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uma simplificação teórica que poderia ser comparada à eliminação
gradual dos detalhes na técnica de um escultor como
Michelangelo. O outro é o estabelecimento por Melanie Klein da
inveja no lugar proeminente que lhe concedeu em Genebra, em
1955. Não nos é possível fazer avançar o debate científico, a
menos que estejamos preparados para pôr de lado ambos estes
conceitos, desvinculando o primeiro de Freud e o segundo de
Melanie Klein. Desta maneira, libertamo-nos de crenças e de
lealdades, e mais uma vez a única coisa pela qual temos apreço é
a verdade (1989h, p.348)
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.
Partindo da premissa de que tanto para Freud quanto para Winnicott a
psicanálise é uma ciência de certo tipo de fatos clínicos - mesmo que não
possa ser considerada uma ciência factual madura
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-, Loparic, apoiado no
conceito de paradigma e na formulação de como ocorrem as revoluções
científicas, segundo Thomas S. Kuhn, postula que Winnicott deu início a uma
mudança paradigmática na psicanálise que vem produzindo uma revolução
nessa disciplina. Segundo Kuhn, uma revolução acontece numa ciência
quando, devido a um acúmulo de problemas insolúveis (anomalias) no
paradigma vigente, se inicia uma pesquisa denominada revolucionária, com o
intuito de resolvê-los, ao mesmo tempo em que abrange os antigos, e da qual
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No editorial da Revista Brasileira de Psicanálise, vol.36 (4): 731-736, 2002, dedicado à obra
de Winnicott, o psicanalista João Baptista N. F. França, comenta que H. Thorner, psicanalista
da Sociedade Britânica, numa palestra que proferiu no Rio de Janeiro, quando questionado a
respeito de Winnicott, respondeu que este tinha medo da agressividade. Coisa que como
podemos ver pela citação que deu origem a esta nota, está muito longe de ser verdade. Talvez
essa percepção de Thorner, venha de uma carta que Winnicott lhe escreveu a respeito de um
artigo que Thorner havia lido na Sociedade Britânica de Psicanálise. Nessa carta Winnicott
escreveu: “Tenho certeza de que você sabe exatamente o que tem em mente quando diz:
partes perigosas...derivadas da pulsão de morte..devem ser expulsas”, etc, etc. Eu mesmo não
sei o que você quer dizer, e pelo menos metade da Sociedade deve sentir que você está
dizendo “pulsão de morte”, em vez de usar as palavras “agressividade” e “ódio”. Você talvez
ache que isso não tem importância, e não tem mesmo, no contexto do seu ensaio, mas seria
realmente útil para a Sociedade se conseguíssemos descobrir uma linguagem comum.
Qualquer hora dessas, quando você não tiver nada para fazer, que tal reescrever aquela frase
sem usar as palavras “pulsão de morte”, só por minha causa?”(1987b, p.186).
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“Uma ciência factual madura é o quadro no qual se desenvolve uma atividade de resolução de
problemas semelhantes a quebra cabeças. A estrutura interna desse quadro é caracterizada
por uma maneira de ver o mundo e de falar sobre ele, compartilhada por um grupo
institucionalizado, estruturada como um paradigma ou uma matriz disciplinar” (Loparic, 2006,
p.2)