Download PDF
ads:
VALTER LUIZ DE MACEDO
PROVÍNCIA FLUMINENSE:
um território a serviço da nação.
Tese apresentada ao Curso de Doutorado do Instituto
de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da
Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte
dos requisitos necessários à obtenção do grau de
Doutor em Planejamento Urbano e Regional.
Orientadora: Prof. Dra. Fania Fridman
Doutora em Economia pela Universidade
de Paris VIII, França
Rio de Janeiro
2008
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
FICHA CATALOGRÁFICA
M121p Macedo, Valter Luiz de.
Província fluminense : um território a serviço da nação /
Valter Luiz de Macedo. – 2008.
238 f. : il. ; 30 cm.
Orientador: Fania Fridman.
Tese (doutorado) – Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e
Regional, 2008.
Bibliografia: f. 205-226.
1. Planejamento regional – Rio de Janeiro (Estado).
2. Território nacional. 3. Cidades e vilas – História.
4. Rio de Janeiro (Estado) - História. I. Fridman, Fania.
II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto de
Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional. III. Título.
CDD: 981.53
ads:
3
VALTER LUIZ DE MACEDO
PROVÍNCIA FLUMINENSE:
um território a serviço da nação.
Tese apresentada ao Curso de Doutorado do Instituto
de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da
Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte
dos requisitos necessários à obtenção do grau de
Doutor em Planejamento Urbano e Regional.
4
Dedico este êxito à Roberta Azevedo da Silva por toda a base afetiva e apoio
constante e incondicional para a sua realização e por sua companhia, amor e
amizade em todos os momentos da minha vida.
5
Como registrar os meus agradecimentos aqui?
Para não esquecer de ninguém, agradeço a todos que de alguma forma contribuíram
para que este trabalho pudesse ser construído.
Em especial, à minha orientadora Fania Fridman por todos os exemplos e incentivos
constantes em nossa intensa e já duradoura trajetória de pesquisa e amizade.
Também ao professor Maurício de A. Abreu (IGEO/UFRJ) pela sua presteza e
consideração ao aceitar irrestritamente participar da minha banca examinadora,
acrescentando-a em muito com as suas observações e presença.
6
O primeiro cuidado de um individuo e de uma Nação he sua conservação.
Primeiro se existe, para depois curar-se do modo de existir. O primeiro objecto he
vital, o modo de existir he segundário.
João Calda Vianna, Relatório do Presidente da Província do Rio de Janeiro
Quer se situe em 1558 ou no ano da graça de 1958, trata-se, para
quem quer compreender o mundo, de definir uma hierarquia de forças,
de correntes, de movimentos particulares; depois, apreender de novo
uma constelação de conjunto. (...) Cada ‘atualidade’ reúne movimentos
de origem, de ritmo diferentes: o tempo de hoje data, ao mesmo tempo,
de ontem, de anteontem, de outrora.
Fernand Braudel, Escritos sobre a História
7
RESUMO
Nossa pesquisa toma por contexto o processo de organização territorial brasileira a
partir dos interesses internos pós-Independência, quando surge um ideário de
Nação, para investigar as práticas que consolidaram a integração do território da
província fluminense. Partimos da hipótese de que a política territorial imperial visava
o fortalecimento de uma unidade nacional e procuramos observar que tal objetivo
extrapolava a ordem econômica assentada na produção agrícola, apontando para o
papel preponderante desempenhado pelas cidades, que, em redes, serviram de
instrumentos de regulação e de controle sobre suas regiões. Consideramos que o
ideal de Nação desenvolvido serviu como retórica para o controle territorial e que o
projeto nacional implementado foi, em essência, um projeto de natureza urbana
articulado em um contexto regional. Por envolver a Corte e congregar a maior parte
da nobreza e da renda do Império, além da constatação de que o seu número de
núcleos urbanos triplicou no período considerado, admitimos o território fluminense e
sua sociedade nobiliárquica e estratificada como laboratório para nosso trabalho.
Nossa intenção consiste no estudo do processo de integração entre distintas
regiões, entre produção e comércio, potencializado pelo advento das ferrovias, mas
não iniciado através delas. Visamos, no conjunto das “ideologias geográficas” que
nortearam o período imperial brasileiro e seu projeto nacional, identificar a natureza
do espaço produzido no caso fluminense.
Palavras-Chave: Província Fluminense. Território. Nação. Cidade e Região.
Planejamento territorial.
8
ABSTRACT
The context of our research is the process of the Brazilian territorial organization
through investigating the practices which solidified the integration of the lands of the
fluminense province, from the internal interests during the period of post
independence, when an idea of creating a Nation came up. We started from the
hypothesis that the imperial territorial policy aimed at strenghthening a national unity
and tried to observe that such objective overstepped the economical order settled in
the agricultural production, pointed to the preponderant role played by the cities,
which served as means of regulation and control over their regions. We considered
that the ideal of a developed Nation served as a rhetoric for the territorial control and
that the implemented national project was urban in essence, which was articulated in
a regional context. We took the fluminense territory and its noble stratified society as
a laboratory for our work, because the Court was involved and thus it congregated
the most part of the nobility and the gains of the Empire. Besides, the triplication of
urban centers was an evidence during that period. We mean to study the process of
integration between distinct regions, between production and trade, powered but not
started by the coming of the railroads. We aimed at identifying the nature of the
development of the fluminense area in the set of the “geographical ideologies” which
directed the Brazilian imperial period and its national project.
Key-Words: Fluminense Province. Territory. Nation. City and Region. Territorial
Planning.
9
LISTA DE FIGURAS E QUADROS
Figura 1: Surgimento e evolução de cleos urbanos coloniais a partir de um marco religioso.
123
Figura 2: Organograma da Administração Provincial 1834/1840
155
Figura 3: Organograma da Administração Provincial 1841/1846
156
Figura 4: Organograma da Administração Provincial 1846/1858
157
Figura 5:
Organograma da Administração Provincial 1859/1875
158
Figura 6.1:
Organograma da Administração Provincial 1876/1889 (1)
159
Figura 6.2:
Organograma da Administração Provincial 1876/1889 (2)
160
Quadro 1: Inserção do Império em distintas periodizações da História do Brasil
99
Quadro 2: Comarcas, municípios e freguesias na província fluminense (1843)
145
Quadro 3:
O
bras de infra-estrutura de circulação na província fluminense em 1843.
177
Quadro 4: Legiões da Guarda Nacional na província fluminense em 1843.
184
Quadro 5:
Distritos eleitorais da província fluminense e Corte (1856).
185
Quadro 6:
Datas para entrega dos saldos de arrecadação provincial (1882).
191
10
LISTA DE TABELAS E MAPAS
Tabela 1: Percentual brasileiro na produção mundial de café (1820-1889).
51
Tabela 2: Principais produtos brasileiros para exportação - % (1821-1890).
51
Tabela 3: Vilas e cidades fluminenses criadas durante o período colonial.
126
Tabela 4: Principais receitas da província fluminense no ano financeiro 1841/1842
133
Tabela 5: Participações das províncias nas rendas gerais do Império (1859/1864)
133
Tabela 6: Vilas e cidades fluminenses criadas durante o período imperial
136
Tabela 7:
Receitas da província fluminense por repartições (1841/1842 e 1843/1844)
189
Mapa 1: América Latina em 1830
69
Mapa 2: Desmembramentos da Capitania de São Paulo no século XVIII
102
Mapa 3: Divisão político-administrativa e povoamento em 1822
106
Mapa 4: Comarcas, municípios e freguesias na província fluminense (1843)
125
Mapa 5: “Certões” na Capitania do Rio de Janeiro no final do século XVIII
128
Mapa 6: Caminhos freguesias e aldeias na região de Vassouras no início do século XIX
135
Mapa 7: Aldeias, freguesias, vilas e núcleos coloniais na região de Campos (meados XIX)
143
Mapa 8: Comarcas na província fluminense (século XIX)
148
11
SUMÁRIO
Introdução ...........................................................................................................
12
1. A pesquisa e seus caminhos..........................................................................
1.1. O viés geográfico-histórico ........................................................................
1.2. Posturas diante do objeto ..........................................................................
18
20
29
2. Território e cidade no Brasil imperial............................................................
2.1. Notas sobre o período imperial brasileiro ..................................................
2.2. Do conceito de nação ao projeto nacional brasileiro .................................
2.3. A base material da nação ..........................................................................
34
36
62
97
3. Cidade e nação na província fluminense......................................................
3.1. O território legado ......................................................................................
3.2. O movimento da economia fluminense e suas cidades.............................
3.3. Operacionalizando o território....................................................................
117
118
131
149
Considerações Finais .........................................................................................
200
Referências Bibliográficas .................................................................................
Fontes de dados primários....................................................................................
205
219
Anexos
1. Os gabinetes do Segundo Reinado...................................................................
2. Reprodução de “A grande política” ...................................................................
227
228
Apêndices
1. Justiça no Brasil e no Rio de Janeiro................................................................
2. Listagem dos Presidentes da Província Fluminense.........................................
230
233
12
Introdução
Quando da transição do Brasil colonial para o Império, o termo “brasileiro” que,
muitas vezes, era confundido com o termo “brasiliense”, denotava, em alguns
casos, apenas aquele aqui nascido e, em outros, aquele aqui estabelecido, distante
que estava da sua acepção moderna de identidade coletiva. Tal distância era
compreendida pelo caráter secundário que esta questão mantinha quando da
subjugação do Brasil à sua metrópole. No que se refere ao vasto território e a
despeito do esforço português, a ocupação ainda era rarefeita, concentrada na faixa
litorânea, pouco articulada e formada por aglomerados urbanos simplórios. A capital
não fugia à regra.
Estes dois exemplos, capturados do cotidiano social e da base física da
colônia, mostram alguns dos obstáculos a serem superados a partir de 1822 quando
a proclamada independência exigiria um “pensar” e um “fazer” a respeito da
emancipação política do novo país. Processo este que, ancorado nas iniciativas do
liberalismo nascente europeu no que se referia à formação de unidades políticas
constitucionais, prontamente adotou a bandeira da Nação.
No entanto, aqui, o projeto nacional defendido estava assentado na
manutenção de características estruturais do momento histórico anterior como a
forte desigualdade de classes e a escravidão. Marca principal da construção do
Estado imperial brasileiro, o conservadorismo das elites dominantes assegurou uma
configuração política ímpar no contexto da América Latina. A viabilidade da
monarquia constitucional naquele momento foi garantida pelo viés patrimonialista e
pelo receio de revoltas escravas como o fora no Haiti ou de radicalizações
republicanas como se assistiu em toda a vizinhança.
Inaugurada nestes termos, a nação a ser criada teria que encontrar meios para
se fazer “brasileira” e abranger e ser soberana sobre seu território. Para além da
manutenção da saúde econômica, assentada na produção agrícola, seus mentores
deveriam preocupar-se com questões como a conquista de fronteiras, a
manutenção da ordem, a gerência do espaço interno e suas relações, a
arrecadação de impostos, a imposição de um credo, a unificação da língua e a
13
“civilização” dos seus membros, tomada à moda dos preceitos europeus de
sociedade. Neste contexto, uma questão relevante passou a ser a integração
territorial e a configuração a ser adotada para o emergente espaço nacional. Nossos
estudos têm apontado para uma política imperial voltada para o fortalecimento desta
unidade através da instituição de vilas e cidades.
É exatamente diante da envergadura de tal projeto que, a nosso ver, o espaço
urbano foi tomado como elemento-chave pelos seus idealizadores que se serviram
da Nação como retórica para a manutenção do controle social e territorial nas
formas aentão consagradas. Isto é, sem maiores rupturas. Para o trato de tal
questão, consideramos indispensável a pesquisa sobre a gênese da nação
brasileira, sua organização, suas normas, seus agentes e conflitos sociais,
sobretudo o papel da aristocracia que, concentrando a riqueza da Nação, era
agraciada com títulos nobiliárquicos e constituía a força política de apoio ao Império.
Neste caminhar, os núcleos urbanos (sobretudo as cidades) foram tomados como
centro do exercício do poder concentrando funções tanto administrativas quanto de
controle (inclusive social). E se a integração do todo físico da nação era questão de
ordem, foram tomados também como nós na rede de comunicações e de
transportes que haveria de ser montada.
Nos discursos e políticas nacionalistas daquele momento, o sentimento de
pertencimento ao Brasil e a identificação com o “ser” brasileiro emanariam dos
ambientes urbanos, pois deveriam comportar símbolos e sistemas de representação
do novo nível de progresso e civilidade a ser alcançado. Mais ainda: seria o meio
para se atingir a integração do território, assegurando as áreas de fronteira e
ocupando suas imensas áreas a partir das diretrizes estabelecidas na sede da Corte
centralizadora.
Falamos, no plano ideológico, de um projeto civilizatório que pretendia criar
uma história e uma identidade nacional brasileira e, no plano espacial, de uma rede
urbana e seus nós como forma de regulação e controle sobre as regiões.
Consideramos o ideal nacional apresentado como um projeto urbano em essência,
pois foi utilizado intencionalmente como símbolo em um projeto de controle
territorial.
Afirmamos que o processo de unificação do território brasileiro foi pensado
como meta que seria alcançada através da constituição de cidades, visto que é por
meio do conjunto delas que a produção, circulação e o consumo (no plano
14
econômico) e a dominação (a partir da representação simbólica dos valores que
seriam emanados) acontecem efetivamente. Parece-nos que tal processo se
verificou no entorno imediato da capital imperial e, deste modo, originaram-se as
bases para a sua integração observada com descontinuidades nas décadas
posteriores.
A ocupação no Brasil do século XIX se deu, em boa parte, através de uma
política de instituição de cleos coloniais que objetivavam uma conquista do
território baseada no elemento étnico europeu que responderia pelo uso cnico do
espaço e pelo idealizado branqueamento da população. Por lei, todos os municípios
do Império teriam a obrigação de instituir um núcleo colonial e, em cada um deles,
uma vila. Estudos recentes revelam que muitos desses núcleos implantados no
período, e que contavam com funções econômicas e finalidades geopolíticas e
civilizatórias previamente definidas, vieram a constituir-se em cidades que,
articulando-se aos demais núcleos urbanos ou diretamente à Corte, conformariam
uma rede (incipiente, mas integradora por possibilitar as comunicações
pretendidas). Nestes temos, o território fluminense e sua sociedade nobiliárquica e
estratificada configuram um laboratório para tal estudo. Afora a experiência dos
núcleos coloniais, foi significativo o número de vilas que no período imperial foram
elevadas à categoria de cidade. Por um processo ou por outro, a área do atual
Estado do Rio de Janeiro viu o seu número de núcleos urbanos (fossem cidades ou
vilas) mais que triplicar entre o final do período colonial e a década de 1890.
Sabemos que a ocupação do interior da província fluminense se iniciou durante
o século XVIII por conta da atividade mineradora nas Gerais. A abertura de
caminhos e a instalação de pousos durante o percurso caracterizaram uma certa
“empresa povoadora” controlada direta ou indiretamente pelo Estado que visava a
conquista do solo para satisfação do mercado interno e estrangeiro. Com objetivos
similares, importantes vias partindo da cidade do Rio de Janeiro ou chegando até
ela desenhavam o mapa das comunicações estabelecidas até então entre a Capital
e sua hinterlândia, seja em traçado “direto” rumo às minas (através de localidades
como Petrópolis e Três Rios) ou mais “circulares” como os que atingiam São Paulo
ou os que exploravam o baixo curso do rio Paraíba do Sul, na atual região norte do
Estado.
Abertos por particulares através de cláusula nas cartas de sesmarias e, em
muitos casos, aproveitando o traçado derivado de antigas vias de circulação
15
indígena, tais caminhos foram essenciais para o estabelecimento de comunicações
e fluxos de mercadorias entre diversas localidades. Também, por estes caminhos,
surgiram aglomerados, pontos de feiras periódicas, vilas, cidades, sítios, fazendas,
além de outras estradas tributárias. E, sem precedentes, esta dinâmica
condicionada pela prática de abertura de novas vias de circulação foi intensificada
com a atividade cafeeira.
Observamos ainda que um comércio de gêneros alimentícios e de animais
que, originário das Minas Gerais se articulava com o Rio de Janeiro, deu origem a
um setor de subsistência mercantil também responsável pela ocupação do interior
fluminense. Os recursos e os caminhos das tropas tiveram destaque na expansão
da economia cafeeira e de seus valores sociais. Por estas vias de penetração,
fornecia-se à capital parte dos gêneros agrícolas que ela consumia, circulavam
informações e estabeleciam-se engenhos e demais fazendas de café. A articulação
entre produção e comércio, viabilizada pelo crescente número de vias de circulação
propiciou também a instalação de núcleos de povoamento, como mencionado.
Desta forma, podemos entender que desde os primórdios da ocupação e
exploração do território fluminense o eixo principal das atividades realizadas eram
as estradas coloniais, tendência que persistiu durante o culo XIX quando as
grandes fazendas cafeicultoras no Vale do Paraíba e o dinamismo açucareiro na
região de Campos dos Goytacazes desempenharam papel de referência no “mapa
das interações possíveis”, ostentando a riqueza que sustentou o Império. De
contrapartida, algumas áreas da província, como o litoral sul em torno de Angra dos
Reis e Parati, viveram momento de decadência e isolamento por conta de novas
dinâmicas econômicas em outros locais e seus correspondentes eixos espaciais.
Sobre estas questões, ressaltamos a articulação de uma renda fundiária
brasileira e um capital produtivo internacional para a construção de ferrovias que
viriam agilizar a produção e consolidar uma infra-estrutura de transportes. O ponto a
ser considerado aqui é o que marca um processo de integração entre produção e
comércio entre distintas regiões, potencializado pelo advento das ferrovias, mas não
iniciado através delas. Vias de circulação e de comunicação, mesmo que mais
lentas, estavam delineadas como testemunho da lógica social, política e
econômica em vigor no território. No entanto, e o caso fluminense nos mostra, a
“rede” pensada e estabelecida não fugia de sua definição teórica e afirmava o
caráter seletivo do espaço tornado território.
16
O respeitado geógrafo Roberto Lobato Corrêa apontou a lacuna existente
nos estudos sobre a estruturação do território brasileiro no que se refere à questão
das redes estabelecidas nos sucessivos momentos históricos. Foi adiante ao
afirmar que a análise acerca da organização sócio-espacial brasileira seria
enriquecida se compreendida à luz das relações entre rede urbana e oligarquias
rurais. Nossa intenção, assim, consiste em enfatizar o espaço fluminense,
pesquisando a organização territorial pensada para tal província, uma vez que não
se trata apenas do surgimento de núcleos articulados e com funções distintas, mas
de uma intenção no âmbito de um projeto maior.
A despeito da visão de que as práticas de planejamento territorial têm uma
tradição associada ao século XX, parece-nos relevante considerar as discussões
atuais em fóruns de História do Urbanismo e de Planejamento Urbano e Regional
que mostram que programas de ão governamental e intervenções de base
urbana no espaço brasileiro são mais antigos. As implicações deste fato nos levam
a novos entendimentos sobre a ordenação do “chão” fluminense.
Buscamos compreender a base territorial do planejamento político imperial e
observamos tal questão a partir do viés geográfico-histórico. Em outras palavras,
buscamos nas políticas territoriais e nos espaços produzidos as “ideologias
geográficas” que nortearam o império brasileiro quando de seu projeto nacional,
avaliando até que ponto as idéias de cidade e região foram efetivamente
operacionalizadas e relacionadas. Como dito, nossa lupa centra atenção no caso
fluminense.
Para tanto, esta tese está estruturada em três partes. Na primeira delas,
buscamos assinalar nossas posturas metodológicas diante do objeto e indicar os
caminhos tomados pela pesquisa. Nosso objeto se mostra aqui através de suas
principais características e questões sugeridas. A intenção é fundamentar a
necessidade de um olhar para os processos envolvidos através de suas relações
com a “ampla escala”. Também o é indicar a centralidade que o entendimento sobre
os mecanismos de representação e consciência do espaço assumem neste
trabalho.
Este, ao considerar a hipótese de um projeto nacional de unidade territorial a
partir de um urbano simbólico e também materialidade em suas relações com a
região em que se insere, aponta para duas questões operacionais imprescindíveis:
a compreensão desse ideário nacional e a configuração espacial que ele alude.
17
Neste sentido, a segunda parte deste trabalho busca indicar as especificidades da
cena brasileira no período em tela buscando perceber o território como reflexo e
condição em cada momento. Entendemos que este esforço não seria possível sem
uma leitura sobre o arcabouço teórico a respeito da nação e do território e o fizemos
de forma a inserir o nosso objeto na própria discussão e não apenas na sua
seqüência.
A terceira e última parte desta tese resgata as considerações realizadas nas
unidades anteriores sobre a província do Rio de Janeiro a partir dos dados que nos
permitiram alinhar a pesquisa. Não se trata porém de apresentar nosso objeto neste
momento, mas de verificá-lo a partir das suas informações específicas. Aqui,
discursos do poder executivo, planos de infraestrutura física, documentos
administrativos, textos de lei, entre outros documentos, são examinados para se
buscar um entendimento sobre a conformação territorial fluminense em um contexto
em que o Estado monárquico brasileiro buscava ser nacional nos moldes de
sociedades que construíam a sua nação a partir de realidades outras. É a captura
desse descompasso que julgamos poder observar na escala da província.
18
1. A pesquisa e seus caminhos
Analisar o processo histórico de formação do território fluminense durante o
século XIX, quando se realizou no Brasil a efetivação de um projeto nacional
significa observar como determinadas frações desse território passaram a se
configurar como espaços delimitados e diferenciados no contexto político,
econômico e social da província durante o período imperial. Tal temática torna-se
oportuna quando observamos que há um hiato na literatura sobre o Estado do Rio
de Janeiro naquilo que se refere à sua conformação territorial, não nos oferecendo
uma informação precisa sobre sua constituição.
Tentando contribuir para o preenchimento desta lacuna, o campo problemático
de nossa pesquisa pode ser enunciado como a relação entre o projeto de
constituição de Nação no Brasil pós-Independência e o processo de organização
urbana e territorial fluminense. Trabalharemos especificamente com a idéia de que o
projeto nacional pretendido para o Brasil independente pode ser visto como aquele
que, na base territorial, considera o urbano como mecanismo de articulação das
esferas regionais e, na vertente simbólica, pensa este urbano como instrumento
civilizatório. Através deste foco, observamos que se o processo de articulação do
território fluminense se deu através de uma economia agrícola e da consolidação de
uma aristocracia composta por senhores rurais que giravam em torno do poder
central, tal processo só poderia acontecer pela constituição de uma rede de cidades,
visto que é através dela que produção, circulação, consumo e dominação política
efetivamente acontecem.
Assim, partimos da premissa de que existiu uma relação direta entre cidade,
região e a política territorial imperial e, para dar conta de uma análise por este viés,
temos a consciência de que o nosso esforço deverá conjugar uma dimensão
temporal ao estudo de uma dada forma de organização do espaço. Seguindo os
ensinamentos de Santos (1985), quando nos alerta da “geografização” dos espaços
produzidos como resultado de um conjunto de variáveis que interagem entre si e que
mudam no transcurso da história dos lugares, pensamos priorizar os sistemas que
se sucedem em detrimento dos fatos isolados.
19
No contexto da expansão econômica européia no período considerado,
indicamos as seguintes questões em nosso trabalho: 1) A partir da política colonial
portuguesa de gestão do espaço, pensamos nos termos do processo de
organização territorial fluminense que passam a vigorar no período pós-
Independência do Brasil, quando dos ideais nacionalistas; 2) Entendido que, do jogo
político em torno do Estado Imperial, consolidaram-se determinadas forças que
definiram os moldes da construção de valores e de espaços unificados, assinalamos
a emergência de um projeto centralizador/civilizador de base territorial urbana e
regional; 3) Por tal premissa, importante será entender as características de tal
política centralizadora no espaço que envolve a então capital do Brasil e sua
hinterlândia mais imediata, correspondente ao atual Estado do Rio de Janeiro; 4)
Ademais, há de se considerar as formas de ação dos atores envolvidos (Estado,
nobreza cafeeira e do açúcar e demais proprietários de escravos e de terras) para a
manutenção do prestígio e da legitimidade; e 5) Reflexo dos interesses em pauta,
pensamos na importância conferida às vias de comunicação e de circulação para a
unidade a ser dada ao território fluminense, reportando-nos aqui à operacionalidade
de uma rede urbana que permitiria a dinamização de distintas regiões comandadas
pela sede do poder imperial e que, diminuindo a autonomia municipal, possibilitou
arranjos políticos em torno de interesses regionais.
Tais questionamentos revelam os objetivos da tese. Em primeiro lugar,
relembramos que nosso trabalho está atento ao fato de que “o tema rede urbana e
oligarquias rurais parece ser de extrema relevância para se compreender a
organização sócio-espacial brasileira” (CORRÊA, 1998, p. 114), apresentando um
estudo sobre o território fluminense que se insere nos debates atuais sobre as
determinações históricas da urbanização brasileira. Em última análise, visamos
somar esforços no sentido de apresentar um “olhar” sobre o processo de ocupação
territorial na província do Rio de Janeiro que articula as dimensões do local e do
regional em um contexto de afirmação nacional. Nosso trabalho, ao tentar cumprir
seus objetivos e abordar as questões listadas, terá que buscar na
interdisciplinaridade o tratamento de seus marcos teóricos. Se enfatizamos que
será priorizado o olhar da “geografia retrospectiva” nos moldes apresentados por
autores como Azevedo (1956, 1957a), Abreu (1996) e Moraes (2002), também é
verdade que não poderemos nos distanciar de campos disciplinares como o das
Ciências Políticas (no que se relaciona com as discussões sobre “nação”, “Estado”
20
e “poder”), do Urbanismo em sua interface com a História (“urbanização pretérita”,
Império no Brasil) e com a própria Geografia (“território”, “rede geográfica”, “rede
urbana”, “região”).
Ao indicarmos tais campos, fica assinalado que nosso estudo sugere a hipótese
de que podemos pensar em um projeto nacional de unidade territorial a partir de um
urbano simbólico e também materialidade que considera a dimensão política da
região em que se insere. Dialogamos inicialmente com os escritos do historiador
francês Fernand Braudel e sua defesa em nome de uma “ampla escalapara se
compreender a História e, de forma específica, com os textos do geógrafo brasileiro
Antonio Carlos Robert
Moraes quando discute a questão da representação e da
consciência do espaço.
1.1. O viés geográfico-histórico
Na linhagem da revolução metodológica no campo dos estudos históricos a
partir da revista Annales d’histoire Économique et Sociale, publicada na França em
1929 por Lucien Febvre e Marc Bloch, os trabalhos de Braudel o alçaram ao posto
de principal continuador e herdeiro de uma nova maneira de se conceber e escrever
a História. Aberto sem concessões à interdisciplinaridade em uma proposta em que
a Geografia e a Economia se revestiam de um interesse especial, Braudel ampliou a
dimensão do historiador ao observar o caminhar das sociedades humanas através
de seus variados ritmos, superando o método tradicional de olhar para o passado
através da escala humana, da ação dos “grandes homens”. Sem se desfazer do
interesse por esses relatos, ele concebe níveis distintos para os tempos da História,
centrando atenção nos processos mais extensos do que o da vida dos indivíduos.
Em última análise, ele buscava a relação entre os fatos e as estruturas que modelam
as sociedades, sejam elas materiais ou relativas às mentalidades. Com esta nova
postura metodológica, a História mudou de objeto uma vez que mudou de
temporalidade. Nas palavras do próprio autor:
A recente ruptura com as formas tradicionais da história do século XIX
não foi uma ruptura total com o tempo curto. Sabe-se que ela
21
redundou em benefício da história econômica e social, em detrimento
da história política. Daí, uma reviravolta e uma inegável renovação;
daí, inevitavelmente, modificações de método, deslocamentos de
centros de interesses com a aparição de uma história quantitativa que,
certamente, não disse sua última palavra (BRAUDEL, 1992, p. 47).
Neste processo de mudanças, a influência desempenhada por outras ciências
no grupo dos Annales muito se deveu ao monumental texto, organizado em 1903, do
geógrafo Vidal de la Blache sobre a história francesa. Neste trabalho, que no
contexto daquele país visava fundar um patriotismo legitimador da República, o autor
partia do território para construir a idéia de um grupo social que, limitado e
condicionado por circunstâncias objetivas do meio geográfico, havia constituído uma
pátria e um Estado. Não que Vidal de la Blache visse no meio impedimentos para os
impulsos sociais, mas lembrava dele como uma resistência a ser percebida e
impossível de ser dissociada da História. Assim, o tempo dos homens encontrava o
“atrito” do espaço, mas não o espaço através do determinismo físico defendido pela
Geografia que se fazia na Alemanha e que se afirmava como referência em tempos
de institucionalização desta ciência.
1
Ao romper com esta corrente, acabou tomado
como influência no processo através do qual os historiadores descobriam no espaço
o elemento responsável por uma maior densidade do tempo histórico.
Em particular, para Braudel, a Geografia passou a configurar um instrumental
de trabalho que o possibilitaria encontrar as realidades mais lentas e importantes no
trato explicativo sobre as características observadas nos seus objetos de estudo.
Importante frisar que este instrumental passava agora a ser manuseado de forma
completamente distinta da tradição, uma vez que o mais se oferecia apenas para
descrição introdutória do meio físico a ser considerado. Nas obras assim
organizadas, estas introduções geográficas à História viam o espaço como palco
para os acontecimentos das sociedades. Através de Braudel, o espaço passou a ser
considerado também no âmbito da análise histórica como elemento condicionante e
reflexo da ação humana.
Este caminho possibilitou a mais importante mudança metodológica sentida na
História durante o século XX e aproximou de vez os textos dos Annales dos
1
Seguindo Moraes (1991), é paradigmático o fato de, no contexto de afirmação dos Estados
Nacionais europeus, ter sido exatamente a Alemanha (com sua tardia unificação política) o principal
locus de desenvolvimento da reflexão geográfica. É verdadeiro dizer que tal ciência encontrou
expressivo desenvolvimento e reconhecimento exatamente nos países que dificuldades encontraram
neste processo.
22
geógrafos de ponta, notadamente franceses e alemães. Destes últimos, por
exemplo, Braudel tomou a habitual tríplice divisão da Geografia em “espaço”,
“economia” e “sociedade” como base analítica para o seu principal trabalho (“O
Mediterrâneo e o mundo mediterrâneo na época de Philippe II”) e suas postulações
quanto à episteme da História.
Para ele, esta tríplice divisão se confirma quando enfatiza que a História para
ser vista em “ampla escala” deve ser decomposta em três planos escalonados que
se referem aos distintos tempos em que transcorrem os acontecimentos estudados:
um “tempo geográfico”, um “tempo social” e um “tempo individual”. O primeiro se
refere à “história quase imóvel, a do homem em suas relações com o meio que o
cerca; uma história lenta no seu transcorrer e a transformar-se, feita com freqüência
de retornos insistentes, de ciclos incessantemente recomeçados”, o segundo tempo
à “história lentamente ritmada, (...) dos grupos [sociais] e dos agrupamentos” e o
terceiro tempo que se refere à história tradicional, da dimensão do indivíduo, a
história ocorrencial, dos eventos, “uma história com oscilações breves, rápidas,
nervosas” (BRAUDEL, 1992, p. 13-14).
Ao discorrer sobre este último, ele o considerou como “agitação de superfície” e
alertou:
Desconfiemos dessa história ainda ardente, tal como os
contemporâneos a sentiram, descreveram, viveram, no ritmo de sua
vida, breve como a nossa. Ela tem a dimensão de suas cóleras, de
seus sonhos e de suas ilusões. (...) Os acontecimentos retumbantes
não são amiúde mais que instantes, que manifestações dos largos
destinos e só se explicam por eles (BRAUDEL, 1992, p. 14-15).
Ao falar ainda sobre a apropriação da História pelas demais ciências sociais,
enfatizou que a tendência era a de desconhecer um aspecto da realidade importante
para a primeira: a duração social, os “tempos múltiplos e contraditórios da vida dos
homens, que não são apenas a substância do passado, mas também o estofo da
vida social atual” (BRAUDEL, 1992, p. 43). E, neste sentido, para ele, que deu
ênfase ao fato de que “nada é mais importante, no centro da realidade social do que
a oposição viva, íntima, repetida indefinidamente entre o instante e o tempo lento a
escoar-se”, a conclusão a ser concebida ressaltava que os estudos importantes
realizados por historiadores vinham contribuindo para a afirmação da multiplicidade
23
do tempo e da centralidade do “tempo longo” para as análises mais profícuas. Neste
sentido, é emblemática a seguinte citação:
Todo trabalho histórico decompõe o tempo decorrido, escolhe entre
suas realidades cronológicas, segundo preferências e opções
exclusivas mais ou menos conscientes. A história tradicional, atenta
ao tempo breve, ao indivíduo, ao evento, habituou-nos há muito tempo
à sua narrativa precipitada, dramática, de fôlego curto (BRAUDEL,
1992, p. 44).
E defendendo a “grande medida como mecanismo de superação a este
entrave, enfatizou que a “nova história econômica e social” articula ao relato ou
“recitativo tradicional” um interesse pela “conjuntura que põe em questão o passado
por largas fatias: dez, vinte ou cinqüenta anos”, chamando a atenção para sua
premissa de que “bem além desse segundo recitativo, situa-se uma história de
respiração mais contida ainda, e desta vez, de amplitude secular: a história de longa,
e mesmo, de longuíssima duração” (BRAUDEL, 1992, p. 44).
Nestes termos, o autor passava a considerar como essencial o entendimento
das estruturas na compreensão voltada para o passado mais distante e que
persistia. Convém, no entanto, salientar que, aqui, ele tratou de diferenciar sua idéia
do próprio estruturalismo afirmando que:
Por estrutura, os observadores do social entendem uma organização,
uma coerência, relações bastante fixas entre realidade e massas
sociais. Para nós, historiadores, uma estrutura é sem dúvida,
articulação, arquitetura, porém mais ainda, uma realidade que o tempo
utiliza mal e veicula mui longamente. Certas estruturas, por viverem
muito tempo, tornam-se elementos estáveis de uma infinidade de
gerações; atravancam a história, incomodam-na, portanto,
comandando-lhe o escoamento. Outras estão mais prontas a se
esfarelar. Mas todas são ao mesmo tempo, sustentáculos e
obstáculos. Obstáculos, assinalam-se como limites (envolventes, no
sentido matemático) dos quais o homem e suas experiências não
podem libertar-se. Pensai na dificuldade de quebrar certos quadros
geográficos, certas realidades biológicas, certos limites da
produtividade, até mesmo, estas ou aquelas coerções espirituais: os
quadros mentais também são prisões de longa duração (BRAUDEL,
1992, p. 49-50).
Ao pensar desta forma, Braudel avançou em relação aos pioneiros da Annales
olhando para a História como um conjunto de rupturas e continuidades. Para ele, ela
traz não apenas o que muda (como pensava Marc Bloch), mas também
24
permanências. Assim, pode compreendê-la como globalidade, marcada pela
dialética permanente entre mudança e não-mudança e associá-la a uma constante
interdisciplinaridade para o seu entendimento. E, neste sentido, dois outros
conceitos que ele associa à sua idéia de tempo longo e que são fundamentais em
nosso trabalho são os de “civilização” e o de “economia-mundo”.
O primeiro deles, cuja definição remonta do século XVIII, é, para o autor, a
própria tradução da “larga medida” por traduzir pares como estrutura-conjuntura e
instante-duração através de sua idéia de oposição à barbárie. O segundo conceito,
proveniente do pensamento alemão, interage com a questão da vida material em
sua relação com a história econômica e diz respeito às distintas regiões do planeta
integradas pela atividade econômica.
Nestes termos, se constrói a globalidade defendida em sua nova História. Para
o caso de crítica ou incompreensão, Braudel esclarece recorrendo ao quadro da
Europa entre os séculos XIV e XVIII e olhando, especificamente, para os seus
numerosos surtos de progresso e repetidos abalos de crises agrícolas estacionais:
A dificuldade, por um paradoxo apenas aparente, é discernir a longa
duração no domínio onde a pesquisa histórica acaba de obter seus
inegáveis sucessos: o domínio econômico. Ciclos, interciclos, crises
estruturais ocultam aqui as regularidades, as permanências de
sistema, alguns disseram de civilizações (...) evoquei após alguns
outros, os traços principais do capitalismo comercial para a Europa
Ocidental, etapa de longa duração. Não obstante todas as
modificações evidentes que os percorrem, esses quatro ou cinco
séculos de vida econômica tiveram uma certa coerência, até a
agitação do século XVIII e da revolução industrial da qual ainda não
saímos. Alguns traços lhes são comuns e permanecem imutáveis,
enquanto que em torno deles, entre outras continuidades, mil rupturas
e agitações renovavam o aspecto do mundo (BRAUDEL, 1992, p. 51-
52).
Em síntese, a História decorrente dos escritos de Braudel é aquela que se
impõe por constantes variações e continuidades e na qual importantes eventos
nestes ciclos nem sempre são percebidos se a medida para a análise for a curta e
tênue escala temporal humana. Para o autor, os três tempos indicados devem ser
considerados pelo pesquisador para que ele fuja do inadmissível “erro historizante”
que consiste em trabalhar com uma dessas escalas em detrimento das demais.
Marcada a influência em nosso trabalho de uma análise histórica que perceba
também a longa duração, o outro ponto a ser destacado se refere à visão da
25
Geografia como materialidade e representação. E, neste contexto, foi importante no
olhar sobre o nosso objeto a relação que Robert Moraes aponta entre a História do
Brasil e a questão do território (MORAES, 1988, 1991 e 2002). Com apoio decisivo
nestes textos, caminhamos na busca por um entendimento das determinações
geográficas de um momento específico do Brasil. Ao tentar a compreensão das
bases territoriais do discurso e das políticas imperiais, enfatizamos a dimensão
espacial como norteadora de pressupostos básicos do nosso processo histórico.
Nesses textos, ao discutir de modo sistemático o tema da representação e da
consciência do espaço, o autor distinguiu três níveis de sua abordagem: o do
“horizonte geográfico”, o do “pensamento geográfico” e o das “ideologias
geográficas”. A primeira destas abordagens faz referência ao conhecimento do
senso geral sobre o meio físico da superfície terrestre e está circunscrita ao conjunto
de informações geográficas do indivíduo comum. No estágio mais elaborado de
construção mental, o “pensamento geográfico” diz respeito àquela abordagem
constituída pelo discurso do saber culto e pelas representações sistemáticas e
normatizadas da consciência do espaço do planeta. Por sua vez, o autor considera
como “ideologias geográficas” o conjunto de representações sobre o espaço com um
caráter político explícito, conferindo ao território uma importância fundamental no
debate sobre as relações entre política e cultura e desvendando os diferentes usos
ideológicos da Geografia em momentos importantes da História.
Não é sem propósito que o autor, atentando para o contexto de afirmação das
nações européias, afirma que:
Na verdade, as teorias modernas dessa disciplina foram, em muito,
veículos de legitimação das nacionalidades e dos respectivos projetos
nacionais. O discurso geográfico foi, sem dúvida, um elemento central
na consolidação do sentimento de pátria. Pode-se mesmo dizer que
esse seria o principal núcleo divulgador da idéia da identidade pelo
espaço (MORAES, 1991, p. 166).
A valorização dos atributos espaciais como base para as formulações
ideológicas de medidas de cunho político caracteriza o uso do território como
suporte e produto destas ações e, de uma forma geral, este processo resulta na
valorização de determinadas partes do território em detrimento das demais. Além do
mais, por esta análise, podemos perceber que o “pensamento geográfico” pode
constituir-se em veículo para as “ideologias geográficas”, mesmo que estas sejam
26
antagônicas entre si. Interessa-nos, em particular, perceber como e quais temas
desta ciência estiveram presentes nos diversos tipos de representações discursivas
que emanam da vida política brasileira em determinados momentos de sua trajetória.
Entender tal questão requer pensar inicialmente que, de acordo com Moraes,
todo grupo ou indivíduo social carrega consigo uma forma particular de
representação do espaço e é decorrente dela que cada um projeta suas
intervenções materiais no meio concreto. Toda representação do espaço, portanto,
acaba por denotar uma ação política, pois se insere na produção material das
sociedades e na disputa por formas hegemônicas de ação entre os mesmos grupos
ou indivíduos sociais.
Se adotarmos uma concepção gramsciana de hegemonia na qual ela é
entendida como uma situação de domínio de uma dada classe ou indivíduo através
do controle tanto das condições intelectuais quanto materiais de produção,
“universalizando” seus interesses, perceberemos a centralidade do conceito de
“ideologias geográficas” para a reflexão sobre a produção material dos territórios,
tomados também como locus dos sistemas de representação dominante. Pensamos
ser esta ótica apontada eficaz para avaliar as questões do nosso trabalho, sobretudo
por ser o período imperial rico na construção de símbolos e sistemas de
representação para afirmação dos propósitos da nação que estava sendo
implantada.
A partir desta noção de “ideologia geográfica”, outros textos fundamentais para
a análise e compreensão da carga simbólica dos espaços se somaram em nosso
estudo, como os escritos de Milton Santos e de Pierre Bourdieu. Seguindo a linha
que discute tal questão a partir das ideologias dominantes, Santos (1999) nos
lembra que a totalidade social é composta por aspectos de realidade e de ideologia
e que esta última é importante ao produzir símbolos que assumem forma de objetos
concretos ou de discursos criadores do real. Lembramos ainda das “representações
objectais” definidas teoricamente por Bourdieu (1989) que se materializam em
coisas ou atos a partir de manipulações simbólicas que alvejam a determinação das
representações mentais que baseiam os interesses e os pressupostos dos agentes
sociais. Corroborando a idéia apresentada, é importante reafirmar que, na base
das construções concretas está uma ideologia hegemônica e que a realidade é
densa de metáforas e se impõe através da produção recorrente de imagens e do
27
imaginário que, naturalizando um pensamento dominante, o faz passar por único
(SANTOS, 2000).
Ao considerar tais questões a partir ainda desse olhar miltoniano, pensamos
que a análise dos fatos deve ser travada de maneira a perceber que o próprio
movimento da sociedade que se estuda transforma a significação de suas variáveis
constitutivas e “por isso mesmo, a cada nova divisão do trabalho, a cada nova
transformação social, há, paralelamente, para os fabricantes de significados, uma
exigência de renovação das ideologias e dos universos simbólicos, ao mesmo
tempo em que, aos outros, tornam-se possíveis o entendimento do processo e a
busca de um sentido” (SANTOS, 1999, p. 103).
No nosso estudo em particular, tais indicações impõem considerar que refletir
sobre a organização espacial em um território (sobretudo no que se refere à
conformação de sua rede urbana) significa considerar o discurso dominante e sua
gama de representações. Perguntamo-nos sobre as lógicas que norteiam a
conformação das morfologias espaciais, em especial aquelas concentradoras,
observando, por exemplo, o padrão de urbanização estabelecido, as relações da
economia imperial com a Europa e o modelo de desenvolvimento das economias
regionais. Ao eleger o modo como se redesenhou a rede de cidades fluminenses,
intentamos superar a prática comum de se considerar as variáveis econômicas
como determinantes nas dinâmicas territoriais e considerar a organização do
sistema urbano não como resultante, mas como parte constitutiva nos processos de
mudança na província e no império. A dinâmica e as alternativas de localização da
atividade econômica, bem como os movimentos da população, constituem-se em
aspectos indutores importantes e conformaram um território em constante
transformação. O movimento da economia associado às políticas de urbanização
acabou por imprimir formas fazendo-se valer de um conjunto de representações
como as de “sociedade moderna” e “nação”.
Por último, vale lembrar que, ao centrar nossa atenção na temática da rede
urbana, temos a consciência de que operamos com escalas ou, de forma mais
enfática, trabalhamos com o “problema da escala” tal como enunciado por Castro
(1995), que ressaltou ser esta uma estratégia de compreensão do real via
representação. Assim, nos é imposta a obrigação de laborar continuamente com a
mudança de escalas tanto cartográficas quanto as conceituais (ora a da rede
urbana, do espaço urbano e ora a da província). E com este rol de preceitos, é
28
sempre oportuno resgatar Roberto Lobato Corrêa e o seu alerta de que o
importante, para o pesquisador, é não perder de vista as relações entre os modos
como o urbano pode ser geograficamente analisado, não esquecendo ainda de que
“a operação escalar não introduz uma visão deformada, geradora de dicotomia,
mas, ao contrário, ressalta as ricas possibilidades de se analisar o mundo real, o
urbano no caso, em dois níveis conceituais complementares” (CORRÊA, 2003, p.
136). O objetivo é o de chamar a atenção para os processos sociais que ocorrendo
no âmbito da rede urbana, conformam o espaço urbano ou vice-versa, entendendo
que tais conexões entre escalas impõem uma análise que as utilize como método
para dar unidade ao estudo do espaço tomado como objeto de pesquisa.
Podemos ainda resgatar a primeira citação desta unidade para reafirmar os
cuidados tomados para um trabalho consciente das variáveis que interagem entre si
e que podem mudar no transcurso da história dos lugares. Para cada aspecto desta
atenção, um grupo de indicações teóricas foi buscado para a nossa tentativa de
integração das diferentes escalas (inclusive de temporalidade) de análise. Afinal:
(...) não se pode fazer uma interpretação válida dos sistemas locais
na escala local. Eventos à escala mundial, sejam os de hoje ou os de
ontem, contribuem mais para o entendimento dos subespaços que os
fenômenos locais. Estes últimos não são mais que o resultado, direto
ou indireto, de forças cuja gestação ocorre à distância. Isto não
impede que estes subespaços sejam dotados de alguma autonomia
em razão do peso da inércia gerada pelas forças produzidas ou
amalgamadas localmente (SANTOS, 1985, p. 22).
Os autores citados até o momento se somam nesta citação e nos mostram que
não existe uma escala ideal para a análise da realidade, uma vez que esta é
complexa e demanda soluções práticas para o entendimento do objeto. No mais,
sabemos que a cada enfoque sua variação ocorrerá pela importância e abranncia
das ações de cada grupo de atores sociais envolvidos. Por esta imposição envolver
juízo de valores, algumas posturas do texto merecem indicação. Assim, ressaltados
até aqui os pressupostos que orientam o nosso trabalho de tese, justificando a
opção pelo método geográfico-histórico e destacando a importância do discurso e
das escalas para o processo explicativo a respeito da formação territorial
fluminense, cabe indicar a seguir as posturas diante do objeto de pesquisa,
fortalecendo o caminho a ser trilhado.
29
1.2. Posturas diante do objeto
havíamos dito que a área do atual Estado do Rio de Janeiro viu o seu
número de núcleos urbanos mais que triplicar entre o final do período colonial e a
década de 1890. Para sermos mais precisos, nela existiam 15 aglomerados urbanos
(entre cidades e vilas) antes de 1822 e, no pós-1889, havia um total de 48 sedes
de municípios (CIDE, 1998). Se de caráter espontâneo, conveniente ou racional
2
, o
fato é que esse acréscimo carece de um entendimento no contexto do período
imperial brasileiro. E, no olhar para o nosso objeto e nossas questões, pensamos
nas janelas reflexivas propostas por importantes autores que têm se debruçado
sobre os “movimentos do pensamento” a serem considerados no trato prático e
metodológico da pesquisa nas ciências sociais. Em particular, nos apoiamos em
Bourdieu et al (2004) e em Lefèbvre (1995).
Por um lado, temos nos primeiros autores a radicalidade da crítica no sentido
de que eles defendem a reflexão sobre a efetiva relevância social e histórica do
trabalho do pesquisador, enfatizando que este é um ser com maneira específica de
pensar em relação aos demais membros do seu tempo e espaço. Desta forma,
assinalam a preocupação com uma análise constante do trabalho como medida
fundamental para se fugir da mecanização em que podem se transformar os
preceitos do todo e para que não se ceda ao risco das prenoções e da
naturalização dos termos. O método do racionalismo aplicado, defendido pelos
autores, confirma e constrói um novo objeto real a cada momento da pesquisa, uma
vez que prega que os atos epistemológicos o são lineares e que, portanto, as
operações de pesquisa se consubstanciam na dialética teoria/verificação. E nela, as
teorias podem ser reconstruídas o tempo todo pelas especificidades do objeto.
Por outro lado, Lefèbvre, mesmo centrado no pensamento dialético, não
descarta de forma alguma o pensamento lógico, reconhecendo que sua construção
foi momento importante na história do conhecimento humano e continua
fundamental quando é necessário classificar, definir, organizar e distinguir
metodicamente os conteúdos do conhecimento. No entanto, e confirmando o que
havíamos construído anteriormente, o autor enfatiza que a lógica formal parte da
2
Entre os estudiosos, no que se refere especificamente à formação urbana mineira, existe uma
discussão sobre o caráter deste processo, existindo a defesa por um urbanismo espontâneo (Robert
Smith e Sylvio de Vasconcellos), conveniente (Rodrigo Bastos e Cláudia Damasceno Fonseca) ou
racional (Nestor Goulart Reis) (LIMA, 2006).
30
não contradição (do que não muda, da estabilidade), sendo mais apropriada para a
pesquisa científica a lógica dialética por partir do princípio da contradição e
totalidade, segundo a qual a realidade é essencialmente processo, mudança, devir.
Partindo do pressuposto de que estamos sempre diante de verdades parciais,
Lefèbvre define um conjunto de categorias pelas quais o pensamento se move e
que consubstanciam tensões analíticas entre pares de termos polares, opostos e
indissoluvelmente relacionados. o eles: entendimento-razão, verdade-erro,
absoluto-relativo e mediato-imediato. A título de exemplo, no caso da primeira
tensão, o autor discorre sobre qual pensamento estará transitando da
decomposição de seu objeto em elementos para a restauração da unidade desse
mesmo objeto. O entendimento, aplicado aos objetos do conhecimento, buscará
definir seus elementos constitutivos que, por sua vez, isolados, tomam vida própria.
O pensamento em movimento recorre à razão no sentido de reconstituir o todo e a
razão irá proceder a esta reconstituição a partir da compreensão de como cada um
dos detalhes contribui para a constituição do todo. Desta forma, para ele, o
conhecimento se afirma, transitando ainda pelos demais pares analíticos.
As orientações indicadas até aqui não o mais que exercícios de vigilância
epistemológica que devemos incorporar ao nosso processo de pesquisa. Assim,
necessárias se fazem algumas reflexões. Em primeiro lugar, exercitando a
radicalidade da crítica a partir de Bourdieu et al (2004), vemos que, ao olharmos
para o nosso objeto de pesquisa, constatamos que a relevância do nosso trabalho
reside no fato de que, no contexto dos debates afins, ele caminha para a afirmativa
de que o controle do território fluminense no século XIX se deu através de uma
política de instituição de núcleos urbanos dotados de funções regionais
diferenciadas.
Até então, pensávamos que esta assertiva, considerada no projeto como uma
hipótese, era bastante para a realização do trabalho, observando apenas as
determinações para a criação de vilas e cidades. No entanto, quando nos dirigimos
ao objeto, percebemos que a idéia de algo semelhante a uma rede de cidades
pressupõe mais que os pontos físicos, implica as relações entre eles. A partir daí, o
tratamento teórico a respeito dessa rede teria que dar conta efetivamente da
natureza dessas relações e de suas informações e dados. Esta imposição do objeto
nos levaria para o questionamento sobre a posição ocupada pelo empírico em
nosso trabalho.
31
Indagando sobre a natureza da tarefa analítica assumida em nossa pesquisa,
ficou nítida a necessidade de investigação sobre as premissas alegadas para a
criação por parte do governo imperial de vilas e cidades no território em questão.
Tal universo de investigação nos permite perceber que a tarefa analítica assumida
em nosso projeto se baseia em questões que devem ser pensadas tanto em sua
totalidade quanto na conexão dos seus elementos, acionando algumas das “regras
práticas” do método proposto por Lefèbvre (1995). Cabe ressaltar o contexto das
nossas questões para que possamos respondê-las.
Ao olharmos para o nosso objeto, enumeramos os seguintes fenômenos que
especificam o seu campo problemático: instituição de políticas de estruturação do
território para definição de fronteiras, articulação, integração e ordenação segundo
propósito pré-estabelecido (autorização para aberturas de caminhos, criação de
vilas e cidades, solicitação para abertura de portos fluviais, incremento nos fluxos de
pessoas e produtos no território são alguns exemplos). Estes fenômenos, por sua
vez, suscitam determinados agentes: o Imperador, os Presidentes da Província e os
“homens bons”
3
, representantes das Câmaras Municipais e, ao mesmo tempo,
senhores de terras e de escravos que, em sua maioria, eram agraciados com títulos
nobiliárquicos e constituíam a força política e econômica de apoio ao Império.
No tratamento empírico do nosso objeto, ficou evidente a necessidade do trato
teórico e metodológico das seguintes categorias-chave: a natureza do Estado em
vigor no período em questão (imperial, centrado no poder moderador e com
discurso nacionalista e integracionista), sua estrutura e distinções em relação ao
período anterior; a imbricação entre esferas da produção econômica e influências,
inclusive sociais, como norteadoras das relações de poder observadas no período
em estudo (interesses imediatistas nas práticas e discurso pseudo-nacionalista); e
as formas de uso do território fluminense, então sob os princípios de Nação e de
centralização do poder (políticas de ordenação territorial via instituição de núcleos
urbanos).
Em relação à estrutura do Estado em vigor no peodo considerado, a própria
Constituição Imperial denota a forma jurídico-institucional tomada, sendo ajustada a
cada momento via decretos promulgados que ora ampliavam, ora descentralizavam
o poder de decisão conferido ao Moderador, ora delegavam autonomia para as
3
Este termo era adotado desde o período colonial para designar todo aquele que possuía projeção
social, geralmente pertencente à classe proprietária de terras e de escravos negros ou indígenas.
32
localidades, ora as submetiam ao crivo do poder central em movimentos que
funcionam como termômetro dos seguidos levantes revolucionários ocorridos e das
pressões exercidas também pela “boa sociedade”
4
do Império.
No que se refere às poticas de ordenação territorial, consideramos como
indicadores os decretos criando núcleos urbanos (vilas ou cidades), aldeias de
povoamento e núcleos coloniais ou promovendo arraiais e vilas a status superiores
na hierarquia urbana, anunciando licitação para abertura de caminhos e/ou criação
de vilas e benfeitorias territoriais (pontes, aterramentos, portos, etc). Também são
indicadores os Registros de Terras das diversas paróquias e freguesias da província
a respeito de sua dinâmica fundiária.
Estes aspectos específicos podem ser compreendidos, segundo Lefèbvre, a
partir da consciência de que todo objeto é totalidade e “unidade de contraditórios” e,
desta forma, lembramos que as condições econômicas e políticas vigentes no
nosso recorte temporal mantinham as contradições entre grupos concorrentes e o
Estado Imperial, além de estarem também presentes internamente em ambos os
casos. A articulação do território fluminense não ocorreu de maneira homogênea
nem atendendo a todos os interesses em questão. Observar este fato nos permite
fugir do risco da generalização.
No mais, ressaltemos que a lógica clássica cultiva o pensamento linear,
racional, buscando superar incertezas e dúvidas para se chegar à segurança de
“verdades” incontestáveis. A lógica dialética, por sua vez, considera a incerteza e o
contraditório como as bases da natureza do conhecimento e da realidade. Por esta
premissa, percebemos que todo conhecimento julgado objetivo, na verdade, se
inicia na esfera da subjetividade ficando registrado que nossas posturas e
vigilâncias em relação ao objeto de pesquisa se inserem em um contexto em que
não nos interessa o pragmatismo do método, mas o seu entendimento como
instrumento de reflexão.
Por fim, ao avançar nestas questões de caráter teórico e metodológico,
apontamos também para novos papéis do empírico em nosso trabalho e,
novamente seguindo as “regras práticas”, conseguimos aprofundar o nosso objeto
ao agregar a ele um novo ângulo analítico. Ao fazermos uso da expressão “ação
4
“Resgatada das reminiscências de Francisco de Paula Ferreira Rezende (1832-93) por Ilmar Mattos,
a expressão procura designar a reduzida elite econômica, política e cultural do Império, que partilhava
códigos de valores e de comportamento modelados na concepção européia de civilização(NEVES,
2002a, p. 95).
33
organizadora do território”, estamos nos referindo, em outras palavras, a uma
prática planejadora por parte do Estado visto que havia uma intencionalidade e
seletividade no uso do território. No entanto, sabemos ser “planejamento um
conceito, uma construção datada e de uso direcionado. Atentamos, aqui, para o
problema da “naturalização dos termos”, da necessidade de superação das “pré-
noções” e para a importância do par dialético “imediato/mediato”. Achamos que a
pesquisa histórica apresenta grandes impasses metodológicos. Mas, ganhamos a
consciência de que não poderemos olhar para o passado, procurando nele o
presente e os seus termos. A tarefa parece ser a de atingir o século XIX e suas
lógicas, “distinguindo seus movimentos longos e impulsos breves”, fugindo das
naturalizações e buscando as conexões que revelem o específico em nosso objeto.
O primeiro passo será dado a seguir.
34
2. Território e cidade no Brasil imperial
Analisar o período imperial brasileiro através de suas premissas e realizações
não tem sido tarefa fácil para os estudiosos, por conta das múltiplas nuances que
carrega. No entanto, importantes obras têm lançado luz sobre este momento
definidor de muitas das características atuais do Brasil e entre elas podemos citar
como referência para o debate os trabalhos de fôlego de Nelson Werneck Sodré
(1935), José Murilo de Carvalho (1988), Ilmar Mattos (1994), Richard Graham
(1997), Demétrio Magnoli (1997) e Lília Moritz Schwarcz (2000).
Do conjunto destas contribuições, entendemos que a ruptura do Brasil com os
coloniais laços de dominação pressupunha, evidentemente, a construção de um
novo Estado. Mais ainda: o novo arranjo institucional a ser montado estaria
fatalmente assentado em arraigados traços do conservadorismo que marcava o
arranjo social existente até então. O que nos chama a atenção é o fato de que não
são apenas os laços de sociabilidade estabelecidos que se manterão a partir da
Independência, mas também a forte relação (diríamos, a centralidade)
estabelecida entre a dimensão espacial e a conformação desta sociabilidade.
Além do contexto histórico, que se inseria em um movimento externo de
expansão territorial e de ocupação de espaços, o desenvolvimento econômico,
político, social e cultural da colônia também fora pautado na apropriação de “novas”
terras de tal forma que todas as dimensões do poder passavam necessariamente
pela propriedade fundiária. Queremos enfatizar, a manutenção desta premissa
mesmo diante da emancipação em relação a Portugal e diante do fato que, apesar
dela, o Brasil ainda não havia se desvencilhado das frentes de povoamento.
A questão espacial é reforçada, então, com o advento da construção de um
novo Estado e, voltando aos autores enumerados, com a emergência de um projeto
nacional que lhe dará forma e a necessária e imposta identidade brasileira. Em uma
sociedade marcada por uma espacialidade latente que lhe imprimia uma dinâmica
social notadamente desigual e coercitiva, as representações da nação muitas vezes
foram reduzidas à consideração do país como apenas território (MORAES, 1988),
35
justificando a busca pela unidade e por (mais) controle. Pensamos na importância
das cidades exatamente neste momento.
Assim, em nosso trabalho, mister se faz reunir os principais elementos que
definiram o Brasil depois de sua emancipação política no que alude, em especial, ao
contexto e fatos do Império que nos permitem refletir sobre a centralização
administrativa e o uso do território. Tal contexto se refere ao momento vivido na
Europa ao qual estávamos estreitamente relacionados. Se lembrarmos que, em boa
parte daquele continente, a industrialização e a urbanização foram a marca do
século XIX, estaremos fazendo alusão a uma conjuntura de mudanças que vinha
tomando corpo e que, ocorrendo também no âmbito das relações sociais, deu
origem a um modelo específico de sociedade instituída como “moderna”.
De forma meramente pedagógica, podemos apresentar esta sociedade a partir
das seguintes características gerais que se contrapõem àquelas “tradicionais”:
capitalismo como modo de produção, especialização de funções, diversidade de
valores individuais (diversidade ética, religiosa e normativa), estratificação social por
critério econômico, questionamento das bases da hierarquia social e alcance
crescente na escala mundial.
5
No escopo dessas características estão processos como o ritmo inédito de
desenvolvimento tecnológico atingido por estas sociedades, o rompimento dos
antigos vínculos entre as atividades mundanas e a religião, a ascensão da
burguesia ao poder, o surgimento de ideologias proletárias, o desenvolvimento das
ciências, a expansão de sua influência e interconexão a quase todo o planeta
6
e o
surgimento de novos marcos institucionais no âmbito dessas sociedades. A respeito
deste último processo, destacamos que:
Algumas formas sociais modernas simplesmente não se encontram
em períodos históricos precedentes, tais como o sistema político do
5
Não se pode esquecer o fato de que sociedade moderna” encontra nas ciências sociais diferentes
acepções. No entanto, os clássicos da Sociologia, através de caminhos distintos, são unânimes
quanto ao seu caráter conflituoso. Para Durkheim, o conflito provém da grande e progressiva divisão
do trabalho, exigindo novos mecanismos de integração social como a normatização, a educação e a
produção da consciência do pertencimento ao todo. Marx a definia por suas relações de produção,
sendo a própria sociedade capitalista e seus mecanismos de exploração das classes sociais que
expõem os limites da igualdade e liberdade. Por último, Weber a concebia pela ótica do conflito de
valores, uma vez que notava nela a ausência de unidade em termos de justiça, ética e estética,
decorrente que era de um longo processo de racionalização das atividades humanas.
6
Santos (1994) afirma que o nível técnico alcançado por aquelas sociedades permitia a consideração
de alguns territórios com espaços internacionalizados, diferente do que ocorria na maior parte do
planeta (já conhecido pela humanidade).
36
Estado-Nação, a dependência por atacado da produção de fontes de
energia inanimadas ou a completa transformação em mercadoria de
produtos e trabalho assalariado. Outras têm apenas uma
continuidade especiosa como ordens sociais pré-existentes. Um
exemplo é a cidade. Os modernos assentamentos urbanos
freqüentemente incorporam os lugares das cidades tradicionais e isto
faz parecer que meramente expandiram-se a partir delas. Na
verdade, o urbanismo moderno é ordenado segundo princípios
completamente diferentes dos que estabeleceram a cidade pré -
moderna em relação ao campo em períodos anteriores (GIDDENS,
1991, p.16).
Aqui estão alguns pressupostos da idéia de “nação” e suas imbricações com o
território. E, mais especificamente, com as cidades (modernas ou que assim
desejem ser). Neste sentido, ler a construção conceitual do primeiro termo nos dará
suporte para as reflexões sobre nosso objeto no que ele nos suscita em particular.
Por isso, esta unidade da tese se estrutura a partir das relações entre tais conceitos
no recorte temporal indicado e na constante relação entre o Brasil e suas
determinações externas.
Se lembrarmos que a Geo-História proposta considera um duplo nculo entre
homem e natureza, assimilando as diferentes velocidades próprias dos processos
históricos, e observando-as em diferentes escalas, perceberemos que determinadas
realidades podem ser simultâneas e não necessariamente contemporâneas. Uma
vez que estávamos fortemente vinculados à Europa, mas em uma posição
subalterna em qualquer aspecto que se considerasse, olhar para o Império do Brasil
significa apreender, no contexto dos países de formação colonial, seus processos de
longa duração e os seus impulsos breves, que denotam suas particularidades.
Sigamos os fatos para tentar destacar o rebatimento das transformações materiais e
intelectuais européias na realidade que efetivamente nos interessa.
2.1. Notas sobre o período imperial brasileiro
A despeito da Inconfidência Mineira, no final do século XVIII, ou da abertura
dos portos “às nações amigas” em 1808, o processo de independência brasileira
começou a tomar faces concretas quando do regresso de D. João VI a Portugal em
agosto de 1821. Desde a criação do Reino Unido no Brasil, seis anos antes, as elites
37
portuguesas haviam se empenhado por medidas que diminuíssem a importância
brasileira frente ao império lusitano cujo evento mais relevante foi a Revolução do
Porto em 1820 e a conseqüente convocação das Cortes Gerais Extraordinárias e
Constituintes da Nação Portuguesa no ano seguinte, forçando a volta do rei a
Lisboa.
Ao sair do Brasil, D. João VI deixou seu filho Pedro no papel de príncipe-
regente pensando em uma continuidade administrativa e política. No entanto, a
realidade não tardaria em mostrar novos caminhos uma vez que a aristocracia
latifundiária brasileira começou a observar na figura de D. Pedro a saída para uma
independência pacífica, pois o seu apoio impediria a atuação dos grupos
republicanos e abolicionistas e, ainda, a participação das camadas populares no
processo separatista. Diante do que ocorria nas demais regiões da América,
apostavam na manutenção da monarquia como garantia da unidade do país contra
possíveis movimentos revolucionários que pleiteassem a divisão territorial.
Contrariando os interesses de Portugal, sobretudo os propósitos
recolonizadores, D. Pedro iniciou uma série de reformas políticas e administrativas
que encaminhariam o Brasil para um confronto com as ordens vindas de D. João VI.
Estão, do início de 1822, entre elas, a nomeação de José Bonifácio (líder da
bancada brasileira nas Cortes Constituintes em Lisboa e ardoroso defensor da
independência e de uma monarquia constitucional, mesclando posições liberais e
conservadoras) para o cargo de Ministro do Reino e Estrangeiros (o mais alto
ocupado até então por um brasileiro) e a criação do Conselho de Procuradores
Gerais das Províncias do Brasil (uma espécie de parlamento que examinaria as
decisões vindas das Cortes, julgando a sua aplicabilidade na colônia). Em seguida,
recebeu amplo apoio da maçonaria do Rio de Janeiro, instituição de grande
influência nos movimentos de independência, através da condecoração com o título
de Protetor e Defensor Perpétuo do Brasil.
Se, por um lado, D. Pedro continuava a tomar medidas de cunho rebelde como
o decreto que qualificava como inimigas as tropas portuguesas desembarcadas no
Brasil sem o seu consentimento e o Manifesto às Nações Amigas, escrito por
Bonifácio, que assegurava o Brasil como “reino irmão de Portugal”, por outro lado, D.
João VI ampliava sua política de controle da colônia, anulando a convocação da
Constituinte proposta por seu filho para substituir o Conselho de Procuradores;
38
ameaçando o envio de tropas militares e exigindo o imediato retorno do príncipe-
regente a Portugal.
Incentivado pelo Ministro do Reino e por sua esposa Leopoldina, proclama a
separação do Brasil em relação à Portugal, sendo coroado D. Pedro I no final
daquele 1822.
7
Diferentemente de toda a América espanhola, o Brasil marcaria a
sua passagem do período colonial para a independência de forma pacífica por conta
de uma série de motivos específicos: o trono brasileiro passaria a ser ocupado por
um nobre da mesma casa reinante da antiga metrópole da qual era herdeiro em
linha direta de sua coroa e, sobretudo, a manutenção de uma ordem estruturada em
privilégios das elites, notadamente a manutenção do trabalho escravo. O Brasil, que
teve sua independência formal reconhecida internacionalmente apenas a partir do
Tratado de Paz e Amizade com Portugal de 1825, se configurou como o único país
independente da América do Sul adepto da escravidão como força de trabalho
característica e a única monarquia instaurada no continente no pós-emancipação.
Na tentativa de garantir e criar uma nova nação, (...) as elites do sul
do país apostavam claramente na monarquia e na conformação de
uma ritualística local. A realeza aparecia, em tal contexto, como o
único sistema capaz de assegurar a unidade do vasto território e
impedir o fantasma do desmembramento vivido pelas ex-colônias
espanholas. É nesse sentido que a monarquia se transforma em um
símbolo fundamental em face da fragilidade da situação
(SCHWARCZ, 2000, p. 18).
No entanto, consolidar a independência do Brasil não foi missão fácil para D.
Pedro I que tinha que enfrentar os movimentos no interior das províncias que
contestavam sua autoridade e os embates na elaboração daquela que seria a
primeira constituição brasileira. Era necessário, portanto, um governo de equilíbrio,
discernimento e de apoio popular, mas os tons assumidos foram os da centralização
e do despotismo, minando sua base de apoio político ao desagradar interesses
provinciais. O primeiro grande embate ocorreu durante a Assembléia Constituinte
quando os grupos que o haviam apoiado iniciam a luta por interesses específicos e
trazem à tona três nítidas tendências políticas: a liberal (que, mesmo formada por
moderados e radicais, defendia uma monarquia constitucionalista que limitasse os
poderes do imperador ao reconhecer o legislativo como representante legítimo da
7
Como tudo era discurso, D. Pedro foi coroado imperador, sugerindo, apesar do direito monárquico,
uma aproximação maior com um desejo popular que o título de rei não comportaria.
39
nação a ser construída), a conservadora (que defendia um executivo forte e
centralizado pelo monarca como mecanismo institucional para manter a ordem social
e a unidade do Império) e a republicana (que, mesmo sem maior expressão, estaria
presente em todos os movimentos de oposição que caracterizaram o período).
Instalada em março de 1823 e presidida por Antônio Carlos Ribeiro de
Andrada, irmão de Bonifácio, a nossa primeira Assembléia Constituinte foi formada
por 80 deputados (dos quais bacharéis, padres, magistrados e senhores de terras e
de escravos formavam o conjunto) que, representando as províncias eram, na
maioria, comprometidos com ideais liberais. Este fato logo gerou um mal estar nos
trabalhos diante do poder absoluto pretendido por D. Pedro I. Mesmo assim, esses
seguiram em meio às discussões quanto à autoridade do imperador na Constituinte
e à cidadania dos portugueses residentes no Brasil (fato que assumiu contornos
críticos e ocasionou a separação dos constituintes entre um partido português e um
partido brasileiro).
8
O anteprojeto da Constituição ficou pronto em novembro do
mesmo ano e, a despeito da maioria liberal e por conta dos interesses do imperador,
garantia alguns dos aspectos mais defendidos por conservadores (manutenção da
ordem escravocrata e atribuição de direitos políticos apenas aos detentores de
fortunas).
A este tempo, Jo Bonifácio, “tornou-se crítico veemente das atitudes
arbitrárias de D. Pedro e de suas ligações com os portugueses, escrevendo nas
páginas do periódico O Tamoio, que fundara, entrando em rota de colisão com o
imperador” (NEVES, 2002b, p. 425). Tais atritos motivaram a ação despótica por
parte do monarca de dissolver a Assembléia e ordenar a prisão e desterro às suas
lideranças, incluindo os irmãos Andrada. Dois pontos do texto elaborado pelos
deputados contrariaram D. Pedro I: o estatuto indissolúvel da Câmara, que seria
controlada pelas Forças Armadas, e o caráter apenas suspensivo atribuído ao veto
do imperador.
A primeira Constituição brasileira, outorgada em 25 de março de 1824, foi fruto
dos trabalhos de uma comissão especial nomeada por D. Pedro I para este fim. O
Conselho de Estado, formado por lideranças da ala conservadora estabelecia, desta
forma, um governo “monárquico, hereditário e constitucional representativo” formado
8
Aqui, “partido” é usado mais para se referir a um grupo em defesa de uma dada idéia do que no
sentido que atribuímos à palavra atualmente. No Brasil, no sentido estrito do termo, foi verificado
apenas em 1835 (criação do Partido Conservador) e em 1840 (quando foi fundado o Partido Liberal).
40
por um poder Executivo, a ser exercido pelo próprio imperador e seus ministros
indicados, um Legislativo e um Judiciário, além de um quarto poder, o Moderador.
Este, por sua vez, garantia ao soberano o status de absolutista ao considerá-lo
inviolável e sagrado, não submetido a nenhuma instância legal e lhe conferindo veto
sobre questões dos demais poderes. Na verdade, o Moderador era exercido pelo
imperador e membros do Conselho de Estado, mecanismo institucional que marcaria
todo o período imperial, configurando-se no principal espaço de força e prestígio
político.
A força conferida ao imperador pela nova Carta delegava o poder de escolha
de senadores entre os três mais votados nas províncias, de dissolução ou
convocação da Assembléia Geral (órgão máximo do Legislativo, formado pela
reunião de suas duas casas: o Senado, vitalício, e a Câmara de Deputados, com
caráter temporário e também passível de suspensão pelo monarca) e o poder de
também dissolver ou convocar os Conselhos Provinciais.
A nova Constituição oficializava o Brasil como uma monarquia católica e que, a
despeito da manutenção da mão-de-obra escrava, dizia-se avançar na questão ao
abolir algumas formas de castigo aos cativos como o açoite e a marca de ferro
quente. Por sua vez, o processo eleitoral determinado na Carta, baseado no voto
censitário e na condição dos candidatos como brasileiros e católicos, estabelecia
dois turnos de maneira que um colégio eleitoral, decidido em votação primária,
escolheria em eleições secundárias senadores, deputados gerais e ocupantes das
cadeiras dos conselhos de províncias. A questão da renda marcava efetivamente a
exclusão da grande maioria da população brasileira tanto da possibilidade do
exercício da representação política quanto do próprio processo eleitoral, pois
determinava que apenas estariam aptos para o voto nas eleições primárias os
homens que comprovassem renda líquida anual superior a 100 mil réis e apenas
poderiam se candidatar às vagas do colégio eleitoral aqueles com renda líquida
anual superior a 200 mil is, aumentando este piso se o candidato visasse vaga na
Câmara (400 mil réis) ou no Senado (800 mil réis).
O Primeiro Reinado não tardaria em enfrentar os primeiros levantes liberais
contra a Carta outorgada e a centralização política engendrada pelo imperador. A
título de exemplo, lembremos que ainda em 1824, estourou em Pernambuco a
Confederação do Equador, movimento que defendia a autonomia da região e a
organização federalista com governo representativo e republicano. Rapidamente
41
envolveu as províncias vizinhas da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará,
ganhando a adesão de separatistas nas capitais e no interior. A ação do governo
central, no entanto, foi efetiva na retomada de Recife e Olinda e na perseguição e
cerco aos líderes do movimento que conseguiram fugir para o interior. Em novembro
do mesmo ano, estava contido e suas lideranças condenadas à morte, incluindo
Frei Caneca, o único morto por fuzilamento por conta da recusa dos subalternos em
enforcá-lo. À força, D. Pedro I foi sufocando os levantes contrários à independência
ou ao seu governo que se esboçavam no território a ser integrado sob a chancela
absolutista. Quanto à Constituição, perduraria, com poucas alterações, durante todo
o período imperial.
Em termos econômicos, o Primeiro Reinado manteve a antiga estrutura colonial
baseada na produção agro-exportadora. Entretanto, ao invés da dependência
portuguesa, o Brasil passou a gravitar na esfera da economia inglesa, os únicos
compradores dos nossos produtos primários e os nossos principais fornecedores de
mercadorias manufaturadas. Tal privilégio foi decorrente da intermediação da
Inglaterra no processo de independência, quando bancou o empréstimo para o
pagamento da indenização junto a Portugal, teve renovadas as vantagens
comerciais alcançadas com os tratados de 1810 junto a D. João VI e impôs o
compromisso do Brasil em relação à convenção internacional para o fim do tráfico de
escravos.
A atividade cafeeira, em plena expansão desde o início do culo, passou a
representar quase 40% das exportações brasileiras no final da cada de 1820.
Inicialmente cultivado no município do Rio de Janeiro, conheceu grande expansão
no vale fluminense do rio Paraíba do Sul. A este tempo, a província congregou as
principais fazendas de ca e as grandes fortunas que alicerçavam a economia
brasileira. É unânime o fato de que a renda dos “barões de café” sustentou o período
imperial até seu final e foi convertida, inclusive, em títulos nobiliárquicos e em
políticas de favorecimentos.
9
O Brasil vivia um momento de dificuldade gerada pela crise nos preços
internacionais dos produtos que completavam as nossas exportações (algodão,
9
No império brasileiro, a nobreza era adquirida (não vinha e nem seguia linhagem) e formalizada
através dos artigos 102 (item 11) e 142 (item 7) da Carta de 1824. Em última análise, o texto da lei
assegurava a vontade pessoal do imperador como único fator determinante quando se tratava de
nobilitar alguém. Segundo Guimarães (2002), apesar de constantes manifestações de desagrado, D.
Pedro I chegou a conferir 119 títulos em seu curto reinado.
42
cacau e açúcar) e agravada com a perda do nosso principal mercado consumidor de
tabaco, a África, por conta das pressões inglesas para o fim do tráfico negreiro. Os
lucros provenientes do canão cobriam os déficits da nossa balança comercial e a
política de D. Pedro I para lidar com a situação consistiu na desvalorização da taxa
cambial e na aquisição de empréstimo no exterior, a maior parte oriunda da
Inglaterra.
A crise econômica também possuía agravantes internos: as constantes revoltas
e sublevações nas províncias em oposição às ações centralizadoras faziam com que
muitos governos locais o repassassem os impostos à capital. Além do mais, a
forte relação entre governo central e grandes proprietários fazia com que o
imperador abonasse a cobrança de parte do imposto territorial de fazendas
comprometendo uma significativa fonte de recursos. Completando este quadro,
lembremos dos gastos elevados do governo com a independência e com a
repressão aos movimentos de rebelião. Em 1828, um outro evento de grandes
proporções também foi determinante para a perda de prestígio do soberano: os
enormes gastos e a derrota do Brasil na Guerra Cisplatina, quando o território da
província anexada em 1821 originou a República do Uruguai.
Na Câmara dos Deputados, uma forte e aberta oposição a D. Pedro I começou
a ser feita por liberais moderados e por federalistas (chamados de democratas). Os
moderados alegavam que a crise agro-exportadora, a violenta repressão à
Confederação do Equador, a perda da Província Cisplatina, os déficits no orçamento
e o perdão de importantes impostos comprovavam uma incapacidade do soberano
em lidar com tais questões, defendendo a manutenção do centralismo político-
administrativo do governo mas com um Legislativo mais forte e atuante. Os
democratas defendiam uma participação política mais ampla e um equilíbrio de
poderes entre o governo central e províncias. Reunindo muitos profissionais liberais
e comerciantes, defendiam inclusive idéias republicanas.
10
A forte oposição ao monarca e a ebulição política que começava a ser
observada no Brasil motivaram a criação de diversos folhetins oposicionistas.
10
De Portugal, também vinham motivos para a desconfiança de muitos brasileiros em relação a D.
Pedro I. Desde a morte de D. João VI, em 1826, quando fora proclamado sucessor natural do trono
português (cargo ao qual renunciou em favor de sua filha Maria da Glória, ainda menor de idade), o
monarca despertava suspeitas no Brasil de que pretendia, em algum momento, unir as duas Coroas.
Quando seu irmão, D. Manoel, incumbido pelo próprio D. Pedro I a casar-se com a sobrinha e a
exercer o poder como príncipe regente até a maioridade de Maria da Glória, fez-se proclamar rei em
1828, estabelecendo um governo absolutista em Portugal, o interesse e o envolvimento de D. Pedro I
com as questões daquele país reforçaram as suspeitas de um possível golpe por parte do imperador.
43
Mesmo com a forte censura do poder central, tais jornais faziam circular por todo
império severas críticas ao governo. Com destaque, listamos O Aurora Fluminense
(editado por Evaristo da Veiga no Rio de Janeiro), Sentinela da Liberdade (escrito
por Cipriano Barata em Pernambuco) e O Observador Constitucional (dirigido por
Líbero Badaró em São Paulo)
11
.
O ano de 1831 foi marcado por uma série de confrontos entre as faões
políticas presentes na cena brasileira e pela renúncia do imperador. Seus partidários
haviam conquistado a adesão dos portugueses residentes no país e este fato
intensificou o surgimento de diversos conflitos abertos nas províncias, a exemplo da
Noite das Garrafadas que opôs brasileiros e portugueses nas ruas da cidade do Rio
de Janeiro durante um ato de desagravo ao imperador. Em abril, devido às pressões
e à falta de apoio potico que experimentava, D. Pedro I deixou o poder. Por força
da Carta que outorgara, a abdicação ocorreu em nome do parente masculino mais
próximo: seu filho Pedro, de cinco anos de idade. Consolidado este ato, partiu para a
Europa em uma embarcação inglesa. No Brasil, uma Regência, tríplice e provisória,
foi instituída para a sua administração.
O período que se seguiu foi marcado como um dos mais conturbados da
história brasileira, sendo caracterizado por grande violência social (uma vez que
estouraram diversas rebeliões nas províncias contra a unidade territorial desejada
pelo poder central) e por uma acirrada disputa por poder entre, pelo menos, três
facções que se desenharam no interior da elite política (liberais radicais, liberais
moderados e restauradores), dando início às organizações partidárias no Brasil. A
primeira dessas disputas ocorreu logo na formação da regência trina instalada no
mesmo dia da abdicação. Prevista pela própria Constituição, esta teve inicialmente
um caráter provisório devido à falta de quorum na Assembléia Geral para decidir
sobre o novo governo que atuaria até a maioridade do herdeiro do trono. A
composição da Regência denotaria os diferentes interesses em disputa.
12
A Câmara, que entendia a forte centralização do governo de D. Pedro I como o
real motivo de sua perda de apoio e isolamento político, determinou uma série de
limitações ao poder da Regência e, entre elas, estava a proibição de dissolver
11
Este foi assassinado em 20 de novembro de 1830, data que marcou o fim na circulação d’O
Observador.
12
A primeira Regência foi formada pelos senadores José Joaquim de Carneiro Campos (Marquês de
Caravelas) e Nicolau de Campos Vergueiro, indicados respectivamente por restauradores e liberais
moderados, e pelo brigadeiro Francisco de Lima e Silva, representante da ala mais conservadora do
Exército.
44
instituições do Legislativo. Na verdade, com tais manobras, o centro do poder no
Brasil passava a ser a própria Câmara, onde a ala liberal radical, mesmo sem
representante entre os regentes, obteve importantes vitórias nas votações.
Não tardou e, em meados do mesmo 1831, a Regência Trina Permanente foi
eleita pela Assembléia Geral de maneira a privilegiar as facções políticas com
expressão nas capitais e em meio às elites agrárias regionais, sendo composta por
nomes que representavam o sul e o norte do Império.
13
Em oposição ao poder
central do Rio de Janeiro, esta representatividade logo se converteria em medidas
práticas favoráveis aos interesses regionais, como a criação da Guarda Nacional, a
aprovação do Código do Processo Criminal e, sobretudo, do Ato Adicional de 1834.
Aprovada pela Câmara, ainda em 1831, a Guarda Nacional desorganizou o
Exército ao estruturar-se de maneira descentralizada. Nela, os oficiais de alta
patente passaram a ser eleitos nas regiões de atuação, através de forte vinculação
com os membros das elites agrárias e agregados. A partir daquele momento,
instituía-se no Brasil uma força armada diretamente vinculada à aristocracia rural de
maneira que, para muitos historiadores, o coronelismo político passava a contar com
um dos seus componentes fundamentais.
Outra importante medida descentralizadora foi o Código do Processo Criminal,
aprovado em 1832. Esta legislação alterava a base jurídica e institucional vigente,
chegando ao nível de estabelecer que os juízes de paz, cujas indicações passavam
a caber de forma direta aos senhores locais, acumulariam amplos poderes nas
regiões sob suas jurisdições. E esse poder se referia, principalmente, à corporação
paramilitar recém-criada.
(...) a Guarda Nacional baseava sua atuação no município, paróquias
e curatos, subordinada diretamente aos juízes de paz. De acordo com
o primeiro regulamento, a milícia era composta por todos os
brasileiros entre 21 e 60 anos que viviam sob o pátrio poder, desde
que auferissem a renda mínima exigida para serem eleitores. (...) Se o
exercício dos cargos eletivos [postos mais baixos do oficialato] era
temporário (de quatro anos), o dos oficiais nomeados durava de
acordo com os interesses da autoridade que os havia indicado
(ENGEL, 2002, p. 318-319).
13
Esta segunda Regência, formada pelos deputados José da Costa Carvalho (Marquês de
Montalvão) e João Bráulio Muniz (ambos da ala moderada) e pelo brigadeiro Francisco de Lima e
Silva (mantido regente pela oficialidade conservadora), tratava de expressar a forte divisão que existia
no Império entre províncias do norte e do sul (herança ainda da partição do território colonial em dois
Estados: Grão-Pará e Maranhão e Brasil) (GRAHAM, 1997).
45
Apesar do expressivo avanço liberal que tais medidas representavam, o marco
fundamental no plano institucional ocorreu em 1834 quando um conjunto de
mudanças na Constituição foi aprovado através de Ato Adicional. No bojo, o
Conselho de Estado (essencial na centralização do poder e que contava com nomes
do período de D. Pedro I) foi extinto, sendo transferidos para as províncias os
poderes policial e militar e o direito de elegerem suas assembléias legislativas.
Assegurava-se, assim, um decisivo marco legal para o poder regional, apesar do
Executivo local continuar sob indicação do governo central. Também, pelo Ato, foi
mantido o caráter vitalício do Senado e determinou-se o fim o regime de Regência
Trina, sendo substituído por uma Regência Una eletiva por quatro anos, em um
arranjo que, para alguns historiadores funcionou como uma experiência republicana
em meio ao regime monárquico.
Na visão conservadora de Oliveira Vianna, em sua crítica às políticas
descentralizadoras
(...) o que as experiências do Código do Processo Criminal e do Ato
Adicional demonstram é que essas instituições liberais, fecundíssimas
em outros climas, servem aqui, não à democracia, à liberdade de
direito, mas apenas aos nossos instintos irredutíveis, de caudilhagem
local, aos interesses centrífugos do provincialismo, à dispersão, à
incoerência, à dissociação, ao isolamento dos grandes patriarcas
territoriais do período colonial. (...) esta é, em suma, a tendência
incoercível das nossas gentes do norte e do sul, todas as vezes
adquirem a liberdade da sua própria direção (VIANNA, 1933, p.192).
Confirmando o conjunto de conquistas liberais, foi realizada a eleição prevista
no Ato para o cargo de regente. Empossado em 1835, o padre Antônio Diogo Feijó
(que havia ocupado o Ministério da Justiça entre junho de 1831 e agosto de 1832,
sendo eleito senador em 1833) se tornou o primeiro regente único do Brasil depois
de receber um total de 2.826 votos, pouco mais do que o seu concorrente
conservador. Defendendo o fortalecimento do poder Executivo, não completou o
mandato. Autoritário na condução do Estado, e com poucos recursos devido à
intensa oposição parlamentar, teve que enfrentar grandes rebeliões provinciais que
marcaram aquele período (como a Cabanagem, no Pará, e o início da Guerra dos
Farrapos, no Rio Grande do Sul). Sem bases próprias de apoio político, renunciou
em 1837. Tal fato marcou também o desgaste dos liberais e abriu espaço para uma
46
vitória conservadora na Câmara dos Deputados, que escolheu Pedro de Araújo Lima
como o novo regente.
Assim, a segunda Regência Una foi marcada por uma forte reação às
conquistas liberais obtidas. Muitas foram abolidas e a Lei de Interpretação do Ato
Adicional, de 1840, que restringiu o poder provincial das Assembléias Legislativas e
da polícia Judiciária em nome do fortalecimento do poder central, motivou uma
inesperada aproximação dos liberais em relação à maioridade do imperador. Neste
intuito, aproveitaram a instabilidade política gerada com as dissidências no Senado e
na Câmara e com as revoltas e rebeliões que ocorriam em todo o Brasil (como a
continuidade da Guerra dos Farrapos, no Rio Grande do Sul, e a eclosão da
Sabinada, na Bahia, e da Balaiada, no Maranhão), contrárias à centralização
conservadora, passaram a reconhecer na restauração da monarquia uma saída para
a sua reaproximação ao poder.
Para contornar a pouca idade do príncipe herdeiro, os liberais lançaram uma
campanha pró-maioridade que, do Senado, ganhou as ruas e obteve eco na opinião
pública, sendo tema recorrente de discussão. Extrapolando os fechados círculos
políticos convencionais, a campanha dos moderados conseguiu seu intento
ajudando na queda dos conservadores. Com tal manobra e atropelando a
Constituição, os liberais conseguiram com que o príncipe sucessor fosse declarado
maior de idade, pondo fim ao período regencial. Este, como já dito, marcado por dois
importantes aspectos: os severos embates entre liberais e conservadores (que
dominaram a cena política e fizeram surgir os primeiros partidos no país) e a eclosão
de diversos motins, levantes, revoltas e rebeliões que avançaram de um estágio
mais inicial de organização, em seus primeiros anos, para um nível mais estruturado
e com a participação ativa de camadas populares livres e de escravos (como foram
os movimentos observados entre 1834 e 1840).
14
14
No início do período regencial, motins militares contra o atraso no pagamento dos soldos ou em
defesa da volta de D. Pedro I (ocorridos no Rio de Janeiro), levantes nacionalistas que queriam a
expulsão dos portugueses ou o seu desarmamento (que estouram no Maranhão, em Pernambuco, na
Bahia e no Rio de Janeiro), além de movimentos civis restauradores (espalhados pelos sertões de
Pernambuco e Alagoas e pelo interior das Minas Gerais) foram caracterizados pelo pouco nível de
organização e pela falta de base popular, sendo fácil e fortemente reprimidos pelas forças legalistas
sob o comando do futuro Duque de Caxias, na época major Luis Alves de Lima e Silva. No entanto, a
partir de 1834, o Brasil passou a ser sacudido por uma série de revoltas que, organizadas e com
significativa adesão popular, ameaçaram romper a ordem social e política instituída desde os tempos
coloniais. Cabanagem, Guerra dos Farrapos, Sabinada e Balaiada são exemplos dessas revoltas
que, contra a ordem vigente, foram sufocadas (mas não sem dificuldade) pelas forças imperiais da
Regência, que seria, ela também, sufocada pela manobra política da maioridade.
47
O Segundo Reinado foi iniciado em 1840 com D. Pedro II sagrado imperador,
posto que ocuparia por 49 anos. Uma característica marcante desse período foi a
reorganização do poder que agregou liberais e conservadores em uma mesma
esfera política. No entanto, esta realidade não ocorreu sem intensas disputas entre
tais facções políticas. Em um primeiro momento, devido ao sucesso do movimento
da maioridade, o Partido Liberal ascendeu ao poder, formando quase que por
completo o seu ministério. Sua influência chegou ao ponto de pressionar D. Pedro II
para a dissolução da Câmara, majoritariamente conservadora. As primeiras eleições
do período, realizadas no mesmo ano e sob a marca da violência e da corrupção,
asseguraram ampla maioria aos liberais. Por sua vez, as pressões dos
conservadores resultaram em mais uma dissolução e, desta vez, a elite “áulica”
(grupo palaciano conservador que gravitava em torno do imperador) justificou o
movimento com denúncias de fraudes no referido processo eleitoral.
A partir da posse do novo ministério conservador, não tardaram medidas
polêmicas e uma das primeiras foi a Reforma do Código Criminal, centralizando as
ações judiciais e policiais em complementação à Lei de Interpretação do Ato
Adicional editada no ano interior. Como exemplo, a nova lei destituiu a maior parte
das funções dos juízes de paz, até então eleitos nos municípios, e as repassou para
juízes que, a partir daquele momento, seriam nomeados pelo governo imperial.
O descontentamento em relação a esta nova medida foi observado entre a elite
agrária de distintos pontos do Brasil sendo acordada a sua desobediência pelos
representantes liberais que iniciaram uma série de movimentos oposicionistas com
alguns, inclusive, evoluindo para a luta armada. Foram os casos da revolução liberal
em São Paulo (que eclodiu na capital em 1842 e contou com apoio do ex-regente
Feijó e da população de vilas próximas como Itu e Itapetininga) e em Minas Gerais
(que eclodira no mesmo ano, sendo sufocada em violento combate na vila de Santa
Luzia por forças legalistas comandadas pelo então Barão de Caxias, que também
derrotara os rebeldes de São Paulo). Apenas em 1844, os liberais voltariam ao
poder através de sucessivos governos até 1848, quando os conservadores, com um
ministério presidido pelo ex-regente Araújo Lima, retornam ao centro das decisões.
No entanto em 1847 um ato marcou o início de um processo de normalização
política e reestruturação do Estado: a criação, por decreto imperial, do cargo de
Presidente do Conselho de Ministros, nomeado por D. Pedro II e com poderes para
a escolha dos demais ministros. Neste novo arranjo institucional o presidente, depois
48
de formar o ministério, obrigava-se a submetê-lo à Câmara dos Deputados para
avaliação e aprovação, cabendo ao imperador o papel de árbitro em caso de
discordâncias entre estas instâncias e o poder de demitir o gabinete ministerial ou
dissolver a Câmara.
Nos textos sobre o período é recorrente a associação de tal momento a uma
experiência parlamentarista no Brasil, ainda que diferente do modelo inglês por
conta da manutenção do Poder Moderador que detinha o voto final. Este sistema
político implantado acabava subjugando as demais instâncias do poder quando, por
exemplo, da composição do Conselho. Se este deveria merecer a confiança da
Câmara, além da do imperador, deste último dependia de forma mais direta. Nos
casos em que os deputados tentaram mudar o gabinete contra as preferências de D.
Pedro II, este não hesitou em usar suas atribuições do Moderador para dissolver a
Câmara, convocando novas eleões. A artimanha política contava com o peso
decisivo do governo nos processos eleitorais da época, garantindo uma composição
da Câmara de forma harmônica com o Conselho de Ministros por ele apoiado.
Assim, durante o longo tempo em que permaneceu no comando do Brasil, D.
Pedro II formou 36 ministérios diferentes que, de forma alternada, contemplavam o
Partido Liberal e o Partido Conservador (ver Anexo 1). Registra-se aqui a principal
característica política do Segundo Reinado: a alternância no governo de liberais e
conservadores ou a convivência de ambos na esfera do poder central. Houve,
inclusive, a criação de um Ministério da Conciliação em 1853, marcando a identidade
de interesses através de sua composição que privilegiava os dois partidos. Autores
diversos dão conta da crônica de época, enfatizando que, nas ruas e no interior era
recorrente o dito popular de que não havia nada mais semelhante a um “saquarema”
do que um “luzia” no poder.
É importante observar que medidas de conciliação entre tais frentes políticas
foram apenas possíveis com a sufocação dos últimos resquícios do liberalismo
radical e democrático que surgiram com o processo de independência do Brasil.
Neste sentido, a Rebelião Praieira, ocorrida na província de Pernambuco a partir de
1848, foi um momento decisivo. Iniciado quando os liberais moderados estavam no
poder central, o movimento foi o principal foco de uma onda de descontentamento
da ala radical do Partido Liberal que não aceitava a manutenção das leis centralistas
que combatiam e que estavam sendo defendidas e postas em prática pelos
moderados em sua aliança com D. Pedro II.
49
Em Pernambuco, diferente do que ocorria em outros pontos do Império, o
governo estava sob o comando de um liberal radical, Antonio Pinto de Chichorro da
Gama
15
, com participação efetiva em grupos de oposição cerrada aos moderados do
partido.
16
Também em Pernambuco, mesmo a despeito de todas as rebeliões
provinciais haverem sido sufocadas por forças legalistas desde meados de 1845, os
ideais revolucionários continuavam a alimentar correntes contrárias ao poder
monopolizador das famílias oligárquicas da região e ao controle local do comércio
exercido pelos portugueses. Tais fatos levaram os radicais a pensar em um
programa avançado para a sociedade brasileira em detrimento das orientações
majoritárias do seu partido.
Com a queda do gabinete liberal no Rio de Janeiro e, como dito, a ascensão
de Araújo Lima como Presidente do Conselho de Ministros, um político conservador
mineiro foi nomeado para comandar Pernambuco e sufocar as manifestações de
descontentamento. A partir deste fato, os liberais radicais deflagraram a rebelião
que, iniciada em Olinda no final de 1848 com a adesão da população urbana pobre,
não tardou a espalhar-se por toda a Zona da Mata da província, mobilizando
pequenos arrendatários, boiadeiros, negros libertos e mascates em diversos
conflitos com forças legalistas em que se contam 23 baixas entre os soldados das
forças imperiais e 43 entre os rebelados.
No início de 1849, os praieiros lançam o “Manifesto do Mundo” em que
defendem o voto livre e universal, a irrestrita liberdade de imprensa, o fim do
Moderador, a efetiva independência dos poderes constituídos, a nacionalização do
comércio e a garantia do trabalho como meio de vida do cidadão. Tais pontos
denotavam o tom revolucionário do programa que, entretanto, não deixava de ser
ambíguo também ao se calar sobre o fim da escravidão.
A luta pelo “Manifesto” seguiu com novas empreitadas e após a tentativa
frustrada de ocupação de Recife, resolveu concentrar as ações no interior da
15
Mineiro de nascimento, Chichorro havia sido, em 1837, indicado para a presidência da província
do Rio de Janeiro. Ao falar do mandato do Visconde do Uruguai na província fluminense durante o
período de 21 de abril de 1836 à 05 de agosto de 1840, Lacombe (1973, p. 12) relata que “Em 1836,
elegera-se Deputado Geral pela mesma província, integrando o Partido Moderado, então em
oposição ao Regente Feijó. Exonerado, por esse motivo da província fluminense a 15 de setembro de
1837, deveria passar o cargo a Antonio Pinto de Chichorro da Gama, nomeado por Carta Imperial
dessa mesma data. Com a queda de Feijó (19 de setembro), porém, teve a demissão tornada sem
efeito pelo novo Regente, Araújo Lima (conservador), que anulou igualmente, por Decreto de 19 de
outubro, a nomeação de Chichorro (...)”
16
As reuniões aconteciam nas proximidades d’O Diário Novo, de tendência liberal, sito à rua da Praia,
em Recife.
50
província. Àquele momento, congregando mais de dois mil combatentes, os praieiros
deflagraram uma “guerra de guerrilhas” por meses em que morreram cerca de
trezentos deles. Em agosto do mesmo ano, ainda tentaram invadir a província
vizinha da Paraíba, mas sem êxito e com dificuldades em receber apoio de outras
localidades, perderam força até a captura do capitão de artilharia e líder das
guerrilhas Pedro Ivo Veloso da Silveira, fato que decretou o fim da rebelião.
O tom radical do movimento e a longa resistência que ofereceu às forças
imperiais fizeram com que a sua supressão fosse tomada como exemplar pelo poder
central e como marco do fim dos radicalismos no Império, facilitando a aliança
política impetrada por D. Pedro II e que seria oficializada com a criação, como
dito, do Ministério da Conciliação. Sobre este contexto, é oportuno lembrar que
A preservação do Império acabaria sendo obra dos regentes e da elite
política (...) sobretudo do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas, com a
progressiva aquiescência das demais, todas concordes em que, de
preferência à desordem e ao caos, era preferível defender a
Constituição de 1824 na sua plenitude, sem prejuízo das desavenças
políticas e ideológicas que separavam conservadores e liberais.
Prevaleceu o compromisso, urdido pelos saquaremas os
conservadores fluminenses –, segundo o qual as divergências
políticas do “mundo do governo”, nas palavras de Ilmar Mattos,
deveriam ser resolvidas no espaço institucional do Parlamento, das
eleições, do jogo político e não por meio das armas. É certo que os
liberais mais autênticos desejavam abrir mais o campo institucional
para as contendas, suprimindo os institutos autocráticos do regime,
sobretudo o Poder moderador, chave do sistema. Mas souberam
conviver com ele até 1889 (VAINFAS, 2002, p.358).
A esta conjuntura política de estabilidade e de consolidação das instituições, o
Império brasileiro, após grandes contratempos, iniciou período de aparente
tranqüilidade, característica mais evidente do Segundo Reinado durante as décadas
de 1850 e 1860, quando também experimentou prosperidade e relativa
diversificação da economia, além de um notório processo de afirmação cultural. No
plano econômico, o café se consolidava como o principal produto de nossa pauta de
exportação “que em 1850 era o quarto item do comércio mundial” (LESSA, 2001, p.
265) e chegou a ter, na segunda metade do século XIX, cerca da metade de sua
produção total fornecida pelo Brasil
17
, conforme tabela a seguir:
17
No ano de 1850, a província fluminense respondia por mais de ¾ do café brasileiro (VITORINO,
2002, p. 158).
51
Tabela 1: Percentual brasileiro na produção mundial de café (1820-1889).
Período 1820/29 1830/39 1840/49 1850/59 1860/69 1870/79 1880/89
Percentual
18,18 29,70 40,00 52,09 49,07 49,09 53,63
Fonte: VITORINO (2002, p. 158).
No entanto, de enfatizar também que, no período em questão, a atividade
agrícola como um todo experimentou um importante processo de diversificação.
Apesar do café sustentar seus índices de crescimento e o cacau, proveniente do
recôncavo da Bahia, manter com oscilações a sua participação de períodos
anteriores, outros produtos dinamizaram a atividade: a borracha, responsável por
uma marcha de exploração na planície do rio Amazonas, chegaria a ocupar a
terceira posição entre nossas exportações no final do Império, e, sobretudo, o
algodão, cultivado em larga escala em boa parte das províncias nordestinas, que
viveria seu auge na década de 1860 quando foi o segundo produto de nossas
exportações, beneficiado que foi pela desorganização da produção norte-americana
durante os anos de sua Guerra de Secessão. A tabela abaixo detalha nossas
principais exportações durante o período imperial.
Tabela 2: Principais produtos brasileiros para exportação - % (1821-1890).
Produtos 1821/30
1831/40
1841/50
1851/60
1861/70
1871/80
1881/90
Café 18,4
43,8
41,4
48,8
45,5
56,6
61,5
Açúcar 30,1
24,0
26,7
21,2
12,3
11,8
9,9
Algodão 20,6
10,8
7,5
6,2
18,3
9,5
4,2
Fumo 2,5
1,9
1,8
2,6
3,0
3,4
2,7
Cacau 0,5
0,6
1,0
1,0
0,9
1,2
1,6
Couros 13,6
7,9
8,5
7,2
6,0
5,6
3,2
Borracha
0,1
0,3
0,4
2,3
3,1
5,5
8,0
Fonte: FARIA (2002a, p. 249).
Paralelo a essa dinamização da agricultura no Brasil, a pecuária, mesmo
voltada para o abastecimento do mercado interno e não sendo direcionada pelos
determinantes do comércio internacional, também se consolidou como uma atividade
econômica importante. Desenvolvida nos sertões
18
do Império, acabou concorrendo
18
Segundo Romeiro e Botelho (2003), a palavra “sertão” era utilizada no período colonial para
designar os lugares não povoados ou de povoamento escasso, com fronteiras incertas. Referia-se
também aos locais desertos, incultos, selvagens. A definição chegou ao período imperial ainda com
esta conotação, mas também já associada à idéia de “interior”, de território distante do litoral.
52
para a efetiva ocupação e posterior povoamento de áreas como o oeste mineiro, o
noroeste paulista e o sul do Mato Grosso.
Além destas, uma outra atividade, a então pouco significativa devido aos
acordos comerciais brasileiros de exclusividade com a Inglaterra, iniciou sua
expansão: a indústria
19
. Embora não seja possível falar em uma industrialização no
país anteriormente à década de 1870 (LUZ, 1978) devido à ausência de políticas
governamentais efetivas de incentivo a esta atividade
20
, esforços isolados fizeram
com que, nos cinco primeiros anos da década de 1850, 40 patentes fossem
expedidas no Brasil em contraste com a única que havia sido registrada na década
anterior. A sua relativa expansão, juntamente com a do setor de serviços,
direcionada pela ação de importantes empreendedores que surgiram no peodo,
ocorreu nas décadas seguintes de tal sorte que, nos anos de 1860, mais empresas
industriais foram fundadas, além de bancos, caixas econômicas, companhias de
seguro, de colonização, de navegação a vapor, de transporte urbano e de gás, e
foram construídas as primeiras estradas de ferro do país.
É importante observar que o impulso em infra-estrutura aconteceu concentrado
nas áreas articuladas ao café: primeiro na província fluminense e depois na paulista.
Ainda na primeira metade do culo XIX, a atividade cafeeira fez com que grandes
fazendas fossem estabelecidas no Vale do Paraíba do Sul, fazendo surgir e expandir
cidades como Valença, Vassouras e Piraí. No oeste de São Paulo, nos latifúndios de
terra roxa na área compreendida entre as atuais cidades de Campinas a Ribeirão
Preto, o café encontrou, na década de 1850, as condições que tornariam esta
região sua principal produtora no Brasil a partir do final dos anos 1870.
Assentada na grande propriedade, na monocultura para exportação e no
trabalho escravo, a atividade cafeeira deslocou a primazia econômica das antigas
regiões agrícolas do Nordeste para o atual Sudeste e chegou a representar, no final
do período imperial, quase 62% da receita das vendas externas brasileiras,
garantindo os superávits da nossa balança comercial ao longo da década de 1860.
19
O termo “indústria” inexistia no século XIX com o significado econômico da atualidade e se
confundia com manufatura. Nos dicionários de época, “indústria” era a “destreza para ganhar a vida”
ou fazer obras mecânicas” e como a “fábrica mecânica e oficina de artefatos, lanifícios, sedas,
chapéus, panos” era denominada de “manufatura”, fica explicada a associação dos termos (FARIA,
2002b, p. 372).
20
Na historiografia brasileira, o termo “agrarismo” é usado para denotar a forte pressão que a elite
agrária exercia junto ao governo contra os planos industrialistas (fosse criação de indústrias ou
aprovação de tarifas protecionistas) e a favor dos produtos agrícolas, enfatizados como verdadeira
riqueza nacional. Desta forma, o período imperial não chegou a formar no Brasil um grupo industrial.
53
Paradoxalmente, o café representava a riqueza e o ponto frágil da economia
brasileira, uma vez que sua expansão continuada ao mesmo tempo que aquecia os
cofres da nação, anulava a segurança de uma diversificação econômica deixada
para trás com a decadência, nas últimas décadas do Império, de lavouras e regiões
tradicionais como as do açúcar e algodão. Tal dinâmica pode ser observada na
Tabela 2.
A riqueza cafeeira fez a província fluminense se destacar no cenário
econômico, político, cultural e territorial do Império. Por ter seu apogeu
conjuntamente ao do período imperial, a elite cafeicultora fluminense foi a que
melhor espelhou o momento através do poder efetivo e simbólico decorrente de suas
suntuosas fazendas e da influência imediata no Conselho do Imperador. De maneira
sintomática, cunhou-se a expressão “o Brasil é o Vale”. O oeste paulista, por sua
vez, marcaria a cena brasileira de forma decisiva quando da República.
O bom momento econômico que se vivia tinha também outras razões na sua
base: a fixação dos impostos de importação na faixa média de 30% através das
tarifas Alves Branco, em vigor desde 1844, conjuntamente com o fim do privilégio
inglês de pagar apenas 15% e a abolição do tráfico legal de escravos em 1850
proporcionaram uma redução nos gastos com importação e a liberação de capital
para investimento em atividades distintas da economia agrícola tradicional. Esta, em
contrapartida, foi severamente impactada com o fim do comércio legal de cativos
negros e com o conseqüente aumento do seu preço no mercado ilegal que se
instaurou internamente ao Império, intra e interprovincial. Foi neste contexto,
inclusive, que os senhores de engenho do Nordeste, com suas atividades em
decadência, se estabeleceram como ofertadores de escravos para as fazendas de
café que se expandiam no Vale do Paraíba do Sul.
O vigor político e econômico do Império estimulou D. Pedro II a pensar em um
projeto de “redescoberta” do Brasil em que seus valores e traços históricos fossem
reunidos para a sua celebração. A questão em pauta era a da construção de uma
identidade brasileira e esta deveria servir à idéia de nação. As ações do monarca,
neste sentido, visavam cooptar homens das letras e artes para um movimento que
afirmasse um nacionalismo calcado na valorização do passado e dos traços culturais
presentes na realidade brasileira daquele momento.
No campo da história, literatura e pintura, vários foram os nomes que se
engajaram no movimento nascido da idéia e do financiamento do Imperador.
54
Podemos pensar no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB)
21
como
exemplo desse projeto nacionalista marcadamente conservador em harmonia com o
apogeu de um Império agrário e escravocrata. A presença e influência do monarca
na instituição eram constantes e decisivas, como também o eram os recursos
financeiros do governo que serviam, entre outros, para a concessão de prêmios aos
trabalhos e para o envio de inúmeros bolsistas à Europa (em especial, para a Torre
do Tombo em Portugal) para pesquisa e cópia da documentação ali depositada
sobre o Brasil. Financiado desta forma, Francisco Adolfo de Varnhagem publicou,
em 1854, a clássica obra “História Geral do Brasil” que, a despeito de inaugurar a
nossa historiografia, idealizava não sem propósitos, uma nacionalidade baseada nos
princípios de uma civilização branca.
O tom civilizatório e intencional como parte do projeto pretendido de nação
encontrou respaldo também na literatura que se fazia no Brasil, notadamente no
romantismo indianista em seu auge entre os anos de 1837 e 1869. Sem dúvida,
obras como “O Guarani” e “Iracema”, do deputado conservador José de Alencar, ao
mesmo tempo em que fundaram o romance no Brasil, o fizeram a serviço da
mistificação de uma sociedade em que os nativos foram retratados como “bons
selvagens” e belos. De contrapartida,
A política indigenista praticada pelo Império foi, em contraste com a
colonial, bastante omissa, seguindo, em linhas gerais, o espírito do
antigo diretório pombalino, que previa a integração dos “índios à
civilização”, concedendo-lhes o foro de “vassalos livres” e estimulando
sua inserção no mercado de trabalho o que resultou, na prática, em
forte exploração da mão-de-obra nativa nas áreas de fronteira. No
entanto, foi no Império que a figura do índio acabaria elevada à
condição de símbolo genuíno da nacionalidade, espécie de matriz de
uma nacionalidade originária (VAINFAS, 2002b, p.367).
Sob influência do romantismo europeu e o seu repúdio aos modelos estéticos
clássicos, a nossa produção literária daquele momento, diferentemente dos
escritores franceses que recorriam à Idade Média como época heróica, buscava na
idealização dos índios os elementos a serem ressaltados para a construção de um
passado que pudesse ser lido como digno. Para casar-se com a história real, os
indígenas são mortos nestes romances, mas esta morte é apresentada como
21
Criado em 1838 na regência de Araújo Lima a partir do modelo do Institut Historique, fundado em
Paris em 1834, o IHGB, que será observado mais adiante, sempre apresentou propósitos
conservadores que se alinharam a uma construção heróica do Brasil.
55
sacrifício necessário à emergência do Brasil civilizado, moderno e imperial. Foi,
nestes termos, que se tentou a formação de uma temática nacional.
A intenção de recontar em tons heróicos o passado brasileiro também se
expressou no universo da pintura e, nestes termos, a Academia Imperial de Belas
Artes, com financiamento do governo central, foi um vigoroso instrumento do projeto
de monumentalização do Brasil posto em prática pelo IHGB e pelo Imperador. Nela,
foram constantes as bolsas de estudo para a Europa concedidas a pintores
brasileiros que, por instruções, deveriam distanciar-se das novas diretrizes da arte
que atingiam aquele continente na época (como o realismo ou o paisagismo),
mantendo seus pincéis a favor de uma obra neoclássica como era do gosto de D.
Pedro II. De volta ao Brasil, nomes como Pedro Américo e Vítor Meireles acabaram
por definir os traços visuais mais marcantes da nação que se consolidava, sendo os
principais responsáveis por sua representação pictórica e fazendo escola na pintura
nacional.
22
Neste período, o negro foi desconsiderado pelas artes brasileiras e o
indígena foi visto de forma romanceada, cabendo apenas ao branco a grandiosidade
de ações (inclusive sobre a natureza) e a civilidade.
O cenário musical da época também refletia este pressuposto. Embora as
modinhas de âmbito doméstico fossem um sucesso no Segundo Reinado, foi o canto
lírico a prioridade dada por D. Pedro II no campo especifico da música. Afeito às
operas, não poupou recursos para tentar transformar o Brasil em um importante
centro erudito e, neste contexto, encampou a idéia e financiou a criação do
Conservatório Nacional de sica, nos anos de 1850, voltado para a educação
musical de iniciantes de pouca renda, e fundou, em 1857, a Imperial Academia de
Música e Ópera Nacional, da qual saíram muitos músicos e compositores com
bolsas de aperfeiçoamento na Europa. Destes, o mais célebre foi Carlos Gomes,
autor da ópera “O Guarani”, baseada no romance de Jo de Alencar, que
apresentou às platéias do velho continente e dos Estados Unidos uma obra clássica
22
A memória visual da história brasileira até aquele momento, marcadamente idealizada e atendendo
a encomendas do próprio governo imperial, se deve às telas destes dois pintores e à influência que
exerceram em uma geração de discípulos. Episódios como “O grito do Ipiranga”, “A batalha do Avaí”
e “Libertação dos escravos” foram recontados a partir dos quadros de Pedro Américo, enquanto que
Vítor Meireles imaginou “A primeira missa no Brasil”, “A batalha naval do Riachuelo”, “A passagem de
Humaitá” e “A batalha dos Guararapes”. Enquanto o primeiro seguiu vida política, sendo eleito
deputado pelo Rio de Janeiro, o segundo dedicou-se à cátedra e, como professor da Academia,
exerceu influência direta sobre muitos dos novos nomes da pintura brasileira. São exemplos de
quadros que mantiveram a grandiosidade e a idealização como traços mais presentes na pintura da
nossa história: O último Tamoio” (de Rodolfo Amoedo), “A prisão de Tiradentes” (de Antônio
Parreiras) e a “Proclamação da República” (de Henrique Bernadelli).
56
composta em português e, bem ao gosto do projeto nacionalista do Imperador, com
temática brasileira (idealizada pelo indianismo romântico e que mostrava um Brasil
civilizado). Nos grandiosos espaços construídos para a música clássica no Brasil,
nos intervalos das árias, a elite imperial também discutia negócios e política.
E os números do Império brasileiro, neste momento de afirmação cultural das
elites, de tranqüilidade política e de prosperidade econômica mostravam fôlego
quando uma série de fatos novos começou a indicar a mudança. O “apogeu do
fulgor imperial”, denominação dada pelo historiador Capistrano de Abreu ao período
que engloba as décadas de 1850 e 1860, caminhava para o seu fim, motivado por
novas configurações no campo da política propriamente dito (o rompimento da
conciliação entre liberais e conservadores e o fortalecimento de um projeto
republicano) e em sua relação estreita com a economia (os efeitos danosos da
Guerra do Paraguai e o fim do escravismo).
Se foi a subordinação do liberalismo radical, conseguido com o fim da
Revolução Praieira, o fato que possibilitou a conciliação política das elites, foi o seu
ressurgimento na cena imperial que marcou o fim da aliança que sustentava D.
Pedro II. Mesmo em tempos de Ministério da Conciliação, as divergências sempre
estiveram postas quando uma corrente ou outra se sentia prejudicada com as
decisões tomadas ou com sua representatividade no Conselho. A Lei dos Círculos,
neste sentido, foi um exemplo desses impasses. Aprovada em 1855 a favor dos
liberais, estabelecia circunscrições que ultrapassavam os limites provinciais quando
da escolha de nomes dos candidatos ao Parlamento, diminuindo as intervenções
dos Presidentes de Província no ministério. Em 1860, setores conservadores
insatisfeitos com o seu texto conseguiram alterá-la e ampliar o número de deputados
eleitos pelo seu partido. A reação liberal foi intensa e, das discussões, uma nova
tentativa para manter a conciliação foi implantada através da Liga Progressista, que
se estabeleceu em 1862 e vigorou até 1868.
Neste período, os grandes gastos despendidos com a Guerra do Paraguai
(1864-1870) e os seus impasses políticos decorrentes de comandos nem sempre
vitoriosos ampliaram as diferenças entre liberais e conservadores no trato de tais
questões; uns discursando a favor de reformas profundas e outros tentando apenas
manter seus espaços no poder. Exemplificando este embate, que se arrastaria até o
final do Império, o texto a seguir mostra a conclusão a que chegou o deputado Tito
Franco, membro liberal do Conselho de Sua Majestade, sobre a atuação do
57
seguidos gabinetes rivais em tempo de guerra. (Ver reprodução de parte do original
no Anexo 2)
Fonte: D’ALMEIDA (1877, p. 156).
As discussões também se acirrariam quanto ao fim do trabalho escravo e à
entrada de mão-de-obra estrangeira no Brasil. Publicamente, os liberais passam a
se comprometer com a causa abolicionista e têm seu gabinete demitido em 1868,
fato que acabou impulsionando a criação do Partido Liberal Radical de onde se
originou o Partido Republicano. Assim, rompia-se a conciliação entre as elites
imperiais e o apoio político com o qual contava o Imperador para a sua solidez no
poder.
As décadas de 1870 e 1880 marcaram a derrocada da monarquia quando a
forte oposição ao seu unitarismo formada por frentes abolicionistas, federalistas e
positivistas converge para uma solução republicana. Neste período, D. Pedro II
perdeu também o apoio da Igreja
23
(quando suspendeu uma decisão dos bispos de
Olinda e do Pará que proibia a participação de maçons em confrarias e irmandades
católicas e, principalmente, quando em 1874 ordenou a prisão e punição destes
bispos que o desobedeceram na proibição) e do Exército (devido aos novos ideais
de organização que os militares adquiriram no contato com seus pares da Argentina
23
A união entre Estado e Igreja no período imperial estava assegurada pela Constituição de 1824,
que descrevia as atribuições do clero (muitas delas inerentes ao Estado como registros de
nascimentos, casamentos, óbitos e imóveis, pelas quais recebiam proventos do governo) e garantia
ao Imperador a interferência nas questões religiosas através do padroado (que permitia ao monarca a
indicação de nomes, a serem confirmados pelo Papa, para os principais cargos eclesiásticos) e do
beneplácito (que, contrariando Roma, determinava que todas as bulas pontifícias apenas teriam
validade no Brasil depois da aprovação do Imperador).
58
e Uruguai, países republicanos, quando da Guerra do Paraguai; devido também à
disseminação da causa abolicionista entre eles, sobretudo com o intenso
recrutamento de negros libertos e cativos para as fileiras da guerra; e devido ainda à
adesão de muitos oficiais à doutrina positivista e à causa republicana). É na
conjuntura política do término da Guerra do Paraguai que:
(...) surge um exército nacional relativamente organizado, com o
prestígio de haver vencido a guerra, e conseqüentemente credor da
gratidão nacional, e vulnerável a pregações modernizadoras,
especialmente aquelas que contemplassem um regime onde a ordem,
a disciplina, e evidentemente seus garantidores, fossem prezados e
cultivados (SANTOS, 1978, p. 37).
A partir de 1870, a causa abolicionista já estava presente no cotidiano de
amplos setores da sociedade brasileira. Entre a população que vivia nas cidades, a
discussão era mais evidente e a escravidão contestada e apontada como o
elemento responsável pelo atraso do Brasil em relação ao nível de civilização de
diversos países. A influência da expansão capitalista inglesa e do modo de ser da
sociedade francesa muito contribuiu para que um número considerável de
jornalistas, escritores, políticos, professores e militares associassem as idéias de
progresso às de trabalho livre, constituindo uma importante frente de resistência ao
sistema de escravidão no qual se assentava nossa economia e sociedade. No
período, a intelectualidade brasileira muito absorveu das idéias do inglês Herbert
Spencer e do francês Auguste Comte, fazendo com que o discurso da modernização
passasse por questões como progresso, civilização, ciência e liberdade assumindo
uma faceta conservadora.
A campanha abolicionista que ganhou as ruas do Império ecoava o discurso
construído desde a década de 1820 quando José Bonifácio dizia ser a “instituição
nefasta” da escravidão “corruptora da moral e dos costumes” e “inibidora do
progresso e da indústria”. A diferença estava no contexto social e econômico dos
dois momentos, uma vez que nos anos 1870 o Brasil experimentava a expansão das
práticas capitalistas, o desenvolvimento dos centros urbanos, o crescimento da mão-
de-obra livre, a oposição de segmentos da sociedade ao trabalho compulsório, a
difusão da idéia de progresso e a pressão internacional pelo fim da escravidão,
sobretudo, quando a partir de 1865, o Brasil passou a ser o único país independente
da América a preservar tal sistema.
59
Neste contexto, associações e publicações em defesa da liberdade dos negros
foram organizadas e nomes se afirmaram no movimento como os de Joaquim
Nabuco e José do Patrocínio. O primeiro destacou-se à frente da Sociedade
Brasileira contra a Escravidão (de 1880) e o segundo, da Confederação Abolicionista
(que, em 1883, congregava inúmeras associações espalhadas pelas províncias). Os
discursos proferidos pelos abolicionistas ganharam a Câmara, a imprensa
24
e a
população mesmo assumindo uma postura cautelosa que unia a bandeira da
liberdade e do progresso à necessidade de manutenção da ordem e da lei,
sobretudo quando se ampliava a rebeldia dos escravos, com fugas muitas vezes
promovidas por militantes abolicionistas.
A resistência dos setores conservadores e dos senhores de escravos,
respaldados pela omissão ou parceria das autoridades governamentais, se deu sob
a forma de calúnias e difamações veiculadas pelos jornais de orientação regressista,
perseguições e ameaças de morte (sobretudo nas regiões interioranas), vigilância
aos jornais abolicionistas, proibição de “ajuntamento em praças e ruas” para coibir
eventos antiescravistas ou através de medidas paliativas como as leis do Ventre
Livre (aprovada em 1871 durante o gabinete conservador do Visconde de Rio
Branco, estabelecia liberdade apenas para os “ingênuos”, como os filhos de cativos
com menos de 8 anos de idade eram chamados)
25
e dos Sexagenários (aprovada
em 1885 no governo conservador do Barão de Cotegipe, concedeu liberdade
apenas formal aos escravos com mais de 60 anos de idade, pois, na prática, eles
tinham que trabalhar até os 65 a título de indenização ao seus senhores). No
entanto, as pressões de diversos matizes contra a escravidão (fuga de escravos,
crescimento de quilombos, manifestações nas ruas do Império e incisivas
reivindicações abolicionistas no Parlamento) forçaram o gabinete conservador que
atuava em 1888 à aprovação da Lei Áurea em uma votação em que o texto recebeu
24
Além dos veículos da imprensa que noticiavam cada vez mais a temática da escravidão, muitos
folhetins voltados especificamente à causa abolicionista foram lançados no período. O primeiro deles
foi “Gazeta de Notícias”, fundado em 1876 na cidade do Rio de Janeiro. Depois, na mesma cidade, os
mais influentes foram “O Abolicionista” (criado pela Sociedade Brasileira contra a Escravidão em
1880), a “Revista Ilustrada” (que usava charges para criticar o trabalho escravo e seus defensores), a
“Gazeta da Tarde” e a “Cidade do Rio” (fundados por José do Patrocínio em 1880 e 1887,
respectivamente), além do “Redenção” (criado em 1887 em São Paulo e que reunia muitos “caifazes”,
abolicionistas que apoiavam ações como fugas e sublevações de escravos).
25
De uma forma geral, observou-se uma divisão de opiniões sobre a lei inclusive entre as províncias:
aquelas que não dependiam tanto do trabalho escravo quanto no passado aceitavam-na sem maiores
problemas, enquanto as diretamente relacionadas à atividade cafeeira mantinham firme posição
contrária à sua aprovação. Na Câmara, quase 2/3 dos votos foram favoráveis à lei. Muitos dos
deputados derrotados (a grande maioria do Sudeste) abraçaria depois a causa republicana.
60
ainda 9 votos contrários, sendo 8 de deputados da província fluminense ligados ao
café do Vale do Paraíba.
Uma outra frente que muito concorreu para a derrocada da monarquia foi
aquela formada pelos descontentes com a forte centralização do poder e defensores
de uma organização federalista e republicana do Brasil. Mesmo que os ideais
republicanos tivessem marcado presença desde o período colonial em muitas
revoltas e insurreições, o contexto dos anos 1870 promoveu dois fatos ao posto de
grande importância para o fortalecimento de tais idéias: o fim do bipartidarismo por
conta da criação, em 1865, do Partido Liberal Radical (que evoluiria para o Partido
Republicano) e a publicação pelo jornal “A República” (fundado em dezembro de
1870 na cidade do Rio de Janeiro) do “Manifesto Republicano”, texto que se tornou
referência para o movimento que se instituía no país, defendendo o federalismo e o
fim da união Estado/Igreja e do Senado vitalício.
Um sentimento liberal-republicano encontrou eco em outras províncias e
envolveu a ala mais dinâmica dos fazendeiros de café, os industriais de São Paulo e
do Rio de Janeiro (descontentes com a pouca acolhida que diziam ter no
Parlamento, dominado que estava pela aristocracia agrária) e as classes dias
urbanas de norte a sul que reivindicavam maior representação social. E nesta
marcha de adesão, em que diversos clubes e jornais voltados para a causa, foi
fundado o Partido Republicano, que passou a disputar cargos eletivos em 1876,
assistiu ao desenvolvimento de duas tendências internas: uma formada por
cafeicultores descontentes com a Lei do Ventre Livre e a outra formada por um
grupo urbano e abolicionista. Alguns dos membros da primeira tendência se
destacaram na direção das convenções realizadas pelo Partido Republicano
Paulista (PRP) em 1873, com a presença maciça de fazendeiros. Entre os da
segunda tendência, houve quem trabalhasse na aproximação do movimento com os
setores populares através de comícios e conferências (para tentar diminuir o
prestígio que o imperador e a Princesa Isabel desfrutavam junto aos mais humildes
da Corte, sobretudo entre os negros) e houve quem buscou apoio entre os militares
descontentes com a política imperial.
Uma terceira frente que concorreu para o fim da monarquia no Brasil foi a dos
positivistas, formada majoritariamente por militares do Exército. Importante observar
aqui o fato de que esta instituição tivera seu efetivo ampliado e seus equipamentos
aperfeiçoados com o aumento de seu prestígio potico após a vitória no Paraguai e
61
que, ao invés deste investimento consolidar seu apoio ao Império, reverte-se contra
ele por conta da aproximação de sua oficialidade às causas antiescravistas e
republicanas. Na base desta realidade, estava a mudança na composição social do
Exército observada desde o início dos anos de 1850. Até então, era comum a
dedicação de filhos das elites proprietárias de escravos à carreira militar, mas, face
aos baixos soldos, os cargos de oficiais passaram a ser ocupados por filhos de
burocratas ou de militares sem posses, acarretando um distanciamento entre estes e
a elite política do Império formada na maioria por bacharéis de Direito, a quem os
militares associavam a burocracia e a corrupção.
A este tempo a Escola Militar da Praia Vermelha, na Corte, proporcionou uma
coesão também entre os futuros oficiais do Brasil em sua rejeição às elites civis e
em defesa da república em nome da “ordem e progresso”. Sua ideologia encontrava
uma difusão significativa através de outras instituições como a Sociedade Positivista
do Rio de Janeiro (criada em 1876 e que originaria a Igreja Positivista do Brasil em
1881) e o Clube Militar (fundado em 1887 também na cidade do Rio de Janeiro).
No centro da Corte, nem a demissão do gabinete conservador de Cotegipe e
nem a abolição da escravatura, ambos em 1888, foram suficientes para apaziguar as
pregações positivistas, que se ampliavam pelos quartéis, e a propaganda
republicana, intensificada através da imprensa e de comícios. Os esforços do poder
central para reduzir a expansão destas “novas” idéias eram vistos, inclusive, nas
esferas provinciais como, por exemplo, nas tentativas de fiscalização do sistema de
ensino. O exemplo a seguir, retirado do relatório do presidente da província
fluminense a exato um mês da proclamação da República, é sintomático:
É quase nulla a fiscalisação dos inspectores e superintendentes.
Servindo gratuitamente por livre nomeação do governo, elles são pela
maior parte indifferentes ao que se passa na escola e levam as
preocupações políticas para o terreno neutro da instrucção, onde
deviam emmudecer todas as paixões e interesses. A inspeção das
escolas deve ser permanente, pela intervenção e vigilância constante
das autoridades locaes e, ao mesmo tempo, imprevista, inesperada,
por intermédio de agentes directores da administração central (RIO
DE JANEIRO, 1889, p. 39).
D. Pedro II ainda tentou reduzir as insatisfações estabelecendo um gabinete
liderado pelo liberal Visconde de Ouro Preto, em junho de 1889, mas as dificuldades
em implementar as reformas desejadas por republicanos e militares aceleraram as
62
articulações para o golpe. A data de 15 de novembro se deu menos por
planejamento e mais por conta da necessidade de ação dos conspiradores devido
aos boatos de que o monarca já havia tomado conhecimento do plano.
Assim, mais um capítulo da vida política do Brasil tinha início por ato que
desconsiderava a lei e a população. O próprio Aristides Lobo, um dos articuladores
do golpe, ao retratar o fato em carta publicada no paulista “Diário Popular” no dia 18
seguinte, afirmou que “o povo assistiu bestializado” aos fatos julgando se tratar de
parada militar. Parte da população, principalmente a que tinha apreço pelo
imperador não aceitou a transição, sofrendo repressão por parte do novo governo
republicano quando das suas manifestações a favor da monarquia. Tais fatos
comprovam que o sentido etimológico da palavra “república” não fez parte do projeto
dos conspiradores que a instalaram. Ao contrário, o novo poder receava a
participação popular e a premissa da “ordem e progresso” reafirmou uma sociedade
determinada por suas elites.
26
Sessenta e sete anos depois de inaugurada, a nação pleiteada para o Brasil
mostrava nítidos sinais de fragilidade. Se é correto afirmar que importantes
conquistas foram verificadas no período que se encerrava, também o é o fato de que
ela ainda carecia de maturidade, distante que estava do modelo teórico no qual se
baseara e da abrangência defendida por aqueles que discursaram em seu nome.
2.2. Do conceito de nação ao projeto nacional brasileiro
Não uma definição universal para nação devido à complexa natureza dos
elementos a que se refere. A acepção atual foi construída no discurso político
europeu com o advento da Revolução Francesa, “embora seu uso tivesse, naquele
período, bem distante da univocidade” (BOBBIO; MATTEUCI; PASQUINO, 2004, p.
795). Se na literatura o termo surgiu com o romantismo alemão ainda no século
XVIII, a teorização na qual foi tomada como fundamento natural do poder político em
26
Sob a presidência do Marechal Deodoro, o primeiro ministério republicano foi composto
essencialmente por figuras que haviam participado ativamente da conspiração: Campos Sales
(Justiça), Aristides Lobo (Interior), Rui Barbosa (Fazenda), Benjamin Constant (Guerra e o efêmero
Ministério da Instrução blica, Correios e Telégrafos), Eduardo Wandenkolk (Marinha), Quintino
Bocaiúva (Relações Exteriores) e Demétrio Ribeiro (Agricultura, Comércio e Obras Públicas).
63
sua fusão com o Estado apenas se estabeleceu em meados dos oitocentos, quando
se tornou constante o questionamento sobre os predicados a serem considerados
para que determinados agrupamentos humanos pudessem efetivamente ser
chamados de nação.
Uma consulta aos dicionários de época comprova o uso de distintas
interpretações ao termo antes do século XIX e, neste sentido, Guerra (2003) nos
lembra que sempre esteve associado à identidade étnica ou territorial. Sobre o
primeiro sentido, aponta que desde a Idade Média de acordo com dicionários
franceses e espanhóis da época o vocábulo se aplicava a grupos corporativos
fundados sobre uma origem comum - geográfica ou política, real ou suposta -
servindo para designar qualquer grupo com características semelhantes. A respeito
do segundo sentido, informa que o termo estava associado à idéia de pátria,
considerada como território no qual se assentava um dado agrupamento humano
com características de nação. Desta associação, inclusive, o autor revela um
terceiro sentido, o político, que predominara por todo século XVIII associado
comumente a idéia de reino ou província. Sendo assim, “a nação que aparece aqui
é uma imagem com atributos múltiplos, precursora da nação moderna, mesmo
que, no momento, se trate mais de um ideal que de uma realidade, tendo em vista
que os exemplos com que os dicionários ilustram sua definição não reúnem
precisamente tais características” GUERRA (2003, p. 37).
Em nosso trabalho, interessa-nos a análise que o autor elabora quando
observa a definição do termo quanto à sua extensão geográfica, constatando a
importância conferida às cidades como unidades políticas completas e elementos
de base para a unidade pretendida das nações.
Ao tomar o exemplo da monarquia espanhola à época dos Habsburgos, o autor
identifica “como um agregado de unidades políticas (européias e americanas) com
uma seqüência de seus elementos constitutivos que merece análise complementar”.
Para ele, “sua estrutura é claramente piramidal, com uma sobreposição de
comunidades políticas tendencialmente completa: cidades, províncias e reinos”, na
qual “o elemento de base, os fundamentos de toda a construção política são as
cidades” (GUERRA, 2003, p. 39), identificadas, inclusive, através de seus diferentes
tipos: “cabeças de Reino”, “as que têm voto em Cortes”, além das demais cidades,
64
vilas e lugares sem representação específica. Voltaremos a esta questão quando
tratarmos especificamente do nosso objeto de estudo.
27
Segundo Gellner (1996, p. 507), em tempos pré-modernos tal questão era
desprovida de resposta geral e, mais significativo ainda, não era colocada. Os seres
humanos eram membros de grupos de parentesco ou de organizações locais,
súditos de dinastias, adeptos de tipos de em geral ligados a uma legitimação
política, membros de estados sociais ritual ou juridicamente definidos, e assim por
diante. Nestas formações, a identificação cultural e a lealdade política eram
complexas e variáveis e a questão sobre a nação raramente era posta. Ela apenas
se difundiu (e de forma intensa) no contexto de um tipo peculiar de organização
sóciopolítica que, a partir do final do século XVIII, se disseminaria pela Europa
sendo reconhecida como “sociedade moderna”.
Neste processo, a nação deixou de ser atrelada a uma espécie de direito
natural das populações de congregar traços identitários de língua, cultura, religião e
tradições em um território a elas associado, para ser construída, teoricamente, a
partir da percepção de um mote indutor dessa identidade coletiva associado a
mecanismos de instrução e sob a tutela de um Estado. Assim, considerar a idéia de
sociedade em seu sentido moderno consiste em perceber que ela se confunde com
a própria idéia de Estado e, mais ainda, com a de Estado nacional. Para
compreender tal imbricação, destacamos a contribuição referencial para o debate
advinda de Charles Tilly (1996) e Reinhard Bendix (1996).
Ao observar a Europa no final da Idade Média, Tilly enumera as características
que possibilitaram uma uniformidade singular ao processo de formação do Estado
no continente: uma certa homogeneidade cultural advinda do Império Romano; base
camponesa desintegrada e submetida a um senhor de terras que intermediava as
relações entre os camponeses e o soberano; existência de cidades que
apareciam como centros de comércio, comunicação, administração e manufaturas e
o estabelecimento de uma burguesia urbana com significativos laços com o campo.
27
Observando três dos mais importantes dicionários portugueses que surgiram ao longo dos séculos
XVIII e XIX, o termo “nação” é percebido em suas transformações por Botelho (1988). De um
significado mais próximo à definição de reino e senhorio, presente em uns, ele passa para
considerações sobre cultura e governo comuns, em outros. Entretanto, em edição de 1891 do
dicionário de Moraes e Silva, pela primeira vez o conceito articula-se ao de Estado e aproxima-se do
de cidadania. Portanto, se ao findar o século XIX, o termo em sua dupla articulação, relacionava-se
com os de povo e cultura, Botelho diz que é correto afirmar que os dicionários portugueses
expressam os contornos que a questão nacional assumira na Europa em décadas anteriores e que
transparece na bibliografia corrente sobre o tema.
65
Do ponto de vista econômico, portanto, havia uma certa complexidade nas
relações entre campo e cidade e estas estavam voltadas para a produção de
riqueza, fator que foi fundamental para a sustentação do Estado que estaria por vir.
Do ponto de vista político, o autor destaca que havia resistência ao poder do
soberano e locais para a sua expressão (as assembléias deliberativas locais), além
de uma notável capacidade de fazer e de ser bem sucedido na guerra.
Quanto a este último aspecto, Tilly diz ser central na formação dos Estados por
recorrer à coerção através da qual as demais condições podem ser aproveitadas.
Também determina a expansão contínua das forças armadas que, por sua vez,
requerem recursos e a gerência destes, sugerindo o desenvolvimento de
burocracias e inovações administrativas. A conexão entre estes itens é ativada
quando, em caso de resistências, a coerção é ampliada. Neste contexto, uma das
premissas básicas do Estado seria a coesão e lealdade de seus membros frente ao
próprio regime e à resistência a uma situação de ameaça externa, impondo então, a
criação de mecanismos que garantissem a participação política da população. A
construção nacional, para o autor, emerge quando se permitiu a instauração de um
sistema político no qual os governantes se comprometem com atividades de (re)
distribuição de recursos, oportunidades e justiça.
Não obstante às diferenças na formulação teórica de Tilly sobre o Estado
moderno em relação a outro autor de grande expressão no debate (Bendix),
podemos dizer que ambas se aproximam exatamente quando o cidadão é tomado
como estatuto desta nova configuração política, baseada sobretudo na constituição
de um governo direto que se sustenta no processo de homogeneização de suas
populações. Estes aspectos representam fatores importantes na questão do
nacionalismo que, para Tilly, vai ser entendido como a mobilização em torno do
Estado que, não apenas extrai recursos da população, mas se compromete com a
sua devolução sob alguma forma de compensação.
Para este autor, portanto, os Estados nacionais caracterizar-se-iam pela união,
numa estrutura central relativamente coordenada, de importantes organizações
militares, extrativas, administrativas, distributivas e produtivas, sendo relevante o
reconhecimento de que eles não se originaram de um modelo preconcebido, mas
foram “o resultado das necessidades, dos embates com outros Estados e das lutas
e negociações com classes diferentes da população” (TILLY, 1996, p. 75-76).
66
O estreito relacionamento que se desenvolve entre os processos de
construção do Estado e de construção da nação é também explicitado por Bendix
(1996), embora em direção diferente da observada até aqui. Esse autor analisa o
processo de legitimação da autoridade pública por meio da burocratização que
caracteriza o que chama de “Estado-nação ocidental”. Para nós, interessa a
consideração de que o processo de construção desse tipo de comunidade política
passa necessariamente pela possibilidade de afirmação de uma autoridade pública
legítima, com base na burocracia, abrangendo o reconhecimento de direitos básicos
para os membros dessa comunidade política e o domínio de todo o território a ela
subordinado.
Para este raciocínio, o autor recupera o rompimento das relações tradicionais
entre as classes numa situação pré-moderna e a emergência de uma “autoridade
individualista” que passará a conviver com reivindicações e protestos em favor da
igualdade de direitos para os cidadãos e com a necessidade de codificação desses
direitos e correspondentes deveres. Na busca por legitimidade, fez-se urgente a
entrada das classes baixas na arena política através da permissão para
agrupamentos em associações e da ampliação dos sistemas de educação básica.
É neste momento que Bendix fala da constituição de uma burocracia estatal
fundada na hierarquia, impessoalidade e regulamentação legal e administrativa que,
composta por funcionários distantes das relações tradicionais, permite a
legitimidade e o alcance nacional da autoridade. Assim, o autor pode sintetizar o
que entende como principal característica do Estado moderno: a simbiose
construída entre Estado e nação através da simultaneidade e reciprocidade entre a
burocratização da autoridade pública e a extensão dos mecanismos de cidadania.
Se Tilly tinha entendido a construção do Estado e a construção nacional como
processos a princípio independentes, unidos em contextos específicos (e no caso
europeu, surgido a partir da necessidade do Estado legitimar-se para extração de
recursos através do consentimento dos seus membros), diferentemente de Bendix
que o concebe simultaneamente à idéia de nação, o fato é que ambos concordam
com a peculiaridade da moderna organização política européia denominada Estado
nacional. O primeiro sendo visto como sistema burocrático administrativo impessoal
e legalmente regulamentado enquanto o segundo, que legitima e completa o
primeiro, sendo entendido como o adjetivo que denota um grupo populacional
assistido em ampla maioria por direitos de cidadania.
67
A equação que iguala a nação ao Estado e ao povo, tendo este surgido com a
adjetivação de “povo soberano”, foi apresentada por Hobsbawm (1990, p. 32) ao
considerar os marcos da Revolução Francesa. Entretanto, com o avançar do século
XIX, as construções teóricas burguesas a respeito do Estado nacional passaram a
dar importância fundamental a temas como etnicidade, língua comum, religião,
território e lembranças históricas comuns. Foi na esteira da expansão do liberalismo
na Europa, que a idéia de nação acabou por ser tomada como bandeira para a
organização de comunidades políticas marcadas pela unidade e pelo estatuto
constitucional. Unidade esta conseguida, em todos os seus níveis, através de uma
substancial carga simbólica caracteristicamente nacional e menos dinástica ou
religiosa como observado nas comunidades que, de acordo com a clássica
formulação de Benedict Anderson, tendem ao declínio com o advento na nação,
“uma comunidade política imaginada, e imaginada como implicitamente limitada e
soberana” (ANDERSON, 1989, p. 14).
De todas estas considerações, observamos que “é muito recente a invenção
da nação, entendida como Estado-nação, definida pela independência ou soberania
política e pela unidade territorial e legal” (CHAUÍ, 2000, p. 14). Ao seguir os estudos
de Hobsbawm, a autora nos informa que a nação é nascida por volta de 1830 na
Europa e que antes os termos políticos mais comumente empregados eram os de
povo e pátria.
Daquele historiador, Chauí se refere especificamente à periodização proposta
a respeito da invenção histórica do Estado-nação, do aparecimento da nação no
vocabulário político europeu e de suas mudanças nos momentos seguintes a partir
de três etapas. De 1830 a 1880, fala-se em “princípio da nacionalidade” (princípio
que definia quando poderia ou não haver uma nação ou um Estado-nação); de 1880
a 1918, tem-se a “idéia nacional” (quando o Estado, precisando mobilizar a
população a seu favor, lança mão de uma espécie de religião cívica: o patriotismo);
e de 1918 aos anos 1950-60, surge a “questão nacional” (quando observa-se a
consolidação de formas até extremadas de nacionalismos que, através das
comunicações de massa, transformava símbolos nacionais em parte da vida
cotidiana dos diversos indivíduos).
Aqui, é importante observar que:
68
Nesta periodização, a primeira etapa vincula nação e território, a
segunda a articula à ngua, à religião e à raça, e a terceira enfatiza a
consciência nacional, definida por um conjunto de lealdades políticas.
Na primeira etapa, o discurso da nacionalidade provém da economia
política liberal; na segunda, dos intelectuais pequeno-burgueses,
particularmente alemães e italianos; e, na terceira, emana
principalmente dos partidos políticos e do Estado (CHAUÍ, 2000, p.
16).
Ainda, segundo a autora, o ponto de partida dessas elaborações foi o
surgimento do Estado moderno da “era das revoluções”, definido por um território
contínuo, com limites e fronteiras estabelecidas e que agia política e
administrativamente sem sistemas intermediários de dominação, precisando ainda
do consentimento prático de seus “cidadãos válidos” para as políticas fiscais e
ações militares. Neste intuito, este Estado precisava enfrentar dois problemas
principais: de um lado, incluir todos os habitantes do território na esfera da
administração estatal e de outro, obter a lealdade dos habitantes ao sistema
dirigente, uma vez que a luta de classes, a luta no interior de cada classe social, as
tendências políticas antagônicas e as crenças religiosas disputavam essa lealdade.
A autora constata que, para dar a essa divisão econômica, social e política uma
forma de unidade indivisa, surge a idéia de nação tomada como solução.
Nação esta nos moldes apresentados até aqui em sua simbiose com o Estado.
No entanto, percebemos ser este Estado nacional uma resultante absolutamente
contingencial e singular do ponto de vista histórico e esta percepção é essencial
para observarmos que em grande parte do Terceiro Mundo o nacionalismo nutriu
um forte movimento anticolonial que, contraditoriamente, não se esforçou para
redefinir algumas das estruturas mais marcantes do período anterior. Também
de se verificar que as pré-condições indicadas por Tilly e Bendix para a construção
do Estado moderno na Europa, por suas especificidades, não existiam nestes
arranjos sociais, tendo estes distintos pressupostos para a sua formação.
Na América Latina, a formação dos Estados Nacionais caracterizou-se por uma
série de lutas internas em defesa do unitarismo ou federalismo (disputa observada
no Brasil quando do seu período regencial) em um momento no qual se processava
a organização dos exércitos. Por questões estruturais diferentes do momento
europeu, a realidade política ou social entre as ex-colônias espanholas na América
(ver Mapa 1 a seguir) também não pode ser tomada a partir de afirmações gerais no
69
pós-independência. E as razões para tal fato decorrem de quatro importantes
questões:
Mapa 1: América Latina em 1830
Fonte: BETHELL (2001, p. 266).
1) A diversidade étnica dos novos países era imensa e no caso da Bolívia,
Peru, Equador, Guatemala e, em menor grau, do México, poucos traços do grande
70
contingente indígena foram assimilados pela cultura espanhola dominante. Ainda
mais, “nas sociedades em que a classe baixa era composta muito mais de pessoas
distintas em termos culturais da elite hispânica, era pequena a possibilidade de essa
classe envolver-se ativamente na política” (SAFFORD, 2001, p. 329); 2) A variação
geográfica da América espanhola, uma vez que, sem determinismos, nos países em
que a maior parte da população estava localizada em regiões costeiras (como na
região do rio da Prata, no Chile e na Venezuela) houve uma maior estabilidade
econômica e política decorrente da estreita relação com o mercado europeu e da
arrecadação de taxas de alfândega sobre os produtos comercializados ao passo
que esta dinâmica foi menos observada nos países em que grandes parcelas de
suas populações viviam isoladas em áreas montanhosas (como no caso do México,
da Guatemala e dos andinos); 3) As diferenças na herança colonial notadamente no
que se refere à importância da Igreja católica, mais presente na vida cultural e na
estrutura política e econômica de países como o México (de colonização mais
antiga e de grande importância durante todo o período de dominação espanhola) do
que em regiões de desenvolvimento mais recente como a Venezuela e os países da
bacia platina, onde o poder e os privilégios que a Igreja havia conquistado no
período colonial foram mais facilmente reduzidos ou eliminados com os processos
de independência; e 4) Aos distintos papéis desempenhados pelos militares das
colônias espanholas no campo da política sobretudo quando da independência, pois
no Peru e, principalmente, no México boa parte dos oficiais era composta por
criollos treinados pelos espanhóis às vésperas da separação que mantiveram suas
posições e organizados em grupo coorporativo, defendiam interesses de classe com
ativa participação na cena política. Em outros países, mesmo que com resultados
distintos, o exército foi desarticulado e reestruturado nos momentos seguintes à
independência.
28
Compreender, portanto, a constituição das nações no nosso continente requer
passar por uma variedade de situações, procurando o específico e o geral em cada
uma. Além do mais, segundo os estudiosos da temática, o que se tem produzido diz
mais respeito ao plano da política estritamente nacional, geralmente obedecendo ao
28
Safford (2001, p. 330-331) cita que na Venezuela os oficiais heróis da independência, apesar das
reivindicações, nunca atuaram efetivamente como grupo de interesse coorporativo, enquanto que no
Chile e em Nova Granada os militares que haviam comandado o processo de separação logo se
submeteram à elite econômica civil. Por sua vez, na Argentina, o exército profissional havia sido
desarticulado por inteiro nos combates com os grupos milicianos locais.
71
recorte da capital do país considerado e deixando para se estudar a análise das
idéias expressas pela elite em inúmeros materiais impressos. Não formam ainda um
conjunto sólido os estudos do processo político no plano local, dos grupos e
interesses em jogo ou de lutas pelo domínio do Estado nacional. E este, na maioria
dos casos, era extremamente fraco, com receitas limitadas e exércitos pouco mais
fortes do que as forças que eventualmente poderiam ser reunidas nas províncias
constituídas.
Como visto no Mapa 1, no contexto geral de emancipação política, as antigas
colônias da América Espanhola passaram por um processo de fragmentação
enquanto o Brasil conseguiu, a despeito das imensas diferenças regionais, manter
seu território intacto. Na discussão deste fato, Bethell (2001b) diz que uma
consciência de autodeterminação política e econômica desde fins do século XVIII se
fez menos presente aqui do que nas demais colônias do continente. Ao investigar
os pressupostos da independência brasileira, lança luz nesta questão e na relação
que a produção da colônia representava no conjunto da economia lusa.
Para ele, o principal fator responsável pela manifesta prosperidade da
metrópole no início do culo XIX foi o crescimento das exportações agrícolas
brasileiras de açúcar e algodão em volume e em valor desde o último quarto do
século XVIII. A este tempo, a produção brasileira respondia por 80% das
exportações realizadas pelas colônias portuguesas e cerca de 60% do que Portugal
reexportava para os demais centros europeus. Também em termos demográficos, o
Brasil começava a apresentar números superiores ao da metrópole e, no final do
século XVII, contava com cerca de 2,5 milhões de habitantes de acordo com as
estimativas mais modestas. Citando Robert Southey em seu Journal of a residence
in Portugal 1800-1801, o autor escreve que um galho tão pesado, não poderia ficar
preso por muito tempo a um tronco tão podre” (BETHEL, 2001b, p. 192),
descrevendo Portugal no período em que a Inglaterra expandia a sua Revolução
Industrial como um país atrasado em termos econômicos, isolado culturalmente em
relação à Europa, com limitados recursos naturais em seu próprio território e com
um modesto poderio militar e naval.
Neste contexto de grande peso da produção das colônias portuguesas,
sobretudo do Brasil, na composição das rendas da Coroa, surgia um senso mais
agudo de insatisfação com a tutela econômica e política de Portugal (além da
hostilidade interna entre os brasileiros nativos e os portugueses, que ocupavam a
72
maioria dos altos cargos do governo e monopolizavam o comércio ultramarino e
local) e com a própria situação de colônia, uma vez que ficava evidente o relativo
atraso econômico da metrópole em relação à sua mais importante possessão.
Conflitos reais e potenciais com Portugal começavam de fato a ser perceptíveis.
No âmbito das colônias espanholas e inglesas da América, este senso de
identidade em importantes setores da oligarquia colonial branca e nativa vinha se
desenvolvendo durante toda a segunda metade do século XVIII, mesmo que com
traços distintos da realidade brasileira. Aqui, o autor afirma que segundo a tese de
estudiosos, os colonos tinham vínculos mais estreitos de interesse com a metrópole
do que os criollos nas demais colônias do continente fazendo com que houvesse
menos motivos de insatisfação com o controle português (fato que não impediu a
ocorrência de importantes movimentos reivindicatórios, acarretando em um
processo de independência ímpar no contexto do continente). Tais razões podem
ser enumeradas da seguinte forma: 1) A oligarquia brasileira do período era ainda
iniciante, não tendo raízes muito antigas ou consolidadas enquanto classe. Poucas
famílias de fazendeiros tinham suas origens relacionadas aos donatários do século
XVI; 2) O governo colonial português não foi tão opressivo como a Espanha em
suas colônias. Aqui, alguns brasileiros natos chegaram a ocupar postos de nível
médio no aparato burocrático e até cargos de magistrados da coroa e governadores
em diversos territórios do império português, além de funções administrativas no
próprio Portugal. Diferente da Espanha, os portugueses governavam com o
intermédio das classes dominantes locais que atuavam na aplicação das políticas
da metrópole e estabeleciam um status quo em que as contestações eram raras; 3)
O Brasil colonial não possuía universidades (nem mesmo imprensa) de tal forma
que os vínculos pessoais e familiares entre setores das elites brasileiras e
portuguesas eram estreitados por conta de uma formação intelectual comum; 4) A
base escravista da sociedade colonial brasileira fazia com que a maior parte da
população da colônia fosse constituída por negros (cativos ou libertos) o que gerava
um grande desconforto para a minoria branca no que se refere aos riscos de uma
convulsão racial e social, aceitando o governo português como instrumento para o
controle social desejado; 5) A economia agrária e exportadora da colônia fazia com
que os grandes senhores de lavouras mantivessem estreitos laços com os
comerciantes da metrópole, elos com o mercado europeu e com o comércio
atlântico, inclusive de escravos (um empreendimento predominantemente
73
português). Ressalta-se aqui uma diferença desta estrutura em relação à verificada
nas colônias espanholas que, através dos hacendados, eram dinamizados o
comércio interno e a economia doméstica; e 6) A reorganização imperial que
Portugal executou na segunda metade do século XVIII acabou beneficiando muitos
brasileiros que lucraram com o confisco dos bens dos jesuítas após a sua expulsão
e com a expansão do aparato burocrático e militar, abrindo novas oportunidades de
inserção da população local nos quadros e nos negócios públicos.
Assim, para Bethell, tais aspectos explicam porque no Brasil uma consciência
de autodeterminação política e econômica desde fins do século XVIII se fez menos
presente do que nas demais colônias da América espanhola. É verdade que a
separação das colônias do continente americano de suas metrópoles (Inglaterra,
Espanha e Portugal) é entendida pela crise econômica, política e ideológica do
sistema colonial no mundo atlântico no final do século XVIII e inicio do XIX, no
entanto no Brasil a independência muito se deveu às repercussões dos
acontecimentos políticos e militares que ocorriam na Europa naquele momento. Se
é condizente afirmar que o Brasil caminhava para um confronto direto com Portugal
desde 1808, quando recebeu a família real e alçou posto de sede da capital do
reino, também é importante observar que até 1820 não havia um sentimento sólido
de separação total entre ambos. Neste sentido, as revoluções portuguesas de 1820
(com o retorno de D. João VI a Lisboa) e a determinação de Portugal de reverter as
conquistas que o Brasil experimentara desde 1808 foram também os motivos que
fizeram com que as elites brasileiras abraçassem a causa da independência.
Diferentemente do que ocorreu nas demais colônias da América espanhola
(onde a luta pela independência durou anos e contou com episódios de violência e,
sobretudo, onde a separação resultou na fragmentação do território em variados
países que adotaram o sistema republicano federalista), o processo de
independência no Brasil foi marcado por um grau extremado de continuidade
política (D. Pedro I e as elites assumiram o aparato burocrático do Estado português
sem grandes alterações), econômica (mantiveram-se o modo colonial de produção
e o papel do Brasil na divisão internacional do trabalho, alterado com a substituição
de Portugal pela Inglaterra no posto de principal parceiro comercial do Brasil) e
social (não houve rebeliões que chegassem a alterar a ordem vigente e nenhuma
concessão importante foi dada aos setores menos privilegiados, mantendo-se
intacta, inclusive, a base escravista da sociedade). Tratou-se, portanto, de uma
74
revolução conservadora, ou mesmo, nos dizeres de Bethell (2001b), de uma
“contra-revolução”.
29
Um outro aspecto a ser observado faz referência ao papel da Igreja no
processo de independência da América e a sua situação no período seguinte. Aqui,
encontramos novamente diferenças entre o ocorrido nas ex-colônias espanholas e
no Brasil. Em meio à revolução conservadora que foi a sua independência, a
continuidade nas questões eclesiásticas também foi observada tal como nas de
ordem econômica, potica ou social. Não houve no Brasil um anticlericalismo liberal
e agressivo no pós-independência como verificado nos países vizinhos e, ao
contrário, Roma não tardou em reconhecer a transferência do padroado do rei de
Portugal para o imperador brasileiro, assegurando o Catolicismo como religião de
Estado.
É ainda Bethell (2001a) quem afirma que uma considerável parte da hierarquia
da Igreja no Brasil era composta por brasileiros natos e que muitos defendiam a
causa fundiária, a questão nativista e a manutenção da monarquia sob manto de D.
Pedro I. Também que se observar que a instalação da Corte no Rio de Janeiro
acabou por isolar o Brasil dos conflitos políticos e ideológicos que varriam a Igreja
hispano-americana no período pós-independência. A partir destes fatores, o autor
afirma que a Igreja acabou por congregar fortes elementos para manter-se sólida
como instituição do Império sem sofrer grandes percalços tal como vivenciado nas
recém-repúblicas do continente onde sofreu rias baixas no seu pessoal e bens
econômicos.
Ali a Igreja de Roma emergira das lutas de independência muito enfraquecida,
uma vez que os seus laços com a coroa espanhola sempre foram estreitos e
marcados por lealdade incondicional. Diferente do que ocorrera no Brasil, a quase
totalidade da hierarquia católica nas colônias hispânicas era formada por bispos
peninsulares e identificados com os interesses da coroa, que tentava combater a
expansão dos ideais liberais que se propagavam pela Europa do período. Em um
intricado jogo de interesses, o alto clero tinha consciência da ameaça que
movimentos revolucionários representavam para a posição solidamente
estabelecida pela Igreja na estrutura política e administrativa do reino espanhol e,
29
Para Bethell (2001b, p.230), “(...) se considerarmos que o liberalismo radical (e o republicanismo)
de 1789, 1798, 1817, 1821-1823 e 1824 fora enfrentado e derrotado, pode-se dizer que se tratou de
uma contra-revolução”.
75
como uma de suas ações mais difundidas, destituía das funções ou determinava o
retorno à metrópole todos os bispos distantes desta postura de lealdade.
Assim, a instalação das repúblicas na América espanhola representou um forte
golpe para a Igreja católica tanto em relação ao seu prestígio político quanto à sua
influência ideológica. Os novos tempos trouxeram uma legitimação para as
mudanças em curso baseadas não mais no pensamento político católico, mas na
filosofia da era da razão referida ao utilitarismo de Bentham que oferecia um sólido
suporte intelectual para o republicanismo e uma filosofia alternativa de vida
(BETHELL, 2001a). Uma situação de ordem prática acentuou um certo desmonte da
Igreja Católica naquele período: muitos bispos comprometidos com a causa da
metrópole decidiram ou foram impelidos a retornar, deixando vagas muitas sedes
episcopais
30
. Por outro lado, Roma recusava-se a cooperar imediatamente com os
novos governos ou se via envolta em uma certa inércia administrativa motivada
pelas três mudanças do papado em um período curto de tempo (1823-1831).
Apenas a partir deste momento, a Igreja em vários países da América iniciou um
processo de reorganização administrativa, ocupando gradativamente os cargos em
aberto e reintegrando as estruturas eclesiásticas nos níveis inferiores ao
episcopado.
Mesmo reconhecendo o catolicismo como religião oficial, os novos governos
da América espanhola adotaram a tolerância religiosa como princípio e, algumas
vezes, uma legislação hostil para com Roma (como no caso de Bolívar e Sucre). O
liberalismo instalado nas ex-colônias afirmava a supremacia do Estado secular e a
liberdade de pensamento como forma de superar o poder temporal e a influência da
Igreja como premissas para se atingir a pretendida modernização política,
econômica e social. Como forma de resistência, Roma instruía seus bispos a
mobilizarem as forças conservadoras locais de maneira que, podemos afirmar, foi
30
É Bethell (2001a, p. 270) quem nos traz alguns dados deste quadro: Para a região que inclui
atualmente o Equador, Peru, Bolívia, Chile e Argentina, havia apenas um único bispo legítimo em
1825. Toda a extensão do México e da América Central não contava com nenhum bispo na maior
parte do ano de 1829. Inúmeras dioceses ficaram vagas por períodos que vão de uma ou duas
décadas (como Caracas, 1817-1827; México, 1824-1839; Guatemala, 1830-1844; Lima, 1822-1834;
Buenos Aires, 1813-1833; e Santa Cruz, 1813-1835) até mais de trinta anos (como Cuenca, 1814-
1847 e Córdoba, 1816-1857). De uma forma geral, a Igreja perdeu no período quase 50% de seu
clero secular e para o regular mais do que este percentual. Diminuíram expressivamente o número de
ordenações nos diversos países, chegando inclusive a não ocorrer nenhuma em alguns casos (como
na província franciscana de Lima durante todo o período 1821-1837). O retorno de muitos religiosos à
Espanha no período pós-independência e a hostilidade para com a Igreja fizeram com que 25 de um
total de 41 conventos existentes na Bolívia fossem fechados no primeiro ano da república.
76
este contínuo embate entre Estado liberal e Igreja Católica que marcou o segundo
terço do século XIX em toda a América de origem espanhola. Em alguns casos,
como no México, esta questão política assumiu contornos de guerra civil de grandes
proporções em um quadro marcadamente distinto daquele observado no Brasil
(onde um conflito entre a Igreja e o Império foi verificado apenas a partir da cada
de 1870 e em meio a um questionamento do poder monárquico por parte de outros
segmentos da sociedade).
Até aqui, procuramos distinguir mais o processo de emancipação política
observado no Brasil em relação àqueles ocorridos em seus vizinhos do que
considerar especificamente a natureza do projeto nacional implantado na ex-colônia
portuguesa. Pensamos ter sido necessário tal caminho para as reflexões que se
seguem a respeito de temas como o grau de pertencimento da população brasileira
à comunidade nacional, os vários critérios de definição da nacionalidade ou os
padrões de relacionamento entre Estado, sociedade e o território.
Os primeiros trabalhos sobre a construção da nação no Brasil ainda estavam,
segundo Botelho (1988) vinculados ao tema do nativismo, próximo de um
protonacionalismo tal qual nos moldes defendidos por Hobsbawm (1990)
estabelecendo um continuum que vai até meados do século XIX, quando o tema da
nacionalidade aparece, sobretudo associado à literatura e à produção intelectual de
modo mais amplo. Alguns trabalhos abordam a questão ao tratar do peodo da
Independência, quando vários conceitos de nação estiveram em debate. Após esse
momento, o processo de construção da nação brasileira passa a ser quase que
exclusivo do aparelho estatal imperial (e, portanto, sem maiores questionamentos),
voltando a ter uma discussão crítica por parte dos cientistas sociais a partir da
década de 1870. Para o autor, tal período é visto como uma ruptura tanto do ponto
de vista da produção intelectual como das próprias possibilidades de difusão de
sentimentos de nacionalidade em camadas mais amplas da população,
consolidando-se a difusão de uma identidade nacional apenas ao avançar do século
XX.
Consideremos, a partir de agora, mais especificamente o rebatimento destas
questões no Brasil do século XIX e, em especial, as suas relações com a questão
do território. Assim, em uma primeira aproximação, observamos que no caso
brasileiro a idéia de imaginação é central como ferramenta explicativa da construção
ideológica e material da nação no que diz respeito, sobretudo, às concepções de
77
patriotismo e ao estabelecimento das fronteiras do Império. Parece-nos que tal idéia
tem o mesmo significado de invenção para Hobsbawm e Ranger (1984) e confirma
a expressão “comunidade imaginada” de Anderson (1989).
Em seus escritos, Magnoli (1997) não contrapõe ideologia à imaginação/
imaginário, mencionando uma “ideologia nacionalista” para denominar a invenção
de tradições nacionais que ancorariam a legitimidade da nação no imaginário de um
passado a ser superado. Refere-se também ao termo ao lembrar do expansionismo
norte-americano e da sua noção de “fronteira” como imaginação espacial e
identitária, compreensão geográfica e concepção de grupo no tempo através da
premissa de “destino manifesto”.
Ainda sobre esta representação, comenta que o uso pela elite imperial da
lenda geográfica da “Ilha Brasil” apoiou a construção de “um edifício ideológico
verossímil” que discursava em prol de um nacionalismo que operou como alicerce
para a idéia de que as instituições do Império tinham uma “ideologia imanente” ao
contrário daquilo que o passado mostrava em variados aspectos. Por outro lado,
afirma também que a força da idéia de fronteiras naturais emana o de
considerações racionais, mas de “consensos imaginários” que influem sobre o real
no que se relaciona à questão das políticas de cunho territorial, tratadas como
assunto de soberania.
Sobre esta idéia seminal que inspirou a concepção imaginária da
nacionalidade brasileira, é válido destacar que pressupunha:
(...) a existência, na América do Sul, de um todo geográfico e
geometricamente definido e quase insulado, o qual comporia o
território natural do Brasil. Tal narrativa, inspirada em relatos e mapas
de viajantes, funcionou como mito de origem da nação. Segundo ela,
o Brasil seria uma unidade natural, herdada pela colonização
portuguesa e consagrada pela independência. Desta forma, o
conceito de território brasileiro antecipou-se à emergência do próprio
Estado nacional (OLIVEIRA, 2008, p.3).
Cabe observar que a doutrina das fronteiras naturais valeu-se de categorias
aparentemente opostas, como neste caso ideológico-imaginário, mas que
estabeleciam campos comunicantes para cada uma delas. Nestes termos, Magnoli
(1997 e 2003) afirma que a ideologia está sempre ligada à necessidade de
legitimação do poder e o imaginário não é cerceado por esta necessidade, pois
independe em seu surgimento de comprovações racionais e compõe um corpus
78
assistemático e indeterminado de figuras, formas e imagens do qual a ideologia
pode e precisa (por conta de seu enraizamento entre as pessoas) servir-se para
cumprir sua função legitimadora.
Além do mito da Ilha Brasil, o de uma língua geral dos indígenas, referência de
uma unidade cultural ameríndia que daria ao território brasileiro um caráter de
unidade anterior aos portugueses, é outra idéia que colabora fundamentalmente
com a legitimação da nacionalidade, por contribuir para que fosse estendida ao
passado. Magnoli argumenta que esta idéia corresponde mais aos desejos e
realizações dos jesuítas, interessados em uma língua com a qual pudessem se
comunicar e evangelizar índios de variados grupos culturais e lingüísticos. Com
isso, os jesuítas acabaram tornando concreta a presença dessa língua, por utilizá-la
e ensiná-la em tribos de troncos lingüísticos diversos.
Com estas referências do período colonial, o autor dedica especial atenção ao
estudo da formação das fronteiras e de seu componente ideológico: um patriotismo
que, no Império, teria a função de garantir a unidade da nação recém instituída e
criar uma identidade nacional em sintonia com as iniciativas geopolíticas e
diplomáticas. É neste sentido que, revogando os mitos aqui mencionados, uma das
principais idéias postas à disposição do poder imperial era a da nação brasileira
preexistente, mas oculta sob o manto português que se apresentava à História a
partir da Independência. No que nos interessa em particular, observemos que esta
imagem tinha a missão de subordinar e submeter os processos revolucionários
separatistas e republicanos (ou monarquistas em alguns casos como a guerra pela
Independência na Bahia) que se tornaram constantes, sobretudo no período
1831/1848. Estes movimentos, enumerados nesta tese, eram considerados pelos
poderes imperiais como ameaças ao rumo glorioso da nação tal qual seu discurso
pregava.
Ainda no que concerne à fundação imaginária e simbólica da nacionalidade
brasileira, lembremos de Marilena Chauí quando nos fala que:
Para realizar tal tarefa, o poder político precisa construir um
semióforo fundamental, aquele que será o lugar e o guardião dos
semióforos públicos. Esse semióforo-matriz é a nação. Por meio da
intelligentsia (ou de seus intelectuais orgânicos), da escola, da
biblioteca, do museu, do arquivo de documentos raros, do patrimônio
histórico e geográfico e dos monumentos celebratórios, o poder
político faz da nação o sujeito produtor dos semióforos nacionais e,
79
ao mesmo tempo, o objeto do culto integrador da sociedade uma e
indivisa (CHAUÍ, 2000, p. 14).
A questão aqui envolve imagem e representação e, como fica evidente nas
palavras da autora, o poder político aparece como agente principal na sua produção
e reprodução. Se voltarmos à discussão dos mitos tal qual Magnoli nos apresentou,
vale ressaltar um trecho onde diz que:
A crítica da narrativa mitológica pode ter sucesso se, antes de
tudo, for capaz de definir adequadamente o seu objeto, que é um
relato historiográfico. É esse relato, e não uma suposta verdade
empírica escondida, que deve ser iluminado e desvendado. Ele tem
de ser encarado como um fenômeno histórico, cujas raízes
encontram-se nas formas específicas de constituição do Estado
brasileiro. Para isso, é preciso levá-lo a sério, tratando-o como é: um
mito de fundação. (...) o alvo da crítica não é o de contar uma outra
história - uma história verdadeira - da nacionalidade, mas o de contar
a história da narrativa (MAGNOLI, 1997, p. 290-291).
Destas considerações, constatamos o papel central do Estado na construção
da narrativa da nação brasileira e, assim, confirmamos a assertiva de Hobsbawm
(1990) na qual “as nações não fazem Estados e nacionalismo, mas o contrário”.
Apenas a título de exemplo, Graham (1997), ao observar em parte de seu livro a
questão dos Estados-nacionais no contexto da América Latina, cita o historiador
chileno Mario Góngora ao afirmar que naquele país também “a nação não teria
existido sem o Estado, que o moldou através dos culos XIX e XX” e cita William
Taylor e Brian Hamnett para dizer que o mesmo ocorreu no subcontinente como um
todo.
Sobre a questão da centralização no Brasil promovida pelo Estado, Barman
(1988) declara que a unidade nacional foi, em grande parte, criada por um governo
central e Sérgio Buarque de Holanda destaca que “a unidade nacional (...) estará ao
ponto de esfacelar-se nos dias que imediatamente antecedem e sucedem à
proclamação da Independência. Daí por diante irá fazer-se passo lento de sorte que
só em meados do século pode dizer-se consumado” (HOLANDA, 1962, p. 16).
Ao contrário de Magnoli, Graham (1997) diz que a identificação com a unidade
territorial certamente não foi predeterminada no Brasil que, nunca havia tido tal
característica durante a Colônia. E continua: depois que a separação entre o Estado
do Maranhão e o Estado do Brasil foi abolida em 1772, muitas das 14 (mais tarde
80
18) capitanias continuavam a relacionar-se diretamente com a metrópole. Elas
prestavam contas diretamente ao rei em Lisboa e desconsideravam o Governador
Geral ou Vice-rei, no Rio de Janeiro, que permanecia como um primeiro entre pares,
diferenciado mais por seu título do que por sua jurisdição maior. Com cada capitania
voltada para as exportações à Europa, poucas conexões econômicas as ligavam
entre si e a comunicação das capitanias do norte com Lisboa era mais fácil do que
com o Rio de Janeiro. Para o autor, não existiu nenhuma cidade centralizadora na
América portuguesa, assim como não existiu nenhuma na América espanhola como
um todo.
Sendo assim, os precursores do movimento de independência no país, em
conspirações tramadas em Minas Gerais, em 1789, e na Bahia, 1798, tentaram
libertar do domínio português somente aquelas áreas e não visaram a
independência de um todo unido e maior. Alguns autores, inclusive, afirmam
freqüentemente que, quando o governo português se transferiu para o Rio de
Janeiro, em 1808, tornou-se o Brasil de fato independente, especialmente porque
declarou a abertura dos portos para comercializar com outra nação e pôs fim ao
monopólio colonial de comércio ultramarino, que estava nas mãos das casas de
comércio portuguesas. A este passo, destruiu-se uma característica determinante
da relação colonial anterior. Mas tal afirmativa, uma vez mais, pressupõe que o
“Brasil” existisse. Ao contrário, não importando o quanto algumas pessoas, em
cada uma das capitanias anteriores, desejassem a liberdade conseguida do controle
de Lisboa, elas não se regozijavam em ser governadas a partir do Rio de Janeiro.
Em 1815, um observador francês disse que o Brasil era apenas “a designação
genérica das possessões portuguesas na América do Sul” (citado por HOLANDA,
1962, p. 16).
No entanto, é sabido que uma rebelião republicana separatista irrompeu em
Pernambuco, em 1817 e, apesar de reprimida em poucos meses por tropas leais
vindas de outras regiões, revelou um sentimento regionalista profundo. Quando, em
1820, foi exigido o retorno do rei D. João VI a Portugal, as províncias do norte do
Brasil aprovaram a sua ida enquanto importantes atores sociais do sul insistiam na
sua permanência em terras brasileiras. Quando seu filho declarou a Independência
do Brasil, a maior parte das províncias do norte foi contra e permaneceu leal a
Portugal até defrontar-se com uma força vinda do Rio de Janeiro. A unidade do
81
Brasil pareceu duvidosa para os contemporâneos, e historiadores que a tem
explicado desde então desconsideram a “desunião” que ocorria no território colonial.
Graham ainda nos fala que historiadores nacionalistas recorreram a certos
contorcionismos para explicar esses fatos. Na opinião de Oliveira Lima, foi a corte
portuguesa que “fomentou (...) a desunião (...) privando (o Brasil) de seu centro
natural de atração, que era a capital consagrada por D. João VI”. JoHonório
Rodrigues, que argumenta vigorosamente pela pré-existência de uma nação
brasileira unida, descartou esses eventos, considerando-os como sem importância:
“Somente a minoria dirigente de umas poucas províncias não teve a sensibilidade
histórico-política de sentir que o Brasil era singular, único, individual, diferente de
Portugal”. Contrasta ainda os “verdadeiros brasileiros”, aqueles que resistiram ao
domínio português, dos “brasileiros infiéis”, que perpetraram tantas “traições”. Por
fim, reforça Graham, forças do sul cumpriram “a obra de ajuda aos patriotas” em
sua batalha para unir-se à nação. Na visão contrária de Barman, mesmo o fato dos
grupos do sul terem declarado sua aliança a D. Pedro I em meados de 1822, não
implicariam no “triunfo do nacionalismo”, denotando simplesmente a preferência por
uma promessa de autonomia local ao invés do domínio português. Afirma ainda que
a unidade do país não se destacava entre suas aspirações na época.
Observemos ainda que depois de D. Pedro I coroado imperador e da expulsão
das forças portuguesas, ele ainda enfrentou resistência local. Barman nos informa
que o líder da revolta pernambucana de 1824, Frei Caneca, afirmou que o Brasil
havia se tornado “independente, não apenas como um todo, mas em cada uma de
suas partes ou províncias, e estas, independentes uma das outras (...) Uma
província não tem o direito de forçar qualquer outra província a fazer nada”
(BARMAN, 1988, p. 121). E continua dizendo que o embaixador britânico, no Rio de
Janeiro, em 1826, acreditava numa provável fragmentação do Brasil, uma vez que
“grande parte da população daquelas províncias distantes (do Pará e do Maranhão),
e até mesmo do Pernambuco e da Bahia estava contra o governo imperial e
inclinada (...) a separar-se dos estados do sul” (BARMAN, 1988, p.121 citando Frei
Caneca).
Tais observações fazem com que um período específico da História do Brasil
desperte interesse especial dos estudiosos no que se refere à sua dimensão
espacial. Aqui, falamos do intervalo que vai da abdicação forçada de D. Pedro I,
quando o país parecia desintegrar-se, até meados do século XIX quando, para
82
muitos, consolidava-se um Império com líderes locais vinculados a outros através
de todo o território. Discutiremos a seguir esta mudança a partir de autores como
José Murilo de Carvalho, Caio Prado Junior, Fernando Novais e Carlos Guilherme
Mota, além de Ilmar Rohloff de Mattos.
Carvalho (1988) discute essa questão, observando a formação ideológica e
intelectual comum de uma elite política. Ele lembra que, diferentemente da situação
na América espanhola, onde numerosas universidades treinavam profissionais
locais, nenhuma universidade existia no Brasil colonial. No início do regime
independente no Brasil, dependia-se de homens educados na Universidade de
Coimbra, em Portugal, para administrar a burocracia do Estado e desempenhar as
funções do judiciário, contando assim com funcionários e burocratas que tinham alta
estima por uma autoridade central firme. Sua educação também enfatizava
obediência para com a figura real (tido como o juiz supremo, próximo ao próprio
Deus), pois como um ex-aluno relembrara “o direito de resistência, este baluarte da
liberdade, era inteiramente proscrito; e desgraçado de quem dele se lembrasse!”
(CARVALHO, 1988, p. 51).
Atento ao fato de que muitos brasileiros letrados haviam servido ao antigo
regime em Portugal, na Índia ou África e no Brasil, o autor argumenta que tal
formação e experiência explicam a unidade frágil do Brasil, não somente a elite
nacional, mas advogados e juízes haviam recebido uma formação no direito romano
e compartilhavam uma crença nas virtudes do poder centralizado e no que tem sido
chamado de “ditadura monárquica”. Observamos que, como funcionários do Estado,
criaram uma nação.
A interpretação de Carvalho tem a vantagem de não transformar o Estado em
objeto, mas suscita uma questão que nos remete a aceitação da visão política
desses homens por parte da elite econômica de tantas regiões diversas e os
interesses materiais em jogo nesse processo. E esta questão nos leva para o
segundo eixo interpretativo que relaciona uma classe dominante ao controle do
Estado. Em um extremo do espectro, Prado Júnior (1975), em livro publicado pela
primeira vez em 1933 e que se tornou referência para gerações de historiadores
brasileiros, declara que a independência resultou unicamente do interesse da classe
agrícola em livrar-se dos portugueses. Os eventos na Europa (invasão napoleônica,
a fuga da Corte para o Brasil e, posteriormente, as tentativas de imposição sobre a
colônia por parte das cortes portuguesas) explicam o modo mais ou menos pacífico
83
da elaboração da independência e a ausência de uma longa guerra, uma vez que
esses acontecimentos deixaram a classe comercial portuguesa enfraquecida não
conseguindo manter seu controle exclusivo sobre o comércio colonial. Os
proprietários de terras e os escravocratas brasileiros emergiram triunfantes. Para o
autor, era deles o novo Estado.
Novais e Mota (1986) também enfatizam o triunfo dessa classe, mas ao invés
de apenas apontarem os mercadores portugueses como inimigos da independência,
enfatizam a própria natureza do sistema mercantilista nas Américas, visto que era
baseado no princípio do exclusivo comercial. Aquele sistema enfrentou uma crise
causada pelo próprio sucesso, pois havia criado uma classe de fazendeiros mais
próspera e exigente além de descontente com o monopólio colonial; havia
estimulado o crescimento do número de escravos, exigindo vigilância mais firme e
havia fomentado uma rivalidade entre os poderes imperiais e ex-imperiais que
encorajaram a Inglaterra olhar favoravelmente para a independência latino-
americana. Para estes autores, se a independência foi um processo decorrente das
exigências dos fazendeiros, segue-se que estes dominaram o Estado resultante.
Talvez o argumento mais criterioso e provocativo sobre as origens da coesão
nacional do pós-independência esteja em Mattos (1994) que procura demonstrar
como interesses de classes se uniram especificamente ao poder do Estado. O autor
se concentra no período de meados da década de 1830 até o início da década de
1860 e considera um bloco de fazendeiros de café da região do Rio de Janeiro,
recentemente enriquecidos, e liderado por um pequeno grupo de políticos/estadistas
ativos (ou saídos daquele bloco ou a ele ligados por laços de casamento).
Esforçando-se com sucesso para absorver líderes de outras regiões, chegaram a
constituir-se em uma classe única que se definia por sua oposição a outras classes,
especialmente aos escravos, mas também à plebe urbana rude e inquieta. Para ele,
essa classe senhorial abraçou uma ideologia da ordem desenvolvida e defendida
por advogados, juízes, jornalistas, professores, médicos, empresários, políticos e
burocratas, isto é, os “intelectuais orgânicos” (conceito trazido por Gramsci). Através
deste processo de formação de uma classe poderosa que dominava todo o Brasil,
prossegue o autor, emergiu um forte Estado centralizado. Mattos entende esse
Estado não apenas como aparato coercitivo, mas como instrumento de orientação
intelectual e moral. Por meio dele, a classe senhorial construiu sua unidade e
expandiu seu poder, tanto horizontalmente, por todo o território brasileiro, quanto
84
verticalmente, sobre maiores segmentos da população livre, não impondo a
submissão, mas incorporando esses grupos à “civilização”.
Até aqui, procuramos considerar como as preocupações econômicas e sociais
contribuíram de maneira decisiva para assegurar a unidade do Brasil. Tais
interesses conduziram a aceitação de um Estado centralizado que contribuiu
decisivamente para a formação de uma nação. Interesses materiais e econômicos
forjaram um Estado centralizado e uma unidade nacional.
Ainda sobre o conturbado período na história imperial - o dos seguidos
movimentos revolucionários - cabe observar, ressaltando alguns aspectos, os
motivos que fizerem as elites locais e regionais aceitarem um comando centralizado
possibilitando a unidade territorial. Graham (1997) chega a falar em uma “desordem
social” que ameaçava mais as elites do que a centralização a partir do Rio de
Janeiro. Para ele, em esforços para sustentar auto-governos regionais ou a
independência completa do poder central, ficou gradualmente claro que abalar a
unidade do Império significaria enfraquecer a autoridade dos senhores de
propriedades sobre os escravos e sobre as classes inferiores em geral. É desta
constatação que o autor caracteriza o referido espectro de desordem social que
incomodava as elites.
Por outro lado, enfatiza que na maioria das revoltas do Brasil, exceto a do Rio
Grande do Sul, faltava coesão e controle. Ele descreve que, quando ocorriam
revoltas regionais, o caos se seguia, e a própria instituição da escravatura parecia
ameaçada. Assim, as elites políticas, que haviam exigido autonomia local mais
ampla, retrocederam e o curso das exigências foi mudado quando passaram a
apoiar uma rie de medidas nacionais destinadas a fortalecer a autoridade central
e a limitar as liberdades regionais.
Passaram a temer a desordem mais do que se ressentiam da autoridade
central, pensando-a como uma maneira de prevenir aquela. A elite, nos diversos
pontos do Brasil, coadunou com as novas instituições por conta de aspectos inter-
relacionados como o seu envolvimento pelo discurso hegemônico, aspecto
lembrado por Mattos (1994), o fato de que tivera seus filhos instruídos sobretudo em
Coimbra, como enfatizou Carvalho (1988), e o compromisso com interesses
imediatos contra os quais trabalhavam os levantes revolucionários. Assim,
identificamos mais um aspecto para a anuência dos líderes regionais do Império em
85
relação à autoridade central e à unidade territorial como pressupostos
fundamentais.
Seguindo Moraes (2002) dizíamos em outro momento deste trabalho que, nos
países de formação colonial, a dimensão espacial adquiriu considerável importância
na explicação de suas dinâmicas históricas, pois a própria colonização estava
pautada na relação sociedade e espaço. A partir desta lembrança e dos tópicos
discutidos até aqui, destacamos que a questão da unidade territorial, necessidade
da nação, sugere que argumentos de índole geográfica (que nos remetem ao
campo das “ideologias geográficas”) legitimaram discursos de um Brasil também
como espaço a ser conquistado. E esta necessidade coloca em evidência uma outra
face do processo: a que nos mostra o padrão discursivo sico do século XIX
estruturado em torno do conceito de “civilização” e da empreitada monárquica em
sua missão civilizadora.
E, nesta nova frente, o papel dos núcleos urbanos é tomado como essencial.
Eles seriam vistos como espaço dos semióforos desejados mais do que pontos de
articulação das regiões e do Império como um todo. No entanto, para a discussão
da nação como projeto civilizatório e o papel dos núcleos urbanos como espaço dos
símbolos, é importante que observemos que a figura do Imperador oferecia
legitimidade em um ambiente onde os chefes locais tinham poder baseado em seus
recursos econômicos, alianças políticas ou na força, mas a autoridade dependia de
serem aceitos por seus possíveis seguidores como legitimamente investidos deste
poder. O status individual das elites brasileiras dependia, em larga escala, de
fatores não econômicos e poderia ser reforçada se derivasse do governo legítimo
de um monarca frente a uma ordem social profundamente hierarquizada.
A legitimação imperial e a efetivação da autoridade do monarca serviam aos
líderes locais melhor que uma república fragmentada. Neste sentido, é importante
frisar que suas ações fundamentaram uma proposta social de controle das classes
inferiores e também uma proposta política de dar legitimidade às suas influências.
Como disse Graham, “o governo central não foi imposto às pessoas influentes ou
até mesmo vendido a eles. Eles o escolheram” (GRAHAM, 1997, p. 12). E esta
escolha também considerava o fato de que a monarquia também lhes oferecia a
possibilidade e os meios pelos quais resolveriam suas diferenças sem minar a
ordem, uma vez que o imperador, juiz supremo em todas as ocasiões, tomaria as
86
decisões aceitas por todos sem perda de prestígio. Neste sentido, é reveladora a
citação seguinte:
Ninguém [no Brasil] deseja obedecer a seu semelhante; o imperador
está acima de todos, ninguém é igual a ele; a vaidade de ninguém, o
orgulho de ninguém é ferido por obedecer a um governante
hereditário (BARMAN, 1988, citando relato do embaixador da Áustria
em visita ao império brasileiro).
A manutenção da monarquia, no entanto, bem como a constante reprodução
da força do imperador para desempenhar tais funções, além da manutenção do seu
carisma, era apenas possível pela considerável constância com que os símbolos de
sua autoridade, respeito e familiaridade eram disseminados pelo território imperial.
Assim, o jogo de cena incluía as datas comemorativas de sua vida pessoal (seu
aniversário, o de casamento, de nascimento de seus filhos, ocasiões semelhantes
na vida de sua família) que eram comemoradas em diversas partes do império com
fogos de artifício, missas solenes, discursos, bandeiras, tambores e música,
paradas com carros alegóricos, e, durante a noite, “iluminações”, quando em toda
casa, seja de rico ou pobre, acendia-se, pelo menos, uma vela em cada janela
(GRAHAM, 1997).
Além do mais, os símbolos cívicos também foram utilizados em demasia para
marcar a figura do imperador como soberano ímpar: ruas e praças das diversas
cidades e vilas eram batizadas com seu nome ou com o de personagens da realeza
ou de acontecimentos importantes em suas vidas, erguiam-se monumentos para o
imperador e cunhavam-se moedas com sua efígie. Aqui relembramos que, através
“do patrimônio histórico e geográfico e dos monumentos celebratórios, o poder
político faz da nação o sujeito produtor dos semióforos nacionais e, ao mesmo
tempo, o objeto do culto integrador da sociedade uma e indivisa” (CHAUÍ, 2000, p.
14). E nestes termos, observamos que, se os interesses materiais levavam os
senhores de engenho e os fazendeiros a apoiarem a monarquia, os esquemas
culturais moldavam e solidificavam os seus compromissos em um cenário no qual
esta assegurava uma lealdade coletiva baseada em tradições.
Neste momento da discussão, a questão do Estado se impõe e a observamos
como instrumento deste processo. Seguimos a posição de Mattos (1994) quando vê
o Estado como um artefato cultural, construído precisamente para legitimar o que
poderia ser visto como ilegítimo (o domínio de uns sobre os outros). Contando com
87
a força que tenta monopolizar, seus principais instrumentos são culturais, ou seja, a
criação de uma visão de mundo, de atitudes e noções que legitimam seu domínio
como algo conveniente e certo. Dessa forma, o Estado combina a ameaça da força
com o consentimento e, no caso do Brasil Império, por ação do poder moderador,
fazendeiros de café dos arredores do Rio de Janeiro (o proferido “tempo
saquarema” de Mattos) e proprietários e escravocratas espalhados por todo o
Brasil, de onde dominavam a política local e tomaram a iniciativa de construir um
Estado para controlar a massa informe dos pobres e escravos. Estes atores
econômicos, além de agraciados que eram com títulos nobiliárquicos,
freqüentemente tornaram-se membros do gabinete ministerial e das demais casas
de representação política daquele momento.
Imbuídos da necessidade de reforçar sua “clientela” local e estendê-la para
além desta esfera, os líderes com habilidade política buscavam se envolver com
questões provinciais e nacionais fazendo com que, através destas atitudes do
cotidiano, o Rio de Janeiro (residência do Moderador) passasse a se firmar como
capital do Império e centro do Brasil no século XIX. Observamos que o esforço das
elites em manter uma clientela local acabava por enaltecer a idéia de um Estado
centralizado e, portanto, a idéia de uma unidade nacional.
Martins (2005) revela como um outro viés desta questão, o jurídico-
institucional, nos ajuda a entender a monarquia constitucional brasileira a partir de
um longo processo de organização de uma autoridade central no qual a instituição
do Conselho de Estado desempenhou papel fundamental. Este Conselho, estudado
pela autora, foi responsável pela montagem da estrutura jurídico-administrativa que
fortaleceu as bases do Estado Imperial, constituindo-se em espaço de negociações,
acomodação dos conflitos e conciliação de interesses das elites. Para ela, a
compreensão das ações e do comportamento das elites imperiais brasileiras (que
não representavam um todo uno nem um grupo isolado) pode ser alcançada através
da análise da dinâmica desta instituição e da identificação de suas redes de
sociabilidade e parentesco que eram estruturalmente confirmadas a cada momento.
Em última análise, os membros do Conselho integravam diferentes grupos
constituídos desde o século anterior baseados em grupos familiares tradicionais e
suas alianças clientelistas que se perpetuavam.
Gravitando, assim, em torno dos cargos mais importantes, a elite brasileira em
suas diferentes representações acabava por sustentar o equipamento do Estado,
88
tornando-o a sua própria razão de ser. Para Graham (1997), depois de 1840, na
visão da maioria dos homens abastados, a função principal do governo central era
conceder-lhes tais posições e cargos e era através de tal nomeação que o governo
melhor preenchia seu objetivo. Ainda, as posições mais procuradas eram as de
oficial da Guarda Nacional, delegado de polícia ou juiz substituto de município.
Assim, para além de seu poder econômico, tais posições asseguravam aos
senhores proprietários a autoridade legítima em suas regiões de origem.
Entretanto, frisemos que esta forma de se fazer prestigiado e legítimo,
desenvolveu um consentimento e depois um entusiasmo por parte das elites em
compor o corpo político mais amplo, alimentando uma expectativa de favores a
serem obtidos através do Gabinete Ministerial. Tal realidade fez consolidar um
senso de vantagens e experiências compartilhadas com outros líderes mesmo
através de longas distâncias de tal maneira que, apesar das queixas em relação à
omissão do Governo às necessidades locais, nenhuma revolução irrompeu entre
1848 e 1889 e, ao que consta, nenhuma também chegou a ser planejada.
É bem verdade que a dinâmica da produção cafeeira no interior imediato da
capital do Império, fortaleceu em seu apogeu a estabilidade característica daquele
momento. Mas também o é o fato de que tal estabilidade de nada ou pouco serviria
para as elites das demais regiões se elas não possuíssem os laços de
pertencimento ao governo como um todo através de seus mecanismos
patrimonialistas. Assim, é correto afirmar que, neste cenário, o apego à região não
desapareceu, mas aquele em relação à nação expandiu-se fortemente e as duas
idéias já não apareciam mais como excludentes, uma vez que das transações
políticas diárias surgia um sistema de lealdades que mantinha a união nacional.
Se a Corte contribuiu fortemente para a construção de um sentimento de
nacionalidade entre os líderes provinciais, ela era, antes de tudo, um símbolo e
impunha uma coesão a partir de uma rede nacional de clientelismo e patrocínio
baseada nos princípios gerais da hierarquia, lealdade e obrigações pessoais.
Nestes termos, o ideário da nação foi prontamente disseminado e demonstrado nas
localidades quando dos variados rituais de patriotismo que passaram a ser
realizados nos mais diversos lugares (arraiais, vilarejos, cidades, fazendas) sob a
promoção das elites locais que reforçavam o projeto moderador de constituição da
nação sob sua ordenação e seus valores políticos, econômicos, sociais, culturais,...
civilizatórios. Gradualmente, e isto era verdade em meados do século XIX, todos
89
na população se consideravam “brasileiros” a despeito do que ocorria quando da
transição do Brasil colonial para o Império como informávamos no início desta tese.
Do ponto de vista da produção intelectual que legitimaria o discurso
nacionalizante brasileiro, coube aos políticos e letrados reunidos em torno do IHGB
a missão de amalgamar “em um corpo sólido e político” (nos dizeres de José
Bonifácio em discurso de 1813) a heterogeneidade observada no Brasil, criando-lhe
uma gênese para a sua história. Com esta postura notadamente iluminista, pois se
partia do esclarecimento dos membros do topo da pirâmide social para o posterior
esclarecimento dos seus demais integrantes, o Instituto se revestia da missão de
definir uma identidade para a nação. Entre os aspectos a serem observados neste
projeto, pensemos que a definição de um corpo social requer necessariamente a
assimilação dos seus elementos externos, apontando para aclaração do “outro”. Ao
pensar no Brasil como representante da idéia de civilização branca e européia no
Novo Mundo
31
, a elite o faria através de uma dupla angulação: apontar, tanto no
plano interno quanto no externo, quem estaria excluído do seu projeto nacional.
Fortemente marcada pela dificuldade em assimilar a questão racial, a elite
letrada do IHGB operava seus trabalhos a partir de um par de categorias que
isolavam o branco, associado ao mundo da “civilização e estado social”, dos índios,
relacionados à “natureza e barbárie”, e dos negros, a quem cabia apenas esta
última. Articulando metáforas de parentesco para valorizar as heranças do Brasil em
relação à antiga metrópole, a nação restrita dos brancos foi ávida na produção de
imagens depreciativas desses “outros” a ponto de seu poder de reprodução
extrapolar o momento histórico preciso de sua produção. É verdade, como
dissemos, que o elemento indígena foi tomado como uma “espécie de matriz de
uma nacionalidade originária”, mas o foi de maneira romanceada e em meio a um
arraigado debate no interior do Instituto, em um dos raros momentos em que sua
militância intelectual não se mostrou homogênea.
32
31
As elites se viam como responsáveis por uma missão civilizadora iniciada por Portugal de tal forma
que aqui nação, Estado e Coroa foram tratados como unidade nas discussões sobre o problema
nacional. São ilustrativas, neste caso, as palavras de Adolfo Varnhagem sobre os fundamentos de
sua obra premiada pelo IHGB, conforme indicamos anteriormente: “Em geral busquei inspirações de
patriotismo sem ser no ódio a portugueses, ou à estrangeira Europa, que nos beneficia com
ilustração; tratei de pôr um dique à tanta declamação e servilismo à democracia; e procurei ir
disciplinando produtivamente certas idéias soltas de nacionalidade...” (Grifo nosso)
32
Se existia uma defesa das origens européias da nossa história, a exemplo de Varnhagem, também
havia os que viam o indígena na matriz desse processo, como o poeta Gonçalves Dias. É sintomático
o fato de que ambos foram agraciados com os sugestivos títulos de barão (depois visconde) de Porto
Seguro e de Araguaia, respectivamente.
90
A despeito da valorização de uma herança indígena na nossa historiografia
registrada pelo IHGB, foi secundário o papel efetivo desse povo na sociedade. Os
que se salvaram da dizimação, apesar de considerados “vassalos livres”, foram
afastados da corte e continuaram distantes dos momentos decisivos da vida
pública, além de explorados em termos de mão-de-obra. Quanto aos negros, em
sua absoluta maioria formada por cativos, a própria Constituição lhes negava
direitos ao assegurar o trabalho compulsório. Estes foram os excluídos da nação em
seu plano interno.
Quanto ao externo, o maior receio das elites imperiais era a perda de poder
frente à ameaça republicana como acontecia nos países vizinhos. Criar
mecanismos para manter o Brasil “livre dos traumas e furores democráticos” foi
missão prontamente assimilada pelo IHGB em sua defesa na manutenção do
regime monárquico e na construção de um discurso que sustentasse o isolamento
do país no contexto continental como política externa no Segundo Reinado. A
unidade entre Estado, monarquia e nação foi o critério político utilizado para
justificar as diferenças quanto às formas de organização do primeiro e para associar
a idéia de barbárie ao sistema republicano. Aqui, enfatizamos também que o poder
dessa representação extrapolou o momento histórico de sua criação, refletindo-se
nos desdobramentos diplomáticos da região.
Tais posições dos membros do IHGB, que revelam o seu engajamento com o
projeto de Dom Pedro II, são compreendidas quando observadas a sua composição
e trajetórias. A maior parte do elenco dos 27 fundadores do Instituto desempenhava
funções no aparelho de Estado e havia nomes que circulavam no meio político luso-
brasileiro desde tempos joaninos. Parte ainda desses fundadores era formada por
portugueses vindos para o Brasil quando das invasões napoleônicas na Europa,
refletindo certamente uma recusa ao mote revolucionário francês e uma fidelidade à
casa monárquica de Bragança. Completavam a lista, muitos com carreira na
magistratura, na vida militar e na dia burocracia do governo. No conjunto dos
políticos de origem brasileira, a carreira tinha sido iniciada quando da Constituinte
ou ganho notoriedade após a abdicação.
Resgatamos Carvalho (1988) para marcar que uma diversidade na origem
social desses atores era nivelada por um processo de educação jurídica nos moldes
de Coimbra que se completava com a prática no aparelho estatal. Neste contexto,
na missão instituída pelo IHGB, trabalharam por uma memória nacional que partia
91
do pressuposto da continuidade de um império branco e europeu como assinalado
até o momento. Com este viés ideológico, foram pródigos em sua ação e alçaram a
entidade ao reconhecimento inquestionável. No rol de suas realizações estava a
organização de missões de pesquisadores ao exterior e concursos de monografias,
a promoção de intercâmbio com associações afins internacionais, colaboração nos
processos de demarcação de fronteiras, edição de mapas referenciais do peodo,
coleta e guarda de importante documentação sobre o país e publicação sistemática
de textos de seus associados e da ininterrupta Revista do IHGB. De periodicidade
trimestral, esta publicação funcionou como instrumento de divulgação dos ensaios
sobre a nação pretendida ao ser distribuída para mais de uma centena de
sociedades acadêmicas estrangeiras.
O caráter político de centralização do Império também se fazia presente no
IHGB através de sua prevista ramificação pelo país. A idéia era a de um instituto
histórico sediado na Corte que subordinaria as instituições semelhantes nas
províncias para concentrar o conhecimento produzido sobre o Brasil criando uma
espécie de centro autorizado do discurso da nação. Entre os exemplos de medidas
tomadas neste intuito, indiquemos a sugestão para que a biblioteca da sede do Rio
de Janeiro funcionasse como depósito geral para as publicações das diversas
regiões e o projeto de transformar o Instituto em guardador dos relatórios dos
presidentes de províncias e de todos os dados estatísticos produzidos. Embora o
plano de sucursais não tenha se efetivado, todas as demais ações do IHGB
mostravam uma entidade comprometida com a construção do Brasil em seus
variados aspectos a partir de uma determinada visão de mundo. Em síntese:
Na verdade, composto, em sua maior parte, da ‘boa elite’ da corte de
alguns literatos selecionados, que se encontravam sempre aos
domingos e debatiam temas previamente escolhidos, o IHGB
pretendia fundar a história do Brasil (...). Por meio do financiamento
direto, do incentivo ou do auxílio a poetas, músicos, pintores e
cientistas, Dom Pedro II tomava parte de um grande projeto que
implicava, além do fortalecimento da monarquia e do Estado, a
própria unificação nacional, que também era obrigatoriamente cultural
(SCHWARCZ, 2000, p.127).
Quando a autora cita que a unificação pretendida era “também cultural”, afirma
o fato de uma primazia do território como ente da nação brasileira e a necessidade
do Instituto de pensar seu projeto além desta questão primeira. Assim, a memória
92
nacional seria escrita textualmente por historiadores, visualizada por pintores e teria
seus tipos simbólicos apresentados pelos literatos. No entanto, como a nação
estivera sempre associada imediatamente ao seu território de tal maneira que falar
em unidade nacional significava discursar a favor da integridade territorial, coube
aos geógrafos o pensar sobre esse aspecto.
No contexto da internacionalização da economia pelo qual passava a Europa
no século XIX, a Geografia possuía os pressupostos necessários para a sua
sistematização enquanto ciência acadêmica. Sua instrumentalização a partir da
idéia de “espaço vital” se impunha pelo imperativo de organização do volume de
novas informações surgidas com o desenvolvimento técnico do período. Os temas
geográficos, portanto, passaram a ser primordiais tanto no âmbito da geopolítica
imperialista quanto para os novos Estados que surgiam com a descolonização.
Vale lembrar que, segundo Foucault (1979, p. 14), o exercício do poder nos
Estados territoriais implicou em uma espacialização da política e na consideração
da população como “objeto primeiro da dominação estatal”, percebida como o
conjunto de “habitantes de uma dada porção de espaço”. Neste sentido, apesar das
diferentes conjunturas na própria Europa ou fora dela, concordamos com Moraes
quando afirma que:
Um traço, todavia, parece aproximar as várias manifestações: a
centralidade do discurso geográfico nos momentos de ordenamento
ou reordenamento das esferas de dominação estatal,
necessariamente momentos de dificuldade na afirmação das
identidades. Tal fato anima a fazer um cruzamento entre a história
social das idéias geográficas com a história dos países do chamado
capitalismo tardio, aqueles onde as formas de legitimação social se
mostram mais problemáticas (MORAES, 1991, p. 168).
Vale relembrar que, para o autor, as teorias modernas da Geografia foram
legitimadoras dos projetos nacionais e seu discurso foi central na consolidação da
idéia de identidade coletiva pelo apego à pátria. Não bastasse essa questão, no
contexto da América Latina e mais particularmente do Brasil, a soberania política
não se completaria sem a conquista das áreas interioranas não-povoadas. E este
aspecto reforçou a proximidade das idéias de “unidade nacional” e “integridade
territorial”, trazendo à tona o papel do pensamento geográfico e sua aplicação na
consolidação de ambas.
93
Embora sem o devido destaque no seu estudo no Brasil, o pensamento
geográfico assumiu um papel importante nas representações do território e da
população durante o século XIX. Se a institucionalização da ciência Geografia seria
processo apenas nas primeiras décadas do século seguinte, a verdade é que seus
temas estiveram no centro da produção do Brasil. A construção de “ideologias
geográficas” foi intensa durante o Império e talvez a literatura sobre o tema não
tenha ainda reconhecido este fato por conta do caráter pragmático e oportunista da
contribuição dos geógrafos no período, a serviço que estavam da dominação
estatal.
No ambiente do IHGB em que historiadores literatos e pintores inventaram uma
sociedade para o país, o inventário geográfico desta se distanciou e fixou-se apenas
na natureza e seus aspectos físicos. À sua Comissão de Geografia, coube o
mapeamento sistemático e as descrições corográficas das diversas províncias e,
por isso, era composta por militares que definiam os rumos e temas dos trabalhos.
A nação estava sendo construída, mas, no âmbito de sua principal instituição
legitimadora, a geografia se via envolta em coordenadas cartesianas, relevo, clima e
demais temas estratégicos para as questões militares. No entanto, esta não era a
única geografia que se fazia no país e este é o ponto essencial em nossas
considerações.
Mesmo diante do exposto, salientamos que o IHGB era fundamentalmente
geográfico uma vez que se pautava em referências ao território como premissa e
não à sociedade que o ocupava. O seu discurso até era para a construção de uma
sociedade, mas esta seria em consonância com uma ideologia conservadora que
tinha o território como ponto de partida e o poder que emana do seu controle como
ponto de chegada. Lembremos que foi assinalado nessa tese que a propriedade
fundiária era a base das relações de sociabilidade no Brasil, que o país ainda era
um espaço a ser conquistado em seu interior e que a nação constituída no Império
era desprovida do povo (meros habitantes a serem dominados e civilizados), não
configurando a simbiose entre autoridade pública e mecanismos de cidadania.
Portanto, a valorização dos atributos espaciais estava na base das formulações
ideológicas que sustentavam a monarquia e que davam a diretriz dos trabalhos
realizados em suas instâncias, entre elas o IHGB. O uso político do espaço foi
eficiente enquanto discurso exatamente por não ter sido posto de maneira
94
transparente, anunciada. Estava implícito e arraigado na elite pelo conjunto que as
características relembradas acima impunha no traço social brasileiro.
Os estudos sobre o pensamento geográfico brasileiro precisam incorporar esse
apego ao “chão” como base das falas e políticas que definiram o Império de Dom
Pedro II. Além do mais, mesmo que quiséssemos considerar a Geografia isolada
enquanto disciplina, não poderíamos nos deter apenas à sua cooptação no âmbito
do IHGB. No período monárquico, além de uma geografia para o poder (que estava
expressa também nos bancos escolares do ensino regular proferido), existiam os
geógrafos e nosso primeiro trabalho de fôlego nesta área.
No país, o esforço inaugural para compreender o meio natural em suas
relações com a ação humana foi proferido pelo conhecido Senador Pompeu em seu
Compêndio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil, de 1856. Nesta
obra, que se espelhava nas novas concepções que vinham da França, ele utilizava
princípios de outras disciplinas e relacionava, por exemplo, clima com políticas
sanitárias, discutia a realidade da seca e a melhor forma de utilização da água
disponível, entre outras questões inéditas a então. Por sua posição ideológica
liberal, apresentava uma definição do território relacionada ao povo de maneira
distinta da ensinada na escola: considerava este como “alma do paiz (...) se
felizmente governado” (SOUZA NETO, 1997, p. 76). Por uma série de inovações,
sobretudo metodológicas, este Compêndio se distanciou de uma tradição descritiva
e pode ser considerado a primeira tentativa de se fazer uma geografia científica por
aqui.
Nestes termos, supera a importância do livro Corografia Brazílica (Relação
Histórico-Geográphica do Reino do Brazil), escrito em 1817 (ainda no período
joanino) pelo padre português Aires de Casal e tido como a primeira produção
geográfica do país. Mesmo não sendo um trabalho apurado, pois ignora os
preceitos científicos da época, a compilação que Corografia fez dos dados
existentes sobre o país acabou por torná-la a principal referência para o Império e
para os compêndios geográficos produzidos na Europa. Seu prestígio foi diminuído
apenas quando da publicação da obra do Senador Pompeu e da tradução para o
português de importantes textos sobre o Brasil escritos por estrangeiros e para
trazidos por Capistrano de Abreu, também divulgador no país da Antropogeografia
de Ratzel (CAMPOS, 2004, p. 46).
95
Enquanto estas inovações não se verificavam, o texto de Casal forneceu a
base para o reduzido material escolar produzido no Brasil, denotando um ensino
oficial simplório, descritivo e atrasado no seu tempo. No contexto do projeto
nacional em implantação, não havia um sistema uniforme de ensino e de alcance
nas províncias. Existia inicialmente apenas a preocupação de educar os filhos dos
seus dirigentes, criando alguns cursos superiores e regulamentando suas formas de
acesso. Com a complexidade gradual das populações urbanas ao longo do culo,
a escola foi sendo vista como instrumento de ascensão social e experimentou uma
certa expansão, mais em termos quantitativos do que qualitativos. No conjunto, o
ensino secundário ficou sob a responsabilidade da iniciativa privada e o primário
sob a tutela do Estado (ROMANELLI, 1991).
Apesar de garantido na Constituição em seu artigo 179, o ensino primário foi
delegado às municipalidades por lei de 1827. Por conta das dificuldades em seu
cumprimento, o Ato de 1834 “outorgou às províncias o direito de legislar sobre a
instrução pública, com exceção dos cursos superiores e do ensino da capital do
Império, responsabilidades do poder central” (CAMPOS, 2004, p. 48). Mesmo com
tais mudanças, tratava-se de um ensino elementar que priorizava os “instruções
pátrias” e conteúdos compartimentados nas disciplinas. A exceção foi o Colégio
Pedro II, criado em 1837 na corte para funcionar como modelo e, nos dizeres de
Schwarcz (2000, p. 151), “foi o único que, de certa forma, escapava ao ensino
excessivamente livresco, anticientífico e pouco abrangente da época”.
A nação, portanto, confirmava a sua intenção de mais incutir um dado ideal do
que ofertar conhecimento efetivo à sua população. E esta sequer estava abrangida
por este serviço, reforçando a questão dos semióforos que eram produzidos para o
cotidiano da vida social. Quanto à educação formal, esta era para poucos: os
“mappas” e estatísticas divulgados oficialmente (como, por exemplo, os incluídos
em alguns dos relatórios dos presidente da província que consultamos e que estão
indicados na bibliografia desta tese) mostram que, em seus últimos anos, o Império
tinha ainda 4/5 de sua população livre analfabeta, taxa que atingia mais de 99%
entre os cativos.
O interesse pela formação cidaatravés da educação foi restrito a tal ponto
de não existir cursos para formação de professores no Brasil até 1880, sendo os
critérios para a seleção dos instrutores para a educação básica a maioridade,
96
moralidade e amizade.
33
Mais uma vez confirmamos que nossas elites, “filhas
legítimas da Europa” como as demais do continente americano, na contingência de
construir uma organização autônoma nos moldes da nação, o fizeram mais para si
do que para o conjunto de “brasileiros”. Esta esteve:
Entre o país real dos escravos e miseráveis e o país oficial da elite
dos bacharéis e barões do café. Entre a multidão dos analfabetos e a
limitada camada culta. Entre o interior arcaico e a capital
europeizada. Entre as modas modernas nas ruas e a precariedade da
vida nos cortiços. Entre uma política clientelística de favores e o
arcabouço de um Estado parlamentar. Entre o exercício cotidiano das
práticas mais tradicionais da colonização portuguesa e o desprezo
pela herança ibérica, sublimada em nome do progresso e das Luzes
do século (NEVES, 2002b, p. 546).
Ao relembrar dos teóricos da nação trazidos a esta tese, constatamos que a
“comunidade imaginada” (Anderson) constituída pelo projeto nacional imperial se
distanciava da principal característica do Estado moderno (ou seja: a simbiose
construída entre Estado e nação através da simultaneidade e reciprocidade entre a
burocratização da autoridade pública e a extensão dos mecanismos de cidadania)
(Tilly e Bendix), pois, ferindo a equação que nivela nação, Estado e “povo soberano”
(Hobsbawm), não concebia a idéia de um grupo populacional assistido em ampla
maioria por direitos iguais. A “homogeneização” da população aqui serviu mais para
a criação de uma identidade que permitisse o sentimento de pertencimento ao todo
imperial, sem o compromisso desse Estado com mecanismos efetivos de
compensação dos recursos extraídos de seus (obedientes) membros. Do ponto de
vista do território, este conseguiu sustentar um estatuto nacional e centralizado. Em
especial, através do viés geográfico do IHGB, reafirmamos a eficiência do uso
político do espaço no período imperial de tal sorte que, por exemplo, a maior parte
das nossas fronteiras estava definida antes da República.
34
Observar a natureza da
questão territorial no Império será o próximo passo.
33
As Escolas Normais existiam no Brasil desde 1830 (com a criação da primeira em Niterói) e
foram poucas que a sucederam no período imperial: Salvador (1836) e São Paulo (1875/1878)
(ROMANELLI, 1991). No entanto, em seus currículos, não existia disciplinas voltadas para o fazer
pedagógico. Suas aulas eram de gramática portuguesa, primeiras letras, francês, inglês, geografia,
história, latim, matemática, filosofia moral e racional, grego e retórica (RIO DE JANEIRO, 1843). A
exceção foi a Escola Normal do Rio de Janeiro, criada em 1880.
34
O lema da integridade territorial estava dado no Império, o de sua integração ficaria para o
momento histórico seguinte juntamente com a questão do federalismo.
97
2.3. A base material da nação
Para uma elite que se definia como “representante das idéias da Ilustração”
(GUIMARÃES, 1988), construir um país, afora os interesses mais imediatos do
mundo econômico e político, significava levar a civilização aos povos e ocupar o
solo. Esta era a fórmula a ser seguida e através da qual a população foi pensada
apenas como instrumento do processo. As “ideologias geográficas” subjacentes a
esses interesses nos levam a pensar no papel representado pelos núcleos urbanos
como espaço preferencial para a manifestação e reprodução dos semióforos
nacionais. Também de se reafirmar a cidade como articulador de uma rede
através da qual os fluxos aconteciam. Neste sentido, destacamos o seu caráter
regional como profícuo caminho para a análise do rebatimento no território
fluminense das determinações históricas analisadas até o momento.
Precisamos verificar a afirmativa de que a essência do controle territorial
alvejado pelo poder central era a região, sendo esta atingida na prática através dos
aglomerados urbanos subjugados para confirmarem o Império. Entender o processo
de transformação de espaços em território imperial requer, inicialmente, que se
discorra sobre o conceito de “território” e sua relação com a instância de um poder.
No entanto, é necessário ainda observar a natureza do território herdado pela
colônia e das poticas efetivas de domínio territorial implantadas pela monarquia,
bem como enquadrar as discussões sobre região e cidade neste contexto.
Em primeiro lugar, quanto ao território, é importante perceber que se trata de
um dos conceitos fundamentais do pensamento geográfico e que encerra uma
diversidade de concepções no âmbito desta ciência. Em nosso trabalho, ele é
entendido como:
Um espaço onde se projetou um trabalho, seja energia e informação,
e que, por conseqüência, revela relações marcadas de poder. (...) o
território se apóia no espaço, mas não é o espaço. É uma produção a
partir do espaço. Ora, a produção, por causa de todas as relações
que envolve, se inscreve num campo de poder (RAFFESTIN, 1993, p.
144).
Esta concepção considera o território posterior ao espaço e nos possibilita
considerar três vertentes possíveis para a sua interpretação: uma jurídico-política
que se refere a ele como um espaço delimitado e controlado a partir de um poder de
98
caráter estatal; uma cultural(ista) que, priorizando dimensões simbólicas, o vê como
“produto da apropriação feita através do imaginário e/ou identidade social sobre o
espaço”; e uma vertente econômica que o destaca “em sua perspectiva material,
como produto espacial do embate entre classes sociais e da relação capital-
trabalho” (SPOSITO, 2004, p.18). O fundamental aqui é perceber que estas
dimensões não são excludentes e, ao contrário, devem se justapor para a
apreensão do conceito em tela.
Ao lembrar que um dado território sempre encena uma materialidade como
fundamento para o seu sustento econômico, político e de identificação cultural de
um grupo, Souza (2001) enfatiza a existência de múltiplos territórios na
contemporaneidade e colabora para a visão de que estes não se limitam a uma
ideologização a partir de um poder centralizador como o Estado. No entanto, para o
nosso caso, o processo inverso nos possibilita ver que se o postulado acima é
correto também o é o fato de que não separação entre Estado e território. Com
efeito,
Num sentido mais restrito, o território é o nome político para o espaço
de um país. Em outras palavras, a existência de um país supõe um
território. Mas a existência de uma nação nem sempre é
acompanhada da posse de um território e nem sempre supõe a
existência de um Estado. Pode-se falar, portanto, de territorialidade
sem Estado, mas é praticamente impossível nos referirmos a um
Estado sem território (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 19).
Assim, fica posto que observamos o território como sinônimo de “espaço
geográfico” e o entendemos como central para a compreensão das diversas etapas
da história humana ao tratá-lo como unidade e, ao mesmo tempo, diversidade. Por
isto, a nossa preocupação com as escalas e a opção pelo viés metodológico
geográfico-histórico.
A questão que nos move a partir deste momento é a que se refere aos usos do
território em suas formas hegemônicas. E aqui nos referimos tanto à implantação de
infra-estruturas quanto aos mecanismos que dinamizam a economia e a sociedade
(padrões de localização das atividades produtivas, movimentos da população e leis
de caráter civil, fiscal ou financeiro). Admitindo o pressuposto de que a história dos
territórios é a história dos movimentos que lhes dão fluidez, interessa-nos apreender
as formas jurídicas e políticas presentes no Império do Brasil. Entendemos que tais
99
movimentos não se realizam sem uma regulação política e também econômica e
que, se quisermos dar conta desse olhar geográfico sobre a sociedade, temos que
perceber que este arcabouço condiciona e reflete a instituição de “regiões do
mandar” e “regiões do fazer”. Atentar para estas questões no processo histórico é
desafio que apenas pode ser tomado a partir do instrumento da periodização. Isto
devido ao fato de que o território, a cada momento, denota processos mais breves e
outros mais duradouros e não se caracteriza por uma linearidade dos fatos,
acumulando defasagens e superposições.
No esforço de compreensão da história do território brasileiro, importantes
pensadores propuseram diferentes periodizações a partir de variáveis distintas da
realidade. Apenas para citar alguns clássicos, lembremos que o Império (em si,
delimitado por critérios políticos que lhes dão início e fim) é observado por diversas
fases e elementos conforme mostrado no Quadro 1 a seguir.
Quadro 1: Inserção do Império em distintas periodizações da História do Brasil
Autor Obra Período em que o Império se insere
Argemiro
Jacob Brum
O desenvolvimento
econômico brasileiro
1500/1930: Longa fase agro-exportadora
Caio Prado
Jr.
Formação do Brasil
contemporâneo
1808/1850: Era do liberalismo e fim do pacto colonial
1850/1889: Império escravocrata e aurora burguesa
Celso
Furtado
Formação econômica
do Brasil
Século XIX: Economia de transição para o trabalho
assalariado
Florestan
Fernandes
A revolução burguesa
no Brasil
1808 até meados do XIX: Eclosão do mercado
capitalista moderno
Último quartel do XIX até década de 1950: Formação e
expansão do capitalismo competitivo
Elaborado a partir de SANTOS; SILVEIRA (2001, p. 24-27).
Considerando a dinâmica dos eventos históricos, chamamos a atenção para o
fato de que ao geógrafo cabe a missão de compreender o território como um misto
de registros materiais e representações. Ele é reflexo e condição para as
sociedades e estes aspectos impõem variáveis distintas das utilizadas por outros
especialistas na análise das formações humanas. Portanto, nesta tese, a partir de
importantes contribuições olhamos para a nação através do seu território,
estudamos o Império por seu ordenamento político e territorial. E, neste sentido,
julgamos conveniente tecer comentários sobre os usos predominantes no período
anterior à Independência para compreender em que bases ocorreram as políticas
imperiais no trato com o seu “chão”.
100
O aparato da empresa colonizadora tinha na ocupação do solo o seu impulso
fundamental. No Brasil, Portugal assegurou um território continental e nele
introduziu uma certa unidade jurídica e administrativa que escondia diferenças
regionais marcantes. Interessa-nos observar as caractesticas do território naquele
momento e iniciamos com a falsa idéia de uniformidade contida na expressão
“Brasil Colônia”.
Vale lembrar que em meados do século XVII convivem no atual
território brasileiro distintas zonas de soberania: além do estado do
Brasil, também o do Maranhão (o primeiro respondendo na época ao
Conselho de Portugal, e o segundo diretamente à corte de Madri), o
Brasil holandês (ou Nova Holanda), o território livre de Palmares
(soberano em seu espaço) e os territórios missionários (de ambíguas
relações de obediência, formalmente vinculados à Coroa espanhola
ou portuguesa, mas também respondendo ao comando papal)
(MORAES, 1991, p. 169).
Com os tratados de Madri (1750) e de Santo Ildefonso (1777), a colônia tem
seu espaço ampliado e as diferenças se acentuam. No extremo sul, os campos de
criação de gado levavam uma existência quase autônoma. No centro, extensas
áreas se mantinham aberas à ocupação portuguesa. A região mineira
ensimesmara-se após o apogeu. No interior nordestino, as fazendas de gado
conservavam-se imunes as autoridades e mecanismos de controle centrais. No
litoral, a faixa entre Recife e Rio de Janeiro configurava a única porção da colônia
com relações efetivas. No entanto, ela era descontínua e marcada por rivalidades
regionais.
O espaço brasileiro ainda não se consubstanciava efetivamente como território
sob um comando central. Nas capitanias
35
situadas onde atualmente identificamos
as regiões Nordeste e Sudeste, as relações sociais eram definidas a partir dos
grandes proprietários rurais, ávidos por poder junto ao Estado português. Falamos
de um contra-poder à Coroa de caráter regionalista e formado por oligarquias rurais
com forte poder político local e mesmo regional. Esta realidade o foi vista, por
exemplo, nas áreas da atual região Norte onde “a atividade extrativista, com base
no trabalho indígena, não estabeleceu a propriedade privada, não criou uma classe
de proprietários fundiários” (NOGUEIRA, 1999, p. 70). Muitos autores falam em um
35
Em 1759, as capitanias hereditárias foram abolidas pelas reformas pombalinas, sendo
transformadas em capitanias régias. Entre 1808 e 1821, o termo “capitania” se confundia com
“província” na legislação e na fala cotidiana.
101
arrivismo como marca histórica dos seus mandatários, sobretudo quando do
posterior advento dos seringais. A diferença entre tais regiões fazia com que fossem
mais intensas as relações da Amazônia com Portugal do que com as demais áreas
da costa brasileira.
Dizíamos em nota anterior que era evidente a divisão entre as capitanias do
norte e as do sul e este fato tornou-se traço na nossa cultura em inúmeros
momentos. Quando da constituição do Reino Unido de Portugal e Brasil, surgiram
nas da Amazônia duas frentes políticas com defesas dissonantes em relação aos
acontecimentos:
(...) uma, composta por comerciantes reinóis, defendia a tutela
colonial [não tinham interesse em subordinar-se ao Rio de Janeiro];
outra, apesar de composta por fazendeiros e proprietários de
engenho, não possuía qualquer poder de intervenção na
administração provincial [mas conseguiu articular ainda colonos e
índios contra o domínio português no Pará], e propunha autonomia
36
(NOGUEIRA, 1999, p. 71).
Apesar dessas dissonâncias e da desarticulação do espaço, a empreitada
lusitana conseguiu instalar um aparato produtivo que, diferente do que foi visto em
outros pontos do mundo colonial da época, não partiu de uma infra-estrutura
territorial pré-existente. Neste sentido, a colônia brasileira foi uma invenção
portuguesa baseada em “um padrão extensivo de ocupação do solo aliado a um
padrão intensivo de apropriação dos recursos” (MORAES, 1991, p. 170) que carecia
constantemente de abundante mão-de-obra e terras.
No plano político, a instituição do Governo Geral
37
pleiteava um centro de
comando com poderes para fundar vilas e povoações, conceder sesmarias para a
instalação de engenhos de açúcar ou qualquer outra atividade econômica, explorar
e descobrir terras no sertão, exterminar corsários, edificar fortes e construir navios
para a defesa da terra, garantir o monopólio real sobre a exploração do pau-brasil e
36
Esta realidade originaria depois um dos mais fortes movimentos contrários ao Império, a
Cabanagem. Após esse evento, a Amazônia apenas voltaria ao cenário nacional no final do século
XIX com a exploração da borracha em grande escala. “As províncias da Amazônia, até a ascensão da
borracha como principal produto econômico, viviam reclamando maior atenção do poder central.
Achavam-se desprestigiadas em diversos sentidos, principalmente quanto aos gastos do governo
com o incentivo à colonização e imigração para o sul do país” (NOGUEIRA, 1999, p. 72).
37
Perdurou até 1808 sendo que seus governadores foram chamados de vice-reis a partir de 1720.
Em todo caso, contavam com a assessoria de um provedor-mor (responsável pelas finanças e
cobrança de impostos), um ouvidor-mor (juiz) e um capitão-mor (militar responsável pela defesa da
terra e da costa).
102
fazer alianças com tribos para a catequese. É notório o fato de que a maior parte
destas funções se referia à conquista do solo. Diante das dificuldades de um poder
centralizado, tais atribuições foram divididas com as classes latifundiárias regionais
que assumiram o controle dos órgãos políticos locais e regularam a sociedade e o
território.
A subdivisão política-administrativa dos territórios atendia sobremaneira as
questões de justiça coercitiva e fisco. No interior das capitanias, as Câmaras
deliberavam pela criação de vilas ou de novas freguesias e comarcas
38
. Em alguns
casos, desmembrava-se a própria capitania para melhor gerência dos fluxos
econômicos, garantindo segurança aos negócios régios. Foi o caso da de Minas
Gerais, separada em 1720 da de São Paulo e Minas do Ouro, de 1709. Esta
capitania ainda seria desmembrada para o surgimento da de Goiás e de Mato
Grosso conforme mostra o mapa a seguir.
Mapa 2: Desmembramentos da Capitania de São Paulo no século XVIII
Base cartográfica: IBGE (2007).
38
Adiante, nos deteremos com mais vagar no tema das freguesias e comarcas.
103
O contexto da exploração aurífera é revelador das posturas de Portugal em
relação ao controle das parcelas rentáveis da colônia. As decisões não se
inscreviam apenas na construção de objetos geográficos (fortes, registros, acessos,
etc.) para dinamizar territórios, mas chegavam à proibição de determinados fluxos.
Para evitar o contrabando, foram vetadas a abertura de caminhos e a circulação por
alguns já abertos.
Diversos foram os alvarás e ordens régias nesse sentido. Em 1701,
foi emitida uma ordem proibindo a comunicação da Bahia para as
Minas, que foi estendida, em 1704, à capitania do Espírito Santo. Em
1727, uma ordem régia vetava a abertura de picadas entre as Minas
Gerais e as minas de Cuiabá e as de Goiás. Em 1733, ficou proibida
a abertura de quaisquer caminhos para as regiões de mineração já
descobertas sem autorização prévia por parte da Coroa. E, em 1736,
a ocupação de todas as regiões ainda não povoadas da capitania foi
oficialmente proibida (PIMENTA, 1971, p. 22-23).
Através do trabalho de Soares (2008) sobre a expansão da rede urbana
mineira na segunda metade do século XVIII, podemos visualizar um território que foi
se equipando com marcos da administração portuguesa em tempos de vigilância
redobrada. Em poucas décadas, o aparato real implantou ou fez surgir no território
cidades, vilas, sedes de freguesias, sedes de comarcas, registros, presídios,
capelas, aldeamentos, além de fazendas, caminhos, pontos de pouso para tropeiros
e pontos de trocas de mercadorias.
Dentre essas formas, as vilas e cidades detinham um papel preponderante na
hierarquia administrativa e serão consideradas adiante. Destacamos os registros e
os presídios como ilustração das poticas coloniais para o estrito controle territorial
e suas atividades econômicas. Os primeiros, comuns em todo o Brasil, tinham um
caráter fiscal e, na maioria das vezes, eram constituídos por um casebre ao longo
dos caminhos. Neles, trabalhavam um funcionário do provedor-mor e outro do
ouvidor-mor na coleta de impostos “de passagem” sobre mercadorias, anotando e
controlando a entrada e saída desses produtos em suas regiões de atuação.
Cresciam em número de acordo com a intensificação dos fluxos econômicos e
localizavam-se, preferencialmente, em pontos do território que dificultassem o
desvio das tropas por rotas alternativas. Alguns desses registros, que também
fizeram parte da política imperial, chegaram a originar arraiais ou vilas em várias
capitanias ou províncias.
104
Quanto aos presídios, podemos ressaltar que foram característicos das áreas
de fronteira e dos sertões de floresta no século XVIII e serviam para o
estabelecimento militar destinado à defesa do território, ao trato com os índios
“brabos” e ao controle do contrabando. Eram tidos como local de degredo por terem
seu efetivo composto por homens livres pobres, recolhidos compulsoriamente em
rondas nas vilas entre aqueles sem ocupação permanente e, por isto, considerados
“vadios”. Foram essas construções a forma encontrada pela Coroa para a
imposição de sua posse nas áreas de acesso mais difícil.
Expressão de conquista, as vilas e cidades constituíam o locus da
administração régia na colônia. Desde o início das capitanias, várias vilas foram
criadas por iniciativa dos donatários a quem competia definí-las, segundo o foro e
os costumes do Reino, com seu termo, jurisdição, liberdades e insígnias
respectivas. Reproduzindo a ordem política da sociedade ibérica, tendo por base as
instituições romanas, os municípios foram criados como entidade político-
administrativa cujas funções deveriam corresponder aos princípios estabelecidos
nas ordenações do rei e autoridades metropolitanas. As cartas de doação dos
capitães, assim como os forais, delegavam poderes aos donatários e grandes
senhores para receberem como patrimônio os ofícios das alcaidaria-mores e para
criarem e proverem alguns dos ofícios municipais, como tabeliões do público e do
judicial. Com isso, reproduziam os privilégios que o rei concedia para que as “coisas
da justiça e governança” fossem corretamente administradas e sua autoridade fosse
sentida e observada no novo território.
A literatura específica recente tem mostrado que a história territorial brasileira
tem sido um contínuo processo de ocupação que acentuou, no período colonial, o
papel de determinados “funcionários do urbanismo”.
39
Esta produção acadêmica
conta ainda com variados textos preocupados em evidenciar o fato de que foi
transferida, nos primeiros séculos de nossa história, a responsabilidade pelas
39
Expressão apresentada por Araújo (1998) para enfatizar a idéia de uma política portuguesa de
caráter urbano durante nossa colonização. Entre os aspectos mais particulares de suas
considerações, está o fato de que antes do século XVIII os nossos antigos “funcionários do
urbanismo” eram clérigos, engenheiros militares e “homens bons” da colônia. Diante do Iluminismo e
de suas idéias de que o Rei seria o representante do povo, e não de Deus, a questão do poder
público sobressaiu nas políticas portuguesas, inclusive nas de caráter urbano. Como conseqüência, o
Estado deixou de delegar ao privado as funções relativas às suas cidades e iniciou a formação de
“pensadores” em instituições próprias que se constituiriam em uma nova elite. Marcamos aqui que,
antes das “aulas de arquitetura e fortificação”, fazer cidades (seu espaço interno) não era o que
podemos chamar de um serviço público. No máximo, construíam-se fortalezas uma vez que o objetivo
maior era o controle dos fluxos no espaço maior da colônia.
105
instalações e melhorias urbanas aos homens de posse, comerciantes e aos
religiosos, que pela escassez de uma legislação civil sobre o assunto, estabeleciam
determinações eclesiásticas sobre a estruturação da cidade e seu cotidiano.
O conjunto de assentamentos urbanos criados no período colonial, o caráter
desta iniciativa, as funções que desempenhavam e sua estruturação interna são
aspectos que têm possibilitado o debate sobre uma política territorial portuguesa
eminentemente urbana. Não se trata de discutir apenas se no Brasil houve
determinações prévias para o traçado das cidades nos moldes do que ocorrera na
América espanhola, discussão esta iniciada com a célebre indicação feita por Sérgio
Buarque de Holanda de que as cidades portuguesas aqui instaladas eram
desprovidas de planejamento. Trata-se mais de refletir sobre uma urbanística
portuguesa como elemento de sua geopolítica para a colônia. Trata-se da
territorialização de suas políticas através do instrumento urbano. É este o viés
aceito para se repensar a história colonial pelo seu fenômeno citadino.
Em termos quantitativos, valem os números trazidos por Aroldo de Azevedo
em estudo clássico:
Seria esse o panorama urbano do Brasil no momento em que se
libertou do domínio português: 12 cidades [Belém, o Luís, Oeiras,
Paraíba (atual João Pessoa), Olinda, Salvador, Mariana, Cabo Frio,
Rio de Janeiro, São Paulo, Goiás, e Cuiabá] e 213 vilas, fortemente
concentrada na Região Leste, onde indubitavelmente se situava o
“coração” do país, num amplo triângulo isósceles, cujos vértices
poderiam ser representados por Salvador, Rio de Janeiro e Vila Rica
(AZEVEDO, 1992, p. 56 e 58).
Com o conjunto de mecanismos considerados até aqui, o aparato jurídico
institucional da Coroa portuguesa assegurou ao Brasil um território que não
estabelecia um contínuo espacial, abrangendo o litoral do nordeste, o recôncavo da
Baía de Guanabara, os estuários e baixadas costeiras como a santista, além de
uma interiorização do fato urbano nas Minas Gerais e Goiás e, em menor escala
devido ao seu caráter esporádico, na bacia amazônica e no golfo maranhense. Era
este o espaço geográfico sobre o qual o Império iria construir sua nação,
aprimorando-lhe alguns instrumentos da política territorial, mantendo outros, e
buscando a centralização até então apenas formal.
A divisão político-administrativa do Brasil no final do peodo colonial com as
suas cidades e vilas está representada no mapa a seguir:
106
Mapa 3: Divisão político-administrativa e povoamento no Brasil (1822).
Base cartográfica: IBGE (2007) e AZEVEDO (1992, p. 56).
A divisão territorial do Império manteve a tradição das capitanias, mudando-
lhes o nome para províncias. No entanto, em relação à representatividade, aquelas
vinham passando por mudanças importantes desde 1811 com a criação de juntas
eleitas regionalmente para auxiliar a administração geral. Pela primeira vez, era
estabelecida uma instância intermediária entre as localidades e a capital. Mas foi
por decreto de 1821 que se criou o modelo administrativo que seria mantido por
todo o peodo imperial: aquele constituído por juntas provisórias de governo
formadas através do voto dos eleitores de paróquias nas províncias. A este
107
mecanismo, se somou o citado Conselho de Procuradores Gerais das Províncias
com status de Conselho de Estado, criado em 1822 em meio a crise político-
institucional quando da independência e confirmado pela Carta de 1824 em seu
Capitulo 5º, conforme mostrado a seguir.
O Ato Adicional de 1834 também manteve estes Conselhos, ampliando-lhes o
número de representantes: 36 em Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro, Minas
Gerais e São Paulo; 28 no Pará, Maranhão, Ceará, Paraíba, Alagoas e Rio Grande
do Sul; e 20 nas demais. No entanto, foi com a Lei de Interpretação de 1837 que a
relativa autonomia experimentada pelas províncias seria abolida, encaminhando o
Império para a centralização política que lhe caracterizaria.
Sustentada por forte determinação econômica, a concentração do poder foi a
maneira encontrada no Segundo Reinado para a efetivação do projeto imperial da
nação. E esta requeria, para a apropriação dos espaços, um aparato administrativo
que preterisse a autonomia das localidades. Recuperando o que foi construído
sobre este aspecto até aqui, podemos lembrar que:
O programa da unidade implicava a subordinação das oligarquias ao
centro político. O centralismo político e administrativo do Império
brasileiro, que consagrou o poder do Executivo sobre as esferas
regionais e locais, evidenciava a distinção entre o Estado e as
oligarquias. O traço centralista aparece na Constituição de 1824 em
todos os lugares, mais caracteristicamente na abordagem da divisão
espacial do território. As províncias funcionavam unicamente como
circunscrições territoriais da unidade geral. A divisão do território
circunscrevia-se apenas à dimensão administrativa, não possuindo
nenhuma substância política. Ou dito de outro modo, a atividade
108
política tinha por condição a lealdade à integridade territorial do
Estado e implicava a renúncia à própria representação de espaços
políticos regionais (MAGNOLI, 2003, p. 295).
Posição semelhante também foi defendida por Gouvêa (2008), em texto datado
de 1989, quando afirmava que:
Para estabelecer e organizar um complicado conjunto de instituições
administrativas e políticas, o governo central progressivamente editou
um complexo conjunto de leis. Essas peças legislativas se formaram
em meio a disputas e conflitos, através dos quais o grupo fluminense
[os “saquaremas”] pôde emergir como núcleo vital do grupo
governante do Brasil, após 1837. (...) tendo em vista o processo de
centralização política estabelecido por aquela legislação, muito pouco
foi deixado sob a responsabilidade das instituições políticas e
administrativas provinciais (...) (GOUVÊA, 2008, p. 76).
Entretanto, a feição centralista desse período brasileiro encontra nesta mesma
autora um ponto de inflexão em trabalho mais recente ao observar o intricado jogo
de interesses e instituições regionais que se articulava na esfera geral. Para ela:
A política imperial por certo foi algo mais complexo e sofisticado do
que o simples favoritismo e clientelismo geridos a partir do Rio de
Janeiro. Nesse sentido, uma significativa descontinuidade em relação
ao período colonial deve ser apontada, na medida em que haviam se
constituído espaços de representação dos interesses
regionais/provinciais, o que no período colonial se restringia ao
âmbito das célebres câmaras. O estrangulamento político,
institucional e fiscal das províncias foi, porém, traço marcante do
período monárquico, ensejando inúmeros debates e críticas
extensivos ao Poder Moderador (GOUVÊA, 2002, p. 599).
A discussão que levaria ao federalismo se nutria também do caráter
patrimonialista da sociedade. A ação do Estado Imperial se espraiava por todos os
setores da vida cotidiana e era percebida com preocupação entre os distintos
segmentos políticos. o ilustrativas as falas mostradas a seguir do conservador
José de Alencar no jornal O Protesto, reproduzido por Vitorino (2002), e do liberal
Tito Franco D’Almeida em seu Balanço do Império:
109
(VITORINO, 2002, p.161).
(D’ALMEIDA, 1877, p.169).
Como indicou Faoro, na segunda metade do século XIX, estava em
funcionamento a dominação patrimonial do Estado imperial através do centralismo
de praticamente todas as atividades desenvolvidas no país. No entanto, a partir da
ascensão liberal no cenário potico seriam mais constantes e efetivos os embates a
este status quo. Foi o momento em que um discurso federalista ganhou ênfase
através de grupos que nele viam uma forma de garantir a descentralização e o
aumento da autonomia local reivindicada pelas oligarquias regionais. Embora seu
discurso pregasse inspiração no modelo institucional norte-americano, o federalismo
que aqui foi defendido e o próprio instalado com a República deste se distanciou.
A despeito de sua origem na Europa da época da Revolução Francesa através
do pensamento de Kant, o federalismo alcançou sua plenitude enquanto idéia na
segunda metade da década de 1780 nos Estados Unidos. Escrito para ratificar a
Constituição implantada naquele país, o clássico O Federalista reunia artigos de
Alexander Hamilton, James Madison e John Jay e, de forma pioneira, formulava
110
uma teoria sobre a implementação do Estado federal. Em seus textos, defendiam o
princípio de que um efetivo Estado de direito constitucional apenas poderia realizar-
se plenamente ao adotar uma substancial distribuição das competências através de
um executivo e um judiciário com funções e características do Estado federal. Este
sistema seria estabelecido com instituições garantidoras de um poder central
fortalecido. De contrapartida, uma outra corrente de pensamento polarizou a
discussão e, representada por Thomas Jefferson, defendia a descentralização do
poder para salvaguardar a livre iniciativa e o empreendedorismo dos proprietários
privados.
Mais que a hamiltoniana, foi esta segunda vertente da tradição federalista
norte-americana que chegou, com variações, ao Brasil e a muitos países latino-
americanos no culo XIX. Desta forma, o “federalismo entre nós significava e
significa descentralização, self-government, condição para a liberdade, se não a
própria liberdade(CARVALHO, 2001, p.15). Diferia da matriz da América do Norte
uma vez que o seu princípio básico não era o de unir territórios sob o julgo de um
poder centralizador, mas o de manter uma união destes através do primado regional
(STEPAN, 1999). Voltamos a enfatizar a matriz territorial daquele período. Seguindo
a inflexão apontada por Gouvêa (2002) e depois de considerar o conceito de
território (seu uso no período colonial e disputas no Império), um enquadramento
sobre região e cidade se impõe.
O conceito de região, em diferentes abordagens, tem sido uma constante nos
estudos da Geografia. Para Fonseca (1999), cinco são as suas concepções que têm
prevalecido desde o final do século XIX: região singular, região como classe de
áreas, região de vivência, região do capital e região de poder. Um primeiro enfoque
a ganhar vulto foi a explicação ambientalista da realidade regional defendida pelo
alemão Ratzel, que vinculava a existência de diferenças regionais às formas
naturais distintas de cada porção do planeta. Não tardaria para essa corrente
determinista ser combatida pelo pensamento possibilista, desenvolvido por
franceses, notadamente Vidal de la Blache. Para este, o homem interfere na
natureza de acordo com os seus valores culturais e nível de conhecimento e isto faz
com que cada sociedade crie seu próprio espaço ou suas regiões singulares.
A partir destas abordagens, estruturou-se o conceito de região geográfica (de
acordo com a literatura francesa) ou o de região-paisagem (seguindo pensadores
alemães e norte-americanos). Para todos, caberia ao geógrafo o estudo, ainda que
111
descritivo, sobre os fenômenos naturais e humanos que baseavam as
singularidades observadas nas diversas áreas conhecidas do planeta. Neste
contexto, Hettner, na Alemanha, defendendo o conceito de região-paisagem como
síntese e objeto da Geografia, se destacou por indicar que a simples descrição dos
fenômenos observados não permitiria a explicação das formas regionais e que, para
tal empreitada, estudos mais dinâmicos ofertariam resultados proveitosos. Ainda no
início do século XX, nos Estados Unidos, Sauer (que valorizou a análise cultural das
regiões-paisagens) e Hartshorne (que, para além do objeto, estava preocupado com
o método da Geografia, defendendo o regional como o único possível para integrar
fenômenos heterogêneos) ofereceram importantes contribuições ao debate.
Uma guinada significativa foi apenas observada a partir dos anos de 1950 com
a forte influência do pensamento positivista lógico e dedutivo que adjetivaram o
método científico da época como teorético-quantitativo. No contexto da Geografia, a
região passou a ser vista como uma criação intelectual definida a partir de
instrumentos classificatórios utilizados amplamente nas ciências naturais. A análise
numérica e estatística ficou evidente e Corrêa (1986, p. 32) nos lembra que a região
era definida como uma classe de área ou “um conjunto de lugares onde as
diferenças internas entre esses lugares onde as diferenças internas são menores
que as existentes entre lês e qualquer elemento de outro conjunto de lugares”.
Buscando a explicação das diferenças regionais via padrões espaciais
quantificados, esta abordagem utilizou fartamente o arsenal de teorias de
localização e de desenvolvimento regional ou existentes ou desenvolvidas
naquele contexto. São exemplos: a Teoria do Estado Isolado de Von Thunen (de
1826)
40
, a Teoria da Localização Industrial de Alfred Weber (1909)
41
, a Teoria das
Localidades Centrais de Walter Christaller (1933)
42
, a Teoria dos Pólos de
40
Von Thunen procurou demonstrar que o padrão locacional e as especializações sub-regionais da
agricultura alemã estavam relacionados a três fatores básicos: produtividade física da terra, distância
aos mercados e custos de transportes. Assim, uma forma elementar de configuração das relações
cidade-região seria a relação cidade-campo que conforma o Estado Isolado segundo o autor.
41
Weber, levando em consideração a importância do mercado de trabalho e das economias de
aglomeração, procurou enfatizar o papel dos custos de transportes de matérias primas e dos produtos
acabados, bem como a localização dos mercados consumidores na determinação da localização
industrial.
42
Christaller, em sua teoria, introduz o conceito de centros urbanos e argumenta que a concentração
das atividades econômicas ocorre nessas áreas.
112
Crescimento de François Perroux (1950)
43
, a Teoria da Propagação das Ondas de
Inovação de Hagerstrand (1953) e a Teoria Centro-Periferia de J. Fiedman (1969).
Segundo Corrêa (1994), uma crítica contundente a tais posturas foi
desenvolvida a partir dos anos de 1970 quando a análise regional passou a se
fundamentar no materialismo histórico e dialético e na Geografia humanista e
cultural que se desenvolvia. É neste período que o tema da região passou a ser
interesse efetivo de outras áreas do conhecimento humano, ganhando outros vieses
analíticos. Um deles, apesar das críticas, é o que busca a identificação do indivíduo
em suas relações de classe e lugar através de teorias behavioristas dando ênfase
na percepção subjetiva da região. Autores de peso nesta abordagem são Tuan
(1980) e Fremont (1980) que passaram a valorizar a consciência a as atitudes dos
indivíduos em relação ao seu espaço circundante, uma vez que, para eles, tais
indicadores expressam as representações do cotidiano e criam laços de afetividade
do ser social e o lugar. Foi deste segundo autor a expressão “espaço vivido” que,
considerado em toda sua complexidade, revelaria as distintas realidades regionais.
Um outro viés anatico ganhou força a partir dos anos de 1970 e se nutriu de
uma base materialista-dialética para dar à região uma visão totalizante.
Diferentemente das anteriores, a região passou a ser vista como uma materialidade
resultante de processos econômicos desiguais e combinados que consubstanciam a
acumulação capitalista. Lipietz (1988) foi importante no debate ao enfatizar que a
região é resultante de modos de produção diferentes que geram espaços desiguais.
Entre nós, Oliveira (1981), analisando o Nordeste brasileiro, marcou que as regiões
são decorrentes das distintas formas pelas quais o capitalismo se reproduz,
influenciadas ainda pelo peso que a esfera política desempenha nas conformações
regionais. Acreditava ele (e este ponto tem sido amplamente refutado na atualidade)
que as regiões tenderiam a desaparecer devido ao dinamismo do sistema capitalista
que tenderia à homogeneização dos espaços.
Neste viés da análise, a região passou a ser entendida como uma totalidade
menor onde se combinam elementos da esfera geral (que tem o modo de produção
capitalista como elemento uniformizador) e da particular (as determinações do lugar
como elementos diferenciadores). Acrescentando a esta linha a leitura da região
43
É Perroux quem desenvolve a idéia de polarização de um lugar central subjacente ao conceito de
região. Ele define região por sua natureza econômica e por sua posição de força no contexto da
hierarquia urbana, resultando em “regiões pólo” e “regiões dominadas” (GARCIA; LEMOS, 2004).
113
como uma totalidade social, Costa (1988, p. 25) a define como “um espaço o
institucionalizado como o Estado-Nação, de identidade ideológico-cultural e
representatividade política articuladas em função de interesses específicos,
geralmente econômicos, por uma fração ou bloco ‘regional’ de classe que nele
reconhece sua base territorial de reprodução”.
Neste caminho aqui esboçado, nos permite observar que a análise regional
superou o determinismo ambiental (empirista, indutivo, positivista, endógeno e
singular) para assentar-se em um outro tipo de determinismo, igualmente
problemático: o econômico (materialista e dialético, exógeno e global). Sendo
assim, no conjunto da discussão, diferenciam-se aqueles que têm privilegiado a
análise sob a ótica da dimensão política, até então colocada em segundo plano ou
omitida nos textos e debates. Autores como Claval (1979) e sobretudo Raffestin
(1993) e Lacoste (1988) se destacam no contexto. Tentando entender a
organização espacial das sociedades, Claval se lança, mesmo de uma forma mais
generalista, à análise política da região e nos oferece um estudo sobre a origem e
dimensões do poder puro e complexo, abrangendo desde as sociedades arcaicas
até sua atualidade. No entanto, são os outros autores citados que executam um
trabalho detalhado sobre o poder na conformação das sociedades e de seus
territórios, reforçando a tese de que não emana apenas do Estado, mas também de
grupos individuais e coletivos.
Para Raffestin, as diferenças regionais são explicáveis a partir do momento
que se compreende que as representações simbólicas projetadas no espaço
expressam as relações de poder nos distintos grupos sociais. O estudo do poder,
em uma análise relacional, é o que deve estar, para o autor, na base das análises
regionais. Tomando também o fato político para explicar a dinâmica interna das
distintas formações territoriais, Lacoste utiliza o termo “geopolítica interna” para
dizer que as relações de poder entre os atores sociais de um lugar ou de uma
região, suas contradições, seus mecanismos de articulação e os seus
desdobramentos territoriais em diferentes escalas podem ser explicados quando se
percebe o valor estratégico da região no contexto do Estado-Nação.
Identificamos neste arsenal teórico as questões que circunscrevem o nosso
objeto de estudo em suas relações com as redes técnicas do mandar e do fazer
estabelecidas no território como instrumento para viabilizar a circulação e a
114
comunicação.
44
Raffestin nos mostra como elas se adaptam às variações do espaço
e às mudanças que advêm do tempo e como são móveis e inacabadas. Para ele, “a
rede faz e desfaz as prisões do espaço tornado território: tanto libera como
aprisiona. É porque ela é instrumento, por excelência, do poder” (RAFFESTIN,
1980, p.185).
Esta noção de primeira importância no tratamento da nossa questão é
encontrada também em Lefèbvre e Claval. O primeiro chama a atenção para os
objetos geográficos que permitem a transformação do espaço em território e o
segundo nos faz pensar sobre a mobilidade das idéias e ordens que as redes
permitem realizar. Um ponto que merece atenção neste trabalho de tese é a
propriedade da “conexidade” inerente a rede. Os “nós” são assim lugares de
conexões, de poder e de referência, como sugere Raffestin. É pela conexidade que
a rede solidariza elementos e, ao mesmo tempo, tem o potencial para excluí-los.
As principais matrizes interpretativas da região foram apresentadas para que
pudéssemos observar como a Geografia, disciplina-mãe deste conceito, tem
oferecido elementos para a sua construção e como tais podem ser ampliados e/ou
utilizados no âmbito das demais áreas do conhecimento. Buscamos pensar no
espaço transformado pelos aspectos econômicos, políticos e culturais no processo
histórico com o qual a noção de região, como categoria analítica, expressa uma
especificidade, configurando um espaço particular dentro de uma determinada
organização social mais ampla.
A operacionalização do conceito em tela, doravante reconhecida como
regionalização, se refere ao estabelecimento de uma divisão espacial em “porções”
com características sociais, culturais, ambientais e econômicas semelhantes entre
si e distintas das apresentadas nas demais com as quais constituem o território.
Nosso interesse é pensar a lógica no território fluminense. Acreditamos na premissa
de que o nível de serviços ofertados por uma localidade, seu poder político e
44
Neste caminho, pensemos que toda a história das redes técnicas é a história de inovações que
uma após as outras surgiram em resposta a uma determinada demanda social. Uma leitura atenta
nos mostra o quanto as inovações nos transportes e nas comunicações redesenharam o mapa do
mundo, sobretudo no século XIX. De uma forma geral, as trilhas e os caminhos foram substituídos
pelas estradas de ferro no transporte de bens e mercadorias e o advento do telégrafo e telefone
incrementou a circulação das ordens. Estas inovações modificam os espaços que, atingidos por
linhas de sistemas técnicos permitiram maior velocidade na circulação de bens, de pessoas e de
informações, cumprindo sua razão primeira de ser: agilizar o sistema socioeconômico que as
desenvolveu. No mundo capitalista de então, observou-se a habilidade com a qual as classes
burguesas influenciavam a organização do espaço através dos investimentos nestes sistemas de
infra-estrutura, diferenciando regiões dentro da divisão territorial do trabalho.
115
simbólico foram, no período trabalhado, os indicadores mais evidentes da
capacidade de polarização que os núcleos urbanos teriam que exercer. Lembramos
que o que se quer enfatizar é a função de pólo aglutinador das foas regionais
desempenhada por determinados núcleos urbanos da província, demarcando áreas
de influência. Estas levavam em conta o poder de atração dado pelo gradiente de
trocas com a capital e pela superação das distâncias, vista a urgência conferida às
matérias que se relacionavam com a abertura de caminhos e custos com o
transporte de uma forma geral. Em muitos casos, a incorporação de determinadas
parcelas do território passava primeiro pela instituição desses núcleos urbanos.
Por fim, observar teoricamente a constituição das cidades brasileiras em
momentos pretéritos, no que diz respeito às suas características e relações, não é
uma tarefa das mais simples visto que o arcabouço conceitual sobre o tema e sobre
a área do conhecimento humano em que está inserido apenas se institucionalizou a
partir do final do século XIX. Lembremos, por exemplo, que na tradição geográfica,
são numerosos os estudos sobre hierarquia e natureza das redes urbanas. No
entanto, tais questionamentos apenas foram colocados a partir das primeiras
décadas do século passado e têm na Teoria dos Lugares Centrais sua principal
referência teórica. Assim, a despeito do fato de que muitos autores têm dado
contribuições importantes para as discussões e de que não faltam textos clássicos
sobre o assunto, a questão dos conceitos a serem considerados para a análise das
formações urbanas do passado continua posta.
No contexto de uma ex-colônia que se torna Império quando o mundo, liderado
por forças econômicas provenientes do continente europeu, caminhava para a
afirmação e expansão do capitalismo em sua fase industrial, tomamos a cidade
como um ponto do espaço geográfico que, inicialmente vista como expressão de
controle sobre um território conquistado e como símbolo de poder e civilização,
avança na apropriação dos excedentes agrícolas, canalizando e controlando a
produção rural para exportação. Mais: se seguirmos Corrêa (2006) e utilizarmos o
termo “rede urbana” como o conjunto de cleos urbanos funcionalmente
articulados entre si ou a um núcleo principal através de acessos materializados no
território, poderemos falar em uma divisão territorial do trabalho que enfatiza o papel
da rede urbana através das funções de suas cidades.
De uma forma geral, no Brasil, as cidades se configuravam de acordo com o
modelo espacial mais simples de rede urbana (o dendrítico, orientado sobremaneira
116
pela conformação fluvial existente) e caracterizava-se pela primazia de única cidade
que, muitas vezes sendo a mais antiga, representava a porta de entrada e de saída
de sua hinterlândia. Este modelo, herança do passado colonial, expressava o
processo econômico de remessa direta dos produtos aos mercados externos à
região explorada. de se constatar, neste caso, que: 1) as mediações e fluxos
pouco complexos neste modelo de rede determinam o beneficiamento da cidade
principal em detrimento das demais e 2) o processo evolutivo da organização
espacial tornou a rede urbana mais complexa, mas não eliminou, de um todo, a
herança deixada pela forma dendrítica original da rede considerada.
Em nosso olhar sobre o Brasil do passado, uma direção que nos parece
oportuna é a que relaciona cidade e região, através dos circuitos ou redes criadas
entre os núcleos que emergiam no território, mostrando como determinada cidade
espelhou a região em que estava inserida e, por outro lado, como determinadas
regiões refletiram a ação dos atores hegemônicos urbanos a elas associados.
Quando se pensou em um projeto nacional para o Brasil, as redes imaginadas
e/ou criadas desempenhariam papel primordial na unidade territorial e na
articulação do Império ao circuito econômico que se mundializava. Sabemos que a
constituição de uma rede urbana no país ocorreu de forma lenta nos quatro
primeiros culos, ditada pelo ritmo da exploração do vasto território e marcada por
baixas densidades, e que apenas no último quartel do XIX, esta dinâmica sofreu
alterações significativas. A partir desta consciência e dos elementos trazidos até
aqui, tomamos o território fluminense e sua sociedade nobiliárquica e estratificada
como recorte para nossos estudos sobre a estruturação de um território em relação
direta com a construção da nação.
117
3. Cidade e nação na província fluminense
A província do Rio de Janeiro ocupou lugar de destaque no Império brasileiro
não por ser a porção territorial que envolvia diretamente a capital, mas por que foi a
responsável pela maior parte da renda que sustentou o regime monárquico. A
expansão e o auge da cultura cafeeira em terras fluminenses coincidiu com a
afirmação e o ápice do Estado imperial. Os barões do café que a província produziu
fincaram seu poder não apenas em suas fazendas ou vilas próximas (muitas criadas
ou promovidas por eles neste momento de afirmação), mas principalmente na Corte
onde se faziam decisivos na cena política e determinavam os rumos da nação
brasileira.
Não sem complexidades, reafirmamos o Rio de Janeiro como centro das
disputas travadas no Império e pólo irradiador dos semióforos nacionais, sobretudo
após a conciliação entre saquaremas e luzias. Apesar das descontinuidades físicas
herdadas da colônia e que o país tentou superar, pensamos que a província
também pode ser vista como espelho do que foi experimentado naquele momento
em termos de administração pública e suas relações com as ações privadas.
Ao lembrar de Machado (1990), enfatizamos os acordos necessários entre
centralização e interesses regionais para o estabelecimento da unidade territorial
como unidade política. Assim, ao se defender a primeira assegurava-se na verdade
a propriedade privada da terra e de escravos e a reprodução de uma organização
social e do trabalho, afastando a possibilidade de ameaças representadas pelos
movimentos urbanos em sua maior parte.
É no trato destas questões que olhamos para o espaço fluminense. As
ideologias geográficas que permearam as teias do poder estabelecido denotaram
um uso do território igualmente hierarquizado e baseado na busca por regiões de
domínio. Neste cenário complexo, o café e as cidades nos parecem instrumentos
para tal intento.
Entendemos que para perceber o conjunto das interferências no espaço da
província durante o período imperial não podemos deixar de aludir ao papel que a
cultura cafeeira representou neste processo, seja no chamado “sertão do oeste”
118
(capitaneado por Vassouras) ou posteriormente no “sertão do leste” (cujo pólo foi
Cantagalo). No entanto, uma cultura do açúcar consolidaria uma pujança no norte e
noroeste do território (liderada pela cidade de Campos) e um boom da extração de
sal em Cabo Frio traria ainda algum destaque em termos de relevância territorial. Do
outro lado da moeda, o desenvolvimento técnico dos transportes e mais
especificamente a construção de ferrovias da mesma forma que criaria uma
intensificação dos projetos econômicos de dadas porções do Rio de Janeiro
também faria com que outras experimentassem o isolamento e a perda de
importância relativa entre os “lugares” da província.
Como dizíamos, todas estas questões são essenciais para se entender o
conjunto das interferências no espaço da província durante o período imperial. Mas
discorrer sobre o território legado pelos anos de colônia é essencial para entender
os nexos desse processo. Afinal, a permanência de expressões como “certão
d’oeste” ou “certão d’leste” em momentos de afirmação de uma civilidade associada
a ambientes urbanos é, no mínimo, motivo para curiosidade.
3.1. O território legado
foi dito que o mecanismo jurídico-administrativo de controle territorial que
Portugal utilizou no Brasil era baseado nas doações feitas em Cartas de Sesmarias
que, destacadas do domínio público, viriam a constituir-se em terras de domínio
privado. Neste contexto, as terras que pertenceriam à província fluminense se
inseriam na Capitania de São Vicente, na de São Tomé (depois Paraíba do Sul) e
na pequena Capitania Real do Rio de Janeiro (inserida no interior da primeira).
Sobre a constituição desse território, é importante relatar que:
Martim Afonso de Souza foi contemplado com 100 léguas de costa,
sendo a Capitania que lhe foi doada denominada São Vicente e
dividida em dois lotes. O primeiro com 55 léguas, tendo o rio Macaé
como marco inicial, ia ate o rio Carupacê ou Juquiriquerê; apos a
expulsão dos franceses e tamoios, em 1567, este, em virtude do
abandono do donatário, reverteu a Coroa, passando a denominar-se
Capitania do Rio de Janeiro. O segundo lote, um pouco menor, com
45 léguas, com inicio na foz do rio São Vicente, ia findar-lhe na Ilha
do mel, a entrada da baia de Paranaguá. A Pero de Góis da Silveira
119
foi destinada à área compreendida entre a foz do rio Itapemirim, no
paralelo 21, e a do rio Macaé, conforme o Alvará expedido em 10 de
marco de 1534, confirmado pela Carta de doação de 28 de janeiro de
1536, denominado Capitania de São Tome e, posteriormente,
capitania do Paraíba do Sul. Não tendo contudo, Pero de Góis, em
face dos constantes ataques dos goitacazes, condições de honrar os
seus compromissos, mormente o assumido com o negociante e
armador lisboeta Martim Ferreira, da exportação anual de alguns
milhares de arrobas de açúcar e dar continuidade à empresa, apos
refugiar-se no Espírito Santo, manifestou o referido donatário, por
carta de 29 de abril de 1546, o abandono da capitania. Setenta e três
anos mais tarde, em 1619, o seu filho, Gil de Góis da Silveira, a ela
renunciou a favor da Coroa. Em 1709, e criada a Capitania de São
Paulo e Minas do Ouro, a qual, em 1720, se divide em duas,
constituindo-se, respectivamente, as de São Paulo e a de Minas
Gerais, estabelecendo-se novos limites com as capitanias do Rio de
Janeiro e a de São Tome. Dentro da área territorial dessas duas
capitanias, teve assento à província fluminense, ao ser instituída pela
Carta de 25 de marco de 1824 e corporificada através do Ato
Adicional de 12 de agosto de 1834. Com a criação das províncias do
Rio de Janeiro e a do Espírito Santo, a divisa estabelecida
inicialmente pelos donatários pero de Góis e Vasco Fernandes
Coutinho, tendo por marco o paralelo 21, é deslocada para o rio
Itabapoana. Dentro desses limites especificados, formou-se o
território do Estado do Rio de Janeiro (ABREU, 1994, p. 5-6).
Podemos dizer a sua ocupação inicial foi motivada pelo receio português em
relação à presença francesa na região. É neste contexto, inclusive, que se em
1565 a fundação da cidade do Rio de Janeiro, tomada por este título por ter sido
instituída pelo poder real. A despeito da feitoria de Cabo Frio, este foi o primeiro
assentamento urbano verificado no nosso recorte espacial e o tardaria a
monopolizar os fluxos que foram se estabelecendo no seu entorno, consolidando-se
como entreposto portuário e comercial. A partir deste ponto na entrada da Baía de
Guanabara, a ocupação da região se estendeu pela própria Baixada da Guanabara
e seguiria em direção a serra e à Baixada Campista (LAMEGO, 1963).
Nesse processo, o governo português atuava para assegurar sua possessão
distribuindo sesmarias. Ao final do século XVI, parte do entorno da cidade do Rio de
Janeiro estava ocupado e, em seguida, seria estendida o povoamento tanto do
litoral sul (através da fundação de Angra dos Reis e do surgimento da vila de Parati)
quanto da costa em direção aos lagos (a exemplo de Cabo Frio). A área campista,
que pertencia à Capitania de São Tomé, teve suas terras anexadas à Capitania do
Espírito Santo por conta das constantes lutas entre seus donatários e a população
local. Na área, já existia alguns arraiais e a Vila de São José, de 1677.
120
O início da ocupação do território fluminense esteve integrado ao processo
maior de articulação primitiva do capital mercantil açucareiro. Portanto, a
dinamização que ele iria experimentar se deu por conta dos engenhos de açúcar
instalados no interior da Baía, além da atividade de exploração de madeira. Nos
dois casos, o estabelecimento de diversos portos fluviais foi essencial para viabilizar
o escoamento da produção e a estruturação física daquele recorte. Fridman (1999),
no capítulo “Cidades flutuantes”, já se debruçou sobre esta questão mostrando
como estes portos e as inúmeras fazendas do recôncavo da Guanabara traduziam a
associação da iniciativa privada à empresa colonizadora portuguesa. Empresa esta,
que na região fluminense muito deveu aos engenhos. Com efeito:
Dos séculos XVI até o XX, a cana de açúcar representou a principal
atividade econômica da Baixada, estabelecendo-se logo após a
expulsão dos franceses em 1567. A chamada “zona velha” do açúcar
se caracterizou pela existência de médias e grandes propriedades
que se instalaram principalmente próximas às bacias dos rios Meriti,
Sarapuí, Iguaçu, Pilar, Saracuna, Inhomirim, Suruí, Magé,
Guapimirim, Macacu e Guaxindiba. O bom êxito dessa cultura,
aclimatada à região, concorreu para a multiplicação dos engenhos
que se espalharam desde os extremos costeiros de Parati e escarpas
serranas até as planícies de Campos (CRHYSOSTOMO, 2003, p.
149).
É importante observar que, desde esse momento, durante o século XVII, a
economia do Rio de Janeiro foi baseada nessa produção de açúcar e aguardente a
ponto de todas as demais atividades se submeterem aos movimentos desta
produção. Cabe frisar que Campos se destacaria neste contexto e a colônia como
um todo, favorecida por incentivos do governo português e por um cenário
internacional favorável, viria este produto suplantar em importância econômica a
exploração de madeira que tanto rendera aos cofres portugueses. de se
destacar também que a maioria das unidades produtoras da região era formada por
pequenos engenhos utilizando-se de técnicas rudimentares em glebas que haviam
servido de teste com a pecuária.
Um outro ponto a se marcar é o fato de que os donatários desempenhavam as
funções de produtores, exportadores e responsáveis pelo comércio em suas terras.
Este, de fato, não chegou a promover o povoamento da colônia nem nas poucas
capitanias em que o empreendimento colonial surtiu resultados efetivos. Podemos
dizer que praticamente não existia comércio nos pequenos povoados em uma
121
realidade distinta dos principais portos. No processo de expansão da cana para
regiões mais distantes, portos como o de Angra e Parati, ao sul, e o de São José da
Paraíba do Sul (atual São João da Barra), no norte, assumiram a centralização da
produção local e o recebimento de produtos que chegavam de Portugal pelo porto
do Rio de Janeiro.
Por terra, os caminhos ainda eram insuficientes para um povoamento. Mas não
era esta a única questão. O fato de não haver, naquele momento, uma ocupação
nas áreas mais altas da capitania ocorria por conta de impedimentos técnicos
relativos à:
(...) barreira da Serra do Mar e ao (...) relevo compartimentado de
planalto neste trecho e sua cobertura florestal contínua (...) a
inexistência de um curso fluvial navegável e (...) ausência de trilhas
indígenas, que orientassem a penetração dos primeiros exploradores,
impediram, por dois séculos a expansão para o interior a partir do Rio
de Janeiro, ao contrário do que se daria em Santos e São Paulo,
onde apesar da mesma barreira (...) as demais condições eram
favoráveis (LIMONAD, 1996, p. 84 apud BERNARDES, 1964, p. 58).
Com a prosperidade açucareira, a cidade do Rio de Janeiro continuava sendo
a única aglomeração naquelas extensões. Somando-se às indicações de
Bernardes, lembremos do fato de que donatários geralmente dividiam com
subalternos mais próximos a missão de fundar vilas para melhor prestar serviço a
Coroa, possibilitando um quantitativo maior de núcleos nessas capitanias em
detrimento das reais. Talvez estas condições reunidas expliquem a dinâmica na
Capitania de São Vicente (da qual faziam parte Angra dos Reis e Parati) e na
Capitania do Espírito Santo (para a qual foram incorporadas Campos e São João da
Barra em 1753).
Aliás, esta incorporação aconteceu no momento em que a região se
consolidava como a principal produtora de açúcar face ao declínio desta atividade
no recôncavo da Guanabara. A população rural de Campos que era de
aproximadamente 12.000 habitantes em 1752 alcançava os 50.000 em 1814
(BERNARDES, 1957, p. 197). A autora ainda nos informa que no fim do século XVIII
mais da metade dos engenhos fluminenses estava em Campos e esta dinamização
da produção fizera com que alguns centros de comercialização surgissem no início
do XIX, como foram os casos de Macaé (que existia como aldeamento defensivo
desde 1615) e Maricá (que seria anexada logo depois à povoação de Praia Grande,
122
futura Niterói). Este aspecto difusor de uma hegemonia local verificado em Campos
se deveu em grande parte à precariedade de sua ligação com o Rio de Janeiro.
Tanto que sua produção era escoada pelo pequeno porto de o João da Barra e
depois pelo de Macaé.
45
Afora a iniciativa de particulares no uso do solo e na gestão da economia,
outros agentes fizeram parte da empresa portuguesa de colonização. Como parte
da política da metrópole, o território da colônia também foi tomado por aldeamentos
e freguesias. Os primeiros serviam para a submissão dos indígenas, usando-os no
domínio do território, na segurança dos caminhos e na produção econômica, e
existiam desde 1575. Tais aldeamentos consistiam em uma das formas comuns de
origem de núcleos urbanos no período colonial. Além da Aldeia de Nossa Senhora
das Neves de Macaé, citada, existiram na área do atual estado do Rio de Janeiro
as de São Lourenço (Niterói), São Barnabé (Itaboraí), São Francisco Xavier
(Itaguaí), Nossa Senhora da Guia (Mangaratiba), São Pedro (Cabo Frio), Sacra
Família de Ipuca (Casemiro de Abreu), Santa Rita (Cantagalo), Santo Antônio de
Guarulhos (Campos), São Fidélis de Sigmaringa (São Fidélis), São Jo de
Leonissa ou da Pedra (Itaocara), Santo Antônio de Pádua (Santo Antônio de
Pádua), São Luis Beltrão (Resende), Nossa Senhora da Glória (Valença) e Santo
Antonio do Rio Bonito (Conservatória).
Por sua vez, as freguesias eram divisões administrativas submetidas à
jurisdição espiritual de um representante da igreja católica, que exercia a
administração civil em nome do rei. Fridman (2008) lembra que, em meio à estrutura
eclesiástica centralizadora, o expediente das freguesias favoreceu o envolvimento
maior de cada pároco com as famílias locais do que com o bispo que lhe era
superior. Enfatiza ainda o caráter local da vida política ao lembrar que o fato de
pequenas povoações sempre se iniciarem a partir de cruzeiros ou capelas
demonstra um “sistema patriarcal do domínio político” e uma mistura entre a coisa
pública e o negócio privado na ordem espacial. Um esquema revelador do
surgimento de muitas vilas e povoados na colônia por este processo é ilustrado a
seguir.
45
Apenas no século XIX, iria se desenvolver uma relação de dependência entre o Rio e Campos.
Macaé, a meio caminho, seria a “porta para o norte fluminense”.
123
Figura 1: Surgimento e evolução de núcleos urbanos coloniais a partir de um marco religioso.
Fonte: MACEDO (2002, p. 163, a partir da reunião das imagens de MARX, 1991).
124
Para muitos estudiosos do assunto, de se pensar na instituição de
freguesias como uma decisão que imbricava uma ordem urbana de base patrimonial
e eclesiástica. Como foram constantes, suas instalações indicaram os locais de
povoamento nas capitanias e as conexões estabelecidas na região. Eram comuns
as doações de terrenos às igrejas com a recompensa em forma de postos na
hierarquia pública ou militar, estreitando os vínculos entre religiosos e a “nobreza da
terra”. Na área do atual estado do Rio de Janeiro, foram identificadas as seguintes
freguesias no último quartel do século XVIII: Nossa Senhora da Piedade orago do
Iguaçu; Nossa Senhora da Guia orago de Pacobaíba; Nossa Senhora d´Ajuda orago
da Ilha do Governador; Nossa Senhora do Desterro orago de Itambi; Santíssima
Trindade orago de Santíssima Trindade; Nossa Senhora da Conceição orago do
Alferes; São João Marcos orago de João Marcos; Nossa Senhora da Conceição
orago de Campo Alegre; São Tiago orago de Inhma e Sacra Família orago do
Caminho do Tinguá, São Salvador do Mundo orago de Guaratiba; Nossa Senhora
d´Ajuda orago de Guapimirim; Nossa Senhora do Amparo orago de Maricá; Nossa
Senhora de Nazaré orago de Saquarema; Santana de Macacu; Nossa Senhora da
Conceição, São Pedro e São Paulo orago da Paraíba caminho de Minas Gerais;
São Lourenço orago da aldeia dos índios; Nossa Senhora da Conceição orago de
Marapicu; São Francisco Xavier orago da aldeia de Itaguaí; o Barnabé orago da
aldeia dos Índios; Nossa Senhora da Conceição orago de Iguaba; Sacra Família
orago da aldeia de Ipuca; Nossa Senhora da Guia orago da aldeia de Mangaratiba;
Nossa Senhora da Conceição orago do Rio Bonito, Santíssimo Sacramento orago
de Cantagalo e São Sebastião orago de Araruama.
O Mapa 4 a seguir mostra a delimitação aproximada destas freguesias
desenhada por este autor para Fridman (2008) em seu trabalho a partir das
anotações realizadas pelo Monsenhor Pizarro (iniciadas em 1781 e publicadas em
1794) referentes àquelas localizadas no recôncavo norte ocidental, enseada de
Angra dos Reis e da vila de Santo Antônio de Sá (fundada em 1697 e atual
Cachoeiras de Macacu). A idéia era a de confirmar parcelas do território abarcadas
pela política portuguesa em parceria com agentes privados e a Igreja, tomados
como seus representantes em terras coloniais. Não significa que naquele período
toda a área do atual estado do Rio de Janeiro estivesse ocupada, mas denota o raio
de alcance em que a Coroa desejava que seus párocos atuassem.
125
Mapa 4: Freguesias fluminenses (Século XVIII e início IX)
Elaborado pelo autor para FRIDMAN (2008).
126
A divisão do território, tal qual o mapa mostra, nos a dimensão da
importância que os sistemas de comunicação deveriam desenvolver. De início muito
modesto, estes sistemas também se inserem na discussão que trouxemos sobre
uma política territorial portuguesa de caráter urbano. Na área em estudo, o
surgimento dos primeiros núcleos populacionais esteve associado à abertura
dessas vias de circulação. Se as primeiras seguiam o traçado das originais trilhas
indígenas, as seguintes estavam enquadradas em determinações para o
povoamento e que foram intensificadas em mero e em movimentação com o
advento da exploração do ouro nas Minas Gerais.
É fato que um primeiro surto urbanizador vivido na colônia ocorreu na região
mineira quando um grande contingente de populacional para convergiu, fazendo-
se necessária a infraestrutura para residência, consumo e trabalho. De lá, foram
estabelecidos os primeiros acessos efetivos vindos das capitanias do nordeste e
incrementados os abertos por bandeirantes vindos das “bandas do sul”. Entre 1711
e 1718, oito vilas surgiram na paisagem enquanto o conjunto de vilas e cidades na
área da província fluminense somava sete e não se ampliou mesmo com o fato da
produção ser escoada pelo porto carioca. Em “bandas de ”, apenas o pouso de
Paraíba do Sul viria a se estruturar e tornar-se povoação. A partir destas questões,
de se perceber o conjunto de cleos urbanos em terras fluminenses durante os
séculos XVII e XVIII conforme a tabela a seguir.
Tabela 3: Vilas e cidades fluminenses criadas durante o período colonial.
Município Ato de criação Instalação
Rio de Janeiro Ato de 1565 1567
Angra dos Reis Ordem régia de 1608 1624 2a vila
Cabo Frio Ato de 1615 1615
Parati Ordem régia de 1654 1667
Campos dos Goytacazes Ato de 1677/73 1677
São João da Barra Ato de 1677 1677
Santo Antonio de Alvará de 1697 1697 (Distrito extinto em 1908)
São Jose d`El Rei Alvará de 1772 1783 (Incorporado a Itaboraí em 1833)
Magé Ordem régia de 1789 1789
Resende Carta régia de 1786 1801
São João Marcos Alvará de 1811 1813 (Extinto em 1938)
Macaé Alvará de 1813 1814
Cantagalo Alvará de 1814 1815
Maricá Alvará de 1814 1815
Itaguaí Alvará de 1818 1820
Praia Grande (Niterói) Alvará de 1819 1819
Nova Friburgo Alvará de 1820 1820
Valença Alvará de 1823 1826
Fontes: ABREU (1994) e CIDE (1998).
127
A ação colonizadora consubstanciada na apropriação do território fez surgir
vilas e cidades, caminhos e pontos de pouso ou de comércio, além de portos e
ancoradouros. Esta retaguarda garantiu a prosperidade da cidade do Rio de Janeiro
que teve seu porto utilizado para remeça da produção local para o exterior e como
porta de entrada do território para os produtos que vinham da metrópole. A primazia
da cidade foi confirmada com o advento do ouro quando os produtos que nela
chegavam de Portugal passaram a abastecer as Minas Gerais, Goiás e Mato
Grasso e quando passou a ser a plataforma de exportação do ouro daquela
região.
46
O papel comercial desempenhado pela cidade ressaltava sua importância
política, cuja origem se manifestara desde 1572 quando fora escolhida sede do
governo do sul por conta da sua posição geográfica estratégica.
A cidade firmar-se-ia ainda como centro político, administrativo e financeiro de
uma sociedade dominada por Portugal quando adquiriu o status de sede da capital
do governo no século XVIII em meio ao desejo da metrópole de legitimar seu
território no extremo sul e impedir o contrabando do ouro. Ao longo de sua história,
a cidade incorporou papéis que lhes possibilitava funcionar como ponto de
drenagem de produtos, ordens e serviços em escala regional por assim dizer. Tal
situação seria exacerbada quando da chegada da família real.
A despeito do que acontecia nas baixadas e no litoral em termos de
incorporação efetiva do território à Coroa, o interior fluminense ainda era em boa
parte apenas espaço. Não muito distante do final do período colonial, os mapas
produzidos demonstravam como os seus “certões” ainda eram expressivos e
demandariam novas ações para o controle do território. Não foi sem propósito que a
carta régia de 18 de janeiro de 1751, endereçada ao governador, expressou ordem
de Dom José I para a domesticação do “gentio bravo” em todos os “sertões que
correm para a parte do norte da capitania”. Ver Mapa 5 a seguir.
46
em 1750, amplas regiões do oeste e do sul da colônia estavam atreladas ao porto e comércio do
Rio de Janeiro pelo Caminho Novo de Garcia Rodrigues, aberto em 1725, que saindo do litoral atingia
o Mato Grosso.
128
Mapa 5: “Certões” da Capitania do Rio de Janeiro no final do século XVIII
Base: Carta Geográfica da Capitania do Rio de Janeiro elaborada pelo Ajudante de Engenheiro João Jorge
Lobo em 1778 (Arquivo Nacional).
129
A ilustração nos mostra também que a área a ser ocupada pelo café era, na
época, um dos espaços a serem convertidos em território. Sobre a região, registrou-
se que os Coroados dificultavam o estabelecimento de “qualquer fabrica de açúcar
ou de aguardente” e “os poucos brancos viviam do cultivo da mandioca, do milho e
de alguns legumes e do comercio com os viajantes da Estrada Geral” (PIZARRO,
1945, vol. 4, p. 91).
Em sua expansão, o café traria à tona o expediente da ação colonizadora
urbana e, neste sentido, a importância da cidade é novamente acentuada.
Entendemos ser importante recuperar Ribeiro (2006, p. 177) quando diz que o
Brasil, surgido “pela via evolutiva da atualização histórica, nasceu como uma
civilização urbana” e que esta, “vale dizer, separada em conteúdos rurais e
citadinos, com funções diferentes mas complementares e comandadas por grupos
eruditos da cidade”. Ao longo da história brasileira, variadas têm sido as funções
desempenhadas pelos núcleos urbanos com o ritmo maior de sua apropriação:
suporte ao povoamento, centros de controle político e de armazenamento da
produção agro-extrativa, pontos de conexão com os circuitos mercantis, pólos de
crescimento industrial e ou os atuais nós de redes financeiras e informacionais.
Para Egler (2001, p. 38-9), entre nós, podem ser identificadas três formações
territoriais distintas, expressando as correspondentes relações entre cidade e
campo e entre as cidades no processo de desenvolvimento brasileiro: “escravista
atlântica”, “agro-mercantil nacional” e “urbano-industrial nacional”.
Ao lembrar da lógica de funcionamento do comércio triangular atlântico, o autor
destaca a necessidade de se melhor compreender o papel desempenhado pelas
relações cidade e campo em uma economia submetida ao monopólio mercantil e
controle metropolitano, durante a fase colonial, ou de estruturas de poder
oligárquicas e latifundiárias, durante o período de formação dos Estados Nacionais.
Voltamos ao questionamento que o professor Roberto Lobato Corrêa indicara sobre
um viés que assimilasse a história territorial brasileira a partir das relações entre
rede urbana e oligarquias ou, em outras palavras, o papel da cidade em tempos
pretéritos à afirmação do capitalismo e da ciência urbana.
Sobre esta temática, em meio às discussões mais atuais sobre a cidade no
passado, vale ressaltar que:
130
(...) destaca-se a comprovação de que a economia colonial era muito
mais complexa do que se pensava anteriormente, o que coloca em
xeque (ou relativiza) uma série de afirmações consagradas. É o caso,
por exemplo, das teses que (...) pregam a impossibilidade de
realização de acumulação endógena à colônia (...) (ABREU, 1996, p.
149).
O caso da cidade do Rio de Janeiro nos mostra que na fase “escravista
atlântica”, cidade e campo foram faces da mesma moeda consubstanciada pelo
estabelecimento mercantil, não havendo uma nítida separação de funções pois
estas eram complementares. A cidade era uma extensão do campo e do seu ritmo
dependia para definir seu fazer. De contrapartida, no contexto da formação e
consolidação nacional, o espaço urbano inicia um processo de diferenciação de
suas atividades em relação ao campo. As cidades começaram a adquirir funções
urbanas associadas à acumulação do capital mercantil e à sua aptdão financeira.
Mais ainda: até certo ponto, podemos perceber o fortalecimento de uma capacidade
endógena na cidade capaz de nutrir a produção no campo.
Pensamos ser importante trazer esta discussão uma vez que a cidade
oitocentista no Brasil, a tomar pelo exemplo fluminense, apresentou tais
características. As casas comissárias no Rio de Janeiro e as pressões dos
agraristas contra os novos ventos que chegavam da Europa ilustram este aspecto.
Ajudam também a entender como a base escravista que foi capaz de unir posições
políticas e ideológicas contrárias limitaria a expansão e acumulação ampliada da
economia nacional.
Para encerrar este item sobre o quadro do território fluminense anterior a 1822,
podemos sintetizar as transformações aqui observadas. Ao longo do período
colonial, sua área teve a ocupação e circulação determinados pelo ritmo e eficácia
da base técnica disponível e pelo conjunto de políticas portuguesas para o controle
territorial (sesmarias, fortificações, instituição de vilas e cidades divisão física em
freguesias e comarcas, aldeamentos, abertura de caminhos, registros, portos e
ancoradouros), muitas em parceria com a ação de particulares que tomavam para si
o ônus e o poder decorrente da conquista.
Até finais do século XVII, o espaço fluminense apresentava pequenos núcleos
(quase todos aldeias ou aldeamentos) localizados principalmente próximas aos
cursos de água. O controle da Coroa também se manifestava pela rede de
fortificações que foi se constituindo no entorno da baía de Guanabara e pela
131
atuação dos religiosos na cidade do Rio de Janeiro, nos seus arredores e,
posteriormente, em localidades mais distantes (levando a religião e a administração
portuguesa). A missão de “levar a metrópole para o interior” também foi dada aos
proprietários particulares que, explorando rotas e instituindo povoações,
estabeleceram as comunicações possíveis frente às condões do meio e á
presença indígena.
A abertura de picadas e caminhos, bem como o maior conhecimento e uso das
vias fluviais, marcaria um outro momento na ocupação fluminense. Desta vez, com
uma presença mais efetiva da Coroa por conta economia em torno do ouro.
Pensamos ser deste momento um primeiro desenho das regiões que
caracterizariam o território e que demandariam técnicas de circulação e comando
para a sua posterior incorporação efetiva e integração. Neste contexto, o processo
histórico definiria também os novos grupos que entrariam na disputa por poder
político, econômico, social e espacial.
Por fim, é importante indicar alguns vetores da ocupação fluminense
estabelecidos a partir da proeminência do Rio de Janeiro. Em direção à cidade de
Campos, a atividade açucareira fez surgir novas localidades na região norte e ao
longo do caminho até a capital (que subordinou inclusive todo o território em torno
de Vitória na capitania vizinha). Em direção à antiga área mineradora, a abertura de
caminhos havia estabelecido algum tipo de povoamento na “serra acima”, mas com
o declínio as áreas mais remotas subsistiram em torno de pequenos centros. Por
fim, em direção ao litoral sul, a realidade experimentada por Angra dos Reis e Parati
como entrepostos do açúcar, aguardente e ouro passava por um breve momento de
inflexão. Em todos os casos, o café traria uma outra dimensão para os fatos.
3.2. O movimento da economia fluminense e suas cidades
Nesta tese, havíamos marcado as principais linhas da expansão cafeeira no
Brasil. No entanto, agora nos interessa em particular a sua marcha no território
fluminense, onde se iniciou como uma cultura de quintas e chácaras em locais onde
hoje está o perímetro urbano carioca. Expandiu-se na velocidade do aumento de
sua cotação e consumo no mercado internacional e o seu vetor partiu do Arraial de
132
Mataporcos, no Estácio, e das serras da Tijuca, Gávea, Jacarepaguá e Campo
Grande, expandindo-se para a vila de o João Marcos e depois para o Vale do rio
Paraíba do Sul até Campo Alegre (atual Resende).
47
O Vale se constituiu em grande centro cafeicultor a partir da década de 1820 e,
naquele tempo, por toda parte não existiam mais terras disponíveis para plantar
café. Pois,
Depois que as minas de ouro começaram a se esgotar e a liberdade
de comercio passou a dar maior valor aos produtos coloniais, os
chefes de famílias voltaram as vistas para a agricultura e se pode
esperar ver multiplicarem-se, dentro em breve, os habitantes nas
vastas matas que margeiam a parte dos caminhos de Vila Rica mais
próximas do Rio de Janeiro (SAINT-HILAIRE, 1975, p. 40).
A região utilizada como passagem para as minas e os caminhos que haviam
sido abertos possibilitaram a ocupação do café no antigo eixo do ouro.
48
Além do
mais se encontravam condições favoráveis para o cultivo desta rubiácea:
importância e proximidade da cidade do Rio de Janeiro, fatores geográficas (terreno
sem escarpas ásperas, solo fértil, inclinações suaves na superfície do planalto),
recursos originários das minas e do setor de subsistência mercantil, além dos
referidos caminhos do ouro. Na seqüência, a Tabela 4 mostra a importância do café
para a economia da província fluminense e a Tabela 5 possibilita observar a sua
representatividade na renda geral do Império.
47
D. Jose Justiniano iniciou o cultivo em suas terras do Capão (Irajá) e distribuiu mudas e sementes
para outros padres. Entre eles estava o Pe Antonio Couto da Fonseca que as plantou em suas terras
em Campo Grande e no Arraial de Nossa Senhora do Campo Alegre, iniciando o cultivo no Vale do
Paraíba (MACHADO, 1993).
48
As picadas que partiam do litoral para as antigas regiões das minas foram aproveitadas no vale do
café a exemplo do Caminho Velho (que ligava Guaratinguetá a Parati e depois ao Rio de Janeiro
através de Itaguaí e Santa Cruz) e do Caminho Novo de Garcia Rodrigues Paes (conectando Paraíba
do Sul a Baia de Guanabara via Irajá ou o porto de Iguaçu).
133
Tabela 4: Principais receitas da província fluminense no ano financeiro 1841/1842
Imposto (Repartição): Total:
Dízimo do café 589:311$967
Patente sobre aguardente de consumo 48:103$400
Direitos de portagem 48:005$950
Legados e heranças 44:790$004
Dívida ativa 1832/1833 a 1841/1842 33:137$163
Meia siza 26:708$654
Décima urbana 15:995$152
Fonte: RIO DE JANEIRO (1843).
Tabela 5: Participações das províncias nas rendas gerais do Império (1859/1864)
Províncias Termo médio das rendas % do total das rendas
Rio de Janeiro e Município da Corte 26:914$000
54,45%
Pernambuco 6:066$000
12,27%
Bahia 5:771$000
11,68%
São Pedro (Rio Grande do Sul) 2:889$000
5,84%
Grão Pará 1:823$000
3,71%
Maranhão 1:535$000
3,10%
São Paulo 1:458$000
2,95%
Ceará 617$000
1,24%
Minas Gerais 585$000
1,18%
Alagôas 365$000
0,74%
Parahyba 351$000
0,71%
Paraná 202$000
0,40%
Sergipe 162$000
0,32%
Sancta Catharina 159$000
0,32%
Piauhy 151$000
0,30%
Rio Grande do Norte 129$000
0,26%
Matto Grosso 118$000
0,23%
Espírito Santo 66$000
0,13%
Goyaz 21$000
0,04%
Amazonas 17$000
0,03%
Total 49:402$000
100,00%
Fonte: VITORINO (2002, p. 157).
Com a consolidação da atividade ocorreria a ocupação efetiva deste interior
fluminense. A região serrana transformou-se com o café. Resende, que era apenas
um local de passagem dos povos de São Paulo e das Gerais, não tardaria a
constituir-se em ponto de difusão do café para Barra Mansa, Vassouras, Valença,
Paraíba do Sul e Barra do Piraí, sendo a primeira vila da serra (1801) e elevada a
cidade em 1848. Praticamente toda a província do Rio de Janeiro viveu alguma
experiência relacionada com o cultivo do café, inclusive áreas litorâneas. No entanto
os vetores de expansão foram bem definidos por uma conjuntura de fatores.
Cantagalo, por exemplo, foi lo de irradiação do café para a parte oriental da
região serrana (ocupada por indígenas em suas densas matas) como Resende era
134
para a parte ocidental (antes pouco circulada por tropas). Rapidamente, os cafezais
de Vassouras e Valença encontraram os de São Gonçalo e Cantagalo.
Vassouras era um simples pouso quando a região era ocupada por mineiros
que cultivavam o anil e criavam porcos e carneiros. Logo virou o centro dos grandes
latifundiários fluminenses. Esta ocupação foi devida à construção de variantes do
Caminho Novo em direção a Pati do Alferes, Pau Grande e Sacra Família do Tinguá
pela margem direita do Paraíba do Sul. Tornou-se símbolo da cafeicultura
fluminense e seus fazendeiros receberam importantes títulos nobiliárquicos,
fazendo-se presente nos salões da Corte e na arena política imperial. Era tempo de
saquaremas, conforme nos indicou Mattos (1994) quando destrinchou o “mundo do
governo” da época. “Mundo” este que também se representaria na idéia de
civilidade que estes nobres bebiam.
Quanto ao território desta região, a sua infra-estrutura herdada da colônia foi
prontamente adensada por novos caminhos e freguesias, além da constituição de
novos núcleos como se vê no Mapa 6 adiante.
Se o centro do café imperial era fluminense e era em Vassouras, outras
localidades iriam também se destacar em opulência e prestígio, ilustrando a forma
de tomada do território. Valença, que se tornou importante centro da região, era
antiga área indígena dos coroados que foram sendo exterminados na medida em
que o café avançava. Era um dos “certões” indicados no Mapa 5. Em 1789, Ignacio
de Souza Werneck havia subvertido os índios daquela localidade e depois se
tornara um dos grandes nomes da região. Segundo Pizarro, as orientações da
Coroa eram de “cultivar a terra bravia de indivíduos criados à lei da natureza (...)
agregar ao Estado tão numeroso povo, lançando-se o das terras por eles
ocupadas sem o menor beneficio da lavoura” (PIZARRO, 1945, vol. 5, p. 253). Em
1823, Valença era vila com território desmembrado de Resende e São João
Príncipe e em 1857 era cidade. Ainda floresceram na região os núcleos de Barra
Mansa (desmembrada de Resende), Piraí, Barra do Pirai e Paraíba do Sul,
formando as principais fortunas da época como no caso do Comendador Breves, do
Barão de Piraí e das famílias Werneck e Lacerda.
135
Mapa 6: Caminhos freguesias e aldeias na região de Vassouras no início do século XIX.
Confeccionado pelo autor para FRIDMAN (2005).
136
Este processo de ocupação urbana para e por conta do café pode ser
observado na Tabela 6 a seguir que traz o conjunto de núcleos urbanos em terras
fluminenses criados durante o período imperial. Ele ainda se acentua se
observarmos antigos povoados que foram elevados à vila naquele momento, como
foram os casos de Resende e Valença.
Tabela 6: Vilas e cidades fluminenses criadas durante o período imperial
Município Ato de criação Instalação
Mangaratiba Decreto de 1831 1833
Barra Mansa Decreto de 1832 1833
Itaboraí Lei Geral de 1833 1833
Paraíba do Sul Lei Geral de 1833 1833
Nova Iguaçu Lei Geral de 1833 1833
Vassouras Lei Geral de 1833 1833
Piraí Lei Provincial de 1837 1838
Saquarema Lei Provincial de 1841 1841
Silva Jardim Lei Provincial de 1841 1842
Estrela Lei Provincial de 1846 1846 (Extinta em 1892)
Rio Bonito Lei Provincial de 1846 1846
Casemiro de Abreu Lei Provincial de 1846 1859
Rio Claro Lei Provincial de 1849 1850
São Fidélis Lei Provincial de 1850 1855
Petrópolis Lei Provincial de 1857 1859
Araruama Lei Provincial de 1859 1859
Santa Maria Madalena Lei Provincial de 1861 1862
Sapucaia Lei Provincial de 1874 1875
Carmo Lei Provincial de 1881 1833
Sto. Antonio de Pádua Lei Provincial de 1882 1883
Itaperuna Lei Provincial de 1885 1889
Fontes: ABREU (1994) e CIDE (1998).
Ao considerar esse processo, Fridman (2005) sugere uma reflexão sobre o
padrão de ocupação territorial observado em suas relações com um projeto de
colonização articulado ao fazer urbano. Para a autora, uma onda colonizadora na
zona serrana do sertão do oeste fluminense foi levada à prática por cafeicultores,
colonos e escravos que estabeleceram a chamada “civilização do café”. E lembra
ainda que se Pombal havia determinado um processo de interiorização do
povoamento foi a partir da chegada de D. João VI e durante o século XIX que
ocorreram alterações territoriais através de uma política oficial vinculada a
interesses particulares da exploração do café.
A política de colonização também foi observada na região norte da província
como atesta o texto a seguir:
137
Tendo o Governo Geral concedido a esta província uma sesmaria de
144 légoas de terra quadradas, juntas ou destacadas, onde houvesse
terrenos devolutos, ordenou o Governo o estabelecimento de
Colônias nos Sertões da Pedra Liza em Campos lugar fertilíssimo e
com todas as proporções para taes estabelecimentos. Começarão no
anno findo os trabalhos da medição e tombamento, os quaes
interrompidos pela estação calmosa e pluvial, serão retomados em
Maio, e continuados com vigor; e além disto contractou o Governo
com o Belga Ludgero José Nélis, o estabelecimento de 40 Colonos
do mesmo lugar. Igualmente a receita para fazer face a este ramo de
serviço público tem de ser alcançada por empréstimo na forma da lei
(RIO DE JANEIRO, 1843, p.12).
A tabela apresentada anteriormente mostra ainda como a decisão política de
criação de vilas foi presente no início do período imperial e como ela esteve voltada
para a região cafeeira ou para as áreas de escoamento de sua produção. E, neste
sentido, os vetores que dinamizaram o território foram, conforme assinalados, os
que atingiam Resende e Cantagalo. Ao longo dos caminhos abertos, a expansão da
fronteira agrícola impulsionava as economias regionais e o crescimento das
atividades urbanas a elas relacionadas. Sobre a questão específica do trato do
território, ainda é importante frisar que a autora enfatiza que novos atores surgiriam
aliados à Igreja e prestigiados pelo Estado (quando não eram o próprio Estado).
Este surto urbano no território fluminense trouxe mudanças significativas como
a valorização do solo e a sua concentração, a expulsão dos posseiros das terras e a
transformação de significativa parte deste contingente em agregados das grandes
fazendas de café. E este dinamismo também se refletia no aumento da população
na região e o exemplo de Vassouras é ilustrativo: 20.589 habitantes em 1840
(sendo 14.333 escravos) e mais de 35.000 em 1850 (20.158 escravos). O aumento
populacional condicionava uma maior complexidade na vida econômica e social
através, por exemplo, da vinda de diferentes artífices, portugueses, imigrantes e
mascates para estes novos territórios. Além do mais, sobretudo os núcleos que
assumiam papel de liderança nesta nova rede regional, receberam os próprios
senhores de terra que passaram a optar por estabelecerem residência em palacetes
citadinos. Lá, ampliavam suas atividades econômicas (eram financistas, banqueiros,
etc) e seus horizontes culturais com os modismos modernos e “civilizados”.
No entanto, esta dinâmica haveria de ser possibilitada através de uma rede de
transporte que permitisse os fluxos crescentes de mercadorias e de população. Os
rios que do vale vinham para a baía foram importantes para o intercâmbio entre
138
serra e o porto do Rio de Janeiro. Neste movimento, muitos engenhos e fazendas
se estabeleceram e expandiram ao longo de canais como o Meriti, Sarapuí, Iguaçu,
Pilar, Saracuruna, Suruí, Guapemirim, Magé, Inhomirim, Macacu e Guaxindiba. Era
por estes rios que também subiam os desbravadores e parte do comércio de
mercadorias. A este tempo, os principais portos do fundo da Baía de Guanabara
eram os de Iguaçu (escoava a produção de Vassouras, Valença e Paraíba do Sul
antes da construção de ferrovia), Estrela (escoava a produção de Saracuruna) e o
das Caixas (pelo rio Macacu vinha o café do eixo oriental do vale, notadamente de
Cantagalo). Também portos no sul da província como Parati, Angra dos Reis e
Mangaratiba escoavam café, se especializando na produção que vinha da parte
mais ocidental do Vale, do norte paulista e da zona meridional de Minas.
Uma análise nos relatórios do Ministério do Império da época comprova um
interesse especial das autoridades da Corte a respeito desta região e, em especial,
na sua infraestrutura de circulação. Do conjunto das estradas mencionadas, por
exemplo, nos documentos dos anos entre 1832 e 1840, a maioria se refere a trechos
desta parte sul do território fluminense. Em termos absolutos, a Estrada da
Mambucaba a Angra dos Reis é citada em igual número ao Canal da Pavuna (obra
no município da Corte e de grande importância por conta da conexão que faria com
demais municípios da baixada). Ambos foram citados em cinco dos nove relatórios
editados no período indicado.
O papel estratégico desta região foi expresso em citações como:
O Governo não perde vista o melhoramento das estradas existentes,
que communicão entre si as quatro Provincias Rio de Janeiro, S.
Paulo, Santa Catharina, e S. Pedro; bem como a abertura de huma
estrada nova, que torne indicada communicação mais directa, e mais
facil; como porém elle não possue ainda todos os esclarecimentos,
que se lhe fazem indispensaveis para poder resolver-se com o preciso
conhecimento, espera que elles cheguem, e então dará a este objecto
o impulso, que os meios postos á sua disposição permittirem
(BRASIL, 1836, p. 38-39, grifo nosso).
Ou ainda quando o interesse centrou-se na agilidade das comunicações entre a
grande região cafeeira e as províncias vizinhas com a capital do Império, novamente
a região era observada como fundamental. Com efeito:
Teve lugar o estabelecimento de huma Agencia na Freguezia de
Itacurussá, e augmentarão-se dois estafetas, hum delles na Agencia
139
da Villa de Vassouras, para conduzir de cinco em cinco dias as malas
do Correio da mesma Villa, e do da Villa de Valença, á Freguezia do
Paty, recebendo nesta as que tiverem chegado para aquelles lugares
pelo de Minas; e outro na Administração da Villa de Paraty, para que
houvesse communicação regular, também de cinco em cinco dias,
entre essa Villa, e a Cidade d’Angra dos Reis (BRASIL, 1837, p. 41).
Nossos estudos também mostram, por exemplo, como foram recorrentes as
iniciativas dos presidentes da província em prover o território de infra-estruturas
técnicas capazes de sustentar e alavancar o apogeu do café. Neste sentido, os
esforços eram direcionados e tratados como assunto prioritário. Tomemos o pedido
do presidente da província em 1839 para melhorar a estrada que ligava Parati à
serra por conta do importante movimento do seu porto (4.000 arrobas que vinham
de São Paulo, “alem da produção dessa florescente freguesia que se pode avaliar
em 20.000 arrobas”) (MACHADO, 1993, p. 26). Neste contexto, Angra foi depois do
Rio de Janeiro o porto mais movimentado do sul do Brasil na primeira metade do
XIX, conforme sugeria o nosso grifo em citação anterior.
Quanto à referida estrada, vale ressaltar o seu abandono em momentos
anteriores a ponto de despertar preocupações como a descrita na seguinte citação
do Ministro do Império:
A Villa de Parati tem decahido muito do seu commercio por se haver
tornado cada vez menos transitavel a sua estrada da Serra, que
horrorisa a todos os viandantes. Ha mais de vinte annos se dispõe o
melhoramento della, e apenas ha poucos mezes se concluírão os
exames necessarios, planta, e orçamento, que monta a quarenta e
dois contos de réis (BRASIL, 1832, p. 28).
A dinâmica da região justificaria, pois, a convergência de recursos para os
seus aparatos territoriais em detrimento de outras áreas da província marcadas por
semelhantes estados de conservação de seus caminhos. De uma forma geral,
podemos ressaltar que as estradas eram todas precárias, apenas tinham sofrido
melhorias a partir de 1808 com a política joanina de atração da população e dinheiro
para a capital e hinterlândia. O projeto de construção de vias terrestres incluiu a
Estrada do Comércio concluída em 1817 (levava o café até o porto de Iguaçu) e a
Estrada da Polícia que enveredava por Sacra Família, Vassouras e atingia Valença.
Serviram, pois, para incrementar a valorização e concentração da terra ao irradiar a
economia cafeeira. No entanto, se mostraram insuficientes para tamanho fluxo e os
140
próprios fazendeiros tratavam da manutenção ou abertura de caminhos para não
sofrerem prejuízos. Foram constantes as demandas desta ordem junto ao poder
provincial.
De uma forma geral, após as indicações aqui trazidas podemos resumir a
mudança abissal que esta região sofreu com a atividade cafeeira e que foi capaz de
propagar sua dinâmica, envolvendo outros eixos da província. Se antes, era
composta por simples pousos com poucas habitações para o abastecimento das
tropas de passagem, com o surto cafeeiro viria a se transformar no principal centro
econômico do Império.
Sobre as diversas transformações impostas pela meteórica expansão dessa
cultura em sua ocupação da baixada fluminense ao Vale do Paraíba do Sul, cabe
observar que extensas áreas de florestas foram desmatadas, um fluxo considerável
de escravos foi direcionado para a região proveniente tanto do continente africano
como do nordeste brasileiro, novos núcleos urbanos foram organizados (vilas e,
mesmo, cidades) de maneira que uma soma vultosa de capitais diversificou sua
aplicação com a gradativa complexidade da vida citadina ao mesmo tempo em que
se ampliavam as novas fortunas e os novos latifúndios, sobretudo cafeeiros. Este
surto fez surgir no Brasil uma nova classe social e política e foi responsável pela
inauguração de uma infraestrutura ferroviária e pela vinda efetiva de imigrantes.
A estrutura fundiária baseada ainda no regime colonial das sesmarias
proporcionou um grupo de privilegiados com autoridade em uma sociedade
aristocratizada. Além da formalidade para a concessão de títulos, havia o
pagamento por sua expedição. Não era um mecanismo para todos e assim a
monarquia se distanciava dos princípios desejados para uma nação. As elites
pensavam nas grandes fazendas como ponta de lança da economia e nos
fazendeiros como empresários. Neste sentido, foram constantes os casos em que
grandes produtores ampliavam suas terras a partir da grilagem de pequenas
propriedades, vistas como pouco aproveitadas ou improdutivas. Aqui, as ideologias
também se confirmam ao pensarmos que o pequeno lote possibilitava uma certa
autonomia para o seu possuidor e esta realidade desdizia a ordem implantada
naquele momento: a dependência pessoal. Portanto, não era apenas questão do
porte da lavoura para incrementar a arrecadação fiscal. Mesmo assim, aconteceram
casos de sucesso entre pequenos sitiantes.
141
No entanto, foram constantes os conflitos judiciais entre posseiros e sesmeiros.
Em 1817, o governo português mandou fazer o registro independente da origem da
terra pois existiam muitas sem regulamentação e tal fato negava fundamentalmente
a autoridade do Estado, dividia a classe proprietária e dava condição para a revolta
de muitos. Em Ordem de 14 de marco de 1822, Dom Pedro I reconhecia a
existência das posses e determinava que elas prevalecessem sobre as sesmarias
posteriormente concedidas. Em nova ordem de 22 de outubro de 1823, decretou a
extinção das concessões de sesmarias e acirrou a confusão. As determinações não
cessaram as disputas e os grandes avançaram em seus domínios, inclusive como
posseiros. As pressões se estenderam até a Lei de 1850, proibindo a obtenção de
terras públicas, exceto se compradas, legitimando as sesmarias e as posses
(contanto que cultivadas e não apenas roçadas) e exigindo a anotação das
propriedades irregulares nos Registros paroquiais. Também no período veio a
extinção legal do tráfico negreiro no Brasil e este contexto denotou a preocupação
das elites com uma possível escassez da mão-de-obra para as fazendas de café.
Pensava-se em dificultar o acesso à terra por parte destes e dos imigrantes futuros.
Assim, o Império do cae da conquista de terras era confirmado através de um
número pequeno de famílias controlando as extensas e melhores lavouras. Por
laços de matrimônio no interior da própria elite, mantinha-se o status quo daquela
realidade. O próprio Império vivia momento de consolidação e pacto oligárquico.
Esta realidade apenas mudaria concomitante ao final do próprio Império. O
café continuaria a ser o principal produto da pauta de exportação da República, mas
viria de terras paulistas e seria cultivado em outros moldes, além de encontrar um
outro cenário internacional baseado na expansão do capital e da técnica na Europa
e Estados Unidos. Por aqui, nos anos de 1860, a cafeicultura na parte ocidental
do Vale iniciava seu processo de declínio motivado pelas dificuldades de se
conseguir novas terras e escravos (seus dois sustentáculos). Ao analisar o processo
de desintegração da economia cafeeira provincial, destacamos o modo predatório
de uso do solo (que impunha a necessidade constante de expansão pelo território
em busca de “terras virgens” em detrimento ao abandono das cultivadas),
concorrendo para a grande imobilização de capitais em terras e escravos. O
sistema estava comprometido na base mesmo com tentativas em relação ao uso de
novas técnicas de cultivo, modernizando a produção para liberar mão-de-obra. Os
142
arraigados métodos extensivos de uso do solo e coercitivos sobre a forca de
trabalho foram barreiras definitivas para a sua reprodução.
O declínio da atividade no Rio de Janeiro juntamente com o do sistema
monárquico nos possibilita afirmar que o Império brasileiro foi fundamentalmente
fluminense. Antes de esvair-se, ditou a economia e as regras sociais, políticas e
administrativas que deveriam conformar a nação. E este processo, em que
interesses vários estavam em jogo, deixou seus registros fundantes no território e
na sociedade do país e, em particular, da província que era seu epicentro.
Mesmo respondendo por grande parte das rendas imperiais, a origem desse
volume era restrita a poucas regiões da província. Lembremos que sua dinâmica
territorial no que se refere ao interior tinha se iniciado com a chamada “economia de
passagem” ou “economia acessória” quando da atividade mineradora. Mas, esta
não tinha sido capaz de estabelecer assentamentos efetivos na região e, até então,
as aglomerações existentes se encontravam instaladas no litoral ou na Baixada. A
região do Médio Paraíba do Sul encontrava-se pouco povoada e contava com
escassos núcleos e com alguns posseiros que trabalhavam na produção de gêneros
alimentícios e na pecuária às margens dos precários caminhos.
Com o crescente desenvolvimento agrícola a partir das primeiras décadas do
século XIX, intensificaram-se as condições favoráveis à produção para o
abastecimento e à integração de um mercado interno dinamizado pela riqueza do
café e pela retomada da atividade açucareira na região polarizada por Campos.
Notemos que esta região seria alvo prioritário para instituição de mecanismos como
freguesias, vilas e núcleos coloniais naquele momento. Ver Mapa 7 a diante.
O fato urbano da região de Campos esteve sempre associado ao açúcar e à
riqueza trazida por ele. Se a cidade em si crescia e ganhava novos e modernos
equipamentos, na parte rural grandes propriedades faziam florescer esta economia
que também contava com a importante produção de médias e pequenas lavouras.
O mapa nos mostra uma ocupação preferencial na porção sul do rio Paraíba
denotando áreas ainda a serem ocupadas. A jurisdição estava instalada e a terra
em muitos casos registrada. A ocupação efetiva desse significativo território de
fronteiras era assunto para discussão nos espaços da geopolítica local, como
veremos adiante.
143
Mapa 7: Aldeias, freguesias, vilas e núcleos coloniais na região de Campos (meados XIX)
Elaborado pelo autor para CHRYSÓSTOMO (2006, p. 354).
144
Um outro ponto que queremos destacar se refere às mudanças nos sistemas
valorativos dos lugares neste contexto de afirmação territorial. No interior do Rio de
Janeiro, desenvolveu-se um processo de integração através da articulação entre as
áreas produtoras e o mercado consumidor viabilizado pelos meios de comunicação
existente entre as extremidades dessas conexões. Processo este, observado antes
do advento do sistema ferroviário e que determinou o uso seletivo do território em
que áreas como a de Angra dos Reis e Parati voltaram a experimentar uma
conexão ao comércio da província ao terem sua atividade portuária solicitada para
operacionalizar a empresa cafeicultora.
Se relembrarmos dos pressupostos do ideário nacional promovido pelo
Império, veremos que um deles se refere à constituição e fortalecimento de núcleos
urbanos que trabalhariam para a unidade pretendida. Assim, observamos a
organização territorial da província do Rio de Janeiro como algo pensado, uma vez
que não se tratou apenas do surgimento de um conjunto de núcleos articulados e
com funções distintas, mas de uma intenção no âmbito de um projeto maior. Tanto
as políticas de abertura de caminhos já estabelecidos quanto os que seriam abertos
pelas ferrovias pretendiam integrar ou mesmo constituir territórios.
Sobre este aspecto ainda é importante observar que o advento das estruturas
ferroviárias é uma conjugação de efeitos múltiplos em sua associação com os
processos de urbanização. Com efeito,
(...) os núcleos urbanos pré-existentes que não fossem privilegiados
pela proximidade das linhas férreas e sua articulação com, no caso
do sudeste brasileiro, a cultura do café, seriam cidades mortas” na
expressão já consagrada de Monteiro Lobato (LANNA, 2002, p.2).
A autora fala especificamente das cidades que não assumem o papel de
“pontas de trilho” para justificar o fato de que as que contavam com estações de
meio de linha não teriam garantidas as benesses da rede ferroviária. No nosso
caso, pensamos nas cidades que tiveram suas redes de comunicação e de
circulação de mercadorias preteridas pela ferrovia: Angra dos Reis e Parati.
Portanto, nos referimos aqui a um conjunto não homogêneo de realidades em
que cabe ao Estado articular na arena política (como veremos adiante a partir dos
acontecimentos na Assembléia Provincial) uma visão totalizante e integradora. Não
145
sem conflitos, esta ação passava por instrumentos de diversas ordens. Alguns deles
citados aqui mas que merecem uma atenção mais detalhada pela importância
que tiveram junto ao poder público. No plano da repartição territorial, foram
mantidas as divisões em freguesias (atendendo às estruturas eclesiásticas de
poder), em comarcas (como unidades de controle jurídico) e em distritos(para fins
eleitorais e posteriormente para o trato das obras).
De tradição colonial no Brasil, as freguesias passaram a se configurar como
uma unidade elementar da partilha e da administração pública, sendo dotada de
autoridade militar e policial e de relativa autonomia jurídica. Cada uma delas,
também denominada de paróquia, recebia o nome de um santo católico e seu poder
se expressava pela influência ideológica da Igreja e pela produção agrícola, pastoril
e de serviços, além do acúmulo de propriedades imobiliárias dos grandes senhores
de terra localizados sob sua jurisdição. Se no início do século XIX, se podia falar
em pelo menos 46 freguesias instaladas na província do Rio de Janeiro, este total
chegou a 68 no ano de 1843 e a 119 em 1870. O Quadro 2 a seguir registra o
momento de 1843, identificando-as nos respectivos municípios e comarcas as quais
pertenciam.
Quadro 2: Comarcas, municípios e freguesias na província fluminense (1843)
8 comarcas 25 municípios 68 freguesias
Niterói Niterói São João Baptista de Nicteroy
São Gonçalo
São Sebastião de Itaipú
São Lourenço da Aldea dos Índios
Magé Nossa senhora da Piedade
São Nicolao de Suruhy
Nossa Senhora da Ajuda de Guapimerim
Nossa Senhora Guia da Pacobahiba
Nossa Senhora da Piedade de Inhomirim
Iguaçu São João de Merity
Nossa Senhora do Pilar
Santo Antonio de Jacotinga
Nossa Senhora da Piedade de Iguassú
Nossa Senhora da Conceição do Marapicu
Itaboraí Itaboraí São José de Itaboraí
Nossa Senhora do Desterro
Nossa Senhora da Conceiçao do Rio Bonito
Santo Antonio de Sá Santo Antonio de Sá
Santíssima Trindade
São José da Boa Morte de Guapiassú
Maricá Nossa Senhora da Amparo (=)
Cabo Frio Saquarema Nossa Senhora de Nazareth (=)
Cabo Frio Nossa Senhora da Assumpção
Nossa Senhora da Lapa de Capivary
São Pedro da Aldea dos Índios
São Sebastião de Araruama
146
Macaé São João Baptista de Macaé
Sacra Família do Rio de São João
Nossa Senhora do Desterro de Quissaman
Nossa Senhora das Neves e Santa Rita
Nossa Senhora da Conceição de Carapebus
Angra dos Reis Angra dos Reis Nossa Senhora do Rozário de Mambucaba
Nossa Senhora da Conceição de Angra dos Reis
Santana da Ilha Grande de Fora
Nossa Senhora da Conceição da Ribeira
Itaguaí São Francisco Xavier
São Pedro e São Paulo do Ribeirão das Lajes
Parati Nossa Senhora dos Remédios
Mangaratiba Nossa Senhora da Guia
Santanna de Itacurussá
Campos Campos São Salvador
São Sebastião
Santo Antonio de Guarulhos
São Gonçalo
São Fidélis de Sigmaringa
Santa Rita da Lagoa de Cima
São João da Barra São João Baptista
Resende Resende Nossa Senhora da Conceição
São José do Campo Bello
São João do Príncipe São João Marcos
Nossa Senhora da Piedade do Rio Claro
Capivary Santo Antonio de Capivary
Barra Mansa São Sebastião da Barra Mansa
Vassouras Piraí Santanna
São João Baptista do Arrozal
Vassouras Sacra Família do Tinguá
Nossa Senhora da Conceição
Nossa Senhora da Conceição do Paty do Alferes
Valença Santo Antonio do Rio Bonito
Nossa Senhora da Glória
Paraíba do Sul São Pedro e São Paulo
Santanna de Cebollas
São José do Rio Preto
Cantagalo Cantagalo Santa Rita do Rio Negro
Santíssimo Sacramento
Nova Friburgo Nossa Senhora da Apparecida
São João Baptista
Pastor Protestante
Fonte: RIO DE JANEIRO (1843). (Organizado pelo autor)
Tal expansão da divisão territorial denota a necessidade de especialização das
medidas de administração e, neste sentido, é importante voltar à Lei de Terras.
Através dela, legitimava-se a aquisição pela posse no Brasil, mas esta apenas teria
validade, isolando-se do domínio público, se levada ao Registro do Vigário, livro de
notas da paróquia ou freguesia em que a terra estava localizada. Entre outros
aspectos importantes, cabia ao pároco das freguesias do Império a indicação das
terras que passariam a ser consideradas privadas e aquelas chamadas de
devolutas ou do patrimônio das províncias, vindo daí o caráter obrigatório do
registro e a importância administrativa das freguesias.
147
Quanto às comarcas, é sabido que foram mantidas pelo Código de Processo
Criminal, que extinguiu os Juízes Ordinários e estabeleceu a seguinte estrutura para
cada uma delas: um Juiz Municipal, um Promotor Público, um Conselho de Jurados,
um Escrivão das Execuções e demais oficiais.
49
Como expressão de força das elites
ao redor do Imperador, é importante observar que, para o caso do Ministério
Público, uma lista tríplice deveria ser apresentada pelas Câmaras Municipais para
que os promotores fossem nomeados por um período de três anos pelo governo na
Corte e pelos presidentes de província.
Tal decisão passou a ser ainda mais centralizada através da reforma do
Código de Processo Criminal, quando os promotores não seriam mais indicados por
lista elaborada pelas Câmaras Municipais, mas seriam diretamente nomeados pelo
Imperador ou pelos presidentes de província para cargos com tempo indeterminado.
Além do mais, cada comarca contaria com apenas um promotor e não mais quantos
fossem os seus termos. Apenas nos casos das comarcas mais importantes, poderia
haver a nomeação de mais de um promotor.
Segundo o CIDE (1988), se ainda no início de século XIX existiam apenas as
comarcas de Rio de Janeiro, Ilha Grande, Paraíba Nova, Cantagalo, Cabo Frio e
Campos dos Goytacases, em um total de 6, este número passou para 9 em 1835
(com o novo arranjo territorial, surgem novas denominações como Resende,
Vassouras, Angra dos Reis, Município Neutro, Niterói e Itaboraí) e para 13, incluindo
a Corte, em 1869 (a nova configuração faz surgir comarcas como a de São João
Príncipe, Petrópolis e Magé). Este processo está indicado no Mapa 8 a seguir.
49
Para uma visão panorâmica sobre a constituição da Justiça no Brasil e no Rio de Janeiro, ver
Apêndice 1.
148
Mapa 8: Comarcas na província fluminense
Reelaborado pelo autor a partir de FRIDMAN (2005).
149
As subdivisões sucessivas revelam o crescimento em importância de
determinadas localidades, sendo necessária uma administração mais próxima. O
aumento do aparato institucional para gestão política, judiciária, fiscal e militar do
território muito se deveu ao seu fenômeno urbano. Mas é importante ressaltar que
as comarcas tinham em sua jurisdição um conjunto de outras cidades, além das
demais formas de assentamento urbano encontradas. Portanto, tratava-se de olhar
para o todo da província por regiões. E, neste contexto, eram os municípios mais
importantes que funcionariam como “cabeça de comarca” e teriam sua influência
mais uma vez confirmada sobre determinados conjuntos territoriais da província. No
final do Império, haviam sido criadas 25 comarcas. Além da Corte, Campos dos
Goytacazes e Vassouras se destacaram sem dúvida alguma.
3.3. Operacionalizando o território
Pensar na administração de um todo político e territorial significa não esquecer
dos mecanismos de aplicação do aparato legal e no caso do Império brasileiro
significa entender em que moldes o judiciário se estruturou em suas relações com
os demais poderes, sobretudo o Moderador. No nosso trabalho, foi importante
perceber como ele se relacionou com o executivo provincial. Assim, entender a
história das instituições da Justiça e seus rebatimentos no território carioca e
fluminense requer uma linha do tempo que se inicia em 1751 com a criação da
Relação do Rio de Janeiro. (Ver Apêndice 1)
Naquilo que nos interessa em particular, é importante ressaltar que ela havia
sido transformada em Casa de Suplicação do Brasil por Dom João VI em 1808 e
que, com o Império e a extinção desta Casa
50
, a Relação do Rio de Janeiro voltou a
funcionar com esta denominação e com estatuto de Tribunal de Segunda Instância.
O Desembargador dos Agravos era o cargo de maior importância, sendo escolhido
entre seus pares. Segundo a Carta de 1824, deveria haver uma Relação em cada
província e delas seriam retirados os juízes letrados que comporiam o Tribunal
50
Dom Pedro I extinguiu em 1833 a Casa de Suplicação, a Mesa do Desembargo do Paço e a Mesa
de Consciência e Ordem em prol das Relações e do Conselho.
150
Superior de Justiça, condecorado com o titulo de Conselho. Na verdade, esta
instituição iria subjugar a Relação fazendo do Judiciário um poder político e uma
delegação da nação.
De início, eram quatro as Relações estabelecidas (Corte, Salvador, Recife e
São Luis).
51
A presidência da Relação do Rio de Janeiro ou da Corte foi ocupada
por muitos deputados e nobres que também exerceram a presidência da província.
Alguns nomes são: João Antonio Rodrigues de Carvalho, Jose Vernek Ribeiro de
Aguilar, Jose Carlos Pereira de Almeida Torres (2º Visconde de Macaé), Manoel
Ignácio Cavalcante de Lacerda (Barão de Pirapama), Euzébio de Queiroz Coutinho
Matoso Câmara, Manoel de Jesus Valdetaro (Visconde de Valdetaro), José Tavares
Bastos e Francisco de Faria Lemos. A estes homens estiveram submetidos os
juízes de primeira instância que atuavam na vida cotidiana dos membros da
sociedade. Ressaltamos a Justiça como um poder político em sua estreita relação
com o executivo fluminense. O próximo passo em nosso trabalho consiste na
observação sobre as questões administrativas da província a partir das posturas e
discursos desse poder
Com a Independência, a cidade do Rio de Janeiro passou a ser o município da
Corte e, através da Constituição de 1824 compreendia toda a província fluminense.
Este território continuou administrado de forma única pelo Ministério do Império até
1833, quando foi dividido em seis comarcas. A que incluía a Corte foi separada
político-administrativamente das demais por força do Ato Adicional no ano seguinte.
No contexto das políticas descentralizadoras do momento, esta medida organizou o
funcionamento do município-sede e da província do Rio de Janeiro, equiparando-a
às demais através da criação de sua Assembléia Legislativa.
Regulamentando este dispositivo, a Regência decretou em 23 de agosto de
1834 que a Vila Real de Praia Grande seria a sede da primeira reunião da
Assembléia Provincial que aí inaugurou os seus trabalhos em 01 de fevereiro de
1835. Entre os primeiros atos desta Assembléia, estava a Lei 2 de 26 de março
elegendo aquela vila como Capital da Província e, por conseqüência, a Lei 6 de
28 de março elevava a cidade à nova capital com o nome de Niterói. No entanto,
esta autonomia em relação à Corte não seria efetiva uma vez que:
51
Apenas em 1873, a lei de n° 2.342 elevaria para 11 o número de Relações no Império, ficando a do
Município Neutro com jurisdição sobre as províncias do Rio de Janeiro e do Espírito Santo.
151
(...) a criação do Município Neutro não deu à Província do Rio de
Janeiro representação isolada na Assembléia Geral, pois continuou o
território da Corte a figurar como primeiro distrito eleitoral da província
fluminense (LACOMBE, 1973, p. 8).
Resumia-se a autonomia na existência de um poder legislativo (exercida pela
Assembléia, composta de deputados escolhidos por eleição e com mandato de dois
anos) e um poder executivo exercido, de acordo com o artigo 165 da Constituição,
“por um presidente nomeado pelo Imperador que o poderá remover quando
entender que assim convém ao bom serviço do Estado” (ibdem). O decreto 207
de 18 de setembro de 1841 equipararia os cargos de presidente e vice das
províncias no que se refere às origens e estabilidade.
Ao lembrarmos de que a política administrativa das províncias foi caracterizada
pelo embate entre os seus representantes e o poder central, consideramos ter
ocorrido no caso fluminense um misto de potencialização desse conflito e de
harmonia. A proximidade entre os dois pólos e a parceria entre ambos fazia da
política do Rio de Janeiro um espelho do país. Por vezes, eram os mesmos os
representantes que ocupavam os cargos tanto na província quanto na Assembléia
Geral e no Senado.
Os deputados provinciais eram, em sua maioria, representantes da elite
política e econômica do Rio de Janeiro, sendo muitos aliados do imperador. Na
disputa por interesses locais, não apenas vereadores atuavam mas os presidentes
e deputados provinciais destacaram-se na defesa de questões relativas aos
municípios onde fincaram seus nculos familiares, poticos e econômicos. No
complexo jogo de interesses entre esses níveis do poder, cabia ao presidente da
província fazer-se porta-voz de comunidades e de regiões frente às autoridades
nacionais. Nem sempre as questões foram resolvidas no âmbito da disputa político-
ideológica, uma vez que era relevante a posição que determinada figura ocupava no
meio social aristocrático da monarquia.
Portanto, pensamos ser fundamental olhar para a província por um viés que
também prestigie o conjunto de atributos que os seus representantes maiores
carregavam. Ao relacionar tais informações ao contexto da formação da nação
conforme indicamos na unidade anterior, pensamos poder perceber os discursos e
interesses que conformaram a organização política, socioeconômica e espacial
daquele território. A tabela “Listagem dos Presidentes da Província Fluminense” (ver
152
Apêndice 2), construída com minudência, apresenta detalhes sobre todos os
ocupantes do executivo do Rio de Janeiro, numerando os mandatos regulares e
indicando os vices que assumiram em caráter interino. Também nos preocupamos
em identificar a formação, tulos e cargos que ocuparam na vida pública. Em uma
primeira avaliada, nos chamou a atenção o quão era recorrente o fato de ocuparem
o cargo de presidente em distintas províncias. Embora por demais extensa,
julgamos essencial uma vista esmerada nas informações da tabela para
comprovação da sociedade elitizada, instruída, aristocrática e ávida por poder que
se constituiu na base e como reflexo da nação em seu período imperial. Através
dela, confirmamos ainda nomes indicados nesta tese e decisivos para a política
fluminense (seja por conta de sua atuação e posição econômica seja em suas
relações com o Moderador).
Se o conjunto dos presidentes indicados mostra um grupo com longa
permanência no poder e uma esfera centralizada em que os cargos superiores eram
revezados entre seus ocupantes, a burocracia constituiu-se em veículo de ascensão
e afirmação social. Através dos cargos públicos de segundo e terceiro escalões,
constituídos por brancos pobres e negros libertos, camadas dias urbanas se
formaram e estruturaram as cidades e sociedade fluminense do século XIX. Desta
forma, entendemos que a estrutura territorial da província foi impulsionada e ganhou
feição com a instalação desse aparato administrativo de controle político,
econômico e social. Destaquemos os órgãos de segurança e de definição de obras
de infra-estruturas que deveriam ser incorporadas às localidades.
Falamos aqui especificamente da ação do Estado que consagra as cidades
como locus para a sua política de territorialização de seus objetivos. No entanto,
esta cidade apenas cumpriria este papel se considerada na escala da região em
que se inseria e representava. Por algumas terem concentrado população, serviços
e prestígio, se destacaram do conjunto conformando uma hierarquia do poder e do
dinheiro em exclusivos pontos do território fluminense. Foi neste jogo de poder que
o Estado nacional utilizou os núcleos urbanos para atingir o regional. E, neste
contexto, diversas foram as políticas que transpareciam as “ideologias geográficas”
de que tratamos nesta tese. Como exemplo, tomemos a citação a seguir para o
caso de um projeto de conquista e ocupação dos “terrenos devolutos” do país a
partir da instauração de núcleos a serem inicialmente habitados por “indigentes e
desocupados” das cidades já consolidadas. O discurso fala por si sobre os objetivos
153
e meios a serem tomados para a efetiva apropriação de parcelas mais remotas do
território (regiões, portanto) através da criação de núcleos coloniais (urbanos, em
essência, mesmo que atrelados às atividades agrícolas). Com efeito,
De outra medida, e vem a ser o estabelecimento da Colonias Nacionaes nas
margens dos nossos rios navegaveis, e á beira das estradas principaes,
onde apparecessem terrenos devolutos, a começar da proximidade das
povoações para os lugares mais remotos. Formado o nucleo destas colonias
com familias de camponezes indigentes, para ellas se deverião
successivamente remetter as pessoas de hum e outro sexo, que não
exercem honesto emprego nas povoações, ou não encontrão em que se
occupem. Desta sorte tornar-se-hião mais commodas e mais seguras
nossas communicações; dar-se-hia maior extensão á agricultura; animar-se-
hião os consorcios entre pessoas, que muitas vezes os não contrahem por
falta de meios de subsistencia; diminuir-se-hia consideravelmente a
corrupção dos costumes; finalmente aproveitar-se-hião braços que jazem na
ociosidade. Fazer productivos braços inteiramente inuteis equivalle á sua
adquisição. Este assumpto, Senhores, he hum dos mais importantes, que se
vos pode offerecer; e não duvida o Governo que o mediteis com toda a
attenção, que elle merece (BRASIL, 1834, p. 25).
Nesta citação, chama a atenção também o caráter moral e civilizatório a ser
pretendido pela proposta defendida pelo Ministro do Império quando associa a
retirada dos “indigentes e desocupados” das cidades como uma forma de diminuir-
lhes a “corrupção dos costumes” degradados, entre outras coisas, pela ociosidade,
tornando-os comprometidos com as atividades que dinamizariam os novos núcleos
de ocupação e produção.
Partindo do pressuposto de que modelos idealizadores de sociedade e de
ordenamento encontram nos núcleos urbanos um espaço privilegiado para a sua
difusão, entendemos que a discussão e montagem dos aparatos administrativos
refletem esta intenção. Eles operacionalizam uma vontade prévia e, portanto, um
planejamento. Pretendemos recuperar a natureza das intervenções engendradas
pelos atores sociais e pelo Estado no contexto da formação de uma Nação. Para tal,
o termo intervenção é adotado como prática planejadora, imposição ou negociação
de normas de controle do presente e projeto para o futuro, consubstanciada em um
plano e relacionada, mas não limitada, à gestão da ocupação física. Enfim, uma
prática ideológica hegemônica (FRIDMAN, 2001).
Ao observar o aparato institucional na escala da província fluminense, estamos
atentos aos seus desdobramentos na estrutura e à relevância que determinadas
cidades apresentavam. A partir desta postura, observamos que a prática se nutria
de mecanismos para a perpetuação do poder através da concretização de uma
154
política administrativa que visava articular anseios locais em uma dimensão regional
em sua estreita relação com a esfera central do Império. Portanto, chamamos a
atenção para a criação de uma rede burocrática que se disseminou para levar os
ideais de progresso e civilização defendidos pelo projeto imperial a todos os pontos
do território. Ao dividir funções a partir de pontos previamente escolhidos no
território, a burocracia tinha a intenção de usá-los como multiplicadores para que a
presença do Estado (sua força e símbolos) chegasse também aos locais que
mantinham pouco ou quase nenhum contato com a Corte.
Sobre este aspecto, é importante ver que a reconstituição das estruturas
administrativas da província do Rio de Janeiro (desde o início da organização do
seu poder executivo) nos possibilita uma melhor compreensão dos mecanismos de
domínio arquitetados pelo Estado.
Para o período em estudo, foram elaborados cinco organogramas que dão
conta das (des)continuidades da estrutura administrativa fluminense. Recorremos
às nossas notas sobre o período imperial para entender as mudanças propostas em
cada nova alteração da estrutura política e administrativa da província. A partir
desta observação das diretrizes na escala nacional, tecemos comentários sobre as
ações na escala fluminense.
Os organogramas são os seguintes:
155
Figura 2: Organograma da Administração Provincial 1834/1840
Presidente da
Província
CR - 1834
Secretaria
da
Presidência
CR - 1835
Guarda
Policial da
Província
CR - 1835
Escola
Normal
CR - 1835
Liceu
Provincial
CR - 1839
Colégio de
Artes
Mecânicas
para Órfãos
CR - 1836
Escola de
Arquitetos
Medidores
CR - 1836
EX - 1846
Diretor de
Instrução
Primária
CR - 1837
Diretoria
de Obras
Públicas
CR - 1836
Esquadra
de
Pedestres
CR - 1836
EX - 1837
Chefe de
Polícia de
Comarca
Tesouraria
CR - 1831
EX - 1850
Inspetores
Municipais de
Instrução
Primária
CR - 1836
Escolas
Primárias
Contadoria
CR - 1831
Secretaria
CR - 1831
Tesouraria
CR - 1831
Coletorias
CR - 1836
Mesa
Provincial
CR - 1838
Registros
CR - 1836
Imperador Tribunal do
Tesouro Nacional
Organograma 1834/1840
Códigos
CR – criação do órgão
EX extinção do órgão
Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).
O marco inicial foi o Ato Adicional que criou o Município Neutro e, na prática,
deu origem ao Poder Executivo provincial e à organização do governo da província.
O ano de 1840 antecede a promulgação do regulamento de 21/06/1841 da
Secretaria da Presidência, tornando-a mais complexa e com algum poder sobre
segmentos administrativos até então subordinados diretamente ao presidente da
província (como quase todos os órgãos).
156
Figura 3: Organograma da Administração Provincial 1841/1846
Presidente da
Província
CR - 1834
Secretaria
da Presidência
CR - 1835
Guarda
Policial da
Província
CR - 1835
Diretor de
Instrução
CR - 1844
Junta
Diretora de
Obras
CR - 1844
Diretoria de
Obras
Públicas
CR - 1836
EX - 1844
Distritos
CR - 1844
1ª Seção
CR - 1842
EX - 1846
2ª Seção
CR - 1842
EX - 1846
Coletorias
CR - 1836
Mesa
Provincial
CR - 1838
Registros
CR - 1836
Organograma 1841/1846
Códigos
- - - subordinação direta
até mudança do
superior hierquico
Ministério da
Justiça
Instituto
Vacínico
CR - 1844
Comissão
Central Diretora
da Colonizão
CR - 1844
Chefe de
Polícia
CR - 1841
Administração
da Fazenda
CR – 1842
EX – 1846
Casa de
Detenção
CR - 1847
Delegados
CR - 1841
Escola
Normal
CR - 1835
Liceus
CR - 1839 Angra
1844 Campos
EX - 1859
Colégio de
Artes
Mecânicas
para Órfãos
CR - 1836
Escola de
Arquitetos
Medidores
CR - 1836
EX - 1846
1ª Seção
CR - 1841
2ª Seção
CR - 1841
Diretor de
Instrução
Primária
CR -1837
EX - 1844
Subdelegado
s
CR - 1841
Escolas
Primárias
Inspetores
de
Quarteirão
CR - 1832
Inspetores
Municipais de
Instrução Primária
CR - 1837 EX - 1844
Inspetores
Municipais
de Instrução
CR - 1844
Até 1844
Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).
Verifica-se um maior nível de decisão nas Obras blicas e da Guarda Policial
da Província. Formam-se novas estruturas para a polícia definidas por legislação
imperial (Lei 261 de 03/12/1841 e Regulamento 120 de 31/01/1842). Cria-se, em
1842, a Administração da Fazenda, responsável diretamente pelos assuntos
fazendários provinciais. As secretarias da presidência ampliam suas atribuições.
157
Figura 4: Organograma da Administração Provincial 1846/1858
Presidente da
Província
CR - 1834
Secretaria
da Presidência
CR - 1835
Guarda
Policial da
Província
CR - 1835
Inspetor
Geral
CR - 1849
1ª Seção
CR - 1841
EX - 1859
3ª Seção
CR - 1836
EX - 1859
2ª Seção
CR -1841
EX - 1859
Organograma 1846/1858
Ministério da
Justiça
Arquivo
Estatístico
CR - 1850
Comissão
Central Diretora
da Colonizão
CR - 1844
Chefe de
Polícia
CR - 1841
Instituto
Vacínico
CR - 1844
Casa de
Detenção
CR - 1847
Delegados
CR - 1841
Mesa
Provincial
CR - 1838
Liceus
CR - 1839
1844
EX - 1859
Escola
Normal
CR - 1835
Registros
CR - 1836
3ª Seção
CR - 28/11/1855
EX - 17/04/1856
Diretor de
Instrução
CR -1844
EX - 1849
Escolas
Primárias
Colégio de
Artes
Mecânicas
p/ Órfãos
CR - 1836
Inspetores
Paroquiais
CR - 1849
Secretaria
da Polícia
CR - 1853
Tesouraria
Provincial
CR - 1846
Seção
Especial
CR - 1846
Contadoria
CR - 1846
Coletorias
CR - 1836
Inspetores
Municipais
de
Instrução
CR - 1844
Conselhos
Municipais
CR - 1849
Distritos
CR - 1844
Tesouraria
CR - 1846
Subdelega
dos
CR - 1841
Inspetores
de
Quarteirão
CR - 1832
Junta
Diretora de
Obras
CR - 1844
Entre
1855/1856
Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).
A Deliberação de 03/06/1846 transformou a Administração da Fazenda em
Tesouraria Provincial, subordinando-a à Secretaria da Presidência que, aliás,
no período ampliarem-se suas atribuições.
158
Figura 5: Organograma da Administração Provincial 1859/1875
Presidente da
Província
CR - 1834
Secretaria
da
Presidência
CR – 1835
Organograma 1859/1875
Ministério da
Justiça
Diretoria
de
Instrução
CR - 1859
Arquivo
Estatístico
CR - 1850
Chefe de
Polícia
CR - 1841
Instituto
Vacínico
CR - 1844
Delegados
CR - 1841
Subdelega
dos
CR - 1841
Inspetores
de
Quarteirão
CR - 1832
Diretoria
de Obras
Públicas
CR - 1859
Conselho de
Instrução
CR - 1859
Secretaria
da Polícia
CR - 1853
Diretoria de
Fazenda
CR - 1859
Escola
Normal
CR - 1835
Inspetor
Geral
CR - 1859
Inspetores
Paroquiais
CR - 1849
Força
Policial da
Província
CR - 1835
Guarda
Municipal
CR - 1874
EX - 1878
Distritos
CR - 1844
Seção
CR - 1859
Mesa
Provincial
CR -
1838
Coletorias
CR -
1836
Agências
de Rendas
CR - 1836
Casa de
Detenção
CR -
1847
Tesourari
a
CR -
1859
Procuradori
a
CR - 1859
Contadoria
CR - 1859
Escolas
Primárias
Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).
A Lei nº 1.127 de 04/02/1859 implementa uma Reforma Administrativa na
província. Há, através dela, uma total reestruturação da Secretaria da Presidência,
que perdia alguns de seus assuntos (instrução, obras públicas e fazenda) para
Diretorias próprias vinculadas diretamente ao presidente da província. A Secretaria
ficou com autoridade exclusiva apenas sobre a Força Policial da Província.
159
Figura 6.1: Organograma da Administração Provincial 1876/1889 (1)
Presidente da
Província
CR - 1834
EX - 1889
Secretaria
da
Presidência
CR – 1835
Organograma 1876/1889 (1)
Diretoria
de
Instrução
CR – 1859
Diretoria
de Obras
Públicas
CR - 1859
Inspetores
Gerais
CR – 1859
Inspetores
Paroquiais
CR - 1849
Distritos
CR - 1844 EX - 1882
Circunscrições
CR - 1882
Seção
CR - 1859
Escolas
Primárias
Conselho de
Instrução
CR - 1859
Superintendent
e de Ensino
CR - 1859
Escolas
Normais
CR - 1835
Liceu de
Humanidades
de Campos
CR - 1880
Foa
Pública
Provincial
CR - 1835
Inspetoria
Provincial
de
Imigração
CR - 1880
EX - 1889
Secretaria
da Polícia
CR - 1853
Chefe de
Polícia
CR – 1841
Arquivo
Estatístico
CR - 1850
Instituto
Vacínico
CR - 1844
Seção
CR - 1876
Seção
CR - 1876
Seção
CR - 1876
Seção
CR - 1876
Delegados
CR - 1841
Subdelegados
CR - 1841
Inspetores de
Quarteirão
CR - 1832
Casa de
Deteão
CR - 1841
Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).
160
Figura 6.2: Organograma da Administração Provincial 1876/1889 (2)
Presidente da
Província
CR - 1834
EX - 1889
Diretoria
da
Fazenda
CR – 1859
Registros
CR - 1836
EX - 1890
Coletorias
de Rendas
CR - 1859
Mesa
Provincial
CR - 1859
Tesouraria
Procuradoria
Fiscal
Seção
CR - 1876
Seção
CR - 1876
Seção
CR - 1876
Seção
CR - 1876
Contadoria
Contadoria
do Corpo
Policial
CR - 1888
Seção
Central
CR - 1876
Organograma 1876/1889 (2)
Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).
A Deliberação de 11/08/1876 implementa uma nova Reforma Administrativa na
província reforçando a tendência racionalizadora das medidas de 1859. Continuam
as Diretorias (com mudanças em suas estruturas), mas agora vinculadas à
Secretaria da Presidência, que voltou a ter autoridade também sobre órgãos como o
Arquivo Estatístico, o Instituto Vacínico e a Secretaria de Polícia.
161
Do conjunto desses organogramas, algumas observações devem ser feitas. A
primeira se refere à Repartição da Fazenda e Tesouraria da Província. A lei imperial
de 04/10/1831 (que organizou o Tesouro Nacional) rezava em seu artigo 45 que
“haveria em cada província uma Repartição de Fazenda Pública, denominada de
Tesouraria da Província (...)”. A Tesouraria do Rio de Janeiro foi extinta pelo
decreto imperial 736 de 20/11/1850. No entanto, em 20/05/1842, foi criada, por
regulamento, a Administração da Fazenda da Província Rio de Janeiro, responsável
pela administração, contabilidade, distribuição, arrecadação e fiscalização da renda
pública provincial. Assim, houve sobreposição de órgãos entre 1842 e 1850. Eram,
mesmo assim, independentes uma vez que a Administração da Fazenda ficou com
as rendas propriamente provinciais e a Tesouraria da Província, como nas demais
províncias, estava incumbida das rendas gerais. Assim, este último órgão, a partir
de 1842, passou a servir unicamente ao Tesouro Nacional, não sendo parte do
Executivo provincial.
Uma segunda observação diz respeito aos cargos de nível pessoal. Nas
“Fichas de Registro de Órgãos”, havia sempre um espaço para o “nome do órgão ou
cargo” e este segundo caso era para documentar competências funcionais
importantes, delegadas a nível pessoal e que se confundiam com o próprio
organismo burocrático. Como exemplo, o cargo de Chefe da Polícia tinha suas
atribuições definidas pela legislação sobrepostas à Secretaria de Polícia que,
teoricamente, deveria cuidar desses assuntos (Lei 261 de 03/12/1841 e
Regulamento 120 de 31/01/1842) (Coleção de Leis do Império 1841/1842).
Listemos alguns desses órgãos ou cargos de interesse em nosso trabalho
indicados por Campos et al (1986, grifos nossos):
Presidente da Província
Criação: 03/10/1834 (Lei nº 40)
Extinção: 29/06/1891 (Constituição de 1891)
Superior hierárquico: Ministros de Estado
Antecessor: Presidente em Conselho
Sucessor: Presidente de Estado
Competência:
Executar e fazer executar as leis.
Dispor da força a bem da segurança e tranqüilidade da província. Somente em casos
extraordinários e indispensáveis removerá as Guardas Nacionais para fora dos seus
municípios.
Exercer sobre as Tesourarias provinciais as atribuições consideradas pela Lei 04/10/1831.
Convocar Assembléia Provincial extraordinariamente, prorrogá-la e adiá-la quando assim o
exigir o bem da província, contando que não deixe de haver sessão em nenhum ano.
Suspender a publicação das Leis provinciais em casos dos artigos 15 e 16. (...)
162
Diretoria de Obras Públicas
Criação: 19/12/1836 (Lei nº 64) (regulamentada em 20/05/1837)
Extinção: 13/04/1844 (Lei nº 316 que cria a Junta Diretora de Obras Públicas)
Superior hierárquico: PP (Em 21/06/1841
52
, passa a ser subordinada à Seção da Secretaria da
Presidência)
Competência:
Direção, inspeção e conservação das obras públicas.
Dar o plano de todas as obras públicas que se houverem de fazer na Província.
Formar um plano geral de estradas, pontes e canais para a província, acompanhado dos
respectivos orçamentos e estabelecer prioridades.
Dar planos de concerto e melhoramentos das estradas atuais.
Cuidar e fiscalizar a conservação das obras depois de concluídas.
Fazer executar tais trabalhos, depois de aprovado o plano e orçamento da obra pela
Assembléia Legislativa Provincial ou Presidente da Província.
Determinar o método de fabrico dos carros, marcando o seu comprimento e largura, bem como
a largura do trilho de suas rodas.
Levantar a carta corográfica da província, logo que as circunstancias permitirem este
trabalho.
Fixar os pontos onde se deve estabelecer barreiras, organizar o melhor sistema delas e o
cálculo provável do que podem produzir em cada estrada que forem estabelecidas.
Dirigir as obras em construções necessárias, propor os seus empregados ao Presidente da
Província e fiscalizar o cumprimento de seus deveres, ficando desde estabelecido, que a
gente de pé não pagaria direito de barreira.
Coadjuvar a organização do tombo dos próprios provinciais.
Preparar os materiais para a organização da estatística da província que forem relativos
ao objeto de que se acha encarregada, e colher aquelas informações que lhe forem
exigidas pelo Presidente da Província.
Apresentar ao Presidente da Província, pelo menos um mês antes da abertura das sessões
ordinárias da Assembléia Legislativa Provincial, um relatório circunstanciado a cerca das obras
que foram concluídas; do estado das que se acham em andamento, declarando quais devam
ser empreendidas com preferência para que possa a mesma Assembléia, por meio de seu
Presidente, ser anualmente informada sobre este importante ramo da Administração e
providenciar como julgar conveniente.
Junta de Direção e Inspeção das Obras Públicas
Criação: Regulamento de 27/04/1844
53
Superior: 2ª Seção da Secretaria da Presidência da Província
Competência:
Discutir os projetos de obras que forem empreendidos na província, as plantas e orçamento
delas, e tudo o mais que pelo Presidente da Província for submetido ao seu exame e inspeção,
dando sobre todos esses assuntos o seu parecer por escrito, que será levado a Secretaria da
Presidência, a fim de por ela se deliberar o que convier.
Propor ao Presidente da Província os regulamentos e planos que tratam o art e §4° do
presente regulamento, bem como a art 6°, assim como todos os demais que forem necessários
para estabelecer uniformidade no sistema de obras, na administração delas, no modo de
processar e legalizar as férias e no meio de fiscalizar os dinheiros despendidos neste ramo de
serviço.
Indicar tudo que julgar conveniente ao melhoramento material da província e a difusão e
propagação dos conhecimentos necessários ao ramo científico que conduz a este
melhoramento.
Examinar e fiscalizar as contas dos engenheiros chefes de distritos e todas as mais relativas as
obras públicas que lhes forem remetidas para este fim pelo Presidente da Província.
52
Esta lei marcava os deveres dos empregados da Secretaria de governo.
53
Criou sete distritos de obras públicas na província, nomeando vários oficiais do corpo de
engenheiros e marcando suas atribuições.
163
Distritos de Obras Públicas
Criação: 27/04/1844 (regulamento)
Superior: Junta de Direção e Inspeção das Obras Públicas
Estrutura: um Engenheiro chefe de Distrito
Competência:
54
Direção, administração e fiscalização das obras públicas.
Levantar a planta e fazer o orçamento das obras feitas no seu distrito.
Propor obras de utilidade pública que entender conveniente no seu distrito.
Inspecionar e fiscalizar os Registros, Coletorias e Barreiras do seu distrito.
Diretoria de Obras Públicas
Criação: Lei 1.127 de 1859
Superior: Presidente da Província
Estrutura: uma seção e distritos de obras públicas, com cada um tendo um engenheiro chefe.
Competência:
Inspecionar e fiscalizar os serviços de todas as obras públicas provinciais.
Uma terceira observação se refere a estes três últimos órgãos a partir das
mudanças verificadas na Junta de Direção e Inspeção das Obras blicas. Através
da Deliberação de 28/11/1855, ela passou a subordinar-se a 3ª Seção da Secretaria
da Presidência. Por sua vez, voltou a ser subordinada à Seção da Secretaria da
Presidência pela Deliberação de 17/04/1856. A Lei 1.127 de 04/02/1859
(Reforma de 1859 que marcava as repartições de que se compõe a administração
pública provincial) promoveu mudanças no nome do órgão (que passou se chamar
Diretoria de Obras Públicas), na sua subordinação hierárquica (submeteu-se
diretamente ao Presidente da Província) e na sua estrutura com a criação de uma
seção.
É importante também ressaltar que a Seção da Diretoria de Obras Públicas
(extinta pelo Decreto nº 1.040 de 19/07/1890) não tinha sua competência e estrutura
esclarecidas pela Lei de 1859. Este órgão seria explicitado pela Reforma de
1876 (Deliberação de 01/08/1876). Por ela, a Seção passa a ter uma atribuição
especifica: incumbir-se de tudo que diz respeito às estradas de ferro e obras
hidráulicas e fiscalização das empresas desta natureza auxiliadas pela Província,
exceto a do Ferro-Carril Niteroiense e da de Cantagalo, que poderão ter
engenheiros fiscais, remunerados a sua custa, como estipulado nos respectivos
contratos, mas imediatamente subordinados ao Diretor de Obras Públicas.
55
Sistematizando os atos administrativos pelos quais o Executivo exercia o seu
poder, nos foi possível enxergar os instrumentos utilizados para as práticas políticas
54
Dados retirados do Regulamento de 27/04/1844, citado, e do Regulamento Interno de
31/01/1845, da própria repartição encarregada das obras públicas na província.
55
Sobre esta questão ainda, nos chama a atenção o fato de que o Regulamento de 26/06/1882 passa
a tratar os distritos por circunscrições.
164
sobre a sociedade e o território. Chama atenção, por exemplo, a preocupação no
sistema físico e técnico a ser montado na província, seu caráter regional e as
mudanças do setor de Obras Públicas na arquitetura institucional do poder. Este
setor teve o seu momento em que voltava sua legislação prioritariamente para a
abertura de estradas (sobretudo para o norte da província) e no final do período
imperial se voltou para as questões de urbanização e higienização das cidades,
dentro de um conceito moderno de urbe.
Todas as reformas são entendidas como reflexo da história que se fazia na
Corte em sua luta por centralização do poder. Na verdade, são entendidas como a
própria história pois a nobreza e a classe política do Império se confundiam nos
meandros da administração da província fluminense.
Ao resgatar esta classe, o fazemos pela fala dos presidentes indicados no
Apêndice 2. No conjunto de seus relatórios, entendemos que se assentam
informações preciosas sobre a realidade da província e do Brasil. Inúmeras
entradas podem ser feitas para a investigação e o nosso trabalho, atento aos
preceitos do método científico indicado quando de nossas vigilâncias
epistemológicas, escolheu um viés que capturasse a base territorial engendrada nos
discursos proferidos. Antes de serem prestações de conta e de administrações, os
relatórios presidenciais eram discursos. Estamos atentos, então, às necessárias
mediatizações conforme nos orientou Lefèbvre.
Começando pelas rendas municipais, percebemos um jogo de interesse ou
bairrismos quando confrontávamos o local de nascimento do presidente com os
assuntos que ele relatava, priorizando-o “por ser do bem de todo o paíz” ou
relegando-o “por falta de rendas provinciais” conforme anotações recorrentes nos
discursos do executivo. Além deste aspecto e independente da orientação política
ou da naturalidade dos presidentes, ficou evidente que muitas câmaras não tinham
condições financeiras para cumprir as determinações impostas por lei em relação
aos melhoramentos em seus domínios. Aqui, vale ressaltar que era determinação
central priorizar determinadas obras “para o bem da nação conforme texto de
relatório do Ministro do Império citado a seguir:
Entre as Obras Publicas, as que interessão mais directa, e
poderosamente á riqueza Nacional, são as estradas, e canaes: ellas
abrem novos mercados, e enriquecem os existentes com utilidade
dos productores, e consumidores, por quem se reparte a despeza
165
poupada nos transportes. O Governo lhes tem dado toda a atenção,
ainda que os resultados não possão por ora corresponder aos seus
desejos (BRASIL, 1832, p. 25).
E, no contexto que estamos marcando aqui, a origem dos parcos resultados
neste assunto reclamados pelo Ministro residia na frágil realidade das finanças da
maioria das municipalidades e esta queixa se repetiu em grande parte dos relatórios
provinciais analisados. A saber:
Bem ao facto estaes, Senhores, dos graves defeitos da organisação
das Camaras Municipaes e do quanto soffrem por isso os negócios
que pela Lei do de Outubro de 1828 lhes forão confiados; e se na
alçada da Assembléa Provincial não cabe remediar a todos os
inconvenientes que dahi provêm, compete-lhe legislar sobre a parte
mais importante dos objectos cuja administração pertence aos
Conselhos Municipaes; quero dizer, pontes, canaes e estradas
publicas. (...) vós conheceis por huma experiencia penivel e
quotidiana o estado de nossas estradas, e sabeis quanto, sem duvida
pelos motivos que acabo de ponderar, he inefficaz a acção das
Camaras Municipaes para promover o melhoramento e conservação
destes indispensáveis vehiculos de nossos productos e
communicações (RIO DE JANEIRO, 1835, p. 5-6).
Ou ainda:
As Camaras Municipaes não tem podido fazer aos seus Municípios
todos os bens, que teve em vista a Lei de sua creação. Muitas
causas, que para isso concorrem, nascem dos vícios orgânicos
destas Corporações, por que a Lei do 1º de Outubro de 1828, e
outras confiarão-lhes muitos encargos, e importantes atribuições, sem
lhes deixar todavia alguns dos meios, de que dispunhão as antigas
camaras (RIO DE JANEIRO, 1844, p. 21).
Por conseqüência:
Releva porém, Senhores, reflectir que tal he a multiplicidade de obras
decretadas no corpo de nossa Legislação Provincial, cada uma das
quaes se antolha como mais útil, necessária, e urgente, que he de
impossibilidade absoluta satisfazer as innúmeras reclamações, que
de todos os pontos acodem a presidência para serem preferidas, por
forma que o Governo se em sérios embaraços sobre a escolha
(RIO DE JANEIRO, 1843, p. 38-39).
Esta dificuldade foi registrada na quase totalidade de relatórios, demonstrando
uma luta em que os núcleos menores eram preteridos em relação aqueles auto-
166
sustentados, sendo poucos aqueles “capazes de manter algum controle sobre o
gerenciamento das questões locais” (GOUVÊA, 2008, p. 115). De contrapartida,
ainda era de se contar o fato de que a população era reduzida e mal distribuída pelo
território, reduzindo um pouco as pressões sobre os menores aglomerados por suas
dificuldades intrínsecas, como nos mostra o relato a seguir:
Se a nossa Provincia estivesse por tal modo povoada, que fosse
possível estreitar consideravelmente os Districtos Municipaes, sem
correr-se o perigo de ahi não encontrar-se o numero suffieciente de
individuos habilitados para desempenharem os empregos que essas
divisões exigem (...) seria minha opinião que todas as obras e
melhoramentos materiaes, que dizem respeito a cada Conselho
fossem por elles mesmos promovidos (RIO DE JANEIRO, 1835, p. 6).
Tais questões são fundamentais para as políticas que se enquadram no
escopo do nosso trabalho. Como nos interessou mais de perto a questão da
integração ou não das regiões da província, um assunto a ser visto de perto se
referia ao tratamento que as vias de comunicação tiveram nos círculos da
administração pública e sua relação com as iniciativas privadas. Apenas para se ter
um exemplo, observemos a defesa em prol de uma dada parcela do território
fluminense quando de sua afirmação econômica como imperativo para melhoria de
sua infraestrutura viária sugerida. Neste contexto, perguntava o presidente:
Quaes são porém as estradas, cujos reparos devem por agora ser
preferidos? A fertilidade e riqueza do Termo de Cantagallo, e o
progressivo crescimento, que ali vai adquirindo a cultura do Café,
são, além d’outros, motivos para procurarmos facilitar os transportes
e communicações hoje tão difficeis com aquella parte da Provincia
(RIO DE JANEIRO, 1836 [a], p. 17).
Assim, buscamos observar inicialmente como a administração provincial tratou
tal temática e, desta forma, buscamos compreender a partir dos organogramas
apresentados, a ciranda pela qual os órgãos de obras públicas passaram ao longo
dos anos. Eles, de maneira destacada, envolveriam receitas significativas e diante
da escassez desta caberia ao governo provincial as devidas incumbências frente às
demandas sempre constantes e crescentes. Mais adiante apresentaremos uma
sistematização das principais realidades que eram verificadas neste processo de
167
montagem de infra-estrutura territorial de circulação. Os contratos, as arrematações,
as justificativas e os agentes envolvidos nos oferecem profícuos elementos de
análise.
No entanto, tendo em vista ainda o grau de carência de diversas
municipalidades, a administração fluminense teria que dar conta da geração da
renda para que estas conseguissem prestar contas de suas principais obrigações,
como eram os consertos e reparações de estradas. Como nos mostram os trechos
a seguir, as soluções tentadas envolviam desde a transferência dos rendimentos de
bens indígenas até o restabelecimento de antigos impostos. Com efeito,
Vós sabeis, Senhores, quanto o Codigo do Processo Criminal veio
empeiorar a administração do patrimonio destes indolentes
habitadores do Brasil; por isso e porque cumpre tomar quanto antes a
este respeito huma providencia, não seria quiçá fora de proposito
transferir ás Camaras Municipaes dos respectivos Termos a
administração e rendimento de bens dos Indios; ficando todavia
sujeitas ellas aos encargos que erão desempenhados pela
Conservatoria. Este arbitrio, sobre ser de vossa attribuição, nenhum
prejuizo traria aos Indios e accrescentaria os rendimentos de algumas
Camaras, que os tem tão mingoados (RIO DE JANEIRO, 1835, p. 8-
9).
Quando, Senhores, por todo quanto acabo de expôr-vos, se que a
receita d’esta provincia, com quanto seja maior que a de qualquer
outra do imperio, não basta a satisfazer todas as suas necessidades
e melhoramentos reclamados para o seu mais rapido progresso na
carreira da civilização, da industria e do commercio; quando se
observa que estão começadas e projetadas tantas vias de
communicação, que nada menos são do que tantas outras veias de
riqueza individual e publica; e que muitas outras vão sendo
justamente exigidas pela lavoura e commercio, que progride e
estende-se pela provincia, sede do governo geral; vias que não
cumpre accelerar, como tambem conservar sempre em bom estado
depois de abertas, quando o augmento de população nas cidades e
villas traz a necessidade de templos, escolas, aqueductos, fontes,
casas de caridade, cadêas, augmento da força publica, e tantos
outros objectos de despeza (...) Quero fallar-vos da necessidade de
restabelecerdes um imposto que havíeis abolido em circustancias
talvez em que a provincia podia d’elle prescindir, ou em que cumpria
favorecer a industria sobre que recahia; isto é, o dízimo do assucar
(RIO DE JANEIRO, 1847, p. 44).
56
56
Esta citação nos chama a atenção também pelo fato de reafirmar a província fluminense como a
principal do país e por deixar claro que o trato com as obras que envolviam a questão das vias de
comunicação era uma fonte de “riqueza individual e publica”. É primorosa também a descrição da
dinâmica econômica e territorial a ser alcançada a partir da abertura de estradas e caminhos.
168
Nas primeiras duas décadas de vida autônoma da província, os presidentes
muitas vezes se referiam às dificuldades encontradas como inerentes a fatores
como a desorganização das Câmaras e sobretudo ao baixo grau de integração dos
municípios e de povoamento em determinadas partes da província. A meta de
vencer estas dificuldades era colocada pelos atores como questão nacional como já
citado em exemplo anterior. No entanto, a força do discurso nos faz reproduzir ainda
um texto sobre a importância da Directoria de Obras Públicas que alteia seus “muito
reaes e valiosos serviços á nação” e seus “princípios luminosos” (
RIO DE JANEIRO
,
1843, p. 24) e um outro que enaltece o canal que ligaria Niterói e Campos, definindo
esta obra de âmbito provincial como a que “colloca o paíz em communicação directa
com o Estrangeiro, mudando-lhe a face para melhor” (
RIO DE JANEIRO
, 1843, p.
43).
A idéia de nação como objetivo, atrelada à de pátria ou ainda à de civilização,
estava dada em todas as dimensões das políticas imperiais e em seus diferentes
níveis. O uso de tais conceitos foi recorrente e utilizado em variados contextos,
como, por exemplo, nos casos vistos aaqui e, por último, na defesa da vinda de
uma mão-de-obra européia para o Brasil. Com efeito,
(...) não ha ahi hoje quem desconheça os uteis da colonisação
européa, e mais interessados do que ninguem, somos nós em
promove-la, não seria talvez fora de razão, que a Assembléa
Legislativa authorisasse o Governo da Provincia para tomar hum
certo numero de acções da Companhia que ha pouco se organisara
no Rio de Janeiro com fim tão patriotico e vantajoso. Fôra este hum
meio, em quanto nos não he dado recorrer a outro mais efficaz, de
alentar os esforços dos Cidadãos illustrados que meditão nos meios
de tornar effectivas sem quebra dos interesses materiaes do Paiz, as
dispozições legislativas, que vedão a perniciosa introducção de
escravos (RIO DE JANEIRO, 1836 [a], p. 25).
Assim, através destas citações, podemos melhor indicar o contexto em que se
insere a necessidade de integração territorial do país e da província em particular. E
este imperativo crescente no que se refere à intervenção do governo fluminense na
implementação de melhoramentos materiais, em especial em obras de circulação
“para o bem público”, justificava a centralidade que o trato com as licitações para
obras dessa natureza passaria a ter. Afirmando a precisão de fortalecer o mercado,
sempre discursado em nome dos interesses da nação, os presidentes da província
se valeram do poder que detinham para moldar a estrutura administrativa que
169
melhor se adequasse ao cumprimento dessas prerrogativas. Além da construção de
vias de circulação, eles incorporariam uma necessidade de coleta de informações
sobre os locais para que se pudesse melhor racionalizar os investimentos e tornar a
administração mais eficaz em seus propósitos. Assim, novos órgãos e funções
foram sendo estruturados. O Arquivo Estatístico, neste sentido, foi criado em 1850 e
se manteve até a reforma de 1876 vinculado diretamente à Presidência da Província
no mesmo nível da Diretoria de Fazenda e da Diretoria de Obras.
No entanto, a tomada efetiva do território esbarrava em problemas na
organização política e administrativa das municipalidades frente à legislação
imperial que restringia o papel das Câmaras. Os discursos sinalizavam o processo
de repartição do território em seus vínculos com a ordem política e econômica
vigente no Segundo Reinado. Não faltaram alusões à sua centralização e ao seu
tom modernizador.
A adminstração municipal ressente-se em geral dos inconvenientes
de sua lei orgânica, que se acha na mais completa desharmonia com
índole e lettra da legislação moderna. Mesmo quando essas
corporações fossem sempre formadas de pessoas as mais bem
intencionadas, e que por sua intelligencia podessem supprir de algum
modo á fraqueza e defeitos, de sua organisação, ainda assim os
maus effeitos de uma lei não apropriada ás circusmstancias se farião
sentir. É evidente, e geralmente reconhecida em todo império, a
necessidade de se alterar a instituição d’esses corpos, ao mesmo
tempo deliberativos e executivos, restringindo, definindo e precisando
suas diversas atribuições, no interesse da boa gestão dos negócios
locaes, segundo os princípios de uma bem entendida centralisação
(RIO DE JANEIRO, 1848, p. 39).
Dessa humilde casa, que tem o nome de escola, pende o futuro de
toda uma sociedade. No meio da reacção que se operou em algum
tempo contra as idéas da centralização, o ensino que era o laço mais
forte da unidade do imperio, foi roto, arrancando-se-lhe a
uniformidade e substituindo-a pela cor local de cada provincia. (...)
Esta provincia não pode deixar de disputar precedencia á muitas de
suas irmãs (RIO DE JANEIRO, 1859, p. 57).
Em outra fala e em outro momento, o problema das precárias condições de
muitas municipalidades persistia. No entanto, é importante perceber que estas
passaram a ser relacionadas sobretudo às pequenas localidades, reforçando o
papel dos principais centros da província que se sustentavam e geravam renda aos
cofres provinciais e nacionais. O desafeto de algumas falas confirmava, para nós, o
170
quão era arraigado o Estado territorial imperial nos “microdomínios da vida
cotidiana”. Sobre os pequenos núcleos municipais, um presidente registrou:
Dependentes em tudo da Assembléa e da presidência da provincia, e
dispondo de escassos recursos, que em algumas dellas são
absorvidos pelas despezas do pessoal, não têm as Camaras
Municipaes a necessária iniciativa, e vivem pela parte de expediente.
Cumpre, todavia, não attribuir somente aos cios da lei, o que é
também devido á índole de nosso povo, que está sempre á espera da
acção do governo em tudo que diz respeito aos interesses communs
da sociedade (RIO DE JANEIRO, 1869, p. 26).
O papel das principais cidades no projeto provincial e imperial de “espalhar
luzes” sobre o território também se confirmava quando a matéria era a instrução.
Dois pontos aqui devem ser observados. O primeiro era o fato de que a palavra
“educação” não estava posta, cabendo ao Estado a missão de “instruir” a
população, dar-lhe ordenamentos. Pensamos ser reveladora esta realidade diante
do contexto em que se inseria o império brasileiro naquele momento e cujas
premissas articulamos neste trabalho. O segundo ponto fundamental para a nossa
tese confirma a precariedade da “instrução” ou o seu pouco valor enquanto
elemento de formação de cidadania, mas confirma o projeto territorial pensado a
partir da cidade. Mais ainda: não de todas as cidades. Pinçadas do início do período
de Dom Pedro II, identificamos como reveladoras dessa questão as seguintes falas:
Ja n’outra época mandou a Assembléa sobr’estar no provimento das
cadeiras de instrucção secundária com intuito de formular um
systema geral de estudo. Dispersas essas cadeiras pela província, e
entregues os seus professores a si mesmos, quasi nenhuma tem
podido ser a acção do Governo sobre taes Escolas; que uma das Leis
últimas permitio se provassem. He mui conveniente pois que sejão
ellas subordinadas a um centro, e como existe o Diretor das escolas
primárias, para o qual cargo he sempre nomeada pessoa de variada
instrucção, me parece o mais habilitado para ser ao mesmo tempo
Director das escolas de Instrucção secundária, ou seja ensinada por
Professores e collocados nas diversas Villas e Cidades da província,
ou reunida em Lycêos e Collégios Provinciaes. Como se acha
atualmente dispersa, sem inspecção, pouco fructo tem produzido
semelhantes estabelecimentos. (...) A única participação que tive de
seu Director (Lyceo d’Angra dos Reis) foi um offício em que elle me
pedia providências para se poderem realisar os exames dos alumnos,
que o frequentarão o anno findo, porque os Professores do Lyceo lhe
havião declarado que não se achavão habilitados para examinarem
os examinados senão nas matérias próprias de suas cadeiras, não
tendo conhecimento nas das outras. Este facto demonstra, no seu
entender, que estabelecimentos desta ordem são sempre
171
collocados com mais fructo nas grandes Cidades, onde abundão
as capacidades, que ainda mediante escassos ordenados se
dedicão ao magistério. Não julgo que esta capital necessite de
um Lyceo idêntico, pela proximidade, em que esta da Corte, onde
existem estabelecimentos soffríveis d’instruccao primária e
secundária; mas certamente para o Norte da província reputo uma
necessidade; e bom serviço fareis a província dotando com um
Lyceo a Cidade de Campos, o lugar mais longe da Província
inquestionavelmente. Este Lyceo porém deverá ser montado de
forma que podesse espalhar algumas luzes sobre a agricultura,
estabelecendo-se cadeiras approvadas para tal fim (RIO DE
JANEIRO, 1843, p. 45-46, grifos nossos).
Ninguem hoje desconhece que entre nós, desconexa, sem unidade,
sem uma direcção central, a instrucção publica não tem o carater
de uma instituição nacional; e longe está de corresponder á
natureza, índole e necessidade do paiz. Tão rico nos tres reinos da
natureza, em vez de propagarmos as sciencias physicas, para
aproveitarmos todos os dons que a Providencia tão liberalmente nos
outorgou, a instrucção de nossas escolas, collegios e lyceus é quase
exclusivamente litteraria. Nossos mancebos assim acostumados a
uma instrucção classica e especulativa, não aspirão senão a um titulo
de bacharel, ou doutor, que lhes presumpção de saber, e não
encontrarão outro meio de vida senão o de empregados
publicos. Entendo, Srs., que é tempo de dar outra direccção ao
espírito de nossa mocidade, excitando-lhe o gosto pelos
conhecimentos uteis, formando homens activos e intelligentes que
cultivem a riqueza do paiz, que tirem nossa agricultura da velha rotina
que preguiçosa segue ha tantos annos, e desenvolvão nossa
industria nascente, para qual abundão ahi tantos elementos, que ou
ficão estereis, ou vamos permutar com o estrangeiro, para que nol-os
transforme em objectos de primeira necessidade, que em retorno nos
são vendidos a subido preço. Quando assim me exprimo, não
pretendo proscrever os estudos litterarios; sei que elles engrandecem
a esphera do pensamento, entreteem isnpirações generosas e são
indispensaveis á educação moral da nação; tenho-os até como
necessarios, a fim de contrabalançar essa tendencia exclusiva para
os gosos materiaes da vida, que a civilisação industrial soe
desenvolver, e que não offerecem por fim á especie humana senão o
bem-estar physico. O que eu, porem, condeno e considero
altamente prejudicial ao paiz, é que a instrucção classica se
alimente a expensas dos conhecimentos uteis, das sciencias e
das artes que tanto interessão ao commercio, industria e lavoura
(RIO DE JANEIRO, 1847, p. 41, grifos nossos).
Em meio à precariedade da instrução, contando também a dos instrutores, os
exemplos a serem transmitidos seriam todos os provenientes da base econômica e
do jeito de ser das elites baseado na formação culta e seletiva e nos costumes de
uma classe que se espelhava na “civilizada” Europa. E, neste mar de dificuldades,
as ideologias geográficas são prontamente acionadas. Niterói, apesar de capital da
172
província não mereceria tanto destaque em relação às necessidades observadas
em Campos por uma única razão: sua localização no território. De caráter
predominantemente administrativo, a primeira se subjugaria à Corte tão próxima. De
contrapartida, a segunda era tomada pelo que representava para a economia
nacional e pela necessidade de superar efetivamente sua distância física do poder a
partir dos mais variados instrumentos. Mais revelador ainda para o nosso trabalho é
o fato de que os presidentes da província vêem a instrução como ferramenta para
“iluminar” a agricultura prioritariamente. O saber aqui é meramente técnico,
operacionalizado para agregar territórios que excediam o espaço restrito da cidade.
Assim, através de aparatos localizados em alguns pontos da província a gerência
em espaços largos estava dada. E na retórica, instrução, defendida principalmente
por seu viés técnico, não era educação e sim geopolítica territorial apenas.
Sobre este aspecto ainda, são relevantes os seguintes trechos:
Algumas Camaras Municipaes reclamão a favor de seus respectivos
Termos a creação de novas escolas de Primeiras Letras, e de outros
estudos menores; e porque vos compete providenciar a este respeito,
farei remetter á Secretaria da Assembléa Provincial todos os
documentos relativos a este e outros assumptos. Não devo porém
deixar de emitir a minha opinião sobre objecto de tanta magnitude, e
vem a ser: (...) fôra de meu parecer que, quando mesmo se julgasse
dever continuar inteiramente gratuito o ensino dessas materias,
conviera reunir em Collegios, e em tres ou quatro differentes
pontos da Província todas as Cadeiras creadas, e que se
houverem de crear. Assim tornava-se mais facil a disciplina destes
estabelecimentos, e a despeza com que o Estado deve carregar
achar-se-ha mais módica e profícua (RIO DE JANEIRO, 1835, p. 4,
grifo nosso).
Não posso informar a V. Ex. qual seja o numero de alumnos
matriculados no corrente anno; asseguro porem que no anno
proximo findo elevou-se a mais de 6,000, sendo cerca de 4,000 do
sexo masculino e o resto do sexo feminino. Comparando-se esse
numero com a população approximada da provincia de 840,000
habitantes, vê-se o fundamento das minhas serias preoccupações no
começo deste assumpto. Para uma população de 840,000 almas ha
em toda a provincia 176 escolas de ambos os sexos. Reduzido que
seja aquelle numero a um terço por causa da escravatura, ainda
assim teremos para cada escola o numero de 1,590 individuos, dos
quaes discriminando outro terço, isto é, deduzindo os adultos, resta
ainda a cada uma dellas o numero de 530 meninos. Não avanço pois
proposição que não esteja no espirito de muitos; o atraso da
instrucção primaria indica a necessidade de uma reforma no seu
regime actual. (...) Quanto á instruncção publica secundaria, permitta-
me V. Ex. confessar-lhe que não conheço provincia alguma do
173
Brazil em que ella esteja menos considerada do que na do Rio de
Janeiro. Apenas existem 3 escolas publicas, sendo 2 de francez,
uma em Angra dos Reis e outra em Campos, e 1 de inglez nesta
capital, entretanto que nas outras provincias de ordem inferior, pelo
menos tem as suas capitaes um lycêo publico, em que se leccionão
todas as materias preparatorias exigidas para o curso superior das
academias. Sei que a isso me objectárão, que a proximidade da
corte dispensa essas aulas. Talvez haja razão, entretanto não o
creio porque os poucos collegios particulares de instrucção
secundaria que tem a capital são frequentados por grande numero de
alumnos (...) (RIO DE JANEIRO, 1867 [a], p. 9, grifos nossos).
Em especial, esta última citação tenta discutir a questão das deficiências do
sistema de ensino no que se refere à sua pouca abrangência tanto em termos
populacionais (não apenas quantitativos pelo tom mais liberal do discurso) quanto
em termos territoriais. Expondo algumas mazelas da província, defende a idéia de
um ensino mais irradiado pelos municípios em detrimento a um discurso em prol de
uma dada natureza “inteligente” conferida apenas a alguns deles.
57
Independente das conjunturas políticas no executivo provincial, o fato era que
a infraestrutura de comunicações assumia papel preponderante fosse para expandir
um sistema de instrução ou para otimizar o escoamento da produção econômica e a
disseminação das ordens. Se a questão fundamental que estava dada era a de
suprir o território de mecanismos de integração, importante se faz listar os portos
que funcionariam como elo entre o interior e as rotas oceânicas e indicar também as
principais vias térreas que em um dado momento do Império mereceram atenção
por parte das sucessivas presidências. Quanto aos portos, cabe a seguinte citação:
Além dos portos principaes das cidades de Cabo Frio, e Angra, e
das Villas de Macahé, S. João da Barra, Itaguahy, Mangaratiba, e
Paraty, nas quaes criei collectorias, outros secundários existem, dos
quaes os que demorão ao Sul do Rio de Janeiro começão a florescer
com a freqüência das tropas que descem do centro desta provincia, e
da de São Paulo, principalmente dos municípios do Bananal e Arêas,
com quantidade de café, que he daqui levado por mar para o Rio de
Janeiro. A necessidade de conduzir com maior facilidade e menor
despendio esse importante e avultado producto da nossa
Agricultura tem feito tempos a esta parte, com que os Povos
tenhão aberto algumas communicações para aquelles pontos da
costa que offerecem maior proximidade; e para o embarque a
commodidade precisa. Alguns destes portos, ou saccos, tem attrahido
a si muitas Tropas que antes se dirigião á respectiva cidade, ou Villa,
57
“Ora, ha certas localidades onde torna-se difficil, quase impossível mesmo, achar bons monitores; e
por isso aquelle methodo [de ensino secundário] é principalmente adoptado nas grandes cidades e
povoações intelligentes (RIO DE JANEIRO, 1847, p. 40, grifo nosso).
174
compartindo assim, e diminuindo mais ou menos consideravelmente
o seu Commercio (RIO DE JANEIRO, 1836 [b], p. 24, grifos nossos).
Observando esta dinâmica do território, atrelada ao crescimento na importância
de determinadas vias e regiões, focalizamos o papel do aparato institucional
montado (não sem conflitos) para tal, justificando, pelas reformas identificadas nos
organogramas apresentados, a atenção que as obras públicas relativas às vias de
circulação tiveram junto ao poder provincial e central. Aliás, vias térreas estas
hierarquizadas no final da década de 1870 por conta de reivindicações anteriores e
constantes junto à Assembléia Provincial como nos mostra o seguinte trecho:
A classificação das estradas da provincia era indispensavel para guiar
o governo na decretação das despezas, e desde longa data havia
sido infructiferamente tentada. O regulamento dado pela deliberação
de 4 do corrente mez, attendeu a essa necessidade, estabelecendo
tres ordens de estradas e definindo os requisitos da classificação em
cada ordem: por outra deliberação da mesma data, completei o
trabalho, classificando as estradas de 1ª e 2ª ordem, únicas que ficam
total ou parcialmente a cargo da provincia (RIO DE JANEIRO, 1878,
p. 6).
Ao observarmos uma divisão em três ordens de estradas, sendo uma delas
excluída totalmente da alçada da responsabilidade do poder provincial, buscamos
marcar que o adjetivo “público” foi sempre tomado como neologismo visto que na
prática este setor da administração estatal revelava um dos principais pontos na
estrutura do sistema imperial: a relação intnseca entre as esferas públicas e os
interesses privados. Fossem nos documentos do Ministério do Império (referentes
não apenas ao Rio de Janeiro, mas também às demais regiões do país) ou dos
presidentes fluminenses, esta forte imbricação estava dada mostrando uma certa
expectativa dos governos pela ação privada e um certo desconforto quando de sua
ausência. As citações a seguir mostram como a iniciativa dos “empresários” era
desejada e instituída frente às constantes declarações a respeito das limitações das
rendas públicas no que se refere às obras mais corriqueiras no dia-a-dia da
província (como a arrematação de estradas) ou aos intentos de grande porte (como
os primeiros projetos para a abertura de “caminhos de ferro” efetuando a ligação
entre a Corte e as províncias vizinhas de Minas Gerais e São Paulo). Com efeito,
175
A Villa de Parati tem decahido muito do seu commercio por se haver
tornado cada vez menos transitavel a sua estrada da Serra (...). Na
falta de empresario o Governo mandou dar começo á obra,
applicando o rendimento da Barreira, que pouco avulta no estado
decadente do seu commercio; e hum conto de réis mensal, da
consignação para as obras publicas. Pareceo conveniente a clausula
de emprestimo, para que esta somma, quando puder ser paga pelo
rendimento da respectiva barreira, utilisar a outra estrada, ou se
remetta, pedindo-o assim as circustancias. Do mesmo modo se tem
praticado com outras estradas, que tem renda própria (BRASIL, 1832,
p. 28-29).
Começando pela Provincia do Rio de Janeiro, ha a participar-vos que
o engenheiro César Cadolino tem projectado a construcção de huma
estrada de fero para transito de carros movidos por machinas
locomotivas, a qual, partindo do Campo de S. Christovão, finalisar
em S. João d’El-Rei na Provincia de Minas Geraes. O requerimento
do emprehendedor foi remettido ao Tribunal da Junta do Commercio,
o qual ainda não consultou sobre este importante objecto, por lhe
faltarem esclarecimentos, que são exigidos do referido Engenheiro
(BRASIL, 1838, p. 32).
O Governo, tomando em consideração as Representações de
numerosos habitantes do Município da Corte, e da Provincia do Rio
de Janeiro, e sobre tudo o parecer da commissão de Agricultura de
huma das Augustas Câmaras Legislativas, dado em 23 de Setembro
de 1839; attendendo tambem á convenienia de se transplantar para o
Brasil huma industria, de que não temos ainda conhecimento pratico;
concedeo a Thomaz Cochrane o Privilegio Exclusivo, pelo tempo de
oitenta annos, para a construcção de hum caminho de ferro, que deve
principiar no Município da Corte, e terminar na Provincia de São
Paulo; concedendo-lhe para isso as vantagens, que o mesmo
Governo entendeo caberem nas suas attribuições, e constão, assim
como as obrigações da Companhia, que o dito Cochrane tem de
organisar para levar a effeito aquella empresa, das condições
annexas ao Decreto de 4 de novembro do anno passado. Com as
simples concessões do Governo não poderá realisar-se aquella obra:
o empresário terá de certo de recorrer ao corpo legislativo para
amplia-las de huma maneira proporcionada á magnitude do objecto
própria (BRASIL, 1840, p. 40).
Não tendo apparecido quem arrematasse a estrada que do porto de
Estrella conduz ao Parahybuna, ordenou a Presidência que
começasse a obra por administração; encetada em 11 de janeiro
findo com a consignação (por ora) de 6:000$000 mensaes; tem 55
trabalhadores e está em effectivo andamento (RIO DE JANEIRO,
1843, p. 12).
176
Uma vez que a documentação fala por si sobre tais aspectos, selecionamos o
relatório de 1843 do presidente João Caldas Viana
58
para uma espécie de raio-x das
obras de circulação na província. E os motivos foram: 1) Trata-se de uma das
descrições mais detalhadas sobre este assunto entre o conjunto de relatórios; 2) O
momento em que foi feito refletia o impulso que a questão tomou no início do
Segundo Reinado, quando foi tratada como prioridade para a nação; 3) Vivia-se um
período de “estado sactisfatorio e florescente das finanças da Província”; 4) Boa
parte das obras indicadas se estendeu por períodos posteriores de maneira que
eram citadas nos relatórios subseqüentes; 5) O fato do presidente ser campista
revelava como seus interesses locais, atrelados a região atingida por aquela
municipalidade, ganhavam destaque no trato provincial; 6) Não apenas na
justificativa de aumento da arrecadação, o fato do presidente ser campista mostrava
como se revelava os mecanismos de representação vigentes; 7) Ilustram com
detalhe a relação público-privado na estruturação do espaço a partir de interesses
locais e regionais ao se referir aos constantes entraves ou sucessos nos
arrematamentos; e 8) Denotam os espaços tomados para circulação na província
anteriores ao advento efetivo das ferrovias, que lhe daria uma feição atrelada a
questões relacionadas a um outro nível de contexto.
Havíamos falado sobre uma sistematização das principais realidades que eram
verificadas no processo de montagem de infra-estrutura territorial de circulação por
que achamos que os conflitos e agentes transparecem no texto e, como dito, nos
oferecem profícuos elementos de análise. Tomamos, a partir do Quadro 3 a seguir,
a indicação dessas obras e a percepção da dinâmica em que estão inseridas como
elementos essenciais para a nossa reflexão.
58
O Apêndice 2 mostra que ele havia assumido a província em 1838. Neste segundo governo, foi
primeiro interino por conta da exoneração do Marques de Paraná até 2 de março de 1843 e depois
efetivo até 11 de abril de 1844. Por seu intermédio, a Fazenda Córrego Seco foi arrendada ao Major
Koeler e pelo seu papel com referência a essa fazenda de Dom Pedro II é tido como um dos
fundadores de Petrópolis.
177
Quadro 3: Obras de infra-estrutura de circulação na província fluminense em 1843.
Estrada Geral de Itaguahy
Passara por melhoramentos e “offerece seguro transito a qualquer hora do dia ou da
noite
Estrada da serra de Mangaratiba
A ordem era aplicar o rendimento liquido da respectiva Barreira, mas este se mostrou
insuficiente. Estava passando por obras pequenas com o trabalho de 15 africanos livres. Pede
a Assembléia 32:000$000 para o término das obras em um prazo de 3 anos pois, “por sua
importância esta estrada não deve ser mais demorada
Estrada da Pedra e João d’Oliveira (para Angra dos Reis)
Obras de conservação com o rendimento líquido da Barreira da Pedra e sob a direção do
negociante João Altenfeder.
Ponte e pontelhões no rio Palheiro
Reparos e madeiramento e um aterrado feito à custa de subscrições e donativos.
Estrada da Mambucaba
Levantamento indicou a necessidade de construção de uma ponte orçada em 10:271$800.
Propõe o estabelecimento de Barreira e a elevação da consignação.
Estrada de Paraty
“Na estrada nova pouco se fez durante o anno financeiro. Na velha, por onde continua o
trânsito geral do Commércio fizerão-se algumas estivas, aterros e pequenas calçadas nos
esgotos e alguns outros reparos tendentes a sua conservação, e a não difficultar o trânsito.”
Estrada do Mato Grosso
Devido ao péssimo estado nos lugares Morro do Cambraia e Morro do Alexandre, o Governo
dissolveu a Comissão Administrativa da Estrada dos Fazendeiros substituindo-a por outra
composta por um Conselheiro Barreto Pedrozo e por dois cidadãos Bento da Cunha e João
Jose Ferreira. A consignação passou para 300$000 mensais e foi destinada a renda líquida
da Barreira do Mato Grosso.
Estrada do Rodeio
O cidadão arrematante Daniel Joaquim de Sant’Anna se obrigou a fazer mediante a quantia
de 8:000$000 obras na estrada. Entre elas: pontelhão em frente de sua casa com pegões
de pedra e cal e 25 palmos de vão
Estrada da Polícia
“O Governo, attendendo a importância desta estrada contractou em 15 de janeiro de 1842
com o Tenente Coronel Albino José de Siqueira, a fornecer elle os operários precisos para o
concerto desta estrada pelo jornal diário de 900 réis cada trabalhador, correndo a despesa
com o sustento, curativo, e ferramenta necessária por conta do contractador”. Um outro
contrato, agora com Antonio Pereira de Sampaio, estabelecia o conserto da ponte do
Desengano e a casa da mesma Barreira por 3:900$000.
Estrada do Commércio
A parte plana entre a raiz da Serra do Tinguá e a Villa de Iguassú está em bom estado e
oferece trânsito de toda qualidade. Em 6 léguas ela tem 6 pontes de madeira de Lei
assentadas em sólidos paredões de alvenaria seca, 1 aterro de 200 braças por 28 palmos de
largura e 6 esgotos subterrâneos convenientemente dispostos para o escoamento das águas.
A parte entre o alto da Serra e o ribeirão das Palmeiras tem 8 pontes e 10 esgotos bem
construídos. Entre o ribeirão das Palmeiras e o rio Santana “falta muito trabalho nas suas
400 braças”. Daí ainda faltam 5 léguas para a margem do Paraíba. A ponte no Paraíba com
passagem para Ubá foi orçada em 80:000$000 e coube ao Coronel Conrado Jacob
Niemeyer apresentar projeto. Por contrato adicional de 17 de dezembro de 1842 no valor de
24:000$000, o mesmo fará a execução das obras de calçamento de toda a serra e guarnecerá
os lugares mais estreitos com grandes pedras ou frades de madeira de lei e calçar a Serra
Viúva nos lugares de maior declividade. Recebeu prazo até 30 de setembro de 1844. “He de
lamentar que esta estrada, que tem custado a província enormes despezas, não possa dar
trânsito a carros e seges! O declive da serra chegando a ser em certos lugares de 1:7 a
condena a não servir senão para animaes de carga.”
Estrada e Serra do Couto
Acha-se feita a porção da Serra e o restante consiste apenas “n’uns trilhos mal abertos”. Esta
estrada “he empresa” do Coronel Custódio Ferreira Leite e seu irmão Francisco Leite Ribeiro.
Estrada do Vernek
Precisa só de conservação e existe um contrato com o Tenente Coronel José Pinheiro de
Sousa Vernek de 4 anos para conservá-la desde a encruzilhada com a estrada do
178
Commércio até a ponte do rio do Alferes na Fazenda do Pau Grande.
Estrada dos 3 Córregos do Porto Novo do Cunha
A primeira porção está feita entre os 3 córregos e Bernardo; tem uma boa ponte sobre o rio
Preto. A 2ª entre Aparecida e o Porto Novo do Cunha foi iniciada sob a comissão formada pelo
brigadeiro Inácio Gabriel Monteiro de Barros, padre Manoel Dias Codeco e Luiz de Sousa
Brandão com consignação mensal de 1:000$000.
Estada Velha da Estrella
Foram removidos 18 africanos livres das obras do Cunha para esta obra.
Estrada Normal da Estrella
Não houve arrematantes com a marcação de 6:000$000 mensais e o governo iniciou as obras
em janeiro deste 1843 com 55 trabalhadores. Abriu-se um caminho da casa de Leonardo Dias
Alves na estrada velha até o lugar dos novos quartéis, roçou-se e derrubou-se no alto da serra
uma nova picada, fez-se vários ranchos, armazém, casa do Administrador e “outros misteris”.
“Estes, e muitos outros trabalhos miúdos são apenas preparatórios, mas trabalha-se com
grande actividade, e farei todos os esforços por corresponder ao empenho, que esta
Assemblea demonstrou para a construção d'esta importantíssima estrada, na qual autorisou
o Governo a despender até a quantia annual de 200.000$000.”
Estrada do Porto das Caixas a Cantagallo
Muitos reparos na serra do Morro Queimado, na vargem de Santana e na ponte entre o rio
Tuy e o rio Valério. Os consertos entre a ponte de Casseribu e a morada de Domingos
Caetano Madeira aguardam acordo de valores referentes aos pontelhõoes. Da ponte do rio
Tuy e o rio Valério, o estado da estrada he péssimo por ser o solo pedregozo e inundável com
as enchentes do rio Banguella. Há de se abrir uma nova direção pela outra encosta da
montanha. Da villa de Nova Friburgo a Cantagallo, todos os três caminhos são
péssimos. O mais breve (o da banqueta) he crivado de atoleiros. Investiga-se uma nova
picada.
Estrada de Cantagallo a Macahé
Os trabalhos estão divididos em três secções: 1) entre Cantagallo e o córrego da Luciana
(arrematado por Augusto Maulaz), 2) entre os córregos da Luciana e Sanglard (João Baptista
Midosi) e 3) entre o córrego de Sanglard e o porto de Sapucaia (Bernardino Jose d'Almeida).
Os trabalhos executados em qualquer das três Secções não tem sido feitos com
continuidade
Estrada que de Nictheroy conduz a Maricá pelo Mato da Paciência
Estado deteriorado por não ter o seu arrematante cumprido com o que se obrigou .
Estrada do Morro da Viração
Necessita de consertos e tenciona por em arrematação.
Estrada do Morro do Cavallão
Necessita de consertos e tenciona por em arrematação.
Estrada que de Campos conduz a Nictheroy
É, sem dúvidas, a principal da 4ª Secção e a que mais incômodos, fadigas e precipícios
oferece aos viajantes. “De Nictheroy até Cabo Frio, differentes direccões melhorão o trânsito
no tempo das cheias, mas de Cabo Frio a Campos he de extrema necessidade que se evitem
os passos perigozos, que em certos lugares ameação a vida dos passageiros.” O aterro do
brejo contíguo ao rio das Ostras está arruinado e “serve hoje só para aumentar a dificuldade
de o transporte, quando as ágoas extravasadas do rio (...) chegão as vezes até aos arções da
sella e outras vezes obrigão os animaes a nadar. Nesta passagem morreo um preto no mez
de Novembro último”. A obra foi decretada pela Assembléia. O arrematante do aterro do
Quilombo em Macabu o fazendeiro Joaquim Ribeiro de Castro tem um ano para as obras.
Cabe a Câmara de Campos, por portaria de 10 de marco de 1840, pôr em arrematação a
estrada entre a cidade e o Ururay orçada em 30:291$800. Segundo informações técnicas, não
é prudente fazer tal obra sem antes fazer o canal entre o Paraíba e o Ururahy “obra também
de immensa importância para o Paíz. O caso merece discussão. “Vede pois, Senhores, que
na 4ª Secção não há estrada alguma em construção, ou em reparos.” Na estrada pública na
margem direita do rio Parahyba, que do Município da Villa de São João da Barra conduz a
Cantagallo, mandarão se fazer melhoramentos na porção pedregosa da estrada do Morro do
Fabre a custa do Cofre Municipal; e bem assim a ponte sobre o rio do Collégio do mesmo
cofre pela Lei de 26 de maio de 1842 nº 267. Pede para que a Assembléia reconheça tais
despesas como provinciais.
Ponte do Rio d’Ostras
Necessita de obras devido ao ruinoso estado.
179
Ponte sobre o Rio Carrapato na Lagoa de Carapebus
O aumento do nível da água na lagoa chegou ao piso da ponte, estragando-a. “O mesmo Ten
Cel Jose Carneiro da Silva e irmão que a construíram com expensas suas avisaram que irão
reparar às suas custas os estragos.”
Ponte sobre o Rio Ururahy
Precisa de reparos na pintura e na substituição de algumas tábuas. Tinha a conservarão
mantida (via termo com a Câmara local) por um fazendeiro que falecera há um ano.
Ponte da Valla navegável de que trata a Lei nº 244
A Câmara de Campos fez esta ponte e construiu uma barca de passagem para o rio S João.
Faltam aterros e pontilhões que serão em breve feitos.
Barca de passagem sobre o Rio Macahé
“O atterrado do lado não está solidamente construído, e por isso presumo que será de mui
curta duração.”
Aterrado do Tipota
O arrematante desde 1837 fez uma obra de 391,5 braças que só serve no tempo seco.
Ponte sobre o Rio Santo Antonio no Município de Nova Friburgo
O arrematante faleceu e as obras ficaram pela metade.
Ponte do Banquete (sobre o rio Grande, liga Cantagalo a Nova Friburgo)
“Esta inteiramente arruinada e precisa ser reedificada, ou feita toda de novo”
Ponte do Casseribu
Esta com soalho podre e nega passagem. “A ponte sobre o rio Valério na estrada do Morro
Queimado, a ponte do rio Sapucaia na estrada de Cantagallo ao Porto da Caixas, e a ponte do
Barreto na estrada de Nictheroy, achão-se destruídas; urge pois que sejão reconstruídas, e
feita uma de novo sobre o rio Macacu na estrada de Cantagallo ao pé da povoação de Santa
Anna.”
Ponte do Bananal
Já estão sendo providenciadas obras no pegão e na base.
Ponte do Piraqueassu junto a Villa de Paraty
“Sendo esta ponte ordenada pela Lei nº 214 marcou-se-lhe o lugar em que deverá ella ser
collocada, e poz-se em arrematação a sua construcção; mas não tendo apparecido quem a
quizesse tomar por arrematação, ficou sem seguimento algum esta obra, orçada com largueza
em 5:312$500.
Ponte sobre o Rio Santo Antonio
“Reconhecendo o governo que esta ponte era uma necessidade pública do lugar na estrada
do Picu, ordenou que se levantasse a planta, fizesse o orçamento, e organizasse as
condições para a sua arrematação.” Foi entregue ao Ten Cel Antonio Pereira Leite.
Ponte sobre o Rio Bananal e Barreiros na estrada entre as Villas de Barra Mansa e Rezende
Ordenará reparos na estrada “pela frequência com que he transitada” (p. 37) e a construção
de uma ponte sobre o rio Bananal por 8:070$000, abandonando o projeto de ali construir uma
ponte barca. Pede urgência “pois que por esta estrada descem continuamente grande
número de tropas com café e outros gêneros”. Existe uma ponte arruinadíssima sobre o rio
Barreiros aos cuidados da Câmara de Rezende. Pede 2:795$000 para a obra.
Ponte sobre o Rio Pirahy na Fazenda do Coronel José Francisco Ferreira
Esta importante e elegante ponte deu passagem ao público no dia 10 de novembro do ano
findo. Promete vida longa pela solidez e perfeição. Custou a Fazenda Provincial 9:384$700,
mais 400, 400 e 50$000 de subscrição. “Collocada no cruzamento de duas
frequentadíssimas estradas de Minas e S. Paulo, e tendo franqueado um passo mui diffícil
do rio, he de transcedente utillidade”. Foi administrada gratuitamente pelo Dr. João José
Pereira. Já ordenou a 1ª Secção fazer projeto para collocação de uma barreira com taxas
razoáveis para a sua conservação.
Ponte sobre o Rio Pirahy junto a povoação
Foi aprovada em 1840 e construída em um ano. Foi feita com verba da Câmara e
administrada pelo cidadão Manoel José de Barros Vianna “com grande zelo e desinteresse”.
Caminhos da Vendinha, no Passa-Três, e do Arrozal e cortes do Rio do Sacco em
Mangaratiba
Precisam de obras mas só serão realizadas se “estado das rendas permitir”.
Melhoramentos na Barra do Rio Macacu
O Capitão d’Engenheiros Egídio José de Lorena está sondando as barras dos vários rios
desta bahia para apresentar os meios de melhoramentos. Fez a planta hydrographica do rio
Inhomirim desde a sua foz até o Porto da Estrella.
180
Pharol da Estrella
Pede para que seja reparado nos moldes do de Macacu.
Canal do Nogueira
As obras, iniciadas com tanto entusiasmo por conta da importância do canal e a utilidade que
ia prestar em todo o sentido e até na higiene pública, estão paradas e abandonadas.
Valla navegável de Cacimbas
Está em andamento pela Companhia empresária. Já transpôs a lagoa do Silva (onde
navegam diariamente 10 a 12 canoas de todos os portes, carregadas de taboado, e das
produções agrícolas de todos os portes)
Canalisação da Lagoa Araruama em Cabo Frio
A escavação dos baixos da lagoa é a obra mais urgente do município mas de difícil
realização por conta do “estado sempre vacilante, e muitas vezes péssimo da renda da
Província”.
Corte do Rio de Saco em Mangaratiba
Tamm é obra urgente do município e também de difícil realização por conta do “estado
sempre vacilante, e muitas vezes péssimo da renda da Província”.
Melhoramento de navegação pelo Porto de Itaguahy
Como os obstáculos progridem na foz, mandou levantar obra e aguarda o retorno.
Secção do grande canal de Nictheroy a Campos entre esta última cidade e a Villa de Macahé
Repete o pedido do antecessor sobre a importância desta obra e diz que já providenciou os
seus levantamentos.
“Exceptuada a estrada de ferro projectada desde Rezende até a Corte, não concebo que haja
de mais transcedente utilidade, de maior importância, e que immediatamente deve
concorrer para a prosperidade da Província, do que o Canal (...) um bom Canal facilita os
meios de trazer aos grandes mercados as produções de seu solo. Elle parece destinado a
tornar-se a Veneza Brazileira. Esta obra, e uma Alfândega em Macahée, colloca o paiz em
communicação directa com o Estrangeiro, deve mudar-lhe a face para melhor dentro de
poucos annos”.
Fonte: RIO DE JANEIRO (1843, p. 25-43, grifos nossos). (Organizado pelo autor)
O conjunto de obras em andamento na província, além de indicar as regiões
mais “valorizadas” ou movimentadas em um dado momento, nos mostra as bases
com as quais o Estado promoveria seu propósito de ser territorial. Afinal, parecia
estar dado que:
Os beneficios que produzem as vias de communicação entre as
nações mais cultas e civilisadas, avultão de valor entre aquellas,
que como o Brazil ainda na infancia dos grandes melhoramentos
materiaes tem necessidade de encurtar as distancias que separão
seus ricos e productivos sertões, do litoral, em que o commercio
se desenvolve sempre em maior escala (RIO DE JANEIRO, 1867
[a], p. 9-10, grifos nossos).
Neste processo de retirada do país de sua “infância” material, o aspecto que
transpassa todas as notas que utilizamos para reflexão se refere à questão do
público e do privado. Por exemplo, como registra o último item do Quadro 3, em
texto também assinalado nesta tese, o canal entre Niterói e Campos (em si, uma
infraestrutura microrregional) extrapola a escala provincial para colocar o “paiz em
181
communicação directa com o Estrangeiro” (com E maiúsculo conforme o original),
aludindo ao tom nacional da empreitada que envolveria também atores do setor
privado. Neste sentido, a preocupação antiga de um dado presidente é ilustrativa
dessa realidade conforme registrou em seu relatório:
Não me consta que esteja formada a Companhia para abrir o Canal
de Campos a Macahé, e fazer outras obras publicas (...) os capitaes,
que nos fallecem, superabundão em outros paizes, onde
difficilmente achão vantajoso emprego, e o interesse particular he mui
sagaz em atinar com o que melhor lhe convém, confio, que não esteja
distante a epoca em que, realisada a primeira empresa, afuão para
nossa terra os capitaes e industria dos povos mais do que nós
avançados em civilisação para fazerem, com grande vantagem
nossa e delles, brotar os germes de riqueza aqui profusamente
disseminados (RIO DE JANEIRO, 1836 [a], p. 24, grifos nossos).
Portanto, para a nação que estava sendo construída deveriam convergir
também os homens de “grossa ventura”, além dos representantes do estamento
burocrático. Foi comum o envolvimento “com grande zelo e desinteresse” de ambos
nas obras de infraestrutura que possibilitariam o engrandecimento da nação e este
passaria pela instalação de barreiras a cada novo provimento. Lembremos de
Mattos (1994) e das formas encontradas pelo poder estatal para aproximar os
interesses privados dos públicos foi a promoção de mecanismos para o
melhoramento das condições físicas das estradas e a instalação de equipamentos
públicos, fato que permitiria a ampliação das trocas econômicas e políticas.
Chama a atenção também a indicação da coleta de dados sobre os locais e a
elaboração de cartas hidrográficas. Muito do material produzido naquele momento
sobre o território se referia a rede de “cannaes por água” que deveriam cortar a
província, pois a cada tempo a sua técnica. Esta solução vinha, como vimos, desde
o período colonial e também foi política central durante o Império.
Quanto às demais informações e agentes observados na sistematização que
fizemos através do Quadro 3, o conjunto de grifos confirma processos e agentes
com os quais trabalhamos em nossa tese.
Um outro ponto a ser destacado com importância é aquele que se refere aos
equipamentos e serviços voltados à disseminação da ordem e à civilização na
província em consonância com os ideais nacionais. Aqui, identificamos uma das
mais reveladoras faces do projeto imperial: a de que o território foi tomado como a
própria motivação para a nação. Ressaltemos Moraes (2002) quando afirma que,
182
desde a Independência, as elites brasileiras conceberam o país não como uma
sociedade, mas como um espaço a ser conquistado através de um movimento
expansivo de seu aparato burocrático e institucional. Nestes termos, observamos
que a construção física do Brasil foi alçada à condição de pressuposto básico para o
projeto nacional e civilizador.
Portanto, quando dizíamos sobre um dos aspectos mais reveladores do projeto
imperial em meio aos discursos analisados nos referíamos ao trato sintomático que
equipamentos físicos como escolas, hospitais, casas de caridade e cadeias
receberam, denotando uma população que era tomada apenas como instrumento.
Apesar de muita defesa em prol do aumento da receita para com estes
assuntos, a ótica era desvirtuada de um verdadeiro Estado nacional. Se antes
observamos as políticas de educação sob o ponto de vista territorial, aqui buscamos
entender como a cidadania era desvirtuada neste contexto, servindo para legitimar
imposições. Com efeito,
A despeza feita com este ramo de serviço publico fora sem duvida
huma das mas justificadas, se dela a tirasse toda a vantagem
possivel (...). Depois de havermos conseguido formar hábeis
professores, cumpre multiplicar quanto compatível for com nossos
recursos pecuniários, as escolas de Primeiras letras. Os
conhecimentos que ahi se adquirem são indispensáveis, não para
tratar dos negocios domesticos, mas ainda para bem desempenhar
todos os deveres de Cidadão (RIO DE JANEIRO, 1835, p. 3-4, grifo
nosso).
O cidadão era visto apenas pela ótica dos deveres e da vida doméstica, sem
atrelá-lo aos preceitos de uma sociedade nos padrões utilizados como referência.
De contrapartida, o aparato repressivo era ampliado apesar das dificuldades sempre
enumeradas pelos chefes do Executivo. No entanto, lembremos da força local
exercida diretamente pelos representantes da economia e da lei.
Com relação às casas de cadeia, muitas foram as recomendações para
expandir os prédios tanto em quantidade quanto em área. Aqui, não havia
entrelinhas e o aparato institucional era voltado para a coerção, sendo constantes
as reclamações quanto ao número insuficiente de guardas ou as exposições sobre
o aumento dos gastos com a manutenção e compra de munição e equipamentos do
corpo policial. Em ambos os casos, a segurança e tranqüilidade pública eram
183
acionadas para justificar os números, sobretudo em tempos de guerra (e de
afirmação nacional, por conseqüência) como nos mostra o texto a seguir:
Para acudir ao serviço da policia da capital, mandei posteriormente,
por deliberação de 14, destacar um contingente da guarda nacional
composto de 1 tenente, 3 alferes, 4 inferiores, 8 cabos e 120 praças,
sendo 20 de cavallaria, que ficará substituindo o corpo policial
durante a sua ausencia, ou emquanto se não tomarem por acto
legislativo as providencias que aconselhar a partida de mesmo corpo
para o theatro da guerra. (...) Aproveito esta occasião para render
uma justa homenagem aos sentimentos, de que se possuirão os
officiaes e praças do corpo policial provisorio, quando em um
pensamento commum de patriotismo e abnegação espontaneamente
se apresentarão a partilhar os sacrificios, privações e perigos de todo
o genero, a que estão sujeitos os valentes defensores da honra
nacional (RIO DE JANEIRO, 1867 [b], p. 9).
Em alguns relatórios, o fornecimento de homens para as comarcas era
sugerido tendo em vista a necessidade de condução de presos e recrutas a grandes
distâncias, denotando o baixo grau de fluidez destas regiões. Vale ressaltar também
os valores patrióticos sempre avultados fossem os assuntos que estivessem sendo
considerados.
Sobretudo em épocas de instabilidade potica em regiões próximas à província
fluminense, como no cenário das revoltas ocorridas em São Paulo e Minas Gerais
no início da década de 1840, o território também foi incorporado ao poder por este
viés da segurança. A demanda por maiores efetivos e em maior número de locais
se via, por exemplo, através da solicitação para construção de quartéis e,
sobretudo, pela forma através da qual a Guarda Nacional era gerenciada. Um dos
relatórios do executivo do Rio de Janeiro, o de 1843, mostra que o território
fluminense estava abrangido por 15 legiões dessa milícia, cada uma com um
coronel chefe que devia obrigação ao seu comando superior. Na divisão desse
poder, apareciam nomes civis de peso na cena da província (como representantes
de famílias de destaque econômico e político na época a exemplo dos Breves,
Vernek e d’Almeida) conforme nos mostra o Quadro 4 a seguir:
184
Quadro 4: Legiões da Guarda Nacional na província fluminense em 1843.
Legiões Freguesias a que pertencem Comando Superior
1ª Niterói Niterói, São Gonçalo e Itaipu Belarmino
15ª Magé Magé, Guapimirim, Inhomirim, Nossa
Senhora da Guia e Seruhy
Ricardo de Siqueira
2ª Itaboraí Itaboraí, Rio Bonito, Nossa Senhora do
Desterro
3ª Sto Antonio de Sá Sto Antonio de Sá, São José e
Trindade
Baltazar de Abreu
Cardozo
7ª Cantagalo e Nova Friburgo Cantagalo e Nova Friburgo
4ª Maricá e Saquarema Maricá e Saquarema Manoel Ribeiro
5ª Cabo Frio Cabo Frio, Araruama e São Pedro da
Aldeia
D’Almeida
6ª Campos e São João da
Barra
Campos, São João da Barra, São
Salvador, São Fidelis, Guarulhos, São
Sebastião e São Gonçalo
Manoel Joaquim
Pereira Baptista
14ª Macaé e Capivari Macaé e Capivari
8ª Valença, Vassouras e
Paraíba do Sul
Valença, Vassouras, Paraíba do Sul,
Rio Bonito, Paty do Alferes, Sacra
Família, Cebolas, São José e Rio Preto
Francisco Peixoto de
Lacerda Vernek
13ª Iguaçu Iguaçu, Pilar, Marapicu, Jacutinga e
Merety
9ª Barra Mansa e Resende Barra Mansa, Resende, Amparo,
Espírito Santo, São Vicente, Ferreira e
Santa Ana
José de Souza
Breves Filho
12ª Pirai e Itagu Piraí, Itaguaí, Arrozal, Dores, São
Pedro e São Paulo
10ª Parati e Angra dos Reis Parati, Angra dos Reis, Ribeira e Ilha
Grande
Ananias d’Oliveira
11ª São João do Príncipe e
Mangaratiba
São João do Príncipe, Mangaratiba,
São João Marcos, Rio Claro e
Itacurussá
e Souza
Fonte: Tabela “Commandos superiores, legiões, corpos e esquadrões de cavalaria, batalhões e corpos de
infanteria, e companhias de artilharia da Guarda Nacional da Província” (RIO DE JANEIRO, 1843).
A tabela mostra ainda um território dividido em 25 municipalidades (um número
maior de freguesias) congregadas em 15 áreas de responsabilidade de apenas 7
comandantes superiores. A este mesmo tempo, o corpo policial oficial da província
operacionalizava suas funções através de 13 destacamentos que não
correspondiam aos mesmos indicados pela Guarda Nacional (atrelada que estava à
localização da moradia de seus comandantes superiores). Eram os seguintes os
destacamentos de polícia: Capital, Campos, Cabo Frio, Cantagalo, Vassouras,
Rezende, Paraíba, São João do Príncipe, Arrozal, Itaboraí, Angra dos Reis, Barra
Mansa e Paraibuna.
Tal forma de abarcar o todo físico foi comum em diversas instâncias da
administração fosse ela civil, jurídica, eclesiástica, militar ou paramilitar, fiscal,
eleitoral, etc. O ponto de partida do comando em todas elas era praticamente o
185
mesmo: as cidades mais significativas no conjunto do território fluminense. Quanto
mais particularizado fosse o objetivo da divisão, núcleos de menor significância
assumiam algum tipo de centralidade nos documentos oficiais. No entanto, para
comandos mais centralizados apenas as “cabeças de comarcas” assumiam o posto
e traduziam a quantas o território estava efetivamente estruturado em seu conjunto
hierarquizado de núcleos referenciais. Entendemos que este processo estava
delineado através do Quadro 2 quando víamos a província por suas comarcas,
municipalidades e freguesias. Vejamos mais alguns exemplos.
O Quadro 5 a seguir nos mostra que o Decreto 1.828 de de outubro de
1856 tomava o território fluminense por 12 districtos eleitoraes para um conjunto,
naquela época, de 30 municípios. Eram eles:
Quadro 5:
Distritos eleitorais da província fluminense e Corte (1856).
Distritos eleitorais e
suas cabeças
Paróquias do Colégio Local de reunião
para votação
Parochia do
Santissimo
Sacramento na Cidade
do Rio de Janeiro
Parochia do Santissimo Sacramento na Cidade do Rio
de Janeiro, de Santo Antonio dos Pobres, de Sana
Rita, de Nossa Senhora D’Ajuda da Ilha do
Governador, e do Senhor Bom Jesus do Monte da Ilha
de Paquetá.
Escola Militar
Parochia de Sant’Anna
da Cidade do Rio de
Janeiro,
Parochia de Sant’Anna da Cidade do Rio de Janeiro,
de S. Francisco Xavier do Engenho Velho, de S.
Thiago de Inhaúma, de Nossa Senhora da
Apresentação de Irajá, de Nossa Senhora do Desterro
de Campo Grande, de S. Salvador do Mundo de
Guaratiba, e do curado de Santa Cruz.
Paço da Illustrissima
Camara Municipal
Parochia de S. José
na Cidade do Rio de
Janeiro
Parochia de S. José na cidade do Rio de Janeiro, de
Nossa Senhora da Candelária, de Nossa Senhora da
Gloria, de S. João Baptista da Lagoa, e de Nossa
Senhora do Loreto de Jacarepaguá.
Faculdade de
Medicina
Cidade de S. Salvador
de Campos dos
Goytacases,
Parochia de S. Salvador de Campos, de Nossa
Senhora das Neves, da Nossa senhora da Conceição
de Macabú, de Nossa Senhora da Conceição de
Carapebus, de Nossa Senhora do Desterro de
Quissiman, de Santa Rita da Lagoa de cima, de S.
Gonçali, de S. Sebastião, de Santo Antonio dos
Guarulhos, de Santo Antonio do Carangola, de S.
João a Barra, e do curato da Barra Secca.
Camara Municipal
da Cidade de
Campos
Villa de Cantagalo
Parochia do Santissimo Sacramento de Cantagallo, de
Nossa Senhora do Carmo, de S. Francisco de Paula,
de Santa Maria Magdalena, de Santa Rita do Rio
Negro, de S. Sebastião, de S. João Baptista de Nova
Friburgo, de Nossa Senhora da Conceição de
Paquequer, de S. Fidelis de Sigmaringa, de S. José de
Leonissa da Aldêa da Pedra, de Santo Antonio de
Padua, e do Curato de S. João Baptisa do Vallão dos
Veados.
Matriz da Villa de
Cantagallo
Cidade de Cabo Frio
Parochia de Nossa Senhora da Assumpção de Cabo
Frio, de Nossa Senhora de Nazzaret de Saquarema,
de S. Sebastião de Araruama, de Nossa Senhora da
Lapa de Capivary, de Nossa Senhora do Amparo de
Matriz da Cidade de
Cabo Frio
186
Correntezas, de Nossa Senhora da Conceição de Rio
Bonito, do Curato de Nossa Senhora da Conceição da
Boa Esperança, de S. Pedro da Aldêa, do Curato de
S. Francisco de Paula, da Sacra família da Barra de
São João, e de S. João Baptista de Macahé.
Imperial Cidade de
Nicterohy
Parochia de S. Sebastião de Nicterohy, de Nossa
Senhora da Várzea, de S. Lourenço, de S. Gonçalo,
de Nossa Senhora da Conceição dos Cordeiros, de S.
Sebastião de Itaipú, de Nossa Senhora do Amparo de
Maricá, de S. João Baptista de Itaborahy, e de Nossa
Senhora do Desterro de Tamby.
Câmara Municial da
Imperial Cidade de
Nicterohy
Villa de Magé
Parochia de Nossa Senhora da Piedade de Magé, de
S. Nicolao de Suruhy, de Nossa Senhora d’Ajuda de
Guapemerim, de Nossa Senhora d’Apparecida, de
Santo Antonio de Paquequer, de Santo Antonio de Sá
de Macacú, de S. Jose da Boa Morte, da Santíssima
Trindade, de Nossa Senhora da Piedade de
Inhomerim, de Nossa Senhora do Pilar, de Nossa
Senhora da Guia de Pacopahyba, e de S. Pedro
d’Alcantara de Petropolis.
Matriz da Villa de
Magé
Villa de Vassouras
Parochia de Nossa Senhora da Conceição de
Vassouras, de Santa Cruz dos Mendes, de S. Pedro e
S. Paulo da Parahyba do Sul, de Santo Antonio da
Encruzilhada, de Sant’anna de Cebolas, de S. José do
Rio Preto, de Nossa Senhora da Conceição da
Bemposia, da Sacra Família do Tinguá, de Nossa
Senhora da Conceição do Paty do Alferes, de Nossa
Senhora da Glória de Valença, de Santa Teresa, de
Santo Antonio do Rio Bonito, de Nossa Senhora da
Piedade das Ipyabas, e de Santa Isabel do Rio Preto.
Matriz da Villa de
Vassouras
10°
Villa da Barra Mansa
Parochia de S. Sebastião da Barra Mansa, de S. José
do Turvo de Nossa Senhora do Rosário de Quatís, de
S. Joaquim, do Espírio Santo, de Nossa Senhora do
Amparo, de Sant’Anna do Pirahy, de S. João Baptista
do Arrozal, de Nossa Senhora das Dores, de Nossa
Senhora da Conceição de Resende, do Senhor Bom
Jesus do Ribeirão de Sant’anna, de S. José de Campo
Bello, de S. Vicente Ferrer, e no curato de Santo
Antonio da Varzea Grande.
Matriz da Villa da
Barra Mansa
11°
Villa de Itaguahy
Parochias de S. Francisco Xavier de Itaguahy, de
Nossa Senhora da Conceição do Bananal, de S.
Pedro e S. Paulo do Ribeirão das Lages, de S. João
Marcos, de S. José da Cacaria, de Nossa Senhora da
Conceição do Passa-Tres, de Nossa Senhora da
Piedade de Iguassú, de Sant’Anna das Palmeiras, de
Nossa Senhora da Conceição d Marapicú, de Santo
Antonio de Jacotinga, e de S. João de Merity.
Matriz da Villa de
Itaguahy
12°
Cidade de Angra dos
Reis
Parochia de Nossa Senhora da Conceição de Angra
dos Reis, de Sant’Anna da Ilha Grande de fora, de
Nossa Senhora da Conceição da Ribeira, de Nossa
Senhora do Rosario de Mambucaba, de Nossa
Senhora da Guia de Mangaratiba, de Sant’Anna de
Itacurussá, de Nossa Senhora dos Remedios de
Paraty, de Nossa Senhora da Conceição de
Paratymirim, de Nossa Senhora da Piedade do Rio
Claro, e de Santo Antonio de Capivary.
Paço da Câmara
Municipal da Cidade
de Angra dos Reis
Fonte: Decreto n. 1.828, de 1 de Outubro de 1856 (Arquivo Nacional). (Quadro organizado pelo autor)
Na arrecadação de impostos, por sua natureza espefica, todo o conjunto da
província era chamado a participar das atividades e assim a hierarquização dos
187
lugares apenas era vista quando confrontados os totais arrecadados e não pela
concentração da tarefa em dados pontos do território. Por corresponder à base da
sustentação econômica do regime, desde o início da história da província a
instalação de postos de fiscalização e arrecadação estava dada. No entanto, esta
questão esbarrava nas dificuldades de trânsito oferecidas pelos caminhos da
província como vemos no seguinte texto:
E ainda essa vastíssima secção sejão seis os caminhos que de Minas
Geraes penetrão nesta Provincia, a saber: os do Porto Novo e o
Velho do Cunha, da Pomba, do Muriahé, do Peripitinga e Feijão Cru,
tive todavia por conveniente crear registros somente nos três
primeiros, por se avaliarem apenas o numero de 150 a 200 os
animaes de carga que annualmente descem pelo Muriahé, os quaes
geralmente não conduzem café, e assucar; e por estarem em tão
mao estado os de Peripitinga e Feijão Cru, que impossível he que os
transitem animaes carregados (RIO DE JANEIRO, 1836 [b], p. 19).
Se esta dificuldade era sentida no controle do fluxo de mercadorias, também
era observada na inspeção do trabalho e lisura dos próprios responsáveis por estes
postos. Não sem efeito, a questão das grandes distâncias e dos seus impedimentos
é exposta na citação a seguir:
A difficuldade em fiscalisar e inspecionar os empregados dos
Registros he muito grande. Achando-se estabelecidos longe das
Povoações, e a maior parte em lugares ermos, a grandes distancias
da Capital da Provincia, poucos meios tem o governo para ser
informado com exactidão e imparcialidade acerca do seu
procedimento. (...) Difficiel he, Senhores, encontrar homens probos e
idôneos, que se sujeitem a fazer huma longa e penosa viagem para
hir viver em Registros na extrema da Provincia, no meio da solidão e
da privação das commodidades da vida pela gratificação annual de
500U000 e 400U000rs (RIO DE JANEIRO, 1836 [b], p. 27-28).
Ainda no mesmo relatório, por outros aspectos, podemos observar como as
finanças da província eram dificultadas por este baixo grau de fluidez do território
que, ademais, contava com um incipiente acervo documental sobre suas reais
características. Com efeito,
Tinha de crear Registros em todos os lugares, por onde entrão nesta
provincia gêneros sujeitos ao imposto do Dizimo, e nenhun
esclarecimentos encontrei na Secretaria da Presidência acerca dos
pontos, onde devessem ser collocados. As estradas da Provincia, que
começarão a ser exploradas com systema debaixo da Administração
188
do seu primeiro Presidente, não havião sido todas examinadas, e
menos para fim similhante. Nenhum soccorro me offerecêrão as
cartas existentes, por quanto a melhor não indica exactamente, nem
podia indicar, pela confusão em que se achão, muitos pontos
principaes das extremas da Provincia, além de que, sendo reduzida e
correcta em 1807, não he possível que traga muitos caminhos, que o
tempo, o incremento da população e riqueza, e a necessidade das
communicações tem aberto por toda a provincia. As indagações e
exames, a que logo mandei proceder, e as informações que obtive,
me convencerão de que era necessária a creação de 11 Registros e
7 collectorias de Portos Marítimos, que com effeito forão creados
pelos dous regulamentos de 26 de Maio próximo pretérito, que vos
serão presentes, e nos quaes se contém todas as providencias que
então julguei necessárias para a boa fiscalisação, e arrecadação da
renda (RIO DE JANEIRO, 1836 [b], p. 19).
Ampliando as estimativas dadas em 1836 quanto ao número destes postos de
fiscalização e arrecadação, podemos perceber esse processo em dois momentos
distintos: existiam 17 coletorias no início da década de 1840 para um total de 25
municipalidades enquanto que, na década de 1880, eram 34 para 36 núcleos
urbanos autônomos. No primeiro caso, as receitas provinham das seguintes
repartições provinciais: da Administração da Fazenda (impostos sobre os próprios
provinciais, prêmios de loteria, produtos de loterias a benefício de igrejas e casas de
caridade e cobranças de letras), das 17 Coletorias e 7 Mesas de Renda
(contribuição de polícia, dívida ativa, décima urbana, imposto de 1.800 réis sobre
“cada rez que se talhar”, imposto de patente sobre o consumo de aguardente,
imposto de patente sobre os engenhos, meia siza sobre escravos, legados e
heranças e subsidio literário), das 12 Barreiras (direitos de portagem), das 4 Barcas
de passagem (direito de portagem) e da Mesa Provincial (dízimo do algodão e de
miunças, emolumentos de certidões, multas e quota de dízimo do café). O conjunto
destes postos e o total da arrecadação são mostrados na Tabela 7 a seguir:
189
Tabela 7:
Receitas da província fluminense por repartições (1841/1842 e 1843/1844).
Tipo: Nome: Arrecadação:
1843 / 1844
Obs.: Arrecadação:
1841 /1842
Obs.:
Administ. Fazenda
53:580$000
Obs 1
149:996$242
Obs 3
Coletorias
Nicterói 26:989$040
16:739$360
Iguassú 14:038$000
17:567$466
Magé 10:612$000
10:672$069
Itaboraí 15:212$000
12:168$598
Santo Antonio de 4:690$600
4:670$478
Maricá 4:592$400
5:376$675
Cantagalo 1:666$000
1:244$020
Nova Friburgo 1:430$000
1:137$438
Vassouras 8:426$060
22:514$702
Paraíba do Sul 1:996$000
1:781$925
Valença 3:832$000
5:116$221
Rezende 7:519$600
10:577$047
São João do Príncipe 7:702$360
7:417$770
Barra Mansa 3:696$000
1:932$350
Campos 35:863$200
Obs 2
19:692$188
Piraí 4:021$600
6:202$470
Saquarema 2:661$200
398$609
Mesas de renda
São João da Barra 4:734$000
5:838$941
Cabo Frio 8:252$400
8:276$188
Angra dos Reis 7:904$000
15:137$527
Macaé 3:866$000
8:101$095
Mangaratiba 2:966$000
4:358$856
Itaguaí 4:516$800
3:661$366
Parati 4:522$800
5:797$333
Barreiras
Estrada da Estrella 15:000$000
15:500$000
de Parati 2:400$000
590$490
do Commércio 6:600$000
3:032$240
de Mangaratiba 12:000$000
3:663$640
de Itaguaí 12:000$000
8:643$590
do Mato Grosso 8:000$000
3:575$360
do Rodeio 5:000$000
2:482$290
de Mambucaba 3:000$000
-
da Pedra 8:000$000
503$080
da Polícia 15:000$000
7:825$650
de Cantagallo 6:000$000
2:189$610
Ponte do Desengano 8:000$000
7:534$300
Barcas de passagem
Rio Paraíba 10:000$000
-
Paraibuna 4:000$000
-
Macaé 1:800$000
-
Ubá 2:600$000
1:435$490
Mesa Provincial
540:970$000
509:207$265
Obs 4
TOTAL GERAL
905:660$000
993:559$939
Obs 1: Do total, 45:120$000 vem de produtos de loterias a benefício de igrejas.
Obs 2: No total, está incluído 2:000$000 coletado de passagens de rios. É a única coletoria com este imposto.
Obs 3: No período, correspondia a “Thesouraria”.
Obs 4: No período, correspondia a “Mesa Provincial do Consulado da Corte”. Na tabela original: “Consulado”.
Fonte: RIO DE JANEIRO (1844). (Tabela organizada pelo autor)
Além da questão levantada sobre a relação coletorias-municipalidades, os
dados da tabela mostram um esforço da administração em prover o território de
190
mecanismos fiscais. Se as repartições citadas eram simplórias ou deficientes do
ponto de vista material (como relatavam freqüentemente seus presidentes) o fato é
que a base técnica do Estado estava presente em sua atividade de fisco. E ao
compararmos estes dados com os apresentados até aqui pelos outros mecanismos
de divisão territorial, constatamos que, mesmo com as dificuldades inerentes da
época, um grupo reduzido de cidades acumulava funções de centros econômicos,
políticos, eclesiásticos, policiais, eleitorais, etc.
No segundo caso indicado (quando existiam 34 coletorias para 36 núcleos
urbanos autônomos durante a administração de Bernardo Avelino Gavião Peixoto
no início da última década do Império) tais coletorias haviam concentrado um maior
número de impostos a arrecadar. Eram eles: décima urbana, patente sobre o
consumo de aguardente, contribuição de polícia, imposto de 50$ na compra e venda
de escravos, selo de herança e legado, emolumentos, multas, rendimentos de
próprios provinciais, rendimento de “pennas d`água” (“menos em Nictheroy, em que
esta renda é directamente arrecadada pela thesouraria”), selo e emolumentos de
patente de Guarda Nacional, imposto de 1:500$ sobre a averbação de cada escravo
vindo de fora da província, imposto anual de 1:000$000 a que estão sujeitos os
negociantes de escravos e cada um de seus agentes, cobrança de dívida ativa,
rendimento extraordinário, depósitos e “qualquer quantia a que a província tiver
direito, precedendo ordem legal para exigíl-a e recebêl-a” (RIO DE JANEIRO,
1882a, p. 10-11).
Em cada uma dessas repartições do governo, trabalhavam dois funcionários: o
coletor e o escrivão. Seu regulamento garantia uma comissão a esses homens
estabelecida da seguinte forma: 3/5 para o coletor e 2/5 para o escrivão de 25% a
se arrecadação não excedesse 10:000$000, 15% se ficasse entre 10:000$000 e
20:000$000, 10% se entre 20:000$000-30:000$000 e de 5% de tudo que excedesse
30:000$000. De contrapartida, se o coletor não entregasse a arrecadação à
Diretoria da Fazenda até o prazo estabelecido, pagaria 9% de toda a quantia
indevidamente detida em seu poder, além de perder o direito a porcentagem na
arrecadação.
Optamos por apresentar as coletorias as quais nos referimos aqui a partir do
calendário estipulado para o recolhimento de suas rendas para percebermos mais
aspectos desse aparato técnico e administrativo de extração de rendas das
atividades desenvolvidas no território. Segundo o regulamento dessas repartições,
191
existiam cinco datas ao longo do ano financeiro para a entrega da arrecadação por
parte de seus funcionários, exceto na capital da província onde esse ato aconteceria
de maneira mais freqüente. O Quadro 6 a seguir especifica as datas e indica as
coletorias existentes naquele momento.
Quadro 6:
Datas para entrega dos saldos de arrecadação provincial (1882).
Dia Coletoria
1 e 10 Niterói
4 Estrella, Iguassu, Itaboraí, Magé, Maricá, Petrópolis
5 Itaguaí, Nova Friburgo, Santana de Macacu e Vassouras
7 Barra Mansa, Piraí, Paraíba do Sul, Rio Bonito e Sapucaia
9 Capivary, Rio Claro, Rezende e Valença
11 Angra dos Reis, Araruama, Mangaratiba, Parati e Saquarema
13 Cantagalo, Cabo Frio, São João do Príncipe e Santa Maria Magdalena
15 Barra de São João e São João da Barra
17 Macaé e São Fidélis
18 Campos
Obs: Os dias especificados se referem aos meses de janeiro, março, abril, julho e outubro.
Fonte: RIO DE JANEIRO (1882a, p. 9).
Deste quadro de se observar ainda que a quase totalidade dos municípios
existentes na província naquele momento já tinha sido capturada pelos mecanismos
diretos de cobrança de impostos. Chama a atenção o caráter exclusivo dado a
Campos nesta tabela. Na verdade, em todas as distintas formas de se olhar e se
apropriar do território mostradas até aqui, esta cidade reservava seu destaque na
realidade fluminense no período. As rendas provenientes desta cidade, que
capitaneava as atividades de grande área do norte da província, garantiram a
centralidade deste município nos assuntos da época.
Naquele momento, foram constantes também as chamadas dos presidentes
para a questão da melhoria material das vilas e cidades. Ora reclamando a falta de
sustento dos menores, ora enaltecendo as potencialidades de determinados
núcleos. Ora sugerindo à Assembléia mais verbas para novos sistemas técnicos
59
e
ora disputando recursos para o reparo de estruturas precárias. No período áureo do
Império (que correspondeu aos ciclos de saldo positivo na arrecadação de rendas
da província fluminense), foram as barreiras, registros e coletorias que responderam
pela segunda fonte de recursos para o Rio de Janeiro, atrás apenas do café.
59
Solicitando a criação de uma Secção de Navegação Interior dos Rios e Lagos da Província e a
construção de um estaleiro e mais barcas para a circulação, Caldas Viana diz: “Peco-vos pois que
habiliteis o Governo com meios para conseguir tão importantes fins, ampliando devidamente a Lei nº
277. Tudo neste gênero está por crear; o grande impulso deve partir da Assembléa” (RIO DE
JANEIRO, 1843, p. 24).
192
Com o declínio deste no Vale do rio Paraíba do Sul, uma tentativa ainda seria
observada com seu deslocamento para as “bandas de leste” até Cantagalo. Mas um
novo cenário econômico se confirmaria a partir da década de 1860 com a expansão
continuada da atividade açucareira em Campos. Se a estagnação seria notada nas
antigas áreas do café e a decadência verificada naqueles cleos portuários que
cumpriram significativo papel no escoamento das mercadorias a ele associadas, no
norte da província a dinâmica seria intensificada com o retalhamento da região para
a criação de novas municipalidades. Desta forma, a marcha de ocupação foi
acelerada com o acréscimo de cidades, anteriormente freguesias, vilas e arraiais, e
com a criação de novas estradas e caminhos.
Campos se destacou ainda na produção de gêneros voltados para o
abastecimento interno da província. Mas o açúcar foi a base da opulência do norte
fluminense. A região constituiu-se em espaço privilegiado de legitimação do poder
estatal confirmando uma administração como ordenamento territorial nos espaços
urbanos. Foi intensa, naquele momento, a instalação de infra-estruturas e aparatos
administrativos na cidade e em seus distritos e freguesias voltados para o controle
produtivo e político da população. Também nos mecanismos de formação social
como o ensino, esta realidade se observou. O Decreto nº 2.503 de 22/11/1880 pode
ser tomado exemplo. Ele criava o Liceu de Humanidades de Campos vinculado à
Diretoria de Instrução que tinha por competência ministrar o ensino das línguas
portuguesa, francesa, inglesa e latina, da Matemática Elementar, da História, da
Geografia Retórica e Poética e da Filosofia. Na província, apenas em Niterói se
ensinava um cabedal amplo de assuntos.
60
A posição de Campos se fazia presente desde cedo e, no conjunto das
obras que sempre recebeu, destaquemos quando da construção de uma muralha
para proteger a cidade do rio Paraíba. Na Assembléia, o presidente do Rio de
Janeiro dizia:
Esta obra, indispensável para conservar uma Cidade, que por sua
população, riqueza e civilisação he sem duvida a primeira da
Província, e dest’arte as vidas, e fortunas de immensas famílias, que
nella habitão. Mandei fazer esta obra na extensão de toda a cidade
entre a Coroa e porto do Maciel com parapeito, alteamento e
60
A preeminência de Campos entraria na república e, pelo Decreto nº 72 de 15/04/1890, este Liceu
passou a ter a mesma organização que o da antiga capital da província.
193
calçamento da beira do rio pela Câmara, e plantio de arvoredo (RIO
DE JANEIRO, 1843, p. 41, grifo nosso).
E, mais adiante, metaforizando a questão para justificar o apreço com a obra e
solicitar a aprovação dos seus gastos pelos deputados, discursava:
O primeiro cuidado de um individuo, e de uma Nação he sua
conservação. Primeiro se existe, para depois curar-se do modo de
existir. O primeiro objecto he vital, o modo de existir he segundário
(RIO DE JANEIRO, 1843, p. 41, grifo nosso).
Ao grifarmos estas citações, cremos ter assinalado as bases que orientam as
nossas investigações. O ideal nacional do Império estava assentado, pois, em uma
relação muito próxima entre cidade, civilização e fortuna (de poucos). E os
discursos e práticas daqueles incluídos nesta esfera foram sempre no sentido de
manter esta estrutura. Tal qual documentos textuais ou transmitidos pela oralidade,
o território registrou esse movimento. No caso fluminense, alguns de seus pontos
foram reveladores desta rede de poder que se materializava através de uma rede
urbana para subjugação de determinadas regiões. Na realidade específica de
Campos, esta rede conectava sua hinterlândia à capital do Império, transformando
as relações estabelecidas em seu interior e denotando o recorte regional das
políticas territoriais de então. Com efeito,
Para viabilizar a difusão e perpetuação desse poder, o Estado
engendrou uma política de circulação na qual participaram diferentes
grupos com interesses antagônicos. Tal política, por envolver grupos
de poder localizados em diferentes espaços da Província, esteve no
centro do debate da política centralizadora do Império. Portanto, na
medida em que os caminhos eram abertos e foram se instalando os
aparatos administrativos (...) os interesses desses grupos e do
Estado foram assegurados, o que concorreu para a formação de uma
rede urbana, pois permitiu o contato e intercâmbio de mercadorias,
pessoas, informações e ordens (CHRYSÓSTOMO, 2006, p. 7).
Assim, os fluxos se consolidavam na medida em que os vínculos de uma dada
cidade com os demais pontos do território se estreitavam, caracterizando arranjos
regionais diretamente vinculados à capital da província e à cidade do Rio de
Janeiro. Foi o caso de Campos no contexto do norte fluminense. No entanto, uma
questão nos chama a atenção: as fronteiras e as políticas lançadas para a sua
conquista. E, neste caso a região campista é tomada como um profícuo exemplo
194
uma vez que esteve por muito tempo caracterizada por grandes espaços sem um
povoamento efetivo.
61
Neste cenário, a definição e posse das fronteiras assumiam
relevância no contexto das decisões administrativas e revelavam o mote da política
imperial para com o seu território. Sobre esta questão, relatemos os seguintes fatos
ocorridos ainda na época do franco cultivo de café em muitas áreas do atual
sudeste brasileiro:
Parece-me excessiva a quantidade de café de produção de Minas
que se despacha guiado livre do pagamento da cota provincial, com
quanto reconheça que as margens do Parayba, Paraybuna e do Rio
Preto do lado de Minas são férteis, apropriadas para a cultura do café
e effectivamente applicadas a essa cultura. Tive denúncia de fraude,
que não suspeito. Tenho exigido informações e não deixarei de
perscrutar com muita attenção e cuidado os fundamentos desta
denúncia, para chegar ao conhecimento se existe com effeito a
fraude denunciada. Este accréscimo consideravel de producção
de café das províncias limitrophes despachado livre da quota do
dízimo no Consulado provincial já foi notado e assignado no último
relatório do meu antecessor, que não encarava como naturaes, filhas
do progressivo, mas lento crescimento da produção, as differencas
que se enxergavão para mais no número de arrobas, comparadas às
exportações em diversos semestres (RIO DE JANEIRO, 1843, p. 11-
12, grifo nosso).
Os problemas advindos da imprecisão das fronteiras foram sempre registrados
nos documentos da administração provincial durante todo o Império. As duas
citações a seguir mostram que, desde os primeiros anos da província, houve um
eco de tais reivindicações dos presidentes fluminenses junto aos ministros na Corte.
Com efeito,
A incerteza, irregularidade e a natureza dos limites desta Provincia
com a de S. Paulo não somente embaraçarão o governo na
collocação dos Registros, como tambem tem de difficultar a
fiscalisação que lhes he commetida, dando lugar ao extravio.
Accresce achar-se o município do Bananal, e grande parte do de
Arêas inteiramente encravado por huma língua de terra entre os
nossos de Angra, S. João do Príncipe, Barra Mansa, e Rezende, e
serem os caminhos mais vantajosos deste ultimo Município para os
nossos portos de mar os que atravessão aquella língua de terra
pertencente a S. Paulo, e do Rio de Janeiro, os que mais florescem
com a cultura do café, poderia acontecer que algumas tropas
descendo do Rezende recebessem guias na Provincia de S. Paulo,
61
Esse histórico está na base do fato de que, por muito tempo, os municípios desta região contaram
com extensões territoriais destacadas no contexto da província e do Estado do Rio de Janeiro.
Atualmente, Campos se mantém como o maior dos municípios fluminenses neste aspecto.
195
vindo depois verifica-las, e annota-las no competente registro, ou que
gêneros sujeitos á quota, produzidos aquém dos mesmos registros
fossem transportados por atalhos para o territorio da provincia visinha
para fim similhante. O mesmo pode acontecer em algumas das
Fazendas sitas na margem d’aquem do rio Parahyba, nos lugares
onde serve de divisa com Minas Geraes (RIO DE JANEIRO, 1836 [b],
p. 19-20).
O Governo esta bem esperançado de que vos convencereis da
necessidade de dar ás nossas Provincias huma divisão mais natural,
e mais conforme aos princípios das boas divisões topographicas; e
nella não vos esquecereis de estender ao Sul os Limites da Provincia
do Rio de Janeiro, comprehendendo-os dentro de huma linha tirada
do pico da Serra da Bocaina ao pico da Serra da Mantiqueira, e
traspassando-lhe os Municipios de Arêas, e Bananal, ora
pertencentes á Provincia de S. Paulo, e que ficão encravads pelo
Norte com a Villa de Rezende, e pelo Sul com as de Paraty, S. João
do Principe, Mangaratiba, e Ilha Grande (BRASIL, 1837, p. 8-9).
No entanto, as três citações que se seguem nos mostram como a questão da
delimitação definitiva das fronteiras provinciais continuou protelada por décadas,
mantendo este assunto presente nos discursos do executivo fluminense.
Os conflictos constantes que se dão entre as autoridades desta
provincia e as de S. Paulo e Minas exigiam de ha muito tempo
providencias, que os fizessem cassar, determinando-se claramente
as divisas entre estas tres provincias. Em virtude desta necessidade,
por aviso do ministerio do Imperio de 6 de abril do anno passado
ordenou-se, que se começasse o exame para a demarcação dos
limites desta provincia com a de S. Paulo, e foi nomeado o coronel
Galdino Justiniano da Silva Pimentel para proceder a este trabalho de
accordo com o engenheiro que fôsse nomeado pelo presidente
daquella provincia. (...) officiei ao governo imperial ponderando-lhe a
necessidade de prosseguir o levantamento da carta de fronteira entre
as duas provincias para que houvesse uma base segura, em que se
firmasse o corpo legislativo para decidir esta questão já tão antiga, e
cuja decisão torna-se urgente (RIO DE JANEIRO, 1859, p. 31).
Chamo a attenção de V. Ex. para os conflictos de jurisdição que tem
havido entre as autoridades policiaes desta provincia e a de Minas
Geraes ácerca dos limites de ambas. (...) O decreto 297 de 19 de
maio de 1843 foi que traçou os limites entre essas duas provincias, e
os conflictos que se tem dado, originão-se fa falta de precisão e
clareza da linha por elle estabelecida. Para evitar-se questões
repetidas e suscitadas todos os annos, senão todos os mezes, (...)
Ordenei á directoria de obras que mandasse activar o levantamento
da planta dos terrenos entre as parochias de Nossa Senhora da
Conceição das Duas Barras e as que lhe ficão circumvisinhas, afim
de poder-se com acerto resolver as duvidas suscitadas entre as
196
autoridades e os moradores desses logares ácerca dos respectivos
limites dessas parochias (RIO DE JANEIRO, 1867 [a], p. 33).
Infelizmente a Provincia não possue uma boa demarcação dos
limites, e esta falta muito prejudica a boa administração da justiça,
não sabendo bem os Juizes até que ponto do territorio se estende a
sua jurisdição, e onde começa a do seu visinho. Não é na parte
judiciaria que se encontram esses inconvenientes. A divisão
eclesiastica, administrativa e política, resentem-se da mesma
incerteza, e a Presidência é chamada muitas vezes a decidir
questões de limites para que lhe faltam os devidos esclarecimentos
(RIO DE JANEIRO, 1872, p. 12).
As citações mostram que em todas as décadas da vida da província, a questão
da indefinição das fronteiras foi colocada e sempre o problema maior a ser resolvido
fazia referência à perda de impostos devidos. Frente aos casos de denúncia de
sonegação motivada por indefinições territoriais, o Estado não hesitou, mesmo que
com demora, em usar o aparato disponível para definir a situação a seu favor. E
reuniu alguns dos instrumentos de controle do território fartamente utilizados no país
como, por exemplo, a instituição da freguesia.
No caso da demanda de 1843, ao expor sua estratégia, ilustrada na citação a
seguir, o poder provincial também nos ofereceu uma definição detalhada dos limites
em disputa.
Chamo finalmente vossa attenção sobre uma lacuna que escapou na
Lei de 04 de Maio de 1842 sob nº 266. O Curato da Aldea da Pedra e
de São José de Leonissa he um e o mesmo Curato; denomina-se
Curato de São José de Leonissa da Aldea da Pedra. O outro Curato
que se quizesse introduzir n’essa Lei, elevando-o á Capela Filial
Curada da Freguezia de São Fidélis de Sigmaringa, he o de Santo
Antonio de Pádua, sito nos Sertões dos Puris, ou da Pomba, quasi
fronteiro á Capella Filial Curada de São José de Leonissa da Aldea
da Pedra. Esta fica na margem direita do rio Parahyba e o Curato de
Santo Antonio de Pádua fica na margem esquerda do mesmo rio
mais para o centro, e he limitado pelo Município de Cantagallo, pelo
rio Parahyba, pelas divisas da Freguezia de Santo Antonio de
Guarulhos, e pelo lado da Província de Minas pelas divisas
provisórias, que o meu antecessor mandou observar pela sua
Portaria de 18 de Outubro de 1842, no intuito de obstar as
invasões da Província de Minas no território da nossa província
por esse lado. Esses limites, que se ordenou ás autoridades locaes
observassem restrictamente são: o riacho Prepetinga desde a sua foz
no Parahyba até um ponto fronteiro á barra do ribeirão Santo Antonio,
correndo depois por este ribeirão acima até a Serra denominada
Santo Antonio, d’ahi a um ponto do Muriahé, chamado Poço Fundo
correndo pela Serra do Gavião até a Cachoeira dos Tombos no rio
Carangola, e seguindo a Serra do Carangola até encontrar a
197
Província do Espírito Santo. Urge pois que nesta Sessão emendeis a
Lei no sentido acima exposto. Filiado este Curato, que o Exm.
Diocesano acaba de prover de Pastor, á Freguezia de S.Fidelis,
que lhe he a mais próxima, porá barreira á ambição dos muitos
Mineiros, que atrahidos pela fertilidade de nossas terras e matas,
tem vindo estabelecer-se n’esse nosso território, mas dão de
propósito, ou por hábito, obediência ás Autoridades Mineiras
mais visinhas, e n’esse tíitulo funda Minas sua pretenção a parte
do Município de Campos, com quem confina. Talvez fosse mesmo
conveniente elevar desde á Freguezia este Curato, para ahí
estabelecer Autoridades Civis, Criminaes e Militares, e termos
melhor garantia contra a desanexação ambicionada (RIO DE
JANEIRO, 1843, p. 15-16, grifos nossos).
Alguns anos depois, com o receio de que freguesias fossem criadas de forma
indiscriminada, mas atento às ações observadas nas províncias com as quais
disputa limites, o presidente defende que:
É da maior conveniencia que por lei sejão estabelecidas regras fixas
segundo as quaes possa qualquer territorio ser elevado á cathegoria
de freguezia. Muito importa estabelecer que nenhuma parochia seja
creada sem que seu territorio comprehenda uma determinada
população, e nelle exista templo com todos os paramentos
necessarios para a celebração do culto, e administração dos
Sacramentos; que os projectos ou requerimentos relativos á creação
de freguezias sejão baseados em um mappa estatístico da população
do lugar, e da parochia, ou parochias, que soffrerem desmembração,
em informações da camara municipal respectiva sobre a necessidade
da nova parochia e suas convenientes divizas; finalmente, em
attestado do Ordinario sobre a utilidade da creação pelo lado
espiritual, acompanhado da informação do parocho ou parochos
respectivos. A assembléa legislativa da provincia de Minas acaba mui
sabiamente de prover sobre semelhante objecto pela sua resolução
314 de 8 de abril do anno preterito. Condições analogas devem
regular tambem a creação de novas villas, ou comarcas (RIO DE
JANEIRO, 1847, p. 12-13).
No contexto das definições municipais na província, demandas e soluções nos
quadros apresentados até aqui explicam o processo de retalhamento das terras por
divisões administrativas em alguns casos e o crescimento da área de abrangência
em outros em um constante refazer das fronteiras durante os anos correspondentes
ao Segundo Reinado. Pareceu clara a decisão política das autoridades fluminenses
voltada para um projeto de conquista do interior. Lembremos que ao fim do período
colonial os “certões” ainda eram um desafio para a posse efetiva do território pelas
elites, uma vez que o histórico da capitania e província, bem como do Brasil havia
sido pautado na proeminência das faixas litorâneas. Vassouras e a região cafeeira
198
nos trouxeram os exemplos que mostram a usurpação de terras indígenas em prol
de uma economia para o Império e para os proprietários privados donos de terras e
escravos. Lá, o interior havia sido conquistado.
Tal projeto parece ter tido êxito quando conseguia o povoamento nos distintos
pontos da província ao mesmo tempo em que legitimava o poder imperial através de
um aparato administrativo e institucional que se ajustava às necessidades que
surgiam em um contexto de inquestionável afirmação social das elites. No entanto,
temos que considerar também que uma integração de fato do território seria
experiência reservada para o século seguinte. Mas esta ocorreria a partir do
arcabouço técnico montado no período imperial conforme nos lembra Lamego
(1963), para quem o conjunto de ferrovias e o plano viário provincial se mostraram
compatíveis com as necessidades observadas nas primeiras décadas da República.
Ao afirmar sobre o povoamento de distintos pontos do Rio de Janeiro, estamos
recapitulando o rol de iniciativas levadas à prática para tal finalidade e este envolve
os mecanismos de aumento de captação de renda para conquista de novas áreas
através da criação de vilas e cidades, abertura de vias de circulação em diferentes
modais e o incentivo à imigração via núcleos coloniais. O rol de instrumentos pra tal
empreitada também foi ressaltado. Na análise desse processo de afirmação do
Estado, ressaltemos Abreu (1997) quando considera a importância dos saberes
técnicos voltados para a organização dos espaços citadinos e suas conexões com
outros pontos do território através da ampliação das obras públicas.
Foi notória a evolução da rede de circulação e de cidades no território
fluminense a partir da década de 1830 e sobretudo a partir dos anos de 1850. Até
então, momentos de crises econômicas e políticas inibiam os investimentos desta
ordem. No entanto, a segunda metade do XIX iria documentar um conjunto de
medidas para a ocupação econômica do território a partir dos preceitos
estabelecidos para “o bem da nação e da civilidade”. Estas refletiam as novas
demandas trazidas com “as luzes” e incorporavam novos saberes e códigos de
linguagem na qual o discurso cientifico estruturava sua legitimação e ia rompendo a
farta produção de ensaios sobre o território. Reflexo deste processo, a
administração estatal dinamizava sua organização e estrutura para dar conta dos
mecanismos de geração de conhecimento sobre os lugares e de interferência sobre
os espaços.
199
Em sua parceria com as iniciativas de particulares de fato ou particulares do
Estado (integrantes do funcionalismo público que participavam como contribuintes e
beneficiados em inúmeras e significativas obras), o governo provincial fluminense
levou a cabo uma política territorial que em seu conjunto foi responsável por uma
polarização de grandes áreas por um número restrito de cidades que, no ritmo dos
processos econômicos observados (com diferença no tempo e no espaço) criaram
uma rede de feição dendrítrica.
Assim, o “chão” da província mais importante do Império foi redesenhado com
um riscado que atingia, pela primeira vez, pontos inacessíveis à “civilização”. Em
nome dela e da modernidade, fartamente aludidas nos discursos e nas conversas
de sao, o Estado se obrigou a promover os meios apropriados para que estradas,
ferrovias, barreiras, coletorias, pontes, pontilhões, escolas, cadeias, casas de
câmara pudessem escrever no território as insígnias da nação.
200
Considerações finais
Nossa atenção no caso da província fluminense buscou compreender a base
territorial do planejamento político imperial engendrado para garantir a construção
de um país que se tornava independente. Apoiando-se em uma análise desta
questão a partir de um viés geográfico-histórico, nosso trabalho buscou nas políticas
territoriais e nos espaços produzidos as bases geográficas que nortearam o império
brasileiro quando de seu projeto nacional, avaliando até que ponto as idéias de
cidade e região foram efetivamente operacionalizadas e relacionadas.
Como considerado ao longo de todo este texto, as insígnias da nação tomaram
também a forma de objetos construídos no espaço para inaugurar uma nova fase de
fluxos materiais e econômicos no território, defendidos em nome da riqueza a ser
perseguida. Além deste aspecto, e permeado a ele, pretendiam ainda estabelecer o
início de uma aludida civilidade ao Brasil nos padrões previamente defendidos por
uma elite ávida por poder e mecanismos de autopreservação e reprodução.
Partindo do pressuposto de que modelos idealizadores de sociedade e de
ordenamento espacial encontram nos núcleos urbanos um espaço privilegiado para
a sua difusão, buscamos compreender tal base no conjunto das medidas pensadas
e/ou tomadas durante o período de existência da província do Rio de Janeiro.
Período este, marcado pelas décadas inaugurais da nação brasileira formalmente
instituída. Sendo assim, as reflexões sobre a natureza deste projeto nacional se
impuseram nesta tese para que as questões do nosso recorte espacial fossem
consideradas no conjunto da dinâmica imperial e de suas principais questões
ideológicas.
Neste contexto, consideramos que, na condição de país recém inaugurado,
parece que o ato em si de criar uma nação despertou mais o pensamento e os
esforços da elite imperial brasileira do que imaginar as bases de uma sustentação
continuada. Construída por interesses imediatistas e por um padrão intensivo de
apropriação dos recursos, a monarquia subjugava a questão da identidade e
atrelava o Estado a uma base dinástica para legitimar sua soberania. Os recursos
aqui considerados incluíam também a população, uma vez que a idéia a nação
201
estava sendo efetivada mais por sua referência ao território e à economia dele
decorrente do que à sociedade.
Lembramos do preterido “mundo da desordem” e dos atributos de liberdade e
prosperidade garantidos em Carta e exclusivos da “boa sociedade” que vivia uma
civilização nos moldes das festas do requintado Cassino Fluminense na Corte. Em
contraposição, lembramos também dos inúmeros pequenos sitiantes que tiveram
suas terras tomadas por grandes cafeicultores no Vale do rio Paraíba do Sul e da
celeuma que encontrava nesses mesmos cafeicultores a figura da justiça que
resolveria os conflitos a seu favor. O enriquecimento constante era motivo de
comemoração e talvez fossem esses mesmos a freqüentar o fidalgo salão da Lapa.
Desde cedo, o Brasil se assentara em uma base escravocrata e racial que
negava a existência de um povo. Tal estrutura se manteve no período imperial e o
ideário de nação acabou como produto de aplicações desvirtuadas das teorias
vindas da Europa. Aqui, uma produção oficial de idéias foi tomada como
pressuposto para informar e legitimar os padrões pretendidos de sociedade,
criando-lhe uma história e determinando-lhe caminhos incompatíveis com a
estrutura social presente e seus diversos anseios.
No entanto, o poder não consistia em um bloco único e a mudança institucional
trazida pelo Império fortalecia as disputas dentro da elite intelectual e potica do
país. Esboçou-se então uma certa oposição ao restrito círculo das grandes famílias
agrárias que comandavam a vida econômica brasileira. Este fato nos leva a pensar
que, de certo, o jogo político presente durante as distintas fases do período
monárquico no país não foi simplesmente um embate entre conservadores e
liberais. As teias eram complexas e lembramos que, mesmo em tempos de
centralização promovida pelo Moderador (quando se deu o momento de calma no
Império), havia mecanismos de liberdade local. De maneira distinta do período
colonial, a complexidade da cena política abrira caminhos para as questões e
representatividades regionais, sobretudo as referentes aos interesses provinciais.
Apontamos na tese o quadro que determinava esta complexidade e do qual a
categoria povo passaria a ser discursada como fundante da nação. No âmbito da
intelectualidade, foi apenas no último quartel do século XIX que ela foi tomada como
objeto de análise crítica ao se iniciar um pensamento apurado sobre a formação
brasileira. A questão dada era agora a de explicar o que se fazia brasileiro e não
202
mais imaginá-lo. E isto passava necessariamente pela revista aos impasses que se
acumulavam na nação.
Podemos sentenciar que a nação dos barões de café, que representaram o
apogeu das finanças da província, foi construída a partir de alguns desacertos
estruturais. Sustentou-se e discursou em cima da monocultura primária. Confundiu
o território atributo da nação como sendo a própria nação. Pregou uma civilidade
sem se importar em estar cercada por escravos e pobreza. A nação dessa
sociedade era algo exclusivo e inatingível para a maioria. Na busca por lucro
imediato através da incorporação de mais terras e escravos e da imposição do
poder também simbólico ignorou a natureza do chão tomado por nação. O uso
predatório fez o solo empobrecer e a volumosa massa escrava imobilizou seu
capital. Diante destas questões, os barões de café conheceram o declínio. E, nos
moldes em que foi assentada, a nação demoraria a encontrar um novo eixo.
No que se refere ao nosso objeto de estudo, relembramos dos pressupostos
de uma identidade nacional pelo espaço como fórmula para se atingir a integração
pretendida. Assim, os discursos do poder executivo, os planos de infraestrutura
física, os documentos administrativos, os textos de lei, entre outros documentos,
mostraram um planejamento territorial baseado na privatização do solo e em
políticas de urbanização baseadas, em larga medida, na participação de agentes
privados e na profusão dos símbolos de modernidade e civilidade. Sobretudo nos
casos em que a carência material era notória, esses foram os referenciais tomados.
Ao olhar as cidades e a natureza das políticas e das representações que
indicamos, constatamos os processos de privatização do solo e incremento da vida
urbana como a forma espacial adotada para a criação, apropriação e circulação dos
mecanismos de mando. O caso fluminense parece ser exemplar. Como a própria
nação, o que foi tentado neste território foi primeiro a ocupação para depois articular
uma integração que não se efetivou em sua base. Esta ficaria aberta às ideologias
(também geográficas) seguintes.
O processo de estruturação do território fluminense durante o século XIX
acabou por configurar espacialidades, contrapondo áreas de concentração
populacional e de esvaziamento ou com ocupação rarefeita e reduzidos fluxos de
interconexão entre poucas centralidades expressivas, aglomeradoras de população
e atividades econômicas. Observamos que os efeitos das mudanças no âmbito das
relações econômicas e sociais resultaram em um misto de continuidade e mudança
203
no qual os aspectos pré-existentes condicionam o surgimento do novo. Buscamos
entender o que movia esses processos, como se redefiniram os centros de
comando e como se (re)distribuíram as formas de exercício de poder econômico e
político a partir da emergência de atores que gradativamente dinamizaram as
economias urbanas e/ou regionais emergentes.
Os núcleos urbanos surgiram em um território com extensões a serem
encurtadas e, neste processo, observamos os mecanismos que legitimaram a
produção de imagens para a conquista do território. Reafirmamos que, no caso
fluminense, os distintos níveis de acessibilidade nas diferentes regiões da província
denotavam um embrionário processo de divisão espacial do trabalho. Este indicava,
naquela escala, a existência de um comércio interno e o surgimento de um
processo de urbanização e, em escalas maiores, a confirmação do uso seletivo de
espaços articulados à expansão do capitalismo europeu e a confirmação do papel
do Brasil como ofertador de matérias-primas na divisão internacional do trabalho
que se consubstanciava.
Novamente na escala provincial, vimos que a dinâmica urbana e a alocação
das infra-estruturas administrativas a seu serviço consolidaram o poder político dos
agentes econômicos mais importantes relacionados às atividades agrícolas,
comerciais e manufatureiras consideradas. Eles foram determinantes ainda para o
fortalecimento estatal na regulação dos fluxos e na ampliação de sua rede
administrativa.
Entendendo Estado-nação como formação política típica da modernidade,
tomamos o Império brasileiro em seu projeto de afirmação territorial estruturado
como conjuntos urbanos regionais ligados diretamente ao poder centralizado da
Corte. O caso da província fluminense nos permite investigar sobre a configuração
de uma desejada rede e seus nós e sobre a importância das cidades e vilas em
seus momentos de apogeu e de declínio (como em alguns casos). Tal perspectiva
oferece elementos para se buscar explicações neste período para as configurações
espaciais observadas na história do Estado do Rio de Janeiro. Pensamos ser esta
indicação um dos corolários da discussão travada nesta tese.
Por fim, os conceitos de cidade e de região se imbricaram na nossa análise por
conta do caráter territorial dado ao projeto nacional desenvolvido no Brasil no
período. Nele, a questão político-regional estava dada a priori uma vez que se
pensou no poder como um bloco único emanando de um centro em direção à sua
204
hinterlândia. Nestes termos, o conceito de região, tão discutido e ainda aberto a
novos vieses, voltou a se assemelhar ao seu conteúdo clássico quando estava
associado às idéias de centralização, uniformização administrativa e diversidades
sobre as quais um poder único deveria ser exercido. A geopolítica local provincial
espelhou este processo.
Afirmamos novamente a importância do conceito em tela por permitir as
discussões políticas sobre a dinâmica do Estado e a incorporação da dimensão
espacial nas demais esferas da vida social. No nosso caso específico, observamos
uma política territorial que utilizava o discurso da nação para controlar distintas
regiões e suas dinâmicas econômicas e sociais através dos núcleos urbanos.
Acreditamos poder pensar no caráter regional que as cidades detinham no contexto
do Estado imperial nacional brasileiro. Era este o “serviço” a ser desempenhado
pelo território “para o bem da nação”. Pensamos que discutir cidade naquele
momento era discutir região.
205
Referências bibliográficas
ABREU, Antonio Izaías da Costa. Municípios e topônimos fluminenses. Histórico
e Memória. Niterói: Imprensa Oficial do Estado do Rio de Janeiro, 1994.
ABREU, Capistrano de. Caminhos Antigos e Povoamento do Brasil. Brasília:
UnB, 1963.
ABREU, Maurício de A. Pensando a cidade no Brasil do passado. In: CASTRO, Iná
Elias de et al (Orgs.): Brasil: questões atuais da reorganização do território. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 1996.
ANDERSON, Benedict. Nação e consciência nacional. São Paulo: Ática, 1989.
ANDRADE, Manuel Correia de. Cidade e campo no Brasil. São Paulo: Brasiliense,
1974.
ANDRADE, Manuel Correia de. A questão do território no Brasil. São Paulo;
Recife: Hucitec; Ipespe, 1995.
ARAÚJO, Renata M. As cidades da Amazônia do século XVIII. Belém, Macapá e
Mazagão. Porto: FAUP Publicações, 1998.
ARRAIS, Tadeu Pereira Alencar. Entre a rede urbana e a cidade-região: o que há de
novo no centro goiano? In: ENCONTRO NACIONAL DA ANPUR, 10., 2003, Belo
Horizonte. Anais...Belo Horizonte: UFMG, 2003.
AZEVEDO, Aroldo de. Vilas e cidades do Brasil colonial; ensaio de geografia
urbana retrospectiva. Boletim nº 208. São Paulo: Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras da USP, 1956.
AZEVEDO, Aroldo de. Embriões de cidades brasileiras. Boletim Paulista de
Geografia, nº 25. São Paulo: março 1957a.
AZEVEDO, Aroldo de. Arraiais e corrutelas. Boletim Paulista de Geografia, nº 27.
São Paulo: outubro 1957b.
206
AZEVEDO, Aroldo de. Vilas e cidades do Brasil colonial; ensaio de geografia urbana
retrospectiva. Terra Livre - AGB, nº 10, p. 23-78. São Paulo, jan-jul 1992.
BARMAN, Roderick. Brasil: a formação de uma nação (1798/1852). Stanford:
Stanford University Press, 1988.
BENDIX, Reinhard. Construção nacional e cidadania. São Paulo: EdUSP, 1996.
BERNARDES, Lysia Maria Cavalcanti. Planície litorânea e zona canavieira do
Estado do Rio de Janeiro. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE GEOGRAFIA,
18., 1957, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: IBGE, 1957.
BERNARDES, Lysia Maria Cavalcanti et al. Rio de Janeiro e a sua região. Rio de
Janeiro: IBGE, Conselho Nacional de Geografia, 1964.
BETHELL, Leslie. A Igreja e a Independência da América Latina. In: ______ (Org.).
História da América Latina (Volume III – Da Independência até 1870), p. 267-273.
São Paulo: Edusp, Imprensa Oficial do Estado; Brasília: Fundação Alexandre de
Gusmão, 2001a.
BETHELL, Leslie. A Independência do Brasil. In: ______ (Org.). História da
América Latina (Volume III – Da Independência até 1870), p. 187-230. São Paulo:
Edusp, Imprensa Oficial do Estado; Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão,
2001b.
BOBBIO, Noberto; MATTEUCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de
política. 12ª ed. Volume 2. Brasília: EdUnB, 2004.
BOTELHO, Tarcísio R. População e nação no Brasil do século XIX. 1998. Tese
(Doutorado). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, São
Paulo, 1998.
BOTELHO, Tarcisio R. Censos e construção nacional no Brasil imperial. Tempo
Social, vol.17, nº 1, p.321-341, junho 2005.
BOURDIEU, Pierre. Campo intelectual e projeto criador In: POUILLON, Jean (Org.).
Problemas do Estruturalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 1968.
207
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Lisboa: Difel; Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 1989.
BOURDIEU, Pierre et al. Ofício de sociólogo: metodologia de pesquisa na
sociologia. Petrópolis: Vozes, 2004, 4ª ed.
BRAUDEL, Fernand. Escritos sobre a História. 2ª ed. Coleção Debates. São
Paulo: Perspectiva, 1992.
BUENO, Beatriz P. Siqueira. Desenho e Desígnio – O Brasil dos Engenheiros
Militares (1500-1822). 2001. Tese (Doutorado). Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da USP. São Paulo, maio 2001.
CAMPOS, André Luiz Vieira de et al. História administrativa da província
fluminense (1834-1889). Rio de Janeiro: Arquivo Público de Estado do Rio de
Janeiro, 1986. Mimeografado.
CAMPOS, Rui Ribeiro de. A dimensão populacional na obra de Josué de
Castro. 2004. Tese (Doutorado). IGCE / Unesp, Rio Claro/SP, 2004.
CARVALHO, José Murilo de.Teatro de sombras: a política imperial. São Paulo,
Vértice, 1988.
CASTRO, Iná Elias de. O Problema da Escala. In: CASTRO, Iná Elias; GOMES,
Paulo César C.; CORRÊA, Roberto Lobato (Orgs.). Geografia: Conceitos e Temas.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995.
CHAUÍ, Marilena. Brasil: mito fundador e sociedade autoritária. São Paulo: Perseu
Abramo, 2000.
CHRYSOSTOMO, Maria Isabel de Jesus. Idéias em ordenamento, cidades em
formação: a produção da rede urbana na província do Rio de Janeiro. 2006. Tese
(Doutorado em Planejamento Urbano e Regional). IPPUR, UFRJ, Rio de Janeiro,
2006.
CLAVAL, Paul. Espaço e poder. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.
CIDE (Fundação Centro de Informações e Dados do Rio de Janeiro). Estado do
Rio de Janeiro: Território. 2ª ed. Rio de Janeiro: CIDE, 1998.
208
CORRÊA, Roberto Lobato. Região e organização espacial. São Paulo: Ática,
1986.
CORRÊA, Roberto Lobato. Hinterlândias, hierarquias e redes: uma avaliação da
produção geográfica brasileira. In: CARLOS, Ana Fani A. (Org.). Os caminhos da
reflexão sobre a cidade e o urbano, p. 323-359. São Paulo: Ed. da Universidade
de São Paulo, 1994.
CORRÊA, Roberto Lobato. O estudo da rede urbana. Uma proposição
metodológica. Revista Brasileira de Geografia, nº 2, abr-jun 1998.
CORRÊA, Roberto Lobato. Uma nota sobre o urbano e a escala. Território, Rio de
Janeiro, ano VII, nº 11, 12 e 13, set./out. 2003.
CORRÊA, Roberto Lobato. Estudos sobre a rede urbana. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil, 2006.
COSTA, Wanderley Messias da. O Estado e as políticas territoriais no Brasil. 10ª
ed., Contexto (Repensando a Geografia). São Paulo: EdUSP, 2001.
D’ALMEIDA, Tito Franco. A grande política. Balanço do Império no reinado actual.
Liberaes e conservadores. Estudo político-financeiro. Rio de Janeiro: Imperial
Instituto Artístico, 1877.
DAVIDOVICH, Fani R. Um foco sobre o processo de urbanização do estado do Rio
de Janeiro. Revista Brasileira de Geografia, v. 48, nº 3, p. 333-371, jul./set., 1986.
DE PAULA, Ricardo Zimbrão Affonso. Região e regionalização: um estudo da
formação regional da Zona da Mata de Minas Gerais. Revista de História
Econômica e Economia Regional Aplicada, v.1, nº 1, jan-jul 2006.
DONGHI, Túlio Halperín. A economia e a sociedade na América espanhola do pós-
Independência. In: BETHELL, Leslie (Org.). História da América Latina (Volume III
– Da Independência até 1870), p. 277-327. São Paulo: Edusp, Imprensa Oficial do
Estado; Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2001.
209
EGLER, Cláudio A. Gonçalves. Subsídios à caracterização e tendências da rede
urbana do Brasil; configuração e dinâmica da rede urbana. Petrópolis, 2001.
Mimeografado.
ELIAS, Nobert. O processo civilizador. 2º vol. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993.
ENGEL, Magali Gouveia. Guarda Nacional. In: VAINFAS, Ronaldo (Org.).
Dicionário do Brasil Imperial, p. 318-320. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.
FAORO, Raymundo. Os donos do poder: Formação do patronato político
brasileiro. 13ª ed. São Paulo: Globo, 1988.
FARIA, Sheila de Castro. Exportações. In: VAINFAS, Ronaldo (Org.). Dicionário do
Brasil Imperial, p. 248-252. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002a.
FARIA, Sheila de Castro. Indústria. In: VAINFAS, Ronaldo (Org.). Dicionário do
Brasil Imperial, p. 248-252. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002b.
FONSECA, Antonio Ângelo Martins da. Em torno do conceito de região. Sitientibus,
nº 21, p. 89-100, UEFS, Feira de Santana, jul/dez 1999.
FOUCAULT,Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979.
FREMONT, A. A região, espaço vivido. Coimbra: Livraria Almeidina, 1980.
FRIDMAN, Fania. Donos do Rio em nome do Rei. Uma história fundiária da
cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar/Garamond, 1999.
FRIDMAN, Fania. De núcleos coloniais a vilas e cidades: Nova Friburgo e
Petrópolis. In: ENCONTRO NACIONAL DA ANPUR, 9., 2001, Rio de Janeiro.
Anais... , v.2, p. 610-623. Rio de Janeiro: UFRJ/IPPUR, 2001.
FRIDMAN, Fania. As cidades e o café. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE
HISTÓRIA ECONÔMICA, 6., 04 a 07 setembro 2005, Conservatória. Anais...,
Conservatória, 2005.
210
FRIDMAN, Fania. Freguesias do Rio de Janeiro ao final do século XVIII. In:
SEMINÁRIO DE HISTÓRIA DA CIDADE E DO URBANISMO, 10., outubro 2008,
Recife. Anais..., Recife: UFPE, 2008.
GARCIA, Ricardo Alexandrino; LEMOS, Mauro Borges. As áreas de influência dos
pólos econômicos brasileiros: uma comparação entre dois modelos de
regionalização. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 14.,
set 2004, Caxambu. Anais..., Caxambu: ABEP, 2004.
GEDDES, Patrick. Cidades em evolução. São Paulo: Papirus, 1994.
GEIGER, Pedro Pinchas. Novas estruturas urbano-regionais: a categoria região
cidade global. In: SPÓSITO, Maria Encarnação (Org.). Urbanização e cidades:
perspectivas geográficas. Presidente Prudente: Unesp, Gasperr, 2001.
GELLNER, Ernest. Nação. In: Dicionário do pensamento social do século XX.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996.
GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade. São Paulo: Unesp,
1991.
GOMES, Ângela Maria de Castro. A política brasileira em busca da modernidade: na
fronteira entre o público e o privado. In: SCHAWRCZ, Lilia Moritz (Org.). História da
vida privada no Brasil. Volume IV. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
GOMES, Ângela Maria de Castro. Essa gente do Rio... Modernismo e
nacionalismo. Rio de Janeiro: FGV, 1999.
GOUVÊA, Maria de Fátima Silva. Províncias. In: VAINFAS, Ronaldo (Org).
Dicionário do Brasil Imperial, p. 597-599. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.
GOUVÊA, Maria de Fátima Silva. O império das províncias. Rio de Janeiro 1822-
1889. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.
GRAHAM, Richard. Clientelismo e política no Brasil do século XIX. Rio de
Janeiro: Editora da UFRJ, 1997.
211
GUERRA, François-Xavier. A nação moderna: novas legitimidades e velhas
identidades. In: JANCSÓ, István (Org.). Brasil. Formação do Estado e da Nação, p.
33-60. São Paulo: Editora Hucitec; Ijuí: Editora Unijuí, 2003.
GUIMARÃES, Manoel Luís S. Nação e civilização nos trópicos: o Instituto Histórico
e Geográfico Brasileiro e o projeto de uma história nacional. Estudos Históricos,
Rio de Janeiro, ano 1, nº 1, p. 5-27, 1988.
GUIMARÃES, Lúcia. Nobreza. In: VAINFAS, Ronaldo (Org.). Dicionário do Brasil
Imperial, p. 553-555. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.
HAESBAERT, Rogério. Dês-territorialização e identidade: a rede “gaúcha” no
Nordeste. Niterói: EdUFF, 1997.
HAESBAERT, Rogério. A multiterritorialidade do mundo e o exemplo da Al Qaeda.
Terra Livre, v. 1, nº 18, p. 37-46. São Paulo, jan/jun 2002.
HOBSBAWM, Eric; RANGER, Terence. A invenção das tradições. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1984.
HOBSBAWM, Eric. Nações e nacionalismo desde 1780. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1990.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. A herança colonial – sua desagregação. In: História
geral da civilização brasileira. Tomo II, “O Brasil monárquico”. São Paulo: Difel,
1960.
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Síntese da documentação
histórico-administrativa e geográfica dos Estados Unidos do Brasil – Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro: IBGE, Departamento de Documentação e Biblioteca, 1995.
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Brasil 500 anos de
povoamento. 2ª ed. Rio de Janeiro: IBGE, Centro de Documentação e
Disseminação de Informações, 2007.
LACOMBE, Lourenço Luiz. Os chefes do executivo fluminense. Série Monografias
I. Petrópolis: Museu Imperial, Departamento de Assuntos Culturais, 1973.
212
LACOSTE, Yves. A Geografia: isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra.
Campinas: Papirus, 1988.
LAMEGO, A. R. A aristocracia rural do café na província fluminense. Anuário do
Museu Nacional, Rio de Janeiro, 1946.
LAMEGO, Alberto Ribeiro. O homem e a serra. 2ª ed. Rio de Janeiro: IBGE,
Conselho Nacional de Geografia, 1963.
LANNA, Ana Lucia Duarte. Cidades e ferrovias no Brasil do século XIX - algumas
reflexões sobre a diversidade dos significados sociais e impactos urbanos: Jundiaí e
Campinas. SEMINÁRIO DE HISTÓRIA DA CIDADE E DO URBANISMO, 7., 2002,
Salvador. Anais..., Salvador, UFBA, 2002.
LEFÈBVRE, Henri. Lógica formal, lógica dialética. 6ª ed. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1995.
LEMOS, Maurício Borges. Duas técnicas de análise regional elaboradas a partir
de categorias espaciais: a regionalização e o método estrutural-diferencial. 1991.
Tese (Professor Titular) Departamento de Ciências Econômicas da Universidade
Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1991.
LEMOS, Mauro Borges et al. A nova configuração regional brasileira e sua geografia
econômica. Estudos Econômicos, v. 33, nº 4, p. 665-700, São Paulo, out./dez
2003.
LENCIONI, Sandra. Região e Geografia. São Paulo: EdUSP, 1999.
LEPETIT, Bernard. Arquitetura, Geografia e História: usos da escala. In:
SALGUEIRO, Heliana Angotti (Org.). Por uma nova história urbana. São Paulo,
Edusp, 2001.
LESSA, Carlos. O parto sem dor do Estado Nacional brasileiro e com muita dor, da
economia nacional. In: FIORI, José Luis (Org.). Polarização mundial e
crescimento, p. 245-268. Petrópolis: Vozes, 2001.
LIMA, Evelyn Furkin Werneck. Um cenário diferenciado: o urbanismo peculiar da
região das Minas no século XVIII. SEMINÁRIO DE HISTÓRIA DA CIDADE E DO
URBANISMO, 9., 4 a 6 de setembro 2006, São Paulo. Anais..., São Paulo, 2006.
213
LIMONAD, Ester. A urbanização do território: o caso do interior fluminense. Revista
Fluminense de Geografia, nº 2, p. 19-27, Niterói, AGB-Niterói, nov 1998.
LIMONAD, Ester. Os lugares da urbanização: o caso do interior fluminense. 1996.
Tese (Doutorado), FAUSP, São Paulo, 1996.
LINHARES, Maria Yedda; SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. Região e História
Agrária. Estudos Históricos, vol. 8, nº 15, p.17-26, Rio de Janeiro, 1995.
LIPIETZ, Alain. O capital e seu espaço. São Paulo: Nobel, 1988.
LUZ, Nícia Vilela. A luta pela industrialização no Brasil. 2ª ed. São Paulo: Alfa-
Ômega, 1978.
MACEDO, Valter Luiz de. O passado de volta: planejamento estratégico,
mercantilização do espaço público e desigualdade urbana. 2002. Dissertação
(Mestrado em Planejamento Urbano e regional), IPPUR, UFRJ, Rio de Janeiro,
2002.
MACHADO, Humberto Fernandes. Escravos, senhores e café. A crise da
cafeicultura escravista do Vale do Paraíba fluminense 1860-1888. Niterói: Clube de
Literatura Cromos, 1993.
MACHADO, Lia Osório. A questão da unidade territorial do Brasil. ENCONTRO
NACIONAL DE GEÓGRAFOS BRASILEIROS, 8., 1990, Salvador. Anais..., v. 2, p.
717-725, Salvador: AGB, 1990.
MACHADO, Lia Osório. As idéias no lugar: o desenvolvimento do pensamento
geográfico no Brasil no início do século XX. Terra Brasilis, ano I , nº 2, p. 11-31,
Rio de Janeiro, 2000.
MAGNOLI, Demétrio. O corpo da pátria: Imaginação geográfica e política externa
no Brasil (1808-1912). São Paulo: Unesp/Moderna, 1997.
MAGNOLI, Demétrio. O Estado em busca do seu território.In JANCSÓ, István (Org.).
Brasil. Formação do Estado e da Nação, p. 285-296. São Paulo: Editora Hucitec;
Ijuí: Editora Unijuí, 2003.
214
MARTINS, Maria Fernanda Vieira. A velha arte de governar: um estudo sobre
política e elites a partir do Conselho de Estado 1842/1889. 2005. Tese (Doutorado),
IFCS, UFRJ, Rio de Janeiro, 2005.
MARX, Murillo. Cidade no Brasil. Terra de quem? São Paulo: Edusp-Nobel, 1991.
MATTOS, Hebe M. Escravidão e cidadania no Brasil monárquico. Rio de Janeiro:
Zahar, 2000.
MATTOS, Ilmar R. O tempo saquarema. A formação do Estado Imperial. 3ª ed.,
Rio de Janeiro: Access, 1994.
MORAES, Antonio Carlos Robert. Ideologias geográficas: espaço, cultura e
política no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1988.
MORAES, Antonio Carlos Robert. Notas sobre identidade nacional e
institucionalização da Geografia no Brasil. Estudos Históricos, vol. 4, nº 8, p 166-
176, Rio de Janeiro, 1991.
MORAES, Antonio Carlos Robert. Território e História no Brasil. São Paulo:
Hucitec, 2002.
MOTA, Carlos Guilherme. Idéias do Brasil: formação e problemas (1817-1850). In:
______ (Org.). Viagem incompleta: a experiência brasileira (1500-2000). São
Paulo: Senac, 2000.
MOURA, Rosa. Rede urbana e reestruturação do território nacional: um percurso
por entre representações. SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOGRAFIA URBANA, 8.,
2003, Recife. Anais..., Recife: UFPE, 2003.
NEVES, Lúcia Bastos Pereira das. Boa sociedade. In: VAINFAS, Ronaldo (Org.).
Dicionário do Brasil Imperial, p. 95-98. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002a.
NEVES, Lúcia Bastos Pereira das. José Bonifácio de Andrada e Silva. In: VAINFAS,
Ronaldo (Org.). Dicionário do Brasil Imperial, p. 424-426. Rio de Janeiro: Objetiva,
2002b.
NOGUEIRA, Ricardo José Batista. Amazônia e questão regional: um regionalismo
sufocado. Revista GeoUSP, nº 5, p. 67-76, São Paulo, 1999.
215
NOVAIS Fernando A.; MOTA, Carlos Guilherme. A independência política do
Brasil. São Paulo: Moderna, 1986.
OLIVEIRA, Francisco. Elegia para uma re(li)gião. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1981.
OLIVEIRA, Ivan Tiago Machado. Imaginação geográfica, território e identidade
nacional no Brasil. Revista Urutágua, nº 15, Maringá: DCS/UEM, abr/jul 2008.
PIMENTA, Demerval José. Caminhos de Minas Gerais. Belo Horizonte: Imprensa
Oficial, 1971.
PIRES, João Marcelo Ramos. Entre a província e a nação: centralização,
descentralização e a obra de Sérgio Buarque de Holanda na década de 1930. 2005.
Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Ciência Política, IFCS,
UFRJ, Rio de Janeiro, 2005.
PIZARRO, Jose de Souza Azevedo. Memórias históricas do Rio de Janeiro.
Volume 5. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1945.
PRADO JÚNIOR, Caio. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense,
1945.
PRADO JÚNIOR, Caio. Evolução política do Brasil e outros estudos. São Paulo:
Brasiliense, 1975.
RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. São Paulo: Ática, 1993.
[Original 1880]
REIS, Arthur C. F. Épocas e visões regionais do Brasil. Manaus: Governo do
Estado do Amazonas, 1966.
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro. A formação e o sentido do Brasil. São Paulo:
Companhia das Letras, 2006.
RIBEIRO, Luiz Cézar de Queiroz; CARDOSO, Adauto Lúcio. Da cidade à nação:
gênese e evolução do urbanismo no Brasil. In: RIBEIRO, Luiz Cézar de Queiroz;
216
PECHMAN, Robert (Orgs.). Cidade, povo e nação. Gênese do urbanismo
moderno. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996.
ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da educação no Brasil. 13ª ed.
Petrópolis: Vozes, 1991.
ROMERO, José Luis. América Latina: as cidades e as idéias. Rio de Janeiro:
Editora UFRJ, 2004.
SAFFORD, Frank. Política, ideologia e sociedade na América espanhola do pós-
Independência. BETHELL, Leslie (Org.). História da América Latina (Volume III –
Da Independência até 1870), p. 329-412. São Paulo: Edusp, Imprensa Oficial do
Estado; Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2001.
SANCHEZ, M. G. Proveito e negócio. Regimes de propriedades e estruturas
fundiárias no Brasil: o caso do Rio de Janeiro entre os séculos XVIII e XIX. 1997.
Tese (Doutorado), IFCS, UFRJ, Rio de Janeiro, 1997.
SAINT-HILAIRE, Auguste. Viagens pelas províncias do Rio de Janeiro e Minas
Gerais. São Paulo: Edusp; Belo Horizonte: Itatiaia, 1975.
SANTOS, Milton. Dimensão temporal e sistemas espaciais no Terceiro Mundo. In:
______. Espaço e Método, p. 21-35. 1ª ed. São Paulo: Nobel, 1985.
SANTOS, Milton. A urbanização brasileira. São Paulo: Hucitec, 1993.
SANTOS, Milton. Técnica, espaço, tempo: globalização e meio técnico-científico-
informacional. São Paulo: Hucitec, 1994.
SANTOS, Milton. A natureza do espaço. Técnica e tempo. Razão e emoção. 3ª ed.
São Paulo: Hucitec, 1999.
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência
universal. 2ª ed. Rio de Janeiro; São Paulo: Record, 2000.
SANTOS, Milton; SILVEIRA, Maria Laura da. O Brasil: território e sociedade no
início do século XXI. Rio de Janeiro: Record, 2001.
217
SANTOS, Paulo F. Formação de cidades no Brasil. COLÓQUIO INTERNACIONAL
DE ESTUDOS LUSO–BRASILEIROS, 5., 1968, Coimbra. Anais..., Coimbra, 1968.
SANTOS, Wanderley Guilherme dos. Ordem burguesa e liberalismo político. São
Paulo: Livraria Duas Cidades, 1978.
SANTOS, Wilmihara B. S. Alves dos. Povo e raça na formação da nação: o debate
entre Manoel Bomfim e Silvio Romero. 2006. Dissertação (Mestrado em Ciências
Sociais), Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista,
Marília/SP, 2006.
SARTRE, Jean-Paul. Questão de método. 2ª ed. São Paulo: Difusão Européia do
Livro, 1967.
SCHWARCZ, Lília Moritz. As barbas do imperador. D. Pedro II, um monarca nos
trópicos. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
SCHWARTZ, Stuart B. Gente da terra braziliense da nasção. Pensando o Brasil: a
construção de um povo. In: MOTA, C. G. (Org.). Viagem incompleta: a experiência
brasileira (1500-2000). Formação histórica, p.103-125. São Paulo: Senac, 2000.
SILVA, Paulo R. Paranhos da. Rio de Janeiro 240 anos de Justiça (Regedores e
presidentes). Rio de Janeiro: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, 1990.
SOARES, Josarlete Magalhães. Expansão da rede urbana mineira e ocupação
territorial da Zona da Mata na segunda metade do século XVIII. In: SEMINÁRIO DE
HISTÓRIA DA CIDADE E DO URBANISMO, 10., outubro 2008, Recife. Anais...,
Recife: UFPE, 2008.
SODRÉ, Nélson Werneck. Panorama do Segundo Império. São Paulo: Cia. das
Letras, 1935.
SOUZA NETO, Manoel Fernandes de. Senador Pompeu: um geógrafo do poder no
Império do Brasil. 1997. Dissertação (Mestrado em Geografia Humana), Faculdade
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, USP, São Paulo, 1997.
SOUZA, Marcelo José Lopes de. O território: sobre espaço e poder. Autonomia e
desenvolvimento. In: CASTRO, Iná Elias de; GOMES, Paulo César da Costa;
CORRÊA, Roberto Lobato (Orgs). Geografia: conceitos e temas, p. 77-116. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.
218
SPOSITO, Eliseu Savério. Sobre o conceito de território: um exercício metodológico
para a leitura da formação territorial do sudoeste do Paraná. In: SPOSITO, Eliseu
Savério et al. Território e desenvolvimento: diferentes abordagens. Francisco
Beltrão: UniOeste, 2004.
STEPAN, Alfred. Para uma nova análise comparativa do federalismo e da
democracia: federações que restringem ou ampliam o poder do demos. Dados
Revista de Ciências Sociais, volume 42, nº 02, 1999.
TILLY, Charles. Os Estados e seus cidadãos. In: ______. Coerção, capital e
Estados europeus, p. 157-193. São Paulo: EDUSP, 1996.
TUAN, Yi-Fu. Topofilia. São Paulo: Difel, 1980.
URICOECHEA, Fernando. O minotauro imperial: a burocratização do Estado
patrimonial brasileiro no século XIX. Rio de Janeiro: Difel, 1978.
VAINFAS, Ronaldo. Império. In: ______. (Org.). Dicionário do Brasil Imperial
1822-1889, p. 356-359. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002a.
VAINFAS, Ronaldo. Indianismo. In: ______. (Org.). Dicionário do Brasil Imperial
1822-1889, p. 367-369. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002b.
VIANNA, José Francisco Oliveira. Populações meridionais do Brasil: história,
organização, psicologia. Populações rurais do Centro-Sul. Volume I. 3ª ed. São
Paulo: Companhia Editora Nacional, 1933.
VITORINO, Artur José Renda. Cercamento à brasileira: conformação do mercado
de trabalho livre na Corte nas décadas de 1850 a 1880. 2002. Tese (Doutorado em
História), IFCH, UNICAMP, Campinas, 2002.
219
Fontes de dados primários:
APERJ (ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO)
Relatórios dos Presidentes da Província do Rio de Janeiro / Sala de Leitura
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do presidente da provincia do Rio de
Janeiro, João Caldas Vianna, na abertura da 2ª sessão da 4ª legislatura da
Assembléa Provincial em 05 de março de 1843, acompanhado do orçamento da
receita e despeza para o ano financeiro de 1843 a 1844. Niterói, 1843. (Códice: 01)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do Presidente da Província do Rio de
Janeiro, João Caldas Vianna, no dia 1º de março de 1844. Rio de Janeiro, 1844.
(Códice: 02)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do presidente da provincia do Rio de
Janeiro, o senador Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho, na abertura da
Assembléa Legislativa Provincial no 1.o de março de 1846, acompanhado do
orçamento da receita e despeza para o anno financeiro de 1846 a 1847. Segunda
edição. Nictheroy, Typographia de Amaral & Irmão, 1853. (Códice: 04)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do vice-presidente da provincia do Rio
de Janeiro, o veador João Pereira Darrigue Faro, na abertura da segunda sessão
da nona legislatura da Assembléa Legislativa Provincial, no dia 1.o de agosto de
1853, acompanhado do orçamento da receita e despeza para o anno de 1854. Rio
de Janeiro, Empreza Typographia Dous de Dezembro de Paula Brito, 1853. (Códice:
06)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do vice-presidente da província do Rio
de Janeiro, o doutor José Ricardo de Sá Rego, na abertura da segunda sessão da
décima legislatura da Assembléa Legislativa Provincial, acompanhado do orçamento
da receita e despeza para o anno [seguinte] de 1856. Nictheroy, Typographia de
Quirino & Irmão, 1855. (Códice: 09)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado ao Excellentissimo Vice-
Presidente da Provincia do Rio de Janeiro o Senhor Conselheiro Antonio Nicólao
Tolentino pelo Presidente o Conselheiro Luiz Antonio Barbosa sobre o estado da
administração da mesma provincia em 2 de Maio de 1856. Rio de Janeiro,
Typographia Imperial e Constitucional de J. Villeneuve e Comp., 1856a. (Códice: 11)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na 2a sessão da 14a legislatura pelo vice-presidente,
220
o doutor José Ricardo de Sá Rego. Nictheroy, Typographia do Echo da Nação,
1861. (Códice: 12)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na primeira sessão da decima-quinta legislatura no
dia 8 de setembro de 1862 pelo vice-presidente da mesma provincia, José Norberto
dos Santos. Rio de Janeiro, Typographia universal de Laemmert, 1862. (Códice: 13)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na primeira sessão da decima-quinta legislatura no
dia 9 de outubro de 1864, pelo presidente da mesma provincia, o conselheiro João
Crispiano Soares. Rio de Janeiro, Typographia Universal de Laemmert, 1864.
(Códice: 16)
RIO DE JANEIRO (Província). Falla apresentada á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na segunda sessão da decima-quinta legislatura no
dia 15 de outubro de 1865, pelo primeiro vice-presidente da mesma provincia, o
dezembargador José Tavares Bastos. Rio de Janeiro, Typographia universal de
Laemmert, 1865. (Códice: 17)
RIO DE JANEIRO (Província). Falla do presidente da provincia do Rio de
Janeiro, dr. Experidião Eloy de Barros Pimental, na abertura da 1a sessão da
decima-sexta legislatura da Assembléa Legislativa Provincial no dia 8 de outubro de
1866, acompanhada do relatorio com que o ex.mo sr. vice-presidente,
dezembargador José Tavares Bastos, passou-lhe a administração da mesma
provincia. Rio de Janeiro, Typographia de Quirino & Irmão, 1866. (Códice: 18)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na segunda sessão da decima-setima legislatura no
dia 1º de outubro de 1869 pelo 1o vice-presidente, desembargador Diogo Teixeira de
Macedo. Rio de Janeiro, Typographia do Diario do Rio de Janeiro, 1869. (Códice:
21)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na sessão extraordinaria no dia 1o de maio de 1873
pelo presidente, desembargador Manoel José de Freitas Travassos. Rio de Janeiro,
Typographia do Apostolo, 1873. (Códice: 22)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na segunda sessão da decima nona legislatura no dia
8 de setembro de 1873 pelo presidente, desembargador Manoel José de Freitas
Travassos. Rio de Janeiro, Typographia do Apostolo, 1873. (Códice: 23)
221
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na primeira sessão da vigesima primeira legislatura
no dia 22 de outubro de 1876 pelo presidente, conselheiro Francisco Xavier Pinto
Lima. Rio de Janeiro, Typographia do Apostolo, 1876. (Códice: 25)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na segunda sessão da vigesima segunda legislatura
no dia 8 de setembro de 1879 pelo presidente, dr. Americo de Moura Marcondes de
Andrade. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1879. (Códice: 28)
RIO DE JANEIRO (Província). Legislação. Regulamento das Collectorias das
rendas da Província do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Typographia Montenegro,
1882a. (Sala de Leitura)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na abertura da primeira sessão da vigesima quarta
legislatura em 8 de agosto de 1882 pelo presidente, desembargador Bernardo
Avelino Gavião Peixoto. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1882b. (Códice:
30)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na abertura da primeira sessão da vigesima quarta
legislatura em 8 de agosto de 1884 pelo presidente, José Leandro de Godoy e
Vasconcellos. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1884. (Códice: 32)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na abertura da segunda sessão da vigesima sexta
legislatura em 12 de setembro de 1887 pelo presidente, dr. Antonio da Rocha
Fernandes Leão. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1887. (Códice: 33)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na abertura da primeira sessão da vigesima setima
legislatura em 8 de agosto de 1888 pelo presidente, dr. José Bento de Araujo. Rio de
Janeiro, Typographia Montenegro, 1888. (Códice: 34)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na abertura da segunda sessão da vigesima setima
legislatura em 15 de outubro de 1889 pelo presidente, conselheiro Carlos Affonso de
Assis Figueiredo. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1889. (Códice: 36)
222
APERJ (ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO)
Coleção de Leis do Brasil
Coleção de Leis do Império do Brasil
LAMP-CRL (THE LATIN AMERICAN MICROFORM PROJECT AT THE CENTER
FOR RESEARCH LIBRARIES), com apoio da BIBLIOTECA NACIONAL DO RIO
DE JANEIRO.
Relatórios dos Presidentes da Província do Rio de Janeiro
Acervo disponível em <http://www.crl.edu/content/brazil/jain.htm>
RIO DE JANEIRO (Província). Falla com que o presidente da provincia de Rio de
Janeiro, o conselheiro Joaquim José Rodrigues Torres, abriu a 1.a sessão da 1.a
legislatura da Assembléa Legislativa da mesma província, no dia 1.o de fevereiro de
1835. Nictheroy, Typographia de Amaral & Irmão, 1850. (Códice: 768 BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Falla com que o presidente da provincia de Rio de
Janeiro, Joaquim José Rodrigues Torres, abriu a Sessão Ordinária da Assembléa
Legislativa Provincial em 1º de Março de 1836. [a] (Códice: U814)
RIO DE JANEIRO (Província). Exposição do Presidente da Província do Rio de
Janeiro Paulino José Soares de Souza apresentada em 18 de outubro de 1836 á
Assembléa Provincial. Nicterohy, 1836. [b] (Códice: U815)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do presidente da provincia do Rio de
Janeiro, o conselheiro Paulino José Soares de Souza, na abertura da 2.a sessão da
2.a legislatura da Assembléa Provincial, acompanhado do orçamento da receita e
despeza para o anno de 1839 a 1840. Segunda edição. Nictheroy Typographia de
Amaral & Irmão, 1851. (Códice: 770 BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do presidente da provincia do Rio de
Janeiro, o conselheiro Paulino José Soares de Souza na abertura da 1.a sessão da
3.a legislatura da Assembléa Provincial, acompanhado do orçamento da receita e
despeza para o anno de 1840 a 1841. Segunda edição. Nictheroy, Typographia de
Amaral & Irmão, 1851. (Códice: 771 BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do presidente da provincia do Rio de
Janeiro, o senador Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho, na abertura da
Assembléa Legislativa Provincial no 1.o dia de março de 1847, acompanhado do
orçamento da receita e despeza para o anno financeiro de 1847. Rio de Janeiro,
Typographia do Diario, de N.L. Vianna, 1847. (Códice: 777 BN)
223
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do presidente da provincia do Rio de
Janeiro, o doutor Luiz Pedreira do Coutto Ferraz, na abertura da 2.a sessão da 7.a
legislatura da Assembléa Provincial, no dia 1.o de março de 1849, acompanhado do
orçamento da receita e despesa para o anno financeiro de 1849 a 1850. Rio de
Janeiro, Typographia do Diario, de N.L. Vianna, 1849. (Códice: 779 BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do vice-presidente da provincia do Rio
de Janeiro, o commendador João Pereira Darrigue Faro, na abertura da 1.a sessão
da 8.a legislatura da Assembléa Provincial, no dia 1.o de março de 1850,
acompanhado do orçamento da receita e despesa para o anno financeiro de 1850-
1851. Rio de Janeiro, Typographia do Diario, de N.L. Vianna, 1850. (Códice: 780
BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do vice-presidente da provincia do Rio
de Janeiro, o veador João Pereira Darrigue Faro, na abertura da segunda sessão
da oitava legislatura da Assembléa Provincial, no dia 1.o de agosto de 1851,
accompanhado do orçamento da receita e despeza para o anno de 1852. Rio de
Janeiro, Typographia Universal de Laemmert, 1851. (Códice: 781 BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na 1ª sessão da 11ª legislatura pelo vice-presidente
da provincia, o conselheiro Antonio Nicoláo Tolentino. Nictheroy, Typographia da
Patria de C.B. de Moura, 1856b. (Códice: 786 BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado ao excellentíssimo
Presidente da Província do Rio de Janeiro, o senhor doutor Ignácio Francisco
Silveira da Motta, pelo Ex-Presidente, o doutor João de Almeida Pereira, sobre o
estado da administração da mesma província em 25 de Abril de 1859. Nictheroy,
Typographia da Pátria, 1859. (Códice: u836)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado a Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na segunda sessão da decima quinta legislatura no
dia 1.o de outubro de 1863, pelo presidente da mesma provincia, dr. Polycarpo
Lopes de Leão. [n.p.] Typographia do Correio Mercantil, 1863. (Códice: 793 BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á S. Exª o Sr. 1º Vice-
Presidente da Província do Rio de Janeiro Dr. Eduardo Pindahyba de Mattos pelo
Presidente Dr. Espiridião Eloy de Barros Pimentel em 21 de Maio de 1867. Rio de
Janeiro, Typographia de Quirino & Irmão, 1867.[a] (Códice: u846)
224
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na segunda sessão da decima-sexta legislatura no
dia 20 de outubro de 1867 pelo presidente da mesma província, dr. Esperidião Eloy
de Barros Pimental. Rio de Janeiro, Typographia Universal de Laemmert, 1867. [b]
(Códice: 798 BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na primeira sessão da decima nona legislatura no dia
29 de setembro de 1872 pelo presidente, conselheiro Josino do Nascimento Silva.
Rio de Janeiro, Typographia Perseverança, 1872. (Códice: 803 BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na sessão extraordinaria no dia 20 de março de 1874
pelo presidente, dezembargador Manoel José de Freitas Travassos. Rio de Janeiro,
Typographia do Apostolo, 1874. (Códice: 806 BN)
RIO DE JANEIRO (Província). Exposição com que o Visconde de Prados passou
a administração da Província do Rio de Janeiro ao Exm. Sr. Dr. Luiz Pinto de
Miranda Montenegro, 1º Vice-Presidente da mesma Província, no dia 26 de
Dezembro de 1878. Rio de Janeiro, Typographia Nacional, 1879. (Códice: u855)
RIO DE JANEIRO (Província). Exposição com que o Bacharel Américo de Moura
Marcondes de Andrade passou a administração da Província do Rio de Janeiro
ao 1º Vice-Presidente da mesma Província Bacharel Paulo José Pereira de Almeida
Torres no dia 20 de Abril de 1880. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1880.
(Códice: u857)
RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa
Provincial do Rio de Janeiro na abertura da segunda sessão da vigesima terceira
legislatura em 8 de agosto de 1881 pelo presidente, dr. Martinho Alvares da Silva
Campos. Rio de Janeiro, Imprensa Industrial de João Paulo Ferreira Dias, 1881.
(Códice: 813 BN)
ARQUIVO NACIONAL
BRASIL (Ministério do Império). Ministro Nicolau Pereira de Campos Vergueiro.
Relatório do ano de 1832, apresentado à Assembléia Geral Legislativa em sessão
ordinária de 1833. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1833.
BRASIL (Ministério do Império). Relatório ministerial de 1833 publicado em maio
de 1834, por Antônio Pinto Chichorro da Gama.
225
BRASIL (Ministério do Império). Ministro Joaquim Vieira da Silva e Souza. Relatório
do ano de 1834 apresentado à Assembléia Geral Legislativa na sessão ordinária de
1835. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1835.
BRASIL (Ministério do Império). Ministro Jose Ignacio Borges. Relatório do ano de
1835, apresentado à Assembléia Geral Legislativa na sessão ordinária de 1836. Rio
de Janeiro: Typographia Nacional, 1836.
BRASIL (Ministério do Império). Ministro Antonio Paulino Limpo de Abrêo. Relatório
do ano de 1836, apresentado á Assembléia Geral Legislativa na sessão ordinária de
1837. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1837.
BRASIL (Ministério do Império). Relatório do Ministério do Império de 1837.
Ministro e secretário de Estado Interino, Bernardo Pereira de Vasconcellos. Rio de
Janeiro: Typographia Nacional, 1838.
BRASIL (Ministério do Império). Ministro Francisco de Paula de Almeida e
Albuquerque. Relatório do ano de 1838, apresentado à Assembléia Geral
Legislativa na sessão ordinária de 1839. Rio de Janeiro: Typographia Nacional,
1839.
BRASIL (Ministério do Império). Ministro Francisco Ramiro D’Assis Coelho.
Relatório do ano de 1839, apresentado à Assembléia Geral Legislativa na sessão
Ordinária de 1840. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1840.
BRASIL (Ministério do Império). Ministro Candido José de Araújo Vianna. Relatório
do ano de 1840, apresentado na Assembléia Geral Legislativa na sessão ordinária
de 1841. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1841.
RIO DE JANEIRO (Província). Decreto nº 1.828 de 1 de Outubro de 1856, divide a
Província do Rio de Janeiro em districtos eleitoraes.
Conjunto Documental: Capitania do Rio de Janeiro
Notação: caixa 746, pct. 01
Datas-Limite: 1700-1808
Título do Fundo ou Coleção: Vice-reinado
Código do Fundo: D9
Conjunto Documental: Câmaras municipais. Ofícios de diversas autoridades e
câmaras municipais
226
Notação: IJJ9 536
Datas-Limite: 1808-1870
Título do Fundo ou Coleção: Série Interior
Código do Fundo: AA
Conjunto Documental: Criação de vilas e limites de províncias
Notação: códice 602, vol. 02
Datas-Limite: 1750-1795
Título do Fundo ou Coleção: Diversos códices - SDH
Código do Fundo: NP
REAL GABINETE PORTUGUÊS DE LEITURA
Dicionário da Língua Portuguesa, por Bernardo de Lima e Melo Bacellar. Lisboa,
1783.
Dicionário da Língua Portuguesa. Lisboa: Academia Real das Ciências, 1793.
Dicionário da Língua Portuguesa, por Antônio de Moraes Silva e revisto por
Theotônio José de Oliveira Velho. Lisboa, 1831.
Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, por Antonio Joaquim de Macedo
Soares. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1889.
Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, por Antenor Nascentes. Rio de
Janeiro, 1932, 1ª edição.
Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa. Elucidário etimológico crítico das
palavras e frases que originárias do Brasil não se encontram nos dicionários da
língua portuguesa ou neles vêem com forma ou significado diferente (1875-1888).
Por Antonio Joaquim de Macedo Soares e revisto por Julião Rangel de Macedo
Soares. Rio de Janeiro, 1954.
227
Anexos
ANEXO 1: OS GABINETES DO SEGUNDO REINADO
Os Gabinetes Partido Data da
Posse
Antônio Carlos, Antônio Limpo Paulino de Abreu (Visconde de Abaeté), Martins Francisco,
Aureliano Coutinho (Visconde de Sepetiba), Holanda Cavalcanti (Visconde de Albuquerque),
Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque (Visconde de Suassuna)
Liberal 24/07/1840
Araújo Viana, Paulino de Souza, Aureliano Coutinho, Miguel Calmon, Francisco Vilela Barbosa
(Marquês de Paranaguá) , Clemente Pereira
Silva Maia, Carneiro Leão, Joaquim Francisco Viana, Salvador Maciel e Rodrigues Torres
Conservador
Conservador
23/03/1841
1843
Almeida Torres, Manuel Alves Branco, Ferreira França e Jerônimo Coelho
Marcelino de Brito, Fernandes Torres, Bento da Silva Lisboa, Holanda Cavalcanti, João Paulo
dos Santos Barreto
Manuel Alves Branco, Visconde de Caraveles (36)
José Carlos Pereira de Almeida Torres (Visconde de Macaé)
Francisco de Paula Souza e Melo
Liberal
Liberal
Liberal
Liberal
Liberal
02/02/1844
1846
22/05/1847
08/03/1848
31/05/1848
Pedro Araújo Lima (Visconde depois Marques de Olinda) Conservador
29/09/1848
José da Costa Carvalho (Marques de Monte Alegre) Liberal 08/10/1849
Joaquim José Rodrigues Torres (Visconde de Itaboraí)
Honório Hermeto Carneiro Leão
Luís Alves de Lima e Silva (Duque de Caxias)
Pedro de Araújo Lima (Visconde, depois, Marques de Olinda)
Antônio Paulino Limpo de Abreu (Visconde de Abaeté)
Ângelo Muniz da Silva Ferraz (Barão de Uruguaiana)
Luís Alves de Lima e Silva (Duque de Caxias)
Conservador
Conservador
Conservador
Conservador
Conservador
Conservador
Conservador
11/05/1852
06/09/1853
03/09/1856
04/05/1857
12/12/1858
10/08/1859
02/03/1861
Zacarias de Goes e Vasconcelos
Pedro de Araújo Lima (Visconde, depois Marques de Olinda)
Zacarias de Goes e Vasconcelos
Francisco José Furtado
Pedro de Araújo Lima (Visconde, depois Marques de Olinda)
Zacarias de Goes e Vasconcelos
Liberal
Liberal
Liberal
Liberal
Liberal
Liberal
24/05/1862
30/05/1862
15/01/1864
31/08/1864
12/05/1865
03/08/1866
Joaquim José Rodrigues Torres (Visconde de Itaboraí)
José Antônio Pimenta Bueno (Visconde de São Vicente)
José Maria da Silva Paranhos (Visconde do Rio Branco)
Luís Alves de Lima e Silva (Duque de Caxias)
Conservador
Conservador
Conservador
Conservador
16/07/1868
29/09/1870
07/03/1871
25/06/1875
João Lins Vieira C. Sinimbú (Visconde de Sinimbú)
José Antônio Saraiva
Martinho Alvares Silva Campos
João Lustosa da Cunha Paranaguá (2° Marques de Paranaguá)
Lafayette Rodrigues Pereira
Manoel Pinto de Souza Dantas
José Antônio Saraiva
Liberal
Liberal
Liberal
Liberal
Liberal
Liberal
Liberal
05/01/1878
28/03/1880
21/01/1882
03/07/1882
24/05/1883
06/06/1884
06/05/1885
João Maurício Wanderley (Barão de Cotejipe)
João Alfredo Correia de Oliveira
Conservador
Conservador
20/08/1885
10/03/1888
Afonso Celso de Assis Figueiredo (Visconde de Ouro Preto) Liberal 07/06/1889
Fonte: SOARES, Carlos Dalmiro da Silva. Evolução histórico-sociológica dos partidos políticos no Brasil Imperial.
Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1503>. Acesso em 04/01/2008.
228
ANEXO 2: REPRODUÇÃO DE “A GRANDE POLÍTICA” (D’ALMEIDA, 1877).
(Folha de rosto e Capítulo X, p. 143-147)
229
D’ALMEIDA, 1877, folha de rosto e p. 143-147.
230
Apêndices
Apêndice 1: JUSTIÇA NO BRASIL E NO RIO DE JANEIRO
Entender a história das instituições da Justiça nos seus rebatimentos no território carioca
e fluminense significa entender uma linha do tempo que se inicia em 1751 com a criação da
Relação do Rio de Janeiro. Ela se inseria em um processo de constituição da Justiça no Brasil
e, para entendermos seus precedentes, é importante olhar o seguinte quadro:
Justiça no Brasil
1530 a 1548 Exercida através de Portugal pelos seus ouvidores e Tribunais Superiores
como a Mesa do Desembargo do Paço.
1548 a 1580 Ouvidor Geral no próprio Brasil e cargos de juízes ordinários e de vintena que
atuavam no nível das capitanias.
1580 a 1640 União Ibérica: Código Filipino substitui o manuelino.
Relação do Estado do Brasil 1609 com governador, chanceler, desembargador
dos agravos e apelações, etc e, no vel municipal, os juízes ordinários e de
vintena. Sede: Salvador e jurisdição em todo o território brasileiro.
A relação desaparece por alvará do rei de Espanha em 1626 e somente o
Ouvidor Geral permanece como distribuidor da justiça no Brasil.
1640... Restauração do trono português
A Relação do Estado do Brasil é restaurada quase que com os mesmos cargos.
Apenas no nível municipal ha ampliação: juiz de fora e dos órfãos quase que
diretamente vinculados às câmaras.
Fonte: SILVA (1990)
Uma vez que todo o aparato judicial se concentrava na Relação da Bahia e esta não se
fazia atuante frente às demandas judiciais de todo o território, criou-se a Relação do Rio de
Janeiro (1751-1808) por conta do incremento populacional verificado com o aumento da
importância econômica da região. A estratégia de D. Jose I era economizar os cofres públicos.
Com efeito,
Tendo consideração a me representarem os povos da parte Sul do
Estado do Brasil, que por ficar em tanta distancia a Relação da Bahia
não podem seguir nela as suas causas e requerimentos sem proceder
grandes demoras, despesas e perigos, o que poderia evitar-se
criando-se outra relação na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro,
que os ditos povos se ofereciam a manter as suas custas, fui servido
mandar ver esta matéria (...) houve por bem de criar a dita Relação
(SILVA, 1990, p. 29).
A referência era clara e apenas os que pagassem estariam sob a proteção da justiça
colonial e o domínio era, sem dúvida, o das câmaras municipais e de seus “homens bons”. A
presidência do Tribunal da Relação foi dada ao governador da capitania do Rio de Janeiro.
Quanto ao seu limite de atuação, o artigo 10 do seu Regimento estabelecia que:
Terá esta Relação por seu distrito todo o território que fica ao Sul do
estado do Brasil, em que se compreendem treze comarcas, a saber, Rio
231
de Janeiro, São Paulo, Ouro Preto, Rio das Mortes, Sabará, Rio das
Velhas, Serro do Frio, Cuiabá, Goiáses, Paranaguá, Espírito Santo,
Itacazes e Ilha de Santa Catarina, incluindo todas as Judicaturas,
Ouvidorias e capitanias, que houverem criado, ou de novo se criarem
no referido âmbito, que hei por bem separar inteiramente do distrito e
jurisdição da Relação da Bahia (SILVA, 1990, p. 30-31).
A referência era clara e apenas os que pagassem estariam sob a proteção da justiça
colonial e o domínio era, sem dúvida, o das câmaras municipais e de seus “homens bons”. A
presidência do Tribunal da Relação foi dada ao governador da capitania do Rio de Janeiro.
Quanto ao seu limite de atuação, o artigo 10 do seu Regimento estabelecia que:
Terá esta Relação por seu distrito todo o território que fica ao Sul do
estado do Brasil, em que se compreendem treze comarcas, a saber, Rio
de Janeiro, São Paulo, Ouro Preto, Rio das Mortes, Sabará, Rio das
Velhas, Serro do Frio, Cuiabá, Goiáses, Paranaguá, Espírito Santo,
Itacazes e Ilha de Santa Catarina, incluindo todas as Judicaturas,
Ouvidorias e capitanias, que houverem criado, ou de novo se criarem
no referido âmbito, que hei por bem separar inteiramente do distrito e
jurisdição da Relação da Bahia (SILVA, 1990, p. 30-31).
Em 1808, a Relação do Rio de Janeiro passou para a Casa da Suplicação do Brasil em
uma estratégia geopolítica em que Dom João VI mostrava ao mundo seu novo endereço e
iniciava a modernização no Brasil de acordo com os valores em voga (geralmente associado
ao discurso do sentir-se amparado por um substancial aparato burocrático) e com a ótica
colonizador-colonizado. A Casa da Suplicação do Brasil funcionou como Superior Tribunal
de Justiça, subjugando a Relação da Bahia.
Com o Império, a Casa foi extinta e a Relação do Rio de Janeiro voltou a funcionar com
a denominação até 1889 e com estatuto de Tribunal de Segunda Instância. O Desembargador
dos Agravos era o cargo de maior importância, sendo escolhido entre seus pares. Segundo a
Carta de 1824, deveria haver uma Relação em cada província e delas seriam retirados os
juízes letrados que comporiam o Tribunal Superior de Justiça, condecorado com o titulo de
Conselho. Na verdade, a instituição do Conselho iria subjugar a Relação e o judiciário seria,
assim, um poder político e uma delegação da nação e os que o exerciam (magistrados) eram
nomeados pelo Imperador, que podia também suspendê-los. No tribunal Superior, cabia
também ao Imperador a escolha do presidente.
De início, eram quatro as Relações estabelecidas de maneira que apenas a parte norte do
Império foi dividida para efeito de atuação. Eram elas: Corte (com jurisdição sobre todo o
território da Província do Rio de Janeiro), Salvador, Recife e São Luis. A lei de 2.342 de
06/08/1873 elevou para 11 o número de Relações no Império, tendo a do Município Neutro
jurisdição sobre as províncias do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. A presidência da Relação
do Rio de Janeiro, foi ocupada por muitos deputados, nobres que também exerceram a
presidência da província fluminense e, mais comum, de outras províncias do Império. Alguns
nomes são: João Antonio Rodrigues de Carvalho, Jose Vernek Ribeiro de Aguilar, Jose Carlos
Pereira de Almeida Torres (2o Visconde de Macaé), Manoel Ignácio Cavalcante de Lacerda
(Barão de Pirapama), Euzébio de Queiroz Coutinho Matoso Câmara, Manoel de Jesus
Valdetaro (Visconde de Valdetaro), José Tavares Bastos e Francisco de Faria Lemos. A estes
homens estiveram submetidos os juízes de primeira instância que atuavam na vida cotidiana
dos membros da sociedade e que expressavam as leis da nação que estava sendo criada.
232
A partir de Silva (1990, p. 146-147), indicamos no quadro abaixo os seguintes juízes de
primeira instância no Rio de Janeiro naquele momento:
Juízes ordinários (extintos pelo Código Criminal): tinham por circunscrição o conselho e
eram eleitos em segredo por seis eleitores do segundo grau. Processavam e julgavam
feitos cíveis e crimes, alem das atribuições administrativas municipais. Eram também
juízes de sisas. Sua alçada era de 3000 reis nos lugares de população superior a 200
almas e de 1800 reis em moveis e 1200 reis em bens de raiz nos lugares menos
populosos. Nas causas que a excedessem de suas sentenças havia apelação ou agravo
para o Ouvidor Geral da comarca ou para a Relação competente, conforme o valor
coubesse ou não na alçada do ouvidor.
Juízes de órfãos: eram eleitos como ordinários ou nomeados como de fora nos termos
com mais de 400 pessoas.
Juízes do crime: atribuições criminais dos de fora. Policiava os bairros com jurisdição em
toda cidade e seu termo. Cumpriam determinações do Intendente geral de policia
nomeado pelo governador da capitania.
Juízes de fato: criados em 1822 para as causas de abuso de liberdade da imprensa. Das
suas decisões só cabia recurso a Coroa.
Juízes de paz: criados pela lei de 15 de outubro de 1827 em cada uma das freguesias e
capelas filiais curadas eleitos da mesma forma que os vereadores. Funções: conciliar
partes antes da demanda, julgar causas pequenas menores que 16$, por em custodia os
bêbados, corrigir bêbedos, turbulentos e meretrizes escandalosas (obrigando-os a assinar
temo de bem viver), fazer observar as posturas policiais das câmaras e, pelo artigo 88 da
lei de 1 de outubro de 1828, tinha competência privativa para conhecer das multas por
contravenção as posturas municipais. Resumo: muitas funções administrativas exercidas
em nome de uma coletividade municipal.
Juízes municipais: O Código de processo Criminal criou em cada termo um que era
nomeado pelo governador na província do rj e pelo presidente do conselho nas outras de
uma lista tríplice que a câmara enviava de 3 em 3 anos (p. 148). Eles substituíam os
juízes de direito, executavam sentenças dos juízes de direito e dos tribunais, exerciam
cumulativamente as atribuições policiais, concediam hábeas corpus e processavam os
feitos cíveis ate a sentença.
Juízes de direito: nomeados pelo imperador como os desembargadores dentre os
bacharéis bem conceituados e com pratica de pelo menos um ano nos foros.
Preferencialmente tinham que ter sido juízes municipais ou promotores. O aviso de 22 de
outubro de 1833 declarou que nas cidades populosas um dos juízes de direito seria o
chefe de Policia. O aviso de 3 de dezembro do mesmo ano completava dizendo que o
havendo mais de um as atribuições policiais pertenciam aos juízes de paz ou municipais.
Juízes de vintena: eleitos ano a ano pelos vereadores, juízes e procurador e atuavam em
causas ate $400, prender e entregar criminosos de sua jurisdição.
233
Apêndice 2: LISTAGEM DOS PRESIDENTES DA PROVÍNCIA FLUMINENSE
(Chefes do Executivo: presidentes e vices interinos)
Nome Período
(Posse)
Formação Títulos e Honrarias Conselho Cargos que ocupou
01 Joaquim José
Rodrigues
Torres
14/08/1834 a
21/04/1836
(exonerado)
Estudou
Coimbra
Doutor em
matemática
Visconde com
grandeza de Itaboraí
em 1854
Dep. Geral
Pres. Assemb.
Ministro (vzs)
Senador
02 Paulino Jose
Soares de Sousa
Nomeado em
21/04/1836
até
05/08/1840
Direito
Coimbra
Visconde com
grandeza do Uruguai
em 02/12/1854
Efetivo
desde 1853
Ministro (vzs)
Senador
Jose Inácio Vaz
Vieira
30/04 a
23/10/1837
período final
de Feijó
Bacharel
FDSP 1832
Oficial da Rosa Conselho do
Imperador
Deputado
Manuel Jose de
Oliveira
30/04 a
18/06/1838
João Caldas
Viana
18/06 a
22/10/1838
Estudou o
secundário em
Coimbra
Bacharel
FDSP
Deputado (vzs)
Advogado na Corte.
Luis Antonio
Muniz dos
Santos Lobo
02/05 a
02/10/1839
(ver 06.4)
Ordenou-se
sacerdote
Antonio Alves
da Silva Pinto
Junior
23/10 a
04/11/1839
FDSP em
1833.
Brás Carneiro
Nogueira da
Costa e Gama
03/04 a
02/08/1840
Visconde com
grandeza de Baependi
desde 1828, foi Conde
em 1858. Filho dos
Marqueses de
Baependi
Deputado das AG e
AP: RJ e Senador em
1872, chegando a PS:
PE em 1868
03 Manuel Jose de
Sousa França
22/08/1840 a
31/03/1841
Conselho de
Sua
Majestade
Advogado na corte e
deputado desde a
constituinte 1823 (vzs)
Brás Carneiro
Nogueira da
Costa e Gama
31/03/1841 a
01/12/1841
04 Honório
Hermeto
Carneiro Leão
Nomeado em
04/10/1841 a
01/01/1843
(Exonerado)
Bacharel em
Direito pela
Universidade
de Coimbra
Visconde de Paraná
em 1852 e marquês em
1854
Conselheiro
em 1842
Deputado (vzs),
Senador 1842, Ministro
(2x). Morreu como
chefe do Gabinete
Conciliação.
PP: PE
05
João Caldas
Viana
01/01/1843 a
02/03/1843
e
02/03/1843 a
11/04/1844
Estudou o
secundário em
Coimbra
Bacharel
FDSP
Deputado provincial
(vzs) e, no fim da vida,
advogava na corte.
06 Aureliano de
Sousa e Oliveira
Coutinho
12/04/1844 a
03/04/1848
Bacharel em
Coimbra
Visconde de Sepetiba
em 1855
Gentil-Homem da
Imperial Câmara. Foi
um dos fundadores do
IHGB
Conselho Ministro (vzs)
Deputado: MG e RJ
Senador: AL em 1842
PP: SP
Luis Antonio
Muniz dos
Santos Lobo
(…) 1846
(Ver 02.4)
Ordenou-se
sacerdote
07 Manuel de Jesus
Valdetaro
04/04 a
06/06/1848
FDSP 1832 Visconde de Valdetaro
em 1886 e elevado a
grandeza em 1889
Sócio do IHGB
Conselho Seguiu magistratura e
foi Ministro do
Supremo Tribunal,
sendo seu presidente
Foi DP e DG: RJ
234
08 Felisberto
Caldeira Brant
Pontes
Nomeado em
02/06/1848,
tomou posse
em 07/06
exerceu o
cargo ate
09/10/1848
2° Visconde com
grandeza de Barbacena
desde 1830 Filho dos
marqueses
Militar, depois
diplomata e político.
Deputado pela BA,
Industrial e Diretor da
Estrada de Ferro D
Pedro II
09 Luis Pedreira do
Couto Ferraz
Empossado
em
10/10/1848,
exerceu o
cargo até
02/05/1853
Bacharel,
doutor e
professor da
FDSP
Barão e Visconde do
Bom Retiro em 1867 e
1872
Veador da Casa
Imperial
Fundador e presidente
do IHGB
Condecorado com as
ordens do Cruzeiro, da
Rosa e Grã-Cruz de
Cristo
Conselheiro
do
Imperador e
do Estado
em 1871
Deputado pela pv ES
Dep e senador pela pv
RJ
Ministro 1853
PP: ES
João Pereira
Darringue de
Faro
Como 3º
Vice,
nomeado em
25/10/1849,
ocupou o
governo de:
15/12/1849 a
15/09/1850
05/05/1851 a
24/09/1851
03/05/1852 a
10/09/1852
03/05/1853 a
22/09/1853
2º Barão e Visconde
de Rio Bonito em
março e dezembro de
1854
Filho do barão do Rio
Bonito Joaquim Jose
Pereira de Faro
Hábito do Cruzeiro
Comenda da Rosa
Veador
Major da Imperial
Guarda de Honra
Vereador ao Senado da
Câmara do Rio e
Deputado da
assembléia fluminense
10 Luís Antonio
Barbosa
22/09/1853 a
02/10/1857
(exonerado)
FDSP 1835 Conselho do
Imperador
DP e DG: MG (vzs),
chegando a presid.
Magistratura
Ministro da Justiça
1853
Senador: MG 1859 (foi
escolhido, mas não
tomou posse)
Brás Carneiro
Nogueira da
Costa e Gama
23/10 a
11/10/1853
Visconde de Baependi
João Pereira
Darringue de
Faro
02/05 a
13/09/1854
Barão do Rio Bonito
Brás Carneiro
Nogueira da
Costa e Gama
18/09 a
15/10/1854
Visconde de Baependi
José Ricardo de
Sá Rego
03/05 a
18/09/1855
FDSP 1837 Comendador da Rosa Juiz e Desembargador
na Relação da Corte até
aposentadoria
MG 1850 e foi vice AL
Brás Carneiro
Nogueira da
Costa e Gama
19/09 a
25/11/1855
Visconde de Baependi
Antonio
Nicolau
Tolentino
(ver 11)
02/05 a
07/10/1856
Grande dignitário da
Rosa
Cavaleiro de Cristo
Conselho do
Imperador
Funcionário do
Tesouro Nacional e
outras repartições da
fazenda
Diretor da Academia
Belas Artes
Presidente Caixa
Econômica
João Manuel
Pereira da Silva
03/05 a
04/08/1857
FDSP 1838 “Historiador de
nomeada, obteve de
Início advogado e
jornalista
235
Sua Majestade o título
de Conselho, a
dignataria da Rosa e a
comenda de Cristo.
Era sócio do IHGB.”
p.26
DP e DG: RJ (vzs) e
Senador pelo RJ 1888
11
Antonio
Nicolau
Tolentino
04/08/1857 a
24/10/1858
Grande dignitário da
Rosa
Cavaleiro de Cristo
Conselho do
Imperador
Funcionário do
Tesouro Nacional e
outras repartições da
fazenda
Diretor da Academia
Belas Artes
Presidente Caixa
Econômica
12 José da Silva
Paranhos
30/10/1858 a
13/12/1858
Graduado
Escola Militar
Visconde com
grandeza do Rio
Branco em 1870
DP e DG: RJ
Senador: MT 1862
Diplomata, Ministro de
Estado (vzs)
13/12/58 a
17/12/1858
13 João de
Almeida Pereira
Filho
17/12/1858 a
24/04/1859
FDSP 1850 Veador
Comendador de Cristo
Conselho de
Sua
Majestade
DG: RJ (vzs)
Ministro do Império
1859
14 Inácio Francisco
Silveira da Mota
25/04/1859 a
15/04/1861
(Exonerado)
FDSP 1838 Barão de Vila França
em 1875 e elevado a
grandeza em 1877
Comendador de Cristo
DP:Niterói
PP: PI
PP: CE
José Ricardo
de Sá Rego
16/04 a
20/09/1861
15 Luis Alves Leite
de Oliveira Belo
21/09/1861 a
09/02/1863
(Exonerado)
Permaneceu
até 14/02/63
FDSP 1841 Magistrado no RJ e RS
Dep RS (vzs)
Vice PP: RS
José Norberto
dos Santos
04/05 a
09/09/1862
FDSP
16 Policarpo Lopes
de Leão
14/02/1863 a
23/01/1864
(Exonerado)
Permaneceu
até 15/02
FD Olinda
1834
Conselho Vários cargos
magistratura BA MA e
Corte. Desembargador
e aposentou-se com
honras de Min.do ST
16
.1
José Tavares
Bastos
15/02 a
03/05/1864
FD Olinda
1836
Sócio do IHGB Conselho Deputado PE (vzs)
PP: SP
17 João Cipriano
Soares
03mai64 a
17out64
(Exonerado)
Permaneceu
até 21/10
FDSP 34 e
doutor 35
Conselho de
Sua
Majestade
PP: MG
PP: MT
PP: SP
José Tavares
Bastos
21/10 a
02/11/1864
FD Olinda
1836
Sócio do IHGB Conselho Deputado PE (vzs)
PP: SP
18 Bernardo de
Souza Franco
03/11/1864 a
21/09/1865
(Exonerado)
FD Olinda
1835
Visconde com
grandeza de Souza
Franco em 1872
Grã-Cruz de Cristo e
Dignitário da Rosa
1859
Conselho
Magistrado
desembargador
DG: PA (vzs)
Senador PA 1855
Ministro (2x)
PP: PA; PP: AL
José Tavares
Bastos
06/05 a
11/07/1865
FD Olinda
1836
Sócio do IHGB Conselho Deputado PE (vzs)
PP: SP
José Tavares
Bastos
23set65 a
06dez65
FD Olinda
1836
Sócio do IHGB Conselho Deputado PE (vzs)
PP: SP
19 Domiciano
Leite Ribeiro
07/12/65 a
03/05/1866
FDSP 33 Visconde com
grandeza de Araxá em
1872
Conselho
Estado 1866
como
membro
extrord e
Magist, liter, advoc
DG: MG
Minist Agric em 1864
No final, advogava em
Barra Mansa
236
efetivado em
1878
PP: SP
José Tavares
Bastos
03/05 a
04/10/1866
FD Olinda
1836
Sócio do IHGB Conselho Dep PE vzs
SP
20 Espiridião Elói
de Barros
Pimentel
04/10/1866 a
20/02/1868
(Renúncia)
FD Olinda
1847
Magistrado (vp);
Desembarg da Relação
de SP e da Corte; Min.
e Presid do ST ; DP e
DG:AL
PP: AL (vzs); PP: RS
PP: BA
Tomás Gomes
dos Santos
20/02/1867
Eduardo
Pindaíba de
Matos
13/05 a
30/09/1867
Conselho Chefe da Polícia (vp)
Ministro do Supremo
Eduardo
Pindaíba de
Matos
20/02 a
10/03/1868
Conselho Chefe da Polícia (vp)
Ministro do Supremo
21 Américo
Brasiliense de
Almeida e Melo
10/03/1868 a
22/07/1868
(Exonerado)
FDSP 1835
Dr 1860
Sócio IHGB Adv/magist
Minist STF por Mal
Floriano
DP (vzs) e DG: SP
1891 Gov SP
Foi um dos proj da
Constit Republicana
PP: PB
Eduardo
Pindaíba de
Matos
09/05 a
30/07/1868
Conselho Chefe da Polícia (vp)
Ministro do Supremo
22 Benevuto
Augusto de
Magalhães
Taque
30/06/1868 a
01/05/1869
(Renúncia)
Conselho
1870
DG BA 1869
Ministro de
Estrangeiros 1861
PP: RN, MA, PE
Diogo Teixeira
de Macedo
01/05/1869 a
05/05/1870
(Renúncia)
FDSP Barão de São Diogo
em 1873
DG: RJ 1853
Aposent. como
desembargador
Manoel José de
Freitas
Travassos
05/06 a
20/10/1870
23 José Maria
Correia de Sá e
Benevides
01/01 a
26/10/1870
FDSP 54
Dout SP 58
Lecionou FDSP
Magist e jornal.
DP: SP
PP:MG
24 Teodoro
Machado Freire
Pereira da Silva
27/10/1870 a
06/03/1871
FD Olinda 52 Conselho Chefe policia (vp,
inclusive a Corte)
DP e DG: PE
1871 Min Agric no
gabinete Visc RBco e
referendou Lei ventre
Livre
PP: PB, BA
Manoel José de
Freitas
Travassos
07/03 a
15/04/1871
25 Josino do
Nascimento da
Silva
15/04/1871 a
10/10/1872
FDSP 34 Sócio IHGB
Comend Cristo
Conselho Adv e magist
DP e DG: RJ
Jornalista
PP: SP
26 Bento Luís de
Oliveira Lisboa
10/10/1872 a
26/03/1873
(Exonerado a
pedido)
FDSP 59 Conselho Magist (vp)
RJ: Minist STF
DP Nite
RS
27
Manoel José de
Freitas
Travassos
26/03/1873 a
18/09/1874
(Exonerado a
FDSP 34 Prov SCasa da Corte
Hábitos da Rosa e do
Cruzeiro e a Comanda
Magist, aposent como
Min ST
237
pedido)
Permaneceu
até
26/09/1974
de Cristo
Foro de Guarda Roupa
e Veador da casa
Imperial
Vice PP: RS
28 Francisco
Xavier de Pinto
Lima
26/09/1874 a
16/01/1878
FD Olinda 57 Barão com grandeza
de Pinto Lima 1888
Comendador da Rosa
Conselho Magist
DP BA
DG: BA, ES (vzs)
Min Mar 1864
PP: RS, SP
Bernardo
Augusto
Nascentes de
Azambuja
15/03 a
11/11/1875
Letras Paris
FDSP
Conselho
Francisco
Antônio de
Souza
13/01/1877 a
10/11/1877
José Francisco
Cardoso
16 e
17/01/1878
FDSP Comendador da Rosa e
de Cristo
PP: PR 1859
29 Camilo Maria
Ferreira
Armond
18/01 a
25/12/1878
Dir e Medic
Paris
Br Prados 61
Visc 71
Conde 81
Membro
extraord.
DG: MG (vzs)
Dir Observ Astron RJ
Luís Pinto de
Miranda
Montenegro
25/12/1878 a
05/03/1879
FDSP 53 Filho 2º Visc c grand
da Vila Real Praia
Grande
Desembargador
30 Américo de
Moura
Marcondes de
Andrade
05/03/1879 a
20/04/1880
(Exonerado)
FDSP 57 Magistr e advocacia
PP: RS
Paulo José
Pereira de
Almeida
20/04 a
24/04/1880
FDSP 58 Filho 2º Visc grand de
Macaé
Diretor (vários anos)
Muito dedicado a
província
31 João Marcelino
de Souza
Gonzaga
24/04/1880 a
14/03/1881
FDSP 41 Moço Fidalgo da Casa
Imperial
Ordem da Rosa e
Cristo
Juiz munic na pv Sp
Dep prov SP
PP AL e
RS
32 Martinho
Álvares da Silva
Campos
15/03 a
12/12/1881
(Exonerado?)
Medic Corte
37
Conselheiro
efetivo
DP Niterói; DG
Chefe gabinete 82 c/
Fazenda
Sen MG
Paulo José
Pereira de
Almeida
12/12/1881 a
16/03/1882
FDSP 58 Filho 2º Visc grand de
Macaé
Diretor (vários anos)
Muito dedicado a
província
33 Bernardo
Avelino Gavião
Peixoto
16/03/1882 a
27/10/1883
(Exonerado)
Bac Acad SP
49
Magist SP
DP: SP (vzs)
Paulo José
Pereira de
Almeida
13/11 a
23/11/1882
FDSP 58 Filho 2º Visc grand de
Macaé
Diretor Faz vários anos
Muito dedicado a
província
Teodoro de
Azevedo Júnior
28/10 a
30/10/1883
Comendador Rosa Cel GNac
Dir Caixa Econ
34 José Leandro
Godói e
Vasconcelos
31/10/1883 a
17/08/1884
FD Olinda 57 DG: PE
PP: MA
PP: RS
35 José Cesário de
Faria Alvim
18/08/1884 a
25/08/1885
FDSP 62 Adv MG
DP: Ouro Preto (vzs)
DG: MG (3x)
Pref DFed
PP: MG
36 Antonio da
Costa Pinto e
Silva
26/08/1885 a
19/04/1886
(Exonerado)
FDSP 49 Cavaleiro de Cristo Conselho DProv Nit
DG SP vzs
Ministro gab Caxias
PP: PB, RS, SP
Manoel Jacinto
Nogueira da
Gama
20/04/1886 a
17/05/1886
FDSP 59 Filho do 2º Conde
Baependi
DP: Niterói
238
Antônio da
Rocha
Fernandes Leão
18/05 a
29/07/1886
37
Antônio da
Rocha
Fernandes
Leão
30/07/1886 a
25/04/1888
(Exonerado)
Ficou até 29
FDSP 61 Promotor MG
Advoc
DG: MG desde 63
Sem do Imp 89
Manoel Jacinto
Nogueira da
Gama
30/04 a
03/05/1888
FDSP 59 Filho do 2º Conde
Baependi
DP: Niterói
38 José Bento de
Araújo
Ver OBS
04/05/1888 a
18/06/1889
FDSP 68 Conselho Adv na Corte
PP: MA (3x)
PP: MT (2x)
PP: SC
39 Carlos Afonso
de Assis
Figueiredo
19/06 a
15/11/1889
(República)
FDSP 67 Irmão do Visc Ouro
Preto
Conselho Adv MG
DP e DG: MG (vzs)
Minist Guerra 82
Organizado pelo autor a partir de Lacombe (1973) e Relatórios dos Presidentes de Província.
Siglas utilizadas:
FDSP – Faculdade de Direito de SP
FD Olinda – Faculdade de Direito de Olinda
PP – Presidente de Província
PS – Presidente do Senado
AG – Assembléia Geral
AP – Assembléia Provincial
DP – Deputado Provincial
DG – Deputado Geral
ST – Supremo Tribunal
vp – várias provícias
vzs – várias vezes
239
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo