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Serviço de Gestão Acadêmica
“Degradação Ambiental e Perspectivas de Saúde: um olhar retrospectivo sobre a
sub-bacia hidrográfica do canal do Cunha”
por
Luís Cesar Peruci do Amaral
Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre em Ciências
na área de Saúde Pública.
Orientadora Principal: Prof.ª Dr.ª Cynara de Lourdes Nóbrega da Cunha
Segundo Orientador: Prof. Dr. Aldo Pacheco Ferreira
Rio de Janeiro, maio de 2006.
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Serviço de Gestão Acadêmica
Esta dissertação, intitulada
“Degradação Ambiental e Perspectivas de Saúde: um olhar retrospectivo
sobre a sub-bacia hidrográfica do canal do Cunha”
apresentada por
Luís Cesar Peruci do Amaral
foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros:
Prof. Dr. Julio Domingos Nunes Fortes
Prof. Dr. Odir Clécio da Cruz Roque
Prof.ª Dr.ª Cynara de Lourdes Nóbrega da Cunha – Orientadora Principal
Dissertação defendida e aprovada em 31 de maio de 2006.
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Catalogação na fonte
Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde/Fiocruz
Biblioteca de Saúde Pública
A485 Amaral, Luís Cesar Peruci do.
Degradação ambiental e perspectivas de saúde: um olhar retrospectivo sob a
sub-bacia hidrográfica do canal do Cunha / Luís César Peruci do Amaral. -- Rio
de Janeiro: s. n., 2006.
168 f.: il.; 30 cm.
Orientador: Cunha, Cynara de Lourdes Nóbrega da
Ferreira, Aldo Pacheco
Dissertação (Mestrado) - Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca,
Rio de Janeiro, 2006.
1. Impacto Ambiental. 2. Bacias Hidrográficas. 3. Qualidade da Água.
4. Urbanização. 5. Política Ambiental. 6. Processo Saúde-Doença.
7. Indicadores de Desenvolvimento Sustentável. 8. Rio de Janeiro. I.Título.
CDD - 20.ed. – R363.7098153
4
Dedico,
À Professora, Mestre e Amiga, Ana Clara Torres
Ribeiro, pela capacidade de compreender, apoiar e
formar, o meu eterno carinho. Pelo seu brilhantismo e
integridade, a minha eterna admiração.
Aos meus sobrinhos Hugo e André, com carinho
especial.
5
Agradeço,
A todos os amigos que incentivaram e contribuíram para a
concretização desse momento, e em especial:
- aos meus orientadores Cynara Nóbrega e Aldo Pacheco, pela
capacidade de compreender as dificuldades e pelo incentivo no
enfrentamento das barreiras;
- ao mestre Odir Roque, pelas discussões intermináveis e a
amizade no decorrer da jornada;
- as amigas Valéria Borba e Tininha, pelo incentivo a minha
candidatura ao concurso de mestrado;
- aos amigos de todas as horas, por ouvir e compreender as
lamentações infinitas que se desdobraram neste trabalho, Alice
Lourenço, Ana Paula, Beatriz Duquelwisk, Elizete Menegat,
Ione Silveira, Laura Maul, Leonardo Romão, Lúcia Amaral,
Mara Santos, Rute Tostes, Stela Reis, Thiago Silva, Ubiray
Rezende e tantos outros;
- a FEEMA/RJ, IPP/PCRJ, SMMA/PCRJ, SMS/PCRJ pela
generosa cessão dos dados trabalhados;
- aos carinhosos colaboradores, Professora Diana Maul e
Professor Dalton Marcondes, a minha gratidão.
6
“...É impossível esperar que uma sociedade como a nossa,
radicalmente desigual e autoritária, baseada em relações de
privilégio e arbitrariedade, possa produzir cidades que não
tenham essas características...”
Ermínia Maricato
7
Sumário
Lista de ilustrações .....................................................................................................................9
Lista de tabelas .........................................................................................................................10
Lista de gráficos .......................................................................................................................11
Lista de quadros........................................................................................................................12
Lista de mapas..........................................................................................................................13
Resumo.....................................................................................................................................14
Palavras-chave..........................................................................................................................14
Abstract.....................................................................................................................................15
Key-words ................................................................................................................................15
Capítulo 1 - Introdução.............................................................................................................16
1.1. Apresentação.................................................................................................................16
1.2. Justificativa para a escolha do tema .............................................................................20
1.3. Formulação da situação-problema................................................................................22
1.4. Relevância do estudo....................................................................................................25
1.5. Objetivo geral...............................................................................................................26
1.6. Objetivos específicos....................................................................................................26
Capítulo 2 - Referencial Teórico...............................................................................................27
2.1. Para entender a sustentabilidade: outras leituras, novos paradigmas..........................27
2.2. Contextualizando índices ambientais: o que são e para que servem...........................38
Capítulo 3 - Procedimentos Metodológicos.............................................................................47
Capítulo 4 - Tempos e Espaços: O processo de ocupação e a história do lugar......................49
3.1. Ocupação urbana – entendendo a periodização............................................................49
3.2. Do século XVI ao século XIX......................................................................................50
3.3. A primeira metade do século XX..................................................................................53
3.4. A segunda metade do século XX e os primeiros anos do século XXI..........................61
3.5. Considerações finais.....................................................................................................67
Capítulo 5 - Da Baixada de Inhaúma ao Maciço da Tijuca: Conhecendo o sítio de estudo...68
Capítulo 6 – Qualidade Hídrica do Canal do Cunha..............................................................104
6.1. Comentários iniciais...................................................................................................104
6.2. A Água com Recurso Indispensável à Vida, à Manutenção da Saúde e a Conservação
do Meio...............................................................................................................................104
6.3. Monitoramento das Estações de Coleta, Escolha e Grupamento dos Parâmetros......109
6.4. Estudos de Enquadramento do Manancial .................................................................111
6.5. Análise dos Parâmetros Estabelecidos........................................................................112
6.6. Grupo A: Parâmetros referentes aos ciclos do oxigênio e o potencial de depuração:114
6.7. Grupo B: Parâmetros referentes ao ciclo do nitrogênio orgânico e o potencial de
degradação:.........................................................................................................................118
8
6.8. Grupo C: Parâmetros referentes à concentração de microorganismos e o potencial de
contaminação:.....................................................................................................................124
Capítulo 7 – Relações Endêmico-epidêmicas: Pequeno estudo sobre saúde e doença.........128
Para entender a questão ......................................................................................................128
O dengue.............................................................................................................................130
A Leptospirose....................................................................................................................145
Sobre outros agravos potenciais.........................................................................................153
Conclusão ...............................................................................................................................154
Referências .............................................................................................................................161
Outras Fontes..........................................................................................................................167
Relação de Anexos .................................................................................................................168
9
Lista de ilustrações
Ilustração 01: Micro-bacia do Canal do Cunha - perspectiva .................................................17
Ilustração 02: Pirâmide de Informações:.................................................................................38
Ilustração 03: Rio Faria (1929): retificação das margens.......................................................55
Ilustração 04: Praia de Ipicu em 1940 (sem a favela)..............................................................61
Ilustração 05: Favela da Maré em 1968 (palafitas) .................................................................62
Ilustração 06: Evolução Urbanística do Complexo da Maré...................................................63
Ilustração 07: Evolução Arquitetônica do Complexo da Maré................................................63
Ilustração 08: Complexo da Maré – excessiva densidade.......................................................70
Ilustração 09: Vista aérea da sub-bacia: densidade excessiva e ausência de vegetação.........73
Ilustrações 10A e 10B: Nascente do Rio Faria, em meio à ocupação urbana.........................84
Ilustração 11: Armazém abandonado, visto do Viaduto de Benfica......................................100
Ilustração 12: Domínio da Baía de Guanabara e detalhe da região do Canal do Cunha, com a
estação de medição CN100.....................................................................................................109
Ilustração 13: Localização da estação CN 100......................................................................110
Ilustração 14: Modelo dos ciclo do oxigênio, nitrogênio orgânico e fósforo orgânico.........113
Ilustração 15 – Solução analítica do Ciclo do Nitrogênio em 60 dias de simulação..............120
10
Lista de tabelas
Tabela 1 - Evolução da população em maiores cidades brasileiras nas últimas seis décadas..27
Tabela 02-A: Indicadores utilizados no ISAU.........................................................................46
Tabela 02-B: Critérios de qualidade elaborados a partir do ISAU..........................................46
Tabela 3A: Análise comparativa de dados do Município do Rio de Janeiro e Sub-bacia do
Cunha........................................................................................................................................72
Tabela 3B: Análise comparativa de dados do Município do Rio de Janeiro e Sub-bacia do
Cunha........................................................................................................................................72
Tabela 04: Crescimento percentual da população em setores subnormais (1980-2000).........81
Tabela 05: Rede Hidrográfica da Sub-bacia............................................................................82
Tabela 06: Número de favelas, habitantes e domicílios, por RA, na sub-bacia do Canal do
Cunha........................................................................................................................................88
Tabela 07: Relação de Favelas, por RA, na Sub-Bacia Hidrográfica......................................91
Tabela 08: Número de fontes poluidoras por bairro e percentual de contribuição na sub-bacia
do Canal do Cunha. ................................................................................................................103
Tabela 09: Coordenadas da estação de coleta CN 100..........................................................110
11
Lista de gráficos
Quadro 01: Dimensões do ambientalismo ....................................................................... 29
Quadro 02: Histórico das ações mundiais pela sustentabilidade ..................................... 32
Quadro 03: Quadro epistemológico do pensamento sobre sustentabilidade ................... 33
Quadro 04: Elenco de doenças de veiculação hídrica, segundo o modelo de
contaminação ....................................................................................................................
105
Quadro 05: Estudo de causa/efeito por tipo de poluente ................................................. 108
Quadro 06: Introdução dos tipos de dengue I, II, III e IV no Brasil ................................ 130
12
Lista de quadros
Gráfico 01: Distribuição da população por setores subnormais, por APs ............... 80
Gráfico 02: Percentual de moradores, por setores normais e subnormais, no Rio
de Janeiro (Censo Demográfico 2000) ..................................................................... 88
Gráfico 03: Percentual de moradores, por setores normais e subnormais, na Sub-
bacia do Canal do Cunha (Censo Demográfico 2000) ............................................. 89
Gráfico 04: Percentual de favelas por RA na sub-bacia hidrográfica ...................... 90
Gráfico 05: Percentual de residentes em favelas por RA na sub-bacia hidrográfica 90
Gráfico 06: Salinidade da estação CN100 ............................................................... 112
Gráfico 07A– Valores de DBO medidos na estação CN 100 ................................... 114
Gráfico 07B – Valores de DBO medidos na estação CN 100 ................................... 114
Gráfico 8 – Valores de OD medidos na estação CN 100 .......................................... 115
Gráfico 09 – Valores de DQO medidos na estação CN 100 ..................................... 116
Gráfico 10 – Relação DQO/DBO observados na estação CN 100 ........................... 117
Gráfico 11 – Valores de Nitrogênio Amoniacal medidos na estação CN 100 .......... 119
Gráfico 12 – Valores de Ph medidos na estação CN 100 ......................................... 119
Gráfico 12AValores de Nitrogênio Nitrito medidos na estação CN 100 .............. 122
Gráfico 12B – Valores de Nitrogênio Nitrito medidos na estação CN 100 .............. 122
Gráfico 13AValores de Nitrogênio Nitrato medidos na estação CN 100 ............. 123
Gráfico 13B – Valores de Nitrogênio Nitrato medidos na estação CN 100 ............. 123
Gráfico 14AValores de Coliformes Fecais medidos na estação CN0100 ............. 125
Gráfico 14B – Valores de Coliformes Fecais medidos na estação CN0100 ............. 125
Gráfico 15-A: Série temporal do comportamento do dengue no Brasil .................. 131
Gráfico 15-B: Série temporal do comportamento do dengue no Brasil .................. 132
Gráfico 16: Curva de internações por inserção de tipo de dengue .......................... 132
Gráfico 17: Comparativo das incidências do dengue no Rio de Janeiro ................. 143
Gráfico 18: Número de casos de leptospirose no Rio de Janeiro entre 1996 e
2004 .......................................................................................................................... 147
Gráfico 19: Distribuição de casos de leptospirose no Rio de Janeiro, por distintas
espacialidades, para os anos de 1996 e 2004 ............................................................ 151
Gráfico 20: Casos de leptospirose, por RA, na AP2.1 – 1996 ................................. 152
Gráfico 21: Casos de leptospirose na VI RA – 1996 ............................................... 152
13
Lista de mapas
Mapa 01: Freguesias do Rio de Janeiro no século XIX. .........................................................52
Mapa 02: Espacialização das Favelas na Cidade do Rio de Janeiro em 1928.........................54
Mapa 03: Primeira e Segunda Zona Industrial do Rio de Janeiro...........................................57
Mapa 04: Espacialização das Favelas no Rio de Janeiro em 1948..........................................58
Mapa 05: Incremento da População em Favelas na Década de 50..........................................60
Mapa 06: Distribuição da População por RA 1970, Rio de Janeiro........................................65
Mapa 07: Distribuição da População por RA 2000, Rio de Janeiro........................................65
Mapa 08: Mapa com as divisões por AP, RA e sub-bacia.......................................................69
Mapa 09: Mapa de divisão de bairros e a delimitação da sub-bacia. ......................................69
Mapa 10: Distribuição da população, por bairros - 2000........................................................76
Mapa 11: Crescimento da população, por bairros – 1991/2000..............................................76
Mapa 12: Densidade demográfica, por bairros - 1991. ...........................................................77
Mapa 13: Densidade demográfica, por bairros – 2000............................................................77
Mapa 14: Relevo e hipsometria da cidade do Rio de Janeiro - 2000......................................85
Mapa 15: Chuvas médias anuais na cidade do Rio de Janeiro - 2000.....................................85
Mapa 16: Mapa de divisão em bacias hidrográficas e da hidrografia da Cidade do Rio Janeiro
– 2000.......................................................................................................................................86
Mapa 17A: Cadastro de Favelas com Loteamentos Irregulares da Cidade do Rio de Janeiro.
..................................................................................................................................................95
Mapa 17B: Cadastro de Favelas com Loteamentos Irregulares na Sub-Bacia Hidrográfica...96
Mapa 18: Uso do solo e traçado viário na sub-bacia hidrográfica do Canal do Cunha...........98
Mapa 19: Espacialização das fontes poluidoras, segundo classe poluidora, na sub-bacia do
Canal do Cunha. .....................................................................................................................102
Mapa 20: Incidência de Dengue no ano 1997. ......................................................................135
Mapa 21: Incidência de Dengue no ano 2000. ......................................................................136
Mapa 22: Incidência de Dengue no ano 2003. ......................................................................137
Mapa 23: Incidência de Dengue no ano 2004. ......................................................................138
Mapa 24: Incidência de Dengue no ano 1998. ......................................................................139
Mapa 25: Incidência de Dengue no ano 2001. ......................................................................140
Mapa 26: Incidência de Dengue no ano 2002. ......................................................................141
Mapa 27: Incidência de Leptospirose no ano de 1994. .........................................................149
Mapa 28: Incidência de Leptospirose no ano de 1994. .........................................................150
14
Resumo
O trabalho se propõe a compreender as relações entre o processo de ocupação do solo e seu
estado de degradação (e/ou conservação). Nesta direção, adota como unidade de análise a
sub-bacia hidrográfica urbana do Canal do Cunha, enfatizando em última instância o corpo
d’água como testemunho dos sucessivos impactos que sofreu, oriundos das características da
ocupação daquele sítio e das marcas impressas no território como conseqüência desta
denominada evolução urbana.
Dessa forma, o estudo resgata um apanhado da problemática urbano-ambiental e de sua
inserção na dinâmica do capitalismo periférico, onde a ausência de políticas públicas
adequadas viabilizou, ao longo das décadas, a excessiva estratificação social da área, com a
inadequada ou insuficiente alocação de investimentos, que se traduziu na crescente
deterioração da sub-bacia.
Trata-se, portanto, de uma análise comparativa entre o processo de uso e ocupação do solo
(história do lugar), a degradação do sítio (prejuízos à saúde ambiental) e as características de
sua população (condições de vida e alterações nas relações endêmico-epidêmicas),
fundamentando, por fim, as bases conceituais e filosóficas que devem, a posteriori, subsidiar a
elaboração de métodos de quantificação e qualificação desta mesma degradação.
Palavras-chave
1. Impacto Ambiental; 2. Bacias Hidrográficas; 3. Qualidade da Água; 4. Urbanização;
5. Política Ambiental; 6. Processo Saúde-Doença; 7. Indicadores de Desenvolvimento
Sustentável; 8. Rio de Janeiro.
15
Abstract
This dissertation aims at the understanding of the relationships among the land use and
occupation and its degree of preservation or deterioration. The urban hydrographic basin of
Canal do Cunha was chosen as the unit of analysis, emphasizing the water body as the witness
of successive impacts coming from the occupation model of that place and from the existing
signs of the territory as a consequence of its urban development.
Thus, the present research brings about urban environmental issues and their insertion in a
peripheral capitalist model where the absence of adequate public policies, during decades,
developed into, the existing aggressive social stratification added to inadequate and
insufficient investments allocation, encouraging a qualitative decreasing that explains the
increasing deterioration of the basin.
Therefore, this paper is a comparative analysis among the process of land use and occupation
or the history of place, the deterioration of place or the damages to environmental health, and
the characteristics of its population (its living conditions and changes on the endemic-
epidemic relationships), which will provide the conceptual and philosophical foundations to
support the elaboration of methods for the quantitative and qualitative assessment of this same
degradation.
Key-words
1. Environmental Impact; 2. Hydrographic Basins; 3. Water Quality; 4. Urbanization;
5. Environmental Policy; 6. Health-Disease Process; 7. Sustainable Development
Indicatons; 8. Rio de Janeiro.
16
Capítulo 1 - Introdução
1.1. Apresentação
O presente trabalho propõe o estudo das relações entre o processo de ocupação do solo, em
uma bacia hidrográfica urbana, e seu estado de degradação (e/ou conservação) considerando,
em última instância, o corpo d’água como testemunha dos impactos sucessivos oriundos do
modelo de ocupação de um determinado sítio e das marcas impressas no território pelo
processo de evolução urbana, condicionada por um mecanismo (forma-conteúdo) de
apropriação espacial. Trata-se de uma análise comparativa entre o processo de uso e
ocupação do solo (história do lugar), a degradação do sítio e as características de saúde de sua
população. Objetiva-se, por fim, discutir as bases que fundamentam a elaboração de um
índice que mensure a degradação ambiental, tomando, por base, a concepção de índices
ambientais amplamente reconhecidos e as formulações oriundas de um estudo de caso.
O trabalho insere-se na linha de pesquisa ‘Desenvolvimento de Indicadores de Poluição
Antrópica’, vinculada ao grupo de pesquisa ‘Ambiente, Ecossistemas e Sustentabilidade’
(CNPq), da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/FIOCRUZ), e associa-se
ao estudo das relações entre o processo de ‘colonização’ do espaço, a degradação ambiental e
seus impactos sobre a saúde. Neste sentido, direciona seu estudo de caso à micro-bacia
hidrográfica do Canal do Cunha (ilustração 01), contribuinte da Baia de Guanabara, que
atravessa região extremamente pobre da cidade do Rio de Janeiro, com predomínio de favelas.
Portanto, ao entendermos o manancial como testemunho do impacto do processo de ocupação
sobre a ‘base natural’, inclusive a partir do estudo das atuais condições sanitárias, torna-se
possível definir propostas de intervenção que se justifiquem pela melhoria dos padrões de
qualidade de água do canal, possibilitando seu monitoramento e efetivando, como
conseqüência, transformações positivas na qualidade de vida da população local e melhorias
no ambiente urbano como um todo.
17
A foto abaixo nos mostra a Sub-Bacia Hidrográfica do Canal do Cunha (delimitada pela linha
vermelha), em contraste com a Baia de Guanabara, a Ilha do Fundão e o skyline do Rio de
Janeiro.
Ilustração 01: Micro-bacia do Canal do Cunha - perspectiva
Fonte: Googleearth, acesso em janeiro de 2006.
Nesta direção, a Introdução (capítulo 1) nos traz um apanhado da problemática urbana e de
sua inserção num modelo capitalista periférico
1
, onde a ausência de políticas públicas
adequadas viabilizou, ao longo das décadas, a excessiva estratificação social e, com ela, um
processo – até então - irreversível de estratificação e de deterioração do território.
O capítulo 2, a Referencial Teórico, viabiliza a discussão conceitual de sustentabilidade e o
entendimento de sua pertinência para as diferentes áreas do conhecimento. Contribui,
1
Ver Milton Santos, Urbanização Brasileira; Ana Clara Torres Ribeiro, Rio de Janeiro: Perfis de uma
Metrópole em Mutação; e Vilmar Faria, Cinqüenta Anos de Urbanização no Brasil.
18
também, com uma breve análise acerca da quantificação da degradação através do estudo
sistemático de índices de qualidade ambiental, sua aplicação, relação e relevância.
O capítulo 3, Procedimentos Metodológicos, foi dedicado a descrição da metodologia.
O capítulo 4 foi denominado Tempos e Espaços: O processo de ocupação e a história do
lugar. Este tema valoriza o processo histórico de ocupação e estruturação do território. Nele
notamos claramente que, em contraposição a outras áreas da cidade do Rio de Janeiro que
sofreram um declínio urbano-ambiental ao longo do tempo fundamentalmente pelo
desmantelamento da sua vitalidade socioeconômica, boa parte da região que compõe a micro-
bacia de estudo já nasce degradada por um rápido e contínuo processo de criação de território
e apropriação de espaços inóspitos em função de uma demanda criada pelo surgimento
sucessivo de novas estruturas precárias e deficientes; e que se tornam, no decorrer da história
do lugar, o epicentro da problemática ambiental e desestruturante das ações de saúde pública,
com impactos, inclusive, na formação da vida coletiva e das redes sociais.
O capítulo 5 foi intitulado Da Baixada de Inhaúma ao Maciço da Tijuca: Conhecendo o sítio
de estudo. Trata-se do reconhecimento crítico em torno do uso e da ocupação do solo em seu
estado atual, abordando suas potencialidades, conformidades e limites. Esta etapa é dedicada
à quantificação e à qualificação da região no que se refere à degradação ambiental,
disponibilidade de infra-estrutura urbana, aumento relativo e absoluto de densidade e
caracterização da população local, através do estudo dos aspectos demográficos, sociais,
culturais, econômicos e das características geográficas do lugar.
O capítulo 6, chamado Qualidade Hídrica do Canal do Cunha, traz informações sobre a
qualidade da água do Canal do Cunha e busca desvendar analiticamente o comportamento dos
dados para determinados parâmetros de qualidade (oxigênio dissolvido – OD - , demanda
bioquímica de oxigênio – DBO -, demanda química de oxigênio – DQO – nitrogênio
amoniacal, nitrito, nitrato, coliforme total e coliforme fecal) desde 1980 até 2004, assim como
discutir as relações entre tais parâmetros. Tem por objetivo refletir os possíveis elos entre o
processo de urbanização e degradação da área com o comportamento daquelas variáveis ao
longo de mais de duas décadas.
19
O capítulo 7, Relações Endêmico-Epidêmicas: Pequeno estudo sobre saúde e doença,
estrutura-se baseado em dois tipos de agravos (dengue e leptospirose) que se vinculam, de
forma complexa, ao processo de urbanização. Com esse objetivo serão utilizadas informações
do histórico dos acometimentos e sua correlação com a área em estudo e, finalmente, entre
esta e a cidade do Rio de Janeiro. Busca, por fim estabelecer os elos possíveis entre o
processo endêmico-epidêmico no lugar e sua utilização como parâmetro para estudo da
degradação ambiental.
Por fim, a conclusão, discute o processo e as etapas de construção de um indicador de
degradação ambiental, e trabalha a instância teórico-filosófica, observando que um modelo
numérico de quantificação, por si mesmo, deve retratar as relações sócio-ambientais e a
historicidade intrínseca aos lugares e aos processos.
O trabalho, aqui apresentado, não propõe a construção de um índice de degradação ambiental,
mas estuda, nos planos teórico e filosófico, os condicionantes estruturais para sua formulação
e aplicação. Nesta direção, observamos que a complexidade das relações ecológicas está
vinculada a uma lógica de derivações na qual as ações do homem e suas inter-relações com o
meio são pautadas – possivelmente - pela imprevisibilidade dos acontecimentos somada às
necessidades de sobrevivência (inclusive política), muitas vezes desvinculada da lógica
tradicional (original).
20
1.2. Justificativa para a escolha do tema
“As razões das poluições dos rios se devem a duas ordens de fatos diferentes. A primeira
relacionada com o crescimento da população humana e grau cada vez mais elevado de
urbanização. A segunda provém do desenvolvimento industrial. As metrópoles formadas
despejam nos rios enormes volumes de águas usadas, não tratadas ou parcialmente tratadas,
efluentes dos esgotos domésticos e industriais.” (Furquim, 1978). No que tange ao
comentário de Sebastião Furquim, referente aos impactos do crescimento urbano sobre o
aumento da poluição ambiental, fundamentalmente sobre os mananciais, podemos considerar
que a densidade demográfica e a ausência de mecanismos adequados de controle e depuração
artificial (recuperação) são fatores determinantes para a manutenção ou depreciação da
qualidade das estruturas urbanas nas quais distintos grupos e populações estão submetidos.
O primeiro fator caracteriza-se por suas condições especiais que favorecem fortemente a
concentração de cargas poluidoras. O segundo caracteriza-se pela incapacidade do poder
público em equacionar demandas ambientais mediante uma política de investimentos
adequadamente distributiva, e de formas legais que garantam não só reservas orçamentárias
destinadas a investimentos em saneamento, por exemplo, mas também mecanismos de
controle de sua aplicação equilibrada no meio urbano, e do controle sobre as formas de
apropriação especulativas ou anônimas (irregular) do solo, que culminam em elevados índices
de densidade.
Quanto à parcela atribuída ao acelerado desenvolvimento industrial, podemos acrescentar
duas questões passíveis de análise: o primeiro ponto se refere a desigual distribuição da
produção no território nacional, que gerou regiões de grande concentração industrial,
sobrepondo distintos processos e sistemas de produção que acarretam na eliminação de uma
complexa variedade de agentes químicos, físicos e biológicos, potencializando o risco de
contaminação sobre um mesmo ecossistema; e o segundo se refere à ausência de uma
consciência cidadã (cívica) e ambiental mais ampla, na medida em que “quando um elo do
setor produtivo lança esgotos não tratados e ‘mata’ um rio, faz uma enorme economia em seus
gastos. No entanto, a conta das obras para ‘importar água e suprir a demanda que rio morto
não consegue mais cobrir será paga com dinheiro dos cofres públicos e pela sociedade, assim
como a conta da recuperação daquele rio” (Magalhães, 2004). Ou seja, polui sem maiores
21
preocupações com os efetivos impactos sobre a natureza, assim como com os efeitos e custos
sociais e econômicos do desgaste ambiental que gerou. Ainda, sobre este ponto, podemos
destacar a carência de modelos adequados de políticas públicas que viabilizem o controle
sobre o processo de poluição ambiental ocasionado pela indústria moderna e mecanismos de
incentivo a práticas produtivas sadias e menos poluidoras.
O planejamento urbano, principalmente o planejamento da recuperação e da preservação de
sistemas ambientais urbanos, surge como um elemento indispensável na discussão sobre a
construção de modelos integrados de preservação (e resgate) da qualidade ambiental das
cidades brasileiras, em especial, das regiões metropolitanas. Nesta direção, a incorporação de
recursos legais mais rígidos e de políticas compartilhadas e transversais é fundamental para
garantir o êxito do processo.
Notoriamente, o crescente aumento na expectativa da vida humana está relacionado
diretamente ao aumento da qualidade de vida, não só no que se refere à melhoria de suas
condições, ampliação e disponibilidade de acesso aos bens de consumo, benefícios da
urbanidade e recursos técnicos mais sofisticados, mas também a uma maior preocupação
ambiental e à produção de um ambiente urbano com mais qualidade (fundamentalmente nas
áreas onde este fenômeno se manifesta com maior intensidade - regiões de maior
concentração de renda, onde normalmente se concentram os maiores investimentos públicos
em infra-estrutura urbana, inclusive saneamento, e adequação dos espaços públicos).
Qualquer estudo em torno da qualidade ambiental urbana deve levar em conta as relações
estabelecidas no sistema hídrico ao qual tal grupamento está submetido. Naturalmente,
parâmetros que relacionem dados sobre o grau de impermeabilização do solo, desmatamento,
ocupação de encostas, áreas suscetíveis às epidemias e áreas ribeirinhas sujeitas à inundação,
deslizamentos e enchentes, devem receber enfoque prioritário. Da mesma forma, as descargas
de poluentes a que o sistema hídrico urbano está submetido deve ser alvo de controle
sistemático do poder público. Assim, o uso do solo em áreas circunscritas a mananciais
urbanos torna-se foco estratégico do planejamento ambiental, de modo que a compreensão das
relações entre o processo de degradação ambiental, o modelo de uso e ocupação do solo e as
relações de saúde-doença presentes num mesmo sistema é o primeiro passo para estudar
22
mecanismos eficientes de quantificação desses processos e então pensar sobre sua
incorporação prática no modelo de planejamento e gestão das cidades.
1.3. Formulação da situação-problema
De modo geral podemos dizer que os grandes impactos ambientais em meio urbano são
oriundos, fundamentalmente, por formas inadequadas de ocupação do solo, que geram
elevados níveis de concentração de poluentes, e pelo esparso e inadequado modelo
distributivo de investimentos em saneamento em áreas densamente povoadas, e não,
simplesmente, pelo elevado crescimento das cidades (brasileiras) constatado nas últimas
décadas.
O mesmo avanço tecnológico, marcado pelas sucessivas fases do processo mundial de
industrialização, que serviu de força motriz ao crescimento das cidades, a partir de complexos
movimentos de migração pelo território, viabilizou, ao longo do tempo, técnicas sofisticadas
de manejo e saneamento ambiental, que potencializaram novos modelos de grupamentos e
ocupação dos espaços urbanos (uso do solo mais criterioso). Lamentavelmente, o processo de
modernização não conseguiu propor soluções ao modelo de gestão na maior parte das cidades
do país, traduzindo tais avanços técnicos em benefícios públicos, igualmente distribuídos pelo
território e pelos grupos, levando a uma minoria privilegiada a possibilidade de usufruir de
estruturas ambientais de maior qualidade.
Se por um lado, essa ‘ingerência institucional’ sobre o processo de formação da metrópole é
retratada nas intenções de uso e ocupação do solo e normatizada pelos diferentes planos e
projetos (Agache (1927), Doxiades (1960), Pub-Rio (1977) e Plano Decenal da Cidade do Rio
de Janeiro (1992)) (Name, no prelo), os Planos de Estruturação Urbana e as legislações
complementares) que se sucederam no Rio de Janeiro, sua ‘intencionalidade’ fica aparente
quando observamos o descaso com a forma de ocupação dos bairros populares (segregados e
relegados), incrustados nas das zonas industriais, apropriando-se consecutivamente das áreas
de alagados, das encostas e das laterais dos ramais ferroviários e dos principais eixos viários
de expansão da cidade. Cresceram desprovidos não só de uma proposta urbanística que
levasse em conta as características geográficas e ambientais do espaços ocupados mas,
23
também, conseqüentemente, das obras necessárias ao processo de apropriação imobiliária e
parcelamento do solo. Essa cronologia de fatos implementa, de alguma forma, dois processos
de segregação, distintos em seus atributos. O primeiro que se remete a partição da cidade
entre as áreas com amplo investimento (eixos de expansão do capital imobiliário) e as áreas
de apropriação popular. O segundo, mais sutil, se refere à partição das glebas, na medida em
que, pelo não planejamento integrado e contínuo da ocupação, criam-se núcleos privilegiados
dentro de sítios que surgem alijados, num primeiro momento, dos investimentos em
estruturação urbana, estabelecendo diferenças visíveis relacionadas aos níveis de pobreza (que
se associam deliberadamente aos distintos graus dos investimentos públicos) e da apropriação
privilegiada dos ‘melhores’ espaços, com diferentes níveis de exposição aos riscos naturais.
Dessa forma, o processo de urbanização vai legando às regiões características particulares,
condicionadas, normalmente, ao potencial de aprovisionamento de infra-estrutura e a
capacidade de normatização e controle. A sub-bacia hidrográfica do Canal do Cunha, objeto
do processo acima descrito, foi ocupada a partir do compartilhamento das duas formas de
segregação e desprovida, em boa parte da região, de regulamentação fundiária e de controle
urbanístico, com prejuízos lineares à construção de uma lógica espacial morfologicamente
equilibrada, da preservação/criação de condições ambientais mínimas, visando absorver os
desgastes da urbanização, da conservação de uma atividade econômica perene e do
equacionamento de uma demanda educacional e cultural nascente, a partir de alternativas
efetivas, na medida em que a política nacional de educação é fragilizada pelos governos
sucessivamente ao longo de décadas pela ausência de investimentos e pela valorização do
‘quantitativo’ em detrimento do ‘qualitativo’.
Enquanto a localização estratégica da sub-bacia hidrográfica implica em sua permanência
como região de ‘passagem’, interligando toda Zona Oeste (AP 5) e o restante da Zona Norte
(AP 3.3 e parte da AP 3.1) às Áreas Centrais (AP 1) e Zona Sul (AP 2) e, mais recentemente, a
Baixada da Barra, Recreio e Jacarepaguá (AP 4) a estes outros centros urbanos, o relevo
predominantemente ‘plano’ favoreceu a rápida ocupação das áreas baixas, legando às favelas
a ocupação das encostas dos mangues, além algumas regiões de alagados e a beira de riachos
(aterrados posteriormente).
24
A região conta hoje com 133 favelas e 24 loteamentos clandestinos ou irregulares e, dos
7.015,99 hectares que ocupa, somente 415,43 hectares são áreas naturais; e a ausência maciça
de vegetação, forma uma imensa ilha de calor sobre sub-bacia, somente aliviada pelas
constantes trocas propiciadas por sua proximidade com a Baia de Guanabara. Essa é a bacia
hidrográfica atmosfericamente mais poluída da cidade do Rio de Janeiro, seus bairros estão
incluídos entre os bairros com maior densidade e com (na maioria) os menores rendimentos
da cidade (tabela 01 e 02); é cortada por um conjunto de vias coletoras de primeira ordem e
vias arteriais, que fazem da região consolidadamente uma área de passagem, e tem o canal
que lhe dá o nome com características de poluição superiores aos padrões adotados para a
classe 3 (águas salobras).
Deste modo, surgem algumas questões fundamentais relacionadas ao processo de urbanização
e degradação ambiental dos espaços urbanos: (1). De que forma, o processo de urbanização,
preponderantemente de uso e ocupação do solo, contribuiu para os elevados níveis de
degradação ambiental da Sub-bacia Hidrográfica do Canal do Cunha?; (2). Como se dá este
desgaste, ao longo do tempo, e como ele se relaciona a deterioração das águas do canal?; (3).
Como a deterioração do manancial, associada à pauperização e precarização da área,
repercutem nas relações endêmica-epidêmicas na sub-bacia?; (4). Como quantificar essa
degradação?; (5). Como dimensionar níveis e parâmetros satisfatórios de sustentabilidade? A
ausência de resposta a estas questões, e a outras tantas, surge como um obstáculo à adoção de
um modelo de desenvolvimento que valorize a preservação dos ecossistemas presentes no
meio urbano e a qualidade de vida, como prospectiva à construção de uma cidade saudável.
25
1.4. Relevância do estudo
A pesquisa ganha notoriedade em função de três fatores principais:
O primeiro se refere ao enfoque inovador, vinculado à natureza do recorte espacial aqui
contemplado. A adoção de bacias hidrográficas para a análise urbana não tem se efetivado
como uma prática no processo de pesquisa, planejamento e gestão. Usualmente, outras
unidades espaciais, com ênfase nos recortes político-admistrativos, são incorporadas
prioritariamente como modelos de ordenação territorial e estudos urbanos, mesmo quando o
fenômeno a ser observado se trata de um fenômeno de cunho ambiental, inviabilizando um
processo de planejamento integrado. No entanto, o enfoque a partir da bacia hidrográfica tem
se mostrado o recorte ideal para investigações e ações associadas aos processos de
degeneração, acomodação e recuperação das estruturas ambientais.
O segundo fator se associa à formação dos subúrbios cariocas. Muito pouca literatura foi
encontrada detalhando a estruturação dos subúrbios e o processo de sua formação. Desta
maneira, este trabalho acumula a experiência de refletir sobre uma área bastante complexa do
município do Rio de Janeiro, ainda (relativamente) pouco explorada na análise da cidade, da
dinâmica urbana e do seu meio ambiente.
O terceiro argumento se refere ao objetivo central do trabalho – o tema degradação ambiental
em áreas urbanas – e a opção analítica adotada no estudo, como forma de compreender os
sentidos da sustentabilidade, assim como os processos que culminam na degeneração material
e social de uma de uma determinada região, formulando os pressupostos teóricos que balizam
a formulação de um índice de degradação ambiental direcionado aqueles espaços. Trata-se de
estabelecer um olhar analítico-diferenciado, incorporando em sua essência elementos
significativos do cotidiano e da vida urbana, que representam as causas, as características e/ou
as conseqüência, em diversos níveis, do processo de degradação. É importante salientar que
esta é uma primeira etapa, que fundamenta um longo trabalho de estudos e descobertas, em
direção à construção de um indicador responsável, passível de ser usado pelos gestores na
adoção de políticas públicas, alocando recursos que visem minimizar os desequilíbrios e
desajustes que provocam e são provocados pela degradação ambiental.
26
1.5. Objetivo geral
- Estudar os impactos ambientais, oriundos do processo de urbanização (uso e ocupação do
solo) em uma bacia hidrográfica urbana, enfocando o manancial como ‘testemunha-síntese
(Braga et al (2003)) do processo de degradação, e formulando, a partir do entendimento do
processo de ocupação, da qualidade da água e das características endêmicas do local, as bases
conceituais em que sustentam um índice de degradação ambiental.
1.6. Objetivos específicos
- Compreender como a evolução da ocupação urbana na sub-bacia hidrográfica se relaciona
aos distintos níveis de degradação da área e da água do canal;
- Avaliar a qualidade das águas superficiais de bacia contribuinte da Baía de Guanabara, com
enfoque no Canal do Cunha, a partir de dados existentes;
- Entender as conformidades e as relações entre a degradação do sítio em estudo, suas
características, e as relações endêmico-epidêmicas da área;
- Estabelecer, a partir de estudo de caso e de base bibliográfica, a fundamentação conceitual
(teórica e filosófica) das categorias de parâmetros vinculadas ao futuro desenvolvimento de
um índice que mensure a degradação ambiental em sub-bacias hidrográficas urbanas.
27
Capítulo 2 - Referencial Teórico
2.1. Para entender a sustentabilidade: outras leituras, novos paradigmas
O modelo adotado de crescimento econômico transformou, nas últimas cinco décadas – como
em nenhuma outra nação, em tão pouco tempo -, a fisionomia do Brasil. O país deixou de ser
essencialmente rural e assumiu as características de uma sociedade urbana, com mais de 82%
da população vivendo em cidades. O fenômeno da crescente urbanização brasileira,
entretanto, aconteceu de forma desigual, em decorrência do desequilíbrio na distribuição
territorial dos investimentos. Um enorme contingente populacional concentrou-se em
algumas regiões geográficas privilegiadas, gerando fenômenos expressivos,
fundamentalmente, do adensamento populacional, conurbação de espaços habitados e da
degradação ambiental. A tabela 1 apresenta a evolução da população em algumas das
principais cidades do país, nas últimas seis décadas.
Tabela 1 - Evolução da população em maiores cidades brasileiras nas últimas seis décadas.
1950 1960 1970 1980 1991 2000
Rio de Janeiro 2.377.451 3.281.908 4.251.918 5.090.790 5.480.778 5.857.904
São Paulo 2.198.096 3.781.446 5.924.615 8.493.226 9.646.185 10.434.250
Salvador 417.235 649.453 1.007.195 1.501.981 2.075.273 2.443.107
Porto Alegre 394.151 635.125 885.545 1.125.477 1.263.403 1.360.590
Belém 254.949 399.222 633.374 933.287 1.244.689 1.280.614
Fonte: Armazém de Dados da PCRJ (www.armazemdedados.rio.rj.gov.br), apud IBGE, Anuário
Estatístico do Brasil (1997) e Censo Demográfico (1980 e 2000).
Assim, o modelo que conduziu a ocupação do território, o acelerado ritmo da urbanização, o
crescimento desordenado, a prática ausência de planejamento, a falta de uma preocupação
mais apurada com o ambiente e o não acompanhamento do ritmo de crescimento urbano pela
implantação de redes de infra-estrutura sanitária acarretaram, principalmente nas últimas
décadas, a degradação crescente dos núcleos urbanos no Brasil e, com especial intensidade,
dos espaços mais densamente povoados, as regiões metropolitanas.
28
A escala alcançada pelas metrópoles, associada ao seu padrão de urbanização, está
diretamente relacionada ao nível e à intensidade dos fenômenos de degradação ambiental.
Assim, tanto a excessiva dispersão periférica da população, quanto a sua excessiva
concentração geram impactos negativos sobre as condições de instalação/preservação das
redes de serviços que sustentam a vida urbana, assim como, dos recursos ambientais que são
indispensáveis ao funcionamento destas redes.
Por esta razão, devemos refletir o meio como um sistema (mais ou menos flexível) capaz de
absorver e aliviar tensões apenas até determinados limites, além dos quais, encontra-se
comprometida a sua capacidade de auto-depuração, seja por restrição parcial e condicionada,
seja pela ‘apatia’ ou ‘incapacidade’ da natureza em garantir o equilíbrio e o funcionamento de
mecanismos de regeneração. Todo o ‘supersistema’ controlado pela atual base técnica que
opera sobre a Terra é dependente da base de recursos naturais que nela existe. Esta
capacidade, porém, é limitada por características específicas do planeta. Na medida em que
se rompe essa capacidade de suporte, ou ‘capacidade de carga’ (Arrow et al., 1995), e isso se
dá em função das atividades humanas, ocorre uma redução dos ‘serviços’ oferecidos pela
biosfera à humanidade (Bellen, 2005); a essa redução, chamamos degradação ambiental
(Araújo et al., 2005), e suas características se relacionam à atividade desempenhada sobre a
base física em que tal redução se dá, podendo estar atrelada a numerosos fatores como
distúrbios climáticos, processos naturais de erosão e formação do solo, ‘invasão natural de
plantas ou animais nocivos’, ou pela ação antrópica, direta ou indireta (Araújo et al., 2005).
Sua identificação, quando relacionada à ação do homem, muito dependerá da maneira como é
compreendido o processo de degradação, e, ainda, das noções adotadas pelo conceito
antagônico de sustentabilidade.
Devemos esclarecer que o conceito de sustentabilidade envolve, intrinsecamente, a noção de
tempo na sua concepção; a sustentabilidade “só pode ser observada a partir da perspectiva
futura, de ameaças e oportunidades” (Bellen, 2005, apud Bossel, 1998,1999). Por outro lado,
trata-se de um conceito fortemente imbuído de valores, pois se vincula a princípios éticos,
morais, “às crenças e aos valores que fundamentam uma sociedade ou comunidade...” (Bellen,
2005, apud Dahl, 1997).
29
Na medida em que o entendimento da sustentabilidade perpassa por convicções sociais,
devemos refletir que, se tais convicções emergem de um processo evolutivo nas diferentes
sociedades, a noção de sustentabilidade, sua operacionalização e a identificação de seus
atributos devem co-evoluir “em interação mútua” com as concepções dos povos (e dos
grupos) para que o sistema “permaneça viável” (Bellen, 2005). Para Bossel (1999), a
sustentabilidade deve ser entendida a partir das seguintes dimensões: material, ambiental,
social, ecológica, econômica, legal, cultural, política e psicológica, haja vista que “uma
sociedade ambiental e fisicamente sustentável, pode ser psicológica e culturalmente
insustentável” (Bellen, 2005).
Dessa forma, as diferentes ideologias fazem do ambientalismo, no que se refere às dicotomias
entre degradação e sustentabilidade, um campo complexo e dinâmico, porque emergem da
própria complexidade dos indivíduos e das sociedades. Nesta direção, Pearce (1993) nos
aponta dois extremos ideológicos que nos remetem a graus ou níveis possíveis de
sustentabilidade: o tecnocentrismo e o ecocentrismo, expressados, no quadro 01, através de
quatro campos distintos.
Quadro 01: Dimensões do ambientalismo.
Tecnocêntrico Ecocêntrico
Cornucopiana Adaptativa Comunalista Ecologia
Profunda
Exploração de
recursos,
orientação pelo
crescimento.
Conservacionismo
de recursos,
posição gerencial.
Preservacionismo
de recursos.
Preservacionismo
profundo.
Rótulo
Ambiental
Economia
antiverde, livre
mercado.
Economia verde,
mercado verde
conduzido por
instrumentos de
incentivos
econômicos.
Economia verde
profunda.
Economia
steady-state,
regulação
macroambiental.
Economia verde
muito profunda,
forte regulação
para minimizar a
tomada de
recursos.
Tipo de
Economia
Objetivo
econômico,
maximização do
crescimento
econômico.
Considera que o
mercado livre
em conjunção
Modificação do
crescimento
econômico, norma
do capital
constante, alguma
mudança de
escala.
Crescimento
econômico nulo,
crescimento
populacional
nulo.
Perspectiva
sistêmica, saúde
do todo
Reduzida escala
da economia e da
população.
Imperativa
mudança de
escala,
interpretação
literal de Gaia.
Estratégia de
Gestão
30
com o progresso
técnico deve
possibilitar a
eliminação das
restrições
relativas aos
limites e à
escassez.
(ecossistema),
hipótese de Gaia
e suas
implicações.
Direitos e
interesses dos
indivíduos
contemporâneos,
valor
instrumental da
natureza.
Eqüidade intra e
intergerencial
(pobres
contemporâneos e
gerações futuras),
valor instrumental
da natureza.
Interesse coletivo
sobrepuja o
interesse
individual, valor
primário dos
ecossistemas e
valor secundário
para suas funções
e serviços.
Bioética (direitos
e interesses
conferidos a
todas as
espécies), valor
intrínseco da
natureza.
Ética
Sustentabilidade
muito fraca.
Sustentabilidade
fraca.
Sustentabilidade
forte.
Sustentabilidade
muito forte.
Grau de
Sustentabilidade
Fonte: retirado de Bellen (2005).
O quadro acima nos traz as quatro dimensões do ambientalismo, estruturada a partir de
diferentes concepções ideológicas, estabelecendo características do tipo de economia, as
estratégias de gestão (impactos sobre a economia), os parâmetros éticos e os respectivos graus
de sustentabilidade, a elas relacionadas. Observamos que tais dimensões se aproximam dos
padrões políticos de estruturação da sociedade contemporânea, na medida em que tendências
tecnocêntricas mais acentuadas remetem a padrões políticos neoliberais (plena economia de
mercado e mínima regulação). Nessa concepção enquadra-se o momento histórico atual,
vivido pela maior parte dos povos do ocidente. No outro extremo, as tendências ecocêntricas
mais amenas remetem aos padrões da economia planificada, com parâmetros de regulação
mais rígidos e padrões de consumo equilibrados, enquanto a as tendências ecocêntricas mais
radicais remetem ao total controle sobre o uso de recursos e as esferas do consumo e
produção.
Podemos considerar que a concepção de sustentabilidade tem sua origem nos anos 70, quando
uma associação de cientistas políticos e empresários, denominada Clube de Roma, encomenda
um conjunto de estudos sobre os impactos do desenvolvimento no meio ambiente resultando,
em 1972, no relatório TheLimits of Growth. O quadro 2 traz o histórico das ações nas últimas
três décadas em prol da sustentabilidade.
31
A partir dele, evidencia-se uma série de iniciativas vinculadas ao pensamento dos princípios
que irão nortear, no início dos anos 90, as concepções de desenvolvimento sustentável. O
quadro 3, adaptado de Bellen (2005), nos traz a estruturação de alguns dos pensamentos mais
importantes sobre sustentabilidade no período relatado.
As diversas concepções sobre sustentabilidade, precisamente com enfoque no
desenvolvimento sustentável, evidenciam a diversidade de conceitos formuladas em função de
distintos campos ideológicos. É sabido, porém, que todo desenvolvimento, independente do
modelo adotado, implica em algum grau de degradação ao meio ambiente, na medida em que
“existe um limite físico dentro do qual uma economia pode operar” (Bellen, 2005). Neste
sentido, uma das abordagens considerada de suma importância para se alcançar a
sustentabilidade, é a descrita por Robert et al. (1995) em que a natureza deve sobreviver
independente de seu valor econômico (natural step), e se fundamenta em quatro condições
(Bellen, 2005, apud Robert et al., 1995) abaixo relacionadas:
- As substâncias na crosta terrestre não devem aumentar sistematicamente na ecosfera;
- As substâncias produzidas pela sociedade não devem aumentar sistematicamente na
ecosfera;
- A base física para a produtividade e a diversidade da natureza não deve ser sistematicamente
reduzida;
- Os recursos devem ser utilizados correta e eficientemente com relação ao alcance das
necessidades humanas.
32
Quadro 2: Histórico das ações mundiais pela sustentabilidade.
Período Responsável Iniciativa Princípio
1972 Clube de Roma
Produção do relatório
The Limits to Growth
Rompe com a idéia da ausência de
limites para a exploração dos recursos
da natureza, contrapondo-se à
concepção dominante de crescimento
contínuo da sociedade industrial.
1972 ------------
Conferência de
Estocolmo
Têm como foco central a preocupação
com o crescimento populacional, o
processo de urbanização e a tecnologia
envolvida na industrialização.
1973 Ignacy Sachs
Surgimento do
Conceito de
Ecodesenvolvimento
A formulação do novo modelo aborda
prioritariamente a questão da
educação, da participação, da
preservação dos recursos naturais
juntamente com a satisfação das
necessidades básicas. Referindo-se
inicialmente aos países periféricos,
logo evidenciou-se, a partir do
conceito, a interdependência entre
desenvolvimento e meio ambiente.
Conferência das
Nações Unidas sobre
Comércio e
Desenvolvimento e do
Programa de Meio
Ambiente das Nações
Unidas
1974
Organização das
Nações Unidas
(ONU)
Declaração de
Cocoyok
Inova a relação entre meio ambiente e
desenvolvimento através do
lançamento de hipóteses como a
afirmativa de que a explosão
populacional é decorrente da absoluta
falta de recursos em alguns países, a
destruição ambiental também decorre
da pobreza e os países desenvolvidos
têm uma parcela de culpa nos
problemas globais, uma vez que têm
um elevado nível de consumo.
1975
Fundação Dag-
Hammarskjöld e
o Programa de
Meio Ambiente
da ONU
Produção de relatório
Enfoca as relações do poder com a
degradação ambiental, destacando as
potencialidades da mobilização das
forças capazes de mudar as estruturas
dos sistemas vigentes, possibilitando o
surgimento de um novo
desenvolvimento.
Conferência ECO 92
1992 ONU
Documento
Agenda 21
(estabelece um
plano de ação
composto por 40
capítulos)
A interligação entre desenvolvimento
social e econômico e as
transformações do meio ambiente
entou no discurso oficial da maioria
dos países do mundo, e a percepção da
relação entre problemas do meio
ambiente e o processo de
desenvolvimento se legitima pelo
surgimento do conceito de
desenvolvimento sustentável.
Fonte: adaptado de Bellen (2005).
Segundo Bellen (2005, apud Hardi e Barg, 1997), na medida em que é impossível
prever detalhadamente a “dinâmica da sustentabilidade humana e natural”, é difícil
avaliar precisamente as condições de sustentabildade dentro de determinado
desenvolvimento, apesar de podermos apontar sua direção. O debate contemporâneo
em torno da sustentabilidade faz-se então a partir de aspectos distintos do conceito,
sugerindo a incorporação de elementos relacionados ao tripé já consensuado economia,
ecologia e bem-estar humano. Para Sachs (1997), o conceito de sustentabilidade deve
abranger cinco dimensões (social, econômica, ecológica, geográfica e cultural). O fato
é que um conceito com tão distintas concepções ideológicas, fica difícil de ser
operacionalizado, modelado e avaliado.
Da perspectiva econômica, a sustentabilidade é compreendida como estoques e fluxos
de capital, na medida em que está aberta a considerar não só como capital os
convencionais monetário e econômico, mas também diferentes outros tipos como o
capital humano, o capital social e o capital ambiental ou natural
2
. Trata-se, para os
economistas, da manutenção do capital em todas as suas formas, conforme nos coloca
Bellen (2005). Para ele, os economistas tendem a ser otimistas no que se trata da
capacidade humana de se adaptar a novas realidades e resolver problemas por sua
capacidade técnica. A aceitação ou não das trocas entre as diferentes modalidades de
capitais remetem ao debate sobre a estruturação de graus ou uma escala ou hierarquia de
sustentabilidade, dando origem a algumas correntes do pensamento econômico sobre
sustentabilidade. Num conceito de sustentabilidade forte todos os níveis de recursos
devem ser mantidos, enquanto na sustentabilidade fraca admite-se trocas entre tipos de
capitais, desde que se mantenha constante seu estoque (Turner, 1993).
Na perspectiva social, a sustentabilidade se refere não só aos níveis de bem estar dos
indivíduos e grupos, “a condição humana e os meios para aumentar a qualidade de vida
dessa condição” (Rutherford, 1997), mas também às garantias de acesso a condições
(materiais) de vida, a capacidade da sociedade de reagir aos processos individual e
coletivamente (Ribeiro, 2005) e a preservação e reprodução do capital humano como
garantia de reprodução da própria base social. Para Sachs (1997), a sustentabilidade
2
Para Turner (1993), o capital natural é constituído pela base de recursos renováveis e não-renováveis,
pela biodiversidade e pela capacidade de absorção de dejetos dos ecossistemas.
36
social refere-se a “um processo de desenvolvimento que leve a um crescimento estável
com distribuição eqüitativa de renda, gerando, com isso a diminuição das atuais
diferenças entre os diversos níveis na sociedade e a melhoria das condições de vida das
populações”.
No âmbito ambiental (ecológico ou natural), a sustentabilidade remete às preocupações
constantes com os impactos das atividades antrópicas sobre o meio ambiente, tendo em
vista que “a produção primária”, oferecida pela natureza, é a base fundamental sobre a
qual se assenta a espécie humana (Bellen, 2005). Essa abordagem implica em
potencializar a capacidade do planeta pela melhor apropriação dos diversos ecossitemas
e seus atributos, reduzindo sua degradação ao menos estágio possível (Bellen, 2005).
Neste sentido, Sachs (1997) observa uma série de ações, como reduzir o uso de
combustíveis fósseis, assim como a emissão de substâncias poluentes, adotar políticas
de conservação de energia e de recursos, substituir recursos não-renováveis por
renováveis e aumentar a eficiência em relação aos recursos utilizados.
Na perspectiva geográfica, orienta-se para alcançar a sustentabilidade, a busca de uma
configuração espacial (territorial urbana e rural) com vistas a proteger a diversidade
biológica e em prol da melhor qualidade de vida dos grupos humanos. Ela envolve
também, a distribuição territorial mais eqüitativa dos assentamentos humanos e das
atividades produtivas.
Finalmente, na visão cultural, sustentabilidade significa a maior ou menor capacidade
de preservação da cultura e características locais e regionais, em detrimento da
padronização cultural global, imposta pelos grandes centros do mundo, ou cidades
mundiais. Tal uniformização é viabilizada, principalmente, pela acelerada ampliação da
base técnica - tecnologias de informação e comunicação - e pela perda do potencial
crítico pela padronização cultural (ciclo) e desinstrumentalização educacional. Ela se
associa ao reconhecimento do lugar e à incorporação de um senso maior de pertinência.
Nesta direção, Sachs (1997) nos coloca que a sustentabilidade cultural está relacionada
ao caminho da modernização sem o rompimento da identidade cultural dentro de
contextos espaciais específicos.
37
Assim, o reconhecimento das múltiplas dimensões e sua capacidade real de interação,
das fragilidades e das potencialidades do(s) sistema(s), é o primeiro passo para a
compreensão dos impactos destas interações e, consequentemente, de uma proximidade
mais efetiva na elaboração de modelos adequados de quantificação e qualificação das
relações de sustentabilidade, possibilitando o desenvolvimento de métodos e técnicas
direcionadas ao planejamento ambiental, urbano e regional com vistas à implementação
de melhorias significativas na vida das populações.
38
2.2. Contextualizando índices ambientais: o que são e para que
servem
O termo índice se remete a relação entre os valores de qualquer medida ou gradação e é,
numa divisão ou gradação, o objeto móvel que fornece indicação de qualidade ou
denota características especiais. Índices ambientais são, portanto, o conjunto de
atributos que, por sua gradação, fornecem as características do meio ambiente. Eles são
o último patamar da pirâmide de informações (Hammond et al., 1995, in Bellen, 2005),
sendo a instância mais próxima a formulação das políticas públicas e tomadas de
decisão.
Ilustração 02: Pirâmide de Informações:
Fonte: Bellen, 2005, apud Hamoond, 1995.
Podemos dizer, de forma simplificada, que os índices são, normalmente, formados por
um sistemas de indicadores formulados e selecionados em ‘diferentes níveis
hierárquicos de percepção’, desenvolvidos a partir da agregação de dados em nível
mais baixo (pirâmide de informações), por um relação, ou de forma mais complexa,
como o resultado de um modelo ou simulação (Bellen, 2005).
Como nos traz Bellen (2005), o termo indicador se origina do latim indicare, que
significa descobrir, apontar, anunciar, estimar (Bellen, 2005, apud Hammond et al.,
1995). Neste sentido, ‘os indicadores podem comunicar ou informar sobre o processo
39
em direção a uma determinada meta, como, por exemplo, o desenvolvimento
sustentável, mas também podem ser entendidos como um recurso que deixa mais
perceptível uma tendência ou fenômeno que não seja imediatamente detectável’ (Bellen,
2005, apud Hammond et al., 1995), como a degradação ambiental.
Devemos compreender um indicador como um parâmetro, ou valor derivado de
parâmetros que apontem e fornecem informações sobre o estado de um fenômeno, com
uma extensão significativa (Bellen, 2005, apud OECD
3
, 1993).
Segundo Gallopin (1996), indicadores também podem ser entendidos como uma
variável, que se relaciona a um atributo específico, que não pode ser diretamente
representado; é, portanto, uma representação operacional de atributos de um sistema,
como qualidades, características, propriedades. Assim, o quanto uma variável será fiel
ao atributo que ela representa, é uma conseqüência da habilidade do pesquisador, tanto
quanto dos limites e dos propósitos da pesquisa (Bellen, 2005).
Conforme nos traz Gallopin (1996), os indicadores mais desejados são aqueles que
simplificam informações, sem mascará-las e dissolve-las, fazendo com que fenômenos
que ocorrem na realidade se tornem mais visíveis.
Conforme Bellen (2005), Tunstall (1994 e 1992) fornece as principais funções dos
indicadores, a saber:
- Avaliação de condições e tendências;
- Comparação entre lugares e situações;
- Avaliação de condições e tendências em relação às metas e aos objetivos;
- Prover informações de advertência;
- Antecipar futuras condições e tendências.
Indicadores podem ser quantitativos ou qualitativos. Ele nos aponta que, para um
grande número de autores, os indicadores mais adequados para mensurar o
desenvolvimento sustentável (e a degradação ambiental) deveriam ser mais qualitativos,
“em função das limitações explícitas ou implícitas que existem em relação a indicadores
simplesmente numéricos” (Bellen, 2005). Para Gallopin (1996), são preferíveis os
3
OECD – Organization for Economic Cooperation and Development.
40
indicadores qualitativos em três situações: 1) quando não forem disponíveis
informações quantitativas; 2) quando o atributo de interesse é inerentemente não
quantificável; 3) quando determinações de custo assim o obrigarem. Bellen (2005)
ainda nos lembra que atributos qualitativos podem ser associados, por vezes, a notações
quantitativas.
Por fim, Bellen, 2005, apud, Meadows (1998) traz uma contribuição bastante
significativa, dizendo que a utilização de indicadores “é uma maneira intuitiva de
monitorar complexos sistemas, que a sociedade considera importantes e precisa
controlar”. Para ela, um indicador ambiental funciona como um termômetro, que
mesmo não medindo um sistema específico do corpo humano, dá uma preciosa
informação sobre a saúde. “Eles são elementos importantes” – representativos – “da
maneira como a sociedade entende seu mundo, toma suas decisões e planeja a sua ação”
(Bellen, 2005, apud Meadows, 1998). Os indicadores estão inseridos em culturas
específicas. A sociedade mede o que valoriza. Para Meadows (1998), eles são
instrumentos de mudança da sociedade: “A sociedade mede o que valoriza e aprende a
valorizar aquilo que mede”. Trata-se de um processo de retroalimentação bastante
natural para a autora.
Para Dias et al. (2003), o termo ‘indicador ambiental’ refere-se a “uma quantidade
derivada de uma variável poluente e usada para refletir tributos ambientais. Indicadores
ambientais podem ser representados individualmente ou agregados de maneira a formar
um índice ambiental”. Um ‘índice’ é um número derivado de dois ou mais indicadores.
Na computação do índice o primeiro passo é, freqüentemente, computar os indicadores
individuais, um para cada poluente; sendo então referidos como ‘sub-índices’.
A qualificação de índices ambientais e sua valorização na construção de políticas
públicas têm sido cada vez mais freqüente e relevante, face às, cada vez maiores,
exigências sobre os padrões de qualidade de vida e ambiental, dado o estresse urbano, e
pela intensificação do uso do solo e das novas relações espaço-temporal (Santos, 1997 e
Harvey, 1999), orientadas fundamentalmente pela noção de desmistificação do tempo e
pelas novas formas de organização do tecido social (Ribeiro, 2003). Os índices de
qualidade de vida e do ambiente, e de condições de vida servem, não só para viabilizar
uma avaliação comparativa da qualidade de vida e do ambiente na região estudada,
41
como também, para auxiliar no processo de planejamento das cidades e micro-regiões,
no que se refere à integração entre meio ambiente e desenvolvimento social e
econômico.
Braga et al. (2003) mostra que os índices ambientais existentes são ‘modelos de
interação atividade antrópica/meio ambiente’ que podem ser classificados segundo três
categorias principais de indicadores: estado, pressão e resposta. Neste sentido, enquanto
indicadores de estado se referem à situação presente dos sistemas naturais (física ou
biológica), indicadores de pressão tentam avaliar os impactos das atividades antrópicas
sobre os sistemas naturais, e indicadores de resposta observam a qualidade das políticas
formuladas para minimizar os impactos do homem sobre o meio (Braga et al 2003, apud
Herculano, 1998, Isla, 1998 e ESI, 2002).
A uma primeira dificuldade em torno do tema que é a multiplicidade de conceitos e
concepções sobre sustentabilidade e qualidade ambiental, considerando que a
abordagem conceitual utilizada sobre sustentabilidade urbana foi extraída de Acserald
(1999), onde “uma cidade é considerada sustentável na medida em que é capaz de evitar
a degradação e manter a saúde de seu sistema ambiental, reduzir a desigualdade social,
prover seus habitantes de um ambiente construído saudável, bem como construir pactos
políticos e ações de cidadania que o permitam enfrentar desafios presentes e futuros”.
Uma segunda dificuldade se refere ao processo de compatibilização de diferentes dados,
de diferentes origens, “produzidos a partir de escalas distintas, com cobertura e
distribuição espacial e temporal diversas” (Acserald, 1999).
O índice de sustentabilidade urbana, desenvolvido por Braga et al (2003), foi inspirado
no ‘estudo sobre o ambiente, a população, a economia, a sociedade e a vida política’
(Braga et al, 2003) e no Environmental Sustainability Index (ESI, 2002). Este índice é
composto a partir da hierarquização de quatros índices temáticos:
(1). Índice de Qualidade do Sistema Ambiental (indicador de estado): baseado em Paula
(1997), este índice mede a saúde do sistema ambiental através da qualidade da água e da
biota existente nos sedimentos do rio. Pressupõe o rio como um “testemunho-síntese”
do sistema ambiental, na medida em que este registra as agressões ambientais da bacia
42
de drenagem, a partir das alterações do uso do solo. Tem como indicador a qualidade da
água e é composto pela variável ‘índice de qualidade da água no período de chuva’;
(2). Índice de Qualidade de Vida (indicador de estado): baseado em Sen (2000), mede
aspectos de qualidade da vida humana e do ambiente construído. Utiliza, na sua
composição, parâmetros associados ao desenvolvimento humano, que reflete o conjunto
das oportunidades que o indivíduo tem a seu favor para alcançar ‘funcionalidades
4
’.
Neste caso, destacamos os indicadores condições de vida, com as variáveis
‘saúde/longevidade’, ‘educação’ e ‘criança’, e renda, com a variável ‘renda’. O outro
grupo de parâmetros reflete a qualidade do ambiente construído para o “provimento de
condições adequadas a uma vida humana saudável”. É composto pelos indicadores
qualidade da habitação, com as variáveis ‘percentual de habitações subnormais’ e
‘densidade por cômodo’; e conforto ambiental, com as variáveis ‘área verde’ e
‘ocorrência de perturbações ruidosas por população total’;
(3). Índice de Redução da Pressão Antrópica (indicador de pressão): mensura o estresse
exercido, principalmente, pela urbanização e pelas atividades econômicas “sobre o
sistema ambiental local” (estresse interno nas cidades e no seu entorno). Tem como
indicadores a redução da pressão urbana, com as variáveis ‘mudança percentual na
população projetada em 25 anos’, ‘índice de serviços sanitários urbanos e índice
sanitário crítico’, ‘número de veículos por população urbana’ e ‘percentual de
domicílios em área de risco’; a redução da pressão industrial, com as variáveis
‘emissão de poluentes hídricos por valores máximos de emissão permitidos na
legislação’, ‘intensidade energética’, ‘intensidade no uso da água’ e ‘percentual do
território ocupado pela produção de carvão vegetal’, e redução da pressão da
agropecuária e silvicultura, com as variáveis ‘densidade de lavouras e pastagens no
município’, ‘taxa de crescimento média de lavouras e pastagens nos 10 últimos anos’ e
‘área ocupada com matas e florestas plantadas por área ocupada com matas e florestas
naturais nos estabelecimentos agrícolas';
4
Funcionalidade, segundo Sen (2000), se refere não só às conquistas elementares como nutrição, abrigo e
saúde, mas, também, ao desenvolvimento da auto-estima e das formas de integração social.
43
(4). Índice de Capacidade Político-Institucional (indicador de resposta): mede a
capacidade dos sistemas político, institucional, social e cultural locais de superar as
principais barreiras e oferecer respostas aos desafios presentes e futuros de
sustentabilidade. Tem como indicadores a autonomia político-administrativa, com as
variáveis ‘autonomia fiscal’, ‘endividamento público’ e ‘peso eleitoral’; políticas
públicas ambientais, com as variáveis ‘discurso ambiental’, ‘prática da intervenção
ambiental’, ‘grau de distanciamento discurso e prática’; gestão ambiental industrial,
com as variáveis ‘discurso ambiental’, ‘prática da intervenção ambiental’, ‘grau de
distanciamento discurso e prática’; e intervenção da sociedade civil, com as variáveis
‘organização ambientalista’, ‘organização sócio-política’, ‘participação político-
eleitoral’ e ‘peso da imprensa local’.
A escolha dos parâmetros a serem adotados considerou critérios de relevância e
capacidade da variável em traduzir o fenômeno, aderência local, disponibilidade,
cobertura e atualidade dos dados e capacidade da variável em permitir comparações
temporais. Tais parâmetros viabilizam não só a criação de indicadores adequados à
realidade da região em estudo, como, também, permitem seu cálculo para outras
localidades.
O uso de índices na avaliação de qualidade das águas tem sido cada vez mais freqüente.
Dentre estes, um dos mais importantes é o IQA, da NSF (National Sanitation
Fundation), que vem sendo utilizado inclusive por órgãos estaduais e federais
brasileiros, como o Centro de Recursos Ambientais (CRA/BA) e a Agência Nacional de
Águas (ANA), e serviu de base para o desenvolvimento do Índice de Qualidade de
Água da Companhia de Tecnologia em Saneamento Ambiental (CETESB/SP). O índice
da NSF (USA) foi composto através da consulta a 142 especialistas em qualidade de
água em todo o mundo que estabeleceram nove parâmetros de qualidade de água, com
pesos distintos, dentre os 35 parâmetros propostos inicialmente para avaliação.
Segundo Dias et al. (2003, apud Ott, 1978), os índices ambientais incluem “variáveis
poluentes refletindo a qualidade destes liberados no meio ambiente e não a quantidade,
realmente, presente após ter ocorrido à difusão e mistura”. Para cada parâmetro, foram
estabelecidas “curvas de variação da qualidade da água”, “sintetizadas em um conjunto
de curvas médias para cada parâmetro” e descritas em Ott (1978).
44
Outro estudo mostra a aplicação de índices no estudo da qualidade da água no Rio
Itapicuru, na Bahia, (Mestrinho, 2003) através do Índice de Qualidade de Água (IQA)
da National Sanitation Fundation (NSF). O trabalho mostra uma descrição bastante
detalhada da área, enfatizando que a região apresenta “um quadro social caótico em
contraste com a potencialidade dos recursos naturais disponíveis” (Mestrinho, 2003),
acrescenta ainda que existem poucos estudos em torno do diagnóstico e monitoramento
dos impactos ambientais sobre as águas na região. A metodologia de trabalho de
Mestrinho (2003) consiste na definição de 5 pontos a partir de “critérios de abrangência
espacial e pontos estratégicos, entendidos como aqueles próximos a maior ocupação e
circulação de pessoas...”. Foram utilizados procedimentos recomendados no Guia de
Coleta e Preservação de Amostras (CETESB, 1994), e Standard Methods for the
Examination of Water and Wastewater (1998). Em cada ponto foram medidos os
parâmetros físico-químicos pH na água e sedimento, sólidos totais dissolvidos (STD),
salinidade, oxigênio dissolvido (OD), condutividade elétrica e temperatura do ar e da
água, enquanto os parâmetros de demanda bioquímica de oxigênio (DBO), coliformes
fecais, nitrogênio total e turbidez foram analisados em laboratório. Para classificação da
qualidade da água pelo IQA, a autora utilizou as curvas de qualidade da NSF.
Mestrinho (2003) observa que uma só campanha de amostragem mostrou-se insuficiente
para “estabelecer relações do tipo causa e efeito para qualidade das águas”, além de
apontar para o comprometimento da qualidade das águas da bacia, a partir da
incorporação de novas atividades, oriunda de um processo de desenvolvimento
inadequado.
Na sua metodologia do trabalho Avaliação da Qualidade das Águas Superficiais na
Microbacia do Rio Dourados Utilizando o Índice de Qualidade de Águas IQA-NSF,
Dias et al (2003), explicita que foram estabelecidos 10 pontos de coleta (com pelo
menos duas amostras anuais), cujas amostragens foram realizadas entre 1999 e 2002.
Como já foi dito, o índice aplicado para avaliação da qualidade da água foi o IQA - NSF
(USA), e os parâmetros DBO, coliformes fecais, fosfato total, nitrogênio nitrato, OD,
pH, sólidos totais, temperatura e turbidez foram analisados em laboratório, segundo
procedimentos recomendados pelo Standard Methods for the Examination of Water and
Wastewater (1998).
45
Segundo Dias et al (2003), das 160 amostras, em 10 ocorreram eventos de chuvas e a
não ocorrência de chuva pode proporcionar o aumento da concentração de compostos
poluidores nos mananciais estudados. O IQA-NSF é utilizado pela CETESB/SP com
adaptações, utilizando o parâmetro Nitrogênio Total. O estudo, porém, aplicou o
“parâmetro de nitrogênio nitrato”, conforme Ott (1978). Não houve comprometimento
das águas da micro-bacia do Rio Dourados (Bacia do Paraná - MS), na medida em que
67,5% das amostras são de boa qualidade, legando ao rio, durante seu percurso, a
'responsabilidade' pela recuperação do corpo hídrico e assinala para a necessidade de
aumento do número de pontos de coleta, viabilizando um melhor monitoramento do
sistema.
O Índice de Sustentabilidade da Água Urbana (ISAU), em desenvolvimento por Cunha
e Ferreira (2005), remete ao pensamento sobre a cidade sustentável. Sua concepção,
expressa na tabela 01, utiliza-se dos conhecimentos sobre os efeitos do uso indevido da
água urbana, da quantidade e qualidade da água e de suas influências no ambiente e na
saúde humana, além do atendimento pelos serviços de esgotamento sanitário (Ferreira &
Cunha, 2005).
O índice é definido a partir de indicadores que explicitem os múltiplos usos da água e os
conflitos deles decorrentes. Assim, baliza-se no IQA/NSF, e tem sua formulação a partir
de 11 parâmetros, oriundos dos serviços de água e esgoto e encontrados no Sistema
Nacional de Informação sobre Saneamento (SNIS, 2000 e 2001). Foram definidos 6
parâmetros para a água e 5 parâmetros para esgoto, conforme nos apresenta a Tabela 02-
A, onde são mostrados os indicadores consolidados usados no índice de sustentabilidade
da água urbana, com os respectivos pesos e notas para a cidade do Rio de Janeiro. A
Tabela 02-B mostra os critérios para definição da qualidade, segundo o ISAU.
A tabela a seguir traz a relação de indicadores consolidados usados no Índice de
Sustentabilidade da Água Urbana, com os respectivos pesos e notas para a Cidade do
Rio de Janeiro.
46
Tabela 02-A: Indicadores utilizados no ISAU.
Indicadores Peso (p
i
) Nota (I
i
)
Ano base 2000
Nota (I
i
)
Ano base 2001
Consumo médio per capita de água 0.100 58.17 57.65
Índice de atendimento urbano de água 0.100 87.50 87.30
Índice de perdas na distribuição 0.075 42.20 42.20
Índice do consumo de água 0.100 42.32 42.32
Consumo médio de água por economia 0.050 42.88 45.32
Índice de atendimento total de água 0.075 89.47 89.47
Índice de coleta de esgotos 0.100 81.60 81.60
Índice de tratamento de esgoto 0.100 60.24 62.33
Índice de atendimento urbano de esgoto
referido ao(s) município(s) atendido(s)
com água
0.100 47.40 47.40
Índice de esgoto tratado referido à água
consumida
0.100 58.45 59.15
Índice de atendimento total de esgoto
referido aos municípios atendidos com
água
0.100 56.09 57.22
Fonte: Cunha e Ferreira (2005). Implicações e Perspectivas da Sustentabilidade Ambiental no
Abastecimento e na Qualidade da Água Urbana.
Tabela 02-B: Critérios de qualidade elaborados a partir do ISAU
Faixa do índice de sustentabilidade
de água urbana
Critérios de qualidade
0 - 19 Péssimo
20 - 36 Ruim
37 - 51 Aceitável
52 - 79 Bom
80 - 100 Ótimo
Fonte: Cunha e Ferreira (2005). Implicações e Perspectivas da Sustentabilidade Ambiental no
Abastecimento e na Qualidade da Água Urbana.
Embora o peso dos parâmetros ainda esteja em discussão, o ISAU representa um avanço
significativo no estudo dos ecossistemas urbanos, podendo ser considerado como um
importante componente num indicador de sustentabilidade ambiental.
47
Capítulo 3 - Procedimentos Metodológicos
O desenvolvimento metodológico desta dissertação utilizou-se das prerrogativas de
pesquisa aplicada, exploratória e descritiva. Quanto à forma de abordagem do problema
teve aspectos norteadores quantitativos e qualitativos (Lakatos & Marconi, 1993;
Minayo, 1993; Barros & Lehfeld, 1999; Gil, 1999; Goldenberg, 1999).
Dessa forma, o trabalho de pesquisa foi desenvolvido a partir do reconhecimento
sistemático da região que compreende o Canal do Cunha.
O primeiro momento corresponde ao estudo do processo de evolução urbana e ocupação
da Baixada de Inhaúma (sub-bacia). Posteriormente, foi realizado um diagnóstico da
área, delineando o padrão e percentuais aproximados das formas de uso e das categorias
de ocupação do solo na região, utilizando plantas cadastrais e o mosaico aéreo das
últimas décadas, assim como dados do Censo 1991 e 2000 (Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística - IBGE), do Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento
(SNIS, 2000, 2001, 2002 e 2003), Anuários Estatísticos do Instituto Pereira Passos e
outras fontes de informação, como a Fundação CIDE, Armazém de Dados da Prefeitura
do Rio de Janeiro, Secretarias Municipais de Meio Ambiente, Urbanismo e Habitação.
Também foram usados recursos como imagens de satélite (inclusive imagens retiradas
do Google Earth), fotografias digitais e outros meios de documentação visual.
Pela inexistência de dados urbanos agregados pela unidade territorial bacia hidrográfica,
foi necessário produzir os dados naquela unidade espacial. Neste sentido, o primeiro
passo foi delimitar os bairros compreendidos pela sub-bacia hidrográfica e observar, nos
bairros limítrofes, qual o percentual aproximado da sua contribuição na bacia (ver mapa
09). Assim, com a delimitação dos bairros, regiões administrativas e áreas de
planejamento (ver mapa 08) que integram a sub-bacia concluída, o segundo passo foi
calcular, numericamente, a contribuição aproximada de cada bairro na formulação dos
valores a serem atribuídos à bacia. É necessário esclarecer que, por opção
metodológica, decidiu-se por estabelecer equivalências entre percentuais de participação
dos bairros na bacia e seus atributos, como número de domicílios, áreas naturais, áreas
urbanizadas etc... Embora tal decisão conduza a um pequeno desvio da realidade em
48
função da possível não homogeneidade na distribuição dos atributos, consideramos que
tal desvio se encontra numa faixa de tolerância perfeitamente aceitável para os objetivos
do estudo. Outra alternativa mais rigorosa, porém inviável pelo pouco tempo disponível
para a realização do trabalho, seria considerar os dados agregados pelas centenas de
setores censitários da bacia, dentro desta mesma metodologia de compensação para os
setores limítrofes, mas diminuindo, contudo, o desvio referente à faixa de tolerância.
O segundo momento corresponde à organização dos dados de qualidade da água do
Canal do Cunha, assim como estudos de sua contribuição e lançamentos na Baía de
Guanabara. Tais informações foram fornecidas pela Fundação Estadual de Engenharia
do Meio Ambiente (FEEMA). Este núcleo analítico tem por princípio reconstituir os
impactos sofridos nos últimos vinte e cinco anos na sub-bacia hidrográfica estudada
nesta dissertação, e retratados na qualidade da água do canal a partir de alterações
significativas das suas características, que se expressam por mudanças de tendências
presentes em diferentes parâmetros de qualidade. Busca, também, compreender a
relevância daqueles parâmetros na mensuração e qualificação da degradação ambiental,
ponderando sobre possíveis contribuições que mascarem a realidade constituída pela
sobreposição histórica de um grande número de fontes e processos poluidores.
O terceiro momento corresponde ao levantamento das doenças relacionadas ao processo
de urbanização, analisadas a partir de estudos comparativos em série histórica entre
diferentes regiões da Cidade do Rio de Janeiro. Foram utilizados dados secundários da
Secretaria Municipal de Saúde (SMS / SES-RJ).
O trabalho de pesquisa é coroado com discussão teórica em torno dos mecanismos de
quantificação (e qualificação) da degradação ambiental. Trata-se de um estudo
analítico-comparativo entre índices de sustentabilidade ambiental, de modo a contribuir
com a construção futura de indicadores que levem em conta o real processo de
degradação de áreas urbanas. Trata-se, sobretudo, de uma descrição dos índices e de
análise sobre como eles respondem ao processo de desenvolvimento em suas sucessivas
etapas.
49
Capítulo 4 - Tempos e Espaços: O processo de
ocupação e a história do lugar
3.1. Ocupação urbana – entendendo a periodização
O trecho a seguir corresponde ao processo de evolução da ocupação urbana na sub-
bacia hidrográfica. Trata-se de compreender a lógica em que se deu a formação e o
desenvolvimento da região, para se entender a natureza de seus problemas ambientais e
sociais. Nesta direção, as páginas que se seguem trazem um breve resumo periodizado,
com os fatos mais relevantes que se sucederam e marcaram a transformação da região
rural em solo urbano, com todos os atributos que lhe foram facultados e os que ainda lhe
são característicos, fazendo da sub-bacia uma região bastante peculiar.
Dessa forma, foram detectados três grandes períodos que correspondem ao processo de
evolutivo da ocupação na micro-bacia:
1º) Até o final do século XIX: corresponde a ocupação e usos rurais, vinculadas ao
abastecimento da cidade e exportação de produtos primários. Este período comporta
três momentos relacionados à ocupação das terras pelos Jesuítas, a ocupação das terras
por grandes e médios fazendeiros e, o terceiros momento, já no século XIX, os
primeiros processos de retalhamento do solo em chácaras e sítios, seguidos da
apropriação do eixo ferroviário por moradias populares.
2º) A primeira metade do século XX: corresponde a formação dos bairros tradicionais e
operários, a implantação e consolidação da vocação e usos industriais na região. É neste
momento que se dá o surgimento de um enorme leque de favelas e a apropriação de
grandes áreas pela grande pobreza na sub-bacia. O fim do período denota a afirmação e
crescimento das enormes áreas favelizadas e a implementação de uma política que visa
uma lógica de desenvolvimento metropolitano, em detrimento de uma lógica associada
à harmonia de um desenvolvimento local equilibrado e promissor.
50
3º) A segunda metade do século XX e os primeiros anos do século XXI: corresponde a
inversão da vocação industrial e ao êxodo de fábricas e indústrias; ao surgimento e
crescimento de centenas de favelas e a consolidação de alguns dos maiores complexos
de áreas carentes na cidade do Rio de Janeiro; ao aumento da violência e do
narcotráfico, impelindo outras conotações para além de áreas de pobreza àquelas
tipologias, fundamentalmente às associadas ao medo e à violência; ao encapsulando de
bairros tradicionais por conjuntos e complexos de favelas; à afirmação e intensificação
da política metropolitana, em detrimento da política e interesses locais; e, finalmente, à
apropriação de grandes áreas da Baia de Guanabara, sobre forma de aterro.
3.2. Do século XVI ao século XIX
Os primórdios da ocupação da Baixada de Inhaúma e sua estruturação produtiva
guardam relação com o modelo de colonização de boa parte das terras brasileiras, a
cargo da Companhia de Jesus ou Ordem Jesuítica, e datam da segunda metade do século
XVI. Ela se vincula a até então Sesmaria de Iguaçu, onde foram instalados três
importantes engenhos de açúcar: Engenho Novo, Engenho Velho e São Cristóvão.
Com o uso de mão-de-obra escrava, os jesuítas também mantinham produção de cal e
anil, criavam animais e arrendavam parte das terras do latifúndio (Santos, 1965).
Em 1743 foi criada a Freguesia de Inhaúma, com a instalação da Paróquia de São Tiago
de Inhaúma (Santos, id.), tendo como aspectos naturais relevantes suas inúmeras
nascentes, rios e riachos: Timbau, Faria, Timbó, Inhaúma, Manguinhos, Escorremão e
Gomes (Santos, ibid.).
Em 1759, estas terras foram confiscadas pelo governo do Marquês de Pombal, e, em
1781, foram vendidas em hasta pública. Dessa forma, com a expulsão dos jesuítas, as
propriedades daquelas terras foram transferidas para Manuel de Araújo Gomes, Manuel
Joaquim da Silva e Castro e Manuel Teodoro (Santos, ibid.).
Em 1762 foi criada a Freguesia do Engenho Velho e em 1856 foi criada e Freguesia de
São Cristóvão (Santos, ibid.).
51
No ano de 1873 foi então criada a Freguesia da Nossa Senhora do Engenho Novo
(conforme mapa I, das Freguesias do Rio de Janeiro), tendo seu território sido
desmembrado das Freguesias de São Cristóvão, Inhaúma e Engenho Velho (Santos,
ibid.). Ao longo do século seguinte, a região adensou-se e foi parcelada em chácaras e
sítios, facultando o desenvolvimento de comércio.
Tendo em vista o recenseamento de 1890, observamos que as freguesias de São
Cristóvão, Engenho Novo e Inhaúma tinham, respectivamente, 22.387, 27.752 e 17.421
habitantes. Assim, podemos observar que a população da sub-bacia, já no final do
século XIX, aproximava-se de 67.560 habitantes. Somente a Freguesia de Inhaúma, que
tem sua estação ferroviária (Estação de Inhaúma – ramal Rio D’Ouro) construída no ano
de 1883, entre outras benfeitorias urbanas, teve sua população elevada de 7.444
habitantes em 1879 para 17.421 habitantes em 1890.
Com a instalação, em 1858, da Estrada de Ferro Pedro II – depois denominada de
Central do Brasil - os subúrbios foram definitivamente ocupados principalmente ao
longo da linha e no entorno das estações do primeiro trecho do trem, que circulava entre
o Campo de Santana e o engenho de Queimados (hoje Nova Iguaçu), com as paradas de
Engenho Novo e Cascadura, conforme nos mostra o anexo I, que trás a relação das
estações de trens e ferrovias do Rio de Janeiro, por ano de sua inauguração
5
.
5
O anexo I, retirada de Silveira (no prelo), mostra a abertura dos ramais das Estradas de Ferro D. Pedro
II (Central: ramal de Santa Cruz e ramal de Queimados), Melhoramentos do Brasil (incorporada à
Central), Rio D’Ouro (desativada para dar lugar ao Pré-metrô ou Metrô de superfície - Linha II) e a
Leopoldina (Estrada de Ferro do Norte), segundo ano de inauguração das principais estações.
52
Mapa 01: Freguesias do Rio de Janeiro no século XIX.
53
3.3. A primeira metade do século XX
Em 1903, foi desmembrado da Freguesia do Engenho Novo, o distrito do Méier. E em
1926 seu território foi novamente retalhado, com a criação dos distritos de Madureira e
Realengo.
Entre 1928 e 1933, já se registrava uma grande quantidade de favelas consolidadas e o
surgimento de dezenas de novos núcleos na região da Microbacia do Canal Cunha,
como pode ser visto no mapa 02, de espacialização das favelas cariocas no ano de 1928
(Silva, 2003). Este mapa também mostra o recorte territorial da cidade do Rio de
Janeiro no litoral da Baia de Guanabara com suas formas originais, posteriormente
desconfiguradas pelos sucessivos aterros. Nas décadas posteriores estes núcleos
desenvolveram-se alcançando elevada densidade.
Neste sentido, a década de 20 retrata o primeiro movimento de expansão das favelas
naquela região como um dos principais vetores de crescimento da zona norte da cidade;
o aumento do proletariado e a criação de bairros operários; o crescimento das
atividades produtivas de base urbana; e a implantação sucessiva de indústrias em São
Cristóvão
6
e no Caju.
No final dos anos 20, a Mangueira e o Jacarezinho já são assunto na imprensa. Neste
período tem início o núcleo da favela Joaquim de Queiroz no Complexo do Alemão, que
se desenvolve muito nas décadas posteriores.
6
Com o fim do Império no Brasil e a implantação da República, observamos a desconfiguração dos
espaços de poder relacionados ao antigo regime como forma de transformação da memória nacional
através de alterações associadas ao sistema material de objetos (Santos, 1996) e seus correspondentes
significados. Neste sentido, o Bairro de São Cristóvão, berço material da Realeza Brasileira e alvo de
projetos sucessivos de embelezamento e estruturação no século anterior, tem suas características
transformadas de vila imperial para bairro industrial, como podemos observar no primeiro zoneamento
industrial do Rio de Janeiro elaborado na década seguinte.
54
Mapa 02: Espacialização das Favelas na Cidade do Rio de Janeiro em 1928.
Fonte: Abreu, 1997.
55
Em 1933, o censo predial do Distrito Federal contabiliza 48.192 casebres que
representam 20,58% do total de prédios do Rio de Janeiro (anexo II). Nesta década,
nota-se o grande crescimento das favelas na Região da Sub-bacia Hidrográfica do Canal
do Cunha e o surgimento de loteamentos populares. No âmbito da administração
pública bem como na imprensa, as favelas começam ser associadas à questão social.
Crescem rapidamente nos anos 30 e alcançam visibilidade como emblema da pobreza.
A foto abaixo, feita por Malta, em 1029, retrata o Rio Faria antes da implantação da
Zona Industrial, sofrendo processo de retificação das suas margens.
Ilustração 03: Rio Faria (1929): retificação das margens.
Fonte: Abreu, 1997.
Com a crise econômica na base agrícola nacional e o aumento da industrialização na
capital federal, intensificam-se as migrações oriundas do interior do Estado do Rio de
Janeiro em busca de novas oportunidades num setor industrial insurgente, e em
atividades associadas a comércio e serviços, incrementados em função do novo modelo
produtivo nacional (a indústria). Esta migração contribui para o maior adensando das
regiões mais pobres da cidade, tendo em vista a inexistência de políticas voltadas para a
inclusão desta nova população que chega a cada dia no Rio de Janeiro. O grande
56
crescimento demográfico na Capital da República possibilita o desenvolvimento de um
mercado de terras e estrutura-se o capital imobiliário (pequenos incorporadores),
possibilitando os loteamentos suburbanos e tendo, como conseqüência, a rápida
elevação da densidade demográfica no subúrbio.
Até 1920, as indústrias ocupavam, tendenciosamente, os terrenos mais altos da região,
evitando o risco de enchentes nas várzeas dos rios Faria, Timbó e Jacaré, como é o caso
da Companhia Nacional de Tecidos Nova América, em Del Castilho (em 1924), da
General Eletric, em Maria da Graça (1921), da Cisper (em 1917) e da Marvin (em
1921).
A partir de 1930, novas indústrias localizam-se nas imediações das pioneiras já
instaladas na década de 20, pois “... é a partir de 30 que o Estado passa a intervir no
processo de localização industrial, surgindo dessa iniciativa o Decreto que definiu, pela
primeira vez, uma zona industrial na cidade” (Abreu, 1997 – mapa 03).
No período há um grande estímulo governamental para o desenvolvimento industrial e
urbano, com a instalação de plantas industriais no subúrbio, principalmente nas
proximidades das estradas de ferro Central do Brasil, Leopoldina, Rio Douro e Linha
Auxiliar.
As áreas industriais apresentaram um rápido crescimento da atividade industrial e,
consequentemente, de sua população. Esse incremento fabril, motivado pela crise
provocada pela Segunda Guerra Mundial, veio a acelerar o processo de industrialização
e sua localização na região dos subúrbios. Ele acarretou, também, a rápida
implementação de redes de saneamento que atendia a demanda fabril através de novos
espaços infra-estruturados, como a várzea do Rio Faria e Timbó, “situada entre a
avenida Itaoca e a Estrada Velha da Pavuna, que em 1942, tinha suas obras concluídas,
possibilitando a implantação de algumas indústrias pioneiras” que se transferiam do
centro da cidade e adquiriam muitas chácaras existentes no local, a exemplo “da Fábrica
de Papel Tiamuri”. “O número de fábricas se multiplicaria rapidamente nos anos
seguintes” (Abreu, 1997).
57
Mapa 03: Primeira e Segunda Zona Industrial do Rio de Janeiro.
Fonte: Abreu, 1997.
58
No Distrito do Méier, cresciam favelas nos bairros Lins de Vasconcelos e Engenho
Novo. Em 1933 estes bairros apresentavam elevada concentração de casebres. A favela
do Jacarezinho já possuía, neste mesmo período, em torno de 3.325 casebres (Silva,
2003) e a Mangueira em torno de 2.218 casebres (Silva, 2003).
No final dos anos 40, o distrito do Méier apresentava 17 favelas – concentradas no
Engenho Novo, no Engenho de Dentro e em Lins do Vasconcelos. Tais núcleos já
despontavam desde 1928. Nessa mesma época (década de 1940), já registravam na
Penha 11 favelas (ver mapa 04).
Mapa 04: Espacialização das Favelas no Rio de Janeiro em 1948.
Fonte: Abreu, 1997.
59
A partir de então, começam a surgir favelas em áreas alagadas próximas à Baía e aos
rios, com conseqüentes obras de drenagem e infra-estrutura, conforme Abreu (1997):
“Os dados indicam que, embora o número de favelas fosse maior na Zona Sul, a maioria
da população favelada se localizava nos subúrbios, especialmente no Engenho Novo,
circunscrição que incluía o Jacarezinho”.
A década de 40 registra um novo movimento de expansão e elevação da densidade das
favelas, conforme verificamos nos mapas 04 e 05, com consolidação do subúrbio e
expansão horizontal. Crescimento do Caju e do Jacarezinho. Intensificação das
migrações oriundas do próprio Estado do Rio de Janeiro e dos estados vizinhos de
Minas Gerais e Espírito Santo. Elevado crescimento populacional no Distrito Federal.
No final dos anos 40, crescimento das favelas dos bairros de Engenho Novo, Engenho
de Dentro e Lins do Vasconcelos. A Avenida Presidente Vargas havia sido aberta em
1942, impactando sensivelmente a região e “a Avenida Brasil, inaugurada em 1946, é o
melhor exemplo da associação Estado-indústria no período” (Abreu 1997). Acontecem,
neste período, as obras de saneamento na Várzea do Faria-Timbó.
60
Mapa 05: Incremento da População em Favelas na Década de 50.
Fonte: Abreu, 1997
61
3.4. A segunda metade do século XX e os primeiros anos do século XXI
O elevado aumento na população e no número das favelas cariocas (mapa 05) se
efetivou com o período de expressivo crescimento econômico do governo JK e se dá,
entre outros fatores, com a contínua e crescente migração oriunda do nordeste brasileiro
para aquela capital. O Censo do IBGE de 1960 já assinala a existência de 147 favelas e
de uma população favelada de 337.412 indivíduos cidade do Rio de Janeiro, indicando
um período de rápido crescimento demográfico.
Segundo os dados deste censo, Jacarezinho era a maior favela da cidade; a favela da
Penha contava com 11.727 moradores; e observa-se, também, a consolidação das
favelas no litoral norte onde, nas décadas de 40 e 50, desenvolve-se o Complexo da
Maré, inicialmente sobre palafitas que avançam sobre o espelho d’água da baia e, nas
décadas posteriores, pelos sucessivos aterros que caracterizam a viabilização de
processos evolutivos, tanto na forma urbana, quanto na forma arquitetônica, e que
culminam na excessiva densidade que nos apresenta hoje a região.
Ilustração 04: Praia de Ipicu em 1940 (sem a favela)
Fonte: Abreu, 1997.
62
Ilustração 05: Favela da Maré em 1968 (palafitas)
Fonte: Abreu, 1997.
63
Ilustração 06: Evolução Urbanística do Complexo da Maré.
Ilustração 07: Evolução Arquitetônica do Complexo da Maré.
Ilustração 06: Evolução Urbanística do
Complexo da Maré: palafitas seguidas de
aterro.
Ilustração 07: Evolução Arquitetônica do Complexo
da Maré: surgimento de nova tipologia edilícia.
Fonte: Maré, Vida na Favela (Varella,
Bertazzo e Jacques, 2002).
Fonte: Maré, Vida na Favela (Varella, Bertazzo
e Jacques, 2002).
64
No Méier, 39% da população favelada estava associada à atividade industrial.
Jacarezinho compunha 58% do total de trabalhadores da indústria na região, em 1960 –
em função da localização de grandes indústrias na área saneada do Jacaré no início dos
anos 30. Inicia-se nesse momento um movimento de remoção de favelas.
Em boa parte, a favelização da região em estudo surgiu a partir de loteamentos
inicialmente regulares ou em vias de regularização e que, posteriormente tornaram-se
ilegais ou irregulares por omissão judicial. A ocupação posterior já era considerada
“invasão”. Além desta situação, haviam os casos de autorização de proprietários
públicos e privados. Algumas vezes eram cobradas taxas de aluguel para ocupação dos
terrenos (Silva, 2003).
A Ilha do Fundão teve seu aterro executado para formação da Cidade Universitária em
1960, trazendo prejuízo para o ciclo das águas da Baía e criando um canal entre a Ilha
do Fundão e a sub-bacia hidrográfica.
Intensificam-se as migrações internas da Cidade do Rio de Janeiro em direção a
Baixada de Jacarepaguá (especialmente Barra da Tijuca) e a Zona Oeste, e consolidam-
se processos em diferentes vertentes, com aprofundamento da favelização e reversão
industrial (migração das indústrias e deslocamento do parque industrial,
fundamentalmente para Campo Grande e Santa Cruz).
Nas duas últimas décadas do século XX, são fortalecidos processos de migração interna
na cidade do Rio de Janeiro, com deslocamentos expressivos rumo à Zona Oeste e à
Baixada de Jacarepaguá (Barra e Recreio). Tal fenômeno pode ser observado através
dos mapas 07 e 08, da distribuição da população carioca, por região administrativa, nos
anos de 1970 e 2000.
As décadas de 80 e 90 são marcadas pelo agravamento dos processos de exclusão sócio-
espacial, com o encapsulamento dos bairros tradicionais pela favelização. Também no
período temos a região marcada por um novo processo de fragmentação urbana e
desvalorização do solo, com a abertura de duas novas vias expressas: a Linha Vermelha
e a Linha Amarela, que estavam previstas desde o Plano Agache para o Rio de Janeiro.
65
Ainda, pequenos investimentos em saneamento são feitos no início dos anos 80,
sobretudo em melhorias na rede de abastecimento de água.
Mapa 06: Distribuição da População por RA 1970, Rio de Janeiro.
Fonte: IPP/PCRJ.
Mapa 07: Distribuição da População por RA 2000, Rio de Janeiro
Fonte: IPP/PCRJ.
66
A partir da metade da década de noventa, surge uma nova maneira de se pensar a favela,
priorizando sua integração a malha urbana tradicional e consolidada; e tem, como
desdobramentos, o estabelecimento de medidas emergenciais baseadas na realização de
obras de infra-estrutura naqueles locais (intervenções sobre o espaço público). Trata-se
do programa Favela Bairro, que se estende até a atualidade, sendo dividido em duas
etapas, conforme nos apresenta o quadro que compõe o anexo III, produzida para este
estudo, constando das intervenções daquele programa em favelas da Sub-bacia
Hidrográfica do Canal do Cunha, segundo as duas fases do Favela Bairro.
Somam, na primeira fase do programa, 28 favelas contempladas na Sub-bacia do
Cunha, enquanto, na segunda fase, este número é acrescido de 16 novas favelas. A
primeira fase do programa foi realizada entre os anos de 1993 e 2000. A segunda fase
vai daquele período até os dias de hoje (2006).
67
3.5. Considerações finais
O processo, sofrido pela sub-bacia hidrográfica, do ponto de vista espaço-temporal, vai
no sentido da degradação ambiental (rios, encostas, várzeas) e sócio-espacial
(empobrecimento e favelização contínuos). A ocupação do solo se remete ao
encurtamento, pelos seguidos aterros, do espelho da Baía, assim como do assoreamento
dos rios que nela deságuam.
O adensamento da ocupação, seja residencial, seja industrial, vais intensificando o
desajustamento entre as condições geográficas (muito sensíveis do ponto de vista do
equilíbrio ecológico) e as necessidades sociais.
Por fim, é notório que esta região não tem sido objeto de políticas públicas voltadas para
a população local, mas de demandas que obedeciam outras lógicas como, por exemplo,
a viária e a econômica da metrópole com um todo.
68
Capítulo 5 - Da Baixada de Inhaúma ao Maciço da
Tijuca: Conhecendo o sítio de estudo
O texto que se segue propõe o reconhecimento da sub-bacia hidrográfica a partir de um
recorte descritivo das suas condições sócio-ambientais e dos processos de produção que
hoje espelham a realidade da região.
É preciso, entretanto, compreender que as informações aqui analisadas foram geradas
com base em dados originariamente agregados para outras unidades territoriais. Estes
dados foram utilizados na ausência de informação previamente disponível, agregadas na
unidade das micro-bacias hidrográficas. É preciso também salientar que a ausência de
sobreposição das várias unidades de compartimentação territorial (Linhares, 2006) -
que, algumas vezes, obedecem a lógicas diferenciadas - dificulta, sobremaneira, a
elaboração de estudos ambientais, como demonstra o trabalho que se segue.
A sub-bacia do Canal do Cunha pertence à Bacia da Baía da Guanabara, uma das três
grandes bacias hidrográficas que englobam a cidade do Rio de Janeiro. Ela abrange
parcialmente três Áreas de Planejamento da Cidade (AP1, AP3 e AP4), através de parte
das seguintes regiões administrativas (mapa 08): Portuária (AP1), São Cristóvão (AP1),
Maré (AP3), Ramos (AP3), Madureira (AP3) e Jacarepaguá (AP4); e da totalidade
destas outras: Méier (AP3), Jacarezinho (AP3), Complexo do Alemão (AP3) e Inhaúma
(AP3) (mapa 01). Abrange, também, a totalidade dos seguintes bairros (mapa 09):
Caju, Benfica, Manguinhos, Complexo do Alemão, Engenho da Rainha, Tomás Coelho,
Cavalcante, Engenho Leal, Piedade, Encantado, Água Santa, Engenho de Dentro, Lins
de Vasconcelos, Engenho Novo, Sampaio, Riachuelo, Rocha, São Francisco Xavier,
Vasco da Gama, Méier, Todos os Santos, Cachambi, Abolição, Pilares, Inhaúma, Del
Castilho, Higienópolis, Maria da Graça, Jacarezinho, Jacaré; e, parcialmente, os
seguintes bairros: Complexo da Maré, Bonsucesso, Cascadura, Quintino Bocaiúva,
Mangueira, São Cristóvão e Jacarepaguá, conforme os mapas 08 e 09, abaixo.
69
Mapa 08: Mapa com as divisões por AP, RA e sub-bacia.
Fonte: Instituto Pereira Passos, base Censo 2000 - PCRJ (adaptado).
Mapa 09: Mapa de divisão de bairros e a delimitação da sub-bacia.
Fonte: Instituto Pereira Passos, base Censo 2000 - PCRJ (adaptado).
70
Trata-se de região extremamente densa que, correspondendo a aproximadamente 1/17
da área da cidade, detém quase 1/7 de sua população, além de possuir uma das menores
rendas domiciliares do Rio de Janeiro. É, ainda, uma das sub-bacias da cidade que
concentra o maior número de favelas (IPP, Cadastro de Favelas do Rio de Janeiro)(vide
ilustração 08), contando com sistemas de saneamento inadequados, inexistentes ou
descaracterizados por inúmeras e sucessivas ligações clandestinas.
Os IDHs dos bairros que a compõem são alguns dos mais baixos da cidade. São poucas
as praças públicas e é gritante a inexistência de parques na região (ilustração 08), sendo
o campus da Fundação Oswaldo Cruz, além das áreas pertencentes ao exército, alguns
dos poucos refúgios verdes, sem a impermeabilização do solo, quase maciça,
predominante na região. A pouca arborização das vias também constitui-se numa
característica marcante no local.
Ilustração 08: Complexo da Maré – excessiva densidade, impermeabilização do solo e
ausência de vegetação.
Fonte: Jornal O Globo, 18 de maio de 2003.
71
As tabelas 03A, 03B e 03C (anexo IV) trazem a relação das áreas de planejamento,
bairros, percentuais de contribuição de cada bairro na sub-bacia do Canal do Cunha, o
respectivo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), população, áreas, áreas
urbanizadas, áreas naturais, número de domicílios, número de domicílios particulares
permanentes, disponibilidade de rede geral de abastecimento de água canalizada até o
domicílio (em percentual e número absoluto), disponibilidade de rede geral de
esgotamento sanitário (em percentual e número absoluto), disponibilidade de coleta de
lixo por limpeza pública (em percentual e número absoluto), disponibilidade de coleta
de lixo em caçamba (em percentual), quantidade de domicílios particulares permanentes
sem banheiro (em percentual e número absoluto) e renda domiciliar per capta média em
reais e em números absolutos, incluindo o seu equivalente do percentual de contribuição
de cada bairro na sub-bacia hidrográfica.
A partir das tabelas referidas, podemos observar os valores, referentes à sub-bacia
hidrográfica. Ao compará-los, em percentuais, com os valores relativos à cidade do Rio
de Janeiro (tabelas 04A e 04B), a seguir, observamos a excessiva concentração de
população na região, na medida em que a cidade detém uma população de 5.857.904
habitantes (ano 2000) e a, sub-bacia hidrográfica, uma população aproximada de
839.063 habitantes (ano 2000). No que se refere à dimensão territorial, encontramos,
para a bacia hidrográfica, uma área aproximada de 7.015,99 ha, enquanto a Cidade do
Rio de Janeiro possui uma área total de 122.456,08 ha. Se o número de habitantes do
Rio de Janeiro é somente 6,98 vezes maior que o número de habitantes da bacia
hidrográfica, a disponibilidade territorial da cidade sobre a bacia é da ordem de 17,45
vezes. Isso nos aponta para a existência de um imenso desvio na espacialização da
população carioca, que é comprovado pelas taxas de densidade bruta da Cidade do Rio
de Janeiro, da ordem de 48 hab/ha, e da sub-bacia hidrográfica, da ordem de 119,59
hab/ha (ilustrações 08 e 09). É evidente que este acúmulo de população, e processos
que a ele associados, gera uma pressão adicional e acumulativa sobre a base natural na
qual se assenta. E, em função da qualidade e da quantidade da acumulação material e
do rigor e eficácia da regulamentação de controle dos usos do solo, os impactos sobre a
base natural podem ser mais ou menos rigorosos.
Nas ‘sociedades periféricas
7
’, esta distribuição de investimentos é profundamente desigual e,
em boa parte, determinada pelas necessidades das classes dominantes, o que enfatiza
determinadas áreas da cidade como áreas prioritárias de investimento, assim como
determinados recortes urbanos, que se associam às demandas de circulação do circuito
superior da economia urbana (Santos, 1979).
Outros dados (tabelas 03 e 04) adquirem relevância quando refletimos a degradação
ambiental, como o fato da sub-bacia hidrográfica, com uma área de 7.015,99 ha, ter somente
uma parcela de 415,43 ha de áreas naturais (ilustração 09), o que equivale a apenas 5,92% da
área total da sub-bacia, enquanto o Rio de Janeiro possui uma reserva de áreas naturais
equivalente a 29,83% do seu território, ou seja, 5 vezes maior do que as áreas naturais ainda
remanescentes na Sub-bacia Hidrográfica do Canal do Cunha.
Ilustração 09: Vista aérea da sub-bacia: densidade excessiva e ausência de vegetação.
Fonte: Googleearth, acesso em janeiro de 2006.
7
O termo se refere às sociedades capitalistas periféricas.
74
Se continuarmos a comparar os valores da cidade do Rio com os valores da sub-bacia,
veremos que o Rio de Janeiro possui 70,17% de seu território urbanizado, enquanto para a
sub-bacia o percentual é de 94,08% daquelas áreas. O Rio de Janeiro tem 96,28% dos seus
domicílios particulares permanentes atendidos por rede geral de abastecimento de água
canalizada, enquanto a sub-bacia tem 94,92% dos domicílios nesta situação. O Rio de Janeiro
tem 88,83% dos domicílios particulares permanentes com lixo coletado por serviços de
limpeza pública, enquanto a sub-bacia possui apenas 83,64%. Cabem, neste ponto, duas
observações. A primeira, refere-se ao abastecimento de água; pois se levarmos em conta a
freqüência de chegada da água aos domicílios, a sub-bacia hidrográfica, possivelmente,
apresenta uma situação ainda mais desfavorável. A segunda, diz respeito à coleta de lixo, na
medida em que a sub-bacia hidrográfica tem uma concentração de favelas muito superior à da
cidade do Rio de Janeiro, como veremos a seguir. Ainda encontramos uma outra parte dos
domicílios, em função de sua acessibilidade restrita, servidas por coleta de lixo ‘comunitária
em caçambas, o que diminui a diferença percentual (apesar do incômodo dos moradores em
transportarem o lixo até as caçambas), mas não o suficiente para que o total da coleta de lixo
na sub-bacia se equipare ao total da coleta de lixo verificado para a cidade.
Ainda encontramos na sub-bacia um percentual de domicílios sem banheiro da ordem de
2,39%, enquanto no Rio de Janeiro esse percentual cai para 2,17%. Além disso, a renda
domiciliar per capita média da sub-bacia é de aproximadamente ¼ da renda domiciliar per
capita média de um bairro tradicional da Zona Sul – AP2 (sub-bacia com R$ 467,06, e
Copacabana com R$ 1.623,42).
Entretanto, seu percentual de esgotamento sanitário é superior ao total observado para a
cidade do Rio de Janeiro: 91,16% contra 77,99%. Isso se deve à rápida expansão da zona
oeste e à incapacidade da cidade de atender a demanda dos pequenos incorporadores
imobiliários, assim como, a crescente migração para a região.
De forma geral, podemos observar, através da análise acima, que, na maioria dos parâmetros
escolhidos, a sub-bacia hidrográfica apresenta uma tendência desfavorável face aos valores
médios do Rio de Janeiro. Trata-se, assim, de uma região, de forma geral, mais vulnerável do
que o restante da cidade, submetida a um desgaste acumulativo responsável por um processo
de degradação de maior intensidade do que em outras áreas da cidade.
75
O mapa 10, a seguir, mostra a distribuição da população pelos bairros do Rio de Janeiro
(2000), enquanto o mapa 11 traz o crescimento da população e a migração interna na cidade
entre os anos de 1991 e 2000 e, os mapas 12 e 13, a evolução da densidade nos bairros
cariocas no mesmo período.
Podemos observar, de acordo com o mapa 10 e a tabela 01, que os bairros mais populosos na
sub-bacia hidrográfica são o Complexo da Maré, acima dos 100.000 habitantes, o Complexo
do Alemão e o Méier, entre 50.000 e 100.000 habitantes, e, na terceira faixa, entre 30.000 e
50.000 habitantes, os bairros de Inhaúma, Manguinhos, Jacarezinho, Cachambi, Engenho
Novo, Lins de Vasconcelos, Engenho de Dentro, Piedade, Quintinho Bocaiúva e Cascadura,
enquanto os bairros menos populosos são Jacaré, Maria da Graça, Rocha, Água Santa e
Engenheiro Leal, todos com menos de 10.000 habitantes.
Quando analisamos a densidade bruta através do mapa 12, observamos que os bairros mais
densos no ano de 1991, no que concerne aos bairros contribuintes da sub-bacia hidrográfica
do Canal do Cunha, eram os bairros do Complexo da Maré, Jacarezinho, Alemão, Mangueira,
Méier, Todos os Santos e Abolição. Notadamente, os bairros que se constituem unicamente
de favelas são, predominantemente, os bairros mais densos da bacia. Por outro lado, bairros
tradicionais como o Méier, que abrigam pequenas favelas. Estes bairros apresentam alta
densidade demográfica, pela concentração de uma pequena classe média provocada pelo
elevado valor do solo e o encapsulamento do bairro por um entorno favelizado. Na segunda
faixa de densidade, encontram-se bairros como Higienópolis, Encantado, Riachuelo, Engenho
Novo, Cachambi e Pilares; bairros estruturados a partir da sua ocupação por uma classe
média baixa, e da existência de numerosas pequenas e médias favelas em seu território.
76
Mapa 10: Distribuição da população, por bairros - 2000.
Fonte: Instituto Pereira Passos, base Censo 2000 - PCRJ (adaptado).
Mapa 11: Crescimento da população, por bairros – 1991/2000.
(Fluxo migratório intramunicipal)
Fonte: Instituto Pereira Passos, base Censo 2000 - PCRJ (adaptado).
77
Mapa 12: Densidade demográfica, por bairros - 1991.
Fonte: Instituto Pereira Passos, base Censo 2000 - PCRJ (adaptado).
Mapa 13: Densidade demográfica, por bairros – 2000.
Fonte: Instituto Pereira Passos, base Censo 2000 - PCRJ (adaptado).
78
Por outro lado, temos o Caju e Água Santa como os bairros menos densos da bacia no ano de
1991, seguidos de Bonsucesso, Manguinhos, Jacaré, Rocha e Cavalcante. Podemos observar,
também, que tanto o Caju quanto Água Santa abrigam extensos equipamentos institucionais;
o primeiro, um cemitério e uma base militar e, o segundo, um dos maiores presídios do Estado
do Rio de Janeiro, além de possuir, em boa parte da sua área, uma geografia bastante
acidentada, em aclive, que compõe o Maciço da Tijuca. Ainda enfatizamos que Engenheiro
Leal, Água Santa e Quintino Bocaiúva possuem os maiores percentuais de áreas naturais entre
os bairros que compõe a sub-bacia, com 16,84%, 10,19% e 9,58% respectivamente, o que,
evidentemente se reflete na densidade demográfica bruta da área.
Nesta direção, é necessário ressaltar que nem sempre o mapa de densidades, elaborado a partir
da densidade bruta
8
da área, como no caso em estudo, corresponde à qualidade de vida,
conforme nossa análise anterior, na medida em que uma região predominantemente acrescida
de usos industriais, com numerosas plantas ainda ativas, e aparatos institucionais ocupando
grandes áreas, poderá, em função de sua população e do percentual de áreas destinadas a um
ou outro uso, apresentar uma excessiva concentração populacional em pequena fração do
território. São passíveis desta análise, os bairros de Manguinhos e Bonsucesso, entre outros;
o primeiro, pela grande área destinada à Fundação Oswaldo Cruz, à Refinaria de Manguinhos,
o depósito da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos etc, e, o segundo, pela grande
quantidade de armazéns e galpões relacionados ao uso industrial e serviços correlatos.
Ao observarmos o mapa 13 e a tabela 01, relacionados à densidade no ano 2000, podemos
notar uma significativa alteração na distribuição da densidade na bacia hidrográfica, em
função de forte movimento migratório, como veremos adiante. Pelo mapa de densidade,
verificamos que os bairros que, em 1991 ocupavam posições extremas com maior e menor
densidade, na sub-bacia, continuam na mesma situação em 2000. Por outro lado, bairros que
se situavam nas faixas intermediárias tendem, claramente, a perda ou ganhos de densidade.
Notadamente, áreas de favelas, como Manguinhos, ganham densidade, mudando inclusive de
8
A densidade bruta é calculada através da divisão população total sobre a área total de uma região. Quando a
distribuição da população não é relativamente homogênea ao longo da área, devido a algum fenômeno ou uso
específico, a densidade bruta é desfigurada em função de uma fração urbana bastante densa e sua complementar
de uso não residencial. Nestes casos, talvez o índice urbanístico mais indicado seja a densidade líquida, que
expressa a relação entre áreas destinadas diretamente ao uso habitacional e seu número de habitantes.
79
faixa, e bairros tradicionais, como São Cristóvão, Maria da Graça, Del Castilho, Encantado e
Higianópolis, mudam de faixa.
Neste sentido, o mapa de Crescimento da População, por Bairros – 1991/2000 expressa, para
a cidade do Rio de Janeiro, uma tendência à perda de população da AP 2 em direção à AP 4
(Zona Sul, em direção à Barra, Recreio e Vargem Grande) e das AP 1 e AP 3,
predominantemente, em direção a bairros periféricos da própria AP 3 e para a AP 5 (Centro e
Zona Norte, em direção à periferia da Zona Norte e Zona Oeste). Estes processos, já
amplamente abordados na literatura, devem-se a fatores como o aumento da violência, o
estresse urbano, o empobrecimento da população, o crescimento do comércio, dos serviços e
da infra-estrutura na zona oeste, a novas oportunidades de trabalho associadas ao processo de
ocupação, assim como, a pressões contínuas do mercado imobiliário (pequenos
incorporadores => zona oeste e grandes incorporadores => AP 4), apoiadas em campanhas
publicitárias que aliam a periferização gentrificada à qualidade de vida.
A sub-bacia hidrográfica mantém-se em sintonia com as tendências gerais da cidade do Rio de
Janeiro. Podemos, entretanto, observar fenômenos específicos que destacam as
peculiaridades da bacia, como, por exemplo, a expressiva perda de população de Del Castilho
e da Mangueira (20% ou mais), enquanto bairros como Bonsucesso, Água Santa, Encantado,
Riachuelo, Sampaio e Jacarezinho tiveram sua população reduzida entre 10% e 19%. Os
bairros de Benfica, Inhaúma, Engenho da Rainha, Piedade, Abolição, Pilares, Lins de
Vasconcelos, Todos os Santos e Engenho de Dentro demonstram uma perda populacional da
ordem de 0% a 4%, o que corresponde, aproximadamente, a faixa onde se dão fenômenos
demográficos oriundos de perdas vegetativas de população; assim como, quando positivas,
ganhos vegetativos de população, como é o caso do Caju, Tomás Coelho e Quintino
Bocaiúva. Por outro lado, grandes complexos e as áreas com predomínio de favelas, como
Maré, Maguinhos (maior ênfase) e Alemão, assim como bairros tradicionais que expressam a
possibilidade de novas ocupações e adensamento de favelas, como Cavalcanti e Engenheiro
Leal, têm um significativo aumento de população. É importante destacar que, curiosamente,
surgem como exceção: Mangueira e Jacarezinho apresentam perda significativa de
população, em contraste com a tendência geral do crescimento, mesmo que apenas vegetativo,
dos complexos e áreas de favelas. Cabe aqui levantar a possibilidade de que tal decréscimo
80
Tabela 2 Distribuição da população em setores subnormais
479.661
545.011
117.491
179.849
127.561
146.380
144.298
72.182
85.588
77.245
1991 2000
AP 1
AP 4
AP 2
AP 5
AP 3
Fonte: IBGE, Censos
Demográficos.
populacional decorra eventos como incêndios, alagamentos ou intervenções urbanas
específicas, o que será alvo de estudo posterior.
Como podemos observar no gráfico 01 abaixo (Cezar, 2002), o conjunto de favelas localizado
na Área de Planejamento 3 (que corresponde aos subúrbios da Leopoldina, Central e Ilha do
Governador), onde se insere a Sub-bacia Hidrográfica do Canal do Cunha, corresponde a
aproximadamente 50% das favelas do Rio de Janeiro (Cezar, op. cit). Apesar de alguns destes
núcleos terem perdido população, como vimos acima, em média, as favelas da AP 3 cresceram
a uma taxa anual de 1,43%, enquanto a população, nos chamados setores normais, diminuiu
em 0,22% ao ano, conforme os valores apresentados no gráfico 01, baseado nos Censos de
1991 e 2000.
Gráfico 01: Distribuição da população por setores subnormais, por APs.
Cidade do Rio de Janeiro – Censo Demográfico de 1991 e 2000.
Fonte: Cezar, 2002.
81
Ainda segundo Cezar (2002), na cidade do Rio de Janeiro, em 2000, 18,7% da população
residia em setores subnormais. Essa situação, conforme observamos na tabela 03 abaixo,
vem crescendo não só em números absolutos, mas também relativos.
Tabela 04: Crescimento percentual da população em setores subnormais (1980-2000).
Cidade do Rio de Janeiro.
1980 1991 2000
percentual de residentes em setores
subnormais
14% 16% 18,7%
percentual de residentes em setores
normais
- 84% 81,3%
Fonte: Adaptado de Cezar, 2002.
A Sub-bacia do Canal do Cunha localiza-se a leste da cidade do Rio de Janeiro, na região
chamada Baixada de Inhaúma, e tem como limites o Maciço da Tijuca, com a Serra do
Mateus e Cachoeirinha ao sul, a Serra dos Pretos Forros e a Serra do Inácio Dias a oeste; a
noroeste, o Morro do Dendê-Juramento; ao norte, o Morro da Misericórdia; a nordeste, o
Morro Bonsucesso; a sudeste, a Serra do Engenho Novo; e, a leste, a Baia da Guanabara,
confrontando com os bairros da Maré e Caju e, entre eles, a foz do canal que lhe dá o nome
(mapa 14). A Baixada de Inhaúma conta ainda, em seu interior, com o Morro dos Urubus,
com uma altitude entre 100 e 200 metros.
De todas as elevações, a Serra dos Pretos Forros e a Serra de Inácio Dias são os pontos mais
altos, atingindo uma altitude entre 300 e 400 metros, seguidas da Serra do Mateus e
Cachoeirinha, com altitude entre 200 e 300 metros, e do Morro do Dendê-Juramento, com
altitude entre 100 e 200 metros. As demais elevações são todas entre 60 aos 100 metros
(mapa 14).
A pluviometria indica quatro faixas principais na sub-bacia: a primeira, sobre o Maciço da
Tijuca, com um índice de chuvas médias anuais da ordem de 1401 a 1600 mm; a segunda,
que abrange aproximadamente a terça parte da Baixada de Inhaúma, próxima ao maciço,
situa-se na faixa entre 1201 a 1400 mm; a terceira, na parte central da sub-bacia, na faixa de
1001 a 1200 mm; e, finalmente, a quarta faixa, envolvendo a Serra da Misericórdia e o Morro
de Bonsucesso, com pluviosidade média entre 800 a 1000 mm (mapa 15).
82
A hidrografia (mapa 16) da sub-bacia é composta pelos rios Faria, Timbó, Jacaré, Salgado,
Dom Carlos, Faleiros, dos Frangos, Méier e pelos canais do Cunha, Faria-Timbó e Benfica. A
sub-bacia possui aproximadamente 34,7 km de mananciais, que cortam os bairros de
Bonsucesso, Inhaúma, Engenho de Dentro, Encantado, Engenho da Rainha, Engenho Novo,
Sampaio, Jacarezinho, Lins de Vasconcelos, Méier, Cachambi, São Cristóvão, Caju, Pilares,
Abolição, Todos os Santos, Benfica, Manguinhos e Higienópolis (tabela 04).
Podemos dizer, portanto, que a sub-bacia apresenta uma rede hídrica bem distribuída, que
dividde a Baixada de Inhaúma em 4 blocos (entre a Serra do Engenho Novo e o Rio Jacaré;
entre o Rio Jacaré e o Rio Faria; entre o Rio Faria e o Rio Timbó; e, entre o Rio Timbó e a
Serra da Misericórdia). A tabela 04 traz a rede hidrográfica da sub-bacia, com o nome do
manancial, a localização das suas nascentes, a cota da nascente, e a localização dos rios
segundo os bairros que corta e a sua extensão.
Tabela 05: Rede Hidrográfica da Sub-bacia.
Sub-bacia Hidrográfica do Canal do Cunha
manancial nascente cota da nascente localização Extensão
(em Km)
Rio Faria
No encontro entre o
Rio Faleiros e os
Rios dos Frangos e
Méier.
Nascente com
altitude* entre 0 e 50
metros.
Bonsucesso/Inhaúma/En
g. de Dentro/Encantado e
outros
2,0
Rio Timbó
Entre o morro do
Dendê-Juramento e o
Morro dos Urubus.
Nascente com altitude
entre 0 e 50 metros.
Inhaúma/Engenho da
Rainha
8,6
Rio Jacaré
Próximo ao Pico da
Tijuca e ao Pico do
Andaraí, acima da
cota 100 metros.
Tem a nascente mais
alta da sub-bacia, entre
500 e 700 metros, e
outras ainda entre 300
e 500 metros.
Engenho Novo/Sampaio/
/Jacarezinho/ /Lins de
Vasconcelos
6,5
Rio Salgado
No centro da sub-
bacia, entre os Rios
Faria e Jacaré.
Nascente em altitude
entre 0 e 50 metros.
Méier/Cachambi 2,0
Rio Dom
Carlos
Serra do Inácio Dias.
Nascentes entre 300 e
400 metros.
São Cristóvão/Caju 2,3
Rio Faleiros Morro dos Urubus. - Pilares/Abolição 2,8
Rio dos
Frangos
Entre a Serra do
Matheus e
Cachoeirinha e a
Serra dos Pretos
Forros.
Possui nascentes em
duas faixas. A
primeira entre 300 e
400 metros e a
segunda entre 200 e
300 metros.
Encantado/Engenho de
Dentro
2,5
83
Rio Méier
Serra do Mateus e
Cachoeirinha.
Nascentes entre 200 e
300 metros.
Méier/Todos os Santos 4,0
Canal do
Cunha
No encontro do Canal
Faria-Timbó e os Rio
Salgado e Jacaré.
Início na primeira
faixa de altitude, entre
0 e 50 metros.
Benfica/Manguinhos 2,3
Canal Faria
Timbó
Após o encontro dos
Rios Faria e Timbó.
Início na primeira
faixa de altitude, entre
0 e 50 metros.
Inhaúma/Higienópolis/
/Bonsucesso
...
Canal
Benfica
................
Início na primeira
faixa de altitude, entre
0 e 50 metros.
Benfica 1,7
* Para o Rio de Janeiro, pela proximidade com o nível do mar, a altitude equivale a cota.
Fonte: Adaptado do Anuário Estatístico do Rio de Janeiro - IPP/PCRJ, 1998.
Apesar de uma disponibilidade hídrica relativamente abundante, os rios da bacia
caracterizam-se por sua má qualidade desde as nascentes, na medida em que já surgem
poluídos e, em sua maioria, em contextos favelizados, que crescem nas encostas acima da cota
100
9
m, ao longo de toda bacia, como nos mostram os mapas 17A e 17 B.
Neste sentido, o incremento da poluição acontece ao longo de toda sub-bacia pelos mais
variados tipos de contribuição, sendo os mais críticos, o lançamento de esgoto ‘in natura’ e o
lançamento de lixo nos mananciais. As fotos a seguir ilustram a situação dos mananciais da
sub-bacia Hidrográfica do Canal do Cunha.
O anexo V traz, ainda, um acervo imagético, com fotos oriundas de arquivo pessoal elaborado
para esta dissertação, retratando cenas cotidianas da sub-bacia referentes à degradação em
curso, e, especialmente, aos processos apresentados ao longo deste capítulo.
9
A cota 100 metros foi adotada como cota limite para a Zona Especial nº 1 no decreto 322, de 1976, com a
finalidade de delimitar as áreas de proteção ambiental no município do Rio de Janeiro, sendo expressamente
proibida a ocupação urbana acima deste limite.
84
Ilustrações 10A e 10B: Nascente do Rio Faria, em meio à ocupação urbana.
Fonte: Googleearth, acesso em janeiro de 2006.
85
Mapa 14: Relevo e hipsometria da cidade do Rio de Janeiro - 2000.
Fonte: Instituto Pereira Passos, base Censo 2000 - PCRJ (adaptado).
Mapa 15: Chuvas médias anuais na cidade do Rio de Janeiro - 2000.
Fonte: Instituto Pereira Passos, base Censo 2000 - PCRJ (adaptado).
86
Mapa 16: Mapa de divisão em bacias hidrográficas e da hidrografia da Cidade do Rio Janeiro
– 2000.
Fonte: Instituto Pereira Passos, base Censo 2000 - PCRJ (adaptado).
87
Segundo o Censo Demográfico 2000, a cidade do Rio de Janeiro possui 516 setores
subnormais. Entretanto, o Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos (IPP) relaciona,
em seu cadastro de favelas da Cidade do Rio de Janeiro
10
, 752 favelas. Essa diferença se dá
por que a forma de análise e a orientação conceitual das duas instituições para definição e
demarcação da favela são diferentes. O IBGE considera como setor subnormal o aglomerado
constituído por “um conjunto de no mínimo 51 unidades habitacionais, ocupando ou tendo
ocupado até período recente terreno de propriedade alheia (pública ou particular), dispostas,
em geral, de forma desordenada e densa; e carentes, em sua maioria, de serviços públicos
essenciais” (IBGE, 2000). O IPP, por sua vez, adota a definição oriunda do Plano Diretor do
Município do Rio de Janeiro, que define favela como “área predominantemente habitacional,
caracterizada por ocupação da terra por população de baixa renda, com precariedade da infra-
estrutura e de serviços públicos, vias estreitas e de alinhamento irregular, lotes de forma e
tamanho irregular e construções não licenciadas, em desconformidade com os padrões legais”
(PCRJ, 1992).
Dessa forma, podemos compreender que segundo as duas definições, o aspecto legal,
traduzido na propriedade do solo, é de fundamental importância, mas não mostra-se suficiente
para demarcar a ocorrência de favela. É preciso ainda considerar as condições de apropriação
do solo e a morfologia do espaço produzido, assim como a disponibilidade de serviços
públicos.
A sub-bacia hidrográfica concentra em torno de 133 favelas, distribuídas em 9 Regiões
Administrativas, como mostra a tabela 06. Em seu território, estão 4 dos grandes complexos
do Rio de Janeiro: Complexo do Alemão, Complexo de Manguinhos, Complexo do
Jacarezinho e parte do Complexo da Maré. Além desses complexos, outras favelas, de grande
dimensão, se incorporam à área: no plano temos, por exemplo, a Barreira do Vasco, Parque
Boa Esperança, Parque São Sebastião e Quinta do Caju, enquanto que, nas encostas das
serras, temos, por exemplo, a Mangueira, o Morro São João, o Morro do Urubú, o Bairro
Ouro Preto e o Parque Nova Maraca.
10
O Cadastro de Favelas deu origem ao Mapa de Favelas e Loteamento Irregulares / Clandestinos de 2003.
88
Tabela 06: Número de favelas, habitantes e domicílios, por RA, na sub-bacia do Canal do
Cunha.
Número
RA
Nome RA
Nº Favelas na RA
Pertencentes à
Sub-bacia
Nº Habitantes das
Favelas da RA
Pertencentes à
Sub-bacia
Nº de Domicílios
das Favelas da
RA Pertencentes
à Sub-bacia
I RA Portuária
8
11958 3344
VII RA São Cristóvão 11 24702 6369
X RA Ramos 10 23463 6484
XII RA Inhaúma 19 13565 3683
XIII RA Méier 51 37980 10451
XV RA Madureira 11 10078 2696
XXVIII RA Jacarezinho 11 32068 9358
XXIX RA Complexo do Alemão 11 56271 15520
XXX RA Maré 1 5500 1637
Total (9 Ras) 133 215.585 59.542
Fonte: IBGE (2002).
A comparação entre o percentual de moradores em favelas no Rio de Janeiro como um todo e
na sub-bacia hidrográfica nos mostra que as condições de vida na sub-bacia são ainda mais
desfavoráveis (gráficos 02 e 03). Enquanto no Rio, o percentual de habitantes em
aglomerados subnormais é de 18,7%, na sub-bacia, esse percentual cresce para 26%, em
detrimento do percentual de população de setores normais que, na bacia, cai para 74%,
enquanto que para a cidade do Rio de Janeiro este percentual é de 81,3%.
Gráfico 02: Percentual de moradores, por setores normais e subnormais, no Rio de Janeiro
(Censo Demográfico 2000).
Fonte: Cezar, 2002, apud IBGE (Censo Demográfico, 2002).
Percentual de Contribuição das Populações em Setores Normais e
Sub-Normais na Cidade do Rio de Janeiro
18,7%
81,3%
Participação da População
Residente em Setores Sub-
Normais
Participação da População
Residente em Setores
Normais
89
Gráfico 03: Percentual de moradores, por setores normais e subnormais, na Sub-bacia do
Canal do Cunha (Censo Demográfico 2000).
Fonte: IBGE (Censo Demográfico 2000).
A bacia conta com 215.585 habitantes e 59.542 domicílios, distribuídos nas suas133 favelas,
indicando uma densidade domiciliar de 3.62 habitantes/domicílio, uma observação que não
considera a área média de cada domicílio.
Os gráficos 04 e 05 mostram a distribuição de favelas e o número de residentes em favelas por
Região Administrativa. Eles nos indicam a desigualdade no processo de ocupação, expansão
e adensamento das favelas na sub-bacia hidrográfica, que se associa às mínimas condições em
que acontece a reprodução social, como permite observar a disponibilidade de áreas; a
acessibilidade; a proximidade da malha urbana; os meios de transporte e os mecanismos de
proteção social.
Percentual de Contribuição das Populações em Setores Normais e
Sub-Normais na Sub-Bacia Hidrográfica
26%
74%
Participação da População
Residente em Setores Sub-
Normais
Participação da População
Residente em Setores
Normais
90
Gráfico 04: Percentual de favelas por RA na sub-bacia hidrográfica.
Fonte: IBGE, 2000.
Gráfico 05: Percentual de residentes em favelas por RA na sub-bacia hidrográfica.
Fonte: IBGE, 2000.
A tabela 07 traz a relação das favelas por RA na sub-bacia hidrográfica do Canal do Cunha, a
partir do mapa 17A, relativo à espacialização das favelas e dos loteamentos irregulares no Rio
de Janeiro, e o mapa 17B, que exibe estes fenômenos, destacando a na sub-bacia hidrográfica.
Contribuição Percentual por Número de Favelas
por RA na Sub-Bacia Hidrográfica
6%
8%
8%
14%
39%
8%
8%
8%
1%
Portuária
São Cristóvão
Ramos
Inhaúma
Méier
Madureira
Jacarezinho
Complexo do Alemão
Maré
Percentual de Contribuição da População entre
Favelas, por RA, na Sub-Bacia Hidrográfica
6%
11%
11%
6%
18%
5%
15%
25%
3%
Portuária
São Cristóvão
Ramos
Inhaúma
ier
Madureira
Jacarezinho
Complexo do Alemão
Mar é
91
Tabela 07: Relação de Favelas, por RA, na Sub-Bacia Hidrográfica.
Favelas da Bacia Hidrográfica
Favelas RA População Domicílios
Ladeira dos Funcionários I RA Portuária
Parque Alegria I RA Portuária
Parque Boa Esperança I RA Portuária
Parque Conquista I RA Portuária
Parque N. S. da Penha I RA Portuária
Parque São Sebastião I RA Portuária
Parque Vitória I RA Portuária
Quinta do Caju I RA Portuária
11958 3344
Conjunto Ataulfo Alves VII RA São Cristóvão
Mangueira VII RA São Cristóvão
Marechal Jardim VII RA São Cristóvão
Morro dos Telégrafos VII RA São Cristóvão
Parque dos Mineiros VII RA São Cristóvão
Parque Herédia de Sá VII RA São Cristóvão
Parque Horácio Cardoso Franco VII RA São Cristóvão
Rua Ferreira de Araújo VII RA São Cristóvão
Tuiuti VII RA São Cristóvão
Vila Arara VII RA São Cristóvão
Vila Vitória VII RA São Cristóvão
24702 6369
CHP2 X RA Ramos
Com. Agrícola de Higienópolis X RA Ramos
Favela das Carroças X RA Ramos
Mandela de Pedra X RA Ramos
Parque Carlos Chagas X RA Ramos
Parque João Goulart X RA Ramos
Parque Oswaldo Cruz X RA Ramos
Serra Pelada X RA Ramos
Vila São Pedro X RA Ramos
Vila Turismo X RA Ramos
23463 6484
Chácara de Del Castilho XII RA Inhaúma
Morro do Engenho da Rainha XII RA Inhaúma
Parque Evereste XII RA Inhaúma
Parque Félix Ferreira XII RA Inhaúma
Parque Maracá XII RA Inhaúma
Parque Nova Maraca XII RA Inhaúma
Parque Proletariado Águia de Ouro XII RA Inhaúma
Parque Proletariado Engenho da Rainha XII RA Inhaúma
Parque União de Del Castilho XII RA Inhaúma
Relicário XII RA Inhaúma
Rua Brício de Moraes XII RA Inhaúma
Rua Lagoa Redonda XII RA Inhaúma
Rua Pereira Pinto XII RA Inhaúma
Rua Sérgio Silva XII RA Inhaúma
13565 3683
92
Seu Pedro XII RA Inhaúma
Vila Caramuru XII RA Inhaúma
Vila Dom Fábio XII RA Inhaúma
Vila Itaocara XII RA Inhaúma
Vila Maria XII RA Inhaúma
Bairro Ouro Preto XIII RA Méier
Barro Preto XIII RA Méier
Barro Vermelho XIII RA Méier
Beco Vitorino XIII RA Méier
Belém Belém XIII RA Méier
Cachangá XIII RA Méier
Cachoeirinha XIII RA Méier
Cardoso Mesquita, 28 XIII RA Méier
Céu Azul XIII RA Méier
Comunidade dos Marianos XIII RA Méier
Conjunto Residencial Fernão Cardin XIII RA Méier
Dois de Maio XIII RA Méier
Dona Francisca XIII RA Méier
Engenheiro Alfredo Gonçalves XIII RA Méier
Fazendinha da Água Santa XIII RA Méier
Jardim Piedade XIII RA Méier
Joaquim Martins, 378 Fundos XIII RA Méier
Joaquim Méier XIII RA Méier
Marlene XIII RA Méier
Morro da Bacia XIII RA Méier
Morro da Cachoeira Grande XIII RA Méier
Morro da Caixa D' água XIII RA Méier
Morro da Cotia XIII RA Méier
Morro da Matriz XIII RA Méier
Morro do Amor XIII RA Méier
Morro do Céu XIII RA Méier
Morro do Encontro XIII RA Méier
Morro do Pau Ferro XIII RA Méier
Morro do Queto *** XIII RA Méier
Morro do Trajano XIII RA Méier
Morro do Urubu XIII RA Méier
Morro dos Macacos(*) XIII RA Méier
Morro dos Mineiros XIII RA Méier
Morro Inácio Dias XIII RA Méier
Morro Nossa Senhora da Guia XIII RA Méier
Morro São João XIII RA Méier
Outeiro XIII RA Méier
Pica-Pau Amarelo XIII RA Méier
Pretos Forros XIII RA Méier
Rua Camarista,914 XIII RA Méier
Rua Engenheiro Clóvis Daudt, 304 XIII RA Méier
Rua Itabirito XIII RA Méier
Santa Terezinha XIII RA Méier
Santos Titara XIII RA Méier
37980 10451
93
Teixeira Bastos XIII RA Méier
Travessa Bernardo XIII RA Méier
Vila Amizade XIII RA Méier
Vila Cabuçu XIII RA Méier
Vila dos Mineiros XIII RA Méier
Vila Triagem XIII RA Méier
Vila União XIII RA Méier
Beco da Amizade XV RA Madureira
Comendador Visconde de Sabóia XV RA Madureira
Grota XV RA Madureira
Morro do Juramento(*) XV RA Madureira
Padre Manoel da Nóbrega XV RA Madureira
Parque Araruna XV RA Madureira
Parque Silva Vale XV RA Madureira
Rua Baleares, 172 / Rua Amaral, 286 XV RA Madureira
Rua Iguaçu, 360 Casa 23 XV RA Madureira
Sanotório XV RA Madureira
Vila Primavera XV RA Madureira
10078 2696
Itararé XXIX RA Complexo do Alemão
Joaquim de Queirós XXIX RA Complexo do Alemão
Morro da Baiana XXIX RA Complexo do Alemão
Morro das Palmeiras XXIX RA Complexo do Alemão
Morro do Adeus XXIX RA Complexo do Alemão
Morro do Alemão XXIX RA Complexo do Alemão
Morro do Piancó (*) XXIX RA Complexo do Alemão
Mourão Filho XXIX RA Complexo do Alemão
Nova Brasília XXIX RA Complexo do Alemão
Parque Alvorada XXIX RA Complexo do Alemão
Vila Matinha XXIX RA Complexo do Alemão
56271 15520
Carlos Drumond de Andrade XXVIII RA Jacarezinho
Jacarezinho XXVIII RA Jacarezinho
Malvinas XXVIII RA Jacarezinho
Praça Maribá,60 Fundos XXVIII RA Jacarezinho
Rua Matinoré 163, Fundos XXVIII RA Jacarezinho
Rua São João XXVIII RA Jacarezinho
Tancredo Neves XXVIII RA Jacarezinho
Tauta XXVIII RA Jacarezinho
Vila da Rua Viúva Cláudio,211 XXVIII RA Jacarezinho
Vila Jandira XXVIII RA Jacarezinho
Vila Motinoré XXVIII RA Jacarezinho
32068 9358
Pata Choca XXX RA Ma
5500 1637
215585 59542
Fonte: Mapa de Favelas e Loteamentos Irregulares / Clandestinos do Rio de Janeiro, 2003; Cadastro
de Favelas do Rio de Janeiro; Armazém de Dados – IPP/PCRJ, IBGE (Censo 2000).
94
Trata-se de um processo de ocupação peculiar, característico do desenvolvimento capitalista
periférico e, por vezes, provinciano, que é incapaz de garantir a distribuição social da riqueza.
No caso em questão, a reprodução sistemática deste padrão de ocupação - que tem como
características centrais a maciça impermeabilização do solo, a excessiva densidade, a
inexistência de infra-estrutura, a ausência de vegetação, uma morfologia urbana confusa com
graves problemas de acessibilidade, a precariedade da sua tipologia arquitetônica, a ausência
de equipamentos urbanos e de áreas de lazer e recreação – coaduna-se com a ausência de
renda suficiente para garantir os investimentos necessários à manutenção do domicílio,
contribuindo para a perpetuação de condições inadequadas de moradia com alta densidade
domiciliar.
Este processo de ocupação surge associado a áreas vulneráveis – como encostas, alagados e
áreas ribeirinhas –, com forte prejuízo ao ambiente natural, já que depende de desmatamentos,
e vincula-se ao aumento do risco e à incidência de inundações e endemicidades.
Portanto, a massificação deste fenômeno, pela intensidade e magnitude das suas
conseqüências sociais, ambientais e econômicas, gera impactos dificilmente reversíveis no
tecido urbano e no ambiente natural, consolidando atributos sócio-espaciais objetivos e
subjetivos, que acabam por determinar processos de fragmentação urbana, desvalorização do
solo e degeneração ambiental crônicos, com prejuízos crescentes à qualidade de vida.
A espacialização das favelas na sub-bacia hidrográfica, observada através do mapa 17B,
permite constatar a formação de um cinturão urbano nas encostas da sub-bacia, assim como a
apropriação de espaços ao longo da via férrea, de áreas ribeirinhas e ainda de toda a região
costeira da sub-bacia.
O material iconográfico constante no anexo V, exemplifica e ilustra, sobre diversos ângulos,
os fenômenos narrados e suas relações de ‘contigüidade’ e ‘descontinuidade’ com a malha
urbana tradicional.
95
Mapa 17A: Cadastro de Favelas com Loteamentos Irregulares da Cidade do Rio de Janeiro.
Fonte: Instituto Pereira Passos, 2005 - PCRJ.
96
Mapa 17B: Cadastro de Favelas com Loteamentos Irregulares na Sub-Bacia Hidrográfica.
Fonte: Instituto Pereira Passos, 2005 - PCRJ (adaptado).
97
O mapa 18 nos traz o uso do solo na sub-bacia hidrográfica. Através dele podemos observar o
uso do solo em cada área da bacia, assim como a sua relação com as tipologias viárias
disponíveis e os recursos de circulação.
Outros tipos de uso do solo constantes no mapa são: manguezal, cultura, macega, floresta,
terreno rochoso, área urbana, área não ocupada, área industrial, área de lazer e área de serviço.
Quanto à circulação urbana, temos os seguintes tipos: via principal com canteiro divisório,
via principal sem canteiro divisório, via secundária, via não pavimentada, via local, caminho,
rodovia, estrada de ferro e metro em operação.
A sub-bacia hidrográfica ainda abriga dois setores industriais da cidade (São Cristóvão e
Bonsucesso) que, se contribuíram significativamente para o desenvolvimento da cidade,
foram decisivos para o crescente processo de degradação ao qual a área foi e é submetida. No
passado, a criação destes setores correspondem à crescente modernização do Rio de Janeiro,
tendo, em suas origens, funções diferenciadas: consolidação da república e ‘remoção’ das
raízes do império, materializadas no bairro de São Cristóvão (Pereira, 2000); e atendimento
as necessidades vitais da cidade-capital e sua consolidação como referência do processo de
industrialização do país.
Evidentemente, se naquele momento, a industrialização foi a força motriz da ocupação da área
e o principal fator responsável pela degradação da base natural na Baixada de Inhaúma, hoje,
a ausência de alternativas para a imensa maioria da população empobrecida, implica no
crescimento de favelas, que se inscrevem no ranking de agentes poluidores da sub-bacia.
Os usos do solo na sub-bacia, apresentada no mapa 18, mostra que, ainda hoje, o uso
industrial da área é bastante intenso e legitimado pelo zoneamento do Rio de Janeiro, que
estabelece duas grandes áreas industriais na Baixada de Inhaúma.
98
Mapa 18: Uso do solo e traçado viário na sub-bacia hidrográfica do Canal do Cunha.
Fonte: Instituto Pereira Passos – PCRJ (adaptado).
99
Observamos-se que o mapa 18 traz, também, a relação das principais vias da sub-bacia
hidrográfica, identificando as vias arteriais e as vias coletoras de 1ª ordem, e demarcando as
demais vias coletoras e locais. A área também é cortada por 3 três ramais ferroviários em
atividade e um desativado, além de uma linha de metrô de superfície. Este esquema viário e
ferroviário altamente complexo é responsável por boa parte das conexões da cidade do Rio de
Janeiro e da própria Região Metropolitana, na medida em que a Avenida Brasil, a Linha
Vermelha e a Ponte Rio-Niterói são, por assim dizer, as três entradas da cidade. Neste
sentido, a Baixada de Inhaúma pode ser considerada um imenso ‘ da circulação carioca, na
medida em que interliga as 5 áreas de planejamento, e sendo constituída, dessa maneira, no
acesso de boa parte da região metropolitana ao centro de negócios do Rio de Janeiro.
Por outro lado, esta gama de avenidas, vias expressas e ramais ferroviários que cortam a sub-
bacia, servindo a propósitos de circulação e a conexões que extrapolam suas dimensões, foi
sendo incorporada à base física da região sem nenhuma preocupação urbanística maior, que
privilegiasse a relação desses eixos com a formação dos diferentes lugares que constituíam a
sub-bacia ao longo do tempo. As vias férreas parcelaram a bacia em quatro blocos, que se
articulam através de viadutos e mergulhões posteriormente construídos.
Esse conjunto de fatores, por sua vez, impactou fortemente a paisagem e a morfologia dos
logradouros mais vulneráveis, gerando ruas com aspecto bastante árido, onde o mau trato dos
espaços públicos (as poucas praças, logradouros e passeios) é facilmente reconhecível, com
arborização precária ou inexistente, calçamento defeituoso, rede elétrica aparente e misturada
as ligações clandestinas de energia (‘gatos’), equipamentos públicos precários e de valor
estético duvidoso e mobiliário urbano bastante esparso e desgastado. Os edifícios, inclusive
os de valor histórico, em geral são mal cuidados, desprovidos de homogeneidade
arquitetônica, e desvalorizados pela proximidade com as favelas. Também as edificações das
vias coletoras não têm o afastamento necessário e o alinhamento urbano não permite, em boa
parte dos casos, arborização de médio porte.
Evidentemente, a descrição acima não reflete a totalidade dos lugares e características
presentes na sub-bacia. As áreas que tiveram sua origem na mão-de-obra fabril aglutinaram,
posteriormente, extratos da classe média que obtiveram investimentos expressivos em
urbanização, e se caracterizaram pela centralidade que assumiram ao longo do tempo, em
100
áreas como o Méier, possibilitando a constituição de ‘refúgios residenciais, protegidos da
lógica complexa e perversa da ocupação da sub-bacia.
A desindustrialização da área, ocorrida nas últimas décadas, gerou uma grande quantidade de
galpões e armazéns vazios, criando áreas subvalorizadas e mais vulneráveis, passíveis de
rápida favelização. Boa parte destas instalações ainda encontra-se abandonada (ilustração
11); outras ainda, como a Fábrica de Tecidos Nova América, foram reconvertidas, ganhando
novos usos.
Ilustração 11: Armazém abandonado, visto do Viaduto de Benfica.
Fonte: Luís Cesar Peruci do Amaral, 2006 – acervo pessoal.
101
O anexo V, acervo imagético, ainda traz imagens da sub-bacia referidas ao processo de
degradação de estruturas urbanas, retratando fundamentalmente habitações e vias ao longo de
toda área, assim como descaso com relação à produção da paisagem urbana.
Também, segundo a Secretaria Municipal do Meio Ambiente, a área correspondente à sub-
bacia é atingida hoje por 6.332 fontes poluidoras, sendo aproximadamente 670 indústrias, de
acordo com a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAM, 2003). Tais
fontes aparecem espacializadas no mapa 19, e classificadas segundo classe de poluição (ver
anexo VI).
A tabela 08 mostra o número de fontes poluidoras nos bairros da sub-bacia. Trata-se,
novamente, de uma excessiva concentração de atividades nocivas, que, em sua maioria, não
recebem tratamentos específicos de efluentes, agravando o quadro ambiental da micro-bacia
do Canal do Cunha.
102
Mapa 19: Espacialização das fontes poluidoras, segundo classe poluidora, na sub-bacia do
Canal do Cunha.
Fonte: SMMA, apud FIRJAM 2003 e SINAE 2002.
103
Tabela 08: Número de fontes poluidoras por bairro e percentual de contribuição na sub-bacia
do Canal do Cunha.
BAIRRO
NÚMERO DE
FONTES
POLUIDORAS
% DE
CONTRIBUIÇÃO
NA SUB-BACIA
Nº FONTES DA
SUB-BACIA
Abolição 124 100 124
Água Santa 53 100 53
Benfica 75 100 75
Bonsucesso 231 70 161,7
Cachambi 322 100 322
Cajú 4 100 4
Cascadura 113 70 79,1
Cavalcanti 87 100 87
Complexo da Maré 18 30 5,4
Complexo do Alemão 52 100 52
Del Castilho 221 100 221
Encantado 182 100 182
Engenheiro Leal 33 100 33
Engenho da Rainha 74 100 74
Engenho de Dentro 529 100 529
Engenho Novo 430 100 430
Higienópolis 299 100 299
Inhaúma 352 100 352
Jacaré 205 100 205
Jacarezinho 446 100 446
Lins de Vasconcelos 140 100 140
Manguinhos 87 100 87
Maria da Graça 124 100 124
Meier 734 100 734
Piedade 303 100 303
Pilares 232 100 232
Quintino Bocaiúva 106 70 74,2
Riachuelo 145 100 145
Rocha 152 100 152
Sampaio 96 100 96
São Cristóvão 1 30 0,3
São Francisco Xavier 122 100 122
Todos os Santos 195 100 195
Tomás Coelho 192 100 192
Vasco da Gama 1 100 1
TOTAL 6480 6332
Fonte: SMMA, apud FIRJAM 2003 e SINAE 2002.
104
Capítulo 6 – Qualidade Hídrica do Canal do Cunha
6.1. Comentários iniciais
O sub-capítulo a seguir apresenta e discute o comportamento de alguns parâmetros de
qualidade de água do Canal do Cunha a partir de série histórica que contempla o período entre
1980 e 2004. Os dados para o estudo foram cedidos pelo Departamento de Planejamento
Ambiental da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente – FEEMA.
Acreditamos, portanto, para fins deste estudo de caso, que o período estudado é suficiente
para retratar fatos e tendências, de modo a possibilitar a observância de quais e como os
parâmetros de qualidade de água podem contribuir de forma significativa na análise da
degradação ambiental.
6.2. A Água com Recurso Indispensável à Vida, à Manutenção da Saúde e a
Conservação do Meio
Quando pensamos em 'qualidade da água', devemos ter em mente que a necessidade de um
padrão de qualidade mais ou menos rigoroso vai estar diretamente relacionado aos usos a que
determinado manancial se destina. Naturalmente, a água que bebemos tem que responder a
parâmetros mais rígidos que, por exemplo, a lagoa onde nos banhamos. Dessa forma,
estabelecemos abaixo uma breve relação dos principais usos da água:
Abastecimento doméstico (ingestão, preparo de alimentos, higiene pessoal e limpeza
doméstica: usos mais nobres);
Abastecimento industrial;
Irrigação;
Dessedentação de animais;
Agricultura;
Preservação da flora e da fauna;
Recreação e lazer;
Harmonia paisagística;
Geração de energia elétrica;
Navegação;
Diluição de despejos (menos nobre).
105
O mais nobre dos usos da água se refere à ingestão, seguido pelo preparo de alimentos,
higiene pessoal e limpeza doméstica. Ainda podemos ressaltar que a quebra ou redução
desses padrões de qualidade, para determinados fins, vai resultar no desencadeamento de um
extenso processo epidêmico que, sistematicamente, se reflete nas estatísticas de saúde. O
quadro 04 traz o complexo conjunto de doenças de veiculação hídrica e os respectivos
modelos de transmissão.
Quadro 04: Elenco de doenças de veiculação hídrica, segundo o modelo de contaminação.
Doença Agente Causal Sintomas
Disenteria bacilar Bactéria (Shigella dysenteriae) Forte diarréia
Cólera Bactéria (Vibro cholerae)
Diarréia extremamente forte,
desidratação, alta taxa de
mortalidade
Leptospirose Bactéria (Leptospira) Lcterícia, febre
Salmonelose Bactéria (Salmonella) Febre, náusea, diarréia
Febre tifóide Bactéria (Salmonella typhi)
Febre elevada, diarréia, ulceração do
intestino delgado
Disenteria amebiana Protozoário (Entamoeba histolytica)
Diarréia prolongada, com
sangramento, abscessos no fígado e
no intestino fino
Giardíase Protozoário (Giardia lamblia)
Diarréia leve a forte, náusea,
indigestão, flatulência
Hepatite Infecciosa Vírus (vírus da hepatite A) Lcterícia, febre
Gastrenterite
Vírus (enterovírus, parvovírus,
rotavírus)
Diarréia leve e forte
Ingestão de Água Contaminada
Paralisia infantil Vírus (Poliomielites vírus) Paralisia
Escabiose
Sarna (Sarcoptes scabiei) Úlceras na pele
Contato com
Água
Contaminada
Tracoma
Clamídea (Chlamydia tracomatis)
Inflamação dos olhos, cegueira
completa ou parcial
Verminoses, tendo
a Água como um
Estágio no Ciclo
Esquistossomose
Helminto (Schistosoma)
Diarréia, aumento do baço e do
fígado, hemorragias
Malária Protozoário (Plasmodium)
Febre, suor, calafrios, gravidade
variável com o tipo de Plasmodium
Febre amarela Vírus (flavivírus)
Febre, dor de cabeça, prostração,
náusea, vômitos
Dengue Vírus (flavivírus)
Febre, forte dor de cabeça, dores nas
juntas e músculos, erupções
Transmissão através
de Insetos, tendo a
Água como Meio de
Procriação
Filariose Helminto (Wuchereria bancrofti)
Obstrução de vasos, deformação de
tecidos
Fonte: Sperling (1996).
106
São inúmeros os impactos negativos aos quais estão submetidos o homem e o meio ambiente.
A poluição das águas doces é um exemplo, dos mais graves, de agressão ambiental, e,
notadamente, suas interferências sobre a humanidade podem ser avaliadas a partir de quatro
dimensões principais:
(a). dimensão ecológica - se refere à restrição da interatividade com o meio, em função do
elevado grau de degradação ambiental.
(b). dimensão cultural - diz respeito a alterações nos hábitos e costumes na medida em que
novas limitações surgem decorrentes de danos ambientais, se repercutindo na reprodução do
cotidiano, e se relacionam à degeneração de padrões de sociabilidade, fundamentada naquelas
transformações crônicas do meio. Trata-se de processos que englobam, inclusive, a construção
de mecânicas de isolamento cultural, ou, de modo inverso, fomentam a constituição de novas
formas de solidariedade, impulsionadas por alterações bruscas do ambiente, a exemplo de
algumas catástrofes e tragédias ambientais.
(c). dimensão econômica - por sua vez, se refere ao impacto econômico negativo, sobretudo,
na especulação fundiária e imobiliária (valorização do solo). Ela também incorpora efeitos
negativos sobre as formas de produção, na medida em que a imagem das empresas, muitas
vezes, está vinculada a parâmetros ambientais, refletindo, sistematicamente, na queda das
vendas e da percepção negativa do mercado sobre produtos a elas relacionados.
(d). dimensão de saúde humana - se refere à degeneração da saúde da população, a partir da
incorporação de novos ciclos de doenças, com novas relações parasito/hospedeiro.
Segundo Sabroza (1992) a relação da pobreza com um ambiente extremamente degradado
repercute dramaticamente, tanto na saúde ambiental, agravando o grau de degradação do
meio, quanto na saúde dos indivíduos, submetidos a uma gama de fatores de exposição a
riscos e a ciclos de doenças.
Podemos considerar dois padrões de lançamentos de efluentes nos corpos d'água. O primeiro
ocorre de forma controlada, com estudo prévio das contribuições e do modelo de tratamento
necessário à minimização dos impactos. O segundo se refere a despejos descontrolados de
107
efluentes, aumentando sistematicamente o potencial de agravo ao meio ambiente e
dificultando a previsão de zonas de segurança e de zonas críticas de poluição (Eiger, 1991).
Por outro lado, a má disposição dos efluentes industriais e domésticos, a lixiviação por
varredura de chuvas e as borrachas de origem industrial surgem como os principais problemas
de agressão aos mananciais urbanos no Brasil, que são submetidos sistemicamente a uma
série de interferências, seja por ações antrópicas relacionadas ao uso e ocupação inadequada
do solo ou processos produtivos sujos ou ambientalmente incorretos, seja por acidentes e
catástrofes naturais.
O potencial de depuração de um curso d'água, entre outros muitos fatores, depende da
capacidade de re-oxigenação do manancial e da forma de dispersão e diluição, peculiar ao rio,
que se relaciona, diretamente, com seu modelo de escoamento (transporte) de poluentes
(Eiger, 1991).
No que se refere aos impactos sobre o meio ambiente, podemos apontar, rapidamente, os
danos causados ao ecossistema e a biota dos rios, com prejuízo para a reprodução de espécies
aquáticas e aumento da incidência de vetores. No que se refere aos danos da biota, podemos
constatar desde desequilíbrios na cadeia alimentar até a extinção de espécies e plantas
aquáticas, responsáveis por auxiliar na depuração dos mananciais. Ainda, podemos falar de
processos de contaminação das águas subterrâneas (aqüíferos) e do próprio lençol freático, a
partir da poluição de corpos d'água superficiais. Também são relatados pela literatura, danos à
biota ribeirinha, a partir da contaminação de crustáceos e da vegetação nativa (mangue), além
da própria deterioração do solo por rios poluídos (Odum, 1985). Luca (1991) aponta para
uma série de impactos através de um modelo causa/conseqüência, conforme mostramos a
seguir, no quadro 06.
108
Quadro 05: Estudo de causa/efeito por tipo de poluente.
CAUSA (tipo de poluição) CONSEQÜÊNCIA
Matérias orgânicas (solúveis) Depleção do nível de oxigênio.
Fenóis, toxinas de algas. Produção de gosto e odores no tratamento da
água para consumo humano.
Matérias tóxicas e metais pesados (cianetos,
arsênico, selênio, mercúrio, e cromo).
Toxidade e bioacumulação em espécies
aquáticas, com prejuízos para cadeia
alimentar.
Matérias flutuantes. Causam cor e turbidez, sendo indesejáveis do
ponto de vista estético; aumentam o custo do
tratamento da água.
Nutrientes à base de nitrogênio, fósforo e
sílica.
Aumento das chances de eutroficação dos
corpos d' água.
Óleos, graxas e detergentes. Modificam a tensão superficial da água,
influenciando nas trocas gasosas e
dificultando a oxigenação.
Ácidos e álcalis. Interferem com a autodepuração, com a
especiação química e com a manutenção da
vida aquática.
Substâncias odoríferas. Prejuízo à saúde humana.
Poluição térmica. Acelera as taxas de reações bioquímicas,
modifica os valores de saturação e dispersão
de gases na água.
Compostos orgânicos (pesticidas clorados,
solventes orgânicos, poliaromáticos
nucleados, metanos alogenados etc).
Danos crônicos ao ecossistema e a saúde
humana através da bioacumulação nas cadeias
tróficas, com possibilidade de produzir
mutagenicidade e/ou carcinogenicidade
Fonte: Luca (1991).
109
6.3. Monitoramento das Estações de Coleta, Escolha e Grupamento dos Parâmetros
A FEEMA é a responsável pela política ambiental fluminense e através de programas
especiais, como o Programa de Despoluição da Baia de Guanabara, o acompanhamento da
qualidade ambiental é realizado continuamente. Assim, para o monitoramento das estações de
coleta, escolha e grupamento dos parâmetros no sítio de estudo, o acompanhamento dos níveis
de qualidade da água do Canal do Cunha é feito pela estação de medição CN100, conforme
nos demonstra a figura abaixo.
Ilustração 12: Domínio da Baía de Guanabara e detalhe da região do Canal do Cunha, com a
estação de medição CN100.
0 5000 10000 15000 20000 25000 30000 35000 40000
0
5000
10000
15000
20000
25000
30000
35000
40000
45000
50000
C
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n
a
l
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o
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Ilha do Governador
Rio São João do Meriti
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Rio Estrela
Rio Iriri
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o
n
c
a
d
o
r
Rio Guapimirim
Rio Guaxindiba
Rio Imboassu
Ilha de Paquetá
Rio Suruí
Rio Caceribu
Rio Inhomirim
R
i
o
P
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i
a
Rio Saracuruna
C
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a
l
d
a
T
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a
Rio Guarai
MN000
CN100
C
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n
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a
R
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o
T
i
m
b
ó
R
i
o
F
a
r
i
a
É importante observar que a estação CN 100, assim como as demais estações de medição
fluvial da Cidade do Rio de Janeiro, não se constitui num elemento físico, mas sim no ponto
onde a amostra da água é coletada. Dessa forma, a tabela 09, nos traz as coordenadas da
estação CN 100.
110
Tabela 09: Coordenadas da estação de coleta CN 100.
Estação Latitude Longitude X(UTM) Y(UTM)
Canal do
Mangue
MN000 22
0
54’ 01” 43
0
12’ 36” 683597.38 7466403.15
Canal do Cunha CN100 22
0
52’ 46” 43
0
14’ 22” 680604.22 7468746.56
Fonte: FEEMA.
Como podemos notar, a estação CN100 fica após a confluência do Canal do Cunha e o Canal
Faria-Timbó, nas proximidades da Avenida Brasil, a cerca de 1,6 quilômetros da foz do canal.
Devemos, portanto, destacar, que a proximidade entre o ponto de coleta e a foz do canal
revela que a amostra oriunda da estação CN 100 é representativa das contribuições sofridas
pela bacia hidrográfica, enfatizado que somente uma pequena parte das contribuições daquela
bacia se encontram a jusante do ponto de coleta. Abaixo segue a vista aérea da região de
confluência dos rios, com a localização aproximada da estação CN100.
Ilustração 13: Localização da estação CN 100.
Fonte: Google Earth, Satélite Digital Globe, acesso em novembro de 2005.
ES
TAÇÃO
FIOCRUZ
111
O estudo da qualidade da água do manancial foi feito a partir de opção analítica onde se
estabeleceram categorias de parâmetros a partir dos dados disponíveis para a estação CN100.
Optou-se pela escolha de dados que sintetizassem de forma mais geral os processos de
poluição. Assim, os grupos de parâmetros analisados foram estabelecidos da seguinte forma:
(a) parâmetros referentes aos ciclos do oxigênio e o potencial de depuração (oxigênio
dissolvido – OD -, demanda bioquímica de oxigênio - DBO, demanda química de
oxigênio - DQO, relação DQO/DBO);
(b) parâmetros referentes ao ciclo do nitrogênio orgânico e o potencial de degradação
(nitrogênio amoniacal, nitrogênio nitrito, nitrogênio nitrato);
(c) parâmetros referentes à concentração de microorganismos e o potencial de
contaminação (coliformes totais e coliformes fecais).
6.4. Estudos de Enquadramento do Manancial
Os dados fornecidos pela FEEMA revelam que durante todo o período levantado (1980 –
2004), a salinidade foi analisada somente entre 1991 e 1993, revelando uma concentração,
para a estação CN100 na faixa entre 0,5 mg/l e 1,0 mg/l, conforme o gráfico 06. Segundo o
CONAMA 20 e a Resolução 357, as concentrações acima descritas, classificam as águas do
manancial na categoria de águas salobras (com salinidade entre 0.5 mg/l e 30 mg/l).
Devemos, entretanto considerar, nesta análise, que o ponto do canal onde se encontra a
CN100 é bem próxima a Baia de Guanabara, que a declividade deste trecho é reduzida e que,
portanto, as oscilações de maré impactam, no referido trecho de forma a aumentar a
salinidade.
112
Gráfico 06: Salinidade da estação CN100.
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
6.5. Análise dos Parâmetros Estabelecidos
O esquema mostrado na ilustração 14 apresenta os ciclos do oxigênio, nitrogênio orgânico e
fósforo. Trata-se de uma estrutura simplificada que esquematiza os processos de poluição e
depuração ocorridos num corpo d’água, onde o esgoto lançado (nitrogênio amoniacal) sofre
sistematicamente processos de oxidação, transformando-se em nitrito e em nitrato,
respectivamente, através do consumo do oxigênio disponível, gerando maiores demandas
química e biológica de oxigênio (DQO/DBO), e aumentando o substrato para realização da
fotossíntese. O aumento sucessivo da fotossíntese, por sua vez, amplia significativamente o
teor do oxigênio dissolvido disponível. O tempo gasto para a oxidação da amônia até o estado
de nitrato vai variar em função da velocidade do rio e de sua turbulência (poder de dissipação
da descarga), e da concentração de oxigênio dissolvido no corpo manancial, possibilitando
maior ou menor quantidade e velocidade destas reações. O problema acontece quando a DQO
e a DBO são tão altas que o oxigênio dissolvido é insuficiente para promover a oxidação da
amônia, impedindo que esse ciclo se complete.
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
Salinidade (G/1000 G)
Salinidade (mg/l)
113
A poluição de um rio, oriunda do lançamento de efluentes, não fica restrita ao trecho do
lançamento, comprometendo o rio ao longo de boa parte do seu curso e, na medida em que a
pluma de poluentes se mistura, dependendo do nível de concentração e do potencial poluidor
das substâncias, tal diluição pode colocar em risco toda a bacia hidrográfica, bem como a
região estuarina.
Ilustração 14: Modelo dos ciclo do oxigênio, nitrogênio orgânico e fósforo orgânico.
Fonte: Rosman, 1999; e Cunha, 2004.
Programas de monitoramento para sistemas hídricos, com auxílio de modelos computacionais,
podem ajudar a minimizar a degradação ambiental e a garantir um padrão razoável de
qualidade da água dos mananciais, na medida em que o reconhecimento e a ação sobre os
'agentes' causadores da degradação ambiental, pela criação de instrumentos de gestão
integrada, reduzem os efeitos negativos das agressões ao ambiente (Cunha et al., 2003). Nesta
direção, o uso de modelos computacionais no monitoramento de ciclos ecológicos vem
ajudando a viabilizar alternativas efetivas de controle da qualidade ambiental, através de
experimentos de simulação, fundamentalmente, da dispersão de poluentes e da hierarquização
de mecanismos de controle e redução de danos ao meio ambiente e de riscos à saúde humana.
114
6.6. Grupo A: Parâmetros referentes aos ciclos do oxigênio e o potencial de depuração:
Devido aos valores extremamente altos da DBO e da DQO, foram elaborados sucessivos
gráficos com ampliação de escala para cada variável, visando facilitar uma identificação mais
precisa da faixa de predominância do parâmetro estudado.
Gráfico 07A– Valores de DBO medidos na estação CN 100.
0
50
100
150
200
250
300
350
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
DBO (mg/L)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
Gráfico 07B – Valores de DBO medidos na estação CN 100.
0
10
20
30
40
50
60
70
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
DBO (mg/L)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
115
Como nos apontam os gráficos 07A e 07B, a análise da demanda bioquímica de oxigênio
indica uma concentração oscilando entre 20mg/l e 70mg/l, acima dos 10mg/l determinadas
como limite máximo na Resolução CONAMA 357 (de 17 de março de 2005), para classe 3
das águas doce, não delimitando, esta resolução, os limites de DBO para a classe 4 das águas
doce, nem classe 3 das águas salobras. O gráfico mostra, num primeiro período (entre 1980 e
1984), valores de DBO extremamente altos, chegando a 230mg/l. Num segundo período
(entre 1985 e 1998), notamos a redução dos valores, que se mantém na faixa entre 70mg/l e
20mg/l, de modo geral. No terceiro período (entre 1999 e 2004), notamos mais uma redução
nos valores encontrados no gráfico. Se a primeira redução numérica encontrada,
possivelmente, se dá em função da melhoria na distribuição de água na região (bairros
tradicionais) e obras de canalização e drenagem urbana, a segunda redução se dá,
provavelmente, por obras associadas ao Programa Favela Bairro, que melhoraram as
condições de acesso à água encanada e sua freqüência, bem como implementaram ações
voltadas a estruturação das redes públicas de esgotamento e eliminação da ‘vala negra’ nas
favelas da região, inclusive com ligação a estações de tratamento de esgoto. Ainda podemos
especular a possível melhoria na freqüência da água encanada na região a partir do final dos
anos 90, o que favorece a diluição dos dejetos e reduzem, conseqüentemente, os valores da
DBO.
Gráfico 08 – Valores de OD medidos na estação CN 100.
0.0
0.5
1.0
1.5
2.0
2.5
3.0
3.5
4.0
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
OD (mg/L)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
116
Constatamos, no gráfico 08 que, na maior parte do tempo estudado, os valores de OD,
representados no gráfico por 0,1mg/l estão associados a valores abaixo do limite de detecção.
Isso significa que o manancial já não mais atende a classe 4 – águas doces -, nem a classe 3 –
águas salobras (CONAMA 357, de 17 de março de 2005). Se na classe 4 (OD > 2,0mg/l) só
sobrevivem algumas espécies de fictoplantum e zooplanctum, já não havendo sobrevida de
nenhuma espécie de peixe, nas condições apresentadas pelo canal, ocorre somente “a presença
de alguns macroorganismos e larvas de insetos, dotados de meios para sobreviver nas
condições predominantes. No entanto, a macro-fauna é ainda restrita em espécies”. Não
existem mais “as hidras, esponjas, musgos, crustáceos, moluscos e peixes” (Sperling, 1996) –
corresponde, provavelmente, às condições da ‘Zona de Decomposição Ativa’ (Sperling,
1996).
Quanto aos demais valores, especulamos que correspondem a momentos de maior
pluviosidade (períodos de chuva), ou alguma espécie de interrupção nos processos industriais
(a exemplo da Refinaria de Manguinhos).
Gráfico 09 – Valores de DQO medidos na estação CN 100.
0
100
200
300
400
500
600
700
800
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
DQO (mg/L)
Média (15 períodos)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
Notamos que os valores da DQO (gráfico 09) permanecem praticamente constantes ao longo
das duas décadas e meia do estudo, exceto por pequena declividade nos valores que
provavelmente refletem além a melhoria no sistema de abastecimento de água (freqüência e
117
quantidade) - principalmente a partir da metade da década de 80 -, o contínuo processo de
perda de plantas industriais pela migração interna para outros parques industriais na cidade e,
inclusive, pelo fechamento das companhias. Entretanto, podemos destacar que a melhoria no
abastecimento e na oferta de água não significa um incremento significativo no consumo
industrial, na medida em que a evolução tecnológica possibilita a manutenção quantitativa da
produção com menor consumo de água e energia.
Por outro lado, a velocidade adquirida pelas técnicas modernas de produção, possibilita seu
próprio incremento. E a amplificação desse processo, que corresponde ao incremento na
produção, se reflete em uma nova demanda de água consumida no meio fabril. Devemos
destacar que, tendo em vista o atual zoneamento da Cidade do Rio de Janeiro (apresentado
para a sub-bacia no detalhe referente ao mapa 18), a legislação que determina o uso do solo
municipal ainda revela a sub-bacia hidrográfica como região predominantemente industrial
naquela cidade; um fenômeno bastante interessante porque, como já foi dito, o processo de
êxodo das indústrias da região inicia-se no final da década de 60, intensificando-se nos anos
noventa, com a abertura do país ao mercado externo, a adoção do modelo neoliberal e a
conseqüente falência de parte significativa daqueles empreendimentos. Ou seja, boa parte da
zona industrial migrou e outra parte faliu, mas ainda, como podemos ver no gráfico 10, da
relação DQO/DBO, acima de 2,4 (Sperling, 1996), temos uma região cujo despejo
caracteriza-se por sua contribuição predominantemente industrial.
Gráfico 10 – Relação DQO/DBO observados na estação CN 100.
0.0
2.5
5.0
7.5
10.0
12.5
15.0
17.5
20.0
22.5
25.0
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
DQO/DBO
Média (15 períodos)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
118
Neste sentido, observa-se, a partir de 1998, uma elevação sistemática nos valores referentes à
relação DQO/DBO. Tal fenômeno origina-se, possivelmente, das intervenções associadas à
estruturação das favelas, viabilizadas, como já foi dito, pelo Programa Favela Bairro, que teve
como prioridade a eliminação de valas negras, o abastecimento de água e, na maioria das
comunidades contempladas, a implantação de rede de esgoto. Provavelmente, em boa parte
dessas favelas pertencentes à sub-bacia hidrográfica, este novo ramal da rede pública foi
conectado a Estação de Tratamento de Esgotos da Penha, o que responde pela redução
significativa de DBO a partir daquele ano e aumenta a relação DQO/DBO, visto que a carga
de lançamento industrial naquele período não foi alterada.
6.7. Grupo B: Parâmetros referentes ao ciclo do nitrogênio orgânico e o potencial de
degradação:
Observa-se no gráfico 11 para os valores referentes ao nitrogênio amoniacal, o mesmo
fenômeno ocorrido com a DBO, conforme nos mostra a linha de tendência apresentada. Num
primeiro período (1980 – 1983), observamos uma elevada concentração nos valores do
nitrogênio amoniacal, significando um despejo acentuado de esgoto bruto (ou ‘fresco’); o
segundo período revela uma redução na quantidade do esgoto ‘fresco’ lançado no manancial,
que perdura até 1998, aproximadamente, quando há uma acentuada redução no lançamento
dos despejos de esgoto bruto.
As análises anteriores, associadas à DBO e ao OD, justificam adequadamente esses valores e
essas reduções. Entretanto, ao compararmos os valores encontrados no manancial com os
valores máximos permitidos para a classe 3
11
(águas doces) e classe 2
1
(águas salobras), da
Resolução CONAMA 357, de 17 de março de 2005, observamos o seguinte:
(a) Classe 3 (águas doces): para encontrarmos os valores mínimos de nitrogênio
amoniacal total para um manancial da classe 3, precisamos observar os valores de Ph
11
Não existem valores mínimos de Nitrogênio Amoniacal para as classes 4 (águas doces) e 3 (águas salobas),
classes que se aproximam melhor das características do canal, no ponto de coleta, estando, em alguns
parâmetros, com características inferiores mesmo é estas classes.
119
do manacial. Para um Ph médio na faixa de 6,5 à 7,5, conforme observamos no
gráfico 12, temos um valor máximo de nitrogênio amoniacal de 13,3 mg/L N.
(b) Classe 2 (águas salobras): nesta classe, o valor máximo do nitrogênio amoniacal total
é 0,7 mg/L N.
Gráfico 11 – Valores de Nitrogênio Amoniacal medidos na estação CN 100.
0.0
2.0
4.0
6.0
8.0
10.0
12.0
14.0
16.0
18.0
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
NAMONIACAL (mg N/L)
Média (15 períodos)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
Gráfico 12 – Valores de Ph medidos na estação CN 100.
0,00
1,00
2,00
3,00
4,00
5,00
6,00
7,00
8,00
9,00
10,00
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
'10301L - pH(UpH)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
120
Se considerarmos o trecho do manancial, correspondente ao ponto analisado, em consonância
com os dados da FEEMA, um trecho de água salobra
12
, o nitrogênio amoniacal total está
muito acima do que o permitido na norma.
O baixo teor de oxigênio dissolvido, a baixa velocidade do canal e a grande quantidade de
matéria orgânica presente na água (que consome o oxigênio dissolvido), impede, pela
ausência de oxigênio disponível, a oxidação da amônia, em primeira instância, e,
posteriormente, a oxidação do nitrogênio nitrito, conforme mostra a ilustração 15, retirado de
Cunha (2006), com base em Harleman (1978), que trás o Ciclo do Nitrogênio (considerando a
amônia, o nitrato e o nitrogênio orgânico) aos 60 dias, e representa a oxidação sucessiva dos
compostos nitrogenados de sua forma menos estável e mais agressiva ao meio ambiente
(amônia) até sua forma ecologicamente mais equilibrada (nitrato).
Ilustração 15 – Solução analítica do Ciclo do Nitrogênio em 60 dias de simulação.
Fonte: Cunha (2006).
12
. A partir de informação fornecida pela FEEMA, as coletas são sempre realizadas em períodos de vazante,
para evitar ao máximo a interferência das águas da baia sobre o manancial. Dessa forma, podemos considerar
que, se a interferência das alterações de maré são mínimas e as análises de salinidade se encontram na faixa
observada, o trecho do manancial, determinado pelo ponto de coleta, é, sem dúvida, um trecho de água salobra.
121
Como podemos observar no gráfico a quantidade total de nitrogênio é preservada, embora
sofra variação entre as substâncias ao longo do tempo, com diminuição de nitrogênio orgânico
e proporcional aumento de nitrato através da oxidação, tendendo, ao longo do tempo (60 dias)
a alcançar maior equilíbrio ecossistêmico, sendo o nitrogênio orgânico praticamente todo
oxidado.
É importante observar que o experimento acima desconsidera a presença de matéria orgânica
de modo que o OD encontrado naquele manancial destina-se quase que exclusivamente, a
oxidação da amônia e do nitrogênio orgânico.
Neste sentido, ao observarmos os gráficos 12A e 12B, veremos os baixíssimos níveis de
nitrito, variando entre 0,002 mg/l e 0,01 mg/l ao longo do tempo. Valores estes bastante
inferiores ao valor máximo permitido pelo CONAMA 357 para a classe II – águas salobras:
0,20 mg/l.
O fenômeno se dá, como já foi dito, pelo excesso de carga orgânica (esgoto bruto), que
consome todo OD disponível, gerando elevadas DBO e DQO, e não permitindo a oxidação da
amônia, pela falta de oxigênio. Por outro lado, a baixa velocidade do canal não permite
reaeração suficiente para dar vazão à grande carga orgânica a oxidar e a integralidade do ciclo
do nitrogênio. Ainda, podemos enfocar a proximidade da estação com sua foz na Baia de
Guanabara, que não permitiria que o ciclo se completasse pelo curto tempo de percurso.
122
Gráfico 12AValores de Nitrogênio Nitrito medidos na estação CN 100.
0.00
0.10
0.20
0.30
0.40
0.50
0.60
0.70
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
Nitrito (mg/L)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
Gráfico 12B – Valores de Nitrogênio Nitrito medidos na estação CN 100.
0.00
0.02
0.04
0.06
0.08
0.10
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
Nitrito (mg/L)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
123
Nos gráficos 13A e 13B, também podemos notar os níveis de nitrato bastante baixos, entre
0,01 mg/L N e 0,05 mg/L N, próximos ao limite de detecção. Isso se dá na medida em que
sequer o primeiro ciclo de oxidação (amônia – nitrito) pôde ser completado pela ausência de
OD, de forma que a formação do nitrato no segundo ciclo de oxidação (nitrito – nitrato) é
ainda menor (muitíssimo abaixo, evidentemente, dos valores máximos permitidos pelo
CONAMA 357 para a Classe II – águas salobras: 0,70 mg/L N).
Gráfico 13AValores de Nitrogênio Nitrato medidos na estação CN 100.
0.0
2.0
4.0
6.0
8.0
10.0
12.0
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
Nitrato (mg N/L)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
Gráfico 13B – Valores de Nitrogênio Nitrato medidos na estação CN 100.
0.00
0.10
0.20
0.30
0.40
0.50
0.60
0.70
0.80
0.90
1.00
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
Nitrato (mg N/L)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
124
Assim, para mananciais que recebem cargas sucessivas de esgoto bruto, podemos observar,
que quanto maior a quantidade de amônia, mais degradado é o manancial, e quanto menor a
quantidade de amônia e maior a de nitrato, menos degradado é o manancial, pois permitiu as
reações envolvidas no processo natural de depuração, o que significa taxas menores de
matéria orgânica e mais disponibilidade de OD.
6.8. Grupo C: Parâmetros referentes à concentração de microorganismos e o potencial
de contaminação:
Embora o CONAMA 20 estabeleça um limite máximo de coliformes totais (20.000 coliformes
totais/100 ml) como parâmetro de qualidade, em detrimento do uso de coliformes fecais
(limite máximo de 4.000 coliformes fecais/100 ml), em áreas onde existam restrições
laboratoriais que inviabilizem a análise deste último parâmetro, o CONAMA 357 não admite
tal substituição, apontando como única alternativa viável, em substituição à análise dos
coliformes termotolerantes (fecais), a determinação da E. Coli, ‘de acordo com limites
estabelecidos pelo órgão ambiental competente (CONAMA 357, 2005).
Dessa forma, optamos por trabalhar unicamente com o parâmetro Coliforme Termotolerante,
não utilizando nem os valores referentes à análise do Coliforme Total, por não serem
considerados como parâmetros-limites da qualidade pelo CONAMA 357, nem os dados de E.
Coli, por não estarem disponíveis para todo o período.
Ao observarmos os gráficos 14A e 14B, notamos um substancial decréscimo da quantidade de
coliformes entre 1982 e 2004. Possivelmente, apenas uma acentuada intervenção urbanística
com significativo aporte em infra-estrutura explicaria tal fenômeno. Entretanto, nos
levantamentos realizados por esta pesquisa, nada foi constatado nesta direção.
125
Gráfico 14AValores de Coliformes Fecais medidos na estação CN0100.
0
20000
40000
60000
80000
100000
120000
140000
160000
180000
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
Coli Fecal (NMPmil/100ml)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
Gráfico 14B – Valores de Coliformes Fecais medidos na estação CN0100.
0
2500
5000
7500
10000
12500
15000
17500
20000
22500
25000
jan-
80
dez-
80
dez-
81
dez-
82
dez-
83
dez-
84
dez-
85
dez-
86
dez-
87
dez-
88
dez-
89
dez-
90
dez-
91
dez-
92
dez-
93
dez-
94
dez-
95
dez-
96
dez-
97
dez-
98
dez-
99
dez-
00
dez-
01
dez-
02
dez-
03
dez-
04
Coli Fecal (NMPmil/100ml)
Fonte: Departamento de Planejamento Ambiental – FEEMA.
126
Por outro lado, os dados disponíveis mostram um aumento expressivo da população das
favelas da área em todo o período observado. Esse aumento corresponde ao crescimento
populacional da região como um todo até o início dos anos 90 e, a partir daí, à migração
expressiva em direção as favelas, o que garante o crescimento populacional da área, apesar da
perda observada nos bairros tradicionais (vide mapa 11, migração intra-urbana entre 1991-
2000).
Mas o que pode ter causado a queda observada nos coliformes termotolerantes? O que
explicaria este resultado?
Uma primeira hipótese, que aqui fazemos, refere-se ao processo industrial. A queda
constatada refletiria o lançamento de algum produto no canal?
Buscou-se, então, identificar substâncias químicas poderiam ocasionar tal impacto e quais
seriam os processos de produção que poderiam se utilizar destas substâncias.
Reconhecemos, então, na Refinaria de Manguinhos a possível responsável por este processo,
na medida em que a sua produção envolve fenol, conforme diz o Environmental Engineers
Handbook (1997):
“Although phenol (C6H5OH) hás been detected in decaying
organic matter and animal urine, its presence in a surface stream
is attributed to industrial pollution. Petroleum refineries, coke
plants, and resin plants are major industrial phenolic waste
sources. Phenolic compound and their derivatives are used in
coatings, solvents, plastis, expolsives, fertilizer, textiles,
paharmaceuticals, soap, and dyes.”
ou seja,
“Muito embora o phenol (C6H5OH) tenha sido detectado em
matérias orgânicas decompostas e urina animal, sua presença na
superfície de um córrego é atribuída à poluição industrial.
Refinarias de petróleo, fábricas de carvão e de resinas são as
maiores fontes de despejo de phenolic. O composto de phenolic e
seus derivados são usados em coberturas, solventes, plásticos,
explosivos, fertilizantes, têxteis, farmacêuticos, sabão e tinturas.”
127
A refinaria lançaria no canal dejetos oriundos de algum processo industrial contendo fenol.
Este último elimina boa parte dos coliformes termotolerantes e, pela proximidade com o
ponto de coleta, o canal não poderia receber maiores contribuições de esgoto em natura após o
lançamento do fenol. O fenol se diluiria após o encontro dos Rios Faria e Timbó, formando o
Canal do Cunha. A partir deste trecho, não há mais contribuição de esgoto fresco até a
estação de medição, já que o canal tem de um lado a Fundação Oswaldo Cruz e, de outro, a
Refinaria de Manguinhos. O fenol então, ao chegar na estação de coleta, já teria se diluído
nas águas do canal; porém, antes, eliminaria boa parte dos coliformes termotolerantes (ou
fecais) ali encontrados.
Porém, não se possui informação relativa à quantidade de fenol lançada pela refinaria, e se tal
quantidade seria suficiente para reduzir acentuadamente os coliformes na proporção
apresentada nos gráficos 14A e 14B. Observamos apenas que a possível localização de um
ponto para lançamento de fenol nas proximidades da Refinaria de Manguinhos,de alguma
forma invalida a hipótese anterior, já que, nestas condições, não haveria tempo hábil para que
o fenol produzisse uma grande queda nos níveis de coliformes fecais até sua medição na
estação CN100. A isto associa-se à baixa velocidade de escoamento das águas do Canal do
Cunha, inviabilizando sua rápida diluição e o conseqüente impacto na carga de coliforme,
conforme verificada nos gráficos. Portanto, permanece a questão sobre as causas da queda
tão significativa nos níveis de coliformes fecais naquele manancial.
128
Capítulo 7 – Relações Endêmico-epidêmicas: Pequeno estudo sobre saúde e
doença
Para entender a questão
O presente capítulo visa compreender as relações de saúde e doença presentes na sub-bacia
hidrográfica a partir de agravos associados, de alguma forma, a características expressivas do
seu processo de urbanização. Trata-se de entender como a lógica endêmica e das epidemias
nos lugares pode impactar e ser impactada pelo que denominamos degradação ambiental de
forma mais ampla, ponderando, a partir daí, sobre sua incorporação como parâmetros
específicos e representativos na busca de modelos que tenham a capacidade de mensurar o
processo de degradação ambiental de uma área.
Optamos por trabalhar com dois de agravos – a saber: dengue e leptospirose - que, se por um
lado, se vinculam diferentemente à estrutura sócio-espacial dos lugares, por outro, se agrupam
no conjunto de doenças denominadas “de notificação compulsória” ou obrigatória. Desta
forma, para efeitos deste estudo, podemos considerar nas suas peculiaridades, o universo das
informações razoavelmente confiável.
Podemos entender o dengue como uma doença relacionada, entre outros fatores, às condições
climáticas locais, e a características morfológicas da urbanização como, por exemplo, o
adensamento excessivo com predominância horizontal (poucos pavimentos). A leptospirose,
por sua vez, incorpora condicionantes históricos do processo de urbanização e dos
investimentos públicos, fundamentalmente, em saneamento, na medida em que a ausência de
uma rede efetiva de drenagem, assim como o próprio modelo de ocupação e a obrigatoriedade
de usos urbanos próximo a calhas naturais, margens de rios e áreas pantanosas, ou o excessivo
acúmulo de lixo no entorno das edificações residenciais, locais de trabalho ou áreas de
circulação obrigatória, favorecem a proliferação da doença.
Os dados trabalhados foram fornecidos pela Coordenação de Programas de Epidemiologia da
Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro e refletem o universo das notificações entre
os anos de 1996 e 2004.
129
Ainda, na medida em que este trabalho se dedica a estudar atributos que integrem a
composição de um indicador ambiental, devemos entender que a composição de qualquer
indicador de cunho ambiental exige que cada parâmetro a ser trabalhado receba um
tratamento singular, dentro das suas particularidades, observando seus próprios mecanismos e
potenciais de interação.
Nesta direção, reconheçamos os limites impostos pelas distintas escalas temporais das
variáveis analisadas e as questões delas decorrentes. Tratam-se de dados secundários
oriundos de diversos órgãos da administração pública estadual e municipal, que são coletados
segundo lógicas diferenciadas e, conseqüentemente, em distintas temporalidades. Entretanto,
observamos que tal fato não invalida o trabalho que se segue. Primeiro pelo fato de que se
trata de um trabalho de prospecção para formulação do indicador, com fins de investigar a
potencialidade e a pertinência dos parâmetros a serem adotados, o que secundariza a questão
da compatibilidade temporal, face à natureza da análise, como se verá a seguir. Em segundo
lugar, por que a lógica de análise da qualidade da água, por exemplo, está associada ao grau
de degradação local, que é expresso pela melhora ou piora da qualidade de água, por impactos
e melhorias do meio urbano, enquanto os dados de saúde aqui se pautam por uma discussão
comparativa entre as partes da cidade. Assim nos propusemos a discutir os agravos abordados
utilizando séries históricas de nove e seis anos, conforme a disponibilidade das bases de dados
da Secretaria Municipal de Saúde, onde avaliamos o comportamento da doença na cidade do
Rio de Janeiro e na micro-bacia do Cunha, tendo como hipótese que uma área mais degradada
está mais propensa, se não houver nenhum fenômeno específico que o impeça, a ter maiores
incidências de determinados tipos de agravos que se associam ao ambiente urbano.
130
O dengue
O dengue é uma doença causada por um arbovirus, com quatro tipos diferentes (vírus tipo I,
tipo II, tipo III e tipo IV), e transmitida por duas espécies de mosquitos, a saber: Aëdes
aegypti e Aëdes albopictus (Cives, 2002), que picam durante o dia, sendo o primeiro deles o
principal vetor de transmissão no Rio de Janeiro. Erradicado na década de 30, em função das
campanhas de controle da febre amarela o A. aegypti retorna nos anos 1970, e o dengue surge
no cenário nacional pela primeira vez em 1981, na região Norte do país. Neste momento,
conforme nos traz Siqueira et all (2005), surgem o dengue tipo I (que se alastra por todo o
país) e o dengue tipo IV (somente em Roraima). Em 1986 temos a entrada do dengue I no
Rio de Janeiro e, em 1990, temos a entrada do dengue tipo II no Rio de Janeiro, com posterior
dispersão para os outros estados da federação. O dengue tipo III, por sua vez, é introduzido
no Brasil pelo Rio de Janeiro no ano 2000 (Siqueira et all, 2005), conforma nos mostra quadro
06 abaixo, seguido pelos gráficos 15-A, 15-B e 16, que trazem, respectivamente, os casos do
dengue registrados por meses do ano e sua totalização anual com os períodos de inserção dos
tipo I, II e III do vírus no país cruzado à curva de hospitalizações por dengue.
Quadro 06: Introdução dos tipos de dengue I, II, III e IV no Brasil.
Fonte: Siqueira et al., 2005.
131
Quadro 6: Introdução dos tipos de dengue I, II, III e IV no Brasil (tradução)
___________________________________________________________________________
PESQUISA
Quadro 1. Cronologia dos maiores casos relacionados à dengue no Brasil, 1981-2002 .
Período/ano Casos .
1981-1993: Ondas epidêmicas em áreas localizadas
1981 Surtos restritos (vírus Den-1* e vírus Den-4†) no noroeste do Brasil (Estado de Roraima)
1986 Introdução do vírus Den-1 (Estado do Rio de Janeiro)
1990 Introdução do vírus Den-2‡ (Estado do Rio de Janeiro) e os primeiros casos confirmados de FDH
1994-2002: Circulação do vírus epidêmico e endêmico por todo o país
1994-1999 Dispersão do Aedes aegypti por toda a nação
1998 Disseminação de surtos em 16 estados (>534.000 casos notificados)
2000 Introdução do vírus Den-3§ (Estado do Rio de Janeiro)
2002 Grandes surtos em 19 estados (>794.000 casos notificados)
Mortes por febre da dengue hemorrágica excedem as mortes causadas por malária
*Sorotipo 1 do vírus da dengue.
†Sorotipo 2 do vírus da dengue.
‡Sorotipo 3 do vírus da dengue.
§Sorotipo 4 do vírus da dengue.
_______________________________________________________________________________________________________________________________________
Fonte: Siqueira et al., 2005.
Gráfico 15-A: Série temporal do comportamento do dengue no Brasil.
Fonte: Siqueira et al., 2005
13
.
13
Gráfico 15-A (tradução): Reported cases (n
o.
) = Casos notificados (n
o.
).
132
Gráfico 15-B: Série temporal do comportamento do dengue no Brasil.
Fonte: Siqueira et al., 2005
14
.
Gráfico 16: Curva de internações por inserção de tipo de dengue.
Fonte: Siqueira et al., 2005
15
.
14
Gráfico 15-B (tradução): Figura 1. Número de casos de febre da dengue notificados por mês, Brasil. A)
1986-1993. B) 1994-2003. As barras escuras representam o mês de janeiro.
15
Gráfico 16 (tradução): Hospilizations = Hospitalizações
DHF (Dengue Hemorrhagic Fever) = Febre da dengue hemorrágica (FDH)
Figura 2. Número de casos notificados e de hospitalizações decorrente de dengue e da febre da dengue
hemorrágica (FHD), Brasil 1986-2002.
133
Notamos a partir dos gráficos que os picos epidêmicos no Brasil e no Rio de Janeiro
acontecem imediatamente após à inserção de um novo tipo de vírus do dengue e sua dispersão
pelo país. Trata-se dos anos de 1987 (90 mil casos – dengue I), 1991 (100 mil casos – dengue
II), 1998
16
(570.148 casos – dengue II) e 2002
*
(com quase 800.000 casos – dengue III)
A transmissão do dengue se dá pela picada do mosquito (Aëdes aegypti), “que prolifera dentro
ou nas proximidades das habitações” (CIVES, 2002). Eles se criam na água, dentro de
qualquer recipiente que possua água mais ou menos limpa. Seus ovos ficam aderidos no
recipiente seco, não adiantando, portanto, simplesmente a troca da água. O raio de ação do
vetor de transmissão é em torno de 200 metros de circunscrição.
O dengue, em mais de 95% dos casos, causa transtornos, mas não coloca a vida da pessoa em
risco, e tem como principais sintomas desconforto, com febre alta, dor de cabeça, muita dor
no corpo, vômitos e manchas avermelhadas pelo corpo, além da possibilidade de pequenos
sangramentos, principalmente no nariz e gengiva (CIVES, 2002). O doente do dengue fica
imunizado para o tipo de vírus que contraiu, não reincidindo na doença daquele tipo do vírus.
Entretanto, o contágio pode ser feito por qualquer um dos outros três tipos identificados,
sendo o segundo contágio, na maioria dos casos, mais grave que o primeiro. A forma grave
da doença está associada à diminuição da pressão sangüínea e pode levar ao óbito.
16
Epidemia de abrangência nacional.
134
Os mapas 20, 21, 22 e 23 trazem a incidência de dengue na cidade do Rio de Janeiro nos anos
de 1997, 2000, 2003 e 2004, respectivamente. Tais mapas representam os anos com as mais
baixas taxas de incidência, no período analisado. De modo geral, podemos observar que os
bairros da sub-bacia hidrográfica são bairros que permanecem, com algumas variações,
endêmicos por todo o período (característica comum em quase toda AP 3 (leia-se AP 3.1, AP
3.2 e AP 3.3) da cidade do Rio de Janeiro). Por outro lado, durante os anos 1998 (mapa 24),
2001 (mapa 25) e 2002 (mapa 26) – anos com maiores taxas de incidência -, notamos uma
propagação maior para as outras áreas da cidade, fundamentalmente as AP 4 e AP 5.
Nesse período, notamos um crescimento sistemático das incidências de dengue em direção
àquelas APs, eclodindo numa epidemia no ano de 2002 na cidade do Rio de Janeiro.
Podemos observar que os bairros com endemicidade mais constante (que é o caso da Sub-
bacia hidrográfica do Canal do Cunha) sofrem aumento das incidências durante os anos
epidêmicos. Porém, são os bairros que nos momentos endêmicos aparecem com baixíssimas
ou nulas taxas de incidência, que nos momentos de epidemia elevam bruscamente todas as
estatísticas. Isso ocorre por que, nos bairros com endemicidade freqüente, ano após ano,
pessoas adoecem, picadas pelo Aëdes aegypti, adquirindo, sucessivamente, imunidade à
doença. No ano epidêmico, portanto, encontramos estes locais com boa parcela de sua
população imune à doença, na medida em que, como já foi dito, cada pessoa só terá a doença
pelo mesmo tipo de vírus uma única vez – imunidade de grupo (Sabroza, 1992). Por outro
lado, logicamente, a epidemia eclode nos bairros onde a imunidade é menor, por serem
bairros com endemicidade menos contínua e freqüente.
Outras vertentes
17
associam as menores taxas, nos períodos epidêmicos, em regiões de maior
endemicidade, a um conjunto mais complexo de fatores além de imunidade de grupo; como
por exemplo, às intervenções do Programa Saúde da Família (heterogêneo em suas ações pela
cidade) e às intervenções urbanas recentes (fundamentalmente em saneamento e outras obras
de infra-estrutura), além das próprias variantes associadas a padrões de notificação menos
rigorosos ou errôneos, na medida em que comprovadamente existe o constrangimento de
pacientes atendidos em emergências fora de suas comunidades originais, em relatar o
verdadeiro bairro de residência
2
.
17
- Notas de reunião com a Gerência de Vigilância Epidemiológica/SMS.
135
Mapa 20: Incidência de Dengue no ano 1997.
Fonte: SMS/RJ.
136
Mapa 21: Incidência de Dengue no ano 2000.
Fonte: SMS/RJ.
137
Mapa 22: Incidência de Dengue no ano 2003.
Fonte: SMS/RJ.
138
Mapa 23: Incidência de Dengue no ano 2004.
Fonte: SMS/RJ.
139
Mapa 24: Incidência de Dengue no ano 1998.
Fonte: SMS/RJ.
140
Mapa 25: Incidência de Dengue no ano 2001.
Fonte: SMS/RJ.
141
Mapa 26: Incidência de Dengue no ano 2002.
Fonte: SMS/RJ.
142
Desta forma, ao observarmos o Complexo da Maré, verificamos uma baixa quantidade de
acometimentos no período analisado, com relação aos outros bairros do Rio de Janeiro e, em
especial, com relação aos bairros pertencentes à região estudada tanto em anos endêmicos
quanto nos considerados anos epidêmicos, conforme já vimos anteriormente. Não
necessariamente uma favela apresentará incidências maiores que bairros tradicionais ou
outros tipos de ocupação (Sabroza, 1992), inclusive por tendências específicas relacionadas ao
ciclo do vetor, mas é, de uma forma geral, nos lugares mais precários
18
em que encontramos
os padrões endêmicos mais constantes
19
.
Por outro lado, fenômenos pontuais que geram alterações de tendências, como a apresentada
pelos números para o Complexo da Maré, não são suficientemente representativos para
caracterizar uma região macro-homogênea dentro de um núcleo urbano ou uma bacia
hidrográfica inteiramente. Observemos o gráfico comparativo das incidências do dengue
abaixo apresentado.
Neste gráfico, comparamos as taxas de incidência do dengue na AP 2.1 (Zona Sul), na cidade
do Rio de Janeiro como um todo, e na Sub-bacia Hidrográfica do Canal do Cunha. Ele nos
mostra que a sub-bacia hidrográfica tem historicamente incidências mais altas que toda a
Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro e, exceto nos anos considerados epidêmicos e pré-
epidêmicos, do que os valores apresentados para toda a cidade. Apenas nos anos de epidemia
a incidência total da cidade do Rio de Janeiro ganha valores mais altos em função da elevação
excepcional das taxas na AP 4 e AP 5 desta cidade, conforme já discutido anteriormente.
18
- Vide os mapas ora apresentados.
19
- A exceção de áreas com programas direcionados de controle epidemiológico ou com outra intervenção
específica que possa resultar em impacto direto no ciclo do vetor.
143
Gráfico 17: Comparativo das incidências do dengue no Rio de Janeiro.
Gráfico Comparativo das Incidências de Dengue
0,0
500,0
1000,0
1500,0
2000,0
2500,0
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
período
taxas
AP 2.1
Rio de Janeiro
Sub-bacia
Hidrográfica
Fonte: Gráfico preparado a partir de dados fornecidos pela Coordenação de Vigilância
Epidemiológica da Secretaria Municipal de Saúde da Cidade do Rio de Janeiro.
A partir da comparação feita no gráfico acima, entre as incidências do dengue na Zona Sul da
cidade do Rio de Janeiro e na Sub-bacia Hidrográfica do Canal do Cunha, podemos
considerar que em regiões de maior precariedade têm mais propensão a taxas de incidências
mais altas que as regiões mais abastadas, pelo menos no caso do dengue. Este fato se associa,
evidentemente, de forma mais complexa a um conjunto de atributos que fazem de
determinados lugares mais ou menos vulneráveis que outros. São fatores característicos de
um processo de reprodução social moldado não só pelas oportunidades, possibilidades
econômicas, acesso aos bens de consumo e a estratégias elementares da vida urbana, mas
também por hábitos, padrões culturais e por costumes, que se refletem sistematicamente na
forma de ocupação e apropriação espacial, e modelam suas características.
Neste sentido, ganha grande relevância a discussão dos critérios que norteiam a construção
dos lugares combinados ao ciclo de vida dos vetores e as formas de transmissão dos agravos.
No caso do dengue, devemos considerar que o raio de ação do Aëdes aegypti (entre de 100 a
200m) é um determinante no processo de transmissão da doença. Desta forma, a proximidade
entre as habitações e a densidade excessiva, com tipologias de predominância horizontal se
144
constitui num potencializador no processo de contágio. Evidentemente o deslocamento do
vetor no plano horizontal ou com pequenas variações de gabarito torna-se privilegiado. Por
outro lado, locais com freqüência inconstante no abastecimento de água, obrigando os
moradores e indústrias a estocagens nem sempre apropriadas, reservatórios sem tampa ou com
tampa inadequada ou quebrada, excesso de lixo e acúmulo de recipientes vazios como latas,
garrafas e pneus, que possam acumular água de chuva e outros elementos (inclusive a falta de
manutenção das construções e do espaço urbano) constituem fatores de risco para o
crescimento do mosquito.
145
A Leptospirose
A leptospirose é uma zoonose, transmitida pela bactéria L. interrogans que acomete roedores,
animais domésticos (cães e gatos) e outros animais com alguma importância econômica (bois,
cavalos, porcos, cabras, ovelhas etc.), e é transmitida ao homem basicamente através da urina
do Rattus norvegicus (rato de esgoto) (CIVES, 2002). Animais domésticos vacinados tornam-
se portadores assintomáticos, podendo transmitir o L. interrogans por toda a vida. A
leptospirose, ao contrário do dengue, não confere imunidade ao infectado, podendo este ter
leptospirose repetidas vezes.
O ciclo de contágio da leptospirose, mais claramente que o do dengue, se associa à macro
estrutura da urbanização, na medida em que a disponibilidade de saneamento básico em áreas
mais abastadas diminui o contato direto, pela eliminação – ou restrição - de áreas de convívio
entre o homem e o rato.
Nas áreas sem saneamento adequado, a sobreposição do convívio espacial aumenta
circunstancialmente a possibilidade do contágio, pois podemos dizer que a ruptura no ciclo de
transmissão da doença está associada à relação de bem estar entre espécies, que não
compartilham (e não desejam compartilhar) do mesmo espaço. Portanto, na presença de
saneamento adequado, o homem usufrui de um espaço salubre para habitar, e o rato usufrui de
espaço adequado ao seu ciclo de vida – o cano de esgoto. Na ausência desta disponibilidade
espacial, vinculada à disponibilidade de infra-estrutura, homem e rato compartilham o mesmo
espaço – o espaço doméstico e peri-domiciliar - aumentando as possibilidades de contágio da
leptospirose (ver esquema de contágio da leptospirose a seguir).
Se o controle da leptospirose se associa de alguma forma ao controle das condições de
reprodução da macro-estrutura sanitária urbana e à disponibilidade de áreas adequadamente
urbanizadas, através da existência de redes de esgotamento sanitário; armazenamento e coleta
de lixo; controle de terrenos baldios com mato em áreas urbanas; e eficaz sistema de
drenagem das águas servidas e das águas pluviais, claramente, fora dos momentos de
epidemias, áreas desfavorecidas destas características serão propensas a serem áreas
endêmicas no que concerne à leptospirose.
146
Esquema do ciclo de contágio da leptospirose:
Fonte: Notas de orientação.
HOMEM
CASA BOA PARA
O HOMEM
CASA BOA PARA
O RATO – cano de
esgoto
Disponibilidade de
saneamento:
- Esgoto;
- Lixo
- Espaços
urbanizados sem
terrenos baldios e
mato alto;
- Drenagem das
á
g
uas servidas
- Esgoto:
saneamento básico.
Ausência ou minoração
do contágio
RATO (urina do
rato
)
Áreas urbanizadas
Enchentes
(contato por
sobreposiçã
o de uso
espacial) –
ausência de
infra-
tt
Contágio
Ruptura do convívio
espacial direto –
separação de espaços
147
No Rio de Janeiro, podemos observar através do gráfico 18, que, notoriamente, o ano de 1996
foi um ano de grande ocorrência de casos de leptospirose, segundo a Secretaria Municipal de
Saúde do Rio de Janeiro, enquanto os anos posteriores têm menor incidência da doença.
Dessa forma, foram escolhidos para estudo de caso, os anos de 1996, como um ano
representativamente epidêmico, e 2004, como um ano representativamente endêmico, no que
se refere à incidência de leptospirose na Cidade do Rio de Janeiro.
Gráfico 18: Número de casos de leptospirose no Rio de Janeiro entre 1996 e 2004.
Número de Casos de Leptospirose no Rio de Janeiro
1 790
124
272
100
84
87 96
114
91
0
500
1 000
1 500
2 000
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Período
Número de Casos de Leptospirose no Rio de Janeiro
Fonte: SMS/PCRJ.
Devemos observar, que o relativo baixo número de casos registrados nos períodos endêmicos,
se deve também ao fato de que os sintomas da leptospirose são facilmente confundidos com
sintomas de outros agravos, como febre amarela, dengue, malária, hantavirose e hepatites
(CIVES, 2002), dificultando o diagnóstico e/ou favorecendo um diagnóstico equivocado da
doença, o que, evidentemente, provoca um desvio substancial no número de notificações.
Nos momentos de epidemia, o sistema de saúde está, possivelmente, mais atento à incidência
do agravo, promovendo diagnóstico e tratamento mais sistemático e menos tardio.
A cidade do Rio de Janeiro registrou, em 1996, 1.790 casos leptospirose, enquanto em toda a
região sudeste foram registrados 3.065 casos, e no território nacional aconteceram 5.281
notificações (CIVES, 2002). Neste universo, a cidade do Rio de Janeiro representou 33,9%
148
do número de notificações ocorridas em todo o Brasil, e 58,4% de todas as notificações da
Região Sudeste. Esta excessiva incidência se deu, fundamentalmente, pela precariedade da
rede de drenagem e a baixa vazão de escoamento da cidade, em função de sua proximidade
com o mar. Conforme Ávila-Pires (2006), observamos o ano de 1996 como um ano de
grandes picos de precipitação atmosférica na cidade do Rio de Janeiro, ocasionando enchentes
(Araújo et all, 2006) por toda a cidade, coincidindo (Ávila-Pires, 2006) com os altos picos de
incidência de leptospirose.
Nesta direção, observamos o mapa 27, que traz a espacialização da doença, naquele ano, na
cidade do Rio de Janeiro.
Como primeiro ponto, observamos que alguns bairros, com alta incidência, correspondem a
bairros de baixíssima população residente, como Ilha do Fundão e Grumari. Dessa forma, o
número mínimo de casos representa a elevada incidência, o que não se traduz como questão
representativa no processo de espacialização da epidemia. Jacarepaguá, por sua vez, destaca-
se como foco de alta incidência, devido às consecutivas cheias do rio Grande e sua bacia
naquele ano de 1996, conforme relata Ferreira et all (1996). A sub-bacia hidrográfica do
Canal do Cunha também expressa uma incidência relativamente alta de casos de leptospirose.
Observamos, na sub-bacia, uma configuração muito similar entre os bairros atingidos no
período considerado epidêmico e no período endêmico (mapa 28, da incidência no ano de
2004), enquanto outros bairros, a exemplo de Região Administrativa de Jacarepaguá, no
período endêmico, alteram significativamente a relação de incidência no que se refere à
configuração apresentada em 1996.
Nesta direção, notamos, portanto que os períodos epidêmicos coincidem com os períodos de
alta pluviosidade, com decorrência de inundações. Neles, a distribuição dos casos de
leptospirose atinge toda a cidade, tendo em vista que, de forma geral, toda a cidade do Rio de
Janeiro apresenta sérios problemas de macro-drenagem. Dito isso, podemos observar que são
áreas endêmicas, os locais carentes de urbanização, com armazenamento inadequado do lixo,
limpeza urbana deficiente, carência de rede de coleta de esgoto, espaços coletivos mal
tratados e terrenos baldios com vegetação alta, facilitando a presença de vetores, assim como
a presença de canais assoreados e cobertos de mato e outras vegetações rasteiras.
149
Mapa 27: Incidência de Leptospirose no ano de 1994.
Mapa 27: Incidência de Leptospirose no ano de 1994.
150
Mapa 28: Incidência de Leptospirose no ano de 1994.
Mapa 28: Incidência de Leptospirose no ano de 1994.
151
O gráfico 19 apresenta os casos de leptospirose na cidade do Rio de Janeiro, agregados pela
AP2.1, com infra-estrutura abundante e alto grau de urbanização, toda a cidade, com
realidades múltiplas, e pela sub-bacia hidrográfica, zona carente de infra-estrutura e
urbanização precária em boa parte da área.
Observamos, a partir deste gráfico, que tanto no ano de 1996 (considerado epidêmico), quanto
no ano de 2004 (endêmico), os casos de leptospirose assumem maior proporção na sub-bacia
hidrográfica em estudo. Isso por que esta, além da decorrente deficiência de macro drenagem,
observada em todo o município, acumula graves questões relacionadas a disponibilidade de
infra-estrutura urbana, dificultando a estratificação espacial do vetor e do homem e,
conseqüentemente, aumentando o probabilidade do contágio.
Gráfico 19: Distribuição de casos de leptospirose no Rio de Janeiro, por distintas
espacialidades, para os anos de 1996 e 2004.
Casos de Leptospirose no Rio de Janeiro
125
2
1790
91
189
17
0
500
1000
1500
2000
1996
Ano de comparão
mero de ca
s
AP 2.1
Cidade do Rio de Janeiro
Sub-bacia Hidrográfica
Fonte: SMS/PCRJ.
Foram elaborados os gráficos 20 e 21, que detalham a distribuição espacial dos casos de
leptospirose na AP2.1, para entendermos como se estratificam os casos de leptospirose
naquela região. Através deles podemos notar que a grande maioria dos casos notificados, são
ocorrências oriundas da RA da Lagoa, mais precisamente do bairro do Jardim Botânico. Tal
fenômeno se justifica por ser esta uma das calhas de drenagem de mais difícil escoamento na
daquela área de planejamento, inundando com grande facilidade e preservando as águas das
enchentes por um longo tempo, devido a sua dificuldade de escoamento.
2004
152
Gráfico 20: Casos de leptospirose, por RA, na AP2.1 – 1996.
Número de Casos de Leptospirose, por RA, na AP2.1 - 1996
16
23
125
0
IV BOTAFOGO
V COPACABANA
VI LAGOA
XXVII ROCINHA
Fonte: SMS/PCRJ.
Gráfico 21: Casos de leptospirose na VI RA – 1996.
Número de Casos de Leptospirose na VI RA - 1996
7
2
2
98
10
6
0
IPANEMA
LEBLON
LAGOA
JARDIM BOTÃNICO
GÁVEA
VIDIGAL
SÃO CONRADO
Fonte: SMS/PCRJ.
Portanto, podemos observar que os períodos endêmicos são, novamente, os períodos mais
indicados para analisarmos a relação da leptospirose como conseqüência do processo de
degradação ambiental urbana; tendo em vista que espaços mais precários, no que se relaciona
a deficiência da macro-estrutura sanitária, são espaços com maior potencial de endemicidade.
Face à carência de redes eficientes de macro-drenagem na cidade do Rio de Janeiro, a
espacialização das epidemias não serve de subsídio a esta discussão, tendo em vista que, em
função das inundações e enchentes, ela acontece por quase toda a cidade, especialmente nas
calhas naturais de drenagem.
153
Sobre outros agravos potenciais
Outros agravos apresentam potencial para análise como efetivos parâmetros para formulação
de indicadores ambientais. Sugere-se aqui, por exemplo, o estudo da diarréia, que se associa
fundamentalmente às condições de higiene dentro da habitação e à ausência de acesso
contínuo aos recursos de saneamento doméstico. Sugere-se, também, uma investigação em
torno das hepatites, leishmaniose, esquistossomose, doenças respiratórias e das alergias, como
agravos com vetores co-relacionados à degradação do meio.
154
Conclusão
A reflexão do processo de degradação do Canal do Cunha nos permitiu compreender que
qualquer indicador ou um índice ambiental corresponde a um modelo da realidade, ou seja, a
uma concepção sintética dos processos responsáveis pela mudança social. É, portanto,
importante salientar que os indicadores e, especialmente, os indicadores ambientais precisam
expressar a complexidade dos sistemas e subsistemas que representam, devendo ser
“analiticamente legítimos e construídos dentro de uma metodologia coerente de mensuração”
(Bellen, 2005). Uma metodologia que retrate, com a maior precisão possível, o domínio
completo dos processos envolvidos na produção da situação examinada e que permita, em
consequência, a simulação do real.
Com essa compreensão, estabelecemos, a partir do presente estudo, um conjunto articulado de
etapas e procedimentos que sustentasse a proposição de um índice de degradação ambiental
que seja coerente com a apropriação analítica de fenômenos naturais, em seus nexos com os
fenômenos sociais. Tais etapas equacionam e fundamentam a reflexão destes nexos e a
possibilidade prática da sua representação simbólica. São elas:
(1). Análise de índices e indicadores existentes, baseados na mensuração de fenômenos de
natureza similar a natureza dos fenômenos naturais que se pretende representar, através da
observação de seu sistema empírico de sustentação e da sua real representatividade;
(2). Estudo conceitual para elaboração do indicador ou índice, envolvendo a escolha de
orientações teóricas e de definições dos fenômenos a serem reunidos e sistematizados por este
instrumento (o índice);
(3). Fundamentação do índice através da sua reflexão filosófica e conceitualmente orientada e
do reconhecimento de seus princípios e capacidade de mensuração do real;
(4). Desvendamento das categorias analíticas escolhidas e da seleção dos parâmetros
empíricos a serem utilizados;
(5). Definição da orientação prática do trabalho, fundamentada em teorias estatísticas,
econômicas e sociais; uma definição diretamente relacionada à formulação numérica do
índice;
155
(6). Apreensão do potencial de aplicação do índice, baseado na sua fundamentação teórica e
na análise dos resultados empíricos do estudo de caso;
(7). Realização de ensaios e simulações, baseados no estudo de caso, para determinação de
pesos, correspondências e variações estatísticas;
(8). Cálculo propriamente dito do índice e/ou indicador;
(9). Escolha metodológica do sistema de validação do índice;
(10). Exercício de validação do índice;
Ao longo da execução das etapas propostas neste estudo, e considerando as características e
singularidades da Sub-bacia do Canal do Cunha, identificamos algumas questões relevantes
que elencamos a seguir.
Ao contrário de outras áreas do Rio de Janeiro, a Sub-bacia do Canal do Cunha já emerge,
historicamente, como uma região submetida a um processo contínuo de degradação
ambiental. O modelo que orientou a apropriação sócio-econômica da micro-bacia já destinou-
a à degradação, como exemplifica o surgimento e a consolidação do hoje denominado
Complexo da Maré. Portanto, a história da formação e da evolução dos lugares é um forte
condicionante da sua micro-sustentabilidade, devendo ser rigorosamente considerada na
elaboração de indicadores ou índices de degradação ambiental, incluindo a trajetória histórica
dos investimentos públicos (diretos e indiretos) realizados nas áreas analisadas. Desta
maneira, o conjunto articulado dos processos sociais, etiológicos, culturais e as heranças
materiais de um lugar desafiam e sustentam a proposição de índices que visem à mensuração
da degradação ambiental urbana.
Na mesma direção, salientamos que a reconstituição do ambiente natural – fundamentalmente
da cobertura vegetal e ribeirinha –, tão ameaçada pelos processos produtivos localizados nas
bacias hidrográficas, constitui-se numa questão a ser imposta ao planejamento urbano, tendo
em vista a afirmação de uma ‘matriz social’ realmente aceitável e digna do ponto de vista da
reprodução humana.
Sendo assim, somente o gerenciamento ambiental integrado e mecanismos eficientes e
preventivos de controle das atividades poluidoras, além de investimentos abrangentes em
156
saneamento ambiental, poderão permitir a reversão da degradação ambiental em curso nas
grandes cidades brasileiras.
A qualidade da água de um manancial expressa, sem dúvida, o ‘somatório dos processos de
degradação sofridos historicamente pela bacia hidrográfica a que pertence. Neste sentido,
qualquer índice de degradação ambiental precisará considerar, como base da sua elaboração,
parâmetros que relacionem a qualidade da água aos processos responsáveis por suas
características intrínsicas.
Neste estudo, os parâmetros de qualidade da água que mostraram maior relevância para a
proposição de um índice de degradação ambiental foram: o oxigênio dissolvido, com maior
peso; a demanda bioquímica de oxigênio; a demanda química de oxigênio; o nitrogênio
amoniacal e a relação nitrogênio amoniacal + nitrito + nitrato, que indica quanta amônia o rio
recebeu e o quanto conseguiu oxidar – quanto a região foi impactada por processos de
degradação e o potencial de depuração do rio –, incluindo condicionantes físico-geográficos
(velocidade, temperatura, volume d’água e matéria orgânica presente...). O conjunto destes
parâmetros revela a degradação ambiental e, logo, os riscos à saúde associados ao meio
ambiente.
Os coliformes termotolerantes também podem ser usados, mas através de uma relação DBO X
coliformes e DQO X coliformes. Estes medem, por sua vez, o risco potencial associado à
contaminação humana (relação ecossistêmica entre natureza e homem).
Ainda pode ser considerada como um macro indicador de alerta. Um rio urbano não pode ser
classificado abaixo da classe III das águas doces – CONAMA 357, de 17 de março de 2005,
para que sua bacia hidrográfica não seja excessivamente degradada e também reduzidos os
riscos ambientais e humanos. Se a classe do rio for inferior III, a bacia hidrográfica precisará
ser alvo imediato de políticas públicas dirigidas às seguintes áreas: (1). intervenções diretas e
de curto-médio prazo – fundamentalmente, intervenções urbanísticas e voltadas ao aumento
do rigor da legislação urbana (zoneamento urbano e meio ambiente); (2). intervenções
indiretas e de médio-longo prazo – fundamentalmente, políticas educacionais, com foco na
educação ambiental e na valorização da cidadania; programas de geração de renda e de
157
qualificação profissional; programas urbanos de longo prazo, voltados à qualificação e à
recuperação das áreas.
Alguns agravos indicam, com particular ênfase, as zonas críticas da degradação ambiental,
especialmente quando observados de forma adequada para tal fim e agregados em unidades
espaciais que permitam diluir os impactos de fenômenos pontuais. Nesta direção, observamos
que regiões mais precárias apresentam mais propensão a incidências mais altas de alguns
agravos vinculados à urbanização do que as regiões mais abastadas. Evidentemente, tal fato
encontra-se associado, de forma mais complexa, a um conjunto de atributos associados à
vulnerabilidade dos lugares. Estes atributos espelham características fundamentais da
reprodução social, que condensam a desigual distribuição de oportunidades econômicas e de
acesso a meios de consumo coletivo e estratégias elementares da vida urbana, mas, também,
hábitos, padrões culturais e costumes, refletidos, sistematicamente, nas formas de ocupação e
de apropriação do espaço urbano.
Ainda nesta mesma direção, destacamos que a formulação de um método que permita
dimensionar as agressões sofridas por um determinado ecossistema, relacionando-as à sua
capacidade de absorção de ações antrópicas, emerge como um desafio de alta complexidade,
em decorrência do grande número de variáveis e condicionantes responsáveis pela descarga
(quantitativa e qualitativa) de energia a qual o ecossistema encontra-se submetido.
Desta maneira, os indicadores ambientais implicam na crescente consolidação de um campo
de estudos que enfrente a complexidade mediante a incorporação consistente de uma
multiplicidade de variáveis representativas de processos transescalares. Entre estes
indicadores, encontramos, por um lado, os que remetem ao conceito de sustentabilidade e, por
outro, os que primam por mensurar o desgaste sofrido por ecossistemas, em função da
atividade humana e da aqui valorizada degradação ambiental. Trata-se, enfim, de um claro
antagonismo entre perspectivas analíticas.
Ao considerarmos a base física da vida social – base natural e ambiente construído -, não
podemos esquecer que estamos frente ao reflexo material de uma sociedade, que envolve a
dialética forma-conteúdo; um reflexo, portanto, que não pode ser compreendido de forma
estática (Lefebvre, 1979). A sociedade sofre contínuas mutações relacionadas tanto a
158
alterações profundas do tecido social, frutos de transformações políticas e culturais, quanto a
mudanças advindas de sua base técnica (Santos, 1997). Por esta razão, a reprodução social
assume caminhos que impactam a materialidade. Por vezes, estes caminhos são ascendentes,
permitindo o aumento do consumo e o usufruto de condições vitais mais favoráveis, e, por
vezes, descendentes, levando à perda de condições econômicas e sócio-culturais, com
consequências negativas para a base material da vida coletiva.
A busca da sustentatibilidade corresponde ao caminho ascendente, enquanto que o caminho
descendente implica no compromisso com a compreensão e a análise do processo de
degradação. Trata-se de direções e forças opostas, que podem surgir com intensidade e
magnitude similares. De fato, fenômenos que, num determinado contexto social, compõem as
condições da sustentabilidade, noutro contexto precisam ser lidos na direção oposta, isto é,
como sinalização de processos de degradação ambiental.
Assim, a mesma lógica que sustenta o debate de um desses conceitos-chaves pode ser
acionada, dialeticamente, na direção oposta e, até mesmo, antagônica. Se o conceito de
sustentabilidade sintetiza valores culturais e carga simbólica, podemos dizer que o conceito de
degradação também apresenta esta mesma capacidade, sobretudo por sua capacidade de
sustentar o reconhecimento e a denúncia de condições de vida inaceitáveis.
Por apresentar essa potencialidade, o conceito de degradação ambiental de áreas urbanas deve
incorporar, além dos atributos tradicionalmente reconhecidos pela análise ambiental (erosão,
desmatamento, lixiviação etc), trabalhados pela geografia física, os condicionantes
relacionados às características morfológicas do ambiente construído e as forças responsáveis
pela configuração deste ambiente, que podem intensificar, retardar ou reverter processos
relacionados à degradação.
Refletindo os indicadores ambientais, cabe dizer, ainda, que, por um lado, existem processos
cujo exame é indispensável ao reconhecimento das perdas sofridas por uma determinada área
(perda sistemática de áreas naturais e de cobertura vegetal, desmatamento das áreas
ribeirinhas, adensamento intenso da ocupação, impermeabilização do solo, estreitamento de
vias etc.) e, por outro, processos que guardam relação com a historicidade dos lugares,
permitindo a formulação de análises projetivas (por exemplo: adensamento da ocupação x
159
investimentos em infra-estrutura urbana ou crescimento do número das atividades poluidoras
x investimentos em reservas ambientais). Estas análises, expressando tendências dos lugares,
podem contribuir para o aumento da eficácia do planejamento urbano e para o direcionamento
de reivindicações diretamente relacionadas à garantia de condições de vida.
Na reflexão e proposição de indicadores ambientais, podem ser consideradas, ainda, variáveis
que não encontram-se diretamente relacionadas ao processo de degradação mas, que
correspondem a atributos que repercutem no processo de degradação ou que dele se originam,
como, por exemplo, características do adoecimento; condições de saúde; nível de instrução e
acesso à informação; preservação de redes sociais; violência; perda de valores culturais,
entre outros fenômenos e processos.
Com essa compreensão da problemática envolvida na formulação de indicadores ambientais,
foram identificadas, a partir deste estudo, quatro categorias de parâmetros teórico-analíticos e
empíricos associados à degradação ambiental, a saber:
(1). Variáveis de primeiro nível: correspondem a parâmetros do ambiente natural, vinculados
à manifestação direta da degradação. Ex: redução de áreas naturais, desmatamento,
assoreamento de rios.
(2). Variáveis de segundo nível: correspondem a parâmetros do ambiente construído e à
morfologia urbana adotada. Ex: vias com reduzida largura, densidade da ocupação,
intensidade da impermeabilização do solo.
(3). Variáveis de terceiro nível: correspondem a parâmetros indiretos das condições de vida
dos segmentos sociais envolvidos. Ex: incidência de enfermidades, nível de renda, acesso à
educação, formas de organização, capacidade de reivindicação.
(4). Variáveis de quarto nível: correspondem à incorporação da historicidade e do
reconhecimento de tendências, exigindo a definição de períodos e a consideração de séries
históricas. Ex: concentração da população x investimentos em meios de consumo coletivo;
implantação de atividades poluidoras x manutenção de reservas fundiárias.
160
Acrescentamos, por fim, que os indicadores que enfatizam a qualidade parecem ser mais
adequados para mensurar a degradação ambiental do que os indicadores apoiados,
exclusivamente, em propósitos quantitativos.
Dessa forma, concluímos que a formulação de um indicador de degradação ambiental, como
no caso da maioria dos indicadores sócio-econômicos, deve, além de superar as barreiras
conceituais, tratar (e condensar) diferentes problemáticas, incorporando variáveis que,
reconhecidas em sua singularidade, sejam apreendidas através de modelos que considerem a
complexa cadeia de causas e conseqüências da condição humana.
161
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Acesso em 2005: http://www.snis.gov.br.
168
Relação de Anexos
Anexo I: Tabela das ferrovias do Rio de Janeiro, por ano de inauguração dos ramais e das
principais estações.
Anexo II-A: Espacialização das Favelas na Cidade do Rio de Janeiro em 1928.
Anexo II-B: Censo Predial de 1933 – Número de Casebres por Circunscrição.
Anexo III: Ações do Programa Favela Bairro na Sub-bacia Hidrográfica do Canal do Cunha.
Anexo IV: Dados dos bairros, para agregação pela sub-bacia hidrográfica.
Anexo V: Acervo Imagético.
Anexo VI: Atividades Poluidoras na Sub-bacia do Canal do Cunha
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