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como outra decisão da presidência da Câmara, anunciada em junho de 2009, acerca dos chama-
dos “contrabandos”
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.
De todo modo, trata-se de mais distorções a afetar a legitimidade do processo legislativo.
No conjunto, entretanto, essas decisões ocorridas no primeiro semestre de 2009 configuram, de
fato, um esforço com vistas à redução de atos do Executivo que, na prática, resultam no controle
da pauta do Congresso pelo governo, o que, se pode aventar, fere a sua autonomia institucional,
debilita a sua imagem pública e, sobretudo, desvirtua ainda mais os princípios da representação
política. Mas, como quase tudo o que diz respeito ao Parlamento, um colegiado heterogêneo,
aqui também há interesses em conflito, o que também se evidencia no fato de os deputados
recorrerem aos “contrabandos” para atender demandas de seus financiadores, numa demons-
tração explícita da influência que o campo econômico exerce sobre a política
5
.
Há ainda alguns fatores significativos, além dos que já foram destacados no capítulo primei-
ro, a deslegitimar o Parlamento e debilitá-lo diante da opinião pública. Alguns analistas políticos
se têm inclinado a discordar dos que veem a política brasileira funcionando mal. Questionam
os critérios pelos quais ela é assim julgada e tentam mostrar que o sistema funciona, produz
decisões, não leva à paralisia. Contudo, isso tem um custo grande em termos de legitimidade,
sobretudo porque faz com que a imprensa e a mídia informativa, como também os públicos con-
sumidores de notícias e entretenimento midiático, passem a tratar como escândalo, por exemplo,
4 Não seriam mais admitidas emendas às medidas provisórias, tanto de outros congressistas quanto do seu rela-
tor, que não tratem do tema original da MP editada pelo governo. Reportagem do Valor Econômico registrou
que, “no vácuo legislativo criado pela proliferação de medidas provisórias, o uso de emendas completamente
alheias ao conteúdo original da MPs substituiu os projetos de lei como principal mecanismo de parlamentares
para fazer avançar propostas de sua autoria”. Na mesma matéria, enquanto um lobista do setor empresarial
critica o fato de que tais emendas são introduzidas “sem transparência e sem condições de manifestação da
sociedade”, o jornal também cita off the records um suposto “cacique do DEM” que assim teria explicado por
que não só a base parlamentar aliada ao governo, mas também a oposição se vale dessa manobra: “Só deputado
babaca apresenta projeto de lei hoje em dia”. “Governo e oposição banalizam recurso a ‘contrabando’ em MP”,
reportagem de Daniel Rittner, publicada no Valor Econômico, edição de 10 de junho de 2009, p. 12.
5 “Os grandes lobistas reduziram o espaço do Legislativo em suas agendas desde a chegada de Lula ao poder e
passaram a focar cada vez mais seu trabalho no Poder Executivo”; isso porque, “na definição de um lobista de
grande empreiteira”, “no estilo de governar petista o Executivo é o todo-poderoso e o Parlamento está no chão”.
Ainda de acordo com a mesma fonte ouvida “em off”, o financiamento privado de campanhas eleitorais “induz a
um acesso desigual de empresas a tomadores de decisão” – além disso, como o processo legislativo passou a ser
definido no governo, restou aos deputados, como reação, passar “a usar emendas às MPs para agradar e atender
demandas de seus financiadores”. “No governo Lula, grupos concentram seus esforços no Executivo”, reporta-
gem da Folha de S.Paulo, publicada em 7 de junho de 2009, p. 8.