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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/ SP
Carla Luciana Pereira de Almeida
Análise das Estratégias de Leitura de Professores da 4ª série do
Ensino Fundamental, sob a perspectiva interativa.
MESTRADO - ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM EDUCAÇÃO:
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
SÃO PAULO
2009
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PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/ SP
Carla Luciana Pereira de Almeida
Análise das Estratégias de Leitura de Professores da 4ª série do
Ensino Fundamental, sob a perspectiva interativa.
MESTRADO - ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM EDUCAÇÃO:
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de MESTRE
em Estudos Pós-Graduados em Educação: Psicologia
da Educação.
Prof. Orientador:
Drª. Maria Celina Teixeira Vieira
SÃO PAULO
2009
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/ SP
Carla Luciana Pereira de Almeida
Análise das Estratégias de Leitura de Professores da 4ª série do
Ensino Fundamental, sob a perspectiva interativa.
MESTRADO - ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM EDUCAÇÃO:
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção
do título de MESTRE no Programa de Estudos Pós-
Graduados em Educação: Psicologia da Educação, da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Banca
Examinadora formada pelos Professores Doutores:
____________________________________
____________________________________
____________________________________
SÃO PAULO
2009
“O valor das coisas não está no tempo em que elas
duram, mas na intensidade com que acontecem. Por
isso, existem momentos inesquecíveis, coisas
inexplicáveis e pessoas incomparáveis”.
Fernando Pessoa
DEDICATÓRIA
Esta Dissertação é dedicada ao meu esposo, Leo, pela demonstração de companheirismo,
dedicação e compreensão, pois, sem sua cumplicidade, seria muito difícil realizar esse sonho.
AGRADECIMENTOS
A Deus, pela graça de me conceber vida, capacidade e persistência para a realização
deste sonho.
A meus pais, pelo apoio e incentivo que sempre demonstraram.
A meu esposo, pelo companheirismo e dedicação demonstrados, que foram
fundamentais para esta conquista.
A meu filho, cuja compreensão de minha ausência em função deste trabalho foi
indispensável.
À minha Orientadora, Profª. Drª. Maria Celina Teixeira Vieira, a quem agradeço pela
paciência, atenção e orientação oferecida.
Às participantes da Banca do Exame de Qualificação, Professoras Drª. Laurinda
Ramalho Almeida (PUC-SP) e Drª. Rosália Maria Netto Prados (UBC), pelas valiosas
contribuições para o desenvolvimento e concretização deste estudo.
Aos professores do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Educação (PUC-
SP), pela possibilidade de crescimentos pessoal e acadêmico, obtida a cada nova
leitura sugerida.
À Direção e Coordenação da escola que se predispôs gentilmente a participar deste
estudo.
Às professoras, que, prontamente e de maneira valiosa, aceitaram contribuir para esta
pesquisa.
À Profª. e amiga, Ana Maria da Silva (Mestre pela USP), pela revisão segura e
pertinente.
À Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, pelo oferecimento da Bolsa, de
modo a viabilizar esta formação.
RESUMO
ALMEIDA, Carla Luciana Pereira de. Análise das estratégias de leitura de
professores da 4ª série do ensino fundamental, sob a perspectiva interativa.
2009.145p. Dissertação de Mestrado. (Mestrado em Educação: Psicologia da
Educação). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/ SP.
Considerando a competência leitora como principal ferramenta de acesso e
transformação de informações em conhecimento e dada a sua relevância no
desenvolvimento da aprendizagem, foi realizado este estudo com o objetivo de, a partir
do depoimento obtido em três entrevistas, com três professoras, de 4ª série do Ensino
Fundamental I, de uma escola pública da rede estadual de ensino da cidade de São
Paulo, identificar, explicitar, analisar e compreender as estratégias de leitura utilizadas,
discutindo-as à luz da perspectiva interativa de leitura. Outrossim, busca-se esclarecer
como ocorre o processamento das informações, segundo o referencial da Psicologia
Cognitiva, objetivando uma aprendizagem significativa, que poderá se beneficiar com o
uso das estratégias de leitura. Como resultado, foi possível conhecer as práticas de
leitura desenvolvidas, bem como verificar que as professoras participantes não
possuem conhecimento dos aspectos cognitivos envolvidos no ato de ler e, por essa
razão, não utilizam de forma sistematizada, as estratégias do antes, durante e depois
da leitura. As atividades de leitura, por sua vez, são fundamentadas em uma concepção
de aprendizagem que prioriza a decodificação, não havendo, portanto, a interação
necessária para a construção da compreensão, tendo como resultado uma
aprendizagem de leitura mecânica, desprovida de sentido e significado. Em razão
dessa prática, não promover a interação necessária entre os conhecimentos prévios do
educando e o que ele ainda não conhece, a mesma dificulta o processamento da
informação e desfavorece a compreensão. Espera-se que este estudo possa contribuir
para a reflexão das práticas de compreensão leitora, permitindo que esta seja
entendida como objeto de ensino e de aprendizagem, e, assim, seja difundido o
conhecimento do uso das estratégias de leitura em todos os componentes curriculares.
PALAVRAS-CHAVE: Aprendizagem significativa, Compreensão leitora, Leitura,
Estratégias de leitura, Leitura interativa.
ABSTRACT
ALMEIDA, Carla Luciana Pereira de. Analysis of reading strategies of teachers 4th
grade of elementary school, by the view interactive. 2009, 145 p. Dissertação de
Mestrado. (Mestrado em Educação: Psicologia da Educação). Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo - PUC/ SP.
Whereas the competence reader as the primary tool for accessing and processing
information into knowledge and given its importance in the development of learning, this
study was conducted with the purpose to evidence obtained results in three interviews
with three teachers, from 4th grade the Elementary School I, a public school of the city
of São Paulo, identify, describe, analyze and understand the strategies used for reading,
and we discuss them in front of the interactive view of reading. Also, we tried to clarify
how the process of information occurs, according to the reference of Cognitive
Psychology, to a significant learning that can be received by the use of reading
strategies. As a result, it was possible to know the practices of reading development,
and we noted that the involved teachers don’t have knowledge of the cognitive aspects
involved in the act of reading and, therefore, there isn’t systematic way of using the
strategies of before, during and after of reading. The activities of reading, in turn, are
based on a conception of learning that prioritizes the decoding, no, so the interaction
necessary for the construction of understanding, resulting in learning to read
mechanically, devoid of meaning and significance. Because this practice doesn’t
promote the necessary interaction between the learner's prior knowledge and what he
still doesn’t know, it makes the processing of information and understanding
disadvantage. We hope this study may contribute to the reflection of the practices of
reading comprehension, allowing to understood like the object of teaching and learning,
and thus be aware of the widespread use of reading strategies in all curriculum
components.
KEYWORDS: significant learning, reading, reading comprehension, reading strategies,
interactive reading.
SUMÁRIO
COMO TUDO COMEÇOU................................................................................. 10
INTRODUÇÃO.................................................................................................. 16
1. MARCO TEÓRICO ...................................................................................... 27
1.1 LEITURA: O QUE É? ................................................................................ 27
1.2 PERCURSO DA LEITURA NO BRASIL ................................................... 28
1.3 ENSINO DE LEITURA: UMA RESPONSABILIDADE DE TODOS OS
PROFESSORES .............................................................................................. 31
1.4 CONCEPÇÕES DE LEITURA ................................................................... 33
1.5 ESTRATÉGIAS DE LEITURA ................................................................... 37
1.5.1 Estratégias de Leitura utilizadas: Antes da Leitura
antecipação).................................................................................................... 40
1.5.2 Estratégias de Leitura utilizadas: Durante a Leitura
(inferência)....................................................................................................... 42
1.5.3 Estratégias de Leitura utilizadas: Depois da Leitura
(verificação).......................................................................................................42
1.6 APRENDIZAGEM VERBAL SIGNIFICATIVA
RECEPTIVA...................................................................................................... 44
2. METODOLOGIA............................................................................................ 55
2.1 COMO SERÁ O PROCESSO?....................................................................56
2.2 TÉCNICA..................................................................................................... 58
2.3 CARACTERIZAÇÃO DA ESCOLA............................................................. 58
3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .......................................... 66
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................101
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...............................................................104
ANEXOS ......................................................................................................... 107
COMO TUDO COMEÇOU...
Ninguém nasce feito. Vamo-nos fazendo
aos poucos, na prática social de que
tomamos parte.
Paulo Freire
Nasci em março de 1972, em uma família de lavradores com pouca
escolaridade, no norte do estado de Minas Gerais, tenho um irmão mais velho. Na
busca de melhores oportunidades de trabalho, meus pais decidiram vir para São
Paulo, nessa ocasião eu tinha nove meses. Quando aqui chegaram, apesar das
dificuldades de adaptação, meu pai logo conseguiu emprego como operário e
conseguiu se estabelecer com a família.
Meus pais sempre valorizaram muita a escola e me incentivaram aos
estudos, contribuindo com o que podiam em relação ao material didático e
acompanhamento escolar. Minha formação básica foi realizada na escola pública,
nas redes municipal e estadual de São Paulo. A escolha no curso superior em
Psicologia foi feita com muito gosto e dedicação, fundamentada no desejo de
compreender o comportamento humano, e suas diferentes manifestações, e
objetivava, ao final do curso, atuar na área Clínica.
Nessa época, estava iniciando minha trajetória profissional em empresa,
na área de Recrutamento e Seleção, meu trabalho consistia em recepcionar os
candidatos, fornecer-lhes relação de documentos e orientá-los na assinatura de
contrato de trabalho. Por necessidade de aumentar os meus rendimentos, em função
do custeio da faculdade, resolvi mudar de empresa. Então, comecei a atuar mais
precisamente com recrutamento e seleção, realizando entrevistas, aplicando testes
psicológicos e organizando treinamento para os funcionários.
Com o passar do tempo, notei que essa atuação não me trazia satisfação
pessoal. Sentia que não havia muito planejamento e reflexão nas minhas ações, uma
vez que as entrevistas de seleção realizadas por mim baseavam-se em um roteiro de
11
perguntas, com o objetivo de verificar a experiência do candidato, sua formação e
estabelecer relação entre a experiência do mesmo e a vaga oferecida.
Uma das atribuições que também me incomodava, era a realização das
entrevistas de “desligamento”, em que o principal objetivo era verificar as condições
de saúde do funcionário e o entendimento deste dos motivos de sua demissão, para
evitar que se acionasse uma causa trabalhista contra a empresa. Não havia,
portanto, nenhuma ação voltada para orientá-lo, em relação ao desenvolvimento de
suas capacidades na busca de novas oportunidades.
Na atuação em Treinamento, uma das minhas responsabilidades era
organizar uma “Integração”, em que era transmitido um filme sobre a instituição e os
benefícios oferecidos. Além disso, preparava material didático pedagógico e a
infraestrutura para a realização dos cursos técnicos para os funcionários.
Essa atuação trazia maior satisfação profissional, muito embora fosse
centrada nas necessidades da empresa, tinha como objetivo a aprendizagem dos
funcionários visando à sua melhoria de desempenho. Assim, sentia que contribuía
para a formação daqueles funcionários, que apresentavam satisfação na realização
dos cursos, fato observado por meio da tabulação dos questionários de avaliação.
Atuar na área de Recursos Humanos foi uma experiência necessária para
minha formação e importante, naquele momento, mas não me trazia uma satisfação
pessoal, uma vez que esses treinamentos eram ocasionais e minha rotina era focada
no recrutamento/ seleção/ desligamento de funcionários.
Na faculdade, cursava as disciplinas de Desenvolvimento, Problemas de
Aprendizagem e identificava o quanto o “papel do professor” era decisivo na
construção da aprendizagem do aluno. Naquele momento, já tinha contato com
textos de Paulo Freire que falavam sobre a aprendizagem libertadora.
Em conversa com uma colega de classe, sobre a minha insatisfação
profissional, ela comentou que estava lecionando, e me sugeriu que buscasse uma
oportunidade como professora na área de ciências, com base nos temas
desenvolvidos nas aulas de Genética e Fisiologia.
Embora não me considerasse preparada para lecionar, uma vez que não
tinha formação em Magistério, naquele momento, estava adquirindo uma visão sobre
12
os processos de aprendizagem, e os fatores que contribuíam para o fracasso
escolar. Assim, compreendi que esses temas também seriam úteis para minha
atuação.
Oportunamente, a empresa em que eu trabalhava estava de mudança para
o interior de São Paulo, razão pela qual eu teria de optar por acompanhá-la ou não.
Dessa forma, movida por minha insatisfação e na busca de conhecimentos novos,
resolvi seguir um caminho, que me oportunizasse outras experiências.
Compareci a escola indicada por minha colega, candidatei-me à vaga de
Professora de Ciências, pois conseguia estabelecer relação entre esta disciplina e o
conteúdo aprendido na Universidade. Minha contratação foi feita em caráter
excepcional, por falta de professores licenciados na área. Era uma escola pública de
grande porte, com falta de muitos professores. Por essa razão, a diretora também
me ofereceu aulas de Educação Artística. Naquele momento, eu recusei por não ter
conhecimento algum que me possibilitasse essa atuação.
Assim, comecei a lecionar Ciências de forma bastante inexperiente, mas
com muita disposição. Gostava da relação com os alunos, sentia-me valorizada e
acreditava que minha dedicação era significativa para eles. Embora sem muita
clareza, já estava assumindo um compromisso pedagógico e político, ou seja, uma
ação voltada para a transformação, não apenas para a reprodução de conteúdo.
Lecionar exige planejamento e estudo, assim sendo, dediquei-me com
afinco. Desenvolvi autoconfiança, acreditava que meu papel não se restringia a
transmitir conhecimento, mas, como afirma Freire, criar possibilidades para sua
produção/ construção. Isto é, eu deveria intervir nas relações dos alunos, que, em
alguns momentos era conflituosa, e compreender sua maneira de agir, buscando
levá-los à reflexão das atitudes. Aprendi, na prática, que “quem ensina aprende ao
ensinar, e quem aprende ensina ao aprender”. (FREIRE, 2007, p. 23).
Lecionei Ciências por quatro anos, enquanto aguardava condições
financeiras, para iniciar uma nova formação, que foi acelerada em decorrência da
promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), em 1996, em que foi
exigida Licenciatura Plena para lecionar.
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Concomitantemente foram criados cursos Superiores, que ofereciam
Complementação Pedagógica para obtenção de Licenciaturas. Assim, apresentei
meu Diploma e Histórico Escolar, para análise em uma Faculdade, com o objetivo de
realizar o aproveitamento de carga horária, para cursar Educação Artística. Esta
disciplina tinha recebido uma nova conotação com a LDB (1996), sendo garantida
como ensino obrigatório para todas as séries, inclusive para o Ciclo I, faixa etária que
me interessava.
Em decorrência da pontuação obtida por lecionar Ciências, consegui
mesmo como estudante, a oportunidade para atuar como professora de Educação
Artística. Satisfeita com minha escolha profissional, a despeito dos dilemas que ela
impõe: baixo salário, dificuldades para conciliar horário e acumular cargos, desgaste
pelo número excessivo de aulas e de alunos por sala etc., decidi prestar concursos
públicos para as redes estadual e municipal de São Paulo. Fui aprovada, com boa
classificação.
Uma vez licenciada e concursada, participei do processo seletivo para a
função de Professor Coordenador, com a qual me identifiquei e me realizei
profissionalmente. Como parte da equipe gestora, tive acesso a várias capacitações:
Pós-graduação em Gestão Educacional pela UNICAMP; Programa de Formação de
Professores Alfabetizadores, “Letra e Vida”, oferecido pela Coordenadoria de Ensino
e Normas Pedagógicas da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (CENP/
SEESP), que tinha como propósito subsidiar os professores sobre uma nova
concepção de ensino, fundamentada na proposta construtivista de Emília Ferreiro.
Como Coordenadora, recebi pela (CENP) capacitação para disseminar o
projeto “Letra e Vida”, permanecendo como capacitadora (na Diretoria de Ensino),
formando professores. O curso consistia em abordar os processos de aquisição da
escrita. Tal experiência me propiciou o acompanhamento do rendimento dos alunos
de forma mais ampla, permitindo analisar os índices de desempenho obtidos, por
meio de avaliações internas e externas.
Compreendi que um dos fatores que compromete o aproveitamento dos
alunos estava diretamente relacionado com as dificuldades apresentadas na
compreensão leitora, observadas pela falta de habilidades dos mesmos em
14
recuperar as informações, formular hipóteses, sintetizar e avaliar o que era proposto
nas atividades.
Considerando que tais habilidades são necessárias à formação crítica e ao
exercício das práticas cidadãs, urge que sejam desenvolvidas na escola. Contudo,
notei faltar uma sistematização do ensino de leitura, que contemplasse o
desenvolvimento dessas habilidades.
Observei que, nas avaliações internas (Sistema de Avaliação e
Rendimento do Estado de São Paulo (SARESP), Prova Brasil e Sistema de
Avaliação de Educação Básica (SAEB), as perguntas exigiam do leitor mais do que
eles estavam habituados a fazer nas atividades de compreensão. Havia também
uma variedade de gêneros textuais: ilustrações, gráficos, tabelas, notícias, tiras de
humor. Isto é, além da decodificação e localização das informações, os alunos
precisavam realizar inferências, estabelecer relações, interagir com o texto etc.
Nessa perspectiva, os resultados apresentados nessas provas
demonstravam que o despreparo dos educandos iniciava-se logo na compreensão
do que estava sendo solicitado. Acredito que estas dificuldades são em parte
responsáveis pela dispersão e desinteresse dos alunos, pois, se eles conseguissem
ao menos entender a pergunta, talvez fossem capazes de inferir as respostas.
Ao analisar o conteúdo, bem como a ordem das perguntas apresentadas
nas avaliações internas, observa-se uma progressão no grau de dificuldade, que
abrange perguntas de localização, inferência e reflexão. Essa coerência na
formulação das questões favorece a organização cognitiva do educando, o que, de
certa forma, contribui para a melhoria dos resultados. Dessa forma, é possível
encontrar desde respostas absurdas, que devem ser eliminadas, até as quase
corretas, que se diferenciam por sutilezas, identificadas por um leitor mais atento.
Compreendi que esse procedimento de organização da estrutura cognitiva,
necessário à compreensão, poderia ser exercitado com mais frequência nas
atividades de leitura. Em decorrência dos resultados apresentados, presume-se que
atividades como essas não são propostas na rotina escolar, ocasionando a falta de
habilidade do educando.
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Acreditando que seria possível intervir nessa situação, decidi buscar o
aprofundamento necessário para isso. Por essa razão, decidi ingressar no Mestrado
em Psicologia da Educação, objetivando conhecer os processos envolvidos no
desenvolvimento da aprendizagem, tendo como referência à compreensão leitora
nesse contexto.
Enfim, ao registrar e analisar minha trajetória profissional foi possível
compreender os sentidos construídos acerca da minha atuação e entender o que
explicita Aguiar “o homem se constitui em uma relação dialética com o social e a
história, sendo ao mesmo tempo único singular e histórico”. Complementa que “o
homem é constituído na e pela atividade e, ao produzir sua forma de existência,
revela sua historicidade, sua ideologia, através de suas relações sociais e do modo
de produção, da qual faz parte”. Conclui, salientando, que o homem se humaniza a
partir de sua apropriação com o mundo. (AGUIAR, 2006, p. 11)
Embora, inicialmente, tenha me formado em Psicologia, opção com a qual
me identifico, por ter me permitido desenvolver habilidades para compreender o
comportamento humano, na prática, constitui-me Professora. Hoje tenho clareza de
que foi na atividade (desapontamento inicial com a área de Recursos Humanos),
fundamentada na reprodução dos interesses da empresa, que se configurou minha
insatisfação e, como conseqüência, desencadeou minha mudança para outra área,
na qual permaneço, por considerá-la um meio de transformar a realidade.
Concluído o Mestrado, viso a atuar na Formação de Professores, pois,
como Paulo Freire, coloca: “não nasci, porém, marcado para ser um professor assim.
Vim me tornando desta forma no corpo das tramas, na reflexão sobre a ação, na
observação atenta a outras práticas, ou a prática de outros sujeitos, na leitura
persistente, crítica, de textos teóricos, não importa se com eles, estava de acordo ou
não” (FREIRE, 1993, p.79-80).
Esta reflexão permite resgatar meu processo como professora e
compreender os caminhos percorridos para alcançar meus objetivos, de maneira
singular. Com a experiência adquirida, acredito que posso contribuir não apenas para
a formação dos educandos, mas também de professores.
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INTRODUÇÃO
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
muda-se o ser, muda-se a confiança;
todo o Mundo é composto de mudança,
tomando sempre novas qualidades.
Luís Vaz de Camões
Acreditar na possibilidade de mudança é fundamental para a educação.
Esta é uma das principais crenças que permite aos educadores não perderem suas
esperanças. “Esperança, que vem do verbo esperançar e não de esperar, no sentido
de acomodação”. (CORTELLA, 2006, p.11). E, assim, persistirem no ofício, pois uma
das certezas que temos é a de que não somos iguais e que sofremos mudanças.
“O animal satisfeito dorme”, citando Guimarães Rosa, Cortella alerta contra
o risco de se cair na monotonia quando se tem a sensação de plenitude e conforto,
aceitando as coisas como estão e rendendo-se à acomodação. Na prática educativa,
é necessário cultivar esperanças e não se acomodar. É esta postura que possibilita
aos educadores não desistirem, pois, embora se reconheça que o processo
educativo não é o único responsável pelas transformações na sociedade, ele pode
ser considerado uma das mais importantes ferramentas para sua realização.
Freire (2007, p.58) já apontava para a necessidade do convívio social e
das relações humanas, como fatores que favorecem a inconclusão do ser,
caracterizando a educação como um processo permanente, aos que se reconhecem
como seres inacabados, suscetíveis de mudanças e transformações.
Considerando que a escola é um espaço que favorece a socialização, faz-
se necessária à organização de situações de ensino, que promovam avanços de
ordens cognitiva, afetiva e social, de maneira a contribuir na formação de cidadãos
críticos, autônomos, conhecedores de seus direitos e deveres. Consequentemente,
na construção de uma sociedade mais justa e democrática.
A democratização do acesso às informações, na Sociedade da Informação
e do Conhecimento, encontra-se cada vez mais intenso, rápido e facilitado, por meio
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de diferentes fontes, tais como: internet, TV, jornal, livro, etc. Não se pode negar que
esse volume intenso de informações tem exercido um papel significativo na
aprendizagem, apresentando-se como um recurso para pesquisa, entretenimento e
prática de escrita. Além de necessário, em função de fazermos parte de um mundo
globalizado, constitui-se um meio eficaz para a produção de conhecimento.
É possível observar que, mesmo na falta de condições ideais, a
informação tem sido disponibilizada a todos os que se interessam por ela. Até na
periferia, onde os recursos financeiros são mais escassos e, portanto, o acesso à
internet em casa é mais difícil, há um número crescente de estabelecimentos (lan-
houses) que, por um custo muito baixo, podem ser obtidas informações em tempo
real.
Embora essa facilidade propicie o contato com a informação, esta, por si
só, não garante a construção do conhecimento, é necessário desenvolver nos alunos
a organização de sua estrutura cognitiva, de modo a capacitá-los a interagir com as
informações, promovendo os questionamentos necessários para a compreensão.
Esta é uma das atribuições da escola.
Em São Paulo, as escolas públicas, de modo geral, recebem bastantes
recursos. As municipais possuem salas de informática, com aulas ministradas por
professores específicos, que permitem acesso a sites recomendados. Nas escolas
estaduais, embora algumas possuam estrutura montada, nem todas as salas de
informática são utilizadas com freqüência, por falta, dentre outras coisas, de
professor.
De acordo com Antunes (2001), o volume de informações transmitido pela
mídia modificou o papel da escola e do professor. Cabendo a este orientar os alunos
quanto aos procedimentos de coleta, organização e, sobretudo, transformação das
informações em conhecimento.
Sabemos que essa transformação (informação/ conhecimento) não é uma
tarefa fácil e envolve diretamente a competência leitora, faz-se necessário
desenvolvê-la, como explica Lerner:
Ensinar a ler é um desafio que transcende a alfabetização
em seu sentido restrito de decodificação. É necessário
18
fazer do ambiente escolar uma comunidade de leitores, que
busque respostas nos textos para os problemas a serem
resolvidos. O desafio é formar praticantes de leitura e
escrita, ao invés de formar indivíduos dependentes da letra,
do texto e da autoridade dos outros. (LERNER, 2002, p.17)
A autora salienta que o papel do professor, como leitor experiente é formar
leitores críticos, capazes de realizar inferências e de estabelecer relações entre o
que já conhece e o que pretende conhecer, selecionando o que e como vai ler.
Podemos observar que na escola o desafio de formar praticantes de
leitura, com o nível proposto pela autora, é imprescindível e se apresenta como uma
preocupação constante. Sabemos, porém, que, em muitos casos, esse patamar não
é atingido de forma satisfatória, tornando necessário repensar o que fazer em
situações como essa.
Nesse contexto, vemos que a competência leitora assume relevância e a
atuação do professor ganha destaque, sendo este conceituado como um leitor
experiente.
Dessa forma, ao considerar o exposto por Antunes (2001) e Lerner (2002),
no que diz respeito ao papel do professor entendemos que a prática de ensino da
leitura pode ser enriquecida com a utilização das estratégias, que são apresentadas
por Solé, por meio da:
Metáfora do andaime que trata o processo de ensinar a ler
como uma construção conjunta estabelecendo uma
comparação entre a construção civil e a aprendizagem,
ressaltando a necessidade de o professor atuar nas zonas
de desenvolvimento proximal do educando. E, assim,
exemplifica que, da mesma maneira que se observa, na
construção civil, a necessidade de se colocar os andaimes
um pouco acima do nível em que se está trabalhando; na
aprendizagem, os desafios propostos devem estar sempre
um pouco além do que o educando é capaz de resolver, de
modo que caberá ao professor ajustar a tarefa, tornando-a
possível de ser realizada.
(SOLÉ, 1998, p. 76).
19
Nessa metáfora, observa-se a relevância do papel do professor, sendo
esse considerado um leitor experiente que, ao proporcionar a interação necessária
para construir a compreensão, estará atuando nas zonas de desenvolvimento
proximal.
Entenda-se por zona de desenvolvimento proximal (ZDP),
conceito Vygotskiano, nas palavras de Rego (2005), a
identificação de dois níveis de desenvolvimentos: um que
se refere às conquistas já efetivadas, que chamamos de
nível de desenvolvimento real ou efetivo, ou seja, aquelas
funções que a criança domina, pois já consegue utilizar
sozinha; e outro, nível de desenvolvimento potencial, que
se relaciona às capacidades em via de serem construídas,
que se refere ao que a criança é capaz de fazer, só que
mediante a ajuda de outra pessoa, que pode ser um adulto
ou até mesmo uma criança mais experiente. À distância
entre o que é capaz de fazer de forma autônoma (nível de
desenvolvimento real) e aquilo que ela realiza em
colaboração com os outros elementos de seu grupo social
(nível de desenvolvimento potencial) caracteriza o que
Vygostsky chamou de zona de desenvolvimento proximal.
(REGO, 2005, p.73).
Dessa forma, entendemos que a atuação do professor na ZDP (zona de
desenvolvimento proximal), por meio das estratégias de leitura, também auxiliará a
organização da estrutura cognitiva e propiciará a compreensão.
Quanto ao uso das estratégias de leitura, tanto Solé (1998) quanto Kleiman
(2002 a e b) enfatizam seu ensino como uma forma de favorecer a compreensão.
Solé considera as estratégias como um procedimento de caráter elevado,
sistematizado, que demanda a definição de objetivos, controle e avaliação. Seu uso
contínuo possibilita o autocontrole da compreensão, pois, na medida em que é
utilizada a compreensão vai sendo construída de forma gradual e progressiva.
(SOLÉ, 1998, 70).
Kleiman reitera essa idéia, chamando as estratégias de leitura de
“operações regulares, que podem ser inferidas a partir da compreensão do texto,
20
que, por sua vez, surge do comportamento verbal e não verbal do leitor, da maneira
como este se relaciona com o objeto”. (KLEIMAN, 2002 a, p.49).
Na escola, notamos que proporcionar o ensino das estratégias de leitura é
pertinente para a melhoria da aprendizagem, pois seu uso transcende a
decodificação e viabiliza o desenvolvimento da compreensão. Nesse contexto, faz-se
necessário também valorizar os conhecimentos prévios dos educandos, ou seja, os
significados construídos, por meio das relações estabelecidas com o mundo. O que é
enfatizado por Freire: “a leitura de mundo precede sempre a leitura da palavra e a
leitura desta implica a continuidade da leitura daquele” (FREIRE, 1983, p. 22).
Nesse sentido, sabemos que o ser humano não nasce pronto e está em
constante desenvolvimento, que ocorre pela apropriação do conhecimento e
concretizado por meio da leitura. Finalmente, esta, hoje em dia, é vista
institucionalmente como ferramenta básica e fundamental para o desenvolvimento da
aprendizagem escolar e aquisição do conhecimento na escola, que se vê obrigada a
atender às demandas sociais, econômicas e políticas.
Compreendendo essa nova atribuição da leitura e visando melhorar a
qualidade do ensino oferecido, as Secretarias da Educação do Estado e da
Prefeitura de São Paulo privilegiaram esse instrumento nas suas ações.
Na Proposta Curricular elaborada, pela Secretaria do Estado da Educação,
em (2008), nota-se que, apesar de o estado de São Paulo estar com o acesso à
escola praticamente universalizado (98,6% das crianças de 7 a 14 anos e 86,4% dos
jovens de 15 a 17 anos freqüentam a escola), esses índices demonstram que falta
ainda garantir a permanência e elevar a qualidade do ensino, sendo estas
viabilizadas, sobretudo, por meio do desenvolvimento da compreensão leitora.
Em relação à permanência na rede estadual, ainda se verifica que a
evasão é um problema, cuja responsabilidade é atribuída à falta de
acompanhamento dos pais, que, por sua vez, são encaminhados aos Conselhos
Tutelares - órgãos responsáveis para verificar os motivos e os encaminhamentos
necessários aos casos de reiteradas faltas, sem justificativa.
Por outro lado, a rede municipal amenizou o problema, com o controle da
frequência feito pelo Programa Assistencial “Leve Leite”. Cabe esclarecer que nesse
21
programa, o aluno que não exceder o limite de faltas, sem justificativa legal, receberá
por mês, o equivalente a dois quilos de leite em pó.
O Governo Federal por sua vez contribui no controle da evasão em ambas
as redes por meio do Programa Bolsa Família. Neste programa, cabe à escola enviar
a freqüência dos beneficiários trimestralmente, para que possa ser, ou não, validada
a permanência do recebimento do benefício (ajuda de custo em espécie à família do
estudante).
No que diz respeito à melhoria da qualidade em 2001, o Ministério da
Educação criou uma rede de formação continuada, e apresentou o Programa de
Formação de Professores Alfabetizadores (PROFA), formulado pela Secretaria de
Educação Fundamental (SEF) do Ministério da Educação (MEC), buscando
implementa-lo por meio de cooperação técnica com as Secretarias de Educação
Estaduais e Municipais que apresentassem interesse. Nas redes de ensino municipal
e estadual de São Paulo, houve a implantação desse programa, intitulado como
PROFA e Letra e Vida, respectivamente.
Em continuidade a esses programas, na rede estadual foi implantado
programa de formação visando o desenvolvimento da compreensão leitora (Ler e
Escrever) e na rede municipal as Orientações Curriculares que visam desenvolver a
competência leitora no ensino fundamental.
Em ambas as propostas observam-se como objetivo primordial o
desenvolvimento da compreensão leitora, reconhecendo-a como ferramenta principal
para que a aprendizagem ocorra.
Dessa forma, vemos que o desafio da escola é proporcionar aos
educandos oportunidades, para que desenvolvam o gosto pela leitura e possam se
tornar leitores autônomos, capazes de selecionar o que vão ler, e a maneira que irão
proceder na realização dessa leitura.
Para que este desafio seja atingido, são necessárias algumas ações,
dentre elas:
Reconhecer a compreensão leitora, como competência fundamental para a
materialização da aprendizagem;
22
Desenvolver Projetos Interdisciplinares, que contemplem atividades de leitura
na rotina;
Organizar um espaço destinado à leitura e, na impossibilidade deste, viabilizar
a circulação dos livros, jornais, revistas com regularidade;
Até aqui, vimos à relevância social da leitura; doravante, falaremos sob o
ponto de vista científico.
Com o objetivo de conhecer as publicações nacionais sobre os
depoimentos dos professores de suas estratégias de leitura com alunos da quarta
série, algumas bases foram consultadas, entre elas: Capes, Biblioteca Virtual da
Sibinet, Biblioteca da PUC-SP, Biblioteca Unicamp, Dedalus (banco de dados
bibliográficos da USP), Scielo, mas não foram encontrados resultados com este
objetivo específico.
Nos artigos encontrados, discute-se a relevância de desenvolver
estratégias de aprendizagem, utilizando a leitura como ferramenta. Dentre estes
pesquisadores, destaca-se Boruchovitch (1999), que vem desenvolvendo pesquisas
na Psicologia Cognitiva, tendo como base a Teoria do Processamento da
Informação, que busca esclarecer como os seres humanos adquirem, armazenam e
utilizam as informações.
É possível estabelecer relação da proposta desta autora, com a
abordagem desenvolvida por Ausubel (1980) por meio do referencial teórico da
Aprendizagem Verbal Significativa, que, por sua vez, fundamenta-se na organização
da estrutura cognitiva do educando, na articulação dos seus conhecimentos com a
nova informação.
O enfoque abordado por Boruchovitch valoriza as estratégias de
aprendizagem na promoção da autonomia do educando, buscando evidenciar o
papel da escola, no desenvolvimento destas habilidades, considerando-as como
favoráveis para o sucesso escolar.
Em 2001, Boruchovitch desenvolveu uma pesquisa numa escola pública
de Campinas, com alunos do ensino fundamental, investigando as estratégias de
leitura espontâneas, mencionadas pelos alunos, no que diz respeito à compreensão
durante a leitura. O método desta pesquisa consistia na seleção aleatória, por meio
23
de um sorteio, de alunos das dezenove salas: terceira quinta e sétima séries. Os
educandos foram informados da realização do sorteio, foi assegurada a
confidencialidade dos dados e esclarecido que as respostas fornecidas não
influenciariam em suas notas.
A partir dessa seleção, foi pesquisado o histórico escolar (promoções e
retenções) desses alunos, que foram entrevistados individualmente, por meio de um
questionário com perguntas objetivas e subjetivas, no intuito de verificar as
estratégias de compreensão por eles utilizadas, e examinar se estes tinham clareza
das suas próprias dificuldades durante a leitura.
A pesquisadora analisou, também, o uso as estratégias de compreensão
de leitura sob quatro fatores: idade, série, gênero e repetência. Os resultados
revelaram que, de modo geral, os alunos usam no mínimo uma estratégia para a
compreensão leitora, isto é, identificam quando a compreensão do conteúdo lido não
é alcançada, no entanto, não dispõem de outras estratégias a ponto de intervir na
situação. Notou-se, também, relação significativa entre os alunos que utilizavam
poucas estratégias de leitura e a reprovação dos mesmos. Então, conclui,
destacando a necessidade de a escola formar um leitor independente, crítico e
reflexivo.
Em 2002, Kopke Filho realizou um estudo acerca do uso de estratégias de
leitura e do conhecimento metacognitivo por professores de Língua Portuguesa.
Participaram do experimento vinte e quatro sujeitos, divididos em dois grupos. Em
sua metodologia, foram usados dois questionários para a coleta de dados: o
primeiro, para estabelecer o repertório de estratégias mais usado pelos sujeitos; o
segundo para explicar como essas estratégias auxilia na compreensão da leitura.
Os resultados mostram que, entre os dois grupos, há respostas
divergentes no que se refere às estratégias que habitualmente empregam no
processo da leitura: um grupo mostra tendência para o modelo tradicional (bottom-
up); outro para o modelo integrado (bottom-up e top-down), que será esclarecido
posteriormente.
Há também respostas incoerentes quanto a fazer previsões: levantam
hipóteses acerca do conteúdo do texto, mas não as confirmam. De acordo com as
posições obtidas por tais estratégias, o processo da leitura é desenvolvido sem
24
prévio planejamento. De todos esses traços, conclui-se que o contexto em que os
sujeitos atuam como leitores não correspondem àquele exigido de quem deve
assumir a orientação de leitores menos experientes.
Em 2004, Salles e Parente realizaram um estudo com o objetivo de
analisar a compreensão de leitura textual de alunos de segunda e terceira séries.
Nesse estudo, participaram 76 crianças, com média de oito anos. A compreensão de
leitura foi avaliada de duas formas: por meio da reprodução oral da história lida, e da
resposta a questões de múltipla escolha. Cada criança era solicitada a ler
silenciosamente uma história, com aproximadamente 200 palavras de extensão e
níveis apropriados de legibilidade para o nível de escolaridade da amostra.
A história “A coisa” foi adaptada do texto de Rocha (1997) para esse
estudo. Era informado à criança que ela deveria, posteriormente, recontar a história
e, em seguida, responder a questões sobre a mesma. O reconto da criança foi
solicitado em primeiro lugar para estar o mais isento possível de interferências. A
análise dos resultados mostrou que os relatos tinham como foco, em média, 21,07%
da estrutura proposicional da história, sendo mais frequente o relato de macro-
proposições (aspectos essenciais do texto, vistos de modo global).
Conforme o esperado, os alunos da terceira série mostraram desempenho
superior aos da segunda série no relato de micro-proposições (detalhes do texto),
assim como nas respostas a questões pontuais sobre a história. Os resultados
sugerem que, durante os primeiros anos de escolarização, ocorreu uma melhora da
memorização de detalhes, enquanto a retenção das ideias essenciais foi influenciada
pelas variações de idade das crianças.
Em 2008, Gomes realizou um estudo de natureza quase-experimental e
delineou procedimentos para sete sessões de intervenção com o objetivo de
melhorar a leitura de alunos do Ensino Fundamental por meio do ensino de
estratégias cognitivas e metacognitivas de aprendizagem, numa perspectiva de
compreensão autorregulada em leitura.
Participaram do estudo duas turmas de quarta série de uma escola
municipal de Jundiaí-SP, seguindo procedimentos éticos previstos, relativos à
pesquisa com seres humanos. Os alunos foram avaliados por meio dos seguintes
25
instrumentos: questionário informativo, escala de estratégias de aprendizagem e dois
testes Cloze de compreensão leitora, em três momentos.
O Grupo Experimental (GE) participou de sete sessões de intervenção,
recebendo apoio motivacional, orientação de estudos, estímulos ao desenvolvimento
da metacognição e ensino de estratégias de aprendizagem em situação de leitura.
Os resultados mostraram ganhos em metacognição para o (GE). Constatou-se
evolução contínua e consistente no GE, cuja maioria atingiu um nível independente
em leitura com desempenho próximo ao do GC, no Pós-Teste.
Acredita-se que os resultados obtidos nesse estudo possam ser úteis a
educadores, psicólogos e psicopedagogos, além de mostrar a importância da
formação de docentes, capazes de aprender e ensinar de modo estratégico, visando
ao desenvolvimento de leitores críticos e aprendizes autorregulados.
Considerando a relevância científica dos resultados apresentados nessas
pesquisas, entendendo que estes seguem uma direção próxima, no sentido de
esclarecer o papel da compreensão leitora no desenvolvimento da aprendizagem e
visando contribuir para o aprofundamento destas questões, o presente estudo,
caracterizado como uma pesquisa exploratória, de traço qualitativo, propõe-se
compreender o depoimento das professoras, da 4ª série do Ensino Fundamental I,
de uma escola pública da rede estadual de ensino da cidade de São Paulo, quanto
ao uso de estratégias de compreensão leitora no processo ensino e aprendizagem.
De forma mais específica, vamos caracterizar as professoras, identificar, explicitar e
analisar as estratégias sinalizadas e discuti-las à luz da perspectiva interativa de
leitura.
Com base nestes objetivos, o referencial teórico irá perpassar por
diferentes áreas de conhecimento, dentre elas: Línguistica aplicada, Psicologia
Cognitiva e da Educação. Para a apresentação da perspectiva interativa de leitura,
embasar-nos-emos em: Solé (1998), Smith (1999), Kleiman (2002 a e b), Koch e
Elias (2006); e no referencial teórico da Aprendizagem Verbal Significativa de
Ausubel (1980).
Posto isto, convido o leitor a me acompanhar neste estudo, organizado em
três capítulos e considerações finais.
26
No capítulo I, será apresentado o marco teórico, relativo à Concepção
Interativa de Leitura e o Referencial da Psicologia Cognitiva; o capítulo seguinte
destina-se a descrever a metodologia por meio dos procedimentos e a técnica
utilizada; finalmente, no capítulo III, será apresentada a análise e discussão dos
resultados por meio da caracterização das professoras formadoras de leitores, o
contexto no qual estão inseridas, bem como a identificação e a análise das
estratégias de leitura sinalizadas sob a luz da perspectiva interativa de leitura.
27
1. MARCO TEÓRICO
Aprender a ler significa também aprender a ler o
mundo, dar sentido a ele e a nós próprios, o que, mal ou
bem, fazemos mesmo sem ser ensinados.
(MARTINS, 1992 p.34)
1.1 LEITURA: O QUE É?
A leitura pode ser entendida de várias maneiras, partindo de contextos
diversos simples até o mais complexos. Ela não está somente associada à escrita,
mas às relações que estabelecemos com o mundo. Tudo é texto. O texto verbal por
sua vez, não se constitui por um amontoado de palavras, mas por um conjunto
organizado de ideias. Lemos quando identificamos som de uma sirene, aliança na
mão esquerda, cédula de valor, data no calendário, placa de trânsito, receita de bolo,
cálculo matemático até a leitura de um texto acadêmico ou a análise profunda de um
poema. O que todos esses contextos de leitura têm em comum é a compreensão
que se tem deles. Ler é uma atividade que não se restringe ao código escrito, mas a
qualquer estímulo visual, auditivo, corporal que tenha significado suficiente para
estabelecer comunicação. Segundo Martins,
Embora o ato de ler seja usualmente relacionado com a
escrita, e o leitor visto como decodificador da letra, ao
observarmos situações como: ler o olhar de alguém, ler o
tempo, o gesto. Vemos que o ato de ler vai além da
escrita. Desta forma, a leitura é considerada como um
processo, no qual o leitor participa e não depende
basicamente de sua capacidade de decifrar sinais, mas
sim de sua capacidade de dar sentido a eles,
compreende-los. A leitura vai, portanto, além do texto e
começa antes do contato com ele. (MARTINS, 1992, p. 8,
32, 34).
28
Partindo do princípio de que tudo pode ser lido, todos sabem ler alguma
coisa. O que diferencia os vários tipos de leitura é o grau de compreensão que
fazemos, ou seja, as relações que estabelecemos entre o lido e nossos
conhecimentos prévios. Logo, ler é atribuir ao significante (palavra, palpável,
concreta) um (ou mais) significado (ideia, abstrato), mesmo que não se atinja o
sentido (interpretação, subjetivo), que exige a apropriação da informação e sua
transformação em conhecimento.
De modo geral, as pessoas pensam que leem, mas o que normalmente
fazem é o reconhecimento das palavras. É o que acontece, por exemplo, quando
estamos diante de um texto em idioma que não conhecemos, olhamos para ele,
identificamos algumas letras, mas não lhe conseguimos atribuir significância.
Embora os exemplos citados revelem diferentes maneiras de se ler o
mundo, neste trabalho, vamo-nos ater à leitura do texto escrito, uma vez que este é
uma linguagem que abarca a maior e mais importante forma de comunicação, por
tratar-se de um registro e, portanto, uma forma de perpetuação do conhecimento, da
cultura e, por extensão, da espécie humana.
1.2 PERCURSO DA LEITURA NO BRASIL
De acordo com Lajolo (1999), no Brasil, em meados do século XIX, no Rio
de Janeiro (sede da monarquia), começam a ser demonstrados os primeiros passos
necessários para a formação e o fortalecimento de uma sociedade leitora. Porém,
sua consolidação ainda teria de esperar até o fim do século XX, movida pelas
descobertas da ciência, as mudanças trazidas pelas Revoluções, o surgimento da
classe burguesa O texto escrito se debate entre ser obra de entretenimento (revista,
obras literárias), documento (contratos, certidões), formador de opinião (jornal), arte
(poesia), ou instrumento de doutrinação (textos religiosos e pedagógicos).
A autora esclarece que a burguesia, em ascensão, já detinha bens
materiais e buscava a cultura da elite, para atingir o status desejado. Na crença de
que a cultura almejada seria alcançada por meio de livros, estes começam a ser
29
importados. Concomitantemente, pessoas cultas e vividas (mais velhas) são
contratadas para cuidar da educação dos filhos que formariam a nova sociedade. Era
comum a existência de grandes bibliotecas particulares, em exibição nas salas, ou
pessoas vistas em público com uma obra espessa nas mãos, a fim de transparecer
intelectualidade, pois o livro era considerado um objeto sagrado, reservado à elite
acadêmica ou religiosa, preferencialmente masculina.
Certo de que as pessoas se tornam melhores, por meio da cultura, obtida a
partir de boas leituras, pois não basta ler qualquer texto, é preciso ler textos que
acrescentem o nível cultural do indivíduo. Nesse contexto, Lobato vislumbra o
mercado editorial emergente e a fragilidade, dos meios de produção nacional para a
editoração. Promove, então, uma reviravolta, com publicações e distribuições
próprias, traduzidas (Perrault, Andersen, Carroll) e adaptações (Dom Quixote,
Hércules) e de outros muitos deles publicados em Portugal e França.
Sabemos que Monteiro Lobato revolucionou o mercado
livreiro do Brasil. Antes de atirar-se como editor, o processo
de editoração entre nós era muito acanhado, havia poucos
pontos de venda, pouco mais de trinta livrarias. Monteiro
Lobato procurou estimular a criação de novos pontos de
vendas e de circulação do livro, adotou um processo novo,
ou das consignações. Ele buscava saber em farmácias, em
vendas à beira das estradas, em pequenas lojas
espalhadas no interior do país, em lugares onde o público
pudesse receber uma nova mercadoria [...] com a
consignação, Lobato ampliou extraordinariamente o
mercado livreiro nacional (LUCAS, 1983, p.91).
Surge o desafio de formar um público comprador de livros suficiente para
oferecer lucros a ponto de convencer os empresários a investirem seus capitais
nessa área. O ensino sistematizado torna-se uma preocupação da sociedade. Escola
precisa de livros. Lobato, então, começa a relacionar suas obras, outrora
primordialmente literária, à função lúdico-pedagógica, convergindo-as ao que hoje
estaria muito próximo do que conhecemos como livro didático. Esse direcionamento
30
surgia a partir dos títulos, a saber: Emília no país da Gramática, Matemática do
Pedrinho, Geografia de Dona Benta.
Nota-se a partir disso, o fortalecimento da relação escola e o mercado
editorial. Lobato passa então a escrever também para o público infantil, tratando-o
como um ser pensante, capaz de refletir sobre assuntos sérios, promovendo o
despertar de sua imaginação e criatividade. Sua contribuição é historicamente
reconhecida, por fornecer uma visão das condições sobre as quais funcionava o
mercado de livros e das transformações ocorridas neste setor. E, neste contexto, o
livro didático foi propulsor da formação do leitor e a respectiva ampliação da empresa
editorial brasileira.
Segundo Lajolo (1999), a história do leitor brasileiro encontra-se, ainda, em
processo de formação, e está associada ao desenvolvimento e modernização da
sociedade, em função do progresso nas edições e distribuição, bem como na
popularização do ensino. Acrescenta que o leitor é constituído historicamente e, no
Brasil, esta constituição apresenta uma dependência da prática escolar, nas
demandas da sala de aula, para difundir a leitura como hábito social.
A autora acrescenta que no século XIX, há uma espécie de paternalismo
do escritor, buscando conduzir o olhar do leitor para uma leitura direcionada,
imperativa, tendenciosa, como se este não tivesse autonomia para fazer fluir a leitura
da obra.
Com Lobato, dentre outros, vemos o enfraquecimento desse paternalismo,
inclusive nas obras para crianças que é substituído pela proposta de parceria e, com
essa postura, o escritor solicita a interação do leitor. Mais especificamente, nos anos
70, em função da configuração social, o narrador assume a tarefa de formar o leitor
não somente em relação à competência leitora, mas desenvolver a competência
interpretativa necessária para a compreensão da realidade política e social.
Atualmente, a leitura é reconhecida como prática social e, portanto,
necessária ao convívio, razão pela qual deve ser realizada sua difusão. Sua
utilização encontra-se vinculada aos meios de comunicação e daí a necessidade de
ser, adequadamente, explorada na escola como competência, imprescindível para
transformar a informação em conhecimento.
31
1.3 ENSINO DE LEITURA: UMA RESPONSABILIDADE DE TODOS OS
PROFESSORES
A palavra escrita é patrimônio da cultura letrada, e todo
professor é, em princípio, representante dessa cultura. Logo, é
responsabilidade de todos os professores, e não apenas do
professor de Língua Portuguesa, inserir os alunos na
sociedade letrada, uma vez que ler é um requisito
indispensável para todos os componentes curriculares.
(KLEIMAN, 2002
a, p.7)
Sabendo dessa responsabilidade conjunta, cabe relacionar as principais
atividades, que, apesar de estar associada a esse componente curricular, pode e
deve ser explorada pelos demais componentes curriculares.
Observamos, na prática, uma visão fragmentada do processo de ensino,
em que os professores de matemática, por exemplo, se preocupam em desenvolver
o conteúdo específico de sua disciplina, sem admitir que, para que a aprendizagem
se efetive, o aluno precisa dominar a competência leitora. O mesmo ocorre em
outras disciplinas. Nota-se o quanto esta afirmação é verdadeira, ao vermos um
professor de disciplina adversa cometer erros de escrita, e ser compreendido; soaria
estranho, no entanto, se um professor de português tivesse dúvida quanto à grafia de
alguma palavra. Esta simples incerteza poderia colocar em cheque sua competência.
Observe-se a necessidade da competência leitora em outras disciplinas
escolares:
Disciplina Assunto Habilidades
Ciências Meio Ambiente
Ler e interpretar textos, explicitando os problemas ambientais
e as principais formas de preservação.
Matemática Adição e Subtração
Ler e compreender uma situação-problema, com o uso dessas
operações.
História Período Paleolítico
Ler, compreender e relacionar as características e
contribuições desse período no contexto histórico.
32
Segundo as Orientações Curriculares e Proposições de Expectativas de
Aprendizagem para o ensino fundamental – Ciclo I (SP, 2007, p 31-32), o ensino de
Língua Portuguesa, considerando o auxílio dos outros componentes curriculares,
deverá organizar um conjunto de atividades que, progressivamente, assegure:
A utilização da linguagem, na escuta e produção de textos orais, e
na leitura e produção de textos escritos, atendendo às múltiplas
demandas sociais, respondendo a diferentes propósitos
comunicativos e expressivos.
A utilização da linguagem, para estruturar e explicar a realidade,
preparando e oferecendo, condições de acessar as informações, no
sentido de preparar o educando para compreender e fazer uso
delas. A partir da identificação de aspectos relevantes, organizando
notas, esquemas e aumentando o aprofundando seus esquemas
cognitivos por meio da ampliação do vocabulário e de seus
respectivos significados.
A análise crítica dos diferentes discursos, inclusive o próprio, por
meio do desenvolvimento da capacidade de avaliação dos textos,
proporcionando a interação com diferentes opiniões, possibilitando
a identificação de referências intertextuais e proporcionando o
repensar de valores pessoais e sociais.
A análise linguística, por meio da utilização dos conhecimentos
adquiridos, de modo a expandir a capacidade de monitorar as
possibilidades de uso da linguagem, e ampliar a capacidade de
análise crítica.
Observa-se, nestas orientações, a valorização do uso da linguagem e da
compreensão leitora, na aprendizagem dos educandos. Embora sejam destinadas à
disciplina Língua Portuguesa, sabemos que estas orientações podem ser, também,
de responsabilidade de todos os professores, uma vez que todos se utilizam de
textos escritos para o desenvolvimento de seus respectivos componentes
curriculares.
33
1.4 CONCEPÇÕES DE LEITURA
Concebendo a relevância da compreensão leitora na construção da
autonomia do educando, reconhecendo-a como um instrumento imprescindível para
a realização de novas aprendizagens, vejamos diferentes concepções e suas
respectivas finalidades para desenvolver essa competência.
Antes de explicitá-las, entendemos como fundamental compreender o
processamento cognitivo presente na atividade de leitura, uma vez que o sucesso da
leitura compreensiva não está associado ao uso de diferentes métodos, mas sim a
compreensão por parte do professor, de como ocorre este processo.
De acordo com Smith (1999, p. 20), “quando lemos, muitas áreas do
cérebro estão em atividade, porém, não há uma parte específica responsável por
este ato. A leitura exige as mesmas habilidades de que o cérebro necessita para
compreender a fala”.
Segundo o autor, para realizarmos a leitura, dependemos muito mais da
informação não visual do que da informação visual, ou seja, dependemos mais dos
conhecimentos “prévios” sobre o assunto, do que sobre o que está sendo lido. A
base para encontrar sentido ao que lemos é o que já temos em nosso cérebro, ou
seja, nossa estrutura cognitiva que possui um modelo de mundo organizado e
consistente, construído ao longo das nossas experiências de vida.
Nesse sentido quando se privilegia apenas a informação visual (letras,
palavras, figuras), sem estabelecer relação com os conhecimentos prévios,
sobrecarregamos a capacidade de compreensão do cérebro, ocasionando a
chamada visão túnel, impedindo a construção de sentido na leitura. A ansiedade, o
medo de cometer erros, presentes na visão túnel, também são fatores que
prejudicam a construção do sentido na leitura,
Para Smith (1999, p.13), um professor que queira promover a
compreensão leitora precisa apresentar material, que faça sentido e desperte o
interesse do educando; e oferecer as orientações necessárias para que o educando
compreenda o que lê. Acrescenta que a responsabilidade do professor “não é de
ensinar a criança a ler, mas a de tornar a aprendizagem possível”. Desta forma,
esclarece que “adquirimos essa habilidade somente por meio da prática”.
34
Com relação ao material, previamente selecionado e potencialmente
significativo, o professor precisará estabelecer critérios para a seleção de temas,
cuidando para que estes sejam coerentes com os objetivos previstos e passíveis de
articulação com os conhecimentos prévios.
Quanto às orientações para os educandos que apresentam dificuldades na
compreensão leitora, devem ser propiciadas condições para a construção do sentido
da leitura, a partir de um leitor experiente como guia.
Ainda a esse respeito, os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1998,
p. 36) apresentam uma concepção interativa de leitura, em que o leitor realiza um
trabalho ativo de construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, dos
seus conhecimentos sobre o assunto, o autor, e do que sabe sobre a língua. Esta
concepção reforça a perspectiva apresentada por Smith (1999), tendo como ponto
comum à valorização das experiências do conhecimento de mundo na construção da
compreensão. De acordo com o exposto, Kleiman afirma que:
A aprendizagem mecânica pressupõe o texto como um
conjunto de elementos gramaticais com significado e
função independente do contexto ou como um depósito de
mensagens e informações, cabendo ao aluno extrair o
sentido de cada palavra para chegar à interpretação do
texto. A interpretação ora está centrada no aluno (qual a
sua opinião), ora está centrada no texto, e o professor dá a
última palavra. Não existe interação entre professor e
alunos, para construir a compreensão, pois ambos estão
ocupados em responder às questões e localizar
informações. (KLEIMAN, 2002
a, p.17-19)
Nesse contexto, notamos que a falta de interação promove a aprendizagem
mecânica de leitura, que por sua vez é prejudicial, pois não possibilita a
compreensão.
Cabe esclarecer que há diferentes concepções de leitura, que segundo
Koch e Elias (2006, p.10-11) essas decorrem em função da visão, que se tem a
respeito da língua, do sujeito e do texto, como veremos a seguir:
35
Quando o foco está no autor, a leitura é entendida como
uma atividade de captação das idéias do autor ou de
reconhecimento das intenções do mesmo, sem se levar em
conta às experiências e conhecimentos do leitor. A língua é
vista como representação do pensamento do autor, que é o
responsável pela construção da representação mental.
Dessa forma, quem escreve deseja que esta seja captada
pelo interlocutor (leitor), da maneira como foi mentalizada.
O texto, por sua vez, é visto como um produto lógico do
pensamento do autor, cabendo ao leitor apenas captar essa
representação mental e dar-lhe sentido.
Quando o foco está no texto, a leitura é entendida como
uma atividade que exige do leitor o foco no texto e em sua
linearidade, enfatizando, sobretudo, a decodificação e o
reconhecimento do sentido das palavras e estruturas do
texto. A língua é considerada uma estrutura pré-
determinada pelo sistema lingüístico e/ ou social e, mais
que um código, é um instrumento de comunicação. O
emissor codifica algo e o leitor busca decodificar-lhe o
significado, realizando a compreensão do texto. O texto,
nesse caso, é produto da codificação de um emissor (que
transforma o abstrato em concreto) a ser decodificado pelo
receptor (este transforma o concreto em abstrato),
privilegiando o conhecimento do código utilizado.
Em ambas as concepções, o papel do leitor é considerado
passivo, não havendo, portanto, a existência de uma
interação, entre o autor-texto-leitor, uma vez que se
desconsideram os conhecimentos prévios do leitor,
favorece a prática de uma aprendizagem mecânica que não
promove a construção de conhecimentos.
Em contrapartida, quando o foco está na interação autor–
texto–leitor, a leitura é concebida como uma atividade
interativa e complexa de produção de sentidos. Por sua
vez, a compreensão se realiza com base nos elementos
linguístico-textuais, para tanto, requer a mobilização de um
vasto conjunto de saberes inter-relacionados com as
36
experiências e conhecimentos do leitor. Os sujeitos (autor e
leitor) são atores, agentes, que se constroem e são
construídos pelo texto, considerando o próprio lugar da
interação e da constituição dos interlocutores. O texto, por
sua vez, possui uma gama de sentidos implícitos e
variados, somente detectáveis quando se tem como pano
de fundo o contexto sócio-cognitivo do autor e do leitor.
Nessa perspectiva, o sentido de um texto é construído na
interação entre o texto e os sujeitos: autor e leitor, e não em
algo que pré-exista dessa interação, caracterizando-se
como uma aprendizagem de leitura que valoriza e prioriza
os conhecimentos do leitor, de modo a construir uma
aprendizagem significativa. (KOCK e ELIAS, 2006, p.10-
11).
Nessa direção, no que se refere à interação autor-texto-leitor, Solé afirma
que o papel do leitor consiste em processar as informações, criticando, avaliando e
construir o sentido e o significado ao que leu. Nesse processo, os conhecimentos
prévios sobre o assunto, a motivação, o tipo de texto a ser lido e os objetivos
auxiliam nas previsões e inferências e extrapolam o conhecimento do código,
possibilitando a aceitação ou rejeição das hipóteses levantadas inicialmente (SOLÉ,
1998, p.22)
Segundo a autora, há dois modelos hierárquicos de processamento da
leitura: ascendentes (Bottom up) e descendente (Top Down). O modelo ascendente
(Bottom up) centrado no texto, que considera que o leitor processa os elementos, do
texto, começando pelas letras, avançando pelas frases, isto é, do simples ao
complexo, chegando à compreensão do todo. Neste modelo, é atribuída grande
importância às habilidades de decodificação, em razão de considerar que a
compreensão é obtida por ela.
No modelo descendente (Top Down), considera que o leitor não assimila
letra por letra, mas se utiliza de seu conhecimento prévio e de seus recursos
cognitivos, isto é, vai do complexo ao simples, para atingir o sentido do texto. Assim,
quanto mais recebe informações antecipadas sobre o texto, menos se fixa nele para
construir sua interpretação. Neste modelo, é atribuída grande importância a
37
interação, pois, é a partir dela que se constrói a interpretação. (SOLÉ, 1998, p. 23)
Kato (1992, p.50-51) acrescenta que é possível diferenciar os tipos de
leitores, a partir desses dois tipos de processamento. O primeiro é aquele que se
utiliza basicamente do processo ascendente, construindo o sentido com base nos
dados do texto, fazendo pouca leitura nas entrelinhas. Ou seja, embora o leitor seja
capaz de detectar inclusive erros contra ortografia, não consegue fazer conclusões,
pois apresenta dificuldades em sintetizar as idéias do texto, por não saber distinguir o
que é mais importante.
O segundo tipo de leitor se utiliza do processamento descendente. É
aquele que apreende facilmente as idéias gerais e principais do texto, contudo, pode
cometer interpretações errôneas, ao fazer mais uso do seu conhecimento do que da
informação efetivamente oferecida pelo texto.
O modelo interativo de leitura, que será discutido neste estudo, valoriza a
formação do leitor maduro, que utiliza de forma adequada os dois processos
complementares. Nesta concepção, ambos os modelos (bottom-up e top-down)
assumem relevância, pois, considera-se que, para realizar a leitura, faz-se
necessário tanto o reconhecimento das palavras de maneira rápida e eficiente, como
também a previsão do que irá aparecer no texto.
Para que seja viabilizado o modelo interativo de leitura, faz se necessário o
uso das estratégias de leitura, que veremos a seguir.
1.5 ESTRATÉGIAS DE LEITURA
Um dos desafios da escola atual é formar leitores ativos que sejam
capazes de questionar sua própria compreensão em condições de estabelecer
relações entre o que conhece e o que será conhecido. E, dessa forma, organizar e
transportar seus conhecimentos de um para outro contexto.
Ao analisarmos o processo de leitura, notamos que somente o
conhecimento do código não garante a compreensão. Além disso, urge mobilizar os
conhecimentos prévios sobre o assunto e o gênero, e desenvolver uma série de
estratégias que permitam construir o significado para a compreensão leitora.
38
Uma vez que estratégia está intrinsecamente relacionada à organização e
planejamento prévio, um de seus pontos fortes consiste em regulamentar a atividade
das pessoas, podendo favorecer na formação de leitores autônomos e contribuir para
dotá-los dos recursos necessários ao aprender a aprender.
Solé (1998) diferencia estratégias de procedimentos, salientando que estes
são definidos como ações automatizadas que não dependem da definição de
objetivos e, dessa forma, não utilizam controle. As primeiras, ao contrário dos
segundos, como não são automatizadas, necessitam de um ensino sistematizado,
podendo ser viabilizadas na escola, uma vez que auxiliarão especificamente na
aprendizagem de leitura, contribuindo de forma decisiva para a autonomia.
De acordo com essa proposta de formação de leitores, Solé destaca que o
leitor ativo deverá agir de maneira a compreender os propósitos implícitos e
explícitos do texto, e, assim, buscar ativar os conhecimentos prévios relevantes, que
se tem sobre o assunto. Esta ativação pode ser obtida por meio de questionamentos,
tais como: O que eu sei sobre o assunto? O que poderia me ajudar a compreendê-
lo? O que sei sobre o autor? O gênero? Em que momento o texto foi produzido?
Para quem? Por quê?
Solé finaliza, alertando sobre a necessidade de avaliar a consistência
interna do conteúdo expresso no texto, sendo que essa avaliação poderá ser
realizada por meio da verificação do sentido e da coerência. Desta forma, justifica o
uso das estratégias de leitura, na formação de leitores autônomos, dotando-os de
capacidade para aprender a partir desta competência (SOLÉ, 1998, p.73-74).
As estratégias de leitura possuem natureza e objetivos diferentes e são
divididas em: seleção, antecipação, inferência e de verificação.
As estratégias de seleção permitem que o leitor se atenha apenas ao que
é relevante em função de seus objetivos, enquanto que as estratégias de
antecipação permitem prever com base em informações explícitas ou suposições o
que ainda está por vir. Ambas são utilizadas no primeiro contato com o texto.
Já as estratégias de inferência são utilizadas durante a leitura, permitindo
captar o que não está dito de forma explícita. São fundamentadas nas pistas
presentes no texto ou baseadas no conhecimento prévio do leitor, de modo que não
são aleatórias. Por sua vez, as estratégias de verificação são utilizadas na
39
finalização da compreensão, tornando possível o seu controle, o que permite
confirmar, ou não, as previsões estabelecidas e possibilitar uma reflexão mais
aprofundada no assunto.
A esse respeito, Kleiman (2002 a, p.7) considera a leitura como uma
“atividade a ser ensinada na escola, e não como pretexto para outras atividades”.
Nesse sentido, expõem-se os aspectos cognitivos presentes no ato de ler, em que o
leitor torna-se sujeito e o texto objeto. E assim classifica a estratégias em: cognitivas
e metacognitivas.
As estratégias cognitivas são as operações inconscientes do leitor, que
não apresentam objetivos específicos; enquanto as metacognitivas são operações
realizadas com algum objetivo em mente sobre as quais se tem controle consciente.
A autora esclarece que a metacognição consiste na capacidade de conhecer o
próprio conhecimento, o que permite pensar sobre a própria atuação, possibilitando o
controle e a regulação das ações. Nesse sentido, o leitor será capaz de identificar e
explicar sua ação. Ressalta, ainda, que o uso das estratégias metacognitivas
possibilita o desenvolvimento de habilidades necessárias para a compreensão.
Kleimam coloca que o leitor proficiente possui flexibilidade na leitura, tem
mais de um procedimento para atingir seus objetivos e apresenta duas
características básicas: lê porque tem algum objetivo em mente; e compreende o que
lê porque utiliza diferentes recursos para essa compreensão (KLEIMAM, 2002b,
p.31, 49, 51).
Dessa forma, a partir da articulação desses conceitos, é possível entender
que as estratégias de leitura possuem natureza metacognitivas, uma vez que
pressupõem o estabelecimento de objetivos e o controle da compreensão.
Com base no exposto, visando o desenvolvimento da compreensão leitora
será necessário esclarecer em que consistem e como devem ser utilizadas as
estratégias antes, durante e depois da leitura.
40
1.5.1 ESTRATÉGIAS DE LEITURA UTILIZADAS: ANTES DA LEITURA
(ANTECIPAÇÃO)
Segundo Solé (1998, p.89), há estratégias que devem ser utilizadas “antes
da leitura”, por meio de ações como: motivar, estabelecer objetivos, revisar e
atualizar os conhecimentos prévios, bem como estabelecer previsões do texto e
formular perguntas sobre ele.
Estar motivado para realizar a leitura é fundamental para encontrar o
sentido e construir a compreensão. Para tanto, estabelecer critérios na seleção dos
temas é imprescindível. O professor deve se preocupar em selecionar textos não
conhecidos, porém, com temas familiares, de modo a possibilitar a articulação
desses com os conhecimentos prévios. Além disso, deve-se evitar a fragmentação
da leitura, e o ler por obrigação. Enfim, criar a motivação para a leitura depende de
um planejamento adequado, em que sejam definidos os critérios e os recursos
necessários para essa atividade.
Considerando que é por meio dos objetivos para realizar a leitura, que será
determinada a forma como se vai ler, é possível determinar diferentes objetivos, tais
como: ler para obter uma informação precisa ou de caráter geral, para seguir uma
instrução, ler para aprender, para revisar um escrito próprio, ler por prazer, para
comunicar, para verificar o que se compreendeu etc.
Assim, verificamos que a clareza na finalidade da leitura é o que favorece
a compreensão. Quando lemos para obter uma informação precisa, o objetivo é
localizar algo específico, trata-se, portanto, do uso de estratégias de seleção das
informações, em que se despreza o que não é necessário, como o que ocorre
quando fazemos uma consulta ao dicionário ou lemos o horóscopo no jornal. Na
escola, esse tipo de atividade é bastante utilizado, pois consiste na busca rápida de
determinada informação.
Ao lemos para seguir instruções de uma regra de jogo ou de um manual de
instalação de equipamentos, necessitamos de uma leitura mais completa, em que
não se pode desprezar nenhuma informação, pois é o conjunto das informações que
irá possibilitar a compreensão, diferente do objetivo de leitura citado anteriormente.
41
Se o objetivo é ler para obter uma informação de caráter geral, não há a
necessidade de detalharmos o assunto. Isso é muito comum na leitura de um jornal,
em que normalmente não lemos toda a matéria, e apenas a manchete e o lide
parecem ser suficientes. Outras vezes, no entanto, as manchetes podem funcionar
como um aspecto motivador para se aprofundar no assunto, em que se busca,
inicialmente, uma visão ampla do tema e, em seguida, seleciona-se outras coisas
que interessem.
Kleimam (2002b, p.39) afirma que a “capacidade de estabelecer objetivos
na leitura é considerada uma estratégia metacognitiva, pois implica controle e
reflexão do próprio conhecimento”. Ressalta que, embora as crianças possam
mostrar maiores dificuldades para avaliar e refletir sobre o próprio conhecimento,
elas precisam se sentir capazes de realizá-lo, uma vez que essa estratégia permite a
melhoria da compreensão.
A formulação de hipóteses, que também contribui para a compreensão é,
também, fundamentada no estabelecimento de objetivos. Embora as previsões e
hipóteses sejam realizadas a todo o momento, torna-se necessário estabelecê-las
antes da leitura propriamente dita, por meio da leitura de título, subtítulo, ilustrações
etc. São essas informações que ativam os conhecimentos prévios, adquiridos ao
longo da vida, e possibilitam a interação com os novos conhecimentos, favorecendo
a compreensão.
Há duas atividades fundamentais que favorecem a compreensão leitora:
estabelecimento de objetivos e formulação de hipóteses. Ambas são estratégias
metacognitivas, ou seja, pressupõem a reflexão e controle do conhecimento.
Há algumas ações que favorecem a revisão e à ativação dos
conhecimentos prévios, uma vez que não é possível padronizar os saberes. Dentre
elas, destacam-se: oferecer uma explicação geral sobre o texto, indicar o tema e
permitir que se sejam estabelecidas relações com sua experiência pessoal,
incentivando a exposição do que já sabe sobre o tema, a sua maneira.
Após a caracterização das estratégias de leitura utilizadas antes da leitura,
faz se igualmente necessário conhecer as estratégias que poderão ser realizadas
durante a leitura, como forma de favorecer as inferências e promover a
compreensão.
42
1.5.2 ESTRATÉGIAS DE LEITURA UTILIZADAS: DURANTE A LEITURA
(INFERÊNCIA)
Esta etapa consiste na parte efetiva do processo, é o momento em que se
confirmam, ou não, as previsões. Pode ser considerada uma manutenção da
anterior, haja vista que o “antes” é pré-requisito do “durante”. Tanto nas atividades de
leitura individual quanto na compartilhada, faz-se necessário desenvolver e incentivar
o uso de estratégias durante a leitura, que consistem em: continuar formulando
previsões sobre o texto e realizar questionamentos após a leitura, com o objetivo de
esclarecer as possíveis dúvidas.
Dessa forma, espera-se que o leitor tenha uma atitude ativa frente o texto,
e que construa sua compreensão no decorrer da leitura. À medida que são
identificadas as dificuldades na compreensão, faz se necessário buscar possíveis
soluções. É essa identificação que permite o entendimento do texto.
Para finalizar, serão caracterizadas as estratégias que devem ser
desenvolvidas depois da leitura, que são responsáveis pela verificação da
compreensão.
1.5.3 ESTRATÉGIAS DE LEITURA UTILIZADAS: DEPOIS DA LEITURA
(VERIFICAÇÃO)
As estratégias que devem ser desenvolvidas e incentivadas depois da
leitura, com o objetivo de favorecer a compreensão, consistem em: identificar as
idéias principais do texto, elaborar um resumo contendo-as, encontrar as respostas
das perguntas previstas inicialmente e refletir sobre o tema proposto.
Para realizar estas tarefas, será necessário estabelecer relações entre os
objetivos da leitura e os conhecimentos prévios do leitor. Pois, quando não ocorre
esta relação, o texto não passa de um conjunto de frases, o que não contribui para a
compreensão de maneira global e esclarecedora.
43
Entendemos que as estratégias utilizadas antes, durante e depois da
leitura, têm a função de favorecer a metacognição (capacidade de conhecer o próprio
conhecimento), permitindo ao educando pensar sobre sua própria compreensão, o
que possibilita o controle e a avaliação de suas ações.
Em síntese, as estratégias de leitura têm a finalidade de: transformar o
leitor passivo em ativo, isto é, alguém que sabe o que vai ler e o porquê dessa ação.
E, assim, assume sua responsabilidade ante a leitura, e a utiliza para tanto suas
experiências, expectativas e questionamentos.
Diante do exposto, é possível reconhecer que as estratégias de leitura
explicitadas desempenham papel fundamental na formação do leitor ativo, de modo a
contribuir para a inserção do mesmo, em práticas cidadãs imprescindíveis à
Sociedade da Informação e do Conhecimento.
Com o objetivo de sintetizar e diferenciar os conceitos envolvidos na
aprendizagem de leitura passiva (focada na decodificação) e a interativa (focada no
uso das estratégias de leitura), veja o mapa conceitual que segue:
44
Com essas práticas, espera-se que haja o desenvolvimento da
compreensão leitora, o que, por sua vez, poderá favorecer a aprendizagem
significativa, que será também discutida neste estudo, por meio do referencial da
Psicologia Cognitiva, apresentado por Ausubel.
1.6 APRENDIZAGEM VERBAL SIGNIFICATIVA RECEPTIVA
David Paul Ausubel nasceu nos Estados Unidos, precisamente em New
York, em 1918. Sua família era de origem judaica, possuía poucos recursos além de
enfrentar dificuldades em decorrência de preconceitos e conflitos religiosos.
Cresceu insatisfeito com a educação que recebera na escola, sendo, muitas vezes,
vítima de ridicularizações e humilhações. Formou-se em Psicologia da Educação,
45
com o objetivo de contribuir com melhorias, que considerava necessárias ao
aprendizado
1
, tornou-se um representante da Psicologia Cognitiva.
As propostas psicoeducativas do psicólogo educacional e cognitivista
David Ausubel estão entre as primeiras na década de 1960, que explicam a
aprendizagem escolar e o ensino distante dos princípios condutistas. (COLL, 2000,
p. 231).
Entender a distância que há entre os princípios condutistas e os
cognitivos presentes na proposta de Ausubel implica em diferenciar os respectivos
objetos de conhecimento, pois, enquanto os princípios condutistas apresentam
interesse pela mudança do comportamento externo e observável, a Psicologia
Cognitiva, por sua vez, apresenta interesse na mudança do conhecimento.
Ao considerar que possuímos uma capacidade mental limitada para
armazenar as informações, é possível verificar a contribuição da Psicologia
cognitiva, no que diz respeito à compreensão da aprendizagem como um processo
de modificação do conhecimento.
Ainda sob este ponto de vista, é necessário que a escola tenha
compromisso em promover um ensino que priorize a organização da estrutura
cognitiva do educando, preparando-o para processar as informações e transformá-
las em conhecimento.
Notamos que para ocorrer essa aprendizagem, em que se objetivam a
modificação do conhecimento e a organização da estrutura cognitiva, faz-se
oportuno sistematizar um ensino que contenha objetivos claros e estratégias
definidas.
Nesse contexto é possível compreender os subsídios que o referencial da
Psicologia Cognitiva oferece para o desenvolvimento de uma aprendizagem
significativa.
Dessa forma sob a perspectiva cognitiva, Ausubel apresenta sua teoria,
que tem como eixo central a aprendizagem significativa, concebendo a
aprendizagem como um processo de modificação do conhecimento e reconhecendo
a importância dos processos mentais nesse desenvolvimento.
1
http://pt.wikipedia.org/wiki/David_Ausubel/ acesso em 05 de janeiro de 2009.
46
Esse processo de modificação do conhecimento ocorre por meio da
interação entre os conhecimentos existentes na estrutura cognitiva (o que o
educando já sabe) com os conteúdos a serem aprendidos que, por sua vez, devem
ser substantivos e não arbitrários.
Faz-se necessário esclarecer que os conteúdos substantivos são
assimilados mais facilmente na estrutura cognitiva, por conterem elementos que
fazem parte do repertório cultural do educando. Já os conteúdos arbitrários têm sua
assimilação dificultada, por não apresentarem relação alguma que lhe faça sentido.
Nesse contexto, é imprescindível a determinação de critérios na seleção
dos conteúdos, tornando-os substantivos, de modo que estes possam ser
substituídos por conceitos equivalentes, sem ocasionar prejuízos na compreensão.
Nesta seleção, em que o objetivo principal é atingir a estrutura cognitiva do
educando, deve ser observadas sua pertinência em relação à faixa etária, cultura,
classe social e ocupação. Os conteúdos devem ser ensinados em contextos reais
de aprendizagem, em situações em que faça sentido, permitindo aos educandos
mobilizar o que sabem acerca do assunto.
Para Ausubel (1980), o fator que exerce maior influência para que ocorra
a aprendizagem é a estrutura cognitiva do indivíduo, bem como sua organização e
clareza e assim afirma: “Se eu tivesse que reduzir toda a psicologia educacional a
um único princípio, diria isto: O fator isolado mais importante que influencia a
aprendizagem é aquilo que o aprendiz já conhece. Descubra o que ele sabe e
baseie nisso os seus ensinamentos”. (AUSUBEL, 1980, p.
iiiv)
Essa estrutura cognitiva é originada, na medida em que nos relacionamos
e atribuímos significados à realidade que nos cerca. São esses primeiros
significados que se constituem como ponto de ancoragem para a construção de
novas aprendizagens. Sua organização é definida por meio de hierarquias, dividida
entre conceitos mais inclusivos, com maior poder de generalização, e conceitos
menos inclusivos, com menor poder de generalização.
Moreira (1982, p.3) esclarece que, na estrutura cognitiva, a aprendizagem
ocorre como um processo de armazenamento da informação, sendo esta
condensada em classes mais genéricas, podendo ser manipulada pelo indivíduo,
quando estabelece relações.
47
A esse respeito, Coll (2000, p 232) afirma que a estrutura cognitiva pode
ser entendida, como uma rede de conceitos organizados de modo hierárquico de
acordo com o grau de abstração e de generalização.
Essa estrutura cognitiva pode ser representada, graficamente, por meio
de uma pirâmide invertida, na base estariam os conceitos mais abrangentes e na
extremidade os conceitos menos abrangentes. Esta organização hierárquica é
representada pela figura a seguir:
Conceitos mais amplos e generalizáveis
Conceitos mais específicos e
menos inclusivos
Nota-se que é fundamental iniciarmos pela identificação de conteúdos
mais abrangentes, para que possam ser priorizados e explorados, em razão de seu
maior poder de generalização. Embora se reconheça a complexidade desta
identificação, por ela implicar na clareza dos professores em diferenciar o que é
essencial do que é secundário este procedimento é primordial para facilitar a
aprendizagem.
Com base nessa organização, para que ocorra a aprendizagem
significativa, são necessárias algumas condições:
Estrutura cognitiva clara e organizada.
Predisposição do aluno em aprender.
48
Seleção de material potencialmente significativo.
Verificamos que, no desenvolvimento da aprendizagem significativa, é
notável a valorização dos conteúdos substantivos em detrimentos aos arbitrários,
seja para organizar a estrutura cognitiva, ampliando sua capacidade, seja para se
obter a disposição do educando para aprender.
Nesse sentido, é possível notar a importância do papel do professor na
seleção de material que promova, além da interação entre o que já existe na
estrutura cognitiva com o que se pretende aprender, estimule o educando para o
aprendizado.
Ausubel (1980, p.23) informa que a aprendizagem significativa pode
ocorrer de duas maneiras: por recepção ou por descoberta. Na primeira, os
conteúdos são apresentados na forma final; na segunda, os conteúdos não são
apresentados de forma acabada, permitindo aos educandos construir seu
conhecimento, antes de assimilá-lo. Embora haja uma tendência em se considerar
que a aprendizagem significativa somente ocorra por meio da descoberta, Ausubel
(1980) enfatiza que ela pode ocorrer das duas formas, ou seja, tanto por recepção
como por descoberta.
Diante do exposto, Moreira (1982, p. 90) salienta que, devido ao ensino
ser predominantemente verbal e receptivo, atribuiu-se grande importância à
linguagem, como facilitadora da aprendizagem significativa. E, por essa razão,
define-se a concepção de Ausubel como Aprendizagem Verbal Significativa
Receptiva.
O autor ressalta que o ensino na sala de aula costuma ser organizado por
meio da linguagem e de sua recepção, o que aparentemente demonstra ser uma
atividade passiva, focada apenas na transmissão do conhecimento.
Nesse contexto, o papel do professor consiste em auxiliar o educando a
construir e organizar sua estrutura cognitiva de maneira hierárquica, propondo um
ensino a partir da apresentação de conceitos mais amplos, generalizáveis e
potencialmente significativos, avançando para conceitos mais específicos e menos
abrangentes.
Acredita-se que essa maneira peculiar de sistematizar e apresentar a
nova informação ao educando contribuirá para a organização da estrutura cognitiva
49
e resultará em uma aprendizagem significativa e não mecânica. A principal
vantagem do desenvolvimento da aprendizagem significativa em relação à
aprendizagem mecânica é o processamento do conteúdo e o aumento da
capacidade de aprender outros conteúdos relacionados a esse, promovendo o
enriquecimento da estrutura cognitiva.
Segundo Moreira (1982, p. 10), a aprendizagem mecânica é necessária
quando um indivíduo adquire informação numa área de conhecimento
completamente nova para ele, ou seja, quando ele não dispõe de conhecimentos
prévios que permitam a articulação com sua estrutura cognitiva. Nesse caso, haverá
a necessidade de apresentar estes conteúdos por meio de esquemas que
favoreçam o estabelecimento de relações.
Como já foi dito anteriormente, todos os indivíduos possuem uma
estrutura cognitiva interna que é constituída por inclusores, conceitos amplos que
são formados na relação com a cultura, o meio, o mundo do indivíduo. Estes
inclusores permitem a inserção de conceitos mais específicos, que proporciona a
assimilação.
A assimilação também chamada de aprendizagem significativa é o
resultado dessa inclusão obliteradora, que é responsável pelo aumento e
enriquecimento da capacidade da estrutura cognitiva, preparando-a para receber
novas informações.
Como forma de esclarecer o que facilita a assimilação, Ausubel (1980)
informa a existência dos princípios de diferenciação progressiva e reconciliação
integrativa, caracterizando-os da seguinte forma:
O princípio de diferenciação progressiva propõe que, no desenvolvimento
da aprendizagem, seja feita a apresentação de idéias mais gerais e inclusivas
inicialmente e, depois, vai diferenciando-as, progressivamente, como uma forma de
facilitar a aprendizagem.
Os processos envolvidos no princípio de diferenciação progressiva são
apresentados como vemos:
50
Já o princípio de reconciliação integrativa propõe que, na apresentação
do conteúdo, sejam esclarecidas as semelhanças e as diferenças entre os
conceitos apresentados em diferentes contextos, como exemplo: A palavra roda
denota algo circular e em movimento. No entanto, ela adquire significações
diferenciadas a partir do contexto em que estiver inserida, como vemos: José está
numa roda de amigos; As crianças brincam de roda no jardim; A roda- gigante
parou; A roda do carro quebrou; Minha cabeça está rodando. Apesar de em todas
as orações, “roda” manter sua significação inicial, ela ganha uma peculiaridade em
cada situação.
De igual importância são os organizadores prévios, que podem ser
constituídos por uma afirmação introdutória e divididos em: expositivos, quando o
51
conteúdo é inteiramente desconhecido e se utiliza o princípio de diferenciação
progressiva; enquanto que nos comparativos, o conteúdo não é inteiramente
desconhecido, utiliza-se o princípio de reconciliação integrativa, estabelecendo uma
relação de comparação, enfatizando as semelhanças e diferenças que há entre
eles. O uso desses princípios e organizadores prévios torna a estrutura cognitiva
mais clara e organizada.
No desenvolvimento da compreensão leitora, é possível identificar a
ocorrência do processo de assimilação (aprendizagem significativa) quando há
seleção de temas compatíveis com a estrutura cognitiva do educando, e se
promove a articulação necessária para construir a compreensão.
No ensino das estratégias de leitura, nota-se também o uso dos princípios
de diferenciação progressiva e reconciliação integrativa, e entendemos que ambos
organizam a estrutura cognitiva.
Nesse sentido, podemos observar que as estratégias utilizadas antes da
leitura (estabelecimento de objetivos, previsões) podem ser favorecidas por meio do
princípio de diferenciação progressiva, uma vez que para o desenvolvimento da
compreensão, inicialmente são apresentadas as idéias mais gerais e inclusivas a
respeito do assunto, permitindo a articulação com os conhecimentos prévios, que
durante a leitura pode se diferenciar progressivamente. Por sua vez o princípio de
reconciliação integrativa, pode ser associado às mesmas estratégias, e pode ser
observado quando na apresentação do conteúdo, são esclarecidas as semelhanças
e as diferenças entre os conceitos que serão apresentados.
Visando a esclarecer a relação desses princípios, com o uso das
estratégias de leitura, temos o mapa conceitual seguir:
52
É possível concluir que quando utilizamos as estratégias antes da leitura
uma das ações previstas é o levantamento das hipóteses. Durante a leitura esse
processo de confirmação das hipóteses, permite construir a compreensão. Assim,
sendo podemos dizer que é por meio da diferenciação progressiva (estabelecimento
de relações) partindo dos conceitos mais amplos para os mais específicos que se
obtém a compreensão.
Os organizadores prévios também podem ser considerados como uma
estratégia de leitura, podendo ser viabilizado antes da leitura por meio de uma roda
53
de conversa, com o objetivo de mobilizar os conhecimentos prévios, sobre o tema
que será lido.
Ainda durante a leitura podemos utilizar o princípio de reconciliação
integrativa, quando buscamos entender os diferentes significados de uma mesma
palavra, por meio de suas semelhanças e diferenças buscando adequá-las naquele
contexto específico.
Ao fim de uma tarefa de leitura é fundamental realizar um resumo das
idéias principais contidas no texto, com a finalidade de verificar se houve a
compreensão e consequentemente uma aprendizagem significativa.
Essas são as possíveis relações que há entre a concepção da
aprendizagem significativa e a concepção interativa de leitura, ambas favorecem a
organização da estrutura cognitiva.
Em relação a essa organização, Ronca (1980, p. 66) “ressalta a
importância de o professor facilitá-la, por meio de estratégias”. A esse respeito,
vemos que o uso das estratégias de leitura como um recurso auxiliar na
organização da estrutura cognitiva. Uma vez que o uso dessas desenvolve a
metacognição, responsável pelo controle da compreensão, permitindo ao educando
avaliar o que compreende e como compreende.
Do ponto de vista da Psicologia da Educação, é coerente considerar a
pertinência dos aspectos cognitivos, amplamente discutidos na teoria da
aprendizagem verbal significativa, contemplados na concepção interativa de leitura.
E deste modo é possível estabelecer relação consistente entre essas abordagens,
uma vez que em ambas, evidencia-se a importância da estrutura cognitiva e
privilegia-se a articulação dos conhecimentos prévios para o desenvolvimento da
aprendizagem.
Nesse sentido, o ensino das estratégias de leitura contribui para a
ocorrência do processamento cognitivo e a respectiva modificação do conhecimento
que poderá ser favorecido por meio do desenvolvimento da compreensão leitora.
É necessário levar em conta, que uma aprendizagem significativa não se
relaciona única e exclusivamente aos aspectos cognitivos, mas está também
associada às referências pessoais, sociais e afetivas do aprendiz (que apesar de
importantes, não serão discutidas neste estudo). Portanto, é importante ressaltar,
54
que a aprendizagem, não ocorre da mesma forma e ao mesmo momento para
todos, o que demonstra a importância de valorizar as diferenças individuais no
desenvolvimento da aprendizagem.
Ronca (1980, p.81) coloca a existência de alguns desafios, para o
exercício da prática educativa, que demandam uma reflexão na sua concretização.
Esses desafios se constituem nos seguintes questionamentos:
Como aproveitar o que já existe na estrutura cognitiva do educando?
Como desenvolver um plano de ensino, considerando esta estrutura?
Como tornar essa estrutura cognitiva clara e organizada?
Nessa perspectiva, é possível verificar as contribuições do
desenvolvimento da compreensão leitora e do uso das estratégias de leitura para
enfrentar esses desafios.
Em relação à valorização da estrutura cognitiva, notamos que as
estratégias utilizadas antes da leitura desempenham esse papel com muita
propriedade quando ativa e articula os conhecimentos prévios do educando.
Enquanto a organização dessa estrutura pode ser favorecida, por meio da definição
de objetivos para realizar a leitura.
No que diz respeito às estratégias durante a leitura, nota-se que o seu
uso, também contribui, pois a compreensão e a checagem de hipóteses promovida
por meio de questionamentos sobre o texto funcionam igualmente como um recurso
para essa organização. Em relação às estratégias depois da leitura, estas também
desempenham importante papel, pois auxiliam na retomada dos conceitos,
contribuindo para a revisão, checagem das dúvidas, fixação dos conceitos e
concretizando a aprendizagem significativa.
Conhecer esses princípios torna-se essencial para a organização de um
plano de ensino coerente a compatível com o que o educando já conhece e o que
necessita conhecer. E desta forma, será possível priorizar os conteúdos de maneira
hierárquica e pertinente.
Para finalizar, entendemos que o uso das estratégias de leitura contribuirá
de maneira efetiva no processamento da informação e na organização da estrutura
cognitiva o que, consequentemente, favorecerá a aprendizagem.
55
2. METODOLOGIA
Esta pesquisa buscará fundamentação a partir do estudo de caso, que,
segundo Chizzotti (2006), é uma estratégia comum na atividade educacional e
consiste em reunir informações sobre um determinado produto, fato ou fenômeno
social contemporâneo complexo, situado em seu contexto específico. Logo, objetiva
reunir dados relevantes sobre o objeto de estudo, buscando um conhecimento mais
amplo sobre ele, esclarecendo questões pertinentes e, sobretudo, instruindo ações
posteriores. É uma pesquisa de caráter exploratório, de traço qualitativo e “pode
revelar realidades universais, porque, guardadas as peculiaridades, nenhum caso é
um fato isolado, independente das relações sociais em que ocorre”. (CHIZZOTI,
2006, p. 135, 138).
Na mesma direção Lüdke e André (1986) afirmam que:
O estudo de um caso seja ele simples ou específico, como o
de uma professora competente de uma escola pública, ou
complexo e abstrato, como o das classes de alfabetização
(CA) ou o do ensino noturno. O caso é sempre bem
delimitado, deve ter seus contornos claramente definidos no
desenrolar do estudo. O caso pode ser similar a outros, mas
ao mesmo tempo distinto, pois tem um interesse próprio,
singular.
(LÜDKE E ANDRÉ, 1986, p.17)
Considerando o exposto, esse estudo buscará situar o perfil das
participantes da pesquisa, caracterizando-as, identificando e analisando as
estratégias de leitura explicitadas e discutindo-as a luz da perspectiva interativa de
leitura.
56
2.1 COMO SERÁ O PROCESSO?
Embora a leitura se dê em vários segmentos da sociedade e em vários
momentos da vida humana, para realizar uma pesquisa científica, sobre esse objeto
faz-se necessário delimitar um recorte, estabelecer objetivos para que se obtenham
resultados. Em função disso, neste estudo, optamos por escolher para análise uma
escola da rede pública estadual de São Paulo.
A opção pela escola ocorreu em decorrência da minha atuação, na
Diretoria de Ensino Sul Três, como Bolsista no programa Bolsa Mestrado do
Governo Estadual. Foi nessa experiência que tive contato com as escolas que
apresentavam baixo Índice de Desenvolvimento de Ensino de São Paulo (IDESP).
Cabe esclarecer que a escola inclusa nesse índice apresenta resultados
insatisfatórios, no desempenho das expectativas de aprendizagem previstas, nos
componentes curriculares de língua portuguesa e matemática.
Entendendo que esses resultados também refletem as dificuldades
originadas, principalmente, pela falta de compreensão leitora, decidi adotar como
critério de escolha, uma dessas escolas para desenvolver esse estudo, sabendo
que, de alguma forma, poderemos contribuir para refletir sobre as razões dos
resultados, no que diz respeito ao desenvolvimento da compreensão leitora.
Em relação à escolha dos participantes (professores da 4ª série, do
Ensino Fundamental I), esta ocorreu em razão de compreender a responsabilidade
destes profissionais no desenvolvimento da autonomia dos educandos, em especial
a leitora. Considerando que, no Ensino Fundamental II, essa competência deverá
se apresentar de maneira satisfatória, uma vez que esses mesmos educandos
serão submetidos a um acúmulo de informações, em decorrência do
aprofundamento necessário nas diferentes áreas do conhecimento.
Cabe esclarecer que, mesmo no caso de alunos que tenham pouca
escolaridade (não mais que cinco ou seis anos na escola), a construção de sua
autonomia poderá ser favorecida quando sua capacidade de ler e atribuir significado
for desenvolvida adequadamente. Desta forma, podemos afirmar que o
57
desenvolvimento dessa competência é imprescindível e se justifica pela sua
relevância na prática social.
Inicialmente, foi contatada a Direção da escola, ocasião em que se
esclareceram os objetivos da pesquisa, que prontamente recebeu o aval necessário
para sua efetivação. A direção orientou que fosse marcado um encontro com a
Coordenadora Pedagógica, que procederia aos encaminhamentos. Fato que
ocorreu antecedente ao Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC),
momento em que os professores, sem os alunos, reúnem-se para discutir questões
pedagógicas.
Foi solicitada a oportunidade de conversar com os professores com a
finalidade de convidá-los a participar da pesquisa, bem como definir os critérios de
escolha dos participantes.
A Coordenadora, por sua vez, já possuía uma pauta para a Reunião que
consistia em apresentar um Projeto de Leitura Coletivo, do gênero poesia.
Posteriormente, foram abordadas as atividades que seriam realizadas em
comemoração ao Dia da Criança. Em seguida, a pesquisadora foi apresentada ao
grupo, esclareceu os objetivos da pesquisa, os motivos da escolha da escola e da
série. Por fim, esclareceu sua necessidade de selecionar três participantes que
lecionassem para a 4ª série. Assim, foi pedido aos interessados que manifestassem
o interesse em participar do estudo, ao que uma das professoras se prontificou
imediatamente. Outras professoras sugeriram, então, que fosse realizado um
sorteio para definir as outras duas. Após escolhidas às três participantes, passaram
a ser chamadas pelos pseudônimos: Eunice, Beatriz e Cristina, visando preservar a
identidade das mesmas.
Na semana seguinte, iniciaram-se as entrevistas (três no total com cada
professora), com duração de cinquenta minutos cada. Ocorreram durante as aulas
de Educação Física, quando os alunos estavam com o professor regente da
disciplina específica, e as professoras colaboradoras poderiam participar da
pesquisa sem comprometer o trabalho docente nem seu tempo para vida pessoal.
58
2.2 TÉCNICA
Cada entrevista foi organizada por meio de perguntas, visando a atender
os objetivos da pesquisa, que consistiam em caracterizar as professoras, identificar
e explicitar as estratégias de compreensão leitora sinalizadas por elas, para que
posteriormente, fossem analisadas e discutidas à luz da perspectiva interativa de
leitura.
No primeiro momento, o objetivo era caracterizar as participantes e
conhecer os motivos que contribuíram para escolha da profissão; na segunda
entrevista, buscou-se conhecer o contexto no qual as professoras estavam
inseridas, como entendiam o processo de ensino e aprendizagem, bem como as
dificuldades dos alunos e o papel da família; complementarmente, o terceiro
encontro, centrou-se em abordar as estratégias de leitura utilizadas pelas
professoras, para a partir daí checar a sua compreensão sobre estratégias.
As respostas obtidas nas entrevistas foram gravadas, com a permissão
das professoras, transcritas e, posteriormente organizadas em um quadro que
permitiu os procedimentos de análise, conforme material anexo.
2.3 CARACTERIZAÇÃO DA ESCOLA
A pesquisa foi realizada em uma escola de Ensino Fundamental e de
Ensino de Jovens e Adultos, localizada na periferia da zona sul de São Paulo, em
uma área de manancial. Ao lado, há outras duas também públicas, de modo que,
juntas, respondem pela demanda de aproximadamente 6.0000 (seis mil) alunos. Na
escola em questão, o número total de alunos é de 2.100, divididos em Ciclo I (1ª a
4ª série), Ciclo II (5ª e 6ª séries) e EJA (Ensinos Fundamental e Médio), distribuídos
nos seguintes períodos:
Manhã: Seis turmas de 5ª série e sete turmas de 6ª séries.
Intermediário: Sete turmas de 1ª séries e sete de 2ª séries.
Vespertino: Seis turmas de 3ª séries e seis de 4ª séries.
59
Noturno: Dez turmas de EJA (ensino de jovens e adultos).
Mesmo com essa oferta de vagas, tornando necessário o funcionamento
em quatro períodos, a escola não consegue absorver toda a demanda local.
Segundo a Direção, isso ocorre devido à cerca de cinquenta por cento dos
educandos, serem moradores de bairros adjacentes, onde não há escolas, visto que
vários alunos chegam a fazer uso de transporte escolar. As salas de aula são
formadas, em média, por 45 alunos, número excessivo que dificulta o
acompanhamento adequado e compromete a aprendizagem.
Em função da demanda excessiva, há uma mobilização dos moradores
para a construção de uma nova escola no bairro que, apesar de prevista, ainda
precisa de definição de local para a sua construção, dificultada por se tratar de uma
extensa área de manancial, povoada indevidamente.
Nesse sentido, cabe esclarecer que a escola foi construída em caráter
emergencial, em 2001, em um padrão de construção chamado Nakamura (escola
de lata). Em 2007, foi reformada a parte externa, de modo que foram substituídas
as paredes de lata pelas de alvenaria. Apesar de todos os entraves e,
principalmente, devido ao empenho da equipe escolar e da participação da
comunidade, o prédio se encontra em excelente estado de conservação, superando
todas as expectativas.
Quanto ao bairro, destacamos um Posto de Saúde, uma igreja católica,
algumas evangélicas, uma Associação Católica de freiras que oferece atividades
para a comunidade (creche, atividades manuais e reforço escolar), uma sede da
Associação dos Moradores do Bairro, um ponto final de ônibus e o comércio local.
Em razão de se tratar de uma zona periférica distante, 32 km do centro de
São Paulo, lá reside uma população desprovida de recursos financeiros (como
consta no projeto político pedagógico), cujas famílias, em sua maioria, migraram do
norte e nordeste do país, com baixa ou nenhuma escolaridade. As pessoas
costumam ter muitos filhos, o sustento fundamenta-se no trabalho informal e a
formação escolar não é prioridade, provavelmente por falta de perspectivas sócio-
econômicas que estimulem a dedicação aos estudos.
Na comunidade, não existem formas variadas de lazer e cultura. A escola,
60
por sua vez, se constitui como um dos únicos espaços públicos, que promove,
esporadicamente, algumas atividades culturais previstas em seu calendário anual.
A Direção da escola esclarece que, durante o ano letivo, são realizados
alguns eventos, por meio de projetos que incluem: datas comemorativas e
atividades culturais, com o objetivo de apresentar o trabalho desenvolvido na
escola, e também buscar a participação dos pais no processo de aprendizagem de
seus filhos. Como exemplos dessas atividades estão previstas no calendário
escolar: Festa Junina, Feira Cultural e outras que, apesar de não constarem no
calendário, também ocorrem (Páscoa, Dia das mães, Dia dos Pais, Dia das
Crianças, Dia do professores e Formatura).
Com relação ao corpo docente, este é formado por sessenta professores
e está completo. Porém, somente quatro são efetivos (titulares de cargo, aprovados
em concurso público), os demais são designados como ocupantes de função, o que
proporciona uma indesejável, e quase sempre prejudicial, rotatividade.
Para minimizar os efeitos dessas mudanças, são realizadas avaliações
anuais, com todo o corpo docente, buscando identificar os aspectos positivos e
negativos do ano letivo, para que a equipe de Gestão possa reavaliar as ações e
apresentá-las para o novo grupo e, assim, traçar um novo plano de ações. Nota-se
que alguns professores que escolhem essa Unidade Escolar por falta de opção em
razão da distância, terminam o ano gostando do trabalho que é desenvolvido na
escola e decidem voltar no ano seguinte.
O quadro administrativo é composto de um Diretor, duas Vice-Diretoras,
duas Coordenadoras, sendo uma responsável pelo Ciclo I e a outra responsável
pelo Ciclo II e EJA.
Em relação a infraestrutura, há: secretaria, sala da direção, da
coordenação, de professores, de vídeo, uma específica para a realização do
Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), cozinha, refeitório, pátio coberto
com palco para as apresentações, onze salas de aula e estacionamento para os
professores. Não há quadra para a prática das aulas de Educação Física, que são
realizadas no pátio e no espaço destinado ao estacionamento.
O trabalho pedagógico é realizado principalmente pelas coordenadoras.
61
Há também para os professores de 1ª e 2ª séries, um horário destinado à formação
continuada do Programa Ler e Escrever, com a finalidade de discutirem propostas
de atividades, bem como sugerir intervenções.
Cabe esclarecer, que o principal objetivo desse programa consiste em
desenvolver a competência leitora e escritora, por essa razão as Coordenadoras
recebem formação por uma equipe da Diretoria de ensino para tornaram-se
multiplicadoras do programa junto a seus professores.
Em relação à inclusão, há dois alunos no Ciclo I que possuem
necessidades especiais (doença mental), mas frequentam as salas regulares. Não
há na escola turmas de Recuperação de Ciclo, os alunos que apresentam
dificuldades na aprendizagem são distribuídos aleatoriamente nas turmas.
A evasão é grande e, muitas vezes, provocada pelas mudanças
constantes (residências alugadas, viagens para terra natal, separação dos
cônjuges). Para os casos de excessivas faltas, a coordenadora costuma
encaminhar para o Conselho Tutelar, que visa ao acompanhamento familiar,
buscando compreender as razões dessa evasão e realizar os encaminhamentos
necessários para assistências médica, psicológica e social, porém, devido ao
número de ocorrências, há uma demora no atendimento.
Em razão da excessiva demanda, a escola tem que atender a três turnos
diurnos e um noturno. A existência desses três turnos diurnos compromete a carga
horária mínima, exigida por lei de 800 horas para o Ensino Fundamental.
Desta forma, para se cumprir à lei, a escola também funciona aos
sábados, ocasionando uma extensiva jornada para alunos e professores, que
contribui para o desgaste físico e psicológico de todos. Em decorrência dessa
ocupação do prédio escolar em três períodos consecutivos, incluindo os sábados, e
também da falta de espaço físico, não foi possível organizar o Projeto de
Recuperação e Reforço Escolar apesar de exigido por lei.
Desta forma, a recuperação é realizada de maneira contínua (durante as
aulas) pelo próprio professor da sala, não havendo, portanto, a recuperação
paralela que deveria ser ofertada no contraturno, por outro professor e com um
número reduzido de alunos. Desta forma, as dificuldades de aprendizagem, não são
62
atendidas de forma individualizada e os resultados ficam comprometidos.
Há também, por essa razão, a necessidade de uma organização em
relação à limpeza, pois, uma vez que o prédio é ocupado em tempo integral, os
funcionários se revezam para realizá-la durante os períodos de intervalo, entrada e
saída de alunos.
Em relação à merenda, esta é servida em ambiente próprio (refeitório), no
qual as crianças podem se sentar para realizá-la com boas condições de higiene e
limpeza.
A escola não possui Biblioteca, os livros recebidos pela Secretaria da
Educação são armazenados em caixas próprias e disponibilizados em kits, pela
coordenação, para uso coletivo.
Complementando a descrição do espaço físico, há uma sala de
informática que não está ativa, por falta de montagem dos equipamentos. Cabe
esclarecer que, se esse espaço estivesse adequado para o uso, ele seria utilizado
pelo próprio professor da sala, de modo que não há na rede um profissional
específico para desenvolver este trabalho.
O acesso à Internet, necessário para realização de pesquisas e até
mesmo de entretenimento, é proporcionado por meio da frequência a lan-house
(espaço de acesso à Internet) existente no bairro, porém, envolve custo.
Em relação ao desempenho, a escola apresenta baixo resultado no Índice
de Desenvolvimento Escolar de São Paulo (IDESP). Trata-se de um índice criado
em 2007, pela Secretaria de Educação de São Paulo, composto pelos resultados do
SARESP e do fluxo escolar, com o objetivo de medir a qualidade do ensino, seus
resultados variam de 0 a 10.
Na tabela abaixo, são apresentados os resultados da escola em questão
no IDESP 2008, ano-base 2007, sendo estes comparados com as instâncias
superiores, as quais são jurisdicionadas.
Resultados do IDESP (Índice de Desenvolvimento escolar de
São Paulo) - 2007
63
Escola Diretoria Município Estado
1,72 2,56 3,02 3,23
Como é possível observar os resultados apresentados pela escola,
comparados com as instâncias superiores, é considerado insatisfatório, de modo que
foi estabelecida uma meta no IDESP/2008, conforme tabela abaixo:
Meta prevista da escola para o IDESP-2008
Ano Letivo Resultados
2007 1,72
2008 1,88
Fonte: idesp.edunet.sp.gov.br
Embora estes resultados não retratem especificamente a competência
leitora, entendemos que estes índices decorrem das dificuldades na compreensão,
uma vez que o desenvolvimento insuficiente desta competência compromete o
desempenho dos alunos, em todas as áreas do conhecimento.
A 4ª série é um marco que finaliza o Ciclo I. De acordo com o sistema de
Progressão Continuada, os alunos que eventualmente apresentam problemas de
desempenho, dentre eles a compreensão leitora, ficam retidos nesta série no
máximo por um ano. Isto significa que alguns alunos, após serem retidos por um
ano, serão aprovados para a série seguinte, mesmo sem condições, o que irá
contribuir para aumentar suas dificuldades na assimilação de conteúdos mais
complexos, que serão abordados nas séries seguintes.
Não é por acaso que, dentre as dez metas para melhorar a educação de
São Paulo, a primeira ação se refere a que todos os alunos de oito anos (3º ano / 2ª
série) estejam plenamente alfabetizados.
Entendendo que a alfabetização plena pressupõe não apenas o ensino da
64
decodificação, mas o desenvolvimento adequado da compreensão leitora. É
possível compreender a priorização desta meta, como sendo algo fundamental para
o prosseguimento dos estudos em níveis mais elevados.
Nesse contexto, a formação continuada oferecida aos professores com
esse enfoque encontra-se presente nos Projetos de Alfabetização desenvolvidos
pela Secretaria (Ler e Escrever e Letra e Vida) merece destaque, e deve a adesão
dos professores ser incentivada.
Na Diretoria Sul três, a qual a escola está jurisdicionada, a formação no
Programa Ler e Escrever é oferecida, aos Coordenadores do Ciclo I, objetivando a
multiplicação deste programa nas escolas, em horário específico, destinado à
formação das professoras que lecionam para a 1ª série.
Em relação à formação do Programa de Alfabetização Letra e Vida, este
está sendo realizado em várias turmas, presencial, fora do horário de trabalho do
professor. Além dessas ações de formação, os Professores do Ciclo I devem
realizar Avaliações Diagnósticas Periódicas (Bimestrais) com seus próprios alunos,
para checar a hipótese de escrita (de acordo com o referencial da psicogênese da
escrita de Emília Ferreiro), e encaminhar a Planilha para a Diretoria, com os
resultados dessas hipóteses.
À Diretoria cabe, pela equipe responsável, o recebimento das planilhas, o
gerenciamento e o controle dos avanços obtidos, de modo a refletir sobre os
resultados. E em caso de necessidade (quando não há avanços nas hipóteses), o
Supervisor da Escola realiza visitas específicas para compreender os motivos da
falta de avanço e, junto com o Coordenador e Professor da Sala, estabelecem-se
ações e encaminhamentos necessários para minimizar o problema.
Vale destacar o Programa Bolsa Alfabetização, em que estudantes de
Pedagogia recebem como incentivo à sua formação uma bolsa integral, para
acompanhar as turmas de 1ª série, de modo a auxiliar a professora da classe com a
aprendizagem da turma.
Conforme a direção informou nessa escola, foram encaminhados quatro
estudantes para essa função, porém só uma se manteve. A desistência das demais
(em razão da difícil localização) contribuiu para aumentar as dificuldades das
65
professoras em realizar o processo de alfabetização desses alunos, em razão do
número excessivo (45) de alunos por sala.
Embora não trate especificamente da 4ª série, nosso objeto de estudo,
ainda como parte das ações para melhoria do IDESP, houve também no final de
2008 a destinação de uma verba específica para o desenvolvimento de um Projeto
denominado Práticas Pedagógicas, que envolve as disciplinas de Língua
Portuguesa e Matemática, para os alunos do Ciclo II e Médio. Sendo que na
disciplina de Língua Portuguesa, o foco está no desenvolvimento da competência
leitora, por meio de diferentes gêneros tais como: História em Quadrinhos,
Fotonovela etc...
Na Diretoria de Ensino, além dos Supervisores, os Professores
Coordenadores da Oficina Pedagógica são designados para acompanhar os
resultados destas ações, por meio de visitas periódicas, buscando identificar as
necessidades da escola, oferecendo subsídios para a prática.
Há também por parte da Oficina Pedagógica, mais precisamente do
Departamento de Línguas, um Cronograma de Palestras oferecido aos professores
e coordenadores, com temas que privilegiam o desenvolvimento da competência
leitora, dada a sua significância como vemos a seguir:
Cronograma de Palestras – Primeiro Semestre-2009
Acordo Ortográfico
Proposta Curricular de Língua Portuguesa
Estratégias de Leitura: Aprendizagem Significativa
Gêneros Literários
Leitura e Interpretação de Letra de Música e Poesia
Como produzir uma Dissertação?
Diante do exposto, será apresentada a análise e discussão dos
resultados, com base na transcrição e análise das entrevistas concedidas pelas
professoras.
66
3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
O senhor... Mire e veja: o mais importante e bonito,
do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre
iguais, ainda não foram terminadas. Mas que elas
vão sempre mudando. Afinam ou desafinam.
Verdade maior. É o que a vida me ensinou.
Guimarães Rosa
A análise dos dados foi realizada considerando-se os objetivos da
pesquisa: compreender o depoimento das professoras, da 4ª série do Ensino
Fundamental I, de uma escola pública da rede estadual de ensino da cidade de São
Paulo, quanto ao uso de estratégias de compreensão leitora no processo ensino e
aprendizagem. De forma mais específica, vamos conhecer as professoras,
identificar, explicitar e analisar as estratégias sinalizadas e discuti-las à luz da
perspectiva interativa de leitura.
Nesta análise, foram respeitados os princípios éticos, no que diz respeito
à preservação da identidade das professoras e de seu local de trabalho. Foram
realizadas três entrevistas: a primeira, com a finalidade de saber como se tornaram
professoras; a segunda, para compreender o que elas entendem por dificuldades
dos alunos e o que fazem para resolver os eventuais problemas; e a terceira, para
identificar as estratégias de leitura utilizadas por elas.
Inicialmente, buscamos entender como as participantes se tornaram
professoras, isto é, os motivos que as levaram à escolha da profissão.
As professoras nasceram em: Eunice – Itabuna (BA), Cristina – Belo
Horizonte (MG) e Beatriz – Salvador (BA); provindo de famílias numerosas,
possuindo, seis, dez e nove irmãos, respectivamente. Apresentam idades
relativamente aproximadas (36, 42 e 43 anos). Todas se casaram, e possuem
filhos, com exceção da Prof. ª Cristina que se encontra viúva há dois anos e não
teve filhos.
Nos depoimentos, é possível verificar que as privações materiais, falta de
apoio e de incentivo da família, apresentadas pela professora Eunice, foram de
67
fato, obstáculos que dificultaram, mas não impediram a conclusão dos estudos.
Nesse contexto, são notáveis o esforço e a dedicação da mesma, observável em
seus relatos:
Tive muitas dificuldades para concluir o ensino básico, pois
morava com minha avó na fazenda e ela achava que só
precisava aprender a escrever o nome. Eu me esforcei
muito, eu não tinha sequer calçado para ir para a escola.
Eu pedia emprestado de uma colega. Nós calçávamos o
mesmo número e ela me emprestava, por que eu insistia
muito, mas ela não gostava. Eu esperava ela chegar da
escola e pegava emprestado. Lembro-me que era um
“quichute”. Eu sempre dava um jeito, oferecia para fazer
algo para ela em troca. Eu lavava louça ou outro serviço
qualquer e ela acabava concordando.
Quanto à professora Cristina, esta expressou suas dificuldades
relacionadas à aprendizagem, em razão do medo que tinha de sua professora:
Eu tinha medo da minha professora da 1ª série. Eu não
conseguia aprender por causa do jeito dela. Depois que eu
mudei de sala e a professora nova, foi paciente comigo. Eu
superei minhas dificuldades e consegui aprender sem
problema algum.
No depoimento da professora Beatriz, verificou-se a relevância do papel
da família, como estímulo para a realização de seus estudos, pois, embora
possuísse poucos recursos, estes não comprometeram a conclusão de seus
estudos:
Minha família era grande, somos nove irmãos e
passamos por muitas dificuldades. Agora os estudos, eu
não tive dificuldades para realizá-los. Sempre estudei em
escola pública e me lembro com saudades da merenda
da escola, pois era de ótima qualidade. Meu pai sempre
foi metalúrgico e minha mãe era doméstica, mas mesmo
de origem simples, incentivavam os filhos a estudar. Nós
68
passamos por dificuldades, mas sempre fomos muito
unidos. Você acredita que dividíamos até o uniforme?
Mesmo minha mãe trabalhando muito, nunca faltava nas
reuniões e sempre acompanhava nossas lições. Lembro
que ela empilhava os cadernos, na mesa da cozinha e
olhava um por um.
Em relação à experiência profissional, duas participantes (Eunice e
Cristina) começaram a trabalhar em casa de família, enquanto a professora Beatriz
teve seu início em uma empresa de informática.
Quanto à escolha profissional, Beatriz manifestou que desde cedo queria
ser professora: “desde pequena, eu já brincava de ser professora”. Desejo esse,
reforçado pelo estímulo de sua família: “Eu me tornei professora, por ser de uma família
de professoras. Minha mãe sempre me incentivou, pois ela achava que ser professora era
uma boa escolha, que me ajudaria a pagar a faculdade”.
Ela se diz satisfeita em ser
professora: “Gosto do que faço. Estou feliz com minha escolha”.
Eunice e Cristina tornaram-se professoras em decorrência de outros
fatores não havendo, nesse momento, uma visível satisfação em exercer o ofício
docente. A primeira explicitou que a falta de opção contribuiu para sua escolha, o
que é possível constatar em seu relato:
Na minha cidade, tinha poucas opções para prosseguir os
estudos, só tinha Contabilidade e Magistério.
Contabilidade não me interessava então acabei fazendo
Magistério, também por esse motivo.
Já a segunda explica que, em decorrência dos seus problemas de saúde,
iniciou a lecionar:
Eu me casei, tive problemas na coluna e fiquei sem poder
trabalhar. Nesse período, dei aula de reforço em minha
casa para meus sobrinhos. Minha cunhada gostou tanto
que espalhou para outras pessoas. Comecei a dar aulas
para outras crianças, filhas de umas amigas delas.
69
No que diz respeito à escolha da formação superior vemos que a
professora Eunice apresenta coerência, relacionando seu gosto pela leitura com sua
formação em Letras, expressa em sua afirmação: Como eu gostava muito de ler e
desde pequena achava isso muito importante, eu resolvi fazer Letras”.
Por sua vez, Cristina não apresentava desejo em ser professora, de modo
que sua formação superior atendeu outra expectativa, como ela mesma expõe:
“Desde criança eu queria fazer Letras para aprender outras línguas. Não pensava em ser
professora”. M
esmo tendo clareza da profissão que não desejava, cursou Licenciatura
Plena em Educação Artística e explica, contraditoriamente: “Eu sempre gostei de
atividades manuais e tenho mais oportunidade, pois tem muita concorrência na área de
Letras”.
A professora Beatriz cursou Pedagogia, por considerar que essa
formação se adequava ao que desejava, pois segundo ela: Resolvi fazer Pedagogia,
para aprofundar meus conhecimentos”.
Pode-se considerar que a opção pela formação
em Pedagogia corresponde à sua atuação como professora do Ciclo I.
No que diz respeito à experiência inicial na educação observa-se que as
professoras Eunice e Cristina iniciaram-se como estagiárias, prática que constitui
parte da formação, e, conforme vemos nos relatos, Eunice manifesta satisfação
nessa atuação:
Quando iniciei em 91, resolvi pedir ao prefeito uma
oportunidade para lecionar, como estagiária. Ele deixou e
já estou a dezessete anos nesta profissão. Foi muito boa,
eu aprendi muito. Eu gostava muito do que fazia e tinha
uma boa relação com os alunos. Eu gostava muito de ler
e lia bastante com eles.
Enquanto Cristina relata seu início, provavelmente em razão da questão
financeira, esclarecendo: “Na escola, iniciei como estagiária, naquela época recebia-se
remuneração”.
A professora Beatriz, por sua vez, teve seu início em uma condição
diferenciada das demais, como professora eventual, o que implica numa atuação
direcionada para prática, como vemos em seu depoimento:
“Em 1988, eu comecei a
70
lecionar como professora eventual. Inclusive onde eu comecei, encontrei várias professoras
da época em que eu estudava”.
Em relação à satisfação pela escolha profissional, foi possível observar
que a professora Cristina, embora saiba impor limites quando necessário reconhece
sua falta de paciência: “Tenho prazer em ensinar, mas não tenho muita paciência. Apesar
de gostar deles (alunos), não sei ficar agradando e, quando precisa, dou bronca”.
Nos relatos das professoras Eunice e Beatriz, nota-se satisfação em suas
atuações, porém, faz-se necessário diferenciá-las. Enquanto a professora Eunice
diz, espontaneamente, sua satisfação pela escolha profissional por meio de sua
afirmação:
Bem! Eu tinha muita admiração por esta profissão.
Achava muito bonito ser professora e sempre pensava na
possibilidade de um dia me tornar uma. Eu ficava
pensando se eu seria uma boa professora.
Beatriz expressa segurança e satisfação, demonstradas pela não
aceitação de outras oportunidades:
Gosto do que faço. Eu já recebi até outros convites, para
atuar na vice-direção e direção. Mas eu nunca aceitei, por
que eu estou feliz com minha escolha, acho que não
saberia fazer outra coisa a não ser lecionar.
A partir da caracterização das participantes, foi possível estabelecer
relação entre a satisfação na escolha de duas professoras e o desenvolvimento de
suas respectivas práticas, a despeito das dificuldades vivenciadas por elas nesse
percurso.
A satisfação foi observada no depoimento da professora Beatriz, que diz
ter recusado outras propostas de trabalho. E, no caso da professora Eunice, cabe
ressaltar que, apesar de sua escolha ocorrer em razão da falta de opção, a mesma
apresenta admiração pela profissão, o que de certa forma, contribui para seu
desenvolvimento profissional.
Entretanto, observamos que, quando não há o desejo na escolha
profissional, sendo esta pautada em questões de outra ordem, tais como:
71
problemas de saúde, preocupação em manter-se empregada, nota-se insatisfação
no exercício da prática, desencadeando um “menor” envolvimento, o que, por sua
vez, compromete a qualidade do ensino, das relações interpessoais e, por
extensão, dos resultados.
A partir dos depoimentos das professoras, é possível entender que a
escolha satisfatória na profissão é um fator determinante e favorece a prática, pois
ser professor implica em mais do que ter um emprego e exige, além de formação
superior, um compromisso com a transformação e com a produção de
conhecimento. Compromisso esse que não se apresenta como uma tarefa fácil, pois
requer reflexão e posicionamento ético, caso contrário, pode-se tornar uma prática
esvaziada de sentido, que não acrescenta a quem ensinam nem quem
supostamente aprende.
Dessa forma, concordamos com Mahoney e Almeida (2004, p. 3), quando
afirma que “o grande desafio do professor, que teve uma formação na qual sua
integração não foi levada em conta, é enxergar seu aluno em sua totalidade e
concretude. A escola será, portanto, um meio para o desenvolvimento do professor
e do aluno, de modo que ambos são afetados um pelo outro”.
Em razão do contexto em que as participantes estavam inseridas,
podemos concluir que não foram acolhidas integralmente durante a realização de
sua formação. Dessa forma, apesar da necessidade de as professoras
desenvolverem um olhar holístico para com seus alunos, em razão de serem por
eles afetadas, notamos que esse ainda não se encontra totalmente desenvolvido.
Ainda a esse respeito, as autoras enfatizam que a falta de satisfação das
necessidades afetivas, cognitivas e motoras, ocasiona prejuízos para o processo de
ensino aprendizagem. No caso do professor, pode gerar falta de compromisso,
demonstrado em alguns depoimentos, apatia, estresse laboral (burnout).
Por essas razões, faz-se necessário que a prática docente seja marcada
por ações articuladas, trabalho coletivo e constituída de sentido, pois, segundo
Severino (1998, p.86), “é essa intencionalidade que evita a fragmentação das
práticas”.
Diante do exposto, a fim de compreender o que elas entendem por
dificuldades dos alunos e o que fazem para resolvê-las, foi realizada uma segunda
entrevista, na qual Eunice e Beatriz demonstraram facilidade em identificar e
72
apresentar o rendimento das turmas, o que deveria favorecer o encaminhamento e
as intervenções necessárias.
A professora Eunice diz: “É uma turma boa! Tem 41 alunos. São frequentes, só
tem um que foi transferido recentemente, no geral eles são bons”.
Quanto às dificuldades dos alunos, esclarece que está mais tranquila, pois
o rendimento dos alunos tem sido satisfatório: “Tenho 37 alunos alfabéticos, que têm
erros de ortografia, mas já sabem ler e escrever. Tirando o que foi transferido, só tem três
que ainda não atingiram o esperado”.
Nesse relato, notamos que o diagnóstico está embasado no desempenho
de escrita. Dessa forma, não são apresentados os resultados obtidos na
compreensão e não são especificadas as dificuldades dos alunos que não atingiram
os objetivos.
Em relação ao desenvolvimento da compreensão, observamos uma ênfase
no modelo ascendente (Bottom up), apresentado por Solé (1998), em que é atribuída
grande importância às habilidades de decodificação, em razão de considerar que a
compreensão é obtida por ela. Portanto, é um modelo centrado no texto e no
processamento dos seus elementos (começando pelas letras, avançando pelas
frases), isto é, do simples ao complexo, chegando à compreensão do todo.
A professora Beatriz ressalta que houve melhorias em relação à disciplina:
“A sala é ótima! Mas não era no início. Tinha alunos que eram extremamente indisciplinados
e que hoje se comportam de forma adequada”.
Assim, esclarece que conversa muito
com os alunos, segundo ela: “
... sempre procura conscientizá-los sobre a importância dos
estudos, da leitura e da necessidade deles ajudarem seus pais no futuro”.
Reforça o bom relacionamento e afinidade que tem com seus alunos: “Você
acredita que todos os dias eles trazem balas para mim? Inclusive aqueles que não têm
condições fazem um esforço para me agradar. Eu percebo que quando alguém não traz
balas, por não ter, quem trouxe acaba cedendo, pra que todos possam me agradar”.
Nota-se nesse depoimento que a afetividade presente na relação
professor – aluno, bem como entre aluno – aluno, é um fator determinante que pode
contribuir para a eficácia do processo ensino-aprendizagem que de acordo com
MAHONEY e ALMEIDA (2004, p.2), “é uma unidade, são faces de uma mesma
moeda”.
Quanto às dificuldades deles, informa que:
73
Sempre tem alguns alunos com dificuldades e esses, eu
coloco do meu lado e converso com eles, para melhorar,
mas quando não produzem, eu não deixo fazer Educação
Física. Como são alunos frequentes, inclusive nas aulas
de sábado, eu tento recuperá-los com atividades
específicas para suas dificuldades.
Dessa forma, caracteriza sua turma:
A sala é bem cheia, no começo eu tinha quarenta e um
alunos. Só houve um desistente, um transferido e um
reclassificado. Agora tenho 38 frequentes, desses, cinco
são repetentes.
Como ainda havia dúvidas sobre quais eram as dificuldades que os
alunos possuíam, a pesquisadora retomou a questão, à qual a professora relata:
Tem um deles (repetentes) que tem problema de saúde
(epilepsia), um faz acompanhamento psicológico, e outro
que tem problema de aprendizagem mesmo, mas a mãe
não aceita. Os outros dois eram só problema de
indisciplina, mas melhoraram muito.
Observamos no relato da professora Beatriz que a reprovação não foi uma
solução apropriada, pois as dificuldades na aprendizagem desses alunos, além de
não serem identificadas, persistem e não notamos um encaminhamento específico,
direcionado para esses casos.
Segundo ela, somente os casos de indisciplina foram revertidos, o que nos
permite pensar, que a avaliação final desses alunos, não foi realizada com base no
desenvolvimento da aprendizagem, mas sim no comportamento indesejado que eles
apresentavam.
Quanto à providência em relação à recuperação durante as aulas com
atividades específicas, essa ação, apesar de ser legítima e necessária, não tem
atingido resultados satisfatórios, provavelmente pela falta de identificação das
dificuldades. Quanto a não permissão dos alunos com baixo rendimento nas aulas de
74
Educação Física, esta ação funciona apenas como punição, uma vez que a atividade
física é apreciada pelos alunos.
Porém, mesmo diante das dificuldades encontradas, reconhece que houve
melhorias:
Mesmo assim, eles têm avançado. Há quatro silábicos
com valor sonoro, que têm avançado muito. Agora tem
um que ainda está pré-silábico, e que infelizmente não
avançou nada, só escreve o primeiro nome.
Notamos que as melhorias mencionadas se referem à evolução na escrita,
sendo possível observar que, considerando a série e as hipóteses apresentadas, o
rendimento dos alunos está muito abaixo do esperado, de modo que os avanços
obtidos não correspondem ao ideal, para serem promovidos em condições de
acompanharem adequadamente a série seguinte.
A professora Cristina também não apresenta clareza quanto ao
rendimento dos alunos, o que é compreensível até certo ponto, em razão do pouco
tempo (dois meses) que leciona nessa sala.
Olha, eu peguei o bonde andando... Estou com eles há
pouco tempo. Estou há mais ou menos dois meses. Eles
estavam ficando com professoras eventuais, pois a
professora da sala está afastada para a Coordenação de
outra escola.
Nesse relato, nota-se que a rotatividade dos professores (várias
professoras eventuais), em razão do afastamento da professora, prejudicou o
acompanhamento do rendimento desses alunos. Essa situação poderia ter sido
minimizada com a substituição de uma única professora, o que possibilitaria a
continuidade do planejamento e do acompanhamento adequado.
Vemos que essa fragmentação compromete o processo de ensino e
aprendizagem, pois não são observados procedimentos que assegurem a
continuidade do processo.
Nesse contexto, observamos que a professora atual, também apresenta
pouco envolvimento com o rendimento dos alunos, de acordo com seu depoimento:
75
Apesar de eles estarem classificados desde o início do
ano como ortográficos (corresponde a alfabéticos), na
minha opinião, essa avaliação não está correta, mas
como não posso interferir no trabalho da colega, não vou
dizer nada sobre isso e vou fazer a minha parte.
A decisão de não interferir no diagnóstico existente, com o qual não
concorda, demonstra a dificuldade da professora em refletir sobre sua prática e
sugere um envolvimento tangencial e um aparente descompromisso com a melhoria
dos resultados.
Considerando que o diagnóstico deve refletir a situação atual dos alunos,
sendo, portanto, dinâmico e portador de resultados parciais, a atitude da professora
não corresponde com esse objetivo. Pois, ao considerar todos os alunos como
ortográficos e propor atividades que correspondam apenas a esse nível de escrita,
há o comprometimento dos avanços dos que ainda não atingiram, fazendo com que
esses se desestimulem diante dos obstáculos.
Diante dessa situação, seria oportuna a realização de um novo
diagnóstico, buscando esclarecer as divergências apresentadas, tornando possível
conhecer os estágios em que os alunos se encontram, para que assim possam ser
realizadas intervenções.
Nesse sentido, notamos a relevância do diagnóstico, pois somente
sabendo de onde partir, ou seja, do que o aluno já sabe, será possível planejar
situações de aprendizagem que favoreça a organização da estrutura cognitiva e
propicie o processamento da informação e da aprendizagem significativa. Pois
segundo Ausubel (1980, p.iiiv), “o fator que exerce maior influência para que ocorra
a aprendizagem é a estrutura cognitiva do indivíduo, bem como sua organização e
clareza”.
Porém, para que essa ocorra, faz-se necessário saber para onde quer ir,
isto é, ter clareza dos objetivos e das estratégias a serem adotadas.
A esse respeito Solé (1998, p.70) afirma:
Se considerarmos que as estratégias de leitura são
procedimentos de ordem elevada que envolve o cognitivo
e o metacognitivo, no ensino elas não podem ser tratadas
como técnicas precisas, receitas infalíveis ou habilidades
76
específicas. O que caracteriza a mentalidade estratégica
é a sua capacidade de representar e analisar os
problemas e a flexibilidade para encontrar soluções. Por
isso, ao ensinar estratégias de compreensão leitora, entre
os alunos deve predominar a construção e o uso de
procedimento de tipo gerais, que possam ser transferidos
sem maiores dificuldades para situações de leitura
múltiplas e variadas.
A referida professora comenta:
Bom, nesta sala tem quarenta alunos, com exceção de
uma aluna, que é faltosa, os outros são frequentes. Pelo
que os alunos me dizem, ela sofreu uma cirurgia na
cabeça, mas eu não sei dizer maiores detalhes. Tudo o
que sei é o que os alunos dizem. Pelo que parece a
família não acompanha e não se preocupa e até o
momento, ninguém da família veio me avisar nada.
No entanto, no sábado, segundo a professora, a coordenadora lhe
informou que:
Teve Reunião de Pais e a Coordenadora veio me avisar
que a mãe esteve com ela, e deu uma satisfação sobre o
estado de saúde aluna. Disse que ela está se
recuperando, mas não trouxe nenhum atestado. Na
minha opinião, mesmo que ela esteja amparada nas
faltas, ela deve ser retida, pois o número de faltas é
excessivo e certamente irá prejudicar sua aprendizagem.
Observamos contradição nesses depoimentos e um encaminhamento
inadequado ao caso, pois, na reunião de pais, quando a mãe compareceu, deveria
ter sido encaminhada para a professora, visando a esclarecer os problemas de
saúde enfrentados pela aluna.
Quanto aos prejuízos na aprendizagem em decorrência das faltas, a
solução encontrada na reprovação, não é adequada, pois, em razão de haver
justificativa, o correto seria a realização do diagnóstico e a realização de uma
77
recuperação paralela, com o objetivo de minimizar suas dificuldades. Nessa
perspectiva cabe ressaltar as considerações feitas por Ronca sobre o papel do
professor (1980, p.81) “o professor que queira ser educador tem o grande desafio
de aproveitar as informações e experiências que os alunos trazem consigo”.
Porém, não observamos interesse por parte da professora em buscar
esclarecimentos e diagnosticar, o que essa aluna sabe, contentando-se apenas
com as informações vindas de variadas fontes (alunos / coordenação), o que reforça
a falta de compromisso com a aprendizagem de seus alunos.
Mesmo com a insistência da pesquisadora, em conhecer o rendimento
dos alunos, a professora delega a responsabilidade da avaliação para o SARESP:
Dentro do possível eles estão melhorando. Agora com o SARESP chegando, é que vamos
ter certeza dessa melhoria”
.
Embora o SARESP seja um instrumento relevante de avaliação, este não
pode ser o único indicador de rendimento, uma vez que sua realização ocorre no
final do segundo semestre, correspondendo com o final do ano letivo, em que resta
pouco tempo para intervenções. Dessa forma, notamos a necessidade de outros
instrumentos que possam diagnosticar e avaliar de forma contínua os avanços
obtidos. Nesse sentido entendemos a relevância do papel do professor exposto por
Moreira (1982, p.90), que consiste em “auxiliar o educando a construir e organizar
sua estrutura cognitiva de maneira hierárquica, propondo um ensino a partir da
apresentação de conceitos mais amplos, generalizáveis e potencialmente
significativos, avançando para conceitos mais específicos e menos abrangentes”.
Segundo o autor, essa maneira de sistematizar e apresentar a nova
informação ao educando contribui para a organização da estrutura cognitiva
resultando em uma aprendizagem significativa e não mecânica, melhorando o
rendimento dos alunos de forma gradual e não apenas na realização do SARESP.
Em relação às principais dificuldades dos alunos, a professora Eunice
não explicita a origem das mesmas, expressa sua opinião sobre os problemas de
ordem psicológica de uma aluna, sem, contudo, ter solicitado laudo psicológico da
mesma, como esclarece:
Ah! Eles têm muitas dificuldades e até já avançaram
muito! E entre eles há uma aluna que é considerada
pelos pais e por ela mesma, como tendo problema de
78
cabeça e por essa razão é acompanhada pelo Psicólogo.
Sinceramente não acho necessário. O que ela tem
mesmo é problema de relacionamento, pois briga demais,
inclusive com alunos de outras salas. Acho que ela é
muito mimada, inadequada, além de falar demais. Não
vejo como problema psicológico.
Prossegue dizendo: Ela já está bem melhor. Conversei muito com ela sobre
seu comportamento e ela tem melhorado”.
Apesar de pertinente a orientação realizada pela professora, essa não
dispensa a apresentação de laudo psicológico, que poderá esclarecer as limitações
e potencialidades da aluna, bem como a maneira adequada para proceder em
relação a sua aprendizagem.
Já a professora Cristina não cita exatamente as dificuldades dos alunos,
sinaliza apenas a indisciplina, como vemos:
Olha, eles são muito indisciplinados, conversam demais,
são muito agitados e sem limites, isso prejudica muito o
rendimento deles.
É sabido que a indisciplina se faz presente e promove o desgaste na
relação professor - aluno, podendo até comprometer a aprendizagem.
A esse respeito, AQUINO (1998) afirma que “os distúrbios de natureza
comportamental, são representados pela indisciplina e que somado ao baixo
aproveitamento, representam os dois grandes males da escola contemporânea,
geradores do fracasso escolar, constituindo-se os principais obstáculos para o
trabalho docente”. Assim, considera a indisciplina “como uma temática
fundamentalmente pedagógica, que pode ser compreendida inicialmente como um
indício de que a intervenção docente não está se processando a contento, que seus
resultados não se aproximam do esperado”.
Dessa forma, salienta a necessidade de repensar posições em que “as
justificativas para o fracasso escolar não sejam embasadas em preconceitos, falsos
conceitos e com raras alternativas de soluções”.
E para promover essa reflexão, propõe o seguinte questionamento:
Como interpretar claramente o que a indisciplina está indicando de forma indireta?
Conclui, alertando-nos que “o aluno indisciplinado está incessantemente nos
chamando à atenção e nos perguntando o tempo todo: Para que escola? Qual a
79
relevância e o sentido do estudo e do conhecimento? No que isso me transforma? E
qual é meu ganho, de fato, com isso?” (AQUINO, 1998, p.19, 20).
Nesse sentido, entendemos que, em situações como a descrita pela
professora Cristina, faz-se necessário ampliar a disposição de aprender dos alunos,
pois esta é uma das condições necessárias para que a aprendizagem ocorra, uma
vez que quanto maior o engajamento nas atividades propostas, menor será a
indisciplina. Igualmente necessário, será auxiliá-los na organização da estrutura
cognitiva, por meio de conteúdos substantivos, que possam ser articulados com os
conhecimentos prévios, resultando em uma aprendizagem significativa.
Nesse sentido, é possível concordar com o exposto por Ausubel (1980,
p.23) quando ressalta a importância do papel do professor “na seleção de material
que promova, além da interação entre o que já existe na estrutura cognitiva com o
que se pretende aprender, estimule o educando para o aprendizado”.
No que se referem às providências tomadas em relação às dificuldades
dos alunos, as professoras Eunice e Cristina consideram que cumprem seu papel e
ressaltam a falta de acompanhamento dos pais. A professora Eunice diz:
Procuro fazer o melhor que posso. Tento atividades
diferenciadas. Mas eles apresentam muitas dificuldades.
Apesar de avançarem muito, ainda não é o suficiente.
Acho que falta também acompanhamento dos pais, pois
esses que têm mais dificuldades, os pais são
completamente ausentes.
Apesar de mencionar o uso de atividades diferenciadas, não são
esclarecidos os critérios utilizados para a seleção desse material, que, de acordo
com a proposta de Ausubel (1980), deve ser potencialmente significativo para que
possa favorecer a organização da estrutura cognitiva. Além da falta de clareza
nessa seleção, a avaliação insatisfatória é atribuída apenas à ausência dos pais, o
que não se constitui um indicador objetivo.
A esse respeito, a professora Cristina acrescenta:
Vai ter um Simulado antes da aplicação do SARESP.
Mas eles têm muitas dificuldades, em resolver situações
80
problemas. Só sabem resolver continhas isoladas. Dentro
de uma situação eles não compreendem as operações,
que devem ser feitas.
...o que mais fazemos trabalhar a leitura. Pois eles não
sabem o que fazer, porque não compreendem o que
lêem. Só tem um ou outro que lê e consegue resolver
sozinhos os problemas. A maioria precisa que eu leia, e
ai aos poucos vão entendendo o que é para ser feito.
Mas no SARESP, não terão essa ajuda, quero ver como
vai ser. Eles também não levam muito a sério. Ao invés
de ler, reler quantas vezes for necessário. Eles lêem uma
única vez, já chutam a resposta e por isso vão mal.
Querem acabar logo, para poderem bagunça.
Eu tenho pegado no pé deles e exigido bastante. Mas,
infelizmente, os pais não fazem o papel deles de
acompanhar os filhos. Eu passo lição de casa, olho os
cadernos, peço para os pais que verifiquem também. E
quando preciso, eu chamo os pais para conversar por
bilhete. Mas nem sempre, eles lêem os bilhetes e
comparecem. Eu tenho feito o possível, e aqueles que se
interessam tem conseguido acompanhar, agora os que
têm dificuldades e os pais não acompanham fica mais
difícil.
Embora nesse relato a professora argumente que desenvolve leitura,
observamos que essa prática, não tem sido suficiente para suprir as dificuldades na
compreensão, pois estas se mantêm e prejudicam o rendimento inclusive em outras
disciplinas. Notamos, mais uma vez, uma necessidade da professora de atribuir à
responsabilidade dos resultados insatisfatórios, apenas aos pais.
Nesse depoimento, podemos constatar os benefícios da intervenção da
professora como leitora experiente, ao interagir na construção da compreensão.
Todavia, observamos que o mesmo não ocorre quando os alunos são submetidos a
avaliações em que esta interação não é realizada. Sabemos que, nessa situação, as
dificuldades iniciam na compreensão do que está sendo solicitado, demonstrando a
inexistência de autonomia na leitura.
81
Diante do exposto, entendemos que se a competência leitora fosse
desenvolvida como procedimento e com o uso das estratégias, consequentemente,
os educandos teriam condições para interagir, formular hipóteses, estabelecer
relações e compreender o que lhe é solicitado, pois de acordo com Solé (1998 p.46)
“quando a leitura envolve a compreensão, ler torna-se um instrumento útil para
aprender significativamente”.
Nessa perspectiva, a professora Beatriz esclarece:
Ele já está aqui desde a 2ª série e sempre apresentou
dificuldades. Na reunião de pais eu procurei saber da mãe,
quais eram as causas dessas dificuldades. “A mãe me
contou que caiu um tanque na cabeça dele, mas que ele
não teve seqüelas”.
Ela não aceita as limitações do filho. Prefere acreditar que
está tudo bem. Eu faço o melhor que posso. Preparo
atividades, que ele consegue fazer, mas não tenho tido
sucesso.
Ta vendo, ele ainda é pré-silábico, ele usa letras que ele
conhece de forma aleatória. Ele deve ter algum problema.
Já era para ele estar bem melhor. Mas como a mãe não
aceita, não se pode fazer nada, além do que tenho feito.
Nesses depoimentos, vemos que as dificuldades apresentadas por esse
aluno são de natureza complexa e necessitam de diagnóstico, uma vez que se
mantêm desde as séries anteriores. Notamos que, por esse motivo, a professora se
exime, considerando ter esgotado seus recursos e, dessa forma, delega para a mãe
a responsabilidade de resolver a situação.
Ao analisarmos o caso, compreendemos que embora as dificuldades de
aceitação da mãe, acrescida da falta de conhecimento de seu papel, contribuam para
a manutenção dessa situação, também notamos a responsabilidade da escola em
oferecer orientação e encaminhamento adequados ao caso.
Notamos nesses relatos que, apesar de a professora buscar informações
junto à mãe, não são observados procedimentos sistematizados para essa
orientação, buscando conscientizá-los dos prejuízos dessa omissão, bem como a
realização dos encaminhamentos necessários para os órgãos competentes que
82
possam apoiá-los na realização desse diagnóstico. Outrossim, entendemos que, se
houvesse na escola o Projeto de Reforço e Recuperação, seria adequado o
encaminhamento desse aluno visando a minimizar essas dificuldades.
Podemos considerar que, na falta dessas providências, o caso torna-se
crônico e o aluno, por sua vez, será promovido sem condições para a série seguinte.
Considerando que, nesse contexto, o aluno estará exposto a um volume superior de
informações que, para serem processadas, necessitam da organização da estrutura
cognitiva que, por ora encontra-se comprometida, impedindo-o de avançar. Diante do
exposto, lamentamos o número de alunos, que se encontram nessa situação, razão
pela qual entendemos a necessidade de intervenções para esses casos.
No que diz respeito às soluções encontradas para os alunos que têm
dificuldades observa-se que a professora Eunice, apesar de esperar uma melhoria
dos seus alunos, acredita que a retenção é o caminho, sendo essa opinião apoiada
pela professora Cristina. Nota-se que somente a professora Beatriz, não partilha
dessa opinião, como vemos nos depoimentos que seguem.
Cabe ressaltar ambas as professoras, Eunice e Beatriz, consideram
necessárias as aulas de reforço para a recuperação desses alunos e lamentam a
falta de espaço na escola, para realização destas aulas.
Professora Eunice:
Se eles não atingirem o esperado até o final do ano, como
estão na 4ª série, serão retidos. Porque não irão conseguir
acompanhar o ritmo do ginásio. Sendo assim é melhor que
façam novamente a 4ª série. Na verdade seria bom, que
eles freqüentassem aulas de reforço. Só que aqui na
escola não tem turmas, por causa do espaço, pois temos
aulas inclusive nos Sábados. O trabalho fica muito difícil,
mas mesmo assim vamos ver o que vai dar, falta ainda um
bimestre. Espero que até lá, eles melhorem e possam ser
promovidos.
Professora Cristina:
Vamos para o último bimestre, quando algum for retido, aí
o pai vai aparecer, para reclamar e achar que tem razão.
Nem todos têm conhecimento das dificuldades dos filhos.
83
Nesse sentido, constatamos o quanto à 4ª série se apresenta como um
marco fundamental, para que seja realizada a organização da estrutura cognitiva,
estabelecendo relações entre os conceitos, preparando-o para processar
informações e transformá-las em conhecimento, o que é esclarecido por COLL
(2000, p.231) quando afirma que “os indivíduos apresentam uma organização
cognitiva interna baseada em conhecimentos de caráter conceitual, sendo que a sua
complexidade depende muito mais das relações que esses conceitos estabelecem
entre si do que do número de conceitos presentes”
Assim, notamos que, na falta de providências durante o Ciclo I, a solução
comumente encontrada é a reprovação. Porém, como é possível observar nos
depoimentos, há alunos que, apesar da retenção, não apresentam melhorias no
rendimento, sendo necessário rever essa medida.
A esse respeito, à professora Beatriz acrescenta:
Não tem jeito, ele vai desse jeito para 5ª série e lá vai ficar
pior, pois nem todo mundo tem paciência, e sabe
acompanhar as dificuldades dele. Até que a mãe se
convença e faça um diagnóstico médico, para ver o que
fazer com ele. Como eles são muito freqüentes inclusive
nas aulas de sábado, eu tento recuperá-los durante as
aulas, com atividades específicas para suas dificuldades.
Eles precisavam mesmo de aulas de reforço, fora da sala,
para que tivessem mais atenção. E que fosse trabalhada
só, a sua dificuldade. Mas como não dá para montar
turma, por causa da falta de espaço e de horário. Agente
faz o que pode. De modo geral eles vão melhorando, só
os que têm realmente muitas dificuldades é que é difícil
progredir.
Notamos, nessas considerações, os obstáculos enfrentados pela falta de
diagnóstico e de providências.
Com relação às dificuldades na aprendizagem, faz-se necessária à
concretização dos projetos de reforço, em horário diferenciado, com turmas
reduzidas e as dificuldades identificadas. Porém, como nesta escola não há espaço
84
destinado para essa prática, em razão do uso ininterrupto do prédio escolar, é
realizada uma recuperação contínua, feita pela própria professora, com base nos
diagnósticos.
De igual importância, deve haver uma cobrança por parte da comunidade,
para que as instâncias superiores viabilizem a distribuição da demanda escolar, por
meio da construção de novas escolas.
Em relação ao papel dos pais no desenvolvimento da aprendizagem, este
é considerado fundamental em todos os depoimentos. Nesse sentido, as professoras
Eunice e Cristina colocam os aspectos que consideram importantes e lamentam a
pequena participação:
Professora Eunice:
Ah! Pelo menos que tomassem conhecimento das
dificuldades dos filhos e os ajudassem nas tarefas e na
leitura. Que demonstrassem mais interesse. Na Reunião
de Pais, os que comparecem, são sempre os pais dos
bons alunos. Dos que têm dificuldades, nunca vêm
ninguém. Então, fica muito difícil. Não adianta! Eles
alegam que trabalham e não comparecem mesmo assim.
Professora Cristina:
Eles tinham que cobrar mais dos filhos, não deixar faltar
sem motivo, exigir que eles fizessem suas lições de casa,
olhar os cadernos. Mas ele se quer, vêem nas reuniões. É
sempre aquela história. Os pais dos alunos que realmente
tem dificuldades, nunca comparecem.
Nesse contexto, a professora Beatriz estabelece espontaneamente
comparação, entre os alunos da rede pública estadual e os da rede particular:
Eu acho que os alunos do estado precisam mais do
professor do que o aluno do particular. No particular, como
os pais pagam, eles exigem mais dos filhos e a carência é
também menor.
85
A professora prossegue, reforçando os benefícios do acompanhamento
dos pais, na melhoria do comportamento de sua turma: “Há alguns pais que também se
preocupam e isso ajuda bastante”.
De acordo com esses depoimentos, a falta de acompanhamentos dos
pais tem sido um fator preponderante que dificulta a melhoria nos alunos.
A esse respeito, Szmanski (2000, p.15) afirma que a família “é uma
instituição que assume a tarefa educativa que lhe é outorgada pela sociedade,
devendo, portanto, receber apoio para o desempenho dessa função”.
Nesse contexto, apresenta a existência de dois modelos de família:
“A família pensada, que é sempre branca, de classe
média, composta de pai, mãe, filhos e avós. Os sentimentos
associados a esse modelo são de amor, acolhimento, apoio e
segurança. Um exemplo de ação voltada para esse tipo de família é
o agendamento das reuniões de pais, durante a semana, no meio do
período, numa clara suposição do lugar doméstico da mulher e de
sua responsabilidade pela educação dos filhos”.
“A família vivida se afasta do modelo anterior por
apresentar estrutura e organização diferentes e são estabelecidas
com arranjos familiares, hierarquizados por idade ou gênero,
convivem com a proposta de uma ligação afetiva duradoura,
incluindo uma relação de cuidado entre os adultos e deles com as
crianças, jovens e também com os idosos”. (SZMANSKI, 2000,
p.15).
Conclui, salientando que em ambos os modelos podem “ser oferecidas
condições adequadas para o desenvolvimento de crianças e adolescentes”. Porém,
a família vivida concreta deve receber apoio das demais instituições, sobretudo da
escola, para o cumprimento de sua função socializadora.
Diante do exposto e considerando a relevância do papel dos pais,
verificamos que estes não são os únicos responsáveis por essa situação, que
poderia ser amenizada, por meio de orientações, com o objetivo de esclarecer seu
papel e os reflexos positivos de seu acompanhamento para a melhoria da
aprendizagem.
86
Todas essas orientações deveriam ser oportunamente formalizadas na
reunião de pais, sendo estas agendadas, em horário conveniente aos mesmos.
Apesar de observar a ausência dos pais, quer seja pelo excesso de trabalho,
reforçado pela preocupação constante em garantir o provimento das necessidades
básicas, quer seja pela falta de preparo para cumprirem seu papel. Para esses
casos, deveriam ser feitas convocações posteriores, em horário oportuno.
Nesse contexto, observa-se que nem sempre há uma reflexão coletiva
entre o grupo de professores, sobre esses aspectos visando à construção de uma
pauta unificada, direcionada primordialmente para esses objetivos, pois vemos que
nessa ocasião, quase sempre são enfocados os problemas de indisciplina.
Entendemos a complexidade das questões apresentadas e sabemos que
esses cuidados, não irão garantir a participação total dos pais, mas estreitariam os
laços entre a escola e a família. Entretanto, para os pais considerados omissos,
seria necessária uma adoção de medidas mais contundentes, tais como,
encaminhamento para o Conselho Tutelar e Vara da Infância.
Dessa forma, vemos que se a escola não se preocupar com essas
questões, estará se rendendo aos desafios e, por conseguinte não estará
cumprindo seu papel.
Na terceira entrevista, foi possível identificar, explicitar e analisar as
estratégias de leitura utilizadas pelas professoras, à luz da perspectiva interativa da
leitura.
A esse respeito, vemos que a solução encontrada pela professora Eunice,
para minimizar a dispersão dos alunos nas aulas de leitura compartilhada, demonstra
que a mesma considera necessário treino para adquirir essa habilidade:
Eu faço de duas formas: leitura livre e compartilhada. No
começo eu tive muitas dificuldades para os alunos
fazerem leitura compartilhada, pois eles se dispersavam
demais e tinham muitas dificuldades. Então eu decidi
escolher um gênero do livro deles. E pedi que treinassem
em casa com seus pais.
87
Neste depoimento, verifica-se que a compreensão da professora a
respeito do conceito de estratégia está associada a maneiras diferentes de estimular
o aluno para a leitura, uma espécie de tentativa e erro sobre o que “dá certo”,
entretanto, isso ocorre de modo empírico, sem reflexão teórica prévia para a ação, ou
seja, sem apresentar um planejamento para estes procedimentos. Notamos que,
embora a leitura seja realizada de duas maneiras (livre e compartilhada), em ambas,
não há determinação de objetivos, que constitui uma importante estratégia de
antecipação e, de acordo com Solé (1998, p.89), permite prever o que será lido, com
base nas informações explícitas ou suposições.
Ainda a esse respeito, não observamos ações para motivar, revisar e
articular os conhecimentos prévios de modo a estabelecer previsões e hipóteses
sobre o texto. Podemos constatar que a falta das estratégias de antecipação pode ter
favorecido o desinteresse e a dispersão dos alunos. E, nesse caso, entendemos que
a solução encontrada pela professora demonstra uma concepção de leitura focada
no ensino do código, que requer treino e, nesse caso, pode ser delegado aos pais.
Quando questionada sobre de que forma os pais poderão ajudar,
argumenta: “Só de cobrarem um pouco, já melhora. Pois se depender só das aulas
fica difícil”.
Apesar da relevância do acompanhamento dos pais, no incentivo à leitura,
notamos uma visão equivocada do papel dos pais com relação a essa
aprendizagem, pois não é legítimo delegar essa tarefa aos mesmos, uma vez que
eles, não estão preparados para exercerem esta função, que a rigor não lhes cabem.
A solução encontrada pela professora Eunice para as aulas de leitura
livre, com a montagem da estante é uma forma de contornar a falta da sala de leitura,
como ela expõe:
Lembra da estante? Então, os livros de lá, podem ser lidos
quando eles terminam a atividade em sala, além de
levarem para casa.
Ainda a esse respeito relata:
Para não ficar muito repetitivo, às vezes eu organizo uma
aula diferente: Peço para os alunos trazerem tapete e
almofada de casa e montamos aqui na sala uma roda de
88
leitura. Só que não dá para fazer sempre. Porque ocupa
muito tempo. Temos que tirar tudo do lugar e depois
colocar novamente. Embora eles gostem, dá muito
trabalho e não dá para fazer sempre.
Nessa prática, notamos que a organização do ambiente e a diversificação
das aulas são pertinentes e contribuem para torná-las prazerosas, mas não
constituem um objetivo para o desenvolvimento da compreensão. Em contrapartida,
vemos que os obstáculos enfrentados na organização do ambiente justificam sua
realização esporádica e demonstram a importância de um espaço adequado para
essa atividade.
Entendemos que, para os resultados serem mais satisfatórios, é oportuno
propor uma roda de conversa sobre o assunto, visando a interagir e a articular os
conhecimentos prévios. Porém, nesse depoimento, não é observada essa estratégia
de antecipação, que poderia ser realizada por meio de questionamentos, tais como:
o que se sabe sobre o assunto, o gênero e o autor? O que poderia ajudar a
compreendê-lo? Em que momento o texto foi produzido? Para quem? Por quê?
Esses questionamentos proporcionam a organização da estrutura
cognitiva e promove o desenvolvimento da compreensão, pois de acordo com Solé
(1998, p. 91) para que seja encontrado sentido na leitura, o educando tem “de saber
o que deve fazer, sentir que é capaz de fazê-lo e achar interessante o que se
propõe”.
Ao serem solicitados detalhes sobre a forma como é realizada a leitura,
neste dia, informa:
Ás vezes fazemos leitura compartilhada e às vezes eu leio
para eles. Também faço a leitura de produções dos textos
deles. E aproveito para fazer a correção dos erros de
concordância. São muitos erros e essa é uma boa hora.
Pois eu vou mostrando para eles, qual é a forma correta. A
única coisa que eu me esqueci de dizer, é que além
dessas atividades. Eu também faço leitura diária com eles.
Eu escolho um tema que seja bom, e fazemos a leitura
compartilhada ou eu mesma leio para ele.
89
Nota-se, nesse relato que, mesmo com a diversificação das aulas (leitura
compartilhada ou feita pela professora), o objetivo principal de ambas se resume na
correção dos erros, o que caracteriza a leitura como instrumento de avaliação e, por
sua vez, não propicia a compreensão.
Nas tarefas de leitura compartilhada, faz se necessário uma atitude
receptiva do professor, que pressupõe observação contínua em relação às decisões
que regulam o processo de ensino e aprendizagem, que de acordo com Solé (1998,
p.166) requer que o mesmo “seja sensível a tudo o que ocorre durante o processo
para ajustar sua própria intervenção”.
Quanto aos critérios para escolha dos temas e a freqüência em que são
realizadas explica: “Eu escolho temas que eles gostam se não, eles não se interessam.
Quando inicia a aula ou após o recreio, pois eles ficam muito agitados e a leitura acalma”.
Nesse relato, vemos que, apesar de importante a preferência dos alunos,
esse não pode ser o único critério para escolha, pois os temas escolhidos devem ser
potencialmente significativos e relacionados com o que o educando já conhece, de
maneira a auxiliar na organização da estrutura cognitiva e favorecer a compreensão.
A esse respeito Solé (1998), destaca a necessidade de
“utilizar textos não conhecidos, porém com temáticas e
conteúdos mais ou menos familiares ao leitor”, esclarece
também que cabe ao professor, “oferecer ajuda
necessária para que possam construir significado sobre o
que se lê”. Desta forma, acrescenta que para motivar a
tarefa de leitura não é necessário que o professor diga:
“Fantástico! Vamos ler!” uma vez que essa motivação é
alcançada quando se “planeja bem a tarefa de leitura e
seleciona com critérios os materiais que nela serão
trabalhados”. (SOLÉ p. 91-93)
A freqüência e a escolha do momento ideal, para realizar a leitura são
fundamentais, porém, quando verificamos que essas ações são utilizadas com o
objetivo de tranquilizar os alunos, observamos que a leitura é utilizada como uma
forma de controle de disciplina, e não com objetivos específicos, necessários para
desenvolver a compreensão.
90
Podemos inferir, nos relatos apresentados, que não há também o uso de
estratégias durante a leitura, visando à construção da compreensão, pois não é
observada a realização de inferências e questionamentos sobre o que se lê, bem
como não são identificadas as dificuldades na construção da compreensão, sendo
essa reduzida aos erros de decodificação.
Embora saibamos que o conhecimento do código é fundamental para que
seja realizada a leitura, este conhecimento só não basta. Para Smith (1999, p. 129)
“fazer a leitura perfeita de cada palavra e usar a leitura para melhorar a ortografia e
expressão escrita contribui para sobrecarregar a tarefa de leitura e tornar difícil à
aprendizagem”.
No que diz respeito às estratégias depois da leitura, também não são
mencionados procedimentos visando à identificação de idéias principais, nem a
elaboração de resumos visando à construção da compreensão.
Nessa perspectiva, Solé (1998, p.173), ressalta a necessidade de
promover atividades em que os alunos tenham que “perguntar, prever, recapitular,
opinar, resumir, comparar suas opiniões com relação ao que leram, tudo isso
fomenta uma leitura inteligente e critica, na qual o leitor vê a sim mesmo como
protagonista do processo de construção de significados”.
Dessa forma, entendemos que essa professora não dispõe de
conhecimento sobre o conceito e os benefícios das estratégias de leitura.
Com relação às estratégias de leitura utilizadas pela professora Cristina, a
mesma relata: “No início eu escolhia um texto, do livro deles. Mas percebi que não
era muito produtivo, pois, como eles conheciam o texto, não se concentravam na
leitura e aí se dispersavam demais”.
Ao ser questionada sobre suas providências nesse sentido, ela acrescenta:
Depois de descobrir isso, eu passei a escolher os
textos, com temas do dia-a-dia, com títulos que
chame atenção. Eu vou inclusive buscar os meus
livros do Letra e Vida, que tem muita coisa
interessante e que eles não conhecem. Sabe como
é 4ª série? Dependendo do que for eles não se
interessam mesmo.
91
É possível estabelecer relação entre esse relato e o da professora
Cristina (citado anteriormente), pois em ambos são apresentados à dispersão e o
desinteresse dos alunos nas aulas de leitura, o que permite concluir que a falta de
definição de objetivos contribui para esse comportamento. Assim, entendemos que
não há um planejamento para o desenvolvimento da compreensão leitora, pois, se
houvesse, esse seria o primeiro procedimento a ser adotado, uma vez que a clareza
dos objetivos, é, pois um principio fundamental para despertar o interesse dos
alunos, e de acordo com Solé (1998, p.114) é responsabilidade do professor,
transformar o aluno, em leitor ativo, isto é alguém que sabe porque lê e assume sua
responsabilidade ante a leitura”.
A falta de interesse pode ser superada por meio da seleção de material
potencialmente significativo que, de acordo com Smith (1999, p.13), deve “fazer
sentido e despertar o interesse o educando”. Para tanto, deve cuidar para que estes
sejam coerentes com os objetivos previstos e passíveis de articulação com os
conhecimentos prévios, de modo a ampliar a estrutura cognitiva que pode ser
favorecido por meio das estratégias, permitindo ao educando compreender o que lê.
Nesse contexto, o cuidado em selecionar os temas, adequando-os ao
interesse dos alunos, é pertinente e se apresenta como uma estratégia eficaz.
Desta forma, descreve como são as aulas bem como sua frequência:
Normalmente as aulas de leitura acontecem na 4ª ou 5ª
feira, mas fora disso, há também uma rotina diária. Eu
mesma faço a leitura para os alunos e aproveito para
demonstrar a pontuação e entonação correta. Em
seguida, faço a leitura compartilhada e aproveito para
fazer as correções.
Observamos que, apesar de manter frequência e de diversificar as aulas
por meio de leitura compartilhada, há nesse depoimento, uma visão equivocada
sobre o desenvolvimento da compreensão leitora, demonstrada pela realização de
correções, tornando a atividade de leitura um instrumento de avaliação.
Nessa leitura diária, fazemos a mesma coisa, eu leio depois
eles lêem e no final debatemos o tema. Ontem nós fizemos
92
uma leitura muito interessante de um texto chamado “Sopa de
Pedra” de Pedro Malazarte, que conta à história, de um
homem muito esperto, que sabe tirar proveito de todas as
situações.
Nesse depoimento, é possível constatar o que diz Solé (1998, p.36) “o
tratamento dado à leitura como objeto de conhecimento não é tão amplo, e em
muitas ocasiões a instrução explícita limita-se ao domínio das habilidades de
codificação”.
Na sequência proposta pela professora (eu leio e depois eles leem), não
são esclarecidos os objetivos. Em relação ao debate, esse pode ser considerado
como sendo uma estratégia útil, a ser realizado depois da leitura, desde que, nesse
momento, sejam identificadas as idéias principais, de modo a facilitar a produção de
um resumo e desenvolver a compreensão.
Como já citado anteriormente, a falta de objetivos, mais uma vez,
compromete os resultados, reforçando sua relevância enquanto estratégia de
leitura.
Ao ser questionada sobre os resultados obtidos nessa aula, explicita:
Eles se divertiram muito. Só que quando fizemos o
debate, sobre o que é mais importante na vida: se é a
honestidade ou a esperteza? Eu fiquei muito
decepcionada quando vi que a maioria deles, achou que
era a esperteza. Eu tive que explicar para eles, a
importância da honestidade. Mas não sei se convenci
todos. A educação que eles recebem não prioriza estes
valores.
Diante desses resultados, a pesquisadora questiona de que forma ela
pretende desenvolver esses valores e, assim, a professora argumenta: “Essa forma eu
acho que é legal, pois eles se divertem com as histórias, e quem tem interesse acaba
aprendendo as coisas boas”.
Nesse relato, observamos que a falta de clareza nos objetivos para leitura
(diversão ou desenvolvimento de valores) comprometeu os resultados na
93
compreensão e não atendeu as expectativas da professora. Observa-se que a
justificativa diante dos resultados insatisfatórios é atribuída a diferentes valores da
educação recebida pelos alunos.
A partir desses depoimentos, concluímos que a professora em questão
também não possui conhecimento das estratégias de leitura e seus benefícios para o
desenvolvimento da compreensão.
Em relação as estratégia de leitura que utiliza, a professora Beatriz coloca:
O que eu faço, nas aulas de leitura. É motivar meus
alunos a ler sempre. Começamos sempre, com uma roda
de conversa, sobre atualidades. Como exemplo eu pego
um artigo de jornal que trata sobre violência, como o caso
da Isabela. E assim eu leio a notícia para eles e exploro o
tema. Falamos sobre a violência que há no bairro, nas
famílias. Eu gosto de fazer assim, pois esta é uma forma
deles se interessar e participar da aula.
Nesse relato, notamos que a escolha de temas atuais, permitindo a
articulação do que os alunos sabem sobre o assunto e proporcionando a participação
deles a partir de suas experiências, é fundamental na construção da compreensão,
pois amplia o interesse dos mesmos. E, dessa forma, constitui-se uma estratégia a
ser utilizada antes e durante a leitura, facilitando o processamento da informação e a
organização da estrutura cognitiva.
Quando questionada sobre a frequência da roda de conversa com temas
atuais, a professora esclarece:
Eu sempre procuro trazer um assunto que possa ser
depois discutido. E depois peço a eles que produzam
algo, sobre o que discutimos. Proponho que eles se
imaginem como autores e escrevam algo sobre o
assunto. Como acharem melhor pode ser em forma de
Poesia, Música, História, Desenho.
94
Nesse depoimento, vemos que a solicitação de produção escrita sobre o
que foi lido não se apresenta como uma estratégia a ser utilizada depois da leitura,
pois não foi possível evidenciar o resgate das idéias principais do que foi lido, por
meio de um resumo. Nesse sentido, observamos que, apesar de se buscar a
compreensão, faz se necessário definir objetivos, inclusive para a produção escrita,
não sendo adequado delegar ao aluno a escolha do gênero, que ele considere
adequado.
Em relação aos efeitos dessa estratégia (roda de conversa sobre
atualidades), no desenvolvimento do hábito de ler, afirma: “... até os que têm mais
dificuldade, gostam da aula de leitura”.
Entendemos que os benefícios dessa estratégia são extensivos a todos em
razão de não se configurar uma forma de avaliação, o que favorece a interação e a
participação. Nesse sentido, descreve a frequência das aulas e como procede com
os alunos com dificuldades:
Na 4ª feira é o dia, que eu faço a leitura e na 6ª feira, eu
abro para eles lerem. Eu sempre pergunto quem gostaria
de ler para nós? Eu não imponho nada. Um dia eu leio, e
outro dia, eu os convido a ler para todos. Os que têm
maiores dificuldades eu tomo leitura individual. Deixo que
eles treinem em casa, e escolham o que querem ler para
mim.
Vemos nesse depoimento que a manutenção de uma rotina para as
atividades de leitura, bem como o respeito demonstrado pela professora pela
decisão dos alunos em realizá-la ou não, se faz necessária. Essas ações permitem
considerar que a leitura, nesse momento, não é desenvolvida como um instrumento
de avaliação. Ao ser questionada sobre outras estratégias utilizadas, ela
argumenta:
Na 6ª feira, como é o dia deles. Eu deixo que eles
escolham algo para trazer para ler. Antes deixo eles
sentados em dupla (quem sabe mais com quem tem mais
dificuldade), para fazerem a leitura silenciosa. E depois
faço o convite para fazerem a leitura; Agora no meu dia
95
que é 4ª feira, eu faço diferente: às vezes leio algo que eu
já escolhi, discutido na roda de conversa, às vezes
escolho as melhores produções deles, mas não falo
quem escreveu. Elogio bastante faço com que a sala
também elogie, e só depois digo quem escreveu. Eles
adoram serem elogiados, sempre se esforçam para
escrever melhor. Eu acho que isso faz com que eles
percam o medo de ler. Eles acabam se acostumando
com a rotina. E quando por alguma razão, não é possível
cumpri-la. Nossa eles me cobram muito. No Sábado eu
tento dar uma atenção especial, para a leitura dos que
apresentam mais dificuldades. Pois nesse dia, sempre
tem menos alunos. Então dá para tomar a leitura
individual deles. Com os outros eu faço atividades de
recorte, colagem para não cansar tanto. Neste dia, eu
tomo a leitura desses com dificuldades e normalmente
utilizo os clássicos, que ele já sabe de cor. O fato deles já
conhecerem a sequência motiva mais.
A estratégia de organizar os alunos sentados em dupla, com critérios
estabelecidos (quem sabe com quem não sabe), é uma forma de realizar
agrupamentos produtivos, que proporcionam uma situação de troca e favorecem a
aprendizagem.
Porém, observamos que na atividade apresentada (leitura silenciosa), a
interação proposta é pequena, portanto, seus resultados são questionáveis. Nota-se
também a falta de objetivos para a leitura, quando se permite que os alunos
escolham o que vão ler, sem ao menos direcionar o gênero que se pretende
desenvolver.
É pertinente tomar a leitura individual dos alunos que têm dificuldades,
para não os expor a constrangimentos. Porém, a utilização da leitura dos clássicos,
em razão dos alunos saberem de cor, demonstra uma concepção de leitura
baseada na decodificação, ou seja, no modelo bottom-up. Tendo em vista que o
modelo interativo de leitura valoriza a formação do leitor maduro, que utiliza de
forma complementar os dois modelos (bottom-up e top-down), tornando necessário
tanto o reconhecimento das palavras de maneira rápida e eficiente, como a previsão
96
do que irá aparecer no texto. Nesse contexto, para que haja uma mudança no
desenvolvimento da compreensão, reconhecemos a necessidade de se promover
uma reflexão acerca da concepção de leitura.
Num desses momentos, um vendedor pediu licença para entrar na sala e
deixou com a professora algumas tabuadas, para serem oferecidas aos alunos que,
de posse da tabuada, diz:
Ta vendo isso aqui. Eles não levam para casa sem saber
o que é não. Nós lemos juntos. O que é? Para que serve?
Quanto custa, elaboramos um bilhete para que os pais
compreendam. Se não eles chegam em casa, e não sabe
nem dizer o que isto significa. Eles são muito curiosos, eu
aproveito esta curiosidade para tudo. Você sabe que por
causa disso, eu percebo que eles estão mais
interessados em ler tudo. Finaliza explicitando: Eu acho
que eles estão gostando mais de ler do que escrever.
Oralmente eles são bons, mas na hora de escrever,
apresentam mais dificuldades do que de ler.
A postura da professora de esclarecer aos alunos no que consiste o
material, oferecido para compra (tabuada), seguido da produção de um bilhete para
transmitir essas informações aos pais, constitui uma forma de explicitar a função
social da leitura e da escrita, atribuindo-lhe sentido e significado.
No que diz respeito às dificuldades encontradas na compreensão leitora
temos os seguintes relatos:
A professora Eunice salienta: “No começo eu tive muitas dificuldades para os
alunos fazerem leitura compartilhada, pois eles se dispersavam demais e tinham muitas
dificuldades”.
A esse respeito, a professora Cristina expõe suas dificuldades:
Nesta sala não é possível fazer leitura silenciosa. Eles
não se concentram e acaba virando bagunça. Há muita
resistência por parte de alguns alunos, por causa das
dificuldades que eles têm. Por exemplo, tem uma aluna
com problemas de visão que se recusa a ler.
97
Observamos que, enquanto a professora Eunice reclama da dispersão
nas aulas de leitura compartilhada; a professora Cristina coloca as dificuldades de
concentração na realização da leitura silenciosa, acrescentando a resistência para
ler de alguns alunos. Conforme já discutido, o pequeno envolvimento dos alunos
ocorre em razão da falta de objetivos de ambas as práticas, bem como por
considerarem a mesma uma forma de avaliação.
Entretanto, a professora Beatriz, não encontra muitas dificuldades na
prática de leitura, mas sim na produção escrita, como expõe: Oralmente eles são
bons, mas na hora de escrever, apresentam mais dificuldades do que de ler”.
Nesse relato, observamos que a valorização da expressão verbal dos
alunos não se apresenta como forma de avaliação demonstrando ser uma prática
favorável para a construção da compreensão.
Com relação à preferência dos alunos em relação aos gêneros, notamos
que esses variam da maneira que segue:
Professora Eunice:
Gostam de aventura, suspense e também de atualidades.
Eu procuro variar os temas, e não leio algo que eles já conhecem. Porque se não, eles não
se interessam”.
Professora Cristina:Temas do dia-a-dia, com títulos que chamem atenção;
coisa interessante e que eles não conhecem”.
Professora Beatriz: “Você sabe que eles gostam muito de poesias”.
Conhecer a preferência dos alunos é primordial, para que possam ser
selecionados temas que estimulem o gosto pela leitura. Porém, esse não pode ser o
único critério para escolha, uma vez que faz se necessário selecionar temas
potencialmente significativos e de acordo com os objetivos e necessidades do
grupo.
Observa-se também a preferência dos alunos pela leitura feita por um
leitor mais experiente, como vemos nos relatos das professoras Eunice e Cristina:
Professora Eunice: “Gostam muito, só que eles preferem que eu faça a leitura.
Por causa dos erros dos colegas, fica mais difícil de entender”.
Professora Cristina: “Na verdade eles preferem que eu faça a leitura, pois
quando todos lêem a compreensão não é a mesma”.
98
Entendemos que a preferência comum dos alunos se dá em função de
que a leitura realizada por um leitor experiente, como guia, é necessária, desde que
se promova a interação, que resultará no desenvolvimento da compreensão. Nos
relatos, não foi observada essa interação, como procedimento.
No que diz respeito às estratégias de compreensão leitora utilizadas com
os alunos que apresentam dificuldades, às professoras Eunice e Cristina
apresentam unanimidade nos procedimentos adotados.
Professora Eunice: “... aqueles que têm muitas dificuldades, eu faço eles lerem
só para mim, depois”.
Professora Cristina:
“Dou a oportunidades a todos, mas se não quer eu não
insisto. Depois eu chamo individualmente, peço que leia só para mim”.
Entretanto, a professora Beatriz acrescenta outras ações, como vemos
em seu depoimento:
Dos que têm maiores dificuldades eu tomo leitura
individual. Deixo que eles treinem em casa, e escolham o
que querem ler para mim, normalmente utilizo os
clássicos, que ele já sabe de cor. O fato deles já
conhecerem a sequência motiva mais.
Esse depoimento reforça a concepção de leitura embasada na
decodificação, com ênfase no treino e na memorização. A motivação dos alunos é
obtida em decorrência do treino e da avaliação satisfatória, o que não demonstra o
desenvolvimento efetivo da compreensão.
De acordo com os depoimentos, as professoras cumprem seus ofícios
com base em: rotinas, cobranças aos alunos e pais, identificação das dificuldades
na aprendizagem e de obstáculos enfrentados pela escola, diagnóstico evolutivo
das hipóteses de escrita com o objetivo de obter a escrita ortográfica e promover o
reconhecimento do código. Entretanto, em relação às práticas de leitura
desenvolvidas, estas não se constituem estratégias de leitura, pois não há um
ensino sistematizado, envolvendo organização e planejamento. Nesse sentido, não
são observados procedimentos que evidenciem o uso contínuo das estratégias, no
desenvolvimento da compreensão.
Assim, constatamos que não são utilizadas estratégias de seleção (antes
da leitura), que permitem ao leitor se ater ao que é relevante em função de seus
objetivos, bem como prever com base em informações explícitas ou suposições o
99
que ainda está por vir. Outrossim, não observamos o uso de estratégia de inferência
(durante a leitura), que permite ao leitor captar o que não está dito de forma explícita,
com base nas pistas presentes no texto ou no conhecimento prévio.
Para finalizar, não se verifica também o uso de estratégias de verificação
(depois da leitura) que permitem ao leitor confirmar, ou não, as previsões
estabelecidas, possibilitando uma reflexão mais aprofundada do assunto.
Com base no exposto, podemos considerar que há um desconhecimento
do processamento cognitivo presente no ato de ler, que de acordo com Smith (1999),
é fundamental e amplia a visão que temos da atividade de leitura focada apenas na
informação visual.
Nesse sentido, entendemos que as informações não visuais presentes na
estrutura cognitiva do educando devem ser exploradas de maneira organizada,
hierárquica e significativa.
Em razão de não haver um ensino sistematizado, lamentavelmente o
desenvolvimento da compreensão leitora, apesar de ter sua dimensão reconhecida e
os resultados de sua ausência diagnosticados, está centrado na decodificação.
Dessa forma, verificamos que quem reconhece o código, sem, contudo,
compreender o que lê, é considerado leitor, mesmo que não corresponda com o ideal
esperado e necessário para o convívio.
De acordo com os depoimentos apresentados, as professoras possuem
uma concepção de ensino e aprendizagem de leitura, centrada na decodificação, em
que é focado apenas o modelo ascendente (Bottom up), caracterizado, de acordo
com Solé (1998), como base no processamento do texto, que se inicia pelo
reconhecimento das letras, progredindo para as palavras e ao final para as frases.
Nesse contexto, foram identificadas atividades, que, apesar de terem
como objetivo oportunizar a compreensão leitora, enfatiza a decodificação e se
apresenta sob a forma de treino e avaliação, não havendo, portanto, indícios de
uma prática de leitura voltada para a interação entre o autor – texto – leitor, que,
conforme Koch e Elias, é “compreendida como uma atividade interativa e complexa
de produção de sentidos que envolvem, desde a compreensão dos elementos
linguísticos presentes na superfície textual, na sua forma de organização,
100
requerendo a mobilização de um vasto conjunto de saberes, considerando as
experiências e os conhecimentos do leitor”. (KOCK e ELIAS, 2006, p.10 e 11).
A concepção de leitura centrada na decodificação, além de não
proporcionar a compreensão, não corresponde com os Parâmetros Curriculares
Nacionais (1998), que são embasados na concepção interativa e prevê a formação
do leitor maduro e, para atingir esse objetivo, acrescenta o uso do modelo
descendente (Top Down), em que se valoriza a estrutura cognitiva, ou seja, dos
conhecimentos prévios, e não apenas do código, para construção da interpretação.
Nessa perspectiva, entendemos que o desenvolvimento da compreensão
leitora encontra-se prejudicado e, para reverter esse quadro, faz-se necessário
desenvolver mais pesquisas, com objetivo de analisar as práticas de leitura e os
avanços obtidos em decorrência dessas. Será por meio dessa reflexão que poderão
ser oferecidos subsídios para a prática e formação dos professores, buscando
enfatizar o processamento das informações, os aspectos cognitivos presentes no
ato de ler, bem como os benefícios do uso das estratégias como procedimento
sistemático que proporciona a construção da compreensão e contribui para uma
aprendizagem significativa.
101
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quero, um dia, dizer às pessoas que nada foi em
vão. Que o amor existe que vale a pena se doar às
amizades, às pessoas, que a vida é bela, sim, e que
eu sempre dei o melhor de mim...
Mario Quintana
Considerando que um dos principais papéis da escola consiste em
transformar informação em conhecimento, o desenvolvimento da competência
leitora deve ser priorizado, pois é por meio desta que é possível acessar as
informações se apropriar do significado, atribuir sentido e construir a compreensão.
Nessa perspectiva, este estudo enfatizou a relevância do
desenvolvimento da competência leitora como ferramenta indispensável para a
aprendizagem e construção da autonomia. Assim, privilegiou-se a concepção
interativa de leitura e os processos cognitivos envolvidos no ato de ler, bem como a
relevância do processamento das informações visando à aprendizagem
significativa. Pois, ao se observar à dimensão do ato de ler com sua complexidade e
abrangência, vemos o quanto ele é fundamental e precisa ser amplamente discutido
e compreendido, pois mais importante do que buscar o método ideal para que a
aprendizagem de leitura ocorra, faz-se necessário conhecer como ocorre esse
processo.
Cabe ressaltar que uma das principais contribuições desse estudo não
está no ensino do método, mas sim na compreensão do processamento das
informações na organização da estrutura cognitiva, além da articulação dos
conhecimentos prévios como fatores que favorecem a compreensão leitora.
Considerando esses aspectos e em razão dos objetivos dessa pesquisa,
que consistiu em: compreender o depoimento das professoras, da 4ª série do
Ensino Fundamental I, de uma escola pública da rede estadual de ensino da cidade
de São Paulo, quanto ao uso de estratégias de compreensão leitora no processo
102
ensino e aprendizagem, buscando identificá-las, analisá-las e discuti-las à luz da
perspectiva interativa de leitura, temos o que segue:
Na análise das entrevistas, verificou-se que, embora a leitura esteja
presente na escola, sendo necessária para o adequado desenvolvimento de todos
os componentes curriculares, o seu reconhecimento, enquanto objeto de ensino,
ainda não é amplamente compreendido e aplicado.
Dessa forma, apesar de observar nos depoimentos, a preocupação das
professoras em desenvolver a compreensão leitora, demonstradas pela:
manutenção de rotina, seleção de temas de interesse dos alunos, roda de conversa
com debate sobre o tema, leitura feita pelo professor e compartilhada, não se
observa um ensino sistematizado, fundamentado na concepção interativa de leitura
e nos processos cognitivos envolvidos no ato de ler.
No que diz respeito ao uso das estratégias de leitura, não foram
identificadas ações no sentido de antecipar e articular os conhecimentos prévios
dos alunos sobre o tema, assunto, gênero, autor, contexto e construção da
compreensão com base nesses elementos, visando a confirmar, ou não, as
hipóteses durante a leitura. Vemos também que não há procedimentos
sistematizados para serem utilizados depois da leitura, visando a verificação da
compreensão por meio da identificação de idéias principais e de realização de
resumos.
Tendo em vista os resultados obtidos, constatamos que as professoras
não conhecem e não utilizam as estratégias de leitura. Dessa forma, sugerimos uma
reflexão em relação aos encaminhamentos necessários, para que sejam articulados
Projetos Interdisciplinares que visem ao desenvolvimento da competência leitora,
como objeto de ensino e responsabilidade de todos. Outrossim, apesar de
identificar como satisfatória a manutenção do prédio e da mobília, bem como a
disponibilização dos recursos, sugerimos que seja destinado espaço adequado para
a realização das aulas de leitura, que poderá ser adaptado na Sala de Vídeo.
Considerando que estes procedimentos são necessários para o
desenvolvimento da compreensão, e que esta favorece a melhoria da qualidade do
ensino em razão de favorecer a aprendizagem significativa, esses deveriam ser
amplamente difundidos.
103
Termino desejando que esse estudo contribua para outras reflexões e
estimule outras pesquisas, com temas que envolvam aspectos complementares,
tais como: Avaliação dos resultados dos programas de formação oferecida pelas
Secretárias (Letra e Vida e Ler e Escrever) que preparam o professor para
desenvolver a competência leitora; Como proporcionar uma formação que viabilize
a mudança de concepção de aprendizagem de leitura? Como priorizar a leitura, na
escola como responsabilidade de todos os componentes curriculares?
Desta forma, acredito que será possível melhorar a qualidade de ensino
ofertada, dada a relevância da competência leitora para o ensino e aprendizagem.
104
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Col. Primeiros Passos.
Sites consultados
AUSUBEL, D. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/, acesso em 05 de
janeiro de 2009.
SÃO PAULO (Estado) IDESP. Disponível em: http://edunet.sp.gov.br /idesp,
acesso em 06 de janeiro de 2009.
107
ANEXO 1
Quadro Comparativo das primeiras entrevistas
Caracterização das Participantes
Objetivos Profª. Eunice Profª. Cristina Profª. Beatriz
Caracterização dos
participantes da
pesquisa
Itabuna, têm 6
irmãos; 36 anos,
casada, com filhos
Belo Horizonte têm
10 irmãos 42 anos,
casada, com filhos.
Salvador, 43 anos,
tem nove irmãos,
viúva; sem filhos.
Início da experiência
profissional
Casa de família Casa de família
Empresa de
Informática
Como se tornaram
professora?
Falta de opção Problemas de saúde
Desejo de ser
professora
Motivos para escolha
da Formação
Superior
Gosto pela leitura;
Fez Letras.
Queria fazer Letras,
mas fez Educação
Artística.
Pedagogia
Dificuldades para
conclusão dos
estudos
Muitas dificuldades
financeiras
Não relata
dificuldades
financeiras, mas sim
o medo da profª. da
1ª série
Não teve
dificuldades, teve
apoio e incentivo da
família.
Início da experiência
na Educação
Estagiária Estagiária Profª. Eventual
Satisfação pela
escolha profissional
Admiração pela
profissão
Tem prazer em
ensinar, mas não tem
paciência.
Gosto do que faço e
não saberia fazer
outra coisa
108
Quadro Comparativo das segundas entrevistas
Rendimento dos alunos
Objetivos Profª. Eunice Profª. Cristina Profª. Beatriz
Rendimento da turma
Clareza no diagnóstico
da turma e
identificação das
dificuldades
Não apresenta clareza
no rendimento da
turma, justifica essa
dificuldade em razão
do pouco tempo que
está com eles.
Associa a melhora no
rendimento e na
disciplina ao bom
relacionamento que
tem com eles.
Principais motivos das
dificuldades dos alunos
Associa o baixo
rendimento as
dificuldades e
apresenta
envolvimento com os
alunos e com os
problemas de saúde
dos mesmos
Atribui o baixo
rendimento á
indisciplina dos alunos
Associa a dificuldade
dos alunos aos
problemas de saúde e
apresenta
envolvimento com os
alunos e com os
problemas de saúde
dos mesmos
Providências tomadas
em relação às
dificuldades dos alunos
Diversifica as
atividades, mas atribui
grande parte da
responsabilidade a
falta de
acompanhamento dos
pais.
Exige e cobra as
atividades e atribui
grande parte da
responsabilidade a
falta de
acompanhamento dos
pais.
Diversifica as
atividades, mas
reconhece que não
tem atingido, atribui
essas dificuldades a
problemas de saúde e
não aceitação da mãe.
Papel atribuído aos
pais no
desenvolvimento da
aprendizagem
Considera
fundamental o
acompanhamento dos
pais
Considera
fundamental o
acompanhamento dos
pais
Considera
fundamental o
acompanhamento dos
pais
Relação da escola com
os pais
Coloca a fragilidade da
relação dos pais com
a escola
Coloca a fragilidade da
relação dos pais com
a escola
Atribui à melhoria de
sua turma a
participação dos pais
Solução encontrada
para as dificuldades de
aprendizagem
Espera melhorias,
considera importante
que houvesse na
escola, aulas de
reforço. Porém
encontra na retenção
a solução para quem
tem dificuldades
Encontra na retenção
a solução para quem
tem dificuldades e
acredita que quando a
retenção se
concretiza, os pais
aparecerão para
reclamar.
Apresenta
preocupação com o
futuro do aluno que
será promovido sem
condições; realiza
recuperação paralela.
Reconhece a
necessidade de aula
de reforço, para as
dificuldades
específicas.
109
Quadro Comparativo das terceiras entrevistas
Identificação das Estratégias de leitura
Objetivos
Profª. Eunice Profª. Cristina Profª. Beatriz
Identificação dos tipos de
Estratégias de Leitur
a
utilizadas
Faço de duas formas:
leitura livre e
compartilhada; Lembra
da estante? Então os
livros de lá, podem ser
lidos quando eles
terminam a atividade em
sala, além de levarem
para casa Para não ficar
muito repetitivo, às vezes
eu organizo uma aula
diferente peço para os
alunos trazerem tapete e
almofada de casa e
montamos aqui na sala
uma roda de leitura; Ás
vezes nós fazemos leitura
compartilhada e às vezes
eu leio para eles; Faço a
leitura de produções dos
textos deles; Escolho um
tema que seja bom, e
fazemos à leitura
compartilhada ou eu
mesma leio para eles;
também faço leitura
diária com eles; Escolho
um tema que seja bom, e
fazemos a leitura
compartilhada ou eu
mesma leio para eles; Eu
escolho temas que eles
gostem se não, eles não se
interessam.
No início eu escolhia um
texto, do livro deles, mas
percebi que não era
muito produtivo, pois
como eles conheciam o
texto, não se
concentravam na leitura
e aí se dispersavam
demais.
Depois passei a escolher
os textos, com temas do
dia-a-dia, com títulos que
chame atenção; A partir
daí, eu mesma faço a
leitura para os alunos e
aproveito para
demonstrar a pontuação e
entonação correta; Faço a
leitura compartilhada e
aproveito para fazer as
correções; Eu leio depois
eles lêem e no final
debatemos o tema.
Motivar meus alunos a
ler sempre; Começamos
sempre, com uma roda
de conversa, sobre
atualidades; Leio a
notícia para eles e
exploro o tema; Sempre
procuro trazer um
assunto que possa ser
depois discutido;
Proponho que eles se
imaginem como autores
e escrevam algo sobre o
assunto como acharem
melhor pode ser em
forma de Poesia, Música,
História, Desenho; Eu
sempre pergunto quem
gostaria de ler para nós?
Eu não imponho nada;
Um dia eu leio, e outro
dia, eu convido eles a ler
para todos; Na 6ª feira,
como é o dia deles. Eu
deixo que eles escolham
algo para trazer para ler;
antes deixo eles sentados
em dupla (quem sabe
mais com quem tem mais
dificuldade), para
fazerem a leitura
silenciosa; Agora no meu
dia que é 4ª feira, ás
vezes leio algo que eu já
escolhi, discutido na roda
de conversa; Ás vezes
escolho, as melhores
produções deles, mas não
falo quem escreveu; No
Sábado eu tento dar uma
atenção especial, para a
leitura dos que
apresentam mais
dificuldades; Neste dia,
eu tomo a leitura desses
com dificuldades e
normalmente utilizo os
clássicos, que ele já sabe
de cor o fato deles já
conhecerem a seqüência,
110
motiva mais.
Dificuldades encontradas
no desenvolvimento d
a
compreensão leitora
No começo eu tive muitas
dificuldades para os
alunos fazerem leitura
compartilhada, pois eles
se dispersavam demais e
tinham muitas
dificuldades.”; “Ás vezes
eu organizo uma aula
diferente... Só que não dá
para fazer sempre, porque
ocupa muito tempo,
temos que tirar tudo do
lugar e depois colocar
novamente embora eles
gostem, dá muito trabalho
e não dá para fazer
sempre; Sentem vergonha
de ler para os colegas”.
Nesta sala não é possível
fazer leitura silenciosa
eles não se concentram e
acaba virando bagunça;
Há muita resistência por
parte de alguns alunos,
por causa das
dificuldades que eles
têm. Por exemplo, tem
uma aluna com
problemas de visão que
se recusa a ler; Dou a
oportunidades a todos,
mas se não quer eu não
insisto depois eu chamo
individualmente, peço
que leia só para mim.
Oralmente eles são bons,
mas na hora de escrever,
apresentam mais
dificuldades do que de
ler.; Eu só me preocupo
mesmo, com quem tem
dificuldades, já são
repetentes, eu não posso
segurá-los. É uma pena
vão para a 5ª série,
ficarão jogados, ninguém
vai se preocupar com
eles.”
Resultados obtidos po
r
meio das estratégias
mencionadas
Embora, os pais, não
façam o acompanhamento
necessário, até que houve
avanços. Eles estão lendo
bem melhor do que no
começo do ano; Só de
cobrarem um pouco, já
melhora. Pois se depender
só das aulas fica difícil.
Eles se divertiram muito.
Quando fizemos o
debate, sobre o que é
mais importante na vida:
Se é a honestidade ou a
esperteza?
Eu fiquei muito
decepcionada quando vi
que a maioria deles,
achou que era a
esperteza. Eu tive que
explicar para eles, a
importância da
honestidade. Mas não sei
se convenci todos. A
educação que eles
recebem não prioriza
estes valores.
Com certeza, até os que
têm mais dificuldade,
gostam da aula de leitura.
“Eles adoram serem
elogiados, sempre se
esforçam para escrever
melhor; Utilizo os
clássicos, que ele já sabe
de cor. O fato deles já
conhecerem a seqüência,
motiva mais.”; Eles são
muito curiosos, eu
aproveito esta
curiosidade para tudo.
Você sabe que por causa
disso, eu percebo que
eles estão mais
interessados em ler tudo.
No Simulado do
SARESP. Eles estavam
muito preocupados. E
“eu já tinha dito para
eles, a importância de
ler, reler, tirar as dúvidas
e só depois responder”.
“Eu percebi que eles não
responderam direto, de
qualquer jeito”. “É muito
gostoso saber que aos
poucos, eles estão
mudando e aumentando
o interesse; Eu acho que
eles estão gostando mais
de ler do que escrever”.
Preferências dos alunos e
m
relação à aula de leitura
Gostam muito, só que
eles preferem que eu faça
a leitura; Por causa dos
erros dos colegas, fica
mais difícil de entender;
Temas do dia-a-dia, com
títulos que chame
atenção.”; Coisa
interessante e que eles
não conhecem; Na
Você sabe que eles
gostam muito de poesias.
111
Eles gostam de aventura,
suspense e também de
atualidades. Eu procuro
variar os temas, e não leio
algo que eles já
conhecem. Porque se não,
eles não se interessam
verdade eles preferem
que eu faça a leitura, pois
quando todos lêem a
compreensão não é a
mesma
Estratégias utilizadas co
m
quem têm dificuldades n
a
compreensão leitora?
Nesses dias, fica
complicado. Mas aqueles
que têm muitas
dificuldades, eu faço eles
lerem só para mim,
depois; Eles preferem,
pois também sentem
vergonha de ler para os
colegas.
Dou a oportunidades a
todos, mas se não quer
eu não insisto. Depois eu
chamo individualmente,
peço que leia só para
mim.
Os que têm maiores
dificuldades eu tomo
leitura individual. Deixo
que eles treinem em casa,
e escolham o que querem
ler para mim. “Deixo
eles sentados em dupla
(quem sabe mais com
quem tem mais
dificuldade), para
fazerem a leitura
silenciosa.”
“... no Sábado eu tento
dar uma atenção
especial, para a leitura
dos que apresentam mais
dificuldades. Pois nesse
dia, sempre tem menos
aluno. Então dá para
tomar a leitura individual
deles.”
“...normalmente utilizo
os clássicos, que ele já
sabe de cor. O fato deles
já conhecerem a
seqüência, motiva mais
112
ANEXO 2
Tabulação das primeiras entrevistas:
Caracterização das
Participantes
P
P
r
r
o
o
f
f
º
º
O
O
b
b
j
j
e
e
t
t
i
i
v
v
o
o
s
s
P
P
e
e
r
r
g
g
u
u
n
n
t
t
a
a
s
s
R
R
e
e
s
s
p
p
o
o
s
s
t
t
a
a
s
s
Eunice
Conhecer as
professoras e fazer a
caracterização dos
participantes da
pesquisa.
Gostaria que me informasse
alguns dados pessoais em
relação a sua idade, estado
civil, formação. E me falasse
também sobre sua origem
familiar.
Nasci em Itabuna na Bahia e tenho 36 anos.
Sou casada, tenho três filhos. Minha família
é toda de lá. Tenho seis irmãos, sendo três
homens e duas mulheres.
Cristina
Tenho 42 anos e sou viúva, não tenho filhos.
Nasci em Belo Horizonte, Minas Gerais.
Tenho muitos irmãos, ao todo dez.
Beatriz
Sou de Salvador e casada, tenho um filho e
43 anos. Tenho nove irmãos.
Eunice
Conhecer a trajetória
profissional das
professoras
Gostaria também de saber
sobre sua trajetória
profissional?
Eu comecei trabalhar em casa de família
quando tinha 12 anos. Eu precisava ajudar
no sustento da casa e também queria
terminar meus estudos.
Cristina
Gostaria também de saber
sobre sua trajetória
profissional?
Eu comecei trabalhar aos dezessete anos.
Trabalhei em casa de família por dois anos.
Depois trabalhei por três anos, como
operadora de caixa e um ano em na linha de
Montagem de uma empresa.
Beatriz
Gostaria também de saber
sobre sua trajetória
profissional?
Eu comecei minha carreira, em uma
empresa de Informática e depois trabalhei
durante quatro anos em uma escola
estadual, como escrituraria e depois
secretária. Depois eu exonerei por que eu
não gostava do que eu fazia.
Eunice
E como você se tornou
professora?
Na minha cidade, tinha poucas opções para
prosseguir os estudos, só tinha
Contabilidade e Magistério. Contabilidade
não me interessava então acabei fazendo
Magistério, também por esse motivo.
Cristina
Como à senhora se tornou
professora?
Me casei, tive problemas na coluna e fiquei
sem poder trabalhar. Nesse período dei aula
de Reforço em minha casa, para meus
sobrinhos. Minha cunhada gostou tanto, que
espalhou para outras pessoas. Comecei a
dar aulas para outras crianças, filhas de
umas amigas delas. Cheguei a ter vinte
crianças.
113
Beatriz
Foi essa experiência na
escola, que motivou a se
tornar professora?
Não. Eu me tornei professora, por ser de
uma família de professoras. Todas as
minhas tias por parte de mãe são
professoras. Desde pequena, eu já brincava
de ser professora. Minha mãe sempre me
incentivou, pois ela achava que ser
professora era uma boa escolha, que me
ajudaria pagar a faculdade.
Eunice
Conhecer os motivos
da escolha da
Formação Superior.
E como foi o ingresso no
ensino superior?
Você fez Magistério, porque
era a melhor opção que tinha
naquele momento, fez Letras
porque gostava de ler e
Pedagogia teve alguma
razão especial?
Como eu gostava muito de ler e desde
pequena achava isso muito importante. Eu
resolvi fazer Letras. Olha eu me dedique
muito! Fiquei inclusive doente para conciliar
tudo. Apesar de exigirem demais, eu aprendi
muito, pois era um curso difícil, mas que me
acrescentou muito. Depois acabei fazendo
pedagogia, que não foi tão bom. Foi á
distância e eu senti muita diferença com a
formação de Letras. Achei que foi meio
jogado, não tinha a mesma exigência e
acompanhamento. Mas mesmo assim, acho
que foi uma experiência necessária.
Na verdade eu fiz, porque quero montar uma
pré-escola futuramente, essa é a minha
intenção.
Cristina
Depois do Magistério, qual
foi sua formação?
Qual foi o motivo dessa
escolha?
Tenho Licenciatura Plena em Educação
Artística.
Eu sempre gostei de atividades manuais e
tenho mais oportunidade, pois têm muita
concorrência na área de Letras.
Beatriz
Além do Magistério, qual é a
sua formação?
Em 2000, eu resolvi fazer Pedagogia, para
aprofundar meus conhecimentos e aprendi
muito.
Eunice
Conhecer como foi a
experiência inicial na
educação.
Como foi sua experiência no
Magistério?
Foi mais fácil, pois eu já estava trabalhando.
Quando iniciei em 91, resolvi pedir ao
prefeito uma oportunidade para lecionar,
como estagiária. Ele deixou e já estou a
dezessete anos nesta profissão.
Foi muito boa, eu aprendi muito. Eu gostava
muito do que fazia e tinha uma boa relação
com os alunos. Eu gostava muito de ler e lia
bastante com eles. Depois de algum tempo,
eu tive que sair desse emprego, pois me
casei e vim para São Paulo.
Cristina
Quando foi que a senhora,
iniciou a lecionar na escola?
Na escola, iniciei como estagiária e nessa
época recebia remuneração. Depois atuei
como eventual e algum tempo depois,
comecei a pegar sala. Desde 2002, pego
sala nessa mesma escola. Só nesse ano
tive dificuldades. Você imagina que nesse
ano eu tenho uma aluna, que já foi minha
quando eu comecei aqui em 2002?
Beatriz
E como foi sua experiência
inicial como professora?
Em 1988, eu comecei a lecionar como
professora eventual. Inclusive onde eu
comecei, encontrei várias professoras da
época que eu estudava.
114
Eunice
Conhecer as
dificuldades para
concluir os estudos
O que mais você se lembra
dessa época?
Tive muitas dificuldades para concluir o
ensino básico, pois morava com minha avó
na fazenda e ela achava que só precisava
aprender a escrever o nome. Quando fui
para a cidade tive que estudar inclusive em
uma escola particular, pois na escola pública
não me aceitaram por que já tinha passado
da idade e eu não tinha documentos.
Eu me esforcei muito, eu não tinha sequer
calçado para ir para a escola.
Eu pedia emprestado de uma colega. Nós
calçávamos o mesmo número e ela me
emprestava, por que eu insistia muito, mas
não gostava. Eu esperava ela chegar da
escola e pegava emprestado. Lembro-me
que era um quichute.
Eu sempre dava um jeito, oferecia para fazer
algo para ela em troca. Eu lavava louça ou
outro serviço qualquer e ela acabava
concordando.
Depois de algum tempo, eu comecei a
trabalhar em casa de família e fui superando
as dificuldades.
Cristina
Não foi feita uma pergunta
específica. A professora fez
essas colocações
espontaneamente, quando
se referia a seus alunos.
Não faz menção de
dificuldades de ordem
financeira
Eu tinha medo da minha professora da 1ª
série. Eu não conseguia aprender por causa
do jeito dela. Depois que eu mudei de sala e
a professora nova, foi paciente comigo. Eu
superei minhas dificuldades e consegui
aprender sem problema algum.
Beatriz
Há algo mais em sua
experiência profissional, ou
na realização de seus
estudos que você gostaria de
falar?
O que mais você se lembra,
dessa época?
Eu nasci na Bahia e vim para cá aos três
anos. Minha família era grande, somos nove
irmãos e passamos por muitas dificuldades.
Agora nos estudos, eu não tive dificuldades
para realizá-los. Sempre estudei em escola
pública e me lembro com saudades da
merenda da escola, pois era de ótima
qualidade.
Meu pai sempre foi metalúrgico e minha mãe
era doméstica, mas mesmo de origem
simples, incentivavam os filhos a estudar.
Como eu tinha muitos irmãos, os mais
velhos cuidavam, dos mais novos. Nós
passamos por dificuldades, mas sempre
fomos muito unidos. Você acredita que
dividíamos até o uniforme?
Mesmo minha mãe trabalhando muito, nunca
faltava nas reuniões e sempre acompanhava
nossas lições. Lembro que ela empilhava os
cadernos, na mesa da cozinha e olhava um
por um.
115
Eunice
Conhecer a
satisfação dos
professores em sua
escolha profissional
Resposta espontânea
quando se referia ao desejo
de ser professora
Bem! Eu tinha muita admiração por esta
profissão. Achava muito bonito ser
professora e sempre pensava na
possibilidade de um dia me tornar uma. Eu
ficava pensando, se eu seria uma boa
professora.
Cristina
Mesmo não sendo sua
primeira escolha, a senhora
gosta do que faz?
Tenho prazer em ensinar! Mas não tenho
muita paciência! Apesar de gostar deles, não
sei ficar agradando e quando precisa dou
bronca.
Beatriz
1)Apesar do incentivo, você
considera que fez a escolha
certa?
2) Apesar das dificuldades,
você está satisfeita com seu
trabalho?
1)Eu considero que sim. Pois as minhas
irmãs, apesar de terem feito a mesma
escolha, fizeram outras formações em outras
áreas e vivem me incentivando a mudar.
Mas eu não tenho vontade. Gosto do que
faço.
Eu já recebi até outros convites, para atuar
na vice-direção e direção. Mas eu nunca
aceitei, por que eu estou feliz com minha
escolha.
2) Esta é a primeira vez, que eu leciono para
a 4ª série, pois minhas amigas diziam que
não era bom, por causa da indisciplina. Mas
eu estou me realizando e amando o que eu
estou fazendo.
Eu gosto do que faço, eu adoro estar aqui
com eles. Sei que eles gostam também de
mim e isso me faz bem. Acho que não
saberia fazer outra coisa, a não ser lecionar.
116
Segunda Entrevista – Rendimento dos alunos
P
P
r
r
o
o
f
f
º
º
O
O
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R
R
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p
o
o
s
s
t
t
a
a
s
s
Eunice
Conhecer o
rendimento da turma.
1) Como é a turma?
2) Como está o rendimento e
as dificuldades que eles
têm?
1) É uma turma boa! Tem 41 alunos. São
freqüentes, só tem um que foi transferido
recentemente. No geral eles são bons.
2) Ah! Agora estou mais tranqüila. Eles estão
com rendimento mais satisfatório. Os que
estão pintados de amarelo (37) são os
alfabéticos, que tem erros de ortografia, mas
já sabem ler e escrever. Tirando o que foi
transferido, só tem três que ainda não atingiu
o esperado.
Cristina
1) Como está o rendimento
da turma?
2) A senhora está com eles
há quanto tempo?
3)Durante esse pouco
tempo, a senhora conseguiu
avaliar como está o
rendimento deles?
4) E como à senhora avalia,
atualmente o rendimento
deles?
5)Considerando esta
realidade e as dificuldades
encontradas, como você
considera o rendimento
deles?
1) Olha, eu peguei o bonde andando... Estou
com eles há pouco tempo...
2) Há estou a mais ou menos dois meses.
Eles estavam ficando com professoras
eventuais, pois a professora da sala está
afastada para a Coordenação de outra
escola.
3)Bem, apesar deles estarem classificados
desde o início do ano, como ortográficos. Na
minha opinião esta avaliação não está
correta. Mas como não posso interferir no
trabalho da colega, não vou dizer nada sobre
isso e vou fazer a minha parte.
4) Bom, nesta sala tem quarenta alunos.
Com exceção de uma aluna, que é faltosa,
os outros são freqüentes.
5)Dentro do possível eles estão melhorando.
Agora com o SARESP chegando, é que
vamos ter certeza dessa melhoria.
Beatriz
1)Como está rendimento dos
alunos?
2)A que se deve essa
melhoria de comportamento?
3)Bom, deu para perceber
que a relação entre a
senhora e os alunos é boa e
isso favorece a
aprendizagem. Mas em
relação ao rendimento, como
eles estão?
4)A senhora tem muitos
alunos, com dificuldades?
5)Mesmo com esses
problemas identificados,
como tem sido
aprendizagem desses
alunos?
1)A sala é ótima! Mas não era no início.
Tinha alunos que eram extremamente
indisciplinados e que hoje se comportam de
forma adequada
2)Há eu tenho com eles um ótimo
relacionamento. Eu sempre procuro
conscientizá-los sobre a importância dos
estudos, da leitura e da necessidade deles
ajudarem seus pais no futuro. Converso
muito com eles, sobre o que vai acontecer o
ano que vem, quando estarão na 5ª série e
das mordomias que vão perder. Eu tenho
muita afinidade com eles. Há alguns pais
que também se preocupam e isso ajuda
bastante. Relata exemplos de sua
afinidade...
3)Bom, sempre têm alguns com dificuldades.
E esses, eu coloco do meu lado e converso
com eles, para melhorar. Mas quando não
produzo, eu não deixo fazer Educação
Física. Como eles são muito freqüentes
inclusive nas aulas de sábado, eu tento
117
recuperá-los durante as aulas, com
atividades específicas para suas
dificuldades.
A sala é bem cheia, no começo eu tinha
quarenta e um aluno. Só houve um
desistente, um transferido e um
reclassificado. Agora tenho 38 freqüentes,
sendo desses, cinco repetentes.
4) Sim os repetentes. Tem um deles que tem
problema de saúde (epilepsia), um faz
acompanhamento psicológico, e um tem
problema de aprendizagem mesmo, mas a
mãe não aceita. Os outros dois eram
problema de indisciplina, mas melhoraram
muito.
5) Mesmo assim eles têm avançado. Há
quatro silábicos com valor sonoro, que tem
avançado muito. Agora tem um que ainda
está pré-silábico, e que infelizmente não
avançou nada, só escreve o primeiro nome.
Eunice
Identificar os
principais motivos
das dificuldades dos
alunos.
Qual é o motivo que levam
estes alunos a não atingirem
o esperado?
Ah! Eles têm muitas dificuldades e até já
avançaram muito! E entre eles há uma aluna
que é considerada pelos pais e por ela
mesma, como tendo problema de cabeça e
por essa razão é acompanhada pelo
Psicólogo.
Cristina
Considerando esta realidade
e as dificuldades
encontradas, como você
considera o rendimento
deles?
Olha, eles são muito indisciplinados.
Conversam demais, são muito agitados e
sem limites. Isso prejudica muito o
rendimento deles.
Beatriz
A senhora tem muitos
alunos, com dificuldades?
Tem um deles que tem problema de saúde
(epilepsia), um faz acompanhamento
psicológico, e um tem problema de
aprendizagem mesmo, mas a mãe não
aceita. Os outros dois eram só problema de
indisciplina, mas melhoraram muito.
Eunice
Providências
tomadas com
relação às
dificuldades dos
alunos
E no caso dela e dos outros
que tem dificuldade o que é
feito, para melhorar a
aprendizagem
Procuro fazer o melhor que posso. Tento
atividades diferenciadas. Mas eles
apresentam muitas dificuldades. Apesar de
avançarem muito, ainda não é o suficiente.
Acho que falta também acompanhamento
dos pais. Pois esses que têm mais
dificuldades, os pais são completamente
ausentes.
Cristina
O que é possível fazer, para
que a indisciplina, não
prejudique a aprendizagem?
Eu tenho pegado no pé deles e exigido
bastante. Mas infelizmente, os pais não
fazem o papel deles de acompanhar os
filhos.
Eu passo lição de casa, olho os cadernos,
peço para os pais que verifiquem também. E
quando preciso, eu chamo os pais para
conversar por bilhete. Mas nem sempre, eles
lêem os bilhetes e comparecem.
Eu tenho feito o possível, e aqueles que se
interessam tem conseguido acompanhar,
agora os que têm dificuldades e os pais não
118
acompanham fica mais difícil.
Beatriz
1)A que se deve essa
dificuldade desse aluno?
2) Pela conversa que você
teve com a mãe, por que ela
não procurou ajuda?
3) Nesse caso, como fica a
aprendizagem dele?
1) Ele já está aqui desde a 2ª série e sempre
apresentou dificuldades. Na reunião de pais
eu procurei saber da mãe, quais eram as
causas dessas dificuldades. A mãe me
contou que caiu um tanque na cabeça dele,
mas que ele não teve seqüelas.
Como ele é uma criança aparentemente
saudável e vaidosa, a mãe não acredita que
ele tenha problema. Eu já conversei muito
com a mãe dele, tentei conscientizá-la.
Inclusive soube que ele já foi encaminhado
pela Coordenação, para acompanhamento
psicológico. Mas pelo que entendi, não
houve nenhuma providência por parte da
mãe.
2) Ela não aceita as limitações do filho.
Prefere acreditar que está tudo bem.
3) Eu faço o melhor que posso. Preparo
atividades, que ele consegue fazer, mas não
tenho tido sucesso.
(Mostra uma atividade que só constava o
primeiro nome do aluno e a escrita de várias
palavras, sem relação com o que havia sido
proposto).
Ta vendo, ele ainda é pré-silábico, ele usa
letras que ele conhece de forma aleatória.
Ele deve ter algum problema. Já era para ele
estar bem melhor. Mas como a mãe não
aceita, não se pode fazer nada, além do que
tenho feito.
Eunice
Compreender o
papel atribuído aos
pais no
desenvolvimento da
aprendizagem
O que você considera
importante, que os pais não
fazem?
Ah! Pelo menos que tomassem
conhecimento, das dificuldades dos filhos e
os ajudasse nas tarefas e na leitura. Que
demonstrassem mais interesse.
Cristina
Qual seria o
acompanhamento adequado
que os pais poderiam fazer,
em relação às dificuldades
na aprendizagem?
Eles tinham que cobrar mais dos filhos, não
deixar faltar sem motivo, exigir que eles
fizessem suas lições de casa, olhar os
cadernos. Mas eles se quer, vêem nas
reuniões.
Beatriz
Afirmação feita
espontaneamente pela
professora
1)A que você atribui, essa
necessidade maior do
professor nos alunos do
estado?
“Eu acho que os alunos do estado precisam
mais do professor do que o aluno do
particular”
1)Pela falta de acompanhamento. No
particular, como os pais pagam, eles exigem
mais dos filhos e a carência é também
menor.
Eunice
Compreender a
relação da escola
com os pais
1)Você já solicitou ajuda,
destes pais?
2) Além da reunião, você já
convocou outras vezes, os
pais desses alunos?
1)Sim. Só que na Reunião de Pais, os que
comparecem, são sempre os pais dos bons
alunos. Os que têm dificuldades, nunca vêm
ninguém. Então fica muito difícil.
2) Já, mais não adianta! Eles alegam que
trabalham e não comparecem mesmo assim.
119
Cristina
A freqüência na última
reunião, não foi boa?
É sempre aquela história. Os pais dos
alunos que realmente tem dificuldades,
nunca comparecem.
Beatriz
A que se deve essa melhoria
de comportamento?
Há alguns pais que também se preocupam e
isso ajuda bastante.
Eunice
Solução encontrada
para as dificuldades
de aprendizagem
O que é feito nesses casos?
1)Se eles não atingirem o esperado até o
final do ano, como estão na 4ª série, serão
retidos. Porque não irão conseguir
acompanhar o ritmo do ginásio. Sendo assim
é melhor que façam novamente a 4ª série.
Na verdade seria bom, que eles
freqüentassem aulas de reforço. Só que aqui
na escola não tem turmas, por causa do
espaço, pois temos aulas inclusive nos
Sábados. O trabalho fica muito difícil, mas
mesmo assim vamos ver o que vai dar, falta
ainda um bimestre. Espero que até lá, eles
melhorem e possam ser promovidos.
Cristina
E o que se faz nesses
casos?
Vamos para o último bimestre, quando
algum for retido, aí o pai vai aparecer, para
reclamar e achar que tem razão. Nem todos
têm conhecimento das dificuldades dos
filhos.
Beatriz
1)No caso dele que já foi
retido, o que será feito?
2) A senhora considera que
esta recuperação, durante as
aulas é suficiente e tem dado
resultados?
1)Não tem jeito, ele vai desse jeito para 5ª
série e lá vai ficar pior, pois nem todo mundo
tem paciência, e sabe acompanhar as
dificuldades dele. Até que a mãe se
convença e faça um diagnóstico médico,
para ver o que fazer com ele.
“Como eles são muito freqüentes inclusive
nas aulas de sábado, eu tento recuperá-los
durante as aulas, com atividades específicas
para suas dificuldades.”
2)Não é. Eles precisavam mesmo de aulas
de reforço, fora da sala, para que tivessem
mais atenção. E que fosse trabalhada só, a
sua dificuldade. Mas como não dá para
montar turma, por causa da falta de espaço
e de horário. Agente faz o que pode. De
modo geral eles vão melhorando, só os que
têm realmente muitas dificuldades é que é
difícil progredir.
120
Terceira Entrevista – Identificação das Estratégias de leitura
Profº Objetivos Perguntas
Respostas
Eunice
Identificação dos
tipos de Estratégias
de Leitura utilizadas
1)Nessa entrevista, gostaria
que me falasse sobre as
estratégias que você usa nas
aulas de leitura?
2) Você acha que os pais,
ajudaram de que forma?
3) E como são as aulas de
leitura livre?
4) Além dessas atividades,
você utiliza outras
estratégias de leitura?
5) Neste dia a leitura é
realizada de que forma?
6) Tem mais alguma
estratégia que a senhora
utilize?
7) E essa leitura, como é
realizada?
8) Como é feita a escolha
desses temas?
9 Você diz que este tipo de
leitura é feita diariamente.
Neste caso têm algum
momento específico para
realizá-la?
1)Eu faço de duas formas: leitura livre e
compartilhada.”
“Decidi escolher um gênero do livro deles. E
pedi que treinassem em casa com seus pais.
2) Só de cobrarem um pouco, já melhora.
Pois se depender só das aulas fica difícil.
“Nas escolas não tem Biblioteca. Aqui nessa
escola, até sei que tem alguns livros. Mas
ainda não foram disponibilizados. Acho que
tem que ter alguém, para fazer isso. Por
isso, eu mesma improvisei essa estante aqui
na sala.”
3) Lembra da estante? Então os livros de lá,
podem ser lidos quando eles terminam a
atividade em sala, além de levarem para
casa.
4) Para não ficar muito repetitivo, às vezes
eu organizo uma aula diferente: Peço para
os alunos trazerem tapete e almofada de
casa e montamos aqui na sala uma roda de
leitura. .
5) Ás vezes nós fazemos leitura
compartilhada e às vezes eu leio para eles.
6) Também faço a leitura de produções dos
textos deles. E aproveito para fazer a
correção dos erros de concordância. São
muitos erros e essa é uma boa hora. Pois eu
vou mostrando para eles, qual é a forma
correta.
“A única coisa que eu me esqueci de dizer, é
que além dessas atividades. Eu também
faço leitura diária com eles.”
7) Eu escolho um tema que seja bom, e
fazemos a leitura compartilhada ou eu
mesma leio para eles.
8) Eu escolho temas que eles gostem se
não, eles não se interessam.
9) Quando inicia a aula ou após o recreio,
pois eles ficam muito agitados e a leitura
acalma.
Cristina
1)Gostaria de conhecer as
estratégias de leitura
utilizadas por você, com esta
turma.
2) Como à senhora resolveu
esta questão?
3) Após selecionar os temas,
o que a senhora faz?
4) Há uma freqüência para a
1) No início eu escolhia um texto, do livro
deles. Mas percebi que não era muito
produtivo, pois como eles conheciam o texto,
não se concentravam na leitura e aí se
dispersavam demais.
2) Depois de descobrir isso, eu passei a
escolher os textos, com temas do dia-a-dia,
com títulos que chame atenção. Eu vou
inclusive buscar os meus livros do Letra e
121
realização destas atividades
de leitura?
5) E como acontece nestes
momentos de leitura diária?
6) O que eles acharam da
história?
7) Como à senhora pretende
enfatizar esses valores
importantes para eles?
Vida, que tem muita coisa interessante e
que eles não conhecem. Sabe como é 4ª
série? Dependendo do que for eles não se
interessam mesmo.
3) A partir daí, eu mesma faço a leitura para
os alunos e aproveito para demonstrar a
pontuação e entonação correta. Em seguida
eu faço a leitura compartilhada e aproveito
para fazer as correções.
4) Normalmente as aulas de leitura
acontecem na 4ª ou 5ª feira, mas fora disso,
há também uma rotina diária.
5) Nessa leitura diária fazemos a mesma
coisa, eu leio depois eles lêem e no final
debatemos o tema.
“Ontem nós fizemos uma leitura muito
interessante de um texto chamado “Sopa de
Pedra” de Pedro Malazarte, que conta a
história, de um homem muito esperto, que
sabe tirar proveito de todas as situações.”
6) Eles se divertiram muito. Só que quando
fizemos o debate, sobre o que é mais
importante na vida: Se é a honestidade ou a
esperteza?
Eu fiquei muito decepcionada quando vi que
a maioria deles, achou que era a esperteza.
Eu tive que explicar para eles, a importância
da honestidade. Mas não sei se convenci
todos. A educação que eles recebem não
prioriza estes valores.
7) Essa forma eu acho que é legal, pois eles
se divertem com as histórias, e quem tem
interesse acaba aprendendo as coisas boas.
Beatriz
1)O objetivo da entrevista de
hoje é falar sobre as
estratégias de leitura,
utilizadas com esta turma.
2) Todas as suas aulas de
leitura iniciam com uma roda
de conversa sobre
atualidades?
3) Da forma, como você
coloca, a senhora incentiva-
os a ler, com atualidades e
através da roda de conversa.
Agindo assim você percebe
que eles têm adquirido
prazer em ler
4) Como é feito nestas aulas
com os alunos que tem
dificuldades?
5) A senhora disse que um
dia lê para eles e no outro os
convida. Há uma rotina para
esta atividade?
6)Além da roda de conversa
1)O que eu faço, nas aulas de leitura. É
motivar meus alunos a ler sempre.
Começamos sempre, com uma roda de
conversa, sobre atualidades. Como exemplo
eu pego um artigo de jornal que trata sobre
violência, como o caso da Isabela. E assim
eu leio a notícia para eles e exploro o tema.
Falamos sobre a violência que há no bairro,
nas famílias.
“Eu gosto de fazer assim, pois esta é uma
forma deles se interessar e participar da
aula”
2) Eu sempre procuro trazer um assunto que
possa ser depois discutido. E depois peço a
eles que produzam algo, sobre o que
discutimos. Proponho que eles se imaginem
como autores e escrevam algo sobre o
assunto. Como acharem melhor pode ser em
forma de Poesia, Música, História, Desenho.
3) Com certeza, até os que têm mais
dificuldade, gostam da aula de leitura.
4) Eu sempre pergunto quem gostaria de ler
122
para iniciar, quais são as
outras estratégias utilizadas
nestes dias?
7) Há mais alguma estratégia
que a senhora utilize?
Obs: Nesse momento, um
vendedor pediu licença para
entrar na Sala e deixou com
a professora algumas
tabuadas, para serem
oferecidas aos alunos.
8) É mesmo, você percebe
que eles têm ampliado o
gosto pela leitura.
9) Algo mais que gostaria de
colocar sobre leitura?
para nós? Eu não imponho nada. Um dia eu
leio, e outro dia, eu convido eles a ler para
todos. Os que têm maiores dificuldades eu
tomo leitura individual. Deixo que eles
treinem em casa, e escolham o que querem
ler para mim.
5)Sim. Na 4ª feira é o dia, que eu faço a
leitura e na 6ª feira, eu abro para eles lerem.
6) Na 6ª feira, como é o dia deles. Eu deixo
que eles escolham algo para trazer para ler.
Antes deixo eles sentados em dupla (quem
sabe mais com quem tem mais dificuldade),
para fazerem a leitura silenciosa. E depois
faço o convite para fazerem a leitura.
Agora no meu dia que é 4ª feira, eu faço
diferente. Ás vezes leio algo que eu já
escolhi, discutido na roda de conversa. Ás
vezes escolho, as melhores produções
deles, mas não falo quem escreveu.
Elogio bastante faço com que a sala também
elogie, e só depois digo quem escreveu.
Eles adoram serem elogiados, sempre se
esforçam para escrever melhor.
Eu acho que isso faz com que eles percam o
medo de ler. Eles acabam se acostumando
com a rotina. E quando por alguma razão,
não é possível cumpri-la. Nossa eles me
cobram muito.
7) Você sabe que no Sábado eu tento dar
uma atenção especial, para a leitura dos que
apresentam mais dificuldades. Pois nesse
dia, sempre tem menos aluno. Então dá para
tomar a leitura individual deles. Com os
outros eu faço atividades de recorte,
colagem para não cansar tanto.
Neste dia, eu tomo a leitura desses com
dificuldades e normalmente utilizo os
clássicos, que ele já sabe de cor. O fato
deles já conhecerem a sequência, motiva
mais.
Obs: De posse da tabuada diz: Ta vendo
isso aqui. Eles não levam para casa sem
saber o que é não.
Nós lemos juntos. O que é? Para que serve?
Quanto custa, elaboramos um bilhete para
que os pais compreendam. Se não eles
chegam em casa , e não sabe nem dizer o
que isto significa. Eles são muito curiosos,
eu aproveito esta curiosidade para tudo.
Você sabe que por causa disso, eu percebo
que eles estão mais interessados em ler
tudo.
8) Eu notei isso no Simulado do SARESP.
123
Eles estavam muito preocupados. E eu já
tinha dito para eles, a importância de ler,
reler, tirar as dúvidas e só depois responder.
Eu percebi que eles não responderam
direto, de qualquer jeito.
É muito gostoso saber que aos poucos, eles
estão mudando e aumentando o interesse.
9) Eu acho que eles estão gostando mais de
ler do que escrever. Oralmente eles são
bons, mas na hora de escrever, apresentam
mais dificuldades do que de ler.
Eunice
Dificuldades
encontradas no
desenvolvimento da
compreensão leitora
“No começo eu tive muitas dificuldades para
os alunos fazerem leitura compartilhada,
pois eles se dispersavam demais e tinham
muitas dificuldades.”
“Ás vezes eu organizo uma aula diferente.
Só que não dá para fazer sempre. Porque
ocupa muito tempo. Temos que tirar tudo do
lugar e depois colocar novamente. Embora
eles gostem, dá muito trabalho e não dá
para fazer sempre.”
“Sentem vergonha de ler para os colegas.”
Cristina
1)Na leitura compartilhada os
resultados são melhores?
2) Como à senhora faz, com
os alunos resistentes?
“Nesta sala não é possível fazer leitura
silenciosa. Eles não se concentram e acaba
virando bagunça.”
1)Há muita resistência por parte de alguns
alunos, por causa das dificuldades que eles
têm. Por exemplo, tem uma aluna com
problemas de visão que se recusa a ler.
2) Dou a oportunidades a todos, mas se não
quer eu não insisto. Depois eu chamo
individualmente, peço que leia só para mim.
Beatriz
“Oralmente eles são bons, mas na hora de
escrever, apresentam mais dificuldades do
que de ler.”
“Eu só me preocupo mesmo, com quem tem
dificuldades, já são repetentes, eu não posso
segurá-los. É uma pena vão para a 5ª série,
ficarão jogados, ninguém vai se preocupar
com eles.”
Eunice
Resultados obtidos
as estratégias
mencionadas
1)E quais foram os
resultados?
2) Você acha que os pais,
ajudaram de que forma?
1) Embora, os pais, não façam o
acompanhamento necessário, até que houve
avanços. Eles estão lendo bem melhor do
que no começo do ano.
2) Só de cobrarem um pouco, já melhora.
Pois se depender só das aulas fica difícil.
Cristina
1 )O que eles acharam da
história?
1)Eles se divertiram muito.Quando fizemos o
debate, sobre o que é mais importante na
vida: Se é a honestidade ou a esperteza?
Eu fiquei muito decepcionada quando vi que
a maioria deles, achou que era a esperteza.
Eu tive que explicar para eles, a importância
da honestidade. Mas não sei se convenci
todos. A educação que eles recebem não
124
prioriza estes valores.
Beatriz
1) Agindo assim você
percebe que eles têm
adquirido prazer em ler.
1)Com certeza, até os que têm mais
dificuldade, gostam da aula de leitura.
“Eles adoram serem elogiados, sempre se
esforçam para escrever melhor.”
“Utilizo os clássicos, que ele já sabe de cor.
O fato deles já conhecerem a seqüência,
motiva mais.”
“Eles são muito curiosos, eu aproveito esta
curiosidade para tudo. Você sabe que por
causa disso, eu percebo que eles estão mais
interessados em ler tudo.
“No Simulado do SARESP. Eles estavam
muito preocupados. E eu já tinha dito para
eles, a importância de ler, reler, tirar as
dúvidas e só depois responder”. “Eu percebi
que eles não responderam direto, de
qualquer jeito”. “É muito gostoso saber que
aos poucos, eles estão mudando e
aumentando o interesse.”
“Eu acho que eles estão gostando mais de
ler do que escrever”.
Eunice
Compreender a
preferência s dos
alunos em relação a
aula de leitura
1)E eles gostam desta aula?
2) E eles falam o porquê da
preferência?
3) E qual é a preferência
deles?
1)Gostam muito, só que eles preferem que
eu faça a leitura.
2) Por causa dos erros dos colegas, fica
mais difícil de entender.
3) Eles gostam de aventura, suspense e
também de atualidades. Eu procuro variar os
temas, e não leio algo que eles já conhecem.
Porque se não, eles não se interessam.
Cristina
“Temas do dia-a-dia, com títulos que chame
atenção.”
“...coisa interessante e que eles não
conhecem”
“Na verdade eles preferem que eu faça a
leitura, pois quando todos lêem a
compreensão não é a mesma.”
Beatriz
“Você sabe que eles gostam muito de
poesias.”
Eunice
Conhecer as
estratégias utilizadas
com quem tem
dificuldades na
compreensão
leitora?
1)Na leitura compartilhada, o
que se faz com esses alunos
que tem dificuldades?
2) E eles concordam?
1)Nesses dias, fica complicado. Mas aqueles
que têm muitas dificuldades, eu faço eles
lerem só para mim, depois
2)Eles preferem, pois também sentem
vergonha de ler para os colegas.
125
Cristina
1)Como à senhora faz, com
os alunos resistentes?
1) Dou a oportunidades a todos, mas se não
quer eu não insisto. Depois eu chamo
individualmente, peço que leia só para mim.
Beatriz
1)Como é feito nestas aulas
com os alunos que tem
dificuldades?
1) Os que têm maiores dificuldades eu tomo
leitura individual. Deixo que eles treinem em
casa, e escolham o que querem ler para
mim.
“Deixo eles sentados em dupla (quem sabe
mais com quem tem mais dificuldade), para
fazerem a leitura silenciosa.”
“... no Sábado eu tento dar uma atenção
especial, para a leitura dos que apresentam
mais dificuldades. Pois nesse dia, sempre
tem menos aluno. Então dá para tomar a
leitura individual deles.”
“...normalmente utilizo os clássicos, que ele
já sabe de cor. O fato deles já conhecerem a
seqüência, motiva mais.
126
Anexo 3
TRANSCRIÇÕES DAS ENTREVISTAS
Professora Eunice
Data: 14/10/08
Primeira Entrevista
A entrevista aconteceu na Sala de aula, durante as aulas de Educação
Física.
A pesquisadora se dirigiu até a sala, aguardou a saída dos alunos, que
nesse dia foi um pouco mais demorada, pois os mesmos estavam ganhando sorvete
em comemoração ao Dia das crianças.
Pesquisadora: Tudo bem!
Professora: Tudo!
Pesquisadora: Podemos conversar agora?
Professora: Podemos.
Pesquisadora: Nessa entrevista professora, tenho o objetivo de conhecê-la
e saber sobre sua trajetória profissional. Gostaria então que me informasse alguns
dados pessoais em relação a sua idade, estado civil, formação. E me falasse
também sobre sua origem familiar.
Professora: Nasci em Itabuna na Bahia e tenho 36 anos. Sou casada,
tenho três filhos. Minha família é toda de lá. Tenho seis irmãos, sendo três homens e
duas mulheres. E eu sou a terceira.
Pesquisadora: Além desses dados, gostaria que você me contasse um
pouco mais sobre você e sua trajetória profissional.
Professora: Ah! Tudo bem!
Pesquisadora: Antes de iniciar na educação, você teve outra experiência
profissional.
Professora: Eu comecei trabalhar em casa de família quando tinha 12
anos. Eu precisava ajudar no sustento da casa e também queria terminar meus
estudos.
Pesquisadora: E como você se tornou professora?
Professora: Bem! Eu tinha muita admiração por esta profissão. Achava
muito bonito ser professora, e sempre pensava na possibilidade de um dia me tornar
uma. Eu ficava pensando, se eu seria uma boa professora. Tive muitas dificuldades
para concluir o ensino básico, pois morava com minha avó na fazenda e ela achava
que só precisava aprender a escrever o nome. Quando fui para a cidade tive que
estudar inclusive em uma escola particular, pois na escola pública não me aceitaram
por que já tinha passado da idade e eu não tinha documentos.
Pesquisadora: O que mais você se lembra dessa época?
Professora: Eu me esforcei muito, eu não tinha sequer calçado para ir para
a escola.
Pesquisadora: E como você fazia?
Professora: Eu pedia emprestado de uma colega. Nós calçávamos o
mesmo número e ela me emprestava, por que eu insistia muito, mas não gostava. Eu
esperava ela chegar da escola e pegava emprestado. Lembro-me que era um
quichute.
127
Pesquisadora: Mesmo com essas dificuldades, você conseguiu concluir?
Professora: Eu sempre dava um jeito, oferecia para fazer algo para ela em
troca. Eu lavava louça ou outro serviço qualquer e ela acabava concordando.
Depois de algum tempo, eu comecei a trabalhar em casa de família e fui
superando as dificuldades. Consegui terminar o fundamental e começar o
Magistério.
Pesquisadora: E como foi se deu a escolha pelo Magistério?
Professora: Na minha cidade, tinha poucas opções para prosseguir os
estudos, só tinha Contabilidade e Magistério. Contabilidade não me interessava
então acabei fazendo Magistério, também por esse motivo.
Pesquisadora: Como foi sua experiência no Magistério?
Professora: Foi mais fácil, pois eu já estava trabalhando. Quando iniciei em
91, resolvi pedir ao prefeito uma oportunidade para lecionar, como estagiária. Ele
deixou e já estou a dezessete anos nesta profissão.
Pesquisadora: E como foi essa primeira experiência na escola?
Professora: Foi muito boa, eu aprendi muito. Eu gostava muito do que fazia
e tinha uma boa relação com os alunos. Eu gostava muito de ler e lia bastante com
eles. Depois de algum tempo, eu tive que sair desse emprego, pois me casei e vim
para São Paulo.
Pesquisadora: Quando você chegou aqui, você continuou lecionando?
Professora: Sim e foi nessa época, que resolvi fazer faculdade também.
Pesquisadora: E como foi o ingresso no ensino superior?
Professora: Como eu gostava muito de ler e desde pequena achava isso
muito importante. Eu resolvi fazer Letras. Olha eu me dedique muito! Fiquei inclusive
doente para conciliar tudo. Apesar de exigirem demais, eu aprendi muito, pois era um
curso difícil, mas que me acrescentou muito.Depois acabei fazendo pedagogia, que
não foi tão bom. Foi á distância e eu senti muita diferença com a formação de Letras.
Achei que foi meio jogado, não tinha a mesma exigência e acompanhamento. Mas
mesmo assim, acho que foi uma experiência necessária.
Pesquisadora: Você fez Magistério, porque era a melhor opção que tinha
naquele momento, fez Letras porque gostava de ler e Pedagogia teve alguma razão
especial?
Professora: Na verdade eu fiz, porque quero montar uma pré-escola
futuramente, essa é a minha intenção.
Neste momento, um aluno pediu licença e solicitou a presença da
professora no pátio, dizendo que estava sendo organizada uma homenagem aos
Professores, pois era véspera do Dia dos Professores.
Assim, a pesquisadora teve que interromper a entrevista, pois não havia
mais como continuar.
A pesquisadora se despediu da professora e combinou o próximo encontro
para a próxima aula.
128
Data: 21/10/08
Segunda Entrevista
A segunda entrevista foi realizada dentro da sala de aula, durante o horário
da aula de Educação Física.
A pesquisadora se dirigiu até a sala, aguardou a saída dos alunos e entrou
na sala.
Pesquisadora: Boa Tarde, professora! Tudo bem?
Professora: Boa Tarde! Tudo e com você?
Pesquisadora: Tudo bem? Podemos realizar a entrevista agora?
Professora: Podemos. Só estou um pouco ocupada. Tenho que entregar o
gráfico das hipóteses para a Coordenação ainda hoje.
Pesquisadora: Bom, se você achar melhor. Posso voltar outro dia. Você
avalia o que é melhor, não quero atrapalhar.
Professora: Não! Não tem problema, já está quase pronto.
Como o objetivo dessa entrevista consistia, em conhecer o contexto em
que a professora estava, buscou conhecer o rendimento dos alunos e o nível em que
eles se encontravam. Mas antes a pesquisadora retomou a última entrevista.
Pesquisadora: Na outra entrevista, estávamos falando sobre sua formação
e trajetória profissional. A senhora me falou das suas dificuldades financeiras em
concluir o ensino fundamental. Colocou os motivos que levou a fazer o Magistério,
Letras e de sua intenção de montar uma pré-escola, que levou a fazer Pedagogia.
Além dessas informações, você gostaria de acrescentar algo mais sobre sua
formação?
Professora: Não, já falei tudo. Se eu lembrar mais alguma coisa eu falo
depois.
Pesquisadora: Bom o objetivo dessa entrevista é conhecer, como é a
turma? Como está o rendimento e as dificuldades que eles têm?
Professora: É uma turma boa! Tem 41 alunos. São freqüentes, só tem um
que foi transferido recentemente. No geral eles são bons.
Apresentou uma tabela (com o nome dos alunos e a cor correspondente a
suas hipóteses de escrita).
Pesquisadora: Qual hipótese corresponde à cor amarela, que tem mais?
Professora: Ah! Agora estou mais tranqüila. Eles estão com rendimento
mais satisfatório. Os que estão pintados de amarelo (37) são os alfabéticos, que tem
erros de ortografia, mas já sabem ler e escrever. Tirando o que foi transferido, só tem
três que ainda não atingiu o esperado.
Pesquisadora: Qual é o motivo que levam estes alunos a não atingirem o
esperado?
Professora: Ah! Eles têm muitas dificuldades e até já avançaram muito! E
entre eles há uma aluna que é considerada pelos pais e por ela mesma, como tendo
problema de cabeça e por essa razão é acompanhada pelo Psicólogo.
Sinceramente não acho necessário. O que ela tem mesmo é problema de
relacionamento, pois briga demais, inclusive com alunos de outras salas. Acho que
ela é muito mimada, inadequada, além de falar demais. Não vejo como problema
129
psicológico.
Pesquisadora: Como você lida com essa situação?
Professora: Ela já está bem melhor. Conversei muito com ela, sobre seu
comportamento e ela tem melhorado.
Pesquisadora: E no caso dela e dos outros que tem dificuldade o que é
feito, para melhorar a aprendizagem?
Professora: Procuro fazer o melhor que posso. Tento atividades
diferenciadas. Mas eles apresentam muitas dificuldades. Apesar de avançarem
muito, ainda não é o suficiente. Acho que falta também acompanhamento dos pais.
Pois esses que têm mais dificuldades, os pais são completamente ausentes.
Pesquisadora: O que você considera importante, que os pais não fazem?
Professora: Ah! Pelo menos que tomassem conhecimento, das dificuldades
dos filhos e os ajudasse nas tarefas e na leitura. Que demonstrassem mais interesse.
Pesquisadora: Você já solicitou ajuda, destes pais?
Professora: Sim. Só que na Reunião de Pais, os que comparecem, são
sempre os pais dos bons alunos. Os que têm dificuldades, nunca vêm ninguém.
Então fica muito difícil.
Pesquisadora: Além da reunião, você já convocou outras vezes, os pais
desses alunos?
Professora: Já, mais não adianta! Eles alegam que trabalham e não
comparecem mesmo assim.
Pesquisadora: O que é feito nesses casos?
Professora: Se eles não atingirem o esperado até o final do ano, como
estão na 4ª série, serão retidos. Porque não irão conseguir acompanhar o ritmo do
ginásio. Sendo assim é melhor que façam novamente a 4ª série.
Na verdade seria bom, que eles freqüentassem aulas de reforço. Só que
aqui na escola não tem turmas, por causa do espaço, pois temos aulas inclusive nos
Sábados. O trabalho fica muito difícil, mas mesmo assim vamos ver o que vai dar,
falta ainda um bimestre. Espero que até lá, eles melhorem e possam ser promovidos.
Pesquisadora: Mesmo sem o reforço, com essas dificuldades e sem a
ajuda dos pais, a senhora acha possível que melhorem?
Professora: Olha é muito relativo, ás vezes pode acontecer uma melhoria
repentina. Dependendo do interesse deles, tudo é possível. Mas é difícil...
Pesquisadora: Considerando as dificuldades desses alunos, o mais
recomendável é promovê-los ou retê-los?
Professora: É como eu disse quem tiver melhoria aprova, quem não tiver
retém. Por que não vão conseguir acompanhar. Os professores do ginásio, não
conseguem fazer o acompanhamento que eles precisam. Eles têm apenas a
preocupação com o conteúdo, não sabem ensinar a ler e a escrever. Se esses
alunos forem para lá, com essas dificuldades, ficarão com elas até a 8ª série. Por
isso, ou se reprova agora na 4ª série ou vai adiar a retenção para a 8ªsérie, que
também pode reter. Mas é pior porque ele vai se prejudicar ainda mais.
Pesquisadora: O que você acha que falta para os professores do Ciclo II,
realizarem este acompanhamento das dificuldades dos alunos?
Professora: Eles não têm tempo, por que as aulas são curtas. Nem
130
paciência para fazer este trabalho, além de acharem que é responsabilidade dos
professores do Ciclo I apenas.
Pesquisadora: Você acha que a formação que eles têm, favorece esse
trabalho?
Professora: Acho que não. Nem todos fizeram Magistério.
Todos os professores de português pelo menos, deveria saber alfabetizar.
Isso ajudaria muito. Mas é muito difícil, ta fora da realidade.
Pesquisadora: Mesmo com essas dificuldades, você está satisfeita com
seu trabalho?
Professora: Sou. Eu mudei muito minha postura profissional. Sabe, antes
de fazer o Letra e Vida, eu achava que este método não funcionava e que era muito
difícil trabalhar assim.
Pesquisadora: O que você achava difícil?
Professora: Achava difícil preparar atividades que servisse para todos.
Agora que aprendi fazer o diagnóstico e conheço as dificuldades dos alunos, sei
escolher melhor as atividades para eles. O meu trabalho está mais produtivo e os
resultados estão melhores.
Pesquisadora: Você considera que essa formação foi importante, para seu
trabalho?
Professora: Sim, sem dúvida. Sempre ajuda de alguma forma.
Pesquisadora: Além da formação continuada no curso Letra e Vida, você
fez outros cursos?
Professora: Fiz Pedagogia não por causa de lecionar em outras séries,
mas pra ver se ampliavam meus conhecimentos. Como disse já trabalho dezessete
anos no Ciclo I e não quero lecionar para o Ciclo II.
Pesquisadora: Há algum motivo especial, para você não querer atuar em
outras séries.
Professora: Eu não tenho vontade. Teria que começar como eventual, eu
tenho medo dessa realidade. Os alunos são muito difíceis e não respeitam eventuais.
Vou tentar uma oportunidade no Projeto de Leitura, pois acho mais satisfatório.
Só que é muito difícil também. Nas escolas não tem Biblioteca. Aqui nessa escola,
até sei que tem alguns livros. Mas ainda não foram disponibilizados. Acho que tem
que ter alguém, para fazer isso. Por isso, eu mesma improvisei essa estante aqui na
sala.
Pesquisadora: E como funciona?
Professora: Ah! Funciona muito bem! Tem alunos que já leram muitos
livros, desta forma. Eu trouxe essa estante, e todos nós trazemos livros, que possam
ser emprestados até o fim do ano. Pois aqui na escola só tem alguns gibis e revistas
Recreio, disponíveis. Mas são muito frágeis e podem ser rasgadas facilmente. Então
só usamos aqui na sala.
Nesse momento tocou um sinal.
Pesquisadora: Esse é o sinal do intervalo?
Professora: É sim. Eles já devem estar vindo para a sala, para pegar o
lanche.
Pesquisadora: Tem algo mais que gostaria de acrescentar?
Professora: Nesse momento não!
Pesquisadora: Então nós continuamos na próxima entrevista. Muito
obrigado pelas informações.
131
Professora: Espero ter ajudado de alguma forma.
Pesquisadora: Ajudou muito. Até mais!
Data: 28/10/08
Terceira Entrevista
A pesquisadora novamente foi até a sala, os alunos já haviam saído e a
professora estava a aguardando, conforme o combinado.
Pesquisadora: Tudo bem?
Professora: Tudo. Já estou te esperando.
Pesquisadora: Na entrevista passada, falamos sobre sua trajetória
profissional. Tem algo mais que você gostaria de acrescentar sobre sua trajetória
profissional.
Professora: Nesse momento, não me lembro de mais nada.
Pesquisadora: Nessa entrevista, gostaria que me falasse sobre as
estratégias que você usa nas aulas de leitura?
Professora: Eu faço de duas formas: leitura livre e compartilhada.
No começo eu tive muitas dificuldades para os alunos fazerem leitura
compartilhada, pois eles se dispersavam demais e tinham muitas dificuldades. Então
eu decidi escolher um gênero do livro deles. E pedi que treinassem em casa com
seus pais.
Pesquisadora: E quais foram os resultados?
Professora: Como eles tinham muitas dificuldades, achei que essa era uma
saída para melhorar o rendimento deles. Embora, os pais, não façam o
acompanhamento necessário, até que houve avanços. Eles estão lendo bem melhor
do que no começo do ano.
Pesquisadora: Você acha que os pais, ajudaram de que forma?
Professora: Só de cobrarem um pouco, já melhora. Pois se depender só
das aulas fica difícil.
Pesquisadora: E como são as aulas de leitura livre?
Professora: Lembra da estante? Então os livros de lá, podem ser lidos
quando eles terminam a atividade em sala, além de levarem para casa.
Pesquisadora: Além dessas atividades, você utiliza outras estratégias de
leitura?
Professora: Para não ficar muito repetitivo, às vezes eu organizo uma aula
diferente: Peço para os alunos trazerem tapete e almofada de casa e montamos aqui
na sala uma roda de leitura.
Só que não dá para fazer sempre. Porque ocupa muito tempo. Temos que
tirar tudo do lugar e depois colocar novamente. Embora eles gostem, dá muito
trabalho e não dá para fazer sempre.
Pesquisadora: Neste dia a leitura é realizada de que forma?
Professora: Ás vezes nós fazemos leitura compartilhada e às vezes eu leio
para eles.
132
Pesquisadora: E eles gostam desta aula?
Professora: Gostam muito, só que eles preferem que eu faça a leitura.
Pesquisadora: E eles falam o porquê da preferência?
Professora: Por causa dos erros dos colegas, fica mais difícil de entender.
Pesquisadora: Na leitura compartilhada, o que se faz com esses alunos
que tem dificuldades?
Professora: Nesses dias, fica complicado. Mas aqueles que têm muitas
dificuldades, eu faço eles lerem só para mim, depois.
Pesquisadora: E eles concordam?
Professora: Eles preferem, pois também sentem vergonha de ler para os
colegas.
Pesquisadora: Tem mais alguma estratégia que a senhora utilize?
Professora: Há! Eu também faço a leitura de produções dos textos deles. E
aproveito para fazer a correção dos erros de concordância. São muitos erros e essa
é uma boa hora. Pois eu vou mostrando para eles, qual é a forma correta.
Basicamente é isso que eu faço nas aulas de leitura. A única coisa que eu
me esqueci de dizer, é que além dessas atividades. Eu também faço leitura diária
com eles.
Pesquisadora: E essa leitura, como é realizada?
Professora: Eu escolho um tema que seja bom, e fazemos a leitura
compartilhada ou eu mesma leio para eles.
Pesquisadora: Como é feita a escolha desses temas?
Professora: Eu escolho temas que eles gostem se não, eles não se
interessam.
Pesquisadora: E qual é a preferência deles?
Professora: Eles gostam de aventura, suspense e também de atualidades.
Eu procuro variar os temas, e não leio algo que eles já conhecem. Porque se não,
eles não se interessam.
Pesquisadora: Você diz que este tipo de leitura é feita diariamente. Neste
caso têm algum momento específico para realizá-la?
Professora: Quando inicia a aula ou após o recreio, pois eles ficam muito
agitados e a leitura acalma.
Pesquisadora: Então eles gostam da aula de leitura?
Professora: Gostam sim, mas preferem que eu leia, do que fazer leitura
compartilhada.
Pesquisadora: Há algo mais, que gostaria de falar sobre leitura?
Professora: No momento não. Tudo que eu faço, já foi falado.
Pesquisadora: Então, eu gostaria de agradecer mais uma vez, pelo seu
depoimento. Agora eu vou transcrever as entrevistas e se ficar alguma dúvida eu
volto a te procurar. Muito obrigado!
Professora: Se precisar de mais alguma coisa estou á disposição.
Pesquisadora: Até mais.
133
Professora Cristina
Data: 04/11/08
Primeira Entrevista
A entrevista foi realizada na sala de aula, a pesquisadora aguardou a saída
dos alunos para aula de Educação Física, entrou na sala.
Pesquisadora: Boa tarde, professora!
Professora: Boa Tarde! Hoje estou um pouco atrapalhada, pois preciso
organizar estes questionários do SARESP até a hora do intervalo.
Pesquisadora: Mas a senhora acha possível mesmo assim? Se a senhora
achar necessário eu volto outro dia.
Professora: Agente dá um jeito! Estou só passando as respostas dos pais
no gabarito e tenho até a hora do intervalo.
Pesquisadora: Este questionário é respondido pelos pais em casa e o
gabarito é feito aqui na escola pelos professores?
Professora: É porque se deixar por conta deles, não sai nada. Essa folha
de resposta é encaminhada para a Diretoria e não pode ter erros.
Pesquisadora: E no geral, como os pais avaliam a escola?
Professora: Bom! Tem uns que são bastante conscientes e conseguem ver
as coisas boas que a escola tem. Agora tem uns que só fazem críticas. E o pior é
que, os que criticam mais, são aqueles que não acompanham nada. É muito fácil
falar mal da escola, dos professores, do governo e não fazer a sua parte.
Pesquisadora: O que a senhora considera importante, que é da
responsabilidade deles que eles não fazem?
Professora: Esses pais que falaram mal da escola são os que agente
percebe que não fazem seu papel. Seus filhos nunca fazem as lições de casa, têm
muitas dificuldades na leitura. Eles acham que a escola tem que fazer tudo sozinha e
não assumem sua responsabilidade de pais. Mas de modo geral, as avaliações estão
boas. A comunidade daqui até que valoriza essa escola.
Pesquisadora: Nessa entrevista, eu pretendo conhecê-la. Gostaria então
que me informasse alguns dados pessoais em relação a sua idade, estado civil,
origem, filhos, formação.
Professora: Tenho 42 anos e sou viúva, não tenho filhos.
Pesquisadora: Onde a senhora nasceu?
Professora: Nasci em Belo Horizonte, Minas Gerais.
Pesquisadora: A senhora tem irmãos?
Professora: Tenho muitos, ao todo dez. Eu sou a oitava.
Pesquisadora: Gostaria também de saber sobre sua trajetória profissional.
Como à senhora se tornou professora?
Professora: Eu comecei trabalhar aos dezessete anos em casa de família.
Trabalhei por dois anos. Depois trabalhei por três anos, como operadora de caixa e
um ano em na linha de Montagem de uma empresa.
Passado algum tempo, me casei, tive problemas na coluna e fiquei sem
poder trabalhar. Nesse período dei aula de Reforço em minha casa, para meus
sobrinhos. Minha cunhada gostou tanto, que espalhou para outras pessoas. Comecei
a dar aulas para outras crianças, filhas de umas amigas delas. Cheguei a ter vinte
crianças.
134
Foi essa atividade, que me fez interessar a fazer o Magistério, fez com que
eu percebesse minha vocação. Desde criança eu queria fazer Letras, por causa de
aprender outras línguas. Não pensava em ser professora.
Pesquisadora: Depois do Magistério, qual foi sua formação?
Professora: Tenho Licenciatura Plena em Educação Artística.
Pesquisadora: Qual foi o motivo dessa escolha?
Professora: Eu sempre gostei de atividades manuais e tenho mais
oportunidade, pois têm muita concorrência na área de Letras.
Pesquisadora: Mesmo não sendo sua primeira escolha, a senhora gosta do
que faz?
Professora: Tenho prazer em ensinar! Mas não tenho muita paciência!
Apesar de gostar deles, não sei ficar agradando e quando precisa dou bronca.
Pesquisadora: Quando foi que a senhora, iniciou a lecionar na escola?
Professora: Na escola, iniciei como estagiária e nessa época recebia
remuneração. Depois atuei como eventual e algum tempo depois, comecei a pegar
sala. Desde 2002, pego sala nessa mesma escola. Só nesse ano tive dificuldades.
Você imagina que nesse ano eu tenho uma aluna, que já foi minha quando eu
comecei aqui em 2002?
Hoje em dia, não sou mais a mesma. Depois que meu marido morreu,
muita coisa mudou. Tanto na minha vida pessoal e inclusive em relação ao meu
trabalho.
Pesquisadora: O que essas mudanças, têm ocasionado?
Professora: Eu perdi meu incentivo, ele que sempre me apoiou nos
estudos, e que me incentivava em tudo. Sabe, eu vivia super bem com meu marido,
ele era meu porto seguro. Quando eu estava alegre ele ficava, quando eu estava
triste ele sabia me ouvir. Agora mudou tudo.
Pesquisadora: Como à senhora tem lhe dado com essa situação?
Professora: Vivo um dia após o outro! Eu sofri muito, e ultimamente tenho
tido muitas dificuldades em memorizar os assuntos atuais. Ainda bem, que minha
memória de longo prazo não está prejudicada.
Sabe, a morte dele foi muito repentina. Ele teve falência de órgãos, e
entupimento de veias. Ele tomava remédio de pressão, pois ela vivia alterando. Um
dia começou a sentir tontura, fez exames e no mesmo dia entrou em coma e morreu.
Para piorar a situação, depois de três meses, meu irmão foi atropelado e
também morreu. Tudo isso, mexeu muito comigo, e fez com que eu mudasse minha
forma de lhe dar com as situações.
Pesquisadora: Mesmo se sentindo assim, a senhora não tentou um
afastamento, para cuidar de sua saúde?
Professora: Eu estou superando o luto, já faz dois anos. Pois ele sempre
me deu forças para estudar. Quando ele faleceu ainda não tinha terminado, tive
muitas dificuldades financeiras, para pagar a faculdade. Depois que ele morreu, fui
morar com minha irmã, para ter companhia.
Pesquisadora: Diante dessa situação, como à senhora consegue lecionar?
Professora: Tenho me esforçado muito, peço ajuda das colegas, leio e
procuro fazer a minha parte. Só estou muito preocupada, com a prova que terei que
fazer no fim do ano, para continuar a lecionar.
135
Pesquisadora: E como à senhora tem se preparado para esta prova?
Professora: Eu tenho me preocupado muito, e estou lendo a proposta
curricular, para ver se absorvo alguma coisa. Mas sei que não vai ser fácil. Só espero
que com todas essas dificuldades, consiga me concentrar. Tenho pedido a Deus
para me ajudar
O conteúdo que vai cair nessa prova está muito difícil, de ensinar para os
alunos acompanhar. Eles têm muitas dificuldades em interpretar problemas. Estamos
prestes ao SARESP, e eles só conseguem fazer continhas isoladas, não sabem
resolvê-los dentro de uma situação. E mesmo agente, tendo trabalhado tanto
interpretação. Ainda não é o suficiente, os resultados ainda não são satisfatórios.
Sabe, hoje entendo que minha professora da 1ª série não era ruim. Só não
sabia, transmitir o que sabia para os alunos. Eu sempre pensei que não seria como
ela. E por isso me preocupo com a forma de transmitir o conhecimento para eles.
Tento facilitar ao máximo.
Pesquisadora: Como à senhora faz, para facilitar a aprendizagem deles?
Professora: Faço minha parte, converso muito com eles, tento demonstrar
as dificuldades que eles terão por falta dos estudos. Tento conscientizá-lo para se
interessarem mais.
Pesquisadora: E quais são os resultados?
Professora: Infelizmente ainda é muito pequeno. Pois como eu disse, eles
não têm limites. E os pais não acompanham como deveriam, incentivando, ajudando.
No fim se o aluno, não aprende a responsabilidade toda, fica é mesmo nas costas do
professor. É isso que pensa os pais, os governantes e todo mundo.
Pesquisadora: E como à senhora vê essa situação?
Professora: Com certo desânimo. Mas espero que um dia os professores
sejam realmente valorizados pelo nosso trabalho, que não tem sido fácil.
Bate o sinal e assim a pesquisadora, finaliza a entrevista.
Pesquisadora: Obrigado pela entrevista e nos veremos mais uma vez, até
a próxima.
Data: 11/11/08
Segunda Entrevista
A entrevista foi realizada na Sala de Aula, durante a aula de Educação
Física.
Pesquisadora: Boa Tarde, professora! Tudo bem?
Professora: Tudo!
Pesquisadora: A senhora acha possível realizar a entrevista, agora?
Professora: Sim, podemos.
Pesquisadora: Bom, o objetivo desta entrevista será conhecer seu
trabalho, ou seja, compreender como está o rendimento da turma?
Professora: Olha, eu peguei o bonde andando... Estou com eles há pouco
tempo...
Pesquisadora: A senhora está com eles há quanto tempo?
136
Professora: Há estou a mais ou menos dois meses. Eles estavam ficando
com professoras eventuais, pois a professora da sala está afastada para a
Coordenação de outra escola.
Pesquisadora: Durante esse pouco tempo, a senhora conseguiu avaliar
como está o rendimento deles?
Professora: Bem, apesar deles estarem classificados desde o início do
ano, como ortográficos. Na minha opinião esta avaliação não está correta. Mas
como não posso interferir no trabalho da colega, não vou dizer nada sobre isso e
vou fazer a minha parte.
Pesquisadora: E como à senhora avalia, atualmente o rendimento deles?
Professora: Bom, nesta sala tem quarenta alunos. Com exceção de uma
aluna, que é faltosa, os outros são freqüentes.
Pesquisadora: A senhora sabe o motivo das faltas?
Professora: Pelo que os alunos me dizem, ela sofreu uma cirurgia na
cabeça. Mas eu não sei dizer maiores detalhes. Tudo o que sei é o que os alunos
dizem. Inclusive esses dias os alunos me disseram, que ela estava um dia desses
no muro aqui da escola. Eu achei muito estranho, como que alguém que fez cirurgia
na cabeça pode estar na rua desse jeito. Pelo que parece a família, não acompanha
e não se preocupa. Mas até o momento, ninguém da família veio me avisar nada.
Pesquisadora: Houve alguma providência da escola, em relação a essa
aluna?
Professora: No Sábado passado, teve Reunião de Pais e a Coordenadora,
veio me avisar que a mãe esteve com ela, e deu uma satisfação sobre o estado de
saúde. Disse que ela está se recuperando, mas não trouxe nenhum atestado. Na
minha opinião, mesmo que ela esteja amparada nas faltas, ela deve ser retida, pois o
número de faltas é excessivo e certamente irá prejudicar sua aprendizagem.
Sabe, eu acho que hoje em dia protegem demais esses alunos. Na minha
época não era assim não. Nós tínhamos um respeito pelos professores, o que hoje
não existe.
Eu tinha medo da minha professora da 1ª série. Eu não conseguia
aprender por causa do jeito dela. Depois que eu mudei de sala e a professora nova,
foi paciente comigo. Eu superei minhas dificuldades e consegui aprender sem
problema algum.
Não acho que precisava ser assim. Mas considero o respeito importante. E
hoje não se tem mais isso. Tudo que se faz, pode ser um trauma para o aluno. Para
mim essa experiência ruim com essa professora, me serviu de motivação e não para
me traumatizar.
Por isso eu procuro ser firme com eles e quando precisa sei dar bronca.
Pesquisadora: Considerando esta realidade e as dificuldades encontradas,
como você considera o rendimento deles?
Professora: Olha, eles são muito indisciplinados. Conversam demais, são
muito agitados e sem limites. Isso prejudica muito o rendimento deles. Mas dentro
do possível eles estão melhorando. Agora com o SARESP chegando, é que vamos
ter certeza dessa melhoria.
Pesquisadora: O que tem sido feito, para prepará-los para o SARESP?
Professora: Vai ter um Simulado antes da aplicação do SARESP. Mas eles
têm muitas dificuldades, em resolver situações problemas. Só sabem resolver
continhas isoladas. Dentro de uma situação eles não compreendem as operações,
que devem ser feitas.
137
Pesquisadora: O que pode ser feito para melhorar essa compreensão?
Professora: É o que mais fazemos, trabalhar a leitura. Pois eles não sabem
o que fazer, porque não compreendem o que lêem. Só tem um ou outro que lê e
consegue resolver sozinho os problemas. A maioria precisa que eu leia, e ai aos
poucos vão entendendo o que é para ser feito. Mas no SARESP, não terão essa
ajuda, quero ver como vai ser. Eles também não levam muito a sério. Ao invés de ler,
reler quantas vezes for necessário. Eles lêem uma única vez, já chutam a resposta e
por isso vão mal. Querem acabar logo, para poderem bagunçar.
Pesquisadora: O que é possível fazer, para que a indisciplina, não
prejudique a aprendizagem?
Professora: Eu tenho pegado no pé deles e exigido bastante. Mas
infelizmente, os pais não fazem o papel deles de acompanhar os filhos.
Eu passo lição de casa, olho os cadernos, peço para os pais que
verifiquem também. E quando preciso, eu chamo os pais para conversar por bilhete.
Mas nem sempre, eles lêem os bilhetes e comparecem.
Eu tenho feito o possível, e aqueles que se interessam tem conseguido
acompanhar, agora os que têm dificuldades e os pais não acompanham fica mais
difícil.
Pesquisadora: Qual seria o acompanhamento adequado que os pais
poderiam fazer, em relação às dificuldades na aprendizagem?
Professora: Eles tinham que cobrar mais dos filhos, não deixar faltar sem
motivo, exigir que eles fizessem suas lições de casa, olhar os cadernos. Mas eles se
quer, vêem nas reuniões.
Pesquisadora: A freqüência na última reunião, não foi boa?
Professora: É sempre aquela história. Os pais dos alunos que realmente
tem dificuldades, nunca comparecem.
Pesquisadora: E o que se faz nesses casos?
Professora: Vamos para o último bimestre, quando algum for retido, aí o
pai vai aparecer, para reclamar e achar que tem razão. Nem todos têm conhecimento
das dificuldades dos filhos.
Pesquisadora: Tem algo mais sobre o rendimento deles, que você gostaria
de acrescentar?
Professora: Por enquanto é só. Acho que já falei tudo.
Pesquisadora: Nosso tempo já está acabando. Mas teremos outros
momentos para dar continuidade. Nos vemos na próxima aula de educação física.
Professora: A próxima aula é na terça-feira. Eu acho que eu não venho,
pois eu vou abonar.
Pesquisadora: Bom, eu estarei aqui, pois vou também entrevistar a outra
professora. Se você não estiver fica para a próxima aula. Tudo bem?
Professora: Fica assim então!
Pesquisadora: Até logo.
138
Data: 18/11/08
Terceira Entrevista
Após a saída dos alunos a pesquisadora entrou na sala, cumprimentou a
professora e iniciou a entrevista.
Pesquisadora: Na entrevista passada falamos sobre o rendimento da
turma. A senhora gostaria de acrescentar algo mais?
Professora: Não. Acho que já falei sobre as minhas dificuldades, penso
que falei tudo que me lembrava.
Pesquisadora: Se a senhora lembrar algo, que queira acrescentar fica à
vontade. Nesta entrevista eu gostaria de conhecer as estratégias de leitura utilizadas
por você, com esta turma.
Professora: No início eu escolhia um texto, do livro deles. Mas percebi que
não era muito produtivo, pois como eles conheciam o texto, não se concentravam na
leitura e aí se dispersavam demais.
Nesta sala não é possível fazer leitura silenciosa. Eles não se concentram
e acaba virando bagunça.
Pesquisadora: Como à senhora resolveu esta questão?
Professora: Depois de descobrir isso, eu passei a escolher os textos, com
temas do dia-a-dia, com títulos que chame atenção. Eu vou inclusive buscar os meus
livros do Letra e Vida, que tem muita coisa interessante e que eles não conhecem.
Sabe como é 4ª série? Dependendo do que for eles não se interessam mesmo.
Pesquisadora: Após selecionar os temas, o que a senhora faz?
Professora: A partir daí, eu mesma faço a leitura para os alunos e
aproveito para demonstrar a pontuação e entonação correta.
Em seguida eu faço a leitura compartilhada e aproveito para fazer as
correções.
Pesquisadora: A senhora colocou que a atividade de leitura silenciosa não
é muito produtiva e na leitura compartilhada os resultados são melhores?
Professora: Há muita resistência por parte de alguns alunos, por causa das
dificuldades que eles têm. Por exemplo, tem uma aluna com problemas de visão que
se recusa a ler. Mas há também os que gostam bastante.
Na verdade eles preferem que eu faça a leitura, pois quando todos lêem a
compreensão não é a mesma.
Pesquisadora: Como à senhora faz, com os alunos resistentes?
Professora: Dou a oportunidades a todos, mas se não quer eu não insisto.
Depois eu chamo individualmente, peço que leia só para mim.
Pesquisadora: Há uma freqüência para a realização destas atividades de
leitura?
Professora: Normalmente as aulas de leitura acontecem na 4ª ou 5ª feira,
mas fora disso, há também uma rotina diária.
Pesquisadora: E como acontece nestes momentos de leitura diária?
Professora: Nessa leitura diária fazemos a mesma coisa, eu leio depois
eles lêem e no final debatemos o tema.
Ontem nós fizemos uma leitura muito interessante de um texto chamado
“Sopa de Pedra” de Pedro Malazarte, que conta a história, de um homem muito
esperto, que sabe tirar proveito de todas as situações.
139
Relata resumidamente a história: Este homem esperto resolveu fazer uma
sopa de pedra e apostou, com seus colegas, que iria convencer sua vizinha, que era
muquirana a ajudá-lo. Aos poucos ele foi pedindo ingredientes para ela, para colocar
na sopa. E como ela estava interessada em comer a sopa, acabou cedendo aos
poucos o que ele pedia, sem perceber que estava sendo enrolada. De modo que a
sopa ficou pronta, com os ingredientes que ela deu e não somente com as pedras.
Pesquisadora: O que eles acharam da história?
Professora: Eles se divertiram muito. Só que quando fizemos o debate,
sobre o que é mais importante na vida: Se é a honestidade ou a esperteza?
Eu fiquei muito decepcionada quando vi que a maioria deles, achou que
era a esperteza.
Eu tive que explicar para eles, a importância da honestidade. Mas não sei
se convenci todos. A educação que eles recebem não prioriza estes valores.
Pesquisadora: Como à senhora pretende enfatizar esses valores
importantes para eles?
Professora: Essa forma eu acho que é legal, pois eles se divertem com as
histórias, e quem tem interesse acaba aprendendo as coisas boas.
Pesquisadora: Há alguma outra estratégia de leitura?
Professora: Não. O que faço realmente é o que falamos. Não me lembro
de mais nada.
Pesquisadora: Muito obrigado por mais esta entrevista. Se precisar de
mais alguma informação quando eu fizer a transcrição, se precisar eu retorno.
Professora: Se precisar, estou à disposição. Pode voltar.
Professora Beatriz
Data: 16/10/08
Primeira Entrevista
A Pesquisadora dirigiu-se para a sala de aula, aguardou a saída dos
alunos.
Pesquisadora: Boa tarde, professora? Tudo bem?
Professora: Boa tarde, tá tudo bem.
Pesquisadora: Podemos fazer a entrevista?
Professora: Claro.
Pesquisadora: Bem professora, o objetivo desta entrevista será
compreender sua trajetória profissional, ou seja, como se tornou professora? Porém
antes eu precisava de alguns dados pessoais da senhora (idade, estado civil, origem,
filhos e formação).
Professora: Sou de Salvador, sou casada e tenho um filho.
Pesquisadora: Quantos anos a senhora têm?
140
Professora: Tenho 43.
Pesquisadora: Como à senhora se tornou professora?
Professora: Eu comecei minha carreira, em uma empresa de Informática e
depois trabalhei durante quatro anos em uma escola estadual, como escrituraria e
depois secretária. Depois eu exonerei por que eu não gostava do que eu fazia.
Pesquisadora: Foi essa experiência na escola, que motivou a se tornar
professora?
Professora: Não. Eu me tornei professora, por ser de uma família de
professoras. Todas as minhas tias por parte de mãe são professoras.
Eu nasci na Bahia e vim para cá aos três anos. Minha família era grande,
somos nove irmãos e passamos por muitas dificuldades. Desde pequena, eu já
brincava de ser professora. Minha mãe sempre me incentivou, pois ela achava que
ser professora era uma boa escolha, que me ajudaria pagar a faculdade.
Pesquisadora: Apesar do incentivo, você considera que fez a escolha
certa?
Professora: Eu considero que sim. Pois as minhas irmãs, apesar de terem
feito a mesma escolha, fizeram outras formações em outras áreas e vivem me
incentivando a mudar. Mas eu não tenho vontade. Gosto do que faço.
Eu já recebi até outros convites, para atuar na vice-direção e direção. Mas
eu nunca aceitei, por que eu estou feliz com minha escolha.
Pesquisadora: E como foi sua experiência inicial como professora?
Professora: Em 1988, eu comecei a lecionar como professora eventual.
Inclusive onde eu comecei, encontrei várias professoras da época que eu estudava.
Já estou na rede há vinte anos e no particular há 18 anos. Acho que vou
me aposentar como OFA. Já fiz vários concursos, e até agora não consegui passar
por pouca coisa. Graças a Deus e a minha pontuação. Não tenho dificuldades, para
pegar sala. Somente em 1992 fiquei sem conseguir e neste ano, me dediquei apenas
ao particular.
Agora no particular trabalhei em uma mesma escola por oito anos e só sai
de lá quando me casei. Fui para outra escola, de uma amiga minha e já estou lá há
dez anos. Apesar de ter trabalhado seis anos sem registro, quando minha amiga
vendeu a escola, ela fez boas referências minhas e fui contratada. E já estou lá
registrada, há quatro anos.
A primeira escola particular, que trabalhei era de uma classe social, com
melhor poder aquisitivo. A que trabalho atualmente é uma escola, também de bairro.
Eu sinto que os alunos, dessa escola são mais esforçados, pois os pais
acompanham e exigem mais.
Pesquisadora: Além do melhor acompanhamento dos pais, que contribui
para a aprendizagem. O que a senhora vê como um problema que dificulta a
aprendizagem na escola pública?
Professora: O rendimento é igual a do particular. Lá também têm os que
não querem saber de nada e os muitos interessados. O que faz mesmo diferença, é
o acompanhamento dos pais.
141
Pesquisadora: Nessa turma, o acompanhamento dos pais é muito
complicado?
Professora: Mais ou menos. Tem sempre aqueles que não acompanham
nada.
Já estou acostumada, eu mesma pego no pé. Por que se for esperar, nada
acontece! Faz parte da profissão.
Pesquisadora: Além do Magistério, qual é a sua formação?
Professora: Em 2000, eu resolvi fazer Pedagogia, para aprofundar meus
conhecimentos e aprendi muito. Muita coisa, que eu vi na Faculdade, foi dado no
Letra e Vida, por exemplo, o diagnóstico das hipóteses.
Pesquisadora: A senhora fez, este curso?
Professora: Infelizmente não. Pois como trabalho em dois lugares, me falta
tempo. Já me inscrevi algumas vezes, mas ainda não consegui me organizar nos
horários que tem para fazê-lo.
Eu estou decidida a deixar a escola particular no próximo ano. Pois falta
tempo para tudo. Eu tenho sentido que meu filho que está com 10 anos, está
precisando mais da minha presença. Vou esperar conseguir uma sala no estado e
pedir demissão.
Já conversei com meu marido, meu filho sobre isso e eles concordou. Meu
filho não vê à hora disso acontecer.
Pesquisadora: Há algo mais em sua experiência profissional, ou na
realização de seus estudos que você gostaria de falar?
Professora: Na vida profissional eu já falei tudo. Agora nos estudos, eu não
tive dificuldades para realizá-los. Sempre estudei em escola pública e me lembro
com saudades da merenda da escola, pois era de ótima qualidade.
Inclusive eu conscientizo meus alunos, sobre a importância deles não
desperdiçarem a merenda, pois há muitos necessitados, que não tem essa
oportunidade de escolher o que vai comer.
Pesquisadora: O que mais você se lembra, dessa época?
Professora: Meu pai sempre foi metalúrgico e minha mãe era doméstica,
mas mesmo de origem simples, incentivavam os filhos a estudar.
Como eu tinha muitos irmãos, os mais velhos cuidavam, dos mais novos.
Nos passamos por dificuldades, mas sempre fomos muito unidos. Você acredita que
dividíamos até o uniforme?
Mesmo minha mãe trabalhando muito, nunca faltava nas reuniões e
sempre acompanhava nossas lições. Lembro que ela empilhava os cadernos, na
mesa da cozinha e olhava um por um.
Ah! Também não posso esquecer a minha professora da 2ª série, que era
maravilhosa. Eu acho que inclusive me espelhei nela.
Pesquisadora: Em que aspectos, você acha que se espelhou nela?
142
Professora: Ela tinha uma maneira especial de tratar os alunos e até
mesmo os pais nas reuniões. Eu procuro fazer isso também.
Eu me lembro que nos dias de reunião, ela falava para minha mãe, sobre o
comportamento do meu irmão, que estudava na mesma sala que eu, e era terrível.
Ela sempre tinha paciência e calma, para falar com a minha mãe, dizendo
que era uma fase e que ia logo passar. E esse jeito dela tranqüilizava minha mãe.
Eu acho que os pais precisam também ser orientados, em relação à
educação de seus filhos. Às vezes eles ficam perdidos e o professor pode e deve
ajudar. Eu sempre que sinto essa necessidade faço isso, pois sei o quanto é
importante.
Bateu o sinal e a pesquisadora finalizou a entrevista.
Pesquisadora: Gostaria de falar algo mais?
Professora: Eu falo demais e acho que já falei tudo.
Pesquisadora: Ainda teremos mais uma entrevista. Eu volto na próxima
semana e obrigado pelas informações.
Data: 23/10/08
Segunda Entrevista
A pesquisadora chegou à sala, aguardou a saída dos alunos e entrou na
sala.
Pesquisadora: Tudo bem professora!
Professora: Tudo!
Pesquisadora: Podemos realizar a entrevista?
Professora: Sim, podemos.
Pesquisadora: Professora, o objetivo desta entrevista, será compreender a
realidade da sala, e assim verificar como está rendimento dos alunos?
Professora: A sala é ótima! Mas não era no início. Tinha alunos que eram
extremamente indisciplinados e que hoje se comportam de forma adequada.
Pesquisadora: A que se deve essa melhoria de comportamento?
Professora: Há eu tenho com eles um ótimo relacionamento. Eu sempre
procuro conscientizá-los sobre a importância dos estudos, da leitura e da
necessidade deles ajudarem seus pais no futuro. Converso muito com eles, sobre o
que vai acontecer o ano que vem, quando estarão na 5ª série e das mordomias que
vão perder.
Eu tenho muita afinidade com eles. Há alguns pais que também se
preocupam e isso ajuda bastante.
Você acredita, que todos os dias eles trazem balas para mim. Inclusive
aqueles que não têm condições, fazem um esforço para me agradar.
Eu percebo que quando alguém não traz balas, por não ter. Quem trouxe
acaba cedendo, pra que todos possam me agradar.
143
Pesquisadora: Essa atitude deles de ceder para que todos possam agradar
é bem interessante. Como você se sente com tanta demonstração de afeto?
Professora: Eu fico muito feliz e tento retribuir da melhor forma. Quando eu
percebi que o número de balas, estava ficando muito grande, e eu já não sabia mais
o que fazer. Decidi negociar com eles o que faríamos com as balas.
Pesquisadora: E qual foi à decisão?
Professora: Eles me ajudaram muito dando sugestões. Mas acabamos
decidindo, que as balas seriam distribuídas entre eles, independentes de terem
trazido ou não. Pois eu não daria conta de tantas balas.
Pesquisadora: Bom, deu para perceber que a relação entre a senhora e os
alunos é boa e isso favorece a aprendizagem. Mas em relação ao rendimento, como
eles estão?
Professora: Bom, sempre têm alguns com dificuldades. E esses, eu coloco
do meu lado e converso com eles, para melhorar. Mas quando não produzo, eu não
deixo fazer Educação Física. Como eles são muito freqüentes inclusive nas aulas de
sábado, eu tento recuperá-los durante as aulas, com atividades específicas para
suas dificuldades.
A sala é bem cheia, no começo eu tinha quarenta e um aluno. Só houve
um desistente, um transferido e um reclassificado. Agora tenho 38 freqüentes, sendo
desses, cinco repetentes.
Pesquisadora: A senhora considera que esta recuperação, durante as
aulas é suficiente e tem dado resultados?
Professora: Não é. Eles precisavam mesmo de aulas de reforço, fora da
sala, para que tivessem mais atenção. E que fosse trabalhada só, a sua dificuldade.
Mas como não dá para montar turma, por causa da falta de espaço e de horário.
Agente faz o que pode. De modo geral eles vão melhorando, só os que têm
realmente muitas dificuldades é que é difícil progredir.
Pesquisadora: A senhora tem muitos alunos, com dificuldades?
Professora: Sim os repetentes. Tem um deles que tem problema de saúde
(epilepsia), um faz acompanhamento psicológico, e um tem problema de
aprendizagem mesmo, mas a mãe não aceita. Os outros dois eram só problema de
indisciplina, mas melhoraram muito.
Pesquisadora: Mesmo com esses problemas identificados, como tem sido
aprendizagem desses alunos?
Professora: Mesmo assim eles têm avançado. Há quatro silábicos com
valor sonoro, que tem avançado muito. Agora tem um que ainda está pré-silábico, e
que infelizmente não avançou nada, só escreve o primeiro nome.
Pesquisadora: A que se deve essa dificuldade desse aluno?
Professora: Ele já está aqui desde a 2ª série e sempre apresentou
dificuldades. Na reunião de pais eu procurei saber da mãe, quais eram as causas
dessas dificuldades. A mãe me contou que caiu um tanque na cabeça dele, mas que
ele não teve seqüelas.
144
Como ele é uma criança aparentemente saudável e vaidosa, a mãe não
acredita que ele tenha problema. Eu já conversei muito com a mãe dele, tentei
conscientizá-la. Inclusive soube que ele já foi encaminhado pela Coordenação, para
acompanhamento psicológico. Mas pelo que entendi, não houve nenhuma
providência por parte da mãe.
Pesquisadora: Pela conversa que você teve com a mãe, por que ela não
procurou ajuda?
Professora: Ela não aceita as limitações do filho. Prefere acreditar que está
tudo bem.
Pesquisadora: Nesse caso, como fica a aprendizagem dele?
Professora: Eu faço o melhor que posso. Preparo atividades, que ele
consegue fazer, mas não tenho tido sucesso.
Nesse momento a professora, retira do diário uma atividade do aluno, que
solicitava ao mesmo nomear alguns objetos.
Nessa atividade só constava seu primeiro nome e a escrita de várias
palavras, sem relação com o que havia sido proposto.
Professora: Ta vendo, ele ainda é pré-silábico, ele usa letras que ele
conhece de forma aleatória. Ele deve ter algum problema. Já era para ele estar bem
melhor. Mas como a mãe não aceita, não se pode fazer nada, além do que tenho
feito.
Pesquisadora: No caso dele que já foi retido, o que será feito?
Professora: Não tem jeito, ele vai desse jeito para 5ª série e lá vai ficar
pior, pois nem todo mundo tem paciência, e sabe acompanhar as dificuldades dele.
Até que a mãe se convença e faça um diagnóstico médico, para ver o que fazer com
ele.
Pesquisadora: E os demais com estão?
Professora: Eu sinto que meus alunos preferem mais ler do que escrever.
Pois quando eu peço para escreverem o que leram, sobre algo, sinto muita
resistência da parte deles.
Agora por exemplo, eu estou trabalhando poesia. Mas sempre começamos
as aulas, com uma roda de conversa sobre, atualidades. Eu sempre peço opinião
deles, sobre o que acontecendo.
Eles participam muito e já sabem opinar também.
Pesquisadora: Eles gostam de poesia?
Professora: Adoram, eles escrevem uma mais linda, do que a outra e todos
querem ler a sua. Com a escrita de poesia está sendo melhor. Pois eles gostaram
deste gênero.
Pesquisadora: Apesar das dificuldades, você está satisfeita com seu
trabalho?
Professora: Esta é a primeira vez, que eu leciono para a 4ª série, pois
minhas amigas diziam que não era bom, por causa da indisciplina. Mas eu estou me
realizando e amando o que eu estou fazendo.
145
Eu gosto do que faço, eu adoro estar aqui com eles. Sei que eles gostam
também de mim e isso me faz bem. Acho que não saberia fazer outra coisa, a não
ser lecionar. Eu acho que os alunos do estado precisam mais do professor do que o
aluno do particular.
Pesquisadora: A que você atribui, essa necessidade maior do professor
nos alunos do estado?
Professora: Pela falta de acompanhamento. No particular, como os pais
pagam, eles exigem mais dos filhos e a carência é também menor.
Bate o sinal e a pesquisadora finaliza a entrevista se despedindo.
Pesquisadora: Infelizmente, nosso tempo acabou. A senhora gostaria de
colocar algo mais.
Professora: Não acho que não.
Pesquisadora: Volto na próxima aula e muito obrigado pelas informações.
Até mais.
Data: 07/11/08
Terceira Entrevista
A professora aguardou a saída dos alunos e entrou na sala.
Pesquisadora: Boa Tarde, professora, tudo bem?
Professora: Tudo.
Pesquisadora: Sobre o rendimento dos alunos, que falamos na entrevista
passada. Há algo mais que gostaria de falar?
Professora: Não. Acho que falei o principal.
Pesquisadora: Bom, o objetivo da entrevista de hoje é falar sobre as
estratégias de leitura, utilizadas com esta turma.
Professora: O que eu faço, nas aulas de leitura. É motivar meus alunos a
ler sempre.
Começamos sempre, com uma roda de conversa, sobre atualidades.
Como exemplo eu pego um artigo de jornal que trata sobre violência, como o caso da
Isabela. E assim eu leio a notícia para eles e exploro o tema. Falamos sobre a
violência que há no bairro, nas famílias.
Hoje, eles acabaram de voltar de uma Palestra sobre deficiência física, já
sei que na próxima aula de leitura, terei que trazer algo que fale sobre o assunto para
lermos.
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Eu gosto de fazer assim, pois esta é uma forma deles se interessar e
participar da aula.
Pesquisadora: Todas as suas aulas de leitura iniciam com uma roda de
conversa sobre atualidades?
Professora: Eu sempre procuro trazer um assunto que possa ser depois
discutido. E depois peço a eles que produzam algo, sobre o que discutimos.
Proponho que eles se imaginem como autores e escrevam algo sobre o assunto.
Como acharem melhor pode ser em forma de Poesia, Música, História, Desenho.
Você sabe que eles gostam muito de poesias. Sai uma mais linda do que a outra.
Estou pensando em escolher algumas para expor. Eu gostaria muito de poder editar
um livro com as produções deles. Sonho que um dia na escola pública, eu consiga
patrocínio para fazer isso. Tenho alunos maravilhosos, que sonham com esta
oportunidade. Eu falo para eles, que nós que somos pobres, só podemos viajar
sempre, através dos livros.
Pesquisadora: Da forma, como você coloca, a senhora incentiva-os a ler,
com atualidades e através da roda de conversa. Agindo assim você percebe que eles
têm adquirido prazer em ler.
Professora: Com certeza, até os que têm mais dificuldade, gostam da aula
de leitura.
Pesquisadora: Como é feito nestas aulas com os alunos que tem
dificuldades?
Professora: Eu sempre pergunto quem gostaria de ler para nós? Eu não
imponho nada. Um dia eu leio, e outro dia, eu convido eles a ler para todos. Os que
têm maiores dificuldades eu tomo leitura individual. Deixo que eles treinem em casa,
e escolham o que querem ler para mim.
Pesquisadora: A senhora disse que um dia lê para eles e no outro os
convida. Há uma rotina para esta atividade?
Professora: Sim. Na 4ª feira é o dia, que eu faço a leitura e na 6ª feira, eu
abro para eles lerem.
Pesquisadora: Além da roda de conversa para iniciar, quais são as outras
estratégias utilizadas nestes dias?
Professora: Na 6ª feira, como é o dia deles. Eu deixo que eles escolham
algo para trazer para ler. Antes deixo eles sentados em dupla (quem sabe mais com
quem tem mais dificuldade), para fazerem a leitura silenciosa. E depois faço o
convite para fazerem a leitura.
Agora no meu dia que é 4ª feira, eu faço diferente. Ás vezes leio algo que
eu já escolhi, discutido na roda de conversa. Ás vezes escolho, as melhores
produções deles, mas não falo quem escreveu.
Elogio bastante faço com que a sala também elogie, e só depois digo
quem escreveu. Eles adoram serem elogiados, sempre se esforçam para escrever
melhor.
Eu acho que isso faz com que eles percam o medo de ler. Eles acabam se
acostumando com a rotina. E quando por alguma razão, não é possível cumpri-la.
Nossa eles me cobram muito.
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Pesquisadora: Há mais alguma estratégia que a senhora utilize?
Professora: Você sabe que no Sábado eu tento dar uma atenção especial,
para a leitura dos que apresentam mais dificuldades. Pois nesse dia, sempre tem
menos aluno. Então dá para tomar a leitura individual deles. Com os outros eu faço
atividades de recorte, colagem para não cansar tanto.
Neste dia, eu tomo a leitura desses com dificuldades e normalmente utilizo
os clássicos, que ele já sabe de cor. O fato deles já conhecerem a seqüência, motiva
mais.
Nesse momento, um vendedor pediu licença para entrar na Sala e deixou
com a professora algumas tabuadas, para serem oferecidas aos alunos. Retirou-se
dizendo que voltaria no dia seguinte.
A professora de posse da tabuada, falou:
Ta vendo isso aqui. Eles não levam para casa sem saber o que é não.
Nós lemos juntos. O que é? Para que serve? Quanto custa, elaboramos
um bilhete para que os pais compreendam. Se não eles chegam em casa, e não
sabe nem dizer o que isto significa. Eles são muito curiosos, eu aproveito esta
curiosidade para tudo.
Você sabe que por causa disso, eu percebo que eles estão mais
interessados em ler tudo.
Pesquisadora: É mesmo, você percebe que eles têm ampliado o gosto pela
leitura.
Professora: Eu notei isso no Simulado do SARESP. Eles estavam muito
preocupados. E eu já tinha dito para eles, a importância de ler, reler, tirar as dúvidas
e só depois responder. Eu percebi que eles não responderam direto, de qualquer
jeito. É muito gostoso saber que aos poucos, eles estão mudando e aumentando o
interesse.
Pesquisadora: Algo mais que gostaria de colocar sobre leitura?
Professora: Eu acho que eles estão gostando mais de ler do que escrever.
Oralmente eles são bons, mas na hora de escrever, apresentam mais dificuldades do
que de ler. Se bem que tem até gente na Faculdade que tem dificuldade para
escrever. Pelo menos eles são espontâneos. Escrevem como pensam. Tem gente
que nem isso consegue. Trava. Não é mesmo?
Eu só me preocupo mesmo, com quem tem dificuldades, já são repetentes,
eu não posso segurá-los. É uma pena vão para a 5ª série, ficarão jogados, ninguém
vai se preocupar com eles. Aqui pelo menos, eu dou a chance deles pensarem sobre
seu erro. Até fazer certo. Lá não errou, errou.
Pesquisadora: A senhora gostaria de colocar algo mais, sobre leitura?
Professora: Não.
Pesquisadora: Então, finalizamos aqui e após a transcrição, se ficar
alguma dúvida eu volto.
Muito obrigado por tudo e até mais.
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