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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Luciana Fabíola Gonçalves
O gênero oral debate em sala de aula: um estudo de caso
MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA
SÃO PAULO
2009
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Luciana Fabíola Gonçalves
O gênero oral debate em sala de aula: um estudo de caso
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em
Língua Portuguesa, sob orientação da Profa. Dra. Neusa
Maria Oliveira Barbosa Bastos.
SÃO PAULO
2009
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Banca Examinadora:
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___________________________________________
___________________________________________
AGRADECIMENTOS
Agradeço, com profundo respeito e admiração, aos meus pais, que, com paciência e
dedicação, sempre me apoiaram. Não posso me esquecer de toda a equipe da EE
Thomázia Montoro, que colaborou para a realização deste trabalho.
Aos meus queridos amigos: Lulu, Taba, Cátia, Sumaia, Amandy, Betinho, Dédé, Preta,
Cumpa, Arthur, Regina, Sílvio, José Sérgio, Jane, Palmira, Berê e aos outros que não
citei, mas muito me ajudaram, apoiando-me nos momentos difíceis e sempre me
estimulando a nunca desistir!!
As minhas jóias e razão de tudo, Yan e Malú.
RESUMO
O ensino com gêneros orais vigora como uma das diretrizes propostas pelos PCN de
Língua Portuguesa. Entretanto, muitos professores ainda têm sérias dificuldades em
lidar com essa modalidade, que parece ser relegada a segundo plano nas escolas do
País. São poucas as referências teóricas sobre o desenvolvimento de práticas
pedagógicas com esse gênero.
No intuito de contribuirmos para o aprimoramento das aulas com gêneros orais,
verificamos, neste trabalho, como o gênero debate em sala de aula foi utilizado em uma
aula de Língua Portuguesa, na 6ª série do Ensino Fundamental, e apresentamos uma
sequência didática para o ensino desse gênero. Nosso foco foi o de observar como se
instaurou a interação no debate e quais foram os elementos linguísticos utilizados pelos
alunos e pela professora-mediadora no processo interacional.
Para tanto, embasamos-nos em estudos sobre sociointeracionismo discursivo
(BAKHTIN, 2002; BRONCKART, 2007); interação pela linguagem (KOCH, 2000);
características da oralidade e da escrita (MARCUSCHI, 2007a); importância dos
gêneros orais em sala de aula e desenvolvimento de sequência didática (DOLZ &
SCHNEUWLY, 2004a, 2004b; DOLZ, NOVERRAZ & SCHNEUWLY, 2004);
características do gênero debate em sala de aula (RIBEIRO, 2009), entre outros.
O trabalho revelou que, de modo geral, os professores no Ensino Fundamental sentem
dificuldades para trabalhar com o gênero oral. Em nossas observações, constatamos
que os alunos não são devidamente orientados para interagir nesse gênero, por não
conseguirem explorar adequadamente os elementos linguísticos que levam a uma
interação mais significativa. Possivelmente, o professor teria alcançado melhores
resultados se tivesse partido de uma sequência didática.
Palavras-chaves: Língua Portuguesa, ensino, gêneros orais
ABSTRACT
Oral genres integrate one of the directives proposed by Portuguese PCNs. However,
many teachers face great difficulty in dealing with it. Oral genres seem to have been
considered a secondary teaching practice in Brazilian schools. There are few theoretical
references to the development of pedagogic practices that utilize this genre.
In order to improve teaching using oral genres, this study analyzed a classroom debate
with sixth grade students during a Portuguese language class, presenting a didactic
sequence for the teaching of this gender. Our aim was to analyze student interaction
during the debate and which linguistic elements were used by the students and by the
teacher-moderator.
This work is based on socio-interactive speech (BAKHTIN, 2002; BRONCKART, 1999,
2007); interaction through language (KOCH, 2000); oral and written characteristics
(MARCUSHI, 2007a); the importance of oral genres in the classroom and the
development of didactic sequences (DOLZ & SCHNEUWLY, 2004a, 2004b; DOLZ,
NOVERRAZ & SCHNEUWLY, 2004; the characteristics of classroom debates
(RIBEIRO, 2009).
This study showed that, generally, elementary school teachers face difficulty in using
oral genres in the classroom. We concluded that the students were not being correctly
oriented to interact in this genre, because they could not explore adequately the
linguistic elements that lead to a more comprehensive interaction. The teacher would
have had better results have if he would have started from a didactic sequence.
Key words: Portuguese Language, teaching, oral genres
SUMÁRIO
Introdução
08
1. Gêneros orais e ensino 13
1.1. PCN e ensino de Língua Portuguesa 14
1.2. Oralidade e escrita 19
1.3. Gêneros orais na sala de aula 27
1.4. Sequência didática e avaliação
34
2. Gênero oral debate em sala de aula 41
2.1. Características 42
2.2. Elementos organizadores da interação oral 48
2.3. Operadores argumentativos
52
3. Análise do gênero debate em sala de aula e proposta de seqüência
didática
57
3.1. Contexto da pesquisa 58
3.2. Análise de dados 63
3.3. Análise do debate em sala de aula 68
3.4. Proposta de seqüência didática 78
Considerações finais
85
Bibliografia
88
Anexos
93
Anexo 1 – Questionário de sondagem 94
Anexo 2 – Transcrição do debate 95
Anexo 3 – Respostas da professora sobre sequência didática 111
Introdução
9
A publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) no final da década de 1990
parece ter despertado ações que incluem gêneros orais em propostas de ensino de
Língua Portuguesa. De acordo com as diretrizes apresentadas nesse documento, não
só o texto escrito deve ser a unidade básica para o ensino de língua materna; tal
atividade deve também se embasar na produção de textos orais, considerando-se seus
diferentes aspectos e gêneros (BRASIL, 1998).
Entretanto, o ensino da modalidade oral parece ser ainda relegado a segundo plano
nas escolas do País, pois quase não aparece em materiais didáticos e há ainda poucas
referências teóricas sobre como se deve proceder no ensino de gêneros dessa
natureza. Some-se a esse fato a fragilidade existente na formação dos docentes
brasileiros de modo geral: nossa realidade demonstra a dificuldade dos educadores no
trabalho com a oralidade, pois poucos são os que realmente conhecem suas
características.
Apesar desse quadro, os PCN sugerem que em aulas de língua materna sejam
desenvolvidas a oralidade, a escrita e a leitura. Se o oral é uma das práticas discursivas
sugeridas, faz-se necessário então o aprofundamento dos estudos nesse campo, tendo-
se em vista o desenvolvimento de novas metodologias e estratégias que garantam a
formação de um falante fluente, capaz de realizar escolhas adequadas aos gêneros
textuais que irá utilizar.
10
Nossa prática como professora de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental do Ciclo
II também aponta para a importância da inserção da oralidade nas atividades
pedagógicas em aulas de Língua Portuguesa: são diversas as situações vivenciadas
pelos alunos que demandam o aprimoramento da modalidade oral, tais como a
exposição de ideias de modo claro diante do professor e dos colegas, a participação em
seminários e debates, entre outras.
Entre os desafios com que nos deparamos, verificamos a necessidade de estudos que
demonstrem o que já foi realizado por outros educadores em relação à inserção de
gêneros orais em práticas pedagógicas; de estudos que abordem gêneros orais típicos
das salas de aula e de abordagens eficientes de avaliação da modalidade oral. É nesse
contexto que surge a necessidade de desenvolvermos esta dissertação, norteadas
pelas seguintes perguntas de pesquisa:
como os professores desenvolvem suas práticas pedagógicas com gêneros orais
em aulas no Ensino Fundamental?;
como o gênero debate em sala de aula é inserido nessas aulas?;
que procedimentos podem ser adotados para que os alunos se apropriem desse
gênero de modo mais eficiente?
Com base nessas questões, traçamos os seguintes objetivos:
11
verificar como professores de uma escola estadual desenvolvem suas práticas
pedagógicas com gêneros orais em aulas no Ensino Fundamental, para alunos
de 5ª a 8ª séries;
verificar como o gênero debate em sala de aula foi utilizado em uma aula de
Língua Portuguesa na 6ª série do Ensino Fundamental;
verificar quais os elementos linguísticos utilizados pelos alunos para instauração
da interação no debate;
propor uma sequência didática para o ensino do gênero debate em sala de aula.
O presente trabalho está dividido em três capítulos: Gêneros orais e ensino; Gênero
oral debate em sala de aula e Análise do gênero debate em sala de aula e proposta de
sequência didática.
No primeiro capítulo, apresentamos as orientações dos PCN para o ensino de Língua
Portuguesa por meio de gêneros textuais, enfatizando a concepção sociointeracionista
de linguagem que rege as diretrizes estabelecidas nesse documento, com base em
Bakhtin (2002) e Bronckart (2007). A seguir, tratamos de algumas características da
oralidade e da escrita, na ótica de Marcuschi (2007a), ratificando a ausência de uma
dicotomia entre essas modalidades. Tratamos da importância dos gêneros orais em
aulas de Língua Portuguesa, fundamentadas nos estudos de Dolz e Schneuwly (2004a,
2004b); Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004) e Brasil (1998). Por fim, explicitamos os
componentes da sequência didática e tratamos do processo de avaliação, considerando
os estudos de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004).
12
No segundo capítulo, traçamos as características do gênero oral debate em sala de
aula, tendo em vista os estudos de Dolz e Schneuwly (2004a, 2004b); Dolz, Schneuwly
e De Pietro (2004) e Ribeiro (2009). Na sequência, estudamos alguns fatores
linguísticos responsáveis pela organização da interação nesse gênero, embasadas em
Ribeiro (2009) e observamos a importância dos operadores argumentativos no
processo interativo, sustentadas por Koch (2000).
No terceiro capítulo, apresentamos o contexto da pesquisa, os procedimentos
metodológicos, a análise dos dados coletados, a discussão dos resultados obtidos. Por
fim, propomos uma sequência didática para o ensino do gênero debate em sala de
aula.
Reafirmamos a importância de o professor aprofundar seus conhecimentos no ensino
de língua materna com gêneros textuais orais – e não só com escritos –, evitando, por
exemplo, reduzir suas aulas ao ensino de gramática, como ainda ocorre em muitas
instituições. Embora os PCN já tenham estabelecido algumas diretrizes nesse sentido,
as propostas curriculares, organizadas por séries e por bimestres, não orientam ainda
de maneira satisfatória o ensino da oralidade. Desse modo, o professor sente
dificuldade em incluir a modalidade oral em seu processo de avaliação. Esperamos que
este trabalho possa contribuir para o aprimoramento das práticas pedagógicas com
gêneros orais, oferecendo subsídios para a realização de um processo avaliativo de
qualidade.
Capítulo 1 – Gêneros orais e ensino
14
Neste capítulo, apresentamos as recomendações dos PCN para o ensino de Língua
Portuguesa por meio de gêneros textuais, enfatizando a concepção sociointeracionista
de linguagem que subjaz às diretrizes estabelecidas nesse documento. Para tanto,
consideramos os estudos de Bakhtin (2002) e Bronckart (2007). A seguir, tratamos de
algumas características da oralidade e da escrita, na perspectiva de Marcuschi (2007a),
destacando a inexistência de uma dicotomia entre essas modalidades. Tratamos da
importância dos gêneros orais em aulas de Língua Portuguesa, embasadas nas ideias
de Dolz e Schneuwly (2004a, 2004b); Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004) e Brasil
(1998). Apresentamos estudos sobre sequência didática e tratamos do processo de
avaliação, fundamentadas em Dolz, Noverraz & Schneuwly (2004).
1.1. PCN e ensino de Língua Portuguesa
Uma vez que os PCN têm como finalidade principal constituir-se em uma referência
para professores no processo de elaboração de suas propostas didáticas, iniciamos
nossas considerações sobre ensino de gêneros orais refletindo sobre os pressupostos
sociointeracionistas que embasam suas orientações para um ensino eficiente de Língua
Portuguesa.
Os PCN norteiam as Propostas Curriculares Bimestrais de Língua Portuguesa do
Estado de São Paulo, entretanto muitos professores não apresentam o preparo
necessário para compreender os pressupostos teóricos que subjazem às orientações
15
para o tratamento da linguagem. Sobre tal despreparo, Biasi-Rodrigues (2001: 01)
afirma:
[...] fica patente a necessidade de se facilitar cada vez mais o acesso desses
profissionais às novas teorias e de prepará-los para lidar com novas orientações de
tratamento de linguagem verbal em sala de aula, para que possam instrumentalizar os
seus alunos para ações comunicativas de que efetivamente participam ou poderão
participar.
Quando o foco se volta para o professor e o ensino da expressão oral, o despreparo
torna-se ainda mais latente. Em virtude da supervalorização da escrita, advinda de
teorias cognitivas que enfatizam dicotomias inexistentes entre a modalidade oral e
escrita, o educador, que, de modo geral, formou-se dentro dessa visão dicotômica da
linguagem, apresenta dificuldades em transpor as diretrizes dos PCN para a sua sala
de aula. Um dos problemas enfrentados por ele, certamente, decorre da não
compreensão dos pressupostos teóricos que sustentam as orientações apresentadas.
De acordo com o documento, para que o ensino de Língua Portuguesa nos terceiro e
quarto ciclos do Ensino Fundamental seja eficiente, o professor deve guiar-se pelos
seguintes objetivos:
utilizar a linguagem na escuta e produção de textos escritos de modo a atender a
múltiplas demandas sociais;
16
responder a diferentes propósitos comunicativos e expressivos e considerar as
diferentes condições de produção do discurso;
utilizar a linguagem para estruturar a experiência e explicar a realidade, operando
sobre as representações construídas em várias áreas do conhecimento;
saber como proceder para ter acesso, compreender e fazer uso de informações
contidas nos textos, reconstruindo o modo pelo qual se organizam em
sistemas coerentes;
ser capaz de operar sobre o conteúdo representacional dos textos, identificando
aspectos relevantes, organizando notas, elaborando roteiros, resumos, índices,
esquemas, etc.;
aumentar e aprofundar seus esquemas cognitivos pela ampliação do léxico e
de suas respectivas redes semânticas;
analisar criticamente os diferentes discursos, inclusive o próprio, desenvolvendo
a capacidade de avaliação dos textos:
contrapor sua interpretação da realidade a diferentes opiniões;
inferir as possíveis intenções do autor marcadas no texto;
identificar referências intertextuais presentes no texto;
perceber os processos de convencimento utilizados para atuar sobre
interlocutor/leitor;
identificar e repensando juízos de valor tanto socioideológicos (preconceituosos
ou não) quanto histórico-culturais (inclusive estéticos) associados à linguagem e
à língua;
reafirmar sua identidade pessoal e social;
conhecer e valorizar as diferentes variedades do Português, procurando
combater preconceito lingüístico;
reconhecer e valorizar a linguagem de seu grupo social como instrumento
adequado e eficiente na comunicação cotidiana, na elaboração artística e mesmo
17
nas interações com pessoas de outros grupos sociais que se expressem por
meio de outras variedades;
usar os conhecimentos adquiridos por meio da prática de análise lingüística para
expandir sua capacidade de monitoração das possibilidades de uso de
linguagem, ampliando a capacidade de análise crítica (BRASIL, 1998: 32-3).
Como podemos observar, os PCN preconizam que o ensino de língua materna deve
fundamentar-se no princípio sociointeracionista de que a linguagem é um lugar de
interação. Desse modo, devemos organizar nossos discursos em decorrência das
condições contextuais que os circundam, as quais determinam, entre outros fatores, a
escolha do gênero textual no qual o discurso irá se concretizar. Marcuschi (2005: 25)
explica que gêneros “são formas verbais de ação social relativamente estáveis
realizadas em textos situados em comunidades de práticas sociais e em domínios
discursivos específicos”.
Como as esferas discursivas de comunicação são infinitas, pois são incontáveis os
campos de atividade humana em que exercemos determinado papel social,
dependendo da situação e do propósito comunicativo, também são incontáveis os
gêneros textuais de que dispomos para nos comunicarmos. Circular em diversas
esferas obriga-nos então a utilizar gêneros simples e complexos, sendo o primeiro
relativo a comunicações verbais espontâneas, como um diálogo cotidiano, e o segundo
relativo a circunstâncias de comunicação mais complexas, como o romance e o
discurso científico. Sobre tais gêneros, Bakhtin (2002: 263) afirma que, no processo de
sua formação, os gêneros secundários “incorporam e reelaboram diversos gêneros
18
primários (simples), que se formaram nas condições da comunicação discursiva
imediata”.
Nessa perspectiva, a definição de gênero pode parecer equivocadamente confusa ao
professor, por existir um número ilimitado de gêneros textuais e por alguns possuírem
características híbridas, variando de acordo com o espaço, o tempo, o período histórico-
político-cultural, o suporte em que estão circulando, os papéis sociais exercidos pelos
interlocutores da situação de comunicação e, sobretudo, por cada texto ter
propriedades próprias, mas ao mesmo tempo comuns a modelos já praticados.
Com base em tais observações, Bronckart (2007) argumenta que a cada circunstância
de comunicação temos de nos apropriar de um gênero já existente e, ao mesmo tempo,
recriá-lo, pois cada situação de ação de linguagem pode exigir uma adaptação ao
gênero já utilizado. Uma ação de linguagem refere-se à decisão que qualquer pessoa
adota ao buscar gêneros que sejam modelos de ação dentro de determinado contexto.
O aluno, portanto, sempre ao se apropriar de um gênero, deve ser hábil para calcular
um denominador comum entre a situação comunicativa e o conhecimento pré-existente
das ações de linguagem possíveis dentro de um determinado gênero. Ao realizar tais
operações, insere-se no universo social discursivo em que vive, interagindo, ao seu
estilo, com as mais diversas atividades comunicativas existentes em diversos domínios
discursivos. Bronckart (2007: 103) explica que
19
a apropriação dos gêneros é, por isso, um mecanismo fundamental de socialização, de
inserção prática nas atividades comunicativas humanas. [...] é nesse processo geral de
apropriação dos gêneros que se molda a pessoa. Esse processo de adoção-adaptação
gera novos exemplares de gêneros, mais ou menos diferentes dos exemplares pré-
existentes, e que, conseqüentemente, é pelo acúmulo desses processos individuais que
os gêneros se modificam permanentemente e tomam um estatuto fundamentalmente
dinâmico ou histórico.
Assim, o professor, em suas práticas pedagógicas, não deve simplesmente levar o
aluno a identificar os gêneros; deve fazê-lo perceber que os gêneros são pré-construtos
para executarmos nossas ações de linguagem (BRONCKART, 2007). O estudante deve
compreender que a apropriação de um gênero não é uma atividade meramente
reprodutiva, já que se adapta às particularidades de cada situação de comunicação.
1.2. Oralidade e escrita
São diversas as discussões em torno das particularidades entre oralidade e escrita,
conforme apontam os trabalhos de alguns estudiosos da língua, como Marcuschi
(2007a) e Fávero et al. (2007). Atualmente, a ideia de que essas modalidades sejam
dicotômicas não é mais considerada, haja vista que ambas podem ser concebidas
como “atividades interativas e complementares no contexto das práticas sociais e
culturais” (MARCUSCHI, 2007a: 16).
20
Uma aproximação estreita entre fala e escrita pode ser observada em ambientes
virtuais. Ao adentrarmos uma sala de bate-papo, por exemplo, verificamos um modelo
de comunicação que mescla as duas modalidades, formando um texto misto, cuja
característica é uma escrita oralizada.
Marcuschi (2007a) ressalta que, ao longo da história da humanidade, o homem pode
ser definido como um ser que fala e não um ser que escreve. Mas isso não significa que
devamos considerar a oralidade como sendo superior à escrita ou, ainda, a escrita
como sendo uma mera representação da fala. O autor ressalta que não há como tratá-
las com base apenas no código linguístico, sem considerar a sua distribuição nas
práticas sociais cotidianas.
Obviamente, oralidade e escrita têm, cada uma, suas características próprias. A
oralidade vale-se de elementos extralinguísticos na produção de sentidos, como
prosódia, gestualidade, expressões faciais, entre outros. A escrita, por sua vez,
apresenta elementos próprios, como tipos de letra, cores, sinais de pontuação para
representar gestos, expressões e prosódia, por exemplo. Contudo, tais características
não são opostas o suficiente para caracterizarem uma dicotomia.
Marcuschi (2007a: 27) explica que as perspectivas dicotômicas entre as duas
modalidades da língua originaram o prescritivismo de uma norma padrão, representada
na norma culta. Em decorrência disso, estabeleceram-se diferenças estanques entre
língua falada e língua escrita, conforme exposto no quadro a seguir:
21
Fala versus escrita
contextualizada descontextualizada
dependente autônoma
implícita explícita
redundante condensada
não-planejada planejada
imprecisa precisa
não-normatizada normatizada
fragmentária completa
O autor observa que essas dicotomias se configuram nas condições empíricas de uso
da língua, tais como planejamento e verbalização, e não em características reais dos
textos produzidos, considerando-se a natureza social que os circundam.
Entretanto, embora essa perspectiva venha sendo amplamente discutida no contexto
educacional brasileiro, os professores, de modo geral, continuam embasando-se nas
diferenças apresentadas, demonstrando dificuldade para trabalhar com a oralidade em
sala de aula. Em suas práticas pedagógicas, dão mais importância à escrita, relegando
a oralidade a um segundo plano. Até mesmo em cursos de graduação de Letras, em
que se formam novos docentes que atuarão no âmbito do ensino de língua materna, a
modalidade oral parece não ter adquirido ainda o mesmo grau de importância da
modalidade escrita. Mas em que consiste, de fato, trabalhar a oralidade em sala de
aula?
22
De acordo com os PCN (BRASIL, 1998), os conteúdos de Língua Portuguesa devem
articular-se em torno das modalidades oral e escrita, tendo-se em vista a reflexão sobre
suas características, ou seja, tais conteúdos devem ser considerados em uma
perspectiva de uso-reflexão-uso, com vistas à formação de um usuário competente do
ponto de vista comunicacional, capaz de realizar escolhas adequadas ao contexto em
que se insere. No que diz respeito à produção de textos orais, espera-se que o aluno:
planeje a fala pública usando a linguagem escrita em função das exigências da situação e
dos objetivos estabelecidos;considere os papéis assumidos pelos participantes, ajustando o
texto à variedade lingüística adequada;saiba utilizar e valorizar o repertório lingüístico de sua
comunidade na produção de textos;monitore seu desempenho oral, levando em conta a
intenção comunicativa e a reação dos interlocutores e reformulando o planejamento prévio,
quando necessário;considere possíveis efeitos de sentido produzidos pela utilização de
elementos não-verbais. BRASIL, 1998: 51.
Como podemos observar, a essas diretrizes subjaz uma perspectiva sociointeracionista
da linguagem, que enfatiza a característica dialógica das atividades discursivas. Nessa
ótica, Marcuschi (2007a: 33) observa que fala e escrita apresentam:
dialogicidade
usos estratégicos
funções interacionais
envolvimento
23
negociação
situacionalidade
coerência
dinamicidade
De acordo com os PCN, os professores devem considerar que os alunos chegam à
escola com uma competência discursiva utilizada em suas interações cotidianas. Assim,
podem valer-se dessa competência para desenvolver nos estudantes as habilidades
necessárias para o desenvolvimento pleno da cidadania. Cabe à escola, entre outros
procedimentos,
ensinar o aluno a utilizar a linguagem oral no planejamento e realização de
apresentações públicas: realização de entrevistas, debates, seminários, apresentações
teatrais etc. Trata-se de propor situações didáticas nas quais essas atividades façam
sentido de fato, pois é descabido treinar um nível mais formal de fala tomado como mais
apropriado para todas as situações
(BRASIL, 1998: 25).
Por fim, a escola também deve considerar que fala e escrita trazem entre si mais
semelhanças do que diferenças; elas não são estanques, mas convivem em um
continuum fundamentado nos usos da língua e não em normas que, em uma visão
dicotômica, estabelecem a oralidade como sendo própria de situações informais e a
escrita como sendo própria de situações formais de comunicação. Na verdade, a
oralidade pode ajudar no aprimoramento da produção escrita e vice-versa.
Por exemplo, a preparação de exposições orais pode ser planejada por meio da escrita,
24
para que tópicos importantes não sejam esquecidos e para que não haja desvio do
tema proposto. Palestrantes e conferencistas certamente escreverão previamente o que
dirão, o que confirma a importância da modalidade escrita no aprimoramento da
modalidade oral.
Assim, em salas de aula de Língua Portuguesa, o professor pode propor atividades de
retextualização. Conforme explica Marcuschi (2007a), nesse processo deve ser
observado o modo como o aluno compreende um texto, para que tenha condições de
transpô-lo para a escrita. A atividade cognitiva da compreensão textual é a fonte de
muitos problemas de coerência nesse processo, que se apoiará não só no momento do
evento comunicativo do gênero oral, mas também na transposição das falas desse
evento para a realização da retextualização.
Como exemplo de atividade de retextualização, podemos ter uma entrevista em um
canal de TV (gênero oral) transposta para uma revista impressa (gênero escrito). O
processo pode ocorrer também da escrita para a fala (uma exposição oral de um texto
escrito); da fala para a fala (tradução simultânea de uma conferência) ou da escrita para
a escrita (resumo sobre um texto escrito).
Alguns aspectos importantes no processo de retextualização de textos orais devem ser
observados, para que a ação pedagógica atinja os objetivos traçados pelo professor. Os
três primeiros aspectos, que são a idealização, a reformulação e a adaptação,
conduzem a operações de natureza linguístico-textual-discursiva. Apesar de focarem as
25
evidências empíricas linguísticas, tais transformações estão relacionadas diretamente
ao discurso, constituindo-o.
As operações não são sequenciais, pois a compreensão está inserida em todo o
processo de retextualização, mas ocorrem preferencialmente nesta ordem: há
primeiramente a eliminação de marcas interacionais, hesitações e partes de palavras,
depois a introdução da pontuação com base na entoação das falas, a retirada de
repetições, reduplicações, redundâncias, paráfrases e pronomes egóticos e a
introdução da paragrafação e pontuação detalhada, sem modificação da ordem dos
tópicos discursivos.
Na realização das operações de idealização e regularização, os alunos terão de
identificar traços da linguagem oral, o que incumbe o professor de levar ao
conhecimento dos estudantes aspectos prosódicos da oralidade, para que sejam
identificados e eliminados no momento da retextualização. As hesitações, as pausas, os
elementos lexicalizados e não-lexicalizados tipicamente produzidos na fala, como os
marcadores conversacionais, segmentos de palavras iniciadas e não-concluídas e as
sobreposições e partes inaudíveis serão eliminados. Na operação de adaptação, os
estudantes terão de realizar ações como reconstrução de estruturas truncadas,
concordâncias, reordenação sintática, encadeamentos e reordenação tópica do texto e
reorganização da sequência argumentativa (estratégia de estruturação argumentativa),
em que se agrupam os argumentos e condensam-se as ideias (estratégia de
condensação).
26
O quarto aspecto a ser observado em processos de retextualização é o cognitivo e
conduz a processos de compreensão que levam a mudanças mais complexas, como,
por exemplo, as inferências e as generalizações. Segundo Marcuschi (2007a: 69-70),
esse aspecto
é o mais complexo e menos trabalhado, distribuindo-se ao longo de todas as demais
operações, o que pede para esse bloco um modelo específico, já que para poder transformar
um texto é necessário compreendê-lo ou pelo menos ter uma compreensão dele. De igual
modo que dois falantes só interagem na suposição de uma certa compreensão mútua, um
indivíduo só pode retextualizar na suposição de compreensão do texto de origem.
Ressaltamos que, apesar de as retextualizações estarem presentes em nosso cotidiano
discursivo, não se trata de um processo mecânico e tampouco de desprivilegiar a fala
perante a escrita, insinuando que tais elementos prosódicos significam transformar um
texto falado caótico em um escrito organizado e bem-formado. Trata-se de fazer com
que o aluno perceba que a ordem dos textos orais difere da ordem dos textos escritos.
Marcuschi (2007a:47) afirma:
Fique claro, desde já, que o texto oral está em ordem na sua formulação e no geral não
apresenta problemas para a compreensão. Sua passagem para a escrita vai receber
interferências mais ou menos acentuadas a depender do que se tem em vista, mas não por
ser a fala insuficientemente organizada. Portanto, a passagem da fala para a escrita não é a
passagem do caos para a ordem: é a passagem de uma ordem para outra ordem.
27
1.3. Gêneros orais na sala de aula
Os PCN refletem a ideia de que a concepção de ensino de língua centrada apenas na
gramática normativa está cada vez menos em voga nas esferas educacionais. Em vez
disso, afloram propostas de trabalhos com gêneros textuais, tendo-se em vista o
desenvolvimento pleno da competência discursiva dos alunos, que devem ser capazes
de adequar suas escolhas linguísticas às situações interacionais de que participam.
Conforme mencionamos, tais pressupostos embasam-se em princípios
sociointeracionistas de linguagem (BAKHTIN, 2002; BRONCKART, 2007) que têm o
texto como lugar de interação e como fundamento do processo de ensino e
aprendizagem de língua materna. Todavia, notamos o despreparo de muitos
professores diante das propostas dos PCN e observamos o texto sendo abordado,
muitas vezes, como um estimulador da leitura ou como pretexto para o ensino de
gramática. Por esse motivo, antes de tratarmos especificamente do ensino de gêneros
orais, discursaremos brevemente sobre noções que deveriam permear atividades com
gêneros em salas de aula de Língua Portuguesa.
Apenas recentemente, os gêneros textuais foram considerados como sendo um meio
eficaz para o ensino das modalidades oral e escrita. Marcuschi (2008) explica que essa
expressão esteve muitas vezes vinculada à literatura, mas, atualmente, seu conceito
tomou dimensões multidisciplinares, que designam os discursos que circulam por
diversas situações comunicacionais.
28
Nesse prisma, Dolz e Schneuwly (2004b: 171) consideram os gêneros como
instrumentos ou megainstrumentos, já que em uma determinada situação um gênero é
uma ferramenta escolhida por um locutor que agirá discursivamente no intuito de
alcançar determinada intenção. Nas palavras dos autores,
os gêneros podem ser considerados instrumentos que fundam a possibilidade de
comunicação (e de aprendizagem). Vejamos o desenvolvimento dessa metáfora do
gênero como instrumento. Um agente deve agir linguisticamente (falar ou escrever),
numa situação definida por uma finalidade, um lugar social e destinatários. A ação de
falar realiza-se com a ajuda de um gênero, que é um instrumento para agir
linguisticamente. Eis porque, às vezes, o chamamos megainstrumento, para dizer que se
trata de um conjunto de instrumentos, um pouco como uma fábrica. Mas
fundamentalmente se trata de um instrumento que permite realizar uma ação numa
situação particular. E aprender a falar é apropriar-se dos instrumentos para falar em
situações de linguagem diversas, isto é, apropriar-se dos gêneros.
Tais observações levam-nos a refletir sobre o modo como os professores devem
ensinar com gêneros. Cabe a eles proporcionar oportunidades para que os estudantes
se apropriem de gêneros diversos, em situações reais de comunicação. Para tanto,
precisam fundamentar-se na natureza dialógica da linguagem: em uma situação
comunicativa, precisamos relacionar nosso discurso àquele que o recebe e que se
propõe a compreender o significado do que dizemos. Nesse contexto, temos um locutor
que se dirige a um interlocutor e este último não é um ser passivo: ele assume uma
29
postura responsiva ativa, concordando, discordando, complementando o discurso
daquele que lhe dirige a palavra (BAKHTIN, 2002).
Além disso, os educadores precisam escolher os gêneros mais adequados à situação
de aprendizagem. De acordo com Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), os
agrupamentos de gêneros e os critérios de progressão são métodos que podem ser
adotados para facilitar essa escolha. Os agrupamentos são realizados em função de
certas regularidades linguísticas que podem ser priorizadas pelo professor, de acordo
com seus objetivos didáticos.
Essas regularidades precisam ser identificadas para serem trabalhadas ao longo dos
módulos de uma sequência didática. Por exemplo, quando se vai realizar um debate, é
comum o uso de unidades linguísticas como os conectivos argumentativos (mas,
porque etc.) ou as modalizações (provavelmente, certamente etc.).
Segundo os autores, é necessário que os agrupamentos
correspondam às grandes finalidades sociais atribuídas ao ensino, cobrindo os domínios
essenciais de comunicação escrita e oral em nossa sociedade; retomem, de maneira
flexível, certas distinções tipológicas, da maneira como já funcionam em vários manuais,
planejamentos e currículos; sejam relativamente homogêneos quanto às capacidades de
linguagem (Dolz, Noverraz e Schneuwly, 2004: 120).
30
Para a definição de quais gêneros farão parte dos agrupamentos, a progressão por
meio dos ciclos (ou séries) é um meio em que o professor pode se apoiar para realizar
suas sequências didáticas. Pela progressão, não há sentido em repetir os mesmos
gêneros nos mesmos ciclos, há de se trabalhar outros gêneros, em vários níveis de
complexidade. Assim, quanto mais cedo a criança entrar em contato com formas mais
simples de algum gênero, nos últimos ciclos a tendência é a de que ela domine bem o
gênero mais elaborado que será trabalhado. Sobre esse detalhe da progressão, Dolz,
Noverraz e Schneuwly (2004: 125) afirmam:
Cada gênero pode ser abordado em diferentes níveis de complexidade. O conto, por
exemplo, será trabalhado em diferentes etapas do ensino fundamental, porém com
objetivos graduados, tanto do ponto de vista da organização e da construção de
personagens típicas das unidades lingüísticas que o caracterizam. Se nos ciclos/séries
inferiores, os alunos descobrem as principais características do conto, da 7ª à 8ª série, o
domínio do gênero pode permitir o distanciamento e a paródia. A repetição dos mesmos
gêneros a cada ano não se justifica. Entretanto, a retomada de objetivos trabalhados,
após um certo espaço de tempo e numa nova perspectiva, parece indispensável para que
a aprendizagem seja assegurada.
A progressão consiste em uma organização temporal do ensino para que se chegue a
uma aprendizagem satisfatória. A organização dos objetivos gerais de aprendizagem
tem de realizada entre os diferentes ciclos do Ensino Fundamental (progressão
interciclos), assim como a da definição dos objetivos específicos e a dos conteúdos
disciplinares de cada série pertencente a cada ciclo (progressão intraciclo).
31
Para que haja uma organização temporal dos objetivos que atenda às necessidades de
aprendizagem dos alunos, são necessárias estratégias de ensino que, segundo Dolz e
Schneuwly (2004a: 53),
supõem a busca de intervenções no meio escolar que favoreçam a mudança e a promoção
dos alunos a uma melhor maestria dos gêneros e das situações de comunicação que lhes
correspondem. Trata-se, fundamentalmente, de se fornecerem aos alunos instrumentos
necessários para progredir.
A progressão é requisito para a elaboração da sequência didática, pois define os
objetivos a serem atingidos em cada módulo e na produção final e permite uma
organização de uma sequência de atividades e exercícios que transformem
gradualmente as capacidades iniciais dos alunos para dominarem um gênero. Para a
elaboração da progressão, são necessárias as seguintes estratégias, por parte do
professor, de acordo com Dolz e Schneuwly (2004a: 54):
Adaptar a escolha de gêneros e de situações de comunicação às capacidades de
linguagem apresentadas pelos alunos;
Antecipar as transformações possíveis e as etapas que poderiam ser transpostas;
Simplificar a complexidade, em função dos elementos que excedem as capacidades
iniciais das crianças;
Esclarecer com os alunos os objetivos limitados visados e o itinerário a percorrer para
atingi-los;
Dar tempo suficiente para permitir as aprendizagens;
Ordenar as intervenções de maneira a permitir as transformações;
32
Escolher os momentos de colaboração com os outros alunos para facilitar as
transformações;
Avaliar as transformações produzidas.
As progressões não podem ser definidas com base em um gênero, pois sua diversidade
e seu caráter multiforme impossibilitam sua sistematização. Porém, podem ser
realizados agrupamentos de gêneros para cada capacidade de linguagem que se
queira desenvolver com os alunos. Essas capacidades têm relação estreita com os
aspectos tipológicos do discurso: no caso, por exemplo, de uma argumentação, a
capacidade de linguagem a ser trabalhada é a sustentação, a refutação e a negociação
de tomada de posição.
Em suma, os agrupamentos são uma tentativa de se determinarem certos modelos de
gêneros para que seja realizado um trabalho didático com eles. Para Dolz e Schneuwly
(2004a: 59)
Os agrupamentos assim definidos não são estanques uns com relação aos outros; não é
possível classificar cada gênero de maneira absoluta em um dos agrupamentos propostos,
no máximo, seria possível determinar certos gêneros que seriam protótipos para cada
agrupamento e, assim, talvez particularmente indicados para um trabalho didático.
Em relação aos gêneros orais, destacamos que são diversos os argumentos em prol do
ensino da oralidade em sala de aula: a competitividade do mercado de trabalho exige
das pessoas maior facilidade de se comunicar, não só por meio da escrita, mas também
33
da modalidade oral; muitos alunos têm dificuldades de escrever porque consideram a
produção escrita idêntica à produção oral, entre outros. Nessa perspectiva, os PCN
(BRASIL, 1998: 15) asseveram que
[...] nas inúmeras situações sociais do exercício da cidadania que se colocam fora dos muros da
escola – a busca de serviços, as tarefas profissionais, os encontros institucionalizados, a defesa
de seus direitos e opiniões – os alunos serão avaliados (em outros termos, aceitos ou
discriminados) à medida que forem capazes de responder a diferentes exigências de fala e de
adequação às características próprias de diferentes gêneros do oral.
Os gêneros orais que circulam no ambiente de sala de aula são aqueles mais
pertinentes ao processo de didatização que ocorre na escola (como, por exemplo,
debates, exposições orais, seminários, discussões, júris simulados etc.), pois são
gêneros que os alunos conhecem, por meio das mídias existentes (TV, rádio, cinema,
internet) e já carregam certo conhecimento das características básicas que os
constituem estes gêneros orais.
Porém, não podem ser, evidentemente, considerados os mesmos que a sociedade
utiliza em situações reais – trata-se de uma variação do gênero original. Por essa razão,
são chamados de gêneros escolares. Sobre o assunto, Dolz e Schneuwly (2004: 179)
comentam que
[...] a escolarização dos gêneros orais suscita inevitavelmente transformações, algumas sob o
controle mais ou menos consciente dos parceiros do ensino, outras automaticamente ligadas às
restrições das situações didáticas. Desse ponto de vista, os gêneros escolares podem ser
considerados variantes dos gêneros de referência, que visam ser acessíveis ao aluno.
34
As transformações que os gêneros orais sofrem com a escolarização do gênero são
variações necessárias, que têm de considerar aspectos importantes, como: a
possibilidade de aprendizagem dos alunos, os objetivos de natureza ética que a escola
coloca para o ensino e a adaptação da função de determinado gênero oral. Por
exemplo, na realização do debate em sala de aula, sua função será transformada,
diferenciando-se da função do debate televisivo (que os alunos já conhecem).
A exposição dos alunos aos gêneros orais mais complexos, de domínio público, exige
que o professor execute as transformações e variações necessárias, para que o gênero
oral debate em sala de aula não seja confundido com o gênero oral conversa ou
discussão. Nem mesmo pode ser considerado um debate público regrado ou
deliberativo, pois o ambiente escolar determina suas transformações. Um debate na
televisão, por exemplo, enfatizará mais as dimensões do discurso que provoquem
polêmicas, distintivamente de um debate em sala de aula em que, segundo Dolz e
Schneuwly (apud Miller, 1987; Nonnon 1996/1997: 12-49) evidencia mais sua finalidade
de construção coletiva de um saber sobre determinado assunto.
1.4. Sequência didática e avaliação
Em seus estudos sobre o ensino da expressão oral e escrita, Dolz, Noverraz e
Schneuwly (2004: 96) defendem a importância da elaboração de uma sequência
didática, que consiste em uma sequência de atividades organizadas de forma gradual,
35
cujo objetivo é propiciar ao aluno o domínio das características discursivas de um
determinado gênero textual. Para os autores, esse processo deve:
permitir o ensino da oralidade e da escrita a partir de um encaminhando, a um só tempo,
semelhante e diferenciado; propor uma concepção que englobe o conjunto da
escolaridade obrigatória; centrar-se , de fato, nas dimensões textuais da expressão oral e
escrita; oferecer um material rico em textos de referência, escritos e orais, nos quais os
alunos possam inspirar-se para as suas produções; ser modular, para permitir uma
diferenciação do ensino; favorecer a elaboração de projetos de classe.
No universo escolar, é necessário que o professor parta do princípio de que os gêneros
produzidos na escola são unidades concretas nas quais devem se embasar o processo
de ensino e aprendizagem. Nesse sentido, Marcuschi (2008: 213) enfatiza que o ensino
de gêneros textuais deve se realizar de modo ordenado, distribuído progressivamente
em todas as séries do Ensino Fundamental. O autor reforça a importância de o
professor criar situações reais, “com contextos que permitem reproduzir em grandes
linhas e no detalhe a situação concreta de produção textual, incluindo sua circulação,
ou seja, com atenção para o processo de relação entre produtores e receptores”.
Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004) observam que a estrutura de uma sequência
didática deve conter: apresentação da situação, produção inicial, módulo 1, módulo 2,
módulo n e produção final.
36
Na apresentação da situação, o professor explica aos alunos o projeto a ser realizado,
preparando-os para a produção inicial. Nessa etapa, devem ser respondidas questões
importantes, como: qual gênero será abordado?, a quem se dirige a produção?, que
forma assumirá a produção?, quem participará da comunicação?, e os alunos devem
conscientizar-se da importância de sua participação ativa no desenvolvimento do
projeto.
Na produção inicial, os alunos produzem um texto oral ou escrito que demonstre as
representações que têm da atividade proposta na sequência didática. Esse é um
momento importante, pois o educador tem a oportunidade de diagnosticar eventuais
problemas apresentados pelos estudantes. Segundo Dolz, Novarrez e Schneuwly
(2004: 102), para o professor,
essas primeiras produções – que não receberão, evidentemente, uma nota – constituem
momentos privilegiados de observação, que permitem refinar a seqüência, modulá-la e
adaptá-la de uma maneira mais precisa às capacidades reais dos alunos de uma dada
turma.
Assim, esse é o primeiro contato do aluno não só com o gênero que está sendo
trabalhado, mas com as dificuldades relativas ao objeto de aprendizagem. A produção
textual dessa etapa pode ser comparada com a produção final, estabelecendo-se,
desse modo, um processo de avaliação contínua.
37
Após a apresentação da situação e da produção inicial, há o desenvolvimento dos
módulos, que visam a trabalhar os problemas encontrados nas produções iniciais dos
alunos. Nesse momento, serão desenvolvidas ações específicas, que abordem o
reconhecimento da situação comunicativa por parte dos alunos; o planejamento da
estrutura do texto, de acordo com a intenção comunicativa do locutor, o perfil do
interlocutor, o lugar e o tempo em que se insere a mensagem; a realização da
mensagem por meio de elementos linguísticos adequados ao contexto comunicativo.
Nos módulos, podem ocorrer atividades de observação e análise de textos, tarefas
simplificadas de produção textual e elaboração de uma linguagem comum, que permite
ao estudante falar dos textos produzidos por eles ou pelos colegas, comentando-os ou
criticando-os.
Por fim, as sequências têm seu desfecho na produção final. Nela os alunos aplicam o
que aprenderam nos módulos sobre o gênero estudado e o professor poderá avaliar se
os elementos trabalhados foram apreendidos de modo eficiente e, dessa forma, dar
continuidade ao planejamento do trabalho.
Dissemos que a avaliação dos alunos na sequência didática deve ser contínua e deve
permitir ao professor redirecionar o caminho da aprendizagem. Mas no que se refere à
avaliação da produção oral, alguns obstáculos devem ser considerados. Um deles é
que as turmas que preenchem nossas salas de aula são, de modo geral, bastante
numerosas e, por conta disso, nem sempre há condições para uma avaliação mais
individualizada. Outro ponto a ser destacado é que os professores nem sempre têm
38
condições de estabelecer critérios para avaliar esse tipo de produção, por não ter
conhecimento suficiente das características da oralidade.
A avaliação deve atuar como elemento balizador entre as produções dos alunos e as
intervenções pedagógicas. Ao avaliar, o professor terá de proporcionar ao aluno acesso
a todas as partes do objeto de aprendizagem. Ter consciência do que conseguiu
aprender, como conseguiu e o que falta aprender são dados importantes para que o
aluno construa o conhecimento.
É importante que o docente faça um registro das ocorrências em sala de aula de
produção de gêneros orais, para que o processo avaliativo seja mais eficiente. Nesse
sentido, os PCN (BRASIL, 1997: 93) afirmam:
Ao se avaliar, devem-se buscar informações. Para isso, o professor precisa construir
formas de registro qualitativamente diferentes das que têm sido utilizadas
tradicionalmente pela escola, para obter informações relevantes para a organização da
ação pedagógica.
A avaliação deve ser, então, uma forma de refletir sobre os conhecimentos que estão
sendo construídos. Deve ser a via em que o aluno descobre que podem existir outros
modos de aprender, conhecer e fazer. Trata-se de avaliar de modo formativo, com
vistas a proporcionar autonomia ao aprendiz. Em outros termos, a avaliação formativa
implica levar o estudante à construção do saber por meio de atividades reflexivas, que
permitam que ele reflita sobre o próprio processo de aprendizagem.
39
Os critérios de avaliação na produção de gêneros orais são diretrizes importantes para
orientar o professor na construção das indicações a respeito de seus alunos. O que
exigir, o mínimo a ser alcançado e o que determina seu melhor ou pior desempenho
devem estar de acordo com os objetivos propostos para o ensino de Língua Portuguesa
no Ensino Fundamental. De acordo com os PCN, os alunos devem ser capazes de
demonstrar compreensão de textos orais, nos gêneros previstos para o ciclo; atribuir sentido
aos textos orais e escritos, posicionando-se criticamente diante deles; selecionar e coordenar
estratégias de leitura, adequadas a diferentes objetivos e interesses e à característica do
gênero e suporte (BRASIL, 1997: 95).
No trabalho com a modalidade oral, melhor seria o registro, por parte do professor, das
atividades propostas por meio de transcrição. Além de já ser uma forma usual de
avaliação da modalidade escrita, o professor, ao avaliar a transcrição, terá de sempre
compreendê-la como resultado de ações anteriores que acionaram os gêneros orais
para que fosse possível sua produção. Por meio dela, poderá organizar alguns módulos
de sua sequência didática.
A transcrição também se faz necessária para o aluno poder realizar as operações dos
processos de retextualização que serão feitos nos módulos didáticos. Apenas a
participação no evento comunicativo não propicia condições para análise das
características próprias da linguagem oral: é a união dos dados colhidos na transcrição
com a experiência vivenciada pelos participantes do evento no momento da
40
comunicação que implicarão uma plena compreensão do texto que será
rextextualizado.
No próximo capítulo, explicitaremos as características do gênero debate em sala de
aula, destacando os elementos linguísticos que estabelecem a interação entre os
participantes.
Capítulo 2 – Gênero oral debate em sala de aula
42
Neste capítulo, traçamos as características do gênero debate em sala de aula, tendo
em vista os estudos de Dolz e Schneuwly (2004a, 2004b); Dolz, Schneuwly e De Pietro
(2004a, 2004b) e Ribeiro (2009). Em seguida, estudamos alguns fatores linguísticos
responsáveis pela organização da interação nesse gênero, no intuito de analisar o
processo de argumentação construída pelos participantes do evento comunicativo em
questão, embasadas em Ribeiro (2009). Observamos a importância dos operadores
argumentativos no processo interativo, sustentadas por Koch (2000).
2.1. Características
Consideramos que o gênero debate em sala de aula é um poderoso aliado para o
desenvolvimento da oralidade, uma vez que contempla a ampliação de uma importante
capacidade de linguagem dos alunos: a de refutar, negociar as tomadas de posição
perante um determinado tema ou sustentar determinada idéia que defende. Dolz e
Schneuwly (2004: 166) explicam que esse gênero consiste em “uma discussão sobre
uma questão controversa entre muitos participantes que exprimem suas opiniões ou
atitudes, tentando modificar a dos outros ou ajustando as suas próprias em vista de
construir uma resposta comum para a questão inicial”.
O debate desempenha um importante papel na vida escolar e em nossa sociedade,
pois, por meio dele, os estudantes podem desenvolver um conjunto de capacidades
privilegiadas, como a gestão de palavras entre os participantes, a escuta do outro e a
43
retomada do discurso. No entanto, o debate que circula em sala de aula não pode ser
somente aquele que imita o clássico modelo do debate televisivo, já que as condições
de produção do momento de comunicação, o local, sua função dentro da sala de aula
são diferentes das de um estúdio de TV, onde é realizado o debate regrado
televisionado.
Dolz, Schneuwly e De Pietro (2004b) explicam que há pelo menos três tipos de debate,
que, de acordo com os objetivos didáticos do professor, podem ser trabalhados em sala
de aula:
a) O debate de opinião de fundo controverso, que diz respeito à exposição de
crenças e opiniões, com vistas a influenciar a posição do outro. Por meio dos
confrontos das ideia, esse tipo de debate representa um poderoso meio de
compreender um assunto controverso, pois nele o aluno descobre as mais
variadas facetas sobre o tema debatido, podendo, inclusive, forjar uma nova
ideia sobre o assunto, ou até transformar um argumento seu anterior.
b) O debate deliberativo, no qual a argumentação tem por objetivo uma tomada de
decisão, o que exercita a negociação entre as partes opostas, pois todos têm de
pensar numa só solução para a questão central;
c) O debate para resolução de problemas, que aumenta a capacidade dos alunos
de buscar soluções para a questão proposta. Por exemplo: “Como funciona o
grêmio de uma escola?” Os alunos, juntos, irão gerir a resposta para a pergunta,
44
formulando suas opiniões e escutando as dos outros, a fim de tirar proveito do
conjunto dos saberes distribuídos no grupo de debatedores.
Nos 3º e 4º ciclos do Ensino Fundamental, os alunos já têm habilidade para organizar a
tomada de turnos, para expor suas ideias de modo ordenado e também para escutar o
outro, entretanto não organizam ainda seus argumentos de modo adequado e também
sentem certa dificuldade para negociar suas opiniões com os outros participantes.
Dolz, Schneuwly e De Pietro (2004b: 258) explicam:
Notamos que muitos debates de crianças tendiam a “girar em círculo” e chegavam
rapidamente a um impasse ou voltavam-se constantemente aos mesmos argumentos, na
falta de um gancho que permitisse passar a outra coisa, por exemplo, a um nível de
generalização mais alto ou a um aspecto da problemática.
Para que os alunos consigam transpor os níveis propostos, para que consigam
desenvolver adequadamente as capacidades de linguagem subjacentes ao debate em
sala de aula, é necessário explanar sobre as características desse gênero oral. Assim,
conforme explica Ribeiro (2009), ao elaborarem suas sequências didáticas com o
gênero debate em sala de aula, o educador terá de trabalhar os seguintes aspectos:
a) sequência tipológica (argumentativa) - é necessário apresentar ao aluno textos
variados, orais ou escritos, que tenham a predominância da tipologia textual
argumentativa;
45
b) estratégias discursivas: deliberação, explicação, demonstração - o aluno deverá
ter ciência das ações discursivas a serem realizadas no momento do debate;
c) estratégias enunciativas: marcas do autor e do destinatário - esse item refere-se
às condições de produção, qual a função do debate e quem são os participantes
envolvidos. Tais informações têm de ser claras, para que os alunos possam
formular suas idéias;
d) estratégia argumentativa: tese, argumentos e conclusão - cabe ao professor
estimular os alunos a construírem e defenderem opiniões e ideias, para que
possam argumentar com o devido respaldo de informações sobre o tema
proposto;
e) organização linguística (características linguísticas típicas do gênero oral
debate), como presença de expressões de responsabilidade de autoria, como eu
penso, eu acho; discurso quase sempre em primeira pessoa, pois se trata de
textos em que se tem de expressar as próprias opiniões; articulação coesiva
pelos operadores argumentativos; uso do presente do indicativo, como marcador
temporal, uso de modalizadores, predominância de conectivos de encadeamento
etc.
Nos módulos da sequência, outros gêneros podem ser trabalhados para que os alunos
desenvolvam melhor sua capacidade argumentativa, preparando-os para a produção
final de um debate. Um deles é o diálogo argumentativo, que, segundo Ribeiro (2009:
43), é uma variação do diálogo cuja importância
46
incide sobre a capacidade de gerar conflitos, fazendo com que os interlocutores busquem
novos argumentos para defender suas idéias. Buscando convencer ou persuadir o outro
através do discurso, o interlocutor sempre estará recorrendo ao raciocínio lógico, às
evidências, às emoções, às provas e outros mecanismos de argumentação, no sentido
de validar o discurso próprio.
O professor deve escolher com bastante atenção o tema do debate, pois esse deve
estar de acordo com os objetivos do processo de ensino e aprendizagem. Conforme
observam Dolz, Schneuwly e De Pietro (2004b: 262), ele deve levar em conta quatro
dimensões do gênero:
a) dimensão psicológica (interesse dos alunos) - é importante perceber os
interesses dos alunos, suas preferências e afetos, para que a escolha seja
compatível com tais interesses;
b) dimensão cognitiva (nível de complexidade compatível com os alunos) - o nível
de complexidade do tema tem de estar de acordo com o repertório que os alunos
já trazem consigo;
c) dimensão social (aprofundamento crítico e social) - o tema tem de estar
relacionado à realidade vivenciada pelos alunos dentro e fora da escola,
atingindo certa espessura social. Deve conter potencialidades polêmicas, para
desencadeamento da discussão e abrir perspectivas para a elaboração de um
projeto de classe que faça sentido para os aprendizes;
47
d) dimensão didática (conteúdo de aprendizagem) - o tema tem de apresentar certo
nível de dificuldade, que comporte aprendizagens, em que os alunos expandam
seu conhecimento sobre determinado assunto.
Seja qual for o tipo de debate, essa atividade proporciona interação intensa entre os
participantes e oferece uma oportunidade aos alunos de transitarem por outros
universos discursivos, pois, por meio dos temas escolhidos, tomam conhecimento de
palavras, expressões e idéias novas e, como se trata de uma comunicação semiformal,
leva-os a por em prática um nível de linguagem mais elaborado e planejado,
diferentemente das falas a que estão acostumados em seus cotidianos.
No que se refere aos elementos facilitadores da interação, podemos citar os
marcadores conversacionais, os modalizadores e os operadores argumentativos, que
serão as categorias de análise do debate em sala de aula neste trabalho. Trataremos
desses elementos de forma mais específica na próxima seção.
Escolhemos o gênero debate em sala de aula como objeto de análise nesta pesquisa
porque se trata de um gênero essencialmente argumentativo e nem sempre o professor
parece utilizá-lo adequadamente. O ensino desse gênero deve ser considerado mais
seriamente pelos educadores e não apenas como uma técnica de avaliação
descontextualizada, sem relação com as práticas sociais vivenciadas pelos alunos.
Caso contrário, teremos apenas uma forma de participação tumultuada e mal planejada
48
dos alunos em aulas de língua portuguesa, que pode desestimular a todos no que diz
respeito ao ensino e à aprendizagem de gêneros orais.
2.2. Elementos organizadores da interação oral
O debate é um gênero oral que, por apresentar a argumentação como tipologia
predominante em sua constituição, tem os operadores argumentativos como principais
organizadores dos argumentos, refutações e negociações. O ato de sustentar uma
opinião ou negociá-la exige o uso de expressões que articulam os pensamentos e
ideias de maneira clara e objetiva, no momento da apresentação oral.
Embora os operadores argumentativos sejam um dos principais elementos da interação
verbal num debate, existem outros elementos da interação que são próprios da
linguagem oral e que constituem itens importantes a serem observados, como os
marcadores conversacionais, por exemplo.
Neste trabalho, observaremos no gênero debate em sala de aula duas marcas
linguísticas da argumentação e um aspecto da interação verbal, estudado pela análise
da conversação: os operadores argumentativos, os indicadores modais e os
marcadores conversacionais, respectivamente. Especificamente nesta seção,
trataremos dos indicadores modais e dos marcadores conversacionais. Quanto aos
operadores argumentativos, trataremos deles na próxima seção.
49
Os índices de modalidade, ou ainda, os modalizadores regulam a forma como são ditas
as idéias e argumentações e, segundo Koch (2000: 47) “são igualmente importantes na
construção do sentido do discurso e na sinalização do modo como aquilo que se diz é
dito”.
Os principais tipos de modalidade indicados pela lógica, que veiculam o mesmo
conteúdo proposicional são: necessário/possível, certo/duvidoso, obrigatório/facultativo.
Entre eles, há diversas formas de lexicalização das modalidades no discurso,
consideradas formas cristalizadas de expressão da modalidade. Algumas delas são:
a) é + adjetivo:
É necessário que a criminalidade acabe (representa uma necessidade).
É possível que a criminalidade acabe (representa uma possibilidade).
É certo que a criminalidade vai acabar (representa uma certeza).
É provável que a criminalidade acabe (representa uma dúvida).
b) Certos advérbios e locuções adverbiais (talvez, certamente, possivelmente,
possivelmente):
Possivelmente a criminalidade acabará (representa uma possibilidade).
Certamente a criminalidade vai acabar (representa uma certeza).
c) Verbos auxiliares modais, como poder e dever:
A criminalidade deve acabar (representa uma certeza).
50
A criminalidade pode acabar (representa uma possibilidade).
d) Construções verbais de auxiliar + infinitivo (ter de + infinitivo, precisar ou necessitar +
infinitivo ou dever + infinitivo):
A criminalidade tem de acabar (representa uma necessidade).
A criminalidade deverá acabar num futuro próximo (representa uma possibilidade).
A criminalidade precisa acabar! (representa uma necessidade).
e) Orações modalizadoras (tenho certeza de que, não há dúvida de que,
possibilidade de, todos sabem que, eu acho que etc.).
Não há dúvida de que a criminalidade tem de acabar.
Em todos os meios de lexicalização das modalidades acima mencionados, verificamos
um índice de modalidade para um mesmo conteúdo proposicional. Há casos em que se
pode verificar uma mesma modalidade, com diferentes funções, ou, ainda, um indicador
modal que representa diferentes modalidades, como é o caso dos verbos poder e dever
nos seguintes exemplos:
Todos os participantes do concurso devem comparecer ao local indicado para as
incrições (devem = obrigatoriedade).
O clima deve esquentar amanhã (deve = possibilidade).
Os participantes podem se apresentar com trajes adequados (podem = facultativo).
As inscrições podem ser encerradas de repente. (podem = possibilidade).
51
No que se refere aos marcadores conversacionais, estes são índices que servem para
organizar as relações estruturais e linguísticas da conversação em turnos (trocas de
falas dos participantes da interação verbal) e a ligação interna em unidades
constitutivas de turno. Portanto, têm funções sintáticas e conversacionais, porém são
próprios da linguagem oral. Segundo Marcuschi (2007b: 61), “Tudo indica que as
unidades, na conversação, devem obedecer a princípios meramente comunicativos
para sua demarcação e não a princípios meramente sintáticos”. São sinais que servem
como elo entre as unidades comunicativas, que orientam os falantes entre si e
aparecem em várias posições: na troca de falantes, ou na mudança de tópico, por
exemplo.
Os recursos verbais que operam como marcadores conversacionais são palavras de
senso comum, estereotipadas, que não contribuem com informações novas ou
adicionais, mas situam os interlocutores no contexto geral da conversação. As marcas
conversacionais verbais dividem-se em dois grandes grupos: as marcas produzidas
pelos falantes e as produzidas pelos ouvintes. As marcas produzidas pelos falantes
subdividem-se em marcas conversacionais pré-posicionadas e pós-posicionada. Por
exemplo: “olha” é um marcador que orienta o ouvinte e geralmente é evidente no
começo de turnos ou de unidades comunicativas. Já o marcador “né” é encontrado no
final de turnos ou de unidades comunicativas.
Os marcadores conversacionais produzidos pelos ouvintes dividem-se em três grupos:
os convergentes, que orientam o falante e demonstram concordância com o que foi dito
52
pelo falante, os indagativos, que expressam dúvida e os divergentes, que orientam o
falante no sentido de discordância com sua fala.
Na próxima seção, trataremos dos operadores argumentativos, um elemento importante
da interação verbal num debate. Serão selecionados alguns tipos de operadores para
que haja uma verificação de seu uso, na análise do debate.
2.3. Operadores argumentativos
O termo operadores argumentativos foi introduzido por O. Ducrot, criador da Semântica
Argumentativa (ou Semântica da Enunciação), para denominar os elementos
gramaticais de uma língua que têm a função de “indicar a força argumentativa dos
enunciados, a direção (sentido) para o qual apontam” (KOCH, 2000: 30).
A autora ressalta que, para compreendermos o funcionamento dos operadores, é
necessário levar em conta duas noções básicas: a de escala argumentativa e a de
classe argumentativa.
Segundo Koch (2000: 31-38), os tipos de operadores argumentativos são:
a) Operadores que assinalam o argumento mais forte de uma escala orientada no
sentido de determinada conclusão: até, mesmo, até mesmo, inclusive.
53
Exemplo: “O homem teme o pensamento como nada mais na terra, mais que a
ruína e mesmo mais que a morte”. Nesse caso, o termo mesmo conduz à
conclusão, indicando a introdução de um argumento mais forte.
b) Operadores que somam argumentos a favor de uma mesma conclusão (isto é,
argumentos a favor de uma mesma classe argumentativa): e, também, ainda,
nem, não só...mas também, tanto...como, além de.
Exemplo: “João é o melhor candidato. Tem boa formação em Economia, tem
experiência no cargo e não se envolve em negociatas”. Aqui, o conectivo e
somou vários argumentos a favor de que João é o melhor candidato.
c) Operadores que introduzem conclusão relativamente a argumentos
apresentados em enunciados anteriores: portanto, logo, por conseguinte, pois,
em decorrência, consequentemente.
Exemplo: “O custo de vida vem subindo vertiginosamente; as condições de
saúde do povo brasileiro são péssimas e a educação vai de mal a pior. Portanto
não se pode dizer que o Brasil esteja prestes a se integrar no primeiro mundo”.
Nesse trecho, o termo portanto introduz uma conclusão decorrente da ideia
anterior.
d) Operadores argumentativos que introduzem argumentos alternativos que levam a
conclusões diferentes ou opostas: ou, ou então, quer...quer, seja.
Exemplo: “Vamos juntos participar da passeata. Ou você prefere se omitir e ficar
aguardando os acontecimentos?” Aqui, o termo ou designa argumentos
alternativos.
54
e) Operadores que estabelecem relações de comparação entre elementos, com
vistas a uma dada conclusão: mais que, menos que, tão...como.
Exemplo: “Vamos convocar Lúcia para redigir o contrato. A Márcia é tão
competente quanto a Lúcia”. O termo tão e quanto, nesse trecho, estabeleceram
relações de comparação.
f) Operadores que introduzem uma justificativa ou explicação relativamente ao
enunciado anterior: porque que, já que, pois.
Exemplos: “Não fique triste que esse mundo é todo teu. Tu és muito mais bonita
que a Camélia que morreu” (Jardineira). Nesse exemplo, o termo que introduz
uma justificativa.
g) Operadores que contrapõem argumentos orientados para conclusões contrárias:
mas (porém, todavia, contudo, no entanto) e embora, (ainda que, posto que,
apesar de que).
Exemplos: “A equipe da casa não jogou mal, mas o adversário foi melhor e
mereceu ganhar o jogo” / “Embora o candidato se tivesse esforçado para causar
boa impressão, sua timidez e insegurança fizeram com que não fosse
selecionado”. Aqui, o termo embora indica que a idéia que se seguirá é contrária
à ideia que está na oração principal.
Do ponto de vista semântico, os operadores do grupo do mas e os do grupo do
embora têm funcionamento semelhante: eles opõem argumentos enunciados de
perspectivas diferentes, que orientam, portanto, para conclusões contrárias. A
diferença entre os dois grupos diz respeito à estratégia argumentativa utilizada
55
pelo locutor: no caso do mas, ele emprega a estratégia do suspense, isto é, faz
com que venha à mente do interlocutor uma conclusão, para depois introduzir o
argumento que irá levar à outra conclusão. Ao empregar o embora, o locutor
utiliza a estratégia de antecipação, ou seja anuncia, de antemão, que o
argumento introduzido pelo conectivo vai ser anulado.
h) Operadores que têm por função introduzir no enunciado conteúdos
pressupostos: já, ainda, agora.
Exemplo: “Paulo ainda mora no Rio”. O operador ainda remete a um pressuposto
de que Paulo já morava no Rio.
i) Operadores que se distribuem em escalas opostas, isto é, um deles funciona
numa escala orientada para a afirmação total e o outro, numa escala orientada
para a negação total.
Exemplos: “Ela estudou pouco” (tem possibilidade de passar) /“Ela estudou um
pouco” (provavelmente não passará).
Enfatizamos com Koch (2000: 38-39) que os operadores argumentativos ainda fazem
falta nos manuais didáticos que norteiam o trabalho do professor em salas de aula de
língua materna. Nesse sentido, a autora explica:
trata-se de elementos que – por falta de tempo ou por outras razões que não cabe aqui
discutir – têm merecido pouca atenção nos livros didáticos e nas aulas de língua
portuguesa, já que pertencem às classes gramaticais invariáveis (advérbios, preposições,
conjunções, locuções adverbiais, prepositivas, conjuntivas, etc) ou, então, são palavras
que de acordo com a NGB (Nomenclatura Gramatical Brasileira) não foram incluídas em
56
nenhuma das dez classes gramaticais, merecendo assim “classificação à parte”...
Acontece, porém, que são justamente essas palavrinhas (tradicionalmente descritas
como “meros elementos de relação, destituídas de qualquer conteúdo semântico”) as
responsáveis, em grande parte, pela força argumentativa de nossos textos.
Os operadores argumentativos têm uma fundamental importância no processo de
argumentar, pois são responsáveis pelo direcionamento e pela articulação das opiniões
e refutações e funcionam como indicativos da capacidade argumentativa dos alunos. O
trabalho com os operadores é necessário quando se desenvolvem sequências didáticas
baseadas em gêneros agrupados na esfera da argumentação. A apropriação adequada
desses articuladores e o conhecimento sobre seus tipos e suas variações de sentido
propiciarão um melhor desempenho no debate.
No próximo capítulo, o gênero debate em sala de aula será analisado, bem como
elementos lingüísticos que promovam a interação verbal a argumentação nesse tipo de
gênero oral, e em seguida será proposta uma seqüência didática.
Capítulo 3 – Análise do gênero debate em sala de
aula e proposta de sequência didática
58
Neste capítulo, apresentamos o contexto de nossa investigação, caracterizando a
unidade escolar em que colhemos os dados de pesquisa e o perfil dos alunos e da
professora envolvida no debate analisado. Em seguida, explicitamos os procedimentos
metodológicos adotados, tendo em vista o alcance dos objetivos do trabalho, e
apresentamos a análise de dados e os resultados obtidos. Por fim, propomos uma
sequência didática para o ensino do gênero debate em sala de aula.
3.1. Contexto da pesquisa
A escola
O universo de nossa pesquisa consiste em uma unidade escolar da Rede Pública, na
qual atuamos como professora de Língua Portuguesa, situada na zona Oeste da cidade
de São Paulo. Essa localização contribui para a constituição de uma clientela
passageira: os alunos que frequentam a instituição deslocam-se, de modo geral, de
outras regiões distantes, perigosas e carentes, no intuito de obter ensino de melhor
qualidade, misturando-se aos poucos estudantes de classe média que moram no bairro.
Apesar de a unidade escolar ter um projeto pedagógico que prevê a inclusão da
comunidade, por meio da formação de grêmios estudantis e de reuniões pedagógicas, o
perfil de seus frequentadores não converge para esse sentido: a clientela passageira
59
cria vínculos superficiais com a instituição e isso resulta no descomprometimento com o
ambiente escolar.
Com relação à classe escolhida para a realização da análise do gênero debate em sala
de aula, trata-se de uma turma de trinta e cinco alunos, que constituem um grupo
heterogêneo, com idade entre onze e quatorze anos. A sala apresenta sérios
problemas, como, por exemplo, alunos semianalfabetos, segundo relato da própria
professora da turma.
A professora J., que ministra aulas para essa classe, está na unidade há
aproximadamente 8 anos, sendo que suas aulas são planejadas com base nos
conteúdos citados no Planejamento Bimestral. Além de seguir as propostas curriculares
sugeridas pela Secretaria da Educação de São Paulo, ela se utiliza de diversos outros
recursos em suas aulas, como manuais didáticos, dicionários, jornais, revistas e outras
mídias. Contudo, apesar de aproveitar uma grande variedade de materiais em sua aula,
há um planejamento, porém ele não segue o modelo sistemático de sequências
didáticas para o trabalho com os gêneros orais.
Suas aulas são ainda baseadas em princípios estruturalistas e tradicionais, com
exercícios prescritivos. Portanto, há uma sistematização do ensino por meio dos
gêneros, em suas aulas, contudo ela não segue o modelo proposto, por meio dos
módulos didáticos.
60
Procedimentos metodológicos
Conforme mencionamos na introdução deste trabalho, nossa pesquisa norteia-se pelas
seguintes questões:
como os professores desenvolvem suas práticas pedagógicas com gêneros orais
em aulas de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental?;
como o gênero debate em sala de aula é inserido nessas aulas?;
que procedimentos podem ser adotados para que os alunos se apropriem desse
gênero de modo mais eficiente?
Com base nessas perguntas, traçamos os seguintes objetivos:
verificar como professores de 5ª a 8ª séries, em uma escola estadual,
desenvolvem suas práticas pedagógicas com gêneros orais nas suas aulas no
Ensino Fundamental;
verificar como o gênero debate em sala de aula foi utilizado em uma aula de
Língua Portuguesa na 6ª. série do Ensino Fundamental;
verificar quais os elementos linguísticos utilizados pelos alunos e para
instauração da interação no debate;
propor uma sequência didática para o ensino do gênero debate em sala de aula.
61
No intuito de alcançá-los, elaboramos, em um primeiro momento, um Questionário de
sondagem
1
com questões de múltipla escolha, para verificar como os professores da
escola selecionada desenvolviam suas práticas pedagógicas com gêneros orais em
aulas de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental.
O grupo de professores que respondeu o questionário era composto por professores
que lecionavam na 6ª série da turma escolhida para a realização da transcrição e
professores que lecionavam em turmas das 5ª, 7ª e 8ª séries. Dos doze professores
que responderam o questionário, quatro omitiram a disciplina que lecionavam.
Acreditamos que a resistência desses professores se deva ao fato de temerem serem
identificados. Do grupo dos nove professores que responderam o nome da disciplina
que leciona, dois eram de Ciências, um de Língua Inglesa, um de História, um de Arte,
um de Geografia e dois de Leitura e Produção de Textos.
Em seguida, realizamos a transcrição
2
e a análise de um debate em uma aula de
Língua Portuguesa, ministrada para a 6ª. série do Ensino Fundamental. A classe foi
escolhida aleatoriamente, com base nas respostas atribuídas à primeira questão do
Questionário de sondagem: escolhemos a classe de uma professora, designada aqui de
professora J., que prontamente aceitou participar da atividade de investigação.
A transcrição da conversação foi realizada tendo-se em vista o objetivo de verificar
quais os elementos linguísticos utilizados por alunos e professor-mediador para
1
Apresentado no anexo 1 da dissertação.
2
A transcrição do debate consta no anexo 2 deste trabalho.
62
instauração da interação. Pressupostos da análise da conversação embasaram os
aspectos observados ao transcrevermos o debate. Fatores importantes, como as
pausas, o volume de voz utilizado pelo interlocutor, a entonação, as tomadas de turnos
pelos participantes da interação verbal, as observações de fatos não-linguísticos, todos
os fatores são indicados numa transcrição por meio de sinais, que obedeceram a
convenções, que são os sinais mais frequentes e úteis para uma transcrição, segundo
Marcuschi (2007b: 10 ).
O debate durou trinta e quatro minutos e seu registro contou com o auxílio de uma
câmera digital e um aparelho MP3. Embora, nesta pesquisa, os elementos
paralinguísticos não tenham sido considerados, a câmera ajudou na transcrição das
falas dos participantes, pois a identificação de quem fala tornou-se mais precisa.
Dezesseis alunos participaram do debate, mas somente oito verbalizaram suas opiniões
de forma recorrente. Desses oito, cinco participaram mais ativamente e três, de modo
menos ativo. Os mais ativos receberam as designações de A1, A2, A3, A4 e A5 e os
menos ativos foram designados pela letra A. A professora-mediadora recebeu a
designação de P.
Após o debate, solicitamos à educadora que respondesse a um Questionário sobre
sequência didática
3
, sem nenhuma interferência de nossa parte. Nosso intuito foi o de
verificar como a professora organizou as atividades para a produção do debate e, com
3
Apresentamos esse questionário no anexo 3 desta pesquisa.
63
os resultados obtidos, propor uma sequência didática que pudesse contribuir para um
melhor aproveitamento desse gênero em sala de aula.
Por fim, propusemos uma sequência didática com a finalidade de contribuir para um
melhor aproveitamento do gênero debate em sala de aula em aulas de Língua
Portuguesa no Ensino Fundamental. Para tanto, embasamo-nos nos estudos de Dolz,
Noverraz e Schneuwly (2004), mencionados no capítulo 2.
3.2. Análise de dados
Questionário de sondagem
Com a aplicação do Questionário de sondagem, procuramos verificar como professores
de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental de uma escola estadual desenvolvem suas
práticas pedagógicas com gêneros orais em sala de aula, no Ensino Fundamental.
Na primeira questão, procuramos observar que gêneros orais eram mais praticados na
escola. As alternativas de resposta consistiam em: debates, seminários, leitura em voz
alta, outros. Os docentes poderiam escolher mais de uma alternativa, ao responder a
primeira questão e suas escolhas estão apresentadas no quadro abaixo:
Debate Seminário Leitura em
voz alta
Outros
58% 25% 83% 16%
64
Como podemos observar, o gênero leitura em voz alta foi o mais cotado. Atribuímos
esse fato à forma tradicional como a maioria dos professores ainda ministra as aulas,
em que a leitura em voz alta é um dos gêneros orais mais utilizados como estratégia de
ensino e aprendizagem e como principal meio de diagnosticar problemas de leitura dos
alunos.
O debate foi a segunda alternativa mais cotada e esse resultado só confirma a
importância de se desenvolverem estudos que auxiliem os professores a aproveitar
melhor os debates em suas práticas pedagógicas. Acreditamos que os professores se
valem de debates como meio de trabalhar com os alunos a argumentação oral, porém
não são trabalhados aspectos importantes da oralidade, como elementos prosódicos
adequados à situação de comunicação, características da interação verbal, como as
pausas, hesitações, repetições, o uso dos marcadores conversacionais e,
principalmente, os operadores argumentativos. Além de não trabalharem fatores
constituintes importantes do debate, os professores não procuram informações sobre as
características do gênero que será usado como objeto de ensino.
O seminário veio em seguida e, por ser um gênero oral que exige uma preparação
muito intensa por parte dos alunos para ser realizado. O gênero oral seminário é
considerado um gênero escolar, por propiciar o desenvolvimento de diversas
habilidades dos alunos. Foi um gênero que teve sua gênese em grandes empresas, na
década de 80, sendo usado como estratégia de desenvolvimento para que seus
empregados fizessem um melhor trabalho em equipe. Foi adaptado ao ambiente
65
escolar e, desde então, tornou-se uma tradicional ferramenta, conhecida dos
professores. O gênero seminário, pela complexidade enfrentada pelos alunos para
prepará-lo, exige mais tempo para o momento da apresentação oral, portanto os
professores o utilizam com menos freqüência que o debate, por exemplo.
Na alternativa Outros, tivemos participação nas aulas e leitura silenciosa. É importante
observar que alguns professores que participaram da pesquisa consideram tais
alternativas como gênero, fato que demonstra desconhecimento sobre o assunto. A
leitura silenciosa, por exemplo, é uma estratégia pedagógica que prepara para uma
atividade que será desenvolvida e não constitui um gênero oral. Além disso, nem
mesmo pode ser avaliada pelo professor, já que é silenciosa.
Na segunda questão, tivemos como objetivo observar com que frequência os gêneros
orais eram praticados em salas de aula. O quadro a seguir demonstra os resultados
obtidos:
Frequentemente Às vezes Raramente Nunca
75% 16% 8% _
O fato de todos os professores terem mencionado que trabalham com gêneros orais em
suas aulas indica que têm a noção da importância de se desenvolverem as habilidades
orais dos alunos. Entretanto, ressaltamos que eles não parecem ter conhecimentos
66
teóricos suficientes para trabalhar com essa modalidade linguística e isso reflete na
utilização inadequada dos gêneros orais.
Na terceira questão, procuramos observar se os gêneros orais eram considerados em
processos avaliatórios. Perguntamos ao professor se havia em seu diário um campo
para a avaliação das atividades orais e as respostas foram as seguintes:
Sim, todos os
bimestres
Sim, porém nem
todos os
bimestres
Não, mas incluo
o oral no
processo de
avaliação para
estabelecer a
nota final
Não, utilizo como
avaliação
somente
trabalhos
escritos
41% 33% 8% 2%
Diante desses dados, constatamos que, embora os gêneros orais mais complexos não
sejam praticados com frequência em sala de aula, a maioria dos professores os inclui
em seus processos de avaliação finais. A maior parte dos professores, ao responder
que inclui o oral no processo de avaliação, demonstra reconhecer a importância do
desenvolvimento das habilidades orais dos alunos, porém, pelas respostas dadas às
primeira e segunda questões, concluímos que eles trabalham os gêneros orais menos
complexos.
67
Na última questão, nossa finalidade foi observar se os professores verificaram, na
Proposta Curricular Bimestral 2008, a menção a gêneros orais em sua disciplina. As
respostas foram:
Sim Não Não sei; não me lembro
66% 17% 17%
Na Proposta Curricular Bimestral, há uma diretriz clara para que se trabalhe com
gêneros, inclusive os orais, em salas de aula. Assim, os professores teriam de
responder que, mesmo que não tivessem lido a Proposta, a menção do trabalho com
gêneros em sua disciplina era certa.
Entretanto, observamos que 66% dos docentes responderam ter verificado a presença
dos gêneros orais, 17% responderam que não verificaram a presença dos gêneros orais
na Proposta e 17% responderam não se lembrarem dos gêneros orais na Proposta.
Apesar de a grande maioria dos professores da escola estar ciente da relevância do
uso dos gêneros orais, um número considerável de professores ainda desconhece os
gêneros orais como ferramenta eficaz para o desenvolvimento da oralidade dos alunos.
Os que responderam a alternativa b ou c possivelmente desconhecem as novas
propostas ou possuem um conhecimento superficial a seu respeito. Se somarmos as
duas porcentagens das alternativas b e c, verificaremos que 32% dos professores
68
entrevistados ou não saberiam apontar, na sua disciplina, os gêneros orais na Proposta,
ou nem tomaram conhecimento do documento.
As respostas só confirmaram a necessidade de os professores participarem de
atividades de reciclagem profissional, que lhes permitam aprofundar conhecimentos
sobre o trabalho com gêneros textuais. Ao fazerem um estudo mais detalhado sobre o
uso dos gêneros como objeto de ensino, constatarão que, ao seguirem uma prática
pedagógica planejada por meio das sequências didáticas, chegarão aos objetivos
propostos.
Tendo em vista os dados obtidos com o Questionário de sondagem, podemos afirmar,
em síntese, que os professores entrevistados, embora saibam da importância dos
gêneros orais para o desenvolvimento da linguagem oral, necessitam sistematizar o
trabalho com a oralidade, por meio das sequências didáticas.
3.3. Análise do debate em sala de aula
Nesta seção faremos um estudo de caso de um debate em sala de aula, que, segundo
Chizzotti (1995: 102)
é uma caracterização abrangente para designar uma diversidade de pesquisas que coletam
e registram dados de um caso particular ou de vários casos a fim de organizar um relatório
ordenado e crítico de uma experiência, ou avaliá-la analiticamente, objetivando tomar
decisões a seu respeito ou propor uma ação transformadora.
69
A transcrição e a análise do debate permitiram-nos verificar como esse gênero foi
utilizado em uma aula de Língua Portuguesa na 6ª. série do Ensino Fundamental.
Nosso foco foi o de observar como se instaurou a interação no debate e quais foram os
elementos linguísticos utilizados pelos alunos e pela professora-mediadora no processo
interacional.
As tomadas de turno foram quantificadas em minutos e o resultado obtido foi o
seguinte:
Aluno Tomada de turno Tempo de exposição (em
minutos)
A1 40 6’
A2 11 1’50”
A3 18 2’40”
A4 20 3’
A5 04 1’
A 50 14’
P 112 7’
Ao tabularmos esses dados, tivemos como objetivo observar como ocorreram as
tomadas de turnos entre os participantes, tendo em vista que o gênero debate se
70
constitui por um alto nível de interação, em que as tomadas de turno pelos participantes
ocorrem de forma equilibrada.
O quadro acima demonstra que houve um equilíbrio entre o professor-mediador do
debate e o aluno participante A1, porém os demais participantes falaram poucos
minutos. As tomadas de turno dos participantes devem ser maiores, para indicarem
assim um nível de interação satisfatório, como o de A1. Partimos do princípio sócio-
discursivo-interacionista de que, para haver a construção conjunta do conhecimento,
todos os participantes do momento de comunicação devem interagir de forma
equilibrada. Cabe ao professor-mediador viabilizar o equilíbrio da interação dos
participantes do evento comunicativo, estimulando todos os alunos a fazerem suas
tomadas de turnos.
Na interação instaurada entre os participantes, procuramos observar quais marcadores
conversacionais e quais índices de modalidade foram utilizados na organização do
debate e, ainda, que operadores argumentativos foram mais utilizados pelos alunos em
suas exposições orais e como esses operadores contribuíram para o processo de
argumentação dos alunos em torno do tema debatido.
A identificação dos marcadores conversacionais e dos modalizadores poderá contribuir
para a elaboração de exercícios de retextualização, que serão propostos na sequência
didática como sugestão na próxima seção. Suas ocorrências, ao serem evidenciadas
nas atividades em que os alunos terão de passar da linguagem oral para a linguagem
71
escrita, proporcionarão a demonstração na prática das peculiaridades de cada uma das
linguagens.
Os operadores argumentativos mais utilizados serão analisados e, assim como os
outros elementos de interação que já foram citados, serão retextualizados em propostas
de atividades inseridas nos módulos didáticos. Selecionamos os dois operadores
argumentativos mais utilizados pelos alunos no momento da realização do debate,
procurando verificar se esse uso foi coerente ou não com a ideia exposta após o termo
articulador argumentativo.
Primeiramente, comecemos com a identificação dos marcadores conversacionais.
Selecionamos as evidências desses marcadores na fala dos alunos participantes do
debate. Foram separados conforme o seu posicionamento: se foram encontrados no
começo ou no final de turnos, ou no começo ou final de unidades comunicativas.
Identificamos o posicionamento, utilizando a seguinte abreviação: CT (começo de
turno), FT (final de turno), CUC (começo de unidade comunicativa) e FUC (final de
unidade comunicativa):
A1 6 né, ó, é, que é assim (CT)/ claro (FT).
A2 6 bom, é (CT)/ ó, como é (CUC)
A3 2 não, é (CT)
A4 4 Ah, sim (CT)/ (FT)
A5 -
72
A 8 Bom, ta bom (CT)/ é isso (FT)/como se fala?, ô (CUC)/ entendeu (FUC)
Podemos perceber que o exemplo acima revela que, apesar de A1 ter falado mais que
todos os outros participantes do debate
4
, usou o mesmo número de marcadores
conversacionais de A2. Os marcadores foram usados de maneira muito particular por
cada um, pois os participantes escolheram os mesmos para usarem em diferentes
turnos, indicando que cada aluno possui suas escolhas e preferências individuais dos
marcadores conversacionais utilizados e, provavelmente, utilizam-nos em outras
situações de interação verbal.
A identificação dos marcadores facilitará a identificação das peculiaridades da
linguagem oral. O levantamento dessas evidências será necessário para que, no
processo de retextualização proposta sejam suprimidos, por meio de estratégias de
eliminação, um dos primeiros passos realizados nas operações textuais-discursivas.
Entre as vinte e seis ocorrências de marcadores conversacionais, verificaremos sua
presença, nas quatro posições possíveis dentro de um turno, separando quatro turnos:
Exemplo 1 –
A1: é... porque você é contra”
Nesse caso, o marcador encontra-se no começo de um turno.
4
Quadro do número de minutos que cada um falou se encontra na p.69.
73
Exemplo 2 –
A1: primeiro o grupo que é contra...
Nesse caso, o marcador está no final de um turno.
Exemplo 3 –
A2: ó professora... tenho uma resposta aqui... ó... porque ele polui
Nesse caso, o marcador está no começo de unidade comunicativa.
Exemplo 4 –
A : eu acho que Javé é uma história real’... porque... é porque os moradores viviam lá...
então eles não queriam se separar... porque... tinha gente morta... da família DELES
lá... entendeu”... e a empresa inundou a cidade deles... e começaram a chorar... e::
javé é uma cidade que eles sentiram saudade, é isso
Nesse caso, a marcador está no final de uma unidade conversacional.
A segunda categoria a ser verificada são os índices modais, ou, ainda, os
modalizadores. Serão também evidenciados como com os marcadores
conversacionais, embora os modalizadores estejam envolvidos em outros tipos de
operações textuais-discursivas, que abordaremos na proposta da sequência didática. A
tabela abaixo apresenta o número de ocorrências de cada aluno dos modalizadores e,
em seguida, mencionamos os índices modais:
A1 = 9 ocorrências. Descrição: Eu queria saber/ Vocês tem que/ Eles têm que/ Eu acho
que/ Na minha opinião.
A2 = 0 ocorrências.
74
A3 = 4 ocorrências. Descrição: Eu também acho que/ Devia ter.
A4 = 8 ocorrências. Descrição: Tem que ter/ Devem estar/ Eu acho/ Você não acharia/
Eles deviam doar/ Tem que haver.
A5 = 0 ocorrências.
A = 11 ocorrências. Descrição: Eu acho/ Tem a possibilidade/ Queria ter encenado/
Tem que saber a localização exata/ Acho melhor/ É melhor.
Apesar de o aluno A1 ter maior tomada de turnos e ter maior tempo de exposição oral,
A4 apresentou uma desenvoltura excelente, no que se refere ao uso dos
modalizadores, pois eles são de fundamental importância para exporem claramente
suas opiniões e idéias durante o debate. Nesse sentido, A4 apresentou uma boa
desenvoltura na exposição oral durante o debate em sala de aula. Já o número de
ocorrências dos outros participantes está de acordo com o número de turnos e tempo
de exposição oral de cada um deles. Os participantes A2 e A5 falaram poucos minutos,
por isso as estratégias de interação verbal foram pouco utilizadas.
De um total de trinta e duas incidências de uso de modalizadores, foram verificados os
casos mais significativos, de acordo com o propósito de levar ao conhecimento dos
alunos as diferenças e nuances entre o uso dos índices modais na linguagem oral e
escrita, exercício esse que será proposto na retextualização. A seguir, podemos
observar as seguintes verificações e qual a implicação do seu uso.
Exemplo 5 –
75
A1: é, mas a cidade é muito pequena/ então, é::... vai ter um trabalho imenso... que
pode ajudar várias pessoas... então... tem que matar alguma cidade para isso/ então...
essa cidade podia se locomover dali/ pra construção da hidroelétrica
Nos termos evidenciados no exemplo acima, o aluno A1, ao usar o verbo auxiliar ter, no
presente do indicativo, mais o que e o verbo principal no infinitivo matar evidencia uma
modalização para exprimir a ideia de que será inevitável, na construção da hidroelétrica,
a inundação de algumas terras, que podem incluir vilas e cidades. Já os termos podia
se locomover indicam a modalização para introduzir uma sugestão, como solução para
os moradores das cidades e vilas alagadas.
Passemos para mais um exemplo de uso dos índices modais.
Exemplo 6 –
A4 : eu acho assim... que:: como a prefeitura fez a usina... eles deviam... como eram
poucas pessoas em Javé... deviam doar umas casas pra eles morar... pra não
prejudicá-los também...
Com o uso do verbo dever mais o verbo principal doar, o aluno utiliza a modalização
para a expressar a opinião de que a construtora da hidroelétrica tem obrigação de
ressarcir os habitantes das cidades e vilas afetadas.
Nos dois exemplos acima, as expressões modalizadoras servem como caminhos para
expressarem de forma objetiva e clara as opiniões. Vale ressaltar que os índices Eu
acho ou Na minha opinião podem ser considerados tanto marcadores conversacionais
como índices de modalização, como podemos observar no exemplo abaixo.
76
Exemplo 7 –
A1: na minha opinião...a energia solar é a melhor...porque”... porque você vai num
estabelecimento... que tenha energia da eletropaulo...ela vai sempre estar pagando
uma quantia em dinheiro/
O lexema na minha opinião torna-se um índice modal a partir do momento em que não
é somente um índice de interação verbal de confirmação para o falante. A1, ao usar o
termo, modalizou no sentido de deixar clara que se trata de uma certeza, pois a energia
solar é mais econômica que as outras vindas de fontes diversas, como é o caso das
hidroelétricas.
Passemos, agora, para a última categoria de análise, que são os operadores
argumentativos mais utilizados pelos participantes do debate em sala de aula. Abaixo, o
quadro de ocorrências, dos dois operadores mais utilizados, por participante:
PORQUE MAS
A1 10 5
A2 4 1
A3 3 1
A4 4 1
A5 1 -
A 8 1
77
Os números revelam que, apesar de o mas ser um dos mais utilizados, ele foi usado
bem menos que o porque, o que remete à dificuldade dos alunos para elaborar suas
refutações sobre o tema e os tópicos que estão sendo abordados.
Outro fator importante é a pouca variedade do uso desses operadores, pois foram
utilizadas somente duas categorias das nove já mencionadas nesse trabalho
5
. Um dos
objetivos dos exercícios de retextualização dos módulos didáticos, inseridos na
proposta da sequência didática, é levar o aluno a utilizar uma variedade maior de
operadores argumentativos em diferentes situações de comunicação, em diferentes
gêneros argumentativos, como o debate em sala de aula, gênero oral abordado nesta
dissertação.
O levantamento desses índices é importante para o aluno, pois, reconhecendo a
importância dos operadores argumentativos na linguagem escrita e falada, ele pode
apropriar-se do uso de outros, não só o porque e o mas, como pudemos observar pelos
dados colhidos.
A seguir, verificaremos o uso do porque e do mas no exemplo abaixo:
Exemplo 8 –
A 1: eu acho que sim... porque tem a energia solar... um exemplo da energia solar...
tem casa hoje que é movi::da à energia solar... mas isso... é:: tipo assi::m... se a casa
tem energia solar... ela custa 50.000... ela vai valer 120.000... ela dobra de preço”
5
O s tipos de operadores argumentativos encontram-se na p 52, capítulo XX.
78
Nos termos destacados, percebemos o uso pertinente à argumentação apresentada: o
porque introduz uma explicação ao fato de o aluno achar que a energia solar é mais
barata que a elétrica. O mas introduz a adversidade em relação ao uso da energia
solar, pois o equipamento que permite o uso desse tipo de energia é caro.
Na próxima seção, será apresentada uma proposta de uma seqüência didática para
melhor viabilizar e sistematizar o trabalho do professor com o gênero oral debate em
sala de aula.
3.4. Proposta de uma sequência didática
Com base nos resultados obtidos na análise de dados, propomos uma sequência
didática prevista para três semanas. O material a ser utilizado nas etapas são cadernos,
cartolinas, lápis, caneta, canetinha (ou canetão) e um aparelho de gravação de áudio e
vídeo, para gravar os momentos de debate de qualquer tipo, realizado durante a
seqüência didática.
Na apresentação inicial já é colocado o tema e o professor o situa como o tema será
contextualizado e desenvolvido ao longo dos módulos, e logo se faz a produção inicial:
um debate regrado de opinião sobre o tema proposto, no caso o meio ambiente e os
avanços tecnológicos. A essa produção chamamos de diagnóstica, que será
comparada futuramente com a produção final. Com esse procedimento, ficarão
evidentes os avanços dos alunos e o que lhe falta ainda aprender. Já na produção
79
inicial, com a gravação das partes argumentativas dos alunos, eles, sob orientação do
professor, realizarão exercícios de retextualização.
A sequência didática para trabalhar com o gênero oral debate propõe que sejam
trabalhados, durante três oficinas, três gêneros argumentativos (dois orais e um
escrito). O primeiro gênero é o diálogo argumentativo, sendo a primeira oficina uma
socialização dos conhecimentos pesquisados sobre a temática meio ambiente. Os
alunos utilizarão cartazes, para exporem suas idéias principais sobre o tema, um
aparelho de reprodução (cd ou vídeo-cassete) e uma TV, para assistirem aos debates
gravados, selecionados pelo professor.
É importante trabalhar outros gêneros orais argumentativos para que o aluno entre em
contato com uma variedade de gêneros orais mais simples e informais, que irão
prepará-lo para a apresentação oral do debate em sala de aula, objetivo da produção
final dessa sequência didática. As idéias principais, quando levantadas pelo grupo num
diálogo argumentativo, faz uma preparação para os exercícios de retextualização e
suas operações.
Para a realização desses exercícios nos módulos didáticos, há a necessidade de serem
gravados trechos, tanto da produção inicial como dos gêneros orais argumentativos
desenvolvidos ao longo da realização dos módulos didáticos, pois só assim as
retextualizações poderão ser realizadas. A gravação de todo o evento poderá ser
realizada, para que o aluno selecione somente os trechos em que haja algum tipo de
80
expressão verbal de ideias, opiniões e argumentos. Com esses trechos transcritos, os
alunos perceberão as particularidades de cada linguagem e terão a noção das relações
existentes entre a escrita e a oralidade. Segundo Marcuschi (2007a: 99):
Não é difícil obter dados de retextualizações. Basta dispor de gravações e transcrições que o
trabalho pode fluir de maneira bastante proveitosa. No caso de ser utilizado em contextos de
ensino, o método serve para avaliar o grau de consciência lingüística o e domínio da noção
das revelações entre o texto oral e o texto escrito.
Na verdade, em todas as oficinas que tiverem momentos de prática de gêneros orais
argumentativos, pode haver gravação do evento comunicativo e transcrição das partes
interessantes.
Todos os momentos em que a retextualização for realizada, as nove operações
textuais-discursivas de passagem do texto oral para o escrito terão de ser realizadas
cuidadosamente, para que o resultado seja positivo.
As quatro primeiras operações de passagem estão estritamente relacionadas à
linguagem oral e dependem das orientações dos professores para que os alunos
possam realizá-las. Nas quatro primeiras operações, baseados nos trechos gravados,
os alunos, nesta ordem, terão de:
eliminar as marcas estritamente orais (como os marcadores conversacionais);
introduzir pontuação conforme intuição pela entoação das falas;
retirar as repetições, reduplicações, redundâncias, etc;
81
introduzir a paragrafação do texto, sem modificação da ordem dos tópicos
discursivos.
Trata-se das operações regularização e idealização, na retextualização do texto oral
para o escrito. Já as operações que realmente transformam e concluem a
retextualização são as cinco últimas operações, que serão realizadas após a conclusão
das quatro primeiras operações já mencionadas.
Portanto, o estudo dos textos argumentativos escritos a ser realizado na primeira e na
segunda oficina é de suma importância, pois o aluno terá como perceber as
particularidades da argumentação na oralidade e na escrita e se expressará melhor em
sua apresentação oral, na produção final do debate em sala de aula.
Das cinco operações restantes, as que mais são trabalhadas em gêneros
argumentativos, como é o caso do debate, são as últimas operações, que consistem em
reordenar o texto em tópicos, para reorganização da sequência argumentativa, e em
agrupar os argumentos, condensando-se as idéias e opiniões. Para o domínio dessas
duas operações é necessário um conhecimento razoável do manejo da língua em
diversas situações de comunicação, essencialmente em situações em que se usem os
gêneros orais argumentativos. Segundo Marcuschi (2007a: 86):
Esta operação exige alto domínio da escrita e se dá em especial em textos mais complexos
em que o aspecto argumentativo predomina ou em diálogos para os quais se sugere uma
82
retextualização mais global sem atenção para detalhes informacionais, sendo então
acopladas a esta a 9ª operação.
Portanto, por ser uma operação complicada e exigir um nível de conhecimento da
linguagem que provavelmente um aluno de 6ª série ainda não tenha, as duas primeiras
oficinas dos módulos didáticos são de extrema relevância para que os aprendizes
tenham conhecimento sobre opiniões diversas sobre o mesmo tema e, em seguida,
consigam formular suas próprias opiniões a respeito do assunto debatido em sala de
aula.
A prática da transcrição deve ser realizada pelo professor somente de algumas partes
do momento do debate, as que os alunos expõem suas idéias e opiniões, não havendo
a necessidade de se fazer a transcrição completa. A partir das gravações, o professor
passará para os alunos a transcrição dessas partes, juntamente com as gravações, que
serão reproduzidas para os alunos, várias vezes, para que o aluno se conscientize das
peculiaridades de cada linguagem, a oral e a escrita.
A segunda oficina aborda o gênero texto de opinião. Consiste em uma atividade em que
os estudantes farão a análise de textos de opinião, sobre o tema abordado, a partir de
escuta e leitura de textos e produzirão seu próprio texto de opinião, sobre o assunto
que está sendo abordado.
83
Nesse módulo, as operações de retextualização não serão utilizadas, pois os alunos
partirão de textos escritos, para realizarem suas produções. Embora não sejam
realizados exercícios de retextualização, há a necessidade de serem descritos os
operadores argumentativos, para que os alunos possam identificá-los, bem como suas
funções, demonstrando a importância desses articuladores no texto falado e escrito.
Na terceira oficina, a primeira ação será uma oficina de escuta e observação de um
debate, em vídeo, sobre as fontes de energia existentes (Projeto educativo da TV
Escola/MEC), seguida de uma análise e discussão sobre os tipos de argumentos
apresentados no debate, para que o aluno se sinta preparado para formular seus
próprios argumentos, refutações e negociações.
A próxima ação será outra oficina de escuta, em que se comparam dois tipos de
debate: um acerca do desequilíbrio ecológico e desenvolvimento urbano ( Programa de
TV gravado/Rede Cultura) e o outro, um debate político (Programa de TV gravado). A
comparação deve ser feita, observando como nos dois casos houve a argumentação e
a refutação de idéias e opiniões.
No caso do debate em sala de aula, se a professora-mediadora tivesse realizado os
passos propostos pelos módulos didáticos, com os exercícios de retextualização e o
contato com outros gêneros argumentativos, o resultado da produção final seria
certamente mais positivo, pois os alunos teriam um conhecimento maior sobre os
84
recursos verbais interacionais e utilizariam, provavelmente, uma variedade maior de
operadores para sustentarem seus argumentos.
A produção de diálogos argumentativos, a partir de situações vividas na escola, a leitura
de textos produzidos pelos alunos, a reelaboração de textos orais de forma escrita e a
organização de debates de vários tipos, executados nos módulos didáticos, preparam o
aluno para ter um bom desempenho em sua produção final, que é a realização do
debate regrado de opinião. A análise desses três gêneros argumentativos trabalhados
em sala de aula trarão aos alunos uma melhor realização de sua produção final.
Para que os alunos avaliem o conhecimento que construíram sobre o gênero debate e,
ainda, o que falta aprender, as gravações das produções inicial e final são importantes,
justamente para comparar os dois momentos da sequência didática, observando-se
quais foram seus pontos de evolução e quais ainda faltam ser desenvolvidos.
As transcrições servirão de material de avaliação das ações do professor, e mais ainda
do aluno que pode, posteriormente, selecionar os argumentos, as refutações, as
opiniões e as negociações para analisá-las mais profundamente.
Considerações finais
86
Nesta dissertação, procuramos mostrar que os gêneros orais fazem parte das
atividades realizadas na escola, porém de modo não-sistematizado. Os professores
utilizam gêneros orais em suas práticas em sala de aula, contudo trabalham pouco os
de domínio público, como é o caso do debate. Consideramos importante destacar que
os alunos já vêm com o domínio dos gêneros orais informais e cotidianos, como a
conversa espontânea. Cabe à escola levar esses alunos a praticarem gêneros orais
mais complexos e formais.
Além disso, a escola deve levar o aluno a conhecer as peculiaridades da linguagem oral
e perceber que tanto a oralidade quanto a escrita são vias de expressão fundamentais
da língua e que devem ser articuladas conforme a situação de comunicativa em que
estão inseridas.
Os professores devem procurar caminhos teórico-metodológicos para desenvolver
adequadamente o ensino por meio dos gêneros orais e estimular o aluno a não
considerar a escrita como sendo a mais importante e o único objetivo da escolarização.
Procuramos apresentar uma proposta didática para o ensino do gênero debate em sala
de aula, partindo da premissa de que os gêneros orais devem ser objetos de estudos
em sala de aula, em todo Ensino Fundamental. Buscamos um modelo didático que
propiciasse, por meio das relações intertextuais, a apropriação de conhecimentos sobre
o gênero.
87
Sabemos que a estratégia dos modelos didáticos não é novidade, porém reconhecemos
seu valor no sentido de indicarmos novos caminhos com a argumentação oral. A
utilização da sequência didática como proposta de ensino possibilita a alunos e
professores a apropriação mais adequada de um número diversificado de gêneros com
a mesma tipologia, tanto orais como escritos.
Não podemos afirmar que a elaboração e aplicão de uma sequência didática para o
ensino do gênero debate em sala de aula torne os alunos mais competentes no domínio
dos gêneros orais argumentativos. Contudo, é possível concluir que a sistematização
proporcionada certamente contribuirá para a evolução da capacidade argumentativa
dos alunos, tornando-os capazes de selecionar diferentes estratégias argumentativas e
adequá-las de acordo com a situação comunicativa.
A análise das evidências linguísticas do debate em sala de aula leva-nos a concluir que
a performance final dos alunos poderia ser muito mais adequada se o trabalho com o
gênero oral em questão tivesse sido realizado por meio de uma sequência didática. Por
tudo isso, reafirmamos a necessidade de mudança de postura dos professores, no
sentido de intervir com ações didáticas que possam propiciar situações de linguagem
que desenvolvam a oralidade.
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89
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Anexos
94
Anexo 1 – Questionário de sondagem
Gêneros orais e seu papel em sala de aula.
Quais gêneros orais você mais pratica em sala de aula:
A. Debates
B. Seminários
C. Leitura em voz alta
D. Outros: _____________________________________________
Com qual frequência você pratica os gêneros orais com seus alunos:
A. Frequentemente
B. Às vezes
C. Raramente
D. Nunca
Você, em seu diário, reserva um campo só com as notas de avaliação sobre o
desenvolvimento das habilidades orais de seu aluno?
A. Sim, todos os bimestres
B. Sim, porém nem todos os bimestres
C. Não, mas incluo o oral no processo de avaliação para estabelecer a nota final
D. Não, mas incluo no processo de avaliação para dar a nota final
E. Não, utilizo como avaliação somente trabalhos escritos
Na Proposta Curricular Bimestral 2008/SP, na sua disciplina, os gêneros orais
aparecem como item proposto?
A. Sim
B. Não
C. Não sei; não me lembro
95
Anexo 2 – Transcrição do debate
Para a realização da transcrição, foram utilizadas as convenções contidas na obra de
Marcuschi, Análise da conversação. Os alunos que tiveram mais destaque, falando com
maior frequência, foram denominados como A1, A2 e assim por diante. A abreviação P
refere-se à professora. Os alunos que falaram eventualmente nos turnos foram
indicados somente com a letra A.
P : então... nó::s vamos fazer ho::je o debate... né gente’...nós temos aí:: o pessoal
contra... então/ já expliquei pra vocês... vocês vão faze::r... um vai fazer pergunta pro
outro/ sente-se por favor... ((barulho de carteiras sendo arrastadas)) sente-se... um vai
fazer pergunta pro outro e::... o auditório vai observar... pra isso... a gente vai dispor as
cadeiras de modo que todos do auditório vejam... tanto o que está perguntando...que é
a favor... tanto o outro que vai ser contra a construção da hidroelétrica... tá ... então
A : [Eu sou contra]
P : [...não... não importa o que você é... importa que você vai ouvir ... importa o que
você... é::... vai debater... depois... que vai ter um momento que o auditório vai poder
perguntar pra essas pessoas que responderam e perguntaram... é::... alguma coisa que
você queira saber pra definir a sua posição... né”... se você é contra ou favor... ou
chegar àquela conclusão... né” porque o debate tem duas partes né”... a segunda parte
é qual...é a da pergunta que a gente tem que entrar num consenso... não é”
A: [é::]
P : ...o que a gente pode fazer para ter o progresso e NÂ-O agredir a natureza...não é
isso”... então tá’... é::... eu pediria pra essa carteira/ xo eu arrumar como eu costumo
arrumar/
A : M. pediu pra senhora perguntar é:... perguntar pra senhora arrumar essas coisas
96
P : [depois eu arrumo... senão vai atrapalhar /... / se vai ter que levantar daí de
qualquer jeito’/ por favor”/ você M. V. ... você... coloque a sua carteira pra gente fechar
/.../
A : [aqui G.”]
P :você não vai gravar”/ então pode gravar’
A : [eu começo
A : [onde é que faz”
P: é aqui... ó que vai gravar”
((Muitos ruídos, professor procurando alguém para gravar e arrastando as carteiras))
P: agora/ pode começar a gravar/ aí ó... vamos fazer o debate”/O que estão aí alheios...
gente”... pessoal... pesso-al’... quem não vai participar do debate... mesmo perguntando
ou respondendo... tem que ficar a par pra depois perguntar/Então vem pra cá/ você tem
que ficar sabendo o que está acontecendo’/ venham pra cá... gente”
A : [é / Mariana / Luana / vem pra cá”]
((muitos ruídos inaudíveis, depois se acalmam e o primeiro que vai perguntar no
debate, dirige-se à professora))
A1. primeiro é o grupo que é contra... né”
P. [eu vou definir isso agora/ vamo lá”
((ruídos inaudíveis de pessoas falando alto))
P. primeira pessoa a perguntar... vai ser o L./ por favor você quer LEVANTAR DO
LUGAR”/vem L.... por favor/ muito barulho na sala... vou começar a mandar pra fora”
VOU COMEÇAR A MANDAR PRA FORA” (2.5) e o P. vai responder... isso mesmo
P....((risos)) muito bem’/ O Paulo pode sentar-se... você tem um minuto é::... para
perguntar... fazer a pergunta/ você é a favor’
A : [/.../
P : é mas você é contra né”/ pode perguntar/ você tem um minuto/ você tem um minuto
pras respostas... E o L. tem trinta segundos para os comentários/ Lembrem que esses
comentários é a parte ma::is importante do debate... ta::” /Então... pode perguntar
A1: eu queria saber qual é/
97
P : um momento/ CALEM A BOCA... você... pode sair da sala...não tem/ temos tempo
de aula ... então... pode perguntar L.
A1 : então... eu queria saber... porque você é contra a usina hidroelétrica’
A2 : porque eu sou contra”
A1 : é... porque você é contra”
A2 : bom... eu sou contra...
P. é você tem um minuto pra responder... mas é bom responder logo que esse minuto
passa rapidinho...
((o auditório ri alto))
P : eu acho que você não está apto a responder... precisa ser substituído/ Quem quer”/
Quem” (2.5) ((silêncio no auditório)) pessoal do auditório... quem quer responder”
((risadas baixinhas, murmúrios e silêncio da maior parte do auditório))
P : quem é contra a construção da usina e queira falar no lugar de::le::”
((os alunos discutem quem é contra ou a favor))
A : é contra”
A2 : ó professora... tenho uma resposta aqui... ó... porque ele polui
P : [polui...]
A2 : muito
P : como assim... polui muito”
A1 : é::... como assim
A2 : polui muito o rio’
P : Você mal informado... ele não polui o rio... ele inunda o lugar/ Você não viu o
filme”/ vamos dar mais uma chance pra ele’/ Vai... pergunta de novo’
A1 : porque você é contra a construção da:: hidroelétrica”
A2 : porque ia... como é”... fazer o rio trans-bor-dar a cidade... e as pessoas iam pra
outro/ como é/ pra outra região...
98
P : comentário
A1: é, mas a cidade é muito pequena/ então, é::... vai ter um trabalho imenso... que
pode ajudar várias pessoas... então... tem que matar alguma cidade para isso/ então...
essa cidade podia se locomover dali/ pra construção da hidroelétrica
P. mu::ito bem”... está ótimo”/ Agora... calma gente... não se tem palma em debate”...
por enquanto eles estão debate::ndo pra de-po::is vocês fazerem as perguntas pra
eles... né”/ agora vem o G.... vai perguntar/ e o M. J.... vai responder
A : [Eu!]
P : alguém entra no lugar do M.”
A2 : ele é bu::rro ...depois fala de mim’
P : alguém no lugar do M. e do P.” (2.5) alguém quer responder” vai lá Tainá” (2.5)
ninguém... então acho que vai ter que ser o Paulo mesmo”/ que se prontificou a falar a
fav/... contra... né”/Quem mais”/ então ta... vamo lá”/ o que é isso”
((G. se dirige à professora com um papel na mão))
A3 ....eu vou ver pra ler o que ele perguntar... ver se ele é contra o que eu to lendo
P : é... mas não pode/ Ô gente... SILÊNCIO” (2.5) ((a sala continua agitada, mas
falando em tom moderado)) você deu o nome ontem... lembra”/ arrependido”
((G. se senta na carteira para fazer a pergunta))
P : então... G.... pode perguntar
A3: “Uma usina hidro/ hi-dro-elé::trica é um conjunto complexo arquitetônico... capaz de
produzir através do aproveitamento do potencial hidro/hidráulico existente num rio”/
você é contra isso”
((o auditório dá risadas por não entender a pergunta))
P : explique isso sem o papel”
A3 : não...ele me deu isso aqui hoje... e falou pra eu ler o papel...
P : explique o que você leu... o que você está explicando”((professora se refere ao
papel que G. leu))
((risadas do auditório, inclusive de A1 e A2))
99
P : explique aí”
A3 : [aqui está explicando que:: é arquitetônico... é um conjunto de
P : [o que que é isso então?
A3 : é a definição da usina hidroelétrica”
P : explique isso... é a definição
((A1, A2 e A3 falam ao mesmo tempo))
A1, A2, A3 : [é, é a DEFINIÇÃO
P : são palavras difíceis... né G.”... pra que você quer usar isso a seu favor”
A3 : porque você é contra a nossa hidroelétrica”
P : você tem que formular a pergunta
A2 : [eu sou contra a construção da usina hidre /.../
((risadas pois o aluno falou errada a palavra))
A1: Hi-dro elétrica
A2: Hi-dro-e-létrica... porque ia fazer a cidade transbordar... ai todas as pessoas iam ter
que sair e::... morar lá na cidade que era tão falada...
P : [ é:: mas ó/ tudo repetindo/então
vamos lá/ agora taí o F./F. vamo fazer a pergunta M./M.... faltou a M....
A1 : faltou
P : gente... esse grupo difícil... pode entrar no lugar do P.((A4 levanta a mão para
poder entrar no lugar de P.))/ finalmente alguém pra entrar no lugar do P.
A : [eu também quero ir
P : então vamos lá
((A4 se acomoda na cadeira))
A1 : já que você é contra a usina hidroelétrica ... você é a favor a viver com a luz da
lâmpada ou é::... como fala...prefere vive a luz de vela”
100
A4 : eu acho que:: aquela cidade era muito pobre e não podia viver assim... a luz de
vela... porque toda cidade... tem que ter luz da energia
P : entã::o... aí... aí vai ficar sem energia/ eles tinham energia... não”
A3 : não
P : [não chegava até/ então... como que tem energia... se não vão construir a
hidroelétrica”
A4 : eles ia morar em outro lugar que tivesse energia’
P : então... mas você tem que ser a favor’
A1 : contra
P : [contra aliá::s
A3 : [contra
((os colegas começama ajudar A5 a se colocar contra))
A1 : você tem que ser contra a construção da usina
A3 : [fala que você tem que ser contra
A4 : a::h... eles viveram sem a luz... eles devem estar acostumados com isso’
((risadas do auditório diante da resposta irreverente))
P : ai meu Deus” ((risos da professora))
A4 : então fica na vela mesmo
P : ah... então está ó::timo... esse argumento ó” / então bom... muito bom... prum
começo... ótimo saída”... N. bom aí o papo... né”
A1 : deixa eu no lugar dela’/ deixa eu fazer a pergunta’
P : pode
A1 : pra gente não construir a:: usina hidroelétrica... e inundar a cidade... vocês tem que
ter um argumento mu::ito forte... eu queria saber... qual o argumento que ia contra nós...
pra poder /
A4 : pode repetir”
((risos do auditório))
101
A1 : ó...pra gente não construir a hidroelétrica... a gente alagar a cidade... vocês tem
que ter um argumento muito forte contra a hidroelétrica... você que é contra a
hidroelétrica... que motivo que você usaria para impedir a:: ge::nte:: de:: construir a
hidroelétrica”
A4 : (2.5) deixa eu pensar
((risos do auditório))
A : fala... fala M.
A4 : como o filme... eles tavam/ como diz no filme... eles estavam usando o livro para
salvar o alagamento da cidade... para não construírem a usina hidroelétrica...]
P : ago::ra... vou fazer uma pergunta...vou quebrar o protocol/ a PRÓPRIA
PROFESSORA quebrando o protocolo aqui... do debate/ do debate regrado é::/ vou
perguntar assim... que patrimônio histórico Javé tinha M.’... que patrimônio histórico
Javé teria”
A4 : o que é patrimônio”
A1 : patrimônio é um artefato antigo que justifique/
P : aquilo que tem uma importância
histórica e cultural pro lugar... Javé tem algum patrimônio”
A4 : eu acho (2.5) e::u:: acho que sim
P : o que que seria o patrimônio histórico de Javé”
A4 : a cidade era muito falada na/então eles acostumaram lá... então aquela cidade é
bem antiga
P : bem antiga... né” ... e tem moradores/ onde tem pessoas... tem costumes
A4 : a cidade era bem antiga
P : você se saiu muito bem”... falando... porque esse é um argumento co::ntra, não é”
agora você tem um comentário... você fez a pergunta para ele... agora você vai
comentar a resposta dele
A1 : é::... o argumento dele é muito forte... ma::’s teria que ter bastante relatos é:: tipo
testemunhas de:: ... cada pessoa dizendo uma história diferente... então... as próprias
pesso::as... que estão indo contra... tão guerreando entre si ali/ eu acho
102
P. ah
A4 : posso fazer uma pergunta pra ele”
P : então agora é::... nós vamos trocar quem é que quer fazer a pergunta’ L.”
A : não
P : não né”/ pra variar... está falando sobre/ o que que está tão interessante”... vem
mais pra cá... pra vocês poderem participar... pra poderem fazer perguntas’/ vem pra
cá”/ vem ver o debate”/ então... essa outra você pode fazer... ó::... agora/ é o contra/ o
F. aí”... não... J.....J.L. aí”
A : não
A4 : [não... saiu
P : saiu... a J. não ve::io... I::hh... desfalcado o grupo contra , hein”/J.”...J.”/ J.... não
vai fazer nenhuma pergunta”
A1 : pergunta”... ela não é contra”
P : é contra... aqui marcado... devia perguntar alguma coisa para eles reponderem...
quem é que vai responder”
A4 : eu”
P : M.”/ M.não quer responder”... N. também não quer’
A3 : deixa eu responder”
P : G.
A3: EU”
P : quer responder”
A5 : Quero
((a professora dá chance para que A5 pergunta, já que não tinha feito antes))
P : então vai lá... você.... sai que ele vai responder’
A5 : vou responder”
P : não... pergunta é você quem faz’
103
A5 : porque você é contra a construção”
P : e::ssa pergunta já foi feita”
A : deixa eu per-gun-ta::r”
P : ca::lma que vai ser aberto ao auditório/ é::... o quer pensar um pouqui::nho
antes de fazer a pergunta
A5 : não
A4 : professora... posso entrar no lugar do G.”
P : então pode... pode sentar no lugar da J./ a pergunta... isso
A4 : porque você quer que construa a usina hidroelétrica”
A1 : porque eu acho que:: vai melhorar a vida da população’
A4 : porque’
P : não... não... você só po::de fazer comentário... não pode perguntar
A4 : não pode”
P : não pode
A4 : ah... mas com essa resposta que você deu... você nu::m... acharia que:: podiam
fazer uma usina hidroelétrica... que aquelas pessoas estão muito acostumadas... aquele
local... sentiriam falta de lá... né”
P : âhn’
A4 : entã::o... seria ruim porque/ por exemplo... você mora muito tempo com seu pai...
se você fosse se afastar dele... você ia ficar com saudade dele/
P : então vamos lá... quem mais quer fazer perguntas pro
A1 : [eu quero fazer
P : nossa... o M. bom de responder... hein”/ Você já respondeu’
A : [eu quero perguntar
((tumulto inaudível))
104
P : que::m mais quer fazer pergunta::s”
((o tumulto continua))
P : pera aí... eu vou começar a fazer/ e o auditório vai poder fazer perguntas...vamos
abrir entâ::o... pro auditório”
A : vamos
A1 : vamos
P : então vamos... quem gostaria de fazer as perguntas”/ Quem gostaria de fazer
alguma pergunta”
A : o auditório”
P : o auditório
P : ó... pergunta
A : essa cidade pelo menos existe”
P : a::h... ele perguntou assim... essa cidade re::a::lmente existe”... quem gostaria de
responder”.... o contra ou a favor (2.5) xi::... vocês vem pra cá... que agora vocês são o
auditório... vamos fazer perguntas... todo mundo... você sabe a resposta”
((professora dá a vez para alguém do auditório falar, que ainda não havia se
pronunciado))
A : bom... um dia estava pesquisando na internet... a história de Javé... que é que era
uma história antes de cristo
P : [mas é Javé bíblica
A : é
P : tá... mas é a Javé do Ceará
A : Ceará é:: como se fala/ digamos assi::m... é::... como o município de sp
P : ah... é uma cidade també::m...você sabe se ela é rea::l ou nâ::o” / quem sabe me
responder”
A1 : eu a::cho que:: ela não é não
105
A3 : eu também acho que não’
A : eu acho que é
A : eu acho que é:: porque o rio transbordou
P : e você C.... porque acha que é”
A : porque foi transbordada /.../ na televisão... em uma hidroelétrica
P : GENTE... xi::... mas várias/ pára de falar’/ ó... no:: no filme... eu não sei se vocês
repararam... no filme tem uma senho::ra... que começa a chorar por Javé... e ela... fala
o nome de Javé... então parece... a partir do filme... pare::ce que a gente pó::de...
chegar a conclusão que é real... que ela realmente existiu e sumiu do mapa... em
função da usina é::... quem mais quer perguntar”
A : eu... se essa cidade existe... tem a possibilidade de estar embaixo do oceano...
professora”
P : do oceano”... não... debaixo de alguma usina/ alguém mais vai perguntar”
A : Javé é só uma história ou é real”
P : acaba::mos de perguntar... acaba::mos de responder... quem poderia responder isso
ai... do grupo contra e do grupo a favor”... a pergunta é... será que Javé é uma história
rea::l... ou não”
A : eu acho que Javé é uma história real’... porque... é porque os moradores viviam lá...
então eles não queriam se separar... porque... tinha gente morta... da família DELES
lá... entendeu”... e a empresa inundou a cidade deles... e começaram a chorar... e:: javé
é uma cidade que eles sentiram saudade, é isso
A : então a questão
((muitos do auditório falam ao mesmo tempo))
A : não respondeu
P : [não respondeu a pergunta...você tem uma fo::rma de resposta melhor”
A3 : eu acho... professora... que:: como fizeram o filme... devia ter alguma coisa a ver...
o filme e a cidade... por isso eu acho que e::la:: é real
A1 : mas teve
P : teve o que”
106
A3 : entre o filme e a cidade
P : mas ali era um filme’
A3 : então... isso que eu acho... como era um filme/
A : que nem no começo do filme... que:: o homem naquele bar lá... que ele começa a
contar
P : e daí’
A : ele falava de um jeito muito real
A3 : mas como ele podia sair assim
A : sair encenando
P : sair encenando”
A1 : ele contava com uma naturalidade que parecia ser ele
P : gente... vamos colocar o pessoal pra dentro... por favor... senão eu vou receber
bronca... vamos aqui... fazer perguntas pro pessoal do contra e do a favor”
A : professora... eu tenho uma pergunta
P : pode fazer... alto
A : é::... bom... é:: se é mentira... da onde que o diretor tirou a idéia do filme
A1 : é igual um autor de livro
P : você pode responder
A : [é a autora do Harry Porter ((tumulto na sala para responderem))
P : ó... xi::... ouçam aí
A : acho que eles não iam tirar essas idéias “narradores de Jávé”... sendo que não
existia essa cidade
A1 : que não EXIS-TIS-SE
A : é... não existisse
107
A3 : não teria nem a idéia’
A : pode ter encenado essa filme... por uma coisa assim... por... por eles podem ter
inventado esse filme... ou estão baseando num fato real que aconteceu”
P : geralmente... geralmente né”... a arte imita a vida... ou a vida imita a arte”
A : [a art/
P : então...quando você fala em narradores de Javé... a cidade de Javé...
possivelmente... a::lguma o::utra cidade já foi inundada por uma usina hidroelétrica... e
tem a mesma história de Javé... não Javé... exatamente... mas o que se se/ o que que
isso importa... o que importa é você prestar atenção para o problema do filme... não é...
ai então
A : porque o pessoal da hidroelétrica não queria só:: inundar a cidade/ queria melhorar
porque não tinha energia elétrica... não tinha nada
A : então... é:: onde eles iam morar...se:: fosse inundada a cidade”
P : então e:: ele tem uma pergunta... pode fazer
A : porque, por causa des/ dessa usina hidroelétrica/ como é que a cidade foi parar
debaixo d’água”
P : ó... pode explicar
A1 : porque quando eles... quando eles vão fazer uma usina hd... o rio... o rio ele
enche... porque... porque eles coloca vários materiais... pra:: produzir energia porque
eles usa a:: velociadade da água... a pressão da água pra produzir energia... então eles
tem que usar muita queda... porque se:: você for ver uma foto de uma usina
hidroelétrica... você pode ver que a água cain::do...porque... porque:: a água
cain::do... a gravidade vai puxar a água e a potência... produz energia
P : ENTÃ::O... precisa de um reservatório mui::to gran::de... pra..
A1 : [muito grande pra /.../ e às
vezes... o rio também:: assim... às vezes o rio está em ou::tro /.../... o rio toma ou::tra
trajetória... então acaba alagando outros lugares e:: alagando as cidades
P : muito bem”... respondeu bem... não é”
A : e também... professora... eles não iam ter nenhum problema de inundar a cidade...
porque a cidade não:: tem:: nenhum ponto histórico... não tem nada oficial que aquela
cidade é importante”
108
P : ÁH:: então você é a favor... né”... você acha melhor trazer o progresso/ agora vamos
fazer a segun::da etapa do debate... a segunda etapa do debate/ fala... pode falar
A : não é:: que é assim... então/ mas assim/eles não ia
P : Ô GENTE”
((tumulto na sala))
P : fechem a porta aí::... fechem a porta/ xi::... silêncio (2.5) ô... calaboca aí vocês...
silêncio”... pode falar
A : a:: cidade tem que saber a localização exata... pra poder fazer a hidroelétrica
P : sim... aí a grande questão... será que a gente... em detrimento de toda uma
população que vai ser beneficiada com a/com a luz... a gente sacrifica o povoado de
Javé... que é pequenininho... ou a gente dei::xa o povoado lá... e:: não leva... a luz
necessária
A : eu acho que
A1: [no começo do filme
P : [e como levar essa luz... ai vem a pergunta do debate
consensual... do debate aberto/ como levar essa luz... sem prejudicar a natureza... sem
inundar Javé... por exemplo”
A1 : só tem uma maneira... é aquela maneira... tipo:: movida ao vento
P : [então é::
A1 : tem ali na pesquisa’
P : [onde está a pesquisa”
((inaudível, tumulto e várias pessoas chamando ao mesmo tempo))
A : ô professora... ô professora... eu acho professora... não ter a hidroelétrica porque é
melhor sem energia do que
A1 : [olha aqui na pesquisa
P : renovável não é::... alternativa/ quais são as energias alternativas que vocês
pesquisaram... que não se::ja é:: a usina... que cai a água e tem a potên::cia e tudo
mais
109
A1 : professora... eu pesquisei duas...uma que é energia solar
P : [solar
A1 : /.../que usa a energia do sol
P : pera só um pouquinho/ o GENTE”/ venham participar do debate... muito legal viu”
A3 : vocês não querem participar e fica atrapalhando nosso trabaho”
P : é isso mesmo”... vocês não têm o di::rei::to de atrapalhar a maioria que está aqui”...
xi::... fiquem quietos”/ Pode falar
A1 : tem a energia que é ... energia/
P: ô M.... venha aqui participa... você estava até:: ago::ra aqui... participando”
A 1: energia renovável... que é:: tipo de um ventilador gigante... que:: o:: vento bate...
gira e a pressão do vento forte e:: a energia solar... que é feito num tipo um vidro/
P: [Nossa::”... eu não sabia disso não”... renovável é:: aquela energia que... por
exemplo... a água vai pro rio... e o ve::nto...você /não gasta na::da” legal”/ e a energia
solar”
A 1: [a energia solar eu não cheguei a pesquisar ma::s/
P: [e o valor disso tudo”... o
que sai mais barato”
A 2: [ah” é:: a energia elétrica”
P: será::”
A 1: eu acho que sim... porque tem a energia solar... um exemplo da energia solar...
tem casa hoje que é movi::da à energia solar... mas isso... é:: tipo assi::m... se a casa
tem energia solar... ela custa 50.000... ela vai valer 120.000... ela dobra de preço”
P: [porque”...porque a energia solar ela é renovável”...ela nunca acaba...
A 2: mas o equipamento é caro”
A 3: [que capta a energia é caro”
P: é muito mais caro”
110
A1: na minha opinião...a energia solar é a melhor...porque”... porque você vai num
estabelecimento... que tenha energia da eletropaulo...ela vai sempre estar pagando
uma quantia em dinheiro/
P: [é/
A1: se ela gastar o dinheiro com a energia solar... ela vai pagar ca:ro... mas não vai
mais ficar gastando com energia... ela vai com o dinhe:iro... ela vai pagar a::
eletropaulo... ela vai poder usar a energia solar e::... economizar bem mais/
P: [será que o
povo de Javé terá condições”... e mais... será que::... o construtor da hidroelétrica vai ter
condições”... mas tem que lutar pra essa condição... que é uma energia mais barata e
agride menos a natureza/
A: [ô... professora... acho melhor não
construir a hidroelétrica... porque é melhor não ter energia... do que ter um lugar para
morar... e ter energia e:: não ter um lugar para morar/
P : [mas são poucos...
em benefício de muitos... porque a energia vai para mu::itas cidades... pessoas...
A1: que é assim... você tirando o habitat de po::ucas pessoas... e:: dando um habitat
confortável para mais milhões de pessoas...
P : [é isso... isso
A1: daí:: eles vão/
P : [quer comentar”
A4 : eu acho assim... que:: como a prefeitura fez a usina... eles deviam... como eram
poucas pessoas em Javé... deviam doar umas casas pra eles morar... pra não
prejudicá-los também...
P : [M. veio com a solução que:: fortalece o contra... porque:: a
solução e o consenso é esse... tem que haver a indenização... tem que haver a
construção e a indenização/
A4 [sim... tem que haver/
A1: [claro
P : assi::m... nós encerramos o debate
A: posso falar”
111
P: não há mais tempo... meu amo::r... próxima vez debateremos com outras pessoas...
de:: o::utras salas... é:: o mesmo tema... o próximo passo é esse/ bom... esse foi o
debate da sexta série da ee thomázia monto::ro, feito no dia 22 do 03 de:: 2009/ final de
transcrição/
Anexo 3 - Questionário sobre sequência didática
1. Quais os procedimentos que prepararam o aluno para o momento do debate em
sala de aula? Descreva-os passo a passo.
Primeiro passo: passei o filme “Narradores de Javé”, para eles assistirem.
Depois, pedi uma pesquisa sobre o tema proposto. Dei uma aula sobre como
funciona o debate. Logo em seguida, realizei o debate e, depois, pedi que me
entregassem uma resenha sobre o tema.
2. Houve alguma explanação sobre o gênero oral que iria ser trabalhado? Que tipo
de orientação?
Sim, falei que o debate era formado por três componentes: os debatedores, o
mediador (que seria eu) e o auditório. E que seria dividido em duas partes, sendo
a última uma discussão para se chegar a um consenso sobre o tema.
3. Quais etapas do procedimento foram avaliadas e que tipos de avaliação foram
usadas?
Dei nota para a participação dos alunos no debate e na resenha.
112
4. Foi passada alguma informação aos alunos sobre o funcionamento e
mecanismos da linguagem oral?
Não, nunca li nada a respeito.
5. Foram trabalhadas anteriormente à explanação características linguísticas que
facilitariam a argumentação, tão necessárias em um debate (como os
operadores argumentativos)?
Não, não tenho o costume.
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