & idéias, 5ª série. v. 1. 3. ed. São Paulo:
Scipione, 1996a.
______; INFANTE, U. Português: palavras & idéias, 6ª série. v. 2. 5. ed. São Paulo:
Scipione, 1996b.
______; INFANTE, U. Português: palavras & idéias, série. v. 3. São Paulo: Scipione,
1990.
______; INFANTE, U. Português: palavras & idéias, 8ª série. v. 4. 3. ed. São Paulo:
Scipione, 1995.
180
ANEXOS
181
ANEXO 1
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006d, p. 109)
182
ANEXO 2
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 229)
183
ANEXO 3
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 92)
184
ANEXO 4
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 218)
185
ANEXO 5
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006c, p. 58)
186
ANEXO 6
Leia este texto do poeta gaúcho Mário Quintana:
Tão simplesmente
Tudo se fazia tão simplesmente:
as chinoquinhas pintavam as faces
com papel de seda vermelho,
os negrinhos tocavam pente
com papel de seda branco,
as mocinhas da casa punham papelotes
antes de irem dormir...
e aplicava-se a Maravilha Curativa
para todas as dores
menos para as dores de amores,
que já eram as mesmas de sempre!
(NICOLA; INFANTE, 1990, p. 139)
187
ANEXO 7
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 247)
188
ANEXO 8
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 248)
189
ANEXO 9
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006d, p. 99)
190
ANEXO 10
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p.63)
191
ANEXO 11
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 65)
192
ANEXO 12
NOITE DE SÃO JOÃO
Bernardo Élis
(ÉLIS, Bernardo. Noite de São João. In: ______. Seleta. 2. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1976, p. 35-39)
(FARACO; MOURA, 1985a, p. 67)
193
ANEXO 13
Texto E
Cântico do calvário
à memória de meu Filho
morto a 11 de dezembro de 1863
Eras na vida a pomba predileta
Que sobre um mar de angústias conduzia
O ramo da esperança. Eras a estrela
Que entre as névoas do inverno cintilava
Apontando o caminho ao pegureiro.
Eras a messe de um dourado estio.
Eras o idílio de um amor sublime.
Eras a glória, a inspiração, a pátria,
O porvir de teu pai! Ah! no entanto,
Pomba, - varou-te a flecha do destino!
Astro, engoliu-te o temporal do norte!
Teto, caíste! Crença, já não vives!
Correi, correi, oh! lágrimas saudosas,
Legado acerbo da ventura extinta,
Dúbios archotes que a tremer clareiam
A lousa fria de um sonhar que é morto!
(...)
(VARELA, Fagundes. In: Poemas de Fagundes Varela. o Paulo, INL/Cultrix, 1971. p. 67-8)
(NICOLA, 1993b, p. 92)
194
ANEXO 14
Leia este conto, de Machado de Assis:
Noite de almirante
Deolindo Venta-Grande (era uma alcunha de bordo) saiu do arsenal de marinha e enfiou pela rua de
Bragança. Batiam três horas da tarde. Era a fina flor dos marujos e, de mais, levava um grande ar de felicidade
nos olhos. A corveta dele voltou de uma longa viagem de instrução, e Deolindo veio à terra tão depressa
alcançou licença. Os companheiros disseram-lhe, rindo:
- Ah! Venta-Grande! Que noite de almirante vai você passar! ceia, viola e os braços de Genoveva.
Colozinho de Genoveva...
Deolindo sorriu. Era assim mesmo, uma noite de almirante, como eles dizem, uma dessas grandes noites
de almirante que o esperava em terra. Começara a paixão três meses antes de sair a corveta. Chamava-se
Genoveva, caboclinha de vinte anos, esperta, olho negro e atrevido. Encontraram-se em casa de terceiro e
ficaram morrendo um pelo outro, a tal ponto que estiveram prestes a dar uma cabeçada, ele deixaria o serviço e
ela o acompanharia para a vila mais recôndita do interior.
A velha Inácia, que morava com ela, dissuadiu-os disso; Deolindo não teve remédio senão seguir em
viagem de instrução. Eram oito ou dez meses de ausência. Como fiança recíproca, entenderam dever fazer um
juramento de fidelidade.
- Juro por Deus que está no céu. E você?
- Eu também.
- Diz direito.
- Juro por Deus que está no céu; a luz me falte na hora da morte.
Estava celebrado o contrato. Não havia descrer da sinceridade de ambos; ela chorava doidamente, ele
mordia o beiço para dissimular. Afinal separaram-se, Genoveva foi ver sair a corveta e voltou para casa com um
tal aperto no coração que parecia que "lhe ia dar uma coisa". Não lhe deu nada, felizmente; os dias foram
passando, as semanas, os meses, dez meses, ao cabo dos quais, a corveta tornou e Deolindo com ela.
Lá vai ele agora, pela rua de Bragança, Prainha e Saúde, até ao princípio da Gamboa, onde mora
Genoveva. A casa é uma rotulazinha escura, portal rachado do sol, passando o cemitério dos Ingleses; deve
estar Genoveva, debruçada à janela, esperando por ele. Deolindo prepara uma palavra que lhe diga. formulou
esta: "Jurei e cumpri", mas procura outra melhor. Ao mesmo tempo lembra as mulheres que viu por esse mundo
de Cristo, italianas, marselhesas ou turcas, muitas delas bonitas, ou que lhe pareciam tais. Concorda que nem
todas seriam para os beiços dele, mas algumas eram, e nem por isso fez caso de nenhuma. pensava em
Genoveva. A mesma casinha dela, tão pequenina, e a mobília de pé quebrado, tudo velho e pouco, isso mesmo
lhe lembrava diante dos palácios de outras terras. Foi à custa de muita economia que comprou em Trieste um par
de brincos, que leva agora no bolso com algumas bugigangas. E ela que lhe guardaria? Pode ser que um lenço
marcado com o nome dele e uma âncora na ponta, porque ela sabia marcar muito bem. Nisto chegou à Gamboa,
passou o cemitério e deu com a casa fechada. Bateu, falou-lhe uma voz conhecida, a da velha Inácia, que veio
abrir-lhe a porta com grandes exclamações de prazer. Deolindo, impaciente, perguntou por Genoveva.
- Não me fale nessa maluca, arremeteu a velha. Estou bem satisfeita com o conselho que lhe dei. Olhe
se fugisse. Estava agora como o lindo amor.
- Mas que foi? que foi?
A velha disse-lhe que descansasse, que não era nada, uma dessas coisas que aparecem na vida; não valia a
pena zangar-se. Genoveva andava com a cabeça virada...
- Mas virada por quê?
- Está com um mascate, José Diogo. Conheceu José Diogo, mascate de fazendas? Está com ele. Não
imagina a paixão que eles m um pelo outro. Ela então anda maluca. Foi o motivo da nossa briga. José Diogo
não me saía da porta; eram conversas e mais conversas, até que eu um dia disse que não queria a minha casa
difamada. Ah! meu pai do céu! foi um dia de juízo. Genoveva investiu para mim com uns olhos deste tamanho,
dizendo que nunca difamou ninguém e não precisava de esmolas. Que esmolas, Genoveva? O que digo é que não
quero esses cochichos à porta, desde as aves-marias... Dois dias depois estava mudada e brigada comigo.
- Onde mora ela?
- Na praia Formosa, antes de chegar à pedreira, uma rótula pintada de novo.
Deolindo não quis ouvir mais nada. A velha Inácia, um tanto arrependida, ainda lhe deu avisos de
prudência, mas ele não os escutou e foi andando. Deixo de notar o que pensou em todo o caminho; não pensou
nada. As idéias marinhavam-lhe no cérebro, como em hora de temporal, no meio de uma confusão de ventos e
apitos. Entre elas rutilou a faca de bordo, ensangüentada e vingadora. Tinha passado a Gamboa, o Saco do
Alferes, entrara na praia Formosa. Não sabia o número de casa, mas era perto da pedreira, pintada de novo, e
com auxílio da vizinhança poderia achá-la. Não contou com o acaso que pegou de Genoveva e -la sentar à
195
janela, cosendo, no momento em que Deolindo ia passando. Ele conheceu-a e parou; ela, vendo o vulto de um
homem, levantou os olhos e deu com o marujo.
- Que é isso? exclamou espantada. Quando chegou? Entre, seu Deolindo.
E, levantando-se, abriu a tula e fê-lo entrar. Qualquer outro homem ficaria alvoroçado de esperanças,
tão francas eram as maneiras da rapariga; podia ser que a velha se enganasse ou mentisse; podia ser mesmo que a
cantiga do mascate estivesse acabada. Tudo isso lhe passou pela cabeça, sem a forma precisa do raciocínio ou da
reflexão, mas em tumulto e rápido. Genoveva deixou a porta aberta, -lo sentar-se, pediu-lhe notícias da viagem
e achou-o mais gordo; nenhuma comoção nem intimidade. Deolindo perdeu a última esperança. Em falta de faca,
bastavam-lhe as mãos para estrangular Genoveva, que era um pedacinho de gente, e durante os primeiros
minutos não pensou em outra coisa.
- Sei tudo, disse ele.
- Quem lhe contou?
Deolindo levantou os ombros.
- Fosse quem fosse, tornou ela, disseram-lhe que eu gostava muito de um moço?
- Disseram.
- Disseram a verdade.
Deolindo chegou a ter um ímpeto; ela -lo parar com a ação dos olhos. Em seguida disse que, se lhe
abrira a porta, é porque contava que era homem de juízo. Contou-lhe então tudo, as saudades que curtira, as
propostas do mascate, as suas recusas, até que um dia, sem saber como, amanhecera gostando dele.
- Pode crer que pensei muito e muito em você. Sinhá Inácia que lhe diga se não chorei muito... Mas o
coração mudou... Mudou... Conto-lhe tudo isto, como se estivesse diante do padre, concluiu sorrindo.
Não sorria de escárnio. A expressão das palavras é que era uma mescla de candura e cinismo, de
insolência e simplicidade, que desisto de definir melhor. Creio até que insolência e cinismo são mal aplicados.
Genoveva não se defendia de um erro ou de um perjúrio; não se defendia de nada; faltava-lhe o padrão moral das
ações. O que dizia, em resumo, é que era melhor não ter mudado, dava-se bem com a afeição do Deolindo, a
prova é que quis fugir com ele; mas, uma vez que o mascate venceu o marujo, a razão era do mascate, e cumpria
declará-lo. Que vos parece? O pobre marujo citava o juramento de despedida, como uma obrigação eterna, diante
da qual consentira em não fugir e embarcar: "Juro por Deus que está no céu; a luz me falte na hora da morte". Se
embarcou, foi porque ela lhe jurou isso. Com essas palavras é que andou, viajou, esperou e tornou; foram elas
que lhe deram a força de viver. Juro por Deus que está no céu; a luz me falte na hora da morte...
- Pois, sim, Deolindo, era verdade. Quando jurei, era verdade. Tanto era verdade que eu queria fugir com
você para o sertão. Deus sabe se era verdade! Mas vieram outras coisas... Veio este moço e eu comecei a
gostar dele...
- Mas a gente jura é para isso mesmo; é para não gostar de mais ninguém...
- Deixa disso, Deolindo. Então você só se lembrou de mim? Deixa de partes...
- A que horas volta José Diogo?
- Não volta hoje.
- Não?
- Não volta; está lá para os lados de Guaratiba com a caixa; deve voltar sexta-feira ou sábado... E por que
é que você quer saber? Que mal lhe fez ele?
Pode ser que qualquer outra mulher tivesse igual palavra; poucas lhe dariam uma expressão tão ndida,
não de propósito, mas involuntariamente. Vede que estamos aqui muito próximos da natureza. Que mal lhe fez
ele? Que mal lhe fez esta pedra que caiu de cima? Qualquer mestre de física lhe explicaria a queda das pedras.
Deolindo declarou, com um gesto de desespero, que queria matá-lo. Genoveva olhou para ele com desprezo,
sorriu de leve e deu um muxoxo; e, como ele lhe falasse de ingratidão e perjúrio, não pôde disfarçar o pasmo.
Que perjúrio? que ingratidão? lhe tinha dito e repetia que quando jurou era verdade. Nossa Senhora, que ali
estava, em cima da cômoda, sabia se era verdade ou não. Era assim que lhe pagava o que padeceu? E ele que
tanto enchia a boca de fidelidade, tinha-se lembrado dela por onde andou?
A resposta dele foi meter a mão no bolso e tirar o pacote que lhe trazia. Ela abriu-o, aventou as
bugigangas, uma por uma, e por fim deu com os brincos. Não eram nem poderiam ser ricos; eram mesmo de mau
gosto, mas faziam uma vista de todos os diabos. Genoveva pegou deles, contente, deslumbrada, mirou-os por um
lado e outro, perto e longe dos olhos, e afinal enfiou-os nas orelhas; depois foi ao espelho de pataca, suspenso na
parede, entre a janela e a rótula, para ver o efeito que lhe faziam. Recuou, aproximou-se, voltou a cabeça da
direita para a esquerda e da esquerda para a direita.
- Sim, senhor, muito bonitos, disse ela, fazendo uma grande mesura de agradecimento. Onde é que
comprou?
Creio que ele não respondeu nada, não teria tempo para isso, porque ela disparou mais duas ou três
perguntas, uma atrás da outra, tão confusa estava de receber um mimo a troco de um esquecimento. Confusão de
cinco ou quatro minutos; pode ser que dois. Não tardou que tirasse os brincos, e os contemplasse e pusesse na
caixinha em cima da mesa redonda que estava no meio da sala. Ele pela sua parte começou a crer que, assim
196
como a perdeu, estando ausente, assim o outro, ausente, podia também perdê-la; e, provavelmente, ela não lhe
jurara nada.
- Brincando, brincando, é noite, disse Genoveva.
Com efeito, a noite ia caindo rapidamente. não podiam ver o hospital dos Lázaros e mal distinguiam a
ilha dos Melões; as mesmas lanchas e canoas, postas em seco, defronte da casa, confundiam-se com a terra e o
lodo da praia. Genoveva acendeu uma vela. Depois foi sentar-se na soleira da porta e pediu-lhe que contasse
alguma coisa das terras por onde andara. Deolindo recusou a princípio; disse que se ia embora, levantou-se e deu
alguns passos na sala. Mas o demônio da esperança mordia e babujava o coração do pobre diabo, e ele voltou a
sentar-se, para dizer duas ou três anedotas de bordo. Genoveva escutava com atenção. Interrompidos por uma
mulher da vizinhança, que ali veio, Genoveva -la sentar-se também para ouvir "as bonitas histórias que o Sr.
Deolindo estava contando". Não houve outra apresentação. A grande dama que prolonga a vigília para concluir a
leitura de um livro ou de um capítulo, não vive mais intimamente a vida dos personagens do que a antiga amante
do marujo vivia as cenas que ele ia contando, tão livremente interessada e presa, como se entre ambos não
houvesse mais que uma narração de episódios. Que importa à grande dama o autor do livro? Que importava a
esta rapariga o contador dos episódios?
A esperança, entretanto, começava a desampará-lo e ele levantou-se definitivamente para sair. Genoveva
não quis deixá-lo sair antes que a amiga visse os brincos, e foi mostrar-lhos com grandes encarecimentos. A
outra ficou encantada, elogiou-os muito, perguntou se os comprara em França e pediu a Genoveva que os
pusesse.
- Realmente, são muito bonitos.
Quero crer que o próprio marujo concordou com essa opinião. Gostou de os ver, achou que pareciam
feitos para ela e, durante alguns segundos, saboreou o prazer exclusivo e superfino de haver dado um bom
presente; mas foram só alguns segundos.
Como ele se despedisse, Genoveva acompanhou-o até à porta para lhe agradecer ainda uma vez o mimo, e
provavelmente dizer-lhe algumas coisas meigas e inúteis. A amiga, que deixara ficar na sala, apenas lhe ouviu
esta palavra: "Deixa disso, Deolindo"; e esta outra do marinheiro: "Voverá." Não pôde ouvir o resto, que não
passou de um sussurro.
Deolindo seguiu, praia fora, cabisbaixo e lento, não já o rapaz impetuoso da tarde, mas com um ar velho e
triste, ou, para usar outra metáfora de marujo, como um homem "que vai do meio caminho para terra". Genoveva
entrou logo depois, alegre e barulhenta. Contou à outra a anedota dos seus amores marítimos, gabou muito o
gênio do Deolindo e os seus bonitos modos; a amiga declarou achá-lo grandemente simpático.
- Muito bom rapaz, insistiu Genoveva. Sabe o que ele me disse agora?
- Que foi?
- Que vai matar-se.
- Jesus!
- Qual o quê! Não se mata, não. Deolindo é assim mesmo; diz as coisas, mas não faz. Você verá que não
se mata. Coitado, são ciúmes. Mas os brincos são muito engraçados.
- Eu aqui ainda não vi destes.
- Nem eu, concordou Genoveva, examinando-os à luz. Depois guardou-os e convidou a outra a coser. -
Vamos coser um bocadinho, quero acabar o meu corpinho azul...
A verdade é que o marinheiro não se matou. No dia seguinte, alguns dos companheiros bateram-lhe no
ombro, cumprimentando-o pela noite de almirante, e pediram-lhe notícias de Genoveva, se estava mais bonita, se
chorara muito na ausência, etc. Ele respondia a tudo com um sorriso satisfeito e discreto, um sorriso de pessoa
que viveu uma grande noite. Parece que teve vergonha da realidade e preferiu mentir.
(Histórias sem data. São Paulo: Ática, 1998, p. 115-120)
alcunha: nome acessório ou qualificativo (geralmente sarcástico ou irônico) que se atribui a alguém por efeito de sua
atividade profissional, defeito físico ou moral.
candura: qualidade de cândido, puro, ingênuo, inocente.
colo: parte do corpo formada pelo pescoço e pelos ombros.
corveta: navio de guerra leve e rápido.
fiança: ação ou efeito de fiar ou abonar; aval.
marcar: bordar o nome ou as letras iniciais do nome de alguém.
mascate: vendedor(a) ambulante de quinquilharias.
pataca: antiga moeda de prata de pequeno valor.
recôndita: oculta, escondida.
rótula: gelosia; grade de ripas que guarnece algumas janelas e portas.
rutilar: tornar rútilo, brilhante.
venta: narina, nariz.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 130-133)
197
ANEXO 15
Leia esta crônica, de Fernando Sabino:
A última crônica
A caminho de casa, entro num botequim da Gávea para tomar um café junto ao balcão. Na realidade
estou adiando o momento de escrever. A perspectiva me assusta. Gostaria de estar inspirado, de coroar com êxito
mais um ano nesta busca do pitoresco ou do irrisório no cotidiano de cada um. Eu pretendia apenas recolher da
vida diária algo de seu disperso conteúdo humano, fruto da convivência, que a faz mais digna de ser
vivida. Visava ao circunstancial, ao episódico. Nesta perseguição do acidental, quer num flagrante de esquina,
quer nas palavras de uma criança ou num acidente doméstico, torno-me simples espectador e perco a noção do
essencial. Sem mais nada para contar, curvo a cabeça e tomo meu café, enquanto o verso do poeta se repete na
lembrança: "assim eu quereria o meu último poema". Não sou poeta e estou sem assunto. Lanço então um último
olhar fora de mim, onde vivem os assuntos que merecem uma crônica.
Ao fundo do botequim um casal de pretos acaba de sentar-se, numa das últimas mesas de mármore ao
longo da parede de espelhos. A compostura da humildade, na contenção de gestos e palavras, deixa-se
acrescentar pela presença de uma negrinha de seus três anos, laço na cabeça, toda arrumadinha no vestido pobre,
que se instalou também à mesa: mal ousa balançar as perninhas curtas ou correr os olhos grandes de curiosidade
ao redor. Três seres esquivos que compõem em torno à mesa a instituição tradicional da família, célula da
sociedade. Vejo, porém, que se preparam para algo mais que matar a fome.
Passo a observá-los. O pai, depois de contar o dinheiro que discretamente retirou do bolso, aborda o
garçom, inclinando-se para trás na cadeira, e aponta no balcão um pedaço de bolo sob a redoma. A mãe limita-se
a ficar olhando imóvel, vagamente ansiosa, como se aguardasse a aprovação do garçom. Este ouve, concentrado,
o pedido do homem e depois se afasta para atendê-lo. A mulher suspira, olhando para os lados, a reassegurar-se
da naturalidade de sua presença ali. A meu lado o garçom encaminha a ordem do freguês. O homem atrás do
balcão apanha a porção do bolo com a mão, larga-o no pratinho -- um bolo simples, amarelo-escuro, apenas uma
pequena fatia triangular.
A negrinha, contida na sua expectativa, olha a garrafa de Coca-Cola e o pratinho que o garçom deixou à
sua frente. Por que não começa a comer? Vejo que os três, pai, mãe e filha, obedecem em torno à mesa um
discreto ritual. A mãe remexe na bolsa de plástico preto e brilhante, retira qualquer coisa. O pai se mune de uma
caixa de fósforos, e espera. A filha aguarda também, atenta como um animalzinho. Ninguém mais os observa
além de mim.
São três velinhas brancas, minúsculas, que a mãe espeta
caprichosamente na fatia do bolo. E enquanto ela serve a Coca-
Cola, o pai risca o fósforo e acende as velas. Como a um gesto
ensaiado, a menininha repousa o queixo no mármore e sopra com
força, apagando as chamas. Imediatamente põe-se a bater palmas,
muito compenetrada, cantando num balbucio, a que os pais se
juntam, discretos: "parabéns pra você, parabéns pra
você..." Depois a mãe recolhe as velas, torna a guardá-las na
bolsa. A negrinha agarra finalmente o bolo com as duas mãos
sôfregas e põe-se a comê-lo. A mulher está olhando para ela com
ternura ajeita-lhe a fitinha no cabelo crespo, limpa o farelo de
bolo que lhe cai ao colo. O pai corre os olhos pelo botequim,
satisfeito, como a se convencer intimamente do sucesso da
celebração. comigo de súbito, a observá-lo, nossos olhos se
encontram, ele se perturba, constrangido vacila, ameaça abaixar a cabeça, mas acaba sustentando o olhar e
enfim se abre num sorriso.
Assim eu quereria minha última crônica: que fosse pura como esse sorriso.
(Fernando Sabino. In: Para gostar de ler. São Paulo: Ática, 1979-1980. v. 5, p. 40-2)
circunstancial: relativo à situação, estado ou condição de coisa(s) ou pessoa(s) em determinado momento.
contenção: ato de conter-se, manter-se dentro de certos limites, controlar.
pitoresco: divertido, original.
redoma: cúpula de vidro usada para proteger certos objetos ou resguardar alimentos.
sôfrego: apressado, impaciente.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005c, p. 70-71)
198
ANEXO 16
O texto a seguir é uma carta de reclamação, publicada no jornal O Estado de S. Paulo, na
seção São Paulo Reclama. Leia-o.
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005c, p. 169)
199
ANEXO 17
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 154)
200
ANEXO 18
(NICOLA; INFANTE, 1996a, p. 108)
201
ANEXO 19
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 234)
202
ANEXO 20
Quadro modelo de conjugação das formas compostas:
MODO INDICATIVO
Formas compostas
É formado pelo
Verbo auxiliar
Verbo que se está conjugando
Pretérito perfeito
Presente do indicativo
+
Particípio
Pretérito mais-que-
perfeito
Pretérito imperfeito do
indicativo
+
Particípio
Futuro do presente
Futuro do presente
+
Particípio
Futuro do pretérito (1ª
forma)
Futuro do pretérito
+
Particípio
Futuro do pretérito (2ª
forma)
Pretérito mais-que-perfeito
do indicativo
+
Particípio
MODO SUBJUNTIVO
Formas compostas
É formado pelo
Verbo auxiliar
Verbo que se está conjugando
Pretérito perfeito
Presente do subjuntivo
+
Particípio
Pretérito mais-que-
perfeito
Pretérito imperfeito do
subjuntivo
+
Particípio
Futuro
Futuro do subjuntivo
+
Particípio
(FERREIRA, 1974, p. 180)
203
ANEXO 21
Queremos, também, que você preencha o que falta neste outro quadro (em caso de dúvida,
consulte o livro da quinta série):
QUADRO DAS DESINÊNCIAS TEMPORAIS E DAS FORMAS NOMINAIS
(para as três conjugações)
MODO
INDICATIVO
Presente
Para as 3 conjugações
Pretérito imperfeito
Para a 1ª conjugação
Para a 2ª e 3ª conjugações
Pretérito perfeito
Para a 1ª conjugação
Para a 2ª e 3ª conjugações
Pretérito mais-que-perfeito
Para as 3 conjugações
Futuro do presente
Para as 3 conjugações
Futuro do pretérito
Para as 3 conjugações
MODO
SUBJUNTIVO
Presente
Para a 1ª conjugação
Para a 2ª e 3ª conjugações
Pretérito imperfeito
Para as 3 conjugações
Futuro
Para as 3 conjugações
FORMAS
NOMINAIS
Particípio
Para as 3 conjugações
Gerúndio
Para as 3 conjugações
Infinitivo impessoal
Para as 3 conjugações
Infinitivo pessoal
Para as 3 conjugações
(FERREIRA, 1974, p.185)
204
ANEXO 22
Texto presente no livro didático de Ferreira (1975):
Anjo da noite
Cecília Meireles
Às dez e meia, o guarda-noturno entra de serviço. Late o cãozinho do portão no
primeiro plano; ladra o cão maior no quintal, no segundo plano: de plano em plano, até a
floresta, grandes e pequenos cães rosnam, ganem, uivam, na densa escuridão da noite, todos
sobressaltados pelo trilar do apito do guarda-noturno. Pelo mesmo motivo, faz-se um hiato no
jardim, entre os insetos que ciciavam e sussurravam nas frondes: que novo bicho é esse que
começa a cantar com uma voz que eles julgam conhecer, que se parece com a sua, mas que se
eleva com uma força gigantesca?
Passo a passo, o guarda-noturno vai subindo a rua. não apita: vai caminhando
descansadamente, como quem passeia, como quem pensa, como um poeta numa alameda
silenciosa, sob árvore em flor. Assim vai andando o guarda-noturno. Se a noite é bem
sossegada, pode-se ouvir sua mão sacudir a caixa de fósforos, e até adivinhar, com bom
ouvido, quantos fósforos estão lá dentro. Os cães emudecem. Os insetos recomeçam a ciciar.
O guarda-noturno olha para as casas, para os edifícios, para os muros e grades, para as
janelas e os portões. Uma pequena luz, de cima: várias noites, aquela vaga claridade na
janela; é uma pessoa doente? O guarda-noturno caminha com delicadeza, para não assustar,
para não acordar ninguém. Lá vão seus passos vagarosos, cadenciados, cosendo a sua sombra
com a pedra da calçada.
Vagos rumores de bondes, de ônibus, os últimos veículos, sonolentos, que vão e
voltam quase vazios. O guarda-noturno, que passa rente às casas, pode ouvir ainda a música
de algum rádio, o choro de alguma criança, um resto de conversa, alguma risada. Mas vai
andando. A noite é serena, a rua está em paz, o luar põe uma névoa azulada nos jardins, nos
terraços, nas fachadas: o guarda-noturno pára e contempla.
À noite, o mundo é bonito, como se não houvesse desacordos, aflições, ameaças.
Mesmo os doentes parecem que são mais felizes: esperam dormir um pouco à sua suavidade
da sombra e do silêncio. muitos sonhos em cada casa. É bom ter uma casa, dormir,
sonhar. O gato retardatário que volta apressado, com certo ar de culpa, num pulo exato galga
o muro e desaparece: ele também tem o seu cantinho para descansar. O mundo podia ser
tranqüilo. As criaturas podiam ser amáveis. No entanto, ele mesmo, o guarda-noturno, traz um
revólver no bolso, para defender uma rua...
E se um pequeno rumor chega ao seu ouvido e um vulto parece apontar na esquina, o
guarda-noturno torna a trilar longamente, como quem vai soprando um longo colar de contas
de vidro. E recomeça a andar, passo a passo, firme e cauteloso, dissipando ladrões e
fantasmas. É a hora muito profunda em que os insetos do jardim estão completamente
extasiados, ao perfume da gardênia e à brancura da lua. E as pessoas adormecidas sentem,
dentro de seus sonhos, que o guarda-noturno está tomando conta da noite, a vagar pelas ruas,
anjo sem asas, porém armado.
(MEIRELES, C. et. al. Quadrante II. 4. ed. Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1968. Disponível em: <
http://www.maristas.org.br/colegios/page.asp?cod=17&codpag=8636&rand=30/6/200721:53:10 >. Acesso em:
27 jan. 2010)
205
ANEXO 23
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 233)
206
ANEXO 24
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 250)
207
ANEXO 25
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002a, p. 250)
208
ANEXO 26
(CEREJA; MAGALHÃES, 2006c, p. 109)
209
ANEXO 27
(CEREJA; MAGALHÃES, 2002b, p. 69)
210
ANEXO 28
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 146)
211
ANEXO 29
(LAJOLO; OSAKABE; SAVIOLI, 1977, p. 56-57)
212
ANEXO 30
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 144)
213
ANEXO 31
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005b, p. 342)
214
ANEXO 32
(CEREJA; MAGALHÃES, 2005c, p. 328)
215
ANEXO 33
Uma morena
*
Caio Fernando Abreu
(ABREU, Caio Fernando. Fotografias. In: Morangos mofados. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1982, p. 93)
(FARACO; MOURA, 1985a, p. 20)
*
Título original: 3x4: Liége.
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