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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE LETRAS MODERNAS
MARTA IGLESIS FARRERO
A literatura: um espaço potencialmente aberto ao equívoco e à alteridade
nas aulas de ELE para brasileiros
São Paulo
2009
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MARTA IGLESIS FARRERO
A literatura: um espaço potencialmente aberto ao equívoco e à alteridade
nas aulas de ELE para brasileiros
Dissertação apresentada à Área de Língua
Espanhola e Literaturas Espanhola e Hispano-
Americana da Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas da Universidade de São
Paulo para obtenção do título de Mestre em
Língua Espanhola.
Área de concentração: Língua Espanhola
Orientador: Profa. Dra. Maria Teresa Celada
São Paulo
2009
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Nome: FARRERO, Marta Iglesis
Título: A literatura: um espaço potencialmente aberto ao equívoco e à alteridade nas aulas de
ELE para brasileiros
Dissertação apresentada à Área de Língua
Espanhola e Literaturas Espanhola e Hispano-
Americana da Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas da Universidade de São
Paulo para obtenção do título de Mestre em
Língua Espanhola.
Aprovado em:
Banca Examinadora
Profa. Dra. Maria Zulma Moriondo Kulikowski Instituição: USP/FFLCH/DLM
Julgamento:___________________________ Assinatura:_______________________
Profa. Dra. María Dolores Aybar Ramirez Instituição: Unesp/Araraquara
Julgamento:___________________________ Assinatura:_______________________
Profa. Dra. Monica Ferreira Mayrink O'Kuinghttons Instituição: USP/FFLCH/DLM
Julgamento:___________________________ Assinatura:________________________
Profa. Dra. Adriana Kanzepolsky Instituição: USP/FFLCH/DLM
Julgamento:___________________________ Assinatura:________________________
Profa. Dra. Cristine Fickelscherer de Mattos Instituição: UNIFIEO
Julgamento :__________________________ Assinatura:_______________________
A Paco e Pepita, meus pais, pelo amor
incondicional.
A Patricia, minha filha, que torna divina
minha existência como ser humano e como
mãe.
AGRADECIMENTOS
A Maria Teresa Celada, minha orientadora e amiga, que me “abraçou” e me abriu as portas da
carreira acadêmica, e cujo exemplo me inspira e estimula a continuar trilhando caminhos pelo
mundo da linguagem.
Ao Prof. Hermes por ter acreditado em mim, me incentivando e apoiando a entrar no cativante
mundo da educação.
A Gláucia Rezende, pela acolhida, pela amizade e por ter criado condições para o
desenvolvimento desta pesquisa.
A Liliane Kafler pela amizade, e pelo grande apoio que me ofereceu ao longo desses anos.
A Karla e Vanessa pela alegria que me trazem no dia-a-dia e pela paciência, incentivo e apoio
nos momentos de dificuldade.
A Flávio por sua companhia durante os finais de semana e por contribuir no desenvolvimento
deste trabalho para o enriquecimento desse estudo.
A Maria Zulma Kulikowski e Pablo Gasparini pela grande contribuição que fizeram à minha
qualificação, que ajudou ao enriquecimento deste estudo.
A Reinaldo pelo companheirismo, por me aceitar, por me ajudar e por me acalmar quando
muitas vezes o desespero falou mais alto.
A Patricia, minha filha, pelo amor e companheirismo. Ela é a minha referência, inspiração e
meu orgulho. Obrigada por compreender minha ausência.
A meus amigos, que acompanharam este trabalho me incentivando.
Talvez não haja na nossa infância dias que
tenhamos vivido tão plenamente como aqueles
que pensamos ter deixado passar sem vivê-los,
aqueles que passamos na companhia de um
livro preferido.
M
ARCEL
P
ROUST
RESUMO
IGLESIS, M. A literatura: um espaço potencialmente aberto ao equívoco e à alteridade nas
aulas de ELE para brasileiros. 2009. 161 f. 120 +1CD-ROM. Dissertação (Mestrado em
Língua Espanhola) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São
Paulo, 2010.
Diante do processo de “instrumentalização” de que vem sendo objeto a língua
espanhola nas práticas de ensino aprendizado, nas quais fica reduzida a uma língua veicular a
serviço de resolver as urgências do sujeito contemporâneo, entendido como um “sujeito
pragmático”, propomos trabalhar o texto literário como um suporte ligado a experiências de
leitura nessas práticas. Pensamos que dessa forma poderíamos oferecer uma certa resistência à
referida redução da língua, pois, nossa hipótese é que a materialidade do texto literário torna
possível o confronto entre um sujeito e duas dimensões que consideramos que não devem ser
escamoteadas, tal como, a nosso ver, acontece no processo de “instrumentalização” de que
falamos. Este, de fato, não apenas evita a dimensão do equívoco mas também contorna a
exposição à alteridade. De nossa perspectiva, determinados textos literários apresentam de
forma potencializada a não estabilização semântica dos sentidos e exploram a relação com o
estranho. Nesse sentido, realizamos uma experiência piloto com aprendizes brasileiros de
língua espanhola que nos permitiu constituir um corpus no qual a partir do lugar teórico da
Análise do Discurso de linha francesa analisamos as imagens detectadas nas respostas dos
aprendizes aos questionários aplicados ao longo do processo, bem como as produções escritas
por eles realizadas durante mesmo. Nessa análise, detectamos deslocamentos tanto no nível
do registro imaginário quanto no da elaboração simbólica.
Palavras-chave: ensino de língua espanhola para brasileiros, processos de
instrumentalização, leitura, literatura, imaginário, discurso.
ABSTRACT
IGLESIS, M. Literature:a potentially open place to the misconception and to the alterity in
ELE classes for the Brazilians. 2009. f. 161 +1CD-ROM. Dissertation (MA in Spanish) –
Faculty of Philosophy, Languages and Human Sciences, University of São Paulo, 2010.
In teaching learning practices, the Spanish language has been suffering from the
“instrumentalization” process in which it is transformed in a vector language so as to solve the
contemporary subject urgencies, being this subject understood as a “pragmatic subject”. We
propose here to deal with the literary text as a support linked to reading experiences in these
practices and in this way we thought be possible to offer a certain resistance to the language
usage as mentioned above. Our hypothesis is that the literary text materiality makes it
possible the confrontation between one subject and two dimensions which, in our view,
shouldn’t be disguised such as it happens in the “instrumentalization” process ”. In fact, this
not only would avoid the misconception dimension but also would minimize the exposition to
the alterity. From our perspective, certain literary texts present the non-stabilization semantics
of the senses in a potentialized form and explore the relation with the strange. In this sense, on
the grounds of the Discourse Analysis in the French line of thought , we have done a pilot
experience with Brazilian learners of the Spanish language , allowing us to constitute a
corpus, in which the detected images in the learners’ answers to the questionnaires
throughout the process are analyzed as well as the written productions. In this analysis, we
have detected misplacement both in the imaginary register level and in the symbolic
elaboration.
Key-words: Spanish teaching for the Brazilians, “instrumentalization” processes, reading,
literature, imaginary, discourse.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10
CAPÍTULO 1
O LUGAR DO TEXTO E DA LEITURA EM CERTAS PRÁTICAS DE ENSINO DE
ELE NO BRASIL ....................................................................................................... 13
1. Os Métodos de Ensino de Línguas Estrangeiras e o lugar da leitura ................................... 15
1.1 A onipresença do texto escrito: Método Tradicional.......................................................... 16
1.2 A ausência do texto escrito: Método Direto ....................................................................... 18
1.3 A presença discreta do texto escrito: Métodos Estruturais ................................................. 20
1. 4 A presença de textos sem identidade própria: Enfoque Comunicativo ............................. 23
2. A aprendizagem de línguas estrangeiras: “dor” e “prazer” .................................................. 25
3. O aprendiz brasileiro e a língua espanhola ........................................................................... 28
4. Alguns aspectos do espanhol na atual conjuntura no Brasil ................................................. 31
CAPÍTULO 2
A LEITURA DE LITERATURA NA AULA DE ELE .................................................. 36
1. A Leitura ............................................................................................................................... 36
2. Constituição do leitor na escola brasileira ............................................................................ 40
2.1 Instâncias do ideológico na escola...................................................................................... 41
2.1.1 Instância do Jurídico ........................................................................................................ 41
2.1.2 Instância do Econômico................................................................................................... 43
2.1.3 Instância do Político ....................................................................................................... 44
2.2 Os efeitos: a identidade linguística escolar no âmbito escolar ........................................... 45
3. A literatura na prática de ensino de ELE .............................................................................. 47
3.1. Antecedentes ...................................................................................................................... 47
3.2 Nossa proposta - As várias razões que nos afetam ............................................................. 49
CAPÍTULO 3
NOSSA EXPERIÊNCIA – CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO ....................................... 56
1. As linhas gerais da experiência ............................................................................................ 56
2. O corpus ................................................................................................................................ 56
3. Sobre a instituição e nossos aprendizes ................................................................................ 58
4. Programa do curso ................................................................................................................ 60
4.1 Análise do livro didático: Planeta E/LE 1 .......................................................................... 60
4.2 A seleção dos textos literários ............................................................................................ 66
4.3. Sobre como articulamos a experiência de ler os textos literários ...................................... 70
CAPÍTULO 4
NOSSO CORPUS - CRISTALIZAÇÕES E DESLOCAMENTOS ............................. 72
1. No registro do imaginário ..................................................................................................... 72
1.1 As imagens iniciais ............................................................................................................. 73
1.2 A reformulação imaginária ................................................................................................. 78
2. No registro do simbólico ...................................................................................................... 83
CERTAS CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................... 91
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 94
ANEXO ..................................................................................................................... 99
10
INTRODUÇÃO
Um movimento utópico
A língua espanhola, de acordo com o que se afirma em determinadas discursividades,
é uma língua que “triunfa no mundo atual” tal como observa Acuña (2007)
1
. Assim, dentre
as várias ações destacadas pela autora (cf. ibid.), fazem-se projeções sobre o número de
falantes com os quais esse idioma contará nas próximas décadas, fala-se dessa língua como
recurso econômico, organizam-se inúmeros congressos internacionais para defendê-la e
promovê-la. No Brasil, esse fenômeno tem determinadas repercussões e um de seus efeitos é
que em 5 de agosto de 2005, o presidente Luiz Ignácio Lula da Silva sancionou a lei
11161, que estabelece a obrigatoriedade da oferta da língua espanhola nas instituições de
ensino médio de todo o país. Num cenário que, neste país, já vinha marcado por uma demanda
crescente de cursos de espanhol e por uma resposta que se expressou mediante o aumento da
oferta de cursos, essa lei precipitou a abertura de cursos de formação de professores bem
como a produção de materiais didáticos para atender toda essa mudança que começa nos anos
90 e que, na primeira década deste século, atinge uma determinada estabilidade.
Em nossa atuação docente em cursos de espanhol oferecidos por escolas de línguas,
percebemos que as práticas discursivas de ensino/aprendizagem dessa língua, tal como
acontece com as línguas estrangeiras de forma geral no mundo contemporâneo, não oferecem
resistência a um forte processo de instrumentalização posto ao serviço de satisfazer as
urgências de um “sujeito pragmático” (cf. Celada, 2002). Consequentemente as amostras de
língua que aparecem nos livros didáticos livros que, na maioria das vezes, funcionam como
suporte principal das referidas práticas – apresentam essa língua moldada, de acordo com uma
gradação de forma que possa satisfazer as urgências de um sujeito que precisará dela como
veicular. Acreditamos que essa língua imaginária (cf. Orlandi, 2002b), reduzida ao mínimo,
sem densidade semântica, pode não oferecer resistência à ilusão de competência espontânea
que determina a relação do brasileiro com a língua espanhola (cf. Celada, 2002) ou, inclusive,
pode não contribuir a atender as expectativas de língua de cultura, um saber que o brasileiro
1
Trata-se do artigo de ACUÑA, L. La certificación internacional del español como lengua extranjera: entre
la megalomanía y la necesidad de los hablantes.
Disponível em: <http://addendaetcorrigenda.blogia.com/temas/instituciones-y-politicas-culturales-y-
linguisticas-institucions-i-politiques-culturals-i-linguistiques.php>. Acesso em: 10/11/2009
11
supõe a essa língua (cf. Sousa, 2007). E mas ainda, pode reforçar a violência simbólica que
segundo a própria Celada (2002), com base nas reflexões de Gallo (1992), essa língua produz
para o brasileiro, ao ressoar como a língua da escrita “conservada” na escola.
Isto posto, e como sujeitos desta pesquisa, supondo à literatura um saber e, também, a
capacidade de ser fonte de experiências prazerosas, decidimos apostar nela na procura de um
gesto que oferecesse resistência a esse movimento de instrumentalização que sofrem as
línguas estrangeiras em práticas de ensino-aprendizado e à referida violência simbólica que
marca a relação do brasileiro com o espanhol, por efeito da ferida que esse sujeito carrega a
respeito da escrita do português “conservado”, de acordo com Gallo (1992), numa escola
centrada em reproduzir textos (e não em produzi-los). Esta última relação está determinada
pela descontinuidade que entre oralidade e escrita essa escola sustenta, como fruto de
determinados processos históricos (cf. Celada, 2002).
Partindo da formulação de Pêcheux “Nada da poesia é estranho à ngua” (cf. 1990, p.
51), asserção que nos preserva de defender que a poesia (como equívoco, como deslize, como
movimento metafórico) estaria apenas restrita ao universo da literatura, decidimos pôr em
prática através de uma pequena experiência, a partir da qual produzimos o corpus desta
dissertação, a introdução da leitura de textos literários nas aulas de ELE, de modo a opor uma
certa resistência ao referido processo de instrumentalização da língua. Para tanto, nosso ponto
de partida é uma espécie de utopia que, ao longo deste trabalho iremos submetendo às devidas
inflexões: o texto literário, quando selecionado de acordo com certos parâmetros, e a prática
de sua leitura poderão reforçar o fato de que “a língua chega toda”
2
, ampliando a
competência sobre a mesma, para além do recorte gradativo que se faz dela na prática de
ensino/aprendizagem. Parece-nos, inclusive, que estabelecer a relação com a materialidade da
linguagem literária poderá propiciar a produção de uma posição “leitor”, marcada pela
exposição à polissemia, ao vacilo e à desestabilização semântica que são próprios do real da
língua e que a literatura concentra de forma potencializada.
A presente dissertação constará de quatro capítulos, que passamos a descrever. No
primeiro deles começaremos por recuperar trabalhos que nos permitam determinar qual é o
lugar da literatura e do exercício da leitura nos diferentes métodos de ensino/aprendizagem de
espanhol como língua estrangeira doravante, ELE. Na sequência apresentamos o processo
de aprendizagem das línguas estrangeiras, o aprendiz brasileiro e a língua espanhola, e
2
Esta afirmação foi realizada de forma reiterada em vários textos da extensa produção de Claudia Lemos, sobre
os processos de aquisição, entre eles: LEMOS, C. Sobre os Pronomes Pessoais na Fala da Criaça. Letras de
Hoje, v. 39. Fac. 3. pp. 9 – 25.
12
finalizamos o capítulo fazendo uma descrição da presença do espanhol no Brasil e discutindo
a prática de ensino dessa língua a serviço de resolver as urgências do sujeito contemporâneo,
entendido como um “sujeito pragmático”. Concluiremos que o ensino da língua espanhola no
Brasil fica restrito a uma abordagem que contempla esse idioma como uma língua adelgaçada,
sem espessura semântica e reduzida a uma única função, a comunicativa. Finalizaremos esse
capítulo propondo a prática de leitura de textos literários como um gesto que ofereça
resistência à instrumentalização da língua espanhola nas práticas atuais de aprendizado, tais
como acontecem, de forma geral, no Brasil. Parece-nos que essa experiência de leitura
propicia colocar o aluno no confronto com o que é constitutivo de sua relação com uma língua
estrangeira: a desestabilização dos sentidos, a ambiguidade, o duplo sentido tudo aquilo que
se relaciona com o equívoco.
O segundo capítulo, por sua vez, versará sobre a leitura. Em primeiro lugar
abordaremos as várias concepções teóricas sobre a leitura e defenderemos a abordagem
discursiva. Passaremos, subsequentemente, à descrição da constituição do leitor na escola
brasileira, baseados nos estudos de Nunes (2003) e Orlandi (2002a), o que nos permitirá
conhecer as diferentes instâncias que afetam a formação desse leitor. Ainda nesse segundo
capitulo, e buscando nos aprofundar na prática da leitura literária, abordaremos o efeito que
essa tem sobre o leitor, o lugar da literatura em certas pesquisas já realizadas. Por fim,
discutiremos o porquê do uso da literatura na aula de ELE e evidenciaremos o jogo do texto
descrito nos estudos de Iser (2002). A série de relações desenvolvidas ao longo do capítulo
nos levará a concluir que a prática com textos literários solicitará do aluno a interpretação, o
deslocamento, as novas significações.
Objetivando introduzir nossa experiência piloto, o terceiro capítulo desenvolverá o
relato dessa experiência de trabalho com dois cursos de extensão de ELE oferecidos por mim
na Universidade São Judas Tadeu. Nesse mesmo capítulo, discutiremos o material didático
adotado, bem como a escolha dos textos literários e as atividades propostas.
No quarto capítulo nos concentraremos na análise dos resultados de dados do corpus
da nossa pesquisa (extraídos dos questionários aplicados e de produções escritas realizadas
pelos alunos dos cursos), e concluiremos mostrando os deslocamentos que detectamos nos
nossos aprendizes tanto no registro do imaginário, como no registro do simbólico.
Por fim, no último capítulo, dedicado às nossas considerações, retomaremos nossa
hipótese inicial, defendida ao longo do trabalho, a fim de colocar em relevo algumas
conclusões resultantes da nossa experiência.
13
CAPÍTULO 1
O LUGAR DO TEXTO E DA LEITURA EM CERTAS PRÁTICAS DE ENSINO DE
ELE NO BRASIL
Antes de enunciar aqui a forma como organizaremos este capítulo, começaremos por
submeter a certas especificações o processo de instrumentalização das línguas estrangeiras nas
práticas discursivas de ensino-aprendizado ao qual fizemos referência em nossa Introdução,
pois tal processo será, de alguma forma, nosso ponto de partida. Em primeiro lugar,
gostaríamos de dizer que essa instrumentalização entra em relação com a forma como o
aprendiz é interpelado em tais práticas: de acordo com Pêcheux, diremos que essa forma
corresponde à do “sujeito pragmático”, entendido como “cada um de nós” que, frente às
urgências da vida, temos necessidade e desejo de um mundo “semanticamente normal”, ou
seja, segundo o autor, “normatizado” (cf. 1990, p. 34). Frente à necessidade imperiosa de
homogeneidade lógica que esse sujeito apresenta – ainda segundo Pêcheux – surge uma
multiplicidade de pequenos sistemas lógicos que se estendem a todos os âmbitos da vida
humana, e dessa forma a língua passa pela instrumentalização que faz possível que ela
conta de adequar-se à resolução das necessidades restritas a tais sistemas, como se o real da
língua não existisse e o equívoco e todas as falhas que este implica fossem meros acidentes da
língua, não constitutivos dela (cf. ibid., p. 51). Esse processo se faz sobre a base de um outro:
o que Auroux (2001) chama de gramatização, por meio da qual a gramática se torna uma
técnica pedagógica de aprendizagem das línguas, bem como um meio de descrevê-las (cf.
ibid., p. 37). Segundo esse autor “[P]or gramatização deve-se entender o processo que conduz
a descrever e a instrumentar uma língua na base de duas tecnologias, que são ainda hoje os
pilares de nosso saber metalinguístico: a gramática e o dicionário” (ibid., p. 65).
As práticas de ensino-aprendizado de espanhol às quais nos referimos apóiam-se de
maneira central nos livros didáticos; assim, como observado por Serrani (1988 apud
CELADA, 2001, p. 122)
3
para o caso das línguas estrangeiras de forma geral, estes, em lugar
de desenvolver o papel de mediadores, e assim ser apenas componentes das condições de
produção do processo de ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras, acabam funcionando
como suporte essencial da prática de ensino. Esse fato fica ainda mais acentuado no caso do
3
SERRANI-INFANTE, S. Abordagem transdisciplinar da enunciação em segunda língua: a proposta AREDA.
In: SIGNORINI, I, e CAVALCANTI, M; (orgs.). Lingüística aplicada transdisciplinaridade.
Campinas:Mercado das Letras, 1998, p. 143 - 167
14
ensino do espanhol no Brasil, no qual segundo a própria Celada (2001) diante da curta
experiência por parte das escolas e dos professores, tais livros assumem o papel de “guias”,
sendo responsáveis pela produção de determinados resultados (cf. ibid.). Nesse sentido,
podemos observar que, de forma geral, neles opera uma redução da língua, que supõe a
domesticação da dimensão de alteridade que um simbólico sempre implica, apresentando uma
língua “forjada” para resolver, com forte imediatismo, as urgências em função de garantir a
comunicação do sujeito pragmático do mundo moderno; assim, a língua é reduzida a uma
única função, a comunicativa, e sua ordem fica subordinada à administração de um mínimo de
vocabulário e de gramática.
Embora uma determinada “organização” da língua (cf. Pêcheux, 1990) e o trabalho
com os efeitos de uma determinada estabilização semântica sejam importantes por servir
como uma âncora no ensino formal de línguas, o que vemos nos casos que nos ocupam é que
o aluno está exposto a uma língua modelada, composta por uma série de “coisas-à-saber”
4
desvinculadas de uma memória, de uma história, de um contexto social, isto é, de tudo aquilo
que poderia trazer a ambiguidade, o duplo sentido, o equívoco – segundo Pêcheux, a “poesia”,
que não é estranha à língua de forma constitutiva (cf. ibid., p. 51).
Preocupados com esse gesto excessivo de instrumentalização da ngua que se
concentra de forma clara nos livros didáticos, é que abrimos um espaço na aula de ELE para a
leitura do texto literário, pois consideramos que nele o real da língua se apresenta de forma
potencializada. Talvez seja preciso dizer que podemos propiciar tal trabalho pelo fato de o
espanhol e o português serem línguas que, para o brasileiro, apresentam um efeito de
transparência que é possível explorar.
A partir da série de considerações que acabamos de desenvolver, organizaremos o
presente capítulo da seguinte forma: no item 1, faremos um histórico sobre os diferentes
métodos de ensino de línguas estrangeiras para pensar melhor a prática atual de
ensino/aprendizagem de ELE no Brasil e entender como nela funciona a leitura do texto
literário.
Feito isso, no item 2, argumentaremos sobre o processo de aprendizagem de uma
língua estrangeira e os aspectos que nele estão envolvidos da subjetividade do aprendiz,
principalmente a partir de considerações realizadas por Revuz (2002). Ainda nesse item
apresentaremos formulações de Celada (2002) e iremos tecendo certas considerações que nos
4
Cf. Pêcheux, 1990, p. 50 – 53.
15
levarão a concluir que o processo de aprendizagem de uma língua estrangeira carrega a
ambivalência de ser tanto prazeroso como doloroso.
Em seguida, passaremos ao item 3, retomando as considerações de Revuz (2002) e de
Celada (2002), apresentadas no item anterior, e discutiremos as especificidades que
apresentam os sujeitos brasileiros ao entrarem em contato com o real da língua espanhola
durante o processo de aprendizagem dessa língua. Ainda neste item comentaremos como
determinados pré-construídos existentes na discursividade dos brasileiros sobre a língua
espanhola constituem uma situação desfavorável para o processo de ensino/aprendizagem do
espanhol.
Por último, apresentaremos o cenário da língua espanhola no Brasil, e abordaremos
certos fatos que dizem respeito ao processo de instrumentalização que essa língua está
sofrendo ao serviço de satisfazer as urgências de um “sujeito pragmático” (cf. CELADA,
2002), que “corre atrás” de ser capaz de atingir as exigências do mercado.
Passaremos, agora, a realizar a primeira das tarefas elencadas.
1. Os Métodos de Ensino de Línguas Estrangeiras e o lugar da leitura
Para realizar o referido histórico dos métodos de ensino de língua estrangeira
recorreremos a Kondo, Fernández e Higueras (1997), e teceremos algumas considerações
centrando-nos no lugar que a leitura e os textos literários ocupam, em cada um desses
métodos, principalmente com base nas pesquisas realizadas por Pietraróia (1997). Também
tentaremos estabelecer algumas relações específicas com os livros didáticos de ELE, a partir
dos estudos de Sánchez (1992).
Essa bibliografia nos permiti descrever as premissas teóricas que norteiam os
métodos; os princípios metodológicos, as teorias da linguagem e da psicologia que a eles
subjazem; o lugar que o texto ocupa em cada um deles, bem como sua tipologia e finalidade;
e, por fim, as práticas de leitura exploradas a seu redor. Nesse sentido, nossa busca nos
mostrará determinados gestos cristalizados e, também, nos indicará possíveis novos percursos
na prática da leitura em práticas de ensino de língua estrangeira. Também faremos referência
aos livros didáticos publicados na Espanha enquadrados em cada método, o que semais um
dado para compreender as atuais práticas de ensino de ELE.
Antes de traçar esse histórico, é importante fazer uma consideração: embora possamos
descrever por meio de uma linearização e sequência cronológica grandes linhas
metodológicas, quando falamos de Ensino de Línguas Estrangeiras, devemos considerar que,
16
em muitas ocasiões, e na prática, essas linhas coexistem, e que esse fato depende de inúmeras
variáveis, como podem ser o meio escolar, a interação entre professor e aluno, entre outras
(cf. PIERATRÓIA, 1997, p 21). Entendemos que a prática de ensino de línguas estrangeiras é
determinada pelos métodos de ensino dessas línguas, métodos que, por sua vez, estão, como
todo discurso, marcados ideologicamente e submetidos à história. Esses métodos fazem parte
das condições de produção das aulas de línguas estrangeiras – a escolha de textos pelo
professor e de certa forma de ler, a prática de determinada tipologia de exercícios e têm
legitimado algumas práticas no ensino/aprendizagem dessas línguas.
Segundo Sánchez (1992), os métodos que tiveram maior repercussão no ensino de
ELE são: o Método Tradicional, o Método Direto, os Métodos Estruturais e, por último, o
Funcional e Comunicativo. Passaremos a centrar-nos no primeiro deles.
1.1 A onipresença do texto escrito: Método Tradicional
De acordo, com o histórico de Sánchez (1992), que acabamos de citar, durante o
século XV a língua mais estudada no mundo ocidental foi o latim, que era a ngua da
religião, da educação, do comércio, das relações internacionais e da política. Ao chegar ao
século XVI, e devido às mudanças políticas que a Europa experimentou, o inglês, o francês e
o italiano começaram a deslocar o latim e tomaram força como línguas de comunicação (cf.
KONDO; FERNÁNDEZ; HIGUERAS, 1997, p. 11). Dessa forma, ainda segundo essas
autoras (cf. ibid.), desde o século XVI até o século XIX, o latim, que tinha sido estudado e
empregado como língua viva, passou a ser uma língua “de prestígio” e perdeu o lugar de
língua de uso. O ensino do latim como língua estrangeira concentrou-se em estudar o latim
clássico de Virgílio, Cícero e Ovídio como disciplinas básicas das escolas Europeias (cf.
ibid.).
O ensino de línguas estrangeiras segundo as estudiosas (cf. ibid., p.11)– começou a
ser incorporado no currículo acadêmico no século XVII e baseou-se nas técnicas de
aprendizagem que até então se conheciam, ou seja, nas técnicas de aprendizagem do latim, em
que a gramática, em vez de um meio, era um fim em si mesmo. A meta era a perfeição na
construção sintática e as mesmas técnicas, que foram as tradicionais, se perpetuaram:
tradução, exercícios de gramática aplicando paradigmas, memorização de listas de
vocabulário não contextualizadas, etc. (cf. ibid.). As estudiosas acrescentam ainda que esse
método se desenvolveu plenamente no século XIX e é o que conhecemos por “método
tradicional” ou “de gramática tradução(cf. ibid.). Segundo Deyer, em tal método, o texto é
17
onipresente(1998, p. 5). Para a autora, trabalhavam-se textos exclusivamente literários
submetidos a questionários fechados que perseguiam a construção de uma bagagem cultural e
a instalação de práticas de análise literária e gramatical (cf. ibid.); e, segundo Jover-Faleiros, a
leitura que se fazia dos textos era do tipo linear, semasiológica (partia-se da palavra para o
sentido) e a explicação do texto e a tradução eram as atividades que fechavam a lição (cf.
2006, p. 71). Com isso, fica claro que a construção de sentidos do texto e o prazer pelo ato de
ler eram práticas suplantadas por uma necessidade outra, qual seja, a de transmitir o conteúdo
linear; isto significa que se tratava de uma prática de leitura alienada e sem sentido. Nota-se
claramente que o texto era utilizado apenas como pretexto. Nesse sentido, Pietraróia (1997),
com base nas ideias adotadas por H. Portine (1987)
5
, diz:
[...] o tipo de leitura proposto pela metodologia tradicional é dominado por uma
concepção lexicalista, em que o objetivo primeiro eram as palavras, a partir das
quais chegava-se às ideias, pensamentos e conceitos por eles transmitidos, bastando
conhecer sua tradução, seu equivalente semântico, para compreender seu sentido na
língua estrangeira ( p.27).
A partir da afirmação da autora, fica patente que o que se realizava era uma
“decodificação” do sistema linguístico do texto, sem permitir que o aprendiz discorresse pelo
texto na busca da construção do sentido, pois o objetivo da leitura era a tradução. existia
uma leitura aquela autorizada pelo professor e todas as que diferiam do modelo
considerado como “correto” não se aceitavam e eram punidas. Essa carência nos mostra que
nesse método o texto literário estava ao alcance do aluno, porém não era aproveitado na
amplitude de suas possibilidades, uma vez que o foco se restringia tão somente à concepção
lexicalista proposta na época.
Segundo Sánchez, tal abordagem teve ecos tão expressivos no processo formal de
ensino/aprendizagem de ELE em particular, que acabaram deixando uma tradição gramatical
sempre “em estado presente” ainda nas práticas atuais (cf. 1992, p. 365), embora a partir do
século XIX houvesse grande inquietude pela introdução da faceta “prática” (equivalente a
“falar espanhol”) (cf. ibid., p. 367). Mesmo assim o próprio Sánchez observa com relação a
este último aspecto que
[...] se trata de un deseo más que de una realidad. El aspecto práctico suele reducirse
a la introducción de temas de traducción directa e inversa, series de textos, diálogos
más o menos actualizados, listas de vocabularios con frecuencia agrupados por áreas
temáticas y, en ocasiones, algunos diálogos o lecturas de textos escogidos. La
5
PORTINE, H. Lecture et activité textualisante, Le Français dans le Monde, número especial: Vers um niveau
3. Paris, Háchette, p. 42-9, 1987.
18
organización de estos libros sigue girando, no obstante, en torno a lo gramatical. (cf.
ibid.).
Como podemos observar, a gramática exerce uma prevalência no ensino do idioma
no caso, do espanhol –, ofuscando as possibilidades de leitura, interpretação e pluralidades
potenciais que o texto oferece por sua natureza constitutiva.
1.2 A ausência do texto escrito: Método Direto
Na segunda metade do século XIX, de acordo com Sánchez (1992), surge a
necessidade de aprender rapidamente uma língua estrangeira para “sobreviver” lembremos
dos grandes movimentos migratórios dessa época. Esse fato, junto aos avanços da linguística,
foi decisivo para a concretização dos Métodos Naturais e do Método Direto. Esse último foi
largamente difundido sob o nome de método “Berlitz”.
No final do século XIX, segundo Kondo, Fernández e Higueras (1997), a linguística
experimentou um forte impulso, especialmente a fonética: desenha-se o Alfabeto Fonético
Internacional. De acordo com essas autoras (ibid., p. 21), foi nessa época que se começou a
falar da prioridade da ngua falada e da necessidade de desenvolver uma prática oral nas
aulas. Essas ideias ganharam força graças à larga difusão através de seminários, artigos,
livros, bem como de toda classe de publicações que contaram com o apoio dos seus
defensores, entre eles Henry Sweet (Inglaterra), Wilhelm Viëtor (Alemanha), Paul Passy
(França), sendo que – como indicam as próprias estudiosas (cf. ibid.) – esses foram os
protagonistas do Movimento Reformista, um dos maiores da história da metodologia das
línguas estrangeiras.
Como consequência dessas reformas e inovações, e da pressão exercida pela situação
histórico-social da necessidade de aprender as
ínguas estrangeiras observam Kondo,
Fernández e Higueras (cf. ibid., p. 22)– , surgem os Métodos Naturais no ensino dessas
línguas e o Método Direto. É nesse sentido que elas afirmam que este se opunha radicalmente
ao método tradicional; a nova metodologia, como o próprio nome indica, tem como base o
“princípio direto”, com os seguintes posicionamentos: o ensino do vocabulário sem
intermediação da língua materna, o ensino da língua oral sem a passagem pela língua escrita e
o ensino da gramática sem explicações de regras explícitas (cf. ibid.). Portanto, indícios de
que a leitura, em consonância com as bases teóricas do método, também devia se dar de forma
direta, ou seja, sem ajuda da ngua materna. A compreensão da leitura devia ser quase
19
imediata, quase instantânea, e com isso se produzia uma leitura muito superficial. Pietraróia,
em relação aos tipos de texto utilizados no método direto, afirma:
Talvez pela dificuldade prática que esse tipo de leitura impunha aos escritos
complexos, os textos autênticos eram pouco presentes no ensino direto. Além dessa
metodologia ter se colocado contra a utilização maciça de textos literários,
procurando oferecer ao aluno uma ngua cotidiana, que pudesse ser utilizada em
seu dia-a-dia, ela passou também a utilizar textos fabricados e artificiais [...] (ibid.,
p. 31)
O método direto teoricamente não deixava espaço para a leitura de textos em
detrimento da grande ênfase dada à oralidade e, embora com o tempo e frente às
dificuldades que ele próprio apresentava – na prática do ensino de línguas estrangeiras fossem
acrescentados alguns textos, esses eram “fabricados” com o objetivo de reproduzir a língua do
universo da oralidade. Assim, para Jover-Faleiros, a leitura ficava atrelada à fala: ela era um
treino para o sistema fonológico da língua estrangeira e ler bem significava ter boa pronúncia
(cf. 2006, p.71 ). Nesse contexto, a leitura era um desdobramento da fala, um treino da
pronúncia (cf. ibid.).
Segundo Sánchez, o método direto era quase referência obrigatória em todos os
manuais de ELE no início do século XX (cf. 1992, p.375), mas em muitos casos não era
seguido devido a não propiciar uma aprendizagem sistêmica e estruturada pois, ao contrário,
era bem mais disperso. Não obstante, entre os dois extremos, o do método tradicional e o da
metodologia direta, os manuais de ELE adotam um “meio termo”, não chegam a ser obras
totalmente gramaticais, mas também não chegam a ser expoentes claros do método direto (cf.
ibid.). Nesse sentido, Sánchez comenta:
En un inicio resulta fácil y hasta entretenido referirse a objetos directamente (Esto es
una llave. ¿Qué es esto…? etc.). Sobrepasado este umbral elemental, el profesor se
encuentra con las manos vacías, sin saber qué hacer […] con materiales que no le
sugieren “correr”, o “abrir la puerta”…[…] El profesor que se encuentra en tal
situación vuelve al único parámetro cuantificable que le es familiar: la gramática.
(ibid., p.378)
Por fim, de nossa perspectiva, é preciso dar destaque para o fato de que nesse método
o texto passou a estar (PIETRARÓIA, 1997), que a prioridade era a prática da pronúncia
como objetivo final do processo de ensino /aprendizagem.
20
1.3 A presença discreta do texto escrito: Métodos Estruturais
De acordo com Kondo, Fernández e Higueras, a partir dos anos trinta e por causa das
contribuições da Linguística, o ensino de línguas estrangeiras e de língua espanhola entra em
uma nova fase, na qual os planejamentos linguísticos de base estrutural se aplicam à descrição
das línguas naturais, dando lugar a várias correntes metodológicas com elementos comuns:
método áudio-oral, método estruturo-global-áudio-visual e método situacional (cf., 1997 p.
35). Foi nos EUA onde encontramos os antecedentes mais próximos do que seria o Método
Audiolingual (cf. ibid.). Por causa da participação dos EUA na segunda guerra mundial, o
governo norte-americano começou a percebeu a importância de dispor de pessoas com
capacidade para entender e falar fluidamente o alemão, o francês e o italiano, para que
pudessem dedicar-se à tradução, interpretação e, certamente, à espionagem (cf., ibid., p. 35-
36). Dessa maneira, o governo norte-americano encarregou às universidades a criação de um
programa de ensino de línguas estrangeiras para o exército. Os alunos tinham de assistir à aula
dez horas por dia e seis dias por semana e, na maior parte do tempo, dedicavam-se a fazer
exercícios estruturais de repetição. (cf. ibid., p 36). Segundo as autoras, o resultado foi bom,
não pelo método em si, mas pela quantidade de tempo investido e, a partir daí, houve uma
tendência a favorecer a prática das estruturas mediante exercícios orais de repetição contínua
(cf. ibid.). Muito rapidamente essa nova tendência metodológica se propagou a outras escolas
e universidades norte-americanas, com o nome de Método Oral, Auro-Oral ou Estrutural (cf.
ibid.).
Os avanços tecnológicos, ainda segundo Kondo, Fernández e Higueras, favoreceram
muito o desenvolvimento dos métodos áudio-orais (cf. ibid.). Entre esses avanços, podemos
encontrar os cursos radiados, o uso do fonógrafo, a aparição do “long-play”, e mais tarde, em
meados dos anos 50, se produz o início do auge dos laboratórios de idiomas com a aparição
do radiocassette (cf. ibid., p. 36-37). Com a guerra fria, o Audiolingualismo ou Método
Áudio-oral se consolidou, principalmente em 1957, quando foi lançado o primeiro satélite
soviético e o governo dos EUA percebeu a importância do ensino de línguas estrangeiras, com
o medo de que poderiam ficar atrás na carreira espacial, pelo fato de haverem se isolado dos
avanços científicos feitos pelos outros países (cf. ibid.). Os métodos anteriores, tradicional e
direto, observa Sánchez (1992), não davam conta da necessidade imperiosa daquele momento:
Para ello no servía el método gramatical, ya que la memorización o aprendizaje de
reglas y frases bien construidas no facilitaba la adquisición rápida que exigían los
responsables de la milicia; ni tampoco se ofrecía con la gramática la posibilidad de
21
comunicarse en la lengua del extranjero […] El método directo tampoco era el más
adecuado, pues la escasa elaboración de los materiales con que se trabajaba
facilitaba la dispersión del aprendizaje (p. 385 – 386).
Nesse momento, recorreu-se aos programas desenvolvidos pelos serviços de
inteligência, por um lado, e, por outro, ao enfoque áudio-oral ou estrutural desenvolvido por
Fries sendo Bloomfield primeiro, e depois Fries os que originaram o movimento renovador
(cf. KONDO; FERNÁNDEZ; HIGUERAS, 1997, p, 37 ). A eles se somaram os fundamentos
psicológicos do behaviorismo, que imperava naquele momento. Com isso tudo, chegou-se à
constituição da fórmula do Método Audiolingual, cujo método está arraigado em duas
correntes paralelas de pensamento: a psicologia behaviorista e a linguística estruturalista. (cf.
ibid.). Segundo Kondo, Fernández e Higueras (cf. 1997, p. 39), os princípios teóricos que
caracterizam esse método recolhem com exatidão as ideias básicas do behaviorismo e do
estruturalismo:
a) seguindo as bases estruturalistas, a língua é vista como um sistema de elementos
relacionados estruturalmente. Os elementos, fonemas, morfemas, palavras, frases, orações,
se produzem de forma linear e estão organizados em níveis (o nível fonético, o
morfológico, etc.) que se constroem uns sobre outros, sendo o nível dos fonemas o básico,
depois o dos morfemas e assim sucessivamente até chegar às orações. Portanto, aprender
uma língua consiste em conhecer os elementos que constituem os níveis e aprender as
regras pelas quais esses elementos se combinam;
b) todas as nguas estão organizadas nesses veis, no entanto, todas as nguas são
diferentes;
c) para o audiolingualismo, a língua é fundamentalmente um fenômeno oral. A escritura é
uma manifestação secundária da fala;
d) uma identidade entre como se aprende a LM e como se aprende a língua estrangeira e,
por essa razão, o processo de ensino aprendizagem desta última deve se iniciar pelas
destrezas orais, que todas as línguas nativas aprendem-se primeiro oralmente, antes de
passar à leitura e à escritura;
e) a língua é um conjunto de hábitos, por isso o objetivo do ensino de uma língua estrangeira
é desenvolver no aluno as mesmas habilidades que tem o falante nativo. Considera-se
imprescindível a formação de hábitos automáticos que, com o tempo, levem o aluno a
dominar a língua estrangeira no nível inconsciente.
Assim, percebemos que nesses métodos a atividade de leitura continuou atrelada à
expressão oral. Jover-Faleiros (2006) observa que a leitura aparecia quando, teoricamente,
22
o aluno tinha domínio do sistema fonológico e, assim, “praticava a pronúncia” (cf. p. 72).
Consequentemente vemos que a leitura permanecia como uma prática do oral, que também
não deixou lugar para a construção de sentidos, tal como no método direto. Segundo
Gaonac´h
6
(1987, apud PIETRARÓIA, 1997, p. 43), os signos de uma ngua aprendidos em
situações muito estruturadas não permitem a utilização eficaz em situações não estruturadas;
essa observação nos leva a pensar que na proposta audiolingual não haveria possibilidade de
transferir esses saberes ao campo la leitura de textos literários.
Os textos utilizados pelos métodos estruturais, observamos, eram produtos de
laboratório, tinham por finalidade aplicar as estruturas e ficavam relegados a último plano.
Nas palavras de Denyer (1998), encontravam-se:
Arrojados al final de la lección de los métodos estructuro-globales, algunos raros
textos literarios precedidos de una vaga consigna incitativa actúan como
figurantes, añadiéndose a los diálogos prefabricados y sin que quede demasiado
claro lo que hay que hacer con ellos (ibid., p.5).
O fato de os conteúdos se apresentarem gradativamente, segundo a dificuldade
linguística – afirma a autora fazia com que as atividades de compreensão e expressão
escrita, consideradas de maior complexidade, só aparecessem no final da lição.
O manual Español en Directo
7
, segundo Sánchez (1992), foi o primeiro publicado na
Espanha para o ensino do ELE, e enquadrado dentro de uma metodologia estrutural inscrita na
variante “situacional” (cf. p. 394 -395); todavia, nesse manual também componentes do
método direto e do método gramatical. Sob a mesma metodologia, observamos que também
foi publicado, e bastante utilizado no Brasil, o manual Español 2000
8
, estruturado em três
níveis: “Elemental”, “Medio” e “Superior”, apresentando textos literários somente no último
nível, sendo que nos dois primeiros níveis são utilizados no início de cada lição diálogos e
textos sobre aspectos culturais do mundo hispânico, configurando a base para o ensino do
vocabulário e dos diferentes aspectos gramaticais.
Como conclusão sobre o estudo do método estrutural no processo de
ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras, é possível reconhecer que o trabalho com o
texto ainda é pouco utilizado, de forma que outras estratégias são empregadas na prática desse
processo. A memorização e a repetição das estruturas linguísticas e o trabalho com a
6
GAONAC´H. Theóries dáprentissage et acquisition dúne langue étrangère. Paris, Hatier – Crédif, 1987.
7
Sánchez, A., Español en Directo (Método estructural / situacional en cinco niveles: 1A, 1B, 2A, 2B y 3),
SGEL, 1974 (colaboradores: Ríos, Domínguez y Matilla / Cabré y Matilla). Cassettes y diapositivas.
8
García Fernández, N. y J. Sánchez Lobato, Español 2000, SGEL, 1981. Tres niveles: Elemental, Medio y
Superior. Cassettes.
23
pronúncia são preponderantes em tal método e, por isso, o texto pode assumir uma função
secundária.
1. 4 A presença de textos sem identidade própria: Enfoque Comunicativo
Kondo, Fernandez e Higueras (1997) comentam que, contra o behaviorismo, surgiram
os enfoques cognitivos na psicolinguística, enfoques que colocavam em relevo a importância
dos fatores cognitivos na aprendizagem (cf. p.69). As diferentes teorias cognitivistas
abandonavam a idéia da imitação como processo básico do desenvolvimento da linguagem.
Existem diferentes posições dentro dos enfoques cognitivos, embora todos eles tenham um
em comum: a oposição behaviorista no processo de aquisição da linguagem.
Um modelo cognitivo é o inatismo, indicam Kondo, Fernández e Higueras (1997), o
qual sustenta a existência de uma capacidade genética inata no ser humano para desenvolver a
linguagem (cf., ibid.). Outro modelo cognitivo, observam as autoras, é o construtivismo de
Piaget (1896 –1980), que afirma que as estruturas linguísticas surgem somente no momento
no qual a criança dispõe de fundamentos cognitivos estabelecidos, e não antes (cf., ibid.).
Portanto, poder-se-ia falar de estágios de maturidade que permitem ou não a aquisição de
determinadas estruturas, dependendo do seu desenvolvimento cognitivo geral. Esses dois
modelos, como já mencionamos, rejeitam a idéia de que a aprendizagem da língua consista na
imitação e formação de hábitos e ressaltam a importância que os processos mentais têm na
aquisição da língua.
Paralelamente, nos anos 60, aparece em cena a chamada gramática generativo-
transformacional, a partir de uma mudança radical que experimentou a linguística com a
publicação de Aspectos da teoria da sintaxe de Noam Chomsky.
O gerativismo - diferentemente do estruturalismo - fixa seu objetivo na análise do
conhecimento linguístico, com o fim de encontrar uma explicação aos fenômenos linguísticos;
defende que uma psicologia baseada no estímulo-resposta não conta das produções novas,
ou seja, da criatividade da linguagem humana, por isso, a gramática generativa sustenta que
na mente humana existem princípios gerais de estruturação da linguagem que se colocam, de
forma automática, em funcionamento no momento em que a criança é exposta à língua (cf.
ibid., p. 70). Essa série de princípios constituem o DAL (dispositivo de aquisição da
linguagem), que concebe a língua como regida por regras internas de caráter finito, que
produzem um número infinito de frases (cf. ibid.).
24
Como é de se supor, essa nova concepção de língua produziu uma mudança radical no
conceito do processo de ensino aprendizagem e deu origem à aparição de uma série de
métodos para o ensino de língua estrangeira, entre eles os métodos funcionais e
comunicativos.
Jover-Faleiros (2006) observa que nos métodos funcionais muda-se o foco, o olhar vai
em direção das estruturas de conhecimento do mundo do sujeito, sendo que o tratamento da
informação pelo aluno não é negligenciado, assim o sentido volta a ocupar um lugar de
destaque e, com ele, a leitura volta a ser contemplada como atividade de compressão e não
mais como um reforço da fonética (cf. p. 72).
Os textos utilizados nessa metodologia, observa Pietraróia (1997), eram autênticos,
como formulários, bilhetes, artigos de revistas populares etc.; que, embora no início
servissem, como nos métodos anteriores, de suporte à expressão oral, ou de base para o ensino
da cultura, aos poucos são abordados em relação às próprias características de ordem da
escrita (cf. , p. 78). Graças às noções de autenticidade e de situação de comunicação, diz a
autora, tanto a escrita como a leitura aparecem de forma mais consistente na metodologia
nocional-funcional. A escrita passa a ser vista como um conjunto autônomo de práticas
específicas, e não mais como um simples código de reprodução oral (cf. ibid., p.77).
O enfoque
9
comunicativo surgiu no início dos anos 70, segundo Sanchez (1992),
dando continuidade à linha de trabalho iniciada com os programas nócio-funcionais. Segundo
Littlewood
10
(1981 apud RICHARDS; RODGERS, 1998, p. 69), uma das características mais
marcantes do enfoque comunicativo de idiomas é que determinava como foco central os
aspectos funcionais da língua. Nesse enfoque, para desenvolver o ensino de línguas
estrangeiras se considerava que havia de existir um equilíbrio entre as quatro destrezas
(produção e compreensão oral e escrita), ficando em segundo plano os paradigmas
gramaticais.
As práticas da leitura e da escrita podiam ser iniciadas desde o primeiro dia de aula,
esse era e é um dos distintivos fundamentais desse enfoque, segundo Finochiaro e Brumfit
11
(1983 apud RICHARDS; RODGERS, 1998, p. 70). A tipologia de textos que podiam ser
9
Segundo Kondo, Fernández e Higueras (1997, p. 145), o termo “enfoque” refere-se a teorias sobre a natureza
da língua e sobre a aprendizagem da língua que constituem a fonte dos princípios e das práticas de ensino;
relaciona-se, portanto, com os aspectos linguísticos e psicolinguísticos que configuram as distintas teorias. De
uma perspectiva mais ampla, poder-se-ia interpretar como um modo particular de entender o ensino e a
aprendizagem (cf. ibid).
10
LITTLEWOOD, W. La enseñanza comunicativa de idiomas: introducción al enfoque comunicativo.
Madrid: CambridgeUniversity press, 1981.
11
FINOCHIARO, M., BRUMFIT, C. The funtional-Notional Aproach: from theory to practice. Nova York:
CambridgeUniversity press, 1983.
25
utilizados nesse enfoque era muito variada, mas os textos serviam para a produção de
discussões orais (cf. DENYER, 1998, p. 6), portanto, apaga-se, mais uma vez, o exercício da
leitura como possibilidade para ter acesso a um aprendizado mais pleno do idioma.
12
Em resumo, e de nossa perspectiva, que é a de designar a presença do texto nos
diferentes métodos de ensino/aprendizagem de língua estrangeira, podemos dizer que este se
deslocou de um lugar central para uma periferia que, na maioria dos casos, resulta em uma
real ausência. Num outro sentido, é preciso reconhecer que as diversas abordagens
apresentadas, mesmo sendo diferentes, têm deixado marcas no processo formal de
ensino/aprendizagem da Língua espanhola no Brasil. Porém, também é preciso reconhecer
que nenhuma delas contempla o confronto provocado pela relação que supõe o aprendizado
de uma língua estrangeira a respeito de um sujeito, pois tendem a apresentar a língua
estrangeira como um todo estabilizado ao qual se teria acesso de forma gradativa, de acordo
com uma dificuldade que se define a partir de aspectos linguísticos fundamentalmente,
gramaticais com a finalidade de atingir as funções comunicativas. Além disso, a leitura é
usada como pretexto para outros fins (adquirir vocabulário, aprender gramática, poder realizar
uma prática de pronúncia e/ou ter acesso a temas que funcionem como base da conversação).
Isso tem legitimado certos gestos (a crença de que o sentido das palavras estaria pré-
determinado) na prática formal do ensino/aprendizagem de ELE no Brasil, com o agravante
de que isso retoma e intensifica uma prática de leitura escolar, como veremos no capítulo 2
desta dissertação, que abafa a diferença, demarcando uma suposta verdade, postulando a
homogeneidade e, consequentemente, como diria Coracini, comprimindo as margens, não
possibilitando a prática da leitura nas aulas de língua estrangeira como “processo de
identificação do sujeito para a criação de novas significações” (cf. 1995, p. 110).
2. A aprendizagem de línguas estrangeiras: “dor” e “prazer”
A aprendizagem de uma língua estrangeira como observado por Rossignoli (2002)
envolve várias questões, não somente de ordem cognitiva. Nesse processo trata-se de aceitar
tudo o que a língua estrangeira carrega de estranho e de diferente, e não somente de “adquirir”
o conhecimento linguístico desta e “saber usá-lo” (cf., ibid., p. 110).
12
No que tange ao surgimento de livros didáticos sob esse enfoque na Espanha foram varios os que se
publicaram e chegaram ao Brasl. Dentre eles, designamos especialmente Planet@, pois este foi o livro adotado
nos programas de Cursos Extracurriculares da Universidade São Judas Tadeu, onde foram recolhidas as
produções escritas que analisaremos nesta dissertação de mestrado, tal como já antecipamos na Introdução.
26
Revuz (2002), em seu texto “A língua estrangeira entre o desejo de um outro lugar e o
risco do exílio”, parte da constatação do alto nível de fracasso na aprendizagem de línguas
estrangeiras, que explica e tenta justificar pelo desinteresse da didática dessas línguas na
análise do confronto que supõe para o aprendiz o encontro com uma língua estrangeira.
Segundo a autora, o processo de aprendizagem de uma língua estrangeira aparece
efetivamente como uma experiência nova, mas a novidade está na modalidade desse encontro
com a nova língua, que faz vir à consciência um laço muito específico que mantemos com a
materna (cf. ibid., p. 215). Nesse sentido, a autora diz que “[T]oda tentativa de aprender uma
outra língua vem perturbar, questionar, modificar aquilo que está inscrito em nós com as
palavras dessa primeira língua” (ibid., p. 217). Poderíamos dizer que Rossignoli corrobora
essa ideia quando afirma:
Possíveis resistências à língua estrangeira advêm do fato dela exigir, em maior ou
menor grau, a relativização das representações com as quais o aprendiz se identifica
desde sempre. Tais resistências podem vir a configurar estratégias de não-
aprendizagem, que buscam preservar aquilo que se construiu por intermédio da
língua materna (2002, p. 110) (grifo nosso).
Nesse sentido, retomando Revuz, a “nominação” em língua materna aponta um
referente provido de carga afetiva, e essa afetividade é marcada pelo “porta-voz”, que, na
maioria das vezes, são os pais da criança. a nominação em outra língua que não seja a
materna acrescenta essa mesma estudiosa está desprovida dessa carga afetiva (cf. ibid., p.
223) e, “consequentemente, a operação de nominação em língua estrangeira vai provocar um
deslocamento das marcas anteriores” (ibid.).
Estamos de acordo com a autora e, em nosso entender, o deslocamento que o aprendiz
sofre ao nomear as coisas numa língua estrangeira e, de forma mais ampla, ao aprender essa
língua ou ter que se relacionar com o mundo mediante esse novo simbólico, constitui um
processo que poderia ser entendido como “doloroso”. Celada (2004), a partir da perspectiva
da Análise do Discurso (AD), observa que nos processos de ensino, o funcionamento da
língua estrangeira que é alvo de aprendizagem solicitará a subjetividade do aprendiz e fará
com que este, dependendo de sua capacidade de se submeter à alteridade, circule por
diferentes posições, uma vez que com base em reflexões de cheux (1990)– acredita que,
nesse processo, a língua estrangeira será tomada em redes de memória, resultando em
filiações identificadoras (cf. ibid., p. 38)
13
. Ainda segundo a autora, esses movimentos que
13
A autora faz referência a Serrani – Infante (1998) quando fala de “redes de memória” e “filiações
identificadoras”. In: SIGNORINI, I (org.) Elementos para uma discussão no campo aplicado. Campinas:
FAPESP, FAEP/Unicamp, Mercado das Letras. 1998, p. 253 e 257
27
têm lugar nesse processo de ensino/aprendizagem se dão sob o regime de uma contradição,
que constitui a relação do sujeito com a língua estrangeira: o funcionamento desta exigirá do
aprendiz que se submeta à memória de seu dizer (ao dizível) para se tornar sujeito dela (cf.
ibid., p. 39). Em síntese, o aprendiz tem que se subordinar à língua do Outro e isto produzirá
um efeito que, segundo Celada, corresponde àquilo que se designa ao reconhecer que ele “tem
domínio” dessa língua (ibid., p. 37). Nesse sentido, num outro texto, a autora conclui que: O
processo de aprender uma língua estrangeira deve ser entendido como de assujeitamento,
pois se trata da submissão de um sujeito às formas de dizer e à memória de sentidos que ela
produz” (grifos da autora) (id., 2009, p. 149).
Esse processo de submissão de assujeitamento que uma língua solicita de um
sujeito acontece, então, num palco de tensões, no qual este tenta fechar a ferida causada pelo
descentramento que sofre frente ao funcionamento da língua estrangeira (cf. ibid.). Ainda
segundo Celada: “Esse processo implica que essa outra língua e os saberes que ela pode supor
entrarão em relações (de captura ou identificação, de resistência, de confronto) com a malha
de uma subjetividade inscrita em determinadas filiações de sentido” (ibid.). Como indício
dessa resistência sofrida pelo sujeito, podemos mencionar o “sotaque" do estrangeiro:
O processo de aprendizagem dessa língua envolveria um deslocamento com relação à forma na
qual a garganta prepara a modulação; com relação aos pontos e modos em que a ngua, os
dentes, a boca entram em contato e em funcionamento para articular sentido. (ibid., p. 40).
Celada, tomando como base reflexões de Deleuze e Guattari (1977)
14
, explica que esse
processo supõe uma ressignificação do real do corpo e o sotaque seria resultado da resistência
que este oferece à articulação da língua estrangeira, uma vez que ele foi moldado na língua
materna (cf. ibid.).
É preciso, no entanto, apontar que esse processo de aprendizagem de uma ngua
estrangeira, para alguns sujeitos, é prazeroso. Segundo Coracini (1998 apud CELADA, 2002,
p.29), para esses, embora sejam poucos, o processo de aprender e falar uma língua estrangeira
representa ir à procura de um “desejo de plenitude”. Segundo Celada (cf. ibid.), as
observações que Coracini faz no campo da Linguística. Aplicada a partir de uma perspectiva
psicanalítica, confirmam esse desejo de plenitude que certos sujeitos têm na hora de aprender
e falar línguas estrangeiras e que é possível ver refletido na figura do poliglota. Para Coracini
(1998 apud CELADA, ibid.), “aprender línguas desempenha uma forte atração”, e isso pode
14
DELEUZE, G. et GUATTARI, F. “O que é uma literatura menor?” In: Kafka: por uma literatura menor.
(Trad.. por Julio Castañon Guimarães). Rio de Janeiro:Imago, 1977.
28
ser explicado como “o desejo do outro, desse outro que nos constitui e cujo acesso nos é
interditado, esse outro que viria completar o um”.
A partir da série de formulações que acabamos de expor, é importante destacarmos
que o processo de aprendizagem de uma língua estrangeira carrega a ambivalência de ser
tanto prazeroso como doloroso e, inclusive, pode carregar esses dois pólos numa relação
contraditória. Passaremos, a seguir, a realizar uma especificação de como isso se no caso
do aprendizado de espanhol por brasileiros.
3. O aprendiz brasileiro e a língua espanhola
Retomando as considerações de Revuz e Celada, observamos que a dor descrita pelas
autoras com relação ao processo de aprendizagem de uma língua estrangeira, no caso do
ensino do espanhol alcança especificidades devido à condição histórica do brasileiro com
relação a sua língua materna e devido ao modo como o espanhol o afeta nesse sentido.
Na relação específica do brasileiro com a língua espanhola, Celada (2002) detecta
traços constitutivos da subjetividade do brasileiro quando ele é exposto ao funcionamento
material dessa língua em processos de aprendizagem formal; essa subjetividade, explica, está
fortemente determinada pelo processo de colonização e de formação da nação brasileira, que
acabou por resultar numa não-continuidade entre a escrita e a oralidade do português do
Brasil (cf. ibid., p. 264). A própria autora observa que, a partir dos anos 90 e devido a uma
série de fatos dentre eles, o Tratado do Mercosul o espanhol começa a passar por um
processo que o vincula a uma imagem de língua como veicular, lugar que até esse momento
não tinha ocupado no imaginário do brasileiro (ibid., p. 45). Assim, para o brasileiro, que
projetara imaginariamente o espanhol como uma “língua fácil” e sobre a qual teria
competência espontânea, a experiência do processo de aprendizagem faz que esse pré-
construído comece a sofrer uma comoção, e o aprendiz passe a ver a ngua espanhola como
“difícil”, “correta”, “rebuscada” (cf. ibid.). A pesquisadora interpreta que, quando expressa
este imaginário, o aprendiz brasileiro está se sentindo afetado pela língua espanhola de uma
forma singular: para ele, esta ressoa como a língua “modelar” com a qual teve uma
experiência traumática na escola.
15
Consequentemente, a autora considera que o processo de
aprendizado de espanhol implica uma violência simbólica para o brasileiro, pois a relação
15
De acordo com o percurso histórico que Celada (2002) formula em seu trabalho, a escrita na escola é “exibida”
como uma língua modelar e não é trabalhada com a finalidade de que o sujeito se aproprie dela. É desse modo
que o brasileiro, afirma a autora tomando como base reflexões de Orlandi (2002a), fica excluído da escrita.
29
com esse simbólico, “singularmente estrangeiro” (cf. ibid.), toca e reaviva a ferida que ele
carrega por efeito da experiência escolar vivida com a referida língua “modelar”.
Poderíamos observar que a pouca experiência no ensino do espanhol para brasileiros
(lembremos que essa língua vem sendo estudada de forma maciça a partir dos anos 90) e a
reflexão, de curta trajetória, no que refere ao funcionamento da língua espanhola no campo
dos estudos dessa língua no Brasil e, também, no que se refere à relação sujeito/objeto de
aprendizagem (cf. González, 2002) são fatores que permitem pensar que nas práticas de
ensino podemos terminar alimentando a referida violência simbólica.
16
Nesse sentido, acreditamos que o fato de privilegiar o enfoque que considera a
gradação gramatical por mais de que esta apareça vinculada às funções comunicativas e,
inclusive, as abordagens contrastivas – que muitas vezes se reduzem ao contraste gramatical –
podem reforçar essa violência (isso que nós chamamos aqui de dor); ou seja, insistimos em
apontar que haveria um processo de gramatização da língua espanhola como estrangeira
(cf. AUROUX, 2001) que também estaria incidindo nos processos de aprendizado, nos quais,
de nossa perspectiva, o brasileiro trabalha sua forma de “assujeitar-se” a essa língua para se
tornar sujeito dela.
No caso da língua espanhola, segundo o estudo feito por Sousa (2007) a partir de
imagens detectadas nas glosas que a pesquisadora recolheu mediante questionários que
indagavam o imaginário desses estudantes em relação à língua-objeto de aprendizado a
primeira imagem atribuída a esse simbólico foi a de língua veicular, ocupando a segunda
posição entre as línguas dos negócios no mundo atual. Todavia, Sousa observa, no plano
imaginário do sujeito, um deslocamento na relação aprendiz/língua espanhola, e isso é dado
pelo fato de que ele passa a privilegiar a imagem dessa língua como uma “língua de cultura”,
pois esta lhe permitiria “ter acesso” às culturas dos povos hispânicos em toda a sua
heterogeneidade. Podemos inferir, a partir dessa afirmação, que o brasileiro se identifica, ao
menos imaginariamente, com a heterogeneidade que essa língua lhe promete e com a
possibilidade de que esta lhe dê acesso a diversas culturas, provavelmente devido à riqueza da
própria variedade da língua brasileira (o português falado). Vale aqui fazer uma observação
sobre como entenderemos neste trabalho o conceito de “heterogeneidade”. Segundo Serrani-
Infante (1997), “ao se estudarem os fatores que incidem na produção em LE/L2, dois níveis
de análise do heterogêneo podem ser considerados” (apud Celada, 2002, p. 128). O primeiro
16
González (2005) observa que os estudos do espanhol no Brasil durante muito tempo se mantiveram
congelados num modelo de contraste ingênuo, realizado “termo a termo”. Essa visão gramatical só reforçaria, de
nossa perspectiva, a relação entre espanhol e português, como “língua modelar”, nunca atingida na escola
brasileira.
30
deles é “o da diversidade, no qual se estudam as realizações discursivas de línguas (ou
variedades) distintas em contextos diversos” (ibid.), e o segundo é o que a pesquisadora
denomina de alteridade discursiva: “considerando que há, além dessa diversidade, uma
dimensão constitutiva da alteridade social e do inconsciente” (ibid.). Parece-nos importante
resgatar essas reflexões para frisar a importância de pensar a necessária aliança e
interdependência entre diversidade e alteridade, para poder ir forjando uma forma de pensar
que nos permita trabalhar de um modo que ofereça resistência à ilusão de transparência que o
brasileiro projeta com relação ao espanhol.
A ilusão segundo a qual a proximidade do espanhol com o português permitiria ao
sujeito brasileiro ter uma competência espontânea sobre essa língua constitui uma situação
desfavorável no processo de aprendizagem formal dessa língua. Fanjul (2008), no artigo
“Ecos de mercado en docentes-alumnos de ELE en Brasil, Repeticiones y Ausencias”,
constata o funcionamento dessa “ilusão de competência espontânea”, a partir da análise de
uma amostra de respostas a questões colocadas a aspirantes ao ingresso a um curso de
especialização para professores de espanhol, oferecido por uma importante universidade de
São Paulo, como parte do processo de seleção. Na análise que o estudioso faz ao analisar as
respostas dadas a uma das questões formuladas aos candidatos para que expusessem suas
experiências pessoais como professores de língua espanhola bem como suas experiências
como aprendizes dessa língua (cf. ibid.), depara-se com a ideia de “facilidade” que esses
aspirantes detêm sobre o processo de aprendizagem do espanhol. Essa “facilidade”, observa
Fanjul (cf. ibid.), quando aparece expressa na amostra, associa-se a conceitos como
“naturalidade e “espontaneidade”. O estudioso (cf. ibid.) atribui este fato à ideia de uma
interpretação vulgarizada, produzida pelo mercantilismo do ensino de línguas estrangeiras,
que tem incrementado a crença de espontaneidade e a expectativa de uma aprendizagem sem
investimento cognitivo, nem subjetivo (cf. ibid.). Apresentamos, a seguir, o enunciado
produzido por um dos candidatos:
Caso 1: Mientras trabajo con alumnos que buscan mejoria para su familia con el
estudió,las clases son de mas de treinta (rede pública) y ellos aprenden la lengua
española con muy facilidad […] la profesion de maestro eres siempre una
constante estudió de cosas nuevas todos los días, ahora tienes que salir del
tradicional de sus clases e ibas para metodos avanzados. (grifos nossos).
No corpus desse enunciado aparece a ideia de “muy facilidad no processo de
aprendizagem e, também, se percebe que o sujeito está tomado pela ilusão de competência
espontânea no que tange a conhecer a língua española, por se perceber uma defasagem nas
31
habilidades próprias que registra e que fazem referência às marcas formais da enunciação: as
de espaço, tempo e pessoa, etc. Vale ressaltar que esses textos analisados foram produzidos no
âmbito do ensino de línguas estrangeiras, e os candidatos à prova de acesso ao curso de
especialização já ministravam aulas de espanhol ou pretendiam fazê-lo.
Tomando como exemplo tal enunciado, e sem pretender fazer uma análise minuciosa,
que não é esse o objetivo da pesquisa, é possível apontar deslizes como (“la profesion de
maestro eres” , “ahora tienes que salir del tradicional de sus clases e ibas para”), entre outros.
Tais ocorrências bem como efeito de indeterminação semântica que produz esse enunciado
nos permitem afirmar que a posição simbólica de “ilusão de competência espontânea”
(CELADA, 2002) que caracterizou a relação do brasileiro com a língua espanhola ainda
continua sendo uma posição possível, sobretudo em práticas de ensino que não lhe oferecem a
suficiente resistência, por considerar que a diferença entre a língua espanhola e o português é
facilmente “contornável” (cf. ibid., p. 37).
Antes de formular nossa hipótese, que nos permitirá passar ao capítulo 3, vamos ainda
apresentar alguns outros aspectos que nos permitam conhecer melhor as condições de
produção das práticas de ensino-aprendizagem de espanhol que analisamos.
4. Alguns aspectos do espanhol na atual conjuntura no Brasil
A língua espanhola no Brasil, no início do século XXI, vem crescendo e ganhando
prestígio (cf. FERNÁNDEZ, 2005, p. 18). Segundo o autor, esse crescimento da língua
espanhola se deve a três fatos de notável importância econômica, social e cultural do país: o
Mercosul (Mercado Comum dos Países da América do Sul, criado em 1991); a vinda e
implantação de grandes empresas de origem espanhola, as estreitas relações comerciais com
a Espanha e, por último, o peso da cultura hispânica em geral este , menos tangível e
mensurável que os outros fatores assinalados. Essa informação é corroborada analisando as
relações econômicas do Brasil com os países vizinhos de língua espanhola e, sobretudo,
constatando, por exemplo, o número de empresas espanholas ou de capital misto radicadas no
Brasil
17
.
17
Segundo dados registrado no site da Câmara Oficial Espanhola do Comércio no Brasil, trata-se de 309
empresas. Entre elas, empresas de grande porte, como Telefônica, Banco Santander, Brasil Telecom, entre
outras. Disponível em: <http://www.camaraespanhola.org.br/> Acesso em: 09/05/09.
32
De nossa perspectiva, esses fatos contribuíram para a efervescência de um
acontecimento: a aprovação da Lei 11.161
18
que dispõe sobre a obrigatoriedade da oferta do
espanhol nas instituições de ensino e a liberdade dos alunos para optarem por esse ensino
dentro da carga horária normal de aula.
alguns autores que aderem ao que s interpretamos que é a ideologia do
Mercado e que afirmam que quem julgar desnecessária a aprendizagem da língua espanhola
ficará marginalizado do mercado de trabalho, uma vez que as empresas estão exigindo
espanhol fluente como pré-requisito de contratação. Nas palavras de Sedycias (2005): “No
caso específico do Brasil[...] aprender espanhol deixou de ser um luxo intelectual para se
tornar praticamente uma emergência(grifo nosso) (p. 35). Estamos diante da produção de
um imaginário do espanhol no Brasil como língua que colaborará para a qualificação daquele
que a fale, uma vez que o mercado a exige como condição para que ele se insira no mundo
globalizado. A grande preocupação dos tempos contemporâneos é se ajustar à dinâmica das
relações plurais existentes nos diferentes âmbitos do trabalho e, portanto, surge a necessidade
de aprender o idioma como condição para pertencer a esse mundo que exige profissionais
capacitados para se comunicarem em outras línguas e negociarem com outras culturas.
O contexto atual brasileiro em que se essa necessidade de falar espanhol é de uma
vida impressa pela velocidade dos meios de comunicação, principalmente da internet, o que
provoca a expectativa no sujeito de que a aquisição de conhecimentos e a aprendizagem de
uma língua estrangeira fica reduzida a tal aquisição deva ser quase “instantânea”. A essa
expectativa de que o processo de aprendizagem tem de acompanhar o ritmo rápido do mundo
nas mais diversas relações, soma-se a ilusão de competência espontânea que o brasileiro tem
frente à língua espanhola.
Frente à necessidade do brasileiro de aprender essa língua, circunscrita à situação e
cenários descritos acima, surgem muitas ofertas de cursos de espanhol com a promessa de
que esta será aprendida de forma rápida, o que vem ao encontro de satisfazer as expectativas e
necessidades produzidas por essa instância ideológica vinculada a discursividades do
Mercado. Nesse sentido, apresentamos a seguir alguns exemplos de enunciados que reforçam
a ideia de “velocidade” e “rapidez” na oferta de cursos de espanhol:
18
Colocamos no Anexo 1 desta dissertação integralmente o texto da Lei 11.161, de 05 de agosto de 2005.
33
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Uma leitura mais cuidadosa desses fragmentos nos permite reconhecer os termos “rápido”,
“dinâmico”, “compacto”, “intensivo”, “imersão”, que nos confirmam o postulado de
“urgência” que vem acontecendo no Brasil no que tange ao ensino/aprendizagem da língua
espanhola (cf. FANJUL, 2008). os termos “fala”, “conversação”, “língua falada” reforçam
a demanda do mercado de trabalho em relação ao desenvolvimento da competência oral, o
que corrobora o postulado de reduzir a ngua a uma única função, a “comunicação” cf.
Castaños
19
(1993 apud FANJUL, 2008). Dessa forma, os cursos livres de espanhol têm um
perfil que atende muito mais à necessidade comunicativa em função das demandas do mundo
contemporâneo, influenciado pelas condições político-econômicas já expostas.
Nesse sentido, o ensino da língua espanhola fica restrito a uma abordagem que
contempla esse “idioma” como uma língua para a comunicação: assim, a produção de
sentidos nesse espaço fica submetida a uma estabilização lógica e higiênica do pensamento,
não havendo espaço para a ambiguidade, o duplo sentido, a opacidade semântica, isto é, tudo
aquilo que constitui o equívoco. Assim, essa perspectiva não contribui para alcançar a
19
CASTAÑOS,F. “Dez contradições do enfoque comunicativo”, Trabalhos em Lingüística Aplicada, 21,
1993, p. 79-93.
34
complexidade dos papéis que a língua tem e exerce na vida humana a produção imaginária,
as identificações sociais e também a não comunicação (cf. FANJUL, 2008).
A pouca tradição do ensino da língua espanhola no Brasil, bem como a falta de
estudos linguísticos no âmbito do ensino/aprendizagem do espanhol no país (cf. Kulikowski,
2005, p. 45), nos levam a observar a herança de uma prática de ensino baseada nas
abordagens do Método Tradicional, do Método Direto, dos Métodos Estruturais. Prática de
ensino que não contempla o confronto entre a ngua espanhola e a materna (o português),
“passando para o professor e, consequentemente, para o aluno, a imagem de que aprender
línguas é uma atividade sem conflitos” (CORACINI, 1997, p.156).
Nesse sentido, levando em conta os vários aspectos tratados ao longo deste capítulo,
entendemos que interferir nas práticas de ensino formal de uma língua estrangeira poderá vir a
favorecer a produção de uma certa resistência ao processo de instrumentalização que a língua
espanhola vem sofrendo no Brasil, por efeito da dimensão ideológica que se vincula à força
do Mercado e que encontra sua aliada, na instância concreta da prática de ensino, na
abordagem comunicativa. Pensamos, sobretudo a partir do que nos possibilitou ver a análise
de Fanjul (2008), que essa aliança (que poderíamos sintetizar mediante a junção de dois
significantes: “urgência-comunicação”) não funciona a favor de propiciar o deslocamento da
posição-sujeito marcada pela ilusão de competência espontânea que caracteriza a tomada da
palavra em espanhol por parte de brasileiros. Nesse sentido, pensamos que o trabalho com a
materialidade de certa literatura e com determinadas atividades de leitura pode repor a
densidade linguístico-discursiva a que pensamos que o aprendiz deve ser exposto (reforçando
o fato de que, como observa, Lemos
20
, “a língua chega toda”). E, também, considerando essa
literatura como uma das prefigurações mais próximas do real da língua (isto é, tudo o que
no seu funcionamento convoca a possibilidade do equívoco), acreditamos que poderíamos
contribuir a descomprimir o efeito da dor (pelo estranhamento a que uma língua estrangeira
expõe o aprendiz) e, também, o da violência simbólica que Celada observa para o caso do
espanhol para o brasileiro uma língua que, com relação a este, a pesquisadora designa como
singularmente estrangeira.
Consideramos preciso dizer que não estamos pensando a literatura e a relação que com
ela queremos criar em sala de aula como “causa” de determinadas consequências ou, se
quisermos, de determinados objetivos previstos e calculados. Pensamos nesse gesto de
20
Esta formulação está presente nos trabalhos de Claudia Lemos (Unicamp). fizemos referência a autora e
bibliografia em nota de rodapé na Introdução desta dissertação de mestrado.
35
interferência como uma forma de instalar um regime de sentidos que desfralde efeitos, para
que a língua espanhola passe a funcionar como um passaporte sem destino certo. Esse gesto
pode contribuir a interpelar o sujeito a partir de outro lugar: em vez de instalar a urgência e o
imediatismo, abrir a possibilidade da exposição ao duplo sentido, à ambiguidade, ao vaivém
semântico, à desestabilização dos sentidos; enfim, ao universo que Pêcheux designa como
poesia, ao dizer que nada desta é estranho à ngua (cf. 1990, p. 51). A formulação do
estudioso nos permite afirmar que o domínio da poesia não é privativo da literatura; e que esta
última carregaria de forma potencializada algo que é constitutivo do funcionamento da
linguagem. Por fim, explorando conclusões formuladas por Sousa (2007), pensamos que o
fato de trabalhar a leitura de literatura nas práticas de ensino/aprendizagem de espanhol pode
propiciar a exploração da imagem de “língua de cultura” que o aprendiz brasileiro atribui a
essa língua, vinculando esse processo também ao prazer.
Passamos assim ao capítulo 2, no qual refletiremos sobre a posição-sujeito de leitura
que a escola brasileira constrói de forma privilegiada e, assim, veremos que nossa proposta de
trabalho com a literatura se vincula também à necessidade de deslocar tal posição.
36
CAPÍTULO 2
A LEITURA DE LITERATURA NA AULA DE ELE
Neste capítulo, que dividimos em 3 itens, começaremos por desenvolver o conceito de
leitura a partir de uma perspectiva cognitiva, pelo peso que esta tem nas abordagens utilizadas
nas práticas de ensino de língua estrangeira e de ngua materna, para colocá-lo em
contraposição com um conceito de leitura discursivo, que é o que pensamos que deve dar
corpo ao trabalho com a literatura que acabamos de propor, ao encerrar o capítulo 1.
Imediatamente, passaremos a analisar como funcionam as práticas de leitura na escola
brasileira pelo fato de considerarmos importante conhecer como se constrói uma determinada
identidade linguística escolar (ORLANDI, 2002a) e como se interpela um sujeito para que ele
ocupe, de forma privilegiada, uma posição-leitor determinada. Por isso, no item 2, nos
centraremos no estudo da constituição do leitor na escola brasileira a partir de autores que
mencionaremos oportunamente para, no item 3, poder apresentar as várias razões que nos
levam a formular nossa proposta; isto é, levantar a hipótese de que a leitura de literatura nas
práticas de ensino-aprendizado de língua espanhola poderia exercer efeitos no campo da
subjetividade de nossos aprendizes e contribuir a produzir certos deslocamentos (cf.
CELADA, 2009).
1. A Leitura
O termo leitura é tomado em vários sentidos –leitura de uma obra de arte, leitura de um
gesto, leitura vinculada à alfabetização, dentre outros–, porém, neste trabalho, nos
ocuparemos da leitura do texto escrito em sua concepção mais ampla (cf. ORLANDI, 2000, p.
7). Nesse sentido, várias abordagens teóricas sobre a leitura, sendo a cognitivista (cf.
NUNES, 1994. p.14-15), que focaliza a atividade intelectual do leitor, a mais difundida
atualmente. Para descrever essa abordagem, tomaremos como base Kato (1990) quem,
entendendo a leitura como processo de decodificação, a partir de estudos das áreas da
cognição e da inteligência artificial, identifica duas concepções teóricas radicalmente opostas:
a hipótese ascendente (bottom-up) ou dependente do texto, e a hipótese descendente (top-
down) ou dependente do leitor (cf. ibid., p. 66). Assim, segundo Pietraróia, definem-se dois
modelos de leitura, sendo que o primeiro, aquele que depende do texto (bottom-up), tem como
ponto de partida as informações de “baixo nível” (letras, sílabas, palavras, frases, enunciados,
37
parágrafos, textos); estas começam pela menor unidade –as letras– e, de forma linear e
hierárquica, chegam às formações mais complexas e ao texto (cf. 1997, p. 85). o segundo,
aquele que depende do sujeito (top-down), começa, pela maior unidade, ou seja, o texto, e aos
poucos se dirige às unidades menores que o constituem (cf.ibid.). Segundo Coracini, o
modelo ascendente provém de uma visão estruturalista e mecanicista da linguagem, em que o
sentido estaria arraigado às palavras e às frases, e ao leitor caberia a tarefa de decodificá-lo
(cf. 1995. p. 13). Isto é, “o texto se objetifica, ganha existência própria, independente do
sujeito e da situação de enunciação: o leitor seria, então, o receptáculo de um saber contido
no texto, unidade que é preciso capturar para construir o sentido” (grifos da autora) (ibid.). Já
a postura descendente seria aquela em que o “bom leitor”, frente aos dados do texto, seria
capaz de acionar esquemas, “pacotes de conhecimentos estruturados, acompanhados de
instruções para seu uso” (KATO, 1990, p. 14). Cabe observar que terminologias como
“acionar”, “pacotes de conhecimentos estruturados”, “instruções” provêm dos estudos sobre
inteligência artificial (cf. CORACINI, 1995, p.13).
Para Kato, esses dois modelos se tornam coerentes numa posição intermediária, em
que os processos ascendentes e descendentes são complementares, em que a leitura é vista
como uma interação entre leitor e texto, sem privilegiar ou depreciar os dados linguísticos (cf.
1990, p. 67). Assim, percebe-se que inclusive nessa concepção intermediária,
interacionanista, dos processos de leitura, o texto é de principal importância, tendo esse um
significado próprio, cabendo ao leitor extraí-lo (cf. ibid., p. 71). De acordo com Coracini, é o
texto que predetermina a leitura, tendo ele primazia sobre o leitor (cf. 1995, p. 15). Nesse
modelo, a leitura fica à mercê do significado do texto, que é quem autoriza certo número de
leituras através das inferências permitidas, sendo da competência do leitor a apreensão do(s)
sentido(s) nele inscritos; nessa perspectiva, o texto é autoridade (cf. ibid.).
Essa concepção de processo de leitura, como apontado acima, é amplamente difundida
e são muitos os linguistas aplicados que a adotam, às vezes com pequenas adaptações; entre
eles podemos citar a própria Kato (1985)
21
, Cavalcanti (1983 apud, ibid.)
22
, Kleiman (1989
apud, ibid.)
23
, dentre outros.
Coracini (1995) aponta uma outra concepção de processo de leitura que tem sido
chamada de discursiva, e que se situa entre a interface da análise do discurso e a perspectiva
21
1985 refere-se à 1ª ed. A edição de Kato, M. que consta nas referências desta dIsertação é de 1990
22
A obra citada por Coracini é CAVALCANTI, M. Interpretação Prágmatica. Principios retóricos na interação
leitor-texto em língua estrangeira. Anais do VIII Encontro Nacional de Linguistica. RJ:PUC, 1983.
23
A obra citada por Coracini é KLEIMAN, A. Leitura: Ensino e Pesquisa. Campinas: Pontes, 1989.
38
desconstrutivista
24
, cujo principal representante é Derrida (1973 apud, ibid.)
25
. Essa
concepção considera o ato de ler como um processo discursivo, no qual os sujeitos produtores
de sentido (autor e leitor) estão sócio-historicamente determinados e ideologicamente
constituídos; portanto, o momento social é determinante do comportamento, das atitudes, da
linguagem do leitor, assim como da configuração de sentidos concebida por cada um deles
(cf. ibid.).
Entendemos, assim, que o significado do processo de leitura não é pré-dado pelo autor
do texto, antes é construído pelo sujeito leitor através da transformação do material pré-dado
do texto (cf. ISER, 2002 p. 115). Dessa forma, Coracini também acredita que:
Se entendermos discurso como conjunto de enunciados possíveis numa dada
formação discursiva, em que os sujeitos determinam as condições de exercícios da
função enunciativa, (Foucault, 1969) ao mesmo tempo em que são por elas
determinados, se compreendemos linguagem como uma série infinita de jogos
convencionais (no sentido que Wittgenstain ao termo), cujas regras são
partilhadas por uma comunidade cultural, interpretativa, que determina a produção
do sentido, então, compreenderemos que não pode ser o texto o receptáculo fiel do
sentido, que este não pode ser controlado a não ser pelos sujeitos submersos num
determinado contexto sócio-histórico (ideológico), responsável pelas condições de
produção. Estas nada mais são do que o imaginário discursivo que habita o sujeito e
que determina o seu dizer. (grifo do autor) (ibid., p. 15-16).
Assim, cada indivíduo realizará diferentes leituras, dependendo do momento em que
estas sejam feitas, como coloca Foucault
26
(1971 apud, ibid.): “O dizer é inevitavelmente
habitado pelo dito e se abre sempre à pluralidade de sentidos, que, por não se produzirem
jamais nas mesmas circunstâncias, são, ao mesmo tempo e inevitavelmente novos.”(grifos
nossos).
Dessa forma, fala-se em pluralidade de sentidos, mas não na acepção de texto
polissêmico que se constrói como oposto ao texto monossêmico, e sim na acepção de
“disseminação de sentidos”, como explica Derrida
27
(1972, p. 61, apud, ibid.):
A atenção dada à polissemia ou politematismo constitui, certamente, um progresso
com relação à linearidade de uma escritura ou de uma leitura monossêmica, ansiosa
por se amarrar ao sentido tutor, ao significado principal do texto [...]. Entretanto, a
polissemia enquanto tal se organiza no horizonte implícito de uma resolução unitária
do sentido, para não dizer de uma dialética [...], de uma dialética teleológica e
totalizante que deve permitir a um dado momento, por mais distante que esteja,
24
Segundo Grigoletto, o desconstrutivismo considera que um texto nunca possui significado anterior à leitura,
inserindo-se, dessa forma, no domínio da heterogeneidade e da intertextualidade. Nesse sentido, essa linha
aponta que devem ser permitidas várias leituras e abordagens na construção de um significado (cf. 1995, p.
104).
25
A obra citada por Coracine é DERRIDA, J. De la Grammatologie. Paris: Les Editions de Minuit, 1967.
26
FOUCAULT. L’ ordre Du Discours. Paris:Ed. Gallimard, 1971.
27
DERRIDA, J. Positions. Paris: Les Editions de Minuit, 1972.
39
reunir a totalidade de um texto na verdade de seu sentido, o que constitui o texto em
expressão, em ilustração, e anula o deslocamento aberto e produtivo da cadeia
textual. A Disseminação, ao contrário, por produzir um número não finito de efeitos
semânticos, não se deixa reduzir nem a um presente de origem simples [...] nem a
uma presença escatológica. Ela marca uma multiplicidade irredutível e geradora. O
suplemento e a turbulência de uma certa falta fraturam o limite do texto, interditando
sua formalização exaustiva e enclausurante e pelo menos a taxionomia saturante, de
seus temas, de seu significado, de seu querer-dizer.(grifos do autor).
A partir desse pensamento, entendemos que a disseminação de sentidos produzidos no
processo de leitura é infinita, e ela só é interrompida quando o leitor formaliza um significado.
Já a “leitura polissêmica”, embora suponha pluralidade de sentidos, caminha sempre à procura
de uma causa final, ou seja, seu fim está predeterminado a explicar o sentido final do texto.
Portanto, na concepção de leitura como disseminação de sentidos, a intenção do autor
corresponderá à interpretação que o sujeito leitor fizer da leitura do texto (cf. ibid., p.17).
Foucault
28
(1969 apud, ibid.) defende que os textos: “[...] não passam [...] de grafismos
empilhados sob poeira das bibliotecas, dormindo um sono profundo em direção ao qual não
pararam de deslizar desde que foram pronunciados, desde que foram esquecidos e que seu
efeito visível se perdeu no tempo”. Assim, cada situação enunciativa –leitura– será capaz
de conferir sentido aos sinais gráficos dos textos, transformando-os em sinais linguísticos
textuais (cf. ibid.). Quanto ao autor do texto, ainda segundo Foucault, entidade jurídica que
responde pelo documento escrito, ele não pode interferir no processo interpretativo, marcado
pelas condições individuais-histórico-sociais de cada sujeito-leitor (cf. ibid.). Ele será
realizado pelo sujeito-leitor no momento da enunciação –leitura– (cf. ibid.). Portanto, o leitor
apenas podeimaginar, a partir da própria interpretação, quais foram as intenções do autor
no momento de enunciar seu texto, mas nunca saber ao certo –escritura– (cf.ibid.). Nessa
perspectiva, é o leitor quem determina as leituras, e não o texto e/ou autor, enquanto
participante de uma determinada formação discursiva, sujeito clivado, heterogêneo,
perpassado pelo inconsciente, o qual se inscreve no discurso (cf. ibid.).
Se bem pensamos que não se aprende a interpretar (ORLANDI,1996), pois o
homem interpreta filiando-se a este ou aquele sentido, inscrevendo-se nesta ou naquela
discursividade –no caso específico de aprendizado de uma língua estrangeira, filiando-se a
uma memória outra– num processo de identificação (cf. id, 2003, p. 19). Nas palavras de
Pêcheux (1990):
28
A obra citada por Coracini é FOUCAULT. L’ Archéologie du discours. Paris: Ed. Gallimard, 1969.
40
[...] as coisas-à-saber [...] são sempre tomadas em redes de memória dando lugar a
filiações identificadoras e o de aprendizagens por interação: a transferência
não é uma “interação”, e as filiações históricas nas quais se inscrevem os indivíduos
não são “máquinas de aprender” [...] Pêcheux (1990 apud ORLANDI, 2003, p. 19)
(grifo nosso).
Portanto, pensamos que o professor não pode “ensinar a interpretar”, porém, se ele
compreender como um objeto simbólico produz sentidos, poderá situar-se em relação à
interpretação e seu trabalho poderá interferir nas práticas, no caso, na de leitura (cf. ibid., p.
19). Aliás, pensamos que essa posição o deixará mais próximo da possibilidade de estar atento
ao desejo dos aprendizes.
Enfim, os gestos de interpretação não são passíveis de ensino, mas os processos de
identificação podem ser trabalhados, e pode-se alargar a capacidade de interpretação do
sujeito, como observa Orlandi, embora não possamos esquecer que este sempre está
ideologicamente determinado (cf.ibid.). Por isso, acreditamos necessário conhecer
profundamente a forma como a escola brasileira interpela seu sujeito como leitor, pois, como
afirma Nunes, “(o) leitor não cria sua posição a partir do nada, ele é capturado, ele resiste, ele
desloca” (2003, p. 45).
2. Constituição do leitor na escola brasileira
Segundo, Coracini a concepção instituída na escola é a de “leitura enquanto
decifração” e a de texto “enquanto conjunto de palavras que se sucedem umas às outras na
linearidade espacial e temporal do papel, como se o sentido do texto resultasse da soma do
significado isolado de cada palavra (cf. 1995, p. 19).
Para compreender a posição-leitor que a escola privilegia, nos apoiaremos em estudos
de Nunes (2003) e de Orlandi (2002a). Primeiro apresentaremos as três instâncias ideológicas
que, segundo Nunes, são determinantes na leitura e mostraremos como essas influenciam a
constituição do leitor brasileiro dentro da escola. Em segundo lugar, e com base nas reflexões
de Orlandi, explicaremos as três instâncias de saber que segundo a autora caracterizam a
“identidade linguística escolar” e veremos como se constituem, especificamente, as produções
de linguagem com relação à leitura.
41
2.1 Instâncias do ideológico na escola
A partir da análise de um corpus determinado, Nunes (2003) percebe no âmbito da
escola a presença de instâncias ideológicas, que acabam constituindo o discurso escolar.
Assim, segundo ele, os termos “prova”, “teste”, “avaliação”, “interpretação”, “dever de casa”,
remetem ao domínio do jurídico; e explica que no espaço da escola no Brasil o aluno tem de
“provar que leu”, se submetendo às práticas de avaliação, tem de prestar conta das obrigações
escolares, assim como os professores precisam julgar, debater, estabelecer regras e interpretá-
las (cf., ibid., p. 26). os termos “empréstimo”, “troca”, “venda”, acumulação de saber”,
“planejamento”, “ficha de leitura”, remetem ao espaço econômico administrativo; nesse
sentido, existe uma economia de leitura no que se refere à acumulação de livros nas
bibliotecas, emprestá-los, adquiri-los, trocá-los, e também uma administração da leitura
quando se elaboram fichas de leitura, resumos (cf. ibid., p. 27). Por último, Nunes faz
referência aos termos “opinião”, “leitura livre”, “orientada”, “polêmica”, “oficial”, “correta”,
“boa” ou “máe observa que esses podem ser relacionados ao espaço moral e político (cf.
ibid.).
A partir dessas delimitações, o autor chega a um recorte que distingue três instâncias
ideológicas
29
determinantes do processo de leitura (cf. ibid.):
a) a instância do jurídico;
b) a instância do econômico e,
c) a instância do político.
A seguir veremos como cada uma dessas instâncias interfere na constituição do leitor
brasileiro e na produção de leitura.
2.1.1 Instância do Jurídico
No espaço jurídico, Nunes (2003) analisa a maneira como o sujeito-de-direito no
Brasil, em sua forma histórica, se constitui enquanto leitor dentro da escola (cf. ibid.). Essa
análise foi realizada a partir de duas questões (cf. ibid., p. 28). Em primeiro lugar, a questão
da regra jurídica em relação às regras ou normas de leitura e, em segundo, do
funcionamento da regra, de sua aplicação, de sua interpretação, e da utilização de um
arquivo (cf. ibid.). O autor explica que a regra no espaço jurídico fica subordinada à
29
Nunes explica que o termo ideologia nesse trabalho é considerado “[...] como o mecanismo de produzir a
evidência” (ibid.).
42
formulação de um corpo de leis, normas, códigos, bem como à aplicação e à interpretação
dessas regras diante de um fato. Na escola acontece o mesmo, um conjunto de regras que
orientam o funcionamento institucional, o regulamento da escola, o programa do curso, a
normalização das atividades do professor, bem como a forma de interpretá-las (cf. ibid., p 28).
Pensando o efeito-leitor no Brasil, no que se refere a como se dá o processo de ensino, de
constituição de identidades linguísticas e nacionais em relação à leitura, Nunes observa dois
pontos de interesse no contato entre a regra jurídica e a regularização da leitura na escola (cf.
ibid.):
a) “a regra gramatical”;
b) “a construção de arquivos e a interpretação de textos”.
Quanto à primeira, o autor observa que no Brasil uma longa tradição de ensino de
gramática que perdura até os dias de hoje, o que coloca em jogo uma “lógica” gramatical,
podendo ver isso refletido nas atividades de interpretação que às vezes são automatizadas,
como se fossem rezas em que se valorizam as repetições das estruturas, e outras são
organizadas partindo de instrumentos como o livro didático (cf. ibid., p. 30). Assim, o autor
observa que no âmbito escolar a leitura traz uma espécie de julgamento, de avaliação e de
apreciação daquilo que se lê (cf. ibid. p. 31). Vejamos isso nas palavras do autor a seguir:
A leitura do aluno é constantemente julgada, avaliada pelo professor. Tal julgamento
regula imaginariamente o procedimento de leitura dos alunos, afetando desde a
imagem dele na sala de aula até a sua efetiva aprovação escolar. Os alunos, para
obterem boas avaliações, boas notas, devem se inteirar das estratégias de leitura
adequadas [...] Para cada disciplina, os alunos percebem uma maneira de obter os
resultados, eles vão construindo seu modo de ler e de mostrar essa leitura, eles vão
se constituindo enquanto sujeito-aprendiz. (ibid.).
No que diz respeito ao segundo ponto, a construção de arquivos e a interpretação de
textos”, o autor explica que o Brasil, como país de colonização, tem uma história marcada
pela censura, pela dependência externa e pela escassez de material, e como consequência
desse processo, o livro didático, de alguma forma, substitui a falta de arquivo e mascara a sua
existência; esse fato, conclui, determina e até explica a dependência do livro didático nas
situações de ensino na escola brasileira (cf. ibid., p.33).
Por outro lado, Nunes observa que a restrição de arquivo também influencia os
diferentes modos de ler, uma vez que diante da escassez de material arquivado, alguns
professores preocupados com a formação de espaços de leitura têm recorrido à montagem de
pequenos arquivos para a circulação de livros entre seus alunos; nesse contexto se promove a
“leitura do aluno”, não importando o “conteúdo, e sim a quantidade de livros lidos, ou seja, a
43
acumulação de saber (cf. ibid., p. 34-35). Ao mesmo tempo, e com a elaboração de fichas de
leitura, acaba se promovendo uma visibilidade do leitor, que se torna mensurável (cf. ibid.),
aspecto que entra em relação com a instância econômica.
2.1.2 Instância do Econômico
Segundo Nunes, o leitor atual também é atingido pelo discurso econômico que vigora
na sociedade, fazendo uso de uma prática administrativa que leva à organização de um
trabalho mais sistemático com a leitura (cf. ibid., p. 36). As relações de produção do mundo
capitalista fazem com que o leitor dos dias de hoje se depare constantemente com palavras do
tipo: “produtividade”, “rendimento”, “organização”, “competência”, “rapidez”, “eficiência”
(cf. ibid.).
Na escola, observa Nunes, pode-se observar a relação com o espaço do econômico,
nas práticas de avaliação, controles de frequência, boletins, históricos escolares, contagem de
crédito, técnicas de estudo de memorização, até de leitura através de elaboração de fichas,
contagem de livros lidos, seleção de palavras-chave, modelos interpretativos em forma de
perguntas dirigidas e testes de múltipla escolha, favorecendo assim o surgimento de um modo
mecanizado de leitura (cf. ibid., p. 37). Também é possível observar que o espaço econômico
se transfere para a escola na prática de interpretação de gráficos, bancos de dados, tabelas, ou
seja, espaços logicamente estabilizados, dando visibilidade aos alunos e/ou objetos de leitura,
agilizando desta maneira as atividades (cf. ibid.).
Ainda sob o aspecto do econômico, Nunes salienta as condições que a indústria do
eletrônico propicia, trazendo condições específicas para certos tipos de leituras (cf. ibid., p.
38). No caso da editoração dos jornais, o autor exemplifica com um encarte especial da Folha
de São Paulo
30
, que mostrava o investimento desse jornal na utilização de textos escritos com
imagens de todo tipo, como fotografias, desenhos, mapas, gráficos etc. que “facilitam” a
leitura, com o “máximo de informação” e o “mínimo para sua leitura” (ibid., p 39).
As técnicas de leitura são consideradas no âmbito da formatação, do layout, do
design, da estética e da funcionalidade, tendo em vista um leitor pragmático, que
“cada vez mais rapidamente”, tem interesses determinados, e consequentemente um
perfil esboçado conforme a posição socioeconômica: “profissional liberal”,
“empresário”, “estudante”, “dona de casa” (ibid.).
30
Folha de São Paulo, 17-02-91, ano 70, nº 22.600.
44
Fica muito claro que o sistema econômico caminha na direção do avanço dessas
tecnologias, que por sua vez tornam dinâmicos, automatizados, simplificados os gestos de
leitura, reforçando, assim, um lugar cristalizado que não propicia a produção de novas
significações.
2.1.3 Instância do Político
É na instância do político que o leitor estabelece um contato entre aquilo que ele
absorve da sua leitura e aquilo que é produto da leitura feita pelos interesses ideológicos da
sociedade; assim, segundo Nunes (2003), trata-se de uma dialética que incorpora a
virtualidade dessas duas leituras: o lugar que ocupa o leitor e o lugar que ocupa seu contexto
social. Por isso, o leitor tem a responsabilidade de atribuir sentidos, de interpretar, de se
responsabilizar por aquilo que lê, quer dentro das redes de interpretação, quer dentro da
divisão social do trabalho de leitura (cf. ibid., p. 44).
O primeiro nível da política de leitura é a distribuição dos textos que organiza a
formação de espaços de leitura em uma conjuntura dada: no meio escolar, na imprensa, no
âmbito religioso etc.; desta forma, essa distribuição é determinante daquilo que pode e deve
ser lido em certas circunstâncias, fazendo com que os modos de leitura e seus sentidos sejam
os produzidos por especialistas, ficando consagrados, e sendo sustentados pelos sujeitos
anônimos que aderem a essas interpretações (cf. ibid., p. 41). No caso do ensino da literatura
na escola brasileira, o autor observa que esse está marcado por um discurso formulado a partir
de uma ideologia que pretende sistematizar os acontecimentos literários, classificando-os em
ordem cronológica, segundo o movimento, enumerando os principais autores e as respectivas
obras de cada um deles (cf. ibid.). Assim se constitui uma forma modelar a ser preenchida,
com datas, características e autores dos movimentos literários, apagando, os espaços de
interpretação que o texto literário abre (ibid., p 42).
A dominância de discurso liberal presente na atualidade é mais uma influência do
discurso político, visto que:
[...] a imagem de um leitor “heróico”, que por iniciativa própria, e sem limitações de
censura ou de condições financeiras, pode tudo ler e interpretar. Fica apagado com
isso o trabalho de leitura (Pêcheux, 1982), bem como a política de distribuição e
tratamento de textos, ao passo que se confere ao sujeito a tarefa de construir
“livremente” sua história de leitura (ibid., p 42 -43).
31
31
A obra de Pêcheux citada por Nunes é “Lire l’ archive aujourd’ hui”. Archives et documents de la Societé d’
histoire et d’ épistémologie des sciencies du langage (Saint Cloud), 1982, 2:35-45.
45
O discurso liberal provoca gestos de leitura isentos de um cuidado para a construção
de leituras em que o sujeito possa se significar.
2.2 Os efeitos: a identidade linguística escolar no âmbito escolar
Na escola brasileira, de forma geral, e apoiando-nos no texto “Identidade linguística
escolar” de Orlandi, a relação com a leitura ou com o texto é marcada pelo que a pesquisadora
designa como “repetição empírica”: o aluno não é motivado a refletir sobre novas
significações, mas a repetir o que a escola impõe (cf. 2002a).
Nessa linha de raciocínio, Orlandi acrescenta que, quando se trata de refletir sobre a
“identidade linguística”, deve-se observar a forma como o aluno se relaciona com a ordem do
simbólico, com os discursos da/na escola e inclusive com o discurso gramatical que constitui
sua relação com a língua portuguesa (cf. ibid., p. 207). A autora caracteriza a identidade
linguística escolar em diferentes instâncias (todas elas do domínio do imaginário): a) “saber
produzir uma relação com a língua oficial que produza uma imagem da boa linguagem, da
linguagem correta, escolar” (ibid., p. 207); b) “[produzir um] saber convencional sobre
conhecimentos, sejam eles de geografia, história, matemática. Sem esquecer que ‘saber’ é
saber dizer” (ibid.); c) produzir um saber em literatura, dos autores e obras importantes da
nossa literatura, etc. (cf. ibid., p. 208).
32
Esses saberes são os que o aluno adquire durante o período de escolarização, porém
eles não significam que o aluno compreenda totalmente a língua (cf. ibid.), mas os discursos
da língua que atravessam o espaço da escola.
Tomando como base a relação entre a repetição (paráfrase) e a polissemia como
constitutiva de toda produção de linguagem, Orlandi identifica (cf. ibid.):
a) a repetição empírica: é o efeito papagaio;
b) a repetição formal: nela não é trabalhada a ligação do sujeito com a memória
discursiva;
32
Esses discursos ou saberes que todo mundo que frequentou a escola deve ter é o que a autora chama de “identidade
linguística escolar” (cf. ibid.). Isso abrange não somente a língua, mas os discursos produzidos por e na língua que se
fala na escola, e o conjunto desses saberes ou dizeres constitui a “escolaridade” (cf. ibid., p. 208).
46
c) a repetição histórica: trata-se do saber discursivo, do dizer não repetível enquanto
memória constitutiva. É nesse domínio da repetição histórica que o sujeito produz
aquele sentido em “seu” discurso, em sua memória.
A historização que a pesquisadora atribui ao último tipo de repetição é justamente repetição
e, ao mesmo tempo, deslocamento (ibid., p. 209). Orlandi observa que nesse caso deve ser
trabalhado o equívoco, pois, “enquanto lugar de interpretação, é justamente o espaço do
trabalho da identificação do sujeito que nos concerne nesta reflexão”; no entanto, acrescenta
“nem sempre se reconhece esse lugar” (ibid.). No caso da escola brasileira, pratica-se a
repetição empírica e a racionalização da repetição formal e, assim, a repetição histórica que
significa que o sujeito pratique sua inscrição em novos saberes não chega a ser praticada
nesse espaço. (cf. ibid., p. 211).
Vejamos o que Orlandi propõe a esse respeito no livro A leitura e os leitores, por ela
organizado:
A leitura do aluno é constantemente julgada, avaliada pelo professor. Tal julgamento
regula imaginariamente o procedimento de leitura dos alunos, afetando desde a
imagem dele na sala de aula aa sua efetiva aprovação escolar [...] Entre deixar
falar a leitura do professor, suas técnicas de interpretação, seus modelos de prova, e
estabelecer uma posição de leitor autônoma, o aluno aparece numa posição
intermediária. Ele depende da instituição escolar para obter os benefícios
decorrentes e aí muitas vezes adere cegamente ao discurso escolar. Nesse caso,
provar que leu significa silenciar a própria leitura e aderir à leitura do outro, sem um
distanciamento crítico (2003, p. 31-32).
A autora defende a posição de que se deve trabalhar a repetição histórica afirmando que “[a]
escola deve levar ao ‘deslocamento’ da identidade, para que o sujeito não seja o lugar cego
que resulta automaticamente dos processos de identificação” (2002a, p. 211). Na direção
contrária ao exercício dessa prática escolar, afirma: “[t]odo processo de significação é
constituído por uma ‘mexida’ (deslize) em redes de filiações históricas (Pêcheux, 1990),
sendo, desse modo, ao mesmo tempo, repetição e deslocamento”; por isso, o sujeito se
produz ao mesmo tempo como repetição e deslocamento (ibid., p. 204 e 207). Essa afirmação
é muito importante aqui, pois nos permite pensar que, na prática de ensino-aprendizado de
uma língua estrangeira (no caso, o espanhol), podemos interferir no modo de interpelação
dominante da escola – retomado e reforçado em outras instâncias de nossa sociedade – a partir
de exercícios ou de práticas de leitura que impliquem um impacto na relação sujeito/texto.
47
3. A literatura na prática de ensino de ELE
Começaremos por apresentar alguns estudos que realizam propostas com literatura no
campo da prática de ensino de línguas estrangeiras para poder contextualizar melhor nossa
proposta.
3.1. Antecedentes
Ao debruçar-nos sobre a história das metodologias e abordagens de
ensino/aprendizagem das línguas estrangeiras, pudemos constatar que nelas não há um espaço
reservado para a prática de leitura literária nem para uma reflexão específica sobre o que
poderia implicar a realização dessa prática. Por isso, de forma geral, o que é possível observar
nos livros didáticos de ELE é a presença da literatura ao serviço dos conteúdos gramaticais: a
literatura para ilustrar ou exemplificar determinados itens do campo gramatical.
No Brasil, de forma específica, devido ao alto grau de desenvolvimento da reflexão
sobre o ensino de línguas estrangeiras em diversas instituições, alguns autores defendem a
presença da literatura nessa prática de ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras, entre eles
Serrani-Infante (2005), quem trabalha no campo da Análise do Discurso. Em seu livro
Discurso e cultura na aula de língua, a autora dedica o capítulo III à literatura e ao ensino de
língua. Partindo da observação das tendências predominantes no ensino ao longo das últimas
décadas, principalmente de nguas estrangeiras, constata que nos enfoques nocional-
funcionais não há presença de textos literários, uma vez que essas abordagens priorizam o uso
funcional da língua, com predomínio de diálogos recortados do cotidiano da vida real a través
dos quais, por exemplo, pedir informação, se desculpar, etc:
Uma das razões alegadas frequentemente ou implícitas nas propostas didáticas tem sido
que os textos literários teriam relativamente pouca aplicação em usos linguísticos
funcionais, especialmente em contexto da vida diária. Metodologicamente, nesses
enfoques preponderavam os procedimentos dialógicos na interação, com temáticas
cotidianas, como compra-venda, pedidos de permissão para ações ou desculpas em
interações do dia-a-dia e assim por diante (ibid., p. 47).
Serrani justifica e defende a inclusão de textos literários na prática de
ensino/aprendizagem de línguas, junto a outros não literários, “pelo princípio de [que] quanto
mais amplo o leque de gêneros discursivos trabalhados, mais ampla será a possibilidade de
desenvolvimento da capacidade textual discursiva” (ibid.).
48
Assim, a autora apresenta uma proposta baseada em um trabalho discursivo “intra e
interlinguístico”
33
nas diferentes práticas verbais (expressão e compreensão escrita e oral), por
meio de práticas pré-pedagógicas que permitem que o professor possa preparar os temas
linguísticos, discursivos e sócio-histórico-culturais a serem focados nas aulas de leitura e
evitar, assim, a leitura como mera decodificação (cf. id., p. 75). A pesquisadora considera que
língua e discurso são interdependentes e que a “língua não preexiste ao discurso” (ibid.); por
essa razão não considera necessário o trabalho prévio para aquisição de estruturas e de léxico,
que mais tarde viriam a ser efetivamente usados e, nesse sentido, sua proposta é a de
trabalhar com os textos logo de início, não sendo o ensino de estruturas lingüísticas um
requisito prévio (cf. ibid., p. 63).
34
A autora propõe o uso de todo tipo de texto, visando que o professor de língua seja um
mediador cultural; para tal, o procedimento consiste, num primeiro momento, na realização de
oficinas de compreensão e produção discursiva, e, posteriormente, na leitura dos textos
prática na qual os alunos podem debater e escrever com os colegas e com o professor (cf.
ibid., p. 47).
Outra proposta de inclusão da literatura na prática de ensino de língua estrangeira,
desta vez restrita aos cursos conhecidos como “instrumentais de leitura”, é realizada por
Jover-Faleiros (2006); passaremos aqui, a resenhá-la de forma breve. A estudiosa aborda o
estudo da experiência de leitura literária num curso de francês instrumental para brasileiros e
visa analisar a reação dos aprendizes em contato com a materialidade do texto. Para tanto, ela
realizou uma experiência com os alunos e observou seus processos de “construção de sentido
num exercício dividido em duas etapas. Na primeira, o aluno, após a leitura, respondia por
escrito a certas questões; na segunda, após relerem o que haviam escrito na primeira fase,
passava a realizar a discussão sobre o texto lido e sobre as respostas do questionário aplicado,
o que era registrado pela pesquisadora (cf. ibid., p. 138). Após a análise dos registros
coletados na experiência, esta conclui:
Se a pedagogia do escrito desenvolvida na França na década de 1980 buscava
assegurar ao aluno que podia ler em ngua estrangeira, uma das possibilidades da
leitura literária é ser potencialmente plural, ou seja, asseguramos ao aluno que
ele pode fazer outras leituras. Leituras que ultrapassem o nível informativo do
texto, relacionando-o com outros conhecimentos e leituras. [...] nossos alunos devem
produzir conhecimento por meio de suas leituras e o contato com textos literários é
33
Serrani (2005) usa os termos intradiscurso e interdiscurso, oriundos de Pêcheux (1988). O intradiscurso é a
dimensão linear da linguagem e o interdiscurso é a dimensão vertical do discurso, que remete às memórias
implícitas que o atravessam – explica a pesquisadora.
34
Essa afirmação de Serrani nos parece importante e será aproveitada em nossa experiência.
49
uma das maneiras de estimular uma leitura mais reflexiva por várias razões
(grifos nossos) (ibid., p. 211).
Como podemos observar, tanto Serrani-Infante (2005) como Jover-Faleiros (2006)
apóiam o uso do texto literário nas aulas de língua estrangeira. A primeira porque no texto
grande utilidade para trabalhar os aspectos culturais e fugir das propostas “utilitaristas” da
didática de línguas; a segunda, para ajudar no processo de reflexão e construção de
significados na leitura de textos em ngua estrangeira. Nossa proposta, nesse sentido,
apresentará uma certa especificidade: vai se centrar no efeito que o contato com a
materialidade do texto literário pode ter no processo de ensino/aprendizagem da língua
estrangeira para o sujeito aprendiz.
3.2 Nossa proposta - As várias razões que nos afetam
A seguir, iremos entrelaçando diversas afirmações acerca da especificidade da
literatura com as quais, como sujeitos desta pesquisa, nos identificamos de maneira forte,
porquanto elas designam alguns aspectos que trazem sentido(s) para nossa proposta e que vão
ao encontro de nosso desejo: o de explorar o trabalho com a leitura de literatura em processos
de ensino-aprendizado de ELE, no Brasil.
Começaremos por retomar as afirmações já clássicas no universo da crítica literária no
Brasil que constam no ensaio “Direitos humanos e literatura”, de Antônio Cândido (2004): de
acordo com elas, a literatura é “manifestação universal de todos os homens e de todos os
tempos”; não homem que possa viver sem ela pelo fato de esta permitir que ele entre no
mundo fabulado contato necessário a qualquer ser humano; tem um papel humanizador; a
forma do seu discurso coloca as palavras em evidência de modo a facilitar a percepção das
mesmas; assim, a literatura enriquece nosso mundo e nossa linguagem e nos faz mais
sensíveis (ibid., p. 174-191). Enfim, na conclusão do autor, “[U]ma sociedade justa pressupõe
o respeito dos direitos humanos, e a fruição da arte e da literatura em todas as modalidades e
em todos os níveis é um direito inalienável” (ibid., p. 191).
35
Para começar a apresentar certas características próprias da leitura de textos literários
que a diferenciam da leitura de textos de outros gêneros, recorremos a Lewis (2000) quem,
em seu livro A experiência de ler, diz que:
35
A experiência de fruição literária apontada por Candido coincide com a afirmada por Proust, Barthes, Calvino,
Eco, entre outros, como retomaremos oportunamente.
50
[...] uma obra literária pode ser tomada sob dois aspetos. Tanto significa como é. É,
a um tempo, logos (algo que se disse) e poieme (algo que se fez). Como logos,
conta uma história, exprime emoção, exorta, advoga, descreve, censura ou provoca
o riso. Como poieme, pela sua beleza auditiva e também pelo equilíbrio, o contraste
e a multiplicidade unificada de suas sucessivas partes, é um objet d’art, algo a que
se deu uma forma suscetível de proporcionar grande satisfação ( p. 179-80) (grifos
do autor).
Assim, conclui afirmando que “o que distingue a leitura estritamente literária da
leitura científica ou informativa em geral” é que “não precisarmos aceitar ou provar o logos
(ibid., p. 185) (grifo do autor). E ainda observa que a literatura nos permite “ver com outros
olhos, fantasiar, com outras imaginações, sentir com outros corações, ao mesmo tempo que
com os nossos” (ibid., p. 185). À luz do autor:
A experiência literária cura a ferida da individualidade, sem lhe minar privilégio.
emoções de massa que também curam a ferida, porém destroem o privilégio.[...]
Mas, ao ler a grande literatura, torno-me mil seres diferentes, sem deixar de ser eu
próprio (ibid., p. 190).
A literatura, segundo Lewis (cf. ibid.), nos colocaria nesse lugar no qual abandonamos
nossa posição de sujeito social e, assim, nos permite ocupar uma nova posição para ter acesso
a experiências que não as nossas, sem por isso submeter-nos, ao contrário do que acontece nas
comunicações de massa.
Os relatos de grandes escritores sobre sua experiência como leitores (como Proust,
Barthes, Calvino, Lewis) narram a descoberta de novos mundos, a solidão acompanhada pelos
livros, o isolamento voluntário, a memória de leituras. O prazer é comum no depoimento de
todos eles. Jover-Faleiros, que propôs um trabalho com literatura em práticas de ensino de
língua estrangeira, afirma que ao ler: “Oscilamos na oposição constituída por Barthes entre o
prazer e a fruição da leitura. O primeiro nos é agradável, tranquilizador porque nos
reconhecemos naquilo que lemos; a segunda abala nossas certezas sobre o mundo e a vida que
nele levamos” (2006, p. 91). Vejamos o que o próprio Barthes diz ao traçar a diferença entre
texto de prazer e de fruição:
Texto de prazer: aquele que contenta, enche, euforia; aquele que vem da cultura,
não rompe com ela, está ligado a uma prática confortável da leitura. Texto de
fruição: aquele que põe em estado de perda, aquele que desconforta (talvez até um
certo enfado), faz vacilar as bases históricas, culturais, psicológicas do leitor, a
consistência de seus gostos, de seus valores e de suas lembranças, faz entrar em
crise uma relação com a linguagem (Barthes, 2004, p. 20-21 [1. ed.: 1973]).
51
Passando agora a focalizar a relação específica do brasileiro com textos literários em
LE, a professora Maria Augusta da Costa Vieira (1996) descreve esse contato como uma
experiência, para ela, diferente da que tem como leitora de outras literaturas estrangeiras:
[...] com o passar dos anos fui constatando que, embora a literatura brasileira, junto
eventualmente a outras literaturas estrangeiras, continuasse ostentando todos os seus
encantos, minha condição de leitora parecia mais aguçada quando me concentrava
nos textos espanhóis ou hispano-americanos (ibid., p. 114).
A autora aponta para um componente essencial que faz com que o funcionamento da
leitura da literatura, para os brasileiros, seja diferente quando se trata de língua espanhola:
“trata-se das especificidades que aproximam o espanhol do português” e que fazem que um
brasileiro, em contato com textos hispânicos, se encontre “numa posição paradoxal que faz
coincidir na sua leitura a proximidade e o distanciamento” (ibid.). E acrescenta: “As
semelhanças entre as duas línguas criam zonas permeáveis em suas fronteiras”, e, ao mesmo
tempo, “não apagam os traços da identidade estrangeira” (ibid.). Assim, a relação entre as
palavras e as coisas em espanhol, aos olhos do leitor brasileiro, “possibilita a propriedade de
suscitar de forma potencializada o lugar, não comum, das palavras, ou seja, o espaço singular
da literatura” (ibid.).
Parece-nos que, à luz das observações da pesquisadora, podemos dizer que, se por um
lado a proximidade das duas línguas, espanhol e português, possibilita, na leitura, a “ilusão de
competência espontânea” que o brasileiro tem sobre a ngua espanhola, por outro a literatura
coloca essas línguas numa relação muito específica que “mostra”, com expressividade, essa
língua estrangeira em sua alteridade. Acreditamos que, por suas especificidades e pelos
efeitos que a literatura tem sobre o sujeito leitor, sua presença nas práticas de
ensino/aprendizagem de ngua espanhola poderá favorecer a possibilidade de o aluno ocupar
uma posição de interpretação, se distanciando dos sentidos cristalizados e legitimados –
movimentos estes que reforçariam o que é preciso fazer (os investimentos que é preciso
realizar, de acordo com Celada [2009]) no processo de aprendizado dessa língua,
singularmente estrangeira.
No entanto, essas não são ainda todas as razões que nos levam a defender uma
proposta de trabalhar com a leitura de literatura no processo de aprendizagem de língua
espanhola pelos aprendizes brasileiros. Não são todas porque não pretendemos dar conta aqui
de uma enumeração exaustiva e, também, porque algo que gostaríamos de abordar e de
formular a partir de Iser (2002): os espaços que “o jogo do texto abre” para a interpretação.
52
Na concepção de Iser (2002), o texto
36
é um campo de jogo, no qual os autores
incitam os leitores a jogar. Campo de jogo composto por um mundo que é esboçado de modo
a incitar o leitor a imaginá-lo e, por fim, a interpretá-lo (cf. ibid., p.107). Assim, dá-se uma
dupla operação: imaginar e interpretar; enquanto o leitor tenta visualizar as formas possíveis
do mundo identificável, o mundo contido no texto começa a se modificar, e todas as formas
que o leitor imagina transgridem e, consequentemente, modificam o mundo contido no texto
(cf. ibid.). Todo texto de ficção, segundo o estudioso, invoca um acordo entre autor e leitor
que se institui antes da leitura, no qual ambos aceitam que o mundo textual, embora não seja
real, de ser concebido como se fosse realidade; desta forma, embora o texto possa repetir
uma realidade identificável, não provoca consequências no mundo real referido, e, portanto, o
mundo repetível no texto é diferente daquele a que se refere, porquanto nenhuma descrição
pode ser aquilo que se descreve (cf. ibid.). Consequentemente, no texto surgem diferenças
que, segundo Iser, determinam vários “níveis de diferença” que se dão simultaneamente (cf.
ibid., 107-108): a) “Extratextualmente”: entre o autor e o mundo em que ele intervém, e entre
o texto e um mundo extratextual, assim como entre o texto e outros textos; b)
“intratextualmente”: entre os itens selecionados a partir de sistemas extratextuais e entre
constelações semânticas construídas no texto; c) “entre texto e leitor”: entre as atitudes
naturais do leitor (postas agora entre parênteses) e aquelas que lhe exigem adotar; entre o que
é denotado pelo mundo repetido no texto e o que essa denotação –agora a servir como um
análogo que guia– pretende transgredir.
As diferenças provocadas pelos diferentes níveis são –segundo Iser– as que constituem
o espaço vazio do texto que põe o jogo em movimento, sendo três os aspectos que
determinam que o movimento seja jogo: a) o confronto das posições diferenciáveis de cada
nível; b) a confrontação que provoca o movimento de ida e vinda (o movimento é básico para
o jogo e a diferença que dele resulta tem que ser erradicada para alcançar um resultado); c) o
36
Iser afirma que a relação entre o autor, o texto e o leitor deve ser concebida como um processo em andamento
que produz algo antes inexistente. Nessa relação, a concepção de texto é diferente da noção tradicional de
representação, na qual a mesis envolve uma “referência” pré-dada, que se pretende representar. A função de
representação sob a perspectiva aristotélica é dupla: “tornar perceptíveis as formas constitutivas da natureza” e
“completar o que a natureza deixara incompleto”; em nenhum dos casos a mímesis se pode limitar à mera
imitação do que é, uma vez que os processos de elucidação e complementação exigem uma atividade
performativa se as ausências aparentes hão de se transformar em presença (cf. ibid., p. 105). Desde o
acontecimento do mundo moderno, a tendência é privilegiar o aspecto performativo da relação autor-texto-leitor,
uma vez que o pré-dado não é visto como um objeto de representação, mas sim como o material a partir do qual
algo novo é modelado; o novo produto não é predeterminado pelas funções e estruturas do material referido no
texto (cf. ibid.).
53
movimento contínuo entre as posições que revela suas diferenças, considerando que cada
diferença abre espaço para o jogo e, daí, para a transformação (cf. ibid.) (grifos nossos).
O resultado do jogo textual é redutivo, pois aborta as possibilidades de multiplicidade
de sentidos, observa Iser; assim, quando se toma uma decisão, no sentido de acrescentar um
significado ao texto, o movimento do jogo se detém (cf. ibid.). O significado do texto,
segundo o autor, se transforma numa espécie de “suplemento” que é engendrado através do
jogo e isso significa que não há significado prévio ao jogo (cf. ibid., p. 109).
Iser (cf. ibid.) observa que da mesma forma que surge espaço entre autor e leitor,
também surge no texto literário, assim ele descreve três níveis nesse tipo de texto: a) o nível
estrutural, cujo objetivo é mapear o espaço; b) o nível funcional, que tentará explicar o
objetivo; c) o nível interpretativo, que se questionará por que jogamos e por que precisamos
jogar; a diferença surgida entre os diferentes níveis é a que provoca o movimento para diante
e para trás, e dessa forma abre os espaços do jogo entre as posições que separa (cf. ibid.).
O menor espaço do jogo, segundo Iser, é aquele produzido pelo significante fraturado,
e esse é, ao mesmo tempo, denotativo e figurativo: assim, o significante fraturado perde a
função denotativa para passar a ter a função figurativa, mas sem perder o que significava
como denotativo (o significado básico), assim, o movimento do jogo converte o significante
fraturado numa matriz de duplo significado: denotativo e figurativo simultaneamente,
invocando alguma coisa engendrada pelo texto, mas que não é pré-dada por ele (cf. ibid.).
Quando o leitor concebe o que o texto esboça, ele atribui um significado ao suplemento e, aí,
o jogo se encerra (ibid., p. 110-111).
Outro espaço do jogo é dado pelo esquema. Esse, segundo Piaget
37
(1975 apud, ibid.),
em sua teoria do jogo, é o produto do empenho que temos em nos adaptar ao mundo em que
estamos. Mas os esquemas não facilitam a adaptação ao mundo sico através de sua
internalização para que possam funcionar em nível subconsciente, também podem ser usados
para “moldar coisas de outro modo inapreensíveis”, ou seja, nos concedem a possibilidade de
assimilar objetos de acordo com nossas necessidades e/ou tendências (ibid., p.111). Quando
ocorre essa inversão de esquema de acomodação (o primeiro) para esquema de assimilação (o
segundo) é quando se produz a diferença e se abre o espaço do jogo (cf. ibid.). A diferença
acontece porque o esquema original fica em segundo plano; embora continue mantendo sua
forma original, é deslocado pelo esquema invertido (assimilação) que, no lugar de imitar algo,
serve para “representar” o “irrepresentável” (cf. ibid., p.112).
37
A obra de Piaget citada por Iser é Nachahmung. Spiel und Traum, Gesammelte Werke, 5, (Trad. Leo
Montada, Stuttgart, Ernst Klett, 1975, p. 178-216.
54
Assim, Iser observa que tanto o significante fraturado quanto o esquema invertido
abrem o espaço do jogo e põem o jogo em movimento, e o texto torna esse movimento uma
matriz geradora de algo novo (cf. ibid.). O movimento é dirigido por estratégias e cada
estratégia permite um tipo de jogo diferente. Existem quatro estratégias (cf. ibid., p.113): a)
Agon é o padrão de jogo quando o texto se centra em normas e valores conflitantes luta, é
debate); b) Alea é o padrão de jogo baseado na sorte e na imprevisibilidade (através da
desfamiliarização, atinge o inconcebível); c) Mimicy é um padrão de jogo designado para
criar ilusão (o denotado pelo significante deve ser tomado como o que diz); d) Ilix é padrão de
jogo em que as posições são subvertidas, canceladas, recortadas ou carnavalizadas (ressalta os
pontos de vista das posições assumidas no jogo) (grifos do autor).
Essas estratégias podem combinar-se de várias formas diferentes e segundo a
combinação cada uma assume um papel (cf. ibid., p. 114). Os jogos que resultam dos papéis
são produzidos de acordo com regras: reguladoras (funcionam de acordo com as convenções
estabilizadas), e aleatórias (liberam o restrito pelas convenções) (cf. ibid.). Segundo Iser:
[...] o jogo do texto não é nem ganho, nem perda, mas sim um processo de
transformação das posições, que uma presença dinâmica à ausência e alteridade à
diferença (ibid.).
e, consequentemente, o resultado do jogo nunca será pré-dado pelo texto; é o resultado da
transformação do material pré-dado contido no texto (cf. ibid.). A transformação se dirige
sempre a alguma meta a ser cumprida pelo leitor e, assim, o jogo do texto poderá ser
concluído de vários modos: a) em termos semânticos, pelo fato de ser traço dominante no ser
humano querer compreender as coisas, desviando-se do que não lhe é familiar; b) com intuito
de obter experiência: abrindo-se ao texto com o objetivo de que nossos valores sejam
influenciados e/ou modificados pelo texto; c) com intuito de obter prazer: dando precedência
ao deleite (cf. ibid., 116-117). Cada um desses modos, conclui Iser (cf. ibid.), representa uma
tendência com a qual pode ser realizado o jogo do texto.
Até aqui focalizamos o nível estrutural do texto literário e, também, a forma como ele
convida o leitor a entrar no jogo do texto, criado a partir das diferenças entre os níveis que
apresenta. No que se refere ao nível funcional do texto (qual a função do jogo?) –, Iser aponta
para a transformação como caminho de acesso ao inacessível, experiência que nos prazer
justamente porque nos concede atingir o inacessível. Já no nível interpretativo (“por que
jogamos e por que precisamos jogar?”), o autor explica que jogamos para ter acesso a um
meio que permite transpor fronteiras ao mesmo tempo em que satisfaz necessidades tanto
55
epistemológicas como antropológicas: epistemológicas porque nos impregnam a presença
com uma ausência (esboçada pelo texto e negada pela autenticidade do resultado do jogo, pois
esta é encenada ou representada); antropológicas porque nos permitem atingir aquilo que nos
é recusado (cf. ibid., p. 118). Portanto, o jogo do texto literário nos permite “estender a nós
mesmos” pelo fato de nos conceder tanto ter a ausência como a presença (ibid.).
Com base nas formulações de Iser, acreditamos que os espaços do “jogo do texto” que
se abrem à interpretação do sujeito leitor (cf. ISER, 2002) podem entrar em relação com o
espaço do equívoco e da historização dos sentidos de que fala Orlandi (cf. item 2 deste
capítulo) para formular seu conceito de leitura como processo discursivo. Parece-nos que
esses espaços (do “jogo do texto” e do equívoco) correspondem ao lugar da interpretação,
onde é possível produzir “outros sentidos” e onde se torna propício a produção do
“deslocamento”: explorar esse lugar é propiciar a possibilidade de que aconteçam
identificações, no registro do imaginário e do simbólico, por parte de um sujeito (cf.
ORLANDI, 2002a).
Como antecipamos no final do capítulo 1, acreditamos que a prática de leitura de
um certo tipo de literatura nas aulas de língua espanhola expode forma potencializada o
sujeito leitor ao lugar do “equívoco” e do “estranhamento”, forçando-o a entrar “no jogo do
texto” e de “encerrar” esse jogo alcançando o que ele acha ser “seu(s) significado(s)” (cf.
ISER, 2002). Parece-nos que o importante, no caso, é essa experiência de o sujeito entrar em
tal jogo (para encerrá-lo ou nele permanecer) a que poderá fortalecer a malha de sua
subjetividade explorando suas potencialidades pois, como investimento poderá vir a significar
certas inversões e promover a repetição histórica, necessária e fundamental para que um
sujeito se inscreva numa outra memória de dizer, lembrando que a materialidade da língua
espanhola, justamente e como observa Zoppi-Fontana (1995), expõe o brasileiro ao equívoco
na própria.
Para que, na prática de ensino de língua espanhola, o sujeito não seja uma vez mais “o
lugar cego que resulta automaticamente dos processos de identificação” (ORLANDI, 2002a),
queremos interferir nessa prática mediante gestos que propiciem a produção de um
transferencial isto é, marcado pelo deslocamento tanto no registro do imaginário quanto do
simbólico do sujeito da aprendizagem; por isso, construiremos instrumentos que nos
possibilitem propiciar e detectar tais deslocamentos nesses dois registros, como ficará exposto
no próximo capítulo.
56
CAPÍTULO 3
NOSSA EXPERIÊNCIA – CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO
Este capítulo, como anunciado, versará sobre nossa experiência piloto. Nele nos
centraremos em apresentar as condições de sua produção. No item 1, faremos uma descrição
geral de tal experiência para, no item 2, realizar a apresentação do recorte do corpus, fazendo
referência aos objetivos da experiência. No item 3, faremos a descrição da instituição e dos
vários aspectos que dizem respeito ao lugar (social, institucional) ocupado por nossos
aprendizes. Feito isso, no item 4, exporemos os programas do curso oferecido para os dois
grupos que participaram da nossa pesquisa, e faremos uma análise do livro didático adotado,
incluindo a antecipação do sujeito-leitor que este implica. Finalmente, ainda no item 4,
explicaremos como fizemos a seleção dos textos literários que incluímos nesse programa de
trabalho e quais foram as atividades realizadas no desenvolvimento dos cursos.
1. As linhas gerais da experiência
Começaremos dizendo que trabalhamos com dois grupos de ELE (A e B), em nível
Básico I. Ambos foram oferecidos pelo Departamento de Cursos de Extensão (DCEx) da
Universidade São Judas Tadeu. Como nesse Departamento os programas dos cursos de
espanhol se articulam com base no livro didático (doravante LD) Planeta E/LE da editora
Edelsa, esse foi também, em nosso caso, o instrumento que organizou os conteúdos a serem
oferecidos. No grupo A, as aulas se organizaram para dar conta do estudo das quatro
primeiras unidades do referido LD (relativas ao nível básico) e, no final do curso,
introduzimos a leitura de um texto literário, tal como será devidamente descrito no item
correspondente. No grupo B, a sequência das quatro unidades foi escandida pela introdução
de textos literários vinculados a práticas de leitura que também definiremos em detalhe ao
longo deste capítulo.
2. O corpus
O corpus do nosso trabalho está composto pelos enunciados das respostas aos
questionários aplicados aos grupos de aprendizes de língua espanhola, bem como pelas
produções escritas que estes fizeram ao longo do curso, como veremos detalhadamente a
seguir. Sua totalidade encontra-se gravada no CD que acompanha a presente dissertação.
57
Com relação aos questionários, devemos esclarecer que foram aplicados em ambos os
grupos, porém em dois momentos diferentes: um ao início e o outro ao final do curso. O
primeiro questionário, doravante Q1, foi preparado para que pudéssemos esboçar o perfil dos
aprendizes que frequentavam o curso, e detectar as imagens que eram capazes de projetar
sobre a língua espanhola, a literatura e a prática da sua leitura, no início desse curso. Além de
disponibilizá-lo na íntegra, tal como foi aplicado nos referidos grupos, o transcrevemos a
seguir:
1. ¿Cómo te llamas?
2. ¿De dónde eres?
3. ¿Dónde vives?
4. ¿Cuál es tu dirección?
5. ¿Dónde naciste? ¿Cuándo?
6. ¿Cuál es tu número de teléfono?
7. ¿Qué curso haces en la universidad?
8. ¿Ya has hecho algún curso universitario anteriormente? ¿Dónde? ¿Cuál?
9. ¿Has estudiado lengua o cultura hispánica anteriormente? ¿Dónde? ¿Por cuánto tiempo?
10. ¿A qué se debe tu interés por la lengua española?
11. ¿Te gusta leer?
12. ¿Con qué frecuencia lees y qué lees?
13. ¿Qué tipo de lectura te gusta más? ¿Por qué?
14. ¿Qué te parece la literatura? ¿Te gusta leer literatura?
15. ¿Te gustaría leer literatura en este curso de español? ¿Por qué?
16. ¿Qué esperas de este curso?
Com relação ao segundo questionário, doravante Q2, aplicado no final do curso,
tentamos medir a preferência dos aprendizes pelos tipos de texto que tinham aparecido ao
longo do curso, além de tentar detectar se tinham surgido novas imagens sobre a ngua
espanhola, a literatura e a prática de sua leitura. Transcrevemos a seguir as perguntas do Q2,
esclarecendo que se encontra na íntegra, tal como foi entregue aos alunos, no:
Evalúa las respuestas a las siguientes preguntas atribuyéndoles una puntuación de 1 a 3,
considerando que 1 es la máxima puntuación que puedes atribuir y que 3 es la mínima.
1. A lo largo del curso hemos leído varios tipos de textos. ¿Cuál te ha gustado más?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
¿Por qué?
2. ¿Qué tipo de texto te resultó más fácil de leer?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
3. ¿Qué tipo de texto te ha producido mayor placer al leerlo?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
4. ¿Con qué tipo de texto te ha parecido que consigues aprender más sobre la lengua
española?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
58
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
¿Por qué?
5. ¿Qué tipo de texto te ha motivado más para estudiar la lengua española?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
6. ¿Qué imagen tienes de la lengua española al terminar el curso?
- Una lengua para el mercado de trabajo ( )
- Una lengua de cultura ( )
- Una lengua que sirve para viajar y hacer nuevos amigos ( )
7. ¿En el Básico II, próximo módulo del curso de español, con qué tipo de texto te
gustaría trabajar más?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
8. ¿Después de haber terminado este curso ha cambiado tu opinión sobre la lengua
española? ¿Por qué?
Sí ( ) No ( ) Un poco ( )
9. ¿Qué actividades te han gustado más en el curso? Clasifica de 1 a 6, siendo 1 la
puntuación máxima y 6 la mínima).
- Escuchar grabaciones de los diálogos ( )
- Leer los textos del libro ( )
- Leer textos literarios
- Escribir ( )
- Hablar ( )
- Hacer ejercicios de gramática( )
Vale ressaltar, ainda com relação à produção dos questionários, que deixamos aos
pesquisados o critério de responder às perguntas em português ou em espanhol. Antes dos
alunos responderem aos questionários, lemos todas as questões em voz alta e respondemos a
todas as dúvidas que foram surgindo; em alguns casos, sobretudo na aplicação do Q1, usamos
o recurso da tradução à língua portuguesa. Optamos por realizar os questionários em língua
espanhola para explorar a possibilidade de entrar em contato com essa língua também nessa
ocasião.
no que se refere à outra parte de nosso corpus, isto é, às produções escritas pelos
aprendizes obtidas nas atividades realizadas no decorrer do curso, o objetivo era detectar e
analisar as marcas discursivas que pudessem indicar possíveis deslocamentos nas posições-
sujeito (cf. Pêcheux, 1988), tentando fundamentalmente estabelecer uma comparação entre a
produção dos aprendizes do grupo A com a do grupo B.
3. Sobre a instituição e nossos aprendizes
A Universidade São Judas Tadeu é uma instituição privada de ensino superior da
cidade de São Paulo, que possui dois campi, um no bairro da Mooca e outro no bairro do
Butantã. Além de oferecer cursos de graduação e de pós-graduação, tanto no nível latu sensu
59
como estrictu sensu, a instituição tem um departamento de cursos de extensão (DCEx), dentre
eles os de língua estrangeira, tanto para seu corpo discente quanto docente.
O Curso de Espanhol é ofertado pelo DCEx dividido em seis módulos, dois para cada
nível (Básico, Intermediário, Avançado), com uma carga horária de 48 horas/aula cada um. O
livro adotado é Planeta E/LE, publicado pela editora Edelsa.
Todos os alunos que frequentaram as aulas dos dois cursos Básicos de Espanhol 1 da
Universidade São Judas Tadeu eram regularmente matriculados na graduação dessa
instituição. Pelo fato de ser um curso livre e pago, nem sempre o departamento responsável
consegue adesões suficientes para a abertura de turmas. Em razão disso, o curso Espanhol 1
foi oferecido à comunidade discente excepcionalmente de forma gratuita a fim de garantir,
para a realização de nossa pesquisa, duas turmas de no mínimo 10 e no máximo 20 alunos.
Embora o curso fosse gratuito, as normas seguidas foram as praticadas habitualmente pelo
DCEx para quaisquer cursos de extensão oferecidos por esse departamento: 75% de
frequência obrigatória e bom aproveitamento do curso. A seleção dos alunos dos dois cursos
que participaram de nossa experiência piloto foi realizada pelo próprio DCEx, considerando a
ordem de inscrição e a avaliação do histórico escolar dos interessados. Nossa forma de
avaliação consistiu na correção de vários exercícios, produções escritas e orais, e a aplicação
de uma prova escrita. Ao término do curso, como é de praxe no DCEx dessa instituição, os
alunos que obtiveram a frequência mínima exigida e mostraram um bom aproveitamento
receberam um Certificado da Universidade São Judas Tadeu, fato que mencionamos porque,
com a obtenção de tal documento, todos os alunos podem convalidar a carga horária de 48
horas como atividades complementares obrigatórias dos cursos de graduação.
No caso dos dois cursos que oferecemos, a grande maioria dos aprendizes não tinha
ainda nenhum curso superior completo, como fica registrado ao ler o gráfico 2, do Anexo 5
38
(A5 G2), e era oriunda do curso de Administração de Empresas. No grupo A, os 18 alunos
que o integravam provinham desse curso; no grupo B, de um total de 16 alunos, 4 eram de
Ciências Contábeis e 1 de Desenho Industrial.
Dentre os 34 alunos que constituíram os dois grupos, mais da metade dos nossos
sujeitos-aprendizes tinha entre 19 e 25 anos de idade (A5 G1), e todos fizeram o ensino
fundamental e médio na escola pública. Boa parte do grupo provinha de uma classe social de
baixo poder aquisitivo e frequentava a faculdade como beneficiária de bolsas de estudo, sendo
38
Ver no Anexo 5, Gráfico 2. Doravante, faremos esta referência colocando A4-G2.
60
que, o primeiro contato com a língua espanhola em uma situação de aprendizagem formal (A5
– G3) foi através dos nossos cursos.
A seguir apresentaremos o programa do curso.
4. Programa do curso
Foram seguidos dois programas, um para cada grupo. As aulas do grupo A se ativeram
ao programa, às atividades e aos exercícios das quatro primeiras unidades do livro Planeta
E/LE 1, e aos correspondentes do seu livro de exercícios. Acrescentamos a leitura de um
conto, sem avançar em outras atividades, como descrito no plano de curso que se encontra no
Anexo 4. A inclusão de apenas um texto literário no grupo A teve como objetivo oferecer
uma amostra para que o aluno pudesse ter um parâmetro comparativo e, assim, pudesse se
manifestar com relação aos textos que classificamos do seguinte modo: a) diálogos do LD, b)
outros textos do LD, c) textos literários, introduzidos por nós em nossos programas.
39
o grupo B teve o mesmo programa, entretanto foram substituídas as atividades
denominadas “350 millones”, presentes em cada unidade do Planeta E/LE 1, por um texto
literário com atividades desenhadas por nós, conforme veremos mais detalhadamente ainda
neste capítulo.
Passemos, neste ponto, a apresentar a análise do livro didático adotado.
4.1 Análise do livro didático: Planeta E/LE 1
Planet@ de Matilde Cerrolaza, Oscar Cerrolaza e Begoña Llovet é um livro didático
destinado ao ensino do espanhol como língua estrangeira procedente da Espanha e editado
pela Edelsa. Está articulado em quatro volumes (Planeta, 1, 2, 3, 4). Cada volume tem em
torno de cinco unidades temáticas e cada unidade está organizada em seis seções seguidas a
rigor: Introducción al tema”; “Órbita 1”; “Órbita 2”; “Tarea Final”; “350 millones”;
“Recuerda”; “En Autonomía”. Acompanha cada volume um caderno de exercícios chamado
Libro de referencia gramatical: fichas de ejercicios”. A coleção oferece ainda para o
professor, além dos referidos materiais, o Guia didático, um CD com as gravações para os
exercícios de compreensão auditiva, uma pasta com transparências como material de apoio
39
Todos esses textos que acabamos de enumerar encontram-se no Anexo 6 (todos os textos do LD) e no Anexo 7
(todos os textos literários selecionados por nós) desta dissertação.
61
para as aulas e um vídeo com imagens que ilustram ou acompanham as gravações dos
exercícios de compreensão auditiva.
Esse material foi lançado em 1998 e teve um grande apogeu no Brasil logo de início,
sendo adotado, dentre outras, por instituições de ensino de São Paulo de grande renome, como
os Cursos de Espanhol do Colégio Miguel de Cervantes, a Coordenadoria Geral de
Especialização, Aperfeiçoamento e Extensão da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (COGEAE - PUC/SP), o Colégio Visconde de Porto Seguro, o Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial (SENAC), bem como por escolas de idiomas como a WIZARD. O
material foi apresentado no Brasil como Planet@ - Versión Mercosur, que consta de um
anexo ao livro original cujo objetivo, segundo se depreende da leitura da introdução, é
apresentar amostras das variantes iberoamericanas e tratar dos aspectos contrastivos entre
espanhol e português. Já o Libro de referencia gramatical se apresenta sob o nome de
“Versión Brasileña” com a inclusão, no final dele, Diccionario de Falsos Amigos Español
Portugués, Portugués Español de Balbina Lorenzo Feijóo e Rafael Eugenio Hoyos-
Andrade.
Planet@ teve grande aceitação no Brasil por se tratar do primeiro material de
ensino/aprendizagem formal de ELE que se apresentou sob a perspectiva do enfoque
comunicativo com ênfase no “enfoque por tareas” A editora o apresenta até hoje com o
seguinte enunciado: Planet@, como última evolución del método comunicativo, propone los
planteamientos metodológicos y estratégicos más modernos para la adquisición del Español
como Lengua Extranjera” (grifos nossos)
.
40
Corroborando essa ideia de “última evolución del método comunicativo”, os autores
definem o livro, na sua Introdução, como um novo manual que se enquadra numa
metodologia eclética sob um novo conceito pedagógico no âmbito do ensino de idiomas que
tem como base o enfoque comunicativo, princípios oriundos da revalorização do sujeito-
aprendiz e da dimensão psicológica e emocional da aprendizagem e da pedagogia do positivo
(cf. CERROLAZA, [...], LLOVET, 1998, p. 3, tradução nossa).
É interessante observar as designações de “novo” e de “novidade”, que produzem o
efeito de inovação, de transformação, quando, em síntese, como conseguiremos mostrar, este
LD parafraseia, reproduz uma tradição de ensino de espanhol fortemente marcada pela
presença de conteúdos, de regras e de observações gramaticais. Com base em observações de
40
Disponível em:
http://www.edelsa.es/cata.php?tematica=metodos&tipo=catalogo&nivel=1. Acesso em:
20/05/2009.
62
Coracini (1999), poderíamos dizer que, como em toda abordagem inovadora de
ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras, o autor de LDs “não se conta” de que apenas
desloca o seu olhar de uma forma para outra: “não o enfoque comunicativo tal como vinha
sendo trabalhado”, mas “a última evolução do método comunicativo”; não apenas os
exercícios gramaticais ou a simples produção de um texto, mas uma tarefa final coroando
cada unidade. Embora as bases teóricas do enfoque comunicativo anunciem um equilíbrio
entre as destrezas, Planet@ privilegia nitidamente a linguagem oral. Segundo os autores, a
“Práctica Global” da “Órbita 1 nome dado às partes que compõem cada uma das unidades
corresponde a uma atividade significativa na qual se exercita a competência comunicativa,
mobilizam-se os recursos obtidos na órbita em questão e se ativam as destrezas. Dessa forma,
na primeira “Práctica Global”, a atividade proposta é preencher os dados de um documento
(Documento Nacional de Identidade da Espanha), para depois conversar com os colegas e
verificar se há alguma semelhança com os dados por cada um deles utilizados.
Esse privilegiar a linguagem oral pode ser colocado em relação com uma instância que
compreendemos como política: o Planet@ ELE 1 contextualiza de forma específica a maioria
de seus exercícios e atividades de modo a preparar o aprendiz para ter uma experiência (de
intercâmbio, de estudo) na Espanha. Por exemplo, a primeira “Tarea Final”
41
solicita do
aprendiz que preencha um formulário, destinado a estrangeiros residentes na Espanha, para
solicitar permissão de trabalho.
A seguir analisaremos Planet@ ELE 1 com o objetivo de descrever o ponto de contato
que se trava com os espaços jurídico, econômico e político descritos por Nunes (2003) como
as três instâncias ideológicas determinantes na produção de leitura, apresentadas no
capítulo 2. Acreditamos que a partir da análise que faremos sobre como essas instâncias
permeiam o material didático, e mais especificamente as atividades de compreensão escrita
propostas, poderemos levantar indícios sobre como é concebido o sujeito-leitor e de que
forma este material didático determinará certos gestos de leitura.
Começaremos pela análise da instância do jurídico, apontada por Nunes (2003), que se
deixa transparecer pelo funcionamento da regra, sua aplicação e sua interpretação. O livro
Planet@ ELE 1 norteia-se pelo estudo da gramática uma vez que cada unidade, sobre uma
área temática e por meio dos expoentes funcionais, apresenta uma sistematização gramatical
que o aluno tem que aplicar na realização dos exercícios. Essa rotina de trabalho estabelecida
41
O objetivo da “Tarea Final” das unidades do Planet@, segundo os autores, é que o aluno coloque em prática
todos os conteúdos aprendidos até aquele momento, o que lhe permitirá grande autonomia e tomada de decisões
(cf. CERROLAZA M., [...], O. LLOVET, B. 1998, p. 3).
63
pelo LD nos permite observar que é possível que o aluno interprete que, se ele aprender bem a
regra, será “bem sucedido” nas práticas que o livro solicita. Fazemos esta observação
pensando, a partir de formulações de Orlandi (2002a, p. 208), que se trata aqui da repetição
formal que consiste justamente na mera aplicação de uma regra. Por meio dessa rotina, o
aluno percebe uma maneira de obter os resultados esperados e vai construindo seu modo de
ler de forma linear e unívoca, construindo assim uma imagem da língua estrangeira e de seu
funcionamento como se estes se reduzissem a um conjunto de normas e de vocabulário. Dessa
forma, o aprendiz crê que apenas conhecendo a gramática e o vocabulário terá o domínio do
idioma e conseguirá se comunicar perfeitamente em qualquer situação.
Ao relacionar Planet@ ELE 1 com a instância do econômico, constatamos que o livro
apresenta uma grande poluição” visual, devido à coexistência de diferentes materialidades
textuais, propiciadas pelas novas tecnologias, em um mesmo espaço. Trata-se de fotos,
desenhos, gráficos, tabelas, entre outros, apresentados ao aluno a fim de facilitar-lhe a
assimilação do conteúdo, com o “máximo de informação” e o “mínimo de leitura” (cf.
NUNES, ibid., p. 39). Isso, ainda com base em formulações desse estudioso, coloca o aluno
num espaço lógico-pragmático de urgências, decisões e escolhas, tornando-o impotente para
produzir sentidos de outro modo (cf. ibid., p. 38). Por exemplo, na atividade “350 millones
referente à primeira unidade, o aluno se depara com um texto escrito muito simples do lado de
um mapa e seguido de uma planilha com registros estatísticos e um gráfico
42
. Frente a essa
diversidade de materialidades, a leitura é facilitada e o aluno realiza a tarefa proposta sem
precisar refletir, pois apenas deverá registrar as “informações” ou os “dados” literalmente
dados na planilha, no mapa, no texto escrito, e no gráfico. A leitura é realizada sobre
materialidades que se apresentam em espaços logicamente estabilizados, daí que o exercício
de ler se articule sobre as noções de rapidez, otimização e produtividade, próprias do discurso
econômico que vigora na sociedade atual. Com isso, o aluno é forçado à interpretação única,
aquela que preexiste à sua leitura, uma vez que o próprio exercício de compreensão visa a
“repetição empírica” (cf. ORLANDI, 2002a) das informações do texto.
Pensando, agora, em vincular o LD à instância do político (NUNES, 2003), podemos
observar que tal instância permeia o livro Planet@ ELE 1 indicando uma matriz ideológica
que diz respeito ao “prestígio da língua espanhola” enquanto a sua presença no mundo
pessoas que falam essa língua, países em que é oficial assim como a “soberania da Espanha
sobre os países hispano-americanos”, especialmente no que tange ao âmbito econômico. Com
42
Ver no Anexo 6, texto 3a. Doravante, faremos esta referência colocando A6-T3a.
64
relação ao “prestígio da língua espanhola”, podemos citar a seção denominada “350
millones”, recorrente em cada unidade do livro, que faz referência explícita à presença dessa
língua no mundo. Nessa seção, a atividade proposta na primeira unidade trata dos países que
têm como língua oficial o espanhol (A6-T3a e T3b); na segunda unidade, trata dos problemas
das grandes cidades, colocando como exemplo Lima e Buenos Aires (A6-T9a e T9b); na
terceira, expõe o perfil da família média na Espanha e na Argentina (A6-T13a e T13b); na
quarta, trata da povoação indígena do continente americano (A6-T20a-b-c-d); e na quinta e
última unidade do livro (que não entrou em nosso programa de Básico I), apresenta as datas
de fatos históricos relevantes na Espanha e no México.
43
Com relação à “soberania da Espanha sobre os países hispano-americanos”, podemos
destacar os textos que fazem referência ao grande número de imigrantes oriundos dos países
sul-americanos e africanos naquele país, que faz parte da Comunidade Europeia, tal como se
explicita na unidade 5 do LD. Já quando são abordados os países hispano-americanos,
apontam-se os problemas, os dados étnicos e as culturas indígenas necessitadas de apoio
internacional. Assim, podemos observar que nos dois textos apresentados na seção “Órbita 4”
intitulados: “La familia Pérez vive en Espana” (A6-T14) e “La familia Gutierres vive en la
Sierra de Perú(A6-T15) discutem-se as atividades cotidianas dos membros de cada uma das
famílias. Uma das particularidades do pai da família espanhola é que colabora como
voluntário em uma ONG, enquanto a mãe trabalha como voluntária um dia por semana
ensinando espanhol a imigrantes. Ela apadrinha um menino do Peru que, coincidentemente, é
o filho da família Gutierres e que pode ir à escola graças a ser apadrinhado por essa família.
Essas marcas nos dão indícios de uma ideologia que perpassa o livro Planet@ ELE 1,
dando destaque, como acabamos de apresentar, à presença da língua espanhola no mundo e à
soberania da Espanha sobre os países hispano-americanos. Nesse sentido, o LD se inscreve
numa discursividade cuja circulação permeia diversos âmbitos do ensino da língua espanhola
no Brasil, vinculada ao Estado Espanhol e a instâncias bancos, editoras, grandes firmas
que promovem essa língua como “recurso econômico” (cf. FANJUL, 2008). Corroborando a
ideologia da hegemonia da Espanha frente aos outros países hispânicos, Berdugo (2001)
mostra que a expansão do espanhol como língua veicular é uma vantagem para a Espanha,
que ela se coloca como elo entre a Europa e a comunidade hispânica mundial: “La posición de
43
Todos esses temas são sempre tratados com ênfase nos números: na primeira unidade registram-se quantos
países falam espanhol e quantos habitantes tem cada país; na segunda, quantos são os lugares de interesse e quais
os problemas das capitais dos países latino-americanos apresentados; na terceira, quanto ganha uma família
espanhola e uma argentina e quanto gastam com alimentação; na quarta, quantos indígenas em cada um dos
países da América Hispânica; por último, na quinta unidade, são registradas as datas de acontecimentos
históricos da Espanha e do México.
65
España como puente o como nexo entre Europa y el resto de la comunidad hispanohablante
puede colocarnos en una situación de privilegio con respecto al mercado europeo.”
Planet@ ELE 1, com sua concepção gramatical da língua espanhola, apresenta-se
como um instrumento linguístico que coloca a Espanha e a língua espanhola numa posição
dominante ao mesmo tempo que reduz a língua. Corroborando essa ideia, Auroux (2001)
declara: “do mesmo modo que um martelo prolonga o gesto da mão, transformando-o, uma
gramática prolonga a fala natural e dá acesso a um corpo de regras e de formas que não
figuram junto na competência de um mesmo locutor” ( p. 69). No livro há uma clara redução
da língua a uma única função, a comunicativa, que subjaz à gramática e ao vocabulário,
apagando dessa forma a complexidade que qualquer língua tem na vida humana, seja como
organizadora do mundo cognitivo, seja como participante da produção imaginária e do não
comunicável, entre outros (cf. FANJUL, 2008). Com o intuito de promover e de expandir o
espanhol, mais uma vez, acaba-se encobrindo a diferença própria da língua, mediante a
retomada de gestos de um processo de gramatização tradicional (conteúdos e regras
gramaticais), como antecipamos, e submetendo-o a uma “nova forma”: a
instrumentalização ao serviço da comunicação imediata e da solução, como dissemos, das
urgências de um sujeito pragmático.
44
Esse processo de gramatização, que retoma o
tradicional sob a forma do “novo” (cf. supra), tem implicâncias políticas. E, nesse
reducionismo da língua, a leitura acaba sendo afetada, uma vez que se evidencia uma relação
direta e unívoca entre as palavras e as coisas, como se o significado das palavras fosse
inerente a elas e coubesse ao aluno apenas extraí-lo.
Outra característica marcante do livro Planet@ E/LE 1 é a quase inexistência de
seções de leitura, em detrimento da ênfase dada à produção oral. Os tipos de texto são sob a
forma de diálogos e/ou de pequenos textos fabricados
45
a partir dos expoentes funcionais que
vão pautando a gramática e o vocabulário apresentados numa sequência hierárquica que
obedece ao grau de complexidade linguística. Os exercícios de expressão escrita solicitados
aos aprendizes ora se limitam ao reconhecimento e à cópia de informações explícitas no texto
(repetição empírica), ora a escrever um texto no molde do apresentado por esse LD (repetição
formal). Por exemplo, na seção “350 millones” da unidade três do livro
i
, são apresentados
44
Segundo Auroux (2001): “Por gramatização deve-se entender o processo que conduz a descrever e a
instrumentar uma língua na base de duas tecnologias, que são ainda hoje os pilares de nosso saber
metalingüístico: a gramática e o dicionário (p. 65). Porém, mais do que uma descrição metalingüística, o
processo de gramaticalização proporciona a Ocidente um meio de conhecimento e dominação sobre as outras
culturas do mundo, dessa forma a gramática e o dicionário são concebidos pelo autor como verdadeiros
instrumentos lingüísticos que mudam a ecologia da comunicação (cf. AUROUX, 1998: apud, DINIZ, 2008, p.
31) (grifos nossos). AROUX, La Raison, le langage et les normes. Paris: Presses Universitaire de France, 1998.
45
No Anexo 6 desta dissertação, colocamos os textos das quatro primeiras unidades do Planet@ E)LE 1.
66
dois textos, um que discorre sobre a típica família de classe média espanhola (A6 –T13a) e o
outro sobre a Argentina (A6 –T13b). O exercício de compreensão propõe as seguintes
questões: “¿Cómo es la familia?, ¿Qué cosas tienen?, ¿Cuál es la renta per capita?, ¿Qué es lo
más importante para cada familia?”. O aprendiz precisa apenas copiar um trecho do texto para
responder às perguntas. E como atividade final ele deve escrever um pequeno perfil da família
de classe média brasileira, ou seja, ele reproduz o modelo do texto desse LD, somente deve
mudar algumas informações pontuais, como mero de filhos, metros quadrados da casa,
renda per capita, entre outras. Assim, os textos apresentam-se sem história e ficam reduzidos a
um conjunto de palavras e frases, com um sentido pré-dado e sem relação com a “vida do
aluno-leitor”, o que comporta uma “quebra com a historicidade” (GRIGOLETTO, 1999,
p.84).
Tanto no que tange à compreensão de textos como à sua produção, a disseminação de
sentidos não é facilitada, já que as atividades propostas visam o mero exercício de língua,
priorizando a correção gramatical e o uso do vocabulário com um único sentido. Como afirma
Coracini “[...] ler em aula de língua estrangeira equivale a realizar mais [...] um exercício de
língua, de gramática e vocabulário.” (1999, p. 13), não permitindo que o aluno acrescente ao
texto “um novo fio”(ibid), por outras palavras, não permite que ele deixe suas marcas ao se
significar, ao interpretar.
Concluímos assim que o material didático analisado, Planet@ E/LE 1, convoca o
sujeito-aprendiz à “repetição empírica” e à “repetição formal” dificultando a “repetição
histórica” (ORLANDI, 2002a, p. 208) e a construção de sentido na sua necessária
historicidade.
Passaremos, neste ponto, a realizar a apresentação dos parâmetros que nortearam a
seleção dos textos literários introduzidos no programa do grupo A e do grupo B.
4.2 A seleção dos textos literários
As motivações que levam a escolher textos literários para serem lidos na aula de ELE
podem estar relacionadas ao que classificamos, a partir de nossas observações na prática
docente, como: razões de cunho linguístico-discursivo, cultural e/ou afetivo. As primeiras, de
cunho linguístico-discursivo, tentam contemplar a facilidade e/ou dificuldade de compreensão
que o texto escolhido apresenta, por exemplo, em termos de aspectos temporais: marcadores
de tempo, tempos e modos verbais; em termos de vocabulário, o campo lexical com o qual
queremos que o aluno se familiarize; ou ainda, em termos de gênero, quais procedimentos de
67
coerência e coesão queremos que ele conheça. As segundas, de cunho cultural, seriam as que
levam à escolha de determinados textos literários com o intuito de aproximar os alunos aos
expoentes “consagrados” (em diferentes âmbitos e com diferentes sentidos) da literatura
espanhola e hispano-americana mediante as obras dos grandes autores, épocas e/ou
movimentos literários. Seria o caso de textos emblemáticos do ensino do ELE, como El
ingenioso hidalgo Don Quixote de La Mancha, Cien años de soledad, bem como textos de
escritores como Pablo Neruda, Federico García Lorca, Lope de Vega, Julio Cortázar, entre
outros. as terceiras, de cunho afetivo, são as que levam o docente pelo simples prazer de
sua leitura e por acreditar que seus alunos possam usufruir do mesmo gosto/ prazer. É uma
forma que os docentes têm de compartilhar as leituras das quais gostam, ora porque estas lhes
provocam determinados sentimentos de estranhamento ou por se reconhecerem neles, ou
ainda por reconhecerem um cenário que lhes é familiar e que os ajuda para a compreensão do
mundo. De fato, esse tipo de escolha nem sempre tem razões que possam ser explicitadas.
Existem outras razões, além das descritas acima, que podem dirigir a seleção dos textos
literários a serem usados dentro da sala de aula, mas não vamos aprofundar nelas, uma vez
que fogem do escopo de nosso estudo. Em nosso caso, essa série de fatores não deixava de
estar presente, porém, o que mais nos orientava na seleção dos textos era a série de razões que
expussemos no item 3 do capítulo 2 desta dissertação. Nesse sentido, queremos dar destaque
para uma observação: não buscávamos instrumentalizar a literatura, queríamos explorar o que
ela carrega, como a prefiguração mais próxima do funcionamento do real da língua e,
também, queríamos aproveitar que nela “a língua chega toda” interferindo na gradação à
qual a língua ficava submetida no do LD que já apresentamos.
No contexto da instituição na qual realizamos nossa experiência, o programa do curso
ficou fortemente subordinado ao livro Planet@ E/LE 1 devido, como observamos, a uma
questão institucional. Conhecendo os textos pré-definidos pelo livro didático adotado e de
acordo com nossa proposta de leitura literária, decidimos adotar textos do gênero fantástico e
narrativas breves.
A escolha de textos breves entre os quais também incluímos narrativas breves e
contos – deu-se porque permitiria que os alunos realizassem sua leitura (e re-leituras) no curto
espaço de tempo da aula. Já a decisão pela escolha do gênero fantástico teve como base a
conceitualização elaborada por Todorov (2007), que passamos a apresentar, por causa da
produtividade que pode vir a ter na pesquisa que desenvolvemos.
Segundo o autor (ibid.), a literatura fantástica caracteriza-se como uma variedade da
literatura ou, como se diz comumente, um gênero literário. Ele procura definir uma regra que
68
funcione para os textos e que permita classificá-los como obras fantásticas; nesse sentido,
afirma que “o fantástico é a hesitação experimentada por um ser que conhece as leis
naturais, face a um acontecimento aparentemente sobrenatural” (ibid., p. 31). A partir da
formulação dessa regra, são necessárias três condições para que uma obra possa ser
classificada como fantástica (cf. ibid., p. 37-39): a) a primeira é a hesitação; ou seja, precisa-
se de um elemento estranho que a provoque; b) a segunda condição é a necessidade de o leitor
se identificar com uma das personagens; c) a terceira é a de o leitor não poder fazer nem uma
interpretação alegórica nem uma interpretação poética da leitura do texto. A primeira e a
terceira dessas condições são as que constituem principalmente o gênero, sendo que a
segunda, de acordo com Todorov, não é imprescindível (cf. ibid.).
Para o autor, o fantástico se situa no limite entre dois gêneros: o estranho e o
maravilhoso (cf. ibid., p. 50). O estranho acontece quando os fenômenos descritos são
explicáveis, o maravilhoso, quando os acontecimentos não se explicam; nas palavras de
Todorov:
O fantástico [...] dura apenas o tempo de uma hesitação: hesitação comum ao
leitor e à personagem, que devem decidir se o que percebem depende ou não da
“realidade”, tal qual existe na opinião comum. No fim da história, o leitor, quando
não a personagem, toma contudo uma decisão, opta por uma ou outra solução,
saindo desse modo do fantástico. Se ele decide que as leis da realidade
permanecem intactas e permitem explicar os fenômenos descritos, dizemos que
a obra se liga a um outro gênero: o estranho. Se, ao contrário, decide que se devem
admitir novas leis da natureza, pelas quais os fenômenos podem ser explicados,
entramos no gênero do maravilhoso (ibid., p. 47-48) (grifos nossos).
Até o momento apresentamos as definições do fantástico, mas não abordamos a
“função” que a leitura dessa literatura teria em nossos cursos, razão crucial pela qual
escolhemos esse gênero, pensando o fantástico como uma função que atravessaria a prática de
ensino, abrindo potencialmente um espaço para o sujeito se relacionar com a língua
estrangeira a partir de lugares e sentidos estranhos, não conhecidos e não estabilizados, e
interferindo assim na relação pragmática que o LD trava entre esse sujeito e o mundo. Tratar-
se-ia de uma tentativa de reforçar o sentimento de estranhamento vinculado ao de
transgressão.
46
Nesse sentido, vale a pena tomar uma das conclusões que formula Todorov ao
afirmar que “[...] o fantástico permite franquear certos limites inacessíveis [...]” embora
possamos duvidar que os acontecimentos sobrenaturais não sejam mais que pretextos; por
46
Segundo Todorov, durante muito tempo o fantástico teve a função social que mais tarde foi ocupada pela
psicanálise:
[...] a Psicanálise substitui (e por isso mesmo tornou inútil) a literatura fantástica. Não se tem necessidade hoje de recorrer ao
diabo para falar de um desejo sexual excessivo, nem aos vampiros para designar a atração exercida pelos cadáveres: a
Psicanálise, e a literatura que, direta ou indiretamente, nela se inspira, tratam disto tudo em termos disfarçados (ibid., p. 169).
69
isso, acrescenta, “a função do sobrenatural [no gênero fantástico] é subtrair o texto à ação da
lei e com isto mesmo transgredi-la” (ibid., p. 167-168). Com relação à função literária do
fantástico, sabe-se que “[a] narrativa elementar comporta dois tipos de episódios: os que
descrevem um estado de equilíbrio ou desequilíbrio, e os que descrevem a passagem de um a
outro” e a intervenção do sobrenatural facilita, torna mais cômoda e rápida essa passagem (cf.
ibid., p. 172-73). Portanto, “quer seja no interior da vida social ou da narrativa, a intervenção
do elemento sobrenatural constitui sempre uma ruptura no sistema de regras preestabelecidas
e nela encontra justificação” (ibid., p. 174).
Pelas especificidades que a literatura fantástica apresenta a hesitação, o elemento
sobrenatural –, acreditamos que este gênero potencializaria o efeito que a leitura de textos
literários tem sobre o sujeito-leitor. Pensamos que o fantástico poderia precipitar o
deslocamento do sujeito aprendiz em relação a formas de dizer habituais no território
conhecido de sua língua de origem e a sentidos cristalizados e legitimados aos quais se
submete.
A seleção de textos literários foi realizada, fundamentalmente, para construir o
programa do curso de Espanhol Básico I, correspondente ao grupo B, com o qual se fez a
leitura e as atividades de cada um dos textos literários escolhidos
47
. Embora fosse realizada a
leitura de um dos textos para o grupo A
48
, não se avançou com as atividades, objetivando que
esse grupo de aprendizes pudesse ter um contato com a materialidade literária e assim detectar
a impressão que eles tinham a partir da observação em sala de aula e das respostas do Q2.
Ao escolher cada texto, levamos em consideração o gênero, sua extensão, certos
parâmetros linguístico-discursivos, o interesse que poderia suscitar nos alunos, além do fato
de serem textos muito significativos para nós, como docentes. Cabe observar que dois dos
quatro textos que iríamos utilizar na sala de aula tinham alguns aspectos em comum: o autor e
o tema. Trata-se de “Animales en los Espejos” (de El Libro de los Seres Imaginarios, 2005) e
de “Borges y Yo” (de El hacedor
49
, narrativa presente em Obras Completas: 1923-1972,
1974), ambos do escritor argentino Jorge Luis Borges. Os dois abordam o duplo; no primeiro,
o narrador descreve dois mundos, o especular e o humano; no segundo, trata-se da dualidade
do ser.
no que se refere aos outros dois textos escolhidos, que descrevemos a seguir, pouco
tinham em comum, com exceção de ambos pertencerem também ao gênero fantástico e de
47
Os textos literários escolhidos encontram-se no Anexo 7 desta dissertação.
48
Ver plano de aula Anexo 4.
49
Informação disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Borges_y_yo. Acesso em: 20/01/2009.
70
terem como tema a morte. O primeiro desses contos é “El Almohadón de Plumas” (em Todos
los Cuentos, 1997), do uruguaio Horacio Quiroga. Nele, narra-se minuciosamente a agonia
vivida pelas duas personagens frente ao adoecimento inexplicável e sem causas aparentes
sofrido por Alicia que, aos poucos, vai se extinguindo na morte. Pela falta de certezas sobre o
que acontece durante a narração, o leitor consegue encontrar explicações dentro da própria
narrativa. É no fim do conto que o narrador revela a causa da morte de Alicia: um ser
monstruoso encontrado no travesseiro de plumas da personagem é o responsável pelo destino
irreversível e inexorável que a leva à morte. o conto “El Árbol de Orofaz parte de uma
coleção de histórias curtas denominada Historias de Altamira (1961)
50
da escritora espanhola
Ana Maria Matute.
Ao redor desses quatro textos organizamos uma série de atividades que articularam a
experiência de leitura de literatura realizada fundamentalmente no Grupo B; a partir de tal
experiência, os alunos produziram textos escritos que, como já antecipamos, integram o
corpus que analisaremos no capítulo 4.
4.3. Sobre como articulamos a experiência de ler os textos literários
A primeira aproximação ao texto (no caso do grupo A, a única) foi sempre realizada
mediante a leitura em voz alta, efetuada pelo professor do curso. Várias foram as razões para
tal. A primeira delas respondia à imagem que os aprendizes têm da língua espanhola, que
identificam como “bonita”. Segundo Souza Junior, esta imagem é uma das que impele os
alunos a estudar e, também, funciona como um dos pivôs que sustento ao processo de
ensino-aprendizado dessa língua (cf. 2008, p, 30). Essa imagem está presente nos enunciados
das respostas dos questionários dos nossos alunos, que analisaremos no próximo capítulo.
A segunda razão pela qual decidimos que as leituras dos textos literários deveriam ser
feitas, na primeira aproximação, em voz alta e pelo professor, foi a ideia de colocar um
mediador entre o texto literário e os sujeitos-aprendizes. Bajard (2007) descreve a “sessão de
mediação” (ibid., p 44) como um dispositivo formal que possibilita a aproximação da
literatura às crianças ainda não letradas. Na nossa experiência, o “mediador” era a voz do
leitor, que abria as portas para que os aprendizes entrassem em contato com a dimensão do
universo da escrita literária. Consideramos que essa aproximação, mediada pelo suporte da
voz uma metonímia do oral era importante, uma vez que detectáramos nos enunciados do
50
Informação disponível em: < http://en.wikipedia.org/wiki/El_%C3%A1rbol_de_oro>. Acesso em: 20/01/2009.
71
Q1, aplicados no início dos cursos, um distanciamento com relação à prática da leitura
literária, como será observado no capítulo 4.
A terceira razão teve a ver com a consideração do apego que o brasileiro tem à língua
oral. Conforme destaca Orlandi (2002b),
[O]s brasileiros têm diferentemente dos europeus uma relação frouxa com a
escrita e um apego forte à oralidade. Na comunicação administrativa, por exemplo,
as pessoas lêem os papéis mas ‘acreditam’ mais no que lhes é dito oralmente,
confirmado verbalmente (p. 28).
Segundo a autora, esse fato é devido à “descontinuidade” que, de forma específica (por razões
históricas51), se travou entre escrita e oralidade no português do brasileiro.
No que tange às atividades a serem realizadas pelos sujeitos-aprendizes do grupo B
que preparamos para esses textos, apoiamo-nos nas considerações que Grigoletto (1995) faz
sobre a importância de levar o aluno a perceber que não existe uma única leitura, nem
tampouco um significado dado para um texto, além de incentivá-lo a não se comportar
como um mero reprodutor de significações feitas (cf. ibid., p. 110). A materialidade do
texto literário facilitou esta tarefa porque, apesar de apresentar de forma potencializada a
ambiguidade, o duplo sentido, o vaivém semântico, a desestabilização dos sentidos enfim, o
universo que Pêcheux designa como poesia, ao dizer que nada dessa é estranho à língua
(1990, p.51), não produziu resistências, como poderia ter acontecido; pelo contrário, o grupo
demonstrou forte capacidade de exposição à alteridade.
As atividades propostas que foram realizadas pelos aprendizes encontram-se descritas
no Anexo 8 desta dissertação. Todavia, é importante ressaltar que durante as atividades, no
decorrer do curso, permitimos que, na produção oral e escrita, os sujeitos-aprendizes fizessem
suas colocações de forma livre e espontânea, sem silenciá-los, e com isso abrimos espaço para
a diversidade e para a produção de significados. As interpretações que os aprendizes fizeram
do texto, após a leitura do mesmo realizada pelo professor –, mediante a série de atividades
produzidas em sala de aula, era compartilhada pelo grupo de alunos de forma oral, com o
objetivo de que cada um deles pudesse reformular as primeiras hipóteses sobre o texto antes
de avançar para a produção escrita solicitada como “lição de casa”.
Chegamos assim ao capítulo 4 onde apresentaremos a análise dos resultados da
experiência descrita.
51
Dentre as principais: pelo apagamento da língua geral, que nunca foi, como oralidade, legitimada na escrita
(cf. ORLANDI, 2002b).
72
CAPÍTULO 4
NOSSO CORPUS - CRISTALIZAÇÕES E DESLOCAMENTOS
Neste capítulo, como já adiantamos, apresentaremos a análise de um recorte de nosso
corpus de pesquisa. Para tal, nos apoiaremos, fundamentalmente, na perspectiva teórica da
Análise do Discurso de linha francesa e trabalharemos em dois níveis:
a) no item 1, ao analisar os enunciados registrados no Q1 e no Q2, nos centraremos no
plano do registro do imaginário, isto é no plano da glossa (SOUSA, 2007) que sobre a língua,
a literatura e sua leitra realizam os aprendizes. Por isso, num primeiro momento,
trabalharemos sobre os enunciados registrados no Q1 com o intuito de detectar as imagens
que surgem com relação a esses três objetos. Num segundo momento, tomando como
corpus os enunciados que aparecem nas respostas ao Q2, nos centraremos em detectar se essas
imagens ficam congeladas ao longo desse curso inicial do processo de ensino-aprendizado ou
se são submetidas a uma certa descristalização. Por último, tomando como apoio certos
gráficos produzidos com base nos registros de Q2, poderemos colocar em relação
determinados aspectos dos dois questionários para analisar pontos de contato e diferenças
entre o Grupo A – para o qual oferecemos um curso quase exclusivamente norteado pelo livro
didático Planet@ e o grupo B, para o qual o programa do curso previa a inclusão de textos
literários;
b) já no item 2, trabalharemos no plano do registro do simbólico – especificamente, na
elaboração da escrita em língua espanhola –, sobre um recorte que realizaremos a partir do
total de produções realizadas por nossos aprendizes ao longo de cada um dos dois cursos
oferecidos (Grupo A e B), tal como detalhamos no capítulo 3. Neste caso, tentaremos
estabelecer comparações entre as produções dos dois grupos e detectar marcas linguístico-
discursivas que indiquem possíveis deslocamentos de posição-sujeito.
1. No registro do imaginário
Como anunciamos no capítulo 3 e retomamos na introdução deste, ao pedir que os
alunos respondessem aos questionários pretendíamos recolher um corpus que nos
possibilitasse, por meio da análise, detectar as imagens que o sujeito aprendiz projetava no
início do processo acerca da língua espanhola, da literatura e da leitura desta. Esse foi,
fundamentalmente, o objetivo da aplicação do Q1, e a referida análise será realizada no item
1.1.
73
por meio da aplicação do Q2, no final do curso, visávamos obter registros, ainda no
plano do registro do imaginário, que nos permitissem detectar se as imagens iniciais se
mantinham ou haviam sofrido algum tipo de reformulação, por efeito de os aprendizes terem
passado por um processo que os colocava em relação direta com a língua espanhola. A análise
desta parte do corpus será realizada no item 1.2.
1.1 As imagens iniciais
Começaremos por designar as imagens mais recorrentes detectadas nos enunciados das
respostas ao Q1, tanto no grupo A quanto no B. Nesse sentido, veremos que algumas delas
estão vinculadas a um pré-construído que afeta o dizer desses sujeitos-aprendizes, antes de
entrarem em contato com a língua num contexto formal de ensino-aprendizado.
Do total de 34 aprendizes que responderam ao questionário (Grupo A e B), 22 deles
afirmaram, mediante diferentes formas de dizer, que o interesse pela língua espanhola se
devia a que ela os tornaria mais aptos para serem aceitos no mercado de trabalho. Tais
enunciações indicam que, no início do processo, esses sujeitos supunham certos saberes à
língua espanhola e que estes se relacionavam ao que promete uma “língua veicular”. Celada
(2002) observa que a língua espanhola no Brasil a partir da década de 90, em virtude da
assinatura do tratado do Mercosul bem como de outros fatores relativos ao processo de
globalização, começou a se apresentar como veicular: isto é, como uma língua de sociedade,
que está em toda parte que é urbana, estatal ou mesmo mundial –, língua de troca comercial
e de transmissão burocrática (cf. p. 18).
52
Vale ressaltar que a autora observa que, antes dos
anos 90, o brasileiro não supunha à língua espanhola um saber pelo qual valesse a pena o fato
de se submeter ao trabalho de estudá-la; por isso, naquele cenário era habitual deparar-se com
enunciados que expressavam o sintoma dessa relação: “Estudar espanhol?! Precisa mesmo?
(ibid).
A partir da análise de nossos enunciados, temos indícios para dizer que o pré-
construído existente antes dos anos 90 no Brasil, a respeito da língua espanhola como uma
língua parecida ao português e que, portanto, era fácil, fato pelo qual não era preciso
submeter-se a seu estudo – perdeu força e não afeta os sujeitos dos enunciados registrados nas
respostas ao Q1. Ao mesmo tempo, podemos observar que uma outra imagem vai se
fortalecendo e cristalizando, indicando a configuração de um novo pré-construído: a língua
52
A definição de língua veicular na qual a autora se baseia é de Deleuze e Guattari (1977), obra referida em
nota de rodapé do capítulo 1.
74
espanhola como uma língua de negócios, o que no corpus analisado por Celada (referido
fundamentalmente a propagandas de escolas de línguas nos anos 90) ainda era impensável.
Nesse sentido, Sousa (2007), em pesquisa realizada para a dissertação de mestrado,
constatara que a imagem do espanhol como “segunda” língua de negócios (depois do inglês)
marcava a relação inicial dos aprendizes de sua pesquisa, pois, nos enunciados por ela
recolhidos, esses sujeitos se submetiam às evidências de tal imagem como um pré-
construído. No entanto, na pesquisa realizada por Lemos (2008), na qual a autora analisava
propagandas de escola de línguas, é possível ver que esse pré-construído está ainda em fase de
produção e que, para tanto, nesses discursos, se recorre à memória discursiva do inglês.
Assim, o nome da escola, seguido do fragmento Inglês-Espanhol” contribuiria ao
fortalecimento dessa imagem de língua veicular que vemos que está em fase de consolidação.
Nesse sentido, nosso corpus se insere nesse trabalho da memória discursiva, que implica uma
reformulação imaginária: vemos, assim, que a referida imagem se apresenta como uma
evidência, como algo dado e “já pensado”, para nossos aprendizes.
A seguir, apresentamos alguns enunciados nos quais aparece essa imagem; todos eles
respondiam à pergunta: “¿A qué se debe tu interés por la lengua española?”
53
(1) Mi interés por la lengua española estas ligado a mi trabajo i mi formacion (aluno 1 -grupo B)
(grifos nossos).
(2) É uma lingua muito bela, adoro aprender e também porque vai enriquecer meu curriculo (aluno
1- grupo A) (grifos nossos).
(3) Por que é uma língua diferente da língua Portuguesa e que tem uma cultura diferente também. A
exigência do mercado de trabalho (aluno 5 -grupo B) (grifos nossos).
(4) Trabaja en una empresa y hablo con los clientes del Mercosul (aluno 10 -grupo B).
(5) Se debe por interes profisional, na oficina onde trabajo ablo con muchos estrangeros,
principalmente da América do Sul (aluno 3 -grupo A).
Vale a pena destacar que no enunciado (3), no fragmento “é uma língua diferente da
língua Portuguesa”, detectamos mais uma marca a favor da hipótese de que essa língua
espanhola estaria sendo reconhecida como uma língua outra, produzindo uma antecipação que
supõe uma interrupção da rotina de uma memória segundo a qual a língua espanhola era, para
o brasileiro, uma extensão da própria (cf. CELADA, 2002, p. 245).
Ao mesmo tempo, contraditoriamente, é preciso que reconheçamos atentando para a
materialidade da língua de nossos enunciados que, apesar do que observamos no plano do
imaginário com relação a uma possível substituição da imagem de língua fácil pela imagem
53
Todos os fragmentos transcritos neste capítulo são registrados tal qual aparecem nas respostas dos
questionários.
75
de língua veicular, alguns dos estudantes não responderam em português.
54
Diante de um
questionário com perguntas elaboradas em espanhol, se sentiram convocados a ocupar uma
posição e a ocuparam; de nosso ponto de vista, essa posição seria alimentada por uma ilusão
de competência espontânea (cf. CELADA, 2002), o que funcionaria como indício de que
esses aprendizes ainda viam a língua espanhola como uma projeção da própria.
Nos enunciados das respostas dos questionários de nossos aprendizes, também
constatamos diversas formas de qualificar a língua espanhola como “bonita”, imagem que
parece ser importante para esses sujeitos-aprendizes terem decidido se submeter a seu estudo.
Essa imagem já foi detectada por Souza Junior (2008), na pesquisa de Iniciação Cientifica que
realizou sobre as imagens projetadas sobre a língua espanhola por alunos de diferentes
semestres do curso de letras habilitação Espanhol, da Universidade de São Paulo. O
pesquisador notou que essa imagem estava estreitamente relacionada para o sujeito brasileiro
à sonoridade da língua, e que se mantinha no decorrer do seu processo de aprendizagem (cf. p.
30).
55
(6) Mi interés por la Lengua Española se debe pelo fato de ser una lengua muy Bonito de hablar […]
(aluno 9 -Grupo A) (grifos nossos).
(7) A lingua espanhola é um charme, acho muito lindo esse idioma. (aluno 4 -Grupo B) (grifos
nossos).
(8) Por que me gusta e para mi trabajo futuro. Por que es bonito el sonido, me encanta las canciónes
(aluno 6 - grupo A) (grifos nossos).
(9) Mi Gusta mucho la lengua española, por que é uma lingua muito bonita de se falar e é a terceira
lingua mais falada no mundo, e a segunda no mundo corporativo (aluno 8 - grupo A) (grifos
nossos).
Passaremos, a seguir, a analisar os enunciados que responderam à pergunta: “¿Qué te
parece la literatura? ¿Te gusta leer literatura?”, anunciando que os sujeitos de nossa pesquisa
projetaram, em sua maioria, uma imagem negativa tanto dela quanto de sua prática de leitura.
A seguir, pinçamos alguns, pela produtividade que podem ter para esta reflexão:
(10) A literatura é muito complexa não gosto (aluno 17 - grupo A) (grifos nossos).
(11) Acho a literatura, um pouco chata, na verdade não gosto muito de literatura (aluno 8 -Grupo A)
(grifos nossos).
(12) No mucho (aluno 1 – grupo B).
Os dois primeiros enunciados têm em comum o fato de apresentarem explicitamente
designado o impacto negativo da literatura sobre os sujeitos. Embora no enunciado (11) o
54
Tanto no grupo A quanto no B houve alunos que não responderam em português.
55
Essa imagem foi uma das razões, como já mencionamos no capítulo 3, que colaboraram na decisão de ler os
textos literários em “voz alta” em nossos cursos de língua espanhola, nos quais a literatura se fez presente com
modalidades diferentes.
76
sujeito amenize seu “não gostar” quando modaliza sua asserção dizendo: “não gosto muito”, o
adjetivo “chata” carrega uma imagem mais forte do que a que está inscrita no adjetivo
“complexa” do enunciado (10). Nesse sentido, vejamos o seguinte enunciado no qual é
projetada uma outra forma de distanciamento ou melhor, de não identificação entre o
sujeito e a literatura:
(13) La literatura para mi es muy importante, pero tengo PREGUIÇA de hacer este tipo de lectura pela
linguagem non utilizada, pelo vocabulário antigo (aluno 9 - grupo A).
É interessante observar que o aprendiz se distancia da prática da leitura literária pelo
motivo de a literatura ter “linguagem non utilizada” e “vocabulário antigo”. O sujeito projeta
uma imagem segundo a qual a materialidade linguístico-discursiva da literatura lhe provoca
um estranhamento, uma vez que ela não se inscreve em discursividades contemporâneas. Com
base em reflexões desenvolvidas por Payer, poderíamos dizer que “passado” se relaciona com
“obsoleto” (2006, p. 155) e que um indício de não identificação que aponta para uma
posição sujeito “indeterminado” que, tomado pelo desânimo, como também poderíamos
formular a partir de considerações de Payer, “não teria forças” para investir no gesto de se
sobrepor a esse efeito de sentido (cf. Payer, 1995). Segundo a autora (ibid., p. 41), tratar-se-ia
de um sujeito que não é capaz de ter “força de vontade” diante do “empreendimento” que lhe
suporia realizar a leitura de literatura e que, portanto, sucumbe. Talvez, poderíamos dizer que
o sujeito aprendiz que recebíamos na sala de aula, por certas observações que fizemos com
relação a sua identificação com discursividades do Mercado, não teria como aderir a uma
relação com a literatura, devido a que seu nculo mais marcante com a língua viria por um
viés pragmático: essa língua lhe forneceria a possibilidade de ter acesso a uma inclusão no
mundo do trabalho, satisfazendo suas urgências mais imediatas.
No fragmento do enunciado (13) em análise, uma marca linguístico-discursiva com
relação à qual o próprio enunciador expressa sua relação com a literatura: “PREGUIÇA”,
fragmento para o qual destaque mediante maiúsculas e sublinhado. Todavia, é preciso
observar que esse fragmento entra em contradição com um anterior que expressa a projeção
da literatura como “muy importante”. Passaremos a ver em que consiste tal contradição.
Em outros enunciados, as imagens positivas sobre a literatura (e sua prática de leitura)
aparecem vinculadas a um saber que a ela é suposto, no caso, especificamente relacionado
com “cultura” é “história”:
77
(14) Vejo a literatura como uma certa cultura do pais pais foi atravéz da Literatura que tivemos o prazer
de conhecer obras dos “Genios” (aluno 5 - Grupo B) (grifos nossos).
(15) Gosto de literatura. Acredito que a literatura de um país ajuda a conhecer melhor a cultura (aluno
13 - Grupo B) (grifos nossos).
(16) Gosto muito de ler literatura (Brasileira), pois mostra importantes acontecimentos na história do
Brasil
- Graciliano Ramos
-Machado de Assis
-Clarice Lispector
-etc (aluno 14 - Grupo B).
A contradição de que falamos faz operar dois sentidos que poderíamos expressar da
seguinte forma: “é importante porém eu não posso”, o que nos permite inferir que o sujeito
sofre uma exclusão com relação a esse objeto, para ele “inatingível”. Com relação ao
enunciado (16), é interessante observar que nele a imagem de literatura se identifica com a
“Literatura Brasileira” e seus autores. Acreditamos que essa identificação seja forjada pelo
discurso da instituição escolar; nesse sentido, retomamos Orlandi (2002a) quando apresenta as
instâncias do domínio do imaginário que caracterizam o que ela chama de “identidade
linguística escolar” do brasileiro. Uma delas tem a ver com o “saber literário” que todos
aqueles que frequentaram a escola “têm que ter”: no caso especifico da literatura equivale a
“saber as obras e os autores mais importantes da literatura brasileira e portuguesa” (cf. ibid.,
p. 208-209). Em nosso enunciado, justamente aparece a alusão à importância (no caso, ligada
à história) e o enunciado não culmina num ponto final, pois na linha seguinte, parece
continuar com a menção de uma série de nomes de autores. Essa quebra na sequência linear
ou na horizontalidade da escrita pois os nomes são elencados numa lista vertical nos
permite estabelecer uma relação com certas práticas de enumeração dos textos escolares e
considerar o enunciado como atendendo a uma necessidade de “provar” esse saber literário de
que fala Orlandi (ibid.); nesse sentido, a enunciação também funcionaria como uma prova
(que opera no sujeito como um efeito de sentido) que restou da relação que o aprendiz
manteve na escola com esse campo de saber – a literatura. Portanto, uma “demonstração
de saber”, ligada a uma forma de memória trabalhada nessa instituição; porém, também
podemos observar que aparece aí o jogo memória/esquecimento, marcado mediante uma
enumeração que, na materialidade da escrita, se encerra mediante a forma “etc”, pista de uma
incompletude. Portanto, poderíamos concluir que a contradição de que falamos aparece entre
a relação que sintagmaticamente se trava entre “literatura” e “importância”, e o elenco
paradigmático dos grandes autores da literatura (brasileira).
No seguinte enunciado, que pinçamos de nosso corpus, também surgem as imagens de
um saber literário instituído pela escola, neste caso, identificado com Literatura Brasileira e
78
Portuguesa: obras (Primo Basílio, Memórias Póstumas de Brás Cubas) e autores (Jorge
Amado).
(17) Literatura algumas são interessantes, como Primo Basílio e Memorias Postumas de Brás Cubas, já os
livros do Jorge Amado as palavras são difíceis, torna-se cansativo (aluno 2 - Grupo B) (grifos
nossos).
1.2 A reformulação imaginária
A aplicação do Q2 pressupunha uma hipótese: a de que no imaginário dos sujeitos (do
Grupo A e B), ao entrar em contato com o real da língua ao longo do curso, haveria
reformulações. No grupo B, também pensávamos que as imagens detectadas no início com
relação à literatura seriam afetadas pelo confronto com determinadas experiências de leitura
literária que realizamos durante o curso.
Devemos começar registrando que, nos enunciados das respostas à pergunta do Q2
“¿Después de haber terminado este curso cambiado tu opinión sobre la lengua española?
¿Por qué?”, foram recorrentes, em ambos os grupos (A e B), as imagens sobre a facilidade
e/ou dificuldade de aprendizagem” dessa língua. Como expusemos em 1.1, a imagem de
língua fácil que poderíamos expandir mediante a sequência “espanhol - língua parecida -
língua cil” (cf. CELADA, 2002, p. 31) não apareceu nos enunciados das respostas do Q1
e, por isso, chegamos a observar que ela parecia ter sido deslocada pela imagem de “língua
veicular”, chegando a postular que esta estaria se sobrepondo à primeira e, dessa forma, a
falta de suposição de um saber seria substituída pela suposição de saberes ligados ao
veicular’. Lembremos de fragmentos como “vai enriquecer meu curriculo”, “mi trabajo i mi
formación”, a exigência do mercado de trabalho”, que funcionam como indícios de um
sujeito interpelado pelo mercado, se submetendo a esses sentidos e supondo à língua
espanhola a capacidade de lhe dar acesso ao mundo do trabalho. Porém, também observamos
que, ao responder o Q1, alguns deles ocuparam uma posição-simbólica que vinculamos a uma
“ilusão de competência espontânea”, absolutamente vinculada a um imaginário não
manifesto expressamente mas inscrito na materialidade da língua produzida do espanhol
como língua “parecida e fácil”, com relação à qual projetaram ter uma competência
espontânea ao não escrever em português. Vejamos os enunciados nos quais a contradição
entre língua fácil/língua difícil aparece expressamente formulada:
79
(18) Antes yo piensava que eras más cil esa lengua ahora yo entendí que é más interesante y con
palabras que parecen ser o que no son (aluno 16 - grupo A) (grifos nossos).
(19) Porque não é o cil falar español como os “cursos milagre”, é mais complexa e apaixonante do
que parece, a maneira que é organizada a língua é muito inteligente (aluno 1 - grupo B) (grifos
nossos).
(20) Bom gostei de poder ter uma noção da língua e da cultura, porem achei que fosse mais fácil de
aprender, conclui que não? (aluno 5 - grupo B) (grifos nossos).
(21) Pois não imaginava que fosse tão prazeroso saber falar outra língua, sem contar que é mais difícil
que imaginava (aluno 9 - grupo B) (grifos nossos).
Os fragmentos aos quais damos destaque indicam que o pré-construído de ngua fácil
ainda mostra sua incidência no registro do imaginário dos aprendizes e surge, como fruto de
uma espécie de efeito retroativo (um efeito “rebote”); quando o sujeito entra em contato com
a língua, com o real de uma língua que “chega toda”, esse objeto se reconfigura sob a
projeção de uma nova antecipação: é, na verdade, uma língua “difícil”. Observamos na
horizontalidade da enunciação desses aprendizes uma divisão da temporalidade: com base em
observações de Payer (2006, p. 158), diríamos que um plano temporal que coincide com o
momento da enunciação, no qual a ngua se percebe como difícil, menos fácil; e um outro
plano anterior ao da enunciação, no qual é projetada uma representação da memória de língua,
que aparece como “narrada”, como “designada” (“yo pensaba que era más fácil”, “achei que
fosse mais fácil”, “sem contar que é mais difícil que imaginava”) enfim, como “deixada
para trás”.
Assim retomando o enunciado (21), escrito em português,
Pois não imaginava que fosse tão prazeroso saber falar outra língua, sem contar que é mais difícil que
imaginava (aluno 9 - grupo B) (grifos nossos).
aparece uma relação entre duas temporalidades, sendo que na “anterior”, essa língua era
difícil (não tanto quanto agora). Devemos observar que esse sujeito também não apresentou
sua enunciação em espanhol nas respostas ao Q1, o que nos reforça a ideia de que “facilidade”
e “ilusão de competência espontânea” estão vinculadas pois, neste caso, reconhecer a língua
estrangeira como difícil não propiciou a toma da palavra em espanhol.
56
A seguir, para poder abordar o imaginário sobre literatura e sobre sua leitura,
apresentaremos e analisaremos os enunciados registrados nas respostas à primeira questão do
Q2: “A lo largo del curso hemos leído varios tipos de textos. ¿Cuál te ha gustado más? ¿Por
56
Aproveitamos para observar que, ao responder ao Q2, outros sujeitos também escreveram em português, o que
é muito significativo.
80
qué?”.
57
Dentre as formulações produzidas pelos alunos que indicaram o texto literário como
aquele do qual mais tinham gostado (50% no grupo A e 80% no B), começaremos por analisar
uma das produzidos pelo Grupo A – em cujo curso, tal como detalhamos no Anexo 8, fizemos
apenas a leitura em voz alta de um conto. Passemos, agora, a nosso próximo enunciado:
(22) Me gustan los textos litererios porque tienen palavras diferentes y son mas interesantes (aluno 5 -
grupo A) (grifos nossos).
Surpreende-nos a identificação da literatura com “palavras diferentes” e a relação
dessa identificação com “mas interesantes”; aliás, poderíamos observar que a comparação que
está em jogo funciona com relação aos outros textos enumerados na pergunta do Q2: diálogos
do LD, textos do LD e textos literários. Essa relação reformula a imagem que detectamos no
Q1: a projeção da literatura como “chata”, como produzindo “preguiça”. Além de o
“interessante” estar precedido pelo advérbio de intensidade “mas” (mais), que força à nova
imagem.
É interessante observar que a imagem que o sujeito projeta de “palavras diferentes”
(sendo que “diferentes” provavelmente se aproxime dos sentidos que tem em português) entra
também em contradição com a designação que aparecia no primeiro dia de aula, quando num
dos enunciados observávamos o fragmento as palavras são difíceis”. Estamos, enfim, diante
de uma reformulação discursiva: há indícios de um deslocamento pelo qual se passa de
projetar “a literatura tem palavras difíceis” a afirmar que “a literatura tem palavras
diferentes”.
Vejamos como no seguinte enunciado podemos detectar que esse deslocamento
aparece em outras formulações, o que indica que este tem chance de permanecer:
(23) As historias lidas en sala nos deixava a vontade, podíamos imaginar alem (aluno 11- grupo B).
57
Com a aplicação do Q2 visamos obter registros, ainda no plano do imaginário, que nos permitissem detectar as
preferências pelos tipos de texto (diálogos do LD, textos do LD, texto literário) bem como as relações que os
sujeitos-aprendizes, de ambos os grupos, foram estabelecendo com esses textos. O texto de que mais gostaram
nossos aprendizes de ambos os grupos foi o literário (ver gráfico 1 e 2 do Anexo 9, doravante: A9 G1 e 2), e
sua leitura foi a que maior prazer lhes proporcionou (A9 G5 e 6). Também foi esse o texto que mais os
motivou para continuar estudando a língua espanhola (A9 G9 e 10). Porém, esse também foi o texto que
apareceu com maior recorrência na hora de ser indicado como o mais difícil de ler, frente aos “diálogos do LD”,
que foram os mais indicados nas respostas às perguntas sobre qual texto tinha sido o mais fácil na hora da leitura
(A9 – G3 e 4). De fato, como docentes, projetáramos que os sujeitos se deparassem com maiores dificuldades na
hora de ler textos nos quais a desestabilização dos sentidos, a ambiguidade e a opacidade da linguagem se
apresentam de forma potencializada.
81
A orientação de sentido indicada pela comparação estabelecida pelo fragmento “mas
interesantes” no enunciado (22) tem sequência no fragmento que aqui consideramos tão
significativo: “imaginar alem”; esse “alem”, quando colocado em confronto com os sentidos
que apareciam nas respostas ao Q1, nos permite pensar em algumas relações possíveis para o
“aqui” que está aí pressuposto: “a sala de aula” (e tudo o que ela implica), “a literatura (aquela
que aparecia fortemente determinada por uma memória escolar)”. Poderíamos interpretar tais
dizeres, tais modos de dizer como indícios de que a descristalização de um pré-construído está
começando a acontecer; que estamos, enfim, diante de um processo de reformulação de
memória discursiva. Esse fragmento, “imaginar alem”, ainda funciona como indício de que
um umbral semiótico teria sido atravessado e, nesse sentido, chamam nossa atenção essas
duas marcas de generalização: “nos” (pronome na primeira pessoa plural) e “podíamos”
(verbo conjugado nessa mesma pessoa e número), que indicam que esse sujeito, do grupo B,
ocupa a posição de um portavoz que percebe o “imaginar além” afeta o grupo do qual ele faz
parte, e não se restringe apenas a ele.
58
No próximo enunciado,
(24) Porque os textos literários nos trazem diversos significados e nos fazem pensar bastante (aluno 14 -
grupo B).
o que chama atenção é que a imagem positiva que o sujeito enuncia sobre a literatura e
provocada pela diversidade de significados, pela polissemia, pela ambigüidade, pela
instabilidade dos sentidos a que esse tipo de texto o expõe isto é, pelo real da língua que
certas regiões da literatura apresentam de forma potencializada, sobretudo, quando as práticas
de leitura permitem que o equívoco possa ser explorado. Nesse fragmento também aparece o
fragmento “pensar” que podemos pensar como um objeto com o qual se identifica, projetando
a possibilidade de não reproduzir mas de “produzir” sentidos. Pareceria que começa a se
configurar um imaginário sobre a literatura e sua leitura que poderia dar corpo a uma outra
posição-sujeito de leitura, que passe a “determinar” significado(s) ou, como diria Iser (2002),
a não atribuir significado para que o jogo continue, o que fará com que o sujeito permaneça
num “vaivém” e neste se (re)-signifique (ibid.).
Parece-nos interessante, neste ponto, passar a citar um enunciado que traz um aspecto
diferente para o deslocamento imaginário que estamos detectando:
58
Lembramos que a pergunta foi formulada na segunda pessoa do singular.
82
(25) Eu gosto muito de saber outros povos e acho muito bem escritos os contos os contos espanhóis
(aluna 8- grupo B) (grifos nossos).
Aqui aparece a literatura vinculada a “outros povos”; o enunciador atribui à literatura a
capacidade de lhe dar acesso a saberes sobre os outros, ou sobre o outro.
59
Parece-nos que,
nesse sentido, a literatura exploraria a capacidade de se expor à alteridade.
Por fim, passamos ao seguinte enunciado, o último nesta seção:
(26) Por que los textos literários que la profesora ha leído me ayudaran a desenvolver y perder lo
medo de escribir y hablar español (aluno 1 - grupo B) (grifos nossos)
Aqui, com o fragmento “perder lo medo”, estamos de novo diante de uma divisão da
temporalidade: antes havia “medo”, agora não mais. E esse efeito que entra em relação
com “escribir”, primeiro, e com “hablar español” é atribuído pelo enunciador a “los textos
literários que la profesora ha leído”; observamos, na horizontalidade da enunciação desse
aprendiz, a importância que toma o que tínhamos antecipado como um fator favorável: a
leitura em voz alta, a voz como suporte da escrita. Interpretamos o fragmento “escribir y
hablar” como um indício de que algo vai interferindo na memória de um sujeito atrelado a
uma forte e marcada descontinuidade entre oralidade e escrita com relação ao português
brasileiro.
Os enunciados que surgiram, da aplicação do Q2 no grupo B, em resposta à pergunta
“¿Con qué tipo de texto te ha parecido que consigues aprender más sobre la lengua
española?”, nos faz pensar que a dificuldade apresentada pelos textos literários pode favorecer
a aprendizagem da língua espanhola (A9 G8). Vejamos, neste sentido, os seguintes
enunciados que surgiram em resposta a essa pergunta, e apresentam o sentido de que o texto
literário ajuda mais no processo de aprendizagem da língua espanhola:
(27) Los textos Literarios tienen muchas palabras diferentes. Los diálogos del libro son tiene para
aprender los los cosas sensillos (aluno 5 - grupo A) (grifos nossos).
(28) Por tem palavras diferentes que não se usa no dia dia palavras bonitas, ricas da cultura Espanhola
(aluno 5 - grupo B) (grifos nossos).
(29) Acredito que todos trazem um pouco da cultura estudada, mas como havia dito, acredito que os
textos literários tenham mais para oferecer, pois fogem da didática dos livros e nos trazem
palavras e linguagem daquela cultura (aluno 2 - grupo B) (grifos nossos).
(30) Porque me hace viajar por la lengua, por la imaginación de los escritores, conocer a la manera de
decir cosas iguales as que decimos, pero de forma diferente (aluno 10 - grupo B) (grifos nossos).
59
A imagem da língua espanhola como língua que dá acesso à cultura ou culturas de outros povos aparecia nos
enunciados registrados nos Q1 e, também, é uma imagem constatada e analisada na pesquisa desenvolvida por
Sousa (2007).
83
(31) Porque os textos literários fazem refletir sobre o assunto abordado, e para conseguir explicar o que
entendemos somos “forçados” a entender o significado das palavras, além do que parecem, o que
acho muito bom (aluno 1 - grupo B) (grifos nossos).
A maioria dos aprendizes indicou o texto literário, como o texto que mais gostariam
de trabalhar no modulo seguinte (A9 G13 e 14). Vale ressaltar que no grupo B, essa escolha
foi quase totalitária, somente 1 aluno escolheu outro tipo de texto. Já frente às atividades
realizadas no decorrer do curso os alunos indicaram a produção oral como a atividade que
mais gostaram, no grupo B, especificamente, a produção oral concorre igualitariamente com
as atividades de literatura (A9 – G17 e 18).
Neste ponto, passaremos a detectar o que aconteceu no registro do simbólico, isto é no
plano da elaboração que da língua espanhola realizaram nossos aprendizes, dando destaque,
como já adiantamos, para o fato de que nossa análise ficará restrita à produção escrita.
2. No registro do simbólico
Tomaremos como base parte das produções escritas, tanto do grupo A cujo curso
esteve quase exclusivamente vinculado às atividades propostas pelo LD –, quanto do grupo B
em cujo programa, tal como detalhamos no capítulo 3, introduzimos a leitura de quatro
textos literários e as atividades que a estes se referiam. Apesar de tratar-se de cursos com
propostas marcadamente diferenciadas – fato que nos poderia levar a pensar que as produções
por parte dos alunos seriam claramente “diversas” começamos por antecipar que as
diferenças, mesmo que sejam significativas, também são sutis: no contexto deste trabalho
funcionam apenas como indícios de possíveis deslocamentos por parte dos aprendizes numa
prática de ensino-aprendizado que definimos como processo de identificação. Assim, nosso
intuito não será comparar para realizar medições ou provar e comprovar a hipótese que
permeiou nossa experiência, inclusive, porque esta se restringiu a um curso inicial, o que
representa uma certa limitação, pois só nos permite elaborar conjeturas indiciais acerca do que
aconteceu nesse lapso de tempo que consideramos que, como curso básico, em geral funciona
como fundador da relação que um sujeito trava com a língua estrangeira, em nosso caso o
espanhol. Porém, também é preciso contextualizar essas conjeturas e pensar que, como elas se
referem justamente ao universo da escrita um espaço pelo qual o brasileiro não tem (tanto)
apego (ORLANDI, 2002b) –, ganham mais significação e representatividade.
Começaremos por abordar algumas das produções realizadas em resposta a atividades
propostas pelo LD. Posteriormente, pinçaremos algumas produções realizadas depois de ter
84
concluído as diversas atividades relativas à leitura de um dos textos literários; portanto, neste
caso, nos limitaremos a trabalhar com produções do grupo B. Por fim, tomaremos algumas
produções do Grupo A e outras do B, relativas à última atividade solicitada e realizada em
ambos os cursos, sem que esta estivesse vinculada a uma leitura específica nem fosse prevista
pelo LD.
No que tange às atividades realizadas a partir de propostas contidas no LD de ambos
os grupos, passamos a apresentar relatos produzidos (após a aula 14, de um total de 16) em
resposta ao enunciado da p. 90 do Planet@ E/LE 1: “Ahora escribe um texto en el que
explicas qué haces en uma semana”:
(32) Me levanto a las 6:30 de la mañana, me ducho y me arreglo. Vo trabajar donde me gusta mucho
estar. Cuando vo a la universidad me divirto con mi amigos y aprendo mucho con los profesores,
vuelvo a mi casa muy tarde, me ducho y me acuesto. Hago isso a la lunes a viernes.
En los sábados me levanto a las 7:30 en la mañana y vo a la universidad porque aprendo español.
Cuanto vuelvo a casa, vo jugar futebol, namorar, etc. Me acuesto muy tarde porque me gusta
mucho curtir las noches.
En los domingos no me levanto muy cedo porque fico acuestado mucho tempo (aluno 13 grupo
A).
(33) Durante la semana, me llevanto as cinco y cuarto de la mañana, me cepillo los dientes, me ducho y
hago el desayuno. Salgo de la casa a las seis en punto, y voy a pie hasta estación de tren Grajaú
para ir a trabajar. Entro a las ocho , el almuerzo a las trece, e salgo a las dieciesiete. Voy de autobús
hasta faculdade São Judas, que comienza la clase a la sete y diez de la noche. Tengo merienda a la
nueve menos diez de la noche, dónde tomo café con leche con mi amiga Nadir (casi todos los
dias).Tengo clase hasta once menos veinte de la noche. Cuando chego en casa, me cepillo los
dientes, me ducho y voy dormir a la doce de la noche (aluno 9 – grupo B).
(34) Texto a cerca del como es mi semana
Yo me levanto a las seis menos dez de la mañana, tomo una ducha y hago el desayuno, despues a
las siete menos dez llego lo trabajo, a las nueve en punto hago el desayuno mas una vez y despues a
las doze yo armuezo.
A la una en punto vuelvo a trabajar haste las cinco , sago de mi trabajo y voy para mi casa, llego a
las cinco y quince, tomo un café y un pan con mantequilla y despues me ducho y voy para la
universidad .
A las siete y dez comesan la classe y dez y cuarenta voy para mi casa.
Llego en mi casa a las once y trienta, hago a la cena, me cepillo y me acuesto.
Mi semana es assim, el sabados cuando llevanto, tomo una ducha, me acepillo ,hago el desayuno y
voy para la classe de español, a las nueve in punto llego ,despues del la classe voy para mi casa y a
la doze y trienta llego en mi casa, armuerzo y hago los trabajos de la universidad.
A noche a veses sago,y al domingos a las doze voy a iglesia,l lego a las una y trienta, armuezo,
descanso para poder comesar la semana otra vez (aluno 1- grupo B).
60
Poderíamos observar que o que prevalece nestes casos é o fato de que os sujeitos-aprendizes
realizaram uma produção com base no modelo que o LD apresenta para abordar as funções:
“hablar de la frecuencia, de períodos; usar los días de la semana y los verbos reflexivos de
actividad cotidiana” (cf. CERROLAZA, LLOVET, 1998, p. 5).
60
Esclarecemos que, nestes casos, como se tratava de uma tarefa a ser realizada em casa, recebemos os textos
por e-mail; portanto, os apresentamos transcritos na versão digital.
85
O que podemos observar é que estamos diante de produções que implicam,
fundamentalmente, a repetição formal, visando trabalhar a regularização da memória na
língua estrangeira (cf. ACHARD, 1999). Nesse movimento, observamos fragmentos que
funcionam como indícios de forte coincidência com a memória discursiva outra (a memória
do dizer em espanhol) e fragmentos que interpretamos como deslizes que se afastam dessa
memória. Ainda prestando atenção para a materialidade, poderíamos dizer que o trabalho de
autoria por parte do aprendiz parece afetado, de maneira marcante, pela posição de “ilusão de
competência espontânea” à qual fizemos referência em vários momentos deste trabalho e que
consideramos, junto com Celada (2002), como determinante na relação brasileiro/língua
espanhola.
Passamos agora a abordar duas produções do grupo B
61
, realizadas a partir da leitura
de um texto literário. Ambas as produções foram realizadas após a leitura do primeiro texto
literário: “Animales em los espejos” de Jorge Luis Borges. A atividade proposta (descrita no
Anexo 8) consistiu em solicitar a escrita de um texto respondendo à pergunta: “¿Qué ves
cuando te miras al espejo?” e visava trabalhar a memória de certos saberes linguísticos
abordados até esse momento (a quarta aula de um total de 16): dentre eles, a designação das
nacionalidades e das profissões, a expressão da idade, etc. (ver “plano de aula”, em Anexo 4).
Passamos a transcrever a primeira das produções que aqui apresentaremos:
(35) ¿Que ves cuando estas de lante el espejo?
Todo el dia vejo una persona diferente: Cuando estoy feliz, sinto como si el mundo estivese
abierto, yo conseguirei alcanzar todos los desejos, un trabajo mejor, un puesto el mejor. Cuando
estoy de lante el espejo pienso que a vida puede ser mejor y que depende solamente de mi, no existi
la barreria.
Cuando estoy triste soy una persona que no percebe como el mundo es maravilloso, fico cerrada
dentro de mi mundo, deixo el soñar.
El espejo puede ser un amigo y un inemigo, cuando me sinto fuerte el espejo muestra
dirección de la felicidad das coisas buenas.
Vejo duas personas diferentes luchando para continuar vivendo (aluno 2 – grupo B) (grifos nossos).
O primeiro aspecto que chama nossa atenção é que o sujeito aprendiz parece ter sido
afetado pelo modo como a literatura que selecionamos para o curso produz sentido,
modalidade marcada pelo equívoco e pela exposição à alteridade. Nesse sentido, o sujeito da
enunciação não se afirma como uma unidade ao falar de si mesmo, não se submete a essa
evidência; ao contrário, se expõe a uma duplicidade que ao longo do texto deságua na divisão
entre “estar feliz” e “estar triste”.
61
Ao longo do curso, como parte do processo de avaliação, na hora de ler essas produções, estas já se
apresentaram para nós com um diferencial significativo que gostaríamos de explorar, em meio à leitura e à
interpretação de nosso corpus, neste espaço de análise.
86
Damos destaque para alguns fragmentos do texto porque materializados no entremeio
das línguas (cf. CELADA, 2002) atingem determinada força expressiva. Tomaremos alguns
deles, sem o ânimo de querer ser exaustivos e dar conta de todos os deslizes e marcas que
aparecem:
- “(T)odo el día”: devemos começar esclarecendo que pensamos que, como docentes e de
forma geral, realizamos a avaliação das produções de nossos aprendizes no intervalo entre “o
que projetamos que esse aprendiz teria querido dizer” e “aquilo que ele realmente disse”.
Isto ocorre justamente a partir de uma marca que indica que não foi atingida a
regularidade nas formas de dizer, vinculadas a uma memória discursiva outra. Assim,
poderíamos aludir ao confronto ente a forma “todo el día” cuja materialidade indica que
esse sujeito está afetado pelas formas próprias ao funcionamento da outra língua e a
forma que pensamos que poderia entrar na cadeia para produzir coerência discursiva: “todos
los días”; porém, o primeiro marcador consegue expressar os efeitos de “cansaço”,
produzidos por uma certa rotina, aos quais o sujeito da enunciação parece estar exposto,
contribuindo para a referida coerência.
- “un puesto el mejor”, fragmento no qual esse artigo, de difícil aquisição para um brasileiro,
sobretudo nesse momento inicial do processo de aprendizado, produz uma significação pela
qual o vacilo entre “un puesto mejor” e “un puesto, el mejor” parecem indicar a direção de
sentidos que traça o sujeito desejante;
- “El espejo puede ser un amigo y un inemigo, cuando me sinto fuerte el espejo muestra lá
dirección de la felicidad das coisas buenas”: parece-nos um fragmento muito rico e
gostaríamos apenas de atentarmos para os sentidos que instala “muestra dirección”. O
vaivém entre “la” como artigo (em espanhol) e “lá”, como dêitico do português, instala,
nesse entremeio, uma instabilidade que não deixa de trazer os sentidos de indeterminação de
um “lá” que ressoa, nesta análise, como o “alem” do fragmento “imaginar alem” que
apareceu enunciado (23).
Na seguinte produção, também será possível detectar um sujeito aprendiz afetado pela
prática da leitura de literatura: de um lado, desliza pela língua estrangeira sob o regime da
ilusão de competência espontânea; de outro, desliza por ela como se esta funcionasse como
um passaporte sem destino fixo (não instrumentalizada para “viajar”, “para saber como
comprar no supermercado”, “para se comunicar numa loja”), e não estivesse subordinada a
uma gradação. O sujeito exposto a uma língua que, irremediavelmente, “chega toda
responde:
87
(36) ¿Que miro enfrente del espejo?
La representatión física de una sopa de proteínas. Que de una maneira ordenada, se convierte
autonoma y ambulante. De ese molde, esta sopa se consiencia de si misma y interactuar con
ochas sopas autonomas.
Pero echa consiencia más allá. La sopa necesita apoyo. El apoyo del espíritu, que actua como
emociones y sentimientos. Entonces esto espíritu crece y toma forma, y entonses
pasamos llamarlo de alma.
E como la sopa, la alma no incuentrase sola. ?Su compania? Almas. Cada vez más, y más almas.
Espíritus y sopas más allá de sus ingredientes estan juntos y vivem en paz y harmonia.
La harmonia que vien y toma forma de Dios. La harmonia de un cuerpo que ejerce pleno control de
su brazo y piernas o extase de su existencia, donde no existe o contexto relativo de bien y malo.
Cada ingrediente, cada sopa, cada espiritu y alma. El todo faz parte de algo muy más grande do que
se creer, infinitas veces más distante la imaginación muy fértil de cada ser (aluno 3 grupo B)
(grifos nossos).
Esse texto pode ser interpretado como uma enunciação sobre o próprio processo transferencial
que os alunos e a docente estavam vivendo. Os fragmentos que destacamos nas primeiras três
linhas indicam uma direção de sentido que vai de “molde” (e todos os sentidos que a esse
significante se associam) a “se convierte autonoma y ambulante”, uma metáfora do próprio
processo no qual o sujeito se sente envolvido.
Nesse sentido, pensamos que essa produção está permeada pelo desejo de aprender
uma língua estrangeira, pelo anseio de ocupar um lugar em que “possa atuar sem interditos
sobre a sua língua, um desejo de posse total, onde possa se expressar livremente” (SOUZA
JUNIOR, 2004, p. 14). Talvez o fragmento que condensa essa interpretação seja “donde no
existe o contexto relativo de bien y malo”, pois pensamos que projeta o lugar que representa
para esse sujeito-aprendiz a inscrição total na língua espanhola, momento em que não vai
existir mais – no imaginário do sujeito – o acertar e o errar na língua.
De nossa perspectiva, esses textos apontam para uma ruptura a respeito da estrutura
“modelar”, designação que utilizamos de forma recorrente nesta dissertação, e que agora
aproveitamos para parafrasear por meio de significantes como “emoldurada” e “modelada” no
LD. Dizemos estrutura modelar” porque as amostras de língua desse LD são exibidas como
modelo; “emoldurada” e “modelada”, porque está dentro de uma moldura e aparece
subordinada a funções comunicativas. Assim, tal estrutura é exibida no espaço do LD para ser
retomada e reproduzida pelos sujeitos-aprendizes, com base em repetições empíricas e
formais. Já nas produções do grupo B, detectamos marcas que dizem respeito a um possível
trabalho de produção de autoria, e não apenas de reprodução.
88
Por fim, passaremos neste ponto, a apresentar três textos que foram produzidos com
relação à última proposta de trabalho em ambos os grupos, o A e o B. Tal proposta era a
seguinte: “Escribe un texto contando tus deseos y tus planes para el futuro y explica qué estás
haciendo para alcanzarlos”. Numa primeira aproximação, pudemos constatar que, enquanto
os aprendizes do grupo A apresentaram produções breves (mais atadas à [re]-produção da
estrutura modelar), os do B realizaram produções de maior extensão. A seguir, apresentamos,
uma produção de um sujeito-aprendiz de cada grupo:
(37) Yo tengo muchos planos para mi vida, neste año pretendo en primeiro lugar ser contratada pela
empresa que trabajo. Estoy queriendo comprar uno terreno para yo y mí prometido construir
nuestra casa.
Quiero estudiar más la materia de matemática y hacer mas amigos, contactos para empezar mi
carreira profesional.
En medio de lo año voy sacar mi cartera de habilitacion, preciso de más comodidad para ir de mi
casa para mi trabajo e mas tarde para universidad.
En final del año estarei empezando uno curso de lengua inglesa.
Todos los mi planos son de longo plazo en mi vida, tengo uno foco, una vontade de ser una grande
empresaria en mina empresa de buffet e eventos, deseo suerte mi misma y ha todos que me
ayudaran nessa camino (aluno 16 – grupo A).
(38) ¿Que quiero de mi vida?
Yo actualmente hago muchas cosas en mi vida, trabajo, estudio en la universidad, estudio la lengua
española, hago gimnasia, salgo de juergas con mis amigos y etc…
Además, mismo siendo muchas cosas para una persona sola, me gusta mucho de todo.
El curso de Administración que hago en la Universidad és una das cosas mas importantes en mi
vida, porque és con elle que voy garantir mi futuro, tener un buen trabajo, un bello coche y etc.
Todas las otras actividades que hago actualmente también son muy importantes, porque es en ellas
que aprendemos muchas cosas, muchos significados que yo siempre voy usar por toda la mi vida.
A veces pienso en desistir de todo que hago, pero que non puedo desistir porque, son esas cosas
que hacen de la vida más divertida más emocionante.
Para el futuro, estoy piensando o que voy hacer desde los días de hoy, quiero terminar mi curso de
Administración y después continuar estudiando, por que és muy importante para tener una carrera
brillante
Pienso hacer una larga viaje por la Europa conocer nuevos pueblos, nuevas culturas, nuevas
personas y etc…
Quiero continuar estudiando la lengua española, porque és muy importante para mi y para mi
carrera profesionale
Quiero casarme con una bella mujer, porque quiero tener una familia muy grande, con muchos
hijos y perros.
Voy a habitar en una casa muy grande, con jardines e árboles, porque me gusta mucho de la
naturaleza
Pienso continuar en la misma empresa donde trabajo actualmente, porque veo e sueno con un
brillante futuro profesionale, además tengo que esforrçarme desde ahora.
Y, para finalizar, prometo que voy ayudar todas las personas que mi ayudaran en esta vida. (aluno
14 – grupo B).
(39) Hablar de Nadir es muy fácil, pero algunas veces no es fácil entender sus devaneios. Siempre fui
sueñadora.
Ya tuve sueños de viver en el Japon, de ser una gran persona, de aquellas que haces gran cosas, y
que son recordadas para toda la vida.
Ya quiso ser muy importante para alguien;
El tiempo pasó, algunas cosas yo conseguí, otras no, pero no desisti.
Tuve desilusiones, fui muy feliz, también hice personas felices.
89
Un día tuve sueños de tener una vida a dos conoci a alguien que me encantó, me casé, tuve hijos,
me senti la persona mas feliz del mundo al mirarlos en sus ojos, jugué con ellos. Hoy me encanto
con las cosas que ellos hacen, Sueño en verlos crecer y realizar sus sueños. Me separé, volvi a
estudiar, recordé mis sueños del pasado. Yo no esto mas sola tengo amigos para dividir los
momentos, alegres o tristes; y también para dividir el trabajo, me gusta mucho trabajar, convivir
con las personas. Pienso que no puedo vivir sin el convivio diario de las personas.
Hago mi trabajo con cariño , no me gusta despertar temprano, pero si tengo que hacer, hago.
Yo estoy muy feliz porque he descubierto que ainda puedo soñar con el futuro, tengo mucho a
realizar. En el futuro me gustaría vivir en el campo […] (aluna 10 – grupo B).
Em todas essas produções é preciso reconhecer que uma exacerbação da ilusão de
competência espontânea e que os aprendizes deslizam pela língua espanhola sob esse efeito:
“sem interditos”, sob o regime de “um desejo de posse total da língua” (cf. SOUZA JUNIOR,
2004). Porém, algo que diferencia a produção que registramos sob o número (37) das
outras duas. Na (38), observamos que o aprendiz colocou título a seu texto, assim como o
fizeram mais 4 aprendizes desse grupo ou seja, 5 de 10 sujeitos-aprendizes colocaram titulo
na produção. Em contraposição, nenhum aprendiz do grupo A o fez. A produção (39) foi a
mais extensa de todas, o sujeito-aprendiz escreveu uma página (frente e verso). Nela percebe-
se, um sujeito afetado pela dispersão de sentidos e de formas de dizer não vinculadas à
organização apresentada pelo LD. Poderíamos atribuir a significativa extensão que
apresentam as produções do grupo B àquela antecipação imaginária que detectamos no item 1
deste capítulo: “perder lo medo de escribir y hablar español”, fragmento produzido por um
aprendiz do grupo B (aluno 1), para justificar sua preferência pelo texto literário (pergunta 1,
Q2). Por fim, o desejo que percorre as produções do Grupo B, de forma mais ou menos geral,
atinge a culminação metafórica nos “sueños” da produção (39), significante que recorreu em
ouros textos dos aprendizes desse grupo.
62
A partir da observação das produções escritas de nossos sujeitos-aprendizes, podemos
inferir que a prática de leitura de textos literários potencializaria a produção de sentidos (ao
contrario que do LD que produz o sentido “único”, porque o subordina a espaços logicamente
estabilizados), propiciando as condições necessárias para que os sujeitos produzam textos
escritos a partir de uma posição de autoria (cf. GALLO, 1992), e abandonem a posição-aluno
reforçada pelo LD. Assim, como autores, também se “autorizariam” a produzir nessa língua
(PFEIFFER, 2007). Com base nas lúcidas formulações de Gallo (ibid.), poderíamos incentivar
o deslocamento da posição-aluno (sujeito reprodutor do discurso escrito) para a posição-autor
(sujeito produtor do seu discurso escrito).
62
Consideramos pertinente esclarecer que a aluno que realizou a produção (39) sabia um pouco de espanhol ao
chegar ao curso.
90
Assim, podemos dizer que nossa proposta visou um exercício com a língua que não
propiciasse apenas a repetição empírica ou formal, mas fornecesse as condições para o
acontecimento da “repetição histórica, a que inscreve o dizer não repetível enquanto memória
constitutiva, saber discursivo [...]. É nesse domínio [...] que o sujeito faz aquele sentido fazer
sentido em ‘seu’ discurso, em sua memória” (ORLANDI, 2002a, p. 208).
Em nossa análise, detectamos pistas tanto no registro do imaginário quanto do
simbólico, que indicam possíveis “mexidas” na rede de memória à qual um sujeito está se
filiando. De nossa perspectiva, elas funcionam como indicadoras de que uma identidade, que
pensamos como “um feixe instável de traços que decanta de processos de identificação” (cf.
CELADA, 2008) está aí em movimento.
91
CERTAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
Talvez o leitor tenha percebido que nosso desejo, como sujeitos desta pesquisa,
atravessou com insistência e de forma contumaz a composição e escrita desta dissertação.
Nesse sentido, o presente trabalho produziu em nós uma série de efeitos que não são passíveis
de medição e que, também, ainda não seremos capazes de expressar ou dizer neste item, no
qual encerramos nosso trabalho. Vamos nos limitar, portanto, a retomar o caminho percorrido.
Num primeiro momento, foi preciso compreender a situação da língua espanhola, em
linhas gerais e de forma específica no cenário brasileiro, para perceber que essa língua está
passando por um forte processo de instrumentalização, a serviço de atender as urgências do
mercado e do “sujeito pragmático” que este privilegia. Vimos que a abordagem comunicativa,
cujos objetivos vão ao encontro das razões e exigências do Mercado, acaba reduzindo a língua
a um modelo, justamente, “moldado” para possibilitar a comunicação, apresentando uma
gradação na qual a língua aparece “simplificada”, “magra”, “estabilizada”. Com a finalidade
de se adequar a cursos rápidos e eficientes, parece querer contornar o incontornável: o
confronto do aprendiz com o real da língua.
Vimos também que a esse fato, vem se somar outro: o aprendiz brasileiro se relaciona
com a língua espanhola de uma forma muito específica. Por motivos históricos, até a cada
de 90, o brasileiro estabeleceu uma relação com essa língua marcada pelo funcionamento de
um pré-construido, segundo o qual “a ngua espanhola é uma língua parecida com o
português e, portanto fácil” (cf. CELADA, 2002, p. 10). Esse pré-construido mostra-se muito
forte e de longa duração, embora com a assinatura do tratado do Mercosul e, principalmente,
com a instalação de firmas de capital espanhol, tenha começado a sofrer uma descristalização;
assim, constatamos que, aos poucos, vai sendo deslocado por uma outra imagem: a língua
espanhola como veicular. Esse jogo imaginário é trabalhado nas práticas marcadas pela
abordagem comunicativa e pelos estudos contrastivos, sendo que neste último caso,
predomina um contraste reduzido ao “termo a termo”.
Tentando oferecer uma certa resistência ao modo como essas práticas vem sendo
desenvolvidas de forma geral, é que estudamos diferentes abordagens sobre a leitura e nos
identificamos com a proposta discursiva que veio a enriquecer e dar corpo a nosso desejo: o
de trabalhar com a literatura. No início, isto se apresentava como uma certeza e, ao mesmo
tempo, como uma projeção utópica que era preciso modalizar e submeter a certas
determinações. Fomos, assim, procurando razões, e as formulações realizadas por autores
diversos nos ajudaram a determinar nossa hipótese acerca da leitura de certa literatura na
92
prática específica de ensino-aprendizado de espanhol como língua estrangeira para brasileiros.
Para tanto, tentamos conhecer e compreender a constituição de uma certa posição-sujeito de
leitura que a escola brasileira privilegia e propor o confronto dos nossos aprendizes com
formas de leitura que pudessem propiciar a “repetição histórica”, tentando evitar uma certa
“repetição formal” ou “empírica” aquelas que os LDs privilegiam. Assim, produzimos uma
experiência piloto para propiciar certos deslocamentos tanto no plano do imaginário (da
projeção ou antecipação imaginária) quanto no plano do simbólico (da elaboração linguístico-
discursiva que o aprendiz faz dessa língua).
A produção da experiência que realizamos e sua concretização no plano da prática
com sujeitos-aprendizes de ngua espanhola permitiram que detectássemos indícios de
descristalização, no registro do imaginário, de pré-construidos fortemente determinados não
apenas com relação à língua espanhola mas também com relação à literatura e à leitura
literária. Além disso, também observamos certos deslocamentos, no registro do simbólico,
que interpretamos como uma passagem da posição aluno para uma posição mais vinculada à
autoria.
Neste ponto, queremos acreditar que a leitura de literatura se tornou, para nossos
sujeitos-aprendizes, uma prática que os incentiva a continuar se submetendo ao estudo da
língua espanhola, ao mesmo tempo que lhes mostra, de forma potencializada, mediante a
opacidade e o equívoco, as diferenças entre essa língua e o português. Nesse sentido,
retomamos os dêiticos como, “além” e “lá”, que foram recorrecorrentes nas produções desses
aprendizes, porque nos parece que eles dizem respeito à possibilidade de indicar outros
espaços, lugares, posições ou territórios, que o os previstos nem pela prática escolar nem
pelos LDs nem pelas práticas que atravessam discursivades do mundo contemporâneo e que
interpelam o sujeito a partir de uma lógica que estabiliza os sentidos, traçando fronteiras que
atravessam o campo de suas subjetividades. Dizem respeito, enfim, à direção instalada por um
desejo, singular para cada sujeito aprendiz, que vinha ao encontro do nosso. Juntos, davam
sustento a um processo transferencial que permitiu a produção de deslocamentos tanto com
relação aos sujeitos aprendizes quanto com relação ao sujeito da pesquisa e da prática
docente. Talvez o efeito mais forte seja para nós concluir que um sujeito pode passar por um
processo de determinação (e se identificar como autor e leitor) na relação (aparentemente
paradoxal) que implica que se submeta ao equívoco e à alteridade.
Resta dizer algo que consideramos importante frisar: com nossa proposta, não estamos
procurando sucesso ou uma taxa menor de insucesso, estamos tentando atravessar o
93
imaginário (ORLANDI, 2002a) e interferir nas práticas que limitam o trabalho com a
memória discursiva ao plano da reprodução, pois nosso desejo, como o de muitos professores
de língua estrangeira, é uma utopia: a inscrição de um sujeito nas discursividades da língua
outra – um passaporte, reiteramos, sem destino fixo.
94
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CHARTIER, R. A aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: Ed. da Unesp, 1998.
JAKOBSON, R. Poética em ação. São Paulo: Perspectiva, 1990.
98
ORLANDI, E. Análise do discurso. Princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 1999.
______. A linguagem e seu funcionamento: as formas do discurso.
ed. Campinas: Pontes,
2000.
PAZ, O. O arco e a lira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.
PIERATRÓIA, C. Questões de leitura. São Paulo: Annablume, 2001.
PIGLIA, R. O último leitor. (Trad. H. Jahn). São Paulo: Cia. das letras, 2006. (Original em
espanhol: 2006).
PIGNATARI, D. Comunicação poética. São Paulo: Cortez, 1986.
Livros didáticos
CERROLAZA, M.;[...
], O.; LLOVET, B. Planeta E/LE: 1Libro del alumno. Madri:
Edelsa, 2004.
______. Libro de referencia gramatical: fichas de ejercicios – Planeta 1 E/LE
. Madri:
Edelsa, 2004.
99
ANEXOS
100
ANEXO 1- Lei 11.161, de 05 de agosto de 2005
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1
o
O ensino da língua espanhola, de oferta obrigatória pela escola e de matrícula facultativa
para o aluno, será implantado, gradativamente, nos currículos plenos do ensino médio.
§ 1
o
O processo de implantação deverá estar concluído no prazo de cinco anos, a partir da
implantação desta Lei.
§ 2
o
É facultada a inclusão da língua espanhola nos currículos plenos do ensino fundamental de
5
a
a 8
a
séries.
Art. 2
o
A oferta da língua espanhola pelas redes públicas de ensino deverá ser feita no horário
regular de aula dos alunos.
Art. 3
o
Os sistemas públicos de ensino implantarão Centros de Ensino de Língua Estrangeira,
cuja programação incluirá, necessariamente, a oferta de língua espanhola.
Art. 4
o
A rede privada poderá tornar disponível esta oferta por meio de diferentes estratégias que
incluam desde aulas convencionais no horário normal dos alunos até a matrícula em cursos e Centro
de Estudos de Língua Moderna.
Art. 5
o
Os Conselhos Estaduais de Educação e do Distrito Federal emitirão as normas
necessárias à execução desta Lei, de acordo com as condições e peculiaridades de cada unidade
federada.
Art. 6
o
A União, no âmbito da política nacional de educação, estimulará e apoiará os sistemas
estaduais e do Distrito Federal na execução desta Lei.
Art. 7
o
Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.
Brasília, 5 de agosto de 2005; 184
o
da Independência e 117
o
da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Fernando Haddad
101
ANEXO 2 – Primeiro questionário aplicado aos grupos de Espanhol Básico 1: Q1
1. ¿Cómo te llamas?
2. ¿De dónde eres?
3. ¿Dónde vives?
4. ¿Cuál es tu dirección?
5. ¿Dónde naciste? ¿Cuándo?
6. ¿Cuál es tu número de teléfono?
7. ¿Qué curso haces en la universidad?
8. ¿Ya has hecho algún curso universitario anteriormente? ¿Dónde? ¿Cual?
9.
¿Has estudiado lengua o cultura hispánica anteriormente? ¿Dónde? ¿Por cuánto tiempo?
10. ¿A qué se debe tu interés por la lengua española?
11. ¿Te gusta leer?
12. ¿Con qué frecuencia lees y qué lees?
13. ¿Qué tipo de lectura te gusta más? ¿Por qué?
102
14. ¿Qué te parece la literatura? ¿Te gusta leer literatura?
15. ¿Te gustaría leer literatura en este curso de español? ¿Por qué?
16.
¿Qué esperas de este curso?
103
ANEXO 3
-
Segundo questionário aplicado aos grupos de Espanhol Básico 1: Q2
Nombre:…………………………………………………………………………………..
Evalúa las siguientes preguntas de 1 a 3, considerando la máxima nota 1 y la mínima 3.
1. A lo largo del curso hemos leído varios tipos de textos. ¿Qué tipo de texto te ha gustado más?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
¿por qué?
________________________________________________________________
________________________________________________________________
________________________________________________________________
2. ¿Qué tipo de texto te resulto más fácil para leer?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
3. ¿Qué tipo de texto te ha producido mayor placer al leerlo?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
4. ¿Con qué tipo de texto te ha parecido que consigues aprender más sobre la lengua española?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
¿Por qué?
________________________________________________________________
________________________________________________________________
________________________________________________________________
5. ¿Qué tipo de texto te ha motivado más para estudio de la lengua española?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
6. ¿Qué imagen tienes de la lengua española?
- Una lengua para los negocios ( )
- Una lengua de cultura ( )
- Una lengua que sirve para viajar y hacer nuevos amigos ( )
7. ¿En el Básico II , próximo módulo del curso de español, con qué tipo de texto te gustaría trabajar
más?
- Los diálogos de las unidades del libro didáctico ( )
- Los otros textos del libro didáctico ( )
- Los textos literarios ( )
8. ¿Después de haber terminado este curso ha cambiado tu opinión sobre la lengua española? ¿por
qué?
Sí ( )
No ( )
Un poco ( )
104
________________________________________________________________
________________________________________________________________
________________________________________________________________
11. ¿ Qué actividades te han gustado más en el curso? Clasifica de 1 a 6, siendo 1 la que más te ha
gustado y 6 la que menos).
- Escuchar grabaciones de los diálogos ( )
- Leer los textos del libro ( )
- Leer textos literarios
- Escribir ( )
- Hablar ( )
- Hacer ejercicios de gramática( )
105
ANEXO 4 – Planos de Aula
Planificación de Clase Grupo B
1ª Clase:
- Presentación del curso
- Español X Castellano
- Español en el mundo
- Inicio unidad 1 Planet@ 1
Abecedário/ fonética
- Actividades:
Deletrear palabras
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 1: El abecedario
2ª Clase
- Revisión da 1ª clase
- Funciones:
Saludar y despedirse
Preguntar e informar sobre el nombre y el origen
Preguntar cómo se escribe/deletrear
Preguntar e informar sobre las profesiones
- Léxico:
Abecedario (fonética)
Gentilicios
Profesiones
- Gramática:
Tratamiento formal X informal
Verbos LLAMARSE, SER, VIVIR, TENER,HACER
- Actividades:
Comprensión oral y escrita (diálogo pág. 14).
Simular una fiesta de encuentro
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 1: El abecedario
Ficha 5: Gentilicios
3ª Clase
- Revisión da 2ª clase
- Funciones:
Pedir una consumición y pagar
- Léxico:
Bebidas
Comidas en el desayuno y en el aperitivo
106
Numerales cardinales
- Gramática:
Pronombres personales
- Actividades:
Comprensión oral y escrita (diálogo pág. 22).
Responder cuestionario
63
(individual)
Imaginar un personaje y hacer preguntas hasta adivinar quién es (parejas)
Juego de conjugación de verbos
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 2: Pronombres personales: pronombres sujeto.
Ficha 3: Usos del pronombre sujeto.
Ficha 5: Gentilicios.
Ficha 6: Los números cardinales.
Ficha 8: Verbos irregulares: HACER, SER y TENER.
4ª Clase
- Revisión de 3ª clase
- Funciones:
Preguntar datos de una 3ª persona. Ej.: ¿Qué hace tu madre?/ ¿A qué se dedica
tu padre?
- Léxico:
La familia.
- Gramática:
Conjugación regular.
Género
Pronombres interrogativos
- Actividades:
Preguntar sobre datos personales y la familia (parejas).
Crear un personaje y escribir un dialogo de encuentro con él/ella (individual).
Rellenar un formulario de solicitud de permiso de residencia para extranjeros
(parejas).
Actividad cultural “350 millones” ( grupos): expresión y comprensión
escrita y oral (textos pág. 28 - 29)
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 7: La familia y las profesiones: el genero
Ficha 4: El presente regular
Ficha 9: Los pronombres interrogativos
5ª. Clase
- Revisión de lãs clases 1ª, 2ª, 3ª e 4ª referente a la unidad 1 del libro Planet@ 1
- Inicio unidad 2 Planet@ 1
- Funciones:
Llamar la atención de alguien (formal e informalmente)
Preguntar e informar sobre direcciones.
Hablar de la localización a la que se encuentra algo
63
Primeiro questionário aplicado aos alunos do grupo Básico 1, do curso de extensão, da Universidade São Judas
Tadeu, campus Butantã. Ver questionário no anexo.
107
Localizar
Confirmar que se ha entendido una información
Agradecer
- Léxico:
La ciudad: establecimientos, locales, adjetivos para describir.
Preposiciones compuestas: Detrás de, al lado de, encima de, delante de,
dentro de, debajo de.
- Gramática:
Verbos irregulares: SEGUIR, GIRAR, IR
Género y número.
Heterogénericos.
Los artículos determinados e indeterminados.
Contracciones AL, DEL.
- Actividades:
Hablar del habitat ideal (gran grupo).
Comprensión oral y escrita (diálogo, pág. 39).
Preguntar e informar sobre direcciones (parejas).
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 11: Los adjetivos – el género y el número
Ficha 12: El artículo
Ficha 13: Preposiciones compuestas
Ficha 15: Contracciones AL, DEL
6ª Clase
- Revisión 5ª clase.
- Funciones:
Hablar de la ciudad, del campo.
- Léxico:
Adjetivos para describir la vida en la ciudad y la vida en el campo.
Medios de transporte.
- Gramática:
Diferencias entre HAY, TENER
64
, ESTÁ y ESTÁN.
Revisión verbos irregulares: SEGUIR, GIRAR, IR.
Comparación de superioridad, inferioridad e igualdad.
Mejor y peor
- Actividades:
Comprensión oral y escrita (texto sobre la vida en la ciudad, pág. 43).
Comprensión escrita (texto sobre vida en el campo, pág. 44)
Comprensión oral y escrita (textos comparando la vida en la ciudad y en el
campo, pág. 45 - 46).
Comprensión y expresión escrita: comparaciones de viviendas anunciadas en
periódico.
Actividad cultural “350 millones” (grupos): expresión y comprensión y
oral escrita (textos pág. 52- 53.
64
Descrição adicional ao livro didático adotado por ser um assunto de conflito para os alunos brasileiros.
108
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 14: La comparación
Ficha 16: Preposiciones con verbo de movimiento
Ficha 17: HAY, ESTÁ, ESTÁN
Ficha 18: Verbos irregulares: SEGUIR, GIRAR, IR
7ª Clase
- Revisión para la prueba
- Actividades:
Expresión oral y escrita: describir un itinerario y explicarlo (en parejas).
Hablar de las ventajas y desventajas de los medios de transportes (gran
grupo).
Decidir el destino de un viaje y justificar la decisión. (grupos). Escribir
itinerario.
8ª Clase
- 1ª prueba escrita, básico 1.
9ª Clase
- Entrega y corrección de la prueba
- Inicio unidad 3 libro Planet@ 1
- Funciones:
Solicitar un producto
Preguntar el precio y pagar
Referirse a un objeto por sus características o por la distancia entre ellos.
Hablar de cantidades pesos y medidas.
Hablar sobre los gustos, concordar y discordar. Ej.: A mi me gusta…, a
mi también, pues a mi no./ A mi no me gusta…, a mi tampoco, pues a
mi sí.
- Léxico:
Alimentos: frutas, verduras, carnes, pescados etc.
- Gramática:
Verbos GUSTAR.
Los pronombres indirecto tónicos y átonos.
- Actividades:
Comprensión oral y escrita (diálogo, pág. 63).
Expresión oral y escrita: Elaboración de un diálogo en un tienda, papel de roles
(parejas).
Preguntar sobre los gustos – concordar y discordar (gran grupo)
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 20: Adjetivos y pronombres deícticos.
Ficha 21: GUSTA/GUSTAN.
Ficha 22: El verbo “gustar” y los pronombres.
10ª Clase
- Revisión de la 9ª clase.
- Funciones:
Expresar gustos (parte II) y preferencias.
109
- Gramática:
Verbo PREFERIR.
Los pronombres objeto directo.
- Actividades:
Organizar una fiesta y un menú de acuerdo a los gustos de los invitados.
Expresión oral y escrita: Elaboración de un diálogo en un mercado, papel de
roles (parejas).
Expresión escrita: escribir un texto sobre lo que le gusta a hacer a un personaje
famoso.
Comprensión y expresión escrita (texto pág. 74): Escribir un texto sobre lo que
te gusta hacer.
Comprensión y expresión escrita (texto pág. 75): Escribir un decálogo de cómo
es el consumidor ideal.
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 23: Verbo “parecer”.
Ficha 24: Pronombres interrogativos: QUÉ, CUÁL.
Ficha 25: Pronombres personales: pronombres acusativos
11ª Clase
- Revisión de la 10ª clase.
- Gramática:
Acentuación.
- Actividades:
Actividad cultural “350 millones” (grupos): expresión y comprensión y
oral escrita (textos pág. 76 – 77).
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 10: La sílaba y el acento
Ficha 19: Acentuación palabras agudas.
Ficha 26: Acentuación palabras esdrújulas.
Ficha 38: Acentuación palabras llanas.
- Inicio unidad 4 libro Planet@ 1
- Funciones:
Hablar de acciones habituales y cotidianas.
Situar las acciones temporalmente.
Preguntar e informar sobre la hora.
Identificar la parte del día.
- Léxico:
Los días de la semana.
- Gramática:
Verbos reflexivos de actividad cotidiana.
- Actividades:
Comprensión escrita (textos pág. 86 – 87)
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 27: La hora.
Ficha 28: Las expresiones del tiempo.
Ficha 35: Verbos reflexivos
110
12ª Clase
- Revisión de la 11ª Clase.
- Funciones:
Preguntar e informar sobre la hora.
Identificar la parte del día.
Hablar de la frecuencia.
Hablar de periodos.
- Léxico:
Los meses y las estaciones del año.
- Gramática:
Formación del gerundio.
Diptongaciones de los verbos.
Irregularidad –GO
Verbos: SABER, DAR
- Actividades:
Comprensión escrita y oral (texto pág. 88)
Expresión escrita: escribir un texto explicando qué haces durante la semana.
Hablar sobre acciones en gerundio.
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 27: La hora.
Ficha 28: Las expresiones del tiempo.
Fichas 29: Presentes irregulares: -GO
Ficha 30: Presentes irregulares: O – EU
Ficha 31: Presentes irregulares: E – IE
Ficha 32: Presentes irregulares: E – I
Ficha 33: Presentes irregulares: Verbos especiales
Ficha 32: Presentes irregulares: repaso
Ficha 36: Gerundio
13ª Clase
- Revisión de la 12ª clase.
- Funciones:
Anunciar un encuentro.
Proponer una actividad.
Concertar una cita: aceptarla, rehusarla, justificarse.
- Léxico:
Lugares y actividades de ocio: ir al teatro, ir al cine, jugar al tenis etc.
- Gramática:
IR A + infinitivo
Querer + infinitivo
Pensar + infinitivo
Marcadores temporales de futuro: Dentro de, la próxima semana, mañana
etc.
- Actividades:
Expresión oral: entrevistar sobre las actividades cotidianas y la frecuencia.
Comprensión escrita y oral (texto pág. 94).
Comprensión escrita y expresión oral (texto pág. 95): concertar citas (parejas).
Expresión oral: comentar que te gusta hacer en tu tiempo libre (parejas)
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
111
Fichas 37: Futuro: IR A + infinitivo.
14ª Clase
- Revisión de la 13ª clase.
- Funciones:
Hablar del futuro (decisiones, deseos, proyectos)
- Léxico:
Del cuento “El almohadón de plumas” de Horacio Quiroga.
- Gramática:
IR A + infinitivo
Querer + infinitivo
Pensar + infinitivo
Marcadores temporales de futuro: Dentro de, la próxima semana, mañana
etc.
- Actividades:
Comprensión escrita: lectura del cuento “El almohadón de plumas” de
Horacio Quiroga (lectura y comentario en gran grupo).
Expresión escrita: redacción sobre qué hace un personaje (foto del libro pág.
99) normalmente que crees qué hace en este momento y qué va hacer dentro de
unos años (individual).
15ª Clase
- Revisión para la prueba
- Actividades:
Actividad cultural “350 millones” (grupos): expresión y comprensión y oral
escrita (textos pág. 100 - 101).
16ª Clase
- 2ª prueba escrita, básico 1.
- Responder el 2º cuestionario.
112
Planificación de Clase Grupo B
1ª Clase:
- Presentación del curso
- Español X Castellano
- Español en el mundo
- Inicio unidad 1 Planet@ 1
Abecedário/ fonética
- Actividades:
Deletrear palabras
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 1: El abecedario
2ª Clase
- Revisión da 1ª clase
- Funciones:
Saludar y despedirse
Preguntar e informar sobre el nombre y el origen
Preguntar cómo se escribe/deletrear
Preguntar e informar sobre las profesiones
- Léxico:
Abecedario (fonética)
Gentilicios
Profesiones
- Gramática:
Tratamiento formal X informal
Verbos LLAMARSE, SER, VIVIR, TENER,HACER
- Actividades:
Comprensión oral y escrita (diálogo pág. 14).
Simular una fiesta de encuentro
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 1: El abecedario
Ficha 5: Gentilicios
3ª Clase
- Revisión de la 2ª clase.
- Funciones:
Pedir una consumición y pagar
- Léxico:
Bebidas
Comidas en el desayuno y en el aperitivo
Numerales cardinales
- Gramática:
Pronombres personales
- Actividades:
113
Comprensión oral y escrita (diálogo pág. 22).
Responder cuestionario
65
(individual)
Imaginar un personaje y hacer preguntas hasta adivinar quién es (parejas)
Juego de conjugación de verbos
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 2: Pronombres personales: pronombres sujeto.
Ficha 3: Usos del pronombre sujeto.
Ficha 5: Gentilicios.
Ficha 6: Los números cardinales.
Ficha 8: Verbos irregulares: HACER, SER y TENER.
4ª Clase
- Revisión de la 3ª clase
- Funciones:
Preguntar datos de una 3ª persona. Ej.: ¿Qué hace tu madre?/ ¿A qué se dedica
tu padre?
- Léxico:
La familia.
- Gramática:
Conjugación regular.
Género
Pronombres interrogativos
- Actividades:
Preguntar sobre datos personales y la familia (parejas).
Crear un personaje y escribir un dialogo de encuentro con él/ella (individual).
Rellenar un formulario de solicitud de permiso de residencia para extranjeros
(parejas).
Lectura de la narrativa corta “Animales en los espejos” de Jorge Luis
Borges (lectura; comentario en gran grupo; actividades).
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 7: La familia y las profesiones: el genero
Ficha 4: El presente regular
Ficha 9: Los pronombres interrogativos
5ª. Clase
- Revisión de las clases 1ª, 2ª, 3ª e 4ª referente a la unidad 1 del libro Planet@ 1
- Inicio unidad 2 Planet@ 1
- Funciones:
Llamar la atención de alguien (formal e informalmente)
Preguntar e informar sobre direcciones.
Hablar de la localización a la que se encuentra algo
Localizar
Confirmar que se ha entendido una información
Agradecer
- Léxico:
65
Primeiro questionário aplicado aos alunos do grupo Básico 1, do curso de extensão, da Universidade São Judas
Tadeu, campus Butantã. Ver questionário no anexo.
114
La ciudad: establecimientos, locales, adjetivos para describir.
Preposiciones compuestas: Detrás de, al lado de, encima de, delante de,
dentro de, debajo de.
- Gramática:
Verbos irregulares: SEGUIR, GIRAR, IR
Género y número.
Heterogénericos.
Los artículos determinados e indeterminados.
Contracciones AL, DEL.
- Actividades:
Hablar del habitat ideal (gran grupo).
Comprensión oral y escrita (diálogo, pág. 39).
Preguntar e informar sobre direcciones (parejas).
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 11: Los adjetivos – el género y el número
Ficha 12: El artículo
Ficha 13: Preposiciones compuestas
Ficha 15: Contracciones AL, DEL
6ª Clase
- Revisión de la 5ª clase.
- Funciones:
Hablar de la ciudad, del campo.
- Léxico:
Adjetivos para describir la vida en la ciudad y la vida en el campo.
Medios de transporte.
- Gramática:
Diferencias entre HAY, TENER
66
, ESTÁ y ESTÁN.
Revisión verbos irregulares: SEGUIR, GIRAR, IR.
Comparación de superioridad, inferioridad e igualdad.
Mejor y peor
- Actividades:
Comprensión oral y escrita (texto sobre la vida en la ciudad, pág. 43).
Comprensión escrita (texto sobre vida en el campo, pág. 44)
Comprensión oral y escrita (textos comparando la vida en la ciudad y en el
campo, pág. 45 - 46).
Comprensión y expresión escrita: comparaciones de viviendas anunciadas en
periódico.
Lectura de la narrativa corta “Borges y Yo” de Jorge Luis Borges
(lectura; comentario en gran grupo; actividades).
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 14: La comparación
Ficha 16: Preposiciones con verbo de movimiento
Ficha 17: HAY, ESTÁ, ESTÁN
Ficha 18: Verbos irregulares: SEGUIR, GIRAR, IR
66
Descrição adicional ao livro didático adotado por ser um assunto de conflito para os alunos brasileiros.
115
7ª Clase
- Revisión para la prueba
- Actividades:
Expresión oral y escrita: describir un itinerario y explicarlo (en parejas).
Hablar de las ventajas y desventajas de los medios de transportes (gran
grupo).
Decidir el destino de un viaje y justificar la decisión. (grupos). Escribir
itinerario.
8ª Clase
- 1ª prueba escrita, básico 1.
9ª Clase
- Entrega y corrección de la prueba.
- Inicio unidad 3 libro Planet@ 1
- Funciones:
Solicitar un producto
Preguntar el precio y pagar
Referirse a un objeto por sus características o por la distancia entre ellos.
Hablar de cantidades pesos y medidas.
Hablar sobre los gustos, concordar y discordar. Ej.: A mi me gusta…, a
mi también, pues a mi no./ A mi no me gusta…, a mi tampoco, pues a
mi sí.
- Léxico:
Alimentos: frutas, verduras, carnes, pescados etc.
- Gramática:
Verbos GUSTAR.
Los pronombres indirecto tónicos y átonos.
- Actividades:
Comprensión oral y escrita (diálogo, pág. 63).
Expresión oral y escrita: Elaboración de un diálogo en un tienda, papel de roles
(parejas).
Preguntar sobre los gustos – concordar y discordar (gran grupo)
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 20: Adjetivos y pronombres deícticos.
Ficha 21: GUSTA/GUSTAN.
Ficha 22: El verbo “gustar” y los pronombres.
10ª Clase
- Revisión de la 9ª clase.
- Funciones:
Expresar gustos (parte II) y preferencias.
- Gramática:
Verbo PREFERIR.
Los pronombres objeto directo.
- Actividades:
Organizar una fiesta y un menú de acuerdo a los gustos de los invitados.
116
Expresión oral y escrita: Elaboración de un diálogo en un mercado, papel de
roles (parejas).
Expresión escrita: escribir un texto sobre lo que le gusta a hacer a un personaje
famoso.
Comprensión y expresión escrita (texto pág. 74): Escribir un texto sobre lo que
te gusta hacer.
Comprensión y expresión escrita (texto pág. 75): Escribir un decálogo de cómo
es el consumidor ideal.
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 23: Verbo “parecer”.
Ficha 24: Pronombres interrogativos: QUÉ, CUÁL.
Ficha 25: Pronombres personales: pronombres acusativos
11ª Clase
- Revisión de la 10ª clase.
- Gramática:
Acentuación.
- Actividades:
Lectura del cuento la narrativa “El almohadón de Plumas” de Horácio
Quiroga (lectura ;comentario en gran grupo; actividades).
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 10: La sílaba y el acento
Ficha 19: Acentuación palabras agudas.
Ficha 26: Acentuación palabras esdrújulas.
Ficha 38: Acentuación palabras llanas.
- Inicio unidad 4 libro Planet@ 1
- Funciones::
Hablar de acciones habituales y cotidianas.
Situar las acciones temporalmente.
Preguntar e informar sobre la hora.
Identificar la parte del día.
- Léxico:
Los días de la semana.
- Gramática:
Verbos reflexivos de actividad cotidiana.
- Actividades:
Comprensión escrita (textos pág. 86 – 87)
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 27: La hora.
Ficha 28: Las expresiones del tiempo.
Ficha 35: Verbos reflexivos
12ª Clase
- Revisión da 11ª Clase.
- Funciones:
Preguntar e informar sobre la hora.
Identificar la parte del día.
Hablar de la frecuencia.
Hablar de periodos.
117
- Léxico:
Los meses y las estaciones del año.
- Gramática:
Formación del gerundio.
Diptongaciones de los verbos.
Irregularidad –GO
Verbos: SABER, DAR
- Actividades:
Comprensión escrita y oral (texto pág. 88)
Expresión escrita: escribir un texto explicando qué haces durante la semana.
Hablar sobre acciones en gerundio.
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Ficha 27: La hora.
Ficha 28: Las expresiones del tiempo.
Fichas 29: Presentes irregulares: -GO
Ficha 30: Presentes irregulares: O – EU
Ficha 31: Presentes irregulares: E – IE
Ficha 32: Presentes irregulares: E – I
Ficha 33: Presentes irregulares: Verbos especiales
Ficha 32: Presentes irregulares: repaso
Ficha 36: Gerundio
13ª Clase
- Revisión de la 12ª clase.
- Funciones:
Anunciar un encuentro.
Proponer una actividad.
Concertar una cita: aceptarla, rehusarla, justificarse.
- Léxico:
Lugares y actividades de ocio: ir al teatro, ir al cine, jugar al tenis etc.
- Gramática:
IR A + infinitivo
Querer + infinitivo
Pensar + infinitivo
Marcadores temporales de futuro: Dentro de, la próxima semana, mañana
etc.
- Actividades:
Expresión oral: entrevistar sobre las actividades cotidianas y la frecuencia.
Comprensión escrita y oral (texto pág. 94).
Comprensión escrita y expresión oral (texto pág. 95): concertar citas (parejas).
Expresión oral: comentar que te gusta hacer en tu tiempo libre (parejas)
- Fichas de ejercicios del Libro de referencia gramatical - Planet@ E.L.E 1
Fichas 37: Futuro: IR A + infinitivo.
14ª Clase
- Revisión de la 13ª clase.
- Funciones:
Hablar del futuro (decisiones, deseos, proyectos)
118
- Léxico:
Del cuento “El almohadón de plumas” de Horacio Quiroga.
- Gramática:
IR A + infinitivo
Querer + infinitivo
Pensar + infinitivo
Marcadores temporales de futuro: Dentro de, la próxima semana, mañana
etc.
- Actividades:
Expresión escrita: redacción sobre qué hace un personaje (foto del libro pág.
99) normalmente que crees qué hace en este momento y qué va hacer dentro de
unos años (individual).
15ª Clase
- Revisión para la prueba
- Actividades:
Lectura del cuento “El árbol de oro” de Ana María Matute (lectura; comentario
en gran grupo; actividades).
16ª Clase
- 2ª prueba escrita, básico 1.
- Responder el 2º cuestionario.
119
ANEXO 5 – Gráficos nossos aprendizes
GRÁFICO 1 GRÁFICO 2
GRÁFICO 3 GRÁFICO 4
Grau de escolaridade
6%
94%
SUPERIOR COMPLETO
SUPERIOR CURSANDO
Idade média
62,5%
25,0%
0,0%
12,5%
DE 19 ATÉ 25 ANOS
DE 26 ATÉ 30 ANOS
DE 31 ATÉ 40 ANOS
ACIMA DE 40 ANOS
Grupo B
Idade média
66,7%
11,1%
16,7%
5,6%
DE 19 ATÉ 25 ANOS
DE 26 ATÉ 30 ANOS
DE 31 ATÉ 40 ANOS
ACIMA DE 40 ANOS
Grupo A
Grau de escolaridade
11%
89%
SUPERIOR COMPLETO
SUPERIOR CURSANDO
Grupo A Grupo B
120
GRÁFICO 5 GRÁFICO6
Estudou espanhol
anteriormente?
6,3%
93,8%
SIM
NÃO
Estudou espanhol
anteriormente?
17%
83%
SIM
NÃO
Grupo A Grupo B
121
ANEXO 6 – Textos das unidades 1, 2, 3 e 4 do Planeta@ E/LE 1
122
123
124
125
126
127
128
129
130
131
132
133
134
135
136
137
138
139
140
141
142
143
144
145
146
ANEXO 7- Textos literários selecionados
Primer Texto: “Animales de los espejos”
67
de Jorge Luis Borges
En algún tomo de las Cartas edificantes y curiosas que aparecieron en París, durane la
primera mitad del siglo XVIII, el P. Zallinger, de la Compañía de Jesús, proyectó un examen
de las ilusiones y errores del vulgo de Cantón; en un censo preliminar anotó que el Pez era un
ser fugitivo y resplandecientte que nadie había tocado, pero que muchos pretendían haber
visto en el fondo de los espejos. El P. Zallinger murió en 1736 y el trabajo iniciado por su
pluma quedó inconcluso: ciento cincuenta años después Herbert Allen Giles tomó la tarea
interrumpida. Según Giles, la creencia del Pez es parte de un mito más amplio, que se refiere
a la época legendaria del Emperado Amarillo.
En aquel tiempo, el mundo de los espejos y el mundo de los hombres no estaban, como
ahora, incomunicados. Eran, además, muy diversos: no coincidían ni los seres ni los colores
ni las formas. Ambos reinos, el especular y el humano, vivían en paz, se entraba y salía por
los espejos. Una noche, la gente del espejo invadió la tierra. Su fuerza era grande, pero al
cabo de sangrientas batallas las artes mágias del Emerador Amarillo prevalecieron. Éste
rechazó a los invasores, los encarceló en los espejos y les impuso la tarea de repetir, como en
una especie de sueño, todos los actos de los hombres. Los privó de su fuerza y de su figura y
los redujo a meros reflejos serviles. Un día, sin embargo, scudirán ese letargo mágico.
El primero que despertarán será el Pez. En el fondo del espejo percibiremos una línea muy
tenue y el color de esa línea será un color no parecido a ningún otro. Después, irán
despertando las otras formas. Gradualmente diferirán de nosotros, gradualmente no nos
imitarán. Romperán las barreras de vidrio o de metal y esta vez no serán vencidas. Junto a
las criaturas de los espejos combatirán las criaturas del agua.
En el Yunnan no se habla del Pez, sino del Tigre del Espejo. Otros entienden que antes de
la invasión oiremos desde el fondo de los espejos el rumor de las armas
67
Disponível em: < http://www.sololiteratura.com/bor/borellibrode.htm>. Acessado em: 16/10/2009
147
Segundo texto: "Borges y yo"
68
de Jorge Luis Borges
Al otro, a Borges, es a quien le ocurren las cosas. Yo camino por Buenos Aires y me demoro,
acaso ya mecánicamente, para mirar el arco de un zaguán y la puerta cancel; de Borges tengo
noticias por el correo y veo su nombre en una terna de profesores o en un diccionario
biográfico. Me gustan los relojes de arena, los mapas, la tipografía del siglo XVIII, las
etimologías, el sabor del café y la prosa de Stevenson; el otro comparte esas preferencias, pero
de un modo vanidoso que las convierte en atributos de un actor. Seria exagerado afirmar que
nuestra relación es hostil; yo vivo, yo me dejo vivir, para que Borges pueda tramar su
literatura y esa literatura me justifica. Nada me cuesta confesar que ha logrado ciertas páginas
válidas, pero esas páginas no me pueden salvar, quizá porque lo bueno ya no es de nadie, ni
siquiera del otro, sino del lenguaje o la tradición. Por lo demás, yo estoy destinado a
perderme, definitivamente, y sólo algún instante de mí podrá sobrevivir en el otro.
Poco a poco voy cediéndole todo, aunque me consta su perversa costumbre de falsear y
magnificar. Spinoza entendió que todas las cosas quieren perseverar en su ser; la piedra
eternamente quiere ser piedra y el tigre un tigre. Yo he de quedar en Borges, no en
(si es que alguien soy), pero me reconozco menos en sus libros que en muchos otros o que en
el laborioso rasgueo de una guitarra. Hace años yo traté de librarme de él y pasé de las
mitologías del arrabal a los juegos con el tiempo y con lo infinito, pero esos juegos son de
Borges ahora y tendré que idear otras cosas. Así mi vida es una fuga y todo lo pierdo y todo
es del olvido, o del otro.
No sé cuál de los dos escribe esta página.
Segundo texto: “El almohadón de plumas”
69
de Horacio Quiroga
Su luna de miel fue un largo escalofrío. Rubia, angelical y tímida, el carácter duro de su
marido heló sus soñadas niñerías de novia. Lo quería mucho, sin embargo, a veces con un
ligero estremecimiento cuando volviendo de noche juntos por la calle, echaba una furtiva
mirada a la alta estatura de Jordán, mudo desde hacía una hora. Él, por su parte, la amaba
profundamente, sin darlo a conocer.
68
Disponível em: http://www.patriagrande.net/argentina/jorge.luis.borges/ Acessado em: 19:10/2009
69
Disponível em: http://www.analitica.com/Bitblio/hquiroga/plumas.asp Acessado em: 19:10/2009
148
Durante tres meses —se habían casado en abril— vivieron una dicha especial. Sin duda
hubiera ella deseado menos severidad en ese rígido cielo de amor, más expansiva e incauta
ternura; pero el impasible semblante de su marido la contenía siempre.
La casa en que vivían influía un poco en sus estremecimientos. La blancura del patio
silencioso —frisos, columnas y estatuas de mármol— producía una otoñal impresión de
palacio encantado. Dentro, el brillo glacial del estuco, sin el más leve rasguño en las altas
paredes, afirmaba aquella sensación de desapacible frío. Al cruzar de una pieza a otra, los
pasos hallaban eco en toda la casa, como si un largo abandono hubiera sensibilizado su
resonancia.
En ese extraño nido de amor, Alicia pasó todo el otoño. No obstante, había concluido por
echar un velo sobre sus antiguos sueños, y aún vivía dormida en la casa hostil, sin querer
pensar en nada hasta que llegaba su marido.
No es raro que adelgazara. Tuvo un ligero ataque de influenza que se arrastró insidiosamente
días y días; Alicia no se reponía nunca. Al fin una tarde pudo salir al jardín apoyada en el
brazo de él. Miraba indiferente a uno y otro lado. De pronto Jordán, con honda ternura, le
pasó la mano por la cabeza, y Alicia rompió en seguida en sollozos, echándole los brazos al
cuello. Lloró largamente todo su espanto callado, redoblando el llanto a la menor tentativa de
caricia. Luego los sollozos fueron retardándose, y aún quedó largo rato escondida en su
cuello, sin moverse ni decir una palabra.
Fue ese el último día que Alicia estuvo levantada. Al día siguiente amaneció desvanecida. El
médico de Jordán la examinó con suma atención, ordenándole calma y descanso absolutos.
—No —le dijo a Jordán en la puerta de calle, con la voz todavía baja—. Tiene una gran
debilidad que no me explico, y sin vómitos, nada.. . Si mañana se despierta como hoy,
llámeme enseguida.
Al otro día Alicia seguía peor. Hubo consulta. Constatóse una anemia de marcha agudísima,
completamente inexplicable. Alicia no tuvo más desmayos, pero se iba visiblemente a la
muerte. Todo el día el dormitorio estaba con las luces prendidas y en pleno silencio.
Pasábanse horas sin oír el menor ruido. Alicia dormitaba. Jordán vivía casi en la sala, también
con toda la luz encendida. Paseábase sin cesar de un extremo a otro, con incansable
obstinación. La alfombra ahogaba sus pesos. A ratos entraba en el dormitorio y proseguía su
mudo vaivén a lo largo de la cama, mirando a su mujer cada vez que caminaba en su
dirección.
Pronto Alicia comenzó a tener alucinaciones, confusas y flotantes al principio, y que
descendieron luego a ras del suelo. La joven, con los ojos desmesuradamente abiertos, no
149
hacía sino mirar la alfombra a uno y otro lado del respaldo de la cama. Una noche se quedó de
repente mirando fijamente. Al rato abrió la boca para gritar, y sus narices y labios se perlaron
de sudor.
—¡Jordán! ¡Jordán! —clamó, rígida de espanto, sin dejar de mirar la alfombra.
Jordán corrió al dormitorio, y al verlo aparecer Alicia dio un alarido de horror.
—¡Soy yo, Alicia, soy yo!
Alicia lo miró con extravió, miró la alfombra, volvió a mirarlo, y después de largo rato de
estupefacta confrontación, se serenó. Sonrió y tomó entre las suyas la mano de su marido,
acariciándola temblando.
Entre sus alucinaciones más porfiadas, hubo un antropoide, apoyado en la alfombra sobre los
dedos, que tenía fijos en ella los ojos.
Los médicos volvieron inútilmente. Había allí delante de ellos una vida que se acababa,
desangrándose día a día, hora a hora, sin saber absolutamente cómo. En la última consulta
Alicia yacía en estupor mientras ellos la pulsaban, pasándose de uno a otro la muñeca inerte.
La observaron largo rato en silencio y siguieron al comedor.
—Pst... —se encogió de hombros desalentado su médico—. Es un caso serio... poco hay que
hacer...
—¡Sólo eso me faltaba! —resopló Jordán. Y tamborileó bruscamente sobre la mesa.
Alicia fue extinguiéndose en su delirio de anemia, agravado de tarde, pero que remitía
siempre en las primeras horas. Durante el día no avanzaba su enfermedad, pero cada mañana
amanecía lívida, en ncope casi. Parecía que únicamente de noche se le fuera la vida en
nuevas alas de sangre. Tenía siempre al despertar la sensación de estar desplomada en la cama
con un millón de kilos encima. Desde el tercer día este hundimiento no la abandonó más.
Apenas podía mover la cabeza. No quiso que le tocaran la cama, ni aún que le arreglaran el
almohadón. Sus terrores crepusculares avanzaron en forma de monstruos que se arrastraban
hasta la cama y trepaban dificultosamente por la colcha.
Perdió luego el conocimiento. Los dos días finales deliró sin cesar a media voz. Las luces
continuaban fúnebremente encendidas en el dormitorio y la sala. En el silencio agónico de la
casa, no se oía más que el delirio monótono que salía de la cama, y el rumor ahogado de los
eternos pasos de Jordán.
Murió, por fin. La sirvienta, que entró después a deshacer la cama, sola ya, miró un rato
extrañada el almohadón.
—¡Señor! —llamó a Jordán en voz baja—. En el almohadón hay manchas que parecen de
sangre.
150
Jordán se acercó rápidamente Y se dobló a su vez. Efectivamente, sobre la funda, a ambos
lados del hueco que había dejado la cabeza de Alicia, se veían manchitas oscuras.
—Parecen picaduras —murmuró la sirvienta después de un rato de inmóvil observación.
—Levántelo a la luz —le dijo Jordán.
La sirvienta lo levantó, pero enseguida lo dejó caer, y se quedó mirando a aquél, lívida y
temblando. Sin saber por qué, Jordán sintió que los cabellos se le erizaban.
—¿Qué hay?—murmuró con la voz ronca.
—Pesa mucho —articuló la sirvienta, sin dejar de temblar.
Jordán lo levantó; pesaba extraordinariamente. Salieron con él, y sobre la mesa del comedor
Jordán cortó funda y envoltura de un tajo. Las plumas superiores volaron, y la sirvienta dio un
grito de horror con toda la boca abierta, llevándose las manos crispadas a los bandos: —sobre
el fondo, entre las plumas, moviendo lentamente las patas velludas, había un animal
monstruoso, una bola viviente y viscosa. Estaba tan hinchado que apenas se le pronunciaba la
boca.
Noche a noche, desde que Alicia había caído en cama, había aplicado sigilosamente su boca
—su trompa, mejor dicho— a las sienes de aquélla, chupándole la sangre. La picadura era
casi imperceptible. La remoción diaria del almohadón había impedido sin dada su desarrollo,
pero desde que la joven no pudo moverse, la succión fue vertiginosa. En cinco días, en cinco
noches, había vaciado a Alicia.
Estos parásitos de las aves, diminutos en el medio habitual, llegan a adquirir en ciertas
condiciones proporciones enormes. La sangre humana parece serles particularmente
favorable, y no es raro hallarlos en los almohadones de pluma.
Segundo texto: “El árbol de oro”
70
de Ana Maria Matute
Asistí durante un otoño a la escuela de la señorita Leocadia, en la aldea, porque mi salud no
andaba bien y el abuelo retrasó mi vuelta a la ciudad. Como era el tiempo frío y estaban los
suelos embarrados y no se veía rastro de muchachos, me aburría dentro de la casa, y pedí al
abuelo asistir a la escuela. El abuelo consintió, y acudí a aquella casita alargada y blanca de
cal, con el tejado pajizo y requemado por el sol y las nieves, a las afueras del pueblo.
La señorita Leocadia era alta y gruesa, tenía el carácter más bien áspero y grandes juanetes en
los pies, que la obligaban a andar como quien arrastra cadenas. Las clases en la escuela, con la
70
Disponível em: < http://www.eslconnect.com/apspanish/arboldeoro.html>. Acessado em: 16/10/2009
151
lluvia rebotando en el tejado y en los cristales, con las moscas pegajosas de la tormenta
persiguiéndose alrededor de la bombilla, tenían su atractivo. Recuerdo especialmente a un
muchacho de unos diez años, hijo de un aparcero muy pobre, llamado Ivo. Era un muchacho
delgado, de ojos azules, que bizqueaba ligeramente al hablar. Todos los muchachos y
muchachas de la escuela admiraban y envidiaban un poco a Ivo, por el don que poseía de
atraer la atención sobre sí, en todo momento. No es que fuera ni inteligente ni gracioso, y, sin
embargo, había algo en
él, en su voz quizás, en las cosas que contaba, que conseguía cautivar a quien le escuchase.
También la señorita Leocadia se dejaba prender de aquella red de plata que Ivo tendía a
cuantos atendían sus enrevesadas conversaciones, y yo creo que muchas veces contra su
voluntad- la señorita Leocadia le confiaba a Ivo tareas deseadas por todos, o distinciones que
merecían alumnos más estudiosos y aplicados.
Quizá lo que más se envidiaba de Ivo era la posesión de la codiciada llave de la torrecita. Ésta
era, en efecto, una pequeña torre situada en un ángulo de la escuela, en cuyo interior se
guardaban los libros de lectura. Allí entraba Ivo a buscarlos, y allí volvía a dejarlos, al
terminar la clase. La señorita Leocadia se lo encomendó a él,
nadie sabía en realidad por qué.
Ivo estaba muy orgulloso de esta distinción, y por nada del mundo la hubiera cedido. Un día,
Mateo Heredia, el más aplicado y estudioso de la escuela, pidió encargarse de la tarea -a todos
nos fascinaba el misterioso interior de la torrecita, donde no entramos nunca-, y la señorita
Leocadia pareció acceder. Pero Ivo se levantó, y acercándose a la maestra empezó a hablarle
en su voz baja, bizqueando los ojos y moviendo mucho las manos, como tenía por costumbre.
La maestra dudó un poco, y al fin dijo:
-Quede todo como estaba. Que siga encargándose Ivo de la torrecita.
A la salida de la escuela le pregunté:
-¿Qué le has dicho a la maestra?
Ivo me miró de través y vi relampaguear sus ojos azules.
-Le hablé del árbol de oro.
Sentí una gran curiosidad.
-¿Qué árbol?
Hacía frío y el camino estaba húmedo, con grandes charcos que brillaban al sol pálido de la
tarde. Ivo empezó a chapotear en ellos, sonriendo con misterio.
152
-Si no se lo cuentas a nadie...
-Te lo juro, que a nadie se lo diré.
Entonces Ivo me explicó:
-Veo un árbol de oro. Un árbol completamente de oro: ramas, tronco, hojas... ¿sabes? Las
hojas no se caen nunca. En verano, en invierno, siempre. Resplandece mucho; tanto, que
tengo que cerrar los ojos para que no me duelan.
-¡Qué embustero eres! -dije, aunque con algo de zozobra. Ivo me
miró con desprecio.
-No te lo creas -contestó-. Me es completamente igual que te lo creas o no... ¡Nadie entrará
nunca en la torrecita, y a nadie dejaré ver mi árbol de oro! ¡Es mío! La señorita Leocadia lo
sabe, y no se atreve a darle la llave a Mateo Heredia, ni a nadie... ¡Mientras yo viva, nadie
podrá entrar allí y ver mi árbol!
Lo dijo de tal forma que no pude evitar el preguntarle:
-¿Y cómo lo ves...?
-¡Ah, no es fácil -dijo, con aire misterioso-. Cualquiera no
podría verlo. Yo sé la rendija exacta.
-¿Rendija?...
-Sí, una rendija de la pared. Una que hay corriendo el cajón de la
derecha: me agacho y me paso horas y horas... ¡Cómo brilla el árbol!
¡Cómo brilla! Fíjate que si algún pájaro se le pone encima
también se vuelve de oro. Eso me digo yo: si me subiera a una rama,
¿me volvería acaso de oro también?
No supe qué decirle, pero, desde aquel momento, mi deseo de ver el árbol creció de tal forma
que me desasosegaba. Todos los días, al acabar la clase de lectura, Ivo se acercaba al cajón de
la maestra, sacaba la llave y se dirigía a la torrecita. Cuando volvía, le preguntaba:
-¿Lo has visto?
-Sí -me contestaba. Y, a veces, explicaba alguna novedad:
-Le han salido unas flores raras. Mira: así de grandes, como mi mano
lo menos, y con los pétalos alargados. Me parece que esa flor es parecida al arzadú.
-¡La flor del frío! -decía yo, con asombro-. ¡Pero el
Arzadú es encarnado!
-Muy bien -asentía él, con gesto de paciencia-. Pero en mi
árbol es oro puro.
153
-Además, el arzadú crece al borde de los caminos... y no es un
árbol.
No se podía discutir con él. Siempre tenía razón, o por lo
menos lo parecía.
Ocurrió entonces algo que secretamente yo deseaba; me avergonzaba sentirlo, pero así era:
Ivo enfermó, y la señorita Leocadia encargo a otro la llave de la torrecita. Primeramente, la
disfrutó Mateo Heredia. Yo espié su regreso, el primer día, y le dije:
-¿Has visto un árbol de oro?
-¿Qué andas graznando? -me contestó de malos modos, porque no
era simpático, y menos conmigo. Quise dárselo a entender, pero no me hizo caso.
Unos días después, me dijo:
-Si me das algo a cambio, te dejo un ratito la llave y vas durante el
recreo. Nadie te verá... Vacié mi hucha, y, por fin, conseguí la codiciada llave. Mis manos
temblaban de emoción cuando entré en el cuartito de la torre. Allí estaba el cajón. Lo aparté y
vi brillar la rendija en la oscuridad. Me agaché y miré.
Cuando la luz dejó de cegarme, mi ojo derecho sólo descubrió una cosa: la seca tierra de la
llanura alargándose hacia el cielo.
Nada más. Lo mismo que se veía desde las ventanas altas. La tierra desnuda y yerma, y nada
más que la tierra. Tuve una gran decepción y la seguridad de que me habían estafado. No
sabía cómo ni de qué manera, pero me habían estafado.
Olvidé la llave y el árbol de oro. Antes de que llegaran las nieves regresé a la ciudad.
Dos veranos más tarde volví a las montañas. Un día, pasando por el cementerio -era ya tarde y
se anunciaba la noche en el cielo: el sol, como una bola roja, caía a lo lejos, hacia la carrera
terrible y sosegada de la llanura- vi algo extraño. De la tierra grasienta y pedregosa, entre las
cruces caídas, nacía un árbol grande y hermoso, con las hojas anchas de oro: encendido y
brillante todo él, cegador. Algo me vino a la memoria, como un sueño, y pensé: "Es un árbol
de oro". Busqué al pie del árbol, y no tardé en dar con una crucecilla de hierro negro, mohosa
por la lluvia. Mientras la enderezaba, leí: IVO MÁRQUEZ, DE DIEZ AÑOS DE EDAD.
Y no daba tristeza alguna, sino, tal vez, una extraña y muy grande
alegría.
154
ANEXO 8 – Atividades propostas para os textos literários
Atividade proposta para o texto “Animales en los Espejos”, de Jorge Luis Borges
1º Leitura do texto em voz alta pelo professor.
Divisão da turma em quatro grupos. Os pequenos grupos releem o texto para desenvolver
uma das seguintes atividades (pois a cada um foi alocada apenas uma atividade):
a) trabalhar o vocabulário do texto, comentando qual acepção ou acepções são as mais
adequada(s) para o(s) sentido(s) que os sujeitos-aprendizes atribuem ao texto;
b) descrever as novas experiências que o texto proporciona;
c) definir a qual dos mundos acham que eles pertencem, como sujeitos do mundo;
d) escrever o que interpretam do texto.
3º Cada pequeno grupo apresenta para o grande grupo a tarefa desenvolvida em 2.
Os alunos discutem sobre o texto (as intervenções são feitas livremente). O professor
atua como mediador.
71
5º Atividade final – Escrita de um texto: “¿Qué ves cuando te miras al espejo?
Atividade proposta para o texto “Borges y Yo”, de Jorge Luis Borges
1º Leitura do texto em voz alta, pelo professor.
Divisão da turma em três grupos, que releem o texto para desenvolver uma das seguintes
atividades (cada grupo tem uma atividade designada):
a) trabalhar o vocabulário do texto, comentando qual acepção ou acepções são as mais
adequada(s) para o(s) sentido(s) que os sujeitos-aprendizes atribuem ao texto;
b) descrever quais pistas são oferecidas pelo texto para pensar que as duas personagens se
referem a uma “mesma pessoa”;
c) comentar como percebem as personagens.
3º Cada pequeno grupo apresenta para o grande grupo a tarefa desenvolvida.
Os alunos discutem sobre o texto (as intervenções são feitas livremente). O professor
atua como mediador.
5º Atividade final: Completar os seguintes fragmentos
1. Yo soy...
71
Cabe observar que essa atividade estava prevista para ser feita em 1h30m , mas acabou tomando as 3h da aula,
que, inclusive, não teve intervalo devido ao grande envolvimento dos alunos com a proposta.
155
(Nome do aluno) (ser)…
2. Yo quiero…
(Nome do aluno) (querer)…
3. Yo tengo...
(Nome do aluno) (tener)…
4. Yo temo…
(Nome do aluno) (temer)…
5. Yo espero…
(Nome do aluno) (esperar)…
6. Yo sueño…
(Nome do aluno) (soñar)…
7. Me gusta vivir...
(Nome do aluno) (gustar)…
8. Me enorgullezco…
(Nome do aluno) (enorgullecerse)…
9. Yo sé...
(Nome do aluno) (saber)…
10. Yo digo…
(Nome do aluno) (decir)…
Atividade proposta para o conto “El almohadón de plumas”, de Horacio Quiroga
1º Apresenta-se o título do conto e se pergunta sobre que poderá tratar a história.
2º Leitura do texto em voz alta, pelo professor.
Os alunos discutem o texto e os desdobramentos do relato (as intervenções são feitas
livremente). O professor faz de mediador e trabalha o sentido do vocabulário do texto, sobre o
qual os alunos manifestam dúvidas.
Atividade final: Marcar que pistas são dadas pelo narrador sobre o desenlace da morte da
personagem Alicia
72
.
72
Devido à extensão desse conto, não foram previstas outras atividades para serem realizadas na sala de aula.
156
Atividade proposta para o conto “El árbol de oro”, de Ana de Maria Matute
1º Leitura do texto em voz alta pelo professor.
Divisão da turma em quatro grupos. Os pequenos grupos releem o texto para desenvolver
uma das seguintes atividades (cada grupo tem uma atividade designada)
73
:
a) trabalhar o vocabulário do texto, comentando qual acepção ou acepções são as mais
adequada(s) para o(s) sentido(s) que os sujeitos-aprendizes atribuem ao texto
74
;
b) comentar se a história poderia ter acontecido no Brasil e justificar o porquê;
c) comentar/discutir como percebem as personagens.
3º Cada pequeno grupo apresenta para o grande grupo a tarefa desenvolvida.
Todos os alunos discutem o texto (as intervenções são feitas livremente). O professor
faz de mediador.
4º Atividade final: Escrever um texto sobre “¿Qué o quién es tu árbol de oro?”
73
A designação de tarefas foi feita para que os pequenos grupos não repetissem a atividade e pudessem ter a
oportunidade de desenvolver outra que não fosse o trabalho com o vocabulário.
74
O conto foi dividido em duas partes para o trabalho de vocabulário devido a sua extensão. Enquanto um grupo
trabalhava com o vocabulário da primeira parte, outro fez o mesmo trabalho com a segunda parte do conto.
157
ANEXO 9 – Gráficos Resultados Q2
Gráfico 1 Gráfico 2
Gráfico 3 Gráfico 4
1. A lo largo del curso hemos
ldo varios tipos de textos. ¿Cuál
te ha gustado más?
37,5%
12,5%
50,0%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
1. A lo largo del curso hemos
ldo varios tipos de textos. ¿Cuál
te ha gustado más?
10%
10%
80%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
Grupo A
Grupo B
2. ¿Qué tipo de texto te resultó
más fácil para leer?
40%
40%
20%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
2. ¿Qué tipo de texto te resultó
más fácil para leer?
25%
75%
0%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
158
Gráfico 5 Gráfico 6
Gráfico 7 Gráfico 8
3. ¿Qué tipo de texto te ha
producido mayor placer al leerlo?
50%
0%
50%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
3. ¿Qué tipo de texto te ha
producido mayor placer al leerlo?
0%
10%
90%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
4. ¿Con qué tipo de texto te ha
parecido que consigues aprender
más sobre la lengua española?
50%
25%
25%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
4. ¿Con qué tipo de texto te ha
parecido que consigues aprender
más sobre la lengua española?
30%
30%
40%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
159
Gráfico 9 Gráfico 10
Gráfico 11 Gráfico 12
5. ¿Qué tipo de texto te ha
motivado más para estudiar la
lengua española?
37,5%
12,5%
50,0%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
5. ¿Qué tipo de texto te ha
motivado más para estudiar la
lengua española?
30,0%
30,0%
40,0%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
6. ¿Qué imagen tienes de la
lengua española al terminar el
curso?
37,5%
37,5%
25,0%
Lengua de negócios
Lengua de cultura
Lengua para viajar y hacer amigos
6. ¿Qué imagen tienes de la
lengua española al terminar el
curso?
20,0%
50,0%
30,0%
Lengua de negócios
Lengua de cultura
Lengua para viajar y hacer amigos
160
Gráfico 13 Gráfico 14
Gráfico 15 Gráfico 16
7. ¿En el Básico II, próximo
módulo del curso de español, con
qué tipo de texto te gustaría de
trabajar más?
25%
25%
50%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
7. ¿En el Básico II, próximo
módulo del curso de español, con
qué tipo de texto te gustaría de
trabajar más?
0%
11%
89%
Libro Didáctico
Diálogos
Textos Literários
8. ¿Después de haber terminado
este curso ha cambiado tu
opinión sobre la lengua
española? ¿Por qué?
90,0%
10,0%
0,0%
Sí Nó Un poco
8. ¿Después de haber terminado
este curso ha cambiado tu
opinión sobre la lengua
española? ¿Por qué?
25,0%
37,5%
37,5%
Sí Nó Un poco
161
Gráfico 17 Gráfico 18
9. ¿Qué actividades te han
gustado más en el curso?
37,5%
62,5%
0,0%
0,0%
0,0%
0,0%
Escuchar grabaciones de los diálogos
Leer los textos del libro
Escribir
Hablar
Leer el cuento literário
Hacer ejercícios de gramática
9. ¿Qué actividades te han
gustado más en el curso?
12,5%
0,0%
12,5%
37,5%
37,5%
0,0%
Escuchar grabaciones de los diálogos
Leer los textos del libro
Escribir
Hablar
Leer el cuento literário
Hacer ejercícios de gramática
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