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O gênero feminino aparece na folha como incapaz de ser responsabilizada
por seus atos. A mulher precisaria ser cuidada, orientada, protegida; aparece quase
sempre como alguém que precisa da cabeça masculina para pensar, agir, deixando
nas mãos dos homens qualquer tipo de atitude. O trabalho, a política, ou a luta pela
sobrevivência acabariam por embrutecer a mulher, embora muitos articulistas
reconheçam nela a disposição para esses afazeres. São situações, segundo o
jornal, que lhe roubariam as “características e qualidades naturais”.
A Mulher de Sociedade
Três simples qualidades bastam para tornar qualquer senhora
perfeitamente de edade e distincta: a simplicidade, a bondade e a
modestia. A razão por que a mulher da burguezia é geralmente mais mal
criada do que a mulher aristocratica, é que a burgueza, pelas lutas da vida
em que se achou empenhada com seu par ou com seu marido, pela sua
intervenção nos negocios, pela sua constante aspiração ao exito, à fortuna,
à riqueza, ao ingresso nas classes superiores, sendo muitas vezes
humilhada, repellida, derrotada, creou naturalmente na sua alma o
despeito, a amargura, a inveja. Ainda depois de vencedora, de
enriquecida, de nobilizada, no meio feliz da opulencia e da dignidade, a
pontinha de fel da antiga lutadora transparece na sua nova pelle e alastra-
se na sua personalidade como uma nodoa grosseira.
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Nesse artigo, o jornal é prescritivo, pauta-se por um código de conduta
social. Reforça um modelo de mulher, estereotipada, quando afirma que seu lugar
não é no trabalho, e nem mesmo emitindo opinião sobre notícias jornalísticas.
Compara a mulher a uma criança de pouca idade que reclama sobre si a
responsabilidade de um pai ou mãe para conduzi-la e assumir seus atos.
Hontem, fomos testemunhas de um disparate, que nos enche de
indignação: um soldado levava prêsa uma mulher! Em fins do século 19,
ainda se prende mulher! Aonde ficou estacionado o intellecto humano, que
deixou crescer esta verruga nos nossos costumes penaes! Compreende-
se que na meia edade os tribunaes se occupassem de processar até uma
cabra de leite, que chifrara o bêbê que amamentava; pois que no
Maranham, reinando os jesuitas se fez processo a formigas, que roubavão
os frades; e já nas eras de 1800, em Pacatuba, se processou uma vacca.
Mas prender, processar mulheres e até leval-as ao jury é disfructe, que,
por demais ridiculo, não cabe em nossos tempos, repugna as sciencias
medicas e juridicas. A mulher, disse um filosopho allemão é um ente
intermediario entre o homem, e a criança. Da brasileira, é regra de direito,
a cabeça é seo marido; logo, não tem nenhuma, quem não tem marido.
Presos devem ser os maridos, das que os têem...
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Jornal A Republica, Fortaleza, A Mulher de Sociedade (Gazetilha), 04/07/1907, nº 150, p. 1.
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Jornal A Republica, Fortaleza, Cousas à Toa, 07/01/1898, nº 5, p. 1.