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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO
MARCIO LEWENSZTAJN
APLICAÇÃO DO MODELO TEORIA DE COMPORTAMENTO DA CARTEIRA NA
FORMAÇÃO DA CARTEIRA DE INVESTIMENTOS DO INVESTIDOR BRASILEIRO
SÃO PAULO
2009
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MARCIO LEWENSZTAJN
APLICAÇÃO DO MODELO TEORIA DE COMPORTAMENTO DA CARTEIRA NA
FORMAÇÃO DA CARTEIRA DE INVESTIMENTOS DO INVESTIDOR BRASILEIRO
Dissertação apresentada à Escola de
Administração de Empresas de São Paulo da
Fundação Getulio Vargas, como requisito para
obtenção do título de Mestre em Administração
de Empresas.
Campo de conhecimento: Mercados Financeiros
e Finanças Corporativas
Orientador: Prof. Dr. Fabio Gallo Garcia
SÃO PAULO
2009
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Lewensztajn, Marcio.
Aplicação do Modelo Teoria de Comportamento da Carteira na Formação
da Carteira de Investimentos do Investidor Brasileiro / Marcio Lewensztajn. -
2009.
74 f.
Orientador: Fábio Gallo Garcia.
Dissertação (mestrado) - Escola de Administração de Empresas de São
Paulo.
1. Investidores (Finanças) - Conduta. 2. Investimentos. 3. Finanças
comportamentais. I. Garcia, Fábio Gallo. II. Dissertação (mestrado) - Escola
de Administração de Empresas de São Paulo. III. Título.
CDU 336
MARCIO LEWENSZTAJN
APLICAÇÃO DO MODELO TEORIA DE COMPORTAMENTO DA CARTEIRA NA
FORMAÇÃO DA CARTEIRA DE INVESTIMENTOS DO INVESTIDOR BRASILEIRO
Dissertação apresentada à Escola de
Administração de Empresas de São Paulo
da Fundação Getulio Vargas, como
requisito para obtenção do título de Mestre
em Administração de Empresas.
Campo de conhecimento:
Mercados Financeiros e Finanças
Corporativas
Data de aprovação:
__/__/__
Banca Examinadora:
Prof. Dr. Fabio Gallo Garcia (Orientador)
FGV-EAESP
Prof. Dr. Ricardo Ratner Rochman
FGV-EAESP
Prof. Dr. Flávio Estevéz Calife
PUC-SP
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Fabio Gallo Garcia pela orientação, críticas e sugestões durante a
elaboração deste trabalho.
Aos Professores Ricardo Ratner Rochman e Flávio Estevéz Calife pelas críticas,
sugestões e disponibilidade de participação nas Bancas de Qualificação e Final da
Dissertação.
Aos meus pais, meu irmão e minha esposa Miriam pela paciência, compreensão e
apoio dado em todos os momentos dedicados ao desenvolvimento deste trabalho.
Aos participantes da pesquisa, cujas respostas foram fundamentais para alcançar os
resultados desta Dissertação.
Aos amigos que apoiaram a realização deste trabalho.
Aos colegas de turma do MPA/2007, em particular ao grupo auto-intitulado petit-
comité.
RESUMO
Desde a implantação do Plano Real em 1994, observa-se no mercado brasileiro uma
estabilidade econômica que permitiu o crescimento na oferta de fundos de
investimento e empresas que lançaram ações em bolsa de valores. O ambiente
criado a partir de então, disponibilizou ao investidor pessoa física acesso a uma
maior variedade de produtos financeiros, a realizar aplicações por um prazo mais
longo de tempo e a tomar decisões de investimento. A teoria tradicional de finanças
está estabelecida como referência acadêmica e prática para explicar e apoiar o
processo de tomada de decisão de investimento. Entretanto, estudos realizados
apontaram violações dos axiomas que servem como ponto de partida de tal teoria. A
partir desses trabalhos, surgiu uma ramificação em finanças, chamada finanças
comportamentais, que buscou entender o processo de escolha dos indivíduos a
partir da observação do seu comportamento. De acordo com o proposto por finanças
comportamentais, no processo de escolha de alternativas que envolvam risco a
forma com que as mesmas se apresentam e são contabilizadas mentalmente
influenciam a decisão final dos indivíduos. O objetivo deste trabalho foi verificar, no
mercado brasileiro, a aplicação de contabilidade mental por investidores individuais,
em particular o conceito que os mesmos ignoram a covariância entre os ativos,
conforme a versão de múltiplas contas mentais da teoria de comportamento da
carteira. Pesquisa com um grupo de 44 investidores individuais indicou que eles
ignoraram a covariância entre os ativos na tomada de decisão de investimento.
Palavras-chave: contabilidade mental, teoria dos prospectos, teoria de comportamento
da carteira, teoria SP/A, comportamento do investidor e modelo de apreçamento de
ativos financeiros.
ABSTRACT
Since the implementation of the Plano Real in 1994, Brazilian economy has been
through a period of economic stability that allowed the increase in the number of
investment funds and listed companies. This environment offered individual investors
a wider number of financial products, the possibility of making long-term investments
and being part of the decision making process. Traditional finance theory is
established as an academic and industry-wide reference to explain and support
investment decision process. However, studies have indicated violations of the
axioms that support such theory. In the light of these studies, a ramification has
emerged in finance, named behavioral finance, that attempted to understand the
process of choice by observation of individual behavior. According to behavioral
finance, during the process of choice under risk the way situations are both
introduced and mentally accounted influence the final decision. The goal of this study
was to verify in the Brazilian market the use of mental accounting by individual
investors, in particular the concept that they overlook covariance according to the
multiple mental account version of the behavioral portfolio theory. A survey research
was made with 44 individual investors and the result indicated that they overlooked
covariance in the decision making process.
Keywords: mental accounting, prospect theory, behavioral portfolio theory, SP/A theory,
investor behavior and capital asset pricing model.
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 Índice IGP-M de Jan/89 a Jun/94
6
Gráfico 2 Índice IGP-M de Jul/94 a Set/09
7
Gráfico 3 Histórico da meta SELIC (%)
7
Gráfico 4 Número de investidores pessoa-física e participação no
volume de negócios da Bolsa de Valores de São Paulo
(BOVESPA)
8
Gráfico 5 Fronteira eficiente
11
Gráfico 6 Linha de alocação de capital
11
Gráfico 7 Relação utilidade da riqueza e riqueza
13
Gráfico 8 Função valor hipotética
24
Gráfico 9 Decomposição da função decumulativa ponderada da
teoria SP/A
37
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Respostas da pesquisa por item
50
Tabela 2 Respostas da pesquisa por item (%)
50
Tabela 3 Consolidação das respostas da pesquisa (%)
50
Tabela 4 Consolidação das respostas da pesquisa por item
(%)
51
Tabela 5 Respostas esperadas da pesquisa por item
utilizando a TCC – MCM
54
Tabela 6 Respostas esperadas da pesquisa por item (%)
utilizando a TCC-MCM
54
Tabela 7 Medidas de desvios entre os valores observados
e esperados utilizando a TCC – MCM
55
Tabela 8 Respostas esperadas da pesquisa por item
utilizando o conceito Efeito Disposição,
a TCC – MCM e a Teoria dos Prospectos
55
Tabela 9 Respostas esperadas da pesquisa por item (%)
utilizando o conceito Efeito Disposição,
a TCC – MCM e a Teoria dos Prospectos
56
Tabela 10 Medidas de desvios entre os valores observados
e esperados utilizando o conceito Efeito
Disposição, a TCC – MCM e a Teoria dos
Prospectos
56
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
BOVESPA Bolsa de Valores de São Paulo
CDI Certificados de Depósitos Interbancários
LFT Letras Financeiras do Tesouro
NASDAQ National Association of Securities Dealers Automated Quotations
SELIC Sistema Especial de Liquidação e Custódia
ANBID Associação Brasileira de Bancos de Investimento
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO
1
1.1 Questão de Pesquisa
5
1.2 Objetivo
6
1.3 Justificativa do Tema
6
2 REVISÃO DA LITERATURA
2.1 Introdução ao Modelo de Apreçamento de Ativos
Financeiros 10
2.1.1 Paradoxo de São Petesburgo 12
2.2 Modelo de Apreçamento de Ativos Financeiros (MAAF) 13
2.3 Hipótese do Mercado Eficiente (HME) 17
2.4 Teoria dos Prospectos 19
2.4.1 Função Valor e Ponto de Referência 23
2.5 Ordenamento e Estrutura 26
2.6 Contabilidade Mental 28
2.7 Ancoragem 33
2.8 Arrependimento e Orgulho 34
2.9 Auto-Controle 34
2.10 Teoria SP/A 35
2.10.1 Descrição do Modelo de Lopes (1987) 36
2.11 Teoria de Comportamento da Carteira (TCC) 38
2.11.1 Relação entre a teoria do Modelo de Apreçamento
de Ativos Financeiros e a Versão Conta Mental Única da
Teoria de Comportamento da Carteira 39
2.11.2 Teoria de Comportamento da Carteira – Versão
Múltiplas Contas Mentais 40
3 METODOLOGIA DE PESQUISA
3.1 Paradigma 42
3.2 Metodologia de Pesquisa 43
3.3 Formulação da Pesquisa e Amostra 44
3.4 Formato da Pesquisa 45
3.5 Elaboração das Situações Testadas 46
3.6 Modelo da Pesquisa Enviada para os Investidores 48
3.7 Comentários sobre as Situações Apresentadas aos
Investidores 49
4 RESULTADOS DA PESQUISA
50
4.1 Resultados Esperados 53
5 CONCLUSÃO
57
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
59
1
1 INTRODUÇÃO
Os estudos tradicionais em finanças da forma como delineado a partir da metade do
século XX, tiveram como princípios considerar o indivíduo como um ser racional,
perfeitamente informado e centrado em si mesmo. Ao analisar corretamente custos
e benefícios e ponderá-los seguindo regras estatísticas e utilidades marginais, o
indivíduo seria capaz de tomar decisões ótimas em busca de seus próprios
interesses.
Nas décadas de 40 e 50, finanças ainda era uma matéria voltada para o meio
acadêmico com pouca ligação prática com a formação de tomada de decisão de
investimento. Porém, durante este período, dois estudos ligados as percepções de
consumo do investidor foram desenvolvidos e contribuíram de maneira significativa
na formação de finanças:
a) a teoria de utilidade esperada de Von Neumann–Morgenstern (1944);
b) a teoria fundamental da gestão da carteira de investimentos lançada por
Markowitz (1952a).
Estes trabalhos, cujas teorias serviram de fundação para constituição de finanças
tradicionais, partiram de proposições axiomáticas em relação ao comportamento do
investidor, tais como a maximização da utilidade esperada e racionalidade para
definir de forma mais abrangente o seu comportamento econômico.
O princípio da racionalidade pode ser entendido como uma aproximação, baseado
na crença ou esperança que desvios de atos racionais são raros quando as apostas
são significativas ou que os agentes do mercado não permitirão que tal movimento
aconteça. Logo, em termos práticos, é difícil crer que a todo instante o ser humano
toma decisões racionais. (Kahneman, 2003). Esse tipo de posicionamento em
relação a racionalidade do indivíduo veio à tona pouco após o trabalho de Markowitz
(1952b). Allais (1953) mostrou que os indivíduos podem tomar decisões
influenciadas também pela forma como as situações lhes são apresentados.
2
O início de divergência em relação ao comportamento do indivíduo na tomada de
decisão serviu de alicerce para o desenvolvimento de uma linha de estudo à parte
dentro de finanças. A partir do corpo teórico de Markowitz (1952a, 1952b), o qual
ganhou impulso com os trabalhos de Sharpe (1964), Lintner (1965a e 1965b) e
Mossin (1966), nasce uma ramificação de finanças tradicionais chamada finanças
comportamentais.
Uma das principais diferenças entre as duas é o caminho que cada uma percorre até
chegar às conclusões. Se por um lado, finanças tradicionais parte de axiomas para
estimar as preferências dos indivíduos, por outro, finanças comportamentais parte
da observação do comportamento do indivíduo para posterior inferência de
resultados. A partir desta última metodologia de trabalho, diversos estudos e testes
observaram violações aos axiomas ou desvios das premissas adotadas por finanças
tradicionais.
Uma questão que surge após estas considerações é: por que, então, os estudos de
finanças tradicionais ainda influenciam tanto o mundo acadêmico e a indústria
financeira?
Porque apesar de existir pouca dúvida de que os indivíduos possuam
comportamentos idiossincráticos, ainda não existe consenso claro sobre o que isto
representa, por exemplo, na gestão de investimentos. Adicionalmente, é difícil
reverter uma ortodoxia que produziu profundos entendimentos acerca de assuntos
complexos, tais como otimização de carteira de investimentos, a hipótese dos
mercados eficientes, o modelo de apreçamento de ativos financeiros, entre outros.
Por mais que os estudos em finanças comportamentais tenham avançado nos
últimos 25 anos, seus modelos ainda precisam alcançar o mesmo nível de aceitação
que os modelos de finanças tradicionais têm entre seus discípulos. (Lo, 2005).
Entretanto, parte do espaço conquistado por finanças comportamentais está
relacionada com a tentativa de explicar eventos que sob a ótica de finanças
tradicionais não poderiam acontecer, tais como a formação de bolhas no mercado
imobiliário americano entre 2007 e 2009 e nas ações de empresas de tecnologia da
3
bolsa NASDAQ em 2000. Shiller (2005) verificou influências psicológicas,
demográficas e históricas para embasar o entendimento acerca destas bolhas.
Em relação à prática dos conceitos de finanças comportamentais, nota-se avanços
na sua aplicação. O banco americano J.P. Morgan lançou no início da década de 90,
através da sua gestora de recursos J.P. Morgan Asset Management, fundos de
ações no Reino Unido que aplicavam as teorias de finanças comportamentais para
formação das carteiras de investimentos de clientes individuais. Mais tarde, este
mesmo banco ampliou a aplicação das teorias de finanças comportamentais para
fundos que investem em ações por toda a Europa e em 2007 para fundos de
investimento nos Estados Unidos e Japão. (J.P. Morgan, 2009).
Em outro exemplo, através de relatório publicado para clientes de alta renda do
banco suíço UBS AG, um grupo de analistas explora as influências do
comportamento dos indivíduos na tomada de decisão e seus efeitos nos resultados
das carteiras de investimentos. (Weisser; Wacker; Klement, 2007).
Logo, conforme visto existem evidências do crescimento de finanças
comportamentais como fonte de referência para a indústria financeira, a qual tem
aplicado e reconhecido seus conhecimentos na aplicação prática em investimentos.
Porém, ainda existe um longo caminho para que a integração entre finanças
comportamentais e tradicionais se complete. Kahneman (2003) reconhece que as
diferenças entre as duas têm diminuído nos últimos anos, mas não vê em curto
espaço de tempo que seus respectivos estudiosos compartilhem uma teoria comum
do comportamento humano. Conforme suas palavras:
A igreja da economia tem admitido e reconhecido alguns acadêmicos
que seriam considerados heréticos em períodos anteriores e a
análise convencional econômica agora está sendo feita com
premissas que são muito mais plausíveis psicologicamente falando
do que no passado. Entretanto, a metodologia analítica da economia
é estável e isto restringirá a conciliação entre as duas disciplinas.
(Kahneman, 2003, p 165-166, tradução do pesquisador).
4
Por outro lado, o trabalho de Lo (2005) pode ser visto como um esforço para
aproveitar técnicas de finanças tradicionais e comportamentais com o objetivo de
criar um meio termo entre as mesmas. Lo (2005) buscou conciliar proponentes da
hipótese dos mercados eficientes e de modelos comportamentais para a elaboração
da hipótese adaptável dos mercados (adaptive markets hypothesis). Neste artigo,
princípios evolucionários foram aplicados para verificar que a eficiência dos
mercados também está relacionada com fatores ambientais, tais como número de
concorrentes, magnitude das oportunidades disponíveis para realização de lucros e
adaptabilidade dos participantes do mercado.
Desta forma, Lo (2005) aglutinou ideias de finanças tradicionais, tais como que os
indivíduos agem por conta própria, com as possibilidades de que os mesmos
cometem erros e podem aprender e se adaptar ao meio que estão inseridos. Assim,
é possível, por exemplo, que haja espaço para arbitragem de tempos em tempos.
Usando as palavras de Lo (2005):
A partir de uma perspectiva evolucionária, a existência de ativos
líquidos nos mercados financeiros implica que oportunidades de
lucros devem estar presentes. À medida que são exploradas,
desaparecem. Mas novas oportunidades também estão sendo
criadas continuamente, dado que certas espécies morrem, outras
nascem e que as instituições e as condições dos negócios mudam.
(Lo, 2005, p. 25, tradução do pesquisador).
Logo, nota-se a possibilidade de combinar partes de finanças tradicionais e
comportamentais para avançar no entendimento do comportamento dos indivíduos,
sua consequente tomada de decisão e formação das carteiras de investimentos.
5
1.1 Questão de Pesquisa
Os trabalhos em finanças comportamentais são elaborados, em geral, de forma
descritiva e influenciados pela metodologia psicológica que leva em conta
observações empíricas, experimentações controladas e aplicações clínicas. A partir
da aplicação de testes e observações das atitudes dos indivíduos realizam-se
inferências sobre os seus comportamentos (Lo, 2005).
Paralelo a isto existe, conforme visto anteriormente, uma grande influência na
indústria financeira de técnicas e teorias desenvolvidas por acadêmicos em finanças
tradicionais.
Isto posto, a questão que norteou a realização deste trabalho foi: é possível verificar,
no mercado local, que no processo de tomada de decisão e formação da carteira de
investimentos os investidores possuem comportamento evidenciado por finanças
comportamentais?
No Brasil diversos trabalhos foram feitos nessa linha. Iglesias (2005) aponta a
compatibilidade entre a alocação em ações e a teoria dos prospectos. Martits (2008)
mostra que o comportamento dos investidores individuais é melhor representado por
uma função que incorpora aversão a perdas do que pela função de utilidade
tradicional. Barros (2005) investiga as decisões de financiamento e investimento de
empresas quando os gestores possuem vieses de otimismo e excesso de confiança.
Lintz (2004) detectou a existência de falhas cognitivas em um grupo de executivos
financeiros que podem potencializar a dinâmica das bolhas especulativas no
mercado de câmbio brasileiro.
Desta forma, em que pese a sua recente história de atuação na gestão pessoal de
ativos (conforme mostrado na seção 1.3), o investidor individual brasileiro também
pode ser objeto de estudo pela abordagem de finanças comportamentais.
6
1.2 Objetivo
Verificar, no mercado brasileiro, a aplicação do conceito da contabilidade mental, em
particular que os investidores ignoram a covariância entre os ativos na formação das
suas carteiras de investimento, conforme descrito na versão de múltiplas contas
mentais de Shefrin e Staman (2000).
1.3 Justificativa do Tema
Após o advento do plano Real em de 1994, o Brasil conseguiu controlar um quadro
de inflação crônica que permitiu ao país entrar num ciclo virtuoso de ajustes
econômicos que permitiram um crescimento sustentado. Os gráficos 1 e 2 mostram
que no período entre Janeiro de 1989 e de Junho de 1994, a inflação apresentava
índices muito elevados indo para um patamar inferior a partir de meados de 1994.
Gráfico 1 – Índice IGP-M de Jan/89 a Jun/94
Fonte: PortalBrasil - Disponível em < http://www.portalbrasil.net/igpm.htm
>. Acesso em: 29 out. 2009.
7
Gráfico 2 – Índice IGP-M de Jul/94 a Set/09
Fonte: PortalBrasil - Disponível em < http://www.portalbrasil.net/igpm.htm
>. Acesso em: 29 out. 2009.
Notadamente nos últimos 10 anos, a combinação do quadro citado anteriormente
com a difusão do uso da internet, a criação de regras de governança corporativa por
empresas listadas na Bolsa de Valores de São Paulo (BOVESPA) e um ciclo longo
de redução de taxa de juros (ver gráfico 3) a partir de 2005, proporcionaram o
acesso de pessoas físicas a um novo universo que muitos não estavam habituados
até então: a possibilidade de constituição e gestão de uma carteira de investimentos
financeiros.
Gráfico 3 – Histórico da meta SELIC (%)
Fonte: Banco Central do Brasil - Disponível em <http://www.bcb.gov.br/?COPOMJUROS
>. Acesso em: 14 nov.
2009.
8
Simplificadamente, a carteira de investimentos de uma pessoa física no Brasil pode
ser dividida em ativos com alto e médio risco e baixo risco. No primeiro grupo,
encontram-se ações, fundos de ações e fundos multimercados. Este último grupo
não possui definição única e, em geral, possuem liberdade de investimento em
diversos mercados, tais como renda fixa, câmbio, renda variável e derivativos. De
acordo com a página da internet da Associação Brasileira de Bancos de
Investimento – ANBID, a classificação de fundos multimercados baseia-se nas
estratégias adotadas pelos gestores para atingir os objetivos dos fundos que devem
prevalecer sobre os instrumentos utilizados. As estratégias são: i) Macro; ii) Trading;
iii) Multiestratégia; iv) Multigestor; v) Juros e Moedas; vi) Estratégia Específica; vii)
Comprado e Vendido; viii) Balanceados e ix) Capital Protegido.
No grupo de ativos de baixo risco, encontram-se a poupança e fundos referenciados
DI que buscam investir, no mínimo, 95% do valor de sua carteira em títulos ou
operações que busquem acompanhar as variações das taxas CDI ou SELIC.
Conforme citado na página anterior, o gráfico 4 mostra que no caso da renda
variável, em particular, houve crescimento expressivo no volume de negócios com
ações via home broker, bem como no número de contas pessoa-física desde 2004.
Gráfico 4 – Número de investidores pessoa-física e participação no volume de negócios da Bolsa de Valores de
São Paulo (BOVESPA)
Fonte: Bolsa de Valores de São Paulo - BOVESPA - Disponível em
<http://ri.bmfbovespa.com.br/upload/portal_investidores/pt/informacoes_financeiras/relatorios_itr_dfp_ian/DFP%2
0-%2031.12.2008.pdf >, p. 9. Acesso em: 14 nov. 2009.
9
Desta forma, a necessidade de realizar as alocações de recursos entre as distintas
classes de investimento, fez com que o investidor brasileiro se deparasse com uma
situação relativamente nova em sua experiência como gestor de recursos.
O uso de técnicas de apreçamento para apoiar a decisão de compra e venda dos
ativos, o equilíbrio da carteira entre as classes de investimentos e o prazo de
reavaliação dos mesmos passaram a ser considerações necessárias para
otimização e usufruto da carteira, dado determinado perfil de risco e comportamento
do investidor. Logo, a aplicação dos conceitos de finanças comportamentais em
relação a tomada de decisão pode contribuir para o entendimento acerca da
composição da carteira de investimentos individual.
10
2 REVISÃO DA LITERATURA
2.1 Introdução ao Modelo de Apreçamento de Ativos Financeiros (MAAF)
A teoria fundamental da gestão da carteira de investimentos foi lançada por
Markowitz (1952a). Amparado em medidas estatísticas, tais como variância, desvio
padrão e covariância, ele inicialmente chamou a atenção para a prática da
diversificação, ou seja, a combinação de ativos que não necessariamente se move
na mesma direção e por isto conseguem reduzir o desvio padrão (risco) do retorno
total do investimento.
A partir dessa consideração, podem ser comparadas carteiras de investimentos que
melhor se adequam ao perfil de risco do investidor e selecioná-las. Esta última etapa
pode ser feita com o uso do que Markowitz (1952a) chamou de fronteira eficiente. A
fronteira eficiente define a combinação ótima de ativos de risco dentro de uma
carteira de investimentos, isto é, para um determinado desvio-padrão qual carteira
oferece o maior retorno. A linha sólida do gráfico 5 mostra a fronteira eficiente
elaborada a partir da combinação de 10 ações de empresas americanas. Os pontos
A, B, C e D do gráfico 5 são exemplos de carteiras de investimentos formados com
estes ativos. Cada um deles é chamado de carteira de investimentos eficientes.
(Brealey, Myers e Allen, 2008, p. 211).
11
Gráfico 5 – Fronteira eficiente
Fonte: Brealey, Myers e Allen, 2008, p. 211.
De maneira mais abrangente, a fronteira eficiente serve também para a
determinação da alocação ótima dos ativos com risco e livres de risco de uma
carteira de investimentos. Isto é possível associando-a com a linha de alocação de
capital (capital allocation line), que reflete todas as combinações de risco-retorno
disponíveis para o investidor tendo como ponto de partida o retorno esperado para o
ativo livre de risco, r
f
. (Bodie, Kane e Marcus, 2005, p. 203). O gráfico abaixo ajuda a
entender este processo.
Gráfico 6 – Linha de alocação de capital
Fonte: Bodie, Kane e Marcus, 2005, p. 236.
12
O ponto P é a carteira de investimentos eficiente que combina ativos de risco, ao
mesmo tempo em que é tangenciado pela linha CAL(P). Isto significa que a carteira
de investimentos P é a que melhor comporá com ativos livres de risco na formação
final da carteira de investimentos.
Em termos práticos, se for considerada a gestão de recursos feita por um
profissional, por exemplo, existem duas tarefas distintas. Uma cabe ao gestor
determinar a alocação ótima dos ativos arriscados e outra ao investidor, em definir o
melhor balanceamento entre os ativos de risco sugeridos e os ativos livres de risco.
Esta dinâmica gera a propriedade de separação entre o investidor e o gestor. (Bodie,
Kane e Marcus, 2005, p. 252).
A questão seguinte é: uma vez determinada a carteira de ativos com risco que
melhor se combina com ativos sem risco, qual será a proporção entre estas duas
classes, considerando a propriedade de separação? A resposta depende da
sensibilidade do investidor a incertezas. Em outras palavras, sua aversão a risco.
2.1.1 Paradoxo de São Petesburgo
Daniel Bernoulli (1738) analisou a propensão a risco de indivíduos em um jogo de
“cara e coroa”. A regra era: pagava-se uma taxa de entrada e a moeda jogada
sucessivamente. Cada vez que desse coroa, o participante tinha direito a ser
recompensado em $2,00. Entretanto, quando saísse a primeira cara o jogo era
terminado e o ganho, se existente, apurado e pago.
Bernoulli (1738) observou que apesar da recompensa poder ser infinita, os
participantes não estavam dispostos a pagar muito para participar do experimento. A
partir daí surgiu um paradoxo: se o indivíduo busca maximizar sua riqueza de forma
racional, ele deveria entrar neste jogo pagando qualquer custo. Então por que
Bernoulli (1738) não verificou isto?
13
A solução deste paradoxo foi dada pelo mesmo Bernoulli (1738) que verificou que os
indivíduos não atribuem o mesmo valor financeiro para todas as recompensas. Logo,
quanto maior for a riqueza do indivíduo, menor seu apreço pelo ganho extra. Isto faz
com que a relação da utilidade da riqueza, U(W), versus a riqueza, W, seja côncava,
conforme gráfico 7.
Gráfico 7 – Relação utilidade da riqueza e riqueza
Fonte: Bodie, Kane e Marcus, 2005, p. 193.
2.2 Modelo de Apreçamento de Ativos Financeiros (MAAF)
O desenvolvimento dos trabalhos de Markowitz (1952a, 1952b) culminou, doze anos
depois, com a elaboração do modelo de apreçamento de ativos financeiros por
Sharpe (1964), Lintner (1965a) e Mossin (1966). Este tempo de gestação indica que
o salto entre o primeiro trabalho e os outros três não foi trivial. (Bodie, Kane e
Marcus, 2005, p. 282).
Conforme listado abaixo, verifica-se que o MAAF parte de uma série de premissas
acerca do comportamento do investidor que os tornam praticamente iguais,
exceções feitas à riqueza inicial e aversão ao risco.
a) existe uma grande quantidade de investidores, cada um com uma pequena
parcela de riqueza dentro do universo de investidores, de forma que cada um
deles é um tomador de preço e as suas compras e vendas de ativos não
influenciam os preços dos mesmos;
14
b) todos os investidores possuem um mesmo período de investimento;
c) todos os investidores analisam os investimentos da mesma maneira e
compartilham a mesma visão de perspectivas econômicas, de maneira que a
opinião sobre o valor do ativo ao final do período de investimento é igual entre
todos, ou seja, as expectativas são homogêneas;
d) todos os investidores são racionais e buscam otimizar a relação média-
variância;
e) investidores podem se posicionar comprados ou vendidos em qualquer ativo a
um custo igual à taxa de juros livre de riscos;
f) os investimentos são limitados aos ativos negociados publicamente, tais como
ações e títulos de renda fixa;
g) investidores não pagam impostos e custos de transação.
Um conceito relevante na formação do MAAF é o de carteira de investimentos do
mercado que significa o valor de riqueza somado de todos ativos disponíveis na
economia. O MAAF considera que todos os indivíduos tentam maximizar suas
carteiras de investimentos e com isto chega a uma mesma carteira, cuja proporção
de ativos é igual a da carteira do mercado (M). Desta forma, a carteira do mercado é
igual a carteira de cada investidor. Analogamente ao visto na seção 2.1, a carteira
do mercado também possui uma linha de alocação, chamada linha de capital do
mercado, que provê uma combinação ótima entre ativos de risco e livres de risco.
(Sharpe, 1964).
Um ponto que se apresenta neste momento é: se as carteiras de investimentos
individuais são iguais a do mercado como um todo, vale a pena perseguir uma
estratégia ativa de seleção de ativos e combinação de elementos arriscados e não
arriscados? Os seguidores do teorema dos fundos mútuos, que afirma que a
alocação da parte arriscada da carteira de deve ser feita passivamente seguindo a
carteira do mercado, dirão que sim. (Bodie, Kane e Marcus, 2005, p. 285).
Até agora, priorizou-se lançar as principais premissas e considerações do MAAF. A
partir desta etapa, serão ressaltadas as principais contribuições do modelo no que
diz respeito às formas de relação entre risco e retorno.
15
Ao tratar ativos livres de risco e com risco, cabe considerar que o ativo com risco
precisa gerar um retorno esperado adicional por unidade de risco que ele carrega.
(Sharpe, 1964). Esta definição fica mais clara se tivermos como referência o retorno
esperado do ativo livre de risco, cujo risco é zero e o retorno é igual a taxa de juros
pura (Sharpe, 1964).
Isto posto, em uma carteira de investimentos que contemple ativos com e sem risco,
o retorno total esperado é uma combinação de cada um dos retornos esperados,
ponderado pela alocação feita em cada uma destas duas classes. (Sharpe, 1964;
Lintner, 1965a).
Simplificadamente, seja y o percentual de alocação em um único ativo com risco, r
seja o retorno deste ativo, (1-y) seja a alocação em ativos livres de risco e r
f
seja o
seu respectivo retorno. A rentabilidade total da carteira, r
c,
é:
r
c
= yr + (1-y)r
f
Considerando o valor esperado de retornos, pode-se reescrever de outra maneira a
relação anterior:
E(r
c
) = yE(r) + (1-y)r
f
Isolando-se y, tem-se que:
E(r
c
) = r
f
+ y[E(r)- r
f
] (1)
A relação acima mostra que a carteira de investimentos espera receber um prêmio
de risco que depende da parte arriscada da carteira, sendo esta denotada por
[E(r)- r
f
].
É possível escrever y também em função do desvio-padrão da parcela com e sem
risco da carteira. O desvio-padrão total é:
σ
c
= yσ
+ (1-y)σ
f
16
Porém, dado que σ
f
= 0, σ
c
= yσ. Colocando-se y em termos dos desvios-padrão e
aplicando-se em (i), tem-se que:
E(r
c
) = r
f
+ (σ
c
/σ)[E(r)- r
f
]
No caso da carteira de investimentos do mercado, a relação (σ
c
/σ) pode ser feita da
seguinte forma:
(σ
c
/σ) = Cov(r
x
, r
M
)/σ
2
M
, (2)
onde o numerador representa a covariância entre o ativo com risco e o mercado e o
denominador a variância do mercado. Aplicando-se (2) em (1), tem-se que:
E(r) = r
f
+ (Cov(r, r
M
)/σ
2
M
)[E(r
M
)- r
f
] (3)
A parcela Cov(r, r
M
)/σ
2
M
é o beta (
β
) do ativo arriscado. (Bodie, Kane e Marcus, 2005,
p. 283). A função do beta é medir a contribuição do ativo para a variância da carteira
de investimentos do mercado como uma fração da variância total da carteira do
mercado.
Por fim, a equação (3) pode ser representada graficamente por uma reta, chamada
linha de mercado do ativo, cuja inclinação é dada pelo beta do ativo. (Bodie, Kane e
Marcus, 2005, p. 290). A linha de mercado do ativo permite avaliar o retorno
requerido para se realizar um investimento no mesmo, tendo em conta o risco que
isto implica, e comparar se o retorno que o mercado exige para o ativo está maior ou
menor que o requerido por determinado investidor. Consequentemente, esta
comparação auxilia na tomada de decisão sobre a compra ou venda do ativo.
O MAAF está estabelecido como referência para a predição de retornos esperados.
Entretanto, estudos posteriores aos de Sharpe (1964), Lintner (1965a e 1965b) e
Mossin (1966) mostraram que o MAAF não explicava completamente os retornos de
ativos, por exemplo, ações. No Brasil, Silva et al. (2009) testaram e compararam
17
duas versões do MAAF na precificação de índices acionários no Brasil entre 2005 e
2008: a estática e a condicional que considera não estacionárias as estimativas dos
coeficientes ao longo de um determinado período. Estes autores verificaram que no
período completo analisado, a versão condicional tende a explicar melhor o retorno
esperado dos índices acionários da BOVESPA.
2.3 Hipótese do Mercado Eficiente (HME)
A hipótese do mercado eficiente tomou impulso a partir da década de 1950 quando o
início do uso dos computadores apoiou a evolução dos estudos das séries de dados.
Nesta época, os estudiosos acreditavam que a análise do comportamento passado
de variáveis econômicas poderia ajudar a predizer suas características futuras.
Kendall (1953) realizou um estudo observatório do comportamento da variação
semanal de 19 índices de ações de indústrias britânicas e dos preços à vista da
farinha (bolsa de Chicago) e do algodão (bolsa de Nova Iorque). No caso do
mercado acionário, verificou pouca correlação dos seus movimentos com séries
históricas. Usando suas palavras, “a menos que ações se comportem
diferentemente da média de ações similares, não há esperança de se predizer
movimentos para a semana seguinte sem informação externa.” (Kendall, 1953, p.
11, tradução do pesquisador).
Fama (1970) aprofundou os estudos sobre os efeitos da informação na definição do
preço dos ativos, bem como o comportamento dos seus preços. Inspirado na teoria
de retornos esperados de Sharpe (1964) e Lintner (1965a, 1965b), Fama (1970)
mostrou que a informação existente é uma condicionante para o modelo de retorno
esperado em equilíbrio dos ativos, logo estaria integralmente refletida no preço dos
mesmos. A consequência desta condição é a impossibilidade de geração de
retornos adicionais aos dos retornos esperados em equilíbrio. Logo, em outras
palavras, não existe espaço para arbitragem e o retorno esperado será um modelo
de “jogo justo” (“fair game” model). (Fama, 1970).
18
Com relação ao comportamento do preço dos ativos, Fama (1970) menciona que o
fato dos preços dos ativos refletirem integralmente a informação disponível, implica
assumir que as sucessivas alterações de preço são independentes e identicamente
distribuídas. A combinação destas duas hipóteses constitui o modelo de caminho
aleatório (random walk model).
Bodie, Kane e Marcus (2005) exemplificam a teoria de Fama (1970) com a seguinte
situação: caso surgisse uma informação implicando que uma ação está barata, os
investidores deveriam comprar este ativo forçando seu preço para um patamar justo.
A partir deste nível, o movimento seguinte de valorização ou desvalorização da ação
seria reflexo da existência de nova informação, cuja definição é ser imprevisível.
Desta forma, o preço das ações segue um caminho imprevisível e aleatório sempre
incorporando toda informação disponível sobre as mesmas. Esta dinâmica constitui
a hipótese do mercado eficiente. (Bodie, Kane e Marcus, 2005, p. 370-371).
A hipótese do mercado eficiente pode ser separada em três versões de acordo com
o uso do termo “toda informação disponível”. Fama (1970) enunciou a forma fraca,
na qual o preço da ação de uma empresa reflete toda a informação que pode ser
derivada pela análise dos seus dados históricos, a forma semi-forte, que se
preocupa em entender a velocidade na qual o preço da ação se ajusta a publicação
de dados operacionais e financeiros e por fim, a forma forte, que inclui além de toda
a informação disponível sobre as partes operacionais e históricas, dados que
apenas alguns investidores ou grupos tenham sobre a mesma.
Após o trabalho de Fama (1970), estudo desenvolvido por Grossman e Stiglitz
(1980) mostrou que os investidores que gastam dinheiro para obter informação
podem ser recompensados com ganhos extras, contrariando a hipótese do mercado
eficiente. Neste caso, quando investidores informados observam que o retorno de
uma ação será alto, eles fazem investimento neste ativo e influenciam seu preço
para cima (alternativamente quando vendem e pressionam o preço para baixo se a
informação é negativa). Desta maneira, existe um fluxo de informação do investidor
informado para o desinformado através da variação de preços das ações.
19
A partir da teoria lançada pela hipótese do mercado eficiente, abriu-se vasto campo
para aplicação de métodos para estimação do valor das ações e estratégias de
alocação de ativos. Pode-se dar como exemplo a análise fundamentalista, que parte
do estudo das demonstrações financeiras das empresas e desempenho histórico
para estimar o preço justo da ação e a análise técnica que usa gráficos de preços e
volumes de negociação passada para analisar tendências e ciclos de valorização ou
desvalorização.
No Brasil, Villaschi, Galdi e Nossa (2009), combinaram dados utilizados em técnicas
fundamentalistas, tais como lucro líquido e retorno sobre ativos, com medidas
desenvolvidas para avaliar empresas com baixa razão book-to-market (LBM), tais
como gastos com pesquisa e desenvolvimento e estabilidade no crescimento de
vendas, para separar empresas LBM listadas na BOVESPA em bem e mal
sucedidas. Adicionalmente, é possível mencionar a estratégia passiva de alocação
de ativos seguindo um índice de referência no mercado, na crença que toda a
informação está disponível e já está refletida no preço dos ativos, logo não sendo
possível obter ganhos extras.
Porém, outras técnicas surgiram para auxiliar na compreensão do entendimento do
investidor e a formação da tomada de decisão. Conforme será descrito adiante, é
possível entender o investidor sob uma ótica mais subjetiva e observadora.
2.4 Teoria dos Prospectos
A constituição de modelos que, em geral, explicam o preço dos ativos e
comportamento dos investidores considera suas preferências ou como os
investidores tomam decisões que envolvam risco.
Tradicionalmente, tais modelos e teorias foram influenciados pela teoria da utilidade
esperada, a qual era dominada por uma normativa de escolha racional, cuja
assunção era de que pessoas, que em geral obedeciam a um número plausível de
20
axiomas poderiam ser representadas por uma função de utilidade (Von Neumann, J.
e Morgenstern, O., 1944).
Entretanto, estudos mostraram que pessoas violavam sistematicamente os axiomas
da teoria da utilidade esperada quando realizavam escolhas de risco. Apesar de não
ser objeto deste trabalho, as publicações sobre aversão ao desapontamento de Gul
(1991), teoria do arrependimento de Bell (1982) e utilidade esperada implícita de
Chew (1989), entre outros, são exemplos de trabalhos que buscaram caminhos
alternativos para entender e explicar as preferências das pessoas.
Se por um lado os estudos da teoria da utilidade esperada e suas derivações ainda
são reconhecidos e aprofundados, por outro cabe destacar que estudos em finanças
comportamentais estão mostrando que as violações observadas na teoria da
utilidade esperada são fundamentais para o entendimento de alguns fenômenos
financeiros (ver exemplos na seção 2.5).
De todas as teorias não ligadas à teoria da utilidade esperada, a teoria dos
prospectos talvez seja a mais promissora para aplicações em finanças.
[...] a teoria dos prospectos é a que mais bem sucedida em capturar
os resultados experimentais. [...] e não possui aspiração de ser um
modelo normativo; ela simplesmente tenta capturar as atitudes das
pessoas em relação a apostas de risco tão parcimoniosamente
quanto possível. (Barberis e Thaler, 2005, p. 16-17, tradução do
pesquisador).
Adicionalmente, um dos grandes feitos alcançados pela teoria dos prospectos
(Kahneman e Tversky, 1979) foi o de integrar as constatações realizadas por
Markowitz (1952b) e Allais (1953) que refutavam a tese que as pessoas se
comportavam de acordo com a teoria neoclássica quando expostas a situações de
decisão que envolvessem risco.
Antes de entrar em mais detalhes sobre os principais aspectos da teoria dos
prospectos, vale ressaltar as suas principais diferenças em relação à teoria da
utilidade esperada, conforme Shefrin (2008):
21
a) formação de valor na teoria da utilidade esperada é quantificada pela riqueza
ou bem-estar final e na teoria dos prospectos em ganhos e perdas relativos a
um ponto de referência;
b) tolerância ao risco é uniforme sob a ótica da teoria da utilidade esperada e
variável na teoria dos prospectos, mudando de acordo com a percepção de
qual domínio (de ganho ou de perda) a pessoa está inserida;
c) teoria da utilidade esperada assume que as pessoas ponderam as
probabilidades corretamente, ao passo que a teoria dos prospectos admite
que as pessoas atribuam mais peso a algumas probabilidades e menos a
outras;
d) teoria da utilidade esperada postula que as pessoas são imunes à maneira
como a escolha é apresentada ou descrita, contrariamente ao que postula a
teoria dos prospectos, que afirma que a forma como a escolha é apresentada
afeta a tomada de decisão da pessoa.
Kahneman e Tversky (1979) conduziram uma série de experimentos para identificar
como pessoas tomavam decisões que envolviam risco e verificaram a existência de
efeitos empíricos que aparentemente violavam a teoria da utilidade esperada. Os
efeitos certeza e isolamento exemplificam isto. O primeiro efeito está relacionado ao
fato que as pessoas atribuem mais peso a resultados que são certos de acontecer
do que os prováveis. Isto é contrário ao que postula a teoria da utilidade esperada
que afirma que os resultados são ponderados pelas suas probabilidades. O segundo
efeito mostra que as pessoas tendem a focar somente em perdas e ganhos
isolando-as de outras variáveis relevantes ao prospecto (ver Problemas 1 e 2 na
seção 2.4.1).
Ao estudar o processo de escolha das pessoas, Kahneman e Tversky (1979) o
separaram em duas fases subsequentes: edição e avaliação. A edição consiste em
uma análise preliminar do prospecto apresentado e que normalmente resulta numa
representação simplificada do mesmo. A função desta fase é organizar e reformular
as opções de maneira a simplificar a avaliação e escolha. Durante a edição, são
22
realizadas diversas operações que transformam os resultados e as probabilidades
associados com cada prospecto. Kahneman e Tversky (1979) definiram as seguintes
operações da fase de edição que são aplicadas a cada prospecto em separado:
i. coding: as pessoas normalmente percebem os resultados das
decisões como ganhos e perdas, ao invés de estados finais de
riqueza. Para quantificar os ganhos e perdas, é necessário
estabelecer um ponto de referência que pode ser afetado de
acordo com a formulação do prospecto e pelas expectativas do
tomador de decisão;
ii. combinação: às vezes os prospectos podem ser simplificados
pela combinação de probabilidades associadas com resultados
idênticos. Por exemplo, a possibilidade de ganhar $200 com
25% de chance em duas tentativas pode ser simplificada a uma
única chance de ganhar os mesmos $200 com 50% de chance;
iii. segregação: alguns prospectos contêm um componente livre de
risco que é segregado do componente com risco;
iv. cancelamento: é aplicada a dois ou mais prospectos e consiste
em descartar pares de resultados com a mesma probabilidade.
O exemplo a seguir ilustra esta situação, onde (X valor, p
probabilidade): a escolha entre o prospecto (200, 0,2;100, 0,5;-
50, 0,3) e o prospecto (200, 0,2;150, 0,5;-100, 0,3) pode ser
reduzida à escolha entre (100, 0,5;-50, 0,3) e (150, 0,5;-100,
0,3);
v. simplificação: está relacionado ao arredondamento das
probabilidades do prospecto acontecer. Por exemplo, o
prospecto (101, 0,49) provavelmente será considerado como
uma chance de 50% de ganhar $100. Outro efeito da
simplificação é descartar resultados extremamente improváveis;
vi. dominância: um prospecto pode dominar o outro se houver
simplificação de um componente do prospecto. Por exemplo, o
23
prospecto (500, 0,2; 101, 0,49), onde (X valor, p probabilidade),
aparentemente domina o prospecto (500, 0,15; 99, 0,51) se o
segundo componente de ambos os prospectos for simplificado
para (100, 0,5).
Na sequência da fase de edição faz-se necessário avaliar cada um dos prospectos,
de forma que a escolha seja feita com base naquele que possua o maior valor.
Entra-se, então, na fase de avaliação onde os prospectos podem ser escolhidos
utilizando-se dois caminhos: pela conclusão de que um prospecto domina o outro ou
pela comparação de seus valores (Tversky e Kahneman, 1986). Conforme
Kahneman e Tversky (1979), considere um prospecto da forma (x,p;y,q), ou seja, a
probabilidade de receber x é p, a probabilidade de receber y é q e a probabilidade de
não receber nada é (1-p-q), onde p+q <= 1. De acordo com a teoria dos prospectos,
existem pesos de decisão (decision weights) π(.) associados a cada probabilidade p
e q que refletem os impactos de p e q no valor total do prospecto e valores v(.)
ligados a cada resultado x e y que refletem o valor subjetivo de cada um destes
resultados. Kahneman e Tversky (1979) afirmam que v(.) mede o valor dos desvios
em relação ao ponto de referência, isto é, os ganhos e perdas. A combinação de
π(.) e v(.) é o valor total do prospecto. Neste exemplo, seria
π(
p)v(x) +
π(
q)v(y).
2.4.1 Função Valor e Ponto de Referência
A função valor da teoria dos prospectos possui as seguintes características:
a) definida como desvios em relação ao ponto de referência;
b) côncava no domínio dos ganhos e convexa no domínio das perdas;
c) mais inclinada no domínio das perdas do que no domínio dos ganhos.
24
Gráfico 8 – Função valor hipotética
Fonte: Kahneman e Tversky, 1979, p. 279
Conforme gráfico 8, a curva tem forma de um S, caracterizando o fato de que o valor
atribuído para uma determinada perda é maior do que para um mesmo ganho, isto
é, existe uma aversão a risco no domínio dos ganhos e uma propensão a tomada de
risco no domínio das perdas.
Os Problemas 1 e 2 abaixo ilustram a situação ilustrada anteriormente e foram
aplicados por Kahneman e Tversky (1979). O primeiro foi apresentado a 70 pessoas
e o segundo a 68 pessoas.
Problema 1: Em adição ao que quer que você tenha, lhe foi dado $1.000.
Agora você precisa escolher entre:
A: Ganhar $500 com certeza
B: 50% de chance de ganhar $1.000 e 50% de chance de não ganhar nada
Problema 2: Em adição ao que quer que você tenha, lhe foi dado $2.000.
Agora você precisa escolher entre:
C: Perder $500 com certeza
D: 50% de chance de perder $1.000 e 50% de chance de não ganhar nada
25
A maioria dos respondentes, isto é, 84% escolheram A (ganhar $500 com certeza)
em relação a B e 69% escolheram D (apostar ao invés de aceitar uma perda
certeira) em relação a C. Logo, podem-se concluir duas coisas:
a) existem indicações de aversão a risco para prospectos positivos e propensão
a tomar risco para prospectos negativos. Shefrin e Statman (1985) analisaram
esta situação e a chamaram efeito disposição;
b) as pessoas tendem a isolar os ganhos e perdas de outras variáveis
importantes (neste caso o que é pago inicialmente para as pessoas
participarem da pesquisa), mostrando os impactos do efeito isolamento (ver
definição na seção 2.4).
Em sua essência, a teoria dos prospectos mostra que os transportadores de valor
(carriers of value) são mudanças na riqueza ou bem-estar dos indivíduos, ao invés
de estados finais. Isto leva a uma consideração sobre como acontecem as nossas
percepções. De acordo com a teoria dos prospectos, nossas percepções estão mais
ligadas a avaliações de mudanças do que de avaliações absolutas. Por exemplo,
quando nos manifestamos acerca da temperatura de um ambiente, a experiência
passada e o contexto presente definem um parâmetro, chamado de ponto de
referência, a partir do qual o estímulo passa a ser percebido e referenciado. Desta
forma, é possível dizer se o meio está mais quente ou mais frio. Analogamente, o
valor de determinado ativo também deve ser tratado em função do ponto de
referência e da magnitude da mudança em relação ao ponto de referência.
A teoria dos prospectos trouxe uma abordagem integrativa sobre o processo de
tomada de decisão baseada em conceitos ligados às percepções e emoções dos
indivíduos. Acima de tudo, trata-se de um trabalho realizado com o objetivo de
descrever comportamentos de escolha sob risco, cujos resultados foram ricos e
persuasivos. Na sua sequência, serão apresentados outros estudos que
aprofundaram e/ou ampliaram os caminhos da influência da psicologia em finanças
comportamentais. Exemplo disso foi a teoria SP/A desenvolvida por Lopes (1987) e
que será descrita na seção 2.10.
26
2.5 Ordenamento e Estrutura
Conforme discutido na seção anterior, a teoria dos prospectos define a fase de
“edição” como a primeira etapa da análise de um prospecto e enfatiza o uso de um
ponto de referência para se avaliar e quantificar os possíveis ganhos e perdas
relativas ao prospecto apresentado.
Entretanto, a definição de qual será o ponto de referência depende
fundamentalmente da forma como o prospecto é apresentado e pelas expectativas
do tomador de decisão (Kahneman e Tversky (1979)). Logo, um mesmo prospecto
apresentado de maneiras diferentes pode gerar decisões e escolhas distintas. Isto é
o que é Tversky e Kahneman (1986) e mais tarde Thaler (1999) chamaram de
framing ou ordenamento e estrutura.
O conceito de ordenamento e estrutura chama a atenção para a premissa de
invariância usada na teoria da utilidade esperada. A invariância, nas palavras de
Tversky e Kahneman (1986), “requer que diferentes representações de um mesmo
problema que envolva escolha deveriam resultar nas mesmas preferências, isto é,
as preferências entre as opções deveriam ser independentes da sua descrição”
(tradução do pesquisador).
Porém, testes realizados por Kahneman e Tversky (1984) mostraram uma violação
do princípio da invariância. Abaixo está descrito um dos testes, onde N é o número
total de respondentes e o percentual de escolha de cada opção está entre
parênteses:
Problema 3 (N=152): Imagine que os Estados Unidos da América estejam
preparando uma solução para uma doença que deverá matar 600 pessoas.
Duas alternativas de programas para combater a doença estão sendo
propostas. Assuma que as estimativas científicas exatas das consequências
dos programas são como seguem:
Se o programa A for adotado, 200 pessoas serão salvas. (72%)
27
Se o programa B for adotado, existe um terço de probabilidade que 600
pessoas serão salvas e dois terços de probabilidade que nenhuma pessoa
será salva. (28%)
A formulação do problema 3 determina como ponto de referência o fato que a
doença pode matar 600 pessoas. Com relação aos resultados, mostra, em linha com
o exposto na seção 2.4.1, que as preferências dos respondentes é avessa ao risco,
ou seja, é favorável àquela que mais salvaria vidas com certeza. A seguir, considere
outro problema no qual a mesma história se apresenta, porém seguida por uma
descrição diferente dos dois programas:
Problema 4 (N=155): Se o Programa C for adotado, 400 pessoas morrerão.
(22%)
Se o Programa D for adotado, existe um terço de probabilidade que ninguém
morrerá e dois terços de probabilidade que 600 pessoas morrerão. (78%)
As opções C e D do problema 4 são exatamente iguais, em termos reais, aos
apresentados nas opções A e B do problema 3, respectivamente. Contudo, o
problema 2 assume que o ponto de referência é a situação que ninguém morre da
doença. Logo, os respondentes são menos avessos ao risco do que no problema 3.
Uma vez mostrado um caso em que a forma que os problemas são apresentados
gera diferentes escolhas, é interessante mudar o foco da análise para entender o
que estar por trás da formulação da escolha final do tomador de decisão.
28
2.6 Contabilidade Mental
Quase tudo na vida guarda-se um registro. Seja para recordar aniversários de
parentes, contar experiências sobre viagens feitas ou uma simples ida ao cinema,
estes momentos ficam guardados na memória. Às vezes mais precisamente ou
menos precisamente, não importa. Fato é que essas informações contêm uma parte
da história de cada indivíduo e, normalmente, quando tais situações acontecem, as
mesmas são passíveis de análise.
Tomemos, por exemplo, o caso da ida ao cinema. Seja o ingresso para uma grande
estreia comprado com uma semana de antecedência. Como se trata de um evento
importante e com muita demanda, o preço pago foi de $100. Justamente duas horas
antes da sessão, uma grande quantidade de chuva cai na cidade e alaga as
principais vias de acesso ao local onde o filme será exibido, tornando a ida ao
cinema praticamente impossível. Por que, neste caso, pode haver uma sensação
negativa de ter prejuízo de $100 ou pior, forçar a ida ao cinema mesmo em
condições adversas?
A resposta pode ser de duas formas: a primeira é considerar como as transações
são avaliadas e a segunda traçando um paralelo com a contabilidade tradicional.
Thaler (1999) afirma que a maioria das compras rotineiras não possui avaliação ex-
post. Entretanto, se o tamanho da transação aumenta ou a compra ou situação
vivida fogem do usual, é mais frequente a avaliação ex-post. Faltar a um evento cujo
ingresso foi comprado com antecedência torna esta compra relevante e passiva de
avaliação. Como Heath (1995) sugere, os custos de enfrentar ruas alagadas são
encarados não como monetários e sim acidentais, isto é, ficam em uma conta
mental separada. Situação semelhante aparecerá nos problemas do teatro,
apresentados mais adiante.
A segunda maneira de analisar a situação do cinema é tentar entender como os
indivíduos registram, resumem e avaliam as suas despesas. Thaler (1999) compara
estes movimentos feitos mentalmente, ou em outros termos, contabilidade mental,
29
com a contabilidade praticada pelas empresas. Estas seguem regras e convenções
determinadas ao longo dos anos. Logo, guardam em seus livros anotações e
registros de transações para saber, entre outras coisas, a origem e destino dos
recursos, o lucro obtido, os custos incorridos e se os mesmos estão sob controle.
Com isto podem periodicamente avaliar o estado financeiro da organização.
A contabilidade mental por sua vez, tem um propósito muito parecido para os
indivíduos, com a diferença que não existem regras que obrigam os indivíduos a
registrar as transações de maneira igual entre eles. Voltando no caso do cinema, um
indivíduo pode agir de acordo com o estudado por Heath (1995) e ir ao cinema de
qualquer forma, ou não, isto é, para outra pessoa o custo já foi incorrido e ela pode
se sentir aliviada por ter chovido antes de sair de casa e não incorrer no
inconveniente de ficar presa por um engarrafamento ou ter seu carro avariado pelo
excesso de água. A consequência disto é que apenas é possível aprender sobre
contabilidade mental pela observação do comportamento dos indivíduos e a partir
daí inferir regras. (Thaler, 1999).
Shefrin e Statman (1985) analisaram o conceito de contabilidade mental de maneira
a prover uma estrutura para a fase de edição da teoria dos prospectos. A principal
ideia deste conceito é que os tomadores de decisão tendem a segregar os diferentes
tipos de escolhas em contas separadas e a partir daí aplicam para cada uma delas
de forma isolada e sem considerar possíveis interações, as regras de decisão
definidas pela teoria dos prospectos.
Esta definição serve para explicar porque um investidor reluta em reajustar o ponto
de referência quando investe em determinada ação. Quando uma ação é comprada,
uma nova conta mental é aberta e o ponto de referência passa a ser o seu preço de
compra. Logo, se cria uma contabilidade de ganhos e perdas em função do preço
atual comparado ao preço de aquisição.
Tal maneira de pensar e agir foi estudada por Shefrin e Statman (1985) que
propuseram o termo “efeito disposição” para explicar porque os investidores tendem
a realizar os ganhos dos investimentos rapidamente e manter prejuízos dos
investimentos por muito tempo. O efeito disposição foi testado e constatado por
30
Odean (1999) em um estudo dos registros de negociação de 10.000 contas de uma
grande corretora nos Estados Unidos entre Janeiro de 1987 e Dezembro de 1993.
Kahneman e Tversky (1984) citam que uma pessoa constitui uma conta mental para
especificar as vantagens e desvantagens associadas a uma opção em relação a um
estado de referência. Adicionalmente, lançam os conceitos de conta mental mínima,
tópica e compreensiva. Os problemas abaixo foram aplicados por eles e explicam
cada um destes conceitos.
Problema 5: Imagine que você esteja para comprar uma jaqueta por $125 e
uma calculadora por $15. O vendedor da calculadora informa que a
calculadora que você quer comprar está em promoção por $10 em outra loja a
20 minutos de carro. Você se deslocaria até a outra loja?
Este problema combina aceitar uma opção que combina a desvantagem de ir até a
outra loja com a vantagem do desconto. Com base neste caso, pelo critério de conta
mental mínima a vantagem de dirigir até a outra loja está associada somente ao
ganho de $5. Já a conta mental tópica relaciona as consequencias das possíveis
escolhas com uma referência que é determinada pelo contexto na qual surge a
necessidade de decisão. No problema 5, o tópico relevante é a compra da
calculadora e o benefício da viagem é limitado ao desconto de $15 para $10. Devido
ao fato que o potencial de economia está ligado somente à calculadora, o preço da
jaqueta não é incluído na conta mental tópica. O preço da jaqueta poderia ser
incluído na conta mental compreensiva, a qual contemplaria o benefício do desconto
com outras despesas não relacionadas diretamente com a situação proposta, tais
como despesas mensais de luz, gás, telefone, etc.
Kahneman e Tversky (1984) defendem que as pessoas tomam decisões usando as
contas mentais tópicas e que isto leva a avaliação dos ganhos e perdas de maneira
relativa, ao invés de absoluta. Thaler (1999) analisou os problemas descritos acima
e argumenta que “a utilidade de poupar $5 deve estar associada com as diferenças
de valor, ao invés do valor das diferenças.”
31
Os problemas 6 e 7 abaixo mostram outros casos de contabilidade mental
controlado pela conta tópica e que foram estudados por Kahneman e Tversky
(1984).
Problema 6 (N=200): Imagine que você decidiu ir ao teatro e pagou $10 pelo
ingresso. Ao entrar no teatro você descobre que perdeu o ingresso. O assento
não era marcado e não é possível recuperar o ingresso. Você pagaria $10 por
outro ingresso?
Sim (46%) / Não (54%)
Problema 7 (N=183): Imagine que você decidiu ir ao teatro e o ingresso custa
$10.
Ao entrar no teatro você descobre que perdeu uma nota de $10. Ainda assim
você pagaria $10 para assistir à peça?
Sim (88%) / Não (12%)
Apesar dos resultados financeiros serem o mesmo, ou seja, ambas as situações
implicarem em custo adicional de $10, Kahneman e Tversky (1984) atribuem à
discrepância nas respostas o fato que as contas mentais têm uma organização
tópica. Ir ao teatro é visto como uma transação em que o custo do ingresso é
trocado pela experiência de assistir à peça e a compra de um segundo ingresso, em
função da perda do original, dá a sensação de estar se gastando excessivamente
em dita troca.
Alternativamente, a perda da nota de $10 não é vista como parte integrante do
programa ir ao teatro e sim como fato que deixa a pessoa mais pobre.
O conceito de contabilidade mental foi objeto de outros trabalhos que ampliaram o
seu campo de aplicação. Thaler (1985) desenvolveu um modelo de comportamento
do consumidor usando um híbrido de psicologia cognitiva e microeconomia, além de
incorporar o conceito de contabilidade mental na tomada de decisão do consumidor.
32
Gross (1982) ilustra situações práticas da aplicação do conceito de contabilidade
mental. As seguintes citações foram extraídas do seu livro para corretores de ações
e mostram a dificuldade que os clientes têm em realizar prejuízos com ações:
Muitos clientes, entretanto, não venderão nada com prejuízo. Eles
não querem desistir da esperança de realizar um lucro em um
determinado investimento ou talvez queiram ficar no “zero a zero”
antes de vender o ativo.
Investidores que aceitam perdas não podem manter justificativas
para as suas esposas, como: “Amor é só uma perda de um papel.
Apenas espere. A ação vai se recuperar”.
As palavras que eu considero que tenham um poder mágico no
sentido que tornam mais fácil a aceitação de uma perda são: transfira
seus ativos. (Gross, 1982, p. 150-152, tradução do pesquisador).
Ao usar o termo “transferir”, Gross (1982) condensa em um verbo o esforço para
convencer seus clientes a se desviarem de uma barreira que os levará a realização
de uma perda. Entretanto, isto implica um escopo mais amplo, ou seja, resulta lidar
com diversos sentimentos inerentes do ser humano, tais como ancoragem, aversão
ao arrependimento, orgulho, e auto-controle, entre outros. A seguir serão discutidas
tais sensações.
33
2.7 Ancoragem
Tversky e Kahneman (1974) analisaram como as pessoas fazem estimativas. As
observações do trabalho destes autores mostram que, em geral, as pessoas usam
regras de bolso, ou heurística, para estabelecer o valor de algo desconhecido, por
exemplo, o peso de uma geladeira, ou estimar as chances dos principais times de
uma liga de futebol de ganhar o próximo torneio.
A constatação que Tversky e Kahneman (1974) fizeram é que em muitas situações
as pessoas partem de um valor inicial para projetar suas respostas finais. Em função
da experiência de vida de cada um e da forma como elas veem e interpretam
determinada situação, a definição do ponto de partida que ajudará na tomada de
decisão possui um viés. Isto leva a definição de ancoragem estabelecida por
Tversky e Kahneman (1974) de que diferentes pontos iniciais levam a diferentes
estimativas, as quais são viesadas em relação aos valores iniciais. A consequência
disto é que existe um risco de se superestimar ou subestimar uma decisão. O
exemplo a seguir, retirado de Tversky e Kahneman (1974), mostra um caso de
decisão subestimada.
Foi solicitado a dois grupos de estudantes de ensino médio que estimassem em 5
segundos o resultado de uma expressão numérica escrita no quadro-negro. Um
grupo estimou o produto
8 X 7 X 6 X 5 X 4 X 3 X 2 X 1
Enquanto outro grupo estimou o produto
1 X 2 X 3 X 4 X 5 X 6 X 7 X 8
Para responder rapidamente a este produto, as pessoas fazem a conta parcialmente
e complementam com estimativas usando extrapolação ou ajustes. Entretanto, como
ajustes são normalmente insuficientes, eles levam a subestimar o resultado final.
34
Além disso, como o resultado da multiplicação parcial (da esquerda para a direita) é
maior na sequência descendente do que na ascendente, a primeira expressão deve
ser julgada maior que a segunda. Ambas as expectativas foram atendidas. A
mediana da sequência ascendente foi 512 e da descendente foi 2.250. A resposta
correta é 40.320.
2.8 Arrependimento e Orgulho
Arrependimento é um sentimento de frustração por saber ex post que uma decisão
diferente da que foi tomada no passado teve um resultado bem melhor. O
sentimento contrário é orgulho. Este assunto foi discutido por Kahneman e Tversky
(1982) e ajuda a explicar o porquê sentimentos podem tornar a realização de um
prejuízo tão mais difícil e demorado do que vender uma ação ainda que com um
lucro mínimo.
2.9 Auto-Controle
O conceito de auto-controle está relacionado à capacidade de equilibrar razão e
emoção de forma a sustentar ou desfazer determinada posição. Thaler e Shefrin
(1981) modelaram o ser humano como uma organização, sendo assim passivo de
um problema de agência.
Analogamente ao conceito de uma empresa, na qual acionistas (principal) e
gestores (agente) são protagonistas do conflito, no ser humano os atores desta
relação são contas mentais racionais (principal) e emocionais (agente). À parte
racional é atribuída a capacidade de planejamento, logo ela é capaz de ver a longo
prazo e à parte emocional, tida como mais primitiva, cabe a realização e uma visão
mais de curto prazo (“míope” nas palavras de Thaler e Shefrin, 1981, tradução do
pesquisador). Este “jogo” entre as contas mentais oferece outra visão sobre os
35
efeitos de se realizar ou não um prejuízo e considerar as possíveis interações e
covariâncias dos ativos.
Esta formulação foi adaptada por Shefrin e Statman (2000) e a aplicação por estes
autores será discutida na seção 2.11.
2.10 Teoria SP/A
A teoria SP/A foi desenvolvida por Lopes (1987) e se caracteriza por ser um trabalho
baseado em psicologia que definiu um modelo para capturar as atitudes das
pessoas em relação a risco, levando em consideração que elas possuem como
referência um valor mínimo de riqueza. Em sua definição, S significa segurança, P
potencial e A aspiração.
Shefrin e Statman (2000) afirmam que a teoria SP/A teve como origem o trabalho de
Friedman e Savage (1948) que verificou que pessoas que fazem seguro também
apostam em loterias.
Por sua vez, Shefrin (2008) sugere que a teoria SP/A possui vantagens importantes
em relação a teoria dos prospectos e que levam a um melhor entendimento sobre
como as pessoas realizam escolhas.
Adicionalmente, Shefrin e Statman (2000) compararam a teoria de Lopes (1987)
com o trabalho de Arzac e Bawa (1977). Segundo Shefrin e Statman (2000), o
conceito de segurança é análogo ao de safety, isto é, uma preocupação geral
exposta pelas pessoas em evitar baixos níveis de riqueza. A noção de aspiração
está ligada a uma meta, sendo que Lopes (1987), na visão de Shefrin e Statman
(2000), generaliza o conceito aplicado por Arzac e Bawa (1977) de alcançar um
valor específico. De acordo com Shefrin e Statman (2000), não existe conceito
análogo na teoria de Arzac e Bawa (1977) ao conceito de potencial, o qual está
relacionado a um desejo geral de alcançar altos níveis de riqueza.
36
2.10.1 Descrição do Modelo de Lopes (1987)
No trabalho de Lopes (1987), duas emoções inerentes a todos os indivíduos estão
ativamente ligadas no processo de tomada de decisão de risco: medo e esperança.
No modelo, ambas são representadas por uma função transformação h, cuja técnica
foi desenvolvida por Quiggin (1982, 1993) e Yaari (1987).
O sentimento de medo está ligado ao conceito de segurança e faz com que as
pessoas deem mais peso às probabilidades relativas aos piores resultados do que
em relação aos melhores resultados. Isto confere a este sentimento uma função
convexa.
Contrariamente, a esperança, associada ao conceito de potencial, faz com que as
pessoas atribuam maior peso em relação aos melhores resultados do que em
relação aos piores resultados. Logo, a função ligada a esperança é convexa.
A combinação das duas funções é que molda a função que reflete de escolha final
do tomador de decisão.
O gráfico 9 ilustra as três funções, onde D é uma distribuição decumulativa, o medo
é representado pela função h1(D), a esperança é representada pela função h2(D) e
a combinação dessas duas funções leva a função h(D).
37
Gráfico 9 – Decomposição da função decumulativa ponderada da teoria SP/A
Fonte: Shefrin, 2008, p. 431
Considerando a característica de D, as probabilidades associadas com os resultados
mais desfavoráveis estão ligados a valores de D mais próximos de 1. Por isto, a
função h1(D) alcança seu ponto máximo na parte mais à direita da figura.
Contrariamente, a função h2(D) tem seu ponto máximo no lado esquerdo do gráfico.
Dadas as influências das duas outras funções, esta última é côncava no lado
esquerdo e convexa do lado direito. Lopes (1987) chamou esta configuração da
função h(D) de “otimismo cauteloso”.
A teoria de Lopes (1987) juntamente com a teoria dos prospectos de Kahneman e
Tversky (1979), serviu de base para o desenvolvimento da teoria de comportamento
da carteira de Shefrin e Statman (2000), a ser descrita a na seção seguinte.
38
2.11 Teoria de Comportamento da Carteira (TCC)
A teoria de comportamento da carteira de Shefrin e Statman (2000) se caracteriza
por determinar um modelo de formação de carteira de investimentos que contempla
elementos ligados às emoções e percepções dos investidores.
As duas fontes de inspiração para a elaboração do trabalho de Shefrin e Statman
(2000) foram a teoria SP/A de Lopes (1987) e de contabilidade mental lançado por
Kahneman e Tversky (1979).
Conforme visto na seção 2.10, Lopes (1987) elaborou um estudo psicológico que
mostra que distintas emoções influenciam a tomada de decisão que envolve risco.
Shefrin e Statman (2000) usaram este pressuposto para formatar sua teoria, na qual
os investidores escolhem sua carteira de investimentos considerando a riqueza
esperada, o desejo por segurança e potencial, certos níveis de aspiração e as
probabilidades de alcançar tais níveis de aspiração.
O conceito de contabilidade mental explorado na seção 2.6, permitiu a Shefrin e
Statman (2000) elaborar a teoria de comportamento da carteira em duas versões:
conta mental única e múltiplas contas mentais. Na primeira versão, os investidores
integram as carteiras de investimentos em uma conta mental única e conseguem
fazê-lo porque usam a covariância entre os ativos. Esta versão é comparada por
Shefrin e Statman (2000) com a teoria MAAF, a qual foi vista na seção 2.1. Na
segunda versão, os investidores ignoram a covariância entre os ativos e separam as
carteiras de investimentos em múltiplas contas mentais. Nesta versão que a
contabilidade mental é mais evidente e seus impactos serão discutidos na seção
2.11.2.
Antes de seguir com a análise da teoria de comportamento da carteira, cabe uma
comparação entre esta e a teoria de finanças, em particular a teoria MAAF.
39
2.11.1 Relação entre a teoria do Modelo de Apreçamento de Ativos
Financeiros e a Versão Conta Mental Única da Teoria de
Comportamento da Carteira
As duas teorias utilizam a fronteira eficiente como maneira de determinar a carteira
de investimentos ótima (vide seção 2.1 que trata da definição de carteira eficiente).
Entretanto, elas diferem no espaço em que são formadas e na sua composição.
A fronteira eficiente, tal qual definida por Markowitz (1952a), é limitada pela média,
μ, e variância dos ativos, σ, ao passo que na versão de conta mental única, o
espaço é limitado pela expectativa de riqueza, E
h
(W), e probabilidade que a riqueza
seja menor que um dado nível de subsistência, Pr{W<=A}. Em ambos os casos, os
investidores preferem um alto μ e E
h
(W) e um baixo σ e Pr{W<=A}.
Consequentemente, a fronteira eficiente de ambas as teorias são obtidas
maximizando μ e E
h
(W) para σ e Pr{W<=A} fixos, respectivamente.
De acordo com a versão Shefrin e Statman (2000) para uma conta mental única, a
composição da carteira ótima é feita pela combinação de títulos e tíquetes de loteria
e no MAAF é uma combinação da carteira do mercado e um ativo livre de risco.
Shefrin e Statman (2000) mostraram que, em geral, as fronteiras eficientes da
versão conta mental única e a determinada de acordo com o MAAF não coincidem,
sendo um dos motivos justamente a forma como são compostas. Isto acontece
porque os investidores da teoria de comportamento da carteira versão conta mental
única rejeitam escolher uma carteira cuja distribuição de retornos é normal,
favorecendo carteiras de investimento compostas por títulos e tíquetes de loteria.
40
2.11.2 Teoria de Comportamento da Carteira – Versão Múltiplas Contas
Mentais
A inserção do conceito de contabilidade mental (ver seção 2.6) é a principal
característica que difere a versão conta mental única da versão múltiplas contas
mentais da teoria de comportamento da carteira. Os investidores da versão múltiplas
contas mentais agem ignorando o efeito da covariância entre as carteiras de
investimentos e os segregam em distintas contas mentais.
A aplicação da covariância na tomada de decisão foi objeto de estudo de diversos
autores. Tversky e Kahneman (1986) apresentaram evidências da dificuldade que a
covariância e outras propriedades das distribuições conjuntas de probabilidade
impõem na formalização da decisão. Normalmente, as pessoas tendem a simplificar
o processo decisório ao dividir as probabilidades em contas mentais e as carteiras
de investimentos como se fossem pirâmides com camadas.
Kroll, Levy e Rapaport (1988) conduziram experimentos com três grupos de
pessoas, que foram solicitadas a formar carteiras de investimentos com três ativos,
A, B e C. As informações oferecidas sobre estes três ativos foram os retornos
esperados e uma matriz de variância-covariância. As correlações entre A e B e A e
C foram determinadas como sendo zero para os três grupos. Porém, para o primeiro
grupo, a correlação entre B e C foi determinada como sendo zero, para o segundo
grupo foi definida que seria 0,8 e para o terceiro grupo seria -0,8. As diferenças de
covariâncias definidas para os três grupos são tais que se os integrantes dos grupos
considerassem a covariância a proporção média de alocação em cada ativo seria
diferente entre os três grupos. Entretanto, Kroll, Levy e Rapaport (1998) não
acharam diferenças significativas entre as carteiras que os três grupos formaram.
Logo, os participantes da pesquisa ignoraram as covariâncias à medida que foram
construindo suas carteiras de investimento.
Shefrin e Statman (2000) apresentaram a versão múltiplas contas mentais de
maneira a refletir as diversas aspirações de riqueza que os investidores podem ter,
desde as mais baixas até as mais altas. Neste momento, Shefrin e Statman (2000)
41
combinam definitivamente os conceitos de contabilidade mental, tal qual lançada
pela teoria dos prospectos com a teoria SP/A de Lopes (1987).
De maneira geral, os investidores combinam dois tipos de aspirações: ao mesmo
tempo em que querem evitar a pobreza eles também querem ficar ricos. Do ponto de
vista de formação de carteiras de investimento, pode ser aplicado um raciocínio
análogo, ou seja, as mesmas combinam diversos níveis de riqueza como se fossem
uma pirâmide com camadas, nos quais os investidores dividem a sua riqueza entre
uma parte inferior, com o objetivo de evitar a pobreza, e uma mais alta, designada
para alcançar a riqueza pretendida.
Logo, são definidas duas contas mentais do tipo “executoras” ou “agentes” que por
sua vez são gerenciadas por um principal “planejador”. Estas definições seguem os
trabalhos de Thaler e Shefrin (1981) citados na seção 2.9. Cada conta mental possui
um nível aspiracional diferente, sendo um baixo e um alto e o objetivo do principal
planejador é balancear as duas contas mentais, de forma a maximizar a utilidade
total do investidor.
A partir desta configuração proposta de contas mentais, Shefrin e Statman (2000)
montaram uma função utilidade que desenha os contornos da divisão de riqueza
entre as duas contas mentais, geridos pelo planejador.
42
3 METODOLOGIA DE PESQUISA
3.1 Paradigma
Considerando que este trabalho envolveu aspectos subjetivos e comportamentais
dos investidores, foi aplicado o paradigma fenomenológico para amparar a
metodologia de pesquisa utilizada.
Os métodos de pesquisa usados no paradigma citado são “técnicas interpretativas
que procuram descrever, traduzir e entender o significado e não a frequência de
determinados fenômenos que acontecem com mais ou menos naturalidade no
mundo social”. (Van Maanen, 1983).
De acordo com Collis e Hussey (2005), as principais características do paradigma a
ser utilizado são:
a) tende a produzir dados qualitativos;
b) usa amostras pequenas, dado que o objetivo neste paradigma é a
profundidade e não a análise estatística;
c) interessa-se pela geração de teorias;
d) ênfase na qualidade e profundidade dos dados, em sua maioria
qualitativos, ou plenos de significado, pois captam a riqueza de
detalhes e as nuances dos fenômenos que estão sendo estudados;
e) pesquisa realizada em campo;
f) apesar de seguir diversos procedimentos para garantir a confiabilidade
ou autenticidade de suas descobertas, no paradigma fenomenológico
isto não é tão importante;
g) validade alta, dado que o objetivo é obter pleno acesso ao
conhecimento e ao significado daqueles envolvidos no fenômeno. A
validade de construto se aplica melhor ao objetivo da pesquisa, pois
existem vários fenômenos que não são diretamente observáveis
43
(construtos hipotéticos), tais como esperança, medo, ambição e
ansiedade do investidor;
h) generalização de resultados de uma amostra para uma população. De
acordo com Gummesson (1991) e Normann (1970), é possível realizar
esta ampliação mesmo sob o paradigma fenomenológico, de maneira
que os padrões, conceitos e teorias gerados em um ambiente podem
ser aplicados em outro.
3.2 Metodologia de Pesquisa
A pesquisa foi realizada através de um estudo empírico. Foi utilizada uma
“metodologia positivista na qual uma amostra de sujeitos é retirada de uma
população e estudada para se fazerem inferências sobre esta população” (Collis e
Hussey,2005). Bussab e Moretin (2006) definem população como um conjunto de
indivíduos (ou objetos), tendo pelo menos uma variável comum observável e
amostra como qualquer subconjunto da população.
No âmbito de finanças comportamentais, Benartzi e Thaler (1995) realizaram
simulações e funções de utilidade para estudar a aversão a perdas e
complementaram o estudo com testes junto a universitários para validar suas
previsões teóricas. Para isto, basearam-se em séries históricas longas para
fundamentar a teoria, o que sugere o uso de estudos longitudinais. Método
semelhante foi usado por Barberis, Huang e Santos (2001) e Lakonishok, Shleifer e
Vishny (1994).
Kahneman e Tversky (1979) usaram entrevistas com estudantes para avaliar
estatisticamente o efeito do seguro probabilístico e sua relação com a concavidade
da função utilidade do dinheiro.
Com base na análise dos trabalhos citados acima, verifica-se o uso da metodologia
de pesquisa positivista em estudos de finanças comportamentais.
44
3.3 Formulação da Pesquisa e Amostra
Entre os dias 22 e 23 de setembro de 2009, o conteúdo da pesquisa foi enviado por
meio eletrônico (e-mail) a um grupo de 10 investidores para que estes pudessem
fazer sugestões e comentários ao texto original apresentado. As sugestões foram
devolvidas e analisadas até o dia 30 de setembro quando a versão final da pesquisa
foi concluída. Cabe ressaltar que este grupo de 10 investidores fez parte da amostra
final estudada.
A pesquisa foi enviada para 65 investidores individuais entre os dias 01 de Outubro
de 2009 e 15 de Outubro de 2009.
A escolha dos investidores foi feita atendendo os seguintes critérios:
a) pessoas entre 25 e 50 anos de idade que fazem a gestão do seu próprio
patrimônio financeiro;
b) respondentes possuem experiência profissional de pelo menos 5 anos;
c) indivíduos exercem ou exerceram algum tipo de profissão que pode estar
ligado ou não ao mercado financeiro.
Do total de pessoas selecionadas, 33 são contatos pessoais e 32 são contatos
profissionais do pesquisador. Adicionalmente, 50 trabalham em cargos gerenciais
e/ou executivos do mercado financeiro, 14 em cargos gerenciais e/ou executivos de
empresas/indústrias e um está aposentado, mas fez carreira em instituições
financeiras de grande porte.
A forma de comunicação, isto é, tanto o envio do seu conteúdo quanto o
recebimento das respostas, aconteceu por meio eletrônico (e-mail). Entretanto, em
função de avisos de ausência temporária ou erro no endereço eletrônico, quatro
investidores não puderam ser acessados.
45
O tamanho da amostra foi de 44 investidores, cujas características são:
a) cinco mulheres e 39 homens;
b) dois respondentes com idade entre 25 e 29 anos;
c) 22 respondentes, dos quais três mulheres, com idade entre 30 e 35
anos;
d) 13 respondentes, dos quais duas mulheres, com idade entre 36 e 40
anos;
e) quatro respondentes com idade entre 41 e 45 anos;
f) três respondentes com idade entre 46 e 50 anos.
3.4 Formato da Pesquisa
A estrutura da pesquisa foi elaborada de forma a explorar elementos da tomada de
decisão do investidor que pudessem evidenciar características semelhantes às
descritas pela versão de múltiplas contas mentais da teoria de Shefrin e Staman
(2000).
Considerando que tal teoria envolve aspectos subjetivos, a pesquisa buscou
informações sobre as percepções, sentimentos e julgamento dos investidores. Logo,
não eram esperadas respostas certas ou erradas e sim as que melhor
representassem as características de cada indivíduo.
Desta forma, buscou-se preparar situações de maneira consistente para evitar
ambiguidades na sua interpretação. Levou-se em consideração que “a tarefa básica
da maioria das questões subjetivas é fazê-las de forma simples e bem definida.”
(Fowler, 1995, p. 46). Logo, a pesquisa foi formatada visando que a leitura e o
registro das respostas fosse o mais fácil possível.
Com relação à definição da estratégia para obtenção das respostas, foi utilizada a
tipo “concorda-discorda” com quatro escalas, conforme sugerido por Fowler (1995):
46
a) Concordo Totalmente
b) Concordo
c) Discordo
d) Discordo Totalmente
Segundo Fowler (1995), a forma “concorda-discorda” evita o uso de mais de uma
dimensão (p. ex. com o uso de “Concordo Fortemente”) que poderia adicionar um
componente emocional à resposta ou um determinado grau de convicção em
relação à mesma que ultrapassaria a tarefa cognitiva que se busca com a situação
apresentada.
Outro ponto considerado na formação das escalas está relacionado com a ausência
de uma resposta neutra. Quando os respondentes são forçados a escolher uma
resposta por não lhes ser oferecida uma opção no meio ou neutra, a maioria deles
realiza uma escolha. (Fowler, 1995).
3.5 Elaboração das Situações Testadas
As situações propostas para os respondentes incluíam o uso de instrumentos
básicos do mercado financeiro, tais como taxa de câmbio R$/US$, taxa de juros
SELIC e classes de investimento (ações e/ou renda fixa).
Logo, optou-se pela simplificação para evitar dúvidas quanto ao instrumento usado
em cada situação, por exemplo, quando se usa a nomenclatura “títulos públicos pós-
fixados”, ao invés do termo técnico LFT (Letras Financeiras do Tesouro).
47
Adicionalmente, no tratamento dado ao investimento em renda variável, usou-se a
nomenclatura “ação”, não sendo feita nenhuma atribuição a uma ação de uma
empresa ou setor específico, de forma a evitar algum tipo de viés do respondente. A
exceção foi no item 5), onde foi citado o setor de varejo como exemplo de setor
comum de empresas listadas na bolsa de São Paulo e Nova York.
48
3.6 Modelo da Pesquisa Enviada para os Investidores
1 2 3 4
Concordo
Totalmente
Concordo Discordo Discordo
Totalmente
Usando a escala acima, classifique as afirmações dos itens abaixo:
1) __ Há um mês você comprou uma ação a R$70 que atualmente está sendo
negociada a R$60. Hoje o Banco Central aumenta a taxa de juros Selic em 0,5%
a.a. e a tendência é de continuar subindo os juros. Você vende a ação com prejuízo
e com os recursos faz uma alocação em títulos públicos pós-fixados.
2) __ Você recebe R$1.000 como pagamento para participar de uma pesquisa que
apresenta escolhas como as abaixo.
A: ganhar mais R$500 com certeza
B: 50% de chance de ganhar mais R$1.000 e 50% de não ganhar nada
Você escolhe A em relação B.
3)__ Você recebe R$2.000 como pagamento para participar de uma outra pesquisa
que apresenta escolhas como as abaixo.
A: perder R$500 com certeza
B: 50% de chance de perder R$1.000 e 50% de chance de perder R$0
Você escolhe A em relação B.
4) __ Você só tem investimentos em renda variável, recebe R$100 para investir e
analisa que uma ação tem perspectiva de alta de 15% em um ano. Você compra a
ação e não considera a possibilidade real de aumento de 10% a.a. para 30% a.a. na
taxa de juros Selic nos próximos 12 meses.
5) __ Você possui ações de empresas brasileiras de um determinado setor da
BOVESPA (ex: varejo) e considera que investir em ações desse mesmo setor em
empresas listadas na bolsa de Nova York tornará sua carteira de investimentos total
muito mais arriscada.
6) __ Metade da sua carteira de investimentos está alocada em títulos públicos
atrelados à taxa Selic e outra metade em ações. De repente a taxa de câmbio passa
de R$1,85/US$1,00 para R$2,00/US$1,00. Você mantém a proporção de ativos
citada inicialmente.
49
3.7 Comentários sobre as Situações Apresentadas aos Investidores
Situação 1: é apresentado ao respondente um prejuízo em um investimento em
determinada ação e a perspectiva de aumento de juros. Logo, o objetivo era verificar
se o respondente realizaria o prejuízo ou não quando apresentado a uma maior
possibilidade de obter mais ganhos em outro investimento.
Situações 2 e 3: réplicas dos testes feitos por Kahneman e Tversky (1979). Neste
caso, a meta era verificar se os respondentes integravam o pagamento inicial com
as perspectivas de ganho e/ou perda.
Situação 4: a situação é semelhante à situação número 1, com a diferença que o
investidor tem a opção de escolha de onde alocar os recursos recebidos. A questão
central tratada aqui é que existe uma carteira concentrada em uma classe de
investimentos, o investidor recebe uma quantia para investir e acrescenta-se uma
real mudança em uma variável (taxa de juros) que pode afetar o desempenho das
ações. Se o investidor levar em consideração a covariância entre renda variável e o
movimento das taxas de juros, poderia iniciar um movimento de alocação em ativos
remunerados pela taxa SELIC.
Situação 5: neste item, tentou-se de verificar se os investidores considerariam
investir em ações do mesmo setor em países diferentes tornaria a carteira de
investimentos mais arriscada ou não e se, na hipótese de considerar que existe uma
covariância entre elas, risco como da alocação neste setor no Brasil e no exterior,
diminuiria dada a diversificação.
Situação 6: o objetivo neste caso foi testar se o investidor considera a covariância
entre um movimento na taxa de câmbio e o seu impacto nos seus investimentos.
Uma súbita mudança na taxa de câmbio implica alguma instabilidade no mercado de
ações, em particular às ações de empresas que tenham dívidas em dólar, por
exemplo. Logo, isto deveria levar a que o investidor revisitasse sua carteira,
considerando os efeitos que a desvalorização cambial imputaria na sua carteira, em
especial na parte de renda variável.
50
4 RESULTADOS DA PESQUISA
As tabelas 1 a 4 mostram os resultados da pesquisa.
Itemda
Pe squisa
Concordo
Totalmente Concordo Di scordo
Discordo
Totalmente
1 2 13 18 11
219119 5
31111157
4281321
5382211
6922130
Tabela 1 – Respostas da pesquisa por item
Fonte: Quadro elaborado pelo pesquisador
Itemda
Pe squisa
Concordo
Totalmente Concordo Di scordo
Discordo
Totalmente
1 5% 3 0% 41% 25%
2 43% 25% 20% 11%
3 25% 25% 34% 16%
4 5% 1 8% 30% 48%
5 7% 1 8% 50% 25%
6 20% 50% 30% 0%
Tabela 2 – Respostas da pesquisa por item (%)
Fonte: Quadro elaborado pelo pesquisador
Itemda
Pesquisa
ConcordoTotalmente
+Concordo
DiscordoTotalmente+
Discordo
115 29
230 14
322 22
410 34
512 32
631 13
Tabela 3 – Consolidação das respostas da pesquisa por item
Fonte: Quadro elaborado pelo pesquisador
51
Itemda
Pe squisa
ConcordoTotalmente
+Concordo
DiscordoTotalmente
+Discordo
1 34% 66%
2 68% 32%
3 50% 50%
4 23% 77%
5 25% 75%
6 70% 30%
Tabela 4 – Consolidação das respostas da pesquisa por item (%)
Fonte: Quadro elaborado pelo pesquisador
A maioria dos respondentes, 66%, discordou ou discordou totalmente da
possibilidade de vender uma ação com prejuízo e alocar os recursos provenientes
de tal transação em ativos de renda fixa, conforme descrito na questão 1.
Evidenciou-se neste caso situação semelhante ao efeito disposição definido por
Shefrin e Statman (1985) e visto na seção 2.4.1. Adicionalmente, foi possível notar
que os investidores poderiam estar ignorando o efeito da covariância entre a
possibilidade de aumento de juros e o impacto negativo que isto poderia ter no
mercado acionário.
As respostas das duas próximas questões da pesquisa buscaram evidenciar duas
coisas:
1 a falta de integração entre os pagamentos iniciais propostos para a
participação nas pesquisas e os resultados das escolhas, conforme
observado por Khaneman e Tversky (1979);
2 aversão aos riscos no domínio dos ganhos e propensão ao risco no
domínio das perdas, conforme descrito por Kahneman e Tversky (1979).
Os respondentes podem ter ignorado o fato que as questões 2 e 3 produzirem as
mesmas escolhas finais se os pagamentos iniciais fossem considerados junto com
as escolhas apresentadas. Na questão 2 a maioria, ou 68%, concordou ou
concordou totalmente com o ganho certo (em linha com o observado por Kahneman
e Tversky, 1979). Por outro lado, metade das respostas da questão 3 discordaram
ou discordaram totalmente da escolha de perda certa em relação a chance de
perder algo ou não perder nada. Ainda que isto não convirja para a verificação feita
52
por Kahneman e Tversky (1979), que observou que a maioria das pessoas aceitam
tomar risco no domínio das perdas, o percentual de respostas em direção a uma
opção por risco para reduzir as chances de perda não é desprezível.
As respostas da 4ª questão indicaram que os respondentes poderiam considerar os
impactos de um relevante aumento na taxa de juros na compra de uma ação e sua
respectiva chance de apreciação, uma vez que 77% das respostas discordaram ou
discordaram totalmente da hipótese comprar a ação e ignorar um aumento de juros
significativo.
Consideração semelhante às respostas da questão anterior poderia ser feita para o
item seguinte. Na 5ª questão, 75% dos respondentes discordaram ou discordaram
totalmente de um aumento de risco na carteira de ações por investir em ativos do
mesmo setor na Bolsa de São Paulo e de Nova York. Novamente apareceram
indícios que os investidores considerariam a covariância entre os ativos de forma
que a carteira total não teria aumento significativo de risco.
Por fim, na 6ª e última questão, 70% das respostas concordavam ou concordavam
totalmente com a manutenção da proporção da carteira de investimentos entre
ativos sem risco pós-fixados e ações, numa situação onde a taxa de câmbio
aumentaria repentinamente. Apesar de não existir obrigatoriedade de re-equilíbrio
imediato na composição da carteira dada uma variação na taxa de câmbio, o fato
que a maioria dos respondentes teria intenção de manter a proporção dos ativos é
um indício que eles poderiam ignorar os efeitos da covariância entre o preço das
ações e a taxa R$/US$. Adicionalmente, o preço pago pelas ações que compõem a
carteira de renda variável poderia influenciar a resposta de rebalancear a carteria,
pois serve como referência para o desinvestimento. Indiretamente, pode-se notar o
efeito da ancoragem como parte da formação das respostas.
53
4.1 Resultados Esperados
De forma a verificar se o observado na pesquisa possui associação ou não com a
teoria de contabilidade mental, será feita comparação entre os dados obtidos e o
que seria esperado se fossem aplicados primeiramente somente os preceitos da
teoria de comportamento da carteira na versão múltiplas contas mentais e num
segundo momento adicionando os preceitos da teoria dos prospectos e o conceito
efeito disposição.
Logo, os resultados esperados da pesquisa serão definidos de duas maneiras:
a) considerando que todos os itens da pesquisa se comportariam com base no
que seria esperado pela teoria de comportamento da carteira na versão múltiplas
contas mentais, isto é, os investidores ignoram a covariância entre os ativos;
b) considerando que o item 1 se comportaria de acordo com a aplicação do
conceito efeito disposição, que os itens 2 e 3 seguiriam o conceito que as escolhas
podem ser alteradas em função da representação dos resultados (teoria dos
prospectos) e que os itens 4, 5 e 6 seguiriam a teoria de comportamento da carteira
na versão múltiplas contas mentais. Nestes últimos 3 itens, os valores esperados
foram assumidos como sendo iguais aos utilizados na letra a) acima.
Em seguida, para ambas as maneiras serão feitas análises estatísticas
considerando as medidas de desvios entre os valores observados e esperados,
conforme fórmula abaixo, e os cálculos da medida de afastamento (qui-quadrado de
Pearson) e coeficiente de contingência, tais quais definidos por Bussab e Morettin
(2006, p. 78 e p. 80),
Medida de desvio = [(o
i
– e
i
)
2
] / e
i
, onde o
i
são os valores observados e e
i
os
esperados
54
As tabelas 5 e 6 mostram os resultados esperados aplicando-se somente a teoria de
comportamento da carteira versão múltiplas contas mentais (TCC-MCM). Nesta
versão, os indivíduos tendem a ignorar a covariância entre os ativos, guardando-os
em contas mentais separadas. Logo, de forma a refletir esta afirmação, foi
considerado que a maioria das respostas, na proporção 70%/30%, deveria apontar
para tal expectativa.
Itemda
Pesquisa
ConcordoTotalmente
+Concordo
DiscordoTotalmente+
Discordo
113 31
231 13
313 31
431 13
531 13
631 13
Tabela 5 – Respostas esperadas da pesquisa por item utilizando a
TCC – MCM
Fonte: Quadro elaborado pelo pesquisador
Itemda
Pe squi sa
ConcordoTotalmente
+Concordo
DiscordoTotalmente
+Discordo
1 30% 70%
2 70% 30%
3 30% 70%
4 70% 30%
5 70% 30%
6 70% 30%
Tabela 6 – Respostas esperadas da pesquisa por item (%) utilizando
a TCC-MCM
Fonte: Quadro elaborado pelo pesquisador
A tabela 7 mostra as medidas de desvios entre os valores observados na tabela 3 e
os esperados na tabela 5.
55
Itemda
Pesquisa
ConcordoTotalmente
+Concordo
DiscordoTotalmente+
Discordo
10,2 0,1
20,0 0,0
35,9 2,5
4 14,0 32,8
5 11,5 26,8
60,0 0,0
Tabela 7 – Medidas de desvios entre os valores observados
e esperados utilizando a TCC – MCM
Fonte: Quadro elaborado pelo pesquisador
Por fim, o cálculo da medida qui-quadrado de Pearson resultou no valor 93,9 e o
coeficiente de contingência calculado foi de 0,83.
A segunda maneira adotada para compilação dos valores esperados levou às
tabelas 8 e 9.
Itemda
Pesquisa
ConcordoTotalmente
+Concordo
DiscordoTotalmente+
Discordo
19 35
237 7
314 30
431 13
531 13
631 13
Tabela 8 – Respostas esperadas da pesquisa por item utilizando
o conceito Efeito Disposição, a TCC – MCM e a Teoria dos Prospectos
Fonte: Quadro elaborado pelo pesquisador
56
Itemda
Pe squisa
ConcordoTotalmente
+Concordo
DiscordoTotalmente
+Discordo
1 20% 80%
2 84% 16%
3 31% 69%
4 70% 30%
5 70% 30%
6 70% 30%
Tabela 9 – Respostas esperadas da pesquisa por
item (%) utilizando o conceito Efeito Disposição, a TCC – MCM e
a Teoria dos Prospectos
Fonte: Quadro elaborado pelo pesquisador
Os valores esperados para o item 1 refletem a teoria de Shefrin e Statman (1985),
na qual os investidores tendem a realizar ganhos rapidamente e demoram a realizar
prejuízos. Neste contexto, os valores assumidos buscam refletir tal afirmação. Já os
valores esperados dos itens 2 e 3 são iguais aos verificados por Kahneman e
Tversky (1979, p. 273) e dos itens 4, 5 e 6 seguem os valores da Tabela 6.
A tabela 10 mostra as medidas de desvios entre os valores observados na tabela 3 e
os esperados na tabela 8.
Itemda
Pesquisa
ConcordoTotalmente
+Concordo
DiscordoT otalmente+
Discordo
14,4 1,1
21,3 6,9
35,1 2,3
414,0 32,8
511,5 26,8
60,0 0,0
Tabela 10 – Medidas de desvios entre os valores observados
e esperados utilizando o conceito Efeito Disposição, a TCC – MCM
e a Teoria dos Prospectos
Fonte: Quadro elaborado pelo pesquisador
Nesta segunda forma de análise, o cálculo da medida qui-quadrado de Pearson
resultou no valor 106,2 e o coeficiente de contingência calculado foi de 0,84.
57
5 CONCLUSÃO
A investigação realizada neste trabalho teve uma abordagem qualitativa. Buscou-se
dar ênfase a elaboração de questões simples de pesquisa que pudessem captar as
nuances do fenômeno que foi objeto desta dissertação, isto é, a aplicação da
contabilidade mental pelo investidor individual brasileiro, tal qual descrito pelo
modelo de múltiplas contas mentais de Shefrin e Statman (2000).
De acordo com Bussab e Morettin (2006), valores grandes do qui-quadrado de
Pearson indicam associação entre os dados comparados. Por exemplo, um qui-
quadrado de Pearson de 173,2 pode ser considerado grande e indicar a existência
de associação entre duas variáveis (Bussab e Morettin 2006, p. 78). O valor
encontrado pela primeira maneira estudada neste trabalho foi 93,9 e 106,2 pela
segunda. Partindo-se da referência de Bussab e Morettin (2006, p. 78), é possível
afirmar que estes dois valores são grandes. Logo, os resultados da pesquisa
possuem associação com o que seria esperado utilizando-se tão somente o preceito
que os investidores ignoram a covariância entre os ativos, conforme a versão de
múltiplas contas mentais de Shefrin e Statman (2000), quanto compondo esta teoria
com a teoria dos prospectos e o conceito efeito disposição.
Apesar dos resultados apontarem para associação entre a teoria e a prática,
algumas limitações da pesquisa impediram a generalização da sua conclusão, tais
como o baixo número de respondentes em relação ao universo de investidores
pessoa-física no Brasil e a não revisão da pesquisa por uma pessoa ligada ao
campo da psicologia. Adicionalmente, podem surgir questionamentos acerca da
validade de respostas baseadas em situações hipotéticas. Porém, escolhas feitas a
partir de situações hipotéticas é a maneira mais simples de investigar questões
ligadas ao comportamento do investidor (Kahneman e Tversky, 1979). Partindo das
premissas que os respondentes frequentemente saberiam como agir em situações
reais de escolha e que os mesmos não têm razão para fugir das suas preferências
verdadeiras, é possível aceitar as respostas da pesquisa como fonte dos caminhos
que levaram à conclusão desta dissertação.
58
Conforme Lintz (2004), “finanças comportamentais está deixando de ser uma linha
de pesquisa à margem da corrente principal, denominada linha clássica de
expectativas racionais e eficiência de mercado.” Neste sentido, este trabalho buscou
dar um passo no campo de contabilidade mental ao verificar a sua aplicabilidade por
investidores individuais brasileiros. Trabalhos futuros, contudo, poderão aprofundar e
testar a aplicação da teoria de Shefrin e Statman (2000) em um número de
investidores mais amplo e/ou com características demográficas específicas, por
exemplo, um grupo de mulheres que sejam clientes ativas de uma corretora. Desta
maneira, poderão contribuir com o entendimento acerca da formação das suas
carteiras de investimento sob uma perspectiva que também contemple aspectos
psicológicos dos investidores.
59
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