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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL - PUC/RS
NEUZA BARBOSA MICHEL
ADAPTAÇÃO CURRICULAR INDIVIDUALIZADA DE ALUNOS
DISLÉXICOS EM ATENDIMENTO PSICOPEDAGÓGICO EM
ESCOLAS MUNICIPAIS DE ESTEIO/RS
PORTO ALEGRE
2009
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NEUZA BARBOSA MICHEL
ADAPTAÇÃO CURRICULAR INDIVIDUALIZADA DE ALUNOS
DISLÉXICOS EM ATENDIMENTO PSICOPEDAGÓGICO EM
ESCOLAS MUNICIPAIS DE ESTEIO/RS
Dissertação de Mestrado apresentada para
obtenção do título de Mestre
Programa de Pós-Graduação Em Educação
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul - PUC/RS
Orientador: Dr. Claus Dieter Stobäus
PORTO ALEGRE
2009
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TERMO DE APROVAÇÃO
NEUZA BARBOSA MICHEL
ADAPTAÇÃO CURRICULAR INDIVIDUALIZADA DE ALUNOS
DISLÉXICOS EM ATENDIMENTO PSICOPEDAGÓGICO EM
ESCOLAS MUNICIPAIS DE ESTEIO/RS
Dissertação de Mestrado aprovada como requisito para obtenção do título de Mestre
em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC/RS.
Aprovada em: Porto Alegre, ___ de ____________ de 2009.
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________________________
Prof. Dr. Claus Dieter Stobäus (orientador)
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC/RS
________________________________________________________________
Prof. Dr.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC/RS
________________________________________________________________
Prof. Dr.
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC/RS
AGRADECIMENTOS
Agradeço especialmente a Deus que vem
dando-me saúde o suficiente para eu poder
trabalhar e ir atrás dos meus sonhos.
À Secretaria Municipal de Educação e à
Secretaria Municipal da Saúde do município
de Esteio que me concederam autonomia,
confiança e espaço para a realização deste
trabalho.
Aos pais que confiaram seus filhos e seus
problemas à integridade deste trabalho.
Às crianças que permitiram investigar suas
dificuldades a serviço da pesquisa e da
ciência.
Ao meu professor e orientador Dr. Claus
Stobäus que me ouviu, me incluiu.
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a todos que
compartilham e acreditam, teorizam e
praticam a idéia de um sujeito pertencente a
todos os espaços que exigem ética, respeito
e valorização a vida na singularidade de
cada ser e, em especial, ao meu querido
Cláudio L. Dusik, que me passa que o
mundo é possível.
“Se as cores se misturam pelos campos
É que flores diferentes vivem juntas [...]”
(Roberto Carlos)
RESUMO
A presente pesquisa tem como objetivo descrever o motivo de desenvolver
uma adaptação no currículo escolar para alunos com dislexia. O estudo foi realizado
com três estudantes do ensino fundamental das escolas municipais de Esteio/RS
que chegaram para atendimento psicopedagógico no posto de saúde, cujo
diagnóstico para a dificuldade de aprendizagem era dislexia. A partir do momento
que se levantou a hipótese de que a criança ou o adolescente tivesse o transtorno,
iniciou-se o processo de investigação, sendo necessária avaliação multidisciplinar
para a conclusão do diagnóstico. Concomitante ao atendimento psicopedagógico,
investigou-se os conhecimentos que a equipe pedagógica e professores tinham
sobre dislexia e orientou-os nas defasagens de conhecimento desse transtorno,
através de textos e/ou encontros que tratam sobre o tema. As escolas foram
orientadas a trabalhar com Adaptação Curricular Individualizada para esses alunos
(ACIs) e realizou-se também atendimentos com os pais, explicando-lhes sobre o
transtorno de dislexia e orientando-os como poderiam contribuir com
desenvolvimento da aprendizagem do filho. A partir dos dados pôde-se descrever,
de modo geral, que os professores dizem ter conhecimentos "conceituais" sobre
dislexia, necessitando aprofundar os conhecimentos sobre o tema. Quanto aos
alunos, o trabalho vem mostrando resultados na diminuição do fracasso escolar e no
desenvolvimento do seu bem-estar, visto aprender a lidar com essa dificuldade. Em
relação ao motivo de desenvolver uma adaptação no currículo escolar para alunos
com dislexia, foi possível descrever que as adaptações não são rígidas nem
permanentes, à medida que a aprendizagem do aluno avança, se modifica, ou até
mesmo, quando não se está percebendo que a ACI está beneficiando a sua
aprendizagem, esta deve ser reorganizada pelos professores e equipe pedagógica.
As considerações refletem que chegar ao diagnóstico de Dislexia não é simples, e
que independente de diagnóstico precisamos conhecer em cada aluno, desde o
momento em que entra para a escola, onde ele se situa em termos de habilidades
escolares.
8
Palavras-chave: atendimento psicopedagógico. Dificuldades de aprendizagem.
Dislexia. Adaptação Curricular Individualizada.
ABSTRACT
This present research has as objective describes the reason of developing an
adaptation in the school curriculum for students with dyslexia. The study was
accomplished with three students of the fundamental education of the municipal
schools of Esteio city, RS state, that arrive for service psychopedagogic at the health
center, whose diagnostic for the learning difficulty was dyslexia. Starting from the
moment that got up the hypothesis that the child or the adolescent had the disturbed,
the investigation process began, being necessary evaluation multidiscipline for the
conclusion of the diagnostic. Concomitant to the service psychopedagogic, it is
investigated the knowledge that the pedagogic team and teachers have on dyslexia
and it guides them in the discrepancies of knowledge of this trouble, through texts
and/or encounters that treat on the theme. The schools are guided to work with
Individualized Collegiate Curricula Adjustments (ICCA) for those students and also
takes services for the parents, explaining up above dyslexia and guiding as they can
contribute with development of the son's learning. Starting from the data it could be
described, in general, that the teachers say have conceptual knowledge up above
dyslexia, needing to deepen the knowledge on the theme. Up above the students,
the work is showing results in the decrease of the school failure and in the
development of his well-being, already to learn to work with that difficulty. In relation
to the reason of developing an adaptation in the school curriculum for students with
dyslexia, it was possible to describe that the adaptations are not rigid nor permanent,
and as the student's learning advance, modifies, the ICCA is benefitting his learning,
for this cause the curricula should be reorganized by the teachers and pedagogic
team. The considerations ponders than to arrive to the diagnostic of Dyslexia it is not
simple and, independent of the diagnostic, we needed to perceive each one of the
students, early the moment he enters to the school, where he is in terms of school
abilities.
Word-key: psychopedagogic service. Learning difficulties. Dyslexia. Collegiate
Curricula Adjustments.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABD - Associação Brasileira de Dislexia
ACI - Adaptação Curricular Individualizada
CEMEI - Centro Municipal de Educação Inclusiva
FAA - Ficha de Atendimento Ambulatorial
FAR - Ficha Ambulatorial de Reuniões
LA - Laboratório de Aprendizagem
NDR - Nível do Desenvolvimento Real
NEE - Necessidade Educativa Especial
QI - Quociente de inteligência
TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
ZDP - Zona de Desenvolvimento Proximal
ZDR - Zona de Desenvolvimento Real
LISTA DE FIGURAS E TABELAS
FIGURA 1 - Produção escrita de paciente com Dislexia. Caso I. .............................. 77
FIGURA 2 - Produção escrita de paciente com Dislexia. Caso II. ............................. 82
FIGURA 3 - Produção escrita de paciente com Dislexia. Caso III. ............................ 89
TABELA 1 - Categorias de Conteúdo levantadas a partir das entrevistas ................ 90
TABELA 2 - Conhecimentos dos professores sobre dislexia por categoria .............. 90
TABELA 3 - Necessidade dos Professores de Informações sobre Adaptação
Curricular Individualizada por Categoria ............................................... 92
LISTA DE APÊNDICE E ANEXOS
APÊNDICE 1 - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ................................ 112
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15
2 REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................... 18
2.1 Diversidade, Currículo e Avaliação na Perspectiva da Inclusão .......................... 18
2.2 Transitando Pelos Estudos de Vygotsky ............................................................. 35
2.3 Características da Dislexia .................................................................................. 47
2.3.1 Leitura e dislexia .................................................................................... 49
2.3.2 Etiologia ................................................................................................. 52
2.3.3 Classificação .......................................................................................... 52
2.3.4 Genética e dislexia ................................................................................. 54
2.3.5 Áreas cerebrais envolvidas na leitura .................................................... 55
2.3.6 Quadro clínico e diagnóstico ................................................................. 56
2.3.7 Tratamento ............................................................................................ 58
2.3.8 O que versa a Associação Brasileira de Dislexia ................................... 59
2.4 Adaptação Curricular Individualizada: Pontos e Contrapontos Estudos
que se Realizam ................................................................................................. 64
3 METODOLOGIA .................................................................................................... 66
3.1 Problema ............................................................................................................. 66
3.2 Objetivos ............................................................................................................. 66
3.2.1 Objetivo Geral ........................................................................................ 66
3.2.2 Objetivos Específicos ............................................................................. 66
3.3 Tipo de Pesquisa ................................................................................................. 67
3.4 Participantes ........................................................................................................ 67
3.5 Procedimentos .................................................................................................... 67
3.6 Instrumentos ........................................................................................................ 69
3.7 Procedimento de Análise de Dados .................................................................... 69
4 APRESENTAÇÃO DOS DADOS ........................................................................... 70
4.1 Apresentação dos Casos .................................................................................... 72
4.1.1 Caso I .................................................................................................... 72
4.1.2 Caso II ................................................................................................... 79
4.1.3 Caso III .................................................................................................. 85
14
4.2 Apresentação dos Dados das Entrevistas ........................................................... 89
5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS ............................................................... 93
5.1 Análise dos Casos ............................................................................................... 93
5.2 Discussão e Análise das Entrevistas ................................................................... 97
6 DA PESQUISA À AÇÃO: ESCOLA, FAMÍLIA, SOCIEDADE E DISLEXIA ........ 100
6.1 Proposta de ACI para a Escola ......................................................................... 100
6.2 Manejo da Família e Dislexia ............................................................................ 103
6.3 Sociedade e Dislexia ......................................................................................... 104
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 106
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 109
1 INTRODUÇÃO
A Educação Inclusiva é o espaço que se abre ou que deve, obrigatoriamente,
se abrir a todos àqueles que, por alguma razão, ficaram e/ou ficam a margem do
processo de aprendizagem. E quem são eles? São os deficientes físicos, os
sindrômicos, os deficientes mentais, o gordo, o índio, o negro, o pobre e, sem
dúvida, aqui caberia mais gente! São todos os excluídos.
Bem, se necessitamos de uma Educação Inclusiva é porque, certamente,
vivenciamos uma Educação Exclusiva no sentido não da exclusividade, mas,
contrariamente ao termo, de “deixar de fora”.
Beyer (2006, p. 28) questiona que, “[...] assim, a questão que passou a ser
formulada foi: como, de que forma, com que meios pôr em movimento ações
escolares inclusivas?” Ainda oferece possibilidades dizendo que:
Precisamos entender que as crianças são diferentes entre si. Elas são
únicas em sua forma de pensar e aprender. Todas as crianças, não apenas
as que apresentam alguma limitação ou deficiência, são especiais. Por isto,
também é errado exigir de diferentes crianças o mesmo desempenho e lidar
com elas de maneira uniforme. O ensino deve ser organizado de forma que
contemple as crianças em suas distintas capacidades.
Referente a essas reflexões, o município de Esteio/RS, local em que atuo como
Psicopedagoga, na Secretaria Municipal de Saúde, vem implementando a Política
de Educação Inclusiva. Para tanto, propõe-se a promover a participação e novas
relações entre alunos, que são fundamentais para uma socialização humanizadora.
São necessárias novas relações pedagógicas, centradas nas formas de aprender, e
de melhores relações sociais, que valorizem a diversidade em todas as instâncias,
construindo uma sociedade mais inclusiva e mais justa.
Assim, a presente pesquisa intenta descrever uma das ferramentas da
Educação Inclusiva para alunos com dislexia: a Adaptação Curricular Individualizada
ACI.
Para tanto, faz-se necessário um considerável estudo sobre o assunto, revendo
conceitos de autores contemporâneos que, em alguns momentos, não tratam
especificamente sobre esse transtorno de aprendizagem, mas que possibilitam
16
realizar nexos, como formas de (re) pensar uma aprendizagem que contemple a
todos, considerando o que é possível para cada ser, ou seja, as especificidades de
cada um.
Então, esta pesquisa pretende descrever os objetivos, todos e
procedimentos desenvolvidos na construção da Adaptação Curricular, desde a
identificação do aluno e os primeiros contatos com o Centro Municipal de Educação
Inclusiva, até a contribuição do/a Psicopedagogo/a nessa efetivação de um auxiliar a
adaptar o currículo escolar para esse aluno.
Na Revisão Teórica, capítulo 2, no subcapítulo intitulado "Diversidade, currículo
e avaliação na perspectiva da inclusão", aborda-se conceitos importantes para a
compreensão deste estudo: educação inclusiva, educação especial, deficiência,
diferença e diversidade, currículo e avaliação. O subcapítulo "Transitando pelos
estudos de Vygotsky" aborda a escola como espaço privilegiado para que a criança
desenvolva-se pelas circunstâncias da apropriação daquilo que é social, conforme
abordagem vygotskyniana.
No mesmo capítulo, descreve-se no item 2.3 as principais características do
transtorno de dislexia aqui estudado, descrevendo as principais dificuldades
causadas nos indivíduos que a possuem, a Etiologia desse transtorno, sua
classificação, as cargas genéticas, as áreas cerebrais envolvidas na leitura, bem
como elucida o quadro clínico, os procedimentos para diagnóstico e o tratamento.
Esse capítulo encerra descrevendo o que versa a Associação Brasileira de Dislexia,
uma das principais instituições que representa as pessoas acometidas desse
transtorno no Brasil. O capítulo 2.4, com o título Adaptação Curricular
Individualizada: Pontos e Contrapontos Estudos que se Realizam”, levanta-se
principais conclusões dos estudos de Maria Teresa Eglér Mantoan, Marilene da Silva
Cardoso, Eugenio González e Rosa Blanco, estudiosos contemporâneos no
assunto.
O terceiro capítulo evidencia a abordagem metodológica usada nessa
pesquisa, que é qualitativa e exploratória. O quarto capítulo apresenta os dados,
primeiramente quanto aos estudos dos casos e depois quanto às entrevistas. O
quinto capítulo analisa e discute os dados apresentados, relacionando-os com o
17
problema e objetivos desse estudo.
Rumo à finalização, o sexto capítulo procura responder o problema de
pesquisa levantado nesse estudo, ou seja, como é e por que desenvolver a
adaptação curricular individualizada para alunos com dislexia? E como o/a
Psicopedagogo/a contribui nessa construção? Assim, mostra-se uma proposta de
adaptação curricular individualizada para alunos disléxicos e considerações sobre o
manejo da família e da sociedade, finalizando então com considerações finais, que
aborda a reflexão da pesquisadora sobre todo o escopo deste estudo.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 DIVERSIDADE, CURRÍCULO E AVALIAÇÃO NA PERSPECTIVA DA
INCLUSÃO
Considerando a complexidade da escola contemporânea e os elementos que
orientam este trabalho, faz-se necessário discutirmos aqui, concisamente, alguns
conceitos importantes para a compreensão deste estudo: educação inclusiva,
educação especial, deficiência, diferença e diversidade, currículo e avaliação.
Ao longo do trabalho estes conceitos vão sendo retomados, estudados e
analisados, dado a importância destes para a constituição desta pesquisa.
a) Educação Inclusiva
Hugo Otto Beyer (2006, p. 28) nos diz:
A primeira condição para a educação inclusiva não custa dinheiro: ela exige
uma nova forma de pensar. Precisamos entender que as crianças são
diferentes entre si. Elas são únicas em sua forma de pensar e aprender.
Todas as crianças, não apenas as que apresentam alguma limitação ou
deficiência, o especiais. Por isto, também é errado exigir de diferentes
crianças o mesmo desempenho e lidar com elas de maneira uniforme. O
ensino deve ser organizado de forma que contemple as crianças em suas
distintas capacidades.
Possivelmente temos o maior problema para a educação inclusiva: mexer
com as concepções, com os ranços de muitos educadores. Concepções estas que,
muitas vezes, não estão tão esclarecidas para o próprio educador! É o próprio ranço,
comodismo e conformismo que o impede de (re) olhar para uma nova proposta de
educação que, dificilmente, e torçam para isto, voltará a ser segregadora. Sabemos
19
e jamais podemos negar a história de desprestígio social e financeiro que vive os
professores hoje, principalmente àqueles que pertencem à rede pública de ensino.
Sabemos também dos problemas de indisciplina com alunos e da carga horária
excessiva de trabalho. Contudo, precisamos acreditar que estas dificuldades não
podem impedir e impossibilitar uma nova forma de agir e fazer com os alunos. Que
direitos temos de negar ao outro o que lhe é de direito por dificuldades nossas?
Educar, numa perspectiva inclusiva, considerando então toda a
complexidade da escola atual, nos remete, sem possibilidades de escolhas, se é na
educação o desejo de permanecer ao (re) compromisso da responsabilidade e da
ética que nos outorga a prática pedagógica.
b) Educação Especial
Parece necessário quando se fala ou se escreve sobre Educação Especial,
contextualizá-la e dizê-la de como foi pensada e proposta nos diferentes períodos
históricos pelos quais passou e vem passando.
Ao longo da história, como nos escreve Lara (2007), a educação de pessoas
com necessidades educacionais especiais utilizou muitas terminologias para
designar estas pessoas, variando conforme a época e os diferentes enfoques, entre
eles o clínico e o pedagógico. Fato esse que exigiu o ressignificado de concepções e
o surgimento de novos paradigmas educacionais. Estes fatos trouxeram
significativos avanços para a compreensão e aceitação das pessoas de modo geral
no sentido de acolhimento e pertencimento, sem a preocupação preconceituosa de
ser ou não deficiente. Para tanto, muitos foram os movimentos e as lutas na busca
por respeito, dignidade, liberdade, educação, trabalho, saúde e, principalmente, por
equiparação de oportunidades.
Precisamos romper as barreiras cognitivas, arquitetônicas, emocionais, de
atitudes e de comunicação, que dificultam o desenvolvimento dos seres humanos,
sejam quais forem suas origens, raças, culturas religiões, opções sexuais e
ideológicas, condições sociais, físicas, homens ou mulheres, prossegue a autora. As
iniciativas no Brasil, ainda são tímidas, no entanto, o trabalho de conscientização
20
apresenta alguns resultados positivos e, certamente, a educação desempenha um
papel preponderante na efetivação de metas que visam diminuir as desigualdades
sociais.
Sabemos que a Educação Especial faz parte da Educação Brasileira desde
a década de sessenta, através da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
nº. 4024/61, em seus artigos 88 e 89 no título 10 - da Educação de Excepcionais.
A terminologia excepcional, termo utilizado na época, extremamente
estigmatizante e pejorativo, foi sendo substituído por outros, embasado em novas
concepções de ser humano e sociedade.
No artigo 89 ficou evidenciado um forte comprometimento com a iniciativa
privada, e uma indefinição dos poderes públicos com a educação dos
“excepcionais”, marcando notoriamente a época do período ditatorial no Brasil.
Na década de setenta surgiu a LDB 5692/71, com um artigo, o 9º, gerando
grande polêmica em relação a dois pontos principais. O primeiro diz respeito às
deficiências pontuadas no texto do artigo (físicas e mentais), ignorando as demais
deficiências, ou incluindo-as na categoria de deficiências físicas. O segundo ponto
se refere àqueles que se encontram em atraso considerável enquanto a idade
regular de matrícula”, o que ocasionou uma grande confusão, aumentando o
alunado da educação especial, muitos deles encaminhados erroneamente para o
tratamento especial, sem serem deficientes.
A atual LDB/96 avançou consideravelmente, em relação às demais, pois
garante um capítulo exclusivo à Educação Especial e esclarece que cabe ao Estado
se responsabilizar pelo atendimento especializado, o que deve iniciar na Educação
Infantil. É uma lei com caráter democrático, flexível, abrangente e, que preconiza
enfaticamente, a inclusão educacional em todos os segmentos do Sistema
Educacional Brasileiro.
No entanto, nenhum dispositivo legal tem um chamamento tão forte para a
inclusão quanto a Declaração de Salamanca, como ficou conhecida a Conferência
Mundial de Educação Especial. Foi um encontro acontecido em Salamanca, na
Espanha, entre os dias 7 e 10 de junho de 1994, com o objetivo de promover a
21
Educação para Todos, e no qual foi assinado um documento que tratou de reafirmar
o direito universal de todos à educação. Foi esse documento assinado que
oficializou o termo inclusão no âmbito da educação.
César Coll et al, (2007), no livro Desenvolvimento Psicológico e Educação,
também apresentam sua contribuição ao registrar o caminho que vem percorrendo a
Educação Especial. Conforme os autores, o conceito de necessidades educativas
especiais começou a ser empregado nos anos 60, mas inicialmente não foi capaz
de modificar os esquemas vigentes na educação especial. A escolha do termo
necessidades educativas especiais reflete o fato de que os alunos com deficiência
ou com dificuldades significativas de aprendizagem podem apresentar necessidades
educativas de gravidades distintas em diferentes momentos. A partir dessa década,
produz-se um movimento bastante forte, impulsionado por âmbitos sociais muito
diversos, que irá provocar profundas transformações no campo da educação
especial. Os principais fatores que favorecem essas mudanças, citam os autores,
podem ser resumidos em:
1- Uma nova concepção dos transtornos do desenvolvimento e da
deficiência. A ênfase anterior nos fatores inatos e constitutivos, na estabilidade do
tempo e na possibilidade de agrupar as crianças com menos déficits nas mesmas
escolas especiais, abre caminho para uma nova visão em que não se estuda a
deficiência como uma situação interna do aluno, mas em que ela é considerada em
relação aos fatores ambientais e, particularmente, à resposta que a escola
proporciona. O sistema educacional pode intervir, portanto, para favorecer o
desenvolvimento e aprendizagem dos alunos.
2- Uma perspectiva distinta dos processos de aprendizagem e das
diferenças individuais. As novas teorias do desenvolvimento e da aprendizagem são
mais interativas e se afastam dos modelos que destacam a influência determinante
do desenvolvimento sobre a aprendizagem. Destaca-se o papel ativo do aprendiz e
a importância de que os professores levem em conta seu nível inicial de
conhecimentos e os ajudem a completá-los ou reorganizá-los. Dessa perspectiva, o
processo de ensino converte-se em uma experiência compartilhada mais
individualizada, em que não deve supor que os alunos de uma mesma sala de aula,
ainda que tenham a mesma idade ou a mesma deficiência, enfrentarão de igual
22
maneira o processo de aprendizagem. As demandas dos alunos são distintas e, por
isso, se põe em questão a prática habitual de agrupá-los exclusivamente em função
das deficiências.
3- A revisão da avaliação psicométrica. A utilização dos testes psicométricos
como o melhor método para conhecer a capacidade dos alunos começa a ser revista
de forma radical. Por um lado, considera-se que os resultados dos testes não devem
servir para classificar os alunos de forma permanente. Por outro lado, destacam-se
as possibilidades de aprendizagem dos alunos e outorga-se às escolas um papel
influente para produzir mudanças positivas. Abre-se passagem para novos sistemas
de avaliação, baseados no estudo das potencialidades de aprendizagem dos alunos.
Considera-se necessária a colaboração dos psicólogos com os professores para
avaliação dos alunos com problemas de aprendizagem. Os instrumentos de
avaliação estão mais relacionados com o currículo e têm como principal objetivo
orientar a prática educativa.
4- A presença de um maior número de professores competentes. As
reformas empreendidas em um número considerável de países também estão
voltadas à modificação dos sistemas de formação dos professores e à sua
qualificação profissional. Desse modo, reformulam-se as razões da separação entre
as escolas regulares e as de educação especial, e ampliam-se as experiências
inovadoras nas escolas em relação aos alunos que manifestam sérios problemas em
suas aprendizagens escolares.
5- A extensão da educação obrigatória. As escolas regulares têm de
enfrentar a tarefa de ensinar a todos os alunos e constatam as grandes diferenças
que existem entre eles. A generalização do ensino médio leva a uma reformulação
das funções da escola, que deve ser “compreensiva”, isto é, integradora e não-
segregadora.
6- O abandono escolar. Um número significativo de alunos abandona a
escola antes de concluir a educação obrigatória ou não termina com êxito seus
estudos básicos. O conceito de fracasso escolar, cujas causas, mesmo sendo
pouco precisas, situam-se prioritariamente em fatores sociais, culturais e educativos,
reformula as fronteiras entre a normalidade, o fracasso e a deficiência e, como
23
conseqüência disso, reformula as fronteiras entre alunos que freqüentam uma
escola regular e alunos que vão para uma escola de educação especial.
7- A avaliação das escolas da escola especial: Os resultados limitados
obtidos pelas escolas de educação especial, com maior parte dos alunos, levam a
repensar sua função. A heterogeneidade dos alunos que eram escolarizados nelas,
as escassas expectativas que se tinha sobre seus progressos e as dificuldades de
integração social posterior de seus alunos contribuem para que se estenda a idéia
de que poderia haver outras formas de escolarização para aqueles que não são
gravemente afetados.
8- As experiências positivas de integração. A integração começa a ser posta
em prática, e a avaliação de suas possibilidades contribui para criar uma atmosfera
mais agradável. A difusão da informação, a participação de setores mais amplos e
variados nesses projetos e o apoio que recebem dos gestores educacionais de
diferentes países ampliam suas repercussões e criam um clima cada vez mais
favorável à opção integradora.
9- A existência de uma corrente normalizadora no enfoque dos serviços
sociais. As formulações integradoras e normalizadoras estendem-se a todos os
serviços sociais. Algumas de suas manifestações podem ser encontradas na
aproximação dos atendimentos médicos, psicológicos e educacionais nos locais de
residência dos cidadãos, na importância cada vez maior que se atribui aos fatores
ambientais, no papel crescente dos serviços próprios da comunidade, dos quais
também participam homens e mulheres voluntários, e na relevância do enfoque
comunitário nas diferentes disciplinas relacionadas à saúde. Tudo isso conta a favor
de que todos os cidadãos se beneficiam igualmente dos mesmos serviços, o que
supõe evitar que haja sistemas paralelos que diferenciem alguns poucos da maioria.
10- Os movimentos sociais a favor da igualdade. Uma sensibilidade maior
para os direitos das minorias e para sua integração na sociedade se estende por
todos os países. Essa mudança de atitude em relação às minorias dos indivíduos
com deficiência é favorecida não apenas pela pressão dos pais e das associações
de pessoas adultas que reclamam seus direitos, mas também por movimentos
24
sociais muito mais amplos, que defendem os direitos civis das minorias raciais,
culturais ou lingüísticas.
Todos esses fatores, explicam os escritores, impulsionados da mudança e,
ao mesmo tempo, do processo de transformação, contribuíram para aceitação de
uma nova maneira de entender a deficiência a partir de uma perspectiva
educacional. São dois os fenômenos mais relevantes dessa nova aproximação: no
plano conceitual, um novo enfoque baseado na análise das necessidades
educativas especiais dos alunos; no plano da prática educativa, o desenvolvimento
da integração educativa, que impulsiona, ao mesmo tempo, mudanças na
concepção do currículo, na ordem das escolas, na formação dos professores e no
processo de ensino na sala de aula.
c) Deficiência
A deficiência gestada, adquirida ou congênita? Qual delas causa em mim
maior culpa por poder correr, olhar, caminhar, ouvir ou falar? Qual delas me faz
agradecer por ser e permanecer com o corpo perfeito e, ainda, olhar para os meus
filhos e vê-los todos crescidos e saudáveis, sem mais precisar de mim para
caminhar, tomar banho e comer? Basta, agora, continuar a amá-los.
As questões levantadas acima podem causar alívio, revolta, preocupação!
Como pode alguém falar disso assim? A forma como início é, propositadamente,
enfadonha, nojenta. De que lugar penso que falo por não estar deficiente? Sim, eu
não estou.
A maior deficiência é aquela gestada internamente por nós mesmos, por
nossos pré-conceitos que fazemos das pessoas sem ao menos informá-las. É não
acreditar e não outorgar ao outro o direito a sua vez, a sua possibilidade.
A deficiência é a falta. Mas não é a falta dos membros, dos sentidos e do
dinheiro. Tudo isso faz falta, é diferente. A deficiência é a arrogância, a falta de
25
caráter, o preconceito, a falta de humildade, a ausência de solidariedade, precisa
mais? Sim, precisa.
No âmbito escolar, receber um aluno com deficiência não basta para dar
conta de algo muito maior, que é a questão da aprendizagem deste aluno. Sim, da
aprendizagem. Obviamente sabemos que boas intenções, bom trato e afetividade,
são muito importantes para todos os alunos, não somente para quem tem algum tipo
de deficiência, é necessário, mas a escola tem uma função, um papel social muito
importante que é dar conta da aprendizagem de todos os seus alunos, inclusive do
aluno com deficiências, considerando suas condições orgânicas, físicas e psíquicas.
Somente socialização não serve, pois existem outros espaços de socialização, mas
o espaço para aprender, ao menos a ler e escrever, é a escola, não tenhamos
dúvidas disso. Quem vai ter que responder como o deficiente aprende é a escola.
Isso mesmo! Nós os professores! Quem mais irá responder a esta questão? Os
médicos!? Não, não entreguemos aos outros profissionais o que é função nossa! Os
arquitetos e engenheiros estão cuidando das barreiras arquitetônicas. Sim, eu não
sei planejar rampas de acesso, elevadores, banheiros e outros meios que facilitam o
acesso aos deficientes físicos. Você sabe? Os médicos irão dar o diagnóstico e
prescrever a medicação quando necessário. Eu também não me autorizo a fazer
isso, nem devo. Agora, professores, podemos e devemos buscar informações,
estudarmos para darmos conta do que é nosso: o ensino. O encontro e diálogo com
outros profissionais, certamente, é muito importante, mas não nos isenta de nossa
função. Que fique claro isso!
Também é de nosso conhecimento que as condições para a inclusão do
aluno com deficiência precisam, urgentemente, serem oferecidas. afeto e
atenção não bastam. Então, cabe a nós professores, exigirmos por condições
adequadas de trabalho: redução do número de alunos nas turmas onde houver
deficiente, principalmente se for deficiência mental, síndromes; salas de aula com as
adaptações necessárias à deficiência; recurso humano de apoio quando houver
necessidade; tempo e assessoria para planejamento das aulas, principalmente
quando houver necessidade de adaptação curricular individualizada; espaço para
reuniões; investimento em formações, etc. É professores! Isso é extremamente
importante: QUERER, estar aberto à inclusão, assumir as dificuldades, mas, não
abandonar a toga e permanecer dentro das salas de aula queixosos e rançosos.
26
Hugo Otto Bayer (2006, p.66) enfatiza:
[...] para que o atendimento escolar de alunos com deficiência seja possível
no ensino regular, deve haver a tomada de consciência e a disposição de
participação no processo por parte dos vários sujeitos envolvidos (pais,
crianças, professores, gestores, etc.).
d) Diferença
O sociólogo português Boaventura Souza dos Santos havia,
inteligentemente, preconizado Devemos lutar pela igualdade quando a diferença
nos inferioriza, e lutar pela diferença quando a igualdade nos descaracteriza.” Esta
frase parece que por si só já se basta quando o assunto é a diferença.
E dentro da escola! Como lidarmos com os diferentes saberes trazidos pelos
alunos, com as diferentes concepções dos professores, com as diferentes classes
sociais dos alunos? Sim, não se espantem, dentro da escola pública e, também na
privada existem estas diferenças. Na verdade, o que precisamos é dialogar com as
diferenças. Existem opiniões, crenças e concepções diferentes umas das outras,
mas que nos permitem, repetindo, um diálogo sobre as mesmas e, esse diálogo em
alguns momentos envolve conflitos, que precisamos diferenciar de brigas, e
necessariamente, no âmbito escolar chegarmos a uma síntese do que fica melhor
para todos os que fazem parte do processo educativo.
A escola deve servir bem a todos considerando suas diferenças e, ao
mesmo tempo, oferecer igualdades de oportunidades de acesso, permanência e
aprendizagem. Isso é utopia? Sim, é a utopia possível.
e) Diversidade
Se existe um lugar para a diversidade, este lugar é a escola.
27
Como trabalhar com a diversidade encontrada na sala de aula? Se
pensarmos que temos alunos com religiões diferentes, vindos de outros estados do
Brasil e, portanto, trazem junto uma enriquecedora cultura, alunos de origem alemã,
italiana, japonesa, afrodescendentes, etc, variando a presença destes de um Estado
para o outro, ou até mesmo, de um município para o outro, de um bairro para o
outro. Em Porto Alegre, na Lomba do Pinheiro temos a aldeia Guarani, nos
municípios de Camaquã e Viamão também vivem índios. Ou seja, temos muito
próximo, culturas e saberes diferentes. Por que não organizarmos um grupo de
alunos de religiões diferentes, e poder cada um trazer um pouco da história, das
crenças de sua religião; visitarmos uma aldeia indígena para conhecer os seus
costumes, sua língua, como vivem, trazer pais de alunos de origens diversas para
falar da sua cultura, seja ela, afrobrasileira, alemã, italiana, etc.?
Estes são apenas exemplos de como é possível trabalharmos com a
diversidade em sala de aula. Isto também é conteúdo. Isto é possível, mas
evidentemente, temos que sair do lugar da queixa imobilizadora, pegar um livro e
passar o texto no quadro é o mais fácil. Entretanto, propostas muito simples, como
as apontadas, também não são difíceis e, ainda, ampliam o universo de participação
da comunidade escolar e geram prazer e aprendizagem quando bem
orientadas/organizadas. Sejamos mais audaciosos em nosso trabalho. Para
Camacho (apud STOBÄUS e MOSQUERA, 2004, p. 9):
[...] acolher e cultivar as diferenças como um elemento de valor positivo, a
abertura de um espaço pluralista e multicultural, no qual se mesclem as
cores, os gêneros, as capacidades, permitindo assim o acesso aos serviços
básicos e elementares de todos os seres humanos e a construção de uma
escola, uma educação na qual todos, sem exclusão, encontrem um
resposta educativa de acordo a suas necessidades e características
peculiares.
Sejamos mais audaciosos em nosso trabalho. As mudanças podem começar
pela minha prática, não preciso esperar para que o outro inicie, mas posso seduzi-
lo a participar também. Acreditem professores, o prazer no trabalho causa menos
dores, menos stress e, ainda, deixa algo para ser saudosamente lembrado.
28
f) Currículo escolar
Michel (2008) apresenta um estudo sobre este tema que vale a pena ser
revisto, retomado. No capítulo intitulado “A atenção à diversidade na sala de aula e
as adaptações do currículo”, do livro “Desenvolvimento psicológico e educação:
transtornos de desenvolvimento e necessidades educativas especiais”, de Coll,
Marchesi e Palácios (2004), Blanco traz a difícil e obrigatória tarefa da educação
escolar de ensinar, respeitando e considerando as necessidades, diversidade e
diferenças de cada um e, ainda, oferecendo igualdade de oportunidades. Será que a
escola consegue ou conseguirá, minimamente, atender a tudo isso?
Blanco (apud COLL, MARCHESI e PALÁCIOS, 2004) sustenta que sim, que é
possível. Mas para isso, a escola deverá sair do lugar em que se colocou, do lugar
em que tudo é para todos igualmente, esquecendo-se, parece, que a igualdade
desejada é a de direitos e oportunidades.
A autora refere, ainda, que existem necessidades educativas comuns,
compartilhadas por todos os alunos, relacionadas às aprendizagens essenciais para
o seu desenvolvimento pessoal e sua socialização, que se expressam no currículo
escolar. Porém, enfatiza que nem todos os alunos conseguem se beneficiar deste
currículo, organizado igualmente para todos, justamente porque todos não são
iguais. Existe uma diversidade de conhecimentos, experiências, ritmo e motivações
trazidas pelos alunos. Enfoca a resposta educativa à diversidade dos alunos e
uma atenção especial às adaptações curriculares individuais.
Tradicionalmente, as medidas para superar ou amenizar as dificuldades de
aprendizagem são centradas nos alunos, mas, contrariamente ao que se poderia
pensar, não são medidas que consideram as reais necessidades de cada aluno, são
medidas segregadoras, cujo foco permanece sendo unicamente ao aluno que não
aprende. Mexe-se com o aluno colocando-o em classes de reforços, escolas
especiais, entre outras nomenclaturas, mas pouco se pensa ou se faz na
perspectiva de construir um currículo que corresponda às necessidades destes
alunos. E, mesmo quando colocados separadamente, o plano continua, na maioria
das vezes, igual para aquele grupo.
Conforme a autora, existe uma tendência cada vez maior para os currículos
29
abertos e flexíveis, que permitem responder ao duplo desafio da compreensibilidade
e da diversidade. São estabelecidas aprendizagens mínimas, para assegurar que
todos os alunos adquiram certos elementos básicos da cultura e, as escolas, a partir
desses mínimos, constroem uma proposta curricular, adequando, desenvolvendo e
enriquecendo o currículo oficial em função das características dos alunos e do
contexto sociocultural de referência. A resposta à diversidade implica um currículo
que responda e atenda às necessidades educativas de todos os alunos, incluindo,
obviamente, os alunos com necessidades educativas especiais. Se a escola é para
todos, entende-se que a aprendizagem também deve acontecer para todos. No
entanto, se todos têm direito as mesmas oportunidades e pretende-se garantir o
acesso, a permanência e a qualidade de ensino é preciso que a escola reflita a
respeito e planeje de forma conjunta a ação educacional mais adequada ao seu
contexto.
A mesma autora salienta que algumas estratégias, tais como possibilitar maior
tempo para o aluno concluir as atividades e atividades complementares, podem
beneficiar os alunos com dificuldades; em alguns casos, no entanto, determinadas
necessidades individuais não podem ser resolvidas por estes meios, sendo
necessário r em prática uma série de outras ajudas, recursos e medidas
pedagógicas especiais ou de caráter extraordinário, diferentes das que requer
habitualmente à maioria dos alunos. A autora está chamando a atenção à
diversidade na sala de aula e às adaptações no currículo. A atenção deve ser
deslocada do sujeito para o ambiente, sendo fundamental a identificação dos apoios
adequados ao sujeito em cada contexto. A avaliação psicopedagógica deve servir
para orientar o processo educacional em seu contexto, facilitando a tarefa dos
professores que trabalham cotidianamente com os alunos. Deve proporcionar uma
informação relevante não para conhecer de forma completa as necessidades dos
alunos e seu contexto escolar, familiar e social, como também para fundamentar e
justificar a necessidade de mudanças na oferta educacional de caráter
extraordinário.
As colocações da autora nos remetem a pensar que, a médio e longo prazo,
não existirá mais espaço para a segregação, para a compartimentação e exclusão
das pessoas no âmbito escolar. A resposta à aprendizagem de todos está para a
escola, amparada e assessorada por profissionais como o psicopedagogo, contando
30
com o envolvimento e encorajamento de todos os professores e equipe, pois estes
chegam querer que o médico, o psicólogo, o fonoaudiólogo e outros, respondam
como os alunos aprendem. Estes profissionais, em muitos momentos,
evidentemente, serão necessários e importantes, mas esta resposta deve ser
encontrada dentro da própria instituição escolar por meio do seu currículo. A grande
tarefa de pensar e viabilizar este espaço de aprendizagem para todos, considerando
toda a diversidade, necessidades e sentimentos contraditórios que este grupo traz,
está para a comunidade escolar e, quem não estiver, ao menos, aberto a aprender a
(re) aprender e (re) construir o que está cristalizado pelo tempo, está fadado, sem
saudosismo, à extinção.
No mesmo livro, Martín (apud COLL, MARCHESI e PALACIOS, 2004), no
capítulo “Ensinar a pensar por meio do currículo”, sustenta a importância de
desenvolver a metacognição em todos os alunos, inclusive nos alunos com
necessidades educativas especiais. É descobrindo como o aluno aprende a
aprender e o próprio aluno reconhecendo-se como sujeito que aprende e, também,
como aprende, que o ensino te mais significado e valor na sua vida social,
contribuindo com sua auto-estima. Ensinar a pensar significa, portanto, ajudar os
alunos a desenvolver diferentes habilidades, que aprendam estratégias cognitivas e
que exerçam sobre elas uma relação metacognitiva. O desenvolvimento da
metacognição realiza-se precisamente mediante os sucessivos processos de
tomada de consciência. Ressalta, entre outros, a importância dos trabalhos de
Piaget ao enfoque metacognitivo de processamento de informação.
Conforme a autora, as crenças que os alunos têm acerca de sua capacidade
para enfrentar com êxito a resolução de novos problemas, o tipo de meta que se
propõem e os estilos de aprendizagem com que abordam as tarefas são os
principais fatores explicativos da importância do papel da motivação e dos padrões
atributivos na capacidade dos alunos de utilizar um pensamento estratégico. O tipo
de atribuição que os alunos fazem de seus êxitos e fracassos interagem logicamente
com tais crenças. O autoconceito acadêmico e, sobretudo, sua dimensão afetiva a
auto-estima constroem-se em interação com as atribuições que os professores e
colegas fazem da atuação do aluno ao longo de sua história escolar.
Ainda segundo a autora, se algo parece caracterizar a diferença entre alunos
31
com bom rendimento, e aqueles que apresentam grandes dificuldades de
aprendizagem, é precisamente a capacidade diferente de um e de outros para
utilizar o pensamento estratégico que lhes permite resolver problemas que nunca
enfrentaram antes e gerar novos conhecimentos. O ensino da generalização deve
ser um comprometimento básico de qualquer programa que deseja melhorar as
habilidades de pensamento dos alunos com dificuldades de aprendizagem ou com
deficiência mental. Mas problematiza: quem irá ensinar a pensar? Todas as
disciplinas? A história mostra que o que fica para todos acaba sendo de ninguém.
Martín diz, então, que é necessário compartilhar com os alunos a meta da
atividade a ser realizada. Passa ser, com isso, uma proposta da escola ensinar a
pensar por meio do currículo, e não tarefa de um professor isolado. O nível de
motivação, de envolvimento global do aluno na aprendizagem, dependerá do sentido
que confere à tarefa. O pensamento estratégico está relacionado com a riqueza da
base de conhecimentos dos alunos, ao iniciar um determinado tema é necessário
comprovar os conhecimentos prévios do aluno e trabalhar os conteúdos de que o
aluno não dispõe. O papel de mediador do professor baseia-se na linguagem. Por
meio da linguagem, o professor reconstrói as representações de seus alunos e lhes
ensina, em um plano interpessoal, a dizer a si mesmo, o que depois lhes permitirá
auto-regular seu comportamento. Todos os métodos que se propõem nos programas
de ensinar a pensar revelam esse papel nuclear da aprendizagem.
A autora prossegue ressaltando a importância de criar um clima estimulante e
de confiança na sala de aula. O clima da aula deve estimular as perguntas e as
respostas, deve valorizar todas as contribuições, deve mostrar aos alunos que
realmente se aprende com os outros e que todos aprendem. O erro é permitido e
todos estão sujeitos a ele e à busca do acerto. Quando se muda o clima da aula, os
alunos voltam a confiar na sua capacidade de aprender. Um aluno que se sente
confiante e seguro aprende melhor. Para um aluno com necessidade educativa
especial, a segurança e a confiabilidade de seus pares e professores, e o
sentimento que a partir do erro também se chega a respostas certas, lhe dará
estímulos e persistência necessária ao desenvolvimento de sua aprendizagem.
Entra a relevância de a escola estar ancorada pela assessoria de um
psicopedagogo que se proponha, de fato, a contribuir com os professores na (re)
32
construção de escolas para pensar.
Todas essas mudanças demandam uma mudança significativa de posturas e
concepções acerca de tudo que se pretenda atingir em termos de aprendizagem, de
conteúdos e programas que tenham a pretensão de ir muito além da cópia e da
escrita, mas que estabeleçam um diálogo entre o que já se sabe e o que se aprende
de novo.
Mas se estamos falando de mudanças de paradigmas/concepções e o
desenvolvimento de um currículo que beneficie, estimule e qualifique a
aprendizagem de todos os alunos, inclusive os alunos com NEEs, não podemos
passar incólumes pelo processo de avaliação. É necessário falarmos com
propriedade e seriedade sobre o processo de avaliação. Isto implica estudo. A
avaliação, por mais novo que isso possa parecer, ou propositadamente esquecido,
negligenciado, sempre teve a função diagnóstica e interventiva. Faz-se necessário,
portanto, considerando o tema que estamos abordando, discutirmos sobre a
avaliação na dimensão inclusiva.
O que é avaliar? Avaliar na Dimensão Inclusiva?! Do que e de quem estamos
falando? Aqui, intencionalmente, estamos falando da Avaliação na perspectiva da
Escola Inclusiva. Escola esta que necessita obrigatória, humana e
responsavelmente passar por uma profunda transformação na sua forma de ser, de
atuar, de pensar, na sua forma de avaliar.
Como quase toda mudança, é normal que se sinta alguma dor. Dor esta que
precisa ser enfrentada, vivenciada, superada ou, ao menos, amenizada, mas jamais
negada.
Por que avaliar na perspectiva da Inclusão causa tanto desconforto? Será que,
em algum momento, conseguimos avaliar nossos alunos, nossas ações, nossos
pais, nossos professores, etc., sem ter como único parâmetro a própria pessoa?
Temos o direito de avaliar aquilo que alguém faz por analogias? Quem nos outorga
este direito?
Voltemos às salas de aula. estão os professores com seus trezentos,
quinhentos alunos, principalmente, quando das séries finais do Ensino Fundamental.
33
E como avaliar considerando cada ser como único? Bem, se ninguém disse que era
difícil também ninguém falou que seria fácil, porque avaliar é responsabilizar-se por
“uma fatia”, no mínimo, da vida escolar de cada aluno, seja ele com Necessidade
Educativa Especial ou não.
Avaliar na dimensão inclusiva implica muito e muito mais que pensarmos na
estrutura física da escola. Estas, obviamente, o necessárias, são importantes e
facilitadoras para os deficientes físicos, assim como os recursos didáticos e
metodológicos também são importantes e necessários para todos os alunos com
NEEs e sem NEEs. A grande mudança que precisa acontecer, antes mesmo ou
concomitante com as alterações dos prédios, da contratação de professores com
domínio de linguagem de sinais, etc., é a mudança de paradigma, a mudança de
concepção do educador. Esta parece ser a mais difícil porque implica mexer, muitas
vezes, com concepções claramente preconceituosas, segregadoras, com as quais
tudo serve para todos. Nada mais!
Conforme Beyer (2006, p. 39),:
O paradigma que se propõe para a educação especial, diante das últimas
transformações paradigmáticas, é, assim, o de uma educação especial
móvel, dinâmica, deslocada dos redutos históricos da escola especial para
uma presença subsidiária nas escolas regulares. Cabe destacar, porém,
que novos conceitos e uma formação diferenciada deverá ser desenvolvida
pelo professor.
As respostas que se buscam de como o aluno com NEE aprende, como avaliar
o aluno com NEE, qual o limite de sua aprendizagem (será que existe resposta para
esta última? Alguém consegue responder qual o limite de sua própria
aprendizagem?), estão para os professores, para os pedagogos responderem. Sim.
Não entreguemos aos outros o que é tarefa nossa! Deixemos para os arquitetos e
engenheiros pensar e planejar as rampas, os banheiros, as salas de aula, etc.,
deixemos para os médicos prescrever a medicação, mas tomemos para nós
educadores, professores, o compromisso de ensinar e avaliar. Evidentemente, o
diálogo entre os profissionais é importante, mas cada um fala e responde pela sua
especificidade.
Somos educadores, professores. Sabemos e entendemos, então, de avaliação,
de ensino de alunos com NEEs. Não, não sabemos?! É passada a hora de
34
buscarmos saber. O ato pedagógico nos pertence, não duvidemos disso.
Segundo Beyer (2006, p. 57),:
Para os professores em atividade, para quem a proposta da
integração/inclusão escolar surge como um adicional “complicador”, uma
formação continuada deveria tentar propiciar ferramentas básicas, tendo em
vista sua capacitação. Evidentemente, esta formação deve ter os requisitos
essenciais para uma condução razoável do processo de ensino-
aprendizagem, desde os fundamentos conceituais da educação
integradora/inclusiva até os aspectos pedagógicos implícitos nesse
processo, tais como a metodologia de ensino, os recursos didáticos, as
formas de aprendizagem de alunos com necessidades especiais, sua
progressão escolar, as questões de avaliação e da terminalidade escolar,
etc.
Comecemos, então, a considerar que mesmo com trezentos ou quinhentos
alunos, não teremos todos esses com NEE. Desta forma, o planejamento da aula e
avaliação diferenciada será realizado para este grupo de alunos que delas
necessitam. É fácil fazer Adaptação Curricular Individualizada? Não. É possível
fazer? É. O professor precisa de apoio pedagógico? Precisa!
Beyer (2006, p. 39) destaca é importante frisar que a educação inclusiva é
pedagogicamente realizável, e prossegue (p. 41) dizendo que:
É preciso realçar que a ação pedagógica especializada nas classes
inclusivas é conduzida no contexto institucional da escola, e não
individualmente, como se tratasse de uma prática clínico-terapêutica. Tais
ações não devem desconsiderar, no entanto, as necessidades específicas
de alguns alunos. As ações são desenvolvidas no contexto da sala de aula
com todos os alunos, com intervenção mais intensa, porém, com os alunos
com necessidades especiais.
Assim, é fundamental o professor “abrir-separa a inclusão, ele necessita sair
do lugar da queixa, que imobiliza, que emperra. É comum ouvirmos nas salas dos
professores reclamações como baixo salário, indisciplina, turmas numerosas, etc.,
muitas, como as citadas, realmente pertinentes.
É bom lembrarmos que Freire (1996, p. 74), no seu livro Pedagogia da
Autonomia, já dizia:
A luta dos professores em defesa de seus direitos e de sua dignidade deve
ser entendida como um momento importante de sua prática docente,
enquanto prática ética. Não é algo que vem de fora da atividade docente,
mas algo que dela faz parte. O combate em favor da dignidade da prática
docente é tão parte dela mesma quanto dela faz parte o respeito que o
professor deve ter à identidade do educando, à sua pessoa, a seu direito de
ser. [...]. “Não o que fazer” é o discurso acomodado que não podemos
35
aceitar.
Acrescenta o autor (p. 75), no mesmo livro, questionamentos sobre:
Como ser educador, sobretudo numa perspectiva progressista, sem
aprender, com maior ou menor esforço, a conviver com os diferentes?
Como ser educador, se não desenvolvo em mim a indispensável
amorosidade aos educandos com quem me comprometo e ao próprio
processo formador de que sou parte? Não posso desgostar do que faço sob
pena de não fazê-lo bem. [...]. Aceito até abandoná-la, cansado, à procura
de melhores dias. O que não é possível é, ficando nela, aviltá-la com o
desdém de mim mesmo e dos educandos.
Podemos, então, pensar que avaliar na dimensão inclusiva implica sermos
humildes, mas sempre com a autoridade e competência necessária ao cumprirmos
nossa função de professor, de educador que, quanto mais sabe e conhece, mais
amplia o seu horizonte à busca de novos saberes.
2.2 TRANSITANDO PELOS ESTUDOS DE VYGOTSKY
A verdade precisa ser dita: Vygotsky não é leitura de fácil compreensão.
Contudo, outra verdade deve ser falada: é importante ler Vygostky. Incrivelmente o
autor pensou, pesquisou e escreveu sobre conceitos e posturas que estamos
discutindo ou (re) discutindo nos dias atuais sobre aprendizagem, desenvolvimento
humano, ensino, cultura, neurociências, etc.
No capítulo anterior citei Martín (apud COLL, MARCHESI e PALACIOS, 2004),
que refere que é necessário comprovar os conhecimentos prévios do aluno e
trabalhar os conteúdos de que o aluno não dispõe. Vygotsky já havia tratado sobre a
importância da consideração dos conhecimentos prévios trazidos pela criança,
quando escreveu sobre os conceitos de Zona de Desenvolvimento Real (ZDR) e
Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), dois níveis de desenvolvimento
apresentados pelo autor, de que tratarei mais adiante.
Considerando os conhecimentos que possuo acerca da teoria vygotskyana, a
partir das leituras e estudos realizados, assentar-me-ei também em Michel (2008),
36
me permitirei escrever sobre o seu legado teórico, pois considero importante para
sustentar os estudos e a pesquisa que venho realizando acerca das crianças com
dislexia.
A abordagem proposta por Vygotsky, que buscava uma síntese para a
psicologia, almejava integrar, numa mesma perspectiva, o ser humano enquanto
corpo e mente, enquanto ser biológico e cultural, enquanto membro de uma espécie
animal e participante de um processo histórico. Para o autor, as funções
psicológicas têm um suporte biológico, pois são produtos da atividade cerebral: a
materialidade do cérebro define limites e possibilidades para o funcionamento
psicológico. O cérebro, no entanto, o é um sistema de funções fixas e imutáveis,
mas um sistema aberto, de grande plasticidade, em constante transformação. Sua
estrutura e modos de funcionamento são moldados ao longo da história da espécie e
do desenvolvimento individual. Essa idéia de flexibilidade cerebral supõe a presença
de uma estrutura básica estabelecida ao longo da evolução da espécie, que cada
um de seus membros traz consigo ao nascer.
Para Vygotsky, o fundamento do funcionamento psicológico tipicamente
humano é cultural e, portanto, histórico. Os elementos mediadores na relação entre
homem e o mundo são construídos nas relações entre os homens. O ser humano
transforma-se de biológico em histórico, num processo em que a cultura é parte
essencial da constituição da natureza humana. O sujeito humano é constituído por
aquilo que é herdado fisicamente e pela experiência individual, mas sua vida, seu
trabalho, seu comportamento também se baseiam claramente na experiência
histórica e social. Isto é, aquilo que não foi vivenciado pessoalmente pelo sujeito,
mas está na experiência dos outros e nas conquistas acumuladas pelas gerações
que o precederam.
Vygotsky aliava duas preocupações muito distintas: um projeto de construir
uma nova psicologia e um projeto de construir uma nova sociedade. Nesse sentido,
ao articular seus interesses, intenso relevo às condições em que a vida humana
se processa, acreditando que o ser humano pode constituir-se enquanto sujeito de
várias maneiras, dependendo das situações concretas em que vive. É pela
apropriação ativa, que se dá nas e pelas interações humanas organizadas em
atividades, que os seres humanos constituem-se como sujeitos capazes de pensar
37
autonomamente, distanciando-se de seu ambiente imediato para melhor analisá-lo,
percebendo suas falhas e encaminhando soluções. Assim, em sua visão, a escola
constitui-se em espaço privilegiado para que a criança se aproprie das conquistas
das gerações precedentes, na medida em que nela se conta com o amparo e o
auxílio de membros mais experientes da cultura, na difícil empreitada de construir
uma visão própria e crítica do real.
Vygotsky não chega a construir uma escola de psicologia. Sua contribuição
está em ter esboçado, em suas linhas gerais, o caminho para alcançar uma
psicologia com inspiração no materialismo dialético, que encara o desenvolvimento
humano como sendo constituído pelas circunstâncias do ambiente físico e social em
que se dá. O autor parte do pressuposto que o desenvolvimento humano se em
razão de sujeito e objeto (meio físico e social) manterem entre si relações recíprocas
e contínuas. É, portanto, um autor que se vincula à corrente interacionista em
psicologia.
Mas o que se entende por “interacionismo”? Trata-se de uma abordagem que,
em psicologia, estuda as trocas que se estabelecem entre o homem e a realidade
em que vive, elucidando, de um lado, o impacto do sujeito sobre o meio físico e
social e, de outro, o papel desse meio na construção do sujeito. Vygostky envereda
por um interacionismo de cunho cio-histórico, no qual salienta as interações do
sujeito com o objeto, apontando que a ação do primeiro sobre o segundo passa,
necessariamente, pela mediação social. Daí sua proposta ser conhecida como
sócio-interacionista. O autor discorda de que a evolução da inteligência seja da
mesma natureza que a evolução biológica.
Ao contrário, Vygotsky salienta que o desenvolvimento não se a partir da
maturação e sim da apropriação daquilo que é social. O desenvolvimento das
funções psicológicas superiores não é genético, mas apropriativo de um psiquismo
que é historicamente acumulado sob forma de relações sociais entre os homens. É
por meio da relação com os adultos ou companheiros que as gerações mais novas
se apropriam de formas mais abstratas de pensar; por sua vez, serão efetivas
para a sobrevivência se conseguirem superar as anteriores, mais antigas e
concretas, constituídas na experiência pessoal de cada um.
38
Por isso, o autor considera que as formas mais elevadas do pensamento
aparecem antes da vida coletiva e, mais tarde, levam ao desenvolvimento da
reflexão, na conduta humana. Assim, as funções psicológicas superiores são, antes
de qualquer coisa, relações reais entre os homens: o social está, sempre, em sua
origem.
Vygotsky assume a posição de que o ser humano, tão logo nasce, vê-se
envolvido em um mundo eminentemente social. É justamente em razão de
encontrar-se embebido nesse entorno humanizado e, portanto, cultural e histórico,
que o bebê humano pode sobreviver. Assim, todo trabalho do desenvolvimento
consiste em converter o plano biológico, próprio da espécie, no plano social,
mediante a cultura em que se processa. Essa cultura é internalizada por meio de
mecanismos de mediação simbólica, de maneira que, paulatinamente, o sujeito
biológico converte-se em sujeito humano que, por sua vez, re-estrutura também o
plano do social. Postula-se, dessa forma, a presença de mecanismos de
internalização, pelos quais, a partir do plano interpessoal, o bebê eleva suas formas
de ação individual, incidindo no plano social e, assim, sucessivamente.
Entende-se por internalização uma série de transformações, das quais talvez a
principal delas seja aquela em que o processo interpessoal (externo) converte-se em
um processo intrapessoal (interno). O interessante dessa formulação é que, para
Vygotsky, o externo o meio social não é outra coisa do que o interno o
psiquismo individual. De fato, se a mediação é simbólica, ela atua tanto nos
indivíduos como fora deles. Desse modo, postula que todas as funções superiores
da criança (atenção voluntária, memória lógica, formação de conceitos, etc.) não
passam de “relações reais entre os homens”. Chega-se, assim, à constatação de
que, muito embora haja apenas um psiquismo, ele é constituído por duas formas
que nele se opõe: a externa e a interna.
Desta maneira, o desenvolvimento é entendido como engendrado no embate
entre o interno e o externo, na contradição interna desses dois momentos
indissociáveis e, não obstante, separados do psiquismo humano em suas formas
superiores. Cada um deles manifesta-se como negação do outro; o psiquismo
individual re-elabora constantemente as relações reais entre os homens, as quais,
por sua vez, impulsionam o psiquismo individual a re-trabalhar a si próprio. Assim,
39
ao longo de desenvolvimento, a pessoa torna-se para si aquilo que ela é em si, por
meio do que representa para os outros.
Vygostky a criança como alguém ativo, mas vai mais além. Em sua
concepção, a criança além de ativa é, essencialmente, interativa. Na verdade,
diferente de outras teorias psicológicas, a sócio-histórica o psiquismo humano
como uma construção social, que resulta da apropriação, por parte do sujeito, dos
conhecimentos e das produções culturais da sociedade em que vive, por intermédio
da mediação da própria sociedade. Entende mediação como necessária intervenção
de algo entre duas coisas para que um tipo específico de relação se estabeleça.
Esse algo, na visão vigotskyana, é um outro, um parceiro mais experiente,
seja ele um adulto ou um parceiro da mesma idade. Existem muitos e diversificados
mecanismos de mediação nas relações entre as pessoas, notadamente em virtude
da complexidade da vida em sociedade. Diferentemente de outras espécies animais,
que orientam sua conduta por mecanismos inatos e instintivos, o ser humano cria
instrumentos de ordem física e simbólica, que passam a ser utilizados para
conhecer, criticar e transformar o mundo que o cerca, comunicar suas idéias e
experiências e construir novas formas de pensar.
Vygotsky dá especial ênfase à mediação dos sistemas de signos, ou seja, à
mediação simbólica. Por meio dela, os sujeitos humanos são constituintes e
constituídos, sempre enquanto relações sociais internalizadas. Dito de outra forma,
o ser humano, para sobreviver e ser, constrói uma realidade humana e, nesse
processo, constrói também a si mesmo. É, portanto, na e pela interação com outros
sujeitos humanos, na atividade humana, que formas de pensar são construídas e/ou
transformadas, por sua vez transformando também o entorno. Pode-se dizer,
portanto, que é pela apropriação e internalização do saber e do fazer da comunidade
em que o sujeito se insere, que ele se constitui enquanto tal e, ao ser assim
constituído, constitui também sua comunidade.
A concepção vygotskyana a respeito da relação linguagem/pensamento elegeu
a categoria atividade como a unidade de análise própria da psicologia, por
conservar as características fundamentais das funções psicológicas mais complexas
do ser humano, desde as mais simples associações estímulo/resposta a as
40
produções culturais mais elevadas do ser humano (os sistemas religiosos, éticos, a
produção do conhecimento). Preocupado coma questão da criação humana,
Vygotsky ênfase às atividades que se voltam mais para as pessoas do que para
a natureza, entendendo que as primeiras, por causarem impacto sobre os outros
seres humanos, transformam-se em atividades significativas.
Assim é que o bebê, vivendo em um mundo humanizado, humaniza-se no
decorrer das múltiplas e variadas interações que mantém com o grupo social,
reconstruindo, em si mesmo, aquilo que foi conquista das gerações anteriores. O
processo de apropriação, que se pela intermediação da linguagem ao longo das
atividades humanas, não pode, contudo, ser entendido como mera reprodução, no
indivíduo, daquilo que se passa no plano do social. Admitir isso equivaleria a aceitar
o determinismo do social sobre o sujeito, algo que os próprios pressupostos da
corrente sócio-histórica negam com veemência.
É, pois, na e pelas interações dos homens que os signos se originam, vindo a
construir instrumentos que permitem a troca e a comunicação entre as pessoas. Ora,
os signos são palavras, e a palavra é parte inerente da linguagem. Ao privilegiar os
instrumentos simbólicos (que regulam as ações sobre o psiquismo das pessoas)
sobre os físicos (que regulam as ações sobre os objetos), Vygotsky faz da
linguagem o ponto nodal de sua teoria. Sua unidade de análise é, então, o
significado da palavra, uma vez que este faz parte tanto da linguagem (enquanto
sonoridade) quanto do pensamento (enquanto conceito).
A linguagem torna-se, assim, um aspecto central dessa abordagem, visto sua
aquisição, ou seja, a incorporação de signos à atividade prática, permitir a
transformação de funções psicológicas elementares, de origem biológica, em
funções psicológicas superiores, de origem sócio-cultural. Adicionalmente, a
linguagem, criada na e por intermédio da atividade humana, permite que esta última
organize-se, que seja planejada em função de seus fins. Convém ressaltar, no
entanto, que se a aquisição da linguagem é uma conquista importante do
desenvolvimento, a criança, ao nascer, encontra-se mergulhada no campo do
simbólico, sendo dele parte integrante, na medida em que suas ações são, sempre,
significantes para os outros, que lhes atribuem significado específico em um sistema
de condutas sociais.
41
Instrumentos de interação, os signos, além de propiciarem a comunicação,
cumprem um papel central na regulação da conduta humana: de regulação externa,
próxima aos estímulos e aos processos de condicionamento, passam para uma
regulação de caráter interpessoal, até serem paulatinamente internalizados,
convertendo-se em instrumentos internos e objetivos da relação que cada indivíduo
mantém consigo mesmo.
Assim origina-se, para Vygotsky, a consciência humana, entendida como
experiência das muitas experiências: por meio da internalização dos instrumentos de
relação entre pessoas (os signos). Com isso, a consciência tem origem e natureza
social, sendo semioticamente estruturada, melhor dizendo, semanticamente
estruturada. A consciência é entendida, tal como as funções psicológicas superiores,
como mecanismos de significação, ou seja, como formas que apreendem o real não
de maneira direta e imediata, e sim através de categorias e conceitos, cujo
significado muda ao longo do desenvolvimento. Isso posto, pode-se compreender
melhor como Vygotsky concebe a articulação linguagem/pensamento.
Seu postulado central é o de que a conexão pensamento/linguagem tem sua
origem no desenvolvimento e torna-se mais estreita em seu decorrer, constituindo o
pensamento verbal, ou seja, a base essencial da estrutura semântica da
consciência. A linguagem permite a construção de conceitos elementos centrais do
pensamento e a construção deste último adquire conseqüentemente, uma
formulação lingüística, de modo que a linguagem se converte em ferramenta do
pensamento. Dessa forma, pensamento e linguagem, a despeito de terem origens
genéticas distintas, acabam por se fundir, dialeticamente, ao longo do
desenvolvimento: linguagem converte-se em pensamento e pensamento em
linguagem.
Para Vygotsky, o desenvolvimento significa a progressiva individualização de
uma organização social de base, o que implica recolocar a questão da linguagem
egocêntrica. Ele observou, tal como Piaget, a fragmentação dessa modalidade de
fala e seu eventual desaparecimento, mas, diferentemente dele, sua proposta é a de
que a fala egocêntrica o desaparece: ela apenas submerge, dando origem à
linguagem interior. Ao estudar a linguagem egocêntrica, Vygostky nela duas
funções: primeira a objetiva, que procura regular e permitir o planejamento da
42
atividade infantil, servindo como instrumento central na resolução de problemas e,
segunda, a subjetiva, que tenta cumprir os propósitos sociais de comunicação, tal
como crêem as crianças. Dessa forma, à medida que a linguagem egocêntrica torna-
se mais independente e autônoma de sua função subjetiva, mais pobre ela torna-se
enquanto manifestação externa: deixa de ser vocalizada e parece gradualmente
desaparecer.
De fato, na visão vigotskyana, a linguagem egocêntrica vai paulatinamente
adquirindo uma estrutura cada vez mais próxima da linguagem interior. Observou,
assim, que a criança abandona a linguagem egocêntrica desvencilhando-se, aos
poucos, de vários planos. O que permanece da linguagem da fala egocêntrica é o
plano semântico, base da linguagem interna, que é, em si mesma uma função, ou
seja, constitui em grande parte um pensamento que opera por significados puros,
dinâmicos, que transitam entre a palavra e o pensamento. Parece justo supor,
assim, que cognição e linguagem se encontram intimamente vinculados para
Vygotsky, formando o que chama de pensamento verbal, que opera, basicamente,
via puro significados.
Para Vygotsky o desenvolvimento cognitivo é um processo dialético
extremamente complexo, que mantém relações recíprocas e contínuas com a
aprendizagem: esta se converte em desenvolvimento, o qual, por sua vez, abre
novos patamares de aprendizagem. Nesse modelo teórico, a aprendizagem torna-
se condição essencial para a transformação qualitativa das funções psicológicas
elementares em funções psicológicas superiores. A aprendizagem o se constitui,
conseqüentemente, na concepção de Vygotsky, em algo que decorre do
desenvolvimento, tal como postula Piaget. De igual modo, não se confunde com
desenvolvimento, como apregoam os ambientalistas.
Na verdade, o desenvolvimento, que supõe a construção de funções
psicológicas superiores exige que se suponha a presença de processos de
apropriação e internalização de instrumentos simbólicos, por meio da interação que
se estabelece na e pela atividade. Esses aspectos, por sua vez, colocam a
aprendizagem humana como sendo de natureza essencialmente social, permitindo
às crianças alcançarem as formas de pensar daqueles que às rodeiam.
43
Dessa forma, a maturação biológica não pode produzir, por si só, funções
psicológicas superiores: sua construção implica o uso de sinais, símbolos e signos,
que nada mais são do que instrumentos que permitem a interação e,
conseqüentemente, a realização da atividade. Ora, instrumentos de interação
requerem, necessariamente, a presença de outros membros da espécie, em uma
determinada cultura, tempo e espaço.
A aprendizagem é, então, entendida como aquilo que é apropriado e
internalizado nas relações sociais estabelecidas, ocorrendo, convém ressaltar,
quando os instrumentos e as pautas de interação o passíveis de serem
apropriados, ou seja, precisam não estar muito distante do Nível do
Desenvolvimento Real (NDR). Para melhor elucidar a concepção de Vygotsky sobre
a relação desenvolvimento/aprendizagem, cabe explicitar dois conceitos
importantes, conforme mencionado no início desse capítulo: o de Zona de
Desenvolvimento Proximal (ZDP) e Zona de Desenvolvimento Real (ZDR).
Concomitante às explicitações destes conceitos, surgem, neste momento, as
amarrações cabíveis ao tema, objeto de estudo desse trabalho Crianças
Disléxicas e ACIs - e vai se justificando, também, porque foi necessária toda uma
transitação pela teoria vygotskyana.
Segundo Vygostky, para instruir ou ensinar uma criança faz-se necessário que
se conheça aquilo que ela já consegue fazer sozinha, ou seja, sem ajuda do outro. A
esse patamar evolutivo -se o nome de nível de desenvolvimento real (NDR). Há,
entretanto, que se considerar outro aspecto: aquilo que a criança ainda não realiza
por si mesma, mas que o faz mediante o auxílio do outro. O conjunto de atividades
que a criança é capaz de resolver quando conta com a ajuda ou orientação de
membros mais experientes da espécie, sejam eles adultos ou companheiros de
mesma idade, define-se como nível de desenvolvimento proximal (NDP).
Ora, o conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP) diz respeito à
“distância” entre o nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento
proximal: entre aquilo que a criança já faz de forma independente e aquilo que, para
ser solucionado, requer ainda o concurso de outros, considerados sempre como
agentes de desenvolvimento. Esse conceito elucida bem a visão Vygotskyana de
desenvolvimento: a apropriação e internalização de instrumentos proporcionados por
44
agentes culturais de interação, que levam à elaboração de funções psicológicas que
estavam próximas de se completar e que, em se completando, propiciam novas
aprendizagens.
Essa definição traz a vantagem adicional de propiciar uma forma alternativa de
encarar o desenvolvimento: volta-se para o futuro, para aquilo que ainda nele não
ocorreu, mas que, proximamente, ocorrerá. As implicações práticas dessa
perspectiva não podem ser menosprezadas: o desenvolvimento humano só pode ser
concebido em suas inter-relações com a aprendizagem humana que, por sua vez,
decorre necessariamente da relação com os outros. Nesse sentido, aprendizagem
produz desenvolvimento e esse possibilita novas condições para a aprendizagem,
sempre em um contexto interativo, ou seja, de interlocução que se dá na atividade.
Mesmo sendo tema do capítulo posterior, cabe aqui dar um breve conceito de
dislexia. A Associação Brasileira de Dislexia (ABD, 2007) define dislexia como “um
distúrbio ou transtorno de aprendizagem na área da leitura, escrita e soletração.
Considerando todo o esboço feito aqui da teoria vygotskyana, acrescidos das
discussões propostas no capítulo Diversidade, currículo e avaliação na perspectiva
da inclusão, podemos propor que para trabalhar e avaliar alunos disléxicos, ou com
qualquer outra dificuldade de aprendizagem ou até mesmo alunos que não
apresentam dificuldades, contudo não vamos nos afastar do tema proposto nesse
trabalho, que são os alunos com dislexia é necessário conhecermos a história
prévia deste sujeito.
Normalmente, quando se chega ao diagnóstico de dislexia, o aluno está pela
série do ensino fundamental. Isto porque se considera que nos dois primeiros
anos, ele está em de processo de alfabetização e, quando muito, se a equipe
pedagógica e pais sabem algo deste transtorno, podem pensar que é uma criança
de risco, mas ainda ficam na espera e não a encaminham logo para uma avaliação
psicopedagógica. Isso resulta, muitas vezes, em um processo de reprovação na
escola e, quando se chega ao diagnóstico, normalmente, uma defasagem
série/idade. Isto posto, é importante dizer que não existem crianças com mais ou
com menos dislexia. Existem crianças disléxicas.
O que vai interferir no seu desenvolvimento escolar é justamente a apropriação
45
das condições favoráveis ou não de acesso ao mundo da leitura e escrita até chegar
à escola. Sim, vida antes de chegar à escola. alguém na família com
diagnóstico de dislexia ou que não conseguiu aprender a ler e escrever mesmo indo
à escola? Esta criança tinha, minimamente, contato com livros, histórias, lápis etc.?
Seus pais ou responsáveis contavam histórias para ela ouvir? Davam livros para que
ela, através das gravuras, contasse histórias? Ou seja, precisamos saber onde ela
está em seu nível de desenvolvimento de leitura, o que ela já consegue ler e
escrever sozinha, qual seu nível de desenvolvimento real? A partir destes
conhecimentos podemos ajudá-la a contornar suas dificuldades. Exatamente,
contornar, amenizar, lidar com a dificuldade, porque o disléxico sempre será
disléxico, ele não será um leitor fluente/lexical, contudo poderá seguir qualquer
profissão desde que sejam oferecidas condições apropriadas para o
desenvolvimento de sua aprendizagem. A apropriação de sua história, que fique
claro, serve como referência para o planejamento, também, da adaptação curricular
a ser realizada. Crianças com dislexia provenientes de ambientes estimuladores,
provavelmente, terão maiores facilidades em lidar com o transtorno.
Em nenhum momento, portanto, podemos pensar que crianças que chegam à
escola com poucos estímulos ambientais e que sejam diagnosticadas com dislexia,
estejam fadadas ao fracasso escolar, esse é o determinismo ambiental que
Vygotsky rejeitou. Reiterando, a apropriação da sua história prévia, seu nível de
desenvolvimento real será o “fundamento” para a realização da adaptação curricular
individualizada.
De acordo com o modelo histórico-cultural, os traços de cada ser humano
estão intimamente relacionados ao aprendizado, à apropriação (por intermédio das
pessoas mais experientes, da linguagem e outros mediadores) do legado do seu
grupo cultural (sistemas de representação, formas de pensar e agir). O
comportamento e a capacidade de um determinado indivíduo dependerão de suas
experiências, de sua história educativa, que, por sua vez, sempre terão relações
com as características do grupo social e da época em que ele se insere. Assim, a
singularidade de cada indivíduo não resulta de fatores isolados (por exemplo,
exclusivamente da educação familiar recebida, do contexto sócio-político da época
em que viveu, da classe social a que pertence etc.), mas da multiplicidade de
influências que recaem sobre o sujeito no curso do seu desenvolvimento. O modo
46
pelo qual o sujeito melhor conseguirá desenvolver habilidades para a sua
aprendizagem dependerá da constituição do próprio sujeito e às inferências a ele
propostas.
Não podemos ter a pretensão ou cometer o equívoco de termos as mesmas
respostas para todos os indivíduos. De acordo com a abordagem histórico-cultural,
não é possível pressupor efeitos universais e homogêneos da escolarização. Não é
qualquer escola, nem qualquer prática pedagógica que proporcionará ao indivíduo a
possibilidade de desenvolver funções psíquicas mais elaboradas. Essa perspectiva
teórica aponta claramente que o impacto da escolarização dependerá da qualidade
do trabalho realizado. Vygotsky evidencia que o ensino é efetivo e eficaz quando
se adianta ao desenvolvimento: a qualidade do trabalho pedagógico está, portanto,
necessariamente associada à capacidade de promoção de avanços no
desenvolvimento do aluno.
Tal posição fundamenta-se no conceito de zona de desenvolvimento proximal,
que postula a importância da atuação de elementos mais experientes para que
determinadas competências dos estudantes possam se transformar em conquistas.
Para o bem ou para mal, ninguém nasce com manual de instruções, caso fosse
assim, daríamos consultorias. Contudo, não podemos nos eximir de nossa
responsabilidade de buscarmos referências teóricas que fortaleçam nossa prática.
As crianças não aprendem sozinhas, elas precisam do outro, como nos informa
Vygotsky, ou seja, é necessária a referência, o modelo. Nós, adultos, também
precisamos do outro para aprender a (re) aprender.
Nessa perspectiva, é o aprendizado que possibilita, movimenta e impulsiona o
desenvolvimento. O aprendizado é, portanto, o aspecto necessário e universal, uma
espécie de garantia do desenvolvimento das características psicológicas
especificamente humanas e culturalmente organizadas.
Embora Vygotsky refira-se à educação e ao aprendizado num sentido amplo, é
possível identificar, em sua obra, várias passagens em que dirige a sua atenção
especialmente à educação e ao aprendizado escolar. Ele postula que a escola, por
oferecer conteúdos e desenvolver modalidades de pensamento bastante
específicas, tem um papel diferente e insubstituível na apropriação, pelo sujeito, da
47
experiência culturalmente acumulada. Justamente por isso, ela representa o
elemento imprescindível para a realização plena do desenvolvimento dos indivíduos
(que vivem em sociedades escolarizadas), que promove um modo mais
sofisticado de analisar e generalizar os elementos da realidade: o pensamento
conceitual.
Por essa razão, o estudo dos processos de formação e a diferenciação entre
os conceitos cotidianos e científicos ocupam lugar de destaque em seus trabalhos.
Ele chama de conceitos cotidianos (ou espontâneos) aqueles que são adquiridos
pela criança fora do contexto escolar ou de qualquer instituição formal; são os
conceitos formados no curso da atividade prática e nas relações comunicativas
travadas em seu dia-a-dia. os conceitos científicos seriam aqueles desenvolvidos
no processo de assimilação de conhecimentos comunicados sistematicamente à
criança durante o ensino escolar.
As atividades educativas na instituição escolar, diversamente do que ocorre no
cotidiano extra-escolar, são sistemáticas, tem uma intencionalidade deliberada em
um compromisso explícito (legitimado historicamente) em tornar acessível o
conhecimento formalmente organizado. Em tal contexto, os estudantes são
desafiados a entender as bases dos sistemas de concepção científicas, a realizar
abstrações e generalizações mais amplas acerca da realidade (que, por sua vez,
transformam os modos de utilização da linguagem) e a tomar consciência de seus
próprios conceitos mentais (metacognição). A interação com estes conhecimentos
possibilita ao sujeito novas formas de pensamento, de inserção e atuação em seu
meio: na medida em que expande seus conhecimentos, o indivíduo modifica sua
relação cognitiva com o mundo. Em síntese, as premissas vygotskyanas ressaltam o
papel crucial que a cultura escolar tem sobre o comportamento e o desenvolvimento
de funções psicológicas superiores.
2.3 CARACTERÍSTICAS DA DISLEXIA
Para definir dislexia, faz-se necessário definir antes leitura. Colomer e Camps
(2002) definem que a leitura consiste em um complexo conjunto de habilidades que
48
incluem: reconhecimento das palavras impressas, determinação do significado de
palavras e frases e coordenação desses significados dentro do contexto geral do
tema.
Freire (1995) relata que a leitura é a capacidade de tirar conclusões utilizando
mais do que as informações coletadas no texto, ou seja, capacidade de levantar
hipóteses, de conceber novas idéias e soluções, a partir da experiência da leitura.
O livro Transtornos da Aprendizagem: abordagem neurobiológica e
multidisciplinar (ROTTA etal., 2006) apresenta um considerável e importante estudo,
realizado por médicos, psicólogos, fonoaudiólogos e psicopedagogos sobre dislexia,
que vale apontar aqui algumas informações.
Segundo Rotta et al. (2006, p. 152),:
Fala-se de leitura em sentido estrito quando nossa atenção se dirige para
um texto escrito, não estando em jogo sua extensão ou complexidade. O
texto pode conter apenas uma palavra ou pode estar expresso em muitas
delas; como servir como aviso ou chamada; pode servir para expor
sentimentos e idéias, ou para estimular a reflexão. A leitura é, portanto, uma
forma de dar sentido ao que está escrito, e não de decodificar a palavra em
sons.
Nos Estados Unidos, relatam Rotta e Pedroso (2006), em 1937, o neurologista
americano Samuel Orton desenvolveu um trabalho de grande relevância, tendo suas
descobertas apresentado perspectivas inovadoras. Inicialmente pensou que a
dislexia seria causada por um problema no sistema visual (os sinais mais evidentes
na dislexia manifestavam-se na escrita: substituições de letras, erros de sequência,
etc.). Posteriormente, apercebeu-se a relação entre a dislexia e a linguagem oral,
passou a utilizar a designação de Alexia do Desenvolvimento, e preconizou a
necessidade de uma intervenção terapêutica individualizada, multissensorial,
estruturada, sistemática, sequencial e cumulativa. Propôs que as dificuldades de
leitura fossem devidas ao que chamam de reversões, que podiam ser de dois tipos.
O primeiro tipo consistia em confundir letras de mesma forma, mas de orientação
diferente, como b e d. O segundo tipo consistia em reverter, parcial ou totalmente, a
ordem das letras em palavras.
Sugeriu que o fenômeno era provocado por imagens competitivas nos dois
hemisférios cerebrais devido à falência em estabelecer dominância cerebral
49
unilateral e consistência perceptiva. Denominou essa condição de estrefossimbolia,
símbolos invertidos, denominação ainda aceita como um dos principais sinais de
diagnóstico de dislexia. Estudou famílias de disléxicos e encontrou algumas
alterações, como escrita em espelho, e chamou também a atenção para o aspecto
genético.
A visão de Orton continha o que ainda hoje é uma confusão comum junto aos
profissionais que trabalham com dificuldades de leitura. É verdade que as crianças
com dificuldades de leitura fazem algumas vezes erros de reversão, mas as normais
também o fazem e a proporção de reversões não difere entre as com e sem
dificuldades de leitura.
A década de 1990 foi pródiga em trabalhos que tentavam desvendar os
aspectos genéticos envolvidos na dislexia. Por outro lado, inúmeros autores,
utilizando-se de exames complementares, provaram a possibilidade de
malformações ou alterações cerebrais em crianças disléxicas. Foram demonstradas
alterações anatômicas e funcionais a partir de estudos eletroencefalográficos.
Segundo a definição da World Federation of Neurology, a dislexia é um
transtorno manifestado por dificuldade na aprendizagem da leitura, apesar de
instrução convencional, inteligência adequada e oportunidade sociocultural.
2.3.1 Leitura e dislexia
Normalmente, as dificuldades de leitura envolvem a incapacidade de
compreender o material escrito. As dificuldades de compreensão, em geral, não
estão no nível das palavras individuais, mas sim no nível de sentenças e frases, ou
na integração da formação dentro das frases. A leitura é uma forma complexa de
aprendizagem simbólica, na qual mudanças relativamente triviais em uma palavra
podem alterar completamente sua pronúncia e significado. É um processo que
envolve linguagem escrita, atenção, habilidade motora, vários tipos de memória,
organização de texto e imagem mental.
50
Talvez mais do que em outras dificuldades específicas de aprendizagem, as
dificuldades de leitura podem impedir o progresso educacional em várias áreas
porque a leitura é a via de acesso para uma grande variedade de informações. A
incapacidade de aprender a ler nos primeiros anos escolares mantém as crianças
afastadas de praticamente o que resta do currículo escolar. Por exemplo, a
apresentação dos problemas de matemática, nos currículos escolares, é
basicamente feita pelo meio escrito. Se uma criança apresenta problemas de leitura,
é bastante provável que isso dificulte seu progresso em aritmética também. As
dificuldades de leitura também afetam negativamente a aquisição de conhecimentos
além do currículo escolar.
O processo de leitura varia de indivíduo para indivíduo, dependendo de fatores
como idade, maturação, sexo, hereditariedade, tipo de língua, prática e motivação.
Rotta et al. (2006, p. 153) nos fala que Myklebust e Johnson, em 1987,
definiram a dislexia como uma síndrome complexa de disfunções psiconeurológicas
associadas, tais como perturbações em orientação, tempo, linguagem escrita,
soletração, memória, percepção visual e auditiva, habilidades motoras e habilidades
sensoriais relacionadas.
Dividiram a dislexia em auditiva e visual, com finalidades educacionais. Na
dislexia auditiva são observadas dificuldades significativas na discriminação de sons
de letras e palavras compostas, além de falhas na memorização de padrões de
sons, seqüências, palavras compostas e histórias. Na dislexia visual dificuldades
em seguir e reter as seqüências visuais, na análise e integração visual de quebra-
cabeças ou em tarefas similares. Ocorrem freqüentes reversões e inversões de
letras, sendo que o disléxico visual confunde com facilidade palavras e letras. O
mais freqüente é uma associação das duas formas, mesmo que tenha iniciado por
uma delas, mas o comum é que em seu desenrolar apareçam sempre falhas mistas.
Na mesma época, Bryant e Bradley (apud ROTTA et al. 2006, p.153) definiram
as crianças disléxicas como aquelas que apresentam problemas quando tentam
aprender a ler e escrever, embora sejam inteligentes, rápidas e atentas. Estes
autores enfatizam que as dificuldades dessas crianças persistem, ainda que elas
tenham encorajamento e ajuda dos pais e professores. O estudo realizado por esses
51
autores sugere que possa haver uma relação causal entre o reconhecimento
fonológico fraco e as dificuldades de leitura.
Ajuriaguerra, informa Rotta et al. (2006), observou que as crianças disléxicas,
submetidas à avaliação cognitiva por testes como o WISC, apresentavam potencial
intelectual dentro da média ou até superior, tanto nas escalas verbais como de
execução. Tinham visão e audição adequada, além de não apresentarem
deficiências neurológicas e físicas significativas. Apesar de suas dificuldades, o
ocorriam problemas sociais ou emocionais importantes e haviam sido expostas a
oportunidades adequadas para estimular a aprendizagem da leitura.
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSM IV (1995)
caracteriza a dislexia como comprometimento acentuado no desenvolvimento das
habilidades de reconhecimento das palavras e da compreensão da leitura. O
diagnóstico é referido somente se esta incapacidade interferir significativamente no
desempenho escolar ou nas atividades da vida diária que requerem habilidades de
leitura. A leitura oral no disléxico é caracterizada por omissões, distorções e
substituições de palavras e pela leitura lenta e vacilante. Nesse distúrbio, a
compreensão da leitura também é afetada.
Giacheti e Capellini (2000 apud ROTTA et al., 2006, p. 153), afirmaram que
O distúrbio específico de leitura, ou dislexia do desenvolvimento, é definido
como um distúrbio neurológico, de origem congênita, que acomete crianças
com potencial intelectual normal, sem déficits sensoriais, com suposta
instrução educação apropriada, mas que não conseguem adquirir ou
desempenhar satisfatoriamente a habilidade para a leitura e/ou escrita.
Nico et al. ( apud ROTTA et al., 2006, p. 153), referiram que:
O momento no qual a dislexia se torna mais evidente é o período de 6 a 7
anos. Nessa fase, pais e professores observam que crianças com
inteligência média, ou até acima da média, podem apresentar dificuldade
atípica para aprender a ler, escrever, soletrar e calcular. A leitura lenta,
trabalhosa e individual da palavra impede a habilidade da criança
compreender o que leu. Essa situação ocorre mesmo quando a
compreensão da língua falada for normal. muita dificuldade em
transformar a solicitação em som. Deficiências no processo fonológico, que
são fortes indicadores de futuras dificuldades na leitura e escrita, podem ser
identificadas no jardim da infância e na alfabetização. Nessa época, é
possível identificar crianças de risco, que tiveram história de atraso no
desenvolvimento da fala ou dificuldade em reconhecer rimas nas canções,
entre outras possibilidades. A decodificação e o uso de estratégia de
memória estão comprometidos, do que resulta um vocabulário pobre e
limitado para a idade.
52
2.3.2 Etiologia
Os estudos a respeito de pacientes disléxicos têm mostrado que dentro da
etiologia devem ser considerados sempre dois aspectos, que podem estar isolados,
mas que em geral são complementares: causas genéticas e causas adquiridas.
Com base na observação desses fatores, podemos dividir a etiologia em três
possibilidades: genética, adquirida e multifatorial ou mista.
2.3.3 Classificação
De acordo com Rotta e Pedroso (2006), a dislexia pode ser classificada de
várias formas, conforme os critérios usados para classificação. Alguns autores
classificam a dislexia tendo como base testes diagnósticos, fonoaudiológicos,
pedagógicos e psicológicos.
Uma das formas de classificar a dislexia, destacam os autores, é a que
privilegia as percepções e as manifestações visual e auditiva, cabendo aí, também,
as formas mistas, quando as duas vias perceptivas estão envolvidas. Essa
classificação, com pequenas variações, tem sido aceita por outros autores, que
referem as mesmas três formas da seguinte maneira: com memória auditiva pobre e
visual boa; com memória visual boa e auditiva pobre; e com dificuldades em ambas.
Outros preferem apoiar-se nos resultados de testes como o WISC, diferenciando as
formas em que predomínio de comprometimento do potencial verbal sobre os de
performance das em que ocorre em contrário.
Entretanto, a forma mais completa e mais utilizada, segundo Rotta e Pedroso
(2006), é a apresentada por Boder e Miklebust:
Dislexia Disfonética quando a criança tem dificuldades para ler
palavras desconhecidas. Apresenta alguma habilidade para reconhecer
palavras como um todo, mas não consegue dividir as palavras em sons.
53
Começa a ler e em seguida passa a adivinhar algumas palavras,
considerando parte delas, por exemplo: “maltez por talvez”, “medida
por menina”, “contar por comprar”, etc. Comete erros na leitura e na
escrita, do tipo inversões, omissões, ou agregação de fonemas ou de
sílabas, por exemplo: “lata” por “alta”, “caalo” por “cavalo”, entre outros.
Dislexia Diseidética a criança de forma muito lenta, decompondo a
palavra em suas partes, por ter dificuldades de ler globalmente. Assim
como a leitura, também a escrita é pobre. Os erros mais freqüentes na
escrita são as inversões e as falhas na acentuação. Os sintomas mais
comuns são: leitura silabada, sem conseguir a síntese, com presença de
aglutinação/fragmentação; trocas por equivalentes fonéticos; e maior
dificuldade para a leitura do que para a escrita.
Dislexia Mista (Alexia) pensa-se em dislexia mista quando ocorrem
alterações associadas das duas formas anteriores, em diferentes
combinações e intensidades. Neste grupo estão situados os casos mais
graves e de difícil acompanhamento. A leitura costuma ser ainda mais
difícil e ocorrem dificuldades mistas tanto na leitura como na escrita.
Segundo as escolas mais modernas e os teóricos mais atualizados em
lingüística, o fenômeno da linguagem escrita não é transcrição da linguagem oral.
Ela tem suas próprias seqüências e deve ser adquirida como uma nova linguagem.
Antes de tudo, com aspectos semânticos enfatizados e não como simples
decodificação e codificação, requerem síntese e análise visual e auditiva, assim
como discriminação têmporo-espacial.
Assencio-Ferreira (2005) aponta que existem autores que acreditam na
existência de um tipo especial de dislexia denominada:
Dislexia Congênita ou Inata a criança nasce com o transtorno e a
origem pode ser devida a múltiplos fatores p-natais. Constituem os
casos mais graves, com acentuada dificuldade na habilidade para a
aquisição de leitura e escrita; estas crianças raramente conseguem
adquirir a alfabetização. As dificuldades apresentadas o incuráveis,
pois mesmo que o indivíduo adquira alguma capacitação escolar, não
54
consegue ler/escrever por muito tempo e, após ler/escrever, não recorda
do conteúdo.
2.3.4 Genética e dislexia
Rotta e Pedroso (2006) afirmam que as associações entre dislexia e genética,
nas diferentes pesquisas, encontram padrões de transmissão, que se encaixam em
vários modelos de herança. Em algumas famílias a dislexia é transmitida de forma
dominante. Esses casos podem ser explicados por um modo de transmissão
dominante e autossômica influenciado pelo sexo. Nesses casos, a dislexia tem uma
probabilidade de 100% em indivíduos do sexo masculino. Dessa forma, todo
indivíduo do sexo masculino que herda gene ou genes para dislexia desenvolve o
transtorno. O mesmo ocorre em torno de 65% das mulheres portadoras.
Nem todos os processos relacionados à leitura são herdáveis, continuam os
autores. A leitura proficiente é caracterizada por dois conjuntos de processos
cognitivos, um deles concentrado na precisão da leitura e da escrita e o outro
concentrado na fluência ou na automaticidade da leitura. herdabilidade
importante para a escrita, memória de curto prazo, decodificação fonológica,
consciência dos fonemas e reconhecimento de palavra, enquanto a codificação
ortográfica e a compreensão da leitura parecem não ser herdáveis. A herdabilidade
para o reconhecimento da palavra tem sido estimada em cerca de metade dos
casos.
Em geral, a influência genética parece ser um pouco mais elevada para a
decodificação fonológica e a consciência do fonema do que para o reconhecimento
da palavra e a codificação ortográfica. O impacto do ambiente parece ser importante
para todos os processos relacionados com a leitura e especialmente forte para o
reconhecimento da palavra.
Quando se usa a expressão gene da leitura parte-se do pressuposto que
um gene que afeta o curso normal da aquisição de habilidades de leitura. A busca
por um gene da leitura é inspirada pela inferência de que um ou mais
55
responsáveis, pelo menos em parte, pela distribuição observada das dificuldades de
leituras nas famílias. Acredita-se que, embora esses genes desorganizem a leitura,
o necessariamente a controlem.
As questões sobre a hereditariedade da dislexia são ainda polêmicas. As
evidências atuais apóiam a perspectiva de que a dislexia é familiar, uma vez que
35% a 40% dos parentes de primeiro grau são afetados, herdada em cerca de 50%
dos casos, é heterogênea em seu modo de transmissão, como evidencia tanto a
forma poligênica como a de gene predominantemente responsável pelo distúrbio,
ligada em algumas famílias a marcadores genéticos no cromossomo 15 e
possivelmente, em outras famílias, a marcadores genéticos nos cromossomos 6 e 7,
dizem Rotta e Pedroso (2006).
2.3.5 Áreas cerebrais envolvidas na leitura
Segundo Rotta e Pedroso (2006, p. 158), os estudos que envolvem o
processamento da linguagem, em indivíduos normais adultos, apontam
consistentemente para a ativação temporal esquerda durante a execução de tarefas
de linguagem:
As diferenças estruturais entre o cérebro das pessoas com dislexia e o das
pessoas sem dislexia concentram-se fundamentalmente no plano temporal.
Nos leitores normais, o plano esquerdo é caracteristicamente maior que o
direito; quanto maior é o plano esquerdo em relação ao direito, melhores as
habilidades lingüísticas da pessoa. Nos leitores com dislexia, o plano
esquerdo é caracteristicamente mais ou menos do mesmo tamanho que o
direito.
A descoberta inicial da simetria dos planos, esquerdo e direito, em indivíduos
com dislexia tem sido confirmada pelas técnicas mais precisas de medição, como a
Ressonância Magnética Nuclear, afirmam os neurologistas ora mencionados.
Copactua de semelhante posição Assêncio-Ferreira (2005, p. 54), ao afirmar que:
Em exames de neuroimagem como Ressonância Magnética Encefálica, foi
observada alteração orgânica, anatômica, caracterizada por hemisférios
cerebrais idênticos no tamanho, o que é considerado anormal, pois em
crianças normais o hemisfério esquerdo é maior que o direito.
56
2.3.6 Quadro clínico e diagnóstico
A avaliação da criança disléxica inicia com a queixa principal que motivou a
consulta. O mais comum é que a família se queixe de dificuldades para a
alfabetização, comentando que a criança parece não ter interesse na leitura e/ou na
escrita, uma vez que para outras atividades se mostra capaz. Em alguns casos, os
pais e os professores pensam em falta de atenção, uma vez que, por apresentar
dificuldades, a criança perde o interesse. Na maioria das vezes ainda não se tem
elementos para fazer o diagnóstico de dislexia, pois essa pode ser também a
maneira como se apresenta certo atraso na aquisição da leitura e/ou da escrita. No
entanto, são crianças de risco que devem ser seguidas com uma orientação
pedagógica ativa.
Nos casos mais leves, principalmente em escolas cuja metodologia de ensino
suporta falhas nos primeiros anos, o escolar começa a apresentar dificuldades, não
mais possíveis de serem consideradas variantes da normalidade, após a terceira
série do ensino fundamental, quando é necessária maior abstração.
Muitas vezes, a criança chega para consulta não só por suas dificuldades
específicas de leitura e de escrita, mas também com queixas comportamentais
associadas devido ao fracasso na aprendizagem. A história da criança disléxica não
pode terminar sem os importantes questionamentos a respeito da história familiar.
Ao lado das queixas específicas para ler e escrever, muitas vezes toma um
vulto maior a repercussão comportamental que esses fracassos produzem na
criança em idade escolar. Muitas vezes as queixas de ansiedade, agressividade,
depressão, ou hiperatividade e desatenção, inclusive, são predominantes durante a
primeira consulta. Junto com essas queixas, frequentemente está embutido o medo
que os pais carregam de que o filho tenha algum grau de deficiência mental.
Sabe-se da relação entre dislexia e possibilidades de herança; portanto, não se
pode concluir a história sem antes perguntar sobre a história familiar e sobre a
consangüinidade. A história do relacionamento interpessoal da criança com cada
membro da família, com os colegas e com os amigos é fundamental para que se
57
conheça um pouco mais como ela consegue vivenciar suas dificuldades.
Terminado o levantamento da história familiar, é importante que seja avaliada a
produção textual da criança, primeiro observando os cadernos e depois pedindo que
a criança escreva algo espontaneamente. Não é necessário que seja um texto
(podem ser palavras isoladas). Assim já se pode observar:
leitura e escrita, muitas vezes incompreensíveis;
confusões de letras com diferente orientação espacial (p/q; b/d)
inversões de sílabas ou palavras (par/pra; lata/alta)
substituições de palavras com estrutura semelhante
(contribuiu/construiu);
supressão ou adição de letras ou de sílabas (caalo/cavalo; berla/bela);
repetição de labas ou palavras (eu jogo jogo bola; bolo de
chococolate);
fragmentação incorreta (querojo garbola / quero jogar bola);
dificuldade para entender o texto lido.
As observações mostram a importância não de fazer a criança ler e
escrever, durante a consulta, como também devem ser observados os cadernos
com a produção escolar diária.
Embora o diagnóstico da dislexia seja clínico neurológico, psicopedagógico e
fonoaudiológico, muitas vezes é necessário lançar mão de exames complementares
para, como o nome diz, complementar informações ou observar co-morbidades.
Entre esses exames estão os estudos neurofisiológicos como eletrencefalograma;
exames auditivos e visuais; e testes psicológicos que contemplem os aspectos
cognitivos e afetivos, enfatizam Rotta e Pedroso (2006).
O diagnóstico deve ser feito a partir das premissas do DSM-IV, que denomina
transtorno específico da linguagem quando:
o rendimento da leitura está abaixo do esperado para a idade
cronológica, em criança com inteligência normal e com escolaridade
apropriada para sua idade;
58
a dificuldade na compreensão da leitura interfere significativamente no
rendimento escolar ou nas atividades da vida diária que exigem
habilidades de leitura;
na presença de um déficit sensorial, as dificuldades de leitura excedem
aquelas esperadas nessa associação.
Para o diagnóstico deve-se, ainda, considerar outros aspectos:
o histórico familiar, que com freqüência é dominante;
a presença de co-morbidades neuropsicológicas que não são
infreqüentes, como déficit de atenção, de memória, dificuldades
visoespaciais, além da falta de motivação.
A dislexia costuma melhorar com a idade, o que reafirma a importância de
tratamento precoce, não específico, como também para as co-morbidades. Por
outro lado, é fundamental a parceria que se deve estabelecer entre profissionais que
atuam no diagnóstico e no tratamento com a criança, os pais e os professores.
assim poderão ser evitadas situações que impeçam esse progresso, ou expectativas
maiores do que a capacidade da criança, que vai resultar em frustração. Muitas
vezes os pais e/ou escolar necessitam de suporte psicológico. Como evidenciam
Moojen e França (apud ROTTA et al., 2006, p.167), é um problema persistente até
a vida adulta (com atenuações), mesmo com tratamento adequado, o que torna o
prognóstico reservado.
2.3.7 Tratamento
O tratamento está centrado na reeducação da linguagem escrita, abordando
todos os aspectos envolvidos. O profissional de fonoaudiologia ou de
psicopedagogia, treinado para trabalhar com transtorno específico de linguagem
escrita, parte de um diagnóstico completo, necessário para que seja feito um
planejamento, para cada etapa, seguindo uma cronologia adequada.
59
Segundo a International Dyslexia Society, na dislexia deve sempre ser
observado que as diferenças são pessoais, o diagnóstico é clínico, o entendimento é
científico e o tratamento é educacional.
Tanto o diagnóstico como o tratamento pode ter características
multidisciplinares, principalmente interdisciplinares, porque dessa forma poderão
ser abordados, no momento certo, cada um dos aspectos de um todo, que deve ser
encarado de maneira uniforme.
2.3.8 O que versa a Associação Brasileira de Dislexia
A Associação Brasileira de Dislexia (ABD, 2007), em estudo realizado por seus
profissionais, define dislexia como “um distúrbio ou transtorno de aprendizagem na
área da leitura, escrita e soletração”. A dislexia é o distúrbio de maior incidência nas
salas de aula e pesquisas realizadas em vários países mostram que cerca de 10 a
15% da população mundial é disléxica.
Ao contrário do que muitos pensam, a dislexia não é o resultado de má
alfabetização, desatenção, desmotivação, condição sócio-econômica ou baixa
inteligência. Ela é uma condição hereditária com alterações genéticas, apresentando
ainda alterações no padrão neurológico.
Por esses múltiplos fatores é que a dislexia deve ser diagnosticada por uma
equipe multidisciplinar. Esse tipo de avaliação condições de um
acompanhamento mais efetivo das dificuldades após o diagnóstico, direcionando-o
às particularidades de cada indivíduo, levando a resultados mais concretos.
Conforme a ABD, a dislexia é genética e hereditária, se a criança possuir pais
ou outros parentes disléxicos, quanto mais cedo for realizado o diagnóstico melhor
para os pais, à escola e à própria criança. A criança poderá passar pelo processo de
avaliação realizada por uma equipe multidisciplinar especializada, mas se não
houver passado pelo processo de alfabetização, o diagnóstico será apenas de uma
"criança de risco". Segundo a ABD (2007), haverá sempre:
60
dificuldades com a linguagem e escrita ;
dificuldades em escrever;
dificuldades com a ortografia; e
lentidão na aprendizagem da leitura;
Haverá muitas vezes:
disgrafia (letra feia);
discalculia, dificuldade com a matemática, sobretudo na assimilação de
símbolos e de decorar tabuada;
dificuldades com a memória de curto prazo e com a organização‟;
dificuldades em seguir indicações de caminhos e em executar seqüências
de tarefas complexas;
dificuldades para compreender textos escritos;
dificuldades em aprender uma segunda língua.
dificuldades com a linguagem falada;
dificuldades com a percepção espacial; e
confusão entre direita e esquerda.
Na pré-escola, a ABD (2007) sugere ficar alerta se a criança apresentar alguns
destes sintomas:
dispersão;
fraco desenvolvimento da atenção;
atraso no desenvolvimento da fala e da linguagem;
dificuldade em aprender rimas e canções;
fraco desenvolvimento da coordenação motora;
dificuldade com quebra cabeça; e
falta de interesse por livros impressos.
O fato de apresentar alguns desses sintomas, observa a ABD, não indica
61
necessariamente que ela seja disléxica; há outros fatores a serem observados.
Porém, com certeza, estaremos diante de um quadro que pede uma maior atenção
e/ou estimulação.
Na idade escolar, segue destacando a ABD (2007), se a criança continua
apresentando alguns ou vários dos sintomas a seguir, é necessário um diagnóstico e
acompanhamento adequado, para que possa prosseguir seus estudos junto com os
demais colegas e tenha menos prejuízo emocional, dificuldade na aquisição e
automação da leitura e escrita.
Pobre conhecimento de rima (sons iguais no final das palavras) e aliteração
(sons iguais no início das palavras);
Desatenção e dispersão;
Dificuldade em copiar de livros e da lousa;
Dificuldade na coordenação motora fina (desenhos, pintura) e/ou grossa
(ginástica, dança, etc.);
Desorganização geral, podemos citar os constantes atrasos na entrega de
trabalhos escolares e perda de materiais escolares;
Confusão entre esquerda e direita;
Dificuldade em manusear mapas, dicionários, listas telefônicas, etc.;
Vocabulário pobre, com sentenças curtas e imaturas ou sentenças longas e
vagas;
Dificuldade na memória de curto prazo, como instruções, recados, etc;
Dificuldades em decorar seqüências, como meses do ano, alfabeto,
tabuada, etc;
Dificuldade na matemática e desenho geométrico;
Dificuldade em nomear objetos e pessoas (disnomias);
Troca de letras na escrita;
Dificuldade na aprendizagem de uma segunda língua;
Problemas de conduta como: depressão, timidez excessiva ou o „‟palhaço‟‟
62
da turma; e
Bom desempenho em provas orais.
Se nessa fase a criança não for acompanhada adequadamente, os sintomas
persistirão e irão permear a fase adulta, com possíveis prejuízos emocionais e,
conseqüentemente, sociais e profissionais.
Se não teve um acompanhamento adequado na fase escolar ou pré-escolar,
coloca a ABD (2007), o adulto disléxico ainda apresentará dificuldades:
Continuada dificuldade na leitura e escrita;
Memória imediata prejudicada;
Dificuldade na aprendizagem de uma segunda língua;
Dificuldade em nomear objetos e pessoas (disnomia);
Dificuldade com direita e esquerda;
Dificuldade em organização; e
Aspectos afetivos emocionais prejudicados, trazendo como conseqüência:
depressão, ansiedade, baixa auto-estima e, algumas vezes, o ingresso para
as drogas e ao álcool.
A ABD (2007) ainda salienta que os sintomas que podem indicar a dislexia,
antes de um diagnóstico multidisciplinar, indicam um distúrbio de aprendizagem,
não confirmam a dislexia. Os mesmos sintomas podem indicar outras situações,
como lesões, síndromes e etc.
Então, como diagnosticar a dislexia?
Identificado o problema de rendimento escolar ou sintomas isolados, que
podem ser percebidos na escola ou mesmo em casa, deve-se procurar ajuda
especializada.
Uma equipe multidisciplinar, formada por Psicóloga, Fonoaudióloga e
Psicopedagoga Clínica deve iniciar uma minuciosa investigação. Essa mesma
equipe deve ainda garantir uma maior abrangência do processo de avaliação,
verificando a necessidade do parecer de outros profissionais, como Neurologista,
63
Oftalmologista e outros, conforme o caso.
A equipe de profissionais deve verificar todas as possibilidades antes de
confirmar ou descartar o diagnóstico de dislexia. É o que se chama de Avaliação
Multidisciplinar e de Exclusão.
Outros fatores deverão ser descartados, como ficit intelectual, disfunções ou
deficiências auditivas e visuais, lesões cerebrais (congênitas e adquiridas),
desordens afetivas anteriores ao processo de fracasso escolar (com constantes
fracassos escolares o disléxico irá apresentar prejuízos emocionais, mas estes são
conseqüências, não causa da dislexia).
Neste processo ainda é muito importante tomar o parecer da escola, dos pais e
levantar o histórico familiar e de evolução do paciente. Essa avaliação não só
identifica as causas das dificuldades apresentadas, assim como permite um
encaminhamento adequado a cada caso, por meio de um relatório por escrito.
Sendo diagnosticada a dislexia, o encaminhamento orienta o acompanhamento
consoante às particularidades de cada caso, o que permite que este seja mais eficaz
e mais proveitoso, pois o profissional que assumir o caso não precisará de um
tempo, para identificação do problema, bem como terá ainda acesso a pareceres
importantes. Conhecendo as causas das dificuldades, o potencial e as
individualidades do indivíduo, o profissional pode utilizar a linha que achar mais
conveniente. Os resultados irão aparecer de forma consistente e progressiva. Ao
contrário do que muitos pensam, o disléxico sempre contorna suas dificuldades,
encontrando seu caminho. Ele responde bem a situações que possam ser
associadas a vivências concretas e aos múltiplos sentidos. Ele também tem sua
própria lógica, sendo importante o bom entrosamento com os profissionais atuantes.
Outro passo importante a ser dado é definir um programa em etapas e somente
passar para a seguinte após confirmar que a anterior foi devidamente absorvida,
sempre retomando as etapas anteriores. É o que se chama de sistema
Multissensorial e Cumulativo. Também é de extrema importância haver uma boa
troca de informações e experiências dos procedimentos executados, entre
profissional, escola e família.
64
2.4 ADAPTAÇÃO CURRICULAR INDIVIDUALIZADA: PONTOS E CONTRAPONTOS
ESTUDOS QUE SE REALIZAM
González (2007, p. 29) afirma:
A intervenção educacional, no contexto da educação especial, somente
pode atingir os objetivos propostos de formação integral em conhecimentos,
destrezas e valores de todos os alunos e oferecer a melhor qualidade de
vida possível nos âmbitos pessoal, profissional e social, etc., mediante as
adaptações curriculares apropriadas.
O autor defende a proposta de adaptação curricular individualizada para que os
alunos aprendam dentro de suas condições orgânicas e pessoais. Considera
necessário o sistema educacional oferecer os meios necessários e eficazes a
realização da mesma, quais sejam eles: apoio aos professores e apropriação das
reais necessidades dos alunos a fim de proporcionar condições que favoreçam uma
educação que seja completa e gratificante.
As adaptações curriculares devem partir do projeto curricular da escola,
prossegue o autor. São organizadas acolhendo as necessidades dos alunos, com
isso não homogeneização de ensino, pois devem atender as peculiaridades de
cada caso podendo ser adaptações pouco significativas que atendem os diferentes
ritmos, formas e estilos de aprendizagem ou adaptações significativas que exigem
modificações expressivas de alguns componentes do currículo.
Cardoso (2004), em amplo estudo realizado, apresenta os benefícios de uma
prática inclusiva que ofereça aos alunos com NEE a realização de adaptação
curricular individualizada. A autora, uma das estudiosas contemporânea no assunto,
apresenta em seu trabalho desde uma retrospectiva histórica do movimento de
exclusão/inclusão das pessoas com NEEs, passando por explicações aprofundadas
da elaboração das ACIs: no que constituem, tipos de ACIs, quando fazer ACI,
conhecimentos importantes acerca da sua realização, personagens envolvidos, etc.
Blanco (apud COLL, 2004) diz que, mesmo a escola considerando toda a
65
diversidade existente em seu contexto, pode acontecer que alguns alunos não
consigam se beneficiar da proposta de aprendizagem oferecida, sendo necessário,
nestes casos, a organização de adaptação curricular individualizada. Salienta, no
entanto, que antes de se realizar a ACI é necessário oferecer ao educando, que está
apresentando dificuldades, um conjunto de medidas pedagógicas que possam
compensar tais dificuldades. Caso as medidas utilizadas não apresentarem
resultados satisfatórios, é o momento de encaminhar o aluno para uma avaliação
psicopedagógica, a fim de verificar quais as adaptações a serem realizadas.
Mantoan (apud STOBÄUS e MOSQUERA, 2004, p. 33), também referência no
assunto, nos fala que a inclusão é uma possibilidade de aprimorar a Educação
Escolar, e deve contemplar a todos os alunos, com e sem deficiência. Ressalta que
a inclusão é uma conseqüência da transformação do ensino regular, do
aperfeiçoamento de suas práticas. No entanto, no que tange as adaptações
curriculares, a autora considera que não é possível sabermos, por antecedência,
qual o limite da aprendizagem de uma pessoa, “o quanto e como alguém será capaz
de aprender”, acredita que (p. 34):
Sejam quais forem as limitações do aluno, adaptar currículo, facilitar tarefas
e diminuir o alcance dos objetivos educacionais concorrem para que
rebaixemos o nível de nossas expectativas com relação à potencialidade
desse, para enfrentar uma tarefa mais complexa.
Os professores, fala a autora, devem estar abertos para a inclusão e também
preparados para trabalhar com os alunos com deficiências. É contrária a idéia de
tutores em sala de aula, salienta (p.35):
A nosso ver, essa alternativa constitui mais uma barreira à inclusão, pois é
uma solução que exclui, que segrega e desqualifica o professor responsável
pela turma e que o acomoda, não provocando mudanças na sua maneira de
atuar, uma vez que as necessidades educativas do aluno com deficiência
estão sendo supridas pelo educador especializado.
Como vemos, González, Mantoan, Cardoso e Blanco são defensores da
prática inclusiva nas escolas regulares de ensino. Aprofundando-se nestes estudos
(livros, palestras, artigos, etc.), constata-se a consideração que realizam a todo o
universo de concepções, ajustes e necessidades que essa prática aspira. Contudo,
diferente dos outros autores, Mantoan sugere que seja realizada por outros
caminhos que não adaptação curricular individualizada.
3 METODOLOGIA
3.1 PROBLEMA
Por que desenvolver a Adaptação Curricular Individualizada para alunos com
dislexia?
3.2 OBJETIVOS
3.2.1 Objetivo Geral
Descrever o desenvolvimento de uma adaptação no currículo escolar com
alunos com diagnóstico de Dislexia.
3.2.2 Objetivos Específicos
Descrever a identificação do aluno e seus primeiros contatos com o Centro
Municipal de Educação Inclusiva;
Descrever a Adaptação do Currículo Escolar para alunos com diagnóstico de
Dislexia;
Descrever os materiais elaborados durante os processos de inclusão
educacional destes alunos;
Descrever os resultados psicopedagógicos da inclusão educacional destes
alunos.
67
3.3 TIPO DE PESQUISA
A pesquisa foi do tipo Estudo de Caso, em Nível Descritivo-Interpretativo, ou
seja, buscou conhecer o como e os porquês, evidenciando a sua unidade e
identidade própria. Foi uma investigação descritiva e qualitativa, debruçando-se
sobre uma situação específica, procurando descobrir o que nela de mais
essencial e característico. Este tipo de pesquisa também é entendido por Lakatos e
Marconi (1991) como uma investigação empírica em que se formula um problema
com o fim de familiarizar o pesquisador com seu objeto de estudo para futuramente
realizar uma pesquisa mais precisa, ou ainda, modificar e clarificar conceitos.
Descreve precisamente uma situação ou problema mediante a análise da literatura
existente e mediante entrevistas com pessoas com experiência com o problema,
obtendo assim descrições quantitativas e/ou qualitativas do objeto de estudo,
devendo o investigador conceituar as inter-relações entre as propriedades do
fenômeno, fato ou ambiente observado, podendo ser usadas variedades de
procedimentos para coleta de dados.
3.4 PARTICIPANTES
Foram participantes deste estudo três alunos da Rede Municipal de Ensino de
Esteio/RS, em atendimento psicopedagógico, com hipótese de dislexia.
Complementariamente, também foram utilizadas informações colhidas com
seus familiares e com os profissionais envolvidos com estes alunos.
3.5 PROCEDIMENTOS
A presente dissertação, tencionando aprofundar os conhecimentos teóricos
68
acerca do transtorno do desenvolvimento da aprendizagem da escrita e
compreensão leitora - Dislexia, bem como acompanhar o desenvolvimento e
construção da Adaptação Curricular Individualizada para alunos que apresentam
essa dificuldade, seguiu os seguintes procedimentos:
1) Entrou em contato com a coordenação do Centro Municipal de Educação
Inclusiva (CEMEI);
2) Propôs a Pesquisa e acompanhamento da Adaptação Curricular
Individualizada (ACI), para os alunos disléxicos nas escolas municipais de
Esteio e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido,
(Apêndice 1);
3) Realizou reuniões com os professores e equipes diretivas, afim de verificar
os conhecimentos sobre o tema; e
4) Realizou reuniões pedagógicas com os professores e equipes que
debateram os temas propostos.
Seguindo estes passos, no primeiro momento, foi realizado contato com a
coordenadora do CEMEI, afim de fazer-lhe a proposta. Com a aceitação, o segundo
momento foi encaminhar para o diagnóstico os alunos, em atendimento
psicopedagógico, que tenham hipótese de dislexia. O diagnóstico foi realizado por
equipe multidisciplinar, composta por neuropediatra, fonoaudióloga, psicóloga e
psicopedagoga.
No terceiro momento, juntamente com as assessoras de inclusão do CEMEI,
foram realizados encontros com os professores e equipe diretiva - esta última
normalmente representada pelo serviço de supervisão escolar e orientação
educacional -, afim de verificar quais eram os conhecimentos que os professores
possuíam acerca da dislexia. O próximo passo foi dar assessoria, em parceria com o
CEMEI, aos professores e equipe na elaboração da Adaptação Curricular
Individualizada aos alunos com dislexia, dando ênfase, principalmente, ao processo
de avaliação.
69
3.6 INSTRUMENTOS
Utilizou-se três tipos de instrumentos, complementários entre si.
a) Entrevistas de levantamento de informações iniciais, com estas duas
perguntas amplas:
Quais os conhecimentos que os professores e equipe possuem sobre
dislexia?
O que você gostaria de receber de informações sobre Adaptação Curricular
Individualizada em dislexia e temas relacionados?
b) Entrevistas Clínicas e procedimentos psicopedagógicos; e
c) Relatórios de Reuniões.
3.7 PROCEDIMENTO DE ANÁLISE DE DADOS
A partir de registros dos casos que foram atendidos e dos acompanhamentos
das Adaptações Curriculares Individualizadas, realizou-se análise crítica baseada
com a fundamentação teórica, bem como do conhecimento e experiência
profissional construída até o momento.
Para análise dos dados das entrevistas, seguiu-se orientação de Bardin (1979),
denominado de Análise de Conteúdo, que consiste em encontrar pontos de
coincidências nas verbalizações dos sujeitos, que ajudem a reinterpretá-las e a
atingir uma compreensão aprofundada de seus significados. A partir disso, se
possibilita a formulação de categorias que serão discutidas com a apresentação dos
dados e com a literatura existente.
4 APRESENTAÇÃO DOS DADOS
Para melhor compreensão deste trabalho, acredito ser necessário dar algumas
explicações de sua origem, pois ele (pronome pessoal propositadamente usado),
possui uma andança até chegar aqui (apud MICHEL, 2008).
Em 2007, eu estava fazendo especialização em Educação Inclusiva, quando
decidi fazer a monografia com o tema Dislexia e Adaptação Curricular
Individualizada em crianças em atendimento psicopedagógico e estudantes das
escolas municipais de Esteio, município o qual trabalho. A seguir apresento,
sucintamente, como esse trabalho foi se delineando até chegar onde estamos.
Em 26/06/2007, realizei contato com a coordenadora do Centro Municipal de
Educação Inclusiva (CEMEI), senhora Cristina Proença Cardoso. Esse centro é
mantido e gerenciado pela Secretaria Municipal de Educação de Esteio. Agendamos
reunião para o dia 03/07/2007, às 9h, a fim de fazer-lhe a proposta de acompanhar a
Adaptação Curricular Individualizada (ACI) de crianças com dislexia que estivessem
em atendimento psicopedagógico. A proposta foi aceita e, desde então, venho
acompanhando a aprendizagem das crianças, participando de reuniões com as
equipes, professores, realizando encontros com os pais das crianças, oferecendo
suporte pedagógico aos responsáveis e escola, etc.
Em 27 de março de 2008, em novo encontro com a coordenadora do CEMEI,
faço-lhe a proposta de dar continuidade ao trabalho, agora com vistas ao mestrado.
A responsável mostrou-se favorável e interessada no prosseguimento da atividade e
dialogou, como em outrora, com a secretária de educação para dar-me retorno.
Concomitante aos contatos com a coordenadoria do CEMEI, vou entrelaçando
com a secretaria da saúde, a qual faço parte, que também precisa autorizar-me a
continuidade do trabalho. Em 20/03/2008, às 16h, em reunião com o então diretor
técnico da saúde, senhor José Antônio Almeida Silveira, hoje secretário da saúde,
falo que tenciono dar continuidade ao trabalho iniciado em 2007 com a secretaria de
educação, dando assessoria às ACIs de alunos em atendimento psicopedagógico
com dislexia. Doutor Silveira concorda com o seguimento da proposta e aguardou a
formalização do pedido com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
71
Em 10/04/2008 recebo telefonema da coordenadora do CEMEI autorizando-me
a prosseguir com a pesquisa. Em 17/04/2008 entrego os Termos de Consentimento
Livre e Esclarecido à coordenadora do CEMEI e ao diretor técnico da saúde.
Em 11/05/2009 retorno ao CEMEI para uma reunião com a nova equipe. Em
janeiro deste mesmo ano houve posse da nova administração municipal, com isso, o
centro passa por algumas mudanças na sua forma de atuar, ainda em fase de
implementação por seus assessores. Fui recebida pela Equipe de Educação
Inclusiva composta pelos assessores Cláudio Luciano Dusik, Elaine Souza, Gecilda
Leote e Marilza Mello. Explico o trabalho que venho realizando com as crianças,
conhecido pelos assessores Cláudio Dusik e Marilza Mello, pois faziam parte da
equipe do CEMEI. Os assessores referem que algumas alterações foram e estão
sendo realizadas no trabalho de assessoria às escolas. Atualmente as escolas
contam com “monitora de apoio” que são estagiárias do curso de pedagogia que
entram na sala de aula para dar suporte ao trabalho do professor, quando
necessário, em situações de alunos com NEE. Ou seja, por ora, não mais o
assessor do CEMEI entrando semanalmente nas escolas; as ACIs estão sob
responsabilidade do professor do laboratório de aprendizagem.
A equipe informa que em 12/05/2009 se reunirá para discutir propostas de se
encaminhar a educação inclusiva no município. Sugiro que repensem as ACIs a
cargo do professor do laboratório de aprendizagem (LA). Penso que nem todos os
professores de LA possuem condições de fazê-lo, até porque alguns recém
chegaram às escolas, outros não possuem formação para dar conta de uma ACI;
talvez em algumas escolas seria possível, em outras, não. Sugiro que fique a cargo
das equipes diretivas
1
, sob orientação do supervisor escolar e orientador
educacional. A sugestão é compreendida, bem vista. Cláudio Dusik pergunta se eu
faria uma formação com as equipes diretivas sobre ACIs, coloco-me à disposição.
___________________
1
A Equipe Diretiva de cada escola da rede municipal é composta de diretor/a, vice-diretor/a,
supervisor escolar e orientador educacional, sendo que o/a diretor/a e vice-diretor/a o eleitos pela
comunidade e devem possuir graduação em Supervisão Escolar. Já os/as supervisores/as escolar e
orientadores/as educacionais são admitidos por concurso público.
72
4.1 APRESENTAÇÃO DOS CASOS
4.1.1 Caso I
F, 13 anos, série, em atendimento psicopedagógico desde 03 de janeiro de
2006. A mãe buscou atendimento com queixas, na época, que a filha, então com 9
anos, rie, “não queria aprender”, “ela chora na sala de aula”, dizia a mãe. Em
julho de 2007 foi dado, pela equipe multidisciplinar envolvendo neuropediatra,
fonoaudióloga e psicopedagoga (eu), o diagnóstico de dislexia.
Em 11/09/2007, às 13h30min, na Escola Municipal de Ensino Fundamental
Maria Cordélia Simon Marques realizamos reunião a fim de iniciarmos a Adaptação
Curricular Individualizada de F. Participaram da reunião a orientadora e a
supervisora pedagógica, a professora da turma da aluna, a professora do
Laboratório de Aprendizagem (LA) e professora itinerante do CEMEI.
A professora titular e a professora do LA perguntam-me do que se trata a
dislexia. A professora titular diz não ter conhecimento sobre o assunto. Ainda,
destaca que F, 11anos, série, é uma aluna bastante participativa e sua maior
dificuldade é justamente ler e escrever. Explico o que é a dislexia, quais os sintomas
que a pessoa apresenta e como se faz, usualmente, o diagnóstico.
Conforme Coll, Marchesi e Palácios (2004, p. 100):
Os sujeitos com problemas no reconhecimento das palavras apresentam
um déficit que tem pouca relação com a capacidade intelectual geral tal
como é medida pelo WISC. É por isso que se podem encontrar sujeitos com
pouca capacidade intelectual que conseguem ler bem, ainda que
obviamente o sejam capazes de compreender o que lêem e, ao
contrário, sujeitos com QI alto que tem problemas nessas operações.
As professoras solicitam auxílio de como trabalhar com a aluna. Explico que,
na verdade, a Adaptação Curricular Individualizada para alunos disléxicos é mínima,
o currículo sofre alguns ajustes, não necessitando praticamente de "recortes" nos
conteúdos, pois a capacidade intelectual do aluno disléxico está preservada, a
73
maioria dos autores estabelece o nível acima de 85 na escala WISC
2
para o
diagnóstico de dislexia.
Apesar de não ter realizado avaliação psicológica, F está em atendimento
psicopedagógico mais de um ano, fez avaliação neurológica e fonoaudiológica,
todas confirmando o quadro de dislexia. Refiro que F progrediu muito em termos
de escrita e compreensão leitora, visto que venho trabalhando muito o
desenvolvimento da consciência fonológica. Contudo, sua escrita é bastante lenta,
ou seja, F precisa buscar o som de cada letra para escrever uma palavra
corretamente, o que demanda um maior tempo para a escrita, sendo esta uma
adaptação curricular necessária: o aumento do tempo para executar a tarefa.
Sua leitura oral também não é fluente, sendo indicado que se faça a leitura
oral, pois normalmente F apresenta bom entendimento do material lido e explicado.
Basicamente, explico às professoras, que a ACI deve constar de poucas pias de
texto, preferencialmente trazer o texto digitado e/ou solicitar que copie apenas um ou
dois parágrafos do que a professora considerar mais importante do assunto
trabalhado, pois, ratifico, sua escrita é lenta. Também não pedir que faça leituras
orais perante o grande grupo, a menos que F não se importe ou peça, e a turma
esteja bem trabalhada quanto às dificuldades que F apresenta para ler oralmente,
visto ser importante não causar-lhe constrangimentos por algo (a dislexia) que é
alheio a sua vontade.
Conforme a professora, e constatação minha também, F resolve bem os
cálculos envolvendo as quatro operações, enfatizo, todavia, que os problemas
matemáticos devem ser lidos oralmente para que F possa interpretá-los e saber que
tipo de cálculo fazer. A ACI fica, resumidamente, assim sugerida:
- Evitar cópias de textos grandes, a menos que seja dado um tempo maior para
concluir;
- Preferencialmente trazer os textos digitados/fotocópias, pedindo que copie um
ou dois parágrafos apenas;
___________________
2
Escala de Inteligência Wechsler para Crianças
74
- Realizar a leitura oral dos textos para F e/ou solicitar a leitura em grupo;
- Não pretender que alcance um nível leitor igual a dos outros colegas;
- Valorizar sempre os trabalhos pelo seu conteúdo e não pelos erros de escrita;
- Sempre que possível realizar avaliação oralmente e/ou ler as questões para
que responda oralmente ou oferecer-lhe um tempo maior para que responda por
escrito; e
- Destacar os aspectos positivos em seu trabalho.
Deixo, por pedido das professoras, cópias de alguns textos que tratam sobre
dislexia.
Em 20 de novembro de 2007, retornei à essa Escola, às 13h30min, para um
novo encontro a respeito da Adaptação Curricular Individualizada da aluna F.
Participaram da reunião a professora do Laboratório de Aprendizagem (LA), a
professora titular da turma de F e a assessora do CEMEI.
A professora relata que F, influenciada pela novela das 20h, que apresenta
uma moça com dislexia, não quer copiar e nem ler nada. A assessora e eu
orientamos para que retome algumas combinações realizadas com a aluna. A
professora prossegue dizendo que sabe que algumas coisas F consegue copiar e
ler.
Coll, Marchesi e Palácios (2004, p. 101) destacam que “[...] a leitura de
palavras familiares pode ser mais fluida e correta. Em última análise, os disléxicos
fonológicos lêem as palavras familiares muito melhor que as não familiares”. Retomo
que a escrita e leitura de F não é fluente e devido ao esforço que exige para ler e
escrever, estas atividades tornam-se cansativas. Contudo, é importante retomar com
a aluna que em algumas atividades com leitura e escrita deve e tem condições de
realizar.
Sugiro a intervenção da orientadora educacional na retomada de combinações
com a aluna e também dialogar com a mãe da menina. Neste momento é importante
estar dialogando com F e sua mãe sobre os programas de televisão, o que podemos
75
tomar como exemplo, o que é somente ficção e serve de entretenimento, etc.
A Adaptação Curricular Individualizada de F segue sem sofrer corte nos
conteúdos desenvolvidos e permanece as orientações dadas à professora como:
realizar a leitura oral de textos à aluna, verificar a compreensão que teve do mesmo,
providenciar cópia das atividades, valorizar suas produções escritas e respostas
dadas pela coerência e acerto das mesmas e não pela ortografia, reduzir os textos
quando considerar necessário a aluna copiar, etc.
Em reunião na Escola Maria Marques, em 12/09/2008, juntamente com a
assessora do CEMEI, professora titular da turma, professora do Laboratório de
aprendizagem, orientadora educacional e supervisora escolar discutimos sobre o
processo de aprendizagem de F. A professora refere que F agora “faz questão de
copiar todas as atividades”, mas a professora percebe que “às vezes, ela cansa”. No
conselho de classe, realizado em 04/09/2008, foi pontuado que está com
dificuldades para concluir todas as atividades, bem como em divisão e multiplicação;
quanto à socialização está bem. Peço cópia da ACI. Deixo novos materiais sobre
dislexia.
F retorna ao atendimento em março de 2009, após período de férias, agora
está com 13 anos, na série. Em sessão realizada dia 17/03/2009, combinamos
horário para organização de estudos. Através de avaliações constato dificuldades na
orientação espacial e temporal, memória recente, imediata e remota e gnosia
espacial no examinador (no outro). Disse que está conseguindo copiar as atividades
do quadro, que uma colega auxilia-a na leitura e que está se relacionando bem com
os professores.
Mantoan (apud STOBÄUS e MOSQUERA, 2004, p. 31) afirma:
Sabemos que a cooperação cria laços muito fortes entre os alunos e
propicia interações que encorajam os mesmos. É esperado que um aluno
seja tutorado naturalmente por outro colega, que tem facilidade, em uma
dada disciplina curricular, por exemplo. Esse apoio espontâneo é mais um
meio de fazer com que a turma reconheça as diferenças e perceba que
cada um tem suas habilidades, talentos, competências e dificuldades para
abordar um ou outro conteúdo, do leque das disciplinas escolares.
Na sessão do dia 03/04/2009 queixa-se: “ninguém sabe, parece, que eu tenho
dislexia”, referindo-se aos professores. Fala que em algumas matérias, não está
76
conseguindo copiar todo o conteúdo.
Nessa mesma sessão a mãe comparece. Diz que dialogou com a
orientadora escolar e os professores estão cientes da situação da filha, contudo
ainda não há plano diferenciado.
Em outra sessão traz a prova de geografia. Vejo, pelas respostas, que a
professora não considerou as alterações (erros) de ortografia, mas a coerência das
idéias, o que é uma adequação na hora de avaliar um instrumento escrito de um
disléxico. Mesmo a prova sendo escrita, não indicada à F, houve adequação no
momento da correção.
Percebo que F está bem quanto às habilidades aritméticas, mas suas
dificuldades na leitura e compreensão leitora, bem como escrita, permanecem
bastante acentuadas. Ela produz grandes erros/alterações ortográficas, ficando sua
escrita, em vários momentos, praticamente ilegível devido às trocas, substituições,
omissões e acréscimos que produz. Ela própria, passado algum tempo, diz não
entender o que escreveu. com grande esforço textos escritos, mas ao término
acaba não tendo compreensão.
Em 18/05/2009 vou à Escola Maria Marques. Reúno-me com a orientadora
Conceição Gonçalves e esta relata que os professores trabalham com orientações
sobre F, mas que este ano não formalizaram a ACI. Oriento/sugiro para que façam e
coloco-me à disposição para assessorar. Diz que os professores pesquisaram sobre
dislexia, mas a lembro de ter deixado material na escola. Falo que F apresenta
acentuado transtorno na compreensão leitora e escrita. Oriento: não esperar, criar
expectativa que venha a ser normoleitora/ortográfica; priorizar atividades orais; e
tarefas de copiar ser apenas com pequenos textos. Falo da prova de geografia que
F levou à sessão; que considerei adequada a correção, mas reafirmei que em testes
escritos as questões devem ser sempre lidas à aluna.
A orientadora pergunta qual é a melhor forma de avaliar a aluna, e eu sugiro
ser por argüição oral ou que o professor leia a prova/teste, deixando que ela
responda por escrito, mas que ele considere as respostas pela idéia da aluna como
fez a professora de geografia, e não pela ortografia. Também oriento para que sejam
dadas fotocópias dos textos para a aluna, pois ela possui dificuldades de
77
compreender sua própria letra e às alterações que produz devido ao próprio
transtorno. Fico disponível à escola para tratar com os professores sobre dislexia e
assessorar na ACI de F, caso resolvam formalizá-la.
F vem passando incólume pela série sem sofrer problemas de disciplina,
conseguiu se adaptar bem com os vários professores, períodos, diversas matérias,
acrescenta-se a isso a entrada na adolescência. Sua dificuldade está centrada na
leitura e escrita. Apresenta grandes dificuldades para ler e escrever. Nunca
reprovou.
A Figura 1 a seguir mostra um texto de F, "Menininha"
3
:
Menininha
Todos os dias na escola eu via você
Eu te olhava todo instante e nem sabia porquê
Eu era apenas uma menina descobrindo a paixão
Eu te olhava todo instante e nem sabia porquê
Até que um dia vi seus olhos olharem minha mão tocou - foi o primeiro beijo
Tudo parecia um sonho realidade
Até que meu pai me disse filha nós vamos pra outra cidade.
Cresci longe da minha menininha,
nunca esqueci do meu menininho
Ah! Avisa que tô voltando. Eu voltei pra gritar
Te amo, te amo, te amo, minha menininha...
FIGURA 1
Produção escrita de paciente com Dislexia. Caso I.
Fonte: MICHEL, Neuza B. Adaptação Curricular Individualizada de Alunos Disléxicos em Atendimento
Psicopedagógico em Escolas Municipais de Esteio/RS. 2009. 113 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) Programa de Pós-Graduação Em Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.
___________________
3
Baseada na música do Grupo Tchê Garotos, “Menininha”.
78
Dos encaminhamentos com a família:
No posto de atendimento realizo reuniões com a mãe de F, onde trato,
inicialmente sobre a hipótese de dislexia. Em 18 de maio de 2007 falo da hipótese
diagnóstica e dos encaminhamentos que serão necessários para confirmação do
quadro: avaliação com neuropediatra, fonoaudióloga e psicóloga. A mãe, sempre
sensível e solícita às necessidades da filha, inicia com os atendimentos
encaminhados por mim diretamente aos profissionais do posto de saúde, o que
beneficia a todos: profissionais e família, em termos de agilidade e trocas de
informações. A única avaliação não realizada por F foi o teste WISC, pois não
dispomos do material na unidade e a família não teve recursos para o serviço
particular. Optamos (neuropediatra, fonoaudióloga e eu) após avaliações, em
darmos o diagnóstico, pois éramos três profissionais compactuando da mesma
opinião e a menina seria beneficiada com o diagnóstico na escola, pois a partir deste
se iniciaria a ACI.
Em 15 de junho de 2007, a mãe havia iniciado a avaliação com a
fonoaudióloga. Com a neuropediatra, eu havia feito encaminhamento em 09 de
março de 2007. A primeira consulta foi em 13 de abril de 2007.
Em 17 de julho de 2007, em novo encontro com a mãe, com o diagnóstico
concluído, explico com maior precisão no que consiste o transtorno de dislexia e
como a família pode contribuir com a aprendizagem de F. A responsável autoriza
meu contato com a equipe pedagógica da escola a fim de estar dialogando sobre o
diagnóstico e contribuindo com orientações sobre a melhor proposta pedagógica
para F. Também entrego, ao longo dos atendimentos, textos explicativos sobre o
assunto. À medida que vou atendendo a menina, vou dialogando e orientando a
família.
Em 17 de agosto de 2007, oriento à mãe para que entregue cópia dos
diagnósticos à escola. Em diálogo com a orientadora escolar, esta diz que está
providenciando encaminhamento da aluna ao CEMEI. Em 14 de setembro de 2007,
dialogo novamente com a mãe e informo que fui à escola e iniciamos a adaptação
curricular individualizada para a menina.
Em 29/05/2008 comparece a mãe de F na unidade de saúde. Diz que a filha
79
não freqüentará o laboratório de aprendizagem na escola, pois está bem quanto a
aprendizagem. Acompanharei sua ACI com atendimento psicopedagógico quinzenal.
A responsável relata que F vem lidando bem com o transtorno de dislexia. Retomo
orientações do que se trata o transtorno e digo que providenciarei material para
estudo/leitura.
Em 29/08/2008, em novo encontro com a mãe, entrego novos textos sobre
dislexia. A mãe refere que leu os textos oferecidos anteriormente; e que o marido,
pai de F, apesar de não ler, pois apresenta dificuldades para leitura, sabe do que se
trata o transtorno. A responsável relata que procura deixar os parentes próximos
avó, tios informados a respeito, conforme refere “nunca sabemos o dia de amanhã
e se eu não estiver aqui? Outras pessoas próximas, além do pai e do irmão, têm que
saber do que se trata a dislexia!”. A mãe mostra preocupações com o próximo
ano, quando F estará na série e terá vários professores. Chora durante a sessão,
e recomendo mais uma vez a ela procurar atendimento em psicoterapia, mas ela diz
não ter horários. Percebo resistência dela.
4.1.2 Caso II
L, 10 anos, em atendimento psicopedagógico desde 02 de julho de 2007,
estava na série, reprovou uma vez na série, veio encaminhado pelo
neuropediatra com hipótese de dislexia.
Ao longo das sessões L mostra-se um menino bastante conversador, disperso
nas realizações das atividades, dificuldades com a memória recente (curto prazo),
dificuldades para compreensão leitora, escrita e disgrafia, sintomas que indicam
quadro de dislexia. Contudo, percebe-se que é uma criança inteligente que busca
alternativas para contornar suas dificuldades.
Em 10 de julho de 2007 comparecem ao posto de saúde a orientadora
educacional da escola de L, a professora titular e a professora estagiária. Falo da
hipótese de dislexia também levantada pela neuropediatra e que estamos
aguardando avaliação psicológica e fonoaudiológica para confirmar esse transtorno
80
de aprendizagem. A equipe da escola diz que iniciará ACI com L; relatam que o
menino é participativo, inteligente, mas com dificuldades para leitura e escrita.
Conversamos a respeito do transtorno de dislexia, do que se trata e quais as
atividades e avaliações que beneficiam a aprendizagem do aluno.
Em reunião com a orientadora educacional e com a assessora itinerante do
CEMEI, em 29/11/2007, pergunto-lhes o que sabem sobre dislexia e como está L na
escola. A orientadora refere que houve alguns problemas na turma devido a muitas
troca de professoras: a turma esteve com estagiária, após a professora titular
assumiu, mas logo entrou em licença saúde, então uma nova professora ficou com a
turma, até que a titular retornou e voltou a assumir os alunos, mas encontra-se em
licença saúde novamente. Quanto a L, diz que está bem, é muito comunicativo e
perspicaz, vem desenvolvendo bem as atividades diferenciadas que envolvem
leitura e escrita.
A respeito do que sabem sobre dislexia, dizem que após o diagnóstico de L
foram buscar mais informações sobre o assunto. Percebo que há a necessidade de
orientar-lhes sobre dislexia e assim prosseguimos a reunião.
Segundo Coll, Marchesi e Palácios (2004, p.101)
em geral, entende-se que para poder falar de um atraso específico na
aprendizagem da leitura é necessário reunir várias condições:
- que a capacidade intelectual dos sujeitos seja normal (por exemplo, um
QI
4
não inferior a 85);
- que se constate em atraso de pelo menos dois anos entre a capacidade
geral (avaliada mediante QI) e o rendimento na leitura (avaliado mediante
prova padronizada);
- que haja contato com a oportunidade de aprender, isto é, que tenha
recebido um ensino convencional, com freqüência regular às aulas e uma
formação adequada;
- que não haja uma causa que por si mesma possa explicar o atraso, sejam
problemas emocionais que tenham impedido a participação do aluno nas
experiências de aprendizagem e ensino. Que tenha um QI normal.
Oriento e sugiro formas de trabalhar e avaliar o aluno disléxico, assim como fiz
no caso I. Deixo materiais (textos e sites) que podem ajudar-lhes no aprofundamento
do assunto.
___________________
4
Quociente de inteligência (abreviado para QI, de uso geral) é uma medida derivada da divisão da
idade mental pela idade cronológica, obtida por meio de testes desenvolvidos para avaliar as
capacidades cognitivas (inteligência) de um sujeito, em comparação ao seu grupo etário.
81
Em 2008, L cursa a série, segue no acompanhamento psicopedagógico e é
aprovado para a 5ª série.
Em 2009, nas sessões, observo grande avanço na leitura de L, quase que
lexical e, mesmo que vacilante, consegue uma boa compreensão leitora, contudo
sua escrita permanece disgráfica, trocas de letras, omissões, etc.
O avanço de série trouxe mudanças para L: a multiplicidade de professores na
série, que agora são nove professores e, até então, havia no máximo três; as
mudanças da própria idade, saindo do mundo infantil, pois ele é bastante menino
“serelepe” para uma, digamos, pré-adolescência que ele ainda não se deu conta,
parece; conta que não consegue deixar o bico a noite, passa o dia jogando bola,
tudo de um jeito criança de ser que lhe é muito próprio, parecendo realmente que
nada pode perder. Mas está de certa forma bem nesta transição.
Em 25 de maio de 2009 vou à Escola Municipal Vila Olímpica e reúno-me com
a orientadora pedagógica Maria Jurema Becker. A orientadora, que chegou à escola
este ano, está apropriada da história de L, os professores receberam material sobre
dislexia, refere que a “queixa” dos professores ou dificuldades que vem trazendo
está relacionado às atitudes do aluno, bastante disperso e desatento, contudo está
bem quanto à aprendizagem dos conteúdos. Dialogamos sobre avaliação e
metodologia adequada ao aluno. Em 29/05/09 os professores reunir-se-ão para
realizar a ACI do aluno.
L vem sentindo, e seu comportamento e suas atitudes confirmam, a saída dos
anos iniciais do ensino fundamental à entrada dos anos finais. Seu problema, com
atenuações, está na relação estabelecida com os professores e colegas.
Permanecem as alterações na escrita, como mostra a Figura 2, com troca de
letras com fonemas semelhantes ("s" e "c"); junção de palavras ("tenum" para "tem
um"); omissão de letras ("fomato" para "formato"); deslocamento ("froma" para
"formar"); entre outras. Contudo, vem progredindo na compreensão leitora.
82
FIGURA 2
Produção escrita de paciente com Dislexia. Caso II.
Fonte: MICHEL, Neuza B. Adaptação Curricular Individualizada de Alunos Disléxicos em Atendimento
Psicopedagógico em Escolas Municipais de Esteio/RS. 2009. 113 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) Programa de Pós-Graduação Em Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.
Dos encaminhamentos com a família, destacamos os seguintes momentos.
Em 12 de fevereiro de 2007 compareceu a mãe de L para entrevista
psicopedagógica. Conforme relato da responsável, L não consegue ler e escrever, já
esteve em atendimento psicopedagógico, psicológico e fonoaudiológico; diz que
atualmente encontra-se em atendimento com a neuropediatra do posto de saúde,
que fez o encaminhamento para avaliação psicopedagógica por hipótese de dislexia.
Importante salientar que o atendimento psicológico também foi realizado nesta
unidade de saúde, contudo a mãe explica que devido à gravidez do outro filho, e
problemas de saúde, não teve como permanecer e acabou abandonando o serviço,
os atendimentos fonoaudiológico e psicopedagógico foram realizados através de
convênios e também foram interrompidos.
Na história vital de L não relatos de problemas relativos à gravidez, parto,
desenvolvimento motor e controle esfincteriano, contudo apresentou atraso no
desenvolvimento da linguagem, começou a falar com quase três anos, “demorou
muito”, disse a mãe. L fez, recentemente, audiometria e avaliação oftalmológica,
mas nada foi constatado.
A mãe de L mostra-se uma pessoa esclarecida, responsável com os
encaminhamentos propostos. No início de julho de 2007, inicia avaliação
psicodiagnóstica com o menino. Foi necessário realizar esta avaliação fora da
unidade da saúde, com atendimento particular, pois na saúde municipal e no
CEMEI, ainda, não os materiais necessários para a aplicação dos testes
83
psicológicos.
A avaliação com a fonoaudióloga foi realizada na própria unidade de saúde,
onde L é atendido por mim e pela neuropediatra. O diagnóstico de dislexia foi
dado por equipe técnica (neuropediatra, fonoaudióloga, psicopedagoga) após
conclusão do laudo psicodiagnóstico. Conforme a psicóloga, foram utilizados para a
avaliação psicodiagnóstica de L os seguintes instrumentos: Escala de Inteligência
Wechsler para Crianças (WISC- III - R) e Rorscharch (teste projetivo).
Todas as entrevistas de levantamento do histórico de L foram realizadas com a
mãe do menino, pois devido ao trabalho do pai, não há possibilidades de horários.
Em 03 de setembro de 2007, indiquei atendimento psicoterapêutico para mãe
de L. No dia 14, deste mesmo mês, iniciou com o psicólogo de adultos da unidade
de saúde. L, por indicação da equipe do posto e da psicóloga que realizou o
psicodiagnóstico, aguarda retorno ao atendimento psicológico. A mãe desejava que
retornasse a mesma psicóloga que o atendeu em outrora, pois segundo conta,
possuía muito bom vínculo com a profissional.
Com a mãe de L também realizo encontros explicando, dialogando sobre o
transtorno de dislexia e orientando-lhe como melhor ajudar o filho com as atividades
escolares e futuras. Dou-lhe textos sobre dislexia, sugiro sites de pesquisa, etc.
Em 23/04/2008 retomo atendimento psicopedagógico com L, agora na série
e acompanhamento da ACI. A mãe fala que L não freqüentará o laboratório de
aprendizagem.
Em 11/08/2008 a mãe relata que percebe L mais interessado nas atividades
escolares, mostrando interesse em atividades que envolvam leitura e escrita. Na
escola, solicita para ler oralmente, sente que o filho está mais seguro, sem medo de
“ler errado”, e ele próprio, relata a mãe, às vezes, explica à irmã menor porque não
fluentemente e não escreve corretamente algumas palavras. A e, por sua vez,
leu todo o material passado sobre dislexia, pergunta-me porque o transtorno ocorre
mais em meninos do que em meninas. Passo-lhe novo material sobre o tema. L
encontra-se em atendimento psicológico. A mãe fala estar preocupada, pois L
permanece chupando bico e “come muito”, parece ansioso.
84
Em 20/03/2009, L está na série, a mãe relata que dialogou com os
professores, o professor de geografia disse que dará fotocópias de textos, os demais
mostraram-se disponíveis. Refere que L está “muito agitado, copia, mas não dá para
entender o que escreve”. Em 17/04/2009, novamente a mãe queixa-se do
comportamento de L na escola e em casa: “muito agitado”, “notas baixas em
matemática, não pergunta quando tem dúvidas, responde para a mãe e
professores”; a mãe relata que L está com o comportamento bastante diferente,
atitudes inadequadas. Solicita novo encaminhamento à neuropediatra.
Em 08/06/2009 a mãe de L comparece ao posto de saúde. Dialogamos. A
responsável esteve na escola em reunião com a orientadora escolar que diz que L
está mais calmo, parece que a fase de grande agitação na série está passando;
combinou horários adequados com o filho para a realização das tarefas escolares
em casa, horários em que pode sentar com ele e auxiliá-lo. Na sessão, observo L
mais atento às propostas de trabalho.
Essa transição da para a 5ª série, normalmente, vem acompanhada de
alguns “desajustes” ou “(re) ajustes”, seja no comportamento ou na aprendizagem e,
não raro, um interfere no outro. Vários fatores contribuem: idade, estão entrando na
adolescência, quantas coisas advém com isso! Lidam com várias disciplinas e
professores, troca de períodos, etc.; ou seja, a série exige uma autonomia e
disciplina que, muitas vezes, os alunos não possuem ou não foram devidamente
preparados. Estão, pelo menos inicialmente, muito agarrados à “barra da saia” da
professora, acostumados que foram até então e, de repente, se vêem ou se acham
“soltos” e acabam não sabendo lidar com isso. Resultado: desordem, bagunça na
sala de aula, gerando mal-estar aos professores, pais e aos próprios alunos.
Oriento a mãe para valorizar as mudanças que estão trazendo benefícios a L,
não reforçar comportamentos como “tu estás muito agitado, não pára quieto, está a
milhão, etc.”, pois isso acaba não contribuindo e pode fazer com que, realmente, ele
assuma o que está sendo dito e projetado pela pessoa que confia e ama. Atitudes
como de combinar horários para estudo, realização de temas, lazer e acompanhar a
vida escolar, estas sim, geram segurança e dão suporte a L.
85
4.1.3 Caso III
T iniciou atendimento psicopedagógico em 27 de maio de 2005, na época
estava com 12 anos. Veio encaminhado pela psicóloga, fonoaudióloga e escola.
havia repetido a série e estava repetindo a série naquele ano. Mesmo estando
com os atendimentos psicológicos e fonoaudiológicos bastante tempo, suas
dificuldades para leitura e escrita permaneciam.
Em sua história, não relatos de problemas relativos à gravidez, parto e
desenvolvimento. Nem história de otites ou dificuldades visuais. Falou na idade
esperada, não apresentando dificuldades que tivessem chamado à atenção quanto a
esse aspecto do desenvolvimento. Os problemas começaram com a alfabetização.
T foi criado pelos avós paternos desde os 4 anos de idade. Segundo relato da
avó, o pai foi assassinado “em uma festa de churrasco para homens, houve uma
briga, não era com ele, era com outros dois, ele separou os dois e deram um tiro,
isso foi num domingo”. T também estava em atendimento psiquiátrico, havia feito
uso de Ritalina e, no momento, tomava Fluoxetina. Na escola, estava “muito
desobediente com a professora, a professora pediu pra ficar com ele, mas acho que
ela se arrependeu! Com os colegas, brigam muito”, conta a avó.
Na época, acreditava-se que as dificuldades de aprendizagem de T estivessem
atreladas aos problemas emocionais, devido à perda do pai, a separação da mãe,
dos irmãos, pois foi residir com os avós, ou seja, mesmo com o afeto e bem-querer
dos avós, passou a viver em outra casa, com outras pessoas; teve que se
reorganizar externa, interna e psiquicamente, elaborar o luto do pai, tudo isso aos
quatro anos de idade! Evidentemente as dificuldades na escola com o aprender,
também atravessavam por este caminho, aprender para T estava, até então, sendo
muito difícil! Estava quase que ligado a perdas e ter que, necessariamente, conviver
com estas. Bem, se o atendimento psicológico vinha sendo emocionalmente muito
bom para T, o mesmo progresso não se via em relação à aprendizagem da leitura e
escrita e percebia-se que era um menino bastante inteligente.
A avó, na entrevista psicopedagógica, referiu que o seu desejo era que “ele
86
aprenda a ler, ele sabe um pouquinho, mas o para acompanhar a série [...] ele
tem muita dificuldade para ler e escrever”.
Em 2006 não tínhamos na unidade de saúde neuropediatra. Havia a suspeita
de dislexia, mas precisávamos da avaliação neurológica. Foi então, que em acordo
com o avô, encaminhei-o para a Dr. Ana Guardiola. A consulta foi agendada para 10
de janeiro daquele ano. Em sessão com T e seu avô, em 03/02/2006, dialogamos
sobre o atendimento com a neurologista. Entenderam, médica e avô, que eu deveria
ir buscar o diagnóstico.
Em 06/02/2006 dialoguei com a Dr. Ana Guardiola por telefone. Sugeriu que eu
fosse buscar a avaliação neurológica de T, pois percebeu o avô como “uma pessoa
bastante afetiva e simples, poderá não ter entendimento do diagnóstico”, referiu.
Em 23/02/2006 fomos, psicóloga Claudia e eu, ao consultório da neurologista.
Disse-nos que se tratava de um quadro de Dislexia, considera “que no ensino formal
T não irá avançar, terá que ser avaliado de outra forma, mais para o lado oral.” Fez
referências à lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Realizou vários
testes. Em alguns T apresentou desempenho inferior a sua idade, em outros foi
correspondente à idade cronológica. Sugeriu que após algum tempo fizesse nova
avaliação, pois estava em atendimento psiquiátrico, psicológico e
psicopedagógico.
Em 03/03/2006, em sessão com T e seu avô, faço devolução diagnóstica da
avaliação neurológica realizada com a Dr. Ana Guardiola. Enquanto eu explicava ao
avô, T fechou os olhos, fez como se estivesse dormindo, após a saída do avô da
sala, permaneceu “dormindo”, deixei-o “dormindo”, logo “acordou” e voltou-se à
proposta de trabalho.
Mesmo com a avaliação neurológica, precisávamos da avaliação cognitiva. No
posto de saúde não dispomos do material para realizá-la. Em 14/07/2006 dialogo
com T e seu avô sobre avaliação cognitiva, concordam em fazê-la. Em 14/08/2006 o
avô comparece para a sessão. Encaminho T para a avaliação psicodiagnóstica no
Instituto Cyro Martins, com a psicóloga Fátima Oliveira, a primeira sessão foi
agendada para 15/08/2006, às 16h15min.
87
Em 04/10/2006 fomos, psicóloga Claudia e eu, ao Instituto Cyro Martins.
Dialogarmos com a psicóloga Fátima Oliveira. Conforme psicóloga, o resultado do
teste WISC mostrou que T possui nível cognitivo acima da média. Outros testes
mostram questões emocionais, que segundo a profissional, também além da dislexia
podem interferir na aprendizagem de T. Relatou que deu uma pequena fábula para T
ler. Ele leu e compreendeu-a, mas não conseguiu ler as palavras “papai” e “mamãe
contidas na história, acredita que isso seja em razão de sua história prévia. Sugeriu
terapia familiar. A psicóloga o concorda com o diagnóstico da Dr. Ana Guardiola
no que diz respeito a hiperatividade.
No dia 05/10/2006 retornamos à Escola Municipal Flores da Cunha.
Dialogamos com a orientadora, supervisora e diretora. Orientei-as quanto aos
procedimentos que o necessários para realizar avaliações escritas com T: ler a
prova para ele, tempo maior para a realização ou por argüição oral.
Nas sessões oriento T quanto ao seu potencial cognitivo, as normas que
precisa seguir na escola e em casa, a dislexia não deve ser usada para ganhos
secundários. O que tem condições e dever de fazer, deve ser feito.
Com a família, principalmente com T e avô, dialogamos sobre o transtorno de
dislexia. Com a escola, em diferentes momentos, na própria instituição e no posto de
saúde, reúno-me com os profissionais para tratarmos sobre a Adaptação Curricular
Individualizada, procedimentos adequados para avaliá-lo, metodologia específica
para cópias de textos, etc.
Atualmente T encontra-se na série. Está com 16 anos. Os problemas de
disciplina atenuaram-se consideravelmente. Mostra-se maduro, consciente do
transtorno que apresenta, deseja concluir o ensino fundamental antes dos 18 anos
em virtude do alistamento militar. Busca formas de contornar suas dificuldades,
apóia-se na memória auditiva, registra palavras-chaves, sente que está lendo com
melhor compreensão. Em sessão realizada dia 20/03/2009 comentou “não estou
lendo fluente, mas entendo o texto”, participa oralmente das aulas, seja perguntando
ou dando sua contribuição sobre o que sabe, participa da banda da escola, possui
bom relacionamento com professores e colegas. Realmente sua compreensão
leitora vem melhorando, sua escrita ainda apresenta transposições de letras, trocas
88
com letras que apresentam o mesmo som, apoio na oralidade, omissões, contudo
está dentro do prognóstico para o quadro de dislexia.
Em sessão realizada em 16/07/09 fala que a metodologia usada pelos
professores atende sua necessidade; “não é focal, até porque eu não gosto disso,
de me expor”, diz ele, mas relata que os professores realizam aulas explicativas,
lêem os textos ou solicitam que o grupo leia, ou seja, a metodologia contempla a
todos sem, no entanto, ser um plano diferenciado somente para ele. Quanto às
avaliações escritas, estas sim, são adaptadas para ele. Realiza-as com a professora
do LA. A professora faz a leitura e T responde oralmente.
T, agora mostra-se tranqüilo quanto ao comportamento e relações com
colegas e professores. A fase crítica de rebeldias e reprovações passou. Sofreu
até chegar ao diagnóstico. Considerado inteligente pelos profissionais que lhe
atendiam, escola e família, não compreendiam o motivo pelo qual não se
alfabetizava adequadamente em termos de leitura e escrita. Em razão disso, não foi
poupado do processo de reprovações. Reprovou na 1ª, 4ª e 5ª séries.
Na série, em 2006, estava com o diagnóstico de dislexia, todavia a
escola não trabalhou com ACI, vinha trabalhando com orientações aos professores;
aliado a isso, foi um ano de problemas relativos ao comportamento do aluno:
negava-se a realizar os trabalhos propostos, o comparecia às avaliações em
horários alternativos, era considerado líder negativo na turma, tinha defasagem
idade /série, etc.
T, também sentiu a saída da e chegada a série. Hoje, aos 16 anos,
possui uma boa relação na escola e lida bem com o transtorno de dislexia.
Apresenta boa compreensão leitora apesar de não possuir leitura fluente; a escrita é
legível, permanece com alterações, mas dá-se conta das trocas de letras cometidas,
não de fonemas, quando lê pausadamente. Escreve devagar para evitar alterações.
A Figura 3 mostra um texto de T, onde podemos observar sua historia atual, e
como está conseguindo conquistar seus anseios, consciente de suas dificuldades.
Apresenta uma escrita legível, e apesar dos erros ortográficos, um texto
compreensível e coerente.
89
FIGURA 3
Produção escrita de paciente com Dislexia. Caso III.
Fonte: MICHEL, Neuza B. Adaptação Curricular Individualizada de Alunos Disléxicos em Atendimento
Psicopedagógico em Escolas Municipais de Esteio/RS. 2009. 113 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) Programa de Pós-Graduação Em Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.
4.2 APRESENTAÇÃO DOS DADOS DAS ENTREVISTAS
Foram realizadas entrevistas com professores para levantamento de
informações iniciais, com estas duas perguntas amplas:
Quais os conhecimentos que os professores e equipe possuem sobre
dislexia?
O que você gostaria de receber de informações sobre Adaptação Curricular
Individualizada em dislexia e temas relacionados?
Para apresentar os dados das entrevistas organizou-se categorias de
conteúdos, levantados a partir das entrevistas, que ficaram assim organizadas:
90
TABELA 1
Categorias levantadas a partir das respostas nas entrevistas
CATEGORIAS
Conhecimentos dos
professores sobre dislexia
Necessidade dos Professores
de Informações sobre
Adaptação Curricular
Individualizada
Fonte: MICHEL, Neuza B. Adaptação Curricular Individualizada de Alunos Disléxicos em Atendimento
Psicopedagógico em Escolas Municipais de Esteio/RS. 2009. 113 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) Programa de Pós-Graduação Em Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.
Quanto às entrevistas de levantamento de informações sobre quais os
conhecimentos que os professores e equipe possuem sobre dislexia, levantou-se os
seguintes dados:
TABELA 2
Conhecimentos dos professores sobre dislexia por categoria
CATEGORIA
Pouco Conhecimento,
Conhecimento Conceitual
91
CATEGORIA
Comportamento Diferenciado
Problemas na Aprendizagem
Boa Aprendizagem
Alunos Inteligentes
Dificuldades/Transtorno na
Leitura e Escrita;
Dificuldade de Aprendizagem
em Relação a Leitura, Escrita,
Cálculos Matemáticos
Tempo para Aprender
Diferenciado
Dificuldades na Realização
das Atividades
Necessidade de Métodos/
Avaliação Diferenciados
Fonte: MICHEL, Neuza B. Adaptação Curricular Individualizada de Alunos Disléxicos em Atendimento
Psicopedagógico em Escolas Municipais de Esteio/RS. 2009. 113 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) Programa de Pós-Graduação Em Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.
Quanto às entrevistas de levantamento de informações sobre o que gostaria de
92
receber de informações sobre Adaptação Curricular Individualizada em dislexia e
temas relacionados, obteve-se os seguintes dados:
TABELA 3
Necessidade dos Professores de Informações sobre Adaptação Curricular Individualizada por
Categoria
CATEGORIA
Informações Completas
Aprofundar Conhecimentos
Sugestões Práticas
Método de Ensino
Avaliação
Conhecimentos Teóricos
Mitos da dislexia
Fonte: MICHEL, Neuza B. Adaptação Curricular Individualizada de Alunos Disléxicos em Atendimento
Psicopedagógico em Escolas Municipais de Esteio/RS. 2009. 113 f. Dissertação (Mestrado em
Educação) Programa de Pós-Graduação Em Educação, Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.
5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
5.1 ANÁLISE DOS CASOS
Como vimos, ou vemos, o transtorno apresentado pelas crianças, que se
transformaram em adolescentes, é Dislexia. Contudo, cada uma é única na sua
forma de lidar com o transtorno, de pensar, de agir, de se comunicar nas sessões,
de se relacionar na escola seja com professores ou com colegas. Cada um é único
na sua forma de ser, como qualquer outro aluno com ou sem NEE. O que é em
comum: os três alunos o disléxicos, estão desde a série, mas estudam em
escolas diferentes um do outro.
É sempre importante voltar ao que pode acontecer com qualquer aluno, seja
ele disléxico, com outra NEE ou sem NEE: os problemas disciplinares, adaptação
quando chegam a série e entrada na adolescência. Ora, sem o propósito de
banalizar, sabemos que esses problemas citados, muitas vezes junto a outros, são
bastante freqüentes nas escolas. Então, não é o diagnóstico de dislexia que
acomete desordens nas relações escolares. É claro que um diagnóstico pode
afetar a conduta de um aluno, deixando-o com baixa auto-estima, por exemplo. Mas
não podemos crer que as dificuldades comportamentais estejam ligadas unicamente
a um dado diagnóstico. Seriamos unilaterais demais! Jogaríamos a responsabilidade
exclusivamente para o aluno e sua NEE!
Foi muito importante para a efetivação dos acompanhamentos dos alunos a
participação e envolvimento da família, sem os quais este trabalho se inviabilizaria,
pois as crianças precisavam comparecer às sessões de psicopedagogia. A
ocorrência de faltas consecutivas ou sem justificativas levaria, como norma do
serviço, a perda da vaga ao atendimento, com isso, não fariam mais parte desta
pesquisa, cujo requisito é estar em atendimento psicopedagógico. Mas as faltas sem
explicações não ocorreram. As crianças foram e estão sendo assíduas. Envolvem-se
nas propostas de trabalho, contam como estão sendo acompanhadas na escola,
sabem do que se trata a dislexia, estão aprendendo a lidar com elas próprias, e cada
94
uma do seu jeito, vem atenuando e/ou encontrando soluções para conviver com uma
sociedade que exige o acesso e domínio da leitura e escrita.
Assim, quanto ao problema de pesquisa levantado nesse estudo, como é e
por que desenvolver a Adaptação Curricular Individualizada para alunos com
dislexia? E como o/a Psicopedagogo/a contribui nessa construção? Os dados
apresentados permitiram descrever que:
O trabalho vem se delineando e mostrando resultados na diminuição do
fracasso escolar, isto é, da repetência. Desses três alunos que venho observando e
realizando este trabalho, nenhum deles teve reprovação no ano letivo desde o início
do trabalho com a escola. Uma menina que iniciou o acompanhamento em 2005,
estava na 2ª série e hoje está na 5ª série; um adolescente que se encontrava na
série, agora está na série; e um menino, que iniciou em 2007 estava na 3ª série e
atualmente encontra-se na 5ª série.
Além desses resultados, vejo o desenvolvimento do bem-estar dos alunos e
suas famílias, uma vez que sabem o que se passa com eles: porque não lêem
fluentemente e não possuem escrita ortográfica correta. A apropriação do que se
trata a dislexia - tanto pela criança como pela família -, saber como podem aprender
e lidar com essa dificuldade causa um bem-estar que favorece outras
aprendizagens, além de romper com outros estigmas e medos e com os mitos de
que não aprende por desatenção, preguiça, deficiência mental, etc. aí vale o
trabalho. Desenvolveram uma nova perspectiva de futuro, de que poderão fazer
vestibular e concursos, ou seja, onde for exame seletivo envolvendo leitura e escrita
poderão participar com as devidas adaptações.
O prognóstico dos alunos tem sido bem satisfatório. Os responsáveis estão
bastante envolvidos, os alunos comparecem aos atendimentos e buscam novas
formas de lidar com o transtorno.
Nas sessões "denunciam", em alguns momentos, a metodologia usada pela
escola, também as adaptações que são realizadas, como se sentem, etc. A grande
questão é a escola saber para quem se ensina, como se ensina e quem é esse
aprendiz. É saber que crianças de inteligência supostamente normal, que brincam,
pulam e possuem várias habilidades podem apresentar tamanha dificuldade no
95
desenvolvimento da compreensão leitora. Desta forma, esta pesquisa tem
possibilitado realizar nas escolas em questão, um amplo estudo sobre o transtorno
de dislexia: o que é a dislexia, como lidar com o aluno disléxico; e como ajudar o
filho disléxico (professores e pais ocupam lugares e desempenham funções
diferentes, é bom registrar). O trabalho veio para sustentar que é possível trabalhar
com alunos disléxicos através da Adaptação Curricular Individualizada, o
necessitando grandes ajustes nos conteúdos, mas na forma didática de ensinar e na
forma de avaliar o aluno e incluí-lo nas atividades diárias de sala de aula. Bayer
(2006), sustenta que é errado exigir de diferentes crianças o mesmo desempenho e
lidar com elas de maneira uniforme. O ensino deve ser organizado de forma que
contemple as crianças em suas distintas capacidades.
Quanto ao transtorno de dislexia e as atenuações nas dificuldades de leitura e
escrita, não me parece adequado e não é o propósito comparar uma criança com a
outra. Cada uma vem a seu modo, a seu tempo, amenizando as dificuldades e/ou
buscando formas de contorná-las:
- o menino de 11 anos está com grandes avanços na leitura, consegue
realizar uma boa leitura oral, ter compreensão do material lido, contudo sua escrita
ainda permanece comprometida, apresentando ilegibilidade e alterações
ortográficas;
- a menina de 13 anos mostra-se desenvolta, aprende ouvindo a explicação -
que é a forma que tem se apegado para amenizar suas dificuldades -, mas sua
escrita apresenta muitas alterações, como omissões e trocas de letras, a leitura
permanece fonológica, não consegue ler globalmente, dificultando seu próprio
entendimento e ao ouvinte;
- o adolescente de 16 anos vem progredindo muito em termos de escrita e
compreensão leitora, ele mesmo diz: "não estou lendo fluente, mas entendo o texto"
(sic).
Quanto ao trabalho nas escolas, neste ano de 2009 vem se realizando mais
com equipe pedagógica. Em 2008, havia maior encontro com os próprios
professores. As equipes se mostram bastante comprometidas, pedem orientações,
trabalham os textos deixados com os professores, as ACIs vem sendo realizadas e
96
venho orientando e chamando a atenção para a importância da formalização desse
documento/plano.
É uma pena que haja casos, como o do aluno com 16 anos, em que são
encaminhados com defasagem idade/série. Isso infelizmente é comum acontecer
em casos de dislexia; visto aos mitos como os de que ele não aprende por
desatenção ou preguiça. Até se chegar ao atendimento, até haver suspeita pela
escola ou pelos pais, e até se chegar ao próprio diagnóstico, que envolve outros
profissionais, houve perda de ano letivo. Mas os planos e o encorajamento desse
aluno terminar o ensino fundamental, mostra um novo olhar para sua própria
capacidade. Mas se não passasse por todo esse processo psicopedagógico? Talvez
seria mais um dos milhares de adultos brasileiros não-escolarizados, principalmente
por desacreditarem na sua capacidade de aprender.
O diagnóstico não tem sido fácil de realizar porque envolve outros
profissionais. No posto de saúde temos a fonoaudióloga e a neuropediatra, mas a
neuropediatra atende somente uma vez por semana na unidade, então, leva-se
tempo demandado para fazer um exame neurológico evolutivo. Acrescenta-se,
ainda, a dificuldade de psicodiagnóstico, que é necessário realizar fora da unidade
de saúde, pois não temos o material. Com isso, leva-se mais tempo, visto terem que
aguardar chamamento da fila de espera no Centro Municipal de Educação Inclusiva
(CEMEI) ou na APAE.
Também vemos, pelos estudos feitos, que variações quanto a definição de
dislexia. Segundo a definição da World Federation of Neurology, a dislexia é um
transtorno manifestado por dificuldade na aprendizagem da leitura, apesar de
instrução convencional, inteligência adequada e oportunidade sociocultural.
Giacheti e Capellini, em 2000, afirmaram que o distúrbio específico de leitura,
dependem de potencial intelectual normal, sem déficits sensoriais, com suposta
instrução e educação apropriada. Esses concordam quanto ao potencial intelectual.
Mas temos em 1987, Myklebust e Johnson definindo a dislexia como uma síndrome
complexa de disfunções psiconeurológicas associadas, tais como perturbações em
orientação, tempo, linguagem escrita, soletração, memória, percepção visual e
auditiva, habilidades motoras e habilidades sensoriais relacionadas. E assim surgem
variações também quanto a classificação da dislexia.
97
A pesquisa tomou uma proporção muito maior do que a idéia inicial de
Adaptação Curricular Individualizada. Vejo isso como um ganho, tanto para a
pesquisadora, quanto para as crianças. Hoje minha indagação é se a dificuldade na
leitura e escrita é secundária a um déficit no processamento auditivo ou se trata de
uma dislexia auditiva.
Pelas experiências do trabalho clínico, tenho observado que as dificuldades
para a leitura e escrita podem ser secundárias a outras deficiências. Então, me
parece satisfatória a definição de Giacheti e Cappeline, bem como, a da World
Federation of Neurology.
5.2 DISCUSSÃO E ANÁLISE DAS ENTREVISTAS
Como vemos na categoria Conhecimentos dos professores sobre dislexia
(Tabela 2), os professores dizem ter poucos conhecimentos ou conhecimentos
“conceituais” sobre dislexia, sabem que é um transtorno da compreensão leitora e
da escrita, leram e ouviram falar sobre, até porque a rede municipal de ensino
vem investindo neste trabalho de formação. Eu mesma, desde 2007, venho fazendo
um trabalho junto às escolas com alunos disléxicos, realizando reuniões com os
professores, com equipe pedagógica, disponibilizando material sobre dislexia, etc.
Então, não causa estranheza quando o assunto não lhes é desconhecido, o
contrário causaria dor.
Seguindo esta tabela, na categoria “Comportamento Diferenciado”, ratifico a
necessidade de construir com os professores um saber mais epistemológico sobre
dislexia. Ora, se o professor percebe problemas na aprendizagem, é necessário
investigar que problemas são esses, escorreto considerar que o aluno disléxico
apresenta dificuldades para a aprendizagem, mas a questão é onde se apresenta
tais dificuldades, “comportamento diferenciado e jeito de ser e de aprender de
maneira diferente” não garantem os sintomas para dislexia, pois, a rigor, todos
apresentam tais características.
Moojen e França (apud ROTTA et al., 2006, p. 165) salientam que:
98
Atualmente, observa-se um fenômeno de vulgarização do termo dislexia,
devido a uma não uniformização nos critérios de abrangência do termo, o
que gera uma confusão tanto no meio acadêmico quanto clínico. Em
conseqüência, um reflexo na forma como as informações são veiculadas
no meio científico e de comunicação social.
Os elementos colhidos nas demais categorias, ainda na tabela 2, mostram um
grupo de professores com conhecimentos específicos sobre o tema, o que corrobora
com o que fora afirmado anteriormente a respeito do trabalho que vêm se
desenvolvendo na rede.
Contudo, vemos também, através da Necessidade dos Professores de
Informações sobre Adaptação Curricular Individualizada (Tabela 3), que o
desejo, o pedido, de aprofundar os conhecimentos sobre o tema. Bem, o aluno é
disléxico, possui dificuldades na leitura e escrita, mas como se lida com esse aluno
no dia-a-dia da sala de aula? Como se avalia esse aluno? Os outros alunos podem
saber que ele possui metodologia diferenciada? Parece-me que, na síntese, essas
são as grandes questões que os professores se fazem; e onde posso, com os
saberes que venho construindo, contribuir com a prática pedagógica do professor e
para a aprendizagem do aluno. Até porque de um ano para o outro certa
mudança no quadro de professores, principalmente dos anos finais, então um novo
investimento sempre é necessário e bem-vindo.
Para Moojen e França (apud ROTTA et al., 2006, pág.173),
considerando que é no ambiente escolar que as dificuldades aparecem de
forma crucial; que as condições intelectuais estão preservadas no disléxico
e que não cura plena para esse transtorno, uma das tarefas mais
importantes do psicopedagogo ou do fonoaudiólogo é garantir uma série de
adaptações pedagógicas na escola. O disléxico deve progredir na
escolaridade, independentemente de suas dificuldades na leitura e escrita.
Deve estar muito claro que o problema não é devido à falta de motivação ou
à preguiça.”
Posso estar lidando com a falta/ausência desse conhecimento específico pelo
professor, o que a priori, ele não tem como se apropriar de todos os transtornos de
aprendizagem. O importante é que se aproprie de como o aluno aprende quando
apresenta algum transtorno. Esta é a grande questão a se saber: “como o aluno
aprende, apesar de?”. Pelo trabalho que venho propondo, vejo que disposição. O
pecado não é “o não saber”, mas negar-se ao aprender; pelas respostas, não foi a
impressão.
99
Delors (2006, p. 157) apresenta com propriedade que:
A forte relação estabelecida entre professor e aluno constitui o cerne do
processo pedagógico. O saber pode evidentemente constituir-se de
diversas maneiras [...] Mas para quase todos os alunos, em especial para
os que o dominam ainda os processos de reflexão e de aprendizagem, o
professor continua indispensável. (pág.156).
[...] O trabalho do professor não consiste simplesmente em transmitir
informações ou conhecimentos, mas em apresentá-los sob forma de
problemas a resolver, situando-os num contexto e colocando-os em
perspectiva de modo que o aluno possa estabelecer a ligação entre a sua
solução e outras interrogações mais abrangentes. A relação pedagógica
visa o pleno desenvolvimento da personalidade do aluno no respeito pela
sua autonomia e, deste ponto de vista, a autoridade de que os professores
estão revestidos tem sempre um caráter paradoxal, uma vez que não se
baseia numa afirmação de poder mas no livre reconhecimento da
legitimidade do saber.
Quando um professor diz que “seria importante recebermos informações sobre
métodos avaliativos para os diferentes tipos de dislexia”, ou diz “sim, pois sempre é
importante ter conhecimentos mais profundos”, ele está falando do processo de
avaliação do aluno, como ele fará a avaliação de seu aluno que lê, mas possui
dificuldades na compreensão? Escreve, mas comete muitas alterações na escrita?
Quando ele fala em ter conhecimentos mais aprofundados, está mostrando que
deseja sair da superficialidade.
Marchesi (2008, p. 139) escreve bonita e sabiamente:
O sentido da justiça dos professores se reflete de forma nítida na avaliação
dos alunos. Ao avaliar, como ao ensinar (grifo meu), manifestamos não só
os objetivos que atribuímos à educação, mas também nosso modo de ser. A
avaliação dos outros nos permite conhecer como reagimos com aqueles
que dependem de nós e, portanto, quem somos. Nosso comportamento no
processo de avaliação dos alunos é um bom teste para uma auto-avaliação.
Considerando os saberes e necessidades apresentadas pelos professores o
trabalho segue apresentando uma proposta de ACI para a escola, sugere aos pais
como lidar com o filho disléxico e aponta alguns compromissos da sociedade em
relação a pessoa disléxica.
6 DA PESQUISA À AÇÃO: ESCOLA, FAMÍLIA, SOCIEDADE E DISLEXIA
6.1 PROPOSTA DE ACI PARA A ESCOLA
Certamente não sabemos qual o limite da aprendizagem, em termos de leitura
e escrita, para um aluno disléxico. Não sabemos o limite da aprendizagem de
ninguém, nem mesmo das nossas! Contudo, pelos estudos realizados,
conseguimos, de alguma forma, dizer o que nos é possível, ou nos é mais difícil, o
que fazemos sozinhos, ou precisamos da ajuda do outro Vygotsky, ZDR e ZDP.
Igualmente do aluno, precisamos conhecer, desde o momento em que entra para a
escola, onde ele se situa em termos de habilidades escolares. Pois bem, quando o
aluno chega à escola e começam a surgir algumas dificuldades como as
apresentadas neste estudo, pode-se dizer que é um aluno de risco, ou seja, pode
apresentar dislexia. Realizadas todas as avaliações necessárias, também
descritas e, uma vez confirmado o quadro de dislexia, a proposição deste trabalho é
que seja realizada a adaptação curricular individualizada com o aluno.
O aluno disléxico, como sabemos, possui dificuldades para a compreensão
leitora e escrita. Como exigir deste, mesmo de acordo com a sua série e idade, que
faça uma leitura oral apresentando leitura lexical, fluente, bom ritmo e entonação?
Como exigir que escreva ortograficamente se ele possui dificuldades para
discriminar os fonemas? Claro que essas dificuldades, como podemos ver nos casos
em acompanhamento e na literatura existente, podem atenuar, se diferenciam, uns
vão se apropriando melhor da compreensão leitora, outros da escrita, ou amenizam
ambas, ou ainda permanecem com baixo êxito nas duas. Por isso, a proposta de
realizar ACI para esses sujeitos.
Não sabemos onde o disléxico pode chegar em termos de habilidades leitora e
escrita, todavia sabemos, através dos estudos feitos, que não atingem fluência na
leitura e escrita e, caso venham atingir, é porque não constituía de fato o
diagnóstico.
Um aluno disléxico pode almejar/alcançar veis mais altos de escolarização?
Evidente que sim. Não há impeditivos cognitivos para isso. Contudo, se a escola não
101
propiciar um tipo de avaliação apropriada as suas dificuldades centrais baixo nível
de compreensão leitora e erros ortográficos este aluno passará ano após ano
reprovando e, dificilmente, concluirá o ensino fundamental ou médio. Aqui estou
falando de ACI. É necessário adaptar a avaliação para o aluno disléxico, assim
como outras adaptações serão necessárias.
Então, atendendo ao objetivo desse estudo de descrever o desenvolvimento de
uma adaptação no currículo escolar para alunos com dislexia, compreendo que,
como diz González (2007, p. 31), as adaptações não são rígidas nem
permanentes”, ou seja, podem e devem ser revistas. À medida que a aprendizagem
do aluno avança, se modifica, ou até mesmo, quando não se está percebendo que a
ACI está beneficiando a sua aprendizagem, esta deve ser reorganizada pelos
professores e equipe pedagógica.
A seguir, seguindo os objetivos específicos deste estudo, e ancorando-me nos
estudos realizados, recomendo como ACI para o aluno disléxico:
Adaptação nos conteúdos: é importante mencionar que os conteúdos o
sofrem reduções na ACI do aluno disléxico. Todo conteúdo pode ser
trabalhado. O que precisa ser adaptado é a forma como desenvolvê-los.
Adaptação nos objetivos: é coerente não esperar que o aluno disléxico leia
fluentemente ou compreenda textos com facilidade a partir da leitura
individualizada ou oral. Pode-se desejar, no entanto, que participe de todas
as propostas desenvolvidas em sala de aula. Propostas estas que deverão
ser adequadas a sua necessidade, sejam individual ou grupal.
Adaptação na metodologia: aqui temos uma adaptação importante e que
deve ser significativa. sabemos que todo conteúdo pode ser trabalhado
com o aluno disléxico. No entanto, a maneira como desenvolver estes
mesmos conteúdos precisa diferenciar-se, isto é, adaptar-se a sua precisão.
Algumas adaptações recomendadas:
o trazer fotocópias do material a ser desenvolvido em aula ou, pelo
menos, parte dele;
o não exigir que faça cópia de textos extensos; como não apresenta
fluência na leitura e escrita, precisa muitas vezes apoiar-se na
102
sílaba, o que torna a cópia cansativa, levando-o a cometer muitos
erros, podendo a letra ficar ilegível; o ideal é solicitar que copie
alguns parágrafos, reduzir o texto a ser copiado;
o ajustar o tempo quando for exigido cópias e leituras, propiciar um
tempo maior para que realize tais atividades;
o ler para o aluno o material escrito, pois a leitura lenta e fonológica
pode exauri-lhe, contribuindo para a dificuldade na compreensão;
o não exigir leituras orais perante o grupo quando estas o deixam
constrangido devido a sua dificuldade.
o Ensinar a resumir o que fora explicado/lido e compreendido
quando realizar uma leitura, sintetizar o conteúdo.
o Permitir, se necessário, o uso de gravador e calculadora.
Adaptação na avaliação: aqui também a atenção do professor deve ser
significativa:
o quando se tratar de avaliação escrita, o material deve ser lido ao
aluno e/ou propiciar um tempo maior para a sua realização;
o valorizar as respostas escritas pelo conteúdo, e não pelos erros
apontados de ortografia;
o preferencialmente avaliá-lo por argüição oral.
Adaptação no aprendizado de línguas estrangeiras: é muito difícil para o
disléxico dominar a escrita e leitura de uma nova língua, visto que, possui
dificuldades para o aprendizado da língua materna. Sugere-se então:
o Enfatizar o aprendizado da escuta e fala da língua estrangeira.
Evidentemente acrescenta-se a esta proposta de ACI o que deve ser
considerado de cada aluno disléxico, com prioridade ao seu nível de compreensão
leitora e escrita. Os casos estudados mostram que os problemas causados nas
crianças, pelas dificuldades de leitura, não são todos iguais. Neste momento, de
consideração das peculiaridades de cada um, a ACI passa a ser individualizada.
É muito importante destacar que em nenhum momento deixa-se de se investir
no aluno disléxico para que alcance, dentro de suas condições, um nível melhor de
103
leitura e escrita. As sugestões aqui apresentadas constituem uma forma de
possibilitar e desenvolver o trabalho escolar com o aluno.
6.2 MANEJO DA FAMÍLIA E DISLEXIA
O desejo neste momento é fundamentar a importância da presença da família
no acompanhamento e, podemos dizer, no encorajamento ao filho disléxico. A
questão a ser realizada é “qual o papel da família diante do filho disléxico?”.
Começamos pelo consagrado papel dos pais ou representantes desses na
vida da criança desde os seus primórdios. Ninguém dúvida que é na família que as
primeiras aprendizagens acontecem, os primeiros acertos e desacertos, as primeiras
relações de amor e ódio, de prazer e desprazer, ou seja, é por aqui que tudo se
inicia. O resultado de todos esses sentimentos e vivências contraditórias? Para o
bem ou para o mal, não nascemos com manual de instruções. Sabemos, contudo,
que quanto mais a relação familiar estreitar-se por vínculos de confiança, respeito,
amor e autoridade, as coisas tendem a dar certo. E a dislexia?
A dislexia nada tem haver com isso. Absolutamente nada. Pelo menos, não
do ponto de vista das relações familiares. O sujeito pode ser muito bem amado, ser
sofridamente indesejado, ter uma boa situação econômica ou um baixo poder
econômico, a dislexia poderá estar presente em qualquer um deles. A dislexia não
escolhe a classe, a raça ou relações de vínculos estabelecidas entre a família.
Parece que escolhe o gênero. Pesquisas mostram que está mais presente no sexo
masculino. A origem, como vimos, também é genética e também pode ser adquirida.
Agora, a forma como a família vai lidar com o filho disléxico, a atenção
prestada desde o seu início quando se levanta a suspeita do transtorno, isso sim,
fará enorme diferença na vida da criança ou adolescente. Apresento algumas
atitudes, que ao longo da pesquisa, faz-me acreditar como indispensáveis à família:
Os pais precisam ser muito persistentes para percorrer todas as avaliações
necessárias, ou seja, comprometer-se com isso, do contrário o diagnóstico
prejudica-se;
104
Necessitam buscar informações sobre o transtorno, assim poderão lidar
melhor com as demandas que surgirão;
Dialogar com o filho sobre o sobre o transtorno de dislexia, deixar claro o
que ele tem e nunca negar;
Acompanhar a vida escolar do filho o que é compromisso de todos os pais,
independente da presença ou não de transtorno na aprendizagem;
Deixar claro à criança que a dislexia não a impede de ir à escola e realizar
os deveres escolares, mas que terá ajuda para isso;
Levar o filho aos atendimentos necessários, pois estes podem contribuir a
esclarecer sobre o transtorno e ajudá-lo emocional e pedagogicamente;
Não desejar que seu filho atinja um nível de compreensão leitora e escrita
semelhante ao de outras crianças. Isso deixará a todos frustrados: família e
criança, além de deixá-la ansiosa;
Colocar-se ao lado da criança para ajudá-la, não fazer por ela;
Deixar claro que suas dificuldades na leitura e escrita, apesar de não
superadas, podem ser atenuadas;
Valorizar as potencialidades da criança e suas conquistas.
6.3 SOCIEDADE E DISLEXIA
A sociedade é um organismo vivo. A sociedade somos nós. Somos todo esse
emaranhado de etnias, gênero, raça e concepções. Considerando a diversidade
existente, como lidarmos/recebermos a pessoa disléxica nos diferentes espaços que
a sociedade oferece? Sobretudo nas instituições de ensino e de trabalho?
A sociedade como um todo não tem a obrigação de saber o que é dislexia:
definição, etiologia, prognóstico, etc. Grupos sociais como a família e escola com
sujeitos disléxicos sim, precisam apropriar-se do assunto e contar com o apoio dos
profissionais da educação e da saúde que tenham conhecimento sobre o distúrbio.
Talvez, aqui, esteja um importante dever social: profissionais como o médico, o
105
psicólogo, psicopedagogo e fonoaudiólogo, que estudam a respeito do transtorno de
dislexia, estar aberto e flexível ao diálogo claro e acessível com a família e escola.
Esclarecer como lidar com o aluno e com o filho disléxico constitui-se um dever
social e profissional de extrema relevância.
O disléxico, como vimos, possui inteligência preservada e busca formas de
contornar suas dificuldades. Agora, alguns acessos devem ser oferecidos, como
tutoria no momento de prestar concursos e vestibular. Ele ficará em desvantagem se
lhe oferecer uma prova carregada de textos extensos e questões de múltipla
escolha, exigindo-lhe o mesmo tempo de execução atribuído aos normo-leitores. É
necessária uma adaptação para que ele realize a prova do concurso ou vestibular.
Como sugerido, aqui também é necessário que um profissional leia a prova e,
caso seja escrita, considerar suas respostas pelas idéias produzidas. Em condições
de ler o material, fazer uma previsão de tempo maior é sempre aconselhável.
As universidades, habituadas que estão com todo o rigor dispensado aos
alunos ao nível de escrita e leitura, rigor este legítimo e necessário, necessitam
também adaptar-se ao aluno disléxico. A ênfase é a mesma da que as escolas
devem dar: valorizar seus trabalhos pelas idéias produzidas e permitir que as aulas
sejam gravadas, pois, normalmente, o aluno universitário ouve e registra, o registro
fluente para o disléxico é impraticável, a gravação das aulas poderá ser um recurso
bastante útil.
Para além dos espaços acadêmicos, a sociedade ainda busca por uma
homogeneidade/padronização que sabemos não existir. As pessoas são e pensam
diferente. Como conviver e bem viver com as diferenças já foi amplamente estudado
e fundamentado no início deste trabalho. O disléxico, também precisa trabalhar e
possui condições para isso, precisa como qualquer outra pessoa com ou sem
deficiência, ser respeitado e aceito em diversos espaços sociais. Acrescenta-se o
espaço profissional tão importante para qualquer ser humano. A sociedade carece
de humanização, ser solidária e compreensível às necessidades de cada pessoa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo desse estudo, a apropriação e aprofundamento de outros saberes
foram necessários. Muito mais do que a origem que se constituía em diagnosticar
alunos com dislexia e propor Adaptação Curricular Individualizada, foi preciso
estudar com exaustão no que consiste a Dislexia e as disposições que envolvem a
aquisição da leitura e escrita.
Como vimos, diferentes estudos e definições para Dislexia. Estudos e
definições estas que, em alguns momentos, se diferenciam ou se assemelham, mas
a rigor, a etiologia, diagnóstico, caracterização e tratamento deste comprometimento
permanecem em estudos, assim como, outros transtornos. Em aprendizagem e
saúde é difícil estancarmos os saberes, também não parece ser o recomendável.
Todavia, quando se trabalha com um leque amplo de pesquisas e referências, não é
possível negar as dúvidas que se circunstanciam por vezes. Ora, o que faz então,
compactuar com um ou outro autor, são as próprias observações e características
dos casos em investigação.
Chegar ao diagnóstico de Dislexia não é simples como, rapidamente pensando,
parece ser. Exige o envolvimento de diferentes profissionais. Em se tratando de
unidade pública de saúde, nem sempre temos todos os profissionais disponíveis
e/ou que possam atender concomitantemente com o atendimento psicopedagógico.
Dos casos apresentados aqui, particularmente o caso I e II, o a exceção do que
acontece via de regra. Os responsáveis tiveram condições econômicas de financiar
atendimentos particulares, como a aplicação da avaliação psicométrica. Fora isso,
como mencionado, o diagnóstico é clínico, isto é, não um marcador biológico
que determine o Transtorno de Dislexia, mas sim um conjunto de condições que
caracterizam a dificuldade na aprendizagem da leitura e escrita. Algumas destas
condições apresentam-se também na aprendizagem de não disléxicos. Isso me leva
ser bastante cuidadosa, pois a linha de erro é nue, principalmente quando o aluno
está nos anos iniciais do ensino fundamental. Concordo que mesmo mostrando
características para a dislexia, é mais apropriado acompanhar o caso, propor
adaptações no currículo e deixar o diagnóstico para quando o aluno estiver na 3ª
107
série, pois é difícil dizer que uma criança de ou rie com dificuldades para
apropriar-se da leitura e escrita tenha dislexia, mesmo com os achados que a
caracteriza, pois pode ser uma dificuldade transitória, um distúrbio de aprendizagem.
O que irá determinar, então, é a permanência das dificuldades e as avaliações de
exclusão, chamadas de Avaliação Diferencial Multidisciplinar, para a constituição do
quadro de dislexia.
Bem, e as ACIs para os alunos disléxicos? Posso dizer que estão acontecendo
sob a orientação da equipe pedagógica da escola em estreita relação com o serviço
psicopedagógico. Os alunos permanecem no atendimento. As reuniões nas escolas
foram propostas afim de efetivar esta pesquisa e continuam sendo realizadas
sempre que as equipe assim o necessitar. Como mudança de série do aluno,
mudanças no quadro de professores a cada novo ano, ou no próprio ano corrente,
necessidade de sempre a escola, e coloco-me à disposição para isso também,
estar retomando as questões para o entendimento do que se trata a dislexia e
trabalho com ACI. As equipes mostram-se bastante envolvidas, abertas ao diálogo e
à proposta de ACI. Mesmo quando optaram por trabalhar orientando os professores
na sua prática, foram flexíveis as sugestões dadas.
Foi fundamental para a concretização e permanência deste trabalho o
envolvimento e responsabilidade das famílias. Nem eu imaginava que os
responsáveis valorizariam e acompanhariam tanto os seus filhos no transcurso de
todo o atendimento; as andanças que tiveram que fazer afim de realizar o
diagnóstico, as sessões no posto, as reuniões que participaram e participam na
escola e a busca que fazem por essas, principalmente quando o ano se inicia - ficam
angustiados, pois a equipe pedagógica pode ter mudado, professores, etc, é
necessário informar-lhes, então, da situação do filho - a assiduidade das crianças
nas sessões, o desejo da permanência no atendimento, o compromisso com as
leituras propostas sobre dislexia, os medos que sentiram quando da transição para a
série e a busca de apoio junto ao serviço, os medos que antecipam quando o
filho sair do município e freqüentar outra escola no ensino médio, “como vai ser?”,
me perguntam.
Venho trabalhando no sentido também de “acalmá-los”, pois se possuem o
diagnóstico, as adaptações devem ser oferecidas. Vejo que o grande marco deste
108
trabalho, o que o substanciou, tornou-o possível, foi poder ter contado com os
pais/responsáveis. Se as crianças não dessem prosseguimento ao atendimento, a
pesquisa não se realizaria. E comprovei a importância e o estímulo da participação
da família para o sucesso da aprendizagem do aluno. Este ancoramento dado pelos
responsáveis é muito relevante. Faz diferença inclusive na prática escolar, que
muitas vezes no atropelo cotidiano, “esquece-se” daquele aluno que precisa da ACI.
Está sendo um grande aprendizado acompanhar essas crianças por todo esse
tempo. Estou vendo como vem se dando a aprendizagem de cada uma, os avanços
que conseguem, as estagnações, a mudança física e comportamental que surge ano
após ano.
Finalizo sem, na verdade, finalizar. O trabalho com os alunos disléxicos
permanece. Tenho outras crianças com hipótese de dislexia, realizando avaliações e
tenciono dar prosseguimento a proposta de ACI, sem evidentemente aplicá-la
indiscriminadamente, tanto em alunos disléxicos como para outras situações
diagnósticas que se fizerem necessárias.
Estudo e pesquiso. Estudo porque inquieta-me o meu não-saber. Pesquiso
para certificar-me e contribuir com o que penso saber. Concluo que o meu não-saber
insere-me num compromisso social e pessoal em busca de novos saberes. O
conhecimento acabado e determinado é inatingível.
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neurologia. São José dos Campos: Pulso, 2005.
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______. A formação Social da Mente. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
APÊNDICE 1
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Estou realizando o mestrado cuja linha de pesquisa é Desenvolvimento da Pessoa, Saúde e
Educação com o tema voltado para ADAPTAÇÃO CURRICULAR DE ALUNOS DISLÉXICOS, EM
ATENDIMENTO PSICOPEDAGÓGICO, NAS ESCOLAS MUNICIPAIS DE ESTEIO como dissertação da
tese de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, tendo como professor orientador Dr. Claus Dieter
Stobäus, telefone 3320.3635.
Esta pesquisa intenta prosseguir com o trabalho iniciado em 2007, onde foi realizado o
acompanhamento e assessoramento, juntamente com a equipe do CEMEI e escola, da Adaptação
Curricular Individualizada de alunos disléxicos das escolas municipais de Esteio.
Para que possa atingir o objetivo proposto, solicito o seu consentimento para realizar juntamente
com a Secretaria de Educação, representada pelo Centro Municipal de Educação Inclusiva
(CEMEI), acompanhamento da Adaptação Curricular Individualizada (ACI), de alunos que estão ou
estiveram, em atendimento psicopedagógico, pela Secretaria Municipal da Saúde, com
diagnóstico de dislexia. O trabalho objetiva também realizar reuniões com os professores dos
alunos, pais e equipe diretiva a fim de averiguar quais os conhecimentos que possuem a cerca da
dislexia e, juntamente com o CEMEI, estar assessorando estes pais e profissionais naquilo que lhes
for necessário e compatível com os objetivos deste trabalho.
Pela presente proposta assumo o compromisso com a responsabilidade e ética que a prática
profissional exige.
Declaro que recebi uma cópia do presente Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Responsável:
_____________________________________________________________________________
Pesquisadora: Neuza Barbosa Michel (99789272)
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul - PUCRS
Porto Alegre,.......de ..............de 2009.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Ficha Catalográfica elaborada por
Nívea Bezerra Vasconcelos e Silva CRB 10/1255
M623a Michel, Neuza Barbosa
Adaptação curricular individualizada de alunos
disléxicos em atendimento psicopedagógico em escolas
municipais de Esteio/RS. / Neuza Barbosa Michel. Porto
Alegre, 2009.
113 f. il.
Dissertação (Mestrado em Educação) Faculdade de
Educação, PUCRS, 2009.
Orientador: Prof. Dr. Claus Dieter Stobäus.
1. Educação Especial. 2. Dislexia - Escola. 3.
Aprendizagem Dificuldades. 4. Adaptação Curricular
Individualizada. 5. Atendimento Psicopedagógico. I.
Stobäus, Claus Dieter. II. Título.
CDD 371.9
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