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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO RURAL
CHAIANE LEAL AGNE
AGROINDÚSTRIAS RURAIS FAMILIARES E A REDE DE RELAÇÕES SOCIAIS
NOS MERCADOS DE PROXIMIDADE NA REGIÃO DO COREDE JACUÍ
CENTRO/RS
Porto Alegre
2010
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CHAIANE LEAL AGNE
AGROINDÚSTRIAS RURAIS FAMILIARES E A REDE DE RELAÇÕES SOCIAIS
NOS MERCADOS DE PROXIMIDADE NA REGIÃO DO COREDE JACUÍ
CENTRO/RS
Dissertação submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento Rural da
Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS,
como requisito parcial para obtenção do título de
mestre em Desenvolvimento Rural.
Orientador: Prof. Dr. Paulo Dabdab Waquil
Série PGDR – Dissertação n°115
Porto Alegre
2010
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DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
Responsável: Biblioteca Gládis W. do Amaral, Faculdade de Ciências Econômicas da
UFRGS
A271a Agne, Chaiane Leal
Agroindústrias rurais familiares e a rede de relações sociais nos mercados de
proximidade na região Corede Jacuí Centro/RS / Chaiane Leal Agne. – Porto
Alegre, 2010.
164 f.: il.
Orientador: Paulo Dabdab Waquil.
Série PGDR ; Dissertação n. 115.
Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Rural) - Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Ciências Econômicas, Programa
de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural, Porto Alegre, 2010.
1. Desenvolvimento rural. 2. Agricultura f
amiliar : Relações sociais.
3. Agroindústria familiar : Produção : Mercado. I. Waquil, Paulo Dabdad.
II. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de Ciências
Econômicas. Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural.
III. Título.
CDU 631.115
631.145
CHAIANE LEAL AGNE
AGROINDÚSTRIAS RURAIS FAMILIARES E A REDE DE RELAÇÕES SOCIAIS
NOS MERCADOS DE PROXIMIDADE NA REGIÃO DO COREDE JACUÍ
CENTRO/RS
Dissertação submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento Rural da
Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS,
como requisito parcial para obtenção do título de
mestre em Desenvolvimento Rural.
Aprovada em Porto Alegre, 21 de janeiro de 2010.
Banca Examinadora:
Prof. Dr. Paulo Dabdab Waquil - Orientador
PGDR/UFRGS
Prof. Dr. Leonardo Xavier da Silva
PGDR/UFRGS
Prof. Dr. Glauco Schultz
UNIVATES/Lajeado – RS
Prof. Dr. Marcelino de Souza
PGDR/UFRGS
Aos agricultores familiares, que, com suas estratégias estão (re) criando novas formas de
enfrentar crises financeiras e garantir a reprodução social da família.
AGRADECIMENTOS
A concretização deste mestrado era um sonho almejado desde os primeiros semestres da graduação em
Desenvolvimento Rural e Gestão Agroindustrial da Uergs. Agradeço:
À Professora Dr. Rosangela Lunardi, por me fazer acreditar que esse sonho era possível;
Aos agricultores, pelo aprendizado, convivência, disposição, pelas caronas, cafés e almoços.
Ao orientador Professor Dr. Paulo Waquil, que com dedicação e inteligência, guiou meus passos,
conduziu minhas ideias, me ensinou a ter paciência e sempre demonstrou confiança no nosso trabalho.
À CAPES, pelo apoio financeiro e oportunidade de dedicação exclusiva aos estudos;
Aos professores doutores Egon Roque Fröhlich, Sérgio Schneider, Tatiana Engel Gerhardt, Marta
Júlia Marques Lopes, Johannes Doll, Leonardo Xavier da Silva, Glauco Schultz e Marcelino de Souza.
Seus ensinamentos contribuíram para a reflexão e a realização deste trabalho;
Às instituições e órgãos públicos dos municípios do Corede Jacuí Centro. Agradeço em especial aos
Secretários da Agricultura dos municípios de Cerro Branco e Cachoeira do Sul: Charles Ricardo
Petermann e Marcos Vinicius Cornelli por facilitarem o transporte até as propriedades rurais; À “Dona
Eni”, da pousada Ouro Verde (Restinga Seca) pelo carinho e informações sobre o município;
Às organizações sociais “Casa das Mulheres Trabalhadoras Rurais” de Cachoeira do Sul, “Associação
dos Produtores Rurais” de Paraíso do Sul, “Cooperativa Querência”, de São Sepé, Associação dos
Arrozeiros” de Restinga Seca, pelo atendimento, dedicação e informações sobre os agricultores.
Aos colegas do mestrado e doutorado, pela convivência e troca de conhecimentos;
Agradeço à Li (Elizângela Carvalheiro), que me motivou a estudar mercados, leu com atenção o
projeto de pesquisa, pela amizade e tempo que passamos em pesquisa no Paraná.
À Gisele Martins Guimarães, pelos primeiros ensinamentos sobre agroindústria rural, quando este
trabalho era apenas um projeto;
Aos colegas do grupo de pesquisa: graduandos da UFRGS, mestrandos e doutorandos do PGDR e
CEPAN, coordenados pelo Prof. Dr. Paulo Waquil. As reuniões, discussões e apresentações dos
projetos, dissertações, teses e trabalhos de pesquisa foram fundamentais para o crescimento e
amadurecimento profissional;
Aos funcionários do IEPE: Eliane, Lisiane, Marilene e Norberto, que sempre me atenderam e
responderam meus e-mails de solicitação de ajuda.
A Deus, pela vida e força para superar mais um desafio;
À família, por todo o incentivo e por guiar meus passos em busca do conhecimento;
Ao Ricardo, pela paciência e apoio para atingir meus objetivos.
“[...] iniciamos pela dificuldade no plantio. Nós plantávamos soja e
tivemos problemas. A gente sempre ouve falar em diversificação da
pequena propriedade. Nós precisávamos diversificar, ter outra
alternativa a mais para a propriedade. No começo fazíamos pra
nós e agora não, os doces de figo viraram um negócio pra gente.”
(produtor 39, São Sepé, RS).
RESUMO
A diversificação das atividades produtivas e sociais é uma realidade da agricultura familiar
brasileira. O processamento da produção agropecuária e a inserção do produto agroindustrial
nos mercados são formas desta diversificação. Este trabalho teve como principal objetivo
descrever as relações que formam a rede social dos mercados de proximidade, ou seja,
demonstrar as relações que as ARFs mantêm com outros agentes para realizar as ações de
troca e comercialização de produtos agroindustriais. A região estudada compreende os
municípios que compõe o Corede Jacuí Centro: Cachoeira do Sul, Cerro Branco, Novo
Cabrais, Paraíso do Sul, Restinga Seca, São Sepé e Vila Nova do Sul. O estudo caracterizou-
se como exploratório-descritivo, com a coleta de informações secundárias e primárias. As
informações do IBGE sobre as indústrias rurais serviram de suporte para definir o número de
entrevistas que seriam efetuadas em cada município. Foram realizadas 41 entrevistas, com o
auxílio de um formulário semiestruturado e diários de campo. Utilizou-se de metodologia
qualitativa (análise de conteúdo) e quantitativa (medidas de dispersão: média aritmética
simples e desvio padrão; medidas de localização: máximo e mínimo) para a análise dos dados.
A formação social da rede dos mercados de proximidade envolve interações dos produtores
com atores de instituições e da comunidade, com intermediários, pontes de inserção,
consumidores e demais agentes da sociedade civil. Destaca-se a venda direta para
consumidores urbanos, representando uma média de 51% da produção vendida, cujas formas
de comercialização são: de porta em porta, por encomenda, em feiras, em eventos e na
propriedade. Nas relações de comercialização e trocas com parentes e vizinhos, as famílias
comercializam uma média de 14% e 1%, respectivamente. Estas interações são evidenciadas
pela troca de produtos, matéria-prima e serviços na atividade agroindustrial. Quanto às
relações comerciais com as pontes de inserção e intermediários, correspondem a 19% e 15%
da produção vendida, respectivamente. Para os agricultores, as características de diferenciação
dos seus produtos são: o natural, o jeito de fazer, o sabor, o trabalho do agricultor para
produzir, o preço, a certificação SIM e a produção ecológica. Dentre as inovações destacam-
se: a embalagem, a consistência, o tempero, os sabores, a produção light, o tamanho, a
concentração do produto e a modificação da receita.
Palavras-chave: Agroindústrias Rurais Familiares. Agricultura familiar. Mercados de
proximidade. Relações sociais. Diferenciação. Inovação.
ABSTRACT
The diversification of the social and productive activities is what usually happens in the
Brazilian household agriculture. The agricultural production processing and the agro
industrial product insertion in the markets are manners of this diversification. This paper had
as main objective to describe the relations that constitute the social networking of the
proximity markets to the change and merchandising of the agroindustrial products. The region
studied comprehends the cities that belong to Corede Jacuí Centro: Cachoeira do Sul, Cerro
Branco, Novo Cabrais, Paraíso do Sul, Restinga Seca, São Sepé and Vila Nova do Sul. This
study was characterized as an exploratory-descriptive analysis, with the gathering of
secondary and primary information. The data about agrobusiness provided by IBGE gave a
support to define the number of interviews that would be done in each city. 41 interviews
have been accomplished, with the assistance of a semi-structured form and field diaries.
Qualitative methodology has been used (content analysis) and quantitative (disperse
measurements: simple arithmetic average and standard deviation; localization measurements:
maximum and minimum) for the data analysis. The social formation of the proximate market
networking involves interactions of the producers with actors of institutions and the
community, with middlemen, insertion bridges, consumers and other agents of the civil
society. The direct sale to the urban consumer has been highlighted, representing an average
of 51% of the sold production, whose merchandising forms are: door to door, by order, at
fairs, at events and at the property. In the relationships of marketing and exchanges with
relatives and neighbors, the families commercialized an average of 14% and 1% respectively.
These interactions are spotlighted by the exchange of products, raw material, and services at
the agroindustrial activity. Concerned with the commercial relationship with the insertion
bridges and middlemen, it corresponds to 19% and 15% of the commercialized production,
respectively. According to the peasants, the characteristics that differ their products are: the
natural, the way to make, the flavor, the farmer’s work to produce, the price, the SIM
certification and the ecological production. Among the innovations some are pointed out: the
package, the consistency, the seasoning, the flavors, the light production, the size, the product
concentration and the recipe modification.
Key-words: Household rural agro-industries. Household agriculture. Proximity markets.
Social relationships. Differentiation. Innovation.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Etapas do processo de produção e comercialização de uma ARF...........................32
Figura 2 - Os mercados de proximidade: resultado de interações da agricultura familiar com a
coletividade (relações de parentesco, amizade e/ou vizinhança), e os vínculos com a sociedade
geral (consumidores urbanos)...................................................................................................47
Figura 3 - Divisão política dos municípios do Corede Jacuí Centro - Rio Grande do Sul RS.
Área em destaque: Cachoeira do Sul, Cerro Branco, Novo Cabrais, Paraíso do Sul, Restinga
Seca, São Sepé e Vila Nova do Sul..........................................................................................58
Figura 4 - Engenho de cana-de-açúcar herdado de antepassados (ARF 20, Restinga Seca) e
queijos em maturação, produzido de acordo com o “saber-fazer” de gerações passadas (ARF
31, Paraíso do Sul)....................................................................................................................78
Figura 5 - Rede de relações sociais nos mercados de proximidade na região do Corede Jacuí
Centro - RS...............................................................................................................................89
Figura 6 - Rede de relações para comercialização e troca de produtos e/ou serviços (atividade
de agroindustrialização) das ARFs mediante vínculos de parentesco e vizinhança.................93
Figura 7 - Produção das famílias quilombolas (panificação) na COOPASA, em Restinga Seca.
..................................................................................................................................................97
Figura 8 - Abate de Frangos na ARF 2, na localidade de Forqueta, em Cachoeira do Sul......99
Figura 9 - Espaço de comercialização localizado à margem da rodovia em Restinga Seca
(ARF 10, propriedade de 4.000m²).........................................................................................102
Figura 10 - Placa de identificação da Agroindústria Rural Familiar ARF 15, localizada
paralelamente à rodovia, em Restinga Seca. ..........................................................................103
Figura 11 - Feira Livre Municipal de Cachoeira do Sul: famílias expondo seus produtos
agroindustriais .......................................................................................................................105
Figura 12 - Feira de agricultores familiares ecológicos, assessorados pelo CAPA, em
Cachoeira do Sul.....................................................................................................................106
Figura 13 - Abrangência geográfica da comercialização – área hachurada: locais de residência
dos consumidores ...................................................................................................................108
Figura 14 - Casa das Mulheres Trabalhadoras Rurais esquerda) e alguns produtos
agroindustriais de panificação (à direita), Cachoeira do Sul..................................................113
Figura 15 - Associação dos Arrozeiros (fachada do estabelecimento – à esquerda) e os
produtos agroindustriais das famílias expostos no interior da organização direita), Restinga
Seca.........................................................................................................................................115
Figura 16 - Cooperativa Querência: Fachada do Mercado Colonial da Querência (à esquerda)
e prateleira com produtos agroindustriais (doces, vinhos, mel, derivados da cana-de-açúcar e
panificados), São Sepé............................................................................................................115
Figura 17 - Centro de Comercialização de Paraíso do Sul: fachada do estabelecimento (à
esquerda) e produtos agroindustriais expostos à venda no interior da organização (mel, açúcar
mascavo e artesanato – no centro) e (vinhos e cachaça – à direita). ......................................116
Figura 18 - Frango e suco de uva produzidos sem a adição de conservantes. Destaque para o
Slogan “Frango Caipira” “Ponha mais qualidade na sua mesa” esquerda, produto da ARF
2). Suco de uva com Slogan “Suco de uva natural” (à direita, produto da ARF 26).. ...........121
Figura 19 - Inovações no processo de produção (queijos produzidos pela ARF 7, de acordo
com o processo francês, à esquerda); nas embalagens de isopor (bolachas caseiras, ARF 26, à
direita).....................................................................................................................................125
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Origem das famílias (Ascendência)
.............................................................................
70
Gráfico 2 - Estrutura fundiária (área em hectares) das ARFs...................................................71
Gráfico 3 - Número de produtos agroindustriais (de diferentes tipos) que as famílias produzem
..................................................................................................................................................74
Gráfico 4 - Motivações para o desenvolvimento de atividades agroindustriais.......................79
Gráfico 5 - Dificuldades das famílias para a adoção da certificação SIM ...............................82
Gráfico 6 - Negociação de preço entre produtor e consumidor urbano direto .......................109
Gráfico 7 - Características de diferenciação dos produtos agroindustriais nos mercados de
proximidade............................................................................................................................122
Gráfico 8 - Formas de planejamento da quantidade da produção para comercialização nas
ARFs.......................................................................................................................................128
LISTA DE QUADROS
Quadro1 - Definição da amostra: número de entrevistas planejadas e realizadas....................63
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Índice de Desenvolvimento Humano, Renda, Longevidade e Educação dos
municípios do Corede Jacuí Centro, no ano de 2000...............................................................59
Tabela 2 - Número de estabelecimentos e área (agricultura familiar e não-familiar) dos
municípios da região do Corede Jacuí Centro, no ano de 2006. ..............................................60
Tabela 3 - Principais atividades agropecuárias desenvolvidas pelas ARFs do Corede Jacuí
Centro - RS...............................................................................................................................69
Tabela 4 - Número de atividades agropecuárias desenvolvidas nas ARFs ..............................70
Tabela 5 - Média do número de componentes das famílias, residentes nas ARFs...................71
Tabela 6 - Origem da mão-de-obra na produção das ARFs.....................................................72
Tabela 7 - Quantidade de produtos agroindustriais desenvolvidos pelas ARFs.......................73
Tabela 8 - Origem da matéria-prima das ARFs........................................................................75
Tabela 9 - Produção agroindustrial (derivados) e número de ARFs ........................................76
Tabela 10 - Motivações para as atividades de agroindustrialização nas ARFs........................78
Tabela 11 - Estrutura física, destino dos resíduos da produção das ARFs...............................80
Tabela 12 - Certificação e informalidade das ARFs.................................................................81
Tabela 13 - Dificuldades das famílias para a adoção de certificação nas ARFs ......................82
Tabela 14 - Origem da renda e destino das receitas dos produtos das ARFs...........................85
Tabela 15 - Incentivos institucionais para agroindustrialização...............................................88
Tabela 16 - Identificação das relações sociais das ARFs no âmbito da comercialização e troca
..................................................................................................................................................90
Tabela 17 - Relações de comercialização e troca entre vizinhos, parentes e amigos...............94
Tabela 18 - Locais de comercialização das ARFs (relações de parentesco, amizade e
vizinhança)................................................................................................................................95
Tabela 19 - Relações de comercialização das ARFs com consumidores urbanos .................101
Tabela 20 - Locais de comercialização das ARFs com clientes urbanos diretos ...................104
Tabela 21 - Local de origem (residência) dos consumidores diretos.....................................107
Tabela 22 - Relações de comercialização das ARFs com intermediários e pontes de inserção
................................................................................................................................................112
Tabela 23 - Origem da fórmula da produção agroindustrial ..................................................120
Tabela 24 - Tipos de inovações e as famílias que as desenvolvem........................................126
Tabela 25 - Denominação do produto agroindustrial pelos consumidores ............................126
Tabela 26 - Tempo de armazenagem da produção até comercialização ................................127
Tabela 27 - Forma de propaganda do produto agroindustrial ................................................131
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................18
2 A AGROINDÚSTRIA, OS MERCADOS E O DESENVOLVIMENTO RURAL........22
2.1 ARF e AGRICULTURA FAMILIAR: CONCEITOS.................................................................... 27
2.2 OS MERCADOS: IMBRICAÇÕES SOCIAIS............................................................................... 33
3 OS MERCADOS DE PROXIMIDADE: INTERAÇÕES SOCIAIS?............................39
3.1 COLETIVIDADE E MERCADOS: AS RELAÇÕES DE TROCA E INTERCONHECIMENTO42
3.2 REDES INTERPESSOAIS: OS MERCADOS URBANOS E NÃO URBANOS ......................... 46
3.2.1 Os mercados diretos com o consumidor nos mercados de proximidade: Short food supply chains
............................................................................................................................................................... 49
3.3 OS MERCADOS DE PROXIMIDADE SOCIAL E OS MERCADOS LOCAIS.......................... 51
3.4 A DIFERENCIAÇÃO E INOVAÇÃO DOS PRODUTOS AGROINDUSTRIAIS NOS
MERCADOS DE PROXIMIDADE: CONCEITOS............................................................................. 53
4 O UNIVERSO EMPÍRICO: A REGIÃO DE ESTUDO E METODOLOGIA DA
PESQUISA..............................................................................................................................56
4.1 A REGIÃO DO COREDE JACUÍ CENTRO: ASPECTOS HISTÓRICOS E
SOCIOECONÔMICOS ........................................................................................................................ 56
4.2 METODOLOGIA ........................................................................................................................... 60
5 O SOCIAL E O PRODUTIVO NAS AGROINDÚSTRIAS RURAIS FAMILIARES:
A FAMÍLIA, O TRABALHO E A RENDA.........................................................................67
5.1 PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA, ESTRUTURA FUNDIÁRIA E O TRABALHO FAMILIAR 68
5.2 A DIVERSIDADE DOS PRODUTOS, ESTRUTURA FÍSICA E RENDA FAMILIAR.............. 73
6 A FORMAÇÃO SOCIAL DAS REDES NOS MERCADOS DE PROXIMIDADE DAS
ARFs ........................................................................................................................................86
6.1 VIZINHOS E PARENTES: RECIPROCIDADE, TRABALHO E CONSUMO........................... 91
6.2 A RELAÇÃO SOCIAL PRODUTOR-CONSUMIDOR: A VENDA FACE TO FACE ............. 100
6.3 O ELO DO PRODUTOR-CONSUMIDOR: OS INTERMEDIÁRIOS E AS PONTES DE
INSERÇÃO LOCAIS ......................................................................................................................... 110
7 A DIFERENCIAÇÃO E INOVAÇÃO COMO ESTRATÉGIAS NOS MERCADOS
DE PROXIMIDADE: OS ATRIBUTOS DA PRODUÇÃO AGROINDUSTRIAL.......117
7.1 O DIFERENCIAL E A INOVAÇÃO: A SINERGIA ENTRE PRODUÇÃO E CONSUMO?.... 118
7.2 O PRODUTO AGROINDUSTRIAL E AS FORMAS DE PROPAGANDA: A AMPLIAÇÃO DA
REDE DE CONSUMIDORES............................................................................................................ 129
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................132
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................139
APÊNDICE A - Formulário semiestruturado - Coleta de dados - Agroindústrias Rurais
Familiares – ARF ...................................................................................................................154
APÊNDICE B - Descrição dos produtos agroindustriais desenvolvidos pelas ARFs do
Corede Jacuí Centro - RS .......................................................................................................160
APÊNDICE C - Tipos de inovações empregadas e as respectivas famílias que as
desenvolvem...........................................................................................................................162
ANEXO - Tabela 1 - Transformação ou beneficiamento de produtos agropecuários (produtos
e derivados) quanto a forma de comercialização na região do Corede Jacuí Centro - RS.....163
18
1 INTRODUÇÃO
As perspectivas atuais sobre a temática do Desenvolvimento Rural apontam para a
emergência de novos interesses de pesquisa ligados especificamente à compreensão das
diversas maneiras pelas quais os atores
1
sociais rurais manejam suas dificuldades da vida
cotidiana. A agricultura familiar tem sido objeto de estudo e componente desse debate, pois os
produtores estão adotando alternativas produtivas tendo em vista a sua própria inclusão social
e econômica.
Esta inclusão é resultado de um processo caracterizado por um conjunto de ações
desenvolvidas por esses atores e envolvem atividades políticas, sociais, econômicas,
ambientais, culturais, e a sua interação com os demais agentes da sociedade civil (instituições,
organizações sociais, órgãos públicos e privados, universidades, etc.). Nesta rede de relações,
os agricultores familiares estão trocando informações e desenvolvendo novas atividades de
produção e comercialização.
A troca de informações pelos atores nestas redes sociais pode explicar o
desenvolvimento de novos conhecimentos, de atividades produtivas, bem como o
aperfeiçoamento de ações já realizadas pela agricultura familiar. Componente desta discussão,
a Agroindústria Rural Familiar - ARF destaca-se como uma atividade dinâmica, onde os
agricultores empregam desde os conhecimentos técnicos nas atividades de produção
agropecuária e processamento até as estratégias que envolvem a negociação dos produtos e a
conquista de mercados.
Frutas sendo transformadas em geleias, verduras e legumes processados e
conservados, carnes transformadas em embutidos, leite em queijo, são alguns exemplos de
produtos gerados pelos agricultores. As motivações das famílias para produzir estão
relacionadas com os aspectos culturais, históricos, sociais e econômicos, podendo estar
atrelada à finalidade de alimentação do grupo doméstico e/ou com o objetivo de auferir renda.
Desta forma, as ARFs apresentam-se com uma série de oportunidades de pesquisas,
com elementos de análise que se situam desde os aspectos da produção à comercialização.
Entretanto, a escolha do tema possui uma motivação pessoal, resultado de uma trajetória de
1
As palavras atores e agentes serão utilizadas neste trabalho como sinônimos. Neste sentido, os atores e agentes
serão identificados como sujeitos que participam das ações de produção, comercialização e consumo de produtos
agroindustriais, que fazem parte da rede social dos mercados de proximidade.
19
experiências realizadas com agroindústrias familiares (rurais e urbanas) no município de
Cachoeira do Sul, no período de 2005 a 2007. Nos resultados destas pesquisas, a atividade
agroindustrial indicou ser fonte de renda, geração de empregos e agregação de valor aos
produtos agropecuários (AGNE; LUNARDI, 2007). Contudo, apesar do conhecimento prévio
sobre os benefícios econômicos que as famílias estavam gerando com essa atividade, surgiram
questões e lacunas pertinentes para uma nova pesquisa. Entender como as famílias
conseguem inserir seus produtos nos mercados, o conhecimento e o planejamento que
possuem sobre a produção para atender os objetivos de consumo dos seus clientes, e quais as
relações sociais que estão dinamizando a comercialização surgiram como indagações.
Assim, o presente trabalho fundamentou-se na tentativa de compreender a seguinte
questão: quais relações sociais (ARFs e outros atores) estão formando a rede social nos
mercados de proximidade, no que se refere ao desenvolvimento das ações de troca e
comercialização de produtos agroindustriais? Desse modo, o objetivo geral deste trabalho
será descrever as relações sociais que formam a rede social dos mercados de proximidade,
demonstrando as relações que as ARFs mantêm com outros agentes para realizar as ações de
troca e comercialização de produtos agroindustriais.
Nos objetivos específicos, propõe-se:
(1) caracterizar socioeconomicamente as ARFs nos aspectos da produção agropecuária
e agroindustrial, estrutura fundiária, trabalho e origem da renda da unidade;
(2) identificar as diferentes relações sociais que as ARFs utilizam para a
comercialização e troca dos seus produtos, representando quantitativamente a porcentagem
referente ao total da produção comercializada em cada canal mediante as relações de
parentesco, amizade e vizinhança, pontes de inserção, intermediários e vendas diretas aos
consumidores urbanos;
(3) identificar as características que estão diferenciando a produção e as inovações
desenvolvidas nos produtos das ARFs.
A pesquisa caracteriza-se em compreender as relações sociais que estão compondo os
mercados de proximidade para as famílias situadas na região central do Rio Grande do Sul,
cujo recorte de análise compreende uma amostra de ARFs dos municípios componentes do
Corede Jacuí Centro. Essa região é formada pelos municípios de Cachoeira do Sul, Cerro
Branco, Novo Cabrais, Paraíso do Sul, Restinga Seca, São Sepé e Vila Nova do Sul e é
caracterizada pela expressividade no número de estabelecimentos familiares (INCRA, 2008).
Através da industrialização da produção agropecuária, os agricultores estão
desenvolvendo diversos produtos, que são os derivados do leite, carnes bovinas, suínas,
20
ovinas, caprinos e embutidos, sucos, geleias e componentes do processamento de frutas,
derivados da cana-de-açúcar, entre outros, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística - IBGE, Censo Agropecuário – 1995/1996.
As formas como as famílias vinculam-se com os diferentes mercados é uma questão
de interesse e motivação pessoal, que relaciona duas temáticas (ARF e mercados) na área
do Desenvolvimento Rural cujos conhecimentos são limitados. Compreender como as
famílias estão desenvolvendo suas atividades de produção e comercialização agroindustrial é
pertinente, especialmente pela necessidade de diagnosticar os canais de venda dos produtos.
Assim, os estudos visando retratar o funcionamento destes mercados podem servir de
subsídio para a elaboração e avaliação de políticas públicas relacionadas às formas de
produção e comercialização das ARFs. Entretanto, o trabalho não restringiu a pesquisa com as
ARFs que produzem informalmente, porque as características “formal” e “informal
2
não são
requisitos para identificar quais são os canais de comercialização das agroindústrias. Por
exemplo, a certificação formal não é uma condição para a exclusão de relações diretas de
comercialização, assim como a informalidade não é um requisito para as famílias não
possuírem relações com intermediários.
As informações disponíveis no Censo Agropecuário 1995/1996, divulgadas pelo
IBGE, fornecem indicativos de que a maneira predominante de comercialização das
agroindústrias é aquela caracterizada pelas relações diretas com consumidores. No entanto,
ainda surgem questões com o intuito de identificar quem são esses consumidores (parentes,
vizinhos), como a agricultura familiar está desenvolvendo essas relações (diferenciação e
inovação dos produtos), e que agentes (institucionais, órgãos públicos, sociedade civil) estão
participando das atividades de produção, comercialização e consumo.
Toda realidade empírica tal como originou a problemática dessa pesquisa, exige a
escolha de referenciais teóricos, conceitos e noções consistentes capazes de servir de guia
para a produção de conhecimentos científicos. Assim, o trabalho está estruturado de forma a
apresentar no segundo capítulo, a relação entre as temáticas: ARF, agricultura familiar,
mercados e Desenvolvimento Rural, abordando conceitos e perspectivas teóricas.
2
A informalidade é diferenciada do termo ilegal, porque a primeira diz respeito a uma atividade cujos processos
de produção não se enquadram nos padrões de regulação vigentes. Já a ilegalidade é um ato (crime) que
pressupõe a repressão da polícia e não de um órgão fiscalizador, como é o caso da informalidade (WILKINSON;
MIOR, 1999). A formalidade das ARFs refere-se ao conjunto de documentos que permitem o funcionamento da
estrutura produtiva e comercialização dos produtos. A documentação envolve licenciamentos, de acordo com
cada caso. As licenças são ambientais, jurídicas e sanitárias que garantem “formalmente” a sanidade da produção
e a
preservação dos recursos naturais (no caso da licença ambiental), conforme mencionam Pelegrini e Gazolla
(2008).
21
Posteriormente, no terceiro capítulo será abordada a discussão sobre a noção de mercados de
proximidade, com a apresentação das correntes teóricas que embasam a identificação das
relações sociais que estão formando a rede dos mercados para as ARFs. Neste capítulo será
discutida ainda a noção de proximidade como resultado de interação social e não como um
espaço geográfico delimitado. Posteriormente, serão abordados conceitos e autores que
embasam a discussão sobre diferenciação e inovação da produção agroindustrial familiar.
Na sequência, como parte posterior à fundamentação teórica, serão apresentadas as
características da região na qual se aplicou a pesquisa, assim como os materiais e métodos que
guiaram a coleta e análise dos dados, formando o quarto capítulo da dissertação. No quinto
capítulo serão retratadas as características produtivas, as questões de gênero, renda, produtos
agropecuários, trabalho e estrutura física das ARFs.
No sexto capítulo será apresentada a formação social da rede nos mercados de
proximidade, demonstrando quantitativamente e qualitativamente a participação das relações
sociais nos canais de comercialização e troca. Tais relações estão caracterizadas segundo a
divisão pelas relações de vizinhança e parentesco, com intermediários e pontes de inserção
locais e a relação produtor-consumidor urbano.
No penúltimo capítulo serão apresentadas quais as características que estão
diferenciando os produtos agroindustriais nos mercados de proximidade, retratando a própria
diferenciação como uma das estratégias
3
que as ARFs utilizam para a consolidação dos
mercados. Além disso, pretende-se discutir a definição de diferenciação dos produtos das
ARFs que transcende as características vinculadas ao natural, social, ambiental, cultural, etc.
Para embasar esta discussão, faz-se pertinente apresentar as inovações, neste trabalho,
identificada pelo desenvolvimento de novos produtos e/ou modificação de processos
produtivos nas ARFs.
3
Não uma definição única no que se refere a palavra estratégia. Dentre outras formas, a estratégia pode ser
entendida como um plano e ações que tenham como finalidade atingir um determinado objetivo (MINTZBERG
et al.,1996). Assim, quando menciona-se a palavra “estratégia” neste trabalho, ela está relacionada ao
planejamento e ações que as famílias estão desenvolvendo para comercializar os produtos agroindustriais, obter
renda, expandir as vendas, conquistar e fidelizar consumidores, etc.
22
2 A AGROINDÚSTRIA, OS MERCADOS E O DESENVOLVIMENTO RURAL
Do ponto de vista teórico, destacam-se duas vertentes divergentes na forma de tratar a
inserção da agricultura familiar nos mercados. Essa inserção se apresenta sob a forma de
comercialização e/ou compra de produtos, assim como pela externalização de insumos,
trabalho e/ou tecnologia para complementar a produção das famílias
1
. A primeira vertente
destaca a situação da agricultura familiar como agente de especialização, onde os esforços de
trabalho e produção estão concentrados no desenvolvimento de produtos cuja finalidade é a
venda por meio de integração às empresas agroindustriais. A dominação destas companhias
no que se refere às técnicas de produção e comercialização de alimentos agropecuários são os
argumentos. Nesta visão destacam-se os autores Goodman et al. (1990), Bonano (1999),
Batalha et al. (2004).
A segunda perspectiva destaca o reconhecimento do agricultor familiar como um
agente de interação social e com participação efetiva na construção de seus resultados
econômicos. Seguindo esta vertente de pensamento, destacam os trabalhos de Ploeg (2008) e
Long (2007) e a perspectiva da teoria centrada ao ator, revelando a capacidade de agência da
agricultura camponesa na construção de estratégias dos seus meios de vida.
O reconhecimento da agricultura familiar como um agente de interação com a
sociedade não é componente de um debate novo. As sociedades camponesas, retratadas nos
trabalhos de Chayanov (1974), Mendras (1978), Shanin (1980), desenvolviam relações com o
ambiente interno (familiar e comunidade), e vinculavam-se socialmente com diferentes
setores econômicos (ambiente externo
2
). Nos trabalhos de Abramovay (1992; 2000), percebe-
se ainda o agricultor familiar como participante de estratégias de viabilização de suas
atividades produtivas.
1
A externalização de insumos/mão-de-obra/tecnologia (como dependência para desenvolver o processo
produtivo) e/ou a compra de alimentos que as famílias necessitam e não produzem, correspondem às ações do
processo no qual Ploeg (1992) denominou de mercantilização. “Trata-se de um processo pelo qual o agricultor
passa a ter a sua reprodução social e econômica dependente do mercado(GAZOLLA, 2006, p.83). Portanto, é
um processo que envolve uma multiplicidade de relações nos mercados e não somente a relação de
comercialização de produtos, como é o foco deste trabalho.
2
O sentido de ambiente externo será compreendido nesta dissertação como aquele ambiente “fora da porteira”
da propriedade rural, não tendo a intenção de discutir sobre o continuum entre o rural e urbano, como comenta
Wanderley (2000).
23
Esses referenciais trazem à tona a discussão sobre a habilidade da agricultura familiar
no desenvolvimento de relações amplas com diversos setores econômicos, bem como a
pertinência para o conhecimento de que estas relações não se reduzem à unidade de produção
(família) e seu entorno (vizinhança).
Neste contexto, Marsden (1992, 1998), Ploeg (1997; 2006) e Wanderley (2000)
discutem ainda sobre a caracterização dos novos espaços rurais. Esses espaços adquirem a
diversidade não somente nas formas de produção, mas de interação. As distintas relações
sociais, econômicas e culturais dos agricultores preservadas com a sociedade rural ou ainda,
sendo resultado de contatos com agentes urbanos, caracterizam uma nova dimensão do olhar
teórico e empírico do Desenvolvimento Rural. Esta discussão direciona pesquisas na tentativa
de compreender não somente quais são os produtos da agricultura familiar, mas suas
características enquanto um agente de estratégias para a sua própria inclusão e
desenvolvimento de espaços econômicos.
O emprego de uma diversidade de estratégias, a incorporação de mudanças, inovações
e a participação de mercados dinâmicos caracterizam a agricultura familiar como um setor
competitivo e de capacidade produtiva eficiente (ABRAMOVAY et al., 2003). A comunidade
rural, entendida na presente dissertação como o conjunto de relações sociais próximas
geograficamente das famílias, tais como organizações locais, igrejas, grupos informais,
relações de vizinhança, parentesco, entre outros, pode estar sendo caracterizada como canal de
comercialização dos produtos agropecuários e agroindustriais. Não obstante, as relações dos
agricultores com atores pertencentes a órgãos públicos e privados podem ser ainda outros
meios de desenvolvimento de suas atividades de produção, consumo, mercados de trabalho e
de venda de produtos. Os sistemas financeiros, organizações sociais, são outros exemplos do
conjunto de interações, que auxiliam no desenvolvimento de atividades agrícolas, não-
agrícolas e nas ações de comercialização, como o auxílio ao crédito, à informação, à
assistência técnica, etc.
No conjunto destas habilidades, a agricultura familiar desenvolve a industrialização de
sua produção agropecuária e, vinculada a esta produção, suas estratégias estão sendo
formuladas para encontrar um espaço promissor de venda de seus produtos. A realidade social
dos mercados permite reconhecer que existem tanto os agricultores que comercializam a
produção certificada quanto os que não possuem qualquer identificação padronizada.
Entretanto, independente de certificação para a produção, as famílias estão desenvolvendo
estratégias para inserir, conquistar e desenvolver mercados.
24
Poucos pesquisadores questionam sobre as agroindústrias e suas relações informais
nos mercados. A temática Agroindústria Rural Familiar é retratada como uma oportunidade
de agregação de valor e renda, podendo também gerar outros serviços e empregos chegando
enfim, até o sentido mais amplo da noção complexa de Desenvolvimento Rural. No entanto,
torna-se pertinente a agenda de pesquisas que objetivam retratar o conjunto de interações que
a agricultura familiar mantém com diversos agentes sociais, que desenvolvem suas atividades
produtivas e comerciais. Não obstante, o conjunto dessas interações pode explicar e direcionar
a forma como é conhecida a realidade social destas famílias.
Ressaltando, a discussão sobre o Desenvolvimento Rural deve abarcar as interações
que a agricultura familiar possui com a sociedade em geral, sendo esta a forma de conhecer e
compreender as estratégias de dinamização econômica e social dos espaços rurais atuais. A
escassez desta discussão é objeto de crítica de Garcia-Parpet (2002, p.205):
[...] “a falta de rigor analítico sobre as práticas mercantis entre camponeses
brasileiros parece estar presente na maioria das concepções de universitários, de
membros da alta administração ou de políticos implicados na gestão de formas de
comercialização de alimentos”. [...] “seria como se o comércio não preenchesse
nenhuma função social e devesse ser eliminado ou substituído em prazo mais ou
menos longo”.
Relacionando a temática ARF, os mercados e a noção de Desenvolvimento Rural,
percebe-se a abrangência de assuntos que podem ser estudados mediante o uso dessa
associação. A ARF é mais do que um conjunto de atividade agrícola e não-agrícola, que
mescla a produção agropecuária e a industrial pelo processamento. A agroindustrialização
destaca-se como uma forma de diversificação produtiva, construída por um conjunto de
fatores sejam eles institucionais, sociais, econômicos, culturais, etc. A produção adquire uma
função social no que diz respeito ao seu aproveitamento para a alimentação da família e os
mercados adquirem pertinência como um meio de viabilização destas ações. Os produtos da
ARF são como “pontes” unindo agricultores e consumidores, pois por meio de sua produção,
os agricultores estabelecem vínculos, desenvolvem mercados e garantem um meio de renda
para a família.
Nos últimos anos, vêm se destacando as pesquisas sobre as formas de comercialização
dos agricultores e a manutenção e conquista de consumidores para seus produtos. Estas
perspectivas estão relacionadas, sobretudo, pelas estratégias emergentes de Desenvolvimento
Rural na Europa, onde se observa a crescente discussão sobre as formas de produção dos
agricultores (diferenciação dos produtos) e seus nichos de mercados (MARSDEN et al., 2000;
25
RENTING et al., 2003). Estas formas estão ligadas à preservação da natureza, à cultura e às
características regionais, aos movimentos de divergência sobre a alimentação padronizada, à
relação com a paisagem, hábitos saudáveis, biodiversidade, etc. Este discurso está relacionado
a uma série de motivações, tanto por parte dos agricultores quanto pelos demais agentes que
participam destas estratégias, inclusive pelos próprios consumidores.
Sob essa perspectiva, a noção de Desenvolvimento Rural surge de uma discussão
focada no rural para um debate amplo, cujo retrato concentra-se não somente nas formas de
produção, mas também pela multiplicidade de atividades e práticas (atividades agrícolas, não-
agrícolas, inovações, empreendedorismo, conservação da natureza e paisagem), que estão
sendo desenvolvidas através da interação dos agricultores com uma diversidade de agentes
(CONTERATO, 2008).
Além disso, considera-se que o Desenvolvimento Rural está ancorado não somente nas
potencialidades de uma determinada localidade, mas na capacidade de interação da
comunidade com outras regiões (FLOYSAND; SJOHOLT, 2007). A diversificação das
atividades e o desenvolvimento de novos produtos são formas de viabilizar a produção da
agricultura familiar. As ações de produção e comercialização dependerão da construção e
desenvolvimento de relações sociais nos mercados. Desse modo, ganha destaque a pertinência
em reconhecer os canais de comercialização e o conjunto de relações que desenvolvem e
facilitam estas ações.
A inserção das famílias nos mercados pelas atividades da ARF exige dos agricultores a
produção, o planejamento e o gerenciamento, além do desenvolvimento de contatos sociais
diversificados. Tais mercados requerem, sobretudo, constantes relações sociais de normas
formais e informais
3
. Nestas relações, agentes sociais institucionalizados formal e
informalmente são componentes de redes sociais. Esta abordagem traz à tona a pertinência
em questionar a viabilização social e econômica das atividades de agroindustrialização, que se
relacionam diretamente com as formas com as quais as famílias estão encontrando mercados
que preservem e valorizem os seus produtos.
3
Quando se menciona relações sociais formais e informais diferencia-se do sentido de comercialização formal e
informal. As relações sociais formais ou instituição formal é resultado de acordos sociais em que exige um
contrato ou uma formalidade explicitada por meio de documentação. Já as relações ou instituições informais não
requerem qualquer tipo de contrato ou documentação formal, pois os indivíduos realizam acordo mediante
relações de confiança.
26
Os produtos das ARF, por exemplo, são dotados de características de diferenciação
4
e
são estes aspectos que estão sendo valorizados pelos consumidores. Entretanto, sabe-se que
estes consumidores estão caracterizados como um nicho de mercado
5
, porque têm
preferências alimentares distintas e condizentes aos produtos oferecidos pelos agricultores.
A relação das ARF com seus mercados pode indicar novas maneiras de se pensar em
estratégias de Desenvolvimento Rural no Brasil. Para Abramovay et al. (2003), as políticas
públicas no país devem considerar os agricultores familiares enquanto agentes sociais que
podem ter acesso aos mercados dinâmicos e promissores. Para isso, emergem tanto políticas
públicas quanto publicações científicas dedicadas, respectivamente, ao desenvolvimento de
estratégias e à compreensão de quais mercados participa a agricultura familiar. No que se
refere às políticas públicas no Brasil, destacam-se os mercados institucionais, que são canais
de comercialização que oportunizam aos agricultores familiares o escoamento da sua
produção.
Como componente destas iniciativas, o PAA - Programa de Aquisição de Alimentos -
destaca-se pela promoção de ações para o fortalecimento da agricultura familiar, por parte do
governo federal, e para viabilizar o acesso aos alimentos para populações em situação de
insegurança alimentar e nutricional. A estratégia apresenta-se como uma política pública
institucional relacionada ao Programa Fome Zero. De caráter semelhante, o PNAE - Programa
Nacional de Alimentação Escolar - caracteriza-se pela transferência de recursos do governo
federal aos estados, Distrito Federal e municípios, que são utilizados para a compra de
alimentos agropecuários destinados à alimentação escolar. As duas iniciativas enquadram-se
nas formas como estão sendo aplicados e adaptados politicamente os debates teóricos sobre a
convergência entre produção e consumo na perspectiva de estratégias componentes do
Desenvolvimento Rural.
a pertinência de compreender as redes sociais nas quais estão imbricadas tanto as
relações de produção quanto as atividades de comercialização (GARCIA-PARPET, 2002).
Estas redes de sociabilidade estão sendo construídas com a intenção de aproximar
consumidores e produtores, aproveitando a potencialidade local tanto por parte da produção
agropecuária quanto pela preservação do hábito alimentar populacional. O escoamento da
produção da agricultura adquire uma dimensão local, de proximidade e interação social, com
4
A diferenciação será entendida neste trabalho como todas as características que diferem processos e produtos
nos mercados de proximidade.
5
Consideram-se como nicho de mercado, os consumidores dos produtos da ARF, podendo ser resultado de
relações diretas (face a face) ou indiretas (intermediários, pontes de inserção, revendedores, etc.).
27
o consumo destes produtos no próprio município, regiões ou estados. Renting et al. (2003)
destaca a pertinência de estudos empíricos que contemplem essas novas formas de
organização com o intuito de compreender as características sociais que estão enraizadas
nestes mercados. Resultado de uma construção política, social e institucional, os mercados
para as ARF vêm se destacando nessa dimensão, onde os agricultores encontram
oportunidades e constroem nichos de mercados em que a análise sobre uma base sociológica
torna-se pertinente.
2.1 ARF e AGRICULTURA FAMILIAR: CONCEITOS
O termo agricultura familiar é fortemente discutido no Brasil entre acadêmicos,
gestores de políticas públicas, órgãos relacionados ao meio rural, etc. No conjunto destes
debates encontram-se tanto conceitos que são utilizados para operacionalização de políticas
públicas quanto uma série de noções cuja aplicação se insere em pesquisas científicas. Apesar
de inúmeras vertentes teórico-analíticas, podem-se destacar tanto aspectos convergentes
quanto divergentes na forma como a sociedade civil (seja acadêmica, órgãos públicos, agentes
de extensão rural e outros) vem identificando a agricultura familiar no Brasil.
Dessa forma, algumas características parecem estar presentes nos inúmeros estudos e
debates sobre a agricultura familiar. A primeira delas diz respeito à relação entre trabalho e
família, onde a gestão da propriedade e as atividades produtivas são coordenadas pelo grupo
doméstico (WANDERLEY, 2001). O segundo aspecto se refere à diversidade social do setor,
onde as famílias possuem diferentes maneiras de produzir, de relacionar-se com a
comunidade, de utilizar os recursos naturais, de negociar seus produtos, etc. Em concordância
com Niederle e Wesz Júnior (2009, p.18) “essa diversidade é fruto da coexistência de distintas
formas sociais de produção e das múltiplas estratégias de reprodução social, econômica e
cultural que as mesmas desenvolvem”.
Os agricultores familiares apresentam nas suas características sociais e tradicionais
uma estreita relação histórica com o campesinato (WANDERLEY, 2001). A produção
destinada ao consumo familiar e para comercialização, a prioridade pelo bem-estar do grupo
doméstico, como afirma Chayanov (1974), são outros elementos que distinguem a agricultura
familiar das demais empresas situadas no meio rural.
28
Relacionar a agricultura familiar e a agroindústria requer a escolha de uma definição
teórica que possa embasar a análise da presente pesquisa. Assim, considera-se como
agricultura familiar o desenvolvimento do trabalho e gestão pelos membros da família (como
mencionam Wanderley, 2001 e Guanziroli, 2001), podendo contratar mão-de-obra em regime
temporário, como afirma Schneider (2003). O trabalho temporário é executado nas épocas em
que é pertinente a alocação de mão-de-obra para complementar o serviço exercido pela
família, como colheitas, abate, plantio, etc.
Na agroindústria, o grupo doméstico assume a responsabilidade no que tange às
escolhas sobre quais serão as atividades produtivas que irão desempenhar, assim como o uso e
destinação de recursos econômicos, sociais e ambientais (PELEGRINI; GAZOLLA, 2008).
A responsabilidade sobre a produção exercida pela família e a relação estreita entre o que é
produzido e consumido são alguns aspectos de identificação da agricultura familiar no Brasil,
citado por Martins et al. (2007, p.22), no documento para a elaboração das diretrizes do
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF:
[...] considera-se como agricultura familiar aquela em que os trabalhos em nível de
unidade de produção são exercidos predominantemente pela família, mantendo ela a
iniciativa, o domínio e o controle do que e do como produzir, havendo uma relação
estreita entre o que é produzido e o que é consumido, (ou seja, são unidades de
produção e de consumo), mantendo também a diversificação produtiva, tendo alguns
produtos relacionados com o mercado.
No presente trabalho, quando se menciona o termo ARF deve-se deixar claro que a
agricultura familiar encontra-se como um agente produtor, sendo que a família é o ator,
aquela que realiza todas as etapas, inclusive a interação com agentes componentes dos
mercados de proximidade. Sabe-se, no entanto, que as agroindústrias podem ter ligação ou
não com a agricultura familiar, porque o espaço rural brasileiro é diversificado, com a
presença de empresas agroindustriais.
Com base na definição de Mior (2007, p. 10), “agroindústria familiar rural é uma
forma de organização onde a família rural produz, processa e/ou transforma parte de sua
produção agrícola e/ou pecuária, visando, sobretudo, a produção de valor de troca que se
realiza na comercialização”. No entanto, os produtos gerados pelas agroindústrias podem ter
origem no beneficiamento e/ou transformação de produtos agrosilvopastoris, aquícolas e
extrativistas, incluindo o artesanato
6
(MDA, 2004).
6
Optou-se pela pesquisa com as Agroindústrias Rurais Familiares que produzem alimentos, embora possam
existir unidades na região que desenvolvem outros produtos cuja origem da matéria-prima é a agropecuária. Ex:
sabão, vassoura, algodão, lã, artigos de couro e madeira, etc.
29
São vários os autores que conceituam a Agroindústria Rural Familiar: Mior, 2005;
2007; Prezotto, 2002; Pelegrini e Gazolla, 2008; Guimarães e Silveira, 2007. Estes autores
utilizam conceitos definidos de acordo com a realidade social das famílias que fizeram parte
de seus trabalhos. Dessa forma, será utilizada a definição de ARF de acordo com as
características mencionadas por estes autores e a complementação de aspectos da realidade
social das famílias que fizeram parte da pesquisa, quais sejam:
a atividade de beneficiamento e/ou transformação
7
da produção agropecuária que
gera produtos alimentícios;
o processamento que pode ser realizado numa estrutura física específica e/ou na
residência (lar) da família, localizada no meio rural;
o grupo doméstico que é caracterizado pelas relações de parentesco, consaguinidade
e/ou adoção. Assim, no decorrer do trabalho será utilizada a expressão “grupo doméstico”
como sinônimo de família. A família caracteriza-se pelo conjunto de pessoas que residem na
mesma unidade, participando de qualquer atividade relacionada à produção, trabalho e
consumo.
a mão-de-obra para a execução das ações de produzir e processar a produção
agropecuária que é de origem familiar, podendo haver contratação temporária (diaristas ou
mensalistas) ou troca de serviços com vizinhos. A gestão das atividades de produção e
comercialização é coordenada pela família. De acordo com Santos (2006), as atividades
gerenciadas pela família não se resumem ao emprego de força de trabalho na unidade para a
produção e processamento, mas também às decisões de planejamento e de comercialização da
produção, atuando em todas as etapas, com a complexidade e dificuldade inerente à cadeia
produtiva;
a ARF que pode ser desenvolvida cooperativamente (associações, cooperativas) ou
possuir caráter individual (uma única família);
a matéria-prima (produção agropecuária, bem como insumos complementares -
aditivos, ingredientes - utilizados no processamento) que pode ter origem própria (família)
e/ou de terceiros. A aquisição de matéria-prima para industrialização pode ser
complementada com a compra e/ou troca de produtos com outros agricultores, seja por
relações de parentesco, amizade, vizinhança ou ainda, mediante a compra em
7
O beneficiamento caracteriza-se pelo emprego de processos simples, sem a perda das características físicas dos
produtos. Na transformação são realizados processos visando a obtenção de um novo produto. Quando
mencionada, no presente trabalho, a palavra processamento se refere às ações de beneficiamento e/ou
transformação da produção agropecuária.
30
estabelecimentos comerciais urbanos ou rurais. Pela diversidade social e produtiva, pode-se
observar tanto o desenvolvimento de produtos cuja totalidade da matéria-prima tem origem na
família, como também aquelas unidades onde são adquiridos, por meio de terceiros,
ingredientes complementares ou ainda, todos os ingredientes para a produção agroindustrial.
Uma das discussões sobre as ARFs no Brasil centra-se na origem e nas motivações
que orientam a agricultura familiar para o desenvolvimento dessas atividades. Por um lado,
alguns autores destacam o desenvolvimento dessa produção relacionada com a interação dos
agricultores familiares com os agentes técnicos de extensão rural (como menciona Vieira,
1997) e outros ainda retratam a relação da agroindústria com o saber-fazer tradicional das
famílias, tal como retratam Pettan (2005); Pereira e Neves, (2004).
As duas formas de interpretação nos parecem adequadas. A agroindustrialização, para
algumas famílias, pode ter origem na história e cultura de imigrantes europeus que trouxeram
ao Brasil um conjunto de técnicas para a fabricação desses produtos alimentares
(PELEGRINI; VELA, 2005). Em outros estabelecimentos rurais, a ARF surgiu como uma
alternativa de transformar a produção in natura quando esta excedia a quantidade necessária
ao consumo familiar (BRITO, 2005). Para Mior (2005), a origem da ARF marca-se,
sobretudo, pela necessidade dos agricultores em prolongar a vida útil da produção agrícola
perecível, oportunizando o armazenamento dos produtos para a alimentação da família. Após
a identificação de oportunidades de comercialização pelos agricultores, estes produtos
passaram a ter também um valor de troca e constituir uma fonte de renda familiar.
A agroindústria rural familiar fez parte de um estudo dos autores Pelegrini e Gazolla
(2008), na região do Médio Alto Uruguai, Rio Grande do Sul. Nesta região, os processos de
agroindustrialização são estratégias dos agricultores para viabilizar a reprodução social da
família. Além disso, os produtores estão desenvolvendo atividades de agroindustrialização
baseados em conhecimentos locais e a produção é diferenciada pela aplicação de uma receita
de processamento específica aos hábitos de consumo peculiares da região.
As agroindústrias são atividades que geram uma série de benefícios para as famílias
envolvidas. Dentre tais vantagens, está a agregação de valor à produção agropecuária e a
alternativa de renda familiar, a diversificação de suas atividades produtivas, a replicação de
conhecimentos técnicos familiares e a retenção da família no meio rural (PELEGRINI;
GAZOLLA, 2008; NIEDERLE; WESZ JÚNIOR, 2009; RUIZ et al., 2002; TRENTIN;
WESZ JÚNIOR, 2006).
A ARF vem sendo destacada ainda como uma das estratégias que a agricultura
familiar utiliza para driblar os riscos das atividades agropecuárias, ou seja, enfrentar
31
contingências econômicas (PREZOTTO, 2002; SOUZA, 2005). Assim, a agroindústria
também está relacionada às demais atividades, na medida em que os agricultores podem
empregar os recursos financeiros originários da comercialização dos produtos agroindustriais
para realizar investimentos e/ou cobrir outros gastos na propriedade. O valor de troca, no
entanto, não está unicamente relacionado aos benefícios econômicos, sendo que a renda é
utilizada para diferentes objetivos, e um deles caracteriza-se pela compra de alimentos que
não são produzidos na propriedade, garantindo, desse modo, a subsistência familiar
(PELEGRINI; GAZOLLA, 2008).
Discussões inovadoras orientam ainda para a relação entre as atividades de
agroindustrialização e o turismo rural, e, para a relação da agroindústria e o desenvolvimento
de novidades
8
na agricultura familiar. No turismo, os produtos alimentícios desenvolvidos
pelas famílias com características específicas do local estão sendo considerados como
atrativos aos visitantes dos estabelecimentos rurais. Destaca-se, no RS, a produção de vinhos
(Vale dos Vinhedos
9
Bento Gonçalves), e de vinhos e aguardente na região da Quarta
Colônia
10
(SILVEIRA et al., 2006). as novidades, estão sendo retratadas mediante as
mudanças nos processos de produção e comercialização, pois os produtores estão
desenvolvendo a produção específica ao consumo de um determinado nicho e inovando
mediante a construção de organizações sociais e redes agroalimentares alternativas
(PELEGRINI et al., 2009; NIEDERLE; WESZ JÚNIOR, 2009).
Toda a sequência de ações - da produção até a comercialização - numa ARF depende
de quais produtos são gerados. Assim, a produção pode ser resultado de um processamento
simples, de um beneficiamento ou até de uma transformação. Considerando a definição de
Mior (2005), Boucher (1998), resultados de trabalhos de Fernandes Filho (2008), Agne e
Lunardi (2007), as etapas podem seguir uma ordem, quais sejam: a produção agrícola,
colheita, seleção, lavagem, classificação, processamento, armazenagem (cuja parte pode ser
destinada ao consumo da família), embalagem, transporte e comercialização. É importante
ressaltar que, em algumas etapas, pode haver a produção de excedentes (cascas de frutas e
legumes, bagaço de cana-de-açúcar, soro de leite, resíduos da produção animal), que podem
8
Novelty (em português novidade) é um termo utilizado por Ploeg et al. (2007) para definir o emprego de novas
atividades, conhecimentos, recursos, práticas que é gerado a partir de um conhecimento tácito dos agricultores
que é típico de um local.
9
Disponível em: <http://www.valedosvinhedos.com.br/principal.asp>
10
Os municípios pertencentes à Quarta Colônia de imigração italiana no RS que fizeram parte do estudo citado
foram: Agudo, Ivorá, Nova Palma, Dona Francisca e Silveira Martins (SILVEIRA et al., 2006).
32
ser reaproveitados como insumos para o desenvolvimento de outras atividades na propriedade
como a adubação e a alimentação animal.
Não uma única sequência de etapas produtivas que demonstre a realidade das
famílias que se dedicam à atividade de agroindustrialização, pois as ações que envolvem o
processo produtivo estão relacionadas com a produção agropecuária, alimentação da família e
comercialização. Assim, por exemplo, as famílias, em época de escassez, tanto podem decidir
ofertar os produtos da agroindústria para a alimentação do grupo doméstico, como podem
optar por quais destinos elas darão para os resíduos gerados no processo produtivo (solo,
animais, plantas). Estas decisões vão interferir na cadeia de produção, podendo gerar outras
etapas ou a ausência de algumas delas.
As etapas demonstradas na Figura 1, a seguir, são condizentes com o modo de fazer
onde a matéria-prima é proveniente da unidade de produção familiar, podendo, conforme
citado acima, sofrer variações nas etapas ou até mesmo a ausência de algumas delas,
considerando a realidade econômica, social e cultural de cada ARF. A produção agropecuária
é uma etapa que pode ser executada ou não pela família. Por exemplo, para uma ARF cuja
totalidade da matéria-prima agropecuária é adquirida de terceiros, não a produção, apenas
as etapas subsequentes. Nos casos em que as famílias utilizam matéria-prima própria com a
complementação de ingredientes terceirizados, a produção agropecuária é parcialmente
desenvolvida, representando parte dos insumos do produto final.
Figura 1 – Etapas do processo de produção e comercialização de uma ARF
Fonte: Adaptado de BOUCHER (1998); AGNE; LUNARDI (2007).
Produção agropecuária
Colheita
Processamento
Armazenagem
Embalagem
Transporte
Comercialização
Família
(responsáveis)
proximidade
Relações com consumidores
urbanos locais e “não locais”
Relações de troca e
comercialização: parentesco,
amizade, vizinhança
Pontes de inserção
Intermediários
Resíduos – não
aproveitáveis
Consumo
familiar
Resíduos –
Animais
/solo
Lavagem, Classificação
33
Uma das etapas de diversificação dos produtos agroindustrializados é o
processamento, sendo que para alguns produtos é realizada a transformação (cana-de-açúcar
melado; leite – queijo; frutas – geleia), enquanto que para outros há um processamento
simples (produtos minimamente processados
11
conservas diversas, legumes picados e
desfolhados).
Numa agroindústria, as etapas de processamento podem gerar ou não um novo produto
de origem animal ou vegetal (PREZOTTO, 2002). Também podem resultar em produtos
agroindustrializados de origem do reino fungi (fungos), como as populares conservas de
cogumelos. Algumas características de diferenciação referem-se às ações de adição de
ingredientes e substâncias diversas, tornando-os produtos singulares. As ações de
diferenciação são realizadas tendo como objetivo garantir a satisfação dos consumidores ou
até mesmo de inserir a produção em novos mercados.
2.2 OS MERCADOS: IMBRICAÇÕES SOCIAIS
O que difere o Desenvolvimento das demais áreas é o rol de teorias de vários campos
da ciência para a explicação dos fenômenos sociais. Exige a aproximação de duas ou mais
áreas do conhecimento e sua interpenetração teórica, a fim de que possam servir de subsídios
para a resolução da problemática de pesquisa. Neste sentido, a proposta teórica da Sociologia
Econômica preenche os requisitos metodológicos das pesquisas na área do Desenvolvimento
Rural, pela característica da interdisciplinaridade das ciências econômicas e sociais.
A Sociologia Econômica, abordando a impossibilidade de descolamento das relações
sociais dos processos de comercialização, origina-se como uma proposta adequada no
entendimento destas interações sociais que estão enraizadas
12
nas relações de proximidade.
Smelser (1968, p.62) conceitua a Sociologia Econômica como “a aplicação do esquema geral,
variáveis e modelos explicativos de sociologia a este complexo de atividades que se refere à
produção, à distribuição, às trocas e ao consumo de bens e serviços escassos”. Dessa forma,
11
Os produtos minimamente processados são caracterizados pelo emprego de processamento mínimo, sendo que
os produtos são fisicamente alterados, mas permanecem no estado fresco. Exemplo: Hortaliças e legumes
cortados. (HANASHIRO, 2003).
12
Neste trabalho será utilizado o termo “enraizamento” como tradução da palavra de origem inglesa:
Embeddedness. A palavra enraizamento, neste trabalho, significa que as relações sociais estão fixadas nos
mercados. O significado da palavra “enraizarno dicionário da língua portuguesa refere-se aos verbos firmar-se,
fixar-se, consolidar-se e radicar-se.
34
como parte constituinte do estudo da Sociologia Econômica, os mercados apresentam-se
como uma das ferramentas teórico-analíticas da abordagem, que são compreendidos pela
mixagem entre as variáveis econômicas e não-econômicas.
Vários são os postulados da abordagem teórica da Sociologia Econômica; no âmbito
dos mercados, considera-se que os indivíduos não são motivados por questões de ordem
exclusivamente econômicas tendo outros elementos de ordem social que influenciam na
tomada de decisões (SMELSER, 1968). Granovetter (2000, p.4) considera que nas interações
sociais “as pessoas têm um conjunto de motivações, e por isso, existe dificuldade em
descrevê-las e resumi-las a questões de autointeresse pessoal”. Este argumento apresenta-se
como uma proposta para compreensão do funcionamento dos mercados que considerem os
diferentes objetivos dos agentes. Como afirma Granovetter (2000, p.3) “nessas relações estão
condicionadas motivações econômicas e sociais que as pessoas possuem enquanto sujeitos
participantes das atividades de produção, consumo e distribuição”.
Os mercados são classificados por Smelser (1968) em três tipos: mercado de trabalho,
de serviços e de bens de consumo. Pela complexidade inerente às três formas de mercados
que se perpetuam sobre características sociológicas e ainda, por ser o objetivo da presente
pesquisa, concentraremos a discussão no terceiro tipo. Nos mercados de bens de consumo,
entendidos neste trabalho como produtos agroindustriais, emergem relações sociais que
influenciam as preferências e escolhas dos consumidores. Na sociologia econômica, essas
ações são consideradas, como afirma Smelser (1968, p.63) “como um dos tipos de sanção na
vida social”. Os contatos sociais informais influenciam na forma como os produtos são
identificados pelos consumidores. Essa identificação pressupõe uma publicidade, que é a
comunicação entre esses agentes (SMELSER, 1968).
Na perspectiva dos mercados enquanto resultado de relações sociais, Karl Polanyi
(1980) destaca-se como um dos autores referenciais. Não existem relações econômicas que
possam ser “separadas” das relações sociais que as transformam. Os aspectos sociais estão
enraizados e determinam como ocorrem os processos de transações e explicam como os
mercados são desenvolvidos.
Considera-se relevante para a compreensão do funcionamento dos mercados todos os
aspectos inerentes a uma sociedade, tais como desigualdade econômica, cultura, raça, etnia,
sexo, entre outros (LIE, 1997). Krippner et al. (2004) acrescenta que as etapas produtivas são
componentes dos mercados, ao considerar que a produção pode ser planejada em função dos
consumidores. As ações de produção, comercialização e consumo envolvem decisões dos
atores que estão formando as redes sociais.
35
Estas decisões, para Granovetter (2007, p.9) “estão enraizadas em sistemas concretos e
contínuos de relações sociais, onde os atores não adotam de forma servil um roteiro escrito
para eles pela intersecção específica de categorias que eles porventura ocupem”. As formas
como os atores sociais tomam decisões estariam imbricadas na própria cultura e hábito desses
agentes, o que explicaria suas motivações para a participação em um mercado. Tanto o
consumo quanto a comercialização de um produto e/ou serviço estaria relacionado com
aspectos que são estabelecidos culturalmente, como afirma Polanyi (1980, p.75): “os fatores
limitantes surgem de todos os pontos do compasso sociológico: o costume e a lei, a religião e
a magia contribuem igualmente para o resultado, que é restringir os atos de troca em relação a
pessoas e objetos, tempo e ocasião”.
Na visão da Sociologia Econômica, as motivações pessoais e a confiança,
“enraizadas” nas relações comerciais, constituem um avanço no entendimento dos mercados
nos quais se inserem as agroindústrias. Os mercados são espaços de interação humana, cujas
dimensões sociais tornam-se aspectos presentes que fundamentam as ações de permuta e
comercialização. Mercados são formados por atores e redes sociais, condutas, instituições
formais e informais, entre outros. Como afirma Krippner et al. (2004, p. 112) “o estado, a
cultura, a política estão contidos em todas as ações dos mercados, exercendo uma variação de
sua influência sobre os tipos de mercados”.
A reinterpretação posterior de Granovetter (1985) - precursor da Nova Sociologia
Econômica, para a noção de Embeddedness
13
, proposta originalmente por Polanyi, pressupõe
que os mercados estão enraizados em outros aspectos da vida social, que têm implicações no
seu funcionamento, criando e recriando demanda para diversos produtos. A demanda teria
relação com um enraizamento na própria cultura da comunidade local, suas crenças, sua
religião, política e outros aspectos sociais. A originalidade de Granovetter (1985) é a
agregação dos conceitos de laços fracos e fortes, objetivando explicar o funcionamento das
redes sociais.
Para Granovetter (1985), é a análise sobre as redes sociais que pode servir de subsídios
para explicar a criação de oportunidades econômicas, tais como o emprego, a
comercialização, etc. Como afirma Granovetter (1973, p.2) “a força do vínculo é uma
combinação linear do tempo, intensidade emocional, intimidade (confiança mútua), e os
serviços recíprocos que caracterizam o vínculo”. A intensidade dos laços dependerá de quão
13
A tradução mais adequada da palavra (termo) para o português significa imersão ou enraizamento. Na noção
de embeddedness os resultados da ação econômica e as instituições são influenciados pelas relações pessoais dos
seus atores e pela estrutura da rede onde estão inseridos (GRANOVETTER, 1985).
36
similares forem os agentes sociais (VALE, 2006). Os laços fortes são representados pela
interação social dos membros pertencentes a um grupo específico e particular
(GRANOVETTER, 1973).
Laços fracos dizem respeito às relações sociais entre os atores de redes distintas.
Segundo Granovetter (1973), a capacidade dos agentes em construir relações com atores de
outras redes pela ampliação de contatos com pessoas próximas que os une é a premissa da
construção de laços fracos e que adquire pertinência na forma como são criadas as
oportunidades econômicas. Ao manter relações com diversas redes, os atores ampliam os
contatos sociais, que por sua vez, adquirem informações privilegiadas. Para Granovetter
(1973, p.3) “quanto mais frequentemente as pessoas interagirem umas com as outras, mais
sucesso terão, e cada vez mais forte será o sentimento de amizade”.
Assim, os laços fracos estariam caracterizando as relações de “conhecidos” e não as
relações de amizade, porque estas serviriam como pontes para a ampliação dos contatos de
laços fracos. Um amigo (laço forte) estaria na origem da aproximação entre dois agentes de
redes distintas. De acordo com Granovetter (1973), os laços fracos é que podem adquirir a
capacidade de replicação e desenvolvimento de novas relações sociais.
Granovetter (1985) conclui nos seus trabalhos que a posição dos atores nessas redes é
determinante no surgimento de oportunidades de trabalho. Assim, os atores inseridos em
redes sociais ampliam estas oportunidades, ancoradas na confiança. Esse contato é também
um meio que os atores utilizam para a redução de riscos inerentes às transações
14
(SONN;
STORPER, 2003). A perpetuação dessas informações dependeria fundamentalmente do
círculo de contatos sociais, que por sua vez, permitiria a tais atores a geração de um pré-
conceito sobre o produto e/ou serviço. A decisão é tomada mediante o raciocínio de que os
informantes já efetuaram a transação e têm o conhecimento de baixo custo, rápido e detalhado
(GRANOVETTER, 1985). “Assim, os indivíduos tomam decisões com base nos
conhecimentos acumulados ao longo desses relacionamentos” (GRANOVETTER, 1985,
p.491).
Os vínculos entre os atores sociais são baseados na confiança e na reciprocidade
(GRANOVETTER, 1973). A posição dos atores nas redes, bem como as constantes
interações sociais com agentes que formam essas estruturas, têm implicações na ampliação de
oportunidades econômicas, tanto por parte de quem produz quanto de quem consome. As
14
A teoria dos custos de transação (ECT), abordagem não utilizada neste trabalho, é uma perspectiva que
considera que os atores sociais estão desenvolvendo contratos e sistemas de governança para reduzir os riscos e
incertezas nas operações de compra, venda, contratos de trabalho, prestação de serviços, etc. (WILLIAMSON,
1979).
37
ARFs podem estar submersas em relações sociais construídas, e o conjunto destas relações
(redes) pode explicar como os agricultores estão inserindo seus produtos nos mercados.
Entretanto, a crescente discussão ancora-se na tentativa de responder o que são afinal
os mercados: “Os mercados são definidos como espaços de interação humana que replicam
conhecimentos” (STORR, 2008, p.136). Os atores, sujeitos da interação compartilham
informações que vão além das ações de comercializar e comprar. Desse modo, não se pode
considerar os mercados como algo externo às pessoas, mas, sobretudo, como resultado de
ações que são construídas pelas pessoas (KRIPPNER et al., 2004). Deve-se considerar um
mercado como um elemento de dinâmica cultural e social, que traduz a forma como são
produzidas as relações entre os produtores e consumidores e não a sua redução ao ato e ao
funcionamento dos mecanismos de compra e venda (ANDREATTA; WICKLIFFG, 2002).
Nesta visão está embutida a noção de que o mercado não se reduz somente à operação
de compra e venda, mas ao conjunto de todas as operações e relações que estão sendo
desenvolvidas no interior delas, inclusive os aspectos do planejamento da produção
(KRIPPNER et al., 2004). A noção de mercados, neste momento, adquire uma dimensão de
complexidade. As estratégias desenvolvidas para a criação de um novo produto e inserção em
nichos de mercados estariam embutidas no próprio conceito. Para Krippner et al. (2004,
p.111), a própria afirmação de que os mercados são determinados apenas pelo enraizamento
nas relações sociais acarretou na consideração por parte dos estudiosos em Sociologia
Econômica em aceitar o próprio mercado como algo concedido”.
No funcionamento dos mercados, consideram-se as informações geradas a partir das
interações entre consumidores e produtores no ambiente da comercialização. Para White
(1981), nestas relações os atores desenvolvem observações de cada comportamento
(consumidores e produtores), e essa visão é um elemento-chave da reprodução de mercados.
“A noção de mercados consiste de estruturas que são reproduzidas através da sinalização ou
comunicação entre os participantes” (WHITE, 1981, p.268). Krippner et al. (2004, p.112)
considera que essas relações “são decretadas mediante compromissos sociais e se estendem
além do espaço do tempo da comercialização propriamente dita”.
Vários autores: Soninno, 2007; Kirwan, 2004; Hinrichs, 2000, têm trabalhado com
pesquisas sobre a teoria da Nova Sociologia Econômica, especificamente a noção de
enraizamento. Pela complexidade inerente a essas formas de mercado, que se perpetuam
através das relações de sociabilidade e se enraízam mediante motivações intrínsecas dos
consumidores e produtores, a noção de enraizamento, sob aplicação à realidade empírica,
ainda mostra-se insuficiente para entender essas interações de forma complexa (SONINNO,
38
2007). Estas críticas direcionam o debate para compreender outras motivações enraizadas nas
próprias atitudes dos agentes que estão inseridos nesses mercados.
No Brasil, destacam-se alguns autores que trabalham com a perspectiva da Nova
Sociologia Econômica, relacionando a teoria às questões sobre a comercialização dos
produtos da agricultura familiar. Entre os autores estão Wilkinson (2004), Raud (2008),
Abramovay et al. (2003), Mior (2008). Para Wilkinson (2004, p.13), “a persistência e a
resistência da pequena agroindústria devem-se ao seu embeddedness, enquanto a sua
adaptação à transformação dos mercados e aos novos critérios de regulação exige esforços de
construção social de mercados”. No caso da agricultura familiar, os autores identificam que
“no Sul do Brasil, onde o empreendimento familiar conseguiu acesso à terra e onde existiam
mercados funcionando de maneira minimamente dinâmica, os agricultores revelaram
capacidades produtivas surpreendentes” (ABRAMOVAY et al. 2003, p. 245).
Abramovay (1998) considera que um dos maiores desafios para a agricultura familiar
afirmar-se economicamente consiste na sua capacidade de organização, no que se refere à
construção de novos mercados, bem como o vínculo social que mantém com os
consumidores. Abramovay et al. (2003) consideram que a inserção no mercado, bem como as
relações sociais mantidas com os consumidores e intermediários podem ser caracterizadas
como estratégias para ampliar as oportunidades sociais e econômicas para muitas populações,
especialmente para as populações rurais mais pobres. Estas famílias, para os autores,
dependem de mercados que podem ser definidos como um conjunto de interações sociais.
Pela amplitude de noções do que são mercados, que fazem parte da corrente teórica da
Sociologia Econômica e da Nova Sociologia Econômica, fez-se pertinente apresentar uma
definição que será utilizada como orientação neste trabalho. Consideram-se mercados como
um conjunto de relações sociais organizadas em redes, assim como as ações originárias destas
interações que oportunizam o acesso das ARFs aos seus mercados consumidores. Neste
sentido, a delimitação caracterizou-se no estudo das relações nos mercados de proximidade,
cuja noção é retratada a seguir.
39
3 OS MERCADOS DE PROXIMIDADE: INTERAÇÕES SOCIAIS?
Polanyi e Granovetter indicam, respectivamente, a noção de mercado, e a existência de
redes sociais como ampliação de oportunidades nos mercados. Os autores, no entanto, não
discorrem sobre os mercados cujos atores são os agricultores familiares. Como podem ser
caracterizados, do aspecto teórico, os mercados nos quais as ARFs participam?
As abordagens teóricas das sociedades camponesas de Mendras (1978) e Wolf (1970)
servem de subsídios para uma indicação de quais mercados estariam sendo desenvolvidos
pelas ARFs. A economia camponesa, retratada através das perspectivas sociais, identifica as
formas como a agricultura familiar vem desempenhando as suas atividades produtivas e
comerciais. Os produtos da agroindústria encontram mercados cujas interações desenvolvidas
pelas famílias com agentes sociais são diversificadas. Quais são, porém, estas relações?
Como indicativo para responder essas questões e servindo como base para a
construção de um referencial teórico que se aproxima da realidade dos mercados das ARFs,
será apresentada a noção de mercados de proximidade. Segundo Wilkinson (2002, p.814):
“esses mercados podem ser vistos, fundamentalmente, como o prolongamento de relações
familiares, ou, diretamente, com consumidores ou, com canais de comercialização”.
A partir desta noção, investigou-se quais autores poderiam compor o referencial
teórico para explicar os mercados de proximidade para as ARFs. Como os mercados de
proximidade são constituídos por relações sociais entre produtores e agentes, pressupõe-se
uma interação entre ambos. A noção de interação social se caracteriza pela presença de uma
ação mútua e reciprocidade entre duas pessoas, funcionando como uma espécie de feedback
ou realimentação de informações (MARC; PICARD, 1970).
Hartmann et al. (2008) consideram a interação como a capacidade de agentes sociais
inseridos em redes, em motivar outros, influenciando suas próprias escolhas assim como a de
outros indivíduos. O resultado desse conjunto de interações tem implicações econômicas e
sociais para os agentes envolvidos. O feedback, para Hartmann et al. (2008) ocasiona um
efeito de multiplicador social, que significa a capacidade dos agentes de influenciar outros por
meio de uma rede social. Este multiplicador tem implicações em negócios e são importantes
dispositivos na propaganda de produtos.
40
Assim, a noção de mercados de proximidade pressupõe o funcionamento de redes
sociais, sendo que os componentes desta rede estão em interação. Dessa forma, a proximidade
das relações sociais que são estabelecidas entre diversos atores constitui uma ampla rede de
contatos (FLOYSAND; SJOHOLT, 2007). As redes sociais, de acordo com esses autores, não
se configuram numa limitação do espaço geográfico, pois os diversos atores se encontram em
diferentes ambientes, o que permite a persistência das relações e das funções executadas. A
comunicação estabelecida numa ampla rede de atores faz com que as informações sobre as
oportunidades de mercado e/ou de consumo se perpetuem.
Considerando que os mercados de proximidade são formados por redes sociais, faz-se
pertinente apresentar autores que possam guiar à compreensão da realidade das ARFs.
Primeiramente, considera-se que essas redes estão formadas pelas relações que as ARFs
possuem com parentes, amigos e vizinhos, que é retratada no item 3.1. As relações
geograficamente próximas, resultado de interações de vizinhança são apresentadas por
Polanyi (1980, p.7) como mercados locais que permanecem indiferentes nas situações de
tempo e lugar. As relações de troca e de comercialização da produção entre os agricultores é
uma das formas organizadoras da vida da sociedade comunitária (MENDRAS, 1978).
Porém, Mendras (1978) não descreve as relações que os agricultores desenvolvem
com agentes da sociedade urbana, como ocorre frequentemente nas feiras livres, nas vendas
diretas (face a face, porta em porta), em estabelecimentos comerciais, em organizações
sociais, etc. Assim, não se pode pensar que os mercados das ARFs são formados somente
pelas relações que os agricultores possuem com outros produtores que se localizam próximos
à sua propriedade.
Desse modo, os agricultores estão desenvolvendo relações de troca e comercialização
com vizinhos, parentes, amigos e ainda com os consumidores urbanos. Os consumidores
podem ser elementos-chave para compreender a ampliação de vendas dos produtos, pela
propaganda divulgada a outros atores sociais. Estas relações fazem parte da noção de
mercados em redes proposta por Wolf (1970), que é apresentada no item 3.2.
Como relações componentes das redes, será abordada a perspectiva teórica das cadeias
agroalimentares curtas - Short Food Supply Chains (item 3.2.1), que é apropriada, no presente
trabalho, pela estreita relação entre esta abordagem e a noção de mercados de proximidade.
As cadeias curtas são canais de comercialização onde os agricultores mantêm um contato
direto com os consumidores.
A construção deste referencial permite discutir se a própria noção de proximidade é
apenas um elemento de indicação geográfica. Dessa forma, no decorrer do capítulo, além de
41
descrever as correntes teóricas que explicam as relações nos mercados de proximidade,
objetiva-se discutir sobre proximidade e localidade (item 3.3). Posteriormente, serão citados
autores que embasam os conceitos de diferenciação e inovação dos produtos agroindustriais
nos mercados de proximidade (item 3.4).
Assim, o enraizamento deve considerar a amplitude e a diversidade das formas de
proximidade das relações sociais, cujos processos que motivam os atores são suas condições
culturais e os conhecimentos que são compartilhados por meio desses contatos diretos
(FLOYSAND; SJOHOLT, 2007). Essas relações sociais são organizadas considerando os
interesses dos atores envolvidos, seus acordos informais e a partilha de uma “linguagem”
comum para a realização da comercialização (STORR, 2008). Em outras palavras, ambos os
atores se reconhecem e se identificam por meio dessas relações, que não podem ser traduzidas
somente por critérios econômicos, tais como renda e preço do produto.
Mediante a leitura destes autores, faz-se pertinente apresentar o que se entende por
“mercados de proximidade”, que embasará a análise da dissertação. Dessa forma, os
chamados “mercados de proximidade
1
”, neste trabalho, serão entendidos como um conjunto
de interações sociais (redes) entre produtores e agentes sociais que estão desenvolvendo as
atividades de produção, comercialização e consumo agroindustrial. As redes podem ser
formadas por instituições, intermediários, consumidores, órgãos públicos, organizações
sociais, etc. A proximidade está relacionada com a interação social presente nestes contatos
pessoais, não restringindo o contato dos agricultores com os agentes que residem na
localidade ou região.
1
Optou-se pela utilização das palavras “mercados de proximidade” pela adequação das características do mesmo
à realidade da região. A utilização do termo “mercado local” poderia resultar na interpretação de que os
produtores estão interagindo com agentes residentes no município ou região. Os mercados de proximidade, neste
trabalho, diferem dos mercados locais pela abrangência de que as relações entre os atores não podem ser
delimitadas geograficamente (FLOYSAND; SJOHOLT, 2007). Esta abordagem permite retratar de maneira
abrangente as ações de produção, comercialização e consumo dos produtos agroindustriais.
42
3.1 COLETIVIDADE E MERCADOS: AS RELAÇÕES DE TROCA E
INTERCONHECIMENTO
Os agricultores familiares necessitam de outros bens, que não são produzidos por eles,
para complementar o processo de produção e satisfazer as necessidades da família. As
vestimentas, insumos, serviços técnicos, auxílios financeiros, são algumas das necessidades.
Além disso, os agricultores inserem-se em mercados tendo em vista comercializar sua
produção excedente e obter capital para, novamente, trocá-lo por produtos e serviços (WOLF,
1970). Reconhece-se a complexidade do número de operações que os agricultores podem
manter com o ambiente externo (mercados) que não se resumem à comercialização, mas,
sobretudo, ao consumo familiar. A delimitação da abordagem a que nos referimos situa-se no
entendimento das relações de comercialização, e, sendo assim, o foco concentra-se no
entendimento do conjunto dessas interações.
As formas de interação social com diferentes mercados têm sua origem nas
perspectivas das sociedades camponesas, que constituem, juntamente com a abordagem
teórica da Nova Sociologia Econômica, subsídios para a compreensão do funcionamento dos
mercados de proximidade. A coletividade para Mendras (1978) refere-se a uma localidade
organizada socialmente, a comunidade
2
é representada pelo conjunto de grupos
domésticos
3
. Tanto a coletividade como a comunidade apresentam relações de
interconhecimento, que é a forma como são organizadas as relações sociais. Entretanto,
Mendras (1978, p.87) o considera que essas relações aconteçam da mesma forma em todas
as comunidades:
[...] “uma aldeia ou uma coletividade pode ser caracterizada por sua organização
mais ou menos individualista, mais ou menos comunitária, mas em todos esses
casos, a dimensão do grupo social e o tipo de relações que nele reina podem ser
caracterizados pelo termo interconhecimento, que assinala a forma particular de
organização da sociabilidade”.
As relações de troca entre uma coletividade permitindo a obtenção de produtos
diferentes daqueles que produzem e que são necessários para o consumo da família é retratada
2
A comunidade rural será entendida na presente dissertação como o conjunto de relações sociais próximas
geograficamente das famílias, tais como organizações locais, igrejas, grupos informais, relações de vizinhança,
parentesco, entre outros.
3
Neste trabalho, considera-se como grupos domésticos as famílias - a unidade familiar enquanto produtora de
atividades de agroindustrialização. Portanto, utilizar-se-á a expressão “grupos domésticos” com a finalidade de
manter o termo original do autor.
43
por Smelser (1968), Mendras (1978), Polanyi (1980) e Wolf (1970). Para Smelser (1968,
p.157), os agentes sociais não trocam apenas produtos: “fornecem-se bens e serviços porque é
o que se faz tradicionalmente; o único princípio de cálculo é a vaga descrição de que, em
longo prazo, os bens e serviços dados e recebidos devem se compensar”. Para Polanyi (1980),
os sistemas de trocas são complexos e obedecem dois princípios distintos: a reciprocidade e a
redistribuição. O primeiro deles se caracteriza por ações compartilhadas entre os indivíduos
que pressupõem uma compensação posterior. Ao oferecer um produto para a troca, por
exemplo, os agentes podem, posteriormente, usufruir de um outro produto e/ou serviço que
necessitam. Na segunda diretriz, de acordo com Polanyi (1980), os bens e serviços são
entregues a uma instituição, que por fim, redistribui à população.
Pelo foco da dissertação estar associada diretamente com a produção agroindustrial
relaciona-se a ideia de troca com uma reciprocidade, tal como definiu Polanyi (1980), pois os
agricultores podem estar compartilhando produtos e/ou serviços no que se refere à atividade
agroindustrial. Estas trocas, geralmente estão enraizadas na reciprocidade, como menciona
Sabourin (2009, p.57): “as prestações e relações econômicas dependem de estruturas de
reciprocidade mais ou menos instituídas que, quando são equilibradas ou simétricas, dão
origem à produção de valores materiais de uso ou de serviços, bem como valores humanos
afetivos e éticos”.
A contribuição teórica para o entendimento das relações como laços de parentesco,
amizade e vizinhança que dinamizam as atividades comerciais da agricultura familiar tem
como principal autor, Mendras (1978, p.66): “a sociedade camponesa organiza o essencial da
vida econômica no seio dos grupos domésticos: cada grupo doméstico assegura a produção de
certos bens alimentícios ou outros, que consome ou troca por outros bens e serviços com
outros grupos domésticos”. O sentido de “grupo doméstico” ao qual o autor se refere se
caracteriza pelos membros que convivem juntos na mesma propriedade, partilhando alimentos
e trabalho (atividade econômica e social comum). Assim, o grupo doméstico adquire uma
interpretação distinta de família, pois como o próprio autor menciona, os moradores de uma
mesma casa nem sempre possuem laços de parentesco.
As relações de troca, sejam elas resultantes de produtos ou de serviços, adquirem uma
função vital no que diz respeito aos aspectos econômicos e sociais dos agricultores familiares,
pois são uma forma simbólica e de pertencimento (sentimento de pertencer a uma
determinada comunidade), assim como também geram produção material para os grupos
domésticos (como exemplo a ajuda mútua, compartilhamento de recursos produtivos, etc.)
(SABOURIN, 2009).
44
Estas trocas entre os membros de uma comunidade constituem uma forma de
comercialização, pois é uma transação realizada por agricultores familiares mediante as
relações de sociabilidade entre atores que compreendem uma das formas de reprodução social
das famílias. Wolf (1970) definiu os mercados de troca como “mercados secionais” que
podem ultrapassar os limites físicos de uma comunidade, ou seja, as trocas podem ser
realizadas mediante interações dos agricultores com outras comunidades: “Um mercado reúne
uma série de comunidades que estão espalhadas em torno dele de maneira periférica, como os
planetas do sistema solar em torno do sol” (WOLF, 1970, p.63):
[...] cada uma das comunidades pode ter sua própria especialidade econômica.
Geralmente, a base principal da maioria das comunidades é alguma forma de
cultivo, e a especialidade econômica é sustentada por pessoas que cultivam parte do
tempo e também constroem recipientes, tecem roupas, fabricam telhas e trabalham
com o couro. Um pequeno número de comunidades pode, na verdade, especializar-
se quase inteiramente na produção de um artesanato específico. Periodicamente, as
pessoas chegadas de várias comunidades encontram-se no mercado e trocam frutos
de seu trabalho.
Para Polanyi (1980) esses sistemas de troca funcionam com a ausência de registros e
administração complexos porque a própria sociedade, participante dessas formas de interação,
organiza-se economicamente mediante as relações sociais e as regras estabelecidas entre os
agentes. “A relação do mercado e comunidade indica o quanto essas duas formas
(sociabilidade e mercados) estão interligadas, apesar da distinção entre ambas” (GUDEMAN
4
apud STORR, 2008, p.138). Pode-se afirmar que os negócios estão enraizados nas relações
sociais e vice-versa (GRANOVETTER, 1985).
Ambos (comunidade e mercado) estão relacionados dialeticamente, pois ao mesmo
tempo em que o mercado pode ser desenvolvido no interior de uma comunidade, as relações
de sociabilidade presentes entre esses atores podem resultar na criação de oportunidades de
comercialização (STORR, 2008). Nestas relações, não necessariamente, há a geração de
excedentes econômicos por meio de renda monetária, mas esta condição não descarta a
necessidade de compreender o quanto essas transações podem ser importantes para os
agricultores envolvidos. Nas comunidades em que as relações de reciprocidade e cooperação
estão presentes, os mercados podem estar enraizados e constituírem um meio de reprodução
social para as famílias envolvidas.
Esses mercados são distintos, fundamentados sob relações de parentesco, amizade e/ou
vizinhança que constituem relações complexas e típicas de grupos sociais dinâmicos,
4
GUDEMAN, S. The anthropology of economy. Malden: Blackwell, 2001.
45
tradicionais e heterogêneos, tal como é a agricultura familiar. Cada coletividade detém suas
próprias relações, e o número dessas interações dependerá dos recursos disponíveis na
comunidade para o sustento dos seus membros (MENDRAS, 1978). Como afirma Mendras
(1978, p.94): “as relações com o mundo exterior podem ser muito limitadas, mas podem ser
também estreitas e numerosas”. As trocas são essenciais para a subsistência das famílias, além
de fortalecerem laços e vínculos sociais (RIBEIRO; GALIZONI, 2007). Podem estar
fundamentados ainda em relações de longo alcance que implicam em aceitação e confiança
(POLANYI, 1980).
Ao mesmo tempo em que o agricultor preserva relações com a comunidade, mantém
também interação com o ambiente externo. Para Mendras (1978), os agricultores necessitam
interagir com essa sociedade, porque absorvem recursos e reforçam sua economia. Como
afirma Mendras (1978, p.14): “existe uma autonomia relativa das coletividades camponesas
frente a uma sociedade envolvente que as domina, mas tolera suas originalidades”.
As relações de sociabilidade na própria comunidade podem estar relacionadas com os
mercados característicos das ARF. Entretanto, não se tem a pretensão de afirmar que as
unidades familiares atuais convivem harmonicamente em sua coletividade “fechada” ao
mundo exterior, ou retraindo-se de informações provenientes da sociedade envolvente.
Entretanto, a abordagem proposta por Mendras (1978), no que se refere às relações de
interconhecimento da agricultura camponesa, pode servir de subsídio para entender as
relações de comercialização e troca de produtos e serviços que as famílias desenvolvem nas
atividades agroindustriais.
Estudos mostram que agricultores familiares brasileiros organizam-se de modo que a
reciprocidade é uma das relações locais preservadas por esses atores, que constituem e
fundamentam as interações econômicas (RIBEIRO; GALIZONI, 2007; SABOURIN, 1999;
RADOMSKY, 2006). No seu sentido mais amplo, a reciprocidade envolve uma série de
relações sociais que não apenas a troca de um produto por outro. Assim, nem toda ação de
reciprocidade
5
é uma prática de finalidade econômica, ou seja, existem relações em que há um
compartilhamento de informações, ajuda mútua, etc. Desse modo, a troca (produtos e/ou
serviços) é componente da reciprocidade, um dos canais de comercialização que as famílias
utilizam para o escoamento da produção agroindustrial. Dessa forma, as práticas de
reciprocidade podem ser entendidas por um conjunto de interações sociais entre componentes
5
Eric Sabourin (2009, p.56 e 57), na obra intitulada “Camponeses do Brasil: entre a troca mercantil e a
reciprocidade” explica que as relações de reciprocidade “implicam o ser humano (individuo ou grupo) em sua
totalidade, tanto do ponto de vista (econômico) quanto simbólico e social”.
46
da própria comunidade, dinamizando atividades produtivas, econômicas e sociais. Estudos
realizados por Pelegrini e Gazolla (2008) mostram que essas interações permanecem como
uma das formas de escoamento da produção agroindustrial, embora não seja interpretada por
estes autores como uma forma dinâmica de mercados das ARFs (envolvendo as ações de
produção, comercialização e consumo dos produtos agroindustriais).
3.2 REDES INTERPESSOAIS: OS MERCADOS URBANOS E NÃO URBANOS
A agricultura familiar constrói e amplia as relações sociais para além dessas
coletividades, criando oportunidades de troca com o ambiente externo. Desse modo, tal como
menciona Wolf (1970, p.35), “o agricultor complementa os bens que ele produz e as
habilidades que ele detém com outros bens e serviços”. O suprimento das necessidades
familiares constitui a motivação para a interação dos agricultores com os setores econômicos
externos (WOLF, 1970).
O prolongamento das relações sociais é característico dos mercados de rede definido
por Wolf (1970). As ligações ou vínculos sociais estão submersos em outras relações
indiretas, porque os laços que unem dois indivíduos estão consequentemente, interligados a
outros (BARNES
6
apud WOLF, 1970, p.65):
[...] cada indivíduo tem parentes, mas na sociedade, cada um desses indivíduos tem
uma série diferente de parentes. [...] a rede é um conjunto de pontos, alguns dos
quais ajuntados por linhas. Os pontos nessa imagem são as pessoas ou, algumas
vezes grupos, e as linhas indicam que as pessoas estão interagindo. Uma rede desse
tipo não possui limites externos nem divisões internas bem delimitadas, pois cada
pessoa se vê como o centro de um conjunto de amigos.
Na definição de redes, a ligação de umas pessoas com as outras, por meio das
relações sociais, formando “esquematicamente” uma malha intrincada, cujos pontos são
representados por indivíduos e as linhas a ligação e interação que os unem (BARNES,
1987). A agricultura familiar interage por meio de relações mercantis, não somente com a
comunidade da qual é membro, mas, sobretudo, com consumidores residentes na zona urbana.
É o conjunto destas relações sociais que formam as redes dos mercados para as agroindústrias
rurais familiares. Entretanto, ao delimitar a análise de redes sociais enquanto um conjunto de
6
BARNES, J.A. Class and Committees in a Norwegian Island Parish. Human Relations, VII, n. 1, p 39-58,
1954.
47
participantes que interagem mediante relações de produção, comercialização e consumo de
produtos agroindustrializados, observa-se que os vínculos sociais das ARF estão
caracterizados por dois tipos de relações: a interação agricultor-agricultor (laços de
coletividade) e a relação produtor-consumidor urbano. Estas relações estão expressas através
de vários canais de comercialização, que para o caso das ARF são: as feiras livres, os
consumidores e os intermediários que dinamizam a venda destes produtos (FIGURA 2).
De acordo com a Figura 2, pode-se observar um conjunto de relações entre produtores
e agentes, onde o círculo central é a unidade familiar de uma ARF. Os círculos da rede
representam os agentes econômicos e os traços são identificados pelas relações sociais que os
unem. Os laços de coletividade estão dispostos numa proximidade física menor quando
comparada às interações com os demais consumidores (os chamados urbanos).
Figura 2 – Os mercados de proximidade: resultado de interações da agricultura familiar com a
coletividade (relações de parentesco, amizade e/ou vizinhança), e os vínculos com a sociedade
geral (consumidores urbanos).
Fonte: Adaptado de Wolf (1970), Mendras (1978) e Granovetter (1985)
Na perspectiva de Wolf (1970) um mercado organiza-se dessa maneira, havendo a
possibilidade de um prolongamento das relações sociais, onde os produtos agroindustriais
podem tornar-se conhecidos ou os agricultores podem conquistar clientes mediante uma
ligação realizada primeiramente com um agente (consumidor). Este agente possui um
conjunto de relações de amizade, parentesco e vizinhança que podem replicar o seu
conhecimento acerca de um produto para outras pessoas (GRANOVETTER, 1985).
Tanto nas relações comunitárias quanto naquelas com consumidores urbanos, a ARF
liga-se de igual maneira por meio da transação econômica, o que se diferencia, são as
obrigações sociais existentes entre os membros de uma comunidade, que transcendem a outras
AF
Laços de coletividade
Laços consumidores urbanos
Laços consumidor
-
consumidor
48
atividades societárias (WOLF, 1970). As atividades societárias são compostas de ações
recíprocas e organização social (igrejas, festas), que acontecem mais frequentemente nas
comunidades. Estes mercados estão organizados mediante relações que cumprem, sobretudo,
uma função social, ligados por vínculos de parentesco. Para Wolf (1970), estes laços são
caracterizados por uma intensidade maior do que aqueles cujas relações são estabelecidas
entre os consumidores urbanos ou outros sujeitos “mais distantes” geograficamente.
As relações dos produtores com consumidores urbanos adquirem uma característica
particular que é o desconhecimento ou incerteza da repetição da comercialização, pois ambos
podem “quebrar” essa interação. Como Wolf (1970, p.65) afirma: “um homem pode oferecer
porcos a B para venda numa semana, mas a D, F ou Z por várias semanas”. A incerteza
pressupõe também a inserção de outros agentes na rede, tais como a concorrência com outros
agricultores que produzem os mesmos produtos, intermediários ou outros consumidores como
retrata WOLF, 1970, p.71:
[...] “quando o camponês se envolve em mercados em rede, ele pode ter de
confrontar-se com a proliferação de artesãos e vendedores intermediários
especializados ou serviços comerciais com os quais ele deve competir não
econômica, mas também socialmente”.
Nesta perspectiva, ainda observa-se uma lacuna para afirmar o quanto estes laços de
coletividade permaneceram como canais de comercialização da produção das ARFs. Não se
pode afirmar que todas as unidades são organizadas de igual maneira, ou seja, cada ARF pode
possuir um conjunto de relações nos mercados que lhe é peculiar, assim como sua
comunidade pode apresentar características e diferentes formas de organização social
(cooperativas, associações, encontros, festas, igreja, etc.).
Assim, a noção de redes que será utilizada como base para a compreensão de como
estão organizados os mercados de proximidade será uma junção entre as perspectivas de
Granovetter (1985) e Wolf (1970). A perspectiva teórica de Wolf (1970) se aproxima
parcialmente da abordagem proposta por Granovetter (1985) no que diz respeito à noção de
enraizamento: os resultados da ação econômica e as instituições são influenciados pelas
relações pessoais dos seus atores e pela estrutura da rede no qual estão inseridos. Wolf (1970)
e Granovetter (1985) concentram a discussão sobre as redes sociais, assim como a difusão da
informação sobre oportunidades econômicas pelas interações entre os atores que compõem a
rede.
49
Porém, o ponto que distingue as duas perspectivas é que a noção de redes de Wolf
(1970) está interpretada sob a realidade social camponesa, numa dimensão antropológica,
social e econômica. Wolf (1970) ainda considera as relações de troca como parte da noção de
mercados em rede e a presença das relações comunitárias como uma oportunidade de
comercialização para a agricultura camponesa. Como a noção de redes de Granovetter (1985)
originou-se a partir de uma pesquisa sobre as oportunidades no mercado de trabalho nos
Estados Unidos, a interpretação do autor se detém a esta realidade.
Assim, as redes são conjuntos de relações sociais. As ARFs são componentes desta
rede e mantêm interações sociais com outros atores (vizinhos, amigos, parentes, consumidores
urbanos, instituições, organizações sociais, etc.) para o desenvolvimento da atividade
produtiva e comercial. A interação entre produtor e consumidor é uma dessas relações, tal
como será retratada, teoricamente, a seguir.
3.2.1 Os mercados diretos com o consumidor nos mercados de proximidade: Short food
supply chains
As cadeias agroalimentares curtas short food supply chains, são identificadas pela
forma de comercialização em que os agricultores mantêm interações com os consumidores,
eliminando as relações com intermediários e/ou elos da cadeia produtiva. Esta eliminação de
intermediários é importante indicativo da geração e apropriação de valor adicionado por parte
dos produtores que comercializam sob essa forma (MARSDEN et al.; 2003).
A proposta teórica das cadeias curtas vem sendo retratada como afirma Sage (2002,
p.3) por “uma estratégia diferente de relacionamento que reúne uma série de vínculos entre
produtores e consumidores quando comparado às cadeias agroalimentares convencionais”.
Essas alternativas de mercados são sustentadas mediante um equilíbrio de motivações entre os
produtores e consumidores, onde as características intrínsecas dos produtos e as interações
sociais estão enraizadas na comercialização (KIRWAN, 2004).
Sistemas Agroalimentares Locais também é outro termo utilizado para representar a
estreita relação entre o produtor e o consumidor (VERGUNST, 2002). Os mercados diretos ou
face to face (face a face) estão sendo retratados como oportunidades de comercialização para
os produtores, pela valorização do contato com os consumidores e a obtenção de um preço
satisfatório na venda (ANDREATTA; WICKLIFFG, 2002; HINRICHS, 2000; KIRWAN,
2004; RENTING et al., 2003;). Além disso, o desenvolvimento desta forma de
50
comercialização vem sendo reconhecido como uma forma de estimular a produção e o
consumo de alimentos de uma determinada localidade. (SELFA; QAZI, 2003).
Nas cadeias curtas, o produtor passa ter um papel de agente no qual é responsável por
todas as etapas de elaboração dos produtos, inclusive da própria comercialização. A
responsabilidade sobre todas as etapas é um indicativo importante na geração de renda na
atividade agroindustrial (PEREIRA; NEVES, 2004). Garcia-Parpet (2002, p.207) enumera as
características dessas relações nos mercados diretos de feiras livres, destacando a geração de
renda e minimização de riscos:
[...] “a combinação de atividades agrícolas e comerciais apresenta numerosas
vantagens: o comércio das feiras permite aos camponeses complementar suas rendas
sem perder a autonomia; a atividade mercantil fornece aos pequenos produtores uma
renda apreciável durante os períodos de relativa inatividade, aqueles períodos que
precedem o plantio momento estratégico do ano quando é, frequentemente,
necessário contratar diaristas”. [...] “a frequência em feiras oportuniza aos pequenos
produtores reagir melhor à flutuação de preços”.
Godoy e Anjos (2007) destacam que este tipo de comercialização (feiras livres) é uma
forma pica de venda informal, onde predominam os agricultores que produzem e
comercializam seus produtos sem registro de inspeção sanitária. Para Sonnino (2007), as
motivações que guiam os atores para a compra ou venda neste tipo de mercado podem estar
ligadas às características dos produtos que relacionam a cultura, geografia e ecologia. Kirwan
(2004) afirma que as motivações dos produtores de Londres para participarem desse mercado
caracterizam-se pela agregação de valor possibilitada pela eliminação de intermediários e
troca de conhecimentos com os consumidores. Esta forma de comercialização oportuniza aos
agricultores obterem informações sobre as preferências de consumo dos seus clientes. Ao
realizar a atividade de comercialização, os agricultores garantem a fidelidade dos clientes
porque o produto é entregue ao consumidor quase que “fresco”. Por outro lado, a
comunicação com o agricultor oportuniza aos consumidores obter conhecimento sobre como é
desenvolvida a produção. Esta característica é um dos aspectos valorizados pelos clientes.
(MARSDEN et al., 2003).
Mais do que a importância econômica, esses tipos de mercados cumprem uma função
social no que diz respeito às trocas benéficas para ambos os atores envolvidos, que vão desde
adquirir e vender o produto até obter novos conhecimentos acerca da atividade que
desempenham (SAGE, 2003). Nos trabalhos de Andreatta e Wickliffg (2002), os autores
verificaram que os mercados diretos da Carolina do Norte são organizados e desenvolvidos
com umarie de benefícios sociais e econômicos aos produtores e consumidores.
Essa
51
discussão merece destaque uma vez que, na própria noção de mercados, proposta pela
Sociologia Econômica, se considera que os atores sociais têm condutas econômicas e não-
econômicas. Os produtores rurais estão comercializando diretamente com os clientes devido a
um equilíbrio entre a viabilidade econômica e os interesses sociais que estão embutidos nessas
formas (SAGE, 2003).
Além de serem constituídos pela relação produtor-consumidor, os mercados de
proximidade envolvem uma série de interações, como demonstrado nos itens anteriores. A
proximidade não está relacionada unicamente ao aspecto geográfico, pois os agricultores
podem estar interagindo com agentes que residem em outros municípios, estados e países.
Neste sentido, no tópico a seguir, será tratada a discussão sobre os mercados de proximidade
social e os mercados locais.
3.3 OS MERCADOS DE PROXIMIDADE SOCIAL E OS MERCADOS LOCAIS
Mendras (1978) e Wolf (1970) retratam a perspectiva das relações sociais que
acontecem na comunidade e as interações das famílias com os consumidores urbanos. Porém,
os autores não caracterizam as ações de comercialização e consumo que não acontecem no
ambiente local.
Ao considerar que os mercados são conjuntos de relações e operações que envolvem a
produção, comercialização e consumo, o termo local” reduz a forma como os mercados de
proximidade estão sendo desenvolvidos. Assim, o ato da comercialização pode estar
acontecendo no ambiente local (interação produtor-consumidor), mas o consumo do produto
pode estar sendo realizado em outras cidades, estados e/ou país (locais de residência dos
consumidores).
Para Vergunst (2002), o mercado local tem relação com a proximidade entre as
pessoas, ao invés de uma delimitação de uma área específica. Estar próximo não implicaria
necessariamente numa interação social entre atores que estão residindo num mesmo
município, região ou localidade. Nos trabalhos de Selfa e Qazi (2005), o mercado local
adquire uma conotação diferenciada para alguns produtores entrevistados nos Estados Unidos,
porque os agricultores relacionam o termo localidade pelas relações de comercialização ou
troca de alimentos com os amigos, vizinhos e membros da comunidade.
52
A proximidade, no contexto dos agricultores familiares que comercializam a produção
agroindustrial, envolve uma complexa rede de relações sociais que transcendem os limites do
espaço físico local. Os mercados de proximidade não se resumem aos atos de
comercialização, mas sim como um conjunto de todas as ações e interações sociais dos
produtores com diversos agentes visando a inserção do produto no mercado ou uma ão de
troca. Envolvem estratégias de negociação, hábitos, cultura, consumidores, instituições,
relações de troca de serviços, produtos, matéria-prima, etc. Nem sempre é possível delimitar
ou mapear fisicamente um espaço geográfico que demonstre o círculo de relações locais
(SELFA; QAZI, 2005).
A utilização da expressão “mercados de proximidade” adquire uma conotação distinta
e adequada para a compreensão da construção de relações complexas entre os agricultores e
os demais agentes. As reestruturações econômicas e sociais de uma série de localidades se
explicam pela capacidade de sua interação com o meio externo, onde os atores estão em
constante relação, transcendendo os limites do espaço (caracterizado como um sistema), que
Floysand e Sjoholt (2007) denominaram de multinível de uma área social.
Tanto o número quanto a forma de interações adquirem uma realidade complexa. A
própria noção de mercados, enquanto espaços de interação social remete à existência de
relacionamentos ilimitados (STORR, 2008). A forma como a informação sobre produtos e/ou
serviços é compartilhada entre os agentes componentes dos mercados de proximidade
constitui um indicativo de construção social de mercados. Wilkinson (2002, p.820) oferece
algumas indicações sobre a forma de organização dos mercados de proximidade que envolve
o desenvolvimento dos mercados à distância através da ampliação das relações sociais
estabelecidas em rede: “Tem sido notado o peso de redes de parentesco e étnicas na expansão
do comércio internacional, tanto no passado como na atualidade, bem como o peso desse
comércio amparado em redes funcionando à distância”.
Granovetter (1973) afirma que os contatos indiretos (laços fracos) se estabelecem
como “pontes” que são construídas entre os atores constituintes do sistema social
aproximando e criando novas relações e, assim, novas oportunidades de comercialização.
Essa organização opera sob as bases de confiança, o que a distingue das normas formais de
comercialização. Esta confiança diz respeito ao relacionamento entre produtor – consumidor e
consumidor consumidor, porque o cliente acredita estar adquirindo um produto cujas
características são condizentes às suas preferências. De acordo com esses autores, a confiança
é a base para a certificação informal da produção. Porém, outros elementos são pertinentes
53
para entender como essas relações são desenvolvidas, como as estratégias de diferenciação e
inovação da produção agroindustrial, que serão retratadas teoricamente a seguir.
3.4 A DIFERENCIAÇÃO E INOVAÇÃO DOS PRODUTOS AGROINDUSTRIAIS NOS
MERCADOS DE PROXIMIDADE: CONCEITOS
Estudos indicam que as características da produção dos agricultores (diferenciação e
inovação) são elementos que explicam a conquista e manutenção das relações sociais com
consumidores e a venda para um determinado nicho de mercado. Sobre o termo diferenciação,
autores como Pelegrini e Gazolla, (2008); Fligstein e Dauter, (2007); White (1981), destacam
que os mercados de nicho exigem características específicas dos produtos, ao invés de
obedecer a critérios de padronização da forma de consumo.
As formas de organização dos mercados de proximidade envolvem, além das relações
sociais que compõem as redes, os produtos que são desenvolvidos pelas famílias, como
afirmam Fligstein e Dauter (2007, p.115): “o significado anexado aos produtos negociados
entre os produtores e consumidores exprime a forma como as relações interpessoais estão
enraizadas nas relações de troca e, por sua vez, são moldadas por eles”.
Assim, as formas como as famílias estão mantendo suas relações com diversos agentes
para viabilizar sua comercialização podem ser explicadas pelas características de
diferenciação que a produção adquire frente aos consumidores. Para Pelegrini e Gazolla
(2008), os consumidores ligados às ARFs reconhecem o produto artesanal pelo valor
nutricional que ostenta, além de classificá-lo como “produto de qualidade superior”. Esta
qualidade, para Pettan et al. (2004, p.3), se explica porque “a produção resulta de uma estreita
relação entre o “saber-fazer” (o homem) e as características das distintas zonas agroclimáticas
existentes no território nacional que propiciam sabores, cores e aromas únicos”.
Para Sage (2003), os produtores estão mantendo suas relações sociais nos mercados
porque estão realizando esforços quanto ao cumprimento das satisfações de consumo dos seus
clientes. Esta satisfação é proveniente de diversos fatores, e um deles está relacionado à
própria característica de diferenciação da produção. De acordo com White (1981, p.517) “o
mercado emerge como uma estrutura de papéis onde cada unidade produtora possui uma
diferenciação de nichos”. A diferenciação da produção pode ser representada de inúmeras
formas, tais como patentes, marcas e propagandas (SWEDBERG, 1994).
54
Para Prezotto (2002), os produtos das ARFs estão atingindo consumidores dispostos a
adquirir alimentos que expressam: a aparência de limpeza, o cuidado com a saúde, a ecologia,
o meio ambiente, o social e o cultural, porque estes elementos estão sendo valorizados nestas
formas de consumo. O conjunto destas características forma a definição do que o autor
denominou de “Qualidade Ampla”.
A forma de produção ecológica representa para o consumidor o cuidado que o
produtor possui com o meio ambiente e animais, remetendo, inclusive, à forma de produção
isenta de aditivos/insumos químicos. Na característica social, é considerada a importância de
adquirir produtos que sejam condizentes à situação socioeconômica da população, além de
contribuir para o desenvolvimento das formas de inclusão social. Na cultura, o consumo está
associado à busca de preservar a forma de produção da agricultura familiar. A aparência do
produto é outra característica de diferenciação, representada pela embalagem e imagem do
produto que pode ser avaliado a olho nu (PREZOTTO, 2002). Estas características não
somente podem atrair consumidores locais, mas justificam a forma como os produtos
artesanais estão aderindo a nichos de mercados regionais e internacionais (MALUF, 2004).
Assim, o termo diferenciação para a produção agroindustrial adquire uma série de
dimensões. A diferenciação, neste trabalho será entendida pelas características que tornam os
produtos singulares e específicos aos nichos de mercado a que se destinam. Não há uma única
interpretação e conceito sobre quais são os fatores que diferenciam os produtos frente aos
nichos de mercado.
A inovação é outra estratégia empregada pelas famílias para conquistar consumidores.
Para Fligstein e Dauter (2007), a estrutura social do mercado identificada como um conjunto
de relações (incluindo a relação produtor e consumidor) pode afetar tanto o desenvolvimento
de novas empresas quanto mecanismos de inovação, diversificação e novos mercados. As
exigências dos consumidores podem resultar na criação de estratégias na unidade familiar,
como a transformação de habilidades ou a transformação de um produto (WOLF, 1970).
Dargan e Shucksmith (2006, p.5) identificam a inovação como um processo não
somente urbano, mas também como uma ação desenvolvida pela interação dos agricultores e
agentes locais. Os autores conceituam a inovação:
[...] “a inovação não se limita a fazer referência a produtos ou tecnologias, mas
também aos processos e estratégias para a inovação. [...] a inovação não se refere
necessariamente a novos produtos e processos, mas os produtos e processos que são
novos para uma região, instituição ou empresa”.
55
A inovação pressupõe um conjunto de fatores que podem definir o acesso aos
mercados através do desenvolvimento e/ou melhoramento de novos produtos e serviços, que
podem envolver “tecnologia, treinamento, marketing e atividade comercial, o design e a
política de qualidade” (MURDOCH, 2000, p.412). “O processo de inserção nos mercados
envolve a formação de vínculos localizados de conhecimento e confiança que estão na base
dos próprios processos de inovação” (ABRAMOVAY et al. 2003, p. 279). Assim como
Abramovay et al. (2003), Dargan e Schucksmith (2006) consideram que a inovação é
proveniente de um processo de aprendizado, o significando que as inovações são apenas
decorrentes de novas técnicas ou saberes científicos, mas como algo que é construído pelas
pessoas.
A proximidade entre as pessoas, sejam empresas, consumidores, produtores e
instituições é objeto de discussão sobre a inovação. Para Sonn e Storper (2003), a
comunicação através desta proximidade na interação social tem oportunizado às pessoas
envolvidas a partilha de novos conhecimentos, produtos e processos, que se traduzem em
resultados econômicos. “Os atores não tomam decisões de maneira isolada, mas no seio de
relações sociais, que é um comportamento rotineiro, orientado por valores e regras morais de
instituições informais” (RAUD, 2008, p.47).
Para adequar os produtos aos objetivos de consumo dos clientes, os produtores podem
estar redimensionando o processo produtivo, com o emprego de novos ingredientes, a adoção
de outras fórmulas (receitas), além de desenvolver novos produtos. A análise da inovação,
neste trabalho, estará centrada em identificar as mudanças nos processos de produção, bem
como o desenvolvimento de novos produtos agroindustriais. Os processos de produção podem
ser: a adição de ingredientes, o aprendizado de uma nova receita, embalagens, rótulos, etc.
56
4 O UNIVERSO EMPÍRICO: A REGIÃO DE ESTUDO E METODOLOGIA DA
PESQUISA
Este capítulo tem como objetivo retratar brevemente as características históricas,
sociais e econômicas da região do Corede Jacuí Centro (4.1) e posteriormente apresentar as
etapas de pesquisa, bem como a metodologia que foi utilizada para a realização do trabalho
(4.2).
4.1 A REGIÃO DO COREDE JACUÍ CENTRO: ASPECTOS HISTÓRICOS E
SOCIOECONÔMICOS
A formação histórico-cultural da região, onde atualmente se situam os municípios do
Corede Jacuí Centro, tem relação com os povos de imigração açoriana, alemã e italiana, que
desenvolviam as atividades de agricultura e pecuária. Como menciona Medeiros (2006,
p.281): “inicialmente foram os açorianos vindo para o Sul, ainda no período colonial; no
governo imperial foi a criação das colônias no Rio Grande do Sul, atraindo principalmente
alemães, num primeiro momento, e italianos a seguir”. Esta colonização contribuiu para a
revitalização da agricultura, especialmente da cultura do trigo (LANDO; BARROS, 1992).
Os imigrantes, tanto os de origem alemã quanto italiana, preocupavam-se com a
economia de subsistência, que desenvolviam através dos sistemas de policultivos (LANDO;
BARROS, 1992). Os cultivos de milho, trigo, feijão, batata, abóbora, mandioca, fumo, cana-
de-açúcar, arroz, erva-mate, amendoim e ainda, a pecuária (bovinos e suínos) se
caracterizaram como as principais atividades desenvolvidas (LANDO; BARROS, 1981;
BONI; COSTA, 1984).
Os municípios pertencentes a esta região receberam os primeiros imigrantes alemães
(1857), formando a Colônia
1
de Santo Ângelo (LANDO; BARROS, 1992). Esta colônia
1
A palavra colônia refere-se à designação das terras utilizadas ao recebimento dos imigrantes europeus, que
tinham como objetivo o estabelecimento das pequenas e médias propriedades no Brasil (LANDO; BARROS,
1992).
57
correspondia a uma extensa área geográfica, que posteriormente deu origem a vários
municípios da região centro do RS, onde atualmente, estão localizados alguns municípios do
Corede: Cachoeira do Sul, Cerro Branco, Paraíso do Sul e Novo Cabrais.
O município de Restinga Seca pertence à região que faz parte da imigração italiana
denominada Quarta Colônia, que recebeu os primeiros imigrantes italianos em 1877, enquanto
os municípios de Vila Nova do Sul e São Sepé têm fortes influências indígenas, jesuítas e
italianas.
Entre as atividades desenvolvidas pelos imigrantes, a transformação e beneficiamento
de produtos agropecuários constituíam uma das formas de complementar a receita familiar,
mesmo em pequena produção, quando tais produtos inseriam-se nos comércios locais (BONI;
COSTA, 1984). Dentre os produtos
2
introduzidos pela cultura alemã, destacam-se a
fabricação de cigarros, cerveja, derivados da cana-de-açúcar (melado, cachaça) e óleo
(PELLANDA, 1925; BONI; COSTA, 1984). Os italianos desenvolveram as atividades de
agroindustrialização mediante o cultivo de grãos como o trigo e o milho. Conforme Azevedo
(1994, p.35), “por causa da polenta, base da alimentação do colono, desenvolveu-se a cultura
do milho. Quem diz milho diz também aves, ovos, porcos, banha, produção de salsicharia,
etc.”.
Além de se constituir como produto de consumo das famílias italianas, o milho era
utilizado como alimentação para os animais. O excedente da carne das aves e dos porcos, do
trigo e do milho os agricultores processaram e transformaram em produtos como o salame,
banha, farinhas de trigo e milho (AZEVEDO, 1994; BONI; COSTA, 1984). Outra atividade
de igual importância foi o cultivo de uvas, sendo o vinho o destaque da produção de origem
italiana (BONI; COSTA, 1984). A agropecuária e as agroindústrias caracterizaram-se como
atividades que se desenvolveram a partir do interesse dos produtores na alimentação familiar,
seguindo-se como oportunidades de comercialização e agregação de valor aos produtos da
região.
O Corede
3
Jacuí Centro desmembrou-se do originário Corede Central cuja sede é o
município de Santa Maria, e foi criado em 2001. Localiza-se na porção central do Estado e
2
Destaca-se além dos produtos agroindustrializados, o desenvolvimento de outras atividades características de
imigrantes alemães, e complementares da renda familiar, tais como o couro (curtume e calçados), a metalurgia, a
tecelagem e a impressão (BONI; COSTA, 1984). As atividades comerciais, tais como sapataria, ferrarias,
alfaiatarias, mesmo que em pequena proporção, fazem parte da história da imigração alemã da região
(PELLANDA, 1925).
3
A criação dos COREDES – Conselho Regional de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul possui uma
trajetória de mobilização social e institucional com o objetivo de identificar os problemas relacionados ao
58
abrange os municípios de Cachoeira do Sul, Cerro Branco, Paraíso do Sul, Novo Cabrais,
Restinga Seca, São Sepé e Vila Nova do Sul (FIGURA 3). Possui uma área territorial de
8.098,6 km², com uma população total de 146.331 habitantes, sendo que 25% destes residem
no meio rural e 75% na área urbana (FEE, 2008).
Figura 3 – Divisão política dos municípios do Corede Jacuí Centro - Rio Grande do Sul – RS.
Área em destaque: Cachoeira do Sul, Cerro Branco, Novo Cabrais, Paraíso do Sul, Restinga
Seca, São Sepé e Vila Nova do Sul.
Fonte: Adaptado pela autora do Atlas Sócio-econômico do Rio Grande do Sul RS, IBGE 2004/ IPEA
2000
4
. Elaboração SCP/DEPLAN (2004).
No que se refere aos dados socioeconômicos, na região do Corede Jacuí Centro, o
Índice de Desenvolvimento Humano - IDH apresenta valores no ano de 2000, entre 0,729 a
0,788. Os maiores índices correspondem aos municípios de Cachoeira do Sul (0,788) e São
Desenvolvimento Regional, além de aproximar a comunicação entre esta esfera e a administração pública
(BANDEIRA, 1999).
4
Disponível em: <http://www.scp.rs.gov.br/atlas/atlas.asp?menu=630>
59
Sepé (0,775), enquanto os menores índices são encontrados em Novo Cabrais e Vila Nova do
Sul (Tabela 1). Os índices de longevidade são semelhantes ao IDH, variando de 0,727 a
0,782.
Quando se refere às informações do índice Educação, nota-se que há um resultado
superior quando comparado às demais áreas: renda e longevidade. Os resultados para o índice
Educação variam de 0,798 (Cerro Branco) a 0,884 (Restinga Seca). Os menores índices estão
na renda, com índice mínimo de 0,62 (Novo Cabrais) e 0,719 (Cachoeira do Sul).
Tabela 1 - Índice de Desenvolvimento Humano, Renda, Longevidade e Educação dos
municípios do Corede Jacuí Centro, no ano de 2000
Municípios
IDH (00) IDH Renda (00) IDH Long. (00) IDH Educ. (00)
Cachoeira do Sul 0,788 0,719 0,766 0,879
Cerro Branco 0,737 0,646 0,766 0,798
Novo Cabrais 0,729 0,620 0,742 0,826
Paraíso do Sul 0,764 0,654 0,782 0,856
Restinga Seca 0,765 0,677 0,733 0,884
São Sepé 0,775 0,676 0,775 0,875
Vila Nova do Sul 0,736 0,644 0,727 0,838
Fonte: PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, 2008.
Segundo dados da FEE (2007), a atividade agropecuária do Corede Jacuí Centro
apresenta-se com uma produção diversificada, envolvendo o desenvolvimento de culturas
permanentes, temporárias, a pecuária, a produção de origem animal e a extração vegetal.
Quanto aos dados referentes à área colhida, o plantio de grãos (arroz, soja, milho e trigo)
destaca-se como uma das principais atividades. espaço significativo para a pecuária
número de cabeças - (bovinos, galinhas, ovinos) e para a produção de origem animal (lã e mel
de abelha) – quantidade produzida (kg).
Com relação ao número de estabelecimentos, a agricultura familiar
5
representa 80% do
total de propriedades, com 8.868 unidades. A área total (n° de estabelecimentos familiares e
não-familiares) corresponde a 665.988 hectares. Os agricultores familiares ocupam 23% desse
espaço, com 155.314 hectares. (Tabela 2).
5
O IBGE considera como Agricultura Familiar, os estabelecimentos e empreendimentos rurais que atendam as
características impostas pela Lei 11.326, de 24 de julho de 2006, a saber: a área do estabelecimento ou
empreendimento rural não excede a 4 módulos fiscais; a mão-de-obra utilizada nas atividades econômicas
desenvolvidas é predominantemente da própria família; a renda familiar é predominantemente originária dessas
atividades; e o estabelecimento ou empreendimento é dirigido pela família. Os estabelecimentos denominados
“não-familiares” correspondem aos empreendimentos que não atendam as quatro características mencionadas
anteriormente.
60
Tabela 2 – Número de estabelecimentos e área (agricultura familiar e não-familiar) dos
municípios da região do Corede Jacuí Centro, no ano de 2006.
Agricultura Familiar Não-familiar
Municípios
Estabelecimentos Área (ha) Estabelecimentos Área (ha)
Cachoeira do Sul 2.325 39.456 1.016 284.170
Cerro Branco 831 9.987 34 892
Novo Cabrais 759 7.804 61 5.888
Paraíso do Sul 1.084 15.116 48 3.849
Restinga Seca 1.682 23.184 313 47.050
São Sepé 1.535 47.253 551 136.395
Vila Nova do Sul 652 12.514 184 32.430
TOTAIS 8.868 155.314 2.207 510.674
Fonte: IBGE – Censo Agropecuário 2006 – Resultados preliminares (Adaptado pela autora).
A produção agropecuária da agricultura familiar é bastante diversificada, tendo como
principais atividades: o plantio de grãos (arroz e milho), mandioca e a produção animal
(pecuária de leite e de corte e galinhas). No que se refere às atividades produtivas, cada
município possui características distintas. Os agricultores familiares do município de
Cachoeira do Sul participam consideravelmente da produção de grãos (arroz) e esse produto é
uma das principais atividades econômicas da localidade (INCRA, 2008).
A agricultura familiar dos municípios de Cerro Branco, Novo Cabrais, Paraíso do Sul
e Restinga Seca possui uma participação significativa na produção de arroz e fumo. A
fruticultura (laranja) e a produção animal (ovinos) têm destaque nos municípios de São Sepé e
Vila Nova do Sul. Já no município de Paraíso do Sul, os agricultores familiares possuem uma
produção expressiva nas atividades de silvicultura e extração vegetal, o que não se verifica
nas demais localidades (INCRA, 2008).
4.2 METODOLOGIA
A escolha do local para a realização deste estudo faz parte de uma trajetória de
pesquisas realizadas em conjunto com a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul
(UERGS), iniciadas em 2005
6
, que foram relevantes para o conhecimento de parte da
6
Essas pesquisas correspondem aos estudos realizados para a formulação de relatórios de estágios e Trabalho de
Conclusão de Curso, apresentado na UERGS (Unidade Cachoeira do Sul). A temática destes estudos foram a
Agroindústria Rural, com análises de renda, custo e lucro, cujos objetos de pesquisas foram os produtores de mel
da Associação Cachoeirense de Apicultores ACAPI, e agricultores familiares que comercializaram produtos
agroindustriais na Feira Livre Municipal de Cachoeira do Sul, no período de 2005 a 2007.
61
realidade dos agricultores familiares que desenvolvem atividades agroindustriais. Destaca-se a
pertinência em desenvolver pesquisas na região do Corede Jacuí Centro, já que na temática do
Desenvolvimento Rural e agroindústria familiar, são limitados os estudos nestes municípios.
A pesquisa foi caracterizada como um estudo exploratório-descritivo. Conforme
Triviños (1987), os estudos descritivos exigem um conjunto de informações a priori, e sendo
assim, foi conveniente a realização de um estudo preliminar exploratório, visando investigar
informações secundárias sobre as atividades de agroindustrialização na região do Corede
Jacuí Centro, assim como pesquisas sobre referenciais teóricos que serviram como base para a
análise dos dados. As informações secundárias foram provenientes dos dados do IBGE -
Censo Agropecuário – 1995/1996.
As formas de inserção da produção agroindustrial (Indústria Rural
7
) nos mercados são
retratadas pelo IBGE como “canais de comercialização” e subdividem-se em quatro
categorias: entregue à cooperativa, entregue à indústria, entregue ao intermediário e venda
direta ao consumidor (IBGE, Censo Agropecuário 1995/1996). Este trabalho considerou os
canais de comercialização e trocas: vizinhança, parentesco e amizade (comunidade), pontes de
inserção (organizações sociais), intermediários (estabelecimentos comerciais de revenda do
produto) e os consumidores urbanos. Esta definição foi elaborada de acordo com as
informações constantes nos referenciais teóricos e elementos da realidade das ARFs da região
do Corede Jacuí Centro.
Para a definição de uma base do número de agroindústrias que seriam entrevistadas,
utilizou-se como parâmetro as informações específicas sobre os canais de venda dos produtos
do Censo Agropecuário 1995/1996, desconsiderando os dados que se referem às unidades
cuja produção agroindustrial é específica para o consumo da família. As informações apontam
para uma diversidade de produtos que são agroindustrializados, variando de acordo com a
potencialidade da produção agropecuária de cada município. No entanto, em termos
quantitativos, destacam-se pelo maior número de informantes (sendo que o total é 793), que
produzem para comercialização, consecutivamente, os municípios de Cachoeira do Sul (33%),
Restinga Seca (31%), Paraíso do Sul (12%), São Sepé (12%) e Cerro Branco (10%). Tendo
em vista retratar a região do Corede Jacuí Centro no que se refere à comercialização de
produtos agroindustrializados e seus mercados característicos, optou-se pela definição da
7
As ações de industrialização da produção agropecuária pelos agricultores são denominadas pelo Censo
Agropecuário 1995/1996 por Indústrias Rurais, sendo que a nomenclatura para essas ações está sendo
modificada para Agroindústrias Rurais, cujos dados estão previstos (até o momento da coleta de informações
para esta pesquisa) para serem disponibilizados a partir de agosto de 2009, portanto, não podendo ser utilizado
para este estudo.
62
amostra utilizando o número total de informantes que comercializam sua produção,
descartando os dois municípios que possuem o menor número de agroindústrias, quais sejam:
Novo Cabrais e Vila Nova do Sul. Em termos quantitativos, esses municípios correspondem a
respectivamente, cerca de 6% e 2% do número total de Indústrias Rurais na região.
A seleção das agroindústrias que participariam da pesquisa obedeceu aos seguintes
critérios:
- o desenvolvimento de, no mínimo, uma atividade agroindustrial, cujas características
são a atividade de processamento da produção agropecuária no próprio estabelecimento, com
o emprego de mão-de-obra familiar (MIOR, 2005).
- a comercialização da produção agroindustrial para qualquer canal de venda: (direta/
intermediário);
- a vinculação com a agricultura familiar, ou seja, a gestão e a produção coordenadas
pela família.
Planejou-se a realização de entrevistas que contemplassem uma amostra de número
total de 40 ARFs para a região. Num processo anterior à aplicação das entrevistas, fez-se
pertinente contatar instituições ligadas ao meio rural, tais como Secretarias de Agricultura, de
Desenvolvimento e EMATER. A interação da pesquisadora nestas instituições fez-se
necessária para a obtenção de informações (endereço, telefone, local de comercialização) das
famílias que desenvolvem atividades agroindustriais em cada município. Obteve-se apenas
contatos de 2 a 5 agroindústrias (dependendo do município), pois não um registro de
informações sobre as agroindústrias nestes órgãos, fato este, justificado pela informalidade da
atividade na região.
Entretanto, através destes órgãos, foi possível obter conhecimento sobre as
organizações sociais, feiras e eventos que promovem a comercialização dos produtos
agroindustriais em cada município. Nestes locais (feiras e organizações sociais), os atendentes
das cooperativas, associações e os agricultores contribuíram para a divulgação de dados sobre
outras agroindústrias. Em cada visita à casa de uma família, os agricultores informaram sobre
a localização e telefone de outras famílias que desenvolviam produtos agroindustriais para a
venda.
A definição do número de entrevistas a serem realizadas em cada município obedeceu
ao critério de uma relação entre o número total de informantes (região) que agroindustrializam
e sua respectiva correspondência em porcentagens. Como o número de entrevistas foi
estabelecido em 40 (podendo variar entre 35 mínimo e 50 – máximo), a definição da
amostra obedeceu ao seguinte cálculo: 40 x 33% = 13 (exemplo para o município de
63
Cachoeira do Sul). Este cálculo foi utilizado como referência e guia para o número de
entrevistas que seriam realizadas. No entanto, por tratar-se de uma pesquisa qualitativa, as
entrevistas não obedeceram rigorosamente essa definição, sendo que foram realizadas 41
entrevistas (Quadro 1). Este mero foi possível devido à oportunidade de pesquisa, pelo
apoio de instituições ligadas ao meio rural (EMATER e Secretaria de Agricultura), das
organizações sociais e dos agricultores da região. Considerou-se cada família entrevistada
como 1 ARF. As pessoas da família que contribuíram como fonte de informações no
momento da entrevista foi variável, (de um a três informantes).
Quadro 1 – Definição da amostra: número de entrevistas planejadas e realizadas
Municípios N° entrevistas Planejadas N° entrevistas Realizadas
Cachoeira do Sul 33% - 13 a 15 13
Cerro Branco 10% - 4 a 6 5
Paraíso do Sul 12% - 5 a 6 5
Restinga Seca 31% - 12 a 15 13
São Sepé 12% - 5 a 8 5
TOTAIS 35 a 50 41
Fonte: Elaborado pela autora.
A coleta de dados foi realizada no período compreendido entre os meses de maio e
junho de 2009, com instrumentos de coletas de dados: formulário semi-estruturado
(APÊNDICE A) - que se caracterizou por um roteiro de perguntas abertas, que foi aplicado
por meio de entrevistas; e diários de campo (GARCIA FILHO, 1999; GIL, 2008). Estes
procedimentos de coleta de dados se justificam pela vantagem em obter maiores informações
sobre o objeto de estudo e, sobretudo, por facilitar a compreensão de atitudes possibilitada
pela observação e interação com as famílias. Além disso, possibilita uma maior liberdade de
expressão por parte dos entrevistados e captação de detalhes pelo entrevistador por meio de
observação e anotações complementares, e demanda um tempo adequado ao previsto para a
coleta das informações pertinentes ao trabalho.
Como técnica de complementação de anotações pertinentes à pesquisa, utilizou-se um
diário de campo, que permitiu o registro do detalhamento das informações, observações e
reflexões surgidas no decorrer da investigação (FONTANELLA et al., 2006). Esta técnica se
caracteriza por um detalhamento descritivo e pessoal dos interlocutores, grupos e ambientes
estudados. A captação do conteúdo das notas de campo consistiu no tipo de material
64
descritivo, condizente com os objetivos da pesquisa. A finalidade dessa técnica é captar,
através de palavras, uma imagem do local, das pessoas, das ações e das conversas observadas.
Como forma de facilitar a organização e sistematização dos dados, foi conveniente
elaborar dois tipos de diários: diário da observação - composto de indicações práticas sobre
quem, onde, como, quando e o que aconteceu e trechos de conversas, diálogos ou falas dos
produtores; diário da pesquisa - que se caracterizou por uma complementação às anotações da
observação, que são compostas de questionamentos, análises que vão orientar a observação e
o que será observado posteriormente. Fizeram-se necessárias anotações referentes às dúvidas,
abordagens teóricas, possíveis leituras e questões que poderiam ser aprofundadas em
observações posteriores.
As entrevistas foram conduzidas de acordo com os seguintes temas: identificação
pessoal, produção agroindustrial, inovações/processos de diferenciação e as interações sociais
nos mercados de proximidade. No primeiro tópico foram coletadas informações sobre a
localidade, atividades agropecuárias e agroindustriais (consumo e comercialização).
Quanto às questões referentes à produção agroindustrial foram coletadas informações
sobre a renda
8
, incentivos, motivações, estrutura e processo produtivo (armazenagem,
resíduos, aditivos químicos) e origem das técnicas de processamento. Neste item foram
coletadas também informações sobre a origem da matéria-prima, consumo da família e mão-
de-obra (identificando se é realizada somente por membros da família ou se há contratação de
serviços temporários). Estas questões foram pertinentes para responder o primeiro objetivo
específico proposto pela pesquisa.
Com a finalidade de atingir o segundo objetivo específico da investigação foi
necessário abordar questões sobre quais canais de comercialização os agricultores estão
vendendo a sua produção, descrevendo as relações sociais que formam os mercados de
proximidade e identificando a porcentagem dessas relações (trocas e comercialização).
Objetivando identificar quais as inovações ou diferenciações empregadas no processo de
produção dos produtos agroindustriais, foram elaboradas questões sobre as inovações
específicas a cada um dos produtos e/ou processos. Como informação pertinente, foi
conveniente investigar sobre as dificuldades para a adoção de normas certificadoras de
sanidade para os produtos agroindustriais.
8
As perguntas sobre a renda não tiveram objetivo de fazer um cálculo, apenas identificar na visão do produtor a
importância da renda proveniente das atividades agroindustriais e agropecuárias.
65
Com o intuito de reconhecer a forma como os produtores relacionam-se com os
consumidores por meio da venda de produtos agroindustriais, fez-se necessário abordar
questões sobre as estratégias de fidelidade aos clientes, denominação dos produtos, origem
dos consumidores, estratégias para conquista de mercados e negociação produtor-consumidor.
Houve a pertinência de aplicar um pré-teste, com a finalidade de averiguar as questões
propostas, de maneira a adequá-las à compreensão dos agricultores. Os formulários do pré-
teste foram aplicados em Cachoeira do Sul, onde dois produtores foram entrevistados, tendo
sido descartados da amostra, posteriormente. O pré-teste resultou em modificações na ordem
de algumas questões, assim como a adição de itens complementares, principalmente no que se
refere à identificação dos canais de comercialização das agroindústrias.
Para conhecer as ARFs que se adequariam ao conceito estipulado, foi pertinente a
realização de uma conversa informal com os produtores, realizada no momento da visita da
pesquisadora às unidades, como uma etapa anterior à entrevista. Nessa ocasião, uma ARF
poderia ou não corresponder ao conceito previamente estabelecido. Sendo assim, houve a
pertinência de não realizar a pesquisa nas unidades que não correspondiam a uma ARF, ou
seja, aquelas que não se adequariam ao conceito de Mior (2005), que não seriam identificadas
como agricultura familiar e também que produz somente para o consumo da família.
As entrevistas foram realizadas em diversos locais: na residência das famílias, igrejas,
feiras, centro de comercialização e organizações sociais (associações). A interação da
pesquisadora com as famílias nestes ambientes permitiu o conhecimento e a coleta de
informações sobre o funcionamento dos canais de comercialização, principalmente sobre a
forma de organização das pontes de inserção locais.
Como forma de identificação das ARFs, cada família recebeu um número, obedecendo
à ordem em que aconteciam as entrevistas, no intuito de preservar a identidade das famílias
nos resultados do trabalho. Para análise dos formulários foi empregada a metodologia
qualitativa e quantitativa.
A análise qualitativa serviu de suporte para a confecção e descrição dos textos, sendo
que a técnica empregada caracterizou-se pela descrição do conteúdo expresso nas frases ditas
pelas famílias (análise de conteúdo). Neste método de análise, é desenvolvida a interpretação
do autor sobre uma determinada realidade social, considerando que esta interpretação é
formulada pelo cientista e não pelos sujeitos pesquisados (MARTINS, 2004).
A análise de conteúdo foi realizada de acordo com os seguintes passos: (1) leitura do
material: primeiramente foi necessário organizar todos os formulários e diários de campo e
fazer uma leitura de todas as respostas das 41 entrevistas; (2) definição de categorias de
66
análise dos textos, conforme os objetivos da pesquisa: produção agroindustrial: família e
organização do trabalho; relações sociais de produção, troca e comercialização: comunidade,
organizações sociais, instituições, consumidores urbanos, intermediários, diferenciação e
inovação dos produtos agroindustriais. Cada categoria possui um conjunto de respostas (total
de 41 entrevistas), não podendo haver repetições, ou seja, um determinado texto é identificado
e categorizado num item (GHIGLIONE; MATALON, 1997); (3) definição de unidades de
registro, de contexto e de numeração. Para analisar as entrevistas, é conveniente após a
definição de categorias, eleger a unidade de análise, conforme Ghiglione e Matalon (1997).
Neste trabalho foi utilizado como unidade de análise o segmento de conteúdo mínimo: a frase
gerada na entrevista, dita pelas pessoas entrevistadas. As categorias e unidades serviram de
subsídios para interpretar o conteúdo expresso nas mensagens e fazer as inferências
(MINAYO, 1992). Não foi utilizada outra unidade (contexto ou numeração) e nem a
contagem de frequências de determinadas palavras, pois não houve gravação de entrevistas,
apenas a anotação de frases que se adequariam aos objetivos da pesquisa.
Na análise quantitativa foram utilizadas as medidas de dispersão e localização:
(1) média aritmética simples: para calcular a média das diferentes porcentagens de
cada forma de inserção das ARFs aos mercados - relações de parentesco e vizinhança,
relações com as pontes de inserção, com intermediários e com consumidores urbanos). Esta
porcentagem foi informada pelos agricultores, que identificaram o percentual com relação à
quantidade comercializada em cada uma das formas de inserção. Desse modo, não foi
identificada a quantidade de produtos vendidos, mas sim, foram investigados por quais canais
as famílias inserem a maior quantidade da produção (equivalente em litros, quilos ou
unidades, dependendo de qual produto se refere). Assim, para cada forma de inserção foram
coletadas suas respectivas porcentagens, que posteriormente foram somadas e divididas pelo
número de ARFs entrevistadas (N = 41), resultando na média aritmética simples.
(2) desvio padrão: utilizado para identificar a variabilidade dos resultados, no que se
refere à quantidade de produtos agroindustriais desenvolvidos em cada ARF, para demonstrar
a diferença que pode ocorrer na interpretação da média e dos casos isolados (de cada ARF)
nas porcentagens da produção comercializada em cada canal acima descrito.
(3) máximo e (4) mínimo: aplicado para demonstrar a quantidade máxima e mínima da
porcentagem comercializada em cada canal e os valores máximos e mínimos de produtos
desenvolvidos pelas agroindústrias.
67
5 O SOCIAL E O PRODUTIVO NAS AGROINDÚSTRIAS RURAIS FAMILIARES:
A FAMÍLIA, O TRABALHO E A RENDA
O ato de transformar ou beneficiar a produção agropecuária no próprio
estabelecimento rural vem sendo retratado por alguns órgãos de pesquisa, tais como o IBGE.
Essas informações estão disponíveis no Censo Agropecuário, que nas últimas pesquisas
(2006) vem definindo uma nova nomenclatura para estas atividades, que até o último Censo
disponível (1995-1996) está apresentada como “Indústria Rural”. A mudança do termo
“Indústria Rural” para Agroindústria Rural
1
entretanto, não exclui a forma como a instituição
prossegue coletando as informações sobre a atividade, contemplando tanto os dados sobre as
unidades familiares quanto às não-familiares.
A região do Corede Jacuí Centro apresenta-se com uma diversidade de produtos
agropecuários que são beneficiados e/ou transformados (Tabela 1 Anexo). um espaço
significativo tanto para a produção de origem animal quanto para a de origem vegetal no que
se refere aos produtos agroindustrializados (IBGE, Censo Agropecuário 1995/1996). Quando
se menciona o valor da produção (Mil R$) e o número de informantes, as agroindústrias de
produtos de origem animal ocupam um espaço significativo. Nesta produção está incluída a
produção de carne verde
2
(bovinos, suínos, ovinos) além de outros produtos que são
produzidos a partir desses insumos, tais como banha, embutidos (linguiça, salame) e toucinho.
Os derivados do leite estão incluídos nestas formas, em que os produtos creme de leite, doce
de leite, queijo ou requeijão e manteiga são desenvolvidos.
Na produção de origem vegetal, em especial a dos derivados de cana-de-açúcar
(aguardente de cana, açúcar, melado e rapadura), os valores de produção são significativos.
Ainda relacionada a esse tipo de produção, a fruticultura é um destaque no que se refere à
quantidade de produtos que são extraídos das frutas, entretanto, com valores de produção e
números de informantes menos significativos. Neste segmento, estão as frutas cristalizadas, as
geleias, os licores, as pastas e o vinho (de frutas e de uva). Outros produtos agroindustriais de
origem vegetal são os derivados da mandioca (farinha, polvilho), do milho (fubá) e fumo em
rolo ou corda.
1
Nas informações que se referem à Industria Rural (IBGE Censo Agropecuário 1995/1996) neste trabalho
definida como Agroindústria Rural, estão incluídas todas as formas de produção (familiares e empresariais).
2
De acordo com Valle (2002) e Filgueiras et al. (2006), a carne verde é obtida através do abate de bovinos,
suínos e ovinos que foram alimentados com pastagens e mineração.
68
O município de Cachoeira do Sul destaca-se pelo maior número de informantes no que
se refere às unidades que transformam e/ou beneficiam produtos de origem agropecuária, e
Vila Nova do Sul apresenta-se com o menor mero de produtores quando comparado aos
demais municípios da região. Apesar da diversidade de produtos que são oferecidos na região,
alguns municípios apresentam características peculiares, como por exemplo, a produção de
licor de frutas que é encontrada somente no município de Cachoeira do Sul, enquanto o
produto “vinho de frutas” é inserido nos mercados através dos produtores de São Sepé.
Em contrapartida, os dados do IBGE não são suficientes para conhecer as atividades
de produção e comercialização de produtos agroindustriais desenvolvidas pela agricultura
familiar, pois as informações sobre as agroindústrias rurais disponíveis pelo órgão de pesquisa
contemplam também as empresas de pequeno porte que não utilizam mão-de-obra da família.
As agroindústrias se caracterizam, sobretudo, pelo dinamismo das atividades de
produção agropecuária, técnicas de processamento agroindustrial e comercialização. Assim, é
uma atividade que relaciona a família (alimentação, cultura, gênero, trabalho) e o ambiente
produtivo (animais e plantas).
Neste sentido, este capítulo está estruturado com o objetivo de mostrar a relação da
atividade agroindustrial com as demais ações desenvolvidas pelos membros da família no
ambiente da unidade de produção (estabelecimento rural). Para isso, serão retratadas as
características das ARFs no que se refere à produção agropecuária, estrutura fundiária,
trabalho familiar (item 5.1) e a diversidade dos produtos, estrutura física das agroindústrias e
renda familiar (item 5.2).
5.1 PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA, ESTRUTURA FUNDIÁRIA E O TRABALHO
FAMILIAR
Os estabelecimentos familiares da região possuem uma característica de diversificação
das atividades agropecuárias, sendo que são desenvolvidos produtos que servem tanto como
fonte de alimentação para a família e os animais, como para comercialização e como matéria-
prima para processamento na agroindústria rural. Os principais produtos agropecuários
desenvolvidos pelas famílias são o cultivo de grãos (arroz, soja e milho), de fumo e de
hortigranjeiros (Tabela 3). Considerando o número total da amostra da pesquisa (41 ARFs),
destaca-se a atividade de horticultura, que é desenvolvida em 95,1% das unidades, seguida da
69
fruticultura (90,2%), da suinocultura (78%), da bovinocultura (gado de leite, 73,2%), e
frangos (70,7%), conforme informações da Tabela 3.
Tabela 3 - Principais atividades agropecuárias desenvolvidas pelas ARFs do Corede
Jacuí Centro - RS
Sistemas de produção % ARFs
1. Horticultura 95,1
2. Fruticultura 90,2
3. Suinocultura 78
4. Pecuária (gado de leite) 73,2
5. Frangos 70,7
6. Arroz 46,3
7. Milho 34,1
8. Cana-de-açúcar 34,1
9. Fumo 26,8
10. Mandioca 19,5
11. Pecuária (gado de corte) 17,1
12. Soja 14,6
13. Batata 9,8
14. Amendoim 7,4
15. Feijão 4,9
16. Batata-doce 4,9
17. Outros (*) 16,8
Fonte: Elaborado pela autora.
Nota: (*) Os produtos identificados como "outros" correspondem aos produtos: peixe,
noz, ovinos, eucalipto, caprinos, patos e uva.
A diversidade social e econômica da agricultura familiar vem sendo retratada como
uma característica pertinente à abordagem do Desenvolvimento Rural, tanto no plano teórico
quanto empírico. Schneider et al. (2006) relacionam a diversificação das atividades
econômicas como uma das estratégias de obtenção da renda e redução dos riscos inerentes às
atividades agrícolas. Esta afirmação é condizente com a realidade social e econômica das
famílias, que desenvolvem uma média de 6,4 atividades diferentes, conforme a Tabela 4.
Esta diversidade de produtos é, por um lado, uma forma estratégica das famílias para a
alimentação do grupo doméstico e, por outro, adquirir de terceiros (estabelecimentos
comerciais, outros produtores) apenas os produtos complementares. Assim, as famílias
possuem a disposição um rol de produtos para satisfazer a sua necessidade alimentar. O
desvio padrão (de 1,7) demonstra a variabilidade na quantidade de atividades que as famílias
desenvolvem, tendo unidades que se dedicam no mínimo, a quatro tipos de atividades, e
ARFs que possuem 10 tipos de produtos, que é a quantidade máxima, conforme dados da
Tabela 4. Estas atividades, no entanto, correspondem à produção agropecuária, não
70
considerando nesta análise que os produtos agroindustriais são também componentes desta
diversificação, como será retratado no item 5.2.
Tabela 4 – Número de atividades agropecuárias
desenvolvidas nas ARFs
Medidas de dispersão N° Atividades agropecuárias
Média 6,4
Desvio Padrão 1,7
Mínimo 4
Máximo 10
Fonte: Elaborado pela autora.
No que se refere à formação histórico-cultural da região, a ascendência das famílias
está de acordo com as informações citadas no capítulo anterior. Verifica-se que a
predominância de famílias que possuem relação de parentesco (pai, avó, bisavó, etc.) com os
povos de imigração alemã (52%) e italiana (32%). Em porcentagens menores, pode-se
destacar a relação das famílias com a origem brasileira, portuguesa e africana, representando,
respectivamente, 10, 2 e 2% das ARFs. A combinação de diferentes ascendências (alemã e
italiana) foi mencionada por 2% das famílias (Gráfico 1).
52%
32%
10%
2%
2%
2%
Alemã
Italiana
Brasileira
Alemã e Italiana
Portuguesa
Africana
Gráfico 1 - Origem das famílias (Ascendência)
Fonte: Elaborado pela autora.
Nota: A ascendência foi mencionada pelo entrevistado (a), não tendo a pretensão de afirmar
que todos os membros da família possuem a mesma origem.
A forma como a família utiliza o espaço físico da unidade rural é representada pela
dinamização das atividades sociais e produtivas, pois a propriedade é o local onde residem,
produzem e processam. As ARFs são compostas por uma média de 3,6 pessoas
(considerando apenas as residentes nas unidades), sendo que propriedades com no máximo
71
7 componentes e no mínimo 2 pessoas (Tabela 5). O desvio padrão de 1,5 demonstra o
quanto os valores individuais (de cada ARF) são variáveis, comparado ao valor da média.
Nota-se que uma variabilidade considerável, pois 32% das unidades possuem entre 5 e 7
componentes.
Tabela 5 - Média do número de componentes das famílias, residentes nas ARFs
Medidas de dispersão N° componentes
Média 3,6
Desvio Padrão 1,5
Mínimo 2
Máximo 7
Fonte: Elaborado pela autora.
No que se refere ao tamanho das propriedades (área – expresso em hectares), as
unidades que possuem de 0,4 a 20 hectares correspondem a mais da metade do total da
amostra, onde 24 famílias se enquadram nesta categoria, representando uma porcentagem
equivalente a 58,5 - resultante da soma das duas porcentagens: de 0,4 a 10 ha (24,4%) e de 11
a 20 ha (34,1%). É pertinente ressaltar que dentre as ARFs, a unidade cuja área representa o
valor mínimo é a realidade de uma família que trabalha num espaço de terra de apenas 4.000
e a de tamanho máximo é expressa por uma propriedade cuja área é de 100 hectares
(Gráfico 2).
10
24,4
14
34,1
7
17,1
4
9,8
1
2,4
5
12,2
0
5
10
15
20
25
30
35
0,4 a 10 11 a 20 21 a 30 31 a 40 41 a 50 Acima de
50
N de ARF
Porcentagens (%)
Gráfico 2 - Estrutura fundiária (área em hectares) das ARFs
Fonte: Elaborado pela autora.
Nas ARFs uma organização social do trabalho, no que diz respeito à questão de
gênero, visto que as mulheres assumem os afazeres domésticos e um conjunto de ações que
72
envolvem a produção agroindustrial quando estas etapas são realizadas na cozinha (BONI,
2006). As mulheres realizam o processamento de produtos que envolvem um trabalho
minucioso, detalhista, cujo cuidado na realização das etapas é essencial.
Verificou-se a dedicação das mulheres no setor de panificação (pães, cucas, bolachas),
conservas de doces e legumes, geleias, frutas cristalizadas, rapaduras, etc. Nestas produções, o
homem possui uma participação pouco significativa, sendo que as suas ações estão
concentradas no desenvolvimento de trabalhos que envolvem os serviços de preparação dos
produtos agropecuários desde a produção até a colheita. Porém, no caso de alguns produtos, o
homem participa de todas as etapas produtivas, como é o caso do abate de animais e
fabricação de embutidos.
As ARFs caracterizam-se, sobretudo, por um espaço onde os membros da família e/ou
da comunidade realizam o trabalho de modo organizado, onde uma divisão de tarefas,
explicada pelo mero de etapas e a mão-de-obra intensiva que envolvem a produção e
comercialização. A relação de trabalho que envolve a mão-de-obra exclusivamente familiar é
realidade em 34 unidades estudadas e correspondem a 82,9% da amostra, conforme a Tabela
6. As relações que envolvem a mão-de-obra familiar e trocas de serviços, estão presentes em
7,3% da amostra, o que é demonstrado pelo número de 3 unidades. A mesma porcentagem é
observada nas relações representadas por um conjunto de trabalho familiar e contratada
(Tabela 6).
Tabela 6 - Origem da mão-de-obra na produção das ARFs
Origem N° ARFs %
Total Familiar 34 82,9
Familiar e trocas 3 7,3
Familiar e contratada 3 7,3
Familiar e cooperativo 1 2,4
TOTAIS 41 100
Fonte: Elaborado pela autora.
As relações expressas por "Familiar e trocas" correspondem a uma ajuda mútua entre a
família e os membros que residem próximos às ARFs, para a execução dos serviços da
agroindústria. São caracterizadas por relações de parentesco e vizinhança. As relações
expressas por "Familiar e contratada" referem-se ao contrato de diaristas que trabalham em
épocas de abates e produção intensiva. Os diaristas são originários da comunidade ou da zona
urbana do município e contratados por meio de relações de amizade (confiança). Já as
relações de cunho "Familiar e cooperativo" são aquelas que reúnem um grupo de agricultores
na produção e uma distribuição de sobras (lucro) provenientes da comercialização, ou seja,
73
todos os componentes da organização são beneficiados, como é o caso da cooperativa -
COOPASA
3
.
5.2 A DIVERSIDADE DOS PRODUTOS, ESTRUTURA FÍSICA E RENDA FAMILIAR
A produção diversificada não é uma característica exclusiva das atividades
agropecuárias, a diversificação é uma característica também das atividades agroindustriais.
Esta realidade se justifica pelo objetivo dos agricultores, que é o de disponibilizar um
conjunto de produtos agroindustriais para a alimentação da família e, também, como forma de
acesso aos mercados, desenvolver vários produtos com características específicas a cada tipo
de consumidor, conforme será detalhado nos próximos capítulos. Para atingir os diferentes
objetivos, as famílias organizam seu espaço produtivo, empregando a técnica, o insumo e o
processo adequado a cada tipo de produto. A diversidade de produtos agroindustriais também
é uma característica dos agricultores que compõem a região do CONDESUS Consórcio de
Desenvolvimento Sustentável da Quarta Colônia (NEUMANN et al., 2007).
Não uma distinção entre o que é produzido para venda e o que a família destina
para o próprio consumo, pois os mesmos produtos cumprem ambas as funções:
comercialização e alimentação familiar. No que se refere à quantidade de produtos que os
agricultores desenvolvem nas ARFs, a média é 4,7, considerando que existem as ARFs que
produzem um único produto (valor mínimo) e também uma família que desenvolve 14
produtos (Tabela 7). Com o desvio padrão de 3,3%, nota-se a variabilidade no número de
produtos fabricados pelas famílias, sendo que 9 unidades desenvolvem um único produto, e
que aproximadamente 78% das ARFs fabricam entre 2 a 14 produtos diferentes (Gráfico 3).
Tabela 7 - Quantidade de produtos agroindustriais desenvolvidos pelas ARFs
Medidas de Dispersão N° produtos
Média 4,7
Desvio Padrão 3,3
Mínimo 1
Máximo 14
Fonte: Elaborado pela autora.
3
A COOPASA é uma organização social cooperativa da comunidade quilombola da região de São Miguel dos
Morenos, localizada no município de Restinga Seca. Fundada por 6 famílias da comunidade, que produzem pães,
cucas, salgadinhos e bolachas.
74
Gráfico 3 Número de produtos agroindustriais (de diferentes
tipos) que as famílias produzem
Fonte: Elaborado pela autora
Os diferentes meios – comercialização, troca e consumo familiar - que as ARFs
utilizam para o escoamento da produção agroindustrial refletem-se na forma como as ARFs
organizam o trabalho, a produção agropecuária, os insumos, etc. O desenvolvimento das
atividades agroindustriais está associado ao aproveitamento dos recursos de trabalho, estrutura
física (equipamentos, utensílios) e matérias-primas disponíveis para a transformação ou
processamento na ARF.
De acordo com as informações constantes na Tabela 8, em 12 unidades (29,3% das
ARFs), a matéria-prima é originada exclusivamente na propriedade familiar. Quando os
produtos agropecuários de origem familiar não são suficientes para suprir a quantidade dos
insumos necessários para a produção, ou não são produzidos (como a farinha de trigo,
recheios para salgados e doces), usa-se a complementação de ingredientes de origem na
comunidade (4 ARFs), comércio local ou terceirizada (18 ARFs). Não obstante, há o conjunto
de todas estas relações para a aquisição da matéria-prima, havendo uma complementação dos
produtos da família, comunidade, comércio e terceirizada, retratada por 5 unidades.
A matéria-prima, cuja origem é totalmente terceirizada, ou seja, quando a família
adquire produtos agropecuários por meio de relações com revendedores ou fornecedores, não
apresenta números significativos. Apenas uma unidade apresenta esta característica,
justificada pelas condições ambientais não favoráveis à produção da uva utilizada como
0
2
4
6
8
10
12
14
16
1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25
27
29
31
33 35
37
39
41
ARFs
N° produtos
75
matéria-prima para a fabricação do vinho e que é adquirida por meio de revendedores de
Caxias do Sul.
Tabela 8 – Origem da matéria-prima das ARFs
Origem N° ARFs
%
Própria 12 29,3
Própria e comércio/terceirizada 19 46,3
Própria e comunidade 4 9,8
Própria, comunidade e comércio 5 12,2
Terceirizada 1 2,4
TOTAIS 41 100
Fonte: Elaborado pela autora.
A possibilidade de geração de inúmeros produtos agroindustriais utilizando-se uma
única matéria-prima principal (mudando-se apenas os complementos e/ou processos), pode
ser considerada como outra “estratégia produtivadas ARFs no que se refere à diversificação
da produção (APÊNDICE B). Dos derivados da cana-de-açúcar resultam como produtos
finais o açúcar mascavo, a cachaça, o melado, a rapadura de melado (com amendoim), entre
outros que são desenvolvidos por 16 ARFs (Tabela 9). Da produção de leite, além do produto
suprir o consumo familiar, ele também pode ser transformado em queijo, ricota, nata, doce de
leite, iogurte, manteiga, requeijão, rapadura de leite, entre outros que estão presentes em 18
ARFs.
O setor de panificação e confeitaria destaca-se pela quantidade de produtos que são
desenvolvidos com a utilização da principal matéria-prima: a farinha de trigo. Este insumo, no
entanto, é adquirido de estabelecimentos comerciais, mas com a complementação dos
ingredientes disponíveis na unidade, necessários para a receita de cada produto: pães,
bolachas, cucas (alemã e italiana), tortas, salgadinhos, massas, etc. Nesta produção estão
inseridas 13 famílias. As frutas disponíveis nas propriedades rurais são utilizadas como
matéria-prima para a fabricação de geleias, recheios de cucas, doces, chimias, conservas de
legumes, cristalizados, rapaduras, etc. Pela diversidade de frutas que são processadas e pela
possibilidade de combinação de duas ou mais espécies, as famílias fabricam uma variedade de
produtos, que são diferenciados pelos sabores e processos. O número de ARFs que
desenvolvem esta produção é de 14 famílias (Tabela 9).
A produção de origem animal, considerada, neste trabalho, como todos os produtos
que são obtidos através do abate de animais como porcos, gado e frango, a partir dos quais,
posteriormente, são produzidos embutidos (linguiça, salame, presunto, banha, bacon e
torresmo) é desenvolvida em 7 ARFs. Os produtos minimamente processados, como a
76
mandioca e a noz (descascada, cortada e embalada) estão presentes em, 4 e 6 ARFs,
respectivamente.
Tabela 9 - Produção agroindustrial (derivados) e número de ARFs
Produtos N° ARFs
Derivados da cana-de-açúcar 16
Derivados do leite 18
Embutidos e produção animal (carnes) 7
Panificação e confeitaria 13
Doces e geleias de frutas 14
Produtos minimamente processados 4
Outros (¹) 6
Fonte: Elaborado pela autora.
Nota: (1) Os produtos mencionados como “Outros” são: mel, conservas (pepinos),
mandolate, vinhos e licores.
Apesar de não serem resultado de transformação, os produtos minimamente
processados são, também, estratégias dos agricultores para prolongar a vida útil do produto e
possibilitar a comercialização dos mesmos por um preço maior se comparado à produção in
natura. Nas duas ARFs que desenvolvem essa produção, as famílias destacaram que houve a
elevação do preço de comercialização quando aplicadas as ações de lavar, selecionar, cortar,
embalar e congelar, realizadas nos produtos: mandioca e noz.
Embora não se constitui como a motivação principal e única para as famílias
dedicarem-se às atividades de agroindustrialização, a agregação de valor, aliada à
oportunidade de comercializar e à possibilidade de aumentar, diversificar e encontrar uma
alternativa de renda para a família tem sido citada pelas ARFs. Considerando 41 ARFs e que
foram geradas 59 respostas, 22 unidades fizeram referência a estes itens como alguns dos
incentivos para o desenvolvimento destas atividades, correspondendo a 37,3 % do total das
respostas (Tabela 10 e Gráfico 4). A oportunidade de comercialização (pela construção de um
espaço físico de venda da produção) e a observação das preferências de consumo dos clientes
configuraram como outros incentivos para o início da produção agroindustrial. A alternativa
de renda também foi uma das principais motivações que levaram os agricultores familiares a
desenvolver atividades agroindustriais na região oeste do Paraná (STADUTO; AMORIM,
2008).
A agroindústria, vista como uma geração de renda e comercialização pode se
evidenciar nas ARFs:
77
[...] “é uma coisa que aprendi com a mãe, que me ensinou a fazer. E também é uma
oportunidade de comercializar na associação, comercializa e é uma renda que
consegue tirar um lucro”. (Produtora 16, Restinga Seca).
[...] “o emprego difícil, para viver com essa renda até uma autonomia pra
gente” (Produtores 23, Restinga Seca).
[...]“começou por causa da feira, tinha um lugar para vender. Se não tivesse essa
feira, eu não ia vender, fica mais difícil” (Produtor 27, Paraíso do Sul).
Algumas famílias demonstraram insatisfação econômica no que se refere às receitas
monetárias provenientes da comercialização de grãos e produtos in natura, e este fator foi
mencionado como impulsionador no desenvolvimento de atividades agroindustriais,
representando 18,6% do total das respostas (59), mencionadas por 11 ARFs, tal como se
observa:
[...]“só do arroz não tava dando para sobreviver” (Produtora 14, Restinga Seca).
[...]“ foi pelo mal preço pago pelo porco vivo ao produtor”. “Nós ficávamos no
prejuízo, era uns 15 cheques que tava na rua”. “Nós víamos na agroindústria uma
alternativa de renda para o ano todo”. [...] “Soja e arroz era uma vez por ano”.
(Produtor 15, Restinga Seca)
A estrutura física aliada ou não ao conhecimento técnico herdado de antepassados
(16,9%) (Figura 4), a atividade como terapia e o “gostar do que se faz” (10,2%), a
disponibilidade de matéria-prima (quando esta excede à quantidade consumida pela família)
(6,8%), o incentivo institucional (técnico e/ou financeiro) (3,4%), e o objetivo de inserir os
jovens e mulheres nas atividades (1,7%) destacam-se como outras motivações.
A Figura 4, a seguir, expressa a realidade de duas famílias que preservam os
equipamentos herdados de antepassados (pai e avô) para a produção de cachaça (à esquerda) e
a técnica (saber-fazer) de gerações passadas desenvolvida na fabricação de queijos direita).
O conhecimento técnico herdado da família, os equipamentos e a estrutura justificam as
motivações que estes agricultores possuem para dar continuidade à produção agroindustrial.
78
Figura 4 Engenho de cana-de-açúcar herdado de antepassados
(ARF 20, Restinga Seca) e queijos em maturação, produzido de
acordo com o “saber-fazer” de gerações passadas (ARF 31,
Paraíso do Sul).
Fonte: Fotografia da autora (junho/2009).
Três ARFs do município de Cerro Branco mencionaram a intenção de desenvolver
outras atividades como alternativas à produção de fumo, como sendo a principal motivação
para possuir atividades agroindustriais (5,1%, Tabela 10 e Gráfico 4). Esta motivação está
relacionada à própria representação da atividade fumageira para as famílias. Alguns aspectos
sobre a atividade são evidenciados pelos depoimentos das famílias, como o alto preço dos
insumos e a utilização de insumos químicos:
[...]“queremos parar com o fumo, isso que motivou a gente”. Os insumos do fumo
são muito caros. E era isso que a gente fazia. Para o fumo recebemos 2,3 meses,
depois não temos mais o que receber. Para a agroindústria é dinheiro todo o ano
(Produtor 32, Cerro Branco).
[...]“era pra deixar o fumo que ia muito veneno. “Agora estamos produzindo fumo
orgânico, que não vai nada de veneno, é também mais valorizado, o pessoal da
REAL TABACOS que vem buscar”. “Esse fumo vai pra fora, para exportar”
(Produtora 33, Cerro Branco).
Tabela 10 - Motivações para as atividades de agroindustrialização nas ARFs
Itens % N° ARFs
Estrutura e/ou técnica herdada de antepassados 16,9 10
Gostar do que faz e terapia 10,2 6
Oportunidade de comercializar e renda 37,3 22
Matéria-prima excedente 6,8 4
Baixo preço de venda dos produtos agropecuários 18,6 11
Alternativa à produção de fumo 5,1 3
Incentivo institucional (técnico e/ou financeiro) 3,4 2
Atividade para jovens e mulheres 1,7 1
TOTAIS 100,0 59
Fonte: Elaborado pela autora.
Notas: O número de ARFs (N) não se refere ao tamanho da amostra, mas sim ao número total de
famílias que mencionou o respectivo item como uma das motivações para desenvolver uma
atividade de agroindustrialização. Em várias ARFs foram citadas duas ou mais motivações.
79
16,9%
10,2%
37,3%
6,8%
18,6%
5,1%
3,4%
1,7%
Estrutura e/ou técnica herdada de
antepassados
Gostar do que faz e terapia
Oportunidade de comercializar e
renda
Matéria-prima excedente
Baixo preço de venda dos
produtos agropecuários
Alternativa à produção de fumo
Incentivo institucional (técnico
e/ou financeiro)
Atividade para jovens e mulheres
Gráfico 4 – Motivações para o desenvolvimento de atividades agroindustriais
Fonte: Elaborado pela autora.
As motivações citadas anteriormente relacionam-se com as diferentes estratégias
que os agricultores familiares desenvolvem para aproveitar os recursos disponíveis na unidade
e, com eles, criarem novas maneiras para alcançar os objetivos desejáveis, tais como: ter uma
fonte de renda, uma atividade, fixar os jovens no meio rural, diminuir a produção de fumo,
etc. Estratégias que se configuram nas formas como a agricultura camponesa cria mecanismos
para enfrentar e contrapor as dificuldades econômicas inerentes à produção agropecuária
(PLOEG, 2008). Os agricultores não objetivam interromper as atividades agropecuárias, pois
estas produções possuem diferentes destinos: como matéria-prima para o processamento na
agroindústria, fonte de renda e alimentação familiar.
A organização da estrutura física, no que se refere às atividades de processamento da
produção agropecuária, acontece de duas formas: nas ARFs que possuem uma estrutura
própria (43,9% - 18 famílias), um espaço físico com equipamentos, materiais e utensílios
próximo à residência. Esta estrutura, em alguns casos, foi herdada de antepassados (pai, avô)
e em outras foram construídas pelas famílias, de forma individual ou coletiva (no caso das
organizações sociais). A outra maneira é a realização do processamento em uma peça da
residência (mesmo local de moradia das famílias), geralmente na cozinha ou na varanda da
casa, verificado em 23 ARFs e representando uma porcentagem de 56,1% (Tabela 11). A
produção que é fabricada nestes espaços é geralmente a de derivados do leite, panificação e
confeitaria, geleias e doces de frutas, uma vez que as famílias utilizam os mesmos utensílios
para a fabricação da alimentação.
80
Durante o processamento, são gerados resíduos que não podem ser aproveitados para a
geração de outros produtos na agroindústria. No entanto, as famílias utilizam as sobras como
cascas de frutas e legumes, soro de leite, bagaço da cana-de-açúcar, resíduos da produção
animal, entre outros, para adubação do solo e alimentação de animais. O aproveitamento das
sobras para uso exclusivo na fabricação de compostagem e adubação orgânica acontece em 10
ARFs, representando 24,4% do total das famílias. Já o destino das sobras para fins de
alimentação animal é realidade em 21 unidades, o que representa 51,2% das unidades.
Algumas famílias utilizam as duas formas (adubação do solo e alimentação de animais) como
destinos para os resíduos da agroindústria, representando 19,5% e 8 ARFs.
Assim, os resíduos do processo de produção da agroindústria são reaproveitados para
o desenvolvimento de outras atividades na propriedade, como também é verificado por
Nierdele e Wesz Júnior (2009, p.14) nos resultados de pesquisas com agroindústrias de
derivados de cana-de-açúcar:
[...] “numa clara alusão à coprodução entre homem e natureza, percebe-se que
grande parte dos resíduos gerados por este tipo de agroindustrialização realimenta o
novo ciclo produtivo, ou é utilizada em outras atividades produtivas, como é o caso
também da produção para autoconsumo”.
Apenas 4,9% (duas unidades) que produzem embutidos não podem aproveitar os
resíduos do abate de porcos. Uma destas famílias entrega os resíduos para as empresas de
coleta e outra descarta as sobras em forma de aterro, conforme a Tabela 11:
Tabela 11 – Estrutura física, destino dos resíduos da produção das ARFs
Estrutura Destino dos resíduos
ARFs
Própria (na casa)¹ Animais Solo Mist Outra
18 23 21 10 8 2
% 43,9 56,1 51,2 24,4 19,5 4,9
Fonte: Elaborado pela autora.
Notas (1): A estrutura física das ARFs quando se menciona que é localizada na própria
casa, considera-se que o processamento ocorre na cozinha ou varanda, peças que são
utilizadas por algumas famílias.
(2): A forma de destino dos resíduos identificada pela palavra “Mista” refere-se a duas
maneiras de aproveitamento: alimentação dos animais e adubação do solo.
Apesar de quase a metade (43,9%) das ARFs possuírem uma estrutura física com
equipamentos, utensílios e materiais para a realização das etapas do processamento
agroindustrial, apenas 4 unidades (9,8%) possuem algum selo de certificação (Tabela 12).
Estas unidades possuem a adequação da estrutura produtiva às normas vigentes no Sistema de
Inspeção Municipal SIM, que conferem às ARFS a inserção do produto em
81
estabelecimentos comerciais do município. Duas ARFs (4,9%) possuem o Alvará Sanitário da
prefeitura municipal, que é uma das etapas anteriores à liberação do registro e selo de
certificação SIM, que permite o funcionamento da estrutura produtiva. A informalidade, aqui
entendida como a ausência de certificação formal (selo de inspeção municipal: SIM) é
realidade em 35 ARFs, representando 85,4% do total de unidades, conforme a Tabela 12.
Tabela 12 – Certificação e informalidade das ARFs
Certificação
ARFs
SIM Alvará Sanitário
Informal
4
2
35
% 9,8
4,9
85,4
Fonte: Elaborado pela autora.
Tanto as famílias que possuem certificação formal quanto as que não possuem,
enumeram alguns entraves para a adequação da estrutura produtiva ao SIM. A ausência de
recursos financeiros para investimentos e o alto custo para a manutenção da estrutura da
produção (relacionada à pequena escala produtiva), destacam-se como as principais
dificuldades, mencionadas por 31 famílias, representando 62% do total das respostas (Tabela
13 e Gráfico 5). As famílias expuseram esses problemas:
[...] “não compensa manter a estrutura funcionando, as máquinas estão todas
paradas” “Nós tínhamos o selo SABOR GAÚCHO e código de barra e o SIM”. “os
que ajudavam a produzir desistiram e foram plantar fumo”.(Produtor 11, Cachoeira
do Sul).
[...]“é pouca produção e não vale a pena fazer. Se tem que fazer rótulo não vale a
pena, produzimos em junho, julho. Se certificar tem que fazer o ano todo para
compensar” (Produtora 29, Paraíso do Sul).
As exigências cnicas relacionadas à obtenção de registros formais e as altas taxas de
impostos são outros obstáculos para certificação das ARFs, representando 14% das respostas
mencionadas por 7 famílias (Tabela 13, Gráfico 5). Também representam problemas: o
desenvolvimento de outras atividades, ou seja, a família não possui uma dedicação exclusiva
no que se refere à organização do tempo de trabalho na agroindústria (10% - 5 ARFs); o
reconhecimento de que existem outros agricultores que desenvolvem os mesmos produtos;
dificuldades para a construção de uma organização social para minimizar os entraves de
certificação (4% - 2 ARFs); a ausência de preocupação e/ou desconhecimento sobre as
normas que regem o funcionamento das agroindústrias e selos de certificação (8% - 4 ARFs) e
ainda, como se verifica em 1 ARF, a falta de incentivo familiar.
82
Tabela 13 - Dificuldades das famílias para a adoção de certificação nas ARFs
Itens % N°ARFs
Financeira - custo alto - pequena produção 62 31
Outras atividades 10 5
Concorrência 4 2
Burocracia (técnica e impostos) 14 7
Desconhecem e não têm preocupação 8 4
Não têm incentivo da família 2 1
TOTAIS 100,0 50
Fonte: Elaborado pela autora.
Nota: O número de ARFs (N) não se referem ao tamanho da amostra, mas sim ao mero total de
famílias que mencionou o respectivo item como uma das dificuldades para a adoção da certificação.
Desse modo, em várias ARFs houve a citação de dois ou mais entraves.
É pertinente ressaltar que existe a inter-relação de duas ou mais dificuldades, uma vez
que os entraves de cunho financeiro estão relacionados também com as questões que
envolvem as altas taxas de impostos e a exigência de contratação de técnicos para fiscalização
da produção. A pequena escala de produção também está relacionada às questões financeiras,
já que as famílias que mencionam tal empecilho reconhecerem que os altos custos que
envolvem a certificação dos produtos inviabilizariam economicamente a ARF. Estas
constatações fazem parte da realidade das ARFs:
[...] “é a concorrência dos vinhos, tem muita gente produzindo. Os tributos para
registrar é muito caro, um horror. Ainda me falaram que precisa vir um enólogo de
Santa Maria olhar a produção, mas como a produção é pequena não vale a pena, é
enólogo, contador, técnico, vai sair 3 vezes mais caro” ( Produtor 22, Restinga
Seca).
[...]
tem que montar uma firma, tem que ter grande quantidade, colocar empregado
e só se dedicar para aquilo. Não fizemos só isso” (Produtor 37, São Sepé).
62%
10%
4%
14%
8%
2%
Financeiro - custo alto -
pequena produção
Possui outras atividades
Concorrência
Burocracia (cnica e
impostos)
Desconhece e não tem
preocupação
Não tem incentivo da família
Gráfico 5 – Dificuldades das famílias para a adoção da certificação SIM
Fonte: Elaborado pela autora.
83
A Tabela 14 expressa as atividades que contribuem significativamente para a garantia
de renda familiar e qual a aplicação da renda proveniente da comercialização dos produtos
agroindustriais. A produção agropecuária, destacando o plantio de monocultivos (arroz, fumo,
soja, milho) e a pecuária de leite são as principais fontes de renda para 15 famílias,
representando 36,6% do total de unidades. Em 4 ARFs (9,8% das unidades), tais atividades
funcionam como complementares
4
na formação da renda familiar, juntamente com a renda da
aposentadoria. Dentre estas ARFs destacam-se as unidades que começaram a desenvolver
atividades agroindustriais porque tinham como objetivo encontrar outra renda superior à
atividade fumageira, como demonstrado anteriormente, na Tabela 10 e Gráfico 4 . No entanto,
3 ARFs ainda continuam produzindo fumo sendo o produto mencionado por 2 delas como
fonte complementar na renda familiar.
Os produtos agropecuários processados contribuem como a principal renda para 9
famílias (22%), e como atividade complementar na formação de renda familiar, ou seja, como
participante da renda agropecuária ou aposentadoria rural mencionada, respectivamente, em 5
ARFs (12,2%) e 2 ARFs (4,9%). Nas demais unidades, foram mencionadas outras fontes de
renda como principais: a aposentadoria (3 ARFs - 7,3%), os aluguéis de casa na cidade e a
realização de trabalhos na comunidade (3 ARFs - 7,3%), conforme a Tabela 14.
As receitas monetárias provenientes das atividades agroindustriais cumprem a função
de investimentos
5
, a aquisição de alimentos e gastos gerais da família. Em 18 ARFs (43,9%),
a renda que a família adquire com a comercialização dos produtos é disponibilizada para as
despesas com a alimentação, vestuário, reformas na casa, gastos com estudos dos filhos,
transporte, etc. Nestas unidades, não o uso da renda para a realização de investimentos na
ARF e na atividade agropecuária, sendo que a renda da agroindústria é destinada
exclusivamente para suprir parte ou a totalidade das necessidades da família. Em resumo,
enquanto em algumas unidades observa-se a destinação da renda para a alimentação da
família e reformas na casa, em outras, a renda supre apenas a compra de alguns produtos para
o consumo. Esta diversidade econômica, no que diz respeito à destinação da renda da
agroindústria, pode ser observada em alguns depoimentos:
4
Estão sendo consideradas como atividades complementares neste trabalho, as respostas dos produtores quando
estes não souberam identificar qual a renda maior, ou seja, as duas contribuem para a formação da renda. (Ex.
ARF e agropecuária, ARF e aposentadoria, Agropecuária e aposentadoria).
5
Consideram-se investimentos todos os gastos com as atividades (ARF e agropecuária) que visam um retorno
financeiro futuro (instalações, insumos, máquinas, implementos, transporte, mão-de-obra).
84
[...] “a renda não é satisfatória, nós sobrevivemos porque produzimos aquilo que
comemos, se não produzimos a comunidade produz”. “Aqui na comunidade todo
mundo planta, e são 8 famílias que estão num pedacinho de terra. E todos se
ajudam”.
A guria precisa de ônibus, e nós repartimos as sobras, eu ajudo minha filha
no colégio. “A gente sempre ajuda a família” (Produtores 19, Restinga Seca).
[...]“eu comprei o piso [reforma casa] com o dinheiro das vendas do pepino [em
conserva] o ano passado” (Produtora 21, Restinga Seca).
[...]“nunca cobriu as despesas. Esse ano deu R$ 600,00. pra comprar alguma
coisa para a casa, como o sal, o açúcar” (Produtora 28, Paraíso do Sul).
As famílias que utilizam a renda para os gastos da família, para investimentos na
atividade agroindustrial e na agropecuária correspondem a 10 ARFs (24,4%). A aplicação da
renda da agroindústria adquire, nestas unidades, a função econômica (gastos com as
atividades agroindustriais e agropecuárias visando um retorno financeiro) e a função social,
que diz respeito à aquisição de alimentos para a família e para os animais que servirão,
posteriormente, para o consumo, bem como o melhoramento das estruturas da residência e da
propriedade, tal como verificado nas ARFs:
[...]“eu compro coisas para casa e ainda comprei um forno que precisava na
produção, no mês passado”. [...]“com o dinheiro ainda sustento uma filha que estuda
em Santa Maria”. (Produtora 4, Cachoeira do Sul)
[...] “melhorar galpões, reformar a casa da família e ajudo as filhas que estão
estudando” (Produtor 39, São Sepé).
A destinação da renda para investimentos exclusivamente nas atividades agropecuárias
ou somente nas agroindustriais é realidade em, respectivamente, 8 ARFs (19,5%) e 5 ARFs
(12,2%). Nestas unidades, a renda cumpre a função de aplicação de recursos como aquisição
de equipamentos, materiais para facilitar o trabalho na lavoura, utensílios para o
desenvolvimento de produtos agroindustriais, o pagamento de financiamento da estrutura
agroindustrial, entre outros. Esta análise é uma constatação das seguintes famílias:
[...] “compramos um trator, debulhadeira de milho e guincho, até roçadeira, para
facilitar o trabalho” (Produtores 11, Cachoeira do Sul).
[...]“já compramos balança eletrônica, batedeira, o lucro que sobra a gente divide
[ela e a sogra]” (Produtora 26, Restinga Seca).
85
Tabela 14 - Origem da renda e destino das receitas dos produtos das ARFs
Principal fonte de renda familiar N° ARFs %
Produção agroindustrial 9 22,0
Produção agroindustrial e agropecuária 5 12,2
ARF e aposentadoria 2 4,9
Aposentadoria 3 7,3
Produção agropecuária 15 36,6
Aposentadoria e produção agropecuária 4 9,8
Outros¹ 3 7,3
TOTAIS 41 100,0
Destino da renda dos produtos da ARF N° ARFs %
Investimento na atividade agropecuária 8 19,5
Gastos familiares (consumo e outros) 18 43,9
Investimento na ARF 5 12,2
Gastos família, investimentos ARF e agropecuária 10 24,4
TOTAIS 41 100,0
Fonte: Elaborado pela autora.
Notas: (1) A origem da renda identificada como “outros” se refere a trabalhos realizados na
comunidade e aluguel de uma casa na cidade.
As famílias não dependem, exclusivamente, da comercialização de um único produto
como forma de garantia de renda, seja ele agroindustrial ou não. Não obstante, algumas
famílias ainda buscam outras remunerações, como trabalho, aposentadoria, aluguéis, etc.
Desse modo, a renda é o resultado de todas as atividades desenvolvidas pelas famílias,
permitindo que elas possuam um fluxo de caixa ao longo do ano. Este, por sua vez, permite
gerenciar o capital para investimentos em outras atividades e para a aquisição de produtos
para suprir a necessidade da família.
86
6 A FORMAÇÃO SOCIAL DAS REDES NOS MERCADOS DE PROXIMIDADE DAS
ARFs
No capítulo precedente pudemos perceber as características das agroindústrias no
âmbito da produção e da família. Dentre tantos aspectos sociais, econômicos e culturais
dessas unidades, a ausência e as dificuldades para a adoção da certificação para a produção
têm sido retratadas. Todavia, esta característica não impede a agricultura familiar de
comercializar seus produtos agroindustriais. Alguns autores têm chamado a atenção para o
fato de que a comercialização das ARFs acontece no ambiente local, e a venda de produtos no
município e região é o objetivo destas unidades (PELEGRINI; GAZOLLA, 2008; SILVEIRA
et al., 2006); enquanto outros destacaram a ligação da comercialização ao prolongamento das
relações sociais locais, como parentesco, amizade e vizinhança (WILKINSON, 2002).
O que se pretende no presente capítulo, além de descrever as relações sociais que
compõem os mercados de proximidade, é demonstrar que as relações neste âmbito não se
resumem ao ato da comercialização e que as relações que as ARFs possuem não são
caracterizadas, essencialmente, por ligações com pessoas que residem no município ou região.
Portanto, a utilização do termo “mercado local” não é suficiente para demonstrar as relações
que envolvem a produção, o consumo e a comercialização dos produtos agroindustriais na
região do Corede Jacuí Centro.
Assim, as redes sociais dos mercados de proximidade não são constituídas somente
por atores que residem na mesma região, cidade ou comunidade (proximidade geográfica),
mas também são compostas de agentes que residem em locais, cidades e estados distintos. As
famílias estão inseridas em um conjunto de relações sociais, locais ou não, que explicam a
forma como a atividade de agroindustrialização, seja formal ou informal, está encontrando
canais de comercialização para escoamento do produto.
No que se refere ao desenvolvimento produtivo da agroindústria, destacam-se a
atuação de Instituições
1
locais (governamentais e não-governamentais) que fazem parte da
rede social dos mercados de proximidade. As relações sociais das famílias com estas
instituições contribuem para a ampliação e o acesso aos conhecimentos técnicos e/ou captação
1
Considera-se Instituição como uma organização pública, privada ou não-governamental cujo objetivo é a
prestação de assistência técnica e/ou captação de recursos financeiros para as ARFs.
87
de recursos financeiros para a produção agroindustrial. Estas informações e/ou recursos
explicam a forma como os agricultores inserem seus produtos nos mercados. Não obstante,
essas instituições desenvolveram locais físicos específicos de comercialização, onde os
agricultores expõem a produção da agroindústria, como por exemplo, as feiras.
A Tabela 15, a seguir, expressa as instituições que atuam no desenvolvimento das
ARFs, como por exemplo, a EMATER Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
que foi mencionada por 23 famílias como órgão de incentivo à agroindustrialização. Sob sua
atuação na região, destaca-se a assistência técnica, assessoria de projetos de agroindústrias,
prestação de conhecimentos sobre normas técnicas de higiene e sanidade na produção,
promoção de cursos de capacitação e diversificação de produtos agroindustriais. A instituição
atua no Grupo de Mulheres Trabalhadoras Rurais (Cachoeira do Sul), cooperativas,
associações de mulheres (Restinga Seca), Associação de Produtores para a Prestação de
Serviços e Assistência Técnica - APSAT (São Sepé), grupo de quilombolas (Restinga Seca e
São Sepé), captação de recursos e assessoria de projetos (Cerro Branco). A forma como a
instituição vem desenvolvendo os mercados de proximidade para as agroindústrias é
mencionada pelas famílias:
[...] “a massa folhada aprendi a fazer com os cursos da Emater, mas as cucas e bolos
já fazia com que tinha aprendido da mãe” (Produtora 14, Restinga).
[...] “a Emater ajuda, com a visita das comunidades e cursos [normas de higiene e
receitas de panificação] (Produtora 3, Cachoeira do Sul).
[...] “tudo produzido com bastante higiene, a cozinha toda limpa, essas instruções
foram passadas para nós [associação] pelos cursos da Emater”(Produtora 5,
Cachoeira do Sul).
As famílias que desenvolvem suas atividades mediante a construção de suas próprias
estratégias de produção e comercialização representam 13 ARFs. Nestas unidades, não a
articulação entre as famílias e as instituições no que se refere à atividade agroindustrial. O
apoio proveniente dos órgãos governamentais, tais como Secretaria de Agricultura e
prefeitura municipal é mencionado por 8 ARFs. Estas relações são pertinentes na medida em
que funcionam como captação de recursos para o desenvolvimento de agroindústrias, além de
prestar assistência técnica para análise dos produtos, de acordo com as normas da vigilância
sanitária. As famílias articuladas nestas relações estão adequando-se à inspeção SIM, e outras
incorporaram a atividade agroindustrial na propriedade a partir do recurso financeiro destas
instituições locais.
88
O Centro de Atendimento ao Pequeno Agricultor CAPA é uma instituição não-
governamental que atua na promoção de desenvolvimento de práticas ecológicas, cuja
entidade financiadora é a Fundação Luterana de Diaconia - FLD. A assessoria desta
organização conta com a prestação de serviços técnicos e cursos de capacitação relacionados
às atividades agropecuárias e agroindustriais. O CAPA está vinculado a 2 famílias, que
comercializam na Feira Ecológica de Cachoeira do Sul.
Outros órgãos são mencionados, como as Universidades - Universidade de Santa Cruz
do Sul (UNISC), que atua no desenvolvimento de práticas ecológicas em Cerro Branco (1
família) - e o SEBRAE Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, que presta cursos
sobre comercialização e técnicas de vendas (2 famílias).
Tabela 15 - Incentivos institucionais para agroindustrialização
Incentivos N° ¹ ARFs
%
Não possuem 13 26,5
EMATER 23 46,9
Secretaria Agricultura/Prefeitura 8 16,3
Universidades 1 2,0
Organizações não-governamentais – CAPA 2 4,1
SEBRAE 2 4,1
TOTAIS 49 100,0
Fonte: Elaborado pela autora.
Notas: (1) O número de ARFs (N) não se refere ao tamanho da amostra, mas sim ao número
total de famílias que mencionou o respectivo item como incentivo (financeiro ou técnico) para
as atividades de agroindustrialização. Desse modo, em algumas ARFs houve a citação de dois
ou mais incentivos.
Compondo o conjunto de relações, a Figura 5 exprime a forma como os agricultores
estão interagindo com diversos agentes sociais, tais como instituições, outros produtores,
intermediários, cooperativas, associações, consumidores e os demais agentes da sociedade
civil. Neste capítulo serão retratadas as relações que compõem as redes de comercialização e
troca e, no capítulo posterior, além de discutir sobre diferenciação e inovação, será
apresentada a relação consumidor-consumidor, explicando como ocorre a propaganda do
produto agroindustrial e a ampliação dos mercados consumidores.
Há uma nítida união entre as estratégias construídas no processo de produção e
comercialização. Os mercados não se restringem às relações de compra e venda, mas a todas
as ações construídas a priori tendo em vista a comercialização dos produtos agroindustriais,
englobando também as relações de troca de produtos entre os agricultores. Para viabilizar seus
mercados, as famílias se vinculam com agentes da sociedade civil, que podem desempenhar o
89
papel de transmissores de informações técnicas ou serem intermediários, consumidores,
fornecedores de matéria-prima, etc. (Figura 5).
Figura 5 - Rede de relações sociais nos mercados de proximidade na região do Corede Jacuí
Centro – RS.
Fonte: Elaborado pela autora.
A tabela 16 apresenta, de maneira sucinta, quais os canais de comercialização e troca
em que as famílias estão inseridas. As relações que as famílias possuem com vizinhos e
parentes caracterizam-se por 15% da forma de escoamento da produção agroindustrial (14%
nas relações de venda e 1% na forma de troca de produtos - produtos). Estas relações
adquirem uma diversidade, pois os produtores também estão interagindo no ambiente da
produção, pelas relações de reciprocidade (troca de produtos e serviços), proporcionando às
ARFs o alcance aos objetivos comerciais e sociais.
As pontes de inserção e os intermediários funcionam como elos que ligam o produtor
ao consumidor. Entretanto, os dois canais de comercialização apresentam suas
especificidades. Enquanto que a ponte de inserção
2
é um espaço construído socialmente por
agricultores familiares, instituições locais e agentes da sociedade civil para fomentar a
comercialização, os intermediários representam os proprietários dos estabelecimentos
comerciais, sendo que estes atuam como revendedores dos produtos. Segundo dados do
IBGE, Censo Agropecuário 1995/1996, apenas 22% dos produtores da região entregam sua
produção para o intermediário, enquanto as formas de comercialização por meio de
2
A denominação “pontes de inserção” é uma designação específica para este trabalho, tendo a finalidade de
diferenciar as relações: agricultores - intermediários e agricultores - organizações sociais locais.
Produtor
Intermediários
Pontes de
inserção
Diferenciação e inovação
Consumidor
Produtor
Consumidor
Instituições
Agentes -
sociedade civil
90
cooperativas e indústrias apresentam juntas, menos de 1% do número total de informantes
3
.
No que se refere às informações geradas na pesquisa, as pontes de inserção e intermediários
correspondem a uma média de, respectivamente, 19 e 15% da totalidade da produção
agroindustrial comercializada pelas famílias.
Ainda de acordo com este censo, um total de 792 informantes desenvolve alguma
atividade de agroindustrialização no Corede Jacuí Centro, sendo que 77% desses produtores
estão inseridos nas formas diretas de comercialização. A constante interação com os
consumidores é a forma que os produtores estão encontrando para a viabilização e
dinamização de suas atividades produtivas (IBGE, 1995/1996).
As informações geradas com a pesquisa nas ARFs reafirmam esta realidade, ou seja, a
forma predominante de escoamento da produção agroindustrial destaca-se sob a
comercialização direta com o consumidor urbano, representando uma média de 51% do total
da produção vendida. Feiras, eventos, vendas de porta em porta, sob encomendas, na
propriedade são alguns dos locais de interação.
A comercialização direta destaca-se, ainda, na medida em que se consideram as
relações de vizinhança e parentesco (14%). Ao somarmos estes dois valores percentuais de
51% de consumidores urbanos e 14% de vendas mediante relações de parentesco e
vizinhança, obteremos o percentual de 65%, o que nos permite afirmar que a forma
predominante de comercialização está assentada sob as relações diretas, com o contato de
proximidade social entre produtor e consumidor (Tabela 16).
Tabela 16 – Identificação das relações sociais das ARFs no âmbito da comercialização e
troca
Relações (trocas e comercialização)
Medidas de
dispersão
Vizinhança/
parentesco Troca Pontes de inserção Intermediários
Consumidores
Urbanos
Média 14% 1% 19% 15% 51%
Desvio Padrão 0,20% 0,02% 0,31% 0,27% 0,36%
Mínimo 0% 0% 0% 0% 0%
Máximo 99% 5% 90% 100% 100%
Fonte: Elaborado pela autora.
3
As informações sobre as indústrias rurais do IBGE estão organizadas da seguinte forma: para cada produto (ex.
aguardente de cana) é possível obter os dados: número de informantes, quantidade (produzida e vendida) e o
valor da produção. E para cada item é identificada a condição do produtor, grupo de atividade econômica,
destino da produção e grupos de área total. Assim, um mesmo produtor pode estar identificado em dois ou mais
produtos (considerando que as famílias podem dedicar-se ao desenvolvimento de vários produtos diferentes), e
sendo assim, esse produtor é considerado (1) informante para cada produto diferente.
91
A complexidade que está inerente nos mercados de proximidade impede, numa
pesquisa deste porte, que sejam descritas, detalhadamente, todas as relações que estão
compondo a realidade social das ARFs. Assim, o presente capítulo está estruturado com o
objetivo de retratar as relações sociais que fazem parte dos mercados de proximidade,
concentrando a discussão sobre as relações de troca e comercialização das famílias. Pela
união entre produção e comercialização, convém em alguns momentos demonstrar essa
ligação, como ficou evidenciado nas relações com as instituições e como será delineado nas
interações que as famílias possuem com parentes e vizinhos.
Ao longo do capítulo serão apresentadas, detalhadamente, as relações que estão
formando a rede social nos mercados de proximidade, concentrando a discussão sobre os
canais de venda das ARFs, caracterizando as relações e as respectivas porcentagens
(quantidade da produção) comercializadas em cada item, quais sejam: vizinhos e parentes,
consumidores urbanos, intermediários e pontes de inserção. A apresentação está organizada
de modo a retratar, primeiramente, os canais de comercialização expressos pelas relações de
vizinhança e parentesco (6.1), consumidores urbanos (6.2) e a comercialização através dos
intermediários e pontes de inserção (organizações sociais) – (6.3).
6.1 VIZINHOS E PARENTES: RECIPROCIDADE, TRABALHO E CONSUMO
As trocas são essenciais para a subsistência das famílias, fortalecendo laços e vínculos
sociais (RIBEIRO; GALIZONI, 2007). Estas relações, que configuram os laços de parentesco,
amizade e vizinhança, adquirem uma característica de desenvolvimento das atividades de
agroindustrialização e consequentemente, dos mercados das famílias. Na região estudada, não
nitidamente um modelo único de relações de trocas entre os agricultores, capaz de
interpretar a realidade social e econômica da totalidade das ARFs que participaram desta
pesquisa.
Mendras (1978, p.66) havia mencionado que a troca não é somente de produtos,
mas de serviços entre os agricultores pertencentes a uma determinada comunidade. Não
obstante, os camponeses podem estabelecer relações de troca em outras comunidades, e não
somente àquela a que pertencem (WOLF, 1970). As ARFs estão interagindo com outras
comunidades, localizadas no espaço físico do município e inclusive fora dele. Entretanto, as
relações que as ARFs mantêm com seus vizinhos, parentes e amigos não se resumem a estas
92
duas ações (troca de produtos ou serviços), mas se estabelecem sob a forma de contrato de
mão-de-obra temporária e troca de conhecimentos e informações sobre a produção
agroindustrial, como afirmou um agricultor:
[...] “a gente vai aprendendo também quando visitamos outra família e vemos o jeito
como fazem, trocamos ideias” (Produtor 27, Paraíso do Sul).
A Figura 6 apresenta a rede de relações das ARFs com outras unidades (que
desenvolvem ou não produtos agroindustriais) para comercialização (identificada pela seta de
um sentido) e troca de produtos e/ou serviços (seta de dois sentidos). Uma ARF A troca
produtos e/ou serviços com outra família ARF B (membro da mesma comunidade), assim
como também comercializa produtos com ARF D, membro da comunidade vizinha. As
relações também podem acontecer mediante uma ARF e outra unidade de produção (UP C
da mesma comunidade, UP E comunidade vizinha e/ou UP F cidade vizinha), que não
possui uma atividade de agroindustrialização, mas que pode ser um consumidor, fornecedor
de matéria-prima ou prestador de serviços para a ARF.
Não há uma delimitação geográfica que expresse o alcance destas relações. Os amigos
e parentes adquirem uma diversidade no que se refere ao local de residência. Enquanto que
algumas relações são entre membros da mesma comunidade, em outras as famílias interagem
com parentes e amigos pertencentes a outras comunidades ou à zona urbana do município e
até mesmo com pessoas residentes em outras cidades, como pode ser observado na Figura 6.
Assim, as relações de parentesco e amizade não estão localizadas, essencialmente, na
comunidade. Porém, na comunidade, são evidenciados os vínculos de amizade, vizinhança e
parentesco, assim como as relações de conflito (posse da terra, relações de trabalho, etc.).
93
Figura 6Rede de relações para comercialização e troca de produtos e/ou serviços (atividade
de agroindustrialização) das ARFs mediante vínculos de parentesco e vizinhança.
Fonte: Elaborado pela autora.
Os vizinhos ora são consumidores, ora fornecedores de serviços ou matéria-prima
para a agroindústria (efetivadas pelas relações de troca). A negociação dos produtos e/ou
serviços ocorre de maneira diferenciada entre as ARFs. Enquanto que algumas famílias
negociam produtos da agroindústria por serviços, em outras se trocam serviços pela mesma
quantidade de horas trabalhadas ou ainda apenas a troca de um produto agroindustrial por
outro (agroindustrial ou agropecuário).
A reciprocidade expressa pelas relações de trabalho é também comentada por
Radomsky (2006), que afirma que o processo de desenvolvimento da economia local do
município de Veranópolis teve como base as redes sociais de ajuda tua, originárias do
modo de ser do agricultor.
A troca, como uma ação de reciprocidade na atividade agroindustrial adquire uma
função social que é a de garantir o acesso aos alimentos para a subsistência familiar que não
são produzidos internamente (na propriedade). A relação do produtor-produtor ainda pode se
estabelecer mediante a compra e a venda. O vizinho é um consumidor dos produtos
agroindustriais e o faz pelo pagamento em dinheiro. A forma de comercialização com os
vizinhos e parentes representa uma média de 14% do total da produção das ARF,
considerando as famílias que não comercializam através destas relações (mínimo) e outras
que vendem 99% dos produtos (Tabela 17). O desvio padrão de 0,20% demonstra que todos
os valores (de cada ARF) não estão tão distantes da média, pois apenas 15% das
Cidade Y
Comunidade A
Comunidade B
ARF
A
ARF
D
ARF
B
UP
C
UP
E
Cidade X
UP
F
94
agroindústrias possuem valores que situam entre 30 e 99%. Algumas famílias não
comercializam e nem trocam produtos com os membros da mesma comunidade. Esta ação é
justificada pela característica dos agricultores vizinhos desenvolverem os mesmos tipos de
produtos. Um exemplo é a Comunidade de Vila Rosa, em Restinga Seca, caracterizada pela
produção dos derivados da cana-de-açúcar, como mencionou uma produtora:
[...] “tudo o que produzimos os vizinhos também fazem” (Produtora 25, Restinga
Seca).
As relações de troca de produtos das ARFs através dos vínculos de parentesco e
vizinhança são menos expressivas quando comparadas às relações de comercialização,
indicando uma média de apenas 1% do total da quantidade destinada para a venda, com
unidades que não utilizam qualquer relação de troca e outras onde as relações representam 5%
do total da produção (Tabela 17). O desvio padrão de 0,02% demonstra o quanto que os
valores estão próximos ou distantes da média. A variabilidade nos resultados é considerável,
sendo que 68% das agroindústrias não possuem relações de troca (0%) e 24% das unidades
possuem valores entre 3 e 5%.
Tabela 17 – Relações de comercialização e troca entre vizinhos, parentes e amigos
Quantidade da produção (vizinhança e
parentesco)
Medidas de
dispersão
Comercialização Troca
Média 14% 1%
Desvio Padrão 0,20% 0,02%
Mínimo 0% 0%
Máximo 99% 5%
Fonte: Elaborado pela autora.
Nota: A porcentagem não é referente aomero de relações, mas sim a quantidade
da produção comercializada sob a forma de venda (pagamento em dinheiro) ou
troca (produtos).
A singularidade da comercialização e troca das unidades é identificada através do
círculo de relações sociais de cada família com a sua comunidade, do desenvolvimento de
interações com parentes e vizinhos, bem como da organização social da agricultura familiar
nessa localidade. Associações, cooperativas, grupos de senhoras e jovens, igrejas, festas e
encontros fazem parte das organizações sociais presentes na região.
A Tabela 18, a seguir, retrata a diversidade de locais onde ocorre a comercialização
dos produtos agroindustriais na comunidade. A igreja é uma organização que cumpre a função
95
de reunir os agricultores para as atividades religiosas e sociais, pois os eventos (almoços,
reuniões) acontecem neste local. A igreja é mencionada como um espaço de comercialização
para 11 famílias. Não obstante, estes locais estão sendo uma das formas dos agricultores
compartilharem novas receitas, conhecimentos e elaborarem estratégias conjuntas de
produção e comercialização agroindustrial.
Os eventos que não acontecem na igreja, são realizados nos espaços físicos das
residências, salões da comunidade, cooperativas e associações. Nestas festas, 7 famílias
comercializam seus produtos agroindustriais. A forma predominante das relações de venda
entre os produtores acontece na própria residência, sendo que o consumidor é quem se desloca
até o local da propriedade para realizar a compra do produto agroindustrial, mencionada por
35 famílias.
Tabela 18 - Locais de comercialização das ARFs (relações de parentesco, amizade e
vizinhança)
Locais
Igreja Festas Propriedade
11 ARFs 7 ARFs 35 ARFs
Fonte: Elaborado pela autora.
Nota: Considerando o total da amostra (41), 16 ARFs utilizam mais de um
local de comercialização
Pela diversidade social que as relações comunitárias se apresentam na região, é
pertinente descrever alguns municípios cujas famílias estão inseridas, significativamente, nas
relações de troca e comercialização com outros produtores da comunidade. Restinga Seca
destaca-se pela presença da Comunidade São Miguel, denominada Comunidade São Miguel
dos Morenos ou São Miguel Velho. Nesta localidade residem aproximadamente 160 famílias,
cuja origem é de descendentes de escravos negros, atualmente reconhecidos como membros
do território de quilombolas, correspondendo a uma área de 90 hectares (PARÉ et al., 2007).
Em 2004, a comunidade foi reconhecida pelo Ministério da Cultura como território
Quilombola (ANJOS; SILVA, 2004).
Residentes na mesma comunidade e situados geograficamente próximos às residências
das famílias quilombolas, os alemães e italianos completam a formação social dos grupos de
agricultores que agroindustrializam produtos. Esta formação social é marcada pelas disputas
entre quilombolas, alemães e italianos no que se refere ao reconhecimento do território
(OLIVEIRA; MORTARI, 2006).
Entretanto, estas disputas foram evidenciadas somente no que se refere ao direito e
reconhecimento da identidade dessas terras, porque alguns descendentes de alemães, italianos
96
e quilombolas interagem socialmente no desenvolvimento da atividade agroindustrial. Os
agricultores de origem quilombola são consumidores de produtos agroindustriais que os
descendentes de alemães e italianos desenvolvem, assim como são prestadores de serviços na
produção agroindustrial. Algumas famílias de origem alemã e italiana demonstraram a
preferência da manutenção de relações de trabalho com os quilombolas, porque os consideram
pessoas de confiança.
As relações comunitárias no município de Restinga Seca apresentam-se com
características distintas, dada a formação social, histórica e cultural da localidade. As famílias
mantêm relações de comercialização, troca e contrato de serviços no que se refere ao
desenvolvimento de atividades agroindustriais. Tais relações podem acontecer entre os
membros de origem em comum, assim como de origens distintas, como os quilombolas,
alemães e italianos destacados anteriormente.
A forma como a família organiza suas relações sociais interfere na maneira como
ocorre a comercialização dos produtos agroindustriais. Por exemplo, a alocação de serviços na
comunidade permite a construção de uma rede de relações sociais, ampliando a capacidade de
produção e, consequentemente, a comercialização. Assim, os atos envolvidos na produção
estão intimamente relacionados com a comercialização dos produtos. Esta evidência converge
na própria noção de mercados como resultado de um conjunto de ações entre atores sociais,
tendo como objetivo a comercialização de produtos e/ou serviços (KRIPPNER et al., 2004;
WHITE, 1981). Assim, os mercados apresentam-se como um resultado de ações construídas
por esses agricultores e seus conjuntos de relações sociais.
Na comunidade de São Miguel dos Morenos, situações em que a família produz e
comercializa quase que a totalidade da produção para os vizinhos (99% e 90%) e outras
onde não se percebe nitidamente a separação física das unidades, porque várias famílias
residem num mesmo espaço de terra, compartilhando trabalho e alimentos. Esse último
exemplo destaca-se como a organização social para produção agroindustrial a COOPASA.
A cooperativa reúne cerca de 6 famílias, que residem na Comunidade de São Miguel dos
Morenos, fundada com o objetivo de desenvolver a produção agroindustrial. Pela proximidade
geográfica das famílias, a realocação dos recursos de matéria-prima e mão-de-obra torna-se
um elemento facilitador no desenvolvimento das atividades de agroindustrialização (Figura
7).
97
Figura 7 Produção das famílias quilombolas (panificação) na COOPASA,
em Restinga Seca.
Fonte: Fotografia da autora (junho/2009).
Sob as relações de parentesco, amizade e vizinhança, 15% da produção da cooperativa
é comercializada e 5% é negociada por meio de troca de produtos, onde o produto final (cuca
de amendoim é objeto de troca das famílias pela matéria-prima ovo e leite, ingredientes
deste produto). Estes ingredientes (ovo e leite) são adquiridos através de relações com outros
produtores da comunidade que produzem estes produtos. O restante da produção (80%) é
comercializado mediante a venda de porta em porta, e por encomendas na zona urbana de
Restinga Seca.
A forma como o grupo de agricultores viabiliza o acesso à cidade para
comercializarem sua produção é resultado das estratégias de cooperação. Um casal de
produtores realiza a entrega e comercializa os produtos, repartindo as despesas e receitas
decorrentes dessa atividade.
O município de São Sepé destaca-se como outro exemplo pertinente das relações de
reciprocidade no desenvolvimento de atividades agroindustriais. A Associação de Produtores
para a Prestação de Serviços e Assistência Técnica - APSAT é uma organização social que
reúne cerca de 20 famílias, na comunidade de Mata Grande. Os agricultores se reúnem
semanalmente para discussão de estratégias de desenvolvimento e diversificação das
atividades agropecuárias. A associação também organiza cursos de capacitação técnica,
oferecidos pela EMATER.
98
Entre as atividades, a produção agroindustrial se destaca como uma das estratégias da
associação. As relações entre os agricultores se estabelecem tanto nas formas de desenvolver
a produção agroindustrial como também para facilitar a comercialização dos produtos. Na
Semana Santa e no Natal, é realizada uma Feira no município para reunir os agricultores na
praça central da cidade, a fim de que estes exponham seus produtos. Nestas ocasiões, os
agricultores se organizam na contratação de um caminhão com o objetivo de viabilizar o
transporte dos produtos agroindustriais até a Feira. Esta estratégia viabiliza economicamente
os custos, que as despesas são repartidas entre os agricultores, e muitos deles não possuem
automóvel para o transporte de produtos até a cidade.
Tal comunidade é também um espaço de comercialização. As festas na Igreja,
reuniões e encontros são oportunidades para a venda dos produtos. Um exemplo é um
depoimento de uma associada da comunidade de Mata Grande:
[...] “quando tem festas sou eu quem faço a cuca pra eles, e sai em grande
quantidade”. [...] “como aqui na comunidade não tem. Associação, festas e tudo que
tiver a gente participa” (Produtora 40, Associada APSAT, São Sepé).
As relações entre vizinhos, parentes e amigos não se caracterizam somente pela
comercialização dos produtos, mas em etapas anteriores, como a produção. Todas as etapas
que envolvem a produção demonstram o modo como as ARFs inserem seus produtos nos
mercados e conquistam consumidores. Atender uma quantidade de consumidores ou
intermediários é explicado pela forma com que a família organiza seu espaço de produção. A
reciprocidade, no que se refere às trocas de produtos e serviços não é uma realidade da
Comunidade de São Miguel dos Morenos em Restinga Seca, comentada anteriormente, mas
também é verificada na organização social da Comunidade de Mata Grande em São Sepé e na
localidade de Forqueta, em Cachoeira do Sul.
A família de Cachoeira do Sul atende uma demanda diversificada através de dois
canais de comercialização: intermediários (rede de supermercados, armazéns) e consumidores
diretos. Tendo em vista o atendimento aos pedidos destes canais de comercialização, a família
necessita organizar uma rede de relações de vizinhança e parentesco, sendo que o trabalho
envolve cerca de 8 pessoas, incluindo os filhos e vizinhos (Figura 8). A relação de troca é em
forma de trabalho, com a negociação de outro serviço quando o vizinho necessita.
99
Figura 8 Abate de frangos na ARF 2, na localidade de Forqueta, em
Cachoeira do Sul.
Fonte: Fotografia da autora (maio/2009).
As redes de relações de amizade perpassam as interações sociais na comunidade. Essa
constatação é resultado da ampliação de conhecimentos da ARF 7, do município de Cachoeira
do Sul, no que se refere à produção de queijos. A receita, de origem francesa, foi oportunizada
por um “conhecido” formado em Medicina Veterinária e que residiu na Europa por dois anos.
O produto, ao passar por um processo diferenciado (cujas características serão aprofundadas
no sétimo capítulo), oportunizou ao agricultor a ampliação e consolidação de um mercado
consumidor (pizzarias e restaurantes) que anteriormente não fazia parte de suas relações.
Assim, para algumas ARFs retratadas, a formação social da rede de vizinhos, parentes,
amigos ou “conhecidos” viabiliza o acesso aos mercados; pela própria comercialização ou
troca, pelo cumprimento da quantidade de produção para atender a diversos canais de
comercialização e, ainda, para conquista de consumidores, mediante características de
diversificação e diferenciação dos produtos.
As relações de interconhecimento estão presentes nas comunidades, e não como
afirmar que todas as comunidades estão organizadas com a mesma intensidade de relações
(MENDRAS, 1978). Assim, em algumas se percebe uma organização social onde
constantemente o encontro de agricultores, assim como a manutenção das relações de
vizinhança, amizade e parentesco em festas, associações, cooperativas, etc. Enquanto em
100
outras se evidenciam disputas entre os agricultores, falta de organização social ou, ainda,
ausência de comunicação e/ou interação entre os membros da comunidade.
É importante ressaltar que as relações de interconhecimento não são homogêneas, e
constituem uma forma particular de organização de cada comunidade. A forma como estas
relações se estabelecem e se mantêm é específica de cada local. A relação entre a
comunidade, as relações com parentes e amigos que não estão localizados na comunidade e os
mercados de proximidade adquirem pertinência no desenvolvimento da atividade de
agroindustrialização (produção e comercialização). As formas como os agricultores interagem
com esses agentes, além de criarem oportunidades de comercialização e troca, estabelecem
contatos sociais que permitem desenvolver as formas produtivas da agroindústria e contribuir
para o acesso aos alimentos que um determinado grupo doméstico objetiva.
6.2 A RELAÇÃO SOCIAL PRODUTOR-CONSUMIDOR: A VENDA FACE TO FACE
Outra forma de comercialização que se distingue pela proximidade social agricultor-
consumidor caracteriza-se pela venda face a face, ou pela denominação teórica europeia
“Cadeias Agroalimentares Curtas”. Nesta perspectiva teórica, nota-se um apelo à citação de
um ambiente de sociabilidade, uma vez que agricultores e consumidores estão em constante
interação, trocando informações. O que se tem observado é que a sociabilidade não acontece
somente nestas formas de comercialização, mas pode também acontecer através das relações
com as instituições, organizações sociais, intermediários e demais agentes da sociedade civil,
como retratado anteriormente.
O que se pode ressaltar é que as cadeias curtas são expressas somente nas ações de
comercialização dos produtos, pois os mercados de proximidade são representados por uma
série de relações sociais. Não como afirmar que somente relação produtor-consumidor,
que os agricultores estão interagindo com outros atores. Desse modo, mesmo que algumas
famílias possuam apenas as relações diretas com os consumidores, não se pode afirmar que
estão inseridas em cadeias curtas de mercados, mas sim em cadeias curtas de comercialização
ou troca.
101
As maneiras de encontro entre agricultores e consumidores
4
adquirem formas
variadas, havendo situações em que os agricultores não necessitam realizar um deslocamento
de sua propriedade porque são os consumidores que vão ao seu encontro, enquanto que em
outras, as relações acontecem mediante a entrega do produto pelo agricultor na residência dos
consumidores. A relação produtor-consumidor caracteriza-se pelo vínculo social que se
diferencia nas estratégias que as famílias utilizam para comercializar seus produtos
agroindustriais. A comercialização na forma chamada face a face acontece em feiras de
produtores, vendas de porta em porta, eventos, sob encomendas (entregues nas residências dos
consumidores, nas comunidades) (como retratada no item 6.1), e até mesmo em visitas dos
clientes às propriedades dos agricultores.
A comercialização direta com o consumidor urbano caracteriza-se por uma média de
51% da produção agroindustrial vendida. No entanto, esta média não expressa a realidade de
todas as famílias, tendo casos em que estas relações não acontecem (0% de vendas) e outros
em que a comercialização da totalidade da produção desta forma (100%), conforme os
dados da Tabela 19. O desvio padrão de 0,36% demonstra a variabilidade nestes resultados,
sendo que 37% das agroindústrias possuem valores de 0 a 20%, no que se refere à venda
direta com consumidores urbanos.
Tabela 19 - Relações de comercialização das ARFs com consumidores urbanos
Quantidade da Produção
Medidas de dispersão
Consumidores Urbanos
Média 51%
Desvio Padrão 0,36%
Mínimo 0%
Máximo 100%
Fonte: Elaborado pela autora.
Dada a diversidade de estratégias que as famílias estão adotando para venderem sua
produção, é pertinente destacar que as ARFs combinam diferentes formas de comercialização
de seus produtos. Duas unidades não possuem nculos comerciais com clientes urbanos
diretos; são famílias que estão inserindo a sua produção através de intermediários, pontes de
inserção e/ou através de interações com vizinhos e parentes. As demais ARFs (39) estão
4
Neste item será abordada a relação entre produtor e consumidor urbano. O consumidor urbano, neste trabalho
será caracterizado pelo cliente que reside na zona urbana dos municípios, região e estados brasileiros. Os
parentes (consumidores dos produtos agroindustriais) podem ser tanto membros da comunidade como também
residentes da zona urbana. Porém, localizar as diferentes relações não constitui objetivo deste trabalho, apenas
distinguir (caracterizar) essas relações. As relações de parentesco foram delineadas no item 6.1, porque as
interações das famílias com os parentes localizam-se, geralmente, na comunidade.
102
inseridas em alguma forma de comercialização com consumidores urbanos. Os locais que as
famílias utilizam para venderem seus produtos o: feiras, eventos na cidade, porta em porta,
sob encomendas e na propriedade (Tabela 20).
Dentre as formas utilizadas para comercializar a produção destaca-se a venda na
propriedade, onde o consumidor urbano se desloca até a unidade para efetuar a compra. Nesta
realidade, estão inseridas 36 famílias (Tabela 20), que recebem os consumidores nas suas
residências, com o emprego de diferentes estratégias para despertar a atenção dos clientes.
Algumas unidades localizam-se geograficamente próximas às rodovias, favorecendo a
comercialização de produtos aos viajantes que circulam no local. Esta vantagem comparativa
é aproveitada pelas famílias, que constroem tendas, mercadinhos, placas de identificação, com
o objetivo de estimular as vendas (Figuras 9 e 10).
Figura 9 Espaço de comercialização localizado à margem da rodovia em
Restinga Seca (ARF 10, propriedade de 4.000m²).
Fonte: Fotografia da autora (junho/2009).
103
Figura 10 Placa de identificação da Agroindústria Rural Familiar ARF 15,
localizada paralelamente à rodovia, em Restinga Seca.
Fonte: Fotografia da autora (junho/2009).
A entrega dos produtos nas residências dos consumidores por meio da organização de
pedidos é outra forma de comercialização que foi adotada por 30 famílias. As vendas
realizadas de “porta em porta” representam estratégias de comercialização de 10 unidades. A
diferença das duas formas de comercialização: de porta em porta e entrega de produtos sob
encomendas, é que a primeira caracteriza-se pelo oferecimento dos produtos aos
consumidores nas residências sem a certeza de que o produto será vendido, e a segunda
significa a entrega de um determinado produto que foi previamente encomendado pelo
consumidor. Esta encomenda acontece de formas variadas: por telefone, quando o consumidor
encontra o produtor em algum estabelecimento ou pela venda anterior.
As formas como as famílias estão criando estratégias para viabilizar o acesso à zona
urbana têm sido diferenciadas. Automóveis, motos, caminhoneta coletiva, carona e ônibus são
relatados como meios de transporte do produto. Destaca-se a estratégia de uma produtora que
comercializa cucas e es em Cachoeira do Sul: na ausência de um sistema de transporte
próprio, a produtora se desloca semanalmente até a cidade através de ônibus e utiliza para o
transporte dos produtos na cidade um carrinho de bebê adaptado com prateleiras, construído
para facilitar a entrega de encomendas e a venda de porta em porta.
As famílias participam de eventos, e estes se caracterizam como outras oportunidades
de comercialização da produção agroindustrial. Festas com o objetivo de celebrar os
104
aniversários dos municípios, datas comemorativas e divulgação das atividades agropecuárias
destacam-se como os principais eventos que envolvem 9 famílias: em Cachoeira do Sul
(Fenarroz e Feapec), Cerro Branco (Fest Feira), Paraíso do Sul (Feira Agroindustrial e
Comercial), Restinga Seca (Festa de Emancipação do município) e São Sepé (Expofeira).
As feiras de produtores são outros ambientes de encontro entre agricultores e
consumidores. As feiras funcionam como um espaço de relações sociais, onde as ações de
consumo e comercialização acontecem entre produtores-consumidores e produtores-
produtores. A combinação entre trabalho agrícola e negócio é outra característica na qual os
agricultores encontram consumidores potenciais para seus produtos (GARCIA-PARPET,
2002).
Do total da amostra (41), 20 famílias utilizam estes espaços para expor sua produção
agropecuária e agroindustrial (Tabela 20). Os locais mencionados na Tabela 20 como
“Outros” se referem à venda de produtos nas ruas e à entrega de produtos em ônibus
interurbanos. Um produtor de Cachoeira do Sul relata que comercializou através da entrega
do produto por uma pessoa que iria deslocar-se até o local de residência do consumidor,
utilizando um meio de transporte coletivo interurbano. Um produtor de vinhos, licores e
cachaça do município de Restinga Seca tem a oportunidade de comercializar seus produtos
quando realiza a entrega da produção nos armazéns e minimercados da cidade. Nesta ocasião,
os consumidores abordam o produtor para a compra direta dos produtos:
[...] “quando vou fazer a entrega nos armazéns tem um pessoal que às vezes espera e
querem que eu venda, eu vendo, mas às vezes os donos estão por perto fica
chato vender”(Produtor 22, Restinga Seca).
Tabela 20 – Locais de comercialização das ARFs com clientes urbanos diretos
Locais (Ambientes de Comercialização - clientes urbanos diretos)
Feiras Eventos Porta em porta Sob encomenda Na propriedade Outros
N
ARFs
20
9
10
30
36
2
Fonte: Elaborado pela autora.
O município de Cachoeira do Sul possui três pontos de feirantes, sendo que um deles
localiza-se nas proximidades do Colégio Estadual Cândida Fortes Brandão. Esta feira, que
acontece semanalmente, se destaca por abranger consumidores do entorno e envolve pais dos
alunos, pessoas que residem nas proximidades do colégio, etc. A Feira Livre Municipal
(Figura 11), localizada no centro da cidade, é um espaço que se destaca pelo número de
produtores participantes (aproximadamente 30) e que, para algumas famílias, ainda
caracteriza-se como principal meio de comercialização da produção agroindustrial.
105
Figura 11 Feira Livre Municipal de Cachoeira do Sul: famílias expondo
seus produtos agroindustriais.
Fonte: Fotografia da autora (maio/2009).
A Feira ecológica do município de Cachoeira do Sul (Figura 12) é uma organização
que foi criada mediante a mobilização dos agricultores familiares (aproximadamente 6
famílias) e o CAPA, cuja distinção é a produção com a minimização de impactos ao meio
ambiente (solo, ar, água). Os agricultores se reúnem semanalmente para expor a produção
agropecuária e agroindustrial, com a organização de tarefas: atendimento, pesagem e
recebimento do pagamento. Semanalmente, duas famílias são incumbidas dos trabalhos e
dividem entre si os serviços relacionados à comercialização dos produtos.
106
Figura 12 Feira de agricultores familiares ecológicos, assessorados
pelo CAPA, em Cachoeira do Sul.
Fonte: Fotografia da autora (junho/2009).
O município de Cachoeira do Sul possui uma organização diferenciada da região, no
que se refere à promoção de Feiras de Produtores. A Feira do município de Cerro Branco
conta com a participação de duas famílias, que comercializam no centro da cidade,
semanalmente. Restinga Seca possui uma feira localizada no Sindicato Rural, onde duas
famílias são responsáveis pelo recebimento dos produtos e comercialização. A diferença desta
feira é que não a mobilização de todos os produtores, não havendo, portanto, a interação
direta com os consumidores. Os demais municípios (Paraíso do Sul, e São Sepé) não possuem
Feiras de Produtores, envolvendo as famílias apenas em atividades e eventos comemorativos
da cidade.
Nas diferentes formas retratadas: as vendas em feiras, eventos, porta em porta, sob
encomenda e na propriedade, produtores e consumidores se encontram para realizar a
transação. A manutenção destas relações diretas, não importando em qual local o agricultor
encontra o consumidor, não é característica exclusiva das famílias que não possuem
certificação formal para a produção, sendo observada também nas ARFs que estão operando
sua estrutura produtiva através da inspeção SIM e Vigilância Sanitária. Nestes ambientes,
tanto os produtores que possuem a certificação formal, quanto os que vendem a produção
informalmente formam o cenário da comercialização direta com os consumidores.
107
Destacam-se dois produtores que, após a conquista da certificação formal para a
produção agroindustrial mantiveram as relações diretas com os consumidores e as vendas na
feira do município:
[...] “tenho mais de 100 clientes diretos”. “Eu tenho um consumidor que compra de
mim uns 14 anos, desde que eu ainda estava vendendo clandestino” (Produtor 2,
Cachoeira do Sul).
[...] “a entrega que faço é particular mesmo, é para manter a clientela fiel que eu
já tinha” (Produtor 7, Cachoeira do Sul)
Para as famílias que agroindustrializam, as redes sociais, e entre elas a relação de
comercialização entre produtor e consumidor, não podem ser caracterizadas somente pelas
vendas com o contato com pessoas residentes no município e região. Como menciona
Floysand e Sjoholt, (2007), a formação social destas redes ultrapassa os limites geográficos da
localidade. Das 41 famílias, 27 (65,9%) comercializam diretamente com consumidores do
mesmo município, de inúmeras localidades do Rio Grande do Sul e até mesmo de outros
estados (Tabela 21). Para 14 famílias, (34,1%) a venda limita-se às relações diretas com os
consumidores residentes no município e região (Tabela 21).
Tabela 21 - Local de origem (residência) dos consumidores diretos
Município e região Município, RS e outros estados
N° ARFs
14 27
% 34,1 65,9
Fonte: Elaborado pela autora.
Notas: Estas informações referem-se somente às relações com os consumidores diretos, pois
as famílias não possuem conhecimentos da origem dos consumidores que adquirem os
produtos via intermediários ou pontes de inserção (cooperativas e associações).
A diversidade, no que se refere aos locais de origem dos consumidores, pode ser
evidenciada nos depoimentos:
[...] “mas são muito poucos (consumidores) daqui. Pra onde mais vendemos são de
POA, Caxias, Santa Maria e região”. (Produtores 23, Restinga Seca).
[...] “quando participamos da Feira FEST FEIRA, 90% do que foi vendido foi gente
de fora. Como é difícil o povo daqui aceitar as coisas do município! Tem gente que
comprou do Maranhão, Cuiabá, Manaus” (Produtora 34, Cerro Branco).
[...] “tem gente que vem de fora do município. Porto Alegre, Santa Maria, São
Paulo. A filha de uma conhecida minha (de São Paulo) levou pacotes de bolachas. O
pessoal de Santa Maria adora a rosquinha que eu faço” (Produtora 40, São Sepé).
108
Assim, ao explorar o alcance geográfico das relações sociais dos produtores e
consumidores, pode-se verificar que as famílias estão interagindo com inúmeras pessoas
residentes em diferentes locais do país. Em concordância com Floysand e Sjoholt (2007) não
é possível fazer uma delimitação geográfica da abrangência e do número de relações que as
redes podem alcançar. Além das interações presentes na região do Corede Jacuí Centro e
outras cidades do RS, destaca-se a comercialização de produtos para consumidores que
residem nos estados de Santa Catarina,
Paraná,
São Paulo,
Rio de Janeiro,
Brasília,
Goiás,
Maranhão,
Amazônia,
Mato Grosso
e
Acre (Figura 13).
Figura 13 Abrangência geográfica da
comercialização área hachurada: locais de
residência dos consumidores
Fonte: Adaptado de
5
IBGE, Mapas Interativos, Mapa Brasil,
Divisões Territoriais.
A manutenção das relações sociais produtores-consumidores urbanos é comentada por
Hinrichs (2000), sendo que a autora afirma que esta forma de comercialização está sustentada
na satisfação econômica de ambos, sendo que a proximidade da relação social permite a
negociação do preço do produto. A combinação do preço de venda entre produtor e
consumidor é uma ação desenvolvida por 56% das famílias (Gráfico 6).
5
Disponível em: <http://mapas.ibge.gov.br/divisao/viewer.htm>
109
56%
39%
5%
SIM
NÃO
Não há relação produtor-
consumidor urbano
Gráfico 6 - Negociação de preço entre produtor e consumidor urbano direto
Fonte: Elaborado pela autora.
Notas: As porcentagens foram calculadas considerando que 2 unidades não possuem
relações com consumidores urbanos diretos.
Granovetter (1973) destaca os atributos como confiança e intimidade que estão
enraizados nas decisões sobre produção e consumo, e discute ainda, a própria interpretação do
funcionamento desses mercados, que não pode ser compreendido pela utilização de critérios
exclusivamente econômicos. Assim, a negociação do preço do produto entre produtor e
consumidor não se caracteriza como uma condição única de perpetuação desta forma de
comercialização, tal como se pode verificar nos depoimentos de situações diversas das
famílias:
[...] “às vezes até penso: ah, como meus pães são caros! Mas se os fregueses
compram é porque estão gostando” (Produtora 3, Cachoeira do Sul).
[...] “na quantidade maior, em baldes, a gente baixa R$ 1,00 no preço. Nosso preço é
bom comparado aos dos outros. Já estamos barato o suficiente. O consumidor nunca
pede preço menor, porque eu já tenho um preço bom” (Produtor 32, Cerro Branco)”.
A comercialização direta com o consumidor oportuniza aos agricultores a adição de
valor na venda do produto, pela eliminação de intermediários (MARSDEN et al.; 2003). Não
obstante, as relações próximas entre produtores e consumidores permitem a interação social
entre ambos (ANDREATTA; WICKLIFFG, 2002; KIRWAN, 2004; RENTING et al., 2003).
Assim, as relações entre produtores e consumidores apresentam-se com uma
diversidade de motivações econômicas e sociais que explicam a escolha por esse tipo de
comercialização e consumo. A diversidade das motivações das famílias e suas vantagens na
110
comercialização direta não permitem a construção de uma descrição homogênea desta
relação. As vantagens que podem ser geradas nestas interações são heterogêneas e particulares
de cada família e seus consumidores. Alguns agricultores mencionam benefícios sociais e
econômicos e outros ainda descrevem desvantagens nessa forma de comercialização, tal como
se verifica em três depoimentos distintos:
[...] “porque se vende o produto e consegue passar para a pessoa como tu faz. Nos
mercados [intermediários] não se consegue fazer isso, mas assim eu posso explicar
como eu faço” (Produtora 16, Restinga Seca).
[...] “a venda aqui [Feira Livre de Cachoeira do Sul] é dinheiro na hora, além de
conseguirmos um valor mais alto. Para o armazém a gente tem que fazer mais
barato. A única desvantagem que vejo é o tempo disponibilizado” (Produtora 1,
Cachoeira do Sul).
[...] “a vantagem quem tem é eles porque eles pagam mais barato pelo produto e não
eu. Vendo mais pra revenda mesmo ou pra Querência [cooperativa]. Não vejo
vantagem mais porque eu vendo pelo mesmo preço pra revendedor e pra eles”
(Produtora 38, São Sepé).
Embora algumas famílias apresentem desvantagens da comercialização direta com os
consumidores, é pertinente ressaltar que apenas 9 ARFs não destacaram benefícios desta
relação social. As demais (30 ARFs) mencionam vantagens como: a adição de valor
proporcionada por esta forma de comercialização, conhecer as preferências dos consumidores,
a valorização do seu trabalho e produto, a conversa com os clientes como uma distração,
ausência de formalidade do contrato de venda, a estabilidade das vendas, etc.
6.3 O ELO DO PRODUTOR-CONSUMIDOR: OS INTERMEDIÁRIOS E AS PONTES DE
INSERÇÃO LOCAIS
As formas de intermediação das famílias com os consumidores são caracterizadas pela
relação com os proprietários de estabelecimentos comerciais (minimercados, armazéns,
padarias, restaurantes, escola municipal
6
, etc.) e com as pontes de inserção (cooperativas e
associações). A relação das famílias com os proprietários dos estabelecimentos comerciais
6
Um produtor de Cachoeira do Sul comercializa iogurte através do convênio com a prefeitura municipal
mediante o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Apesar de ser identificado como um mercado
institucional, essa relação está sendo retratada como um intermediário, sendo essa forma que o produtor utilizou
para explicar a relação.
111
(denominados no presente trabalho como intermediários) adquire características que diferem
das pontes de inserção. Os intermediários são revendedores do produto, sendo que o produtor
não tem participação direta na formação do preço de venda. Nestes casos, o agricultor entrega
a sua produção ao estabelecimento comercial e os responsáveis pela empresa determinam o
valor que será comercializado.
Estas relações são caracterizadas por uma dia de 15% do total da produção
comercializada das ARFs (Tabela 22), e alguns agricultores retrataram a pertinência da
manutenção dessas relações, dada a praticidade da entrega da produção em dois ou três
estabelecimentos. No entanto, este resultado pode variar (desvio padrão de 0,27%), conforme
a realidade de cada agroindústria, pois 23 famílias não possuem relações (0%, mínimo) com
os proprietários de estabelecimentos comerciais e, em outros, as ARFs entregam a totalidade
da produção (100%, máximo).
Quando comparada à relação direta com o consumidor, a relação produtor-
intermediário apresenta mais segurança e oportuniza a comercialização de uma quantidade
maior da produção. Os agricultores ainda mencionam que a venda direta exige um trabalho
dispendioso e que pode gerar insegurança no pagamento:
[...] “o negócio bom é chegar e entregar 50 litros de iogurte em um armazém”.
(Produtor 7, Cachoeira do Sul)
[...] “se eu tivesse legalizado e conseguisse colocar no mercado era melhor do que
vender de porta em porta” (Produtor 32, Cerro Branco)
[...] “às vezes levo calote [de consumidores], aconteceu de cheque sem fundo”
(Produtora 14, Restinga Seca).
As pontes de inserção são organizações sociais criadas pelos agricultores e pelas
instituições locais e permitem a comercialização de produtos agroindustrializados. São
espaços de interação social das ARFs com outros produtores locais ou que residem em
municípios vizinhos. Os produtos agroindustriais são postos à venda através de uma
organização intermediada por um funcionário contratado pela associação ou cooperativa, que
tem a função de receber os produtos, definir os preços, disponibilizá-los em prateleiras e
atender os consumidores. Nestes locais, a definição do preço acontece através de um cálculo
(média de valores de comercialização de todos os associados). Neste caso, não é o preço que
diferencia o produto, pois há uma padronização no valor estipulado para a venda.
As ARFs utilizam estas formas como meio de inserir seus produtos nos mercados, e
representam uma média de 19% do total da produção comercializada. Entretanto, este
112
resultado não representa a realidade de todas as famílias, podendo variar (conforme o desvio
padrão de 0,31%), pois em 56% das ARFs não relação (0%, mínimo) da família com as
organizações e, em outros, as ARFs entregam quase a totalidade (90% da produção) nestes
estabelecimentos (Tabela 22). O município de Cerro Branco é o único local que não possui
pontes de inserção, sendo que as formas predominantes de comercialização da produção são
as vendas diretas aos consumidores. A não ocorrência de pontes de inserção neste município
não caracteriza a ausência de cooperativas e associações, mas se refere à carência de um
espaço físico que comporte a produção agroindustrial sem a necessidade da presença do
produtor para efetuar a comercialização.
Tabela 22 – Relações de comercialização das ARFs com intermediários e pontes de
inserção
Quantidade da Produção Medidas de
dispersão
Intermediários Pontes de inserção
Média 15% 19%
Desvio Padrão 0,27% 0,31%
Mínimo 0% 0%
Máximo 100% 90%
Fonte: Elaborado pela autora.
Apesar de não possuírem certificação, nas pontes de inserção os produtos são
identificados por um rótulo. Entretanto, esta identificação não é padronizada, pois o selo
possui uma caracterização própria, expresso pelo nome do produtor (a), código ou número.
Esta identificação foi criada com o intuito de facilitar o trabalho do atendente do
estabelecimento no controle do fluxo de vendas, assim como é uma forma de “aproximar
consumidor e produtor”. Esta aproximação acontece na medida em que o consumidor
identifica o produto pelo rótulo ou nome do produtor. Assim, quando repetir a transação, o
consumidor reconhece o produto pela identificação, relacionando o produto consumido a
quem produz (agricultor). Pode-se verificar esta realidade nos seguintes argumentos:
[...] “a única propaganda é da Associação [Centro de Comercialização]. Acontece
também de eles levarem o produto e olham o nome [rótulo]. Quando chegam aqui
outra vez eles sabem o que querem, e pede pelo nome do produtor” (Produtor
27, Paraíso do Sul).
[...] “os consumidores quando vão na Querência, eles sabem o número do
produtor, porque cada um tem o seu. Quando eles vão comprar o queijo eles pedem
pelo meu número, porque eles sabem que aquele queijo é meu”. (Produtora 40, São
Sepé).
113
Todas as organizações possuem essa adequação, com exceção do Centro de
Comercialização de Paraíso do Sul, onde as famílias são responsáveis pela criação de um
rótulo específico, assim como podem optar pela utilização de uma identificação.
As pontes de inserção foram fundadas após a consolidação de um mercado
consumidor e, em alguns casos, foram construídas como substituição à Feira de Produtores,
como acontece com os estabelecimentos de Paraíso do Sul e São Sepé. Nestes locais, os
consumidores ainda os designam como “Feira”. Assim, essas pontes apresentam uma
característica de replicar as compras que eram anteriormente efetuadas nas feiras, mudando
somente a forma como as transações ocorrem, ou seja, com mínima interação social produtor-
consumidor.
Nas pontes de inserção, a informação é replicada mediante a relação social do
produtor-atendente-consumidor, onde o atendente do estabelecimento funciona como um elo
entre o produtor e consumidor. Essa ligação é retratada através da relação social atendente-
consumidor, onde os compradores expõem suas opiniões sobre os produtos
agroindustrializados e efetuam a realização de pedidos.
Apesar das pontes possuírem tais características comuns, essas organizações
apresentam suas particularidades no que se refere à formação social do grupo de agricultores.
No município de Cachoeira do Sul, um grupo de mulheres se reuniu com a intenção de
organizar uma associação para desenvolver suas atividades produtivas, bem como ampliar a
comercialização dos produtos. A fundação do grupo “Associação das Mulheres Trabalhadoras
Rurais” oportunizou a criação de um espaço físico, localizado no centro da cidade,
denominado “Casa das Mulheres Trabalhadoras Rurais”, destinado à exposição e
comercialização dos produtos (panificação, geleias e derivados do leite), (Figura 14).
Figura 14 Casa das Mulheres Trabalhadoras Rurais (à esquerda) e
alguns produtos agroindustriais de panificação direita), Cachoeira do
Sul.
Fonte: Fotografia da autora (maio/2009).
114
Com a mobilização das agricultoras (aproximadamente 15 associadas ativas) em
parceria com instituições locais, a organização social ampliou o acesso aos cursos técnicos de
produção agroindustrial da EMATER, assim como oportunizou a troca de experiências sobre
a atividade através da interação entre as produtoras. Além disso, a união do grupo viabilizou a
participação das mulheres em eventos para comercializar os produtos - como a Feira Nacional
do Arroz (Fenarroz) e Feira de Agropecuária (Feapec) feiras tradicionais do município de
Cachoeira do Sul.
A interação entre as produtoras é evidenciada no seguinte depoimento:
[...] “a gente tem a sabedoria antiga, junta com as nossas e das outras [agricultoras]
que produzem e também dos cursos da Emater. [...] é uma troca de receita recíproca
(produtora-produtora)” (Produtora 5, associada da Casa das Mulheres Trabalhadoras
Rurais, Cachoeira do Sul).
Destaca-se a participação das mulheres tanto nas etapas de fabricação dos produtos
quanto nas atividades comerciais, fato também verificado por Santos (2006). Outra questão
diz respeito à autonomia financeira das mulheres, aspecto mencionado por Staduto e Amorim
(2008, p.13): “a decisão sobre a produção e comercialização cuja participação efetiva é das
mulheres permite a conquista de autonomia financeira, o que possibilita melhoria da
qualidade de vida para as agricultoras e uma oportunidade para alterar as relações de gênero
no espaço familiar”.
A Associação dos Arrozeiros é outra organização que desempenha a função de reunir
os produtos agroindustriais para serem comercializados. Este espaço está localizado no centro
da cidade de Restinga Seca e abrange a produção de panificados, geleias, mel, derivados de
cana-de-açúcar e vinhos (Figura 15). A participação de agricultores (46 associados) nesta
organização é restrita aos produtores de arroz, sendo que são as mulheres que lideram o
desenvolvimento das atividades agroindustriais e artesanato.
115
Figura 15 Associação dos Arrozeiros (fachada do estabelecimento à
esquerda) e os produtos agroindustriais das famílias expostos no interior da
organização (à direita), Restinga Seca.
Fonte: Fotografia da autora (junho/2009).
A Querência é uma cooperativa organizada pelos agricultores do município de São
Sepé, cuja fundação teve como intuito a criação de um espaço físico de comercialização de
produtos agroindustriais e agropecuários, denominado “Mercado Colonial da Querência”
(Figura 16). Localizado no centro da cidade, o mercado reúne tanto a produção de agricultores
locais como também de outros municípios, como Vila Nova do Sul, Caçapava do Sul, etc. A
agregação de outros produtores da região nesta organização faz a cooperativa contemplar
mais de 130 associados.
Figura 16 Cooperativa Querência: Fachada do Mercado Colonial da Querência
esquerda) e prateleira com produtos agroindustriais (doces, vinhos, mel, derivados da
cana-de-açúcar e panificados), São Sepé.
Fonte: Fotografia da autora (junho/2009).
No município de Paraíso do Sul, os agricultores e as instituições locais (prefeitura
municipal e EMATER) construíram um local de comercialização para a produção
agroindustrial e artesanal (Figura 17). Este espaço objetivou a substituição da Feira de
Produtores, além de concentrar a produção no estabelecimento localizado próximo à RST
287, via de acesso aos municípios de Restinga Seca, Agudo, Santa Maria, etc. Essa
116
localização tem como objetivo ampliar a comercialização, dado o número de passageiros e
viajantes que circulam nesta rodovia. O “Centro de Comercialização” não é reconhecido por
esta denominação pelos consumidores e produtores. Tanto os clientes quanto os agricultores
designam o local por “Feira de Produtores”. Assim, com a finalidade de que os consumidores
reconheçam este espaço de comercialização, a associação adaptou uma placa de identificação
com o nome: “Feira de Produtos Coloniais”.
Figura 17 – Centro de Comercialização de Paraíso do Sul: fachada do estabelecimento
esquerda) e produtos agroindustriais expostos à venda no interior da organização
(mel, açúcar mascavo e artesanato – no centro) e (vinhos e cachaça – à direita).
Fonte: Fotografia da autora (junho/2009).
As pontes de inserção são, sobretudo, organizações que surgiram mediante a
mobilização de agricultores, instituições locais e demais agentes da sociedade civil. A
construção desses locais viabilizou a comercialização dos produtos através do conjunto de
relações que contribuíram para a construção física e a localização do espaço para que os
agricultores pudessem organizar a sua produção. O conjunto destes fatores é que possibilitou
o acesso aos mercados consumidores.
Outro elemento-chave nesta discussão é o produto agroindustrial, que com suas
características intrínsecas, adquire uma pertinência na manutenção das relações de
comercialização. Assim, no próximo capítulo será discutido o que é diferenciação para os
produtores e quais são as características que diferem os produtos agroindustriais nos mercados
de proximidade. Não obstante, pretende-se apresentar as inovações que as famílias
desenvolvem nos produtos e nos processos agroindustriais.
117
7 A DIFERENCIAÇÃO E INOVAÇÃO COMO ESTRATÉGIAS NOS MERCADOS
DE PROXIMIDADE: OS ATRIBUTOS DA PRODUÇÃO AGROINDUSTRIAL
Tem se observado a discussão sobre as características que diferem os produtos da
agricultura familiar frente aos mercados consumidores. Neste debate nota-se um apelo para a
noção de diferenciação da produção relacionada ao modo de fazer diferente ao da indústria,
com a participação dos agricultores nas atividades de produção e comercialização, o cuidado
ao meio ambiente (solo, água, ar), a preservação dos hábitos alimentares da localidade
(região, município), as formas de produção isentas de insumos químicos e artificiais, etc.
(MARSDEN et al., 2000; MALUF, 2004; PREZOTTO, 2002). Dentre outras características,
estas estão sendo valorizadas por alguns consumidores e influenciando as suas escolhas no
que se refere à compra de produtos alimentares. Este debate faz parte ainda da discussão
sobre a redefinição de qualidade, do crescimento do nicho de mercado alternativo à
alimentação padronizada (GOODMAN, 2003; KIRWAN, 2004; RENTING et al., 2003).
Wilkinson (2002, 2004) afirma que a consolidação de mercados pela agroindústria
familiar pode estar relacionada com a confiança entre produtor e consumidor, e as
características da produção associadas à tradição, ao artesanal e ao local. Em outras palavras,
os produtos das ARFs estão se diferenciando por uma série de características e encontrando
nichos de mercados. Mas o que é diferenciação dos produtos? Quais estratégias as famílias
que agroindustrializam estão utilizando para manter a rede de relações nos mercados de
proximidade? As famílias adotam inovações na produção?
O que se tem notado nestas vertentes teóricas é que não se menciona a inovação como
um elemento da diferenciação, neste trabalho, entendida como toda mudança no processo de
produção, ou o desenvolvimento de novos produtos
1
como estratégia de comercialização
agroindustrial. A inovação pode ser um atributo da própria diferenciação dos produtos
agroindustriais, na medida em que os agricultores passam a modificar/incrementar processos,
diferenciando os produtos pela adição de ingredientes, consistências, tonalidades, etc.
A diferenciação estaria sendo relacionada apenas às características relacionadas ao
ambiental e social, como menciona Sulzbacher (2009, p.6): “produtos carregados de uma
1
A escolha em estudar apenas a inovação como uma mudança no processo de produção ou o desenvolvimento
de novos produtos (o que é novo para a família) se justifica pela limitação da pesquisa (dissertação). O conceito
de inovação é amplo, necessitando realizar uma escolha para determinar qual será o foco do trabalho e discussão.
Por exemplo, para algumas famílias, a inovação também está relacionada ao desenvolvimento de atividades
agroindustriais, as novas relações nos mercados, etc.
118
identidade territorial (relação entre sujeito e espaço), saudáveis, naturais e vinculados a um
processo produtivo carregado de uma simbologia ambiental e social”.
A discussão sobre diferenciação se amplia pelo próprio reconhecimento de que
algumas famílias desenvolvem modificações no processo produtivo, diferenciando a forma
como o produto é oferecido para os consumidores ou desenvolvendo produtos novos. A
modificação de ingredientes, a adição de substâncias, a combinação de matérias-primas, os
produtos com graus de concentração diferente, como exemplo, a cachaça (fraca, média e
forte), além de produtos que sejam de tonalidades diferenciadas (escuro, claro), destacam-se
como algumas inovações que estão diferenciando os produtos das ARFs da região.
A inovação e a diferenciação podem explicar a forma como as famílias inserem seus
produtos nos mercados e conquistam consumidores. As famílias que adotam estas práticas
ampliam o nicho de mercados, pois são oferecidos vários tipos de produtos, resultado de
combinações e/ou processos diferentes, com a possibilidade de agradar as preferências
distintas de cada consumidor.
Em algumas famílias não se observa qualquer tipo de inovação, ou seja, as ARFs
produzem sem qualquer mudança no processo produtivo e o produto não se diferencia ao
longo do tempo. Esta característica não é negativa, pois a preservação da receita da produção
é também uma forma de garantir a comercialização para um determinado nicho de mercado.
Em algumas unidades, a mudança no processo produtivo ou a simples adição de novos
insumos pode acarretar a perda de relações com alguns consumidores.
Assim, o presente capítulo tem como objetivo discutir a noção de diferenciação para
as ARFs nos mercados de proximidade, bem como caracterizar as inovações nos produtos que
são ofertados a estes mercados de proximidade. Como a pesquisa se restringiu às entrevistas
com os agricultores familiares, a discussão foca-se no entendimento destas questões do ponto
de vista das famílias.
7.1 O DIFERENCIAL E A INOVAÇÃO: A SINERGIA ENTRE PRODUÇÃO E
CONSUMO?
A abordagem sobre inovação tem sido retratada com ênfase nas áreas urbanas.
Entretanto, para os autores Dargan e Shucksmith (2006), a inovação é uma das estratégias
para garantir a competitividade, tanto nas áreas urbanas como nas rurais. A inovação não é
119
resultado de um saber científico ou um conhecimento inédito, mas, sobretudo é caracterizada
“pela adoção de processos ou produtos que são novos para uma determinada empresa, região
ou instituição” (DARGAN; SHUCKSMITH, 2006, p.5). Para Fligstein e Dauter (2007), as
inovações acontecem pelas interações sociais presentes na estrutura de mercado.
A fórmula da produção agroindustrial, sendo um resultado de interações sociais na
própria família e/ou pela troca de conhecimentos com outros agentes (técnicos, produtores,
organizações, etc.) adquire pertinência na forma como o produto final vai apresentar as
características de diferenciação e inovação frente aos mercados consumidores. A
diferenciação é uma característica que torna o produto agroindustrial singular frente aos
nichos de mercados que as ARFs participam.
A diversidade de relações sociais não se limita ao âmbito da comercialização, sendo
evidenciada também nas formas como as famílias organizam a sua produção, como
caracterizado nos capítulos anteriores. O processamento agroindustrial possui origens
diferenciadas entre as famílias no que diz respeito ao conhecimento e às técnicas. Esta
diversidade impossibilita diagnosticar a produção das ARFs apenas como resultado de uma
combinação de conhecimentos técnicos ou oriundos de um saber-fazer familiar, como afirma
Ruiz et al. (2002, p.1): “o aporte tecnológico geralmente se origina da própria família do
produtor ou do agente de extensão rural”.
A Tabela 23, a seguir, expressa os elementos desta diversidade. Enquanto algumas
ARFs possuem a produção assentada em conhecimentos técnicos da família (14 unidades), em
outras se observa o saber para o processamento da produção originário das técnicas de cursos
oferecidos por instituições, como a EMATER, SENAR e Secretaria de Agricultura do
município (3 unidades). um destaque para as formas de combinação de uma série de
aprendizados que contempla: as receitas técnicas e familiares (14 unidades), os
conhecimentos familiares e de outros produtores (5 unidades), a junção dos saberes técnicos,
familiares e de outros produtores (2 unidades) e até mesmo a união entre o conhecimento
familiar e as modificações próprias (resultado de experimentações dos próprios produtores),
verificado em 3 unidades.
120
Tabela 23 - Origem da fórmula da produção agroindustrial
Origem N° ARFs
%
Familiar, sem modificações na receita 14 34
Familiar, com modificações próprias 3 7
Técnico - EMATER, SENAR, Vigilância 3 7
Familiar e técnico 14 34
Familiar e outros produtores 5 12
Familiar, outros produtores e técnicos 2 5
TOTAIS 41 100
Fonte: Elaborado pela autora.
As famílias reconheceram que os produtos possuem diferenciais frente aos seus
mercados consumidores. Este diferencial é resultado da forma de produção, da estreita relação
entre agricultura e agroindústria. A menção ao natural como característica de diferenciação é
realidade em 24 ARF, correspondendo a 51% do total das respostas
2
. Para estes agricultores,
o que diferencia o produto (frente aos mercados consumidores) é a isenção de ingredientes
químicos na receita, assim como substâncias para aumentar o volume ou peso dos produtos
(Figura 18). Esta característica também está diferenciando os produtos agroindustriais dos
agricultores da região oeste do Paraná, que relacionaram a conquista de mercados ao modo de
produção isento de conservantes químicos (STADUTO; AMORIM, 2008).
Esta realidade explica também como as famílias estão desenvolvendo a produção, pois
98% das ARFs não utilizam conservantes químicos nos produtos. uma relação do termo
“Natural” como um indicativo que o produto é saudável e confeccionado sem mistura”. Esta
relação pode ser notada em algumas ARFs:
[...] “o diferencial é o que eu já ouvi falar. As pessoas falam: eu comprei salame de ti
e é bom. Não interessa pra mim a quantidade e sim a qualidade do produto. É tudo
natural, não tem nada de supérfluo nos produtos. Por exemplo: tem produto que
vendem dizendo que é pura carne de porco, mas quando o cara vai cortar não é”.
“Mas eu vou estragar o produto colocando sebo”? (Produtor 15, Restinga Seca).
[...]
é porque não usamos produtos químicos. O consumidor valoriza isso, se não a
gente não vendia tanto” (Produtora 38, São Sepé).
2
Seis famílias atribuíram duas ou mais características de diferenciação dos produtos. A porcentagem, portanto,
foi calculada a partir do total de ARFs que mencionaram o respectivo item como diferencial.
121
Figura 18 Frango e suco de uva produzidos sem a adição de
conservantes. Destaque para o Slogan “Frango Caipira” Ponha mais
qualidade na sua mesa” esquerda, produto da ARF 2). Suco de uva
com slogan “Suco de uva natural” (à direita, produto da ARF 26).
Fonte: Fotografia da autora (junho/2009).
O processamento, bem como o desenvolvimento das etapas de elaboração do produto
e o cuidado na escolha da matéria-prima da produção, é que adquire a característica de
diferenciação nos mercados de proximidade, para 16 ARFs (Gráfico 7). O “Jeito de fazer” é
uma característica que é associada a um determinado produtor, e que é reconhecida pelos
consumidores que distinguem o produto por uma determinada receita peculiar. Este “Jeito de
fazer” também está relacionado à identificação (por parte dos consumidores) da
responsabilidade do agricultor no trabalho minucioso para produzir. Esta dedicação é um fator
decisivo no que se refere às características que diferem o produto para os consumidores, tal
como se verifica nos argumentos das famílias:
[...] “é tudo escolhido e torrado para ficar bom o produto. Os outros dizem que o
nosso produto é melhor. O amendoim é selecionado, eu tiro fora os grãos que não
são bons. O que eu não quero para mim eu não quero para os outros”. (Produtora 25,
Restinga Seca).
[...] “o diferente é que o queijo que faço é desnatado, ele fica mais sequinho. Outra
coisa que faço é curar na geladeira. Não posso deixar curar na rua porque pode vir as
moscas ou outros bichos e contaminar o queijo. O queijo sem a nata fica diferente”.
(Produtora 30, Paraíso do Sul).
Outra característica que confere diferencial à produção nos mercados consumidores é
o sabor do produto, que pelo emprego de ingredientes como temperos, torna o mesmo
agradável ao paladar dos consumidores. Também foram mencionados como diferenciais: o
trabalho para desenvolver a produção (relacionado à mão-de-obra intensiva da família), a
certificação SIM e Vigilância Sanitária, o preço, e a produção ecológica. Cada item foi
mencionado por 1 família, representando 2% das respostas.
122
51%
33%
8%
2%
2%
2%
2%
Natural
Jeito de fazer
Sabor
O trabalho para produzir
Preço
A certificação SIM
Ecológico
Gráfico 7 - Características de diferenciação dos produtos agroindustriais nos
mercados de proximidade
Fonte: Elaborado pela autora.
Notas: A porcentagem foi calculada de acordo com o número de itens mencionados. Assim,
o número de ARFs (N) não se refere ao tamanho da amostra, mas sim ao número total de
famílias que mencionou o respectivo item como diferencial do produto. Em 6 famílias,
houve a citação de duas ou mais características de diferenciação.
Estas características estão condizentes com a diferenciação retratada como um
conjunto de atributos que relacionam a saúde, a ecologia, o meio ambiente, o social, o cultural
e a aparência, denominada de “Qualidade Ampla” (PREZOTTO, 2002). Além destas, a
diferenciação pode estar relacionada ainda com o desenvolvimento de processos inovadores,
bem como a produção de novos produtos. Esta inovação vem sendo destacada pela ampliação
da diversificação de produtos que são oferecidos aos mercados de proximidade (APÊNDICE
C).
Uma mesma matéria-prima ao receber novos ingredientes, transforma-se em outro
produto na medida em que suas características tornam-se singulares e específicas a um
determinado nicho de mercado. Assim, além dos agricultores oferecerem os produtos que
desenvolviam anteriormente à inovação, agora as famílias possuem outros tipos que se
adaptam às preferências de diferentes consumidores.
Wolf (1970) considera que as modificações nos produtos são desenvolvidas pelas
exigências dos consumidores. Contudo as modificações no processo e a ampliação dos
produtos que os agricultores inserem nos mercados são resultado de inúmeras características.
Investigar como são desenvolvidas estas inovações e quais agentes estão participando dessa
construção não se constituiu objetivo desta pesquisa. Entretanto, alguns autores afirmam que
as relações sociais (redes) podem ser um indicativo para compreender como tais inovações
são construídas.
123
Sonn e Storper (2003) reconhecem que a comunicação através da interação social tem
oportunizado às pessoas envolvidas a partilha de novos conhecimentos, produtos e processos.
As ARFs estão inovando, seja mediante o aproveitamento dos seus recursos produtivos seja
através de suas estratégias, ideias e experimentações.
Entretanto, os processos inovadores nem sempre são sinônimo de ampliação da
diversificação de produtos. Em 2 famílias (Tabela 24), o desenvolvimento de processos
inovadores que permitem modificar o produto, como a adição de ingredientes que o torna
diferenciado. Como exemplo:
[...] “mudamos a receita do melado para deixar mais cremoso. Agora colocamos
água quando já está quase pronto, isso o deixa mais cremoso e mais fácil de passar
no pão. Aprendemos com outros produtores mesmo. Um pega a receita de outro, a
gente sempre aprende coisa nova” (Produtora 29, Paraíso do Sul).
Outro processo que não amplia a diversificação da produção é a apresentação dos
produtos, como a disposição do produto nos pacotes, o tamanho, a tonalidade e o uso de
embalagens plásticas e de isopor, desenvolvida por cinco famílias (Figura 19). Alguns
exemplos expressam essa inovação:
[...] “esses potes plásticos e embalagens foram empregadas para atender as
exigências dos consumidores” (Produtora 1, Cachoeira do Sul).
[...] “antes colocávamos em saquinhos, o pessoal olhava as bolachas e acabava
quebrando. Agora mudamos para essas bandejinhas de isopor e papel filme e isso
ajudou muito melhorou a apresentação do produto”.
“Uma coisa nova que fizemos
foi fazer os sortidos [bandeja com vários tipos de biscoitos], a dona do armazém
falou para nós experimentar e agora é o tipo que mais sai”. (Produtora 26, Restinga
Seca).
[...] “só o que a gente faz é que mudamos o tamanho. O consumidor prefere mais
pequeno, porque assim ele demora mais pra secar”[queijo]. (Produtor 37, São Sepé).
Nos demais processos de inovação, observa-se a ampliação da diversidade de
produtos. A adição de temperos, como sal e pimenta é verificada em 3 ARFs; produtos com
consistências diferenciadas são observados em 2 famílias; a diversidade de sabores e a
combinação de recheios de doces e salgados, assim como a variação de polpas de frutas
(cucas, geleias, rapaduras) é estratégia de 6 famílias, conforme expresso na Tabela 24.
Outras inovações como o desenvolvimento de produtos Light (produtos com redução
calórica mínima de 25%, pela substituição de algum ingrediente: gorduras, carboidratos ou
proteínas) são estratégias de 2 ARFs, que produzem pães de centeio e de farinha integral.
124
Nestas inovações, verificou-se que as famílias observaram a preferência dos consumidores
para adotar estas inovações. Esta afirmação aproxima-se da lógica de que o consumidor pode
estar diretamente envolvido na forma como o agricultor produz e redireciona a sua produção.
A diversidade dessas inovações pode ser evidenciada nestes depoimentos:
[...] “muitos consumidores não podem comer pão branco, e querem comer pão
integral, de centeio”(Produtora 4, Cachoeira do Sul).
[...] “o pessoal pediu pão salgado com recheio de linguiça e queijo, nos fizemos e
começamos a vender depois que eles pediram” (Produtor 10, Cachoeira do Sul).
[...] “nós fizemos de acordo com os consumidores. Tem uns que preferem sem
pimenta, outros com a pimenta. Outros sem alho, e com alho”. (Produtores 33, Cerro
Branco).
[...] “nós estamos sempre incrementando. Eles que pedem [consumidores] o que eles
querem. Por exemplo, já fiz uma rapadura com abóbora e mamão porque uma
pessoa me pediu”. (Produtora 38, São Sepé).
A produção de um mesmo produto com concentrações diferentes, como por exemplo,
a cachaça cujo teor de álcool pode apresentar variações é uma técnica utilizada por 1 família
(Tabela 24), que divide em três tipos a produção: fraca, média e forte (variando entre o mais
baixo e o mais forte teor de álcool).
Outro exemplo pertinente na forma como a característica de diferenciação pode estar
associada a processos de inovação é a maneira como um produtor redirecionou a produção de
queijos. O processo produtivo era realizado mediante a aplicação de uma receita familiar até o
aprendizado cnico oferecido por um conhecido” que residiu dois anos na França (Figura
19). A receita utiliza 30% de soro e 30% de água no processo, garantindo um sabor peculiar
ao queijo, o que confere uma diferenciação do produto para os consumidores:
[...] “todos que provaram dizem que meu queijo é diferente, tem um sabor diferente.
Os donos da Pizzaria querem o queijo que fabrico porque dizem que o queijo
derrete melhor” (Produtor 7, Cachoeira do Sul).
125
Figura 19 Inovações: no processo de produção (queijos produzidos
pela ARF 7, de acordo com o processo francês, à esquerda); e
mudança na embalagem (isopor) (bolachas caseiras, ARF 26, à
direita).
Fonte: Fotografia da autora (junho/2009).
O desenvolvimento de novos produtos caracterizou-se como outro tipo de inovação.
Esta inovação se distingue das demais porque não uma modificação no conhecimento
existente, mas sim a incorporação de um determinado processo produtivo até então totalmente
desconhecido pelos agricultores. O receituário para a fabricação destes produtos foi sendo
incorporado na medida em que os agricultores pesquisavam informações técnicas com
instituições, nas relações com consumidores, amizade, vizinhança, parentesco, e até mesmo
nas tentativas de acerto e erro
3
. Algumas das inovações são:
[...] “o licor de pêssego que comecei a fazer teve bastante saída, agora o de morango
e abacaxi quase não teve, aí não faço muito” (Produtor 22, Restinga Seca).
[...] “comecei a fazer Wafer, amendoim açucarado. O Wafer vende bem, no caso do
amendoim ucarado acertamos na segunda receita. Outro produto que passamos a
produzir é a cueca virada” (Produtora 34, Cerro Branco).
[...] “aquilo que o consumidor pede, a gente faz. Eles gostam muito daquela cuca
italiana [sem recheio] eu faço só daquela, é sovada” (Produtora 40, São Sepé).
3
As estratégias de acerto e erro correspondem à produção baseada em experimentações. A receita é colocada em
teste, até que o produto final seja condizente aos objetivos dos mercados consumidores.
126
Tabela 24 - Tipos de inovações e as famílias que as desenvolvem
Inovações Agroindústrias Rurais Familiares
Embalagens e apresentação 1 e 26
Consistência do produto 1e 39
Tempero (sal, pimenta) 7, 33, e 38
Sabores (recheios, polpa e coberturas) 4, 5, 10, 13, 14 e 38
Produtos light 3 e 4
Concentração do produto 20
Tamanho 21 e 37
Adição de ingredientes/modificação 5 e 29
Tonalidades 35
Receita de outro país 7
Outros produtos 14, 21, 22, 23, 32, 34, 40 e 41
TOTAIS 23 famílias que inovaram* e 18 que não inovaram
Fonte: Elaborado pela autora.
Nota: (*) O total de famílias que inovaram (23) não caracteriza o total de inovações, pois seis famílias
adotam entre dois e três tipos de inovações.
Além das características de diferenciação, os produtos são reconhecidos pelos
consumidores por uma denominação específica, que é a forma como os clientes utilizam para
identificar a produção das ARFs. A designação “Colonial” é a forma utilizada como
identificação dos produtos de 24 ARFs pelos seus respectivos consumidores (Tabela 25). Esta
denominação expressa a relação da agricultura familiar com as atividades agroindustriais, pois
os adjetivos colonial” e “da colônia” são referentes ao processo histórico-cultural da
imigração européia (alemã e italiana), presentes no Rio Grande do Sul (GUIMARÃES;
SILVEIRA, 2007).
O produto agroindustrial recebe ainda outras formas de identificação pelos
consumidores. A utilização da denominação “Caseiro”, a designação pela marca do produto,
pelo nome do produtor, pelo nome do produto e a utilização de duas ou mais formas
correspondem a respectivamente, 7,3; 2,4; 4,9; 4,9 e 22% (Tabela 25).
Tabela 25 - Denominação do produto agroindustrial pelos
consumidores
Designação do produto N° ARFs %
Colonial ou da Colônia 24 58,5
Caseiro 3 7,3
Marca do produto 1 2,4
Nome do produtor (a) 2 4,9
Nome do produto 2 4,9
Duas ou mais formas ¹ 9 22,0
TOTAIS 41 100
Fonte: Elaborado pela autora.
Nota: (1) As denominações do produto que se apresentam sob várias formas
envolvem os nomes: colonial, caseiro, natural, ecológico e artesanal.
127
A forma como o produto é apresentado aos mercados de proximidade destaca-se como
outra estratégia que diferencia a produção agroindustrial. O processo produtivo nas ARFs
adquire uma característica distinta no que se refere ao tempo de armazenagem do produto.
Após o desenvolvimento de todas as etapas da produção, as famílias depositam seus produtos
na propriedade, onde o tempo de duração de armazenagem varia de 8 horas a 1 ano. Esta
variação no tempo de armazenagem do produto depende do tipo de produção, por exemplo: o
vinho e a cachaça são produtos que são conservados pelo período de 1 ano, enquanto que os
pães, cucas e salgados requerem a armazenagem de, no máximo 1 dia.
Neste sentido, um curto espaço de tempo entre a produção e a comercialização ou
entre a produção e a entrega aos intermediários e pontes de inserção, pois 39% das ARFs
realizam estas duas etapas em até 24 horas (Tabela 26). São famílias que produzem pães,
cucas, embutidos e salgados. No período de 2 a 4 dias, 9 ARFs (22%) armazenam queijo,
manteiga, requeijão, geleias, conservas de legumes, etc. Os produtos como bolachas, melado e
queijo (cujo tempo de cura é maior) são armazenados no período de 5 a 7 dias, por 9 famílias
(22%). O tempo de armazenagem de 14 a 21 dias são relacionados à produção de linguiça
seca e mel, representando 3 ARFs (7,3%). A produção de vinho, licores, cachaça e geleias
(congeladas) são armazenadas por um tempo que varia de 60 dias até 1 ano, por 4 famílias
(9,8%), conforme a Tabela 26.
Tabela 26 - Tempo de armazenagem da produção até comercialização
Tempo de armazenagem N° AFRs
%
Até 24 horas 16 39,0
2 a 4 dias 9 22,0
5 a 7 dias 9 22,0
14 a 21 dias 3 7,3
60 dias a 1 ano 4 9,8
TOTAIS 41 100
Fonte: Elaborado pela autora.
A produção e a armazenagem são processos que requerem um planejamento conforme
os objetivos de cada família. O Gráfico 8 demonstra as formas de planejamento da produção
das famílias. Sessenta e dois por cento das ARFs definem a quantidade da produção de acordo
com a média das vendas, o que demonstra o conhecimento dos produtos que são requeridos
pelos mercados consumidores, assim como as épocas em que não são consumidos
determinados tipos de produtos e a oscilação das vendas em determinados dias do mês.
128
A produção orientada pela disponibilidade de matéria-prima na propriedade é outra
forma de planejamento que é utilizada por 27% das ARFs. O planejamento segue ainda a
orientação pelo excedente do consumo da família (2%), pelo controle de todas as etapas do
processo de produção (2%) e pela disponibilidade de trabalho para produzir (2%).
62%
27%
2%
2%
2%
5%
Média das vendas
Disponibilidade de maria-prima
Pelo excedente - sobra do consumo
familiar
Anualmente - controle de todo o
processo de produção
Pela disponibilidade de mão-de-obra
Disponibilidade de maria-prima e
pela média de vendas
Gráfico 8 - Formas de planejamento da quantidade da produção para
comercialização nas ARFs
Fonte: Elaborado pela autora.
Consideram-se a inovação e a diferenciação como estratégias para o acesso aos
mercados de proximidade, bem como táticas para manter a fidelidade dos mercados
consumidores. Esta afirmação se verifica na medida em que os produtores relacionam as
características dos produtos como elementos que favorecem a comercialização.
Características como qualidade do produto, apresentação, higiene, limpeza, sabor, tempero,
matéria-prima de qualidade, bom atendimento e produção de acordo com a preferência do
consumidor foram os fatores citados pelas famílias que garantem a fidelidade dos clientes.
As relações das famílias com os mercados de proximidade estão atreladas ao modo de
desenvolver o processo produtivo agroindustrial. O produto, adquirindo características de
diferenciação e inovação, torna-se um elemento-chave para compreender os mercados em que
os agricultores estão participando. O produto, ao sofrer modificações, não perde a sua
característica tradicional, mas se adapta aos interesses dos mercados. Pela proximidade dos
contatos que os agricultores possuem com vários agentes componentes dos mercados de
proximidade, o acesso a informações detalhadas sobre os novos produtos que estão sendo
comercializados.
Resultado ou não de uma construção social, as inovações estão sendo vistas como
novas formas de compreender o acesso aos mercados. A abordagem qualifica o agricultor
129
como um componente ativo nas decisões sobre a produção (de produtos e de estratégias) e
negociação desses produtos. As inovações se perpetuam pela capacidade desses atores em
construir suas relações, e assim, ampliar suas informações técnicas, econômicas e de
mercados. A comunicação entre os atores da rede dos mercados de proximidade social
também se destaca como uma forma de propaganda do produto e será retratada
detalhadamente a seguir.
7.2 O PRODUTO AGROINDUSTRIAL E AS FORMAS DE PROPAGANDA
4
: A
AMPLIAÇÃO DA REDE DE CONSUMIDORES
Considerando-se que as famílias estão desenvolvendo relações com os consumidores
de origem da comunidade, da zona urbana do município, de outros estados, surge a seguinte
questão: como se ampliam as redes sociais destes consumidores nos mercados de
proximidade? Para White (1981), os mercados se multiplicam através da própria estrutura
social, e são reproduzidos na comunicação entre os participantes. Floysand e Sjoholt (2007)
consideram que a comunicação entre os atores que compõem as redes é a forma como as
informações sobre as oportunidades de consumo se multiplicam.
As noções de mercado como interações sociais são alguns indicativos da forma de
organização das redes sociais de consumidores e produtores. Não objetiva-se responder essa
questão, porque não elementos empíricos que permitam a formulação de uma resposta
científica. Entretanto, pretende-se apontar algumas direções que possam guiar a compreensão
da forma como as ARFs ampliam seus contatos sociais e sua comercialização com
consumidores urbanos.
A forma com que o produto torna-se conhecido é resultado de informações
compartilhadas entre vários agentes sociais, e a forma expressiva no caso da comercialização
das ARFs, é a propaganda boca a boca, predominante em 65,9% da amostra e em 27 famílias,
conforme a Tabela 27. Para estas famílias o único meio de divulgação do seu produto, que
permite ampliar a venda, é a estreita relação existente entre outra rede social: consumidor-
consumidor. Um indivíduo A, que consome os produtos de uma determinada família divulga
4
A definição de propaganda está sendo utilizada, neste trabalho, como a propagação de informações (PINHO,
1990). Assim, quando é discutido sobre a propaganda está se referindo aos meios utilizados para a divulgação do
produto agroindustrial, tendo como objetivo a comercialização.
130
a informação sobre o produto para um indivíduo B, que passa, posteriormente a ser um
consumidor. A forma como esta informação é reproduzida adquire características
diferenciadas, que pode ser pelo oferecimento do produto, pela própria conversa, etc. A
comunicação entre os consumidores é conhecida pelos produtores:
[...] “a gente não precisa [de propaganda] porque eles mesmos falam para outras
pessoas. Quem come acaba espalhando para as demais pessoas. Uma pessoa que
comeu na casa de outra, acaba conhecendo o produto” (Produtores 19, Restinga
Seca).
[...] “eles [os consumidores] ficam sabendo por outros. A gente também é assim. Se
a gente ouve de um negócio bom a gente corre atrás” (Produtora 28, Paraíso do Sul).
[...] “é através dos consumidores mesmo que o produto é conhecido, às vezes tem
gente que chega aqui na propriedade, e eu nem conheço, dizendo que alguém disse
que eu faço um queijo bom” (Produtor 7, Cachoeira do Sul).
Na forma de divulgação através dessas redes (contato consumidor-consumidor) ainda
podem estar inseridas as propagandas do produto relacionado a uma determinada localidade.
A localidade de Mata Grande, zona rural do município de São Sepé, é reconhecida pelos
mercados consumidores pela produção agroindustrial de qualidade. Os agricultores
identificam esta vantagem e utilizam a expressão “Produto da Mata Grande” como forma de
propaganda e estratégia de comercialização, conforme explica um associado da APSAT:
[...] “um fala pro outro do nosso produto. Tem isso aqui também da questão da Mata
Grande ter uma história de produção boa. É o vinho da Mata Grande, é o melado
da Mata Grande, e a gente também coloca isso pra divulgar” (Produtor 39, São
Sepé).
As demais formas de divulgação do produto ocorrem através das pontes de inserção
(organizações sociais para comercialização), mencionadas por 2 ARFs (4,9%); pelas
características dos produtos (3 ARFs); pelos intermediários e pela amostra do produto,
quando o produtor oferece uma porção do produto ao consumidor (1 ARF). Além disso, 7
famílias (17,1%) mencionaram a utilização de duas ou mais destas formas como propaganda
do produto, incluindo a divulgação na rádio local.
131
Tabela 27 - Forma de propaganda do produto agroindustrial
Forma de divulgação N° ARFs %
Boca a Boca 27 65,9
Produto 3 7,3
Pontes de inserção 2 4,9
Intermediários 1 2,4
Prova do produto 1 2,4
Várias formas¹ 7 17,1
TOTAIS 41 100,0
Fonte: Elaborado pela autora.
Nota: (1) As várias formas se referem à combinação de duas ou mais formas de
propaganda do produto, incluindo a divulgação na rádio da cidade, que não foi citada
acima.
As estratégias das famílias para comercializarem a sua produção perpassam através
das redes com as quais mantêm contatos; um consumidor possui uma rede de parentesco,
amizade e vizinhança, replicando o conhecimento acerca de um produto para outras pessoas
(GRANOVETTER, 1985). A ampliação e extensão das interações sociais na rede estão
diretamente relacionadas com a capacidade de transmissão de informações entre os agentes
que formam a estrutura da mesma (GRANOVETTER, 1990).
A característica de perpetuação da informação através dos contatos sociais é apenas
uma das formas de ampliar a rede de consumidores. Este aspecto confirma a asserção de
Smelser (1968), que explica o funcionamento dos contatos sociais, onde a interação está
presente na forma de organização dos mercados. Assim, a propaganda discorre sem possuir
um mecanismo de marketing organizado em sistemas digitais de informação. Pelo contrário, a
informação provém das próprias interações, pelas conversas entre os atores da rede. A
divulgação ocorre porque os atores estão objetivando as mesmas preferências de consumo, ou
seja, consumir um determinado tipo de produto é uma finalidade construída, seja no âmbito
histórico, social ou cultural.
132
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pertinência em discutir sobre a realidade social e econômica das agroindústrias
rurais familiares, especialmente sobre como as famílias estão comercializando seus produtos,
constituiu-se como principal motivação para a realização deste trabalho. O tema faz parte da
discussão sobre as relações sociais que estão enraizadas nas ações de consumo e
comercialização de produtos diferenciados da agricultura familiar. Esta diferenciação, no que
se refere à produção, e às relações sociais de comercialização fazem parte das chamadas
“redes agroalimentares alternativas” que vêm se contrapondo à padronização e
homogeneização dos hábitos de consumo no mundo.
Esta discussão é pertinente à abordagem de Desenvolvimento Rural porque questiona
sobre as formas que as famílias vêm utilizando para resolver a problemática da
comercialização agroindustrial, principalmente no que se refere aos entraves da certificação e
sanidade dos produtos. Para isso, as famílias estão organizando-se em redes, interagindo com
uma série de atores, que contribuem para o desenvolvimento das atividades de produção,
comercialização e consumo. Dessa forma, as famílias que estão desenvolvendo produtos
agroindustriais estão interagindo com outros atores residentes no município, região e país.
Esses atores são agentes da sociedade civil, coordenadores de secretarias de agricultura,
técnicos de extensão rural, universitários, agentes de organizações governamentais e não-
governamentais, educadores do SEBRAE, parentes, vizinhos, empresários (intermediários) e
consumidores urbanos.
Através da análise da rede social, pode-se afirmar que cada ator tem uma função nos
mercados de proximidade: os agentes que compram os produtos, os que prestam assistência
técnica, os que fornecem matéria-prima e força de trabalho, os que instruem (com cursos,
informações), os que têm a função de intermediar a relação entre a família e os consumidores,
etc. A ação de comercialização depende de todas as outras etapas e seus recursos: a produção
agropecuária (matéria-prima), colheita (compra ou troca), processamento da produção,
armazenagem, consumo familiar e transporte. Assim, os mercados de proximidade não são
restritos ao ato de comercialização e a rede social não está limitada geograficamente aos
municípios que compõem o Corede Jacuí Centro.
133
Cada família possui uma rede social diferente, porém é o conjunto destas interações
que está compondo a rede social da região. As redes sociais não são estáticas, elas podem
sofrer modificações no que se refere ao conjunto de relações sociais. Um novo ator, uma nova
relação pode provocar mudanças nas atividades de produção, comercialização e consumo dos
produtos agroindustriais. Além disso, não uma única forma que expresse esta realidade,
justificada pela diversidade das agroindústrias rurais familiares e seu conjunto de interações
sociais nos mercados de proximidade.
No âmbito da família, uma série de interações é evidenciada. As agroindústrias são
atividades que relacionam a família (alimentação, gênero, cultura, trabalho), o ambiente
produtivo (animais e plantas) e a comercialização (relações sociais nos mercados). Os
diversos produtos agropecuários e agroindustriais estão garantindo alimentação para as
famílias e renda (principal ou complementar). Entretanto, as motivações dos agricultores para
desenvolver atividades agroindustriais não podem ser relacionadas somente aos critérios
econômicos, tais como a renda. Continuar a atividade herdada pelos pais e avós, o lazer, a
terapia, o objetivo de reter os jovens no campo, como alternativa à produção de fumo, são
outras motivações mencionadas pelos agricultores.
De um produto que foi desenvolvido primeiramente para consumo da família, agora
também se obtém valor de troca, oportunizada pelas relações sociais nos mercados de
proximidade. Os mercados não podem ser definidos apenas como ponto de encontro entre
produtores e consumidores. Como menciona Granovetter (1973), são as redes sociais que
estão dinamizando as oportunidades econômicas, como a oferta de trabalho. Os atores, em
constante interação social, partilham informações e criam um vínculo, caracterizado pela
confiança e reciprocidade.
Dessa forma, as relações que estão sendo desenvolvidas no âmbito produtivo (da
agroindústria) e familiar também devem ser consideradas como elementos dos mercados de
proximidade. A alocação de mão-de-obra, a ajuda mútua entre os vizinhos, as relações de
parentesco, as organizações sociais, as igrejas, os grupos informais e formais presentes na
comunidade e também na zona urbana do município, são outros aspectos pertinentes. Estas
relações estão explicando a forma como os agricultores comercializam e conseguem fabricar
uma determinada quantidade de produtos para atender os seus canais de venda. Tais relações
são picas da agricultura familiar e estão viabilizando suas atividades econômicas e sociais.
Embora, frequentemente, as relações de parentesco e vizinhança aconteçam na comunidade, é
pertinente destacar que os parentes são sujeitos que residem não na própria comunidade,
134
mas também em outras comunidades, nas zonas urbanas dos municípios ou, ainda, em outras
cidades.
No aspecto quantitativo, as relações de troca e comercialização por meio de relações
de vizinhança e parentesco não são significativas. Entretanto, é conveniente destacar que na
ausência de matéria-prima para completar o processo de fabricação, verificou-se que algumas
famílias estão acessando determinados produtos através destas relações. Além disso, a igreja,
as organizações sociais e festas que acontecem na comunidade, além de serem meios de
interação social, podem ser também espaços de comercialização, pois em algumas
agroindústrias, as famílias aproveitam estas ocasiões para venderem os seus produtos. As
relações de trocas (produtos agroindustriais) são também formas de garantir os alimentos
necessários à subsistência da família, que os produtos da agroindústria servem tanto para
alimentação familiar quanto para comercialização. Assim, os mesmos tipos de produtos que
as famílias consomem são comercializados via relações de proximidade.
Essas relações de reciprocidade são pertinentes à análise do funcionamento da rede
social, pois permitem entender como a proximidade das famílias com outras unidades de
produção vêm facilitando o desenvolvimento das atividades produtivas, comerciais e de
consumo dos produtos agroindustriais. A proximidade geográfica é um ponto importante, uma
vez que os agricultores estão acessando com mais facilidade os recursos (mão-de-obra,
produtos) para dar continuidade à cadeia produtiva da agroindústria. As regras de contrato de
trabalho entre os produtores não podem ser explicadas pela formalidade, mas sim pela
confiança que foi construída historicamente, pelas relações de amizade. Ao invés da
documentação formal, os agricultores se organizam mediante a reciprocidade e selam o
acordo através da conversa informal.
No que se refere às relações das famílias com as instituições (coordenadores de
secretarias de agricultura, técnicos de extensão rural, universitários, agentes de organizações
não-governamentais, educadores do SEBRAE), estas estão desenvolvendo as atividades nos
aspectos produtivo e comercial. Através dessas interações, 28 famílias têm acesso aos cursos
de capacitação para desenvolver os processos de certificação (relacionados à sanidade dos
produtos), instruções para aprender novos processos produtivos e informações para melhorar
a apresentação do produto e propaganda. E, além de serem formas de captação de recursos
para algumas famílias iniciarem a atividade agroindustrial (verificado em uma família do
município de Cerro Branco), estas interações também contribuem para as agroindústrias
desenvolverem novos produtos, atingirem mercados de nichos específicos (como por
exemplo, a produção orgânica) e aperfeiçoarem seus conhecimentos para ampliar a
135
comercialização (apresentação do produto, propaganda), criando ainda, novos espaços de
venda para os produtos (como as pontes de inserção e feiras locais).
Neste sentido, cabe ressaltar a desigualdade nas interações das famílias com as
instituições, pois 13 famílias não possuem relações com agentes pertencentes aos órgãos
públicos e entidades não-governamentais no que se refere ao desenvolvimento de atividades
agroindustriais. Nestas agroindústrias, as famílias desenvolvem outras estratégias para
produzir e comercializar (através dos conhecimentos técnicos herdados de antepassados e/ou
das informações compartilhadas com outros atores sociais).
As pontes de inserção são organizações sociais que foram criadas para substituir as
feiras de produtores. As famílias e as instituições locais desenvolveram locais físicos
específicos para expor a produção da agroindústria e o artesanato. A comunicação entre as
famílias destas organizações e os agentes que coordenam as vendas permite conhecer as
preferências de consumo dos clientes que frequentam estes locais. Dessa forma, os atores que
são incumbidos de exercer o trabalho de atendimento aos clientes e de organização da
produção dos agricultores são elementos-chave para entender o funcionamento destas
associações e cooperativas. Esses agentes possuem um rol de informações sobre as
agroindústrias e os consumidores. A organização dos pedidos dos clientes, a valorização da
produção da agricultura familiar local e a comunicação sobre modificações nos produtos são
formas que esses agentes estão desenvolvendo para dinamizar a comercialização dos
produtos. Outros agentes que estão intermediando as relações das famílias com os
consumidores são os proprietários e trabalhadores de minimercados e armazéns. A
oportunidade de entregar uma maior quantidade da produção nestes locais e a segurança no
recebimento do pagamento são características valorizadas pelas famílias.
Ainda no aspecto quantitativo, o principal canal de comercialização das agroindústrias
rurais familiares é o da interação produtor-consumidor urbano, justificada pela média de 51%
da quantidade de produção comercializada. Se somarmos os resultados (médias) de
comercialização e troca com parentes e vizinhos, esse número sobe para 66%. De acordo com
esse resultado, pode-se afirmar que a comercialização direta com o consumidor é a forma que
as famílias estão encontrando para venderem a sua produção. Os consumidores, além das
relações de parentesco e vizinhança, são agentes residentes da zona urbana dos municípios, de
outras cidades e também de outros estados.
As interações diretas com os consumidores estão oportunizando aos agricultores
obterem conhecimento sobre as suas preferências de consumo, e as famílias estão
desenvolvendo estratégias para garantir a fidelidade dos clientes. Segundo os agricultores, os
136
consumidores estão valorizando as características de diferenciação dos produtos
agroindustriais, que se destacam pela isenção de insumos químicos, pelo modo de produção
(matéria-prima selecionada), além das receitas (temperos, processos) típicas de cada família.
Entretanto, além de reconhecer que os mercados de proximidade são dotados de redes
sociais, não são apenas estas relações que explicam o seu funcionamento e as estratégias de
agroindustrialização das famílias. A cultura, os aspectos históricos e econômicos também
podem estar direcionando as decisões de consumo e comercialização. As características que
diferem a produção frente aos nichos de mercados são outros indicativos para a resistência
dessas redes. Neste debate, as noções de diferenciação e inovação ganham destaque: as
inovações diferenciam determinados produtos, como por exemplo, o redirecionamento da
produção de queijo e de pães light, no município de Cachoeira do Sul. Com essas inovações,
duas famílias diferenciaram seus produtos nos mercados de proximidade, garantindo a
fidelidade de clientes.
Dessa forma, a inovação nas ARFs do Corede Jacuí Centro é retratada como uma
adição às características de diferenciação, uma vez que os produtos não perdem os elementos
diferenciais de mercado (natural, jeito de fazer, trabalho do agricultor, ecológico, etc.), mas
são modificados e elaborados para atender as exigências dos consumidores. Além disso, com
a inovação, as famílias ampliam os tipos de produtos que são inseridos nos mercados de
proximidade (sabores, consistências, tamanho, tonalidade, etc.) tendo em vista a satisfação
das necessidades diferenciadas de cada consumidor.
Assim, a discussão sobre as características de diferenciação da produção merece uma
amplitude. A diferenciação e a inovação, para as famílias do Corede Jacuí Centro, têm um
papel pertinente para estabelecer relações de comercialização nos mercados de proximidade.
A agenda de novas pesquisas sobre a produção das agroindústrias deve considerar essas
mudanças e identificar quais as inovações que podem estar diferenciando os produtos
agroindustriais nos mercados. pertinência em investigar sobre outras características de
diferenciação que vão além dos atributos: natural, ecológico e ambiental. As novas pesquisas
devem considerar também o papel das inovações para a criação de diferenciação de produtos
e a construção de oportunidades de comercialização.
As famílias, interagindo com uma série de atores em redes sociais, podem estar
compartilhando informações para modificarem e desenvolverem novos produtos, processos e
trocas de conhecimentos. A produção pode ser resultante de um processo organizado em
redes, com a participação (co-produção) de uma série de agentes (institucionais, organizações
137
sociais, produtores, consumidores, etc.). Retratar essas relações caracteriza-se como um
próximo desafio de pesquisa.
A consolidação dos mercados (e das relações) vai além dos princípios e normas de
certificação formal para a produção. Ao contrário, essas redes funcionam por meio de
“certificação informal”, ou seja, é o consumidor que certifica o produto pela confiança que
possui no agricultor. A proximidade da relação social do produtor e consumidor facilita esta
certificação. Na produção e comercialização informal, geralmente o produto não tem um
rótulo e identificação padronizada que especifique as informações nutricionais e o prazo de
validade. O “selo” do produto que garante credibilidade frente aos mercados consumidores é
resultado da interação entre os atores nas redes (produtores e consumidores, produtores e
intermediários). A informalidade, portanto, não é um empecilho para as famílias
estabelecerem relações de comercialização e troca para os produtos agroindustriais.
Não obstante, as famílias que aderiram aos sistemas de inspeção não
descaracterizaram seus produtos frente aos mercados consumidores, pois a produção
continuou sendo desenvolvida através da fórmula específica da família, com os ingredientes e
etapas produtivas próprias. A formalidade da produção oportunizou às famílias ampliarem a
comercialização, pela oportunidade de venda em redes de hipermercados.
Os consumidores diretos estão em contato com seus parentes, amigos, vizinhos e
“conhecidos”, e esta interação é uma forma de divulgação do produto agroindustrial. Para
muitas famílias não outra forma de propaganda do produto, ou seja, é através da interação
consumidor-consumidor que a produção é conhecida e são construídas novas relações. A
propaganda do produto, sendo o resultado de uma comunicação compartilhada entre os
agentes que compõem esta rede é um elemento que pode contribuir para a compreensão de
como são desenvolvidas essas relações que ultrapassam os limites geográficos da cidade ou
do estado. Essa propaganda também relaciona a produção a um determinado território
(verificada na localidade de Mata Grande, em São Sepé).
Outra questão pertinente a novas pesquisas, refere-se ao papel dos consumidores para
a persistência das formas produtivas das agroindústrias rurais familiares. Os consumidores são
atores das redes sociais. As motivações que orientam os clientes a manterem relações de
comercialização com os produtores destacam-se como oportunidades de pesquisa, bem como
reconhecer as características que diferenciam esses produtos para esses agentes.
As informações geradas no presente trabalho oportunizaram o conhecimento das
relações sociais que estão compondo as redes nos mercados de proximidade social. A rede
social é uma temática pertinente à abordagem de Desenvolvimento Rural, porque considera
138
que os atores sociais rurais (entre eles, a agricultura familiar) constroem relações que não
estão limitadas à localidade e à região. Retratar essas relações, quem são os agentes, como e
porque ocorrem, quem são os atores e qual papel cada agente desempenha nas mais diversas
atividades da agricultura familiar são questões pertinentes para entender os processos de
Desenvolvimento Rural no Brasil.
139
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87, n. 3, p. 517-547, nov. 1981. Disponível em: <www.jstor.org/stable/2778933> Acesso em:
19 abr. 2004.
WOLF, E. Sociedades Camponesas. Rio de Janeiro: Zahar,1970. 149 p.
154
APÊNDICE A – Formulário semiestruturado - Coleta de dados - Agroindústrias Rurais
Familiares – ARF
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO RURAL
Entrevistadora: Chaiane Leal Agne – Mestranda PGDR/UFRGS
1. Identificação
Nome do responsável pela propriedade:...............................................................
Distrito:...................................................................................................................
Localidade:.............................................................................................................
Origem da família (naturalidade e imigrantes).......................................................
Membros que residem na propriedade: (nomes e grau de parentesco):...............
Quadro 1 - Identificação da parcela de terra
Descrição Hectares
1. Área própria
2. Arrendada de terceiros
3. Arrendada p/ terceiros
4. Área em parceria ou outros...
Total da área
Atividades agropecuárias:
Atividades para autoconsumo:
Comercialização:
2. Caracterização da Agroindústria Rural Familiar
a) Porque se dedica à atividade de agroindustrialização? Houve incentivo governamental,
familiar? Qual foi a (s) principal (is) motivação (ões)?
b) Possui uma estrutura própria para processamento da produção agropecuária na propriedade
rural? Se caso positivo, é na residência ou separado?
c) Os resíduos (sobras) que não são utilizadas para a fabricação dos produtos são
reaproveitados?
( ) sim. Qual o destino? Animais, solo? ( ) não
d) Quanto tempo em média a produção agroindustrial fica armazenada na propriedade antes
de comercializar?
e) Qual a origem da receita do processamento dos produtos?
155
( ) família, sem modificações na receita (totalmente preservada);
( ) família, com pequenas modificações próprias (familiar) na receita ou adição de
ingredientes (parcialmente preservada);
( ) técnico (SENAR, EMATER); Outros? Quais?
( ) familiar + técnico (SENAR, EMATER). Outros Quais?
( ) Normas de vigilância sanitária (secretarias da saúde, etc.)
( ) outras formas. Quais?
f) Utiliza aditivos químicos (conservantes, aromatizantes, espessantes, etc) como forma de
prolongar a vida útil dos produtos?
( ) sim. Quais? ( ) não
Quadro 2 – Identificação dos produtos agroindustriais comercializados - ARFAs
Produtos Origem da matéria-prima (insumos) Mão-de-obra (*)
Embalagens (*)
Apresentação
Autoconsumo
( ) TF ( ) FC
( ) sim ( ) não
( ) TF ( ) FC
( ) sim ( ) não
( ) TF ( ) FC
( ) sim ( ) não
( ) TF ( ) FC
( ) sim ( ) não
Notas: (*) Preencher os dados referentes à mão-de-obra de acordo com a seguinte síntese: TF: (total familiar) ou
FC (familiar e contratada temporária)
g) Precisa adquirir produtos agrícolas e/ou insumos de terceiros para complementar o
processo de produção agroindustrial? Quais? Quem fornece?
h) A renda monetária da produção agroindustrial é satisfatória para cobrir despesas da
família? ( ) sim ( ) não. Se caso afirmativo, mencionar a atividade de agroindustrialização
principal:
i) Qual (s) o (s) produto (s) agropecuário principal para a garantia de renda da família?
j) Utiliza a renda proveniente da agroindústria para investimentos, despesas ou gastos com a
atividade agropecuária?
156
2. Os mercados de proximidade
2.1 Inovações/processos de diferenciação
a) O que considera como diferencial no seu produto? O que o seu produto tem de diferente do
industrial?
b) O Sr. possui certificação? Como identifica seus produtos? (ex. rótulo próprio, selo
específico, informação nutricional)?
c) Se caso negativo, perguntar: qual o principal empecilho para a adoção da certificação?
Porque não adota a certificação?
d) Você adota alguma inovação nos produtos para atender as exigências dos consumidores?
Quais? Os produtos são padronizados ou diferenciados? Ex. Tonalidades, consistências.
Quadro 3 - Inovações e diferenciações empregadas no processo de produção agroindustrial
artesanal
Produto Inovações Houve adição de valor? Aceitação pelo consumidor
( ) sim ( ) não ( ) sim ( ) não
( ) sim ( ) não ( ) sim ( ) não
( ) sim ( ) não ( ) sim ( ) não
Obs. As inovações ou diferenciação serão entendidas como toda mudança no processo de produção que é
realizada pela família para tornar seu produto mais atrativo. Pode ser a adição de um insumo especial, como
também a adoção de uma receita nova para o preparo dos produtos.
2.2 Interações sociais
a) Qual a origem dos consumidores? (município, região, estado)?
b) Comercializa sempre para os mesmos consumidores/intermediários?
c) Onde comercializa seus produtos? (local: município, região, estado)?
157
( ) somente no município ( ) no município e região ( ) município, região e estado ( )
outros locais. Quais?
d) Quais os componentes da família que participam da comercialização?
e) Participam de eventos, feiras ou amostras em outros municípios para expor seus produtos?
Comercializa bem nesses eventos?
f) Que critérios que utiliza para estabelecer o preço de comercialização de seus produtos?
Quadro 4 – Identificação dos agentes, forma de comercialização e porcentagem das interações
sociais nos mercados de proximidade (trocas e comercialização) para a ARFA
Agentes Sociais Forma de comercialização
% Total
Consumidores
( ) feiras. Quais?
Urbanos
( ) eventos. Quais?
-que não tenham
( ) porta em porta
vínculo parentesco
( ) sob encomenda, entregue nas residências dos consumidores
( ) na propriedade
( ) outra. Qual?
Intermediários
( ) armazéns
( ) supermercados
( ) cooperativas, associações
( ) indústrias
( ) outras. Quais?
Vizinhança
( ) associações, cooperativas
Amigos
( ) festas, reuniões e confraternizações
( ) outras. Quais?
Parentes
( ) feiras. Quais?
( ) porta em porta
( ) na sua propriedade
( ) outra. Qual?
Trocas
( ) vizinhos
( ) parentes
( ) outros agentes. Quais?
Obs.
Os consumidores diretos caracterizados pela relação com a comunidade são definidos pelas relações de
comercialização produtor-produtor, já os urbanos são definidos pela comercialização em feiras livres, em porta
em porta. Há também as relações de troca com a comunidade (de uma região) que permitem o escoamento da
produção agroindustrial mediante trocas de um produto por outro.
g) Possuiu apoio institucional (prefeitura, Emater, governo, políticas públicas) para a
comercialização dos produtos ou auxílio (técnica, projetos) para a produção? Qual (is)?
158
h) O que voacha importante para que os consumidores mantenham-se fiéis à compra de
seus produtos? Que aspectos considera importante para manter-se no mercado?
i) Que denominação seus produtos recebem por parte dos consumidores?
( ) Colonial ou da colônia
( ) Artesanal
( ) Tradicional
( ) Denominação específica. Qual?
( ) Natural
( ) Caseiro
( ) Outra forma. Qual?
j) Quais as vantagens e desvantagens na comercialização direta com os consumidores? Além
da comercialização, existem outros benefícios na relação que tem com o consumidor?
Aprendizado, troca de idéias, diversão, lazer, outros?
Quadro 5 – Identificação das interações sociais nas comunidades (*):
Relações
A família participa? Comercializa? O que?
Organizações sociais
Igreja ( ) sim ( ) não
Festas, comemorações ( ) sim ( ) não
Cooperativas ( ) sim ( ) não
Associações ( ) sim ( ) não
Sindicatos ( ) sim ( ) não
Encontros ( ) sim ( ) não
Outras
Obs. (*) Comunidade: considera-se pelas propriedades, estabelecimentos geograficamente próximos as ARF,
pode ser vizinhos, parentes e amigos. Considera-se também a relação produtor-produtor.
k) Quais suas estratégias para conquista de consumidores? Quais pessoas da família
participam na criação de estratégias?
l) Existe uma negociação de preço entre você e o consumidor? O preço é diferenciado ou
padronizado?
m) Deseja expandir seus mercados? ( ) sim ( ) não. Por quê?
n) O Sr. adquire produtos de vizinhos, parentes, amigos que moram próximos ao seu
estabelecimento? Quais? Esse consumo é via compra, troca ou outros? Troca por produtos da
agroindústria?
159
o) O Sr. adquire produtos de consumidores urbanos? Quais? Especifique o ramo: farmácia,
alimentos, insumos agrícolas, etc. Esse consumo é via compra, troca ou outros? Troca por
produtos da agroindústria?
p) Como vocês planejam sua produção (quantidade produzida)?
q) Como faz a propaganda dos seus produtos? Como seus produtos ficam conhecidos pelos
consumidores? Ex. Propaganda boca a boca, amostra, etc.
Anotações complementares
160
APÊNDICE B – Descrição dos produtos agroindustriais desenvolvidos pelas ARFs do Corede Jacuí Centro - RS
ARF
Derivados cana-de-úcar Derivados do leite Embutidos e prod. Animal Panificação e confeitaria Doces e geléias de frutas PMP(¹) Outros
1 Melado Queijo, ricota e nata Chimia colonial
2 Frango e Lingüiça porco
3 Doce de leite Pães, bolachas
Conservas, chimia,
geléias e cristalizados
4
Pães, bolachas
e cucas alemã (²) Nozes
5 Mandioca Mel
6
Rapadura (melado
amendoim) Rapadura de leite
Bolachas doce e salgada,
tortas, cuca ale Conservas e cristalizados
7 Iogurte e queijo
8 Queijo
9
Rapadura (melado e
amendoim) Rapadura de leite Chimia e conservas Mandioca
10
Rapadura (melado
amendoim)
Rapadura de leite,
requeijão e nata Pães e cucas alemã Geléias
11
Rapadura (melado
e amendoim),
açúcar mascavo
e melado Queijo
12 Queijo
13
Melado, rapadura
(melado
e amendoim) Manteiga e requeijão Pães e cucas alemã Chimia colonial
14 Rapadura de leite
Pães, cucas alemã e italiana (²),
bolacha doce e salgada, tortas
15 ³
Salame, lingüiça porco e mista,
salsichão,
banha, bacon, copa
(presunto italiano)
16 Chimias
17 Melado Queijo Frango Conservas, geléias e doces Mandioca
18 Queijo
19
Pães, bolachas doce e
salgada, cuca ale
20 Cachaça
21
Pães, bolachas doce e salgada,
cuca alemã, salgados (³),
tortas, ravióli (massa)
Conservas
(pepinos)
22 Vinhos
161
e licores
23
Rapadura
(melado e amendoim),
melado
e açúcar mascavo
Mandolate
e Mel
24 Melado e Açúcar mascavo Bolachas
25
Rapadura (melado e
amendoim
26
Salgados,
bolachas doces,
bolos e docinhos
27 Queijo Torresmo e banha
28 Melado
29 Melado
30 Queijo Mel
31 Melado Torresmo e banha Chimia colonial
32 Melado e Cachaça
33
Lingüiça porco e mista,
morcela,
banha, torresmo, frango
34 Frango Pão, bolachas e wafer Conservas, doces e chimias
Conservas
(pepinos)
35 Melado
36 Vinhos
37 Queijo
38
Doces, cristalizados,
rapaduras, passas e cocadas
39
Doces,
cristalizados e conservas
40 Queijo
Pães, biscoitos doces
e salgados,
cuca alemã Doces, conservas e chimias
41
Doce de leite,
ambrosia
e queijo
Biscoitos salgados e doces
Doces, geléias, conservas,
chimias, rapaduras e cristalizados
Notas: (1) - Os Produtos Minimamente Processados PMP - Os Produtos Minimamente Processados PMP - são caracterizados pelo emprego de processamento mínimo,
sendo que os produtos são fisicamente alterados, mas permanecem no estado fresco. Exemplo: Hortaliças e legumes cortados. (HANASHIRO, 2003).Os produtos: mandioca e
noz se enquadram neste segmento, porque a mandioca é comercializada descascada, cortada e embalada e a noz é vendida sem a casca, adicionando valor pelo trabalho dos
agricultores.
Fonte: Elaborado pela autora.
162
APÊNDICE C - Tipos de inovações empregadas e as respectivas famílias que as desenvolvem
Inovações ARFs
Embalagens e apresentação 1 - Potes plásticos 26 - Bolachas sortidas
Consistência do produto 1- Nata e melado consistencias diferentes 39 - Figada consistencias diferentes
Tempero (sal, pimenta) 38 - sal na rapadura, 7- Queijo c/sal e s/sal 33 -Lingüiça com pimenta e sem pimenta
Sabores (recheios, polpa e coberturas) 4 e 5, 14, 10 - Cuca de vários sabores, 38 - Rapaduras de frutas 13 - Geléias de polpas diferentes
Produtos light/diet 3 - Pão integral 4 - Pão integral e de centeio
Concentração do produto 20 - Cachaça (fraca, média e forte)
Tamanho 37 - Queijo 500g 21 - Mini Tortas
Adição de ingredientes/modificação 29 - Água no melado 5 - Palitinho crocante
Tonalidades 35 - Melado (claro e escuro)
Receita de outro país 7 - Queijo - receita da França
14 e 41 - Salgados fritos 21- Mini-pizza e outros salgados 22 - Licor (pessego, morango e abacaxi)
Outros produtos
23 - Bolachas amanteigadas, 32 - Melado 40 - Cuca italiana 34 - Wafer e amendoim açúcarado
Fonte: Elaborado pela autora.
163
ANEXO - Tabela 1 - Transformação ou beneficiamento de produtos agropecuários (produtos e derivados) quanto a forma de comercialização na
região do Corede Jacuí Centro - RS
Canal de comercialização
Entregue a cooperativa Entregue a indústria Entregue ao intermediário Venda direta ao consumidor
Quantidade Quantidade Quantidade
Produtos
Inform Prod. Vend. VP* Inform.
Prod.
Vend. VP Inform.
Prod. Vend. VP Inform. Prod. Vend. VP
TOTAIS
Inform.
Total VP
(R$ mil)
Produção Animal
Carnes
Carne verde de bovinos
1
216
216
389
21
67
64
57
40
70
64
93
539
Carne verde de suínos
2
0
0
0
8
8
6
8
39
16
12
28
36
Carne verde de ovinos
1
0
0
0
5
7
6
8
5
1
0
1
9
Banha
1
0
0
0
29
4
3
5
142
22
17
22
27
Embutidos
1
0
0
0
3
1
1
3
11
4
3
11
14
Toucinho
1
0
0
0
0
TOTAL 1
5
66
238
310
625
Produção Animal
Leite
Creme de leite
2
0
0
0
0
0
Doce de leite
1
0
0
1
7
0
0
2
0
3
Manteiga
2
0
0
0
15
0
0
0
0
0
Queijo ou requeijão
45
23
19
56
157
45
38
148
57
204
TOTAL 48
181
229
207
Produção Vegetal
Cana -de-açúcar
Aguardente de cana
4
8
8
7
15
18
18
22
26
29
Açúcar
2
0
0
0
3
0
0
0
0
0
Melado
16
17
15
18
90
48
42
42
57
60
Rapadura
7
2
2
6
47
29
28
22
30
28
TOTAL 29
155
184
117
Frutas
Frutas cristalizadas
2
0
0
1
1
0
0
0
0
1
Geléia de frutas
2
1
1
1
1
1
Licor de frutas
1
0
0
0
0
0
Pasta de frutas
2
0
0
0
18
2
2
6
2
6
Vinho de frutas
2
2
1
2
1
2
164
Vinho de uva
1
0
0
1
2
0
0
0
0
1
TOTAL 5
26
31
11
Mandioca
Farinha de mandioca
1
5
5
1
5
1
Goma (polvilho de
mandioca)
1
0
0
0
0
0
Outros
0
Fubá de milho
2
0
0
0
0
0
Fumo em rolo ou corda
1
8
8
16
25
14
14
33
8
7
7
14
29
63
TOTAL 1
27
10
38
64
Notas:* O valor da produção é expresso em R$ (mil) para todos os produtos. A abreviatura inform. caracteriza-se pelo número de informantes que possuem uma indústria no estabelecimento que
beneficia ou transforma o produto vegetal ou animal correspondente
.
Fonte: IBGE - Censo Agropecuário 1995/1996
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