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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
ORDEM OU PEDIDO? COMO OS BRASILEIROS
INTERPRETAM ATOS DE FALA PRODUZIDOS POR
APRENDIZES DE PLE
Priscilla da Silva Santos
Rio de Janeiro
Agosto de 2009
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ii
ORDEM OU PEDIDO? COMO OS BRASILEIROS
INTERPRETAM ATOS DE FALA PRODUZIDOS POR
APRENDIZES DE PLE
Priscilla da Silva Santos
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Letras
Vernáculas da Universidade Federal do Rio
de Janeiro como quesito para a obtenção do
Título de Mestre em Letras Vernáculas
(Língua Portuguesa).
Orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Mônica Maria Rio Nobre
Co-orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Myrian Azevedo de Freitas
Rio de Janeiro
Agosto de 2009
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iii
Ordem ou pedido ? Como os brasileiros interpretam atos de fala
produzidos por aprendizes de PLE
Priscilla da Silva Santos
Orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Mônica Maria Rio Nobre
Co-orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Myrian Azevedo de Freitas
Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em
Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ, como
parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras
Vernáculas (Língua Portuguesa).
Examinada por:
___________________________________________________
Presidente, Profa. Dra. Mônica Maria Rio Nobre (UFRJ)
_______________________________________________________
Profa. Dra. Patricia Maria Campos de Almeida (UFRJ)
_______________________________________________________
Profa. Dra. Sílvia Rodrigues Vieira (UFRJ)
_______________________________________________________
Profa. Dra. Christina Abreu Gomes (UFRJ) Suplente
_______________________________________________________
Profa. Dra. Mônica Tavares Orsini (UFRJ) Suplente
Rio de Janeiro
Agosto de 2009
iv
Nº SANTOS, Priscilla da Silva
Ordem ou pedido? Como os brasileiros interpretam atos de fala produzidos por
aprendizes de PLE
Dissertação (Mestrado em Letras Vernáculas - Língua Portuguesa) - Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras.
Orientadora: Mônica Maria Rio Nobre
Co-orientadora: Myrian Azevedo de Freitas
1. Ensino de Português como Língua Estrangeira. 2 Teoria dos Atos de Fala. 3.
Ordem e Pedido. 4. Prosódia. 5. Letras Teses
I. Nobre, Monica M. Rio (Orientadora). II. Freitas, Myrian Azevedo de (Co-
orientadora). III Universidade Federal do Rio de Janeiro. Programa de Pós -
Graduação em Letras Vernáculas. IV. Ordem ou pedido? Como os brasileiros
interpretam atos de fala produzidos por aprendizes de PLE.
CDD:
v
SINOPSE
Estudo dos atos de fala ordem e pedido,
voltado para o ensino de português como
língua estrangeira, sob a luz da Pragmática.
Verificação da influência de fatores
prosódicos no sucesso da realização desses
atos de fala quando produzidos por
estrangeiros aprendizes de português e
interpretados por falantes nativos brasileiros.
vi
RESUMO
Ordem ou pedido ? Como os brasileiros interpretam atos de fala
produzidos por aprendizes de PLE
Priscilla da Silva Santos
Orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Mônica Maria Rio Nobre
Co-orientadora: Prof
a
. Dr
a
. Myrian Azevedo de Freitas
Resumo da dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de
Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).
Ensinar uma língua estrangeira é levar o aprendiz a se comunicar no
idioma alvo. Sendo assim, não basta pensar o ensino de nguas em termos
estruturais, é preciso considerar, também, seu aspecto pragmático. É
fundamental lembrarmos do conceito defendido por Searle (1981) de que o ato
de fala é a unidade mínima da comunicação, e ensinar o aprendiz como agir
através das palavras em um idioma não materno. No que concerne
especificamente do ensino de português como ngua estrangeira, o conceito
de Searle vem sendo aplicado na organização dos conteúdos dos materiais
didáticos e tem se mostrado uma rica fonte de trabalhos científicos, motivando
teses e dissertações. O presente trabalho também se fundamentou na Teoria
dos Atos de Fala, e investiga a produção oral de aprendizes de português, na
cidade do Rio de Janeiro ao realizarem ordens e pedidos, e como os falantes
nativos brasileiros interpretam essas produções.
O foco na produção oral dos aprendizes justifica-se pelo fato de que a
maioria das interações comunicativas que um estrangeiro realiza no Brasil
ocorre com o uso da habilidade em questão. As ordens e os pedidos obtidos
com os informantes foram analisados em sua estrutura, contexto comunicativo,
intenção do falante, grau de hierarquia entre os participantes e também no
nível prosódico. Dessa forma, busca-se verificar quais fatores influenciam para
que os atos de fala sejam realizados com sucesso na interação entre falantes
nativos e não nativos do português do Brasil. No nível prosódico, comparam-se
as produções dos estrangeiros com os padrões propostos por Moraes (2008)
para ordens e pedidos no português do Brasil, a fim de verificar em que medida
a entoação afeta a realização dos atos de fala investigados. Os resultados
desta pesquisa podem servir como mais uma ferramenta para a formação do
professor de português como língua estrangeira, levando-o, assim como os
demais interessados na área, a rever sua postura sobre o ensino de pronúncia
e sobre o papel da fonologia no ensino de línguas.
Palavras-chave: Atos de fala, Ordem e Pedido, Prosódia, Pragmática, Ensino
de PLE, Ensino de Pronúncia.
Rio de Janeiro
Agosto de 2009
vii
ABSTRACT
Request or command? How Brazilian speakers interpret speech acts
produced by PFL learners.
Priscilla da Silva Santos
Advisor: Prof
a
. Dr
a
. Mônica Maria Rio Nobre
Co-advisor: Prof
a
. Dr
a
. Myrian Azevedo de Freitas
Master of Arts thesis submitted to the Pos-Graduation Program on Vernacular
Studies of the Federal University of Rio de Janeiro in order to fulfill partial requirements
to obtain the title of Master on Vernacular Studies (Portuguese Language).
Teaching a foreign language means to make the learner be able to
communicate with other people using the target language adequately. In order
to attain this goal, to consider structural aspects of the language is not enough.
It is also necessary to have in mind pragmatical factors. It is important to remember Searles
concept that speech acts are the minimal units of communication and to teach the
learner how to deal with words in a nonnative language. In what concerns
specifically the teaching of Portuguese as a foreign language, Seales concept (1981)
has been applied to the organization of didactic materials and proved to be a profitable
source for scientific theses and dissertations on language teaching. Our
research was carried out in Rio de Janeiro and also uses the principles of Speech Act
Theory to investigate requests and commands orally produced by students of
Portuguese as a foreign language, as well as the way Brazilian Portuguese
native speakers interpret these speech acts.
The foccus of our work was oral production in so far as most communicative
interactions between foreigners and Portuguese native speakers in Brazil are
performed orally. Requests and commands produced by the research subjects
through elicitation were analyzed according to several perspectives: their grammatical
structure and communicative context, the speakers objectives, the hierarchical
position of the speech act participants and also the prosodic cues to their interpretation. Our aim
was to identify the factors contributing for the well succeeded interpretation by Brazilian
Portuguese native speakers of requests and commands orally produced by Portuguese
language learners. The prosodic analysis involved the comparison between the
learners production and the Brazilian Portuguese request and command basic
melodic patterns as identified by Moraes (2008). In this respect, our goal was to
determine how the production and interpretation of these speech acts were
influenced by the intonation contours that characterized them. We hope the
results of this research may contribute to improve the courses directed to the
global formation of teachers of Portuguese as a foreign language. We also hope
that language teachers and people in general may review their assumptions in
what concerns the importance of pronunciation training and the role of
phonology in the area of language teaching and learning.
KEYWORDS: Speech Acts, Request and Command, Prosody, Pragmatics, PFL
Teaching, Pronunciation Teaching.
Rio de Janeiro
Agosto de 2009
viii
Ao meu eficiente, e por vezes zombeteiro, Anjo da
Guarda.
Que não folga, e só descansa, um pouco, quando eu
durmo tranquila em casa.
Sem o seu olhar atento, tudo teria ficado naquela curva da
estrada.
ix
Agradecimentos
À minha irmã Patrícia, minha jóia rara, meu orgulho, meu refúgio.
À minha mãe Delza, pelo seu amor incondicional.
Ao meu pai Alfredo, por ser meu porto seguro, meu herói.
Ao meu afilhado Gabriel, pelos sorrisos que me trouxe à face em momentos de
grande tensão.
À minha orientadora, Profa. Dra. Mônica Nobre, por ter aceitado o desafio de
me orientar, pela dedicação e enorme paciência ao longo do percurso. Pelos
conselhos sempre bem dados e por tudo que me ensinou. Se chego até aqui é
por conta da sua grande competência.
À minha co-orientadora Profa. Dra. Myrian Freitas, por tudo o que me ensinou
ao longo do mestrado, pela paciência e atenção com que me acolheu, e me
ajudou a conhecer um pouco do fantástico mundo da prosódia.
À professora Dra. Patricia Almeida, por ter me aberto as portas do mundo
científico e do PLE, por ser um exemplo de profissional e de pessoa. Quando
crescer, quero ser igual a você.
A todos os professores do programa de pós graduação que me ajudaram a
percorrer esse percurso: Profa Dra. Violeta Rodrigues, Profa. Dra. Lucia Helena
Gouvea, Profa. Dra. Leonor Werneck, Profa. Dra. Regina Gomes, Prof. Dr.
João Moraes, Prof. Dr. Uli Reich e Profa. Dra Aurora Neiva.
Às professoras do setor de Português Língua Estrangeira, Profa. Msta. Ana
Catarina Nobre de Mello e Profa. Dra. Danúsia Torres dos Santos, que me
acolheram, me ensinaram o caminho da pesquisa em PLE e sempre me
apoiaram nessa caminhada.
À amiga Cristiane Ribeiro, companheira de PLE, por ter acompanhado, mesmo
que a distância, todos os momentos da minha caminhada até aqui.
À amiga Andrea Belfort, companheira de sonhos profissionais, pessoa que na
hora certa tinha sempre as palavras exatas para não me deixar desistir, por ter
acreditado no meu potencial, sempre. E um agradecimento mais que especial
por ter me ajudando nas minhas incursões a campo para coletas de dados.
Aos meus mui diletos colegas de mestrado: Manuela Colamarco, Bárbara
Fadul, Luisa Vianna, Rosana, Rafael Guimarães, Patricia Botelho, pelos
desabafos, risos, papos, momentos únicos que nos levaram até a defesa.
Às amigas Lia Abrantes e Mariane Duarte, por toda prática de sala de aula que
me ensinaram, por todo apoio que me deram desde aquele primeiro dia em que
entrei em suas salas de aulas como estagiária, e saí professora de PLE.
À amiga da vida Natália Ribeiro, por ter aguentado com bravura cada momento
dessa caminhada, sempre ao meu lado, compartilhando as lágrimas e os risos
x
desses últimos anos. Disse o poeta que amigos a gente não faz, mas sim
reconhece-os, e com você foi assim, quando chegou, sabia que era um caso
irreversível de amizade. Dividimos o mesmo teto por um tempo, e então
aprendi a dividir com você a minha vida. não moramos mais juntas, mas
ainda hoje, nos momentos de alegria e tristeza, a pessoa com quem não posso
deixar de falar é você. E que assim seja para todo o sempre.
A Leandro Bronzato, por ter sempre estado ao meu lado dando força, incentivo,
ajudando com o Excel, sendo cobaia dos testinhos, segurando a minha mão
nas horas de pânico. Sempre preocupado e atento, seu carinho também me
ajudou a seguir. É muito bom saber que tenho você ao meu lado, para tudo e
apesar de tudo.
À Roberta Rimulo, amiga 18 anos. Sempre quando penso na essência da
palavra amizade, lembro-me de você. Não nos vemos todos os dias, passamos
anos geograficamente distantes, mas ainda assim sabemos, quando nos
vemos, que a amizade está ali. Olho pra você e vejo a menina de sete anos de
idade, e me orgulho por ser amiga da mulher que se tornou. E sei que te levarei
pra sempre em minha vida.
À minha prima Kelly, que chegou para me ajudar quando eu mais precisava,
com a coleta de dados, mostrando que os laços de amizade e carinho resistem
a tempo e distância.
Às amigas Jane Duarte, Claudia Megda, Camilla Stohler, por toda atenção,
incentivo, cumplicidade, palavras de apoio, e carinho durante esse complicado
período. E, ainda, por sempre acreditarem em mim e valorizarem o meu
trabalho.
À amiga Cinthia, pelo grande incentivo e amizade.
Ao amigo de uma vida inteira, Paulo Henrique, pelo carinho, amizade,
preocupação, companheirismo, incentivo, e por nunca desistir de mim, até
mesmo quando o mestrado me roubou de seu convívio.
Ao companheiro de planos loucos, idéias furadas, papos cabeças, conselhos
valiosos, e que, na reta final, fizeram e fazem toda diferença: Rodrigo Pereira.
Esse é a prova de que a amizade não se explica, acontece e só.
A um cavaleiro errante que passou pela minha vida e tirou muitas coisas do
lugar. Fez com que revisse conceitos, tivesse novas aspirações, trouxe-me riso
e alegria. Sempre será muito importante na minha vida, por tudo que me
ensinou, por tudo que representa: Rômulo Lemos.
xi
A linguagem se parece com um explosivo, visto
que a junção de um elemento mínimo
pode produzir efeitos terríveis.
Reflitam em tudo o que se seguiu à enunciação
Por Hitler das palavras: “A guerra!”
BERTRAND RUSSELL (apud Armengaud, 2006:99)
xii
SUMÁRIO
ÍNDICE DE QUADROS ....................................................................................xiv
ÍNDICE DE GRÁFICOS ....................................................................................xv
ÍNDICE DE FIGURAS.......................................................................................xvi
INTRODUÇÃO..................................................................................................17
1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.................................................................22
1.1 A Pragmática................................................................................22
1.1.1 A proposta de Hansson (1974)..........................................24
1.1.2 A Teoria dos Atos de Fala.................................................28
1.1.3 A Teoria da Polidez...........................................................33
1.1.4 Pedido vs. Ordem: a visão de Searle...............................35
1.1.5 Pedido vs. Ordem: a visão de Oliveira..............................36
1.1.6 Pedido vs. Ordem: a visão de Kerbrat-Orecchioni ...........41
1.1.7 Pedido vs. Ordem: a visão de Cunha e Cintra..................49
1.2 Ensino de língua estrangeira.......................................................51
1.2.1 Ensino de pronúncia: problemas.......................................54
1.2.2 Compreensibilidade e inteligibilidade ...............................57
1.2.3 O paradoxo no ensino de pronúncia.................................60
1.2.4 Ensino de pronúncia em materiais de PLE.......................61
1.2.5 Ensino de ordem e pedido em materiais de PLE .............62
1.3 A prosódia ................................................................................65
1.3.1 Teoria Autossegmental Métrica e o ToBI.............................69
1.3.2 Prosódia e ensino de línguas...............................................70
xiii
2. METODOLOGIA ......................................................................................75
2.1 Elaboração do corpus..................................................................75
2.2 Perfil dos informantes..................................................................80
2.3 Coleta e armazenamento dos dados...........................................83
2.4 Teste de percepção.....................................................................85
3. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS..................................................89
3.1 Caracterização morfossintática de ordem e pedido....................89
3.2 Interpretação de ordem e pedido sob a ótica da percepção ......98
3.3 A relação entre a prosódia e a interpretação dos ouvintes........102
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................116
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................120
ANEXOS..........................................................................................................124
xiv
ÍNDICE DE QUADROS
Quadro 1.1 Comparação das condições de felicidade para pedidos e
advertências ......................................................................................................32
Quadro 1.2 Quadro teórico das formas do ato de fala pedido em materiais
didáticos de PLE................................................................................................64
Quadro 2.1 Situações do DCT........................................................................78
Quadro 2.2 Aspectos envolvidos nas situações do DCT................................79
Quadro 3.1 Situações do DCT que sugeriam a produção de „ordens‟...........90
Quadro 3.2 Estruturas morfossintáticas dos atos de fala „ordem‟ e „pedido‟..91
Quadro 3.3 Situações do DCT que sugeriam a produção de „pedidos‟..........91
Quadro 3.4 Resultado do teste de percepção no que diz respeito à
identificação dos atos de fala em estudo...........................................................98
Quadro 3.5 Resultados das fases de produção e percepção no que diz
respeito ao sexo dos informantes „ordens‟.....................................................99
Quadro 3.6 Resultados das fases de produção e percepção no que diz
respeito ao sexo dos informantes „pedidos‟..................................................100
Quadro 3.7 Produção e percepção dos atos de fala estudados no que diz
respeito à nacionalidade dos informantes.......................................................100
Quadro 3.8 Total de dados obtidos através do teste de percepção e sua
identificação pelos juízes.................................................................................101
Quadro 3.9 Resultado do teste de percepção no que diz respeito aos
enunciados percebidos como „outros‟..............................................................102
xv
ÍNDICE DE GRÁFICOS
Gráfico 1.1 Quantitativo das estruturas gramaticais de pedidos em manuais
didáticos de PLE................................................................................................65
Gráfico 2.1 Relação hierárquica entre os papéis comunicativos no DCT......79
Gráfico 2.2 Tipo de relação interpessoal entre os participantes das situações
comunicativas no DCT.......................................................................................80
Gráfico 2.3 Línguas estrangeiras, além do português, faladas pelos
informantes franceses........................................................................................82
Gráfico 2.4 Línguas estrangeiras, além do português, faladas pelos
informantes alemães..........................................................................................83
Gráfico 3.1 Frequência de ocorrência das estruturas morfossintáticas em
„ordem‟...............................................................................................................93
Gráfico 3.2 Ocorrência do posicionamento de „favor‟ em relação ao núcleo do
ato de fala „ordem‟.............................................................................................94
Gráfico 3.3 Frequência de ocorrência das estruturas morfossintáticas em
„pedido‟...............................................................................................................96
Gráfico 3.4 Ocorrência do posicionamento de „favor‟ em relação ao núcleo do
ato de fala „pedido‟.............................................................................................97
xvi
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1 Esquema de Kerbrat-Orecchioni para atos diretivos ....................42
Figura PRAAT 1 Ordem 1.............................................................................104
Figura PRAAT 2 Ordem 2............................................................................105
Figura PRAAT 3 Request 1..........................................................................107
Figura PRAAT 4 Request 2…......................................................................108
Figura PRAAT 5 Request 3..........................................................................109
Figura PRAAT 6 Yes-no questios neutral 1..................................................110
Figura PRAAT 7 Yes-no questios neutral 2..................................................111
Figura PRAAT 8 Yes-no questios neutral 3..................................................111
Figura PRAAT 9 Yes-no questios neutral 4..................................................112
Figura PRAAT 10 Asserção 1.......................................................................114
Figura PRAAT 11 Asserção 2 ......................................................................115
Introdução
Os materiais didáticos para o ensino de língua portuguesa para
estrangeiros há muito abordam a questão dos atos de fala, seja em sua
organização conteudística, seja nos diálogos utilizados na apresentação do
tópico de cada unidade gramatical, a ser estudado. Observa-se, então, que o
conceito de Searle (1981) que entende o ato de fala como unidade mínima da
comunicação vem sendo colocado em prática no ensino de língua estrangeira
(LE), uma vez que é inegável que a comunicação tem sido seu foco principal.
Por conta disso, espera-se que os professores de línguas estrangeiras em
geral e de português como língua estrangeira, também, dominem,
minimamente, os aspectos formais e interacionais que norteiam e caracterizam
os atos de fala.
Contudo, alguns estudos na área de ensino de línguas indicam que
esses aspectos vêm sendo negligenciados tanto por materiais didáticos, quanto
por professores, e uma hipótese para isso pode ser o desconhecimento de
muitas das teorias relacionadas ao tema. Esse fato pode causar problemas na
interação de sala de aula, e mesmo no dia a dia do aluno estrangeiro. É o caso,
por exemplo, de um pedido interpretado erroneamente como ordem, quando
proferido por um falante hierarquicamente inferior ao seu interlocutor. O que
levaria, então, um pedido a ser interpretado como uma ordem ou vice-versa?
Considerando os aspectos mencionados acima, o presente trabalho
pretende realizar um estudo dos atos de fala pedido e ordem, com
aplicabilidade para o ensino do português como língua estrangeira. Entende-se
que, para tal, é preciso realizar um levantamento teórico sobre esse assunto,
18
englobando tanto a estrutura gramatical de tais atos de fala quanto seu
contexto de uso.
A escolha dos atos de fala ordem e pedido para serem investigados se
deu através da observação de que alguns brasileiros consideravam que os
estrangeiros eram ríspidos em sua forma de pedir ou dar ordens, quando se
comunicavam em português, provocando, assim, antipatia por parte de seu
interlocutor. Essa reação fazia com que o ouvinte, entre outras possibilidades:
(i) não realizasse a ação solicitada, levando o ato de fala a um insucesso; (ii)
cumprisse o ato de fala proposto pelo falante, mas o fizesse contra sua
vontade; ou (iii) alimentasse o estereótipo de que os estrangeiros são rudes e,
até mesmo, grosseiros, sobretudo quando se encontram em posição
hierárquica superior à de seu interlocutor.
Ao pensar nas possíveis razões para essas situações, inicialmente
buscaram-se justificativas para as construções gramaticais utilizadas pelos
falantes estrangeiros na realização de tais atos comunicativos. Tal
possibilidade levou à busca em materiais didáticos específicos para o ensino
de português como língua estrangeira, de como os atos de fala em questão
eram tratados. A investigação centrada na estrutura gramatical de tais atos de
fala pouco esclarecia sobre os ruídos existentes na comunicação entre
brasileiros e estrangeiros aprendizes de português, quando o segundo
intencionava proferir uma ordem ou um pedido ao primeiro. A dúvida, até então
sem solução, levou a um novo caminho de pesquisa. Dessa vez, além da
estrutura, seria investigada também a prosódia dos atos de fala diretivos, tendo
como ponto de partida a afirmação de Searle (1981: 43):
19
o marcador de força ilocucional indica o modo pelo qual é preciso
considerar a proposição, isto é, qual será a força ilocucional a atribuir
à enunciação; ou, ainda, qual é o acto ilocucional realizado pelo
falante quando profere a frase. Os processos utilizados em português
para marcar esta força ilocucional incluem, pelo menos, a ordem das
palavras, o acento tónico, a entoação, a pontuação, o modo do verbo
e os verbos chamados <<performativos>>.
Assim, não a Pragmática e os conceitos gramaticais dos atos de fala
ordem e pedido serviriam como suporte teórico para o estudo que ora se
apresenta, mas também a Fonologia com seu suporte sobre o estudo da
entonação. Ao longo do percurso científico, outras teorias passaram a balizar a
presente investigação: a Análise da Conversação, a Teoria da Polidez, o
ensino de língua estrangeira, o ensino de pronúncia, a Teoria Autossegmetal
Métrica, dentre outras que serão abordadas ao longo das páginas que seguem.
Após um estudo de cunho teórico, o alvo passou a ser a realidade
comunicativa dos alunos de PLE
1
e os possíveis ruídos ocasionados na
produção de ordens e pedidos. Para isso, elaborou-se um corpus composto por
84 enunciados elicitados por falantes de outras línguas aprendizes de
português em contexto de imersão
2
, em que os informantes eram levados a
produzir os atos de fala em estudo. Como o ruído comunicativo ocorria no nível
do ouvinte, foram selecionadas as sentenças que mais se adequavam
morfossintaticamente às ordens e aos pedidos, e essas foram submetidas à
percepção de falantes nativos
3
do português do Brasil. A tais falantes nativos,
chamados neste trabalho de juízes, cabia identificar a sentença como ordem,
pedido ou outro ato de fala que lhe fosse mais adequado.
1
PLE: Português como Língua Estrangeira.
2
País onde a língua que está sendo aprendida, no caso o português do Brasil, é falada como língua
materna.
3
Falante nativo: falante que tem como primeira língua, ou língua materna, o idioma falado no país em que
vive, no caso da presente pesquisa, o Brasil.
20
Das frases submetidas ao teste de percepção, foram selecionadas as
que obtiveram resultados mais expressivos quantitativamente, que foram
analisadas acusticamente no programa computacional PRAAT. O
comportamento do contorno melódico das sentenças selecionadas foi
comparado com as propostas de Moraes, feitas em um estudo publicado em
2008, ocasião em que esse autor define padrões entonacionais para alguns
atos de fala diretivos, dentre eles ordem e pedido.
Todo o percurso investigativo tem como objetivo buscar, como foi
mencionado, justificativas para problemas na percepção de pedidos e ordens
produzidos por falantes não nativos do português do Brasil quando em
interação com brasileiros. Este trabalho visa a oferecer suporte teórico e prático
para professores de português como língua estrangeira e demais interessados
na área, no que diz respeito ao ensino dos atos de fala, especificamente
ordens e pedidos.
Esta dissertação está dividida da seguinte maneira: no primeiro capítulo,
é apresentado o referencial teórico como base da pesquisa. Trataremos da
Pragmática, da Teoria dos Atos de Fala com a visão de vários autores sobre
ordem e pedido, do ensino de língua estrangeira enfocando os problemas de
pronúncia, compreensibilidade e inteligibilidade, o tratamento dispensado por
manuais de PLE a essas questões, além de abordarmos questões referentes à
entonação, como a Teoria Autossegmental e Métrica, e o ToBI. O capítulo 2 é
dedicado à Metodologia, e nele serão expostos a elaboração do corpus, o perfil
dos informantes, o método de coleta e armazenamento de dados. O terceiro
capítulo trata da descrição e análise dos dados, mostrando-se a caracterização
morfossintática de ordem e pedido, a interpretação desses atos de fala sob a
21
ótica dos informantes que participaram do teste de percepção e, por fim, a
análise das curvas entonacionais, das sentenças realizando, assim, a relação
entre prosódia e a interpretação dos informantes. O capítulo 4 é dedicado às
considerações finais acerca de nossa pesquisa.
22
1 Fundamentação teórica
Para a realização deste estudo, foi necessário buscar embasamento
teórico em diversas linhas. Este capítulo se divide em duas partes, a primeira
voltada para as questões relativas a Pragmática, Atos de Fala, Teoria da
Polidez e a abordagem de alguns autores sobre os atos de fala ordem e
pedido. A segunda parte deste capítulo trata do ensino de língua estrangeira,
começando por um panorama geral a respeito das metodologias de ensino de
línguas, seguido do ensino da pronúncia. Por fim, serão abordados conceitos a
respeito de prosódia, fundamentais para o desenvolvimento da pesquisa.
1.1 A pragmática
Uma das correntes teóricas que alicerçam o presente estudo é a
Pragmática. Sua escolha deve-se por investigar o signo linguístico analisando
não sua estrutura formal e semântica, mas também os participantes da
interação, a intenção comunicativa do falante e a reação do ouvinte. Essa é
uma explicação simplista do que seria e sobre o que estudaria a Pragmática,
uma vez que sua definição é complexa e merece um pouco mais de atenção.
Levinson, em sua obra publicada em 1983 (com edição brasileira em
2007), Pragmatics, afirma que
num certo sentido, não absolutamente nenhum problema de
definição: assim como, tradicionalmente, a sintaxe é considerada o
estudo das propriedades combinatórias das palavras e suas partes, e
a semântica o estudo do significado, a pragmática é o estudo do uso
linguístico (2007 [1983]: 6).
Contudo, a definição apresentada não conta da real estrutura dos
estudos pragmáticos. Esses estudos se dividem nas áreas da filosofia e
23
linguística, e, para dificultar a obtenção de uma definição para o termo
Pragmática, alguns estudiosos como Searle e Lyons, de acordo com Levinson,
julgam-no incerto e obscuro. Assim, os pragmaticistas trazem consigo a tarefa
de mostrar que “o termo realmente tem aplicação clara (Levinson 2007
[1983]:7).
De acordo com Levinson (2007 [1983]), o melhor é entender a
Pragmática como “o estudo da capacidade dos usuários da língua de
emparelhar sentenças com os contextos em que elas seriam adequadas” (p.
29), ou, em outras palavras “uma teoria pragmática, em princípio, deve prever,
para toda e qualquer sentença bem formada de uma língua, numa
interpretação semântica específica, o conjunto de contextos em que seria
adequada” (p. 29).
Outra linha teórica em direção à qual o estudo apresentado se direciona
é a Prosódia. O autor supracitado afirma omitir a abordagem da relação entre
Pragmática e Prosódia em seus estudos por não haver investigação científica
suficiente na área; contudo, ele admite a importância dos fatores prosódicos
para a Pragmática. E essa relação será abordada nos capítulos posteriores
deste trabalho.
A Pragmática é de fundamental relevância para a abordagem que se
pretende dar ao ensino de PLE, uma vez que acredita-se não ser possível
ensinar uma língua estrangeira centrada apenas nos seus aspectos semânticos
e formais, embora haja abordagens de ensino de língua estrangeira com bases
estruturais. Como o foco do ensino é a comunicação em um idioma não
materno, não se pode deixar de apresentar ao aprendiz como a língua é
24
utilizada no seu cotidiano, em situações reais de uso, e, para tal, não se podem
fechar os olhos para os aspectos pragmáticos.
1.1.1 A proposta de Hansson (1974)
Segundo Armengaud em seu livro „A pragmática‟ de 2006, Hansson
(1974) foi o primeiro estudioso que tentou unificar sistemáticamente e articular
as diferentes partes da semiótica (sintática, semântica e pragmática), que
vinham até então avançando de maneira relativamente independente. Hansson
define três graus da pragmática, e cada um deles leva em conta um aspecto do
contexto termo que, segundo Levinson (2007), possui grande complexidade
de definição que, de um grau a outro, se enriquece e complexifica.
A pragmática de primeiro grau centra-se no estudo dos símbolos
indexicais (pronomes como “eu”, “tu”, “ele”, os demonstrativos ou dêiticos como
“isto”, “aquilo”, agora”). A pragmática de segundo grau é “o estudo da maneira
em que a proposição expressa se liga à frase pronunciada, onde, nos casos
relevantes, a proposição expressa deve ser distinguida do significado literal da
frase” (Armengaud 2006:84, grifos da autora). O ponto de maior interesse,
dentro das teorias da pragmática de segundo grau, é o estudo de Grice sobre
as máximas conversacionais.
A partir do seu princípio de cooperação comunicativa, em que Grice
afirma, segundo Armengaud, “dê a sua contribuição à comunicação na maneira
solicitada, no momento em que ela ocorre, pelo objetivo reconhecido da
comunicação de que você está participando” (2006: 88), ele desenvolve suas
quatro máximas conversacionais, cuja denominação e função foram tomadas
25
de empréstimo à tabela dos juízos de Kant. Elas fornecem as premissas
faltantes ao silogismo elíptico (entitema), cuja implicatura é em geral a
conclusão. São elas:
(i) máxima da quantidade - “torne seu discurso tão rico de
informação(ões), mas não em excesso, quanto requerido pelo objetivo
da comunicação” – Informatividade;
(ii) máxima da qualidade - “não afirme o que você acredita ser falso, nem
aquilo de que não tem prova suficiente” Sinceridade;
(iii) máxima da relação - “seja pertinente” – Pertinência; e
(iv) máxima da modalidade: “seja claro, sem equívocos, sintético e
ordenado” – Civilidade.
Uma infração aberta às máximas provoca no ouvinte uma inquirição, a
partir da dupla suposição: (a) que o falante respeita, por princípio, as máximas;
(b) que, na ocorrência, ele não podia respeitar todas ao mesmo tempo; e (c)
que à infração „aberta‟ de uma das máximas corresponde o respeito tácito de
outra.
A pragmática de terceiro grau é a que mais interessa para o presente
estudo. Segundo Armengaud (2006), o ponto de partida da teoria clássica dos
atos de fala é a convicção de que a unidade mínima da comunicação humana
não é nem a frase, nem qualquer outra expressão, e sim a realização
(performance) de alguns tipos de ato. O pioneiro nessa convicção foi o filósofo
John L. Austin, que deu uma longa lista desses atos: afirmar, fazer uma
pergunta, dar uma ordem, prometer, descrever, agradecer, criticar, pedir,
desafiar, autorizar, ente outros. Ele inaugura a Teoria dos Atos de Fala com
sua obra How to do things with words, em 1962. Para Armengaud, “ao
26
pronunciar uma frase, um falante realiza um, outro ou, às vezes, vários atos de
fala. O ato em si não deve ser confundido com a frase (ou com a expressão
linguística, qualquer que seja ela) utilizada em sua realização” (2006: 100).
A Teoria dos Atos de Fala é reconhecidamente um estudo importante na
área da pragmática, tendo em vista que é uma investigação sistemática da
relação entre os signos e seus intérpretes. Trata-se de saber o que fazem os
intérpretes ao utilizarem certos tipos de signos. Contudo, nenhum de seus
precursores (Austin e Searle) utiliza o termo pragmática para designar seus
estudos.
A forma lógica do ato ilocucionário em seu vínculo com um conteúdo
proposicional foi expressa pelos teóricos Searle e Vanderveken, de acordo com
Armengaud (2006), da seguinte maneira:
F (p) p é o conteúdo proposicional e F, a força ilocucionária.
A referida autora, ainda em sua obra de 2006, afirma que um
problema na classificação dos atos de fala, tendo em vista que as categorias
propostas por Austin mais parecem um agrupamento de verbos ilocucionais do
que uma real divisão dos atos de fala. Vale mencionar que Austin abre as
discussões sobre o tema, que será desenvolvido por outros estudiosos, como
Searle, por exemplo.
Armengaud também apresenta a proposta de classificação dos atos de
fala elaborada por Searle, que, apesar da dificuldade de propor outra
classificação que contemplasse todos os critérios envolvidos, estabelece doze
possibilidades de divisão dos atos ilocucionários. São eles:
27
a) diferença quanto à finalidade do ato responde à pergunta “Qual é o
ponto?”, as condições essenciais para a realização de um ato. Searle
chama de ponto ilocucionário a finalidade de um ato ilocucionário. O
ponto faz parte da força ilocucionária sem recobri-la;
b) diferenças quanto à orientação de ajuste entre as palavras e as
coisas trata-se de conseguir que o mundo se conforme às palavras (o
ponto de vista é que faz o objeto);
c) diferença acerca dos estados psicológicos expressos condição de
sinceridade do ato. Os principais estados psicológicos aptos a reagrupar
o maior número de atos ilocucionários são: crença (asserção,
observação), a intenção (promessa, voto, ameaça), o desejo ou a
necessidade (ordem, pedido, prece), o prazer (felicitações, saudação de
boas vindas);
d) diferenças de intensidade de investimento ou de comprometimento
manifesto na apresentação do ponto ilocucionário (insisto / sugiro
quero / desejo gostaria que / ordeno que eu não peço, eu mando);
e) diferenças de estatuto ou de posição do falante e do ouvinte, na
medida em que a força ilocucionária da sentença é sensível a isso;
f) diferenças na maneira com que a sentença se relaciona com os
interesses do falante e do ouvinte;
g) diferenças na relação com o todo do discurso, com o todo discursivo
expressões performativas (concluo, respondo) destinadas a vincular
uma sentença ao resto do discurso. Possui um valor argumentativo e
indica a posição do falante no discurso (também conectivos como,
contudo, além disso);
28
h) diferenças de conteúdo proposicional determinadas por marcas ou
procedimentos indicativos da força;
i) diferenças entre os atos que são sempre atos de fala e os que podem
ser realizados como atos de fala, mas que não são necessariamente
realizados como tal;
j) diferenças entre os atos que requerem instituições extralinguísticas
para a sua realização e aqueles que não requerem;
k) diferenças entre os atos em que o verbo ilocucionário correspondente
tem um performativo e aqueles que não o têm. atos que possuem
verbos para exprimi-los, como prometer e ordenar. outros como
ameaçar não são utilizados na realização do ato; e
l) diferenças do estilo de realização do ato ilocucionário - alguns verbos
ilocucionários servem para marcar o que se pode chamar de estilo
particular segundo o qual um ato ilocucionário é realizado. A diferença
entre fazer uma proclamação e fazer uma confidência não implica
necessariamente uma diferença de ponto ilocucionário ou de conteúdo
proposicional, mas apenas de estilo de realização.
1.1.2 A Teoria dos Atos de Fala
4
Austin, ao definir as diretrizes da Teoria dos Atos de Fala, desconstrói a
ideia defendida pelos filósofos a respeito dos enunciados que seguem o
binômio verdadeiro ou falso, e introduz o conceito dos enunciados
performativos. Através desse novo tipo de enunciado, o falante executa uma
4
Os atos de fala ordem e pedido, que são o foco desta pesquisa, serão tratados especificamente mais
adiante.
29
ação ao proferi-lo. Segundo Kerbrat-Orecchioni (2005: 20), um enunciado
performativo é um enunciado que, desde que sejam respeitadas certas
condições de êxito, realiza a ação que ele denomina” (grifos da autora).
Essas condições de êxito de que fala Kerbrat-Orecchioni são chamadas
por Austin de condições de felicidade, que é a reunião de fatores que levam um
ato de fala a ser realizado de acordo com a intenção comunicativa do falante.
Uma vez que a um enunciado performativo não cabe ser verdadeiro ou falso,
ele pode ser bem sucedido ou não. O filósofo, então, distingue três categorias
principais das condições de felicidade (apud Levinson 1983 [2007]: 291):
A (i) deve existir um procedimento convencional que tenha um
efeito convencional
- (ii) As circunstâncias e as pessoas devem ser adequadas,
conforme especificado no procedimento
B O procedimento deve ser executado (i) corretamente e (ii)
completamente
C Muitas vezes (i) as pessoas devem ter os pensamentos,
sentimentos e intenções requeridos conforme especificado no
procedimento, e (ii) se a conduta consequente é especificada, então,
as partes relevantes devem ater-se a essa conduta.
Quando se infringe a categoria C, acontece uma insinceridade, seria um abuso
que somente seria descoberto em momento posterior à enunciação, enquanto
uma violação às categorias A e B dá origem a falhas, fazendo com que as
ações pretendidas não sejam realizadas.
Austin logo percebe que sua proposta de definição dos atos
performativos possui uma série de problemas (que mais tarde serão
contestados e repensados por seu discípulo Searle), e divide os atos de fala
em dois outros atos:
(i) ilocucionários o que se faz quando fala. Alguns são
suficientemente definidos pelas regras gerais da linguagem, outras
30
dependem de certas condições extralinguísticas, como condições
institucionais de dimensão social; e
(ii) perlocucionários efeitos produzidos pelas sentenças (convencer,
emocionar...). Os efeitos perlocucionários provêm de atos
ilocucionários; porém, convém separar esses conceitos, uma vez que
seus efeitos podem ser obtidos por meios não necessariamente
linguísticos.
. No que diz respeito à classificação, Austin propõe as seguintes
categorias para os atos de fala:
(i) veridictivos: consistem em pronunciar um julgamento (veredicto)
fundado na evidência ou em boas razões, acerca de um valor ou de um
fato. Exemplos: desculpar, considerar, calcular, descrever, entre outros;
(ii) exercitivos: consistem em formular uma decisão em favor ou no
sentido de uma sequência de ações. Exemplos: ordenar, comandar,
suplicar e recomendar;
(iii) comissivos: comprometem o leitor com determinada sequência de
ações. Exemplos: prometer, fazer voto de e jurar;
(iv) expositivos: são utilizados para expor concepções, conduzir uma
argumentação, esclarecer a utilização de palavras, assegurar as
referências. Exemplos: afirmar, negar e responder; e
(v) comportamentais: trata-se de reações ao comportamento dos outros,
aos acontecimentos que lhes dizem respeito; são expressões de
atitudes acerca de seu comportamento ou de seu destino. Exemplos:
desculpar-se, agradecer e felicitar.
31
Searle revisita a obra de seu professor e segue no desenvolvimento dos
estudos dos atos de fala, ou de linguagem. Ele compartilha com Austin a ideia
de que “todo o enunciado linguístico funciona como um ato particular” (Kerbrat-
Orecchioni, 2005: 27), e o componente que atribui ao enunciado o valor de ato
de fala é a força ilocucionária. Segundo Searle (1981: 36), um mesmo
enunciado pode ter diferentes forças ilocucionárias, assim como se pode
proferir um enunciado vazio de valor ilocucional.
Searle (1981) apresenta três diferentes atos sob o nome de atos de fala:
a) atos de enunciação consistem em enunciar palavras;
b) atos proposicionais consistem em referir e predicar; e
c) atos ilocucionais força do ato de fala, ou propósito comunicativo
(afirmar, perguntar, ordenar, entre outros).
A essas noções, o autor acrescenta o ato perlocucional, que é proposto por
Austin, e que leva em conta o efeito produzido por determinado enunciado
sobre “as ações, pensamentos ou crenças dos ouvintes” (1981: 37).
Para que o valor ilocucionário do ato de fala atinja o valor perlocucional
desejado, é preciso, segundo Kerbrart-Orecchioni, que se obedeçam a
algumas condições de sucesso. Dentre essas condições, estão o nível
hierárquico dos participantes, sobretudo em atos como ordem, e o ambiente
em que se dará a interação (por exemplo, para que a frase “Feche a porta” seja
interpretada como uma ordem, é preciso que haja uma porta, que ela esteja
aberta e que o ouvinte esteja em um nível hierárquico que o leve a obedecer tal
ordem). Sem que as condições de sucesso sejam obedecidas, o ato de fala
tende a não se concretizar.
32
Sobre essas condições de sucesso, Levinson (2007) afirma que Searle
se baseia no conceito de condição de felicidade proposto por Austin e sugere
quatro tipos de condição que se pode usar para comparar os atos de fala,
classificados de acordo com a forma que especificam o conteúdo
proposicional, as precondições preparatórias, as condições de sinceridade
e a condição essencial(grifos do autor, Levinson 2007 [1983]: 304). O autor
utiliza o exemplo abaixo para explicar o que seria cada um desses itens de
classificação:
Condições
Pedidos
Advertências
Conteúdo proposicional
Futuro ato A de O
Acontecimento futuro A
Preparatórias
1. F acredita que O tem
condições de
executar A
2. Não é evidente que O
executaria A sem que
lhe pedisse para
faze-lo.
1. F pensa que A
ocorrerá e que A não
é do interesse de O
2. F pensa que não é
evidente para O que
A ocorrerá
Sinceridade
F quer que O execute A
F acredita que A não é do
melhor interesse de O
Essencial
Conta como tentativa de
fazer O executar A
Conta como entendimento de
que A não é o melhor
interesse de O
Quadro 1.1 Comparação das condições de felicidade para pedidos e advertências (cf. Levinson, 2007[1983]: 304)
Ainda no tocante à classificação dos atos de fala, Searle, segundo
Levinson (2007 [1983] ), vai além da proposta de taxonomia dos verbos
performativos de Austin, apresentada anteriormente, e elabora um esquema
baseado nas condições de verdade, em que seriam cinco os tipos básicos de
ação que alguém pode realizar ao falar. Contudo, esse sistema classificatório
não se baseia nas condições de felicidade, contrariamente ao que afirma
Searle, e carece de fundamentos que a embasem. Segue o esquema:
(i) representativas, que comprometem o falante com a verdade da
proposição expressa (casos paradigmáticos: afirmar, concluir, etc.)
(ii) diretivas, que são tentativas do falante de fazer com que o
destinatário faça algo (casos paradigmáticos: pedir, perguntar)
(iii) comissivas, que comprometem o falante com algum curso de
ação futuro (casos paradigmáticos: prometer, ameaçar, oferecer)
33
(iv) expressivas, que expressam um estado psicológico (casos
paradigmáticos: agradecer, desculpar-se, etc.)
(v) declarações, que resultam em mudanças imediatas no estado
institucional de coisas e que tendem a se valer de instituões
extralinguísticas complexas (casos paradigmáticos: excomunhão,
batizar, declarar guerra). (grifos do autor Levinson, 2007: 305)
1.1.3 A Teoria da polidez
Os estudos sobre a Teoria da Polidez baseiam-se, segundo Kerbrat-
Orecchioni, “na ideia de que todo indivíduo é movido pelo desejo de ver
preservado seu „território‟ (corporal, material, espacial, temporal ou mental) e
sua „face‟ (fazer boa figura na interação)” (2005: 87). Esses conceitos foram
observados primeiramente por Goffman (1967, 1971) e trabalhados também
por Brown & Levinson. Esses últimos autores renomearam os conceitos de
território e face, em face negativa e face positiva, respectivamente.
O desejo de preservação da „face‟ está constantemente presente na vida
dos indivíduos que agem socialmente, uma vez que, durante uma
comunicação, os falantes se veem constantemente tendo suas „faces‟
ameaçadas por diversos atos de linguagem. Segundo Kerbrat-Orecchioni, atos
como ameaças e promessas ameaçam a face negativa do autor, enquanto
críticas e confissões ameaçam sua face positiva. Esses atos ameaçadores são
chamados de FTAs (Face Threatening Acts).
Como os indivíduos estão em constante busca pela preservação da sua
face, uma das questões para os estudiosos da comunicação é verificar quais
são as estratégias usadas pelos falantes para se comunicarem sem ameaçar a
face do outro. Tal questionamento é a base dos estudos da Teoria da Polidez,
de Brown e Levinson.
34
Nessa perspectiva, portanto, a polidez aparece como um meio de
conciliar o desejo mútuo de preservação das faces com o fato de que
a maior parte dos atos de linguagem produzidos ao longo da
interação são potencialmente ameaçadores para uma ou outra
dessas faces (Kerbrat-Orecchioni, 2005:87).
Algumas formulações e estratégias são utilizadas na tentativa de
preservar a face do outro e de si, como, por exemplo, a formulação de atos
indiretos, utilização de expressões reparadoras, representadas pelo pedido de
desculpas, ou suavizadores, como é o caso da expressão „por favor‟ em ordens
e pedidos (cf. item 1.1.6 adiante). também recursos minimizadores,
desarmadores, e aduladores, todos com o objetivo de amenizar o FTA.
No modelo de Brown e Levinson, a polidez serve, basicamente, para
limitar os danos causados na interação, sendo o ponto chave a consciência por
parte dos interlocutores de que é preciso um esforço enorme para minimizar os
riscos de confrontação e de agressões a que todos estão expostos ao se
comunicarem.
Além dos FTAs, também os FFAs (Face Flattering Act), que é o
complemento positivo aos FTAs, isto é, um ato elogioso. Esses atos compõem
todo ato de linguagem, que podem ser formados por: um FTA, um FFA ou um
complexo dos dois.
Segundo Kerbrat-Orecchioni (2005: 89), a polidez negativa consiste em
evitar a produção de um FTA ou suavizar sua realização por algum
procedimento. Já a polidez positiva consiste em realizar algum FFA. Ambos,
FFAs ou FTAs, possuem gradações, o que implica, serem esse atos, por
vezes, mais ou menos fortes, e a principal consequência disso é a reação do
interlocutor.
35
As questões levantadas na teoria de Brown & Levinson são de total
relevância quando se considera o ensino de uma língua estrangeira. Os pontos
abordados pelos autores são facilmente verificáveis e comprováveis em
qualquer tipo de interação social comunicativa, de forma que o aprendiz de LE
precisa dominar não o aspecto formal do idioma, mas também, e sobretudo,
suas regras sociais, principalmente quando em interação com falantes nativos
da língua alvo e nesse ponto a Teoria da Polidez possui total relevância.
1.1.4 Pedido vs Ordem: a visão de Searle
A diferenciação entre os atos de fala pedido e ordem é uma questão
controversa entre algumas correntes teóricas, como a Pragmática e a
Fonologia. Do ponto de vista estrutural, atos de fala distintos, uma vez que
cada um tem sua estrutura linguística particular. sob a ótica da Pragmática,
a ordem seria uma gradação do ato de fala pedido. O que diferenciaria um ato
do outro teria relação com o seu contexto de produção, assim como o nível
hierárquico dos participantes da comunicação. Para a fonologia, também
dois atos de fala distintos, uma vez que cada um possui seu próprio
comportamento entonacional.
Em sua obra “Actos de Fala”, publicada em 1981, Searle defende que os
atos de fala obedecem a determinados tipos de regras para serem executados
com sucesso, como mencionado em 1.1.2. O pedido segue as seguintes
regras: (i) de conteúdo proposicional - ser um ato que ocorrerá no futuro em
relação ao momento da sua enunciação; (ii) preparatória a) O está em
condições de realizar A. F acredita que O esteja em condições de realizar A. b)
36
Não é óbvio nem para F nem para O que O realizará A no decurso normal dos
acontecimentos, por deliberação própria; (iii) de sinceridade F quer que O
faça A; (iv) essencial - vale como uma tentativa de conseguir que O faça A.
Searle define o ato de ordenar juntamente com sua explanação sobre o
ato de pedir, não os separando. Esse autor, para definir ordem, faz um
comentário na seção que versa sobre o ato de pedir. Segundo ele,
ordenar e comandar têm a regra preparatória adicional que consiste
em F tem que estar numa posição de autoridade sobre O. Comandar
provavelmente, não tem a condição <<pragmática>> que exige não-
objetividade. Além disso, em ambos, a relação de autoridade
prejudica a condição essencial, porque a enunciação se vale com
uma tentativa de fazer com que O realiza A em virtude da autoridade
de F sobre O (1981: 88).
1.1.5 Pedido vs Ordem: a visão de Oliveira (1992)
Em sua tese de doutorado, Oliveira (1992) faz um estudo da realização
de pedidos em cartas institucionais. A autora apresenta o conceito de pedidos
nas teorias que embasam sua pesquisa, a saber: Teoria dos Atos de Fala,
Análise da Conversação e Teoria da Polidez.
Para a teoria clássica dos Atos de Fala, o pedido é um micro ato de
intenção comunicativa que prediz uma ação futura do ouvinte. Sua descrição
linguística é a seguinte: pronome de primeira pessoa (singular e plural) + verbo
performativo explícito no presente do indicativo na voz passiva + pronome de
segunda pessoa + sentença que expressa o conteúdo proposicional da
elocução.
Oliveira utiliza a proposta de Searle (1981) sobre as regras que
estabelecem a realização de um pedido, mencionadas anteriormente. Ela
também considera a existência de pedidos indiretos, produzidos pela afirmação
37
ou questionamento e condições contextuais de realização do ato. São elas: (i)
condição preparatória Será que você pode fazer X?; e (ii) condição de
sinceridade Eu gostaria que você fizesse X?. Contudo, Oliveira pondera que
pedidos indiretos gerados a partir de uma referência parcial ao objeto
pedido ou de pistas contextuais, foram considerados marginais pela
teoria clássica dos atos de fala, porque são mais difíceis de serem
explicados por interferências dependentes do contexto (sem página)
5
.
A autora cita os estudos de Van Dijk (1976), que estabelece uma análise
do nível macro do ato de fala pedido e mostra-o como um ato realizado através
de outros atos. Nesse caso, cada ato tem uma função específica na realização
do ato principal, e “a intenção comunicativa do falante é vista, portanto, através
de uma hierarquia mental de objetivos para realizar o objetivo maior do texto”
(sem página). Segundo uma análise clássica, os atos de fala não são vistos
sob o ponto de vista interacional, mas sim sob a ótica da intenção do falante.
Para a Análise da Conversação (doravante AC), o pedido é visto como
uma ação que é preferencialmente evitada por sua possibilidade de obter uma
resposta não preferida, a recusa. O interesse da AC é investigar como pedidos
bem sucedidos são formulados e como agir para proteger-se na interação de
possíveis ameaças.
Uma forma de driblar a ameaça da recusa é produzir um pré-pedido, que
em alguns casos pode funcionar como o próprio pedido. Oliveira apresenta
alguns tipos de pré-pedidos apresentados por Levinson (1983 apud Oliveira
1992):
I. o que checa as precondições para a realização do ato: o falante
provê informação suficiente para que o ouvinte faça inferência sobre
5
O exemplar de Oliveira consultado não possuía numeração nas páginas, por isso, nessa citação, assim
como nas demais referentes à mesma obra, usa-se o termo “sem página”.
38
provável ocorrência de um pedido e, antes que ele se realize, mostre
que não tem condições de atendê-lo, para que o falante, depois de
checar as razões para a recusa, possa evitar o ato;
II. o que fornece ao ouvinte toda a informação necessária para que ele
atenda ao pedido: o falante faz um convite ao interlocutor para
produzir um oferecimento que é a resposta pretendida para o pedido
que nem se chegou a realizar;
III. o que mostra pessimismo intencional: o falante assume para o
ouvinte que não condições para que o ato se realize. Assim, fica
esperando que o ouvinte mostre que ele está enganado.
Ao abordar a questão do pedido analisado pela Teoria da Polidez,
Oliveira apresenta o ponto de vista de alguns estudiosos da área: Lakoff, Leech
e Brown & Levinson.
Lakoff (apud Oliveira, 1992) relaciona polidez a uma das funções da
linguagem, a de reforçar relações, e chama a atenção para o fato de que
“raramente produzimos atos de fala para expressar apenas informação factual.
Frequentemente, o falante procura estabelecer uma relação formal ou não
com o ouvinte e obter um efeito favorável frente àquela informação” (Oliveira,
1992: sem página). Exceto em situações em que o conteúdo é impolido, o
locutor pode recorrer a expressões consideradas polidas para controlar o efeito
que a frase terá sobre o ouvinte. Para a escolha da melhor estratégia de
polidez, o locutor deve observar qual regra de polidez está sendo infringida, e
observá-las de acordo com o seu interesse comunicativo. Tais regras são: (i)
não imponha; (ii) dê opções; e (iii) faça o outro se sentir bem seja amigável.
Ainda segundo Lakoff (apud Oliveira, 1992),
39
o pedido pode, em determinadas situações, ser um ato de imposição,
uma demonstração de quebra de camaradagem. Caberia, então, ao
falante enfraquecer a força ilocucionária, de modo convencional ou
não, através de estratégias como inclusão de expressões de polidez
(por favor), ou expressões evasivas (hedges) ou da indiretividade
(como a apresentação de motivos, por exemplo), pois, como mostra
Tannen (1984, 1986), essas construções podem frequentemente
competir entre si (Oliveira, 1992, sem página).
Segundo Leech (apud Oliveira, 1992), a polidez está relacionada à
função interpessoal da linguagem. Para ele, o pedido estaria relacionado à
observância da Máxima de Tato, que objetiva evitar a ameaça ao equilíbrio da
relação falante-ouvinte. As características semânticas do verbo pedir são:
I. X (o evento descrito no conteúdo proposicional) segue o ato de fala;
II. o ouvinte está envolvido em X;
III. X é condicional (o evento ocorrerá se o ouvinte indicar acordo ou
aceitação);
IV. X é desejado pelo ouvinte e talvez seja desejado pelo falante; e
V. a atitude implicada é um desejo de que o ouvinte faça X.
Para Leech (apud Oliveira, 1992), o pedido faz parte dos atos de fala
que competem com a meta social, e isso por conta de seu conteúdo
proposicional ser uma ação futura. O autor ainda distingue “ações futuras que
envolvem esforço, problema, custo para o ouvinte daquelas que representam
benefício” (Oliveira, 1992: sem página). No caso das primeiras, o pedido tem a
força de imposição e a elas se aplica a versão negativa da Máxima do Tato:
minimize o custo para o ouvinte. no caso das segundas, o pedido pode ter
outra força, como a de um convite ou oferecimento, e a eles se aplica a face
positiva da referida Máxima: maximize o benefício para o ouvinte. Sendo
assim, a escala proposta por Leech (apud Oliveira, 1992) baseia-se na relação
custo-benefício do ato de fala. Contudo, essa não é a única variável na
40
determinação do grau de tato apropriado proposta por ele. O poder do ouvinte,
a distância social entre os participantes da interação, a quantidade de opções
dada pelo falante e a indiretividade também são consideradas como critérios
para delimitar o grau de polidez a ser utilizado na interação. Quanto maior for a
distância social e o poder do ouvinte, maior será o grau de polidez exigido, e
em casos de pedido com força de imposição, o imperativo e outra estratégia
que implique não opção para o ouvinte devem ser evitados.
Nas teorias de Brown e Levinson também a relação da polidez com a
função social da linguagem referente à noção de ameaça e preservação de
face, introduzidas por Goffman (1967). Nesse viés, o pedido está incluído entre
os atos que primariamente ameaçam a face negativa do ouvinte. Tais autores
distinguem o pedido da ordem e afirmam, que no caso do primeiro, há também
ameaça à face do falante, o que não ocorre no caso do segundo. Ao se realizar
uma ordem ou pedido, o falante pressiona o ouvinte a fazer, ou deixar de fazer
algo, interferindo, assim, em sua liberdade.
Segundo Oliveira (1992), Brown e Levinson, utilizam como variáveis de
grau de polidez e risco a serem realizados nos pedidos e ordens os mesmos
propostos por Leech (1983) (poder e distância social), além do teor de risco
daquele ato de fala em dada cultura. Em relação ao grau de risco, vale
mencionar que ele é determinado pelas razões que movem o agente da ação
pedida a não poder, não dever ou não querer realizar tal ação.
41
1.1.6 Pedido vs Ordem: a visão de Kerbrat-Orecchioni
Baseada em Benveniste, Kerbrat-Orecchioni (2005) afirma, que sob
aspectos formais, pergunta e ordem são atos de fala distintos.
Reconhece-se amplamente que proposições assertivas,
proposições interrogativas, proposições imperativas, diferenciadas
por traços específicos de sintaxe e de gramática [...]. Ora, essas três
modalidades são apenas o reflexo dos três comportamentos
fundamentais do homem que fala e age através do discurso sobre
seu interlocutor: ele quer lhe transmitir um elemento de
conhecimento, ou obter dele uma informação, ou dar-lhe uma ordem
(Benveniste, 1966:130 apud Kerbrat-Orecchioni, 2005:99).
Ela chama de pergunta os pedidos que podem ser realizados por meio
de frases interrogativas, como, por exemplo, Que horas são? que é o mesmo
que dizer: Diga-me que horas são. na ordem, não uma forma
interrogativa correspondente, como, por exemplo, Feche a porta!
Para Searle, apud Kerbrat-Orecchioni (2005), ordem e pergunta são dois
membros do mesmo grupo de atos de fala: os atos diretivos (em que se tenta
levar o outro a fazer algo). Nessa perspectiva, a pergunta seria um caso mais
particular de ordem. A analogia entre ordem e pergunta se baseia na relação
entre „fazer‟ e „dizer‟, uma vez que a pergunta seria a solicitação de um dizer,
enquanto a ordem, uma solicitação de um fazer. Contudo, “toda a pragmática
se assenta sobre o postulado de que dizer é fazer: nesse sentido, toda
pergunta é uma forma de ordem” (Kerbrat-Orecchioni, 2005:99).
Ao levar em conta os pontos de vista de Benveniste e Searle (1981), a
autora define que: (a) os pedidos são uma categoria maior de atos de fala, que
engloba o pedido de um dizer (pergunta) e o pedido de um fazer (solicitação); e
(b) a ordem é um tipo particular de solicitação.
42
A autora propõe o seguinte esquema:
Figura 1 Esquema de Kerbrat-Orecchioni, 2005:100
Diferenciar a pergunta da solicitação não é tarefa fácil, tendo em vista
que sua fronteira é, por vezes, incerta. Uma amostra de tal dificuldade é o caso
dos pedidos indiretos, que serão abordados a seguir.
a) Pergunta
Kerbrat-Orecchioni (2005) considera como pergunta “todo enunciado
que se apresentar com a finalidade principal de obter do destinatário um aporte
de informação” (2005:101). A autora diferencia a pergunta total da pergunta
parcial, sendo a primeira quando a informação pedida tem relação com “o valor
de verdade do conteúdo proposicional global” (2005:101), e a segunda quando
a informação pedida “diz respeito apenas a um dos constituintes da frase,
espécie de „incógnita‟ cuja natureza o interrogador pede que o interrogado
indique” (2005:101). Um exemplo de pergunta total seria „Pedro acordou?‟, e de
pergunta parcial, „Pedro acorda quando?‟.
43
Para a classificação das perguntas, o estabelecimento de alguns
critérios: (i) a natureza dos marcadores do valor ilocutório; (ii) as razões que
fazem com que se solicite a outrem tal ou tal informação; (iii) a natureza
particular da informação pedida e, correlativamente, a função conversacional
da pergunta; e (iv) o valor da pergunta e seus efeitos sobre a relação
interpessoal. Dentre tais critérios, o mais relevante para o presente estudo é o
primeiro, a natureza dos marcadores do valor ilocutório, que será abordado
posteriormente.
a.1) Os marcadores de pergunta
Em uma pergunta expressa diretamente, o enunciado possui uma
estrutura interrogativa, por conta da existência de alguns marcadores
específicos, que são escolhidos de acordo com a situação comunicativa, bem
como do tipo de interação em que os falantes se encontram. Tais marcadores
podem ser de várias naturezas:
I. lexical: com verbo performativo (Eu lhe pergunto se Ana está aqui);
II. morfossintática: presença de um morfema interrogativo (“será
que” em início de frase e „hein?‟, „não?‟, „não é?‟ para perguntas
totais; e elementos tais como „quem que)‟, „o que‟, „qual (dos/das)‟,
„quando‟ – para perguntas categoriais;
III. sintática: inversão do pronome pessoal reto (Estaria ele com fome?);
e
IV. prosódico, no caso da fala: esquema melódico geralmente
ascendente, ou, no caso da escrita, o ponto de interrogação.
44
Em oposição à pergunta expressa diretamente, tem-se o valor de
pergunta expresso indiretamente, acrescentando-se a um outro ato de
linguagem, como, por exemplo, „Eu gostaria de saber se o almoço está pronto‟,
que se opõe à pergunta direta „O almoço está pronto?‟. Nesses exemplos,
tem-se enunciados em que fica claro o âmbito da formulação indireta
convencional. Segundo Kerbrat-Orecchioni (2005), ainda a indiretividade da
interrogativa presente em situações em que o falante emite dúvida ou
incerteza, pois tais enunciados podem funcionar como perguntas implícitas ou
pedidos de confirmação, e isso se dá por conta da seguinte regra de derivação
ilocutória: “toda asserção acompanhada de um modalizador de dúvida ou
incerteza sobre uma situação supostamente conhecida do destinatário pode
funcionar como uma pergunta indireta sobre essa situação” (2005: 104).
Para uma asserção ter valor de pergunta, o contexto em que ela é
proferida é de suma importância, pois, em algumas situações, o contexto por si
faz pressupor que está embutida a pergunta, sem que haja marcas
explícitas para configurá-la como tal. A autora exemplifica essa situação com a
frase „Você está com fome‟, que pode ser entendida como uma pergunta
mesmo que não haja uma entonação ascendente marcando a interrogação.
Isso acontece porque as frases que relatam experiências íntimas em geral são
tidas como asserção quando proferida em primeira pessoa, e não em segunda
(pessoa com quem se fala) como no exemplo. O tipo de atividade na qual se
insere a pergunta é outro dado contextual importante para a compreensão de
uma pergunta como asserção ou vice-versa.
Pode-se afirmar que há, dentre os indicadores de pergunta, uma
gradação, pois alguns são claros e inquestionáveis, como menciona Kerbrat-
45
Orecchioni (2005), enquanto outros são mais imprecisos. Nessa escala, a
entonação e o grau de informação que os interlocutores compartilham estão
em grau menor que os fatores gramaticais, tendo em vista que os dois
primeiros são mais variáveis que o último.
b) Solicitação
Kerbrat-Orecchioni (2005) inicia sua seção sobre a solicitação
relembrando que essa ocorre “a cada vez que um locutor produzir um
enunciado para pedir a seu interlocutor o cumprimento de um ato qualquer (de
caráter não linguageiro)” e que a ordem “é um caso particular de solicitação,
que se caracteriza por seu teor „autoritário‟” (2005:113). Estes conceitos são
basilares para o presente estudo, que versa sobre as diferenças na produção
de ordens e pedidos por aprendizes de português como língua estrangeira.
Outro ponto relevante é a consideração que a autora faz a respeito da
grande variação de que os locutores dispõem para realizar uma determinada
solicitação: “formulações indiretas não convencionais, mas também
formulações indiretas convencionais” (2005: 113). A variedade mencionada se
justifica pela força ameaçadora que o ato de linguagem em foco produz no
interlocutor.
A autora levanta alguns pontos frágeis nas definições de ordem
propostas, a saber: “deve-se privilegiar o critério contextual (o emissor da
ordem está, institucionalmente, em posição de autoridade) ou o critério formal
(a ordem é formulada em termos autoritários)?” (2005: 114, grifos da autora).
Ela ainda menciona que os dois critérios não coincidem, pois alguém em nível
46
institucional superior pode preferir suavizar a ordem utilizando critérios formais
que amenizem sua força ilocutória, assim como, em uma situação comunicativa
em que interlocutores possuem níveis hierárquicos similares, o locutor pode
utilizar uma forma imperativa para se dirigir a seu ouvinte. Outro ponto a ser
observado é que, se o foco da análise for o critério formal, quais estruturas
deverão ser a base do ato de ordem: a forma usada com o verbo performativo
(Eu ordeno que você abra a porta) ou a forma que tem o uso do verbo no
imperativo (Abra a porta)?.
b.1) As formulações indiretas da solicitação
As classificações propostas para as formulações indiretas de solicitação
se baseiam em critérios como:
I. o tipo de ato de linguagem “invadido” pela solicitação e desviado em
seu proveito. Como exemplos, tem-se: uma pergunta, uma sugestão,
uma asserção, afirmação de uma obrigação e constatação sobre um
estado de coisas, particular ou geral, realizado ou não;
II. o caráter mais ou menos convencional do ato indireto;
III. o caráter mais ou menos „brutal‟ ou, ao contrário, suavizado da
formulação: alguns tipos de formulações indiretas podem soar de
forma autoritária para o interlocutor, sendo consideradas como
ordens. É o caso: (i) das asserções iniciadas por „Eu quero‟ “quero
que você estuda agora” (dado 03_07); (ii) das asserções contendo
um modalizador deôntico (com valor de obrigação) - “Olha filho, você
tem que comer a verdura pra ficar forte” (dados 03_03); e (iii)
asserções no indicativo, futuro ou presente. Trata-se de ordens
47
disfarçadas de asserções, “de enunciados indiretos, portanto, mas
nem por isso deixam de ser extremamente diretivos” (2005: 117)
“Desliga esse computador” (dados 03_07).
Em relação ao item (iii) acima exposto, Kerbrat-Orecchioni menciona que
o emprego do indicativo como ordem indireta é bastante recorrente no francês,
e embasa sua afirmação nos estudos de Camus sobre a ordem em reuniões na
Câmara de Comércio. Contudo, a autora lembra que o contexto em que o
enunciado ocorre, bem como os acompanhamentos prosódicos e
mimogestuais, influenciam muito no caráter mais ou menos autoritário da
formulação indicativa, que pode ser tão impositiva quanto a forma imperativa.
alguns procedimentos agravadores tais como morfemas de
insistência ou impaciência, que, quando utilizados, podem endurecer a
solicitação, seja ela direta ou indireta. Como exemplo, tem-se a frase “Quero
que você estuda agora” (dados 03_07, grifo nosso). Sobre isso, Kerbrat-
Orecchioni afirma ter a prosódia, ou o „tom‟, “um papel pragmático fundamental
em todas as situações comunicativas” (2005: 118), sobretudo em algumas
específicas, como na prática militar.
b.2) Formulações suavizadas
alguns procedimentos na comunicação que podem suavizar a força
impositiva de verbos no imperativo; é o caso dos procedimentos de mitigação.
Eles podem ser: (i) justificação; (ii) desatualização modal e temporal (uso de
verbos no futuro do presente ou do pretérito); (iii) adulação; (iv) prefácio; (v)
minimização; (vi) estratégia do pessimismo; e (vii) outros marcadores de
opcionalidade apresentam a execução da solicitação como inteiramente
48
sujeita à disponibilidade e à boa vontade do interlocutor (exemplo: Se você
puder...).
A autora observa que a expressão „por favor‟ funciona também como
mitigação, mas possui caráter ambíguo “pois em muitos casos ele confirma
uma solicitação, ao mesmo tempo em que procura suavizá-la” (2005: 119, grifo
da autora). As frases a seguir, encontradas no corpus deste estudo,
comprovam tais características de „por favor‟:
I. „Você precisa fazer as tarefas para que consiga aprovar o curso.
Faça, por favor‟. (dado 07_13)
II. „Por favor, tire sus papéis de minha mesa‟. (dado 07_09)
III. „Nos podemos desmarcar ou trocar o horário de aula, por favor?‟
(dado 05_02)
b.3) Solicitação e relação interpessoal
De acordo com a teoria da polidez de Brown e Levinson (apud Kerbrat-
Orecchioni 2005), é preciso que se suavize um ato ameaçador à face do
interlocutor, e isso pode ocorrer em proporções variáveis. Alguns fatores estão
relacionados a essas proporções:
I. o peso do enunciado ameaçador à face - “quanto mais forte é a
ameaça, mais convém suavizar o enunciado ameaçador” (Kerbrat-
Orecchioni 2005: 120). Também deve ser considerado o “quadro
comunicativo e o „contrato‟ (sistema de direitos e deveres) que esse
quadro instaura entre os interlocutores” (Kerbrat-Orecchioni 2005:
120, grifos da autora);
49
II. a natureza da relação interpessoal, ou seja, os fatores „D‟ e „P‟
distância social e poder, respectivamente. No primeiro, “quanto maior
for a distância entre os interlocutores, mais suavizadores são
convenientes”, e, em relação ao segundo,
em uma relação hierárquica, o princípio de deferência exige que os
atos potencialmente ameaçadores se façam acompanhar de uma
„embalagem ritual‟, a qual é muito mais importante quando eles
emanam do inferior do que quando vêm do superior. (Kerbrat-
Orecchioni,2005: 120)
b.4) As reações à solicitação
Com o que foi apresentado, Kerbrat-Orecchioni (2005) afirma que a
solicitação traz em si uma forte carga relacional e por conta disso deve-se
atentar a como ela é manipulada na interação, e tomar as devidas precauções
para que mal entendidos não ocorram. À solicitação, podem-se ter duas
categorias de reações:
I. reação preferida de aceitação, que é o encadeamento preferencial
para tal ato; e
II. reação negativa de recusa, que é o encadeamento não preferido,
considerado fortemente ameaçador para o solicitante.
A autora apresenta outro tipo de reação que se acrescenta aos dois
anteriores, a réplica. Ela é ameaçadora, assim como a recusa, pois coloca em
xeque uma ou outra condição de êxito da solicitação.
1.1.7 Pedido vs Ordem: a visão de Cunha & Cintra
Não se pode tratar o aspecto formal dos atos de fala pedido e ordem
sem se verificar como os gramáticos que investigam o português como língua
50
materna os abordam. Cunha & Cintra (2001) tratam do assunto ao trabalharem
o modo imperativo, e afirmam que, apesar de o sentido original da palavra em
latim que origem ao termo imperativo, imperare, significar comandar, esse
modo não é utilizado, em geral, para comandar ou dar ordens, pois formas
mais eficazes para expressar tais noções. Esses estudiosos afirmam que
quando empregamos o IMPERATIVO, em geral, temos o intuito de
exortar o nosso interlocutor a cumprir a ação indicada pelo verbo. É,
pois, mais o modo da exortação, do conselho, do convite, do que
propriamente do comando, da ordem (grifos do autor, Cunha & Cintra,
2001: 477).
Cunha & Cintra (2001) reconhecem, ainda, que os diversos valores do
imperativo não estão restritos ao significado do verbo, mas também a dados do
contexto e enfatizam a função da entonação para a noção expressa pelo verbo
“conforme o tom da voz, a noção de comando pode enfraquecer-se e até
chegar à súplica” (2001: 478). Eles ainda mencionam que, apesar de o
enunciado em que se usa o modo verbal em questão ser no tempo presente, o
valor expresso é de futuro, pois a ação ainda vai se realizar.
formas verbais que podem substituir o modo imperativo e expressar
outros matizes que ele apresenta. Podem ser: frases nominais - que reforçam o
tom de comando - alguns tempos no indicativo (presente e futuro do presente),
imperfeito do subjuntivo transformam a ordem em uma sugestão - infinitivo,
gerúndio valor depreciativo, ir + infinitivo e querer (presente ou imperfeito do
indicativo) + infinitivo. Os autores mencionam também que “variados
recursos estilísticos para reforçar ou atenuar a vontade expressa pelo
IMPERATIVO” (2001: 481). Ressaltam que o tom de voz é fundamental para
que a eficácia do ato seja garantida. Dentre os recursos citados, destaca-se o
51
uso de elementos atenuadores (´por favor´) ou de reforço (´imediatamente´)
para a formulação de ordens e pedidos.
1.2 Ensino de língua estrangeira
Durante muito tempo, várias foram as formas de se ensinar língua
estrangeira. A tradução, por exemplo, era o método usado para o ensino das
línguas clássicas, como grego e latim. Essa forma de pensar e ensinar língua
estrangeira era aplicada sem embasamento teórico e sem preocupação
científica o ensino era simplesmente uma prática.
A partir dos primeiros anos do século XX, o ensino de língua estrangeira
recebeu maior atenção por parte da academia. A preocupação passou a ser a
busca por maior fundamentação teórica que desse suporte ao ensino de língua,
buscando-se um método que pudesse orientar a prática docente.
Desde então muitos o os métodos propostos, utilizados e,
consequentemente, criticados. Segundo Maciel (2004:3),
“os primeiros métodos, que aparecem a partir dessas premissas, têm
como base a gramática. Porém não no sentido tradicional clássico,
mas sim como estruturas modelares. Isto leva ao desenvolvimento de
métodos situacionais e audiolinguais.”
O método audiolingual
9
(segundo Maciel 2004) surgiu durante a
Segunda Guerra Mundial por conta da necessidade de os Estados Unidos
formar falantes de língua estrangeira, uma vez que era impossível encontrar
um contingente que já fosse falante de um segundo idioma. Para isso, o
governo norte americano investiu no ensino e na pesquisa dessa área, pois era
9
Esse método inicialmente era um programa de treinamento militar denominado Army Specialized
Training Program (ASTP).
52
preciso formar falantes fluentes em pouco tempo. O sucesso do método
elaborado para o exército foi tamanho que ele se espalhou e passou a ser
implantado em universidades e escolas. Sua técnica foi aperfeiçoada e mais
tarde renomeada de “Abordagem Audiolingual”.
A ênfase dessa abordagem era a oralidade e o aluno deveria ser
exposto à língua escrita depois de devidamente familiarizado com a língua
falada, sob pena de haver um prejuízo na pronúncia. O erro era encarado de
forma negativa e as estruturas gramaticais vistas exaustivamente, com
exercícios de repetição a fim de automatizar o conhecimento adquirido. A
análise contrastiva entre línguas era bem vista pela abordagem audiolingual,
pois, dessa forma, era possível prever erros e dificuldades durante o processo
de ensino da língua estrangeira a ser aprendida.
O método audiolingual foi sendo questionado por estudiosos da época
na área de ensino de língua estrangeira devido aos resultados obtidos com sua
aplicação, e com o tempo passou a ser considerado pouco eficaz, do ponto de
vista do uso, para os alunos.. Por volta da década de setenta, houve mudanças
nas linhas teóricas de estudo da linguagem, e com isso surge a abordagem
comunicativa. Maciel (2004: 7 e 8) afirma que
os pressupostos teóricos que servem à Abordagem Comunicativa têm
origem em várias áreas disciplinares: a filosofia da linguagem com os
atos de fala, a contribuição de Wittgenstein, de Austin e Searle e a
influência da pragmática, da sociolinguística e da Análise do
Discurso. Não se deve mais pensar isoladamente a palavra e a
sentença como pertencente a um sistema abstrato, mas, sim, pensar
a proposição, ou melhor o enunciado pleno de vida e de ação.
Poderíamos citar, também, a contribuição de Bakhtin com o conceito
de dialogia, de gêneros discursivos, como tipos estáveis de
enunciado, linguagem como atividade, linguagem ligada à ação. É
preciso citar os linguistas ingleses Halliday e Widdowson com as
questões do uso da linguagem devidamente contextualizada, (o uso
que engloba a forma).
53
Na abordagem comunicativa, o centro do ensino é o aluno, o professor
passa a ser um motivador para a aprendizagem da língua estrangeira, e o erro,
parte do processo. O aluno passa a ser exposto a situações comunicativas, de
interação real na língua que está aprendendo, e a gramática não é o foco
principal do ensino. Um equívoco no uso dessa abordagem é pensar que a
gramática não deve ser ensinada, ela deve ser apresentada ao aluno de forma
contextualizada, de modo que ele perceba a forma gramatical através do uso.
Segundo essa abordagem, não se aprende apenas outro sistema
linguístico, mas aprende-se a realizar ações sociais e culturais apropriadas
através do discurso. É o que afirma Almeida Filho (2005: 81), que complementa
a noção de discurso presente na abordagem comunicativa:
O discurso é aqui concebido como uma linguagem com fins
específicos e aceitáveis, marcado por diferenças individuais em
situações sócio-culturais reais nas quais o (inter) locutor se depara
com a manutenção das relações sociais, conflitos, necessidades de
informações e negociações sempre sob o prisma de atitudes,
motivações pessoais ou coletivo-culturais.
Na mesma linha de pensamento de Almeida Filho, Trouche (2005), em
seu artigo sobre a abordagem comunicativa, ensina que:
Entendendo-se o processo de ensino de nguas como aquisição, o
aprendiz/aluno, em certa medida, deverá incorporar algumas regras
gramaticais mas em função do uso. A competência comunicativa
implica também conhecimento e habilidade de realização deste
conhecimento. Nem o conhecimento gramatical, nem só o
conhecimento sobre a natureza da comunicação humana são
suficientes, isoladamente, para o uso efetivo de uma segunda língua
em situações de comunicação real. Adquirir uma língua significa,
pois, desempenho satisfatório em situações concretas de convívio
social; significa domínio de regras de uso.
A prática de tal abordagem em sala de aula exige do professor
conhecimentos sobre a língua em uso, além da crença de que uma visão
funcional da língua pode ser mais eficaz do que um ensino voltado para a
forma. Dentro dessa perspectiva, a sala de aula pode ser vista como um
54
ambiente de interação social, onde os alunos possam vivenciar a língua
aprendida, e não apenas um ambiente de estudo.
1.2.1 Ensino de pronúncia: problemas
Voltando-se especificamente para o ensino de português como língua
estrangeira, uma análise realizada por Silveira e Rossi (2006) em materiais
didáticos disponíveis no mercado
10
observou que os aspectos fonéticos e
fonológicos contemplados pelos manuais são insuficientes para um ensino
completo da pronúncia em língua portuguesa. Tem-se, então, um problema
para o ensino de pronúncia: a baixa ocorrência dessa abordagem nos manuais
didáticos.
Vale salientar que o objetivo de um ensino de pronúncia não é fazer o
aprendiz a falar como um falante nativo da língua alvo
11
. Dessa forma, Morley
(apud Silveira & Rossi, 2006: 2 e 3) propõe quatro metas a serem atingidas
com o ensino da pronúncia:
(a) inteligibilidade funcional, ou seja, a pronúncia do aluno tem que
ser boa o suficiente para que os seus interlocutores o compreendam;
(b) comunicabilidade funcional, isto é, a pronúncia do aluno deve
possibilitar uma comunicação bem sucedida em atividades cotidianas;
(c) estímulo da auto-confiança, o que significa fazer com que o aluno
adquira confiança na sua habilidade de se expressar na língua alvo e,
por último, (d) desenvolvimento de habilidades de monitoramento da
fala e estratégias de modificação da fala para serem usadas fora da
sala de aula.
10
Para o estudo em questão, Silveira & Rossi (2006) analisaram os seguintes livros textos - Aprendendo
português do Brasil (LAROCA et al., 1992); Avenida Brasil 1 (LIMA et al., 1991); Avenida Brasil 2 (LIMA et
al., 1995); Bem-Vindo 1a e 2a edições (FLORISSI et al., 1999 e 2004); DiálogoBrasil (LIMA et al., 2003);
Fala Brasil (COUDRY & FONTÃO, 1998); Falar ... Ler ... Escrever (LIMA & IUNES, 2000); Interagindo em
português: textos e visões do Brasil (HENRIQUES & GRANNIER, 2001); Passagens: português do Brasil
para estrangeiros (CELLI, 2002); Sempre amigos: fala Brasil para jovens (COUDRY & PATROCÍNIO,
2000); Tudo Bem: português para uma nova geração (FLORISSE et al., 2002); Um português bem
brasileiro (FUNCEB, s.a.) e Via Brasil (LIMA & IUNES,1990).
11
Língua alvo é a língua estrangeira que se está aprendendo, a que se deseja adquirir.
55
No âmbito do ensino de língua estrangeira de forma geral, a produção
oral, mais especificamente a pronúncia, vem sendo pouco tratada pelos
métodos, da mesma forma que acontece no ensino de PLE - como indicado por
Silveira e Rossi (2006) - e por vezes pouco praticada pelos professores.
Quando chega a ser abordada, em geral, o que se observa é um tratamento
superficial, baseado em exercícios de repetição de frases, palavras e de pares
mínimos
12
.
Segundo Hinks (2003), não se pode perder de vista o risco da
fossilização
13
da pronúncia do aprendiz. Para tanto, é necessário um professor
preparado para o ensino dessa habilidade da língua. Ainda segundo a autora,
outro agravante para o ensino da pronúncia é que, ao se pensar o ensino de
inglês ao redor do mundo, muitos professores não tiveram a oportunidade de
ter essa habilidade desenvolvida de forma a ser comparada à de um falante
nativo. Aliás, o ensino da pronúncia parece que vem sendo negligenciado
dentro do ensino de línguas.
Outro dado importante a ser considerado no ensino da pronúncia, é o
fator emocional. Para uma aprendizagem mais eficaz da habilidade oral, deve-
se avaliar até que ponto o aluno deseja perder o seu sotaque de estrangeiro,
uma vez que esse pode ser encarado como uma marca de identidade; sendo
assim, a motivação também deve ser considerada. Fraser (1999) aponta que o
tempo disponibilizado pelo aluno para a prática da pronúncia também é
relevante para sua aprendizagem. Desse modo, a a melhora na qualidade da
produção oral em língua estrangeira viria com a prática. Ainda segundo Fraser,
12
Par mínimo: duplas de palavras que, permutando um fonema, diferem no significado.
13
A fossilização pode ser entendida como fase do processo de ensino-aprendizagem de LE em que o
aprendiz não evolui mais na aquisição do idioma alvo, e o que, geralmente, se observa é
a formação de uma língua intermediária entre a que está sendo aprendida e a materna, conhecida como
interlíngua (como exemplo disso, tem-se o portunhol).
56
fatores como o componente cognitivo, a diferença entre a percepção fonêmica
e a realidade da produção acústica, bem como a ausência de um sistema de
escrita alfabética em algumas línguas, também dificultam o ensino da
pronúncia. Pode-se, ainda, considerar que limitações físicas dos órgãos
acústico-articulatórios dos falantes de algumas línguas que dificultam a
realização de certos sons da língua estrangeira que está sendo aprendida,
como é o caso das línguas que possuem sons realizados por meio de cliques,
articulação que não é comum aos falantes do português, por exemplo.
Hinks (2003) observou que, no caso do ensino de inglês como ngua
estrangeira, um dilema na questão do tipo de variedade a ser ensinado. Ao
se focar no ensino de PLE realizado no Brasil, o mesmo conflito se apresenta:
que tipo de pronúncia se privilegia no ensino a carioca, a paulista, a do
nordeste do Brasil ou a do sul? Voltando ao ensino do inglês, ainda o
problema, já mencionado, de os professores nem sempre terem uma pronúncia
considerada próxima da realizada por um falante nativo, o que aponta para a
qualidade da formação do profissional.
Alguns estudos, como o de Hinks 2003, avaliam o uso de aparatos
tecnológicos no ensino da pronúncia de língua estrangeira, mais
especificamente, de programas computacionais
14
que auxiliariam no ensino. Há
pontos positivos a serem salientados nessa prática, e alguns resultados
favoráveis foram detectados; porém, esse tipo de investigação mostra que
mais eficácia na utilização de programas quando o aprendiz é auxiliado por um
instrutor que o ajuda a, entre outras coisas, interpretar os resultados
apresentados pelo programa (resultados por meio de gráficos e curvas de
14
Programas como Talk to Me, desenvolvido pela Auralog e PhonePass SET-10 test da Ordinate Corp,
utilizados no ensino de ingles como segunda língua.
57
entonação). Além disso, os resultados positivos estão relacionados ao tempo
dedicado pelos alunos à prática das atividades com os programas
computacionais.
dois problemas que advêm dessas atividades com ferramentas
computacionais: o primeiro é o custo do curso, que acabaria sendo elevado,
por conta da necessidade de ter profissionais especializados dedicando-se a
auxiliar os alunos nos usos dos programas; o segundo problema recai sobre a
responsabilidade do próprio aluno, que precisaria ter disciplina suficiente e
controle sobre seu processo de aprendizagem, realizando, por conta própria,
algumas atividades para a prática da pronúncia.
Um último problema, mas não menos importante, a ser mencionado é a
negligência do aspecto prosódico no ensino de língua estrangeira. Quando
falam de pronúncia, a grande maioria dos materiais didáticos aborda os
segmentos (oposição de pares mínimos, por exemplo, como mencionado
acima) das palavras e desprezam o caráter prosódico. Isso faz com que o
aprendiz não perceba algumas nuances que os suprassegmentos são capazes
de revelar, como a diferença entre atos de fala que possuem formas
gramaticais diferentes. O aprendiz costuma perceber esse aspecto,
geralmente, autonomamente, com seu contato com o idioma aprendido.
1.2.2 Compreensibilidade e inteligibilidade
Dois aspectos importantes a serem considerados no ensino da
pronúncia são a compreensibilidade e a inteligibilidade. O primeiro diz respeito
à capacidade do aprendiz de língua estrangeira conseguir se fazer entender no
idioma que está adquirindo. Já o segundo faz referência à capacidade de o
58
falante nativo de um idioma, quando em interação com um falante não nativo,
reconhecer sua língua materna sendo falada pelo estrangeiro. Esses dois
aspectos indicam o quanto um falante nativo da língua alvo compreende o que
foi produzido oralmente por um aprendiz do seu idioma.
Em experimentos realizados por Munro e Dewing (2000), os autores
avaliaram quais dados da pronúncia de um falante não nativo, aprendiz de uma
L2
15
, comprometeriam a inteligibilidade e a compreensão do enunciado. O
estudo revelou que os erros de prosódia (elementos suprassegmentais)
comprometem mais a inteligibilidade do que os erros de natureza segmental.
Foi também avaliado se um ensino voltado para a prosódia seria mais eficaz do
que um ensino global, e a análise dos dados revelou que o sotaque pouco
interfere na compreensão.
Percebe-se, então, que há uma relação entre inteligibilidade e percepção
de compreensibilidade, e dessa com a questão do sotaque. Essa observação já
havia sido feita em estudos de Varonis e Gass (apud Munro e Dewing 2000),
anteriores aos de Munro e Dewing, que confirmaram os resultados das
primeiras pesquisas. Porém, as conclusões não são exatamente iguais e
apresentaram distinções também ocasionadas por diferenças na metodologia.
Sobre a inteligibilidade, Setter e Jenkins (2005: 2) afirmam que:
However, when a pronunciation feature impedes the intelligibility of a
word, the likelihood particularly in the case of a non-native listener,
who tends to focus on the acoustic signal rather than use contextual
cues to resolve ambiguity is that communication will fail even before
pragmatic factors enter the equation (cf. Jenkins, 2000: 8083).
Esses autores também apontam que os fatores suprassegmentais são os que
mais causam dificuldade de compreensão na interação entre falantes não-
15
L2 = segunda língua, aprendida em contexto de imersão, no país onde a língua alvo é falada como
língua materna.
59
nativos e nativos, prejudicando a inteligibilidade. Porém, em interação entre
falantes não-nativos de uma L2, os traços suprassegmentais não possuem
tanta influência na qualidade da inteligibilidade.
Os estudos norte-americanos realizados a fim de se verificar a
inteligibilidade na pronúncia de aprendizes de uma L2 ou LE apontam,
sobretudo nas pesquisas de Munro e Dewing, possíveis implicações para o
ensino de segunda língua e pesquisa na área. Nessa perspectiva, vale
ressaltar os seguintes pontos:
embora a força do sotaque esteja relacionada com a questão da
inteligibilidade e da compreensibilidade, um sotaque de estrangeiro
acentuado não necessariamente causa, no falante de L2, problemas
oriundos de tais aspectos (compreensibilidade e inteligibilidade);
se a inteligibilidade e a compreensibilidade são os pontos principais
no ensino de pronúncia para o aprendiz, o professor deve priorizar a
melhoria dos erros que interferem nesses dois aspectos, e não focar
um tipo de ensino que trabalhe a redução do sotaque globalmente;
não evidências empíricas que indiquem quais aspectos
particulares do sotaque interferem mais na inteligibilidade e na
compreensibilidade; sendo assim, os professores não têm um
parâmetro, um padrão, na hora de ensinar a pronúncia; e
necessidade de realizar outros estudos que avaliem aprendizes
com diferentes níveis de proficiência, e também que elucidem os
elementos que contribuem de forma mais específica para a
inteligibilidade (sub-segmental, segmental, prosódica) na pronúncia.
60
1.2.3 O paradoxo no ensino de pronúncia
Pardo (2004) indica que o ensino de pronúncia, além de ser uma
questão relacionada ao papel do professor, tem ligações também com o tempo
que o aprendiz dedica à questão da aprendizagem da oralidade, e essa
afirmação vai ao encontro do que Fraser (1999) afirma (cf. item 1.2.1 acima).
Ao pesquisar a opinião de alguns professores de inglês para estrangeiros, o
autor pôde observar que nem sempre há a preocupação de um ensino de
pronúncia sistematizado, ou mesmo regular. Alguns professores entendem que
a pronúncia dos seus alunos está próxima à de um falante nativo, ou que o
aluno consegue se fazer entender no idioma aprendido, e, por isso, não
investem no aperfeiçoamento de habilidade oral. Outros argumentam que
ensinam a pronúncia de forma espontânea, ou seja, sem sistematização. Há,
na verdade, os professores que trabalham a pronúncia, mas a maioria de forma
ocasional, não frequente.
Ainda segundo Pardo, alguns professores atribuem a dificuldade do
ensino da pronúncia a fatores não somente de ordem cognitiva, mas que
envolvem também aspectos biológicos, sociais e psicológicos, que fogem do
controle do professor. Por outro lado, os alunos têm uma visão bastante
positiva do ensino da pronúncia, o que gera um paradoxo entre o ponto de vista
dos professores e o dos alunos. Enquanto os professores pensam ser
impossível ensinar pronúncia, os alunos aceitam muito bem essas aulas.
61
1.2.4 Ensino de pronúncia em materiais de PLE
O estudo realizado por Silveira e Rossi (2006) mostra que o ensino de
pronúncia em materiais didáticos de PLE é muito pouco abordado. Em geral,
são privilegiadas atividades com pares mínimos em palavras isoladas e a
questão da entonação, muito importante para o português do Brasil, pouco é
trabalhada.
Segundo as autoras, os principais conteúdos abordados nos materiais
são:
(a) contrastes consonantais (/s/~/z/; /S/~/Z/; /b/~/v/; (b) alguns casos
particulares de consoantes (/η/ e/ λ/); (c) as vogais orais, nasais e
ditongos; (d) o contraste aberto/fechado para as vogais; (e) o
processo de alçamento das vogais /e/ e /o/ em posição átona; (f) o
conceito de sílaba tônica; (g) os processos fonológicos que se
aplicam às grafias “l”, “m” e “n” em posição final de sílaba ou de
palavra; e (h) certos casos que geram dificuldades até mesmo para
falantes nativos devido às irregularidades do sistema ortográfico do
PB (e.g.: as grafias “g”, “q” e “x”). (2006:15)
Outro ponto considerado, no estudo, é a forma como é feita a
abordagem do ensino da pronúncia: em geral, ensina-se partindo da grafia para
a produção oral. Dessa forma, a atividade funciona mais como um reforço da
ortografia do que, de fato, a prática da oralidade. Os livros, normalmente,
solicitam que os alunos escrevam o som que está em foco na aula (ou na
lição), ou que reconheçam os sons em listas de palavras fornecidas pelo
material. Desse modo, os alunos tendem a adquirir um maior domínio da
escrita do que da fala. Outro problema que se pode levantar nas aulas de PLE
é o de não se abordar o ensino de fala encadeada
16
, que, no caso do
português do Brasil, é um aspecto bastante importante no ensino de prosódia.
16
Fala encadeada: fala em seu fluxo normal, sem pausas. Geralmente, na fala encadeada, há a junção
de palavras e / ou sílabas, assim como a supressão de algum som, como é o caso de E em fim de palavra
(que em geral apresenta som de I).
62
Silveira e Rossi (2006) observaram, também, que nem todos os livros
analisados tratavam do ensino da pronúncia, e dentre os que abordavam o
tema, o mais interessante, para elas, seria um manual produzido na Argentina,
voltado ao ensino de português para o público local. Dessa forma, tem-se um
ensino voltado às diferenças entre os elementos fonéticos e fonológicos do
português brasileiro e o espanhol argentino, o que dificulta a implantação desse
material didático para falantes de outras línguas, ou mesmo falantes de outras
variantes do espanhol.
As atividades de escuta constituem outra questão em relação ao tema.
Nelas, em geral, os alunos são levados a trabalhar a compreensão auditiva. Na
maioria das vezes são gravações que reproduzem situações artificiais de fala,
com diálogos travados lentamente, muito distantes do que, de fato, acontece
no cotidiano. Isso faz com que o aprendiz não vivencie a linguagem oral como
ela é na realidade do dia a dia. Se o aluno não tem uma percepção adequada
da língua alvo, provavelmente sua produção oral também será prejudicada.
As variações dialetais também não são abordadas pelos materiais
didáticos de forma a contemplar a totalidade da diversidade linguística do
Brasil. E isso leva a outra questão a ser pensada no ensino da pronúncia em
PLE: que variedade ensinar para os aprendizes?
1.2.6 Ensino de ordem e pedido em materiais de PLE
No nível formal, alguns gramáticos apontam determinados tempos e
modos verbais como estruturas que podem caracterizar um enunciado como
ordem ou como pedido. Ao investigar gramáticas que focam o ensino de
63
português como língua estrangeira, algumas divergências nas definições
das formas gramaticais que caracterizariam os atos de linguagem pedido e
ordem.
Para Hutchinson & Lloyd (1999: 64 e 130), os pedidos podem ser feitos
com verbos no presente do subjuntivo ou no imperativo, desde que
acompanhados morfemas como „por favor‟ (Eu quero que você feche a janela,
por favor. / Feche a janela, por favor). As autoras ainda consideram o futuro do
pretérito (por elas chamado de condicional) como uma forma de realizar
pedidos polidos (polite request), e a essa estrutura não seria obrigatório o
acréscimo de „por favor‟ (Você poderia fechar a janela? / Você fecharia a
janela? / Gostaria que me desse sua opinião sobre esse assunto.).
Perini (2002: 228 e 239) também considera que pedidos podem ser
formulados utilizando-se os tempos e modos verbais expostos por Hutchinson
& Lloyd (1999). Entretanto, o autor não faz menção ao uso do presente do
subjuntivo nem à expressão „por favor‟ para a formulação de pedidos, mas
seleciona exemplos em que o uso desse morfema ocorre (“Por favor, me passa
o sal”). O autor indica o uso do imperativo para a realização de ordens (“Sai daí
imediatamente”), e o mesmo ponto de vista tem sido utilizado pelos autores de
materiais didáticos, que, geralmente, abordam o ato de linguagem ordem ao
ensinarem o modo verbal imperativo.
Contudo, ao se verificar a ocorrência dos atos de linguagem em questão
nos livros didáticos de ensino de português língua estrangeira, percebe-se que
um descompasso entre o que os livros trazem e o que as gramáticas de
português como língua estrangeira apresentam.
64
Em um levantamento das formas de pedidos encontradas em sete livros
didáticos para ensino de PLE - a saber: Tudo bem” (1984), “Muito Prazer”
(1988), “Aprendendo o Português do Brasil” (1992), “Falar...Ler...Escrever”
(1999), Bem-vindo! (1999), “Fala Brasil” (2002) e “Diálogo Brasil” (2003) -
notou-se que são apresentadas mais formas gramaticais do que propõem tanto
Hutchinson & Lloyd (1999), quanto Perini.
Pode-se propor o seguinte quadro teórico, das formas do ato de fala
pedido encontradas nos materiais didáticos:
Quadro 1.2 Quadro teórico das formas do ato de fala pedido em materiais didáticos de PLE.
Em termos quantitativos, propõe-se o seguinte gráfico de ocorrência das
estruturas gramaticais (encontrados nos livros didáticos de PLE):
Poder no presente + infinitivo - Você (o senhor) pode repetir? (Diálogo Brasil, p.3)
Imperativo - Traga duas caipirinhas. (Tudo Bem, v. 1, p. 10)
Pretérito imperfeito - Queria que o senhor visse a pia da cozinha que está
entupida. (Aprendendo o Português do Brasil, p. 156)
Futuro do pretérito - Gostaria de ver um aparelho de som. (Falar...Ler... Escrever,
p. 81)
Por favor + expressões nominais - Uma informação, por favor. (Diálogo Brasil, p.
15)
Por favor + imperativo - Por favor, diga ao chefe que estamos levando conosco
muito material interessante. (Bem Vindo!, p. 27)
Por favor + pretérito imperfeito - Por favor, eu queria ver aquela camiseta na
vitrina. (Muito Prazer, v 1, p. 44)
Por favor + futuro do pretérito - Gostaria de falar com o gerente, por favor. (Bem
Vindo!, p. 91)
Estrutura de pedidos
65
Gráfico 1.1 Quantitativo das estruturas gramaticais de pedidos em manuais didáticos de PLE.
No gráfico acima, nota-se, também, que uma tendência em se utilizar
a partícula “por favor” como marca de pedidos, independente da forma verbal.
Tais observações vão ao encontro do que é proposto por Hutchinson & Lloyd
(1999) e Perini (2002), com uma ressalva: não foi observada a ocorrência do
presente do subjuntivo sendo usado nas construções do pedido, como
propõem Hutchinson & Lloyd (1999: 64 e 130). Como estruturas menos
freqüentes, tem-se o uso do modo imperativo e „poder‟ + infinitivo.
1.3 A prosódia
Um ponto fundamental para esta pesquisa é o papel da prosódia, ou
mais especificamente da entonação, na diferenciação entre ordem e pedido.
Francis Nolan (2006), em seu artigo intitulado Intonation”, relaciona a
entonação ao significado da fala, independentemente das palavras que a
compõem e da sua representação sonora, ou seja, da composição segmental
Pedidos em Números (ocorrência em materiais didáticos de
PLE)
53%
18%
14%
3%
3%
9%
Por favor
Pretérito Imperfeito
Futuro do Pretérito
Modo Imperativo
Poder (presente)+ infinitivo
Outras Estruturas
66
das palavras. Dessa forma, a entonação faz parte do sentido global do
enunciado e possui tanta relevância quanto sua formação estrutural. Ela é
modulada pelo pitch, modulações da F0 ou frequência fundamental, que vão
além da sentença e se estendem por toda a enunciação. A variação de altura
tonal (pitch), porém, não pode ser sempre considerada isoladamente, uma vez
que a análise prosódica dos enunciados pode incluir outros elementos, como
ritmo e velocidade de fala (timing), acento frasal relacionado à amplitude
(loudness) e qualidade de voz (sound voice).
Nolan (2006: 1), em seu estudo, diferencia entonação de prosódia. Para
ele, a entonação está relacionada aos efeitos da inflexão tonal na fala,
enquanto que a prosódia atribui um caráter mais generalizante, que agrega
características como patterns of pitch, timing, loudness and (sometimes) voice
quality”.
18
O autor ainda defende que a entonação carrega uma variedade de
tipos de informação, possui uma função dentro do discurso, pode refletir a
estrutura da informação de uma sentença e destacar constituintes importantes
dentro do enunciado. A entonação também pode transmitir atitudes do falante,
como amizade, entusiasmo ou, até mesmo, hostilidade. Assim, o ouvinte pode
usar o seu modelo de fala para inferir o estado emocional do falante como
excitação, depressão e tristeza -, além de poder regular a alternância de turnos
em uma conversa em situação de interação comunicativa.
Madureira (1999: 55) afirma que a entonação “compreende padrões de
pitch que têm forma, função e domínios específicos”. Para pitch, a autora
propõe como tradução o termo „inflexão tonal‟, que será utilizado, a partir de
agora, neste trabalho. Ela afirma, também, que as alterações na fala chamadas
18
Tradução: padrões tonais, rítmicos, acentuais e (às vezes) padrões de qualidade vocal.
67
de entonação correspondem: a modulações de frequência fundamental,
medida em hertz; à intensidade, medida em decibéis; e à duração, medida em
milissegundos. Sobre a frequência fundamental (F0), Madureira (1999: 55)
afirma que:
o parâmetro acústico mais importante da entoação é a frequência
fundamental, termo que designa o número de repetições de ciclos de
uma onda periódica. O correlato fisiológico da frequência fundamental
é o número de vibrações (o abrir e fechar) das cordas vocais e o
correlato perceptual é o pitch (inflexão tonal).
O papel da entonação dentro da comunicação é um dos pontos chave
do presente estudo, pois o que está em cheque é a entonação como um dos
recursos para a identificação dos atos de fala como ordem ou como pedido. As
escolhas feitas pelos falantes em termos de gradientes entonacionais são
determinantes para atribuir ao enunciado características do ato de fala a ser
realizado. A entonação também é responsável pela atribuição do grau de
polidez utilizado na sentença, que é fundamental para o sucesso comunicativo
da construção formal expressa pelo falante. Outra função comunicativa
atribuída à entonação é revelar, em uma sentença, quais são as informações
novas que ela traz, e aquelas que foram mencionadas no contexto onde ela
é expressa.
Os estudos acerca da entonação estão localizados dentro da área
científica da fonologia. Entonação e fonologia utilizam-se de unidades
linguísticas contrastivas, que formam a base contínua da variável melódica da
fala. As unidades formadoras de tal base não são providas de significado
quando consideradas isoladamente; contudo, passam a -lo quando inseridas
em um contexto, combinados com outros elementos.
68
Centrando-se na fonologia, Pierrehumbert (1980) propõe uma
representação da inflexão tonal em dois tons, L (low) e H (high), que dependem
do contexto em que se realizam para se definirem. Os enunciados consistem
em uma ou mais frases entonacionais
19
. A melodia de tais frases é decomposta
dentro da sequência de elementos, cada uma com dois tons. Esses tons
podem ser associados a uma sílaba acentuada, e atuar como sinalizadores de
acento frasal (pitch accent); podem, ainda, assinalar o começo e final da frase
e, neste caso, funcionar como tons de fronteira.
Quando uma curva melódica (F0) se inicia baixa e segue em um
movimento ascendente, tem-se a representação bitonal L+H, e se essa segue
em sentido descendente, tem-se H+L. Quando uma das proeminências
acentuais é distintiva, ou corresponde à sílaba tônica da palavra, a que carrega
o acento frasal, leva consigo a marca diacrítica (*).
Para a representação das curvas entonacionais que compõem o corpus
em estudo, optou-se por utilizar a teoria autossegmental trica (AM). Essa
teoria descreve os tons como altos (H) e baixos (L), conforme apresentado no
trabalho de Pierrehumbert acima citado. De acordo com Nolan (s.d. : 7), the
Hs and Ls constitute pitch targets, and pitch movements arise from interpolating
between („joing up‟) these targets”.
20
19
Frase entonacional = Sintagma entonacional: é constituído por um ou mais sintagmas sintáticos e tem
um contorno identificável. É um dos constituintes prosódicos que se relacionam hierarquicamente entre si
e definem a organização fonológica de uma língua. Os constituintes prosódicos são (do menor para o
maior): sílaba → pé → grupo clítico → palavra prosódica → sintagma fonológico → sintagma entonacional
→ enunciado.
20
Tradução: os tons altos e baixos constituem alvos acentuais e os movimentos tonais surgem da ligação
(associação) entre estes alvos.
69
1.3.1 Teoria Autossegmental e Métrica (AM) e o ToBI
A teoria autossegmental métrica tem como maiores expoentes os
estudos realizados por Pierrehumbert (1980), Beckman & Pirrehumbert (1986)
e Ladd (1996). É uma abordagem de base fonológica, onde a inflexão tonal é
analisada como tons (sequência de elementos fonológicos discretos). uma
distinção entre dois tipos de tons, citados anteriormente: tons de fronteira
(boundary tones) e acentos frasais (phrase accents).
Pierrehumbert “elabora uma notação específica para dar conta da
associação fonológica entre os tons e o texto”, segundo Colamarco (2007: 9).
Nessa notação, como mencionado, duas categorias tonais definem os alvos
da linha referente à frequência fundamental (F0): H (alto) e L (baixo). É
possível haver uma associação desses acentos tonais com outras categorias
de suporte tonal, como com a sílaba acentuada, e essa associação é indicada
por um asterisco (H* e L*). O acento pode ser monotonal (H, L, H* ou L*) ou
bitonal (H*L, HL*, L*H, LH*).
A versão mais atualizada da proposta de Pierrehumbert é o sistema
Tone and Break Indices (ToBi). Segundo Madureira (1999: 64), esse sistema
de transcrição prosódica foi desenvolvido para a língua inglesa, em busca de
um padrão comum que facilitasse o compartilhamento de bancos de dados
prosódicos.
O ToBI tem como objetivos, segundo apresenta Wightman, em seu
artigo ToBI or not ToBI” (2002), servir: (1) à transcrição prosódica, objetivo
esse que foi sendo modificado com o desenvolvimento dos estudos na área, e
ficou restrito à proeminência e às frases entonacionais; (2) como instrumento
notacional de cunho geral (theory friendly), em que se busca uma notação de
70
simples leitura que sirva para unificar o registro dos corpora de estudos que
agregam diferentes teorias prosódicas; (3) à reprodução das transcrições com
auxílio de recursos do tipo interstranscriber; e (4) como notação passível de ser
utilizada para outras línguas e/ou fenômenos.
Durante o processo de desenvolvimento do ToBI, portanto, foi observado
que o sistema permitia (a) transcrever a entonação, e (b) utilizar as transcrições
como ferramentas independentes.
Considerado o desenho inicial dos objetivos do ToBI, a transcrição da
entonação precisa preencher, simultaneamente, dois papéis: (1) capturar o
significado dos eventos entonacionais, como, por exemplo, proeminência e
continuidade; e (2) descrever a forma do contorno melódico, ou curva
entonacional.
1.3.2 Prosódia e ensino de línguas
O que é prosódia? Mateus (2004) inicia seus escritos sobre o tema com
tal pergunta, e, ao realizar um percurso histórico nas gramáticas de língua
portuguesa atrás da resposta, conclui que encontrá-la não é tão simples quanto
localizar a definição de sintaxe, por exemplo. Geralmente, a prosódia es
relacionada ao ritmo da fala, ao tom ou ao acento, relacionando-os ao conceito
de sílaba, e isso provoca um reducionismo do escopo da prosódia. Ao realizar
uma investigação de cunho etimológico, Mateus conclui que esse viés pouco
contribui para o esclarecimento da questão, uma vez que a etimologia atribui à
prosódia a significação de melodia que acompanha o discurso e, na língua
71
grega, mais precisamente, o acento melódico que a caracteriza” (Pereira 1992
apud Mateus 2004).
A autora encontra resposta aos seus questionamentos sobre prosódia
nas teorias linguísticas que apontam como objetos de investigação o tom, a
intensidade e a duração dos sons que se organizam ao longo da cadeia falada.
Assim, os traços prosódicos são:
tom (ou pitch) tem como correlato acústico a frequência da onda
sonora e diz respeito à quantidade de vezes que um ciclo completo de
vibração das partículas sonoras se repete ao longo de um segundo;
quanto maior o número de ciclos, maior a altura do som;
intensidade origina o acento de um som e está relacionada com a
amplitude das ondas sonoras (quanto maior a amplitude, maior a
quantidade de energia e, consequentemente, maior a proeminência
acentual); e
duração tempo de produção de um som. É inversamente proporcional
à velocidade da fala.
Mateus afirma, ainda, que “essas propriedades são inerentes ao som e
estão relacionadas às características acústicas das ondas sonoras” (2004: 6).
Além disso, são elas que constituem as características dos sons de cada
idioma, que definem o ritmo de cada língua, assim como permitem a distinção
entre línguas entoacionais e tonais.
Essas propriedades organizadas dentro de um enunciado é que
conferem a ele a entonação, ou seja, a forma como a estrutura da fala se
organiza mediante variações do contorno melódico das ondas sonoras, da sua
duração e da sua amplitude. Eis o ponto fundamental da presente pesquisa,
72
que investiga os contornos melódicos dos enunciados que expressam ordens e
pedidos.
Voltando-se para a fonologia, Mateus (2004: 6) afirma que as línguas
utilizam as características entonacionais com objetivos diversos, a saber:
(i) para marcar os limites das unidades (o acento pode indicar o fim
ou o início da palavra; a curva de entoação pode igualmente marcar
os limites de unidades prosódicas); (ii) para criar oposições distintivas
(nas línguas tonais como, p.ex. o chinês, o tom de uma sílaba, por
contraste com os tons das que a rodeiam, pode opor significados
entre duas palavras cujos segmentos são iguais tendo, assim, uma
função distintiva; da mesma forma, a duração de uma sílaba pode ter
valor distintivo como p. ex. em latim ou em inglês); (iii) para distinguir
significados globais de globais de construções frásicas (a entoação é
usada frequentemente para diferenciar uma interrogação de uma
afirmação, por exemplo; neste caso pode dizer-se que a entoação
tem valor distintivo).
Dos pontos elencados pela autora, um merece ênfase para este estudo:
a entonação, em línguas entoacionais, com um valor distintivo (vale frisar que o
valor distintivo aqui referido é no nível do enunciado suprassegmento - e não
no do segmento o que caracterizaria uma língua tonal). Em geral, quando se
aborda essa questão, alguns estudiosos como a própria Professora Mira
Mateus, se valem da dicotomia asserção / interrogação para reforçar o caráter
distintivo da entonação. Contudo, estudos como o de Moraes e Colamarco
(2007) indicam que a questão vai além da abordagem gramatical (sintaxe,
semântica, morfologia e fonologia), estendendo-se também à seara da
pragmática, sendo este o principal aspecto que irá opor os atos de fala
pergunta a pedido (no estudo de Moraes e Colamarco), e pedido à ordem (na
pesquisa ora apresentada).
A entonação vista como portadora de significado e, consequentemente,
como traço distintivo entre enunciados, também está presente nos estudos de
Halliday (apud Beaugrande, 1981) no que diz respeito à sua gramática
73
sistêmico-funcional. Esse autor relaciona a tonicidade com o foco informacional
em inglês, assim como com a atitude do falante, que, ao realizar um enunciado
em que sua curva melódica tem um tom ascendente, expressa incerteza,
enquanto o tom descendente expressa certeza. Halliday ainda menciona que o
tom descendente no inglês é mais frequente e caracteriza sentenças
declarativas, o tom ascendente aparece mais em diálogos do que em
narrativas e afirma que a tonalidade deve ser um caráter universal, próprio de
cada língua natural.
Um ponto comum aos estudos de Mateus (2007) e Halliday (apud
Beaugrande, 1981) é que ambos, ainda que cada um à sua forma, entendem
que o contato com o som da língua, com a sua prosódia, precede a sua
aprendizagem formal. Prova disso é que um bebê começa a se comunicar por
tons e não por palavras. Outro fato que vem ao encontro dessa idéia é que,
muitas vezes, um indivíduo rotula um idioma de áspero ou cantado sem
conhecer dele uma palavra sequer, e isso se pelo som da língua a que é
exposto.
Contudo, na contramão do processo natural de aquisição da linguagem,
os métodos de ensino de língua estrangeira não privilegiam o ensino de
prosódia. O que se encontra é a constante repetição do clássico modelo focado
na sintaxe, no léxico e na morfologia.
Considerando o ensino do português como língua estrangeira, percebe-
se uma grande carência de materiais didáticos que privilegiem o ensino das
características prosódicas do idioma. Quando esse tema é abordado, em geral
observa-se que é tratado com grande reducionismo, pois os autores se atêm a
distinguir asserção de interrogação, ou a fazer distinção de pares mínimos, no
74
nível segmental (cf. seção 1.2.4). Um tratamento que relacione as questões
prosódicas com as pragmáticas no ensino de línguas ainda carece de maiores
estudos.
Mateus (2007: 20) enumera as funções, na língua, da entonação
no português:
emocional (para exprimir excitação, aborrecimento, surpresa),
informacional (para indicar uma informação nova, por exemplo),
textual (distinguindo a interrogação da afirmação ou da ordem),
psicológica (organizando a língua em unidades que são mais
facilmente percebidas e memorizadas) e identificadora (visto que
pode ser uma marca de identidade que permite reconhecer a classe
social a que pertence a pessoa ou, por vezes, a sua profissão).
As marcas prosódicas no português do Brasil, assim como em muitas
línguas do mundo, podem também ser uma forma de identificação regional do
falante e funcionar como um rótulo social. Esses aspectos são importantes de
serem mostrados ao aprendiz de PLE, sobretudo os que estão em contexto de
não imersão
21
, pois não carregam somente marcas linguísticas de um idioma,
mas também aspectos culturais de um povo.
21
Contexto de não imersão: local onde se ensina um idioma que não é aprendido como língua materna.
Exemplo: ensino de português em país de língua espanhola.
75
2 Metodologia
Para a realização do estudo ora apresentado, foi constituído um corpus
de língua oral, composto por 84 sentenças, nas quais se objetivava a produção
dos atos de fala ordem e pedido por falantes de outras línguas aprendizes de
português. Neste capítulo, serão apresentados: (i) o modo como o corpus foi
elaborado, (ii) o perfil dos informantes, (iii) as informações sobre o
armazenamento dos dados, (iv) os instrumentos empregados na análise, e (v)
a formulação e a aplicação do teste de percepção.
2.1 Elaboração do corpus
No campo da Pragmática, sobretudo nos estudos dos atos de fala, um
instrumento de pesquisa que vem sendo utilizado desde 1982 é o Discourse
Completion Test (DCT). Esse instrumento foi adaptado por Blum Kulka (1987) e
consiste em apresentar ao entrevistado uma série de situações em que se
deve utilizar o ato de fala pesquisado em língua materna ou estrangeira.
Inicialmente, o teste era realizado utilizando-se a modalidade escrita da língua.
Contudo, os pesquisadores que o empregavam observaram que os resultados
poderiam ser falseados, visto que a pessoa que respondia ao DCT tinha tempo
para reformular sua resposta, e, dessa forma, não havia uma reação natural à
situação. Assim, estudos recentes como o de Almeida (2007) e Nelson et al
(2002
a e 2002b) apontam uma outra proposta de coleta de dados, utilizando a
modalidade oral da língua, sendo o corpus inicialmente gravado e
posteriormente transcrito.
Em sua tese de doutorado, Almeida (2007) menciona a grande
dificuldade que alguns estudiosos encontram em realizar pesquisas com atos
76
de fala, pois eles acreditam que a melhor forma de coleta seria capturar a
produção espontânea de tais atos, uma vez que a presença do pesquisador,
bem como a própria situação de pesquisa em si, interferiria na reação do
informante. Sobre o DCT, a autora menciona também que
essa metodologia para coleta de dados vem sendo empregada com
sucesso pelos pesquisadores do Cross Cultural Speech Act
Realization Project (CCSARP) que, segundo Rose (1992), representa
o que há de mais desenvolvido em termos de pesquisa a respeito de
atos de fala. O DCT tem sido apontado como um instrumento que nos
a possibilidade de obter uma grande quantidade de dados em um
curto espaço de tempo e em contextos em que a observação pode
ser difícil (Lorenzo-Dus 2001; Rose, 1992; Márquez Reiter, 2000).
Além disso, Billmyer e Varghese (2000) consideram-no de fácil
manuseio tanto por parte do pesquisador quanto por parte do
participante. Ademais, as situações fornecem um contexto controlado
para a realização dos atos de fala e sua coleta. (ALMEIDA, 2007: 99)
Nas situações elaboradas para comporem o DCT, faz-se necessário
deixar claras as informações contextuais em que tal enunciado deverá ser
realizado. A composição do cenário e da cena em que ocorrerá a interação é
de fundamental importância para as escolhas linguísticas que serão feitas pelo
falante. Questões como o nível hierárquico entre os participantes da interação,
tipo de relação entre eles, local onde a enunciação ocorre, e, sobretudo, o
propósito comunicativo do enunciado são fundamentais para o posicionamento
do falante na situação, e, consequentemente, para os resultados da pesquisa.
Assim, aqui optou-se por usar o DCT como todo de coleta de dados.
Foram elaboradas quatorze situações que possibilitariam aos informantes
elicitarem atos de ordem e pedido. O quadro completo com as situações
utilizadas vai a seguir.
77
1. Você foi convidado(a) para uma festa no fim de semana e precisa
comprar uma roupa para usar nesse dia. Você decide ir ao shopping
e, chegando à loja de sua preferência, a vendedora dirige-se a você e
pergunta: - Boa tarde, em que posso ajudar? Você diz: [prestação de
serviço superior]
2. Você é aluno de um curso de português e tem aulas particulares em
seu local de trabalho. No dia anterior à sua aula, você constata que
precisa marcou uma reunião exatamente no horário em que costuma
ter a sua aula de português. Você, então, decide ligar para a sua
professora para desmarcar a aula e agendar novo horário. Você
telefona para ela e diz: [prestação de serviço superior]
3. Você tem um filho pequeno, de três anos, que não gosta de comer
verduras. Vonão sabe mais o que fazer para que a criança se
alimente de forma saudável. Depois de você fazer o prato para ele,
você diz: [familiar superior]
4. Você é funcionário(a) de uma empresa brasileira há muitos anos.
Você é e sempre foi um(a) funcionário(a) dedicado ao trabalho e à
empresa e acredita que merece receber um aumento de salário. Você
então resolve conversar com o seu chefe sobre o assunto, e para isso
você marca com ele uma reunião. Na hora da reunião, ele então
pergunta a você: e então, sobre o que você quer falar? Você então
responde: [trabalho inferior]
5. Chegou o dia do pagamento das contas de casa e voestá sem
tempo para ir ao banco. Seu marido (ou sua esposa) está com o dia
menos ocupado que o seu e você quer que ele (ou ela) pague as
contas. Antes de sair de casa, você fala: [família igual]
6. Você é funcionário de uma empresa aérea brasileira e faz o check in
dos passageiros. Você está atendendo um cliente. Depois de todo o
procedimento de identificação e escolha do lugar no avião, o
passageiro continua com a bagagem na mão. Você precisa fazer com
que ele coloque a bagagem na esteira, para ser despachada. Ele
então pergunta a você: - É isso? Preciso fazer mais alguma coisa?
Você diz: [prestação de serviço inferior]
7. Você tem um filho adolescente que não gosta de ajudar nas tarefas
domésticas, nem de fazer os deveres da escola. Você decide mudar
essa situação e quer que ele arrume o quarto e faça as tarefas do
colégio. Então, quando ele está jogando no computador, você fala:
[família superior]
8. Você é aluno de um curso de português e não entende o que o
professor/a professora falou. Você precisa dizer a ele/ela que vo
78
Quadro 2.1 Situações do DCT
Como foi mencionado, informações sobre a cena são de fundamental
relevância para as escolhas feitas pelo falante, e, dessa forma, para a presente
pesquisa buscou-se considerar, no que diz respeito ao contexto de enunciação,
os seguintes aspectos: (i) o contexto em que ocorre a enunciação tipo de
relação entre os participantes; (ii) o grau de formalidade; e (iii) o nível
não entendeu e quer que ele repita a explicação: [sala de aula
inferior]
9. Você trabalha com uma equipe de profissionais e a sua mesa fica ao
lado de um colega que é muito desorganizado. Um dia, depois do
almoço, você chega e vê uma pilha de papéis em sua mesa, colocada
ali pelo seu colega de trabalho, porque ele não tinha mais espaço na
mesa dele. Com a pilha de papéis em sua mesa você não tem como
trabalhar. Você precisa falar com o seu colega de trabalho para ele
tirar as coisas da sua mesa. Você diz: [trabalho igual]
10. Você ainda mora com seus pais e não tem seu próprio carro. No
próximo fim de semana você quer sair com os amigos e precisa que
seu pai lhe empreste o automóvel. Você então diz a ele: [família
inferior]
11. Seu amigo está fazendo aniversário e convidou vo para almoçar
com ele em um restaurante de que ele gosta muito. Ao chegar
vocês sentam, se acomodam e o garçom vai falar com vocês: - Boa
tarde, o que vocês vão querer? Você diz: [prestação de serviço
superior]
12. Você é presidente de uma empresa brasileira e precisa que sua
secretária marque uma reunião com os diretores. Você então chama a
secretária até a sua sala e diz: [trabalho superior]
13. Você é professor de uma universidade importante no Brasil, e durante
a sua aula percebe que um dos alunos nunca realiza as tarefas de
casa. Você precisa lembrar ao aluno a importância de fazer os
exercícios. Assim, você se aproxima e diz: [sala de aula superior]
14. Você é presidente de uma empresa brasileira e quer que um de seus
diretores faça um relatório referente aos lucros do mês anterior. Você,
então, chama-o a sua sala e diz a ele: [trabalho superior]
79
hierárquico entre os participantes. Abaixo, o quadro com a distribuição desses
fatores nas situações utilizadas para a pesquisa.
Contexto da
enunciação
Nível hierárquico
Situações no DCT
Prestação de serviço
Superior
1, 2, 11
Prestação de serviço
Inferior
6
Sala de aula
Superior
13
Sala de aula
Inferior
8
Família
Superior
3, 7
Família
Inferior
10
Família
Igual
5
Trabalho
Superior
12, 14
Trabalho
Inferior
4
Trabalho
Igual
9
Quadro 2.2 Aspectos envolvidos nas situações do DCT
Os gráficos 2.1 e 2.2 oferecem uma melhor visualização das situações
comunicativas utilizadas no DCT, no tocante ao nível hierárquico dos papéis
comunicativos que o informante deveria assumir, e ao tipo de relação que
deveria existir entre falante e ouvinte. Os dados foram organizados de forma
quantitativa em que o todo, 100%, representa o total de situações utilizadas no
teste, no caso quatorze.
Gráfico 2.1 Relação hierárquica entre os papéis comunicativos no DCT
80
Gráfico 2.2 Tipo de relação interpessoal entre os participantes das situações comunicativas no DCT
2.2 Perfil dos informantes
Para a composição do banco de dados de língua oral que seria utilizado
no estudo, houve a participação de seis alunos do curso de português para
estrangeiros destinado aos estudantes que vêm de universidades de diversos
países para cumprir uma etapa de seus cursos de graduação na Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Esse curso é oferecido como disciplina da
grade de graduação da Faculdade de Letras e ministrado por professores do
Departamento de Letras Vernáculas, Setor de Português Língua Estrangeira
(SePLE). Os alunos que frequentavam o curso eram oriundos de universidades
européias com as quais a UFRJ tem convênios de intercâmbio, e estão no
Brasil para cumprir o último ano de seus cursos de graduação, parte que inclui
estágios e é obrigatório que seja realizado fora de seu país de origem. Para
eles, o curso de português é disciplina obrigatória, que conta créditos para a
conclusão da etapa brasileira de seus cursos universitários. Contudo, na turma
81
entrevistada havia uma aluna que fugia do perfil do grupo, pois estava nos
últimos meses do seu curso de pós graduação em saúde pública, que realizava
no Centro de Ciências da Saúde, também da UFRJ. Para ela, o curso de
português não era obrigatório, e ela o realizava para melhorar seu
conhecimento sobre a língua. Vale ressaltar que tal aluna o faz parte do
perfil dos alunos a quem o curso de Intercambistas é direcionado.
A coleta de dados foi realizada nas dependências da Faculdade de
Letras da UFRJ, durante o mês de julho de 2008, período em que os alunos
concluíam o nível intermediário do curso de português para estrangeiros. Esses
informantes são de nacionalidades francesa e alemã, estavam no Brasil
pelo menos seis meses e conviviam diariamente com brasileiros, tanto em seus
cursos universitários quanto em suas relações pessoais.
Todos os informantes responderam a um questionário, pelo qual se
objetivava saber se a língua portuguesa era o primeiro idioma estrangeiro que
eles estavam aprendendo, se haviam morado em outros países antes de virem
para o Brasil, se tinham estudado português antes de virem para o intercâmbio
e se utilizavam o português em seu dia a dia. Os informantes eram três
homens e três mulheres. O questionário encontra-se no ANEXO 01.
Dentre os informantes, havia estudantes dos seguintes centros de
estudo da UFRJ e respectivos cursos: CT (Centro de Tecnologia Curso de
Engenharia), CLA (Centro de Letras e Artes FAU, Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo - Curso de Arquitetura), CCS (Centro de Ciências da Saúde Pós-
graduação em Saúde Pública) e CFCH (Centro de Filosofia e Ciências
Humanas IFCS, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais Curso de
Sociologia). Cinco dos informantes haviam morado em outros países antes
82
de virem para o Brasil, mas não especificaram quais ao responderem sobre
isso no questionário, e todos falavam outras línguas estrangeiras, sobretudo o
inglês, o que pode ser observado com maiores detalhes nos gráficos 2.3 e 2.4.
É importante não perder de vista que havia quatro informantes de
nacionalidade francesa e dois de nacionalidade alemã, e é sobre esses valores
que se calculou o percentual dos gráficos. Não é possível mensurar o grau de
proficiência dos informantes em relação às línguas estrangeiras indicadas por
eles, uma vez que não foi feita uma avaliação, de qualquer natureza, que
fornecesse tal dado. Três deles (dois franceses e um alemão) haviam
estudado português em seus países de origem antes de iniciarem o curso na
UFRJ.
Gráfico 2.3 Línguas estrangeiras, além do português, faladas pelos informantes franceses
83
Gráfico 2.4 Línguas estrangeiras, além do português, faladas pelos informantes alemães
Vale mencionar que todos relataram ter o português como principal
língua de comunicação no Brasil, que moravam em apartamentos
compartilhados com outras pessoas de nacionalidades distintas das suas,
incluindo brasileiros. Nesse caso, a língua comum era o português, o que era o
fato determinante para a imersão na língua estrangeira que estava sendo
aprendida. Alguns alunos comentaram, inclusive, que não conseguiam mais
raciocinar nas outras línguas estrangeiras que já tinham estudado, pois o
português “tomava todo o espaço”, como relatou uma das informantes de
nacionalidade alemã.
2.3 Coleta e armazenamento dos dados
Os dados de língua oral foram coletados em um gravador digital (da
marca Sony, modelo ICD-P520), em formato .WAV, e armazenados no
computador para posterior análise acústica no programa computacional
PRAAT, um software para análise de fala desenvolvido por Paul Boersma e
84
David Weenick.
22
Neste programa, é possível fazer análise de vários aspectos
da produção oral, bem como realizar síntese de fala. Neste trabalho, esse
recurso analítico é de grande importância, já que a curva entoacional produzida
pelos aprendizes de PLE e gerada pelo PRAAT poderá ser comparada às
curvas típicas para ordem e pedido no português do Brasil, apontadas por
Moraes (2008), de forma a identificar possíveis desvios.
Após serem armazenados, os dados de produção oral foram transcritos
ortograficamente com o uso do programa de texto Word for Windows, onde
foram catalogados e novamente armazenados. A transcrição dos dados
encontra-se no Anexo 02. Depois dessa etapa, foi realizada uma análise das
escolhas linguísticas utilizadas pelos informantes, considerando o contexto
pragmático de cada uma delas. Para isso, usou-se o programa MonoconcPro,
descrito a seguir:
um programa desenvolvido por Michael Barlow, do Departamento de
Linguística da Universidade de Rice. (...)Com esse programa é
possível, a partir de um determinado corpus, realizar tarefas como:
criar listas de palavras em ordem alfabética ou por frequência de
emprego; gerar produção de concordâncias [concordance] e obter
informação sobre colocações [collocation]. (ALMEIDA, 2007: 108)
Para a organização e identificação dos dados, atribuiu-se a cada
informante um número, e na transcrição desses dados, combinava-se o
número do informante ao da situação do DCT, de forma que um dado
identificado com o número 02_07 corresponde ao informante de número 02 e à
situação 07.
22
O programa PRAAT está disponível gratuitamente na página www.praat.org.
85
2.4 Teste de percepção
Após a primeira análise de cunho formal das sentenças que compõem o
corpus, foram selecionadas trinta e quatro produções classificadas
gramaticalmente como ordens e pedidos. Essas produções foram acessadas
no PRAAT de forma a permitir sua segmentação para isolar apenas as
sentenças nucleares dos atos de fala que constituem o foco desta pesquisa, à
exclusão dos trechos correspondentes, por exemplo, à justificativa e à
preparação dos referidos atos, bem como de qualquer outro elemento
periférico, incorporado ao ato comunicativo.
As segmentações selecionadas foram numeradas e organizadas em
sequência. Posteriormente, foram avaliadas por 20 juízes que as identificavam
como ordem, pedido ou enunciado de outra natureza, neste último caso,
especificando por escrito o tipo de ato de fala em que julgavam que o referido
enunciado se enquadrava. Dentre as opções feitas por eles sob o rótulo
„outros‟, destacam-se a pergunta e o desejo.
Inicialmente, tentou-se categorizar os possíveis juízes pelos critérios de
sexo, e de faixa etária, este último critério abrangendo cinco subdivisões. A
ficha encontra-se no Anexo 03.
A primeira rodada de testes foi aplicada na cidade de Volta Redonda,
interior do estado do Rio de Janeiro
23
. Devido ao fato de a maioria dos juízes,
sobretudo os da faixa etária E (acima de 55 anos), nunca ter tido contato com
falantes de outras línguas, eles não compreendiam o que estava sendo falado
nas gravações, o que gerava a necessidade de se repetir a frase várias vezes.
Ao longo da testagem, verificou-se que o número elevado de repetições
23
A primeira rodada de testes de percepção foi realizada na cidade de Volta Redonda (RJ) em razão da
autora do presente estudo, durante a fase de aplicação dos testes, residir em tal cidade.
86
falseava a percepção do ouvinte, o que gerava uma situação comunicativa
artificial que fugia do foco da pesquisa.
Em contrapartida, o público das demais faixas etárias mostrava-se mais
disposto a ouvir atentamente e tentar identificar em que tipo se enquadrava
cada uma das sentenças que compunham o teste. Ao analisar melhor o perfil
dos informantes e os resultados obtidos até então, verificou-se que as variantes
sexo e idade não eram tão relevantes, mas sim o nível de instrução dos juízes,
uma vez que aqueles que se mostraram mais cooperativos durante a
realização do teste eram, em sua maioria, estudantes universitários ou pessoas
com nível superior completo. Dessa forma, um novo desenho do teste foi feito,
priorizando sua aplicação a 20 juízes de nível universitário ou com nível
superior completo.
Vale frisar, como mencionado acima, que, tendo em vista o perfil
comportamental dos juízes em todas as fases de aplicação do teste de
percepção, conclui-se que o problema identificado com os juízes que atuaram
na primeira etapa pode ter sido gerado pela falta de experiência daqueles
ouvintes com a produção oral em língua portuguesa de falantes de línguas
estrangeiras, uma vez que residem em uma cidade onde não um índice
expressivo de pessoas provenientes de países estrangeiros. Optou-se, então,
por tentar sanar o problema selecionando novo conjunto de juízes residentes
em uma cidade diferente, na qual circulasse usualmente um contingente
considerável de estrangeiros. Dessa forma, decidiu-se aplicar o teste na cidade
do Rio de Janeiro.
O teste de percepção foi aplicado, portanto, com dois grupos:
universitários e profissionais de nível superior da cidade de Volta Redonda e do
87
Rio de Janeiro, tendo como principal critério para seleção dos juízes (pessoas
selecionadas para ouvirem as gravações e responderem ao questionário,
indicando qual ato de fala o falante estrangeiro realizaria em casa situação
comunicativa, usando a língua portuguesa) o nível de instrução. Os juízes eram
pré-selecionados por se adequarem ao critério mencionado, independente
do sexo e da idade, e assim houve juízes de ambos os sexos, com faixa etária
que vai dos 19 aos 65 anos.
O teste de percepção ora descrito foi de fundamental relevância para os
resultados que serão apresentados, pois serviu de base para identificar os tipos
de atos de fala a serem analisados no PRAAT para obtenção dos contornos
melódicos referentes a cada um dos enunciados. Tal procedimento é o cerne
do estudo, pois através da análise dos parâmetros acústicos fornecidos pelo
PRAAT é que se determinam as características das curvas entonacionais que
acompanham a enunciação das sentenças do corpus consideradas
majoritariamente como ordem ou pedido pelos juízes, para, em seguida,
compará-las às curvas descritas por Moraes (2008) como prototípicas destes
atos de fala, com vistas a identificar pontos de semelhança e de divergência.
Espera-se, também, verificar em que medida os aspectos prosódicos atuantes
na produção do ato de fala interferem na sua interpretação.
Das 34 sentenças submetidas aos juízes, foram selecionadas onze para
análise da curva entonacional. Os critérios para seleção dessas onze
sentenças foram: (i) obterem mais de 90% de respostas semelhantes no teste
de percepção; (ii) terem sido identificadas, pelos juízes, com mais de 50% de
desvio do ato de fala originariamente pretendido como o caso das „ordens‟
identificadas por mais de 50% dos juízes como sendo „pedido‟; e (iii) serem
88
identificadas erroneamente como um mesmo ato de fala, diferente dos que
estão em foco na pesquisa é o caso dos „pedidos‟ identificados, pelos juízes,
como afirmação ou pergunta. A análise dos dados obtidos será o alvo do
próximo capítulo.
89
3 Descrição e Análise dos dados
Neste capítulo, o corpus constituído será descrito e analisado.
Inicialmente, foram delimitados, com base em gramáticas de PLE e materiais
didáticos voltados para o ensino de português como língua estrangeira, as
estruturas morfossintáticas que identificariam ordens e pedidos. Feito isso,
hipóteses serão levantadas com base nas teorias estudadas no capítulo 1 para
as estruturas preferidas nos atos de fala em análise.
Na segunda parte, os resultados dos testes de percepção serão
apresentados e analisados quantitativamente, a fim de identificar questões
como qual nacionalidade entre os alunos estrangeiros seria mais produtiva na
produção de ordens e pedidos. Por fim, será feita uma análise de cunho
prosódico, com base nas curvas entonacionais, geradas a partir dos dados
mais relevantes identificados no teste de percepção, que serão analisadas à
luz do estudo de Moraes (2008).
3.1 Caracterização morfossintática de ordem e pedido
Para iniciar a apresentação dos dados do corpus, vale retomarem-se
alguns dos conceitos abordados no Capítulo 1 acerca dos atos de fala em
análise: ordem e pedido. Ao formular as situações contextuais que foram
utilizadas no teste de compreensão discursiva, ou Discorse Completion Test,
(DCT), fonte das sentenças avaliadas no teste de percepção e analisadas
acusticamente, considerou-se como possíveis estímulos para a produção de
ordens as situações em que o falante se encontrava em posição
hierarquicamente superior à do ouvinte (que iria realizar ou não o ato de fala).
90
Dois papéis comunicativos mostraram-se bastante produtivos quando da
produção de ordens: papéis de mãe/pai e chefe, ou seja, uma relação em
contexto familiar e outra em contexto profissional, relativa ao cargo ocupado no
trabalho. Tais relações interpessoais eram incitadas pelas seguintes situações
comunicativas:
3. Você tem um filho pequeno, de três anos, que o gosta de comer
verduras.Você já não sabe mais o que fazer para que a criança se
alimente de forma saudável. Depois de você fazer o prato para ele, você
diz: [familiar superior]
7. Você tem um filho adolescente que não gosta de ajudar nas tarefas
domésticas, nem de fazer os deveres da escola. Você decide mudar
essa situação e quer que ele arrume o quarto e faça as tarefas do
colégio. Então, quando ele está jogando no computador, vo fala:
[família superior]
12. Você é presidente de uma empresa brasileira e precisa que sua
secretária marque uma reunião com os diretores. Você então chama a
secretária até a sua sala e diz: [trabalho superior]
14. Você é presidente de uma empresa brasileira e quer que um de seus
diretores faça um relatório referente aos lucros do mês anterior. Você,
então, chama-o a sua sala e diz a ele: [trabalho superior]
Quadro 3.1 Situações do DCT que sugeriam a produção de „ordens‟
No caso do ato de fala pedido, a situação difere um pouco da situação
de ordem. Levando-se em conta a Teoria da Polidez, segundo a qual não se
deve causar “ameaça à face” dos participantes da comunicação, verificou-se a
preferência pela realização do ato de fala pedido, tendo ele ocorrido inclusive
em situações em que se esperava a produção de uma ordem. A isso também
se pode atribuir a necessidade de o falante persuadir o ouvinte, e levá-lo a,
efetivamente, realizar a ação pensada no momento da enunciação do ato de
91
fala, ou seja, o ato comunicativo terá sido concretizado com êxito se o
ouvinte cumprir a ação enunciada pelo falante, entendendo as palavras como
ações. Para o teste de percepção e posterior análise acústica, foram
selecionadas sentenças que apresentavam estrutura morfossintática dos atos
de fala estudados (ver quadro 3.2), sendo essas as características que foram
privilegiadas para as escolhas dos atos de fala pedido, assim como para o ato
de fala ordem.
Quadro 3.2 Estruturas Morfossintáticas dos atos de fala „ordem‟ e „pedido‟
Dentre os contextos situacionais que objetivavam a produção de pedidos, têm-
se como exemplos:
5. Chegou o dia do pagamento das contas de casa e você está sem tempo
para ir ao banco. Seu marido (ou sua esposa) está com o dia menos
ocupado que o seu e você quer que ele (ou ela) pague as contas. Antes
de sair de casa, você fala: [família igual]
11. Seu amigo está fazendo aniversário e convidou você para almoçar com
ele em um restaurante de que ele gosta muito. Ao chegar vocês
sentam, se acomodam e o garçom vai falar com vocês: - Boa tarde, o
que vocês vão querer? Você diz: [prestação de serviço superior]
Quadro 3.3 Situações do DCT que sugeriam a produção de „pedidos
92
Do total de dados obtidos na aplicação do DCT, 34 enunciados
produzidos pelos informantes estrangeiros foram selecionados, por se
constituírem nas sentenças que apresentavam o maior número de marcas
morfossintáticas características dos atos de fala em estudo, (cf. Quadro 3.2).
Outro aspecto favorável à seleção de tais sentenças para o teste de percepção
foi a sua configuração em atos de fala diretos, que são identificados como tal
através de suas marcas morfossintáticas, e não são uma construção que
demanda inferência, inclusive a partir de pistas contextuais não linguísticas
(como alguém que diz numa sala abafada: -Estou com tanto calor”, como um
pedido para que a janela seja aberta, ou para que o ar condicionado seja
ligado). Nesses atos de fala, seus núcleos puderam ser retirados sem prejuízo
do sentido e sem alteração da intenção comunicativa. Foram esses núcleos
que, depois de segmentados no programa computacional PRAAT, como foi
mencionado no capítulo anterior, foram organizados em sequência e
submetidos à avaliação de 20 juízes (cf. capítulo 2), que os classificariam de
acordo com a sua percepção. Nessa seleção, havia 14 elicitações classificadas
inicialmente como ordens, por conta de suas marcas morfossintáticas, e 20
como pedidos.
Tratando especificamente das produções obtidas via DCT, no que diz
respeito às ordens, pôde-se observar que houve uma preferência pelo uso de
expressões que amenizassem o caráter autoritário do ato de linguagem ordem
no caso, „por favor‟ e „faz favor‟. Tais expressões, a princípio, caracterizavam
o ato de fala pedido, de forma que foi necessário focar a análise no tempo
verbal utilizado na elaboração da frase para identificá-las como ordem. Dessa
93
forma, foram selecionados nove enunciados que correspondiam a onze ordens
distintas, tendo em vista que um mesmo enunciado continha três ordens:
dado 01_07 - Vo vai deixar o computador [[agora]] e,
<por favor>, arrumar o seu quarto e me ajudar para cozinhar,
[[agora]], não para esperar. (grifos nossos).
Esse enunciado torna-se interessante para a análise na medida em que é o
único no qual o falante utiliza estratégias de amenização de um ato de fala que
provoca uma ameaça às faces positiva e negativa do ouvinte (cf. capitulo 1), e
também é o único que contém palavras intensificadoras da ordem, no caso,
„agora‟. O gráfico abaixo mostra a ocorrência das duas possibilidades, no
corpus.
Gráfico 3.1 Frequência de ocorrência das estruturas morfossintáticas em „ordem‟.
Pode-se observar que o percentual de ocorrências com o uso da
expressão amenizadora do ato de fala ordem é bem mais expressivo do que
outras estratégias identificadas, como, por exemplo, o uso do intensificador de
94
ordem „agora‟. Dessa forma, vale notar em que momento do ato de fala ele
ocorre. Segundo Kerbrart-Orechioni, outra estratégia de amenizar a força
ilocucionária da ordem é apresentar uma razão para se solicitar a ação em
questão. Entende-se que a formulação da justificativa não constitui o elemento
principal dos atos de fala estudados, o que torna necessário dividir a ordem,
bem como o pedido, em núcleo parte que contém o ato de fala em si, e
justificativa.
Considerando a preferência pelo uso de elementos morfossintáticos
amenizadores de ordem, nota-se que as expressões „por favor‟ e „faz favor‟ não
estão posicionadas sempre no mesmo ponto do enunciado, podendo estar: (a)
antepostas ao núcleo dado 03_06 Senhor, [[por favor]], me a mala; (b)
pospostas ao núcleo dado 07_03 Filho, você precisa comer algumas
verduras. Coma [[por favor]]; e (c) entre duas ordens seguidas dado 01_07
Você vai deixar o computador agora e, [[por favor]], arrumar o seu quarto e me
ajudar para cozinhar, agora, não dá para esperar.
Gráfico 3.2 Ocorrência do posicionamento de „favor‟ em relação ao núcleo do ato de fala „ordem‟.
95
Outra estrutura morfossintática presente nos dados é o uso de
intensificadores da ordem, no caso a palavra „agora‟. Ela foi encontrada em três
enunciados e mostrou-se a segunda estrutura mais produtiva. Em relação ao
seu posicionamento, essa palavra apareceu sempre no fim do ato de fala,
portanto, posposto ao seu núcleo, como em:
dado 03_07 - Desliga esse computador, quero que você
estuda [[agora]].
Mais uma característica dessa estratégia é que, nesses casos, não se
observou a presença da justificativa para o núcleo do ato de fala, como ocorreu
nos enunciados em que aparece o uso de „favor‟. nos enunciados em que
ela ocorre, nota-se que o núcleo das ordens vem depois de sua justificativa.
Em relação aos pedidos, observa-se que dois tipos de estrutura são
produtivos e esses, na maioria das vezes, não co-existem em um enunciado.
São: uso da expressão composta pela palavra „favor‟, assim como nas ordens
amenizadas, e o uso dos verbos no futuro do pretérito ou imperfeito do
indicativo. A frequência de tais estruturas nos dados pode ser observada no
gráfico 3.3.
Dado 01_08 - Você [[poderia]] repetir, ou explicar de novo
porque eu acho que eu tenho algumas dúvidas.
Dado 04_08 - Você pode repeter ou dar mais explicações,
faz [[favor]].
96
Gráfico 3.3 - Frequência de ocorrência das estruturas morfossintáticas em „pedido‟.
Observa-se que, quando preferência pelo uso de „favor‟, há também
uma locução verbal composta pelo verbo poder + verbo principal no infinitivo,
como pode ser visto no exemplo acima. Nesse caso, „favor‟ aparece, em 90,9%
de um total de 11 enunciados, depois do núcleo do ato de fala e depois de sua
justificativa, quando alguma, enquanto apenas 11,1% aparecem antes do
núcleo e também antes da justificativa do ato de fala pedido. Esses dados
podem ser mais bem visualizados no gráfico 3.4.
Dado 03_05 - Querido, você pode ir ao banco pra, para
pagar as contas pra mim, por [[favor]].
Dado 01_10 - Pai, por [[favor]], eu preciso do seu carro,
pode me emprestar?
pretérito imperfeito do
indicativo
97
Gráfico 3.4 Ocorrência do posicionamento de „favor‟ em relação ao núcleo do ato de fala „pedido‟.
Em relação à ocorrência dos tempos verbais do modo indicativo, futuro
do pretérito e pretérito imperfeito, observa-se que os verbos nesses tempos
constituem os núcleos do ato de fala pedido, e em apenas uma ocorrência
esses verbos apareceram tanto no núcleo quanto na justificativa (dado 06_08 -
Desculpa, professora, eu não entendi a pergunta, se você [[poderia]] repetir
[[seria]] bom pra mim). A possibilidade de ocorrência de vários desses tempos
verbais encontra explicação na tese de doutorado de Rebello (2008), em que a
autora investiga o emprego do pretérito imperfeito pelo futuro do pretérito do
indicativo. Em seus estudos, confirma-se que essa troca é uma tendência no
português do Brasil, contudo não de forma aleatória. fatores relacionados
ao contexto comunicativo que regem a escolha do tempo verbal, e a Teoria da
Polidez traz justificativas para isso. Nos dados, essa substituição se deu em
sentenças que exigiam do falante um elevado grau de polidez, como no caso
de realizar solicitações a pessoas de nível hierárquico superior ao seu, o que
contraria os estudos de Rebello. Contudo, isso pode ser justificado pelos
argumentos da autora para seu estudo de doutorado, a escassez de “meios
98
que orientem o professor de PBE e o aprendiz estrangeiro de realizarem esta
substituição de maneira eficaz” (2008: 10)
3.2 Interpretação de ordem e pedido sob a ótica da percepção
Do universo de elicitações produzidas por falantes não nativos de
português na aplicação do DCT, primeiramente foram segmentadas no
programa computacional PRAAT, como mencionado (cf. capítulo 2),
quatorze sentenças com marcas morfossintáticas de ordem e vinte com marcas
morfossintáticas de pedido. Em seguida, essas sentenças foram submetidas à
avaliação dos juízes, constituindo-se, assim, o teste de percepção.
Das quatorze elicitações de ordens, dez foram identificadas
corretamente pela maioria dos juízes do teste de percepção (mais de 50% ),
enquanto quatro tiveram outro tipo de classificação. Dos pedidos, dezessete
das vinte elicitações definidas como tal obtiveram êxito em sua identificação,
sendo classificadas pela maioria dos avaliadores como sendo o ato de fala em
questão, enquanto apenas três desviaram do objetivo. Nota-se, através dos
números, que a quantidade de desvios é equivalente nos atos de fala em
questão, não havendo um que se destaque pela maior regularidade de
identificação. Tais informações é o que demonstra o quadro 3.4
Quadro 3.4 Resultado do teste de percepção no que diz respeito à identificação dos atos de fala em estudo.
Alvos (atos de fala
produzidos)
Total (34 sentenças
avaliadas no teste de
percepção)
Acertos (>50 % de
identificação com o
ato alvo)
Desvios (<50 % de
identificação com o
ato alvo)
Ordem
14
10
4
Pedidos
20
17
3
99
Das quatorze ordens dos testes de percepção, dez foram produzidas por
mulheres, e apenas quatro foram proferidas por homens. Tendo em vista que,
entre os informantes entrevistados na elaboração do DCT, 50% eram do sexo
feminino e 50% do masculino, observa-se claramente que há, no corpus, maior
facilidade por parte das mulheres na produção de ordens. Desse modo,
embora a variável sexo não tenha sido relevante com relação aos juízes na
fase de percepção, ela foi relevante para os informantes na fase de produção.
O quadro 3.5 mostra os números referentes à produção e à percepção de
ordem e pedido considerando o sexo dos informantes.
Sexo (dos
produtores dos atos
de fala avaliados)
Total (14 ordens
presentes no teste de
percepção)
Acertos (>50 % de
identificação com o
ato alvo - ordem)
Desvios (<50 % de
identificação com o
ato alvo - ordem)
Mulheres
10
7
3
Homens
4
3
1
Quadro 3.5 Resultado das fases de produção e percepção no que diz respeito ao sexo dos informantes - ordens.
Em relação ao ato de fala pedido, observa-se que a diferença de
produção tendo como base o sexo do informante não representa uma diferença
relevante, tendo em vista que onze elicitações foram produzidas por homens e
nove, por mulheres. O quadro 3.6 demonstra a diferença de produção dos
pedidos entre os sexos e deixa evidente a pouca diferença absoluta que
entre eles. Tais números indicam a preferência de ambos os sexos por
determinado ato de fala, no caso o pedido, quando o objetivo é levar o falante a
produzir uma ação, e é o que demonstra o quadro 3.6, quando comparado ao
quadro 3.5.
100
Sexo (dos
produtores dos atos
de fala avaliados)
Total (14 ordens
presentes no teste de
percepção)
Acertos (>50 % de
identificação com o
ato alvo ordem)
Desvios (<50 % de
identificação com o
ato alvo - ordem)
Mulheres
9
8
1
Homens
11
9
2
Quadro 3.6 Resultado das fases de produção e percepção no que diz respeito ao sexo dos informantes - pedidos.
No que diz respeito à nacionalidade dos estrangeiros em relação à
produção de ordens e pedidos, os dados indicam que não uma
nacionalidade preferencial para que a produção de um determinado ato de fala
predomine. Há equivalência entre franceses e alemães tanto na produção
quando na percepção, por parte dos juízes, dos atos de fala em estudo. Dessa
forma, nota-se que a variante nacionalidade pouco influencia nos resultados da
presente pesquisa.
Das 34 sentenças utilizadas no teste de percepção, dezessete foram
produzidas por alemães e dezessete por franceses. Das produções dos
alemães, quatorze foram compreendidas pelos juízes do teste de percepção
como sendo os atos de fala tidos como alvo da produção, enquanto que três
foram compreendidos com desvio. Já no caso dos informantes franceses, treze
elicitações foram compreendidas com êxito e quatro com desvio (dados
presentes no quadro 3.7).
Nacionalidade (dos
informantes
entrevistados para a
elaboração do DCT
6 no total)
Total (34 sentenças
avaliadas no teste de
percepção)
Acertos (>50 % de
identificação com o
ato alvo)
Desvios (<50 % de
identificação com o
ato alvo)
Alemã
17
14
3
Francesa
17
13
4
Quadro 3.7 Prodão e percepção dos atos de fala estudados no que diz respeito à nacionalidade dos informantes.
101
Tratando especificamente do teste de percepção, as 34 sentenças foram
submetidas à avaliação de 20 juízes, totalizando, assim, 680 dados para
análise. Desses, 29,41% foram identificados como ordem, 55,74% como
pedidos e 14,85% como outros atos de fala, como pode ser verificado no
quadro 3.8. Esses números corroboram o que se percebera na aplicação do
DCT, a preferência pela produção de pedidos. Contudo, indicam também que
apenas marcas morfossintáticas não são suficientes para a caracterização dos
atos de fala pesquisados; caso contrário, não haveria incidência de “outros”.
Isso leva ao próximo passo da pesquisa, que é o de identificar possíveis
características de cunho suprassegmental dos enunciados, que os aproximem
ou distanciem do padrão proposto por Moraes (2008) para ordens e pedidos.
Total bruto de
dados
Ordem
Pedido
Outros
Números
absolutos
680
200
379
101
Percentual
100%
29,41%
55,74%
14,85%
Quadro 3.8 Total de dados obtidos através do teste de percepção e sua identificação pelos juízes.
Como foi mencionado no Capítulo 2, era dada aos juízes a
possibilidade de especificarem o ato de fala compreendido quando eles
avaliavam que a enunciação não se tratava nem de ordem nem de pedido.
Essa era uma resposta aberta, podendo se tratar de qualquer ato de linguagem
que ocorresse ao juiz. Ainda assim, de 101 sentenças não identificadas como
ordem ou pedido, 82 81,2% foram avaliadas como afirmação, pergunta ou
desejo e apenas 19 18,8% receberam outros rótulos. Esses atos de fala
estão elencados na tabela 3.9. Uma possível explicação para tal fato será
102
abordada mais adiante neste capítulo, quando será mostrada a análise
acústica das sentenças mais relevantes para o presente estudo.
ATOS DE FALA
MENCIONADOS
OCORRÊNCIAS
PORCENTAGEM
Afirmação
38
37,6%
Pergunta
23
22,8%
Ameaça
6
5,9%
Sugestão (conselho)
7
6,9%
Necessidade
3
3%
Desejo
21
20,8%
Explicação
3
3%
TOTAL
101
100%
Quadro 3.9 Resultado do teste percepção no que diz respeito aos enunciados percebidos como „outros‟.
3.3 A relação entre a prosódia e a interpretação dos ouvintes
No que diz respeito à pesquisa dos atos de fala relacionados à área de
ensino de português como língua estrangeira, inclusive pedido e ordem, muito
tem sido estudado
24
. Não obstante, não se pode deixar de observar que o
principal objeto de análise é o aspecto formal dos atos de fala.
Considerando a pronúncia como um dos focos relevantes no ensino de
língua estrangeira, e que a prosódia constitui um dos seus principais
problemas, entende-se que observar apenas o nível formal do processo
comunicativo não é o suficiente para o sucesso do processo ensino
aprendizagem. Dessa forma, esta pesquisa lança um olhar sobre o nível
suprassegmental dos atos de fala ordem e pedido, e, para tanto, pretende
24
Conferir pesquisas realizadas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, dentre as quais
podem-se citar trabalhos de mestrado e doutorado de LE BERRE (2008) e ALMEIDA (2007).
103
analisar acusticamente os enunciados percebidos pelos juízes no teste de
percepçao realizado, buscando identificar características e semelhanças dos
atos de fala estudados com seus padrões para o português do Brasil,
embasado no trabalho de Moraes.
Esse pesquisador, em seu artigo publicado em 2008, realiza uma breve
descrição de quatorze contornos melódicos do português brasileiro, na variante
carioca. O autor utiliza o recurso da ressíntese de fala a fim de tentar identificar
quais as características prosódicas são realmente contrastivas e quais são
consideradas alofônicas. A análise dos dados é feita com base na teoria
autossegmental e métrica (AM).
As sentenças utilizadas para compor o corpus do estudo de Moraes
foram elaboradas em laboratório, levando em conta a tonicidade das palavras e
o número de sílaba dos enunciados, e foram reproduzidas por uma informante
carioca, do sexo feminino. As frases eram contextualizadas, para ambientar o
falante a produzi-las com a entonação desejada de acordo com o contorno
melódico a ser investigado. Posteriormente as frases foram submetidas a teste
de audição em que ouvintes identificavam que tipo de sentença estava sendo
produzida (asserção, pergunta total, dentre outros).
Em uma nova etapa de seu estudo, Moraes modificou o contorno
declarativo das sentenças, utilizando o programa computacional PRAAT, já
mencionado no capítulo 2, mantendo as categorias dos enunciados originais.
Com esse procedimento, o pesquisador obteve 105 novas sentenças que
foram submetidas a novo teste de audição, visando a verificar em que medida
as alterações influenciam na interpretação dos ouvintes, e se uma determinada
104
característica prosódica determina ou influencia a interpretação, isoladamente
ou junto com outros elementos prosódicos.
I. Ordens
Figura PRAAT 1 Ordem 1
A frase „Faça isso para essa tarde‟ (Figura PRAAT 1) apresentou 100%
de identificação como ordem, contudo sua curva entonacional não se aproxima
do padrão proposto por Moraes (2008) para tal ato de fala. A frase se inicia
com um ataque alto, bitonal, segundo a AM
25
, H*L, e termina de uma forma
semelhante ao definido como asserção ou statement” (cf. na subseção II. c),
com uma queda na F0, configurando-se H*L, com tom de fronteira L%.
Entretanto, Moraes afirma que o contorno melódico de ordem é similar ao de
asserções, podendo, no entanto, constituir-se entre eles um par mínimo. O que
vai diferenciá-los é o seu acento nuclear, e, segundo Moraes (2008: 03),
25
AM: Teoria Autossegmental e Métrica.
105
“the similarity of contours and the absence of such possible “minimal
pairs” lead us to consider that these pre-nuclear accents are
allophonic variants of the same /H+H*/ accent, that is, that there is a
phonological identity between the patterns of command and wh-
question, which in turn contrast with the patterns of the statement by
its prenuclear accent”.
A similaridade em foco é o que pode ser considerado como fator de
identificação das asserções como ordens por 100% dos juízes.
Figura PRAAT 2 Ordem 2
em „Quero que você estuda agora‟ (figura PRAAT 2) um contorno
melódico semelhante ao da primeira sentença, iniciado com um ataque alto, ou
seja, a primeira sílaba tônica da frase está em um nível superior ao do restante
do enunciado. Essa proeminência, que se configura em H*L, leva a um declínio
no final do enunciado HL* com um tom de fronteira L%. Esse desenho também
se aproxima da curva melódica de uma asserção. Dessa forma, os dados
indicam que as curvas entonacionais dos enunciados com mais de 95% de
identificação como ordem, consideradas assim os protótipos desse ato de fala,
106
não possuem stricto senso uma curva melódica semelhante ao padrão de
ordem definido por Moraes (2008), mas se assemelham ao de uma asserção.
Dessa forma, nos dados, o padrão de “ordem” seria: frase iniciada por
ataque alto H*L com declínio de curva melódica na última sílaba, sendo ela
pos tônica, com um tom de fronteira L%.
II. Pedidos
A curva entonacional apresentada por Moraes (2008) como sendo
característica dos pedidos ou requests apresenta, em seu contorno melódico,
a silaba pré-acentuada em nível baixo, uma subida na sílaba tônica final e
descida na postônica, como nas interrogativas totais neutras ( Yes-no question
neutral”). No entanto, o pico da F0, na última sílaba acentuada - tônica - está
localizada no começo da vogal, não no final, o que leva a configuração
intrassilábica a uma queda. Dois pontos levam a distinguir as interrogativas
totais dos pedidos, de acordo com Moraes (2008): (i) - a descida final nos
contornos dos pedidos atinge menor nível do que nas interrogativas totais
neutras”; e (ii)- a primeira sílaba tônica está localizada em um nível mais alto
nos pedidos que no caso das interrogativas totais neutras, a exemplo do que
ocorre com as interrogativas parciais.
Fonologicamente os pedidos apresentam uma curva melódica interna à
última sílaba acentuada, o que os distingue do padrão das interrogativas totais
neutras. O alinhamento do pico da F0 está, dessa forma, incorporado na
representação proposta para contorno do acento nuclear- L>H* L- no primeiro
terço da sílaba.
107
a) Requests
Figura PRAAT 3 Request 1
A frase A:: você pode me emprestar o carro‟, que pode ser observada
pela curva entonacional acima, foi identificada por 100% dos juízes como
sendo um pedido. Sua curva melódica termina em direção ascendente
possuindo a configuração da palavra final em LH*, alinhado no primeiro terço
da sílaba, na tônica, e tom de fronteira H%. Tal desenho assemelha-se com a
proposta de Moraes (2008) para tal ato de fala.
Essas mesmas características são observadas nas curvas melódicas
das figuras 4 e 5 geradas pelo PRAAT. A diferença no contorno entonacional
que elas apresentam é em relação à posição do acento tônico final, pois em
„Você poderia repetir‟ tem-se tom baixo (L) na sílaba tônica final, enquanto que
em “Eu queria um vinho verde” a tônica final apresenta tom alto (H). Tal
diferença pode ter ocorrido devido ao mero de sílabas e pauta acentual das
palavras finais das sentenças em análise: verde é dissílaba e paroxítona,
108
enquanto repetir é trissílaba e oxítona. Tais sentenças foram identificadas pelos
juízes com 95% e 90% de acerto, ou seja, quase 100% das pessoas
submetidas ao teste de percepção entenderam tais enunciados como sendo o
ato de fala pedido.
Pode-se então considerar que a entonação, nas frases analisadas na
categoria de pedido, foi aspecto decisivo na sua identificação como tal, uma
vez que não há semelhança de cunho morfossintático entre sentenças. Embora
as estruturas sejam caracterizadoras do ato de fala pedido (poder+ verbo
principal / futuro do pretérito + verbo principal / imperfeito do indicativo), não se
pode deixar de considerar que o aspecto comum às três sentenças são suas
curvas melódicas, que formam o mesmo contorno, e apresentam as mesmas
características no que diz respeito ao acento tonal. Assim, quanto à forma
estrutural, não apresentam as semelhanças (cada frase é estruturada
morfossintaticamente de formas distintas, embora as três sejam características
de pedidos), que existem no que diz respeito à entonação.
Figura PRAAT 4 Request 2
109
Figura PRAAT 5 Request 3
b) Interrogativa total neutra
uma grande proximidade entre o contorno melódico do ato de fala
pedido e dos enunciados identificados por Moraes (2008) como interrogativas
totais, como o próprio autor apontara antes
26
. Para distinguir as duas curvas
melódicas, a questão do alinhamento acentual da sílaba tônica é de
fundamental relevância. Nos pedidos, o alinhamento ocorre no primeiro terço,
ou seja, no início da sílaba tônica. Já em interrogativas totais neutras, ele se dá
na margem direita da vogal acentuada, ou seja a dois terços da tônica, na sua
porção final.
Contudo, não houve diferença de percepção por parte dos juízes em
relação à identificação como pedido das interrogativas totais neutras, sendo
que, das quatro curvas caracterizadas como tal, duas („Você pode me
26
Cf. MORAES & COLAMARCO, 2007
110
emprestar o carro‟ e „Você poderia repetir ou explicar de novo‟) foram
identificadas por 100% dos juízes como pedido. as demais frases („Você
poderia marcar uma reunião pra mim na sexta-feira‟ e „Pode me emprestar o
carro no fim de semana‟) tiveram o percentual de identificação como pedido em
90% e 95%, respectivamente.
Figura PRAAT 6 - Yes-no question neutral 1
111
Figura PRAAT 7 - Yes-no question neutral 2
Figura PRAAT 8 - Yes-no question neutral 3
112
Figura PRAAT 9 - Yes-no question neutral 4
No caso de „Figura PRAAT 7‟ ocorre um período composto por orações
coordenadas. uma queda da F0 na fronteira das orações com um
alongamento do conectivo „ou‟. Nesse enunciado observa-se ainda uma pausa
não preenchida, que não parece ter influenciado nos resultados. um
movimento descendente ascendente na última palavra do enunciado, onde se
localiza a sílaba nica final. Já nas „Figuras PRAAT 8 e 9‟, que refletem
produções que obtiveram 90% e 95% de identificação como pedido pelos
juízes, observa-se um tom alto (H) na sílaba tônica, mantendo-se ao fim do
enunciado, com tom de fronteira H%.
Somente na „Figura PRAAT 6‟, correspondente a 100% de identificação
como pedido, observa-se um movimento ascendente descendente, com subida
na postônica, seguida de queda com tom de fronteira L%. Como o alinhamento
da sílaba acentuada acontece próximo à margem direita, tal enunciado
enquadra-se no padrão descrito por Moraes (2008) para interrogativa total
neutra. O movimento ascendente descendente deve ter sido fator determinante
113
para sua identificação como pedido por todos os informantes do teste de
percepção.
c) Asserção
Em geral, o enfoque do contorno melódico em frases definidas por
Moraes como asserções (“statements”) -se em função do acento pré-nuclear.
Contudo, tal desenho irá aproximar sua curva daquelas características de
frases definidas como interrogativas disjuntivas (“alternative questions”), sendo
assim variantes alofônicas, com um contorno /L*H/ ou /LH*/. Para solucionar tal
impasse, Moraes (2008) propõe que seja considerado para as asserções o
acento nuclear, e não mais o pré-nuclear. Dessa forma, um movimento
descendente entre a sílaba pretônica e a tônica, com a representação bitonal
/HL*/, seguida por um tom de fronteira L%.
As características de asserção estão presentes, como já mencionado, na
configuração das elicitações identificadas pelos juízes como ordens; contudo,
essas possuem uma peculiaridade, iniciam-se com uma palavra em que um
ataque silábico alto. No caso das sentenças identificadas como pedido e que
apresentam comportamento de asserções, a palavra que inicia a frase possui
um ataque baixo, sendo essa a principal marca prosódica que permite
distinguir, neste caso, o ato de fala ordem do pedido.
Na sentença observada na „Figura PRAAT 10‟, fica nítida a altura em
que a F0 inicia a frase, um nível baixo em relação à sílaba que a segue.
Observa-se que há uma pausa preenchida (a::) por uma vogal, que, não
obstante, nessa frase não demonstra influência nos resultados do teste de
percepção, a exemplo do que ocorreu na sentença correspondente à „Figura
114
PRAAT 3‟. O enunciado abaixo foi identificado por 90% dos juízes como sendo
um pedido, e 5% como ordem. A justificativa para essas duas classificações
pode ser a semelhança entre as curvas melódicas de tais atos de fala, que se
diferenciam pelo seu ataque, alto para ordens e baixo para asserção.
Figura PRAAT 10 - Asserção 1
Na „Figura PRAAT 11, tem-se um período composto por coordenação,
em que uma relação de adição entre as duas orações, e o pedido está
concentrado na primeira oração. Nela observa-se um comportamento
semelhante ao do enunciado acima, tendo início com uma sílaba em nível
baixo da F0. Contudo, a segunda oração começa por um ataque alto, o que
caracteriza o ato de fala ordem, tratando-se assim de um enunciado misto.
Esse ato de fala foi identificado por 90% dos juízes do teste de
percepção como sendo pedido e por 10% como se tratando de uma ordem.
Percebe-se, assim, que o caráter duplo da sentença influenciou a compreensão
dos ouvintes, levando-os a focar em um dos atos de fala presentes no
115
enunciado, de acordo com o seu comportamento entonacional, o que poderia
levá-los a um equívoco de compreensão, e gerar, assim, um ruído na
comunicação entre os falantes.
Figura PRAAT 11 - Asserção 2
Nas duas sentenças que se assemelham ao padrão descrito como
asserção por Moraes (2008), observa-se que há também uma regularidade no
que diz respeito à morfossintaxe. Ambas apresentam o verbo no imperfeito do
indicativo, sendo fator determinante a questão de uma delas ser formada por
um período composto por coordenação.
116
Considerações finais
Segundo Searle (1981: 21), “falar uma língua é adotar uma forma de
comportamento regido por regras, sendo estas regras de uma grande
complexidade. Aprender uma língua é (inter alia) aprender e dominar essas
regras”. As regras a que Searle se refere não são apenas de cunho estrutural,
mas sim regras de uso desse idioma, regras que o individualizam e trazem
consigo não estruturas linguísticas, mas também marcas culturais do país
do qual esse idioma é língua mãe. Portanto, na tarefa de aprendizado de uma
língua, faz-se necessário ampliar a ótica de análise para além da forma, e
considerar também os aspectos pragmáticos e prosódicos que a envolvem.
Ao longo do processo investigativo, ficou patente o reducionismo dos
materiais didáticos, aqui analisados, de ensino de PLE, que abordam de forma
simplista os aspectos pragmáticos e prosódicos da língua. Fica por conta da
inferência do aluno ou da disponibilidade do professor estabelecer as relações
entre a estrutura formal da língua e os contextos interacionais adequados de
uso.
No que se refere ao ensino de pronúncia, a prosódia exerce papel
relevante na medida em que participa da caracterização de diferentes atos de
fala. No entanto, a maioria dos manuais de PLE não reserva espaço para
aspectos referentes à produção oral, sejam eles de natureza segmental ou
suprassegmental. Novamente, cabe ao professor tentar suprir as lacunas.
No âmbito do ensino de PLE, ainda são escassos pesquisas e métodos
que relacionem pragmática à prosódia. Este foi o motivo que deu origem ao
tema desenvolvido neste trabalho e também a razão pela qual parte das
117
referências aqui utilizadas teve de ser buscada em material voltado para o
ensino de inglês como língua estrangeira.
No que diz respeito aos atos de fala ordem e pedido, os dados aqui
analisados indicam que os aprendizes de português língua estrangeira
conseguem perceber e produzir regras de uso que vão além do que os
manuais e gramáticas propõem para seu ensino. Isso pode ser atribuído ao
contato dos alunos estrangeiros com falantes nativos da língua portuguesa,
uma vez que os aprendizes estão em contexto de imersão linguística.
No que tange às ordens, pôde-se observar, nos dados, que o contexto
situacional e o papel comunicativo desempenhado pelos interlocutores
influenciam diretamente nas escolhas linguísticas para a realização desse ato
de fala. Essas escolhas devem, portanto, ser compreendidas à luz dos estudos
de base pragmática. Isso leva a crer que o uso da língua em sua unidade
mínima de comunicação precisa ser considerado em todos os seus aspectos
para ser compreendido e ensinado, seja como língua materna ou estrangeira, e
não apenas sob o ponto de vista formal, como tem sido tratado pelos atuais
manuais didáticos de PLE.
Em relação aos pedidos, também se pôde observar grande relevância
do contexto pragmático para as suas produções. Dentre os informantes
estrangeiros, notou-se que não relação entre a situação discursiva e as
escolhas morfossintáticas na produção de pedidos, mas sim uma relação de
cunho prosódico. Observou-se, também, que as estruturas gramaticais usadas
não são apenas as referenciadas por Perini e Hutchinson & Lloyd. Entretanto
notou-se que os atos de fala pedido são privilegiados pelos falantes em relação
ao ato de fala ordem, por serem atos comunicativos menos agressivos à face
118
do ouvinte, e, consequentemente, por possuírem maiores chances de serem
realizados com êxito. Isso mostra que os alunos estão, de alguma forma,
atentos à situação pragmática que permeia a produção dos atos de fala ordem
e pedido.
O ensino dos atos de fala segue moldes tradicionais, focados na forma,
com ênfase em tempos e modos verbais, o que não é o suficiente para se
dominar todas as regras pragmáticas e os elementos prosódicos que permeiam
sua produção e que são de fundamental relevância para o sucesso do ato
comunicativo.
Vale pensar se os materiais didáticos consideram que cabe ao
professor o papel de apresentar aos alunos, que aprendem português como
língua estrangeira, as diversas possibilidades situacionais, estruturais e
entonacionais que podem ser usadas na produção de ordens e pedidos.
Porém, essa prática é arriscada, levando em conta a real situação do mercado
de trabalho dos professores de português língua estrangeira, que, por vezes,
não recebem a formação necessária para poderem arcar com tal
responsabilidade. Outra questão é que um pensamento ingênuo como esse
tiraria a função principal do material didático de conduzir o aluno a uma
aprendizagem eficaz (que o possibilite usar a língua aprendida para a
comunicação).
Os resultados do teste de percepção deixaram evidente que, por vezes,
o caráter prosódico se sobrepõe ao formal na identificação dos atos de fala
ordem e pedido. Isso indica, mais uma vez, que um ensino que privilegia a
forma em detrimento de aspectos pragmáticos e prosódicos não conta de
119
preparar o aprendiz de língua estrangeira para a interação comunicativa com
falantes nativos.
a interação entre fatores gramaticais, pragmáticos e prosódicos
poderá tornar mais eficiente o ensino de pronúncia em PLE, nos moldes da
proposta de Searle citada no início deste capítulo: falar uma língua é dominar
suas regras formais, pragmáticas e fonológicas.
120
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124
ANEXOS
Anexo 01 Ficha de identificação preenchida pelos participantes da
elaboração do corpus oral, realizado por meio de um DCT.
125
Anexo 02 Transcrição dos dados obtidos durante a aplicação do Teste de
Compreensão Discursiva (DCT)
N.
Identificação
Situação
01_01
Boa tarde, eu acho que eu vou dar um olho só. E se eu
preciso de uma coisa eu vou chamar você.
01_02
Professora, sou Laura quem fala, eu queria avisar é... de uma
situação, eu acho que amanha não vou poder chegar na aula
porque eu tenho uma reunião e é impossível de trocar o
horário, me desculpa e... eu acho que, eu espero que não vai
ser um problema. Eu vou, próxima aula vou chegar ao ponto.
01_03
Se ele quer crescer forte, e inteligente, tem que comer
verdura.
01_04
Estou aqui na verdade para pedir um aumento de salário. Eu
queria pedir esse aumento de salário porque eu acho que eu
trabalhei bastante para a empresa e que ela rola bem hoje,
porque eu acho que eu mereço esse aumento, não sei, o que
que você acha, eu acho que a gente poderia conversar sobre
isso, por favor.
01_05
O amor, eu acho que você tem tempo livre hoje, não. Eu vou
trabalhar muito pra entregar o trabalho amanha e seria ótimo
se você poderia pagar a conta da água da casa, então, se
você quiser eu poderia devolver uma outra coisa pra você.
01_06
Claro que sim senhor, você, o senhor tem que deixar a
bagagem pra mim, porque você não pode trazer a bagagem
no avião, sim, no avião sim, mas não com você, na sala com
os passageiros, então, por favor, eu vou me preocupar do seu
bagagem, deixa-la por favor.
01_07
Meu filho, agora você tem que parar de zuar, porque não dá
para continuar assim, você não faz nada para a escola, não
me ajuda na casa, eu não gosto isso, eu acho que as coisas
têm que mudar. Então você vai deixar o computador agora e,
por favor, arrumar o seu quarto e me ajudar para cozinhar,
agora, não dá para esperar.
01_08
Professor, por favor, isso não é muito claro para mim. Você
poderia repetir, ou explicar de novo porque eu acho que eu
tenho algumas dúvidas.
01_09
Não espera por ele e coloca as folhas sobre os papéis dele.
Ele não pode fazer isso. Se quando voltar ele não estar feliz
vou falar pra ele que ele tem que respeitar meu espaço.
01_10
Pai, por favor, eu preciso do seu carro, pode me emprestar?
Vou fazer muita atenção e, com certeza você pode me dar sua
confiança.
01_11
Boa tarde, bom, a gente vai começar com um vinho tinto, pode
ser, e depois eu estou com muita fome, não seu para os
outros, mas a gente vai tomar um grande pizza e cm certeza
126
doces depois.
01_12
Por favor, Maria, eu vou... preciso de organizar uma reunião
com os outros diretores. Ëéé... você pode combinar com eles,
e ver qual seria o melhor dia, o melhor horário, pra acomodar,
não sei, qual seria o melhor. Eu acho que pra mim eu posso:::
estar livre quando eles querem.
01_13
Oi alunos, boa tarde. Ninguém fez os exercícios, é isso? Eu
acho que não é muito profissional e eu acho que você não vãi
conseguir aprender bem e rápido, é::: o português, se você
não pratica na, fora da faculdade. A gente tem aulas dois
horas por semana, é pouco então se você não tenta de
trabalhar mais sozinho vai ser difícil. Acho que você vai perder
tempo, que você poderia chegar mais rápido ao seu objetivo.
01_14
Bom, agora vamos ver a situação da empresa hoje. Eu
preciso de conhecer todos os números, todos os, ééé::: a
questão econômica, e sem mentir eu quero, eu queria um
documento bem feito, um resumo sobre o lucro do mês
anterior, por favor, preciso isso para, rápido.
N.
Identificação
Situação
02_01
Boa tarde, eu estou procurando um, ah, uma roupa, um
vestido porque esse fim de semana eu tenho que ir pra uma
festa.
02_02
Alo, é o Amance, do curso de português, tudo bom. Eu liguei
pra você pra, só pra avisar você que infelizmente não vai ser
possível a gente se encontrar amanha que eu totalmente
esqueci mas eu marquei uma reunião exatamente no horário
da aula, então eu so queria avisar você e remarcar outro dia
02_03
Eu passei o dia inteiro pra cozinhar pra vc, você não agradece
nem vai comer. Pra mim tanto faz não nada não, você vai ter
que comer e eu so preparei coisas boas pra você, por exemplo
quiabo é igual a batata fritas, só que verde, mas você não
sabe porque você não quer experiementar.
02_04
Eu queria falar com você a respeito do meu trabalho, ou seje,
da, você sabe que faz muito tempo que eu trabalho né, na sua
empresa, eu gosto muito do, eu estou ainda gostando muito,
mas eu tenho a impressão que eu me dediquei muito mas que
a a empresa ainda não agradeceu muito aos meus esforços,
então eu queria pedir pra você alguma coisa pra, pros serviços
que eu forneci durante todos esses anos, como, não sei, uma
semana de férias ou um aumento de salário.
02_05
Oi querida, eu te falei que eu recentemente fiquei muito
ocupado, fiquei com as, eu fiquei, (pausa) eu trabalhei muito e
eu não te teve muito tempo de cuidar dessas coisas, hoje
também vou ter que correr, correr pra, pra empresa de um
cliente e cuidar do meu negocio, então eu queria saber se
você, se você pode ao lugar de mim ir ao banco e pagar as
contas, que eu não vou poder hoje.
127
02_06
Precisa sim. Se o senhor (tosse) pode deixar sua mala se não
não vai poder (tosse) entrar no avião com essa bagagem,
então (pausa), é, eu vou pedir pra você deixar a bagagem com
a gente, que a gente vai cuidar dela.
02_07
Oi menino, eu percebi ultimamente que você não ficou muito
preocupado com as escolas e a sua mãe reclamou que você
não estava, não ajudava muito ela, nem sua irmã, nem mim,
então eu queria que você seja mais legal com a sua família e
também mais dedicado aos estudos.
02_08
Desculpe senhora mas, faz uma hora que eu to na sua aula e
ate agora não entendi nada. Eu vou precisar de mais tempo,
eu acho, ou o melhor será você falar menos rápido ou em
português certinho, que assim não dá.
02_09
Eu sinto muito mas vou ter que pedir você tirar todas as suas
coisas do, da mesa que assim não tem como. Eu ate hoje não
falei nada que o seu desarrumado ficava na sua mesa, mas
agora não dá. Você vai ter que ou mudar o seu jeito de
trabalhar ou eu vou embora e achar uma outra mesa.
02_10
Oi pai, eu esqueci de falar mas no fim de semana que vem eu
tenho festa de uma amiga minha que mora a uns 25
quilômetros daqui. Eu queria emprestar o seu carro, que eu
também vou ter que levar 6 ou 7 amigos pra lá, e ninguém tem
carro, então queria saber se você pode emprestar o carro pra
mim. Eu vou devolver o dia depois sem problemas. Eu vou
dormir lá.
02_11
Não sei, o meu amigo conhece o cardápio, talvez ele sabe o
que que é melhor pra mim.
02_12
Oi meu bem, eu preciso da sua ajuda. Vou pedir um favor pra
você. Vou querer marcar uma reunião com os diretores, é
bastante urgente. Tem como você ligar pra eles e marcar
segunda as seis horas? Obrigada.
02_13
Então, eu sei que vocês se deram bem na prova de vestibular
e que vocês estão muito feliz agora, vocês trabalharam muito
por isso e eu admiro vocês por isso, mas não quer dizer que
agora vai ser tudo fácil. Vocês vão ter que estudar, continuar
estudando e fazer as tarefas que se não não vai dar vocês vão
repetir muitos anos e nunca vão ter as oportunidades de .. as
boas oportunidades para assistir a um estágio ou arrumar um
trabalho sendo tão pouco sério.
02_14
Boa tarde. Eu vou precisar de um relatório a respeito dos
lucros do mês anterior. Eu pensei em você (pausa) e eu quero,
queria que você faça isso pra mim, se você tiver tempo.
N.
Identificação
Situação
03_01
Eu queria um vestido para usar essa noite para ir a um festa.
03_02
Oi professora, eu queria dizer que eu estaja com doença, eu
não posso atender a aula.
03_03
Olha filho, você tem que comer a verdura pra ficar forte.
128
03_04
Eu queria falar sobre o meu salário eu acho que eu mereço
uma, um salário maior porque eu to trabalhando muito bom.
03_05
Querido, você pode ir ao banco pra, para pagar as contas pra
mim, por favor.
03_06
Senhor, por favor, me dá a mala.
03_07
Desliga esse computador, quero que você estuda agora.
03_08
Com licença, professora, eu não entendo. Você pode repetir,
por favor.
03_09
Que bagunça é essa. Pode arrumar isso pra mim, por favor.
03_10
Pai, pode me emprestar o carro no fim de semana por favor.
03_11
Eu queria um vinho verde, por favor, e um frango assado.
03_12
Você poderia marcar uma reunião pra mim na sexta-feira, por
favor.
03_13
Se você não fazer o trabalho eu não posso te dar uma nota
agradável.
03_14
Eu queria de um relatório de vocês ate na semana que vem.
N.
Identificação
Situação
04_01
Boa tarde, eu vou a uma festa com amigos, tranquilo, eu
queria comprar um roupa legal, o que você tem, o que eu
posso comprar aqui?
04_02
Olá professor, beleza, eu cou Eric, eu tenho um pequeno
problema porque eu não posso ir na aula de português
amanha porque eu tenho que ir na outro lugar. Nos podemos
marcar para um outro dia se isso é possível. Obrigada.
04_03
Você deveria comer as verduras porque é bom para saúde,
para ter vitaminas e para ser forte como Popeye. Eu fiz isso
para você, você deveria se alegrar comigo, tentar
experimentar e comer um pouco o que eu fiz pra você.
04_04
Olá patrão, eu queria saber uma coisa, eu estou na empresa
desde muitos tempos, eu trabalho muito bem, você nunca fez
criticas sobre meu trabalho, é, eu queria saber se pode ser
possível de eu receber um pouco mais dinheiro, porque eu
estou aqui desde dez anos, quinze anos, nunca teve
problema, então eu espero uma resposta rápida.
04_05
Amor, você pode ir na banco para fazer o pagamento das
contas que nos acabamos de receber, eu não posso ir hoje
porque eu estou muito ocupado no trabalho e outras coisas.
Você pode ir para mim, obrigada.
04_06
Desculpe, eu queria ter seu mala para fazer um cheack in
completo, você pode me dar, eu vou fazer registração,
Obrigada.
04_07
Pare de jogar no computador, nos temos que, você nos ajudar
a fazer tarefas domésticas, por exemplo, você pode tentar
limpar sua quarto que é muita suja, e não pode continuar
assim. Pare e ajude-nos.
04_08
Professora, eu tenho um problema, eu não entendo o que
você acabou de dizer, você pode repeter ou dar mais
129
explicações, faz favor.
04_09
Eu tenho que trabalhar, você pode tirar seus papeis e outras
coisas da minha mesa, porque está cheia? Você deveria
organizar a um pouco mais sua mesa para ter mais espaço,
obrigada, se você pode fazer isso vai ser o melhor para nós.
04_10
Pai, eu preciso usar o carro para a próxima fim de semana
para ir na uma festa com amigos. Você pode me emprestar o
carro, faz favor?
04_11
Garçom, nos queremos tomar um chopp, se você tem um
chopp gelado, faz favor.
04_12
Cara secretária, preciso que você marca uma reunião com os
diretor da empresa, daqui um semana que vem, se você pode
fazer isso vai ser legal para mim, obrigada.
04_13
Alunos você tem que fazer suas trabalha, seus trabalhos, na
tarefas de casa, se você não vai fazer eu vou não fazer para
vocês. Eu acho que é o melhor maneira, melhor jeito de
aprender é de fazer o trabalho da casa, se você não vai fazer
isso você não vai memorizar e não pode lembrar tudo o que
nos vamos aprender em sala.
04_14
Vai sar daqui um pouco fim de ano e eu queria saber o que
você fez no seu trabalho para saber o que funciona e o que
não funciona, para tentar melhorar e para fazer correção para
o ano que vem.
N.
Identificação
Situação
05_01
Obrigada, eu prefiro ver primeiro sozinho, se eu precisa ajuda
de você eu volta pra você, porque eu tenho preferência
pessoal e eu queria ver primeiro sozinho, obrigada.
05_02
Olá Andréa, desculpa, eu marquei hoje reunião com meus
parceiros de trabalho. Nos podemos desmarcar ou trocar o
horário de aula, por favor? Obrigada.
05_03
Olha, você conhecer o desenho Popai. Ele come sempre
coisas verdes pra crescer e tem energia pra briga com Brutos.
Então melhor você come, ou então você fica sempre pequeno
como agora.
05_04
Senhor, eu marquei reunião com você por causa eu trabalha
agora muito tempo aqui, meu ultimo aumento de salário é ja
muito tempo atrás. Eu quis perguntar se tem uma possibilidade
real sobre um aumento de salário.
05_05
As contas de luz, de água chegam hoje, eu não tenho tempo
hoje. Você pode ir pra o banco e paga as taxas de juros, ou se
você não vai eles desligam o luz e nós ficamos sem energia
aqui.
05_06
Senhor, se você me não dá o mala, você pode ficar com ele,
mas com esse tamanho de mala você não pode entrar o avião.
Os companheiros de avião que vão com você não te deixam
entrar e se você fazer bagunça eles chamam o segurança de
aeroporto e eles la é obrigatório de entregar o mala. Então
130
você pode escolher agora ou você vai perder o seu vôo ou sua
mala.
05_07
Filho, você pode ajudar ou não? Todo mundo aqui em casa
ajuda, todos tem tarefas próprias, mas só você não liga pra
essa coisa. Olha, você quer um novo computador para novos
jogo? Se você quer, você pode esquecer, se você não ajuda
não recebe.
05_08
Como funciona essa, eu não entende a coisa direito. Você
pode repetir por favor?
05_09
Olha, você deixa sua coisas na sua lugar, na sua mesa, por
favor. Mas se isso acontece de novo, eu tenho aqui uma coisa
que destruir papel, se você chega aqui de novo eu vou jogar
essa daí dentro e você tem que escrever tudo de novo,
arrumar tudo de novo.
05_10
Pai, você pode me emprestar o carro? Eu queria ir a um
festival com meus amigos. Tem possibilidade de você me
emprestar o carro?
05_11
Boa tarde, eu queria um cerveja e o prato principal
vegetariano.
05_12
A senhora pode marcar uma reunião com meus parceiros?
Melhor você manda um e-mail, todo mundo pode ler. Pede
eles uma resposta, se eles podem ir ou não.
05_13
O senhor pode entregar os exercícios para a próxima aula, por
favor? Porque eles são importantes para as notas, e eu não
sei que, o senhor quer ficar sem grau, grau I, eu tenho que
avisar você, e para isso o matéria para casa é muito
importante.
05_14
Com licença, você pode entregar logo os referentes aos lucros
do ultimo mês, se não todo mundo aqui vamos passar por uns
problemas porque nos recebemos o fiscalização de ministério
de fazenda aquim eu acho que não é bom para a reputação da
nossa empresa.
N.
Identificação
Situação
06_01
Boa tarde, eu quero um vestido para uma festa esteno fim de
semana, eu gosto dos cores pretas e sombras e um vestido
bem largo porque eu quero dançar mas sem que eu esteja
com vergonha.
06_02
Bom dia professora, eu queria me desculpar porque eu não
vou poder ir na aula de português, é: porque já marquei um
horário com outro amigo.
06_03
Se você comer verduras vai ter um bolo de chocolate em
sobremesa.
06_04
Eu acho que trabalhei muito para a sua empresa, que mereço
alguma compensação, então gostaria que eu tivesse mais
dinheiro em cada mês.
06_05
Oi querido, eu não tenho tempo de ir pra o banco, então se
você tiver o tempo de ir pra mim seria ótimo.
131
06_06
Desculpa senhor, mas eu preciso de sua mala pra fazer o
cheack in, se não vai ter problemas.
06_07
Eu decidi de vender o computador porque você sempre está
fazendo coisas com o computador e não, você não arruma o
seu quarto, você não trabalha pra, você não estuda para a
escola, então, tem que atuar.
06_08
Desculpa, professora, eu não entendi a pergunta, se você
poderia repetir seria bom pra mim.
06_09
Eu preciso do meu espaço de trabalho então com as suas, os
seus papeis na minha mesa não posso, tire as suas coisas,
por favor.
06_10
Oh pai, sabe, eu vou para uma festa este fim de semana,
então, seria possível que você me empreste o seu carro, dá
pra ir até, até Ipanema com o seu carro?
06_11
Eu gostaria a mesma coisa que o meu amigo vai pegar.
06_12
Por favor, preciso de marcar um horário com os outros
diretores da empresa, se for possível faça isso pra esta tarde.
06_13
Gente, tem um, é, quando::, É::ser aluno significa estudar um
pouquinho na casa, não é bastante ficar aqui na mesa da aula
sem fazer nada, então espero que a semana que vem vocês
vão fazer o exercício que eu vou dar pra vocês.
06_14
Boa tarde, eu preciso dum relatório dos lucros do mês anterior,
e faça isso pra mim, por favor, porque eu não tenho tempo
esta semana.
132
Anexo 03 Ficha de identificação e instruções recebidas pelos participantes do
teste de percepção.
FICHA DE IDENTIFICAÇÃO
Nome:
Sexo:
(x,y)
( ) M [x] ( ) F [y]
Idade:
( ) A 15 a 20 anos ( )B 21 a 30 anos
( ) C 31 a 40 anos ( )D 41 a 55 anos
( ) E acima de 55 anos
Profissão:
Contato:
(e-mail e/ ou tel.)
Instruções
Você vai ouvir sentenças em português, faladas por pessoas
estrangeiras.
Indique no formulário, da próxima página, a opção em que
melhor se enquadra o que você ouviu.
No caso de optar por „outro‟, especifique sua opinião usando
apenas uma palavra. OBS.: Algumas idéias para a opção
„Outro‟: dúvida, afirmação, desejo, ameaça, interrogação,
entre outras coisas que você possa entender ao ouvir a
gravação.
Muito obrigada pela sua colaborão!
133
Anexo 04 Formulário preenchido durante o teste de percepção
TESTE DE PERCEPÇÃO
01) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
02) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
03) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
04) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
05) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
06) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
07) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
08) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
______________
09) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
10) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
11) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
12) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
13) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
14) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
15) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
16) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
17) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
18) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
19) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
20) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
21) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
22) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
23) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
24) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
______________
25) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
26) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
27) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
28) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
29) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
30) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
31) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
32) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
33) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
34) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
35) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
36) ( ) Ordem
( ) Pedido
( ) Outro:
_____________
134
Anexo 05 Transcrição das sentenças ouvidas pelos juízes
N.
Sentença
1
Você vai deixar o seu computador agora
2
Desliga esse computador
3
Eu queria um relatório de vocês
4
Você pode ir para mim
5
Você pode ir para o banco e paga os taxas de juros
6
Faça isso para essa tarde
7
Você pode me emprestar o carro
8
Você poderia repetir ou explicar de novo
9
Pode repetir
10
Você pode tratar de limpar sua quarto
11
Eu queria um cerveja e o prato principal vegetariano
12
Você poderia repetir
13
Você pode em lugar de mim ir pro banco e pagar as contas
14
Você pode me emprestar o carro
15
Tem possibilidade de você emprestar o carro
16
Preciso de marcar um horário com os outros diretores da
empresa
17
Eu espero uma resposta rápida
18
Empreste o seu carro
19
A senhora pode marcar uma reunião com os meus parceiros
20
Me da a mala
21
Você pode repetir ou dar mais explicaçaos
22
É melhor você mandar um email todo mundo pode ler
23
Preciso dum relatório dos lucros do mês anterior
24
Eu queria um documento bem feito
25
Pode me emprestar o carro no fim de semana
26
Nos queremos tomar um Chopp, se você tem um chopp gelado
27
O senhor pode entregar os exercícios para o próxima aula
28
Faça isso pra mim
29
Você tem que comer a verdura
30
Você pode tirar seus papeis e outras coisas da minha mesa
31
Você pode entregar logo os referentes aos lucros do ultimo mês
32
Eu queria um vinho verde
33
Você tem que fazer suas trabalhas
34
Gostaria que eu tivesse mais dinheiro a cada mês
35
Quero que você estuda agora
36
Você poderia marcar uma reunião pra mim na sexta feira
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