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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MARIA DILMA PONTE DE BRITO
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS PROFESSORES DE MATEMÁTICA DO
ENSINO FUNDAMENTAL ACERCA DOS ALUNOS DA ESCOLA PÚBLICA
TERESINA – 2009
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MARIA DILMA PONTE DE BRITO
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS PROFESSORES DE MATEMÁTICA DO
ENSINO FUNDAMENTAL ACERCA DOS ALUNOS DA ESCOLA PÚBLICA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Educação PPGEd, do Centro de Ciência da
Educação da Universidade Federal do Piauí UFPI, como
requisito para obtenção do título de Mestre em Educação,
na Linha de Pesquisa Educação, Movimentos Sociais e
Políticas Públicas, sob a orientação do Professor Doutor
Luís Carlos Sales.
TERESINA – 2009
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MARIA DILMA PONTE DE BRITO
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS PROFESSORES DE MATEMÁTICA DO
ENSINO FUNDAMENTAL ACERCA DOS ALUNOS DA ESCOLA PÚBLICA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação PPGEd, do Centro de
Ciência da Educação da Universidade Federal do
Piauí-UFPI , como requisito para obtenção do título de
Mestre em Educação, na Linha de Pesquisa Educação,
Movimentos Sociais e Políticas Públicas, sob a
orientação do Professor Doutor Luís Carlos Sales.
BANCA EXAMINADORA
Professor Doutor Luís Carlos Sales (Orientador) - UFPI
Professor Doutor Luiz Botelho Albuquerque – UFC
Professora Doutora Maria da Glória Soares Barbosa Lima – UFPI
AGRADECIMENTOS
Meus agradecimentos especiais ao meu esposo José Ademir de Brito, aos filhos, Breno Ponte
de Brito e Dante Ponte de Brito, que compreenderam minha ausência física e espiritual. Física
durante o período que estive em Teresina para cursar as disciplinas do Mestrado e espiritual
depois do meu retorno, enquanto dediquei-me as leituras, escritas e reflexões para concluir
minha dissertação. Obrigada! Amo vocês!
Minha gratidão a Professora Doutora Luciana Matias Cavalcante, que sempre me incentivou a
ingressar no Mestrado e dedicou parte de seu precioso tempo me acompanhando em toda
trajetória, lendo meus escritos, discutindo comigo e me fornecendo material importante para
meu trabalho. Obrigada Lu!
Obrigada, Professora Mestranda Rossana Carvalho e Silva Aguiar, você está presente em
todos os momentos de minhas produções literárias e agora você contribuiu de forma relevante
na qualidade dessa dissertação, revisando meu trabalho com muito carinho. Fico muito grata!
Agradeço também a vocês, professores interlocutores, por terem dedicado parte de seu
precioso tempo respondendo minhas indagações. Suas contribuições foram importantes e
valiosas. Obrigada mesmo!
Professor Doutor Luís Carlos Sales, meu orientador, foi com muita sabedoria,
disponibilidade e paciência que você me acompanhou nessa construção. Como engenheiro e
educador você me orientou, guiando meus passos e observando cada tijolo, cada parede
erguida nessa obra. Enfim, ela está pronta. Obrigada pelos ensinamentos e pela orientação.
Dedico este trabalho a todos os educadores que
cotidianamente estão a ensinar e aprender, sempre
abertos a repensar o pensado.
“Levando em conta a preocupação geral com a Educação Matemática no
mundo todo e os investimentos nessa área, uma conclusão se torna
inevitável: o ensino da matemática é uma atividade humana assombrada
pelo fracasso. Na esperança de exorcizar o fracasso as pesquisas apostam
na mudança da escola, da sala de aula, mudança do aluno, mudança do
professor”.
Roberto Ribeiro Baldino
RESUMO
O objetivo deste estudo é analisar as representações sociais do professor de
Matemática do Ensino Fundamental acerca do aluno da escola pública, a fim de
estabelecer um paralelo entre essas representações e as práticas dos professores,
assumidas em sala de aula, diante do lócus escola blica e particular. Para a
consecução desse objetivo, elencamos algumas categorias teóricas para análise: as
Representações Sociais de Moscovici, o Habitus de Bourdieu, o público e o privado na
educação brasileira. Utilizamos uma metodologia quanti/qualitativo de natureza exploratória
descritiva. As entrevistas aplicadas aos professores foram semi-estruturadas e os dados foram
estudados por meio de análise de conteúdo, categorizados segundo Bardin (1977). Os
resultados apontam para uma representação de aluno da escola pública como um sujeito
diferente daquele que frequenta a escola particular, principalmente, quanto às condições
sociais precárias vividas por esse aluno. Atribui o seu despreparo à ausência do
acompanhamento da família, apresentando os pais com formação inadequada e, portanto,
incapazes de contribuir na formação dos filhos. Esta descrição nos aproxima de uma visão
estereotipada deste público e colabora para desqualificar a atuação docente. A escola pública
foi representada como uma escola de estrutura precária, onde a direção e coordenação não
estão presentes para motivar e cobrar dos alunos e professores empenho nas atividades,
colaborando para tornar essa escola transigente. Diante desse cenário, os elementos que
formam esse olhar colaboram para a reprodução de situações de exclusão em que se
encontram os representantes das camadas populares, pois recebem formação de segunda
ordem, dificultando seu ingresso numa Instituição de Ensino Superior, bem como na
competição própria do mercado do trabalho. A escola pública possui caráter político, próprio
a todo aparato educacional, com uma dimensão fortemente articulada à condição de classe e à
transformação social. Na contemporaneidade esse espaço escolar encontra-se marcado pelas
contradições sociais próprias da sociedade capitalista, portanto, caracteriza-se como espaço
também de conflito, retratado em suas condições estruturais, pedagógicas e em sua dimensão
cultural.
Palavras-chave: Professor(a) de Matemática. Aluno da escola pública. Representações sociais.
ABSTRACT
The goal of this study is to analyze the social representations of Fundamental Teaching
Mathematic Teachers about state school students in order to establish a parallel between the
social representations and the practices taken by teachers in both public and private school
classrooms. To have the goal achieved some theoretical categories were listed: the social
representations of Moscovici; Bourdieu’s Habitus; and public and private Brazilian education.
It was used an exploratory descriptive methodology exploiting both quantitative and
qualitative approaches. The interviews applied to the teachers were semi-structured and the
data were studied by means of content analyzes and categorized in agreement with Bardin
(1977). The results lead to a representation of the public school student as a different subject
from the one that attend private schools, mainly because of the precarious social condition
that this student has to face to live on. It attributes the student unpreparedness to the lack of
family attendance, presenting parents with improper education and incapable to contribute
and educate their children. The present portrait brings a stereotypical view of this audience
and cooperates to disqualify the teachers’ acting. The public school was represented as a
school with an insufficient structure where managers and coordinators are not present to
motivate and gather students and teachers engaged on activities, contributing to make the
school tolerant. In face of this scenario, the elements molding this view collaborate to
reproduce situations of exclusion where the representatives of the popular layer can be found
because they receive a second class education. It complicates the student intention to attend
both university and job market. The public school has a political feature that is self to every
educational system. It is strongly articulated to a class condition and to a social
transformation. In the contemporaneity the school space is marked by social contradictions
inherent to a capitalist society so it is as well characterized as a space of conflict that is
portrayed by its structural and pedagogical conditions and also in its cultural dimension.
Key-words: Mathematic teacher. Public school student. Social representations
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Fatores que justificam o baixo nível dos alunos da escola pública na
perspectiva docente......................................................................................
59
Tabela 2 - Fatores que dificultam o ensino na Escola Pública atribuídos pelos
professores de Matemática do Ensino Fundamental de Parnaíba.................
65
Tabela 3 - Fatores que diferenciam a aprendizagem do aluno da escola pública em
relação aos alunos da escola particular.........................................................
68
Tabela 4 - Motivos que levam o professor de Matemática a repassar de forma
diferente o conteúdo programático na escola pública e na escola
particular........................................................................................................
72
Tabela 5 - Fatores que prejudicam o aproveitamento dos alunos da escola pública na
disciplina Matemática...................................................................................
79
Tabela 6 - Fatores que influenciam a motivação da aprendizagem da disciplina
Matemática tanto na rede pública como privada...........................................
83
Tabela 7 - Fatores apontados pelos professores que influenciam seus pares mudar a
metodologia de ensino na rede pública.........................................................
86
Tabela 8 - Fatores que levam o professor entrevistado mudar a metodologia ao
lecionar na escola pública.............................................................................
91
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1
Perfil dos entrevistados quanto à atuação nas redes de ensino público e
privado............................................................................................................ 54
Gráfico 2
Perfil dos entrevistados quanto ao gênero...................................................... 55
Gráfico 3
Perfil dos entrevistados quanto ao tempo de experiência no magistério....... 56
Gráfico 4
Fatores que justificam o baixo nível dos alunos da escola pública na
perspectiva docente........................................................................................ 60
Gráfico 5
Fatores que dificultam o ensino na Escola Pública atribuídos pelos
professores de Matemática do Ensino Fundamental de Parnaíba.................. 65
Gráfico 6
Fatores que diferenciam a aprendizagem do aluno da escola pública em
relação ao aluno da escola particular............................................................. 68
Gráfico 7
Motivos que levam o professor de Matemática a repassar de forma
diferente o conteúdo programático na escola pública e na escola
particular........................................................................................................ 73
Gráfico 8
Fatores que prejudicam o aproveitamento dos alunos da escola pública na
disciplina Matemática.................................................................................... 79
Gráfico 9
Fatores que influenciam a motivação da aprendizagem da disciplina
Matemática tanto na rede pública como privada............................................
83
Gráfico 10
Fatores apontados pelos professores que influenciam seus pares mudar a
metodologia de ensino na rede pública.........................................................
86
Gráfico 11
Percentual relativo à mudança de metodologia na rede pública.................... 90
Gráfico 12
Fatores que levam o professor entrevistado a mudar a metodologia ao
lecionar na escola pública..............................................................................
91
LISTA DE FIGURAS
Figura 1
- Representações sociais dos professores de matemática acerca dos alunos
da Escola Pública................................................................................... 95
Figura 2
- Representações sociais dos professores de matemática acerca da Escola
Pública...................................................................................................... 96
Figura 3
- Representações sociais dos professores de matemática acerca do professor
de Escola Pública...................................................................................... 97
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................12
CAPÍTULO I - CULTURA, FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
PROFISSIONAL DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA E A PRÁTICA
PEDAGÓGICA .........................................................................................................20
1.1 Ensino e propostas pedagógicas: modelo tradicional.............................................23
1.2 Ensino e proposta pedagógica: modelo reflexivo.................................................. 26
CAPÍTULO II - O PÚBLICO E O PRIVADO NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO
BRASILEIRA E O DESEMPENHO ESCOLAR CONFORME AS
TEORIAS....................................................................................................................29
2.1 A história da educação brasileira: breve relato.......................................................30
2.1.1 As camadas populares e a escola pública............................................................34
2.2 O desempenho escolar conforme as teorias............................................................36
CAPÍTULO III TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E O
CONECEITO DE HABITUS DE PIERRE BOURDIEU..................................... 41
3.1 Representações sociais: conceitos e bases teóricas................................................42
3.2 Pierre Bourdieu e o conceito de habitus.................................................................47
CAPÍTULO IV - APORTE METODOLÓGICO....................................................51
4.1 Procedimentos de coleta de dados..........................................................................52
4.2 Caracterização dos sujeitos envolvidos no estudo..................................................53
4.3 Análise de dados.....................................................................................................57
CAPÍTULO V - ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS......................................59
CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................98
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
....................................................................103
12
INTRODUÇÃO
Como evidencia Baldino (1998), na epígrafe desse trabalho, o conteúdo da
disciplina Matemática é “assombrado pelo fracasso”, apontando para a necessidade de
mudanças ligadas principalmente à estrutura da escola, bem como aos aspectos didáticos do
trabalho educativo. Diante das dificuldades encontradas por alunos e professores no processo
de ensino e da aprendizagem da Matemática, reveladas nos índices de avaliação, segundo
dados do Ministério de Educação e Cultura - MEC, Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO
1
e baseada em estudos sobre as representações
sociais, desenvolvidos por Sales (2000) e Lima (2006), surgiu nosso interesse em pesquisar
as representações sociais do professor de Matemática acerca do aluno da escola pública.
Trata-se de uma pesquisa inédita dentro do Programa de Pós Graduação em Educação do
Centro de Ciências da Educação da Universidade Federal do Piauí UFPI, pois, para além
das mudanças estruturais e didáticas do trabalho educativo no campo da Matemática é
preciso refletir sobre as Representações Sociais, as ideias pré-concebidas que fazem parte do
trabalho do educador. Nesse sentido, desenvolvemos esse estudo focalizando três pontos
importantes: o professor de Matemática, o aluno da escola pública e as Representações
Sociais dos professores.
A postura do professor de Matemática se destaca dos demais professores, pois muitas
vezes é construída sob o estigma da matéria que ministra, uma vez que está lidando com uma
disciplina caracterizada como “difícil” e que o aluno necessita de bagagem de conhecimentos
prévios, acumulados de séries anteriores, visto que o raciocínio lógico-matemático prevê
certo nível de abstração intrínseco ao próprio saber. O nível de reprovação em Matemática é
bem maior que em todas as outras disciplinas e nem por isso o professor fica constrangido
em reprovar mais da metade da turma, que esse fenômeno se tornou natural nessa área de
conhecimento.
Se observarmos a formação do professor de Matemática e a metodologia empregada
para desenvolver a disciplina de forma mais eficaz, temos que nos reportar à história do
professor e sua formação, visto que até o século XIX, segundo Miguel, Garnica e
D’ambrósio (2004), a maioria dos professores de Matemática eram engenheiros e não era
exigido a esse profissional nenhum conhecimento especial para lecionar. A partir do século
XX, com a implantação das universidades e com a diversificação de cursos superiores, os
1
Esses dados serão apresentados na página 15 deste estudo.
13
engenheiros passaram a concorrer com economistas e administradores e mais tarde com os
egressos dos cursos de formação de professores em Matemática, que segundo entendimento
de Perez (1999, p. 269), essa “formação clássica desse profissional, ainda hoje é muito
discutida, necessitando ser transformada e concebida na perspectiva do desenvolvimento
profissional”
2
.
Considerando que as camadas populares constituem a grande maioria da população
brasileira, e que este contingente frequenta a escola pública ela foi também o foco de nosso
estudo, porque as altas taxas de repetência e evasão são bastante elevadas nas instituições de
ensino, o que evidencia um déficit de aprendizagem maior que nas escolas da rede privada,
portanto extremamente insatisfatória do ponto de vista qualitativo. Para Soares (1992, p. 5-6),
“[...] o fracasso escolar dos alunos pertencentes às camadas populares, comprovado pelos
altos índices de repetência e evasão, mostra que vem ocorrendo uma progressiva
democratização do acesso à escola, não tem igualmente ocorrido à democratização da
escola.” Patto (1999, p. 10) ratifica esse pensamento quando aponta a escola pública como
representada como “escola humilde”, de “professores humildes” e de “alunos e famílias
humildes”. A escola pública é estereotipada negativamente, os professores e alunos
desvalorizados e são integrantes de famílias que carregam o peso cotidiano de muitas formas
de exclusão.
A Matemática faz parte do nosso cotidiano e serve de instrumento para diversas áreas
do conhecimento. O papel da Matemática na sociedade tem sido de grande valor desde a
antiguidade. Hoje esse papel tem ainda maior importância porque a Matemática está integrada
ao planejamento tecnológico, à economia e à vida social de modo geral, tornando-se parte
essencial da formação dos indivíduos. Segundo Bicudo (2004, p. 53), “o dever da educação
matemática não é apenas ajudar os estudantes a aprender certas formas de conhecimento e de
técnicas, mas também convidá-los a refletirem sobre como essas formas de conhecimento e de
técnicas devem ser trazidas à ação”.
Compreendemos que aprender Matemática na sociedade da informação e do
conhecimento se faz necessário, mas as dificuldades encontradas por alunos e professores no
processo de ensino e da aprendizagem da Matemática são reveladas nos índices de avaliação
da aprendizagem. Em muitos casos, o aluno não consegue entender a Matemática que a
escola lhe ensina, elevando o índice de reprovação, ou então, mesmo que aprovado, sente
2
Entende-se por desenvolvimento profissional, a evolução e a continuidade da educação inicial, incluindo
conhecimentos, habilidades, atitudes e uma cultura que envolva o ensino reflexivo e o trabalho colaborativo,
entre outros fatores.
14
dificuldades em utilizar o conhecimento visto na escola. Em síntese, grande parte dos alunos
não consegue efetivamente ter acesso a esse saber de fundamental importância para sua vida.
Ensinar Matemática requer tanto a construção do raciocínio lógico, em nível abstrato,
quanto sua consolidação, vinculando-o à realidade. Esse contexto remete à construção de uma
imagem distorcida dessa área do saber, estabelecida geralmente desde os primeiros contatos,
muitas vezes responsável pelas dificuldades crônicas identificadas no âmbito do ensino e da
aprendizagem. Diante das características de precisão, de rigor, de neutralidade da disciplina,
forma-se essa visão de complexidade. Ao profissional da Matemática, o professor, cabe a
tarefa de romper o estigma da dificuldade atribuída a esta área do conhecimento. Cabe a ele a
árdua missão de quebrar esse paradigma e aproximá-la de sua utilidade prática, relacionando
o conhecimento matemático ao cotidiano do aluno, atribuindo significados aos conteúdos
trabalhados, contribuindo para romper com o mito da Matemática como algo inacessível.
Nesse sentido, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1998), ao proporem um
trabalho com temas transversais, acabam gerando no professor uma expectativa de superação
dessa problemática, pois propõem temas emergentes na sociedade, tais como Trabalho e
consumo, Meio ambiente, Ética, Saúde, Orientação sexual e Pluralidade cultural que abrem
espaço para integrar os conteúdos curriculares ao cotidiano do aluno. Entretanto, a perspectiva
da interdisciplinaridade que proporcionaria essa integração não se consolidou na prática
diante do modelo estanque de organização do saber presente em nossas escolas.
Os PCN/1998 são norteadores para a elaboração de Currículos de todas as disciplinas
do Ensino Fundamental e Ensino Médio. Esses Parâmetros, que estão organizados no Ensino
Fundamental em dois ciclos (Ciclo I - 1
a
e 2
a
série; e Ciclo II - 3
a
e 4
a
série), têm como
propósito fazer com que os alunos passem a pensar matematicamente, desenvolver formas de
raciocínio, estabelecer conexões entre temas de matemática e outras disciplinas, desenvolver a
capacidade de resolver problemas e até propor novos problemas. É nessa fase escolar que o
raciocínio lógico-matemático é enfatizado no que concerne às noções iniciais, tais como o
conhecimento espacial, as representações numéricas quanto a quantidade, acréscimos e
retiradas presentes na adição/multiplicação, subtração/divisão, a capacidade de interpretar
situações-problema, enfim, são conhecimentos necessários à aquisição de conteúdos mais
complexos que serão apresentados no decorrer de sua formação, nas séries subsequentes.
Esse panorama de aprendizagem é elemento de reflexão dos educadores entrevistados
nessa pesquisa, pois apresentam o déficit cognitivo nas séries iniciais do Ensino Fundamental
como justificativa para o baixo rendimento dos alunos da escola pública.
15
Para Bicudo (2004), a Educação Matemática deve ir além de ajudar os estudantes a
aprender certas formas de conhecimentos e de técnicas, estabelecendo confrontos com as
situações concretas presentes no cotidiano desses educandos, levando-os a refletirem e
lidarem com esses conhecimentos de forma prática.
Dentro do magistério, um grande descontentamento em relação à baixa
aprendizagem do aluno. Segundo dados da pesquisa feita pela UNESCO e pela Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico em 2003
3
, onde foram testados estudantes
de 41 países, na faixa de 15 anos de idade, de escolas públicas e particulares, com relação à
leitura, Ciências e Matemática, o Brasil apresentou resultados preocupantes: com relação à
leitura, esta ficou em 37º lugar, principalmente porque os jovens não conseguiam interpretar o
que liam. Nas provas de Ciências e Matemática, o resultado foi ainda pior, ficando em 40º
lugar (CAMPOS, 2007).
Segundo essa pesquisa maioria dos alunos tem dificuldades para aprender conceitos
matemáticos e dificuldade para perceber sua utilidade e aplicação prática. Segundo Van de
Walle (2001, apud ONUCHIC; ALLEVATO, 2004), essas dificuldades de aprendizagem
estão ligadas à qualidade da aula de Matemática e diretamente vinculadas à postura do
professor. A propósito, o referido autor apresenta quatro componentes essenciais às práticas
pedagógicas: gostar de lecionar e, especialmente, de lecionar Matemática; ser capaz de
identificar os estágios operatórios do raciocínio dos alunos, entendendo como aprendem;
inserir em seu planejamento tarefas e materiais interessantes que estimulem o raciocínio; e,
por fim, trabalhar os conteúdos partindo da resolução de problemas.
Somos conscientes de que a educação não é um conceito fácil de construir numa
realidade complexa como a do Brasil, marcada por uma herança social/econômica elitista e
com tantas diversidades, pois a educação é uma prática social que se interliga aos elementos
centrais da sociedade, colaborando tanto para sua reprodução quanto para a transformação
sociocultural, permitindo que o homem se eduque em interação com o meio, aceitando os
desafios presentes nessa sociedade, transformando seu lócus e, consequentemente,
transformando a si mesmo.
Nesse contexto, é visível que estamos vivenciando uma época de muitas
transformações, de muitos desafios causados pela globalização. Nosso cotidiano caracteriza-
se principalmente pelos avanços tecnológicos instigando novas aprendizagens, minimizando
nossos esforços e permitindo a comunicação em tempo real, colaborando com as relações
3
Pesquisa apresentada em matéria jornalística no Fantástico, em 07 de julho de 2003. Disponível em:
<www.globo.com/fantastico>. Acesso em 30 set 2005.
16
interpessoais. Por outro lado, vemos o aumento significativo do desemprego, subemprego,
portanto um aumento considerável de excluídos, de jovens sem oportunidades, apesar de a Lei
Diretrizes e Bases da Educação (LDB n
o
9394/96) garantir o Ensino Fundamental obrigatório.
Nos momentos atuais da nossa história, tornou-se lugar comum afirmar que o aluno da
escola pública recebe formação inferior em relação aos alunos de escola particular, que têm
melhores condições de ensino-aprendizagem em virtude das condições físicas e técnicas da
escola, dentre muitos outros fatores. Nesse mesmo contexto, o senso comum apresenta a
escola particular como uma instituição mais disciplinada, organizada, segura e
respeitosa; fatores que contribuem para o melhor aproveitamento dos estudantes. As
percepções convergem no sentido de que a escola privada pode garantir uma
preparação mais adequada para o ingresso no ensino superior. Embora também nessa
escola a aversão pela disciplina Matemática exista, remetendo a um quadro de muitas
reprovações.
Segundo Soares (1992, p. 10-14), o fracasso escolar, presente na escola pública,
é remetido principalmente ao aluno e ao contexto social onde está inserido, pois se
explica a partir de três principais ideologias: a
ideologia do dom, fundamentada nas
condições naturais dos indivíduos ou capacidade cognitiva (há alunos mais capazes,
mais inteligentes que outros); a ideologia da deficiência cultural, que apresenta as
desigualdades sociais como explicação para o fracasso escolar; e a ideologia das
diferenças culturais
, que remete novamente às condições culturais, entretanto sem
considerá-la como deficiente, mas como diferente, dada às condições sociais e às
divisões de classe na sociedade. Nesse caso, à escola cabe a responsabilidade pelo
fracasso escolar que trata de forma discriminativa a diversidade cultural.
Diante desse contexto, o objetivo desse estudo é analisar as representações
sociais do professor de Matemática do Ensino Fundamental acerca do aluno da escola
pública, buscando compreender possíveis relações entre representação e prática
pedagógica.
Para atingir tal objetivo, contamos com as reflexões acerca das representações sociais
de autores como: Moscovici (2004), Jodelet (1984), Anadón (2003) e Jovchelovich (1995).
Contamos também com os estudos sobre Ensino Público e Privado e as representações sociais
elaboradas nesse contexto, produzidos por Rodrigues (2001), Sales (2000), e Soares (1992)
que contribuíram apresentando a escola pública como espaço complexo e simbolicamente
construído. Ainda, tomamos como referência os estudos de Bourdieu (1994) que enfoca a
categoria
habitus. No contexto da Matemática, contamos com os estudos de Bicudo (2004),
17
D`Ambrosio (2007) e Machado (1994), que analisam o Ensino da Matemática, dentre outros
autores com os quais procuramos dialogar, buscando refletir e encontrar respostas às
indagações que nos inquietam diante dos objetivos que pretendemos alcançar. .
O conceito de representações sociais, ponto importante nessa discussão, refere-se ao
“mundo de idéias” sob o qual programamos nossa ação. As representações sociais são
elaboradas no contexto das relações entre os indivíduos, portanto formam um eixo
heterogêneo no que se refere às diversas realidades que compõem a sociedade. Para Jodolet
(1989, apud ANADÓN; MACHADO, 2003), as representações estão vinculadas ao senso
comum, compondo o universo cultural, portanto enraizadas nas práticas cotidianas. Elas são
elaboradas por meio de valores, crenças, estereótipos e são partilhadas pelo grupo social no
que integra diferentes objetivos (pessoas, acontecimentos, mundos), alargando a forma de ver
as coisas comumente. Nesse sentido, a mídia é responsável pela disseminação de idéias e,
muitas vezes, atua influenciando e manipulando a sociedade, construindo representações e
criando sistemas que dão versões à realidade. Portanto, entendemos que as Representações
Sociais têm força de influenciar a sociedade e no nosso caso específico de estudo, o
“professor” e suas práticas dentro do ambiente escolar.
Pretendemos, com esse estudo, contribuir com as reflexões acerca do ensino nas
escolas públicas, especificamente no ensino da Matemática, buscando verificar se as
representações sociais partilhadas por professores de Matemática acerca do aluno da escola
pública influenciam a sua prática. Para tanto, realizamos pesquisa exploratória de natureza
descritiva para descobrir as características desse fenômeno representacional.
Em relação à escola pública, são construídas representações acerca dos alunos que
participam da formação ali construída. Segundo Lima (2006), tornou-se comum afirmar que a
escola pública de modo geral desenvolve formação de segunda ordem e, consequentemente,
seus integrantes apresentam maior dificuldade de raciocinar e aprender. Percebe-se de forma
mais evidente que desde o Ensino Fundamental, principalmente na escola pública, falta ao
aluno maior estímulo e motivação para lidar com os números, remetendo a pouca afinidade
dos educandos com os conteúdos de Matemática, além de fortalecer a visão de que essa
disciplina é “bicho papão”.
A imagem que os professores constroem de seus alunos estão ancoradas por
representações sociais. Na concepção de Gilly (1980, apud ANADÓM; MACHADO, 2003),
estas representações construídas pelos professores resultam de quatro influências normativas
presentes no contexto escolar: as regras construídas pela sociedade que se integram ao
18
ambiente escolar; as normas elaboradas pela escola que direcionam os comportamentos; as
idéias que circulam no campo ideológico e as regras que regem a instituição.
Portanto, o foco desse estudo delineia-se pelo campo das representações sociais
elaborado pelos professores de Matemática e a consolidação de sua prática pedagógica,
conforme a rede de ensino em que atuam. Para tanto, desenvolvemos o estudo em cinco
capítulos, os quais são resumidamente apresentados a seguir:
No primeiro capítulo, tratamos da “cultura, formação e desenvolvimento profissional
de professores que ensinam a disciplina de Matemática” para retratar as reflexões
desenvolvidas acerca do fazer do professor de Matemática, enfocando os paradigmas que
cercam o trabalho desse profissional.
No segundo capítulo, estudamos “o público e o privado na história da educação
brasileira e o desempenho escolar, conforme as teorias”; buscando identificar como ao longo
da história da educação brasileira foi sendo elaborada essa dicotomia: público e privado e em
que condições econômicas e políticas essas duas escolas foram se organizando. Ainda nesse
capítulo, enfocamos a presença das classes populares na escola, os entraves ao
desenvolvimento de uma escola para essa classe social, bem como as diversas teorias que
tentam explicar o fracasso escolar dessa parcela da população.
No capítulo terceiro, estudamos as “teorias das representações sociais de Moscovici”,
que nos permitem compreender como se formam os conhecimentos e ideias em nossas
mentes, bem como sua contribuição ao entendimento das ações educativas, estabelecendo
relações com o conceito de habitus, segundo Bourdieu, visto que essas categorias se
aproximam e se complementam, contribuindo para retratar o agir do professor em sala de
aula, fundamentando suas escolhas, comportamentos e atitudes.
No capítulo quarto, enfocamos a metodologia utilizada, buscando proporcionar ao
leitor uma visão sucinta das categorias analisadas e do aporte metodológico que subsidiou a
pesquisa enquanto procedimentos de campo.
No quinto capítulo, apresentamos os resultados da pesquisa, discutindo as entrevistas,
ressaltando as categorias de análise, tais como: baixo rendimento escolar, ausência da família,
escola transigente, recursos didáticos precários, desinteresse dos alunos e outras categorias
apresentadas pelos professores, referindo-se à escola pública e privada.
Nas considerações finais deste estudo, retomamos as ideias mais importantes que
compõem o discurso dos professores de Matemática, elaborando um panorama de
representações acerca do aluno da escola pública, dos professores e da escola pública e
privada. Apresentamos, ainda, reflexões sobre estas representações sociais e sua influência, na
19
perspectiva docente, sobre essas práticas pedagógicas desenvolvidas pelos professores de
Matemática.
20
CAPÍTULO I
CULTURA, FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DO
PROFESSOR DE MATEMÁTICA E A PRÁTICA PEDAGÓGICA
O grande desafio da atualidade no campo da educação é discutir o papel do professor
diante da sociedade da informação e da comunicação, exigindo do educador uma nova postura
e um redimensionamento profissional, uma vez que na atual sociedade, denominada sociedade
do conhecimento, espera-se do professor atitudes para além do ensino, propondo outras
competências, tais como a pesquisa, a reflexão cotidiana e o julgamento, produzindo
informações e transformações no exercício de sua prática cotidiana que é marcada pela
presença de diversidades culturais, valores e situações imprevisíveis.
Nesse sentido, a formação do professor e a experiência pedagógica têm grande
importância para sua prática, pois não uma receita a seguir diante das diversidades e
improvisações diárias presentes no ambiente escolar e na profissão de “professor”. Essa
diversidade aponta para a insuficiência da técnica e teoria, próprias dos saberes curriculares
para conduzir o processo educativo.
Segundo Mendes Sobrinho (2007, p.93), “o pensamento técnico e instrumental não
dão conta do clima de singularidade existente na sala de aula. O professor se depara
cotidianamente com fluxo contínuo de acontecimentos rápidos que não deixam tempo para
refletir a ação que deve ser tomada”. Explica ele, ainda, que a vivência e a experiência
cotidiana é que conduzem atitudes prudentes e sabedoria para lidar com a complexidade da
profissão docente.
Assim, a prática do professor está atrelada a sua formação, ou seja, a formação é um
suporte fundamental do desenvolvimento profissional do docente e cabe a ele a competência
de conduzir o ensino de acordo com seus saberes, que são oriundos de diversas fontes e de
natureza distinta.
Nesse sentido, explica Tardif (2002, p.19), o saber do professor é adquirido no
contexto de sua história e de sua profissão, portanto, os saberes são temporais e, ao mesmo
tempo, plurais e heterogêneos por advirem de fontes diversas. Assim, são também pessoais,
por serem internalizados de forma subjetiva.
21
Para Perez (2004, p. 252), a chave dessa competência profissional é a capacidade de
equacionar e resolver problemas da prática profissional. Segundo ele,
[...] a investigação, a curiosidade, o pensamento organizado aliado à vontade em
resolver os problemas são ingredientes essenciais para o progresso em qualquer
domínio da atividade humana. Não basta conhecer proposições e teorias. É preciso
estudo e pesquisa para renovar e, sobretudo, reflexão para não ensinar apenas “o
que” e “como” lhe foi ensinado.
O processo de ensino e da aprendizagem, portanto, envolvendo aluno e professor, é
bastante complexo e é visto atualmente como um dos principais projetos de investigação,
diante da baixa aprendizagem por parte dos alunos, especialmente no caso da Matemática, que
sempre reprova uma quantidade significativa de alunos, mesmo aqueles que são brilhantes e
se sobressaem em outras áreas.
Micotti (1999, p.154) indica que os problemas na educação brasileira se originam de
um misto entre descaso dos dirigentes e elementos presentes na própria formação dos
professores, apresentando uma realidade pedagógica heterogênea, visto que esses
profissionais caminham entre fazeres tradicionais e progressistas, muitas vezes inseguros
quanto a sua prática pedagógica. E nessa perspectiva, acrescenta:
Até pouco tempo, ensinar era sinônimo de transmitir informações, mas as idéias
pedagógicas mudaram. Apesar disso, muitos profissionais da educação, ainda, vêem
com bons olhos o ensino tradicional. Eles elogiam o bom nível do trabalho escolar
feito no passado e rejeitam as mudanças; duvidam da validade da atuação escolar e
consideram os professores pouco exigentes.
O professor é o mediador entre os conhecimentos historicamente produzidos e o aluno,
indicando que seu papel social, bem como o papel dos alunos possui uma dimensão política,
responsável, em grande parte, pelas transformações da escola e da sociedade. Contudo, as
dificuldades e os fracassos, para a maioria dos professores, estão vinculados ao aluno, que não
tem base, nem condições de aprender. Nesse sentido, Micotti (1999, p.157), cita Vinh Bang
(1989), afirmando que as representações de aluno influenciam no fazer do professor, haja
vista que “há idéias e quase crenças difíceis de desfazer: o fracasso não provém do professor,
mas do aluno que aprende mal. Idéias como essas, justificam e ajudam a manter o ensino
tradicional”. Cabe ressaltar que, diante dessas concepções equivocadas da aprendizagem ou
mesmo do fracasso vivido na escola, deve-se levar em consideração a formação inicial e
continuada do profissional da educação, bem como os saberes da experiência que acrescentam
ao seu cotidiano à reflexão crítica sobre as práticas que desenvolve.
Perez (1999, p. 268) acentua a importância da formação inicial do professor de
Matemática, visto que é nesse período que esse profissional vai se delineando, elaborando
estratégias de trabalho, incorporando “características essenciais a sua cultura profissional [...],
22
por ser um período em que as virtudes, os vícios e as rotinas, se assumem como processos
usuais na profissão”. Nesta mesma linha de pensamento, cita Imbernón (1994, apud PEREZ,
1999, p. 271) ao abordar a formação dos professores em especial a do professor de
Matemática:
Que a formação inicial do professor de Matemática seja flexível e que desenvolva
uma atitude crítica no licenciado de maneira cooperadora e colegiada e uma
constante receptividade para o novo, que a formação inicial tem de preparar para
uma profissão que demanda continuar estudando durante toda a vida profissional.
Não se trata, pois de aprender um ofício em que predominam estereótipos e técnicas
predeterminadas sendo que se trata de aprender os fundamentos de uma cultura
profissional, que significa saber porque se faz, o que se faz e, quando e porque é
necessário fazê-lo de um modo distinto.
Dessa forma, o autor está falando de um modelo reflexivo de educação que se
distancia do modelo tradicional. A importância da educação continuada e reflexiva é assunto
abordado por pesquisadores, debatidos em seminários e congressos, discutidos por vários
autores, tais como: Imbernón (2000); Pimenta e Ghedin (2002); Perrenoud (1997). Desde
1996, com a promulgação da Lei Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 9394, essa
temática passou a ser enfatizada, haja vista que a referida legislação apresenta a formação dos
profissionais em educação como um processo contínuo, formação inicial e permanente,
destacando a prática docente.
Fiorentini (2003, p. 26-30) apresentou, em 1994, o resultado de um trabalho de
pesquisa sobre educação Matemática que realizou entre os anos de 1960 a 1990, fazendo uma
análise de 204 teses e dissertações produzidas nos cursos de pós-graduação. Chegou à
conclusão de que os pesquisadores nesse período estavam preocupados com a formação
inicial do professor, mas que a partir de 1990, essas pesquisas, que a princípio eram
tímidas e dispersas, tomaram corpo e após quase 30 anos foram desenvolvidas inúmeras
investigações mais consistentes com o objetivo de conhecer a licenciatura, identificar seus
problemas e propor alternativas. Como resultado daquela pesquisa, os cursos de licenciatura, a
partir dessa investigação, foram reestruturados e o trabalho colaborativo passou também a ser
uma tendência forte na formação do professor.
Segundo Guarnica (1996, p.14), a Licenciatura de Matemática foi debatida no
Encontro Nacional Paulista (EPEMS), tratando de questões da profissionalização do trabalho
docente, da pesquisa em educação e educação Matemática, aspectos de evasão, retenção e
expectativas, entre outros fatores. Bertoni (1995) e Perez (1995) também desenvolveram
estudos acerca de Licenciaturas em Matemática nas quais enfatizam as disciplinas para a
23
formação do professor, conteúdos específicos, prática de ensino, representação da
Matemática, metodologia e instrumentação, entre outros pontos (PEREZ, 1999).
No final do ano 2000, a UNICAMP havia levantado 160 pesquisas sobre a formação
do professor de Matemática no Brasil, com o objetivo de melhor compreender as mudanças
apresentadas e apontar novas perspectivas de estudo nessa área, conforme nos informa
Fiorentini (2003). Segundo o referido autor, tem havido um descontentamento com a estrutura
dos cursos de Licenciatura em Matemática, por serem deficientes no processo inicial e não
viabilizarem uma efetiva formação contínua que rompa com a tradição pedagógica.
Diante do exposto, o saber docente e sua prática no cotidiano da sala de aula são
exercidos dentro de dois modelos: o tradicional e o reflexivo. No modelo reflexivo, o
professor analisa sua prática, elabora teorias, descreve situações, partilha suas ideias com seus
pares e alunos, induzem discussões em grupo e constrói práticas adequadas à situação em caso
concreto.
O modelo tradicional ainda é utilizado por muitos professores, que consideram o saber
constituído, estruturado pelo professor, limitando-se a transferir para o aprendiz um saber
criado e sistematizado. Nesse sentido, Micotti (1999, p.157) afirma:
[...] o saber, a decoração de textos ou partes de livros didáticos, a repetição de
informações, apresentadas nas aulas formam o caminho que camufla os insucessos
na apropriação do saber. A memorização pode ocorrer sem compreensão. A falta de
compreensão pode chegar a ponto de impedir que a formação tenha algum
significado para o aluno e de compreender sua transformação do conhecimento.
Ao que indica, a prática do professor na sala de aula está orientada entre o modelo
tradicional e o modelo reflexivo. Discutiremos essas duas abordagens para melhor
compreendermos o ensino e da aprendizagem da disciplina Matemática.
1.1 Ensino e propostas pedagógicas: modelo tradicional
O modelo tradicional está muito presente no ensino da Matemática, uma vez que a
maioria dos professores ainda não conseguiu se libertar das técnicas, métodos e concepções
que foram incorporadas na sua formação inicial.
Segundo D´Ambrosio (2007, p. 91), “[...] todo professor, ao iniciar sua carreira, vai
fazer na sala de aula, basicamente, o que viu alguém que o impressionou fazendo. E,
certamente vai deixar de fazer algo que viu e que não aprovou.” Segundo o autor, além desse
24
lado emocional que fica impregnado na memória de sua experiência, esse profissional
também passa a trabalhar com o intuitivo, refletindo, atualizando e modificando aquilo que
ele aprendeu e incorporou a sua prática, ou seja, o professor vai reelaborar, com base em
modelos vividos e na sua experiência cotidiana, a metodologia que aplicará na sala de aula.
Compreendemos que o professor com uma prática eminentemente tradicional, não
valoriza a reflexão como condição para reelaborar sua ação, acentuando apenas a preocupação
com a transmissão do saber já constituído e estruturado, cabendo ao aluno retê-lo como
condição para seu sucesso. A aprendizagem é vista como informações apresentadas na sala de
aula e que serão captadas pelos alunos.
Micotti (1999, p.156), ao se referir ao modelo tradicional, enfatiza que:
O trabalho didático escolhe um trajeto “simples” transferir para o aprendiz os
elementos extraídos do saber e sistematizados, ao longo da história das ciências,
fruto do trabalho de pesquisadores. As aulas consistem, sobretudo, em explanações
sobre temas do programa; entende-se que basta o professor dominar a matéria que
leciona para ensinar bem
.
Assim, na maioria dos casos, o professor ensina superficialmente, uma vez que a
ênfase no domínio do conteúdo por meio da memorização de fórmulas, textos e a repetição de
informações, técnicas enfatizadas na abordagem tradicional, não implicam em compreensão.
Esse método que pouco pode somar à aprendizagem do aluno, até o século XX, estava bem
presente no ensino de Matemática e ainda permanece nos dias atuais.
Compreendemos, diante do exposto, que, para o método tradicional, a memorização de
fatos básicos é considerada importante e que o aluno é sempre culpado de seu fracasso por ter
recebido mal o saber transmitido pelo professor. Cabe ressaltar que na Matemática a memória
sozinha não possibilita muitos avanços, visto que exige do aluno outras habilidades, tais
como: capacidade de interpretação, dedução, lógica, entre outras.
No senso comum, sabe-se que quem não aprende é porque não raciocina bem e quem é
inteligente aprende rapidamente. Mitos que descompromete o professor do fracasso escolar e
que justificam manter o modelo tradicional.
A discussão sobre a formação do professor e a correlação dessa formação com sua
prática pedagógica é assunto bastante debatido por teóricos como Tardif (2000), Cunha
(1998), dentre outros. Lima (2006), refletindo sobre as práticas tradicionais, indica alguns
pressupostos que analisam essa modalidade de prática pedagógica, caracterizando-a como:
a) finitude do conhecimento e sua descontextualização histórica; b) disciplina intelectual
concebida como reprodução de palavras, textos e experiências; c) privilegiamento da
capacidade de memorizar na qual o aluno vai internalizando a idéia de que o parâmetro de
avaliação de aprendizagem é o pensamento e o discurso do professor, assim como o que
25
recomenda o livro-texto; d) linearidade imposta ao trato com o conhecimento, com o ensino e
com a aprendizagem; e) circunscrição de cada disciplina a um espaço único de especialização
de saberes, desfavorecendo qualquer possibilidade de interdisciplinaridade; f) professor como
principal fonte de formação, sua habilidade em transferir conhecimento é o que define sua
competência docente; g) pesquisa excluída do cotidiano dos alunos da graduação, visto que
nesse conjunto de pressuposições não lugar para “dúvidas”, ou seja, pesquisa é concebida
como atividade para poucos”iniciados” e não para “iniciantes”.
(LIMA, M, 2006,
p.108-109)
Segundo Freire (1998), o professor, no exercício de sua profissão, deverá refletir sobre
sua prática, sobre as dificuldades do educando, reconstruir saberes, operar mudanças no seu
fazer docente, buscar novos aportes dentro da realidade social e promover a parceria entre
professor e aluno no intuito de construir a qualidade do ensinar/aprender.
O professor tradicional constrói, muitas vezes, uma postura de superioridade diante do
grupo, distancia-se do aluno, esquiva-se das consequências do ato pedagógico e, ainda,
desvaloriza as várias trajetórias para o aprender, negando ao aluno a oportunidade de construir
e transformar saberes, fortalecendo, muitas vezes, estereótipos, tais como: alunos mais
inteligentes, alunos incapazes, alunos desinteressados, dentre outros, tanto em relação aos
alunos de escola pública quanto em relação aos alunos da escola privada.
Segundo Polettini (1996), na disciplina Matemática existe uma postura pouco
reflexiva, pois afirma que é difícil mudar em curto prazo o conhecimento e as crenças dos
professores de Matemática porque são fortemente influenciadas por suas experiências
oriundas da condição de estudante de Matemática. Para Silva (1996, p.78), muitos professores
entendem que “o aspecto primordial no ensino da matemática é a competência do professor
em termos de conhecimento da matéria e que a capacitação pedagógica, reduzida a
capacidade de transmitir o conteúdo, tida como dote natural, pode ser incrementada através do
aconselhamento e do exemplo”. Diante do exposto, o autor responsabiliza o fracasso escolar
na disciplina Matemática aos métodos tradicionais aplicados na sala de aula que desestimula a
aprendizagem provocando a evasão e a reprovação.
26
1.2 Ensino e proposta pedagógica: modelo reflexivo
Uma nova perspectiva do desenvolvimento profissional, exigida pela sociedade de
informação e comunicação, aborda o modelo do professor reflexivo, crítico, colaborador e
investigador na ação, opondo-se ao modelo do professor tradicional.
Esse novo modelo surge provocando reformas curriculares e, segundo Imbernón (1994
apud PEREZ, 1999, p. 279), propõe aos professores um papel ativo nas várias atividades, tais
como avaliação, projetos pedagógicos, planejamentos. Devem possuir habilidades de
“interagir e aprender com seus iguais, consultar e relacionar-se com pessoas alheias à escola,
relacionar-se com diretores, pais e outros membros da comunidade educativa”. E ainda:
O professor reflexivo crítico transpassa as paredes da aula e da escola. Esta
perspectiva nos conduz a um marco conceitual em relação a como entender o
desenvolvimento profissional e, portanto, a uma maneira distinta de relacionar a
teoria e prática. O profissional de educação tem que participar na criação do
conhecimento pedagógico, na política curricular e na tomada de decisões a respeito
dos processos educativos e formativos [...] (IMBERNÓN, 1994 apud PEREZ, 1999,
p. 279).
Nessa perspectiva, Nóvoa (1992) aponta a importância da troca de experiências e a
partilha dos saberes entre os professores para a consolidação de sua identidade profissional,
sugerindo a “criação de redes coletivas de trabalho” como caminho para a afirmação de um
campo autônomo no profissional docente.
Assim, a presença dos professores “nas redes coletivas de trabalho” refletindo sobre a
prática pedagógica e a interiorização do trabalho colaborativo pelos docentes, é de suma
importância, especialmente para o professor de Matemática que tem se deparado com o
problema do fracasso escolar vinculado ao campo do ensinar e aprender.
Compreendemos, desta forma, que a formação do professor de Matemática, no modelo
reflexivo, deve ser repensada, no sentido de formar um profissional reflexivo, pronto para
mudanças e para atuar em cada situação. Essa nova proposta de reflexão do professor na sua
prática pedagógica compreende:
a) compreensão da provisoriedade e da relatividade do conhecimento. “Essa idéia
desenvolve uma visão de mundo, uma perspectiva de transitoriedade, uma
concepção de movimento de vida”; b) valorização do pensamento divergente, por
ser esta a condição para a criatividade; c) valorização do espírito da criatividade, de
questionamento exigente e da incerteza, como forma de perspectivar um processo de
aprender rico de significados; d) formato interdisciplinar de tratar o conhecimento,
assegurando mais significância aos conteúdos; e) concepção de pesquisa como um
comportamento de ensino e a extensão como referencial de chegada e de partida, de
aproximação e compreensão da realidade; f) iguais condições de valorização tanto
dos conteúdos como das capacidades sócio-intelectuais (CUNHA, 1998 apud LIMA,
M, 2006, p.109).
27
Fiorentini (2006), ao referir-se às pesquisas realizadas na área do ensino da
Matemática, ressaltou que algumas práticas educativas apresentaram-se significativas por
estimularem a investigação, exploração do conteúdo de modo a possibilitar a construção de
hipóteses e o desenvolvimento do raciocínio lógico-matemático. Segundo o referido autor, é
dessa forma que a Matemática passa a ser mais bem vista pelo aluno e, conseqüentemente,
gera uma boa aprendizagem até diante de classes heterogêneas.
Mudar o modelo da educação tradicional para o modelo reflexivo não é modismo. Os
movimentos e transformações no contexto educacional são bastante necessários e visíveis.
Segundo Hengemühle (2005), o que nos leva a acreditar mais em um modelo que no outro é
seu efeito referente à motivação do aluno, é quando o professor consegue transpor as teorias
para a prática na sala de aula de forma a repercutir na qualidade da aprendizagem.
Sobre o papel do novo professor, Antunes (1998, p. 60) adverte:
O papel do novo professor é usar a perspectiva de como se aprendizagem, para
que, usando a ferramenta dos conteúdos postos pelo ambiente e pelo meio social,
estimule as diferentes inteligências de seus alunos e os leve a se tornarem aptos a
resolver problemas ou, quem sabe criar produtos válidos para seu tempo e sua
cultura.
A questão da reflexão como elemento presente no cotidiano era proposto por Freire
(1995, p.83). Durante a execução do projeto de reorganização curricular no município de São
Paulo, Freire deixa explícito o seu desejo de que a escola pública seja “a escola onde tem
lugar de destaque a apreensão crítica do conhecimento significativo através da relação
dialógica. É a escola que estimula o aluno a perguntar, a criticar, a criar”.
Nesse contexto, Alves (2006, p. 47-64) aborda a respeito das desigualdades nos
resultados escolares e o impacto que a organização e funcionamento da escola têm na vida dos
alunos. E continua explicando que a ausência da igualdade de oportunidades educacionais
entre indivíduos em razão do sexo, da raça, da religião ou da região de origem nas instituições
públicas de ensino em todos os níveis, reflete um pessimismo pedagógico e aponta uma
relação existente entre desempenho escolar e origem social.
Assim, enfatizamos a necessidade de mudanças na prática pedagógica no ensino de
Matemática, apontadas por Tardif (2002), Charlot (2000), Polettini (1996), dentre outros,
direcionando-as ao modelo reflexivo para atender exigências da sociedade atual, favorecendo
eficácia na relação ensino/aprendizagem. Na concepção de Miskulin (2003), diante dos
avanços científico-tecnológicos que acarretam a concepção de mundo, de onde decorre a
sociedade de conhecimento, gerando informações rápidas e contínuas impõem aos educadores
28
de Matemática a necessidade de repensarem suas ações educativas, priorizando a formação
reflexiva que transcenda o paradigma tradicional. Afirma o referido autor que:
[...] a matemática deve ser medida também por metodologias alternativas, em que
o aluno em formação vivencie novos processos educacionais, plenos de sentido
com seus significados e valores. A ausência de uma educação matemática com
qualidade acarretará, provavelmente, ao jovem, futuro professor, a falta de
oportunidade de crescimento no saber matemático, importante para sua qualificação
profissional em qualquer área (2003, p. 217 - 219).
É preciso, ainda, considerar que as diversidades estão bem presentes nas escolas
brasileiras e que nas escolas públicas estão a grande maioria dos alunos das camadas
populares. Para Romanowski (2006, p.103), aprender é uma ação interativa e enfatiza a
importância do professor conhecer as “características pessoais dos alunos, as questões
afetivas, de saber usar a emoção e nela colocar a razão, para a comunicação que possa ser
estabelecida”.
Abordaremos no próximo capítulo reflexões acerca da escola pública e o desempenho
de seus alunos, uma vez que o fracasso escolar nesse espaço é mais evidente, apresentando
grande índice de reprovação, de repetência, principalmente na disciplina Matemática, como
ratificaremos no capítulo intitulado “O público e o privado na história da educação brasileira e
o desempenho escolar conforme as teorias”.
29
CAPÍTULO II
O PÚBLICO E O PRIVADO NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA E O
DESEMPENHO ESCOLAR, CONFORME AS TEORIAS
A ausência da igualdade de oportunidades educacionais, mencionadas no capítulo
anterior, reforça estereótipos sociais, em relação aos alunos das camadas populares, que
freqüentam a escola pública.
Bourdieu e Passeron (1975), citados por Tiballi (2003, p. 204), reconhecem que “a
cultura transmitida pela escola é uma cultura de classe, que favorece os favorecidos”. Ambos
defendem que existem diferenças culturais e de ethos
4
culturais em uma sociedade.
Nas décadas de 1970 e 1980, outros educadores como Garcia (1977), Freitag (1978) e
Saviani (1983) evidenciaram o caráter seletivo e discriminador das escolas no Brasil. Segundo
Tiballi (2003, p. 204-205), o discurso pedagógico nos anos de 1980, “deslocou-se das análises
macroestruturais para as causas intraescolares do insucesso escolar, das teorias explicativas
para a observação, apreensão e interferência na prática pedagógica escolar”.
Assim, muitos teóricos criticaram as justificativas para o fracasso escolar centradas
exclusivamente nas diferenças individuais, refutando termos como anormais, retardados,
deficiente mental, irregular, inadaptado, difícil, desajustado que, por muito tempo, eram
usados como categorias explicativas para o insucesso escolar e que colaboravam para a
exclusão desse público do meio social, tanto educativo quanto em outros ambientes de
interação. Observamos que a exclusão daqueles que não possuem condições cognitivas
consideradas favoráveis vem se firmando historicamente no Brasil, permanecendo até hoje,
mesmo que o discurso a favor da inclusão social seja enfatizado, ficando o atendimento
escolar de qualidade restrito a uma parcela reduzida da população.
Patto (1999, p.35) ressalta que as relações desiguais produzidas na sociedade
capitalista são reproduzidas pela escola, haja vista que a sociedade produziu uma escola
diferente para os diversos grupos sociais. Segundo a autora, [...] “as teorias trazem as marcas
de seu tempo, das limitações inscritas nesta realidade que misturam as mais diversas heranças
e está sob o impacto constante de forças e interesses contraditórios e complexos”. Entretanto,
4
Sistema de valores implícitos e profundamente interiorizados, que contribui para definir, entre coisas, as
atitudes face ao capital cultural e à instituição escolar (BOURDIEU, 1998, p. 42).
30
a visão reprodutivista tão presente nas análises sobre a escola e o fracasso escolar nos anos 80
é criticada na contemporaneidade por sua visão pessimista da escola e por reduzir essa
instituição à reprodução da sociedade capitalista e suas desigualdades. Essa visão apresenta o
indivíduo como determinado pelo ambiente e não reconhece o potencial transformador da
educação.
Diante do exposto neste capítulo, fundamentado na história da educação brasileira,
retrataremos a seguir, a trajetória de luta pela escola pública, gratuita e laica, bem como
refletiremos sobre a qualidade da educação matemática oferecida às camadas populares,
interligando o insucesso da aprendizagem às condições econômicas e culturais e às teorias que
abordam o desempenho escolar, na tentativa de explicar as origens do fracasso na escola.
2.1 A história da educação brasileira: breve relato
Para compreendermos o sistema atual da educação brasileira, marcado pelo
preconceito, discriminação e exclusão, é necessário buscarmos a história da educação que
teve início com a chegada dos jesuítas em 1549, permanecendo como únicos educadores por
mais de duzentos anos. A princípio, criaram escolas de primeiras letras onde propagavam
idéias católicas e depois fundaram colégios destinados a formar sacerdotes, preparando para o
ensino superior também aqueles que queriam seguir outras profissões, ou seja, os colégios
eram destinados a oferecer aos filhos das famílias influentes uma educação clássica e
humanística. O método de ensino jesuítico, impregnado pelas relações elaboradas no
seminário, caracterizava-se pela rigidez dos valores, rigor com o conteúdo e controle
disciplinar, dando origem ao método tradicional de ensino (BERGER, 1980).
O interesse em beneficiar uma minoria, a classe elitizada, em detrimento do restante
da população, era evidente nesse período. Segundo Ribeiro (2005), os colégios dos jesuítas
foram instrumentos de formação da elite colonial, instruindo os descendentes dos
colonizadores, diante do apoio real oferecido à Companhia de Jesus, em contrapartida exigia a
educação dos filhos dos nobres, enquanto que os índios eram apenas catequizados. Assim,
desde o início da história da educação brasileira, fica caracterizado o tipo de escola dominante
e a dependência administrativa do “sistema educacional brasileiro”.
Berger (1980) considera que a educação no Brasil está dividida em oito períodos:
monopólio jesuítico, ensaios de secularização; reconstrução e academização; abandono
31
público e a fase áurea da iniciativa particular; reformas consecutivas e desconexas; ensaio de
democratização e adaptação às condições brasileiras; expansão de um sistema educacional
alienado da realidade; aproximação às necessidades da sociedade global.
Segundo o referido autor, a expulsão dos jesuítas nada contribuiu para melhorar o
sistema educacional, conforme se esperava. As escolas e aulas régias que surgiram no período
seguinte à expulsão dos jesuítas funcionavam mal, eram de má qualidade e em número
restrito, representando o fracasso da secularização.
A “reconstrução e academização” foi um novo período da educação brasileira,
marcada pela vinda da família real para o Brasil em 1808, momento em que foram criadas leis
referentes à criação da escola pública e escolas primárias gratuitas, mas que infelizmente
fracassaram. As escolas elitistas, no entanto, existiam na maioria das capitais.
No “período imperial”, o governo central se preocupou exclusivamente com a escola
superior, “abandonando o ensino público”, levando ao fracasso as escolas primárias e
secundárias e, em consequência disso, as escolas particulares progrediram. Esse abandono
marca historicamente o desprestígio do ensino público e colabora para a exclusão das classes
populares do sistema educacional.
O “período das reformas” também não logrou êxito por serem consecutivas e
desconexas como descreve Berger (1980, p. 169):
[...] o imperador D. Pedro II tratou largamente do problema educacional. Advogou a
necessidade de criar um ministério da educação, de fundar escolas técnicas e
vocacionais, etc. Tratava-se da proposição de um amplo e bem coordenado sistema
educacional de instrução pública. Como, porém, logo após, foi proclamada a
república (1889), tudo não passou de uma manifestação de boas intenções.
Com as reformas econômicas e políticas que passam a fazer parte do cenário mundial
dado o desenvolvimento da indústria, urbanização e, no Brasil, Revolução de 1930, inicia-se
uma fase de democratização da educação para as camadas populares. Esse período foi
marcado pelo Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova que, inspirados pelo Movimento da
“Escola Ativa” de Dewey, experiência de ensino com um enfoque pedagógico centrado nas
necessidades do educando, visando sua inserção social, lutou para implantar no Brasil um
sistema educacional leigo, público e gratuito e, em certa medida, esse movimento marcou o
início da luta pela educação pública no Brasil, e como descreve Romanelli (1994, p.147):
[...] o direito de cada indivíduo à sua educação integral decorre logicamente para o
Estado, que o reconhece e proclama, o dever de considerar a educação, na variedade
de seus graus e manifestações, como uma função social e eminentemente pública,
que ele é chamado a desempenhar com a cooperação de todas as manifestações
sociais [...] o Manifesto toca profundamente no aspecto político da educação e ao
abordá-lo, toma partido em favor de uma ação vigorosa do Estado, no sentido de que
32
este, se não elimina, pelo menos não deixa aumentar as distâncias já então existentes
entre as classes sociais, no que respeita às oportunidades educacionais.
Nesse período de “ensaio de democratização e tentativa de adaptação às condições da
realidade brasileira às camadas populares”, alguns resultados relevantes são ressaltados por
Berger (1980): pela primeira vez uma reforma de ensino se de baixo para cima, é criado o
Ministério da Educação que passa a orientar as reformas que surgem como a de Francisco
Campos e a reforma Capanema.
A fase de “redemocratização” do Brasil, em 1945, e a nova constituição de 1946,
aliadas à efervescência do Movimento pela Escola Nova, suscitaram discussões em torno de
uma legislação específica para a educação brasileira, a “Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional”, então proposta pelo Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova. Esse período,
nomeado por Berger (1980), “período de expansão de um sistema educacional alheio à
realidade” (1946-1961), centrou-se em discussões acerca de questões ideológicas e políticas
quanto à universalização da educação e seu caráter estatal, e como descreve Berger (1980,
p.175):
A oferta educacional se transforma em tema político central, surgindo também como
slogan mais importante nas campanhas eleitorais. Os políticos à cata de votos
prometem escolas para todos os recantos do país [...]. Desta forma foram
efetivamente construídas escolas em muitos pontos do país, sem que, porém
houvesse a mínima preocupação com a qualidade do ensino oferecido, com a
formação dos professores e com o meio financeiro da educação.
Desse modo, o “período da tentativa de aproximação do sistema educacional às
necessidades globais” é marcado pelo aparecimento de diversas leis sobre reforma
educacional, mas que apenas se aproximaram das aspirações existentes acerca da educação,
cujo resultado é difícil de avaliar em virtude de outras reformas (agrárias, políticas,
universitárias) terem sido consideradas de primeiro plano (BERGER, 1980).
O processo de instauração de um sistema educacional democrático e regido pelo
Estado para o povo não se deu de modo iminente após o Manifesto dos Pioneiros,
transcorrendo um longo processo de manifestações em busca da elaboração da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Nesse período, a luta em defesa da escola pública
passou a exigir uma ação mais efetiva do Estado, deixando os aspectos científicos e didáticos
em segundo plano.
Em de julho de 1959, O Estado de São Paulo e o Diário do Congresso Nacional
publicaram um segundo Manifesto dos Educadores, uma vez mais redigido por
Fernando Azevedo e assinado por 189 pessoas, dentre as quais educadores,
intelectuais e estudantes. Desta vez, todavia, o “Manifesto ao Povo e ao Governo”,
sem abandonar sua linha de pensamento original, deixava um pouco de lado a
preocupação de afirmar os princípios da Escola Nova, para, acima de tudo, tratar do
aspecto social da educação, dos deveres do Estado Democrático e da imperiosa
33
necessidade de não cuidar o Estado da sobrevivência da escola pública, como
também de efetivamente assegurá-lo a todos. (ROMANELLI, 1994, p. 179)
Nesse contexto, ao analisar a história da educação brasileira, Ribeiro (2005) indica o
ponto crucial das discussões acerca do financiamento da escola pública e as pressões
exercidas pelos representantes da rede privada de ensino junto ao Estado. Enquanto uns se
prendiam ao aspecto jurídico, de que a família surgiu antes do Estado, portanto a criança não
depende do Estado, cabendo aos pais o dever de ministrar a educação, os defensores da Escola
Nova defendiam que cada um deveria ser responsável pela sua própria formação enquanto os
grupos sociais deveriam proporcionar as condições para essa formação, sendo assim a escola
pública, lugar mais adequado para formar esses cidadãos. Em contrapartida, os defensores da
escola privada defendiam que o Estado deveria financiar o ensino particular para que os pais
tivessem a liberdade de escolher a escola de seus filhos, por meio da concessão de bolsas de
estudo para que pudessem ter acesso à rede particular. A despeito dessa discussão, para
Ribeiro (2005), a solução para enfrentar o problema da educação escolar tem que ser buscado
nas raízes econômicas e políticas, com a elaboração de estratégias para se construir um novo
sistema educacional, comprometido com uma educação de qualidade para todos.
Ocorre, no entanto, que a cada dia, a cada época, torna-se mais visível na história da
educação brasileira que são poucas as iniciativas que priorizam a educação das camadas
populares. O que se constata no campo educacional é que as camadas populares, desde o
início da nossa história, foram discriminadas. Nesse sentido, muitos estudos apresentam como
indicadores de avaliação da escola pública o insuficiente número de escolas e um ensino de
qualidade inferior àquele organizado pelas escolas da rede privada, seja pela qualidade da
estrutura física ou formação e compromisso dos educadores com esse público. Para Soares,
[...] essa escola para o povo é, ainda, extremamente insatisfatória, do ponto de vista
quantitativo e, sobretudo, qualitativo. Não só estamos longe de ter escolas para
todos, como também a escola que temos é antes contra o povo que para o povo; o
fracasso escolar dos alunos pertencentes às camadas populares, comprovado pelos
altos índices de repetência e evasão, mostra que, vem ocorrendo uma progressiva
democratização de acesso à escola, não igualmente ocorrido a democratização da
escola. Nossa escola tem-se mostrado incompetente para a educação das camadas
populares, e essa incompetência, gerando fracasso escolar, tem tido grave efeito não
de acentuar as desigualdades sociais, mas, sobretudo, de legitimá-las (1992, p. 5-
6).
34
2.1.1 As camadas populares e a escola pública
A escola é uma parte constitutiva do todo social. É participante das mudanças que dão
significado à vida e que proporciona, através da educação, a inserção desse contingente na
sociedade e no mundo do trabalho.
Desde a década de 1980, a educação para todos foi incluída na pauta dos programas
governamentais. Segundo Romanowski (2006, p.101), os índices oficiais apontavam, em
2006, que o número de matrícula na educação básica ultrapassa a 55 milhões, correspondente
a 97% do total das crianças de 7 a 14 anos. Nesse sentido, registra:
[...] o fracasso escolar expresso pelo índice de evasão e pelos resultados dos exames
promovidos pelos órgãos governamentais como – Saeb e Enem - revela que à
expansão da escolarização, tanto em número de matrículas quanto em anos de
permanência (da educação infantil ao ensino superior), não tem correspondido a
melhoria do desempenho de aprendizagem dos alunos.
Estudos que analisaram o sistema público nacional, segundo Tiballi (2003),
responsabilizaram a escola e a prática do professor pelo fracasso escolar, contrariando o
pensamento da escola tradicional que descompromete o professor e que, segundo o “senso
comum”, quem não aprende é porque não sabe raciocinar e quem é inteligente aprende
rapidamente.
Werebe (1979, p.202) elucidou, com comprovações estatísticas, “as grandezas e as
misérias do ensino no Brasil”, abordando as mazelas do ensino público. Enfatizou a situação
deficitária do ensino, citou as condições materiais precárias de funcionamento das escolas, fez
referência às diversidades regionais, ignorância das famílias, condições de saúde dos alunos,
desprestígio da escola, subtração da carga horária escolar.
A Fundação Carlos Chagas, que desde 1970 tem investigado a deficiência da escola
pública brasileira, concluiu, após suas pesquisas, que o fracasso escolar incidia
preponderantemente sobre as crianças pobres, pois a elas era negado o acesso aos estímulos
socioculturais e às habilidades prévias que garantem o sucesso escolar. Zago (2003), quando
se refere aos avanços consequentes da LDB nº 5.692/71, que ampliou vagas para favorecer as
camadas populares, enfatiza que se trata de uma democratização quantitativa do ensino, pois
não foi acompanhada de um avanço qualitativo, que produz mais rendimento escolar.
Zago (2003, p.40), apoiando-se em Bourdieu e Champagne, afirma que:
Os alunos e estudantes provenientes das famílias mais desprovidas culturalmente
têm todas as chances de obter, ao fim de uma longa escolaridade, muitas vezes pagas
com pesados sacrifícios, um diploma desvalorizado; e, se fracassam, o que segue
35
sendo seu destino mais provável, são votados a uma exclusão, sem dúvida, mais
estigmatizante e mais total do que era no passado.
Conforme a literatura consultada, as camadas populares ficam excluídas da educação
de qualidade no Brasil, o que já é notório desde o início de nossa história, diante do privilégio
que gozavam as classes dominantes.
Esse cenário, na verdade, permite-nos observar que a análise da escola pública e do
ensino ministrado nessa instituição deve levar em consideração a trajetória histórica de
construção do ensino público e gratuito dirigido às classes menos abastadas de nossa
sociedade, observando que as dificuldades de implementação dessa escola revelam intenções
políticas, econômicas e sociais expressas nas decisões e ações de nossos representantes. A
escola pública organizada para atender mais às necessidades quantitativas (universalização do
ensino) que às necessidades qualitativas (melhoria da estrutura física, recursos didáticos,
formação de professores, entre outros aspectos), colabora para estabelecer uma linha de
distanciamento entre ensino público e privado, garantindo que o sistema de ensino brasileiro
caracterize-se pela dualidade escolar, ou seja, uma escola destinada às classes médias e altas e
outra às classes populares.
Althusser, Bourdieu, Passeron e Establet, dentre outros autores nas décadas de 1960 a
1980 discutiam os problemas sociais, endereçando-os aos problemas estruturais com os quais
se organizava a sociedade, considerada “reprodutivista”, remetendo a escola pública à
condição de aparelho ideológico do Estado, compreendendo que a sociedade desigual se
reproduzia também a partir da escola, pois remetia as classes populares a um único caminho:
a sua própria condição de classe e, por meio da ideologia, mantinham-na como agente de
reprodução social.
Entretanto, a perspectiva reprodutivista dos estruturalistas, criticada no final da década
de 1990, por ser considerada determinista e pessimista, não levando em conta as capacidades
de intervenção do homem, inclusive na condição de produtor da história, foi superada
enquanto paradigma de explicação dos problemas que cercam o ensino público.
Compreendemos, todavia, que apesar da análise reprodutivista não enfocar a realidade
escolar de forma dialética, apresentando-se de forma radical, negando aspectos positivos
presentes na formação dos indivíduos que lhes permitem dialogar com a escola, essa
abordagem revelou elementos do sistema social, necessários à análise neste estudo, tais como
a noção de classe social que, principalmente ao nível do senso comum como elemento das
representações sociais, faz parte dos discursos de muitos dos professores entrevistados.
36
2.2 O desempenho escolar conforme as teorias
À luz do que foi abordado nos itens anteriores, o entendimento é que o discurso pela
democratização do ensino é um fato histórico e embora tenha tido algum avanço quantitativo,
no aspecto qualitativo pouco tem evoluído. Em consequência, o fracasso escolar é uma
realidade na educação brasileira, sendo mais presente nas camadas populares. Soares (1992)
discute as principais teorias ou ideologias que tentaram explicar o insucesso escolar dos
alunos das camadas populares: a ideologia do dom; a ideologia da deficiência cultural; a
ideologia das diferenças culturais e a ideologia da carência social.
Conforme Soares (1992), a ideologia do dom associa o fracasso escolar à ausência das
aptidões intelectuais e às condições básicas para o bom aproveitamento do conhecimento
transmitido. As diferenças sociais teriam sua origem em diferentes aptidões de inteligência,
caso o aluno não seja capaz de ajustar-se, adaptar-se à escola, ele não será bem sucedido e
nem a escola poderá ser responsabilizada por este fato. Essa teoria foi superada quando se
percebeu que o fracasso escolar estava maciçamente presente na escola pública, não de forma
individualizada, mas assolava grupos de alunos, portanto, o atributo “dom” não poderia
explicar essa problemática.
Por outro lado, a teoria ou ideologia da deficiência cultural explica que as
desigualdades de dom, inteligência ou aptidão, estão relacionadas às desigualdades sociais e
não naturais. Assim as condições privilegiadas das classes dominantes, ao desenvolverem
hábitos, atitudes e habilidades nas crianças, desde a primeira infância, favorecem o sucesso
escolar desta classe. Enquanto a carência cultural das classes populares, vítima de privação
alimentar, subnutrição, dentre outros fatores, estaria fadada ao fracasso escolar (SOARES,
1992).
Essa teoria apresenta a linguagem como elemento explicativo para a carência cultural
das crianças das camadas populares, haja vista concebê-la diferentemente das crianças de
classes abastadas, principalmente por considerá-las portadoras de “déficit linguístico”,
atribuindo esse déficit ao meio social e familiar em que vivem e indicando que reflete nas
dificuldades de aprendizagem da criança segundo essa teoria. Cabe destacar que essa visão
carregada de estereótipo deixa de reconhecer a cultura popular como elemento significativo
no contexto da aprendizagem, no sentido de direcionar ao currículo escolar espaço para esse
saber. O que a escola faz, entretanto, é produzir um sistema educativo que privilegia o saber
próprio da cultura elitizada.
37
Assim, Soares (1992, 20) adverte que a teoria da deficiência cultural afirma que:
As crianças das camadas populares chegam a escola com uma linguagem deficiente,
que as impede de obter sucesso nas atividades e na aprendizagem: seu vocabulário é
pobre - não sabem o nome de objetos comuns; usam frases incompletas, curtas,
monossilábicas; sua sintaxe é confusa e inadequada à expressão do pensamento
lógico; cometem “erros” de concordância, de regência, de pronúncia; comunicam-se
mais através de recursos não-verbais que de recursos verbais. Em síntese: são
crianças “deficitárias” linguisticamente.
Para Patto (1993, p.36), apoiada em Bourdieu, o “desempenho escolar das crianças
tem uma relação mais evidente com a história educacional dos pais do que com o seu nível
ocupacional”. Mas o sistema educacional, segundo ele, ao oferecer um currículo no estilo
linguístico socialmente valorizado, opondo-se à linguagem da classe trabalhadora, privilegia a
classe favorecida e também passa a ser responsável pela distribuição desigual do capital
cultural entre as classes sociais, promovendo níveis desiguais de desempenho e de realizações
acadêmicas.
Labov (1972, apud SOARES, 1992) esclarece que o dialeto das classes favorecidas
nos dá impressão de que sua linguagem é racional, lógica e inteligente, enquanto que o dialeto
popular é direto, econômico, sem redundância, perfeitamente estruturado e nega o acúmulo de
erros e a incapacidade de seus falantes, mas apesar de tudo o fracasso escolar da criança das
camadas populares é visto como consequência do seu capital cultural e não pela dificuldade
da escola em integrá-la à realidade escolar legitimada socialmente.
Partindo da justificativa que a nenhum grupo pode faltar cultura, a teoria da
deficiência cultural ficou inadequada, surgindo assim uma nova teoria na tentativa de
justificar o fracasso escolar, denominada ideologia das diferenças culturais, que,
contrariamente às outras duas teorias, mencionadas anteriormente, não isenta a escola de sua
responsabilidade, esta imputa a ela o fracasso dos alunos por tratar discriminadamente os
alunos das camadas populares, transformando as diferenças em deficiências.
Soares (1992, p.16) acrescenta que a ideologia das diferenças culturais está
diretamente relacionada a estudos sobre a lingüística, focados na linguagem das classes
populares, mostrando que esta linguagem é diferente da linguagem socialmente prestigiada,
mas não inferior. Para a autora, “o papel central atribuído à linguagem numa e noutra
ideologia explica-se por sua fundamental importância no contexto cultural: a linguagem é, ao
mesmo tempo, o principal produto da cultura e é o principal instrumento para sua
transmissão.” Neste sentido, Bernstein (1993, p.130) explica:
Os problemas gerais presentes no ensino de crianças provenientes da classe baixa,
quando comparados com os problemas referentes ao ensino de crianças de classe
média, não se referem necessariamente a problemas de ensino de crianças que difiram
quando à capacidade inata para aprender, tal como evidenciada pelos testes de
38
inteligência. De fato, provas de que deve haver um número absoluto maior de
crianças com nível intelectual muito alto na classe baixa do que nos grupos sociais
superiores. O que importa é saber que existe uma relação particular entre os escores
obtidos em testes verbais e não-verbais, de aplicação coletiva, em diferentes grupos
sociais.
Para Bernstein (1993), o choque de linguagem que as crianças da classe baixa
vivenciam, ao ingressarem na escola, gera dificuldade de aprendizagem de leitura, de
ampliação de vocabulário, de organização de significados verbais, de escrita e de
interpretação. Isso reflete no ensino da Matemática, porque embora os alunos dominem a
tabuada, eles terão dificuldade para ordenar o enunciado verbal antes de executar as operações
aritméticas.
Assim, as crianças vivenciam processos linguísticos diferentes, mas para Bernstein,
(1992, p.38) qualquer que seja o processo linguístico vivenciado no processo de socialização,
não existe um código melhor que o outro e explica: “as dificuldades de aprendizagem da
criança da classe trabalhadora se devem não à ‘deficiência’ de sua linguagem, mas ao
confronto entre os códigos no contexto da instituição escolar”.
Lahire (1997, p.106), ao estudar o sucesso escolar de crianças pertencentes às famílias
dos meios populares, observa que mesmo indiretamente ou em situações específicas, é
importante o vínculo entre pais e filhos para o desempenho escolar. Explica que “o apoio
moral, efetivo, simbólico se mostra tanto mais importante quanto sejam pequenos os
investimentos familiares”. No entanto, quando se trata de escola pública, a presença desses
pais é bastante cobrada, haja vista a crescente dificuldade quanto ao acompanhamento dos
filhos, seja porque não priorizam essa demanda dado os diversos problemas ligados à
sobrevivência mais direta, ou mesmo às dificuldades ligadas a sua baixa escolarização,
transferindo para a escola a responsabilidade com a educação de seus filhos.
Compreendemos assim que as escolas públicas que abrigam estudantes de camadas
populares enfrentam situações complexas. Zago (2003, p. 21), ao realizar pesquisa com 16
famílias entre os anos de 1993/94, concluiu que as más condições de moradia, a renda familiar
baixa, o pouco estudo dos pais e o analfabetismo por parte das mães refletem negativamente
na aprendizagem do aluno. Portanto, a escola pública, para essas classes populares, passa a ser
o local privilegiado da aprendizagem e requer que seus professores conheçam bem a realidade
de seus alunos, buscando identificar as dificuldades que passam, para interar-se de suas
questões afetivas e de suas experiências anteriores, para tomá-las como ponto de partida não
como elemento que justifique a baixa qualidade do ensino, mas como indicador para a
39
elaboração de práticas pedagógicas ancoradas em representações sociais negativas desses
alunos.
Para Soares (1992, p. 14), é inadequado qualificar grupos sociais como culturalmente
deficientes ou privados de cultura. A ideologia da deficiência cultural defende essa carência
cultural, hierarquizando as culturas. Na verdade, para a autora, o que deve ser reconhecido é
uma “diversidade de culturas, diferentes uma das outras, mas todas igualmente estruturadas,
coerentes e complexas”. Nesse sentido, o professor deve trabalhar na perspectiva da
multiculturalidade, tomando como suporte para sua prática a necessidade de abordar, não a
cultura presente no cotidiano das classes populares (linguagem, valores, musicalidade, idéias
e signos, etc.), mas ao valorizá-la, torná-los proprietários da cultura mais ampla e legitimada
socialmente.
O professor reflexivo, na sua prática docente, ao utilizar da aprendizagem interativa,
deve lançar mão das estratégias e das teorias cognitivas, artísticas, compreensiva e sócio-
comunicativas, para buscar o sucesso escolar, sobretudo dos alunos das camadas populares
que têm demonstrado uma aprendizagem deficitária em relação aos alunos da rede privada.
Compreendemos assim que, tanto a teoria da deficiência cultural e linguística quanto a
teoria das diferenças culturais e linguísticas, transfere para a escola o papel de disseminadora
da cultura dominante, legitimada socialmente, desvalorizando o saber popular, principalmente
a linguagem construída na esfera da vida cotidiana. Portanto, ao adentrar na escola, o aluno
das classes populares não possui a tarefa apenas de aprender os conteúdos das várias
disciplinas, mas entender todo um conjunto de códigos linguísticos necessários à
comunicação. Nesse sentido, Soares (1992, p. 79) faz o seguinte comentário:
Quando teorias sobre as relações entre linguagem e classe social são escolhidas para
fundamentar e orientar a prática pedagógica, a opção que se está fazendo não é,
apenas uma opção técnica, em busca de uma competência que lute contra o fracasso
escolar, que na verdade, é o fracasso da escola, mas é, sobretudo, uma opção
política, que expressa um compromisso com a luta contra as discriminações e as
desigualdades sociais.
As teorias que discutiram o fracasso escolar dos alunos das camadas populares
colaboraram para a construção de rótulos e classificação desses alunos, tais como:
inteligentes, competentes, fracos, dentre outros, gerando representações sociais nos
professores e em toda comunidade escolar e, em certa medida, influenciando as práticas
pedagógicas.
Nesse contexto, o que se vê na escola pública em relação à disciplina Matemática é um
elevado índice de reprovação dos alunos, se compararmos o aproveitamento desses alunos em
relação aos alunos da escola privada, uma vez que esta disciplina exige do aluno domínio da
40
linguagem, reflexão, raciocínio, interpretação, habilidades que são desenvolvidas em
ambientes que favorecem boas condições de ensino.
Os alunos de escola pública apesar de muitas vezes terem maior vivência com a
prática de lidar com os números porque são obrigados a negociar para o sustendo da casa,
sentem, em sua maioria, dificuldade de formalizar cálculos seguindo regras matemáticas,
principalmente porque esse saber elaborado socialmente não é objeto de interesse na sala de
aula. Nesse sentido, mesmo vivendo experiências diferentes na construção do raciocínio
lógico-matemático, tanto alunos da escola pública quanto alunos da escola privada, na maioria
dos casos, não aplicam esses saberes no espaço das aulas de Matemática. Segundo
D’Ámbrosio (2007), Bicudo (1996) e Perez (2004), falta uma maior aproximação da
Matemática que se aprende na escola com o cotidiano do aluno. Lins (2004, p. 93) afirma que
existe uma grande distância entre a Matemática que se aprende na sala de aula e sua aplicação
na vida real.
Na disciplina de Matemática, os alunos das camadas populares poderiam relacionar
conteúdos disciplinares com situações do cotidiano que experimentam muito cedo, ligadas à
utilização do dinheiro, por exemplo, em situações concretas da vida diária. São possuidores de
um repertório de saberes que os qualificam para a resolução de situações-problemas no campo
da Matemática, desde que a linguagem utilizada na sala de aula se aproxime de seu campo
cultural. Entretanto, o comportamento, o costume e a convivência grupal desses alunos
contribuem para que o senso comum os representem como portadores de déficit cultural e
cognitivo de acordo com a ideologia do dom e da deficiência cultural, ao invés de os
considerarem possuidores de uma outra cultura.
Para compreendermos melhor o conceito e as características das Representações
Sociais, dedicaremos o próximo capítulo ao estudo dessa teoria, no qual refletiremos também
acerca do conceito de habitus, conforme proposições de Bourdieu.
41
CAPÍTULO III
TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E O CONCEITO DE HABITUS DE
PIERRE BOURDIEU
O objetivo deste trabalho, como mencionado, é analisar as representações sociais dos
professores de Matemática do Ensino Fundamental acerca dos alunos da escola pública,
compreender e interpretar as possíveis relações entre representações sociais e prática
pedagógica. Para bem entender suas representações, discutimos nos capítulos anteriores
acerca da relação entre formação e desenvolvimento profissional que norteiam o
comportamento dos professores da escola pública e privada, bem como as teorias que
explicam o fracasso escolar das camadas populares.
Nesse contexto, a teoria das representações sociais e o conceito de habitus de Pierre
Bourdieu são indispensáveis para a compreensão das práticas dos professores, as quais são
influenciadas pelo conjunto social, criado pelo homem e que explicam o mundo e o homem
dentro desse mundo, bem como nos oferece embasamento teórico que fundamenta as práticas
desta investigação.
Assim, a teoria das representações sociais revela-se importante aporte teórico para o
pesquisador que procura compreender os significados elaborados pelos sujeitos em seu
cotidiano. Sendo o homem um ser social que interage com o mundo, estabelecendo uma teia
de relações entre si e o que o cerca, faz - se necessária a compreensão de certos conceitos
produzidos nessa interação, estabelecendo relações entre idéias e realidade, ou seja, como e
onde são formados os conceitos, as ideias e, por conseguinte, a própria realidade.
A teoria das representações sociais explica como os saberes sociais se constroem e se
transformam de acordo com o contexto social. São fenômenos diversos, constituídos de
elementos informativos, cognitivos, ideológicos, normativos, crenças, valores, atitudes,
opiniões, imagens que, segundo Jodelet (1995, p.17), “nos guiam de modo a nomear e definir
conjuntamente os diferentes aspectos da realidade diária, no modo de interpretar esses
aspectos, tomar decisões e, eventualmente, posicionar-se junto a eles de forma defensiva”.
Compreendemos, diante do exposto, que as representações sociais oferecem
justificativa às práticas cotidianas de um conjunto social, no caso do presente estudo, às
práticas do professor de Matemática junto a alunos da escola pública. Este entendimento
42
revela-se como fenômeno significativo para esta investigação, uma vez que o estudo dessas
representações sociais nos levará a questionar, buscar o novo, quebrar paradigmas
tradicionais. Desse modo, as reflexões acerca da representação social da escola pública, do
aluno e do professor de Matemática dessa rede de ensino, são pontos importantes para se
compreender ideias pré-concebidas que influenciam a prática pedagógica do professor e,
consequemente, refletem no ensino e na aprendizagem, gerando o tão evidenciado fracasso
escolar, principalmente em relação à disciplina matemática que no geral representa um
“assombro” para os alunos, especialmente os da rede púbica.
3.1 Representações Sociais: conceito e bases teóricas
Serge Moscovici por meio da Psicologia Social ao se referir às representações sociais
procura esclarecer certos pontos que nos levam a compreender o indivíduo isoladamente e em
grupo e suas relações com o contexto social. Assim, ele define as representações como:
Um sistema de valores, idéias e práticas, com uma dupla função: primeiro
estabelecer uma ordem que possibilitará às pessoas orientarem-se em seu mundo
material e social e controla-lo; e, em segundo lugar, possibilitar que a comunicação
seja possível entre os membros de uma comunidade, fornecendo-lhe código para
nomear e classificar, sem ambuiguidade, os vários aspectos de seu mundo e de sua
história individual e social (1976, p. xii).
Segundo Anadón e Machado (2003), quem primeiro utilizou o termo “representações
sociais” foi o sociólogo Durkheim ao prefaciar a segunda edição do livro intitulado “As regras
do método sociológico”. Para ele, representações sociais se referem às representações
coletivas, que se opõem a representação individual e compreende diversos tipos de produções
mentais e sociais, como a ciência, a religião, a ideologia, os mitos e outras produções não
idênticas quanto à constituição de formas e funções e que se distanciam do senso comum.
Desta forma, Durkheim (1978, p.79) defende de forma inflexível que o coletivo não pode ser
explicado em termos individuais e que “são as representações coletivas que traduzem a
maneira como o grupo se pensa nas suas relações com os objetos que o afetam”.
Anadón e Machado (2003), ao analisarem a correlação entre o pensamento de
Durkheim e Moscovici acerca do conceito de representações afirmam que este último se opõe
ao pensamento de Durkheim, notadamente ao considerar que o saber científico é transformado
em uma dimensão de senso comum, instituindo dessa forma uma relação entre o sujeito (ego),
o sujeito social (alter) e o objetivo, julgando, por conseguinte, ser mais adequado estudar as
43
representações sociais do que estudar representações coletivas. Neste sentido, Jodelet (2001)
explica que às representações “corresponde um ato de pensamento pelo qual o sujeito se
reporta a um objeto. Este pode ser tanto uma pessoa, quanto uma coisa, um acontecimento
material, psíquico ou social, um fenômeno natural, uma idéia, etc.” e deixa evidente que não
há representação sem objeto.
No contexto desta discussão Farr (1995, p.44), refere que Moscovici, ao se reportar à
representação coletiva de Durkheim, a descreve e a identifica como “uma categoria coletiva
que deve ser explicada a um nível inferior, isto é, em nível da Psicologia Social”, haja vista
que Moscovici identifica a terminologia de Durkheim “representações coletivas” às
sociedades menos complexas estudadas pelo referido autor. Dessa forma, Moscovici, na
compreensão de Farr (1995 p. 45), “estava modernizando a ciência social, ao substituir as
representações coletivas por representações sociais a fim de formar a ciência social mais
adequada ao mundo moderno”, principalmente dado ao pluralismo e rapidez com que estas
sociedades se transformam.
Moscovici as Representações Sociais como estrutura dinâmica, própria do mundo
atual, defendendo a bilateralidade entre o indivíduo e o social e preferindo usar o termo
representações sociais uma vez que a legitimação se torna parte de uma dinâmica social
complexa e contestada e não mais pela intervenção de uma garantia divina, própria da
representação coletiva de Durkheim.
A compreensão de Moscovici das representações sociais percebida como um
fenômeno, vista antes pela sociologia e pela psicologia apenas de forma conceitual,
representou um grande avanço, porque enquanto a sociologia sabia de sua existência, mas não
se importava com sua estrutura interna, a preocupação da psicologia se limitava à dinâmica
das representações. Como fenômeno, ela “passou a ser olhada como uma maneira específica
de compreender e comunicar, abstrair sentido do mundo e introduzir nele ordem e percepção
que reproduzam o mundo de uma forma significativa” (MOSCOVICI, 2007, p. 45-46).
Esta modernização da ciência social feita, por Moscovici, compreende a substituição
das categorias analíticas utilizadas por Durkheim, tais como, linguagem, religião, costume,
mito, mágico e outros fenômenos pelo estudo das concepções leigas acerca da ciência. Para
Moscovici (1978, p. 41), “as representações sociais correspondem, por um lado, à substância
simbólica que entra na elaboração e, por outro, à prática que produz a dita substância, tal
como a ciência ou os mitos correspondem a sua prática científica e mítica.”
Assim as representações sociais,
44
[...] diariamente e espontaneamente se tornam senso comum, enquanto
representações do senso comum se transformam em representações científicas e
autônomas [...] como um conhecimento popular do senso comum fornece sempre o
conhecimento que as pessoas têm a seu dispor: a própria ciência e tecnologia não
hesitam em emprestar dele quando necessitam uma idéia, uma imagem, uma
construção (MOSCOVICI, 2007, p. 200).
Entendemos que as representações influenciam as pessoas, impregnando suas mentes
de forma que ideias e pensamentos são aceitos porque são definições que existem. Assim,
“se uma representação social é uma preparação para ação, ela não o é somente à medida que
guia um comportamento, mas, sobretudo na medida em que o remodela e reconstitui os
elementos do meio ambiente em que o comportamento deve ter lugar” (MOSCOVICI, 1978,
p. 49).
Nesse sentido, observa-se que as representações sociais entrelaçam o universo exterior
com o interior do indivíduo ou grupo, de forma que as imagens, a percepção, os preconceitos
e as opiniões construídas pelos indivíduos e pela coletividade traduzem reciprocamente a
escala de valores por eles elaborados, induzindo a representar o mundo como ele é aos nossos
olhos ou como ele deve ser e ainda como pode modificar-se.
Neste sentido, Moscovici (2007, p.37 e 38) enfatiza que,
[...] todos os sistemas de classificação, todas as imagens e todas as descrições que
circulam dentro de uma sociedade, mesmo as descrições científicas implicam um elo
de prévios sistemas e imagens, uma estratificação na memória coletiva e uma
reprodução na linguagem que, invariavelmente, reflete um conhecimento anterior e
que quebra as amarras da informação presente. [...] as representações sociais
deriva do sucesso com que elas controlam a realidade de hoje através de ontem e da
continuidade que isso pressupõe.
Desta forma, entendemos que as representações sociais se legitimam em questões
sociais relevantes do cotidiano, existentes antes mesmo de nossa vinda ao mundo e que a
partir delas formamos novas representações, influenciando o comportamento do indivíduo.
Diante do exposto, ao analisar os discursos acerca das práticas pedagógicas
vivenciadas pelos professores de Matemática e suas representações acerca dos alunos da
escola pública, percebemos que estão impregnadas por representações construídas na
sociedade e no mundo educacional, transformadas em senso comum, elaboradas ao longo da
história da educação e que refletem hoje na ação docente presente no cotidiano da sala de
aula, nas suas decisões e nas suas posições ideológicas.
Vala (1993, p. 355) explica que “uma vez criada uma representação acerca de um
outro, essa representação passa a constituir esse outro e orienta a interação de modo a atribuir
foros de realidade ao que é representação”.
45
Assim, as representações sociais constituem um conjunto de conceitos, proposições e
explicações criadas na vida cotidiana no decurso da comunicação inter-individual e segundo
Moscovici (1981), equivalem aos mitos e aos sistemas de crenças tradicionais que estão
impregnados em nossa sociedade.
Essas representações sociais do professor acerca de seus alunos, as imagens e
percepções que o levam a categorizá-los e tipificá-los como esforçados, inteligentes, carentes,
desmotivados, desinteressados é importante para nosso estudo, para compreender as ações,
habitus e atitudes relativas à prática pedagógica do professor de Matemática ao lecionar na
escola pública, visto que a disciplina Matemática apresenta sua complexidade retratada nos
índices de avaliações, que demonstram elevado índice de reprovação nesta matéria.
Comungamos com o pensamento de Leite (1993), ao explicar que não basta o saber do
professor, mas para que ele seja bem sucedido em sua profissão é necessário ter a capacidade
de lidar com os alunos, aceitá-los e entendê-los. A imagem e a percepção, que são
ingredientes da representação social, interferem na relação professor-aluno e tudo influencia
no processo de ensino e da aprendizagem. Assim:
[...] poucos alunos podem ser percebidos, ou poucos conseguem identificar-se
através do professor: deste não recebem de volta, a própria imagem. A fim de que
possam saber quem e como são. Esse processo não seria tão pernicioso, se os
professores conseguissem manter uma atitude de neutralidade diante dos alunos sem
manifestar preferências e antipatias. [...] o processo de percepção do professor não é
arbitrário, e o fato de muitos professores perceberem os mesmo alunos indica que
não se trata de apreciações inteiramente deformada por fatores pessoais. [...] Apesar
disso, professores que podem ter um rendimento muito maior, não apenas de um
ou vários alunos [...] De outro lado, existem professores que, embora
especificamente competentes em sua disciplina, são incapazes de obter produção
satisfatória. Esta diferença poderia ser explicada como resultante de uma seleção
perceptual (LEITE, 1993, p.242 - 245).
Os estereótipos a respeito da escola pública, de sua estrutura precária, como
insuficiência de material didático, e seus professores tipificados como desmotivados,
descompromissados e com deficiência didática, conforme retrata o senso comum e o discurso
de muitos interlocutores desta pesquisa, repercute no dia a dia do professor, gerando o
habitus
que desfavorece uma prática eficaz.
As representações sociais na educação foram temas de trabalhos desenvolvidos por
diversos autores, dentre eles destacamos Gilly (1980), que segundo sua concepção as
representações sociais que os professores constroem de seus alunos demonstram que elas:
[...] são resultados de quatro tipos de influências normativas: as regras e os modelos
a seguir exigidos pela sociedade; as normas da escola definindo os comportamentos
e as regras que regem a instituição; as regras ideológicas que circulam no meio
educativo e a influência exercida pelas normas que levam consigo os atores sociais
imersos na educação (1980 apud ANADÓN & MACHADO, 2003, p.75).
46
O autor em referência explica ainda que o professor tem o papel de transmitir
conhecimentos e a função de controlar e gerir a classe. Papel este bastante complexo,
principalmente quando se trata de transmitir conhecimentos matemáticos. É, portanto, no
processo de interação cotidiana que o professor produz pensamentos necessários a sua prática,
munido de ideias e imagens que compõem um repertório interpretativo sobre o real. Assim, o
professor está influenciado por palavras, que passeiam pelos seus sentidos, olhos, mente e
ouvidos, influenciando na forma de convencionalizar objetos, pessoas ou acontecimentos.
Estas representações criadas pelo homem são produtos da interação e da comunicação.
As representações sociais contribuem para analisar e explicar os modelos, as noções
que formam o mundo das idéias e que se constituem em objetos e questões relevantes que
legitimam e justificam decisões cotidianas e ações sobre esse cotidiano. Assim, a maneira
como os professores representam os alunos da escola pública, as suas práticas ao ministrarem
a disciplina Matemática, pode ser compreendida através das representações sociais
compartilhadas dentro do contexto social que remetem significados e refletem seus atos como
professores.
Lima (2006, fl. 56) entende que as representações sociais:
Geram movimentos, atitudes, imagens e ações constituídas por um conjunto social e
o acesso a essas representações confere os pensamentos enraizados numa prática que
pressupõe as interações do contexto da vida dos sujeitos, das relações, de linguagem,
que servem como senha para aprender os objetivos socialmente partilhados.
As representações sociais devem ser analisadas criticamente, uma vez que advêm de
situações reais; perpassam o conjunto da sociedade ou de determinado grupo social como algo
anterior e habitual; são manifestadas por sentimentos, condutas, palavras e devem ser
refletidas a partir da compreensão dos comportamentos sociais; são conceitos do senso
comum.
Moscovici (2007) explica que toda ruptura de uma “experiência ordinária”, que fuja de
uma situação familiar, qualquer fato que não esteja devidamente claro, cria um sentido
complementar e coloca em ação uma procura pelo sentido. As representações sociais surgem
a partir deste momento, quando é sentida a necessidade de se objetivar algo abstrato em
concreto, formando, assim, imagens e significados. O processo de ancoragem
5
(identificação)
5
São as ancoragens que vão explicar e descrever o funcionamento dos meta-sistemas sociais. A ancoragem
psicológica refere-se aos sistemas de valores e às crenças gerais intra e interpessoais. São as atitudes, os fatores e
às crenças que nos mostram o nível psicológico da ancoragem. A ancoragem sociológica é dada pelas inserções
específicas dos indivíduos ou dos grupos nas relações partilhadas. São deste modo as pertenças
socioprofissionais, o gênero, a afiliação religiosa ou política que mostram o nível sociológico e cultural da
ancoragem (PEREIRA, 2005, p. 25).
47
transforma em familiar essas imagens e significados incorporando-as, ou seja, tornando o
desconhecido legítimo e justificando ações dentro do contexto social.
Influenciadas pelas representações sociais e pelo
habitus, as pessoas estão predispostas
a certas atitudes, agindo e reagindo de forma específica gerando práticas, atitudes e
percepções.
Barreto (1993, p. 297), ao se referir a educação formal, a evidencia como uma
“transmissão de conhecimentos, habilidades e atitudes como necessários à prática da vida
cotidiana. O conteúdo dessa transmissão e os processos através dos quais ela é feita são
impregnados de valores”. Tudo isso vai influenciar, segundo ele, numa maneira própria de
cada um perceber, interpretar a realidade, impregnando hábitos de sentir, de atuar, de fazer, de
pensar.
Nesse sentido, Barreto (1993, p. 296) explica que dentro do sistema de ensino os
professores são condutores da transmissão de hábitos e valores. Para Barreto (1993, p. 296-
297), “os professores são a via preferencial, dentro de nosso sistema de ensino, de transmissão
desse conjunto de hábitos e valores que caracterizam uma determinada maneira de ser”.
Assim, influenciadas pelas representações sociais e pelos
habitus, categoria
explicitada no item a seguir, as pessoas têm certas atitudes, agem de forma específica para
alcançar seus objetivos, concordando ou discordando de algo. Habitus, segundo Lima (2006,
56), “é um conjunto de tendências que predispõem os agentes a agir e reagir de determinadas
maneiras, gerando práticas, percepções e atitudes”.
3.2 Pierre Bourdieu e o conceito de Habitus
Bourdieu (2001, p. XLI) defende que o inconsciente influencia a prática dos sujeitos.
Assim, explica que “o habitus vem a ser, portanto, um princípio operador, que leva a cabo a
interação entre dois sistemas de relações, as estruturas objetivas e as práticas”. Existe, na sua
opinião, uma predisposição na forma de agir das pessoas por influência do habitus.
Para Perrenoud, a noção de habitus de Bourdieu “permite articular consciência e
inconsciência, razão e outras motivações, decisões e rotinas, improvisações e regularidades”
(1997, p. 24).
Bourdieu nos estudos sobre trocas simbólicas elaborou o conceito de habitus,
buscando compreender as ações dos indivíduos pela internalização de estruturas conceituais
48
que são capazes de delinear intenções, ações, interações. Por meio do conceito de habitus é
possível a compreensão de toda dinâmica social porque, segundo Bourdieu
6
, habitus é
[...] um sistema de disposições duráveis, estruturadas predispostas a funcionar como
estruturas estruturantes, isto é, um princípio gerador e estruturador das práticas e das
representações que podem ser objetivamente “reguladas” e “regulares” sem ser o
produto de obediência a regras objetivamente adaptadas ao seu fim sem supor a
intenção consciente dos fins e o domínio expresso das operações necessárias para
atingi-los e coletivamente orquestradas, sem ser o produto da ação organizadora de
um regente (1994, p. 60-61).
Habitus, nesta perspectiva, é um conhecimento adquirido que indica uma postura
inconsciente de um agente em ação, porque são produtos de um modus operandi
7
. As ações
dos sujeitos são construídas inconscientemente, ou seja, são frutos da realidade objetiva da
sociedade como todo proveniente da interiorização dos padrões, normas, valores e regras
sociais.
Bourdieu esclarece essas implicações provenientes da esfera social e explica que “a
noção de habitus, não somente se aplica a interiorização das normas e dos valores, mas inclui
o sistema de classificações que preexistem (logicamente) às representações sociais” (ORTIZ,
1994, p.16).
Nesse sentido, Bourdieu aponta as variedades de habitus adquiridos na família, na
escola, nos grupos e classes, e enfatizando a transformação de habitus e sua diversificação a
partir das experiências do agente, quando explica;
Habitus seria um conjunto de esquemas implantados desde a primeira educação
familiar, e constantemente reposto e retualizado ao longo da trajetória social restante,
que demarcam os limites à consciência possível de ser mobilizados pelos grupos e/ou
classes, sendo assim responsáveis, em última instância, pelo campo de seu sentido em
que operam as relações da força. Para além das “comunicações das consciências”, os
grupos e/ou classes compartilham das inúmeras competências que perfazem seu
capital cultural, como uma espécie de princípio que rege as trajetórias possíveis e
potenciais das práticas. (BOURDIEU, 2001, p.XLII).
Portanto, o habitus orienta as ações e tanto ele como as representações sociais
estabelecem uma estrutura epistemológica entre sujeito/objetivo. Essas reflexões estão
diretamente vinculadas às noções de representações sociais, visto que privilegiam os modelos
ou “padrões” construídos socialmente e sua “impregnação” como um fazer constante, próprio
do cotidiano. O fazer do professor e as noções de aluno são produzidas nas relações sociais e
consolidadas no habitus, assim o seu estudo é importante na compreensão das ações ou
práticas pedagógicas.
6
Obra organizada por Renato Ortiz, coordenada por Florestan Fernandes e traduzida por Paulo Monteiro e Alícia
Auzmendi (vide referências bibliográficas).
7
Na visão escolástica, Modus operandi é uma disposição estável para se operar numa determinada direção.
49
Nessa pesquisa, buscamos compreender como as ações dos professores de Matemática
das escolas públicas são orientadas e podem estar pautadas pelos habitus. Perrenoud (1997)
nos remete a uma reflexão acerca das competências, qualificações e os meios de avaliação que
um professor põe em prática. Para o autor, o professor ao ensinar convive com situações
imprevistas, precisando sair delas com grande precisão, agindo, muitas vezes, de forma não
racional e reflexiva, mas utilizando de uma resposta pré-programada retirada de seu repertório
acabado, influenciado pelo habitus. Explica:
O habitus é formado por rotina, por hábitos no sentido comum da palavra, mas
também por esquemas operatórios de alto nível. Improvisar não equivale a repetir
mecanicamente. Existe sempre uma parte de acomodação, de diferenciação, de
inovação na resposta a uma nova situação, mesmo que transponhamos condutas
eficazes num outro contexto (PERRENOUD, 1997, p.108).
Assim compreendemos que não é possível construir habitus no processo de
formação dos professores, uma vez que não se pode prever o cotidiano da sala de aula, com
todas as situações que venham a ocorrer, no entanto, é possível preparar o futuro professor,
desenvolvendo equilíbrio emocional para lidar com as emoções excessivas, a indiferença e a
hostilidade na sua prática, isto é, durante a formação do professor é possível ajudar a analisar
os seus impulsos e tudo que pode interferir no
habitus que, segundo Perrenoud, ele pode ser
constituído “não em circuito fechado, mas à medida de uma interação entre a experiência, a
tomada de consciência, a discussão, o envolvimento em novas situações”.
A experiência no âmbito do ensino e a atividade docente são chamados por Tardif de
“saberes da experiência ou da prática”, que são nada mais que os saberes que se incorporam
na vida individual e coletiva sob forma de habitus e de habilidades de fazer e saber ser, que
fundem e (re)significam os saberes provenientes da formação inicial: “Os saberes
experienciais não são saberes como os demais; são, ao contrário, formados de todos os
demais, mas retraduzidos, polidos e submetidos às certezas construídas na prática e na
experiência” (TARDIF, 1991, apud GONÇALVES, FIORENTINI, 2005, p. 83).
Dessa forma, Perrenoud nos remete a uma prática reflexiva e crítica, às
representações incutidas na formação dos professores que os preparam para interiorizar,
valorizar e respeitar normas, provocando um olhar essencialmente normativo sobre a
realidade como, por exemplo:
Um professor está constantemente tentado a considerar que os pais não assumem a
suas responsabilidades, que os colegas dos graus precedentes não preparam
convenientemente os alunos, que os autores de metodologias e de meios de ensino
não estavam à altura de sua tarefa, que os professores de apoio não desempenham a
sua função. Quanto ao aluno, é tentador atribuir as diferenças de comportamento ou
a falta de vontade de trabalhar a uma forma ou outra de inadaptação ou de desvio
(PERRENOUND, 1997 p.111).
50
Nesse ínterim, entendemos que a formação inicial do professor é impregnada de
normas que influenciam seus habitus e que, muitas vezes, não condizem com determinada
realidade. Nesse sentido, Ortiz (1994, p.18) nos adverte que:
[...] a ação pedagógica na primeira fase de formação do agente é vista como
produtora de um “hábito primário, característica de um grupo ou de uma classe que
está no princípio da constituição ulterior do todo outro hábito.”
8
As estruturas de um
habitus logicamente anterior comandam, portanto, o processo de estruturação de
novos
habitus a serem produzidos por novas agências pedagógicas.
Na prática, o professor direciona suas ações baseado nos conhecimentos adquiridos
na sua formação, nos saberes acumulados e incorporados pela sociedade, além do que o
professor pode formar habitus no processo de seu fazer docente, construindo dessa forma sua
prática, não apenas no produto proveniente de sua formação, mas também pautado pelas
experiências adquiridas dentro e fora da sala de aula, somadas aos saberes, crenças e
representações incutidas na sua trajetória profissional. Nesse contexto, podemos afirmar que
as representações sociais colaboram na construção do habitus, pois são construtos de práticas
produzidas na interioridade das matrizes cognitivas, compondo um referencial quando
colocadas em confronto com as matrizes do social, produto dos saberes e práticas sociais
compartilhadas, elementos que compõem o universo cultural, que influenciam e são
influenciados por ele.
A partir do estudo de representações sociais e habitus, que são subjacentes às ações
dos indivíduos, discutidas neste capítulo, buscamos compreender essas matrizes cognitivas
referentes ao aluno da escola pública, do professor de Matemática do Ensino Fundamental das
escolas públicas de Parnaíba e refletir sobre seu posicionamento diante das questões
abordadas nas entrevistas que lhes propomos e que são analisadas no Capítulo V desta
dissertação. A seguir, apresentaremos os procedimentos acerca da metodologia utilizada neste
trabalho de pesquisa.
8
Obra organizada por Renato Ortiz, coordenada por Florestan Fernandes e traduzida por Paulo Monteiro e Alícia
Auzmendi (vide referências bibliográficas). Trecho citado por Ortiz, extraído da Obra “A Reprodução” de
autoria de P. Bourdieu e J. C. Passeron.
51
CAPÍTULO IV
APORTE METODOLÓGICO
Para estudar as representações sociais dos professores de Matemática acerca do aluno
de escola pública, optamos por uma metodologia que privilegiasse aspectos
quanti/qualitativos. A pesquisa qualitativa explica o significado do fenômeno e dos processos
sociais, envolvendo crenças, valores, representações sociais que orientam as relações entre os
indivíduos (PÁDUA, 2000).
Na pesquisa qualitativa, a produção de conhecimento científico se através da
interligação entre alguns elementos presentes no contexto investigado, tais como o
pesquisador, os sujeitos envolvidos no cotidiano estudado, o referencial teórico e os próprios
instrumentos selecionados e sistematizados para a coleta. Essa interação e o reconhecimento
dos pontos que devem interligar esses elementos constituem ponto central para o
desvelamento da realidade. Nesse sentido, reflete Cavalcante: A realidade não pode ser
pensada e analisada de longe, o pesquisador precisa estabelecer contato, ‘participar’, dialogar,
tornar os sujeitos envolvidos parceiros de suas inquietações, parceiros do ato investigativo”
(2006, f. 34).
A pesquisa qualitativa, portanto, trabalha com a subjetividade, tentando interpretar o
discurso dos sujeitos a fim de entender a natureza do fenômeno social. A intersecção entre
qualidade e quantidade é uma característica que está impressa na análise apresentada acerca
do real e do próprio processo de investigação, visto que na qualidade, podemos encontrar a
quantidade quando temos que descrever espaços, pessoas e ações. Assim também na
quantidade, encontramos a subjetividade do pesquisador escolhendo categorias de análise,
tópicos de questionários e analisando dados. Dessa forma, procuramos harmonizar na nossa
pesquisa os métodos quantitativo e qualitativo, considerando que diante de certas situações,
apresentamos dados em números com relação ao exercício da docência dos sujeitos
entrevistados, a questão de gênero, dentre outros fatores. Nesta perspectiva, André argumenta:
Por essa razão não me parece ser muito conveniente continuar usando o termo
‘pesquisa qualitativa’ de forma tão ampla e genérica como preferem alguns. Eu
reservaria o termo quantitativo para diferenciar técnicas de coleta ou, até melhor,
para designar o tipo de dado obtido, e utilizaria denominações mais precisas para
determinar o tipo de pesquisa realizada: histórica, descritiva, participante,
etnográfica, fenomenológica, etc. (2005, p.24-25).
52
Nesse sentido, considerando a especificidade da pesquisa realizada, visto que procurou
refletir sobre as representações acerca do aluno da escola pública partilhadas por professores
que ensinam Matemática, escolhemos trilhar o caminho metodológico da pesquisa
exploratória descritiva que tem sido utilizado para aproximar o universo das ideias, valores e
intuições, presentes entre os sujeitos e que revelam aspectos importantes do real. Para
Richardson (1999), esse tipo de abordagem propõe descobrir as características de um
fenômeno, considerando o contexto em que estão inseridos.
A técnica de coleta de dados que escolhemos foi a entrevista semiestruturada
9
, que é
construída por perguntas abertas, com maior flexibilidade nas respostas o que vislumbramos
contribuir para garantir um feedback mais fidedigno.
4.1 Procedimentos de coleta de dados
Iniciamos o trabalho de campo fazendo um levantamento do universo pesquisado a
fim de traçar um perfil do grupo de professores de Matemática e selecionar aqueles que
estavam dentro dos critérios desejados. O convite à participação na pesquisa foi feito
individualmente, quando apresentamos rapidamente o objetivo do estudo.
A elaboração e a análise do roteiro de entrevistas semi-estruturadas foi o segundo
passo para a coleta de informações, o que nos permitiu verificar se as perguntas estavam
realmente atendendo ao objetivo de nosso estudo para então dar início ao processo de
entrevistas.
Após agendar previamente as entrevistas, organizamos um cronograma dessas
sessões, bem como identificamos locais adequados nas várias escolas para possibilitar um
momento tranquilo para o diálogo. Observamos, logo de início, a existência de empatia com
todos nossos interlocutores, uma vez que fomos recebidos de forma cordial, solidária e todos
encontraram um “jeitinho” para dedicar parte de seu precioso tempo ao nosso trabalho.
Assim, todas as entrevistas aconteceram num ambiente amigável, onde a conversa fluiu
descontraidamente, o que nos assegurou respostas sinceras, espontâneas e de grande valia
para nossa pesquisa.
9
Entrevistas semi-estruturadas são aquelas que possuem um roteiro flexível, possibilitando um diálogo aberto
entre professor (a) e entrevistador (a), ou seja, novas perguntas podem surgir mediante a conversação. Vide
Anexo A.
53
Começamos as entrevistas no início do mês de agosto de 2008 e as concluímos no
final de setembro do mesmo ano. Passamos, portanto, aproximadamente 55 dias trabalhando
nos três turnos. Concomitantemente, íamos logo fazendo a transcrição, o que nos permitiu
melhorar gradativamente a qualidade das entrevistas, porque, ao repassar para o papel, a fala
de nossos interlocutores íamos captando aquilo que tinha ficado a desejar. Assim, no ato de
transcrição, fomos averiguando se as análises prévias levantadas a respeito de nosso objeto de
estudo se confirmavam ou não.
A entrevista abordava sobre o tempo de experiência no magistério, sobre a
metodologia de ensino, grau de dificuldade dos alunos nas duas instituições, o interesse dos
alunos, a motivação para aprendizagem da disciplina, bem como estimulava à construção de
um perfil dos alunos da escola pública e privada. O tempo para cada entrevista foi de
aproximadamente 30 minutos.
4.2 Caracterização dos sujeitos envolvidos no estudo
Realizamos a pesquisa na cidade de Parnaíba, onde entrevistamos 20 professores de
Matemática do Ensino Fundamental que lecionam ou lecionaram, concomitantemente, nas
redes de ensino público e privado, visto que o objetivo foi apreender as Representações
Sociais dos professores de Matemática acerca dos alunos da escola pública com vistas a
observar possíveis relações entre tais representações e suas práticas pedagógicas.
Nesse sentido, adotamos dois critérios na escolha de nossos interlocutores: o primeiro
é que fossem ou que tivessem sido professores de Matemática do Ensino Fundamental de
Parnaíba; e o segundo é que tivessem tido experiência na rede pública e privada na referida
cidade. A nossa intenção primeira era que os professores entrevistados estivessem lecionando
atualmente nas duas redes de ensino, não encontrando 20 professores dentro desse perfil,
flexibilizamos o critério da escolha, conforme mencionamos acima.
Assim, após definir o perfil dos professores que atenderiam a nossa proposta de
pesquisa, passamos a visitar as escolas de Ensino Fundamental públicas e privadas da cidade
de Parnaíba, onde entrevistamos 20 (vinte) professores com experiência docente na disciplina
de Matemática nas duas redes de ensino. O Gráfico 1 nos remete ao perfil dos entrevistados
quanto à rede de atuação.
54
Gráfico 1 – Perfil dos entrevistados quanto à atuação nas redes de
ensino público e privado
65%
10%
25%
PROFESSORES LECIONANDO NA ESCOLA PÚBLICA E PRIVADA
PROFESSORES LECIONANDO SOMENTE NA ESCOLA PÚBLICA
PROFESSORES LECIONANDO SOMENTE NA ESCOLA PRIVADA
Dos 20 (vinte) professores entrevistados, 13 (treze) estão atualmente ministrando aulas
de Matemática no Ensino Fundamental, tanto em escola pública quanto em escola privada.
Dois professores deixaram a escola privada e lecionam agora somente na escola pública.
Quatro estão, no momento, lecionando apenas na rede privada e um professor, recentemente,
aposentou-se da rede pública e na rede privada deixou de lecionar nas séries mais avançadas
do Ensino Fundamental, passando a lecionar agora em escola particular, nas séries iniciais do
Ensino Fundamental.
Ao fazermos um levantamento do universo pesquisado, observamos que a rede privada
compõe seu quadro docente com um número significativo de professores atuantes no ensino
público e que na rede pública de ensino, universo bem mais amplo, encontramos um grande
número de professores exclusivos, mas que, expressiva maioria, não possui vínculo
empregatício, atuando como estagiário/bolsista. Esse público não foi selecionado para
participar da pesquisa por não corresponder aos critérios adotados e também porque, muitas
vezes, está numa condição passageira como professor.
Assim a maioria dos professores de Matemática, dentro do perfil que buscamos e que
foi descrito anteriormente, é do sexo masculino (60%). O Gráfico 2 nos uma visão dessa
realidade.
55
Gráfico 2 – Perfil dos entrevistados quanto ao gênero
60%
40%
HOMENS MULHERES
Verificamos, assim, a predominância de professores do sexo masculino na área de
exatas. Segundo Brito (1996, p.75), “a habilidade matemática é uma característica masculina,
portanto os homens apresentam alta habilidade matemática e baixa habilidade verbal,
enquanto as mulheres apresentam alta habilidade verbal e baixa habilidade matemática.” No
entanto, sabemos que em relação à questão de gênero, ouvimos nas falas de P11 e P12:
Eu vejo a dificuldade na aprendizagem da disciplina Matemática, mais da parte do
sexo feminino, não sei porque a matéria de cálculo, o sexo feminino tem mais
dificuldade de aprendizagem (P11).
Um dos meus objetivos como professor de Matemática é desmistificar essa idéia que
a Matemática é um bicho papão, que é uma disciplina que os homens têm mais
afinidades e as mulheres não (P12).
Neste conjunto de falas percebemos duas representações sociais sobre a disciplina
Matemática: uma que Matemática é difícil a outra que os homens se saem melhor que as
mulheres em Matemática.
Em relação às Representações Sociais sobre gênero na escola, nos reportamos a uma
pesquisa sobre meninas e Matemática, realizada por Walkerdine (1995, p.214). A autora
descreve que:
[...] quando os resultados dos alunos e das alunas invertiam a expectativa, isto é, as
mulheres fossem mais bem sucedidas que os homens, contrariando o modelo
tradicional, as justificativas dos professores, eram que as mulheres eram mais
esforçadas enquanto os homens não se saíram bem porque eram inquietos, mas
muito brilhantes, menosprezando as potencialidades do sexo feminino.
Nesse aspecto, ficou evidente que existe uma representação de que a Matemática
enquanto área de conhecimento está permeada também por uma perspectiva sexista,
56
atribuindo ao sexo feminino condição inferior no campo da aprendizagem na disciplina
Matemática.
Recentemente, Góis (Folha de São Paulo, 04.01.2009) relatou que a Matemática já não
é mais especialidade dos garotos, comprovando com dados do SAEB (avaliação da
qualidade de educação realizada pelo Ministério de Educação e Cultura MEC). Segundo a
pesquisa, “durante 1996 a 2007 a distância que separava meninas de meninos nessa disciplina
diminuiu em todas as séries analisadas.” Para caracterizar essa nova realidade, Góis explica
que em países com níveis altos de igualdade de gênero, não diferença no aproveitamento
da disciplina Matemática quanto ao sexo.
Quanto ao tempo de magistério como professor de Matemática, verificamos que a
metade dos professores entrevistados tem mais de 10 anos de experiência profissional,
conforme pode ser visualizado no Gráfico 3.
Gráfico 3 – Perfil dos entrevistados quanto ao tempo de experiência
no magistério
50%50%
ACIMA DE 10 ANOS ABAIXO DE 10 ANOS
O tempo de magistério dos professores de Matemática, alvo de nossa pesquisa, ficou
dentro do intervalo de 4 a 28 anos de profissão, sendo que 50% (cinqüenta por cento) estão
acima de 10 (dez) anos no exercício da profissão e 50% (cinqüenta por cento) abaixo de 10
(dez) anos. Portanto, são professores experientes e com bastante familiaridade com a
disciplina, com a escola pública e privada e com os alunos das duas redes de ensino.
Nesse contexto, depois de conhecer nossos interlocutores quanto à atuação nas redes
de ensino pública e privada, e quanto ao gênero e tempo de magistério, seguimos no diálogo
57
em busca de respostas para as questões que permitissem a explicitação das Representações de
aluno da escola pública compartilhadas pelos professores.
Cada resposta coletada nas entrevistas que realizamos com os 20 professores de
Matemática do Ensino Fundamental de Parnaíba foi analisada individualmente, procurando
compreender a colocação dos sujeitos diante das perguntas arguidas em entrevista semi-
estruturada, de acordo com um roteiro elaborado previamente.
Os professores por meio de suas falas deixaram transparecer, de forma explícita, as
representações sociais que partilham sobre seus alunos, emitindo crenças, valores e atitudes
como educadores, assim como revelaram a condução de suas práticas no cotidiano escolar.
4.3 Análise dos dados
Entrevistamos os professores utilizando gravador e fita cassete. O momento da
transcrição foi iniciado com a escuta da gravação por seguidas vezes, a fim de possibilitar
impregnar no pesquisador o conteúdo para estabelecer uma transcrição literal da fala do
interlocutor, facilitando o momento de categorização dos discursos e análise dos dados.
Fizemos a análise dos dados de acordo com o processo do método de análise de
conteúdo utilizando a técnica de análise categorial, isto é, classificando os elementos do
conjunto pesquisado, diferenciando cada um deles e reagrupando.
A análise de conteúdo é definida por Bardin (1977, p.117) como “um conjunto de
técnicas de análise de comunicação que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de
descrição de conteúdos das mensagens”, enquanto que para Franco (2003, p.14), “a análise do
conteúdo, assenta-se nos pressupostos de uma concepção crítica e dinâmica da linguagem”.
Explica ele, que essa linguagem é aquela construída na sociedade, elaborada em momentos
históricos diferentes, desenvolvendo representações sociais identificadas na linguagem,
pensamentos e ações de forma interativa.
Dessa forma, fomos identificando categorias, em conformidade com as falas dos
entrevistados. Entendemos que formular categorias é interpretar o real, através da análise do
material colhido até chegar ao ponto satisfatório e realístico. Segundo Cury (1985, p.21), as
categorias “possuem simultaneamente a função de intérpretes do real e de indicadoras de uma
estratégia política. As categorias são instrumentos metodológicos da dialética para analisar os
fenômenos [...].”
58
Assim, cada resposta de nossa entrevista serviu para determinar as categorias
empíricas
10
que são “objeto” de reflexão neste estudo, analisadas de forma mais detalhada no
capítulo V. Enfatizamos, também, que foi resguardada a identidade de cada professor, na
tentativa de preservá-lo, pois partilharam nas entrevistas sua representação de aluno da escola
pública e privada, bem como estabeleceram críticas à forma como seus pares atuam
profissionalmente nessas escolas.
10
Categorias empíricas são nomeações atribuídas aos dados para sintetizar as ideias ali presentes. Emergem no momento da
pesquisa de campo, possuem vínculo com o roteiro de entrevistas, bem como com o aporte teórico (OLIVEIRA, Marly de P.
p.27).
59
CAPÍTULO V
ANÁLISE DOS DADOS COLETADOS: resultados e reflexões
Neste capítulo analisamos os dados coletados nas entrevistas realizadas com 20
professores de Matemática das duas redes de ensino, pública e privada, de Parnaíba.
A partir do primeiro questionamento, os dados foram analisados tomando por base a
técnica de análise categorial, conforme Bardin (1977). Essa técnica é dividida em fases: inicia
com a escuta das falas, transcrição e nova leitura do material a fim de agrupar as recorrências
por questões, sistematizando os discursos em grupos de categorias; nova leitura para
organização de subcategorias e nova sistematização em subgrupos ou unidades de análise.
Indagamos os sujeitos com a primeira questão: “Já que você é ou foi professor de
Matemática tanto na escola pública, quanto na escola privada, gostaria que você relatasse sua
experiência, descrevendo o nível dos alunos de cada rede de ensino”. Analisando as respostas,
observamos uma tendência de se julgar o aluno da escola pública com menos capacidade do
que o aluno da escola particular. Assim, 100% dos professores enfatizaram o baixo nível dos
alunos da rede pública, justificando que esse público vive em uma realidade socioeconômica
inferior; não são estudantes profissionais, o que reduz seu tempo de dedicação aos estudos; os
pais não os acompanham em suas atividades escolares; o ensino da escola pública é inferior,
pois não dispõe de recursos didáticos e maior controle do grupo gestor; ainda, o desinteresse
dos alunos é maior que na escola da rede privada.
A análise e reflexão das falas dos entrevistados permitiram a construção de seis
categorias que justificam esse baixo nível, distribuídas por percentuais em ordem decrescente
na Tabela 1/Gráfico 4.
Tabela 1 - Fatores que justificam o baixo nível dos alunos da escola pública na perspectiva docente
CATEGORIAS QUANTIDADE DE RESPOSTAS PERCENTUAL
1. Falta de Base 11 55%
2. Baixo Nível Econômico 07 35%
3. Ausência da Família 06 30%
4. Recurso Didático Precário 04 20%
5. Escola Transigente 04 20%
6. Discente Desinteressado 03 15%
60
Gráfico 4 – Fatores que justificam o baixo nível dos alunos da escola pública na perspectiva docente
55
35
30
20 20
15
0
10
20
30
40
50
60
1
Categorias
Percentual %
Falta de Base
Baixo vel Econômico
Ausência da Família
Recurso Didático
Precário
Escola Transigente
Discente
Desinteressado
De acordo com as falas dos professores entrevistados, concluímos que das seis
categorias que representam o nível do aluno da escola pública, quatro são oriundas de um
contexto macro, portanto o aluno é vítima de problemas sociais, que escapa a sua vontade.
Assim, as categorias: baixo nível econômico, ausência da família, recurso didático precário,
escola transigente, estão fora do aluno, alheia a sua vontade, não nos permitindo, dessa forma,
responsabilizá-lo pelo nível a ele imputado.
Falta de base, categoria que está representada pelo percentual de 55%, foi a
frequência mais elevada, o que significa dizer que mais da metade dos professores
entrevistados atribuem à formação anterior, base para o rendimento escolar, um grau de
inferioridade significativo em relação à bagagem de conhecimentos dos alunos da escola
pública quando, comparados aos alunos da rede particular. Entre alguns dos relatos dos
professores interlocutores, ao serem indagados a respeito dessa questão, destacam as seguintes
falas:
Bem, na escola particular, os alunos têm uma base um pouco melhor devido as
séries iniciais, eles terem sido melhor preparados. na rede pública, parece que
uma deficiência na base. Então, quando chegamos nas séries seguintes eles têm
certa dificuldade porque não aprenderam conceitos básicos de matemática (P2).
Na área de matemática, uma diferença bem significativa, porque a grande
maioria dos meninos não tinha conhecimento básico da matemática. Por exemplo,
quando eu trabalhei no oitavo e sétimo ano, vamos dizer assim, 80% dos alunos não
sabiam nem a tabuada. Então, ficava complicado trabalhar a matemática com essa
dificuldade na base. Na escola privada também existe isso, só que em número
menor (P8).
Na escola privada o ensino é bem melhor. Os alunos aprendem com mais
facilidade, ele tem uma base de conhecimento que não dificulta tanto essa
61
aprendizagem. Já na escola pública, eles não trazem essa base, então, eles não
aprendem com tanta facilidade. Eu acredito que por não ter base de ensino, eles
aprendem com mais dificuldade. O conteúdo que a gente trabalha numa série numa
escola privada, tem que trabalhar num nível mais baixo, vamos falar assim, para
eles conseguirem aprender um pouco (P9).
Os alunos da escola pública estudam a noite, trabalham manhã e tarde, não tem
tempo para se dedicar aos estudos. na escola privada o aluno é profissional,
vive para estudar. [...] em termo de conhecimento a gente nota que o aluno da
escola privada tem um pouco mais de conhecimento e assimila a matéria, não sei se
por pressão que existe dentro de casa para aprender pelo fato de ser escola paga
(P11).
A representação que os professores entrevistados têm dos alunos de escola pública é
que seu conhecimento em relação aos conteúdos são deficitários, dificultando a aprendizagem
dos conteúdos subsequentes. Segundo eles, nas escolas públicas, esse conhecimento não é
transmitido de forma satisfatória uma vez que o conteúdo programático não é repassado
integralmente, ficando sempre uma defasagem.
Nesse contexto, Mantoan (2002) questiona sobre a prática do professor, antes de
buscar o fracasso e a deficiência do aluno. Segundo ele, o ensinar e aprender são uma via de
mão dupla, devendo o professor localizar as barreiras que estão impedindo o resultado
positivo de seu trabalho. Assim, a reflexão individual e coletiva leva o professor a aprender,
conhecer, aprender a fazer e conviver com as dificuldades, planejando e criando situações que
favoreçam o desenvolvimento cognitivo do aluno.
No entanto, verificamos que o esforço do professor para transmitir o conhecimento,
que é resguardado no conteúdo programático, escapa a sua capacidade de gestão, uma vez que
na escola pública a quantidade de feriados e dias não letivos, em virtude de vários
acontecimentos de ordem social e emergente, impossibilita ao professor repassar para o aluno
todo o programa planejado para o ano letivo, necessário para dar continuidade aos saberes das
séries seguintes, como analisaremos nos depoimentos dos professores ainda neste capítulo.
A categoria baixo nível econômico ficou em segundo lugar, dentre as categorias
elencadas (35%). Sobre essa categoria, ouvimos de nossos entrevistados, que:
A maioria dos alunos de escola pública são pessoas carentes que não tem condição
e que a gente observa essa falta de condição, as dificuldades que surgem. [...]
Alguns deles trabalham desde cedo [...] Ele tem pouco menos de tempo, eles não
têm recursos para comprar livros, utilizar alguns recursos extras, então ele tem que
estudar com o básico, com aquilo que a escola oferece, onde na realidade o aluno
da escola privada tem outros recursos (P1).
Eu acho que os alunos da escola privada são mais privilegiados, acho que pelo
poder aquisitivo, eu acho que isso diferencia [...] Quem está na escola pública, é o
pessoal de uma renda menor [...] Isso interfere diretamente no rendimento do aluno,
é uma questão social mesmo (P5).
62
A relação entre os fatores macroestruturais e o rendimento escolar fundamentou os
estudos elaborados nas décadas de 1970 e 1980, apresentando a pobreza como determinante
no percurso escolar do aluno das classes populares. Entretanto, a perspectiva de análise do
fracasso escolar deve levar em conta vários fatores presentes não na dimensão extra-
escolar, mas também intraescolar, negando a visão determinista presente nas análises
anteriores
11
(ZAGO, 2003). Vimos nessa pesquisa que aluno de escola pública, na maioria,
não é estudante profissional, precisa, portanto, contribuir financeiramente com a família e
manter-se com o básico para seu sustento, o que reduz seu tempo de estudo e dificulta a
aprendizagem. Diante das condições financeiras precárias, esse aluno fica impossibilitado de
complementar seus estudos com outros saberes, comprar livros, acessar a internet e buscar
outras informações necessárias. Segundo Lima (2006, f.77), “a família e o baixo nível
socioeconômico se entrelaçam, que um dos problemas da família é o econômico”. Para
nossos entrevistados, o sucesso escolar dos alunos da escola privada em parte se pelo
acompanhamento da família.
A ausência da família no acompanhamento do aluno foi a categoria que ficou em
terceiro lugar de importância (30%). Vejamos alguns trechos de entrevistas em que os
entrevistados se referem ao acompanhamento dos alunos da escola pública pelos pais.
Bom, o nível tem relação direta com a participação da família. Porque
individualmente o nível não muda. Nós temos alunos bons na escola pública e na
escola privada. Agora, devido o acompanhamento, o maior interesse dos pais e
responsáveis, na escola privada, o nível se torna mais elevado (P15).
O nível dos alunos da escola pública é muito bom, pois eles têm a mesma
capacidade de aprendizagem, porém falta muitas vezes o acompanhamento da
família e os da escola privada quando os pais não podem acompanhá-los, eles pagam
um orientador (P16).
[...] A alimentação, o acompanhamento familiar, toda essa estrutura que envolve o
meio do aluno é importante, para que o aluno se sinta mais seguro. Qual o filho que
estuda na rede privada que a mãe deixa ir sem tomar café? Sem dar o dinheiro da
merenda? Qual é o filho que fica a tarde toda ociosa sem fazer nada? A mãe sempre
se preocupa em fazer uma atividade extra, um cursinho extra, ou um professor, ou
seja, um acompanhamento mais eficaz. Na rede pública não, se o aluno não se virar
por si só ele não irá se destacar (P20).
Para nossos entrevistados, os alunos de escola pública não têm o seu dia organizado
em torno das atividades escolares, com acompanhamento regular das tarefas como acontece
com boa parte dos alunos da escola particular. A falta desse acompanhamento contribui na
repetição de série, evasão, enfim, no fracasso escolar. Para Zago (2003, p. 20), “a família por
11
Referência ao capítulo II deste trabalho que enfatiza as ideologias explicativas do fracasso escolar que foram
sendo superadas: ideologia do dom; ideologia da deficiência cultural; ideologia das diferenças culturais.
63
intermédio de suas ações materiais e simbólicas, tem um papel importante na vida escolar de
seus filhos”.
A categoria recursos didáticos precários ocupou o quarto lugar (20%) dentre os
principais fatores que justificam o baixo nível dos alunos da escola pública, empatando com a
categoria escola transigente. Apresentamos, a seguir, o que ouvimos de nossos entrevistados,
a respeito dessa categoria.
O aluno da escola pública tem dificuldade de comprar material, não dispõe de
recursos como Internet, revistas, livros, enquanto que o aluno da escola privada tem
mais facilidade de dispor desse material didático (P13).
Nas escolas públicas nós temos muitos alunos bons, que perdem fazendo
comparativo com a escola privada, por falta de incentivo, falta material didático
que não é suficiente, por falta de até mesmo de condições sociais que afetam o
desenvolvimento do aluno (P15).
[...] na escola privada, os alunos têm mais livros, mais recursos, então se torna um
aprendizado mais dinâmico. Já na escola pública, nós temos mais carência de
material, inclusive isso está mudando, porque 10 anos atrás não se falava em
livro de matemática para esses alunos e hoje tem alguns colégios que tem livros
[...] Antes se fazia lista de exercício, apontamentos, ou seja, era muito mais difícil
(P20).
Podemos observar pelas transcrições das falas de nossos sujeitos, mencionadas
anteriormente, que dada à precária situação financeira dos alunos, eles não adquirem material
escolar indispensável a seus estudos. Em relação às condições socioeconômicas sobre a
definição do futuro escolar e social, Zago (2003, p.35) nos adverte que:
As difíceis condições de sobrevivência face a baixa renda, trabalho instável,
moradia nas favelas, não são evidentemente elementos favoráveis à freqüência da
escola e a construção de um percurso escolar regular, mas esses dados tomados
isoladamente não fornecem evidência suficientes para explicar as situações
escolares de sucesso ou fracasso escolar.
Em relação à categoria escola transigente (20%), verificamos na fala de nossos
interlocutores a necessidade do professor “puxar mais pelo aluno da escola pública” (P3).
Outro indicador dessa característica é representado pelo não cumprimento do conteúdo
programático de forma integral: “o professor o ano passado não explicou isso direito ou ainda
não conseguiu cumprir o conteúdo programático” (P4). Ainda, em outros depoimentos: “a
rede privada tem maior controle dos alunos, mais normas o que qualifica seu ensino” (P7).
Evidenciam, ao caracterizar a organização escolar, que o acompanhamento na escola pública,
tanto nos aspectos pedagógicos, quanto nos aspectos relativos às responsabilidades que o
professor assume, contribui para a qualidade na rede particular de ensino: “na escola
particular, o professor por ser acompanhado por uma equipe de coordenadores, tem mais
responsabilidade, o que não acontece na rede pública” (P10). Compreendemos dessa forma
64
que a condescendência da escola pública contribui para uma representação não satisfatória do
professor dessa instituição de ensino, conduzindo ao desenvolvimento de certo habitus, já que
se tornou senso comum afirmar que neste espaço educacional desenvolve-se uma prática
descompromissada. O habitus torna-se elemento da própria identidade ou perfil profissional
dos docentes, sendo consubstanciado nas práticas cotidianas, num fazer rotineiro aliado ao
repertório de ideias e valores próprios das representações do ser professor no espaço público.
Segundo Bourdieu (1994, p.76),
[...] o habitus produz práticas, individuais e coletivas, produz história, portanto, em
conformidade com os esquemas engendrados pela história [...] é o sistema de
disposições passado que sobrevive no atual e que tende a perpetuar-se no futuro,
atualizando-se nas práticas estruturadas segundo princípios.
Vimos que os pontos abordados em quatro categorias que construímos com base nas
respostas da primeira questão não imputam diretamente ao aluno da escola pública a
responsabilidade do baixo nível que carregam em relação aos alunos da rede particular. Nesse
sentido, Libâneo (2002, p.11) critica os órgãos oficiais que declaram a democratização da
escola e que embora proclamem e favoreçam o acesso à escola das camadas populares, não
oferecem de fato condições mínimas que assegurem o seu funcionamento, tais como: bons
salários aos professores, condições favoráveis de trabalho, consequentemente, condições de
aprendizagem aos alunos.
Em relação ao desinteresse do discente, última categoria que listamos quanto ao nível
dos alunos da escola pública, 15% dos entrevistados atribuem o baixo nível desse aluno ao
seu desinteresse no estudo da Matemática.
Olhe em relação a rede pública a gente percebe, um certo desnivelamento porque o
aluno da escola pública não tem gosto. [...] a grande maioria dos alunos da rede
pública não tem apreço pela disciplina. Não demonstram interesse em aprender.
(P4).
Na escola pública, os alunos são desinteressados. De 30 alunos que a gente tem 5
querem chegar na faculdade, o restante querem terminar. Às vezes tão na escola
pela bolsa família ou por algum projeto de vida que obriga o aluno está na sala de
aula (P9).
De acordo com os professores entrevistados, aparentemente, cabe ao aluno a
motivação e esforço nos estudos para melhorar o seu nível. Porém, compreendemos através de
leituras, baseadas em estudos sociológicos, que o interesse ou desinteresse do aluno não é
consequência somente da inserção no meio em que vive, portanto, mesmo que a família e sua
situação financeira influenciem e motivem o aluno nesse percurso à escola cabe um papel
importante. Segundo Soares (1992), o fracasso escolar das camadas populares é explicado por
ideologias que buscam na desigual distribuição de riquezas, na carência cultural, fundamentos
65
que justifiquem o baixo aproveitamento do aluno e até mesmo sua aptidão. Ideologias que
terminam por direcionar ao aluno e a sua condição social a responsabilidade pelo ato de
aprender. Nesse sentido indagamos: Qual o papel da escola? Onde situar seu grau de
responsabilidade?
A segunda pergunta que fizemos aos professores entrevistados foi a seguinte: onde é
mais difícil ser professor de Matemática, na escola pública ou privada? Por quê?
Ao analisarmos as falas de nossos interlocutores, concluímos que dos 20 professores
entrevistados, 45% indicaram a escola pública com maior grau de dificuldade para lecionar,
em virtude da ausência de material didático, precária situação financeira dos alunos, enquanto
15% apontaram a escola privada como muito exigente, falta de liberdade de escolhas e alunos
indisciplinados, preferindo lecionar na escola pública. Oito professores, que representam 40%
dos entrevistados, declararam que em ambas existem dificuldades.
Analisando as justificativas de suas respostas, encontramos 4 (quatro) categorias as
quais são apresentadas a seguir na Tabela 2 e no Gráfico 5.
Tabela 2 - Fatores que dificultam o ensino na Escola Pública atribuídos pelos professores de Matemática
do Ensino Fundamental de Parnaíba
CATEGORIAS QUANTIDADE DE RESPOSTAS PERCENTUAL
1. Baixo Rendimento Escolar 11 55%
2. Discentes Desinteressados 07 35%
3. Recurso Didático Precário 02 10%
4. Baixo Nível Econômico 01 5%
Gráfico 5 – Fatores que dificultam o ensino na Escola Pública atribuídos pelos professores de Matemática
do Ensino Fundamental de Parnaíba
55
35
10
5
0
10
20
30
40
50
60
Baixo Rendimento Escolar
Categorias
Percentual %
Baixo Rendimento
Escolar
Discente
Dessinteressado
Recurso Didático
Precário
Baixo Nível Econômico
66
Ao compararmos as categorias que emergiram da questão 1 com as que emergiram da
questão 2, verificamos que as categorias encontradas na questão 1 estão contidas na questão 2.
Assim, constatamos que as representações sociais elaboradas pelos professores entrevistados,
a respeito do aluno da escola pública, apresentam esse aluno como detentor de baixo
rendimento escolar, em função da defasagem referente às séries anteriores (categoria presente
cinco vezes nas questões formuladas, com percentual sempre elevado), do qual a escola e a
família têm sua parcela de responsabilidade. Esse contexto também é explicado pelo
desinteresse do aluno em virtude dos problemas sociais enfrentados, sem maiores condições
de dedicar-se aos estudos pelo fato de trabalhar desde cedo, enquanto que a precária situação
financeira da família não o possibilita enriquecer seus conhecimentos, utilizando recursos
extraescolares.
Na questão 2, constatamos que os professores, em sua maioria, consideram a escola
pública como a instituição mais difícil de trabalhar, visto que tanto o público atendido quanto
as condições materiais representam obstáculos ao desenvolvimento de suas atividades. Os
depoimentos que seguem ilustram esse cenário:
Eu considero mais difícil lecionar na escola pública porque os alunos são
desinteressados, faltam e não são cobrados nem pelos pais nem pela escola. Na
escola privada, nós temos mais acompanhamento dos alunos (P8)
É mais difícil ser professor de Matemática na escola pública, porque os alunos não
freqüentam assiduamente as aulas, são desinteressados e isso nos obriga a repetir, a
voltar o assunto (P11)
Bom, é muito mais difícil na escola pública, pelo fato de você ter que voltar a séries
passadas para você poder relembrar o aluno do que foi visto [..] É muito mais difícil
na escola pública pelo fato de desinteresse do aluno, também pela quantidade de
faltas. (P 11)
Na escola pública, nós temos aquela deficiência do aluno. [...] A gente tem aquela
deficiência do aluno ser mais velho, mais atrasado, infelizmente o acompanhamento
familiar não é como o da escola privada, até mesmo na alimentação. (P20)
Quanto à representação que o professor tem da escola pública, de acordo com suas
falas, é de que sua estrutura é inferior oferecendo um trabalho pedagógico desprovido de
material didático, inclusive com muita carência de livros e que, diferentemente da escola
particular, o professor da escola pública não é acompanhado pela direção e coordenação de
forma eficaz.
Existe sempre uma distorção muito grande entre escola pública e privada, a gente
nota que nas escolas públicas, existe uma carência muito grande a própria estrutura
da escola deixa a desejar. [...] não tem biblioteca com muitos livros como nas
67
escolas privadas e falta a presença da coordenação e direção tanto em relação ao
professor como ao aluno (P17)
Dessa forma, duas representações foram abordadas pelos nossos interlocutores na
análise em questão. A representação social do aluno e a representação acerca da escola
pública. Vejamos as falas dos 15% dos professores que apontaram a escola privada como a
instituição mais difícil de lecionar.
Para lecionar na escola privada você tem que se adequar ao que o colégio quer. O
colégio é mais rígido e quer que você mude seu estilo. Na escola pública a gente fica
mais a vontade (P6).
É mais difícil ser professor de Matemática na escola privada porque os alunos são
mais indisciplinados. Na escola pública, embora não pareça o aluno respeita mais o
professor. Para mim se torna mais difícil ser professor na escola privada porque os
alunos não têm disciplina, principalmente em relação ao respeito pelo professor
(P15).
A escola particular hoje exige mais do professor, porque os alunos são mais
exigentes. Por isso eu acho mais complicado ser professor na escola privada porque
somos mais exigidos (P17)
As reflexões que indicam a escola privada como a instituição mais difícil de lecionar
remeteram-na ao patamar da exigência, pois nesse espaço é solicitado ao professor adaptação
de seu modelo pedagógico, bem como as exigências de coordenadores, pais e alunos são
elementos que contribuem para limitar sua liberdade. Outros depoimentos indicam a presença
do aluno como “cliente” que, na visão de mercado, deve ser aquele “que tem sempre razão”, o
que desvirtua os papéis tradicionalmente construídos e assumidos por professores e alunos no
âmbito da sala de aula.
Na terceira questão, indagamos: em sua opinião, existe diferença de aprendizagem
entre os alunos da escola pública ou privada? Justifique sua resposta?
Dos vinte professores entrevistados, apenas 1 (um) enfatizou que não existe diferença
de aprendizagem entre os alunos da escola pública e da escola privada. Os demais professores
(95%) apontaram as razões que justificam essa diferença de aprendizagem, conforme
visualizamos na Tabela 3 e no Gráfico 6.
68
Tabela 3 - Fatores que diferenciam a aprendizagem do aluno da escola pública, em relação aos alunos da
escola particular
CATEGORIAS QUANTIDADE DE RESPOSTAS PERCENTUAL
1. Baixo Nível Escolar 08 40%
2. Ausência da Família 06 30%
3. Estrutura da Escola Pública 03 15%
4. Baixo Nível Econômico da Família 02 10%
5. Desinteresse do Aluno 01 5%
6. Falta de Vontade Política 01 5%
Gráfico 6 - Fatores que diferenciam a aprendizagem do aluno da escola pública em relação ao aluno da
escola particular
40
30
15
10
5 5
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
1
Categorias
Percentual %
Baixo Nível Escolar
Ausência da Família
Estrutura da Escola
Pública
Baixo Nível Econômico
da Família
Desinteresse do Aluno
Falta de Vontade
Política
A partir da Tabela 3, do Gráfico 6, observa-se que o baixo nível escolar é a categoria
que melhor expressa a diferença na aprendizagem do aluno da escola pública em relação ao
aluno da escola particular. Segundo as representações dos professores as categorias que
melhor expressam e justificam essa diferença são, principalmente, o baixo nível escolar (40%)
e a ausência da família (30%). As categorias estrutura da escola pública (15%); baixo nível
econômico da família (10%); desinteresse do aluno (5%); e a falta de vontade política (5%)
também explicam tal diferença.
Em relação à categoria baixo nível escolar, a maioria dos entrevistados justifica
afirmando que alunos da escola pública apresentam maior dificuldade de aprendizagem na
Matemática porque não possuem uma “base consistente” quanto aos conteúdos ministrados
69
nas séries anteriores e que são pré-requisitos necessários à aprendizagem de novos conteúdos.
Esta categoria atingiu o maior percentual (40%) e aparece pela terceira vez ao analisarmos as
respostas de nossos entrevistados. Destacamos as seguintes falas:
O aluno da escola privada tem mais facilidade de absorver o conteúdo porque ele
traz bagagem dos anos anteriores. um aluno de escola pública como eu tinha
falado anteriormente, param de estudar, mudam constantemente de professores, a
bagagem que eles trazem não é satisfatória (P1).
A diferença que existe é justamente a base, que muitas vezes eles não têm. Na escola
privada eles têm base. Na pública a gente vê deficiência nesse ponto (P2).
A diferença está no déficit de aprendizagem. O que eu não consegui captar nas séries
anteriores vai me faltar na seguinte e dificultar a aprendizagem. [...] Na escola
pública o professor deixa lacunas (P4).
A maioria dos alunos de escola pública tem dificuldade de aprendizagem. Eles não
acumulam com tanta facilidade o conteúdo repassado. Falta base, parece que o
conteúdo anterior não foi visto (P9).
A diferença de aprendizagem existe. Existe na questão da base porque muitos alunos
da escola pública não têm base sólida da Matemática. Eles passam sem ter
conhecimento necessário e vai dificultar o trabalho da gente na série seguinte (14).
Existe sim, diferença de aprendizagem. Na escola privada o nível de escolaridade e
financeira é melhor, fazendo com que os alunos sejam mais preparados do que os
alunos da escola pública (P16).
Existe, porque na escola pública sempre uma defasagem do conteúdo de uma
série para outra e fica difícil para o aluno acompanhar. Já na escola privada, o
conteúdo é dado e o aluno está mais pronto para aprender o que se repassa (18).
Observamos que a maioria das falas sobre o aluno da escola pública se repete,
fortalecendo a ideia de que esse aluno fracassa em função da sua condição de classe, que
parece influenciar as representações sociais dos professores acerca do aluno da escola pública.
Portanto, o olhar do professor relaciona o baixo rendimento escolar do aluno à ausência da
família, ao baixo nível socioeconômico e desinteresse do aluno como características centrais
da situação escolar, discutidas anteriormente.
A ausência da família nas atividades escolares e no envolvimento geral com a escola é
bem mais evidente na rede publica de ensino. Na rede privada, parte do sucesso escolar dos
alunos é obtido em virtude do acompanhamento dos pais nas atividades escolares, conforme
podemos observar nos seguintes trechos de entrevistas:
A diferença da aprendizagem entre um aluno da escola pública e outro aluno da
escola privada está no acompanhamento da família. Na escola pública, os pais não
têm conhecimento para orientá-los (P8).
Existe diferença de aprendizagem, porque na escola privada por ser pago, o pai
também faz pressão para que os filhos estudem. Na escola pública, o aluno não tem
obrigatoriedade de freqüentar, perde aulas e não consegue acompanhar e a gente tem
que estar sempre voltando (P11).
70
A diferença na aprendizagem está no acompanhamento da família. [...] Hoje a escola
tem todo material e outros incentivos. Então a diferença, como eu falei , é na
parte de ter ou não acompanhamento pelos pais ou responsáveis. O
acompanhamento e interesses dos pais na escola privada tornam o nível do aluno
mais elevado (P15).
Existe diferença de aprendizagem entre os alunos da escola pública e privada desde
a família e o apoio escolar. [...] Aquele pai que está sempre presente, procura saber o
que está acontecendo, ensina a tarefa de casa, contribui para o aprendizado do aluno.
[...] Quando a família incentiva estudar, a buscar o aprendizado isso também facilita.
A escola particular tem mais subsídio no sentido de fazer essas coisas, buscar
atividades que melhora o aprendizado (P 19).
O aluno da escola privada tem toda estrutura familiar, onde o pai na verdade se
preocupa com os filhos. Não é que o pai humilde não se preocupe, mas que ele
não tem estrutura e isso influencia o adolescente que está em processo de formação
que fica inibido, vergonhoso por não ter condições (P20).
As falas dos professores entrevistados sobre as famílias dos alunos de escola pública
revelam que os pais não estão presentes na educação do filho, dentre as explicações dadas,
encontramos:
1. Baixa situação econômica da família;
2. Baixo nível cultural dos pais;
3. Falta de tempo, dentre outros.
De acordo com as falas dos entrevistados que transcrevemos a seguir, constatamos que
a escola pública foi também responsabilizada pela não assimilação do conteúdo transmitido
aos alunos, em virtude de sua estrutura precária, o que nos levou a criar uma categoria com a
denominação, estrutura precária da escola pública.
Na escola pública, o aprendizado do aluno é pior porque a estrutura da escola é
diferente da escola privada. Os alunos não têm acompanhamento, a quantidade de
horas/ aula no ensino público, ela é menor. [..] Normalmente, as escolas privadas são
menores, isso facilita mais a presença da direção, da coordenação um
acompanhamento mais próximo, acho que isso interfere diretamente na
aprendizagem. Não que os alunos da escola privada sejam mais capazes, mas
aprendem com mais facilidade por serem mais assistidos. A distinção está por
(P5).
A diferença de aprendizagem existe. Na escola pública, os alunos têm mais
dificuldade por causa da estrutura da escola que não tem recursos didáticos, acesso a
Internet, como os alunos da escola privada têm (P12).
A escola pública não tem estrutura adequada, seu estado deixa muito a desejar, a
diretoria da escola não tem bom empenho e isso dificulta a aprendizagem dos alunos
(P17).
Com base no que nos foi relatado pelos entrevistados, criamos uma quarta categoria,
baixo nível econômico da família, que contribui na justificativa de que a aprendizagem se
71
de forma diferenciada entre os alunos da rede pública e privada. Assim, ouvimos dos
professores entrevistados:
Existe diferença entre aprendizagem dos alunos porque, por exemplo, um menino de
escola particular os pais sempre estão colocando para eles estudarem, tem condições
de comprar livros, computador e na rede pública não tem isso (P3).
Existe mais aproveitamento na escola privada, em virtude das condições do aluno de
adquirir material escolar. Resumindo, o aluno da escola privada não tem problemas
sociais e financeiros (P13).
Ao aluno foi imputada a responsabilidade no aprendizado do que lhe é repassado
pelos professores. Alguns de nossos entrevistados representaram o aluno da escola pública
como desinteressado, o que nos levou a criar uma categoria com essa denominação, diante do
que emergiu das falas:
Existe diferença de aprendizagem. Os alunos da escola pública são mais alheios,
possuem grau de desinteresse muito grande e na escola privada pelo
acompanhamento dos pais os alunos são mais interessados e aprendem melhor (P6).
Fiorentini (2006, p.129), ao realizar uma pesquisa junto aos professores de Matemática
que atuam nas escolas públicas e privada no Estado de São Paulo, verificou que dentre
algumas dificuldades e insatisfação apontadas pelos docentes estava a falta de interesse dos
alunos. Segundo ele, o grande desafio do professor é conquistar esse aluno que não quer vir à
escola, não está interessado em aprender, muito menos a disciplina Matemática.
A falta de uma remuneração digna para o professor também foi abordada como
resposta nas entrevistas, ocasionando desmotivação ao professor que reflete
consequentemente na aprendizagem do aluno da escola pública. Vejamos o que disseram os
professores:
A motivação do professor vai refletir na forma de transmitir a disciplina para o
aluno, facilitando ou não sua aprendizagem. Os professores de escola pública são
sempre desmotivados em virtude dos governantes não enxergarem o estudo, a
batalha do professor para ganhar uma migalha. Os governantes precisam valorizar
mais o ensino em si (P10).
Assim, constamos que os professores, ao responderem essa questão, revelaram três
eixos representacionais, relacionados ao aluno, ao professor e a escola pública. Ao representar
os discentes, os professores enfatizaram que o aluno da escola pública apresenta um déficit de
conhecimento, uma situação financeira precária, a família não os acompanha nas atividades
escolares e são desinteressados.
Para os professores, a escola pública tem uma estrutura precária, o que significa dizer
que não possuem os recursos didáticos necessários para melhorar a qualidade das aulas, a
72
diretoria e a coordenação não são presentes, o tamanho da escola não é adequado e muitos
alunos são aglomerados em sala de aula.
[...] a gente tem que ter um pouco mais de cautela com o aluno da escola pública, a
gente precisa ter um pouco mais de paciência, os assunto tem que ser trabalhado
com mais calma porque apresenta muita dificuldade, além da estrutura e da falta de
acompanhamento por parte da direção que não existe. na escola privada, como
alguns deles são mais preparados, que tem outros recursos como a Internet,
livros didáticos a gente não observa tanta carência assim (P1).
Quanto aos professores, os relatos descrevem as dificuldades na profissão associadas a
má remuneração, desmotivação, o não cumprimento da carga horária, bem como afirmam que
alteram sua prática ao ministrarem aulas na escola pública, pois não conseguem transmitir
integralmente o conteúdo programático.
Nesse sentido, Marcondes (2002, p. 202) explica que os professores no Brasil
enfrentam diversos problemas ao lecionarem na escola pública em virtude das dificuldades de
materiais e recursos deficientes, além de sentir que sua profissão não é valorizada, ocupando
um baixo status social e um salário inadequado que não o motiva para um trabalho eficaz.
O professor que afirmou não existir diferença de aprendizagem entre os alunos da
escola pública ou privada, justificou sua resposta da seguinte forma:
Na minha opinião, não há diferença de aprendizagem entre os alunos da escola
pública ou privada, tudo depende do aluno. Se o aluno tem interesse, seja na escola
pública ou privada, ele conseguirá ter êxito naquilo que se propõe (P7).
Com o objetivo de averiguar se os alunos da escola pública têm acesso ao mesmo
conteúdo dos alunos da escola privada, fizemos o seguinte questionamento na quarta questão:
da mesma forma que é repassado o conteúdo programático na escola pública é repassado
igualmente na escola privada?
Oitenta por cento (80%) dos entrevistados responderam que o conteúdo programático
não é repassado igualmente nas duas redes de ensino. A partir de suas justificativas, criamos
algumas categorias, que podem ser visualizadas no Tabela 4, Gráfico 7.
Tabela 4 - Motivos que levam o professor de Matemática a repassar de forma diferente o
conteúdo programático na escola pública e na escola particular.
CATEGORIAS QUANTIDADE DE RESPOSTAS PERCENTUAL
1. Dias Letivos Insuficientes 06 30%
2. Baixo Rendimento Escolar 06 30%
3. Discente Desinteressado 02 10%
4. Docente Descompromissado 02 10%
5. Escola Transigente 02 10%
6. Faixa Etária Diversificada 01 5%
73
Gráfico 7 - Motivos que levam o professor de Matemática a repassar de forma diferente o conteúdo
programático na escola pública e na escola particular
30 30
10 10 10
5
0
5
10
15
20
25
30
35
1
Categorias
Percentual %
Dias Letivos
Insuficientes
Baixo Rendimento
Escolar
Discente
Desinteressado
Docentes
Descompromissados
Escola Transigente
Faixa Étaria
Diversificada
As categorias dias letivos insuficientes e baixo rendimento escolar atingiram
percentual mais alto (30%). Mais uma vez, o baixo rendimento escolar do aluno da escola
pública foi abordado, desta vez como sendo um dos motivos que leva o professor a repassar o
conteúdo programático de forma diferente em relação à rede privada. Parte dos discursos
(10%) remete ao professor, ao aluno e à escola, percentual igual de responsabilidade em
relação ao não cumprimento de forma satisfatória do conteúdo programático. Segundo eles,
na escola pública o conteúdo programático não é repassado integralmente, ou porque os
alunos são desinteressados ou porque os professores de escola pública não estão
comprometidos profissionalmente. Ainda indicam que, por ser mal administrada, a escola
pública tem seus dias letivos reduzidos, comprometidos pelos feriados, greves, problemas na
estrutura da escola como falta de água, situações emergenciais de calamidade pública como
enchentes, servindo a escola de abrigo para os flagelados.
A faixa etária diversificada nas salas de aula da escola pública (5% dos depoimentos),
também foi apontada como uma das causas que prejudicam a transmissão do conteúdo
escolar. Vejamos algumas falas dos entrevistados sobre esse questionamento, que originou a
categoria dias letivos insuficientes.
Na escola pública, o conteúdo programático não é cumprido em virtude do
calendário escolar que não é cumprido rigorosamente, por conta de feriados, de
datas comemorativas, por conta de “N” fatores, feiras, exposições, essas coisas. O
calendário fica comprometido. Dizem, vamos ter um sábado letivo, mas o aluno da
74
escola pública não tem interesse de ir a escola dia de sábado. A gente não cumpre,
não consegue cumprir a programação (P4).
Olhe, a previsão é que o conteúdo seja o mesmo, mas a gente sabe que na escola
pública muita coisa é motivo para não ter aula. Isso acaba atrapalhando a seqüência
da aula, acaba atrapalhando a programação. Na escola privada a gente não isso
(P5).
Na escola pública existe às vezes muito feriado, muitas reuniões, algumas coisas que
fazem a gente não ter aulas. Os dias letivos das escolas particulares são cumpridos.
Já na escola pública isso não acontece e o conteúdo dado em uma é para ser igual na
outra, todo caso eu procuro não ter diferenças (P6).
Não. Isso é impossível, você repassar todo o conteúdo na escola pública. Até
porque tem uma diferença, é bem mais complicado. Na escola privada tem aula
durante todo o período. Na escola pública não, geralmente uma grande
quantidade de dias que você não trabalha, por causa de uma coisa ou por outra, é
assim (P7).
Na escola pública a gente não consegue dar 50% do conteúdo programático durante
todo o ano, pela quantidade de falta dos alunos, pelo número de feriados, que na
escola qualquer coisinha pára. Véspera de feriado a gente não consegue dar aula
porque os alunos acham que véspera de feriado é feriado, então os alunos vão
embora mais cedo, quando bate o recreio eles vão embora, não esperam as duas
últimas aulas e a gente tem que esperar para repassar o conteúdo (P11).
Tem algumas particularidades que distingue a escola pública da escola privada, por
exemplo, greves, quebram o conteúdo programático. Como nós tivemos greve
esse ano nas escolas do município, fica perdido uma parte do conteúdo que é
programado. Outro exemplo, falta água na escola, quando precisa construir algo na
escola, fazer um retoque no prédio, em caso de calamidade pública como enchentes,
que tivemos esse ano também aqui na escola, os desabrigados vinham pra e a
gente ficava sem aulas (P15).
Diante do descaso com o aluno das camadas populares, Soares (1992, p. 73) afirma
que a escola pública é insatisfatória, sobretudo do ponto de vista qualitativo, e lamenta porque
a escola é muito mais importante para as camadas populares do que para as classes
dominantes. “Para estas têm, sobretudo, a função de legitimar privilégios garantidos pela
classe de origem; para as camadas populares, a escola é a instância em que podem ser
adquiridos os instrumentos necessários à luta contra a desigual distribuição desse privilégio”.
Cabe ressaltar que a reflexão entre público e privado deve endereçar responsabilidades aos
administradores eleitos pelo povo, que administram os recursos públicos e, na maioria dos
casos, não priorizam a educação. Os problemas apontados pelos professores são remetidos à
administração ou descaso com o serviço público, compreendendo o sistema público de
educação como construtor de escolas com ensino deficiente. Nesse contexto, Patto (1999, p.
134) nos diz que,
Inúmeras passagens levam a sensação de que o tempo passa, mas alguns problemas
básicos do ensino público brasileiro permanecem praticamente intocados, apesar das
intenções de demagogicamente proclamadas por tantos políticos e dos esforços
sinceramente empreendidos por muitos pesquisadores e educadores: assinala-se o
75
considerável aumento que teve o número de escolas pela extensão de certas idéias
políticas e necessidades econômicas. Ao crescer esse número, não se deram
sensíveis mudanças no espírito e na forma do trabalho escolar.
Segundo a Tabela 4 e o Gráfico 7, a categoria baixo rendimento escolar obteve
também um percentual de 30%. Os trechos de entrevistas apresentados abaixo justificam a
criação dessa categoria para explicar porque na escola pública o conteúdo programático não é
repassado igualmente como na escola particular.
Na escola pública o aluno vem com uma dificuldade anterior e você tem que
trabalhar tudo novamente, envolver todos, mudar sua metodologia, trabalhar assim
de uma forma mais leve para que toda a sala acompanhe e a programação fica
comprometida (P1).
O professor tenta passar o conteúdo programático do mesmo jeito, mas na escola
pública tem uma defasagem se ele for acelerar o aluno pode não acompanhar (P3).
Não é não. Na escola particular eu dificultava mais na hora de passar o conteúdo na
escola pública, se eu dificultasse lá, eles não conseguiam acompanhar, eu tinha que
manerar para eles conseguirem (P9).
O aluno na escola pública o desempenho é mínimo. A gente nota a distorção entre os
alunos da escola pública e da escola privada. Daí o conteúdo não pode ser passado
de forma igualitária de uma rede de ensino para outra (P17).
Não. Eu acredito que não. Os alunos de escola pública têm um conteúdo fraco,
temos que revisar esse conteúdo, então ele nunca vai até o final como na escola
particular (P19).
A gente aprofunda mais, o conteúdo na escola privada. A escola pública é muito
carente, a gente não pode exigir tanto. A gente nota que a base é totalmente diferente
de uma rede de ensino para outra. Em termos de conteúdo programático é em
qualquer lugar do Brasil, mas a diferença é o aprofundamento (P20).
A categoria baixo rendimento escolar aparece novamente na fala dos professores como
causa da impossibilidade de transmitir o conteúdo programático na escola pública da mesma
forma que ele repassa na escola privada. As causas desse baixo rendimento escolar foram
discutidas anteriormente. Analisando esses discursos, podemos compreender que as
entrelinhas revelam uma concepção homogeneizadora acerca da escola pública e de seu
público, apresentando-os sempre de forma negativa, desprovidos de potencial e caracterizados
pela inferioridade mediante os alunos da rede privada. Para Sales (2000, p.159), muitos dos
sujeitos manifestaram,
[...] de forma mais explícita, sua visão preconceituosa sobre as escolas públicas e
principalmente sobre os pequenos estabelecimentos de ensino localizados fora dos
centros urbanos. Os sujeitos, ao falarem sobre essas escolas, geralmente utilizam
rótulos e demonstram muita convicção em suas afirmações.
76
Segundo o referido autor, os rótulos são estereótipos, representações que direcionam
as ações dos sujeitos, portanto, no nosso caso, podemos compreender que as práticas
pedagógicas são ações construídas, também, por essas representações.
Os professores entrevistados (10%) responsabilizaram o aluno por não conseguirem
repassar o conteúdo programado, atribuindo a esse público o desinteresse, originando assim
mais uma categoria. Vejamos trechos das entrevistas, referente a essa questão:
O conteúdo programático não é dado integralmente na rede pública como é na rede
privada, pela falta de interesse dos alunos. Pela grande quantidade de faltas dos
alunos, vão embora mais cedo, a gente não pode ir para frente (P11).
Na escola pública, numa classe de 40 alunos, comparecem menos de 50% as aulas.
Numa sala de 40 alunos a gente vê 15, pela falta de desejo que realmente uns tem de
quererem estudar. O conteúdo programático fica prejudicado (P17)
Essa categoria discente desinteressado apareceu também pela quarta vez nesse
trabalho de pesquisa, portanto comentada anteriormente. O desinteresse do aluno da escola
pública, fruto muitas vezes do contexto social e escolar não pode ser analisado somente por
um ângulo, mas cabe afirmar que colabora na reprodução das desigualdades, visto que
contribui para o fracasso escolar. Esse fracasso estimula a não continuidade dos estudos,
direcionando esse público na reprodução de sua situação de classe. Por outro lado, o
professor, ao tachar seu aluno de desinteressado o faz, muitas vezes, porque analisam as ações
e atitudes desse aluno sem levar em conta o modelo de ensino que ministram ou as reais
necessidades desse grupo, sem levar em conta, também, padrões culturais. Nesse sentido Patto
(1999, p. 156) adverte:
Os professores não entendem ou discriminam seus alunos de classe baixa por terem
pouca sensibilidade e pouca falta de conhecimento a respeito dos padrões culturais
dos alunos pobres, em função de condição de classe média. [...] o desconhecimento a
respeito dessas crianças é generalizado. Portanto, mesmo que esse professor tente
suprir suas lacunas de informação e corrigir seus vieses de classe entrando em
contato com o textos que lhe estão mais a mão, é provável que continuará a
desconhecer seus alunos pobres, julgando que os conhece.
Os entrevistados também enfatizaram que, muitas vezes, o conteúdo programático não
é repassado igualmente nas duas redes de ensino em virtude da falta de comprometimento do
professor com a escola pública. As falas a seguir fundamentam a categoria docentes
descompromissados (10% dos entrevistados):
Eu acredito que não. O professor da escola pública ele é acomodado. Quando ele
realmente é professor comprometido ele deve passar o conteúdo programático
igualmente nas duas redes de ensino. Mas realmente o professor não tem esse
compromisso nas escolas públicas. (P2)
Não é repassado igualmente o conteúdo programático nas duas redes de ensino. Na
escola pública, eu tenho percebido que muitos professores não levam em
consideração a necessidade do aprendizado do aluno, mas sim a necessidade do
77
professor, se ele quer ou não ensinar. Alguns acham que por ser escola pública
relaxam, faltam e não levam tanto a sério, existe esse ponto. (P18)
Os professores entrevistados deixaram explícito em suas falas, que o conteúdo
programático não é repassado igualmente nas duas redes de ensino, exteriorizando o habitus,
ao exercerem práticas diferentes na escola pública. Para Perrenoud (1997), apesar de o
professor utilizar modelos didáticos e esquemas conscientes de ação, a sua prática é dirigida
pelo habitus. Esta representação do docente como descompromissado, como revelam muitos
depoimentos, aliada a representação da escola pública como transigente, favorece a análise de
que o ensino desenvolvido na escola pública não é objeto de preocupação e rigor tanto quanto
aquele elaborado e produzido na escola particular, comprometido por muitos fatores, dentre
os quais destacamos a ausência da assiduidade do professor e o não repasse integral do
conteúdo programático.
O absenteísmo dos professores na escola pública é apontado como um dos fatores que
comprometem o conteúdo programático nessa rede de ensino. Durham (2008, p.20) considera
o absenteísmo dos professores uma das “pragas” da escola pública brasileira. Para essa autora,
o índice de ausência é “escandaloso”. Segundo pesquisa realizada pela autora, “um professor
falta, em média, um mês de trabalho por ano e, o pior, não perde um centavo por isso.”
Embora os dados coletados por essa autora não estejam atrelados diretamente a nossa
realidade (cidade de Parnaíba Piauí), podemos perceber, segundo relatos dos professores, a
falta de profissionalismo do professor e o corporativismo presente no meio escolar,
respaldado pela falta de cobrança da administração diante de situações dessa natureza.
Nesse contexto, nos reportamos à categoria escola transigente, direcionada por 10%
dos professores que indicaram a falta de cobrança dos administradores como ponto
fundamental para o repasse integral do conteúdo programático na escola pública. Os
professores reclamam da falta de acompanhamento pedagógico, elemento importante na
garantia da qualidade do ensino nas escolas privadas.
Na escola particular o professor trabalha num ritmo mais acelerado, numa cobrança
um pouco maior, então... Na escola pública, ele é mais acomodado, não tem
cobrança e o conteúdo não é passado integralmente (P2)
Existe uma cobrança maior na rede particular. Na pública essa cobrança não é tão
forte assim. Eu acredito que na escola particular o conteúdo didático é cumprido, na
escola pública , o assunto do cronograma não é passado todo (P19).
Em relação à transmissão do conteúdo programático tem grande importância, nesse
contexto, a boa gestão da escola. Silva (2003, p.182-185) nos remete a um trabalho de
pesquisa que realizou em Pernambuco, deixando evidente a importância da dedicação dos
78
gestores para fazer a escola funcionar bem, acompanhando os trabalhos dos professores no
esforço de recuperar as aulas não ministradas por diversos fatores específicos da rede pública,
procurando de todas as formas cumprir o programa da disciplina. Ao fazer referência a uma
escola pública diferenciada, ela enfatiza que o ponto principal para assegurar a qualidade do
trabalho é o empenho da direção que é dedicada, eleita pelos pares, desenvolvendo um
trabalho com os atores da escola e a comunidade na gestão escolar.
Em relação à última categoria dessa questão, faixa etária diversificada, ouvimos dos
entrevistados o seguinte:
Na escola privada a faixa etária dos alunos é praticamente a mesma. na escola
pública, não é. O aluno deixou de estudar, às vezes está com vários anos que não
estuda e você precisa trabalhar na sala com todos os alunos, trabalhar de forma mais
leve e o conteúdo não dá para ser dado integralmente. (P1)
Os professores entrevistados enfatizaram que nas salas de aula da escola pública
existem alunos de diversas faixas etárias, portanto turmas heterogêneas, o que dificulta a
transmissão do conteúdo programático, problema não vivenciado na rede privada. Trabalhar
com turmas heterogêneas não é fácil, exigindo formação especial do profissional em
educação. Nesse sentido, o economista Castro (2008, p. 22) evidencia o sucesso das escolas
dos Estados Unidos e Canadá que têm resultados positivos ao trabalharem com turmas
heterogêneas porque os professores recebem formação especial para atuarem nessa realidade,
ênfase dada a essa especialidade nos cursos de formação de professores. Nesse cenário,
Marcondes (2002, p.199) propõe:
Que se coloque em discussão a expectativa dos professores trabalharem com turmas
homogêneas em nível de aproveitamento escolar, alunos considerados “imaturos”,
porque não estão prontos, alunos considerados “deficientes”, concepção de
conhecimento como algo “pronto, acabado”, expectativa de “resultados imediatos”,
a separação de alunos considerados “fracos”, “rotular alunos”, usar determinados
procedimentos de avaliar e atribuir a eles valor “inquestionáveis” e muitos outros
aspectos que pode e devem ser questionados e submetidos à reflexão.
A busca constante dessa igualdade na escola, prezando pela homogeneidade
acentua a desigualdade ao desprezar a diversidade própria de cada grupo. Segundo Figueiredo
(2002, p.68), “na tentativa de garantir a homogeneidade na turma e entre alunos, a escola
exclui aqueles que se diferenciam.”
A quinta questão de nossa entrevista indaga sobre o aproveitamento da disciplina
matemática pelo aluno das duas redes de ensino. Questionamos os sujeitos da seguinte forma:
Como você vê o aproveitamento da disciplina Matemática pelo aluno da escola pública e pelo
aluno da escola privada?
79
Dos vinte professores entrevistados, 75% responderam que os alunos da rede privada
têm um aproveitamento melhor, 20% consideram o aproveitamento igual nas duas redes de
ensino e apenas 5% considerou que o aluno da escola pública aproveitava melhor a disciplina
Matemática. Com base nas falas de nossos entrevistados, criamos quatro categorias, conforme
podem ser visualizadas na Tabela 5 e no Gráfico 8.
Tabela 5 – Fatores que prejudicam o aproveitamento dos alunos da escola pública na disciplina
Matemática
CATEGORIAS QUANTIDADE DE RESPOSTAS PERCENTUAL
1. Baixo Rendimento Escolar 06 30%
2. Ausência da Família 05 25%
3. Baixo Nível Econômico 02 10%
4. Discentes Desinteressados 02 10%
Gráfico 8 – Fatores que prejudicam o aproveitamento dos alunos da escola pública na disciplina
Matemática
De acordo com os sujeitos entrevistados, o baixo rendimento escolar é o fator mais
apontado (30%) como responsável pelo aproveitamento insatisfatório do aluno da escola
pública em relação à disciplina Matemática, gerando uma categoria com alto percentual e que
aparece pela quinta vez na análise, portanto, já comentada anteriormente. Relataremos as falas
de alguns de nossos entrevistados buscando uma visualização mais enfática desse cenário:
O aproveitamento do aluno da escola privada é melhor porque ele vê o conteúdo do
livro quase 100% e muitas vezes até repetido. Na escola privada, ele 70% do
conteúdo quando muito. (P2)
30
25
10 10
0
5
10
15
20
25
30
35
Baixo Rendimento Escolar
Categorias
Percentual
Baixo Rendimento
Escolar
Ausência da Família
Baixo Nível Econômico
Discente
Desinteressado
80
Eu acredito que na rede privada o aluno tenha mais aproveitamento. Na escola
pública, os alunos têm uma defasagem muito grande. A gente tenta acelerar mas
quando vê que está devagar a gente tem que voltar. (P3)
Na escola privada o aproveitamento é maior porque o aluno tem uma base maior.
Ele toda a programação durante o ano. Mas o aproveitamento depende muito do
aluno. (P11)
O aproveitamento depende do aluno que tem base para aprender. Quando ele não
tem base, ele sente muita dificuldade naquela série, porque não tem esse conteúdo
passado. Por isso, o aproveitamento é melhor na escola privada. (P14)
O aproveitamento da disciplina matemática é melhor na escola privada, por conta do
conteúdo que é abordado de uma maneira mais completa, não pode faltar. O diretor,
a coordenação, eles dizem que temos que o conteúdo completo e a gente faz tudo
para chegar até o final. (P19)
Na escola pública, a base do aluno é muito deficiente. A base do aluno que vem da
escola privada é diferente da base do aluno da escola pública. A estrutura da escola
pública é muito carente, por isso o aproveitamento dos alunos da escola pública é
inferior em relação aos alunos da escola privada. (P20)
Os sujeitos entrevistados responsabilizaram também a falta de acompanhamento da
família nas atividades escolares do aluno da escola pública, como sendo um outro motivo que
prejudica o seu aproveitamento em relação à disciplina Matemática. Com base nas respostas
dos entrevistados, criamos a categoria ausência da família que atingiu o percentual de 25%.
Olhe, a avaliação escrita não mede o grau de aprendizagem do aluno, ou seja, o
aproveitamento desse aluno.[...] Eu fiz uma ligação da matemática com a ciência,
mostrei dentro da história a vivência da matemática, como ela partiu e o meu aluno
na hora de uma resposta não conseguiu acompanhar a minha linha de raciocínio. A
gente o pontapé, a gente encaminha mas em casa a gente percebe que os alunos
precisam estudar mais. Os alunos de escola particular têm um aproveitamento
melhor da aprendizagem da matemática porque os pais dão uma pressãozinha,
acompanham mais o aluno. (P4)
Eu acho que o que motivo a aprendizagem é o interesse, ter objetivos e o
acompanhamento da família, né? [...] Na escola pública normalmente são famílias
que não fazem acompanhamento, isso interfere diretamente no rendimento. (P5)
O aproveitamento na questão familiar mesmo. Quando ele tem acompanhamento
familiar, ele tem a vivência prática, se esse aluno é levado a fazer compras, mexer
com o dinheiro, com papel, observar números ele vive essa questão prática e tem
uma melhor aprendizagem. Na escola pública eles não têm esse acompanhamento
dos pais, na escola privada os pais exigem mais, com medo de não passarem de
ano e ter desperdiço de dinheiro. (P8)
Existe mais aproveitamento na escola privada, em virtude do acompanhamento da
família. O aluno da escola pública tem problemas de dificuldades sociais e
financeiras. (P13)
Em termos de rendimento, o aluno da escola privada tem um maior rendimento, o
aproveitamento é maior. Na escola pública, não acompanhamento dos pais, eles
não conseguem desenvolver tarefa porque não tem incentivo em casa e seu tempo é
pouco. (P15)
81
Os professores entrevistados enfatizaram com veemência a importância da família no
acompanhamento do aluno, sendo essa categoria citada pela terceira vez, portanto, também
comentada anteriormente. Acerca desse aspecto, Viana (2003, p.58), ao dizer “que as famílias
populares participam da construção do sucesso escolar dos filhos de modo diferenciado, nem
sempre facilmente visível e voltado explícita e objetivamente para tal fim [...]”.
Acrescentamos que estas famílias, por conviverem no seu cotidiano com o desafio de
enfrentar conflitos de ordem social, material e financeira, são ausentes do cotidiano escolar o
que colabora para o pouco crédito atribuído a essa instituição, mesmo em situação de sucesso
dos filhos.
Outra categoria que emergiu das falas dos entrevistados, tentando justificar as causas
do baixo rendimento dos alunos da rede pública em relação ao aproveitamento da disciplina
Matemática, foi o baixo nível econômico (10%). Vejamos o que disseram os entrevistados.
O aluno da escola privada tem um aproveitamento melhor porque ele tem como tirar
suas dúvidas, busca outros livros, outros exercícios, outras atividades, para que ele
possa entender aquilo que ele não compreendeu. o aluno da escola pública ele não
tem condição de pagar um tempinho a Internet para fazer uma pesquisa, de reunir
amigos em casa para estudar e tirar dúvidas, devido essa precária situação de falta de
recursos, o aluno da escola pública tem o aproveitamento é inferior. (P1)
Na escola privada o aproveitamento do aluno é melhor, porque o aluno tem
condições de adquirir material escolar. O aluno da escola pública tem dificuldades
sociais e financeiras. (P13)
A categoria baixo nível econômico foi comentada nas questões anteriores,
aparecendo pela quarta vez nas respostas das indagações feitas aos entrevistados. Vários
programas para complementação da renda familiar são desenvolvidos pelo governo
Municipal, Estadual e Federal, procurando assim minimizar a situação econômica dessas
famílias de forma a lhes dar condições para encaminhar seus filhos à escola.
Na contemporaneidade, observamos o crescimento do desemprego, consequentemente,
o acirramento das situações de exclusão social estimuladas pelas transformações econômicas
frente à sociedade global. Segundo Guimarães e Almeida (2005, p.129),
Entre as famílias pobres as ameaças sempre foram mais presentes e o desemprego
muito mais constante; contudo, no mundo de economia globalizada e pobreza
regionalizada segundo as especificidades locais, elas são hoje mais duramente
atingidas pelo desemprego. A rua passa a ser espaço em que, paulatina e
crescentemente, ganha visibilidade social uma grande gama de excluídos: homem
em idade adulta e produtiva, velhos e crianças.
Essa realidade de empobrecimento termina por delinear um perfil de mudanças na
própria organização familiar, pois os desafios são acentuados e as dificuldades de criar laços
de solidariedade entre os membros são maiores. Nesse sentido, o papel da família na
82
formação do cidadão, segundo Baptista (2001), deve atender aos requisitos de proteção,
pertencimento, construção de afetos, educação e socialização.
Ao aluno da rede pública, também, foi imputada a responsabilidade do seu
aproveitamento ruim porque ele tem menos interesse de estudar do que ao aluno da escola
privada. O desinteresse do aluno foi categoria abordada pela quinta vez e comentada nas
questões anteriores. Ouvimos dos sujeitos entrevistados o seguinte:
O aluno da escola pública sente um pouco mais de dificuldade, tem um
aproveitamento menor, devido o fator desinteresse dele que é maior do que o do
aluno da escola particular. Porque você que antigamente na escola pública você
não tinha livros didáticos, hoje não tem mais a questão eu não tenho livros como é
que eu estudo. Mas, o que você é que na escola pública o aluno torna-se muito
mais desinteressado do que na escola privada (P6).
O aproveitamento do aluno da escola pública é inferior ao aproveitamento do aluno
da escola privada, porque ele é muito desinteressado. O aluno da escola pública tem
um desempenho mínimo, a gente nota uma evasão muito grande (P17).
Indagamos na sexta pergunta de nossa entrevista: em sua opinião, existe motivação
para aprendizagem da disciplina matemática? Em quais da rede de ensino esta motivação é
mais evidente? Justifique sua resposta.
Esse questionamento foi feito com o objetivo de conhecer quais os fatores que
motivam os alunos aprenderem a Matemática e em que rede de ensino ela (motivação) está
mais presente.
O resultado de nossa pesquisa demonstrou que oitenta por cento (80%) dos professores
de Matemática estão preocupados em motivar seus alunos nas duas redes de ensino. Apesar de
procurarem utilizar recursos didáticos, associarem a matemática com o dia-a-dia do aluno,
quinze por cento (15%) dos entrevistados considerou que essa motivação dos professores tem
maior resultado na escola privada porque outros fatores contribuem em despertar esse
interesse pela Matemática, como o acompanhamento da família, a estrutura da escola, a
presença da direção, além dos recursos didáticos que a escola particular oferece para tornar as
aulas mais atrativas. Apenas 1 (um) professor (5%) identificou que na escola pública a
motivação dos alunos é mais evidente em virtude das olimpíadas da Matemática que vem
acontecendo há alguns anos.
Na Tabela 6 e no Gráfico 9 visualizamos as categorias que emergiram das falas dos
professores, ao explicitarem os fatores que influenciam na motivação da aprendizagem na
disciplina Matemática, tanto na rede pública quanto na privada.
83
Tabela 6 - Fatores que influenciam a motivação da aprendizagem da disciplina Matemática tanto na rede
pública como privada
CATEGORIAS QUANTIDADE DE RESPOSTAS PERCENTUAL
1. Acompanhamento da Família 07 35%
2. Didática do Professor 05 25%
3. Discentes Desinteressados 02 10%
Gráfico 9 – Fatores que influenciam a motivação da aprendizagem da disciplina Matemática tanto na rede
pública como privada
35
25
10
0
5
10
15
20
25
30
35
40
1
Categorias
Percentuais%
Acompanhamento da
Família
Didática do Professor
Discentes
Desinteressados
Dentre as três categorias criadas podemos evidenciar a presença da família, como
papel preponderante para o bom rendimento do aluno na sala de aula. Entre as falas dos
entrevistados, citamos: “a motivação está mais presente na escola particular porque existe
uma cobrança dos pais, existe contato entre escola, pais e alunos bem maior do que na escola
pública” (P18).
Segundo os professores entrevistados, a família mantém o equilíbrio emocional do
aluno, dando-lhe segurança e motivação para uma aprendizagem eficaz. Para Portes (2003), a
família se esforça para inculcar uma ordem moral doméstica no filho desde tenra idade,
abalizando seus procedimentos sociais e motivando para as atividades escolares. Assim,
compreendemos que a família de forma lenta e processual vai impregnando a afetividade, a
moral, o interesse pela educação e socialização de seus filhos. Quanto mais organizada for a
família mais probabilidade ela tem para repassar essa afetividade. Apresenta-se ao olhar
84
apressado a visão de que as camadas populares, em virtudes de problemas econômicos e
sociais das mais diversas ordens, a família não está tão presente na vida de seus filhos ou pelo
menos com a mesma proporção que estão os pais dos alunos da escola privada.
O resultado desta pesquisa apontou que 80% dos professores entrevistados estão
preocupados em motivar os alunos para aprendizagem da disciplina, que segundo as
entrevistas com os docentes, é identificada como “bicho papão” pelos alunos, considerada
também como uma matéria “chata, enfadonha, antipática” o que, em certa medida, reflete na
necessidade do professor trabalhar de forma criativa, buscando minimizar esses adjetivos,
desmistificando essa representação trazida pelo aluno. Alguns reconhecem a dificuldade de
transmitir o conteúdo programático. Vejamos algumas dessas falas.
A disciplina Matemática a gente sente muita dificuldade em repassar para os alunos.
Eu mesma particularmente, para que eu me livrasse desse obstáculo eu fiz de algum
conhecimento que tinha de eletrônica e desenvolvo jogos (P2).
A disciplina Matemática tem um grau de dificuldade no quesito motivação. O
aluno a Matemática como algo complicado, antipático, chato, enfadonho. Para a
gente transmitir esse conteúdo e fazer interessante a gente tem dificuldade (P5).
O papel do professor foi apontado de fundamental importância na motivação para a
aprendizagem da disciplina, bem como revelam sentir necessidade de desconstruir certos
estereótipos vinculados à disciplina Matemática, tais como quando esta é endereçada,
principalmente, ao sexo masculino. Algumas falas dos entrevistados comprovam isso:
Olhe, a motivação principal é tentar o aluno gostar da Matemática. O professor
incentiva trabalhando a Matemática de forma que ele possa observar que os cálculos,
que ela em si, vai servir no seu dia –a -dia. (P1)
A função do professor é mostrar o quanto a Matemática é importante. Então, a partir
do momento que o aluno percebe onde ela está, ou seja, observa que a Matemática
está em todos os lugares da vida eles vão ter mais interesse pela disciplina (P8).
O professor utiliza recursos para motivar o aluno como vídeos. Ele explica, explica e
leva para o vídeo e o aluno se aprimora com certeza. Fica mais motivado (P10).
Olhe, eu acredito que a motivação parta do aluno e do jeito do professor ensinar. [...]
Chamo os alunos que estão atrás para frente, a gente sempre consegue atrair a
atenção deles (P11).
Eu costumo dizer que o papel do professor é fundamental na motivação. Eu costumo
falar que um dos meus objetivos é desmistificar essa idéia de que Matemática é
bicho papão, que é uma disciplina que os homens tem mais afinidades, que os
homens aprendem Matemática. [...] A gente aprende Matemática é de forma
prazerosa, a figura do professor é fundamental nessa motivação [grifo nosso] (P12).
As dificuldades que os professores apontaram para motivar a aprendizagem da
disciplina Matemática, além da representação que ela traz de ser difícil, complexa, como foi
85
falado anteriormente, foram a falta de recursos para tornar as aulas mais interessantes e o não
acompanhamento dos pais. A escola privada foi citada nas falas dos entrevistados como
aquelas que têm mais recursos didáticos e os pais estão mais presentes. A escola pública foi
citada por um dos sujeitos, evidenciando que ela está crescendo no item motivação através das
olimpíadas de Matemática. Transcrevemos a seguir o que ouvimos os entrevistados.
[...] Para que os alunos se sintam mais motivados para aprender Matemática usa-se
jogos, recursos para desenvolver raciocínio, o xadrez trabalha a concentração, que
deve ser utilizado tanto na escola pública como privada. A falta de recursos
prejudica o desempenho de certo modo na sala de aula (P1).
A motivação para aprender Matemática está mais presente na rede pública, desde as
Olimpíadas da Matemática que está com uns três ou quatro anos. Onde eu trabalho
os meninos receberam prêmios, até computadores. Melhoraram as notas e estão
muito estimulados a estudar. Perto das olimpíadas, ficam querendo aulas extras dia
de sábado (P3).
Na escola privada, o aluno é mais motivado a aprender porque ele tem
acompanhamento da família e condições em adquirir material (P13).
Na escola privada, a motivação é maior devido existir mais recursos e a família
acompanhar os alunos. [...] Para motivar a aprendizagem da Matemática, você pode
utilizar a forma lúdica. Trazemos para a sala equipamentos, jogos. Antes na escola
pública a gente ia buscar sozinhos, hoje o governo já arranjou um dinheirinho.
(P14).
A escola particular tem mais subsídio, tem mais remuneração no sentido de buscar
atividades, fazer mais coisas, tipo algumas atividades, para motivar e melhorar a
aprendizagem (P19).
Alguns desses entrevistados evidenciaram a falta de interesse do aluno pela disciplina
nas duas redes de ensino, porque a representação de ser uma matéria de difícil compreensão
desestimula o aluno tanto da rede pública quanto da rede privada. Apontaram, também, em
suas falas, a falta de vontade de aprender. A propósito, selecionamos os seguintes registros:
Não existe motivação nem na rede pública e nem na privada. O aluno não tem
incentivo. O professor tenta, mas não consegue motivar (P7).
Em nenhuma das duas redes de ensino o aluno é motivado a estudar Matemática,
porque os alunos têm um certo medo dessa matéria que começa dificultar. [...] os
alunos não cobram do professor. O que você fala, está bem falado. Se você sentar e
não der aula nenhuma eles estão achando bom. [...] Eles não conseguem cobrar,
puxar, para você ensinar (P11).
Perguntamos aos nossos entrevistados, na sétima questão, se os professores mudam a
metodologia de ensino de uma rede para outra. Fizemos a seguinte indagação: pela sua
experiência como professor (a), você acha que os outros professores mudam a sua
metodologia conforme a rede de ensino que estão atuando?
Noventa e cinco por cento (95%) dos nossos entrevistados responderam que seus pares
mudam a metodologia, conforme a rede de ensino em que estão atuando, em virtude da
86
característica do aluno, da escola e do perfil do professor, dentre outros fatores. Em relação
aos alunos, essa mudança de metodologia, segundo esses professores, se em virtude do
nível do aluno, da falta de interesse pela disciplina. A escola também foi responsabilizada,
pois deve levar o professor a mudar de metodologia, pois é, muitas vezes, condescendente,
não cobra dos professores, a direção não é tão presente, pagam baixos salários e possuem
estrutura precária. Os professores foram considerados descompromissados e desmotivados
pelo baixo salário e pelas condições precárias da escola. Na Tabela 7 e no Gráfico 11,
apresentamos as categorias e seus respectivos percentuais.
Tabela 7 – Fatores apontados pelos professores que influenciam seus pares mudar a metodologia de
ensino na rede pública
CATEGORIAS QUANTIDADE DE RESPOSTAS PERCENTUAL
1. Nível do Aluno 09 45%
2. Pouca Cobrança da Escola 06 30%
3. Docente Descompromissado 04 20%
4. Baixo Salário 02 10%
5. Infra-Estrutura Deficiente 02 10%
Gráfico 10 – Fatores apontados pelos professores que influenciam seus pares mudar a metodologia de
ensino na rede pública
45
30
20
10 10
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
1
Categorias
Percentual %
Nível do Aluno
Pouca Cobrança da
Escola
Docente
Descompromissado
Baixo Salário
Infra-Estrutura Deficiente
87
Quarenta e cinco por cento (45%) de nossos entrevistados apontaram a necessidade de
mudar a metodologia de ensino de uma rede de ensino para outra em virtude do nível do
aluno.
Você muda assim, se você observa dificuldades na sala de aula, você observa que o
nível de dificuldade de uma sala é bem maior que a outra, ai sim, você começa a
diferenciar essa metodologia, porque você vai trabalhar mais em cima daquela sala,
daqueles alunos. Mas, com relação a rede pública e rede privada é necessário que
você trabalhe igualmente, independente que seja pública ou privada . [...] Agora, na
escola pública, você tem que ter mais disponibilidade para trabalhar a série anterior
porque eles vêm com dificuldades, os alunos às vezes está com vários anos sem
estudar, e você tem assim que mudar sua metodologia, trabalhar assim de uma
forma mais leve. (P1).
Olha a metodologia eu acho que não muda, eu sou professora nas duas redes de
ensino pública e privada, do mesmo jeito que eu ensino pra um eu ensino pro outro.
Agora, a gente tem que ver o nível que eles estão acompanhando. A metodologia
muda no sentido de atender o aluno. [...] O nível do aluno da rede particular é
melhor [...] Os alunos da rede pública não têm muita maturidade como se o
professor não puxasse por eles, eles chegam a quinta e oitava série com uma
defasagem muito grande (P3).
Eu creio que depende da turma. O professor muda a metodologia dependendo da
turma. Não entre rede pública e privada, mas dentro de um colégio particular
“X”, se a turma em si é diferente do colégio particular “Y”, a gente tem que mudar
a metodologia, usar a metodologia do ator. Incorporar a personagem daquela
turma.[...] Os alunos da rede particular, privada a gente percebe que eles têm uma
estrutura melhor do que aqueles da rede pública (P6).
Sim, claro a metodologia utilizada é diferente. Na rede privada, apesar de não ser
todos interessados, a gente consegue puxar mais, eles conseguem compreender,
assimilar, pelo fato da base. na escola pública, a gente tem uma dificuldade
muito grande para que o aluno consiga aprender; a gente tem que voltar a série
anterior (P11).
A metodologia muda em virtude do perfil do aluno e grau de dificuldade. [..] Na
escola privada, o aluno tem um nível melhor de entendimento. (P13).
Sim. Isso é evidente. A metodologia a gente muda. A maneira que eu trabalho na
escola particular eu não posso trabalhar igualmente na escola pública, porque nós
temos alunos que são diferentes, de perfil diferente, de história diferente, de vida
diferente e isso tem que ser levado em conta (P12).
Acredito que sim. Alguns alunos precisam de uma maneira diferente de abordar o
conteúdo. Alguns aprendem mais rápidos, outros demoram um pouco assimilar o
conteúdo. A metodologia muda de conformidade com o aluno [..] Na escola pública
o aluno tem um conteúdo básico fraco, tem que revisar. (P19).
Com certeza, cada sala é um mundo diferente. A clientela é diferente. Na escola
privada, nós temos turma de 30 a 40 alunos e a clientela é mais homogênea. A
metodologia que se usa na escola privada tem que trazer resultado porque a
cobrança é maior. Na rede pública, a clientela é heterogênea, a metodologia tem
que se adequar, uns sabem, outros sabem mais ou menos e outros não sabem nada.
Assim a metodologia tem que se adequar (20).
Para trinta por cento (30%) dos entrevistados, existe pouca cobrança da escola pública
inclusive no sentido de exigir dos professores uma boa metodologia para que a aprendizagem
88
seja mais eficaz, como acontece na escola privada. Esta falta de cobrança gera, da parte do
professor, um desrespeito ao ensino, ao mudar sua prática na escola pública, retratando o
habitus existente entre os professores da rede pública ao se revelarem descompromissados do
fazer, uma vez que não planejam suas aulas, denotando uma prática influenciada pelo
habitus,
ou seja, se restringem a ministrar aulas rotineiras, postura que se tornou comum aos docentes
desta rede de ensino. Mesmo os professores novatos, ao ingressarem na escola pública passam
a fazer o que seus pares fazem, portanto tornou-se regra nesta rede de ensino a postura
estruturada pelo
habitus. “O habitus é formado por rotinas de hábitos no sentido comum da
palavra” (PERRENOUD, 1997, p.108). Em virtude dessa falta de cobrança da escola, da
família, dos alunos e até da sociedade, os professores da escola pública não estão empenhados
com os resultados da aprendizagem. Alguns trechos das entrevistas evidenciam este
fenômeno.
Tem professores que mudam a metodologia quando a escola exige mais dele.
Dizem que na rede pública não precisam se esforçar tanto. (P1).
Com certeza, a metodologia muda. É claro que na rede particular o professor é
exigido, a direção exige, a comunidade existe, a família exige, ele tem que mostrar
trabalho. Infelizmente, a gente encontra professor na rede pública brincando de dar
aula. Infelizmente (P4).
A metodologia muda sim. Pelo fato da escola pública não ter uma direção tão
presente. Os alunos não fazem uma cobrança sistemática, então os professores se
acham livres. Não planejam suas aulas, não estão preocupados em oferecer um
ensino de qualidade. Enquanto que na escola privada, ele tem que prestar conta de
que ele está trabalhando na sala de aula, acaba por aplicar uma metodologia mais
rígida, que tenha mais resultado (P5).
A metodologia muda porque na escola pública o professor tem mais flexibilidade.
Na escola privada, o professor tem que seguir um cronograma (P7).
Na escola pública, nós temos muitos professores novatos, que não tem
responsabilidade de transmitir o conteúdo. Não estão preocupados em planejar suas
aulas, nem em inovar. Eles não são efetivos, estão de passagem. na escola
privada, a direção, os coordenadores estão em cima. A escola particular é paga, o
professor se preocupa com a metodologia (P10).
Tem que ver também a responsabilidade do professor, quando ensinam na escola
pública eles sabem que não são cobrados e ensinam de qualquer jeito até os
professores novatos chegam com está mentalidade que na escola pública não
precisa se esforçar. O certo era usar a mesma metodologia nas duas redes de ensino,
mas isso não acontece (P13).
Sim, existe diferença de metodologia de uma rede de ensino para outro. Eu ouvi
relato de professor que a escola privada tem maior rigidez em relação ao
acompanhamento de professores, dos conteúdos e por isso fazem a diferença (P15).
Verificamos também, com essa pesquisa, que muitos professores não têm
compromisso com a escola pública, oferecendo um serviço inferior nessa rede de ensino em
89
relação ao que desenvolve na escola privada. Os trechos das entrevistas que reproduzimos a
seguir serviram de subsídios para que criássemos a categoria professores descompromissados
(20%), ao nos referirmos a mudança de metodologia de uma rede de ensino para outra.
Os professores compromissados não mudam a metodologia de uma rede de ensino
para outra, mas os descompromissados deixam a desejar e os alunos são as vítimas
(P2).
A metodologia depende mais do professor do que do próprio sistema da escola. Se
ela é essa, aquela, particular ou não. Está muito ligado com a boa vontade, com
aquela coisa de gostar de fazer. Na escola pública como o professor não tem
cobrança, ele não se preocupa de aplicar uma metodologia que traga mais resultado
(P5).
O professor deveria assumir a responsabilidade, uma vez que ele está dando aulas
para uma equipe de alunos, preparando para o futuro. Não interessa se ele tem
classificação “X” ou “Y”, mas eles não estão motivados. Na escola privada ele é
cobrado, mas a metodologia que o professor aplica de uma rede para outra vai
depender da mentalidade, o ser humano é passível (P10).
Alguns professores mudam de metodologia dependendo da rede de ensino. Os
professores da escola pública levam assim na maré mansa (P14)
A representação que os professores entrevistados fizeram de seus pares denota um
habitus do professor da escola pública, ou seja, nesta rede de ensino existe uma tendência a
uma postura relaxada.
A categoria baixo salário que criamos como uma das justificativas que levam o
professor a mudar de metodologia, de uma rede de ensino para outra, está ilustrada a seguir,
com dois trechos dos entrevistados.
Olha, essa mudança de metodologia cabe a cada um. Mas eu sou muito franco em
falar que quando você é mal remunerado, você não procura se esforçar (P17).
O professor muda sim de metodologia. O ensino público paga mal, então não tem
porque se esforçar tanto pelos alunos. Enquanto que na escola privada a escola paga
bem, é mais cobrada e o professor sente na obrigação de trabalhar com mais
eficiência. Quando ele é bem pago ele planeja suas aulas, procura inovar e se
preocupa em usar uma metodologia que produza bons resultados (P19).
Os professores entrevistados representaram novamente seus pares, caracterizando seu
descompromisso como educador, não se interessando em inovar, melhorar a metodologia e
motivar a aprendizagem dos alunos, atuando na escola pública com uma metodologia pautada
no habitus, enquanto na escola privada sua prática é diferente em virtude da presença da
administração e de uma melhor remuneração dentre outros fatores.
Alguns professores (10%) citaram que a mudança de metodologia de uma rede de
ensino para outra se dá, muitas vezes, devida a infraestrutura deficiente da escola que deixa o
90
professor sem condição de trabalho e um tanto desmotivado. Vejamos o que foi dito pelos
entrevistados:
A mudança de metodologia existe em relação a equipamentos. Se o professor tiver
numa escola que tenha retroprojetos, data show, acesso a Internet, ele vai ter mais
condições para trabalhar. Se ele chegar numa escola que não tem, ele não vai fazer
esse tipo de uso. Mas ele vai tentar passar da melhor maneira possível (P8).
A mudança de metodologia depende de cada um, mas se você chega em certas
escolas públicas e não encontra pincel, não tem nenhum fichário para você
acompanhar seu aluno, os alunos são tão carentes que você fica sem motivação
(P17).
Apenas 1 (um) dos entrevistados foi taxativo em afirmar que os professores não
mudam a metodologia, dependendo da rede de ensino em que está atuando: “os professores
não mudam de metodologia considerando a rede de ensino pública e privada. A forma de
ensinar é a mesma, muda apenas a clientela” (P16).
Após indagar aos entrevistados se seus pares utilizavam a mesma metodologia nas
redes de ensino pública e privada, fizemos a ele o seguinte questionamento, na oitava questão:
Você, por exemplo, varia a forma de ensinar conforme a rede de ensino? Por quê?
Obtivemos como resultado que 70% dos professores mudam a metodologia de ensino
e 30% não mudam. O Gráfico 11 visualiza o resultado da pesquisa.
Gráfico 11 – Percentual relativo à mudança de metodologia na rede pública
70%
30%
Professores que mudam a metodologia
Professores que não mudam a metodologia
Os 70% dos professores que afirmaram mudar a metodologia de ensino, ao lecionar na
rede pública, foram unânimes em afirmar que a mudança não acontece por preconceito com a
escola pública, mas por vários motivos, como por exemplo: nível do aluno, a falta de interesse
91
do discente que desestimula os professores, dificuldade de material didático, salas com grande
número de alunos, impossibilitando utilizar os mesmo métodos de ensino da rede privada.
Com base na fala dos entrevistados, criamos algumas categorias que justificam a
mudança de metodologia de uma rede de ensino para outra, conforme demonstraremos na
Tabela 8 e Gráfico 12.
Tabela 8 – Fatores que levam o professor entrevistado a mudar a metodologia ao lecionar na escola
pública
CATEGORIAS QUANTIDADE
DE RESPOSTAS
PERCENTUAL
1. Nível do Aluno 08 40%
2. Ausência de Motivação do Discente 03 15%
3. Turmas com Grande Número de Alunos 01 5%
4. Escola Transigente 01 5%
5. Ausência de Material Didático 01 5%
Gráfico 12 – Fatores que levam o professor entrevistado a mudar a metodologia ao lecionar na escola
pública
40
15
5 5 5
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
1
Categorias
Percentuais %
vel do aluno
Ausência de motivação
do discente
Turmas com grande
mero de aluno
Escola Transigente
Ausência de material
didático
Transcrevemos trechos da entrevista relacionados com a categoria nível do aluno.
Vario de conformidade com a dificuldade da sala de aula. [...] Você começa a
diferenciar essa metodologia porque você vai trabalhar mais em cima daquela sala,
daqueles alunos, mas com relação a rede pública e rede privada, você trabalha com o
mesmo conteúdo de uma mesma forma, é necessário que você trabalhe igualmente,
92
independente de que seja pública ou privada. [...] O aluno da escola pública você
tem mais cautela, os assuntos tem que ser trabalhado com mais calma porque eles
apresentam muita dificuldade (P1).
Como falei na questão anterior, a metodologia a gente não muda em virtude da
escola ser pública ou privada. A gente tem que ver o nível do aluno [...] O aluno da
rede particular é melhor (P3).
A metodologia a gente muda não por ser rede pública e privada, mas pelo nível
do colégio, como falei na questão anterior. [...] Os alunos da rede privada têm mais
estrutura (P6).
Tento fazer do mesmo jeito. Agora, não pra fazer totalmente igual, porque como
eu já falei anteriormente (nível melhor na escola privada), eu não trabalho igual com
o grau de dificuldades. Na escola privada, eu apresento um problema, na escola
pública eu diminuo o grau de dificuldade do problema, é meio difícil tentar trabalhar
igual (P9).
Sim. Como falei anteriormente, exatamente para atender as necessidades do meu
aluno, porque não adianta eu vir com a metodologia que deu certo na escola
particular (aluno com base melhor), maneira como eu expliquei, a forma como eu
elaborei o exercício, corrigir se a realidade do meu aluno da escola pública é outra.
O fato de eu trabalhar de forma diferenciada não quer dizer que eu trabalhar na
escola pública de forma inferior (P12).
Sim, mudo de metodologia em virtude do perfil do aluno e grau de dificuldade. [...]
Na escola privada, o nível é melhor (P13).
Mudo, conforme o nível da turma, se uma turma tiver dificuldade em determinado
assunto, procuro ensinar de forma diferente [...] Na escola privada, o nível é muito
bom porque tem o acompanhamento da família (P16).
Mudo porque a realidade de cada sala exige. [...] Na escola pública, nós temos
aquela deficiência do aluno (P20).
Os relatos desses professores deixam bem claro que a mudança de metodologia
acontece independente da escola ser pública ou privada, levando em consideração o nível do
aluno. Evidenciaram em outras questões (2 e 3) anteriores que o nível do aluno da escola
pública é deficiente em relação ao nível do aluno da escola privada.
Ouvimos também dos professores entrevistados que é a motivação do aluno, o
interesse dele pela aula que faz o professor melhorar ou não a metodologia. Ele é influenciado
pelo empenho demonstrado pelo aluno. A forma de ensinar, portanto, independe da rede de
ensino e sim do entusiasmo do aluno, embora tenham demonstrado, ao serem levantadas
outras questões, que na escola privada o aluno, em geral, é mais interessado.
Não diferenciação de ensinar, o que justamente é o fator motivação, que na
escola privada existe mais, enquanto na escola pública não se vê isso (P17).
Eu procuro trabalhar de acordo com o empenho dos alunos. As turmas mais
interessadas, motivadas, o professor também se interessam. A forma de ensinar
independe de ser escola pública e privada (P18).
Não mudo a metodologia por ser escola pública ou privada. Mudo dependendo do
aluno que se tem na sala de aula. [...] Até na escola privada a gente tem aluno que
93
não tem tanto interesse, tanta motivação e a gente procura fazer de maneira
diferente para eles entenderem (P19).
Vimos também que outro motivo responsável pela forma diferente de ensinar na
escola pública é a grande quantidade de alunos na sala de aula. Um dos professores
entrevistados fez o seguinte comentário:
Dependendo eu mudo a metodologia de uma rede de ensino para outra. Aqui na
escola nós temos em média 15 alunos por turma. Na escola pública, eu tenho 57 a
60 alunos. Então eu não tenho como fazer o mesmo trabalho. Aqui eu posso
acompanhar, dividir em grupos, ir de carteira em carteira. Na escola pública, não
tem como fazer isso. A realidade entre as duas escolas é diferente (P8).
Outro professor explicou que na escola privada a direção exige que a carga horária e o
conteúdo programático sejam cumpridos o que não acontece na escola pública. A ausência da
direção, ou seja, a falta de cobrança da escola faz com que o professor da escola pública não
se preocupe em repassar todo o conteúdo programático para seus alunos.
Vario. Quando eu estou ensinando na escola privada a gente tem que cumprir a
carga horária, a gente tem que puxar mais pelo aluno, a gente tem que ensinar, dar o
conteúdo todo. O aluno tem que se virar para aprender. na escola pública a gente
se preocupa que o aluno entenda. Então a gente prefere que ele aprenda 30% do que
a gente dar 100% do conteúdo e o aluno não aprender nada (P11).
Observamos, novamente, com o depoimento abaixo, que a mudança de metodologia
ocorre independente de ser rede pública ou privada. Entretanto, o professor ao relatar a
estrutura precária da escola pública em relação ao material didático fez uma correlação com a
metodologia de ensino.
Eu mudo, mudo no sentido de estar trabalhando sempre a melhor aula, eu gosto de
estar me avaliando [...] Eu não vejo escola particular ou privada, porque eu como
educadora eu abraço a causa, eu abraço a minha profissão eu procuro me doar. [...] É
claro que na rede particular a gente tem um apoio maior, no sentido de dizer, se eu
não tenho, a escola pode me dar suporte. Às vezes o que dificulta trabalhar na rede
pública, é que se eu não tenho a escola, não vai me ajudar (P4).
Trinta por cento (30%) dos professores entrevistados afirmaram não mudar a forma de
ensino. Vejamos trechos de suas falas:
O método usado na escola particular é o usado na pública. O método que eu utilizo
eu acredito ser o mais eficaz, bem eficiente e deve funcionar nas duas (P2).
Eu aprendi que em termos de ensino aprendizagem a gente não pode fazer distinção
entre essa e aquela escola. Se os alunos têm a mesma capacidade devemos ensinar
igualmente, usar a mesma metodologia. Eu pessoalmente tento não fazer essa
distinção. O que pode ocorrer é em termo do trabalho final, é o não aproveitamento
de alguns pela questão pessoal dele. Mas eu pessoalmente enxergo todos da mesma
forma (P5).
Não mudo. A forma de ensinar é a mesma. Tanto na escola pública como na privada
(P7).
94
Não podemos mudar a metodologia. Não podemos variar os conteúdos, as
motivações são as mesmas, tudo, tudo são os mesmos, você não pode variar. Até
porque se você variar, você não está tendo caráter profissional (P10).
Não. Eu procuro trabalhar da mesma forma, tanto na escola particular como na
escola pública (P14).
Não, particularmente, não. Eu mesmo comento com meus alunos da escola privada,
quando termino uma aula. Eu mesmo confesso para eles, eu dei essa aula nessa
semana na escola pública, o aproveitamento foi melhor, os alunos interagiram mais,
faço comparações (P15).
Na última questão da entrevista que fizemos aos 20 professores de Matemática,
pedimos para que eles relatassem o perfil do aluno da escola pública e do aluno da escola
privada. Transcrevemos na íntegra a forma que interrogamos o entrevistado: descreva o aluno
da escola pública e o aluno da escola privada fazendo um paralelo entre eles.
As respostas dadas a essa indagação vieram apenas ratificar o que os entrevistados
tinham abordado sobre a precariedade do nível do aluno (questão 1), a carência de motivação
presentes nos alunos de escola pública (questão 6), as dificuldades de lecionar na escola
pública em virtude da ausência de material didático, a falta de acompanhamento dos alunos e
professores pela direção da escola (questão 2, 7 e 8), direcionando, dessa forma, ao aluno da
escola privada uma base melhor de conhecimento do conteúdo, por se tratar de alunos mais
interessados em virtude, principalmente, do acompanhamento da família e por possuírem
melhores condições sociais e econômicas, além de outros fatores.
Em síntese, apresentamos nas figuras 1, 2 e 3 o repertório de representações dos
professores, interlocutores neste estudo, acerca do aluno da escola pública, da escola como
ambiente de trabalho e de seus pares, professores da escola pública:
95
Figura 1 – Representação social dos professores de matemática acerca dos alunos da Escola Pública
FALTA
DE BASE
ALUNO
DESINTERESSE E
DESMOTIVAÇÃO
CARENTES E MAL
ALIMENTADOS
SITUAÇÃO
FINANCEIRA
PRECÁRIA
BAIXO
RENDIMENTO
ESCOLAR
AUSÊNCIA
DA FAMÍLIA
96
Figura 2 – Representação social dos professores de matemática acerca da Escola Pública
ESCOLA
ESTRUTURA
PRECÁRIA
AUSÊNCIA DA
DIREÇÃO E
COORDENAÇÃO
FALTA DE
MATERIAL
DIDÁTICO
REMUNERAÇÃO
PRECÁRIA
DIAS LETIVOS
INSUFICIENTES
97
Figura 3 – Representação social dos professores de matemática acerca do professor de Escola Pública
PROFESSOR
DIDÁTICA
INSATISFATÓRIA
DESMOTIVADO
DESCOMPROMISSADO
AMOR OI
NÃO PLANEJAM AULAS
98
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao tecer as considerações finais deste trabalho de pesquisa, enfatizamos que os
resultados a que chegamos, foram discutidos ao longo do texto numa tentativa de aliar teoria e
empiria. Apresentamos, portanto, as reflexões de autores citados no referencial teórico,
buscando analisar os discursos dos professores entrevistados, bem como compreender suas
representações sociais acerca do aluno da escola pública, como um elemento presente na
história da construção da escola pública brasileira. Ao refletirmos sobre a formação do
professor de Matemática, destacamos que essa área do saber tem sido enfatizada nos
currículos escolares por ser um saber instrumental, necessário à formação profissional e por
desenvolver no indivíduo o raciocínio lógico e a “competência” para lidar com circunstâncias
cotidianas ligadas a este saber.
Portanto, o campo de estudo e investigação a que nos propomos, passa pela
compreensão das representações sociais, uma entre três categorias teóricas que emergiram da
análise das entrevistas e que as elencamos para refletir acerca da prática do professor de
Matemática: representações sociais do professor de Matemática em relação a seus pares, em
relação à escola pública e em relação ao aluno da escola pública; habitus, desenvolvido entre
os professores que são os principais responsáveis pela estruturação de suas práticas; e
práticas pedagógicas situando o fazer do professor de Matemática. A pesquisa realizada
focaliza, portanto, três eixos: o primeiro relacionado ao aluno da escola pública; o segundo
relacionado ao docente professor de Matemática e seu fazer docente e o terceiro relacionado à
escola pública.
Caracterizamos, pois, a escola pública brasileira como uma instituição que enfrenta
muitos problemas relativos às condições estruturais, salariais ou mesmo pedagógicas, apesar
de o governo federal, nos últimos anos, ter investido na área tecnológica, buscando incluir
alunos e professores no campo da informática e garantir melhor acesso à escola pública,
dentre outros fatores. Constatamos, entretanto, que o ensino público ainda não alcançou os
resultados desejados quanto à qualidade, constituindo-se em campo de formação
desprestigiado socialmente. Diante dessa realidade, questionamos no decorrer da
investigação: Que representações os professores de Matemática constroem acerca do aluno da
escola pública? As representações sociais do professor de Matemática acerca do aluno da
escola pública influenciam sua prática?
99
Partindo dos objetivos propostos, este estudo possibilitou compreender o repertório de
representações que subsidiam o fazer do educador no âmbito da escola pública e que nos
direciona para os seguintes resultados: o professor de Matemática representa seu aluno de
escola pública como um sujeito diferente daquele que frequenta a escola particular e relaciona
essa diferença, principalmente, às condições sociais precárias vividas por esse aluno. Atribui à
realidade desse aluno a carência material, que repercute no desempenho escolar, tais como,
ausência de livros e o desenvolvimento do hábito da leitura. Descreve esses alunos como
integrantes de famílias também carentes quanto à formação escolar, apresentando os pais com
formação inadequada e, portanto, incapazes de contribuir com as atividades desenvolvidas na
escola, ainda, incapazes de orientar e acompanhar seus filhos no que diz respeito à vida
escolar. Essa descrição tão enfatizada na maioria dos discursos nos aproxima de uma visão
estereotipada do aluno das camadas populares e colabora para desqualificar a atuação docente.
Outra característica atribuída ao aluno, mas que reafirma a desqualificação do ensino no
âmbito público está no déficit de aprendizagem ou “falta de base”, aspecto tão recorrente nos
discursos.
Diante desse cenário, compreendemos que esse modelo de aluno presente nas
representações sociais dos professores vem interferindo de forma direta nas ações
pedagógicas desenvolvidas pelos educadores quando afirmam planejar levando em conta a
condição social desse aluno, seu despreparo para a compreensão de todo o conteúdo (dada a
falta de base) e, portanto, precisam diminuir o ritmo e até mesmo deixar de explorar o
conteúdo programático necessário à sua formação. Ficou evidente na fala dos professores
entrevistados a falta de motivação para trabalhar com os alunos da escola pública, uma vez
que “o baixo nível” atribuído aos discentes dificulta a transmissão do conteúdo programado
para o ano letivo. Essas representações sociais colaboram ainda para inibir práticas inovadoras
no espaço da escola pública, pois propõe um retrato desmobilizador, sem expectativas
positivas para o futuro, colaborando também para acomodar práticas pedagógicas tradicionais
e que não vêm contribuindo para uma boa formação.
A defasagem do conteúdo de uma série para outra, no discurso docente, é justificativa
para a forma diferenciada da prática do professor ao ministrar aulas nesta rede de ensino,
porque ficou presente nas falas dos entrevistados que na escola privada o conteúdo é
repassado integralmente. Assim, afirmamos que as representações sociais que o professor de
Matemática tem do aluno da escola pública são fatores propulsores de práticas fragmentadas,
sem estímulo e, muitas vezes, descomprometidas com a qualidade do ato pedagógico.
100
Nesse contexto, a escola pública foi representada pelos professores entrevistados
como uma escola de estrutura precária, onde a direção e coordenação não estão presentes para
motivar e cobrar dos alunos e dos professores, colaborando para tornar essa escola
transigente; o material didático não é suficiente para tornar as aulas atraentes, diversificar e
melhorar a qualidade da prática e por fim o absenteísmo de professores e alunos é uma
constante, realidade oposta na escola privada, onde existe desde cedo a consciência da
importância do saber transmitido em sala de aula, bem como as exigências da direção e
coordenação representam garantia para uma maior atenção por parte dos docentes quanto às
atividades que desenvolvem.
Os discursos acerca da realidade da escola pública indicam, também, a construção de
um olhar docente sobre seus pares, remetendo-os a um perfil de desinteresse para com o
público atendido, descrevendo práticas fragmentadas, sem planejamento, revelando um
habitus pedagógico descompromissado, diferente daquele empregado no espaço privado. Os
elementos que formam esse olhar atuam como uma “bola de neve”, pois acabam incidindo
sobre uma formação de segunda ordem, colaborando na reprodução da situação de exclusão
em que se encontram os alunos da escola pública.
Os repertórios presentes nos discursos são imagens representativas do real que se
fortalecem no campo das idéias e podem gerar práticas concretas. Nesse sentido, o habitus
colabora no círculo que se forma mediante as representações modeladas nos processos de
interação socialmente construídos.
Assim, podemos apontar como idéias conclusivas neste estudo que o principal
conteúdo do repertório, presente nas representações de nossos interlocutores, é negativo.
Negar seu campo de atuação profissional apresentando-o como fragmentado, desestruturado,
descortinado pelo despreparo e pela falta de compromisso é característica dos discursos sem,
entretanto, reportar-se a uma visão mais dialética, apresentando as qualidades presentes na
escola pública, bem como experiências exitosas que desconstroem um modelo fechado e
engessado de escola.
Diante dessas considerações, queremos contribuir também para a compreensão da
realidade vivenciada pelos alunos da escola pública e as representações do professor de
Matemática em relação a este aluno, que amanhã estará disputando vagas não para
ingressar numa Instituição de Ensino Superior, mas também competindo no mercado de
trabalho. A escola pública está diretamente vinculada à situação social dos sujeitos que dela
participam, apresentando um caráter político próprio a todo aparato educacional, porém com
essa dimensão fortemente articulada à condição de classe e à transformação social.
101
As conclusões apontadas no decorrer deste trabalho são elementos importantes para
uma reflexão mais acurada acerca da qualidade do ensino da escola pública, entretanto não
devem ser encaradas como resultados estáticos, mas como um começo de um (re)pensar que
propicie novas práticas. Nosso intuito não foi construir saberes estanques acerca da realidade
estudada, mas colaborar na desconstrução de representações sociais que, muitas vezes,
elaboramos sobre o outro e sobre determinado contexto, imobilizando também nossa ação
sobre o mundo que se constitui num habitus e se perpetua ano após ano consolidando antigas
práticas. Os verdadeiros educadores são aqueles que cotidianamente estão com o coração
aberto para recomeçar e repensar o que já foi pensando.
Em síntese, após analisarmos e refletirmos sobre as nove (09) questões arguidas aos
professores de Matemática do Ensino Fundamental que lecionam ou lecionaram nas redes
de ensino público e privado na cidade de Parnaíba, observamos a existência de três eixos
representacionais, a exemplo de Lima (2006), com os seguintes relacionamentos:
Representações sociais relacionadas aos alunos de escola publica:
1. Possuem baixo rendimento escolar;
2. Possuem déficit de aprendizagem com relação às séries anteriores (falta de base);
3. São desmotivados e, portanto, desinteressados;
4. Não tem acompanhamento da família;
5. Possuem situação financeira precária;
6. São carentes;
7. São mal alimentados.
Representações sociais relacionadas à escola pública:
1. A estrutura da escola é precária;
2. A direção e coordenação não acompanham o aluno;
3. Os professores não são cobrados pela coordenação e direção;
4. Falta material didático;
5. Remunera precariamente os professores;
6. Os dias letivos são insuficientes.
Representações sociais relacionadas aos colegas professores da escola pública:
1. Os professores são desmotivados;
2. A didática dos professores é insatisfatória;
3. Os professores são descompromissados;
102
4. Os professores não planejam suas aulas.
Esses três eixos demonstram que o processo educativo é permeado por variadas
situações que podem configurar-se na prática descontextualizada do professor, caracterizando
resultados insatisfatórios de aprendizagem. Não é difícil encontrar professores que afirmam
que para ensinar Matemática basta a competência em termos de domínio do conteúdo,
entretanto, saber o que se vai ensinar e saber em profundidade apesar de ser pré-requisito
inquestionável não é suficiente porque deixa de lado a competência pedagógica necessária à
consolidação do ato de ensinar com qualidade. Cabe, portanto, ao professor de Matemática a
tarefa de superar as dificuldades presentes no ensino e aprendizagem da disciplina, rompendo
com estereótipos que se constituem em obstáculos ao seu fazer pedagógico, bem como
colaborando para desconstruir as representações sociais de que esse campo do saber é
inacessível, “difícil” e “complexo”.
O campo de conhecimento da Matemática refere-se a um objeto que deve ser
construído pelos alunos em seu repertório cognitivo e serve como instrumento nas diversas
áreas do conhecimento, pois trabalha com o raciocínio lógico permitindo uma postura
reflexiva diante de situações-problemas encontradas no cotidiano. A prática do professor de
Matemática exige, portanto, uma compreensão ampla relativa a esse saber, numa postura que
vai além da execução de fórmulas, mas voltada para a interpretação, análise e ação a fim de
possibilitar a construção de vários caminhos de raciocínio-lógico articulados pelos alunos.
Nesse sentido, o professor de Matemática deve pensar a realidade social, econômica e cultural
dos discentes não como caminho que fecha oportunidades, mas como situações que podem e
devem permitir fazeres pedagógicos diferenciados, enriquecendo o processo ensino-
aprendizagem.
Nesse sentido, a realidade pesquisada apontou para uma perspectiva desmotivadora do
fazer pedagógico desses professores, indicando que a escola é compreendida como espaço
cultural que não dialoga com as classes populares, em seu universo cultural e social,
principalmente, quando seus interlocutores (os professores) representam seu parceiro do ato
educativo (o aluno) como desfavorecido na execução da ação de aprender.
103
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113
APÊNDICE A - ROTEIRO DE ENTREVISTA
Você é professor de matemática há quanto tempo?
1. que você é ou foi professor (a) de matemática tanto na escola pública quanto na escola
privada, gostaria que você relatasse esta sua experiência, descrevendo o nível dos alunos
de cada rede de ensino.
2. Onde é mais difícil ser professor (a) de matemática: na escola pública ou privada? Por
quê?
3. Em sua opinião existe diferença de aprendizagem entre os alunos da escola pública e
alunos da escola privada? Justifique sua resposta.
Caso sua resposta tenha sido positiva, você atribui isto a quê? Onde as dificuldades do aluno
estão mais presentes, na escola pública ou privada? Você sabe explicar o motivo destas
dificuldades?
4. Da mesma forma que é repassado o conteúdo programático na escola pública é repassado
igualmente na escola particular?.
5. Como você o aproveitamento da disciplina matemática pelo aluno da escola pública e
pelo aluno da escola privada?
6. Em sua opinião existe motivação para aprendizagem da disciplina matemática? Em quais
das redes de ensino esta motivação é mais evidente? Justifique sua resposta.
7. Pela sua experiência como professor (a), você acha que os outros professores mudam a
sua metodologia conforme a rede de ensino que estão atuando?
8. Você, por exemplo, varia a forma de ensinar conforme a rede de ensino? Por quê?
9. Descreva o aluno da escola pública e o aluno da escola privada, fazendo um paralelo
entre eles.
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