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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
A HUMANIZAÇÃO E A FORMAÇÃO MÉDICA NA PERSPECTIVA DOS
ESTUDANTES DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO NORTE
Antonia Núbia de Oliveira Alves
Natal-RN
2008
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Antonia Núbia de Oliveira Alves
A HUMANIZAÇÃO E A FORMAÇÃO MÉDICA NA PERSPECTIVA DOS
ESTUDANTES DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO NORTE
Dissertação apresentada à Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, como
requisito para obtenção do título de Mestre
em Ciências da Saúde pelo Programa de Pós-
Graduação em Ciências da Saúde.
Orientadora: Profa. Dra. Maria José Pereira Vilar
Natal-RN
2008
ii
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CATALOGAÇÃO NA FONTE
A474h
Alves, Antonia Núbia de Oliveira.
A Humanização e a Formação Médica na Perspectiva dos
Estudantes de Medicina da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte / Antonia Núbia de Oliveira Alves. __ Natal -
RN, 2008.
57p.
Orientadora: Profª. Drª. Maria José Pereira Vilar.
Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em
Ciências da Saúde. Centro de Ciências da Saúde. Universidade
Federal do Rio Grande do Norte.
1. Educação Médica - Dissertação. 2. Medicina - Estudantes -
Dissertação 3. Humanização - Dissertação. 4. Grupo Focal -
Dissertação. I. Vilar, Maria José Pereira. II. Título.
iii
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
Prof. Dr. Aldo da Cunha Medeiros
Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde
iv
A HUMANIZAÇÃO E A FORMAÇÃO MÉDICA NA PERSPECTIVA DOS
ESTUDANTES DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO NORTE
PRESIDENTE DA BANCA: Profa. Dra. Maria José Pereira Vilar (UFRN)
BANCA EXAMINADORA:
Profa. Dra. Maria José Pereira Vilar – Orientadora (UFRN)
Profa. Dra. Dione Tavares Maciel – Examinadora Externa (UFPE)
Profa. Dra. Ana Cristina P. F. de Araújo – Examinadora Interna (UFRN)
v
EPÍGRAFE
Saber Viver
Não sei... Se a vida é curta
ou longa demais pra nós,
mas sei que nada do que vivemos
tem sentido se não tocamos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser:
colo que acolhe,
braço que envolve,
palavra que conforta,
silêncio que respeita,
alegria que contagia,
lágrima que corre,
olhar que acaricia,
desejo que sacia,
amor que promove.
E isso não é coisa de outro mundo,
é o que dá sentido à vida,
é o que faz com que ela,
não seja nem curta,
nem longa demais,
mas que seja intensa,
verdadeira, pura... Enquanto durar
Cora Coralina
vi
DEDICATÓRIA
Em especial à minha filha Yasmin, que, na sua ingenuidade,
procurou me consolar e apoiar nos momentos mais angustiantes e
desesperadores, por tentar compreender meu distanciamento e ausência
perante o encerramento da pesquisa.
Ao meu esposo, José Roberto, que, mesmo ausente fisicamente,
esteve presente mentalmente em todos os instantes dedicados à desenvoltura
desta pesquisa.
vii
AGRADECIMENTOS ESPECIAIS
Minha gratidão à Profa. Dra. Maria José Pereira Vilar, pelas
elucidativas sugestões, coragem, dedicação e determinação em aceitar
conduzir comigo este desafio.
Meu reconhecimento à Doutoranda Simone da Nóbrega Tomaz
Moreira, pela disponibilidade, estímulo, apoio e imensas contribuições
proporcionadas a esta pesquisa.
viii
AGRADECIMENTOS
A Deus, por estar me permitindo viver intensamente a cada dia;
À minha família que, mesmo a distância, torceu por mim;
Ao Prof. Dr. George Dantas de Azevedo, pelo exemplo
profissional e por ter acreditado em mim mais do que eu mesma;
À Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), ao
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde (PPGCSa), à
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Demanda
Social (CAPES-DS), por proporcionar esta oportunidade de enriquecimento
científico;
À Profa. Dra. Vera Maria da Rocha, pelas orientações iniciais
desta pesquisa;
Ao Prof. Dr. Modesto Leite Rolim Neto, pelas enormes
contribuições dadas inicialmente a esta pesquisa;
A todos os estudantes do último ano do curso de Medicina, que se
disponibilizaram a participar da pesquisa;
A Marcelo José Santiago Lisboa, que conduziu os grupos focais
na função de moderador, além das contribuições na transcrição de parte do
material coletado, e aos estudantes de Fisioterapia: Bruno Lopes dos Santos,
Sonaira Larissa Varela de Medeiros e Francisco Assis Vieira Júnior (voluntários
da Base de Pesquisa Edusaúde-Centro de Ciências da Saúde-UFRN-Natal-
RN), meu especial agradecimento pela colaboração nas transcrições;
Aos estudantes do Programa de Pós-Graduação em Ciência e
Engenharia de Materiais do Centro de Ciências Exatas e da Terra (CCET), pela
ix
confiança e aceitabilidade em dividirem comigo seu ambiente de estudo, além
de contribuírem com calorosas discussões sobre os mais diferentes pontos de
vistas a respeito da pesquisa;
À equipe da secretaria do PPGCSa, pela atenção e prontidão nos
serviços solicitados;
Às amigas e amigos do Curso de Mestrado, Grupo de Estudos em
Pesquisa Qualitativa e à legião de torcedores, incentivadores, que acreditaram
em mim e muito me ajudaram na feitura desta pesquisa, seja por meio de
informações ou dicas informais.
x
SUMÁRIO
Epígrafe.............................................................................................................. v
Dedicatória .........................................................................................................vi
Agradecimentos especiais.................................................................................vii
Agradecimentos ............................................................................................... viii
Resumo.............................................................................................................xii
1- INTRODUÇÃO............................................................................................. 14
2 - REVISÃO DE LITERATURA ...................................................................... 16
3 - ANEXAÇÃO DO ARTIGO .......................................................................... 21
3.1 Artigo submetido ao periódico Acta Médica Portuguesa / Act Med Port..21
4 - COMENTÁRIOS, CRÍTICAS E SUGESTÕES............................................ 48
5 - REFERÊNCIAS .......................................................................................... 53
Abstract..............................................................................................................57
xi
RESUMO
Este estudo busca compreender a percepção dos estudantes de Medicina da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) acerca da humanização
no contexto da formação médica, através de uma abordagem qualitativa.
Foram utilizadas as técnicas do grupo focal e observação participante,
envolvendo uma equipe multidisciplinar, composta por profissionais das áreas
de antropologia, psicologia e professores do curso médico, que estudou dois
grupos de nove estudantes do último ano do curso. Os dados foram analisados
através da técnica de análise de conteúdo temática categorial, da qual
emergiram três categorias: relação estudante/paciente, ensino/aprendizagem e
relação estudante/professor. A primeira permite identificar que a experiência do
contato do estudante com o paciente é essencial para a construção de uma
visão mais humanizada do processo de adoecer. Em relação à segunda
categoria, percebe-se que a capacitação deficiente de professores para as
práticas pedagógicas e a dicotomia teoria e prática dificultam a formação
autônoma e holística do conhecimento. Da mesma forma, a escassez de
práticas fora do ambiente universitário e de estímulo à atenção multiprofissional
interfere na construção de uma visão integral do indivíduo. Da terceira
categoria, a relação estudante/professor, emergiu duas subcategorias
antagônicas (professor modelo e relações assimétricas) que refletem a
importância da postura ética humanista do professor, em detrimento de uma
atitude autoritária, para a construção da identidade profissional do estudante.
Os resultados apontam aspectos importantes da formação médica, que podem
xii
respaldar uma discussão acerca da humanização, no contexto das novas
diretrizes curriculares nacionais.
Palavras-chave: educação médica, estudantes de Medicina, humanização,
grupo focal.
xiii
1. INTRODUÇÃO
As propostas de mudanças das práticas de saúde no Brasil têm
colocado em destaque, nos últimos anos, os aspectos relacionados à
humanização na assistência à saúde. Embora muito já tenha sido discutido
sobre o conceito de humanização dentro das práticas de saúde, no contexto da
integralidade, efetividade e acesso, a real efetivação desse processo parece
ainda distante.
Entendendo-se a humanização sob a perspectiva filosófica, podemos
traduzi-la como um ideal de construção de uma livre e inclusiva manifestação
dos diversos sujeitos no contexto da organização das práticas de atenção à
saúde, promovida por interações sempre mais simétricas, que permitam uma
compreensão mútua entre seus participantes e a construção consensual dos
seus valores e verdades. Daí a importância de uma hermenêutica dos
discursos científicos, os quais instruem decisivamente as práticas de saúde,
para identificar aspectos de interdição desse ideal e localizar as lacunas que
reclamam novos conceitos ou conhecimentos para serem preenchidos
(1)
.
Nesse sentido, a questão da humanização na formação médica assume
grande relevância no texto das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para
os cursos de Medicina, que estabelecem como modelo do médico desejável
para o país: “O médico com formação generalista, humanista, crítica e
reflexiva. Capacitado para atuar, pautado em princípios éticos, no processo de
saúde/doença em seus diferentes níveis de atenção, com ações de promoção,
prevenção, recuperação e reabilitação da saúde, na perspectiva da
integralidade da assistência, com senso de responsabilidade social e
compromisso com a cidadania, como promotor da saúde integral do ser
humano
(2)
.
Dessa forma, a inserção do tema “humanidades” nas escolas médicas
tem sido uma prática cada vez mais freqüente no Brasil
(3-5)
, especialmente na
busca de aproximar a temática da relação médico/paciente do cotidiano dos
estudantes de medicina, contribuindo, assim, para desenvolver uma atitude
humanizada frente ao ser humano portador de enfermidade.
O curso de Medicina da UFRN, não distante do cenário das DCNs,
iniciou a implantação de um novo projeto pedagógico em 2002
(6)
, construído a
partir de uma visão mais integral do conceito de saúde/doença e valorizando a
formação de um profissional médico mais adequado às reais necessidades da
população brasileira. Partindo do modelo tradicional de ensino do curso,
predominantemente tecnocêntrico, teórico, não contextualizado e com uma
formação humanística deficiente, surgiu, nessa transição, o interesse em captar
a percepção dos estudantes, protagonistas maiores dessa mudança curricular,
no que concerne à humanização dentro da sua formação médica. As relações
dos estudantes com os pacientes, com os docentes e suas vivências dentro do
próprio processo ensino/aprendizagem são percebidas e relatadas em suas
falas e contextualizadas no presente estudo.
15
2. REVISÃO DE LITERATURA
No decorrer do século XX inúmeros avanços tecnológicos foram
agregados à prática médica e dessa efervescência a relação médico/paciente
sofreu grandes modificações. Saiu do cenário mundial a imagem romântica do
médico sábio e conhecedor do progresso científico, aliado ao homem culto,
amante da filosofia, literatura e da história, capaz de se apropriar de
conhecimentos científicos e humanísticos. Sobrepujando-se à figura
supracitada, a medicina passou de uma atividade especulativa, teórica e
imaginativa para o que se considerou uma verdadeira ciência positiva de bases
sólidas
(7, 8)
.
Nesse sentido, o enorme progresso alcançado pelo desenvolvimento
tecnológico, conciliado com as contribuições das ciências físicas, químicas e
biológicas, direcionou a medicina para áreas cada vez mais específicas,
privilegiando os microelementos do indivíduo, surgindo daí o modelo clínico
(9)
.
Assim, a cuidadosa observação do doente foi sendo substituída por um
raciocínio dedutivo, onde o ato médico se desumanizou, visto que a doença, e
não o doente passou a ser o centro do saber reconhecido cientificamente
(8,9)
.
É importante salientar que essa revolução trouxe ganhos para a
medicina, como a formulação de diagnósticos precisos, a descoberta de novas
terapias, entre outros. Desse modo, na tentativa de corresponder ao aparato
tecnológico, o médico centra-se na busca do diagnóstico, onde o exame físico
é sucedido por requisição de exames, culminando em solicitações
complementares que se tornam mais relevantes que o próprio paciente e seus
relatos
(8)
. No campo da educação médica, tudo isso é apresentado ao
16
estudante, muitas vezes sem que se faça a crítica adequada e judiciosa a
respeito do seu uso. Não ocorre a nenhum docente médico omitir informações
a respeito do alcance de todos os modernos recursos tecnológicos disponíveis
na área da saúde. Mas, importa lembrar sempre que à frente de todos esses
recursos está o homem, representado pelo médico
(10)
.
Diante desse cenário, o crescente movimento pela humanização tem
destacado diversos significados e propostas que buscam melhorar a obtenção
do cuidado com a saúde
(11-15)
. Também vários estudos têm focado a
humanização nas práticas de saúde, tendo como um ponto importante a
integralidade do atendimento
(14,16)
. Para Ayres, o ideal de humanização pode
ser genericamente definido como um compromisso das tecnociências da
saúde, em seus meios e fins, com a realização de valores relacionados à
felicidade humana e democraticamente validados como bem comum
(1)
.
O processo de mudança da educação médica traz inúmeros desafios,
entre os quais a ruptura das estruturas cristalizadas e os modelos de ensino
tradicional, partindo para formar profissionais de saúde comprometidos com a
realidade social e com competências que lhes permitam recuperar a dimensão
essencial do cuidado: a relação entre humanos
(17-19)
. É notório enfatizar que as
novas propostas pedagógicas devem sustentar-se em ações que procuram
explorar novas possibilidades, devendo preocupar-se não apenas com
questões curriculares e pedagógicas
(20)
. O enfoque pedagógico moderno tem
como seus principais domínios, o comportamento do paciente, atitude e papel
do médico, interações entre médicos e pacientes e fatores socioculturais
relativos aos cuidados com a saúde
(21)
.
17
Diante do exposto, é importante enfatizar a discussão sobre
"humanidades médicas" na formação universitária dos cursos de Medicina
(22-
25)
, destacando a relação estudante/paciente
(26,27)
e propiciando o
desenvolvimento de habilidades pessoais entre os estudantes que possibilitem
uma maior interação com o seu paciente
(28,29)
. Os primeiros contatos com o
paciente são descritos, em vários estudos, como marcantes e
desencadeadores de diversas emoções, que vão desde ansiedade até
encantamento no encontro com o ser humano em situação de fragilidade.
No campo do ensino/aprendizagem, dentro das propostas curriculares
tradicionais, a fragmentação dos conteúdos com o distanciamento teoria-
prática, aliada às questões inerentes à deficiente formação didática/pedagógica
docente, culmina por interferir na construção de um cenário de aprendizagem
que propicie uma visão holística do ser humano e que valorize a participação
do estudante, nos processos de aprender, e dos professores, como sujeitos
mediadores e provocadores de reflexão.
Nesse sentido, o grande desafio de uma universidade é formar um
profissional da saúde com um perfil criativo frente aos muitos problemas do
cotidiano. Para isso, é necessário ao corpo docente conhecer a tecnologia
vigente, dominar dinâmicas de grupo, estar distante de preconceitos e ser
capaz de lidar com o pluralismo social
(30)
. No entanto, em relação aos
docentes, vale salientar que, historicamente, o ensino médico nasceu da
atividade amadora de alguns clínicos de elevada competência e reconhecida
projeção. Mais tarde, foi crescendo o prestígio das atividades de pesquisa,
transformando, nos últimos cinqüenta anos, as tarefas de ensino do docente
em atividades apenas periféricas, visto que a ênfase atribuída à pesquisa faz
18
com que a avaliação do currículo do professor fique mais centrado na sua
produção. Evidentemente, esse aspecto condiciona o desinteresse pela
atividade docente do professor e, conseqüentemente, na sua capacitação nas
práticas pedagógicas
(31)
.
Ainda no tocante ao ensino/aprendizagem, a ampliação dos cenários de
práticas fora do ambiente hospitalar e o estímulo ao trabalho em equipe
multiprofissional são pontos importantes para a humanização e que dão a
oportunidade a estudantes e professores de vivenciarem situações no mundo
real, onde é possível visualizar reciprocidade de conhecimentos
(32,33)
.
Estudo recente discute a viabilidade do diálogo entre a formação dos
médicos e o Sistema Único de Saúde (SUS), enfatizando o princípio de
integralidade como eixo estruturante dessa formação. Seus resultados
mostram a consciência dos professores das instituições formadoras sobre a
importância do compromisso social que a profissão exige, com as decorrentes
mudanças, embora alguns demonstrem resistência para enfrentar os novos
desafios. Concluem que, assumir um compromisso buscando o diálogo dos
projetos curriculares com o contexto social é um desafio que requer sutileza,
interesse e determinação de todos os envolvidos e que há um longo caminho a
ser percorrido, no qual as escolas médicas exercem papel relevante como um
dos agentes desse processo transformador e “inovador”
(34)
. Para outros, fica
evidente que direcionar o ensino médico como uma prática social, buscando
novas atitudes perante o conhecimento, permite identificar uma consonância
com os pressupostos que têm orientado a reordenação do ensino e das
práticas profissionais em saúde. É indispensável que a produção de
19
conhecimento, formação profissional e prestação de serviços sejam tomadas
como indissociáveis de uma nova prática
(35)
.
No que diz respeito à relação estudante/professor, considera-se
fundamental o papel do professor na formação da identidade do futuro
profissional médico
(19,20)
. Estudos apontam que as reformas curriculares e a
busca de novas técnicas pedagógicas são importantes, contudo, parecem ser
insuficientes para auxiliar os estudantes a elaborar a diversidade de embates
afetivos com os quais irão lidar. Caso os professores não retomem sua função
de educadores e formadores, os estudantes poderão se sentir desprotegidos e
vulneráveis diante da demanda existente no cotidiano de sua vida acadêmica
(36)
.
Nesse sentido, a idéia de compreender a percepção dos estudantes
sobre a humanização das práticas de saúde, durante a formação médica,
permite fomentar uma discussão sobre a humanização, visando a uma melhor
formação dos estudantes no que se refere à construção da sua identidade
profissional.
20
3. ANEXAÇÃO DO ARTIGO
3.1 Artigo submetido ao periódico Acta Médica Portuguesa / Act Med Port.
Título: A humanização e a formação médica na perspectiva dos
estudantes de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
– UFRN
Title: Humanization in undergraduate medical education from the Rio
Grande do Norte Federal University -UFRN medicine student's perspective
Autores: Antonia Núbia de Oliveira Alves
1
, Simone da Nóbrega Tomaz
Moreira
2
, George Dantas de Azevedo
3
, Vera Maria da Rocha
3
, Maria José
Pereira Vilar
3
1
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Natal-RN, Brasil.
2
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da
UFRN, Natal-RN, Brasil.
3
Professor Doutor do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da
UFRN, Natal-RN, Brasil.
Correspondência: Antonia Núbia de Oliveira Alves, Rua da Trilha, 136,
Conjunto Parque das Dunas V – Pajuçara, CEP 59132-470, Natal-RN, Brasil.
21
Título: A humanização e a formação médica na perspectiva dos estudantes de
Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Resumo
Este estudo busca compreender a percepção dos estudantes de Medicina da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) acerca da humanização
no contexto da formação médica, através de uma abordagem qualitativa,
utilizando as técnicas do grupo focal e observação participante, em dois grupos
de nove estudantes do último ano do curso. Os dados foram analisados através
da técnica de análise de conteúdo temática categorial, da qual emergiram três
categorias: relação estudante/paciente, ensino/aprendizagem e relação
estudante/professor. A primeira permite identificar que a experiência do contato
do estudante com o paciente é essencial para a construção de uma visão mais
humanizada do processo de adoecer. Em relação à segunda categoria,
percebe-se que a capacitação deficiente de professores para as práticas
pedagógicas e a dicotomia teoria e prática dificultam a formação autônoma e
holística do conhecimento. Da mesma forma, a escassez de práticas fora do
ambiente universitário e de estímulo à atenção multiprofissional interfere na
construção de uma visão integral do indivíduo. Da terceira categoria, a relação
estudante/professor, emergiu duas subcategorias antagônicas (professor
modelo e relações assimétricas) que refletem a importância da postura ética
humanista do professor, em detrimento de uma atitude autoritária, para a
construção da identidade profissional do estudante. Os resultados apontam
aspectos importantes da formação médica, que podem respaldar uma
22
discussão acerca da humanização, no contexto das novas diretrizes
curriculares nacionais.
Palavras-chave: educação médica, estudantes de Medicina, humanização,
grupo focal.
23
Title: Humanization in undergraduate medical education from the Rio Grande
do Norte Federal University -UFRN medicine student's perspective
Abstract
The aim of this study is to understand the perception of medical students at the
Federal University of Rio Grande do Norte (UFRN) about humanization in the
context of their medical formation, using a qualitative approach. The focus
group and participant observation techniques were used, with two groups of
nine students in their final year. The data were analyzed using the categorical
thematic content analysis technique, from which emerged three categories:
student/patient relationship, teaching/learning and student/professor
relationship. The first allows us to identify that student/patient contact is an
essential experience for adopting a more humanized view of the disease
process. The second category shows that that unqualified professors in the
pedagogic practices inherent to the teaching profession and the theory the
practical dichotomy hinder the autonomous and holistic formation of knowledge.
Similarly, the lack of practices outside the academic environment and the
absence of multiprofessional stimulation interfere in the construction of an
integral view of the individual. From the third category, the student/professor
relationship, emerge two opposing subcategories (professor model and
assymetric relationships) which reflect the importance of the professor`s ethical-
humanist position, as opposed to an authoritarian attitude, to form the
professional attitude of the student. The results point important aspects of the
24
medical formation that may open a discussion about humanization, in the
context of new national curricular guidelines.
Keywords: medical education, medical students, humanization, focus group.
25
Introdução
O grande avanço tecnológico ocorrido na área da saúde, no decorrer do
século XX, provocou uma transformação no perfil de atuação do médico, que
se foi tornando, cada vez mais, um especialista, profundo conhecedor de
exames complexos e especializados, sendo capaz de emitir diagnósticos
precisos e de propor tratamentos eficazes. Nesse processo, percebe-se que a
relação médico/paciente ficou prejudicada, por uma supervalorização da
doença e dos seus sintomas, em detrimento da singularidade do paciente
(1,2)
.
Para acompanhar todo esse desenvolvimento da medicina, a formação
médica, até então sustentada pelo modelo biomédico, tornou-se cada vez mais
especializada e fragmentada, com ênfase no conhecimento técnico. Alguns
autores acreditam que a postura “desumanizada” dos médicos é encorajada
pela prática pedagógica de dissecação de cadáveres. Os médicos não são
educados para lidar com a dimensão de sofrimento, embutida nas
manifestações oriundas de processos de adoecer, traduzido pela semiologia
médica e pelas tecnologias diagnósticas
(3,4)
.
Diante desse cenário, o modelo biopsicossocial surge a partir da
necessidade de se buscar uma visão holística do homem, em que os aspectos
psicológicos e sociais são intrinsecamente vinculados aos aspectos biológicos,
de forma a ampliar a capacidade de autonomia do paciente, formando médicos
reflexivos, éticos, conscientes e sensíveis à pessoa humana e ao seu contexto
social
(5,6)
.
No campo das políticas públicas direcionadas para a saúde da
população e para educação dos profissionais de saúde, vários avanços têm
26
sido conquistados no Brasil, com destaque para as DCNs dos cursos de
graduação da área da saúde
(7)
, os quais, de forma uníssona, enfatizam um
lugar de destaque para os aspectos ético-humanísticos na formação desses
profissionais. As escolas médicas têm realizado, em maior ou menor
profundidade, mudanças em seus projetos pedagógicos, desde adaptações de
grades e de conteúdos disciplinares até verdadeiras transformações
curriculares. Desse modo, rompem as estruturas fragmentadas, oferecendo
uma formação global ao estudante, inserido permanentemente na sociedade,
em contato com a prática de sua futura profissão
(8)
.
.
No contexto da geração de conhecimento sobre humanização em
educação médica, a produção de substrato teórico para orientar as mudanças
curriculares tem sido enfocada com relatos de experiências individuais,
contemplando principalmente a percepção do corpo docente
(9-11)
.
Diante do início da implantação, em 2002, de um novo Projeto
Pedagógico no curso de Medicina da UFRN
(12)
e, considerando todo o
processo de transição que vem acontecendo nas escolas médicas brasileiras, a
busca de compreender a percepção dos estudantes acerca da humanização,
no contexto da formação médica, possibilita obter subsídios para respaldar as
ações a serem implementadas no tocante ao eixo ético humanístico do curso.
Material e métodos
Foi realizado estudo fundamentado na abordagem qualitativa, a qual
permite compreender os significados atribuídos aos fenômenos
(13)
. O estudo
obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da UFRN (protocolo nº
27
68/05) e, após a concordância com os propósitos da pesquisa, todos os
estudantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
As técnicas utilizadas para a obtenção dos dados da pesquisa foram o
grupo focal e a observação participante
(13-16)
. Os estudantes foram
selecionados no Complexo Hospitalar e de Saúde da UFRN, no período de
novembro de 2006 a fevereiro de 2007. Foram realizados dois grupos focais,
com duração média de noventa minutos, compostos de nove estudantes do
último ano do curso de Medicina pertencentes ao currículo anterior à
implantação do novo Projeto Pedagógico. O primeiro grupo foi composto por
cinco mulheres e quatro homens, e o segundo, por três mulheres e seis
homens. A amostragem foi intencional
(16)
, em que se buscou abranger o
problema em suas múltiplas dimensões, seguindo critérios que levaram em
consideração a disponibilidade e interesse dos participantes pela temática
abordada. O fechamento amostral foi determinado pela técnica de saturação,
quando se tornaram evidentes as repetições e redundâncias de informações
(17)
. As entrevistas foram gravadas, transcritas e relidas, produzindo um texto
de quinze páginas, em espaço simples, tendo sido garantidos o sigilo e
anonimato dos participantes.
A discussão do grupo foi conduzida pelo moderador e um secretário,
sendo guiada, mas não limitada, pela seguinte questão norteadora: Como é
percebida a humanização no processo da sua formação médica? Desse modo,
foi iniciado o debate, acolhendo e valorizando os sentimentos, as experiências
e as angústias vividas pelos estudantes durante a sua formação acadêmica. O
moderador foi responsável pela condução do grupo, tendo a função de solicitar
esclarecimentos, aprofundar pontos específicos, estimular a participação
28
homogênea do grupo e proceder à finalização da discussão com os
participantes.
A técnica da observação participante foi utilizada de forma
complementar e simultaneamente com o grupo focal, permitindo a captação de
uma diversidade de situações ou fenômenos que não foram obtidos por meio
de perguntas, mas observados diretamente na realidade enfocada. O
secretário fazia as anotações das expressões, gestos, falas sussurradas e
discordâncias não faladas no diário de campo
(13)
.
A análise dos dados foi realizada utilizando-se a técnica de análise de
conteúdo temática categorial, fundamentada em Bardin
(18)
e Minayo
(13)
. Neste
sentido, o processo analítico compreendeu as seguintes fases: leitura flutuante,
constituição do corpus e formulação de hipóteses e objetivos.
A leitura flutuante consistiu no contato exaustivo com o material
transcrito, onde foi feita uma leitura minuciosa das falas transcritas para
compreender os significados, as argumentações e as justificativas que
conciliaram as práticas discursivas.
Na constituição do corpus ocorreu a organização do material, de forma
que respondesse às normas de validade, tais como: exaustividade (contemplar
todos os aspectos levantados na discussão), representatividade (conter a
representação do universo pretendido), homogeneidade (obedecer a critérios
precisos de escolha em termos do tema, técnicas e interlocutores) e pertinência
(estar adequado aos objetivos do trabalho)
(19)
.
A formulação de hipóteses e objetivos consistiu na seleção das unidades
de análise, mediante o processo de categorização a posteriori ou empírica,
29
através da qual emergiram categorias, que foram descritas e discutidas a partir
do referencial teórico existente.
Resultados e Discussão
Diante do exposto, a partir do referido processo de categorização,
emergiram três categorias, sete subcategorias e 152 unidades de análise,
conforme mostra a Tabela I.
Como reflexo de múltiplos fatores, entre eles, a incorporação crescente
de tecnologias nas práticas de saúde e a fragmentação do conhecimento
médico. O ensino da medicina pautou-se, ao longo das últimas décadas, por
ser desenvolvido preferencialmente em cenários hospitalares, no conhecimento
técnico e especializado, centrado na figura do professor, em detrimento da
atenção básica em saúde e dos aspectos humanísticos relacionados à
profissão.
Neste estudo, analisando a percepção dos estudantes sobre os
aspectos relacionados à humanização durante a formação médica, evidencia-
se que, na relação estudante/paciente, várias situações são vivenciadas e
freqüentemente impressas na formação, ou seja, na construção da identidade
profissional do futuro médico
(20-22)
. Isto pode ser evidenciado a partir da análise
das seguintes falas:
[...] Ver o sofrimento das pessoas, nas mais diferentes formas, nas suas
mais amplas possibilidades como: físicos, financeiros, sociais,
30
psicológicas... é assim que a gente tem um “deslumbre” do que é o ser
humano na sua complexidade.
No entanto, a despeito da sensibilidade demonstrada, não sobra espaço
durante a formação para que o estudante possa dividir ou expressar suas
emoções, tendo muitas vezes que escondê-las, por receio de ser “acusado” de
ser muito frágil, sensível, “mole” e, portanto, “não servir para ser médico”
(23-25)
.
[...] Eu me choquei muito quando vi uma criancinha deitada no banco,
com a mãe chorando e dizendo: não tem jeito, não tem jeito!!!!. Íamos
para sala de aula e parei, um colega disse: “vamos, deixe de
sentimentalismo e seja forte”.
Na maioria dos cursos de Medicina, os estudantes são treinados em
operar equipamentos e fazer leituras de variáveis biológicas, sem espaço para
o desenvolvimento de habilidades e competências que os capacitem para
reconhecer o ser humano como unidade biopsicossocial e espiritual, inserido
num contexto epidemiológico e sociocultural.
As falas seguintes demonstram a necessidade dos estudantes de uma
relação mais próxima e mais humanizada com o paciente
(9, 26,27)
.
[...] O contato com o paciente é essencial pra nossa formação, por mim
seria antes, pois teríamos mais tempo para aprender a lidar com o
sofrimento, com os sentimentos. Isso possibilitaria identificar as reais
31
causas da doença, já que nosso ensino é voltado para a doença e não
para a saúde.
[...] em relação à humanização [...] há consciência realmente que o
médico que se forma hoje não tem nenhuma formação humanizada e
isso reflete na imaturidade do médico que se forma.
Esse contexto de deterioração dos conteúdos humanísticos no processo
ensino/aprendizagem diz respeito ao perfil do corpo docente que,
historicamente, na maioria das escolas médicas, é constituído por médicos
especialistas, com formação direcionada para a prática clínica e pouco
capacitada para as práticas pedagógicas inerentes à profissão de professor
(28)
.
O processo de ensinar define-se pela obtenção da aprendizagem do estudante
e não pela intenção (ou objetivo) do professor ou por uma descrição do que ele
faz em sala de aula. A relação entre o que o professor faz e a efetiva
aprendizagem do estudante é o que, mais apropriadamente, pode ser chamado
de ensinar
(29)
.
No estudo, observa-se o reflexo desse fato na percepção, pelos
estudantes, do contexto da humanização nas questões relacionadas à didática
dos professores, conforme se observa nas falas a seguir:
[...] muitas vezes os professores só se preocupam em dar a sua aula, ou
seja, passar pelo conteúdo sem se preocupar se aprendemos alguma
coisa ou não.
32
[...] Eu noto que mesmo na nossa área (Medicina), muitos deles
(professores) são competentes como profissionais, mas não têm
nenhuma capacidade de ensinar... ensinar significa ter técnica, saber
como abordar um assunto para uma pessoa que não sabe.
Na visão dos estudantes, outro aspecto relacionado ao processo
ensino/aprendizagem é a dicotomia existente entre a teoria e a prática, mais
especificamente entre as ciências básicas e a clínica, levando a uma formação
fragmentada, em que os conhecimentos vêm despidos de seus processos e
sentidos, não propiciando uma visão integral do indivíduo e seu processo
saúde/doença. Esse modelo de ensino das escolas médicas, com curriculum
flexeneriano, vem sendo discutido em todo o mundo
(30,31)
. Tal fato, evidenciado
nas falas a seguir, tem sido apontado como importante desafio a ser enfrentado
no ensino médico, com algumas iniciativas de mudanças nas estruturas
curriculares, visto que se reflete em dicotomias, também, no que diz respeito
aos conceitos de saúde e doença
(32)
.
[...] a gente tem muita dificuldade de visualizar o conhecimento que está
sendo adquirido para o futuro.
[...] A minha proposta é exatamente essa mudança [...] que a
dicotomização deixe de existir, que deveras nos prejudica ao longo do
curso; a gente inicia com a teoria desarticulada com a nossa prática, que
serve pouco para nosso futuro e depois a gente se torna meros
“tocadores” de serviços.
33
Para Freire,
(33)
a interação do estudante com a comunidade propicia a
formação de um profissional que pretende trabalhar num horizonte dialógico e,
por isso, mais eticamente envolvido com a sociedade. A idéia da articulação
entre a universidade e o sistema de saúde na comunidade é uma idéia já
defendida por muitos,
(34)
conforme preconizam as DCNs e parece ser uma
realidade nas experiências exitosas no curso de Medicina da UFRN
(35)
.
Neste estudo, observamos que o contato do estudante com a
comunidade é vivenciado por eles, conforme suas falas, como uma
oportunidade de compreender o paciente e entender sua doença dentro do seu
contexto social:
[...] Essa experiência na comunidade, pra mim foi um ato de
humanização que durante nosso curso a gente vê muito pouco.
[...] Posso acrescentar que a experiência do estágio em Santa Cruz,
(interior do RN), contribuiu bastante para meu aprendizado fora da
universidade e abriu caminhos para que eu pudesse agir como um
verdadeiro profissional, mais humano, mais realista.
Na formação dos profissionais de saúde, é necessário, pois, propiciar
oportunidades que favoreçam o contato dos estudantes com os problemas
reais, de forma a dar sentido ao que se aprende/ensina. Para que se possa
atingir esse objetivo, algumas estratégias são enfatizadas como facilitadoras,
tal como a multiplicidade de cenários para o processo de ensino/aprendizagem
34
que possa promover a interdisciplinaridade e a aprendizagem interprofissional
(36,37)
. Essa estratégia do contato do estudante com a comunidade, através da
inserção das atividades de ensino nos cenários do SUS, tem encontrado
resistência por parte de uma parcela significativa dos professores, sobretudo
nas escolas mais tradicionais, pelo próprio modelo de sua formação
(38)
.
Neste estudo, no entanto, conforme demonstram as falas a seguir, os
estudantes colocam a importância do trabalho em equipe e o papel da
integralidade do atendimento no contexto da humanização dentro da formação
médica.
[...] Eu observei isso em Santa Cruz (local onde se realiza o internato
rural), não sei vocês, mas a gente tinha as equipes de atenção básica
sem uma fragmentação tão importante, tão notória.
[...] O SUS é uma boa maneira de adotar essa nova tendência de
aproximação, de integralidade, é um modelo que visa romper com a
fragmentação da atenção à saúde, ele visa a um atendimento integral.
Outro aspecto percebido pelos estudantes, neste estudo, no tocante às
relações humanas na formação médica, foi o contato com os professores. De
suas falas emergiram duas subcategorias antagônicas em seu significado:
professor modelo e relações assimétricas. Isso reflete a relação dialógica
existente entre os papéis historicamente construídos para professor e
estudante (o primeiro sendo referência para o segundo) e, por outro lado,
processos decorrentes das diversas assimetrias (de poder e conhecimento)
35
que permeiam o processo de ensino/aprendizagem. A figura do ‘professor
modelo’ se apresentou com veemência nas falas dos estudantes a seguir:
[...] Eles, pra mim, são um exemplo de vivência e de sabedoria, pois pra
mim não precisa expelir conhecimento pra mostrar que sabe, mas ser
humano e humilde pra saber passar o conteúdo.
[...] Eu acrescentaria que é, por exemplo, nesses professores, que
procuram dar o melhor de si, que me espelho para poder seguir nessa
profissão que a gente escolheu.
De modo contrário, as relações assimétricas estudante-professor
também foram perceptíveis, conforme segue:
[...] o problema que eu acho é que eles esquecem e precisam saber que
o resto do mundo também pensa.
[...] Eu iria mais adiante, pra não dizer excesso de arrogância, muitos
chegam a lembrar que eles são “Dr. Fulano de tal” e não tem tempo a
perder com certas perguntas ou dúvidas sem sentido.
[...] (alguns) agem com um despotismo descabido, não aceitando
nenhum comentário, mesmo porque, pra eles, nunca sabemos de nada
e não somos capazes de pesquisar ou buscar informações sobre o
assunto que eles tanto dizem saber.
36
Nessa relação estudante/professor, alguns autores colocam que este
último, além de atuar como um modelo para o estudante (processo de
identificação) por intermédio de suas atitudes, gestos, e comportamentos, deve
ter em mente que tais processos se repetirão no relacionamento do futuro
médico com seus pacientes. Essa relação deve ser tão valorizada quanto a
relação que esse professor estabelece com seus próprios pacientes
(39,40)
.
Isso denota que, para exercer o seu papel de facilitador da
aprendizagem, é necessário que o professor assuma uma postura acolhedora,
que leve em consideração os conhecimentos prévios dos estudantes e suas
demandas particulares. Assim, o estudante deve assumir o papel de agente de
aprendizagem e o professor, de orientador e facilitador. Na perspectiva da
formação integral do estudante, para o trabalho em saúde, é necessário, por
parte do professor, o desenvolvimento de habilidades pedagógicas voltadas
para a incorporação de metodologias de ensino/aprendizagem que favoreçam
a troca, a construção do conhecimento e o protagonismo dos estudantes na
apropriação de saberes científicos, éticos e políticos
(41)
.
Em função disso, nos fóruns de educação médica tem se levantado o
debate sobre alguns temas, como a construção ativa e permanente do
conhecimento pelo estudante, a interdisciplinaridade, a humanização da
assistência à saúde e a necessidade de um ambiente acolhedor para os
estudantes nas escolas de Medicina, para auxiliar os jovens a superarem suas
ansiedades e refletirem sobre suas práticas. Quando há carência de
professores, que, além de tecnicamente competentes, tenham atitudes que
possam servir de modelo para a prática profissional, o enfrentamento ocorrerá
a partir dos mecanismos de defesa do ego, onde a negação, a intelectualização
37
e a dissociação são os mais acionados, levando o jovem estudante a se alienar
do humano, isolando-se do paciente
(21,42)
Conclusões
Considerando o processo de mudança curricular que vem sendo
implantado no curso de Medicina da UFRN, percebe-se, com este estudo, a
importância da implementação efetiva de um eixo humanístico na estrutura
curricular, que leve em conta a abordagem dos aspectos apontados.
Promover saúde e humanizar a sua atenção são trabalhos processuais,
a longo prazo, dinâmicos e intimamente relacionados com o contexto em que
se desenvolvem, e cujo diagnóstico é importante para proposição de ações
adequadas. No contexto da educação médica, visualizar o eixo humanístico
significa romper com estruturas fragmentadas dos cursos, como disciplinas
isoladas e não integradas, tendência à especialização precoce do estudante,
inserção tardia deste na prática, utilização de metodologias de ensino
baseadas somente na transmissão de conteúdos e dissociação entre a
formação e as necessidades sociais.
As DCNs para os cursos de Medicina
(43)
definem o perfil do egresso das
escolas médicas brasileiras como um profissional "com formação generalista,
humanista, crítica e reflexiva, capacitado a atuar, pautado em princípios éticos,
no processo saúde/doença em seus diferentes níveis de atenção, com ações
de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação à saúde, na perspectiva
da integralidade da assistência, com senso de responsabilidade social e
38
compromisso com a cidadania, como promotor da saúde integral do ser
humano".
Dessa forma, para que o estudante possa desenvolver uma atitude que
assista o paciente de forma integral, contemplando os seus aspectos
psicológicos, sociais e ambientais, é necessário que vivencie práticas
humanizadas, desde o início da sua formação.
Agradecimentos
Este trabalho contou com o apoio financeiro da CAPES e do Programa de Pós-
Graduação em Ciências da Saúde/Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. O desenvolvimento teve a colaboração de Marcelo José Santiago Lisboa
(Fisioterapeuta e Assistente Administrativo da UFRN) e os estudantes de
Fisioterapia: Bruno Lopes dos Santos, Sonaira Larissa Varela de Medeiros e
Francisco Assis Vieira Júnior (voluntários da Base de Pesquisa Edusaúde-
Centro de Ciências da Saúde-UFRN-Natal-RN).
Não há conflito de interesse.
39
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46
TABELA 1. Categorias e subcategorias obtidas a partir da percepção dos
estudantes sobre a humanização na formação médica.
Categorias Subcategorias
Unidades
de
análise
(n)
1-Relação estudante
/paciente
2-Ensino/aprendizagem
3-Relação estudante
/professor
1.1- Visão integral (holística) do ser
humano
2.1-Didática
2.2-Dicotomia teoria e prática
2.3-Contato com a comunidade
2.4-Integralidade
3.1-Professor modelo
3.2-Relações assimétricas
22
18
22
11
15
25
39
47
4. COMENTÁRIOS, CRÍTICAS E SUGESTÕES
Para demonstrar a relevância desta pesquisa, iniciamos com a
identificação das produções elaboradas no percurso da investigação durante o
curso de Mestrado. Como resultados do projeto, originaram-se as seguintes
publicações:
- Artigo submetido para publicação em periódico internacional
Alves ANO, Moreira, SNS, Azevedo GD, Rocha VM, Vilar MJ. A
humanização e a formação médica na perspectiva dos estudantes de
Medicina da UFRN. Acta Med. Port. (submetido). 2008.
- Artigo completo, publicado em periódico nacional
Rocha VM, Rolim-Neto ML, Alves ANO. Repercussions of the biomedical
model on the formation and humanization of health care practices - a
conceptual historical picture. Revista Neurobiologia. 2005; 68(3): 110-
123.
- Resumo enviado para anais de congresso nacional
Alves ANO, Moreira SN, Azevedo GD, Rocha VM, VILAR MJ. A
humanização e a formação médica na perspectiva dos estudantes de
Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
Resumo enviado para o 46º COBEM, de 18 a 21 de setembro de 2008 -
Salvador - BA.
48
- Resumo publicado em anais de congresso nacional
Alves ANO, Rocha VM. A humanização e a integralização na formação
dos profissionais da saúde: um recorte histórico. VII Congresso Nacional
da Rede Unida, III Fórum Nacional de Redes em Saúde. Trajetória dos
cursos de graduação na área da saúde, necessidades de profissionais e
política de expansão de cursos. ISSN 1678-8680. Anais do VII
Congresso Nacional da Rede UNIDA, Curitiba-PR, 15 a 18 de julho de
2006. Revista Olho Mágico, 13(2) - Abril/Junho de 2006.
Alves ANO, Rocha VM. A humanização no processo de
ensino/aprendizagem da formação médica na UFRN. 8º Congresso
Brasileiro de Saúde Coletiva e 11º Congresso Mundial de Saúde
Pública, ABRASCO- Rio de Janeiro - RJ, 2006.
Alves ANO, Rocha VM. Humanização: uma contribuição na formação
médica. III Congresso Brasileiro de Ciências Sociais e Humanas em
Saúde. ABRASCO/UFSC (Associação Brasileira de Pós-Graduação em
Saúde Coletiva e Universidade Federal de Santa Catarina),
Florianópolis-SC, 09 a 13 de julho de 2005.
Ao iniciar a pesquisa, nos deparamos com algumas restrições que
prejudicaram os primeiros passos da coleta dos dados. Primeiramente, nos
referimos ao acesso ao Complexo Hospitalar e de Saúde da UFRN, por
entraves burocráticos. Em seguida, à tentativa de junção dos grupos para a
realização do grupo focal, pela pouca disponibilidade dos estudantes, já que
49
todos pertenciam ao último ano do curso e estavam em período de avaliação,
além de se encontrarem em fase de seleção para prova de residência médica.
Superados estes imprevistos, o andamento da pesquisa ocorreu conforme as
propostas estipuladas no anteprojeto inicial.
Em relação à aplicação do grupo piloto, este foi necessário para
identificar a viabilidade da questão norteadora, que teve como função
direcionar o andamento da discussão, buscando responder ao objetivo
proposto na pesquisa, além da necessidade de verificação do tempo estimado
para os encontros dos grupos.
No que concerne às dificuldades referentes à metodologia empregada,
destacamos o momento da elaboração do corpus da pesquisa, ou seja,
momento da organização do material coletado, de forma que respondesse a
algumas normas de validade, como: exaustividade, onde os dados
apresentados pudessem contemplar todos os aspectos levantados na
discussão; representatividade, ou melhor, a representação do universo
pretendido; homogeneidade, momento em que os critérios de escolha, em
termos do tema, técnicas e interlocutores obedecessem a uma analogia; e, por
último, a pertinência, ocasião em que o material analisado se apresentasse
adequado aos objetivos da pesquisa.
No que se refere às publicações atuais sobre o assunto investigado,
circundam muitas pesquisas de cunho nacional e/ou internacional que, sem
dúvida, contribuirão para a ampliação do estudo.
O tema humanização tem sido, nos últimos anos, freqüentemente citado
na literatura científica. No campo da saúde, o conceito de humanização surge
como um princípio vinculado ao paradigma de direitos humanos expressos
50
individual e socialmente e referidos a médicos, pacientes, usuários,
consumidores, clientes e cidadãos como sujeitos. A fonte mais recente dos
princípios da humanização pode ser buscada na Declaração Universal dos
Direitos do Homem (ONU, 1948), que se funda na noção de dignidade e
igualdade de todos os seres humanos: em outras palavras, o que é devido ao
paciente como um ser humano, pelos médicos e pelo Estado, se conformou em
grande parte devido a esta compreensão dos direitos básicos da pessoa.
No que se refere à pesquisa: A Humanização e a Formação Médica na
Perspectiva dos Estudantes de Medicina da UFRN, além de sua originalidade,
no que diz respeito à metodologia utilizada, destacamos sua contribuição para
as discussões que vêm sendo desenvolvidas após a implantação do projeto
pedagógico do curso de Medicina da UFRN, desde 2002, tornando-se mais
uma instituição de ensino do Nordeste (a primeira foi a Universidade Federal do
Ceará) a colocar em vigor as DCNs do Curso de Graduação em Medicina, de
2001.
Diante da riqueza do tema e do extenso referencial teórico existente na
literatura atual, falar sobre o enriquecimento intelectual e científico adquirido no
decorrer da pesquisa torna-se bastante relevante. A pesquisa contribuiu,
sobremaneira, para um maior envolvimento como pesquisadora voluntária, no
projeto de pesquisa: Representações Sociais dos pacientes e sua relação com
a doença, fé, família e cura (visão do paciente diante da relação
médico/paciente/doença e da fé/família/cura), cadastrado na Pró-Reitoria de
Pesquisa-UFRN, sob a coordenação da Professora Doutora Lore Fortes, do
Centro de Ciências, Humanas, Letras e Artes (CCHLA), sob o código PIC1276-
2007.
51
Ademais, durante o curso de Mestrado, a participação no módulo
“estágio à docência” propiciou uma oportunidade ímpar, ao freqüentar
ativamente da disciplina intitulada “Sociologia da Saúde”, ministrada pela
Professora supracitada, nos cursos de Odontologia e Enfermagem, este último
durante todo o segundo semestre/2007.
Finalmente, gostaríamos de ressaltar que todas as experiências
adquiridas durante a pós-graduação (Mestrado em Ciências da Saúde),
deixaram a certeza da continuidade e do interesse no âmbito, tanto do ensino
como da pesquisa em saúde.
52
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ABSTRACT
The aim of this study is to understand the perception of medical students at the
Federal University of Rio Grande do Norte (UFRN) about humanization in the
context of their medical formation, using a qualitative approach. The focus
group and participant observation techniques were used, involving a
multidisciplinary team composed of professionals from the areas of
anthropology and psychology, as well as professors from the medical course,
who studied two groups of nine students in their final year. The data were
analyzed using the categorical thematic content analysis technique, from which
emerged three categories: student/patient relationship, teaching/learning and
student/professor relationship. The first allows us to identify that student-patient
contact is an essential experience for adopting a more humanized view of the
disease process. The second category shows that unqualified professors in the
pedagogic practices inherent to the teaching profession and the theory the
practical dichotomy hinder the autonomous and holistic formation of knowledge.
Similarly, the lack of practices outside the academic environment and the
absence of multiprofessional stimulation interfere in the construction of an
integral view of the individual. From the third category, the student/professor
relationship, emerge two opposing subcategories (professor model and
assymetric relationships), which reflect the importance of the professor`s ethical
humanist position, as opposed to an authoritarian attitude, to form the
professional attitude of the student. The results point important aspects of the
medical formation that may open a discussion about humanization, in the
context of new national curricular guidelines.
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Keywords: medical education, medical students, humanization, focus group.
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