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introduzidos pelas leis brasileiras, em um instrumento econômico de gestão, valorização
e racionalização da água bruta pautado na fixação de preço para o uso privativo das
águas dos rios, lagos, aqüíferos e outros corpos d’água. Assim, a cobrança é entendida
como um preço público e como uma retribuição que o usuário faz à sociedade por
utilizar privativamente um bem que é de uso comum (GRANZIEIRA, 2001).
Carrera-Fernandez; Garrido (2002) resumem bem o argumento da necessidade
da aplicação da cobrança da água, associando-o com o momento em que ocorre a
escassez de água. Para eles, sempre que houver abundância de água de boa
qualidade, ela poderá ser considerada como bem livre, sem valor econômico.
Entretanto, a cobrança pelo uso da água se justifica sempre que o balanço hídrico de
uma bacia ou acumulação subterrânea se torne crítico, bem como nos casos onde a
poluição da água possa comprometer a sua qualidade, exigindo assim recursos para
financiar ações, projetos e obras hidráulicas.
Assim, pode-se dizer que, por trás das considerações legais no que concerne ao
reconhecimento da água como bem de valor econômico e da participação social na
gestão hídrica está o cerne da ciência econômica em sua vertente clássica
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pautada
na possibilidade de escassez do bem e nos conflitos originados de tal escassez
(SOUZA JÚNIOR, 2004).
No que tange a Lei 9433/97, o artigo 5, item IV, destaca o instrumento
econômico adotado, ou seja, a cobrança pelo uso da água. No artigo 19, itens I e II, a
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Para os clássicos, como Smith e Ricardo, o valor de um bem é dado por sua raridade e tempo de
trabalho incorporado. Todavia, no contexto em que desenvolveram seus estudos, a água, embora de
grande utilidade, era tida como abundante não requerendo trabalho para ter acesso a mesma de modo
que, em tais circunstâncias, os recursos hídricos não possuíam valor de troca. Já os neoclássicos, não
atribuem nenhum papel e importância à água. Essa ruptura introduz uma mudança radical, pois retira da
econômica toda referência à natureza. O meio ambiente é visto como insumo ou como campo neutro
para a realização das atividades econômicas. A discussão passa a se centrar na distribuição entre os
fatores de produção. Todavia, nos anos 1970, os recursos naturais foram re-introduzidos no escopo da
teoria neoclássica, posto que não se podia ignorar os impactos ambientais causados pelas atividades
econômicas assim como a fragilidade da teoria em explicá-los. A solução neoclássica foi resgatar vários
teóricos como: Hotelling (1931), Coase (1961); Pigou (1920), entre outros. Destaca-se, dentre estes,
Arthur Cecil Pigou (1877-1959), que, em 1920, no livro Economics of welfare, identificou os efeitos
externos ou externalidades, como prejuízos suportados por terceiros, alheios ao processo econômico, em
decorrência do uso de determinados recursos naturais, ou seja, falhas no funcionamento do mercado que
deveriam ser incorporados ao cálculo econômico dos agentes de mercado. Estes custos devem ser
valorados e incluídos nos custos privados, através do processo de correção dos efeitos externos
negativos, ou internalização das externalidades. Para isso, utilizam-se mecanismos de cobrança,
impostos e taxas, efetuados pelo Estado, como forma de ação corretiva (MUELLER, 1996; GODOY,
2007).