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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM DESIGN
(PGDESIGN-UFRGS)
DESIGN GRÁFICO E DESENHO NO CENÁRIO
TECNOLÓGICO CONTEMPORÂNEO: UM ESTUDO
DE CASO
Gabriel Gimmler Netto
ORIENTADORA
Profa. Dra. Evelise Anicet Rüthschilling
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Airton Cattani
Prof. Dr. Luis Edegar Oliveira Costa
Prof. Dr. Flávio Gonçalves
Porto Alegre, novembro de 2009
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II
DESIGN GRÁFICO E DESENHO NO CENÁRIO
TECNOLÓGICO CONTEMPORÂNEO: UM ESTUDO
DE CASO
Gabriel Gimmler Netto
Dissertação apresentada como requisito para obtenção do título de
Mestre em Design & Tecnologia
ORIENTADORA
Profa. Dra. Evelise Anicet Rüthschilling
Porto Alegre, novembro de 2009
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III
Para minha família, em especial para
minha querida avó, Iris Branca Marx Gimmler.
IV
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha família por todo carinho, amor e apoio às minhas escolhas. Por
me ensinarem a ser persistente e apaixonado pelo trabalho.
À minha mãe, Elsa Maria Gimmler, pelo amor incondicional. Por ser a mulher forte
que é. Pelo apoio e liberdade que sempre proporcionou. Pelos ensinamentos,
presença e participação nas diferentes etapas de vida.
Ao meu pai, Alcyone da Cruz Netto Filho, pelo olhar de admiração que percebo
quando relato alguma conquista. Olhar esse que sempre me incentivou a buscar
novas conquistas.
Às minhas irmãs, Maria Manoela Gimmler Netto e Maria Amélia Gimmler Netto, pelo
amor e amizade, sem os quais minha vida seria menos feliz.
À minha tia Maria Clara Gimmler da Luz, pelo apoio e carinho que me dedica.
À minha madrinha Maria Julieta Fonseca Wolff, pelo entusiasmo e afeto, bem como
à sua família, em especial à Renata Wolff pela valiosa ajuda.
À minha orientadora Evelise Anicet Rüthschilling pela paciência, amizade e
dedicação que recebi durante o percurso sinuoso transcorrido nessa pesquisa. Por
ser uma mulher generosa, por abrir as portas e deixá-las abertas. Pela competência
e sinceridade nas orientações.
Ao meu co-orientador Flávio Gonçalves, pela amizade e dedicação. Pelo incentivo e
pelas críticas construtivas tão importantes para o desenvolvimento desse trabalho.
Aos membros da banca final e da banca de qualificação, por todas as indicações.
À professora Paula Ramos pelos conselhos e pela generosidade.
V
Aos artistas/designers que com tanta generosidade contribuíram para a pesquisa
respondendo os questionários.
À Universidade Federal do Rio Grande do Sul, por ter me proporcionado uma
formação acadêmica de grande qualidade e por ter me possibilitado conhecer
pessoas tão generosas e competentes. Pelos muitos amigos que fiz.
Ao PGDesign - UFRGS pela oportunidade que me deu de desenvolver esse trabalho
tão importante para minha vida acadêmica e profissional, como artista e como
designer gráfico. Aos coordenadores, professores e colegas dessa primeira turma,
pela vontade de fazer um programa de pós-graduação livre e interdisciplinar, mas
com rigor e coerência. Aos funcionários do programa pela dedicação, organização e
competência.
Ao Instituto de Artes da UFRGS, por todo o aprendizado que tive, tanto como aluno
da graduação, quanto como professor substituto. A todos professores, coletas,
alunos e funcionários.
Ao Núcleo de Design de Superfície da UFRGS, onde tive o privilégio de, junto com
tantos colegas e amigos, ter tantas boas experiências, aprendizados e conquistas.
A todos os designers com quem trabalhei e que tanto me ensinaram.
Aos colegas artistas de convívio e também aqueles que me influenciaram mesmo
sem saber.
À Adauany Pieve Zimovski pelo carinho e apoio.
Aos meus colegas do Atelier Subterrânea, pelo apoio e paciência que me dedicaram
durante esse período de muito trabalho.
VI
Resumo
A pesquisa que fundamenta a presente dissertação tem como ponto de
partida as percepções pessoais do autor sobre semelhanças no processo de criação
em suas duas áreas de atuação: o design gráfico e o desenho artístico. Para
investigar a existência de tais semelhanças, primeiramente procede-se a uma
pesquisa teórica sobre essas áreas, numa breve abordagem histórica até seus
modos de existir na pós-modernidade, com atenção especial ao papel transformador
exercido pela tecnologia digital. São descritas algumas estratégias contemporâneas
para a criação de imagens, no âmbito do design e das artes visuais, onde se
identificam semelhanças estéticas em procedimentos envolvidos na criação de
desenhos e peças gráficas. Com a finalidade de comprovar a existência de tais
semelhanças e identificar sua origem, em um segundo momento, o processo
pessoal de criação é analisado. Por fim, procede-se à análise dos depoimentos de
profissionais também dedicados ao design gráfico e ao desenho como meio de
expressão, onde se vêem modos diferentes de interação e percebem-se
distanciamentos, transposições, colaborações e contribuições entre essas áreas.
Palavras Chave
Desenho, design gráfico e tecnologia digital.
VII
Abstract
This thesis is based on a research that has its starting point on the author's
personal perceptions of similarities in the creative process in his two areas of work:
graphic design and artistic drawing. To investigate the existence of such similarities,
first a theoretical research is done on these areas, providing a brief historical
approach up until their manners of existence in postmodernity, with special attention
to the transformative role played by digital technology. Some contemporary
strategies are described for the creation of images in design and visual arts, in which
both aesthetic and procedural similarities are identified. Secondly, personal creation
processes are analyzed in order to demonstrate the existence of such similarities and
to identify their origin. Finally, an examination is done of the testimonies of
professionals also dedicated to graphic design and drawing, in which different ways
of interaction are seen, and distancing, transpositions, collaborations and
cooperation between these areas are perceived.
Keywords
Artistic draw, grafic design and digital technology.
VIII
LISTA DE FIGURAS
Figura1: Violino e Cachimbo ................................................................................35
Figura 2: Tristeza do Rei......................................................................................36
Figura 3: Sem Título.............................................................................................37
Figura 4: Vive la France .......................................................................................38
Figura 5: The Fascinating Cypress from Natural History......................................39
Figura 6: Sem Título.............................................................................................41
Figura 7: Sem Título.............................................................................................41
Figura 8: A Morte e a menina...............................................................................43
Figura 9: Wall Drawing.........................................................................................44
Figura 10: Flexibilização.......................................................................................55
Figura 11: Spruch.................................................................................................56
Figura 12: Sem título............................................................................................69
Figura 13: Sem Título...........................................................................................70
Figura 14: Sem título............................................................................................71
Figura 15: Sem título............................................................................................72
Figura 16: Sem Título...........................................................................................73
Figura 17: Instructiosns for A, B and C.................................................................74
Figura 18: Sem título............................................................................................76
Figura 19: Sem título............................................................................................77
Figura 20: The Future for Less #3........................................................................78
Figura 21: Sem título............................................................................................88
Figura 22: Sem título............................................................................................89
Figura 23: Desenho da série Esgrima..................................................................93
Figura 24: Desenho da série Esgrima..................................................................95
Figura 25: Desenhos da série Esgrima ................................................................97
Figura 26: Imagens enviadas por e-mail para a elaboração da peça gráfica ...... 101
Figura 27: Reprodução da tela do computador....................................................102
Figura 28: Estudo da aba.....................................................................................103
Figura 29: Estudo de enquadramento dos elementos expressivos......................104
Figura 30: Estudo para enquadramentos.............................................................105
Figura 31: Solução da página interna...................................................................106
Figura 32: Solução para primeira dobra, contracapa e capa................................107
IX
Figura 33: Capa impressa do folder .....................................................................108
Figura 34: Primeira dobra aberta..........................................................................109
Figura 35: Página interna aberta. 2009................................................................109
Figura 36: Contracapa. 2009................................................................................110
Figura 37: Guilherme Dable .................................................................................118
Figura 38: Fábio Zimbres .....................................................................................119
Figura 39: James Zortea ......................................................................................121
Figura 40: Carla Pilla............................................................................................123
Figura 41: Guto Lacaz..........................................................................................127
Figura 42: Sem Título...........................................................................................132
X
LISTA DE ABREVIATURAS
1. RGB – Red, Green, Blue
2. CMYK – Cian, Magenta, Yellow, Black
3. PS – Post Script
4. EPS – Encapsulated Post Script
5. PDF – Portable Document Format
6. CTP – Computer to plate
7. DPI: Dots per inch
8. JPG: Joint Photographic Experts Group
XI
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................14
1.1 Métodos e procedimentos de pesquisa..........................................................18
1.2 Estrutura do texto...........................................................................................20
2. DESENHO, DESIGN GRÁFICO, TECNOLOGIA DIGITAL E AS IMAGENS
PÓS-MODERNAS................................................................................................21
2.1 O DESENHO..................................................................................................22
2.1.1 O disegno, o desígnio e o desenho.............................................................23
2.1.2 A experiência com o desenho.....................................................................24
2.1.3 Modos tradicionais do desenho...................................................................26
2.1.4 Meios técnicos do desenho.........................................................................27
2.1.5 Suportes do desenho ..................................................................................28
2.1.6 Tipos de desenho........................................................................................30
2.1.6.1 Desenhos preparatórios...........................................................................30
2.1.6.2 Desenhos Finalizados..............................................................................32
2.1.7 O desenho como confissão autográfica, grafológica e conceitual...............32
2.1.8 A expansão dos limites do desenho............................................................34
2.2. O DESIGN GRÁFICO....................................................................................48
2.2.1 O estatuto do desenho na Bauhaus............................................................52
2.2.2 Design Gráfico e significado das imagens / mensagens.............................58
2.3. CARACTERÍSTICAS DAS IMAGENS CONTEMPORÂNEAS.......................63
2.3.1 Sobre estratégias Contemporâneas............................................................68
2.3.1.1 Interatividade............................................................................................68
2.3.1.2 Indefinição................................................................................................70
2.3.1.3 Imperfeição...............................................................................................75
2.3.1.4 Hibridação................................................................................................77
XII
2.2.3 O PAPEL DA TECNOLOGIA DIGITAL NO DESIGN GRÁFICO .................79
2.2.3.1 Programas Editores Gráficos ...................................................................81
2.2.3.2. O Postscript.............................................................................................83
2.2.3.3. O computer-to-plate (CTP)......................................................................84
2.2.3.4. Os equipamentos periféricos...................................................................84
2.2.3.5. A Internet.................................................................................................84
2.2.3.6 Tecnologia digital e mercado profissional.................................................85
2.2.3.7 Tecnologia digital e a experiência com o desenho...................................87
3. A RELAÇÃO DO DESIGN GRÁFICO E DO DESENHO..................................90
3.1 Descrição do processo de criação dos desenhos da série “Esgrima”............91
3.1.1 Técnica........................................................................................................91
3.1.2. Período de Elaboração...............................................................................91
3.1.3 Ambiente de criação....................................................................................91
3.1.4. Estímulo / Impulsos....................................................................................91
3.1.5. Os Materiais ...............................................................................................92
3.1.6. A realização................................................................................................92
3.1.7. A Exposição ...............................................................................................98
3.1.8. Ações inferidas...........................................................................................98
3.2 Descrição do processo de criação do folder para o programa
Bolsa Iberê Camargo ...........................................................................................98
3.2.1 Técnica........................................................................................................98
3.2.2 Cliente.........................................................................................................99
3.2.3 Ambiente de criação....................................................................................99
3.2.4 Estímulo ......................................................................................................99
3.2.5 Os Elementos..............................................................................................100
3.2.6 A realização.................................................................................................102
3.2.7 A Veiculação ...............................................................................................110
3.2.8 Constatações .............................................................................................111
XIII
3.3 Procedimentos percebidos a partir do processo pessoal de criação..............111
3.4 Questionários .................................................................................................115
3.4.1 Análise dos questionários............................................................................117
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................130
4.1 Conceitos .......................................................................................................130
4.2 Relações entre áreas .....................................................................................133
4.3 Futuras Pesquisas..........................................................................................135
5. APÊNDICES.....................................................................................................137
5.1 Apêncide 1: procedimentos............................................................................137
5.2 Apêncice 2: Questionários..............................................................................145
6. GLOSSÁRIO....................................................................................................161
7. REFERÊNCIAS................................................................................................165
7.1 Referências Eletrônicas..................................................................................169
8. LEITURA COMPLEMENTAR...........................................................................171
14
1. INTRODUÇÃO
A presente dissertação apresenta reflexões sobre resultados advindos de
pesquisa que tem como ponto de partida percepções pessoais a respeito da
similaridade entre os procedimentos criativos adotados nas duas áreas de produção
do autor: o desenho nas artes visuais e o design gráfico.
A produção artística pessoal é caracterizada por uma preferência pelo desenho
como meio de expressão e tem caráter autoral, abstrato e gestual. Existe certa
economia de recursos, restringindo-se basicamente ao uso de alguns materiais
como grafite e fitas adesivas sobre suportes como o papel e a madeira.
A produção pessoal em design gráfico é voltada à elaboração de projetos para
a impressão de peças gráficas como livros, catálogos, capas, materiais promocionais
(panfletos, cartazes, etc.). Parte sempre de uma demanda comercial e destina-se
basicamente à comunicação de mensagens que determinado cliente pretende
transmitir a uma audiência, visando, em última instância, a comunicação e/ou a
venda de determinado produto (os livros, por exemplo). Essa produção é
amplamente suportada pela tecnologia digital. Baseia-se, principalmente, na
articulação de imagens fotográficas e tipográficas e na diagramação de páginas feita
com o auxílio de programas computacionais do tipo editores gráficos.
A percepção de semelhanças no processo de criação nessas áreas distintas
induziu ao pensamento de que podem existir relações de colaboração entre as duas
práticas, quando feitas pelo mesmo sujeito. Esse fato gerou a curiosidade de se
entender sob que aspectos uma produção em artes visuais - que tem o desenho
gestual e abstrato como principal meio de expressão - pode ser assemelhada a uma
produção em design gráfico - amplamente suportada pela tecnologia digital e
dependente de demandas comerciais. É importante dizer que tais produções não se
assemelham esteticamente e que, na função de designer gráfico, o autor dificilmente
usa esboços feitos à mão. As semelhanças entre as duas produções foram
percebidas nas atitudes envolvidas nos processos de criação.
15
Outro dado que cooperou para aumentar a motivação sobre o tema é o fato de
que o termo design - importado da língua inglesa no Brasil para descrever uma
prática profissional e um campo de conhecimento, antes denominados Desenho
Industrial - tem em sua origem mais remota o termo latino disegno, que significa
simultaneamente projeto/desígnio e desenho como signo gráfico de uma idéia. Isso
será discutido mais profundamente no capítulo “Desenho, Design Gráfico,
Tecnologia Digital e Imagens Pós-Modernas”.
Como se verá, o desenho pode ser usado como meio preparatório (esboços,
projetos, etc.) para o design gráfico, assim como o é tradicionalmente para vários
outros gêneros, como a pintura, escultura, arquitetura, engenharia, etc. Sabe-se
também que, no âmbito do design gráfico, o desenho também pode servir como um
elemento de composição (a ilustração, por exemplo) que, ao lado da fotografia e da
tipografia, configura um recurso disponível aos designers gráficos para a
qualificação de peças gráficas.
Entretanto, o recurso do desenho preparatório não é usado pela totalidade dos
profissionais que atuam no design gráfico hoje em dia, a exemplo do próprio autor e
de outros profissionais consultados. Embora a origem do termo design aponte para
uma relação indissociável com o desenho, o design gráfico de hoje aparentemente
não a mantém assim. Seja como meio preparatório ou como elemento de
composição, o desenho é para o designer gráfico contemporâneo uma alternativa a
mais. O design gráfico da atualidade configura uma disciplina que envolve muitos
conhecimentos, como a fluência com a tecnologia digital, conhecimentos técnicos da
indústria gráfica, conhecimentos mercadológicos, entre outros. Saber desenhar não
é mais uma condição necessária.
A pesquisa apresentada foi impulsionada pela constatação de um
distanciamento entre a prática do desenho e do design gráfico de hoje. Embora, em
sua produção, o autor percebe que existem qualidades semelhantes no processo de
criação de desenho artístico e de design gráfico. Aliado a isso, a observação e
análise da obra e da produção de outros artistas e designers permitiu a constatação
de semelhanças estéticas existentes em ambas as áreas. Existiu então a
16
necessidade de realizar o deslocamento da condição de criador para posição de
analista do próprio processo criativo, que são muito pessoais.
A pesquisa “Design gráfico e desenho no cenário tecnológico contemporâneo”,
como o título já indica, analisou as relações entre o design gráfico e o desenho como
meio de expressão, hoje influenciados pela tecnologia digital. Procurou identificar
procedimentos semelhantes, distanciamentos e possíveis contribuições mútuas nos
procedimentos envolvidos na criação de imagens. O universo da pesquisa está
inscrito no campo do design gráfico brasileiro e atual como meio de identificação e
análise das relações entre as duas áreas de estudo. Abrange a produção pessoal do
autor, bem como dados levantados no depoimento de outros profissionais de perfil
similar. Esses profissionais foram selecionados por atuarem no mercado brasileiro
de design gráfico, mas também por se dedicarem ao desenho nas artes visuais e/ou
ilustração. Não existe, contudo, outras restrições de seleção, como faixa etária, por
exemplo.
A questão da pesquisa se estabeleceu da seguinte maneira: Por que se
percebem aspectos semelhantes no processo de criação do design gráfico e do
desenho artístico contemporâneos? Quais são esses aspectos e como podem
caracterizar um diferencial para os designers gráficos que tem o desenho como um
meio de expressão?
O objetivo traçado a partir desse questionamento é compreender como o
design gráfico está em relação ao desenho artístico e vice-versa, identificando
contribuições mútuas nos aspectos processuais, criativos e estéticos, no cenário
atual, mediado pela tecnologia digital. Também se buscou identificar no design
gráfico a função do desenho, como meio preparatório e como meio de expressão;
verificar, na pós-modernidade, a existência de semelhanças e influências entre as
duas práticas, quanto à estética de suas imagens e aos procedimentos criativos;
analisar a importância e as transformações advindas da disseminação da tecnologia
digital no design gráfico e de que maneira interfere nos modus operandi do desenho
contemporâneo.
17
Considera-se que o presente estudo e as reflexões que ele introduz têm três
aspectos principais. Em primeiro lugar, do ponto de vista teórico, procede o
levantamento do estado da arte sobre as disciplinas estudadas, enfocando o
desenho desde seu entendimento tradicional (desenho preparatório e prática
gestual) até a atual expansão de suas fronteiras de atuação, no âmbito da arte e na
maneira com que se relaciona com o design gráfico. Em segundo, analisa o design
gráfico como meio de construção de significados, desde um breve relato histórico,
até sua condição atual na pós-modernidade, suportado pela tecnologia digital. Por
fim, relaciona a produção atual do desenho artístico e do design gráfico com teorias
que descrevem características e estratégias contemporâneas para a elaboração de
imagens.
18
1.1 Métodos e procedimentos de pesquisa
A pesquisa se desenvolveu em três grandes etapas: a revisão bibliográfica e
construção da fundamentação teórica; a análise dos procedimentos pessoais
baseada nos conhecimentos adquiridos na etapa de fundamentação teórica; análise
dos depoimentos de profissionais envolvidos em ambas as áreas, adquiridas por
meio de questionário. De posse dos dados levantados foi processada reflexão que
fomentou a construção de novos conhecimentos.
A primeira etapa foi dividida em três momentos distintos. Primeiramente se
buscou um entendimento sobre o desenho como meio preparatório para outras
disciplinas, como meio de expressão autônomo e como existe hoje o desenho
contemporâneo no universo das artes visuais. Baseia-se nas obras dos autores
Bernice Rose, Ema Dexter, Patrick de Hass e John Berger, entre outros.
Em um segundo momento, fez-se uma breve descrição histórica das origens do
design gráfico baseado nas obras de Nikolaus Pevsner, Richard Hollins e Rafael
Cardoso. Posteriormente, identifica-se o papel do gênero desenho na Bauhaus,
primeira e principal escola de design, segundo a obra de Ellen Lupton e J. Abbott
Miller. A seguir, abordam-se as funções do design gráfico e a maneira como existe
na contemporaneidade (design gráfico pós-moderno) com base na obra de Flávio
Vinicius Cauduro e Ana Claudia Gruszinsky e se descreve a tecnologia digital que
suporta o design gráfico de hoje e como ela opera transformações em sua prática.
Em um terceiro momento, se procedeu a uma descrição das características
contemporâneas da criação de imagens e suas estratégias, identificadas na obra de
Flávio Vinícius Cauduro, Ana Claudia Gruszynski e Maria Beatriz Furtado Rahde.
Contudo, foi feito um recorte dessa teoria, enfocando o que diz respeito às relações
que se pretendeu estabelecer sobre a criação em desenho artístico e em design
gráfico contemporâneos.
A segunda etapa da pesquisa configurou uma reflexão sobre os procedimentos
pessoais de criação que a partir da análise da prática de ateliê, no caso do desenho
artístico e da prática profissional do design gráfico em escritório particular. Foram
19
analisados os procedimentos de criação envolvidos na elaboração de uma série de
desenhos e de uma peça gráfica. Além disso, foram listados procedimentos
recorrentes na realização de trabalhos nas duas áreas para se identificar qualidades
semelhantes entre estratégias pessoais de criação. Essas listagens podem ser
conferidas na íntegra no “apêndice um”. O enfoque foi dado à maneira como os
trabalhos são iniciados e como as escolhas de signos e ações vão determinando o
resultado final de cada trabalho.
A terceira etapa da pesquisa consistiu em adquirir depoimentos de profissionais
de perfil semelhante ao do autor sobre o tema da pesquisa através de questionário.
Tal questionário se caracterizou por permitir que os profissionais consultados
pudessem discorrer sobre o assunto de maneira livre, com questões abertas a
interpretações pessoais sobre as relações do desenho com o design gráfico e com a
tecnologia digital. A última questão se destinou para contribuições espontâneas
sobre o tema.
A intenção foi entender como a experiência com o desenho está presente na
prática profissional do design gráfico, como uma prática influencia a outra, bem
como isso define qualidades do trabalho desses sujeitos. O questionário foi enviado
para todos os profissionais com tal perfil que se conseguiu ter acesso, totalizando
quinze questionários enviados. No entanto, obtiveram-se nove respostas, a saber:
Fábio Zimbres, James Zortea, Guilherme Dable, Guto Lacaz, Elifas Andreata, Mário
Cofieiro, Joaquim da Fonseca, Carla Pila e Francisco Baldini. Seus depoimentos
podem ser lidos na íntegra no “apêndice dois”.
20
1.2 Estrutura do texto
A presente dissertação estrutura-se em três capítulos principais. Além da
presente “Introdução”, o capitulo “Desenho, Design Gráfico, Tecnologia Digital e
Imagens Pós-Modernas” dedica-se a fundamentação teórica construída após
reflexão sobre dados selecionados na revisão bibliográfica. Em “Relações entre o
Design Gráfico e o Desenho”, procede-se uma discussão a partir da análise dos
procedimentos pessoais de criação do autor e dos depoimentos dos profissionais já
citados, baseadas nas constatações advindas da pesquisa teórica. Por fim, na
“Considerações Finais”, discorre-se sobre o aprendizado que a pesquisa
proporcionou e indicam-se desdobramentos futuros.
As fontes de pesquisa que serviram de base para o capítulo “Relações entre o
Design Gráfico e o Desenho” são disponibilizadas na forma de apêndices para não
sobrecarregar o texto. No “Apêndice um”, encontram-se na íntegra as descrições
dos procedimentos envolvidos na criação de desenhos artísticos e peças gráficas
feitos pelo autor. No “Apêndice dois”, estão disponíveis as respostas dos
questionários, assim como foram recebidas. Por fim, têm-se um “Glossário” onde
estão disponibilizados os termos técnicos necessários para o entendimento do que
se diz aqui sobre desenho artístico e design gráfico, grifados no texto com
asteriscos.
21
2. DESENHO, DESIGN GRÁFICO, TECNOLOGIA DIGITAL E AS IMAGENS
PÓS-MODERNAS
O presente capítulo destina-se à fundamentação teórica sobre o desenho, o
design gráfico, a tecnologia digital e as imagens contemporâneas. A primeira parte
dedica-se ao estudo do desenho como meio preparatório, adjunto a outras
disciplinas e como gênero artístico. Faz isso partindo de um entendimento tradicional
do desenho para, posteriormente, investigar como e a partir de quais
especificidades, na modernidade, o desenho atinge status de meio de expressão
autônomo e como existe hoje o desenho contemporâneo.
Na segunda parte faz-se uma breve descrição histórica das origens do design
gráfico. Posteriormente identifica o papel do desenho na Bauhaus, primeira e
principal escola de design e aborda as funções do design gráfico e a maneira como
existe na contemporaneidade. Em seguida se descreve a tecnologia digital que
suporta o design gráfico de hoje e como ela opera transformações em sua prática.
Na terceira parte analisa as características e estratégias da elaboração de
imagens na pós-modernidade, enfocando a relação do desenho e do design gráfico
contemporâneos.
22
2.1 O DESENHO
Desenhar é gerar marcas em uma superfície com a pretensão de criar uma
imagem. Estudiosos se referem ao desenho também como um intervalo entre idéia e
a execução, ou seja, um processo que visa à elaboração, aprimoramento e
concretização dessa idéia. Essas duas características do desenho – por um lado a
concretização da imagem gráfica (grafológica), por outro a intenção de formular uma
idéia e lançar algo de sua inexistência para uma existência futura (conceitual) - são
bases para discussões sobre o desenho.
Este capítulo pretende abordar a capacidade de conceituação e concretização
tradicionalmente atribuídas ao desenho. Indo além, observa-se a maneira como
interage com outros meios, a expansão das possibilidades técnicas e estéticas,
dadas a partir da modernidade, e o modo como o desenho existe hoje.
Dexter (2005) afirma que o desenho tem um caráter elementar por ser a
primeira e mais imediata forma de criar imagens. Devido a esse caráter primário,
através da história, o desenho se relacionou com outros campos, como a pintura, a
escultura, a arquitetura, a comunicação e o design, etc., servindo como meio
preparatório (investigativo e projetivo), pois suporta os pensamentos mais primários.
Faz isso, no entanto, a partir de uma ação corporal, o gesto, ou seja, a partir de uma
habilidade manual conectada à percepção visual e ao pensamento (mão, olho e
cérebro). Nesse sentido, o desenho é o registro do pensamento com testemunho do
gesto.
Tradicionalmente associam-se ao desenho algumas técnicas particulares,
modos de expressão, meios técnicos e suportes específicos. Isso tem sido
consideravelmente expandido desde o século XX. O desenho tem seus próprios
elementos de composição: o ponto, a linha, o plano, as hachuras, as retículas, entre
outros. Esses elementos e as visualidades que as articulações entre eles geram,
assumem desempenhos específicos quando incorporados por outras disciplinas com
as quais o desenho se relaciona: pintura, arquitetura, engenharia, ilustração, design,
etc.
23
A relação entre disciplinas, por vezes indissociável, tem duas vias: na primeira,
como já foi dito, o desenho empresta elementos e modos de expressão às
disciplinas com as quais se relaciona. Na segunda, o desenho, entendido como meio
de expressão autônomo, também absorve elementos e utiliza recursos de outras
áreas criando novas visualidades, se transformando. A seguir é descrito o
entendimento tradicional do desenho e adiante sua participação na modernidade e
na contemporaneidade.
2.1.1 O disegno, o desígnio e o desenho
A origem da palavra desenho está no termo italiano disegno, que por sua vez
tem raiz do termo grego designare.
Disegno é o ‘pai’ de todas as outras formas neolatinas e pode ser
compreendido nos seguintes sentidos: a representação gráfica de uma
imagem, principalmente construída por traços monocromáticos,
enriquecida, às vezes, por estudos de claro e escuro e de aplicação de cor,
com entendimento de seus aspectos estéticos, decorativos e didáticos (...)
Disegno também está relacionado com a representação gráfica de um
trabalho a ser realizado, produzido – um esboço, um rascunho, um projeto
para uma obra pictórica ou arquitetônica, máquinas e ferramentas, padrões
e moldes. (GOMES 1998, p.91)
A idéia de desígnio do desenho - um meio que transita entre a idealização e a
expressão - tem sido construída ao longo da história por vários artistas e teóricos.
Segundo Rose (1976, p.9), em 1607, Frederico Zuccari definiu o disegno como uma
atividade metafísica com origens na mente de Deus. Para ele, o que é revelado na
obra de arte está bem antes presente na mente do artista. Zuccari define o disegno
como a concepção ancestral da idéia. Ele o divide em disegno interno e disego
externo. (ROSE, 1976, p.9)
O disegno interno (ou idéia) de Zuccari precede a execução e é colocado por
Deus na mente do homem, ou seja, “as idéias dos homens são uma faísca da mente
divina” (ROSE, 1976, p.9). O disegno externo é o concretizado, a forma visual da
24
idéia, sua representação artística seja pictórica ou arquitetônica. Assim, disegno
para Zuccari une o poder gerador com representação gráfica. Nesse sentido “o
desenho é a projeção do pensamento do artista em sua menor forma discursiva”
(ROSE, 1976, p.9).
Como uma projeção, pode-se entender o desenho também como algo existente
que lança para fora de si seu potencial significado. Um desenho caracteriza-se por
ser uma proposição e exige do espectador um olhar criativo. Essa noção faz parte
de sua tradição, conforme se percebe na seguinte sentença:
A diferença que se encontra, para mim, entre um belo desenho e um belo
quadro é que, em um pode-se ler, proporcionalmente a sua força, tudo o
que o pintor desejou representar, em outro somos nós mesmos que
concluímos o objeto que nos é oferecido. (CAYLUS, em Discours sur lês
dessins, 1732, apud HASS, 1992)
2.1.2 A experiência com o desenho
Sabe-se que o desenho artístico desenvolve em quem desenha a capacidade
de observação, captação e síntese das formas fundamentais para a construção de
significados.
Desenhar é olhar, analisar a estrutura das aparências. Um desenho de
uma árvore mostra, não uma árvore, mas uma árvore-sendo-olhada.
Considerando que a visão de uma árvore é registrada quase
instantaneamente, o exame da visão de uma árvore (uma árvore-sendo-
olhada), não só leva minutos ou horas em vez de uma fração de segundo,
mas envolve, deriva, e remete para muitas experiências anteriores [...]
propõe a simultaneidade de uma multiplicidade de momentos. (BERGER,
1976, p. 150).
Quando olhamos um desenho não vemos apenas a imagem, mas também a
maneira como foi construída. O desenho revela o processo de seu próprio fazer em
uma visualidade própria, revela o processo da sua própria criação.
25
De cada olhar um desenho reúne um pouco de provas, mas é constituído
por elementos de prova de muitos olhares que podem ser vistos juntos. Por
um lado, não existe uma visão na natureza imutável como a de um
desenho ou pintura (...) o que é imutável em um desenho consiste tantos
momentos montados que constituem uma totalidade, em vez de um
fragmento. (BERGER, 1976, p. 150).
A montagem da totalidade, sugerida por Berger, se dá em um processo
dialético de interação entre o que se olha (representa ou imagina) e o desenho. Os
muitos olhares e momentos são selecionados por quem desenha, de acordo com as
necessidades do próprio desenho. Assim, o sujeito que desenha elabora sua visão
da realidade en pròces, ou seja, em mudança, em julgamento constante e dialético
(KRISTEVA 1974/1984, p. 21, apud CAUDURO, 2001, p.103). Essa visão pode ser
entendida tanto em relação ao mundo real, quanto em relação à própria imaginação.
Ou seja, no processo de construção do desenho o artista faz alguma marca
resultado de alguma ação, a partir de um primeiro ímpeto, para em seguida ser
impressionado por essa marca. Cria-se um novo ímpeto que gera outra marca, em
resposta (uma reação). Isso ocorre sucessivamente, em uma progressão ou em um
diálogo entre o desenho e o desenhista. Esse diálogo depende da interpretação e da
seleção do que é ou será escolhido como elemento de construção do desenho, ou
seja, que tipo de signo (linha, mancha, borrão, hachura*, etc.) é mais adequado para
expressar o que se vê, sente, imagina ou interpreta. A maneira como o desenho se
estabelece (sua forma), faz-se motivo para interpretações a respeito daquilo que se
representa (objeto ou idéia).
Desenhando se aprende a ver seletivamente, com uma atenção que flutua
entre o instante, a fração e o todo. O desenho formula em uma imagem a partir de
intervalos de tempo distintos. É um processo de conhecimento através do qual se
apreende melhor a cena ou a idéia que se pretende representar ou elaborar. Dedica-
se a elas uma atenção ao mesmo tempo seletiva e subjetiva. Articulam-se
elementos gráficos (linhas, pontos, manchas, hachuras, cores, texturas, etc.) que
adquirem significado em uma composição bidimensional e em relação com um tema
enunciado: um contexto.
26
Na elaboração de um desenho de observação, de um esboço de idéia, de um
desenho artístico finalizado, etc., está envolvido um processo indissociável de
mediação entre idéia e forma: um fluxo. Uma idéia, tema ou motivo se alteram a
medida que são concretizados em um desenho.
Além disso, desenhar é um processo de auto-conhecimento. Estão presentes
nesse processo características pessoais como a habilidade e a dificuldade para ver,
entender e representar algo. Desenhando, resolvem-se os problemas gerados por
essas dificuldades, ou, ao menos, adquire-se certa consciência sobre esses
problemas. Aprende-se a improvisar e buscar alternativas. Para Berger (1976,
p.150) um desenho é único para quem o fez, pois oferece uma releitura do processo.
Nessa releitura se pode tomar conhecimento da maneira como o instinto e a tomada
de decisões se articulam em nosso ser.
Com a experiência do desenho cria-se o próprio repertório de ações e
procedimentos e resultados visuais, características do estilo próprio de cada um.
Aprende-se a estabelecer significados com o jogo de articulação dos signos. Como
se verá adiante, a articulação de signos gráficos e a criação ou transformação de
seus significados está na essência também do design gráfico.
2.1.3 Modos tradicionais do desenho
A partir da leitura dos textos de Bernice Rose, entre outros autores,
identificaram-se três modos principais, tradicionalmente atribuídos à prática do
desenho. O primeiro e mais simples modo de desenhar é a delineação, que é o uso
da linha em sua forma pura. Geralmente associado com o desenho de contorno,
onde diferentes aspectos de um objeto são reduzidos a uma imagem na qual não
existem simulações de efeitos de luz e sombra. A linha de contorno descreve algo
separando o que é objeto do que é fundo. Pode ser contínua ou fragmentada. A
variação de intensidade, espessura, trajetória e tamanho provoca sensações de
movimento no espectador, que correspondem ao movimento do ato de desenhar.
27
O segundo modo do desenho existe quando agregados à linha de contorno
temos efeitos de luz e sombra que delimitam tons localizados. O efeito é uma
relativa iluminação na superfície. Os tons de sombra ou brilho podem ser obtidos por
uma variedade de marcas como as hachuras e retículas*, ou ainda a partir de
texturas e manchas feitas por um meio líquido, como o nanquim aplicado com pincel,
ou ainda manchas geradas com lápis pastel seco ou oleoso.
O terceiro modo é o desenho com uso de cores onde áreas de luz e sombra,
em tons de cor localizados, expressam a diferença entre os objetos representados.
Com o desenho colorido se pode representar, o mais próximo possível, os efeitos de
iluminação em composições tonais. Existem também desenhos totalmente coloridos,
onde mesmo as linhas são coloridas. E ainda existem desenhos que podem ser
confundidos com pinturas. As aquarelas geralmente são consideradas formas de
desenhos coloridos, ou pintura aguada, sendo um gênero intermediário.
Em seu sentido mais tradicional, o desenho é identificado pela presença da
linha, pelo contorno, limite de um objeto sólido representado e o contraponto desse
objeto com o fundo, conforme será visto adiante. A relação de figura/fundo é
característica do gênero desenho. Estabelece assim a representação de algo e
coloca a cor em um estado de subordinação, onde ela é o preenchimento de
determinada forma: coloração.
Quanto à composição, no desenho tradicional o arranjo dos elementos é
hierárquico – caracterizado por uma ampla gama de elementos diferentemente
subordinados uns aos outros. Esses elementos estão dispostos segundo a um tema
enunciado, ou motivo da representação ou idealização.
2.1.4 Meios técnicos do desenho
Entende-se por meio técnico os materiais e ferramentas usados para gerar
marcas em determinado suporte a fim de se realizar um desenho. Os meios técnicos
tradicionalmente associados ao desenho são: o carvão, o lápis de grafite, o giz, o
lápis pastel seco e oleoso, a borracha. O pincel e a caneta também fazem parte
28
dessa tradição. Como se verá a partir da era moderna o desenho se instaura como
gênero artístico autônomo e expande seus materiais e técnicas. Assimila o uso de
novas práticas como a colagens, a frotagens ( ver p 38), as tintas e materiais da
pintura, diferentes meios tecnológicos como a fotografia, as fotocópias e a tecnologia
digital.
Nas práticas atuais há uma busca por novos materiais que podem variar de
uma simples ponta de metal para riscar uma superfície sólida até sofisticados
equipamentos associados a programas editores gráficos específicos, como os
tablets*, que simulam, a partir de sua interação com programas editores gráficos, o
ato de desenhar com diversos materiais em um ambiente virtual.
2.1.5 Suportes do desenho
Os suportes do desenho variam de cultura para cultura e de época em época.
Existem desenhos feitos em paredes, em cerâmica, em blocos de pedras e em
tecidos, em papiros etc. A partir da invenção e da disseminação do papel, o desenho
tem sido identificado mais estreitamente com o formato laminar e plano da folha
(ROSE 1976, p.11).
A superfície que serve de suporte para um desenho tem como característica a
ambigüidade de se relacionar com a imagem de maneira concreta e conceitual. A
inscrição de uma linha sobre o suporte imediatamente integra os dois elementos
sem que, no entanto, o suporte perca sua integridade e expressividade de material.
A linha gráfica baliza a área [do suporte] e então define esta, anexando-a,
como seu fundo. Inversamente a linha gráfica pode existir somente de
fronte a esse fundo. Então, se um desenho cobre completamente esse
fundo ele deixa de ser desenho. (BENJAMIN, 1917, apud DEXTER, 2005,
p. 6).
Ou seja, um desenho que cobre completamente seu fundo deixa de ser
desenho e se torna plano. Em tal afirmação percebe-se também um contraponto
29
com a pintura clássica, que preenche completamente seu suporte quando cria a
ilusão de que se vê algo através de uma janela. Na pintura clássica a obra se
caracteriza pelo emprego de tintas e inclusão de matéria pesada sobre um suporte
(telas e molduras) que se impõem fisicamente. No entanto, o pintor procura
neutraliza-las através de uma estética da representação. Para Leonardo da Vinci, “o
quadro é um vidro transparente” (ROSE 1976, p.11). O suporte é esquecido,
escondido sob sua preparação e recoberto pelo tema.
No desenho, ao contrário, o suporte papel é discreto, distingue-se por sua
finura e seu formato simples – no entanto expõe a matéria de sua superfície e deixa
o material revelar suas qualidades expressivas. No desenho o suporte permanece
presente porque não é coberto totalmente. A linha gráfica só pode ser percebida a
partir de seu contraste com o fundo (figura/fundo).
Quando o desenho se faz esboço - plano, projeto, intenção, memória - o
desenhista não se questiona sobre os problemas de inscrição sobre o suporte. A
simplicidade dos meios utilizados e seu caráter íntimo e investigativo permitem-lhe
não abordar estes problemas. Em um esboço, a importância do material envolvido é
fraca. O que interessa é a maneira como ele busca lembrar e concretizar alguma
idéia. Pode ser feito em um guardanapo, tábua de mesa ou página de caderno. O
que interessa para quem esboça é significar e recordar algo (HAAS, 1992, p. 2).
Nesse sentido é que o suporte do desenho é ambíguo: quando é “perceptivelmente
presente, mas conceitualmente ausente” (BRYSON, apud DEXTER, 2005, p.6).
Contudo, na pintura moderna, a tela passa a não ser mais preparada a ponto
de ter suas características materiais escondidas (a trama e a cor do tecido, por
exemplo). Essa característica retorna sobre uma parte das pesquisas modernas em
desenho. Alguns desses desenhos fazem do modo de inscrição do gesto em
determinada superfície o próprio objeto do trabalho, como desenhos sobre páginas
de jornal, por exemplo.
Entretanto, somente a noção de traço e de sua inscrição no suporte não pode
dar conta do conjunto das práticas contemporâneas do desenho. Como veremos
30
adiante, “[...] a história recente do desenho torna caduca qualquer definição desse a
partir de componentes materiais [...]” (HASS, 1992, p.5).
2.1.6 Tipos de desenho
Existem os mais variados tipos de desenho, desde os mais simples aos mais
elaborados, dos mais espontâneos aos mais deliberados e laboriosos. Segundo
ROSE (1976, p.10), na esfera da arte eles geralmente são separados em dois
grupos: os preparatórios e os finalizados. A seguir serão descritos tipos de desenho
de acordo com o conceito dessa autora, mas identificando sua aplicação também
em outras esferas que não só a das artes visuais.
2.1.6.1 Desenhos preparatórios
Do primeiro grupo, fazem parte aqueles que atuam como projetos a serem
realizados em outro meio ou esboços que servem para engendrar uma idéia. Na
esfera da arte, são os desenhos adjuntos à pintura, à escultura, à instalação, ao
vídeo e mesmo a outros desenhos mais elaborados. Entretanto, sabe-se que
desenhos preparatórios são utilizados nas mais diversas áreas do conhecimento
como o design, a moda, a arquitetura, a engenharia, a comunicação, o cinema, etc.
Uma modalidade de desenho preparatório é o esboço. Segundo Hass (1992,
p.2), esboçar tem origem no termo italiano schizzare, que significa manchar,
esguichar, jogar fora. Disso resulta um valor qualitativo atribuído ao desenho que
estaria no signo gerado, ao mesmo tempo espontâneo, intuitivo e seletivo. A
elaboração de um esboço busca a estabilidade da composição, esquecendo o que
não pode ser percebido ou o que é refugável em um instante em que a atenção está
dispersa em um grande número de acontecimentos, filtrando-os. Define-se como um
olhar ou um imaginar seletivos.
O esboço “descarta aquilo que não é cristalizável em uma composição estável:
o detalhe, o frágil, o efêmero, o imperceptível” (HAAS, 1992, p.2). O esboço ainda
31
induz a um processo de “re-interpretação” das idéias. Ajuda a mover o desenhista de
uma idéia preliminar para outra. Goel diz que o se “vê novas idéias existentes nos
croquis” (GOEL, 1999 apud STONES, 2006, p.60).
A fluidez do esboço une os processos de idealização com a concretização em
uma imagem, de maneira intercalada ou simultânea. Vêem-se nessas imagens os
excessos, ausências de sentido, alternativas a uma primeira idéia etc. Para
Goldschmidt, não só o esboço “alivia a carga sobre memória, mas ele também
suporta pensamentos primordiais, através da sua ambigüidade e fluidez”
(GOLDSCHMIDT, 1991, apud STONES, 2006, p.60).
Outra modalidade de desenhos preparatórios, os storyboards, são desenhos
bastante elaborados que descrevem uma história a ser contada pelo cinema,
televisão ou vídeo. Assemelham-se a histórias em quadrinhos, mas são de uso
privado da equipe. Colocam em uma linha de tempo as cenas a serem filmadas. A
busca de sentido, de equilíbrio e de alternativas, própria do desenho, fica clara no
depoimento abaixo sobre o potencial de organização do storyboard:
[...] criava algumas cenas e as dispunha no papel, arranjando-as por
similaridade (subjetiva). Comecei a sentir falta de uma ou outra cena para
unir as outras já criadas. Sentia falta de uma ordem (também subjetiva) e aí
criava uma cena buscando uma sensação de equilíbrio e um caminho de
conexão [...] (JUNGLE, 2007, p.92).
Podem-se considerar também desenhos preparatórios àqueles destinados às
determinações técnicas e aos detalhamentos. Os desenhos técnicos são os
desenvolvidos por engenheiros, arquitetos, designers etc. quando se dedicam a
explicitar cotas, proporções, encaixes, vistas, materiais e processos de construção e
fabricação. Esse tipo de desenho tem como característica principal o objetivo da
representação gráfica de um conteúdo técnico, onde a imagem explica melhor que a
palavra. Faz parte de uma tradição que define o desenho também como uma
disciplina de critérios geométricos e científicos.
Na Renascença, o desenho foi uma disciplina tanto poética como científica,
com as mais altas credenciais intelectuais. Sem o desenho era impossível
32
descrever as recém emergentes disciplinas da anatomia, geometria e
perspectiva, as quais eram consideradas básicas para a cientificamente
precisa compreensão dos objetos como aparecem na natureza ou como
concebidos na imaginação. O desenho foi parte integrante das explorações
de Leonardo sobre formas e causas. (ROSE, 1976: 9).
Assim, pode-se dizer que o desenho, como meio preparatório, é
tradicionalmente relacionado com a subjetividade, com o jogar com os
deslocamentos, o deslizamento, a passagem, o fluído, o instável e a fuga, mas
também com a objetividade, a precisão, a verdade da geometria e a verdade da
ciência.
2.1.6.2 Desenhos Finalizados
O segundo grupo é formado por aqueles desenhos que são obras finalizadas,
um produto final da expressão humana. As Ilustrações e cartoons* fazem parte
desse grupo. Podem-se citar também os desenhos científicos (ciências naturais,
botânicas etc.), mapas e infográficos*, histórias em quadrinho etc. Constituem
desenhos que são, em si, o objeto final da criação.
Na esfera da arte, com mais intensidade a partir do modernismo, o desenho
adquire status de meio de expressão maior, ou seja, não mais adjunto a algum outro
meio. Artistas se voltam a discutir as especificidades do desenho como gênero
artístico autônomo. Os princípios que corroboram para a autonomia do desenho
como meio de expressão autônomo são justamente os elaborados pela tradição: seu
caráter autográfico e grafológico, sua natureza conceitual de ato de significação e
seu caráter projetivo.
2.1.7 O desenho como confissão autográfica, grafológica e conceitual
A linha, afirmou Leonardo da Vinci, não ocorre na natureza (ROSE, 1976, p.13).
Na verdade a noção de linha é intelectual, uma primeira conceituação, que por si só
33
não descreve nada. Mas a linha, mesmo que tenha caráter abstrato e simbólico, é
gerada por um sujeito, dentro de uma tradição artesanal associada a esse meio. Isso
define suas duas condições: conceitual e grafológica.
A habilidade é tradicionalmente admirada como um talento individual. O toque
pessoal distingue um artista de outro e estabelece hierarquias de acordo com a
qualidade do traço. O desenho define-se como uma revelação autográfica,
“presentes nas primeiras e mais intimas e confessionais marcas” (ROSE, 1976,
p.13).
Um único desenho pode também descrever toda uma linguagem estilística,
sintetizando todos os elementos necessários para identificar uma
personalidade artística. A espontaneidade era valorizada [...] mesmo esses
desenhos que apresentavam um deslocamento intelectual foram
apreciados como indicativo de pensamentos pessoais revelados (ROSE,
1976, p. 14).
Foi a partir do reconhecimento da qualidade autográfica do desenho, que o
desenho adquire status de obra onde se percebe o pensamento e a personalidade
de determinado autor através do seu traço particular. Antes, o desenho, considerado
como meio investigativo e íntimo, não era convocado a deixar o ateliê, o que lhe
atribuiu certa liberdade de ser inacabado.
Desde a tradição que foi fixada do século XVII, e até o advento da arte
conceitual, na década de 1960, os dois sentidos de desenho, o conceitual e o
grafológico, não tinham sido rigorosamente distinguidos, como será analisado
adiante, (ROSE, 1976). Como uma primeira representação – nos termos do disegno
de Zuccari – o desenho continua a ser aceito como uma proposição intelectual em
sua essência. As marcas de um desenho têm uma relação simbólica com a nossa
experiência. Não é só que linha não exista na natureza, mas toda a relação de
construção de um desenho é uma proposição do artista compreendida pelo
espectador através de um ato de reconhecimento e de idealização.
O desenho apresenta-se como gesto grafológico que designa algo para além
de si mesmo. Quando coloca para o espectador a carga de significação que carrega,
34
o desenho - a partir de um de seus principais aspectos que é a possibilidade de ser
inacabado e livre - apenas indica possibilidades de interpretação. Com isso abre um
campo de potencialidades bem mais amplo do que a representação hermética da
pintura naturalista, por exemplo. O desígnio do desenho faz parte da “ordem da
decisão”, seja do artista ou do espectador (HASS, 1992, p.8). Seu poder de
sugestão exige do espectador um olhar criativo. Essa noção do poder de
significação em aberto do desenho faz parte de sua tradição e até hoje é motivo de
reflexão. Configura um primeiro ponto de ancoragem para presente dissertação.
2.1.8 A expansão dos limites do desenho
É por sua característica sugestiva, livre e de incompletude, mas também sob
seu aspecto projetivo que o desenho expande seu campo no universo da arte. A
partir do século XX, o desenho amplia seus limites, sem abrir mão, no entanto, das
funções tradicionalmente atribuídas a ele como meio de uma expressão primordial,
como meio preparatório e como veículo de uma verdade geométrica e científica. Na
era moderna o desenho alcança novamente o status de meio de expressão
autônomo.
Conforme já foi dito, historicamente a relação de subordinação do desenho à
pintura o autorizou a uma liberdade maior. Essa liberdade deve-se ao fato de que o
desenho não era convocado a deixar o ateliê (ROSE, 1976, p. 10). Isso justifica seu
caráter íntimo, inacabado, subjetivo.
O incompleto pode prover o íntimo, uma experiência intuitiva muito
diferente da experiência do trabalho finalizado [...] Nesse sentido, o
desenho é artisticamente importante enquanto documento de um momento
ativo de idealização independentemente de seu aspecto formal [...] (ROSE,
1976, p. 10).
A carga energética do estudo, do esboço, do croqui, não é canalizada,
concluída no espaço fechado e imobilizado que constitui o quadro pintado
renascentista. A liberdade inerente a esse meio foi importante frente à necessidade
35
moderna de constantemente inventar novas linguagens pictóricas. Essa almejada
liberdade impulsionou os artistas instaurarem processos de experimentação, que a
partir da primeira metade do século XX nublam as fronteiras que distinguem os
meios de expressão: desenho, pintura, gravura, escultura etc.
A vontade de libertar a arte de sua obrigação de representar levou artistas
como Picasso e Braque (figura 1) a introduzirem no desenho (também na pintura e
na escultura) elementos concretos, estranhos à técnica, como pedaços de jornais,
por exemplo. Não era mais necessário representar pictoricamente algo que se podia
agregar às obras através de procedimentos como a colagem e a assemblagem*. A
concretude do elemento colado não mais representava, mas se auto-representava.
Figura 1: GEORGES BRAQUE, Violino e Cachimbo (1913). Giz, carvão e papel colado, 74 x 106 cm. Museu
Nacional de Arte Moderna, Centro Georges Pompidou, Paris. Fonte ARTCHIVE.
36
Outro processo: Matisse definiu o recorte e a colagem como “desenhos com
tesoura” (ROSE, 1976, p.16). Suas colagens consistiram em cortar e colar pedaços
de papel coloridos para criar parte de uma imagem ou a sua totalidade (figura 2).
Matisse, com seus papéis recortados, se opõe totalmente à primazia do
desenho sobre a cor. Recortando as formas diretamente em papéis
previamente pintados, ele desenha na cor, sendo aqui a tesoura o
instrumento do desenho. (HASS, 1992, p. 6).
Figura 2: HENRI MATISSE, Tristeza do Rei (1952). Guache recortado, 292x396 cm. Museu Nacional de Arte
Moderna. Centro Georges Pompidou, Paris. Fonte: UNCOVERING
37
No Surrealismo o desenho foi um importante meio de experimentação. Os
desenhos automáticos de André Masson (figura 3), dos anos 20, “podem ser
considerados como as primeiras experimentações pondo em cena o inconsciente
pela liberação do gesto” (HASS, 1992. p6). Segundo o artista, “o fato de voltar à
palheta quebra a fluidez da linha autorizada pelo lápis”. (MASSON, apud DE HASS,
1992, p.6).
[...] de fato, a fricção do pincel sobre a tela, a resistência do material, a
lentidão da pintura para secar, freiam a mobilidade da mão. As associações
mentais, as qualidades inconscientes do gesto se denunciam com maior
ênfase pela velocidade de execução que os meios do desenho propiciam.
(HASS, 1992)
Figura 3: ANDRÉ MASSON, sem título (1924). Nanquim sobre papel,
23.5 x 20.6cm, MOMA, NY. Fonte: MOMA
38
As colagens Dadaístas criaram composições que assumem o aspecto
bidimensional do suporte, questionando a perspectiva, a ordem e a hierarquia na
composição. A poesia visual Futurista (figura 4) joga com o desenho da página e a
disposição do texto como elemento de uma linguagem gráfica. Artistas vinculados ao
Cubismo, Futurismo, Surrealismo e Dadaísmo, experimentaram a colagem e
apropriação de elementos concretos como recortes páginas de jornal e outros
impressos, fotografias, objetos cotidianos, etc. Assim, questionam a primazia do
gênio do autor.
Figura 4: FILIPPO TOMMASO MARINETTI, Vive la France (1876-1944). Tinta, pastel e colagem,
30.9 x 32.6 cm, MOMA, NY. Fonte: MOMA
39
Max Ernst dedicou especial atenção à colagem e à frotagem, que consiste em
adquirir texturas de elementos reais, geradas através da marca que determinada
ferramenta cria na folha, posicionada sobre uma superfície com relevo (figura 5). A
partir dessas marcas, Ernst trazia, de seu inconsciente, desenhando e pintando
sobre essas texturas, figuras e formas, monstros e seres distorcidos que recriavam o
significado dessas texturas em imagens surreais.
Figura 5: MAX ERNST, The Fascinating Cypress from Natural History. Exemplar retirado de portfolio de
trinta e quarto collotypes sobre frotagens, 43 x 26 cm. Fonte: KONNERTZ (1991, p.71).
40
Segundo Spies e Konnertz (1997, p.2), seja pela deformação ou através de um
exagero expressivo, as obras de Ernst são um ponto de encontro entre temas e
procedimentos técnicos criados por ele, simultaneamente. Para Rose (1976, p.16),
esses procedimentos técnicos (a frotagem e a colagem estética) na obra de Ernst se
constituem na justaposição de elementos não relacionados, criando “imagens de
alucinações”. O desenho, ao incorporar esses procedimentos, torna-se um meio
propício para investigações ao mesmo tempo técnicas e simbólicas, ou seja, o
desenho serve como um meio de invenção e pesquisa de procedimentos técnicos
que se caracterizam por gerar visualidades singulares e por definir estilos pessoais.
Isso constitui outro ponto de ancoragem da presente reflexão.
As qualidades inerentes ao desenho - liberdade, espontaneidade,
experimentação, hibridização, mas também projeção e precisão - fizeram dele um
meio propício para descoberta de novos procedimentos e visualidades. A partir
dessas qualidades, ao final da primeira metade do século XX, a inovação no campo
do desenho tem duas vertentes principais.
A primeira vertente tem origem no expressionismo abstrato, de Jackson Pollok
(figura 6), por exemplo, e seqüência na obra de em artistas como Robert
Rauschemberg, Jasper Jonnes, Joseph Beuys e Cy Twombly (figura 7), entre outros.
Trata da inscrição do gesto pessoal (grafológico e autográfico) do artista e da
maneira como articula signos gráficos e suportes. Desenvolve-se a partir de
procedimentos iniciados no desenho automático Masson, bem como na frotagen e
colagem estética de Ernst.
41
Figura 6: JACKSON POLLOCK, Untitled. (1912-1956).Tinta e guache sobre papel Howell,
45.5 x 56 cm. MOMA, NY. Fonte: MOMA
Figura 7: CY TWOMBLY, Untitledc (1928). Base de tinta oleo e crayon sobre tela,
405 x 640.3 cm. MOMA, NY. Fonte: MOMA
42
Em Rose (1976, p.16), vemos que foi a geração do expressionismo abstrato,
pouco antes de Rauchemberg, Jones, Beuys e Twombly, que trouxe o problema do
acabado na pintura (levantado por Cezáne), para uma visão mais clara. Também
iniciou o repensar das possibilidades do desenho. Isso se deu nas décadas de 1940
e 1950.
Se todos os passos, toda a luta e pensamento demandados nos chamados
trabalhos acabados pudessem ser incorporados dentro do trabalho,
restando uma visível e vital parte de seu caráter – se uma pintura pudesse
ser inacabada ou incompleta no mesmo sentido em que os esboços são
inacabados – então esboços e pinturas podem gozar do mesmo status e o
desenho pode cessar de funcionar meramente como um passo no caminho
da pintura. (ROSE, 1976: 19).
Na obra de tais artistas, os resíduos do processo de elaboração de uma
imagem passam a ser importantes como elementos de sua própria construção. Os
procedimentos, cristalizados nesses resíduos definem a visualidade indicam os
significados das imagens. Fazem isso frente à nova possibilidade de ser incompleto,
ou seja, com significado em aberto. Os procedimentos inventados pelos artistas
criam visualidades e estilos pessoais.
Assim temos a frotagem e a colagem estética em Ernst, o dripping* em Pollock,
a garatuja em Twombly, a apropriação* em Beuys (figura 8), o apagamento em
Rauschemberg etc. Tais procedimentos se caracterizam por ações diretas no
suporte final da obra. São incorporados pelo gênero desenho, que passa a gozar do
mesmo status da pintura, da escultura e da gravura e a se fundir a elas.
43
Figura 8: JOSEPH BEUYS, A Morte e a menina (1957). Nanquim e aquarela sobre envelope,
17 x 25 cm. Coleção Ludwig Rinn. Fonte: BORER, (2001, fig. 48)
A segunda vertente dá-se a partir da década de 1960. A linha é adotada como
ente conceitual, não como expressão do gesto e o desenho é usado a partir de seu
aspecto projetivo. Trata-se de desenhos feitos de maneira esquemática e modular,
onde as marcas são arranjadas de acordo com um plano mestre. Esses planos
(projetos) não pressupõem a execução feita pelo próprio artista.
O que a linha representa é priorizado, não a linha em si. De maneira geral, as
marcas são agrupadas e os grupos tendem a ser repetidos serialmente. O desenho
se torna menos matéria da espontaneidade (autográfica e grafológica) e mais
dedutivo e conceitual em proposta e execução. Em Sol Lewit, esses desenhos
invadem o espaço de exposição, já que são feitos diretamente na parede da galeria
(figura 9).
44
Figura 9: Wall Drawing, Sol Lewitt, 1972. Fonte: UAVM.
Com toda a experimentação que se dá a partir da modernidade, parece não ser
mais possível definir “invariantes do desenho” (HASS, p. 8). Pode-se desenhar sobre
vários suportes: o papel, mas também a tela (Twombly), a parede (Sol Lewitt), a
areia (Walter de Maria), o mar (Robert Smithson), o ar, etc. Pode-se desenhar
conforme diferentes modalidades com todas as técnicas: o carvão, mas também o
fogo, a dobradura, os recortes, etc.
Em uma seqüência natural, artistas se lançaram em novas aventuras de
significação. Em 1966, Mel Bocker organizou uma exposição na School of Visual
Arts, em Nova York, chamada “Working Drawings and other visible things on paper
not necessarily meant to be viewed as art”, que mostrava, além de desenhos,
anotações, fotocópias de notas de compras, partituras, cálculos matemáticos e
outros objetos gráficos (DEXTER, 2005, p.7). Essa exposição propunha
questionamentos sobre onde estaria realmente a arte: nos objetos expostos ou na
própria concepção da exposição. Isso apresenta novos caminhos para o desenho
45
como, por exemplo, assumir a forma de um ready-made, à maneira de Duchamp, ou
de inserir procedimentos tecnológicos, como a máquina de fotocópias, no universo
da arte.
Assim, para entender o modo de existir do desenho na contemporaneidade
deve-se admiti-lo como um gênero híbrido de possibilidades, que articula diferentes
materiais, contextos e signos de ordem diversa, como os elementos concretos
cotidianos, fotografias, palavra escrita, garatujas etc. Contudo não podemos deixar
de considerá-lo como prática gestual grafológica (entendimento tradicional), ainda
válida. O desenho como gênero híbrido configura o terceiro ponto de ancoragem da
presente reflexão.
A partir do que foi exposto acima, pode-se dizer que uma nova linguagem das
artes visuais surge dissolvendo as fronteiras entre a pintura, o desenho, os meios de
reprodução e os objetos de uso cotidiano. Baseada em um campo expandido
1
que
se caracteriza em um novo relacionamento entre essas disciplinas, potencializado
pelo uso dos meios tecnológicos. Segundo ROSE (1992, p.11), a partir das novas
formas de hibridação de gêneros e linguagens, a pureza formal do desenho não
configura mais uma questão essencial nem uma preocupação. O desenho como um
meio autônomo é apenas um aspecto das novas práticas artísticas.
O importante para entender a atual situação do desenho é que ele se
tornou um dos principais elementos de uma nova linguagem e que opera
com uma enorme variedade de disfarces [...] O desenho se afirmou tanto
em termos de uma autonomia da linha como quanto em termos de um
controle conceitual de outras disciplinas. (ROSE, 1992, p.8).
A natureza de desígnio do desenho se afirma na maneira como se tornou
indissociável de outros gêneros tais como a pintura, o cinema, o vídeo, o design, a
gravura, o grafiti, a web, etc. O desenho é um modo de articulação de significados
básicos estruturais, seja por seu caráter de meio preparatório (esboço, desenho
técnico), por sua qualidade de estrutura geométrica (perspectiva, desenho técnico,
grades e diagramas), obras finalizadas ou por sua incompletude, liberdade e
1
Expressão primeiramente utilizada por Rosalind Krauss em seu livro “Sculpture in the Expanded
Field”, 1979.
46
capacidade de hibridação. O caráter autográfico não é mais uma questão essencial
frente a um ceticismo sobre a relevância da assinatura do gesto pessoal e do gênio
do autor. Contudo, sua qualidade de gênero híbrido e inclusivo, e aberto a
significações prevalece como uma estratégia contemporânea.
A tecnologia digital se estabelece como meio propício para tal estratégia.
Através dos microcomputadores pessoais, dos programas do tipo editores gráficos,
dos programas de edição de vídeo e de equipamentos periféricos de captação de
imagem (scanners e câmeras fotográficas), e de impressão propiciam muitas
possibilidades de interação e articulação de elementos de composição, muitos
advindos da prática do desenho (resíduos, rasuras, borrões, etc.), interagindo com
uma gama enorme de outros signos (fotografias, texturas, textos, etc.).
A mediação entre as técnicas de impressão, colagem, cópia, desenho, imagens
fotográficas, mídia de massa e tecnologia digital são admitidos como uma
contribuição para o enriquecimento da estética visual. Isso se assemelha ao modo
como o desenho tradicional, no modernismo, misturou os meios da aquarela, pincel,
caneta e tinta, aguada, colagem de papeis cortados, a colagem estética, a frotage
ou a mistura do desenho com a pintura. Esses também foram procedimentos
entendidos como constituintes de uma nova estética visual.
Segundo Rose (1992, p.11) o procedimento do pós-modernismo é o re-trabalho
do estilo moderno. Ou seja, a personificação do estilo moderno serve como texto
original. Recordações do passado integram iconograficamente a nova linguagem da
arte e, na mediação da tecnologia, se transfiguram, alegoricamente. Como sugere
Northron Frye’s (apud OWENS, 2004, p.2), a alegoria é “um texto lido através de
outro”. No contexto do pós-modernismo nas artes visuais isso se dá na imagem
apropriada, fragmentada, plural, complexa, com significado em aberto. Imagens e
procedimentos são apropriados e transformados em outra coisa. Seu significado
original é obscurecido e transmutado quando se agrega a tais imagens outro
significado e esse é o objetivo do artista. A alegoria se define por ser uma estratégia
pós-moderna da criação, inclusive da criação de imagens.
47
O resultado formal é uma fusão de vários elementos de origens distintas que
passam a construir uma nova imagem, que pode ter vários planos ou camadas que
expandem a sensação de planos de fundo. Formas “imperfeitas” apenas indicam
novos significados. Essas imagens tendem para a fragmentação, o impreciso, o
imperfeito e o incompleto, porque a resignificação se dá com a hibridização dos
recursos e deslocamento de contextos e a pluralização dos significados por meio de
significantes fragmentados. Por exemplo, o misto entre textual e visual: o
cruzamento de fronteiras.
A tecnologia invadiu o Jardim: frente à mídia de massa e suas técnicas e
com o advento da fotografia como um instrumento para o registro da
primeira concepção do artista, o próprio desenho, como fazer artístico
[autônomo] tem sido assaltado [...] dentro dessa área geral de agregação,
existe uma enorme quantidade de jogos inerentes ao novo modo, e o
desenho, com o seu enorme potencial de reescrever, tem se tornado um
veículo primordial para essa alegoria pós-moderna. (ROSE, 1992, p.11).
Para uma estética pós-moderna, que passa a aceitar a fragmentação, o
impreciso, a multiplicidade de interpretações, a ambigüidade e o híbrido, um estudo
pode ser tão completo quanto qualquer outra obra acabada. A partir de sua
incompletude, tendência ao hibridismo que o desenho mantém sua importância para
a construção de significados em nossos dias.
Não se trata mais de um entendimento tradicional do desenho, embora ele
ainda seja válido, mas quanto à experiência do desenho atuando como um campo
expandido de possibilidades, de fronteiras difusas, de mistura e de incorporação do
aleatório na articulação dos signos visuais e da criação de significados abertos às
interpretações pessoais. Como veremos a seguir essa também configura uma
condição para parte da produção atual do design gráfico.
48
2.2 O DESIGN GRÁFICO
Esse tópico busca entender a constituição do design gráfico como atividade
profissional, revisando antecedentes históricos até a contemporaneidade, quando
são identificadas estratégias mais recorrentes do design gráfico que tem relação
com o que já foi visto sobre o desenho.
O uso do termo design, no Brasil, deve-se à incorporação, relativamente
recente, do substantivo homônimo da língua inglesa. Aqui, esse termo passou a
substituir a expressão Desenho Industrial. Em princípio, faz menção, um conjunto
de conhecimentos e uma prática profissional relacionados à elaboração de projetos
para a fabricação, por meios mecânicos industriais, de objetos padronizados.
O termo inglês tem simultaneamente dois sentidos: o primeiro, abstrato, diz
respeito ao planejamento, à intenção ao desígnio; o segundo, concreto, refere-se à
configuração, à ordenação, ao arranjo e à estrutura de algo. Isso não é restrito à
ação humana, já que, em inglês, pode-se falar no design do universo ou de uma
molécula (DENIS, 2000, p.17), assim como no design de uma espécie, resultado do
processo de seleção natural (DAWKINS, 2001).
O design, como prática profissional, origina-se na separação entre a concepção
e confecção dos objetos, que ocorreu a partir da primeira Revolução Industrial.
Define-se como a elaboração de projetos para produtos destinados à fabricação
mecânica, com padronização dos resultados, com produção em larga escala, com
diminuição dos custos de produção e do produto final, com a satisfação de uma
demanda e com a criação de novos mercados. (DENIS, 2000, p.17).
Na antiguidade já se utilizavam técnicas artesanais de produção seriada, como
a modelagem de cerâmicas e a fundição de metais, que permitiam resultados
padronizados e em escala. Contudo, têm-se como peças chave para a
transformação dos meios de produção os adventos da imprensa de tipos móveis,
mais antiga, que data do século XV, e a indústria têxtil do séc. XVIII. Ambos os
processos pressupunham etapas distintas entre elaboração e execução, com a
49
fabricação de objetos por meios mecânicos e com a padronização dos resultados
obtidos (DENIS, 2000, p.17).
Aconteceu na Europa entre os séculos XVIII e XIX uma série de
transformações nos meios de fabricação, tão profundas e tão decisivas que
costumam ser conceituadas como o acontecimento econômico mais
importante desde o desenvolvimento da agricultura. Essas mudanças
acabaram ficando conhecidas como Revolução Industrial, justamente como
forma de chamar a atenção para o impacto tremendo que exerceram sobre
a sociedade, o qual só encontra eco na ruptura radical com o passado
efetuada pela Revolução Francesa. O termo se refere essencialmente à
criação de um sistema de fabricação que produz em quantidades tão
grandes e a um custo que vai diminuindo tão rapidamente que passa a não
depender mais da demanda existente, mas gera seu próprio mercado.
(HOBSBAWM, 1964, p.50, apud DENIS, 2000. p.18).
A dificuldade de descrever com exatidão o momento em que acontece a
mudança do sistema de produção artesanal para o industrial deve-se ao fato de que
isso se deu de forma heterogênea, tendo acontecido em diferentes épocas em
diferentes regiões. Sabe-se que a Inglaterra foi o berço dessa transformação, devido
a uma confluência de fatores “demográficos, sociais, tecnológicos, geográficos,
culturais e ideológicos, nenhum dos quais explica por si só a precedência inglesa”
(DENIS, 2000, p.17). Não se considera relevante descrever aqui pormenores da
transformação dos meios de produção advinda da Revolução Industrial, mas sim ter
em mente que o enorme aumento de produção provocou também enormes
mudanças nos meios econômicos e sociais. Por exemplo, a produção de tecidos de
algodão aumentou 5000% na Inglaterra, entre 1780 e 1850, com a substituição das
oficinas artesanais pelas fábricas (DENIS, 2000, p.21).
Como sugere Pevsner (1995, p.32), “o grande aumento da produção está
associado à perda da qualidade estética dos produtos, mas isso em si é uma
justificativa simples demais”. Todo o sistema social medieval foi transformado, o que
acabou com “uma classe de patrões cultos e ociosos e com a classe de artesãos
cultos” (PEVSNER, 1995, p.32). A transição das artes aplicadas (artesanato) da
forma medieval para uma forma de produção moderna (industrial) inicia no século
50
XVI e, a partir de 1760, há um rápido aperfeiçoamento técnico. Mas essa transição é
fruto também da mudança de espírito que impulsiona o surgimento da Modernidade.
Isto se deve sem dúvida à profunda modificação espiritual que começou
com a reforma, ganhou força durante o século XVII e se tornou dominante
no Século XVIII. O racionalismo, a filosofia indutiva e a ciência
experimental foram os aspectos mais importantes da atividade européia da
Idade da Razão. (PEVSNER, 1995, p.31).
No artesanato medieval a concepção e confecção dos objetos e utensílios eram
realizadas por um profissional, o artesão, formado em corporações e os objetos que
produzia eram frutos de um grande aprimoramento técnico e estético. Contudo,
mesmo que estivesse inserido em uma linha de produção (oficinas artesanais), sua
produção dava-se em séries de baixa escala. Segundo Pevsner (1995, p.32), com a
industrialização, a produção de objetos em larga escala se distancia do
aprimoramento técnico e estético do artesão medieval e passa a reproduzir e
exagerar a ornamentação dos estilos medievais das artes e da arquitetura.
No meio dessa corrida desenfreada não havia tempo para aperfeiçoar as
inúmeras inovações que iam cair nos braços de produtores e
consumidores. Depois da desaparição do artesão medieval, a qualidade
artística de todos os produtos passou a depender de fabricantes incultos.
(PEVSNER, 1995, p.32).
Isso produziu uma reação, por parte de artistas e teóricos, que passaram a
refletir sobre a estética desses objetos (PEVSER, 1995, p.31). Surge uma crescente
necessidade de aprimoramento estético dos produtos industriais, e com isso,
surgem também profissionais dedicados a sua elaboração. Os primeiros
profissionais a desempenharem tarefas semelhantes às funções de um designer
(elaboração de projetos para a produção industrial) emergiram do processo
produtivo. Eram aqueles operários promovidos aos cargos de controle e concepção
por sua experiência ou habilidade (DENIS, 2000, p.17), os próprios fabricantes
(PEVSNER, 1995, p.32), artistas e artesãos que se adaptaram aos processos de
produção industrial (HOLLINS, 2000, p.5).
51
Em relação ao Design Gráfico, de fato, antes do estabelecimento da profissão e
dos procedimentos gráficos contemporâneos, o planejamento da comunicação
gráfica era feito por profissionais inseridos no processo de produção ou artistas
comerciais ou artistas gráficos: letristas que desenhavam os tipos de letras;
tipógrafos que selecionavam os tipos e planejavam a disposição das manchetes e
blocos de textos, atribuindo hierarquia à informação; ilustradores que produziam
todo o tipo de imagens, desde diagramas mecânicos até desenhos de moda;
técnicos especializados em funções específicas como, por exemplo, transpor
pinturas para matrizes de impressão, separando cada cor em uma matriz;
impressores litográficos, etc. Muitos artistas comerciais das artes gráficas reuniam
várias dessas habilidades (HOLLINS, 2000, p.1 e p.3).
A transformação do operário habilidoso em um profissional liberal, afastado da
experiência produtiva de uma determinada indústria e capaz de elaborar projetos
genéricos, se deve a um “longo processo evolutivo que teve seu início na
organização das primeiras escolas de design no século XIX e que continuou com a
institucionalização do campo ao longo do século XX” (DENIS, 2000, p.18).
A Bauhaus, primeira e principal escola de design, foi criada em 1919, na
República de Weimar, após a derrota da Alemanha na I Guerra Mundial e da
assinatura do Tratado de Versalhes. Até hoje é entendida como um marco da origem
do design. Esforçou-se por renovar o potencial formal e social dos objetos. Foi uma
união de estudantes, professores e administradores sempre em transformação e
frequentemente dividida. Seu legado constitui um modelo teórico baseado na visão
como sentido autônomo de percepção e na abstração como meio para a busca da
essência de uma linguagem visual universal (LUPTON e MILLER, 2008, p.6).
A ideologia da Bauhaus formalizou um Curso Básico que se propunha a
desenvolver nos estudantes uma “base indispensável a toda produção artística”
(LUPTON e MILLER, 2008, p.9). Esse Curso Básico buscava desenvolver uma
“linguagem visual abstrata e abstratizante” (LUPTON e MILLER, 2008, p.9), capaz
de prover bases teóricas e práticas para qualquer prática estética, baseada em
aspectos irredutíveis, essenciais, fundadores e originais da visualidade. Almejava
52
atingir verdades fundamentais do mundo visual e aplicar isso nos projetos de
objetos. Isso caracteriza o caráter revolucionário da Bauhaus.
Como sugere Gruszynski (2007, p.52), a integração do produto artístico e
industrial teve, em um primeiro momento, tal caráter revolucionário, advindo da
“esperança de um novo tempo baseado em uma nova relação com os objetos”
Posteriormente, essa relação se torna preponderantemente estratégica e
corporativa, como modo de atribuir valor econômico aos objetos por seu caráter
estético e simbólico (GRUSZYNSKI, 2007, p.52), criando objetos de desejo.
Para Lupton e Miller (2008, p.9), o esforço da Bauhaus para renovar o potencial
formal e social do design traz a sensação de que muitos caminhos férteis foram
oferecidos, mas não perseguidos e que suas idéias de vanguarda foram
neutralizadas pela incorporação de seus preceitos por uma cultura corporativa. Suas
formas e cores se tornaram matéria dos logotipos da maioria das grandes empresas,
criando um padrão por vezes impositivo e repressor das mudanças.
2.2.1 O estatuto do desenho na Bauhaus
J. Abbot Miller, em seu ensaio “Escola elementar” (LUPTON e MILLER, 2008,
p.8), descobre os predecessores da teoria modernista do design da Bauhaus na
reforma educacional do século XIX, onde autores propunham a decomposição da
experiência visual em elementos geométricos simples e repetitivos como o triângulo,
o quadrado e o círculo, e no uso de grades, compostas por pontos ou linhas.
Por outro lado, Ellem Lupton, no ensaio “Dicionário visual” (LUPTON e MILLER,
2008, p.26) examina algumas das estratégias do design da Bauhaus, relacionadas
ao ideal de uma linguagem visual universal autônoma, “livre das limitações culturais
da escrita alfabética”, cunhada por Kandisnsky na sentença “triângulo amarelo,
quadrado vermelho e círculo azul”.
Como sugerem Lupton e Miller, o desenho se estabelece como área legítima da
educação infantil desde a publicação de “ABC da Anschauung”, de Cristoph Buss,
53
em 1803. Outros autores da época também defendiam o desenho como uma forma
de escrita paralela à escrita alfabética. Pestalozzi inaugura no século XIX o interesse
pelo desenho pedagógico. Seu método baseava-se em uma crença de que o
“quadrado era base de todas as formas, e que o método do desenho deveria basear-
se na divisão de quadrados e curvas em partes” (ASHWING, 1981, p.56, apud
LUPTON e MILLER, 2008, p.10).
[Pestalozzi] procurou desmembrar a complexidade da natureza em suas
formas constituintes [...] para identificar e elementalizar a geometria
subjacente ao mundo visual de forma assimilável pela criança. (ASHWING,
1981, p.16, apud LUPTON e MILLER, 2008, p.10).
Ramsauser em “Tutor de desenho”, 1821, cria um método de desenho baseado
na idéia de um código gráfico reduzido, ou um alfabeto do desenho. Parte da idéia
das formas principais (Hauptformen) que “representam a essência abstrata dos
objetos físicos” (ASHWING, 1981, p.56, apud LUPTON e MILLER, 2008, p.10). A
tipologia proposta por esse autor consiste em três formas principais: objetos em
repouso (objetos eretos e deitados), objetos em movimento (formas direcionais,
setas, objetos em rotação, etc.) e objetos que combinam movimento e repouso
(formas flutuantes como um barco ou que pendem como um galho).
O interesse pelos métodos pedagógicos de desenho do início do século XIX foi
reavivado pelos mestres da Bauhaus: Klee, Kandinsky, e Itten. Tais métodos
entendiam o desenho como uma disciplina normativa e instrumental para a
socialização da criança. Embora almejassem a representação naturalista,
empregavam estratégias analíticas que seriam ecoadas mais tarde nas obras
desses mestres. Kandisnky, por exemplo, isola os elementos da construção pictórica
(ponto, linha e plano) e identifica uma gramática de linhas, atribuindo-lhes poder
emotivo, em vez de uma função estritamente descritiva, baseado na tipologia, acima
citada, proposta por Ramsauser (ASHWING, 1981, p.16, apud LUPTON e MILLER,
2008, p.10).
Outro método de desenho, o de Fredrisch Froebel, 1826 (LUPTON e MILLER,
2008, p.12), adota duas estratégias: o desenho em pontos e o desenho em rede. O
54
desenho em pontos consistia em uma retícula de pontos com intervalos
eqüidistantes no papel do estudante similar a reticula presente na lousa do
professor. O desenho em redes era baseado em uma grade gerada pela ligação
desses pontos. A adição de números aos pontos ou aos eixos da grade permitia o
professor ditar desenhos (LUPTON e MILLER, 2008, p.12). Esses métodos
baseavam o aprendizado da escrita na ligação de pontos, indicando o quanto os
educadores entendiam o desenho e a escrita como disciplinas paralelas.
Frequentemente ensinados com o auxílio de cânticos ritmados, esses
exercícios eram vistos como práticas disciplinares para desenvolver
destreza e habilidades analíticas que beneficiavam seus alunos em todas
as áreas de atuação – não apenas na representação visual. (LUPTON e
MILLER, 2008, p.12)
O uso da grade foi extensão da crença em uma dependência do processo
perceptivo humano a conceitos como horizontalidade e verticalidade. Froebel
achava que existia uma correspondência entre a estrutura da grade e o modo de
recepção da imagem pela retina. Seu método consistia em desenhar figuras
geométricas em uma lousa quadriculada, que seriam repetidos pelos alunos em
folhas também quadriculadas. Eram exercícios que buscavam reduzir a
complexidade do mundo a componentes simplificados. À medida que os exercícios
iam evoluindo, os elementos geométricos se transformavam em representações
naturalistas (LUPTON e MILLER, 2008, p.12).
A grade aparece tanto ao longo dos escritos pedagógicos de Klee quanto em
sua arte. Klee descreve a grade como “possuidora de um ritmo estrutural muito
primitivo”, com a qual os elementos podem ser transferidos de um lugar para outro
com segurança (KLEE, 1981, p.22). Como ferramenta de transferência, a grade é
concebida como algo neutro e invisível e sua regularidade é condição para seu
funcionamento. Contudo, Klee reviu a grade como algo ativo, com variações em sua
estrutura estável. Sabe-se, por experiência própria, que a flexibilização da grade é,
até hoje, uma estratégia muito útil para a elaboração de peças gráficas arejadas
(figura 10).
55
Figura 10: Flexibilização da grade. Fonte: MAT
Por outro lado, Itten “procurava liberar a criatividade de seus alunos por meio
de um retorno à infância, introduzindo explorações elementares de formas e
materiais, automatismo, desenho cego, movimentos rítmicos de desenho e uma
abordagem intuitiva e mística”. O método de Itten era baseado em estudos sobre a
infância da imagem que consideravam a produção infantil e os objetos produzidos
por adultos em culturas não industrializadas e não ocidentais como registros de uma
experiência original e primária da visão. Os artistas influenciados por essa premissa,
recorriam aos desenhos infantis e ao primitivo como “fontes de expressão verdadeira
e imediata” (LUPTON e MILLER, 2008, p.23 e p.24). A seguir vemos uma peça
gráfica criada por Itten onde a caligrafia demonstra certo automatismo e desordem,
determinando uma visualidade bastante expressiva (figura 11).
56
Figura 11: Johannes Itten. Spruch. Litografia, 1921. Fonte: MEMBERS
Conforme sugere Miller (LUPTON e MILLER, 2008, p.24), o retorno às origens
e aos impulsos primitivos, defendidos pelo método de Itten foram, ao mesmo tempo,
sua maior contribuição e a razão de sua saída da Bauhaus. Houve críticas
direcionadas as suas influências expressionistas.
A mudança em direção a uma geometria mais sóbria, de contornos rígidos,
tem sido descrita como uma racionalização progressiva da pedagogia da
Bauhaus. Entretanto, é possível ver essa racionalização da forma como
uma tentativa de quebrar a associação entre o elementarismo e
expressionismo, especialmente tendo em conta que os conservadores
opositores da escola costumavam igualar expressionismo a comunismo,
boemia e influências estrangeiras” (LUPTON e MILLER, 2008, p.24).
57
Itten, Klee e Kandinsky buscaram descobrir as origens da linguagem visual em
geometrias básicas, cores puras e abstração, em práticas pedagógicas que
possuíam simultaneamente caráter científico e expressivo. Objetivaram o estudo das
formas, cores e materiais voltados à constituição de uma ciência da arte que
constituíram construções teóricas a respeito de leis primordiais da forma visual que,
supostamente, operam a parte da história e da cultura.
Nos livros de Kandisnky, Klee, Moholy-Nagy, entre outros, gráficos informativos
funcionam como modelos para uma nova estética, ao mesmo tempo didática e
poética. Grades e gráficos constituíram para esses mestres um ramo privilegiado do
signo. Eram vistos como base de uma escrita visual não ilusionista e de
compreensão universal: uma linguagem visual (LUPTON e MILLER, 2008, p.23 e
p.24).
O desenho foi o meio essencial para o projeto da Bauhaus para uma linguagem
visual, já que suporta tanto investigações a partir de uma verdade geométrica e
científica, quanto impulsos primários, expressivos e abstratos. A palavra “gráfico”
refere-se tanto ao desenho como à escrita. Esses são gêneros diferentes que usam
meios semelhantes. O padrão formado pelo gráfico é percebido como uma Gestalt
(forma ou imagem simples).
Bloco de notas pedagógico, de Paul Klee (1925) e Ponto e linha sobre o
plano, de Wassily Kandisnky, ambos publicados pela Bauhaus, são cartilhas
da gramática de uma escrita visual. Linguagem da visão, de Gyorgy Keples
(1944) e Visão em movimento, de Lászlo Moholy-Nagy, usam a psicologia da
Gestalt para emprestar à linguagem da visão um conceito científico. Ambos
foram escritos na Escola de Design de Chicago, fundada como a ‘Nova
Bauhaus’. Desde então a psicologia da Gestalt tornou-se uma fonte teórica
dominante para o ensino básico de design (LUPTON e MILLER, 2008, p.26).
A partir das premissas da Bauhaus, amparadas teoricamente pela psicologia da
Gestalt, autores como Donis A. Dondis (1997) e Wucius Wong (1992) elaboram
conceitos sobre uma linguagem visual com a articulação concatenada e evoluída de
elementos de desenho (ponto, linha, plano, cor, textura, etc.) arranjados de acordo
58
com uma “sintaxe visual” que propõe estratégias de composição como, por exemplo,
os contrastes formais (claro/escuro, estático/dinâmico, positivo/negativo etc.).
Contudo, mesmo que as imagens apelem para uma faculdade natural da
percepção antes que para a convenção cultural, ou seja, que a resposta que evocam
seja mais sensitiva e emocional que intelectual, isso explica somente em parte a
maneira como se criam significados a partir de imagens. Na pós-modernidade o
contexto social e cultural não pode ser desvinculado da fruição.
2.2.2 Design Gráfico e significado das imagens / mensagens
Ao longo do tempo, com o avanço da indústria e com a especialização das
funções nos meios de produção e reprodução, o design se estabeleceu como
atuação profissional e como disciplina, com um conjunto próprio de conhecimentos
técnicos, mercadológicos e criativos. Hoje em dia, temos uma grande quantidade de
subdivisões do design. Cada uma delas tem origem na especialização da prática
profissional e, a partir disso, configura um novo campo de estudo específico como:
design de produtos, design gráfico, design de superfície, design de web, design
informacional, design de embalagens etc.
O design gráfico se estabelece como área de atuação profissional na
modernidade e está vinculado à Revolução Industrial e à elaboração de projetos
para a confecção mecânica e seriada de objetos dedicados à comunicação
impressa, como os cartazes, livros, revistas, etc. Porém, sua origem está nas
diversas maneiras, estabelecidas ao longo da história, de dispor o conhecimento em
uma forma gráfica.
As mensagens adquirem forma gráfica a partir de sistemas de signos. Quando
reunidos, os signos gráficos, como as linhas de um desenho, os pontos de uma
fotografia, as letras de um alfabeto, formam imagens que, inseridas em um contexto,
são motivos para interpretações. O design gráfico é a arte de criar ou escolher tais
signos, combinando-os em uma superfície predominantemente bidimensional para
transmitir uma idéia (HOLLINS, 2000, p.2).
59
As imagens gráficas são mais do que ilustrações descritivas de coisas
vistas ou imaginadas. São signos cujo contexto lhes dá um sentido especial
e cuja disposição pode conferir-lhes um novo significado. (HOLLINS, 2000,
p.2)
Os signos não carregam significados em si, mas é a relação com o contexto
que lhes traz sentido. O designer gráfico trabalha com signos de ordem variada: a
palavra escrita, elementos tipográficos (forma das letras), a fotografia e a ilustração,
os elementos de desenho (linhas, pontos, planos, formas, texturas, etc.) além dos
materiais e formatos das peças gráficas e da maneira como essas são produzidas.
Esse conjunto de signos é articulado para criar contextos de transmissão de
significados e para estimular a adesão de uma audiência a esses significados. Essa
adesão pode ser conseguida através de procedimentos retóricos persuasivos,
segundo a teoria de Flávio Vinícius Cauduro.
[...] o design gráfico é um processo de busca de soluções para problemas
de comunicação, que procura inventar assim como re-articular signos
visuais. O design tenta aperfeiçoar os aspectos estéticos (icônicos,
emocionais e subjetivos), persuasivos (indicativos, factuais e contextuais) e
informativos (simbólicos, convencionais e comunitários) das mensagens
(discursos). (CAUDURO, 1998 A, p.63).
A elaboração de mensagens gráficas configura uma prática baseada em
sensações subjetivas a respeito dos signos visuais e da temática dos discursos.
Tende a ser passível de identificação e verificação através de indicações factuais e
concretas, de procedimentos técnicos, trabalho e geração de alternativas. Para
então se tornar generalizável, habitual, replicável, aceita e compartilhada
simbolicamente por um grupo ou comunidade.
A palavra escrita é um signo essencial para o design gráfico. Como registro, ela
não comporta uma grande variedade de nuances e inflexões relativas à fala
(HOLLINS 2000, p.3). Ao longo da história têm-se tentado romper essas limitações
com um repertório de procedimentos criativos e de composição especialmente caro
aos designers gráficos como: ampliar ou reduzir a escala de determinadas palavras
60
em relação a outras, escolher diferentes desenhos de letras, cores, espessuras,
ornamentos, ordenamentos, agrupamentos, alinhamentos, espaçamentos de letras,
linhas e blocos, ritmos de leitura etc.
Da mesma forma os outros elementos de composição de uma peça gráfica
(fotografias, ilustrações, elementos gráficos etc.) são submetidos à mesma lógica.
Todos esses procedimentos estão relacionados a um anseio de não só transmitir a
mensagem, mas também dar-lhe uma expressão única, portanto original (HOLLINS,
2000, p.1).
Os procedimentos envolvidos na articulação dos signos estão na essência de
toda a criação em design gráfico. Essa criação se caracteriza pela geração de
alternativas que solucionem melhor os problemas de comunicação estabelecidos
previamente pelo cliente, por exemplo: criar uma peça que divulgue determinado
evento para determinada audiência, dispondo a informação de maneira clara,
chamando a atenção quando colocada junto com peças da concorrência e
transmitindo (geralmente com imagens) determinado conceito.
Embutidos nesse problema inicial estão várias questões. Como transmitir
determinado conceito em imagens? Como essas imagens coexistirão com a
informação textual? Como chamar a atenção da audiência e persuadi-la? O que
essa audiência espera de uma peça gráfica? Como cumprir essas expectativas de
transmissão de certo conteúdo e, ao mesmo tempo, surpreender a audiência com
alguma inovação? O conceito formulado inicialmente pelo cliente realmente condiz
com suas necessidades de comunicação? Os signos selecionados (pelo cliente ou
pelo designer) realmente suprem essas necessidades?
Todas essas questões podem ser respondidas a partir da geração de
alternativas de composição e articulação dos elementos. Essa se caracteriza por ser
um processo de variação e seleção, onde os conceitos são formulados,
reformulados, testados e evoluem. Antes disso existem conceitos a priori, nem
sempre suficientes para se estabelecer estratégias para a solução de um problema
de comunicação, pois podem ser imprecisos ou erroneamente construídos.
61
Francisco Homem de Melo (MELO, 2003, p.96) afirma que o “movimento de
vaivém entre conceito e solução de desenho costuma ocorrer como um processo
indissolúvel, sendo difícil separar aquilo que é conceito daquilo que é desenho”.
Essa afirmação iguala o desenho ao trabalho de construção de alternativas no
design gráfico que se dá em um fluxo entre conceituação e criação de soluções
gráficas. O desenho aqui deve ser considerado de maneira ampla, conforme já foi
visto anteriormente, como a articulação de um conjunto variado de signos e não
apenas como uma prática gestual.
Se por um lado o design gráfico tem em essência um anseio pela originalidade,
por outro, ao depender do entendimento por parte de uma audiência, precisa
reproduzir uma série de convenções e argumentos já estabelecidos. A transmissão
da mensagem depende de um conjunto formado por “estereotipações,
conformidades, repetições, redundâncias e convenções que suportam e possibilitam
a comunicação” (CAUDURO, 1998 D, p.7) dentro de uma comunidade ou meio
social, ou seja, dos determinantes culturais.
Contudo, a originalidade pressupõe uma maneira peculiar de abordar essas
convenções. Em última instância isso define um estilo pessoal. Essa dialética entre
inovação e convenção configura um problema essencial para a prática do designer
gráfico. Diferente do desenho artístico contemporâneo, muitas vezes feito
diretamente no suporte final, sem visar uma solução de problema de comunicação, o
designer gráfico, a partir da geração de alternativas, busca a compreensão por parte
de uma audiência, o cumprimento de uma demanda comercial e a perfeita
realização de seu projeto via produção industrial. Esses fatores condicionam sua
criação. Faz isso a partir de desenhos preparatórios ou, como é usual nos dias de
hoje, com ações diretas nos arquivos de programas computacionais do tipo editores
gráficos, onde se pode articular uma ampla gama de signos como fotos, tipografia,
gráficos etc.
De acordo com a teoria da retórica da persuasão, de Cauduro, na pós-
modernidade, longe dos anseios modernos de estabelecer regras fundamentais para
uma comunicação universal, o design gráfico volta-se, em parte, para o trabalho de
geração de alternativas de comunicação que buscam a significação em aberto,
62
destinadas a audiências específicas em contextos particulares, que participam
ativamente da atribuição de sentidos às mensagens, conforme se verá adiante. De
maneira análoga, essas características podem ser percebidas também na produção
do desenho contemporâneo. Isso caracteriza um conjunto de estratégias para a
criação de imagens comuns para parte das duas áreas estudadas aqui.
No design gráfico atual, tais estratégias, em grande parte, são suportadas pela
tecnologia digital. Essa pode, à medida que se faz necessário, abranger a criação de
uma peça gráfica desde os primeiros esboços até a finalização. O uso de desenhos
preparatórios, feitos à mão, é uma opção a mais para o designer gráfico e depende
de suas preferências e aptidões. O fato de que o design gráfico atual lida com uma
quantidade variada de signos, em especial a fotografia e a tipografia, parece
distanciar a elaboração de peças gráficas da necessidade de desenhar a mão. Essa
tecnologia, através dos computadores pessoais, dos programas computacionais do
tipo editores gráficos e dos equipamentos periféricos de captação de imagens e de
impressão, é mais apropriada para a prática do designer gráfico.
A seguir serão descritas as características e estratégias para a elaboração de
imagens na pós-modernidade, selecionadas para a presente reflexão, segundo a
teoria da retórica das imagens, de Flávio Vinícius Cauduro. Em seguida será
descrita a tecnologia digital que dá suporte ao design gráfico hoje em dia e como ela
influencia a prática profissional e o resultado formal das peças gráficas que vemos
hoje.
63
2.3 CARACTERÍSTICAS DAS IMAGENS CONTEMPORÂNEAS
Sabe-se que o sujeito contemporâneo das grandes cidades é submetido
constantemente a um grande número de imagens, em grande parte destinadas à
promoção do consumo. Essas imagens, difundidas por diversos meios com os quais
esse sujeito se relaciona cotidianamente (cinema, TV, outdoors, cartazes, jornais e
revistas, livros e folhetos, páginas da web etc.) o familiarizam com as proposições de
significado que veiculam, e estão em constante competição por sua adesão a essas
proposições (CAUDURO, 2007, p.273).
O constante esforço de conquistar a atenção do sujeito à determinada
mensagem, a fim de transformá-lo em consumidor, introduz um ritmo intenso e
incessante de mudanças no contexto social e no próprio sujeito. Esse sujeito, que
tem suas crenças e valores em contradição com novos significados, veiculados
pelas imagens e mensagens das chamadas mídias de massa, torna-se um sujeito
en procès, ou seja, em constante julgamento e mudança de suas crenças, valores,
gostos pessoais, estilo de vida, etc. (CAUDURO, 2007, p.274). O sujeito
contemporâneo está em constante e rápida transformação.
A contemporaneidade é marcada pela despreocupação a respeito da
permanência de crenças e valores e por um cultivo da diferença, da
mudança, do relativismo e da complexidade. Fruto e causa de um ciclo
acelerado de mudanças nos significados, a transformação dos significantes
parece obedecer a um conjunto de estratégias que confrontam as
premissas modernas como less is more, form follows function, ornament is
crime, legibility always come first. (CAUDURO, 2007, p.274).
Como se verá, as estratégias citadas por Cauduro introduzem, no contexto das
mensagens e imagens, signos imprecisos, mutáveis e abertos a interpretações.
Nesse contexto, a prática do design gráfico, assim como a das artes visuais, tem
apresentado importantes mudanças estéticas. Tais mudanças se caracterizam pela
apropriação, o site-specífic (a ação pensada para um espaço específico), o efêmero
(a preferência pela impermanência, tanto física da obra, quanto de seus
64
significados), a acumulação (a profusão e sobreposição de significantes e
significados das mensagens), a fragmentação (a desconstrução da boa forma), a
hibridização (a utilização e coexistência e formas e significados díspares), a
performance (a ação no lugar do objeto), etc.
Tais mudanças se estabelecem de modo crítico em relação à utopia do espírito
moderno (e da tradição humanista de modo geral) de que o indivíduo, de posse da
razão e da técnica, transformaria o mundo em busca de uma sociedade idealizada,
justa e democrática. A condição pós-moderna caracteriza-se basicamente pela
crescente descrença do sujeito contemporâneo na validade das metanarrativas e
dos cânones tradicionais (LYOTARD, 1984, apud CAUDURO, 2007, p.274). A
palavra de ordem da pós-modernidade é a incredulidade.
Certamente não se pode considerar a pós-modernidade, bem como a
modernidade, como um bloco monolítico de ideais e crenças, mas sim como a
confluência de sujeitos diferentes para a compreensão de alguns conceitos. O
próprio modernismo nas artes tratou de se contrapor à permanência de dogmas, no
Dadaísmo por exemplo, ironizando a arte e o gênio do autor com estratégias tais
como as apropriações, as colagens e os ready-made* etc. Contudo, para grande
parte do design e da arquitetura modernistas, a teoria da Gestalt sobre a psicologia
da percepção humana da forma e a pintura concreta (Kandisnky, Mondrian, Malevich
etc.) constituiu conceitos chave para o projeto de objetos harmônicos, destinados a
um “homem universal” (GRUSZYNSKI, 2007, p. 57).
Para Winson (apud CAUDURO, 2007, p.274), a pretensão de que valores e
significados, bem como suas formas significantes podem ter um entendimento
universal é o ponto cego da modernidade: “como acreditar na validade de verdades
universais únicas se há tanta diversidade cultural no mundo, no tempo e no
espaço?”
[...] um signo, uma forma, um texto, não podem mais continuar sendo
considerados como simples veículos ou receptáculos para o transporte e
propagação de um conteúdo, sentido, ou significado único, fixo, pré-
determinado; porque sinais materiais só “contêm” a si mesmo, passando a
65
produzir sentido ou significado somente quando interpretados, isto é, só
depois de conectados com outros sinais, presentes no texto (in praesentia)
e/ou na memória do sujeito interpretante (textos in absentia). Portanto, o que
sempre nos surge pela frente são marcas sem significação e que só passam
a ter sentido quando e se as interpretarmos. Logo, signos não podem ser
enviados, mas apenas recebidos (HARLAND 1987, p.132, apud CAUDURO,
1998, p.67)
Na pós-modernidade, o convívio com a diferença, a mudança, o relativismo e a
complexidade das crenças e valores são aceitos e estimulados. Seria uma tentativa
de conviver com a descrença de que a ciência e a tecnologia agem exclusivamente
para melhorar nossas vidas. O aspecto negativo da era moderna (o nacionalismo
totalitário, as guerras, o holocausto, a depredação do meio ambiente e a
incapacidade de suplantar o imperialismo, a miséria, o racismo etc.) tratou de
desacreditá-las frente a um sujeito pós-moderno que revê o passado e se questiona
quanto ao custo do progresso (GRUZINSKI, 2007, p. 57).
Ao rejeitar uma visão idealizada e estática da verdade, o sujeito pós-moderno
se vê frente à possibilidade de uma “verdade dinâmica” (mutante), caracterizada
pela efemeridade, diversidade e relatividade do conhecimento e pela pluralidade de
perspectivas, sentidos, métodos e valores. (CAUDURO, 2007, p.276).
Como conseqüência da pluralidade, existe a preferência e apreço a situações
de duplo sentido, a interpretações não-consensuais, atitudes irônicas e críticas em
relação às grandes narrativas (teorias científicas, mitos religiosos, nacionalismos,
culturas hegemônicas e dogmas profissionais) que se propõe a abarcar e explicar a
totalidade das coisas. A pós-modernidade, ao invés de tentar explicar a realidade,
tenta interpretá-la, sob pontos de vista diversos. Ao invés de métodos baseados em
leis universais, adota modos de pensar e representar que enfatizam a pluralidade de
entendimentos, “caracterizados pelas montagens ao invés da perspectiva, a
intertextualidade ao invés da referência, as parcialidades ao invés de totalidades
abrangentes” (CAUDURO, 2002, p.277).
Parece óbvio que podemos transcender o entendimento do que foi visto até
agora sobre a pós-modernidade para os meios visuais e atuais estratégias pós-
66
modernas de significação, tanto na arte (e no desenho artístico), como no design
gráfico contemporâneos.
São estratégias transgressoras que o modernismo já havia experimentado na
sua ânsia de encontrar sempre novas formas de romper com o passado e ser
sempre inovador e progressista. As estratégias pós-modernas recontextualizam sem
romper, em uma lógica de co-existência. Criticam a busca do novo a todo custo,
proposta pela avantgarde, assim como desconstroem, através de pastiches e
simulacros, a exaltação da genialidade e da criatividade do artista que procurava
excluir a participação da audiência e do seu contexto na interpretação das obras
(CAUDURO, 2007, p.277). As transgressões pós-modernas recriam, reinventam e o
novo surge quase como um evento somatório ou coletivo.
O formulador de imagens pós-modernas está perfeitamente consciente da
inevitável relatividade dos significados dos discursos visuais que constrói. E
por isso esses discursos geralmente propõem jogos interativos e
interpretativos às suas audiências, reconhecendo que os sentidos
produzidos tendem a ser cada vez mais circunstanciais e instáveis, sendo,
em conseqüência, inevitável o aparecimento de certas ambigüidades e
paradoxos. (RAHDE, 2005, p.199).
Contudo, no design gráfico, as estratégias pós-modernas não excluem muitas
conquistas modernistas, que continuam vigentes em grande parte das peças
gráficas produzidas nos dias de hoje. A legibilidade, por exemplo, embora
contestada na obra de designers como April Greiman, David Carson e Nevile Brody,
entre outros, continua sendo necessária, na grande maioria dos casos, para cumprir
a função do design gráfico de comunicar. Configura uma estratégia usual, pois se
insere naquele conjunto de prescrições e conformações essenciais à comunicação.
Quando as formas, grades e cores da Bauhaus aparecem no design
contemporâneo, operam como signos que carregam, através da citação, significados
vinculados a um entendimento histórico: artístico, básico, modernista, etc.
67
[...] se o sujeito contemporâneo é um sujeito de identidade cambiante,
descentrada, fragmentada e contraditória, nada mais natural que esses
sintomas também apareçam nas representações visuais que ele/ela produz
e consome. Mesmo assim, nessa mistura de estilos que caracteriza a pós-
modernidade, continuam a aparecer representações que são soluções
modernistas, pois o pós-modernismo não as exclui ou privilegia a priori.
(RAHDE, 2005, p.199).
A escolha por configurações de textos (fontes, espaçamentos, alinhamentos)
de difícil leitura ou pela integração de textos com ilustrações pode ser incoerente
com o aspecto funcional da comunicação, por outro lado instiga o leitor a “decifrar”
as mensagens de maneira ativa. Nesse contexto, designer e audiência compartilham
a atribuição de sentido de tais mensagens. Para uma audiência ávida por
provocações, esse tipo de estratégia é bem vinda, já que quebra, de maneira lúdica,
a monotonia formal da mensagem estereotipada.
A rejeição da superioridade da interpretação e intenções do “autor” sobre
as demais nivela e põe em disputa os vários sentidos produzidos,
acarretando a aceitação do imprevisível e do casual, o que dá espaço para
a incorporação de eventuais traços do azar e de outras manifestações
materiais aleatórias e indecidíveis (propositais? erráticas?), como “ruídos”,
“impurezas” e “falhas”, que continuam sendo inaceitáveis à ideologia
purista dos racionalistas. (RAHDE, 2005, p.199).
Ao reconhecer a falta de sentido na busca de significados universais, artistas e
designers contemporâneos lançam mão de estratégias que colocam a concretização
dos significados para fora da imagem, exigindo mais da audiência a tarefa de
interagir com as propostas, como participantes na construção dos sentidos. Nesse
contexto é que se percebem similaridades entre as produções do desenho e do
design gráfico contemporâneos. A surpresa que a aleatoriedade de algumas ações e
acontecimentos geram, são estímulos para o criador. De certa maneira, essas
surpresas são esperadas também por parte da audiência.
68
2.3.1 Sobre estratégias Contemporâneas
Como sugere Gonçalves (2009:1), “o termo estratégia pressupõe o
planejamento e execução em função de um objetivo a ser alcançado.” Em certa
medida, estratégia se confunde com método, mas diferentemente deste, prescinde
de um passo a passo previamente estabelecido. Uma estratégia é elaborada a partir
de um resultado a ser alcançado e dos meios disponíveis para isso. Uma estratégia
se diferencia de outra, já que se transforma à medida que almejam resultados
diferentes a serem alcançados através de meios distintos.
O termo estratégia tem sua origem ligada ao universo militar de planos de
guerra. Na Grécia antiga, stratégos era o ator principal que comandava do
alto de uma colina o devir da batalha. Uma boa estratégia seria aquela que,
vista do alto, mas posta em prática por debaixo, de forma encoberta,
chegasse a conduzir os recursos disponíveis ao objetivo estabelecido.
Nesse sentido ela não determina uma direção, mas oferece uma visão do
trajeto e uma idéia de devir. (GONÇALVES, 2009: 1)
A partir da leitura de textos de Flávio Vinícius Cauduro, Ana Claudia Gruszinsky
e Maria Isabel Rahde, identificou-se algumas estratégias comuns ao desenho
contemporâneo e ao design gráfico pós-moderno. Essas estratégias são:
interatividade, indefinição, imperfeição, hibridação. Como se verá, em certos pontos
essas estratégias se fundem, já que todas priorizam a abertura dos significados à
interpretações das audiências.
2.3.1.1 Interatividade
Estratégia que permeia todas as demais apontadas a seguir. Constitui-se em
uma espécie de meta a ser atingida. As imagens produzidas a partir dessa premissa
pretendem significados ambíguos ou contraditórios, efêmeros e indefinidos. São
imagens que não privilegiam nenhum significado definitivo em particular, mas
consideram a significação sempre em um ato de sentido conotativo, quando, além
do sentido habitual e referencial, evocam outros sentidos virtuais, abstratos e
subjetivos.
69
Como conseqüência da natureza inclusiva, as imagens contemporâneas
exigem a participação interpretativa da audiência na produção de seus possíveis
sentidos, permitindo-lhes atuar como co-autores das representações pela maneira
como são induzidos a decifrar tais sentidos conotativos. Na figura a seguir (figura
12), vê-se como a maneira vacilante de articular a ilustração, a fotografia e a
tipografia, coloca para a audiência a função de conectar sentidos.
Figura 12: DAVID CARSON, 1994. Sem título. Impressão off-set. Fonte: CARSON, 1995, sem página.
Na figura 13, vê-se um desenho, um retrato, feito sobre um objeto pré-existente
que se parece com uma capa velha de caderno, onde existe uma textura visual. Isso
leva a tentativa de interpretar que significado essa relação busca estabelecer. De
fato, esse desenho onde um retrato interage sobre um material já contaminado pelo
tempo convida o expectador a interpretá-lo.
70
Figura 13: SHANNON BOOL, 2004. Sem título. Nanquin, acrílico e óleo sobre colagem.
63 x 41 cm. Fonte: DEXTER (2005, p.30)
2.3.1.2 Indefinição
Atualmente é possível observar que certas representações visuais priorizam o
uso de elementos com propósitos desconexos às mensagens que veiculam, ou com
um vínculo subjetivo, que tende a ser descoberto a partir de interpretações. Muitas
vezes, o uso de alguns deles tem apenas propósitos decorativos. Essas imagens
produzem facilmente significados ambíguos, contraditórios, efêmeros e de sentido
71
geral indefinido e cambiante, o que induz os espectadores a participar de um “jogo
hermenêutico” (RAHDE, 2005, p.201), ou seja, da busca de uma compreensão,
buscando alcançar um sentido razoavelmente estável para essas representações.
Esse jogo de “caça ao sentido”, é proposto de várias maneiras, desde as mais
simples às mais complexas. Vê-se que a indefinição busca a interatividade. A peça
gráfica mostrada abaixo (figura 14), relaciona imagens de um varal de roupa com o
mapa da Austrália e a expressão “QWERTY”, sigla que dá nome ao teclado de
computadores e máquinas de escrever que é comumente utilizado no ocidente.
Causa um estranhamento convidativo, que só pode ser diluído com a imersão no
texto e no significado que a indefinição obscurece.
Figura 14: STEPHEN BANHAN, s/d. Sem Título. Impressão off-set.
42 x 59,4 cm. Fonte: WALTON (1996, p.22)
72
Na próxima imagem (figura 15), vê-se um desenho feito sobre fotografia, no
qual uma mancha, feita a partir do estouro de uma bolha de sabão pigmentada com
nanquim, encobre parcialmente a imagem de um jovem que fita a câmera, ou a
mancha, com curiosidade. Pontos negros e movimentos fluidos, gerados pelo
estouro da bolha, criam uma atmosfera bastante ambígua quando relacionados à
imagem da fotografia aparentemente antiga.
Figura 15: ANNA BARRIBALL, 2004. Sem título. Nanquim e bolha de sabão sobre fotografia.
11,4 x 8.9 cm. Fonte: DEXTER (2005, p.28).
Outro recurso, o excesso de elementos pode ser útil para gerar a indefinição.
Imagens obtidas através de montagens ou colagens de elementos díspares e em
profusão. Esse recurso explora a possibilidade expressiva a partir das
73
incompatibilidades de sentidos ou em atitudes irônicas quanto ao uso funcional dos
elementos, à objetividade e ao realismo da representação. A profusão de elementos
inviabiliza uma leitura específica das imagens, como se vê nas peças gráficas
mostradas abaixo que misturam idiomas, desenhos, fotos, ilustrações, páginas
digitalizadas de cadernos e mídias digitais (figura 16).
Figura 16: JAKE TILSON, s/d. Sem Título. Impressão off-set e com CD ROOM encartado.
21 x 28 cm. Fonte: WALTON (1996, p.17).
74
O duplo sentido entre os signos visuais e verbais é também um recurso muito
usado. Incluem a escrita manual, fragmentos de imagens (muitas vezes
colecionadas pelos autores), o uso de sobreposição de camadas, a fusão dos
fragmentos contidos nessas camadas etc. Na figura 17 vemos um desenho que se
funde ao texto, às garatujas e às marcas pretéritas do suporte.
Figura 17: Francis Alys. Instructiosns for A, B and C, 2001. Lápis e tipografia sobre papel.
28 x 20,8 cm. Fonte: DEXTER, 2005, p.17
75
2.3.1.3 Imperfeição
Da mesma forma como foi visto que a pintura e o desenho passaram a
incorporar elementos casuais e fragmentados, ou elementos do seu próprio
processo de elaboração, atribuindo às obras caráter inacabado, a natureza inclusiva
das imagens produzidas na pós-modernidade permite que o designer gráfico
considere a presença de significantes acidentais. Esses são produzidos de maneira
aleatória ou através de atitudes experimentais e expressivas, ou seja, o uso
deliberado de resíduos.
Como sugere Rahde (2005, p.202) essas interferências e ruídos expandem as
possibilidades de significação e produzem conotações contraditórias que
desconcertam os leitores. Ruídos, resíduos, falhas e decomposições intencionais
chamam a atenção para a efemeridade das representações e para o caráter
provisório de nossas significações, enfatizando a necessidade de sermos tolerantes
com as diferenças e defeitos.
A apropriação de elementos vulgares cotidianos, que não tem tradicionalmente
qualidades estéticas, é uma das atitudes do criador que lida deliberadamente com a
imperfeição. Esse se torna um colecionador de objetos, texturas, fragmentos e
resíduos. Na imagem a seguir (figura 18) há desenhos feitos sobre panfletos com
uma clara intenção de transformá-los em suporte, transmutando seus significados
originais de maneira suja, displicente e imperfeita.
76
Figura 18: JOSH SMITH. Sem título, 2004. Técnica mista e colagem sobre madeira.
153,4 x 121.9 cm. Fonte: DEXTER, 2005, p.300
Sujeira e imperfeição podem ser percebidas também no cartaz de David
Carson (figura 19), elaborado a partir de borrões de tinta digitalizados, desenho
vetorial e tipografia digital.
77
Figura 19: DAVID CARSON, 1995. Sem título. Detalhe de página. Impressão off-set.
Fonte: CARSON, 1995, sem página.
2.3.1.4 Hibridação
A Hibridação também constitui uma estratégia que permeia as outras já vistas.
Cede certa liberdade de escolhas aos criadores. Imagens híbridas ou heterogêneas
se caracterizam pela inclusão, valorização da diferença, combinando possibilidades
expressivas díspares em uma única representação: fotos fundidas com grafismos,
78
tipografia, escrita manual, elementos residuais e casuais e, também, imagens
realistas com fragmentos gestuais. A hibridação pode também misturar estímulos
sensoriais diversos como os sonoros, visuais, olfativos, gustativos e sinestésicos
(RAHDE, 2005, p.200).
Da mesma forma, pode colocar em relação direta influências às vezes
antagônicas, como, por exemplo, a legibilidade textual coexistindo com ilustrações
de caráter expressivo e abstrato, ou ainda, imagens realistas relacionando-se com
desenhos automáticos surrealistas (figura 20).
Figura 20: SUSAN TURCOT, 2004. The Future for Less #3. Grafite sobre papel.
30 x 40 cm. Fonte: DEXTER, 2005, p.312.
A análise de tais características e estratégias contemporâneas serve, no
contexto da presente dissertação, para proceder a uma aproximação do design
gráfico e do desenho contemporâneos, seja a partir da estética de suas obras, seja a
partir do aspecto processual e criativo. Está presente nessas estratégias um já
79
citado estado de fluxo entre idéia e realização que, no design gráfico é possibilitado
e induzido pelo uso da tecnologia digital. Faz-se necessária aqui uma breve
explanação sobre tal tecnologia.
2.2.3 O papel da tecnologia digital no design gráfico
O design gráfico de hoje tem apresentado mudanças trazidas pela
disseminação da tecnologia digital. Na criação de uma peça gráfica, não só o
conceito e o desenho se fundem, mas se dissipam as fronteiras entre outras etapas
de projeto, tais como a delimitação do problema, a concepção, a geração de
alternativas.
A então indiscutível noção de como se deveria compor a etapa projetual
hoje está em crise, muito por conta da informatização do processo.
Problematização, geração de alternativas e concepção se entremeiam
frente à tela do computador (FONSECA apud VILLAS-BOAS, 2001).
Indo além, pode-se dizer, por experiência própria, que a tecnologia digital
diminui a distância entre quase todas as etapas do projeto, anteriores e posteriores
ao desenho da peça. Essa tecnologia, através de equipamentos, dos programas
editores gráficos, equipamentos periféricos e da internet, dá suporte à coleta de
dados, à busca e elaboração de elementos de composição (imagens fotográficas,
fontes tipográficas, ilustrações etc.), à pesquisa de referências de design (peças
gráficas de outros designers) e às especificações técnicas para a produção (arte-
final e geração de arquivos de impressão) e à comunicação com clientes e
fornecedores. Todas essas etapas passam, muitas vezes, a acontecer de modo
simultâneo.
Durante as décadas de 1970, 1980 e 1990 viveu-se a introdução e
disseminação do microcomputador nas empresas de design gráfico e publicidade.
Desde então, essa ferramenta se tornou cada vez mais fundamental para o
desenvolvimento de projetos gráficos, diagramação de páginas, tratamento e
manipulação de imagens fotográficas, ilustração e arte-final.
80
Com a evolução e disseminação da tecnologia digital, o design gráfico passou a
ser totalmente suportado por computadores pessoais, equipamentos periféricos de
captação de imagens e impressão e programas computacionais do tipo editores
gráficos. Os arquivos gerados por esses programas substituem antigos originais,
feitos artesanalmente com auxílio do desenho técnico, da colagem de retículas e
letra-set*, da fotocomposição*, da colorização com o uso de tintas e pincéis, do uso
de penas e nanquim, do papel vegetal e dos filmes de poliéster, da ampliação de
fotos, das ampliações e reduções de blocos de texto, feitas em máquinas foto-
copiadoras, etc. Cauduro descreve a introdução da tecnologia digital (desktop
publishing ou DTP) para o design gráfico da seguinte maneira:
A prática da editoração eletrônica, ou do chamado desktop publishing (DTP),
nome pelo qual ela é internacionalmente conhecida hoje em dia, foi
aparecendo gradualmente nas décadas de 70 e 80, com os primeiros
programas processadores de texto e as impressoras de impacto [...] Com a
tecnologia do DTP se podia simular e comparar rapidamente uma quantidade
muito grande de soluções, em forma de arte-final, para problemas de design
gráfico e tipográfico — em número bem maior que aqueles gerados
normalmente por métodos tradicionais (e que apareciam até então sob a
forma de roughs [esboços] e layouts aproximados). (CAUDURO, 1997, p.3).
Não se considera relevante aqui pormenorizar todos os procedimentos
necessários para a elaboração de uma peça gráfica anteriores ao advento da
tecnologia digital. O interessante é ressaltar que cada um deles era realizado por um
profissional técnico especializado. Esses profissionais eram instruídos sobre como
proceder em cada caso, para adequar seus produtos à determinada visualidade
pretendida pelo designer. Isso se dava a partir de especificações técnicas e
detalhamentos feitos em esboços, fichas técnicas e desenhos técnicos. Com a
disseminação da tecnologia digital o designer gráfico passou a ser responsável por
praticamente todas as tarefas envolvidas na elaboração de tais peças gráficas.
Designers, que tradicionalmente se especializavam em criar layouts e em
especificar os elementos gráficos diversos que deviam ser produzidos para a
montagem das artes-finais que iriam para as oficinas de fotogravura,
passaram a ter que executar, e cada vez mais, tarefas anteriormente
supridas por terceiros, tais como redação, digitação e revisão de textos,
81
elaboração de ilustrações (vetoriais ou bitmaps), obtenção e processamento
de imagens (capturadas por câmeras de vídeo, de fotografia ou por
scanners), montagem e arte-finalização de seqüências de páginas e,
finalmente, seleção ou separação de cores para a arte-finais. Em pequenas
empresas muitas vezes designers ainda tinham de confeccionar os fotolitos
nas imagesetters e até mesmo imprimir e encadernar as peças gráficas que
haviam criado (como no caso de propostas e relatórios de pequenas tiragens
destinados a serem lidos por alguns poucos especialistas)”. (CAUDURO,
1997, p.4).
Por outro lado, tal tecnologia trouxe ao designer gráfico maior autonomia e
agilidade, tanto em relação à criação quanto em relação à própria prática
profissional. Quanto à criação, com a tecnologia digital, através dos recursos
oferecidos pelos programas editores gráficos, os designers gráficos têm a
possibilidade de desfazer erros e tomadas de decisão equivocadas, através do
comando undo; de guardar muitas possibilidades de solução gráfica em arquivos
diferentes, através do comando save as; de discutir e aprovar que tais soluções
gráficas diretamente na tela do computador, sem a necessidade de confeccionar
protótipos; de aprimorar detalhes muito pequenos de ilustrações, fotografias e
tipografias, através de aproximações geradas pelo comando zoom, que chegam a
ampliar detalhes até 1400 vezes.
Quanto ao mercado profissional, vê-se que hoje em dia muitos designers atuam
de maneira autônoma, como profissionais liberais, desvinculados de empresas de
design, ou prestando serviços a elas. Isso será mais bem discutido adiante. Antes,
faz-se necessária uma descrição de tal tecnologia digital.
2.2.3.1 Programas Editores Gráficos
Os programas computacionais do tipo editor gráfico são aqueles especialmente
projetados para a construção e manipulação de imagens gráficas, fotográficas ou da
manipulação de tipografia. Os programas existentes hoje em dia no mercado
permitem que se trabalhe em arquivos usados tanto para a criação de determinada
82
peça gráfica, quanto para as especificações de produção e reprodução. Esses
programas são divididos entre vetoriais e bitmaps.
Programas vetoriais produzem imagens que são construídas pelo computador a
partir de algoritmos computacionais que geram formas diversas a partir de curvas,
retas e pontos. Suas interfaces apresentam ícones referentes às ferramentas
normalmente utilizadas analogicamente (lápis, caneta, pincel, carimbo, etc.). Os
usuários podem criar desenhos de contorno, colorir esses desenhos e alterar suas
cores a partir de coordenadas numéricas precisas ou de maneira intuitiva, mesmo
que o programa as converta em sistemas de cor* (CMYK, RGB, etc.) usados na
indústria gráfica. Os programas vetoriais mais disseminados hoje em dia são: o
Adobe Ilustrator e o Corel Draw.
Também permitem que se trabalhe com textos, alterando seu desenho,
tamanho, espaço entre linhas, espaço entre letras, formato dos blocos de texto,
cores etc. Podem-se utilizar elementos estruturais (que não são impressos) tais
como linhas guias e grades, geradas a partir de réguas, com os quais o designer
define como se dará a composição da página com precisão.
Programas bitmap criam e editam imagens compostas por mapas de bit
(unidade do código binário*), que geram pixels* dispostos em uma grade ortogonal.
Cada pixel pode ter uma cor específica de um espectro que alcança até 16 milhões
de cores, dependendo do formato do arquivo. Imagens com 300 pixels por polegada
(padrão industrial) são formadas por uma grande quantidade de tons de cores. Por
isso, esses programas são especializados em imagens fotográficas onde a
quantidade e qualidade de meios tons é fundamental. Os programas bitmap mais
usados hoje em dia são: o Adobe Photoshop e o Corel Photopaint.
Programas vetoriais e bitmap geralmente são usados de maneira integrada, já
que cada um cumpre uma função específica, mesmo que alguns deles incorporem
algumas funções de ambos os tipos. Existem também programas especializados em
fazer a união entre imagens vetoriais e bitmaps, como é o caso do QuarkXPress e
do Adobe Indesign.
83
Com tais programas, além de elaborar desenhos vetoriais e fazer algumas
edições em imagens bitmap, os usuários podem criar uma grande quantidade de
páginas e fazer um livro inteiro em um só arquivo. Essas páginas são coordenadas
por páginas-mestre: modelos que determinam padrões para as outras páginas.
Nelas são dispostos elementos estruturais, desenhos, fundos coloridos, fotografias
etc. Esses elementos são repetidos em todas as outras páginas do arquivo, ou nas
que o usuário determinar. As alterações feitas nas páginas-mestre também são
reproduzidas em todo o arquivo. Nesses programas também se pode criar estilos
visuais, que são repetidos em elementos como textos, ícones etc., facilitando uma
unidade estética.
2.2.3.2 O Postscript
Integrada aos programas editores gráficos, a tecnologia postscript ajudou a
reduzir o número de procedimentos requeridos entre a criação de uma peça gráfica
e a sua impressão, já que trabalha fazendo o vínculo entre o que é criado
digitalmente pelo designer e as especificações técnicas necessárias para a
impressão.
Não se considera relevante aqui estudar a maneira como tal tecnologia opera,
mesmo porque seu uso não depende desse conhecimento, mas sim ter em mente
que o postscript permite a determinação exata do que será impresso e, através das
provas digitais*, qualquer erro pode ser evitado.
Os arquivos postscript (PS, EPS e PDF) comportam informações de imagens
vetoriais e bitmaps, informações de calibragem de cor, textos e especificações de
impressão. São gerados a partir de qualquer programa editor gráfico através de
procedimentos bastante acessíveis e de rápida aprendizagem. Permitem que o
designer execute no computador todas as funções entre a elaboração e a criação da
peça até a geração do arquivo que será usado de original para gravação da matriz
de impressão.
84
2.2.3.3 O computer-to-plate (CTP)
A grande disseminação do CTP, sigla de Computer-to-Plate, ocorrida nos
últimos anos tratou de quase eliminar outra etapa antes fundamental ao processo de
impressão em off-set*: o fotolito*. Trata-se de uma tecnologia que permite a
confecção da matriz de impressão (chapa), diretamente do arquivo postscript.
Outros meios de impressão, como a serigrafia, ainda utilizam o fotolito.
2.2.3.4 Os equipamentos periféricos
Além do microcomputador, hoje em dia se tem acesso fácil e barato a
equipamentos sofisticados de captação de imagens como scanners e câmeras
fotográficas digitais. Eles permitem gerar imagens a partir de elementos concretos,
convertidos diretamente em arquivos digitais, como paisagens, modelos, texturas,
objetos colecionados. Através desses arquivos, editados em programas bitmap, os
designers geram texturas e padrões, simulam tipos de papéis e outros suportes de
impressão, criam ilustrações e fazem suas próprias fotografias e foto montagens.
As impressoras também são equipamentos bastante utilizados pelos designers
em suas criações. As mais comuns são dos tipos Jato de Tinta e Laser. Criam
impressões em cores ou preto e brancas e são utilizadas para a confecção de
protótipos* ou mock-ups*. Impressoras Laser também são úteis para a geração de
fotolitos de baixo custo, impressos em filmes de poliéster, ainda úteis para a
impressão em serigrafia.
2.2.3.5 A Internet
A Internet - rede mundial de comunicação - fornece um amplo banco de dados
de apoio ao desenvolvimento do design gráfico. Estão disponíveis uma enorme
gama de fontes tipográficas, imagens fotográficas, referências de design, textos,
texturas, ilustrações etc. A Internet atua como fonte de coleta de dados e na
85
comunicação entre os atores deste cenário: cliente, designer e fornecedor
(indústria), pois permite o envio de arquivos e a comunicação em tempo real.
2.2.3.6 Tecnologia digital e mercado profissional
O acesso fácil e barato à tecnologia digital, intensificado nas últimas décadas,
causou algumas alterações no mercado profissional do design gráfico. Alguns
designers gráficos tornaram-se profissionais autônomos, ou proprietários de micro-
empresas, prestando serviços aos clientes que antes contratavam escritórios de
design e agências de publicidade. Existem casos em que esses designers
autônomos prestam serviços também aos escritórios e agências, como micro-
empresas terceirizadas. Escritórios e agências evitam assim os encargos fixados
pelas leis trabalhistas na contratação de pessoal.
De posse da tecnologia digital, designers gráficos podem ser responsáveis por
todas as etapas que envolvem a elaboração de uma peça gráfica, na medida em
que isso se faz necessário. De fato, alguns desses designers realizam todo o
processo, desde o atendimento do cliente, passando pela criação, arte-final e
preparação dos arquivos de impressão, até a produção gráfica, que se define como
o acompanhamento da impressão visando verificação da qualidade do serviço da
indústria gráfica que realiza a tarefa.
Paradoxalmente, as facilidades e novas possibilidades, advindas da tecnologia
digital, trazem algum ônus à prática profissional. Encurtam os prazos, diminuem as
vantagens advindas das leis trabalhistas e estabelecem novas concorrências, já que
disseminação dessa tecnologia permite que usuários leigos, que não tem formação
em design (acadêmica ou prática), compitam com os designers pela demanda de
trabalho. A ausência de regulamentação da profissão corrobora com essa situação.
O designer assalariado não passou a ganhar mais por ter de assumir, em
nome da otimização de sua produção, essas funções adicionais. Pelo
contrário, seus empregadores, a pretexto de uma maior evolução tecnológica
da empresa, e visando uma maior qualificação técnica de seu pessoal,
86
passaram a exigir que o designer-empregado se mantivesse constantemente
atualizado com a evolução e a operação dos softwares e hardwares de sua
área, cada vez mais e mais ampla [...] O designer autônomo, por sua vez,
também precisou acompanhar essa evolução tecnológica, para enfrentar a
concorrência de informatas e leigos envolvidos com a editoração eletrônica.
Para manter seu mercado de trabalho, esses designers também precisaram
assumir as várias atividades requeridas pela produção gráfica em DTP, para
poderem apresentar um serviço diferenciado, de preço equivalente, mas de
maior qualidade, em relação aquele oferecido pelo leigo (CAUDURO, 1997,
p.3).
Designers são requisitados para determinado projeto ou função de acordo com
suas habilidades e aptidões pessoais e estilo, tanto no que se refere ao uso da
tecnologia e aos conhecimentos técnicos, quanto por sua capacidade criadora. A
experiência com meios tecnológicos é fundamental para esse profissional ter
liberdade de expressão e competitividade no mercado de trabalho.
Por experiência entenda-se a maneira como os designers, a partir de sua
vivência profissional, aprendizado e instrução, estabelecem métodos e critérios para
a interação com a tecnologia. É essencial que saibam escolher a ferramenta
tecnológica que melhor desempenha uma determinada função para o cumprimento
das tarefas que a solução do problema demanda, ou seja, o domínio do fazer
profissional.
No design gráfico de hoje, a fluência com a tecnologia digital é determinante na
construção de estratégias pessoais (repertório de procedimentos) para abordar o
problema, conceituar e conceber sua solução. Os programas editores gráficos
trouxeram mais autonomia aos designers gráficos, já que dispensam a interação
desses com outros profissionais técnicos e colocam em suas mãos a possibilidade
de interagir diretamente no objeto da criação (no caso o arquivo digital) com uma
ampla gama de possibilidades, já descritas, de articulação de signos visuais.
A maioria dos programas computacionais editores gráficos já oferece a opção
de simular a aparência do projeto que está em desenvolvimentos através de pré-
visualizações rapidamente atualizadas na tela. As imagens atualizadas na tela do
87
computador são muito próximas ao resultado final gerado pelos processos de
impressão.
Frente à tela, o designer tem a possibilidade de realizar diversos experimentos
tendo noção do efeito que irão gerar no objeto real, encurtando o tempo necessário
entre a imaginação e a realização de algo evitando erros e prejuízos. Além disso, é
possível guardar em um arquivo os resultados obtidos através da geração de várias
alternativas, enquanto se verifica novas possibilidades em outro, sem que nada seja
perdido.
2.2.3.7 Tecnologia digital e a experiência com o desenho
Conforme já foi dito, a fluência com a tecnologia digital pode fazer com que o
desenho preparatório ou o esboço feito à mão não seja mais fundamental para a
prática do design gráfico. Frente à necessidade de o designer gráfico de articular um
conjunto heterogêneo de signos (fotos, ilustrações, textos, tipografia, etc.), a
tecnologia digital é um meio mais adequado, já que suporta melhor a articulação
desses signos de forma não linear, suspensos no meio virtual digital usando o
recurso de várias camadas com distintas competências. Exemplificando, algumas
suportam os planos de fundo, outras mantem elementos suspensos sobre esses
planos de fundo, como textos, fotos e elementos gráficos. Essas camadas,
sobrepostas virtualmente, podem ainda promover efeitos de interação entre os
elementos contidos nelas, como por exemplo, fazer com que uma fotografia,
colocada em uma camada mais acima, transpareça detalhes de outra, disposta em
uma camada inferior.
Os recursos dos programas editores gráficos facilitam e até induzem ao uso de
várias lógicas criativas. Possibilitam que os designers gráficos gerem alternativas de
composição, em estratégias baseadas no fluxo de idéias que surgem da
experimentação, de maneira similar ao modo como o desenho articula as dimensões
conceitual e grafológica, sem que haja maiores complicações quanto à produção
industrial das peças gráficas. O resultado formal engendrado por essa estratégia é,
muitas vezes, uma imagem poluída e fragmentada. Apesar disso, a arte-final feita a
88
partir desses programas continua cumprindo as demandas técnicas necessárias à
reprodução.
O uso de camadas digitais é um dos recursos muito utilizado pelos designers.
Praticamente todos os programas citados utilizam camadas sobrepostas com fundos
transparentes, que promovem interações entre os signos visuais dispostos nelas.
Entretanto, o Adobe Photoshop é o programa que expande esse recurso a ponto de
possibilitar experimentações que abrem espaço para acontecimentos aleatórios e
surpreendentes. Trabalhando com uma grande quantidade de camadas, às vezes
mais de 300, os designers podem articular uma grande quantidade de signos que
interagem entre si, criando imagens muito complexas.
Além disso, existem outras possibilidades intrínsecas ao uso desses
programas, tais como manipular blocos de texto com total liberdade ao ponto de
passarem a atuar como elementos de desenho, como linhas (figura 21), ou
digitalizar e inserir tipografia manuscrita, resíduos, texturas, etc. (figura 22).
Figura 21: VIVIANE CHERRY, s/d. Sem título. Impressão off-set.
21 x 29,7 cm. Fonte: WALTON, 1996, p.41.
89
Figura 22: NEVILLE BRODY, s/d. Sem título. Impressão off-set.
420 x 594 cm. Fonte: WALTON, 1996, p.106.
Contudo, a experiência com o desenho, se o considerarmos de maneira ampla
e híbrida, e como um processo de fluxo entre concepção e solução gráfica, como foi
visto até aqui, pode ser um diferencial para designers que busquem estímulos para
sua criação na maneira de interagir com esses programas. Isso será melhor
exemplificado na análise dos depoimentos dos designers/desenhistas, no capítulo 3.
Frente à necessidade contemporânea de se elaborar imagens com significados
abertos a interpretações por parte da audiência, a interação entre o que se chamou
até aqui de desenho híbrido com os programas editores gráficos pode configurar
uma estratégia válida e satisfatória.
90
3. RELAÇÕES ENTRE O DESIGN GRÁFICO E DO DESENHO
O presente capítulo dedica-se a análise e discussão dos procedimentos
envolvidos nos processos de criação em desenho artístico e design gráfico a fim de
estabelecer o entendimento sobre as semelhanças percebidas nessas duas práticas.
Primeiramente faz-se às descrições dos processos pessoais de criação do ator. Em
seguida, procede-se uma discussão dos resultados em relação aos depoimentos
dos profissionais consultados a partir de questionários e em relação ao que foi
levantado na fundamentação teoria.
A pesquisa teórica apontou para o fato de que o desenho não age como puro e
simples desempacotamento de uma idéia ou objeto representado. O ato de
desenhar, sob o aspecto de ser um meio de expressão primário, tem caráter
espontâneo e livre, escolhendo em um universo de possibilidades, aquela que
assumirá um significado em particular. O desenho resultante será sempre e apenas
um resíduo daquilo que terá sido um ato vivo de significação.
Por outro lado, uma das funções essenciais do design gráfico é a elaboração
de significados, expressos por imagens e mensagens, que visam à comunicação
visual e à persuasão de uma audiência. Justamente a respeito dos procedimentos
envolvidos na elaboração de significados expressos em imagens que se percebem
qualidades semelhantes nos processo criativos pessoais do desenho artístico e do
design gráfico.
Tais qualidades foram levantadas a partir de uma análise dos procedimentos
realizados pelo autor em sua prática de ateliê, onde realiza desenhos artísticos, e no
seu escritório de design gráfico, onde atende demandas comerciais e cria peças
gráficas, amplamente auxiliado pela tecnologia digital. A seguir serão descritos os
processos de criação específicos: uma série de desenhos e uma peça gráfica.
Outros exercícios realizados durante a pesquisa, que auxiliaram a se adquirir maior
clareza sobre os procedimentos pessoais de criação, podem ser lidos na íntegra no
“anexo um”.
91
3.1 Descrição do processo de criação dos desenhos da série “Esgrima”
3.1.1 Técnica: Grafite integral, fitas adesivas e papel Canson de gramatura 300g/m2
e formato padrão A3.
3.1.2 Período de Elaboração: 2006
3.1.3 Ambiente de criação
Ateliê / Residência onde o espaço era dividido em ambiente doméstico e local
de trabalho. Não havia a possibilidade de se manter uma produção continua, pois o
ambiente de trabalho devia ser desmontado para dar lugar à vida cotidiana. O
ambiente de trabalho se constituía uma prancheta sobre uma escrivaninha. Os
papéis foram colocados na vertical durante a criação, e os desenhos foram feitos um
de cada vez. Havia, porém, a possibilidade de os desenhos permanecerem expostos
nas paredes, para que se pudesse analisá-los.
3.1.4 Estímulo / Impulsos
A produção dessa série de desenhos foi estimulada por necessidades de
expressão, impulsionadas por emoções que respondiam a alguma percepção ou
sensação. Por outro lado visavam à continuidade de uma pesquisa poética para a
qual a inscrição do gesto no suporte é a diretriz fundamental. O desenvolvimento
dessa pesquisa também configura um forte impulso. Os impulsos podem ser listados
da seguinte forma:
1) Necessidade de expressar algo com vigor e intensidade, talvez para
responder a um sentimento de opressão e incapacidade.
2) Necessidade de realizar uma experiência que envolvesse estímulos fortes
aos sentidos: fazer manual, força física, velocidade, agressividade.
3) Necessidade de fazer algo com liberdade, embora com precisão, concisão e
determinação.
4) Necessidade de se explorar novas possibilidades do desenho.
92
3.1.5 Os Materiais
O papel e o grafite já eram materiais comumente utilizados em outros trabalhos
desenvolvidos nessa pesquisa poética. A escolha por um formato pequeno deveu-se
a uma adequação às limitações físicas do ateliê. O papel Canson foi utilizado por
estar disponível no momento em que se desejou realizar esses desenhos. Houve, no
entanto, uma investigação das qualidades materiais desse papel para que ele
colaborasse expressivamente na composição dos desenhos. Não se desejava tê-lo
somente como um suporte neutro, mas como elemento expressivo.
O uso da fita adesiva se deu de maneira espontânea, como uma descoberta.
Porém, havia um canal aberto para que alguma descoberta acontecesse, já que,
nessa altura, a atenção estava treinada a se voltar ao entorno e a considerar os
acontecimentos aleatórios.
3.1.6 A realização
O gesto de instauração, que dá início a uma série de procedimentos
posteriores, respondeu às necessidades impulsivas. Constituiu-se de um movimento
rápido e forte, feito com a barra de grafite contra o papel, que se assemelha a um
golpe de espada. Esse gesto foi repetido algumas vezes. As linhas geradas com
essa repetição compuseram o desenho à medida que iam se concentrando no
centro da folha. Houve o impulso de se realizar os gestos de maneira precisa e
concisa, respondendo uma necessidade de foco e determinação. As linhas são
curtas e centralizadas e poucas vezes ultrapassam os limites da folha.
O domínio sobre essas linhas era relativo à maneira como o gesto as gerava,
ou seja, tinha relação com a capacidade de mirar um local aproximado. Apesar
disso, essas linhas parecem precisas porque descrevem retas e curvas com clareza.
Não são precisas em relação à representação de algum tema, mas à clareza com
que descrevem um movimento.
93
O acúmulo dessas linhas gerou composições saturadas, feitas de
sobreposições. As diferentes direções que indicam fazem com que o resultado
pareça caótico, embora cada linha tenha a precisão de um corte. Por fim, percebe-
se uma composição bastante definida na relação de uma linha com a outra e do
conjunto delas e com os limites da folha (figura 23).
Figura 23: GABRIEL NETTO, 2006. Desenho da série Esgrima. Grafite e fitas adesivas sobre
papel. 30 x 42cm. Coleção particular. Foto do autor.
Os gestos pareciam repetir o primeiro em uma tentativa de esvaziar o ímpeto
inicial, de esgotá-lo e incorporá-lo. Contudo, as dimensões do papel e a estabilidade
da composição determinaram o fim das ações em cada desenho. O ímpeto ainda
94
latente de desferir golpes no papel trouxe a necessidade de se fazer outros
desenhos. O esgotamento desse ímpeto determinou o número de desenhos feitos.
Os traços foram realizados em cada desenho, um de cada vez, já que eram
colocados isoladamente na única superfície de trabalho que havia no ateliê. Os
desenhos que ficavam prontos eram dispostos na parede para fruição à medida que
iam sendo completados. Não houve o retorno da ação de riscar os desenhos depois
que foram tirados da prancheta.
Os desenhos, dispostos na parede, passaram a constituir uma série com
relação de parentesco, decorrente do conjunto de ações envolvidas em sua
construção, que gerou visualidades parecidas. Guardavam, entretanto, diferenças
que estabeleciam um ritmo para a observação. A atenção transitava de um desenho
para outro, buscando comparações e complementações.
Percebeu-se que a forma centralizada determinava a interrupção de uma
fruição contínua entre cada parte de um todo que se estabelecia. Como as linhas
não ultrapassavam os limites da folha não se estabelecia uma relação de
continuidade, ficando a atenção concentrada na forma centralizada. Buscou-se
então alterar a configuração sem gerar mais linhas, já que essa ação não fazia mais
sentido, tanto para o ímpeto inicial, quanto para a composição saturada dos
desenhos. A nova ação deveria gerar uma maior integração da série.
Primeiramente, se procedeu a uma ação de desestabilização. Essa ação
consistia em arrancar pedaços do papel com fitas adesivas, retirando partes do
desenho e do suporte (figura 24). Pretendia-se, com isso, amenizar a saturação de
linhas em algumas partes do desenho, trazendo o branco do papel novamente ao
seu interior. Algo parecido com o que se faz com a borracha. Imaginou-se que a
borracha não causaria o efeito dramático que era esperado porque borraria os
desenhos. O uso das fitas deve ter origem em procedimentos cotidianos como o de
rasgar, sem querer, papéis colados com elas. Percebeu-se que o papel usado
nesses desenhos suportava essa ação sem grandes danos a sua integridade.
95
Figura 24: GABRIEL NETTO, 2006. Desenho da série Esgrima. Grafite e fitas adesivas sobre
papel. 30 x 42cm. Coleção particular. Foto do autor.
A camada mais externa do papel, que continha o desenho, ficava grudada na
fita e era removida com um puxão. Era arrancada do suporte deixando nele uma
falha. A ausência dessas partes gerava formas casuais que mostravam camadas
internas na espessura do papel e traziam novamente sua cor para a composição.
Essas formas, que se assemelham as manchas de tinta, visualmente pareciam estar
à frente das linhas de grafite. Presentes em todos os desenhos da série criaram um
novo ponto de atenção que se salientava, era mais fluido. Estabeleceu caminhos
para a atenção fluir de um desenho para outro, quebrando o modo estanque das
composições centralizadas, surgindo novos focos.
96
Esses puxões, que arrancavam partes do desenho, pareceram gestos tão
agressivos quanto os golpes que geraram as linhas. Porém, aconteceram de forma
mais premeditada. Percebeu-se que o processo de rasgar o papel com a fita seria
de difícil controle. Isso fez com que as ações fossem menos impulsivas. Concluiu-se
que a medida da sua aplicação (intensidade) deveria ser menor que a medida dos
traços feitos à grafite. Que o uso da pequena medida colaboraria com integração do
todo, mas que qualquer excesso podia destruir os desenhos.
A agressividade parece ser uma característica comum aos dois conjuntos de
ações: as linhas e os rasgos de fitas. Embora ambos permanecessem coerentes ao
ímpeto inicial, os rasgos parecem ter sido mais controlados e cumprem uma função
mais específica: a integração do conjunto de desenhos. Houve um domínio e uma
apropriação de um gesto originalmente agressivo, movido por um instinto de
preservação do que já se havia construído, para tornar esse gesto mais sutil e
colaborativo.
Durante a tentativa de realizar essas retiradas de matéria, formulou-se uma
série de procedimentos necessários para realizá-las de forma mais eficaz e
controlada, como pressionar as fitas contra o papel, com os dedos, nos locais onde
se pretendia arrancar alguma parte. Quanto mais pressão era feita, mais papel era
arrancado. Em situações onde apenas se colava a fita em áreas muito saturadas de
grafite e não se fazia pressão, somente o pó de grafite contido no papel era retirado.
Partes do desenho de grafite eram transferidas para a fita, que continuava
transparente. Entretanto, o desenho se mantinha completo no papel. Essa
descoberta, mais tarde impulsionou outras séries de desenhos e até hoje é motivo
de novas experiências.
Nesse caso, as fitas foram recolocadas nas folhas, criando uma nova camada,
além das linhas e dos rasgos (figuras 25). Essa nova ação estabelece um novo ritmo
a composição das partes e do todo a partir do contraste do alto brilho do plástico da
fita com a opacidade do papel e o menor brilho do grafite. Com isso, criam um novo
fluxo para a atenção entre as partes. Guardam também relação com o desenho de
cada parte, já que carregam resíduos de sua composição.
97
Figura 25: GABRIEL NETTO, 2006. Desenhos da série Esgrima. Grafite e fitas adesivas sobre
papel. Coleção particular. Foto do autor.
98
3.1.7 A Exposição
Esses trabalhos foram mostrados em uma exposição individual realizada em
2006, no Espaço T Cultural da Câmara de Vereadores de Porto Alegre. Na época se
pretendia mostrar os trabalhos da maneira mais simples e espontânea possível.
Foram utilizados apenas duas presilhas, presas em pregos, para fixar cada desenho
nas paredes da galeria. Os desenhos foram dispostos formando um conjunto ou
série, conforme aparecem na figura 25.
3.1.8 Ações inferidas
1) Adequação às limitações impostas pelo ambiente de trabalho e pelos
materiais.
2) Tentativa de se manter fiel aos impulsos iniciais.
3) Interações com o acaso e com o entorno.
4) Atenção ao esgotamento de determinado conjunto de ações.
5) Formulação de novos conjuntos de ações que complementem outros
conjuntos já esgotados.
6) Desconstrução de formas já estabelecidas a fim de criar novas
possibilidades de interação e fruição.
7) Determinação da medida ideal para cada conjunto de ações.
8) Formulação de procedimentos técnicos particulares.
9) Apropriação desses novos conjuntos de ações e de procedimentos em
uma espécie de repertório próprio.
3.2 Descrição do processo de criação do Folder* para o programa Bolsa Iberê
Camargo
3.2.1 Técnica: Manipulação digital de fotografias e tipografia. Programas editores
gráficos envolvidos: Adobe Indesign CS3 e Adobe Photoshop CS3. Impressão Off-
set*. Tiragem: 5000 exemplares
99
3.2.2 Cliente: Fundação Iberê Camargo
3.2.3 Ambiente de criação
O projeto foi desenvolvido em um estúdio / residência, onde trabalho e vida
cotidiana coexistem. Todos os procedimentos de elaboração da peça gráfica foram
suportados pela tecnologia digital: computador pessoal, internet, impressora, e
programas editores gráficos.
3.2.4 Estímulo
O principal estímulo é comercial, ou seja, desenvolver um trabalho por
encomenda e receber remuneração por isso. Pressupõe-se satisfazer as
expectativas do cliente, cumprir os prazos estabelecidos pelo cronograma e, com
isso, criar chances para que aconteçam novas encomendas.
No caso dessa encomenda, a satisfação do cliente dependeu do
desenvolvimento de uma peça gráfica com os seguintes pré-requisitos: beleza,
legibilidade, fácil entendimento do conteúdo, visualidade atual adequada às
diretrizes da identidade visual do cliente e ao meio cultural e artístico onde se insere.
Esses pré-requisitos impõem limites à investigação das possibilidades de desenho
da peça gráfica, já que a legibilidade das informações é um fator condicionante e
imprescindível para um bom resultado e que existem diretrizes bem definidas sobre
o aspecto visual que as peças gráficas devem ter.
Outro estímulo refere-se à necessidade pessoal de que o trabalho se
desenvolva de maneira prazerosa, com resultados coerentes a uma noção particular
de bom design. Acredita-se que isso depende de um envolvimento particular do
designer com os elementos disponíveis (imagens, elementos gráficos, textos etc).
Tais elementos fora fornecidos pelo cliente.
100
3.2.5 Os Elementos
Esse projeto foi desenvolvido sem um briefing especificamente estruturado.
Todo o contato e trocas se deram através de mensagens recebidas por e-mails. O
briefing é fragmentado nas indicações contidas em cada mensagem. Esse é um
procedimento recorrente e muitas vezes os projetos se desenvolvem dessa maneira.
O tipo de informação recebida pode ser mais bem entendido na descrição da
seguinte e-mail: “segue o regulamento, o formato será no mesmo tamanho do folder
das exposições só que com duas dobras e será colocado dentro do saquinho que
usamos no convite da exposição. Normalmente utilizamos para este material obra do
artista que realizou a residência no ano anterior. Vou te passar dois e-mails com as
imagens. Vou te enviar também o banner que preciso para o site e um modelo de
folder das outras edições”.
Porém, experiências anteriores, adquiridas na realização de outros projetos
para esse cliente, fizeram com que não fossem necessárias maiores explicações
quanto à finalidade da peça e às diretrizes a serem seguidas. O regulamento do
programa da Bolsa Iberê Camargo foi recebido em arquivo do programa editor de
textos Microsoft Word e se constitui em um texto com títulos e subtítulos que
descrevem as normas para inscrição, seleção e premiação do concurso.
As imagens foram recebidas em arquivos bitmap, no formato JPEG. Trata-se
de imagens fotográficas que registram o processo de trabalho do artista selecionado
na última edição do programa, que proporcionou a ele uma residência no exterior.
Faz parte das obrigações do selecionado fornecer essas imagens de divulgação.
Nenhuma outra informação sobre o trabalho desenvolvido por esse artista foi
fornecida. Não foi exigido, por parte do cliente, que a peça gráfica descrevesse ou
retratasse o processo de trabalho do artista. Entendeu-se com isso, que tais
imagens poderiam sofrer alterações de modo a passarem a ter um caráter
expressivo, e não meramente ilustrativo ou descritivo. Contudo não se quis
descaracterizar a obra do artista, alterando sua cor, por exemplo. O recurso elegido
foi o recorte e enquadramento e o estudo de diferentes maneiras de dispor na folha
os fragmentos gerados a partir disso.
101
Partiu-se para a análise desses elementos em relação às suas possibilidades
comunicativas, expressivas e técnicas (adequação ao formato sugerido pelo cliente).
O formato deveria ser semelhante às outras peças gráficas já produzidas por eles
(convites de exposição e outras peças gráficas), para que se pudessem aproveitar
envelopes plásticos.
Primeiramente, se analisou as possibilidades de ampliação e redução das
imagens, e sua resolução*. Para que se tenha uma boa impressão no processo off-
set, as imagens precisam ter resolução em torno de 300dpi* no formato final. A
escolha de enquadramentos diferenciados para as fotografias depende de sua
possibilidade de ampliação, já que quanto mais se amplia uma imagem, menos
resolução ela mantém. Trata-se de uma relação inversamente proporcional.
Algumas imagens enviadas poderiam ser ampliadas a ponto de terem 300dpis no
formato pretendido. Essas imagens podem ser vistas a seguir (figura 26).
Figura 26: Imagens enviadas por e-mail para a elaboração da peça gráfica.
102
3.2.6 A realização
Primeiramente se inseriu os elementos (textos, fotos e logotipos) em páginas
criadas no programa editor gráfico Adobe Indesign CS3. Esses elementos foram
dispostos em uma primeira tentativa de ocupação dos espaços do plano (figura 27).
As páginas, ordenadas pelo programa, uma abaixo da outra, representam a frente e
o verso de uma folha de papel. Assim, a página disposta na parte superior da tela
contem, da esquerda para a direita, a aba, a contracapa e a capa, que aparecem
lado a lado. Quando o folder estiver dobrado serão vistas isoladamente. A página na
parte inferior da tela representa a parte interna da peça gráfica, aberta.
Figura 27: Reprodução da tela do computador durante a elaboração da peça gráfica. Interface do
programa Adobe Indesign CS3. 2009. Reprodução do autor.
Essa primeira ação de ocupação do plano define-se em uma ação inicial. A
partir dela foram geradas alternativas de disposição dos elementos, de maneira a
melhorar a hierarquia da informação, fazer fluir a leitura e criar jogos expressivos
entre os elementos. No caso desta peça, essa ação inicial definiu a imagem a ser
usada como capa e contracapa e a maneira como o texto iria correr em colunas. O
termo “jogos expressivos” é usado aqui para definir a maneira como um elemento irá
interagir com outro para estabelecer um sentido subjetivo. Esse sentido, no entanto,
103
não está restrito nem à informação textual, nem à fruição das imagens, mas se
estabelece no conjunto desses elementos, na ordem de sua aparição, em suas
cores, formas e conteúdos.
Quanto à informação textual, percebeu-se que a disposição do texto de
descrição do programa, nesse primeiro momento colocado na contracapa (figura
28), não respeitava uma boa hierarquia. Ele deveria ter prioridade na ordem da
leitura. Procedeu-se um estudo de sua inserção na aba, para ser lido por primeiro.
Junto dele optou-se por usar uma imagem que mostrasse um recorte do processo
de criação do artista, sem explicitá-lo totalmente, mas de maneira sutil, para que
posteriormente pudesse ser visto com mais detalhes. Escolheu-se a imagem de um
desenho pendurado no ateliê, onde se vê também a textura da maneira da parede,
marcas casuais e a expressão em inglês “coat and tie”. O texto foi disposto abaixo,
em letras brancas sobre fundo preto, que harmonizam com a cor do desenho, da
parede e das marcas aleatórias.
Figura 28: Estudo da aba. Reprodução da tela do computador durante a elaboração da peça gráfica.
Interface do programa Adobe Indesign CS3. 2009. Reprodução do autor.
104
O preto e a cor da madeira passaram a ser elementos importantes, pois
geraram uma visualidade que parecia estar coerente com as expectativas do cliente
(elegância, sutileza, etc.) e com o gosto pessoal do autor.
Assim começam a se estabelecer diretrizes para a criação. Elas surgem na
forma de descobertas e trazem em seu caráter um misto de afeição a algum
elemento ou conjunto de elementos e de decisões de ordem funcional como, por
exemplo, que parte da imagem é mais adequada a funcionar como fundo de um
determinado texto. Outras características dessas imagens chamaram a atenção por
serem potenciais elementos expressivos, como as diagonais delimitam áreas de cor
com bastante contraste, os veios das madeiras, as marcas geradas aleatoriamente
nas paredes, as frases escritas nas paredes, as diferenças de plano que se
estabelecem entre as folhas de papel penduradas e o espaço caótico do ateliê. O
passo seguinte foi tentar isolar esses elementos a partir de novos enquadramentos
(figura 29).
Figura 29: Estudo de enquadramento dos elementos expressivos. Reprodução da tela do computador
durante a elaboração da peça gráfica. Interface do programa Adobe Indesign CS3. 2009.
Reprodução do autor.
105
Alguns desses enquadramentos foram usados como elementos gráficos, com
a intenção de criar um fluxo para a atenção que concordasse com o fluxo da leitura
do texto, estabelecendo, porém, complementações entre si (figura 30).
Figura 30: Estudo para enquadramentos. Reprodução da tela do computador durante a elaboração da
peça gráfica. Interface do programa Adobe Indesign CS3. 2009. Reprodução do autor.
Embora esses elementos tenham sido usados em áreas livres do plano,
explorando seus limites, na tentativa de distanciá-los do texto, eles pareciam
concorrer com a leitura, dispersando a atenção, diferentemente do objetivo inicial,
que era promover uma integração. Percebeu-se que isso provinha do uso de
elementos muito distintos entre si, do grande contraste que se estabelecia entre a
cor desses elementos com o fundo branco da folha como também da exploração da
parte central da folha com um elemento que atribuía muito peso a parte sua
superior.
106
As soluções adotadas foram: repetir detalhes da imagem principal, usada na
capa e contracapa e abandonar outras imagens; aplicar uma cor clara no fundo
branco, para diminuir o contraste; não utilizar o elemento disposto no centro da
página, optando por manter somente os elementos dispostos na extrema esquerda e
na extrema direita do plano, marcando o início e o final do texto.
Figura 31: Solução da página interna. Estudo para enquadramentos. Reprodução da tela do
computador durante a elaboração da peça gráfica. Interface do programa Adobe Indesign CS3. 2009.
Reprodução do autor.
Os fragmentos da imagem escolhidos foram aqueles que mostravam uma
diagonal entre a folha levemente pintada com um tom claro e a folha escurecida com
tinta preta. Optou-se por enfocar partes da imagem que mostram marcas do pincel
que descrevem o gesto que as gerou, com a intenção de explicitar certo caráter
gestual da obra desse artista.
A cor escolhida para o fundo da página foi extraída das áreas claras da
imagem para criar harmonia entre os elementos gráficos e o fundo. A diagonal que
se estabelece imaginariamente entre o elemento acima, à esquerda e o elemento
107
abaixo, à direita, reforça o fluxo de leitura do texto. O pequeno fragmento preto da
imagem à esquerda marca o título “Regulamento”, e a grande área preta da imagem
à direita marca o fim da leitura.
As soluções engendradas na página interna (disposição dos elementos e
fundo de cor) foram usadas para resolver a aba, onde o texto de introdução ao
programa Bolsa Iberê Camargo está disposto sobre um fundo da mesma cor e é
acompanhado por um elemento gráfico. Esse é constituído a partir da continuação
da imagem da contracapa, com um pequeno corte, que o torna similar aos
elementos da página interna.
Figura 32: Solução para primeira dobra, contracapa e capa. Estudo para enquadramentos.
Reprodução da tela do computador durante a elaboração da peça gráfica. Interface do programa
Adobe Indesign CS3. 2009. Reprodução do autor.
A composição com o preto e a cor da madeira da parede foi mantida apenas na
contracapa. Assim, considera-se que somente ao visualizar toda a peça gráfica o
usuário terá uma idéia completa de como se articulam os elementos. A maneira
108
como se manipula a peça é representada abaixo. As imagens receberam
tratamentos de cor para que ficassem mais evidentes os detalhes gerados pelos
gestos do pincel e a cor da madeira. O resultado final pode ser visto a seguir (figuras
33, 34, 35 e 36)
Figura 33: Capa impressa do folder. 2009. Reprodução do autor.
109
Figura 34: Primeira dobra aberta: à esquerda página interna e à direita aba. 2009.
Reprodução do autor.
Figura 35: Página interna aberta. 2009. Reprodução do autor.
110
Figura 36: Contracapa. 2009. Reprodução do autor.
3.2.7 A Veiculação
Esse material foi distribuído pela Fundação Iberê Camargo em pontos de
divulgação de eventos culturais, museus, galerias, ateliês, instituições educacionais,
etc. Também foram enviadas unidades pelo correio. Houve uma divulgação via e-
mail, para a qual foram elaboradas imagens digitais que seguiram essa
programação visual.
111
3.2.8 Constatações
1) Adequação às limitações impostas pelo ambiente de trabalho, pelas
técnicas e equipamentos e pelos elementos e diretrizes fornecidos pelo
cliente.
2) Procedimento de ações iniciais.
3) Tentativa de se manter fiel aos impulsos iniciais de experimentação dos
elementos.
4) Busca por descobrir nos elementos fornecidos detalhes expressivos.
5) Atenção para não ocorrer esgotamento de determinado conjunto de ações e
falta de eficácia dos elementos escolhidos.
6) Formulação de novos conjuntos de ações que complementem outros
conjuntos já esgotados.
7) Desconstrução de formas já estabelecidas a fim de criar novas
possibilidades de interação e fruição.
8) Determinação da medida ideal para cada conjunto de ações.
9) Formulação de procedimentos pessoais: técnicos e criativos.
10) Apropriação desses novos conjuntos de ações e de procedimentos em uma
espécie de repertório próprio.
11) Tentativa de propor modos de leitura e fruição, baseados em regras da
percepção visual, como as diagonais, a utilização da página à direita para
os elementos de maior importância, etc. Quanto ao uso das imagens das
obras, houve uma intenção de não restringir a uma pura interpretação,
simplesmente expondo-as, mas sim, de criar meios para que o público
pudesse interpretá-los à sua maneira.
3.3 Procedimentos percebidos a partir do processo pessoal de criação de
ambos os casos
Na análise dos procedimentos, percebeu-se uma estratégia pessoal presente
tanto na prática do desenho artístico, como na prática do design gráfico. Essa
estratégia geral pode ser descrita pelas seguintes etapas:
112
1) Presença de um ímpeto inicial ou uma idéia vaga a ser desenvolvida,
relacionada a um propósito específico que pode ser a necessidade de
expressão de uma emoção ou uma demanda comercial.
2) Ausência de estudos e planejamentos prévios anteriores a fase de
elaboração dos objetos, ou seja, uma preferência pessoal por ações diretas no
objeto final (arquivos digitais ou desenhos), sem o uso de esboços.
3) Presença de um estado de fluxo que pode ser descrito como uma deriva
iniciada no lançamento dos primeiros elementos no plano (físico ou virtual) e
que se estabelece em várias tentativas de arranjo desses elementos a partir de
conjuntos de ações (recortes, enquadramentos, alteração de escala,
justaposições, sobreposições, rasgões, decalques, apagamentos, etc.),
elaboradas especificamente para cada novo trabalho, ou incorporadas de
experiências anteriores.
4) Negação, ou desconstrução, dos grupos de elementos, bem como dos
conjuntos de ações e a formulação de novas alternativas de arranjo de
elementos e de novas ações;
5) Seleção das alternativas mais estáveis que carregam em si maior potência
expressiva.
Tal estratégia funciona como um modo de agir pessoal, comum em ambas as
práticas. Contudo, embora sejam percebidos procedimentos semelhantes no
processo de criação em desenho artístico e design gráfico, tem-se consciência que
existem características fundamentais da cada prática que se mantêm distintas e
também influenciam a criação.
Na prática pessoal do desenho artístico não há a necessidade de comunicar
algo à determinada audiência de maneira precisa. Não há também a necessidade de
vender os desenhos ou idéias e de elaborá-los para que sejam mais bem recebidos
por um determinado público, já que a atividade comercial do autor é o design gráfico.
Isso traz certa liberdade para a criação dos desenhos não se preocupando em
atingir metas comercias, mas sim suprir necessidades pessoais de expressão e
manter coerência com a diretriz principal da pesquisa poética que o autor
desenvolve: a questão da inscrição do gesto em diferentes suportes.
113
No processo de desenho, não existe a possibilidade de se retroceder ações
que se julgam erradas. No design gráfico, suportado pela tecnologia digital, essa
possibilidade é muito presente. Quando algum erro acontece no desenho (por
exemplo, uma mancha que, por descuido, esconde partes importantes da
composição) esse deve ser incorporado e rearticulado com outros elementos, a fim
de re-estabelecer a harmonia da composição. Com isso, o estado de fluxo colocado
em prática na produção em desenho artístico, geralmente gera resultados onde os
resíduos do processo de elaboração da imagem são mais visíveis. Da mesma forma,
muitas vezes esse estado de fluxo gera séries de trabalhos e não obras isoladas,
aonde os procedimentos vão sendo estudados e aprimorados de desenho em
desenho.
No design gráfico, a tecnologia digital permite um grande controle dos erros e
dos acontecimentos aleatórios. O uso de resíduos e acontecimentos aleatórios
depende de uma intenção de induzi-los e geralmente está associado a um estilo
pretendido para determinada peça gráfica. De fato o designer gráfico é submetido a
uma série de restrições alheias às próprias vontades, a saber: as demandas
comerciais; as necessidades de comunicação do cliente e a conseqüente
conformidade às prescrições que suportam tal comunicação; os anseios e
necessidades da audiência; as condicionantes de produção e reprodução advindas
da indústria gráfica; as possibilidades introduzidas pela tecnologia digital. Todas
essas condicionantes balizam e influenciam a criação em design gráfico.
Mesmo que sejam evidentes algumas diferenças, pode-se dizer que o design
gráfico hoje, permite o uso da estratégia de fluxo na criação de peças gráficas.
Conclui-se então, pela percepção pessoal, que existem procedimentos semelhantes
no processo de criação do desenho artístico e do design gráfico contemporâneos
que estão relacionados ao uso de tal estratégia, que no design gráfico é facilitada
pela tecnologia digital.
Tal estratégia parece válida frente à necessidade contemporânea de se
elaborar imagens que expressem significados abertos a interpretações e que
induzam a participação da audiência na atribuição de sentidos para as mensagens.
Sua validade se deve à inerente busca de construção de significados a partir da
114
atenção às similaridades, divergências e complementações que surgem entre os
elementos de composição, por exemplo: um detalhe ou cor de uma foto, uma
palavra chave de um texto, uma composição de linhas, um material inusitado, um
fato acidental, etc. Essa atenção sugere procedimentos originais de articulação
desses elementos que transformam seu significado original, gerando novas
interpretações, novos olhares.
Se as imagens são formuladas a partir de uma atenção e percepção bastante
pessoais que sugerem procedimentos originais de articulação dos signos, o sentido
que transmite só pode ser entendido, por quem frui das imagens, a partir de um
novo ato de significação. O procedimento em fluxo gera imagens que não têm um
sentido único e fechado, mas indicam vieses de interpretação que poderão ou não
ser assimilados na íntegra. Na verdade, muitas vezes nem existe um sentido
integralmente elaborado nessas imagens.
A preferência por estar em fluxo, ou em um jogo sensível de articulação de
signos, é fruto da experiência adquirida com a criação em desenho. As qualidades
que definem essa experiência, já citadas na fundamentação teórica são:
1) Auto-conhecimento, adquirido ao longo do tempo com articulação de
signos, tanto no desenho artístico como no design gráfico, ou seja, uma
consciência das próprias habilidades e dificuldades para ver, analisar,
entender, descrever e representar algo.
2) Tendência a dedicar aos elementos de composição uma atenção ao
mesmo tempo seletiva e sensível, onde os signos adquirem significado em
uma composição bidimensional e em relação a uma maneira pessoal de
interpretar um tema enunciado e elaborar um contexto.Busca de sentido,
de equilíbrio e atenção aos detalhes que define uma postura que aceita e
se vale da indissociabilidade das dimensões conceitual e grafológica
presentes no desenho e também no design gráfico suportado pela
tecnologia digital.
3) Preferência pelo improviso na elaboração de significados a partir de um
jogo de articulação dos signos en pròces, ou seja, em mudança, em
julgamento constante e dialético.
115
4) Busca pelo jogo do improviso que possibilita a criação de repertório
próprio de ações e procedimentos e conseqüentes resultados visuais que
caracterizam um estilo pessoal de abordar os problemas poéticos ou de
comunicação.
5) Estilo permeado pelo improviso e pela atenção seletiva e subjetiva aos
detalhes e ao próprio processo atribui importância aos resíduos e aos
acontecimentos aleatórios como elementos de composição e criação.
6) Somatório de tais condições possibilita a manutenção da significação em
aberto, que é fundamental para parte da produção em design gráfico nos
dias de hoje e que visa ser, mais do que mera comunicação, uma
proposição e exige da audiência um olhar criativo.
Por certo que tais qualidades podem estar presentes em profissionais que não
atuem com desenho artístico e design gráfico simultaneamente. Seria possível até
dizer que estariam presentes, guardadas as diferenças, em profissionais de qualquer
área do conhecimento que envolva a criação. Contudo, é a partir delas que se achou
o viés para indicar colaborações entre as duas áreas pesquisadas aqui. É
necessário então verificar se tais qualidades são compartilhadas por outros
profissionais e de que maneira se estabelecem contribuições. Isso foi feito a partir da
relação das respostas aos questionários com o que foi aprendido até aqui.
3.4 Questionários
As questões do questionário foram formuladas com a intenção de obter
reflexões desses profissionais a respeito das relações entre o desenho e o design
gráfico; se a prática de desenhos preparatórios é comum entre eles; qual o papel da
tecnologia digital em suas produções; se esses profissionais consideram que
desenham a partir da tecnologia digital e qual seu entendimento sobre o que é
desenho. Todos os profissionais foram consultados por e-mail no período entre 25
de julho de 2009 a 15 de setembro de 2009. As questões distribuídas forma as
seguintes:
116
1) Que relação ou contribuição existe entre sua produção em desenho e sua
produção em design gráfico?
2) Que importância você atribui à tecnologia nessas produções?
3) Você faz estudos e desenhos à mão antes de partir para o computador?
De que maneira isso ocorre?
4) Você considera que desenha com o computador? De que maneira isso
acontece?
5) Dê sua contribuição espontânea para essa pesquisa.
A escolha dos profissionais deve-se ao fato de que eles, assim como o autor,
dedicam-se ao design gráfico como profissão e meio de sustento, mas têm
atividades relacionadas ao desenho como meio de expressão, seja como artistas,
ilustradores ou desenvolvendo todas essas funções. Assim, são profissionais de
perfil multidisciplinar e, muitas vezes, estão envolvidos em outras atividades
profissionais além das citadas acima.
Tratam-se geralmente de profissionais autônomos, que prestam serviços para
empresas de forma independente (profissionais liberais), embora já tenham atuado
como empregados de empresas de design, editoras, agências de propaganda e
publicidade. Em alguns casos, são donos ou diretores de empresas, como Francisco
Baldini, diretor da W3Haus, por exemplo.
Alguns são artistas visuais e desempenham essa atividade ativamente, fazendo
exposições, como é o caso de Guto Lacaz, James Zortea, Guilherme Dable,
Joaquim da Fonseca, Chico Baldini e do próprio autor da pesquisa, Gabriel Netto.
Quase todos os profissionais consultados também atuam como ilustradores,
contratados por empresas de design, editoras, agências de publicidade e por outros
designers.
James Zortea, Guilherme Dable e Gabriel Netto também desempenham a
atividade de galeristas e curadores, promovendo várias atividades relacionadas às
artes visuais em Porto Alegre, em seu atelier/galeria, o Atelier Subterrânea, tais
como: exposições, palestras, cursos, workshops, mostras de vídeo, conversas com
artistas, etc.
117
Sabe-se ainda, que Joaquim da Fonseca, James Zortea e Gabriel Netto atuam
ou já atuaram como professores de desenho e/ou design gráfico em instituições de
ensino de nível secundário e superior.
3.4.1 Análise dos questionários
Da relação entre o que foi aprendido na etapa da fundamentação teórica, na
análise dos procedimentos pessoais e nas resposta dos questionários pode-se
levantar alguns dados que auxiliam o entendimento de como as práticas do desenho
artístico e do design gráfico interagem de maneira colaborativa. Os depoimentos dos
profissionais consultados servirão aqui de comprovação para o que foi levantado.
Primeiramente, pode-se dizer que ambas as áreas, desenho e design gráfico,
se complementam no que diz respeito às referências que inspiram as produções dos
profissionais consultados. Essa intercambialidade parece ser causada por certa
atenção especializada que distingue aspectos presentes em uma área e os
transpõem a outra, em uma clara relação de colaboração.
Acredito que a minha produção nas duas áreas não tenha muitas
semelhanças, mas as referências que me alimentam visual e
conceitualmente partem de ambos os campos, e aí elas se cruzam.
(GUILHERME DABLE).
Na imagem a seguir (figura 37) vê-se uma peça gráfica de Guilherme Dable
onde a influência da arte vai além da busca de referência. Introduz na peça um
fragmento de pintura ao qual é dada a maior importância. A maneira como pintura e
título interagem, indica uma clara opção por manter íntegra a comunicação ao
mesmo tempo que funde o elemento expressivo (fragmento) com o elemento de
comunicação (título). O tratamento dado ao restante da informação dedica-se
somente à transmissão da informação.
118
Figura 37: GUILHERME DABLE, 2009. Sem título. Impressão digital laser.
14.8 x 21 cm. Fonte: GDABLE.
As práticas artísticas do desenho e do design gráfico também interagem na
descoberta de soluções. Em alguns casos vêem-se nubladas as fronteiras do que é
o trabalho artístico e do design gráfico. Os depoimentos a seguir refletem a relação
de associação das duas práticas, de trocas mútuas de elementos, procedimentos e
soluções. Na figura 38 vemos um desenho de Fábio Zimbres elaborado a partir da
adição de camadas sobrepostas.
Estamos falando de design, mas meu design mais pessoal é o que se
mistura com meu desenho e trabalho de ilustrador e segue regras
parecidas com as do desenho: vou adicionando coisas e movendo blocos
pra lá e pra cá, tendo em mente apenas a criação de movimento,
119
instabilidade, diversão etc. É quase uma coisa só. Meu trabalho muitas
vezes é uma apropriação pelo desenho de técnicas do design gráfico, é
uma releitura de livros e embalagens e produtos industriais já que é um
trabalho que se alimenta das imagens geradas pelo comércio e
comunicação de massa. Então é natural que os dois se misturem e a
fronteira entre os dois fique indeterminada. (FÁBIO ZIMBRES).
Os desenhos se misturam. Vejo nos estudos que faço [...] se estou
resolvendo uma marca pode aparecer uma solução para um objeto [...].
(GUTO LACAZ)
Figura 38: FÁBIO ZIMBRES, s/d. Sem título. Técnica Mista. Fonte: FZIMBRES.
Outro aspecto colaborativo é a transposição de elementos concretos do
desenho artístico para o design gráfico e vice versa. Sob esse aspecto, a tecnologia
digital tem papel fundamental, já que permite tal transposição a partir da
120
digitalização de experimentações analógicas e impressão de experimentações
digitais. Esse tipo de procedimento tem a função de tornar a visualidade de
determinada peça gráfica mais expressiva e atraente. Por outro lado, o designer
busca criar provocações para si mesmo, quando insere signos que são imprecisos e
fragmentados e tenta elaborar significados a partir da articulação desses signos.
Muitos dos meus trabalhos em design gráfico valem-se da digitalização de
rabiscos, borrões e desgastes de experiências sobre superfícies analógicas
(folhas de papel, lâminas de acetato, fotografias rasuradas ou
quimiografias), esse material "contaminado" impregna o grid asséptico dos
softwares gráficos e trás provocações para a construção do layout [...]
Compreendo o desenho fundamentalmente como vestígio de um
movimento. Esse rastro de um fluxo pode evidenciar-se em duas condições
principais: a primeira, é a condição do desenho como indício de uma ação
do corpo, o gesto do artista ancorado na experimentação sensível da
matéria, um processo do devir permeado intensamente pelo acaso; a
segunda é a articulação do fluxo do pensamento que o desenho possibilita
através de projeções que ordenem e evidenciem esse percurso/fluxograma
das idéias [...] não se pode dissociar ambas na ação do desenho. As coisas
parecem borradas quando se está imerso no trabalho. (JAMES ZORTEA)
A afirmação de James Zortea ainda refere-se à indissociabilidade das
dimensões conceitual e grafológica do desenho e à maneira como isso é transposto
ao design gráfico na tentativa de criar estímulos à criação. A seguir tem-se um
exemplo de peça gráfica produzida nesse sentido, onde coexistem desenhos
vetoriais feitos no computador, borrões digitalizados e tipografia manuscrita (figura
39).
121
Figura 39: JAMES ZORTEA, 2009. Sem título. Impressão off-set. Fonte: JAGOZ.
Percebe-se que existe uma busca por provocações, movimento, instabilidade e
diversão que extrapola o simples uso de elementos de desenho no design gráfico.
Nas práticas pessoais do autor, descritas anteriormente, viu-se que essa busca pode
se dar a partir de um detalhe de foto ou obra de arte, de um material inusitado, de
um suporte com características específicas, da formulação de ações e
procedimentos pessoais, etc. Isso define uma postura de criador que assume a
necessidade de estímulos, às vezes alheios a um problema específico, mas
presentes aos detalhes, indicações, resíduos e acasos. Os significados que surgem
do jogo de articulação dos elementos é, muitas vezes, uma conseqüência e não algo
formulado a priori. Trata-se de uma postura que depende de um envolvimento com
os elementos, enunciados, materiais, procedimentos técnicos e contextos muito
influenciados pela sensibilidade e afinidade. Pode-se ver nos depoimentos abaixo,
que essa é uma postura característica dos profissionais consultados, muito por conta
da prática do desenho.
Às vezes penso em algo e desenho para registrar e depois desenvolver a
idéia. Muitas vezes desenho sem pensar e as formas vão aparecendo do
nada, como se estivesse psicografando. De muitos garranchos surge
sempre alguma luz, uma boa surpresa, uma série, uma história. A mão leva
e é levada. Se desloca, pára, muda de direção, o olho julga... É um bom
desenho? [...] Gosto de voltar a rever desenhos. Assim valorizo idéias que
122
passaram despercebidas. Acho que uma pessoa só pode dizer que viu
uma coisa, depois de tê-la desenhado. (GUTO LACAZ)
Sou um desenhista compulsivo e tenho a tendência a esboçar meus
projetos de design em garatujas rápidas compreensíveis apenas por mim.
Quase nunca chego ao resultado final do design através delas, mas
organizo a casa. (CHICO BALDINI)
Percebe-se que esses profissionais transitam com facilidade entre dois estilos:
um mais autoral, que incorpora no design de uma peça gráfica a poética pessoal,
outro mais neutro, que se dedica a criar visualidades específicas para os clientes.
Vê-se isso no depoimento a seguir.
Muitas vezes meu design se relaciona diretamente com minha produção
em desenho porque é um design aplicado sobre minha própria produção
[...] Nesse caso há uma simbiose porque o design pode se moldar à
ilustração e não um determinar o outro. Mais que isso a composição
resultante é mais próxima do meu repertório pessoal porque o que essas
peças pedem é uma assinatura pessoal, uma linguagem mais intuitiva e
próxima do meu jeito de criar. E também sou livre para quebrar qualquer
regra porque sou meu próprio cliente e qualquer falha na comunicação é
compensada pela expressividade que a peça final apresenta, o que é um
jogo que nem todo cliente pode absorver [...] Outro aspecto de ter uma
atividade de desenho que corre paralelo ao trabalho de design é que eu
não sinta a necessidade de a todo momento ficar tentando me 'expressar'
através do design, muitas vezes, me contento com a boa organização do
espaço e com a criação de uma 'voz' própria ao cliente e que não seja
necessariamente a minha. Quer dizer, não estou buscando um design
'autoral' como chamam, as vezes. Já acho suficiente criar uma
expressividade que sirva aos outros. (FÁBIO ZIMBRES)
A prática do desenho pode se caracterizar também por ser um diferencial em
projetos gráficos, à medida que os designers podem fazer suas próprias ilustrações
e planejá-las de acordo com o contexto das peças gráficas. Na figura 40 vê-se a
simbiose com que design e ilustração interagem na peça gráfica de Carla Pilla.
123
[...] existem projetos com enfoque no design, em que posso ter liberdade
para decidir se seria interessante ou não utilizar uma ilustração para
enriquecer e complementar o design. Caso seja, planejo a ilustração
pensando no contexto ou peça gráfica. (CARLA PILLA)
Figura 40: CARLA PILLA, s/d. Sem título. Página de web site. Fonte: CARLAPILLA.
O depoimento de Joaquim da Fonseca, designer que acompanhou as
transformações ocorridas no âmbito do design gráfico, advindas da evolução da
tecnologia digital, concorda com o que se disse aqui do diferencial do designer
ilustrador.
Comecei minha atividade profissional como designer gráfico numa época
em que o desenho era o principal meio de expressão visual. Quando foram
ocorrendo outros recursos introduzidos pela tecnologia, como a fotografia,
a fotocomposição, depois a computação gráfica, acompanhei essa
evolução sempre usando o desenho como característica, ou diferencial,
124
dos trabalhos que fui produzindo, adaptando-o a essas inovações.
(JOAQUIM DA FONSECA)
Sobre o agir diferenciado dos profissionais, indo além da possibilidade de
transitarem por estilos, de integrarem expressividade e comunicação, ou de
poderem produzir suas próprias ilustrações, percebe-se que sua postura frente a
muitos aspectos da profissão tem abordagens originais. O uso da tecnologia digital é
um exemplo, já que todos esses profissionais tem posicionamentos ao mesmo
tempo críticos e favoráveis ao uso de tal tecnologia, cada um a sua maneira. No
depoimento abaixo se vê uma clara intenção de problematizar o uso da tecnologia e
com isso criar provocações para a prática profissional. Percebe-se uma intenção de,
além de visar resultados formais originais, buscar originalidade e satisfação pessoal
na própria prática.
O computador facilitou o trabalho que antigamente eu tentava fazer com os
fotolitos, dentro da oficina, fazendo fotos e raspando os acetatos. Além
disso, aumentou a precisão dos próprios processos de impressão [...] Por
outro lado acostumou mal os clientes que só pedem trabalho pra ontem. E
também favoreceu minha falta de disciplina porque agora eu parto do zero
até chegar a umas cinco soluções razoáveis quando antes eu tinha que
me concentrar para produzir a melhor solução e apenas isso [...] De fato a
tecnologia, como sempre acontece, muda sua maneira de trabalhar. E
dado que a tecnologia sempre vai fazer parte do fazer humano, cabe a nós
aceitarmos esse fato, mas ao mesmo tempo assumirmos nossa
capacidade de manejá-la e controlá-la. Ou seja, tão interessante quanto
estar atualizado com relação ao que há de mais avançado, é recusar seu
uso e re-programar as tecnologias obsoletas. Compreender e usar novas
tecnologias traz uma possibilidade de re-olhar o mundo, mas deixar de usá-
las não é menos instigante [...] É só uma questão de usar a tecnologia para
colocar sua mente num lugar onde você pode trabalhar. (FÁBIO ZIMBRES)
A tecnologia digital é, para a maioria dos profissionais consultados, muito
importante para a prática em design gráfico, por vezes influenciando a visualidade
das produções. É também espaço de experimentações e provocações, onde atua
como ferramenta integrada às práticas manuais do desenho e da manipulação dos
materiais.
125
No design, me utilizo bastante de possibilidades do Photoshop para
construir imagens. Meu trabalho não teria a mesma cara sem a interface
digital. (GUILHERME DABLE).
No meu processo de criação gráfica, a tecnologia é a ferramenta que
possibilita a passagem da matéria analógica para codificação digital. Como
me interesso pelos comportamentos dos resíduos no desenho, os scanners
e máquinas fotográficas digitais são aparatos importantes para a captação
das minhas ações sobre a matéria. Num segundo instante, após a
digitalização dos resíduos, os softwares gráficos são o campo de
experimentação compositiva, nele arrasto camadas digitais para projetar
uma saída gráfica [...] o campo digital possibilita efetuar fusões de dois
momentos do desenho: a experimentação (fluxo do aqui/agora, o fazer) e a
projeção (deslocamento para o futuro e o passado, o conceber do
gesto). (JAMES ZORTEA).
Para outros profissionais, a tecnologia digital é entendida como uma boa
ferramenta que facilita a elaboração das peças gráficas já que aprimora o
acabamento. Também é fundamental para outras etapas do processo, como a
pesquisa, por exemplo. Nesse contexto, o desenho é entendido como o principal
meio gerador das idéias.
Só consigo pensar na prancheta com papéis e lápis. O computador é uma
valiosa ferramenta, mas é apenas isso. Sou essencialmente um desenhista
que prefere o manuseio de tintas sobre telas ou papéis. O Computador
ajuda a corrigir possíveis imperfeições de cada trabalho e os insere no
design dos produtos para os quais foram produzidos. (ELIFAS
ANDREATA).
Considero a tecnologia uma ótima ferramenta para fazer mais rápido
determinadas etapas do design e da ilustração: pesquisar, testar, por
exemplo, cores e tonalidades, montar a arte-final com um acabamento
satisfatório. Mas o fundamental para o desenho e o design, que é a
criação, independe da tecnologia. (CARLA PILLA).
126
De fato, constatou-se que praticamente todos os profissionais consultados
preferem expressar as primeiras idéias em esboços rápidos concordando com as
qualidades relativas a essa prática gestual, já apontadas anteriormente no capitulo
dois.
Sim. O desenho é, para mim, a ferramenta mais rápida para cristalizar uma
idéia, um ponto de partida, um conceito. Minha organização básica de
pensamento em um projeto passa por desenhar no papel as idéias.
Geralmente, são desenhos pequenos, para apreender as idéias. Daí, a
idéia escolhida pode se desenvolver em uma interface digital.
(GUILHERME DABLE).
Sempre faço estudos preliminares com desenhos, na forma de esboços ou
croquis, antes de usar o computador. Nesses estudos, posso prever e
planejar as idéias, a composição espacial, os valores de sombra e de cores
com antecedência, o que me ajuda a selecionar as melhores alternativas e
facilita e torna mais rápida a execução final no computador. (JOAQUIM DA
FONSECA)
Mesmo quando o produto final é digital, como por exemplo, um desenho
vetorial ou o design de um site, a idéia se materializa a mão livre no papel,
e depois é aperfeiçoada no computador. (CARLA PILLA)
Por outro lado, também se percebe que para alguns profissionais não existem
métodos invariáveis e a prática gestual se intercala com o desenho feito a partir da
tecnologia digital de maneiras diferentes.
Não há regra. Às vezes um esquema é importante antes de começar
porque as coisas ficam mais concretas depois de um desenho e um
pequeno estudo ainda é mais eficiente que partir diretamente pra máquina.
Mas muitas vezes começar pela máquina é parecido com a maneira que eu
começava um projeto de arte-final, medir e cortar o papel, fixar na
prancheta, fazer linhas de margem etc., isso era uma coisa que eu fazia
quando projetava porque já me ajudava a me concentrar no material físico
que eu tinha a disposição e na máquina dá pra fazer a mesma coisa sendo
que não há a necessidade de cortar outro papel e começar tudo de novo
quando alguma alteração de trajeto surge pelo caminho. O desenho serve
pra destravar também quando chegamos num ponto de estagnação no
127
projeto. Claro que é possível divagar no computador, pode-se usar
sistemas no computador em busca de algo aleatório ou inesperado, mas
depois de um tempo seu repertório vai ficando meio repetitivo e sair disso e
brincar com algo diferente vai mudar sua perspectiva e o desenho é uma
ferramenta que serve pra isso, mudar sua maneira de ver. (FÁBIO
ZIMBRES)
Não realizo estudos para antever uma saída gráfica, mas coleciono
resíduos e rasuras que podem constituir a visualidade de um projeto
gráfico. (JAMES ZORTEA)
A maneira como varia a busca de soluções de acordo com o depoimento dos
profissionais consultados remete ao uso de estratégias passíveis de alterações no
lugar de métodos estanques e definidos passo a passo, conforme foi visto na
fundamentação teórica. As estratégias são utilizadas à medida que se tem noção do
objetivo e dos meios existentes para alcançá-los. Abaixo vemos como isso pode
determinar a abordagem do problema, quando Guto Lacaz afirma: ӈs vezes vou
direto para a tela quando a solução é tipográfica”. (figura 41).
Figura 41: GUTO LACAZ, s/d. Sem Título. Fonte: GUTOLACAZ.
128
Em suma, percebeu-se que alguns profissionais consultados entendem o
desenho como prática gestual, preferencialmente manual, mas que pode ser feita a
partir da tecnologia digital através de equipamentos periféricos como tablets e
mouses, mas sempre vinculado à linha e ao gesto que a gera, conforme seu
entendimento tradicional. Não é consensual entre eles o entendimento do desenho
como um meio de expressão híbrido que comporte a articulação de um conjunto
mais amplo de signos (como os recortes de fotografias, materiais impressos, etc.) e
processos (como as colagens, assemblagens, montagens, etc.). Alguns deles, no
entanto, concordam com a opinião defendida no presente texto, de que o desenho
pode ser entendido como um meio de articulação de um conjunto diverso de signos.
Hoje, vivo de desenho. Ora para atender clientes de ilustração e desenho
gráfico, criando marcas, revistas, livros, cartazes, ora para realizar projetos
de artes plásticas. (GUTO LACAZ).
Campos de cor, texto, enquadramento de uma fotografia, tudo isso é
pensado como um desenho. (GUILHERME DABLE).
Sim, meu desenho funciona a base de adição, uma coisa se soma a outra
num processo meio infantil de blocos que vão se armando até criar um
todo. No computador posso usar o mesmo sistema, partir de elementos
simples e ir somando eles aos poucos num processo intuitivo. O
computador também facilita a colagem e a transparência que é um recurso
que usava antes do computador, com xerox e acetatos. Posso partir do
zero no computador da mesma maneira que parto do zero com um papel
em branco, inclusive com a cabeça a zero, sem nenhuma expectativa ou
objetivo. (FÁBIO ZIMBRES).
A partir das respostas, observa-se que esses profissionais dedicam-se a
experimentações que unem desenho, design gráfico, ilustração e tecnologia, de
maneira diferentes, mas fazendo com que seus trabalhos em desenho e em design
gráfico habitem, por vezes, um campo de fronteiras difusas. O desenho e a
experimentação de recursos expressivos atuam como diferencial e como uma
prática que constitui o caráter desses profissionais, sujeitos conscientes de suas
atribuições, habilidades, vivências, afinidades, preferências, limitações e
dificuldades. Embora alguns deles transitem com facilidade entre estilos mais
129
autorais e mais neutros, dependendo da demanda do cliente, são requisitados por
terem trabalhos diferenciados e originais.
O design evolui a partir da produção em série e da otimização dos recursos
industriais e atingiu um momento em que ele está integrado com um
processo de comunicação e de produção industrial onde as interfaces são
praticamente individualizadas parece natural que aconteça as duas coisas:
ferramentas de design sejam ensinadas na escola, assim como o desenho,
não com o objetivo de formar designers, mas para tornar cada um
consciente das possibilidades de criação de interfaces no dia-a-dia e que o
design se aproprie de outras áreas de criação para que possa caminhar
junto com a criação de um imaginário pessoal. Porque o design já deixou
de estar restrito a processos industriais. (FÁBIO ZIMBRES).
Estou aqui fazendo este louvor ao desenho, mas preciso dizer que
desenho enlouquece. Produz raiva, ódio mortal, sensação desagradável de
incapacidade, mostra seus limites. (GUTO LACAZ)
Por fim, pode-se dizer que a prática continuada do desenho faz com que esses
profissionais se relacionem com esse gênero de maneira apaixonada. Pode-se
imaginar, a partir de experiência própria e de seus depoimentos, que eles se
tornaram designers gráficos por terem vivência com o desenho como meio de
expressão anterior à própria escolha da profissão.
Sempre desenhei. Desde criança, na adolescência, depois na faculdade e,
hoje em dia, mais e mais. (GUTO LACAZ)
130
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa apresentada aqui teve como ponto de partida a vontade de
entender percepções pessoais a respeito de semelhanças entre o processo de
criação em design gráfico e em desenho artístico. Entende-se que o surgimento de
tais percepções somente foi possível pelo fato de que essas duas práticas
constituem a produção profissional, o foco de atenção e o meio de vida de um
mesmo sujeito. A motivação foi encontrar as relações entre os dois fazeres e
compartilhar os resultados com a comunidade acadêmica e profissional.
A pesquisa conseguiu delinear as bases para o entendimento das relações
entre áreas buscando, na construção de uma fundamentação teórica e na opinião de
outros profissionais, dados que contribuíssem para a reflexão. A intenção disso foi
fazer com que o resultado final da pesquisa colabore na construção do
conhecimento em torno da relação entre o design gráfico e o desenho artístico e, em
última instância, nas relações entre o design e a arte.
A investigação apontou para resultados pontuais de duas ordens:
1) A elaboração de conceitos próprios sobre semelhanças no processo de
criação de ambas as áreas e a articulação desses conceitos.
2) A identificação de quatro tipos de relações entre as áreas.
4.1 Conceitos
Os três conceitos elaborados no presente estudo são: o desenho híbrido,
características contemporâneas das imagens (comuns à parte da produção atual de
design gráfico e desenho artístico) e a estratégia de fluxo na criação em ambas as
áreas, identificada a partir da produção pessoal e dos pares entrevistados.
O primeiro conceito, levantado na fundamentação teórica, diz respeito a atual
condição do desenho como meio de expressão. Conforme foi visto, o desenho não
pode mais ser considerado somente um meio preparatório e projetivo adjunto a
131
outros meio maiores como a pintura, a arquitetura, o design etc. Também não pode
mais ser entendido apenas como prática gestual, grafológica ou autográfica. Viu-se
que, partir da autonomia como meio de expressão, adquirida com mais intensidade
ao longo do século XX, o desenho passa a incorporar outras técnicas,
transformando-se. Trata-se de um desenho híbrido, no qual a origem grafológica
une-se à colagem, fotografia, tipografia, às formas geradas por programas editores
gráficos e à apropriação de materiais que não são tradicionalmente entendidos como
próprios do desenho, como as fitas adesivas, por exemplo. Identificaram-se a
hibridação do desenho principalmente nos textos das autoras Bernice Rose e Ema
Dexter.
Posteriormente à elaboração do primeiro conceito, foi realizada uma
comparação de peças de design gráfico e de desenho contemporâneo, onde se
constatou que parte das produções contemporâneas de design gráfico e de desenho
artístico se assemelha esteticamente. Essa semelhança advém da maneira como
nas duas áreas os criadores articulam signos de ordem diversa (signos gráficos,
fotografia, texto, tipografia, etc.). Porém, constatou-se que tal semelhança não
advém de um deslocamento de procedimentos de uma área à outra - do desenho
artístico para o design gráfico ou vice-versa –, mas sim porque ambas as áreas
compartilham características que estão além de si mesmas, mas que são
pertencentes à contemporaneidade.
O segundo conceito levantado trata justamente das características das imagens
na contemporaneidade, comuns à parte da produção de desenho artístico e de
design gráfico produzidos hoje em dia. De acordo com a obra de Flávio Vinícius
Cauduro e de Ana Cláudia Gruzinsky, viu-se que a hibridação, uma característica
percebida em algumas obras de desenho artístico atuais, pode ser identificada
também na produção contemporânea do design gráfico. O recorte feito da teoria
desses autores identificou também outras características em comum, a saber: a
imperfeição, a indefinição e a interatividade. Tais características produzem imagens
com significado em aberto, onde as audiências são responsáveis também por
construir seu entendimento, na condição de sujeitos en pròces, ou seja, em
constante transformação e julgamento. Fazem isso, influenciadas pelo meio social e
cultural que se inserem, por seus desejos e preocupações.
132
Distante do anseio moderno de construir entendimentos e verdades universais,
o sujeito criador das imagens contemporâneas, entende que a maneira de existir de
suas criações não está imune ao julgamento e interação de suas audiências. As
características levantadas acima (imperfeição, indefinição, interatividade e
hibridação) podem ser entendidas como estratégias de criação para o design
gráfico, a fim de dar conta da demanda de audiências ávidas pela participação e
interatividade. Isso explica porque parte da produção em design gráfico acaba se
assemelhando esteticamente à produção em desenho artístico hoje em dia.
Embora consciente de que existem exceções, o presente estudo procurou
enfocar justamente as peças gráficas e desenhos artísticos que buscam a abertura
na significação, caracterizados pela condição en pròces, elaborada por Cauduro.
Indo além, procurou-se entender como tal condição existe durante o processo de
criação.
Assim, o terceiro conceito trata de estratégias de criação, e por isso estudou os
procedimentos criativos do autor e de outros profissionais de perfil similar.
Constatou-se a existência do que foi chamado aqui de uma estratégia de fluxo na
criação das imagens. Esse fluxo se estabelece entre a criação do conceito e da
forma de desenhos e peças de design gráfico. A estratégia de fluxo, identificada a
partir da análise da produção pessoal, define-se pela articulação de signos de ordem
diversa (fotografia, tipografia, elementos gráficos etc.) durante a criação de
determinada peça gráfica ou desenho. Grupos de signos e ações são
constantemente elaborados e desfeitos até que a composição e o conceito de
alguma peça gráfica ou desenho se tornem estáveis. Isso por fim descreve o modo
como é indissociável a elaboração do conceito e da forma das peças gráficas e
desenhos analisados.
Conclui-se que os procedimentos semelhantes percebidos nos processos de
criação do desenho artístico e do design gráfico advêm da indissociabilidade das
dimensões formal e conceitual, inerentes à prática do desenho e potencializada no
design gráfico pela tecnologia digital. Tal tecnologia possibilita que a criação em
design gráfico seja realizada a partir de ações diretas no arquivo digital,
caracterizadas pela articulação de signos diversos, em ações que podem ser
133
pautadas pelo improviso e atenção aos detalhes, ao mesmo tempo seletiva e
subjetiva, onde a criação de conceitos se integra com a elaboração de soluções
gráficas. A indissossiabilidade na criação de conceito e forma está presente no
processo criativo de outros profissionais, como o de Fábio Zimbres, por exemplo,
que fala de uma simbiose entre idéia e prática, presente tanto nas produções de
design gráfico como no desenho artístico.
Percebeu-se, entretanto, que não existem regras gerais comuns a todos os
profissionais e que cada um estabelece suas próprias estratégias criativas.
Profissionais diferentes podem gerar imagens híbridas de forma bastante distinta.
Por outro lado, o desenvolvimento da pesquisa apontou para uma inegável condição
do desenho como meio de construção de imagens de significados em aberto, que
pressupõe questões que vão além de sua valorização como prática gestual, com
meios e suportes convencionais. O desenho integrado a colagem, a frotage, a
bricolagem, a assemblage, ao uso de camadas sobrepostas, ou ainda incorporando
meios tecnológicos como as fotocópias e os programas editores gráficos etc., gera
resultados originais que enriquecem a visualidade das peças gráficas, atuando como
um diferencial na produção desses profissionais.
A experiência com o desenho, entendido como um campo expandido de
possibilidades, ou seja, como um meio híbrido, pode ser útil para os designers
gráficos como um meio de aprender, experimentar e inventar procedimentos
próprios em experiências ao mesmo tempo técnicas e simbólicas. Entender o
desenho como ato de significação e sua condição en pròces, pode ajudar aos
designers gráficos contemporâneos frente à missão de construir tais possibilidades
de significação.
4.2 Relações entre áreas
A pesquisa apontou para quatro tipos de relação: distanciamento, transposição,
colaboração e cooperação. O distanciamento é referente à função ou propósito de
cada disciplina. O desenho artístico, ao contrário do design gráfico, não tem uma
demanda comercial ou comunicacional e por isso não é obrigado a estabelecer um
134
entendimento homogêneo. Ou seja, o paradoxo entre ter o significado em aberto e
se fazer entender perfeitamente, existe em muito menor grau no desenho artístico
do que no design gráfico. Por outro lado, o desenho artístico é mais autoral e seu
propósito é poético. A partir de alguns depoimentos vê-se como mesmo a relação de
distanciamento pode ser proveitosa para o profissional dedicado às duas práticas, já
que a necessidade de expressão poética ou autoral é suprida pelo desenho artístico,
ficando a produção em design gráfico livre para, quando necessário, somente
cumprir demandas de comerciais ou de comunicação.
A transposição define-se quando elementos concretos ou subjetivos são
transpostos de uma área a outra. Notou-se que os profissionais envolvidos com a
prática do desenho e do design gráfico, transpõem suas influências, referências,
procedimentos criativos, signos e visualidades. Com essas transposições, criam-se
estímulos para as criações em ambas as áreas, em jogos de articulação pautados
pela descoberta, diversão e, em última instância, pelo prazer na prática profissional.
Um exemplo de transposição é nítido quando James Zortéa afirma que seus os
borrões de seus desenhos “impregnam o grid asséptico do software”.
O aspecto da colaboração fica claro quando se vê as áreas interagirem entre si,
porém de forma distinta. Identifica-se isso quando, por exemplo, um mesmo
profissional executa o design e a ilustração, como fica claro na obra de todos os
profissionais consultados, em especial na de Carla Pilla.
Por cooperação entende-se o momento em que as duas áreas se confundem,
não havendo mais uma distinção precisa. Diz respeito à estratégia de fluxo na
criação de desenhos e peças gráficas e tem repercussão na maneira como os
profissionais estudados têm repertórios próprios de signos e procedimentos, que os
qualificam como profissionais diferenciados no mercado. Tais repertórios criam
maneiras originais de abordar problemas de comunicação caracterizam também
como certo traço pessoal presente em suas criações. A cooperação se estabelece
na maneira como soluções gráficas, conceituais e de estilo permeiam ambas as
práticas.
135
Constatou-se também que esses profissionais executam com facilidade a tarefa
gerar imagens caracterizadas pela imprecisão, pluralidade, multiplicidade de
interpretações, a partir de procedimentos que admitem a fragmentação, a
apropriação do aleatório, o acúmulo, a heterogeneidade dos signos, as
sobreposições de camadas etc. Imagens dessa ordem estão em concordância com
a necessidade de determinadas audiências em participar ativamente da construção
dos sentidos das mensagens, identificadas na obra de Cauduro. Esse fato valida o
fluxo como uma estratégia para o design contemporâneo.
Por fim, pode-se dizer tecnologia digital corrobora para que o designer gráfico
contemporâneo possa produzir peças gráficas de visualidade fragmentada,
imprecisa, com significados em aberto. Deve, para isso, ser entendida como uma
ferramenta que possibilita a geração de múltiplas alternativas de composição através
de experimentações baseadas em processos de fluxo de idéias que surgem de
maneira dialógica. Uma grande vantagem do uso da tecnologia digital no design
gráfico é que possibilita investigações híbridas entre o analógico e o digital, sem que
haja maiores complicações quanto à produção industrial das peças gráficas, que
continuam cumprindo as demandas técnicas necessárias à reprodução.
4.3 Futuras pesquisas
O desdobramento que se pode prever para a pesquisa apresentada até aqui
será refletir mais sobre as relações do desenho e do design e a partir disso, formular
e testar estratégias de ensino de desenho para estudantes de design gráfico,
baseadas na experimentação, a partir do entendimento mais amplo desse gênero.
Nesse sentido, o desenho híbrido seria uma prática para que os sujeitos se
apropriem de suas próprias experiências de significação, com a articulação de um
conjunto variado de signos e materiais integrados com a tecnologia digital. Acredita-
se que isso incentivará futuros designers a elaborar peças gráficas de maneira
autônoma, autoral, expressiva, criativa e experimental. Essas peças, em última
análise, teriam significados em aberto, estimulando as audiências a serem ativas na
construção dos sentidos das mensagens e imagens.
136
Pode-se indicar, como outro desdobramento possível, que outros
pesquisadores envolvidos com o design gráfico simultâneo a outras práticas
artísticas relacionadas a ele, a fotografia, por exemplo, investiguem a partir de que
especificidades podem ser estabelecidas relações de distanciamento, transposição,
colaboração e cooperação.
Por outro lado, sabe-se que na arte contemporânea a questão técnica não é
mais um diferencial e que a segmentação por técnicas (desenho, pintura, gravura
etc.) cada vez menos configura uma preocupação de muitos artistas. Dito isso,
pode-se imaginar que futuras pesquisas decorrentes da apresentada aqui deverão
enfocar as relações do design com a arte de maneira mais ampla.
Por fim, acredita-se que a leitura da presente dissertação poderá servir de
estímulo para pessoas que desejarem atuar em desenho artístico e em design
gráfico, incentivando-as a encararem essas práticas de maneira integrada, ou seja,
com atenção às vantagens que um mesmo sujeito pode ter em se dedicar à essas
áreas simultaneamente. Por outro lado, contribui para a reflexão sobre o estatuto do
desenho como meio preparatório e como meio de expressão, em simbiose com o
design gráfico.
137
5. APÊNDICES
5.1 Apêndice 1: procedimentos do autor.
O que me leva ao ateliê?
• Vontade de desenhar. Vontade de e organizar, agrupar e manipular materiais
• Vontade de interagir com algum material.
• Necessidade de refletir sobre algum trabalho em andamento.
• Necessidade de ter uma produção coerente e continuada.
O que eu faço quando chego no ateliê?
• Arrumo o ambiente.
• Coleciono e organizo instrumentos de desenho, pintura e outros:
lápis, pinceis, bastões, goivas, ferramentas (chaves de fenda, cerras, martelos,
pregos).
• Coleciono e organizo materiais. Esses materiais coletados, comprados ou me são
doados: papéis brancos dos mais variados tipos, papel cartaz, papel vegetal, papel
manteiga, papelão, papel celofane, pedaços de embalagens e de outras peças
gráficas (folders, livros, revistas), pedaços de madeira, lâminas de madeira, material
de escritório (envelopes, grampos, presilhas, fitas adesivas, carimbos, colas),
plásticos, velas, gomas, tintas, sprays, pigmentos em pó.
• Organizo e olho outros desenhos.
• Procuro alguma sensação que venha do material:
Presto atenção em suas qualidades físicas: textura, padrão, temperatura,
composição, toque, cor, formato, dimensões, rigidez, maleabilidade, resistência.
• Tento perceber se o material me traz alguma emoção em relação a alguma
experiência passada: lembrança dos móveis da casa de meus avós, lembrança de
algum procedimento de desenho que fiz na infância, lembrança de alguma vivência
anterior com materiais de escritório, por exemplo.
• Presto atenção em alguma ação própria desse material: grudar, fixar, escorrer,
tingir, sobrepor, transparecer, suportar força, suportar intempéries etc.
138
• Presto atenção se esses materiais me dizem algo em relação ao seu caráter: sutil,
delicado, denso, agressivo, rígido, austero, impreciso, irregular, sinuoso, afetivo,
quente, neutro, imparcial, provocante, assustador, apaixonante etc
• Crio grupos que relacionem os materiais por alguma qualidade em comum, alguma
qualidade complementar a outra, ou por contraste de qualidades:
Ex: duas maneiras de cores e padrões diferentes, um papel e uma madeira de cores
complementares, o grafite em pó, denso e opaco, com o papel celofane, leve e
transparente.
• disponho esses materiais espalhados no ateliê, agrupados.
• Procuro em pastas e arquivos por outros desenhos e estudos já realizados.
• agrupo esses desenhos aos materiais tendo em vista novamente qualidades em
comum, complementares ou contrastantes. Por exemplo: o conjunto de um desenho
saturado por linhas negras, rápidas, irregulares que sangrem a página em relação à
uma matriz de mimeografo onde sobraram resquícios da exposição à luz que
formam linhas muito suaves
• Procuro alguma emoção que sirva de começo e dê força pra minha interação. Às
vezes essa emoção está latente em mim e é decorrência de algum acontecimento
vivido. Em outras vezes me deixo contaminar por alguma emoção gerada por algum
desenho antigo ou por algum material. Exemplo: raiva, incômodo, ganância,
passividade, soberba, bem estar, mal estar, leveza, opressão, vingança, amor.
• Procuro algum conceito de arte, filosofia, design ou ciência que eu tenha estudado
e que tenha alguma relação com o que percebo dos materiais e com as emoções
que suscitam. Ex: repetição, seriação, modularidade, a linha como elemento
modular, abstração, mímesis, ambiente de exposição, cinética, composição química,
esboço e obra, ser um autor, ser um artista, contemporaneidade, multiplicidade,
incerteza, imprecisão, vulgaridade, sagrado, profano.
• Manipulo os materiais ou objetos e presto atenção nos efeitos que essa
manipulação gera. Exemplo: descasco, dobro, vinco, rasgo, amasso, desgasto,
sobreponho, justaponho, grudo, colo, molho, seco, viro, ponho do avesso.
• Interajo com os materiais usando algum instrumento: risco com grafite, arranho
com goivas e chaves de fenda, serro, prego, pinto etc.
• Se a primeira ação é muito observada.
139
• Quando se integra ao “espírito” daquele desenho, mas parece incompleta, ela
poderá ser repetida. Ex: preencher uma determinada superfície de riscos feitos com
régua.
• Quando se integra, mas parece ter chegado ao final, induz à uma ação
complementar: Pintar de branco determinada superfície de um pedaço de madeira e
depois fazer riscos que sobreponham a mancha de tinta e a madeira não pintada.
• Quando não se integra ela induz a uma ação de contraponto ou apagamento: ex:
sobrepor um conjunto de riscos com tinta semitransparente ou totalmente opaca ou
retirar determinada mancha de tinta raspando-a, ou arrancar partes do papel que
contenha algum elemento.
• Quando não consigo uma harmonização da composição e uma relação dessa
composição com a emoção que move as ações, o desenho é abandonado e passa a
integrar uma coleção de desenhos e materiais, para que possa ser revisto e utilizado
posteriormente.
Como geralmente procedo?
• Desenho com os gestos
• Repito gestos
• Risco a mão livre
• Risco com régua
• Risco leve / forte
• Risco longo / curto
• Risco me flexionando (braços, joelhos, coluna)
• Risco caminhando
• Saturo
• Sobreponho
• Justaponho
• Amasso
• Colo
• Arranco
• Descasco
• Quebro
• Corto
• Rasgo
140
• Arranho
• Pinto por cima com tinta
• Apago
• Escondo total ou parcialmente
• Sobreponho algo translúcido (papel, plástico ou tinta)
• Uso cola com grafite em pó, misturado ou borrifado
• Uso goma laca com grafite em pó
• Faço muitos desenhos
• Uso fitas adesivas
• Isso depende da idéia que o material suscitou. Geralmente o material induz alguma
idéia mais elaborada (ex. cobrir um pedaço de papel com riscos verticais). Ou induz
a alguma ação. Fazer um rico curvo ou uma mancha de tinta. Essas ações
configuram lançamentos.
• Trabalhar com linhas que provêm de gestos do corpo. Trabalhar a modularidade e
a repetição da linha. Borrar a fronteira que distingue desenhos de objetos. Fazer
desenhos com a proporção de pessoas etc.
• Em alguns casos executo essa primeira ação às segas. Repito a primeira ação
quando acho que se adequou bem ao material ou à idéia.
• Desenho na vertical, na parede ou em tábuas, em mesas ou no chão.
• Paro e olho em intervalos variados (horas ou dias)
• Olho a forma e a relação dela com o material
• Tento ver se integram e por onde podem se integrar
• Tento ver se a relação entre gesto e material será de integração ou oposição.
• Formulo outra ação e executo.
• Paro novamente.
• Sigo fazendo isso até que haja uma crise ou que chego em algum resultado
satisfatório.
• Abandono o desenho e repito isso em outro suporte.
• Paro quando estou cansado fisicamente ou mentalmente.
• Volto ao ateliê
• Reorganizo
• Exponho os trabalhos
• Crio grupos de trabalhos
• Isolo outros trabalhos
141
• Tenho novas idéias de interação
• Prossigo algum desenho ou começo outro.
• Faço linhas que se cruzam e geram intervalos vazios entre elas. Geram estruturas
que deixam incerto o que é risco e o que é suporte.
• Faço grandes linhas que ocupam alguma direção do papel.
• Risco com réguas várias linhas de ângulos levemente diferentes
• Risco a mão livre várias linhas com ondulações levemente diferentes
• Risco com a barra deitada
• Altero a inclinação da barra enquanto risco
• Oponho gestos curtos a gestos longos
• Penso na relação das linhas com o suporte e componho colocando-as em relação
a esse suporte, próximo da borda, sangrando a borda, mais centralizada ou
centralizada, em diagonal.
• Crio manchas de tinta ou de grafite diluído em cola ou goma
• Risco por cima dessas manchas
• Derramo goma no papel e borrifo grafite em pó
• Retiro material, desgastando.
• Arranco partes de suporte: Ex: lascas de madeira ou pedaços de papel
• risco com grafite sobre papel vegetal
• colo fitas adesivas
• retiro partes do desenho nas fitas (de grafite e, em às vezes do papel) e guardo ou
recoloco. Pode ser no mesmo desenho ou em outro.
142
Porque começo um projeto gráfico?
• Porque tenho uma encomenda.
• Para vender meu trabalho de designer e ser remunerado.
• Para criar um objeto gráfico para o cliente: logotipo, livro, revista, impresso
promocional, impresso educativo ou site.
O que levo em consideração?
• A necessidade do cliente de atingir um objetivo: ter um site que sirva para alguma
função, ter um livro com projeto gráfico interessante, ter um impresso que siga sua
identidade visual, ter uma identidade visual.
• O perfil do cliente e de seu público alvo.
Se é grande ou pequeno, envolvido com cultura, com produção de bens ou com
prestação de serviços.
• Se tem identidade visual e como ela funciona.
• Se é atual, se é bem definida, se tem um desenho harmônico.
• Se tem cores bem definidas, que cores são previstas.
• Que sensação determinado projeto gráfico tem que passar.
• Que conceito.
• Que emoção.
3) Como faço um projeto gráfico?
• Imprimo textos
• Importo todas para a página de algum software gráfico, reduzidas, e as imprimo
• Imprimo cronogramas
• Imprimo manuais de aplicação de logos
• Imprimo dados técnicos e de orçamento
• Imprimo o breafing
• Estudo esses documentos
• Coloco a mostra todos os objetos que recebi daquele cliente.
Fotos, cromos, outras peças gráficas feitas pelo cliente, outras peças gráficas que o
cliente tenha colecionado, amostras de material.
• Presto muita atenção em tudo isso, depois deixo isso por algum tempo, que pode
variar de um a vários dias.
143
• Tento relacionar fotos a cores, e a temas contidos nos textos, seguindo ou não as
indicações do cliente.
• Quando retorno. Releio os documentos. E revejo as referências.
• Procuro em minha coleção de referências, peças gráficas de outros designers,
peças feitas por mim para outros clientes, objetos, fotos, desenhos, papéis, imagens
bitmap e fontes, algo que tenha relação com o que percebi dos materiais analisados.
• Procuro por formatos e processos de impressão, tipos de fonte e maneiras de usá-
las, maneiras de usar fundos de cor e texturas, relação de materiais.
• Procuro sentir alguma sensação de tudo isso. Procuro ser tocado por algum
elemento. Procuro pontos que me chamem mais a atenção. Procuro um detalhe, um
elemento de uma foto, alguma palavra que me remeta uma forma ou cor ou gesto,
alguma cor.
• Procuro ser tocado no sentido de ter alguma sensação que remeta a ritmo: veloz,
estático, fluido, pausado. Isso geralmente se refere ao ritmo da leitura.
• Procuro qualidades que remetam ao caráter: rígido, suave, delicado, austero, culto,
alegre, formal, agitado ou calmo, transparente, subentendido, simples ou complexo.
• Pelas características do projeto, escolho um software para trabalhar. No caso de
um livro, um software paginador, para um trabalho com mais desenhos ou
elementos traçados, um software de ilustração vetorial, e para criar ou editar alguma
imagem bitmap, um software bitmap.
• Como o indesign é um software paginador que tem várias ferramentas de desenho
vetorial e importa e faz algumas edições simples em bitmaps, como torna-los
translúcidos ou inserir uma sombra, geralmente trabalho mais com ele integrado ao
Photoshop.
• Defino o formato do arquivo ou sigo alguma indicação do cliente. Formato das
páginas e número de páginas.
• Coloco páginas extras e importo nelas todas as fotos e textos para o arquivo. Às
vezes importo isso no desktop do software (área livre, que não pertence as páginas
e que não é impressa.
• Crio conjuntos de fotos, ilustrações, informações textuais e tento, página a página
organiza-las em um primeiro lançamento de conposição
• Crio esses conjuntos levando em conta o temas, o formato, a composição
bidimencional, as cores, elementos em comum, como as pessoas, a arquitetura, o
espaço físico, e as proporções entre esses elementos.
144
• Se existe similaridade na proporção (entre pessoas, por exemplo)
• Tento colocar as fotos na ordem em que aparecem no texto
Isolo as imagens menos expressivas ou com composição menos harmônica.
• Escolho uma fonte em minha seleção pessoal ou analiso as fontes do cliente.
• Escolho um corpo para a fonte que seja legível, o menor possível. E vejo se o texto
entra no formato.
• Construo um grid que comporte essas informações.
• Tento ter uma primeira visão do todo do projeto
• Abandono o projeto por horas ou dias.
• Quando retorno, tento ver quais conjuntos de elementos que criei tem coerência
entre si e com os outros conjuntos.
• Mantenho alguns conjuntos e desfaço outros.
• Reagrupo em conjuntos os elementos que foram separados.
• Isolo alguns elementos em uma “quarentena” e desisto de outros.
• Procedo com aprimoramentos da composição:
Ajustar formatos e corte de fotos, ajustar o posicionamento dos textos, elementos
gráficos, ilustrações cores de fundo e padrões.
• Analiso se a leitura está clara ou se é ambígua. Tento perceber se a ambigüidade
no entendimento de alguma informação pode ser construtiva, induzindo algum outro
significado que pode ser útil.
145
5.2 Apêndice 2: Questionários
1. Que relação ou contribuição existe entre sua produção em desenho e
sua produção em design gráfico?
Elifas Andreato
Fiz para a editora Globo duas coleções de sucesso. A primeira foi MPB
Compositores composta de 40 fascículos e 40 cds. A Segunda foi a História do
Samba no mesmo formato. E Há 10 anos edito o Almanaque Brasil de Cultura
Popular com 150 mil exemplares distribuídos nos vôos da Tam. Considero todo este
trabalho a minha produção em design gráfico. Pois não há como realizar trabalhos
desta natureza sem as novas tecnologias.
Fábio Zimbres
Muitas vezes meu design se relaciona diretamente com minha produção em
desenho pq é um design aplicado sobre minha própria produção: cartazes para o
projeto NaTábua, peças para a editora Tonto. Nesse caso há uma simbiose porque
o design pode se moldar a ilustração e não um determinar o outro. Mais que isso a
composição resultante é mais próxima do meu repertório pessoal porque o que
essas peças pedem é uma assinatura pessoal, uma liguagem mais intuitiva e
próxima do meu jeito de criar. E também sou livre para quebrar qualquer regra
porque sou meu próprio cliente e qualquer falha na comunicação é compensada
pela expressividade que a peça final apresenta o que é um jogo que nem todo
cliente pode absorver.
Outro aspecto de ter uma atividade de desenho que corre paralelo ao trabalho de
design é que eu não sinta a necessidade de a todo momento ficar tentando me
'expressar' através do design, muitas vezes, me contento com a boa organização do
espaço e com a criação de uma 'voz' própria ao cliente e que não seja
necessariamente a minha. Quer dizer, não estou buscando um design 'autoral' como
chamam, as vezes. Já acho suficiente criar uma expressividade que sirva aos
outros.
146
Guilherme Dable
Acredito que a minha produção nas duas áreas não tenha muitas semelhanças,
mas as referências que me alimentam visual e conceitualmente partem de ambos os
campos, e aí elas se cruzam. Há trabalhos de design que vejo e me influenciam, de
alguma forma, no meu desenho, assim como trabalhos de arte que podem servir
como ponto de partida, de alguma forma, para um trabalho em design gráfico.
Guto Lacaz
Desenho desde criança. No ginásio aprendi desenho artístico, geométrico e
desenho técnico. Com colegas fazíamos o jornal da classe com cartuns de situações
escolares. Na faculdade de arquitetura fui tomar consciência do desenho como
instrumento de expressão pessoal e de projeto. Na faculdade aprendi comunicação
visual (hoje design gráfico) e desenho industrial. Vi que poderia seguir muitos
caminhos tendo o desenho como instrumento. Tive mais oportunidades com o
desenho gráfico que com o de arquitetura. Os desenhos se misturam. Vejo nos
estudos que faço a caneta sobre sulfite ou manteiga que se estou resolvendo uma
marca pode aparecer uma solução para um objeto para o qual também procurava
uma solução. Acho que para imaginação o desenho é um só. E se manifesta de
formas diferentes de acordo como produto em questão.
Nunca pensei que viveria do desenho. Que comeria, me vestiria, compraria
carro e casa, que ele me seria tão generoso e fiel. Seu poder de registrar o olhar e o
que a imaginação nos presenteia. Seu poder de estimular o auto-conhecimento,
gerando conflitos e soluções. Revelador de idéias, captador de vibrações e criador
de realidades paralelas. Com instrumental rudimentar - lápis e papel - ele se
manifesta. Registra trajetórias, define formas, mostra ponto a ponto uma imagem
que se revela.
James Zoertea
Muitos dos meus trabalhos em design gráfico valem-se da digitalização de
rabiscos, borrões e desgates de experiências sobre superfícies analógicas (folhas de
papel, lâminas de acetato, fotografias rasuradas ou quimiografias), esse material
"contaminado" impregna o grid asséptico dos softwares gráficos e trás provocações
para a construção do layout.
147
Compreendo o desenho fundamentalmente como vestígio de um movimento.
Esse rastro de um fluxo pode evidenciar-se em duas condições principais: a
primeira, é a condição do desenho como indício de uma ação do corpo, o gesto do
artista ancorado na experimentação sensível da matéria, um processo do devir
permeado intensamente pelo acaso; a segunda é a articulação do fluxo do
pensamento que o desenho possibilita através de projeções que ordenem e
evidenciem esse percurso/fluxograma das idéias.
No entanto, esclareço que, em meu processo artístico ou de criação gráfica, por
mais que haja momentos em que prevaleça uma das instâncias (ora a
experimentação, ora a ordenação) não se pode dissociar ambas na ação do
desenho. As coisas parecem borradas quando se está imerso no trabalho.
Joaquim da Fonseca
Minha formação acadêmica e profissional foi no campo das artes plásticas, o
que me conduziu a usar o desenho como forma de expressão. Comecei minha
atividade profissional como designer gráfico numa época em que o desenho era o
principal meio de expressão visual. Quando foram ocorrendo outros recursos
introduzidos pela tecnologia, como a fotografia, a fotocomposição, depois a
computação gráfica, acompanhei essa evolução sempre usando o desenho como
característica, ou diferencial, dos trabalhos que fui produzindo, adaptando-o a essas
inovações.
Francisco Baldini
Sou um desenhista compulsivo e tenho a tendência a esboçar meus projetos de
design em garatujas rápidas compreensíveis apenas por mim. Quase nunca chego
ao resultado final do design através dela mas organizo a casa.
Carla Pilla
Dependendo do projeto, pode envolver um, o outro ou ambos. Normalmente o
projeto tem um enfoque: por exemplo, se vou fazer um livro infantil, o enfoque são
as ilustrações. Nesse caso, penso no projeto gráfico do livro a partir das ilustrações:
como valorizá-las e ao mesmo tempo montar visualmente o livro. Em alguns casos,
148
não tenho o controle sobre o projeto gráfico, apenas entrego a ilustração para que
seja utilizada por outro profissional ou empresa em determinado job. E existem
projetos com enfoque no design, em que posso ter liberdade para decidir se seria
interessante ou não utilizar uma ilustração para enriquecer e complementar o
design. Caso seja, planejo a ilustração pensando no contexto ou peça gráfica.
2. Que importância você atribui à tecnologia nessas produções?
Fábio Zimbres
O computador facilitou o trabalho que antigamente eu tentava fazer com os
fotolitos, dentro da oficina, fazendo fotos e raspando os acetatos. Além disso
aumentou a precisão dos próprios processos de impressão.
Por outro lado acostumou mal os clientes que só pedem trabalho pra ontem. E
também favoreceu minha falta de disciplina pq agora eu parto do zero até chegar a
umas 5 soluções razoáveis qdo antes eu tinha que me concentrar para produzir a
melhor solução e apenas isso.
De fato a tecnologia, como sempre acontece, muda sua maneira de trabalhar. E
dado que a tecnologia sempre vai fazer parte do fazer humano, cabe a nós
aceitarmos esse fato mas ao mesmo tempo assumirmos nossa capacidade de
manejá-la e controlá-la. Ou seja, tão interessante qto estar atualizado com relação
ao que há de mais avançado, é recusar seu uso e reprogramar as tecnologias
obsoletas. Compreender e usar novas tecnologias traz uma possibilidade de re-olhar
o mundo mas deixar de usá-las não é menos instigante.
É só uma questão de usar a tecnologia para colocar sua mente num lugar onde vc
pode trabalhar.
Guilherme Dable
A tecnologia facilita muita coisa na minha produção em design. O trabalho é
mais ágil, certamente. No desenho, a tecnologia me ajuda na facilidade de registrar
os trabalhos em processo e, de posse desses documentos do processo, refletir
149
sobre minha produção. No design, me utilizo bastante de possibilidades do
photoshop para construir imagens. Meu trabalho não teria a mesma cara sem a
interface digital.
Guto Lacaz
Sem tecnologia não tem trabalho – só idéia. Vivenciei a passagem da mão para
o mouse.
James Zortea
No meu processo de criação gráfico, a tecnologia é a ferramenta que possibilita
a passagem da matéria analógica para codificação digital. Como me interesso pelos
comportamentos dos resíduos no desenho, os scanners e máquinas fotográficas
digitais são aparatos importantes para a captação das minhas ações sobre a
matéria. Num segundo instante, após a digitalização dos resíduos, os softwares
gráficos são o campo de experimentação compositiva, nele arrasto camadas digitais
para projetar uma saída gráfica.
Elifas Andreato
Só consigo pensar na prancheta com papéis e lápis. O computador é uma
valiosa ferramenta, mas é apenas isso. Sou essencialmente um desenhista que
prefere o manuseio de tintas sobre telas ou papéis. O Computador ajuda a corrigir
possíveis imperfeições de cada trabalho e os insere no design dos produtos para os
quais foram produzidos.
Mario Cafieiro
A tecnologia possibilita a expansão do design a todas as mídias atuais. As
vezes desenho e faço scanner para redesenhar e personalizar o traço
Joaquim da Fonseca
Maior importância. É claro que tive de me adaptar às inovações que foram
aparecendo, até mesmo tendo que mudar a metodologia dos projetos, que
passaram a exigir novos conceitos e processos na execução dos trabalhos.
150
Carla Pilla
Considero a tecnologia uma ótima ferramenta para fazer mais rápido
determinadas etapas do design e da ilustração: pesquisar, testar por exemplo cores
e tonalidades, montar a arte final com um acabamento satisfatório. Mas o
fundamental para o desenho e o design, que é a criação, independe da tecnologia.
Francisco Baldini
No design para web é imprescindível. é ela que move transporta e transforma
em velocidade avassaladora todas as informações, interações e mudanças, nos
tornando escravos de próteses mentais.
3. Você faz estudos e desenhos à mão antes de partir para o computador?
De que maneira isso ocorre?
Fábio Zimbres
Não há regra. Às vezes um esquema é importante antes de começar pq as
coisas ficam mais concretas depois de um desenho e um pequeno estudo ainda é
mais eficiente que partir diretamente pra máquina. Mas muitas vezes começar pela
máquina é parecido com a maneira que eu começava um projeto de arte-final, medir
e cortar o papel, fixar na prancheta, fazer linhas de margem etc, isso era uma coisa
que eu fazia qdo projetava pq já me ajudava a me concentrar no material físico que
eu tinha a disposição e na mpáquina dá pra fazer a mesma coisa sendo que não há
a necessidade de cortar outro papel e começar tudo de novo quando alguma
alteração de trajeto surge pelo caminho. O desenho serve pra destravar também
quando chegamos num ponto de estagnação no projeto. Claro que é possível
divagar no computador, pode-se usar sistemas no computador em busca de algo
aleatório ou inesperado mas depois de um tempo seu repertório vai ficando meio
repetitivo e sair disso e brincar com algo diferente vai mudar sua perspectiva e o
desenho é uma ferramenta que serve pra isso, mudar sua maneira de ver.
151
Guilherme Dable
Sim. O desenho é, para mim, a ferramenta mais rápida para cristalizar uma
idéia, um ponto de partida, um conceito. Minha organização básica de pensamento
em um projeto passa por desenhar no papel as idéias. Geralmente, são desenhos
pequenos, para apreender as idéias. Daí, a idéia escolhida pode se desenvolver em
uma interface digital.
Guto Lacaz
Em geral desenho no sulfite e redesenho no manteiga antes de ir para tela.
Para alguma coisas a mão ainda é mais rápida e expressiva. Mas, às vezes vou
ditreto para a tela quando a solução é tipográfica. Tudo o que faço passa pelo
desenho: ilustrações, gravuras, objetos, instalações, performances, etc.
Tudo é desenhado. Do informal croqui ao técnico - com os instrumentos de
geometria. Gosto de voltar a rever desenhos. Assim valorizo idéias que passaram
despercebidas. Acho que uma pessoa só pode dizer que viu uma coisa, depois de
tê-la desenhado.
James Zortea
Não realizo estudos para "antever" uma saída gráfica, mas coleciono resíduos
e rasuras que podem constituir a visualidade de um projeto gráfico.
Elifas Andreato
Só consigo pensar na prancheta com papéis e lápis. O computador é uma
valiosa ferramenta, mas é apenas isso. Sou essencialmente um desenhista que
prefere o manuseio de tintas sobre telas ou papéis. O Computador ajuda a corrigir
possíveis imperfeições de cada trabalho e os insere no design dos produtos para os
quais foram produzidos.
Mario Cafieiro
Às vezes desenho e faço scanner para redesenhar e personalizar o traço
152
Joaquim da Fonseca
Sempre faço estudos preliminares com desenhos, na forma de esboços ou
croquis, antes de usar o computador. Nesses estudos, posso prever e planejar as
idéias, a composição espacial, os valores de sombra e de cores com antecedência,
o que me ajuda a selecionar as melhores alternativas e facilita e torna mais rápida a
execução final no computador.
Carla Pilla
Sim, quase sempre. Mesmo quando o produto final é digital, como por exemplo
um desenho vetorial ou o design de um site, a idéia se materializa à mão livre no
papel, e depois é aperfeiçoada no computador.
Francisco Baldini
Vide primeira resposta.
4. Você considera que desenha com o computador? De que maneira isso
acontece?
Fábio Zimbres
Sim, meu desenho funciona a base de adição, uma coisa se soma a outra num
processo meio infantil de blocos que vão se armando até criar um todo. No
computador posso usar o mesmo sistema, partir de elementos simples e ir somando
eles aos poucos num processo intuitivo. O computador tb facilita a colagem e a
transparência que é um recurso que usava antes do computador, com xerox e
acetatos. Posso partir do zero no computador da mesma maneira que parto do zero
com um papel em branco, inclusive com a cabeça a zero, sem nenhuma expectativa
ou objetivo.
Guilherme Dable
Certamente. Campos de cor, texto, enquadramento de uma fotografia, tudo isso
é pensado como um desenho.
153
Guto Lacaz
Desenho com a caneta sobre papel, scaneio e aplico cores (desenhos para
Caros Amigos p/exp.). E com o mouse sobre a tela (quando é um logo/marca que
precisa de uma precisão geométrica )
James Zortea
Quando utilizo uma caneta digital para inscrever algo, sim, certamente estou
desenhando. Ao corrigir contrastes e saturações de uma imagem não compreendo
esse processo como desenho. Logo, creio que existam diversas inteligências em
ação ao utilizar um software gráfico, por exemplo, o campo digital possibilita efetuar
fusões de dois momentos do desenho: a experimentação (fluxo do aqui/agora, o
fazer) e a projeção (deslocamento para o futuro e o passado, o conceber do
gesto).
Mario Cafieiro
Sempre procurei uma simplicidade no desenho e o computador em atende
nestas questões.
Joaquim da Fonseca
Bem, depende do tipo de trabalho. Muitas vezes faço um ou mais desenhos ou
ilustrações à mão que, depois de passarem pelo scanner, podem ser trabalhados,
ou coloridos, num programa gráfico ou editorial. Outras vezes, o desenho pode ser
realizado no próprio computador com os recursos de um programa gráfico, tal como
o Freehand, Photoshop ou InDesign, os programas que mais utilizo. Veja, por
exemplo, no site www.joaquimdafonseca.com.br, a capa do livro "Engenharia
Simultânea", de John P. Hartley (Editora Bookman, Porto Alegre): o desenho foi
realizado inteiramente com os recursos gráficos do programa PageMaker, que, diga-
se de passagem, eram bastante limitados.
Carla Pilla
Depende do que for chamado de desenho. A idéia costuma surgir em
lápis/caneta sobre papel, e dependendo do objetivo final (um desenho
mais manual ou mais vetorial), em algum momento do processo passo ao
154
computador. Em alguns casos redesenho no computador o que esbocei à
mão livre, ou mesmo redesenho sobre uma foto. Isso pode ser chamado de
desenho, mas não envolve criação e sim execução.
Francisco Baldini
Desenho sim com o computador, mas não tenho a mesma intimidade nem
simbiose. o computador fica para o trabalho mais acético. a parte passional é toda
analógica, salvo em algum experimento interativo ou q envolva animação ou vídeo.
5. Dê sua contribuição espontânea sobre o tema dessa pesquisa.
Fábio Zimbres
Estamos falando de design, mas meu design mais pessoal é o que se mistura
com meu desenho e trabalho de ilustrador e segue regras parecidas com as do
desenho: vou adicionando coisas e movendo blocos pra lá e pra tendo em mente
apenas a criação de movimento, instabilidade, diversão etc. É quase uma coisa só.
Meu trabalho muitas vezes é uma apropriação pelo desenho de técnicas do design
gráfico, é uma releitura de livros e embalagens e produtos industriais já que é um
trabalho que se alimenta das imagens geradas pelo comércio e comunicação de
massa. Então é natural que os dois se misturem e a fronteira entre os dois fique
indeterminada.
O design evolui a partir da produção em série e da otimização dos recursos
industriais e atingiu um momento em que ele está integrado com um processo de
comunicação e de produção industrial onde as interfaces são praticamente
individualizadas parece natural que aconteça as duas coisas: ferramentas de design
sejam ensinadas na escola, assim como o desenho, não com o objetivo de formar
designers mas para tornar cada um consciente das possibilidades de criação de
interfaces no dia-a-dia e e que o design se aproprie de outras áreas de criação para
que possa caminhar junto com a criação de uma imaginário pessoal. Porque o
design já deixou de estar restrito a processos industriais.
155
Guto Lacaz
Acho que no texto que te indiquei estará minha contribuição para sua pesquisa.
Trata-se de um livro org pela Edith Derdick com textos de vários colegas – ed.
SENAC.
O desenho foi meu primeiro amor e amigo inseparável de todos os momentos.
Tristeza, melancolia, solidão, alegria, passatempo, lá estava ele para compartilhar
comigo. Adorava ver desenhos impressos em revistas e jornais. Os livros tinham que
ter desenhos. Adorava ver meu vizinho Ruy Pedreira desenhar. Ele desenhava o
que pedíamos. Com caneta-tinteiro, direto, sem errar! Colecionava seus desenhos e
- claro! - queria desenhar como ele. Como todas aquelas formas poderiam surgir da
ponta de uma caneta? Que mágica era aquela? Seria possível dominá-la? Sempre
desenhei. Desde criança, na adolescência, depois na faculdade e, hoje em dia, mais
e mais. Sempre invejei os que desenhavam melhor que eu, os mais virtuosos, ou os
que tinham um desenho muito diferente do meu. Nunca pensei que viveria do
desenho. Que comeria, me vestiria, compraria carro e casa, que ele me seria tão
generoso e fiel. Seu poder de registrar o olhar e o que a imaginação nos presenteia.
Seu poder de estimular o auto-conhecimento, gerando conflitos e soluções.
Revelador de idéias, captador de vibrações e criador de realidades paralelas.
Com instrumental rudimentar - lápis e papel - ele se manifesta. Registra
trajetórias, define formas, mostra ponto a ponto uma imagem que se revela. Já
desenhei com quase tudo. Nos tempos de faculdade, com lápis HB, B, 2B ... 8B e
muito com as canetas tipo Oxford. Criadas para desenho técnico, apresentam um
traço uniforme. Depois, observando desenhistas como Saul Steinberg, Jaguar e
outros, experimentei as penas, que dão grande variedade de espessuras de traço e
expressão. Daí fui para o pincel e o nanquim, onde o acidente traz muitas surpresas
agradáveis. Hoje desenho com caneta-tinteiro Pelikan ponta média e tinta Parker
preta. Às vezes penso em algo e desenho para registrar e depois desenvolver a
idéia. Muitas vezes desenho sem pensar e as formas vão aparecendo do nada,
como se estivesse psicografando. De muitos garranchos surge sempre alguma luz,
uma boa surpresa, uma série, uma história. A mão leva e é levada. Se desloca,
pára, muda de direção, o olho julga ... É um bom desenho? Comecei desenhando
cartuns. Adorava copiar revistas. Depois aprendi geometria e desenho técnico -
156
comecei a desenhar objetos. Depois estudei arquitetura, na qual o desenho é a
linguagem. Aprendi o desenho como instrumento para projetar. Aprendi cinema de
animação. O desenho se prestava a todo tipo de raciocínio, representava todo tipo
de idéia.
Hoje, vivo de desenho. Ora para atender clientes de ilustração e desenho
gráfico, criando marcas, revistas, livros, cartazes, ora para realizar projetos de artes
plásticas. Gosto de folhas soltas de papel sulfite. São baratas, portanto não
intimidam. Tudo o que faço passa pelo desenho: ilustrações, gravuras, objetos,
instalações, performances, etc. Tudo é desenhado. Do informal croqui ao técnico -
com os instrumentos de geometria. Gosto de voltar a rever desenhos. Assim valorizo
idéias que passaram despercebidas. Acho que uma pessoa só pode dizer que viu
uma coisa, depois de tê-la desenhado. Estou aqui fazendo este louvor ao desenho,
mas preciso dizer que desenho enlouquece. Produz raiva, ódio mortal, sensação
desagradável de incapacidade, mostra seus limites.
Mario Cafieiro
Com muita honra, e um pouco atrasado vou responder a seu e-mail do dia 3 de
junho. Como artista e na correria paulista não pude responder antes. Neste mês,
agosto, completo 57 anos. Comecei a trabalhar com 15 anos, sempre em artes
gráficas, Revista Melodias (a revista da mocidade), editora Prelúdio.
Nesta editora ainda se trabalhava com linotipadoras, clichês e tipos manuais.
Fizemos as primeiras fotonovelas com artistas brasileiros. Eu montava as fotos e
aprendi a letrerar os diálogos em baloons. Também desenhava algumas notas sobre
artistas (caricaturas). Havia um super-desenhista, Sergio Lima. Ele desenhava a
lápis, historias infantis (Simaozinho) e adultas (Juvencio, o justiceiro do sertão) e eu
finalizava com nanquim (bico-de-pena e pincel). Era importantíssimo fazer o fino e
grosso com o pincel. Os recursos avançados da época eram muito precários. Para
se obter uma boa impressão, ainda em tricromia, fazíamos o traço em preto e a
colorização no verso, através de mesa de luz. Eu era muito virtuoso e também fazia
plantas de decoração para uma loja na Mooca, meu bairro, (Ming moveis e
decorações).
157
Em 1970 fui para a editora Abril. Trabalhei na revista Claudia como assistente
de arte sob a direção de Atilio Baschera e Lu Rodrigues. O parque gráfico da editora
Abril era o que existia de mais moderno em impressão no Brasil. Fazíamos um
trabalho super-artesanal, tudo feito a mão, pre-paste-up, paste-up, se prismavam as
fotos. Os cantos arredondados eram feitos com o gabarito circular ou compasso.
Chegou a Letraset, maravilha para criar títulos. Desenhei vinhetas de culinária, de
moda e comportamento, Foi a minha melhor escola em termos de artes gráficas.
Muito irrequieto, fui para a divisão de Educação da editora Abril. Participei de
Salões de Arte no Rio de Janeiro (premio aquisição no MAM, salão de verão 1972),
exposições no Rio e em SP. Foi um período particularmente muito rico. Participei de
projetos de alfabetização e fascículos universitários e desenhei vários livros de
literatura. E com o Luiz Raul Machado, desenhei o primeiro livro infantil (João
Teimoso), Já era chefe de arte, quando fui convidado a voltar para a revista Claudia,
como chefe de arte.
Papai sempre trabalhou em gráfica, era um excelente impressor, ele me
incentivou muito a continuar trabalhando e desenvolvendo o dom de desenhar Foi
ele quem me levou aos estúdios da RCA Victor, futura rede Globo, para ter
orientação artística e ser encaminhado profissionalmente para a Editora Prelúdio.
Estudava no período noturno e trabalhava. Com a ida para a editora Abril, os fre-
lances pintando, foi uma boa desculpa para interromper os estudos, pois já tinha
uma profissão: desenhista. Conhecer o mundo era o meu sonho. Queria conhecer a
Alemanha, tentei sem sucesso ir para os USA, visto negado, até África do Sul e
Austrália, foram imaginados. Sentia que mesmo com um cargo respeitado na revista
as limitações eram grandes. Com economia, feita de muito trabalho, aventurei-me
viajar para Europa, destino Londres. A ditadura perseguia solta aqui no Brasil,
tempos sombrios. Com uma reserva para ficar 1 ano, não mais, cheguei a cidade
mais vanguardista da época. Tudo foi encantamento. Os museus, galerias , parques,
livrarias, lojas, feiras, e acima de tudo a liberdade, tudo foi demais!!! Passados seis
meses, decidi ficar. Preparei alguns trabalhos, pedi a família que mandassem
algumas revistas em que havia trabalhado e montei um portifólio. Apresentei-me
numa agencia de empregos e fui encaminhado para uma editora que estava se
mudando para a cidade. Fui selecionado e contratado como sub-diretor de arte de
158
uma revista, onde fazia a parte latino-americana (Vision Magazine), com Marylin
Hoffner, uma badalada diretora de arte americana. Quando Marylin voltou para NY,
assumi a direção de arte da revista. O desafio de trabalhar fora do Brasil aconteceu.
Conheci artistas internacionais que colaboravam nas edições e nunca parei de
desenhar, fiz ate caricaturas políticas para não deixar o habito. Comecei a viajar pela
Europa, a conhecer o mundo. Os museus as igrejas tudo que havia de arte fui atrás.
Ilustrei um livro em Portugal e comecei a receber textos do Brasil que me inspiravam
muito. Pensando em voltar para o Brasil depois de dois anos, ainda fiz uma parada
de oito meses em Paris.
Já de volta ao Brasil fui convidado a trabalhar na editora Ática, Com Ary
Normanha, mudamos a cara do livro didático no Brasil. Só de pensar que um
estudante carrega o ano inteiro o material didático, no mínimo esse material tem que
ser legal. Criamos uma coleção para didática, que foi um best-seller: Para Gostar de
Ler. Este trabalho me gratificou de uma foram inesquecível.
Fomos os precursores de livros que contavam a vida dos autores na intimidade.
Jamais esquecerei a cena com Carlos Drumond de Andrade e eu sentados no chão
de sua casa selecionando as fotos de álbuns de fotos de seu acervo particular. E
assim foi com o grande Rubem Braga, Fernado Sabino e Paulo Mendes Campos.
Na Ática, montei um atelier de arte onde pude experimentar todos os recursos
possíveis e imagináveis. Muita capa de livro foi feita a óleo, tapeçaria, objetos
tridimensionais etc.
Depois de sete anos de Ática, resolvi dar um tempo solo. Montei um estúdio
continuei fazendo ilustrações, catálogos, livros, decoração e murais. Um convite
para voltar a dirigir uma publicação de moda seduziu-me, a ponto de voltar em 1985
para a Abril. Com Costanza Pascolato e Fernado de Barros, fizemos o Jornal de
Claudia Moda, que futuramente viraria a revista Claudia Moda. Foi tb uma
experiência única. Mesmo sem ter acesso aos computadores, criamos movimentos
gráficos ate hoje explorados nas revistas.
Fui diretor de arte de revistas de bordo, Icaro e Transbrasil. No final dos anos
1980,comprei o primeiro Macintosh (eu, Guto Lacaz e Walter Ono). Fomos os
159
pioneiros, aqui em Sampa. Por sugestão do Guto Lacaz, colaborei com a folha de
São Paulo para a coluna de Joyce Pascowitch por vários anos e fiz tb capas do
caderno Ilustrada, uma delas (Multiculturalismo), premiada pelo Clube de Criação de
SP. Familiarizei-me com o computador criando ilustrações utilizando o meu traço.
Desenvolvi uma exposição com curadoria de Guto Lacaz, AS Cantoras do Radio,
1992, utilizando recursos do computador nas imagens que fizeram parte do meu
primeiro trabalho na revista Melodias. Parece-me que os trabalhos também se
fecham em ciclos. Que bom poder reler os trabalhos de outrora. Assim foi e esta
sendo com os desenhos que criei quando jovem. O João Teimoso esta sendo
animado, agora. Por desenhar agora vetorialmente, facilita o processo de animação
em Flash. Muitos desenhos, por mim criados, viraram peças de design em corte a
laser, em metal, em MDF e etc. Transformei alguns desenhos feito para o livro
Raipid Departures, de Vincent Katz, em recortes de alumínio e foram expostos em
Roma, na Galeria de arte Alessandra Bonomo. Com muita satisfação, pois e poesia
pura, ilustrei vários livros de Bartolomeu Campos de Queiros, (Coração não Toma
Sol, Menino de Belem, Diario de Classe etc.).
Hoje, existem faculdades de Design, Design Gráfico, Web, Moda... Tempos
novos e eu, autodidata, (ignorante por conta própria, segundo Mario Quintana) fico
feliz em participar desta historia.
Cultivo um sonho, talvez quem sabe ainda participe de um grande projeto
didático de uma forma virtual, já que o futuro acena com computadores nas escolas.
Vou adorar. Tenho feito projetos corporativos para empresas e sei que a ferramenta
é poderosa. Precisamos implantar isso nas escolas brasileiras. Para não ficarmos
defasados e poder criar um trabalho de raízes e não enlatados.
Agradeço a oportunidade de expressar-me sobre a profissão, pois de repente o
tempo passou tão rápido que estamos no século XXI. Muito obrigado, Gabriel
Gimmler Netto e Prof. Dra. Evelise Anicet.
160
Joaquim da Fonceca
Sendo um entusiasta do desenho, sempre encorajo e aconselho meus alunos a
praticarem o desenho como forma de expressão. Penso que o computador é um
instrumento fantástico e indispensável para o design gráfico, porém é o designer que
tem de determinar o seu comportamento, e não o inverso.
Carla Pilla
Acredito que a facilidade da tecnologia, para alguém despreparado, pode dar a
ilusão de que a criação se resume à técnica e induzir a que o artista pule etapas
fundamentais. Existem ótimos designers que utilizam o computador sem a etapa do
desenho como planejamento de sua criação; mas muitos outros se empolgam com
as possibilidades dos softwares e criam materiais sem planejamento, sem sentido.
Acredito que saber esboçar uma idéia no papel é como aprender a pintar com
tintas ou cores reais: se o artista domina a mistura das cores na paleta e no papel,
pode usar a paleta virtual de cores do Photoshop com a segurança de quem sabe o
que está fazendo.
Francisco Baldini
De uma forma geral me incomoda o fato de estarmos constantemente
tecnologicemente obsoletos. Haja saúde mental para não ficar paranóico. Não existe
nada mais libertador do que misturar tintas, dar riscos enormes, pintar áreas
grandes, ou ficar equilibrando pequenos pontos com cor ou forma!
161
6. GLOSSÁRIO
Assemblage: técnica ou estratégia compositiva baseada no princípio que todo e
qualquer material pode ser incorporado a uma obra de arte, criando um novo
conjunto sem que esta perca o seu sentido original. É uma junção de elementos em
um conjunto maior, onde sempre é possível identificar que cada peça é compatível e
considerado obra.
Bricolagem: é a união de vários elementos para formação de um único e
individualizado objeto.
Briefing: conjunto de informações passadas em uma reunião para o
desenvolvimento de um trabalho, sendo muito utilizadas em Administração,
Relações Públicas, na Publicidade e Design. O briefing deve criar um roteiro de ação
para criar a solução que o cliente procura, é como mapear o problema, e com estas
pistas, ter idéias para criar soluções.
Cartoon: é um desenho humorístico acompanhado ou não de legenda, de caráter
extremamente crítico retratando de uma forma bastante sintetizada algo que envolve
o dia-a-dia de uma sociedade.
CMYK: Cyan, magenta, yelow, black (ou ciano, magenta, amarelo e preto). Sistema
de composição de cores subtrativas primárias usadas na impressão de policromias.
Quando pontos dessas cores são combinados em diferentes densidades, obtêm-se
uma grande variação de cores.
DPI: Dots per inch (pontos por pelegada). Medida da resolução de uma imagem
impressa ou na tela de vídeo, descreve seu grau de definição - quanto mais pontos,
maior a definição. Define a resolução de saída de impressoras e fotocopiadoras, a
resolução de vídeo em monitores e de captação de imagem em scanners.
Dripping: Técnica de pintura que se caracteriza por deixar cair pingos de tinta sobre
uma tela.
162
Filme de poliéster: biaxialmente-orientado de poli(tereftalato de etileno) (boPET) é
utilizado por sua alta resistência tênsil, estabilidade química e dimensional,
transparência, propriedades para bloquear gases e odores, e isolamento elétrico.
Fotocomposição: é a composição tipográfica feita por projeção de caracteres sobre
papel (ou película de filme) fotossensível.
Folder: é o nome que é utilizado no Brasil para designar um tipo de impresso
publicitário com dobras. É utilizado quando se quer passar uma grande quantidade
de informações, ou então quando se faz necessário dar uma aparência estética a
alguma mensagem publicitária. Dependendo do tamanho do papel é possível fazer
um grande número de dobras.
Fotolito: é um filme transparente feito de acetato. Uma imagem colorida é dividida
em quatro cores básicas CMYK gerando quatro fotolitos por imagem, um para cada
cor. Para imagens em preto-e-branco, como textos ou logos simples, é necessário
gravar apenas um fotolito. É gravado por processo óptico a laser numa máquina
imagesetter.
Frotage: técnica de desenho na qual um papel é colocado sobre qualquer suporte
áspero, como pedaços de madeira ou pedra, e tratado com lápis ou crayon até
adquirir a qualidade superficial da substância abaixo.
Hachura: Técnica usada em desenho e gravura que consiste em traçar linhas finas
e paralelas, retas ou curvas, muito próximas umas das outras, criando um efeito de
sombra ou meio-tom.
Infográficos: são representações visuais de informação. Esses gráficos são usados
onde a informação precisa ser explicada de forma mais dinâmica, como em mapas,
jornalismo e manuais técnicos, educativos ou científicos. É um recurso muitas vezes
complexo, podendo se utilizar da combinação de fotografia, desenho e texto.
JPG: Joint Photographic Experts Group. Formato de aruqivo digital. Termo que se
refere a padrão de compactação, com perda, próprio para imagens estáticas, que
retira algumas informações durante a compactação.
163
Letra-set: letras adesivas e transferíveis.
Mock-ups: simulação da peça gráfica, muitas vezes construída de forma artesanal.
Off-set: A impressão off-set (no Brasil chamado também de ofset) é um processo
plano gráfico cuja essência consiste em repulsão entre água e gordura (tinta
gordurosa). O nome off-set - fora do lugar - vem do fato da impressão ser indireta,
ou seja, a tinta passa por um cilindro intermediário, antes de atingir a superfície. Este
método tornou-se principal na impressão de grandes tiragens.
Protótipo: é um produto que ainda não foi comercializado, mas está em fase de
testes ou de planejamento.
Prova digital: página impressa, fora de escala industrial, para identificação de erros
e eventual correção, ou alteração, anteriormente à impressão final.
Ready-made: o ready-made nomeia a principal estratégia de fazer artístico do
artista Marcel Duchamp. Essa estratégia refere-se ao uso de objetos industrializados
no âmbito da arte, desprezando noções comuns à arte histórica como estilo ou
manufatura do objeto de arte, e referindo sua produção primariamente à idéia.
Escolhe produtos industriais, realizados com finalidade prática e não artística (urinol
de louça, pá, roda de bicicleta), e os eleva à categoria de obra de arte.
Retículas: é um nome genérico da técnica de finalização artística que consiste em
imprimir, por decalque, texturas sobre o papel. Uma folha de retícula é composta por
uma camada flexível e transparente que contém a textura impressa. A folha de
retícula é colocada sobre o papel, com a textura para baixo e ao ser esfregada com
o lado cego de uma lâmina transfere a textura para o papel.
RGB: Red, Green, Blue (vermelho, verde e azul). Sistema de cores aditivas
primárias, utilizado pelos monitores de vídeo dos computadores e televisões.
Tablet gráfico: mesa digitalizadora, no Brasil e em Portugal. É um dispositivo
periférico de computador que permite a alguém desenhar imagens diretamente no
computador, geralmente através de um software de tratamento de imagem. Tabletes
164
gráficos consistem de uma superfície plana sobre a qual o utilizador pode desenhar
uma imagem usando um dispositivo semelhante a uma caneta, denominado stylus.
A imagem geralmente não aparece no tablete propriamente dito, mas é exibida na
tela do computador.
165
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