Download PDF
ads:
CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE MINAS GERAIS
DEPARTAMENTO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA
ELIVANE AMARAL DE SOUZA ASSIS
A MAIÊUTICA E A ERÍSTICA NO ENSINO DE GRADUAÇÃO EM
CIÊNCIA E TECNOLOGIA
BELO HORIZONTE – MINAS GERAIS
2009
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
ELIVANE AMARAL DE SOUZA ASSIS
A MAIÊUTICA E A ERÍSTICA NO ENSINO DE GRADUAÇÃO EM
CIÊNCIA E TECNOLOGIA
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em
Educação Tecnológica do Centro Federal de
Educação Tecnológica de Minas Gerais como
requisito básico para obtenção do título de mestre.
Orientador: Dr. Fábio Wellington Orlando da Silva
BELO HORIZONTE – MINAS GERAIS
2009
ads:
ELIVANE AMARAL DE SOUZA ASSIS
A MAIÊUTICA E A ERÍSTICA NO ENSINO DE GRADUAÇÃO EM
CIÊNCIA E TECNOLOGIA
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação Tecnológica do
Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais CEFET-MG, em
____/____/2009, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em
Educação Tecnológica, aprovada pela Banca Examinadora constituída pelos
professores:
___________________________________________________________
Prof. Dr. Fábio Wellington Orlando da Silva – CEFET-MG – Orientador
___________________________________________________________
Prof. Dr. ................................................................................... – Instituição
___________________________________________________________
Prof. Dr. ................................................................................... – Instituição
___________________________________________________________
Prof. Dr. ................................................................................... – Instituição
DEDICATÓRIA
Ao meu pai, Raimundo de Souza, nascido
filósofo e astrônomo, fonte de inspiração e exemplo
de vida para mim;
À minha mãe, Lenita Amaral de Souza (in
memorian), com quem aprendi persistência,
determinação, superação de desafios e
amorosidade;
E aos meus filhos, Bruno Amaral Assis e
Diana Amaral Assis, para os quais também
gostaria de deixar fontes de inspiração, pois eles
sempre me incentivaram e apoiaram em minha
trajetória acadêmica e em suas implicações em
nosso cotidiano, com respeito, afeto, compreensão e
companheirismo.
AGRADECIMENTOS
À vida e às suas oportunidades de crescimento.
À minha família, pelo respeito, amor, companheirismo, generosidade,
compreensão, apoio, incentivo, celebração, espírito investigativo, bom humor e
graça.
À Santuza Abras que me incentivou e apoiou com alegria e entusiasmo,
fortalecendo-me, principalmente nos momentos mais difíceis, alimentando minha
confiança para realizar o meu propósito.
Ao Prof. Dr. Fábio Wellington Orlando da Silva por me dar um voto de
confiança, ao me aceitar como sua orientanda e me desafiar com uma proposta de
pesquisa em epistemologia que resultou neste trabalho.
Aos professores da FaE/CBH/UEMG e aos professores do CEFET/MG que
contribuíram, com sua ajuda para execução da parte empírica deste trabalho.
Aos alunos da FaE/CBH/UEMG e do CEFET/MG que participaram, com
curiosidade e compromisso da parte empírica deste trabalho.
Aos mestres que, na minha trajetória escolar, ensinaram-me a refletir, ter
curiosidade e acreditar em uma forma de ensinar e educar de modo criativo e
dinâmico.
Aos colegas, à direção da FaE/CBH/UEMG, à Universidade do Estado de
Minas Gerais, à FAPEMIG, pela oportunidade de tornar essa pesquisa realidade.
Ao professor Jerônimo Coura Sobrinho, pela leitura e apreciação do primeiro
projeto deste trabalho.
Ao Professor Vicente Parreiras pela disponibilidade em ler o abstract deste
trabalho.
Aos meus colegas do FICITEC, nosso grupo de estudo, pelas trocas de
informações, de conhecimentos, de apoio e de companheirismo.
À Soraia Cardoso, Heloisa de Azevedo Branco, Marisa Andrade Chaves,
Cláudia Eliza das Graças, David José Tierro, Profª. Maria Aparecida Silva, Josué
Lopes, Geraldo F. C. A. de Lima, pela amizade entusiasmo com que sempre se
referiram a esta pesquisa.
Aos professores, coordenadores e funcionários do Mestrado em Educação
Tecnológica, pela alegre e desafiadora convivência e ao Colegiado do Conselho de
Pesquisa e Pos Graduação, pela oportunidade.
Ao Secretário do Mestrado, Fábio Vasconcelos, sempre gentil,
compromissado e competente no atendimento a todos, indistintamente.
Aos autores que deixaram suas valiosas contribuições sobre as quais pude
refletir e ressignificar conhecimentos.
O que não conheces em teu próprio corpo,
Não conhecerás em nenhum outro lugar.
Merleau Ponty
Que canção que fale de mim posso cantar
apenas com palavras que levem
o encanto além da melodia?
A maravilha que encontro
na vida a meu redor
não tem explicação.
E tudo o que toco e vejo
afeta a minha sensibilidade.
Facilmente... sublimo a
minha consciência, até estar
cheia de energia; e a luz
e a sombra do sol são minhas.
Não preencho a minha cabeça
com pensamentos cheios de ansiedade,
já segurei o desespero nas mãos e
segurarei de novo.
Aqui e agora, a minha alegria
existe, está viva.
Preciso do ritmo do tempo
para usá-la.
Sabendo que o cuidado
é permitido,
ele não pode ser poupado
para o meu
amanhã.
Rosalie Andrews
RESUMO
Este estudo investiga como os diálogos socráticos e os estratagemas de
Schopenhauer podem ajudar professores e alunos a perceber argumentos
enganosos, capciosos, a desenvolver pensamento crítico e compreender o processo
de desenvolvimento da ciência como uma estrutura rica e dinâmica. Procurou-
se mostrar que também a Erística pode ser usada como forma de preparação para
entender o processo de pesquisa e do discurso científico, a detecção de falhas de
pensamento, e não apenas como uma arte de disputar. A pesquisa teve como
informantes alunos de ciências exatas e de ciências humanas. Foram realizados
estudos exploratórios para a coleta de dados e aprofundamento posterior do
trabalho. Os resultados desses estudos exploratórios, realizados em novembro e
dezembro de 2008, propiciaram elementos para elaboração do Estudo de Caso.
Utilizando-se o todo de Estudo de Caso, foi ministrado um curso aos alunos da
área de ciências exatas, no período de março a abril de 2009, com carga horária
total de 8 horas/aula, divididas em quatro módulos de 2 horas/aula cada. Concluiu-
se que basta dar a oportunidade aos alunos, pois eles estão prontos e motivados
para um ensino reflexivo, relacionado com a prática. Concluiu-se também que
ciências exatas e ciências humanas são campos complementares e que o ensino de
ciência e tecnologia pode se tornar mais produtivo, interessante, rico, dinâmico e
criativo, indicando possibilidades de desenvolvimento de um tecnohumanismo que
traga contribuições promissoras para a sociedade humana contemporânea.
Palavras chave: Maiêutica, Erística, estratagemas, ciência, tecnologia, diálogos
socráticos, falácias, dialética.
ABSTRACT
This study is an investigation of how the Socratic dialogues and the
Schopenhauer’s stratagems can help teachers and students to see deceiving, and
misleading arguments and to develop a critical thinking as well as understand the
process of science development as a rich and dynamic structure. It is also argued
that the eristic can be used as a way to prepare to understand the research
process and scientific discourse; it is a way to notice thinking failures, and not only
as the art of dispute. The research included students from the exact and human
sciences in an exploratory study as an approach for data collecting and analysis. In
November and December of 2008, the results of these studies provided elements to
elaborate a case study. Using the case study methodology, an eight-hour class was
administered to the students of exact sciences during March and April of 2009. The
conclusion was that if students are given the opportunity, they will be ready and
motivated for a more reflexive teaching and more related to the practice. It also
showed that exact and human sciences complement each other, so the teaching of
science and technology can be more productive, creative, rich, interesting and
dynamic; with possibilities to develop a tecnohumanism that can bring promising
contributions to the contemporary human society.
Key words: Maieutics, Eristic, stratagems, science, technology,
Socratic dialogues, fallacies, dialectic.
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Motivação para ir à palestra .............................................................
61
Gráfico 2 - Argumentos apresentados pelo autor...............................................
62
Gráfico 3 - Concorda ou discorda com as idéias do autor..................................
63
Gráfico 4 - Motivação para ir à palestra .............................................................
64
Gráfico 5 - Argumentos apresentados pelo autor...............................................
65
Gráfico 6 - Concorda ou discorda com as idéias do autor..................................
66
Gráfico 7 - Texto 1 - 23/03/09.............................................................................
68
Gráfico 8 - Texto 1 - 01/04/09.............................................................................
69
Gráfico 9 - Texto 2 - 23/03/09.............................................................................
71
Gráfico 10 - Texto 3 - 01/04/09...........................................................................
72
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................5
2 Dialética socrática e dialética erística de Schopenhauer...................................10
3 O LUGAR DO DEBATE NO ENSINO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA...............30
4 METODOLOGIA................................................................................................47
4.1 Delineamento experimental...............................................................................47
4.2 Coleta de dados.................................................................................................52
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO.........................................................................59
5.1 Entrevista com os professores de biologia ........................................................59
5.2 Análise dos questionários aplicados na turma de Ciências Exatas...................61
5.3 Análise dos questionários aplicados na turma de Ciências Humanas...............64
5.4 Curso: a erística e a falácia no discurso pseudocientífico .................................67
6 CONCLUSÃO....................................................................................................79
7 REFERÊNCIAS .................................................................................................82
8 APÊNDICES......................................................................................................84
9 ANEXOS............................................................................................................88
10 ÍNDICE REMISSIVO..........................................................................................92
5
1 INTRODUÇÃO
Quem se dedica à filosofia põe-se à procura do homem, escuta o que ele
diz, observa o que ele faz e se interessa por sua palavra e ação, desejoso
de partilhar, com seus concidadãos, do destino comum da humanidade.
(Karl Jaspers).
O objetivo desta pesquisa é investigar uma possível contribuição da dialética
socrática e da dialética erística de Schopenhauer ao ensino de ciências, ajudando
professores e alunos a perceberem argumentos enganosos ou capciosos, a
desenvolverem o pensamento crítico e a compreenderem o processo de
desenvolvimento da ciência como uma estrutura rica e dinâmica, e não apenas
cálculos e resultados apresentados de modo descontextualizado do processo de
pesquisa. Aprendendo a reconhecer regras de inferência, aprende-se a raciocinar a
partir da premissa até à conclusão, desenvolvendo o pensamento gico dedutivo e
indutivo, tão necessários nos processos de pesquisa.
quem afirme que viu vários candidatos, a professor de física chegarem
à sua classe com um conhecimento limitado da natureza da ciência. Isso não
surpreende, pois no modelo de ensino atual utilizam-se livros que exibem as
conclusões do trabalho e os conceitos científicos prontos, deixando de fora as
discussões ocorridas ao longo do processo, o contexto, as motivações, as
reviravoltas, os erros e as decisões que explicam como o cientista chegou àquela
conclusão. Isso também deveria ser ensinado aos candidatos a professores,
preparando-os para educar de forma eficaz seus alunos, com maior
desenvolvimento do pensamento crítico, da percepção e compreensão do processo
de pesquisa no ensino de física (1, p. 1).
uma tendência atual de reaproximação entre história, filosofia e ensino de
ciências, desencadeada pela largamente documentada crise do ensino de ciências.
A inclusão de história e filosofia da ciência em vários currículos nacionais como, por
exemplo, na Inglaterra, na Holanda e em outros países, poderia tornar as aulas de
ciência mais desafiadoras e reflexivas, permitindo, desse modo, a superação da
“falta de significação” e contribuindo para o desenvolvimento do pensamento crítico
(2, p. 2).
6
Melhorar a formação do professor é fundamental, é importante auxiliar o
desenvolvimento do ensino de uma epistemologia da ciência, mais rica e mais
autêntica, que permita a compreensão da estrutura das ciências bem como do
espaço que ocupam no sistema intelectual. Conferências internacionais, artigos e
livros publicados, a partir de 1989, mostram o interesse cada vez maior por essa
temática.
Em muitas pesquisas realizadas no Brasil e nos EUA, diversos pesquisadores
como Carl Wenning, Mathews e Dascal vêm encorajando seus alunos a conduzir
“diálogos socráticos” e sugerem, em seus artigos, que professores de ciência
também o façam.
Os alunos sempre estão envolvidos nas discussões em sala de aula, mas
geralmente respondem e não fazem perguntas apropriadas. Por isso, os
professores deveriam desenvolver nos estudantes “a disposição e habilidade” para
fazer perguntas adequadas. Além disso, os professores têm a vantagem de saber o
que é questionamento convergente e questionamento divergente (1, p. 4).
As discussões podem ser divididas, basicamente, em duas classes,
dependendo dos objetivos e expectativas dos participantes: as discussões
persuasivas, em que os participantes são motivados a encontrar um acordo; e as
discussões adversárias, em que nenhum dos participantes espera persuadir ou ser
persuadido; pois pretendem continuar adversários e apresentam seus argumentos
com o objetivo de fazer o seu lado parecer bom, e o do oponente ruim. No primeiro
caso, poder-se-ia incluir o debate científico de bom nível, um trabalho colaborativo
em que se busca construir um discurso comum e coerente acerca da natureza (3, p.
1). O estudo da Maiêutica (Dialética Socrática) tem sido estimulado como um
instrumento para desenvolver essa habilidade.
No segundo caso, tudo o que importa é triunfar sobre o adversário. Para
ganhar uma discussão com sucesso, sua posição deve ser apresentada como se
fosse lógica e racional e, ao mesmo tempo, mostrar a do oponente como ilógica e
irracional. Neste trabalho são apresentadas diversas formas falaciosas de
inferências na argumentação usual que foram descritas por Schopenhauer (4) em
sua Erística, e hoje também são de uso corrente na mídia.
A Dialética Socrática é otodo desenvolvido por Sócrates (5), filósofo grego
do século V a.C. (470-399 a.C.), que inaugura o chamado período antropológico da
filosofia grega. Sócrates fazia uma analogia entre o trabalho de sua mãe e o seu; ele
7
dizia que ela era parteira e trazia ao mundo crianças e ele trazia ao mundo idéias,
por meio do diálogo como modo de parturição de idéias. Isso significa que ele
ensinava aos indivíduos, por meio do diálogo, a arte de raciocinar de modo
adequado, fazendo-lhes perguntas, estabelecendo relações entre idéias, para
chegar a conclusões, a soluções. A finalidade da maiêutica é de natureza ética e
educativa. Ela pode ser dividida em três momentos, segundo alguns autores: a)
ironia; b) refutação; c) maiêutica.
A ironia é o ponto de partida em que Sócrates utiliza-se de argumentação ou
estratagemas para testar a veracidade, a coerência e o conhecimento de seu
oponente; ela tem um caráter formal no método socrático.
A refutação das idéias do interlocutor tem a função de fazê-lo reconhecer as
falhas do próprio pensamento, sua ignorância, para em seguida encaminhá-lo para a
descoberta da verdade. Purificado do erro, o interlocutor é conduzido à etapa
seguinte.
A maiêutica é uma investigação na qual o interrogado busca, dentro de si
mesmo, a verdade, através da coerência lógica.
A interrogação verdadeira do verdadeiro mestre é, na realidade, um método
de ensino e de instrução, mas de uma instrução ativa que se exerce sem que o
pareça, como estímulo, guia e sugestão disfarçada (5, p. 59).
Percebe-se a maestria de Sócrates ao conduzir o interlocutor, através de
perguntas e argumentos, da simples opinião ao desenvolvimento do pensamento
crítico que lhe permite descobrir um saber que traz em si mesmo.
Sócrates representa, na história das concepções filosóficas do homem, no
ocidente, a inflexão decisiva que orienta até hoje o pensamento antropológico. Na
visão socrática, “o humano” tem sentido e explicação quando referido a uma
dimensão de interioridade presente em cada homem, a psyché ou alma. Esse
conceito passará a influenciar toda a cultura ocidental, aliada ao conceito de areté
(virtude). A partir desses conceitos Sócrates introduziu a idéia de personalidade
moral, sobre a qual irão assentar-se os princípios da ética e dos direitos ocidentais
(6, p. 33).
Sócrates desenvolve o conceito de logos (razão, teoria) como inerente ao
homem, o que permitirá que a relação dialógica torne-se essencial nas relações
humanas e é um conceito importante, discutido pela filosofia e pela ciência, através
da história, fundamental nos debates filosóficos e científicos da contemporaneidade.
8
O mesmo vale para o conceito de ética e da sua utilização nas produções
científicas e tecnológicas e sua contribuição sócio-histórico-cultural ainda se reflete
nos debates acalorados em defesa ou contra os benefícios e os malefícios da
ciência e da tecnologia.
A Erística foi desenvolvida pelo filósofo Schopenhauer (1788-1860), na qual
ele apresenta 38 estratagemas que podem ser estudados, compreendidos e
utilizados para reconhecer e desmontar as artimanhas do debate capcioso, aquele
que quer, apenas, confundir e desmoralizar o adversário.
A Erística de Schopenhauer estuda essencialmente a argumentação
desonesta, diferentemente de Aristóteles a quem faz várias referências. Para
Aristóteles, a dialética serve, também, secundariamente, para o treinamento escolar
e os debates públicos, mas Aristóteles advertia que não se deve dialetizar com
quem não conhece o assunto e as regras da argumentação válida, ou seja: quando
praticada a dois é um exercício do qual “só podem participar as pessoas informadas
e honestas, dispostas a encontrar a verdade e abandonar, no curso da disputa, as
opiniões que se revelem inconsistentes” (7, p. 55) objetivo análogo ao da
maiêutica socrática.
Esta pesquisa admite como ponto de partida o seguinte:
[...] para muitos adultos, a experiência de se admirar e refletir nunca
exerceu nenhuma influência sobre suas vidas. Assim, esses adultos
deixaram de questionar e de buscar significados de sua experiência e,
finalmente [...] a proibição de se admirar e questionar se transmite de
geração para geração [...] a filosofia é uma disciplina que inclui a lógica e,
portanto, se ocupa em introduzir os critérios de excelência no processo do
pensar para que os estudantes possam caminhar do simples pensar para o
pensar bem (8, p. 214).
A parte empírica da pesquisa investigou os tipos de argumentos inválidos que
os alunos pesquisados são capazes de perceber no discurso científico. São alunos
de graduação em ciências humanas e em ciências exatas de duas escolas públicas
do município de Belo Horizonte. Partiu-se da hipótese de que eles não
compreendem regras mais elaboradas do pensamento analítico e da dialética. Esse
quadro poderia ser modificado pelo ensino da Dialética Socrática e da Dialética
Erística com finalidade ética e educativa, levando-os a reconhecer argumentos
falaciosos do discurso pseudocientífico, contribuindo para sua formação cnica e
científica de modo crítico. Isto porque um exercício contínuo e profícuo da dialética,
como aqui proposto, poderia contribuir para um ensino de ciência e tecnologia de
9
modo significativo. Essa suposição foi corroborada pela pesquisa empírica, na qual
estudantes revelaram um desenvolvimento significativo do seu pensamento crítico e
reconheceram argumentos falaciosos que antes lhes passava despercebidos.
É importante lembrar que a cultura é o resultado do pensar e do agir humano,
do seu fazer: suas práticas, suas teorias, suas instituições, seus valores materiais e
espirituais. Esse fazer é coletivo e toma sentido pela linguagem e pelo diálogo
estabelecido a partir da linguagem. O homem tem necessidade de se expressar, de
se comunicar, e o faz através de diversos sistemas semióticos e pela faculdade da
linguagem.
Ciência e tecnologia são criações humanas; pseudociência, também. A
tecnologia, que é a técnica enriquecida pelo saber científico, modificou o habitat
humano e, provavelmente, continuará a fazê-lo. Contudo, muita ambigüidade
nessas criações. Por isso é fundamental que esse fazer seja acompanhado de
reflexões sobre o próprio sujeito e o seu fazer, sobre as conseqüências desse fazer.
É fundamental que o ensino de ciência e tecnologia seja nutrido por reflexões
sobre a responsabilidade social dos cientistas e pela compreensão, por parte dos
professores e estudantes, das implicações desse fazer e também do processo como
ele se dá como pesquisa e como construção social.
A filosofia da ciência e da tecnologia tem um compromisso com a
investigação dos fins e das prioridades a que a ciência se propõe e com a
compreensão do processo de pesquisa e investigação científica e suas
conseqüências sociais. Por isso, filósofos da Escola de Frankfurt, por exemplo,
criticaram mitos da ciência (ou pseudociência?) e alertaram para o fato de que,
mesmo sendo produto da racionalidade humana, podem produzir efeitos irracionais
perversos.
Por isto é importante melhorar o ensino de ciência e tecnologia com o
desenvolvimento da reflexão que o pensamento dialético proporciona.
10
2 Dialética socrática e dialética erística de Schopenhauer
“A vida que não é examinada o vale a pena ser vivida”
(Sócrates)
“O tempo da vida humana não passa de um ponto, e a substância é um
fluxo, e suas perceões embotadas, e a composão do corpo
corruptível, e a alma um redemoinho, a sorte inescrutável, e a fama algo
sem sentido. O que então, pode guiar o homem? Somente uma coisa, a
filosofia.”
(Marco Aurélio)
Nas citações em epígrafe vê-se que a filosofia propunha à humanidade não
apenas um modo, mas uma arte de viver. Contudo, a filosofia moderna aparece,
em diversas experiências acamicas, apresentada com uma linguagem cnica
fora do alcance de compreensão dos estudantes. Os filósofos sempre usaram a
argumentação. Na tradição européia, por exemplo, em-se desdobramentos, os
quais serão abordados neste catulo. Questiona-se, aqui, o ensino (ou o não-
ensino) de filosofia com linguagemcnica específica, altamente abstrata, que
estudantes não conseguem compreender; percebe-se que isso os induz à
desmotivação em relação ao estudo da filosofia, de modo geral. Por isto, autores
com Lipman (13) propõem adequação dos textos didáticos, aliados à prática da
argumentação socrática como modo de desenvolver atitude crítica.
Por este motivo faz-se necessário resgatar a importância da filosofia e,
sobretudo, da filosofia da ciência e tecnologia do ponto de vista do pensar bem, de
saber utilizar-se de argumentações apropriadas para a comunicação com o outro e
consigo mesmo.
Neste capítulo, pretende-se mostrar os fatos mais relevantes desse assunto,
de modo que constitua um contexto para a aplicação das idéias apresentadas a
seguir, tanto do ponto de vista teórico quanto dos resultados experimentais
apresentados nos capítulos Resultados e Discussão.
Uma contribuição fundamental que Sócrates deixou para a posteridade foi o
seu método: a maiêutica, que setratada a seguir.
O filósofo grego crates (470-399 a.C.) inaugura o chamado “período
antropológico” da filosofia grega, uma vez que ele volta o foco da filosofia para o
próprio sujeito, a necessidade de conhecer-se. Ele visa desenvolver nas pessoas a
consciência crítica, por meio de diálogos. Como ele nada escreveu, seus dlogos
11
o retratados por um de seus discípulos, Platão (428-347 a.C.), e também por
Xenofonte. Sócrates foi considerado, por alguns de seus contemporâneos
(sobretudo políticos), como um elemento desestabilizador; a causa disso era sua
insistência em fazer perguntas consideradas “embaraçosas”. Por meio de suas
perguntas, ele acabava levando o interlocutor a perceber sua própria ignorância ou
a inconsistência de seus argumentos e, entre esses, alguns eram homens
importantes e poderosos da cidade de Atenas daquela época.
crates procurava o cririo de verdade no homem e o fora dele, por
meio de seu todo, denominado Dialética Socrática. Nesse todo de
investigão, ele jamais fornecia a resposta pronta, as soluções. Ele se limitava a
fazer perguntas, como recurso para levar seu interlocutor a ser estimulado a
raciocinar de modo adequado, induzindo-o à análise para que, assim estimulado,
encontrasse a verdade dentro de si mesmo.
Entre os diversos diálogos de Platão, figura o Teeteto (9, p. 52-56: 149a-
151c), no qual ele demonstra o método socrático, tendo como tema do diálogo a
questão filosófica: o que é conhecimento? O problema posto é o seguinte: no que
consiste o trabalho do filósofo? Qual é o processo de investigação mais adequado
para alcançar a verdade? A tese: por meio de uma comparação lebre, entre o
trabalho de uma parteira e o de um filósofo, Sócrates sustenta que a tarefa do
bio não é propor afirmações verdadeiras, mas favorecer o nascimento da
verdade na alma do interlocutor. Eis um trecho desse famoso diálogo:
CRATES
oh, meu amigo! Nunca ouviste dizer que sou filho de uma
parteira muito competente e forte, Fenarete?
TEETETO
sim, ouvi dizer.
CRATES
e não ouviste dizer que exerço a mesma arte?
TEETETO
o, nunca!
CRATES
sabes, eno, que é assim. Porém, não vás dizer aos
outros. Eles o sabem, caro amigo, que eu possuo essa arte e, como não
sabem, não a mencionam quando falam de mim, mas dizem, sim, que sou
o mais extravagante dos homens e que faço semear dúvidas. Também
isso ouviste dizer, não é verdade?
TEETETO
sim
CRATES
e queres saber o motivo?
TEETETO
sim, de bom grado.
CRATES
procura entender como é esse ofício de parteira e
compreendes mais facilmente o que quero dizer. Sabes que nenhuma
mulher, enquanto tiver condões de conceber e gerar, pode ser parteira
de outras mulheres, mas somente aquelas que não podem mais gerar.
TEETETO
é certo.
12
CRATES
Dizem que isso se deve a Artemisa, que foi destinada a
proteger os partos, mesmo sendo virgem. Ela o permitiu que mulheres
estéreis fossem parteiras, por ser a natureza humana muito fraca para
exercer uma arte da qual o teve experiência; reservou então esse ofício
às mulheres que o podiam mais gerar por causa da idade, honrando
desse modo a semelhaa que tinham com ela.
TEETETO
É natural.
CRATES
E não é igualmente natural que as parteiras saibam
reconhecer, melhor do que ningm, se uma mulher es grávida ou não?
TEETETO
Certamente.
CRATES
E não são as parteiras que, ministrando remédios ou
praticando magias, podem provocar as dores ou atenuá-las, se assim
quiserem, e facilitar o parto daquelas que estão em dificuldade, e a fazer
abortar, se necessário, quando o feto ainda é imaturo?
TEETETO
É verdade.
CRATES
E nunca observaste que elas tamm são muito hábeis em
arranjar casamentos, experientes que são em conhecer que homem e que
mulher devem unir-se para gerar filhos melhores?
TEETETO
o, isso eu não sabia.
CRATES
Então saibas que elas se orgulham mais dessa habilidade
do que do corte do cordão umbilical. Pense um pouco: julgas que
envolvam a mesma arte ou artes diferentes recolher com cuidado os frutos
da terra e saber reconhecer em que terra a planta deve ser plantada e a
semente semeada?
TEETETO
A mesma arte, creio.
CRATES
É esse, portanto, o grande ofício das parteiras, embora
menor do que o meu. Com efeito, às mulheres não acontece ora dar à luz
fantasmas, ora seres reais, sem que se possa distingui-los: porque, se
isso ocorresse, o mais importante e belo ofício das parteiras seria o de
distinguir o verdadeiro do não-verdadeiro,o te parece?
TEETETO
Sim, assim me parece.
CRATES
Ora, a minha arte de obstetra assemelha-se em tudo à das
parteiras, da qual difere por ser exercida sobre os homens, e não sobre as
mulheres, e por cuidar das almas parturientes, e não dos corpos. E a sua
maior qualidade é que por meio dela consigo discernir se a alma de um
jovem à luz um fantasma e uma mentira ou algo de vital e verdadeiro. E
tendo isso em comum com as parteiras, também sou estéril... de
sabedoria. É verdadeiro o que muitos censuram em mim, de questionar os
outros, sem nunca me pronunciar sobre nada, por ser ignorante.
E assim procedo justamente porque o deus me força a ser parteiro,
mas impediu-me de gerar. Portanto, nada tenho de sábio e tampouco
trouxe à luz qualquer descoberta genial gerada pela minha alma.
Entretanto, se entre aqueles que apreciam estar em minha companhia,
alguns, de início, parecem totalmente ignorantes, convivendo comigo
alcançam, se o deus assim permitir, extraordinário resultado: como podem
ver eles mesmos e os outros.
É evidente que de mim o aprenderam nada e que somente em si
mesmos encontraram as inúmeras coisas belas que geraram; mas ajudá-
los a gerar, este sim, é mérito do deus e meu. E eis a prova. Muitos,
desconhecendo essa contribuição, acreditavam que o mérito era
exclusivamente deles e me olhavam com certo desprezo; um dia, antes da
hora, afastaram-se de mim, seja por vontade própria, sejam instigados por
outros; e, distantes de mim, pelo resto do tempo o fizeram mais do que
abortar os resultados dos maus acasalamentos em que se envolveram,
destruindo também, por defeituoso desmame, tudo aquilo que gras à
minha ajuda deram à luz, dando maior valor às mentiras e aos fantasmas
13
do que à verdade; e acabaram por se mostrar ignorantes a si mesmos e
aos outros.
Existem aqueles que depois voltam a invocar minha companhia e para
recuperá-la fazem coisas estranhíssimas; e o denio que vive em mim
me impede de aceitar alguns e me permite aceitar outros; e estes, como
antes, fazem bom proveito. Ora, aqueles que convivem comigo padecem
como as parturientes: por sentirem as dores do parto, e por estarem
cheios de inquietação, dia e noite, muito mais do que as mulheres. E a
minha arte tem o poder de, ao mesmo tempo, provocar e acalmar as suas
dores. É assim que acontece com eles.
Porém, existem outros, Teeteto, que não me parecem prenhes; e,
reconhecendo que não dizer, que com a ajuda do deus, consigo
facilmente encontrar-lhes a companhia de que possam beneficiar-se. E foi
assim que fiz com que muitos se unissem a Pródico, e muitos com outros
homens sábios e divinos. Pois bem, meu excelente amigo, se me alonguei
nessa história é porque suspeito que tu, como tu mesmo sabes, estejas
prenhe e sintas as dores do parto. Entrega-te, pois, a mim, que sou filho
de parteira e obstetra eu mesmo....
E se depois, ao examinar as tuas respostas, eu julgar que alguma
delas é fantasma, e não verdade, e arrancá-la-ei de ti e deitá-la-ei fora,
não te exasperes comigo como fazem pelos seus filhos as mulheres de
primeiro parto. são muitos os que dedicam a mim tal hostilidade, tanto a
ponto de morder-me se eu procuro extirpar deles alguma bobagem; e o
crêem que faço isso por benevolência, longe que estão de saber que
nenhum deus quer mal aos homens; e que eu tampouco procedo assim
por malevolência, mas apenas porque não considero cito aceitar o que é
falso.
Em outro texto, denominado Apologia (10, p. 27:41a-42a), Sócrates
questiona os juízes que o condenaram à morte, após acusações feitas por seus
inimigos. O tema aqui discutido é o tema da morte. O problema é: para que vale a
pena viver? A morte do corpo implica o fim definitivo do indivíduo? Existe vida
depois da morte? Eis um pequeno trecho desse dlogo:
CRATES
Se, no entanto, a morte é uma espécie de transmigrão
desta vida para outro lugar e sendo verdade o que se diz, que nesse lugar
se reúnem todos os mortos, que bem maior do que esse haveria, senhores
juízes? De fato, se alguém, chegando ao Hades, depois de se livrar
desses que se dizem juizes, ali encontrasse os que o são de fato, vale
dizer, Minos, Radamanto, Éaco, Triptólemo e outros semideuses que em
vida agiram segundo a justiça, seria essa uma viagem sem importância?
Quanto cada um de s estaria disposto a pagar para encontrar-se com
Orfeu, Hesíodo ou Homero?
Pois bem, senhores juizes, vós também deveis estar dispostos à
esperança em relação à morte, pensando somente isso, que nenhum mal
pode atingir o homem reto nem em vida nem depois de morto, e que suas
ões não o indiferentes aos deuses.
Mesmo o que aconteceu comigo o aconteceu por acaso: isto está
muito claro para mim, que morrer agora e livrar-me de todas as fadigas
era a melhor coisa. Por isso o me deteve um sinal divino, e de minha
parte o guardo grande rancor contra aqueles que me condenaram e os
meus acusadores.
14
Todavia, eles me condenaram e me acusaram não com esse
entendimento, mas na suposão de causar-me um dano, e por isso
merecem uma justa censura.
Apesar disso, homens, vos po: castigai os meus filhos quando
chegarem à puberdade, atormentando-os do mesmo modo que eu vos
atormentava, se vos parecer que eles cuidam mais da riqueza ou de
qualquer outra coisa que não a virtude, e se eles acreditarem ter um valor
que na verdade não possuem; repreendei-os como eu vos repreendi, por
não se aplicarem às coisas que valem a pena, e por acreditarem que
contam muito quando o contam nada. Se fizerdes isso, teremos
recebido de vós a justiça, eu e os meus filhos.
Mas é chegada a hora de partir: eu para a morte e s para a vida.
Quem de nós se encaminha para o melhor destino, todos s ignoramos,
exceto o deus.
Como pode ser visto nos trechos dos dois diálogos, Sócrates interpelava as
pessoas dizendo-se ignorante, e fazia perguntas aos que se julgavam muito sábios
ou julgavam entender profundamente de determinado assunto. Esse momento é
denominado, por muitos historiadores, como ironia. Em seguida, por meio da
refutação das idéias dos oponentes, acabava levando-os a reconhecer a própria
ignorância ou as falhas da própria argumentação. O momento seguinte é
denominado Maiêutica, centrada na investigação sobre os conceitos.
O mais importante o era chegar, necessariamente, a uma conclusão. O
fundamental era desenvolver a reflexão, a investigação dos conceitos por meio do
raciocínio lógico bem encadeado e reconhecer os argumentos enganosos ou
falaciosos.
É importante lembrar o ideal grego de educação descrito como Paidéia.
Essa palavra aparece no séc. V a.C e indica uma educação ampla que visa formar
o homem como cidadão e torna-se o ideal educativo clássico: a essência de toda
a verdadeira educação ou paidéia é a que ao homem o desejo e a ânsia de se
tornar um cidadão perfeito e o ensina a mandar e a obedecer, tendo a justa como
fundamento (11).
Os gregos desse período são os primeiros a problematizar a educação,
tanto na tragédia quanto na comédia. Mas o conceito de educação alcança seu
status como questão filofica com crates, Platão e Aristóteles. Paidéia designa
o processo educativo que se prolonga por toda a vida, permitindo o desabrochar de
todas as virtualidades do homem.
O objetivo de crates, em seu todo, por meio dos diálogos, era
desmascarar e levar o sujeito à busca da verdade. Sua preocupação era ética e
educativa. Isto é perceptível, por exemplo, no diálogo Teeteto (9), do qual foi
15
transcrito um pequeno trecho neste trabalho. Autores como Modolfo (5) também
observam esse cuidado ético e educativo que aparece nos diálogos platônicos.
Filosofia é filosofar, é exercitar essa atitude por ele ensinada. Seu
conhecimento o é erudão, mas é vivo e em processo contínuo de se fazer, e
tem por base a experiência cotidiana de si mesmo, de sua relação com o outro, do
contexto no qual esinserido.
Percebe-se a maestria de Sócrates ao conduzir o interlocutor, por meio de
perguntas e argumentações, da simples opinião ao desenvolvimento do
pensamento crítico, o qual permite ao interlocutor descobrir um saber que traz em
si mesmo, mas que aentão ignorava.
A dialética soctica permite ir ao centro interno, subjetivo, para desenvolver
a habilidade da auto-observação, do autoconhecimento, aprendendo a reconhecer
e lidar com os próprios enganos ou autoenganos. Também prepara o interlocutor
para o diálogo e a construção que este possibilita. Permite, também, reconhecer o
adverrio maldoso, capaz de utilizar artimanhas e argumentos falaciosos para
vencer o debate a qualquer custo.
Por isso, este trabalho optou por desenvolver, também, com os estudantes,
em sua pesquisa, os fundamentos da Diatica Erística de Schopenhauer.
Aos 31 anos de idade Schopenhauer publica sua principal obra: O Mundo
como Vontade e Representação, na qual ele apresenta seu sistema filosófico. Esta
obra permaneceu como a linha mestra de todo o seu pensamento, ao longo de sua
vida. Segundo Carvalho esta obra de Schopenhauer reflete [...] “esfoo de
autojustificação de um certo sentimento de mundo, no qual o fisofo parece ter
vivido imerso desde a infância (7, p.29) e:
O próprio Schopenhauer, ao delimitar sua cnica, procura
esclarece-la por aproximação e contraste com a dialética de Aristóteles,
mas, interpretando esta última não no esrito de Aristóteles e sim apenas
no de seus próprios objetivos, deixa as coisas um tanto obscuras para o
leitor. (7, p.33)
A Dialética Erística é o nome dado a uma obra póstuma do filósofo Arthur
Schopenhauer (1788-1860). Ela contém 38 estratagemas que podem ser
estudados, compreendidos e utilizados para ensinar a reconhecer e desmontar as
artimanhas do debate capcioso. Nesse tipo de debate, o que se pretende é apenas
confundir, enganar e desmoralizar o adversário.
16
Segundo alguns historiadores, esse pequeno tratado foi escrito,
provavelmente, por volta de 1830-31. O manuscrito, sem título, em um total de 44
ginas encadernadas, pertence ao legado do fisofo. Diversos autores relatam
que, após ter contado a nese do seu interesse pelo tema, Schopenhauer indica
motivos para não publicar o manuscrito:
Reuni os artifícios desonestos mais recorrentes nas controvérsias e
representei claramente cada um deles na sua peculiaridade, ilustrando-o
com exemplos e atribuindo-lhe um nome; por fim, acrescentei também os
meios a serem utilizados contra tais articios, por assim dizer as defesas
contra tais simulões; o resultado foi uma verdadeira dialética erística...
porém, na revio ora empreendida desse meu trabalho passado, acho
que um estudo o exaustivo e minucioso das vias indiretas e dos truques
de que se vale a natureza humana comum para ocultar seus defeitos o
é mais conforme ao meu temperamento e, por isso, deixo-o de lado
(12,
p. 54).
Em consequência disso, autores diferentes publicam a Diatica Erística de
Schopenhauer com títulos variados, com comentários ou não.
Eis os 38 estratagemas que, aqui, aparecem identificados pela letra “Ee o
número correspondente a cada um deles.
E1 Ampliação indevida: levar a afirmação do adverrio para além de seus
limites naturais; tomá-la no sentido mais amplo possível e exagerá-la. Exemplo: A
diz: A paz de 1814 restituiu a independência a todas as cidades hanseáticas
alemãs. D replica: Com aquela paz, Danzig perdeu a indepenncia que Napoleão
lhe havia concedido. A se salva assim: Eu disse todas as cidades hanseáticas
alemãs; Danzig é uma cidade hanseática polonesa” (7, p.126).
E2 Homomia sutil: usar a homonímia para ampliar a afirmação colocada
para aquilo que pouco ou nada tem em comum com o assunto em questão.
Exemplo: “A: ‘O senhor ainda não foi iniciado nos mistérios da filosofia kantiana’. B:
“Ora, o que é cheio de mistérios não me interessa em nada” (4, p.20).
E3 Mudança de modo: a afirmação que foi apresentada em modo relativo é
tomada como se tivesse sido apresentada em modo absoluto, ou pelo menos é
compreendida em um sentido totalmente diferente, sendo refutada com base neste
segundo contexto. Exemplo: “Numa conversação sobre filosofia, reconheci que
meu sistema defendia e elogiava os quietistas. Pouco depois surgiu uma conversa
sobre Hegel e afirmei que grande parte dos seus escritos não tem sentido [...]. Meu
17
adverrio não tentou refutar esta crítica, mas se contentou por formular: eu havia
elogiado os quietistas e estes escreveram tamm muitas coisas sem sentido.
Aceitei este fato, mas corrigi sua afirmação dizendo que não elogiara os quietitas
como filósofos e escritores, e, portanto, não por suas realizações teóricas, mas
somente como pessoas, por seus atos, apenas sob um ponto de vista prático. Mas
no caso de Hegel, tratava-se, ao contrário, de realizações teóricas. Deste modo o
ataque cessou” (7, p.133, 134).
Obs.: Os três primeiros estratagemas são afins.
E4 P-silogismos: se queremos chegar a uma certa conclusão, devemos
evitar que essa seja prevista, e atuar de modo que o adversário, sem percebê-lo,
admita as premissas uma de cada vez e dispersas sem ordem na conversação; do
contrário, ele busca toda a sorte de argúcias.
E5 Uso intencional de premissas falsas: para comprovar nossas
proposições, fazer antes o uso de premissas falsas, se o adversário não quiser
aceitar as verdadeiras, ou porque não as conhece como tal ou porque percebe que
delas a tese se deduzida como consequência imediata. Podemos também refutar
teses falsas do adversário por meio de outra tese falsa que ele aceite como
verdadeira. Exemplo: se ele for militante de alguma seita com a qual não estamos
de acordo, podemos adotar contra ele as máximas dessa seita.
E6 Petição de princípio oculta: ocultamos esta petição ao postular o que
desejamos provar, usando nome distinto. Exemplo: boa reputação em vez de
“honra”, ou ainda usando conceitos intercambveis: animais de sangue quente,
em vez de animais vertebrados, ou: afirmar a incerteza da medicina, postulando a
incerteza de todo o conhecimento humano.
E7 Perguntas em desordem: também chamado de todo erotemático,
que significa método de perguntas e respostas ou “método soctico”; trata-se de
uma inversão do todo socrático destinada a confundir o adversário, e o a
levar ambos os contendores a uma intuição da verdade. Fazer de uma vez
muitas perguntas pormenorizadas e assim ocultar o que, na realidade, queremos
que seja admitido. Em contrapartida, expor rapidamente a própria argumentação,
18
pois aqueles que o lentos de compreensão o conseguem acompanhar, com
exatidão, e deixam passar as eventuais falhas e lacunas da argumentação.
E8 Encolerizar o adversário: provocar a lera, para que, em sua fúria, ele
não seja capaz de raciocinar corretamente e perceber sua própria vantagem.
Exemplo: Fazer-lhe algo injusto, ofender sua honra, tratando-o com insolência.
E9 Perguntas em ordem alterada: o seguir a ordem exigida pela
conclusão, fazer perguntas com transposições de todos os gêneros. Tal
estratagema é análogo ao E4, pois trata-se de mascarar o nosso modo de
proceder.
E10 Pista falsa: Quando percebemos que o adversário responde
propositadamente com negações às perguntas cuja resposta afirmativa poderia
confirmar nossas proposições, então devemos perguntar o contrário da proposição
que nos serve, como se quiséssemos sua aprovação; ou colocar as duas à
escolha, de modo que não perceba qual delas queremos afirmar.
E11 Salto indutivo: se fazemos alguma indução e o adversário admite os
casos particulares em que esta se baseia, não devemos perguntar-lhe se admite
também a verdade geral que deriva desses casos; devemos introduzi-la desde
logo, como se estivesse estabelecida e aceita, pois às vezes ele podecrer que
a admitiu, e o mesmo pode acontecer aos ouvintes, que recordarão as muitas
perguntas feitas sobre os casos singulares, que não podem deixar de levar à
conclusão.
E12 Manipulão sentica: quando o discurso é sobre um conceito geral
que não tem um nome próprio e que deve ser designado figurativamente por uma
metáfora, é preciso escolher a metáfora que mais favoreça a nossa tese. Exemplo:
Se o adversário propôs uma transformação, a chamaremos de “subversãoporque
esta é uma palavra hostil e atuaremos de modo inverso se formos nós que
fizermos a proposta.
E13 Alternativa forçada: para que o adversário aceite uma tese, devemos
apresentar-lhe também a contrária e deixar que ele escolha, ressaltando essa
oposição com estridência, de modo que ele, se o quiser ser contraditório, tenha
19
de se decidir pela nossa tese que, em comparação a outra se mostra muito mais
provável. Exemplo: desejamos que ele admita que um homem tem que fazer tudo o
que seu pai lhe ordena, então perguntamos: Deve-se obedecer ou desobedecer
aos pais em todas as coisas?
E14 Falsa proclamação de vitória: depois de o adversário responder a
muitas perguntas sem que as respostas sejam adequadas à conclusão que
tínhamos em mente, declaramos e proclamamos triunfalmente demonstrada a
conclusão que pretendíamos, ainda que de fato não se siga de suas respostas. Se
o adverrio for tímido ou tolo, se tivermos boa dose de descaramento e uma bela
voz, este golpe poderá funcionar.
E15 Anulação do paradoxo: quando apresentamos uma proposição
paradoxal e temos dificuldade para prová-la, proporemos ao adverrio que a
aceite ou a recuse, uma proposição correta, mas cuja exatidão não seja totalmente
evidente, como se dela quiséssemos construir a demonstração. Se ele,
suspeitando de alguma coisa, a recusar, faremos a redução ao absurdo e
triunfaremos; se ele a aceitar, então teremos dito alguma coisa de razoável e
poderemos protelar a conclusão. Ou aplicaremos o estratagema anterior. Para isso
é preciso uma grande dose de descaramento.
E16 rias modalidades do argumentum ad hominem: se o adversário
faz uma afirmação, devemos perguntar-lhe se o está, de algum modo, em
contradição com algo que anteriormente disse ou aceitou, ou com os princípios de
uma escola ou seita que ele elogia ou aprova. Exemplo: Para alguém que defende
o suicídio, logo gritamos: por que vonão se enforca?
E17 Distinção de emergência: se o adversário nos acossa com uma prova
contrária à nossa, poderemos nos salvar mediante alguma distinção sutil, na qual
não havíamos pensado anteriormente, caso a questão admita dupla interpretação
ou dois casos diferentes.
D18 Uso intencional de mutatio controversiae: se percebemos que o
adverrio adotou uma argumentação que nos derrotará, devemos interromper,
afastar ou desviar a tempo o andamento da disputa, a fim de conduzi-la a outras
questões.
20
E19 Fuga do específico para o geral: se o adversário solicita que
apresentemos alguma objeção contra um ponto concreto de sua tese, mas não
encontramos nada apropriado, devemos enfocar o aspecto geral do tema e ata-
lo assim. Exemplo: Se temos de dizer por que uma determinada hipótese física não
é crível, falaremos da incerteza geral do saber humano, ilustrando-a com toda a
sorte de eventos.
E20 Uso da premissa falsa previamente aceita pelo adverrio: se já
interrogamos o adversário acerca de nossas premissas e ele as aceitou, não
devemos perguntar-lhe mais nada, mesmo que ainda esteja faltando uma ou outra
premissa; nós a presumiremos como aceita e tiraremos a conclusão.
E21 Preferir o argumento sofístico: quando nos vemos diante de um
argumento adversário que é meramente aparente ou sofístico, podemos liquidá-lo
ao desvendar seu caráter capcioso e ilurio, melhor ainda se o combatemos com
um argumento igualmente sostico e aparente. Porque aqui não se trata da
verdade, mas da vitória.
E22 Falsa alegação de petitio principii: se o adversário exigir que
admitamos algo do qual derivariam imediatamente o problema em discussão, nos
recusaremos a fazê-lo, considerando tal exigência uma petitio principii. Desse
modo, subtrairemos a ele seu melhor argumento.
E23 Impelir o adversário ao exagero: a contradição e a luta impelem a
exagerar as afirmações. Devemos provocar o adversário, contradizendo-o, e
induzi-lo assim a exagerar para além do que é verdade uma afirmação que, em si e
em certo contexto, pode ser verdadeira. Refutando o exagero, o reconduzimos aos
limites da nossa afirmação com um “até aqui foi o que eu disse, e nada além”.
E24 Falsa reductio ad absurdum: da proposição do adversário tiram-se à
força, através de falsas consequências e distoões dos conceitos, outras
proposições que não estão ali contidas e que o correspondem à sua opinião; e
que na verdade são absurdas e perigosas. Como parece que tais proposições, que
estão em contradão entre si ou com verdades geralmente admitidas, fazem parte
do raciocínio do adversário, elas passam como uma refutação indireta, apagogia: é
um novo emprego da fallacia non causae ut causae.
21
E25 Falsa instância: a instância é um caso de aplicação da verdade geral
sob cujo conceito é preciso assumir algo com respeito ao qual aquela verdade não
é lida, por conseguinte fica completamente demolida. Mas neste raciocínio pode
haver também enganos. Por isto, quando no debate o adversário faz uso da
instância, é preciso ter em conta o seguinte: 1. se o exemplo é conforme a
verdade; se realmente entra no conceito da verdade apresentada; se está
efetivamente em contradição com a verdade apresentada: muitas vezes isto é
assim em aparência. Exemplo: a proposição “todos os ruminantes m chifres” é
demolida pelo único exemplo do cavalo.
E26 Retórcio Argumenti: quando o argumento que o adversário quer usar
em seu favor pode ser mais bem utilizado contra ele. Exemplo: é uma criaa.
o devemos le-la tão a mal. Retórcio: “Justamente por se tratar de uma
criança, devemos castigá-la, a fim de que não persevere em seus maus hábitos”
(4, p. 37).
E27 Provocar a raiva: se o adversário inesperadamente se zanga diante de
um argumento, devemos insistir energicamente nele, para provocar-lhe a ira, pois é
de supor que tenhamos tocado o lado fraco do seu raciocínio.
E28 Argumento ad auditores: utilizado geralmente quando uma pessoa
culta discute com um auditório inculto. Exemplo: o adversário diz: Na formação da
crosta rochosa primária, a massa que mais tarde se cristalizou para formar o
granito e outros tipos de rochas era líquida por efeito do calor e, portanto, fundida.
A temperatura tinha de ser por volta de 250 ºC. A massa cristalizou-se sobre a
superfície marítima que a cobria.(7, p.159) Replicamos que a tal temperatura, e
até mesmo muito antes, aos 100 ºC, o mar teria estado fervendo e teria se
evaporado no ar. Os ouvintes riem. Para vencermos, o adversário terá de
demonstrar que o ponto de ebulição não depende do grau de calor, mas
também da pressão atmosférica, e esta, assim que apenas a metade da água dos
mares tivesse se evaporado, aumentaria a o ponto em que nem mesmo aos 250
ºC poderia ocorrer a ebulição. Mas isto ele não consegue demonstrar, porque, para
ouvintes sem conhecimentos de Física, seria preciso expor todo um tratado.
22
E29 Desvio: se percebemos que vamos ser derrotados, recorremos a um
desvio, isto é, começamos de repente a falar de algo totalmente diferente, como se
fosse pertinente à questão e constituísse um argumento contra o adversário.
Exemplo: Schopenhauer elogiou o fato de na China não existir uma nobreza
hereditária e de os cargos serem preenchidos tão somente na base de examina.
Seu adversário afirmou que a erudição capacitava tão pouco para exercer cargos
quanto os ritos de nascimento (que ele tinha em certa conta), mas saiu-se mal.
Imediatamente fez um desvio dizendo que, na China, cidadãos de todas as classes
o punidos com castigos corporais, e associou isto com beber muito chá,
reprovando nos chineses ambas as coisas.
Qualquer discussão entre pessoas comuns mostra como este estratagema
é, por assim dizer, instintivo. Exemplo: se um debatedor lança ao outro
reprovações pessoais, este não responde com uma refutação, mas sim com
reprovações pessoais ao primeiro, deixando subsistir os lançados contra ele e,
portanto, quase os admitindo.
E30 Argumentum ad verecundiam: dirigido ao sentimento de honra.
Usamos como fundamento citação de autoridades segundo os conhecimentos do
adverrio. Exemplo: Diz Sêneca: cada um prefere crer a julgar. Portanto, o jogo
nos é mais favovel quando temos de nosso lado uma autoridade respeitada pelo
adverrio. As pessoas comuns têm profundo respeito ante os especialistas de
todo gênero; e o as autoridades que o adversário não entende aquelas que,
geralmente, mais efeito obtém. “São as ovelhas que vão ats do carneiro-guia
aonde quer que as leve. Para elas, é mais fácil morrer do que pensar” (4, p. 42).
E31 Incompetência irônica: quando não se sabe opor nenhum fundamento
aos do adversário, pode-se declarar com a alegação irônica de incompetência: “O
que vo diz ultrapassa minha débil capacidade de compreensão; pode estar certo,
mas o posso compreen-lo e renuncio a todo julgamento(4, p. 46). Podemos
utilizar este estratagema somente quando estamos seguros de que, ante os
ouvintes, gozamos de estima superior à que têm pelo adversário. Exemplo um
professor frente a um estudante. Isto corresponde ao estratagema anterior e é um
modo especialmente malicioso de se valer da própria autoridade em lugar de
razões.
23
E32 Rótulo odioso: um modo rápido de eliminar ou de tornar suspeita uma
afirmação do adversário é reduzi-la a uma categoria geralmente detestada, ainda
que a relação seja pouco rigorosa e tão de vaga semelhança. Exemplo: “Isso é
maniqueísmo”, “é idealismo”,é naturalismo”, “é misticismo”.
E33 Negação da teoria na prática: Isso pode ser verdade em teoria, mas
na prática é falso”. Com este sofisma, aceitam-se os fundamentos, mas negam-se
as consequências.
E34 Resposta ao meneio de esquiva: se o adversário o nenhuma
resposta ou informação direta a uma pergunta ou a um argumento, mas esquiva-se
por meio de outra pergunta ou de uma resposta indireta, ou mesmo por meio de
algo que não pertence ao tema e demonstra querer tratar de um assunto
totalmente diferente, isso é sinal seguro de que atingimos (às vezes sem saber) um
ponto frágil da parte dele. Devemos, portanto insistir.
E35 Persuao pela vontade: se puder ser utilizado, torna surfluos
todos os demais: em vez de fornecer razões ao entendimento, influi-se com
motivações na vontade, e o adversário, do mesmo modo que os ouvintes quando
têm um interesse em comum com ele, são subitamente ganhos para nossa opinião,
mesmo que esta tenha sido tomada de empréstimo num manicômio, pois na maior
parte das vezes pesam mais umas migalhas de vontade que uma tonelada de
compreensão e persuasão. Exemplo: um proprietário de terras afirma a excelência
da mecânica na Inglaterra, onde uma quina a vapor realiza o trabalho de muitos
homens. Fazemo-lo observar que logo também os veículos serão arrastados por
quinas a vapor; com isso cairá o preço dos cavalos de seus numerosos
estábulos; e vermos o que ele diz. Em tais casos a reão mais frequente é: “com
que rapidez sancionamos uma lei que vai contra nós!” (7, p. 177).
E36 Discurso incompreensível: desconcertar, aturdir o adversário com um
caudal de palavras sem sentido. Exemplo: [“Normalmente o homem, ao escutar
apenas palavras, acredita que tamm deve haver nelas algo para pensar”
(Goethe, Fausto)] (p. 179) . Podemos impressio-lo oferecendo, com ar grave, um
absurdo que soe como algo douto e profundo, face ao qual careça de vista, ouvido
e pensamento e apresentá-lo como uma prova incontestável de nossa própria tese.
24
E37 Tomar a prova pela tese: se o adversário tem de fato razão e,
felizmente escolheu, para defender-se, uma prova ruim, se fácil refutarmos essa
prova e daremos isto como uma refutação da tese mesma. Exemplo: esta é a
forma pela qual, bons advogados, perdem uma causa boa. Querem defendê-la
com uma lei que não é aplicável e aquela que é aplicável não lhes vem à mente.
E38 Último estratagema: quando percebemos que o adversário é superior
e que acabará por o nos dar razão, então nos tornamos pessoalmente
ofensivos, insultuosos, grosseiros. É um ataque pessoal. É um apelo desde as
forças do espírito às do corpo, à animalidade. Esta regra é muito popular. Ter muito
sangue frio pode ser de enorme utilidade nessas ocasiões, se, quando o
adverrio passa aos ataques pessoais, respondemos com calma que isso o
tem nada a ver com o tema discutido e retornamos rapidamente a este e
continuamos a demonstrar que objetivamente o adversário não tem rao, sem
prestar atenção às suas ofensas:
Em síntese, a única regra contrária e segura é aquela que Aristóteles
indicava: “Não disputar com o primeiro, com o melhor de todos, mas
somente com aqueles que conhecemos e dos quais sabemos que possui
juízo suficiente para não apresentar coisas tão absurdas a ponto de serem
expostos a humilhação; e que sejam capazes de disputar com fundamentos
e não com decisões autoritárias, e de escutar fundamentos e de aceita-los,
e, por fim, que prezem a verdade, gostem de ouvir bons fundamentos,
mesmo quando provêm da boca do adversário, e possuam a quantidade
necessária de equidade para suportar a perda da razão quando a verdade
permanecer do outro lado. Consequentemente, de cem pessoas, talvez
haja uma com quem valerá a pena disputar. Aos restantes, deixemos falar o
que bem entenderem” (12, p. 55
).
Em todo caso, a controvérsia é, com frequência, útil para os dois lados,
permitindo retificar os próprios pensamentos e também adquirir novos pontos de
vista. Mas os dois contendores devem ser similares em cultura e inteligência.
O adversário que utiliza argumentos capciosos para vencer o debate a
qualquer custo visa neutralizar a diferença qualitativa que era “nossa” superioridade
e visa nos vencer por expedientes simples como: “reúne meia dúzia de comparsas e
nos esmaga pela força do número” somente um longo aprendizado “habilita o
homem a sair imune dessas controvérsias, de modo a poder retornar, sempre que
queira, àquele centro de si mesmo [...] para quem não esteja seguro de possuir essa
25
via de retorno, os combates de argumentos são uma dispersão fatal no
mundanismo” (7, p. 20).
Schopenhauer é um dos raros casos de “precocidade filosófica”: aos trinta e
um anos publica a exposição completa de seu sistema Die welt als wille und
vorstellung (O mundo como vontade e representação) e “até o final de sua longa
vida tudo quanto escreve são acréscimos que em nada alteram as linhas mestras de
seu pensamento filosófico” (12, p. 71).
O breve tratado contendo os trinta e oito estratagemas só foi publicado quatro
anos após sua morte, por iniciativa de seu amigo e discípulo Julius Trauenstädt com
o título Eristik.
Embora Schopenhauer cite, várias vezes, Aristóteles, filósofo grego do século
V a.C., sua erística é bem diferente e, inclusive, o tem objetivo ético e educativo
como a de Aristóteles, a qual visa a mais honesta das investigações.
Para Schopenhauer “só existiam dois modos de pensar: a lógica, caminho
rigoroso da demonstração da verdade, e a dialética, arte de argumentar
independentemente da verdade” (7, p. 53). A verdade objetiva de uma proposição é
diferente da sua validade na aprovação dos contendores e ouvintes. A esta última é
que a dialética se refere.
A dialética pode satisfazer a natural prepotência humana, sua vontade de
sempre “obter razão, independentemente de tê-la: para Schopenhauer, a dialética é
siso, e nada mais. Eis a razão para a denominação do seu pequeno tratado,
dialética erística [...]” (12, p. 51).
O diálogo filosófico representa uma experiência intelectual compartilhada que
possibilita a criação de uma comunidade de investigação; com aprimoramento
superlativo das habilidades do pensamento. Além disso, permite a disciplina de
saber falar e ouvir adequadamente e melhora o poder de raciocínio e o respeito
mútuo.
Tais argumentos permitem afirmar que, ao reconhecer isso, os professores
poderiam se conscientizar desses aspectos e, então, considerar valioso empregar
planos de discussão em sala de aula. Evidentemente, para que isso ocorra, é
necessário criar um ambiente “intelectualmente provocativo” que permita discussões
abertas, de temas que interessem aos debatedores.
Como, geralmente, as escolas repetem o modelo cultural, é fundamental
desenvolver consciência e motivação para ressignificar a cultura docente e discente,
26
fornecendo novas “ferramentas conceituais”. Por isso, autores diversos como
Wenning (1), Dascal (17) e Lipman (13) defendem o uso dos diálogos socráticos
como meios de desenvolvimento dessas habilidades e superação da rigidez
curricular.
Outro ponto levantado neste trabalho é o de que não basta ler textos, ouvir
histórias sobre heróis, decorar princípios éticos; é necessário engajar-se em
investigação ética, ou seja: não adianta receber ferramentas, receber a informação
de para que servem, sem aprender a utilizá-las na prática.
São idéias como essas, levantadas neste trabalho que levam,
necessariamente, ao reconhecimento da necessidade de revisão curricular, de rever
todo o conteúdo programático e a ordem seqüencial das matérias.
O texto secundário [...] é uma barreira entre a criança e a sua herança
humanística, assim como cursos de “metodologias são barreiras entre
professores e as disciplinas acadêmicas [...] quando uma disciplina tenta se
despir de seus pressupostos éticos, lógicos, estéticos e epistemológicos [...]
porque estes são “contestáveis” ou “controversos”, elimina as verdadeiras
características. (13, p. 41)
Isto impede que os estudantes as vejam formar um todo com as demais
disciplinas acadêmicas.
A introdução à filosofia nos currículos tende a reduzir a fragmentação no
processo de aprendizagem. Isto acontece por que desenvolve uma compreensão
crítica e discernimento para respostas que são ou não apropriadas e maior
discernimento para distinguir “certo” e “errado”.
É por tudo isso e mais que surgem autores que defendem que se ensine,
desde cedo, às crianças, a introdução à filosofia. A psicologia, hoje, valoriza o
metacognitivo, a importância do pensar sobre o pensar. Pondera que o
metacognitivo torna possível a autocorreção, o automonitoramento da mente. Ora,
ao aprender a cultivar tal hábito, o sujeito cognoscente raciocinará melhor, do
mesmo modo que “não raciocinarão melhor se não puderem raciocinar como elas
raciocinam” [...] “à luz dessas justificativas para a forma educacional, as apreensões
de Platão sobre a abordagem educacional dos sofistas devem ser reavaliadas” (13,
p. 45).
Evidentemente, Platão questionava o uso que, naquela época, passou-se a
fazer dos sofismas, da retórica como panacéia, em Atenas; o que ocorre ainda nos
dias de hoje.
27
Eis porque, este trabalho discute, neste capítulo, a importância atual do
ensino, hoje, da dialética socrática e da dialética erística de Schopenhauer, no modo
como aqui proposto.
É importante lembrar que, ao longo de todo este trabalho, são colocadas as
diferenças entre habilidades e critérios que devem ser estabelecidos como
condições para o desenvolvimento adequado, no processo ensino-aprendizagem, da
análise crítica e da reflexão, que permitem, ao estudante, o desenvolvimento da
verdadeira capacidade de analisar e compreender a cultura escolar, o seu papel
nela e as consequências socioculturais desse processo.
A importância disso é lembrar que a história da educação moderna e
contemporânea faz lembrar um mito grego: o de Sísifo; esse fora condenado a rolar
uma pedra montanha acima, diariamente; mas ao chegar ela caía, rolando
novamente, em direção ao chão, pela própria lei da gravidade. O mito ilustra bem os
esforços vãos que tantas vezes têm sido feitos, em todos os níveis da educação. A
história da educação, no Brasil, revela para olhos analíticos, críticos, como,
repetidas vezes, os currículos são alterados, mas não se atinge aquilo que, neste
trabalho, é considerado essencial: o mais importante não é saber sobre história das
ciências, mas filosofar sobre a ciência, isto é: “[...] o que é importante não é tanto
‘saber ciências’ quanto ‘pensar cientificamente’”. (13, p.87) Sagan indaga: “na sala
de aula, nos jornais e na televisão, porque não usamos os esportes para ensinar
ciências.” (15, p. 416)
Contudo, é importante lembrar que um dos mais importantes papéis da
filosofia é justamente lidar com “problemas”, com “questões” não resolvidas, e o
problemático parece inesgotável do ponto de vista sociocultural, relacional. Mas a
filosofia lida com o controverso, desarticula artimanhas, aponta falácias e
pensamentos lícitos e ilícitos, desmascara estratagemas.
Neste trabalho procura-se mostrar como a filosofia e a filosofia da ciência e da
tecnologia podem desvelar o que é estéril e superficial na educação e fornecer um
modo/modelo para o processo educacional como um todo.
O ponto mais importante em relação à discussão entre dialética socrática e
dialética erística de Schopenhauer é compreender algumas possibilidades, como:
A dialética socrática permite: melhorar a comunicação; melhorar o
discurso acadêmico; desenvolver atitude questionadora; desenvolver
28
disposição e a habilidade para fazer perguntas; dialogar; reconhecer a
diferença entre discurso convergente e discurso divergente; fazer
perguntas apropriadas;
A dialética erística de Schopenhauer permite: reconhecer argumentos
falaciosos, sofismas, estratagemas; usar arsenal apropriado para se livrar
das artimanhas do adversário, nas disputas e controvérsias; utilizar os
próprios estratagemas para desarticular o adversário; diferenciar
discussões persuasivas de discussões adversárias.
É necessário saber utilizar tarefas principais na argumentação como:
transformar colocação adversária em uma representação significativa para ser
usada, mais tarde, no processo. O argumentador perde a razão se não relacionar o
conteúdo de sua afirmação com o conhecimento do mundo e com a estrutura da
discussão como um todo; decidir qual deve ser sua reação mais apropriada; decidir
qual de suas reivindicações iniciais irá defender ou qual reivindicação do oponente
irá atacar; o argumentador deve demonstrar seu conhecimento e capacidade de
raciocínio para produzir evidência adequada e usar uma linguagem natural, no nível
apropriado dos detalhes e dirigida para alcançar os objetivos do argumentador (14,
p. 4).
A importância do que é discutido neste capítulo é, sobretudo, que entrar em
uma discussão requer vários tipos de conhecimentos de como deve ser o raciocínio
e como se deve arguir e discutir.
O valor pedagógico e educacional do que aqui é apresentado é inestimável,
pois permite, também, superar crenças e opiniões equivocadas, encontrar novos
significados.
Os estudantes aprendem a ampliar o aprendizado, no processo do diálogo, no
reconhecimento de como agir e reagir nas controvérsias e nas disputas, e isso
permite construção de conhecimento. Permite também superar aquela visão de que
os estudantes são passivos, não sabem fazer perguntas adequadas ou são
desmotivados.
Pode-se perceber, nesse ponto, a importância de os professores ensinarem
aos estudantes sobre o processo de geração de perguntas, de questionamentos.
29
Esse saber torna a sala de aula torna um local atrativo, cheio de desafios que
instigam a curiosidade e a capacidade de investigação.
Uma maneira de se fazer essa geração de perguntas é através da “Caixa de
ferramentas” (1, p. 5): são questões de amostra colocadas no quadro, na frente da
sala de aula, diante de todos os alunos. A caixa é composta de notas pré-laboratório
(no ensino de física), sumário dos resultados, gráficos, representações matemáticas,
notas pós-laboratório, soluções finais e soluções alternativas. Cada estudante é
responsável por trazer sua “caixa de ferramentas” para a aula, todos os dias. O
objetivo é que esse material seja utilizado para a discussão, em sala de aula,
propiciando aos estudantes o desenvolvimento das habilidades discutidas por todos
esses autores citados neste trabalho.
Quem utiliza os diálogos socráticos em sala de aula, para promover essas
habilidades, faz algumas recomendações necessárias para obter o engajamento dos
estudantes nos diálogos socráticos, permitindo-lhes sentirem-se confortáveis (1,
p.4):
permita que o estudante apresente, sem ser interrompido;
promova questionamento;
mostre respeito pelas conclusões do estudante;
ajude os estudantes a encontrarem pontos de acordo;
mantenha uma atmosfera positiva;
deixe que os estudantes pensem que a nova idéia é deles;
faça com que os estudantes sintam como e quanto contribuíram para o
processo ocorrido em sala de aula e no processo de investigação como
um todo.
Desta forma, observa-se a convergência do pensamento de todos esses
autores, e deste trabalho, no sentido de que os estudantes devem perguntar,
questionar e desenvolver pensamento crítico como valiosa parte do processo
educacional.
30
3 O LUGAR DO DEBATE NO ENSINO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA
Assim como as crianças tremem e têm medo de tudo na escuridão cega,
também nós, à claridade da luz, às vezes tememos o que não deveria
inspirar mais temor do que as coisas que aterrorizam as crianças no escuro.
(Lucrécio)
De Sócrates a Schopenhauer, Wenning, Flower, Bimbaum, Maxwell, entre
outros, pode-se ver o aspecto humano da ciência. Indivíduos com amplo
conhecimento sobre a natureza da ciência possuem conhecimento de sua
contextualização, de suas nomenclaturas científicas, habilidades do processo
intelectual, regras de evidência científica, postulados da ciência, disposições
científicas e dos maiores mitos sobre a natureza da ciência e da tecnologia.
Algumas práticas pedagógicas ajudam o aluno a fixar e obter o entendimento
requerido: leituras de apoio de livros e artigos que lidam com a natureza da ciência
podem ter um impacto significativo no entendimento dessa conceituação;
discussões de estudo de caso são excelentes fóruns para ampliar o entendimento
dos alunos; lições de averiguação (exames) são fontes de um excelente fórum de
aprendizado para o aluno em relação à natureza da ciência; laboratórios de
averiguação ajudam o estudante a aprender e entender o processo intelectual e as
habilidades do cientista; estudos históricos provam ser uma poderosa ferramenta
não somente para ensinar, mas também para colocar uma face humana na física e
aumentar o interesse do aluno pela matéria; tarefas múltiplas são componentes
importantes para ajudar o aluno a desenvolver um conhecimento mais profundo,
com apresentações, relatórios escritos e orais, questões de múltipla escolha e
questões abertas (de respostas livres) (1, p. 4).
Sagan afirma que:
A cultura comercial es cheia de informações errôneas e
subterfúgios semelhantes à custa do consumidor. Não se devem fazer
perguntas. Não pensem. Comprem. [...] Criam uma corrupção insidiosa das
atitudes populares a respeito da objetividade científica. Hoje, existem até
comerciais em que cientistas reais, alguns de considerável distinção, atuam
como garotos-propaganda para as empresas. Eles nos ensinam que
também cientistas mentem por dinheiro. Como afirmou Tom Paine, o fato de
nos acostumarmos com mentiras cria o fundamento para muitos outros
males (15, p. 239).
31
Existem inúmeros casos de mentiras provadas ou presumíveis com efeito
catastrófico quando o governo e as sociedades perdem a capacidade de pensar
criticamente (15, p.240).
Por isso, para exercitar o pensamento crítico, uma solução é recorrer às
ferramentas de um “kit” (15, p. 241-242):
Sempre que possível, deve haver confirmação independente dos
“fatos”.
Devemos estimular um debate substantivo sobre as evidências, do qual
participarão notórios partidários de todos os pontos de vista.
Os argumentos de autoridade têm pouca importância [...] na ciência não
existem autoridades, quando muito especialistas.
Devemos pensar em mais uma hipótese. Se alguma coisa deve ser
explicada, é preciso pensar em todas as maneiras diferentes pelas
quais poderia ser explicada. Depois devemos pensar nos testes que
poderiam servir para invalidar sistematicamente cada uma das
alternativas. O que sobreviver, a hipótese que resistir a todas as
refutações [...] tem uma chance muito melhor de ser a resposta correta
[...]
Devemos tentar não ficar demasiado ligados a uma hipótese, por ser
a nossa [...]
Devemos quantificar [...] há certamente verdades a serem buscadas nas
muitas questões qualitativas que somos obrigados a enfrentar, mas
encontra-las é mais desafiador.
Se há uma cadeia de argumentos, todos os elos da cadeia devem
funcionar (inclusive a premissa) – e não apenas a maioria deles.
A Navalha de Occam. Essa maneira prática e conveniente de proceder
nos incita a escolher a mais simples dentre duas hipóteses que
explicam os dados com igual eficiência.
Devemos sempre perguntar se a hipótese pode ser, pelo menos em
princípio, falseada [...].
Inúmeros exemplos de falácias muito comuns na nossa cultura e de domínio
público exemplificam a afirmação de que é, em parte, por causa da falta
disseminada de conhecimento sobre a detecção de mentiras que a indústria e a
mídia enganam e a credulidade mata (15, p. 252).
Refletindo sobre tais afirmações percebe-se a possibilidade de se servir aos
impostores, aos charlatães quanto aos sujeitos que queiram defender-se de tais
artimanhas. imposturas que são praticadas sem a finesse, o requinte do
verdadeiro trapaceiro; contudo, também elas têm seus efeitos destrutivos.
A impostura científica apresenta conotações positivas, apesar de,
inicialmente, pensar-se mais ou somente nos aspectos pejorativos. Um biólogo
carente de publicidade, “Peter Duesberg afirma, contra toda evidência, que a causa
32
da Aids não é o HIV, ele semeia confusão de maneira perigosa [...] trata-se,
evidentemente, de uma impostura potencialmente nociva” (16, p. 19).
Tão importante quanto combater as imposturas é compreender as razões de
seu sucesso esse aspecto foi trabalhado com os alunos no curso A Erística e a
Falácia do Discurso Científico e que gerou, nos estudantes, grande curiosidade e
motivação.
Outro importante ponto a observar é a constatação de que a ciência e a
técnica não fizeram recuar as crenças irracionais e parecem até favorecê-las.
Na mídia, o sucesso de séries como “Arquivo X”, filmes como “A Bruxa de
Blair”, “Sexto Sentido” e que são apenas ilustrações de “uma tendência maciça que
demonstra, a golpes de efeitos especiais, a ausência do conflito, [...] entre universo
high tech e sobrenatural” (16, p. 29). Ou seja: os mecanismos de adesão à
impostura colocam em risco ou em jogo nossa relação da verdade e o erro,
dificultando distinguir entre autêntico e simulacro.
Surgem consequências socioculturais graves de tudo isso, como por exemplo:
ao seu modo, os impostores apontam muito sobre o nosso modo de pensar, nossa
visão de mundo, nossos valores; o risco dessa impostura científica tornar-se
norma intelectual; o real se enfraquece sob o impacto da mensagem sobre o
conteúdo; que vários cientistas traiam o ideal da objetividade (16, p. 27).
Um exemplo citado em obras diferentes é o de James Randi, que pratica com
Gerard Majx a desmistificação das performances sobrenaturais;” eu quero muito ter
o espírito aberto, mas não ao ponto de ter um buraco na cabeça” (16, p. 28). E ele
ensina, em dez lições, como se pode fazer pseudociência; para cada capítulo um
título, como se segue:
1. As verdadeiras perguntas, farás.
2. O seu nicho, com cuidado escolherás.
3. A Ciência oficial, achincalharás.
4. A Mídia, com arte usarás.
5. Os fatos, manipularás.
6. A História, reescreverás.
7. Deus e seus santos, honrarás.
8. Espíritos e Demônios, invocarás.
9. Das armadilhas da linguagem, abusarás.
10. Algo refutável, jamais enunciarás.
Filosofia e ciência cresceram de seu mútuo diálogo e a reflexão filosófica não
deve ser indiferente à ciência e tecnologia, no ensino, atualmente. Estamos cientes
de que as “novas” filosofias da ciência ou “novas epistemologias” também exibiram
33
seus problemas. Mas não é justamente isso que permite constante reflexão,
ressignificação e reconstrução/renovação do conhecimento humano?
Contudo, seu efeito contextual é inegável: compreender o trabalho que efetiva
em contextos de investigação, em regras próprias em relação às condições de
aplicação – é algo sempre lembrado.
Os embates desenvolvidos permitem, outrossim, introduzir professores e
estudantes no horizonte das discussões filosóficas geradas pela ciência atual. É
importante lembrar que essas discussões são ricas por delinearem um quadro
marcado por diversificadas tendências.
Contudo, isso talvez seja possível pelo confronto crítico entre abordagens,
projetos, metodologias, objetivos, disciplinas, teorias e cientistas individuais ou
grupos de cientistas. É possível compreender, historicamente, como é complexa
essa discussão entre “coletivo” e “público” e como isso nos leva a refletir sobre o
papel do conflito e do diálogo na construção da ciência, desde a elaboração de
critérios, das tomadas de decisão até as implicações de seus resultados.
Nossas reflexões estarão comprometidas com uma visão de uma nova
racionalidade e do papel essencial do espaço dialógico e das controvérsias
científicas na produção do saber científico e nas decisões políticas.
É importante lembrar que a competição, e não apenas a cooperação,
desempenha um papel fundamental na construção coletiva do saber científico.
Nesse sentido, o mais adequado é falar de “dialética” da construção desse saber,
pois a ciência é uma construção na qual as controvérsias têm importante papel
que começa com uma questão bem definida e rapidamente se expande horizontal e
verticalmente; além disso, seu objetivo é a persuasão, o lance preferido é o
argumento e o encerramento ideal é a resolução. Seus lucros cognitivos são
clarificação da divergência, conciliação dos opostos, emergência de idéias
inovadoras (17, p. 21).
“A ausência de um método de decisão como a prova, que termina o debate
obrigando os participantes a aceitarem a solução por ela ditada, é justamente uma
das características definitórias da controvérsia” (17, p. 23).
A diferença entre controvérsia, disputa e discussão é que a controvérsia tem
papel especial no programa do conhecimento científico; elas explicam o que se
chama de “folga epistêmica”, a qual “facilita a compreensão das relações íntimas
entre controvérsia e inovação” e:
34
Uma vez iniciada, uma controvérsia não tem limites fixados de modo a priori
quanto a onde deveremos para o questionamento de crenças entranhadas,
conceitos, métodos, modos de interpretação, dados, critérios de relevância,
normas de formulação, aceitação e rejeição de hipóteses e outros
componentes do empreendimento científico e da atividade crítica a ele
inerente. Tal irrestrito questionamento pode levar a uma situação de
abertura radical em um dado campo, que, por sua vez, cria condições que
são favoráveis – e talvez essenciais – à emergência de uma inovação
radical (17, p. 25).
Essas afirmações remetem à idéia de que desenvolvimento e progresso são
interligados e indissociáveis da idéia de construção do conhecimento. As questões
ligadas à ciência e à tecnologia remetem-nos, também, à Escola de Frankfurt, ao
esforço dos epistemólogos modernos e contemporâneos para despertar a
consciência do sujeito que elabora discursos. Suas reflexões mostram como o
pensamento de Sócrates e de Schopenhauer são atuais e, utilizados de modo
didaticamente apropriados, podem ajudar alunos e professores na construção de um
modelo/modo de ensino de ciências inteligente e eficaz, na relação teoria-prática.
Afirmações como essas permitem compreender como o objeto desta pesquisa
é atual e de relevância para o estudo e o ensino de ciência e tecnologia.
Dialética Socrática e Dialética Erística são aqui utilizadas como forma de
preparação para entender o processo de pesquisa e do discurso científico, o qual
exige lógica, imaginação, explicações e previsões.
Parte-se dos pressupostos que
a. o debate seja uma construção complexa e fundamental para apresentação
das próprias idéias e descobertas; e também para perceber idéias
convergentes e divergentes no seu próprio discurso e no discurso do seu
oponente;
b. os professores devam utilizar esses recursos ao ensinar a natureza da
ciência;
c. os professores e estudantes devem ter conhecimento de como os
cientistas agem para alcançar suas conclusões e quais são suas
limitações, pois é isso que permite a constante renovação das ciências.
São apresentados a seguir alguns motivos pelos quais o desenvolvimento da
ciência e da tecnologia pressupõe a necessidade de uma teoria do conhecimento.
35
Quando as pessoas sabem como os cientistas agem e alcançam suas
conclusões científicas e quais são as limitações de tais conclusões, elas pensam
melhor sobre o dito e não vão rejeitar a idéia imediatamente, nem aceitá-la sem
crítica. A mídia está repleta de pessoas fazendo afirmações e suposições sobre
várias coisas, sendo que algumas têm fundamento e outras não. Então, um
estudante que possui um bom entendimento do conteúdo da natureza da ciência
terá, supostamente, maior facilidade em distinguir evidência de propaganda,
possibilidade de certeza, crenças racionais de superstições, ciência de folclore,
teoria de dogma.
Ao analisar tais discursos percebe-se que, mesmo em busca de
previsibilidade e da necessidade da relação causal ou mesmo quando, no
empirismo, a causa é associada à função, permanece a dificuldade dos
autores/pesquisadores em conceituar ciência e metodologia científica. Por isso
recorrem a epistemólogos como Popper (1902-1994), Kuhn (1922-1996) e outros,
para indicar os debates que são suscitados nesta área, sobre essa temática, pois os
epistemólogos estabelecem uma organização lógica, indicando passos ou etapas,
segundo seu estilo pessoal, segundo seus confrontos nessa área.
De Bacon (1561-1626) a Feyerabend (1924-1994), os filósofos afirmam que,
quanto maior a provisoriedade de suas construções, mais o ser humano se
empenha em busca do sentido através da construção do conhecimento científico:
[...] a ciência é um enigma que renasce, uma solução que cria um
problema [...] a ciência propõe-nos um existencialismo pela ão enérgica
do ser pensante [...] filosoficamente, toda fronteira absoluta proposta à
ciência é a marca de um problema mal posto [...] (18, p. 25).
Esses sujeitos pensantes constituem a sociedade e: “[...] A sociedade tem
direito ao conhecimento, do qual a ciência e a tecnologia fazem “perigosamente”
parte [...] e filosofia e história devem voltar a ser centrais no projeto educativo, pois
levam à análise e à reflexão” (19, p. 21).
Nesta pesquisa reconhece-se o valor do quanto é importante fornecer
incentivos que motivem os alunos e lhes proporcione um conjunto de hábitos de
trabalho que permita combinar suas inclinações criativas e imaginativas com seus
próprios “desejos de pensar de uma maneira disciplinada e ordenada a respeito do
mundo” (20, p. 54).
36
Por isso propõe que, desde cedo, se ensine às crianças esse modo de
pensar, que tem suas raízes na dialética socrática. Isso traria benefícios por meio do
desenvolvimento de habilidades tais como: raciocínio, formação de conceitos de
investigação. A partir disso, quando forem jovens e adultos estariam mais habilitados
a pesquisarem e elaborarem soluções promissoras a partir da relação teoria-prática;
quando adultos não deixariam escapar a experiência de se admirar, de refletir, de
buscar significados de suas experiências, de questionar o que se transmite de
geração para geração. A filosofia é uma disciplina que inclui a lógica e, portanto, se
ocupa em introduzir os critérios de excelência no processo do pensar para que os
estudantes possam caminhar do simples pensar para o pensar bem.
A questão proposta nesta pesquisa é incentivar os professores a compartilhar
o que sabem sobre o processo de questionamento, de argumentação, de
identificação de afirmações falsas e verdadeiras, para manter a boa qualidade do
discurso na sala de aula e desenvolver, nos alunos, a habilidade do pensamento
crítico. “Pode ser útil se o professor falar sobre os procedimentos; a maioria dos
alunos poderá estar inclinada ou se sentir motivada a aprender mais sobre como
fazer perguntas apropriadas” (1, p. 3). A confirmação de tal idéia/hipótese será
apresentada no capítulo resultado e discussões.
As conseqüências do chamado analfabetismo cienfico são muito mais
perigosas em nossa época do que em qualquer peodo anterior. Grandes vultos
combateram e combatem a chamada PSEUDOCIÊNCIA. Segundo eles, essa é mais
cil de ser inventada que a cncia, e seus padrões de argumentão, que passam por
evincia, são muito menos rigorosos (15, p.31). Portanto, se os estudantes não
aprenderem a desenvolver o pensamento crítico e compreender o PROCESSO pelo
qual a ciência se dá, dificilmente poderão perceber que estejam abrando a
pseudocncia, ficando susceptíveis de serem manipulados por mentes inescrupulosas.
Questões como essas foram levantadas pelas novas filosofias da ciência ou
“novas epistemologias”, as quais também esbarram em alguns problemas. Mas
um ponto que permanece e tem-se robustecido em meio às críticas e às mudanças
nas visões de ciência e tecnologia: é o seu enfoque contextual:
[...] compreender o trabalho da comunidade e produção científica
passa a ser o trabalho que se efetiva em contextos de investigação
programas de pesquisa, constituição de campos (inter) disciplinares com
suas regras próprias, pelo menos no que concerne às condições de sua
aplicação (17, p. 16)
37
Questões como essas se impõem ao saber científico e filosófico
contemporâneo e suas discussões delineiam-se em um quadro que reflete diversas
tendências. Todas essas colocações levam à reflexão sobre a importância do papel
do conflito e do diálogo na construção da ciência e tecnologia, desde a elaboração
de critérios, das tomadas de decisões até as implicações de seus resultados.
Sociólogos e epistemólogos enfatizam a importância de se discutir, de modo
interdisciplinar, esse aspecto da ciência e tecnologia como trabalho coletivo.
Sem contradições e criticismo, não haveria motivação para mudarmos
nossas teorias, não haveria progresso intelectual? Tal questão traz à tona o aspecto
“crítico” onde, antes, era visto apenas o trabalho colaborativo. Significativo é lembrar
que, além de cooperativo e crítico, o saber da ciência e tecnologia apresenta a
competência como elemento necessário. Por isto vale lembrar a importância da
Dialética na construção coletiva desse saber, pois toda interação polêmica é uma
interação dialógica, na medida em que existem, pelo menos, dois lados, ou duas
instâncias enunciativas com posições opostas em relação a alguma questão e se
criticam mutuamente.
Além disso, aprender ciência não significa memorizar seus resultados mais
relevantes, nem suas realizações mais eminentes. Aprender ciência é, acima de
tudo, tomar conhecimento de seu “modus operandi”. Desse modo ocorre uma
alteração de comportamento, com conseqüências para a vida toda e para a
sociedade.
Considerando-se o ponto em que ciência e tecnologia chegaram,
pseudociência pode levar a perigos tecnológicos, indução de erros no uso da
tecnologia para atender a interesses pessoais e de grupos, como laboratórios de
remédios dos quais há inúmeros exemplos.
Hoje, existem até comerciais em que cientistas reais, alguns de
considerável distinção, atuam como garotos-propaganda para as empresas.
Eles nos ensinam que também cientistas mentem por dinheiro. Como
alertou Tom Paine, o fato de nos acostumarmos com mentiras cria o
fundamento para muitos outros males. (15, p. 239)
Pergunta-se: a que interesses a ignorância serve?
A superstição e a pseudociência estão sempre se esquivando do exame
cético, oferecendo respostas fáceis, banalizando a experiência, parecem usar os
métodos e as descobertas da ciência, embora na verdade sejam infiéis à sua
38
natureza frequentemente porque se baseiam em evidência insuficiente ou porque
ignoram pistas que apontam para outro caminho” (15, p. 45).
As vozes aqui citadas juntam-se a muitas outras que refletem sobre as
conseqüências da pseudociência em um mundo globalizado, onde tudo pode ser
visto em tempo real através dos meios de comunicação.
É característica da contemporaneidade o crescente uso de tecnologia no
cotidiano e o grau de sofisticação que ela vai atingindo. A própria LDB (Lei de
Diretrizes e Bases) propõe uma prática educativa adequada à realidade do mundo,
ao mercado de trabalho, à informação e ao conhecimento.
Uma das questões que surge é: como lidar, em sala de aula, com alunos que
navegam pela internet, recebem vultuoso volume de informações pela mídia,
estimulando a curiosidade e a sede de informações, através de uma forma de
comunicação mais sedutora que a escola?
A própria comunicação científica se faz por meio da linguagem e ajudada
pelos progressos da lógica da linguagem. No que se refere à realidade tecnológica,
de modo geral sabemos que autores que se encantam com ela, enquanto outros
alertam para o uso e o risco da pseudociência, de suas motivações ilícitas e
inconfessáveis do ponto de vista moral: “semeamos os campos com trifosfato de
sódio e muito mais gente com fome do que nunca [...] construímos escolas e o
analfabetismo floresce” (21, p. 212).
A literatura está repleta de exemplos de uso inadequado de conhecimentos
da ciência e tecnologia. Exemplo: em 1953, nos EUA, quando a pesquisa da
Fundação Sloan Keterring publicou os resultados alarmantes dos efeitos do uso do
cigarro, as indústrias de tabaco se reuniram virulentamente para publicar
“pesquisas” feitas em seus laboratórios que comprovavam o quanto o tabagismo é
inócuo! Em 1971, a Brown and Williamsom Tobbaco publicaram “pesquisa” que
garante que o fumar cigarro não causa câncer de pulmão e outras doenças. Outro
exemplo: o conhecido caso dos círculos que apareciam em plantações de trigo na
Inglaterra depois de muito sensacionalismo e especulações exóticas, dois britânicos
acabaram confessando à polícia inglesa que os círculos foram feitos por eles
(descreveram como), e não por seres extraterrestres (UFOS).
O pensamento analítico, crítico, aliado ao olhar antropológico, pode permitir
ao homem contemporâneo fazer inúmeras ressignificações, levar à compreensão de
que o real não se esgota no imediato e que a reflexão pode ser atributo de todos
.
39
É possível apontar para a possibilidade de que a conscientização e o
planejamento ainda possam controlar a questão das soluções tecnológicas, desde
que a mentalidade tecnológica não elimine de vez, das novas gerações, sua vida
interior, “lançando-as em um novo barbarismo” (21, p. 127).
A amplamente documentada crise de ensino contemporâneo de ciências,
indica como o ensino de ciências desenvolveu-se dissociado da história e da filosofia
da ciência; estas podem humanizar as ciências e aproximá-las dos interesses
pessoais, culturais, éticos e políticos da comunidade; podem tornar as aulas de
ciência mais reflexivas e, portanto, desafiadoras e contribuir para o entendimento
integral da “matéria científica” e sua significação.
Com este objetivo é que foi feita a inclusão da história e da filosofia da ciência
em currículos nacionais de países como País de Gales, EUA, e Holanda; indica os
resultados positivos de tal modificação curricular. Um exemplo é o do Conselho
Britânico de Currículo Nacional que afirma que os estudantes podem adquirir,
através da inclusão destas duas disciplinas, desenvolvimento de habilidades como:
- distinguir entre asserções e argumentos pautados em dados e provas
científicas e os que não o são;
- considerar a maneira pela qual o desenvolvimento de uma determinada
teoria ou pensamento científico se relaciona ao seu contexto moral,
espiritual, cultural e histórico;
- estudar exemplos de controvérsias científicas e de mudanças no
pensamento científico.
Cada vez mais surgem defensores da importância da inclusão dessas duas
disciplinas como modo de iniciação necessária porque “nenhuma parte da ciência
progrediu muito ou muito rapidamente antes de que essa educação convergente [...]
se tornasse possível” (22, p. 237).
evidências da importância do uso da filosofia para a melhoria do ensino,
dos textos didáticos e da elaboração dos planos de cursos e objetivos para os
cursos de ciência; devem começar por explorar os problemas que os professores
consideram importantes para o desenvolvimento de sua práxis educacional,
mantendo em vista, em seus cursos, o processo de pesquisa/descoberta pelos
cientistas.
Estas reflexões convergem para o fato de que ciência e tecnologia estão
sempre carregadas de valores morais, sociais e econômicos; por isso o
conhecimento gerado pela ciência pode ser apropriado, também, pelas estruturas de
40
poder, inclusive institutos, universidades, mas também por governos e empresas
que pesquisam e desenvolvem produtos a serem comercializados.
Todos os pontos de vista apresentados neste trabalho convergem para a
necessidade de implementar curculos/cursos de ciência com vio reflexiva e para tal
é importante a contribuão da filosofia, tanto para os professores quanto para os
estudantes, para se evitar cair nas armadilhas do que se denomina pseudocncia.
Por motivos como esses que aqui se discutem, é que epistemólogos
modernos e contemporâneos debatem a contradição entre a racionalidade científica
e a técnica e a liberdade humana, criticando, muitas vezes, a indústria do lazer que
massifica a cultura e indicando a necessidade de se desenvolver, cada vez mais, no
ensino de ciência e tecnologia, a análise, a reflexão, pois, sem dúvida, constata-se
que a tecnologia resolve alguns problemas, mas também acarreta outros.
Uma análise da imporncia cultural da História da Ciência no Cinema indica
Galileu como principal agente da revolão cienfica e o nero que permite repensar,
constantemente, as relações entre ciência e sociedade, indica como “iias filosóficas”
podem ser consideradas “perigosas para a ordem vigente, uma vez que geram
reflexões e transformações. Por isto é que Galileu ainda é emblemático”: porque suas
iias e afirmações, além de terem sido levadas para a esfera político-social também
geraram uma expansão que fundamentava-se na certeza de uma “verdadeda ciência
que pudesse ser mostrada de modo indiferente dos valores culturais de eno. Ele,
juntamente com outros pais da ciência moderna mostraram que a ciência “é uma
atividade que desvela o caráter obscuro da natureza [...] utilizando a experimentão e
a linguagem matemática [...]” (23, p. 106).
Esta defesa da necessidade de envolvimento do estudante em seu processo
de aprendizagem e do desenvolvimento de habilidades associadas ao processo de
investigação científica tem por objetivo que o estudante adquira uma visão ampla da
ciência e do modo como ela é construída e utilizada, através do seu ensino mais
adequado.
Quatro demandas fundamentais” “saber o quê”, “saber como”, “saber por
que”, e saber quando e onde aplicar o conhecimento (IES, 1997) (p. 432).
Essas demandas mobilizam “conhecimento declarativo”, “conhecimento
procedimental”, “conhecimento esquemático” e “conhecimento estratégico”,
visando aplicar seus conhecimentos em novas situações e problemas.
Essas demandas, esse desenvolvimento de habilidades têm como objetivo
“o produto do processo de investigação, gerando um modelo, que isso é
coerente com o processo de desenvolvimento científico (24, p. 432).
41
O ponto de vista de que a sala de aula deve permitir estas práticas que visam
ao desenvolvimento de habilidades dos estudantes deve estar aliado ao fato de que
é importante que eles recebam o feedback quanto ao que fizeram e conseguiram
conquistar como aprendizado. Isto os auxiliará em seu desenvolvimento e também
no êxito em participação de programas de avaliação em massa, de diversos países
ou grupo de países: TIMSS (Third International Mathematics and Science Study
Technical/EUA), PISA (Programme for International Student Assessment/EUA),
NAEP (The NAEP guide: a description of the content and methods of the 1997 and
1998 assessments/EUA), ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio/Brasil). Tais
projetos têm, em comum, o objetivo de “evidenciar um panorama do atual processo
de desenvolvimento do conhecimento dos estudos e, com isso, subsidiar novas
propostas e apontar direções a serem tomadas no ensino” (24, p. 436).
Estudos indicam que “dificuldade de avaliação de habilidades de
investigação, especialmente aquelas relacionadas às etapas de “elaboração de
modelo”, “análise” e “comunicação” do ciclo de investigação, apresentando poucas
oportunidades para a explicitação de conhecimentos a elas relacionados” (24, p.
447).
Resultados de pesquisas como os desses programas de avaliação confirmam
a necessidade de se melhorar o ensino de ciência e tecnologia e a importância da
utilização da filosofia da ciência para o desenvolvimento das habilidades propostas e
requeridas. Esses quatro programas avaliados no artigo citado fazem um papel
importante: desvelar que é fundamental que estudantes aprendam análise, reflexão,
para terem condições apropriadas de explicitar suas idéias, contextualizá-las e fazer
transferência de aprendizagem para novas situações-problema. E para que tais
programas venham a dar uma contribuição efetiva, cumprindo o propósito que eles
próprios estabelecem, faz-se necessário um novo percurso no ensino de ciência e
tecnologia, perguntar-se a que serve tal tipo de ensino e optar pela escolha de uma
visão de ensino que integre as possibilidades dos dois campos (hoje ainda
divididos): Exatas e Humanas.
Na atual sociedade da informação, as relações no processo educativo
pressupõem intercâmbio de papéis; suas relações são mais complexas e
necessidade de “reaprender a conhecer, a comunicar-nos, a ensinar e a aprender, a
integrar o humano e o tecnológico, a integrar o individual e o grupal/social” (25, p. 9).
42
Questão: onde está a escola nessas redes? De que redes a escola e os
sujeitos escolares participam?
Muitas vezes, essas práticas, nas escolas, são práticas vazias, premidas por
necessidades advindas de instituições administrativas e burocráticas. Acabam
resumindo-se em práticas como brincadeiras entre amigos, jogos, bate-papos e
festas, sem contribuição para vivências educativas e pedagógicas como seriam de
direito dos estudantes e dever dos profissionais da educação. “A tecnologia e a
pedagogia estão estremecidas” [...] ”A manipulação (tato), a visualização (vista), a
audição, bem como a relação sensível com a “máquina”, estimulam reações
corpóreas indispensáveis ao jogo dialético inerente à concepção e abstração dos
conhecimentos” (25, p. 35).
Logo, a escola deve utilizar-se dessas mesmas tecnologias como importantes
recursos pedagógicos. A questão continua a mesma: como fazê-lo dentro do atual
contexto?
“E nós, professores? Como ficamos em relação a essa realidade? Vamos nos
adaptando e adequando? Partimos da crença de que o sistema é forte e de que não
temos condições de reverter o quadro?” (26, p. 42).
Discutindo tais idéias, depara-se com conceitos socráticos, como esse
referente a valores. Não foi crates, no séc. V a.C. quem conceituou tal palavra e
também ética? Tantos e tantos autores, como aqueles citados neste trabalho, falam
sobre a mesma idéia: o estudante como centro do processo, com seu potencial
criativo e possibilidades inúmeras, infinitas, no campo da ciência e tecnologia mas
deve olhar, internamente, e refletir sobre as consequências de suas escolhas e atos.
É fundamental que a escola seja um lugar de compartilhar hábitos de estudos
e pesquisa para não se perder somente no uso dos recursos tecnológicos. Todos os
autores até aqui apresentados reforçam a idéia da necessidade de se proporcionar,
na educação, espaço para análises, discussões, reflexões, a socialização de
conhecimentos e de vivências pedagógicas como meio para o intercâmbio cultural e
social.
Alguns autores concluem reafirmando, a necessidade da “construção de
sentidos na escola, pela co-participação, pela valorização do outro, pela convivência
com a diferença, pela solidariedade. A esperança reside no estar junto para a
construção de sentidos e relações” (26, 50).
43
Na sociedade contemporânea, as conquistas e os fracassos para defender e
afirmar as identidades estão diretamente ligadas às dinâmicas e aos bloqueios da
comunicação. As novas tecnologias desempenham “um papel de fragmentação no
habitat cultural, com a dissolução do horizonte cultural comum de uma sociedade.
Isso traz riscos para a sua unidade política e cultural” (27, p. 205).
Pelo que se viu, os meios de comunicação atuam como agentes de produção
de sentido – por isso devem ser discutidos pela comunidade escolar e pela família.
[...] as mídias entre jovens faz com que esses mudem seus padrões de
referência, alterem suas relações consigo mesmos e com as circunstâncias
sociais em geral, criando outras necessidades, envolvimentos, modelos de
conduta e, por que não dizer, outros problemas que algumas escolas não
estão preparadas para enfrentar (28, p. 14
).
Por tais motivos é sugerido que se investigue, que se prossiga com pesquisas
sobre o cotidiano escolar e seus sujeitos em relação com o conhecimento,
analisando também as disciplinas permeadas pelas mídias presentes na cultura das
pessoas e que se refletem em sala de aula. “A cultura do conformismo e do
escapismo contribuía para a manutenção de situações problemáticas de ensino
vividas pela série, sem questionamento sobre mudanças necessárias” (28, p.
144).
Questiona se a tecnologia: ela faz mudar nossas visões do mundo e o próprio
mundo, do mesmo modo como nossa visão de mundo influencia nosso pensar
tecnológico
(29, p. 27).
Pode-se perceber que a resposta está implícita na própria pergunta, que é
mais um modo de se questionar o mesmo e atual problema: a relação homem-
mundo que é sempre marcada pela capacidade intrínseca do homem de
transcender. Por isso, não apenas filósofos, mas cientistas também debatem a
mesma questão em busca de uma resposta que resolva a angústia moderna e
contemporânea. Einstein afirmava: “tornou-se chocantemente óbvio que a nossa
tecnologia excedeu a nossa humanidade”.
A tecnologia pode ser dirigida para atender as necessidades da sociedade,
sobretudo para o despertar daqueles que, no estabelecimento científico, se ocupam,
supostamente, da educação em ciências. Deve haver colaboração entre diferentes
pensadores de todos os campos, que se respeitem mutuamente, apesar de suas
diferenças, para mostrar os efeitos positivos e necessários da ciência e tecnologia,
44
mesmo quando muitos autores que falam mais de suas produções e
consequências catastróficas. [...] pode ter chegado o momento para um humanismo
novo, naturalista [...] melhor integração das capacidades racionais e emocionais, a
confiança das visões quantitativa e qualitativa do homem na natureza (30, p. 232).
Em fins de 1963, a National Science Foundation NSF, dos EUA, realizou
uma reunião com cerca de duas dezenas de cientistas, com o objetivo de convencer
alguns deles a adotarem uma nova abordagem do ensino introdutório de Física. O
argumento foi importante e foi considerado que, para fazê-lo, a estratégia mais
adequada a ser adotada era o “pluralismo”. O desafio foi aceito e esse “foi o início do
projeto de física” (31, p. 22 e 24). Havia o interesse de colocar em prática alguns dos
conceitos de ciências discutidos e tentar colocar um modelo pluralista de ensino-
aprendizagem no próprio material do currículo. Foi tomada uma decisão pedagógica
baseada em uma filosofia da educação não comum à maioria, que atraísse um
público variado e motivado; foi considerado importante ter um curso que fosse
significativo sob vários aspectos, cada qual recompensado na prática. Também foi
considerado que o ethos testado e efetivo do laboratório de pesquisa poderia ser
transmitido para a sala de aula.
Neste trabalho admite-se esse ponto de vista, que foi levado em conta ao montar
o curso ministrado e relatado no capítulo Metodologia e no capítulo Resultados e
Discussões. Outro aspecto considerado é que o se deve ter medo de experimentar
diferentes estilos de ensino e que é importante estar pronto para atualizar as idéias
pedagógicas, assim como se faz na pesquisa cienfica. Um aspecto fundamental neste
curso foi a visão humanística do mesmo e seu impacto social.
Outro aspecto importante levado em conta, a educação é diferente de
treinamento: a educação é alcançada transmitindo-se um ponto de vista que permite
generalização e aplicação numa grande variedade de circunstâncias em nossa vida,
desenvolvendo o que se denomina, em psicologia da educação, como transferência
de aprendizagem.
Este trabalho reconhece que a discussão aqui proposta, e embasada pelos
estudos exploratórios e o estudo de caso, também exigirá reflexão, práticas de
outros colegas que queiram testar, empiricamente, o que aqui se propõe.
Neste trabalho deduz-se que, à medida que isto for utilizado em novos
momentos, com novos grupos de estudantes, o que era inédito poderá se tornar
45
uma contribuição para a prática de ensino, na graduação e, talvez, como o trabalho
realizado por Holton (30), também no ensino secundário.
Neste momento histórico em que tanto se estuda e se fala sobre a crise no
ensino de ciências, é importante lembrar que crises são chaves para a promoção de
mudanças e também para permitir que ocorram revoluções. Aqui é proposta uma
revolução no ensino de ciência e tecnologia.
Bachelard considera surpreendente “que os professores de ciência [...] não
compreendam que alguém não compreenda”, que basta repetir lição a lição para
que haja compreensão (31, p. 23). A questão aqui levantada, neste trabalho, é que é
necessário mudar a cultura da sala de aula, é necessário derrubar “os obstáculos já
sedimentados pela vida cotidiana” da sala de aula. “O educador não tem senso do
fracasso justamente porque se acha um mestre” (31, p. 23, 24).
Neste trabalho o que se quer mostrar é que é possível superar tais obstáculos
citados pelos autores aqui relacionados. Esses não passam de obstáculos iniciais
para a cultura científica que sempre pode ser modificada que a marca do sujeito,
no mundo, é sua transcendência. É por isso que a cultura se modifica, a ciência se
renova e o ensino de ciência e tecnologia também pode renovar-se, tornar-se mais
dinâmico, analítico, criativo, gerando maior compreensão e construção de cultura
científica e compreensão e desenvolvimento de espírito científico.
“A filosofia científica deve ser essencialmente uma pedagogia científica. Ora,
para ciência nova, pedagogia nova [...] as fronteiras opressoras são fronteiras
ilusórias” (31, p. 26). Pode-se estabelecer uma analogia entre tal colocação e a da
proposta que aqui é feita para a cultura docente e discente no ensino de ciência e
tecnologia, na contemporaneidade.
Desta forma, pode-se perceber que a proposta deste trabalho é desafiadora e
inovadora; como se viu no capítulo anterior. A Erística de Schopenhauer tem grande
quantidade de títulos publicados e comentados, todos enfatizando o seu caráter de
possibilidade de uso para vencer debates a qualquer preço, usando-se os
estratagemas. Aqui, o que se ensina é como compreender o significado e o sentido
dos estratagemas de Schopenhauer para não se deixar enganar, distinguir
argumentos lícitos de ilícitos e buscar, como Sócrates, através da Maiêutica, idéias
convergentes, descobertas de novos caminhos e possibilidades.
46
Dessa forma, os estudantes (e também professores) podem examinar ou
detectar o que é verdadeiro do que é falso, o que é ciência e o que é pseudociência.
Com o desenvolvimento do pensamento analítico, crítico, é possível mudar,
inclusive, o modo de perceber a relação ensino-aprendizagem. É possível
desenvolver o prazer de pesquisar, de conhecer algo profundo, compreender o
PROCESSO das descobertas, a importância da imaginação para a criação, para a
exploração empírica. Isto permite desenvolver uma nova postura que contribua,
pessoal e socialmente, para a construção de ciência e tecnologia no sentido de
trazer maior benefício para o bem-estar humano. Isto é muito importante, pois
vivemos em uma era complexa, cheia de contradições e ambivalências. Sujeitos
mais preparados, com melhor desenvolvimento de sua capacidade pensante, no
sentido discutido neste trabalho, são mais capazes para resolução desses
problemas do mundo contemporâneo.
O que aqui é proposto permite gerar novas idéias, invenção e criatividade,
sem as quais é impossível o exercício da liberdade do sujeito.
Liberdade não deve ser apenas um discurso, deve ser consciência de ser
sujeito, no mundo, e sobre ele agir de modo consciente, crítico, criativo, assumindo,
reflexivamente, seu papel de fazer cultura. Cada (e todos) estudante deve ter
consciência de seu papel como sujeito, de sua responsabilidade pessoal, ética,
sociocultural, política, econômica, espiritual. Deve-se inquirir sobre: que contribuição
quer dar à sua geração e que herança quer deixar para as gerações futuras?
Como prepará-los para essa conscientização de que eles são parte da
história e, portanto, construtores da mesma? Que eles não são seres passivos que
absorvem informações, mas podem fazer tudo o que foi dito acima? Eis o desafio
educacional aqui proposto para o ensino da ciência e tecnologia.
47
4 METODOLOGIA
4.1 Delineamento experimental
Adotou-se o método/estratégia de Estudo de Caso (32) por ser um
instrumento que apresenta como uma de suas características a possibilidade de
coletar informações específicas e detalhadas, frequentemente de natureza pessoal,
envolvendo o pesquisador sobre um grupo de indivíduos em uma determinada
situação e durante um dado período de tempo.
É uma estratégia que ajuda a esclarecer uma decisão ou conjunto de
decisões, o motivo porque foi tomada; o modo como foi concretizada e os resultados
gerados.
Também é uma investigação empírica que permite investigar os limites entre
o fenômeno observado e o contexto no qual está inserido.
Permite, segundo Yin saber “como” ou “por quê”, o que é pertinente com as
questões propostas neste trabalho; o exige controle sobre eventos
comportamentais e focaliza acontecimentos contemporâneos:
O estudo de caso é a estratégia escolhida ao se examinarem
acontecimentos contemporâneos, mas quando não se podem manipular
comportamentos relevantes [...], embora os estudos de casos e as
pesquisas históricas possam se sobrepor, o poder diferenciador do estudo
de caso é sua capacidade de lidar com uma ampla variedade de evidências
documentos, artefatos, entrevistas e observações além do que pode
estar disponível no estudo histórico convencional. (32, p. 27)
O estudo de caso é boa estratégia quando se parte de proposições teóricas
que norteiem a coleta e a análise dos dados.
Relembrando: a hipótese de partida desse trabalho é a de que os estudantes
não sabem reconhecer argumentos falaciosos nem estabelecer diferença entre
argumentos lícitos e ilícitos. Porém, essa situação pode ser modificada se lhes for
ensinado como reconhecê-los e utilizá-los, através de análise e reflexão, como
forma de construção de conhecimento.
Nesse tipo de estudo, a observadora pode utilizar como técnicas de pesquisa
e observação entrevista, estudos exploratórios preliminares e dados documentais. É
um meio de organizar dados sociais coletados, resguardando seu caráter unitário.
48
Esta pesquisa adotou, inicialmente, a forma de estudos exploratórios como
possibilidade de coleta de dados para aprofundamento posterior do trabalho. Os
resultados desses estudos exploratórios realizados em novembro e dezembro de
2008 propiciaram elementos para elaboração do Estudo de Caso.
Autores comparam os diferentes tipos de pesquisa em relação aos estudos
exploratórios e citam alguns diferenciais (33, p. 36).
O diferencial do estudo exploratório em relação à pesquisa descritiva e à
pesquisa explicativa é que a meta da exploração é clarificar idéias, conceitos e
relações entre variáveis, com a finalidade principal de especificar hipóteses e
fundamentar novos estudos.
Esses “novos” estudos ocorreram após as férias escolares do final do ano
letivo de 2008, ou seja, no início do ano de 2009.
Enquanto nos estudos experimentais os procedimentos implicam controle
sistemático das variáveis, os estudos exploratórios não incluem tal exigência,
embora possam, em alguns casos, utilizar procedimentos relativamente sistemáticos
para a obtenção de observações empíricas e/ou para análise de dados.
Um outro diferencial é que, no caso desse período exploratório, o investigador
deve ir além de descrições quantitativas e/ou qualitativas, tentando conceituar as
inter-relações entre os fenômenos observados. Logo, o investigador deve tentar
organizar suas observações num quadro de referência teórico ou hipotético.
A análise baseou-se na observação das inter-relações entre os fenômenos
observados, isto é: os processos de subjetivação e objetivação dos estudantes
frente aos desafios que lhes foram propostos.
Esses desafios envolveram o teste de várias habilidades, tais como: análise,
reflexão, discurso, perspicácia, conhecimento dos temas, embasamento teórico,
diálogos, debates, redação de suas idéias/argumentos, interatividade no grupo e
com a professora/observadora, superação de timidez para estabelecer e manter
relação intersubjetiva, incentivação, motivação, contato face a face, resolução de
dilemas, entre outras.
Para análise dos resultados encontrados nas respostas dos estudantes, foram
utilizados os seguintes critérios: análise crítica, utilização de argumentação
apropriada, coerência na argumentação, incoerência na argumentação, aceitação
acrítica das idéias do autor, aceitação por mesma crença, não aceitação por crença
49
diferente, percebimento de falácias / sofismas / estratagemas, crítica ou
questionamento à fala do autor baseados em senso-comum.
Esses critérios foram escolhidos tendo-se em conta os fundamentos da
dialética socrática e da dialética erística de Schopenhauer, ambas discutidas no
capitulo Dialética Socrática e Dialética Erística de Schopenhauer, sendo seus
resultados discutidos no próximo capítulo.
Por considerar a entrevista um instrumento de coleta de dados importante, ela
foi utilizada como instrumento inicial no processo de pesquisa, para delinear o
questionário a ser utilizado nas etapas seguintes deste trabalho.
Foram selecionados os seguintes textos: “Convite para ir à palestra do Dr.
Christiano P. da Silva”; “Charge sobre o tema criacionismo e evolucionismo” e “Por
uma nova biologia” (34, anexos a, b, c), também de autoria do mesmo autor Dr
Christiano, para aplicação na fase exploratória.
O texto “Por uma nova biologia” foi também denominado, neste trabalho,
como texto 1. Nele foram identificados, pelo menos seis estratagemas que podem
ser correlacionados à classificação do filósofo Schopenhauer. O termo estratagema
aparece, neste trabalho, identificado pela letra “E” mais o número do mesmo,
segundo a classificação do próprio filósofo citado.
O texto 1 - “Por uma nova biologia” tem como ponto de partida, ao que
parece, o que Schopenhauer classifica como E.13: Alternativa forçada que implica
em que, devemos também apresentar a tese contrária à que estamos defendendo,
ressaltando a oposição com estridência e deixar que ele escolha, de modo que ele,
se não quiser ser contraditório, tenha de decidir pela nossa tese que, em
comparação à outra, se mostra muito mais provável. Percebe-se isso em seu
discurso, no texto sobre Criação X Evolução, onde ele realça com “estridência” os
pontos que ele afirma que são negativos na teoria da evolução, como por exemplo:
“o macaco não tem culpa de tudo que acontece de errado no mundo”; ou: “a teoria
da evolução contraria também pressupostos filosóficos e científicos construídos pela
humanidade”; ou ainda: “os evolucionistas preferem manter-se alheios ao debate”.
Vale lembrar que a teoria de Darwin aparece em um contexto histórico sem a
preocupação de explicar o homem, especificamente; sua intenção é investigar toda
a vida, a possível evolução das espécies de todos os seres vivos.
50
O autor faz afirmação equivocada ainda no primeiro parágrafo: “a evolução é
um fato e não uma tese, ensinam”. Sabe-se que é justamente o oposto: a teoria da
evolução é uma tese e não um fato – afirmação capciosa feita pelo autor.
O E 4: Pré-silogismo permeia todo o texto, pois o objetivo do autor é evitar
que o leitor, ou o ouvinte, perceba claramente a que conclusão se quer chegar. Para
tal, ele vai colocando, de modo disperso, algumas premissas sem ordem, no
desenrolar do texto, ocultando o jogo, com finalidade de induzir o leitor a aceitar a
conclusão que será colocada no final do texto, como modo de manipulação da
opinião pública.
Outro estratagema que aparece com frequência é o E 5: uso intencional de
premissas falsas. Aqui ele utiliza afirmações de conhecimento de domínio público,
mas sem o aprofundamento necessário que permitiria a reflexão e a réplica. Eis
alguns exemplos: “há um conjunto de provas rigorosamente científicas a demonstrar
que o homem jamais compartilhou com o macaco um ancestral comum”. Ora, a
negação do efeito não implica negar a causa. Ele afirma que não foram encontrados
fósseis que possam manter interesse na continuação da investigação pelos
cientistas. Isso é uma falácia, pois animais intermediários entre espécies foram
encontrados, como dinossauros e mamutes.
Outro exemplo de E 4 e E 5: “contra o Criacionismo move-se atualmente uma
conspiração que tem o objetivo de lançar-nos no completo descrédito” uma
afirmação de efeito, no início do segundo parágrafo, forçando o uso do exagero da
palavra “conspiração” quando deveria, se fosse coerente, argumentar com fatos
que ele diz que os fatos é que são importantes e que se devem apresentar os
pontos fortes e fracos de cada teoria. No texto o aparece nenhuma apresentação
de algum ponto fraco do Criacionismo; apenas afirmações vagas e genéricas tais
como: “as pegadas deixadas na natureza favorecem o modo de pensar que se fia na
figura do Criador. Nada de concreto a embasar a teoria da evolução” como se
pode perceber, ele não disse quais o as “pegadas” e nem o que de “concreto”
no Criacionismo. Apenas continua criticando, com estridência, o evolucionismo, bem
ao estilo dos pré-silogismos, afirmações falaciosas, genéricas, aleatórias e também
se utilizando do E 3: Mudança de modo: usando o que é apresentado de modo
relativo como se fosse absoluto, induzindo a uma “compreensão” de sentido
diferente, como na seguinte afirmação: “e note-se que nunca se escavou tanto no
mundo como nos últimos 100 anos e o máximo que os darwinistas encontraram para
51
sustentar sua teoria foram peças fragmentárias como restos de fêmures e
mandíbulas – alegação falsa como foi dito no início dessa análise.
É interessante notar como ele alia a esses estratagemas também o E 1:
Ampliação indevida e E 12: Manipulação semântica, mudando, inclusive o
sentido do conceito de ciência como tal: “o Criacionismo, por seu lado, o desafia
tais pressupostos e procura se ater às evidências verdadeiramente científicas [...]
algo assim como se de um ovo de serpente brotasse, de repente, um pássaro
emplumado. Pergunto-me, e aos pais e professores, se não está passando da
hora de, num debate franco e aberto, colocar em dúvida este improvável todo
científico”.
E concluindo observa-se o uso do E 32: Rótulo odioso: fazer afirmação que
gere vida e possa levá-la à categoria de detestada: “convenhamos que pedaços
de ossos são um alicerce muito frágil para se assentar sobre eles uma teoria que
nega Deus”, ou seja, fica explícito, de forma estridente, em seu texto, que
darwinismo é sinônimo de negação de Deus – outra falácia.
A questão agora é analisar as respostas dos estudantes para constatar, ou
não, se eles perceberam essas ou algumas dessas falácias que estão presentes no
texto.
É interessante observar como em um texto tão pequeno, uma página, o autor
usou seis estratagemas da Dialética Erística de Schopenhauer. Todos eles
adequados ao objetivo precípuo de convencimento do leitor, acerca do seu ponto de
vista.
estratagemas que não constam aqui, mas que, em situação face a face,
com outro(s) contra-argumentando, poderiam aparecer, desde que seu objetivo
fosse vencer a disputa, sempre. São os seguintes: E 8: Encolerizar o adversário; E
31: Incompetência irônica; E 9: Perguntas em ordem alterada: E 17: Distinção
de emergência; E 23: Impelir o adversário ao exagero; E 27: Provocar a raiva; E
34: Perguntas ao meneio de esquiva: E 37: Tomar a prova pela tese.
Como os três textos selecionados eram da área de biologia, foram convidados
dois profissionais dessa área para realização de uma entrevista semi-estruturada,
mestres e professores de biologia em instituição pública de nível superior, em cursos
de graduação.
As entrevistas foram feitas individualmente, de acordo com a disponibilidade
de cada entrevistado.
52
Foi considerada de grande importância a avaliação deles em relação aos
textos que seriam apresentados aos estudantes na fase exploratória realizada em
novembro e dezembro de 2008.
Ao longo da entrevista eles detiveram o maior foco da sua atenção sobre o
texto “Por uma nova biologia”.
Eles observaram que, no de gina, havia uma nota informando que o Dr.
Christiano P. da Silva, à época da publicação do texto na Revista da Associação de
Pesquisa da Criação, era Professor de Matemática na Universidade Federal de
Viçosa e Presidente dessa Associação.
Juntamente com uma cópia desse texto, foi entregue, a cada professor, um
questionário semi-estruturado desenvolvido com o objetivo de coletar dados, o qual
foi respondido por apenas um dos entrevistados.
O segundo entrevistado ofereceu um livro sobre o tema “evolucionismo” para
possível aprofundamento no conhecimento do mesmo.
A seguir foi-lhes solicitado que fizessem uma análise crítica do texto que lhes
havia chamado mais atenção “Por uma nova biologia”, observando possíveis falhas
na argumentação. Um dos entrevistados apresentou sua análise por escrito e o
outro a fez verbalmente.
Os resultados dos questionários respondidos pelos entrevistados, os dados
coletados na entrevista e a análise crítica que fizeram do texto foram analisados e
relacionados aos estratagemas de Schopenhauer. O mesmo questionário foi
aplicado aos alunos de Ciências Humanas e de Ciências Exatas, posteriormente.
Esses dados coletados, posteriormente, com os alunos, foram analisados
com base nos seguintes critérios: a) concordam ou discordam sem reconhecer
argumentos falaciosos; dão opiniões; b) defendem o ponto de vista do autor em
alguma das três questões baseados em crenças e opiniões; c) analisam uma ou
mais afirmações com argumentação superficial, fazendo comentários vagos.
4.2 Coleta de dados
O estudo prosseguiu da seguinte forma: foi realizado em novembro e
dezembro de 2008 e o universo pesquisado envolveu graduandos de duas
faculdades públicas.
53
Inicialmente, o universo pesquisado era composto por uma turma de
ciências exatas e quatro turmas de ciências humanas, devido à abertura de alguns
professores, que se dispuseram a colaborar com a pesquisa. Entretanto, das
quatro turmas de ciências humanas selecionadas e que concordaram em
responder o questionário e assinar o termo de livre consentimento, apenas uma
turma o respondeu com número significativo para amostragem.
Devido a esse fato, a concretização empírica dessa etapa do trabalho ficou
constituída por uma turma da área de ciências exatas (turma mista, com maior
número de homens) e outra da área de ciências humanas (turma
predominantemente feminina, com a presença de apenas um homem). As turmas
foram escolhidas por se tratarem de estudantes de instituições públicas de ensino
superior onde eles têm, entre outros conhecimentos, os de biologia, matemática e
filosofia contidos no currículo escolar.
A amostra selecionada foi composta por uma turma com 20 estudantes, da
área de Ciências Exatas e a outra com 19 estudantes, da área de Ciências
Humanas, ambas do quarto período da graduação.
A aplicação dos questionários ocorreu no final de novembro e início de
dezembro de 2008, nas duas turmas selecionadas. Os estudantes assinaram,
espontaneamente, termo de consentimento livre e esclarecido (APÊNDICE A) que
lhes foi entregue antes da distribuição do questionário. Este era composto por
quatro questões para os três textos propostos igualmente para ambas as turmas,
que responderam por escrito, na presença dos seus professores, utilizando em
dia 20 minutos para cada uma das turmas.
Para realização dessa etapa foram aplicados, para os alunos, os três textos
que apresentavam falácias, as quais foram identificadas e reconhecidas
previamente neste trabalho, como estratagemas na categorização da Dialética
Erística de Schopenhauer.
Em seguida, utilizou-se o mesmo questionário respondido por um dos
professores entrevistados, na etapa anterior (APÊNDICE B), visando identificar,
nas respostas dadas pelos alunos, se eles reconheceriam tais falácias e se
saberiam argumentar sobre as mesmas.
Os questionários foram recolhidos e analisados com base nos cririos
descritos, buscando identificar nas respostas dos estudantes pistas sobre a
hipótese de partida.
54
A partir dos resultados obtidos com a análise dos questionários, decidiu-se
elaborar um curso sobre o tema a erística e a falácia no discurso
pseudocientífico”.
O objetivo foi observar a receptividade dos estudantes e confirmar a
hipótese inicial de que, se lhes fossem ensinadas práticas de dialética socrática e
de dialética erística, eles aprenderiam a detectar as falhas de argumentação, os
argumentos enganosos, melhorar sua capacidade de alise critica e de redigir,
com melhor propriedade, os seus argumentos discursivos.
Em seguida, utilizando-se o todo de Estudo de Caso elaborou-se um
curso ministrado somente aos alunos da área de ciências exatas, no período de
março a abril de 2009, com carga horária total de 8 horas/aula, divididas em quatro
dulos de 2 horas/aula cada.
O curso foi aprovado pelas coordenações de curso da instituição, na qual
havia realizada a etapa anterior (fase exploraria) desse trabalho, em novembro
de 2008.
Ele foi divulgado pelas coordenações em seus respectivos sites, bem como
em visitas a todas as turmas explicando a sua finalidade e a motivação para fazê-
lo. As inscrições foram feitas nas secretarias dessas coordenações, limitando-se a
trinta o número de vagas.
O curso teve boa aceitação, com 38 inscrições, mas apenas 30 alunos foram
selecionados, de acordo com o número de vagas previsto.
No primeiro encontro os alunos assinaram o termo de consentimento livre e
esclarecido. Estiveram presentes 26 alunos; no segundo encontro quatro alunos
que o puderam estar presentes na aula anterior justificaram sua ausência, e
compensaram a carga horia com prorrogação do horário previsto. No terceiro e
quarto encontros estiveram presentes 25 alunos, os quais participaram de todos os
encontros e atividades dos mesmos. Por este motivo, foram considerados apenas
as atividades destes 25 alunos para posterior análise dos resultados.
Foi elaborada uma apostila, especialmente para esse curso.
Iniciou-se o curso com uma introdução, onde foi apresentado seu objetivo:
despertar, nos participantes, o interesse pela reflexão e capacitá-los a distinguir
afirmações e argumentos citos de ilícitos, levando-os a reconhecer os argumentos
falsos do discurso pseudocientífico, contribuindo para sua formão cnica e
científica.
55
Foi observada a motivação deste trabalho no sentido de dar sua contribuição
para que os estudantes desenvolvessem pensamento crítico, análise e reflexão e
pudessem aplicar tais habilidades a todas as áreas de trabalho, em seus contextos
específicos ou em situações do cotidiano.
Colocou-se a importância de se discutir as circunstâncias culturais que
permitiram que alguns discursos tidos como científicos alcançassem grande
reconhecimento, apesar de não o serem, e não foram desmascarados,
adequadamente, mesmo dentro das academias.
Fez-se a contextualização histórica, mostrando como, desde a Grécia
antiga, era observado esse cuidado com a reflexão. Hipócrates, pai da medicina,
cujo juramento ainda é feito atualmente, nas formaturas nessa área,
recomendava: “não deixem nada ao acaso. Não percam nenhum detalhe.
Combinem as observações contraditórias. o tenham pressa”.
Foi lembrado que aprender ciência não significa memorizar resultados mais
relevantes, nem suas realizações mais eminentes. Aprender ciência é, acima de
tudo, tomar conhecimento de seu “modus operandi”. sim, ocorre uma mudança
de comportamento com consequências para a vida e para a sociedade. Esse curso
pretendeu ser uma contribuição nesse sentido.
Os temas foram tratados na seguinte sequência: introdução, os fundamentos
da Dialética Socrática e fragmentos de dois dlogos socráticos para que os
estudantes pudessem acompanhar melhor a linha de racionio ali engendrada.
Com isso, ocorreu uma preparação para a apresentação dos fundamentos da
Diatica Erística de Schopenhauer, de forma sucinta, com seus 38 estratagemas.
Os conceitos discutidos, a então, permitiram a discussão seguinte, a respeito de
Pseudociência e o ensino de ciência e tecnologia na contemporaneidade.
Na parte prática foram utilizados os estratagemas, em forma de exercícios e
grupo de discussão com os estudantes. O objetivo era estabelecer uma relação
entre teoria e prática, ensinando aos estudantes o exercício da diatica socrática e
da diatica erística aqui propostas.
Foi esclarecido, aos estudantes, que a bibliografia, no final da apostila,
ficava como indicação e possibilidade de pesquisa e estudo para aqueles que,
aguçados em sua curiosidade, quisessem aprofundar a temática desenvolvida
nesse curso.
56
Nas páginas 26 e 27 da apostila foi colocado um quadro, retirado de um site
que apresenta tipos de falácias, mas com categorização diferente da de
Schopenhauer. Para permitir uma atividade significativa durante o curso, foi-lhes
sugerido que consultassem o site, o qual afirmava que a importância de
reconhecer as falácias é poder se esquivar ou evitar tantas armadilhas!
Discutiu-se, ainda, através do conteúdo da apostila, que reconhecer
pseudociência é fundamental para desmascarar artigos, livros, propagandas,
pesquisas que mantêm a aparência de ciência, mas são pseudociência; e que ela
tem algumas características comuns: abuso reiterado de conceitos e terminologia
provenientes da matemática e da física; falar abundantemente de teorias científicas
das quais só se tem idéias confusas; usar conceitos da ciência nas ciências sociais
e humanidades sem nenhuma justificação conceitual ou empírica; ostentar
erudição superficial; manipular frases e sentenças que o, inclusive, carentes de
sentido; e tudo isso feito de modo intencional.
Nas considerações finais foi exposto, na apostila, que essa contribuição
visava levar os estudantes à compreensão de que debater temas interessantes
desenvolve prazer de estudar, de pesquisar, de fazer sua própria investigação, de
se motivar a continuar a treinar seu espírito investigativo como uma forma de
construção pessoal e também coletiva do saber. Permite, também, a superação da
visão simplista de progresso como acumulação e reconhecê-lo como processo
indissociável da constrão do conhecimento.
Os procedimentos metodogicos escolhidos para o desenvolvimento do
curso foram:
a. avaliação prévia com alunos: um teste = foram usados dois textos (Texto
1 e Texto 2) com falhas na argumentação científica, solicitando a alise
crítica e a identificação das falhas de argumentação dos mesmos.
Objetivo: verificar se os alunos percebiam tais falhas;
b. fundamentação: trabalhar a Dialética Socrática e a Dialética Erística de
Schopenhauer com os estudantes. Objetivo: diferenciar argumentação
convergente de argumentão divergente para verificar se eles
reconheciam argumentação inválida, sobretudo no discurso científico;
c. avaliação foi usado o texto 1 e um texto novo (Texto 3). Objetivo:
houve mudança de comportamento? A capacidade de avaliar
57
inconsisncias melhorou? Reconheceram facias e estratagemas? O
objetivo foi atingido?
No primeiro encontro foram entregues o texto 1 e 2 com a devida orientação
sobre a atividade referente aos mesmos, e solicitado que fossem entregues sem a
elaboração de comentários sobre eles. Foi explicado aos participantes que o “não
fazer comentários” sobre aquela atividade naquele momento era importante para
que eles viessem, posteriormente, a compreender o processo do que
experienciariam naqueles quatro encontros. A orientação que acompanhou os dois
textos foi a seguinte:
“ANALISE CADA UM DOS TEXTOS, SEPARADAMENTE. ELABORE UMA
CRÍTICA OU DEFESA DE CADA UM DELES, UTILIZAND0-SE DE UMA ANÁLISE
OU REFLEXÃO BEM ELABORADA, RACIOCÍNIO LÓGICO BEM ENCADEADO”.
No segundo encontro, houve aula expositiva sobre os conceitos de Dialética
Socrática e de Dialética Erística de Schopenhauer, utilizando-se apostila distribuída
aos alunos com a devida contextualização histórica, deixando bem clara a diferença
entre dialética socrática, que se utiliza dos diálogos, e dialética erística de
Schopenhauer que esclarece bem como é o uso de estratagemas nas disputas e
como defender-se deles. Discutiu-se a importância das seguintes perguntas: por
quê? para quê? como? no processo de construção do conhecimento. Esclareceu-se
a diferença entre três tipos de interações polêmicas: disputa, discussão e
controvérsia; e entre pensamento gico e pensamento dialético. Foi realizada uma
dinâmica usando-se um exemplo clássico, contido na apostila; em seguida era-lhes
solicitado que o transpusessem, analogamente, para exemplos do cotidiano. No final
dessa atividade, foi sugerida, como atividade extraclasse, que os estudantes
analisassem os estratagemas das páginas 26 a 28 da apostila distribuída no curso
(retirados de um site da internet) e em seguida os relacionassem com os
estratagemas de Schopenhauer apresentados nas páginas de 13 a 20 da mesma
apostila.
O terceiro encontro iniciou-se com a partilha oral da atividade proposta
extraclasse, a partir da formação de um grupo de discussão. A seguir passou-se à
atividade de relacionar teoria e prática, por meio da seguinte dinâmica: uma dupla de
estudantes começava um diálogo ou disputa e a turma identificava qual era o tipo de
58
interação polêmica que estava ocorrendo, explicando com argumentos apropriados
a intenção de cada um deles (se havia falácia ou sofisma). Em situações de impasse
para a dupla, era perguntado aos demais: “quem pode dar um argumento ou uma
saída estratégica para essa situação?”
Essa dinâmica permitiu aos estudantes a compreensão e identificação
gradual do processo do diálogo e o processo da disputa - o como, o porquê, o para
quê, ou seja, a finalidade de cada debatedor. Quando uma disputa era identificada,
os estudantes identificavam também os argumentos inválidos, as falácias, os
estratagemas, justificando com argumentação apropriada. Quando um diálogo era
identificado, os estudantes apontavam o objetivo daquela dupla, naquele momento,
através de argumentação apropriada, isto é: a) encontravam solução para o
problema proposto; b) chegavam a um consenso sobre verdadeiro ou falso em
relação a alguma afirmação usualmente utilizada pela cultura; c) geravam
aprendizado novo através da clarificação de idéias e conceitos.
No quarto e último encontro foi-lhes proposto realizar uma atividade
extraclasse semelhante à do segundo encontro, neste momento de forma individual
e por escrito, solicitando aos estudantes que relacionassem, pelo menos, dois
estratagemas de Schopenhauer aos estratagemas sugeridos no quadro das páginas
26 a 28 da apostila. Após essa atividade, foi entregue, novamente, o texto 1,
juntamente com o texto 3 para serem analisados. Desta vez, a proposta para os dois
textos era:
“LEIA, ATENTAMENTE, O TEXTO E VERIFIQUE SE PRESENÇA DE
FALÁCIAS E ESTRATAGEMAS NO MESMO. SE HOUVER, IDENTIFIQUE-OS, SE
POSSÍVEL”.
As respostas à proposição acima foram analisadas qualitativa e
quantitativamente e os resultados serão demonstrados no capítulo seguinte.
59
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO
5.1 Entrevista com os professores de biologia
Na análise do texto 1, feita pelos professores, foram apontadas falhas na
argumentação como:
O autor é ferrenho defensor do Criacionismo e opositor do Evolucionismo. Ele
nega que a teoria evolucionista seja científica com fundamentação nas pesquisas de
Darwin, na genética e na bioquímica e afirma que o Criacionismo é científico, pois
Deus criou tudo e o gênesis prova isto. Contudo, a ciência considera a bíblia como
não científica, produto de revelações e de foro religioso.
Na teoria Criacionista cada espécie foi criada separadamente por um artífice
inteligente. Ocorreu em curto espaço de tempo (sete dias). Idade da terra de
aproximadamente 10.000 anos, embora James Ussher (1581-1656), bispo irlandês
houvesse calculado a idade dos profetas e dito que a criação do mundo ocorreu no
dia 23 de outubro de 4004 a.C., um domingo no calendário juliano, assim como a
expulsão de Adão e Eva do paraíso ocorreu em 10 de novembro de 4004, uma
segunda feira. Logo, explica a origem da terra e da vida levando em conta escritos
sagrados; explica a origem atribuindo a constituição das coisas à ação de um sujeito
criador. A mais conhecida versão criacionista, no mundo ocidental, foi instituída
pelas religiões judaico-cristãs. No criacionismo bíblico Deus criou a terra em sete
dias: no primeiro construiu o universo e a terra; no segundo e no terceiro
estabeleceu os céus, as terras e os mares do mundo; nos dois dias seguintes
apareceram os primeiros seres vivos e a separação do dia e da noite; no sexto e
último dia surgiram os demais animais e o homem. No sétimo dia Ele descansou.
A teoria Evolucionista é aceita pelos cientistas. A evolução é aceita diante de
evidências de sseis que identificam estágios gradativos da evolução e ocorreu ao
longo de milhões de anos. Hoje, o darwinismo não explica tudo, os cientistas
buscam outras respostas para as questões da origem.
A ação da seleção natural tem como consequência a sobrevivência dos
indivíduos portadores das melhores variações adaptativas em relação ao meio em
que vivem. Tais variações são transmitidas de uma geração para outra. O acúmulo
de variações, ao longo de inúmeras gerações, altera de tal forma os indivíduos que
60
se chega a um estágio no qual surgem descendentes diferentes de seus ancestrais,
e que formam uma nova espécie.
Darwin não conseguiu explicar como as variações ocorrem, apenas diz que
elas ocorrem e são transmitidas; por isso a ciência continua pesquisando, a partir
das idéias de Darwin, e tem acrescentado novos conhecimentos como seleção
natural e incorpora noções de genética, mutação, recombinação gênica, isolamento
reprodutivo, explica como as variações hereditárias ocorrem e sua transmissão de
uma geração para outra.
Variações hereditárias ocorrem: pela recombinação genética que ocorre
durante a produção dos gametas e quando gene de um indivíduo combina com gene
de outro durante a fecundação, resultando novos arranjos de genes e gerações com
características diferentes que serão selecionadas; pelas mutações que são
variações espontâneas dos genes. Genes mutantes determinam novas
características nos organismos e podem ou não ser favoráveis aos indivíduos que os
possuem, face ao ambiente em que vivem. Quando favoráveis prevalecem, são
transmitidas aos descendentes, acumulando-se e contribuindo para o aparecimento
de novas espécies.
61
5.2 Análise dos questionários aplicados na turma de Ciências Exatas
Todos responderam ao questionário (APÊNDICE A) e alguns fizeram
perguntas, demonstrando curiosidade sobre este trabalho. As respostas serão
apresentadas a seguir. Os exemplos citados abaixo respeitam a grafia e pontuação
utilizada pelos respondentes. Nos exemplos utilizou-se letras maiúsculas para
identificar respostas dadas pelos alunos.
Sobre a pergunta de nº 1 (Justifique sua motivação para ir à palestra
recebendo “este” convite), 0% fez argumentações adequadas, sendo que 20% dos
estudantes responderam com argumentos superficiais e 80% fizeram comentários
vagos e deram opiniões, conforme demonstrado no GRAF.1.
Fizeram
argumentação
apropriada
0%
Responderam
com argumentos
"superficiais"
20%
Fizeram
comentários
vagos e deram
opiniões
80%
Gráfico 1 - Motivação para ir à palestra
Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como
comentários vagos e opiniões:
A análise a ser feita é que a palestra será algo relacionado com a e-
volução da humanidade. Não me sentiria motivado por ser apresentado
dessa forma, dando a impressão de algo antigo ou algo parecido.
B esta capa demonstra a “passagemde conhecimento. O conhecimento
e o ensino ao longo da evolução humana. Um homem sem identidade tendo
um papel direto no ensino. Não me sentiria motivado, que as figuras não
são bem explícitas.
62
Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:
C o autor está querendo passar uma idéia de evolução, como várias
teorias afirmam que o homem é uma evolução dos macacos, ele exibe um
macado com capacidade humana, que é dar aula. Não iria na palestra pois
o tema não me interessa hoje, e o cartaz não me despertou interesse.
Sobre a pergunta de nº 2 (Qual é a teoria defendida pelo autor), 100%
responderam criacionismo, reconhecendo o ponto de vista do autor.
Sobre a pergunta de 3 (Analise os argumentos apresentados pelo autor),
0% fez argumentações adequadas, sendo que 20% dos estudantes responderam
com argumentos superficiais e 80% fizeram comentários vagos e deram opiniões,
conforme demonstrado no GRAF. 2.
Fizeram
argumentação
apropriada
0%
Responderam
com
argumentos
"superficiais"
20%
Fizeram
comentários
vagos e deram
opiniões
80%
Gráfico 2 - Argumentos apresentados pelo autor
Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como
comentários vagos e opiniões:
A o autor coloca argumento que o macaco é um ancestral comum e de
que tudo há de errado no mundo não é culpa dele.
C os argumentos do autor são bem explícitos e coerentes. Sendo que as
idéias do criacionismo e do evolucionismo são bem discutidas, expondo os
prós e os contras de cada teoria.
Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:
B – ele apenas criticou e questionou a teoria da evolução
63
Sobre a pergunta de 4 (Justifique se concorda com ou discorda das idéias
do autor), 0% fez argumentações adequadas, sendo que 25% dos estudantes
responderam com argumentos superficiais e 75% fizeram comentários vagos e
deram opiniões, conforme demonstrado no GRAF. 3.
Fizeram
argumentação
apropriada
0%
Responderam
com argumentos
"superficiais"
25%
Fizeram
comentários
vagos e deram
opiniões
75%
Gráfico 3 - Concorda ou discorda com as idéias do autor
Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como
comentários vagos e opiniões:
A – concordo quando ele fala que a evolução não é uma tese e sim um fato.
E que essa evolução é conotante até os dias de hoje.
B concordo com a teoria do autor, que o criacionismo é mais
comprovado cientificamente, sendo mais exata. o evolucionismo se
baseia em idéias de filósofos. Sem ter algo a ver de concreto para se
fundamentarem.
Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:
C – não, pois vários estudos também apontam o contrário, então não é uma
coisa simples de entender e afirmar.
64
5.3 Análise dos questionários aplicados na turma de Ciências Humanas
Sobre a pergunta de nº 1 (Justifique sua motivação para ir à palestra
recebendo “este” convite), 0% fez argumentações adequadas, 16% dos estudantes
responderam com argumentos superficiais e 84% fizeram comentários vagos e
deram opiniões, conforme demonstrado no GRAF. 4.
Fizeram
argumentação
apropriada
0%
Responderam
com argumentos
"superficiais"
16%
Fizeram
comentários
vagos e deram
opiniões
84%
Gráfico 4 - Motivação para ir à palestra
Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como
comentários vagos e opiniões:
A – sim, porque apresenta uma chamada interessante, apesar de não
sabermos do que exatamente será falado e por este motivo instiga nossa
curiosidade.
B – parece tratar a evolução humana vista por um ser que não é humano. O
layout não é convidativo, mas poderia me interessar pelo tema, não pela
ilustração que, para mim, é negativa.
Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:
C a imagem apresenta uma versão reversa da conhecida teoria da
evolução. A palestra parece interessante, entretanto, o próprio palestrante
não parece pensar assim que ofereceu um pen-drive para chamar os
alunos.
Sobre a pergunta de nº 2 (Qual é a teoria defendida pelo autor), 100%
responderam criacionismo, reconhecendo o ponto de vista do autor.
65
Sobre a pergunta de 3 (Analise os argumentos apresentados pelo autor),
0% fez argumentações adequadas, sendo que 20% dos estudantes responderam
com argumentos superficiais e 80% fizeram comentários vagos e deram opiniões,
conforme GRAF. 5.
Fizeram
argumentação
apropriada
0%
Responderam
com argumentos
"superficiais"
20%
Fizeram
comentários
vagos e deram
opiniões
80%
Gráfico 5 - Argumentos apresentados pelo autor
Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como
comentários vagos e opiniões:
A o autor coloca que os danos que a nossa população “evoluída”
causam ao mundo não podem ser sinônimo de uma teoria de evolução.
B acredito e concordo com os argumentos do autor não deveria passar
esta matéria do surgimento com apenas modo científico, cegando” os
alunos sobre outras fontes e formas posveis de surgimento humano.
Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:
C o temos comprovação suficientes para acreditarmos no
evolucionismo como verdade absoluta. Pensar a possibilidade de crião
do mundo é algo inevitável. Precisamos nos ater a comprovações
verdadeiramente científicas, mas fatos que não podem ser explicados
ainda.
Sobre a pergunta de 4 (Justifique se concorda com ou discorda das idéias do
autor), 0% fez argumentações adequadas, sendo que 5% dos estudantes
responderam com argumentos superficiais e 95% fizeram comentários vagos e
deram opiniões (GRAF. 6).
66
Responderam
com argumentos
"superficiais"
5%
Fizeram
argumentação
apropriada
0%
Fizeram
comentários
vagos e deram
opiniões
95%
Gráfico 6 - Concorda ou discorda com as idéias do autor
Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como
comentários vagos e opiniões:
A concordo, na escola realmente por não ser passado outra informação,
acreditamos no método evolutivo, mas quando crescemos e tomamos
consciência e criamos nossa opinião, temos acesso a outras informações,
podemos ter um conceito novo sobre o assunto, por isso seria importante
temos acesso a todas as informações.
B concordo com a teoria da criação, mas penso que nem tudo pode ser
explicado pela ciência. Os alunos devem ter a possibilidade de pesquisar
suas teorias e não chegarem com explicações prontas que o tém
comprovação. Achei interessante o ponto de vista e mais aceitável que o
evolucionismo.
Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:
C – talvez ele esteja se empolgando com os conceitos. Dizer que evoluimos
dos macacos refere-se a uma característica biológica. As atitudes que
temos são de caráter psicológico, o que não, pelo que eu saiba, é possível
de comparação com aqueles mamíferos.
67
5.4 Curso: a erística e a falácia no discurso pseudocientífico
Iniciado o ano de 2009, em fevereiro foi planejado o curso que possibilitaria
a utilização da estratégia/método de estudo de caso. A amostra escolhida foi
aquela relatada no capítulo Metodologia.
O curso iniciou-se com os alunos de graduação em ciências exatas, de
uma escola pública; apresentaram-se com atitude curiosa e tímida, vários deles
recusaram-se a colocar seus nomes nos dois textos que analisaram e
entregaram.
Seguiu-se aula expositiva. Um estudante manifestou-se dizendo que
buscara, no google, o significado de estica; outro perguntou se o tema e o
contdo do curso tinham a ver compersuasão”.
À medida que os conceitos foram apresentados e correlacionados com o
cotidiano dos estudantes e com seu contexto sócio-histórico-cultural e temporal
(são jovens estudantes com expectativas típicas de sua faixa etária, um código
de linguagem comum), eles foram fazendo perguntas, expressando curiosidade e
busca de entendimento do conteúdo ministrado. Isso se reflete nos gráficos (de 7
a 10), quando se compara o texto 1 apresentado na aula do dia 23 de mao e o
mesmo texto apresentado no dia 01 de abril.
No texto 1, distribuído aos estudantes em 23/03/09, 60% criticaram ou
questionaram a fala do autor; 84% o perceberam o uso de facias, sofismas e
estratagemas, 16% foram capazes de perceber o uso de facias, sofismas e
estratagemas pelo autor; 16% não aceitaram os argumentos do autor por terem
crenças diferentes; apenas 4% dos estudantes aceitaram a argumentação do
autor por possuírem a mesma crea; 20% tiveram uma aceitação acrítica dos
argumentos do autor, 28% argumentaram de forma incoerente; 72%
apresentaram coencia na argumentação, baseada no senso comum; 60%
fizeram uso de argumentação apropriada com base no senso comum; e 80%
fizeram uma análise crítica do texto, também baseados no senso comum,
conforme demonstrado no GRAF. 7.
68
20
15
18
7
5
1
4
4
21
15
0 5 10 15 20 25
Análise crítica
Uso de argumentação apropriada
Coerência na argumentação
Incoerência na argumentação
Aceitação acrítica do autor
Aceitação por mesma crença
Não aceitação por crença diferente
Percebimento de falácias / sofismas / estratagemas
Não percebimento de falácias / sofismas / estratagemas
Crítica ou questionamento a fala do autor
Gráfico 7 - Texto 1 - 23/03/09
Exemplos de respostas dadas pelos alunos:
A a crítica à forma com que a teoria darwinista é aceita nos meios científicos e
acadêmicos, exposta no texto de Christiano Pinto da Silva Neto, é válida, uma
vez que essa teoria o está concretamente comprovada. Contudo, a posição
desse autor a favor do ensino das iias criacionistas nas escolas é
controversa, polêmica e inválida. Ao defender a substituão da teoria
darwinista pela iia de que Deus criou a vida, no ensino de Biologia, Christiano
não leva em consideração os efeitos das idéias criacionistas em pessoas que
não acreditam em Deus ou seguem religiões diferentes do catolicismo. Além
disso, como adepto do criacionismo, ele ignora os conflitos existentes na
relação entre ciência e religo.
B – o texto 1 (Por uma nova Biologia) aborda a questão da crítica ao ensino
cego da Teoria da Evolução nas Escolas. De fato, é de interesse dos
educadores o desenvolvimento da capacidade de crítica dos alunos e não
seria má idéia a introdução da Teoria do Criacionismo no plano de curso de
Biologia, que outra teoria também é comentada: a teoria da origem da
vida na Terra a partir de seres extraterrestres. O conhecimento de mais
teorias e o confronto e a análise de suas idéias instigam a capacidade de
crítica dos estudantes [...] A abordagem poderia ter sido feita de modo
menos agressivo à outra linha de pensamento, que sua certeza é
tamanha a favor do criacionismo.
C concordo com o ponto de vista do autor do texto, visto que o
evolucionismo de Darwin é concebido como um fato, uma constatação, e
não uma teoria. E toda teoria pode ser refutada a qualquer momento, desde
que se tenha uma comprovação científica para tal. É difícil aceitar que nós,
a raça humana, tenhamos sido concebidos do puro acaso, sem que tenha
havido uma força maior e misteriosa. Pode-se adotar uma concepção que
concilie o criacionismo e o evolucionismo, como se Deus tivesse usado os
meios que a ciência explica para criar o que somos hoje. Algo que a ciência
explica os caminhos, mas sem excluir a vontade do Criador.
69
No mesmo texto 1, distribuído aos estudantes em 01/04/09, 100% deles
criticaram ou questionaram a fala do autor utilizando argumentão apropriada, todos
(100%) perceberam as facias, sofismas e estratagemas, não houve aceitação ou não
aceitão das iias do autor por crea; todos os estudantes (100%) tiveram coerência
na argumentão, fizeram uso de argumentação apropriada e analisaram o texto de
forma crítica e reflexiva, conforme demonstrado no GRAF. 8.
25
25
25
0
0
0
0
25
0
25
0 5 10 15 20 25
Análise crítica
Uso de argumentação apropriada
Coerência na argumentação
Incoerência na argumentação
Aceitação acrítica do autor
Aceitação por mesma crença
Não aceitação por crença diferente
Percebimento de falácias / sofismas / estratagemas
Não percebimento de falácias / sofismas / estratagemas
Crítica ou questionamento a fala do autor
Gráfico 8 - Texto 1 - 01/04/09
Exemplos de respostas dos alunos (observação: grifos são feitos pelos
alunos, respeitando transcrição literal):
A – o texto apresenta argumentos falaciosos e é possível identificá-los como
estratagemas, segundo a dialética erística de Schopenhauer. No trecho
“Estou convencido – e centenas de pesquisadores sérios em todas as
partes do mundo [...]”, o autor faz uso de argumento de autoridade e de
número para induzir a aceitação do leitor. É possível identificar o
estratagema 13 alternativa forçada, usado pelo autor na quarta linha do
segundo parágrafo. Para o que o leitor aceite sua tese, o autor induz a
chegar a uma resposta ideal para os seus questionamentos. O estratagema
19, fuga do específico para o geral, também está presente no texto. Para
demonstrar que a teoria darwinista não é crível, o autor faz uso da incerteza
geral do saber humano, exemplificando com falhas da teoria evolucionista.
B no texto muitos argumentos falaciosos. O primeiro que pode ser
citado é o uso intencional de premissas falsas.
O autor alega comparações
científicas que não existem, como por exemplo, a prova de que o homem
não possui ancestrais comuns com os macacos, quando na verdade o
70
oposto é demonstrado. Em segundo momento, pode-se notar que o autor
faz uso de rótulo odioso, ao afirmar que o ensino da Teoria da Evolução é
feito por razões obscuras. Assim, o autor faz uso de uma palavra pejorativa
ao questionar a situação, o que também indica que manipulação
semântica. O autor tenta persuadir os leitores a exigir o ensino da Teoria
criacionista fazendo uso de persuasão pela vontade. no segundo
parágrafo faz uso de falsa reductio ad absurdum, alegando persuasão pela
vontade ao apelar para os educadores.
C este texto não pode ser considerado um texto científico, pois sua forma
de argumentos não é lida. Falácias e estratagemas percorrem o texto e
invalidam sua argumentação. Vou listar e comentar abaixo alguns
exemplos. Ele, o autor, afirma que várias provas rigorosamente
científicas que demonstram que o homem e o macaco não compartilham
ancestral comum. Ora, se tais provas existem, onde estão? Como encontrá-
las? O que sabemos da comunidade científica é que mais de 98% dos
genes o contemplados tanto no DNA humano quanto no do chimpanzé,
um macaco. Outra falha nessa mesma afirmação é o fato de ele atribuir tal
mentira como fala de cientistas, autoridades no tema. Este é um
estratagema utilizado quando nos esquivamos ou nos isentamos da
responsabilidade do que essendo dito e transferimos para um grupo o
respaldo. [...] se existem tantos cientistas que desacreditam e derrubam a
teoria da evolução, ela certamente teria sido extinta ou transformada [...]
ele propõe aqui: E 13: alternativa forçada. [...] Quando ele diz que os
evolucionistas se mantém “alheios aos debates”, ele faz uso de E12
manipulação semântica, pois ele quer dizer que os evolucionistas não
freqüentam muitos debates mas alheio faz jus a ignorância, desprezo de
informação, alienação. E ainda postula o que será descoberto! Quanta
ousadia!
O mesmo ocorreu com a atividade relacionada aos textos 2 e 3 aplicada neste
curso.
No texto 2, de Jacques Lacan, distribuído aos participantes do curso em
23/03/09, 60% não responderam, alegando ser o texto incompreensível, 44%
criticaram ou questionaram a fala do autor, baseados em senso comum; 100% não
perceberam o uso de falácias, sofismas e estratagemas, não houve aceitação ou
não aceitação das idéias do autor por crença; 16% tiveram uma aceitação acrítica
dos argumentos do autor, 0% argumentou de forma incoerente; 40% apresentaram
coerência na argumentação baseado em senso comum; 36% fizeram uso de
argumentação apropriada com base no senso comum; e 36% fizeram uma análise
crítica do texto, também baseados no senso comum (GRAF. 9).
71
9
9
10
0
4
0
0
0
25
11
15
0 5 10 15 20 25
Análise crítica
Uso de argumentação apropriada
Coerência na argumentação
Incoerência na argumentação
Aceitação acrítica do autor
Aceitação por mesma crença
Não aceitação por crença diferente
Percebimento de falácias / sofismas / estratagemas
Não percebimento de falácias / sofismas / estratagemas
Crítica ou questionamento a fala do autor
Não responderam alegando ser o texto incompreensível
Gráfico 9 - Texto 2 - 23/03/09
Exemplos de respostas dos alunos:
A discordo de Jacques Lacan. o texto diz muito e significa pouco, pois
suas idéias por mais diversas que sejam, estão totalmente desconexas no
texto, o que impossibilita a coerência. O autor colocou grande quantidade
de informações no texto no intuito de passar imagem para o leitor de um
texto rico em significado, tentando assim intimidar o leitor para convencê-lo
da validade de sua posição.
B Jacques Lacan em sua tese apresentada no texto 2, faz uso de uma
linguagem e lógica tão complicada que chega a prejudicar seu
entendimento por completo. Tentar ligar os fatos com um objeto
aparentemente não demonstra nenhuma lógica, que no início do texto ele
começa falando de perdas e de como elas afetam o sujeito.
C o autor diz que a estrutura neurótica é um toro, mas sua linha de
raciocínio confusa mal deixa abertura para questionamentos. Não concordo
nem discordo de Lacan, pediria um outro exemplo.
No texto 3, também de Jacques Lacan, distribuído aos estudantes em
01/04/09, 100% deles criticaram ou questionaram a fala do autor utilizando
argumentação apropriada, todos (100%) perceberam as falácias, sofismas e
estratagemas, não houve aceitação ou não aceitação das idéias do autor por crença;
todos (100%) os estudantes tiveram coerência na argumentação, fizeram uso de
argumentação apropriada e analisaram o texto de forma crítica e reflexiva, conforme
demonstrado no GRAF. 10.
72
25
25
25
0
25
0
0
25
0
25
0
0 5 10 15 20 25
Análise crítica
Uso de argumentação apropriada
Coerência na argumentação
Incoerência na argumentação
Aceitação acrítica do autor
Aceitação por mesma crença
Não aceitação por crença diferente
Percebimento de falácias / sofismas / estratagemas
Não percebimento de falácias / sofismas / estratagemas
Crítica ou questionamento a fala do autor
Não responderam alegando ser o texto incompreensível
Gráfico 10 - Texto 3 - 01/04/09
Exemplos de respostas dos alunos:
A o zero não é um número irracional, como ele diz. No cálculo diferencial
e integral nós vemos que o tender a zero é irracional. É um número muito
pequeno, que não é zero, ele passa perto de zero. A definição de um
número imaginário é a V-1=i. um número irracional é diferente dos
imaginários. Os irracionais geralmente são usados a partir de sinais. Como
por exemplo o
π.
Nesse texto Lacan usa o E 36 porque muitas pessoas que
não sabem matemática, podem pensar que é verdade. Além disso, tem o
E29, pois ele tenta misturar matemática com psicologia.
B – E 36 – discurso incompreensível: o autor utiliza uma linguagem de difícil
compreensão a fim de desconcertar e aturdir o adversário. E 11 salto
indutivo: o autor conclui apressadamente que todo número irracional é
imaginário. Argumento falso, pois os números irracionais são aqueles que
não podem ser representados por uma fração e os números imaginários são
aqueles representados pelo eixo y cartesiano. E 11 salto indutivo: o autor
conclui apressadamente que, por não serem intuitivos, os números
imaginários não correspondem a algo de real. Os números imaginários
possuem várias aplicações na engenharia.
C Jacques Lacan usa em seu texto uma certa dose de manipulação
sentica (E 12) ao escolher a mefora “...a vida humana poderia ser definida
como um lculo no qual o zero seja irracional”, pois esta metáfora favorece a
sua tese de uma maneira melhor do que qualquer outra. também, claro,
uma certa dose de discurso incompreensível (E 36) durante todo o texto pois,
para leigos, o texto não passa de um grande discurso cnico. Ora, para
alguém que entende razoavelmente de matemática, o zero não é irracional,
portanto essa afirmação é falsa. Percebe-se eno que Lacan usa
intencionalmente premissas falsas (E 20). Consequentemente, as conclues
do autor o feitas “à força através de distoões de conceitos (E 24). É
possível concluir que Lacan faz um discurso duplamente falacioso. Duplamente
pois, em primeiro lugar um discurso incompreensível para leigos e, em
segundo lugar por usar de argumentos falsos durante todo o texto e sua
concluo se baseia nesses falsos argumentos.
73
O objetivo foi cumprido: pôde-se perceber, claramente, que os informantes
aprenderam a identificar argumentos falaciosos, sofismas, estratagemas. O que no
dia 23 de março, primeiro dia de aula, identificavam como “algo errado ou esquisito”;
eles criticavam, mas utilizando-se de afirmações do senso-comum, embora
houvesse coerência em suas falas, em seus discursos contudo, estavam longe de
manifestar uma argumentação apropriada no sentido de análise crítica ou reflexão;
dois alunos a usaram a palavra “inferência”, mas demonstrando que não
compreendiam o real significado da palavra e, portanto, não sabiam aplicar o
processo relacionado à inferência na argumentação.
No último dia do curso todos identificavam falácias, sofismas, estratagemas e
colocaram, espontaneamente, seus nomes e assinaturas nas atividades entregues,
sendo que lhes foi dada a opção, desde o primeiro dia, de usar pseudônimos, se
quisessem. Outro fator significativo: eles não apenas identificaram, mas também
colocaram o nome e o número dos estratagemas aos quais correspondiam as falhas
nos textos, ou seja: foram além do proposto, tal era sua motivação desenvolvida ao
longo desse curso.
Isso evidencia como a prática feita no segundo e terceiro encontros foi
motivadora para eles. O processo de incentivão funcionou: treinaram em duplas e em
grupo de discuso, juntamente com a professora. Gradualmente, foram relacionando
teoria e prática, estabelecendo relações com seu cotidiano escolar e extraescolar,
reconhecendo aplicabilidade do contdo ministrado.
No terceiro e quarto encontros chegaram animados, rindo, contando que, em
sala de aula da graduação, nas diversas disciplinas, um colega falava para o outro:
“olha, isso é E...” e divertiam-se com a curiosidade de seus colegas de turma que
queriam saber do que estavam falando.
Outra atividade dos estudantes que ultrapassou a expectativa foi o exercício
das ginas 26 e 27 da apostila: foi-lhes apresentado o quadro abaixo, retirado de
um site da internet com tipos de falácias, significado e exemplo, conforme exposto a
seguir:
74
Latim / Tipos de Falácias Significado Exemplo
Argumentum ad Antiquitatem /
Argumento Tradicional
Afirmar que algo é verdadeiro ou bom
porque é antigo ou "sempre foi assim"
> "Se o meu avô diz que Garrincha foi
melhor que Pelé, deve ser verdade."
Argumentum ad hominem /
Ataque ao argumentador
Em vez de o argumentador provar a
falsidade do enunciado, ele ataca a
pessoa que fez o enunciado.
> "Se foi um burguês quem disse isso,
certamente é engodo".
Argumentum ad ignorantiam /
Argumento da Ignorância
Ocorre quando algo é considerado
verdadeiro simplesmente porque não foi
provado que é falso (ou provar que algo
é falso por não haver provas de que seja
verdade).Note que é diferente do
princípio científico de se considerar falso
até que seja provado que é verdadeiro.
> "Existe vida em outro planeta, pois
nunca provaram o contrário"
Non sequitur / Não segue
Tipo de falácia na qual a conclusão não
se sustenta nas premissas. uma
violação da coerência textual.
> "Que nome complicado tem este
futebolista. Deve jogar muita bola!"
Argumentum ad Baculum / Apelo
à Força
Utilização de algum tipo de privilégio,
força, poder ou ameaça para impor a
conclusão.
> "Acredite em Deus, senão queimará
eternamente no Inferno."
Argumentum ad populum / Apelo
ao Povo
É a tentativa de ganhar a causa por
apelar a uma grande quantidade de
pessoas.
> "A maioria das pessoas acredita em
alienígenas, portanto eles existem."
Argumentum ad Verecundiam /
Apelo à autoridade
Argumentação baseada no apelo a
alguma autoridade reconhecida para
comprovar a premissa.
> "Se Aristóteles disse isto, então é
verdade."
Generalização Apressada / Falsa
indução
É o oposto da Regra Geral Ocorre
quando uma regra específica é atribuída
ao caso genérico.
> "Minha namorada me traiu. Logo, as
mulheres tendem à traição."
Composição (Tomar o todo pela
parte)
É o fato de concluir que uma propriedade
das partes deve ser aplicada ao todo.
> "Todas as peças deste caminhão são
leves; logo, o caminhão é leve."
Straw man / Espantalho
Consiste em criar idéias reprováveis ou
fracas, atribuindo-as à posição oposta.
> "Meu adversário, por ser de um
partido de esquerda, é a favor do
comunismo radical, e quer retirar todas
as suas posses, além de ocupar as
suas casas com pessoas que você não
conhece."
Tu quoque / Você também
Se estabelece quando se usa os erros
cometidos por outros para desconsiderar
o argumento apresentado
> "Não aceito acusações de erros de
português, pois você também erra
muito"
Ad misericordiam / Apelo à pena
Justifica-se aceitação do argumento pelo
uso de termos que procuram conquistar a
simpatia ou a ligação emocional das
pessoas com o objeto da conclusão,
mesmo desconsiderando-se evidências
em contrário.
> "Como você pode ser cruel e não
destinar recursos internacionais à
Etiópia? Pense em todos os homens,
mulheres e crianças que estão
morrendo de fome por lá!"
Ignoratio Elenchi / Falácia da
diversão
É a introdução de material irrelevante ao
ponto em discussão, em geral com o
objetivo de desviar o argumento para
outra conclusão, muitas vezes mais fácil
de ser combatido.
> "Não acho que homens e mulheres
devam ganhar o mesmo sario por
funções iguais. Sou contra a igualdade
entre os sexos. Em um shopping center,
imagine o que aconteceria se os
banheiros fossem unissex: tanto homens
quanto mulheres se sentiriam
desconfortáveis. Você não acha que
tenho razão?"
Plurium interrogationum / Falácia
da interrogação
A principal idéia é colocar uma questão
que, não importa que resposta tenha
comprometem o opositor .Quem for
tentar responder a qualquer uma dessas
perguntas,estará em apuros.
> "Onde foi que você escondeu o
dinheiro que roubou?"
75
Latim / Tipos de Falácias Significado Exemplo
False metaphor / Analogia
imprópria
São muito úteis durante explanações
difíceis de serem entendidas.
> "Funcionários são como pregos:
freqüentemente precisamos martelá-los
para ficarem mais firmes."
False dichotomy / Falso dilema
Este caso ocorre quando o argumentador
propõe um número limitado de
alternativas dentre todas as possíveis,
em muitos casos sugerindo,
tendenciosamente, uma delas como
verdadeira.
> "Se você não está a meu favor,então
é porque você é contra mim."
Post hoc ergo propter hoc /
Depois disso, então por causa
disso
Consiste em dizer que, pelo simples fato
de um evento ter ocorrido logo após o
outro, eles têm uma relação de causa e
efeito.
> "O Japão rendeu-se logo após a
utilização das bombas atômicas por
parte dos EUA. Portanto, a paz foi
alcançada devido à utilização das
armas nucleares."
Fonte; http://recantodasletras.uol.com.br/teoria literária/1022481
Foi acrescentado à frente de cada uma das linhas, uma coluna em branco,
para que eles pudessem, neste local, colocar pelo menos, um ou dois estratagemas
com o nome e o número de categorização de Schopenhauer (que é diferente em
nomenclatura e exemplos em relação à tabela apresentada).
O que surpreendeu foi que os estudantes colocaram rios e não apenas um
ou dois exemplos de correlação identificando a relação entre eles. Mais uma vez
eles mostraram seu aprendizado, registrando-o dessa forma, por escrito, na
atividade proposta.
Desse modo, percebe-se que a hipótese de partida foi confirmada na
estratégia do estudo de caso: ensinando-lhes a reconhecer o que são falácias,
sofismas, estratagemas, em textos científicos e explicando-lhes a importância do por
quê, do como e do para quê no estudo de Ciência e Tecnologia eles
compreenderam o processo de pesquisa e da construção nessa área de
conhecimento e manifestaram sua motivação em prosseguir no aprofundamento da
matéria.
Percebendo esses significados, o estudo nessa área adquire um sentido novo
que está além dos livros didáticos com suas respostas prontas e com fórmulas
aprendidas de modo desconectado do sentido de construção do conhecimento do
qual, tanto eles quanto os cientistas, podem e devem fazer parte.
Essa compreensão gera uma noção de perspectiva que, até então, os
estudantes não tinham. Estudar era só cumprir tarefas e, segundo eles, muitas
vezes desagradáveis e desmotivadoras.
76
Nos textos 2 e 3 o autor relaciona sua perceão do sujeito neutico com
exemplos matemáticos. No texto 2, muitos estudantes (15) negaram-se a responder;
alegaram ser imposvel responder por que “o cara não falava nada com nada”, “que o
cara queria era aparecer, “que o cara não sabia matemática”, entre outras afirmações
do gênero, como foram apresentados exemplos acima, juntamente com os gráficos.
No último encontro, no texto 3, do mesmo autor, os estudantes fizeram-lhe
críticas, algumas ferrenhas; demonstraram, por escrito, justificativa apropriada para
suas críticas, indicando quais eram e onde estavam os “erros de raciocínio” e que
“seu discurso era todo falacioso”. Os exemplos citados anteriormente, juntamente
com os gráficos, evidenciaram isso.
Está explicitado, nas análises, onde houve aceitação por mesma crença, onde
não houve aceitação por crença diferente, no primeiro encontro do curso. no
último encontro, houve análise crítica detalhada. A aceitação acrítica e incoerência
na argumentação desapareceram.
No final do curso, ao entregarem o material, percebia-se a alegria, a
autoconfiança, a busca de confirmação, com a professora, de que estavam
entregando um trabalho no qual, eles próprios, reconheciam o avanço, suas
conquistas no aprendizado. Quiseram e fizeram, espontaneamente, uma avaliação,
por escrito, do curso, deles e da professora e indagavam sobre a possibilidade de
fazer novo curso, se seria oferecido outro curso desse e quando, que tanto eles
quanto vários de seus colegas gostariam que isso acontecesse.
Seguem-se alguns pequenos exemplos das autoavaliações espontâneas, no
final do quarto encontro: os alunos serão identificados por letras maiúsculas, uma
vez que suas identidades são preservadas, como observado no termo de
consentimento livre e esclarecido que assinaram no início do curso.
A “quero deixar meus sinceros agradecimentos à palestrante pela tão
singular oportunidade de aprender o conteúdo de importância crucial para
que os alunos desenvolvam pensamento crítico e possam identificar as
pseudociências rotuladas como verdade muitas vezes nos discursos de
docentes acadêmicos. Um curso como esse é único. Poderia ter sido
expandido pois com uma carga horária reduzida não é possível explorar
com profundidade o conteúdo. Sugiro a difusão do curso em outras
disciplinas e outras faculdades”.
B “as aulas do curso A Erística e a Falácia do Discurso Pseudocientífico”
foram ministradas com qualidade de ensino de forma interessante, a partir
de debates e exposição teórica. No geral, o curso foi válido, pois ajudou a
aprimorar o meu senso crítico e a minha capacidade argumentativa.
Extensões do curso serão muito bem vindas”.
77
C “considero o curso como um grande aprendizado e que este poderá ser
de grande valia para a vida profissional, que está cercada de discursos
falaciosos. Lamento a pequena carga horária de apenas 8 h, mas serviu
para ajudar na leitura dos textos, artigos e opiniões de profissionais.
Despertou também o interesse em continuar os estudos acerca do
conteúdo”.
D – “o curso “A Erística e a Falácia do Discurso Pseudocientífico” tem
grande validade didática, pois permite às pessoas desenvolverem
habilidades que as capacite a manterem uma postura crítica frente ao
conhecimento. É fundamental que o indivíduo tenha ferramentas que lhe
permitam selecionar a relevância das informações obtidas a fim de obter um
maior amadurecimento intelectual. Dessa forma a produção do
conhecimento pode se dar de forma mais séria”.
E “o curso é de grande valia, pois aumenta a capacidade de interpretação
do aluno, aguça a análise crítica. Apesar de pouco tempo de curso aprendi
bastante, pois ele foi ministrado de forma objetiva e de fácil compreensão. A
mestranda que ministrou o curso se mostrou bem preparada para dar as
aulas e simpática aos alunos, respondendo bem às perguntas e dando
exemplos cabíveis. Espero mais cursos desse tipo...”.
F “o curso de Erística e Falácia do Discurso Pseudocientífico mostrou-se
importante para a formação acadêmica, uma vez que o papel de um
graduando não é somente adquirir conhecimento, mas também questioná-lo
a fim de torná-lo mais de acordo com a realidade observada. Interpretar o
discurso falacioso faz parte de um desenvolvimento científico”.
É gratificante constatar que os resultados foram além das expectativas
iniciais, que a hipótese foi comprovada e que, portanto, é possível fazer algo para
contribuir para a melhoria da qualidade no ensino de ciência e tecnologia e dar essa
contribuição social, pedagógica, educacional, cultural, por meio da relação dos
conteúdos de ciência e tecnologia com a filosofia da ciência e da tecnologia.
A professora lhes disse que não é da área de exatas, mas, como eles
constataram, ela foi capaz de perceber argumentos falaciosos, ainda que não tenha
conhecimento específico, por exemplo, da área de matemática. Mostrou-lhes que
isso é possível graças ao processo que eles também puderam experienciar durante
o curso.
Ela fez referência a um termo que eles utilizaram em um de seus exemplos:
“Parabolóide”, dizendo: “mesmo não tendo noção do significado do termo, vocês não
conseguiram me enganar, percebi os argumentos falaciosos, lembram-se?”
Um estudante, espontaneamente, desenhou para a professora e explicou, em
uma folha de papel, o que é “Parabolóide” e com o esclarecimento de que podem
ser de dois tipos: o elíptico e o hiperbólico. Havia observações como: o primeiro tem
forma de “taça”, o segundo tem forma de “sela de montaria”. A turma ficou curiosa,
quis ver e todos foram complementando as explicações e relacionando com o tema
78
e criticando, ainda mais enfaticamente, os dois textos de Lacan. Os estudantes eram
categóricos em afirmar, por unanimidade, que “o autor podia entender de
psicanálise, mas de matemática ele não sabia nada, só utiliza recursos enganosos e
ainda fazia afirmações completamente errôneas” e iam identificando e discutindo
afirmações sobre matemática, mostrando onde estava o erro e porque era erro e se
orgulhavam de mostrar seu conhecimento em matemática e física o que, segundo
eles, o autor desconhecia.
Foi gratificante perceber o desenvolvimento dos alunos em um curso de
apenas quatro encontros.
Após o encerramento do curso a professora foi abordada, por diversas vezes,
pelos alunos que atenderam ao curso, para informar-lhe que, ao ler artigos, ouvir
palestras, assistir certos documentários, entre outras coisas, conseguiam
identificar argumentos falaciosos, sofismas e, muitas vezes, qual o estratagema que
estava sendo usado. Informaram, também, que conseguiam identificar uma
falácia, não conseguindo, ainda, identificar o estratagema. Manifestaram vontade
de atender a um curso de extensão, para aprofundar mais esse tipo de
conhecimento.
Isso corrobora a hipótese de que basta dar a oportunidade aos alunos, pois
eles estão prontos e motivados para um ensino analítico, de maior relação com a
prática, através do exercício de reflexão. Mostra como ciências exatas e ciências
humanas são campos complementares e, que percebido isso pelos educadores, o
ensino de ciência e tecnologia pode se tornar muito produtivo, criativo, dinâmico e
interessante, contribuindo para melhor relação entre ciência, tecnologia e
humanismo ou tecnohumanismo de qualidade superior ao que se tem comprovado
até então.
79
6 CONCLUSÃO
É um erro capital teorizar antes de ter os dados. Insensivelmente,
começa-se a distorcer os fatos para adaptá-los às teorias, em vez de fazer
com que as teorias se adaptem aos fatos.
(Sherlock Holmes)
O objetivo deste trabalho é investigar como a Dialética Socrática e a Dialética
Erística de Schopenhauer poderiam ajudar alunos e professores a perceber
argumentos enganosos, capciosos, a desenvolver pensamento crítico e
compreender o processo de desenvolvimento da ciência como uma estrutura rica e
dinâmica, e não apenas como cálculos e resultados apresentados de modo
descontextualizado do processo de pesquisa, investigação e conclusão dos
cientistas.
Na primeira parte da pesquisa empírica, com uma turma de ciências exatas e
uma turma de ciências humanas, de duas faculdades públicas, comprovou-se que
os alunos NÃO reconheciam falácias, estratagemas, sofismas; que utilizavam
respostas de senso comum quando lhes era solicitada uma análise crítica, uma
reflexão.
No curso ministrado para alunos de graduação de uma dessas duas
faculdades públicas onde foi realizada a primeira etapa da pesquisa, ficou
constatado, como foi relatado nos capítulos Metodologia e Resultados e Discussão,
o salto qualitativo empreendido por esses alunos após aprenderem, de modo teórico
e prático, a arte da argumentação apropriada, do reconhecimento de falácias,
sofismas, estratagemas. Também aprenderam como esquivar-se desses
estratagemas.
Perceberam o PROCESSO DE SUA APRENDIZAGEM e reconheceram a
importância de compreender, no ensino de ciência e tecnologia, o PROCESSO
desenvolvido pelo cientista para ir de uma hipótese inicial às conclusões e à
refutação de falsos caminhos.
Eles relataram, espontaneamente, que aprenderam COM PRAZER e, por isto,
quiseram ir e foram além do proposto pela professora/pesquisadora; relataram que
gostariam de ter um curso de aprofundamento sobre este tema: A Erística e a
Falácia do Discurso Pseudocientífico.
80
Os resultados relatados às páginas 73 a 78 mostram que o objetivo foi
cumprido: o que no dia 23 de março era identificado como “algo errado ou esquisito”,
no dia 01 de abril era identificado como argumentos falaciosos, identificavam os
estratagemas segundo a classificação do filósofo Schopenhauer; nos textos 2 e 3,
eles identificaram os erros de matemática e criticaram o autor do texto, identificando,
com conhecimento que possuem de física e matemática, os argumentos enganosos
do autor.
Quando lhes foi apresentado um quadro com 17 estratagemas com nomes e
classificação diferentes da classificação de Schopenhauer, e lhes foi solicitado que
identificassem, pelo menos, 2 ou 3 e fizessem a correlação com 2 ou 3 dos
estratagemas de Schopenhauer, eles foram além: quase cem por cento dos alunos
identificaram e fizeram correlação dos 17 estratagemas com os 38 apresentados por
Schopenhauer.
Desta forma, na estratégia do estudo de caso, os estudantes aprenderam a
reconhecer o significado e a aplicabilidade do por quê, do para quê, do como no
estudo de ciência e tecnologia; com isto aprenderam a reconhecer, em textos,
falhas/estratagemas na construção de pseudociência. Eles compreenderam o
processo de pesquisa e de construção nesta área de conhecimento e manifestaram
sua motivação em prosseguir no aprofundamento da matéria.
Os resultados desta pesquisa corroboram a hipótese de partida: é possível e
proveitoso modificar programas e currículos, adequando-os a uma maior
estimulação do pensamento crítico, da análise e da reflexão. Também mostram a
importância da contribuição da filosofia da ciência e tecnologia para um ensino de
qualidade, melhor formação de alunos e professores nesta área.
Desta forma, as aulas podem se tornar desafiadoras, criativas, reflexivas,
permitindo a superação da “falta de significação” da qual reclamam os alunos e
alertam alguns pesquisadores desta área. Contribui para despertar a consciência do
sujeito que elabora discursos.
Este trabalho mostra como o pensamento de Sócrates e de Schopenhauer
são atuais e, utilizados de modo didaticamente apropriado, auxiliam alunos e
professores na construção de um modelo/modo inteligente e eficaz de ensino de
ciências na relação teoria-prática.
Ficou evidenciado que basta dar oportunidade apropriada, com recursos
didáticos adequados, que os alunos se mostram motivados, ávidos por este ensino
81
dinâmico e reflexivo, de maior relação com a prática, como foi descrito no capítulo
Metodologia.
Os resultados deste trabalho permitiram mostrar, também, que ciências
exatas e ciências humanas são campos complementares e podem e devem
dialogar. Uma vez percebido isso pelos educadores, o ensino de ciência e tecnologia
pode enriquecer, tornar-se instigante, estimulante, indicando possibilidade de
desenvolvimento de um tecnohumanismo que traga contribuições promissoras para
a sociedade contemporânea.
82
7 REFERÊNCIAS
1 WENNING, C. J. Engaging students in conducting socratic dialogues:
suggestions for science teachers. Illinois: University of the Illinois, 2006.
2 MATTHEWS, M. R. História, filosofia e ensino de ciências: a tendência atual de
reaproximação. Nova Zelândia: departamento de educação da universidade de
Auckland, 2007.
3 FLOWERS, M. et al. Art: adversary arguments and the logic of personal attacks.
Yale: Yale University, 1982.
4 VOLPI, Franco. A arte de ter razão Schopenhauer. São Paulo: Martins Fontes,
2005
5 MONDOLFO, R. Sócrates. São Paulo: Mestre Jou, 1972.
6 VAZ, H. C. L. Antropologia filosófica. Vol. I. São Paulo: Loyola, 1998.
7 CARVALHO, O. Como vencer um debate sem ter razão. Rio de Janeiro:
Topbooks, 2003.
8 LIPMAN, M. O pensar na educação. Petrópolis: Vozes, 1995.
9 PLATÃO. Diálogos I: Teeteto (ou do conhecimento). São Paulo: Edipro, 2007.
10 PLATÃO. Apologia de sócrates. Coleção os Pensadores. São Paulo: Cia. Brasil
Editora, 1980.
11 JAEGER. Werner. Paidéia los ideales de la cultura griega. Mexico: Fondo de
Cultura Economica, 1957.
12 VOLPI, Franco. A arte de ter razão Schopenhauer. São Paulo: Martins Fontes,
2005.
13 LIPMAN, M. A filosofia vai à escola. São Paulo: Summus, 1990.
14 FLOWERS, M. et al. Art: adversary arguments and the logic of personal attacks.
Yale: Yale University, 1982.
15 SAGAN, C. B. O mundo assombrado pelos demônios. São Paulo: Cia das
Letras, 2007.
16 PRACONTAL, Michel. A impostura cientifica em 10 lições. São Paulo: UNESP,
2002.
17 DASCAL, Marcelo. A dialética na construção coletiva do saber científico. In:
REGNER, A. C e ROHDEN, L (org). A filosofia e a ciência redesenham
horizontes. São Leopoldo, RS: Unisinos, 2005.
18 BACHELARD, G. A epistemologia. Lisboa: Edições 70, 2001.
83
19 MAGALHÃES, G. Introdução à metodologia das pesquisas: caminhos da
ciência e tecnologia. São Paulo: Ática, 2005.
20 LIPMAN, M. A filosofia na sala de aula. São Paulo: Nova Alexandria, 1994.
21 REGIS DE MORAES. Filosofia da ciência e da tecnologia. Campinas: Papirus,
2002.
22 KUHN, Thomas S. A Estrutura das revoluções cientificas. São Paulo:
Perspectivas, 1987.
23 OLIVEIRA, Bernardo Jefferson de. (org.). História da ciência no cinema. Belo
Horizonte: Argumentum / Scientia - UFMG, 2005.
24 MAIA, P. F; JUSTI, R. S. Desenvolvimento de habilidades no ensino de
ciências e o processo de avaliação: análise da coerência. Ciência & Educação,
v.14, n.3, p. 440-457, 2009.
25 PEREIRA, Marcos Vilela. Redes em construção; meios de comunicação e
práticas educativas. São Paulo: JM, 2003.
26 PINTO, Carmen Lúcia Lascano; PRIETSCH, Daisi da Fonseca; SILVEIRA,
Denise Nascimento; PORTO, nia Maria Esperon; REAL, Marlise Flório. No estar-
junto, a construção do sentido e relações de pesquisa em educação, comunicação e
formação docente. In: PEREIRA, Marcos Vilela. Redes em construção; meios de
comunicação e práticas educativas. São Paulo: JM, 2003.
27 GOMES, Pedro Gilberto. Art: a televisão, a criança e o adolescente. In:
PEREIRA, Marcos Vilela. Redes em construção; meios de comunicação e
práticas educativas. São Paulo: JM, 2003.
28 PORTO, nia Maria Esperon. A televisão na escola. Afinal, que pedagogia é
esta? São Paulo JM EDITORA, 2000.
29 PINHEIRO, Lília. Homem: o ser tecnológico. Rev. Filosofia, Ciência e Vida, p.27,
n.27, 2009.
30 HOLTON, Gerald. A imaginação científica. Rio de Janeiro: Zahar Editores,
1979.
31 BACHELARD, G. A formação do espírito científico. Rio de Janeiro:
Contraponto, 2003.
32 YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Trad. Daniel Grassi.
3.ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.
33 GOULART, I.B. Estudos exploratórios em psicologia e trabalho. In: _____. (org.)
Psicologia organizacional e do trabalho; teoria, pesquisa e temas correlatos. São
Paulo: Casa do Psicólogo. 2002.
34 SILVA, C. P. Anexos a, b e c.
84
APÊNDICE A
QUESTIONÁRIO
1. JUSTIFIQUE SUA MOTIVAÇÃO PARA IR À PALESTRA RECEBENDO “ESTE”
CONVITE.
2. QUAL É A TEORIA DEFENDIDA PELO AUTOR?
3. ANALISE A CHARGE APRESENTADA SOBRE OS TEMAS CRIACIONISMO E
DARWINISMO
4. ANALISE OS ARGUMENTOS APRESENTADOS PELO AUTOR,
EXERCITANDO SUA REFLEXÃO, ATRAVÉS DE RACIOCÍNIO LÓGICO BEM
ENCADEADO.
85
APÊNDICE B
A.1 = 23/03/2009 = TEXTO 2 DO CURSO
AUTOR: JACQUES LACAN
ADAPTAÇÃO: Elivane Amaral de Souza Assis (mestranda CEFET/MG)
JACQUES LACAN foi um dos mais influentes psicanalistas do século
XX. Ele também centra seu interesse na topologia, ramo da matemática que trata
(entre outras coisas), das propriedades dos objetos geométricos. A seguir eis uma
pequena transcrição de seu pensamento e de suas afirmações em um seminário:
J.L: Analogia com o quê? “S” designa algo que pode ser escrito
exatamente como esse S. E eu disse que o “S” que designa o sujeito é instrumento,
matéria, para simbolizar uma perda (loss). Uma perda que você apreende por
experiência própria como sujeito (e eu também). Em outras palavras, a separação
(gap) entre uma coisa que tem significados marcados e essa outra coisa que é meu
verdadeiro discurso, que tento colocar no lugar onde você está, você não como
outro sujeito, mas como pessoa capaz de me compreender. Onde está o análogo
[analagon]? Ou essa perda existe, ou não existe. Se existe, é possível designar a
perda por um sistema de símbolos. Em todo caso, a perda não existe antes que esta
simbolização indique seu lugar. Isso não é analogia. É, na verdade, em alguma parte
das realidades, essa espécie de toro. Este toro realmente existe e é exatamente a
estrutura neurótica. Não é uma analogia; nem mesmo uma abstração, porque uma
abstração é alguma espécie de diminuição da realidade, e eu penso que isso é a
própria realidade. (Lacan, 1970, p. 195-196).
Obs: um toro é a superfície formada por um pneumático oco; sua palestra foi
editada, posteriormente, no livro The Languages of Criticism and the Science
of Man, pp. 186-200. Editado por Richard Macsey e Eugenio Donato.
Baltimore: John Hopkins Press.
86
APÊNDICE C
A.4 = 01/04/2009 = TEXTO 1 DO CURSO
A ERÍSTICA E A FALÁCIA DO DISCURSO PSEUDOCIENTÍFICO
TÍTULO: POR UMA NOVA BIOLOGIA
AUTOR: PROF. DR. CHRISTIANO
ATIVIDADE: após ler e analisar, atentamente esse texto, identifique se
argumentos falaciosos; é possível identifica-los como estratagemas, segundo a
dialética erística de Schopenhauer? Por quê? Explicite qual é (ou quais são) o(s)
estratagema(s) encontrado(s) e justifique sua resposta.
87
APÊNDICE D
A.4 = 01/04/2009 = TEXTO 3 DO CURSO
A ERÍSTICA E A FALÁCIA DO DISCURSO PSEUDOCIENTÍFICO.
Adaptação de um texto de Jacques Lacan, feita pela mestranda
PROF. Elivane Amaral de Souza Assis
Se vocês me permitirem usar uma destas fórmulas que me ocorrem
quando escrevo minhas anotações, a vida humana poderia ser definida como um
cálculo no qual o zero seria irracional. Esta fórmula é apenas uma imagem, uma
metáfora matemática. Quando digo “irracional”, não estou me referindo a algum
estado emocional insondável, mas exatamente àquilo que é chamado número
imaginário. A raiz quadrada de menos um não corresponde a nada que esteja sujeito
à nossa intuição, nada de real - no sentido matemático do termo e, no entanto
precisa ser mantida, juntamente com suas funções completas. (Lacan, 1977, pp. 28-
29, seminário realizado originariamente em 1959). Traduzido para o inglês e
publicado em 1977: Jacques Lacan. Desire and the interpretation of desire in
Hamlet. Yale French Studies 55/56: 11-52.
ATIVIDADE: após ler e analisar, atentamente, esse texto, identifique se
argumentos falaciosos; é possível identificá-los como estratagemas, segundo a
dialética erística de Schopenhauer? Por quê? Explicite qual é (ou quais são) o
estratagema encontrado e justifique sua resposta.
88
ANEXO A
89
ANEXO B
90
ANEXO C
91
ANEXO D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
A Maiêutica e a Erística no Ensino de Graduação em Ciências
Eu,_________________________________________________________, estudante da Graduação do
CEFET/MG, concordo em participar do estudo acadêmico intitulado A Maiêutica e a Erística no
Ensino de Graduação em Ciências, para uma dissertação de mestrado do Centro Federal de Educação
Tecnológica de Minas Gerais, e autorizo sua publicação nas condições abaixo.
Resumo do estudo: O objetivo do estudo é investigar como a Maiêutica e a Erística poderiam ajudar
professores e estudantes a desenvolver o pensamento crítico, a perceber argumentos falaciosos e,
principalmente, a compreender o processo de desenvolvimento da ciência como uma estrutura rica e
dinâmica. A Maiêutica é um método desenvolvido pelo filósofo grego Sócrates, que, ensinava por
meio do diálogo, a arte de raciocinar de modo adequado, fazendo perguntas e estabelecendo relações
entre idéias. A Erística foi desenvolvida pelo filósofo alemão Schopenhauer, em que ele demonstra 38
estratagemas ou regras explicitamente inválidas de inferência, usadas apenas para confundir e destruir
o adversário. Pretende-se investigar o conhecimento dos estudantes de cursos de graduação em ciência
e tecnologia a respeito dessas regras inválidas ou não e melhorar sua percepção crítica através do
ensino da Maiêutica e dos estratagemas citados.
Procedimentos: O estudo envolverá a aplicação de questionários e entrevistas com os estudantes.
Desconforto e riscos: Não há.
Benefícios esperados: contribuição à aprendizagem.
Confidencialidade: Os registros de minha participação neste estudo serão mantidos em sigilo até onde
é permitido por lei e todas as informações ficarão restritas à equipe responsável pelo projeto. Qualquer
publicação não identificará nem o participante, nem a instituição a que ele pertence.
Desligamento: A participação neste estudo é voluntária. Sua recusa em participar ou seu desligamento
não envolverá qualquer penalidade ou perda de benefício. Você pode cessar sua participação a
qualquer momento.
Compensação: Você não receberá qualquer compensação financeira por sua participação no estudo.
Consentimento: Li e entendi as informações precedentes. Este formulário está sendo assinado
voluntariamente por mim, indicando o meu consentimento para participar do estudo até que eu decida
o contrário.
Belo Horizonte (MG), _____ de _____________________ de 2009
Assinatura do estudante: ____________________________________
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO
CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE MINAS GERAIS
Mestrado em Educação Tecnológica
92
INDICE REMISSIVO
Aristóteles, 8, 24
ciência, 9, 10, 30, 32, 34, 35, 37, 39, 40, 45, 46, 52, 68, 75
dialética erística, 8, 15, 26, 27, 48, 51, 53, 54, 60
dialética socrática, 6, 8, 11, 26, 27, 48, 52, 54
dialética, 5, 6, 8, 24, 25, 33
ensino, 26, 30, 39, 41, 45, 46, 61, 68, 77
epistemologia, 5, 32
erística, 6, 8, 45, 66, 67, 77
estratagema(s), 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 48, 49 55, 58, 59, 60, 69, 70, 72, 73, 74,
75, 79
estudo de caso, 47, 50
falácia(s), 31, 56, 66, 69, 77, 79
filosofia, 5, 9, 14, 26, 32, 36, 39, 40
hipótese(s), 8, 36, 48, 78
impostura científica, 31, 32
maiêutica, 6, 14, 45
objetivo, 5, 51, 53, 73, 79
paidéia, 14
pedagógico(as), 28, 42, 44, 77
pesquisa, 5, 6, 8, 35, 39, 47
Platão, 10, 11
pseudociência, 9, 36, 37
Schopenhauer, 8, 15, 24, 34, 45, 48, 51, 58, 60
Sócrates, 6, 7, 10, 11, 12, 13, 14, 34, 42
tecnologia, 9, 10, 30, 34, 35, 37, 38, 39, 43, 45, 46, 75, 77
Wenning, 5, 30
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo