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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL E PROBLEMAS URBANOS EM MUNICÍPIOS
METROPOLITANOS: O CASO DE ALVORADA NA REGIÃO METROPOLITANA
DE PORTO ALEGRE (RS)
WILLIAM DA SILVA PAPI
ORIENTADOR: PROF. DR. PAULO ROBERTO RODRIGUES SOARES
PORTO ALEGRE, SETEMBRO DE 2009.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL E PROBLEMAS URBANOS EM MUNICÍPIOS
METROPOLITANOS: O CASO DE ALVORADA NA REGIÃO METROPOLITANA
DE PORTO ALEGRE (RS)
WILLIAM DA SILVA PAPI
Orientador: Prof. Dr. Paulo Roberto Rodrigues Soares
Banca Examinadora:
Prof. Dr. Tânia Strohaeker (PPG em Geografia/UFRGS)
Prof. Dr. Mário Leal Lahorgue (Departamento de Geografia/UFRGS)
Profa. Dra. Susana Maria Valeda da Silva (PPG em Geografia/UFRGS)
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-graduação em
Geografia como requisito para
obtenção do título de Mestre em
Geografia.
PORTO ALEGRE, SETEMBRO DE 2009.
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Papi, William da Silva
Segregação sócio-espacial e problemas urbanos em municípios
metropolitanos : o caso de Alvorada na região metropolitana de Porto Alegre
(RS). / William da Silva Papi. - Porto Alegre : UFRGS/PPGEA, 2009.
[132 f.] il.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Instituto de Geociências. Programa de Pós-Graduação em Geografia, Porto
Alegre, RS - BR, 2009.
Orientador: Prof. Dr. Paulo Roberto Rodrigues Soares
1. Segregação sócio-espacial. 2. Problemas urbanos. 3. Alvorada - RS. I.
Título.
___________________________
Catalogação na Publicação
Biblioteca Geociências - UFRGS
Miriam Alves CRB 10/1947
WILLIAM DA SILVA PAPI
SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL E PROBLEMAS URBANOS EM MUNICÍPIOS
METROPOLITANOS: O CASO DE ALVORADA NA REGIÃO METROPOLITANA
DE PORTO ALEGRE (RS))
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-graduação em
Geografia como requisito para
obtenção do título de Mestre em
Geografia.
Orientador: Prof. Dr. Paulo Roberto
Rodrigues Soares
Aprovado em 25 de setembro de 2009
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________________________
Prof. Dr. Tânia Strohaeker (PPG em Geografia/UFRGS)
___________________________________________________________________
Prof. Dr. Mário Leal Lahorgue (Departamento de Geografia/UFRGS)
__________________________________________________________
Prof. Dra. Susana Maria Valeda da Silva (PPG em Geografia/UFRGS)
Dedico este trabalho à minha esposa e filha por todo
amor, carinho e dedicação recebidos durante estes
10 anos de vida conjunta.
AGRADECIMENTOS
Ao final deste trabalho, muitas são as pessoas às quais, de alguma forma,
devo agradecer pelos mais diversos motivos, o que de certa forma torna menos
grave qualquer injustiça aqui cometida pela não citação ou esquecimento de algum
companheiro desta jornada. A estes, desde me desculpo, deixando aqui meu forte
abraço pelo apoio e compreensão.
Inicialmente, agradeço à Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
universidade pública e gratuita. Ao Programa de Pós-Graduação em Geografia que
me recebeu de portas abertas, apesar de minha formação original de biólogo. Em
especial ao meu orientador Dr. Paulo Roberto Rodrigues Soares que além de
acreditar na possibilidade de um biólogo realizar um estudo sobre questões urbanas,
se mostrou paciente com as dificuldades encontradas ao longo do trabalho.
Não poderia deixar de agradecer aos meus pais que sempre foram grandes
incentivadores em minha formação continuada. A eles agradeço o apoio pessoal,
financeiro e pelo terno cuidado que sempre tiveram pela minha querida filha
Giovanna, nos momentos de ausência minha e de minha esposa, em decorrência da
árdua jornada de trabalho e estudos na qual estamos inseridos. Agradeço ainda ao
meu irmão pela paciência, disposição e atendimento aos meus constantes apelos no
campo da informática, sem o que não teria sido possível a conclusão deste trabalho.
Gostaria de registrar meus agradecimentos aos amigos e colegas que me
acompanharam durante o mestrado e com quem compartilhei idéias, dúvidas e
anseios. Em especial ao camarada Diego Pautasso, com quem venho ao longo dos
últimos 15 anos construindo não uma bela amizade, como um conjunto processo
de formação pessoal e intelectual e cujo constante estímulo e apoio foi um dos
principais responsáveis pelo início e conclusão do mestrado.
Por fim gostaria de agradecer às duas pessoas mais importantes de minha
vida. À minha filha Giovanna, pelo carinho, compreensão e inspiração trazida por
sua beleza, inocência, curiosidade e alegria. À minha esposa Luciana, que mais do
que companheira, ouvindo pacientemente minhas intermináveis construções teóricas
e longas conversas, tem contribuído de forma decisiva em minha formação
acadêmica.
RESUMO
O estudo tem como objetivo entender de que forma o processo de segregação
sócio-espacial repercute sobre os municípios metropolitanos, especialmente em
Alvorada, localizado na Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA), Rio Grande
do Sul, acarretando problemas característicos do espaço urbano. Para tanto, o
trabalho inicia analisando como o município de Alvorada se constitui como espaço
de segregação econômica e social, assumindo a função habitacional dentro da
hierarquia urbana da RMPA. Entendido o papel que Alvorada cumpre dentro da
RMPA, busca-se compreender de que modo a relação de segregação determinou a
configuração do espaço intra-urbano do município, produzindo/reproduzindo
relações de segregação espacial. A partir da articulação entre as relações de
segregação sócio-espacial a nível metropolitano e intra-urbano, o trabalho analisa os
problemas urbanos ligados à questão habitacional, ambiental e ao fenômeno da
violência e de que forma o processo de reestruturação da RMPA maximiza ou
minimiza tais problemas. Com a pesquisa se concluiu que a reestruturação da
RMPA abre duas novas perspectivas para o município de Alvorada, contraditórias,
mas complementares entre si: a melhoria das condições gerais de vida pela maior
inserção econômica de Alvorada dentro da hierarquia urbana da RMPA, ao mesmo
tempo em que incorpora novas e mais intensas relações de segregação sócio-
espacial em seu espaço intra-urbano.
Palavras-chave: segregação sócio-espacial; problemas urbanos e Alvorada – RS.
ABSTRACT
The study has as objective to understand how the process of urban social space
segregation repercute on the metropolitan counties, especially in Alvorada, located in
the Metropolitan Region of Porto Alegre (MRPA), Rio Grande do Sul, causing
characteristic problems of the urban space. For that matter, the study begins
analyzing how the Alvorada County constitutes itself as a space of economic and
social segregation, assuming the habitational function within the urban hierarchy of
MRPA. Once it is understood the role that Alvorada accomplishes inside of the
MRPA, it is able to seek the comprehension about in which way the segregation
relationship determined the configuration of the internal urban space of the County,
producing/reproducing relationships of space segregation. Starting from the
articulation among the relations of social space segregation at metropolitan and
internal urban level, the present study analyzes the urban problems related to the
habitational and environmental issues and to the phenomenon of the violence. It
analyzes also in which way the restructuring process of the MRPA maximizes or
minimizes the problems mentioned earlier. It is possible to conclude with the
research that the restructuring of the MRPA opens two new perspectives to the
Alvorada County, contradictories, but complementary among each other: the
improvement of the general conditions of life by a larger economic insertion of
Alvorada inside the urban hierarchy of MRPA, in the same time that the County
acquires new and more intense relations of social space segregation in its internal
urban space.
Key words: social space segregation; urban problems; Alvorada – RS.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 8
2 ALVORADA: METROPOLIZAÇÃO E SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL ....... 16
2.1 Alvorada e a Segregação Sócio-Espacial na RMPA ..................................... 21
2.2 Reestruturação da RMPA e a Posição de Alvorada ...................................... 35
3 ALVORADA: SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL E CONFIGURAÇÃO DO
ESPAÇO INTRA-URBANO ..................................................................................... 45
3.1 Distrito Passo do Feijó: Loteamentos e Especulação Imobiliária ............... 49
3.2 Alvorada: Ocupação e os Novos Padrões de Loteamento .......................... 67
3.3 Reestruturação da RMPA e Alvorada: da Segregação Interurbana à
Segregação Intra-urbana? ..................................................................................... 78
4 SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL E PROBLEMAS URBANOS DE
ALVORADA ............................................................................................................. 95
4.1 Segregação Sócio-Espacial, Déficit Habitacional e Ocupações Irregulares
em Alvorada ............................................................................................................ 97
4.2 Os Problemas Sócio-Ambientais e as Relações de Segregação
Espacial ................................................................................................................. 104
4.3 Segregação, Violência e as Condições de Vida em Alvorada .................... 113
5 Conclusão .......................................................................................................... 119
6 Referências .,...................................................................................................... 126
8
1 INTRODUÇÃO
Segundo dados do IBGE de 2009, a população brasileira urbana corresponde
à aproximadamente 86%. Atualmente, verificamos, como afirma Milton Santos
(2008) simultaneamente um processo de metropolização, visto que a população
metropolitana continua a aumentar e de desmetropolização, onde as cidades médias
apresentam crescimento populacional, e mesmo econômicos, mais alto do que as
metrópoles.
Esta nova realidade sinaliza a mudança pela qual vem passando as
dinâmicas de urbanização do território nacional, que, após sua interligação,
possibilita às cidades de porte médio, antes de influência regional, relações a nível
nacional e internacional. Ao mesmo tempo, o espaço metropolitano, marcado nas
décadas anteriores pelos altos índices de industrialização, assume, de forma
crescente, novas funcionalidades vinculadas ao controle da economia, assim como à
prestação de serviços e circulação de mercadorias, além de um importante papel na
produção e difusão de inovações tecnológicas.
Apesar do crescimento mais intenso nas cidades médias, as regiões
metropolitanas continuam a crescer. Da mesma forma ocorre com sua participação
na economia. Apesar de diminuir em termos relativos ao estado, as regiões
metropolitanas permanecem crescendo economicamente e absorvendo,
principalmente, as atividades de maior tecnologia empregada e de comando da
economia regional em seus grandes centros.
No entanto, o crescimento dentro das regiões metropolitanas não se
homogeneamente entre os municípios, sobretudo no que se refere às funções
assumidas dentro da divisão territorial do trabalho. Enquanto muitos municípios
metropolitanos absorvem novas funcionalidades produtivas, comerciais e de
serviços com menor capital agregado ou capacidade decisória, respondendo ao
crescente processo de desconcentração das unidades industriais, outros municípios
permanecem como cidades dormitório, apresentando pequenas mudanças em seu
perfil sócio-econômico e populacional.
9
A Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA), hoje constituída por 31
municípios, segue esta mesma dinâmica de urbanização verificada no Brasil como
um todo. Criada pela Lei Complementar 14, de 08 de junho de 1973, a RMPA
nasce com 14 municípios responsáveis pelo rápido crescimento industrial e
conseqüente adensamento urbano, principalmente em torno da capital gaúcha Porto
Alegre, seguindo ao longo da BR-116, rodovia que estruturou o desenvolvimento
observado nos municípios da RMPA.
Enquanto municípios como Canoas, São Leopoldo e Novo Hamburgo, por
exemplo, apresentam importantes índices de crescimento econômico devido à
industrialização, Alvorada, a leste do eixo da BR-116, permanece como uma das
cidades dormitório da RMPA.
Transformado no Distrito Passo do Feijó em 1952, pela Lei Municipal n.º
216 de Viamão, Alvorada somente alcançou a condição de município emancipado
com a Lei 5026, de 17 de setembro de 1965. Com área de 70,8 km
2
, limita-se a
Oeste com Porto Alegre, ao norte com Cachoeirinha e Gravataí e ao sul e leste com
Viamão, conforme Figura 01.
Em nível regional, o município apresenta como principal rodovia de acesso a
RS-118, além da proximidade com a BR-290 (Figura 02). Em vel de deslocamento
inter e intra-urbano, o município é estruturado pela Avenida Presidente Getúlio
Vargas que apresenta ligação direta com Porto Alegre, através da Av. Baltazar de
Oliveira Garcia. Além desta Avenida, apresenta ainda uma segunda avenida
paralela, também extremamente importante na estruturação de seu espaço urbano.
Trata-se da Av. Frederico Dihl que ao se unir com o Caminho do Meio (Av. Protásio
Alves), dá acesso à RS-040 em Viamão.
Alvorada, assim como uma grande quantidade de municípios brasileiros,
nasceu como cidade dormitório dos trabalhadores de baixa ocupados em Porto
Alegre. Com a população formada em grande parte por migrantes, com baixa
escolaridade e qualificação profissional e, conseqüentemente baixas remunerações,
o município não apresenta no início de sua história uma estrutura econômica
significativa.
10
Figura 01 – Região Metropolitana de Porto Alegre, com Alvorada em destaque. Fonte: sítio da Prefeitura de Alvorada
http://www.alvorada.rs.gov.br/, retirado do IBGE.
11
A partir da cada de 1970, com o processo de desconcentração produtiva e a
saída das grandes fábricas da capital para os municípios de sua hinterlândia,
Alvorada suas esperanças frustradas. Apesar da implantação de dois Distritos
Industriais, o município não consegue alavancar um processo de desenvolvimento
econômico, permanecendo em seu território, como atividade econômica básica, o
comércio de consumo básico, e os projetos de loteamentos habitacionais que, após
uma pausa de 15 anos, são retomados a partir de 1979, financiados pelo Banco
Nacional da Habitação (BNH).
Figura 02 Figura de Alvorada indicando os municípios limítrofes e os principais eixos viários. Fonte:
Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental (PDDUA).
Acumulando problemas de ordem econômica, infra-estrutural e social, o
município entra na crise econômica da década de 1980 com o aprofundamento das
condições de pobreza da grande maioria da sua população. Sendo assim, passa a
acumular além dos problemas econômicos e infra-estruturais, o déficit habitacional e
a crescente violência.
12
Com a redemocratização e a tentativa de acabar com o Estado
desenvolvimentista centralizado, através do novo pacto federativo estabelecido pela
Constituição de 1988, o Brasil entra na cada de 1990 implementando um modelo
estatal liberalizante que, para combater a crise econômica e inflacionária que o país
passou na década anterior, aplicou um amargo e ineficaz remédio: a recessão
econômica e o desemprego como forma de contenção da inflação.
Se municípios cuja industrialização sólida garantiu relativa estabilidade ao
longo dos anos 1960-1980 viram surgir uma massa cada vez maior de
desempregados, em municípios como Alvorada, observamos ainda a explosão da
violência, das ocupações irregulares em áreas de risco, dentre outros problemas
urbanos sendo acentuados.
Atualmente, segundo a contagem do IBGE de 2007, a população de Alvorada
ultrapassou 200 mil habitantes, chegando a 207.142, o que corresponde a uma
densidade demográfica de 2.925,3 hab/km
2
, configurando-se como uma cidade de
porte médio, em termos populacionais
1
.
Sua economia, segundo dados da FEE (2005), é baseada no setor de
serviços que corresponde a 82,56% de seu PIB, sendo outros 17,3% gerado pela
indústria, demonstrando que a agricultura e pecuária não apresentam relevância na
produção de riquezas do município. Apesar de apresentar o 31º PIB do Estado em
2006 (R$ 854.695 milhões), apresenta o pior PIB per capita do RS (R$ 3.976).
Com a reestruturação dos espaços urbanos brasileiros, muitos são os
trabalhos que passam a buscar compreender de que forma cidades dias ou
mesmo municípios metropolitanos dinâmicos têm absorvido novas funcionalidades e
suas repercussões econômicas, sociais e espaciais.
Por outro lado, poucos são os estudos sobre municípios metropolitanos que
ficam de fora deste processo de reestruturação, ou melhor, que não conseguem
atrair para si processos de crescimento e desenvolvimento econômico social neste
novo contexto. Muitos trabalhos ao tratarem de espaços segregados, buscam
dentro da metrópole as áreas de maior pobreza e situação de vulnerabilidade social
1
É importante o registro de que o termo médio aqui, está relacionado estritamente à sua dimensão
populacional, sem referências às cidades médias ou intermediárias gaúchas como Caxias do Sul ou
Pelotas, que devido ao seu peso na economia e nas relações intra-regionais e mesmo em escala
nacional ou internacional, vem aumentando sua importância frente às tradicionais metrópoles.
Importantes estudos sobre as cidades médias podem ser obtidos em M. Encarnação Beltrão Espósito
(Org.) “Cidades Médias: espaços em transição”.
13
para suas análises sociais, sem atentar ao papel de periferia da metrópole
desempenhado por muitos municípios metropolitanos, menos ainda do
comportamento destes municípios na dinâmica territorial e econômica da região.
Visando contribuir para o preenchimento desta lacuna nos estudos sobre a
RMPA, o presente estudo tem como objetivo entender de que forma o processo de
hierarquização e segregação sócio-espacial repercutem sobre o município de
Alvorada, acarretando problemas característicos do espaço urbano. Neste sentido o
trabalho apresenta como hipótese principal a de que os principais problemas sociais
existentes no município estão diretamente ligados ao processo de segregação
econômica e sócio-espacial sofrida pelo município desde sua origem dentro da
RMPA.
Para a realização da presente pesquisa, foram utilizados dados quantitativos
e qualitativos. No que se refere aos dados quantitativos, as principais fontes foram
as revisões bibliográficas, órgãos públicos de pesquisa e Secretarias Municipais. Os
dados estatísticos utilizados neste trabalho tiveram a função de evidenciar e
exemplificar determinadas características do município de Alvorada, buscando,
sempre que possível, realizar uma análise comparativa com os demais municípios
da RMPA.
Apesar da importância dos dados quantitativos, estes somente apresentam
conteúdo explicativo, quando capazes de evidenciar um dado específico e
acompanhados de uma sólida análise qualitativa subsidiada por uma matriz
epistemológica capaz de se debruçar sobre uma dada realidade.
A análise da produção do espaço urbano de Alvorada, neste trabalho, se
através dos processos históricos que põem em movimento importantes
transformações em sócio-espaciais. Articulando as mudanças nas dinâmicas
urbanas a nível nacional, regional e intra-urbana, o estudo se valeu da multi-
escalaridade como um método dialético de compreensão da contraditória realidade
do município que, ao mesmo tempo em que se apresenta segregado do
desenvolvimento econômico observado na RMPA, é também fruto deste processo
de modernização impulsionado pela industrialização e urbanização do território
brasileiro.
Após a obtenção dos dados quantitativos e da análise qualitativa da dinâmica
urbana de Alvorada, tanto a nível regional quanto intra-urbano, optou-se por dividir o
trabalho em três capítulos, além das considerações finais.
14
O primeiro capítulo tem como principal objetivo entender de que forma o
município de Alvorada se consolidou como espaço de segragação social da RMPA,
assim como suas mudanças sócio-econômicas de sua origem até os dias de hoje.
Para tanto, este capítulo foi dividido em dois períodos que correspondem a sub-
capítulos. O primeiro, que se estende basicamente da emancipação do município
até fins da década de 1980, sobretudo pela inexistência de dados econômicos e
sociais de Alvorada, visto que até 1965 ainda era um distrito pertencente a Viamão.
Desta forma, busca analisar como dentro do processo de formação da RMPA,
Alvorada, legalmente instituída enquanto município, fica de fora do processo de
industrialização verificado nos municípios da RMPA, sobretudo naqueles localizados
no eixo de desenvolvimento Porto Alegre-Novo Hamburgo, formado ao longo da BR-
116 (Canoas, Esteio e São Leopoldo, por exemplo), assumindo desta forma uma
função meramente habitacional dentro da hierarquia urbana da RMPA.
O segundo período, a partir da década de 1990, marcado não por um
breve período de políticas liberalizantes tanto a nível federal como estadual, mas,
principalmente, pela redemocratização e pelo “fim” do Estado centralizado
desenvolvimentista, busca analisar de que forma a economia da RMPA se
reestruturou, promovendo um movimento de crescimento econômico nos municípios
de Cachoeirinha e Gravataí, fora do eixo da BR-116, e quais os impactos desta
reestruturação na economia do município de Alvorada.
O segundo capítulo busca analisar de que forma as relações de segregação
sócio-espacial observados em Alvorada influenciam o processo de produção do
espaço intra-urbano do município, passando a reproduzi-las em seu interior. Para
tanto o capítulo apresenta uma periodização um pouco diferente da anterior,
acrescentando, na verdade, um período a mais, correspondente a fase em que
Alvorada se constituía apenas como um distrito de Viamão, entre 1949 e 1964,
dividindo o segundo capítulo em três períodos..
O período entre 1949 e 1964, na verdade, não contém, a nível regional,
importantes diferenciações em relação ao período que se estende aa década de
1980, correspondendo ao período desenvolvimentista de intenso processo de
urbanização e metropolização do território brasileiro. Entretanto, se não é
evidenciado papel relevante do então distrito de Viamão na economia da RMPA,
este período marcará fortemente a configuração do espaço intra-urbano de
Alvorada. Com o intenso processo de metropolização em torno da cidade de Porto
15
Alegre, em direção à Novo Hamburgo, em fins da década de 1940 se inicia a
atuação de agentes loteadores da capital sobre o então distrito de Viamão.
Apesar de 1965 não representar uma mudança a nível regional, o município é
emancipado neste ano. Com sua consolidação enquanto município, Alvorada
passará por importantes mudanças no processo de configuração de seu espaço
intra-urbano, justificando assim a periodização até fins da década de 1980.
Iniciado a partir do início da década de 1990, o terceiro período apresenta a
discussão quanto à mudança dos padrões de ocupação do espaço intra-urbano do
município, engendrada, sobretudo, pelo processo de reestruturação das dinâmicas
espaciais da RMPA, viabilizando a incorporação das relações segregação sócio-
espacial para o interior de seu território.
O terceiro capítulo realiza uma breve análise dos problemas urbanos
verificados em Alvorada, a partir da articulação entre as relações de segregação
sócio-espacial, a nível metropolitano e intra-urbano, e os problemas ligados à
questão da habitação, às questões sócio-ambientais e ao fenômeno da violência.
16
2 ALVORADA: METROPOLIZAÇÃO E SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL
O estudo do município de Alvorada, que nasce metropolitano e, portanto,
urbano, necessita ser compreendido dentro do processo de urbanização que se dá
no território nacional a partir da década de 1930. A análise da evolução urbana
brasileira, por sua vez, exige um processo de periodização, no sentido de
caracterizar o tempo-espaço urbano em suas mudanças e permanências, dentro de
um movimento característico de sua formação sócio-espacial.
Para Rangel (2005), o período Republicano, que antecede o período
desenvolvimentista, representa um pacto nacional
2
entre a burguesia comerciante,
voltada ao mercado externo, e o latifúndio pré-capitalista. Sendo assim, o território
brasileiro permanece, de um lado, arcaico com o latifúndio e suas relações internas
pré-capitalistas e de outro, como um país agroexportador, participando da economia
mercantil do sistema mundial, com cidades mercantes voltadas para o mercado
externo, ou seja, permanece ainda com seu modelo de cidade colonial. Esta
organização político-territorial privilegia o poder oligárquico, que através de práticas
coronelistas e patrimonialistas, controla as instituições públicas, assim como as
práticas sociais e econômicas regionais.
Entretanto, é no interior desta sociedade, em fins do século XIX que nascem,
sobretudo por parte dos imigrantes, os primeiros esforços de produção industrial de
bens de consumo, principalmente de artigos têxteis, vestuários e alimentícios,
voltados ao mercado interno. Para Mamigonian (2000, p.38 e 39)
Além da substituição de importações urbanas artesanais e manufatureiras
usando mão-de-obra escrava e livre, ocorreu também uma substituição
natural no interior das fazendas, mais modestas que anteriormente, e
começou a se generalizar, principalmente pela aplicação dos capitais
comerciais que cresceram rigorosamente de 1850 a 1873, mas que se
tornavam ociosos desde então, uma substituição industrial de importações
no setor textil desde o Maranhão até o Rio Grande do Sul. Note-se que esta
substituição industrial, modesta inicialmente, passou a desempenhar um
papel central na economia brasileira após 1930.
Apesar do primeiro impulso das nascentes fábricas manufatureiras do Brasil,
ainda em fins do culo XIX, é com a crise do Entre-Guerras que a economia
brasileira inicia um novo ciclo econômico baseado na indústria, através de um novo
esforço de substituição de importações. Para Rangel, este novo ciclo provoca uma
2
Para melhor compreensão das características e transições de pactos de poder em Rangel, indica-se
a leitura de Ignácio Rangel ”A história da dualidade básica brasileira.”
17
mudança no pacto de poder político, onde a burguesia comerciante agro-
exportadora dá lugar à nascente burguesia industrial que, financiada por parte da
elite agrária, sobretudo aquela responsável pelo abastecimento do mercado interno,
inicia um acelerado processo de industrialização e urbanização do território
brasileiro.
É a partir da relação direta entre as cidades de pequena produção mercantil e
as cidades comerciais, que paulatinamente vão se consolidando também como
cidades industriais, que se estabelecem aglomerações populacionais diretamente
ligadas ao dinamismo destas novas relações de produção engendradas pelo
nascente capitalismo industrial brasileiro.
Com a industrialização e a transformação da o de obra rural em operários
fabris, impulsiona-se um processo de modernização tanto urbana como agrícola.
Inviabilizada a economia de subsistência na cidade, que permanecerá no campo por
um longo tempo em algumas regiões do território nacional, sobretudo nas regiões
norte-nordeste, cresce a necessidade do desenvolvimento de um mercado interno
capaz de responder às demandas tanto para reprodução da força de trabalho como
da nascente indústria brasileira.
No entanto, a criação de um mercado regional ou nacional depende não só da
capacidade produtiva para abastecê-lo, mas do desenvolvimento de uma complexa
rede capaz de integrar o território, possibilitando a circulação de bens de produção e
consumo.
Milton Santos (2008, p.37) chama de meio técnico-científico a crescente
transformação do espaço gerada pela industrialização e instalação de infra-
estruturas, e serviços que constituem a configuração territorial urbana. Para Lojkine
este processo responde ao processo de desenvolvimento das forças produtivas do
modo capitalista:
Sendo assim, a aglomeração da população, dos instrumentos de produção,
do capital, dos prazeres e das necessidades em outras palavras a cidade
não é de modo algum um fenômeno autônomo sujeito a leis do
desenvolvimento totalmente distintas das leis da acumulação capitalista:
não se pode dissociá-la da tendência que o capital tem a aumentar a
produtividade do trabalho pela socialização das condições gerais da
produção das quais a urbanização, vimos, é componente essencial
(LOJKINE,1991, p.137).
18
É respondendo às demandas da industrialização nacional, que o Estado
desenvolvimentista que se estende de 1930, com Vargas, até meados da década de
1980, com o fim da ditadura militar e o início da crise econômica, vai realizar fortes
intervenções no campo da economia. Através dos diversos planos de
desenvolvimento, criação de indústrias de base estatais, implementação de infra-
estruturas, rodovias, Distritos Industriais, entre outras ações, é que a urbanização no
Brasil vai se consolidar.
Portanto, o processo de urbanização está diretamente ligado à unificação do
ainda fragmentado território nacional, viabilizando não a defesa de suas
fronteiras, mas também a consolidação do seu mercado interno. Neste sentido, é
bastante ilustrativa a análise do espaço brasileiro realizada por Golbery do Couto e
Silva (2003) que propõe, na cada de 1950, a integração territorial a partir da
interligação entre os ecúmenos brasileiros e pelo avanço em direção noroeste.
Entretanto, nem todas as cidades, nem mesmo todo o tecido urbano, são alvo
destes investimentos. O emprego de capital imobilizado na produção do espaço é
altamente seletivo, e busca viabilizar tanto a produção como a circulação de
mercadorias, através da interligação de determinados pontos,
produzindo/reproduzindo relações assimétricas entre estes pólos.
Para Corrêa (1989, p.6-7), a formação da rede urbana é fruto de uma divisão
territorial do trabalho, e satisfaz a necessidade de uma economia de mercado
conectar estes diferentes pontos. Da mesma maneira entende Lojkine (1991, p.121):
[...] Na medida em que, segundo nossa hipótese, as formas de urbanização
são antes de mais nada formas da divisão social (e territorial) do trabalho,
elas estão no centro da contradição atual entre as novas exigências do
progresso técnico essencialmente em matéria de formação ampliada das
forças produtivas humanas – e as leis de acumulação do capital.
Portanto, a produção desigual do espaço urbano obedece às relações cada
vez mais hierarquizadas, atendendo assim às necessidades de organização do
espaço urbano brasileiro para a passagem do capitalismo concorrencial ao que
Lênin vem a chamar de Capitalismo Monopolista de Estado
3
. Se durante o período
inicial da urbanização brasileira o que se verifica é a conversão de comerciantes em
industriários, e por conseqüência das cidades mercantes em cidades industriais, na
medida em que estas se industrializam, são aplicados capitais em sua estruturação
3
Em. Imperialismo: Fase Superior do Capitalismo, nin analisa as mudanças do capitalismo no
início do culo XIX na Europa, identificando entre outros elementos: a fusão do capital bancário e
financeiro e o crescente processo de formação de grandes empresas capitalistas monopolizadas.
19
espacial, viabilizando assim a sua posição de comando dentro da hierarquia urbana,
tanto pelo seu papel econômico, como político e de capacidade prestação de
serviços. Desta forma o que observamos é o crescente processo de concentração
dos meios técnico-científicos, pondo em marcha o processo de metropolização no
Brasil.
Além das questões ligadas à urbanização e sua relação com as mudanças na
organização e nas relações do modo de produção capitalista, se faz necessário
avaliar como a dinâmica demográfica no Brasil responde à modernização e
urbanização do território nacional.
O processo de transição demográfica brasileiro apresenta como característica
marcante a passagem de uma população urbana de 26,35% em 1940, para
proporção de 68,86% em 1980, sendo que 28,9% da população brasileira se
encontra em área metropolitana (SANTOS, 2008, p.31). Esta explosão demográfica
na cidade obedece a dois processos: a absorção da população expulsa do campo e
o processo de transição demográfica pela queda nas taxas de mortalidade não
acompanhada em intensidade pela taxa de natalidade, viabilizada sobretudo pelo
processo de urbanização do território nacional.
Segundo a análise de grande parte dos economistas estruturalistas, mais
especificamente os cepalinos, o atraso brasileiro era explicado, dentre outros
fatores, pela persistência das relações arcaicas no campo, que, eliminadas pela
reforma agrária, viabilizariam não a modernização do campo como a transição
demográfica, com a formação de mão-de-obra e de um sólido mercado interno,
necessários ao desenvolvimento do capitalismo nacional.
No entanto, o que ocorreu no Brasil é que, apesar de não ter sido feita a
reforma agrária, por questões ligadas ao pacto de poder vigente, tanto o campo
como a cidade se industrializaram, gerando um fenômeno de maciça expulsão da
mão-de-obra do campo para as cidades que, incapazes de incorporar este grande
exército de reserva, passaram a ver crescer os problemas sociais em seu território.
O intenso êxodo rural observado no Brasil acarretou o rápido crescimento da
população urbana visto que a cidade, através da prestação de serviços de saúde e
da melhoria da qualidade de vida de parcela da população, apesar dos problemas
de saneamento básico e infra-estrutura, assegurou a diminuição da taxa de
mortalidade sem correspondência da taxa de natalidade, sobretudo nas nascentes
metrópoles brasileiras.
20
O processo de metropolização, resultante do processo de concentração de
meios técnicos e da população em algumas cidades, viabiliza, a partir da década de
1970 no Brasil, um crescente processo de desconcentração produtiva, com a saída
de fábricas dos grandes centros urbanos para os municípios metropolitanos,
acompanhada pela centralização das funções de comando da economia por parte
das metrópoles. Analisando as repercussões territoriais que a reestruturação do
capitalismo monopolista engendra, através de sua organização verticalizada, Lojkine
(1991, p.145)
afirma que:
[...] A socialização da cooperação territorial atinge pois o conjunto das
condições gerais da produção e, longe de ser “externa”, em relação a esse
processo, pode-se dizer que as novas formas de urbanização monopolista
são, de certa maneira, “o outro aspecto” da cooperação capitalista, quer se
trate da criação de centros urbanos que concentrem atividades de comando
e meios de formação de forças intelectuais de trabalho ou da
“descentração” das atividades e dos lugares de reprodução da força de
trabalho não diretamente ligados aos centros nervosos da economia e do
poder político.
Neste contexto, o fator localização toma novo significado, engendrando uma
série de transformações em espaços urbanos antes inexpressivos na hierarquia
urbana regional. Além de atrativos naturais que um sítio possa apresentar, outros
elementos são importantes para a definição das vantagens locacionais, tais como
oferta de terra barata, infra-estruturas de transporte e comunicação
regional/nacional, preço e qualificação da mão-de-obra, economias e deseconomias
de aglomeração, entre outros.
Santos & Silveira (2001) apresentam uma rie de categorias que, de certo
modo, são tributárias dos fatores de localização. Ao buscar identificar os fatores que
promovem desigualdades territoriais, os autores propõem pares conceituais tais
como de espaços luminosos, dotados de grande densidade (populacional, técnica e
informacional), fluidos e de rapidez (tanto de deslocamento como de relações sociais
e de troca, em oposição aos espaços opacos (espaços de rarefação, viscosidade e
lentidão) e que, por isso, apresentam menor interesse econômico.
Alvorada, no processo de metropolização observado em torno de Porto
Alegre, parece ter nascido sem brilho, às sombras do dinamismo que a região vai
apresentar ao longo de seu desenvolvimento.
21
2.1 Alvorada e a Segregação Sócio-Espacial na RMPA
Diferentemente das análises que, freqüentemente, analisam os aspectos da
segregação espacial a nível intra-urbano e, via de regra, dentro de um mesmo
município (a metrópole), este sub-capítulo pretende demonstrar a forma como
Alvorada apresenta-se, desde seu surgimento, como espaço de segregação social
dentro da RMPA.
Porto Alegre assume uma sólida e crescente importância na economia
gaúcha a partir da segunda metade do século XIX. Após a crise do trigo, a cidade
passa a comercializar regionalmente o pequeno excedente das colônias alemãs.
Iniciada com a fundação de o Leopoldo em 1824, a colonização alemã
caracteriza-se, inicialmente, pela produção agrícola de subsistência, somente
comercializando seu excedente a partir da década de 1850. O predomínio das
atividades do latifúndio pecuarista sul-riograndense, fica bastante evidente a partir
da comparação entre os valores de exportações provinciais de Rio Grande e Porto
Alegre, superada em mais de três vezes pela primeira como demonstrado por Singer
(1974, p.158). Entretanto, já é possível observar maior diversidade de produtos
comercializados por Porto Alegre e seu predomínio em culturas características da
lavoura de pequenas e médias propriedades.
A partir da década de 1870 observa-se nas colônias alemãs a produção
especializada de bens para comercialização, tais como, o feijão, o toucinho
(substituído paulatinamente pela banha), a farinha de mandioca e o fumo. Além
disso, é a partir desta década que se inicia a colonização italiana na região, que
obedecem ao mesmo processo observado nas colônias alemãs (ocupação e
economia de subsistência, expansão e comercialização de excedentes e
especialização produtiva para o mercado interno).
Com o crescimento da economia das regiões de colonização alemã e italiana,
impulsionado pela produção de bens agrícolas e de pequena criação, que passa a
corresponder a 32,4% da exportação do Estado do Rio Grande do Sul (SINGER,
1974. p.63), Porto Alegre se alça a uma nova posição econômica e funcional no
estado.
Apresentando localização estratégica devido ao lago Guaíba que, através de
seu porto, é capaz de receber o escoamento da produção das regiões dos rios
Jacuí, Caí, dos Sinos e Gravataí, todos navegáveis, Porto Alegre passa, a partir de
22
1908, a ser o principal exportador de produtos do Rio Grande do Sul, deslocando o
eixo econômico do sul latifundiário para o norte de pequenas e médias propriedades
agrícolas, especializadas e de colonização alemã e italiana.
A passagem da cidade comercial para a industrial está diretamente ligada ao
período chamado por Singer (1974, p.167) de “cidade dos alemães”, não só pela sua
capacidade de comercializar o produto de suas colônias, mas por receber o capital
excedente de comerciantes alemães convertidos na nascente indústria capitalista.
Segundo Singer (1974, p.171), é somente no último quartel do século XIX,
que a nascente indústria gaúcha surge ao sul, com a empresa União Fabril de
Rheingantz, com fábricas têxteis em Rio Grande, e uma fábrica de chapéus em
Pelotas. Obedecendo, portanto, ao modelo de industrialização do período,
caracterizado anteriormente, as principais cidades mercantes passam,
paulatinamente a converter-se em cidades industriais, em um dos primeiros esforços
de substituição de importações.
O desenvolvimento industrial em Porto Alegre, no entanto, é diferente do
observado no sul do estado. Enquanto em Rio Grande e Pelotas apresentam maior
especialização com grandes fábricas em poucos ramos (tais como tecelagem,
charutos, conservas alimentícias, moinhos e curtumes), voltados para o mercado
nacional, Porto Alegre está voltado para o mercado regional, sobretudo à região
colonial alemã e italiana, com grande diversidade de produtos (como os oferecidos
por Rio Grande além de metalurgia, calçados, vidro, entre outros), o que trouxe à
capital maiores vantagens econômicas, como evidencia Singer (1974, p.173):
[...] Esta diferenciação maior reflete a diferença entre o mercado da indústria
de Porto Alegre e de Rio Grande. Esta procura alcançar o mercado nacional
através de poucos produtos, ao redor dos quais se concentra o poder
competitivo das empresas. A indústria porto-alegrense, procura antes
penetrar no mercado da zona colonial, atendendo às múltiplas
necessidades de consumo de sua população. A indústria de Rio Grande
sofre, desde o início a competição não apenas de produtos importados mas
também da indústria carioca, paulista e de outras partes do país. A indústria
de Porto Alegre cresce, num primeiro momento, apoiada no mercado das
colônias onde goza de posição privilegiada. Somente depois de esgotar
estas possibilidades de expansão é que ela se lança ao mercado nacional,
contando, no entanto, com sólida base regional. É este fato que acaba
capacitando a indústria porto-alegrense a conquistar a supremacia no
conjunto do estado.
Como conseqüência deste processo de industrialização dinamizado pela
pequena produção mercantil com origem na colonização alemã, consolidou-se um
23
eixo de aglomeração urbana e crescimento econômico ao longo da BR-116,
estendendo-se entre Porto Alegre e Novo Hamburgo.
Entre 1920 e 1970, são fundadas sete cidades metropolitanas neste eixo
urbano estruturado pela BR-116: Canoas, Cachoeirinha, Sapucaia do Sul, Campo
Bom, Sapiranga, Esteio e Estância Velha (Villaça, 1998, p. 104) e apenas duas no
eixo oeste-leste (Guaíba e Alvorada).
Villaça (2001) propõe quatro tipologias de formação/absorção de municípios
metropolitanos. Diferentemente de Canoas, cujo processo de metropolização está
ligado a um transbordamento metropolitano privilegiado por infra-estruturas de
transporte como ferrovias, às quais incluímos aqui as rodovias cuja importância se
amplia a partir da década de 1950, ou de municípios absorvidos pela metrópole, tais
como São Leopoldo e Novo Hamburgo, cuja urbanização é anterior ao processo de
metropolização e ligados antes a sua formação sócio-espacial do que propriamente
ao fenômeno de conurbação, Alvorada enquadra-se no caso em que:
[...] A expansão urbana se manifesta aqui através da formação de uma
imensa periferia em geral de baixa renda, com núcleo local fraco que pouco
apresenta além de quitandas, farmácias ou padarias. Esse caso ocorre
quando a periferia da cidade central ou de algumas de suas grandes
cidades-subúrbios, transborda sobre os municípios vizinhos em pontos
afastado de usas sedes. Às vezes esse “transbordamento” vem a formar um
novo município, e o pólo local – inclusive com a instalação da prefeitura – só
então se forma. Foi o que ocorreu com ... Alvorada, na Área Metropolitana
de Porto Alegre, que resultou o transbordamento de Porto Alegre sobre o
município de Viamão cuja sede era muito distante da divisa com Porto
Alegre...(VILLAÇA, 2001,p.60)
A descrição do autor sobre como o município surge, no território de Viamão,
inclusive com a curiosidade da implantação da prefeitura, é perfeitamente
comprovada tanto pelo estudo da produção do espaço urbano em Alvorada,
analisado no capítulo seguinte, como nos testemunhos de Mário Gaspar Maciel
4
(2006 apud BARROSO, 2006, p.122), participante do processo de emancipação de
Alvorada:
Foi uma grande movimentação. Viamão não dava uma palha por aqui.
vinham arrecadar impostos e não faziam nada. Então nós levantamos uma
bandeira aqui para a emancipação... O Prefeito interventor daqui estava
ausente, disse assim: “Mas a prefeitura, onde é que vai ficar?” Aí eu disse
4
Depoimento colhido pela historiadora Vera Lúcia Maciel Barroso, presente na obra Raízes de
Alvorada. Esta obra foi organizada pela Prefeitura Municipal no sentido de resgatar a história e as
memórias do município.
24
assim: “Ah, a prefeitura vai ser contigo, meu amigo.” ele falou: Quem é
que tem uma sala que eu possa instalar a prefeitura? diz um senhor
idoso: eu tenho uma casa vazia, lá. Pode pegar. Eu não estou usando.” Eu
sou pedreiro, carpinteiro. Então eu fui lá e desmanche uma parede e fiz uma
sala maior e ele instalou a prefeitura ali”... e o município de Alvorada e a
prefeitura nasceu lá.
Apesar de já apresentar loteamentos urbanos desde 1949, somente com a Lei
de nº 216 de 22 de setembro de 1952 foi criado o 7º distrito Passo do Feijó
(sobrenome do primeiro morador da área), ainda pertencente à Viamão. Através da
Lei 5026, de 17 de setembro de 1965, o distrito é emancipado, tornando-se o
município de Alvorada.
Sendo a formação das Regiões Metropolitanas um processo de conurbação
hierarquizada, fruto da divisão territorial do trabalho, os municípios assumem, dentro
desta rede, funções diversas: habitacional, comercial, industrial e de serviços. No
caso da RMPA, onde a BR-116 estrutura o principal eixo de desenvolvimento
econômico, as funções industriais se concentram, neste período inicial, entre Porto
Alegre e Novo Hamburgo. Alvorada, a leste do eixo industrial surge com uma única
função: habitacional.
Entretanto, apesar da possibilidade de se identificar este processo como uma
especialização funcional do município dentro da hierarquia urbana, Alvorada se
apresenta, na verdade, como espaço de segregação social da RMPA, assumindo a
função de absorção da crescente população migrante de baixa renda que engrossa
os bolsões de miséria da capital e municípios vizinhos.
Roche (1955, p. 42) ao descrever ainda na década de 1950 a aglomeração
urbana de Porto Alegre, já identifica as “malocas” como de origem econômica, sendo
apenas um terço advindas do interior. No entanto, afirma que ... Assim a
municipalidade mandou efetuar o recenseamento delas, tratando da sua instalação
em novos bairros organizados pelo serviço da casa popular: dentro de algum tempo
a maloca não será mais que uma recordação”.
Entretanto, diferentemente do que previa o autor, o surgimento das “malocas”,
cortiços e favelas vieram a crescer, fenômeno evidenciado por Santos (2004,
p.194) onde observa que em Porto Alegre “a porcentagem de residentes em favelas
aumentou muito rapidamente em 20 anos (1% em 1940, 5% em 1950, 13% em
1960)”. Portanto, a explosão demográfica resultante do processo de metropolização
brasileira, cuja especificidade foi a de grande expulsão de mão-de-obra do campo
25
sem reforma agrária, promove não só o processo de segregação sócio-espacial
dentro da metrópole como através de seus limites.
Lojkine identifica o processo de segregação espacial dentro das relações
características do Capitalismo Monopolista de Estado, onde o processo verticalizado
de divisão social do trabalho passa a determinar também de forma verticalizada, a
divisão territorial do trabalho. Conforme o autor:
[...] A urbanização capitalista atual poderia ser então definida como a forma
mais desenvolvida da divisão do trabalho material e intelectual. Mas
enquanto pra Marx os dois termos espaciais desta oposição são a cidade
concentração da população, dos instrumentos de produção, do capital, dos
prazeres e das necessidades e o campo que isola e espalha esses
mesmos elementos pode-se formular a hipótese de que essa oposição é
muito mais materializada hoje pela segregação espacial entre os grandes
centros urbanos que concentram ao mesmo tempo o trabalho intelectual
mais desenvolvido e os órgãos de comando e as zonas periféricas onde
estão disseminadas as atividades de execução e os lugares de reprodução
empobrecida da força de trabalho[...] (LOJIKNE, 1991, p.142)
Para Lojkine (1991, p.166), portanto, a expressão espacial da divisão do
trabalho é dada pela segregação produzida “pelos mecanismos de formação dos
preços do solo, estes, por sua vez, determinados, conforme nossa hipótese, pela
divisão social e espacial do trabalho”.
Villaça (2001) critica a visão de Lojkine de que a renda da terra determina o
processo de segregação espacial, pois segundo o autor, deste pressuposto
“presume-se que, no final, as classes de mais alta renda fiquem com a terra mais
cara e as de mais baixa renda, com a mais barata.” (2001, p. 146). Ao final de sua
análise sobre segregação afirma ainda que é mais provável que a verdade esteja
no lado oposto: os preços do solo é que são fruto da segregação” (p. 151)
Analisando Alvorada a partir destas duas perspectivas, podemos verificar
relativa complementaridade entre as duas visões, o que é percebido mesmo em
Lojkine, quando afirma que o preço da terra é determinado pela divisão do trabalho.
Alvorada, cuja localização está fora do eixo de industrialização, assume, portanto,
dentro da hierarquia urbana a função habitacional, ou como citada anteriormente,
de reprodução empobrecida da força de trabalho.
Como conseqüência de sua segregação em nível regional, Alvorada atrai toda
sorte de pequenos especuladores da terra que, beneficiados pela ausência de
constrangimentos sociais, políticos e jurídicos, repartem o solo sem qualquer infra-
26
estrutura, possibilitando o barateamento do preço da terra. O baixo valor de lotes
para habitação atrai assim trabalhadores de baixa renda, o que também passa a ser
fator determinante nos investimentos de capital na área, via de regra, extremamente
baixos, reproduzindo assim o “círculo vicioso” da segregação cio-espacial a partir
das relações entre divisão territorial do trabalho, renda da terra e segregação.
Analisando a dinâmica demográfica do município, percebemos o intenso fluxo
de pessoas que passa a habitar o território. A população de Alvorada que em 1970
era de 40.322 habitantes, passa em 1991 a ser de 142.046, ou seja, um incremento
populacional de mais de três vezes o seu tamanho (Quadro 01).
A crítica de Villaça quanto à relação preço da terra e classe que a ocupa,
parece bastante superficial, na medida em que relacionar a segregação espacial à
renda fundiária não implica em dizer que as classes altas ocupam os lotes mais
caros, mas sim em afirmar que as classes mais altas são capazes de selecionar
para si as áreas segundo seus interesses, visto que para Lojkine a renda da terra é
determinada antes por relações de hierarquia dentro da divisão social e territorial do
trabalho, com menor dependência em relação ao preço da terra. Enquanto às
classes mais empobrecidas, resta ocupar áreas cujo salário possibilita a aquisição
de lotes para a construção da casa própria, ou, como mais intensamente passa a
ocorrer a partir das décadas de 1980 e 1990, vazios urbanos de forma irregular.
Podemos relacionar ainda o processo de segregação sócio-espacial a partir
do par conceitual espaços opacos e espaços luminosos de Santos & Silveira (2001).
Alvorada, ao longo do tempo, parece ter se consolidado enquanto espaço opaco
dentro da RMPA, ou seja, uma forma de segregação sócio-espacial que consiste na
precariedade de meios técnicos pela baixa atratividade deste espaço em relação aos
interesses do capital. Como resultado, além do baixo desenvolvimento econômico,
Alvorada se constituiu como um município que propicia, especialmente até fins da
década de 1990, baixa qualidade de vida, devido à precariedade de infra-estrutura,
inexistência de serviços de água tratada, luz ou esgoto, por exemplo, e que, com
freqüência, correspondem a áreas de grandes riscos de problemas ambientais.
Entretanto, é necessário chamar a atenção desde já quanto aos perigos de se
confundir o processo de segregação sócio-espacial com a inexistência de
articulação entre o espaço segregado e o espaço dinâmico (como um processo de
exclusão), ou ainda, enquanto diferenças meramente temporais entre espaços
modernos e espaços ainda arcaicos.
27
POPULAÇÃO (habitantes)
Municípios 1960 1970 1980 1991
Alvorada 0
40.322
91.380
142.046
Cachoeirinha 0
31.002
63.196
88.195
Canoas 51.778
153.730
220.448
279.127
Esteio 22.113
30.752
50.967
70.547
Gravataí 45.951
52.462
107.438
181.035
Guaíba
33680
55041
83102
85969
Novo Hamburgo 53.776
85.364
136.503
205.668
Porto Alegre 635.125
885.545
1.125.477
1.263.403
São Leopoldo 63.441
64.433
98.592
167.907
Sapucaia do Sul 0
41.744
79.367
104.885
Viamão 50.400
66.443
117.657
169.176
Total 956.264
1.506.838
2.174.127
2.757.958
Quadro 01 – Evolução populacional de Alvorada entre 1960 e 1991
5
. Fonte: Censos IBGE. Elaborado
por William da S. Papi
Milton Santos (2004, p.39) oferece uma importante contribuição para a análise
desta questão na medida em que percebe que dentro da economia urbana, não é
possível falar em economia tradicional, visto que a própria urbanização é fruto do
processo de modernização. Sendo assim, o autor utiliza as categorias de circuitos
superior e inferior para identificar a relação econômica desigual dentro da cidade da
seguinte forma:
Simplificando, pode-se apresentar o circuito superior como constituído pelos
bancos, comércio e indústria de exportação, indústria urbana moderna,
serviços modernos, atacadistas e transportadores. O circuito inferior é
constituído essencialmente por formas de fabricação não-“capital intensivo”,
pelos serviços o modernos fornecidos “a varejo” e pelo comércio o
moderno e de pequena dimensão. (SANTOS, 2004, p.40)
Se entendermos a formação do município de Alvorada enquanto “parte do
circuito inferior da economia da RMPA”, percebemos que os reduzidos valores do
preço da terra, a precariedade das condições de vida e as atividades econômicas
pouco desenvolvidas, obedecem não aos interesses da metrópole, através da
expulsão da crescente população empobrecida, assim como, do capital imobiliário
nascente na RMPA e de interesses políticos e econômicos locais, que lucram com a
baixa complexidade sócio-econômica e com e relação de dependência de Alvorada
com a metrópole.
5
Os municípios cuja população corresponde a zero são aqueles que ainda não são emancipados no período.
28
Apesar de estar acompanhada pelos municípios de Viamão, Guaíba,
Cachoeirinha e Gravataí em sua localização fora do eixo Porto Alegre-Novo
Hamburgo, Alvorada vai sofrer um novo processo de segregação dentro da
economia regional da RMPA.
Obedecendo às políticas dos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PND’s)
que pretendiam desconcentrar o desenvolvimento econômico-industrial, através da
criação de novas rodovias e áreas industriais, a partir da década de 1970 surge um
novo eixo de desenvolvimento que vai marcar os principais investimentos na RMPA.
A rodovia BR-290, que liga o litoral à RMPA se estendendo até a região oeste
do Estado, e a RS-118, que liga os municípios de Viamão, Alvorada, Gravataí e
Cachoeirinha (passando ainda por Esteio e terminando em Sapucaia do Sul) à BR-
116, cria uma nova potencialidade industrial na direção leste-oeste. Desta forma,
surgem quatro áreas industriais ao longo deste eixo: os Distritos Industriais de
Gravataí (figura 01) e de Cachoeirinha (figura 02) e, posteriormente, o Distrito
Industrial Alvorada e Viamão (DIAV) e o Distrito Industrial de Alvorada (DIA), este
municipal e mais próximo da BR-290, porém, limitado pela área de inundação do Rio
Gravataí, o que torna a RS-118 a principal via de acesso.
Gravataí e Cachoeirinha, em seus Distritos Industriais, conseguiram absorver,
a partir do novo eixo rodoviário e do processo de desconcentração produtiva que vai
se tornando crescente, as funções ligadas ao setor secundário da economia,
principalmente os ligados à indústria metal-mecânica.
Gravataí, além de ser mais antiga e de possuir, em 1970, segundo os
dados do Censo Industrial, 124 estabelecimentos industriais com 2.522 pessoas
ocupadas em tal atividade, apresentava posição privilegiada com o cruzamento das
rodovias BR-290 e RS-118 em seu território, local que foi escolhido para a
implantação de seu distrito industrial. Desta forma, Gravataí à época apresenta
excelentes fatores locacionais que permitem compreender os motivos pelo quais o
município atraiu para si um dinâmico processo de desenvolvimento industrial
observado até hoje.
29
Figura 03 – Distrito industrial de Gravataí, localizado entre a BR-290 e a RS-118. Fonte: Google Earth
Entretanto a escolha do município de Cachoeirinha, ou pelo menos da área
onde foi implantado o seu Distrito Industrial, em detrimento de Alvorada é que não
apresenta explicações na dinâmica da economia regional. Cachoeirinha, além de ter
seu Distrito implantado em área contígua ao núcleo urbano, não apresenta acesso
direto a qualquer rodovia, sendo o acesso feito por dentro de Canoas, ou mesmo
saindo da BR-290 e acessando a sua principal avenida através da Av. Flores da
Cunha, a principal avenida do município por conter em si o centro comercial e por
fazer a conexão diária pendular com Porto Alegre.
Em relação ao “efeito de atração” que o dinamismo industrial de uma cidade
pode apresentar, não verificamos tal fenômeno no município. Em 1970,
Cachoeirinha apresentava apenas 59 estabelecimentos industriais com 639 pessoas
empregadas, ou seja, um número bastante limitado que não confere grande
atratividade ao município, se comparado ao desempenho de municípios como
Canoas, Esteio ou mesmo Gravataí.
30
Figura 4 Circulado em amarelo, parte do Distrito Industrial de Cachoeirinha com área urbana em
seu entorno de sul à leste. Podemos observar a inexistência de grande rodovia em sua estruturação.
Fonte: Google Earth
Alvorada, apesar da ausência de histórico de desenvolvimento industrial
relevante em seu território, apresenta boa localização, com a BR-118 cruzando seu
território, e a BR-290 muito próxima, praticamente limitando parte de seu território à
norte. Além disso, o Distrito Industrial de Alvorada encontra-se mais próximo do
Distrito de Gravataí do que o de Cachoeirinha, aumentando assim suas
possibilidades de atração de indústrias, o que, na prática, acabou não se verificando.
Um dos fatores é explicado pela Metroplan, quando no Plano Diretor de 1980
afirma que eram escassos os recursos para a desapropriação e dotação de infra-
estruturas do Distrito Industrial de Alvorada (METROPLAN,1980, p. 44).
Desta forma, fica a lacuna de como explicar a escolha de Cachoeirinha em
detrimento de Alvorada para os investimentos industriais na RMPA. Possivelmente,
questões políticas aí devem estar presentes, mas que escapam a nossa pesquisa.
31
Figura 5 Localização dos Distritos Industriais de Alvorada. Percebe-se a proximidade ao norte com
o Distrito Industrial de Gravataí. Fonte: Google Earth.
O Plano Diretor para o município de Alvorada realizado pela METROPLAN,
em 1980, estava ligado ao Plano de Desenvolvimento Local Integrado, criado pelo
Plano Estratégico de Desenvolvimento no final da década de 1960. Este estudo
tinha como finalidade:
[...] dotar o município de Alvorada dos instrumentos básicos para sua
organização e orientar a ação da Prefeitura Municipal no desenvolvimento
integrado do município em compatibilidade com parâmetros previstos para a
Região Metropolitana de Porto Alegre – RMPA.(METROPLAN, 1980, p.2)
No que diz respeito à industrialização, o estudo identifica que o município
apresenta um reduzido número de estabelecimentos industriais disseminados pelo
seu território e a menor taxa de emprego no setor secundário da RMPA.”
(METROPLAN,1980, p.37).
Entretanto chama a atenção que com a implantação da BR-290, o município
se apresentaria como importante alternativa para a implantação de novos
empreendimentos industriais. Como é possível perceber na figura 3, tanto o DIAV
32
quanto o DIA apresentam fácil acesso pela BR-118 e apresentam grande
proximidade em relação à BR-290. Portanto, o fator localização não parece ser um
impeditivo à industrialização do município, visto que apresenta uma rodovia que
cruza seu território (RS-118), a BR-290 se apresenta bastante próxima ao norte,
além da grande proximidade com o Distrito Industrial de Gravataí.
Observamos no quadro 02 que o município não apresentou grandes avanços
no que diz respeito ao setor secundário. Alvorada conseguiu superar Viamão no
número de pessoas ocupadas na indústria a partir da década de 1980, o que não
aconteceu, entretanto, em número de estabelecimentos.
Número total de Estabelecimentos ou Unidades Locais e ocupados na Industria - Unidade
1970 1975 1980 1985
Municípios
Estabele-
Cimentos
nº de
ocupados
Estabele-
cimentos
nº de
ocupados
Estabele-
cimentos
nº de
ocupados
Estabele-
cimentos
nº de
ocupados
Alvorada 36
180
28
317
99
1297
118
1830
Cachoeirinha
59
639
102
1995
176
4491
174
6346
Canoas 348
7424
385
13128
485
18594
460
16804
Esteio 128
2906
112
4075
115
5397
146
5753
Gravataí 124
2522
122
3575
188
10281
214
11465
Guaíba 69
2908
92
5074
100
8180
108
8132
Novo
Hamburgo 615
17213
738
26705
1261
35063
1068
48089
Porto Alegre 2271
50747
2509
71879
3224
89294
2666
69493
São
Leopoldo 265
7306
307
10941
430
17516
405
18835
Sapucaia do
Sul 57
5634
106
7007
106
8563
170
7178
Viamão 120
382
148
878
139
1200
146
1101
Quadro 02 – Histórico do setor secundário em Alvorada entre 1970-1985. Fonte: IPEAdata. Elaborada
por William S. Papi.
Desta forma, fica evidente que, apesar de apresentar fatores de localização
regional compatíveis com a nova tendência de crescimento industrial da RMPA,
Alvorada fica de fora deste processo, assim como Viamão. Em relação aos demais
fatores locacionais como infra-estrutura e mão-de-obra especializada, o parecem
ser barreiras ao processo de industrialização de Alvorada neste momento, visto que,
os distritos industriais dos demais municípios deste eixo, em especial Cachoeirinha,
não apresentavam grandes vantagens comparativas, com exceção de questões
infra-estruturais.
Além dos baixos índices de desenvolvimento industrial, o setor terciário da
economia também apresenta resultados modestos. Analisando o quadro 3,
elaborado por Villaça (2001, p.302), podemos observar que Porto Alegre apresenta,
33
além do Centro, imeros sub-centros comerciais, dentre eles um localizado na
Avenida Assis Brasil (Passo da Areia) que se apresenta como o terceiro maior ponto
comercial por número de estabelecimentos. A grande proximidade entre o município
de Alvorada e este sub-centro, aliado ao fato de que grande parcela de sua
população trabalha em Porto Alegre, são importantes fatores inibidores da formação
de um centro comercial mais sólido e diversificado, limitando-se, praticamente, às
“quitandas, farmácias ou padarias” descritas por Villaça.
Sub-centros da RMPA Pontuações
Centro Principal 728
Azenha 115
Assis Brasil (Passo da Areia) 112
Novo Hamburgo 88
Canoas 87
São Leopoldo 82
Navegantes 57
Esteio 51
Assis Brasil (São João) 51
Partenon 49
Analisando a quadro acima, pode-se perceber a grande relação entre
estabelecimentos comerciais e o dinamismo econômico municipal. Além de bairros
de Porto Alegre, alguns deles de operários, os principais centros comerciais se
encontram nos municípios de longo histórico comercial e de expressiva
industrialização (como Novo Hamburgo e São Leopoldo), assim como de municípios
com forte vocação industrial neste período (Canoas e Esteio).
A partir dos dados presentes no Quadro 04, é possível fazer algumas análises
sobre a situação de Alvorada em relação aos demais municípios da RMPA.
Alvorada, até a década de 1980 possui população superior à Cachoeirinha, Esteio,
Guaíba e Sapucaia do Sul. Se observarmos o número de estabelecimentos
comerciais e de serviços, percebemos que durante a década de 1970, Alvorada
apresentava maior número de estabelecimentos do que os municípios antes citados,
acompanhando desta forma, uma relativa proporção entre população e terceiro
Quadro 03 Principais centros e sub-centros comerciais da
RMPA em 1975. Fonte: Villaça 2001, p.302. Elaborada por
William da S. Papi.
34
setor. Entretanto, na década de 1980, Alvorada passou a apresentar menor número
de estabelecimentos do que todos os municípios aqui analisados.
Número total de Estabelecimentos ou Unidades Locais e nº pessoas ocupada - Comércio, Serviços - Unidade
1970 1975 1980 1985
Município
Estabele
cimentos
nº de
ocupados
Estabele
cimentos
nº de
ocupados
Estabele
cimentos
nº de
ocupados
Estabeleci
mentos
nº de
ocupados
Alvorada 478
702
589
1129
555
1586
603
1938
Cachoeirinha 472
809
519
1233
599
2245
705
3019
Canoas 2248
4992
1994
7023
2186
10723
2373
13475
Esteio 517
1104
513
1585
601
2446
663
3202
Gravataí 595
1110
629
1425
899
3001
966
3498
Guaíba 452
910
509
1435
608
1939
753
3420
Novo
Hamburgo 1344
4005
1501
6026
1867
9601
2289
13962
Porto Alegre 15258
71752
16493
112618
15879
143747
16122
157676
São Leopoldo 972
3042
1141
4572
1253
5917
1458
7788
Sapucaia do
Sul 383
696
580
1536
721
2429
716
2684
Viamão 599
1002
751
1741
818
2357
975
2775
Quadro 04 – Número de estabelecimentos comerciais e pessoal ocupado. Fonte: Ipeadata. Elaborado
por William S. Papi
Este fenômeno pode ser explicado a partir de dois fatores. O primeiro deles,
relacionado ao fato de que Alvorada, incapaz de empregar sua população dentro
dos seus próprios limites, permanece caracterizando-se basicamente como cidade
dormitório para trabalhadores empregados em Porto Alegre.
Segundo dados do Plano Diretor, somente 24% da população trabalhava em
Alvorada em 1975, enquanto 72% em Porto Alegre (METROPLAN, 1980, p.62).
Desta forma, além da proximidade dos centros comerciais e de serviços da Av. Assis
Brasil em Porto Alegre, o fato de trabalharem na capital em sua grande maioria,
torna mais propício o comércio fora do município que se reforça enquanto cidade
dormitório.
Em segundo lugar, o poder aquisitivo dos munícipes de Alvorada também era
bastante baixo, inviabilizando, desta forma, a geração de uma demanda consistente
de mercadorias, consistindo majoritariamente em artigos de consumo básico e
individual, como evidenciado anteriormente. Segundo os dados do Plano Diretor
(METROPLAN, 1980, p. 61), em 1975, 92% da população do município recebia até
três salários mínimos, e “40% da população era ocupada no setor de serviços,
sendo que destes 75% trabalhavam em Porto Alegre em atividades intermitentes
através de biscates e subempregos”.
35
Sendo assim, tanto os setores secundário como o terciário da economia
urbana de Alvorada se configuram, a a década de 1990, como extremamente
débeis gerando poucas vagas de emprego e com baixo impacto sobre a economia
local.
Um fator fundamental para a análise das relações acima explicitadas é a
compreensão de que a segregação sócio-espacial é tendência e que, portanto, é
mutável ao longo do tempo, de acordo, entre outras coisas, com as mudanças tanto
dentro do modo de produção capitalista, quanto das características regionais,
decorrentes destas mudanças e dos processos de competição/cooperação do
capital industrial e financeiro. Este fator é percebido por na obra de Castells, que
afirma:
[...] Falaremos, por conseguinte, de uma estratificação urbana,
correspondendo ao sistema de estratificação social (ou sistema de
distribuição dos produtos entre os indivíduos e os grupos) e nos casos em
que a distância social tem uma expressão forte, se segregação urbana.
Num primeiro sentido, entenderemos por segregação urbana a tendência à
organização do espaço em zonas de forte homogeneidade social interna e
com intensa disparidade social entre elas, sendo esta disparidade
compreendida não só em termos de diferença, como também de hierarquia.
(CASTELLS, 2006, p. 249-250)
Sendo a segregação sócio-espacial uma tendência, e, portanto, algo não
perene, há a possibilidade de mudanças, nas estruturas da divisão do trabalho, onde
novos espaços luminosos podem surgir, e espaços antes luminosos podem vir a
perder seu brilho.
2.2 Reestruturação da RMPA e a Posição de Alvorada
Com a crise da década de 1980, o Brasil entra em uma fase de transição
rumo à democratização. Entretanto o movimento de redemocratização, iniciada com
a queda do Regime Militar (1985), representa não o fim de um regime autoritário,
como também do colapso do pacto desenvolvimentista e do enfraquecimento da
concepção de Estado Nacional. Passou-se a perceber o Estado como grande
responsável pela estagnação econômica, após cinco décadas de crescimento
promovidas pelo Estado desenvolvimentista. O afastamento deste modelo de Estado
está diretamente relacionado à reestruturação política, a partir da Constituição de
1988, que viabilizou o processo de descentralização administrativa, fiscal e política
36
(FALLETI, 2006). Este processo descentralizador se deu através da “passagem de
responsabilidades, recursos ou autoridade de níveis mais elevados do governo para
níveis inferiores[...]”(FALLETI, 2006 p. 60). Para Almeida & Carneiro:
Com efeito, além de ter-se transformado em ente federativo, o município
recebeu a parcela maior do aumento das transferências constitucionais e foi
o destinatário principal da descentralização de competências e atribuições
na área social. (ALMEIDA; CARNEIRO, 2003, p.129)
Desta forma, as políticas locais, antes relacionadas às mais diversas práticas
de poder oligárquico, passam a se mostrar como a nova saída para o “esgotamento”
de um ciclo de desenvolvimento comandado por uma elite nacional industrialista, e
liderada nas últimas décadas por militares.
A euforia em relação ao novo papel protagonista dos municípios na condução
de políticas para o desenvolvimento econômico e social pode ser de certa forma
representada através da obra de Figueiredo & Lamounier (1996), onde afirmam que:
[...] O regime democrático, e com ele a crescente confiança na
descentralização, e o estímulo à participação são ingredientes fundamentais
na revolução municipal que hoje começa a configurar-se no Brasil...
Ultrapassada a fase de “construção do Estado” (dos anos vinte e trinta) e a
da obsessão industrializante (dos quarenta aos setenta), parece que
chegamos a uma nova fase, cujo leitmotiv é a democracia, que por sua vez
traz a tona e fortalece uma concepção distinta a respeito do município e do
governo municipal[...] (FIGUEIREDO; LAMOUNIER, 1996, p.209-210)
O Estado brasileiro, a partir da década de 1990 até início da presente década,
visando concluir seu objetivo de desmantelamento do Estado desenvolvimentista,
passa a privilegiar a importação de bens de alto valor agregado, o afastamento do
Estado na economia, via privatizações e queda dos investimentos públicos,
estimulando o processo de competição entre as cidades pela instalação de grandes
empresas multinacionais, via incentivos fiscais e linhas de financiamento pelo
BNDES, ao mesmo tempo em que estrangula, sobretudo, a pequena e média
indústria nacional, através de sua política monetária de altos juros e de paridade
cambial entre o real e o dólar, aprofundando problemas que as estratégias
desenvolvimento local prometiam resolver.
Neste mesmo movimento, o estado do Rio Grande do Sul, alinhado com as
novas ideologias de cunho liberalizante do Governo Federal, passa a adotar uma
série de medidas com o intuito de “modernizar o Estado”. Para tal objetivo, se adota
37
a estratégia de privatização de grandes empresas públicas como a Companhia
Riograndense de Telecomunicações (CRT), assim como a mobilização de vultosos
recursos e isenções fiscais para implantação de grandes conglomerados industriais
na RMPA, em sua maioria multinacionais, em detrimento de uma estratégia do apoio
aos arranjos produtivos locais.
Dentre estes novos empreendimentos se destacam o Complexo Industrial
Automotivo General Motors (CIAG) e a empresa fumageira Souza Cruz, além da
montadora Ford que apresentava projeto de instalação em Guaíba, mas que acabou
sendo implantada no estado da Bahia.
O Complexo Industrial Automotivo General Motors, implantado em Gravataí
junto à BR-290, alavancou o PIB do município. Hoje, conforme Quadro 5, se
apresenta como o 6º maior PIB do estado, passando de um PIB per capita de R$
5.118 em 1996 para R$ 14.327 em 2006, enquanto municípios como Alvorada
apresentaram um crescimento bastante modesto em termos absolutos (apesar de
quase dobrar de valor neste período) passando de R$ 2.179 para R$ 3.976 neste
período de 10 anos se configurando como o pior PIB per capita do estado.
Recentemente foi anunciada a ampliação da planta da fábrica para produção de dois
novos modelos, o que implicará em investimentos na ordem de R$ 2 bilhões de
reais
6
, com previsão de gerar cerca de mil empregos diretos dentro do complexo, e
de aproximadamente 7 mil empregos indiretos.
Em Cachoeirinha, a empresa Souza Cruz foi implantada na Av. Frederico
Augusto Ritter, mas junto à RS-118 e em 2009 inaugurou um parque gráfico com
investimentos na ordem de R$130 milhões de reais
7
, gerando 250 empregos
diretos. O município que, em 1996, apresentava um PIB per capita de R$ 5.931,
um pouco mais elevado do que os municípios de Gravataí e Alvorada passou para
R$ 16.743, saltando da posição de 28º PIB do estado para 13º posição em 10 anos.
6
Notícia disponível no site
http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2532461.xml&templat
e=3898.dwt&edition=12443&section=1008, acessado em: 18 de julho de 2009.
7
Disponível no site da empresa
http://www.souzacruz.com.br/OneWeb/sites/SOU_5RRP92.nsf/vwPagesWebLive/80256DAD0063http:
//www.souzacruz.com.br/OneWeb/sites/SOU_5RRP92.nsf/vwPagesWebLive/DO6J5KFS?opendocum
ent&SID=&DTC=&TMP=1, acessado em 18 de julho de 2009.
38
Produto Interno Bruto
Produto Interno Bruto per capita
Municípios
(1.000 R$)
Posto
(RS)
Variação
nominal(%)
(R$)
Posto
(RS)
Variação
nominal(%)
Alvorada 854.695
31º
8,3
3.976
496º
6,0
Cachoeirinha 2.040.613
13º
4,3
16.743
68º
2,5
Canoas 9.607.235
8,3
28.823
7,0
Eldorado do Sul 754.083
39º
16,1
21.961
19º
12,5
Esteio 1.686.721
16º
10,6
19.372
33º
9,2
Gravataí 3.879.258
9,4
14.327
113º
7,0
Guaíba 1.488.010
17º
22,6
14.063
118º
20,6
Novo Hamburgo 3.897.297
1,5
15.062
96º
0,2
Porto Alegre 30.116.002
7,0
20.900
23º
6,1
São Leopoldo 2.390.931
12º
4,6
11.252
208º
3,1
Sapucaia do Sul 1.468.189
18º
-2,4
10.799
229º
-3,9
Viamão 1.425.387
19º
7,2
5.441
490º
5,0
Quadro 05 Produto Interno Bruto (PIB) e PIB per capita de Alvorada .Fonte: Fundação Estadual de
Economia e Estatística (FEE). Elaborada por William da S. Papi
Alvorada, dentro deste mesmo processo, era o local destinado à implantação
de uma fábrica da empresa Dell Computer, que atua no ramo da informática,
especialmente de computadores. Entretanto, a empresa acabou não se implantando
no município, e em 2006, o terreno reservado à Dell Computer foi adquirido para a
implantação da Digitel, empresa também do setor de informática, que promete
investimentos na ordem de R$ 100 milhões de reais, gerando cerca de 400
empregos diretos, além de 400 indiretos com a instalação de 6 empresas
sistemistas
8
.
Apesar de reconhecermos que, com o estabelecimento de um Estado
baseado em um pacto federativo e descentralizador, pelo menos legalmente, o
município ganha maior capacidade de promover políticas públicas mais autônomas e
voltadas ao seu interesse, percebe-se com os exemplos acima que, na prática, as
instâncias estaduais e federais apresentam grande predomínio nas decisões dos
destinos econômicos e regionais do município.
Este forte peso do Estado é percebido, no campo econômico, através das
políticas de planejamento regional e linhas de financiamento para implantação de
8
Estas informações estão disponíveis no site da empresa
http://www.digitel.com.br/news/readnews.asp?news_id=42, acessado em 12 de julho de 2009 e no
site da Prefeitura Municipal http://www.digitel.com.br/news/readnews.asp?news_id=42, acessado em
12 de julho de 2009.
39
empreendimentos. Nestes casos é válido, sobretudo para cada de 1990, afirmar
que as cidades encontram-se não só sob o poder centralizador dos níveis superiores
da federação, mas também dos interesses das grandes corporações que pactuadas
com o Estado, viabilizam a condução das políticas de investimentos no município
segundo seus interesses.
Da mesma forma, no campo das políticas públicas sociais e da infra-estrutura
intra-urbana, a União, principalmente nos últimos anos com a retomada de
investimentos nas áreas sociais e o relativo enfraquecimento de práticas
liberalizantes no interior do Estado, assume um papel determinante em sua
formulação e implementação. Através da concentração da arrecadação a nível
federal, os Ministérios e Secretarias estipulam normas e regulamentações a serem
atendidas em projetos que visem à captação de recursos, impondo aos municípios o
enquadramento às orientações da política nacional na implementação de políticas
públicas locais.
Desta forma, a euforia da “revolução municipal” parece bastante frágil, frente
aos fatos. Entretanto, vale a reflexão de que o município passa a participar mais
ativamente da vida econômica a partir deste período, sendo capaz de atrair novos
investimentos através de articulações em diversos veis das redes sociais, políticas
e econômicas.
Além das mudanças sociais e políticas engendradas a partir de fins da
década de 1990, e do surgimento de grandes conglomerados industriais
multinacionais na economia da RMPA, observamos ainda a continuidade do
processo de desconcentração produtiva já iniciada em fins da década de 1970.
Na última cada, observamos em Alvorada um importante incremento no
número de estabelecimentos industriais. Dentre elas, temos a Sulinox, importante
indústria produtora de ordenhadeiras e sistemas de refrigeração do leite (figuras 04
e 05). Fundada em 1999, a empresa tem origem no bairro navegantes em Porto
Alegre, obedecendo à dinâmica de desconcentração destacada.
40
Figuras 6 e 7 Fotos da empresa Sulinox, implantada recentemente no DIAV. Foto: William S. Papi,
julho de 2009.
Segundo dados do IBGE, o número de estabelecimentos industriais passou
de 880 com 2.935 pessoas ocupadas em 2000, para 917 com 3992 pessoas
ocupadas. O VAB de Alvorada passou dos, aproximadamente, R$ 584 milhões
observados em 2003, para R$ 783 milhões em 2006, sendo que destes 135 milhões
corresponderam ao setor industrial, apresentando uma pequena queda em relação à
2003, onde estes valores giravam em torno de R$ 144 milhões. Entretanto, apesar
do crescimento industrial dos últimos anos, em 2006 percebeu-se uma diminuição
do VAB industrial no município. Este fato é verificado na grande maioria dos
municípios metropolitanos, verificando assim, um forte crescimento do setor terciário
na economia.
Como possíveis explicações para estes fatores, podemos destacar três
elementos chave. O primeiro deles é o crescente papel da produção de bens com
alto valor agregado em tecnologia. Com a passagem da produção manufatureira
para a produção industrial, substituindo crescentemente a força de trabalho humano
pela da máquina, cresce na outra ponta, as necessidades e oportunidades de
formas de trabalho ligadas à criação tecnológica, assim como da organização
produtiva e administrativa voltada à produção. Retomado os estudos de Marx,
Lojkine discute o papel da ciência enquanto força produtiva:
[...]O conjunto de despesas ligadas à pesquisa científica, ao
desenvolvimento do trabalho científico, não pode, à primeira vista
rigorosamente falando fazer parte da esfera de consumo dos meios de
produção; não se trata, como para as despesas de formação profissional,
de despesas ligadas à reprodução da força de trabalho, reprodução
ampliada, complexa, é verdade, mas reprodução final e portanto
improdutiva de mais-valia? Mas então não se compreende mais as novas
relações instauradas pelo maquinismo entre ciência e produção já em várias
ocasiões, no capítulo consagrado ao maquinismo e à indústria moderna, O
41
Capital caracterizava a ciência como “força produtiva independente do
trabalho”, incorporada ao sistema mecânicoe, por isso, aumentando de
maneira extraordinária produtividade do trabalho”...logo, a produção de
mais-valia relativa.” (LOJKINE, 1991, p.125)
O segundo elemento, articulado ao primeiro, é o fato de que os setores da
produção ligados à ciência e desenvolvimento de novas tecnologias, criação gráfica,
e mesmo, de organização e gestão (com a evolução dos sistemas de
telecomunicação e softwares) passam a ser terceirizados, ou seja, migram de dentro
da fábrica (setor secundário), para empresas especializadas em prestação de
serviços a empresas (setor terciários), como bem observa Préteceille (1994, p. 81):
[...] Surgem pois dificuldades conceituais decorrentes do uso globalizante
das noções de serviços ou de “terciário”, das quais certos componentes são
de fato “prolongamentos” da produção industrial. É claro que as diferentes
evoluções da reestruturação industrial produzem transformações muito
importantes e rápidas da estrutura da mão-de-obra, tanto em termos de
qualificação e de condições de emprego quanto em termos. Note-se, aliás,
nesse ponto que uma parte considerável do dinamismo dos serviços
oferecidos as empresas parece muito mais ligado ao crescimento das novas
formas de produção industrial do que as atividades financeiras e comerciais,
inclusive quanto a sua dinâmica de localização.
Analisando este fenômeno na RMPA, Alonso (2009, p.70) propõe a divisão
dos Serviços em quatro grupos: produtivos, distributivos, sociais e pessoais.
Deixando de lado aqui a discussão de até que ponto os serviços identificados pelo
autor como distributivos podem conter na verdade serviços produtivos, segundo
seus estudos, Alonso conclui que as cidades de São Leopoldo, Canoas, Gravataí
Cachoeirinha e Esteio demonstraram ter uma centralidade importante somente nos
serviços profissionais e de negócios”. Apesar de Alvorada não ter sido contemplada
pelo estudo, percebemos através de dados do IBGE que em Alvorada um
aumento considerável do número de estabelecimentos do setor terciário, passando
de 3.376 estabelecimentos que empregavam 8.665 pessoas em 2000, para 4.270
estabelecimentos que ocupam 13.750 pessoas.
Apesar de percebermos que, como havíamos destacado, a capital
concentra em si as funções de serviços, sobretudo as de comando da economia e
da política, assim como de serviços públicos, a pequena quantidade de capital
imóvel aplicada nestas atividades, pode ser um importante fator para explicar sua
capacidade de desconcentração.
42
Em terceiro lugar, relacionado mais diretamente às dinâmicas sócio-espaciais
do que diretamente às mudanças internas ao modo de produção capitalista, a
crescente migração das classes médias para os municípios da periferia, se configura
como um importante dinamizador do comércio e dos serviços.
Na RMPA, a crescente saída das classes médias, movimenta o comércio
local, que passa a atrair novos empreendimentos comerciais como grandes redes de
hipermercados (BIG e Bourbon Country, por exemplo), shopping center’s, centros
comerciais, restaurantes e casas noturnas, assim como de serviços de segurança,
manutenção de equipamentos, entre outros. Desta forma, o crescimento da
participação da classe média nos municípios metropolitanos movimenta a economia
local, respondendo em parte, ao crescimento do setor terciário na economia dos
municípios.
Seguindo esta tendência dos municípios da RMPA, Alvorada apresenta, como
vimos, um importante impulso econômico no setor terciário com a chegada de
empreendimentos como os Hipermercados BIG e a reconfiguração do “eixo
comercial” ao longo da Av. Getúlio Vargas”, impondo uma nova dinâmica intra-
urbana analisada no capítulo seguinte.
Ao longo da Av. Presidente Vargas, percebemos a reconfiguração do espaço
comercial, com a saída de pequenas e médias construções antigas, voltadas ao
pequeno comércio, para novas construções, sem grandes áreas, mas voltadas
para o comércio moderno, mudando a paisagem urbana do local.
Apesar desta importante tendência de crescimento da economia que Alvorada
vem apresentando, o município ainda apresenta uma economia extremamente frágil
e uma população bastante empobrecida.
Como vimos anteriormente, grande parte deste impulso no setor terciário
local é resultado da crescente migração de parcelas da classe média para o
município. Entretanto, pelo fato de manter como local de trabalho a capital, esse
reside, via de regra, nos limites mais próximos à metrópole. Assim sendo, tudo leva
a crer que a inexistência de serviços e comércios especializados não se consolida
pela falta de demanda tanto por parte da população de baixa renda, como da
população que ainda realiza suas atividades de consumo e lazer na capital.
A forte atração da metrópole sobre a população do município se evidencia
através da mobilidade urbana da RMPA, onde percebemos que o grande fluxo de
pessoas no sentido Alvorada-Porto Alegre permanece. Segundo os dados do Censo
43
Demográfico de 2000, da população residente no município com 15 anos ou mais
que trabalha ou estuda, aproximadamente 56,3% realizam suas atividades fora do
município, ou seja, realizam movimento pendular, onde mais de 90% (50,7%) tem
com destino a cidade de Porto Alegre, o maior índice da RMPA (estão próximos
Viamão com 43,3% e Eldorado com 37,9%)
9
.
Além da localização próxima à Porto Alegre, que responde aos movimentos
pendulares dos trabalhadores, se verificarmos que a implantação do principal
estabelecimento comercial do município, o hipermercado BIG, se deu junto à ponte
que liga os dois municípios, fica evidenciado que este responde não à demanda
do município de Alvorada, como aos bairros da Zona Nordeste de Porto Alegre como
Parque dos Maias e Rubem Berta, contemplando assim uma parcela dos
consumidores mais distantes da matriz localizada na Av. Sertório em Porto Alegre.
Em relação ao processo de industrialização, apesar dos indicadores
apresentarem crescimento da atividade industrial, inclusive superando o crescimento
populacional, a participação do município no setor ainda é modesto, e apesar de
como vimos, apresentar dois distritos industriais relativamente bem localizados,
estes não vem conseguindo reverter significativamente sua condição secundária
dentro da dinâmica industrial da RMPA.
Retomando os dados do IBGE, o número de estabelecimentos industriais no
município não é pequeno. Entretanto, pela mão de obra que ocupa, percebe-se que
se tratam de pequenas fábricas, possivelmente muitas de organização familiar. Das
917 unidades locais, 775 empregam a4 funcionários e apenas nove empregam
mais de 50 funcionários em suas instalações.
Como conseqüência do comércio ainda pouco dinâmico e da indústria de
pequeno porte, os índices de empregabilidade do município são dos mais baixos.
Segundo dados do Atlas do Desenvolvimento Urbano da RMPA, em 2000, Alvorada
liderava o ranking do desemprego na RMPA com 19,30%, além de apresentar uma
das mais altas taxas de informalidade (37,87%) e de pobreza a (20,75%), sendo que
66,77% da população ocupada recebia até três salários mínimos. Cabe aqui
salientar que à época o salário mínimo valia R$ 151,00, bem longe dos atuais R$
465,00, o que nos leva a crer que com sua valorização, o índice de pessoas com
renda de até três salários seja ainda maior.
9
Dados obtidos no sítio da Fundação de Economia e Estatística (FEE).www.fee.tche.br
44
Portanto, é sob a marca da segregação sócio-espacial na RMPA que a
população do município de Alvorada vai buscando melhorias nas suas condições de
vida. É a partir desta relação hierárquica e desigual na qual Alvorada se insere na
RMPA que analisaremos como o espaço intra-urbano do município é construído e de
que forma as relações de segregação determinam este processo.
45
3 ALVORADA: SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL E CONFIGURAÇÃO DO
ESPAÇO INTRA-URBANO
Durante o processo de metropolização da RMPA, percebemos não só a
incorporação de municípios anteriores ao processo de conurbação como São
Leopoldo e Novo Hamburgo, assim como a urbanização e a emancipação de
municípios, fruto do processo de desconcentração industrial.
Alvorada nasce a partir do intenso processo de industrialização ocorrido não
na capital gaúcha, como em vários centros urbanos de todo território nacional.
Entretanto, diferentemente dos municípios acima citados, Alvorada se emancipa
com a função de cidade dormitório, ou seja, local de moradia para trabalhadores de
Porto Alegre, sobretudo os migrantes do interior do estado, com pouca qualificação
profissional e baixa remuneração.
O presente capítulo tem como objetivo analisar como o espaço intra-urbano
de Alvorada é produzido a partir das relações de segregação observadas no
processo de urbanização da RMPA, ou seja, de compreender como Alvorada vai se
configurando como espaço de segregação na RMPA.
Muitos são os trabalhos que analisam o espaço intra-urbano de um município,
a partir de seus atributos de sítio, de suas vias de acesso ao comércio, processo de
loteamentos, entre outros. Villaça (2001, p. 20)
ao diferenciar o espaço regional do
intra-urbano, afirma que:
O espaço intra-urbano, ao contrário, é estruturado fundamentalmente pelas
condições de deslocamento do ser humano, seja enquanto portador da
mercadoria força de trabalho – como no deslocamento casa/trabalho –,
enquanto consumidor – reprodução da força de trabalho, deslocamento
casa-compras, casa-lazer, escola, etc. Exatamente daí vem, por exemplo, o
enorme poder estruturador intra-urbano das áreas comerciais e de serviços,
a começar pelo próprio centro urbano. Tais áreas, mesmo nas cidades
industriais, são as que geram e atraem a maior quantidade de
deslocamentos (viagens), pois acumulam os deslocamentos de forças de
trabalho os que ali trabalham com os de consumidores os que ali
fazem compras e vão aos serviços.
A partir do acima exposto, o autor acaba por resumir o intra-urbano ao espaço
de circulação de pessoas ou mercadorias, sendo por este processo determinado.
Ignora, portanto, o papel não só das dinâmicas regionais sobre o espaço intra-
urbano, como do efeito da renda fundiária e do capital imobiliário sobre a produção
do espaço intra-urbano. Como verificaremos em Alvorada, a circulação das pessoas
46
em direção à Porto Alegre é elemento marcante sobre os loteamentos de Alvorada.
Entretanto, o tão importantes quanto os movimentos pendulares da força de
trabalho, o papel das infra-estruturas de água, luz e esgoto, por exemplo, que o
permitem o deslocamento, mas sim a reprodução das condições de vida do
trabalhador e de sua família em seu local de moradia, produzindo o espaço intra-
urbano de forma mais desigual do que em relação ao “deslocamento”.
Logo em seguida, Villaça (2001, p.21) segue afirmando que:
[...] Assim, o desenvolvimento do transporte de energia e das comunicações
que não envolve o deslocamento do ser humano tem provocado no
espaço intra-urbano efeitos desprezíveis, se é que tem existido. Não
conhecemos nenhum estudo com fundamentação teórica e base empírica
que mostre, por exemplo, os efeitos que difusão do telégrafo teve sobre o
espaço intra-urbano... A esse respeito é de se registrar que tais estudos tem
ignorado o fato de que, em qualquer ponto do espaço intra-urbano ou intra-
metropolitanos, os custos da energia e das comunicações são iguais (ou
apresentam diferenças desprezíveis, quando as têm), tornando estes
espaços uniformes ou homogêneos do ponto de vista da disponibilidade de
energia e das comunicações[...]
Inverte-se aqui as relações de causa-efeito. Ao invés de tratarmos o papel
das infra-estruturas e dos equipamentos urbanos tanto na produção como na
seleção de áreas no interior do espaço urbano, o autor se restringe a analisar o
impacto sobre os preços de serviços, ou seja, sobre o custo de reprodução da força
de trabalho. Apesar de alegar a inexistência de “estudos com fundamentação teórica
e base empírica sobre o papel dos telégrafos, dos telefones, fax e da energia elétrica
sobre o espaço intra-urbano, existindo apenas “conjecturas(VILLAÇA, 2001, p.21),
podemos rapidamente nos perguntar: estes serviços são difundidos igualmente no
espaço intra-urbano? A localização, fator destacado pelo próprio autor como
elemento intra-urbano, de serviços como o da internet banda larga, ou de infra-
estrutura de saneamento básico o são fatores importantes durante o processo de
produção do espaço intra-urbano, ou melhor, de como o espaço urbano é
selecionado produzindo/reproduzindo a segregação sócio-espacial?
Longe de negar o papel da circulação na reprodução da força de trabalho e
na estruturação do espaço intra-urbano, o objetivo aqui é o de ampliar o papel dos
equipamentos urbanos, das infra-estruturas de transporte, comunicação, energia e
saneamento básico na análise de sua constituição, assim como, de sua relação com
a segregação sócio-espacial.
47
Além disso, aspectos regionais, tais como rodovias e localização de áreas
industriais, apesar de não serem elementos característicos do espaço intra-urbano,
participam de sua constituição. Em Canoas, por exemplo, não há como analisar os
elementos intra-urbanos sem analisar os efeitos exercidos pela BR-116 que divide o
município ao meio. Da mesma forma, não é possível analisar a “qualidade de vida”
dentro da cidade, propiciado de forma diferenciada, em decorrência, dentre outros
fatores, pelos efeitos ambientais negativos de atividades industriais.
Portanto, diferentemente da concepção de Villaça de que o espaço intra-
urbano corresponde ao espaço do deslocamento da força de trabalho, sendo como
trabalhadores ou consumidores, a análise da produção e configuração sócio-
espacial intra-urbana de Alvorada, passa pela análise de sua posição dentro da
RMPA, como bem destaca Barat (1979, p.3, grifo nosso):
Ao se analisar a economia urbana, carece de sentido desvincular, por
conseguinte: a) a estrutura econômica intra-urbana de sua dimensão
espacial; b) a estrutura econômica intra-urbana do processo econômico nos
sucessivos anéis que a envolvem, da microrregião à Nação, bem como de
sua posição em uma hierarquia de tamanhos urbanos; e c) a organização
espacial intra-urbana do processo de estruturação do espaço urbano-
regional.
A compreensão de que o fenômeno da urbanização, que põe em marcha o
não o processo de industrialização/metropolização como o de produção do
espaço intra-urbano, apresenta dinâmicas espaciais hierarquizadas entre os seus
diferentes núcleos, é de extrema importância para compreender como o espaço
“intra-urbano” de Alvorada é constituído.
Analisamos, no capítulo anterior, o processo de segregação urbana de
Alvorada em sua escala regional, mais especificamente dentro do processo de
metropolização, e de como Alvorada assume dentro da hierarquia urbana a função
habitacional. Cabe aqui, portanto, analisarmos a relação entre a segregação sócio-
espacial e a produção/configuração do espaço intra-urbano, a partir desta
especificidade.
Antes de analisarmos mais detidamente o caso de Alvorada é necessária a
retomada da discussão sobre segregação, agora de forma mais ligada a sua
dimensão intra-urbana, ou seja, de como a desigualdade social se expressa e é
reproduzida pelo espaço intra-urbano de Alvorada.
48
Villaça (2001, p.142), define a segregação “um processo segundo o qual
diferentes classes ou camadas sociais tendem a se concentrar cada vez mais em
diferentes regiões gerais ou conjuntos de bairros da metrópole”. Apesar de destacar
o papel da metrópole, o autor em sua obra entende que as chamadas regiões
metropolitanas tratam-se na verdade de área metropolitana, na medida em que
seriam apenas uma única cidade cujo núcleo está na metrópole (VILLAÇA, 2001,
p.52). Apesar de não utilizarmos a definição de municípios metropolitanos como
bairros, a segregação a nível inter-urbano, ou seja, de que existe uma segregação
entre estes municípios é bastante interessante, sobretudo ao analisarmos o período
que se estende até a década de 1980. Entretanto, com as reestruturações do
capitalismo e da própria RMPA, podemos facilmente identificar processos de
segregação no interior de seus territórios.
Os condomínios fechados são um exemplo da auto-segregação sócio-
espacial identificada o na metrópole, mas que vem se espalhando pelas
regiões metropolitanas. Com o desenvolvimento das redes de infra-estrutura em
transporte, energia e comunicação, que integra áreas distantes em um curto espaço
de tempo, cada vez mais as classes médias se enclausuram em verdadeiros
“enclaves habitacionais”. Desta forma, sob o discurso da busca de qualidade de
vida, muitos indivíduos da classe média alta, procuram áreas distantes, mas dotadas
de rodovias capazes de conectá-la não ao centro político-econômico de forma
relativamente rápida, mas até mesmo dos pontos intra-urbanos do município
metropolitano.
Por outro lado, as formas de segregação ligadas com o processo de
periferização habitacional, em relação à metrópole, passam também a ser
verificadas no interior dos municípios metropolitanos. A saída das classes médias da
metrópole para municípios do entorno, tem provocado um processo de revalorização
do espaço intra-urbano, dividindo cada vez mais estes municípios em áreas
distantes de seu centro comercial, assim como sem acesso a grande parte das infra-
estruturas urbanas, ao passo que as classes médias ocupam lotes bem localizados
e com maior densidade de equipamentos urbanos.
É possível, portanto, verificar no tecido intra-urbano um crescente processo
de segregação sócio-espacial: de um lado as elites econômicas e políticas que
atuam, principalmente de acordo com interesses imobiliários e empresariais, cada
vez mais se “enclausurando” em recortes espaciais definidos e relativamente
49
homogêneos internamente; de outro, grande parte da população de baixa renda
ocupando áreas periféricas longínquas, assim como, locais que proporcionam “baixa
qualidade de vida”, devido à inexistência de serviços e de infra-estrutura de água,
luz ou esgoto, por exemplo, e que, com freqüência, correspondem a áreas de
grande risco de problemas ambientais.
Portanto, cabe aqui identificar de que forma o processo de produção e
configuração do espaço intra-urbano de Alvorada produz/reproduz relações de
segregação sócio-espacial, tanto as determinadas por relações sociais e funcionais
de nível interurbano, como as mais diretamente ligadas a sua dinâmica interna.
3.1 Distrito Passo do Feijó: Loteamentos e Especulação Imobiliária
Enquanto o processo de urbanização no Rio Grande do Sul iniciava a
formação de um aglomerado urbano ao longo do eixo formado pela BR-116, o
território que formaria Alvorada, ainda pertencente à Viamão, se apresentava como
fazendas responsáveis pela produção de leite e de alguns hortifrutigranjeiros
comercializados em Porto Alegre.
Segundo as pesquisas de Vaz (2006, p.81) e relatos de Klagenberg (2006,
p.255), o território de Alvorada foi formado por duas propriedades rurais: a da
Família Feijó (Passo da Figueira), e na outra extremidade a propriedade da família
Barcelos (o Passo da Figueira), que figuraram, como veremos a seguir, na vida
política do município até hoje. Como podemos observar na Figura 08, em 1948
Viamão aprovou os dois primeiros lotes rurais na área que formaria o município.
Apesar de apresentar loteamentos rurais, Alvorada somente vai apresentar
seu primeiro loteamento urbano em 1949. Chamado de Passo do Feijó (Figura09),
este loteamento foi implantado, não por acaso, na divisa com Porto Alegre (ao longo
do Arroio Feijó), junto à Estrada Passo da Figueira, atualmente um prolongamento
da Av. Baltazar de Oliveira Garcia de Porto Alegre, e que recebe o nome de Av.
Presidente Getúlio Vargas.
50
Figura 08 e 09 Os primeiros lotes rurais esquerda) e urbanos direita) do município. Fonte: Secretaria Municipal de Planejamento Urbano e
Habitação de Alvorada
(SPH)
51
Assim como em outras cidades da RMPA (Canoas, Novo Hamburgo e mesmo
Porto Alegre), e diretamente ligado ao acelerado processo de conurbação e
metropolização que esta região passa a apresentar neste período, a década de 1950
representa um importante impulso no número de projetos de loteamentos urbanos.
Transformado no Distrito Passo do Feijó em 1952, pela Lei Municipal n.º
216 de Viamão, o território que veio a formar o município de Alvorada,
apresentava 16 loteamentos aprovados. Entre 1952 até a 1954 foram ainda
aprovados 8 loteamentos, totalizando 24 loteamentos aprovados durante este
período (Quadro 6).
Como podemos verificar na figura 10, os loteamentos urbanos aprovados
entre 1949 e 1954, se concentram ao longo da Estrada Passo do Feijó (Av.
Presidente Getúlio Vargas), com as exceções dos lotes rurais, do loteamento
Torotama, junto à Estrada Caminho do Meio (prolongamento da Av. Protásio Alves),
próximo á Viamão. Sendo a principal conexão com Porto Alegre, que é o destino de
trabalho da maior parte de sua população, esta estrada vai se configurando como a
principal via estruturadora da configuração espacial de Alvorada.
52
Nome loteamento Ano
Aprovação
Número
lotes
Área
loteamento
(ha)
Área lotes
(m
2
)
Características
Lotes
Chácara do Tordilho 1948 183 74,88 3700 Rural
Vila São Pedro I 1948 96 76,85 5 a 6000 Rural
Vila Passo do Feijó 1949 1185 85,67 250 a 1900 Urbano
Vila Torotama 1949 245 12,78 360 Urbano
Vila São Francisco 1950 249 41,08 500 a 1000 Urbano
Vila São Pedro II 1950 382 22,14 360 a 600 Urbano
Vila União 1951 244 14,68 500 Urbano
Vila da Figueira 1951 532 25,80 300 a 500 Urbano
Vila Central 1951 388 23,25 360 a 2000 Urbano
Vila Fontoura 1951 454 100,00 400 a 550 Urbano
Vila Taimbé 1951 418 17,81 324 Urbano
Vila Maringá 1952 939 36,10 300 a 400 Urbano
Vila Duas Figueiras 1952 494 30,24 400 a 600 Urbano
Vila Isabel 1952 182 25,41 1000 Urbano
Vila Primavera 1952 196 15,86 300 a 900 Urbano
Vila Bela Vista 1952 884 49,30 440 Urbano
Vila Aparecida 1953 100 60,14 3500 Urbano
Vila Tijuca 1953 967 55,98 440 Urbano
Vila Icaraí 1954 290 13,33 360 Urbano
Vila Pindorama 1954 148 17,15 300 Urbano
Vila Primavera -
prolongamento
1954 59 2,33 250 a 300 Urbano
Vila Maria Regina 1954 1025 56,03 300 a 390 Urbano
Vila Sumaré 1954 701 34,24 300 a 370 Urbano
Vila Jundiaí 1954 573 27,44 360 a 440 Urbano
Total - 10.934 918,49 - -
Quadro 06 – Loteamentos aprovados no município entre 1948 e 1954. Fonte: Secretaria Municipal de
Planejamento Urbanístico e Habitação (SPH) de Alvorada. Elaborada por William da S. Papi.
53
Figura 10 - Projetos de loteamento aprovados no período entre 1949 e 1954 indicados em roxo. Fonte:
Secretaria Municipal de Planejamento Urbano e Habitação de Alvorada
(SPH)
54
Além da Av. Presidente Getúlio Vargas, a Av. Frederico Dihl (Estrada do
Cocão), vai ganhando importância na medida em que se comunica com a própria
Estrada Passo do Feijó e com o Caminho do Meio (Protásio Alves), que ao se
encontrarem terminam na Av. Bento Gonçalves, no município de Viamão. Além
dos loteamento existentes no período 1949-1954, a crescente importância desta
via urbana para a atração de novos loteamentos habitacionais, se verifica ao
analisarmos os projetos aprovados entre 1955 e 1960 (Quadro 07), onde,
juntamente com a Av. Getúlio Vargas, passa a atrair uma importante parcela de
loteamentos em seus arredores, como verificado na Figura 11.
Este fenômeno se explica pelo fato de que a Av. Frederico Dihl, na verdade, é
uma bifurcação da Pres. Getúlio Vargas, junto ao término da Av. Baltazar de Oliveira
Garcia, ou seja, na entrada do município. Desta forma, esta estrada responde a sua
funcionalidade urbana tal qual a “avenida principal”: a de comunicar Alvorada com
Porto Alegre, viabilizando assim o deslocamento dos trabalhadores para a capital.
Nome loteamento
Ano
Aprovação
Número
lotes
Área
loteamento
(ha)
Área
lotes
(m
2
)
Características
Lotes
Vila Intersul 1ª e 2ª etapas 1955 1511 91,06 360 Urbano
Vila Tupã 1955 220 10,88 360 Urbano
Vila Caxambú 1955 162 7,18 360 Urbano
Vila Maria 1955 452 22,32 360 Urabno
Vila Formosa 1955 901 49,63 360 a 450
Urbano
Vila Agriter 1 1956 823 40,98 360 Urbano
Parque Residencial Piratini 1956 1511 80,00 360 Urbano
Vila Jardim Salomé 1956 579 30,89 360 Urbano
Vila São Lourenço 1957 209 10,15 360 Urbano
Vila Intersul 3ª etapa 1959 1014 55,47 360 Urbano
Vila Jardim Maringá 1959 206 11,13 360 Urbano
Vila Intersul 4ª etapa 1959 1086 63,29 360 Urbano
Vila Agriter 2ª fase 1959 257 25,00 360 Urbano
Vila Americana 1960 637 78,26 300 Urbano
Total - 9.568 576,24 - -
Quadro 07 Loteamentos aprovados entre 1955 e 1960. Fonte: Secretaria Municipal de
Planejamento Urbanístico e Habitação (SPH) de Alvorada. Elaborada por William da S. Papi.
55
Figura 11 Projetos de loteamento aprovados no período entre 1955 e 1960 indicados em marrom. Fonte: Secretaria Municipal de
Planejamento Urbano e Habitação de Alvorada
(SPH)
56
Ao final da década de 1950, o território do Distrito Passo do Feijó,
possuía uma importante parcela de sua área loteada. É bem verdade que, em
grande parte, os lotes não estão ocupados, e nem mesmo apresentam infra-
estrutura. Entretanto, já se apresenta como indicativo de que esta área passaria a
participar do processo de formação da RMPA.
Segundo Rigatti (1983, p.136), o grande impulso da atividade imobiliária
através de loteamentos urbanos na década de 1950 é significativo em diversos
municípios da atual RMPA. Comparando dados disponíveis à época, o autor
identifica que enquanto em Novo Hamburgo correspondem a aproximadamente
50%, e em Canoas 83,34% das áreas loteadas até 1980, em Alvorada este período
corresponde a apenas 26%.
Ao correlacionarmos o processo de parcelamento do solo e de transformação
territorial, verificado em Canoas, Novo Hamburgo e Alvorada, com a dinâmica
econômica, principalmente industrial destes municípios, percebemos uma relação
direta entre área loteada e desempenho industrial.
Segundo dados do Censo Industrial do IBGE, em 1960, Canoas
apresentava 110 estabelecimentos industriais empregando 2237 pessoas; Novo
Hamburgo, 368 estabelecimentos com 9893 trabalhadores; o município Viamão, ao
qual pertencia Alvorada na época, apenas 32 estabelecimentos, com 232 pessoas
ocupadas.
Sendo assim, o principal fator de atração dos agentes loteadores em Canoas
e Novo Hamburgo é a crescente capacidade de absorção de mão-de-obra que estes
municípios em processo de industrialização apresentam, tendo como vantagem
locacional para a implantação de loteamentos habitacionais, a proximidade de áreas
de maior oportunidade de trabalho.
Neste momento, Alvorada se encontra ainda como um distrito de Viamão,
desconexo da economia regional, servindo antes como um bairro periférico de Porto
Alegre destinado a absorver a crescente demanda por habitação dos migrantes
trabalhadores, do que parte do território de Viamão. Sendo assim, vai se tecendo de
acordo com os movimentos de periferização de trabalhadores de Porto Alegre,
advindos, em sua grande maioria, do interior do estado do RS.
Neste sentido, diferentemente do caso de Canoas, a lei de parcelamento do
solo instituída em Porto Alegre em 1954 tem grande importância no processo de
loteamento do território alvoradense. O aumento das exigências para os
57
loteamentos, ligados a garantias de infra-estrutura, reserva de áreas de uso e
serviços públicos, tornaram, muitas vezes, mais lucrativo o uso da terra como forma
de poupança ou para obtenção de lucros futuros através da especulação imobiliária.
Articulado à especulação imobiliária, o adensamento das áreas mais próximas ao
centro e sub-centros da cidade e a diminuição de áreas próprias para loteamentos
habitacionais, ou cuja implantação não implicassem grandes investimentos de
adequação para tal finalidade, trouxe consigo o aumento do preço da terra. Como
conseqüência, veremos a crescente expulsão das camadas mais populares para os
municípios metropolitanos, onde o preço da terra era mais baixo, devido à falta de
infra-estrutura, grande oferta, entre outros fatores.
Como analisado no capítulo anterior, o processo de urbanização brasileira
se caracterizou não por um processo de conurbação e metropolização resultante
do acelerado processo de industrialização verificado no país a partir da década de
1930, mas também pela explosão demográfica. Dentre os fatores que explicam a
explosão demográfica nas áreas metropolitanas, estão a migração de grande parte
da população das regiões agrícolas, resultante da modernização das relações de
produção no campo sem reforma agrária, e a queda na taxa de mortalidade não
acompanhada pela taxa de natalidade. Com a grande concentração populacional,
emerge, entre os diversos problemas sociais decorrentes deste fenômeno, uma
crescente demanda por lotes para habitação.
O caso da RMPA como um todo obedece a esta regra geral observada no
país. Desta forma, uma das saídas possíveis para a acomodação da contradição
aumento da demanda x “escassez” de lotes, foi o transbordamento da capital não
em direção aos municípios que atraem para si um importante processo de
desenvolvimento econômico, através de crescente industrialização (Canoas e Novo
Hamburgo), mas também para municípios que ainda não apresentavam importância
funcional urbana dentro da nascente RMPA, e que, por este entre outros fatores, vai
apresentar um preço mais baixo em seus lotes (o caso de Alvorada).
Dentre os fatores que determinam um baixo valor da terra nestes municípios
estão além da localização (pelo tempo de deslocamento da força de trabalho), a falta
de regulamentações ou de exigência de seu cumprimento sobre a implantação de
loteamentos e a conseqüente falta de infra-estrutura oferecida por estes municípios.
Analisando as regulamentações legais existentes até o final da década de
1950 em Alvorada, Rigatti (1983) destaca a fragilidade do regramento do
58
parcelamento e uso do solo. No nível Federal, através do Decreto-Lei 58, de
1937, regulamentado pelo Decreto 3079 de 1938, a responsabilidade de
regulamentação do parcelamento do solo urbano foi repassada aos entes municipais
e órgãos sanitários. Em nível estadual, a legislação se restringe ao Código Sanitário
do Estado de 1938 e à Circular 1/53, do Departamento Estadual da Saúde, que
estabeleceram alguns requisitos a serem observados no parcelamento do solo
urbano, muito frágeis e mais ligados a questões sanitárias dos lotes.
Desta forma, coube ao Poder Municipal a regulamentação desta questão.
Anterior inclusive à legislação de Porto Alegre, a Lei Municipal 225/1952,
referente às regras em de parcelamento do solo vigentes em Viamão, apresenta
poucas exigências em relação à infra-estrutura dos loteamentos e é bastante
“flexível” em relação aos espaços destinados a equipamentos públicos. Sendo
assim, como destaca Rigatti “... Pela situação de Alvorada, depreende-se que, para
a Prefeitura de Viamão, nunca surgiu o caso de se exigir a infra-estrutura
mencionada na Lei” (Rigatti,1983, p. 72).
Em 1959, a Lei Municipal de 557 passa a apresentar uma maior exigência
quanto às infra-estruturas exigidas e maior clareza quanto às definições de áreas e
equipamentos públicos a serem observados nos loteamentos, assim como seus
prazos de implementação e penalidades para transgressão ou não observância das
exigências da Lei. Tendo grande parte dos loteamentos do período aprovados,
seus efeitos somente puderam ser observados no período seguinte que, como
veremos adiante, não foram os esperados.
Desta forma, diferentemente dos municípios que, como Canoas, apresentam
grande importância econômica e industrial, Alvorada tem nos loteamentos da
década de 1950 uma espécie de reserva de terras de baixo custo, devido à
excessiva oferta de lotes (bastante acima da demanda, como veremos a seguir) e
pela inexistência de infra-estrutura, destinada à absorção dos migrantes cujo
trabalho, em sua maioria em Porto Alegre, não provê remuneração suficiente para a
aquisição da habitação na metrópole.
Analisando o processo de loteamento em Alvorada entre 1961 e 1965
(Quadro 08), ano de emancipação do Município, percebemos uma importante queda
no número de empreendimentos e nas áreas loteadas. Apesar do reduzido número
de loteamentos, a situação antes descrita não se alterou significativamente.
59
Dentre os 9 loteamentos do período, dois são rurais, mas que não se
consolidaram completamente desta forma. O sítio dos açudes hoje apresenta a área
de partes de seus lotes sendo parcelada com ocupações de baixa renda. o Sítio
Estância Grande, apresenta parte de sua área utilizada pelo Distrito Industrial
Alvorada-Viamão (DIAV).
Dentre os demais loteamentos, como pode ser observado na Figura 12,
correspondem ao preenchimento de pequenos vazios da malha de loteamentos,
com exceção da Stela Maris que, antes de se configurar como loteamento vizinho da
Vila Torotama em um futuro processo de integração, parece compartilhar com o
loteamento vizinho um dos primeiros processos de segregação intra-urbanos do
município de Alvorada.
Nome loteamento Ano
Aprovação
Número
lotes
Área
loteamento
(ha)
Área
lotes
(m
2
)
Características
Lotes
Vila Nova Setembrina 1961 249 12,58 360 Urbano
Vila Morumbi 1961 193 10,00 360 Urbano
Jardim Stella Maris 1962 731 43,31 360 Urbano
Vila Tuiuti 1962 179 10,01 360 Urbano
Sítio do Açude 1963 106 40,19 3400 Rural
Parque São Caetano 1963 885 48,17 360 Urbano
Vila Barcelos 1963 61 3,45 360 Urbano
Vila Cedro 1963 725 45,29 360 Urbano
Sítio Estância Grande
10
1964 194 67,99 3300 Rural
Total - 3.323 280,99
Quadro 08 Loteamentos aprovados entre 1961 e 1964. Fonte: Secretaria Municipal de
Planejamento Urbanístico e Habitação (SPH) de Alvorada. Elaborada por William da S. Papi.
A situação destes loteamentos, completamente afastados da área de
adensamento populacional, permanece precária até hoje, com pouca infra-estrutura,
altos índices de pobreza e de violência. A Vila Stela Maris, até início da década de
1983, não possuía pavimentação, a iluminação pública era extremamente precária e
10
Até 2005 o loteamento Sítio Estância Grande não teve nenhum dos seus lotes edificados, somente
os próximos a Av. Pres. Getúlio Vargas, antiga rua Cândido Pinheiro de Barcelos, conhecida
inicialmente como Estrada Passo dos Negros, que formam o Distrito Industrial da CEDIC, hoje
responsabilidade da SEDAI.
60
não existia rede pública de abastecimento de água potável, sendo disponibilizada a
água através de caminhões pipas
11
.
Ao final de 1965, percebemos que as áreas localizadas ao longo das
avenidas Presidente Getúlio Vargas e Frederico Dihl já estão loteadas formando
uma densa “mancha reservada a lotes habitacionais”, localizada próxima à divisa
com Porto Alegre em sua ligação com a Av. Baltazar de Oliveira Garcia.
Em relação a esta situação são necessárias algumas reflexões. A primeira
delas diz respeito ao uso do termo “mancha reservada a lotes habitacionais” ao
invés de mancha urbana, e a segunda diz respeito à constatação de que esta
mancha está diretamente ligada à conexão do município com a metrópole pela Av.
Baltazar de Oliveira Garcia, não sendo observado, neste período, grande interesse
pela conexão via Estrada Caminho do Meio (Av. Protásio Alves).
Como havia sido indicado antes, ao final de 1965, Alvorada apresenta seus
loteamentos estruturados apenas pela abertura de vias, sem qualquer infra-
estrutura, na grande maioria dos casos, e pelo estaqueamento. Além disso, como
veremos no próximo período, o índice de ocupação dos lotes aprovados é
extremamente baixo e está diretamente ligado a loteamentos próximos à Av.
Presidente Getúlio Vargas e à sua proximidade com Porto Alegre. Desta forma, o
continham em si os atributos e equipamentos que o configurassem como uma
mancha efetivamente urbana, tais como infra-estrutura (vias pavimentadas,
iluminação pública, redes de água e esgoto, etc.), comércio, equipamentos de
serviço público, ou mesmo, grande densidade de construções habitacionais. O
território do ainda Distrito passo do Feijó se configurou mais como uma mancha
de reserva para habitação, resultado da intensa atividade de pequenos
especuladores de terra do que um processo efetivo de configuração de um espaço
urbano.
11
Caracterizações pelo professor de Alvorada Carlos Augusto T. de Sá a partir do relato de sua mãe,
ex-moradora do bairro entre 1979 e 1983, quando se mudou para Canoas devido aos constantes
assaltos (Raízes de Alvorada, 2006: p. 268 e 269).
61
Figura 12 – Projetos de loteamento aprovados no período entre 1961 e 1964 indicados em roxo. Fonte: Secretaria
Municipal de Planejamento Urbano e Habitação de Alvo
rada
(SPH)
62
No entanto, apesar de, neste momento, o território de Alvorada ainda não
apresentar a efetiva configuração urbana, o município, e os loteamento são a prova
disto, participa deste processo de urbanização da RMPA. Além disso, durante este
período são determinadas fortemente as formas que o tecido urbano de Alvorada vai
assumir ao longo de sua trajetória.
Entre os fatores determinantes da configuração espacial intra-urbana de
Alvorada, além da inexistência de infra-estrutura, está a forma como as terras foram
parceladas. Analisando o Quadro 09, a partir dos estudos de Rigatti (1983), é
possível verificar que os agentes loteadores do Distrito Passo do Feijó são, na
sua grande maioria, pessoas físicas ou jurídicas de pequeno porte, muitas vezes
sem ligação direta com o mercado imobiliário, residentes em Porto Alegre. Esta
característica dos agentes loteadores nos leva a crer
12
que, pessoas com alto poder
aquisitivo passam a adquirir áreas de terra disponibilizadas a venda pelo
parcelamento das antigas fazendas existentes no Distrito, para posterior
parcelamento e venda de lotes para moradia.
Nome loteamento Agente Loteador Características Lotes
Chácara do Tordilho Carlos Lubisco e Cia. (POA) Rural
Vila São Pedro I Pedro Amandio Stumpf (POA) Rural
Vila Passo do Feijó Paulo da C. Silva e Flávio da C. Silva Urbano
Vila Torotama Gil Azambuja Fortuna Urbano
Vila São Francisco Francisco Marc. da Silva Urbano
Vila São Pedro II Ernesto Pedro Panitz (POA) Urbano
Vila União Armando Bernardi Urbano
Vila da Figueira Amantéa Machado e Cia. Urbano
Vila Central Celso Severino da Silva (POA) Urbano
Vila Fontoura Judith T. da Fontoura (POA) Urbano
Vila Taimbé Madeireira Taimbé Ltda. (POA) Urbano
Vila Maringá Maringá Com. e Imob. Ltda. (POA) Urbano
Vila Duas Figueiras Fortunato F. Zanotto (POA) Urbano
Vila Isabel Eduardo Cristiano Konrad (Viamão) Urbano
Vila Primavera Thalita M. Khun (POA) Urbano
12
A origem e as redes sociais de pequenos agentes loteadores são um ótimo tema para estudos mais
aprofundados buscando entender qual o papel dos pequenos agentes imobiliários e de suas relações
de cooperação/conflito com o grande capital imobiliário que hoje, cada vez mais, domina as relações
comerciais de loteamentos e da produção habitacional no ambiente urbano.
63
Vila Bela Vista Frederico Dihl (Viamão) Urbano
Vila Aparecida Fernando Silv. e outros (POA) Urbano
Vila Tijuca Pedro A. Godoy (Viamão) Urbano
Vila Icaraí José Axelrud (POA) Urbano
Vila Pindorama Olavo José Kuhn (POA) Urbano
Vila Primavera - prolongamento Calógero La Porta (POA) Urbano
Vila Maria Regina Arquimino M. de Souza (POA) Urbano
Vila Sumaré José Axelrud (POA) Urbano
Vila Jundiaí José Axelrud (POA) Urbano
Vila Intersul 1ª e 2ª etapas Cia. Intersul de Invest. (POA) Urbano
Vila Tupã Antônio S. Neto (Viamão) Urbano
Vila Caxambú Floriano P. Primo (POA) Urbano
Vila Maria Irmãos Francisconi e Cia. (POA) Urabno
Vila Formosa Afonso P. Feijó (POA) Urbano
Vila Agriter 1 Territorial Agrícola S/A (POA) Urbano
Parque Residencial Piratini Pedro A. Godoy e Rubens Assmus
(Viamão)
Urbano
Vila Jardim Salomé Podario V. Fereira Sob e Eva A. Barcelos
(POA)
Urbano
Vila São Lourenço Floriano P. Primo (POA) Urbano
Vila Intersul 3ª etapa Cia. Intersul de Invest. (POA) Urbano
Vila Jardim Maringá Arno da Silva Feijó (Viamão) Urbano
Vila Intersul 4ª etapa Cia. Intersul de Invest. (POA) Urbano
Vila Agriter 2ª fase Territorial Agrícola S/A (POA) Urbano
Vila Americana Imoiliária Americana (POA) Urbano
Vila Nova Setembrina Mucio M. de Oliveira (POA) Urbano
Vila Morumbi José Axelrud (POA) Urbano
Jardim Stella Maris Com. e Territ.Stella Maris (POA) Urbano
Vila Tuiuti Urbanizadora Urbi Ltda. (POA) Urbano
Sítio do Açude José Barcelos Guimarães e Norberto B.
Guimarães
Rural
Parque São Caetano Frederico Dihl (Viamão) Urbano
Vila Barcelos Átila Silva de Barcelos Urbano
Vila Cedro Eulio B. da Silva e José G. B. Paris Neto
(POA)
Urbano
Sítio Estância Grande Olinto J. de Oliveira (POA) Rural
Quadro 09 Agentes loteadores no período entre 1948 e 1965. Fonte: Rigatti, 1983. Elaborada por
William da S. Papi.
64
Sem qualquer intervenção ou mediação por parte da Prefeitura de Viamão, as
terras do Distrito foram sendo “esquartejadas” pelos diversos agentes loteadores
deste período de forma quase que aleatória, visto que a única orientação obedecida
nos loteamentos, diretamente ligada à atração exercida pela metrópole, é a ligação
dos lotes com as avenidas principais
13
. O resultado deste processo foi um espaço
totalmente fragmentado, visto que os loteamentos não eram contínuos, o que levou
Rigatti (2006, p.224) a intitular um de seus trabalhos de “Alvorada, ou de como se
constrói uma cidade aos pedaços”.
Por conseqüência, os loteamentos foram assumindo formas estreitas em
largura e de grande extensão em profundidade em relação à via principal. Muitas
vezes, as vias perpendiculares às vias estruturadoras do loteamento (mas paralelas
à Av. Presidente Getúlio Vargas) eram bastante distantes entre si. Além disso, a
maioria dos loteamentos o previa comunicações viárias entre si, como podemos
perceber pela figura 06, gerando quadras contíguas, mas cujo acesso passa a ser
distante.
Se analisarmos, por exemplo, as vilas Sumaré e da Figueira, percebemos
que, apesar de distarem aproximadamente 620 metros, apresentam ligação apenas
pelas Av. Pres. Getúlio Vargas e Itararé que distam uma da outra, em média,
aproximadamente 1,05 km. Desta forma o deslocamento interno entre as duas vilas,
à exceção da utilização de desvios por pequenas ruas, por vezes não pavimentada,
pode se aproximar de 1,5 km.
13
A Av. Presidente Getúlio Vargas, assim como as avenidas principais de muitos municípios do
interior, era e ainda é chamada por muitos moradores, principalmente os mais antigos e vindos dos
municípios do interior, de “faixa”, local onde não embarcava em transportes para a metrópole
como se adensava o pequeno comércio local.
65
Figura 13 Em destaque as vilas Sumaré, União, Taimbé, Icaraí e Da Figueira. Como percebemos
apresentamos loteamentos bastante estreitos e profundos, e com poucas conexões entre si. Ao sul a
Av. Presidente Vargas como a via mais larga em curva; e ao norte e paralela à Av. Itararé, a segunda
linha em vermelho. Fonte: Plano de Desenvolvimento Urbano e Ambiental de Alvorada. Elaborada por
William da S. Papi.
Até hoje praticamente inexistem vias alternativas paralelas com a Av.
Presidente Getúlio Vargas ou à Frederico Dihl. Ao norte, e formando um novo
corredor viário que liga Alvorada à Zona Norte de Porto Alegre via Vila Americana, a
Avenida Itararé apresenta-se como via alternativa, ligando-se ao bairro Sarandi de
Porto Alegre.
Entre as Avenidas Getúlio Vargas e Frederico Dihl, também poderíamos
destacar a Av. Dutra, que se inicia no entroncamento das avenidas citadas e se
estende até a Av. Maringá que, além de apresentar o hospital municipal em suas
proximidades, liga as três avenidas, possibilitando o acesso, via Estrada do Cocão à
RS-40 em Viamão.
Sendo assim, além de acumular problemas ligados à falta de infra-estrutura e
da pequena quantidade de espaços reservados para equipamentos e espaços
públicos, a configuração do espaço intra-urbano de Alvorada acumula ainda o
problema da baixa conectividade entre as diferentes vilas o que reforça a condição
de cidade dormitório.
66
Esta característica do espaço urbano de Alvorada, de um lado, privilegia o
surgimento de um grande número de pequenos estabelecimentos comerciais no
interior das pequenas vilas, reforçando o consumo local das mercadorias básicas.
De outro, a distância significativa entre a vila e a área central do município, torna
mais atrativa a compra de mercadorias na capital, seja pelo comércio mais
diversificado, seja pela possibilidade de aproveitamento do tempo de intervalo ou
mesmo após o término do turno de trabalho para o consumo na capital, dificultando
a formação e o uso de um centro urbano local.
Além das implicações para a mobilidade urbana e para o desenvolvimento do
comércio e serviços locais, a baixa conectividade entre vilas viabiliza a constituição
de territórios de controle paralelo (que serão abordados no próximo capítulo), devido
à estruturação de um espaço fragmentado e desconexo, mesmo internamente,
facilitando o controle territorial de grupos sociais vinculados ao tráfico e demais
formas de criminalidade.
Entretanto, nos parece que neste período estas questões ainda não estão
postas, visto que ainda estamos falando de décadas anteriores à de 1970, período
em que Alvorada ainda não havia se emancipado e em que a criminalidade ainda
era incipiente. Desta forma, neste momento, nos interessa o fato de como este
fenômeno explica mais diretamente a produção e a configuração que o espaço intra-
urbano de Alvorada vai assumir nas décadas seguintes, a partir de sua relação com
a metrópole.
As formas desconexas internamente e fortemente ligadas às avenidas
principais assumidas pelos loteamentos habitacionais, que ainda não haviam se
consolidado enquanto ocupação, materializam, na verdade, as relações de
polarização que Porto Alegre exerce sobre Alvorada. Na verdade, são loteamentos
projetados para a circulação de trabalhadores que através destas avenidas se
deslocam à capital, seja como força de trabalho, seja como consumidor, no centro
de Porto Alegre ou mesmo nos sub-centros comerciais, em especial, ao existente na
Av. Assis Brasil (Passo da Areia), devido a sua proximidade.
Sendo assim, o processo de loteamento do território de Alvorada até a sua
emancipação, reflete a função que o município vai assumindo dentro da hierarquia
urbana da RMPA: a de cidade dormitório, com sua estrutura voltada para os
movimentos pendulares de trabalhadores de Porto Alegre.
67
Após sua emancipação, Alvorada vai passar aproximadamente 15 anos sem
aprovar loteamentos. Este fato é resultado, como destacado antes, de
características deste período: o de intensa especulação imobiliária sem a efetiva
demanda por lotes.
3.2 Alvorada: Ocupação e os Novos Padrões de Loteamento
No período entre 1948 e 1964, os loteamentos apresentam áreas
relativamente pequenas e os agentes loteadores são, em sua grande maioria,
pessoas físicas que adquiriram lotes através do parcelamento de antigas fazendas.
Em momentos subseqüentes, alguns destes agentes loteadores vão
apresentar grande peso político no município. Com poucas exceções, a grande
maioria dos loteadores do território alvoradense é residente em Porto Alegre.
Entretanto, verificamos que parentes, ou mesmo os próprios loteadores, passam, a
partir de 1965, a figurar na vida política de Alvorada, sobretudo aqueles residentes
no município de Viamão.
Através da Lei 5026, de 17 de setembro de 1965, o Distrito Passo do
Feijó é emancipado, tornando-se o município de Alvorada. Segundo relato de Irineu
Luiz da Silveira
14
, um dos líderes do “movimento” de emancipação do município foi
Elisardo Duarte Neto, vereador na primeira legislatura do município e prefeito de
Alvorada entre os anos de 1973 e 1977. Elisardo Duarte Netto era genro de
Frederico Dihl, que fora prefeito de Viamão, assim como agente loteador no
município, dono dos loteamentos Vilas São Caetano e Bela Vista, além de receber
em homenagem o nome da segunda principal avenida do município.
Entre 1969 e 1973, o prefeito do município de Alvorada foi Pedro Antônio
Godoy, eleito novamente em 1989, residente em Viamão e, como vimos no Quadro
9, loteou as Vilas Tijuca e Piratini. Seu vice-prefeito era Normélio Pereira Barcellos,
herdeiro de proprietários de terra na região e parente de loteadores.
Na primeira legislatura dentre os sete representantes legislativos, um era da
família Feijó (Cláudio Lopes). Além das candidaturas, Rigatti destaca ainda que ...
vários membros da família Feijó foram prefeitos ou tiveram cargos públicos.”(1983,
p.89). As famílias Feijó e Barcelos figuram até hoje na vida política do município. Em
14
Relato reproduzido por Vera Lúcia Maciel Barroso (historiadora e professora da Faculdade de Porto
Alegrense - FAPA , Porto Alegre-RS) em Raízes de Alvorada, 2006: p. 117)
68
fins da cada de 1980, Léo Barcelos foi eleito prefeito de Alvorada e seu filho
Márcio Barcelos, desde 1997 vem sendo eleito como vereador, e atualmente ocupa
a pasta da Secretaria Municipal de Captação de Recursos e Investimentos (SMCRI).
Desta forma, se verifica a íntima relação entre posse da terra e o poder
político do município. Além de capitalizar peso político através da venda dos lotes,
esta relação é bastante intrigante, visto que os loteamentos eram aprovados pela
própria prefeitura, sendo possível, desta forma, deduzir os motivos pelos quais o
poder público se eximiu do papel licenciador e fiscalizador dos projetos de
loteamento no município.
Retomando a análise do processo de produção e configuração do espaço
intra-urbano de Alvorada, após sua emancipação em 1965, o município passa por
um período de aproximadamente 15 anos sem apresentar um projeto de loteamento.
A partir do que foi posto para o período anterior, podemos elencar alguns fatores
que contribuem para esta situação.
Em primeiro lugar, a década de 1950 se configura como um período de
intenso processo de loteamento em grande parcela dos municípios da região
metropolitana. Além disso, durante as cadas de 1950 e 1960, foram emancipados
10 municípios hoje pertencentes à RMPA, dos quais três, estão localizados entre
Porto Alegre e Novo Hamburgo: Cachoeirinha, Esteio e Sapucaia do Sul. Desta
forma, a oferta de lotes para habitação, além daquelas oferecidas pelos demais
municípios da conurbação já constituídos há mais tempo (Canoas, Gravataí, Guaíba,
Viamão, entre outros) supera em muito a demanda da época. Como conseqüência,
muitos são os lotes disponíveis à compra e construção de residências. Rigatti (1983,
p. 169), com base nos estudos realizados em 1972 pela Prefeitura Municipal de
Alvorada para cobrança do IPTU, evidencia que:
Observando os resultados por loteamento, temos que, dos 46 considerados,
apenas 7 possuem ocupação dos lotes superior a 50%. Em relação ao total,
28,70% dos lotes são ocupados e 71,30% são vagos, podendo-se constatar
que a grande oferta de terra para habitação, até 1972, não tem
correspondência com a população que, de fato, ocupa os lotes.
Em segundo lugar, Rigatti (1983) destaca ainda o papel da legislação
existente para os loteamentos que passa a ser mais rígida em suas exigências em
infra-estrutura, tornando assim a implantação do loteamento mais cara.
69
Como visto anteriormente, em 1959, Viamão promulga uma lei de
parcelamento do solo relativamente rígida, prevendo a implantação infra-estrutura,
prazos para sua implantação, áreas verdes e institucionais, assim como penalidades
para o descumprimento. Apesar disso, na pratica, no Distrito Passo do Feijó,
estes regramentos não foram observados na aprovação dos loteamentos ou, quando
foram, não foram implementadas na grande maioria dos loteamentos.
Alvorada, após sua emancipação, promulga a Lei 20 de 1969 regrando o
parcelamento do solo, diminuindo a área mínima dos lotes para 300 m
2
, frente aos
360m² determinados pela Lei nº225/52 (RIGATTI, 1983, p. 71). Como bem observa
Rigatti (1983, p. 76) o tamanho mínimo dos lotes é reduzido para 275m
2
, pela Lei
75/1980, e, em menos de seis meses, para 175m
2
com a Lei 78/1980, o que vem
a privilegiar a aprovação do projeto do loteamento Algarve, então do grupo
Bolognesi, aumentando em quase duas vezes o número de lotes por área, em
relação à legislação anterior, ainda no período em que o município pertencia ao
território de Viamão.
Entretanto, mesmo com a redução das exigências da nova lei, inclusive no
que diz respeito à discriminação dos regramentos e prazos para implementação,
assim como de punições e multas para o descumprimento da lei, o município
voltou a receber novos projetos de loteamento em 1979.
Neste mesmo ano, o Governo Federal sancionou a Lei Federal nº. 6.766, que
regulamenta o parcelamento e o uso do solo. Maricato (1987, p.73) sinaliza bem o
papel que os municípios terão com esta lei:
Em rápidas palavras, se antes da lei os executivos municipais queixavam-se
de não ter instrumentos para a punição dos loteadores faltosos, depois da
lei não permanece a desculpa: ela atribui ao poder municipal a faculdade de
incriminar os loteadores clandestinos.
Desta forma, a lei que tinha como objetivo dotar os municípios de atribuições
fiscalizatórias e punitivas reflete em Alvorada de forma negativa. Baseado na Lei
Federal que exige um mínimo de 125 , o município reduziu as restrições para os
loteamentos urbanos em 1980, assim como permaneceu inalterada a situação da
fiscalização municipal, tendo em vista a ausência do poder público na exigência de
cumprimento das regulamentações sobre o parcelamento do solo.
70
Como havia já referido, a falta de infra-estrutura permanece até hoje como um
problema grave do município, apesar de se evidenciarem ações no sentido
reverter este quadro a partir da década de 1990. Portanto, as exigências
regulamentares relativas ao parcelamento do solo instituídas pela lei, parecem não
ter grande papel na diminuição do número de loteamentos no período, assim como,
da falta de infra-estrutura dos loteamentos já existentes.
Em terceiro lugar, e ligado ao aumento das exigências em infra-estrutura, o
início da década de 1960 é um período conturbado com crescimento da inflação, o
que torna mais atraente a retenção da terra, cuja valorização é mais segura. Além
disso, a implantação do lote implica em investimentos, cujo retorno é relativamente
demorado, visto que a oferta, na RMPA no período, é grande, o valor é parcelado
pelo próprio agente em até cem vezes
15
e a concentração de renda, característica
do crescimento econômico brasileiro, dificulta a aquisição dos lotes por parte da
população.
A partir de 1979, são retomados os investimentos em loteamentos no
município de Alvorada. Entretanto, diferente do período anterior, alteram-se os perfis
de loteamento do espaço urbano de Alvorada. A partir do Quadro 10, podemos
perceber a existência de dois projetos de loteamento de grandes dimensões: o
Jardim Algarve, com previsão de 15 mil lotes, e o Parque Residencial Umbu, com
previsão de 8 mil lotes. Somados, totalizam 23 mil lotes, ou seja, quase igualam o
número de lotes aprovados até 1965, sendo que o período entre 1979 e 1983
supera em mais de 5 mil lotes o período anterior.
Na verdade, este fato expressa a mudança do perfil dos agentes loteadores
que atuam em Alvorada. Dentre os fatores principais que levam a esta mudança no
perfil dos agentes e dos projetos de loteamentos urbanos não só em Alvorada, como
em outros municípios da RMPA, estão a ação do Sistema Financeiro da Habitação
(SFH), através do seu principal órgão financiador de empreendimentos
habitacionais, o Banco Nacional de Habitação (BNH) e a nova tendência da política
habitacional do país.
15
Dados fornecidos por Rigatti (1983, p 151).
71
Nome loteamento Ano
Aprovação
Número
lotes
Área
loteamento
(ha)
Área
lotes
(m
2
)
Características
Lotes
Vila Vasconcelos 1979 41 1,78 300 Urbano
Jardim Três Figueiras 1979 82 4,51 300 Urbano
Jardim Porto Alegre 1979 1035 63,29 300 Urbano
Jardim Alvorada 1979 707 44,66 360 Urbano
Parque Residencial Umbu 1980 8000 584,00 250 Urbano
Vila Nossa Senhora
Aparecida
1980 1065 63,55 300 Urbano
Algarve 1980 15000 478,36 175 Urbano
Água Viva 1983 273 17,41 330 Urbano
Germânia I e II 1983 443 7,87 Variável Urbano
Conjunto Habitacional
Salomé
1983 1036 58,79 240 a 500
Urbano
Jardim Esplanada 1983 135 8,00 300 Urbano
Nova Americana 1983 976 38,40 144 Urbano
Parque Madepinho 1983 178 9,00 300 Urbano
Total - 28971 1379,62 - -
Quadro10 Loteamentos aprovados entre 1979 e 1989.Fonte: Secretaria Municipal de Planejamento
Urbanístico e Habitação (SPH) de Alvorada. Elaborada por William da S. Papi.
Maricato (1987), analisando a atuação do BNH no processo habitacional,
identifica três linhas de atuação que oscilam em importância entre 1965 e 1983: o
financiamento habitacional, o de desenvolvimento urbano e de grandes obras de
nível regional. Ao nosso estudo, interessa entender de que forma estas linhas
atuaram tanto no financiamento de empreendimentos voltados às classes mais
populares (na faixa de 1 a 3 salários mínimos), através principalmente das
Cooperativas Habitacionais (COHAB), e aqueles voltados às classes populares com
renda superior aos três salários mínimos e suas relações com os investimentos em
infra-estrutura.
Em Alvorada, a década de 1980 apresenta importante mudança no processo
produção do espaço intra-urbano: o financiamento do BNH passa definir as
necessidades a serem contempladas nos projetos de loteamentos, mesmo os
privados, que além da infra-estrutura passam a contemplar a unidade habitacional
implantada.
72
Os fracassos identificados por Maricato (1987) nos empreendimentos da
década do final da cada de 1960 fizeram com que os projetos voltados para
classes populares fossem retomados em meados da década de 1970, com o
Plano Nacional de Habitação Popular de 1973 e a retomada das COHAB’s.
Desta forma, em Alvorada os dois maiores projetos de loteamentos do
período, os loteamentos Parque Residencial Umbu e Jardim Algarve foram
realizados pela iniciativa privada, com financiamento do BNH, e voltado ao público
com renda superior a três salários mínimos.
Em 1980, foi aprovado o projeto de loteamento do Parque Residencial Umbu,
o segundo maior projeto de loteamento existente no município. Com projeto previsto
para 8.000 unidades habitacionais, o loteamento apresenta somente sua “1º etapa”
implantada. Além disso, grande parte dos lotes foi ocupada de forma irregular.
Vários são os fatores que explicam este processo. O primeiro está
diretamente ligado às condições para compra da unidade habitacional. A restrição
gerada pela exigência de uma renda superior a três salários mínimos faz cair por
terra a real capacidade de aquisição por parte da população do município. Como
vimos, segundo Plano Diretor de 1980 (p.61), 92% da população de Alvorada
apresentava renda salarial de até três salários mínimos.
Em segundo lugar vem a questão da localização do loteamento. O Parque
Residencial Umbu está bastante afastado da área central do município e de Porto
Alegre, como pode ser observado na Figura 14. O acesso é possível por uma rua
sem pavimentação entre o parque Madepinho e a Vila Tijuca ou pela rua Barbosa
Neto, na Estrada Cândido Pinheiro de Barcelos, prolongamento da Av. Presidente
Vargas que acesso ao loteamento Estância Grande e aos Distritos Industriais.
Desta forma, a população com renda mais elevada possui inúmeras possibilidades
mais vantajosas não no município, através da compra de lotes ainda vagos, mas
também nos demais municípios da RMPA.
Dentre as opções que o próprio município passa a apresentar encontram-se
novos loteamentos como o Jardim Porto Alegre, Jardim Alvorada e Jardim Algarve
que, através do financiamento do SFH, disponibilizam quase a totalidade da infra-
estrutura em seus loteamentos, mesmo que muitas vezes insuficientes, tais como
vias urbanas pavimentadas, esgoto pluvial, esgoto cloacal parcialmente tratado,
iluminação pública entre outros, também comercializados por empresas privadas
financiadas pelo BNH.
73
Figura 14 – A área em vermelho ao nordeste da Av. Pres. Getúlio Vargas as vilas Salomé e Umbu, separados pelo arroio
Águas Belas. Ao sul da Av. Frederico Dihl, em vermelho os loteamentos Jardim Algarve, Jardim Porto Alegre e Vila
Nossa Senhora Aparecida. Fonte: Secretaria Municipal de Habitação de Alvorada
74
Se analisarmos a localização do loteamento Algarve, o maior projeto
imobiliário do município, com 15 mil unidades habitacionais previstas, percebemos
que além de ser dotado de maior infra-estrutura, também se encontra mais próximo
à Porto Alegre, cujo deslocamento se pelo caminho: rua Hermínio Machado,
conexão com rua Tiradentes (Intersul), até a Av. Fredertico Dihl, que se liga A Av.
Pres. Getúlio Vargas próximo à ponte que divide os dois municípios. Entretanto,
ganha em importância uma terceira via de acesso à capital: o Caminho do Meio,
prolongamento da Av. Protásio Alves de Porto Alegre, que irá se consolidar no
período seguinte, com a implantação da segunda da fase do projeto, o Porto Verde,
sob o domínio da Habitasul. Por outro lado, o loteamento fica distante da área
central do município, e, além da distância, não apresenta nenhuma conexão viária
que o ligue diretamente com esta área do município.
Outra questão relevante é que no Jardim Algarve se verifica um fenômeno
bastante comum em grande parte dos municípios brasileiros, no que diz respeito a
habitações financiadas pelo BNH. Com a crise econômica da década de 1980,
grande parte dos mutuários passou a acumular dívidas pela incapacidade de pagar
as prestações do parcelamento assumido. Da mesma forma, se observou a
intensificação do processo de ocupações irregulares em grande parte da Vila Umbu,
e da fase do Jardim Algarve, que tiveram seus lotes ocupados de forma irregular,
como previa Rigatti (1983, p.162). Segundo Rapkiewicsz (2006, p. 283), ao final
da década de 1980 o Jardim Algarve passa a apresentar de três grupos de
moradores:
Os mutuários em dia com a prestação da casa própria; os mutuários
inadimplentes, que devido a dificuldades e aos aumentos das prestações
nas prestações , não estavam conseguindo negociar, correndo o risco de
serem despejados e o outro grupo de moradores: os invasores. Com as
invasões, muitas família que foram despejadas, se abrigaram nas margens
do arroio Feijó. Nasce então a vila Samaritana e, posteriormente, outras
vilas relâmpago.
Mesmo com a aprovação dos projetos de loteamento, parte dos lotes do
Jardim Algarve ( fase) e da Vila Umbu (2ª e etapa) a hoje não foram
implantadas, como pode ser observado na figura 15. Apesar da existência de infra-
estrutura urbana, a fase 1 do jardim Algarve apresentou grandes problemas durante
a década de 1980. Com a Lei Municipal nº. 75, aprovada em 1980, a Bolognesi
conseguiu aprovar lotes com apenas 175m², ou seja, com menos da metade da área
dos primeiros lotes do município.
75
Figura 15 – Em azul as parcelas dos loteamentos Umbu (ao nordeste) e Algarve (ao sul) que ainda não foram implantados. Fonte:
Secretaria Municipal de Planejamento Urbanístico e Habitação de
Alvorada
(SPH)
.
76
Com terrenos estreitos (7mx25m), as pequenas casas construídas (tanto em
dimensões como em altura, como pode se observado na Figura 16), ao longo do
tempo, foram recebendo novos anexos com as mais diversas características de
construção, o que tornou muitas delas mais insalubres pela falta de áreas livres para
melhor iluminação solar e circulação de ar.
Além das características habitacionais, os problemas relativos ao transporte
público, iluminação pública, qualidade das redes de infra-estrutura e precariedade na
prestação de serviços públicos sociais eram problemas existentes não no Jardim
Algarve, como na grande maioria das vilas do município, principalmente as mais
afastadas. Desta forma, a crise econômica e a precariedade das condições de vida
presentes ao longo da década de 1980, impulsionaram a formação de Associações
de moradores nas mais diversas vilas, do Parque Residencial Umbu, aos jardins
Alvorada e Algarve.
Figura 16 – Foto de unidades habitacionais existentes no Jardim Algarve. É perceptível a altura do
direito extremamente baixa e com telhado sem inclinação.
77
Observamos, portanto, que mesmo os novos projetos de loteamentos
voltados para classes populares de faixa salarial acima da grande maioria dos
habitantes de Alvorada, apresentam, neste período, dificuldades de consolidação
pela sua baixa conexão com outras vilas e bairros, pela ausência de transporte
público e pela ineficiência de certos serviços.
Em 1982, surge o primeiro loteamento voltado à faixa salarial de até três
salários mínimos, a Cooperativa Habitacional (COHAB) Campos Verdes. Primeiro e
único do município, hoje é denominado COHAB Salomé, e chamado pela população
local de Onze de Abril, homenagem à data da ocupação das unidades habitacionais
que ocorreram nesta data no ano de 1987, como veremos no capítulo seguinte.
Separado do Parque Residencial Umbu pelo arroio Águas Belas, a COHAB
teve suas obras paralisadas por dívidas com a Prefeitura Municipal e posterior
falência. O Conjunto Habitacional Salomé obedeceu ao mesmo processo de
periferização de grande parte dos COHAB’s da RMPA, em área próxima a
ocupações irregulares existentes na Vila Salomé, alagadiça e praticamente às
margens do arroio, com uma distância inferior à 10m de sua margem.
Desta forma, o período entre a emancipação de Alvorada como município e o
final da década de 1980, apresenta dois momentos marcantes: a ausência de
projetos de loteamentos até 1979, e, a partir deste ano, a ação de empresas
imobiliárias que financiadas pelo BNH, passam a implantar loteamentos com a
unidade habitacional já construída e com infra-estrutura básica.
Entretanto, até este período, percebemos que Alvorada, apesar da
implantação de dois Distritos Industriais e da passagem de uma população de
aproximadamente 40 mil habitantes em 1970 para 142 mil habitantes em 1991, não
apresenta grandes mudanças no que diz respeito à sua configuração sócio-espacial.
Durante o período o que se verifica é a melhoria da infra-estrutura das áreas
mais centrais, como o asfaltamento da Av. Presidente Vargas, a extensão das redes
de água, iluminação e transporte público para os bairros mais periféricos e mesmo
vilas que surgiram pela ocupação irregular ou loteamentos clandestinos.
Além disso, podemos observar que, a característica do espaço urbano de
Alvorada “aos pedaços”, com pequenos loteamentos fragmentados, foram surgindo
no interior de algumas vilas pequenos centros comerciais de material de construção,
armazéns, farmácias, como por exemplo, o da Vila Americana constante (Figuras 17
e 18)
78
Figuras 17 e 18 Pequeno centro comercial na Vila Americana com farmácias, loja de materiais de
construção, pequenos bazares, mini-mercados entre outros.
Entretanto, a partir da cada de 1990, o município passará por novas
transformações que mudarão o padrão de ocupação do município, com o surgimento
de loteamentos voltados a classe média, com a consolidação e ampliação da Av.
Pres. Getúlio Vargas como centro comercial e com uma nova dinâmica na entrada
da cidade”.
3.3 Reestruturação da RMPA e Alvorada: da Segregação Interurbana à
Segregação Intra-urbana?
Atualmente, Alvorada apresenta grande parte de sua área urbana
consolidada. Além do processo de aquisição de lotes e de ocupação irregular de
lotes não consolidados ou de áreas verdes não loteadas, durante este período
ocorreram apenas 4 novos projetos de loteamentos, como pode ser observado na
Figura 19. Estes quatro loteamentos são implantados em alguns vazios urbanos
existentes entre loteamentos já previstos ao longo de, aproximadamente 50 anos.
79
Figura.19 As áreas em azul representam os loteamentos do período citado. Fonte: Secretaria Municipal de Habitação de
Alvorada
(SPH)
80
Entretanto, neste período, os fenômenos mais relevantes relativos à produção
do espaço urbano de Alvorada, não estão em si nos projetos de loteamentos
habitacionais, mas sim, no processo inicial de ocupação diferenciada dos lotes. Ou
seja, de um processo inicial de segregação sócio-espacial em nível intra-urbano,
assim como na busca do município de ampliar suas funções urbanas movimentando
transformações em sua configuração espacial.
Se por um lado, a crise econômica brasileira observada ao longo das décadas
de 1980 e 1990 intensificou a proliferação de ocupações irregulares, assim como de
invasões, como o da COHAB da Vila Salomé, de outro, é a partir deste período que
as classes médias passam a sair da metrópole, buscando moradia em municípios no
entorno.
A escassez relativa de terrenos para habitação e o intenso processo de
verticalização observado na capital (que além de apresentar valor relativamente alto,
implica ainda em pagamento taxa de condomínio, fatura muitas vezes bastante alta
em relação ao orçamento dos trabalhadores pela prestação de serviços de
segurança, jardinagem, iluminação, manutenção, entre outros), tornam atrativos os
municípios metropolitanos, cujo preço da unidade habitacional ou do lote para
construção é bem mais baixo. Além disso, outros são os fatores que passam a
influenciar este processo.
A proximidade ao posto de trabalho, em alguns casos já deslocado para os
municípios metropolitanos, a serviços e áreas comerciais, assim como o suposto
aumento da qualidade de vida propiciados pelo trânsito menos intenso e pela
abundância de áreas verdes, o importantes elementos que, pelos menos
ideologicamente, ajudam a valorizar estes novos espaços.
Respondendo a este processo, a partir do final década de 1990, os
loteamentos da segunda fase do loteamento Algarve, que assumido pela Habitasul
passou a ser comercializado como Porto Verde, passa a atrair uma população de
outro perfil em relação ao observado em grande parte da população que procurou
Alvorada como domicílio durante as décadas anteriores.
Diferentemente do Jardim Algarve, com pequenas casas que foram sendo
ampliadas sem qualquer padrão de construção, o Porto Verde apresenta hoje
parâmetros mínimos determinados (Figuras 20 e 21).
81
Figuras 20 e 21 à esquerda temos a imagem de satélite dividindo os loteamentos Algarve e
Porto Verde. À direita, casas do Porto Verde. É possível perceber o alto padrão das construções
com dois andares, alvenaria
1
e telhados de barro.
82
No início do projeto de implantação dos primeiros lotes, o Porto Verde
oferecia as unidades habitacionais construídas, modelo que foi abandonado.
Atualmente, a Habitasul vende apenas o lote determinando que a construção deva
ser feita de alvenaria e com telhado de barro, buscando inibir a construção de
unidades habitacionais com padrão arquitetônico que venha a depreciar o valor do
local, o que na verdade pretende determinar o padrão sócio-econômico dos novos
moradores, evitando ocupações por parte da população mais empobrecida. Desta
forma, neste local se espalham sobrados que, apesar do tamanho reduzido dos
lotes, apresentam padrões arquitetônicos presentes em qualquer bairro de classe
média da capital.
Além da diferença nos padrões arquitetônicos, verificamos ainda grande
diferença no padrão urbanístico. O Porto Verde apresenta grandes áreas verdes em
junto à Av. Zero Hora, principal via de estruturação do loteamento, e em seu
entorno, além de um pequeno shopping
16
e uma praça de alimentação (Figuras 22 e
23). O pequeno comércio local é verificado no Jardim Algarve, a partir da Rua
Antônio Carlos Jobim que divide os dois loteamentos. Desta forma, o Porto Verde
especializa seus lotes para o uso habitacional, oferecendo em sua área central
alguns equipamentos de maior porte.
As características do loteamento Porto Verde deixa claro que o blico alvo a
ser atraído para o local o os setores da classe média e que possam, em seu
bairro, ter acesso ao comércio e a utilização de espaços públicos que propiciem
maior qualidade de vida, ao estilo dos subúrbios norte-americanos.
Além de preço atraente em relação à capital, um lote no local custa em torno
de R$ 24 mil reais, oferece um ambiente distante do centro urbano, se comunicando
com Porto Alegre através do Caminho do Meio, prolongamento da Av. Protásio
Alves cujo trânsito é bem menos intenso, viabilizando uma rápida conexão com a
capital.
16
Segundo as informações obtidas junto a Habitasul, o shopping ainda não está em funcionamento
integral devido a falta de demanda, visto que o Porto Verde ainda não implantou grande parte dos
seus lotes. Entretanto, deve-se ressaltar a existência de público com perfil de uso deste tipo de
espaço no próprio Jardim Algarve, ou mesmo em bairros próximos como a Intersul, Jardim Alvorada e
Jardim Porto Alegre. A investigação de quais fatores fazem com que este shopping ainda não
funcione em sua plenitude pode auxiliar a entender em que medida isto reflete a íntima relação
destes moradores com a procura de espaços de lazer e consumo em Porto Alegre, ou com a
estigmatização de um padrão de shopping Center como um grande empreendimento com grande
“diversidade” de lojas e pessoas de diversos lugares, tais como Iguatemi, Praia de Belas, Bourbon
Country, entre outros.
83
Figuras 22 e 23 – Shopping e praça de alimentação existentes no Porto Verde.
Além do surgimento do loteamento do Porto Verde, as áreas mais próximas à
Av. Presidente Vargas, passam, a partir principalmente da presente década, a
apresentar importante valorização. É possível perceber atualmente o surgimento de
casas novas, bem estruturadas, muitas vezes de dois andares, além de alguns
poucos e pequenos edifícios ao entorno da região central, em meio a casas.
Desta forma, estas vilas estão se apresentando cada vez mais heterogêneas
enquanto característica sócio-econômica e espacial. A melhoria na qualidade de
vida e/ou a mudança do padrão de pessoas que adquirem lotes ou casas na região
vem fazendo com que ao lado de casas simples, de parcela da população bastante
empobrecida ou de migrantes que fixaram residência no local desde longa data,
surjam novas construções de padrão bastante elevado (Figuras 24 e 25).
Este crescente processo de ocupação do espaço urbano por parte da classe
média no município passa a estimular a ampliação do corredor comercial
estabelecido ao longo da Av. Pres. Getúlio Vargas, assim como a consolidação de
um centro. Localizado entre as ruas Flor da Serra Futebol Clube e a rua Porto Rico,
como definido pelo zoneamento de uso do solo do Plano Diretor do município (Lei
Municipal 1137/2000, anexo XII), assim como pela estrutura que apresenta.
84
Figuras 24 e 25 Na mesma rua, localizada a uma quadra do centro comercial, casas de
padrão sócio-econômico bastante desigual, mostrando o processo de substituição das
classes mais pobres por moradores de maior poder aquisitivo.
85
O centro apresenta em seu interior dentre outras instituições públicas a
Prefeitura Municipal e a Praça Central (Figuras 26 e 27), duas escolas estaduais de
Ensino Médio (Antônio de Castro Alves e Senador Salgado Filho), o Fórum
Municipal, o Ministério da Justiça, e algumas Secretarias e Departamentos da
administração pública.
Figuras 26 e 27 À esquerda a praça central aparecendo ao fundo em tom salmão o Fórum do
município. À Direita o prédio da Prefeitura Municipal.
Entre os estabelecimentos de serviços comerciais e financeiros, encontram-se
as agências bancárias, escritórios de advocacia e contábil, clínicas médicas e
dentárias, centros estéticos entre outros. O comércio consiste em auto-peças, lojas
credenciadas de operadoras da telefonia móvel, de móveis e eletrodomésticos,
vestuário e calçados de conhecidas redes que apresentam filiais em diversos
municípios da RMPA. Apesar de não ser o foco do trabalho, cabe aqui apenas uma
pequena constatação. As Casas Bahia se instalaram, a menos de três anos, no
início da aglomeração comercial central e recentemente fechou suas portas, apesar
de ter como característica a venda parcelada com baixo valor e longo prazo de
pagamento, visando o público consumidor de baixa renda, que é característica da
população alvoradense.
De forma menos concentrada, o corredor central formado pela Av. Pres.
Getúlio Vargas se estende até Rua Wenceslau Fontoura, onde encontramos além do
comércio, de menor porte do que o verificado no núcleo central, mas com crescente
renovação e demolição de velhas e pequenas construções degradadas para
construção de novas instalações comerciais, as demais Secretarias e instituições da
administração pública municipal (concentradas em grande parte na Av. Wenceslau
86
Foutoura), o Ginásio Municipal e a garagem da empresa de transporte público
metropolitano do município.
Podemos ressaltar que se comparado com outros municípios, o centro de
Alvorada ainda é bastante limitado, em dimensões e serviços prestados. Este fato
pode ser explicado por diversos fatores. Em primeiro lugar, podemos destacar o fato
de que este movimento ainda é recente, e que, portanto, estes serviços e comércio
especializados podem ser absorvidos aos poucos ao longo dos próximos anos.
Em segundo lugar, temos como um dos fatores determinantes, possivelmente
o principal, o ainda baixo poder aquisitivo da população do município como um todo,
o que, unido aos pequenos núcleos de consumo nos bairros e vilas mais distantes e
ou isoladas, tem como principal conseqüência a baixa capacidade de consumo e
acesso aos serviços mais especializados e caros.
Em terceiro lugar, e diretamente articulado ao elemento anterior, temos a
grande atração por parte da metrópole, seja pelo centro de Porto Alegre, seja pelo
sub-centro comercial da Av. Assis Brasil. A pequena capacidade de consumo de
serviços com maior valor agregado e menos “essenciais” à reprodução básica das
condições de vida, as grandes redes de comércio e serviços especializados,
shopping center, cinema, permanecem atraindo esta pequena demanda em suas
unidades na capital que ainda se apresenta bastante próxima em relação ao
município de Alvorada e ao seu habitante que trabalha em Porto Alegre.
Contrariando a tendência acima descrita, o Hipermercado BIG se instalou na
entrada do município, junto à ponte limítrofe com Porto Alegre, impulsionando não
a implantação de um centro comercial com lojas de materiais de construção,
revenda de motos, entre outros, de um pequeno parque aquático e de um centro
esportivo
17
, como também um novo tipo de ocupação nesta área da cidade.
A localização do hipermercado o tornou capaz, e provavelmente foi projetado
exatamente para isto, de atrair além dos alvoradenses, os consumidores de bairros
de Porto Alegre como Parque dos Maias, Jardim Leopoldina e Rubem Berta que se
encontram mais próximos de Alvorada do que da matriz da loja na Avenida Sertório,
em Porto Alegre.
17
Este centro esportivo foi, na realidade, criado para a formação do time Alvorada-RS, fundado pelo
ex jogador, hoje técnico de futebol Paulo César Carpegiani, mas o projeto foi abandonado a poucos
anos, restando as quadras e campos de futebol alugados para partidas de futebol amador.
87
Como discutido anteriormente, para Villaça (2001) os municípios
metropolitanos se comportam antes como bairros da metrópole do que cidades. Isso
é verificado o pelas relações econômicas ou espaciais, mas também sociais,
pois grande parte destas relações se na metrópole, visto a inexistência de
espaços de lazer, consumo e serviços em seus limites.
Na busca de consolidar uma identidade enquanto município, e não apenas
como bairro pobre da capital, foi implantado na entrada de Alvorada um arco com o
símbolo da cidade: o nascer do sol percebido pelos operários ao se deslocarem ao
trabalho (Figura 28). Apesar de não se tratar de um caminho comum, visto que a
locomoção pelo início da manhã se no sentido Alvorada-Porto Alegre, ao chegar
em Alvorada pela Av. Baltazar de Oliveira Garcia ao nascer do sol, percebe-se que
este se ergue sobre o a imagem do sol do arco, presenteando quem chega com uma
bela imagem.
Figura 28 – Vista da entrada do município de Alvorada a partir da Av. Baltazar de Oliveira Garcia
88
Além do arco, a atual gestão definiu o slogan do município como “Capital da
Solidariedade” por simbolizar a forma como o município teria recebido os migrantes
do interior do estado, que constituem grande parte da população alvoradense.
Neste sentido, este slogan acaba sendo mais representativo do processo de
urbanização e metropolização observado na RMPA, e do território brasileiro como
um todo, do que propriamente uma peculiaridade do município.
Ao encontro deste processo simbólico de destacar a entrada da cidade, surge
no município uma nova área valorizada ao sudeste do hipermercado BIG e ao longo
da Av. Frederico Dihl, impulsionada, principalmente pelo hipermercado BIG.
Praticamente contíguo à área do hipermercado, temos o loteamento Água
Viva. Apesar de ter o projeto aprovado ainda no início da década de 1980, somente
no início desta década se verifica a construção de habitações em seus lotes. Desta
forma, verificamos que desta vez, o empreendedor teve maior sucesso na
valorização do preço de seus lotes que, com a implantação de um grande
estabelecimento comercial viu seu preços aumentados, podendo hoje focar em outro
público para a ocupação da área: a classe média advinda, em grande parte, do
processo de desconcentração verificado com a reestruturação da RMPA.
Isto se verifica pelo padrão de suas construções. Como podemos observar
através das Figuras 29 e 30, verificamos as residências, muitas delas inclusive de
dois andares e já se percebe inclusive grande quantidade de piscinas, identificando
desta forma, a desigualdade no padrão sócio-econômico em relação a grande parte
da população do município.
89
Figuras 29 e 30 Rua do loteamento Água Viva boa infra-estrutura e elevado padrão sócio-
econômico, evidenciando o novo padrão de ocupação existente neste loteamento.
90
Na mesma direção, o loteamento Portal da Bela Vista, cujo projeto foi
aprovado recentemente, apresenta padrão bastante semelhante ao primeiro. Com
forma próxima à circular, além de apresentar casas, construídas ou em construção,
em forma de sobrados, apresenta uma praça em seu centro, com campo de futebol,
equipamentos de recreação e com vegetação preservada em seu centro.
Seguindo na Av. Frederico Dihl, são encontrados ainda um condomínio
residencial plurifamiliar, com três torres de apartamentos, e um pequeno condomínio
fechado unifamiliar aos “fundos” das torres, não de alto padrão, mas bem acima dos
padrões mais populares. Desta forma, além de se perceber uma possível tendência
à segregação espacial pela de valorização imobiliária em relação a outras áreas,
verifica-se também o surgimento de condomínios fechados, consolidando desta
forma, a auto-segregação. Além destes condomínios, a Figura 15, indica a previsão
de implantação de um condomínio “classe A” em uma área a leste da RS-118, que
não apresenta nenhum tipo de loteamento. Entretanto, pelas informações obtidas
junto a Secretarias Municipais, não definições em relação a esta área, sendo
provável a implantação de um novo loteamento industrial.
Em relação aos condomínios, uni ou plurifamiliar, cabe aqui uma pequena
reflexão. Municípios como Esteio
18
, Cachoeirinha e/ou Gravataí, que apresentam
uma série de pequenos e médios condomínios fechados e mesmo grandes
empreendimentos como o Alphavile de Gravataí, assim como maior verticalização
através de condomínios plurifamiliares. Em Alvorada este movimento, além de
recente ainda é limitado em número, visto que uma das poucas formas de
condomínios fechados são dois ou três pequenos empreendimentos junto à Av.
Frederico Dihl, ou prédios aos arredores da Av. Pres. Getúlio Vargas, além do
COHAB Salomé.
Desta forma, o que se verifica são dois fenômenos intimamente articulados
entre si. De um lado, o município absorve a funcionalidade comercial, tornando-se
menos dependente da metrópole no consumo de bens básicos, o que vem alterando
as formas da Av. Presidente Getúlio Vargas e seus loteamentos conexos. De outro,
a entrada da cidade e os loteamentos de função habitacional ao longo da Av.
Frederico Dihl vão atraindo moradores de maior poder aquisitivo, promovendo um
18
A Bolognesi Empreendimentos Ltda., responsável pela construção de condomínios fechados em
Canoas e Cachoeirinha, apresenta em Esteio não um projeto de Condomínio fechado, como
quase um quarto do território deste município.
91
processo de diferenciação sócio-espacial, como pode ser observado já no início da
presente década (Figura 31).
O que queremos destacar aqui é que, apesar de Alvorada ainda apresentar
índices econômicos bastante inferiores aos observados em municípios como
Cachoeirinha, Gravataí ou Esteio, só para dar alguns exemplos, o município vem
absorvendo de forma aparentemente sólida a função comercial em seu interior, além
da ampliação do número de empresas ligadas ao setor industrial ao setor de
informática. Desta forma, o município pode passar ainda a ser um dos novos locais
de moradia não para aqueles que buscam lotes mais baratos, mas como aqueles
que, empregados nestas empresas, passam a perceber em loteamentos como Porto
Verde, Água Viva ou Portal da Bela Vista, uma boa oportunidade de estabelecer
residência.
Figura 31 imagem de satélite identificando a área da entrada do município que se apresenta
valorizada. Fonte: Google Earth. Elaborado por William S. Papi.
Apesar desta crescente presença da classe média no território de Alvorada,
não é possível afirmar que existe uma mudança no padrão sócio-econômico do
município. O que na verdade percebemos, é que paralelamente à pequena parcela
de pessoas da classe média que reside no município, permanece o intenso processo
de ocupação pelas camadas mais populares, apresentando neste período uma
92
grande quantidade de ocupações irregulares nas áreas mais afastadas do eixo
central, assim como da permanência e ampliação das áreas de reprodução
empobrecida da população.
Apesar dos riscos inerentes às generalizações, podemos afirmar que as áreas
ao norte da rua Itararé e a partir da rua Carlos Gomes, ao norte da Av. Pres. Getúlio
Vargas, apresentam- se como uma extensa área caracterizada por uma população
bastante empobrecida, aproximadamente a partir dos loteamentos Tupã. É claro que
mesmo antes apresentamos áreas cuja ocupação é dada por moradores de extrema
pobreza, como a Vila Nova Americana
19
, a Vila Santa Clara e parte da Vila
Americana, estabelecidas às margens do arroio Feijó, na divisa com Porto Alegre,
assim como algumas ruas dentro dos loteamentos desta região que apresentam um
padrão econômico um pouco mais elevado, mas acreditamos não ser falsa a
presente afirmação.
Dentro desta área, encontram-se, por exemplo, as Vilas Cedro, Maria Regina,
Madepinho, Tijuca, Vila Salomé e a COHAB, a Vila Umbu dentre outras. Como
podemos observar nas Figuras 32 e 33, estas áreas apresentam ruas sem
pavimentação, habitações bastante precárias, péssimas condições de saneamento
básico, violência, entre outros.
Ao sul da Av. Pres. Getúlio Vargas, temos os loteamentos já bem distantes da
zona central, como Parque São Pedro e Parque Residencial Piratini, Além de
extensas áreas ao longo da Av. Frederico Dihl, como os loteamentos Intersul, Jardim
Aparecida, além dos mais afastados Stela Maris e Torotama, que apresentam os
mesmos problemas, se não tão intensos, bastante semelhantes.
Desta forma, o que percebemos é que Alvorada, antes configurada como uma
área de segregação em relação à RMPA, passa a incorporar em seu espaço intra-
urbano relações de segregação sócio-espacial, que acreditamos ser bem
representado espacialmente pela Figura 34, que indica o Índices de
Desenvolvimento Humano (IDH) em 2000 no município.
19
A Vila Nova America foi criada pela Prefeitura Municipal na, década de 1980, para a realocação de
famílias que moravam às margens do arroio Feijó, na Vila Americana divisa com Porto Alegre, e que
sofriam com as constantes enchentes, como veremos no capítulo seguinte.
93
Figura 32 e 33 – Acima Vila Salomé, e abaixo uma rua da Vila Umbu. É possível observar a
inexistência de infra-estrutura e a precariedade das habitações.
94
Observamos, portanto, um processo contraditório, mas complementar dentro
da economia do município. De um lado, o aquecimento da economia a nível regional
e municipal, sobretudo no setor de serviços, levando à valorização de antigas vilas
próximas ao centro e surgimento de loteamentos voltados às classes mais elevadas
ou menos empobrecidas no município, seja pela melhoria das condições de vida,
seja pela crescente chegada da população vinda da RMPA.
Figura 34 Indica o IDH dos setores do município, definidos pelo IBGE. Apesar da diferenciação
presente no figura, é no interior da mancha azul que apresentamos as classes mais elevadas; a área
em vermelho, os menores índices de IDH, evidenciando a segregação sócio-espacial existente no
interior do território de Alvorada. Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano da RMPA.
Do outro lado, nas periferias mais afastadas do centro, ou seus interstícios
cuja qualidade de vida se vê bastante prejudicada pelas condições sócio-ambientais,
se encontra a grande maioria da população de Alvorada que permanece fora deste
processo, reproduzindo suas condições de vida através da economia informal, como
a catação de lixo ou venda das mais diversas mercadorias, além da alternativa que o
tráfico e o crime organizado oferecem.
95
4 SEGREGAÇÃO SÓCIO-ESPACIAL E PROBLEMAS URBANOS DE ALVORADA
Como discutido anteriormente, a segregação espacial urbana se manifesta
não pela apropriação desigual do espaço urbano, como pela sua produção
desigual. Enquanto determinadas áreas apresentam grandes investimentos em infra-
estrutura e serviços voltados às classes sociais mais abastadas, os chamados
espaços luminosos de Milton Santos, os espaços opacos acumulam problemas de
diversas ordens ampliando ainda mais a segregação sócio-espacial.
Neste sentido, com o processo de relativa descentralização do Estado
brasileiro, a partir do novo pacto federativo da Constituição, os municípios passaram
a ser cada vez mais responsabilizados pela execução e gestão de políticas públicas,
sobretudo aquelas voltadas à melhoria qualidade de vida de sua população, tais
como as políticas sociais (educação, saúde, assistência social, entre outros) e
políticas de planejamento urbano e obras públicas (zoneamentos, projetos
habitacionais, infra-estrutura, saneamento básico, entre outros).
Em função do baixo dinamismo econômico e da condição de pobreza de
grande parte de sua população, Alvorada apresenta grandes dificuldades
orçamentárias, ficando incapacitado de investir em políticas públicas sociais e de
infra-estrutura.
Como exemplo das dificuldades de arrecadação do município, podemos
verificar os dados sobre os principais impostos municipais, tais como o Imposto
Sobre Serviços (ISS), Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial (IPTU) e
Imposto sobre Transmissão-Intervivos (ITBI), que são extremamente baixos no
município de Alvorada, como pode ser observado no Quadro 11. Dentre as causas
para a pequena arrecadação, se encontram os altos índices de inadimplência, a
baixa valorização dos imóveis no município e o baixo dinamismo do setor de
serviços de alto valor agregado.
Apesar da crescente responsabilização, a concentração das verbas públicas
ainda permanece com a União que além do repasse obrigatório aos municípios,
condiciona o repasse de verbas à apresentação de programas e projetos, sobretudo
nos últimos anos com o abandono do modelo de Estado liberal presente no Brasil
durante a década de 1990, o que obriga municípios a se ajustarem às diretrizes da
União.
96
Arrecadação de impostos municipais
Municípios da RMPA Imposto Sobre
Serviços (ISS)
R$
Imposto sobre a
Propriedade
Predial e
Territorial (IPTU)
R$
Imposto sobre
Transmissão-
Intervivos (ITBI)
R$
Total
Alvorada 2.942.906,00
2.799.612,65
1.103.258,21
6.845.776,86
Cachoeirinha 6.854.031,42
3.626.924,69
1.934.342,18
12.415.298,29
Canoas 39.941.976,53
9.603.451,04
6.728.162,10
56.273.589,67
Eldorado do Sul 5.044.068,62
621.160,96
311.129,59
5.976.359,17
Esteio 4.657.511,76
3.486.994,03
780.264,10
8.924.769,89
Gravataí 11.731.516,97
6.159.427,80
2.565.855,47
20.456.800,24
Guaíba 4.332.590,69
1.586.049,03
771.908,72
6.690.548,44
Novo Hamburgo 24.354.349,43
16.455.822,68
4.340.498,55
45.150.670,66
Porto Alegre 329.619.276,50
204.514.861,30
105.398.971,60
639.533.109,40
São Leopoldo 14.368.452,86
12.781.598,41
2.971.679,62
30.121.730,89
Sapucaia do Sul 4.283.132,89
3.702.687,88
755.857,65
8.741.678,42
Viamão 3.953.803,71
2.245.525,65
1.447.335,58
7.646.664,94
Quadro 11 – Arrecadação de impostos municipais na RMPA no ano de 2007. Fonte: IBGE Cidades
Além das dificuldades de arrecadação e, conseqüentemente, de
implementação de políticas públicas, Alvorada, por se tratar de um dos municípios
mais pobres da RMPA, acumulou durante sua constituição, problemas urbanos das
mais diversas ordens (infra-estruturais, habitacionais e sociais), como conseqüência
do processo de desenvolvimento desigual e combinado da RMPA, característico da
economia capitalista.
Desta forma, neste capítulo buscaremos fazer um breve diagnóstico dos
principais problemas urbanos enfrentados pelo município atualmente, mais
especificamente os problemas habitacionais, sócio-ambientais e da violência,
sempre presente no imaginário da população da RMPA pelas constantes
reportagens sobre os casos de homicídio no município.
Além do diagnóstico, procuraremos analisar as causas destes problemas e
sua relação com os processos de segregação sócio-espacial verificados no
município, tanto a nível regional como intra-urbano, assim como verificar de que
forma a administração pública e suas instituições, sobretudo a nível municipal, tem
atuado neste sentido.
97
4.1 Segregação Sócio-Espacial, Déficit Habitacional e Ocupações Irregulares
em Alvorada
Na obra “A questão da habitação”, Friedrich Engels une três textos escritos
em 1872, onde critica as saídas burguesas para o a crise habitacional percebida nas
cidades européias. Na verdade, como defende o próprio autor, a questão
habitacional somente passa a despertar o interesse da sociedade na medida em que
passa a ameaçar o bem estar também das classes médias e pequeno burguesas,
visto que a situação da classe operária já se encontra desde sua origem em
precárias condições de vida e moradia.
Nesta sua crítica, Engels (1979, p.24) destaca que:
De onde provém a crise da habitação? Como nasceu? Como bom burguês,
o Sr. Sax deve ignorar que ela é um produto de forma social burguesa: uma
sociedade não pode existir sem problemas de habitação quando a grande
massa de trabalhadores dispõem apenas do seu salário, isto é, da soma
dos meios indispensáveis à sua subsistência e à sua reprodução; quando
os melhoramentos mecânicos deixam massas de operários sem trabalho;
quando violentas e cíclicas crises industriais determinam, por um lado, a
existência de um grande exército de reserva de desempregados, e por outro
lado, atiram periodicamente à rua volumosa massa de trabalhadores;
quando os proletários se amontoam nas grandes cidades, e isso, se dá num
ritmo mais rápido que a construção de habitações nas circunstâncias atuais,
e se encontram sempre inquilinos para a mais infecta das pocilgas; ... Em
semelhante sociedade a crise da habitação não é um acaso, mas uma
instituição necessária[...]
Infelizmente a descrição de Engels em relação à Europa do séc. XIX poderia,
sem adaptações, descrever a situação de grande parte das áreas degradadas das
diversas regiões metropolitanas do país hoje em dia.
O modo de produção capitalista, no Brasil, engendrou uma rápida expulsão
da mão-de-obra do campo e formação de um exército industrial de reserva que
passa não a formar uma grande massa de população empobrecida nas grandes
cidades e seu entorno, como desencadeia, também por conseqüência da grande
oferta de o-de-obra, uma queda nos salários da população empregada,
reforçando a concentração de renda tão característica do desenvolvimento
brasileiro. Em pouco tempo, com a crise da década de 1980, esta população deixou
de se tornar um exército de reserva para se ocupar em alguma estratégia de
sobrevivência lhe garantisse o sustento.
98
Sem condições de pagar aluguel, muito menos de adquirir uma casa própria,
resta como possibilidade a ocupação de vazios urbanos ou áreas degradadas
menos interessantes ao capital imobiliário ou ao poder público, reproduzindo, desta
forma, a lógica do “direito à ocupação sim, direito à cidade não” (MARICATO, 1996,
p.63).
Portanto, uma das formas mais características de manifestação da
segregação sócio-espacial é a da habitação, seja quando se aproxima ao modelo
centro-periferia, expulsando as camadas populares para áreas distantes, seja pelo
contraste contíguo da desigualdade de reprodução das condições de vida pelas
condições da habitação, da infra-estrutura local, entre outros, geralmente ligadas às
ocupações irregulares.
Em Alvorada, não possuímos uma data para identificar desde quando são
verificadas ocupações irregulares em áreas ociosas. Entretanto, não somente nas
áreas o urbanizadas as ocupações ocorreram no Brasil. Observando a situação
de ociosidade dos lotes urbanos existentes em Alvorada, a crescente demanda por
unidades habitacionais por parte da população empobrecida, sem condições de
adquirir sua casa própria, e os acontecimentos em núcleo residencial do BNH em
Pernambuco, Rigatti (1983, p.162) já previa que:
[...] Se persistir essa política de que está resultando uma massa incrível de
unidades residenciais que, na verdade, não atende aos setores sociais mais
necessitados os que dispõem de renda familiar inferior a 3 salários
mínimos existe a possibilidade de que em função do volume de unidades
residenciais postas no mercado, venham a existir, possivelmente, núcleos
ou parte de núcleos ociosos, podendo, à semelhança do que sucede nas
áreas de terra ociosas das grandes cidades metropolitanas, ocorrer a
ocupação desses núcleos mediante invasões por população de baixa renda.
Na verdade, Rigatti antecipa um fato que viria a ocorrer em onze de abril de
1987 com o loteamento Campos verdes, uma COHAB, e que no mesmo ano, viria a
se espalhar pela RMPA, como nos casos de Porto Alegre, Canoas e Gravataí.
Como visto anteriormente, a partir da década de 1979, o perfil de projetos de
loteamentos em Alvorada sofreu uma importante alteração. Com a atuação do BNH,
ocorreu a passagem de um modelo de parcelamento do solo voltado para habitação
através de pequenos loteadores que negociavam terrenos para construção, para
médias e grandes empresas imobiliárias que vendiam o lote com as unidades
habitacionais já construídas e com acesso à infra-estrutura.
99
Os empreendimentos privados financiados pelo BNH eram voltados à
população acima dos três salários mínimos, o que correspondia a,
aproximadamente, 8% da população residente do município. Desta forma,
permanecia a grande demanda por unidades habitacionais para a crescente
população que procurava o município de Alvorada como moradia.
Visando responder a esta demanda, o BNH implantou a primeira e única
COHAB no município. Localizada na Vila Salomé, em uma área afastada da região
central, bastante alagadiça pela influência do arroio Águas Belas, ocupada
irregularmente (o que provocou alteração da localização em alguns metros), o
projeto previa a construção de 2040 unidades habitacionais voltadas às camadas
populares cadastradas, não contemplando as famílias que ali viviam.
Com a crise econômica, a inadimplência de grande parte dos mutuários,
decorrente de desemprego ou da depreciação dos salários, e com endividamento e
falência de empreiteiras e do BNH, a COHAB Salomé acaba por não ser entregue,
ficando abandonado por dois anos.
Mas esta situação não permaneceu por muito tempo. Paulo Roberto
Azevedo, no livro Passageiros da ilegalidade (2002), descreve, através de sua
pesquisa, como se deu o processo de ocupação das 2040 unidades habitacionais no
dia 11 de abril de 1987. Segundo o autor, a idéia de ocupação teria sido inspirada
pelo próprio prefeito quando este:
[...] foi a imprensa e anunciou, sem muitas consultas legais, que pretendia
desapropriar os conjuntos habitacionais de propriedade de empreiteiras em
dívida e comercializá-los com a população carente de Alvorada. O prefeito
anunciou que pretendia com esta atitude resolver dois problemas: o déficit
habitacional municipal e a dívida das empreiteiras. Este plano foi anunciado
no Jornal RS, ostentando o título: “Até que enfim um prefeito macho.”
(AZEVEDO, 2002, p.81)
Desta forma, famílias que se encontravam na área irregular da atual Vila
Salomé, elaboraram um plano para ocupação inicial de cinqüenta unidades
habitacionais. Entretanto, como descreve Azevedo (2002, p.82), no dia 11 de abril
de 1987:
100
Assim, por volta das 13 horas, uma multidão formada por 200 famílias
aproximou-se do conjunto pela ala dos sobrados, conduzidos por um grupo,
portando “pés-de-cabra”, com os quais arrombavam os apartamentos. A
ocupação dos cinqüenta sobrados não levou mais que meia hora[...]
Embora houvesse entre os organizadores um receio de que a ocupação dos
sobrados pudesse despertar um movimento maior, ninguém pensava que
este viria tão pido[...] O processo de ocupação durou a as 19 horas
quando as 2040 unidades haviam sido ocupadas, trazendo ao conjunto uma
população inicial de seis mil pessoas que se ampliaria, nos seguintes dias,
para mais de dez mil.
A esta primeira luta por parte dos ocupantes, seguiram uma série de lutas
pela manutenção das unidades ocupadas, pela dotação de fornecimento de serviços
de água e luz, do transporte público, entre outras reivindicações, em parte até hoje
não atendidas de forma adequada (figuras 35 e 36). Cabe ainda destacar que esta
foi a primeira de muitas ocupações de conjuntos habitacionais do BNH que se
sucederam na RMPA. Ainda em Alvorada, no dia 27 de abril do mesmo ano, no
mesmo movimento de ocupações, 331 unidades nos jardins Algarve e Porto Alegre
foram ocupados.
Desta forma, até 16 de maio, 16.482 unidades habitacionais, na maior parte
dois anos ou mais abandonados, haviam sido ocupados pelo movimento, dentre
elas unidades nos bairros Sarandi e Rubem Berta, em Porto Alegre, Conjunto
Guajuviras, em Canoas, Grande Esperança, em Cachoeirinha, dentre outros.
As motivações destas ações de ocupação das unidades habitacionais podem
ser descritas pela frase de um participante do movimento Onze de Abril Naquele
momento senti a força da miséria e a expectativa de muita gente de conseguir um
teto para morar” (AZEVEDO, 2002, p. 82).
101
Figuras 35 e 36 – Fotos do COHAB Salomé, chamado “Onze de Abril”.
102
Entretanto não revela aqui, os reais processos sociais e econômicos que
culminam em tal situação. Enquanto 92% da população residente em Alvorada
apresentava renda inferior a três salários mínimos, os empreendimentos privados,
financiados com dinheiro blico do BNH, lotearam e produziram residências para
classes com melhores condições de renda, provavelmente atendendo em solo
alvoradense a demandas existentes no município de Porto Alegre, por exemplo.
Desta forma, a população sem teto de Alvorada, além de segregada social e
economicamente, sofre com a falta de políticas públicas, ou melhor, com a
intencional inadequação entre as políticas públicas para habitação e suas
demandas. Além disso, dos casos em que o habitante de Alvorada não apresenta
condições de aquisição da casa própria, a segregação cio-espacial se manifesta,
sobretudo nas décadas de 1980 e 1990, através de problemas habitacionais
relativos à localização da habitação da população de baixa renda.
Com o programa “Minha casa, minha vida” do governo federal, foram
retomados, não em Alvorada, como em diversos municípios da RMPA, estudos e
projetos para a implantação de unidades habitacionais de interesse social.
Em Alvorada, foram realizados estudos para diagnosticar a atual situação da
moradia no município de Alvorada e quais estratégias devem ser tomadas para
buscar amenizar o problema do acesso à moradia regularizada.
Segundo dados do estudo, o município apresenta 8.045 unidades
habitacionais em situação de irregularidade, distribuídas em 94 núcleos. Para
atender aquelas situações não regularizáveis pelas condições ambientais ou
constrangimentos de outra ordem, o estudo propõe a construção de 5.500 unidades
habitacionais.
O déficit habitacional identificado no município de Alvorada, na verdade,
corresponde não a um problema na produção de unidades por falta de áreas, mas
sim a falta de oferta de lotes em condições de aquisição por parte das camadas
mais populares do município. Muitos são os fatores que explicam esta situação. Em
primeiro lugar, podemos citar a especulação imobiliária, que retendo a terra eleva o
seu preço em muitas vezes através de uma escassez de oferta artificial. Em
segundo lugar, os loteamentos e a produção de unidades habitacionais que não
respondem às demandas da população local de mais baixa renda, mas sim às
classes médias que vislumbram nos baixos preços (se comparados a capital) dos
lotes em Alvorada uma oportunidade de aquisição da casa própria que na capital, ou
103
mesmo em outros municípios da RMPA, não seria possível devido aos valores mais
elevados. Em terceiro lugar a insuficiência de empreendimentos voltados às
camadas populares, restringidos a dois Programas de Arrendamento Residencial
(PAR) implantados junto à Avenida Presidente Vargas em 2007 e 2008 e a atuais
loteamentos como o da Vila Nossa Senhora Aparecida financiados pelo Crédito
Solidário (Figuras 37 e 38).
Figura 37 – Foto de um PAR na Av. Presidente Vargas (parada 63), próximo à Vila Salomé.
Entretanto, a segregação sócio-espacial e os problemas ligados à questão da
habitação não se restringem à falta de moradia em situação regular. A expulsão das
camadas mais populares para áreas mais periféricas ou cuja qualidade de vida se
vêem prejudicadas por questões ambientais, são uma forma complementar de
agravamento do problema habitacional.
104
Figura 38 – Novo loteamento na Vila Nossa Senhora Aparecida financiado pelo Crédito Solidário.
As áreas mais periféricas, tais como as vilas Cedro, Morumbi, Jundiaí, Nossa
Senhora Aparecida, Parque Residencial Piratini, Stela Maris, entre outros, por se
encontrarem distantes não apresentaram, por longa data, rede de serviços que
atendessem satisfatoriamente a população, garantindo maior qualidade de vida.
4.2 Os Problemas Sócio-Ambientais e as Relações de Segregação Espacial.
Os grandes debates atuais sobre a degradação ambiental vêm destacando
problemas como a poluição atmosférica e o suposto “aquecimento global”
20
, poluição
dos corpos hídricos, desmatamento, entre outros. Dentre os pressupostos que estão
por detrás desta preocupação está a compreensão de que são problemas globais
que teoricamente afligem a toda população mundial, sem exceções e da mesma
maneira. Na verdade, trata-se de uma preocupação das classes médias e altas que,
20
Apesar do aparente consenso científico e principalmente jornalístico, vem ganhando força teses
que se contrapõem a idéia de aquecimento global e que inclusive apontam para seus
desdobramentos geopolíticos sobre países periféricos como Brasil, China, Índia, entre outros.
105
com a modernização e avanço tecnológico, não esperavam passar por novos
constrangimentos de ordem ambiental.
Desta forma se ergue o discurso do desenvolvimento sustentável que visa
unir a idéia de desenvolvimento, ou melhor, de crescimento econômico, com a
sustentabilidade e melhoria da qualidade ambiental. Apesar de conter em si a
possibilidade de maior regramento e controle sobre empresas poluidoras, o discurso
do desenvolvimento sustentável traz consigo dois perversos pressupostos: o de que
não é possível manter os níveis de consumo e crescimento ecomico, e que,
portanto, países periféricos devem buscar novas formas de produção “sustentável” e
o de que por atingir indistintamente a todos os habitantes do planeta terra, está em
cada indivíduo, em suas atitudes, a saída para um ambiente mais “equilibrado”.
Partindo desta perspectiva, os problemas ambientais são analisados a partir
da concepção de impactos ambientais. Desta forma, se destitui o caráter de classe
dos problemas ambientais que passam a ser entendidos como efeitos da
produção/transformação do “espaço social” a partir do “espaço natural”.
Apesar de importante na ampliação do controle social sobre os sistemas
produtivos e na ampliação da qualidade de vida, esta concepção não apreende a
dimensão social da natureza, visto que a produção do espaço, ou a transformação
do “espaço natural” em “espaço social” sempre acarreta impactos ambientais.
Sendo assim, os problemas ambientais urbanos estarão, neste trabalho,
definidos em termos de degradação da qualidade de vida devido a constrangimentos
de ordem natural ou social, como destaca Souza (2005, p.116-117):
É necessário, também, expandir a própria compreensão do que seja os
problemas ambientais. Se considera o ambiente como irredutível “ao meio
ambiente”, englobando, por extensão, também o ambiente socialmente
construído, problemas como a falta de saneamento básico nos espaços
urbanos pobres e segregados são, indiscutivelmente, problemas urbanos
primários, e, ao mesmo tempo, problemas ambientais. Aliás, em metrópoles
do Terceiro Mundo, este tipo de problema ambiental, diretamente vinculado
a esses subprodutos da urbanização capitalista periférica que são a
pobreza e a segregação em larga escala, é um dos mais importantes. Os
problemas ambientais são todos aqueles que afetam negativamente a
qualidade de vida dos indivíduos no contexto de sua interação com o
espaço, seja o espaço natural (estrato natural originário, fatores
geoecológicos), seja, diretamente, o espaço social.
A partir desta concepção, parte dos problemas ambientais urbanos está
diretamente ligada ao processo de segregação espacial e à ocupação, muitas vezes
irregulares, de áreas de risco e de grande degradação ambiental. Da mesma forma
106
entende Maricato(1996), que para designar “pontos de concentração de pobreza à
semelhança de guetos, ou imensas regiões nas quais a pobreza é
homogeneizada”,(p.55) utiliza o termo “segregação espacial ou ambiental”.
Apesar de não adotarmos a definição de segregação ambiental, ela mostra a
íntima relação entre os processos de segregação e problemas ambientais. Mais
adiante a autora afirma que:
A segregação ambiental não é somente uma das faces mais importantes da
exclusão social, mas parte ativa e importante dela. A dificuldade de acesso
aos serviços e infra-estrutura urbanos (transporte precário, ...) somam-se
menores oportunidades de emprego (particularmente do emprego formal),
menores oportunidades de profissionalização, maior exposição à violência
(marginal ou policial), discriminação racial, discriminação com mulheres e
crianças, difícil acesso à justiça oficial, difícil acesso ao lazer. A lista é
interminável. (MARICATO, 1996, p.56)
Tendo em vista o acima exposto, a análise dos problemas ambientais em
Alvorada passa, portanto, pela compreensão dos padrões sociais de produção e
ocupação de seu espaço urbano.
O município de Alvorada, enquanto município segregado do processo de
desenvolvimento econômico e social, apresenta em sua formação grande parte dos
problemas ambientais urbanos observados nas mais diversas cidades do país, tais
como a falta de saneamento básico e os altos índices de problemas de saúde
associados. É bem verdade que independente do processo de modernização
impulsionado pela urbanização, que, conforme discutido anteriormente, é desigual
no espaço e no tempo, todos os municípios da RMPA, e mesmo do Brasil,
apresentam problemas ambientais ligados a segregação espacial.
Entretanto, analisando o caso de Alvorada, o que pode ser estendido à
grande parte dos municípios pobres brasileiros, os problemas ambientais aparecem
antes pela segregação do município em relação à RMPA, ou seja, pela não
extensão deste mesmo movimento de modernização e de desenvolvimento
econômico-social desigual pelo qual passaram muitos municípios da RMPA.
Sendo assim, por muito tempo o espaço intra-urbano de Alvorada, quase
como um todo, apresentava problemas sócio-ambientais urbanos ligados, sobretudo
à falta de infra-estrutura de saneamento básico. na metrópole, ou mesmo de
alguns municípios da RMPA, os problemas de saneamento se apresentavam mais
diretamente ligados aos processos de segregação espacial intra-urbanos, com
107
investimentos públicos e privados mais concentrados em áreas de maior interesse
econômico, relegando periferias aos mais diversos constrangimentos.
Entretanto, esta situação vem sendo alterada a partir da década de 1990, com
a nova dinâmica intra-urbana que o município vem assumindo. Cada vez mais os
constrangimentos de ordem infra-estrutural, sobretudo aqueles que dizem respeito
às condições básicas de vida, como água tratada, luz, esgoto, por exemplo, vão
sendo estendidas para áreas periféricas, assim como vemos maior concentração
destes equipamentos nas áreas mais valorizadas, sobretudo nas áreas do Porto
Verde, loteamentos Portal Bela Vista, Água Viva e zona central da cidade.
Em oposição a esta áreas, percorrendo os bairros e vilas mais periféricos,
sobretudo a partir da Vila Tupã, como destacamos anteriormente, aumentam os
casos de total inadequação das condições de vida pela falta de infra-estrutura e
grande quantidade de lixo, sobretudo nas áreas ocupadas irregularmente,
reforçando novamente lógica do “direito à ocupação, mas não à cidade”
Comecemos com o problema ambiental diretamente ligado à ocupação de
margens de corpos d’água e áreas alagadiças (banhado, sobretudo), definidas pela
legislação ambiental como Área de Preservação Permanente (APP). A figura 38
ilustra a ocupação do solo urbano em Alvorada e os corpos d’água com suas
respectivas APP’s.
Antes de prosseguir a análise cabe aqui apenas um parêntese quanto a esta
situação. A Lei Federal 6.766/1979, que trata sobre o parcelamento do solo, define
as margens de águas correntes como áreas não edificantes em distancia de 15
metros da margem, respeitando legislações específicas nos termos de seu artigo .
o artigo da Lei Federal 4.771/1965 (Código Florestal), define como APP
21
áreas ao longo de cursos d’água, não distingüindo solo urbano, rural ou floresta,
numa distância mínima de 30 metros, ampliada de acordo com a largura do curso
d’água, conforme os limites por este artigo estipulado.
21
Pelo fato de que a topografia de Alvorada não apresentar encostas ou relevo significativo,
analisaremos apenas a situação dos arroios e do Rio Gravataí.
108
Figura 38 - Áreas de APP no interior do território de Alvorada, nos termos da Lei Federal 4.771/1965.
Fonte: Plano ambiental do município de Alvorada - Diagnóstico Ambiental (2007).
Ao se avaliar a aplicabilidade desta lei nas dinâmicas espaciais urbanas,
percebemos que quase a totalidade das conurbações brasileiras estaria em
condição irregular, inclusive, com a do parcelamento do solo que estipula como área
não edificante mínima a metade da distância prevista no Código Florestal. A falta de
uma política voltada ao regramento de vegetações em áreas urbanas torna
praticamente impossível a aplicabilidade da lei, isto se avaliarmos somente a
questão dos córregos. Acrescendo às questões ligadas a ocupações de encostas,
banhados e demais APP’s, percebemos o grande conflito existente entre as atuais
dinâmicas espaciais urbanas e a preservação ambiental.
Apesar da crítica à inaplicabilidade da lei, a definição de uma faixa de APP ao
longo dos corpos d’água em áreas urbanas cumpre importante papel na drenagem
urbana e combate às cheias (na medida em que a mata ciliar evita erosões e
assoreamento dos corpos d’água, diminuindo assim, as chances de seu
transbordamento, além de garantir uma faixa de absorção d’água no caso de seu
transbordamento), assim como ecológico, viabilizando a preservação de parte do
109
patrimônio vegetal e zoológico, na atuando como base das cadeias ecológicas
terrestres.
Para o caso de Alvorada, como fica evidenciado, a mancha urbana apresenta,
em seu interior grande quantidade de “áreas de preservação permanente”. Em parte,
estas áreas passaram por transformações resultantes da implantação de infra-
estrutura como ruas e avenidas, processo resultante do intenso loteamento que o
município passa a receber a partir da década de 1950.
Entretanto, a maior parte destas áreas foi degradada com a retirada de sua
mata ciliar sem receber qualquer tipo de infra-estrutura, principalmente pelo fato de
que se tratam de loteamentos para a classe mais pobre, assim como ocupações
irregulares. Desta forma, durante as épocas de maior pluviosidade, são recorrentes
os problemas com enchentes e drenagem urbana. Com os alagamentos, ficam os
moradores expostos às diversas doenças de pele, verminoses, leptospirose, entre
outras, além do fato de que bastam alguns dias de chuva para o acúmulo de água e
de barro, devido à inexistência de pavimentação.
Dentro deste processo se enquadram as vilas Salomé e Umbu, separadas
pelo Arroio Águas Belas e mesmo a Vila Americana, cuja parcela da população
atingida pelas recorrentes enchentes foi realocada em outra área, formando a Vila
Nova Americana, como descrito anteriormente. Atualmente esta última vem
recebendo constantes atividades de desassoreamento e limpeza em sua margem,
mas ainda não existe um processo efetivo de recuperação de suas margens.
Apesar de, em um primeiro momento, aparecer o “fator antrópico” como
sendo o principal responsável pela degradação ambiental destas áreas, visto que
estão diretamente ligadas à ocupação desordenada do solo e sua
impermeabilização, à eliminação de mata ciliar, à poluição dos corpos d’água, entre
outros fatores, são exatamente as classes mais empobrecidas, que na busca de um
lugar para moradia ocupam estas áreas, as maiores vítimas dos problemas
ambientais produzidos, em parte por si, como bem destaca Souza (2005, p.136):
Na verdade, além de não serem, sob um ângulo estrutural, os culpados, os
pobres urbanos são, isso sim, as principais vítimas dos problemas
derivados de suas estratégias de sobrevivência, como no caso dos
deslizamentos e desmoronamentos em encostas favelizadas. Assim, além
de sofrerem com a pobreza, que traz consigo a segregação residencial, os
pobres urbanos das metrópoles brasileiras são vitimados pelas
conseqüências nefastas dos impactos ambientais negativos que eles,
eventualmente, são induzidos a perpetrar.
110
Em relação ao Rio Gravataí, que limita o município ao norte, percebemos que
a os impactos sobre faixa de preservação permanente não está ligada à ocupação
para loteamentos, seja eles habitacionais ou industriais, até porque a área de várzea
nesta porção do Rio Gravataí, de certa forma inviabiliza ou torna menos “atrativa” a
ocupação de seu sítio. Através das fotos por satélite, percebemos a utilização destas
terras na produção agrícola, e algumas indústrias mineradoras em sua proximidade.
Dentre as ações públicas em relação à recuperação e preservação de áreas
verdes, a administração atual vem realizando ações de plantio as vias urbanas,
praças e ações de recuperação de corpos d’água. Além disso, a Secretaria
Municipal do Meio Ambiente se encontrar em processo de adequação para obtenção
de qualificação para exercer a atividade de licenciamento ambiental de atividades de
impacto local junto ao Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONSEMA). Como na
maioria dos municípios da RMPA, estas ações ainda são insuficientes para a efetiva
recuperação do passivo ambiental
Além das questões ligadas aos corpos d’água e APP’s, outra questão ligada
aos problemas ambientais, entendidos como precarização da qualidade de vida, são
as questões ligadas ao saneamento básico, tais como o abastecimento de água
tratada, tratamento de esgoto e a gestão dos resíduos sólidos (além da drenagem
urbana já trabalhada, pelo menos em parte).
Em relação à água tratada, a partir da década de 1990, como pode ser
observados pelos dados do censo de 1991, Alvorada apresenta a grande maioria
de sua população abastecida pela rede da Companhia Riograndense de
Saneamento (CORSAN), o que foi ampliado em 2000. Entretanto, esta não era a
situação em décadas anteriores. Segundo relatos, mesmo lotes regulares,
aprovados pela Prefeitura Municipal, não apresentavam infra-estrutura alguma, nem
mesmo água tratada. Ao se tratar então de ocupações irregulares, esta situação se
estendeu até a década de 1980, onde a organização e pressão popular, através de
negociações, conquistaram o direito à água tratada.
Em decorrência da falta de água tratada, é muito conhecida na cidade uma
bica d’água localizada na Vila Maringá, onde a população ao atingida pela rede
pública, ou problemas em seu abastecimento. Através de relatos, podemos perceber
a fragilidade infra-estrutural do município no que tange à água tratada, visto a
importância da bica.
111
Em relação ao tratamento de esgoto sanitário, quando existente, está
diretamente ligado à rede de esgoto pluvial, com a presença de fossas sépticas e/ou
sumidouros.
Podemos observar na figura 39, que os loteamentos feitos por grandes
empresas do ramo imobiliário, (Jardim Porto Alegre, Algarve e Porto Verde),
apresentam tratamento parcial do esgoto sanitário. Segundo relatos de moradores,
no Jardim Porto Alegre, este sistema é bastante ineficiente, visto que os dutos
passam pelos terrenos, e não pelas vias, o que levou muitos moradores om
problemas no sistema, realizarem ligações diretas com o esgoto pluvial.
Figura 39.- Localização de serviços prestados, focos de lixo e indústrias no município. Fonte: Plano
ambiental do município de Alvorada - Diagnóstico Ambiental (2007).
No entanto, dentro do “PAC do Saneamento Básico”, a CORSAN está em
processo de implantação de um Sistema de Esgotamento Sanitário (SES), cuja
estação de tratamento que se localizará junto à Estação de Tratamento de Água
existente. Este projeto, segundo informações obtidas junto à Chefe do Departamento
112
de Responsabilidade Sócio-ambiental Anete Pina, será responsável pelo tratamento
de 40% do esgoto sanitário do município.
Outro sério problema de saneamento básico, diz respeito à questão dos
resíduos sólidos. Apesar de a Prefeitura prestar o serviço de coleta do lixo domiciliar,
à praticamente 100% dos domicílios, como destacado na figura anterior, podemos
observar nas figuras 40 e 41, existem vários focos de lixo no município.
Figuras 40 e 41 Focos de lixo no município, à esquerda, na Rua José Lins do Rego e à direita na
Av. Beira Rio na Vila Umbu, ambos em áreas bastante afastados da zona central do município.
Esta realidade, que não se restringe à Alvorada, é hoje um dos principais
problemas ambientais dos municípios metropolitanos. Além de ser um dos principais
responsáveis pela ineficiência dos esgotos pluviais, os resíduos sólidos descartados
de maneira inadequada poluem os corpos d’água e solo, além de atrair vetores.
Diversos são os fatores que levam a esta situação. Primeiramente, muitas
vezes a degradação das condições de vida, ou mesmo o descaso, fazem com que a
própria população descarte o lixo em seu terreno, no arroio que passa junto à sua
rua (ou aos fundos de sua residência), em áreas verdes ou mesmo na rua e em
terrenos baldios.
Em segundo lugar, e articulado ao exposto acima, muitas famílias apresentam
como forma de sustento a coleta de lixo reciclável, sendo descartado de maneira
imprópria aquilo que não possui valor econômico ou não é reaproveitável. Além da
ação da população comum, existe ainda a ação de carroceiros e papa-entulhos que,
113
ao prestarem o serviço de coleta de resíduos da construção civil ou restos de podas
para os moradores das áreas mais centrais, buscam áreas mais distantes do núcleo
urbano, e, portanto, mais próximo das vilas mais pobres, para descartar estes
resíduos, economizando assim a taxa a ser paga ao descartar, por exemplo, em um
aterro sanitário.
Entretanto, apresar de não podermos isentar a própria população quanto à
questão do despejo irregular de resíduos, é bem verdade também que os serviços
de limpeza urbana não atuam da mesma forma nas áreas periféricas, e a localização
dos focos refletem isto, de que atuam nas áreas de maior visibilidade ou de maior
poder aquisitivo. Aqui cabe relembrar a constatação de Souza ao afirmar que as
camadas mais populares, mais do que causadoras dos problemas ambientais, são
vítimas de suas condições precárias de vida, fruto dos processo de segregação
sócio-espacial.
Se identificarmos aqui os principais fatores ligados aos problemas ambientais
destacados acima, percebemos que se destacam as questões relativas à pobreza e
às desigualdades espaçais (como localização e infra-estruturas). Desta forma,
podemos perceber a direta ligação entre o processo de segregação sócio-espacial e
os problemas ambientais verificados nas periferias metropolitanas, e, no caso em
tela, em Alvorada. O que buscamos chamar a atenção aqui é para o fato de que os
principais problemas ambientais de Alvorada, ou os que afetam mais diretamente a
maior parte de sua população estão diretamente relacionados ao seu baixo
desenvolvimento sócio-econômico e ao processo desigual de produção do espaço
intra-urbano, fruto da posição de Alvorada dentro da hierarquia urbana da RMPA.
4.3 Segregação, Violência e as Condições de Vida em Alvorada.
O município de Alvorada vem, nos últimos anos, recebendo o estigma de
município mais violento do Estado. Não raramente abrimos o jornal, ou assistimos
em noticiários locais, casos de homicídios ocorridos no território alvoradense.
Segundo os dados fornecidos pela Secretaria de Justiça e Segurança do Rio
Grande do Sul, Alvorada fechou o ano de 2008 com 70 casos de homicídio
registrados, ou seja, um índice de, aproximadamente 3,38 mortes a cada 10 mil
habitantes, o maior índice da conurbação em torno de Porto Alegre. Dentre estes
municípios, apenas Esteio (3,05) e Viamão (3,28) apresentam índices acima das três
114
mortes a cada 10 mil habitantes. Para o caso de Esteio, poderíamos amenizar o
resultado obtido pela população do município, que por apresentar menos de 100 mil
habitantes, tem números relativos, de certa forma, superestimados em relação aos
seus números absolutos que não chegam a ser alarmantes (24 casos). Viamão,
que em números absolutos apresentou 83 casos de homicídios, apresenta
semelhanças com Alvorada não só nas estatísticas de homicídios.
Além de ser o município sede de Alvorada antes de sua emancipação em
1965, Viamão compartilha com Alvorada uma localização desprivilegiada de acordo
com a dinâmica da RMPA (estruturada pela BR-116), um Distrito Industrial, o
segundo pior PIB per capita da RMPA, dentre outros índices de baixo
desenvolvimento sócio-econômico.
Enquanto isso, municípios bastante próximos a Alvorada como Cachoeirinha
e Gravataí apresentam índices de homicídios inferiores aos 2 casos por 10 mil
habitantes (1,95 e 1,57 respectivamente). Provavelmente não por acaso são
municípios industrializados com importante crescimento econômico a partir da
década de 1970.
Desta forma, seria possível ligar o fenômeno da violência em Alvorada com os
processos de segregação sócio-espacial verificados no município internamente e
mesmo na hierarquia urbana da RMPA?
A primeira relação entre o processo de segregação sócio-espacial em
Alvorada e os altos índices de violência está relacionada à pobreza e exclusão de
grande parte da população. Chamando a atenção para este aspecto, Souza (2001,
p. 320) afirma que:
[...] Um quadro econômico-social adverso, marcado por expressiva pobreza
(absoluta e relativa) e por um elevado nível de desemprego, se não é o
único fator a explicar o incremento das estratégias ilegais de sobrevivência,
é, decerto, ao menos um dos fatores; além do mais, é um empecilho a
erradicação do problema, um empecilho que cresce não apenas com a
expansão do comércio ilícito, mas também na esteira de sua consolidação
como atividade econômica necessária à sobrevivência de parcelas cada vez
menos expressivas dos pobres urbanos. Em não poucas cidades,
incluindo-se as quatro metrópoles investigadas neste livro, assiste-se a uma
gradual “criminalização” da economia urbana – ou seja, a um incremento da
participação do subsetor ilegal/criminoso, considerado como subconjunto do
setor informal, na economia local -, criminalização essa fundamentalmente
ligada ao tráfico de drogas.
Não se pretende aqui determinar que a violência urbana somente se
manifesta através da pobreza, mas sim que o desemprego/subemprego, a
115
precariedade das condições de vida e moradia e a incapacidade de prover o
sustento mínimo da família leva a uma condição onde a criminalidade pode mesmo
ser entendida como uma “estratégia de sobrevivência” como destaca Souza. Da
mesma forma entende Maricato (1996, p. 77) ao afirmar que:
A exclusão social, como vimos, não é uma característica que chegou à
sociedade brasileira com a chamada “globalização”. A novidade trazida pelo
aprofundamento da pobreza nos 80 foi a explosão da violência urbana, que
apresenta números e dimensão até então inéditas. Estamos nos referindo
aqui à violência expressa na criminalidade, em particular nos homicídios,
mas é necessário lembrar que constitui em expressão de violência a
exclusão econômica, social, cultural, legal e ambiental da qual viemos
tratando até agora... O crescimento dos homicídios e latrocínios, entretanto
(ao lado de roubos, seqüestros, assaltos, etc.), é tão espetacular a partir
dos anos 80, que se impõe como evidência, uma vez que passa a fazer
parte da experiência pessoal de cada dia, não apenas como assunto dos
que tem muito a perder, mas também, e sobretudo, dos que têm apenas a
própria vida . Inúmeros são os levantamentos que revelam o que qualquer
cidadão morador de metrópole brasileira sabe: o aumento da violência
criminal.
Desde o início de sua ocupação/produção, Alvorada tem como principal
característica de sua população, ser formada por migrantes com ocupações
profissionais de baixa remuneração, pelos fatores antes abordados. Entretanto,
não existem evidências, e os relatos de moradores antigos confirmam, de que a
violência fosse um problema cujas dimensões fossem verdadeiramente
preocupantes antes da década de 1980.
Entretanto, a crise econômica da década de 1980, aliada ao grande
crescimento populacional ocorrido no município a partir da década de 1970, criam as
condições que culminaram com a explosão dos fenômeno da criminalidade. É nesse
período também que surgiram loteamentos voltados para as classes mais populares
e bastante distanciados das áreas mais centrais do município, tais como a Vila
Umbu, conhecida pelos seus altos índices de violência, e a Vila e o Conjunto
Habitacional Salomé, para citar alguns exemplos.
Em segundo lugar, analisamos a relação entre as formas de
produção/reprodução do espaço urbano e a violência. Sendo Alvorada um município
fruto do processo de urbanização, nos interessa aqui analisar este fenômeno a partir
da perspectiva da violência urbana, que como bem evidencia Maricato “...Se o
conceito de violência urbana não satisfaz, porque permite ocultar a real fonte dos
conflitos, ignorar o ambiente construído como parte integrante da sociedade que
116
produz essa violência (e esse espaço discriminatório) também não satisfaz.
(MARICATO, 1996, p. 85)
Em Alvorada o processo de parcelamento do solo, principalmente entre 1949
e 1964, é caracterizado pelo grande número de pequenos loteamentos, sem infra-
estrutura e sem conexão entre si, se consolidando como elemento marcante da
configuração intra-urbana do município.
A forma da favela, ou seja, de casas empilhadas em morros, cujo aceso
somente é possível através de vielas estreitas é bastante restrita. Entretanto, o
processo de produção espacial fortemente segregado e fragmentado, fruto de
loteamentos projetados/implantados “aos pedaços”, levou à formação de espaços
altamente desconexos e fechados e que de certa forma facilitam o controle por parte
de traficantes, ou de seus subordinados, tornando-se corriqueira a expressão de
moradores ou funcionários públicos de que “dali para frente não é possível entrar”.
Além do histórico processo de loteamentos desconexos, as invasões e
projetos habitacionais e de reassentamento, cuja única preocupação foi a de
acomodar tensões por melhores condições de moradia, o também responsáveis
pela formação de espaços fragmentados.
O caso da Vila Nova Americana neste sentido é emblemático. Buscando uma
alternativa para realocar parte da população da Vila Americana, que sofria com as
enchentes causadas pelo Arroio Feijó, a Prefeitura Municipal buscou negociações
com a Habitasul, agente loteador do Algarve onde se verificam ocupações à beira do
arroio Feijó até hoje, não obtendo êxito.
Com o surgimento dos mutirões por todo Brasil, foi projetado pela prefeitura o
loteamento representado na Figura 42, cuja infra-estrutura foi financiada pelo estado
e os materiais pela União. As casas foram construídas pela própria comunidade,
ficando conhecida como Mutirão. Posteriormente, com o processo de ocupação
irregular, este loteamento viu sua extensão se alterar, criando o que ficou conhecido
como Mutirão II ao norte.
117
Figura 42 Em destaque a Vila Nova Americana e sua baixa conectividade com os demais
loteamentos e com a Av. Pres. Getúlio Vargas. Fonte: Plano de Desenvolvimento Urbano e Ambiental
de Alvorada. Elaborada por William da S. Papi.
Observando a forma do loteamento Nova Americana, percebemos que o
acesso às habitações, a partir do sentido Av. Presidente Getúlio Vargas-Itararé (sul-
norte) se apenas por uma ou duas ruas próximas, com pequenos quarteirões,
cujo controle da entrada e saída de pessoas fica bastante facilitado.
No Parque Residencial Umbu, por exemplo, em uma das saídas de campo, foi
possível verificar a forma ostensiva com que fomos observados. A presença
estranha, movimentou nas esquinas, dois ou três “guardas do tráfico” tentando
identificar os objetivos de nossa visita. Em um caso, inclusive, fomos observados em
um claro aviso de contrariedade de nossa presença naquele local.
Souza (2005) analisa esta relação entre espaço, ou melhor,
território/segregação/violência a partir do processo identificado por ele como
fragmentação do tecido sócio-espacial, destacando sua dimensão política, ou seja,
das relações de poder em que estão envolvidos os mecanismos de segregação
sócio-espacial. Identificando as novas formas de controle e uso do território que se
estabelecem paralelamente ao Estado, através de atividades “informais”, ilegais, ou
de mecanismos de auto-segregação, o autor afirma que:
Como o nome indica, a fragmentação do tecido sociopolítico-espacial coloca
em primeiro plano a dimensão política, vale dizer, a dimensão do poder.
Está-se diante, portanto, de uma fragmentação territorial, no sentido próprio
do termo território: um espaço definido e delimitado por e a partir de
relações de poder. Não importa que a fragmentação não diga respeito a
territórios estatais e sim a territórios cuja formação é conduzida no âmbito
da sociedade civil ou mesmo a territórios ou microterritórios ilegais.
Na verdade, as fronteiras estatais permanecem inalteradas; o que acontece
é que poderes paralelos ao Estado, protagonistas de atividades econômicas
ilícitas, territorializam ostensivamente numerosos pontos do espaço intra-
urbano, notadamente espaços residenciais segregados, desafiando o
controle territorial estatal. Essa formação de enclaves... contribui, de sua
parte, para reforçar na outra ponta do espectro socioeconômico, o
fenômeno da auto-segregação, o qual também possui implicações
territoriais em sentido amplo. (SOUZA, 2005, p. 216 e 217)
118
O surgimento destes territórios, passíveis de controle e usos informais ou
ilegais, pode ser compreendido como resultado do aprofundamento das
desigualdades sociais, da especulação imobiliária, e o conseqüente aumento no
preço de terrenos e imóveis, assim como, do esvaziamento de políticas públicas
voltadas à questão da habitação, que tornaram inacessíveis terrenos e imóveis às
classes mais populares.
Entretanto, ao identificar a relação entre a violência e formas de poder
paralelo sobre o território, por parte dos traficantes, não podemos inferir que
relações ilegais estão ocorrendo à parte da economia formal. Menos correto ainda
seria entender que estas forças se opõem totalmente.
Neste sentido volta a nos subsidiar a idéia de organização da economia a
partir de dois circuitos interdependentes. Souza (2002), analisa o fenômeno do
tráfico de drogas como um fenômeno multiescalar, que se organiza nos níveis
locais/regionais, nacionais e internacionais. Desta forma o tráfico na favela serve
como o braço violento de um circuito econômico muito mais amplo ligado a formas
legais e ilegais do capital, tais como jogo do bicho, capital imobiliário entre outros.
Apesar da crescente demanda por segurança e da relação direta entre este
discurso e a proliferação dos condomínios fechados não só nos municípios da
RMPA, como no Brasil inteiro, e mesmo em diversos países, Alvorada não apresenta
hoje um movimento significativo neste sentido.
Possivelmente por ter se consolidado como um dos municípios mais pobre da
RMPA, este tipo de demanda habitacional, mais diretamente ligada às classes
medias e altas, não apresentaram avanço no município. Desta forma, é a parcela da
sociedade que acumula diversos fatores de vulnerabilidade social que sofre com o
problema da violência, o que de certa forma explica a falta de iniciativas eficazes no
campo do combate à violência no município.
119
5 Conclusão
O núcleo do presente trabalho é buscar entender de que forma as relações de
segregação sócio-espacial dentro da RMPA se manifestam no município de
Alvorada, determinando a forma através da qual seu espaço intra-urbano é
produzido acarretando problemas urbanos.
Para tanto é imprescindível que a análise parta da profunda articulação entre
os fenômenos sócio-espaciais e o tempo histórico, tornando-se importante o esforço
na busca de um a periodização para estes processos.
Desta forma, foi possível identificar em Alvorada três períodos claramente
marcados: o primeiro período se iniciou com o primeiro loteamento Passo do Feijó
em 1949 e se estende até 1965, ainda como Distrito de Viamão, no início do
processo de metropolização do território gaúcho; o segundo, que tem início com a
emancipação do município, corresponde ao processo de consolidação da RMPA e
se estende até, aproximadamente, o final da década de 1980, após a crise
econômica que culmina com a redemocratização e a nova Constituição Federal; por
fim, o terceiro período parte da década de 1990 e se estende até os dias de hoje,
com as mudanças verificadas no Brasil e na RMPA, fruto da reestruturação do
capitalismo e do Estado brasileiro, responsável pela redefinição do pacto federativo
instituído pela Constituição de 1988.
Durante o primeiro período, verificamos que, apesar de pertencente à
Viamão, o território que veio a formar Alvorada foi construído de forma a atender a
contraditórios interesses existentes na capital. Durante a década de 1950, é iniciado
o processo de metropolização com a formação de uma conurbação ao longo do eixo
formado pela BR-116, entre os municípios de Porto Alegre e Novo Hamburgo
22
.
O crescente processo de industrialização e o surgimento de municípios,
respondendo a esta dinâmica econômica, fez com que durante este primeiro período
Alvorada não tivesse grande participação direta neste processo, visto que
juntamente com Viamão, Gravataí e Cachoeirinha, por exemplo, localiza-se a leste
deste eixo, sem comunicação direta com a BR-116.
22
Apesar de entendermos que este eixo poderia ter sido estendido até o município de Caxias do Sul,
o fato de buscarmos entender a formação da RMPA, sobretudo a dinâmica de Alvorada que “não
apresenta história” anterior ao processo de metropolização, levou à diminuição da área a ser
analisada, restringindo-se basicamente ao entorno de Porto Alegre.
120
Apesar disso, neste período se faz sentir em Porto Alegre o aumento da
procura por áreas para habitação, sobretudo por parte da população de mais baixa
renda que, atraída pelas oportunidades de emprego, passam a vir do interior do
estado para capital.
A crescente demanda por terras e o aumento do “fenômeno das malocas”, faz
com que cresçam as exigências legais para novos loteamentos, assim como, o valor
da terra urbana em Porto Alegre, iniciando uma tendência de expulsão de parte da
população mais empobrecida para áreas mais periféricas, inclusive, em municípios
vizinhos.
Respondendo a este processo, inicia-se em Alvorada um vigoroso
parcelamento do solo para fins habitacionais. Pequenos investidores, sobretudo
moradores da capital, compram pequenas parcelas de áreas ainda rurais e as
loteiam para fins urbanos. Entretanto, este processo é antes um processo
especulativo de reserva de terras para ocupação futura do que uma efetiva
demanda, que somente se consolidará em décadas posteriores.
Neste sentido, a definição de Villaça (2001) de transbordamento da metrópole
sobre outros municípios é perfeitamente identificada, sobretudo no caso de
Alvorada. Livre de constrangimentos, de exigências e de fiscalização, estes agentes
loteadores foram projetando pequenos loteamentos, muitos deles desconexos entre
si, formando uma “cidade aos pedaços”. Como resultado da localização, da
inexistência de infra-estruturas e da grande oferta de lotes no ainda Distrito Passo
do Feijó, temos o baixo valor de sua terra urbana, que determinaa faixa sócio-
econômica que ocupará o seu território, a população de baixa renda, ocupada no
município de Porto Alegre.
Portanto se durante o primeiro período de Alvorada não podemos identificar
características sócio-econômicas pela praticamente inexistência de dados sobre o
Distrito, podemos sim verificar duas características fundamentais que determinaram
fortemente a dinâmica do município durante os períodos posteriores: o surgimento
do município como cidade dormitório dos trabalhadores empobrecidos da capital e a
produção de um espaço urbano fragmentado, desconexo e com a total inexistência
de infra-estrutura.
Com a emancipação do município em 1965, se verificou a inexistência de
novos projetos de loteamentos até o ano de 1979. Durante este período, o município
passou a ver seus lotes ocupados por uma população bastante empobrecida, pois
121
como vimos, em 1975, 92% da população apresentava renda inferior a três salários
mínimos.
Entretanto, a primeira contradição entre o processo de desenvolvimento da
economia regional e o caso de Alvorada se a partir da década de 1970, com a
implantação da BR-290 e de quatro distritos Industriais: os dois primeiros nos
municípios de Gravataí e Cachoeirinha, ambos de domínio estadual, e,
posteriormente, dois distritos em Alvorada, um estadual e o outro municipal.
Gravataí, além de ser mais antiga e de possuir, em 1970, 124
estabelecimentos industriais com 2.522 pessoas ocupadas em tal atividade,
apresentava posição privilegiada com o cruzamento das rodovias BR-290 e RS-118
em seu território, local que foi escolhido para a implantação de seu distrito industrial.
Desta forma, Gravataí já à época apresenta excelentes fatores locacionais que
permitem compreender os motivos pelo quais o município atraiu para si um dinâmico
processo de desenvolvimento industrial observado até hoje.
Entretanto a escolha de Cachoeirinha, ou pelo menos da área onde foi
implantado o Distrito Industrial de Cachoeirinha em detrimento de Alvorada é que
não apresenta explicações na dinâmica da economia regional. Cachoeirinha, além
de ter seu Distrito implantado em área contígua ao núcleo urbano, não apresenta
acesso direto a qualquer rodovia, sendo o acesso feito por dentro de Canoas, ou
mesmo saindo da BR-290 e acessando a sua principal avenida através da Av. Flores
da Cunha, a principal avenida do município por conter em si o centro comercial e por
fazer a conexão diária pendular com Porto Alegre.
Em relação ao “efeito de atração” que o dinamismo industrial de uma cidade
pode apresentar, não verificamos tal fenômeno no município. Em 1970,
Cachoeirinha apresentava apenas 59 estabelecimentos industriais com 639 pessoas
empregadas, ou seja, um número bastante limitado que não confere grande
atratividade ao município, se comparado ao desempenho de municípios como
Canoas, Esteio ou mesmo Gravataí.
Alvorada, apesar da ausência de histórico de desenvolvimento industrial
relevante em seu território, apresenta boa localização, com a BR-118 cruzando seu
território, e a BR-290 muito próxima, praticamente limitando parte de seu território à
norte. Além disso, o Distrito Industrial de Alvorada encontra-se mais próximo do
Distrito de Gravataí do que o de Cachoeirinha, aumentando assim suas
possibilidades de atração de indústrias, o que, na prática, acabou não se verificando.
122
Desta forma, fica a lacuna de como explicar a escolha de Cachoeirinha em
detrimento de Alvorada para os investimentos industriais na RMPA. Possivelmente,
questões políticas devem estar presentes, mas que escapam a nossa pesquisa.
Além disso, segundo o Plano realizado pela Metroplan em 1980, eram escassos os
recursos para a desapropriação e dotação de infra-estruturas do Distrito Industrial de
Alvorada (1980, p. 44).
Fica aqui, portanto, a primeira constatação de que Alvorada, na hierarquia da
RMPA, consolidou seu papel como cidade dormitório, ou seja, se “especializou” na
função habitacional. Articulando a monofuncionalidade com as características da
população que é absorvida pelo município, a população de baixa renda, verificamos
que, na verdade, Alvorada não se configura como um caso de especialização, mas
sim como um espaço de segregação econômica e social dentro da RMPA.
Durante este segundo período o município continuará absorvendo a
população trabalhadora de Porto Alegre, ao ponto em que, como evidenciado no
estudo da Metroplan, em 1975, 72,4% da população ocupada, trabalhava em Porto
Alegre (1980, p.63).
A baixa remuneração da população ocupada e a segregação do município em
relação à intensa industrialização da RMPA verificada no período acarretam ainda
em baixo desenvolvimento do comércio local, reforçando assim os baixos índices
econômicos do município, ou seja, reproduzindo o “círculo vicioso” da economia de
Alvorada.
Alvorada passará a participar mais ativamente da dinâmica econômica da
RMPA a partir do novo processo de parcelamento do solo retomado a partir da
década de 1979. Apesar de apresentar ainda grande parte de seus lotes
desocupados, o surgimento do BNH altera profundamente a dinâmica de produção
do espaço interno de Alvorada, cuja função é habitacional.
Apesar do efeito positivo sobre a economia local que estes empreendimentos
possam ter gerado, a completa inadequação entre as unidade habitacionais
construídas, voltadas para assalariados com renda superior a três salários mínimos,
e a população de Alvorada, cuja a grande maioria apresentava renda inferior a esta
faixa, pode ser definido como o segundo movimento de segregação sócio-espacial
de Alvorada em relação à RMPA. Projetados por empreiteiras de Porto Alegre,
possivelmente para atender a demandas de parcela da população da capital, estes
loteamentos se mostram completamente incapazes de responder às demandas da
123
população do município, devido a suas grandes dimensões e incapacidade de
responder às demandas da população com salário inferior à três salários mínimos, o
que acarretou na não implementação de grande parte destes empreendimentos.
Sendo assim, os habitantes de Alvorada que sofrem com a falta da casa
própria, necessitando ocupar irregularmente áreas muitas vezes distantes e/ou que
ofereçam riscos ambientais, são segregados das políticas públicas voltadas para
habitação popular, visto que o único projeto voltado às classes mais necessitadas
deste período, o Conjunto Habitacional Salomé, foi ocupado antes mesmo de ser
inaugurado após dois anos de abandono por dívidas e falências.
Além do problema habitacional que surge neste período no município, é a
partir da década de 1970 que podemos destacar a existência de problemas urbanos
bastante claros no município. Se, durante o surgimento de Alvorada, a pequena
ocupação, que não torna tão necessária a existência de infra-estrutura para
condições de habitabilidade, e a provável similaridade da estrutura urbana básica
dos municípios vizinhos, nos levaram a o analisar a precariedade infra-estrutural
do município como um problema urbano, neste período, com o grande
desenvolvimento técnico e industrial da RMPA e a aceleração do crescimento
populacional do município, não é possível deixar de avaliar este fenômeno.
Com a exceção das vilas mais centrais, e dos loteamentos mais recentes,
cuja infra-estrutura era exigida para que o BNH financiasse a obra, uma grande
parte dos moradores vivia, e ainda vive, em áreas sem rede de distribuição de água
tratada, com precária iluminação pública, ruas sem pavimentação e esgoto pluvial,
cuja água do esgoto sanitários se misturavam em valões ao longo das ruas, dentre
outros problemas.
Com a crise econômica da década de 1980 o município acumulou ainda o
crescente problema da violência e da necessidade de ocupar áreas de forma
irregular, pondo em risco sua própria vida, seja pelas s condições ambientais e
sanitárias destes alojamentos, seja pela crescente relação entre o tráfico e a
violência observados nestas áreas segregadas.
Apesar desta situação de pobreza e crise econômica quase generalizada no
município, é neste período que encontramos as estruturas básicas que responderão
pelo terceiro processo de segregação cio-espacial de Alvorada. Os loteamentos
do Porto Verde, Água Viva e Portal da Bela Vista, este último da década de 2000.
Diferentemente de grande parte dos loteamentos produzidos nas décadas
124
anteriores, estes loteamentos o voltados para população em faixa salarial acima
das que se verificavam em Alvorada.
Com o processo de desconcentração produtiva e a crescente procura por
parte das classes médias de áreas que lhes ofereçam mais conforto por um preço
mais acessível, parte da classe media vai morar em municípios metropolitanos,
sobretudo a partir da década de 1990.
Em Alvorada, estas classes que recentemente vem se instalando, inauguram
uma relação de segregação sócio-espacial de novo tipo. As relações de segregação
que se davam anteriormente ao nível interurbano, entre Porto Alegre e Alvorada,
passam a ser incorporadas no espaço intra-urbano do próprio município.
Surge, portanto, no seio de Alvorada uma série de contradições de
importância muito superior às verificadas até então. Se antes, a população de
Alvorada reivindicava o direito a bens básicos para reprodução de suas condições
de vida, a incorporação do processo de segregação sócio-espacial em seu espaço
intra-urbano possibilita a reivindicação do que Maricato chama de direito à cidade,
ou seja, abre uma nova luta entre classes agora confrontadas no mesmo campo.
Parte da população empobrecida segue segregada ou mesmo aprofunda
suas relações de exclusão social. Entretanto, parte desta mesma população
segregada percebe na presença de uma classe em posição acima dela dentro da
hierarquia sócio-econômica e política, uma oportunidade de novas lutas com ganhos
muito maiores.
Além do elemento dinamizador existente na luta de classes, o próprio
dinamismo verificado na economia, sobretudo no comércio local e na expectativa de
ampliação do número de empresas de grande porte no município, gera novas
oportunidades de emprego, sobretudo para nova geração que vem ampliando seus
índices de escolaridade e capacitação profissional.
Neste sentido, cabe salientar não somente a ampliação de vagas para Ensino
Médio conquistadas pelos habitantes do município, como também o anúncio
23
recente de que Alvorada receberá a primeira escola técnica do município.
Desta forma, por mais contraditório que seja, finalizamos aqui o trabalho
afirmando que a única saída do município de Alvorada é a sua inserção na
economia da RMPA, ou seja, a busca do crescimento econômico desigual que a
23
Informação disponível em http://www.alvorada.rs.gov.br/, acessado em 11 de julho de 2009.
125
coloque em outro patamar de aspirações quanto ao futuro de sua população. Nas
palavras de Rangel:
As pessoas podem fazer uma idéia um pouco romântica de
desenvolvimento econômico, como se ele fosse um paraíso de estabilidade,
bem-estar e paz. É preciso abandonar desde logo estas ilusões. No Brasil,
como em todos os países, o desenvolvimento é um processo doloroso,
repleto de privações, conflitos e inquietações. Tais inquietações são, ao que
parece, uma matéria prima do desenvolvimento, talvez o seu primeiro
motor. Os conflitos de toda natureza são sua expressão. E as privações são
sua conseqüência inevitável, talvez a fonte de novas inquietações. Uma
economia em desenvolvimento não resolve um problema sem criar outro
ainda maior. Salta ininterruptamente de um desequilíbrio a outro...
Mas uma ordem nessa desordem. Uma ordem que construímos com
nossa ação desordenada. o estamos realizando um trabalho de Sísifo,
mas sim saltando de um desequilíbrio a outro, de um problema a outro.
Estamos caminhando. Vejamos como, porque e em que direção...
(RANGEL, 2005, p.41)
Portanto, apesar de inserida segregadamente da dinâmica regional da RMPA,
e de forma desigual, Alvorada deve sua existência às respostas da região aos
problemas dados pelo desenvolvimento da economia local, ou mesmo nacional.
Devemos então, aguardar os rumos que o município irá assumir nos próximos anos,
para identificar quais serão os resultados deste movimento de ainda modesto
crescimento econômico e incorporação das relações de produção/apropriação do
espaço urbano: se o do aprofundamento das desigualdades sociais, ou a melhoria
das condições de vida da população.
126
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