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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
ESCOLA DE ECONOMIA DE SÃO PAULO
FERNANDO CARDOSO COTELO
REVITALIZAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE SÃO PAULO E HABITAÇÃO
POPULAR:
microeconomia e microgeografia
SÃO PAULO
2008
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FERNANDO CARDOSO COTELO
REVITALIZAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE SÃO PAULO E HABITAÇÃO
POPULAR:
microeconomia e microgeografia
Tese apresentada à Escola de Economia
de São Paulo da Fundação Getulio
Vargas, como requisito para obtenção
do título de Doutor em Economia de
Empresas
Campo de conhecimento:
Microeconomia aplicada
SÃO PAULO
2008
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FERNANDO CARDOSO COTELO
REVITALIZAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE SÃO PAULO E HABITAÇÃO
POPULAR: microeconomia e microgeografia
Tese apresentada à Escola de Economia
de São Paulo da Fundação Getulio
Vargas, como requisito para obtenção
do título de Doutor em Economia de
Empresas
Campo de conhecimento:
Microeconomia aplicada
Data de aprovação:
___/___/_____
Banca examinadora:
________________________________
Prof. Dr. Ramon Garcia Fernandez FGV-
EESP (orientador)
________________________________
Prof. Dr. Fernando Garcia
FGV-SP
________________________________
Prof. Dr. Sergio Goldbaum
FGV-EESP
________________________________
Prof. Dr. Danilo Igliori
FEA-USP
________________________________
Prof. Dr. Rodrigo Moita
Ibmec São Paulo
Apresentação e agradecimentos
Resolvi incluir na monografia essa apresentação que conta um pouco da historia de como foi
concebida e como evoluiu a pesquisa ao longo de seus dois anos de execução, a aventura da
coleta de dados e também comentários sobre algumas críticas e observações que surgiram por
ocasião da defesa da tese. Este texto pretende ser informal e não vou aqui citar fontes
acadêmicas.
Quando comecei a estudar o problema dos imóveis abandonados no Centro Histórico de São
Paulo não tinha a menor idéia de onde a pesquisa ia me levar. A idéia inicial surgiu após eu
participar como distinto público de uma apresentação de membros da Secretaria Municipal de
Habitação a uma audiência no SECOVI.
Aprendi que havia muitos imóveis “abandonados”, que os movimentos sociais de sem-tetos
promoviam invasões a esses imóveis ou como os membros dos movimentos preferem chamar,
“ocupações” e que a Prefeitura tinha planos de transformá-los em “habitações para a
populaç~o de baixa renda”.
Em princípio, gostei da idéia de que prédios desocupados pudessem ser reformados e postos à
disposição para abrigar famílias de baixa renda.
Sempre tive simpatia pelo Centrão. Estudei direito no Largo de São Francisco de 1994 a 1998.
Achava muito melhor do que estudar no campus da Cidade Universitária, porque ali saíamos e já
estávamos na rua, no meio daquele movimento e da diversidade toda. Naquela ocasião, eu
conhecia muito bem o Centro. Pensava que conhecia. Na verdade andava pelos calçadões da e
da República quase sempre desviando dos camelôs e de vez em quando comprando algo deles.
Na havia a estação de metrô, ao lado o Páteo do Colégio e o conjunto arquitetônico ao seu
redor, que é bonito, agora m até um restaurante bacana e íamos visitar. Também
freqüentávamos o comércio local quando o produto o tinha pra comprar no camelô. No
calçadão da República havia o Teatro Municipal, o Mappin, cujo prédio imponente hoje está
praticamente vazio (foto 181660293.JPG ) e as livrarias da Rua Barão de Itapetininga. Depois
passei a freqüentar também a região da Rua Santa Ifigênia para comprar equipamentos de
informática.
Aquilo acontecia de dia, porque à noite a coisa era outra. Tínhamos medo de caminhar pelos
calçadões e era comum que os estudantes do Largo que saíam das aulas às onze horas da noite e
tomavam ônibus no terminal da Praça da Bandeira formassem grupos para percorrer os 250
metros do portão do prédio da faculdade até o terminal passando pela Rua do Ouvidor. Os que
tomavam o metrô na Praça da passavam mais medo ainda caminhando 400 metros pelas
Ruas Senador Feijó ou Benjamin Constant àquela hora desertas e sinistras. Não existia bilhete
único em São Paulo, mas não teria sido idéia pagar uma passagem de ônibus a mais pra
atravessar o terminal da Bandeira e usar a passarela pra chegar ao Metrô Anhangabaú com mais
iluminação e segurança. Os professores, os alunos mais ricos e os demais paranóicos
estacionavam seus carros no edifício garagem quase em frente à escada que acesso ao porão
do Centro Acadêmico XI de Agosto, na Rua Riachuelo, único lugar que ficava aberto até mais
tarde naquelas quadras.
Fui umas poucas vezes à Sala São Paulo, uma sala de concertos sofisticadíssima construída na
obsoleta estação de trem da Estrada de Ferro Sorocabana. O prédio fica em frente à Praça Júlio
Prestes onde, do outro lado, está a antiga rodoviária, agora um shopping popular, cujo prédio
parece uma vers~o barata do “Cubo d’|gua” das olimpíadas de Pequim.
Aquela é uma das regiões mais perigosas do Centro à noite. Fica a poucas quadras da famigerada
Cracolândia que, como o nome sugere, é local de consumo e venda de drogas. Como todos,
deixava o carro na porta da sala com o manobrista caríssimo para recuperar o veículo no mesmo
lugar e sair correndo dali.
Como todos os paulistanos, muitos turistas e algumas paulistanas, também conhecia os
arredores da boate Love Story, em frente ao Edifício Copan, manjada região de cabarés, até hoje
bastante freqüentada por todo tipo de pessoas a noite inteira e, por isso mesmo, muito mais
segura do que a da sala de música erudita. O térreo do Edifício Copan é de uso comercial e
bares e restaurantes que ficam abertos até tarde, gerando uma movimentação que se articula
com a Praça Roosevelt que abriga bares, restaurantes e teatros. Esse é o pedaço do Centro aonde
ninguém tem medo de ir à noite.
Voltando aos imóveis degradados, desde a década de 1990 essa tendência já se fazia notar
apesar de alguns esforços do Poder Público como a reurbanização do Vale do Anhangabaú do
final da década de 1980 e outras iniciativas, entre as mais recentes a mudança da sede da
prefeitura para o antigo prédio do Banespa, o Edifício Matarazzo, na Praça do Patriarca.
Quando comecei o estudo de campo havia um grande estardalhaço midiático em torno da
invasão de prédios abandonados no Centro por movimentos organizados de sem-tetos. Depois
vim a descobrir que os prédios invadidos eram pouquíssimos e que muito do que era
conhecimento comum sobre o Centrão ou era mito ou era irrelevante.
Procurei informações sobre a magnitude do problema, quantos prédios estavam nessa condição,
quantas pessoas poderiam ser alojadas, não consegui obter respostas diretas. Saí atrás de
pessoas que tinham contato com a administração e entidades interessadas e as respostas que
obtive sempre soavam como: “isso é possível ser calculado a partir da planta do IPTU”, ou “é
possível verificar se o imóvel est| fechado consultando o registro de imóveis”, mas nunca
consegui chegar a informações sistematizadas; algo que eu pudesse colocar numa planilha do
Excel e estimar a magnitude de áreas ociosas de que estávamos falando, por exemplo. Percebi
que a relevância do meu trabalho dependia de informações às quais eu não tinha acesso.
Isso me incomodou muito, porque eu achava que era importante estudar aquele programa de
habitação. Aquilo representava algo novo e criativo. Mas ao mesmo tempo eu não queria estudar
algo, por mais revolucionário e empolgante que fosse, sem antes procurar entender qual seria
seu impacto em relação à necessidade de revitalização do centro.
Ainda que o programa pudesse ser bem-sucedido no sentido de ser levado a cabo pela
administração seguinte e ter visto serem concretizados todos os seus projetos, eu não tinha idéia
do que isso representava em relação ao que o discurso comum entende como uma espécie de
“morte” urbana que necessita de uma “revitalizaç~o”.
Eu sabia que a via cartorária não era uma alternativa, mas tinha algum conhecimento de
geoprocessamento e descobri que o Google Earth vendia um serviço barato que me permitia
riscar polígonos na foto do satélite. Eu precisava traçar polígonos que tivessem uma precisão de
pelo menos alguns metros. Para o município de São Paulo a qualidade da foto é compatível com
tal precisão.
Resolvi então, junto com a Lígia Kiss, que é antropóloga, imaginar um questionário que eu faria
ao imóvel perguntando sobre sua condição de abandono. O que fizemos basicamente foi nos
perguntar, como, dentro desta população de seres que não podem se comunicar conosco
selecionaríamos aqueles que nos interessam investigar mais a fundo. O critério mais ingênuo era
o critério estético; se o prédio “parecia abandonado”, tinha pichações pela fachada, vidros
quebrados e outros indicadores mais sutis de abandono, seria importante que se encontrasse
alguma pessoa familiarizada com os arredores para fornecer informações mais detalhadas.
Acho importante narrar a cronologia da coleta de dados porque acredito que foi a melhor
oportunidade que tive de aprender alguma coisa sobre o “centr~o”. Deirdre Mc Closkey, em
algum lugar, disse que pra ficar bom não basta ter lógica, fatos e metáforas tem que ter também
uma dimensão narrativa.
O leitor certamente vai aproveitar melhor a leitura se tiver um computador conectado à internet
com o software Google Earth instalado. Ele pode ser encontrado em:
http://earth.google.com.br/intl/pt-BR/download-earth.html
As fotos estão no endereço:
http://picasaweb.google.com.br/fcotelo/TeseDeDoutoradoRevitalizaAoDoCentroHistoricoDeSa
oPauloEHabitaAoPopular?feat=directlink
Outras fotos que foram tiradas durante a pesquisa de campo e estão referenciadas nesta
apresentação, mas não correspondem a prédios que fizeram parte do banco de dados podem ser
encontradas em: http://picasaweb.google.com.br/fcotelo/TeseFotosExtras?feat=directlink
Os traçados dos percursos e outras informações sobre o banco de dados podem ser requisitados
pelo meu email: [email protected]
Começo então com a narrativa da coleta de dados e em seguida apresento brevemente a
evolução das idéias e comento algumas observações e críticas da banca.
Dia 12 de março de 2007, parti a campo para o teste das fichas que fiz com a Ligia, uma câmera
fotográfica e uma prancheta. Na quadra da frente da saída do metrô Sé o primeiro prédio que eu
vi parecia suspeito. Tinha as lojas em baixo funcionando e o primeiro andar estava ocupado.
Os de cima tinham janelas quebradas, grades dos balcões corroídos, teto desabando. Um senhor
em um dos botequins me perguntou o que estava fazendo e me disse: “Quer ver prédios
abandonados, uma volta nessa quadra que você vai ver!”. Foi isto que eu vi: fotos
060010015.JPG, 060020019.JPG, 060030020.JPG, 060040023.JPG, 060050025.JPG. Depois fiz o
meu conhecido percurso da Praça da ao terminal de ônibus da Praça da Bandeira. Três horas
de caminhada e já tinha encontrado uns dez prédios caindo aos pedaços!
Entre o dia 12 e o dia 14 eu consegui marcar os polígonos referentes aos prédios que tinha
encontrado na foto do satélite e fui mostrar pro Robert Nicol, Paulo Sandroni e Fernando Garcia.
Os três ficaram animados e eu também fiquei.
Como o programa da secretaria de habitação considerava os “treze distritos centrais”, resolvi
fazer uma viagem a campo desta vez começando pela Avenida Brigadeiro Luís Antônio a partir
da Avenida Paulista procurando cobrir todas as quadras até a Avenida Vinte e Três de Maio e
chegar o mais próximo possível do centro. Era para estimar a viabilidade de uma cobertura dos
treze “distritos centrais”. Isso foi no dia 15 de março. Percebi que havia muito mais terrenos
sendo utilizados como estacionamentos do que imóveis abandonados propriamente ditos.
Percebi também que não conseguiria, naquele ritmo e sozinho, fazer o levantamento de todos os
treze distritos centrais. Resolvi me concentrar nos distritos e República, até porque quase
todos os projetos do PAR estavam ali, mas resolvi também contar os estacionamentos, uma vez
que me pareceram “terra ociosa”.
Nos dias 19, 21 e 23 de março percorri os calçadões da Sé e da República. Encontrei uma
quantidade enorme de prédios em péssimas condições (as fotos cujos nomes começam com 01,
06 e 18 mostram prédios encontrados nos calçadões). Além da admiração de encontrar prédios
bonitos como esses (fotos 060480130.JPG, 060560138.JPG, 060580140.JPG, 060650151.JPG,
060970200.JPG), o que me chamou mais a atenção foi a gentileza e cooperação com que os
porteiros vinham me fornecer informações, nostálgicos, contando a história da decadência do
lugar, de como os conjuntos comerciais iam se esvaziando e, no fundo, achando divertido que eu
estivesse ali quebrando o tédio quotidiano de guardar a portaria de um edifício fantasma. Ali
está a maior parte dos prédios que chamei de subocupados.
No dia 26 de março cobri uma área enorme. Comecei pelo Hotel Hilton e avancei em direção à
Praça da República visitando as quadras que se situam entre a praça e o Largo do Arouche,
reduto gay do Centro. Praticamente encontrei estacionamentos e um terreno onde se
preparava o canteiro de obras para o lançamento do único prédio residencial que encontrei.
Passei para o outro lado da Avenida São João na altura da Rua General Osório e encontrei um dos
prédios requalificados que estavam prontos (foto 141960330.JPG) para constatar que a obra
estava praticamente finalizada alguns meses e não havia sido entregue. Fui ao local em
outubro de 2008 e a situação ainda era a mesma!
A região que forma um triângulo entre as Avenidas São João, Rio Branco e Duque de Caxias está
repleta de edifícios residenciais enormes com muitos apartamentos minúsculos por andar fotos
(14XXX0356.JPG, 14XXX1742.JPG). Com exceção dos estacionamentos, o resto da terra não está
ociosa, está superlotada. Tomei meu primeiro susto durante a pesquisa, quando já no final do dia
e cansado, tirava uma foto de um estacionamento e, quando olhei atrás de mim, vinha em minha
direção um grupo de jovens e crianças enroladas em cobertores imundos e atrás delas estava
uma outra turma fumando crack embaixo da marquise de um desses “treme-tremes”. Consegui
escapar elegantemente (isto é, sem sair correndo desesperado), mas já antevendo o que viria
nos dias seguintes, quando teria que visitar a Baixada do Glicério, uma área relativamente longe
dali e considerada “barra-pesada”, além da famosa “Cracol}ndia”
No dia 27 de março o queria passar por apuros novamente então iniciei a visita pela Praça
Roosevelt e me ocupei das quadras que se estendem até a Praça da Bandeira dos dois lados da
Avenida Nove de Julho e além para a Avenida Vinte e Três de Maio. De novo a maior parte do que
vi eram estacionamentos. Chamou-me a atenção um prédio gigantesco do INSS em ruínas
(205841917.JPG) na Avenida Nove de Julho e, na Rua Asdrúbal do Nascimento, uma rua que
devia ter-se situado em uma quadra nobre antes da construção da Avenida Vinte e Três de Maio,
mas que depois ficou exposta ao barulho e à poluição, dois prédios residenciais, um invadido e
outro sendo reformado para o PAR (foto 212630428.JPG, 212640431.JPG ).
O dia 29 de março foi o dia mais bonito da pesquisa de campo. Estava quente, mas o céu estava
azul e não estava muito úmido. Tirei várias fotos da cidade que não tinham a ver com a pesquisa,
pois eram prédios que não estavam desocupados e outras curiosidades, exceto pelo famoso
Edifício São Vito (foto YYXXX0478.JPG), que ficou de fora da área de pesquisa. Foi puro deleite
estético. Deixei o metrô na estação São Bento e desci a Ladeira Porto Geral, conhecida de todas
as senhoras que fazem compras nas quadras da Rua Vinte e Cinco de março, o maior centro de
comércio popular de produtos têxteis do Brasil. A idéia era passar por todas as quadras da Vinte
e Cinco de Março e caminhar para o norte até onde desse. Não foi muito surpreendente que não
encontrei muitos prédios em condições de abandono, como ocorreu em todas as regiões onde a
atividade econômica é pujante, tanto que a visita foi rápida e deu tempo de atravessar a Avenida
Senador Queiroz e cobrir também as quadras até a linha de trem, no limite norte do distrito Sé.
Assim que desci a Ladeira Porto Geral percebi algo que não tinha visto nos dias anteriores. Havia
prédios que, à primeira vista, pareciam subutilizados, pois não havia movimento nos andares
superiores (foto 04XXX0459.JPG). Entretanto também não havia pichações nem janelas
quebradas, todas as janelas tinham cortinas ou estavam pintadas de preto. Quando comecei
ingenuamente a perguntar se os andares estavam desocupados não recebia mais a atenção e a
gentileza dos porteiros dos prédios dos calçadões. Na verdade recebia respostas evasivas e caras
feias. Percebi que estava incomodando e que me estavam escondendo algo. Olhando com mais
cuidado, dava pra ver que atrás das janelas que não estavam cobertas havia prateleiras com
mercadoria, fardos de tecido, peças em embalagens vultosas. Então o que estavam escondendo
era o fato de que todos os andares de prédios onde antes havia escritórios, na verdade estavam
sendo utilizados como depósito de mercadorias e que, provavelmente, haveria alguma
ilegalidade envolvida.
Para piorar a minha situação, o prefeito Kassab estava em plena luta contra a publicidade ilegal e
a poluiç~o visual na cidade, com a chamada “Operaç~o Cidade Limpa”, aplicando multas pesadas
a quem desrespeitasse a nova regulamentação, muito mais restritiva que a anterior, para a
colocação de letreiros nas fachadas das lojas. Em uma cidade onde o Poder Público, quando
aparece geralmente é para reprimir, os lojistas vêem um sujeito estranho ao local, com uma
prancheta na mão e uma máquina fotográfica, imediatamente imaginam que seja inimigo, e
inimigo deve ser tratado como inimigo...
Percebi que, dali para frente teria que dividir meu tempo entre fazer o que tinha que fazer para a
pesquisa, ou seja, tirar as fotos e marcar as fichas de campo e também tentar convencer as
pessoas de que não era agente da prefeitura, que era estudante, queria o bem da cidade,
precisava e merecia a cooperação deles. Eu não tenho muito talento pra isso; que dificuldade!
Dia 2 de abril resolvi começar pela Rua Florência de Abreu. Esta rua é conhecida por ser uma
região de comércio especializado em metalurgia e ferramentas. Ao longo dela existe um conjunto
arquitetônico tombado, com casas de três andares e fachada eclética. Encontraram-se ali muitos
imóveis degradados e, até então, para mim, a maior manifestação de um fenômeno pico das
ruas próximas aos calçadões: muitos desses casarões têm seu andar térreo utilizados como
estacionamento enquanto os andares superiores servem simplesmente como cobertura. Ao que
parece, não incentivos econômicos para a manutenção das casas. As rendas derivadas das
vagas de estacionamento são suficientes para manter o imóvel nas condições em que se
encontram. (fotos 033140557.JPG 033110560.JPG 033180564.JPG). Muitos dias depois eu
encontrei uma manifestação mais extrema deste fenômeno em outro local próximo a este.
Do outro lado da Avenida Senador Queiroz executavam-se as obras da Linha Amarela do metrô,
de modo que alguns dos imóveis que foram encontrados abandonados podem ter sido objeto de
desapropriação e isso foi difícil de identificar. Entre a Avenida Prestes Maia e a Rua General
Couto de Magalhães a maior parte dos imóveis encontrados era composta por galpões servindo
como estacionamentos. Neste dia encontrei três dos poucos imóveis ocupados por movimentos
de sem-teto; um no começo da Rua Florêncio de Abreu e outros dois mais ao norte, no distrito
República (fotos 033080546.JPG, 133280578.JPG e 133440608.JPG).
Dia 4 de abril finalmente resolvi enfrentar o que eu imaginava que havia de pior: começaria
pelas ruas ao sul do Forum João Mendes, próximo à Praça da Sé e visitaria as quadras da
Liberdade até os viadutos que passam por cima da Ligação Leste-Oeste e depois, se fosse
possível, rumaria para a Baixada do Glicério. Desci a Rua Galvão Bueno e subi a Rua da Glória até
o fórum de novo e então desci a Rua Conde de Sarzedas, cujo final, juntamente com a Rua Oscar
Cintra Gordinho (é Gordinho mesmo!) e a Rua Helena Zerrener formam uma quadra trapezoidal
que é o centro da Baixada do Glicério. Vale a pena olhar a foto de satélite. A quadra inteira é
formada por prédios gigantescos, um colado na parede do outro, com milhares de apartamentos
do tipo kitchenette. São milhares mesmo, o cálculo que fiz a partir do universo do CENSO mostra
uma densidade de aproximadamente novecentos domicílios por hectare em um dos pontos
desse polígono.
Quando virei a esquina da Conde de Sarzedas com a Cintra Gordinho admirei a parede de
edifícios com fachadas horrorosas, sem marquises de proteção, repletas de pichações, caindo aos
pedaços, milhares de janelinhas e seus varais de roupas coloridas de todos os tamanhos
penduradas para fora. Chamou-me a atenção a predominância de peças de cor vermelha.
Naquele início de uma tarde muito cinzenta parecia o cenário da parte pobre da metrópole do
Blade Runner.
Pensei: “se atirarem alguma coisa na minha cabeça vai ser impossível, e fútil, tentar saber de
onde vem”. Senti que estava correndo perigo e entrei em um bar-padaria. A moça do balcão me
viu fantasiado de prancheta e câmera e fez cara de espanto: “o que esse maluco acha que est|
fazendo aqui?” N~o teve simpatia, n~o teve sorriso, n~o teve nada.
Pedi uma coca-cola pra ganhar tempo, olhar meu mapa e escolher uma rota de escape. Escondi a
prancheta e a câmera dentro da mochila e continuei pela Cintra Gordinho na esperança de
conseguir chegar à Rua Tabatinguera sem levar objetos na cabeça ou tropeçar em uma das
várias pessoas chapadas na calçada; a essa altura já estava apavorado pensando até em facada e
tiro. Durante a fuga deu pra espiar os crackeiros que tomavam conta da praça, zumbis cobertos
com seus panos imundos fumando seus cachimbinhos. Respirei aliviado quando consegui sair
dali.
Por teimosia ainda visitei outras quadras até que, finalmente, atiraram da janela de um dos
prédios um pote desses de maionese tampado cheio de água; acho que era água. Caiu a uns
dois metros de mim. Resolvi dar por encerrada a visita a campo daquele dia e tive vontade de
desistir de tudo. Depois vim a descobrir que a região é controlada pelo PCC (Primeiro Comando
da Capital, uma facção do crime organizado que controla o tráfico de drogas e faz mais outras
maldades em São Paulo) e que ninguém que não é da área entra sem ser anunciado.
Fiquei uma semana em casa fazendo o trabalho de interpretar a foto do satélite e tentar
encontrar as divisas dos terrenos e prédios e pensando se deveria comprar um capacete. Agora
já tinha alguma noção dos padrões de desocupação encontrados, e dei um tempo para me
recuperar do trauma.
Dia 11 de abril foi a vez das quadras da Rua Santa Ifigênia, território conhecido, local onde se
encontram lojas especializadas em eletrônica, iluminação, e instalações elétricas, comércio
frenético. Como na região da Rua Vinte e Cinco de Março, já esperava um padrão do tipo poucos
imóveis desocupados e alguns terrenos utilizados como estacionamentos. Cuidado pra não dar
pinta de fiscal. A nordeste da Rua Santa Ifigênia, próximo à antiga estação de trem onde hoje
funciona a Sala São Paulo, havia uma certa concentração de imóveis ociosos. Ali é onde costuma
ficar a chamada “Cracol}ndia”. Eu digo “costuma ficar” porque a Cracol}ndia n~o tem
exatamente um endereço fixo. O que sei sobre isso é pelos noticiários policiais. Os pequenos
traficantes e usuários podem se deslocar pelas quadras da Rua General Osório e passar para o
outro lado da Avenida Rio Branco até a Rua Vitória, dependendo de como as operações policiais
estiverem atuando, mas preferem ficar perto da Sala São Paulo por algum motivo. E um
problema endêmico daquela região toda. Foi na Rua Vitória, e não na General Osório que eu
tomei o susto do dia 26 de março. Neste dia não senti medo. Na hora do encerramento do
comércio percebi a correria das pessoas para irem embora. Elas corriam bem.
A impressão geral que tive foi que é uma região que tem em comum com a região da Rua Vinte e
Cinco de Março o fato de ser um comércio especializado de abrangência nacional. Ao contrário,
porém, da Vinte e Cinco, nas quadras ao redor da Rua Santa Ifigênia muitos prédios
residenciais e de uso misto, ao estilo daqueles encontrados do outro lado da Avenida Rio Branco,
enormes e com apartamentos minúsculos (fotos de um dos piores: 12XXX1736.JPG
11XXX1738.JPG, atenção ao detalhe da arvore na parede da cobertura). Uma vez fiquei em frente
à portaria de um desses edifícios residenciais para esperar um sujeito que me vendia um cabo de
vídeo “ir peg|-lo no estoque”.
Dia 19 de abril foi a vez de visitar as quadras próximas ao Minhocão, como é popularmente
conhecido o Elevado Costa e Silva, uma via elevada construída na década de 1970 que é objeto
de controvérsia entre urbanistas até hoje. Foi criada para possibilitar uma ligação expressa entre
a chamada Ligação-Leste-Oeste e os bairros Zona Oeste da cidade. O elevado, que passa por cima
da Avenida Amaral Gurgel e de uma parte da Avenida São João, muito rente aos edifícios,
trazendo sujeira e barulho, desvalorizou imóveis antes considerados nobres e contribuiu para
causar um tremendo dano estético à área. Como conseqüência disso, houve incentivos contrários
à construção de novos edifícios no local e vários terrenos tornaram-se estacionamentos. Muitos
argumentam a favor de sua remoção.
A ida a campo seguinte só aconteceu no dia 4 de junho. Deixei para o final os setores
correspondentes à região da Bela Vista. Sabia que aquela região era uma das menos dinâmicas
do Centro e olhando a foto do satélite, que encontraria galpões velhos utilizados como
estacionamentos, como se confirmou. A surpresa desse dia foi encontrar quase uma quadra
inteira de prédios que pertenciam ao Grupo Silvio Santos próximos à Rua Santo Antônio
totalmente desocupados e mais outros tomando uma grande parte da quadra formada pela Rua
Abolição, Rua Jaceguai e Rua Santo Amaro, pertencentes ao mesmo grupo.
As idas a campo dos dias 3 e 9 de setembro foram só para arrematar umas últimas quadras que
faltavam na Avenida Nove de Julho e Prestes Maia. No dia 3 pude contar com a ajuda da Sheila
Mattar e no dia 9 da Anita Rondon. Preciso deixar registrado como dica para aqueles que
quiserem fazer um estudo semelhante: quando fizerem pesquisas de campo em situações hostis,
incluam mulheres no grupo. Por algum motivo que os psicólogos certamente poderão explicar
melhor do que eu, as pessoas respeitam mais e se dispõem melhor a cooperar.
Passei o ano de 2007 e uma parte de 2008 no esforço de coleta e tabulação desses dados. Como
não dispunha de um mapa que me mostrasse o contorno dos terrenos, tive que desenhá-los de
uma forma aproximada. As fotos de satélite precisam ser interpretadas com cuidado, porque
formam uma “colagem” de seções em forma de grandes ret}ngulos e, dependendo do ângulo que
mostram e da iluminação, apresentam características peculiares. Algumas são muito fáceis e
algumas são muito difíceis de interpretar. É tudo um pouco “artesanal”.
Quando a tabulação e a transferência da interpretação da foto do satélite para o sistema de
geoprocessamento (GIS) ficou pronta, a quantidade de informações que surgiram tornou claras
algumas questões, e ao mesmo tempo mudou o foco da pesquisa original.
A quantidade de imóveis descobertos foi tão maior do que a de projetos PAR que, na prática,
mostrou como a intervenção planejada era pequena em relação ao potencial de áreas
subutilizadas. Só este fato já bastou para me desanimar com a pesquisa original, pois percebi que
todo aquele programa que estudava era, no fundo, mais uma intervenção ad hoc. A análise do
próprio banco de dados e dos seus cruzamentos com outros bancos de dados disponíveis,
mostrando mais de quinhentos imóveis subutilizados passou a ser mais interessante do que o
programa de requalificação em si. Acabei me empolgando muito mais com o banco de dados e o
estudo da parte institucional do Programa de Arrendamento Residencial ficou restrito a um
capítulo.
Uma vez que o programa foi descontinuado, talvez, em parte, por algumas razões que serão
levantadas aqui, esse estudo pormenorizado não me parece mais relevante, a não ser que
resolvam reeditar o programa.
Por ocasião da defesa da tese, houve uma série de observações dos membros da banca. O
regimento da Escola de Economia permite que sejam feitas alterações no texto no prazo de trinta
dias a partir da data da defesa para eventualmente incluir sugestões da banca. Ficou combinado
entre nós que o texto não seria alterado, a não ser por alguns erros encontrados. Apenas essa
apresentação foi incluída.
Ficaram sugestões para três possíveis artigos aproveitando o que se aprendeu com a coleta e
processamento de dados primários. Um histórico, explorando a seqüência de intervenções
urbanas para procurar entender as peculiaridades das distribuições de imóveis em condições de
abandono e subutilização. Um artigo metodológico, explicando mais detalhadamente a forma da
coleta de dados e outro empírico procurando testar outras especificações estatísticas e
configurações geométricas para a medição das variáveis.
Uma das questões abordadas pela banca foi sobre a extensão da área de coleta de dados. Foi
argumentado que a fronteira é influenciada pelas quadras adjacentes e é verdade. Mas eu tinha
que decidir onde parar para não enlouquecer. Para se ter uma idéia, a área dentro dos distritos
e República coberta foi de aproximadamente 4km². Não fiz as contas para saber quantos
quilômetros caminhei ao longo das vias, mas se resolvesse estender minha cobertura para
incluir mais duas quadras, tomando como referência uma quadra de 100m, a área adicional a ser
coberta seria de aproximadamente 2km², a metade do que eu tinha feito. Eu não conseguiria
fazer sem assistência.
Outra questão foi a escolha do aparato teórico. Quando vi aquela nuvem de pontos não consegui
imaginar aquilo fazendo sentido no contexto das teorias de economia urbana que eu conhecia,
principalmente para a escala de trabalho que eu escolhi.
Mas o propósito da tese não era montar uma discussão teórica e sim encontrar algum arcabouço
teórico que me permitisse olhar os dados, criar um discurso coerente e extrair informações que
pudessem me dizer algo sobre a política pública que eu estava estudando.
Recebi críticas da banca por não ter-me aprofundado no estudo dos modelos analíticos mais
recentes e mais sofisticados e ter-me utilizado de um modelo menos matemático e mais
interpretativo. Ao meu ver, o modelo que utilizei é operacional porque consegue reunir
elementos de várias famílias de teorias e montar um discurso coerente e útil para a análise de
um problema de tal complexidade.
De qualquer forma, acredito que, se o trabalho tiver sido capaz de ilustrar e analisar o problema
de uma maneira inovadora, terá valido a pena.
Este trabalho, por seu caráter interdisciplinar, criou oportunidade para que eu tivesse muitas
conversas instrutivas e divertidas com pessoas das mais variadas formações acadêmicas.
Os agradecimentos institucionais que gostaria de fazer são em primeiro lugar à Fundação
Getúlio Vargas, à qual devo a maior parte da minha formação acadêmica e que me concedeu uma
bolsa de estudos, ao Lincoln Institute of Land Policy, por um fórum de discussão e por outra
bolsa de estudos e ao Regional Economics Applications Laboratory (REAL) da Universidade de
Illinois em Urbana-Champaign, pela gentil recepção em um programa de intercâmbio.
Quanto às pessoas, pude contar com o luxuoso auxílio de tantas, que corro o risco de esquecer-
me de todas agora. Começando por aqueles que estiveram mais diretamente envolvidos, quero
agradecer ao Bruno Hermann, que além de um excelente economista, foi para mim um grande
professor de geoprocessamento, na maior parte do tempo por telefone. Sergio Goldbaum e
Fernando Garcia me ajudaram na elaboração da estrutura do texto e na econometria, Ramon
Garcia foi menos técnico, mas o menos entusiasmado e de uma generosidade infinita. Ciro
Biderman me despertou o interesse, me iniciou nos estudos econômicos urbanos e ainda me
possibilitou a participação no programa de intercâmbio nos Estados Unidos do qual falei. Esta
oportunidade foi-me muito proveitosa no aprendizado de técnicas para mim então
desconhecidas e no amadurecimento das idéias; agradeço ao Ciro.
Quero também agradecer a outras pessoas, porque contribuíram para a pesquisa, direta ou
indiretamente, por meio de discussões e sugestões inteligentes: Paulo Sandroni e Robert Nicol
foram os primeiros entusiastas com relação à idéia da produção do banco de dados original. Luiz
Carlos Bresser-Pereira e Paulo Furquim deram um tremendo apoio institucional, sem o qual a
tese não teria chegado ao fim. Maria Fernanda Derntl, Camila Maleronka e Paulo Portugal
Moreno me apontaram fatos que eu não saberia se não fossem arquitetas e, no caso do Paulo um
engenheiro, que têm mais familiaridade que eu com a história da urbanização da cidade.
Geoffrey Hewings, diretor do REAL, me recebeu com sua internacionalmente famosa simpatia.
Ele e Jan Brueckner, também da Universidade de Illinois, me tranqüilizaram em relação à
complexidade do tema ao me incentivarem a deixar um pouco de lado a ortodoxia para que não
perdesse o foco da questão prática a ser tratada. Ricardo Stefani e José Luiz de Cápua me
mostraram as entrelinhas do funcionamento dos programas de financiamento, coisas que não
estão escritas em nenhum lugar. Carlos Eduardo “Cadu” Lobo, Rodrigo Moita, Mariana Oliveira,
Egle Spinelli, Eduardo Correa tiveram muita paciência por me escutarem falar
interminavelmente sobre esta pesquisa. Aproveito esta ocasião para agradecer a todos os outros
que eu possa ter esquecido. Ligia Kiss me ajudou a elaborar as fichas de campo e Sheila Mattar,
Anita Rondon, Ivana Kapuśińsky e Evelyn Vivian de Lima me ajudaram no processamento de
dados primários. Esther Dweck e Filipe Pereira me incentivaram a escrever a apresentação.
Finalmente, Fatima Freires me acompanhou durante a revisão final do texto, mas,
evidentemente, está isenta de qualquer responsabilidade em relação ao resultado da redação
final.
Rio de Janeiro, 11 de fevereiro de 2009
RESUMO
Esta tese de doutorado estuda a produção de unidades habitacionais para famílias de baixa
renda coordenada com o programa de revitalização da região central do município de São Paulo.
O estudo recupera o discurso da teoria microeconômica tradicional aplicada a estudos urbanos e
o contrapõe a um discurso alternativo. Foi criada uma base de dados original na forma de um
levantamento dos imóveis subutilizados nos distritos e República a partir de visitas a campo,
com observações diretas dos imóveis e utilizando técnicas de identificação por imagens de
satélite e sistemas de geoprocessamento para avaliar a extensão e os padrões da degradação
imobiliária. Os resultados da análise do banco de dados demonstram a plausibilidade do
discurso alternativo e apontam para alguns fatores significativos que contribuem para o atual
estado de degradação. Retoma-se então a análise da política de repovoamento da região central
por meio de um programa de moradias para famílias de baixa renda e mostra-se como as
técnicas empregadas permitem avaliar as razões para o baixo desempenho dessa agenda política
no contexto de um amplo programa de revitalização urbana.
Palavras-chave: revitalização urbana, habitação, teoria economia urbana, uso do solo urbano
ABSTRACT
This doctoral dissertation is a research on the production of low-income housing in a context of
a revitalizing programme for the central districts of São Paulo. The argument revisits the
mainstream urban microeconomic approach and confronts it with an alternative theoretical
approach. To this purpose, in order to access the extension and geographical pattern of
degradation, a field study was conducted through actual observation of underoccupied real
estate traits and their identification in satellite images as well as data treatment using
geographical information systems. The data corroborate the plausibility of the alternative
approach and indicate some of the local socioeconomic characteristics that contribute to the
present state of degradation. The data analysis then suggests factors that may have lead to the
poor performance of the low-income housing production programme in the larger downtown
revitalization agenda.
Keywords: urban revitalization, housing, urban economics, urban land use
Índice
1 Introdução ................................................................................................................................................................ 23
2 A teoria da localização urbana tradicional e a abordagem heterodoxa.......................................... 32
2.1 A abordagem tradicional .......................................................................................................................... 32
2.2 A teoria da localização urbana ............................................................................................................... 32
2.3 A abordagem heterodoxa ......................................................................................................................... 47
3 Análise empírica .................................................................................................................................................... 56
3.1 Análise descritiva do banco de dados ................................................................................................. 56
3.2 O “problema da |rea unit|ria modific|vel” ...................................................................................... 60
3.3 Análise de padrões espaciais e pontuais ............................................................................................ 60
3.4 Análise de aleatoriedade dos padrões de contigüidade de renda e educação em várias
escalas utilizando o coeficiente de Moran I..................................................................................................... 62
3.5 Análise do banco de dados original a partir da perspectiva do mosaico de
externalidades ............................................................................................................................................................. 70
3.6 Relações entre o banco de dados original e os dados do Censo Demográfico do IBGE e
da RAIS do Ministério do trabalho ...................................................................................................................... 84
4 Subsídios para habitação ................................................................................................................................... 94
4.1 Necessidade de intervenção governamental no mercado de habitação ............................... 94
4.2 Análise da legislação federal referente aos programas de habitação .................................... 96
4.3 O Programa de Arrendamento Residencial PAR ............................................................................ 98
5 Conclusão................................................................................................................................................................111
6 Bibliografia.............................................................................................................................................................113
APÊNDICE: .......................................................................................................................................................................115
Índice de Mapas
Mapa 1.1: Região Metropolitana de São Paulo e distritos centrais ............................................................ 29
Mapa 1.2: Área do estudo de campo e imóveis observados .......................................................................... 30
Mapa 3.1: Municípios da RMSP: renda média total individual..................................................................... 65
Mapa 3.2: Distritos e Áreas de Ponderação do CENSO: renda média total individual ....................... 67
Mapa 3.3: Setores censitários: renda média do responsável ........................................................................ 68
Mapa 3.4: Setores censitários no Centro Histórico: renda média do responsável .............................. 69
Mapa 3.5: Divisão dos distritos Sé e República para análise ........................................................................ 73
Mapa 3.6: Contagem de imóveis subutilizados nos distritos Sé e República ......................................... 79
Mapa 3.7: Contagem de imóveis em condição de subocupação nos distritos Sé e República ......... 81
Mapa 3.8: Contagem de imóveis sem construção utilizados exclusivamente como
estacionamentos nos distritos Sé e República .................................................................................................... 82
Mapa 3.9: Campo calculado a partir da interpolação dos preços de estacionamento para a
primeira hora ................................................................................................................................................................... 89
Mapa 4.1: Unidades PAR propostas e renda média familiar dos setores censitários .......................108
Índice de Tabelas
Tabela 3.1: Tipo de ocupação dos imóveis observados .................................................................................. 56
Tabela 3.2: Tipo de uso do imóvel ........................................................................................................................... 56
Tabela 3.3: Tipo de ocupação e tombamento ...................................................................................................... 57
Tabela 3.4: Resultados comparados para diferentes escalas utilizando a amostra do CENSO ...... 63
Tabela 3.5: Resultados comparados para diferentes escalas utilizando o universo do CENSO ..... 64
Tabela 3.6: nomes das regiões do mosaico .......................................................................................................... 72
Tabela 3.7: Tipologia da ocupação nas regiões .................................................................................................. 74
Tabela 3.8: Análise de padrões de aglomeração utilizando o coeficiente do vizinho mais próximo
(resumo) ............................................................................................................................................................................. 76
Tabela 3.9: Resumo da contagem de imóveis subocupados por região do mosaico (por ordem
decrescente de participação na área total) .......................................................................................................... 83
Tabela 3.10: Resumo das áreas de imóveis subocupados por região do mosaico ............................... 84
Tabela 3.11: Estimativas dos coeficientes dos modelos logísticos ............................................................. 91
Tabela 3.12: Estimativas dos coeficientes dos modelos OLS ........................................................................ 92
Tabela 4.1: Programas do governo federal para a habitação popular ...................................................... 97
Tabela 4.2: Planos de financiamento para imóveis oferecido pelos principais bancos privados102
Tabela 4.3: Comparação entre sistemas de amortização .............................................................................103
Tabela 4.4: Comprometimento da renda familiar ...........................................................................................105
Tabela A.1: Análise da distância média do vizinho mais próximo para as diferentes regiões do
mosaico .............................................................................................................................................................................120
Tabela A.2: Análise da distância média do vizinho mais próximo para as diferentes regiões do
mosaico (somente imóveis desocupados, térreo-ocupados e parcialmente ocupados) .................123
Tabela A.3: Análise da distância média do vizinho mais próximo para as diferentes regiões do
mosaico (somente imóveis sem construções utilizados como estacionamentos) .............................126
Índice de Figuras
Figura 2.1: Função de oferta de renda e tamanho máximo do lote ............................................................ 35
Figura 2.2: Variações em , e (, ) com relação a . ........................................................................... 37
Figura 2.3: Ordem das localizações de equilíbrio para duas famílias com rendimentos diferentes
................................................................................................................................................................................................ 39
Figura 2.4: Configuração de equilíbrio do uso da terra para três classes de famílias ........................ 43
Figura 3.1: Compatibilização das bases georreferenciadas .......................................................................... 87
Figura 4.1: Comparação entre dois sistemas de amortização ....................................................................103
Índice de Fotos
Foto 3.1: Casarão utilizado como estacionamento na Rua Quintino Bocaiúva, 248 ........................... 59
Foto A.1: Centro de São Paulo e percursos do levantamento .....................................................................116
23
1 Introdução
Existe uma agenda paralisada que propõe medidas legais e administrativas para que se
possibilite a revitalização da área central, de algum valor histórico na cidade de São Paulo, mas,
principalmente, repleta de imóveis ociosos.
Durante o mandato do governo municipal eleito para o quadriênio 2001 2004 houve certo
consenso entre os urbanistas e os administradores públicos que se alinhavam com a agenda
política para assuntos de planejamento urbano e habitação, entre eles instituições
independentes como o CEBRAB, através de seu Centro de Estudos da Metrópole (EMURB, 2004),
de que a degradação das áreas centrais está, de alguma forma, relacionada com a falta de
ocupação do espaço urbano durante o período noturno, o que sugeriria a necessidade de
incentivar que pessoas residam nas áreas em questão. Este parece ser o entendimento de
especialistas em, pelo menos, uma instituição internacional independente (Lincoln Institute of
Land Policy) que trata do tema (Clichevsky, 1999).
Atualmente existem muitos imóveis desocupados ou ocupados apenas parcialmente na região
central de São Paulo. Isto ocorre por vários motivos, como estado avançado de depreciação,
problemas legais relacionados a débitos tributários ou disputas judiciais entre herdeiros, além
de muitos terrenos utilizados apenas como estacionamentos subutilizando-se o seu potencial
construtivo, o que sugere algum tipo de falha de mercado”, como se diz na terminologia da
teoria econômica.
O Centro Histórico de São Paulo é uma região urbana totalmente consolidada, com vias de
transporte rápido de massa (trens urbanos, metrô, corredores de ônibus) e toda a infra-
estrutura urbana necessária, como saneamento básico, linhas de eletricidade e
telecomunicações. Parte desse investimento em infra-estrutura se encontra ocioso, uma vez que
o espaço fica desabitado durante a noite. Daí, mais uma vez, a necessidade de se considerar a
ocupação residencial do espaço.
Até o ano de 2004, ainda se sentiam os efeitos de um período em que havia um problema
generalizado de falta de linhas de financiamento para a habitação, em especial a habitação
popular.
As linhas de financiamento destinadas a programas de construção de moradias para famílias de
baixa renda são regulamentadas de acordo com as regras do Sistema Financeiro de Habitação,
uma estrutura jurídico-administrativa mista, com a participação dos setores público e privado e
24
de entidades sem fins lucrativos, instituída no Brasil na década de 1960 e completamente
reformulada na década de 1990, com a finalidade de disciplinar o sistema de crédito imobiliário
brasileiro.
As formas de intervenção, principalmente no que se refere a sua magnitude e escolha dos
imóveis a serem recuperados, também comprometem a eficácia desse tipo de ação do poder
público. É meu entendimento que, de acordo com as diretrizes do SFH, as linhas de
financiamento destinadas a programas de construção de moradias para famílias de baixa renda
vinculadas a programas de revitalização de áreas urbanas centrais apresentem regras muito
rígidas em relação à forma e ao conteúdo dos contratos em que figuram como parte os
mutuários finais.
Consideram-se três hipóteses de trabalho principais:
(1) a concepção dos programas destinados à ocupação desses espaços ociosos por meio da
reforma de prédios não leva em consideração uma série de características da região e não é
capaz de criar um ambiente de confiança que levaria a iniciativa privada a atuar
complementarmente no sentido de ocupar os espaços com a construção de moradias para
classes de renda iguais ou um pouco mais elevadas que a dos habitantes que já ocupam a região,
ainda que possa haver oferta de crédito para tanto;
(2) os programas de habitação postos em prática até o presente momento são tímidos e não são
capazes de gerar uma massa crítica de investimentos necessários para dar partida a um
movimento de investimentos auto-sustentado e com participação significativa do setor privado;
(3) a rigidez das regras estipuladas pelas vias institucionais em vigor disponíveis para esse tipo
de programa gera incentivos contraproducentes. Ao longo do tempo, espera-se que, com esse
tipo de contrato de financiamento, ações individuais dos mutuários e sua percepção do mercado
imobiliário tendam a desviar os objetivos propostos pela política de revitalização da região
central.
A Prefeitura do Município de São Paulo, durante o mandato de 2001 a 2004, criou um programa
que visava a aproveitar edifícios abandonados, em estado avançado de degradação ou ocupados
por movimentos populares ligados às lideranças de sem-tetos para reforma ou construção de
habitações populares.
Sua versão oficial foi publicada no livreto Programa Morar no Centro, editado pela Secretaria
de Habitação e Desenvolvimento Urbano da Prefeitura do Município de São Paulo em 2004.
25
Segundo esse documento:
O Programa Morar no Centro é um conjunto integrado de intervenções municipais;
coordenadas pela Secretaria Municipal de Habitação (SEHAB) com os seguintes objetivos:
melhorar as condições de vida dos moradores do Centro;
viabilizar moradia adequada para pessoas que moram ou trabalham na região;
evitar o processo de expulsão da população mais pobre, que muitas vezes ocorre em
políticas de reabilitação de centros urbanos.
Suas principais diretrizes eram:
priorizar a reforma de prédios vazios;
combinar soluções habitacionais com iniciativas de geração de rendas;
buscar a diversidade social nos bairros centrais.
Para efeito dessa política, foram considerados como “Centro” os distritos da e da República e
mais 11 distritos que os circundam. São eles: Brás, Cambuci, Liberdade, Barra Funda, Bela Vista,
Consolação, Santa Cecília, Bom Retiro, Pari, Belém e Móoca, com área de aproximadamente
52km². O Censo Demográfico do IBGE de 2000 estima que a população residente nesses distritos
seja de 530 mil pessoas.
A prefeitura, então, selecionou 11 imóveis considerados aptos a receberem a implantação do
programa na modalidade PLS (Programa de Locação Social) e mais 13 na modalidade PAR
(Programa de Arrendamento Residencial) dentro desses distritos, com a intenção de instalar
moradores de baixa renda e, assim, iniciar uma agenda política que tendesse a incentivar a
ocupação desses espaços ociosos com residências. Aqui nesse trabalho o PLS será apenas citado,
sendo o estudo do PAR analisado de maneira mais aprofundada.
O IBGE disponibiliza dados georreferenciados de seu Censo Demográfico de 2000 para o
universo e a amostra da pesquisa, tanto na base de pessoas quanto na de domicílios. Os dados
numéricos são vinculados a uma retícula que representa unidades geográficas e está
disponibilizada para diversas escalas, desde o país inteiro (maior unidade geográfica) ao setor
censitário (menor unidade geográfica pesquisada, composta por quadras urbanas), passando
pelas unidades políticas em escalas intermediárias.
Os microdados do universo do Censo Demográfico permitem que sejam calculadas médias de
rendimentos para os chefes de família (ou para os responsáveis pelo domicílio) de cada setor
26
censitário, bem como o número médio de pessoas por unidade habitacional dentro de um setor.
Isso, por sua vez, permite que se calcule uma medida de densidade de residentes.
O Censo, entretanto, não pesquisa edifícios comerciais nem informa nada sobre as condições de
ocupação de cada um dos imóveis. Assim, é impossível, apenas a partir dele, identificar os
imóveis que seriam “candidatos” a fazer parte desse programa. Muitas bases de dados
disponíveis que levam explicitamente em consideração a geografia desta região são pesquisas
privadas elaboradas por agentes privados do sistema imobiliário e, portanto, protegidos, ou de
difícil acesso.
A identificação das características de um imóvel, tais como sua localização, área e orientação na
quadra, histórico de mudanças, como desmembramentos de outros lotes ou remembramentos,
bem como o histórico de seus proprietários e demais direitos e deveres que incidem sobre si ou
seus proprietários, pode ser conseguida através da compra de uma certidão expedida pelo
tabelião do registro de imóveis responsável.
A pesquisa cartorial é inviável para uma tese de doutorado porque é muito cara. Além do mais, o
que interessa aqui é a situação de ocupação do prédio como um todo e não de cada unidade
específica. Assim, para investigar a situação de propriedade de cada imóvel, seria necessário
obter certidões para ao menos uma amostra grande de unidades dentro de um mesmo prédio.
Devido à necessidade de se obter informações de uma forma mais barata, a opção aqui foi
elaborar um levantamento quadra a quadra anotando a posição e atributos relevantes de todos
os imóveis que se situam dentro dos distritos da e República e que se apresentavam de
alguma forma subutilizados na ocasião da coleta dos dados. Algumas quadras na região da
Baixada do Glicério não puderam ser pesquisadas por motivos de segurança.
O levantamento foi feito entre março e setembro de 2007. A intenção inicial era fazê-lo em todos
os distritos centrais, mas a partir das primeiras visitas a campo, as circunstâncias revelaram a
impossibilidade da produção de tal levantamento sem a ajuda de uma equipe. Assim, a coleta de
dados restringiu-se aos dois distritos centrais, onde se localiza o Centro Histórico.
Os imóveis pesquisados foram então localizados através de um sistema de gerenciamento de
imagens de satélite (Google Earth), o que permitiu marcar sua posição e contorno aproximados
em coordenadas geográficas. Posteriormente foram transcritos em um sistema informatizado
de georreferenciamento (ArcGIS), onde as coordenadas geográficas se converteram em
coordenadas projetadas, mais apropriadas para a realização de cálculos.
27
Esse estudo de campo permitiu que se fizessem estimativas diretas da área dos terrenos dos
imóveis considerados e que se identificassem focos de acumulação de imóveis problemáticos e
suas relações com as variáveis socioeconômicas e geográficas das regiões de seu entorno, bem
como uma análise das externalidades de vizinhança presentes.
O estudo mostrou ainda que o potencial de aproveitamento de terras ociosas é muito maior do
que as ocupadas pelos imóveis assinalados no programa original e acabou se tornando mais
interessante do que a investigação que deu motivo ao projeto de tese.
A área recenseada corresponde ao território dos distritos Sé e República , com exceção daquelas
quadras onde não foi possível fazer a inspeção e tem aproximadamente 4,45km².
A partir desse levantamento, pode-se distinguir prédios comerciais e residenciais que se
encontram desocupados, semi-ocupados, ocupados ilegalmente, bem como imóveis utilizados
exclusivamente como estacionamentos.
Foram inclusos os terrenos utilizados exclusivamente como estacionamentos na base de dados
porque, além do fato óbvio de estarem subutilizados do ponto de vista da densidade habitacional
que poderia comportar, se um prédio pode ser reformado ou requalificado para efeito das
intervenções desejadas, também se podem construir unidades habitacionais em terrenos onde
apenas construções leves, como galpões ou outras estruturas destinadas à operação do
negócio do estacionamento, sem que isso importe em custos altos de demolição das coberturas
e proteções para veículos.
Os técnicos que trabalham na operacionalização de intervenções em prédios antigos para
transformá-los em prédios residenciais são categóricos em apontar as dificuldades encontradas
ao tentar fazer orçamentos. Segundo se sabe, normalmente é muito difícil elaborar orçamentos
precisos para esse tipo de obra porque há muita incerteza em relação ao estado da construção e
ao que é necessário para efetivar a obra. Em suma: muitas vezes é mais barato construir um
prédio novo do que reformar ou requalificar um prédio antigo.
O custo de oportunidade típico na alternativa da construção de unidades habitacionais em um
edifício misto com garagem de uso independente dos direitos relacionados aos contratos de
financiamento é aquele correspondente ao tempo em que o estacionamento não pode ser
utilizado em virtude da necessidade de se construir alguma parte da obra.
Como ficará mais evidente no capítulo destinado à análise dessa base de dados, a distribuição
espacial dos prédios subocupados e dos terrenos utilizados exclusivamente como
28
estacionamentos é muito diferente, sugerindo razões econômicas distintas para suas
ocorrências.
O Mapa 1.1 abaixo mostra toda a Região Metropolitana de São Paulo e os distritos centrais, para
dar ao leitor uma idéia da diferença de escalas necessárias ao detalhamento da região
considerada pelas autoridades como área central. A área considerada central aparece dentro do
quadro superior e detalhada no quadro inferior. A região onde foi realizado o estudo empírico de
levantamento dos imóveis considerados problemáticos aparece circundada pelos distritos
centrais.
29
Mapa 1.1: Região Metropolitana de São Paulo e distritos centrais
Fonte: Elaboração própria a partir de mapas do IBGE e CEM-CEBRAP.
O Mapa 1.2 abaixo mostra a região dos distritos e República com a representação
aproximada dos terrenos onde se localizam os imóveis levantados. Os polígonos representam as
30
divisas dos terrenos em escala e as cores representam o tipo de subocupação encontrada nos
imóveis.
Mapa 1.2: Área do estudo de campo e imóveis observados
Fonte: Elaboração própria a partir de mapas do IBGE e CEM-CEBRAP e de informações levantadas entre março
e setembro de 2007.
31
Os distritos representados em cor de areia são República (à esquerda) e Sé (à direita).
O desenvolvimento do trabalho será como segue:
No capítulo 2 será feita a exposição da teoria econômica da localização contrastando o marco
teórico tradicional da teoria microeconômica com o modelo heterodoxo proposto por Pedro
Abramo (2007). Com isso, evidencia-se a necessidade de avaliar o impacto das externalidades
de vizinhança na formação dos preços, a complexidade dos fatores que influem nesse tipo de
avaliação e o questionamento da capacidade da teoria ortodoxa em fornecer sugestões úteis
para a formulação de políticas públicas nas circunstâncias observadas.
No capítulo 3 é feita uma análise minuciosa do banco de dados criado para essa pesquisa. Em
primeiro lugar, utilizam-se dados socioeconômicos de domínio público agregados em regiões de
escalas diferentes para tentar demonstrar a plausibilidade do modelo de Abramo. Em seguida
utilizam-se os conceitos elaborados nesse modelo para a análise das observações coletadas na
expectativa de gerar algum conhecimento relativo às externalidades de vizinhança e suas
conseqüências para a formulação de políticas de habitação na região central de São Paulo.
No capítulo 4 é discutida a modalidade de contrato contemplada pelo PAR e sua comparação
com outras formas de financiamento praticadas pelo mercado. A idéia aqui é discutir os
incentivos individuais produzidos pela forma dos contratos de arrendamento e sua consistência
com a formação de uma configuração local estável e desejável do ponto de vista das
externalidades.
Finalmente, uma Conclusão encerra o trabalho recapitulando o que pode ser depreendido da
análise e apresenta os pontos sensíveis para a formulação de políticas de habitação levando em
consideração as peculiaridades e as circunstâncias atuais da região dos distritos Sé e República.
32
2 A teoria da localização urbana tradicional e a abordagem
heterodoxa
Nesse capítulo expõe-se o instrumental da teoria econômica neoclássica utilizado para a análise
das regras do mecanismo de financiamento e sua relação com a oferta e a demanda de imóveis
de uma forma geral e abstrata.
Inicialmente, mostrarei como a teoria econômica tradicional modela o mercado de terras
urbanas indicando seus conceitos e os trade-offs apontados. Em seguida, quais as adaptações à
teoria tradicional que devem ser introduzidas de modo a permitir uma análise mais realista e
apropriada para o problema em questão.
2.1 A abordagem tradicional
Alguns autores de tradição neoclássica, a partir da década de 1960, comaram a formular
modelos econômicos teóricos que pretendem explicar como indivíduos, atuando dentro de um
contexto onde a terra urbana é uma mercadoria livre para ser comercializada, escolhem um
lugar para morar levando em consideração certas características do terreno e da cidade.
A tradição da economia neoclássica elabora modelos formais partindo de três axiomas
(Arnsperger e Varoufakis, 2006): o individualismo metodológico, o instrumentalismo
metodológico e o equilibrismo metodológico.
Os modelos que tratam da organização residencial de uma área urbana farão uso desses três
expedientes para apresentar uma ordem residencial na qual os agentes competem entre si por
espaço dentro da cidade. O homo economicus aparece como um agente racional que elabora uma
prioridade entre gastos relativos ao transporte até o local de trabalho, o tamanho do espaço
onde deseja habitar e o gasto que deseja efetuar com todos os outros bens que não sejam
moradia nem transporte, esgotando uma restrição orçamentária.
O discurso neoclássico passa então a competir com outros discursos vindos das áreas das
ciências sociais que também procuram explicar o comportamento das pessoas e a forma como a
agregação desses comportamentos se manifesta na ordem urbana.
2.2 A teoria da localização urbana
A exposição que faço aqui se baseia na excelente obra Mercado e ordem urbana (Abramo,
2001), que apresenta um survey do desenvolvimento da teoria neoclássica da localização de
forma sucinta, mas por um ponto de vista bastante crítico. O que interessa aqui é mostrar o
33
desenvolvimento da teoria a partir de um modelo básico e sua implicação para o que
observamos na cidade de S~o Paulo. N~o se trata de “testar a validade” dos modelos, mas criar
um ambiente teórico para a discussão dessa geografia econômica urbana.
O modelo básico de escolha residencial deriva do trabalho clássico de Von Thünen (Der
isolierte Staat in Beziehung auf Landwirstschaft und Nationalökonomie, 1826) e sua versão
moderna proposta por Alonso (1964), Muth (1969) e Mills (1967). A versão de Alonso é baseada
em preços da terra e as de Muth e Mills em preços de imóveis em conjunto com preços da terra
(denominados “serviços de habitaç~o”). Esse modelo é o ponto de partida para a construção do
raciocínio neoclássico e, por esse motivo, procuro detalhá-lo bem, mesmo a custa de entediar o
leitor. A notação que utilizo aqui, e que considero mais didática, segue Fujita (1989). O trabalho
de Fujita também é uma obra que reúne as principais contribuições deste campo teórico de uma
maneira unificada, daí a uniformidade da notação.
O modelo básico focaliza o trade-off entre acessibilidade e espaço e se baseia em algumas
postulações sobre características do espaço:
1. a cidade tem um único distrito onde se encontram todos os empregos, o CDB, central
business district;
2. existe uma rede de transportes densa, de modo que se pode locomover-se de qualquer
ponto da cidade em linha reta até o CDB;
3. a cidade é plana, sem acidentes geográficos e todos os lotes para a habitação são
idênticos exceto pelo seu tamanho, que pode variar.
Como a única característica que interessa é a distância ao centro e simetria total do espaço
devido à rede de transporte densa, o problema pode ser tratado como se fosse unidimensional.
Cada família é representada por um indivíduo que tem uma função de utilidade e uma restrição
orçamentária. Aqui utilizam-se os termos indivíduo e família intercambiavelmente. Esse
indivíduo ou família dispõe de uma renda Y e escolhe o quanto deseja consumir entre s, a área do
terreno e z, a quantidade da mercadoria composta que também representa o numerário com
preço unitário.
A família se localiza a uma distância r do centro. O aluguel que ela paga para viver nesse lugar é
dado por uma função
, que indica que o aluguel por unidade de área depende da distância
ao centro e é multiplicado pelo tamanho do lote, para que se tenha o valor total. O custo de
transporte também é uma função da distância ao centro e é representado por ().
O programa básico de maximização da família é o seguinte:
34
max
,,
(, )
Sujeito a +
= ()
Onde 0 , > 0 , > 0.
Para evitar soluções de canto e garantir a unicidade do resultado do programa de maximização
são necessárias duas hipóteses adicionais:
a funç~o de utilidade é “bem comportada”, é contínua e crescente para todo > 0, > 0 .
Isso garante que as curvas de utilidade não cortam os eixos;
a função de custo de transporte é contínua e crescente para toda distância > 0 e
0
0
< e
= .
A satisfação do indivíduo aumenta quanto maior for o consumo do bem composto e da área
utilizada para morar, porque a função utilidade é crescente nesses dois argumentos. Assim,
quando traçamos curvas de utilidade no gráfico com s no eixo horizontal e z no eixo vertical
obtemos os formatos côncavos usuais da análise microeconômica.
A função de oferta de aluguel aparece inicialmente num modelo de Von Thünen de 1826 e depois
é reintroduzida no contexto da organização urbana por Alonso (1964). Ela funciona como uma
funç~o de utilidade indireta e faz as vezes do leiloeiro walrasiano no processo de coordenação
da oferta e da demanda por espaço no modelo de economia urbana. Ela é expressa da seguinte
forma:
,
= max
,

,
=
Essa função representa a maior oferta de renda por unidade de área que se pode obter residindo
a uma distância r do centro, quando a utilidade se mantém constante. A família que vive a essa
distância do centro e escolhe consumir a cesta (, ) tem
de sua renda sobrando
para pagar o aluguel que, divididos por s , dão a quantia destinada ao aluguel por unidade de
área.
Quando se resolve o problema para a restrição de utilidade
,
= isolando z obm-se a
equação para uma curva de indiferença. O problema de maximização aparece na forma
equivalente:
Ψ
,
= max
,
35
Se chamarmos de R a oferta de aluguel à distância r, a restrição orçamentária pode ser escrita
como:
+ = ().
Temos que, se o indivíduo não faz poupança, a soma do gasto com o bem composto e o aluguel é
igual à renda menos o gasto com transporte. Reordenando:
=

Resolvendo o problema mostra-se que:
(, )

= Ψ(, )
A função de oferta de aluguel é igual à taxa marginal de substituição entre o consumo do bem
composto e o consumo do espaço quando a utilidade é mantida constante, ou seja, é igual ao
ângulo do segmento AC na Figura 2.1abaixo.
Figura 2.1: Função de oferta de renda e tamanho máximo do lote
O ponto B, onde a inclinação da curva de indiferença é igual à inclinação da função de oferta de
aluguel também indica, no eixo horizontal, o tamanho máximo do lote compatível com a
z
(, )
(, )
36
distância do centro, o consumo do bem composto e a renda do indivíduo dados pela solução do
programa de maximização.
Eis algumas propriedades da função de oferta de aluguel: a derivada da função de oferta de
aluguel com relação à distância é dada por:
Ψ(, )

=
()
(, )
< 0
Onde
,
= 
(, )
Essa fórmula sugere que um aumento de r causa uma diminuição na oferta de aluguel a partir de
um efeito direto, o custo de transporte, e um efeito indireto causado pelas mudanças na cesta de
consumo à medida que o ótimo muda de posição. Esse efeito é muito pequeno em comparação
ao outro quando as mudanças em r são pequenas e costuma ser desprezado para esse tipo de
an|lise feita com modelos “bem comportados”. Esse raciocínio justifica o ângulo da curva de
oferta de aluguel ser mais inclinado quando a distância do centro é menor. Isto ocorre porque,
quanto mais longe do centro, maior o gasto com transporte, que deve ser descontado da renda
disponível para pagar o aluguel. Se o nível de satisfação permanece o mesmo, ou seja, a restrição
continua tocando a mesma curva de utilidade, a oferta de renda tem que ser menor.
Com um raciocínio algébrico um pouco mais elaborado, é possível mostrar também que:

,

> 0
Ou seja, que o tamanho máximo do lote aumenta quando se afasta do centro.
O próximo exercício de estática comparativa procura mostrar a variação da distância de
localização e do tamanho do lote quando se vai de uma curva de utilidade para outra de nível
mais elevado.
Tomemos uma distância fixa r e dois níveis de utilidade
1
<
2
. A Figura 2.2 abaixo mostra
que, para uma curva de indiferença mais elevada, para que a curva de oferta de renda toque a
curva de indiferença,
,
1
>
,
2
o ângulo da nova curva de oferta de renda tem que ser
menor e
,
1
>
,
2
. o tamanho do lote tem que ser maior.
37
Figura 2.2: Variações em
,
e (, ) com relação a .
Isso pode ser entendido intuitivamente pelo fato de que, como a distância permanece a mesma, a
renda líquida (do custo de transporte) permanece a mesma, portanto, é possível atingir um
nível de satisfação mais alto se a oferta de aluguel for menor. o aumento do tamanho máximo
do lote precisa de uma hipótese adicional para ser válido. A terra é, por hipótese, um bem
normal, no sentido de que o efeito-renda na demanda marshaliana da terra é positivo.
Essa dedução foi feita para um indivíduo. Se agregarmos todas as rendas ofertadas de todos os
indivíduos teremos um conjunto de curvas de oferta de renda cujo envelope dará uma curva de
oferta de renda agregada. O que permite que essas curvas de oferta de renda sejam agregáveis
são algumas de suas propriedades:
1. a função de oferta de renda é contínua e decrescente em r e u;
2. o tamanho máximo do lote é contínuo e crescente em r e u;
3. a função de custo de transporte é linear ou côncava.
A função de oferta de renda pode ser entendida como uma transformação que mapeia curvas de
indiferença no espaço de mercadorias a curvas geográficas definidas no espaço urbano. É dessa
forma que esses modelos transformam um problema de localização em um problema de
equilíbrio geral no espaço de mercadorias.
(,
1
)
(,
2
)
(,
2
)
1
2
(,
1
)
2
A
2
1
1
<
2
38
Para serem matematicamente coerentes, os sistemas de equilíbrio geral precisam de um
mecanismo para levar os preços e as quantidades para o equilíbrio, um mecanismo de
convergência. O leiloeiro walrasiano, uma das formas de conceber esse tipo de mecanismo, é uma
entidade abstrata que conhece todos os preços e arbitra as ofertas e demandas como se
estivesse organizando um leilão, para chegar num vetor de preços e quantidades de equilíbrio.
Como sabemos, poucos mercados no mundo real que têm essa característica, a exemplo das
commodities que podem ser comercializadas em verdadeiros leilões. O mercado da terra
certamente não é um deles. No caso dos modelos de localização, a idéia de uma curva de oferta
de renda faz o papel do leiloeiro walrasiano, pois é como se funcionasse como um painel público
indicando a todos quais as rendas disponíveis de cada família que as permitiriam morar em cada
um dos anéis concêntricos definidos para cada distância em relação ao centro. Essa suposição
implica que os proprietários alugam seus imóveis para quem oferecer mais a qualquer
momento. São proprietários ausentes. Como veremos mais adiante, os proprietários ausentes
estão em concorrência direta uns com os outros, criando um ambiente onde todos são
equiparados em termos de poder, pois são indiferentes em relação ao inquilino. Isso também
cria um problema quando passamos a lidar com estoques. Esses serão alguns dos argumentos
tomados por base na crítica de Abramo (2001) aos modelos neoclássicos.
A família escolhe a combinação de sua preferência entre o bem composto e área de habitação e a
função de oferta de renda indica, indiretamente, através do custo de transporte, em qual círculo
concêntrico a família será indiferente em se instalar.
Passamos agora à determinação da localização de equilíbrio de uma família dentro da cidade.
Dada uma curva de aluguel () expressa em valores de mercado segundo a distância do centro,
temos que encontrar uma curva de oferta de aluguel que seja tangente a essa curva de mercado
em algum ponto, ou seja:
= Ψ(
,
) e
() Ψ(,
) para todo .
Como essas duas curvas são tangentes, temos que:
Ψ(
,
)

=
Mas
39
Ψ(, )

=
()
(, )
< 0
Então
= 
(
,
).
Esta é a famosa condição de Muth, que afirma que, na localização de equilíbrio, o custo marginal
de transporte tem que ser igual à economia marginal que se tem em relação ao custo marginal
da terra correspondente à mesma localização.
Agora vejamos o que acontece quando temos mais de uma família com curvas de oferta de
aluguel diferentes. Como regra geral, se duas famílias possuem curvas de oferta de renda que se
cruzam apenas uma vez, aquela que for mais inclinada representará um ponto de equilíbrio mais
próximo do centro.
Figura 2.3: Ordem das localizações de equilíbrio para duas famílias com
rendimentos diferentes
A partir dessa propriedade, pode-se mostrar que as famílias com renda mais elevada tenderão a
se localizar em pontos mais afastados do centro. Esse tipo de argumento foi utilizado para
explicar os padrões de dispersão em cidades norte-americanas, onde as famílias ricas tendem a
()
(,
)
j
(,
)
40
morar em subúrbios afastados do centro enquanto as famílias pobres tendem a ocupar o
downtown.
Para que isso seja válido, entretanto, é necessário que todas as famílias tenham a mesma função
utilidade e que os custos de transporte sejam independentes da renda, além do fato de que não
se consideram interações estratégicas entre os agentes.
Esse tipo de raciocínio, evidentemente, não adere aos padrões de países em desenvolvimento,
onde a maior parte das famílias de baixa renda vive nas periferias, como é o caso de São Paulo.
Para explicar esse tipo de fenômeno, foram criados modelos estendidos” onde se considera o
tempo de deslocamento como um parâmetro que influi no custo de oportunidade do trabalho.
Nesse caso, é possível mostrar que, dependendo da elasticidade-renda do tamanho do lote e do
aumento do custo de oportunidade por levar mais tempo para se deslocar, pode haver uma
mudança das curvas de oferta de renda que tendam a sugerir um posicionamento das famílias
mais ricas próximo ao centro.
O modelo “estendido” apresentado aqui é devido a Wingo (1967). O tempo total que o indivíduo
tem a sua disposição é dividido entre o tempo dedicado ao lazer
, tempo dedicado ao trabalho
e uma quantidade indicada pela expressão , que representa o tempo de deslocamento de
casa para o trabalho na forma de uma constante que multiplica a medida de distância, sugerindo
que em qualquer ponto da cidade o tempo de deslocamento é sempre proporcional à distância.
Isso é uma simplificação; sabemos que quanto mais perto do local de trabalho, mais pessoas
estão concentradas, maior a chance de haver congestionamentos e, portanto, de seja necessário
mais tempo para se deslocar a mesma distância do que em um ponto onde o trafego esteja
desimpedido.
A renda da família é representada pela soma de dois componentes: um componente que
representa a renda adquirida através do trabalho
e outro que representa a renda que não é
derivada de trabalho
(herança ou ganhos de capital, por exemplo). representa o salário por
unidade de tempo. O parâmetro a representa o custo pecuniário do transporte por unidade de
distância. O programa de maximização fica assim:
max
,,,
,
(, ,
)
sujeito a
+
+ =
+
e
+
+ =
41
A função de custo do transporte incluindo o custo de oportunidade passa a ser:
= + 
Sendo a o parâmetro que denota o custo pecuniário do transporte e Wb o parâmetro que denota
o custo de oportunidade perdido pelo tempo de deslocamento, lembrando que o salário é dado
exogenamente pelo mercado de trabalho.
Vale a pena detalhar um pouco mais o desenvolvimento deste modelo porque ele é capaz de
produzir resultados que lançam luz à questão de como famílias de diferentes classes de renda se
situam na cidade e explicar por que em cidades brasileiras as famílias pobres tendem a morar
nas periferias.
O efeito da renda não derivada do trabalho é essencialmente o mesmo do modelo básico, qual
seja, um aumento da renda provoca uma diminuição na inclinação da função de oferta de renda,
afastando a família do centro e aumentando o tamanho do lote máximo.
O efeito mais interessante é aquele que pode ser derivado das variações na renda do trabalho.
Da condição de Muth:
(, )

=
()
(, )
Onde
= + 
Calcula-se


=0
=
1



2


=0
=







=0
Nota-se que

=0
tem o mesmo sinal que





=0
.
O primeiro termo entre parênteses é a elasticidade do salário em relação ao custo marginal do
transporte. O segundo termo é a elasticidade do salário em relação ao tamanho do lote. As
preferências dependerão dos parâmetros associados ao custo pecuniário do transporte e ao
custo de oportunidade que o indivíduo perde em termos de salário-hora não dedicada ao
trabalho.
42
O problema de saber como a renda proveniente do trabalho de cada família influenciará na sua
escolha de localização dentro da cidade passa a ser um problema de análise de elasticidades,
pois a renda do trabalho afeta ao mesmo tempo a função de custo de transporte (através do
custo de oportunidade) e a demanda de terra (devido à suposição de que a terra é um bem
normal, e não neutro, em relação à renda líquida).
Intuitivamente, isto quer dizer que, se a família valoriza em termos pecuniários mais o seu
tempo em relação ao que poderia pagar por um aumento marginal no tamanho do seu lote, sua
curva de oferta de renda aumenta de inclinação e essa família tende a se deslocar para o centro.
De acordo com as especificações desse modelo, a família pode escolher o quanto de espaço
pretende consumir, enquanto que o custo de transporte é dado exogenamente e, portanto, não
pode ser modificado por nenhuma mudança de comportamento. Assim, uma afirmação geral da
teoria de localização neoclássica é que os mais pobres têm preferência pela acessibilidade ao
local de trabalho e os mais ricos têm preferência pelo espaço, o que os faz desejar morar
afastados do centro. Isso ocorre se os custos pecuniários de transporte para os ricos for
negligenciável. Como veremos mais adiante, esse não parece ser o caso de São Paulo.
Os resultados desse programa de maximização são válidos de uma forma geral para escolhas
individuais (cada família conta como sendo um indivíduo). Nessa exposição não foi discutida a
questão da estabilidade de um equilíbrio formado pelas escolhas de todas as famílias que
dividem o espaço da cidade.
A agregação das escolhas para vários tipos de família não é tão simples, pois requer uma série de
hipóteses adicionais (mais especificamente sobre as formas de funções de utilidade e custo de
transporte) que evitam as inconsistências matemáticas típicas dos problemas em que se
envolvem agregações e demonstrações de convergências a pontos de equilíbrio. São
demonstrações complicadas e de caráter muito técnico e não serão apresentadas aqui. O leitor
interessado pode consultar os capítulos 3 e 4 de Fujita (1989).
É possível demonstrar que, num contexto onde várias famílias de classes de renda diferentes
disputam competitivamente suas escolhas de localização de acordo com as hipóteses sugeridas,
as famílias seriam distribuídas de acordo com a Figura 2.4 abaixo. As três classes de renda
representam famílias com rendimentos distintos, sendo as do tipo 1 mais pobres, as do tipo 2
com renda intermediária e as do tipo 3 mais ricas. De acordo com o resultado do programa de
maximização, quanto maior a renda proveniente de salários menor será a inclinação da curva de
oferta de renda. A fronteira agrícola surge no lugar onde a curva de oferta de renda tende a ser
horizontal. A curva mais espessa representa o envelope das curvas de oferta de renda agregada.
43
Figura 2.4: Configuração de equilíbrio do uso da terra para três classes de
famílias
Em São Paulo percebemos uma configuração da renda das famílias que diminui, ainda que não
de forma concêntrica e sistemática, à medida que se afasta do centro (esse ponto será mais bem
detalhado no Capítulo 3). É notável o fato de que a infra-estrutura de transporte, tanto em vias
de tráfego como nos equipamentos de transporte público de grande capacidade, deixa muito a
desejar, tornando os deslocamentos em direção ao centro muito demorados.
2
(,
2
)
3
(,
3
)
1
(,
1
)
2
3
1
CBD
Famílias do tipo 2
Famílias do tipo 3
Famílias do tipo 1
Terra agrícola
44
Esse tipo de discrepância em relação à teoria levou a uma série de estudos empíricos e
àelaboração de uma tipologia das cidades segundo sua configuração em termos de distribuição
espacial da renda.
A configuração em que os pobres moram perto do centro e os ricos na periferia parece ser
peculiar à cidade norte-americana, onde o fenômeno do subúrbio branco e rico e do downtown
negro e pobre é generalizado.
Esse tipo de modelo estendido para incluir o custo pecuniário e o custo de oportunidade do
tempo de deslocamento é interessante porque pode lançar luz ao fenômeno da gentrificação que
ocorreu a partir da década de 1980 nos Estados Unidos e em outras cidades em países
desenvolvidos. Se incluirmos uma classe de famílias com rendimento salarial muito alto, pode-se
pensar que o custo de transporte torna-se novamente alto, não por causa de seu custo
pecuniário, mas porque o custo de oportunidade desses indivíduos é alto devido a seus altos
salários. Eles preferem retornar ao centro da cidade para diminuir o tempo de deslocamento até
o local do trabalho. Esse parece ser o caso de Chicago e Nova York, onde os muitos ricos ocupam
a região central, os pobres uma faixa intermediária, e os não tão ricos se situam na periferia.
J| nas cidades do “terceiro mundo” existe um problema estrutural no sistema de transporte,
causado pela falta crônica de infraestrutura de transporte de massa, assim como pela
distribuição espacial das vias de tráfego. O leitor interessado em problemas de transporte
urbano pode consultar o survey elaborado por Vasconcellos (2000). Isso faz com que os
parâmetros relacionados aos custos de transporte sejam muito elevados. Para os pobres, os
custos pecuniários de transporte são elevados e os custos de oportunidade são menores, mas,
para os ricos, o custo pecuniário é baixo. Em compensação, os custos de oportunidade são tão
altos que fazem com que suas curvas de oferta de renda sejam mais inclinadas que as dos
pobres. Esses últimos procuram moradias afastadas apesar de encararem altos custos
pecuniários de transporte.
Para completar a exposição formal do funcionamento desses modelos neoclássicos, passo agora
a descrever um modelo simples representativo de uma classe de modelos introduzidos por Muth
(1967) que procuraexplicar a densidade urbana, refletida na altura dos prédios, como uma
combinação ótima de capital e terra que as construtoras oferecem como produto, de modo a
maximizar seu lucro.
Esse modelo funciona da mesma forma que o que foi apresentado acima quando se considera a
demanda, que agora se introduz a dimensão da oferta. É útil conhecê-lo porque ele promove
45
insights em relação ao comportamento dos produtores que depois serão contrastados com a
perspectiva de uma visão heterodoxa do problema.
Muth não trabalha diretamente com o preço da terra, mas indiretamente, através do que chama
de “serviços de habitaç~o”, que incluem o que se paga pela terra e o que se paga pela construção
do prédio onde se habita.
Para evitar confusão a notação será substituída seguindo Fujita (1989). Aqui, representa a
“quantidade” de serviço de habitaç~o e
() o preço desse serviço. Note que o preço continua
sendo representado por uma função de oferta de renda.
O consumidor resolve o programa:
max
,,
(, )
Sujeito a +
= ()
A diferença entre este e o programa formulado no modelo de Alonso tratado na seção anterior
está em
, que é essencialmente a mesma função de oferta de renda do modelo de Alonso,
só que inclui o preço da terra juntamente com a construção.
E o produtor (um construtor, no caso), maximiza:
max
,
,
Para todo .
Seguindo a tradição neoclássica de análise num mercado competitivo,
,
é uma função de
produção com retornos constantes. Aqui os argumentos são para “terra” e para "capital”. O
fator trabalho utilizado na produção é ignorado. A hipótese de retornos constantes permite a
seguinte normalização:
=
(,)
e =
(,)
Onde é a quantidade de “serviços de habitaç~o” demandada por cada família e e os insumos
associados à produção de , também por família.
A quantidade de serviços de habitação como função da terra e do capital passa a ser:
= (, ).
46
A função de produção é uma simplificação, pois o fator trabalho não aparece como variável de
escolha e o preço do capital é considerado constante em qualquer localidade e normalizado para
o valor unitário. Como o mercado é competitivo, todos os produtores maximizam o lucro quando
este é igual a zero:
,
= 0
Reordenando e normalizando as quantidades:
=
,
+
,
=
+
A expressão acima mostra a correspondência entre a função de oferta de renda na versão de
Alonso e na versão de Muth. Como se supõe que o capital não varia de preço segundo sua
distância do centro, a oferta de renda de Muth é equivalente à de Alonso com o acréscimo do
preço do capital por família.
Substituindo a função de produção em termos de serviços de habitação por família na restrição
do lucro competitivo temos a nova formulação do programa de maximização do consumidor:
max
,,,
(,
,
)
Sujeito a
+ +
= ()
Esse problema pode ser representado por uma função de oferta de renda para o bem habitação
análoga à função de oferta de renda no contexto do modelo de Alonso, definida como:
,
= max
(, )
Onde
(, ) é a solução de + (, ) para .
Isto que mostra que o modelo de Muth e o modelo de Alonso levam ao mesmo raciocínio, com a
diferença que no modelo de Muth somos convidados a enxergar o consumo de habitação como
sendo o consumo de uma combinação de terra e capital. Ele introduz o capital utilizado na
construção como uma variável de escolha no programa de maximização.
47
Devido a essa simetria, os mesmos resultados que valem para a função de oferta de renda valem
para a função de oferta de renda para o bem “serviços de habitação.
O principal resultado do modelo de Muth, que emerge da introdução explícita da escolha de
combinações de capital e terra, é que, para uma cidade monocêntrica com essas especificações
de preferências e produção, a razão capital-terra () ()
diminui à medida que se afasta do
centro. Podemos imaginar que, quanto mais capital, maior a altura do prédio e maior a
densidade de habitantes. Como os construtores trabalham em um mercado competitivo eles
essencialmente executam um programa que indica as quantidades de terra e capital
indiretamente através das preferências dos consumidores.
É importante notar que esses modelos ignoram completamente restrições de ordem
institucional, como planos diretores, leis de zoneamento, códigos de obras e outros fatores que
influenciam o comportamento de todos os agentes. Para a análise que se faz nesse trabalho esses
fatores são de suma importância, por isso se faz necessária a consideração de um outro tipo de
raciocínio, menos elegante em termos de representação lógica, mas essencial à compreensão dos
problemas tratados e à elaboração de políticas públicas voltadas a corrigir as ineficiências
apontadas na análise empírica. Isto é tratado na seção que se segue.
2.3 A abordagem heterodoxa
Nesta seção pretendo apresentar a alternativa ao modelo de localização neoclássico formulada
por Pedro Abramo. Indicarei brevemente os fundamentos teóricos dessa proposta de mudança
de paradigma e suas conseqüências para a análise dos dados empíricos sobre a distribuição de
espaços subutilizados que se observaram no levantamento. O motivo para isso é simples.
Acredito que o paradigma de Abramo tem a dizer coisas muito mais interessantes sobre o
problema concreto que se apresenta do que o modelo tradicional.
A construção completa do modelo alternativo de Abramo se dá em quatro etapas. Como a ênfase
aqui é maior em relação aos conceitos elaborados nas duas primeiras etapas, não vou me
alongar na exposição de cada uma das fases da elaboração da teoria. Uma exposição mais
detalhada das duas primeiras fases deve ser suficiente para que o leitor compreenda o conceito
no contexto da teoria e dos dados. O leitor curioso deve consultar Abramo (2007).
Primeiro se desenvolvem, a partir dos trabalhos de Gary Becker e Thomas Schelling, o conceito
de racionalidade mimética em contraposição à racionalidade paramétrica dos modelos
tradicionais, para enfatizar a existência de interdependência entre as decisões de localização das
famílias.
48
Em segundo lugar, a partir de contribuições de Schackle e Keynes, demonstra-se a necessidade
de abandonar o tratamento das perspectivas sobre o futuro nos moldes da teoria das
expectativas racionais, rejeitando a idéia de convergência das expectativas em favor de uma
incerteza radical”, com a idéia de decisão crucial urbana.
A tarefa aqui é mostrar como é possível a emergência de uma configuração urbana estável em
um ambiente de incerteza radical. As expectativas quanto ao futuro produzem um ambiente
especulativo que pode levar à emergência de uma crença comum quanto à configuração das
externalidades de vizinhança. Abramo chama essa crença de convenção urbana.
Em terceiro lugar, é introduzida a dimensão monetária, pois é a moeda e o crédito que,
antecipando aos empresários da construção o poder de compra necessário para a construção
dos prédios, permitem concretizar os desejos de localização das famílias. Esse raciocínio é de
inspiração schumpeteriana.
As intenções de localização das famílias são expressas em atos mercantis. Isto significa que tanto
os construtores como os bancos têm capacidade, ainda que dentro de certos limites, de
modificar a configuração urbana esperada.
Finalmente, para identificar a dimensão de longo prazo das mudanças da ordem espacial ao
longo do tempo, o estoque residencial é analisado pelo ponto de vista do “ciclo de vida” das
localizações. Nas palavras do autor “este ciclo representa o encadeamento das diferentes
convenções que modificam as características de uma localização.
Por trás do fenômeno da criação e destruição dos estoques urbanos estão dois movimentos: o de
diferenciação espacial, que decorre das práticas dos empresários inovadores, e o de
homogeneização que ocorre quando os empresários da construção decidem imitar as idéias dos
inovadores que acreditam terem sido exitosas.
Passo agora a elaborar esses conceitos teóricos, dando mais ênfase à noção de mosaico de
externalidades, uma vez que a discussão do estudo empírico se baseia fortemente neste conceito,
e ele é o fundamento espacial da formação de crenças ou convenções, processo alternativo que a
teoria heterodoxa apresenta no lugar da agregação de preferências individuais, baseadas numa
racionalidade paramétrica, para explicar a ordem urbana. Esse raciocínio é desenvolvido na
primeira parte de Abramo (2007).
As formulações thünenianas sugerem uma situaç~o de “neutralidade” em relaç~o { localizaç~o,
tanto pelo lado das famílias, que escolhem onde o morar competindo em termos de oferta de
renda com as outras famílias, como pelo lado dos construtores, que escolhem a composição de
49
capital e terra para seus empreendimentos, também de uma maneira competitiva. Essa escolha a
partir de uma função de utilidade e uma restrição orçamentária em um mercado competitivo, e
sem levar em consideração as escolhas dos outros agentes, é o que Abramo (2001, 2007) chama
de racionalidade paramétrica.
O projeto neoclássico de uma teoria da localização a partir dos modelos básicos que foram
mostrados acima representa o espaço urbano como um equilíbrio geral dotado das mesmas
propriedades do equilíbrio geral walrasiano. Segundo o raciocínio neoclássico, a agregação das
preferências das famílias a partir da maximização de uma função de utilidade com restrições
orçamentárias que incluem o tamanho do espaço onde se vai morar, juntamente com uma noção
de competição entre essas famílias, representada pelas curvas de oferta de renda uma espécie
de “m~o invisível urbana” – seria capaz de gerar uma ordem-equilíbrio que fosse única, estável e
eficiente.
O ataque que faz Abramo (2001) à síntese neoclássica urbana começa pela noção de utilidade
familiar. Para Becker (1981), dentro de uma estrutura familiar as decisões são tomadas de modo
a maximizar o bem estar familiar em termos intertemporais. As escolhas de localização da
família fazem parte de suas decisões de investimento. O casal decide que vai morar em um
determinado lugar da cidade, e não em outro, porque precisa maximizar a interdependência das
funções de utilidade intertemporal dos membros da família. Não é possível garantir de antemão
que a decisão da família corresponderá àquela prevista pelo trade-off entre espaço e distância,
como querem os neoclássicos. Uma família procura garantir o bem-estar de seus filhos no
presente e no futuro. Em vista disso, a sua decisão de escolha não pode se restringir ao trade-off
espaço-distância. É possível que a família busque morar numa região onde existam outras
famílias, de preferência mais abastadas que ela, para que seus filhos tenham acesso a melhores
escolas e melhores companhias, por exemplo. Nesse sentido, a decisão de localização comporta
uma decisão de investimento em capital humano. Pode-se dizer que a síntese ortodoxa não
considera a dimensão social e, portanto, não considera os efeitos espaciais da interdependência
das escolhas de localização. Aqui vale a pena citar o texto de Abramo (2007). Os grifos são meus:
Com o reconhecimento da interdependência dessas escolhas e o fato de considerar as
intertemporais, percebi que a decisão de localização era um componente das estratégias de
maximização da função de produção familiar. Significa que, ao fazerem as próprias escolhas, as
famílias podem modificar suas dotações iniciais de recursos. Considerando-se as escolhas
intertemporais, a equilibração mercantil perderia a neutralidade, ou seja, seria possível realizar
transferências de riqueza pelo viés da coordenação espacial mercantil. Esse ponto parece-me
ainda mais interessante porque, partindo de uma linha pertencente ao raciocínio ortodoxo
(beckeriano), cheguei a conclusões heterodoxas. Além disso, as variações beckerianas levaram-
50
me a representar o espaço como um conjunto de externalidades produzidas pela
interdependência das escolhas de localização. É esta representação alternativa à de Thünen que
chamo de mosaico de externalidades.
É importante salientar o seguinte argumento: as famílias podem modificar suas dotações iniciais
de recursos porque as decisões visando ao futuro dos filhos dependem das decisões de outras
famílias e incorporam uma decisão de investimento que, trazido a valor presente, modifica suas
dotações iniciais de recursos. O processo de equilibração dos modelos neoclássicos é realizado
através da “m~o invisível” representada pelas intersecções das funções de oferta de renda com a
restrição orçamentária. Mas se ninguém conhece sua curva de oferta de renda de antemão, fica
claro que esse expediente matemático perde uma dimensão muito importante. A função de
oferta de renda de uma família depende das funções de oferta de renda de outras famílias. Isso
questiona a neutralidade do espaço e coloca em xeque a racionalidade paramétrica, pois uma vez
que a ordem espacial se forma depois das decisões de todos os indivíduos, esses são
obrigados a formular conjecturas em relação às decisões que serão tomadas pelos outros
indivíduos, o que sugere que, no lugar de uma racionalidade paramétrica, a família tende a
racionalizar sua escolha de uma forma estratégica, mais parecida com aquela da teoria dos jogos.
Incorporando o trabalho de Thomas Schelling (1971), que também pode ser encontrado numa
ótima versão de divulgação chamada Micromotives and Macrobehavior (Schelling, 1978),
Abramo propõe a noção de racionalidade mimética em substituição à racionalidade paramétrica.
Em sua obra, Schelling nota que a interdependência das escolhas individuais pode levar a
fenômenos agregados inesperados. O modelo mais simples, apresentado no artigo de 1971,
mostra como uma pequena diferença de preferências pessoais em relação à proximidade entre
vizinhos com características diferentes pode levar, num contexto dinâmico, a um padrão de
segregação ou, na terminologia utilizada pela teoria econômica das informações assimétricas,
um equilíbrio separante (no caso, Schelling utilizou como inspiração preferências racistas no
contexto urbano dos Estados Unidos). Um deslocamento individual pode levar a uma reação em
cadeia que subverte as expectativas iniciais sobre as características da localização onde se
escolheu morar. Essa lógica introduz a noção de tempo e de ambiente de incerteza, essenciais à
análise da escolha de localização, em contraposição à síntese de Thünen-Walras, que é
essencialmente a-histórica e atemporal.
A noção de tempo é estudada a partir das idéias de Shackle, Keynes e Frank Knight. O discurso
ortodoxo raciocina como se o futuro não existisse ou como se estivesse incorporado ao presente
por meio da antecipação de expectativas expressas por uma distribuição de probabilidades. A
noção de incerteza em Keynes não lança mão de elementos estatísticos (esperança matemática)
51
como as noções de aversão ao risco e formulações similares, mas incorpora questões da
psicologia de massas. A formalização matemática da incerteza foi o que permitiu que os
economistas ortodoxos pudessem fazer hipóteses sobre o comportamento individual quando se
olha para o futuro. Incorporando a noção da incerteza radical que se lança sobre todos os
agentes, Abramo propõe que a emergência da ordem espacial é decorrência muito menos das
decisões individuais baseadas em trade-offs entre acessibilidade e espaço, que são próprias da
síntese espacial neoclássica, do que da emergência de convenções, ou seja, crenças, sobre a
ordem espacial. Aquilo que a teoria tradicional gostaria que seus modelos explicassem - as
grandezas econômicas, localizações, áreas, preços e densidade urbanos - seriam estabelecidos
por meio de convenções e não pela agregação de intenções e escolhas de localização individuais.
Outra diferença sugerida é a assimetria de poder entre os agentes que participam do processo de
formação das convenções urbanas. Como vimos na apresentação do modelo de Wingo na seção
anterior, não diferença entre os consumidores e os construtores em termos de relação de
poder. Na verdade, como os preços estão determinados para todos os lugares por meio das
curvas de oferta de renda e os construtores encaram competição perfeita com lucro zero, todos
os preços dos insumos terra e capital são determinados indiretamente pela demanda dos
consumidores dos “serviços de habitaç~o”.
A introdução da idéia de assimetria de poder permite inferir que alguns participantes do
mercado de localização imponham margens de ganho ou markups a outros ou que introduzem
diferenciações de produto (como fazem os empresários schumpeterianos) para obter lucros
extraordinários.
A inspiração dos modelos de Becker de estrutura familiar deu origem a outra conjectura que
distancia a formulação heterodoxa da tradicional e torna mais importante o interesse pela
dimensão temporal. Na abordagem heterodoxa os agentes podem escolher sua localização por
dois motivos: pelo motivo residência e pelo motivo especulação, o que implica que os mesmos
agentes podem exibir um duplo comportamento. Levar em conta esse fenômeno do duplo
comportamento é indispensável quando se considera programas de subsídio à habitação
popular, como veremos no Capítulo 4, que trata dos financiamentos à habitação popular.
Neste ponto passo a detalhar os conceitos de incerteza radical urbana e convenção urbana. O
conceito de incerteza radical surge da necessidade de desistir de qualquer tentativa de
quantificar o risco envolvido nas decisões de localização tanto das famílias como dos
empresários construtores. Isto não significa que os agentes deixem de fazer conjecturas sobre o
futuro. Apenas que, por uma série de motivos, os riscos associados às suas decisões não podem
52
ser analisados da forma usual do paradigma neoclássico, com a formação de expectativas
associadas a distribuições de probabilidade.
Na cidade do modelo neoclássico, como vimos, todas as variáveis são determinadas pela
concorrência das famílias, que ofertam sua renda de acordo com cada uma de suas restrições
orçamentárias, e pela escassez de terra, de modo que o proprietário ausente embolsa todo o
excedente. É como se fosse uma cidade de barracas”. Essas poderiam ser desmontadas a
qualquer tempo e a única barreira à migração interna seria a quantidade de recursos que cada
família está disposta a gastar para pagar seu aluguel.
Acontece que, numa perspectiva mais realista, os únicos agentes que podem oferecer o bem
moradia são os empresários urbanos. A hipótese heterodoxa é a de que os empresários não
atuam segundo o modelo de Muth apresentado na seção anterior, onde todos encaram
concorrência perfeita, auferem lucro zero e apenas transmitem para os insumos que utilizam
uma demanda derivada diretamente da demanda das famílias pelo bem habitação. Nesse caso, a
relação terra/capital é totalmente determinada pela demanda e pelo espaço de localizações.
Ao contrário, imagina-se que os empresários podem apresentar um espírito schumpeteriano e
introduzir novidades inesperadas para surpreender seus concorrentes e ganhar algum poder de
monopólio que permita auferir lucros extraordinários.
Por outro lado, apesar de ser plausível que tipos diferentes de famílias entrem em competição
direta no mercado para escolher localizações e que esses tipos de famílias se diferenciem
somente pela renda, Abramo introduz uma hipótese adicional: as famílias procuram localizações
onde outras famílias de renda mais baixa não estejam presentes. Assim, famílias de uma classe
de renda procuram morar próximo a famílias do mesmo tipo para aproveitar os efeitos
produtivos da sinergia produzida por essas aglomerações. A busca passa a ser não só regida pela
distância ao centro (ou centros, no caso de modelos policêntricos), mas por externalidades
associadas à vizinhança escolhida. É a distância relativa entre as famílias que importa. A análise
heterodoxa, portanto, admite que as decisões sejam tomadas independentemente por cada
família, o que não elimina da análise a meta-hipótese de individualismo metodológico.
Acontece que todas as famílias tomam suas decisões ao mesmo tempo, fazendo surgir um
problema de coordenação porque, de antemão, ninguém conhece as decisões das outras famílias.
Para a teoria tradicional, esse problema é resolvido através do raciocínio individual paramétrico
e essa coordenação forma os círculos concêntricos da Figura 2.4. A incerteza radical emerge de
um comportamento oportunista de famílias que decidem morar em locais onde estejam
53
presentes famílias de renda superior à sua, para aproveitar as externalidades de vizinhança de
acordo com o raciocínio de Becker, já apresentado. Citando o texto original (Abramo 2007):
Feita a escolha, essa família vai morar numa zona cujo perfil populacional lhe é estranho, que
a maioria das demais famílias possui renda superior. (...) A estratégia de se beneficiar da
localização para aumentar suas próprias vantagens (ou proveitos) procede justamente, em
termos intertemporais, de um comportamento oportunista, pois a família que a utiliza vai
usufruir da vantagem de uma externalidade de vizinhança (interação com famílias mais
abastadas) formada, na verdade, sem sua contribuição.
No caso dessa configuração, impõe-se, porém, uma questão concreta: qual será a reação das
famílias majoritárias diante desse tipo diferente, uma vez que, para elas, a chegada do intruso
significa uma redução da externalidade positiva decorrente do efeito causado pela aglomeração
de famílias do mesmo tipo? Pode ser que vejam uma ameaça, ou, pelo contrário, achem que
essa família diferente (e solitária) não modificará de maneira expressiva as externalidades de
vizinhança que os levaram a escolher tal localização. No segundo caso, adotariam um
comportamento mais pacífico diante do intrometido oportunista.
Entretanto, basta que apenas uma das famílias do bairro invadido decida sair (devido a essa
nova e inesperada relação de vizinhança) para que se inicie um processo de transformação da
composição social do bairro. O processo, teorizado por Schelling com o nome de tipping model,
pode obedecer a dinâmicas diversas. Se o lugar que essa partida deixou vago for ocupado por
uma família de renda também inferior, isso pode incentivar a saída de outras famílias mais
abastadas. Daí em diante, um processo reiterativo em que novas chegadas provocam a partida
de antigos moradores fará com que a composição do local entre numa fase de transformação.
(...) E esse processo ocorre a despeito dos postulados da teoria de mercado da localização
residencial, que servem de referência às antecipações racionais dos agentes.
Esse tipo de reação em cadeia é imprevisível, pois não pode ser previsto por algum tipo de
projeção com base em acontecimentos passados. No jargão da econometria de séries de tempo
este seria um fenômeno não-ergótico. Ele pode ocorrer em qualquer lugar, pode gerar novas
reações em cadeia e atingir a cidade como um todo. Isso é a base concreta para a formação de
um contexto onde a incerteza urbana é radical e generalizada. A decisão de uma família pode
deflagrar um processo que muda de maneira imprevisível as características que basearam as
outras escolhas. Isso é o que Shackle chama de decisão crucial.
Passemos agora ao lado da produção. As decisões cruciais, ou seja, aquelas que, uma vez
tomadas por algum agente (ainda que único e independentemente dos outros), possam provocar
uma ruptura de caráter imprevisível com o passado, podem ser tomadas também por
54
empresários schumpeterianos da construção. Em busca de lucros extraordinários, esses
empresários criam inovações imobiliárias que podem assumir o caráter de decisões cruciais.
Nos modelos básicos neoclássicos mostrados na seção anterior todas as grandezas representam
fluxos. O preço da terra e do capital e as restrições orçamentárias representam quantidades que
se renovam a qualquer momento sem nenhum custo, ilustradas pela metáfora da “cidade de
barracas”. Nesse cenário, o modelo de Muth, uma vez que trata a questão a partir de quantidades
do bem habitação, que inclui a terra e o capital, representa o empresário como o construtor de
uma “cidade Lego”, uma que se monta e se desmonta à vontade e sem custos.
Ocorre que as residências são bens duráveis, talvez os mais duráveis que se podem imaginar, o
que significa que formam um estoque ao longo do tempo. A decisão de localização tem uma certa
dimensão irreversível e temporal que não pode ser desprezada. É verdade que existem modelos
neoclássicos que tentam lidar com a formação de estoques como Anas (1978) à custa de muitas
hipóteses irrealistas, mas que m dificuldade em abordar a dimensão histórica. Quando entra
em cena o empresário da construção com vocação schumpeteriana, em busca de inovações, suas
decisões podem desestabilizar a ordem urbana existente.
A inovação de que falamos aqui pode aparecer tanto no produto como no processo de produção.
Neste último caso, uma mudança tecnológica pode tornar possível a construção em lugares onde
nunca ninguém pensou em construir. No modelo de Muth vimos que uma das hipóteses
utilizadas era a de que o capital tem o mesmo preço em qualquer lugar. No caso da inovação de
produto, podemos pensar em mudanças de estilo arquitetônico que diferenciam o produto final
de outros oferecidos no mercado. As características do bem habitação se modificam ao longo do
tempo. Embora Abramo trate apenas do mercado residencial em sua obra, acredito que essas
afirmações também sejam válidas para o mercado de prédios comerciais. Com as inovações na
produção de bens em geral, as estruturas das empresas e suas necessidades também se
modificam e, com isso, a arquitetura dos escritórios segue uma tendência a inovações periódicas.
A conseqüência desse raciocínio é que a configuração das localizações dentro da cidade em
termos de renda média, educação e outras variáveis socioeconômicas não apresentam uma
configuração tão estável e ordenada como sugere a teoria neoclássica. No capítulo em que
analiso o banco de dados mostro na forma de análises qualitativas e quantitativas argumentos
que corroboram a perspectiva hetorodoxa.
É hora de reiterar as perguntas centrais da investigação:
55
A escolha de localização dos projetos pelos agentes públicos, bem como as condições
estipuladas nos contratos de financiamento, fornecem os incentivos adequados para que
o plano de povoamento do centro seja levado a cabo e atinja seus objetivos?
Será possível que os mesmos incentivos tendam a levar à reversão dos objetivos
propostos?
A abrangência do programa é suficiente para gerar uma massa crítica de deslocamentos
e proporcionar o surgimento de uma nova convenção urbana que tenda a gerar demanda
pelas áreas ociosas da região central?
Os contratos de financiamento se aproximam idealmente de um first Best?
Existe alguma maneira de induzir, seja por mudança na legislação urbanística, seja por
investimento público, o surgimento de uma massa crítica de deslocamentos que gerem
externalidades positivas em relação às condições do entorno do lugar de moradia de
cada família deslocada?
A implantação operacional do modelo de revitalização a partir da reforma de prédios
abandonados em São Paulo limitou-se a um número muito pequeno de casos (sete prédios de
apartamentos reformados e entregues até o momento) e ainda não houve tempo suficiente para
que pudéssemos formar uma boa série histórica de avaliação de seu sucesso.
No Capítulo 3 a análise do banco de dados construído para essa pesquisa, juntamente com o
cruzamento de informações de outros dados de domínio público devem lançar alguma luz sobre
essas questões.
56
3 Análise empírica
3.1 Análise descritiva do banco de dados
As tabelas apresentadas a seguir mostram algumas relações de coincidência entre as diferentes
combinações de casos de tipo de ocupação, tipo de uso e aparência de tombamento. As
proporções de cada combinação devem fornecer uma primeira intuição sobre a forma como os
incentivos para a manutenção da função econômica de cada imóvel são tipificados. É importante
notar que não inferência estatística na análise que se segue, uma vez que as observações são
representativas do universo.
Tabela 3.1: Tipo de ocupação dos imóveis observados
Tipo de ocupação
Número
Área (m²)
Terrenos baldios
13
2.5%
7224
2.1%
Imóveis totalmente desocupados
105
20.1%
46993
13.7%
Imóveis utilizados exclusivamente como estacionamentos
235
44.9%
207443
60.5%
Imóveis ocupados por invasão organizada
6
1.1%
5224
1.5%
Obras em andamento
12
2.3%
6091
1.8%
Obras interrompidas
7
1.3%
3822
1.1%
Imóveis onde a maioria dos andares está desocupada
44
8.4%
22156
6.5%
Imóveis onde apenas o térreo está ocupado
101
19.3%
44149
12.9%
Totais
523
100.0%
343102
100.0%
Fonte: elaboração própria
Tabela 3.2: Tipo de uso do imóvel
Tipo de uso
Número
Área (m²)
Não identificado
258
49.3%
215401
62.8%
Uso comercial
178
34.0%
85564
24.9%
Hotel desativado
14
2.7%
8135
2.4%
Uso misto
58
11.1%
26329
7.7%
Uso residencial
15
2.9%
7673
2.2%
Totais
523
100.0%
343102
100.0%
Fonte: elaboração própria
57
Tabela 3.3: Tipo de ocupação e tombamento
Tipo de ocupação
Aparência de tombamento
não
sim
total
Terrenos baldios
13
13
0.0%
Imóveis totalmente desocupados
86
19
105
18.1%
Imóveis utilizados exclusivamente como estacionamentos
230
5
235
2.1%
Imóveis ocupados por invasão organizada
6
6
0.0%
Obras em andamento
9
3
12
25.0%
Obras interrompidas
7
7
0.0%
Imóveis onde a maioria dos andares está desocupada
26
18
44
40.9%
Imóveis onde apenas o térreo está ocupado
58
43
101
42.6%
Fonte: elaboração própria
Quase a metade das observações corresponde a terrenos utilizados como estacionamentos. Há,
entretanto, um número significativo de imóveis totalmente desocupados e imóveis onde apenas
o térreo está ocupado, geralmente com lojas funcionando no nível da rua ou outros casos em que
apenas a parte de baixo do imóvel é utilizada como estacionamento.
Em termos de área, 60,5% estão em terrenos utilizados exclusivamente como estacionamentos.
Aproximadamente 32% são formados pelos terrenos onde imóveis totalmente ou
parcialmente desocupados.
Os imóveis com tipo de uso não identificado correspondem àqueles formados por terrenos com
construções provisórias ou galpões utilizados como estacionamentos, bem como os
considerados baldios.
Nota-se que o problema da ociosidade ocorre principalmente entre os imóveis de uso comercial,
que aparecem em número aproximadamente dez vezes maior do que os imóveis de uso
residencial e três vezes maior do que aqueles de uso misto.
Outro cruzamento de tipos mostra que 18% dos imóveis totalmente desocupados aparentam ser
tombados. Quando somente o térreo es ocupado esse número sobe para 42,6%. Grande
número de imóveis tombados apresenta sinais de ruínas nos andares superiores. Para uso do
imóvel como estacionamento ou loja isso não representa um problema grave, pois os andares
superiores são utilizados apenas como cobertura. Isso indica que a renda obtida pelo imóvel não
é suficiente para cobrir sua depreciação física, mas é suficiente para garantir sua viabilidade
econômica. Estamos aqui num caso clássico de equilíbrio sub-ótimo do ponto de vista estético.
58
A manutenção de um imóvel em boas condições de habitabilidade e dentro da lei envolve custos
que podem ser decompostos da seguinte maneira:
custos relativos à manutenção física do imóvel;
custos administrativos, como cobrança de aluguéis recebíveis;
custos tributários;
custos de transações motivados por disputas judiciais contra mutuários ou inquilinos,
fisco, administração local e espólio.
As receitas necessárias para manter a viabilidade econômica do imóvel são cobertas pelas
receitas de aluguel, de fato ou auto-imputado. A renda residual, depois que se deduzem esses
custos, tem que ser maior ou igual ao custo de oportunidade do uso do imóvel como capital (e
não como moradia) para que a manutenção física do imóvel seja sustentada pelas receitas no
longo prazo.
Todos os imóveis antigos são sensíveis aos custos de transação, porque, devido à sua vida útil
como bem de capital e à dispersão de relações jurídicas que vão se formando em torno dos
direitos de propriedade a eles relacionados ao longo do tempo, a história jurídica do imóvel
tende a se tornar mais complexa com o passar dos anos. Quanto maior o número de disputantes,
mais cara a defesa jurídica dos direitos de propriedade.
Imóveis tombados são particularmente sensíveis aos custos de manutenção física, mas
dependendo de sua proximidade de demanda de espaço para estacionamento, podem
rapidamente se converter em estacionamentos sem aumento de custos físicos de manutenção. É
por isso que há tantos deles. A Foto 3.1 abaixo ilustra o ponto.
59
Foto 3.1: Casarão utilizado como estacionamento na Rua Quintino Bocaiúva,
248
Foto do autor
A utilização de imóveis sem construções ou com construções leves, como galpões de cobertura
para uso exclusivo como estacionamento, por outro lado, apresenta custos muito baixos. Com
exceção de tributação sobre o imóvel (IPTU) e sobre o serviço prestado pelos manobristas (folha
de pagamentos e ISS), os outros custos são praticamente inexistentes. Desde que a demanda por
vagas seja suficiente para gerar uma renda maior do que a taxa de juros de mercado, esse tipo de
uso se justifica do ponto de vista econômico. A base de dados inclui preços de vários
estacionamentos pesquisados. É possível construir curvas de nível que indicam a localização de
focos de escassez de vagas de estacionamento dentro da região.
Outro fato que chama atenção é que de todos os imóveis observados, apenas seis estavam
ocupados irregularmente por pessoas ligadas a movimentos organizados.
Os imóveis catalogados estão distribuídos por todo o território considerado, mas existem
aglomerados de imóveis que surgem em determinadas regiões. várias hipóteses para a
ocorrência desse fenômeno, entre elas a ocorrência de acidentes geográficos, proximidade de
60
vias de grande circulação de automóveis e existência de outros imóveis em situação semelhante,
uma espécie de externalidade negativa causada por outros prédios abandonados no entorno.
O fato de que a área dos terrenos utilizados exclusivamente como estacionamentos é duas vezes
maior do que a área correspondente a edifícios disfuncionais é, a meu ver, suficiente para
esvaziar a importância de políticas de reforma e requalificação de edifícios para fins residenciais,
como é o caso do PAR. As dificuldades em orçar obras nessas condições são freqüentemente
maiores do que realizar orçamentos para prédios novos uma vez que edifícios antigos
apresentam toda sorte de problemas estruturais difíceis de detectar.
Entretanto, as informações coletadas em campo podem servir de subsídios para descobrir como
criar incentivos para que a ocupação de um número inicial de imóveis gere uma massa crítica
suficiente para gerar externalidades positivas em seu entorno e um aumento da renda do
proprietário compatível com a manutenção física do imóvel.
3.2 O “problema da área unitária modificável”
Esse problema é oriundo do fato de que as análises estatísticas que utilizam informações
geográficas ou que, de alguma maneira, utilizam dados vinculados a alguma topologia no espaço
2
, no caso específico aqui, medido em coordenadas geográficas projetadas, são sensíveis ao
sistema de delimitações geográficas (fronteiras) utilizado na análise de dados agregados. Essa
seção segue da leitura de Rogerson, Peter (2001) e Fotheringham et al. (2000).
O problema da área unitária modificável apresenta dois aspectos importantes e que não devem
ser desprezados em qualquer análise. Um deles se relaciona com a localização das fronteiras das
zonas onde se circunscrevem os dados que serão agregados e outro que se refere à escala
geográfica. A busca de robustez nos resultados é melhor apreciada quando se procura fazer
ensaios da análise para diferentes sistemas de zoneamento.
Nesta pesquisa não a possibilidade de utilizar sistemas de zoneamento diferentes daqueles
estipulados pelo IBGE para a pesquisa de campo do Censo Demográfico. É possível, entretanto,
estimar coeficientes para agregados em diferentes escalas.
3.3 Análise de padrões espaciais e pontuais
Passo aqui a descrever dois métodos utilizados por geógrafos para analisar padrões de
dispersão de valores segundo sua posição geográfica.
O primeiro estimador que quero apresentar é o chamado Coeficiente I de Moran, utilizado para
inspecionar regularidades em dados agregados distribuídos em zonas geográficas, como os
61
setores censitários. Este estimador mede o grau de correlação espacial para dados que se
encontram em setores diferentes em um mapa. Ele está contido no intervalo fechado que vai de -
1 a +1. Valores próximos de -1 indicam forte correlação espacial negativa, ou seja, que valores
altos tendem a ficar próximos de valores baixos, uma situação relativamente rara. Valores
próximos a +1 indicam forte correlação espacial positiva, ou seja, os valores altos tendem a ficar
próximos de valores altos. Um valor próximo de 0 indica um padrão aleatório. O Coeficiente I de
Moran é dado por:
=

(
)

(
)
2
No primeiro momento será utilizado o coeficiente I de Moran para mostrar o grau de correlação
espacial em relação à renda e à distância dos centróides (centros geométricos) das regiões para
as quais são representativos os dados agregados do Censo Demográfico do IBGE. A idéia é fazer
os testes em escalas geográficas da maior para a menor. O que temos à disposição são medidas
agregadas no nível dos 39 municípios da RMSP, 162 distritos, 821 áreas de ponderação e 21744
setores censitários.
Em outra seção mais adiante, será calculado o estimador chamado Estimador do vizinho mais
próximo, para detectar padrões de acumulação de ocorrências no espaço.
O estimador do vizinho mais próximo é dado pela seguinte expressão que representa uma
razão entre valores observados e valores esperados:
=
0
=
1 2(
)
Onde é a média das distâncias de cada ponto ao seu vizinho mais próximo e é o número de
pontos por unidade de área.
Sabe-se que a variância das distâncias médias, quando se tomam várias distribuições aleatórias é
igual a:
=
4
4
Onde é o número de pontos observados.
62
varia de 0 a um valor teórico máximo de 2,14 para um padrão de dispersão sistemático em um
plano infinito. Quando = 1 o padrão observado é aleatório porque a média das distâncias é
igual à distância esperada.
Há um teste que testa a hipótese nula de que o padrão é aleatório dado por:
=
(
0
)
[
]
=
0
(4 ) (4)
= 3.826(
0
)
tem uma distribuição normal com média 0 e variância 1 e a significância estatística pode ser
inferida a partir das tabelas usuais.
3.4 Análise de aleatoriedade dos padrões de contigüidade de renda e educação
em várias escalas utilizando o coeficiente de Moran I.
Nessa seção são calculados coeficientes de Moran I para diferentes escalas e configurações
geográficas utilizando-se os dados do CENSO demográfico. A idéia aqui é testar a robustez dessa
medida levando em consideração a geografia da RMSP dividida em unidades geográficas com
agregações distintas.
Como vimos na seção anterior, o índice de Moran I é uma medida não-paramétrica que relaciona
uma grandeza contínua associada a uma região geográfica às distâncias dos centros das outras
regiões consideradas.
O índice está contido no intervalo fechado que vai de -1 a +1. Um índice próximo de -1 indica
uma forte e sistemática correlação espacial negativa, ou seja, valores altos em uma dada região
tendem a ser acompanhados de valores baixos em uma região vizinha. Um índice próximo a +1
indica uma forte e sistemática correlação espacial positiva, ou seja, valores altos (baixos) em
uma região tendem a ser acompanhados de valores altos (baixos) em uma região vizinha.
O teste de signific}ncia para esse coeficiente é, na verdade, um teste de “pseudo-signific}ncia”,
uma vez que o que se compara é a medida do coeficiente com a média de uma distribuição
formada pela permutação dos próprios valores que compõem o coeficiente, simulando então
uma situação contrafactual.
As escalas escolhidas aqui foram aquelas onde foi possível agregar dados da amostra do CENSO.
A menor unidade geográfica representativa da amostra é a área de ponderação do CENSO. Os
dados representativos das áreas de ponderação podem ser agregados e considerados
63
representativos para as divisões de distritos e municípios. A Tabela 3.4 mostra o índice
calculado para os diferentes níveis de agregação.
Tabela 3.4: Resultados comparados para diferentes escalas utilizando a
amostra do CENSO
Dividida por
critério
Índice de Moran
Indice esperado
Variância
Z score
Padrão
Municípios
(RMSP)
Renda média
total individual
- 0.008176
-0.027027
0.000944
0.613615
aleatório
Educação média
0.058133
-0.027027
0.000968
2.737794
Concentrado
**
Distritos (RMSP)
Renda média
total individual
0.267966
-0.006757
0.000070
32.869348
Concentrado
**
Educação média
0.303872
-0.006757
0.000071
36.776918
Concentrado
**
Áreas de
ponderação
(RMSP)
Renda média
total individual
0.216989
-0.001235
0.000004
109.800462
Concentrado
**
Educação média
0.218855
-0.001235
0.000004
110.323723
Concentrado
**
Distritos (MSP)
Renda média
total individual
0.217411
-0.010638
0.000135
19.615333
Concentrado
**
Educação média
0.230642
-0.010638
0.000138
20.534981
Concentrado
**
Áreas de
ponderação
(MSP)
Renda média
total individual
0.265195
-0.002198
0.000012
78.044114
Concentrado
**
Educação média
0.270488
-0.002198
0.000012
79.284928
Concentrado
**
Distritos (Centro
Expandido)
Renda média
total individual
0.127139
-0.024390
0.000423
7.370817
Concentrado
**
Educação média
0.123446
-0.024390
0.000431
7.122041
Concentrado
**
Áreas de
ponderação
(Centro
Expandido)
Renda média
total individual
0.219658
-0.006135
0.000060
29.242961
Concentrado
**
Educação média
0.215434
-0.006135
0.000060
28.621840
Concentrado
**
Fonte: elaboração própria
A Tabela 3.5 abaixo mostra os resultados quando se utilizam os dados do universo do censo
dividido por setores censitários. As regiões escolhidas foram o município de São Paulo, a área do
centro expandido juntamente com os distritos adjacentes, os 13 distritos centrais e o Centro
Histórico (distritos Sé e República).
Os coeficientes são menores do que 0,30 em todos os testes realizados para todas as agregações
em escalas diferentes nas áreas medidas, tanto para a variável renda como para a variável
educação. Isso reforça a noção de mosaico em contraposição à noção de distribuição concêntrica,
pois é possível encontrar áreas com rendas muito díspares muito próximas umas às outras e
também áreas com renda semelhante a grandes distâncias.
64
Tabela 3.5: Resultados comparados para diferentes escalas utilizando o
universo do CENSO
Dividida por
critério
Índice de Moran
Indice esperado
Variância
Z score
Padrão
Distritos centrais +
distritos
adjacentes (43)
Renda média
total individual
- 0.008176
-0.027027
0.000944
0.613615
aleatório
Educação média
0.058133
-0.027027
0.000968
2.737794
Concentrado
**
Distritos centrais
Renda média
total individual
0.267966
-0.006757
0.000070
32.869348
Concentrado
**
Educação média
0.303872
-0.006757
0.000071
36.776918
Concentrado
**
Distritos Sé e
República
Renda média
total individual
0.216989
-0.001235
0.000004
109.800462
Concentrado
**
Educação média
0.218855
-0.001235
0.000004
110.323723
Concentrado
**
Fonte: elaboração própria
A seguir, são apresentados mapas que mostram a distribuição espacial da renda em cada uma
das escalas de agregação espacial utilizadas para o cálculo do coeficiente de Moran I.
O Mapa 3.1 e o Mapa 3.2 mostram escalas de cor representando intervalos de renda para
unidades territoriais identificáveis no Censo Demográfico do IBGE correspondentes àquelas que
foram utilizadas na Tabela 3.4.
Na posição superior do Mapa 3.1 está representada toda a Região Metropolitana de São Paulo
dividida por municípios segundo sua renda média total individual. Na posição inferior encontra-
se a parte central do Município de São Paulo bem como outros municípios vizinhos divididos por
distritos segundo o mesmo critério. Deve-se notar que as escalas de cores não o as mesmas,
pois cada cor representa um intervalo de renda diferente.
O índice de Moran I para a divisão entre municípios indica uma situação de aleatoriedade, ou
seja, não pode ser considerado diferente de zero segundo o teste de pseudo-significância. Isso
pode ser compreendido, por exemplo, pelo fato de que municípios como Santana de Parnaíba
e Barueri, onde condomínios de luxo, muito próximos a cidades-dormitório como Itapevi e
Pirapora do Bom Jesus, de renda média muito baixa, ou à proximidade entre os municípios do
chamado Grande ABC, muito próximos, porém com renda média muito díspare.
A divisão por distritos já começa a lembrar vagamente a divisão concêntrica sugerida pela teoria
da localização preferida pelo mainstream. A parte mais rica se concentra na Zona Oeste do
Município de São Paulo, mas o gradiente está longe de ser uma figura geométrica contínua.
65
Mapa 3.1: Municípios da RMSP: renda média total individual
Fonte: elaboração própria a partir da amostra do CENSO demográfico de 2000 do IBGE
66
Trabalhando com uma escala menor ainda, o Mapa3.2 representa as divisões por distritos e por
áreas de ponderação do CENSO.
Diferentemente do mapa anterior, este representa tanto os distritos na parte superior como as
áreas de ponderação na parte inferior na mesma escala geográfica e na mesma escala de cores,
ou seja, cada cor representa a mesma faixa de renda.
O que chama a atenção é que a divisão dos distritos em áreas de ponderação é capaz de, a partir
desta desagregação espacial, mostrar mais heterogeneidade em termos de renda. Quando
consideramos |reas de ponderaç~o, para falar somente dos 13 “distritos centrais” os distritos
Bom Retiro e Belém são divididos em duas áreas de ponderação, República e Mooca são
divididos em três e os distritos Santa Cecília, Consolação, Bela Vista e Liberdade em quatro
regiões cada. Somente dentro do distrito República, a medição compreende três faixas de renda
dentro da escala utilizada. Isso atesta a heterogeneidade que tomamos como hipótese para o
raciocínio de que para a formulação de políticas públicas urbanas, o modelo do mosaico de
externalidades pode fornecer melhores subsídios.
Elaborando agora a ilustração da Tabela 3.5 por meio de mais um mapa temático, pode-se ver
na parte superior do Mapa 3.3 os setores censitários contidos nos 43 distritos centrais (os 13
centrais para efeito da política pública + 30 distritos adjacentes dos dois lados dos rios Tietê e
Pinheiros).
Os setores de renda mais elevada localizam-se na Zona Oeste, dos dois lados do Rio Pinheiros,
mas não se observa um contínuo entre eles, e sim grupos de quadras onde a renda é mais
elevada que nos arredores, formando “ilhas” de renda alta.
O Mapa 3.4 apresenta o Centro Histórico (Sé e República) e os distritos adjacentes divididos por
setores censitários coloridos de acordo com faixas de renda. Esse mapa mostra, finalmente,
como a heterogeneidade em termos de renda é relevante dentro da área de estudo. Nos 4,5 km²
onde foram recenseados os imóveis setores censitários onde a renda média do responsável é
muito baixa, como algumas quadras da baixada do Glicério (Setor 11 do mosaico veja o Mapa
3.5): renda de R$ 537 num extremo e algumas quadras na Avenida São Luís (Setor 19 do
mosaico veja o Mapa 3.5): renda de R$ 4090, quase oito vezes maior! A distância em linha reta
entre os dois setores é de apenas 1.700m.
67
Mapa 3.2: Distritos e Áreas de Ponderação do CENSO: renda média total
individual
Fonte: elaboração própria a partir da amostra do CENSO demográfico de 2000 do IBGE
68
Mapa 3.3: Setores censitários: renda média do responsável
Fonte: elaboração própria a partir do universo do CENSO demográfico de 2000 do IBGE
69
Mapa 3.4: Setores censitários no Centro Histórico: renda média do responsável
Fonte: elaboração própria a partir do universo do CENSO demográfico de 2000 do IBGE
70
3.5 Análise do banco de dados original a partir da perspectiva do mosaico de
externalidades
Esta seção apresenta uma discussão qualitativa dos distritos centrais, procurando dar uma
interpretaç~o { “microgeografia econômica” da regi~o dos distritos e República de modo a
harmonizá-la com a teoria do mosaico. Tomando literalmente a metáfora do mosaico como
“padr~o composto de v|rias partes irregulares e distintas”, foram representadas regiões que
formam um mosaico dentro dos distritos.
3.5.1 O mosaico
As peças do mosaico (aqui chamadas de setores” do mosaico) do Centro Histórico de São
Paulo de fato são irregulares e heterogêneas, fruto de anos de história e marcados pela
passagem de ciclos econômicos e gerações de urbanistas, juristas e homens públicos, que
imprimiram suas marcas materiais e institucionais. Há, entretanto, alguns critérios mais factuais
pelos quais as divisões dessas microrregiões foram arbitradas. O manual do CENSO não indica
claramente os critérios utilizados para a marcação das fronteiras das unidades geográficas
pesquisadas, mas, ainda que não intencionalmente, muitas das linhas traçadas aqui coincidiram
com as das áreas de ponderação do CENSO.
O traçado das fronteiras dos polígonos deste mosaico, antes de qualquer preocupação com as
divisões das bases de dados públicas disponíveis, baseou-se principalmente numa interpretação
do conceito de “barreira { circulaç~o” (Schor et. al., 2003) adaptada às circunstâncias
experimentadas no curso da elaboração da base de dados. Uma barreira à circulação, para o
efeito dessa análise, é qualquer obstáculo que tende a criar um custo adicional relevante (em
termos de tempo ou conforto) para cruzá-lo, a pé ou sobre rodas, em alguma direção.
Uma via de duas mãos, três pistas de rolamento e um corredor de ônibus como a Avenida Rio
Branco, por exemplo, cria dificuldades para os pedestres que desejam atravessá-la e para os
veículos que desejam cruzá-la. Os sinais para pedestres demoram muito para liberar a passagem.
O automóvel que trafega em uma direção enfrenta dificuldades para fazer um retorno e passar
para a direção contrária.
Os calçadões são barreiras à circulação de automóveis e apresentam problemas específicos. A
grande maioria dos prédios em condição de subocupação está localizada nos calçadões.
Não grandes variações topográficas na área estudada, com exceção do vale do rio
Anhangabaú, hoje canalizado e coberto pela laje do Anhangabaú, e que acompanha o relevo
desde a Praça da até o Largo de São Bento seguindo a Rua Florêncio de Abreu. Uma das
71
divisões do mosaico passa justamente por essa rua, porque as quadras do seu lado direito estão
a aproximadamente 25m de altura em relação ao polígono adjacente formado pela região da Rua
25 de Março. A grande diferença de usos comerciais dentro desses polígonos vizinhos justifica a
divisão. A encosta do vale também se estende na direção sul ao longo da Avenida 9 de Julho. Essa
topografia cria dificuldades de circulação ao longo da linha do vale e é refletida no mapa do
mosaico pelas divisões dos setores 20, 22, 21, 1, 3, 25,2 e 13 (ver Mapa 3.5).
Outro tipo de barreira também surge quando há uma quebra de simetria entre as quadras.
Muitas vezes a quadra de um lado da rua é muito maior do que a quadra do lado oposto, o que
tende a seccionar a circulação dos dois lados da quadra grande como acontece, por exemplo, na
divisão entre os setores 23 e 24 (ver Mapa 3.5).
As divisões do mosaico também refletem diferenças entre localizações com atividades
econômicas distintas, mas a especialização das atividades econômicas parece ser uma
conseqüência desses problemas de circulação aliadas a outros fatores históricos que não podem
ser discutidos neste trabalho.
72
A Tabela 3.6 abaixo indica os nomes dados aos polígonos que formam o mosaico.
Tabela 3.6: nomes das regiões do mosaico
Identificação
Nome
1
Anhangabaú
2
Sé - Rua Paula Souza
3
Sé - Rua Florêncio de Abreu
4
Sé - Rua 25 de Março
5
Sé - Mercado Municipal
6
Sé - Calçadão
7
Sé - Terminal D. Pedro
8
Sé - Largo de São Francisco
9
Sé - Rua Tabatingüera
10
Sé - Liberdade
11
Sé - Baixada do Glicério
12
República - Rua Santa Ifigênia
13
República - Luz
14
República - Avenidas Rio Branco e São João
15
República - Largo do Paissandú
16
República - Arouche
17
República - Minhocão
18
República - Calçadão
19
República - Praça Roosevelt
20
República - Rua Álvaro de Carvalho
21
República - Praça da Bandeira
22
República - Avenida 9 de Julho
23
República - Bexiga
24
República - Avenida Brigadeiro Luís Antônio
25
República - Avenida Casper Líbero
73
O Mapa 3.5 mostra a divisão dos distritos e República (mosaico) adotadas para efeito da
análise qualitativa.
Mapa 3.5: Divisão dos distritos Sé e República para análise
Fonte: elaboração própria a partir de mapas do CEM-CEBRAP e do georreferenciamento da pesquisa de campo
74
A Tabela 3.7 mostra como as observações ficaram distribuídas dentro das divisões do mosaico
segundo a tipologia criada para categorizar o tipo de subutilização.
Tabela 3.7: Tipologia da ocupação nas regiões
Região
Número
de
imóveis
Terrenos
baldios
Imóveis
totalmente
desocupados
Imóveis utilizados
exclusivamente
como
estacionamentos
Imóveis
ocupados
por invasão
organizada
Obras em
andamento
Obras
interrompidas
Imóveis onde
a maioria dos
andares está
desocupada
Imóveis onde
apenas o
térreo está
ocupado
1
9
2
22%
1
11%
4
44%
2
22%
2
24
4
17%
12
50%
1
4%
1
4%
0%
1
4%
5
21%
3
25
1
4%
4
16%
6
24%
1
4%
0%
0%
1
4%
12
48%
4
9
0%
1
11%
3
33%
0%
1
11%
0%
1
11%
3
33%
5
5
0%
0%
0%
0%
0%
0%
2
40%
3
60%
6
51
0%
15
29%
1
2%
0%
1
2%
0%
11
22%
23
45%
7
19
0%
4
21%
7
37%
0%
0%
0%
0%
8
42%
8
20
0%
5
25%
2
10%
0%
3
15%
0%
2
10%
8
40%
9
17
0%
0%
12
71%
0%
1
6%
2
12%
2
12%
0%
10
21
0%
3
14%
16
76%
0%
0%
1
5%
0%
1
5%
11
10
1
10%
0%
9
90%
0%
0%
0%
0%
0%
12
24
1
4%
4
17%
17
71%
1
4%
0%
0%
0%
1
4%
13
35
0%
10
29%
17
49%
2
6%
1
3%
0%
1
3%
4
11%
14
22
0%
2
9%
18
82%
0%
1
5%
1
5%
0%
0%
15
14
0%
2
14%
3
21%
0%
0%
0%
1
7%
8
57%
16
14
1
7%
0%
9
64%
0%
1
7%
0%
2
14%
1
7%
17
44
2
5%
10
23%
28
64%
0%
0%
0%
1
2%
3
7%
18
29
10%
10
34%
0%
0%
0%
0%
6
21%
13
45%
19
7
0%
2
29%
5
71%
0%
0%
0%
0%
0%
20
18
1
6%
1
6%
13
72%
0%
0%
0%
2
11%
1
6%
21
17
0%
2
12%
11
65%
1
6%
1
6%
0%
2
12%
0%
22
6
1
17%
1
17%
4
67%
0%
0%
0%
0%
0%
23
50
6
12%
16
32%
23
46%
0%
0%
2
4%
3
6%
0%
24
19
0%
3
16%
13
68%
0%
0%
0%
2
11%
1
5%
25
15
0%
4
27%
8
53%
0%
0%
1
7%
1
7%
1
7%
total
524
3%
20%
45%
1%
2%
1%
9%
19%
Fonte: elaboração própria
75
3.5.2 Análise de clusters utilizando o coeficiente do vizinho mais próximo
A análise foi feita em três escalas, para ajudar na interpretação, uma vez que a divisão dos
setores é representada por polígonos de formatos bastante diferentes. O uso de mais de um
critério para a inclusão de pontos cria melhores condições para a interpretação dos resultados.
Primeiro foram tomados todos os pontos encontrados, sem fazer distinção entre usos, dentro
dos distritos e República. Em seguida, para cada um dos polígonos que compõem o mosaico,
foram feitas medidas de vizinhança entre os centros dos terrenos dentro de cada polígono,
dentro de uma zona de 250m ao redor do polígono e, finalmente, para o agregado formado pelo
polígono central e aqueles adjacentes a ele.
As medidas foram realizadas primeiro para todos os imóveis, depois somente considerando os
prédios totalmente desocupados, os que apresentavam somente o térreo ocupado e os
parcialmente ocupados como um bloco e, finalmente, somente os imóveis utilizados
exclusivamente como estacionamentos sem construções pesadas.
Essa medida mostrou uma grande diferença na distribuição espacial das construções
subutilizadas em relação à distribuição espacial dos estacionamentos. Em particular, os prédios
problemáticos mostraram-se muito concentrados nos polígonos que formam os calçadões e suas
adjacências.
os terrenos onde funcionam os estacionamentos, com exceção da região dos calçadões (onde
não existem), estão mais uniformemente distribuídos em praticamente todos os outros setores.
A análise dos coeficientes mostra padrões dispersos ou aleatórios na grande maioria dos setores.
A Tabela 3.8 abaixo apresenta o resumo da análise dos padrões de aglomeração para cada um
dos setores do mosaico, bem como para cada vizinhança respectiva. As tabelas mostrando
analiticamente os coeficientes se encontram no apêndice.
76
Tabela 3.8: Análise de padrões de aglomeração utilizando o coeficiente do
vizinho mais próximo (resumo)
Região
seleção de pontos
todos os imóveis
desocupados,
térreo, semi-
ocupados
estacionamentos
todas
concentrado**
concentrado**
concentrado**
1
pontos internos
aleatório
disperso*
buffer de 250m ao redor da região
concentrado**
concentrado**
concentrado**
dentro das regiões contíguas
(3,6,8,15,18,20,21)
concentrado**
concentrado**
concentrado**
2
pontos internos
disperso
aleatório
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
disperso**
concentrado*
disperso*
dentro das regiões contíguas
(3,4,5,13,25)
concentrado**
concentrado**
aleatório
3
pontos internos
disperso**
disperso*
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
aleatório
aleatório
disperso**
dentro das regiões contíguas
(1,2,4,6,25)
concentrado**
aleatório
aleatório
4
pontos internos
concentrado**
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado**
concentrado**
aleatório
dentro das regiões contíguas
(2,3,5,6,7)
concentrado**
concentrado**
concentrado**
5
pontos internos
disperso**
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
aleatório
disperso*
disperso**
dentro das regiões contíguas
(2,4,7)
concentrado
concentrado**
aleatório
6
pontos internos
concentrado**
concentrado**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado**
concentrado**
aleatório
dentro das regiões contíguas
(1,3,4,7,8,9,10)
concentrado**
concentrado**
concentrado**
7
pontos internos
aleatório
aleatório
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado**
concentrado
disperso**
dentro das regiões contíguas
(4,5,6,9)
concentrado**
concentrado**
aleatório
8
pontos internos
aleatório
aleatório
buffer de 250m ao redor da região
concentrado**
concentrado**
aleatório
dentro das regiões contíguas
(1,6,10,21)
concentrado**
concentrado**
aleatório
9
pontos internos
disperso**
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
disperso*
concentrado*
disperso
dentro das regiões contíguas
(6,7,10,11)
disperso**
concentrado**
aleatório
10
pontos internos
concentrado
aleatório
buffer de 250m ao redor da região
concentrado**
aleatório
aleatório
dentro das regiões contíguas
(6,8,9,11,21,24)
concentrado**
concentrado**
aleatório
77
11
pontos internos
aleatório
aleatório
buffer de 250m ao redor da região
aleatório
disperso**
aleatório
dentro das regiões contíguas
(7,9,10)
concentrado**
concentrado**
aleatório
12
pontos internos
aleatório
disperso**
aleatório
buffer de 250m ao redor da região
concentrado
concentrado**
aleatório
dentro das regiões contíguas
(13,14,15,25)
concentrado*
concentrado**
concentrado**
13
pontos internos
aleatório
aleatório
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado**
concentrado**
aleatório
dentro das regiões contíguas
(2,3,12,15,25)
concentrado**
concentrado**
aleatório
14
pontos internos
aleatório
disperso**
disperso
buffer de 250m ao redor da região
aleatório
aleatório
aleatório
dentro das regiões contíguas
(12,15,16,18)
concentrado**
concentrado
aleatório
15
pontos internos
disperso*
aleatório
buffer de 250m ao redor da região
concentrado*
concentrado**
aleatório
dentro das regiões contíguas
(1,12,13,14,16,18,25)
concentrado**
concentrado**
aleatório
16
pontos internos
disperso*
disperso*
buffer de 250m ao redor da região
aleatório
aleatório
aleatório
dentro das regiões contíguas
(14,15,17,18)
concentrado*
concentrado**
aleatório
17
pontos internos
disperso**
aleatório
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado
concentrado*
aleatório
dentro das regiões contíguas
(16,18,19)
concentrado
concentrado*
aleatório
18
pontos internos
aleatório
aleatório
buffer de 250m ao redor da região
concentrado*
concentrado*
aleatório
dentro das regiões contíguas
(1,14,15,16,17,19,20)
concentrado**
concentrado**
concentrado**
19
pontos internos
disperso**
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado*
aleatório
aleatório
dentro das regiões contíguas
(17,18,20)
concentrado**
concentrado*
aleatório
20
pontos internos
disperso**
disperso**
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado*
aleatório
aleatório
dentro das regiões contíguas
(1,18,19,21,22)
concentrado**
concentrado**
aleatório
21
pontos internos
disperso*
disperso**
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado**
aleatório
aleatório
dentro das regiões contíguas
(1,8,10,20,22,23,24)
concentrado**
concentrado**
concentrado*
22
pontos internos
concentrado**
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado
disperso*
aleatório
dentro das regiões contíguas
(20,21,23)
concentrado**
aleatório
aleatório
23
pontos internos
concentrado
aleatório
aleatório
78
buffer de 250m ao redor da região
concentrado**
aleatório
aleatório
dentro das regiões contíguas
(21,22,24)
concentrado**
aleatório
aleatório
24
pontos internos
disperso**
disperso**
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado*
disperso**
aleatório
dentro das regiões contíguas
(10,21,23)
concentrado**
concentrado*
aleatório
25
pontos internos
disperso**
disperso**
disperso**
buffer de 250m ao redor da região
concentrado*
concentrado*
aleatório
dentro das regiões contíguas
(1,2,3,12,13,15)
concentrado**
concentrado**
aleatório
Fonte: elaboração própria
Os mapas que se seguem, mostram a composição de uma grade formada por células quadradas
de 100m de lado. Cada unidade da grade foi colorida de maneira a refletir o número de
observações (imóveis subutilizados e estacionamentos) encontradas em seu interior.
Essa representação permite uma leitura mais apropriada para a associação com o modelo
econômico aqui considerado, pois está relacionada com a hipótese de que o abandono de um
imóvel gera um incentivo ao abandono de imóveis na vizinhança. Isto sugere que algum tipo
de indivisibilidade” do bem “terra”. Essa indivisibilidade, na prática, se pelas restrições das
legislações fundiária, urbanística e de obras ou seja, é de caráter institucional.
A legislação vai sendo modificada ao longo do tempo, mas não se pode esquecer que um prédio
é, provavelmente, a forma de propriedade privada material que leva mais tempo para se
deteriorar. Isto sem contar direitos que são relacionados com a própria terra, alguns até de
caráter perpétuo. Não se pode modificar um traçado urbano - um grupo de quadras para fazer
uma praça, ou uma fileira de casas para fazer passar uma avenida, por exemplo - sem levar em
consideração todos os direitos imobiliários e fundiários de cada um dos proprietários. A
representação por meio da contagem de imóveis aponta essa dificuldade causada pela dimensão
jurídica da propriedade imobiliária e fundiária.
79
Mapa 3.6: Contagem de imóveis subutilizados nos distritos Sé e República
Fonte: elaboração própria
80
No Mapa 3.6 todos os imóveis observados foram contados; isto inclui os imóveis totalmente
desocupados, os que tinham somente seu térreo e sobreloja ocupados, os que apresentavam
mais da metade dos andares desocupados, as obras em andamento, as obras paradas, os
terrenos baldios e aqueles terrenos sem construções destinadas à habitação ou ao comércio
(geralmente galpões) utilizados exclusivamente como estacionamentos. Na legenda estão apenas
representados individualmente os subocupados (em amarelo) e os estacionamentos (em
vermelho).
A representação visual mostrada nos mapas confirma a análise de aglomeração feita a partir das
distâncias observadas entre os imóveis. No Mapa 3.6, onde foram contados também os
estacionamentos, a representação sugere uma presença generalizada de observações com alguns
pontos focais nos setores 3, 6, 7, 8, 13, 17 e 23.
Quando separamos as construções subocupadas (desocupadas, somente com o térreo ocupado e
com mais da metade dos andares desocupados) dos terrenos sem construções utilizados como
estacionamentos, sua distribuição no espaço é muito distinta. Isso sugere que o motivo
econômico pelo qual estão subutilizados é diferente, e pode-se mostrar que, de fato, os dois tipos
de ineficiência estão relacionados a categorias distintas de externalidades.
A diferença mais óbvia é que no Mapa 3.8 a disposição dos estacionamentos forma um anel
relativamente uniforme em torno dos calçadões. no Mapa 3.7, onde só foram contadas as
construções subocupadas, não se pode dizer que uniformidade. A grande maioria das
observações se encontra nos setores onde estão os calçadões (6, 8, 18), nos setores ao longo da
parte norte do Vale do Anhangabaú (3 e 25), e nos setores 15 e 13. Este último, com sérios
problemas de degradaç~o, conhecido como a “antiga cracol}ndia”, tem passado por intervenções
públicas por ocasião das obras da linha 4 do Metrô. H| “vazios” em v|rios setores, chamando
atenção para aqueles que estão em áreas de intensa atividade comercial especializada, como o
setor 12 de comércio de eletrônicos e os setores 4 e 5 onde comércio de produtos têxteis.
Outros setores, como o 10, 11, 14, 16 e 19 são setores onde muitos prédios residenciais,
corroborando, em parte, a idéia de que o uso residencial previne a degradação.
81
Mapa 3.7: Contagem de imóveis em condição de subocupação nos distritos Sé
e República
Fonte: elaboração própria
82
Mapa 3.8: Contagem de imóveis sem construção utilizados exclusivamente
como estacionamentos nos distritos Sé e República
Fonte: elaboração própria
83
A Tabela 3.9 mostra, por ordem decrescente, as regiões do mosaico onde se encontram
observações de imóveis subocupados. Como fica bem visível no Mapa 3.7, os setores 6 e 18
coincidem justamente com os calçadões da Sé e da República respectivamente.
Tabela 3.9: Resumo da contagem de imóveis subocupados por região do
mosaico (por ordem decrescente de participação na área total)
Universo
Subocupados
Estacionamentos
contagem relativa
contagem relativa
Região
dentro do
setor
dentro do Centro
dentro do setor
dentro do Centro
6
51
49
96%
9.33%
1
1.96%
0.19%
18
29
29
100%
5.52%
0.00%
0.00%
23
49
19
39%
3.62%
23
46.94%
4.38%
3
25
17
68%
3.24%
6
24.00%
1.14%
8
20
15
75%
2.86%
2
10.00%
0.38%
13
35
15
43%
2.86%
17
48.57%
3.24%
17
44
14
32%
2.67%
28
63.64%
5.33%
7
19
12
63%
2.29%
7
36.84%
1.33%
15
14
11
79%
2.10%
3
21.43%
0.57%
2
24
10
42%
1.90%
12
50.00%
2.29%
1
9
9
100%
1.71%
0.00%
0.00%
24
19
6
32%
1.14%
13
68.42%
2.48%
4
9
5
56%
0.95%
3
33.33%
0.57%
5
5
5
100%
0.95%
0.00%
0.00%
12
24
5
21%
0.95%
17
70.83%
3.24%
14
23
5
22%
0.95%
16
69.57%
3.05%
25
15
5
33%
0.95%
8
53.33%
1.52%
10
21
4
19%
0.76%
16
76.19%
3.05%
20
18
4
22%
0.76%
13
72.22%
2.48%
21
18
4
22%
0.76%
11
61.11%
2.10%
16
14
3
21%
0.57%
9
64.29%
1.71%
9
17
2
12%
0.38%
12
70.59%
2.29%
19
7
2
29%
0.38%
5
71.43%
0.95%
22
6
1
17%
0.19%
4
66.67%
0.76%
11
10
0%
0.00%
9
90.00%
1.71%
todas
525
250
48%
235
44.76%
Fonte: elaboração própria
Os setores 3 e 23 , que aparecem, respectivamente em terceiro e quarto na lista também têm
uma característica em comum: muitos dos imóveis que se localizam estão sujeitos a leis de
tombamento.
A Tabela 3.10 mostra a mesma lista em ordem decrescente considerando a área estimada.
84
Tabela 3.10: Resumo das áreas de imóveis subocupados por região do
mosaico
Universo
Subocupados
Estacionamentos
área relativa
área relativa
Região
dentro do
setor
dentro do Centro
dentro do setor
dentro do Centro
6
18843
16850
89%
4.95%
1429
7.59%
0.42%
18
14787
14787
100%
4.35%
0.00%
0.00%
3
15853
10334
65%
3.04%
4628
29.20%
1.36%
13
26058
9732
37%
2.86%
12737
48.88%
3.74%
23
31973
8116
25%
2.39%
21775
68.10%
6.40%
17
21571
7027
33%
2.07%
13894
64.41%
4.08%
15
7708
5738
74%
1.69%
1970
25.55%
0.58%
2
17344
4306
25%
1.27%
11843
68.28%
3.48%
12
22347
3661
16%
1.08%
16738
74.90%
4.92%
25
15830
3458
22%
1.02%
11210
70.81%
3.30%
8
5886
3443
58%
1.01%
801
13.61%
0.24%
7
8376
3380
40%
0.99%
4996
59.65%
1.47%
1
3231
3231
100%
0.95%
0.00%
0.00%
20
18425
3182
17%
0.94%
14313
77.69%
4.21%
4
7075
2865
40%
0.84%
3804
53.76%
1.12%
24
12203
2222
18%
0.65%
9981
81.79%
2.93%
5
2023
2023
100%
0.59%
0.00%
0.00%
10
25800
1988
8%
0.58%
23127
89.64%
6.80%
14
16475
1597
10%
0.47%
13899
84.36%
4.09%
16
11772
1538
13%
0.45%
8261
70.18%
2.43%
21
11778
1219
10%
0.36%
9484
80.52%
2.79%
9
9412
888
9%
0.26%
7237
76.89%
2.13%
19
5211
580
11%
0.17%
4631
88.86%
1.36%
22
3671
483
13%
0.14%
2735
74.52%
0.80%
11
6481
0%
0.00%
5519
85.16%
1.62%
todas
340135
113298
33%
205012
60.27%
Fonte: elaboração própria
3.6 Relações entre o banco de dados original e os dados do Censo Demográfico
do IBGE e da RAIS do Ministério do trabalho
Nesta seção, são apresentadas algumas especificações simples de regressões estatísticas que
indicam correlações entre as características das observações do banco de dados original e
variáveis selecionadas do Censo Demográfico de 2000 do IBGE, bem como do Relatório Anual de
Informações Sociais do Ministério do Trabalho
85
3.6.1 Dados e tratamento especial
É necessário, primeiramente, explicar ao leitor como foram feitos os ajustes necessários para
que as bases de dados se tornassem “espacialmente” compatíveis. Como foi dito na seção 3.2
acima, toda vez que se utilizam bases de dados georreferenciadas, sua comparação está sujeita
ao “problema da |rea unit|ria modific|vel”. Quando se trabalha com números reais, basta que os
números estejam na mesma unidade métrica. Quando os dados são georreferenciados, os
territórios considerados são representados por polígonos. Como podemos comparar um dado
referente ao um círculo com um dado referente a um quadrado, ainda que um esteja contido no
outro? No caso desta pesquisa, o problema é comparar as regiões criadas para formar o
“mosaico” com os setores censit|rios se suas fronteiras em geral n~o coincidem?
As fronteiras criadas para o Censo e as fronteiras criadas neste trabalho não coincidem porque
visam observar fenômenos distintos: o Censo está preocupado em produzir dados demográficos.
O mosaico foi criado para ajudar no estudo de problemas de circulação de pessoas e veículos
dentro da área observada.
Esse problema é contornado construindo-se uma grade formada por células quadradas de 100m
de lado, compreendendo uma área de 10.000m² ou 1ha. A grade foi construída dessa forma para
que pudesse ser compatível com a escala do estudo. Em uma cidade planejada com ruas
ortogonais as quadras costumam ter medidas dessa ordem de grandeza. Por outro lado, dado
que as características da malha urbana da região estudada em nada se assemelham com uma
grade ortogonal, é como se as unidades geográficas a serem analisadas fossem traçadas
aleatoriamente, o que garante melhores inferências estatísticas.
Entretanto, adotando-se esse expediente, perde-se informação, uma vez que agora passa a ser
necessário arbitrar valores às células da grade. O procedimento adotado depende de
propriedades cartográficas das variáveis consideradas.
A Figura 3.1 (quadro superior) mostra como um setor censitário (em vermelho) faz intersecção
com várias células da grade. A hipótese adotada é de que todos os valores dentro do setor
censitário são uniformemente distribuídos. Como pela própria construção da pesquisa pelo IBGE
não são identificados indivíduos dentro dos setores censitários, os valores para número de
domicílios dentro de cada célula da grade foram calculados de modo a considerar a contribuição
de dada intersecção proporcionalmente à sua área. Para os valores de renda média foram
considerados os valores relativos ao número de responsáveis por domicílios e os valores
relativos à renda total dentro do setor, tomadas suas proporções pelas áreas e feita a divisão da
renda pelo número de responsáveis para a obtenção do valor médio dentro da célula da grade.
86
Para a atribuição da localização da célula da grade dentro dos setores do mosaico, devido a
limitações do software utilizado ao tratar de problemas de topologia, foram calculados os
centros geométricos de cada célula da grade e o critério para definir a pertinência a uma ou
outra região foi a localização do centro do quadrado dentro do setor (quadro inferior da Figura
3.1). Por exemplo, várias células da grade que são cortadas pela Avenida Rio Branco,
escolhida para ser a fronteira entre os setores 12 e 14. O critério utilizado para decidir a que
setor pertencem foi o setor em que está localizado o centro do quadrado.
Também devido a limitações do software de geoprocessamento, as somas das áreas dos imóveis
observados utilizadas como variáveis dependentes foram consideradas como se estivessem
todas acumuladas no centro de cada célula da grade toda vez que um imóvel tivesse seu centro
geométrico localizado dentro da respectiva célula. Isto, sem dúvida, prejudica a precisão das
estimativas.
87
Figura 3.1: Compatibilização das bases georreferenciadas
No banco de dados original foram pesquisados preços cobrados para a primeira hora de
estacionamento para uma grande amostra. A partir daí foi construído um campo de contornos
88
com valores previstos segundo o método de interpolação ponderada pelo inverso da distância
entre observações vizinhas (Inverse Distance Weighting).
Esse método para encontrar valores interpolados a partir de valores conhecidos foi
desenvolvido por Shepard (1968) e é definido da seguinte forma:
Para um dado interpolado que se quer encontrar para um dado ponto x e pontos
de valores
conhecidos, a forma geral do estimador é uma função de interpolação
() =
(
=0
)
()
=0
onde
=
1
(,
)
sendo
,
a distância euclidiana entre os pontos conhecidos e aquele cujo valor se deseja
interpolar, é o número de pontos na vizinhança usados na interpolação e é um número real
positivo.
O método de Shepard é conseqüência da minimização de um funcional relacionado com uma
medida dos desvios entre n-uplas de pontos de valores conhecidos
,
e k-uplas de pontos
interpolados {
,
} definido como:
,
=
(
)
2
(,
)
=0
1
derivado a partir da condição de minimização:
(, )

= 0
No estimador utilizado aqui = 15 e 1,7.
O Mapa 3.9 abaixo mostra as curvas de nível calculadas para os preços de estacionamento a
partir do estimador de Shepard.
89
Mapa 3.9: Campo calculado a partir da interpolação dos preços de
estacionamento para a primeira hora
Fonte: elaboração própria
90
3.6.2 Testes empíricos
A primeira classe de modelos testados foi a regressão logística, um modelo que procura explicar
a probabilidade de que sejam encontrados edifícios subocupados e estacionamentos dentro de
cada uma das células da grade a partir de outras variáveis contínuas.
A especificação do modelo é a seguinte:
=
Onde
é uma função logística.
A variável dependente tem uma distribuição binária (0 ou 1) que indica a presença de um ou
mais imóveis observados em cada uma das células da grade (1) ou sua ausência (0). Foram
estimadas também regressões referentes à presença de imóveis subocupados, isto é, imóveis
totalmente abandonados, imóveis onde somente o pavimento térreo está ocupado e imóveis com
a maioria dos pavimentos desocupados tomados em conjunto (modelos (1) e (2)), em seguida
somente a presença de terrenos utilizados apenas como estacionamentos (modelos (3) e (4)) e,
finalmente, todas as observações (modelos (5) e (6)).
Para os modelos ímpares foram utilizadas como variáveis explicativas a renda média do
responsável pelo domicílio calculada na célula, o número de empresas cadastradas na RAIS-MT
para o ano de 2001 dentro da célula, o preço do estacionamento estimado pelo método de
Shepard, uma medida de adensamento, (a razão entre o número de domicílios por metro
quadrado) Todas as variáveis foram consideradas em escala logarítmica (ln). Como o preço do
estacionamento não apresentou significância estatística em nenhum dos modelos, foram
rodados modelos alternativos (pares), sem essa variável.
Além disso, considerou-se nos modelos estatísticos a variável categórica que indica a localização
da célula dentro do mosaico, para testar a influência do mosaico na probabilidade da
desocupação. A Tabela 3.11: Estimativas dos coeficientes dos modelos logísticos abaixo resume
as estimativas dos coeficientes para os seis modelos logísticos utilizados.
Os modelos foram capazes de fazer previsões corretas em mais de 70% dos casos nos modelos
onde as observações de imóveis subocupados e estacionamentos estão separadas (1) e (2), (3) e
(4), com um grau um pouco menor de acertos (65%) para as observações tomadas em conjunto.
91
Tabela 3.11: Estimativas dos coeficientes dos modelos logísticos
subocupados
estacionamentos
universo
(1)
(2)
(3)
(4)
(5)
(6)
renda média na célula (ln)
coef.
-1.4502
-1.4521
-0.2817
-0.2496
-1.4177
-1.4113
erro padrão
0.5208
0.5287
0.0663
0.6045
0.4732
0.4728
significância
0.0061
0.0060
0.6422
0.6802
0.0027
0.0028
Adensamento (ln)
coef.
0.3604
0.3511
0.4741
0.4697
0.3369
0.3188
erro padrão
0.1638
0.1605
0.1638
0.1573
0.1412
0.1350
significância
0.0279
0.0287
0.0038
0.0052
0.0170
0.0182
número de empresas (ln)
coef.
0.2949
0.3000
0.1925
0.2062
0.2270
0.2333
erro padrão
0.1030
0.1017
0.1026
0.1014
0.0864
0.0854
significância
0.0042
0.0032
0.0606
0.0419
0.0086
0.0063
preço de estacionamento (ln)
coef.
0.2148
0.5631
0.3134
erro padrão
0.7304
0.7366
0.6753
significância
0.7687
0.4446
0.6426
identificador do mosaico
significância
0.0001
0.0001
0.0000
0.0828
0.0000
0.0000
log likelihood
445.449
455.536
453.461
454.406
549.649
549.865
goodness of fit
447.800
448.808
339.428
339.254
444.466
445.230
previsões corretas (em %)
73.86
73.86
71.90
72.11
65.80
65.80
Fonte: elaboração própria
Os coeficientes relativos à renda têm sinal negativo e são significativos a menos de 0,1% nos
modelos (1) (2) e (3) (4) sugerindo que, tomadas todas as outras variáveis como se fossem
constantes, um aumento da renda média na célula diminui a probabilidade de que se encontrem
observações de imóveis subocupados dentro de cada célula da grade. Eles não são significativos
para os modelos em que são explicadas apenas a presença de estacionamentos.
Os coeficientes relativos ao adensamento são positivos e exibem alta significância (a menos de
5%) em todos os modelos. Isto sugere uma maior probabilidade de encontrar observações
quanto maior o adensamento.
O número de empresas apresenta coeficientes de valor positivo e significantes a menos de 6%
em todos os modelos, sugerindo tanto a necessidade de vagas de estacionamento fora dos
prédios comerciais quanto refletindo o fato de que a grande maioria dos imóveis subocupados e
composta de prédios de uso comercial.
Os preços de estacionamento apresentaram sinal positivo, mas baixa significância em todos os
modelos. Sua exclusão dos modelos não modificou de forma impactante a quantidade de
previsões corretas que as diferentes especificações foram capazes de fornecer.
A Tabela 3.12 que segue mostra os resultados das regressões calculadas a partir do método OLS
para as três variáveis dependentes. Desta vez, foi calculada a relação entre as áreas dos terrenos
92
subocupados ou de estacionamentos e a área da célula, tomada no logaritmo. Essa razão mede,
portanto, a fração da grade que está subocupada ou ocupada por estacionamento. As variáveis
explicativas são as mesmas utilizadas no modelo logístico.
Tabela 3.12: Estimativas dos coeficientes dos modelos OLS
subocupados
estacionamentos
universo
(7)
(8)
(9)
(10)
(11)
(12)
renda média na célula (ln)
coef.
-1.591
-1.592
-0.365
-0.366
-2.064
-2.064
erro padrão
0.581
0.581
0.641
0.640
0.711
0.710
significância
0.006
0.006
0.569
0.568
0.004
0.004
adensamento
coef.
0.320
0.289
0.522
0.507
0.529
0.507
erro padrão
0.167
0.163
0.184
0.179
0.204
0.199
significância
0.057
0.077
0.005
0.005
0.010
0.011
número de empresas (ln)
coef.
0.217
0.230
0.220
0.226
0.311
0.320
erro padrão
0.104
0.103
0.115
0.640
0.127
0.125
significância
0.037
0.026
0.005
0.568
0.015
0.011
preço de estacionamento (ln)
coef.
0.663
0.326
0.460
erro padrão
0.814
0.897
0.996
significância
0.416
0.716
0.645
identificador do mosaico
Significância*
0.000
0.000
0.001
0.000
0.008
0.006
(*) significância conjunta
0.214
0.213
0.204
0.204
0.158
0.158
R² ajustado
0.163
0.163
0.152
0.154
0.103
0.105
Fonte: elaboração própria
Os coeficientes não são altos para nenhum dos modelos e a retirada da variável relacionada
aos preços de estacionamentos não altera o quadro.
A variável identificadora do mosaico aparece como significativa em todas as especificações.
A variável renda aparece com sinal negativo em todas as especificações, mas com significância
apenas em (7), (8), (11) e (12). Isto sugere que, mantidas todas as outras variáveis constantes,
para cada posição dentro do mosaico, quanto maior a renda, menor a quantidade de imóveis
subocupados, mas não se pode afirmar o mesmo em relação aos estacionamentos.
A variável adensamento aparece com sinal positivo e com significância a pelo menos 8% em
todas as especificações, com especial destaque à alta significância das estimativas nos modelos
relativos aos estacionamentos, sugerindo, por um lado a necessidade de vagas de
estacionamento fora dos apartamentos e, por outro, externalidades negativas relacionadas à
superpopulação.
93
A variável número de empresas aparece com sinal positivo em todas as especificações, mas com
significância menor do que 4% apenas em (7), (8), (11) e (12). Isso pode ser explicado, em parte,
porque a grande maioria dos imóveis observados era de uso exclusivamente comercial.
Finalmente, a estimativa de preços de estacionamento não registrou significância em nenhum
dos modelos propostos. Isso pode ser devido tanto a um erro de especificação do interpolador
utilizado como por outros fatores não capturados nas especificações propostas.
3.6.3 Conclusão
O mosaico de externalidades, como o próprio nome diz, sugere a existência de externalidades
locais distribuídas de forma pouco sistemática. Este conceito transmite a idéia de, ao contrário
do que a teoria tradicional propõe, que as escolhas de localização não dependem tanto da
distância entre uma localidade central, o local de moradia e custo de transporte, mas sofrem
forte influência de fatores locais, medidos em escalas muito menores do que a escala da área
urbana tomada em toda a sua extensão. As estimativas significantes para o identificador do
mosaico parecem sugerir uma forte dependência da localização, mesmo para uma área
relativamente pequena como a área onde esta pesquisa de campo foi realizada.
Esses fatores locais podem ser de várias espécies. Pelo que foi possível medir, dada a escassez de
dados para medições na magnitude da escala que foi utilizada, a renda, a densidade populacional
e o número de empresas apresentaram influência significativa na distribuição dos focos de
degradação e subutilização do uso do solo urbano. Em particular, a renda dos moradores nos
arredores é determinante apenas em relação às construções subocupadas, mas não em relação
aos estacionamentos, que estão distribuídos de maneira muito mais uniforme em todo o anel em
volta dos calçadões.
Isso corrobora, pelo menos para o pequeno universo estudado, a tese de Abramo que propõe
que a análise incorpore alguma medida de externalidade local e a noção de interdependência
entre as escolhas dos agentes.
A região onde a pesquisa de campo foi realizada é o núcleo histórico e geográfico da cidade. Ela
sofreu uma grande quantidade de intervenções urbanas, principalmente a partir da década de
1950 com destaque para a introdução dos calçadões na década de 1970. O traçado do mosaico
leva em consideração principalmente a questão da mobilidade e do acesso aos diversos setores.
Ele acompanha as principais barreiras à mobilidade, acidentes geográficos, grandes eixos do
sistema viário e geometria das quadras. Como vimos, ele afeta significativamente tanto a
distribuição de construções subocupadas como a de estacionamentos.
94
4 Subsídios para habitação
Esta seção apresenta uma discussão sobre a motivação política para disponibilizar programas e
fundos de subsídio para o setor de habitação, assim como uma tipificação dos mecanismos
tradicionalmente utilizados. Ao final apresenta uma análise do modelo financeiro utilizado no
Programa de Arrendamento Residencial e o compara com outros modelos praticados pelo
sistema de bancos privados brasileiros.
4.1 Necessidade de intervenção governamental no mercado de habitação
Todos os subsídios governamentais são produto de uma agenda política. Em especial, estão
aqueles destinados à habitação popular. A principal motivação para uma política de subsídios ao
setor de habitação é o fato de que o bem habitação, pelo menos nos padrões de uma sociedade
moderna e que se pretende democrática, é muito caro para os mais pobres. Sendo assim a
habitação popular tem que ser financiada no longo prazo para não comprometer a capacidade de
pagamento da família.
O mainstream da teoria econômica enxerga uma justificativa para o envolvimento do Estado no
setor de habitação na chamada falha de mercado. Isto ocorre quando não se observam interações
entre os agentes individuais de modo que se produzam efeitos desejáveis para cada um dos
indivíduos nem para a sociedade como um todo. Diz-se que o benefício marginal individual, por
ser menor do que o benefício marginal social leva a um investimento menor e à produção de uma
quantidade menor do que a que seria desejável do ponto de vista de toda a sociedade.
Entre as principais falhas de mercado associadas ao setor de habitação que tradicionalmente
levam governos a intervir estão a persistência ao longo do tempo de uma sub-oferta de imóveis,
o preço das unidades, que é alto demais para a população mais pobre, e a impossibilidade de
adquirir imóveis que estejam em conformidade com padrões mínimos de qualidade.
Existe um consenso geral que classifica a habitação como um merit good, sugerindo que o
governo deve assegurar que os indivíduos comprem a quantidade adequada deste bem, porque
isso é do próprio interesse do comprador e da sociedade. A sociedade entende que o Estado deve
tomar atitudes no sentido de promover políticas que tendam a criar condições para que todos
tenham moradia de boa qualidade.
No Brasil, esta intenção é manifestada na própria Constituição, por exemplo, no art. 23 XI que
determina a competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para a
95
promoção de programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e
do saneamento básico.
A pobreza relacionada ao déficit habitacional exacerba outros fenômenos indesejáveis, como a
degradação da saúde individual e pública, do meio-ambiente e do espaço urbano, aumento da
criminalidade e do vandalismo, conflitos familiares entre outros.
A primeira classificação útil para a compreensão dos mecanismos de subsídios ao setor de
habitação é aquela que distingue entre subsídios que induzem a oferta, aqueles que induzem a
demanda e o controle de preços. Essa tipologia é proposta por Angel (2000) num estudo extenso
sobre habitação realizado sob o patrocínio do Banco Mundial. A experiência internacional
aponta uma grande diversidade de mecanismos de subsídio tanto voltados à oferta quanto à
demanda.
Os subsídios destinados à ampliação da oferta de imóveis residenciais são operacionalizados por
agências governamentais, tais como empresas públicas que atuam no setor, por construtores e
incorporadores privados, organizações sem fins lucrativos, cooperativas e agentes privados
individuais.
4.1.1 Mecanismos direcionados à oferta
Existem muitas formas de concessão de subsídios ao setor privado direcionados à oferta. Esses
mecanismos tendem a incentivar a construção diminuindo custos operacionais em relação aos
retornos, de modo a aumentar a taxa de lucro dos agentes produtores. Entre eles estão:
taxas de juros subsidiadas;
garantias ou avais públicos para a captação de fundos;
créditos tributários;
isenções tributárias;
transferências diretas;
títulos isentos de tributação;
aquisição e venda de terrenos por valores abaixo do valor de mercado para construtores;
venda de material de construção a preços subsidiados;
descontos tributários na forma de aumento da depreciação contábil;
flexibilização de regras de zoneamento;
isenção de impostos sobre a propriedade territorial.
96
4.1.2 Mecanismos direcionados à demanda
Os subsídios que tendem a induzir a demanda têm seu fundamento na idéia de evitar que as
agências governamentais atuem diretamente na produção de moradias e na desconfiança de que
a participação direta do governo é ineficiente. Estimular a demanda em contraposição à oferta
permite que o comprador tenha uma maior possibilidade de escolha, podendo optar por
unidades que não estejam em conjuntos habitacionais ou outros projetos públicos.
Esse tipo de subsídio também pode se apresentar de várias formas:
ajuda de custo para a compra de moradia;
suplementação de renda para manter a parcela da renda gasta em aluguel em um
determinado patamar;
transferências diretas para compradores do primeiro imóvel;
deduções de juros vinculados à hipotecas no imposto de renda;
isenções de tributos sobre ganhos de capital para aqueles que desejam vender seu
imóvel;
cancelamento de dívidas com instituições que financiam programas públicos de
habitação;
distribuição ou venda a preços simbólicos de unidades públicas em processo de
privatização aos seus ocupantes em posse do imóvel.
4.1.3 Controle de preços
As principais formas de controle de preços são:
tetos sobre os preços de unidades habitacionais;
tetos sobre o valor de aluguéis;
tetos sobre taxas de juros em programas de poupança destinada à habitação;
tetos sobre taxas de juros em empréstimos garantidos por hipotecas.
4.2 Análise da legislação federal referente aos programas de habitação
O principal documento oficial que expõe as intenções do atual governo federal em relação à
forma institucional que deve operacionalizar e viabilizar o financiamento para o mercado
imobiliário residencial é o texto chamado Política nacional de habitação, editado pela
Secretaria Nacional de Habitação, vinculada ao Ministério das Cidades. O texto se refere
especificamente ao “equacionamento do problema da moradia para a populaç~o de baixa renda”
como prioridade principal do programa.
97
O governo federal disponibiliza uma série de programas para a habitação popular. Eles estão
listados na Tabela 3.1 abaixo. Os programas disponíveis misturam incentivos de vários tipos.
Tabela 4.1: Programas do governo federal para a habitação popular
Produtos
PROGRAMA/AÇÃO
PROPONENTE
FONTE
Construção de unidades
habitacionais
Apoio ao Poder Público para Construção Habitacional
Poder público
OGU
Carta de Crédito Individual
Pessoa física
FGTS
Carta de Crédito Associativo
Pessoa física
FGTS
Apoio à Produção
Pessoa jurídica
FGTS
Pro-Moradia
Poder público
FGTS
Programa de Arrendamento Residencial (PAR)
Pessoa jurídica
FAR
Programa Crédito Solidário
Pessoa física
FDS
Aquisição de unidade
habitacional nova
Apoio ao Poder Público para Construção Habitacional
Poder público
OGU
Carta de Crédito Individual
Pessoa física
FGTS
Carta de Crédito Associativo
Pessoa física
FGTS
Programa de Arrendamento Residencial (PAR)
Pessoa jurídica
FAR
Aquisição de unidade
habitacional usada
Apoio ao Poder Público para Construção Habitacional
Poder público
OGU
Carta de Crédito Individual
Pessoa física
FGTS
Conclusão, ampliação,
reforma ou melhoria de
unidade habitacional
Apoio à Melhoria das Condições de Habitabilidade de
Assentamentos Precários
Poder público
OGU
Carta de Crédito Individual
Pessoa física
FGTS
Programa Crédito Solidário
Pessoa física
FDS
Aquisição de material de
construção
Apoio à Melhoria das Condições de Habitabilidade de
Assentamentos Precários
Poder público
OGU
Carta de Crédito Individual
Pessoa física
FGTS
Programa Crédito Solidário
Pessoa física
FDS
Aquisição de lote
urbanizado
Apoio ao Poder Público para Construção Habitacional
Poder público
OGU
Carta de Crédito Individual
Pessoa física
FGTS
Produção de lote urbanizado
Apoio ao Poder Público para Construção Habitacional
Poder público
OGU
Carta de Crédito Associativo
Pessoa física
FGTS
Requalificação de imóveis
urbanos
Apoio ao Poder Público para Construção Habitacional
Poder público
OGU
Carta de Crédito Associativo
Pessoa física
FGTS
Programa de Arrendamento Residencial (PAR)
Pessoa jurídica
FAR
Urbanização de
assentamentos precários
Apoio à Melhoria das Condições de Habitabilidade de
Assentamentos Precários
Poder público
OGU
Habitar-Brasil/BID
Poder público
OGU
Pro-Moradia
Poder público
FGTS
Desenvolvimento
institucional
Habitar-Brasil/BID
Poder público
OGU
Pro-Moradia
Poder público
FGTS
Fonte: Ministério das Cidades (2008)
É importante mostrar quais são os princípios pelos quais a política oficial se rege no tocante à
questão dos subsídios. O texto mencionado acima diz, em seu capítulo sobre os objetivos gerais
da Política Nacional de Habitação, no que se refere à questão da mobilização de recursos,
identificação da demanda e gestão de subsidios:
98
promoção e apoio a mecanismos de transferências de recursos não
onerosos (na forma de transferência de renda) para atender a parcela de
população sem capacidade de pagamento de moradia, identificada como
pertencente à faixa de população abaixo da linha de pobreza;
concessão de subsídio à família e não ao imóvel, de forma “pessoal,
tempor|ria e intransferível”. O subsídio ser| dado uma única vez em todo
o território nacional, para famílias que não possuam outro imóvel, o que
implica na necessidade de um sistema de informações;
estruturação de uma política de subsídios que deverá estar vinculada à
condição socioeconômica do beneficiário, e não ao valor do imóvel ou do
financiamento, possibilitando sua revisão periódica;
recuperação, ao longo do prazo de financiamento para aquisição, ao
menos de parte dos subsídios concedidos, considerada a evolução sócio-
econômica das famílias;
recuperação total do subsídio concedido, nos casos de revenda ou
alteração dos beneficiários durante a vigência do contrato de
financiamento.
Essa série de princípios foi aplicada na idealização do programa de financiamento pelo qual
estamos interessados, o Programa de Arrendamento Residencial (PAR). Esse programa tem sido
a via financeira disponível para a operacionalização de programas de requalificação de prédios
para efeito de revitalização em regiões centrais degradadas quando a intenção é promover sua
ocupação com famílias de baixa renda.
Esses princípios, que tendem a vincular o financiamento às pessoas, e não aos imóveis em si,
podem gerar incentivos perversos que tendem a promover alocações ineficientes, baixos
incentivos à boa manutenção dos imóveis, geração de mercados ilegais e perder uma boa
oportunidade de realizar verdadeiras transferências de renda para as famílias pobres
envolvidas.
4.3 O Programa de Arrendamento Residencial PAR
Nesta seção, descreverei e analisarei mais pormenorizadamente o Programa de Arrendamento
Residencial (PAR), que é o principal programa destinado a fornecer subsídios para a
recuperação de imóveis para uso residencial em contextos de revitalização urbana. Uma
descrição bastante detalhada dos diversos programas disponíveis no âmbito do Sistema
99
Financeiro de Habitação pode ser encontrada na publicação Financiamento Imobiliário: uma
visão geral dos produtos disponíveis, de autoria do Sinduscon-MG (2006).
O PAR é uma linha de financiamento que visa a arrendar unidades habitacionais para famílias
com renda familiar mensal próxima de seis salários mínimos, contemplando algumas exceções.
O contrato de arrendamento significa que, tecnicamente, o arrendat|rio “aluga” a casa ou
apartamento com uma opção de compra que não pode ser exercida a qualquer momento
durante a vigência do contrato. A palavra aluga es entre aspas porque o arrendamento
residencial é uma construção jurídica que não é nem um contrato de aluguel propriamente dito
nem uma promessa de compra e venda como veremos a seguir.
4.3.1 Estrutura jurídica do PAR
O PAR foi instituído pela Lei 10.188 de 2001, com posteriores modificações dadas pela Lei 10.859
de 2004. Esta lei traça as diretrizes gerais do programa e dispõe principalmente da atribuição de
autoridade e responsabilidades por sua gestão, além de explicitar a forma legal do
arrendamento.
A gestão do programa é atribuída ao Ministério das Cidades e sua operacionalização à Caixa
Econômica Federal, sendo que a remuneração da CEF pelas atividades exercidas no âmbito do
programa é decidida em conjunto pelos Ministérios das Cidades e da Fazenda.
A lei autoriza a CEF a segregar a contabilidade do fundo destinado ao programa bem como
contratar operações de crédito com o FGTS.
Os agentes que fazem parte do programa e suas atribuições são especificados pela Portaria 301
de 2006 do Ministério das Cidades. São eles:
Ministério das Cidades, agente gestor do PAR;
Caixa Econômica Federal, agente gestor do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) e
agente executor do PAR;
Estados, Distrito Federal e Municípios ou seus órgãos da administração direta e indireta;
Empresas do setor de construção civil e Companhias de Habitação Popular
(tradicionalmente conhecidas por COHABs);
Arrendatários, os contratantes finais.
O PAR é um programa destinado a “aquisição de unidades habitacionais a serem construídas, ou
a recuperar ou reformar para arrendamento residencial à população de baixa renda,
prioritariamente concentrada nos centros urbanos com opção de compra ao final do prazo
100
contratado” (Sinduscon-MG, 2006). Esse é o programa candidato natural para o poder público
transformar prédios abandonados em moradia popular no centro de São Paulo, porque é o único
programa da caixa que pode ser utilizado para financiar reformas e qualificação de prédios
degradados voltados à população de baixa renda.
É um programa nacional destinado exclusivamente a municípios com mais de 100 mil habitantes
e é o programa, até o presente momento, escolhido pelos gestores para ser destinado à reforma
e qualificação de prédios em regiões centrais degradadas. O programa estabelece que a tipologia
mínima de cada unidade deva ser de dois quartos, sala, cozinha e banheiro, com área mínima de
37m², mas é flexível no caso de projetos de requalificação, pois muitas vezes a arquitetura dos
prédios a serem requalificados ou reformados não são facilmente conversíveis em unidades com
as características mínimas recomendadas pelas regras gerais do programa. O valor máximo por
unidade a ser financiada é de R$ 40.000 na Região Metropolitana de São Paulo.
A oferta funciona da seguinte forma: a construtora interessada apresenta o projeto à Caixa, que
no decorrer do cronograma da obra, libera os pagamentos para o construtor. Uma vez que este
termina a construção, sai do negócio e em seu lugar entra uma administradora encarregada de
manter as condições do prédio cobrando uma comissão que é paga na proporção de 9,5% da
arrecadação do arrendamento e encargos por atraso.
Segundo as regras do programa, os projetos são escolhidos de acordo com as seguintes
diretrizes:
menor valor das unidades habitacionais conforme o projeto padrão para cada faixa de
renda a ser atendida;
maior contrapartida do poder público local, por meio de aporte de recursos financeiros,
doação de áreas, execução de infra-estrutura ou isenção de taxas ou tributos;
menor taxa de condomínio;
integração a programas de qualificação de centros urbanos.
Pelo lado do arrendatário, a renda familiar mensal mínima requerida é de R$ 1800. O
arrendatário faz um contrato com a Caixa Econômica Federal chamado de Instrumento
Particular de Arrendamento Residencial com Opção de Compra. O prazo de arrendamento é de
180 meses (15 anos) e a taxa de arrendamento é de 0,7% do valor do imóvel. Ao final do prazo
de arrendamento o arrendatário pode optar pela devolução, pela compra ou pela renovação do
arrendamento. No caso de desistência ou inadimplência, o arrendatário não tem direito a
recuperar os valores pagos a título de arrendamento.
101
Dentro da tipologia proposta por Angel (2000) o PAR apresenta, pelo lado da oferta, uma
combinação de transferências diretas dos governos locais para os construtores assim como a
aquisição e venda de terrenos por valores abaixo do valor de mercado e controle de preços, uma
vez que a parcela a ser paga pelo arrendatário é fixada de acordo com o valor estipulado pelo
órgão gestor do programa.
4.3.2 Comparação do PAR com outros planos de financiamento
Como vimos, o PAR é o Programa de Arrendamento Residencial gerido pela Caixa Econômica
Federal. Ele é destinado à aquisição de unidades habitacionais a serem construídas, em
construção, concluídas ou a recuperar ou reformar para arrendamento residencial à população
de baixa renda, prioritariamente concentrada nos grandes centros urbanos, com a opção de
compra ao final do contrato.
O valor a ser pago mensalmente pelo arrendamento de uma unidade construída pelo valor de R$
40.000 será, de acordo com as regras do programa, R$ 280 (0,7% de R$ 40.000).
Para efeito de comparação, foram pesquisados planos de financiamento ofertados por bancos
privados para imóveis no valor de R$ 40.000 e famílias com renda de a R$ 1800 e feitas
algumas simulações.
Para toda a análise supõe-se que a taxa de inflação é igual a zero para evitar a incorporação da
questão dos reajustes. A questão dos reajustes é muito importante quando a conjuntura
macroeconômica é instável, mas não pode ser analisada aqui porque complicaria muito o
raciocínio. Para um conhecimento melhor desse tema é bastante recomendável a leitura de Dias
Carneiro e Valpassos (2003).
A Tabela 4.2 abaixo mostra alguns planos de financiamento oferecidos pelos principais bancos
privados que são compatíveis com os valores e o prazo do PAR. Eles servirão para criar
simulações de fluxos de prestações e saldo devedor.
102
Tabela 4.2: Planos de financiamento para imóveis oferecido pelos principais
bancos privados
Plano/banco
Renda mínima familiar ou
comprometimento de renda
Limites de
financiamento
Taxa de juros
Prazo
Sistema de
amortização
Santander
R$ 2.000,00
R$ 40 mil a R$ 350 mil,
até 80% do valor
7,95% + TR ao ano
até 36 meses, 12% ao
ano nos demais
períodos
até 20
anos
SACRE até 36 meses,
SAC nos demais
Santander
R$ 2.000,00
R$ 40 mil a R$ 350 mil,
até 80% do valor
14% ao ano,
prestações fixas
até 20
anos
Price
Bradesco
Até 30% da renda
Até R$ 350 mil, até 80%
do valor
14% ao ano,
prestações fixas
até 20
anos
Price
Bradesco
Até 30% da renda (SAC) ou 15%
(Price)
Até R$ 120 mil, até 80%
do valor
8% +TR ao ano até 36
meses, 12% ao ano
nos demais
até 20
anos
SAC ou Price
Unibanco
Até R$ 350 mil, até 80%
do valor
8% +TR ao ano até 36
meses, 12% ao ano
nos demais
até 20
anos
SAC
Unibanco
Até R$ 350 mil, até 70%
do valor
14% ao ano,
prestações fixas
até 15
anos
Price
HSBC
R$ 1500 ou 25% da renda
De R$ 15mil a R$ 245
mil, até 70% do valor
12% +PMC ao ano
até 15
anos
HSBC
R$ 1500 ou 25% da renda
De R$ 20mil a R$ 245
mil, até 70% do valor
13% +PMC ao ano
até 15
anos
Itaú
30% da renda
De R$ 20mil a R$ 120
mil, até 80% do valor
8,5% + TR até 60
meses, 12% + TR ao
ano nos demais
até 20
anos
SAC
Fonte: SINDUSCON-MG, 2006
Antes de iniciar as simulações, cabe aqui esclarecer alguns aspectos desses planos de
financiamento. Como se pode perceber pela tabela, todos os planos são bastante parecidos em
relação às taxas de juros, sendo a principal diferença aquela encontrada nos planos de
prestações fixas, que cobram taxas de juros mais altas. Nenhum dos planos oferecidos financia
mais do que 80% do valor do imóvel. Essa parcela de entrada é geralmente financiada pela
própria construtora ou pelo próprio comprador, muitas vezes utilizando fundos do FGTS. Isso
vai criar alguns problemas para estabelecer uma comparação como veremos adiante. O sistema
de amortização do financiamento também varia, sendo que o preferido para prestações
reajustáveis é o SAC (Sistema de amortização constante) e para prestações fixas o sistema Price
é utilizado. A principal diferença entre os dois sistemas é que no sistema Price as prestações são
constantes, enquanto que no sistema SAC as prestações tendem a se reduzir ao longo do prazo.
Assim, o indivíduo que financia pelo sistema SAC pode esperar pagar mais no início, mas terá seu
saldo devedor reduzido mais rapidamente a partir da metade do prazo.
Para ilustrar a diferença entre os dois sistemas de amortização os gráficos abaixo mostram como
se comportam as prestações e a amortização em um empréstimo hipotético de R$ 1000 a ser
pago em 10 prestações anuais a juros de 10% ao ano no sistema Price e no sistema SAC.
103
Tabela 4.3: Comparação entre sistemas de amortização
Price
SAC
período
saldo devedor
prestação
Juros
amortização
saldo devedor
prestação
juros
amortização
0
1000.00
1000.00
1
937.26
162.75
100.00
62.75
900.00
200.00
100.00
100.00
2
868.24
162.75
93.73
69.02
800.00
190.00
90.00
100.00
3
792.31
162.75
86.82
75.92
700.00
180.00
80.00
100.00
4
708.80
162.75
79.23
83.51
600.00
170.00
70.00
100.00
5
616.94
162.75
70.88
91.86
500.00
160.00
60.00
100.00
6
515.88
162.75
61.69
101.05
400.00
150.00
50.00
100.00
7
404.73
162.75
51.59
111.16
300.00
140.00
40.00
100.00
8
282.46
162.75
40.47
122.27
200.00
130.00
30.00
100.00
9
147.96
162.75
28.25
134.50
100.00
120.00
20.00
100.00
10
0.01
162.75
14.80
147.95
0.00
110.00
10.00
100.00
Fonte: elaboração própria
Figura 4.1: Comparação entre dois sistemas de amortização
Fonte: elaboração própria
Todas as prestações, qualquer que seja o sistema, são compostas de uma parcela referente a
juros e outra à amortização do principal.
A diferença entre o sistema Price e o sistema SAC é que, no sistema Price, as prestações são
iguais em todos os períodos. No início da série de pagamentos o devedor paga uma parcela
maior de juros e no final da série uma parcela maior de amortização do principal. No sistema
SAC a quantia amortizada é igual todos os períodos. Como a parcela referente aos juros diminui
com o tempo, a prestação cai com o tempo. Por causa disto, os bancos tendem a permitir um
comprometimento de renda maior quando o sistema escolhido é o SAC.
No caso do PAR, não temos uma série de pagamentos financeiros propriamente dita, pois trata-
se de um contrato de arrendamento em que o valor do pagamento mensal é definido a priori
104
como uma fração do valor repassado à gestora do projeto. A série de pagamentos,
desconsiderando reajustes monetários devido à incidência de indexadores inflacionários, é de
180 pagamentos mensais de R$ 280. Trazendo toda a série a valor presente encontramos a taxa
de juros embutida, que é igual a 0,27% ao mês. A diferença entre os juros cobrados pelos bancos
e os juros embutidos na série do PAR nos dá uma idéia do subsídio incluído na operação.
Se a família tem renda familiar de R$ 1800, pelas regras do PAR, 15,55% de sua renda estará
comprometida. A maior parte dos programas privados de crédito analisa o crédito dos
compradores de modo a não permitir que o valor mensal ultrapasse 30% da renda. Analistas
mais conservadores não permitem que esse valor ultrapasse 20%. Nessas condições, a renda
mínima que a família deve auferir para ser capaz de dispor de no máximo 30% do orçamento é
de R$ 933. Esse, então, é o limite inferior da renda da família candidata nesse programa, se
levarmos em consideração o padrão de segurança financeira requerido para a manutenção do
equilíbrio econômico-financeiro dos contratos.
Considerando que o parâmetro econômico mais sensível do ponto de vista da família é o
tamanho do comprometimento da renda gasta com habitação, a comparação relevante é o valor
das parcelas do arrendamento em relação às prestações de um plano de financiamento oferecido
pelos bancos privados. A diferença entre taxas de juros não é importante num primeiro plano do
ponto de vista do devedor. Este está mais preocupado com o quanto terá que desembolsar por
mês; a taxa de juros passa a ser um parâmetro endógeno na conta feita pelo devedor.
A seguir são apresentadas algumas simulações comparando o PAR a outros planos encontrados
no mercado.
No caso de um plano para financiar R$ 40.000 com prestações idênticas a 14% ao ano (1,1% ao
mês), a prestação é de R$ 511,40 reais por mês.
No caso de um plano para financiar R$ 40.000 com amortização constante a 8% ao ano (0,64%
ao mês) até o 36º mês e 12% ao ano (0.95% ao mês) a partir daí, as prestações começam em R$
478,22 e decrescem linearmente até R$ 428,44 no 36º mês. A partir daí, recomeçam em R$
526,22 e decrescem linearmente até R$ 224,33 no final dos 180 meses.
A Tabela 4.4 abaixo mostra a renda familiar mínima necessária para que uma família possa se
candidatar a um financiamento nos bancos privados de acordo com um requisito de perfil
conservador e outro mais agressivo do ponto de vista do banco, se o financiamento fosse
concedido pelo valor total do imóvel. Os bancos tomam a precaução de não financiar todo o valor
105
para criar um incentivo para que o devedor não deixe de pagar, uma vez que teve de dar uma
entrada antes de ter o financiamento aprovado.
Tabela 4.4: Comprometimento da renda familiar
série
maior prestação
renda necessária para que o comprometimento não
passe de
15%
30%
PAR
280
1867
933
Price
511
3407
1703
SAC
526
3507
1753
Fonte: elaboração própria
O que esta tabela permite comparar é a situação em que o governo (ou outro agente qualquer)
adiante fundos para que a família pague o sinal nas mesmas condições do banco. O que chama
atenção é que no cenário mais agressivo, em que se exige que apenas 30% da renda familiar
fique comprometida, a renda mínima é menor do que aquela estipulada pelo PAR. Isso quer
dizer que, se o governo adiantasse o valor da entrada nas mesmas condições que o banco não
seria necessário o subsídio na forma de controle de preços.
O problema de o arrendamento funcionar como uma espécie de controle de preços é que esse
tipo de contrato não tem a flexibilidade necessária para tolerar variações nos preços. Num
contrato de financiamento bancário, se a família, em algum momento de sua vigência, achar que
pode repassar o financiamento por um preço maior a outro interessado, pode fazê-lo de pleno
direito. Na hipótese de o preço de mercado de seu imóvel subir muito, ele sempre pode
encontrar um comprador e pré-pagar o financiamento, ou repassá-lo adiante com ágio.
No caso do PAR, se houver uma discrepância entre o preço de mercado (ou aluguel) de um
imóvel com características semelhantes no entorno, surgirão incentivos para que o arrendatário
subloque sua unidade e embolse o excedente. O mesmo pode ocorrer se o imóvel for construído
em uma área onde o entorno é habitado por famílias com renda equivalente morando em
imóveis de pior qualidade.
É recorrente o surgimento de denúncias de esquemas de fraude em programas do CDHU, a
companhia mantida pelo governo do Estado de São Paulo e nos Projetos Cingapura da Prefeitura
de São Paulo. O motivo é sempre o mesmo: as famílias contempladas pelo programa, em algum
momento, percebem que estão consumindo um produto cujo valor mensal supera o valor que
desejam, preferindo consumir um produto de pior qualidade (alugar um apartamento menor, ou
em outro local, ou mesmo em uma favela, por exemplo) e embolsar parte do excedente para
comprar outros produtos.
106
Uma vez que a maioria dos contratos firmados nesse tipo de programa não podem ser
transferidos a outras famílias que ofereceriam um valor maior pelos imóveis, o que geralmente
ocorre é a intervenç~o de “m|fias” atuando como intermedi|rios entre os compradores originais
e aqueles que estão dispostos a pagar um prêmio pela moradia. S~o firmados “contratos de
gaveta” cujo cumprimento é garantido por intimidaç~o e constrangimento ilegal. As m|fias,
evidentemente recebem “comissões” para prestar esse serviço. Além de fomentar um mercado
ilegal, esse tipo de intermediação é ineficiente do ponto de vista econômico, pois dissipa renda
entre agentes que não produzem.
O que quero enfatizar aqui é que, mesmo que, por razões ideológicas e políticas justificáveis,
entendêssemos que o formato de contrato imposto pelo PAR fosse ideal, isso não muda o fato de
que, uma vez celebrados os contratos, os imóveis de uma maneira ou de outra estão sujeitos às
forças de mercado. Assim sendo, os arrendatários ou locatários mudarão seu comportamento
para acomodar uma situação em que a satisfação que obtêm do seu status de morador não é
compatível com o valor do imóvel. Assim eles tenderão a quebrar subrepticiamente os contratos
se a situação assim se impuser.
Isso sugere a necessidade de escolher a localização dos imóveis candidatos a alvo desse tipo de
programa de uma maneira que seja compatível com a distribuição espacial da renda no local
onde o projeto deve ser implantado.
Na seção seguinte indicarei possíveis inconsistências nas escolhas de localização dos projetos
PAR em relação à renda familiar e outras variáveis socioeconômicas fornecidas pelo Censo.
4.3.3 O PAR no Centro de São Paulo
Como vimos no Capítulo 3, a escolha de localização das famílias depende da escolha de
localização de outras famílias, uma vez que existem efeitos de externalidades.
Assim sendo, uma política pública que visa acomodar residências em imóveis que não foram
originalmente projetados para isso tem que levar em consideração a vizinhança do imóvel.
Vimos que um dos determinantes das externalidades de vizinhança que podemos observar é a
renda média familiar nos arredores do local escolhido. Uma vez que a renda familiar mensal é
justamente o critério principal para a escolha das famílias que podem participar do programa
PAR, faz-se necessária uma análise geográfica da renda nas localidades.
O Censo Demográfico do IBGE para o ano 2000 produziu microdados do universo da pesquisa
associados a um mapa dos setores censitários. Não há, entretanto, uma variável que indica a
renda familiar média no setor, apenas o valor acumulado da renda de todos os responsáveis pelo
107
domicílio. A renda média do chefe de domicílio é calculada tomando-se a renda acumulada do
distrito e dividindo-a pela quantidade de responsáveis dentro do setor.
Uma possível estimativa da renda média domiciliar consiste em tomar a renda familiar média da
área de ponderação onde o setor se localiza e encontrar a proporção da renda média do
responsável em relação à renda média domiciliar. A partir daí, retorna-se aos valores
encontrados para os responsáveis dentro dos setores censitários e calcula-se o inverso dessa
proporção, obtendo-se a estimativa para a renda média domiciliar dentro do setor censitário.
Como as regras do PAR se referem a valores considerados no final do ano de 2004, foi necessário
atualizar os valores encontrados no Censo e o índice utilizado foi o IPC-A, calculado pelo próprio
IBGE.
O próximo exercício é criar um mapa indicando a renda média domiciliar por setor e verificar se
a localização dos projetos PAR é consistente com a idéia de que não pode haver muita diferença
de renda familiar entre a renda média do setor e a renda máxima das famílias a serem alocadas
no projeto residencial.
O Mapa 4.1 abaixo mostra a região dos distritos e República com a representação
aproximada dos terrenos onde se localizam os imóveis levantados. Os pontos representam a
localização e as cores representam o tipo de ocupação encontrada nos imóveis.
Se é verdade que as famílias escolhem o lugar onde vão morar levando em consideração
características socioeconômicas de seus vizinhos (veja Becker 1976, 1981 e Schelling, 1971,
1978), dando preferência para localizações onde morem outras famílias com renda igual ou
maior à renda da própria família que faz a escolha locacional, então é de fundamental
importância que se leve em consideração a condição financeira das famílias que moram no
entorno antes de escolher o imóvel que será objeto da política pública.
O que não é desejável é que se criem condições para o estabelecimento de famílias com rendas
muito díspares em regiões muito próximas, pois isto tenderia a criar movimentos imprevisíveis
de população.
108
Mapa 4.1: Unidades PAR propostas e renda média familiar dos setores
censitários
Fonte: elaboração própria a partir de dados da Secretaria de Habitação de São Paulo
109
No caso de se instalarem programas de habitação popular em quadras onde a população
residente tenha renda maior do que a renda típica das famílias contempladas pela política
pública de habitação, o que pode ocorrer é uma fuga das famílias originalmente instaladas
devido ao seu desejo de não morar próximo de outras famílias mais pobres que elas.
Por outro lado, pode também ocorrer de famílias com rendimento maior desejem se aproveitar
da margem existente entre o preço de mercado do aluguel na quadra e o preço subsidiado do
imóvel do programa público. Esse é o caso em que estão dispostas a pagar um prêmio para a
família contemplada pelo programa público que seja o suficientemente maior do que a prestação
do arrendamento e suficientemente menor do que o preço de mercado, e é o caso que torna
possível a atuação de máfias.
No caso oposto, aquele em que o programa público escolhe um imóvel numa quadra onde a
população original tem renda menor do que a renda típica da família contemplada no programa
pode ocorrer um efeito em cadeia que traga valorização para os imóveis no entorno. Nesse caso,
a população original sofrerá com o aumento de seu aluguel e uma parte dela acabará tendo que
deixar o local, dando causa para o fenômeno que os planejadores urbanos chamam de “processo
de gentrificaç~o”.
O modelo de segregação espacial de Schelling (1978) também sugere que esses efeitos
dependem de uma “massa crítica” necess|ria para que a din}mica dos deslocamentos se torne
auto-sustentada. Essa afirmação pode ser entendida intuitivamente da seguinte maneira:
imagine uma quadra com 100 famílias e uma renda média de R$ 1000 por mês. Se uma
determinada classe de famílias está disposta a morar na quadra contanto que a metade das
famílias da quadra tenha renda maior ou igual à sua, no momento em que uma família com renda
maior resolve deixar a quadra, a renda média da quadra passa a ser menor do que R$ 1000. Isso
levará outras famílias a deixarem a quadra provocando uma reação em cadeia.
O ponto importante que esse modelo sugere é que existe uma massa crítica que determina a
sensibilidade dessa dinâmica. Quanto maior o número de pessoas a serem consideradas, menor
a probabilidade de que o deslocamento de qualquer uma família provoque uma reação em
cadeia.
Por esse motivo, um programa de revitalização baseado na ocupação de prédios desocupados
transformados em moradia tem maior chance de atingir seus objetivos quando se concentram os
imóveis escolhidos, de modo a alocar famílias com rendas semelhantes próximas umas às outras.
110
Esse mapa mostra como a escolha de localização dos imóveis que fariam parte do programa
negligenciou a dimensão espacial tanto no que se refere à escolha de acordo com a distribuição
geogr|fica da renda como na necessidade de criar uma “massa crítica” de imóveis de modo a
acumular famílias com condições econômicas semelhantes próximas umas às outras.
Os pontos marcados com um círculo no mapa mostram imóveis que, à época em que foi feito o
levantamento, estavam totalmente desocupados, encontravam-se somente com seu térreo e
sobrelojas comerciais ocupadas ou com mais da metade de seus conjuntos comerciais vagos.
Os triângulos em cor lilás representam as localizações propostas para o programa de
revitalização. Não se encontram próximas umas das outras e grande parte está dispersa entre
quadras com rendas médias maiores do que as das populações-alvo.
A escolha de imóveis para esse tipo de programa habitacional está longe de ser um problema
trivial. Em geral ela depende de fatores que vão desde a condição física do imóvel e conseqüente
viabilidade técnica do projeto de reforma, passando por problemas de ordem tributária e até
mesmo a existência de direitos patrimoniais contestados por herdeiros, como é o caso de muitos
dos imóveis abandonados no Centro de São Paulo. O documento elaborado pelo Laboratório de
Habitação e Assentamentos Humanos da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de São Paulo intitulado Observatório do uso do solo e da gestão fundiária de
do Centro de São Paulo (2006) reproduz um extenso estudo apresentando um “levantamento e
avaliação dos instrumentos urbanísticos e tributários instituídos ou implementados nos últimos
15 anos na área central de São Paulo”. Seus autores chamam a atenção para o emaranhado de
problemas jurídicos relacionados aos imóveis ociosos e sua implicação na dificuldade de
estabelecer programas e obter resultados impactantes. Para o leitor que deseja se aprofundar no
estudo dos diversos programas instituídos ao longo dos últimos anos para enfrentar o problema
da degradação do centro e sua avaliação deve consultar esse documento. O estímulo ao
repovoamento da região central através da reforma e requalificação de imóveis abandonados
financiado pelo PAR foi apenas uma de uma série de medidas adotadas para reverter a situação
de degradação e abandono em que a região se encontra.
111
5 Conclusão
A partir do que foi exposto, pode-se delinear algumas conclusões relacionadas às questões
elencadas no final do Capítulo 2.
Em primeiro lugar, evidencia-se a necessidade da realização de estudos de campo que procuram
identificar a extensão e os padrões de incidência de imóveis subutilizados do ponto de vista da
compatibilidade entre a densidade demográfica, o uso e a disponibilidade de infra-estrutura da
região do Centro Histórico. O estudo mostrou que a subutilização ocorre em padrões geográficos
distintos quando se consideram separadamente construções subocupadas e imóveis utilizados
exclusivamente como estacionamentos. O principal determinante parece ser de ordem
urbanística e institucional. A introdução dos calçadões criou dificuldades à circulação de
automóveis que, aparentemente, afetou bastante por um lado a incidência de construções de uso
comercial que se encontram atualmente desocupadas e, por outro lado, gerou uma demanda por
vagas de estacionamento em todo o seu entorno. O desenvolvimento do parcelamento do solo e
das normas de construção criou limitações a inovações arquitetônicas e, por conseqüência,
limitou a possibilidade de que os empresários da construção pudessem obter maiores ganhos
econômicos com produtos diferenciados, tanto para uso comercial como para uso residencial o
que levou ao desinteresse e a falta quase ausência de novos empreendimentos imobiliários na
região nos últimos 15 anos. A grande quantidade de terrenos utilizados como estacionamentos
atesta o uso econômico alternativo do solo.
A grande quantidade de área disponível, em contraposição ao relativamente pequeno número de
projetos PAR demonstra a timidez da intervenção governamental e sua relativa dispersão
demonstra uma falta de atenção à questão das externalidades e sinergias locais, uma vez que
ficou demonstrado que a incidência de imóveis subocupados tende a ocorrer em pontos focais.
Isto sugere que o problema deve ser atacado não com intervenções isoladas, mas de forma a
escolher uma localidade onde se concentrem projetos.
Mostrou-se que a renda média local tem papel significativo e inversamente proporcional na
distribuição da subocupação, apontando para uma possível inconsistência entre o desejo de
evitar a gentrificação e ao mesmo tempo repopular a região com famílias de baixa renda para
promover um uso mais eficiente do solo. A localização de projetos habitacionais para famílias de
baixa renda em quadras onde a renda média é mais elevada invoca a hipótese de Schelling sobre
a dinâmica dos deslocamentos de massa devidos a mudanças pontuais nos padrões de
externalidades de vizinhança. Entretanto, uma grande diferença de faixas de renda entre os
setores do mosaico. Com uma política mais flexível, mais tolerante a algum grau de segregação
112
espacial por renda pode se mostrar mais estável e previsível, possibilitando uma maior gama de
programas de incentivos e a indução da participação do setor privado.
Finalmente, é essencial ter em mente que o estudo de campo mostra apenas uma “imagem”
congelada no tempo e, portanto, não se pode fazer inferências sobre a dinâmica da população
induzida por essas intervenções, permanecendo a hipótese de Schelling apenas uma conjectura
e, a fortiori, apontando para a necessidade de um acompanhamento permanente do mercado
imobiliário da região.
113
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VASCONCELLOS, Eduardo A. Transporte urbano nos países em desenvolvimento: reflexões e
propostas. São Paulo: Annablume, 2000.
115
APÊNDICE:
Metodologia da coleta das informações do banco de dados
O principal objetivo da coleta de dados foi fornecer informações sobre a situação de imóveis
subutilizados na região dos distritos Sé e República.
A inspeção foi feita quadra a quadra em viagens a campo, realizadas nos dias:
Devido à falta de condições de segurança, não foram inspecionados os setores censitários de
números: 355030878000010, 355030878000011, 355030878000012, 355030878000040 e
parte do setor 355030878000030.
Na inspeção foram examinados elementos que caracterizam a subutilização do imóvel, bem
como entrevistas com porteiros, zeladores e vizinhos que atestavam as características
consideradas.
A cada um dos imóveis observados corresponde uma fotografia que mostra na maioria das vezes
a fachada principal do prédio ou a frente principal do terreno. A partir da foto podem-se conferir
as características gerais e o estado de conservação da fachada.
Foram criadas algumas tipologias para a classificação dos imóveis, de acordo com os elementos
que foram considerados relevantes.
Ocupação: foram considerados todos os imóveis que apresentavam características de
subutilização. Imóveis onde não havia nenhuma atividade, ou apenas a atividade de um vigia ou
zelador foram considerados desocupados. Imóveis onde apenas as lojas situadas no térreo e na
sobreloja apresentavam atividade econômica foram assim classificados. Imóveis onde a maioria
dos conjuntos não apresentava atividade econômica foram assim classificados. Os terrenos sem
construções ou com construções leves servindo de abrigo para veículos foram classificados
como estacionamentos.
Tombamento: todos os imóveis da região que apresentam fachadas projetadas antes da década
de 1940 são tombados. Muitos deles apresentam descaracterização das fachadas. Os imóveis
com estilo arquitetônico identificados como sendo desse período foram contados como se
fossem tombados.
Uso: foram consideradas para efeito dessa tipologia três categorias, que são o uso comercial, o
residencial e o misto. A identificação dos usos foi feita a partir do conhecimento da planta de
116
zoneamento, juntamente com observação e entrevista concedida por zeladores ou vizinhos.
Quando o imóvel era um terreno utilizado exclusivamente como estacionamento, contendo ou
não construções leves servindo apenas de abrigo para os veículos e escritório, a classificação foi
deixada sem definição.
As fotos podem ser vistas no endereço:
http://picasaweb.google.com.br/fcotelo/TeseDeDoutoradoRevitalizaAoDoCentroHistoricoDeSa
oPauloEHabitaAoPopular?feat=directlink
Os códigos das fotos são números de nove dígitos distribuídos da seguinte forma:
SSNNNFFFF.JPG onde SS indica o setor do mosaico onde o imóvel foi encontrado, NNN é o
número do imóvel no banco de dados e FFFF é o número da foto. Pode haver mais de uma foto
para alguns imóveis e mais de um imóvel em algumas fotos. Exemplo:
Foto A.1: Centro de São Paulo e percursos do levantamento
117
Descrição sistemática das variáveis, como aparecem na planilha utilizada para a análise
estatística
FID: identificação do ponto ou polígono na base do ArcGIS
ID_NOM: identificação dos atributos nas fichas de campo
DATA: data em que foi feita a coleta em campo
LOGR_OR: quando não foi possível descobrir o número do prédio ou terreno utilizou-se o
número do vizinho mais próximo.
E o prédio está à esquerda do número indicado
D o prédio está à direita do número indicado
<null> - o número indicado é o número do terreno
LOGR_NUM: número do prédio ou terreno ou número do prédio ou terreno vizinho conforme
LOGR_OR
LOGR_TIP: tipo do logradouro. Rua, Avenida, Praça, etc. Todos estão indicados em maiúsculas,
sem acentos, pontuações ou C cedilha
LOGR_NOM: nome do logradouro sem título quando este se refere a um nome próprio
LOGR_TIT: título referente a nome de pessoa ou preposição. Por exemplo: Praça da Sé está
indicada como: PRACA | SE | DA. Isto facilita a geocodificação.
FOTO: Número da foto associada no banco de dados
OCUP: tipo de ocupação. Foram considerados 7 tipos de ocupação:
DESOC: quando o prédio se encontrava totalmente desocupado
PILO: quando somente o pilotis e sobrelojas em um prédio de uso comercial ou misto
estavam ocupados
PARC: quando uma parcela significativa do prédio (mais de 50% dos andares) se
encontrava desocupada
118
EST: quando o imóvel era exclusivamente utilizado como estacionamento, tendo
construções leves ou galpões utilizados apenas para a operação do negócio
OBRAP: indica a presença de uma obra não terminada, sem que haja pessoas habitando o
imóvel a não ser pela possível presença de vigias
OBRAP: indica a presença de uma obra em andamento, seja uma obra nova ou uma
reforma, sem que haja pessoas habitando o imóvel a não ser pela possível presença de vigias ou
operários
BALD: indica terrenos baldios sem construções e sem atividade econômica, como
estacionamentos
TOMB: indica aparência de tombamento. Foi considerada existente a aparência de tombamentos
no caso de imóveis coloniais ou do início do século 20 com fachadas descaracterizadas ou não
USO: tipo de uso. Foram consideradas 4 possibilidades:
COM: uso comercial
MIS: uso misto, com lojas no térreo e sobrelojas e apartamentos residenciais nos andares
superiores
RES: uso exclusivamente residencial
<null> : quando o terreno não apresentava construções habitáveis, mas apenas galpões
ou outras construções leves para uso de vigias ou operação de estacionamentos ou em terrenos
baldios
EST: existência de estacionamento em operação no imóvel
AREA: área estimada do terreno
PERIMETRO: perímetro estimado do terreno
FRENTE: tamanho da testada principal do imóvel
FRENTE2: comprimento da testada secundária do imóvel
PRECO: preço da primeira hora de uma vaga em estacionamento
PRECO2: preço da segunda hora de uma vaga em estacionamento
119
PRECO3: preço da terceira hora de uma vaga em estacionamento
PRECO4: preço da quarta hora de uma vaga em estacionamento
Código da variável
Nome da variável
Valores
FID
Identificação do ponto
De 0 a 585
ID_NOM
Identificação dos atributos
De 1 a 586
DATA
Data da coleta de dados
De 12-03-2007 a 10-09-2007
LOGR_OR
Orientação em relação ao número vizinho
E à esquerda
D à direita
<null> - número exato
LOGR_NUM
Número do prédio
inteiros
LOGR_TIP
Tipo de logradouro
Rua, Avenida, etc.
LOGR_NOM
Nome do logradouro
Sem acentos
LOGR_TIT
Título do nome da rua
Sem acentos
FOTO
Número da foto
Inteiros
OCUP
Tipo de ocupação
DESOC Totalmente
desocupado
PILO Somente o pilotis e
provavelmente uma sobreloja
ocupados
PARC Parcialmente ocupado
(aprox. menos de 50%)
EST ocupado exclusivamente
como estacionamento em
terreno sem construções
OBRAN obra em andamento
OBRAP obra parada
BALD - baldio
TOMB
Aparência de tombamento
SIM, <null>
USO
Tipo de uso
COM - comercial
MIS - misto
RES - Residencial
HOT - hotel
<null>
ESTAC
Existência de estacionamento aberto
SIM, <null>
AREA
Área estimada do terreno
Em m²
PERIMETRO
Perímetro estimado do terreno
Em m
FRENTE
Tamanho da frente
Em m
FRENTE 2
Tamanho da segunda frente
Em m
PRECO
Preço de estacionamento na 1ª hora
Em R$
PRECO2
Preço de estacionamento na 2ª hora
Em R$
PRECO 3
Preço de estacionamento na 3ª hora
Em R$
PRECO 4
Preço de estacionamento na 4ª hora
Em R$
120
Tabela A.1: Análise da distância média do vizinho mais próximo para as
diferentes regiões do mosaico
Distância média do vizinho mais
próximo
Região
seleção de pontos
observada
esperada
dist. Observada /
dist. esperada
z-score (em
desvios padrão)
padrão
todas
35.820456
46.476036
0.770730
-10.049826
concentrado**
1
pontos internos
34.916160
32.877283
1.062015
0.355916
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
37.480319
48.544822
0.772077
-4.382082
concentrado**
dentro das regiões
contíguas
(3,6,8,15,18,20,21)
31.473656
49.213490
0.639533
-9.727984
concentrado**
2
pontos internos
49.666224
42.794250
1.160582
1.504986
disperso
buffer de 250m ao redor
da região
42.714522
36.555975
1.168469
2.696496
disperso**
dentro das regiões
contíguas (3,4,5,13,25)
41.252773
49.785138
0.828616
-3.485297
concentrado**
3
pontos internos
26.464672
23.788975
1.112476
1.075876
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
40.327581
41.720544
0.966612
-0.585410
aleatório
dentro das regiões
contíguas (1,2,4,6,25)
34.882916
48.850013
0.714082
-7.089686
concentrado**
4
pontos internos
99.186618
60.152850
1.648910
3.724229
concentrado**
buffer de 250m ao redor
da região
36.447024
44.109325
0.826288
-3.437570
concentrado**
dentro das regiões
contíguas (2,3,5,6,7)
34.034258
47.725785
0.713121
-6.539941
concentrado**
5
pontos internos
79.832245
37.161932
2.148226
4.911831
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
51.891217
50.576867
1.025987
0.281232
aleatório
dentro das regiões
contíguas (2,4,7)
49.039762
56.474791
0.868348
-1.901500
concentrado
6
pontos internos
25.531709
35.816026
0.712857
-3.922961
concentrado**
buffer de 250m ao redor
da região
30.601546
46.201782
0.662346
-7.858401
concentrado**
dentro das regiões
contíguas (1,3,4,7,8,9,10)
32.891599
47.300820
0.695371
-7.948024
concentrado**
7
pontos internos
27.826743
26.835627
1.036933
0.307979
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
40.034638
48.259107
0.829577
-2.766468
concentrado**
dentro das regiões
contíguas (4,5,6,9)
36.735611
53.763919
0.683276
-6.383707
concentrado**
8
pontos internos
31.593560
30.804923
1.025601
0.219030
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
29.032201
42.943611
0.676054
-6.040394
concentrado**
dentro das regiões
contíguas (1,6,10,21)
29.599645
51.081803
0.579456
-8.776393
concentrado**
9
pontos internos
49.297477
31.529906
1.563515
4.444887
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
34.832608
41.132490
0.846839
-2.416200
disperso*
dentro das regiões
contíguas (6,7,10,11)
31.419960
47.426214
0.662502
-7.013635
disperso**
10
pontos internos
33.115140
41.691544
0.794289
-1.803424
concentrado
buffer de 250m ao redor
da região
35.726817
45.237104
0.789768
-3.483055
concentrado**
dentro das regiões
contíguas
(6,8,9,11,21,24)
35.820456
46.476036
0.770730
-10.049826
concentrado**
11
pontos internos
42.237050
35.111568
1.202938
1.227708
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
39.809426
41.393168
0.961739
-0.474364
aleatório
dentro das regiões
contíguas (7,9,10)
35.902061
51.340971
0.699287
-4.708915
concentrado**
121
12
pontos internos
42.648535
40.894981
1.042879
0.401870
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
38.985158
41.194377
0.946371
-1.041239
concentrado
dentro das regiões
contíguas (13,14,15,25)
39.656351
44.826276
0.884668
-2.324577
concentrado*
13
pontos internos
33.863188
34.187341
0.990518
-0.107312
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
33.194797
39.858738
0.832811
-3.150100
concentrado**
dentro das regiões
contíguas (2,3,12,15,25)
35.820456
46.476036
0.770730
-10.049826
concentrado**
14
pontos internos
47.844067
44.545628
1.074046
0.679357
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
44.209420
46.830622
0.944028
-0.902258
aleatório
dentro das regiões
contíguas (12,15,16,18)
41.623871
48.873972
0.851657
-2.894103
concentrado**
15
pontos internos
35.490954
26.907408
1.319003
2.283441
disperso*
buffer de 250m ao redor
da região
37.067176
43.232194
0.857398
-2.559171
concentrado*
dentro das regiões
contíguas
(1,12,13,14,16,18,25)
39.575403
47.562672
0.832069
-4.101632
concentrado**
16
pontos internos
55.441808
41.993355
1.320252
2.292380
disperso*
buffer de 250m ao redor
da região
46.282174
47.119093
0.982238
-0.282255
aleatório
dentro das regiões
contíguas (14,15,17,18)
55.441808
41.993355
1.320252
2.292380
concentrado*
17
pontos internos
36.482249
28.646022
1.273554
3.471362
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
39.799358
43.778437
0.909109
-1.465151
concentrado
dentro das regiões
contíguas (16,18,19)
40.588615
45.363198
0.894748
-1.952210
concentrado
18
pontos internos
37.571206
38.238656
0.982545
-0.179823
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
43.652519
50.825827
0.858865
-2.444966
concentrado*
dentro das regiões
contíguas
(1,14,15,16,17,19,20)
39.938134
49.176312
0.812142
-4.517413
concentrado**
19
pontos internos
69.224476
36.083872
1.918433
4.648654
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
41.242287
48.375984
0.852536
-2.256866
concentrado*
dentro das regiões
contíguas (17,18,20)
35.820456
46.476036
0.770730
-10.049826
concentrado**
20
pontos internos
39.391697
25.504032
1.544528
4.419646
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
33.807910
40.136581
0.842322
-2.523783
concentrado*
dentro das regiões
contíguas (1,18,19,21,22)
35.820456
46.476036
0.770730
-10.049826
concentrado**
21
pontos internos
32.856340
26.076642
1.259991
2.110211
disperso*
buffer de 250m ao redor
da região
30.885471
40.302515
0.766341
-4.602208
concentrado**
dentro das regiões
contíguas
(1,8,10,20,22,23,24)
31.339443
52.586735
0.595957
-9.777284
concentrado**
22
pontos internos
35.820456
46.476036
0.770730
-10.049826
concentrado**
buffer de 250m ao redor
da região
31.490767
35.704279
0.881989
-1.689463
concentrado
dentro das regiões
contíguas (20,21,23)
29.552425
38.557880
0.766443
-4.262301
concentrado**
23
pontos internos
27.471034
31.470816
0.872905
-1.701991
concentrado
buffer de 250m ao redor
da região
30.826079
36.650215
0.841089
-3.129960
concentrado**
dentro das regiões
contíguas (21,22,24)
29.644299
35.204291
0.842065
-2.898034
concentrado**
24
pontos internos
38.485078
28.972865
1.328315
2.737775
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
34.312905
40.926687
0.838399
-2.568022
concentrado*
122
dentro das regiões
contíguas (10,21,23)
35.820456
46.476036
0.770730
-10.049826
concentrado**
25
pontos internos
43.356807
27.087023
1.600649
4.450379
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
34.753741
38.860855
0.894312
-2.051984
concentrado*
dentro das regiões
contíguas
(1,2,3,12,13,15)
37.654660
48.883668
0.770291
-5.309883
concentrado**
123
Tabela A.2: Análise da distância média do vizinho mais próximo para as
diferentes regiões do mosaico (somente imóveis desocupados, térreo-
ocupados e parcialmente ocupados)
Distância média do vizinho mais
próximo
Região
seleção de pontos
observada
esperada
dist. Observada /
dist. esperada
z-score (em
desvios padrão)
padrão
todas
43.205263
64.281285
0.672128
-9.917563
concentrado**
1
pontos internos
49.684685
33.759556
1.471722
2.552479
disperso*
buffer de 250m ao redor
da região
43.171515
52.860222
0.816711
-3.036675
concentrado**
dentro das regiões
contíguas
(3,6,8,15,18,20,21,25)
34.935586
52.565976
0.664605
-7.645964
concentrado**
2
pontos internos
67.327916
62.822533
1.071716
0.433858
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
43.708286
53.090388
0.823281
-2.028460
concentrado*
dentro das regiões
contíguas
(3,4,5,13,25)
49.067923
67.231734
0.729833
-3.902123
concentrado**
3
pontos internos
26.143002
20.290849
1.288413
2.274945
disperso*
buffer de 250m ao redor
da região
46.888047
53.006385
0.884574
-1.576962
aleatório
dentro das regiões
contíguas (1,2,4,6,13,25)
142.178861
126.933475
1.120105
1.524121
aleatório
4
pontos internos
174.481952
50.905413
3.427572
10.384556
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
38.743133
48.082407
0.805765
-3.239400
concentrado**
dentro das regiões
contíguas
(2,3,5,6,7)
36.140255
49.473860
0.730492
-5.104059
concentrado**
5
pontos internos
79.832244
37.161932
2.148226
4.911831
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
86.012594
66.364660
1.296060
2.335261
disperso*
dentro das regiões
contíguas
(2,4,7)
43.205263
64.281285
0.672128
-9.917563
concentrado**
6
pontos internos
25.733175
36.539655
0.704253
-3.960489
concentrado**
buffer de 250m ao redor
da região
35.887469
52.653425
0.681579
-6.121999
concentrado**
dentro das regiões
contíguas
(1,3,4,7,8,9,10)
35.328769
55.937111
0.631580
-7.459040
concentrado**
7
pontos internos
31.021936
27.485808
1.128653
0.852591
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
45.208912
53.184164
0.850045
-1.945682
concentrado
dentro das regiões
contíguas
(4,5,6,9)
38.446330
51.940034
0.740206
-4.246404
concentrado**
8
pontos internos
32.938582
32.740293
1.006056
0.044874
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
35.959020
44.170315
0.814099
-2.822814
concentrado**
dentro das regiões
contíguas
(1,6,10,21)
33.113780
51.135597
0.647568
-6.030469
concentrado**
9
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
38.021275
47.623720
0.798368
-2.077248
concentrado*
dentro das regiões
contíguas
(6,7,10,11)
29.467640
47.864548
0.615646
-6.018651
concentrado**
10
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
51.152278
59.740375
0.856243
-1.198772
aleatório
124
dentro das regiões
contíguas
(6,8,9,11,21,24)
36.777673
55.040793
0.668189
-5.677618
concentrado**
11
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
59.408204
31.741029
1.871653
4.084607
disperso**
dentro das regiões
contíguas
(7,9,10)
29.467640
47.864548
0.615646
-6.018651
concentrado**
12
pontos internos
107.524224
39.722727
2.706869
7.301568
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
44.903308
61.531680
0.729759
-3.310349
concentrado**
dentro das regiões
contíguas (13,14,15,25)
44.224428
59.510518
0.743136
-3.146484
concentrado**
13
pontos internos
33.847457
41.755073
0.810619
-1.403178
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
37.930896
53.094489
0.714404
-3.785334
concentrado**
dentro das regiões
contíguas (2,3,12,15,25)
41.449431
63.585502
0.651869
-5.286200
concentrado**
14
pontos internos
61.674628
26.262397
2.348401
5.768127
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
46.314141
54.520783
0.849477
-1.603301
aleatório
dentro das regiões
contíguas (12,15,16,18)
50.110541
57.944081
0.864809
-1.882859
concentrado
15
pontos internos
35.447172
29.678592
1.194368
1.233255
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
37.764331
50.438790
0.748716
-3.466549
concentrado**
dentro das regiões
contíguas
(1,12,13,14,16,18,25)
44.787442
60.809978
0.736515
-4.536593
concentrado**
16
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
56.739422
63.270288
0.896778
-1.063410
aleatório
dentro das regiões
contíguas (14,15,17,18)
42.532439
59.197348
0.718486
-4.240601
concentrado**
17
pontos internos
37.055262
44.238177
0.837631
-1.162247
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
49.248949
63.578061
0.774622
-2.240396
concentrado*
dentro das regiões
contíguas
(16,18,19)
49.049798
60.101044
0.816122
-2.437141
concentrado*
18
pontos internos
37.571207
38.238655
0.982545
-0.179823
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
45.628675
53.350238
0.855267
-2.015755
concentrado*
dentro das regiões
contíguas
(1,14,15,16,17,19,20)
48.683339
63.317444
0.768877
-3.854610
concentrado**
19
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
73.646609
71.516002
1.029792
0.261180
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(17,18,20)
46.461744
57.301805
0.810825
-2.533333
concentrado*
20
pontos internos
119.612971
34.079257
3.509847
9.603026
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
60.837471
59.679260
1.019407
0.203355
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(1,18,19,21,22)
52.539489
68.232748
0.770004
-2.782795
concentrado**
21
pontos internos
53.109789
17.154394
3.095988
8.019542
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
56.653691
59.806769
0.947279
-0.653642
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(1,8,10,20,22,23,24)
51.328231
78.490686
0.653940
-5.170668
concentrado**
22
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
54.350499
42.729491
1.271967
2.081167
disperso*
125
dentro das regiões
contíguas
(20,21,23)
54.186094
60.202251
0.900068
-1.011618
aleatório
23
pontos internos
46.246776
43.935938
1.052596
0.438588
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
61.337824
56.686898
1.082046
0.901664
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(21,22,24)
53.417132
52.544498
1.016608
0.174019
aleatório
24
pontos internos
103.407616
48.348189
2.138811
5.336518
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
62.280068
46.609706
1.336204
2.876395
disperso**
dentro das regiões
contíguas
(10,21,23)
54.951005
65.693879
0.836471
-1.797146
concentrado*
25
pontos internos
45.297470
20.736632
2.184418
5.066649
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
40.613718
47.863236
0.848537
-2.225686
concentrado*
dentro das regiões
contíguas
(1,2,3,12,13,15)
42.377347
66.731578
0.635042
-5.883057
concentrado**
126
Tabela A.3: Análise da distância média do vizinho mais próximo para as
diferentes regiões do mosaico (somente imóveis sem construções utilizados
como estacionamentos)
Distância média do vizinho mais
próximo
Região
seleção de pontos
observada
esperada
dist. Observada /
dist. esperada
z-score (em
desvios padrão)
padrão
todas
54.466918
68.407841
0.796209
-5.976549
concentrado**
1
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
54.507529
86.460901
0.630430
-3.081801
concentrado**
dentro das regiões
contíguas
(3,6,8,15,18,20,21,25)
60.863513
95.720239
0.635848
-4.621043
concentrado**
2
pontos internos
73.192662
50.488302
1.449695
2.980163
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
72.729665
58.431411
1.244701
2.520963
disperso*
dentro das regiões
contíguas
(3,4,5,13,25)
70.222920
64.623937
1.086639
1.124153
aleatório
3
pontos internos
62.851020
18.509265
3.395652
11.226134
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
70.685792
52.909412
1.335978
3.277389
disperso**
dentro das regiões
contíguas (1,2,4,6,13,25)
83.997072
86.441923
0.971717
-0.370944
aleatório
4
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
75.399019
78.865827
0.956042
-0.420477
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(2,3,5,6,7)
54.466918
68.407841
0.796209
-5.976549
concentrado**
5
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
121.653008
76.504544
1.590141
3.570151
disperso**
dentro das regiões
contíguas
(2,4,7)
80.489635
85.911112
0.936894
-0.566253
aleatório
6
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
74.248091
86.629042
0.857081
-1.617541
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(1,3,4,7,8,9,10)
65.018709
84.752641
0.767159
-3.053797
concentrado**
7
pontos internos
63.042048
36.206752
1.741168
3.751429
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
69.510924
37.497960
1.853726
7.660559
disperso**
dentro das regiões
contíguas
(4,5,6,9)
65.852759
73.915274
0.890922
-1.180435
aleatório
8
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
64.366767
69.966392
0.919967
-0.750077
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(1,6,10,21)
64.539660
61.465737
1.050010
0.524024
aleatório
9
pontos internos
56.365930
22.246426
2.533707
10.163984
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
57.980104
49.750249
1.165423
1.872241
disperso
dentro das regiões
contíguas
(6,7,10,11)
51.978833
58.039635
0.895575
-1.340117
aleatório
10
pontos internos
50.500315
43.382668
1.164067
1.255484
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
50.861380
53.200441
0.956033
-0.576642
aleatório
127
dentro das regiões
contíguas
(6,8,9,11,21,24)
56.522642
55.849557
1.012052
0.184447
aleatório
11
pontos internos
45.191413
37.010842
1.221032
1.268548
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
46.443540
42.691019
1.087900
0.951245
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(7,9,10)
47.730778
44.154661
1.080991
0.942469
aleatório
12
pontos internos
51.332286
48.476729
1.058906
0.464636
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
51.741509
51.616292
1.002426
0.035038
aleatório
dentro das regiões
contíguas (13,14,15,25)
54.466918
68.407841
0.796209
-5.976549
concentrado**
13
pontos internos
59.740659
42.150898
1.417305
3.291610
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
56.948332
52.851774
1.077510
0.960981
aleatório
dentro das regiões
contíguas (2,3,12,15,25)
59.650607
64.986323
0.917895
-1.246728
aleatório
14
pontos internos
47.714795
39.073479
1.221156
1.692344
disperso
buffer de 250m ao redor
da região
55.047681
58.618388
0.939086
-0.699202
aleatório
dentro das regiões
contíguas (12,15,16,18)
51.899408
57.736052
0.898908
-1.297338
aleatório
15
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
54.527395
58.810798
0.927166
-0.788202
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(1,12,13,14,16,18,25)
54.876680
57.118867
0.960745
-0.628308
aleatório
16
pontos internos
62.122637
45.319381
1.370774
2.127951
disperso*
buffer de 250m ao redor
da região
56.677069
62.859120
0.901652
-1.128876
aleatório
dentro das regiões
contíguas (14,15,17,18)
50.020369
54.507733
0.917675
-1.178577
aleatório
17
pontos internos
49.649321
35.738092
1.389255
3.940434
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
53.144427
48.238266
1.101707
1.230583
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(16,18,19)
56.031440
50.525227
1.108979
1.351140
aleatório
18
pontos internos
-
-
-
-
buffer de 250m ao redor
da região
66.767045
75.977330
0.878776
-1.182515
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(1,14,15,16,17,19,20)
52.707747
63.286212
0.832847
-2.750808
concentrado**
19
pontos internos
109.651418
37.436266
2.929016
8.251857
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
55.393725
54.961090
1.007872
0.094044
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(17,18,20)
54.117687
49.948821
1.083463
1.082935
aleatório
20
pontos internos
49.981395
29.963751
1.668062
4.608073
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
47.721720
48.714288
0.979625
-0.227287
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(1,18,19,21,22)
53.447912
57.895850
0.923173
-0.844305
aleatório
21
pontos internos
55.286627
32.655958
1.693003
4.397058
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
49.114009
49.245973
0.997320
-0.036967
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(1,8,10,20,22,23,24)
48.397733
54.814893
0.882930
-2.028066
concentrado*
22
pontos internos
27.991320
3.525323
7.940072
26.553690
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
44.721282
44.026009
1.015792
0.176164
aleatório
128
dentro das regiões
contíguas
(20,21,23)
44.725814
50.207006
0.890828
-1.491512
aleatório
23
pontos internos
45.624282
41.629380
1.095964
0.880442
aleatório
buffer de 250m ao redor
da região
44.909484
42.359335
1.060203
0.899523
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(21,22,24)
45.015678
46.527842
0.967500
-0.444019
aleatório
24
pontos internos
55.632733
30.701332
1.812063
5.601341
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
55.293216
51.712549
1.069242
0.827239
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(10,21,23)
48.427961
50.393774
0.960991
-0.592334
aleatório
25
pontos internos
66.755529
32.049409
2.082894
5.859518
disperso**
buffer de 250m ao redor
da região
58.602406
54.804978
1.069290
0.827814
aleatório
dentro das regiões
contíguas
(1,2,3,12,13,15)
59.650607
64.986323
0.917895
-1.246728
aleatório
FIM
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