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Trabalho Final de Mestrado em Engenharia Ambiental
Modalidade: Dissertação
ANÁLISE DA INTERCONEXÃO DOS SISTEMAS DE ESGOTOS
SANITÁRIO E PLUVIAL DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO:
VALORIZAÇÃO DAS COLEÇÕES HÍDRICAS SOB
PERSPECTIVA SISTÊMICA
Autor: Alexandre Pessoa Dias
Orientadora: Thereza Christina de Almeida Rosso
Centro de Tecnologia e Ciências
Faculdade de Engenharia
Departamento de Engenharia Sanitária e do Meio Ambiente
Outubro de 2003
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ii
ANÁLISE DA INTERCONEXÃO DOS SISTEMAS DE ESGOTOS
SANITÁRIO E PLUVIAL DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO:
VALORIZAÇÃO DAS COLEÇÕES HÍDRICAS SOB
PERSPECTIVA SISTÊMICA
Alexandre Pessoa Dias
Trabalho Final submetido ao Programa de Pós-
graduação em Engenharia Ambiental da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ,
como parte dos requisitos necessários à obtenção do
título de Mestre em Engenharia Ambiental.
Aprovada por:
__________________________________________________
Prof
a
. Thereza Christina de Almeida Rosso, D.Sc. - Presidente
PEAMB/UERJ
__________________________________________________
Prof. Josué Setta, D.Sc.
DCCT/UERJ
__________________________________________________
Prof. Szachna Eliasz Cynamon, D.Sc.
ENSP/FIOCRUZ
__________________________________________________
Prof. Léo Heller, D.Sc.
DESA/UFMG
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Outubro de 2003
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iii
PESSOA DIAS, ALEXANDRE
Análise da Interconexão dos Sistemas de Esgotos
Sanitário e Pluvial da Cidade do Rio de Janeiro:
Valorização das Coleções Hídricas sob
Perspectiva Sistêmica. [Rio de Janeiro] 2002.
xviii, 244 p. 29,7 cm (FEN/UERJ, Mestrado,
Programa de Pós-graduação em Engenharia
Ambiental - Área de Concentração: Saneamento
Ambiental - Controle da Poluição Urbana e
Industrial, 2003.)
Dissertação - Universidade do Estado do Rio
de Janeiro - UERJ
1. Esgotamento Sanitário
2. Drenagem Pluvial
3. Concepção Sistêmica
4. Valorização das coleções hídricas
I. FEN/UERJ II. Título (série)
iv
Resumo do Trabalho Final apresentado ao PEAMB/UERJ como parte dos requisitos
necessários para a obtenção do grau de Mestre em Engenharia Ambiental
Análise da Interconexão dos Sistemas de Esgotos
Sanitário e Pluvial da Cidade do Rio de Janeiro:
Valorização das Coleções Hídricas sob Perspectiva Sistêmica
Alexandre Pessoa Dias
Outubro de 2003
Orientadora: Thereza Christina de Almeida Rosso
Área de Concentração: Saneamento Ambiental - Controle da Poluição Urbana e Industrial
O controle do aporte indevido de esgoto sanitário nas coleções hídricas da Cidade do Rio de
Janeiro proveniente das interconexões entre os sistemas de esgotamento sanitário e de
drenagem pluvial é um desafio de difícil equacionamento. Sua extensão é um fator
limitante ao desenvolvimento das potencialidades deste ecossistema urbano, questão
amplamente discutida em diversos estados do país e no exterior e, no entanto, minimamente
enfrentada nesta cidade. O estudo histórico dos sistemas de esgotos demonstrou que soluções
parciais e fragmentadas de pretensa despoluição dos corpos hídricos cariocas têm atuado
sobretudo nos efeitos e não nas causas desta poluição, mostrando-se ambientalmente
insustentáveis. A avaliação consignada no fluxograma “soluções atípicas insustentáveis”,
configurou a existência de múltiplas barreiras sanitárias, de resultados questionáveis, que
tornaram ainda mais complexas e custosas a operação e manutenção dos sistemas de esgotos,
demonstrando a pouca compreensão da interdependência entre os sistemas de saneamento e as
comunidades. O trabalho constatou que algumas dificuldades de pretensa ordem técnica têm
como origem limitações conceituais. A superação deste cenário perpassa por uma mudança na
concepção das intervenções de engenharia na cidade, enfocando as fontes de poluição em sua
natureza holística e a necessidade de um conjunto de ações sistêmicas sobre o esgotamento
sanitário e pluvial que tenha como estratégia principal à valorização das coleções hídricas
urbanas. Nas recomendações propõe-se um conjunto de ações articuladas, através do
Programa Caça-Esgoto, que objetiva a recuperação das vantagens do sistema separador
absoluto.
Palavras-Chave: Esgotamento Sanitário, Drenagem Pluvial, Concepção Sistêmica, Histórico
dos Sistemas de Esgotos.
v
Abstract of Final Work presented to PEAMB/UERJ as a partial fulfillment of the
requirements for the degree of Master of Environmental Engineering.
Analysis of the Interconnectivity of the Sanitary and Rain Drainage Systems in
the City of Rio de Janeiro: Emphasis on Water Bodies from a Systemic
Perspective
Alexandre Pessoa Dias
Outubro de 2003
Advisors: Thereza Christina de Almeida Rosso
Area: Environmental Sanitation - Urban and Industrial Pollution Control
The control of sanitary sewage discharge into the receiving waters through unlawful full
conections between sewer system and rainfall collection system is a difficult challenge in the
City of Rio de Janeiro. Its proportion has been a limiting factor to the development of full
potential of the local hydric ecosystems that, besides their importance has been minimally
faced by the public authorities. The city history of sewage systems demonstrated that partial
and fragmented solutions to improve the water resources quality had been focused on the
effects and not in the causes of the pollution and are environmentally unsustainable. The
evaluation presented in the flow chart Unsustainable non Typical Solutions” showed the
existence of many sanitary barriers with questionable results, which, in turn, have made the
operation and maintenance of the sewage systems even more complex and costly, as
consequence of the lack of comprehension about the interdependence of sanitation systems
and communities. The study found out that some difficulties considered as technical ones in
reality derived from conceptual limitations. Such a change should focus on the sources of
pollution in a holistic way, as well as on the need for a set of systemic actions on the
sanitary drainage system, one which would strategically target urban rain drainage. The study
suggest a group of articulated actions, through the “Caça-Esgoto” Program, to recover the
advantages of the separated sewer system.
Key words: Sanitary sewage, Rain drainage, Systemic concept, History of sewage systems
vi
A Pedro Eich Pessoa Dias, revelação de amor sem proporções.
Filho, agora pode desligar o computador, e vamos ao parquinho...
vii
AGRADECIMENTOS
À Universidade do Estado do Rio de Janeiro, constituída pelo seu corpo docente, discente e
técnico-administrativo, que no compartilhamento de suas ansiedades, desejos, lutas e
comemorações me fizeram aprender e reconhecer a universidade como fonte inesgotável de
aprendizado, de importância vital para o país.
Ao Fundo Setorial de Recursos Hídricos (CT-HIDRO), do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
À prof
a
Thereza Christina de Almeida Rosso pela orientação, confiança e oportunidades
oferecidas, fundamentais para a realização deste trabalho.
Aos caros professores Maurício José Ferrari Rey, Moacyr Carvalho Filho, José Alexandre
Pimenta e Carlos Alberto Pereira Correia, que souberam compreender em minha intensa vida
universitária à vontade de participar da construção de nossa universidade e do reconhecimento
aos meus esforços em atuar como engenheiro, para exercer através de minha profissão, o
retorno à sociedade. Obrigado, pelos votos de confiança, estímulos, oportunidades e
principalmente, pela amizade.
Aos professores do Departamento de Engenharia Sanitária e do Meio Ambiente da UERJ, em
especial a Joberto Macedo Pimentel, Gandhi Giordano, Elmo Rodrigues da Silva e Odir
Clécio Roque pelo apoio neste trabalho.
Aos colegas de projetos que colaboraram neste trabalho, os engenheiros Ary Castro Pinto de
Castro e Carlos Alexandre P. R. Batista. Aos estagiários que muito me ensinaram, através de
suas dúvidas, ansiedades e visões de mundo; em especial: Raul Severo, Ágatha Reguse,
Patrick Feno, Nicolas Tateishi, Gustavo Caldas, Alessandra Almeida, Renata da Silva,
Clarissa Miranda, Lívia Santiago, Eliane Kuhnert, Camila Dias.
Ao mestre prof. Breno Marcondes Silva (in memorian), por sua trajetória profissional,
marcada por fortes compromissos com a universidade pública e com as condições sócio-
ambientais de nossa cidade e mundo, por suas aulas, estímulos a profissão por nós escolhida e
pela eterna orientação dada através de seus ensinamentos, que pela intensidade e
profundidade, se revelam de forma distinta e surpreendente para mim a cada dia. Obrigado
viii
também a seu filho, Dalton Marcondes Silva, pelos ensinamentos de Ecologia na Fiocruz e
em sua residência.
À vida e à cidade onde moro, que aprendi no passado a amar de longe e depois a vivenciar
seus problemas e beleza expressas em seu patrimônio histórico cultural e em sua natureza, que
contemplada em diversos ângulos, me reforça nos compromissos de dedicação à sua
valorização.
Aos meus companheiros de movimento estudantil, em especial aos amigos Eduardo Henrique,
Alexandre Seixas França, André Castro e Andréa Matheus Caldeira, que junto comigo
continuam acreditando na necessidade de uma sociedade melhor.
À Milena Campos Eich, minha companheira, alma gêmea de muito tempo. Pelo apoio
espontâneo e grandes esforços em todos os momentos, inclusive no acompanhamento das
intermináveis revisões de texto, vocação que lhe confere. Aos sogros e amigos Neri Vitor e
Elza Rita pela grande herança que lhe deram: a intelectualidade, com olhar atento às classes
menos favorecidas de nosso povo.
E finalmente, à minha querida mãe pela alegria de viver e insistência em lutar por
oportunidades para seus filhos, exemplo de mulher nordestina trabalhadora.
ix
“(...) De uma coisa nós sabemos: A terra não pertence ao homem;
é o homem que pertence a terra. Disto temos certeza. Todas as
coisas estão interligadas, como sangue que une uma família. Tudo
quanto agride a terra, agride os filhos da terra. Não foi o homem
quem teceu a trama da vida: ele é meramente um fio da mesma.
Tudo o que ele fizer à trama, a si próprio fará”.
(Carta do chefe indígena Seattle ao Presidente dos Estados Unidos,
Franklin Pierce, em 1853).
x
SUMÁRIO
RESUMO.................................................................................................................................iv
ABSTRACT .............................................................................................................................v
LISTA DE FIGURAS............................................................................................................xii
LISTA DE QUADROS.........................................................................................................xiv
LISTA DE TABELAS...........................................................................................................xv
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS .........................................................................xvi
1. INTRODUÇÃO ...............................................................................................................001
2. OBJETIVOS E METODOLOGIA................................................................................005
2.1. Objetivo Geral ..............................................................................................................005
2.2. Objetivos Específicos....................................................................................................005
2.3. Metodologia...................................................................................................................006
3. MARCO TEÓRICO........................................................................................................008
3.1. Concepção Sistêmica ....................................................................................................008
3.2. Ecossistema Urbano .....................................................................................................015
3.3. Poluição .........................................................................................................................019
3.4. Sistemas de Saneamento ..............................................................................................021
3.4.1. Definições....................................................................................................................021
3.4.2. Fundamentos Básicos e Princípios..............................................................................024
4. PREMISSAS OPERACIONAIS DOS SISTEMAS DE ESGOTOS...........................027
4.1. Visão Integrada dos Sistemas de Saneamento...........................................................027
4.1.1. Planejamento Urbano Ambiental ................................................................................027
4.1.2. Interdependência com a Sociedade..............................................................................033
4.2. O Esgoto Sanitário........................................................................................................037
4.3. Os Sistemas de Esgotos ................................................................................................043
5. HISTÓRICO DOS SISTEMAS DE ESGOTOS DA CIDADE DO RIO DE
JANEIRO..........................................................................................................................048
5.1. Evolução das Concepções de Saneamento..................................................................048
5.2. Primeiras Intervenções no Rio de Janeiro .................................................................054
5.2.1. Eliminação dos “Ecossistemas Adversos” ..................................................................054
5.2.2. Práticas Individuais para o Esgoto Doméstico............................................................063
5.3. Sistemas Coletivos de Esgotos .....................................................................................072
5.3.1. Influência Inglesa ........................................................................................................072
5.3.2. Pioneirismo em Nível Mundial ...................................................................................075
5.3.3. Evolução dos Tipos de Sistemas de Esgotos...............................................................080
5.3.4. Concessionárias dos Serviços de Esgotos ...................................................................093
5.3.5. A Questão da Ocupação Urbana..................................................................................111
xi
6. INTERCONEXÃO ENTRE OS SISTEMAS DE ESGOTOS.....................................129
6.1. Introdução.....................................................................................................................129
6.2. Os “Canais de Esgotos”................................................................................................130
6.2.1. Caracterização das Coleções Hídricas na Cidade do Rio de Janeiro...........................130
6.2.2. Degradação Ambiental dos Corpos Hídricos ..............................................................134
6.3. Estruturas e Condições Operacionais das Interconexões.........................................141
6.3.1. Origens ........................................................................................................................141
6.3.2. Elementos Atípicos do Sistema Separador Absoluto..................................................149
6.3.3. Estações de Tratamento nos Cursos dos Canais, Rios e Praias...................................162
6.4. Contaminação por Esgoto Sanitário...........................................................................166
6.4.1. Regulamentação...........................................................................................................166
6.4.2. Riscos Epidemiológicos e Ambientais........................................................................167
6.5. Discussão .......................................................................................................................165
7. VALORIZAÇÃO DAS COLEÇÕES HÍDRICAS - UMA NOVA PERSPECTIVA.189
7.1. Generalidades ...............................................................................................................189
7.2. Estudos de Referência..................................................................................................195
7.2.1. A Política de Recursos Hídricos..................................................................................195
7.2.2. Classificação e Uso dos Corpos Hídricos....................................................................196
7.2.3. Plano Diretor de Esgotamento Sanitário .....................................................................202
7.2.4. Plano Diretor de Drenagem Urbana ............................................................................203
7.3. Programa de Despoluição da Baía de Guanabara.....................................................204
7.4. Indicadores de Desempenho dos Sistemas de Esgotos ..............................................206
8. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES .....................................................................210
8.1. Conclusões.....................................................................................................................210
8.2. Proposições e Perspectivas...........................................................................................220
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..............................................................................230
ANEXO - Rio Carioca: da sua história, o que preservar?
xii
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Relações dinâmicas entre processos sociais e ecológicos........................................13
Figura 2. Inter-relações entre sistemas ambientais e humanos................................................16
Figura 3. Trocas de energia, matéria e informação entre a cidade e seu entorno....................17
Figura 4. Barreiras sanitárias...................................................................................................23
Figura 5. Ciclo de empreendimentos de saneamento..............................................................31
Figura 6. Modelos de desenvolvimento atual e sustentável ....................................................51
Figura 7. Mapa topográfico da Cidade do Rio de Janeiro.......................................................55
Figura 8. Canal do Mangue .....................................................................................................56
Figura 9. Arrasamento do morro do Castelo ...........................................................................57
Figura 10. Alterações físicas do centro da cidade do Rio de Janeiro......................................59
Figura 11. Aspectos da Lagoa Rodrigo de Freitas...................................................................60
Figura 12. Delimitações das margens da Lagoa Rodrigo de Freitas.......................................60
Figura 13. Evolução urbanística na Cidade do Rio de Janeiro................................................62
Figura 14. Principais valas do centro da cidade em meados do séc. XIX...............................64
Figura 15. O “Tigre” de Debret...............................................................................................68
Figura 16. Charge: as imundícies das ruas no Rio de Janeiro.................................................70
Figura 17. Charge: o lançamento de dejetos nas praias da cidade ..........................................70
Figura 18. Localização da Estação de Tratamento de Esgoto da Glória.................................79
Figura 19. Bombas da elevatória da Glória fabricadas pela James Watt&Co.........................79
Figura 20. Cloaca Máxima ......................................................................................................81
Figura 21. Aspectos do sistema de esgotos “tout-à-l`égout”..................................................82
Figura 22. Museu do “tout-à-l`égout”....................................................................................82
Figura 23. Estações elevatórias de esgoto concebidas por Saturnino de Brito........................85
Figura 24. Elementos de controle de gases em rede coletora de esgoto sanitário...................87
Figura 25. Tanque fluxível concebido por Saturnino de Brito................................................90
Figura 26. Mictório redutor de consumo de água....................................................................91
Figura 27. Esquema de sistema predial de esgoto sanitário a vácuo.......................................91
Figura 28. Protótipo de bacia sanitária para redução no consumo de água.............................92
Figura 29. Antiga Estação de Tratamento de Esgoto da Gamboa, 1866.................................95
Figura 30. Divisão contratual das áreas de esgotamento sanitário da City e da IAE..............98
Figura 31. Sistema de esgotamento sanitário do Estado da Guanabara em 1964 .................103
Figura 32. Cortiços nos fundos dos prédios nº 12 a 44 da rua do Senado.............................112
Figura 33. Distribuição das áreas favelizadas na Cidade do Rio de Janeiro em 1999 ..........116
Figura 34. Favela do morro de Santo Antônio ......................................................................117
Figura 35. Aspectos dos parques proletários.........................................................................119
xiii
Figura 36. Favela da Rocinha nas décadas de 50 e 60 ..........................................................120
Figura 37. Conjunto habitacional Vila Kennedy...................................................................120
Figura 38. Comunidade Salsa e Merengue, Complexo da Maré...........................................124
Figura 39. Insalubridade em Vigário Geral...........................................................................124
Figura 40. Mapa Hidrográfico da Cidade do Rio de Janeiro.................................................133
Figura 41. Inundação na Praça da Bandeira em 29 janeiro 1940..........................................136
Figura 42. Concepção dos interceptores da Cidade do Rio de Janeiro..................................151
Figura 43. Aspectos construtivos do Interceptor Oceânico da Zona Sul...............................152
Figura 44. Planta Geral do Sistema de Esgotamento da Zona Sul em 1969 .........................153
Figura 45. Desenho esquemático do Sistema Marina da Glória............................................155
Figura 46. Coletores do Sistema Marina da Glória...............................................................155
Figura 47. Galeria de cintura da Lagoa Rodrigo de Freitas...................................................157
Figura 48. Estruturas de Captação de Tempo Seco...............................................................158
Figura 49. Desembocadura do canal da Visconde de Albuquerque......................................159
Figura 50. Comporta do canal da rua General Garzon..........................................................159
Figura 51. Comporta e estrutura de bombeamento do canal da Visconde de Albuquerque..160
Figura 52. Esquema das estruturas de esgotamento da Lagoa Rodrigo de Freitas................160
Figura 53. Estação de Tratamento do rio Carioca.................................................................163
Figura 54. Obras de despoluição da praia de São Conrado...................................................164
Figura 55. Aspectos da praia de Ramos ................................................................................165
Figura 56. Poluição da praia da Barra da Tijuca pelo Canal da Joatinga..............................168
Figura 57. Formação de “línguas negras” .............................................................................170
Figura 58. Ligações irregulares de esgoto doméstico na favela Rio das Pedras ...................172
Figura 59. Modelo causal de doenças relacionadas à drenagem urbana ...............................173
Figura 60. Modelo de troca “esgoto - coleções hídricas”......................................................175
Figura 61. Marco casual da diarréia em Betim, MG.............................................................176
Figura 62. Fluxograma da “Solução Convencional Eficiente”..............................................185
Figura 63. Fluxograma das “Soluções Atípicas Insustentáveis”...........................................186
Figura 64. Usos da água ........................................................................................................199
xiv
LISTA DE QUADROS
Quadro 1. Paradigmas dominante e alternativo.......................................................................14
Quadro 2. Doenças relacionadas à contaminação por fezes....................................................42
Quadro 3. Acidentes desaparecidos e alterados do centro da cidade do Rio de Janeiro.........58
Quadro 4. Evolução política da Cidade do Rio de Janeiro......................................................76
Quadro 5. Concessionárias e repartições dos serviços de esgotos do Rio de Janeiro .............93
Quadro 6. Eventos e marcos jurídico-intitucionais dos serviços de esgoto...........................107
Quadro 7. Implantação dos primeiros sistemas de esgotos da Cidade do Rio de Janeiro.....108
Quadro 8. Bacias de esgotamento sanitário da Cidade do Rio de Janeiro.............................111
Quadro 9. Episódios pluviais causadores de impactos sócio-ambientais na Cidade do RJ...137
Quadro 10. Contraponto entre conceitos higienistas e alternativos de drenagem.................193
Quadro 11. Classificação das águas doces em função dos usos preponderantes ..................197
Quadro 12. Usos diversos das águas .....................................................................................198
Quadro 13. Categorias de análise e variáveis propostas de indicadores ambientais.............209
xv
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Alterações dos ecossistemas da Baía de Guanabara provocadas por ações
antrópicas...............................................................................................................61
Tabela 2. Crescimento populacional da Cidade do Rio de Janeiro, 1585-1950....................114
Tabela 3. Crescimento da população total e subnormal da Cidade do RJ, 1950-2000 .........114
Tabela 4. Principais rios cariocas..........................................................................................132
Tabela 5. Padrões de qualidade dos principais parâmetros das águas, de acordo com a
classificação da Resolução CONAMA n
o
20/86 .................................................200
Tabela 6. Classificação expedita da situação dos corpos d’água ..........................................201
xvi
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária (até 1977)
ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
ABRH Associação Brasileira de Recursos Hídricos
AEERJ Associação das Empresas de Engenharia do Rio de Janeiro
APA Áreas de Proteção Ambiental
APAC Áreas de Proteção ao Ambiente Cultural
APARU Áreas de Proteção Ambiental e Recuperação Urbana
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
BNH Banco Nacional de Habitação
CABES Catálogo Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental
CECA Comissão Estadual de Controle Ambiental
CEDAE Companhia Estadual de Águas de Águas e Esgotos
CEDAG Companhia Estadual de Águas da Guanabara
CITY The Rio de Janeiro City Improvements Company Limited
CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
COHAB Companhia de Habitação Popular
CONAMA Conselho Nacional de Meio Ambiente
COPES Comissão de Planejamento do Sistema de Esgoto do Distrito Federal
CTS Captação de Tempo Seco
CT-HIDRO Fundo Setorial de Recursos Hídricos
DAA Departamento de Águas
DAE Departamento de Águas e Esgotos
DBO Demanda Bioquímica de Oxigênio
DES Departamento de Esgoto Sanitário (até 1964)
DES Departamento de Saneamento
DESMA Departamento de Engenharia Sanitária e do Meio Ambiente
DNOS Departamento Nacional de Obras de Saneamento
DRC Departamento de Rios e Canais
ESAG Empresa de Saneamento da Guanabara
ESEI Emissário Submarino de Ipanema
ENSP Escola Nacional de Saúde Pública
ETA Estação de Tratamento de Água
ETE Estação de Tratamento de Esgoto Sanitário
FAPERJ Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do RJ
FEEMA Fundação Estadual da Engenharia do Meio Ambiente
FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
FIBGE Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz
xvii
GAP Galeria de Águas Pluviais
GEAP Grupo Executivo de Assentamentos Populares
GIS Geographic Information System
GPS Global Position System
IAE Inspetoria de Águas e Esgotos
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
IES Instituto de Engenharia Sanitária
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPP Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos
JBIC Japan Bank for International Cooperation
NBR Norma Brasileira Registrada
OMC Serviços de Operação; Manutenção e Conservação
OMS Organização Mundial de Saúde
OPAS Organização Pan-Americana de Saúde
PAT-
PROSANEAR
Programa de Assistência Técnica ao Prosanear
PCRJ Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro
PDBG Programa de Despoluição da Baía de Guanabara
PDES-RMRJ
Plano Diretor de Esgotamento Sanitário da Região Metropolitana do Rio
de Janeiro e das Bacias Contribuintes à Baía de Guanabara
PDLI Plano de Desenvolvimento Local Integrado
PLANASA Plano Nacional de Saneamento
PMSS Programa de Modernização do Setor Saneamento
PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PROFACE Programa das Favelas da CEDAE
PROSANEAR Programa de Saneamento Básico para a População de Baixa Renda
PSI Projeto de Saneamento Integrado
PVC Cloreto de Polivinila
RES Rede Coletora de Esgoto Sanitário
RIO-ÁGUAS Fundação Instituto das Águas do Município do Rio de Janeiro
RMRJ Região Metropolitana do Rio de Janeiro
SAEDF Serviço de Águas e Esgotos do Distrito Federal
SANERIO
Plano Diretor de Esgotamento Sanitário para Região Metropolitana do
Rio de Janeiro e Área Contribuinte à Baía de Guanabara
SANERJ Companhia de Saneamento do Estado do Rio de Janeiro
SEAERJ Sociedade dos Engenheiros e Arquitetos do Estado do Rio de Janeiro
SEDU Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano
SEMA Secretaria Estadual de Obras e Meio Ambiente
SEMADS Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
SEMADUR Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano
SERLA Fundação Superintendência Estadual de Rios e Lagoas
xviii
SERFHA Serviço de Recuperação de Favelas e Habitações Anti-Higiênicas
SESP Serviço Especial de Saúde Pública
SESRH Secretaria de Estado de Saneamento e Recursos Hídricos
SFAE Serviço Federal de Águas e Esgotos
SISNAMA Sistema Nacional de Meio Ambiente
SLAP Sistema de Licenciamento de Atividades Poluidoras
SMAC Secretaria Municipal de Meio Ambiente
SNIS Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento
SURSAN Superintendência de Urbanização e Saneamento
UCA Unidades de Conservação Ambiental
UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro
UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
USAID United States Agency for International Development
xix
PREPARAÇÃO DOS EXEMPLARES FINAIS
1. Deverão ser entregues cinco exemplares encadernados, 1 exemplar (original) sem
encadernação, e um cd-rom com o trabalho final.
2. Encadernação dos exemplares: deverão ser feitos na xerox da UERJ no térreo.
Procurar por JOSÉ CARLOS telefone 2576 5663. Informar que é do Programa de
Mestrado em Engenharia Ambiental. A capa está padronizada com eles e será em
azul royal. Cada exemplar custa R$30,00. O prazo médio de entrega é de três dias
úteis.
3. Não esquecer de combinar com ele por telefone antes de deixar em um envelope na
xerox aos cuidados do José Carlos. Deixar um telefone de contato para eventuais
problemas e dúvidas.
4. Conforme pode ser observado a segunda folha é a folha de aprovação da banca.
Solicitamos que os alunos antes de encaminharem os trabalhos para encadernação
obtenham as assinaturas nas seis folhas que deverão fazer parte dos exemplares
finais.
1
1. INTRODUÇÃO
“O mundo não vai superar sua crise atual usando o mesmo pensamento
que criou essa situação” (Albert Einstein).
O modelo de desenvolvimento capitalista é pautado no consumismo e tem como
conseqüência inevitável o consumo perdulário de matéria e energia, gerando grande produção
de resíduos. Dentro de uma visão utilitarista, onde o espaço produzido segue a lógica
produtivista que visa incessantemente maiores rentabilidades, os elementos do mundo natural,
a água, o ar e a terra foram, convertidos em atributos da sociedade, em bens de consumo, nos
estritos limites do reino da propriedade privada.
Sendo responsável direta por significativas transformações da natureza, uma vez que é
capaz de valer-se de diversas ciências para desenvolver tecnologias e procedimentos capazes
de minimizar os impactos das ações antrópicas sobre o meio ambiente, a engenharia está
incorporada à questão ambiental. Na atualidade, a poluição urbana tornou-se um dos fatores
mais limitantes para o desenvolvimento das potencialidades das cidades.
Inúmeros projetos de ocupação territorial, obras e implantação de tecnologias geram
graves conflitos de uso dos recursos naturais, provocando impactos ambientais, econômicos e
sociais. As ações de saneamento devem incorporar conceitos e modelos ecológicos para
efetivamente obterem resultados profícuos. Estas mesmas ações devem ser analisadas em suas
mínimas conseqüências, de maneira a permitir o desenvolvimento de todo um substrato
tecnológico capaz de impedir ou neutralizar a introdução de resultados secundários nocivos.
A visão ambiental de um cenário como a Cidade do Rio de Janeiro deve ser
abrangente e enfocar aspectos de arquitetura e engenharia urbana, de infra-estrutura de
saneamento, moradia, controle da poluição e conservação do patrimônio natural, estético e
social, verificando os níveis de qualidade de vida, preservação e recuperação dos
ecossistemas.
O nível de atendimento proporcionado às populações urbanas pelas obras de
saneamento já teve, no Brasil, como resultado da implantação de novos equipamentos e
ampliação de sistemas existentes, um considerável incremento com relação ao
abastecimento de água. Entretanto, para os sistemas de esgotos (sanitários e pluviais), a
situação ainda é precária.
Os sistemas de esgotamento sanitário, tanto nos aspectos quantitativos como
qualitativos, são ainda um grande desafio às políticas públicas do país, uma vez que seu custo
é reconhecidamente elevado e exigem tecnologias apropriadas de planejamento, projeto e
2
construção, devido aos múltiplos fatores intervenientes. Mediante o crescimento das urbes e
do consumo de água, esta questão tem se agravado a cada dia.
Segundo a FIBGE, no Censo Demográfico 2000, “das condições de saneamento
básico, o esgotamento sanitário é o que apresenta o mais longo caminho a ser percorrido
para atingir índice satisfatório que possa garantir melhorias nas condições de moradia e
saúde da população, bem como preservar a qualidade do meio ambiente”.
As legislações urbanísticas e ambientais estão em estágio avançado, porém sua real
implementação depende fundamentalmente de vontade política. Recursos financeiros e
humanos devem ser efetivamente alocados para este fim, traduzindo-se em monitoramento,
controle, fiscalização e punição aos infratores. As demandas legais relativas à evolução da
questão ambiental e aos cenários desenvolvidos incluem com destaque a lei federal n
o
9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais) que prevê punições civil, administrativa e criminal
derivadas de conduta lesiva ao meio ambiente, sendo uma expressão de amadurecimento da
sociedade. O direito à saúde e ao saneamento é constitucionalmente tutelado, portanto, os
serviços de água e esgoto são passíveis de serem cobrados judicialmente pelo Ministério
Público, podendo gerar ao estado e aos prestadores do serviço público a obrigação de reparar
os danos causados por sua prestação deficitária, insuficiente ou inexistente.
Por outro lado, ações pró-ativas responsáveis e compromissadas com o meio ambiente
tendem a ser reconhecidas e valorizadas. O desenvolvimento de padrões de condutas e
normalizações internacionais, como a série ISO 14.000 - Sistemas de Gestão Ambiental, gera
demandas em vel mundial, dando respaldo à atuação dos órgãos e dos profissionais
responsáveis pela gestão do saneamento ambiental. A parametrização de indicadores de
desempenho dos sistemas de saneamento vem se firmando como uma premissa operacional da
qual a sociedade vem exigindo prestação de contas. Os sistemas de esgotos são elementos
básicos fundamentais à estruturação das cidades e a superação de suas defasagens e
dificuldades operacionais, dentro do indissociável binômio quantidade-qualidade, são
imprescindíveis para que a cidade cumpra a função social a que deve aspirar.
Nesse sentido, esta dissertação apresenta a problemática das interconexões entre os
sistemas de esgoto sanitário e de drenagem pluvial na Cidade do Rio de Janeiro, que impedem
a eficácia destes sistemas de saneamento enquanto barreiras sanitárias e ecológicas. A
temática abordada é de grande relevância para o controle da poluição e pretende reiterar a
necessidade de melhor utilização das coleções hídricas urbanas.
Procurou-se, à luz da concepção sistêmica, analisar os sistemas de esgotos da cidade,
partindo-se da compreensão de que os sistemas de saneamento são dinâmicos e sofrem
constantes mudanças ditadas pelos diversos atores sociais que produzem o espaço urbano.
3
Devem ser priorizados as políticas e os programas de recuperação dos ecossistemas fluviais,
lacustres, marítimos e edáficos, ainda que se encontrem altamente antropizados, pois mesmo
assim desempenham funções vitais para a saúde ambiental.
A limitação dos recursos naturais e o nível de hipertrofia e complexidade do ecossistema
urbano estabelecem e ratificam o paradigma de que as intervenções em saneamento, para
cumprirem seus objetivos sanitários, devem atender aos condicionantes ecológicos, superando
suas próprias limitações setoriais.
O texto está estruturado em oito capítulos, incluindo-se esta introdução (Capítulo 1),
além do Anexo. No Capítulo 2 são apresentados os objetivos almejados, o geral e os
específicos, bem como a metodologia de pesquisa adotada.
O marco teórico apresentado no Capítulo 3 está fundamentado na Concepção Sistêmica
como premissa e perspectiva para o desenvolvimento adequado do Saneamento Ambiental. A
urbe está colocada enquanto ecossistema urbano que sofre com a complexidade dos efeitos da
poluição, aqui entendida como problema de natureza holística. Os sistemas de saneamento,
onde se enquadram os sistemas de esgotos, são definidos e norteados por fundamentos básicos
e princípios que estabelecem os critérios de eficiência e eficácia.
O Capítulo 4 destaca o planejamento ambiental urbano que considere a inter-relação
entre os sistemas de saneamento e sua interdependência com a sociedade, colocadas como
premissas operacionais.
Foi necessária ampla consulta bibliográfica para a confecção do Capítulo 5, que
pretende traçar a evolução histórica dos sistemas de esgotos da Cidade do Rio de Janeiro,
dentro de uma análise crítica, na tentativa de superar visões setoriais e superficiais,
artificialmente fragmentadas. Dificuldades foram encontradas pela alta dispersão das
informações e pela escassez de trabalhos que primassem pela preocupação com estes
aspectos.
A evolução dos sistemas de saneamento está vinculada ao desenvolvimento institucional
do Estado, ao modo de produção, ao desenvolvimento tecnológico e à distribuição de renda. A
disseminação da pobreza pelo tecido urbano dificulta a preservação dos recursos naturais e
dos sistemas artificiais de proteção ambiental, de tal forma que a miséria pode ser considerada
o maior obstáculo para a sustentabilidade dos ecossistemas. Desenvolver o saneamento
ambiental requer em primeira e última instâncias soluções sócio-econômica-políticas relativos
a emprego e renda.
No Capítulo 6, a pesquisa caracteriza o elevado estado de interconexão entre os sistemas
de esgotos da cidade, onde soluções emergenciais e pontuais, porém “permanentes”,
desconfiguraram o sistema de esgoto sanitário, concebido em tese como separador absoluto.
4
São identificados os riscos epidemiológicos e ambientais inseridos nos elementos
atípicos ao tipo de esgotamento sanitário da cidade, conseqüência das interconexões
existentes e aqueles em que a alternativa adotada ratifica a permanência das interconexões e
de seus efeitos danosos.
No Capítulo 7, o trabalho justifica e acrescenta argumentos sobre a necessidade do
controle das fontes de poluição provenientes dos aportes de esgotos irregulares. Subsidia-se
na classificação e uso dos corpos hídricos, na atual política de recursos hídricos estabelecida
nas legislações federal e estadual 9.433/97 e 3.239/99, respectivamente, no Plano Diretor de
Esgotamento Sanitário de 1994, ainda vigente, e no termo de referência para elaboração do
futuro Plano Diretor de Drenagem Urbana da Cidade do Rio de Janeiro. O levantamento de
indicadores de desempenho dos sistemas de esgotos foi necessário ao entendimento das atuais
tendências dos estudos e iniciativas desenvolvidos para a melhoria operacional dos serviços
de esgotos.
As conclusões e recomendações apontadas no Capítulo 8 sistematizam os principais
aspectos abordados e tecem proposições julgadas necessárias para a mudança do cenário de
degradação ambiental. Este capítulo apresenta a necessidade de reativação das obras dos
sistemas de esgotos na Bacia de Jacarepaguá e Zona Oeste e de mudança de curso do atual
Programa de Despoluição da Baia de Guanabara para que este efetivamente coloque os
sistemas de esgoto em um outro patamar, sintetizando uma proposta: o Programa Caça
Esgotos - visando a redução da interconexão entre os esgotos sanitário e pluvial, com as
adequações e ampliações necessárias ao sistema de esgotamento sanitário.
O Anexo contém uma breve descrição da historiografia do rio Carioca, suas
características e relevância, justificando a implantação de um plano de manejo de recuperação
ambiental, que poderia vir a ser um marco na mudança de relação frente aos cursos d’água
urbanos.
Para dar a dissertação à necessária unidade, foram abordados os sistemas de
esgotamento sanitário, a drenagem pluvial, suas inter-relações e a interdependência destes às
bacias hidrográficas urbanas e à população residente na ainda bela Cidade do Rio de Janeiro.
5
2. OBJETIVOS E METODOLOGIA
“É indiscutível a importância dos conhecimentos relativos à história das
ciências ou à evolução das técnicas, como importante subsídio para o próprio
estudo científico ou tecnológico” (José Martiniano de Azevedo Netto).
2.1. Objetivo Geral
Esta dissertação pretende analisar a problemática das interconexões entre os sistemas
de esgotamento sanitário e pluvial da Cidade do Rio de Janeiro, verificando até que ponto o
tipo de sistema oficialmente concebido - separador absoluto - de fato contempla suas funções
sanitárias e ambientais de coleta, transporte e destino final adequado dos esgotos sanitários.
Procura-se trabalhar a hipótese de que muitas das soluções adotadas para a despoluição dos
corpos hídricos estão gradualmente descaracterizando e desqualificando as vantagens deste
sistema.
2.2. Objetivos Específicos
A elaboração de uma proposta de valorização sistêmica das coleções hídricas, com a
correspondente ampliação de seus usos, deve se apresentar como uma meta a ser almejada
pela gestão ambiental dos sistemas de esgotos. Por conseguinte, vem a ser objeto deste estudo
os seguintes itens complementares:
Análise da evolução dos sistemas de esgotos (sanitário e pluvial) dentro de uma
contextualização histórica;
Compreensão da multicausalidade da poluição e seus efeitos;
Verificação da relação de interdependência entre a comunidade e a gestão dos
serviços de esgotos e de infra-estrutura urbana;
Estudo das condições de operação, manutenção e conservação destes sistemas,
avaliando sua relação com as obras de ampliação;
Elaboração do escopo de um programa de eliminação das interconexões entre os
sistemas de esgotamento sanitário e de drenagem pluvial.
6
2.3. Metodologia
O método de pesquisa adotado foi o bibliográfico, com consulta a dados primários e
secundários, priorizando inicialmente o acervo técnico do Departamento de Engenharia
Sanitária e do Meio Ambiente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (DESMA). A
participação no projeto: Histórico do Saneamento Ambiental da Região Metropolitana do Rio
de Janeiro, desde setembro de 2001, e no Projeto de Memória: História do DESMA, a partir
de janeiro de 2003, possibilitou a sistematização das fontes mediante levantamento e cadastro
deste acervo histórico. A prioridade desses estudos se deve ao alto nível técnico dos
especialistas e professores que fizeram e fazem parte do quadro docente do DESMA, ao longo
dos seus 30 anos de existência, com relevantes contribuições para o saneamento no Estado do
Rio de Janeiro.
A pesquisa também focalizou artigos e trabalhos publicados nas revistas e anais de
congresso da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), além de
diversos periódicos da área de engenharia. Na contextualização histórica dos sistemas de
esgotos da Cidade do Rio de Janeiro, foram de grande relevância os estudos desenvolvidos
pelos engenheiros: Francisco Saturnino Rodrigues de Brito (1864-1929), José Martiniano de
Azevedo Netto (1918-1991) e José Ribeiro da Silva (1918-). Procurou-se compreender os
sistemas de esgotos dentro de um contexto histórico urbano-espacial.
Para o aprofundamento teórico e técnico, buscou-se subsídio a partir de referências
bibliográficas de várias áreas do conhecimento e atuação profissional, notadamente:
engenharia, ecologia, saneamento, saúde pública, urbanismo e ciências políticas, com consulta
a livros, monografias, artigos publicados em congressos e periódicos, além de visitas em
campo, palestras e seminários referentes à temática em questão.
A amplitude da pesquisa foi motivada pelo entendimento da necessidade da
interdisciplinaridade, evitando uma abordagem fragmentada e unilateral, comum na literatura
especializada em saneamento, principalmente a oferecida pelos órgãos oficiais e não perdendo
a perspectiva da busca pela transdisciplinaridade.
O marco teórico é consubstanciado na análise sistêmica, onde o saneamento se
enquadra dentro de uma conceituação ecológica que ratifica suas funções enquanto barreiras
físico-ecológicas para o controle da poluição e da transmissão de doenças, visando o
desenvolvimento e ampliação dos objetivos e metas contemplados pelo saneamento
ambiental.
7
A ênfase na análise crítica da eficiência dos sistemas de esgotamento sanitário foi
quanto à extensão das interconexões com os sistemas de drenagem pluvial urbano, suas
origens e dinâmica. Para isso foram identificadas as principais práticas e cnicas comumente
utilizadas na cidade do Rio de Janeiro, tais como: extravasores, ligações irregulares e
“estruturas atípicas”.
A classificação e uso dos corpos hídricos foram correlacionados às suas limitações
frente ao atual processo de poluição e às perspectivas de mudanças em cenários futuros.
Foram enfatizados documentos de referência nos diagnósticos e proposições do assunto em
questão, tais como os estudos pertinentes aos planos diretores de esgotos, além da atual
legislação de usos das águas.
A análise quantitativa o foi priorizada, uma vez que se optou no trabalho por uma
análise conceitual, contrapondo-se à literatura oficial que, em geral, evidencia as realizações e
não as carências dos serviços e possibilita acesso apenas parcial às informações, relegando a
um segundo plano os pontos de vista contrários. Acresce-se a isto a precariedade do sistema
de cadastro dos serviços de saneamento e a inconsistência dos dados existentes.
Para o entendimento da complexidade e demandas do tema abordado foi essencial a
atuação do autor nas atividades de coordenação de campo do Núcleo de Estudos e Projetos
(NEP), supervisionando equipes de estagiários da Faculdade de Engenharia da UERJ, de
março de 2001 a março de 2002, em assessoria técnica a CEDAE no levantamento cadastral,
inspeção de ligações clandestinas de esgotos e línguas negras nas diversas localidades do
Estado do Rio de Janeiro contempladas pelo Programa de Despoluição da Baia de Guanabara
e pelas Obras de Esgotamento Sanitário da Bacia de Jacarepaguá.
Este trabalho é parte constitutiva do projeto: Subsídios para a Gestão Integrada do
Saneamento Ambiental em Bacias Hidrográficas Costeiras: Estudo de Caso das Bacias
Hidrográficas da Lagoa Rodrigo de Freitas e Baía de Ilha Grande, Porção Continental,
através do Fundo Setorial de Recursos Hídricos (CT-HIDRO
1
), do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), iniciado em abril de 2002.
1
Os Fundos Setoriais de Ciência e Tecnologia, dentre eles o CT-HIDRO, foram criados pelo Ministério de
Ciência e Tecnologia para incentivar o desenvolvimento científico e tecnológico em áreas estratégicas. Dentre as
áreas prioritárias do programa encontram-se: Água e o Gerenciamento Urbano Integrado; Usos Integrados dos
Sistemas Hídricos e Conservação Ambiental e Qualidade das Águas dos Sistemas Hídricos.
8
3. MARCO TEÓRICO
“Para cuidar do planeta precisamos todos passar por uma alfabetização
ecológica e rever nossos hábitos de consumo. Importa desenvolver uma
ética do cuidado” (Leonardo Boff).
A argumentação teórica deste trabalho está fundamentada nos princípios estabelecidos
pela ciência Ecologia, consubstanciando a proposta de análise sistêmica dos recursos naturais
e artificiais que constituem o ecossistema urbano.
Estes aspectos conceituais são necessários uma vez que a gênese do conhecimento se
insere em correntes de pensamento, através da conceituação de idéias, por um lado; e de fatos
concretos, por outro. A conceituação sugere a formulação do problema, que por sua vez
indica qual deve ser a melhor resposta (solução).
A abordagem holística, com a qual se procurou nortear os estudos e análises
apresentadas nos próximos capítulos, pressupõe uma aproximação radical entre os campos
teórico e prático nas intervenções do saneamento ambiental, sem a qual os resultados para o
controle da poluição urbana continuarão precários e incertos.
3.1. Concepção Sistêmica
As abordagens analítica e holística têm sido os dois principais tipos de procedimentos
na organização da compreensão dos fenômenos no mundo ocidental, desde o século XVII. No
entanto, ao contrário do que se podem sugerir, elas não são excludentes, e sim
complementares, conforme destaca Christofoletti (1999):
Torna-se inadequado entender que haja oposição entre as perspectivas reducionista e
holística. Elas complementam-se e se tornam necessárias aos procedimentos de análise em
todas as disciplinas científicas. O fundamental é sempre estar ciente da totalidade do
sistema abrangente, da complexidade que o caracteriza e da sua estruturação hierárquica.
A abordagem reducionista vai focalizando elementos componentes em cada nível
hierárquico do sistema, mas em cada hierarquia também se pode individualizar nas
entidades e compreendê-las em sua totalidade. Sob uma concepção reformulada, substitui a
antiga concepção de analisar parte por parte e, depois, realizar a síntese.
Utilizado inicialmente em 1926, pelo acadêmico sul-africano Jan Smuts, o termo
holismo sofreu restrições por suas associações ao misticismo e ao vitalismo, pois surgia como
um conceito de metafísica (Christofoletti, 1999). Posteriormente, foi cientificamente
resgatado junto à elaboração dos conceitos relacionados à Ecologia. Também esta foi
desenvolvendo sua definição concomitantemente ao desenvolvimento da Biologia, Física,
Química e outras ciências. O vocábulo Ecologia (“oekologie”) foi citado pela primeira vez em
1866, por um dos mais ardorosos discípulos de Charles Darwin: Ernest Haeckel (1834-1919).
9
Apareceu na nota de de página de seu livro Generelle Morphologie der Organismen,
substituindo o termo Biologia. Esse neologismo, formado com os vocábulos gregos “oîcos” e
“logos”, significa literalmente “ciência do habitat” (Acot, 1990). Para Odum (1987):
(...) a Ecologia tem se tornado cada vez mais uma disciplina integrada, que une as ciências
naturais e sociais. Embora retenha suas bases nas ciências biológicas, a Ecologia é uma
ciência “exata”, pois a pesquisa ecológica utiliza os conceitos e o instrumental da
matemática, da química, da física, etc. Mas também ela é uma ciência “aplicada”, pois o
comportamento humano tem muito a ver com a estrutura e funções dos ecossistemas (...).
O holismo provém de holos” que em grego significa totalidade. É a compreensão da
realidade que articula o todo nas partes e as partes no todo, pois tudo como um processo
dinâmico, diverso e uno (Boff, 1999).
Esta teoria filosófica é aplicada às ciências ambientais para a compreensão das
relações entre os componentes do meio ambiente, sugerindo que os seus elementos vivos
(todos os organismos, inclusive os homens) e não vivos interagem como um "todo", de acordo
com leis físicas, químicas e biológicas bem definidas.
Etimologicamente o termo sistema origina-se da combinação de dois radicais gregos:
syn, que significa “junto” e thesis, com significado de “união”. Seu sentido literal é o de uma
“construção solidária”.
Define-se como o conjunto de elementos, materiais ou ideais, dentre os quais se possa
encontrar ou definir alguma relação. Disposição das partes ou dos elementos de um todo,
coordenados entre si, que funcionam como estrutura organizada (Ferreira, 1986).
O sistema é uma totalidade criada pela integração de um conjunto estruturado de
partes componentes, cujas inter-relações estruturais e funcionais criam uma inteireza que não
se encontra implicada por aquelas partes componentes quando desagregadas (Haigh, 1985
apud Christofoletti, 1999). Pode ser conceituado como “um conjunto de relações mútuas que
constitui uma entidade identificável, seja real ou postulada” (Laszlo & Margenau, 1972 apud
Odum, 1988). A definição da condição de contorno e seu recorte dependem, além das
características do objeto (sistema), também das condições sócio-culturais em que se inscreve
o sujeito observador/conceituador (Morin, 2002).
Quando se conceituam os fenômenos como sistemas, uma das principais atribuições e
dificuldades está em identificar os elementos, seus atributos (variáveis), suas relações e níveis
hierárquicos, a fim de delinear com clareza a extensão abrangida pelo sistema em foco
(Christofoletti, 1999). Sua dimensão mínima é a de uma organização capaz de funcionar por
si só, caso contrário é considerado um elemento de sistema.
Nos anos 40, o biólogo austríaco Ludwig von Bertalanffy, deu pertinência e
universalidade a esta noção, através da obra: Teoria Geral dos Sistemas. Segundo o autor,
10
“somos forçados a tratar com complexos, com totalidades ou sistemas em todos os campos do
conhecimento. Isto implica uma fundamental reorientação do pensamento científico
(Bertalanffy, 1977 apud Silva & Schramm, 1999). Nesta teoria os critérios-chave são:
organização e complexidade.
Os sistemas possuem estruturação, função, dinâmica e evolução. Quando se
apresentam enquanto complexos, significa que são constituídos por uma diversidade de
elementos, com muitos graus de liberdade, encadeamentos, interações, fluxos e
retroalimentação, compondo uma entidade organizada capaz de adaptar sua estrutura interna
interagindo com as informações de seu entorno (Christofoletti, 1999). Esta afirmação implica
no fundamento da mudança, que é uma das principais características de todos os sistemas. O
estudo da complexidade vem sendo considerado como uma importante revolução na ciência,
reformulando e ultrapassando a concepção mecanicista e linear do método cientifico
tradicional.
O físico austríaco Fritjof Capra afirma que o sistema não tem estrutura rígida, mas
manifestações flexíveis, embora estáveis, de processos subjacentes, e ressalta que um dos
princípios fundamentais nesta concepção é o da auto-organização. A estrutura e função do
sistema não são impostas pelo meio ambiente, mas estabelecidas pelo próprio. Então um alto
grau de não-equilíbrio é absolutamente necessário para a auto-organização (Capra, 1982).
Os critérios do pensamento sistêmico são todos interdependentes. A natureza é vista
como uma teia interconexa de relações, na qual a identificação de padrões específicos como
sendo “objetos” depende do observador humano e do processo de conhecimento
(Capra, 1996).
Na visão de Boff (1999), o planeta Terra é um “sistema de sistemas”, um
superorganismo de complexo equilíbrio, urdido ao longo de milhões e milhões de anos. Os
sistemas são compostos por múltiplos fatores, energias, relações, inter-retro-reações que
caracterizam cada ser do universo, onde tudo co-existe e inter-existe (Boff, 1997).
O planeta como unidade integrada foi enfocado pelo químico James Lovelock com a
colaboração da microbiologista norte-americana Lynn Margulis, nos anos 70, através de
estudos para a National Aeronautics and Space Administration (NASA) que culminaram na
“Hipótese de Gaia”. O argumento principal é o de que a Terra é uma entidade viva auto-
organizada, pelo menos na medida em que, tal qual em outros organismos, sua química e
temperatura são auto-reguladas visando um estado favorável à vida. A auto-regulação que
consubstancia essa hipótese é demonstrada através do modelo computacional denominado
“Modelo das Margaridas”, que simula o desenvolvimento e adaptação de diferentes espécies
frente às interferências do ambiente do planeta (Capra, 1996). Para uns, à semelhança de
11
outras hipóteses, esta provou seu valor teórico. Não obstante, críticas quanto à sua
origem e intenção teleológica (Branco, 1999).
A necessidade que atualmente se verifica em vários autores, de afirmação da
perspectiva holística e sistêmica em contraposição à reducionista, pode ser explicada pelo fato
desta ainda estar enraizada e ser a concepção mais aceita (status quo). Consolidada dentro da
conceituação racionalista ocidental tem origens na concepção mecanicista desenvolvida
durante a Revolução Científica, através de nomes como Nicolau Copérnico (1473-1543)
Francis Bacon (1561-1626), Galileu Galilei (1564-1642), René Descartes (1596-1650) e Isaac
Newton (1642-1727) fundadores do método científico moderno.
Para Branco (1999), a validade do princípio de causa e efeito, ou a certeza resultante
da repetição, constitui condição indeclinável a uma concepção mecanicista do Universo e isto
representa o ponto de partida para o reducionismo, para a concepção atomística.
No século XVIII o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) oferece grande
contribuição a este debate através da sua crítica à razão pura. Segundo o filósofo, “o
conhecimento, não é o reflexo do objeto exterior: é o próprio espírito que constrói - com
dados do conhecimento sensível - o objeto do seu saber”. Desse modo, Kant reconhece
limites para o alcance da razão pura (Branco, 1999).
A dialética proposta em Hegel (1770-1831), representante da corrente filosófica
Idealismo Alemão, confronta dois pontos de vista (ou dois fenômenos ou fatos históricos) na
forma de tese e antítese, originando dinamicamente, uma síntese, a qual é diferente dos dois
princípios formadores. Isso se aplica, segundo Hegel, à marcha e ao ritmo de todas as coisas.
Um ser se transforma e evolui pelas contradições que apresenta com seu meio. Esta
contribuição adquire importância na concepção sistêmica, onde, mais importantes do que os
objetos e fatos em si mesmos (ou, para não ferir Kant, suas representações mentais) são as
relações entre eles. Em muitos sistemas complexos tais relações são contraditórias e essas
contradições são essenciais à geração de um estado de equilíbrio dinâmico característico e
necessário à própria integridade do sistema (Branco, 1999).
Nova concepção acerca do movimento dos contrários é apresentada por Karl Heinrich
Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895) que formularam uma teoria do
conhecimento, através de seu método de análise, denominado Materialismo Histórico e
Dialético. Sua proposta de coletivizar as riquezas e distribuir justiça social mudou
radicalmente a história da humanidade.
A consolidação do pensamento cartesiano exerceu no passado um papel progressista
de reflexão, mais independente da fé, em contraposição à visão dogmática, de fundamentação
religiosa, que combinava elementos da razão de Aristóteles (384-322 a.C.) da filosofia
12
Escolástica. O antropocentrismo e o domínio sobre a natureza afirmaram-se na racionalidade
e no método analítico, trazendo grandes avanços no campo científico e nas aplicações
tecnológicas, com o desenvolvimento das especializações. Ainda que limitados, sob o ponto
de vista de compreensão da natureza e da missão da espécie homo sapiens, permitiram que
fossem desenvolvidas importantes conquistas no mundo e no Brasil, inclusive no setor de
saneamento, impedindo que as péssimas condições epidemiológicas ceifassem diversas vidas
nas cidades e no campo, a justificarem-se na necessidade desenvolvimentista e de manutenção
das condições de certa estabilidade do tecido urbano e dos meios de produção.
O cientificismo cartesiano atesta o valor da natureza como bem de utilitarismo. Separa
sociedade de espaço, sujeito de objeto, corpo de mente, razão da emoção e homem da
natureza (Almeida et al, 1999).
O positivismo, que atribuía à “ciência pura” o papel único de constatação e pesquisa
das leis e das relações entre os fatos, teve enorme importância na formação dos engenheiros
brasileiros. Com a valorização da filosofia positivista no século XIX, as especializações
disciplinares vão se estabelecendo como paradigma (Silva & Schramm, 1999). As principais
manifestações do positivismo no Brasil datam de 1850, em teses de doutoramento da Escola
de Medicina e da Escola Militar, para em 1870 deixar a academia e passar a interferir na
política (Rezende, 2002). Para Marques (1998) a Escola Politécnica do Rio de Janeiro foi uma
importante introdutora e veiculadora das idéias positivistas do filósofo francês Auguste Comte
(1798-1857).
Não obstante, o quadro favorável ao projeto modernista tem se modificado, sobretudo
por razões epistemológicas, pois o positivismo não consegue realizar seu projeto de
estabelecer critérios de demarcação entre ciência e não-ciência como garantia da
racionalidade e da universalidade de seu método. Razões cio-políticas para o progresso
científico e tecnológico não asseguraram a democracia e o bem-estar da humanidade.
Finalmente, verifica-se a falência do projeto modernista em assegurar racionalidade na
utilização dos recursos naturais, o que tem conduzido à degradação da qualidade ambiental
em diferentes níveis: local, regional e global (Heller, Nascimento, Von Sperling, 1996).
Kligerman (2001) destaca a importância da concepção sistêmica dentro do setor de
saneamento e propõe a Integração Sistêmica como estratégia de ação entre os setores de
saneamento, saúde e recursos hídricos.
O desafio da atualidade está na mudança do atual paradigma utilitarista, pelo da
concepção sistêmica, para nortear os estudos e as ações ambientais a fim de efetivamente
viabilizar a sustentabilidade das cidades, a partir da conceituação estabelecida por Kuhn
(2003) do termo paradigma - realizações científicas universalmente conhecidas, que, durante
13
algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade praticante de
uma ciência. É toda a constelação de crenças, valores técnicas, etc., partilhadas pelos
membros de uma determinada comunidade.
Esta perspectiva não se restringe apenas aos estudos dos ecossistemas e dos sistemas
artificiais urbanos, mas também das interações entre os sistemas ambientais, sócio-
econômicos, políticos, ideológicos, jurídicos e culturais da sociedade, pois prioriza como
unidade de observação os processos, a organização e não apenas as estruturas e a ordem.
A Figura 1, apresentada a seguir, representa as relações dinâmicas entre os processos
político-econômicos, físico-químicos e sócio-culturais que condicionam a estrutura social e
espaço-temporal das cidades.
Figura 1. Relações dinâmicas entre processos sociais e ecológicos
(Coelho, In: Guerra & Cunha, 2000).
Mesmo com as proposições interpretativas do pensamento sistêmico reforçadas pela
incorporação de novos conceitos e comprovações advindas da evolução das ciências - os
sistemas complexos, a não-linearidade, os princípios de indeterminação, a física quântica, etc.
- o pensamento cartesiano ainda persiste nas intervenções sobre o meio ambiente. As soluções
apresentadas pela maioria dos especialistas perpetuam a visão unilateral e utilitarista de
dominação do homem sobre a natureza. As limitações das soluções adotadas para o controle
da poluição estão reduzindo a disponibilidade dos recursos naturais, vitais para atender às
demandas dos ecossistemas heterotróficos das cidades. Este quadro reforça às críticas a este
modelo de desenvolvimento, abrindo novas perspectivas.
O Quadro 1, apresentado na página seguinte, permite constatar a existência da
defasagem entre a visão de mundo que emerge do estudo dos ecossistemas e os valores que
ainda predominam na filosofia, nas ciências do homem e na dinâmica da sociedade moderna
14
Para assegurar a biodiversidade e sociodiversidade é preciso construir um “modus
vivendi” novo que reconheça a existência e os direitos intrínsecos da natureza.
Quadro 1. Paradigmas dominante e alternativo.
Valores Paradigma dominante Paradigma alternativo
Essência Material (crescimento econômico)
Sistema natural valorizado como
recurso
Dominação sobre a natureza
Não material/autovalorização
Sistema natural valorizado
intrinsecamente
Harmonia com a natureza
Economia Forças do mercado
Riscos e retribuições
Competição
Individualidade
Interesse
Segurança
Cooperação
Suprimento coletivo/social
Gerenciamento Dependência de procedimentos
Ações isoladas
Sigilo
Curto Prazo
Atenção nas etapas com foco
em resultados
Ações inter-relacionadas
Informação compartilhada
Longo prazo
Política Estruturas autoritárias
Hierarquia
Lei e ordem
Estruturas participativas
Não-hierárquico
Libertação
Sociedade Centralizada
Larga escala
Associativa
Ordenada
Descentralizada
Pequena escala
Comunitária
Flexível
Natureza Amplas reservas
Hostil/neutra
Controlável
Recursos limitados
Benigna
Delicadamente balanceada
Conhecimento Confiança ilimitada na ciência e
tecnologia
Separação de
valor / pensamento / sentimento
Racionalidade de meios
Limites e incertezas para
ciência e tecnologia
Interação de
valor / pensamento / sentimento
Racionalidade de fins
Fonte: Adaptado Almeida, et. al.. 1999.
Atualmente a interdisciplinaridade é proclamada não como método e prática para a
produção do conhecimento, mas como instrumento de articulação operativa na resolução dos
cada vez mais complexos problemas do desenvolvimento. Nas suas diferentes vertentes, as
escolas do saber científico devem ser integradas na multidisciplinaridade,
15
interdisciplinaridade e transdisciplinaridade
1
. Pautando-se, inclusive, na participação do
cidadão, devem ser superadas as dificuldades dos técnicos operarem sobre diferentes campos
do conhecimento. Na área ambiental, as disciplinas entrosam-se em sua funcionalidade
expressando justamente a integração do sistema analisado. Segundo Silva (1974):
Quando procuramos dar solução a problemas de grande atualidade, como: poluição,
inundações, super-urbanização, desertificação, produtividade decrescente da agricultura,
salinização e eutrofização de lagos, escassez de matéria primas e principalmente de
energia, o modelo ecológico nos fornece as diretrizes fundamentais.
A visão antropogênica e utilitarista atua de forma antiecológica e orienta ações
deletérias sobre o meio ambiente. Os procedimentos metodológicos utilizados na análise dos
fenômenos estão relacionados com a natureza do objeto de estudo e com a visão de mundo
adotado pelo cientista. O ponto de vista varia de acordo com as classes e grupos sociais, bem
como a evolução histórica dos conceitos. Para Silva (1974), este é considerado a variável
holística mais complexa, uma vez que depende de fatores biopsíquicos e sócio-econômicos.
Verifica-se, portanto, a necessidade de a ciência estar compromissada com os
resultados e aplicações de suas conquistas, em contraposição à herança retrógrada dogmática
do tecnicismo e da “ciência pura”, superando a separação sujeito-objeto que se encontra na
origem da ciência moderna.
O estado de complexidade das sociedades contemporâneas e de suas cidades impõe
novas problematizações sobre a natureza da poluição, desenvolvimento de metodologias e
instrumentos e pesquisa epistemológica da perspectiva sistêmica frente às ações de
saneamento ambiental.
3.2. Ecossistema Urbano
Ecossistema é qualquer unidade que abranja todos os organismos que funcionam em
conjunto (comunidade biótica) numa dada área, interagindo com ambiente físico (abiótico), de
tal forma que o fluxo de energia produza estruturas bióticas claramente definidas e uma
ciclagem de materiais entre as partes vivas e não-vivas (Odum, 1983).
Para Odum (1983), as leis básicas da natureza não foram revogadas, apenas suas
feições e relações quantitativas mudaram, à medida que a população humana mundial e seu
1
A multidisciplinaridade diz respeito ao estudo de um objeto de uma única disciplina por diversas disciplinas ao
mesmo tempo. A interdisciplinaridade diz respeito à transferência dos métodos de uma disciplina à outra. a
transdisciplinaridade traduziria a superação das etapas predecessores, propondo-se a unidade do conhecimento
entre, através e além das diferentes disciplinas. O termo transdisciplinaridade, inicialmente apresentado em
1970 por Jean Piaget (1896-1980) possui distinções entre os limites do conhecimento científico e as propostas de
diálogos e reconciliações do domínio das ciências exatas com as humanas, com a arte, a literatura, a poesia, a
cultura, a tradição, a ética, a estética e até mesmo com a experiência espiritual (Nicolescu, 1997; 2000).
16
prodigioso consumo de energia potencializaram a possibilidade de alteração do ambiente. Em
conseqüência, nossa sobrevivência depende do conhecimento e da ação inteligente para
preservar e melhorar a qualidade ambiental por meio de uma tecnologia harmoniosa e não
prejudicial.
Os sistemas urbanos não são constituídos de elementos (subsistemas) isolados nem da
resultante do somatório deles. São constituídos de subsistemas que se relacionam de forma
sinérgica, em constantes transformações físicas, químicas, biológicas, energéticas, sociais,
culturais e políticas.
Na Figura 2, apresentada a seguir, representa as inter-relações existentes entre os
sistemas ambientais e humanos.
ATMOSFERA
Esporos em
LITOSFERA
Seres vivos
HIDROSFERA
Seres vivos
BIOFÍSICO
Processos fisiológicos e metabólicos.
PSICOSSOCIAL
Interpessoal: relações expressas em padrã
o de comportamento individual e
TECNOLÓGICO
Material = equipamentos físicos e químicos
SISTEMAS HUMANOSSISTEMAS AMBIENTAIS
M
E
T
A
B
O
L
I
S
M
O
H
U
M
A
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S
M
O
H
U
M
A
N
O
E
X
T
E
R
N
O
Figura 2. Inter-relações entre sistemas ambientais e humanos.
(Branco, 1987).
A urbe deve ser vista como uma estrutura global e complexa. As funções e processos
das cidades, como o suporte físico e biológico da sobrevivência dos grupos humanos,
necessitam de grandes aportes de água, alimentos e energia, bem como de soluções de
afastamento e reciclagem de resíduos, de modo a não saturar o ambiente interno e seu
entorno, mantendo sustentável à vida e reprodução dos seres vivos.
17
Segundo Vianna (1991) as condições ecológicas internas dos centros urbanos são
produzidas pelo próprio homem, sobre o substrato natural-físico do lugar onde está a cidade:
topografia, clima, presença de rios, mar, tipo de solo, etc. A concentração de atividades
produtivas e população humana no espaço urbano implica em organizar áreas e serviços,
trabalho, moradia, circulação e outros, reorganizando o espaço físico e as relações ecológicas
nos habitats pré-existentes à instalação da cidade. A qualidade do ar, da água, clima,
insolação, aeração, ruídos, todos estes fatores ambientais são recriados na cidade, e, por vezes,
com componentes completamente alterados. Sobre um meio abiótico, em parte dado pela
natureza (leis biológicas), em parte construído pelo homem (leis sociais), modificam-se as
relações entre populações não humanas, e entre elas e grupos humanos, e entre os
componentes bióticos e os abióticos já alterados, de acordo com a evolução do modo de
produção. A sobrevivência de outras espécies, nele inseridas, mesmo microorganismos,
dependerá de sua introdução ou manutenção nesse meio e criação de condições ecológicas
para sua reprodução (Vianna, 1991).
A cidade é dinâmica no tempo, espaço e influência, sendo e ao mesmo tempo
constituída por sistemas abertos
2
. Muitos problemas da metrópole estão relacionados com as
soluções dos problemas do campo. As migrações para as cidades continuam estimuladas pelas
más condições reinantes no meio rural, com excedente de mão de obra, bem como pelo
domínio crescente e unilateral da urbe sobre o campo.
A Figura 3, a seguir, representa os intercâmbios de materiais, energias e informações
necessárias ao metabolismo urbano.
Figura 3. Trocas de energia, matéria e informação entre a cidade e
seu entorno (Kupchella & Hyland, 1993 apud Ottoni, 1996a).
2
Os sistemas abertos permitem o intercâmbio de energia, matéria e informação com o ambiente.
18
Para Odum (1988) somente se forem incluídos aos limites da urbe, os seus extensos
ambientes de “entrada e saída”, esta poderá ser considerada um ecossistema no sentido
complexo.
No caso do Rio de Janeiro estas relações são bem evidenciadas, pois os sistemas
naturais, artificiais e seminaturais, como os agroecossistemas circundantes, pelas suas
extensões e intensidades se relacionam e interagem de forma singular.
A alta densidade populacional traz a necessidade de aumento dos recursos artificiais,
tornando cada vez mais reduzidos os espaços relativos aos elementos naturais, o que faz
ultrapassar seu limite de tolerância. Dessa forma, a inter-relação e locação nas grandes
cidades tendem a ser cada vez menos ecológicas (Branco & Rocha, 1987).
Entretanto, as modificações antrópicas poderiam se dar de “forma ecológica”. Ao
introduzir elementos artificiais ocupando espaços, criando novas estruturas e novos meios, o
homem poderia analisar previamente e de forma global as implicações sobre o ecossistema
urbano. A não atenção aos limites críticos de manipulação dos sistemas ecológicos, com
evidentes prejuízos à saúde e à qualidade de vida, gera também uma problemática em termos
de limitação de recursos naturais.
A Agenda 21, item 21.7, menciona:
A existência de padrões de produção e consumo não sustentáveis está aumentando a
quantidade e variedade dos resíduos persistentes no meio ambiente em um ritmo sem
precedente. Essa tendência pode aumentar consideravelmente as quantidades de resíduos
produzidos até o fim do século e quadruplicá-los ou quintuplicá-los até o ano 2025. Uma
abordagem preventiva do manejo dos resíduos, centrada na transformação do estilo de vida
e dos padrões de produção e consumo oferece as maiores possibilidades de inverter o
sentido das tendências atuais.
No item 4.15, tem-se:
A fim de que se atinjam os objetivos de qualidade ambiental e desenvolvimento sustentável
será necessário eficiência na produção e mudanças nos padrões de consumo para dar
prioridade ao uso ótimo dos recursos e à redução do desperdício ao mínimo. Em muitos
casos, isso irá exigir uma reorientação dos atuais padrões de produção e consumo,
desenvolvidos pelas sociedades industriais e por sua vez imitados em boa parte do mundo.
No Rio de Janeiro, pela complexidade que se encerra a questão urbana, o desafio está
na atuação dos diversos agentes, cooperando entre si, sob diversos aspectos e perspectivas das
ciências e técnicas envolvidas. A problemática ambiental é multiforme, portanto o
encaminhamento da solução não pode ser feito como se os fenômenos fossem autônomos. Os
conhecimentos não devem se suceder ou se somar, porém se entremear formando um todo
coeso como na realidade as coisas se passam. Corre por conta do homem, por motivos
práticos, didáticos e até mesmo históricos, a divisão do estudo da natureza segundo as
diversas ciências. A proteção ao ambiente caracteriza-se por ações que obedeçam a uma
19
hierarquia onde se situa como primeira prioridade a reversão do processo de generalização da
poluição em toda área, nos ambientes: edáfico, fluvial, lacustre, marítimo e atmosférico
(Silva, 1973).
As tecnologias e metodologias implantadas devem se ater às conseqüências ambientais
provenientes da implantação e operação dos empreendimentos de natureza antrópica. Os
empreendimentos humanos devem quantificar e incorporar na análise custo/benefício os
condicionantes ambientais.
Observa-se que diante da necessidade do desenvolvimento do saneamento ambiental,
os conceitos e modelos ecológicos vêm sendo incorporados nos estudos e projetos como
ferramentas de gestão e recuperação ambiental. Dentre os diversos documentos-produtos
destacam-se: estudos de impacto ambiental (EIA); relatórios de impacto ambiental (RIMA);
auditorias ambientais; análises de riscos; estudos de remediação; planos e sistemas de gestão
ambiental; normalização e certificação ambiental, etc.
Além da compreensão da necessidade de proteção ao meio ambiente a orientar o
planejamento das intervenções nos centros urbanos, para a efetiva implementação das ações
pertinentes é preciso um longo trabalho de cooperação entre os partícipes da sociedade em
geral: governo, instituições, comunidade, empresas, etc., evitando assim a elaboração de
estudos por mera formalidade legal.
3.3. Poluição
As cidades modernas demandam grande influxo de energia concentrada (na maior
parte, suprida por combustíveis fósseis). Por serem sistemas heterotróficos, de metabolismo
intenso, necessitam de elevada entrada de materiais (matéria-prima), para atender ao uso
industrial e comercial, acima e além do necessário para a sustentação da própria vida. Este
aumento no agregado energético tem como conseqüência maior geração de resíduos,
orgânicos e não-orgânicos (Odum, 1988).
Nesta condição, a capacidade dos ecossistemas interno e circundante de assimilarem e
transformarem estas substâncias possui limitações. Por isso, os ambientes de entrada e de
saída das cidades são fundamentais à sua sustentação e equilíbrio dinâmico.
O processo de deterioração ambiental ocorre quando quantidades de substâncias que
entram no ambiente são superiores à sua capacidade de transformá-las, quantitativa e
qualitativamente. Como resultado, acumula-se matéria ou energia no sistema, configurando
situação de poluição. Esta pode acarretar desequilíbrio ecológico, caso se estenda no tempo e
20
no espaço, quando o número e a classe de sistemas e substratos contaminados aumentam e
permanecem por períodos prolongados.
A poluição é qualquer alteração em um meio que, modificando negativamente suas
condições, venha a causar danos à saúde, ao bem-estar da população, à fauna e à flora, aos
bens culturais e paisagísticos, bem como às atividades sociais e econômicas.
Para Silva (1975), as origens condicionam as características da poluição, mas não as
determinam, pois outras variáveis de natureza sócio-econômica (humana) e mesológicas
interferem recíproca e imbricadamente nas mesmas características, que as origens não são
autônomas. Assim, qualquer estudo a partir das origens (particularizadas nas fontes de
poluição), se bem que indispensável de um ponto de vista estritamente tecnológico, não
conduz a alguma solução que possa se traduzir em ponderável melhoria geral. Ainda afirma:
A poluição é um fenômeno globalmente abrangente, isto é, envolve em qualquer dos seus
aspectos, em graus variáveis para cada caso, todos os outros que possam ser considerados.
O obstáculo para o entendimento e solução está em que a poluição é de natureza holística, e
pode ser definida como uma perturbação do processo expansivo pela interferência de
resíduos do sistema que se expande, ou de outros, que lhes sejam contíguos.
A poluição dos corpos receptores (rios, lagos, praias, solos, etc.) traduz-se na redução
do espaço ecológico resultante dos espaços físicos, químicos e biológicos de origens
multicausais (Silva, 1973).
Para a compreensão da poluição, Silva (1975) considera três variáveis fundamentais
que se inter-relacionam: nível, extensão e ponto de vista.
Nível: é a intensidade com que é mobilizada a natureza para atender a uma das
manifestações da poluição. Seu fator dominante é a composição dos poluentes,
existindo uma correlação estatística entre nível de poluição e consumo energético
per capita.
Extensão: é o espaço, na natureza, comprometido pela poluição, tendo como
grandezas determinantes: a constituição e a quantidade dos poluentes.
Ponto de vista: varia com o nível sócio-econômico da população, os usos previstos
para os recursos naturais, os critérios hierárquicos considerados nos malefícios da
poluição e interesse pela defesa de outras espécies ou suas diversas formas de
associação ou inter-relacionamento.
A salubridade é definida por Vianna (1991) pela qualidade das relações entre a
população humana e os resíduos de suas atividades no ambiente, dentro da análise de
situações ecológicas organizadas socialmente no processo histórico. A insalubridade
ocorrendo, enquanto possibilidade de contato, é gradual, de acordo com a intensidade do
21
contato com resíduos. Ocorrem então situações de inter-relações na ausência de barreiras
(físicas, ecológicas ou sociais) construídas, ou na ineficácia das mesmas (Vianna, 1991).
A questão que se pretende abordar nos próximos capítulos, na interação do homem
com o ambiente é a relação da população humana com resíduos gerados (em particular os
esgotos sanitários), aqueles normalmente não mais utilizados no processo produtivo, isto é, o
produto “colateral“ de suas atividades e os sistemas artificiais de proteção - os sistemas de
saneamento.
3.4. Sistemas de Saneamento
3.4.1. Definições
Saúde: estado de completo bem-estar físico, mental e social, não restringe o problema
sanitário ao âmbito das doenças. Além das ações de prevenção e assistência, considera-se
cada vez mais importante atuar sobre os fatores determinantes da saúde. É este o propósito da
promoção da saúde, que constitui o elemento principal das propostas da Organização Mundial
de Saúde (OMS) e da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) (Brasil, 1999).
Salubridade ambiental: entende-se como o estado de higidez em que vive a
população urbana e rural, tanto no que se refere a sua capacidade de inibir, prevenir ou
impedir a ocorrência de endemias ou epidemias veiculadas pelo meio ambiente, como no
tocante ao seu potencial de promover o aperfeiçoamento de condições mesológicas favoráveis
ao pleno gozo da saúde e do bem-estar (Brasil, 1999).
Saneamento básico: é utilizado para se referir ao conjunto de ações consideradas
prioritárias em programas de saúde pública. Em fins da década de 50, o termo foi cunhado
para estabelecer o que era “básico” para interferir no ambiente e obter melhores resultados,
frente à restrição de recursos governamentais destinados a estas atividades, referindo-se,
portanto, as intervenções de água potável e esgoto sanitário, através da Superintendência de
Desenvolvimento do Nordeste - SUDENE (Costa e Silva, 1990 apud Costa, 1994). Essa
expressão ganhou força nas décadas de 70 e 80 com a implantação do Plano Nacional de
Saneamento - PLANASA, que atuava no sistema de abastecimento de água (prioritariamente)
e esgotamento sanitário, além de drenagem urbana (Costa, 1994). Em meados da década de
80, após críticas referentes à necessidade de se ampliar o conceito, passou a contemplar as
atividades: abastecimento de água, esgotamento sanitário, gestão de resíduos sólidos,
drenagem urbana e controle de vetores.
22
Saneamento ambiental: é o conjunto de ações sócio-econômicas que têm por
objetivo alcançar níveis de salubridade ambiental, por meio de abastecimento de água potável,
coleta e disposição sanitária de resíduos sólidos, líquidos e gasosos, promoção da disciplina
sanitária de uso do solo, drenagem urbana, controle de doenças transmissíveis e demais
serviços e obras especializadas, com a finalidade de proteger e melhorar as condições de vida
urbana e rural (Brasil, 1999).
Saneamento significa ação de sanear, ou seja, de “tornar saudável”. Seu objetivo final
é, portanto, a promoção da saúde. Segundo a Organização mundial de Saúde (OMS) é o
controle de todos os fatores do meio físico do homem, que exercem ou podem exercer efeito
prejudicial ao seu estado físico, mental e social (Brasil, 1999). Para Costa (1994), o
saneamento apresenta enorme gama de atividades que envolvem inúmeras interfaces com
outros setores, mas em sua essência é parte das ações de Saúde.. Não obstante, a história do
saneamento no país é marcada por uma dicotomia prejudicial marcada pela disputa de
influência e de recursos entre o modelo assistencialista, de tratamento médico individualizado
e as ações preventivas de saneamento público.
Os espaços onde ocorrem a produção e a reprodução da força de trabalho, quando
organizados para tal, são ambientes construídos. Suas condições físicas e ecológicas vêm
sendo produzidas socialmente e, portanto, a salubridade é uma condição ambiental, de
possibilidade e de intensidade de contato da população humana com outras populações,
principalmente agentes patogênicos. A construção do espaço urbano, principalmente de
moradia, organiza e “desenha” condições microecológicas que permitem refúgio,
sobrevivência e proliferação de agentes patogênicos, parasitos e vetores em potencial,
recriando “habitats” e nichos ecológicos, na relação entre as populações (Vianna, 1991).
Para Cynamon (1975), as situações de insalubridade em geral têm soluções de
barreiras físico-ecológicas construídas, que fazem parte da engenharia sanitária. Essas
barreiras sanitárias estão representadas na Figura 4, da página seguinte, e são abordadas na
definição de saneamento a seguir:
Saneamento pode ser assimilado a um conjunto de barreiras interpostas entre Sistema e
Ambiente. Barreiras que são colocadas à saída de um Sistema para evitar a poluição do
Ambiente, e barreiras colocadas à entrada de Sistemas (individualmente=homem,
coletivo=comunidade ou fábrica, por exemplo) com o propósito de defender os Sistemas
contra danos que lhe possam trazer elementos nocivos do Ambiente.
23
Figura 4. Barreiras sanitárias (Cynamon, 1975).
Os serviços de infra-estrutura se tornam extremamente complexos à medida que o
crescimento das cidades promove o aumento na escala dos componentes e nos problemas que
trazem sua produção: transporte, instalação, operação e manutenção. Pelo seu gigantismo,
criam novos problemas de viabilidade técnico-econômico em cada caso. O problema das
distâncias e do superpovoamento muda o aspecto de vantagens que atraíram os serviços e as
populações para as cidades (Cynamon, 1992).
Sendo uma intervenção física do homem no meio, as ações de saneamento, para seu
conforto, bem-estar e resguardo de salubridade, evoluíram à medida que as civilizações foram
se complexificando. Com a urbanização e a construção de grandes cidades, os problemas
evoluíram, exigindo novas soluções (Costa, 1994).
Atualmente as ações de saneamento podem ser delimitadas de forma abrangente,
contemplando as seguintes ações (FSESP, 1981; Oliveira, 1987; Cynamon, 1975 e Costa e
Silva, 1990 apud Costa, 1994):
Abastecimento de água, incluindo captação, adução, tratamento, reservação e
distribuição;
Coleta, transporte, tratamento e destino final de esgotos sanitários, resíduos industriais
líquidos e águas pluviais;
Acondicionamento, coleta, transporte, tratamento e destino final de resíduos sólidos
urbanos e industriais;
24
Controle de vetores (artrópodes e roedores);
Saneamento dos alimentos;
Condições de salubridade nas habitações, locais de trabalho, de recreação, serviços de
saúde e estabelecimentos de ensino;
Controle da poluição do ar, da água e do solo;
Planejamento territorial e urbanismo;
Vigilância sanitária da água de consumo humano, dos meios de transporte, portos,
aeroportos, rodoviárias e fronteiras;
Saneamento em situações de emergência e calamidade pública;
Aspectos diversos referentes ao saneamento do meio, como: cemitério, ventilação,
iluminação, etc.
A literatura, inclusive a especializada, diverge quanto à conceituação do que seja
saneamento. Para uns, os recursos hídricos e abastecimento de água não estão inclusos,
enquanto outros preferem definições mais abrangentes, incluindo-os. Diante da crise do setor
de saneamento no Brasil, com uma série de indefinições institucionais, políticas e de
diretrizes, nesta dissertação optou-se, pela afirmação das atuais demandas, por definir
saneamento de forma mais extensa e abrangente, em seu sentido lato, conforme as ações
supracitadas, dentro do escopo do Saneamento Ambiental, uma vez que aspectos sócio-
ambientais sofrem e exercem influências sobre diversos fatores e variáveis, sendo
imprescindível levá-los em consideração a fim de garantir resultados efetivos e duradouros.
3.4.2. Fundamentos Básicos e Princípios
Enquanto políticas públicas, as intervenções em saneamento devem obedecer aos
seguintes fundamentos básicos:
Universalização: o acesso aos serviços de saneamento deve ser direito de todos;
Equidade: os serviços e suas cobranças devem ser um instrumento de justiça e
inclusão social;
Integralidade: as ações de saneamento devem ser integradas entre si e com as demais
políticas públicas de saúde, recursos hídricos, desenvolvimento urbano, rural e
habitação;
Titularidade municipal: as demandas sanitárias e ambientais são sentidas nas
localidades e necessitam de respostas, preferencialmente em nível de primeira
instância;
25
Gestão pública: os serviços de saneamento são, por definição, públicos, prestados sob
regime de monopólios, essenciais para a determinação das condições de vida da
população e dos ecossistemas;
Controle social: a participação da sociedade civil no processo decisório de gestão é
fundamental para o controle dos recursos e objetivos de interesse coletivo;
Educação ambiental: suscitar através da transversalidade a introjeção da consciência
ambiental, cultivando conhecimento, julgamento e participação dos grupos sociais nas
ações de melhoria das condições dos ecossistemas;
Avaliação continuada: as ações e intervenções devem visar o atendimento a um
planejamento estratégico, submetendo-se a contínuas análises de resultados, norteadas
por objetivos claros e progressivos.
Os sistemas de saneamento, segundo Cynamon (1975), devem obedecer a
determinados princípios gerais, cuja inobservância leva, inevitavelmente, a péssimos
resultados e, conseqüentemente, a desperdícios. São eles:
1
o
Princípio: Da importância da concentração humana
As medidas de Saneamento se tornam tanto mais importantes quanto maior seja a densidade
humana ou de suas atividades por Unidade de área.
Segundo este princípio, as medidas sanitárias são efetivas quando chegam a atingir
o micro-ambiente.
2
o
Princípio: A importância do detalhe
A obtenção de resultados em saneamento depende às vezes da observância de detalhes
mínimos ou, em outras palavras, a inobservância de detalhes mínimos põe a perder por
vezes investimentos fabulosos.
3
o
Princípio: Do alcance e controle
Às medidas de saneamento, cada uma de per si, para serem realmente efetivadas dentro de
determinada área geográfica tem que ser abrangentes, proteger por medidas de saneamento
parte de uma área dentro de um contexto maior significa colocar em risco de saúde o
somente a área como um todo mas principalmente a área supostamente protegida.
4
o
Princípio: Do período de carência
O período que medeia entre a implantação de medidas de Saneamento e os resultados
sanitários é variável dependendo das entidades mórbidas a serem controladas e das
medidas de saneamento aplicadas.
26
Para a análise de alternativas em empreendimentos de saneamento, segundo Silva
(1983) devem ser consideradas as três grandezas fundamentais: espaço, tempo e energia.
Desta forma, o meio de comparação mais econômico seria o cotejo dessas grandezas, sendo a
opção mais favorável aquela que menor dispêndio apresentar em cada uma e na análise de
suas interdependências e hierarquias:
Espaço: considerar aqueles espaços ocupados pelos empreendimentos (obras,
instalações, serviços de apoio, etc.), além daqueles que ficarão comprometidos isto é,
que deixarão de ter as funções ecológicas que desempenham e/ou ficarão impedidos de
ter outras utilizações no interesse da população futura.
Tempo: a execução do empreendimento deve ser feita com o menor tempo possível,
para que os resultados e objetivos colimados comecem a se apresentar no menor prazo.
As zonas mais densas e com maiores riscos à saúde devem ser priorizadas.
Energia: deve-se pleitear o menor consumo de energia representada pela energia
externa a ser introduzida nos processos de coleta e tratamento, seja: energia elétrica,
insumos, oxigênio, produtos químicos, dentre outros.
A maioria dos problemas sanitários que afetam a população mundial está
intrinsecamente relacionada com o meio ambiente. Um exemplo disso é a diarréia, que com
mais de 4 bilhões de casos por ano, é a doença que mais aflige a humanidade. Dentre as
causas dessa doença destacam-se as condições inadequadas de saneamento (Brasil, 1999).
27
4. PREMISSAS OPERACIONAIS DOS SISTEMAS DE ESGOTOS
“Como nunca antes na história o destino comum nos conclama a buscar um
novo começo(...). Isto requer uma mudança na mente e no coração. Requer
um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal.
Devemos desenvolver e aplicar com imaginação a visão de um modo de vida
sustentável em nível local, nacional, regional e global”(A Carta da Terra).
4.1. Visão Integrada dos Sistemas de Saneamento
4.1.1. Planejamento Urbano Ambiental
O planejamento urbano ambiental pressupõe a atuação de diversos sistemas, estruturas
e serviços nas cidades, desempenhando funções específicas, porém, de forma interdependente
e correlacionada. A concepção sistêmica deve nortear a concepção dos projetos em uma
gestão articulada e em conseqüência interferir em todas as fases dos empreendimentos, sendo
elas: estudos preliminares, estudos de concepção, projetos, obras e gestão.
A introdução de elementos artificiais no ecossistema urbano ocasiona novas relações
com os componentes naturais, que por sua vez estabelecem novas relações ecológicas entre si.
A questão central está em como adequar o processo de desenvolvimento tecnológico para
melhoria da qualidade de vida da sociedade, com a manutenção de elementos dos
ecossistemas em níveis compatíveis com a vida na biosfera.
As recomendações da Agenda 21, item 10.1., indicam:
Caso queiramos, no futuro, atender às necessidades humanas de maneira sustentável, é
essencial resolver hoje esses conflitos e avançar para um uso mais eficaz e eficiente da terra
e de seus recursos naturais. A abordagem integrada do planejamento e do gerenciamento
físico e do uso da terra é uma maneira eminentemente prática de fazê-lo. Examinando todos
os usos da terra de forma integrada é possível reduzir os conflitos ao mínimo, fazer as
alternâncias mais eficientes e vincular o desenvolvimento social e econômico à proteção e
melhoria do meio ambiente, contribuindo assim para atingir os objetivos do
desenvolvimento sustentável. A essência dessa abordagem integrada se expressa na
coordenação de planejamento setorial e atividades de gerenciamento relacionadas aos
diversos aspectos do uso da terra e dos recursos terrestre.
No item 10.3., tem-se:
Os recursos terrestres são usados para inúmeros fins, que interagem e podem competir uns
com os outros; em decorrência, é desejável planejar e gerenciar todos os usos de forma
integrada. A integração deve ter lugar em dois níveis, considerando-se, por um lado, todos
os fatores ambientais, sociais e econômicos (como por exemplo, o impacto dos diversos
setores econômicos e sociais sobre o meio ambiente e os recursos naturais) e, por outro,
todos os componentes ambientais e de recursos reunidos (ou seja, ar, água, biota, terra e
recursos geológicos e naturais). Essa visão integrada facilita as opções e alternâncias
adequadas e desse modo maximiza a produtividade e o uso sustentáveis. A oportunidade de
alocar a terra a diferentes usos surge no curso de projetos importantes de assentamento ou
desenvolvimento ou de forma seqüencial, à medida que a terra vai ficando disponível no
mercado. Isso, por sua vez, possibilita que se fortaleçam modelos tradicionais de
gerenciamento sustentável da terra ou que se determine sua proteção, para conservação da
biodiversidade ou de serviços ecológicos fundamentais.
28
A inter-relação entre as estruturas urbanas dá-se de várias formas. A falta de
urbanização compromete os sistemas de saneamento e vice-versa. Nas áreas desprovidas de
pavimentação, as redes ficam vulneráveis à perda de recobrimento, ação de sobrecargas e
depredações. Os sistemas de drenagem são partes constitutivas dos projetos de vias públicas.
Por outro lado, deficiências e colapsos em redes comprometem os logradouros e
equipamentos urbanos.
Além da interdependência entre os sistemas de esgotamento sanitário, de
abastecimento de água e de drenagem urbana, verifica-se sobre a operacionalidade dos
sistemas de esgotos e preservação dos recursos hídricos a intensa interferência da gestão dos
resíduos sólidos
1
. Tendo acesso à rede de esgoto sanitário pelas instalações prediais, poços de
visita ou pela interconexão com as galerias de águas pluviais, os resíduos sólidos
comprometem significativamente o escoamento e conseqüentemente, as condições de
operação do sistema convencional. Dentre os diversos problemas, encontra-se a redução da
seção de escoamento, que pode chegar à total obstrução, comprometendo a integridade das
tubulações, das bombas e equipamentos em geral. Na drenagem pluvial, esta problemática é
sentida na limpeza dos logradouros, que através do carreamento dos resíduos pelas
chuvas, acarreta poluição difusa das águas pluviais, incorporadas ao sistema de drenagem
pelas calhas do rio, através das caixas de ralo, etc. Outro aspecto diz respeito ao procedimento
inadequado de limpeza das calçadas, amplamente realizado pelos moradores, a “varrição
hidráulica”, que se utiliza das águas para a remoção de terra, lixo, folhas e detritos em geral.
Além de resultar em desperdício de água potável encaminham indevidamente os detritos para
sarjetas, poços de visitas e calhas dos rios.
Os sistemas de esgotos também geram significativo volume de resíduos sólidos, cuja
remoção nos sistemas de gradeamento e nas caixas retentoras deve ser realizada com
eficiência para garantir a operacionalidade adequada.
A compreensão sistêmica dos elementos artificiais que compõem a urbe, numa
abordagem global da fenomenologia interferente nos ecossistemas, poderá maximizar a
capacidade de resposta positiva dos sistemas de saneamento. Para Branco (1987), a proposta é
a utilização do planejamento integrado em termos ecológicos, físico-territoriais, econômicos,
sociais, administrativos, abrangendo as partes, os elementos e o todo de um sistema ou
ecossistema.
1
A gestão de resíduos sólidos é constituída pelas etapas de acondicionamento, coleta, transporte, tratamento e
disposição final desses resíduos, bem como medidas para limpeza dos logradouros públicos, tais como: varrição,
capina, limpeza de monumentos, etc.
29
O planejamento territorial visando à saúde ambiental é trabalho de equipe reunindo
sociólogos, economistas, biologistas, urbanistas, sanitaristas, etc. As variáveis são em
grande número e complexas e o processo de planejamento é mais importante que o plano. A
metodologia apóia-se na Teoria de Sistemas, em modelos simulados, etc. Depende da
política de desenvolvimento, grau de intervenção desejado, recursos, enfoque, e controle
das variáveis. É processo circular cumulativo, com retroação.
Nos grandes centros urbanos como a Cidade do Rio de Janeiro, os recursos artificiais
são variados e introduzidos em velocidades intensas, em grande quantidade. Os sistemas e
serviços de saneamento apresentam-se sofisticados e em grandes escalas. Esta densidade de
urbanização para atender a uma alta densidade populacional faz com que haja necessidade de
uma intensa interação entre os sistemas de saneamento. Desempenhando funções
correlacionadas e localizando-se espacialmente próximos, possuem áreas de atendimento e de
influência comum.
A questão preponderante é que esta relação seja planejada e operacionalizada para
cumprir efetivamente suas funções específicas. Caso contrário, a ineficiência de um interfere
negativamente sobre o outro, podendo, inclusive, estabelecer de forma nociva, interações e
sobrecargas indevidas, como é o caso da interconexão entre os sistemas de esgotos.
Como a maioria das cidades brasileiras, o Rio de Janeiro teve seu crescimento
espontâneo e fragmentado, através de arranjos não planejados entre as partes e o todo. A
oferta de serviços públicos sempre esteve defasada em relação ao ritmo de crescimento
acelerado da cidade. Não pré-estudo e análise dos condicionantes mínimos de suas inter-
relações (em termos ecológicos, físicos, econômicos, sociais e administrativos) de forma
global, como um sistema urbano com seus subsistemas.
A disputa por espaços e infra-estruturas adequadas para fixação dos habitantes tem
sido um grande desafio, tanto na superfície como no subsolo. No subterrâneo, os espaços
também são, na maioria das vezes, rarefeitos e concorridos nos sistemas em operação entre si
e entre eles e os desativados. Destacam-se: esgotos sanitários, drenagem pluvial,
abastecimento de água, cabos telefônicos, televisão, energia elétrica, dutos de gás, elementos
estruturais, fundações, pontes, travessias, estacionamentos, sistema viário, equipamentos
comunitários, etc.
O subsolo da cidade possui grandes extensões resultantes de diversas intervenções
antrópicas. Sucessivos aterros foram executados sem o devido controle de materiais e de
processo executivo, conforme ressalta Brito (Obras, v.XX, 1927):
(...) desde a fundação da cidade o lixo serve de aterro; edificações se fazem sobre terreno de
lixo, mal reduzido, parcialmente imerso na água em que foi atirado. O que vais para a ilha
de Sapucaia está fechando a baía de Manguinhos, e do alto das ameias do Instituto
Oswaldo Cruz vê-se o mal que progride sem protestos (...).
30
Esta condição, associada às características naturais da geomorfologia, estabilidade e
composição do solo, pH, nível alto de lençol freático, traz grandes dificuldades e custos à
implantação, durabilidade das estruturas componentes e gestão dos sistemas de saneamento,
principalmente os de esgotamento sanitário, que exigem maiores profundidades devido ao
escoamento gravitário.
Lessa (2000) afirma que toda a mecânica de solos no Rio é difícil. Tem-se o transporte
subterrâneo mais caro do mundo, cavado ou em rocha viva granítica ou em pântanos
aterrados. O Rio de Janeiro, enquanto metrópole, está submetida à dupla restrição solo/água.
Drenar mangues e lagos, desmontar morros, furar túneis, conter encostas são operações
normais de urbanização na cidade e têm custos extremamente altos.
Animais e vetores como porcos, ratos, etc., além de serem vetores de doenças, podem
causar problemas no sistema. A própria biota vegetal interfere com a ação de raízes sobre as
tubulações e posterior formação de solos de turfa.
Com as legislações urbanas e de proteção ambiental, o saneamento fica contemplado
em tese, através da compatibilização do meio natural a ser protegido, da oferta de infra-
estrutura e dos limites de ocupação impostos pelos condicionantes, sejam naturais ou
resultantes da ação antrópica. A legislação urbanística, em nível municipal, é constituída por
instrumentos que dispõem sobre as diretrizes de desenvolvimento do município ou da cidade
(plano diretor), perímetro urbano, parcelamento do solo urbano, posturas municipais, obras e
edificações e uso e ocupação do solo urbano.
A lei de uso e ocupação do solo é, entre os instrumentos de responsabilidade
municipal, aquele que com mais detalhamento aproxima os temas saneamento e espaço
construído em escala urbana, pois pressupõe a convivência pacífica entre os diversos usos das
edificações, através da definição dos tipos de atividades permitidas e do estabelecimento de
parâmetros de ocupação, em conformidade com a infra-estrutura disponível, densidade
desejada e características ambientais próprias das áreas urbanas.
O plano diretor define de forma articulada as grandes linhas de intervenção sobre a
cidade, de modo a evitar a urbanização predatória e compatibilizar os diversos aspectos
sociais, econômicos, ambientais, culturais e políticos que constituem a própria cidade.
As intervenções de saneamento, em tese, obedecem a um ciclo de desenvolvimento
conforme Figura 5, apresentada na página seguinte.
31
Figura 5. Ciclo de empreendimentos de saneamento
Costa & Girafa, [s.d.].
Cynamon (1975) adverte que o saneamento recebe influência dos mais variados
setores, tais como: saúde, abastecimento de água, transportes terrestres, marítimos e aéreos,
agricultura, planejamento territorial, urbanização e arquitetura, exploração de energia elétrica,
sistemas de recreação, educação, economia (custo/benefício).
Para que se alcancem os resultados esperados é fundamental que a política de
saneamento seja concebida de forma integrada e articulada com as ações municipais de sua
área de influência. As articulações intergovernamental e intersetorial, envolvendo a
comunidade, são as bases para um programa de ação mais eficiente da gestão territorial,
interagindo com todos os partícipes, programas e usos distintos e respeitando os
condicionantes naturais e sociais.
A utilização dos sistemas computacionais com os avanços tecnológicos dos meios de
coleta, manuseio e análise de dados vem a ser um facilitador para a materialização e
implantação de ações sistêmicas. Para Odum (1988):
Felizmente os avanços tecnológicos permitiram-nos lidar quantitativamente com grandes
sistemas complexos como os ecossistemas. As metodologias de marcadores, química de
massa (espectrometria, colorimetria, cromatografia), sensoriamento remoto, monitoramento
automático, modelagem matemática e computação fornecem o instrumental para isso. A
tecnologia é, contudo, uma faca de dois gumes: pode ser um meio de se compreender a
inteireza do homem com a natureza e também um meio de destruí-la.
O desenvolvimento de diagnósticos, programas e ações específicas, tais como:
impactos ambientais, identificação e controle de fontes poluidoras, além de outras ações
deletérias sobre o meio ambiente, em um planejamento ambiental integrado, requer atividades
de controle de uso do solo e aplicação de medidas de proteção ambiental dos meios hídricos,
32
edáficos e atmosféricos. Deve se valer de diversas técnicas, estruturas e processos,
combinados entre si para viabilizar uma abordagem integrada, entre os processos de
planejamento, gerenciamento e fiscalização ambiental.
A Agenda 21 no item 10.11 recomenda:
fortalecer os sistemas de informação, observação sistemática, e avaliação dos dados
ambientais, econômicos e sociais vinculados aos recursos terrestres nos planos mundial,
regional, nacional e local, bem como o potencial produtivo da terra e as modalidades de
uso e gerenciamento da terra.
Muitos desses elementos estão disponíveis, mas é necessário generalizar sua
aplicação, desenvolvendo-os e reforçando-os. Destacam-se: Geographic Information
System” (GIS); “Global Position System” (GPS); sensoriamento remoto; modelagem;
fotografia aérea ou imagem de satélite; banco de dados ambientais, internet, etc.
A própria evolução da engenharia de análise de sistemas, de modelos de gestões
administrativas e da modelagem dos sistemas ambientais implica em uma análise integrada e
sistêmica. Para ser implementada em diversas escalas de grandeza espacial e temporal torna-
se necessário estabelecer as condições de contorno, os elementos constituintes, a hierarquia
das variáveis e os fluxos de matéria e energia desses sistemas.
O não cumprimento da legislação urbana e de proteção ambiental, as dificuldades no
desenvolvimento e principalmente na implantação dos planos diretores gerais e específicos
associados à falta de uma política estratégica para o saneamento, infelizmente tende a acirrar a
visão corporativa e fragmentada que dificulta a realização de ações articuladas com outros
setores.
Grandes dificuldades persistem na superação dos limites setoriais, mesmo em áreas
que em tese deveriam estar profundamente relacionadas em suas intervenções tais como as
relações institucionais entre os setores de saneamento e saúde, que ainda têm demonstrado
dificuldades de articulação (Costa, 1994).
O processo de urbanização, como se apresenta agora, escapou ao controle, a despeito
dos esforços de políticos e profissionais envolvidos. Descontrolou-se porque, de fato, a
abordagem coletiva das soluções urbanas não existe, é um rol de atitudes individuais
motivadas segundo expresso acima, e essas atitudes são ocasionalmente egoístas, às vezes
ignorantes, quando não, apenas inocentes (Kolbuszewski, [s.d.] apud Branco, 1987).
As diretrizes para implantação de um planejamento urbano ambiental devem, através
do estudo histórico das tentativas de implantação de planejamentos estratégicos no país,
impedir erros cometidos em um passado subordinado ao conceito de tecnocracia, que,
segundo Ianni (1979 apud Silva, 1998), envolve a “idéia” de governo ou regime em que
predominam os técnicos, independentemente do jogo político dos partidos, das relações e
33
lutas de classe, entre outros; e por outro lado traz consigo a supremacia da técnica como uma
“variável” independente. Esta inconsistência conceitual resulta em influências políticas
veladas e perniciosas ao planejamento, enquanto componente dinâmico do sistema político-
administrativo.
Não obstante, o quadro atual reflete um movimento dialético na medida em que as
condições de limite e exaustão dos recursos naturais e suas já sentidas conseqüências sobre a
sociedade impostas por políticas desarticuladas, descontínuas e fragmentadas, estabelecem
contradições necessárias para aumento de consciência e capacidade de indignação, resultando
no fato de as questões sócio-ambientais estarem na ordem do dia e na agenda política carioca.
4.1.2. Interdependência com a Sociedade
Os sistemas de saneamento são caracterizados por processos dinâmicos e contínuos de
(re)construção e estruturação dos espaços urbanos. Estes sistemas interagem com os recursos
artificiais e naturais das cidades e com a população, seja ela residente, flutuante ou
temporária
2
.
A relação com que historicamente os governos prestam os serviços públicos e
implantam os sistemas de infra-estrutura urbana é, na grande maioria dos casos, considerando
e reforçando a suposta postura passiva com a qual a sociedade concebe a concretização destes
serviços. Não pretendendo buscar a ideologia refletida nesta prática, as conseqüências desta
alienação geram empecilhos ao desenvolvimento da participação pró-ativa e da co-
responsabilidade, tão necessárias à conservação dos sistemas públicos. Entretanto, verificam-
se grandes esforços das comunidades convergidos em reivindicações de implantação e
ampliação dos serviços, bem como nas constantes reclamações de falta de manutenção
adequada dos sistemas, o que indica necessidades, expectativas e percepções da sociedade.
A Cidade do Rio de Janeiro, principalmente com o fim do regime totalitário na década
de 80, foi palco de intensa atuação de diversas associações de moradores e entidades
ambientais na reivindicação de melhorias dos sistemas de saneamento, das condições de
operação, ampliação dos serviços, até mesmo com críticas às concepções e alternativas
técnicas adotadas (Evangelista, 1989).
Para o desenvolvimento de um ponto de vista (variável holística) adequado, Silva
(1974) valoriza a necessidade da divulgação de informações, em termos simples e precisos,
quanto à natureza do problema da poluição e da importância da responsabilidade
2
Segundo a NBR 9648/86, a população residente é constituída pelos moradores do domicílio; flutuante é a
proveniente de outras comunidades com contribuição de esgoto análoga a residente e a temporária proveniente
de outras comunidades com contribuição de esgoto inferior à residente.
34
compartilhada. A participação coletiva deve ser estimulada ressaltando exemplos de
iniciativas bem sucedidas, utilizando-se meios de comunicação de massa com propriedade e
parcimônia nos incentivos econômicos. Deve-se disciplinar a participação, de forma que todos
reconheçam o modo pelo qual podem fazê-lo, dentro de suas qualificações e respectivas
possibilidades.
Com o apoio e compreensão de um grande mero de indivíduos, o desleixo, os
argumentos de ordem econômica e outras atitudes pessoais que conduzem ao incremento da
poluição, passariam a ser vistos com maus olhos pela maioria sintonizada com o problema, e,
então as leis teriam condições de atuar e funcionar como instrumento de dissuasão (Silva,
1974).
Atualmente, com o aprimoramento da legislação urbana e de proteção ambiental, a
mudança de posturas frente à poluição vem se dando de forma reativa às possibilidades de
punições. Os exemplos e estímulos para a evolução de uma postura pró-ativa de valorização
dos sistemas, equipamentos e serviços públicos, quando ocorrem, são expressões isoladas ou
de um agrupamento específico que, enquanto exceção confirma a regra ainda reinante.
A parceria entre governo, sociedade civil e empresas é essencial para uma
governabilidade efetiva. Para Kligerman (2001):
O Estado não tem sido capaz de satisfazer as demandas das comunidades. Isto ocorre
devido às estratégias nacionais de melhoria ambiental não contemplarem o nível local como
um espaço de intervenção preferencial (...) os problemas “comuns” das comunidades, dos
bairros, são deixados para um segundo plano.
Esta falta de atenção ambiental tem feito com que a população reflita sobre a
necessidade de se mobilizar para construir uma institucionalidade ambiental local. Daí a
necessidade de se criar um nível primário ambiental para reverter a tendência
institucionalizada excessivamente centralizadora, que não é capaz de dar resposta a uma
demanda crescente e não tem flexibilidade para incorporar outros atores, partes integrantes
para a solução desta problemática. Para Kligerman (2001) é importante alertar que o ator
local, a comunidade, o município e o setor privado, devem constituir um elemento integrado e
central de uma estratégia participativa cuja meta seja melhorar o meio ambiente local”.
Para Roque (1997), a participação da comunidade afetada pela intervenção leva seus
atores a se identificarem com o sistema que, para ela, passa a constituir uma estrutura de
propriedade pública e de direito. O não estabelecimento desta identificação acarretará
evidentemente numa relação fria e comercial entre os beneficiários e a empresa, sendo esta
encarada pela população apenas como aquela que comercializa a água, a coleta e o tratamento
de esgoto. A participação da população, assim negligenciada, torna difícil a sua contribuição
nas definições de obras, na proteção de mananciais, na conservação e no zelo pelos
35
equipamentos públicos de saneamento. Sob o ponto de vista social, perde-se o fortalecimento
da cidadania que a participação permitiria.
A disponibilidade dos sistemas de saneamento tem relação direta com os hábitos e
costumes e com suas possibilidades de mudanças. Cynamon (1975) esclarece que a educação
influi na escolha de métodos de saneamento e no seu bom ou mau aproveitamento. Por outro
lado, a existência ou ausência de medidas de saneamento influi sobre a educação. Para se
atingir o máximo de resultados, além dos aspectos físicos, deve-se incluir os aspectos
humanos, de mudanças de hábitos, usos, costumes e conscientização em torno do problema.
A maioria das propagandas oficiais dos governos reproduzidas pelas companhias de
saneamento que visa apenas obter retorno político imediato das intervenções são colocadas de
forma distorcida, com problemas supostamente resolvidos, definitivamente. Trazem ilusões
acerca das dificuldades reais desses sistemas, ou seja, desinformam a população. O mais
agravante desta abordagem está na noção equivocada de que as obras implantadas trarão por
si só a solução dos problemas ambientais e que, conseqüentemente, as ações dos cidadãos não
interferem na qualidade desses sistemas. Impõe-se à comunidade uma postura de inércia e de
manutenção do status quo.
A escala de atuação dos sistemas de saneamento deve chegar ao nível dos usuários, de
forma a envolver a participação da comunidade e seus representantes, embora o processo
adotado deva ser projetado, operado e mantido por técnicos especialistas. Esta necessidade é
estabelecida, uma vez que a comunidade exerce influência direta nas condições de
manutenção e conservação dos sistemas de saneamento, sob todos os modelos de gestão
adotados, e somente sua informação, julgamento e participação, dentro de uma escala de
conscientização, serão capazes, junto aos investimentos necessários, de reverter as condições
operacionais dos sistemas implantados e estabelecer o controle efetivo dos níveis de poluição.
Um programa de eliminação de ligações clandestinas de esgoto e de extravasores irregulares
somente poderá alcançar resultados efetivos e duradouros caso haja o entendimento e a
aceitação da comunidade.
Cabe à empresa responsável pelos serviços demonstrar clareza sobre o real alcance
dessas iniciativas, de forma íntegra, sobretudo esclarecendo tecnicamente os obstáculos e
problemas pelos quais passam os sistemas de saneamento. Este seria um passo fundamental
na conscientização da população, que poderia resultar em uma maior participação coletiva. A
adoção desta postura política serviria como uma verdadeira educação ambiental e comunitária
para transformações culturais de grande alcance, devendo ser aproveitada pelos governos em
parceria com sociedade civil organizada, de forma a estabelecer um outro paradigma de
informação-participação. Este aspecto se apresenta como necessário à eliminação das
36
interconexões entre os sistemas de esgoto e à proteção dos recursos hídricos. Somente desta
forma é que se poderá esperar uma mudança de atitude, hábitos e costumes por parte da
sociedade em geral.
Para isso torna-se necessário priorizar a melhoria da operação, manutenção e
conservação dos sistemas de saneamento por parte da concessionária, através de uma política
de divulgação desses serviços que resulte na melhor “visualização” dos sistemas, na grande
maioria das vezes, localizados no mundo “subterrâneo”, longe dos olhos da população e dos
políticos. Isso implica também na ampliação e valorização do corpo de funcionários de saúde
pública e defensores do meio ambiente, os técnicos que operam estes sistemas.
Segundo Kligerman (2001) a Atenção Primária Ambiental, defendida pela
Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), é um instrumento de política para a gestão da
saúde ambiental que considera que a solução dos problemas ambientais e sanitários (saúde
ambiental) deve ter gestão em nível local, porque é neste nível que o conhecimento exato
da origem dos problemas e é daí que se deve começar o autocontrole.
A necessidade de intervenções em nível das habitações, a fim de melhorar as
condições de suas instalações sanitárias e, por conseguinte, eliminar ligações irregulares,
requer atuação conjunta de educadores, técnicos de engenharia e de profissionais da área de
saúde, necessidade prática que ratifica a co-relação necessária das ações de saneamento, saúde
e educação ambiental.
Na maioria das vezes, a discussão sobre a atuação da população é reduzida à questão
monetária, através da dificuldade de sustentabilidade financeira e econômica dos sistemas,
provocada pela redução da receita arrecadada em decorrência das inadimplências. A maior
participação da comunidade em todas as fases dos empreendimentos, poderia reverter este
quadro, trazendo melhorias na qualidade dos serviços prestados.
O conflito entre os homens é fator de desequilíbrio do ecossistema. A pobreza traz o
agravamento da degradação do meio ambiente, configurando miséria. Conforme apresentado
no subitem # 5.3.5., no Rio de Janeiro, o alto índice de marginalidade associado à alta
mobilidade da população residente nas comunidades carentes, conseqüência da elevada
mobilidade de empregos e serviços da economia informal, são graves entraves à educação
ambiental, participação e integração social, e a ampliação das intervenções do poder público.
Como enfoque sócio-ambiental vale o esclarecimento de Lewis (apud Boff, 1994):
O que nós chamamos de poder do ser humano sobre a natureza vem a ser, na verdade, o
poder exercido por alguns homens e mulheres sobre outros homens e mulheres utilizando a
natureza como seu instrumento
.
37
O planejamento ambiental urbano das cidades do terceiro mundo, segundo Zorzal
(1999b), requer um mapeamento dos conflitos sociais através da análise de estratégias de
sobrevivência econômica da comunidade, da situação legal da ocupação do solo, da avaliação
de grupos e classes sociais em conflitos e dos mecanismos de participação social.
As técnicas de engenharia, bem como outras ferramentas, caem por terra quando não
estão consorciadas à participação comunitária, pois estas certamente providenciam “soluções”
próprias na luta pela sobrevivência, ocupando espaços e desenvolvendo-se à sua maneira,
freqüentemente às margens do poder público constituído. Todavia quase todos os esforços
necessários são postergados pela iniciativa pública para depois que a situação local se torna
ambientalmente impraticável (Zorzal, 1999b).
As experiências para incentivar e viabilizar a participação popular são objeto de
amplos estudos nacionais e internacionais relacionados a diferentes modelos de gestão dos
serviços de saneamento. A instrução escolar é instrumento apropriado ao esclarecimento da
importância da higiene do domicílio, do saneamento e da ecologia, se levar em conta o ponto
de vista da comunidade e suas limitações.
O aprofundamento dos aspectos culturais e sociológicos quanto ao comportamento dos
moradores e as dificuldades pedagógicas de se implantar em mudanças duradouras de hábitos
e posturas que impeçam ações deletérias como as ligações irregulares, escapa ao escopo deste
trabalho.
Em síntese, o novo paradigma da saúde ambiental concebe ações necessárias à
preservação ambiental, à regularização fundiária e à ordenação do uso e ocupação do solo,
com execução de projetos articulados que promovam a melhoria das condições habitacionais,
de infra-estrutura, de ampliação da qualidade e cobertura dos serviços sociais, com educação
ambiental e apoio ao desenvolvimento comunitário.
4.2. O Esgoto Sanitário
Das sociedades mais primitivas até a Revolução Industrial, os componentes principais
dos resíduos das aglomerações humanas eram fecais, orgânicos, restos de roupas e utensílios.
Na medida em que o capitalismo desenvolveu a ciência e a técnica para a produção de
mercadorias, os processos de industrialização e transformação de matérias-primas trouxeram
grandes mudanças qualitativas e quantitativas, passando a produzir águas residuárias mais
complexas, como os efluentes industriais sintéticos.
Os esgotos sanitários representam um saldo energético inaproveitável pelos
organismos que o produziram, bem como por aqueles que lhes têm funções ecológicas
38
análogas. Entretanto, para organismos decompositores, a matéria orgânica dos esgotos
representa fonte de energia indispensável à sobrevivência e à realização de suas funções
ecológicas, principalmente a reciclagem dos nutrientes. A poluição proveniente dos esgotos
traduz-se nos corpos hídricos no incremento do consumo de oxigênio devido à intensificação
do sistema heterotrófico-saprófita.
Segundo prescrito na NBR 9648/86 da ABNT, esgoto sanitário é o despejo líquido
constituído de esgotos doméstico e industrial, água de infiltração e contribuição pluvial
parasitária, sendo:
Esgoto doméstico: despejo líquido resultante do uso da água para higiene e
necessidades fisiológicas humanas;
Esgoto industrial: despejo líquido resultante dos processos industriais, respeitados os
padrões de lançamento estabelecidos;
Águas de infiltração: toda água proveniente do subsolo, indesejável ao sistema
separador e que penetra nas canalizações;
Contribuição pluvial parasitária: parcela deflúvio superficial inevitavelmente
absorvida pela rede coletora de esgoto sanitário.
Essas definições estabelecem as origens das parcelas constituintes do esgoto
sanitário. O esgoto doméstico, salvo exceção, a parcela mais significativa do esgoto sanitário
é resultado do uso da água nas instalações prediais sanitárias das habitações, estabelecimentos
comerciais, instituições públicas, além das instalações sanitárias dos estabelecimentos
industriais.
O esgoto doméstico, de acordo com a utilização das águas nas edificações pode ter a
seguinte classificação (Azevedo, Netto et. al, 1998):
Esgoto fisiológico (águas imundas ou negras): parcela utilizada na eliminação da
material fecal, apresentando alto teor de matéria orgânica e grande quantidade de
microorganismos, inclusive patogênicos;
Esgoto de cocção: resultante do processo de preparo e limpeza de alimentos e
utensílios (geram gorduras);
Esgoto profilático (águas servidas): proveniente da limpeza de corpo, roupas e
ambientes.
A denominação águas residuárias se aplica aos despejos líquidos, de forma genérica,
compreendendo os esgotos domésticos, não-domésticos e pluviais (Azevedo, Netto et. al,
1998). Novas definições estão sendo estabelecidas diante das perspectivas de usos distintos de
39
qualidades de águas diferenciadas e pela ampliação do seu reuso. O esgoto doméstico, sem a
parcela do esgoto fisiológico, leva a denominação de águas cinzas.
A rede coletora de esgoto sanitário recebe contribuições de origem não-doméstica,
podendo ser industriais ou não. Tipicamente, correspondem aos efluentes gerados por diversas
atividades econômicas, recreativas e institucionais, tais como: hospitais, clínicas médicas e
veterinárias, clubes esportivos, gráficas, lavanderias, oficinas mecânicas, postos de serviços,
jóquei, enfim, toda uma sorte de diferentes atividades geradoras de efluentes. Estes,
enquadrados enquanto esgoto industrial, somente devem ser lançados na rede coletora de
esgoto sanitário dentro dos padrões qualitativos e quantitativos de lançamento, de acordo com
as características do sistema existente ou eventual necessidade de adequações ou ampliações.
As águas de infiltração são águas subterrâneas que penetram indesejavelmente nas
canalizações pelas juntas
3
, pelas imperfeições das tubulações (defeitos dimensionais, fissuras,
trincas, rupturas), pelas estruturas dos órgãos acessórios, elevatórias, etc. Essas infiltrações
decorrem dos tipos e qualidade dos materiais empregados, da qualidade das obras, estado de
conservação, condições de assentamento destas tubulações e juntas e das próprias
características do meio: nível do lençol freático, clima, composição e estruturação do solo,
permeabilidade, vegetação, etc.
No dimensionamento da rede coletora de esgoto sanitário, não são consideradas as
contribuições pluviais parasitária
4
e nem as contribuições irregulares ou acidentais
provenientes das ligações irregulares e interconexões com o sistema de drenagem pluvial,
diferentemente das águas de infiltração. A contribuição pluvial parasitária encontra caminho
para a rede de esgoto sanitário através do escoamento das águas pluviais superficiais (run
off”) através de tampões de poços de visita, ligações abandonadas e outras entradas, sendo
sazonal, condicionada ao regime pluviométrico e às condições de estanqueidade do sistema.
As interconexões serão abordadas com detalhe no capítulo # 6.
Os sistemas de esgotos transportam matéria viva que desenvolve diversos processos
metabólicos, gerando gases combustíveis e mórbidos de alta periculosidade. Em síntese, o
esgoto é um sistema vivo.
3
As juntas são vedação entre tubulações (ponta e bolsa ou ponta e ponta). As de mau tipo ou execução são
responsáveis por infiltrações consideráveis. No caso do Brasil, segundo Azevedo Netto (1979) as juntas de
cimento e areia conduziram a maus resultados. Atualmente são recomendados para tubulações de esgoto
sanitário apenas juntas elásticas, e mesmo nesses casos para grandes tubulações em concreto encontram-se
dificuldades na execução, comprometendo a colocação dos anéis elásticos de vedação e, portanto a
estanqueidade.
4
Estudos e medições realizados pelo o antigo DES (SURSAN) na área de Copacabana estabeleceram o valor de
6 L/s por kilômetro para a contribuição pluvial parasitária (Azevedo Netto, 1979). Este valor segundo o prescrito
na NBR 12207/92 para projetos de interceptores, foi incluído como limite superior da taxa adotada, na
inexistência de medições.
40
Os impactos ambientais decorrentes da poluição por esgoto sanitário são:
No ambiente aquático:
Aporte de carga orgânica, coliformes fecais, coliformes totais, nutrientes (N, P),
resíduos sólidos e óleos e graxas;
Alteração da demanda bioquímica de oxigênio (DBO), oxigênio dissolvido (OD), cor,
turbidez, sólidos em suspensão, taxa de sedimentação e pH;
Contaminação por organismos patogênicos e metais pesados;
Presença de substâncias químicas não biodegradáveis, gás sulfídrico e gases
orgânicos;
Proliferação de vetores de doenças;
Ocorrência de eutrofização artificial;
Formação de escuma e lodo.
No ambiente edáfico:
Contaminação por organismos patogênicos, metais pesados;
Ocorrência de erosão;
Extravasamento nas vias públicas.
No ambiente aéreo:
Ocorrência de odores desagradáveis.
No meio biótico:
Morte e deslocamento da fauna;
Proliferação de vetores e de agentes patogênicos;
Alteração na vegetação;
Proliferação de algas.
Nos ecossistemas:
Alteração da biodiversidade;
Interferência na cadeia alimentar;
Alteração dos equilíbrios dos ecossistemas.
A insalubridade resultante dos resíduos procedentes de transformações mais
complexas de matéria-prima na produção gera novas relações entre população humana,
microrganismos e substâncias químicas residuais.
41
Como exemplo tem-se a poluição dos orgânicos persistentes, originários de indústrias
químicas, que merecem tratamento especial, pela sua resistência, a processos de tratamento
convencional e pelo desenvolvimento de agentes patogênicos multiresistentes a
antimicrobianos de uso médico, presente em efluentes hospitalar.
Além das doenças de veiculação hídrica, provocadas pelos organismos encontrados
nos esgotos tais como: bactérias, fungos, protozoários, vírus e helmintos; outras existem em
que a água pode ser um veículo indireto, sendo o “habitat” para os vetores que transmitem. É
o caso da malária, febre amarela, dengue, etc.
Um agravante no potencial de contaminação dos esgotos conduzidos pelos sistemas de
esgotamento sanitário é o fato de que estes conduzem também efluentes não domésticos
(industriais, hospitalares, centros comerciais, etc.), que em muitos casos são conduzidos
indevidamente para o lançamento em rede pública, sem um pré-condicionamento necessário,
estando em não conformidade ao prescrito nas regulamentações pertinentes (NT-202 R.10;
DZ-215
5
R.3; DZ-205
6
R.5 da FEEMA e NBR 9800/87
7
da ABNT).
A contaminação do esgoto sanitário por agentes patogênicos, inclusive os provenientes
de estabelecimentos hospitalares, deveria ser mais estudado, levado-se em consideração sua
desinfecção nas estações de tratamento do sistema de esgotamento sanitário coletivo.
De uma forma geral, o esgoto transportado atualmente pelo sistema de esgotamento
sanitário não é rigorosamente conhecido, nem são conhecidas suficientemente as
características intensamente variáveis, sejam dos esgotos sanitários ou dos esgotos pluviais,
nem das alterações resultantes da mistura indevida entre eles, de modo a possibilitar respostas
confiáveis ao problema da poluição e a apresentação de soluções adequadas.
Pelo exposto, fica evidente a necessidade de impedir a possibilidade de contato entre a
microbiota fecal e o meio ambiente, população humana e vetores. Desta forma os esgotos
deverão ser encaminhados aos ambientes naturais quando não mais forem esgotos, permitindo
assim que sua energia seja reincorporada à biocenose.
5
Segundo o item 7.3 da DZ-215 - “a licença para o lançamento em rede coletora dotada de tratamento ficará
condicionada à comprovação, pelo órgão responsável pela operação, das capacidades de escoamento e de
tratamento da carga orgânica biodegradável”.
6
No item 5.1 da DZ-205 - “no caso de lançamento em rede coletora dotada de tratamento, a licença da atividade
poluidora ficará condicionada à comprovação pelo órgão responsável pela operação, da capacidade de
escoamento e tratamento da carga orgânica biodegradável. Sendo tal capacidade insuficiente, cabeunicamente
à atividade poluidora a redução de sua carga orgânica aos níveis previstos para rede coletora não dotada de
tratamento. De qualquer forma, a remoção de sólidos grosseiros deverá ser feita por estas atividades, como
medida indispensável de proteção da rede coletora”.
7
De acordo com a norma técnica NBR 9800/87 da ABNT é proibido o lançamento no sistema de coleta pública
de substâncias que comprometam a operação e manutenção da rede e interfiram nos processos de tratamento.
42
Os dejetos humanos podem ser veículos de germes patogênicos de várias doenças,
conforme Quadro 2, apresentado abaixo.
Quadro 2. Doenças relacionadas à contaminação por fezes.
Grupo de
doenças
Formas de
transmissão
Principais doenças Formas de prevenção
Feco-orais
(não bacterianas)
Contato de pessoa para
pessoa, quando não se
tem higiene pessoal e
doméstica adequada.
- poliomielite
- hepatite tipo A
- giardíase
-
disenteria amebiana
- diarréia por vírus.
- implantar sistema de
abastecimento de água
- melhorar as moradias e as
instalações sanitárias
- promover a educação
sanitária.
Feco-orais
(bacterianas)
Contato de pessoa para
pessoa, ingestão e contato
com alimentos
contaminados e contato
com fontes de águas
contaminadas pelas fezes.
- febre tifóide
- febre paratifóide
- diarréias e disenterias
bacterianas, como a
cólera.
- implantar sistema de
abastecimento de água
- melhorar as moradias e as
instalações sanitárias
- promover a educação
sanitária
- implantar sistema adequado
de disposição de esgotos.
Helmintos
transmitidos pelo
solo
Ingestão de alimentos
contaminados e contato
da pele com o solo.
- ascaridíase (lombriga)
- tricuríase
- ancilostomíase
(amarelão)
strougilardiase.
- construir e manter limpas as
instalações sanitárias
- tratar os esgotos antes da
disposição no solo
- evitar contato direto da pele
com o solo (usar calçado).
Tênias (solitárias)
na carne de boi e
de porco
Ingestão de carne mal
cozida de animais
infectados.
- teníase
- cisticercose.
- construir instalações
sanitárias adequadas
- tratar os esgotos antes da
disposição no solo
- inspecionar a carne e ter
cuidados na sua preparação
(cozimento).
Helmintos
associados à água
Contato da pele com água
contaminada.
- esquistossomose.
- construir instalações
sanitárias adequadas
tratar os esgotos antes do
lançamento em curso d’água
- controlar os caramujos
- evitar contato com água
contaminada (banho, etc.).
Insetos vetores
relacionados com
as fezes
Procriação de insetos em
locais contaminados pelas
fezes.
- filariose (elefantíase)
- bouba.
- combater os insetos
transmissores
- eliminar condições que
possam favorecer criadouros
- evitar o contato com
criadouros e utilizar meios de
proteção individual.
Fonte: Adaptado de Barros et al., 1995.
43
4.3. Os Sistemas de Esgotos
Os sistemas de esgotos de uma cidade contemplam o escoamento dos esgotos sanitários
e os esgotos pluviais. O sistema de esgotamento sanitário é a integração dos componentes
responsáveis pela coleta, transporte, tratamento e disposição final dos esgotos sanitários. o
sistema de drenagem urbano é um conjunto de estruturas e ações responsáveis pelo
escoamento das águas pluviais, evitando efeitos adversos, tais como: empoçamentos,
inundações, erosões e assoreamentos.
Ambos são subsistemas dos serviços de saneamento básico, que por sua vez fazem parte
dos serviços de infra-estrutura urbana. Enquanto sistemas de saneamento, conforme detalhado
no subitem # 3.4., são sistemas artificiais, de proteção sanitária e ambiental, que funcionam
como barreiras físicas e ecológicas dispostas entre as populações humanas e os agentes
patogênicos, bem como entre elas e o meio ambiente.
O sistema de esgotamento sanitário para atendimento coletivo, de modo geral é
formado pelos sistemas de coleta/transporte e de tratamento/disposição final. Entretanto,
devido aos altos custos de implantação, nem sempre todos os componentes são implantados
em uma única etapa. Os projetos podem ser concebidos e ampliados em mais de uma etapa de
implantação, dentro de uma previsão de crescimento populacional e expansão da área de
atendimento. Com isso ampliam-se as redes, elevatórias e a capacidade de tratamento das
estações. Uma outra alternativa está em valer-se de níveis de tratamento distintos para cada
etapa de ampliação ao longo da vida útil do sistema (Roque, 1997).
A rede coletora responsável pela coleta e transporte do esgoto sanitário normalmente é
constituída pelas ligações prediais, tubulações, órgãos acessórios (poços de visitas, tubos de
inspeção e limpeza, terminais de limpeza, caixas de passagem, sifão invertido) e estações
elevatórias, devendo encaminhar o efluente de forma segura sob o ponto de vista sanitário e
ambiental. Para isso deve obedecer às seguintes condições técnicas:
Coletar, transportar e afastar o esgoto sanitário o mais rapidamente possível a fim de
impedir a septicidade;
Impedir a entrada de material ou de efluentes nocivos aos constituintes do sistema,
condições operacionais e de tratamento;
Permitir a continuidade da coleta e transporte;
Vedar a passagem de gases e animais pelas canalizações e órgãos acessórios;
Permitir a ventilação nos sistemas prediais de esgoto sanitário;
Garantir a estanqueidade, impedindo a passagem do esgoto para o ambiente externo ao
sistema, bem como a entrada de águas de infiltração e material sólido carreado;
44
Minimizar a formação de gases;
Evitar o assoreamento dentro da rede e a formação de depósitos no interior das
canalizações e órgãos acessórios;
Limitar a velocidade de escoamento para o controle de desgaste por abrasão;
Reduzir a perda de carga no sistema;
Facilitar inspeções, desobstruções e manutenção em geral;
Conceber sistemas emergenciais (extravasores e “by pass”);
Oferecer flexibilidade operacional.
As bacias de esgotamento sanitário e pluvial são definidas pelas condições
topográficas, uma vez que o regime hidráulico de escoamento é, salvo exceção, o gravitário,
de lâmina livre, com ão da pressão atmosférica. O conceito que deve nortear a condição
operacional dos sistemas de esgotamento sanitário é o de propiciar a facilidade e rapidez no
escoamento, que não deve estar sujeito a mudanças bruscas no fluxo, evitando a produção, o
desprendimento de gases e a deposição de material sedimentável. Por outro lado, a redução na
perda de carga garante a velocidade de escoamento, otimizando o sistema e seus custos.
Na maioria das vezes, os escoamentos nas tubulações são turbulentos, de regime não
permanente, variado, não uniforme, sendo até mesmo descontínuos, principalmente no início
dos trechos. Entretanto, para efeito do dimensionamento hidráulico esses sistemas são
concebidos utilizando condição simplificada de cálculo, que adota o escoamento laminar,
permanente, uniforme (contínuo) e conservativo em cada trecho
8
, com contribuição em
marcha crescente de montante para jusante. Em conseqüência desta simplificação são
estabelecidas para os cálculos hidráulicos as condições mais desfavoráveis (a favor da
segurança) para cada trecho. (ex: vazão mínima inicial, vazão máxima jusante final,
coeficiente de reforço, etc). A hidráulica das tubulações absorve perfeitamente as variações
decorrentes destas simplificações, contanto que sejam bem operadas.
Além dos próprios cursos d’água naturais e artificiais, as diversas estruturas e
procedimentos que compõem o sistema de drenagem objetivam assegurar o trânsito de
pedestres e veículos, controlar as erosões, proteger propriedades particulares localizadas em
áreas sujeitas à erosão e/ou inundação, proteger logradouros e vias públicas, proteger e
preservar obras, edificações e instalações de utilidade pública, proteger e preservar fundos de
vale e cursos d’água e eliminar a proliferação de doenças e de áreas insalubres (Barros et. al,
1995).
8
De acordo com a NBR 9649/86 da ABNT, trecho é o segmento de coletor, coletor tronco, interceptor, ou
emissário, compreendido entre singularidades sucessivas; entende-se singularidade qualquer órgão acessório,
mudança de direção e variações de seção, de declividade e de vazão quando significativa.
45
As sub-divisões das bacias de esgotamento dependem da escala de estudo, do nível de
detalhamento e da área contemplada pelo projeto. O entendimento de que o sítio em questão
é parte de uma área maior, é imprescindível à análise de como cada sub-bacia pode sofrer
influências de áreas e contribuições contíguas, garantindo assim a integração e articulação do
sistema como um todo.
Este tipo de avaliação deve contemplar o entendimento da flexibilidade operacional
uma vez que os sistemas de esgotos devem ser dinâmicos, tanto no que diz respeito à
necessidade de ampliação de seus índices de cobertura, quanto na capacidade de realizar
modificações em seus componentes, a fim de atender a um estado constante de alterações do
complexo urbanísticos das cidades.
Como dito anteriormente, as ligações prediais
9
, também fazem parte da rede coletora
de esgoto sanitário. Estão na primeira etapa do sistema, sendo responsáveis pela coleta dos
esgotos sanitários das residências e seu encaminhamento à rede pública. O somatório da
extensão das ligações prediais é, salvo exceção, maior que a extensão total do coletor público
de esgoto.
Conforme é detalhado no capítulo # 5, na época da City não se podiam construir
cozinhas e banheiros nas casas no Rio de Janeiro sem a devida autorização da companhia.
Esta atribuição foi gradualmente passada a particulares, cabendo na atualidade à
concessionária fiscalizar e notificar apenas a aceitação com relação às ligações prediais,
executadas por particulares autorizados.
As condições operacionais dos sistemas prediais de esgotos sanitários, que
correspondem às instalações prediais, de responsabilidade particular, estão diretamente
relacionadas às condições da rede pública. Conforme advertência de Azevedo Netto (1979), a
execução das ligações prediais, na maioria das vezes não é tão cuidadosa como a construção
da rede pública. Além disso, o ponto de inserção do coletor predial no coletor público é a
parte mais vulnerável das instalações.
É mister que haja mais controle das condições dos sistemas prediais de esgoto
sanitário que estão em contato com os usuários e apresentam maiores riscos de má utilização,
como também estão mais sujeitos a inadequados projetos e execução. Isto acarreta problemas
tanto nas ligações prediais quanto no sistema como um todo. É, inclusive, através dos
sistemas prediais que a rede pública é ventilada, condição operacional indispensável. Os
hábitos, costumes e informação, definidos pelo nível de condições sócio-econômicas dos
9
De acordo com o prescrito na NBR 9648/86, as ligações prediais são tubulações delimitadas entre a testada dos
loteamentos e a ligação com o coletor público.
46
usuários definem o uso, adequado ou não, dessas instalações e, conseqüentemente, os
problemas que podem ocasionar às redes públicas.
Dentro de uma filosofia de proteção ao sistema público, os aspectos supracitados
devem ser encarados como cuidados necessários, correlacionados aos aspectos referentes às
ligações prediais irregulares de esgoto sanitário ou de efluentes industrias, que são abordados
no capítulo # 6.
No sistema de esgoto do tipo separador absoluto, as redes coletoras de esgotos
sanitários (RES) apresentam características distintas das galerias de águas pluviais (GAP)
devido à natureza dos efluentes, cujas diferenças convém destacar:
Material:
RES: Os materiais e execução devem garantir estanqueidade e permeabilidade (quando
submetido à pressão de 0,1 MPa durante 30 min não devem apresentar vazamentos). As
juntas devem ser elásticas. Para os tubos em concreto o fator água/cimento é de 0,45, no
máximo
10
, e o cimento deve ser resistente a sulfato, compatível com o meio agressivo
11
.
Existe uma maior diversidade de materiais para as tubulações devido aos diâmetros serem
menores (a partir de 100 mm).
GAP: Os materiais e execução devem garantir a estanqueidade e permeabilidade (quando
submetido à pressão de 0,05 MPa durante 15 min não devem apresentar vazamentos). As
juntas podem sergidas. O fator água/cimento é de 0,50 no máximo e o cimento pode ser
de qualquer tipo, exceto no caso de comprovada agressividade do meio externo.
Possuem maiores limitações quanto aos materiais para as tubulações devido a diâmetros
maiores (a partir de 300 mm).
Traçado da rede:
RES: A rede deve viabilizar a coleta dos efluentes sanitários de um maior número possível
de residências, abrangendo a maioria dos logradouros da cidade.
GAP: É suficiente construir a rede apenas nas ruas, que devido à sua baixa declividade,
localização em baixas cotas ou a fim de coletar águas pluviais a montante, recolhem as
águas da bacia de contribuição. Nas situações opostas o escoamento podeser superficial
através das pistas de rolamento e sarjetas.
10
De acordo com o prescrito pela NBR 8890/03 da ABNT.
11
O esgoto sanitário no sistema de drenagem pluvial resulta na deterioração física de canalizações de drenagem
pluvial (corrosão provocada por H
2
S), uma vez que a confecção dos artefatos para água pluvial não
consideram a ação deste efluente agressivo.
47
Condutos:
RES: O transporte somente poderá ser feito por tubulações ou galerias fechadas.
GAP: Pode ser conduzido por tubulações, galerias ou canais a céu aberto.
Regime de escoamento:
RES: O regime de escoamento é contínuo, ocorrendo diariamente, mínimos e máximos de
descargas. As tubulações são dimensionadas a funcionarem no máximo a 75% do seu
diâmetro.
GAP: O regime de escoamento das águas pluviais é intermitente. Sua freqüência depende
da incidência de chuvas e do regime de precipitação. É permitido que os coletores
funcionem a seção plena no regime de descarga máxima.
Lançamento:
RES: Devido ao elevado nível de poluição e potencial de contaminação devem sofrer
tratamento antes do lançamento no destino final.
GAP: Deveriam apresentar-se pouco poluídas, com riscos mínimos de contaminação ou
maus odores, podendo desta forma serem lançadas em diversos pontos dos corpos hídricos
continentais ou diretamente no oceano.
Um aspecto relevante nas obras de engenharia é a vida útil de seus empreendimentos.
A partir do momento que os sistemas ultrapassam o alcance do projeto, tempo para o qual
foram concebidos, gradualmente seus componentes vão perdendo eficiência, até o momento
em que se tornam ineficazes. Este fato ocorre enfaticamente nas obras de saneamento, pelos
limites de depreciação dos equipamentos, durabilidade dos materiais, estruturas e artefatos
sujeitos ao meio agressivo, e pela capacidade hidráulica máxima de atendimento de seus
componentes. A utilização de sistemas obsoletos não garante atender as especificações
necessárias à consecução dos objetivos almejados.
48
5. HISTÓRICO DOS SISTEMAS DE ESGOTOS DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO
“Quando está realmente viva, a memória não contempla a história, mas
convida a fazê-la” (Eduardo Galeano).
Os sistemas de saneamento são equipamentos e serviços dinâmicos cuja historiografia
se confunde com a própria história das urbes, na trajetória de sua organização social e
espacial. Sua evolução está vinculada ao desenvolvimento institucional do Estado, ao modo
de produção, ao desenvolvimento tecnológico e à distribuição de renda. As condições atuais
de uma cidade são intrinsecamente relacionadas ao que se estabeleceu no passado.
Compreender os esforços e energias desprendidas historicamente na solução dos
problemas sanitários e ambientais é essencial para ampliar a visão da questão. A análise
histórica crítica exerce papel preponderante no processo de vitalidade da sociedade, pelo
diálogo entre o antigo e o novo, o clássico e o moderno, o consagrado e o emergente, se
cultivar o olhar reflexivo para o passado e atento para o futuro.
5.1. Evolução das Concepções de Saneamento
A evolução do conceito de poluição sofre alterações de acordo com seu próprio nível e
expansão. As definições clássicas primavam pela conotação estética, de conforto, de
incomodidade. Em seguida acrescentou-se gradativamente ao conceito fatores sanitários,
econômicos e finalmente, ecológicos, o que demonstra evolução na percepção do problema
(Silva, 1974). Também as concepções de saneamento evoluem subordinadas à leitura que
delas fazem os diversos componentes da sociedade e suas classes sociais, ao expressarem seus
pontos de vista específicos, visões de mundo e expectativas.
A origem das ações de saneamento no Brasil (e em todo o mundo ocidental), enquanto
solução coletiva, está associada ao controle de doenças infecto-contagiosas, a partir de
meados do século XIX (Costa, 1994). As primeiras manifestações de preocupação ambiental
têm suas raízes justamente em problemas de saúde pública, nas doenças originadas por déficit
dos serviços sanitários, na contaminação atmosférica e nas condições de moradia e trabalho.
Assim, a saúde e o meio ambiente formam um conceito binário, em que ambos são inclusos e
não excludentes (Kligerman, 2001).
A evolução dos sistemas de esgotos, segundo Desbordes (1987 apud Silveria, 1999),
pode ser caracterizada pela seqüência das seguintes fases: higienista; de racionalização e
normalização dos cálculos hidrológicos; e científica-ambiental do ciclo hidrológico urbano.
49
Abordagem Higienista
Na Antiguidade, os médicos gregos já faziam alusão à relação entre as áreas
pantanosas e as doenças (Rezende & Heller, 2002). No século XVIII, a Itália constatou que as
águas de banhados e zonas alagadiças influenciavam a mortalidade de pessoas e animais. Isto
foi rapidamente levado em consideração na Inglaterra, Alemanha e mais tarde na França,
consolidando a Teoria dos Miasmas
1
, concepção de contágio atmosférico-miasmático que
supunha serem as doenças transmitidas por emanações gasosas provenientes da matéria
orgânica em decomposição. Iniciou-se a fase higienista, uma escola de urbanismo
caracterizada pela tentativa de assegurar condições ambientais sadias ao ser humano, tendo
por fundamentação a implantação de conhecimentos, procedimentos e métodos de referência
científica, liderada por médicos que apregoavam a eliminação dos alagados como medida de
saúde pública. Alagadiços, valas e fossas receptoras de esgoto cloacal eram aterradas e,
posteriormente, substituídos por canalizações, que abriram caminho para os sistemas de
esgotos sanitário e pluvial organizados.
Racionalização e normalização dos cálculos hidrológicos
As epidemias de cólera nas grandes cidades da Europa do século XIX, principalmente
nos anos de 1832 e 1849, impulsionaram as intervenções implementadas pelos engenheiros e
urbanistas. Nesta fase procurava-se determinar e normalizar melhor o cálculo hidrológico para
dimensionamento das obras hidráulicas.
Entre 1850 e fins do século XIX, muitas cidades importantes do mundo foram dotadas
de grandes redes unitárias de esgotos. Exemplo da concepção higienista para outros países, e
na fase hidráulica, o tout-à-l’égout”, sistema de esgoto francês apregoava a idéia do
afastamento rápido das águas de origem cloacal ou pluvial da cidade. Planejado e iniciado a
partir de 1824, começou a receber fezes em 1880, durante o mandato do prefeito
Haussmann
2
(Silva, 2002; Costa, 1994).
Por não alterá-la conceitualmente, esta fase pode ser considerada como um
aperfeiçoamento da primeira, portanto uma etapa mais avançada da mesma.
1
Com o desenvolvimento da microbiologia esta teoria foi superada, gradualmente, pela Teoria Contagionista,
fruto das experiências de John Snow (1813-1858), Louis Pasteur (1822-1895) Heinrich Hermann Robert Koch
(1843-1910), dentre outros que completaram o sistema de causalidade das doenças. No Brasil, a Teoria
Contagionista foi ratificada com as ações implementadas por Oswaldo Cruz.
2
Georges Eugène Haussmann viria a ser mais conhecido pela reforma urbanística que implementou em Paris
visando melhorar as condições sanitárias da cidade, adequá-la ao novo modelo industrial capitalista e inibir
insurreições proletárias com a eliminação das ruas estreitas e tortuosas dos quarteirões populares (Benchimol,
1990). Esta foi a principal referência do engenheiro civil Pereira Passos (1836-1913) na implantação de sua
reforma urbana na cidade do Rio de Janeiro, como prefeito, entre 1902 e 1906.
50
Abordagem científica e ambiental do ciclo hidrológico urbano
Levando em conta os conflitos entre as cidades e seus ciclos hidrológicos, a
abordagem ambiental e a explosão tecnológica iniciadas pelos países desenvolvidos a partir
da década de 1960, expuseram as limitações do higienismo. Silveira (1999) afirma que alguns
autores consideram que nesta terceira fase, houve uma etapa, nos anos 70, calcada nas
simulações hidrológicas de bacias urbanas, e que somente numa segunda etapa, a partir dos
anos 80, a preocupação ambiental realmente tomou forma.
O afastamento rápido das águas, sem uma análise temporal e espacial ao longo das
bacias hidrográficas, e sem maiores cuidados com os possíveis impactos ambientais colaterais
se mostrou limitado no próprio combate às enchentes dos grandes e complexos centros
urbanos. O comprometimento dos recursos dricos exigiu novas formas de problematizar a
questão.
Em decorrência dos conflitos ambientais e outras incompreensões da complexidade
dos ecossistemas nascia o ambientalismo. O desenvolvimento da Ecologia e suas vertentes
viria a trazer instrumentos e métodos de análises mais profundos e consistentes às ações
antrópicas.
No contexto internacional, a preocupação com a questão ambiental tornou-se
proeminente e resultou em grandes conferências mundiais sobre o tema. As preocupações
ambientais foram expressas por Rachel Carson no seu livro de bolso – hoje clássico da
literatura ambientalista - Primavera Silenciosa, de 1962, nas palavras de Aldo Leopoldo em A
Ética da Terra, de 1949, por George Perkins Marsh, em Homem e Natureza, 1864, ou pelos
expoentes pensadores da Grécia clássica e na serenidade da sabedoria oriental e suas culturas
milenares. A Conferência Científica da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre
Conservação e Utilização de Recursos Naturais, em 1949, foi o primeiro marco na ascensão
do movimento ambientalista internacional (McCormick, 1992 apud Silva, 1999). a
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo, 1972, como
marco conceitual da defesa dos recursos naturais visando as condições mínimas de qualidade
de vida do homem contemporâneo traduz um amadurecimento no movimento ambiental. No
mesmo ano é lançado pelo Clube de Roma o documento “The Limits to Growth”, que
estabelecia modelos globais baseados nas técnicas então pioneiras de análise de sistemas,
projetados para predizer o futuro caso não houvesse o ajustamento devido nos modelos de
desenvolvimento econômico adotados na época. Outros esforços se manifestaram na
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (“Rio-
92”) e, recentemente, em agosto de 2002, na World Summit on Sustainable Development, em
51
Johannesburgo, na África do Sul (reconhecida por “Rio +10”), que obteve resultados
modestos frente às expectativas e necessidades, segundo alguns.
O conceito de desenvolvimento sustentável, consolidado na “Rio-92”, busca um
novo modelo de desenvolvimento pautado no respeito ao meio ambiente, na justiça social e na
participação do cidadão. Define-se como aquele que garante as necessidades presentes, sem
comprometer a capacidade de atendimento das necessidades das gerações futuras. A Agenda
21
3
(global) e a Carta da Terra surgem da “Rio-92” como um paradigma a ser vencido
através da evolução conceitual e prática das propostas ambientais a partir da necessidade de
interações em nível planetário.
As conferências internacionais contribuem para que as nações exponham seus pontos
de vista a respeito da questão ambiental e seu comprometimento (ou não) de reversão do
cenário crítico atual.
A Figura 6, apresentada abaixo, identifica o modelo de desenvolvimento atual com o
enfoque linear humano e o de desenvolvimento sustentável proposto, enfocando as relações
com os resíduos produzidos nas diversas etapas.
Figura 6. Modelos de desenvolvimento atual e sustentável
(Braga et. al, 2002).
3
A Agenda 21, no capítulo 18 - Proteção da qualidade e do abastecimento dos recursos hídricos: aplicação de
critérios integrados no desenvolvimento, manejo e uso dos recursos hídricos, estabelece para os países as
seguintes recomendações nas áreas de programas para o setor de água doce: desenvolvimento e manejo integrado
dos recursos hídricos; avaliação dos recursos hídricos; proteção dos recursos hídricos, da qualidade da água e
dos ecossistemas aquáticos; abastecimento de água potável e saneamento; água e desenvolvimento urbano
sustentável; água para produção sustentável de alimentos e desenvolvimento rural sustentável; impactos da
mudança do clima sobre os recursos hídricos.
O ENFOQUE LINEAR HUMANO
ENERGIA
Uso de Recursos
Resíduo/Impacto
Processamento
Modificação
Recursos
Transporte Consumo
Resíduo/Impacto Resíduo/Impacto Resíduo/Impacto
O SISTEMA SUSTENTÁVEL PARA OS HUMANOS
ENERGIA
Uso de Recursos
Processamento
Modificação
Recursos
Transporte Consumo
Impacto minimizado pela restauração ambiental
Resíduo/Impacto
Recuperação
do Recurso
52
Não obstante, vêm sendo feitas críticas aos diversos conceitos difusos relacionados ao
que seja desenvolvimento sustentável”. Feldmann & Bernardo (1994 apud Silva, 1998)
afirmam o caráter elitista e conservador desse conceito. Para tais autores, este não é
necessariamente um novo paradigma, que suporia alterações estruturais, mas um rearranjo de
forças, uma espécie de movimento de modernização conservadora, de base ambientalista.
Assim, quanto mais este conceito é usado, mais fica deprimido seu potencial de significar um
“novo” pensamento social. Para Zorzal (1999b), este conceito foi em parte digerido pelo
poder hegemônico e inserido em sua agenda.
Alguns preferem ampliar o conceito e melhor precisá-lo através de novas
terminologias, tais como: cidade sustentável, sociedade sustentável, modo de vida sustentável,
incorporando a necessidade de erradicação da pobreza e das desigualdades sociais enquanto
preceitos de sustentabilidade.
No Brasil, a reformulação dos currículos plenos dos cursos de engenharia, no limiar da
década de 80, passou a exigir a disciplina Ciências do Ambiente, dentro do currículo do
engenheiro pleno, o que reflete preocupações e aspirações da sociedade, a quem os técnicos
prestam seus serviços.
Atualmente, devido às formas de consumo dos recursos naturais, a geração de
resíduos, principalmente nas grandes metrópoles, surge a necessidade de controle da poluição
sob uma abordagem sistêmica, que considere suas fontes e conseqüências como interferentes
e limitadoras do próprio desenvolvimento das cidades. Daí a definição de saneamento
ambiental, descrita no subitem # 3.4.1., que não exclui as demandas sanitárias, pelo contrário,
a reforça enquanto ação prioritária na garantia de salubridade ambiental, porém não se
limitando a estes objetivos.
A periodização da evolução conceitual da natureza das ações de saneamento é
necessária para o melhor entendimento das ações dominantes. Entretanto, sua evolução não se
deu de forma estanque, obedecendo a uma suposta linearidade. Diversas idéias têm
coexistido, se superpondo, avançando, retrocedendo e ressurgindo dialeticamente.
No Brasil, alguns engenheiros do início do século XX foram denominados
“enciclopédicos”, por sua sólida formação teórico-básica e, em muitos casos, cultura geral e
humanística, que, agregadas às necessidades práticas, permitia-lhes atuar em vários campos
da engenharia (Telles, 1984). Mesmo em uma contextualização histórica positivista, isso
possibilitou-lhes uma posição em cotas mais elevadas na geomorfologia do conhecimento.
53
Destaca-se como exemplo a atuação do engenheiro sanitarista Francisco Saturnino
Rodrigues de Brito
4
(1864-1929), que, mesmo com a limitação dos conceitos e técnicas de
manejo dos recursos naturais à época do Higienismo, superou restrições, indicando soluções
de abrangência ambiental em diversas regiões do país
5
.
Propunha a ciência Higiotécnica, onde a ação preventiva e corretiva dependia da
resolução do problema da Teoria dos Meios. Propunha Brito (Obras, v.II, 1901):
O conhecimento teórico dos agentes mesológicos, a par do estudo biológico do homem,
consta da consideração: das ações mecânicas, astronômicas e físicas, isto é, relativas à
gravidade, à pressão atmosférica, ao movimento e ao repouso dos agentes e dos seres, ao
calor, à eletrificação e ao som; das ações químicas e biológicas do ar, dos líquidos, dos
sólidos; finalmente, da considerável influência social e moral. As relações recíprocas entre
os seres vivos e os modificadores mesológicos formam a teoria dos meios, e ela constituirá,
quando elaborada, a fonte das soluções que em vão procura obter presentemente.
(...) falta-nos a elaboração filosófica das relações, isto é, da teoria dos meios. Se esta
constitui uma dificuldade genérica e fundamental para dar soluções acertadas aos
problemas práticos, ela mais avulta se considerarmos que os documentos em questão,
relativos ao homem e aos modificadores mesológicos, apresentam-se sem método e eivados
de defeitos, cientificamente examinados. Tratando-se de “saneamento” das cidades, vimos
que os obstáculos são quase insuperáveis e que a maior parte das soluções é destituída de
precisão, representando simples tentativas, embora muito coroadas de um êxito local que
tem conduzido a desastrosas generalizações.
Advertia-nos quanto à necessidade de proteção das bacias hidrográficas, de
reflorestamento, no combate a inundações, tendo importante participação na elaboração do
Código de Águas, para regulamentação das concessões de energia elétrica no país, documento
que representou um dos primeiros instrumentos legais de controle do potencial hídrico.
Infelizmente só foi instituído em 10 de julho de 1934, cinco anos após seu falecimento
(Rezende & Heller, 2002).
A posterior fase das modernas especializações da engenharia e de outras profissões,
ocorrida por volta da década de 1960 (Telles, 1984), visou atender às evoluções tecnológicas
da era moderna, ao alargamento e à diversificação das áreas, por um lado; e por outro, reduziu
a percepção da necessidade de cultura e visão de conjunto por parte dos novos engenheiros e
conseqüentemente, sua capacidade de inserção nos problemas nacionais.
Para Silveira (1999), a maioria das obras de drenagem urbana no Brasil ainda segue o
modelo higienista. A análise ambiental multidisciplinar depende diretamente das condições
4
Fluminense da cidade de Campos é o patrono da Engenharia Sanitária no Brasil, título atribuído no I Congresso
de Engenharia Sanitária, realizado no Rio de Janeiro, em julho de 1960 e endossada no VII Convenção Nacional
de Engenharia, de 1972. Segundo Telles (1993) o fundador da especialidade sanitária no país, foi pioneiro na
criação do escritório de engenharia consultiva no país.
5 Elaborou projetos dos serviços de água e esgoto para: Vitória, Campinas, Ribeirão Preto, Limeira, Sorocaba,
Amparo. Também participou dos grandes projetos de Santos, Campos, Recife, João Pessoa, Lagoa Rodrigo de
Freitas, projeto de retificação do rio Tiete. Alem dos projetos para. Petrópolis, Paraíba do Sul, Rio Grande, Santa
Maria, Cachoeira do Sul, Cruz Alta, Passo Fundo, Rosário, Livramento, São Leopoldo, Uruguaiana, São Gabriel,
Iraí, Alegrete, Pelotas, Uberaba, Teófilo Ottoni, Poços de Caldas e Juiz de Fora.
54
locais. Por isso, a prática de transferência de resultados ou métodos é bem menos aceitável
hoje do que o era nas etapas higienistas. A maior resistência a esta nova modelagem reside no
fato de que sua implantação é complexa e custosa.
5.2. Primeiras Intervenções no Rio de Janeiro
5.2.1. Eliminação dos “Ecossistemas Adversos”
A colonização européia extinguiu a relação harmoniosa entre homem e natureza antes
existente no Brasil. Os diversos ciclos econômicos trouxeram impactos negativos sobre os
ecossistemas: o extrativismo do pau-brasil, a agricultura de subsistência, a exploração de
minerais, a monocultura de açúcar e café, a pecuária e a industrialização. O processo de
degradação ambiental não foi gradual nem linear, mas assumiu uma escala mais drástica nas
últimas décadas com o desenvolvimento do modelo urbano-industrial.
As perspectivas histórico-culturais condicionam o relacionamento entre as sociedades
e a natureza. Deflagraram nos colonizadores o medo da floresta selvagem e as tentativas de
sua dominação; nos grupos indígenas e africanos, a perspectiva de refúgio e de conexão com
uma cultura anterior; no ciclo econômico do café, a visão utilitarista de exploração e
posteriormente sua aceitação com reflorestamento das áreas dos mananciais e das encostas do
Maciço da Tijuca e criação dos primeiros jardins blicos; nas teorias médicas, o efeito da
manipulação da paisagem local; à aceleração da superimposição da malha urbana à floresta, o
recente reconhecimento da necessidade de preservação do ecossistema local remanescente
(Schlee, 2001).
Na sua fase inicial, as mesmas condições de isolamento que serviram à defesa do Rio
de Janeiro frente aos constantes ataques promovidos pelos índios e estrangeiros tornaram-se
depois entraves ao desenvolvimento da cidade. A conquista de espaços e infra-estrutura
adequados à fixação dos habitantes foi sempre um grande desafio. A constituição topográfica,
geológica, climática e hidrológica da cidade, associada à configuração original de sua
ocupação e do modelo de colonização, tornaram-na um ambiente propício à proliferação de
doenças. No entanto, para não incorrer em uma geografia determinista e reducionista, a
análise através dos condicionantes geográficos deve ser criteriosa.
O núcleo embrionário da cidade do Rio de Janeiro desenvolveu-se nas estreitas faixas
entre mar e montanha (Coaracy, 1965; Abreu, 1992), delimitadas pelos morros do Castelo,
Santo Antônio, São Bento e Conceição, região denominada Quadrilátero da Várzea, área
sujeita a inundações pelo efeito das chuvas e preamares. A região era de difícil fixação,
situada na zona tropical, de planícies baixas (algumas inferiores a cota média das marés)
55
com pouca declividade, rodeada por montanhas e serras de alta declividade, primitivamente
formada por extensas áreas inundáveis, lagoas, alagadiços, pântanos, mangues e cortada por
uma série de rios e córregos. As águas das marés invadiam os charcos tornando alguns morros
parcial ou completamente insulados.
São dois os domínios fisiográficos principais da cidade: o relevo montanhoso
representado pelos maciços da Pedra Branca, Tijuca, e Mendanha-Gericinó e as zonas de
baixadas circundantes, denominadas localmente de Santa Cruz, Jacarepaguá, Fluminense e
litorânea ou entorno do Maciço Litorâneo. Na faixa litorânea, os cordões de restingas
individualizam formações lagunares de pequena profundidade, destacando-se as lagoas de
Jacarepaguá, Tijuca, Camorim e Rodrigo de Freitas. Os maciços são centros dispersores das
águas pluviais que convergem para o fundo de vales e zonas de baixadas circundantes onde
atualmente se situam os bairros de maior densidade demográfica.
A Figura 7, apresentada a seguir, identifica as características fisiográficas citadas.
Figura 7. Mapa topográfico da Cidade do Rio de Janeiro
(Imagem multiespectral cedida ao Ministério do Exército pela SPOT IMAGE).
As características geomorfológicas naturais e as sucessivas alterações físicas
trouxeram grandes desafios para o processo de urbanização, implantação e gestão dos serviços
de infra-estrutura. O crescimento da cidade foi, em grande parte, produto da realização de
obras de saneamento.
Os primeiros trabalhos de drenagem consistiram na construção de telhados inclinados
e escavação de valas no solo com a finalidade de propiciar o escoamento de águas estagnadas
e de chuvas, práticas de uma engenharia primitiva (Silveira, 1999).
56
O crescimento populacional aumentou a demanda por aterrar, inicialmente novos
caminhos e depois, novas áreas edificáveis, somando-se à necessidade de combate aos
miasmas, solução adotada e intensificada nos períodos subseqüentes, que eliminou
sistematicamente diversos ecossistemas. O desmatamento começou com o pau-brasil e
perdurou por todos os ciclos de monoculturas e ocupação.
O dessecamento de áreas alagáveis iniciou-se em 1641 na antiga Lagoa de Santo
Antônio (atual Largo da Carioca e imediações). No princípio do século XVIII ocorreu o
primeiro grande aterro. A antiga praia de Manuel Brito deu lugar ao Terreiro do Carmo, atual
Praça XV de Novembro. Difícil aterramento se deu no grande Saco de São Diogo, que ia da
atual Rodoviária até a Praça da República e a Tijuca, iniciado por D. João VI, passando pelo
Império (1835), continuando com o Barão de Mauá, em 1857, e concluído por Pereira Passos.
Nesta época, a construção de trecho do canal do Mangue, na altura do Viaduto dos
Marinheiros até o Cais do Porto interligou a comunicação com o mar em suas extremidades.
Foram consumidos cerca de 3 km
2
de manguezais sendo construído sobre o aterro, a Cidade
Nova e a Avenida Brasil. O aterro da orla do Caju a Copacabana, com a construção do Cais
do Porto, disponibilizou uma área de 15 km
2
(Zee, 2000). Outros diversos aterros se
sucederam na cidade tanto nas áreas continentais como na orla marítima até recentemente, em
1992, com a construção da Linha Vermelha.
A Figura 8, apresentada a seguir, mostra aspectos do Canal do Mangue, em 1928, que
passou a escoar, desde os primórdios, a drenagem fluvial, pluvial e também os esgotos
domésticos.
Figura 8. Canal do Mangue
(Augusto Malta, 09/06/1922. AGCRJ).
57
O arrasamento de morros (totais e parciais) para realização de aterros e
disponibilização das áreas pertencentes às antigas elevações se deu, a partir de 1779, com o
Outeiro das Mangueiras, seguido dos morros do Senado, Castelo, Santo Antônio, Anhangá,
Caboclo e Baiano (Barreiros. In: Silva, 1965).
A Figura 9, abaixo, apresenta o desmonte, ocorrido em 1922, do morro do Castelo,
baluarte da cidade nascente.
Figura 9. Arrasamento do morro do Castelo.
(Augusto Malta, 09/06/1922, AGCRJ).
Rios foram retificados, canalizados e aterrados. Diversas praias, alagados e ilhas foram
suprimidas. A cidade aumentou seu espaço urbano conquistando colinas, planície e vales,
avançando sobre montanhas, brejos, pântanos, mangues, lagunas e sistemas fluviais e fazendo
recuar a linha do litoral, com a eliminação das reentrâncias da orla marítima - enseadas, sacos,
gamboas, restingas, pontais, estuários, etc.
Os sucessivos aterros geraram diversos impactos, tais como: supressão de nichos,
subsistemas e ecossistemas, artificialização das margens naturais, redução no espelho d’água,
introdução de materiais estranhos ao meio ambiente, alteração no sistema de circulação de
correntes de maré criando áreas erosivas e deposicionais, alteração do perfil de equilíbrio dos
rios e canais, redução da declividade e agravamento das inundações, instabilidade em aterros
sobre material de baixa capacidade de suporte e/ou mal confinados (Zee, 2000).
A solução adotada viria a trazer no futuro grandes desafios para o sistema de esgotos
da cidade. Os percursos dos rios tornaram-se mais longos e diminuiu-se a declividade dos
estuários. Este fato agravou ainda mais os problemas de escoamento decorrentes das baixas
declividades que caracterizam os cursos d’água das baixadas. Os diversos espaços alagáveis
da cidade, que naturalmente sofriam inundações, configuravam primitivamente “áreas
58
pulmão”. Sendo incorporadas ao processo de urbanização, as edificações e seus habitantes
tornaram-se susceptíveis às enchentes com todos os seus transtornos.
Associadas ao efeito de maré, as características dos talvegues dos rios cariocas
resultaram em uma configuração que, por si só, impôs soluções de esgotamento complexas e
custosas. Acresce comentar que as obras de engenharia, realizadas de forma autônoma e
estanque, na ausência da ação fiscalizadora dos governos em uma perspectiva integrada,
resultaram em graves conseqüências para os ecossistemas. O próprio poder público, movido
pelas pressões econômicas e políticas, é um tradicional infrator ambiental, conduzindo,
estimulando ou cedendo concessões para diversas intervenções nocivas ao meio ambiente e às
comunidades, sem a devida análise dos impactos nos ecossistemas, na dinâmica da cidade e
nos seus sistemas de infra-estrutura.
O Quadro 3, a seguir, lista os acidentes alterados e desaparecidos do centro da cidade
do Rio de Janeiro (Barreiros, In. Silva, 1965) e a Figura 10, subseqüente, identifica a posição
dessas alterações físicas na porção continental e na orla marítima.
Quadro 3. Acidentes desaparecidos e alterados do centro da cidade do Rio de Janeiro.
Cód. Acidente físico Cód.
Acidente físico
A Gamboa Grande 11 Ilha dos Melões
B Lagoa da Sentinela 12 Ilha das Moças (Cães)
C
Lagoa do Polé (Pavuna ou
Lampadosa)
13 Saco do Alferes
D Lagoa de Santo Antônio (Ajuda) 14 Praia da Chichorra
E Lagoa do Destêrro 15 Saco da Gamboa
F Lagoa do Boqueirão 16 Ponta de Nossa Senhora da Saúde
G Mangal de São Diogo 17 Praia do Valongo
1
Final do trecho navegável por
canoas e faluas
18 Praia do Valonguinho
2 Outeiro das Mangueiras 19 Arraial de São Francisco da Prainha
3 Morro do Senado (Pedro Dias) 25 Ponta da Piaçaba
4 Morro do Castelo (Descanso) 26 Praia de Santa Luzia
5 Morro de Santo Antônio 27 Praia do Boqueirão
6 Aguada dos Marinheiros 28 Praia da Lapa
7 Ilha dos Ratos (Fiscal) 29 Praia da Glória
8 Praia de São Cristóvão 30 Saco da Glória
9 Saco de São Diogo 31 Praia do Russel
10 Praia Formosa 32 Ilha de Villegaingnon
Fonte: Barreiros. In. Silva, 1965.
Figura 10. Alterações físicas do centro da cidade do Rio de Janeiro (Barreiros. In: Silva, 1965).
60
Alguns ecossistemas, mesmo não sendo eliminados por completo, sofreram intensas
ações antrópicas, alterando significativamente suas relações ecológicas, como a
biodiversidade, balanço hídrico, condição de contorno, presença de vetores, alterações físico-
químicas, dentre outros. As Figuras 11a e 11b, a seguir, apresentam o contraste de dois
momentos distintos do ambiente estuarino da Lagoa Rodrigo de Freitas.
(a) Gravura de Camões em 1870. (b) Atualidade (www.rio.rj.org.br).
Figura 11. Aspectos da Lagoa Rodrigo de Freitas.
Na Figura 12, apresentada abaixo, estudos desenvolvidos por Breno Marcondes Silva
representam a redução do espelho d’água da Lagoa Rodrigo de Freitas decorrente de
sucessivos aterros.
Figura 12. Delimitações das margens da Lagoa Rodrigo de Freitas
(Silva, O Jornal, 1 maio 1973).
61
A Tabela 1, apresentada a seguir, consigna as alterações físicas dos diversos
ecossistemas da Baía de Guanabara decorrentes das ações antrópicas.
Tabela 1. Alterações
dos ecossistemas da Baía de Guanabara provocadas por ações antrópicas
.
1500 1996
Perdas
1500/1996
Alterações de Superfícies
Área
(km²)
%
Área
(km²)
%
Área
(km²)
%
1. Superfície da Bacia Contribuinte à Baía de Guanabara
1.1. Incluindo a Baía de Guanabara 4.566 100 4.566 100 0 0
1.2. Sem incluir a Baía de Guanabara 4.017 87,97 4.104 89,88 (+87) (+2,16)
2. Superfície da Baía de Guanabara
2.1. Considerando a Baía de Guanabara até
o marco das ilhas Pai, Mãe e Menina e a
Ponta do Arpoador, sem inclusão das ilhas
468 10,24 373 8,16 95 20,29
3. Superfície ocupada pelas ilhas 40 0,87 52 1,13 (+12) (+30,01)
4. Superfície ocupada pelos manguezais 257 5,62 80 1,75 177 68,87
5. Superfície ocupada pelos brejos, alagados
e pântanos
235 5,14 75 1,64 161 68,51
6. Superfície ocupada pelas restingas, dunas
e terraços marinhos
132 2,89 28 0,61 104 78,78
7. Superfície ocupada pelas várzeas e canais
fluviais
43 0,94 8 0,17 35 81,39
8. Superfície ocupada pelos costões, pontões
rochosos e falésias
4 0,08 3 0,07 1 25,01
9. Superfície ocupada pela mata atlântica 3.375 73,91 1.265 27,71 2.110 62,51
10. Superfície ocupada pelas lagunas 12 0,26 3 0,06 9 25,01
Alterações de Unidades
Un. % Un. % Un. %
11. Número de lagunas 39 100 2 5,12 37 94,98
12. Número de ilhas (excluídas lajes (28),
pedras (27), coroas (3), calhaus (2) e parcéis
(1))
127 100 65 51,18 62 48,82
13. Número de ilhas (incluídas lajes (28),
pedras (27), coroas (3), calhaus (2) e parcéis
(1))
188 100 127 67,55 61 32,45
14. Número de enseadas, sacos e gamboas 24 100 9 37,44 15 62,51
15. Número de canais fluviais naturais 50 100 4 8,01 46 92,01
16. Número de praias naturais 118 100 8 6,77 62 93,23
Fonte: Amador, 1997.
62
As Figuras 13a, 13b e 13c, apresentadas abaixo, ilustram a evolução urbanística em
algumas áreas da Cidade do Rio de Janeiro.
(a) Lagoa Rodrigo de Freitas.
(b) Área Portuária, Centro e adjacências.
(c) São Critóvão, Tijuca e adjacências.
Figura 13. Evolução urbanística na Cidade do Rio de Janeiro (1505-
2002)
(Imagens do cd-rom “RIO 500 ANOS”. IPP, 2002).
63
5.2.2. Práticas Individuais para o Esgoto Doméstico
No processo de formação das cidades, os habitantes estabelecem o modo de vida
sedentário, onde a casa passa a ser o espaço do saneamento individual. As habitações do
período colonial e imperial eram precárias, desde as moradias mais simples até a casa-grande,
apesar de sua robustez (Mello e Souza, 1997). Segundo Telles (1984), existiam grandes
diferenças entre as cidades fundadas por espanhóis e pelos portugueses. Enquanto os
primeiros possuíam regras rígidas para o planejamento e construção das cidades, os últimos
não tinham normas a respeito, e, como observa Afonso Arino, ainda eram homens da Idade
Média no que se refere a urbanismo. A evolução urbana é acompanhada pelos hábitos e
costumes da época. A construção das casas com seus cômodos situados ao fundo, bem
escondidos dos olhares de todos, refletia este fato. Inicialmente as casas impunham-se sobre
as ruas sem alinhamentos e planos que recebiam os expurgos das residências.
No Brasil, nos séculos XVI, XVII e meados do XVIII, a presença do poder público nas
questões de esgotamento sanitário limitou-se a tentativas malfadadas de normalizações e
controle das práticas individuais de afastamento dos resíduos gerados. Inicialmente, a coleta e
transporte dos dejetos humanos eram feitos de forma
estática,
por carregadores braçais. O
transporte do esgoto doméstico se deu utilizando-se inicialmente as águas pluviais e
posteriormente a água do abastecimento das residências.
As Valas
Em nosso país, assim como no resto do mundo, as primeiras ações de esgotamento,
foram destinadas ao escoamento das águas pluviais. A construção de diversas valas, utilizadas
para o dessecamento das áreas de alagadiços e consideravelmente ampliadas com as chuvas,
propiciava o descarte de dejetos e lixo, resultando em um péssimo quadro epidemiológico,
com focos permanentes de doenças, vetores e mau cheiro, piorando as condições de
insalubridade da população. No século XVII, com o aumento populacional na urbe carioca,
disseminaram-se as “valas negras”, assim chamadas as valas contaminadas por dejetos
humanos e de animais. Eram em grande parte estabelecidas pelo alargamento de pequenos
córregos existentes, geralmente sem revestimento. Outras eram muradas e calçadas, mas
mesmo assim comumente transbordavam alagando vias públicas e invadindo moradias. Eram
também encontradas em fossas negras inadequadas e nos arrabaldes de sumidouros, sendo
condenadas pelos médicos higienistas. A
Figura 14
,
apresentada na página seguinte,
representa o traçado das principais valas existentes no centro da cidade em meados do século
XIX, de acordo com Alcântara (1952), Gomes (2001) e Silva (2002).
Figura 14. Principais valas do centro da cidade em meados do séc. XIX (Gomes, 2001).
65
A mais importante delas (Vala 1, Figura 14), cujo traçado deu origem às ruas
Uruguaiana e do Acre, era a
Valla,
popularmente conhecida como a “grande vala das
imundícies” e por sua importância histórica merece maior destaque, posteriormente
apresentado.
Partindo da rua Matacavalos (atual Riachuelo), outra vala importante seguia pelas ruas
do Lavradio e Inválidos (Vala 2, Figura 14). Contornando o Morro do Senado, seguia pelas
ruas Nova do Conde (atual Frei Caneca) e Formosa (atual General Caldwell) até a Lagoa da
Sentinela. Com o aterramento da lagoa, seu trajeto continuou pelas ruas do Areal (atual
Moncorvo Filho) e Rua das Flores (atual Rua Santana), desaguando, finalmente, no Mangue
da Cidade Nova, onde depois foi aberto o atual Canal do Mangue.
Nascendo num pântano, onde hoje está a Igreja do Sacramento, outra vala (Vala 3,
Figura 14) passava pelo Largo do Rossio (atual Praça Tiradentes), cruzava as ruas do
Lavradio e dos Inválidos e, seguindo ao lado da Matriz de Santo Antônio, estendia-se pelos
fundos de terrenos da rua do Senado, até lançar-se na vala anterior, supracitada (Vala 2).
Outra vala partia da Rua dos Inválidos (Vala 4, Figura 14), seguindo paralelamente à
rua dos Arcos e entre esta e a rua do Riachuelo, atravessando os terrenos existentes entre elas.
Passava junto ao Aqueduto da Carioca e atravessando os terrenos das casas da rua Visconde
de Maranguape e Dr. Joaquim Silva, cruzava o Beco do Império (atual rua Teotônio Regadas)
e o Largo da Lapa, até desaguar no Boqueirão do Passeio.
Um braço da vala anterior (Vala 4), contornava o sopé do Morro de Santo Antônio,
alcançando o local do antigo Teatro Recreio, onde recebia águas de uma nascente.
Também importante era a que começava na rua de São Lourenço (atual rua Visconde
da Gávea), perto da Chácara dos Cajueiros, passando pelo Campo de Santana, junto à Estrada
de Ferro Central do Brasil, seguindo pela rua Diogo (atual rua General Pedra), rua Santa Rosa
(atual rua Marquês de Pombal), até desaguar no Mangue da Cidade Nova (Vala 5, Figura 14).
Por fim, temos a formada no leito do antigo rio do Catumbi (do Iguassú ou dos
Coqueiros) e que recebia águas das encostas dos morros de Santa Teresa e de Paula Matos
(Vala 6, Figura 14). Seguia pela rua dos Coqueiros, acompanhando a frente do cemitério,
atravessava as ruas do Chichorro e do Catumbi, rua Conde d’Eu (rua Frei Caneca) e rua
Visconde de Sapucaí (antiga rua Bom Jardim), até desaguar no Mangue da Cidade Nova. Essa
vala produzia grandes inundações nas áreas de ambas as margens de seu trecho terminal, que
tinha pouca declividade e cotas muito baixas.
66
Rua Uruguaiana, outrora rua da Valla
A Lagoa de Santo Antônio foi palco das primeiras intervenções, ainda que
rudimentares, ligadas ao saneamento que se têm registro no Rio de Janeiro. Sua área,
correspondente ao atual Largo da Carioca e adjacências da Cinelândia, se estendia até onde
está localizado agora o Teatro Municipal. Esta lagoa, de regime permanente, fazia parte do
complexo lagunar que primitivamente ocupava grandes várzeas do Rio de Janeiro. Um
pequeno trecho seco de terreno, conhecido como Caminho do Desterro (rua Evaristo da
Veiga), a separava de outra lagoa denominada Boqueirão, que seria futuramente aterrada pelo
vice-rei Luis Vasconcelos, dando origem ao Passeio Público (Coaracy, 1965).
A Lagoa de Santo Antônio era extensa, profunda, navegável e de águas límpidas, a
preferida pelos índios para atividades de pesca e banho, até ter sido instalado em uma de suas
margens, em 1610, um matadouro e seu correlato curtume, cujos resíduos eram descartados
em suas águas que, além disso, eram utilizadas para dessedentação do gado criado nas
redondezas. Mediante sucessivas reclamações da congregação ali instalada, uma vez que as
águas poluídas provocavam mau cheiro e proliferação de mosquitos, por determinação da
Câmara foi aberta, em 1641, uma vala, provavelmente, segundo Coaracy (1965),
aproveitando-se de um sangradouro natural que se comunicava com o mar, na antiga Prainha
(Praça Mauá), localizada entre os morros de São Bento e Conceição. Nos períodos de cheias
esta sanga escoava parte das águas que transbordavam das antigas lagoas. A
Valla
,
confeccionada em pedra e cal, era um fosso aberto que tinha como objetivo drenar as águas
estagnadas da lagoa e dessecá-la, entretanto, se mostrou insuficiente e a Câmara em 1646
instalou um conduto de pedra e cal com 0,66m altura por 0,88m de largura (Silva, 2002). O
traçado por onde passava este desvio (
“by pass”
) deu nome à rua do Cano (atual 7 de
Setembro).
Logo a população, gradualmente alojada em suas margens, passou a utilizar-se dela
como um canal de esgoto, lançando os dejetos e lixos a céu aberto. Isso acarretava freqüente
obstrução, o que obrigava a realização de sucessivas intervenções de limpeza (Coaracy,
1965). A Lagoa de Santo Antônio foi aterrada entre 1769-1779, dando origem ao atual Largo
da Carioca. A crescente ocupação da trajetória estabelecida pelo valo daria origem à rua da
Valla
(rua Uruguaiana) e do Aljube (rua do Acre). No séc XVIII, parte daquela foi coberta por
lajes de pedra e posteriormente, em 1790, teve alguns trechos substituídos por abóbadas de
alvenaria de pedra, obra interrompida por falta de recursos. A rua da
Valla
foi o limite da área
urbana da cidade por mais de um século (até o início do século XVIII), tendo inclusive sido
construído ao longo de seu percurso um muro de defesa em conseqüência das invasões
francesas (1710-1711), que logo se deteriorou.
67
Diversas leis e posturas, que iam desde multas, condenações de açoites até a prisão,
foram implementadas no sentido de impedir o lançamento de excretas e lixos nas valas, para
minimizar a gravidade do quadro sanitário e permitir o escoamento das águas pluviais
superficiais. Entretanto, devido ao pouco efeito que surtiram, optou-se por aterros e
canalizações cobertas.
Desde aquela época tentava-se acabar com as valas negras. Segundo Gomes (2001), o
Código de Posturas da Ilustríssima Câmara Municipal de 1838, declarava:
Parágrafo 7
o
: É prohibido tapar e fazer despejos nas vallas que servem de esgoto às águas
na cidade e seu termo, assim como abrir buracos para o mesmo fim nas que estão cobertas
com lagedos (...).
Julgava-se na época que os constantes surtos de doenças eram devidos aos
gases
fétidos que se desprendiam das valas, alagadiços, sumidouros e fossas negras, contaminando
quem passasse por perto. Segundo as concepções médicas dominantes esses focos
contaminavam o ar com seus pútridos miasmas, propiciando uma infinidade de moléstias
(Benchimol, 1990).
Frei José da Costa Azevedo, em 1846, comentando a Vala de Santo Antonio, diz na
Memória Fhilosophica e Pathologica
(Barreto, 1889 apud Silva, 2002) sobre o clima do Rio
de Janeiro, que:
Esta Vala era antigamente descoberta e por isso não só recebia as enxurradas, mas também
servia de cloaca pública, ficando de tal modo entupida de immundicies que jamais se
enseccava com os maiores chuveiros, tanto pelo grande montão, como pela viscosidade de
tal vasa e lodaçal, e assim se conserva esta fonte inexgotável de gazes maléficos.
A disposição de excretas nas vias de circulação remonta às cidades medievais e apesar
da gradual implantação dos sistemas de esgotamento sanitário e pluvial, a presença dos
esgotos lançados nas ruas e áreas públicas, evidenciada nas comunidades carentes, subúrbios
e áreas periférica, persiste mesmo nos dias de hoje.
Os “Tigres”
Nos períodos colonial e imperial, os escravos desempenhavam papel estratégico na
economia e abastecimento geral das cidades do país. Sua mão de obra era amplamente
utilizada para obras e serviços públicos: construção de prédios do governo, docas, canais,
pavimentação e limpeza de logradouros, aterros; transporte de cargas, pessoas, alimentos e
águas. Também eram obrigados a realizar a deplorável função de transportar os dejetos
humanos, o serviço de carregamento mais comum e de status mais baixo (Karasch, 2000).
Os dejetos humanos eram recolhidos das residências, normalmente à noite, por
escravos (em minoria por negros e brancos pobres não-escravos, além de prisioneiros) em
68
barris especiais, denominados popularmente “tigres”, “cubosou “soturnos”. A alcunha de
tigre também era utilizada para identificar os escravos obrigados a desempenhar tal atividade,
inclusive como castigo. A
Figura 15
, a seguir, apresenta as características do tigre na famosa
gravura de Jean Baptist Debret.
Figura 15. O “Tigre” de Debret
(Novais, Mello & Souza, 1997).
Os barris, localizados nos fundos das residências, depois de cheios ficavam à espera de
serem recolhidos, conforme assinala Gilberto Freyre (2001) em
Casa Grande & Senzala
:
Ao escravo negro se obrigou aos trabalhos mais imundos na higiene doméstica e pública
dos tempos coloniais. Um deles, o de carregar à cabeça, das casas para as praias, os barris
de excremento vulgarmente conhecidos por tigre. Barris que nas casas-grandes das cidades
ficavam longos dias dentro de casas, debaixo da escada ou num outro recanto acumulando
matéria. Quando o negro os levava é que não comportavam mais nada. Iam estourando
de cheios. De cheios e de podres (...).
Segundo Silva (2002) no relatório da Junta Central de Higiene Pública ainda em
16/03/1869, o Barão de Lavradio descreve a guarda dos barris nos prédios, do seguinte modo:
Em todas as habitações do interior da cidade eram ellas (as matérias fecaes) acumuladas
em barris que se depositavam ou nos fundos dos quintais, em telheiro adequado a esse fim,
ou em uma pequena divisão próxima às cozinhas, nas casas em que não havia quintal, ou
em algum quarto das lojas, preparado para esse mister; escolhendo-se de preferência o vão
de alguma escada.
A contaminação dos carregadores era constante e a preocupação da população em
geral também. As palavras de JoPereira Rego, o Barão do Lavradio, em 1869 (Farinha
Filho, 1875 apud
Gomes, 2001), ilustram o temor da população, mesmo após o início da
implantação do sistema coletivo na região central:
69
Quem vio esses batalhões de carregadores atravessando a passo accelerado por certas ruas
(...), composto em sua maior parte de escravos ou pretos libertos, velhos, estropeados e
bebados, que encontravão neste trabalho um meio mais lucrativo do que em outros, alguns
dos quaes parecia a cada momento precipitar-se com a carga pesada que comduzião,
atropelando a todos que passavão (...) o pode ainda hoje deixar de estremecer à
lembrança dos sustos por que passou de ser assaltado por um tigre.
As casas em sua maior parte, simples e pobres, normalmente possuíam apenas um ou
dois cômodos. Eram uns espaços provisórios e transitórios, onde as atividades básicas eram
voltadas para a produção (Rezende & Heller, 2002). A inexistência de redes coletoras de
esgotos e de água encanada justificara até então a ausência do banheiro: um cômodo na casa
reservado para higiene pessoal. Os banhos, a higiene matinal e a satisfação das necessidades
fisiológicas eram normalmente realizados nos próprios quartos de dormir, através de bacias,
tinas com água e penicos, respectivamente (Gomes, 2001). As atividades ligadas à limpeza
das roupas e louças eram efetuadas nas áreas de serviço, situadas no lado externo da casa, ou
mesmo na beira de rios, preservando-se o ambiente interno (Mello e Souza, 1997).
Entretanto, nem todos dispunham de escravos ou tinham condições de pagar alguém
pelo serviço. A maioria da população descarregava os dejetos em áreas próximas às
residências, expondo-se às doenças.
No âmbito público, as excretas eram despejadas em praias e lugares ermos, alguns
previamente definidos, valas, rios ou até mesmo clandestinamente em lugares proibidos,
como os logradouros.
Em meados do século XVIII, os despejos sanitários transportados pelos tigres eram
lançados, na área antes deserta e distante do atual Campo de Santana. Grandes fossos ou valas
mandadas abrir pela Câmara para este fim, transformaram o local em uma imensa e perigosa
“cloaca”, que só veio a ser extinta por ordem do vice-rei Conde de Resende, providenciando o
aterro de toda a área contaminada (Coaracy, 1965).
O espaço central do Largo do Rossio (localizado entre o Campo de Santana e a rua da
Valla
), mais próximo às habitações, era clandestinamente utilizado também para despejo de
lixo e dejetos, fato que gerava constantes protestos de moradores e comerciantes.
O lançamento clandestino e seus efeitos na salubridade eram amplamente criticados
conforme representava a charge de 1867,
Figura 16
, apresentada na página seguinte.
Nas vias públicas que não dispunham de canalizações, era permitido, de acordo com as
posturas municipais da época, o lançamento, precedido pelo grito: vai água!”, das águas
de lavagem (banho, cozinha e lavanderia) provenientes das residências (Silva, 2002).
70
Figura 16. Charge: as imundices das
ruas no Rio de Janeiro
(O Alerquim, 1867).
Isso agravava a condição sanitária dos logradouros, estreitos, tortuosos, de baixa
declividade e difícil conservação, alguns com cotas abaixo do nível médio de maré, o poder
público mostrava preocupação em relação ao despejo aleatório dos dejetos e tentava encontrar
soluções (Gomes, 2001). Como exemplo, temos a proposta dos vereadores, que sugeria, em
1832, a construção de:
pontes de madeira seguras, do extremo das quaes se possão lançar ao Mar todos os
despejos da Cidade; com proibição de se lançarem em nenhum outro lugar, nem sobre as
mesmas pontes, que devem estar sempre limpas.
Pontes foram construídas em locais como a praia do Peixe, praia de D. Manuel -
situadas entre o Calabouço e o Arsenal de Marinha - e na Prainha (Silva, 2002). No entanto,
mesmo em locais onde havia pontes, as próprias praias eram alvos constantes de despejos e de
críticas, conforme representado na charge da
Figura 17
, a seguir.
Figura 17. Charge: o lançamento de
dejetos nas praias da cidade
(Semana Ilustrada, n
5, janeiro de 1861, p. 36, Biblioteca
Nacional).
71
As ações visando melhorar as condições sanitárias tinham pouco efeito e as
normalizações tentando definir locais para o lançamento dos dejetos e resíduos sólidos não
eram respeitadas. Os poucos conhecimentos sanitários e científicos da época, associados à
relação escravista de classe, incidiam sobre os níveis elementares de higiene.
Em meados de 1840, companhias privadas proprietárias de barris, tentaram organizar a
coleta e o transporte dos dejetos humanos, por meio de carroças apropriadas, de onde eram
transferidos para barcaças, para terem seu conteúdo despejado no meio da Baía de Guanabara,
longe das praias. Tal solução não vingou e posteriormente, mesmo com implantação da rede
pública de esgoto, a prática primitiva dos “tigresainda foi utilizada por um longo período,
até a efetivação do sistema de esgotamento sanitário e o fim da escravidão.
A indisponibilidade da água era um fator agravante à insalubridade da cidade. O difícil
acesso às poucas fontes, cursos d’água, chafarizes e alguns poucos poços e cisternas trazia
grandes dificuldades ao seu transporte, dificultando a limpeza doméstica e a higiene pessoal.
A água era escassa para todos os usos, tanto de limpeza como dessedentação.
Os serviços de saneamento dos portos foram organizados sob responsabilidade do
município, em 1829, com a
Inspeção dos Portos
. Após sofrer diversas alterações, voltou à
alçada do governo imperial (Rezende & Heller, 2002). Com o surto epidêmico de 1849, foi
criada no mesmo ano a
Comissão Central de Saúde Pública
(Costa, 1994), seguida em 1850
pela
Comissão de Engenheiros
, a fim de realizar obras para melhorar as condições da cidade;
e pela
Junta Central de Higiene Pública
, composta por médicos objetivando dar combate às
epidemias (Telles, 1984). A partir deste momento, todas as iniciativas governamentais em
relação ao urbano deveriam inicialmente ser aprovadas pela Junta, que passou a interferir na
vida privada dos cidadãos, através do combate a hábitos e costumes considerados anti-
higiênicos (Gomes, 2001 apud
Abreu, 1996). Estas comissões passaram a levantar os
problemas sanitários, restringindo suas ações à capital do Império (Costa, 1994).
Segundo Silva (2002), nos relatórios dos anos de 1853, 1855 e 1856, o médico
Francisco de Paula Cândido, primeiro presidente da Junta, apresentou as seguintes causas da
insalubridade:
Os focos e mananciaes de onde provêm os miasmas que pullulam no ar desta cidade são
principalmente os seguintes: os despejos das immundicies, unidos aos esgotos, despejos
orgânicos e a humidade; os rios que trajectam pela cidade carregados de immundicies; o
matadouro; o lixo das ruas e das praias; os cemitérios; as fábricas e estabelecimentos
industriaes; a humidade tão nociva como os miasmas, a qual provem da falta do
escoamento para ás águas pluviaes e para serventia domestica, da construcção e
collocação das casas; e como a umidade é a primeira condição de formação de miasmas,
esta causa reforça as primeiras.
72
Pelo exposto, verifica-se que o processo de degradação ambiental dos cursos d’água já
se apresentava na cidade, desde tempos remotos. A proposta apresentada por Paula Cândido
para reverter esta condição era dotar a cidade de um sistema de esgoto, do tipo separador, com
esgotamento sanitário independente do esgotamento pluvial (Silva, 2002). A convicção de que
rede de esgotos poderia realmente sanear a cidade foi se afirmando entre os médicos e a
figuras de maior projeção no parlamento.
5.3. Sistemas Coletivos de Esgotos
5.3.1. Influência Inglesa
A Inglaterra, por ter sido pioneira no desenvolvimento do capitalismo e berço da
Revolução Industrial
6
iniciada em meados do século XVIII, sofreu, graças à ampliação da
escala de produção, profundas transformações nas cidades e no campo, com vertiginosos
crescimento e concentração populacionais e conseqüente intensificação do processo de
degradação ambiental. O reflexo sobre a saúde pública foi devastador. Diversos surtos
epidêmicos e aumento da morbi-mortalidade por doenças infecciosas e parasitárias passaram a
representar um entrave ao sistema de produção. O flagelo do cólera, em 1826, configurou-se
como pandemia em toda a Europa. Em 1831, a epidemia resultou em 50.000 vítimas fatais. Só
na Inglaterra morreram 25.000 pessoas (Metcalf & Eddy, 1977 apud
Nuvolari, 2003).
A solução necessária foi o investimento maciço no desenvolvimento de políticas
públicas, ciências e técnicas de saneamento.
No estado português não se estabelecera com prioridade o desenvolvimento industrial,
a cidade era um espaço de administração e mercantilização do que se produzia no campo e
nas colônias, mas não era o eixo motor da economia. Tal relação com o mercado externo,
intensificada pelas conspirações internas e conflitos com outras nações, como França e
Holanda, colocava Portugal na órbita da Inglaterra. A dependência de Portugal a Inglaterra
ficou tão grave que o Tratado de Comércio de 1810, que regulava o comércio nos portos
brasileiros, cobrava tarifa alfandegária de 15% dos produtos ingleses que aqui entravam
contra os 16% cobrados aos portugueses, até 1816 (Aquino, 2001).
A disseminação do transporte hidrodinâmico dos dejetos através de tubulações se deu
com a gradual distribuição de água encanada para as residências e com a utilização da bacia
sanitária com descarga hídrica, patenteada em 1775 pelo inventor e construtor inglês Joseph
6
A Revolução Industrial pode ser demarcada em três períodos: De 1760 a 1830, durante o qual os processos de
transformações se ativeram praticamente à Inglaterra, surgindo neste período as máquinas a vapor. De 1830 até
1900, a revolução difundiu-se pela Europa e América, vieram novas formas de energia como a hidrelétrica e
novos combustíveis, como a gasolina. De 1900 em diante, várias inovações surgiram: energia atômica, meios de
comunicação, produção industrial em massa, caracterizando o terceiro estágio da Revolução Industrial.
73
Bramah (1748-1814) (Azevedo Netto, 1959; 1984). Sobrinho & Tsutiya (1999) afirmam,
diferentemente, que a privada hídrica foi inventada em 1595, por Sir John Harington,
ressaltando que foi seu uso generalizado que demorou bastante tempo a ocorrer
7
.
No mesmo ano de 1775, coube ao engenheiro francês Antoine Chézy (1718-1798)
estabelecer sua fórmula de dimensionamento hidráulico, adaptada em 1890 pelo engenheiro
irlandês Robert Manning (1816-1897) e amplamente utilizada nos dias de hoje para
dimensionamento das redes de esgotos.
Os esgotos domésticos de Londres começaram a ser lançados em redes coletoras em
1815. Em 1822 foi feito o primeiro levantamento das condições sanitárias do rio Tâmisa. Em
1830, a aplicação de compostos de cloro começou a ser utilizada para oxidação da matéria
orgânica da água.
Em seu famoso relatório
The Sanitary Conditions of the Labourin Population of
Great Britain”
, de 1842, o engenheiro inglês Edwin Chadwick (1800-1890) destaca a
importância da purificação da água. Seus estudos sobre doenças na classe trabalhadora inglesa
demonstraram a relação entre pobreza e insalubridade e tornaram-se modelo para outros
sanitaristas em várias nações. Segundo Silva (2000), em decorrência de seus trabalhos, a
saúde publica e o saneamento passaram a ser tratados como uma vertente técnica. Chadwick
afirmava que medidas preventivas, como drenagem e limpeza das casas através de um
suprimento de água e de esgotamento, paralelas à limpeza de todos os refugos nocivos das
cidades, eram operações que deveriam ser resolvidas com recursos da engenharia civil e não
do serviço médico (Medeiros Filho, 2003), com o Estado intervindo no meio urbano (Silva,
2000). A partir deste relatório, foi criado na Inglaterra o Conselho Geral de Saúde, que passou
a se encarregar das questões sanitárias. Não obstante, as desapropriações demandadas pela
execução de obras de saneamento desencadearam resistência de proprietários de terra e
imóveis, acarretando seu fechamento (Rezende & Heller, 2002).
Em 1847, tornou-se compulsório o lançamento de todas as águas residuárias das
habitações nas galerias públicas de Londres, proibindo-se ao mesmo tempo o emprego de
fossas negras (Azevedo Netto, 1959). A Inglaterra foi pioneira também na promulgação das
primeiras leis de saneamento e saúde pública em 1848, com a promulgação do
Great Public
Health Act
”: Saneamento com bases científicas. No mesmo ano foi criada a Comissão
Metropolitana de Londres.
Nascido em York, na Inglaterra, o médico John Snow (1813-1858) estabeleceu em
1854 um marco no estudo da epidemiologia, provando cientificamente a relação entre certas
7
Vale observar que o primeiro banheiro com bacia sanitária da Casa Branca, residência oficial do presidente dos
Estados Unidos da América foi instalado em 1851, 51 anos após sua inauguração (Azevedo Netto, 1984).
74
doenças, dentre elas o cólera, e a contaminação da água pelas fezes, deduzindo ser um
organismo vivo o causador da doença. O estudo da microbiologia e seu notável incremento no
fim do século XIX trouxeram o fundamento de que carecia o tratamento das águas residuárias.
Em seguida, em 1857, foi criado o
Conselho de Proteção das Águas do Rio Tâmisa
. Com o
processo contínuo de degradação deste rio devido ao lançamento de esgotos
in natura”
, em
1876 foi promulgada a primeira lei proibindo o lançamento dos efluentes cloacais sem
tratamento nas galerias e nos rios (Azevedo Netto, 1959).
O primeiro sistema de esgotamento (pluvial e doméstico) que obedeceu a princípios
técnicos modernos, alguns ainda vigentes, foi construído em 1842, na cidade de Hamburgo,
Alemanha. Projetado pelo engenheiro Lindley, de origem inglesa, após a destruição parcial da
cidade por um incêndio, levava em conta as condições topográficas locais (Metcalf & Eddy,
1972).
A chegada dos ingleses após a “Abertura dos Portos” contribuiu grandemente para
iniciar uma mudança na mentalidade da sociedade brasileira no que tange à visão do trabalho
enquanto atividade depreciativa e servil. Os ingleses, ricos e com situação privilegiada no
Brasil daqueles tempos, eram essencialmente práticos e progressistas, valorizando as
profissões técnicas a que muitos deles se dedicavam (Freyre, 1948 apud
Telles, 1984).
Como em outras áreas, o saneamento no Brasil sofreu com as tendências e interesses
ditados pelos países desenvolvidos. Os investimentos estrangeiros eram aplicados nos setores
de serviços básicos (incluindo-se os sistemas de esgotos), ferrovias, companhias de gás,
telégrafos e telefones, transporte urbano, companhias de navegação, obras públicas, serviços
particulares, bancos, companhias de crédito e financiamento, de mineração e de seguros
(Castro, 1979 apud Gomes, 2001).
Os países exportadores de capital tinham grandes vantagens em investir fora de seus
limites nacionais, principalmente a Inglaterra, por sua posição privilegiada no quadro
internacional da época. Um dos benefícios era a exportação de materiais de construção e
tecnologia, em que foi isenta de impostos por longos períodos. No caso dos sistemas de
esgotos: tubulações em ferro fundido, manilha de barro vidrado, latrinas, caixas de lavagem,
caldeiras, bombas e equipamentos elétricos e mecânicos; além de animais para remoção de
aterros ou condução de materiais, carvão de pedra e agentes ou meios químicos para
desinfecção (Gomes, 2001; Silva, 2002).
Não é de se estranhar, pelo exposto, que a empresa e tecnologia inglesa tenham atuado
por noventa anos no Rio de Janeiro e nas principais capitais do país, tais como: Santos,
Recife, Porto Alegre, Belém, São Luiz, Fortaleza (Rezende & Heller, 2002).
75
Do total de capital externo investido no Brasil, no período de 1860-1875, 94% era
oriundo da Inglaterra (Castro, 1979 apud Gomes, 2001).
Foi também significativa durante o séc. XIX, até cerca de 1950, a influência francesa
na engenharia e arquitetura brasileira, assim como na cultura de uma maneira geral (Telles,
1984).
A engenharia sanitária viria posteriormente sofrer forte influência norte-americana
decorrente inicialmente do auxílio técnico e financeiro e posteriormente, com maior
intensidade, da hegemonia dos EUA sobre a política nacional.Através da Fundação
Rockefeller, em 1918, em São Paulo, passando pela criação do Serviço Especial de Saúde
Pública
8
(SESP) em 1942, no Rio de Janeiro (Rezende & Heller, 2002).
A partir da cada de 1950 com a entrada maciça de capital estrangeiro e,
posteriormente, na década de 60, apoiou o desenvolvimento do Instituto de Engenharia
Sanitária (IES) da Superintendência de Urbanização e Saneamento (SURSAN), órgão especial
subordinado ao Ministério da Educação e Saúde, transformado em fundação a partir de 1960,
que exerceu forte influência na matriz tecnológica da engenharia sanitária nacional.
Vale ressaltar que as influências inglesa, francesa e norte-americana não impediram
que se firmassem no país, por esforços e interesses próprios, um conjunto de normas,
diretrizes e realizações que permitiram o desenvolvimento da engenharia nacional com a
formulação de soluções convenientes e mais adequadas para nosso meio.
5.3.2. Pioneirismo em Nível Mundial
A urbe carioca passava por profundas transformações em que as emergentes relações
capitalistas de produção orientavam novos processos econômicos, sociais e ideológicos,
entrando em contradição com a cidade escravista e colonial.
A implantação, em 1862, dos sistemas coletivos de esgotos na cidade do Rio de
Janeiro promoveu uma reestruturação do espaço urbano, em sítios já densamente edificados.
Neste período, conforme apresentado no item # 5.1, havia no mundo a associação da
filosofia higienista com as inovações tecnológicas (desenvolvimento da hidráulica de
condutos e canais), as descobertas microbiológicas e, posteriormente, às reformas
urbanísticas.
O Rio de Janeiro foi por três séculos o centro político, administrativo, econômico,
financeiro e artístico do país, sendo na atualidade a segunda maior cidade brasileira, com o
8
Os Estados Unidos, através do SESP, apoiou a criação do primeiro curso de s-graduação em Engenharia
Sanitária do Brasil, segundo do mundo (o primeiro foi criado nos EUA) implementado na Faculdade de Higiene
e Saúde Pública de São Paulo em 1949.
76
segundo maior parque industrial. A cidade exerceu papel pioneiro e destacado no
desenvolvimento de projetos e aplicações de tecnologias desde o início da implantação dos
primeiros sistemas de saneamento. A cidade foi capital do Estado Nacional de 1763 até 1960,
variando de status conforme o
Quadro 4
, apresentado abaixo:
Obs.: 1. A delimitação do atual município do Rio de Janeiro obedece aos limites estabelecidos em 1834 quando
se criou o Município da Corte, vulgarmente chamado de Neutro.
9
2. A lei complementar n
o
.20 de 1974 que unificou os Estados do Rio de Janeiro e da Guanabara, criou a
Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
Em meados do século XIX, as péssimas condições de salubridade das habitações, das
condições de trabalho, os hábitos e costumes, agravados pelas precárias dificuldades de
obtenção de água potável, pela complexidade da drenagem pluvial e pelo manuseio e destino
final dos resíduos gerados, acometiam a cidade por uma sucessão de endemias e epidemias
que vitimavam grandes parcelas de seus habitantes. Eram diversos focos, endêmicos e
esporádicos, de cólera, febre amarela, varíola, tuberculose, peste bubônica, difteria, malária,
tifo, lepra. (Gomes, 2001; Chalhoub, 1996; Telles, 1984).
Este quadro epidemiológico refletia-se de forma distinta nas classes sociais da época.
As camadas mais abastadas tentavam fugir dos principais focos de doenças, localizados na
área central próxima à região portuária, dirigindo-se às áreas mais altas e arejadas, como:
Santa Tereza, Glória, São Cristóvão e fazendas situadas em pontos distantes. Durante o verão,
9
A área do município do Rio de Janeiro é de 1.255,3 Km², incluindo as ilhas e as águas continentais. Mede de
leste a oeste 70 km e de norte a sul 44 km. O município atualmente está dividido em 32 regiões administrativas
com 159 bairros. É delimitada entre a baía de Sepetiba a oeste e a baía de Guanabara a leste. Como limite norte
os municípios de Itaguaí, Nova Iguaçu, São João de Meriti e Duque de Caxias.
Quadro 4. Evolução política da Cidade do Rio de Janeiro.
Período Condição
1565 a 1763 Cidade do litoral sudeste do Brasil.
1763 a 1808 Capital da Colônia e sede do Vice-Reino do Brasil.
1808 a 1821 Capital da Colônia e sede do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.
1822 a 1831 Capital do Primeiro Reinado.
1831 a 1840 Sede da Regência. Em 1834 surge o Município da Corte ou Neutro.
1840 a 1889 Capital do Segundo Reinado.
1889 a 1960 Capital da República. Em 1891 transformou-se em Distrito Federal.
1960 a 1975 Capital do Estado da Guanabara.
1975 em curso
Capital do novo Estado do Rio de Janeiro. Transforma-se o Estado da Guanabara em
município do Rio de Janeiro, com a fusão do antigo Estado do Rio de Janeiro com o
Estado da Guanabara.
77
as elites refugiavam-se na Região Serrana, principalmente em Petrópolis (Rezende & Heller,
2002). Neste aspecto, é relevante o fato de que, não somente as camadas populares estavam
sujeitas a essas doenças. Os surtos epidêmicos punham em risco a própria sobrevivência das
classes dominantes (Benchimol, 1990). Na Corte Imperial, dois filhos do imperador
faleceram, vítimas da febre amarela (Reis. In: Alencastro & Novais, 1997 apud
Rezende &
Heller, 2002). Os estrangeiros recém-chegados que não possuíam os anticorpos, longamente
desenvolvidos pela população local, eram dizimados (Lessa, 2000).
As organizações sócio-espaciais e as condições de vida e saúde dos grupos sociais
pobres, que representavam a grande maioria da população, eram degradantes. Suas vidas eram
acompanhadas pelos flagelos de uma infinidade de doenças. Suas energias eram minguadas
por esforços sobre-humanos, pela desnutrição e pela luta microbiológica travada em seus
organismos, situação esta agravada na população de escravos e de operários, onde outras
moléstias somavam-se às epidemias citadas anteriormente. Segundo Freyre (2001):
(...) diz-nos Jobim que, em 1835, anotou as seguintes moléstias, como predominando entre
os operários e escravos domésticos do Rio de Janeiro: sífilis, hipertrofia do coração,
reumatismo, bronquites, afecções das vias aéreas, pneumonias, pleurises, pericardites,
irritações e inflamações encefálicas, tétano, hepatites, erisipelas, ordinariamente nos
membros inferiores e nos escrotos e determinando hipertrofia e degenerescência
fibrolardácea do tecido celular subcutâneo, extravasões nas diversas cavidades sonoras,
raras vezes nas articulações e freqüentemente no abdômen, na pleura, no pericárdio,
naserose testicular, nos ventrículos cerebrais determinando paralisia; e ainda tubérculos
pulmonares, febres intermitentes, opilação. Os vermes e particularmente a taenia, e as
ascarides lombricóides abundão muito, acrescenta Jobim.
No Rio, as dez principais causas de morte dos escravos eram tuberculose, disenteria,
diarréia, gastrenterite, pneumonia, varíola, hidropisia, hepatite, malária e apoplexia. Doenças
que quando não matavam, mutilavam, como o bicho-de-pé e dracúnculo, afetavam em larga
medida os membros inferiores, infeccionando e ulcerando, causando aleijamento (Karasch,
2000).
Em 1850, intensificam-se as doenças, com intensos surtos de febre amarela, cólera e
peste bubônica. As estimativas indicam que mais de um terço dos 266 mil habitantes do Rio
contraíram febre amarela no verão de 1849-1850. O número oficial de vítimas fatais nesta
primeira epidemia chegou a 4.160 pessoas, mas tudo indica que o total indicado foi
consideravelmente subestimado (Chalhoub, 1996). A epidemia desta doença repetiu-se por
muitos anos (Telles, 1984). Segundo o Barão do Lavradio, a cólera, doença que ceifou
milhares de vidas por todo o mundo, vitimou fatalmente cerca de duzentas mil pessoas no
Brasil, entre 1855 e 1867 (Silva, 2002).
A cidade, enquanto importante entreposto comercial, necessitava de medidas sanitárias
urgentes, uma vez que a proliferação de pestes e doenças contagiosas propiciavam altos riscos
78
de contaminação aos visitantes, gerando insegurança e implicando, portanto, que os navios
comerciais da época, temendo contaminação da tripulação, entrassem em quarentena ou
retirassem seus portos de suas rotas marítimas ou, e, conseqüentemente, causando prejuízos
constantes às nações mais pobres e dependentes do comércio internacional.
No Brasil, relacionavam-se nesta situação, notadamente, os portos do Rio de Janeiro e
Santos. O Rio de Janeiro possuía o principal porto do país e o terceiro no continente
americano em importância, depois de Nova York e Buenos Aires (Lessa, 2000). Era o centro
das atividades mercantis e polarizava as trocas internacionais. A aceleração do crescimento da
economia no país impulsionada pela produção de café e o surgimento de novos
empreendimentos e relações capitalistas promoveram um ideário de modernização para o Rio
de Janeiro incorporado às discussões no urbano. Suas primeiras efetivações ocorreram a partir
da segunda metade do século XIX, tendo seu ápice na
Reforma Urbana
do início do século
XX (Gomes, 2001).
O problema dos esgotos tornou-se o principal alvo da campanha movida pelos
médicos higienistas e, logo, por toda a “opinião pública” ilustrada, em favor de
melhoramentos que saneassem a capital do Império (Benchimol, 1990). Mesmo doenças que
não tinham relação com a contaminação por esgoto sanitário, como a febre amarela
10
, eram
atribuídas na época às emissões miasmáticas provenientes das águas poluídas.
A situação se tornou grave e ameaçadora para a própria manutenção das relações de
produção. Temendo os efeitos econômicos negativos e a desestabilização política e social, o
imperador D. Pedro II (1825-1891), contratou os ingleses para elaborarem e implantarem o
sistema de esgotamento no Rio de Janeiro.
Em nível mundial, o Rio de Janeiro foi uma das cidades pioneiras na implantação do
sistema coletivo de esgotamento sanitário. Diferentemente do sistema de água que foi também
disputado por uma companhia inglesa, estabeleceu-se como serviço de administração pública,
embora a construção tenha sido entregue à empresa privada. A implantação e operação do
sistema de esgoto couberam à empresa de capital privado inglês
“The Rio de Janeiro City
Improvements Company Limited”,
conhecida popularmente pela abreviação
“City”
. Em 1864
era inaugurado na Glória um sistema de esgotamento sanitário completo, constituído por: rede
de coletora de esgotos, elevatória (“
Casa de Machinas”
) e estação de tratamento (
“Casa de
Química”
)
.
10
Em 1900, médicos norte-americanos, em Havana tomando em consideração a antiga idéia de médico cubano
Dr. Carlos Finday, conseguiram provar que o contagio de febre amarela urbana -se por meio da picada do
mosquito Aedes aegypti, sendo necessário para a transmissão que o inseto tenha picado um doente no período em
que o mesmo é infectado (Alcântara, 1953).
79
As
Figuras 18a
e
18b
, a seguir mostram os aspectos da enseada da Glória, onde se
localiza a ETE, em dois momentos distintos na urbanização da cidade, 1904 e 1928, com
detalhe da chaminé já demolida, das antigas bombas a vapor.
(a) Vista da enseada da Glória em 1904.
(b) Vista da enseada da Glória em 1928.
Figura 18. Localização da Estação de Tratamento de Esgoto da Glória
(Revista da Directoria de Engenharia, 1932).
Nas
Figuras 19a
,
19b
e
19c
a seguir,
são apresentados detalhes da elevatória de
esgotos constituída por bombas a vapor de 1862, fabricadas pela firma inglesa
James Watt &
Co.
e instaladas pela
City
no 3
o
distrito, da Glória, atual sede da Sociedade dos Engenheiros e
Arquitetos do Estado do Rio de Janeiro (SEAERJ). Este precioso legado histórico de 141 anos
encontra-se nos dias de hoje em ótimo estado de conservação.
(a)
(b)
(c)
Figura 19. Bombas da elevatória da Glória fabricadas pela James Watt&Co
(Revista da SEAERJ, 1985).
De acordo com registros históricos, o Rio de Janeiro foi uma das primeiras cidades do
mundo a contratar uma companhia para implantar o moderno sistema domiciliar de esgotos.
Para uns, foi a terceira depois de Londres e Paris. Para outros, apenas Hamburgo (1824) e as
maiores cidades da Inglaterra precederam esta iniciativa (Benchimol, 1990). As diversas
fontes bibliográficas se contradizem quanto à ordem deste pioneirismo.
Em seu endereço eletrônico oficial na internet, a CEDAE (2003) afirma que o Rio foi
a segunda capital do mundo a implantar um “adequado” sistema de esgotamento sanitário. A
80
primeira teria sido Londres, em 1815. O sistema de Berlim surgiria em 1874, o de Buenos
Aires em 1877, e o de Roma em 1879. Esta informação é ratificada por Silva (2002), que
menciona a
City
em notícia sobre os esgotos da Cidade do Rio de Janeiro, no
Correio da
Manhã
de 15/11/1940:
a
Segunda capital, em todo o mundo, depois de Londres, a ser dotada de
tão grande beneficiamento (...)
.
Telles (1984) e Rezende & Heller (2002) apontam o Rio como a quinta cidade do
mundo a dispor de um sistema de esgoto sanitário. Na
Revista de Engenharia do Estado da
Guanabara
(n
o
1, jan-mar, 1965) afirma-se que, além de ser a quinta do mundo a ser dotada
de rede de esgoto sanitário, foi a terceira a possuir uma estação de tratamento de esgotos. Para
Costa (In: Revista Municipal de Engenharia, 1992) foi a terceira cidade do mundo e a
primeira das Américas a contar com um sistema de esgotos sanitários.
Uma das divergências está em saber se o sistema de esgotamento francês foi anterior
ao brasileiro. Entretanto, conforme descrito no item # 5.1., apesar de ter iniciada sua
construção em 1824, só começou a receber fezes em 1880.
Brito (Obras, v.II, 1923), no artigo:
Como Melhorar o Sistema de Esgoto do Rio de
Janeiro
, apresentado ao 1
o
Congresso Brasileiro de Higiene, afirma:
“À exceção de algumas cidades inglesas e de Hamburgo, nenhuma das capitais e outras
cidades da Europa teve serviço de esgotos anteriormente a 1864. É, portanto, para louvar o
que então se fez na cidade do Rio de Janeiro, adotando-se os melhores modelos conhecidos
(...)”.
Este conflito de informações traduz a natural dificuldade em se delimitar a concepção
prévia do sistema de esgotamento para a finalidade de transporte de esgoto doméstico e/ou
pluvial, a implantação de diferentes componentes ou partes do sistema de esgotamento, bem
como a dificuldade em se estabelecer “critérios modernos”, uma vez que os próprios estudos
hidráulicos desses sistemas se deram a partir de formulações empíricas, semi-empíricas e
teóricas.
5.3.3. Evolução dos Tipos de Sistemas de Esgotos
A evolução tecnológica para o transporte hidrodinâmico dos dejetos humanos em
tubulações de esgoto sanitário foi posterior às primeiras ações de drenagem pluvial e
implantação de galerias de águas pluviais. A necessidade de coletar e afastar as águas servidas
e dejetos começou a ser mais sentida e reconhecida na medida em que aumentava o consumo
de água por sua distribuição nas residências por tubulações e, principalmente, quando a água
passou a ser utilizada para o afastamento das excretas, isto é, após a adoção generalizada da
bacia sanitária provida de selo hídrico.
81
Os primeiros sistemas de esgotamento construídos nos países europeus eram
constituídos por uma única rede, destinada a coletar o esgoto sanitário e o pluvial,
denominado
sistema unitário.
Os autores são concordes em admitir ter sido Roma a primeira
cidade a possuir um sistema de esgoto, embora concebido tão somente para secar uma área
pantanosa. Posteriormente foram instalados condutos de barro para descarregar águas servidas
e também águas pluviais. Esta galeria, denominada
Cloaca Máxima,
foi construída seis
séculos antes da Era Cristã, com grandes blocos de pedra aparelhada, medindo 1m de altura
por 2m de comprimento, assentados sem rejuntamento. Era constituída de uma galeria de
paredes verticais e teto abobadado, com 800m de extensão e 5m de largura, partindo do
Forum"
e terminando no rio Tigre (Dacach, 1984). Sua seção ainda pode ser vista, conforme
apresentado na
Figura 20
, abaixo.
Figura 20. Cloaca Máxima
(www.mclinck.it/n/citrag/roma/doc/monum/emm_0005.htm)
Outro exemplo de sistema unitário de referencia mundial foi o modelo francês “
tout-à-
l`égout”.
Planejado e iniciado em 1824, começou a receber as fezes em 1880, com a
construção do grande coletor de
Asniers”
(Silva, 2002; Costa, 1994). Durante o mandato do
prefeito Haussmann, o sistema de Paris tinha uma equipe de engenheiros experientes: dentre
eles, Belgrand, que dirigia o importante
Service des Eaux et des Égouts
(Benchimol, 1990),
constituído por grandes galerias que, além de transportarem águas servidas e pluviais,
recebiam todo o lixo urbano. Continham também sob suas abóbadas canalizações de água
potável, água motriz, condutos de ar comprimido e fios de telégrafo (Brito, Obras v.II, 1901)
evitando, por medidas de segurança, condutos de gás, aquecimento urbano e eletricidade,
devido a riscos de explosões.
82
Na época de definição do sistema de esgoto a ser implantado no Brasil, vários técnicos
da época defendiam a construção de uma rede de esgoto unitária, nos moldes do sistema
francês (Silva, 2002; Benchimol, 1990).
As
Figuras 21a
e
21b,
abaixo, apresentam aspectos do sistema de esgoto francês e as
Figuras 22a
e
22b
subseqüentes apresentam a transformação de trechos dos coletores em
museu de saneamento.
(a) Coletor principal do sistema de esgotos, com detalhe
da seção mista.
(b) Coletores secundários de esgotos, com detalhe de
outras instaladas dentro das seções.
Figura 21. Aspectos do sistema de esgotos “tout-à-l`égout”
(Fotos: Gandhi Giordano, 1998).
(a) Mostra de equipamentos de saneamento.
(b) Detalhe do mecanismo de limpeza das galerias.
Figura 22. Museu do “tout-à-l`égout.
(Prospecto:
“Visite des egouts de Paris”
).
No Rio de Janeiro, diferenciando-se do “convencional” da época, o sistema de esgoto
implantado pela
City
foi o do tipo
separador parcial, misto ou separador parcial inglês,
constituído por duas redes coletoras distintas: uma, que coleta e transporta o esgoto sanitário e
parcela das águas de chuvas precipitadas nos telhados e pátios internos das propriedades; e
outra, que viria a receber a parcela das águas pluviais de áreas externas às edificações, em
áreas públicas, e que também seria futuramente construída pela
City
. No trabalho intitulado
83
Como Melhorar o Sistema de Esgoto do Rio de Janeiro,
apresentado no 1
o
Congresso
Brasileiro de Higiene, em 1923, Britto
(Obras, v. II)
afirma:
O contrato estabelecia que o sistema fosse semelhante ao adotado em Leicester e outras
cidades de Inglaterra (grifo do autor) esse sistema é o separador parcial. A rede dos
esgotos recebe promiscuamente os despejos domiciliares e as águas de chuvas caídas nos
telhados e nos pátios calçados; as águas pluviais provenientes das vias públicas são
conduzidas pelas sarjetas para as galerias pluviais que descarregam diretamente nos canais
ou cursos canalizados e na baía de Guanabara.
A implantação deste sistema deveu-se às limitações financeiras e situações peculiares,
diferentes das encontradas na Europa. Muitas áreas não pavimentadas, casas ocupando
grandes lotes com áreas e pátios internos de difícil esgotamento pluvial e principalmente,
chuvas de alta intensidade. Após criteriosos estudos e justificativas, os ingleses implantaram
uma alternativa mais econômica, com modificações em relação ao sistema de esgotamento
unitário tradicional (Sobrinho, 1999).
A maior parte da rede de esgotos da
City
foi projetada e construída para o sistema
misto. Este procedimento foi avaliado após o esgotamento das áreas referentes aos três
primeiros contratos de construção (1857, 1875 e 1890), mas seu funcionamento mostrou
inconveniências nos dias de chuva, quando a rede pública de coletores se tornava incapaz de
escoar as águas que recebia e por isso, eram freqüentes os transbordamentos pelos tampões
dos poços de visitas das ruas. Nesses dias, a companhia paralisava o funcionamento das
estações elevatórias e de tratamento, para que o houvesse consumo excessivo de energia,
sobrecarga e desgaste dos respectivos equipamentos, além de muitas vezes não possuir
capacidade para um maior aporte de esgotos (Silva, 2002). Brito (Obras, v.II, 1923)
expressava críticas ao sistema em questão:
(...) durante as chuvas (não somente as excepcionais) abrem-se as adufas (penstocks) e as
galerias de esgotos descarregam diretamente na baía os líquidos e sólidos transportados (o
defeito provem dos sistemas então universalmente adotados devendo-se normalmente
recorrer à extravasão por vertedor).
Mediante estes inconvenientes, a partir do contrato de 1899, o Governo orientou a
City
a adotar o
sistema separador absoluto,
beneficiando por esta nova concepção, as áreas do
Leme, Copacabana, Ipanema (até a rua Farme de Amoedo), Ilha de Paquetá, Cais do Porto,
Áreas Encravadas (áreas de urbanização retardada proveniente de desmontes e aterros, dentro
de sítios atendidos e como os resultantes do desmonte dos morros do Senado e do Castelo)
(Silva, 2002).
84
O
sistema separador
11
ou separador absoluto
é constituído por dois sistemas de
esgotamento distintos, um destinado a coletar esgoto sanitário e outro, águas pluviais.
Este tipo de esgotamento foi desenvolvido e implantado na cidade de Memphis,
capital do Tennessee, Estados Unidos, em 1879, pelo engenheiro e coronel George Edwin
Waring, que concluiu que para as condições locais da região (rural), ter-se-ia uma
considerável redução no custo de implantação, adotando-se um sistema de coleta e transporte
de esgoto doméstico totalmente independente daquele destinado às águas pluviais (Medeiros
Filho, 1997).
Mesmo havendo outras referências da implantação deste tipo de sistema, sua
consolidação se deu mediante a experiência americana, conforme o abaixo descrito
(Barreto,1889 apud
Silva, 2002).
Proposto em 1843 por Ed. Chadwick, este systema, na opinião de Wazon, parece ter sido
applicado primeiramente em Oxford no anno de 1876 pelo engenheiro H. White, mas foi
installado definitivamente em Memphis (Tennessee, Estados Unidos) no anno de 1879,
graças ao engenheiro americano, Coronel Jorge E. Waring
O Governo, através de termo aditivo aos contratos, assinado em 7 de dezembro de
1912, determinou a obrigatoriedade da adoção do sistema separador absoluto, tanto para as
novas edificações, ainda não esgotadas, quanto para as casas já esgotadas, mas reconstruídas a
partir de 1º de janeiro de 1913 (Silva, 2002).
Silva (2002) cita a Cláusula Primeira do novo Acordo, pela qual a rede de esgotos
passou a receber apenas
águas dos tanques de lavagens de roupa, banheiros e cozinhas, das
cocheiras, fábricas, destilarias e todas as águas que por sua natureza o exijam as condições
de saúde pública.
As instruções de 1912 determinaram que a
City
deveria canalizar as águas pluviais e
nascentes dos prédios novos e reconstruções situadas nas áreas esgotadas, sempre que
possível, para as sarjetas das ruas. Estavam, em tese, definidas a partir daí, redes específicas
para cada tipo de efluente.
O sistema separador absoluto teve como um de seus grandes defensores, o engenheiro
sanitarista Saturnino de Brito. Seus principais argumentos a respeito foram apresentados no
opúsculo
Saneamento de Santos
, de 1898
(Obras, v.I) sua primeira publicação sobre esgotos.
Desenvolveu nesta cidade pela primeira vez no Brasil, o sistema de bombeamento nas
estações elevatórias de esgoto com bombas centrífugas, elétricas e com comando automático,
em substituição aos ejetores de ar comprimido então universalmente empregados (Telles,
1993).
11
A NBR 9648/86 define como sendo o conjunto de condutos, instalações e equipamentos destinados a coletar,
transportar, condicionar e encaminhar somente esgoto sanitário a uma disposição final conveniente, de modo
contínuo e higienicamente seguro.
85
As
Figuras 23a e 23b,
a seguir, apresentam detalhes de projetos de estações
elevatórias elaborados por Saturnino de Brito.
(a)
(b)
Figura 23. Estações elevatórias de esgoto concebidas por Saturnino de Brito
(Sampaio, 1947).
O Rio de Janeiro, bem como a maioria das cidades brasileiras, adotou a concepção do
sistema separador absoluto
como oficial. Entretanto não se impediu que, concomitantemente
a ele, existissem áreas dotadas com sistemas unitários, com situações e estruturas atípicas que
em diversos casos não foram concebidas para estas situações de operação, com presença de
extravasores e ligações prediais irregulares. Esses aspectos, que de muitas maneiras
comprometeram algumas vantagens do sistema
separador absoluto
, serão detalhados no
capítulo # 6.
Nas áreas rural e urbana, as soluções indicadas para o destino de dejetos humanos são
diferentes. Para a área rural, soluções individuais, as assim chamadas soluções
casa por casa
,
são impositivas, devido à alta dispersão da população. À medida que se o adensamento
populacional, as soluções coletivas se tornam ideais; máximas, quando as localidades são
providas de abastecimento público com água canalizada, e obrigatórias, quando os terrenos
não filtram (Cynamon, 1986).
A implantação das primeiras redes coletoras de esgoto sanitário no Rio se deu em área
densamente ocupada. os sítios com pouca densidade populacional iniciaram seu
esgotamento com soluções individuais de tanques sépticos, lançando os efluentes nos rios.
86
Posteriormente, mesmo com o crescimento populacional, em muitas áreas permaneceu a
alternativa individualizada devido à demora na expansão de rede coletora.
O aumento da poluição e o desenvolvimento tecnológico impulsionaram grandes
avanços nas etapas de tratamento e disposição final dos esgotos sanitários, na utilização de
novos materiais (como a família dos plásticos nas tubulações e juntas, por exemplo), na
evolução dos sistemas de bombeamento, automação, monitoramento e nos processos
construtivos (métodos não-destrutivos), dentre outros.
No Rio de Janeiro, entretanto, a concepção geral de coleta e transporte de esgoto
sofreu poucas alterações ao longo do tempo. O sistema de esgoto “convencional”
12
, de
escoamento gravitário, predomina bastante tempo. Não obstante, faz-se necessária a
compreensão das alterações mais significativas para o entendimento dos sistemas de
esgotamento atuais.
Na fase inicial da implantação do sistema de esgoto no Rio de Janeiro, correspondente
aos três primeiros distritos, por serem áreas já densamente ocupadas e por ser mais econômico
(Gomes, 2001), os coletores prediais foram construídos através do sistema de ramais, para
servirem a quarteirões inteiros, atravessando os fundos dos terrenos dos prédios e passando
até sob os pisos de suas áreas internas. Ao fim de algum tempo, o esgotamento por grupos
apresentou graves problemas operacionais nas redes, obstruções e abatimento no interior dos
prédios, de difícil identificação e acesso. Segundo Brito, (Obras, v.II, 1923) nos serviços
antigos eram insuficientes os poços de inspeção e intoleráveis as aberturas de alguns coletores
para desobstruções. As chuvas ocasionavam refluxos nas instalações dos prédios e
comprometiam as condições de salubridade (Gomes, 2001; Silva, 2002).
Parte da antiga rede sofreu revisões, de acordo com as recomendações de 1898,
aproveitando-se, inclusive, das futuras modificações nas ruas da cidade. No 1
o
Congresso
Brasileiro de Higiene, em 1923, Brito (Obras, v.II) propõe como uma das medidas de
melhoria:
Cada casa será diretamente ligada ao coletor geral, estabelecendo-se nas áreas e no
passeio caixas de inspeção para as mudanças de direção ou do greide (...). O esgoto em
grupo, nos terrenos acidentados será admitido quando não for possível o esgoto direto de
cada casa (...).
Mudança considerável de concepção se deu no sistema de ventilação das redes
coletoras. Inicialmente as latrinas eram instaladas nas “secretas” ou “casinhas”, construídas
nos quintais ou em locais definidos pelos proprietários, dentro das casas. Como os banheiros
ainda não existiam, na impossibilidade de construir as “casinhas”, os donos das casas
12
Entende-se como “convencional” os métodos e critérios gerais de parâmetros, dimensionamento e
especificações mais comumente utilizados. Entretanto, como toda a técnica, cada caso depende da
engenhosidade para resolver problemas específicos.
87
optavam por instalar as latrinas junto à cozinha, da qual geralmente eram separadas apenas
por um tapume. Esta condição, associada à crônica falta d’água, agravava a exalação do mau
cheiro proveniente das tubulações (Gomes, 2001). Por conseguinte, desde a implantação das
primeiras redes, havia preocupação em se vedar a saída de gases dos coletores para as
residências, colocando-se sifões desconectores, conhecidos à época como “sifão camelo” nos
coletores domiciliares e estabelecendo fecho hídrico para os gases da rede. A eliminação dos
gases da rede coletora era feita pelos poços ventiladores e chaminés ou postes ventiladores.
As
Figuras 24a
apresentam um exemplar remanescente do poste ventilador localizado na rua
Getúlio, em frente ao n
o
.80, no bairro do Méier. Nas
Figura 24b
e
24c,
encontram-se detalhes
do antigo “sifão camelo”.
(b) Detalhe do sifão desconector.
(a) Vista do poste ventilador.
(c) Idem ao item “b”.
Figura 24. Elementos de controle de gases em rede coletora de esgoto
sanitário
(Fotos: Acervo particular de Ary Pinto de Castro).
Dos poços ventiladores localizados ao lado dos de visita, geralmente das cabeceiras
dos coletores escapavam gases fétidos. Foram feitas, sem sucesso, tentativas de minimizá-los.
Em 1880, foram colocados filtros de carvão vegetal embebido em solução fênica. Foi
recomendada, em 1935, a adoção do sistema
“Webb”
, que consistia na instalação de bicos de
gás no alto dos postes ventiladores, o que não foi efetivado pela concessionária (Roxo &
Ferreira. In: Silva, 1965).
Brito (Obras, v.II, 1923) propunha a supressão dos sifões para que a rede pública
pudesse ser ventilada pelas instalações prediais. Segundo a Revista da SURSAN (1970), ele
foi o primeiro a apontar os inconvenientes de tal sistema e recomendar a ventilação completa
88
dos coletores, utilizando principalmente, as ligações prediais desprovidas de sifões e tornando
os tubos de ventilação das instalações prediais os responsáveis pela ventilação dos coletores
públicos. Os sifões e ventiladores referentes ao antigo sistema foram gradualmente removidos
a partir do
Regulamento e Instalações Prediais de Esgotos Sanitários,
de 1954. Esta singular
regulamentação passou a atender as recomendações técnicas da Associação Brasileira de
Normas Técnicas (ABNT), que já estavam em vigor naquela época.
Como alternativa ao sistema “convencional” temos o
Sistema Condominial.
Desenvolvido inicialmente em 1980 nos bairros de Rocas e Santo Reis, em Natal, Rio Grande
do Norte, pela Companhia de Águas do Rio Grande do Norte (CAERN) se espalhou para
outros estados brasileiros com pequenas adaptações. A idéia central de implementação é o
traçado na forma de condomínios, em grupos de usuários, em vel de quadra urbana, como
unidade de esgotamento. A solução assemelha-se a dos ramais multifamiliares de esgoto dos
edifícios de apartamento, sendo que no lugar de prédios e apartamentos têm-se quadras e
casas. O ramal predial constitui-se de tubulações que passam entre os quintais e interiores dos
lotes com menores diâmetros e recobrimentos e órgãos acessórios específicos. A operação e
manutenção desse ramal são de responsabilidade do próprio “condomínio” criado. (Sobrinho,
2000).
No Rio de Janeiro, o sistema condominial foi utilizado experimentalmente em diversas
comunidades carentes contempladas pelo Programa de Saneamento Básico para a População
de Baixa Renda (PROSANEAR), desde pequenos sítios, como Bananal (170 hab.) até grandes
complexos de favelas, como a do Alemão (135.000 hab.) (Passos, 2001). O resultados destas
intervenções ainda não foram mensurados para avaliação de sua aplicabilidade nestas
comunidades ou em outras. Fabricantes de tubos e acessórios em PVC desenvolveram linhas
completas de produtos a fim de serem utilizados neste tipo de sistema. Tem-se, como
exemplo, a substituição de poços de visita por tubos e terminais de limpeza em PVC, que no
Rio de Janeiro, diferentemente de outros estados, não foram ainda testados.
Outro sistema não-convencional desenvolvido para pequenas coletividades e áreas
periféricas é a
Rede de Coleta e Transporte de Esgoto Decantada,
utilizada inicialmente em
Brotas-Itapipoca, Ceará, em 1983. Concebido pelo Prof. Szachna Elias Cynamon (UERJ e
Fiocruz), apresenta, entre outras características, a utilização de tanques pticos domiciliares
especiais, com dispositivo de secagem de lodo, substituição de poços de visita por tubos de
inspeção e limpeza e tubulações com menores diâmetros (40 mm), podendo funcionar à seção
plena com tratamento de filtro anaeróbio (Cynamon, 1986). Este modelo também foi
implantado em Angra dos Reis, RJ.
89
Diversas modificações vêm sendo estudadas no país como alternativas ao esgotamento
de tios planos visando diminuir a profundidade de suas tubulações, que geram problemas
técnicos e custos altos. Neste caso estão as redes pressurizadas a vácuo
13
e a utilização de
dispositivo gerador de descarga
(Sobrinho, 2000), concepção que se assemelha
conceitualmente aos tanques fluxíveis. No Rio de Janeiro não existem estes sistemas
implantados.
A utilização da água para o transporte hidrodinâmico dos despejos fecais humanos em
canalizações foi no passado uma revolução sanitária frente às formas precárias de disposição
que existiam, trazendo na época, melhorias excepcionais à salubridade. Entretanto, esta
tecnologia encontrou diversas dificuldades de implantação no Rio de Janeiro, exatamente pela
escassez e descontinuidade no fornecimento de água, o que não permitia altura molhada
satisfatória nos coletores e trazia dificuldades de arraste e autolimpeza das tubulações. A
cidade do Rio de Janeiro contou com rede de abastecimento domiciliar de água a partir de
1876, curiosamente após a implantação do sistema de esgoto (1864). O Governo Imperial,
mediante recomendação dos banqueiros Rostchschilds (Coelho, 1985), contratou o engenheiro
italiano Antônio Gabrielli para o projeto e realização das obras, concluídas em 1878, com
8.334 prédios ligados à rede. Até então o abastecimento era feito basicamente por chafarizes e
alguns poços. Em 1840, foi permitido aos particulares canalizarem, por sua conta, a água dos
chafarizes para suas casas. Antes disso, alguns poucos prédios públicos e religiosos
gozavam deste privilégio (Telles, 1984). Contando com melhorias no abastecimento, em 1877
a
City
iniciou a instalação de tanques fluxíveis nas cabeceiras dos coletores, atingindo um
total de 420 unidades, em 1934 (CEDAE, 2003).
Os tanques fluxíveis eram estruturas providas de dispositivos automáticos para
descargas periódicas de água de lavagem, de modo a impedir a formação de depósitos no
interior dos coletores. Suas câmaras de acumulação de água possuíam capacidades de 600,
1200 ou 1800 L, podendo servir a um, dois ou três coletores, admitindo-se que sua descarga
tenha ação de limpeza de 300 m (Azevedo Netto, 1973).
O de uso mais corrente no Brasil empregava o sistema concebido por Saturnino de
Brito, conforme detalhes nas
Figuras 25a
e
25b
, apresentadas na página seguinte.
Devido a problemas de contaminação decorrentes da intermitência no abastecimento
de água, vazamentos nas juntas da tubulação próximas aos tanques, entupimentos nas redes
com enchimento dos tanques e conseqüente contato de esgoto com o ramal distribuidor de
13
Fabricantes de tubulações em PVC já disponibilizaram uma linha de produtos para este tipo de operação.
90
água, associados ao aumento do fornecimento de água, resultaram na sua supressão pelo
antigo Departamento de Esgoto Sanitário do Estado da Guanabara (SURSAN, 1970).
(a)
(b)
Figuras 25.
Tanque fluxível concebido por Saturnino de Brito (Sampaio, 1947).
A situação melhor equacionada foi a de Gabrielli, em 1880, com a conclusão da
adução dos Rios d’Ouro, Santo Antonio e São Pedro, e também posteriormente com a
construção de diversos reservatórios (Silva, 1988).
Na atualidade, os custos dos serviços de abastecimento de água tendem a aumentar
devido à ampliação do sistema para atendimento de novos consumidores, ao acréscimo no
nível de tratamento resultante da elevação do grau de poluição e à contaminação dos
mananciais, além da própria redução na disponibilidade de água devido a uma série de fatores
(conflitos de usos, estiagem, desmatamento, etc). Ações deletérias nos mananciais podem
acarretar níveis de poluição que comprometam sua viabilidade e resulte na escassez de
recursos hídricos para o consumo humano, realidade já enfrentada no Brasil e no mundo.
Com os incrementos nos custos de produção e distribuição da água, vários estudos e
ações de ordem tecnológica e educacional estão sendo desenvolvidos visando otimizar o
sistema para melhor aproveitar sua capacidade de abastecimento e racionalização do
consumo. Destacam-se: proteção e uso racional de mananciais, controle de perdas, campanha
de redução de desperdícios, reuso da água, etc. O desenvolvimento de novas tecnologias de
racionalização deste bem mineral vem se apresentando promissor. Estas medidas estão sendo
estudadas também para os sistemas de esgotamento sanitário e têm levado a uma inversão do
que vem a ser atualmente a tecnologia mais adequada para o esgotamento sanitário. A
necessidade de racionalizar o consumo de água, principalmente a potável, vem convergindo
em esforços no sentido de desenvolver novos conceitos de coleta e transporte de esgoto
sanitário como tecnologias de usos prioritários das águas, de saneamento a seco e reuso de
água.
91
Cynamon (1993) estipula como usos prioritários àqueles em que a água é essencial à
promoção da saúde: bebida, comida, banho, etc.; e usos secundários, em que a utilização de
qualidade de água superior é desperdício, tais como: vaso sanitário, lavagens de rua, carro.
As modificações devem ocorrer a partir das instalações hidráulicas prediais, uma vez
que as residências utilizam grandes volumes de água potável para todas as necessidades,
como a descarga e transporte de material fecal, que pode chegar à ordem de 30% do consumo
de água total (Santos, 2001; Mancuso, 2002). Estudos no
design
de bacias sanitárias, tipos de
descarga, mictório a seco, esgotamento seco a vácuo, instalações de captação e distribuição de
águas pluviais e de reuso de águas residuárias, dentre outros estão se difundindo.
A
Figura 26
,
abaixo, apresenta vista em corte de um modelo de mictório aplicado em
estabelecimentos no RJ, que dispensa água para descarga, reduzindo consideravelmente seu
consumo através de dispositivo selante.
Figura 26. Mictório redutor de consumo de
água.
(Fabricante: Ideal Standard Ltda.).
As
Figuras 27a e 27b
,
abaixo, apresentam o sistema predial de esgoto sanitário a
vácuo desenvolvido pela empresa Evac Ltda, em parceria com a UFSCar, que tem como
justificativa de implementação a redução no consumo de água para descarga dos dejetos.
(a) Representação dos principais dispositivos.
(b) Esquema vertical do sistema predial.
Figura 27. Esquema de sistema predial de esgoto sanitário a vácuo
(www.sanivac.com.br).
92
Para Niemczynowicz (1999), o problema da escassez de água é um problema de
qualidade da água. A maioria dos usos que o homem faz da água, com exceção da irrigação,
não a destrói, em termos de quantidade, mas a polui. A redução da utilização de água limpa
no mundo significa que o uso desta água para o esgotamento sanitário é uma solução inviável
para todos os países que não estiverem equipados com efetivo sistema de tratamento de
esgotos, especialmente onde seca. Sendo assim, o equacionamento dos resíduos sólidos e
líquidos se torna fundamental para os desafios na gestão dos recursos hídricos.
Dentro deste contexto, o desenvolvimento tecnológico aponta como área de pesquisa,
investimentos e de implantação de novos produtos relacionados ao racionamento das águas
utilizadas para transporte dos dejetos humanos. Como exemplo de alternativas de aplicação
deste novo conceito, as
Figuras 28a
,
28b
e
28c
, abaixo, apresentam detalhes de um protótipo
de bacia sanitária utilizada na Universidade de Kalmar, Suécia, que separa as descargas de
urina e de excretas, além de permitir o controle nas vazões de descarga.
(a)
(b)
(c)
Figura 28. Protótipo de bacia sanitária para redução no
consumo de água (Fotos: Rosso, T.C., 2002).
Na atualidade, a alternativa dada de reuso dos efluentes gerados vem para muitos se
apresentando como uma das mais fundamentadas, sob o ponto de vista sistêmico, para o seu
melhor equacionamento e condizente tecnicamente com o termo de
destino final adequado
. A
viabilidade desta solução está relacionada com a evolução tecnológica dos processos de
tratamento e com os parâmetros utilizados para a avaliação custo-benefício.
93
5.3.4. Concessionárias dos Serviços de Esgotos
Marcada pela necessidade de se afirmar enquanto serviço de infra-estrutura urbana
prioritário, a concessão dos serviços de esgoto na cidade do Rio de Janeiro passou por
diversas estruturações institucionais, conforme pode ser evidenciado no
Quadro 5
,
abaixo,
e
sofreu, apesar de seu pioneirismo, uma difícil, lenta e tardia evolução relativa à estruturação
espacial da cidade. A descrição da evolução dos sistemas de esgotos através das
concessionárias a seguir pretende demonstrar esta afirmativa e para isso foi expressivo o
trabalho:
Os Esgotos do Rio de Janeiro - História do Sistema de Esgotos Sanitários da
Cidade do Rio de Janeiro 1857-1997
de autoria do engenheiro José Ribeiro da Silva, ex-
funcionário da antiga
City.
Quadro 5. Concessionárias e repartições dos serviços de esgotos do Rio de Janeiro.
Período Órgão responsável Concessionária / Repartição
Colônia e
Império
Câmara
---
1840-1862
Inspeção Geral das Obras Públicas do
Município da Corte
---
1862-1947
Ministério da Agricultura, Commércio
e Obras Públicas
The Rio de Janeiro City Improvements
Company Limited (City)
1
1924-1937
Ministério da Viação e Obras Públicas
1930 - Ministério da Educação e Saúde
Inspetoria de Águas e Esgotos (IAE)
2
1937-1941 Ministério da Educação e Saúde
Serviço de Águas e Esgotos
do Distrito Federal (SAEDF)
1941-1945
Ministério da Educação e Saúde –
Departamento Nacional de Saúde
Serviço Federal de Águas e Esgotos
(SFAE)
1945-1957
Prefeitura do Distrito Federal -
Secretaria Geral de Viação e Obras
Departamento de Águas e Esgotos (DAE)
1954 – DAE - Divisão de Esgoto
1956 – DAE – Depto. de Esgoto Sanitário
(DES)
1957-1972
Governo do Estado da Guanabara
Secretaria de Obras Públicas
SURSAN
1957 - Dept
o
. de Esgoto Sanitário
1965 - Dept
o
de Saneamento
1972-1975
Governo do Estado da Guanabara
Secretaria de Obras Públicas
Empresa de Saneamento da Guanabara
(ESAG)
1975-
atual
Governo do Estado do Rio de Janeiro
3
Companhia Estadual de Águas e Esgotos
(CEDAE)
Obs.: 1. Os serviços de esgotos tiveram caráter privado no período de 1862-1947.
2. O IAE passou a ampliar o sistema de esgoto a partir de 1935.
3. Atualmente a CEDAE está subordinada a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Urbano (SEMADUR).
94
“The Rio de Janeiro City Improvements Company Limited” (“City”): 1862-1947
O imperador D. Pedro II mandou estudar os sistemas de esgoto sanitário e pluvial da
Inglaterra, existindo plantas de autoria do engenheiro inglês Edward Gotto, datadas do
período 1853-1863 (Revista da SEAERJ, 1990).
Em 1853 foi aberta concorrência para a construção de um sistema de esgotamento
sanitário e duas propostas chegaram à Junta Central de Higiene. A de João Frederico Russell,
que consistia em estabelecer todos os arranjos convenientes nos domicílios particulares, na
construção de redes e transporte do esgoto coletado para unidades de tratamento que se
resumiam a tanques de precipitação química (Coelho, 1985; Telles, 1994). O material sólido
removido seria vendido como adubo e o efluente líquido seria lançado no mar. A outra
proposta, feita pela Companhia
Hanquet
pretendia implantar nas moradias tubos condutores
que levariam as matérias a barris ou reservatórios fechados à pressão hidráulica e
desinfetados, conduzidos a um depósito fora da cidade. A condução se daria em carros
fechados e os dejetos depois de preparados, por fogo, destinados à agricultura. A proposta
vencedora foi a de Russel (Coelho, 1985).
Mediante solicitação da Junta, em 1855, o sistema de tratamento proposto foi aplicado
em caráter experimental na Casa de Correção ou Penitenciária Pública. A experiência teve
êxito atestado pelos engenheiros do
“Civil Engineer Institute”
de Londres, e cnicos
nacionais (Silva, 2002; Telles, 1984).
A execução do sistema de esgotamento e a exploração dos serviços constituíam-se em
empreendimento de vulto e intensivo em capital. Reconhecendo este fato, a Lei n
o
884 e o
contrato de 1857 permitiram a exploração por empresa, desde que ela se constituísse fora do
país, a fim de atrair capitais estrangeiros (leia-se, capital inglês). Em 20/02/1862, foi
constituída a
“The Rio de Janeiro City Improvements Company Limited”,
conhecida
popularmente pela abreviação “
City
”. Em maio de 1863, deu-se a transferência do contrato de
1857 para a nova empresa, que ficou com o privilégio de construir e administrar a rede
pública de esgotos sanitários e pluviais, além de executar e modificar as instalações de
esgotos dos prédios na área contratual, por um período de 90 anos de concessão.
As obras começaram somente em 1862, após nove anos da primeira lei de contratação
dos serviços de esgotos. O projeto e construção do sistema foram do engenheiro Edward
Gotto. A área objeto do contrato (4,24 km
2
) foi dividida nos três distritos mais populosos. O
3
o
distrito, o da Glória (cujo sistema foi o primeiro a entrar em operação) inaugurado em
1864, englobava os bairros de Laranjeiras, Silvestre, Santa Tereza, Flamengo, Lapa, Catete,
praia de Santa Luzia e Glória; o 2
o
distrito, chamado Gamboa, começou a operar em 1865 e
compreendia os bairros do mesmo nome, Estácio de e Catumbi; e o 1
o
distrito, São Bento,
95
chamado posteriormente de Arsenal, entrou em operação em 1866 e contemplava toda a parte
central da cidade, desde o Catete até o aterro no Mangue, limitado pelo mar, Largo da Lapa,
Rua do Riachuelo, parte da Frei Caneca, Praça da República e as encostas dos morros do
Castelo, Santo Antônio, Senado e Livramento.
A
Figura 29
, a seguir, apresenta antiga Estação de Tratamento de Esgoto da Gamboa.
Figura 29. Antiga Estação de Tratamento de
Esgoto da Gamboa, 1866
(CEDAE, 2001).
Em cada um desses distritos havia uma
Casa de Machinas
independente para a rede
coletora de esgotamento da bacia correspondente, com caldeiras, bombas de recalque a vapor
e Estação de Tratamento. O esgoto transportado passava por grades de barras, de limpeza
manual e chegava em poços de reunião. Dali era recalcado para cilindros onde ocorria a
desinfecção com aplicação de sulfato de alumínio, cal e carvão vegetal. Em seguida, o
efluente ia para tanques de sedimentação onde sofria singela filtração passando por camada de
cascalho, carvão vegetal e cordagem, antes de ser lançado no mar.
O pioneirismo da cidade não impediu que o sistema de esgoto fosse alvo de
constantes críticas (Telles, 1984). As reclamações eram quanto à eficiência e quanto à sua
defasagem frente às crescentes demandas populacionais.
O esgotamento da cidade não obedeceu a um projeto amplo, gerando interpretações e
soluções localizadas, fragmentando o sistema em áreas contratuais.
As redes coletoras também recebiam críticas quanto à qualidade das tubulações,
emissão de gases, pouca declividade, insuficiência de poços de visita, dos coletores coletivos,
falta de estanqueidade, etc.
Quanto à eficiência do tratamento, em todo o período, a
City
sofreu diversas críticas,
destacando-se dentre elas: subdimensionamento, eliminação da filtração final, tempo de
detenção insuficiente, descargas indevidas de lama na Baía de Guanabara, limpeza precária e
demorada das instalações, emissão de gases, economia com a adição insuficiente de produtos
químicos, pontos de despejo final inadequados etc.
96
Telles (1984) cita comentário de André Rebouças, em 1888:
Muito se tem escrito sobre os esgotos do Rio de Janeiro, e, no entanto, ainda flutuam junto à
ponte da E.F. Mauá, no extremo setentrional da baía, placas de matéria fecal, projetada
pelas casas de máquinas, oficialmente denominadas de desinfecção! O erro máximo dessa
infeliz obra foi constituir a Baía de Guanabara em uma cloaca.
O lodo gerado pelas estações de esgoto sanitário, chamado na época de “lamas”, era
transportado por carroças até aterros de mangue na Alegria e Saúde e posteriormente tinham
como destino a Ilha de Sapucaia, atual Ilha do Governador. O transporte, descuidado, era
motivo de constantes protestos. Somente em 1934, a
City
inaugurou um sistema mecanizado
de remoção de lodo com bombeamento para embarcações chamadas “lameiros”. Em 1936, os
tanques de sedimentação das estações passaram a ser cobertos, eliminando o mau cheiro e a
proliferação de moscas, promovendo também o ajardinamento das estações (Roxo & Ferreira.
In: Silva, 1965).
O escoamento das águas pluviais também foi objeto do contrato de 1857 com a
City
.
Entretanto, a companhia dispensou pouca atenção ao serviço, tanto na construção de galerias
quanto na manutenção ou eliminação das valas existentes ou mal utilizadas pelos habitantes.
De 1877 a 1886, o Governo Imperial contratou os serviços do engenheiro inglês
Joseph Hancox objetivando resolver os graves problemas de drenagem da cidade, uma vez
que não estava sendo atendido pela
City
. Neste período, foram instaladas 82 km de rede de
drenagem em contraposição à cerca de 9 km de galerias e ramais de águas pluviais executadas
pela
City
, entre 1862 e 1877.
Em conseqüência destes conflitos de atribuições e da defasagem dos próprios serviços
de esgotos sanitários, em 1915 o Governo Federal reestruturou a Inspetoria de Esgotos da
Capital Federal, que ficou, junto com a
City
, responsável pelos serviços de águas pluviais.
Posteriormente, em 1924, estes serviços foram passados para Inspetoria de Águas e Esgotos
(IAE). A solução do problema da ambigüidade da drenagem pluvial se deu somente em 1940,
quando os serviços foram transferidos para a Prefeitura do Distrito Federal passando então ao
Departamento de Obras da Secretaria Geral de Viação e Obras.
Mediante termo aditivo de contrato em vigor entre a
City
e o governo, em 1911,
passou a ser permitido o lançamento de despejos industriais na rede de esgoto, que, por conta
dos efluentes, localizavam-se basicamente próximos aos corpos d’água. Não obstante, vale
destacar a eficiência na manutenção dos serviços da
City
, sendo referência por muito tempo as
Oficinas Eletromecânicas de São Cristóvão, que segundo Silva (2002) estavam aparelhadas
para trabalhos de carpintaria, marcenaria, fundição de ferro e bronze, mecânica, ferraria,
pintura e fabricação de caixas de inspeção, de gorduras, ralos sifonados, poços de visita e
peças de concreto pré-moldado. Esta grande oficina atendia às demandas das redes, reparos
97
elétricos e mecânicos das estações elevatórias e de tratamento. Esta posição mostrava a visão
empresarial de preservar o patrimônio investido, prolongando a utilização, inclusive, após o
prazo normal da vida útil e evitando-se gastos com substituições por manutenção indevida.
No decorrer dos anos, os serviços prestados pela
City
foram se tornando deficientes e
obsoletos, face ao rápido desenvolvimento da cidade. As redes coletoras, estações elevatórias
e de tratamento ficaram aquém das demandas. A necessidade de ampliação do sistema era
constante motivo de conflito de interesses e re-interpretações contratuais entre a empresa e o
poder público.
Não obstante, os ingleses não chegaram a introduzir no sistema do Rio de Janeiro
equipamentos mecânicos apropriados para limpeza das redes coletoras, existentes no
Canadá e em cidades americanas. O que era utilizado pela
City
para limpeza das redes
consistia tão somente em varas de madeira de 1 a 1,50 m, ligadas por juntas de metal,
chamadas de “varas americanas”. Para desobstrução, a
City
importava varas de junco da Índia
(Roxo & Ferreira. In: Silva, 1965).
Segundo o destacado engenheiro Enaldo Cravo Peixoto (1960):
(...) em 1947, sombrias se mostravam as perspectivas referentes ao sistema de esgoto
sanitário da cidade, desde que a companhia City se desinteressava de realizar
melhoramentos na última fase de vigência do seu contrato.
No ano de 1912 praticamente findam as obras de ampliação das redes coletoras de
esgoto sanitário realizadas pela
City
, limitando-se às áreas encravadas, iniciadas em 1937
(Gomes, 2001). Ao fim do contrato, em 1947, a
City
assentou 695.638 m de rede coletora de
esgoto, com 5.870 poços de visita (Silva, 2002).
Inspetoria de Águas e Esgoto (IAE): 1924-1937
Em 1924, a
City
perde o monopólio dos sistemas de esgotamento. É criada a Inspetoria
de Águas e Esgotos, que se torna, de 1934 a 1938, beneficiária de todas as novas concessões
de esgotamento sanitário da cidade, atendendo áreas fora dos limites contratuais da
City
, tais
como: Leblon, Ipanema, Lagoa Rodrigo de Freitas (faixa da orla) e Urca, passando também a
ser responsável pelo sistema de drenagem pluvial e abastecimento de água. No decreto que
autorizava a realização das obras, foi determinado que as instalações dos prédios esgotados
para a rede construída, anteriormente serviços privativos da
City
, passariam a ser executadas
por instaladores particulares, matriculados na inspetoria.
Devido às constantes irregularidades que vinham ocorrendo, dentre elas
a execução
clandestina de instalações de esgotos e as ligações indevidas de águas pluviais à rede de
esgoto sanitário,
foi aprovado em 1934, o regulamento que estabelecia as regras sobre as
98
instalações e a imposição de multas aos infratores. Este regulamento estabelecia que o trecho
do coletor predial entre o limite das propriedades e o coletor público de esgotos, seria feito
pela IAE, `a custa dos proprietários. Nas áreas suburbanas, a população não requeria suas
ligações por não dispor de recursos.
A
Figura 30
,
apresentada abaixo, delimita a divisão contratual das áreas de
esgotamento sanitário, implantadas pela
City
e pela IAE, em diferentes épocas.
Figura 30. Divisão contratual das áreas de esgotamento sanitário da City e da IAE
(Revista de Engenharia do Estado da Guanabara, jan/mar 1965).
99
Serviço de Águas e Esgotos do Distrito Federal (SAEDF): 1937-1941
Com o fim do monopólio dos serviços da
City
, o poder público realizou investimentos
importantes em áreas habitadas por populações de renda média baixa, principalmente nos
subúrbios (Marques, 1993).
O Serviço de Águas e Esgotos do Distrito Federal, em seu curto período de vigência,
deu andamento aos projetos e obras não concluídos pela Inspetoria de Águas e Esgotos,
construindo redes coletoras de esgoto sanitário nos bairros da Penha e Olaria, com o
respectivo tratamento na Estação de Tratamento da Penha, a partir de 1940.
As instalações prediais de esgotos e suas ligações aos coletores públicos ficaram a
cargo do SAEDF, que passou a ser indenizado pela despesa em prestações mensais, a serem
pagas pelos interessados após a execução do serviço.
Serviço Federal de Águas e Esgotos (SFAE): 1941-1945
O Serviço Federal de Águas e Esgotos deu andamento aos serviços iniciados pela IAE
e continuados pelo SAEDF, não se estendendo para novas áreas. Foi incorporado na
Prefeitura do Distrito Federal, na tentativa de assegurar melhores condições financeiras e
operacionais para o suprimento de água e esgotamento sanitário da cidade. A rede de esgotos
de áreas marginais da Lagoa Rodrigo de Freitas foi construída entre 1940 e 1944.
Departamento de Águas e Esgotos (DAE): 1945-1957
O Departamento de Águas e Esgotos, subordinado à Secretaria Geral de Viação e
Obras da Prefeitura do Distrito Federal, passou a ser responsável pelos serviços de água e
esgotos (sanitário e pluvial) do município. Em 25 de abril de 1947, o contrato da
City
expirou
e a responsabilidade da prestação dos serviços de esgotamento passou para o DAE, que
incorporou da
City
todo o acervo e sistemas implantados (Revista de Engenharia, 1965). As
redes coletoras, 15 estações elevatórias e 7 estações de tratamento construídas e operadas pela
City
passaram para o DAE em precárias condições de operacionalidade.
Segundo Peixoto (1960), o abastecimento de água na cidade priorizava os
investimentos, que a carência do precioso líquido é muito mais direta e imediatamente
percebida pelo público. Passava para o plano secundário a solução dos problemas de esgoto,
que se agravavam dia a dia. Desde o início da transferência, esforços foram direcionados no
sentido de se providenciar um departamento próprio para os serviços de esgoto sanitário.
100
Em 1954, os esgotos passam do setor de Serviço de Esgoto para a Divisão de Esgotos,
com estrutura de departamento. Somente em 1956, o DAE foi dividido em Departamento de
Esgoto Sanitário (DES) e Departamento de Águas (DAA), ambos da Prefeitura do Distrito
Federal, posteriormente incorporados pela SURSAN, em 1957 e em 1961, respectivamente.
Até a criação do DES toda a rede implantada na cidade atendia a apenas 30% da população,
sendo imperiosa sua ampliação.
No período do DAE, as instalações domiciliares puderam ser feitas por particulares
licenciados, entretanto, a elaboração dos projetos cabia ao DAE, que se sobrecarregava e não
conseguia atender a demanda de execução das ligações prediais e dos serviços de manutenção
da rede. Em 1954, passou a ser permitida a elaboração de projetos de instalações por
particulares.
Foram construídas redes coletoras em Guaratiba, Olaria, Ramos, Bonsucesso, Ilha do
Governador, coletores na Av. Brasil, além de reformas em diversas elevatórias e implantação
de novas unidades.
Superintendência de Urbanização e Saneamento (SURSAN): 1957-1972
O programa de extensão de rede foi se atrasando, no entanto, e em conseqüência, com
a grande expansão da cidade, grandes zonas, apesar de densamente povoadas e relativamente
urbanizadas, ficaram sem serviços de esgotos; decorrendo ainda na antiga capital do país uma
situação quase vexatória, com um sem número de valas mal cheirosas, e um estado sanitário
bastante ruim, com febres tifóides, e doenças de origem hídrica, em caráter endêmico (Revista
de Engenharia, 1963).
Através de um Fundo Especial de Obras Públicas, em 28/11/57, foi criada a SURSAN,
com a função de executar um Plano de Realizações e Obras, incluindo projetos inadiáveis de
saneamento básico. São desta época os investimentos vultuosos na realização de grandes
obras, iniciadas pela DAE em 1958, na área de abastecimento de água, em que se destaca a
ampliação do sistema do Guandu, incluindo a nova adutora e a estação elevatória do
Lameirão, conhecida como “Obra do Século”.
O Serviço de Controle da Rede da Divisão de Projetos e Obras do Departamento de
Esgotos Sanitários teve grande importância nos estudos de remanejamento de redes de
esgotos, contando com setores de medições, controle técnico e pesquisa.
Em 31 de março de 1958, foi assinado convênio entre a SURSAN e o Ministério da
Saúde, mediante o qual o DES e o Serviço Especial de Saúde Pública (SESP) organizaram a
Comissão de Planejamento do Sistema de Esgotos Sanitários do Distrito Federal (COPES)
voltada para estudos de macroplanejamento da expansão do sistema, de remanejamento da
101
rede existente e de destino final dos esgotos, dentre os quais os projetos de interceptores
oceânicos e do Emissário Submarino de Ipanema (ESEI). Constituído por cinco grupos
permanentes de trabalho: Redes, Interceptores, Oceanografia, Hidrologia e Pesquisas,
desenvolveram o pioneiro
Plano Diretor do Sistema de Esgotos Sanitários do Estado da
Guanabara
(Peixoto, 1960).
Na década de 60, o Governo do Estado logrou contrair os primeiros financiamentos
externos com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o
United States Agency
for Internacional Development
(USAID), o que possibilitou a realização de grandes obras de
saneamento básico.
A fragmentação e inconsistência da política de saneamento ficaram representadas pelo
número e inconstância de diversos órgãos governamentais que atuavam, simultaneamente, nos
níveis municipal, estadual e federal
14
. Estes grupos setoriais disputavam prestígio,
posicionamento institucional e maior influência nas discussões orçamentárias e alocação de
recursos, inclusive os provenientes de financiamento internacional, exprimindo interesses
corporativo-burocráticos e gerando desperdício de esforços e recursos financeiros. Este legado
histórico perpetua-se nos dias atuais, em que a área de saneamento ainda não apresenta
endereço fixo.
Ainda na época do Departamento de Esgotos Sanitários, foram realizados estudos para
normalização junto a ABNT, objetivando implantar fossas sépticas nas residências da zona
suburbana, que até então lançavam despejos domiciliares diretamente nos rios, galerias
pluviais e sarjetas. A construção, limpeza e conservação ficavam sob supervisão deste
departamento.
A partir de janeiro de 1963, os projetos e obras de esgotos pluviais do Estado foram
transferidos da Secretaria de Obras Públicas para o DES. Posteriormente, estes serviços
passaram para o Departamento de Saneamento e para o Departamento de Rios e Canais
(DRC) da SURSAN, onde até 1972, a drenagem pluvial experimenta grande desenvolvimento
(Revista Municipal de Engenharia, 1992).
Em 24/12/62, foi criada a Companhia Estadual de Águas da Guanabara (CEDAG),
com atuação no sistema de abastecimento de água da cidade-estado. A efetivação da
companhia se deu pela extinção do Departamento de Água da SURSAN.
14
No início da cada de 60, havia, segundo Silva (1998), cerca de dezessete órgãos federais que atuavam no
setor, dentre eles: o Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS), o Departamento Nacional de
Obras Contra as Secas (DNOCS), a Fundação Serviços de Saúde Pública (FSESP), o Departamento Nacional de
Endemias Rurais (DNERu), a Divisão de Engenharia Sanitária do Ministério da Saúde, a Superintendência de
Valorização Econômica da Amazônia (SVEA), a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
(SUDENE), a Comissão do Vale do São Francisco (CVSF), a Comissão de Fronteiras, o Plano do Carvão, o
Departamento Nacional da Produção Mineral (DNPM), a Seção de Engenharia Sanitária do Ministério da
Guerra, a Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM).
102
Do outro lado da baía, no então Estado do Rio de Janeiro, em 06 de janeiro de 1972,
foi criada a Companhia de Saneamento do Estado do Rio de Janeiro (SANERJ), encarregada
de explorar os serviços de abastecimento de água e de esgotos sanitários nos municípios
fluminenses.
Vale destacar a criação do antigo órgão de controle ambiental, o Instituto de
Engenharia Sanitária (IES), em 1962, tendo recebido apoio institucional da Organização
Mundial de Saúde (OMS) e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD). Posteriormente, em 1975, a Fundação Estadual da Engenharia do Meio Ambiente
(FEEMA), implementou uma nova dinâmica ao IES, como um órgão com visão abrangente
sobre os problemas ambientais. Estas instituições de pesquisa exerceram papel destacado e
pioneiro no controle da poluição e formação de profissionais no setor, sendo padrão de
referência no país durante longo período.
O decreto “N” n
o
351 de 22 de janeiro de 1965 alterou a denominação do
Departamento de Esgoto Sanitário para Departamento de Saneamento, mantendo a sigla DES
e ampliando suas atribuições no Estado, para também combater pragas, como mosquitos e
ratos. Em novo regulamento de instalações prediais de esgotos sanitários, o DES renunciou
por completo à atribuição de projetar e executar as instalações prediais e coletores de vila, que
ficou a cargo de projetistas, construtores e instaladores autônomos, devidamente licenciados.
A SURSAN construiu coletores de esgotos em diversos logradouros da cidade e
foram beneficiadas várias áreas do subúrbio, como Bonsucesso, Encantado, Piedade, Irajá,
Penha Circular, além da Ilha do Governador, parte de Jacarepaguá, Pedra de Guaratiba, dentre
outros. Este período foi marcado por profundas transformações na estrutura, organização e
racionalidade dos serviços. Para garantir sustentação financeira, o setor “modernizou” a
cobrança de tarifas e buscou grandes empréstimos internacionais.
A
Figura 31
, apresentada na página seguinte, identifica as áreas dotadas de estações
elevatórias e de tratamento de esgoto sanitário e as respectivas bacias contribuintes do Estado
da Guanabara, em 1964.
103
Figura 31. Sistema de esgotamento sanitário do Estado da Guanabara em 1964
(Revista de Engenharia do Estado da Guanabara, jan/mar 1965).
Empresa de Saneamento da Guanabara (ESAG): 1972-1975
A Empresa de Saneamento da Guanabara (ESAG) procurou elaborar o Plano Estadual
de Esgotamento Sanitário. Iniciou e executou quase que completamente o ESEI, com recursos
próprios e financiamento do Banco Nacional de Habitação (BNH), no âmbito do Plano
104
Nacional de Saneamento (PLANASA)
15
. Para a conclusão do Sistema de Esgoto da Zona Sul,
entre 1975 e 1977, foram consumidos aproximadamente 80% dos recursos aplicados em
esgotamento sanitário, unicamente nas regiões administrativas de Copacabana, Lagoa e
Botafogo (Vetter et al., 1979 apud Marques, 1993).
A partir da década de 1970, por meio de uma macropolítica realizada em âmbito
nacional, o PLANASA reuniu recursos significativos para investimento em abastecimento de
água e esgotamento sanitário. Entretanto, os benefícios, incontestáveis no primeiro momento
para o abastecimento de água, não corresponderam à expectativa, pois a meta estabelecida
pelo programa ficou longe de ser alcançada quanto aos equipamentos de esgoto sanitário.
Com a extinção do DRC, a responsabilidade pelo sistema de drenagem pluvial passa
para os departamentos de obras de urbanização, de obras de conservação e geral de secretarias
de obras do Rio de Janeiro (Revista Municipal de Engenharia, 1992).
Até a fusão dos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro em 1975, coexistiam três
organizações de prestação dos serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário
com jurisdição sobre a área da RMRJ, a saber: CEDAG; ESAG e SANERJ.
Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE): 1975 - em curso
Em 24/03/1975, foi criada a Companhia Estadual de Águas e Esgotos, que incorporou
as três organizações supracitadas. Nesta época, deu-se também a criação da Fundação
Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (FEEMA), da Superintendência de Rios e Lagoas
(SERLA) e da Comissão Estadual de Controle Ambiental (CECA). Assim, respeitada a
autonomia municipal fixada em lei, a CEDAE é, salvo exceção, a atual responsável pela
gestão e prestação dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário na
área da RMRJ.
Próximas à definição da RMRJ, instituída em 1974, as atividades da companhia
recém criada ficaram em consonância com a política de desenvolvimento econômico e social
do poder público estadual. Com exceção dos municípios do Rio de Janeiro e de Niterói, os
demais municípios dispunham, em 1980, de apenas cerca de 400 km de redes de esgoto
sanitário, que funcionavam precariamente por falta de conservação e inexistência de rede
15
O PLANASA foi institucionalizado em 1969. Respaldava-se financeiramente nos recursos do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para financiar a implantação ou expansão dos serviços de água e esgoto.
O município aderia ao novo modelo mediante a concessão da prestação dos serviços à companhia do seu Estado,
o que lhe permitia obter os recursos financeiros necessários às obras de saneamento. Recursos significativos
foram direcionados ao plano até meados da década de 1980, se extinguindo informalmente. O histórico da gestão
do setor no país revela que o modelo defendido pelo programa recaía na adoção de tecnologias convencionais
custosas, além de ter sido marcado por forte centralização política, institucional e financeira.
105
pluvial, o que demonstrava necessidade de melhor distribuição dos investimentos no Grande
Rio.
Com o término do PLANASA, que forneceu recursos financeiros para o Departamento
de Saneamento, a ESAG, a CEDAG e a CEDAE, o setor de saneamento no país ficou sem
diretrizes, endereço institucional e fontes regulares de financiamento compatíveis com a
enorme demanda. A falta de um plano nacional e a necessidade de regulamentação do setor,
definindo claramente as atribuições de cada governo em níveis federal, estadual e municipal,
acarretou grandes disputas de áreas de influência e responsabilidades entre as diversas
instâncias de poder.
Na fusão dos antigos estados do Rio e da Guanabara, a responsabilidade sobre os rios
passa para a SERLA e a dos sistemas de microdrenagem, para os municípios. Posteriormente,
com a adoção do sistema de gerenciamento de bacias, algumas delas são inteiramente
transferidas, por convênio, para o município do Rio de Janeiro, desde Irajá até São Conrado
(Revista Municipal de Engenharia, 1992).
Em 1977, a FEEMA cria o
Sistema de Licenciamento de Atividades Poluidoras
(SLAP), o que representou um grande avanço nas atividades de controle de poluição. Foi
através desse instrumento que foi desenvolvida a concessão das licenças: prévia, de instalação
e de operação das indústrias.
Com a volta do regime democrático ao país, a política ambiental passa por novas
reestruturações, como a instituição da lei que estabeleceu a
Política Nacional do Meio
Ambiente
e a previsão de implantação do Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA)
16
.
Tal sistema incluía o conjunto de instituições governamentais que deveriam se ocupar da
proteção e da gestão da qualidade ambiental, tendo por instância superior o Conselho
Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), órgão consultivo e deliberativo, encarregado da
formulação das políticas ambientais, contemplando, embora de forma limitada, a participação
pública, através de organizações representativas da sociedade civil.
Em 1994, foi constituída a Diretoria de Esgotos da CEDAE, antiga reivindicação dos
técnicos da área de esgoto, em sua maior parte originários da ESAG (Marques, 1998), com
atribuições de coordenação, direção e supervisão de todas as atividades relacionadas a
operação, manutenção, controle, planejamento e projeto de sistemas de coleta, transporte e
destino final de esgotos na área do Estado do Rio de Janeiro. Não obstante, diante das
16
Lei 6.938 de 31.08.1981 e regulamentada em 1983. No artigo 2º diz que tem por objetivo a preservação,
melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no país, condições ao
desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida
humana.
106
sucessivas alterações de diretoria na CEDAE, esta diretoria encontra-se atualmente
desativada.
De uma forma geral, as ações de eliminação das valas negras nos subúrbios, favelas e
Baixada Fluminense tiveram, em relação às primeiras intervenções de implantação de redes
de esgoto no centro do Rio, mais de um século de atraso. Obras de saneamento nas
comunidades carentes, através dos programas sociais de saneamento básico, conforme
descrito no subitem # 5.3.5., começaram a ser implantadas pela companhia a partir de 1983.
A poluição na Baía de Guanabara estimulou uma infinidade de estudos que foram
sendo aprimorados com a percepção ambientalista e a utilização da modelagem
computacional. Em 1987, foi criada uma comissão de trabalho que desenvolveu o
Projeto de
Recuperação Gradual do Ecossistema da Baía de Guanabara
, tendo a FEEMA como agente
executivo. Este projeto apresentava a necessidade, dentre outras, de ampliação da rede
coletora de esgoto sanitário na RMRJ e de construção de sistema de tratamento e destino final
adequado dos esgotos coletados. Este seria o principal subsídio à posterior elaboração do
Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG) apresentado no item # 7.3.
Em 1991, tem início o Projeto Ambiente Rio, instituído pelo governo federal com a
atribuição de recuperar as condições ambientais da RMRJ, a fim de minorar os efeitos das
enchentes que assolaram o estado em 1988. Este projeto constituiu-se de ações pontuais,
porém urgentes, sendo integrado em parte, ao Programa de Saneamento Básico da Bacia da
Baía Guanabara, predecessor ao PDBG.
Estudos da distribuição espacial dos sistemas de saneamento no Rio de Janeiro,
desenvolvidos por Marques (1993), quase todas as obras realizadas pelas instituições
responsáveis pelo saneamento antes da criação da CEDAE, localizaram-se nos bairros
reconhecidos, segundo esta metodologia, como “espaços das classes altas” (Tijuca, Vila
Isabel, Botafogo, Copacabana, Lagoa, Barra da Tijuca); “espaço das classes médias
(Engenho Novo, Ilha do Governador, Santa Tereza e Niterói); “centro de negócios” (Centro,
Rio Comprido e Portuária) e “subúrbio tradicional” (Anchieta, Irajá, Penha, Méier, Ramos,
São Cristóvão, Madureira e Jacarepaguá).
Os investimentos em saneamento realizados de 1975 a 1991 promoveram crescente
homogeneização dos espaços na metrópole, com a redução das disparidades nas coberturas
dos serviços, representando a democratização do acesso aos sistemas. Se ficou longe de
representar uma universalidade, colocou a periferia da metrópole em um patamar de menor
carência (Marques, 1993).
107
A implantação dos sistemas de esgotos, assim como os serviços de infra-estrutura
urbana, de uma forma geral, levam em consideração critérios técnicos, mas são
fundamentalmente determinados e viabilizados por decisões políticas, permeadas por pressões
exercidas pelas classes e grupos sociais que disputam as benfeitorias e a valorização
imobiliária. Fica evidente compreender a presença do esgotamento sanitário em determinadas
áreas em detrimentos de outras, cujo atendimento, apesar de tecnicamente fundamentado por
questões como densidade populacional e índices de morbi-mortalidade, é postergado. No
aspecto da análise da disseminação espacial dos sistemas de saneamento e seus fatores
determinantes, ver Coelho (1985); Benchimol (1990); Marques (1993; 1998) e Abreu (1997).
Segundo Silva (2002), o sistema de esgoto sanitário do município do Rio de Janeiro,
sob responsabilidade da CEDAE, era constituído, em 1995, por cerca de 4.600.000 m de rede
coletora, 41 EEs e 17 ETEs (sem contabilizar as unidades em fase de implantação). Já o
Anuário Estatístico da Cidade do Rio de Janeiro relativo ao levantamento de 1998/1999
contabilizou no município, 37 EEs e 13 ETEs. A redução do número de unidades pode ser
decorrente de desativação, proveniente, inclusive, de novas ampliações, como as do PDBG,
por exemplo.
Dados fornecidos pela assessoria de comunicação da CEDAE, em palestra proferida
na SEAERJ, em dezembro de 2002, informam que a extensão de rede coletora da cidade
passou para 4.892.431 m.
O
Quadro 6
, apresentado a seguir, elenca os principais eventos e marcos jurídico-
institucionais dos serviços de esgoto da Cidade do Rio de Janeiro.
Quadro 6. Eventos e marcos jurídico-intitucionais dos serviços de esgoto.
Data Intervenção
28/09/1853
Lei n
o
719, autorizando D. Pedro II a contratar a execução do “serviço de limpeza das
casas da Cidade do Rio de Janeiro, e do esgoto das aguas fluviaes”.
01/10/1856
Lei n
o
884, ratificando as disposições da Lei n
o
719 e urgenciando a contratação dos
serviços de construção de rede de esgoto.
25/04/1857
Assinatura do contrato de concessão dos serviços com João Frederico Russell e
Joaquim Pereira Vianna de Lima Júnior.
29/04/1857
Decreto nº 1929,“approva o contracto para o serviço de limpeza das casas da Cidade do
Rio de Janeiro, e do esgoto das aguas fluviaes, em virtude do que dispõe o parágrafo
terceiro do art. 11 do Decreto n
o
719”.
20/02/1862
Criação, na Inglaterra, da empresa “The Rio de Janeiro City Improvements Company
Limited”, para prestação de serviços de esgoto.
05/1863
Transferência do Contrato de concessão de 1857 de João Frederico Russell para a City
(período de exclusividade por 90 anos).
108
Quadro 6. Eventos e marcos jurídico-intitucionais dos serviços de esgoto (Continuação).
Data Intervenção
31/03/1910
Decreto 7.924, cria a Repartição de Águas, Esgotos e Obras Públicas, incorporando
as atribuições da Repartição Fiscal de Esgotos do Rio de Janeiro.
03/11/1911
Decreto 9.079, tran
sforma a Repartição de Águas, Esgotos e Obras Públicas em
Repartição de Águas e Obras Públicas.
28/04/1915 Decreto nº 11.565, cria a Inspetoria de Esgotos da Capital Federal.
1924
Lei nº 4.793/24, cria a Inspetoria de Águas e Esgotos (IAE) em substituição à Inspetoria
de Esgotos da Capital Federal.
13/01/1937
Lei 378 transferiu os serviços do IAE para o Serviço de Águas e Esgotos do Distrito
Federal (SAEDF).
01/10/1940
Decreto n
o
2.646/40 transfere os serviços de drenagem do Governo Federal para a
Prefeitura do Distrito Federal.
12/04/1945
Decreto n
o
7.459/45 transfere os serviços de água e esgoto sanitário da SFAE para a
Prefeitura do Distrito Federal.
01/09/1945
Decreto n
o
8.211/45 define a responsabilidade pela execução de tais serviços para o
Departamento de Águas e Esgotos (DAE), da Secretaria Geral de Viação e Obras, da
Prefeitura do Distrito Federal.
25/04/1947
Decreto n
o
22.998 transfere para a Prefeitura do Distrito Federal todos os direitos,
compromissos e obrigações da União para com a City
11/10/1956
Lei Municipal n
o
872 desdobra o DAE em Departamento de Águas (DAA) e
Departamento de Esgoto Sanitário (DES).
28/11/1957 Lei n
o
899, de criação da SURSAN, incorporando o DES.
31/03/1958 Criação da Comissão de Planejamento do Sistema de Esgoto Sanitário (COPES).
11/10/1961 Decreto n
o
613, incorporando o DAA à SURSAN
24/12/1962
Lei estadual n
o
263, de criação da
Companhia Estadual de Águas da Guanabara
(CEDAG)
22/01/1965 Decreto “N” n
o
351 alterou denominação do DES para Departamento de Saneamento.
19/10/1965
Decreto estadual “N” n
o
478, efetivação da CEDAG, extinguindo o DAA da SURSAN
29/12/1972 Decreto “E” n
o
5.793 de criação da Empresa de Saneamento da Guanabara (ESAG)
24/03/1975 Decreto Lei n
o
99, criação da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE)
29/07/1998
Decreto n
o
16.887/98 institui o Estatuto da Fundação Instituto das Águas do Município
do Rio de Janeiro (Rio-Águas).
O
Quadro 7
, nas próximas páginas, apresenta a evolução física dos sistemas de esgoto
na Cidade do Rio de Janeiro até o período da DAE, com as datas das primeiras implantações
nos respectivos sítios. A partir da SURSAN os sistemas se ampliam em diversas direções,
ultrapassando posteriormente os limites do município.
109
Quadro 7. Implantação dos primeiros sistemas de esgotos da Cidade do Rio de Janeiro.
Data Intervenção
1862
Início da construção da Estação Elevatória e de Tratamento da Glória, através do aterro de sua
futura área.
01/02/1864
Início de operação do 3
o
distrito da Glória, esgotando 1.200 das 14.600 casas da bacia
contribuinte.
1865 Funcionamento do 2
o
distrito da Gamboa.
1866 Funcionamento do 1
o
distrito do Arsenal.
1868
24.100 m de rede coletora, 59 km de ramais prediais, com 7.800 ligações prediais para cerca de
200.000 hab.
1870 Cerca de 15.155 prédios ligados à rede de esgoto.
1873 Redes coletoras no Catumbi (1
o
distrito).
1874 Redes coletoras em parte de Laranjeiras.
1877 Total de 9.000 m de galerias de drenagem pluvial construída pela City.
28/09/1878
Funcionamento do 4º distrito de São Cristóvão, formado por São Cristóvão, Engenho Velho, Rio
Comprido, Alegria, parte da Tijuca e de Benfica.
24/10/1878
Funcionamento do distrito de Botafogo, formado pelas praias Vermelha e de Botafogo até os
limites do Túnel Alaor Prata e Largo dos Leões.
31/12/1879 23.104 residências ligadas à rede de esgotos.
jan. de 1883 Redes coletoras na Quinta da Boa Vista, Caju e do Trapicheiro (extensão do 4º distrito).
nov. de 1885
Redes coletoras em Vila Isabel, Andaraí Grande, São Francisco Xavier e Riachuelo (extensão do
4º distrito).
1886
81.713 m de galerias de drenagem pluvial construídas por Hancox, contratado pelo Governo
Imperial.
1890
Funcionamento do distrito, contemplando parte restante do Engenho Novo, Méier, Todos os
Santos e Engenho de Dentro (extensão do 4º distrito).
1894 Funcionamento do 7º distrito do Jardim, contemplando Jardim Botânico e Gávea.
1906
Rede coletora em Copacabana, Leme e Ipanema, até rua Farme de Amoedo (extensão do
distrito).
1910 Rede e estação de tratamento na Ilha de Paquetá.
Fev. de 1911
Ligação dos despejos industriais à rede da City mediante fixação de taxas.
1912 Rede coletora do Cais do Porto.
1918 Existiam as ETEs: Arsenal, Gamboa, Glória, São Cristóvão, Botafogo e Alegria.
1928 Total de 529.438 m de rede coletora de esgoto sanitário construído pela City.
1934-1938
IAE implanta rede de esgoto sanitário fora dos limites contratuais da City, nos bairros de Leblon,
Lagoa (faixa da orla), Urca e Ipanema.
110
Quadro 7. Implantação dos primeiros sistemas de esgotos da Cidade do Rio de Janeiro
(Continuação).
Data Intervenção
1937
Esgotamento pela City das áreas que poderiam ser esgotadas, por gravidade, para a rede
existente, denominadas áreas encravadas. São elas: parte do Grajaú, Morro da Viúva, Vila
Floresta, área disponível do desmonte do morro do Castelo.
1940
O SAEDF implanta rede de esgoto sanitário e respectiva estação de tratamento para os bairros da
Penha e Olaria.
1940 O SAEDF inicia as obras da ETE Penha (1
a
etapa), a primeira de tecnologia “moderna”.
1940-1944 Construção da rede coletora de esgoto sanitário de áreas marginais da Lagoa Rodrigo de Freitas.
24/04/1947
Total de 695.638 m de rede coletora de esgoto sanitário construídos pela City e 5870 poços de
visita.
1947 Construção de 30.700 m de coletores de esgoto na Av. Brasil pela DAE.
1949 Construção da 2
a
etapa da ETE da Penha.
1949 Construção da rede coletora de esgoto sanitário em Maria da Graça pela DAE.
1950-1952
Construção da rede coletora de esgoto sanitário em Guaratiba, Olaria, Ramos, Maria da Graça e
Bonsucesso, pela DAE.
1956 Construção da rede coletora de esgoto da Ilha do Governador pela DAE
Bacias de drenagem sanitária
A Cidade do Rio de Janeiro pertence à sub-bacia Oeste de esgotamento sanitário do
estado, constituída, de acordo com a topografia, por três sistemas: Guanabara, onde os
efluentes são encaminhados para a Baía de Guanabara e Oceano Atlântico; Jacarepaguá, em
que o esgotamento dos efluentes vai para o Oceano Atlântico; e Sepetiba, que lança os
esgotos para a Baía de Sepetiba (PDES-RMRJ, 1994).
O
Quadro 8
, apresentado na página seguinte, relaciona, de acordo com o plano diretor,
as bacias de esgotamento ou bairros e o tipo de sistema implantado.
Vale ressaltar que após a elaboração do último plano diretor foram executadas diversas
obras de ampliação do sistema de esgotamento sanitário, sendo de maior vulto as
contempladas pelo Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG), pelo
Esgotamento Sanitário da Baixada de Jacarepaguá, além da implantação pela PCRJ do
sistema
separador
na região do Recreio dos Bandeirantes e em loteamentos em Santa Cruz e
em Campo Grande. Nos bairros da Barra da Tijuca e Jacarepaguá, a CEDAE está executando
as obras do sistema
separador
de esgotamento sanitário, com lançamento final em emissário
submarino, precedido da
Estação de Tratamento da Barra.
Na região do Recreio dos
Bandeirantes, Vargem Grande e Vargem Pequena, a Secretaria Municipal de Obras, através
111
da Fundação Rio-Águas, está implantando o sistema
separador
, contemplando coleta,
transporte e tratamento secundário.
Quadro 8. Bacias de esgotamento sanitário da Cidade do Rio de Janeiro.
Sistema
Bacia de
Esgotamento
Sanitário
Sub-bacias de Esgotamento
Sanitário
Sistema implantado
Zona Norte
Bangu, Acari, Rio das Pedras,
Vigário Geral, Irajá, Penha,
Timbó Faria, Fundão, Alegria.
Zona Centro-Norte
São Cristóvão, Catumbi,
Mangue, Centro.
Zona Sul
Glória, Botafogo, Copacabana,
Lagoa, São Conrado.
Guanabara
Ilhas
Ilha do Governador e Ilha de
Paquetá.
Maior parte da área
dotada de rede no
sistema
separador.
Jacarepaguá
Bairros: Jacarepaguá, Anil, Gardênia Azul, Curicica,
Freguesia, Pechincha, Taquara, Tanque, Praça Seca,
Vila Valqueire, Cidade de Deus, Joá, Itanhangá, Barra
da Tijuca, Camorim, Vargem Pequena, Vargem Grande,
Recreio dos Bandeirantes, Grumari.
Em alguns locais há
redes coletoras no
sistema
separador
, mas
funcionando
isoladamente e com
destino final
independente.
Sepetiba
Bairros: Paciência, Santa Cruz, Sepetiba, Guaratiba,
Barra de Guaratiba, Pedra de Guaratiba, Santíssimo,
Campo Grande, Senador Vasconcelos, Inhoaíba,
Cosmos.
Quase totalidade da
região não conta com
rede no sistema
separador.
5.3.5. A Questão da Ocupação Urbana
A complexa fenomenologia da ocupação urbana sofre efeitos diretos da dinâmica dos
sistemas e serviços de saneamento. Se por um lado, os serviços de esgoto foram
historicamente defasados em relação à ocupação e expansão das áreas habitadas; por outro, a
implantação de novos serviços de infra-estrutura, principalmente em áreas nobres, mais
rentáveis, propiciou a ampliação e intensificação da ocupação.
Desde seus primórdios, a cidade sofreu pela inobservância de normas elementares de
urbanismo que garantissem um crescimento ordenado. A urbe ia se expandindo e levava
consigo o problema da falta de saneamento. A situação se agravou com a chegada da Família
Real, em 1808. O impacto foi sentido imediatamente com o incremento de 15.000 pessoas,
em uma cidade que não possuía mais de 50.000 habitantes (Abreu, 1992; Chalhoub, 1996).
112
A inesperada chegada dos novos moradores gerou sérios problemas habitacionais, pois
em menos de duas décadas, a cidade sua população duplicar, ultrapassando os 100.000
habitantes em 1821.
Com o aumento do fluxo de imigrantes portugueses, o crescimento de alforrias e a
posterior abolição da escravatura com grande migração de ex-escravos das decadentes
fazendas de café do Vale do Paraíba para a cidade, no início do século XX, a população do
Rio de Janeiro chegava a quase 1 milhão de habitantes.
Nos aspectos arquitetônicos e urbanísticos, desenvolveram-se no país cidades com
arquitetura barroca, porém com traçados medievais. Grandes aglomerações na área central,
potencializadas pela nascente especulação imobiliária próxima à zona portuária, geraram a
partir das décadas de 1850 e 1860 (Chalhoub, 1996), o aparecimento de quarteirões
delimitados por ruas estreitas e sem curvas, sem hierarquização de vias e zoneamento,
agregando cortiços: pequenas habitações úmidas, com pouca circulação de ar e iluminação,
sem unidades sanitárias individuais, mas coletivas, carentes de hábitos e padrões higiênicos.
Casarões antigos eram divididos em inúmeros cubículos alugados a famílias inteiras, de forma
improvisada, em precárias condições sanitárias, caracterizando ambientes completamente
insalubres. Essas moradias abrigavam a maior parcela da população pobre da cidade e
possuíam características tão diversas quanto suas denominações: cortiços, sobrados,
estalagens, casa de cômodos, palafitas, mocambos, zungas, freges, barracos, etc. Desde esta
época, a política pública privilegiava a integridade e o conforto das classes abastadas,
deixando a grande maioria da população vulnerável a péssimas condições sanitária e
ambiental, com trágicas conseqüências à saúde pública.
As
Figuras 32a
e
32b
, a seguir, mostram aspectos dos cortiços que se multiplicavam
pelo centro da cidade.
(a)
(b)
Figura 32. Cortiços nos fundos dos prédios nº 12 a 44 da rua do Senado
(Augusto Malta, 27/03/1906. AGCRJ).
113
Em 1930, com o modelo econômico-social urbano industrial adotado, veio o processo
de metropolização, a instalação dos primeiros parques industriais e os surtos migratórios a
eles associados. Este aumento populacional era, sob o ponto de vista da economia capitalista,
necessário para a disponibilização de mão-de-obra barata com excedente de desempregados, a
fim de compor mão-de-obra reserva, sem a retaguarda dos serviços de infra-estrutura.
A explosão demográfica na cidade se deu, na década de 1950, com o ciclo de
industrialização do país; e na década de 1970, com a consolidação das indústrias de base, com
grandes projetos de infra-estrutura urbana, período conhecido como “Milagre Brasileiro”.
O Brasil, até então predominantemente rural, reverteu esse quadro a partir de meados
da década de 1960 (Rezende & Heller, 2002). Segundo censo do FIBGE (2000), atualmente a
concentração da população urbana corresponde a 81,1%.
No início dos anos 70, o Brasil contrapunha aos impactos ambientais decorrentes do
progresso desenfreado e da exploração irracional dos recursos naturais, a retórica abordada
pelos países do primeiro mundo que sugeria uma “face humana do progresso” (Saneamento n.
38, 1970). Entretanto, o que vigorava na prática era a visão utilitarista de “ordenação da
natureza” a favor da viabilização do progresso, em que obras descomedidas de canalização,
diques e pôlders possibilitavam a ocupação urbana e o prodigioso crescimento econômico.
A instalação de indústrias na orla da Baía de Guanabara estava na ordem do dia.
Enquanto isso, o problema da poluição era na prática postergado para um futuro indefinido:
“(...) cujo índice de poluição pelos despejos industriais, se constitui num outro problema
que doravante (grifo nosso), o DNOS vai enfrentar” (Saneamento n. 38, 1970).
A
s
Tabelas 2
e
3
, apresentadas na página seguinte, demonstram o crescimento
populacional da cidade do Rio de Janeiro, do século XVI até 1950, no primeiro; e o
crescimento com as respectivas parcelas referentes aos setores sub-normais, de 1950 a 2000,
no segundo.
Segundo o FIBGE (2000), o processo de favelização na cidade persiste. A população
da Cidade do Rio de Janeiro corresponde a 5.851.914 habitantes, sendo 1.092.783 habitantes
de setores subnormais
17
. No último período intercensitário (1991-2000), a taxa média de
crescimento demográfico foi de 0,73% ao ano, mas a taxa dos setores subnormais, 2,4%. Na
década anterior foi de 1,91% ao ano e 0,38% ao ano para o resto da cidade.
17
Entende-se como assentamento sub-normal o assentamento habitacional irregular (mais de 50 unidades
habitacionais) - favela, mocambo, palafita e assemelhados - localizado em terrenos de propriedade alheia,
pública ou particular, ocupado de forma desordenada e densa, carente de serviços públicos essenciais, inclusive
em área de risco ou legalmente protegida (IBGE, 2000).
114
Tabela 2. Crescimento populacional da Cidade do Rio de Janeiro, 1585-1950.
Ano População Ano População Ano População
1585 3.850 1821 112.695 1872 274.972
1710 12.000 1830 124.978 1890 522.651
1750 25.000 1838 137.078 1906 811.443
1760 30.000 1849 266.466 1920 1.157.873
1799 43.376 1856 151.665 1940 1.764.141
1808 60.000 1870 235.381 1950 2.377.451
Fonte: Silva, 2002.
Obs.: 1. Segundo o autor, os dados de 1849 e 1856 são imprecisos, por excesso e por deficiência,
respectivamente. Censo realizado em 1849 indicava uma população de 205.906 habitantes (Abreu,
1992);
2. Devido às diversas fontes e a época em que foram determinados, com critérios estatísticos
precários, devem ser considerados como valores aproximados.
Tabela 3. Crescimento da população total e subnormal da Cidade do RJ, 1950-2000.
Ano População total
População do setor
subnormal
% da pop.
subnormal
sobre a total
1950
1960
1970
1980
1990
2000
2.377.451
3.281.908
4.285.738
5.090.790
5.480.778
5.851.914
169.303
335.063
554.277
731.490
882.483
1.092783
7,1
10,2
12,9
14,4
16,1
18,7
Fonte: FIBGE, Censo Demográfico, 1960/1970/1980/1990/2000
IPLANRIO: 1991, 2000.
O vetor de crescimento da cidade segue o sentido de Jacarepaguá e Barra da Tijuca.
As taxas de crescimento nessas regiões foram altas para o setor formal: 1,7% e 6,0% ao ano,
respectivamente e ainda mais aceleradas os para setores subnormais, chegando a valores
alarmantes de 7,5% e quase 10%, respectivamente. As taxas de crescimento mais elevadas, de
até 12,8% ao ano, ocorreram nos setores subnormais das zonas periféricas da Zona Oeste,
como Guaratiba, escassamente povoadas até a década de 80. É ali que se concentram hoje os
115
maiores bolsões de pobreza da cidade, conforme apontam os indicadores de família, do Índice
de Desenvolvimento Urbano (IDH
18
) (Prefeitura, 2002).
O processo de urbanização pautado neste modelo de desenvolvimento econômico
induziu nas cidades um crescimento populacional acelerado e desordenado, em nível temporal
e espacial, gerando cortiços e favelização, reflexo de políticas de segregação e desigualdade,
onde a resultante da falta de disponibilidade para todos é o encrudecimento da miséria, um
dos fatores mais degradantes às cidades e seus serviços de infra-estrutura urbana.
A
Figura 33
, apresentada na página seguinte, indica a distribuição das áreas
favelizadas na Cidade do Rio de Janeiro.
Na época dos cortiços, para a classe dominante, era necessário “sanear” a cidade com
o controle das habitações insalubres, principalmente as da classe operária, que eram
consideradas focos de doenças “perigosas”, inclusive socialmente (Benchimol, 1990;
Chalhoub, 1996; Zaluar, 1999). Destaca-se a administração do prefeito Barata Ribeiro que,
em 1883, empreendeu verdadeira guerra aos cortiços, dentre os quais, o célebre “Cabeça de
Porco”, localizado nas faldas do morro da Providência e que abrigava cerca de 2.000 pessoas.
Após sua violenta remoção, não restou outra opção aos moradores senão ocupar o morro
contíguo, aproveitando-se, inclusive, dos restos da demolição para a construção de seus
barracos.
18
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) foi criado originalmente para medir o nível de desenvolvimento
humano dos países e posteriormente passou a ser utilizado para os municípios (IDH-M), com adaptações para as
condições de núcleos sociais menores. O índice é resultado da combinação de indicadores de condições de saúde
e sobrevivência, acesso ao conhecimento e acesso a recursos monetários, variando de 0 (nenhum
desenvolvimento humano) a 1 (desenvolvimento humano total).
Figura 33. Distribuição das áreas favelizadas na Cidade do Rio de Janeiro em 1999 (Anuário Estatístico da Cidade do RJ - 1998).
117
Segundo censo realizado em 1890 (PCRJ, 2002), moravam cerca de 100.000
habitantes em cortiços, o que correspondia a aproximadamente 1/4 da população carioca. As
favelas tiveram origem na ocupação dos morros de Santo Antônio e da Providência, sendo
aquele provavelmente o primeiro a abrigar barracos no Rio de Janeiro (Marins. In: Sevcenko,
1998). Na
Figura 34
, abaixo, verificam-se os barracos localizados no morro de Santo
Antônio.
Figura 34. Favela do morro de Santo Antônio
(Fotos: Augusto Malta, s.d.).
Posteriormente, as autoridades conceberam um plano visando promover,
simultaneamente, a modernização do porto e o saneamento na cidade, bem como sua
urbanização. Para dirigir estas ações foram nomeados, pelo presidente Rodrigues Alves, no
período de 1902 a 1906: o engenheiro urbanista Pereira Passos, prefeito; o engenheiro Lauro
Muller, para os portos; e o médico sanitarista Oswaldo Cruz, dotados de plenos poderes para
realizar a remodelação. Pereira Passos havia participado em 1875, do primeiro relatório da
Comissão de Melhoramentos da Cidade do Rio de Janeiro,
(Reis, 1977 apud Abreu, 1997),
primeiro plano conjunto da cidade, que definia melhoramentos na área central, tais como:
alargamento e retificação de várias ruas e abertura de novas praças e ruas com o fim de
melhorar suas condições higiênicas e facilitar a circulação entre seus diversos pontos
dando, ao mesmo tempo, mais beleza e harmonia às suas construções (devendo as ruas e
praças ficar) dispostas de modo que a ventilação das casas e o escoamento das águas
pluviais sejam feitos com facilidade.
O discurso da modernidade que dava suporte à
Reforma Passos
, calcado no
racionalismo e na destruição da velha ordem, acabou por permitir uma concepção apolítica do
poder, como se este pudesse ser reduzido à administração cnica das coisas (Gomes, 2001).
A fundamentação positivista desta concepção justificou as autoritárias intervenções e
perseguição às classes populares, sumariamente despejadas sem nenhuma alternativa de
moradia, indo ocupar as encostas dos morros, velhos prédios na área central ou transferindo-
se para subúrbios longínquos. A tentativa descuidada de eliminar algumas contradições gerou
118
outras ainda mais graves. A população marginalizada que procura se fixar nas grandes cidades
à procura de novas oportunidades, tende a ser expelida para periferia ou a invadir áreas de
preservação fixando-se em áreas de baixo valor imobiliário, carentes de infra-estrutura
urbana, ou em áreas de risco
19
, à revelia das normas de ocupação urbanísticas vigentes,
desviando e captando recursos clandestinamente e remodelando os usos e espaços segundo
suas demandas específicas. Este quadro mostra a dificuldade de se manter a qualidade
ambiental dos espaços públicos e moradias, tanto nas comunidades carentes quanto nas áreas
nobres.
A distribuição dos investimentos em infra-estrutura na cidade é produto de uma
complicada disputa entre os vários agentes produtores e consumidores. O assentamento
subnormal, setor tradicionalmente associado às favelas foi, ao longo da história do Rio de
Janeiro, considerado um componente indesejável na estrutura urbana. As políticas de governo
eram predominantemente voltadas para sua erradicação, nas áreas próximas à cidade
"formal", principalmente aquelas de alto valor imobiliário.
Esta visão, presente no final do século XIX, perpetuou-se nas décadas seguintes,
inclusive no plano urbanístico, como o
Plano Agache
, do final da década de 20. O
Código de
Obras
da cidade de 1937 entendia a favela como habitação ilegal, que por isso mesmo, não
devia constar do mapa da cidade (Burgos. In: Zaluar, 1999). Nos anos 40, a favela começa a
se mostrar um importante núcleo de oposição política e o Estado passa a repensar sua
proposta em relação a ela. Surgiram alguns projetos para o melhoramento das moradias e
condições higiênicas dos morros, prevenindo-se assim a ocorrência de epidemias nos bairros
da cidade "formal". Ainda nessa década, surgem os parques proletários, que deveriam ser
ocupações provisórias de reeducação social e higiênica, com manutenção das relações de
vizinhanças. Entretanto, ocorre a favelização destes parques, pela precariedade das
instalações, concebidas como provisórias, e a posterior remoção, quando da valorização
imobiliária, de áreas como: Gávea, Leblon, com a transferência das famílias para conjuntos
habitacionais (FAPERJ, 2002).
As
Figuras 35a e 35b,
apresentadas na página seguinte, ilustram os aspectos
construtivos dos parques proletários, caracterizando-os enquanto habitações provisórias.
19
Segundo Regulamento Operacional Habitat BID, áreas de risco são aquelas que uma ou mais das seguintes
condições: terrenos alagadiços ou sujeitos a inundações; aterrados com material nocivo à saúde pública;
insalubres; com declividades acentuadas que exijam obras especiais para implantação segura de edificações; sob
a influência das linhas de alta tensão, rodovias, ferrovias e dutos; sujeitas a deslizamentos, sujeitos a índices de
poluição que impeçam a habitabilidade e salubridade ou; que apresentem conformação geológica e risco natural
que desaconselhe a ocupação humana.
119
(a)
(b)
Figura 35. Aspectos dos parques proletários
(FAPERJ, 2002).
O deslocamento das áreas industriais da cidade para os subúrbios descentralizou as
fontes de emprego, como também a ocupação do espaço urbano. A falta de infra-estrutura , de
serviços básicos urbanos e de condições para pagar o transporte fazia com que grande parcela
do proletariado não conseguisse se fixar nos subúrbios, espalhando-se pelos bairros próximos
ao Centro (Abreu, 1988).
Ainda em 1946, a prefeitura e a Arquidiocese do Rio de Janeiro negociaram a criação
da Fundação Leão XIII, dedicada à assistência material e moral dos habitantes dos morros e
favelas da cidade - dentro de um contexto pós-guerra e de disputa ideológica da guerra-fria.
De 1947 e 1954, a Leão XIII estendeu sua atuação a 34 favelas, implantando em algumas
delas serviços básicos como água, esgoto, luz e redes viárias, e mantendo centros sociais
(Burgos. In: Zaluar, 1999). Em 1956, o governo municipal cria o Serviço de Recuperação de
Favelas e Habitações Anti-Higiênicas (SERFHA), a fim de dar apoio a Fundação Leão XIII,
com a Cruzada São Sebastião (órgão também ligado a Igreja, criado em 1955). A proposta era
o próprio morador dar solução para seus problemas, com apoio e orientação destes órgãos.
Definiram-se lideranças locais que pudessem ser treinadas e organizaram-se as associações de
moradores e trabalhos de educação comunitária (Valla, 1986 apud Cohen, 2000).
Nas
Figuras 36a e 36b
, apresentadas na próxima página, verifica-se a alta densidade
populacional da favela da Rocinha, já nas décadas de 50 e 60.
120
(a)
(b)
Figura 36. Favela da Rocinha nas décadas de 50 e 60
(a) Varal de lembranças. (b) Correio da Manhã, Arquivo Nacional.
Viva Rio: www.favelatemmemoria.com.br.
Nos anos 60 e 70, a política de remoção foi retomada, com a criação da Companhia de
Habitação Popular (COHAB) e dos conjuntos habitacionais, que misturavam pessoas egressas
de diferentes localidades, substituindo a rede de vizinhança procedente das favelas e até
mesmo dos parques proletários, pela rede da violência.
A
Figura 37
, a seguir, apresenta o conjunto habitacional Vila Kennedy, que junto com
o Aliança e Esperança e o Cidade de Deus foram construídos entre 1962 e 1965, com
financiamento norte-americano (USAID).
Figura 37. Conjunto habitacional Vila Kennedy
(AGCRJ/P428).
No período de 1968-1975, foram removidas cerca de 100 mil pessoas, tendo sido
destruídas cerca de 60 favelas (Burgos, In: Zaluar, 1999). Estas operações, superficiais frente
à complexidade da questão, não conseguiram os efeitos previstos, retroalimentando o
crescimento das favelas e trazendo grandes desgastes políticos. As limitações e resistências
ao “remocionismo” foram compreendidas pelo poder público em processo de democratização,
que, ao voltar à questão das favelas em 1979, através do governo federal, optou por um
programa de urbanização, o Promorar. A atuação pioneira se deu no Rio de Janeiro, com o
121
Projeto Rio, que alcançou seis favelas na área do Complexo da Maré. Nas décadas seguintes,
o eixo da problematização seria a integração das favelas à cidade (Burgos, In: Zaluar, 1999).
Em 1980, a Igreja Católica rearticula-se com a Federação das Favelas do Rio de
Janeiro (FAFERJ) para elaborar planos e solucionar problemas dos moradores (Cohen, s.d.).
É nesta contextualização que a cidade passou pela implantação de programas de
saneamento para áreas mais carentes. Em 1980, a CEDAE começa a viabilizar contratos de
saneamento, basicamente obras de coleta de esgoto e distribuição de águas. Em julho de 1983,
inicia-se o Programa de Favelas da CEDAE (PROFACE), que englobava sistemas de
abastecimento de água e esgotamento sanitário, além de atuações paralelas de coleta de lixo,
iluminação pública e regularização de propriedades. Antes deste programa as ações
limitavam-se praticamente a instalar bicas d’água nestas comunidades. Segundo levantamento
realizado pela prefeitura no início dos anos 80, apenas 1% das 364 favelas cadastradas eram
servidas por rede oficial de esgoto sanitário completo; 6% dispunham parcialmente do
serviço; 6% possuíam rede de abastecimento de água total e 13%, rede de água parcial de
água com caráter oficial; e em 92% das localidades, a única forma de esgotamento pluvial era
a drenagem natural pelo terreno. A coleta de lixo foi considerada suficiente em cerca de
17% das áreas faveladas (Burgos. In: Zaluar, 1999).
O PROSANEAR, lançado em 1985, tinha como objetivo precípuo estender o escopo
dos serviços de saneamento (abastecimento de água, coleta e/ou tratamento de esgotos e
investimentos complementares em microdrenagem, afastamento de resíduos sólidos e
instalação de ligação intradomiciliares), às populações urbanas de baixa renda. Neste
programa procurou-se a implantação de componentes sócio-comunitários, como a
mobilização, articulação e educação sanitária e ambiental, além da tecnologia de baixo custo
através da implantação do “não-convencional” sistema condominial (subitem 5.3.3.).
Cynamon (1986) adverte que as soluções para comunidades carentes devem ser simples, de
baixo custo, conquanto que atinjam aos objetivos propostos.
Em 1992, o Plano Diretor da Cidade consolida a idéia de um programa global de
integração das favelas à cidade, que viria a nortear posteriormente a política habitacional
proposta pelo Grupo Executivo de Assentamentos Populares (GEAP), com sete programas,
dentre os quais, o Favela-Bairro (500 a 2.500 domicílios) e seu similar, o Bairrinho (100 a 500
núcleos familiares), ora em execução pela PCRJ. Criados a partir de 1994, como parte das
ações da Secretaria Municipal de Habitação, que assume a responsabilidade blica de
estender a áreas, padrões de urbanização que propiciem sua integração à dinâmica funcional e
vital da cidade “formal”.
122
As principais ações para integrar as áreas favelizadas ao tecido urbano são:
complementar ou construir a estrutura urbana principal; oferecer condições ambientais para a
leitura das favelas como um bairro da cidade; introduzir os valores urbanísticos da cidade
formal como signos de sua identificação como bairro: ruas, praças, mobiliário e serviços
públicos; consolidar a inserção das favelas no processo de planejamento da cidade;
implementar ações de caráter social, incorporando outras dimensões ao programa, como:
creches, programas de geração de renda e capacitação profissional, atividades esportivas,
culturais, de lazer e promover a regularização fundiária e urbanística. A metodologia adotada
para caracterização das áreas de atuação foi a elaboração de matrizes de carências.
De acordo com a legislação urbana prescrita nos planos diretores, nas áreas localizadas
em cotas superiores a (+100m), bem como nas margens de rios, de lagoas e da baía, não são
permitidas ocupações, não havendo indicações urbanísticas. Portanto, as ocupações
clandestinas nestas áreas se dão de forma desordenada, sem nenhuma orientação do poder
público. Em tese, 27% do território do município está sob proteção e ocorre que nem todas as
Unidades de Conservação Ambiental (UCA)
20
se acham implantadas (realidade que se pode
generalizar tanto para o Estado quanto para o resto do país). Muitas dessas áreas, embora
tenham o estatuto legal da proteção, ainda não tem plano de manejo nem contam com
medidas mínimas que garantam sua integridade contra caça, extração ilegal de madeira e
plantas, incêndios e invasões (Prefeitura, 2001, n.9).
A ocupação de áreas inadequadas é, muitas vezes, quer sob a ótica ambiental, quer sob
o ponto de vista da prestação dos serviços de saneamento, um dificultador à universalização
do atendimento e à proteção dos espaços naturais. Esse cenário indica a estreita relação
existente entre a gestão do saneamento ambiental e a política de uso e ocupação do solo
urbano, cujo principal instrumento é a legislação urbanística municipal.
No intenso processo de metropolização sofrido no país, espaços públicos e privados
passaram a se fundir a contragosto das intenções normativas, não apenas nas ruas e na
configuração heterogênea dos bairros, mas nos avanços sobre os mananciais - fontes para
pias, chuveiros e vasos sanitários das cidades. Sem a compreensão de sua complexidade, é
inviabilizado qualquer projeto de controle das formas de moradia (incluindo suas instalações
sanitárias) nas grandes capitais e suas vizinhanças. A difícil previsibilidade da estrutura de
20
O município do Rio de Janeiro possui cerca de 100 áreas protegidas. São UCA, remanescentes de vegetação
que, por seus atributos ecológicos, apresentam um estatuto especial de uso e ocupação do solo e manejo dos seus
ecossistemas naturais. As áreas protegidas são classificadas segundo categorias que correspondem aos distintos
objetivos da proteção: parques, reservas biológicas, estações ecológicas e Áreas de Proteção Ambiental (APA).
Além dessas, o município ainda conta com as Áreas de Proteção Ambiental e Recuperação Urbana (APARU) e
as Áreas de Proteção ao Ambiente Cultural (APAC), criadas por orientação do Plano Diretor da Cidade - que
define a destinação de uso das várias partes da cidade e que orienta os investimentos públicos.
123
crescimento da cidade do Rio de Janeiro compromete os projetos e sistemas de saneamento já
implantados. Esta dificuldade vem sendo sentida algum tempo. Segundo a
Revista de
Engenharia do Estado da Guanabara
(1965):
(...) sérios problemas surgiram, com relação aos métodos a serem adotados para o projeto
dos sistemas de esgotos sanitários. Um dos mais graves residiu na dificuldade de previsão
correta do crescimento populacional do antigo Distrito Federal, crescimento esse de grande
intensidade, desordenado, e, até certo ponto, realmente imprevisível (...).
Nas áreas de ocupação irregular, as redes coletoras são implantadas pela CEDAE, pela
comunidade formalmente organizada para tal (“mutirão”) ou ainda, diretamente pelos
próprios moradores, agrupando diversas características. Assim, principalmente nas favelas,
não é garantido o atendimento à totalidade da população, pois inúmeras ligações domiciliares
irregulares são feitas à margem do sistema de drenagem pluvial.
Os assentamentos subnormais, devido às condições físicas específicas verificadas,
tanto nas áreas elevadas como em regiões inundáveis, tornam-se complexos e oneram em
muito os custos de implantação das redes de esgotos sanitários, estendendo-se também para a
operação e a manutenção dos sistemas de saneamento já implantados. Destacam-se:
Geomorfológicas: altas declividades com velocidade de escoamento excessiva nas
áreas altas. Nas áreas planas, profundidade excessiva da rede coletora, havendo em
alguns casos, necessidade de elevatórias;
Geológicas: afloramento rochoso e transporte de solo (instabilidade do recobrimento
das tubulações) nas áreas altas e pouca capacidade de suporte, aterros irregulares e
influência do lençol freático nas áreas baixas;
Altimetria: transporte difícil e oneroso de materiais, artefatos e equipamentos;
Densidade populacional: excesso de habitações com elevadas taxas de ocupação
domiciliar resultando em altas vazões e muitas interferências;
Ocupação desordenada: loteamentos de geometria irregular, ruas estreitas, travessias e
servidões com alta tortuosidade, resultando em dificuldades de acesso às moradias e
adjacências, inclusive pelas tubulações e órgãos acessórios dos sistemas de esgotos;
Limites de propriedade: ausência de regulamentação quanto à propriedade do solo,
gerando indefinições entre os limites das áreas privadas e os das disponíveis aos
serviços públicos, ocasionando sua redução;
Instabilidade: delimitações espaciais em mutação acelerada, comprometendo a vida
útil das estruturas implantadas;
124
Padrões habitacionais: precárias condições de moradia, com instalações hidráulico-
sanitárias intradomiciliares e peridomiciliares ausentes ou deficitárias.
No caso de assentamentos irregulares, em terrenos, alagadiços ou sujeitos a
inundações, sem infra-estrutura e sem possibilidade de escoamento dos resíduos, tais como o
entorno da Baía de Guanabara e margens dos rios e lagoas, as condições sanitárias são ainda
mais críticas, pois os vetores e agentes patogênicos mantém contato direto e permanente com
os moradores. As
Figuras 38,
39a e 39b
, apresentadas a seguir, mostram um pouco das
condições de vida dos moradores do Complexo da Maré e de Vigário Geral, às margens da
Baía de Guanabara.
Figura 38. Comunidade Salsa e Merengue,
Complexo da Maré
(Foto: Sandra Delgado, out. 2002).
(a) Crianças em Vigário Geral
(b) Habitações sobre águas poluidas e estagnadas.
Figura 39. Insalubridade em Vigário Geral
(Fotos: Dias, A.P., 2001).
Estes aspectos técnicos, associados aos hábitos e costumes condicionados pela baixa
renda, merecem aprofundamento no sentido de possibilitar novas proposições quanto à coleta
125
dos esgotos sanitários e pluviais provenientes destas áreas a fim de se evitarem ligações
irregulares de esgoto sanitário pela falta de rede coletora ou da interligação com o resto do
sistema da cidade, subsistema de coleta ou tratamento (obra de retaguarda). É imprescindível
que sejam realizados estudos no sentido de se avaliarem os resultados e as condições
operacionais dos sistemas de esgotos implantados pelos programas descritos anteriormente,
avaliando também as atuais condições dos sistemas convencional e condominial implantados,
caracterizando as ligações clandestinas, as
soluções atípicas
implantadas, como as
estruturas
de captação de tempo seco
,
abordadas no subitem # 6.3.2.; analisando a viabilidade das
alternativas ao sistema separador e mensurando seus impactos, além de avaliar até que ponto
as intervenções de saneamento possibilitariam o controle da expansão nestas áreas. Somente
desta forma, poder-se-ão estabelecer bases seguras para a implantação de novos programas de
saneamento nas comunidades carentes.
A justificativa de proteção epidemiológica, tanto em comunidades carentes como em
“não carentes”, obedece ao princípio de
alcance e controle
estabelecido por Cynamon (1975),
conforme descrito no subitem # 3.4.2. Este princípio ratifica as justificativas sanitária e
ambiental das intervenções nessas áreas.
A ausência ou a precariedade de um serviço em um determinado sítio repercute
diretamente sobre a gestão do sistema como um todo, na cidade. Áreas favelizadas são, em
muitos casos, exemplos às avessas da inter-relação entre os sistemas de saneamento. A tese de
que os problemas operacionais dos sistemas de saneamento da cidade advêm exclusivamente
das dificuldades provenientes das comunidades carentes, deve levar em conta que as más
condições dos serviços de infra-estrutura urbana, em geral de responsabilidade do poder
público, é que são diretamente agravadas na operação, manutenção e conservação dos
sistemas nas favelas, pelo simples fato de estarem espacialmente inseridas na cidade e de não
serem levadas em conta às especificidades e necessidades de cada sítio, sendo também uma
justificativa de operacionalidade dos sistemas.
A afirmação de que sobrecargas, problemas de entupimento e obstrução no sistema de
esgotamento sanitário são causados em grande parte pelas favelas é facilmente contestada,
inclusive pelos próprios moradores, uma vez verificada ausência de manutenção preventiva,
imprescindível à sua adequada operacionalidade. Na maioria dos casos, as intervenções de
manutenção corretivas são pontuais, não resolvendo os problemas nas suas origens nem na
completa extensão de suas conseqüências. Problemas específicos requerem soluções
adequadas. Áreas de esgotamento próximas à orla marítima, por exemplo, receberão grande
aporte de areia.
126
A necessidade de maior aporte de recursos para um programa de saneamento
ambiental nas comunidades carentes, contemplando suas especificidades técnicas e sócio-
ambientais requer projetos que levem em conta o ponto de vista da comunidade. Nestas
intervenções torna-se imperativa a consolidação de um corpo técnico com experiência
acumulada. Essas considerações são necessárias à sustentabilidade e longevidade das obras
de engenharia. Para Cynamon (1984):
O esforço que deve ser necessariamente organizado com a participação dos solidários tem
que ter como fundamento o estudo de caso, por caso e em cada caso o estudo de uma
solução global, para o mesmo. O estudo envolve dialogo com a população, programação
urbana, abrigo, acesso, infra-estrutura de saneamento, de energia, comunicação, lazer, etc.
Executando-se as parcelas na base de um plano global e na medida das possibilidades.
Nas áreas favelizadas e em loteamentos irregulares ou clandestinos concentram-se
alguns problemas “urbano-epidemiológicos“ da cidade. Situações coletivas de desequilíbrios
agudos, ambientais e sociais, resultantes do processo histórico de reprodução das
desigualdades. As condições habitacionais ideais são aquelas que atendem às funções
técnicas, sanitárias, sócio-culturais, físicas e psíquicas das populações.
O problema do crescimento desordenado, sem infra-estrutura adequada, persiste e se
avoluma, segundo Passos (2002), atualmente existem mais de 600 favelas no estado.
Entretanto, a forma de lidar com essas comunidades vem mudando significativamente. Os
programas sociais de saneamento nas comunidades carentes vêm caminhando pelo ângulo dos
direitos sociais, pretendendo oferecer condições ambientais de leitura da favela como bairro,
incorporando-a à cidade e priorizando, quando necessária, a relocação, para áreas próximas, o
mínimo de famílias - ao invés de removê-las para locais distantes. Propõe-se o reassentamento
em novas áreas compensadas por benfeitorias, quando isto não for possível, o que representa
um amadurecimento na abordagem da questão.
Dialeticamente, a mudança de paradigma nos programas de saneamento pode estar se
dando exatamente nas condições mais complexas, desprovidas da maioria dos serviços de
infra-estrutura e de ações sociais, que são as comunidades carentes. Seu aparente estado de
desordem obedece a uma ordenação própria que exige uma leitura mais atenta. Em verdade
esta desordenação representa uma estratégia de sobrevivência. A ampliação do escopo dos
programas, tanto no âmbito dos sistemas de saneamento quanto nos serviços públicos em
geral, através de trabalhos de assistência técnica e educação ambiental, estreita o contato com
os moradores das comunidades.
127
Segundo Informe Geral (BRASIL, 1999) do Programa de Assistência Técnica ao
Programa de Saneamento Básico para População de Baixa Renda
21
(PAT-Prosanear), em fase
de concepção, propõe-se o desenvolvimento do
Projeto de Saneamento Integrado (PSI)
, de
um
Plano de Desenvolvimento Local Integrado (PDLI)
e de outras ações que venham a ser
definidas durante o desenvolvimento do programa, a ser implementado no Estado do RJ.
O PSI abrange a elaboração de projetos executivos de sistemas de abastecimento de
água, esgotamento sanitário, afastamento de resíduos sólidos, microdrenagem e contenção de
encostas, incorporação de aspectos técnicos e ambientais da área, além de levantamento
sócio-econômico da população. Os projetos devem valer-se de metodologias participativas,
por meio das quais se desenvolva um processo dinâmico de interação entre a população
beneficiada e os agentes envolvidos, objetivando a convergência das demandas sociais,
sanitárias e ambientais, com a adoção de soluções tecnicamente viáveis.
O PDLI, a ser desenvolvido pelas prefeituras das cidades selecionadas, constitui-se de
um planejamento para a área de intervenção contemplada com o PAT-PROSANEAR, cujo
objetivo geral é definir ações e intervenções necessárias ao desenvolvimento integrado,
buscando os mecanismos para sua viabilização, além de estabelecer estratégias para a
recuperação de áreas urbanas degradadas.
No PDLI são identificadas as ações necessárias à preservação ambiental, à
regularização fundiária, à ordenação do uso e ocupação do solo e à execução de projetos
articulados que promovam a melhoria das condições habitacionais, de infra-estrutura e de
ampliação da qualidade e cobertura dos serviços sociais e de apoio ao desenvolvimento
comunitário.
Um grave problema nas comunidades carentes cariocas é a alta mobilidade dos
moradores causada pela mobilidade das fontes de renda (subemprego). A marginalidade nas
comunidades carentes é um dos maiores entraves à participação comunitária e à ampliação e
continuidade das intervenções que exigem a permanente presença do poder público.
Nas tendências de crescimento devem ser avaliadas as correlações entre a implantação
dos sistemas de infra-estrutura, regularização fundiária e tributária e outras intervenções. O
controle urbano deve ser garantido no sentido de ordenar os espaços, garantir mínimas
condições de habitação e promover a proteção ambiental. Essa medida só será justificável e
eficaz caso haja uma política de reversão do enorme déficit habitacional e de inversão do
fluxo migratório para área rural.
21
Modalidade do Pró-Saneamento, programa da Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano (SEDU) do
Governo Federal, que visa promover melhoria das condições de saúde e da qualidade de vida, tendo como
beneficiárias famílias com rendimentos de ate 12 salários mínimos, por meio de ações de saneamento, integradas
e articuladas com outras políticas setoriais.
128
O poder público, inclusive o Judiciário, tem sido historicamente ágil em fazer
respeitar o princípio da propriedade privada, impedindo a ocupação de terrenos particulares,
ainda que desocupados, que não estejam em áreas de risco. Por outro lado, a mesma agilidade
não tem sido demonstrada quando se trata de criar mecanismos que impeçam a especulação
imobiliária em terrenos ociosos situados em locais apropriados para edificações, nem
tampouco em impedir a ocupação de áreas públicas de risco, como são as margens de rios
(Kelman & Magalhães, 1997).
O espaço urbano se constitui como condicionador e condicionante das
transformações econômicas, sociais e políticas. O ficit habitacional da cidade, em
contradição com o expressivo número de áreas e imóveis abandonados e depreciados, no país
e no município do Rio de Janeiro, em particular na própria região do Centro da cidade,
demonstra a ineficiência da política habitacional, o que alimenta permanentemente o processo
de favelização. De forma mais genérica, a raiz da dificuldade no Brasil e no Rio de Janeiro,
que se traduz em problema urbano, é a distribuição de riqueza e poder.
As construções irregulares, suas precárias instalações sanitárias, inclusive com
ligações irregulares no sistema pluvial ou diretamente no solo (“valas negras”), tendem a
aumentar, uma vez que não é sinalizada alternativa de assentamento residencial legalizado,
com apoio técnico e regularidade na ocupação do solo.
O grande desafio é a incorporação, não somente das favelas, mas também de seus
moradores, à cidade e ao campo, para que não haja a constante reprodução de moradias
inseguras, precárias e insalubres em áreas de risco, de proteção ambiental ou onde não é
tecnicamente possível construir sistemas de esgotos sanitários. Para Cynamon (1984),
casos em que o estudo global pode indicar a conveniência de uma erradicação de uma área
carente e sua transferência para outro sítio, diante da inviabilidade de uma solução no mesmo.
As áreas favelizadas, carentes dos sistemas e serviços públicos, representam um
contraste teórico-metodológico que reflete o distanciamento entre práticas de arquitetura e
engenharia e as experiências executadas no local. A solução técnica para este fenômeno tem
que partir de uma equação interdisciplinar, onde haja integração e articulação de vários pontos
de vista e intervenções. Esta equação deve envolver sanitaristas, engenheiros, arquitetos,
médicos, enfermeiros, pedagogos, assistentes sociais, sociólogos, antropólogos, psicólogos e
os outros profissionais da área de saúde pública.
129
6. INTERCONEXÃO ENTRE OS SISTEMAS DE ESGOTOS
“Se formos relatar em 30 minutos a história da Humanidade guardando a
proporcionalidade cronológica, gastaríamos 29 minutos e 51 segundos nos
referindo aos grupos que colhiam e caçavam, um pouco mais de 8 segundos
descrevendo a sociedade agrícola e apenas uma fração de segundo
dedicados aos problemas do mundo industrializado” (Pointing).
6.1. Introdução
Na Cidade do Rio de Janeiro, a grandiosidade da escala dos sistemas de saneamento
implantados, a falta de recursos necessárias à sua gestão adequada, além das dificuldades
decorrentes das alternativas tecnológicas adotadas associadas às especificidades da cidade,
resultou em enorme complexidade e vulnerabilidade. Ao longo do processo de urbanização,
inúmeras dificuldades de operacionalização dos sistemas de esgotamento sanitário e pluvial se
acumularam. Neste cenário, marcado por problemas sanitários e ambientais - surtos
epidêmicos e permanência de valas negras, principalmente na Zona Oeste, Baixada de
Jacarepaguá, subúrbios e comunidades carentes - é necessária uma reflexão sobre as formas
de controle da poluição urbana vigentes, suas tendências e alternativas.
As precárias condições de operação, manutenção e conservação dos sistemas de
saneamento que possuem origens longínquas comprometem a qualidade final dos serviços. O
aporte de esgoto sanitário se dá praticamente na totalidade dos corpos hídricos da cidade e sob
diversas formas. Dentre as principais limitações técnicas dos sistemas de esgotos, destaca-se a
interconexão - situação indesejável de lançamento de efluentes sanitários no sistema de
drenagem pluvial, e vice-versa - que, por sua extensão e intensidade, torna os sistemas
extremamente vulneráveis. A contaminação dos sistemas de drenagem pluvial e de seus
corpos receptores lesa os ecossistemas e submete as populações a riscos epidemiológicos.
Apesar do sistema separador absoluto ser estabelecido legalmente para todo o
território nacional, grande parcela do sistema de drenagem pluvial da cidade recebe, de forma
ilegal e clandestina, despejos de origem doméstica e industrial. Segundo termo de referência
do Plano Diretor de Drenagem, elaborado pela Rio-Águas (PCRJ, 1999), apenas 35% da área
física do município é dotada, de fato, pelo sistema separador absoluto. No restante da área, na
maior parte da Zona Oeste e da Baixada de Jacarepaguá, funciona o sistema de captação
unitário, onde os esgotos são coletados pelas galerias de águas pluviais e lançados diretamente
no meio natural.
130
A interconexão entre os sistemas de esgotos é uma das principais fontes de poluição
dos corpos receptores nas cidades brasileiras, entretanto na maioria das vezes é negligenciada
pelas concessionárias e pelo poder público. Em sentido inverso, a introdão, durante as chuvas,
de quantidade significativa de contribuição indevida às redes coletoras de esgoto sanitário,
compromete sua capacidade hidráulica original, incorpora reduos comumente encontrados nas águas
pluviais (areia, galhos, lixo e folhas), acarretando diversos problemas operacionais.
É urgente a adoção de medidas que minimizem esta dimica de poluão. Algumas soluções
estão sendo implementadas, contudo de forma ainda preria e não prioriria, sem a necesria
avaliação sistêmica de alternativas e resultados. É esta temática que será enfocada a seguir.
6.2. Os “Canais de Esgotos”
6.2.1. Caracterização das Coleções Hídricas na Cidade do Rio de Janeiro
A cidade conta com um sistema hídrico, que inclui cerca de 250 rios e canais,
complexos sistemas lagunares, dos quais fazem parte a Lagoa Rodrigo de Freitas e as lagunas
da Baixada de Jacarepaguá. Estas constituem os corpos receptores dos rios e córregos dos
maciços da Tijuca e da Pedra Branca até o oceano. Em sua extensa costa litorânea (86 km),
limitada à leste pela Baía de Guanabara, a oeste pela Baía de Sepetiba e ao sul pelo Oceano
Atlântico, encontram-se 72 praias (Prefeitura, 2001, v.9).
Os rios cariocas caracterizam-se por modesto volume d’água, sinuosidade dos cursos,
ausência de direção dominante e dificuldades de escoamento devido aos percursos de extensas
áreas planas e com baixas cotas. Essas características, associadas a um regime pluvial tropical
com chuvas intensas no verão, tornam os rios suscetíveis a transbordamentos, a enchentes
periódicas e alagamentos permanentes em certas áreas, intensificados nos períodos de
aumento dos níveis de maré. No período de estiagem reduz-se consideravelmente sua vazão.
Em sua maioria, são canalizados, retificados e cobertos por ruas e avenidas (Prefeitura, 2001,
v.9).
O Rio de Janeiro passou toda sua história realizando grandes esforços na luta pela
água. afirmava Coaracy (1965): desde as suas origens foi sempre o Rio de Janeiro uma
cidade com sede”. Diversas obras de ampliação foram implementadas tentando resolver
problemas distintos, relacionados aos componentes do sistema de abastecimento público -
captação, adução, tratamento, reservação e distribuição.
A população carioca aproveitou-se, no curso de sua história, de diversos mananciais
locais, agrupados, segundo Silva (1988), nos seguintes sistemas:
Santa Tereza: Carioca, Lagoinha, Paineiras;
131
Tijuca: Maracanã, São João, Trapicheiros, Andaraí, Cascatinha, Gávea Pequena;
Gávea: Chácara da Bica, Piaçava, Cabeças, Macacos;
Jacarepaguá: Três Rios, Rio Grande, Covanca, Camorim;
Campo Grande: Mendanha, Cabuçu, Quininha, Batalha;
Guaratiba: Taxas, Andorinhas.
Dentre eles, o rio Carioca, enquanto primeiro manancial superficial, desempenhou
função estratégica para a cidade durante longo tempo, sendo um marco natural da cidade.
Segue Anexo, o trabalho que faz uma síntese de sua relevância na história da cidade e da
importância de sua recuperação ambiental.
Frente ao crescimento de demandas, associado ao avanço do processo de
desmatamento, poluição e devido à sua pouca capacidade de abastecimento, gradualmente
estas coleções hídricas deixaram de servir como mananciais. Ainda no governo imperial, em
1870, a solução adotada foi a captação em mananciais cada vez mais distantes (Telles, 1984).
A partir daí, os antigos mananciais, comprometidos com o processo de poluição, passaram
a ser lembrados somente por ocasião das inundações que acometiam a cidade.
A Cidade do Rio de Janeiro é constituída por áreas de grande vulnerabilidade
ecológica, devido à sua susceptibilidade à erosão e enchentes. A expansão urbana potencializa
os riscos, pois deflagra sistemática degradação ambiental com continuado parcelamento do
solo, desmatamento e asfaltamento, que agravam a grande fragilidade estrutural do seu
ambiente natural (Prefeitura, 2001, v.9).
A Tabela 4, apresentada na página seguinte, relaciona os principais rios da cidade
com as respectivas vertentes, desembocaduras e extensões. A Figura 40 subseqüente
corresponde ao mapa hidrográfico da Cidade do Rio de Janeiro, elaborado pela Fundação
Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (SERLA), em 1996.
132
Tabela 4. Principais rios cariocas.
Localização
Nome do rio
Vertente Desembocadura
Extensão
(Km)
Itaguaí Serra do Gericinó Baía de Sepetiba 35.000
Meriti
(1)
Realengo Baía de Guanabara 25.500
Cabuçu
(2)
Morro da Pedra Branca Baía de Sepetiba 22.500
Guandu do Sapé Morro do Guandu Rio Itaguaí 19.500
Caieira Morro do Pau da Fome Lagoa Camorim 18.000
Fundo Morro do Quilombo Lagoa Camorim 15.000
Pavuna Sítio do Retiro Rio Meriti 13.500
Portinho Serra do Caboclo Canal da Barra de Guaratiba 11.200
Faria Serra do Inácio Dias Baía de Guanabara 10.500
Cachorros Serra do Lameirão Rio Itaguaí 10.000
Porta d`Água Serra da Tijuca Lagoa Camorim 10.000
Maracanã Alto da Boa Vista Canal do Mangue 9.500
Timbó Serra do Inácio Dias Rio Faria 8.500
Cachoeira Pico do Papagaio Lagoa Camorim 8.000
Pedra Serra do Inácio Dias Rio Itaguaí 10.000
Joana Excelsior (Tijuca) Canal do Mangue 6.600
Jacaré Serra do Mateus Rio Faria 6.600
Afonsos Serra da Barata
Rio Meriti 6.200
Covanca Serra do Inácio Dias
Rio Taquara 6.000
Trapicheiro Serra da Carioca
Rio Maracanã 5.700
Caldereiros Serra da Barata
Rio Meriti 5.500
Escorremão Morro da Carioca Baía de Guanabara 5.000
Vargem Grande Serra de Santa Bárbara Pântano de Sernambetiba 5.000
Valqueire Morro do Valqueire Rio Meriti 5.000
Bangu Serra do Bangu Rio Sarapuí 5.000
Comprido Serra da Lagoinha
Canal do Mangue 4.600
Piraraquara Serra da Barata
Rio Meriti 4.500
Carioca Serra da Carioca
Baía de Guanabara 4.300
Macacos Vista Chinesa Lagoa Rodrigo de Freitas 4.000
Rainha Morro do Cóchrane Lagoa Rodrigo de Freitas 4.000
Taquara Morro da Taquara Rio Cachoeira 4.000
Viegas Serra do Bangu Rio Sarapuí 3.700
Sarapuí Campo Grande Baía de Guanabara 3.500
Morto Morro do Sacarrão Pântano de Sernambetiba 3.000
Cabeças Morro das Paineiras Lagoa Rodrigo de Freitas 3.000
Vargem Pequena Morro do Sacarrão Pântano de Sernambetiba 3.000
Irajá Brás de Pina Baía de Guanabara
3.000
Itapuca Santana de Itapuca Baía de Guaratiba
3.000
Picarão Campo do Eng. de Fora Baía de Sepetiba 2.700
Lapidários Vale da Gávea Oceano Atlântico 2.500
João Correia Santana de Itapuca
Baía de Guaratiba
2.200
São João do Carmo Santana de Itapuca
Baía de Guaratiba
2.100
Fonte: Ottoni Netto, 2000.
Obs.: (1) É denominado São João de Meriti depois de receber o rio Pavuna;
(2) Tem a denominação de Cabuçu, em Campo Grande, e a de Piraquê, mais a jusante, em Guaratiba. Pode
ser chamado por ambos o nomes.
.
Figura 40. Mapa Hidrográfico da Cidade do Rio de Janeiro (Anuário Estatístico da Cidade do RJ - 1998).
134
6.2.2. Degradação Ambiental dos Corpos Hídricos
“Canal de esgoto” - no sentido de conduto de esgotos sanitário e industrial - tem sido a
denominação comum adotada pela população do Rio de Janeiro, para designar rios, canais e
córregos que atravessam sua cidade, e que, como tal, deveriam ser reconhecidos. Diante das
evidências torna-se difícil para qualquer especialista desfazer tal confusão e discriminar as
causas que culminaram no atual estado de degradação ambiental.
A alta densidade na urbanização gera inevitavelmente impactos ambientais
1
sobre os
recursos naturais. Contudo, os impactos nas bacias hidrográficas são mais resultantes do uso
perdulário de seus recursos do que do aproveitamento das riquezas naturais nela disponíveis.
A forma como se deu a metropolização da cidade - sem planejamento urbano e preocupação
com os ecossistemas - potencializou os impactos ambientais negativos sobre as bacias
hidrográficas. Dentre as ações deletérias às coleções hídricas destacam-se:
Lançamento de esgotos sanitários;
Lançamento de efluentes não domésticos (industriais, hospitalares, postos, etc.);
Lançamento de fertilizantes e pesticidas provenientes de atividades agropecuárias;
Impermeabilização dos solos;
Vazadouro de resíduos sólidos, incluindo flutuantes;
Carreamento de sedimentos, nutrientes, húmus do solo, derivados de petróleo e
resíduos sólidos para a calha dos rios através do escoamento superficial;
Aterros, autorizados e clandestinos;
Subtração do leito e das áreas de várzea para incorporação às funções urbanas;
Descaracterização das condições naturais, através de desvios e canalizações do leito;
Ocupação desordenada das margens;
Desmatamento;
Assoreamento;
Extração de areia;
Poluição atmosférica;
Poluição resultante de acidentes ambientais, etc.
1
De acordo com art. 1 da resolução CONAMA n
o
20/86, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das
propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia
resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: a saúde, a segurança e o bem-estar da
população; as atividades sociais e econômicas; a biota; as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente e a
qualidade dos recursos ambientais.
135
Sobre o aporte de efluentes (despejos doméstico e industrial) nos corpos hídricos,
entende-se que resíduos orgânicos e tóxicos representam fontes de energia exógenas capazes
de afetar negativamente os balanços energéticos endógenos, dentro da cadeia alimentar
(Adacto Ottoni, 1996). As bacias hidrográficas são sistemas abertos nos quais ocorrem
constantes trocas de energia e matéria com o meio. Estas ações podem gerar, dependendo do
nível e extensão da poluição, pequenos desequilíbrios energéticos e de materiais, que são
assimilados pelas propriedades de autoregulação do sistema expressa na capacidade de
diluição e autodepuração dos corpos hídricos.
Os sistemas hídricos, como os sistemas ambientais em geral, absorvem os eventos e
impactos em seus fluxos de energia e matéria, desde que não sejam ultrapassados os limiares
da resiliência, determinante à persistência das suas relações internas, de forma a permitir o
reajuste de seu estado de equilíbrio dinâmico.
A poluição é inversamente proporcional à diversidade biológica e caso ultrapasse as
condições de resiliência do ecossistema, ela pode implicar na “morte do rio”, situação em que
o déficit de oxigênio, ou os efeitos da toxicidade impedem a sobrevivência da ictiofauna,
promovendo desequilíbrio da biota original, que podem incorporar vetores e agentes
patogênicos, conforme descrito no subitem # 6.4.2.
Grande parcela dos esgotos sanitários gerados ainda é lançada diretamente nos
sistemas de drenagem - rios, canais, galerias de águas pluviais, lagos, lagunas e baías - e nas
regiões litorâneas, sem tratamento adequado. Esses efluentes são um dos principais
responsáveis pela poluição e contaminação das massas de água em seu curso e
desembocaduras (lagunas, baía e orla marítima).
A intensa ocupação e impermeabilização dos solos nas cidades resulta na redução
drástica de parcela do deflúvio pluvial referente às águas de infiltração, fazendo com que haja
um incremento na parcela referente ao escoamento superficial (“run off”). Esta nova
configuração urbana, associada à ampliação dos sistemas de abastecimento de água, traz
consigo a incapacidade de escoamento de superfície e promove a introdução de coletores
subterrâneos - galerias de águas pluviais (GAP) - e a transformação de antigos cursos d’água
de leito natural em canais. O aumento da densidade de urbanização e a implantação de novos
sistemas de drenagem, totalmente artificiais, descaracterizam a drenagem original.
A transferência das águas de infiltração para as calhas dos rios traduz-se no aumento
da possibilidade de enchentes devido ao incremento no volume e na velocidade de
escoamento, uma vez que a recarga dos lençóis subterrâneos pelas águas de infiltração e
posterior recarga dos cursos d’água se de forma mais lenta. Isso gera uma necessidade
136
progressiva de aumento nas seções e mudanças no revestimento dos sistemas de drenagem
urbanos.
Uma vez que realizam, principalmente nas primeiras horas, a lavagem dos
logradouros, as águas de chuva representam, com tudo o que arrastam, um elemento de
poluição difusa considerável. É íntima sua relação com a gestão dos resíduos sólidos e a
conservação dos logradouros.
Para proteção das coleções dricas e manutenção de suas características naturais, é
imprescindível delimitar as suas faixas de proteção visando o disciplinamento das atividades
nos mesmos (Mota, 1995). No entanto, estas áreas, de onde são subtraídas grandes extensões,
sofrem pressões antrópicas constantes para finalidades diversas como, por exemplo, a
ampliação de sistema viário e construções de habitações irregulares, que lançarão
indevidamente seus efluentes nos corpos hídricos. A poluição dos corpos d’água por resíduos
sólidos e líquidos resulta no desprendimento de gases, oriundos destes mesmos efluentes e
também daqueles gerados pelo processo de decomposição anaeróbia, traduzindo-se em
poluição atmosférica.
Os constantes acidentes com cargas e rejeitos industriais poluidores tornam explícita a
vulnerabilidade a que estão sujeitos os corpos d’água localizados próximos às instalações
industriais em atividade ou desativadas, em trajetos percorridos por cargas de risco poluidor,
bem como nas interseções das rotas de transporte, nas proximidades de rodovias e ferrovias.
Como resposta ao não reconhecimento das bacias hidrográficas enquanto ecossistemas
e à falta de integração e planejamento das ações que nelas interferem, as áreas urbanizadas
sofrem impactos e lesões ambientais relacionados às enchentes.
A Figura 41, a seguir, ilustra um dos momentos das inundações sobre a cidade.
(a)
(b)
Figura 41. Inundação na Praça da Bandeira em 29 de janeiro de 1940.
(Revista Municipal de Engenharia - jan/dez 1990).
O Quadro 10, apresentado nas páginas seguintes, relaciona algumas catástrofes
com enchentes vividas pela cidade do Rio de Janeiro, desde tempos imemoriais.
Quadro 9. Episódios pluviais causadores de impactos sócio-ambientais na Cidade do Rio de Janeiro.
Ano Mês/dia Pluviosidade
Impacto gerado
1613 ---- Total de janeiro: 140mm Inundação seguida de 96 dias de seca.
1756 4 a 7 de abril ---- Inundação em toda a cidade; desabamento de casas com vítimas.
1811
10 a 17 de
fevereiro
Devido à grande violência com que a enxurrada descia do Morro do Castelo, ficou
conhecido por Água do Monte. Grande parte do morro desmoronou, fazendo desabar casas
e soterrando várias pessoas, com grandes prejuízos materiais.
1906
25 e 26 de
janeiro;
17 de março
Total de janeiro: 291mm
97mm de 25 para 26
Total de março: 351mm dos
quais 165mm no dia 17
Dois temporais provocaram desmoronamentos nos morros de Santa Teresa, Santo Antônio
e Gamboa, soterrando várias pessoas. Houve muitos desabrigados. O Canal do Mangue
transbordou, alagando quase toda a cidade. Relatório enviado ao Prefeito Pereira Passos
cita a 4ª inundação em 4 meses (dia 17 de março).
1928 26 de fevereiro
Total de fevereiro: 175mm
157mm de 23 a 26
Quatro dias de chuvas contínuas (de 23 a 26) provocaram vários desabamentos de barracos
com vítimas fatais nas favelas dos morros do Salgueiro, Pinto, Trapicheiro, São Carlos,
Querosene, Mangueira e Santo Antônio. Foi crítica a enchente na Praça da Bandeira, Canal
do Mangue, Catete, São Cristóvão, Andaraí, Botafogo e Vila Isabel, onde a água chegou a
1m de altura.
1962
15 e 16 de
janeiro
Total de janeiro: 472mm 242mm
nos dois dias
Violento temporal se iniciou no dia 15 e atingiu no dia 16 um dos maiores indicies de
chuva noticiados no Rio, deixando o saldo de 25 mortes e centenas de desabrigados. O
Canal do Mangue e o Rio Maracanã transbordaram. A Praça da bandeira e São Cristóvão
foram os bairros mais castigados.
1966
11 de janeiro
27 de março
Total de janeiro: 617mm
237mm só no dia 11
403mm nos dias 11 e 12
111mm no dia 27
O ano de 1966 ficou registrado na memória do carioca como aquele em que ocorreu uma
das maiores catástrofes climáticas de sua história. O saldo do violento temporal que caiu
durante 4 horas foi de mais de 100 mortes, sobretudo em Copacabana, Catete, Catumbi,
Méier e Inhaúma, e milhares de desabrigados. Só na favela da Rocinha mais de 40 barracos
foram soterrados, fazendo 30 vítimas. No morro do Pavão o desabamento de 8 barracos
matou 11 pessoas, e, no Morro dos Cabritos, 11 barracos foram atingidos, matando 15
pessoas. Em Santa Teresa o desabamento de 10 barracos fez 15 vítimas fatais. Foi
decretado estado de calamidade pública.
138
QUADRO 10. IMPACTOS AMBIENTAIS DAS ENCHENTES
FOLHA A3 - 2 PAGINAS
FOLHA 2 / 2
139
Os processos de poluição e os impactos ambientais podem gerar efeitos cumulativos
2
e
sinérgicos
3
nos componentes do ecossistema da bacia hidrográfica: as águas de superfície, as
águas subterrâneas e o solo.
No estágio atual, as funções ecológicas dos ambientes naturais afetados pela poluição
estão bastante deterioradas pela hipertrofia da função depuradora. Embora a cidade do Rio de
Janeiro apresente alto índice de cobertura de rede de esgoto sanitário, o sistema não impede a
poluição do sistema de drenagem pluvial da cidade.
Segundo o Plano Diretor - Meio Ambiente (PCRJ, 2000), a situação de esgotamento
sanitário da cidade apresenta-se caótica. Os parâmetros tóxicos da poluição química
proveniente das indústrias que lançam efluentes em corpos hídricos são monitorados pela
FEEMA em vinte e cinco rios, e, destes, nove apresentam-se saturados, treze em vias de
saturação e apenas três encontram-se ainda não saturados.
O relatório de Qualidade da Água da Baía de Guanabara -1990/1997 afirma que, em
relação aos rios da bacia da Baía de Guanabara, os que atravessam as áreas mais densamente
povoadas são verdadeiras “canalizações de esgoto” a céu aberto, recebendo grandes
contribuições de despejos industriais e lixo. Nesta situação, estão incluídos os afluentes da
costa oeste da baía, que vão do Canal do Mangue ao Canal de Sarapuí. Estes rios são
utilizados basicamente para diluição de despejos, embora o uso que lhes seja recomendado
seja o de manutenção da harmonia paisagística e estética.
Para o PDES-RMRJ (1994), a influência da contribuição por esgotos nestas bacias é
enorme, pois do ponto de vista de correntes e da topografia seus rios deságuam em uma área
desfavorável da baía. Em linhas gerais, a maior parte dos rios que deságuam diretamente na
Baía de Guanabara encontra-se em situação crítica ou de transição (critério detalhado na
Tabela 6, do item # 7.2.1.). Os esgotos domésticos e industriais não coletados são as
principais causas da degradação ambiental dos corpos hídricos (PDES-RMRJ, 1994).
Segundo o endereço eletrônico oficial da FEEMA (2002) a bacia da Lagoa Rodrigo de
Freitas: “é circundada por uma área altamente urbanizada que propicia a chegada às suas
águas, por meio dos rios tributários, de carga poluidora considerável, embora exista rede de
esgotamento sanitário”. Também é significativa a contribuição das galerias de águas pluviais
contaminadas que deságuam na lagoa. Desde o século passado, a Lagoa Rodrigo de Freitas
mostra evidências de colapso, com periódicas mortandades de peixes e crescimento exagerado
de vegetação (PCRJ, v.9, 2001). Não obstante, a implantação das galerias de cintura e o
2
Efeito cumulativo é quando o impacto ambiental aumenta em intensidade de ação por sucessivas adições ao
longo do tempo sem perda ou eliminação correspondente.
3
Efeito sinérgico é quando o impacto ambiental ocorre simultaneamente a outros impactos concorrentes gerando
um terceiro efeito.
140
Programa de Monitoramento da Qualidade das Águas de Praias e Lagoas, implantado desde
1995 pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (PCRJ, 1998) vêm propiciando a redução
do aporte de esgoto sanitário nesta laguna.
Para a Baía de Sepetiba, dirigem-se os rios que recebem os esgotos sanitários e
industriais dos municípios de Itaguaí, Mangaratiba, Paracambi, Nova Iguaçu (parte) e Rio de
Janeiro (Santa Cruz e Campo Grande). Segundo a FEEMA, os dados obtidos no
monitoramento sistemático dos rios da baixada da bacia da Baía de Sepetiba permitem
concluir que a falta de infra-estrutura de esgotamento sanitário é responsável pela situação
crítica de degradação dos corpos d’água da região.
Os principais processos envolvidos na degradação da bacia são: a erosão das vertentes
e dos solos motivada pelos desmatamentos, o assoreamento das redes de drenagens e a
poluição dos corpos hídricos por cargas industriais e domésticas. Entre todas as formas de
poluição, a mais crítica é a decorrente da ausência de infra-estruturas de esgoto em
praticamente toda a região. A Baía de Sepetiba recebe, anualmente, um aporte estimado de
1,2 milhão de metros cúbicos de sedimentos através dos rios (PCRJ, v.9, 2001).
As bacias dos rios Paraíba do Sul e Guandu, apesar de fornecer o suprimento de água
para população superior a 8.000.000 de habitantes da Região Metropolitana do Rio de Janeiro
são vítimas de um intenso processo de degradação ambiental, sem a adequada infra-estrutura
de saneamento básico.
É crítica a situação dos rios Poços, Queimados e Ipiranga, que deságuam no rio
Guandu, formando uma espécie de lagoa, imediatamente a montante da tomada d’água da
CEDAE. A bacia do rio dos Poços apresenta uma área de drenagem de cerca de 123km
2
até a
confluência com o rio Queimados. Recebe os esgotos das localidades de Engenheiro Pedreira
e Jardim Marajoara. O rio Queimados drena uma bacia com área aproximada de 48km
2
e
recebe, além dos esgotos de áreas populosas dos distritos de Queimados e Austin, os efluentes
industriais de Queimados, constituindo-se no corpo hídrico mais poluído da região. O rio
Ipiranga, com área de drenagem de 47km
2
, recebe os efluentes das localidades de Cabuçu,
Jardim Laranjeira e Parque Ipiranga. Apesar do somatório de suas contribuições normais não
exceder a 3 m
3
/s, esses afluentes, atravessam hoje, núcleos urbanos cada vez mais populosos,
que despejam em suas águas expressivas quantidades de esgoto e de lixo urbano (Gomes,
2001).
Os resultados do monitoramento do rio Paraíba do Sul mostram que sua contaminação
está acima dos padrões nacionais instituídos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente
(CONAMA) para manganês, cádmio, demanda bioquímica de oxigênio (DBO), coliformes e
fosfato, além da baixa concentração de oxigênio dissolvido (OD). Todos os seus afluentes
141
monitorados apresentam padrões para DBO, coliformes e compostos fosfatados acima dos
níveis permitidos (PCRJ, v.9, 2001).
De acordo com o Relatório de Desenvolvimento Humano do Rio de Janeiro Meio
Ambiente e Sustentabilidade (PCRJ, 2001), as lagunas do município têm insuficiente
renovação das águas, tanto por características intrínsecas quanto pela drenagem dos rios e das
águas pluviais poluídas, em cujas galerias foram feitas ligações clandestinas para escoamento
de esgotos. Especialmente na última década, a ocupação acelerada da Baixada de Jacarepaguá
acarretou o lançamento de grandes volumes de cargas poluidoras no sistema lagunar. Quando
há proximidade de comunidades de baixa renda (caso da Lagoinha), aos esgotos adicionam-se
os resíduos sólidos domésticos. Em Marapendi, o esgotamento é apenas residencial (dos
grandes condomínios), ao passo que em outras se agregam os efluentes industriais (Tijuca,
Camorim e Jacarepaguá).
Quanto à qualidade da água das praias, relatórios da FEEMA (2003) apontam, desde
1975, freqüência de impropriedade para banho em todas as enseadas localizadas no
continente, como é os casos das praias de Ramos, Urca, Botafogo, Ilha do Governador e
outras.
De uma maneira geral, as praias de mar aberto têm bons índices de balneabilidade,
exceto após dias chuvosos e no entorno dos pontos dos deságüe dos canais e rios poluídos. A
impropriedade para banho devido à poluição acarreta sérios prejuízos às atividades turísticas e
de recreação.
Pelo exposto, conclui-se que a denominação - canal de esgoto - inicialmente
apresentada é, sob o ponto de vista técnico, inconsistente. Entretanto, a magnitude da poluição
das coleções hídricas é tão intensa na cidade do Rio de Janeiro que acaba por justificar esta
correlação.
6.3. Estruturas e Condições Operacionais das Interconexões
6.3.1. Origens
Persistem uma série de estruturas e condições de operação que indicam o alto grau de
interconexão entre os sistemas de esgoto sanitário e de drenagem pluvial, o que contribui com
a degradação ambiental e a vulnerabilidade desses sistemas de saneamento.
De acordo com a concepção estabelecida para o sistema separador absoluto, conforme
descrito no subitem # 5.3.3., os esgotos sanitários e pluviais devem ser coletados e
transportados em sistemas distintos, não devendo existir comunicação entre eles, salvo
exceção para extravasores que, devidamente projetados, entram em operação eventualmente
142
em condições específicas e provisórias. Não obstante, a realidade de muitas cidades
brasileiras tem sido a conjugação informal e muitas vezes ilegal, de ambos os sistemas.
O problema das interconexões é antigo e acompanha a cidade desde a implantação dos
primeiros sistemas de esgotamento coletivos, conforme pode ser observado no capítulo # 5.
Ao longo da evolução dos sistemas de esgotos do Rio de Janeiro, em diversos momentos foi
recomendada sua eliminação. Segundo a Revista de Engenharia (1965):
(...) sem falar nas ligações indevidas de esgotos pluviais à rede de esgotos sanitários e
reciprocamente, de águas servidas à rede de esgotos pluviais, fato que, infelizmente, ocorre
em qualquer parte do mundo (...).
No artigo Qualidade das águas - eutrofização (Revista Saneamento, 1976), conclui-se
que o controle e a regularização dos cursos d’água não devem ser apenas quantitativos, mas
também qualitativos, tendo-se em vista a real integração dos recursos hídricos e considerando
que a qualidade das águas deve ser mantida dentro dos padrões mínimos que possibilitam seus
usos múltiplos e legítimos. Propõe-se, dentre outras sugestões “melhorar os dispositivos e os
órgãos das redes de águas pluviais com o objetivo de torná-las eficientes como sistemas,
realmente, separadores absolutos”.
O primeiro Plano Diretor de Esgotamento Sanitário da RMRJ e Área Contribuinte à
Baía de Guanabara, de 1978 (I SANERIO) relata que os rios estavam com suas respectivas
capacidades de autodepuração esgotadas porque vinham recebendo muito tempo despejos
domésticos e industriais. Ressalta a necessidade de eliminação destas poluições, recuperação
das condições de autodepuração destas águas e de planejamento para sua multiutilização, que
poderá, até mesmo, incluir a recepção de despejos de esgotos domésticos (Silva, 2002).
A vulnerabilidade dos sistemas de esgotos provocada pelos extravasores era
criticada por Silva (1983):
Os sistemas de esgoto, quanto mais necessitarem de dispositivos de emergência -
extravasores - que lancem esgotos sem tratamento em ambientes que o próprio sistema visa
proteger, menos confiável ele será. A consagração de falhas nos sistemas de esgotos em
áreas da zona sul, como a coleta de esgoto sanitário pelo sistema de drenagem pluvial
resultou em soluções de precária confiabilidade.
Relatórios da CEDAE focalizam o problema dos extravasores e dão conta do precário
funcionamento das redes de esgotos das bacias da Zona Sul, Centro e da Zona Norte (Silva,
2002). Este autor identifica, em relatório de 1980-1982, que as redes de esgotos de Tijuca e
São Cristóvão possuíam 76 extravasores. Em relatório de 1991, a mesma bacia possuía mais
de 80 extravasores de esgotos para as galerias de águas pluviais.
O levantamento dos planos, programas e projetos do Poder Público Estadual,
identificados a partir de 1984 pela auditoria da Lagoa Rodrigo de Freitas (COPPETEC, 2001),
concluiu que quase a totalidade dos planos de governo reconhece a insuficiência e/ou
143
inadequação da infra-estrutura de saneamento do Estado. Entretanto, as ações efetivadas até o
momento não foram suficientes para reverter este quadro. No Plano Plurianual de Governo
1992/1995, foi abordada a questão das condições sanitárias e ambientais das praias oceânicas
e interiores do Estado, apontando a necessidade de outra intervenção: o remanejamento e a
interligação das redes de esgotamento sanitário da Zona Sul do Rio de Janeiro ao interceptor
oceânico de Ipanema, bem como a correção do destino final dos esgotos domésticos
contribuintes à rede de águas pluviais por ligações clandestinas.
O Plano Diretor Decenal da Cidade do Rio de Janeiro, instituído pela Lei
Complementar nº16, de 04 de Junho de 1992, apresenta no capítulo IV, que trata da Política
de Serviços Públicos e Equipamentos Urbanos, o Programa de Esgotamento Sanitário como
um destes serviços (COPPETEC, 2001). Sobre as interconexões, propõe:
(...) eliminação gradual, conforme definido em plano de trabalho, das conexões existentes
entre os sistemas de esgotamento sanitário e de drenagem (...) exigência de tratamento que
garanta a proteção da saúde humana e dos ecossistemas para o lançamento de esgotos
sanitários nos corpos hídricos receptores, assim considerados os cursos d’água que em seu
estado natural recebem esgoto sanitário.
Através de convênio estabelecido entre a Faculdade de Engenharia da UERJ e a
CEDAE, o trabalho de inspeção de campo para levantamento cadastral do sistema de
esgotamento sanitário, realizado pela equipe de estagiários de engenharia, identificou cerca de
750 (setecentos e cinqüenta) ligações prediais irregulares, somente em parte da área da Ilha do
Governador, conforme noticiado em publicação oficial (CEDAE, 2003).
De acordo com o documento Componentes para Propostas de Ação do PDBG-II,
(CEDAE, 1997):
(...) Houve um momento, no entanto, em que a rede de esgotos sanitários da cidade entrou
em colapso total. Os planos de ocupação foram modificados, começaram a surgir edifícios
onde antes existiam casas e a rede o mais comportou os acréscimos de vazão, sendo
necessário adotar-se soluções extremas. Extravasores foram abertos para as galerias de
águas pluviais, a fim de evitar que os esgotos sanitários jorrassem pelas ruas. E na orla da
Baía essas galerias desembocam em suas águas, poluindo-as. Além disso, no caso
particular da Zona Sul e parte do Centro, o esgoto que a rede comportava, através da
Elevatória de Botafogo, era lançado no Costão do Pão de Açúcar e nas fases de maré
enchente retornava para dentro da Baía de Guanabara (...).
A interconexão entre os sistemas de esgoto sanitário e a drenagem pluvial dá-se
através das seguintes possibilidades:
Ligação das instalações prediais de esgoto sanitário nas instalações de águas pluvias
internas dos imóveis e loteamentos;
Ligação das instalações prediais de águas pluviais nos sistemas prediais de esgotos
sanitários dentro dos imóveis e loteamentos;
144
Lançamento de esgoto sanitário no sistema de drenagem através de ligações prediais
irregulares;
Lançamento de águas pluviais na rede coletora de esgoto sanitário através de ligações
prediais irregulares;
Extravasores da rede de esgoto sanitário sobre o sistema de drenagem e vice versa;
Lançamento final de trechos da rede coletora de esgoto sanitário no sistema de
drenagem;
Lançamento final de trechos das galerias de águas pluviais na rede de esgoto sanitário.
Diversas circunstâncias podem ser classificadas como causa ou efeito destas
interconexões, inclusive alternando-se ciclicamente nesta relação, de forma cumulativa e
sinérgica. As principais estão identificadas a seguir, sem hierarquia de importância.
Regiões sem sistema público de esgotamento sanitário;
Reminiscências de sistemas antigos: separador parcial ou unitário;
Defasagem na implantação e ampliação das etapas dos componentes do sistema;
Prorrogação da utilização de componentes obsoletos do sistema;
Falta de prioridade aos serviços de operação, manutenção e conservação;
Modelo de urbanização e falta de planejamento urbano;
Dificuldades na fiscalização de obras;
Descontrole sobre as ligações prediais irregulares;
Custos na implantação das ligações prediais;
Instalações prediais inadequadas;
Tratamento ineficaz;
Aspectos culturais e educativos;
Adoção de estruturas atípicas do sistema separador absoluto.
A primeira e mais evidente forma de aporte de esgoto sanitário no sistema de
drenagem pluvial está nas áreas que ainda não dispõem de sistema público de coleta e
transporte deste efluente. Mesmo com o alto índice de atendimento de coleta de esgoto na
cidade as coleções hídricas que passam por áreas desprovidas destes serviços ficam
comprometidas, principalmente quando as bacias apresentam alta densidade populacional ou
intensa atividade industrial. A solução individual de construção de tanques sépticos
4
precedente ao lançamento final dos esgotos no sistema de drenagem, conforme
145
regulamentação descrita no subitem # 6.4.1., mostra-se precária pelo baixo grau de eficiência
do tratamento
5
e, principalmente, pela inadequada construção e manutenção das unidades, de
responsabilidade e custeio privados. Este problema ocorre também nas estações de tratamento
de esgoto compactas, de responsabilidade de condomínios e conjuntos habitacionais.
Conforme apresentado no subitem # 5.3.3., os primeiros sistemas de esgotos no Rio de
Janeiro foram os do tipo separador parcial. A partir de 1912, a orientação dada pelo governo
era de que o novo sistema, separador absoluto, fosse aplicado nas novas intervenções. Esta
medida, de grande alcance técnico, resultou em uma ampliação indireta e gradativa da
capacidade de vazão da rede construída, graças à eliminação metódica que se foi processando
nas contribuições pluviais dos prédios antes esgotados pelo sistema separador parcial e que
vieram a sofrer obras de reconstrução (Silva, 2002). Isso implicou na utilização dessas
tubulações, que passaram a estar superdimensionadas (enquanto separador parcial foi
inicialmente implantado para transportarem esgoto sanitário e pluvial), em sucessivas
expansões ocorridas nestas bacias, daí a longevidade da utilização dessas tubulações para o
esgotamento sanitário. Entretanto, por acabarem sendo utilizadas para além da capacidade dos
seus materiais constituintes, trechos antigos, inclusive com idades superiores a 100 (cem)
anos, de tecnologia obsoleta, exigem nos dias de hoje, reparos constantes, com dificuldades
operacionais acumulativas. Acrescido a este fato, algumas áreas que dispunham do sistema
misto, foram, em relação a outras que não dispunham de nenhum sistema, secundarizadas na
implantação do novo tipo de esgotamento.
A possibilidade de desvio dos esgotos sanitários do tratamento, lançando diretamente
na orla marítima, devido ao incremento das águas pluviais fazia parte da concepção do
sistema misto, que preconizava atender a um determinado limite de vazão, proveniente dos
esgotos sanitários, acrescido de determinada intensidade das águas de chuvas.
Segundo Britto (2002), o período do sistema misto assinala o início do uso oficial das
galerias de águas pluviais como sistema auxiliar das redes de esgoto sanitário, através do
extravasamento. Criava-se o conceito que prevaleceria até os dias de hoje, de “água de tempo
seco”, que são os esgotos sanitários irregulares direcionados para as galerias de águas pluviais
na ausência de precipitações.
Posteriormente estruturas, descritas no subitem # 6.3.2., foram sendo implantadas com
o objetivo de tentar proteger alguns trechos de corpos hídricos, como a orla litorânea, por
exemplo, do aporte de águas residuárias. No entanto, quando as chuvas superam a capacidade
4
Com a edição da NBR 13.969/97, tanque séptico é o termo técnico atualizado do que se definia por fossa
séptica.
5
Segundo o prescrito na NBR 7229/93, o efluente originário do tanque séptico mantém a condição de
contaminado. A NBR 13969/97 indica que a faixa provável de eficiência na remoção de DBO é de 40-75%.
146
de escoamento ou ocorre paralisação por falha no sistema de bombeamento ou ainda, por
mera falta de manutenção, o esgoto sanitário é desviado por by pass” e lançado diretamente
nas praias.
A prorrogação ou não ampliação dos sistemas existentes, seja no acréscimo da
extensão da rede coletora ou na implantação de outros componentes (estações elevatórias e de
tratamento, sifões invertidos, etc.) trouxe graves dificuldades. Diante da constante escassez de
recursos financeiros - ou pelo estabelecimento de outras prioridades - a solução mais utilizada
nas grandes cidades brasileiras, inclusive no Rio de Janeiro, foi a construção de trechos de
redes coletoras, para, pelo menos, afastar o esgoto sanitário das proximidades das residências,
evitando-se assim o risco iminente de contaminação, transferindo o problema ao entorno e a
jusante através dos cursos d’água. Estabeleceu-se, como última etapa, a construção das
estações de tratamento. Esta precária solução trouxe a fragmentação das soluções projetadas,
e desarticulou os componentes dos sistemas intensificando a poluição do sistema de
drenagem pluvial e fluvial.
A ampliação do sistema de coleta e transporte, desacompanhada da ampliação do
sistema de recalque (elevatórias) e do de tratamento, têm várias conseqüências. Obriga a
extravasão nessas unidades, das vazões que excedem a máxima, através de desvios (“by
pass”), para algum corpo drico. Além disso, problemas diversos junto à operação do
sistema - vórtices, cavitação, entrada de ar, assoreamento, obstrução, perda de energia e
redução de desempenho - que o depreciam como um todo.
A não substituição das redes coletoras degradadas pelo tempo (fissuração, trincas,
rachaduras, rompimentos, incrustações, etc.), a insuficiência de diâmetro e a defasagem dos
sistemas de recalque, agravadas pela precariedade dos serviços de manutenção, operação e
conservação, resultaram em sistemas obsoletos com diversas complicações operacionais. A
fim de se evitarem problemas maiores decorrentes de extravasamento de esgotos nas vias
públicas utiliza-se o sistema de drenagem como auxiliar, e promove-se a difusão das
interconexões.
A operacionalidade das redes coletoras de esgoto e drenagem é dificultada
mutuamente pelas vazões excedentes ou deficitárias, não levadas em consideração nos
projetos. Os sistemas de esgotos são dimensionados para atender aos limites máximos e
mínimos de vazões e velocidades de escoamento, concomitantemente. O não atendimento a
estes parâmetros ocasiona acúmulo de sedimentos, obstruções nas tubulações e
extravasamentos, dentre outros problemas. A ausência de manutenção preventiva intensifica a
necessidade de interconexões e, desta forma, manutenção e interconexão também se
interagem e se alternam enquanto causa e efeito dos problemas.
147
A rede de esgoto sanitário do município do Rio de Janeiro é, em grande parte, muito
antiga. Trechos de redes que datam do século XIX e não foram remanejados, funcionam de
forma precária, acentuando a fragilidade do sistema em determinados setores. A rede coletora
da Lagoa Rodrigo de Freitas apresenta grande variedade nas idades dos trechos da rede
coletora, que existe desde 1878. As cadas entre 1930 e 1960 foram aquelas em que houve
maior concentração de obras. Segundo levantamento das fichas cadastrais, realizado pela
auditoria ambiental (COPPETEC, 2001), uma grande variedade de matérias de tubulação -
manilha cerâmica, alvenaria tijolo, concreto armado, concreto simples, fibrocimento, PVC e
ferro fundido. O remanejamento torna-se oneroso e complexo pela magnitude e diversidade
de impactos que gera, principalmente nas áreas de alta densidade urbana.
Por suas características específicas de carência dos serviços de infra-estrutura urbana
(dentre eles os sistemas de esgotos), as ligações prediais irregulares existentes nas áreas
favelizadas, abordadas no subitem # 5.3.5., lançam grandes volumes de esgotos sanitários e
resíduos sólidos nos cursos d’água e no solo, poluindo e contaminando áreas adjacentes às
habitações, além de grandes extensões a jusante. Não obstante, a falta de planejamento e
controle urbano não se limitam às comunidades carentes, conforme descrito no subitem #
4.1.1., e ligações irregulares são freqüentemente encontradas também em áreas nobres.
A densidade de urbanização da cidade é alta até mesmo no subsolo e sofre várias
interferências, inclusive de estruturas desativadas, acarretando indisponibilidade do espaço
físico. Este aspecto é agravado por sucessivas intervenções que ocorrem, muitas de forma
arbritária, pelas empresas construtoras ou até mesmo pelos técnicos das concessionárias,
comprometendo a integridade das tubulações e das estruturas assentadas. As dificuldades
para a realização de uma efetiva fiscalização de obras, especialmente as subterrâneas, são
inúmeras. A preocupação com a qualidade na execução das obras a garantir recursos
necessários para a atuação de uma fiscalização compatível com o empreendimento, vem cada
vez mais se tornando uma exceção à regra no país.
Medidas arbitrárias e predatórias de grandes poluentes (indústrias, postos de gasolina,
hípicas, shoppings, instalações da economia informal etc.) intensificaram o processo de
degradação dos ecossistemas e dos sistemas artificiais de saneamento. A falta de uma
fiscalização permanente por parte do poder público alimenta este quadro.
A presença das ligações prediais irregulares não pode ser explicada somente pela falta
de planejamento urbano, pela carência de recursos do poder público e pelas dificuldades
técnicas resultantes deste ou de outros fatores gerencias. A sociedade é carente dos mínimos
conhecimentos a respeito dos serviços de infra-estrutura urbana, das informações básicas
necessárias para a utilização adequada de suas instalações prediais e de seu papel fundamental
148
na preservação do sistema como um todo. Além disso, as ligações prediais feitas às custas dos
respectivos proprietários oneram a população, que encontra grandes dificuldades em dispor de
recursos financeiros para essas despesas.
As ligações irregulares ocorrem com alguma freqüência em imóveis residenciais por
iniciativa inescrupulosa de construtores, encanadores ou curiosos, sobretudo quando essas
ligações trazem maiores facilidades ou maior economia às suas empreitadas (Azevedo Netto,
1979).
A mistura entre esgoto sanitário e águas pluviais pode iniciar-se ainda nas instalações
prediais das habitações e áreas particulares. Esse aspecto foi enfocado por Brito (Obras, v.XX,
1925).
De que vale ter uma rede geral de esgotos bem estabelecida, se as instalações domiciliárias,
entregues à livre exploração de irresponsáveis, mantiverem nas casas os focos de
insalubridade? E essa é a regra, em quase todos os serviços; as próprias repartições, por
comodidade, manifestam-se favoráveis à livre execução pelos proprietários e empreiteiro.
As atuais estações de tratamento de esgoto sanitário sob gerência da CEDAE
6
,
também sofrem com as variações das características qualitativas e quantitativas dos afluentes.
O aumento da vazão afluente causado pela contribuição de esgoto pluvial pode gerar vazões
superiores à vazão máxima da estação, que é obrigada a desviar o excedente dos efluentes
através da estruturas de desvio. O dimensionamento das estações de tratamento leva em
consideração as características do esgoto bruto, dos parâmetros de lançamento do efluente a
ser tratado, a classificação e as respectivas características dos corpos hídricos receptores
devem ser mantidas.
A mudança das características dos afluentes, por diluição ou incremento dos poluentes
incorporados pelos despejos domésticos, pluviais e industriais, compromete a capacidade de
tratamento e aumenta os custos operacionais pela contrapartida do aumento de insumos para o
tratamento (energia, produtos químicos, etc.), e do tempo de detenção dos processos e
operações unitárias que constituem a planta de tratamento das estações. A eficiência do
tratamento abaixo do estabelecido nos projetos é uma constante, motivada por uma série de
fatores. As atuais estações de tratamento de pequeno porte, sob responsabilidade operacional
da concessionária ou de particulares, são mais susceptíveis às variações dos esgotos afluentes.
Portanto, a impossibilidade de operacionalidade dentro de vazões de projetos definidas por
histogramas de vazões, compromete sua eficiência e pode transformar estações de tratamento
em verdadeiras “caixas de passagem” acumuladoras de poluentes, que agravam o problema
6
O sistema de esgotamento sanitário no RJ, ratificado pelos plano diretores de esgotos e pelo PDBG, adota o
modelo concentrado de tratamento, que corresponde a poucas unidades depuradoras de grande porte em oposição
à concepção de sistema de tratamento distribuído, que pressupõe número maior de unidades de tratamento, de
pequeno porte.
149
ambiental ao invés de minimizá-lo. No Rio de Janeiro, esta condição é evidente pelo grande
número de unidades de tratamento de pequeno porte
7
e de soluções individualizadas de
tanques sépticos que sofrem de precariedades na construção e na operacionalidade, estando
sua eficiência praticamente anulada pela ausência de limpeza regular, funcionando em não
conformidade com prescrito na legislação, poluindo os corpos receptores.
Outro aspecto do problema, de origem histórica, está relacionado culturalmente ao
modelo de ocupação urbana adotado no país. Conforme o item # 7.2.2., a administração da
saúde nas cidades renascentistas, inclusive Portugal, assemelhava-se à das cidades medievais.
A influência dos colonizadores portugueses, que construíam no velho estilo colonial, casas de
fundos para os rios, indicava sua utilização para o transporte dos despejos em geral.
(Gonçalves & Guerra. In: Guerra & Cunha, 2001).
A falta de planejamento urbano, de cobertura suficiente pelo sistema de esgotamento
sanitário e de uma cultura de valorização e respeito dos recursos hídricos, fez com que a
sociedade brasileira alimentasse o descuido com os ecossistemas. A baixa auto-estima de
grande parte da população, caracterizada por baixa renda, acrescida à falta de identidade
ambiental e social, estas generalizadas na sociedade e decorrentes da falta ou superficialidade
dos conhecimentos acerca dos ecossistemas existentes nos tios que habitam e da
exacerbação da ideologia do individualismo, traduz-se em atitudes descuidadas para com os
sistemas naturais e artificiais.
A simples adoção das estruturas atípicas do sistema separador absoluto como
alternativa técnica de despoluição dos corpos hídricos, descrita no capítulo subseqüente,
mantém as interconexões, e pode ampliar a extensão da mistura entre as águas e águas
residuárias, provocando, na maioria dos casos, o deslocamento do problema para outras
localidades.
6.3.2. Elementos Atípicos do Sistema Separador Absoluto
Os projetos de engenharia, através do estudo de alternativas, da concepção básica
estabelecida e da metodologia executiva adotada devem incorporar cada vez mais na análise
custo-benefício a variável ambiental. Têm que se apresentar técnica e economicamente
viáveis, com destaque para o ambientalmente sustentável.
7
A FEEMA, segundo prescrito na DZ-215. R3, define que os empreendimentos imobiliários situados em áreas
desprovidas de rede pública que geram cargas orgânicas superiores a 5kg DBO/dia devem construir sistema
coletivo de coleta de esgoto sanitário com estações de tratamento de depuração. Os graus de remoção exigidos
são em função da carga orgânica gerada.
150
Requer-se, para a opção entre os sistemas: separador absoluto, sistema misto ou
unitário, uma série de normalizações e especificações. Cada tipo de sistema decorrente do
tipo de efluente e faixas de vazão utilizados deve possuir características distintas para os tipos
de materiais empregados, traçados, regime de escoamento, condutos e possibilidades de
destino final, conforme apresentado no item # 4.3.
Devido às dificuldades geradas pela interconexão, diversas estruturas e condições de
operacionalidade foram gradualmente implantadas no sistema de esgotamento da Cidade do
Rio de Janeiro, de forma precária ou mesmo projetadas, no intuito de amenizar os impactos
causados pelo déficit na ampliação ou operação inadequada dos sistemas existentes.
Dentre eles destacam-se:
Interceptor Oceânico da Zona Sul;
Galerias de Cintura;
Captações de Tempo Seco;
Aterros e Desvios de Rios e Canais;
“Extravasores Permanentes”;
Estações de Tratamento nos Cursos dos Canais, Rios e Praias.
Interceptor Oceânico da Zona Sul
Os interceptores de esgoto sanitário são canalizações cuja função precípua é receber e
transportar o esgoto sanitário coletado, caracterizado pela defasagem das contribuições, da
qual resulta o amortecimento das vazões máximas (NBR 12207/89, ABNT). Este método de
cálculo possibilita o “achatamento” do hidrograma de vazão decorrente da defasagem horária
das contribuições em marcha, garantindo maior fidelidade e economia no dimensionamento
do sistema.
Os estudos realizados pela SURSAN, através da COPES, para solução do destino final
do esgoto sanitário e remanejamento da rede coletora, levaram em conta a supressão das
elevatórias e a construção de grandes interceptores oceânicos de esgotos. Nestes estudos
foram concebidos inicialmente três interceptores: Interceptor Oceânico da Zona Sul;
Interceptor Norte, abrangendo bacias tributárias situadas nas vertentes da Baía de Sepetiba; e
o Interceptor Centro, para as áreas tributárias de parte do Centro e da Zona Portuária,
conforme pode ser verificado na Figura 42, apresentada na página seguinte. Os esgotos
transportados por esses interceptores seriam encaminhados ao Emissário Submarino de
Ipanema, inicialmente projetado onde hoje se localiza a elevatória de esgoto do Leblon,
próximo ao deságüe do canal da rua Visconde de Albuquerque.
151
Posteriormente, a partir dos estudos do I SANERIO, concluiu-se que, do ponto de
vista técnico e financeiro, a melhor alternativa seria o lançamento na Baía de Guanabara, com
tratamento prévio dos esgotos gerados por parte dos bairros da Zona Norte e do Centro,
mantendo-se com modificações o Interceptor Oceânico da Zona Sul. Esta opção foi ratificada
em estudos posteriores, sendo implantada pelo PDBG.
Figura 42. Concepção dos interceptores da Cidade do Rio de Janeiro
(Revista de Engenharia, 1965).
As obras do Interceptor Oceânico da Zona Sul iniciaram-se em 1962 e foram
concluídas em 1972, entrando em operação em 1975, após realização dos ensaios finais no
ESEI, com a CEDAE. Seu percurso tem início no Aterro do Flamengo, perto do Largo da
Glória, passando pela praia do Flamengo, cruzando a av. Osvaldo Cruz, a praia de Botafogo,
as travessias sob os morros do Pasmado e da Babilônia, e seguindo pela av. Atlântica até a
Elevatória Parafuso, situada no canteiro central da av. Atlântica, em esquina com a rua
Almirante Gonçalves.
Seu traçado utilizou-se dos aterros realizados no Flamengo e do alargamento da praia
de Copacabana, construído inteiramente em concreto armado, com seções progressivamente
variadas, conforme observado nas Figuras 43a, 43b e 43c, apresentadas na pagina seguinte.
152
(b) Seção retangular no trecho
da Av. Osvaldo Cruz
(a) Alargamento da praia de Copacabana e assentamento do
interceptor
(c) Seção em arco no trecho de
Copacabana
Figura 43. Aspectos construtivos do Interceptor Oceânico da Zona Sul.
(a) Revista Saneamento n. 38, 1970. (b) Revista de Engenharia n.1, 1965.
(c) Revista Saneamento n.38, 1970.
Na concepção e construção do Interceptor Oceânico da Zona Sul planejou-se, além da
condução de esgoto sanitário, a coleta e o transporte das águas poluídas provenientes do
sistema de drenagem pluvial, denominadas contribuição de tempo seco (ABNT, NBR
12.207/89) e a dos esgotos provenientes das ligações prediais da orla marítima, desde a Glória
até Copacabana, visando eliminar a poluição nas praias pelo aporte indevido de esgoto
sanitário (Silva, 2002).
Em virtude da não realização de algumas obras definidas em projeto, tais como:
finalização do Interceptor Oceânico (em túnel, sob o morro do Cantagalo); construção da
estação de pré-condicionamento ao do morro do Cantagalo na rua Teixeira Mello, em
Ipanema, com sua ligação ao Emissário Submarino de Ipanema (ESEI), foi implantada como
“solução provisória” a elevatória de bombas parafuso da Av. Almirante Gonçalves, que
recalca o esgoto transportado pelo sistema Zona Sul até a caixa de confluência do emissário,
153
situado na Av. Vieira Souto, em frente à rua Gomes Carneiro, via elevatória André Azevedo,
da rua Francisco Sá.
A Figura 44, a seguir, apresenta um desenho esquemático do Sistema de Esgotamento
da Zona Sul, em 1969, com traçado do Interceptor Oceânico da Zona Sul. O trecho à esquerda
do emissário refere-se à interceptação da Lagoa Rodrigo de Freitas não realizada. Em seu
lugar foram instaladas elevatórias, que recalcam os esgotos das áreas contíguas para a caixa
de confluência do emissário.
F
Figura 44. Planta Geral do Sistema de Esgotamento da
Zona Sul em 1969 (Revista Saneamento n.38, 1970).
Mesmo com o ESEI possuindo capacidade máxima de 12m
3
/s, contra a vazão atual de
cerca de 6,0m
3
/s (Silva, 2002), parte do esgoto transportado pelo interceptor ainda é
extravasado e lançado no costão do Pão de Açúcar, devido a problemas de saturação da rede,
redução de seção por incrustações, assoreamento e galeria em contradeclive (trecho entre a
Elevatória Parafuso e a Elevatória André Azevedo). O extravasor foi concebido para entrar
em operação apenas em situações de emergência, de forma a aliviar o sistema nos casos
especiais.
154
Além disso, em determinadas circunstâncias, no trecho a jusante deste
extravasamento, parte do esgoto sanitário ainda é encaminhado às galerias de águas pluviais,
rios e canais, através de extravasores construídos em diversos pontos, poluindo a Baía de
Guanabara e as praias oceânicas. Desta forma, o Interceptor Oceânico da Zona Sul acaba
contrariando o projeto original, funcionando como interceptor de tempo seco, que, em
situações críticas, capta parcelas dos efluentes poluídos e descarta outras. Por esse motivo,
mesmo sendo o interceptor uma estrutura convencional, devidamente projetada, comporta-se
como estrutura atípica pela particularidade do seu funcionamento.
No Plano Plurianual de Governo 1992/1995 (COPPETEC, 2001), foi abordada a
questão da melhoria das condições sanitárias e ambientais das praias oceânicas e interiores do
Estado, e sugerido:
o remanejamento e interligação das redes de esgotamento sanitário da zona sul do Rio de
Janeiro ao interceptor oceânico de Ipanema, bem como a correção do destino final dos
esgotos domésticos que contribuem à rede de águas pluviais em ligações clandestinas.
O PDES-RMRJ, de 1994, ratificou a necessidade de complementação das obras
concebidas pelo projeto do interceptor para a melhoria do Sistema da Zona Sul. O plano
estimou a vazão de tempo seco (contribuição de esgoto sanitário irregular) que contribuíra
para o Interceptor Oceânico da Zona Sul, na época, em aproximadamente 2,3 m
3
/s, para uma
vazão máxima estimada pela CEDAE de 7,0 m
3
/s (incremento de 32,9%).
Visando eliminar em determinados pontos da enseada da Glória o lançamento de
esgotos provenientes do Centro, Lapa, Castelo, Santa Tereza, Glória, parte do Catete, Cruz
Vermelha e Bairro de Fátima, foram assentados através do PDBG, 1.170 m de coletores de
esgoto de diâmetro de até 1200 mm (Q = 800 L/s), fazendo a conexão com o início do
Interceptor Oceânico da Zona Sul, conforme representados nas Figuras 45 e 46, apresentados
na página seguinte.
155
Figura 45. Desenho esquemático do Sistema Marina da Glória (AEERJ, 1998).
Figura 46. Coletores do Sistema Marina da Glória (Prospecto da CEDAE).
156
Galerias de Cintura
A cidade se valeu da implantação de galerias de cintura para impedir o lançamento de
águas pluviais contaminadas por esgoto sanitário em determinados pontos ou trechos dos
corpos hídricos. Estas “galerias”, na forma de canalizações abertas ou fechadas, além de
tubulações, interceptam os pontos de lançamento de galerias de águas pluviais contaminadas
ou diretamente de ligações irregulares de esgoto sanitário e concentram suas vazões para
lançamento em pontos previamente fixados.
Em alguns casos, os despejos dos efluentes eram apenas redirecionados precariamente
para outros pontos, menos valorizados ou discretos. Em outras situações estas galerias tiveram
seus efluentes captados e encaminhados para o sistema de esgotamento sanitário, como o
ESEI.
As galerias de cintura foram implantadas em diversos trechos da orla marítima, tais
como: praias do Flamengo, Leblon, Copacabana, Botafogo, recentemente a galeria da praia de
Ipanema (entre a Teixeira de Melo e o Jardim de Ala), a Galeria de Cintura da Lagoa
Rodrigo de Freitas, além de outras, que estão em fases de projetos e implantação, como a
Galeria de Cintura da Estrada das Canoas e da Niemeyer, ambas dentro do Programa de
Despoluição da Praia de São Conrado.
Na Lagoa Rodrigo de Freitas, após vistoriar cerca de 100 km de galerias de águas
pluviais, com utilização de microcâmeras (circuito interno fechado de televisão), a CEDAE
identificou mais de 340 ligações irregulares. Mais de 100 L/s de despejos chegavam através
da rede de águas pluviais na lagoa.
A Galeria de Cintura da Lagoa, implantada em 2001, é formada por coletores em
concreto armado e PVC, com diâmetros de 250, 300 e 500 mm e extensão total de 3.900 m
assentados ao longo das avenidas Borges de Medeiros e Epitácio Pessoa. Constituída por
quatro trechos de intercepção independentes, com suas respectivas elevatórias (Q
máx
=15,0 L/s,
cada), recebe as águas residuárias provenientes das galerias de águas pluviais próximas aos
seus deságües. Suas elevatórias bombeiam os efluentes para as elevatórias de esgoto sanitário
existentes, que por sua vez os encaminham para o ESEI.
A galeria não cobre todo o entorno da lagoa, mas apenas os trechos considerados mais
críticos em termos de lançamento de esgotos. A localização dos trechos da galeria está
representada na Figura 47, na página seguinte.
157
Figura 47. Galeria de cintura da Lagoa Rodrigo de Freitas
(Prospecto CEDAE).
A concepção do projeto prevê que a totalidade das águas captadas, inclusive nos picos
de chuva, seja transferida para o sistema de esgotamento, em pontos definidos nas elevatórias.
Entretanto, não garantia de que haverá interceptação de todas as águas pluviais
eventualmente contaminadas por esgotos (COPPETEC, 2001).
Caso haja chuvas intensas que superem a capacidade de bombeamento das elevatórias
da galeria de cintura, as tubulações extravasariam as águas residuárias para a lagoa,
funcionando assim, como interceptores de tempo seco.
A auditoria ambiental da Lagoa Rodrigo de Freitas
(COPPETEC, 2001)
, quanto à
utilização da galeria como captação de esgotos remanescentes nas GAPs, afirma:
É fundamental deixar claro que a ação mais correta é manter sempre um programa de
investigações para a redução do nível de lançamento de esgoto sanitário nas redes pluviais,
sendo a galeria apenas um mecanismo adicional de defesa. Recomenda-se um
acompanhamento operacional no modo em manual, continuamente, o que incluiria a coleta
das primeiras chuvas como parte integrante do sistema, fazendo com que a Galeria
absorvesse as cargas orgânicas e outros compostos poluidores, como os óleos e as graxas
provenientes da lavagem dos revestimentos das vias urbanas pelo escoamento superficial
das águas pluviais. Nesta perspectiva, a Galeria de Cintura toma um caráter de obra
definitiva e não provisória e emergencial.
Captações de Tempo Seco (CTS)
As estruturas denominadas “Captação de Tempo Seco” estão inseridas nas galerias de
águas pluviais capazes de desviar a vazão remanescente que é encontrada quando do estio.
Tais vazões são geralmente provenientes de ligações indevidas de esgoto sanitário na rede de
drenagem pluvial. Enquanto contribuição de tempo seco (conhecida também por “água de
tempo seco”) direciona, nos períodos sem chuva, os esgotos clandestinos contidos no sistema
158
de drenagem para o sistema de esgotamento sanitário. No período chuvoso extravasa as águas
poluídas (águas pluviais e esgoto sanitário) para o sistema de drenagem pluvial (ABNT, NBR
12.207). Essas caixas de transição têm sua capacidade de transmissão de vazão limitada por
aspectos construtivos, de forma que apenas vazões iguais ou inferiores à sua capacidade
máxima, definida conforme suas dimensões e vel da soleira, podem ser encaminhadas ao
sistema de esgotamento sanitário. Detalhes desta estrutura estão representados nas Figura 48a
e 48b, a seguir.
(a)
(b)
Figura 48. Estruturas de Captação de Tempo Seco (COPPETEC, 2001).
Foram identificadas na bacia contribuinte da Lagoa Rodrigo de Freitas, seis unidades
de captação de tempo seco, totalizando uma vazão de 226 L/s, segundo o PDES-RMRJ
(1994). De acordo com o termo de referência do Plano Diretor de Drenagem (PCRJ, 1999), a
CEDAE, em conjunto com a PCRJ, vêm executando tomadas de tempo seco nas galerias de
águas pluviais, em sua maioria localizadas próximo às áreas favelizadas. As contribuições
provenientes das captações em tempo seco da Zona Sul são encaminhadas ao ESEI.
Aterros e Desvios de Rios e Canais
Os aterros e desvios de rios e canais poluídos, na tentativa de salvaguardar
determinado corpo receptor em detrimento de outros, ou mesmo para afastar a possibilidade
de contato e diminuir a visibilidade da poluição, é uma prática comum e antiga nos grandes
centros urbanos. No Rio de Janeiro, vários cursos d’água nesta situação foram aterrados e,
quando não possível, canalizados em galerias subterrâneas.
Por volta de 1920, inspirado nos conceitos de Barão de Tefé, Saturnino de Brito
interceptou os rios Cabeças, dos Macacos e Rainha, que contribuíam permanentemente com
suas águas para a laguna, conduzindo-as a partir daí para o canal da avenida Visconde de
159
Albuquerque, para em seguida desembocar na praia do Leblon, conforme Figura 49,
apresentada a seguir.
Figura 49. Desembocadura do canal da Visconde de Albuquerque
(Foto: Bittom, maio 2002).
No canal da rua General Garzon existe uma comporta que, manobrada
adequadamente, permitiria o deságüe desses rios para a Lagoa Rodrigo de Freitas. Entretanto,
devido aos problemas de poluição das águas da laguna trazida por esses rios, esta comporta de
secionamento impede o deságüe das águas doces necessárias ao ecossistema lacustre,
desviando-as para os canais do Jóckei e da avenida Visconde de Albuquerque.
As Figuras 50a e 50b, a seguir, apresentam detalhes dessa comporta.
(a) Vista geral da comporta.
(b) Retenção de poluentes na comporta.
Figura 50. Comporta do canal da rua General Garzon (Fotos: Dias, A.P. julho 2003).
O impacto ambiental sobre as praias do Leblon e Ipanema provocada pelo aporte de
esgoto sanitário proveniente do canal da avenida Visconde Albuquerque, criou um impasse
que fez o Governo do Estado implantar uma nova comporta neste canal, com a instalação de
bombas para transportar as águas contaminadas para o ESEI, na tentativa de minimizar os
efeitos da contaminação das praias e da laguna. Como o recalque é de uma parcela das águas
poluídas, ocorre retenção de esgoto sanitário a céu aberto nos canais, com interrupção das
160
condições originais de escoamento. Nos períodos de chuva as comportas são abertas para
impedir inundações e as águas pluviais contaminadas são desaguadas na praia e na laguna.
As Figuras 51a e 51b, a seguir apresentam detalhes desta comporta e da estrutura de
captação das águas residuárias localizadas a montante da comporta, no lado esquerdo do
sentido montante-jusante.
(a) Vista geral da comporta.
(b) Gradeamento da estrutura de bombeamento.
Figura 51. Comporta e estrutura de bombeamento do canal da Visconde de Albuquerque.
(Fotos: Dias, A.P. julho 2003).
A Figura 52, abaixo, representa esquematicamente o percurso dos rios anteriormente
citados, o posicionamento das comportas, o sistema de recalque das águas poluídas do canal e
a possibilidade de refluxo para a Lagoa Rodrigo de Freitas.
Figura 52. Esquema das estruturas de esgotamento
da Lagoa Rodrigo de Freitas (Jornal O Globo, 2002).
161
A alternativa de desvio de rios está novamente sendo cogitada, neste caso como
possibilidade de solução do problema de abastecimento de água da RMRJ, especificamente da
poluição do rio Guandu (descrito no subitem # 6.2.1.), próximo ao ponto de captação da
Estação de Tratamento de Água da CEDAE. O aporte próximo da tomada d’água das águas
poluídas provenientes dos rios dos Poços, Queimados e Ipiranga vem comprometendo a
tratabilidade da água do manancial, trazendo riscos iminentes à população beneficiada, além
do comprometimento de outros usos a jusante deste ponto.
Uma das alternativas apontada, inclusive, no PDES-RMRJ e fortalecida pelos recentes
problemas de degradação ambiental deste manancial, propõe o desvio das águas desses rios
afluentes ao rio Guandu, para imediatamente a jusante da tomada d’água, associado
recentemente ao incremento de um tratamento prévio das águas, na própria calha dos
afluentes citados (Gomes, 2002). O tratamento proposta é similar ao descrito no subitem #
6.3.3. e objetiva mitigar os efeitos da poluição no estirão de jusante do rio Guandu.
“Extravasores Permanentes”
Os extravasores de esgoto sanitário, segundo o decreto estadual n
o
533/76, devem ser
concebidos nos projetos de sistemas de esgotos para escoar eventuais excessos de esgoto ou
de água. Estas canalizações ou estruturas são projetadas nas tubulações, canais, órgãos
acessórios, elevatórias e nas ETE`s, uma vez que o escoamento dos sistemas por gravidade
são contínuos e eventualmente precisam desviar o fluxo, por questões de manutenção,
manobras ou para desviar excedentes de água para controle de inundações, no caso do sistema
de drenagem pluvial.
Localizados em cotas superiores ao nível de escoamento normal, entram
automaticamente em operação quando o efluente chega no nível da tubulação de extravasão
fazendo o lançamento do esgoto sanitário, através de estruturas especiais, no sistema de
drenagem, nos cursos d’água e corpos receptores. Com isso é possível eliminar a causa da
interrupção do sistema, de forma que não haja um colapso com fluxo indevido de esgoto para
as vias públicas ou para os domicílios, através do retorno, em sentido contrário ao
escoamento, pelas tubulações da rede pública e pelas ligações prediais, condição de operação
denominado remanso.
A utilização dos extravasores para além dos casos especiais previstos, eventuais e de
curta duração, configura atipicidade de procedimento e de elementos. Por uma questão de
distinção daqueles convencionalmente projetados e operacionalizados, optou-se por chamar a
estes, que freqüentemente entram em operação, de “extravasores permanentes”. Este
extravasamento ocorre desde a implantação das primeiras redes, e, atualmente está presente
162
em diversas estruturas que compõem o sistema de coleta, transporte e tratamento de esgoto
sanitário da cidade do RJ. Condição gerada por diversos fatores, conforme descrito no
capítulo # 6.3.1.
As sobrecargas e dificuldade de escoamento em diversos trechos do sistema obrigam
empresas, construtoras, moradores e a própria concessionária a realizar interconexões com a
drenagem pluvial, utilizando-se desta como um “sistema auxiliar”, a fim de impedir os
transbordamentos de esgoto sanitário pela via pública.
Os pontos de extravasamento “permanentes” estão espacialmente disseminados por
todo o sistema. Segundo Britto (2002), a prática de extravasores não era oficial, e os
responsáveis que a praticavam dificilmente cadastravam a ligação realizada.
Quanto às estações de tratamento nos cursos dos canais, rios e praias, pela mudança
conceitual que encerram, serão detalhadas e comentadas no subitem que segue.
6.3.3. Estações de Tratamento nos Cursos dos Canais, Rios e Praias
Neste subitem é feita uma breve apresentação das estações de tratamento em fluxo nos
cursos dos canais, rios e nas praias, uma vez as recentes implantações da Estação de
Despoluição do Rio Carioca, do Parque Ambiental da Praia de Ramos e da Estação de
Despoluição do Canal da Rocinha (em construção) são conseqüências da interconexão entre
os sistemas de esgotos e os corpos hídricos.
Em vários estados do país, como: São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Minas Gerais e
recentemente, o Rio de Janeiro, vêm sendo introduzidas unidades de tratamento nos cursos
d’água, tecnologia denominada estações de tratamento em fluxo, que objetivam melhorar a
qualidade dos recursos hídricos poluídos, diferentemente das finalidades de produção de água
potável (ETA) e tratamento de água residuárias para lançamento adequado nos corpos
receptores (ETE).
Este tipo de tratamento está em expansão, sendo utilizados cursos d’água, lagoas,
represas, parques e praias, visando reincorporar usos diversos que estavam inviabilizados,
pelo processo de degradação ambiental destes corpos hídricos. Está sendo empregado nas
bacias hidrográficas degradadas por aportes irregulares de esgoto sanitário, despejos
industriais, resíduos sólidos ou por poluição difusa do escoamento pluvial superficial.
Em São Paulo, visando melhorar as condições ambientais do rio Pinheiros, a
disponibilidade hídrica da represa de Billings e reduzir a carga poluidora do rio Tietê, estão
sendo construídas sete estações de tratamento em fluxo com vazões diversas (0,70; 1,05; 1,05;
2,10; 40,0; 45,0 e 50,0 m
3
/s), orçadas em R$ 110 milhões (Revista Bio, 2002).
163
Estação de Despoluição do Rio Carioca
No caso do tratamento em fluxo do rio Carioca, utilizam-se processos físico-químicos
de floculação seguido de flotação. Para isso são adicionados os insumos: reagentes
coagulantes/floculantes, cloro, ar dissolvido e energia elétrica, ajustados para diferentes
vazões de acordo com os objetivos ambientais. A Estação de Despoluição do Rio Carioca
está instalada próxima a sua desembocadura na beira da praia, no canal da galeria de cintura,
construído anteriormente para desvio da foz do rio e da intercepção das galerias de águas
pluviais, também contaminados por esgoto sanitário. O lodo flotado é direcionado à rede
coletora de esgoto sanitário, sendo encaminhado para o ESEI.
Esta estação foi implantada pela antiga Secretaria Estadual de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável (SEMADS), com recursos provenientes da multa paga pela
Petrobrás pelo vazamento de óleo na Baía de Guanabara. Inaugurada em setembro de 2002,
sua gestão está a cargo da organização não-governamental Viva Rio.
O princípio básico desta tecnologia consiste no tratamento das águas na iminência de
seu lançamento na praia, o que limita seu objetivo em não poluir a praia do Flamengo pelos
esgotos transportados pelo rio Carioca e pelas galerias de águas pluviais que são interceptadas
pelo canal da galeria de cintura, visando trazer nas imediações da desembocadura as
condições de balneabilidade. Desta forma, esta concepção pode ser considerada como uma
solução pontual.
A estação funcionará somente nos períodos de seca, com vazão máxima de projeto de
300 L/s. Em caso de chuvas o processo é interrompido, liberando a passagem do fluxo de
águas contaminadas para a praia do Flamengo, no deságüe ao lado do restaurante Porcão.
As Figuras 53a, 53b e 53c a seguir apresentam detalhes da Estação de Tratamento do
rio Carioca.
(a) Estrutura de gradeamento.
(b) Microaeração da massa líquida.
(c) Remoção de lodo flotado.
Figura 53. Estação de Tratamento do Rio Carioca (Fotos: Dias, A.P.15/04/03).
164
Estação de Despoluição do Canal da Rocinha
Outra unidade de flotação em fluxo em fase de implantação é a Estação de
Despoluição do Canal da Rocinha, localizada na Favela da Rocinha (Lagoinha), com
capacidade de 300 L/s (com possibilidade de ampliação para 900 L/s). Esta contribuição
corresponde ao esgoto proveniente da sub-bacia de São Conrado, que engloba os bairros de
São Conrado, vertente São Conrado da favela da Rocinha e morro do Vidigal.
Este empreendimento em execução faz parte das obras de despoluição da praia de o
Conrado contemplando a construção de galerias de cintura ao longo da praia para captar águas
pluviais contaminadas, estações automáticas de remoção de lixo e implantação de extravasor.
A Figura 54, a seguir, apresenta as principais intervenções contempladas no projeto
de despoluição da praia de São Conrado.
Figura 54. Obras de despoluição da praia de São Conrado (Prospecto CEDAE).
165
Parque Ambiental da Praia de Ramos
A concepção adotada no Parque Aquático de Ramos, popularmente conhecido
Piscinão de Ramos”, em operação desde 2001, difere da praia do Flamengo por tratar as
águas da Baia de Guanabara contaminadas pelo grande aporte de águas residuárias. Optou-
se neste caso pelo tratamento da parcela de água do mar utilizada no enchimento da piscina
artificial, com 26.000 m
2
de espelho d’água, instalada nas areias da praia.
Quanto ao processo de tratamento, é similar ao da Estação de Despoluição do Rio
Carioca. As águas próximas à praia de Ramos recebem esgoto sanitário proveniente
principalmente de dois valões que ali desembocam. Com a implantação da estação, 100 L/s de
águas salinas contaminadas sofrem remoção dos resíduos sólidos e posterior tratamento,
viabilizando-se a recreação, outrora feita diretamente na praia, antes das condições precárias
de poluição.
As Figuras 55a e 55b, apresentadas abaixo mostram aspectos da praia de Ramos na
década de 50 e do parque ambiental na atualidade.
(a) Praia na década de 50.
(b) Parque Ambiental da Praia de Ramos 2002
Figura 55. Aspectos da praia de Ramos
(a) Foto: VivaRio-www.favelatemmemoria.com.br.
(b) Foto: Revista Bio, jul.-set. 2002).
A carga orgânica removida no tratamento é encaminhada através de uma derivação da
CEDAE para a Estação de Tratamento de Esgoto da Penha.
Atualmente está em execução o Piscinão da Praia das Pedrinhas, em São Gonçalo,
havendo previsão para a implantação de outros “piscinões” em Magé, Duque de Caxias, Nova
Sepetiba e praia de Cocotá, na Ilha do Governador (Revista Bio, 2002).
166
6.4. Contaminação por Esgoto Sanitário
6.4.1. Regulamentação
No que se refere ao lançamento de esgoto sanitário, cabe evidenciar o art. 277,
capítulo VIII – Do Meio Ambiente, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, que rege:
Art. 277 - Os lançamentos finais dos sistemas públicos e particulares de coleta de esgotos
sanitários, deverão ser precedidos, no mínimo, de tratamento primário completo, na forma
da lei.
§ - Fica vedada a implantação de sistemas de coleta conjunta de águas pluviais e esgotos
domésticos ou industriais.
§ - As atividades poluidoras deverão dispor de bacias de contenção para as águas de
drenagem, na forma de lei.
Pelo decreto estadual n
o
553/76, atualmente em vigência, que regulamenta os serviços
públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário do Estado, administrados pela
CEDAE com vistas à orientação dos usuários, têm-se as seguintes disposições:
Art. 7
- Os prédios, situados em logradouros dotados de abastecimento de água ou rede de
esgoto sanitário, deverão ter suas instalações ligadas aos respectivos sistemas;
Art. 8 - Os prédios, situados em logradouros dotados de sistema unitário ou desprovidos de
qualquer sistema de esgoto sanitário, deverão ter suas instalações de esgoto ligadas a um
dispositivo de tratamento e o efluente deveser encaminhado a destino conveniente, a
critério da CEDAE;
Art. 10
- A rede de esgoto sanitário, integrante do sistema separador absoluto, não poderá
receber, direta ou indiretamente, águas pluviais ou contribuição que possam vir a prejudicar
o seu funcionamento;
Art. 89
- Os dispositivos de tratamento poderão ser estáticos, de fluxo horizontal e contínuo
(fossas sépticas), ou de outro tipo aprovado pela CEDAE.
Em nível municipal, de acordo com a Lei Orgânica, título VI - capítulo VII - Do
Saneamento Básico, temos:
Seção I - Disposições Gerais. Art. 485: A Prefeitura, por iniciativa própria ou a
requerimento de qualquer pessoa do povo, procederá à interdição imediata do loteamento
regular, irregular ou clandestino em que se constatar a venda de lotes ou terrenos, sem
prévia implantação de rede de esgotamento sanitário, abastecimento de água potável e
167
drenagem de águas pluviais, aprovados pelos órgãos competentes. Na alínea 3: Ao Poder
Executivo é vedada a aprovação de qualquer parcelamento em área onde não esteja
assegurada a capacidade técnica de prestação dos serviços de abastecimento de água,
esgotamento sanitário e drenagem de águas pluviais.
Seção II - Da Proteção dos Corpos Hídricos. Art 486: Os lançamentos finais dos sistemas
públicos e particulares, de coleta de esgoto em corpos hídricos receptores deverão ser
precedidos de tratamento adequado.
Seção II - Da Proteção dos Corpos Hídricos. Art 487: É vedada a implantação de
sistemas de coleta conjunta de águas pluviais e esgotos domésticos, patológicos ou
industriais.
Seção II - Da Proteção dos Corpos Hídricos. Art 488: As edificações somente serão
licenciadas se comprovarem a existência de redes de esgoto sanitário e de estação de
tratamento ou de lagoa de estabilização, capacitadas para o atendimento das necessidades de
esgotamento sanitário, a serem criadas. Na alínea 1: Caso inexista o sistema de esgotamento
sanitário, caberá ao incorporador prover toda a infra-estrutura necessária, incluindo o
tratamento dos esgotos; à empresa concessionária, a responsabilidade pela operação e
manutenção da rede e das instalações do sistema. Na alínea 4: Após a implantação do
sistema de esgotos conforme previsto neste artigo, a Prefeitura deverá permanentemente
fiscalizar suas adequadas condições de operação.
6.4.2. Riscos Epidemiológicos e Ambientais
Contrariando o prescrito nas legislações supracitadas, de fato o que se observam no Rio
de Janeiro são as seguintes situações de esgotamento:
Áreas esgotadas pelo sistema separador absoluto, onde os efluentes sanitários são
coletados por rede de esgoto sanitário própria, com destino final adequado;
Áreas esgotadas pelo sistema separador absoluto, onde os efluentes sanitários são
coletados por rede de esgoto sanitário própria, sem destino final adequado;
Áreas sem rede de esgoto sanitário, cujos efluentes domésticos passam por
dispositivos de tratamento (em condições construtivas e de operação diversas) e são
esgotados pelo sistema de drenagem pluvial ou infiltram no solo;
Áreas sem rede de esgoto sanitário, cujos efluentes domésticos são lançados no
sistema de drenagem pluvial sem nenhum tratamento prévio, caracterizando ligações
irregulares;
168
Áreas dotadas de rede coletora, sem unidades de tratamento, com os esgotos sanitários
sendo lançados no sistema de drenagem ou subsolo, caracterizando ligações
irregulares;
Áreas dotadas de rede coletora de esgoto sanitário, que devido a estado deficitário de
operação e manutenção, ou por superação da vida útil, não possui estanqueidade
adequada, poluindo as águas superficiais, subterrâneas e solos;
Áreas onde não existe qualquer tipo de canalização e o esgoto infiltra no solo ou escoa
por “valas negras”;
Áreas situadas em Unidade de Conservação Ambiental (UCA), compatíveis com a Lei
de Zoneamento, de ocupação proibida, desprovidas de sistema de esgotamento
sanitário, porém irregularmente habitadas.
Quanto aos esgotos sanitários, os riscos à saúde pública e ambiental dão-se na
ausência total, parcial ou na precariedade de seus componentes e dos de drenagem pluvial.
Situação esta que ocorre quando os sistemas perdem sua capacidade de coleta, de
estanqueidade no transporte ou quando o efluente coletado não é tratado adequadamente.
A Figura 56, apresentada a seguir mostra a enorme mancha de detritos saindo do Canal
da Joatinga e poluindo a praia da Barra da Tijuca: reflexo da poluição na região das lagunas de
Jacarepaguá.
Figura 56. Poluição da praia da Barra da Tijuca pelo Canal da
Joatinga
(UERJ EM QUESTAO/Comuns Diretoria de Comunicação
n° 80 jan-mar. 2003. Foto: David Zee)
169
O aporte de esgoto pode ocorrer diretamente na fonte geradora - as habitações - onde a
ausência ou precariedade do sistema fará o lançamento no sistema de drenagem, ou no solo,
em áreas peridomiciliares, caso não seja possível um tratamento prévio privado. Não obstante,
verifica-se poluição por ligações irregulares mesmo em áreas dotadas de rede coletora
pública.
As águas e solo tornam-se contaminadas com agentes patogênicos de fontes tais como:
ligações prediais, redes coletoras de esgoto sanitário, fossas sépticas, sistema de drenagem
previamente contaminado e finalmente, pela defecação a céu aberto por pessoas que não
dispõem de nenhum tipo de disposição adequado para as excretas. Quando ocorrem as
precipitações, a parcela do escoamento superficial das águas pluviais em solos contaminados
gera as “valas negras”.
O estado de conservação e de manutenção do sistema de esgotamento sanitário e
pluvial, acrescido das condições de contorno do solo, conforme descrito no item 4.2.
determina a quantidade de águas e águas residuárias que entram ou saem das tubulações, ora
atuando como dreno, captando lençol freático e vazamentos de esgotos no solo, ora
promovendo a percolação dos esgotos sanitário e pluvial para o solo.
As caixas separadoras (gordura, óleo, areia, etc.) do sistema de coleta e transporte de
esgoto, de uma maneira geral, encontram problemas de adequação de projeto, construção e
limpeza, bem como de destino final adequado do material retido. Verifica-se que, em muitos
casos, estas estruturas, fundamentais para a conservação do sistema como um todo, não
exercem sua função básica, transformando-se em “caixas de passagem”. Além disso, existe a
lamentável prática de se coletarem os resíduos separados do efluente nestas caixas
separadoras e lançá-los na rede coletora de esgoto sanitário, nas galerias de águas pluviais,
corpos hídricos ou terrenos baldios, o que também ocorre amplamente com os lodos
removidos na limpeza dos tanques sépticos.
Nas áreas que não possuem rede coletora de esgoto sanitário, mesmo quando atendida
a recomendação de tratamento prévio, normalmente por tanques sépticos, antes do lançamento
nos corpos hídricos ou no solo, geram-se impactos devido à baixa eficiência deste sistema,
conforme descrito anteriormente no item # 6.3.1. O mesmo ocorre com as estações de
tratamento de redes públicas, que mesmo obedecendo à eficiência concebida (o que é raro)
encaminham uma poluição residual. A estações de tratamento de esgoto sanitário (ETE) não
são projetadas para atingir 100% de eficiência, e mesmo naquelas onde a remoção é de 99%,
dependendo da vazão do efluente, da capacidade de sobrevivência do microorganismo
lançado e de sua periculosidade, a permanência de 1% em determinado corpo hídrico pode
170
representar risco à salubridade. A questão está em estabelecer níveis aceitáveis para estes
riscos.
A avaliação do sistema de esgotamento sanitário deve considerar situações distintas.
Inicialmente, os regimes operacionais normais e os de emergência, provenientes de
paralisações de parte do sistema por motivos diversos (obstrução, ruptura de tubulação, falta
de energia elétrica, acidentes, etc.), que podem provocar colapsos com transbordamento de
esgotos pelos poços de visita e, dependendo das cotas, nas próprias caixas de inspeção,
internas ao loteamento das residências. Outra variação está nas condições de estiagem e no
período de chuvas fortes.
Os períodos chuvosos potencializam os problemas e ampliam a disseminação das
águas residuárias, aumentando a probabilidade de contaminações. As possibilidades de
contato com as águas poluídas dos rios pode ocorrer pelo transbordamento nas calhas dos rios,
através do remanso das águas pelas tubulações das ligações prediais ou pela expansão dos
córregos e “valas negras”. Os corpos receptores estão sujeitos a toda sorte de poluição durante
as chuvas. Exemplo marcante se dá na orla marítima com a presença das “línguas negras” que
se formam nas praias, contaminando suas areias e águas, conforme podem ser observadas nas
Figuras 57a, 57b e 57c a seguir.
(b) Praia de Copacabana, em frente à rua
Souza Lima, 07/01/2003.
(a) Canal do Jardim de Alah, 14/04/ 2001.
(c) Praia de Ipanema, próximo a rua Farme de
Amoedo, 07/01/2003.
Figura 57. Formação de “línguas negras” (Jornal “O Globo”).
171
A mistura das águas pluviais com esgoto sanitário não resulta unicamente na diluição
do mesmo. Além do lançamento das águas residuárias nos corpos d’água pelas tubulações das
ligações prediais ou redes públicas de esgoto sanitário, que caracterizam a poluição pontual, a
poluição difusa se pela drenagem urbana de superfícies poluídas, tais como: vias públicas,
áreas industriais, áreas de agricultura intensiva, etc. As chuvas que caem sobre esses locais
promovem o carreamento de resíduos sólidos, óleos, pesticidas, nutrientes, metais pesados e
outros produtos químicos, propiciando a poluição dos corpos hídricos.
Em países onde o controle da poluição pontual se encontra satisfatoriamente
equacionado, o foco das iniciativas tem se direcionado para o controle da poluição difusa,
proveniente da drenagem pluvial. Nos Estados Unidos, a Agência de Proteção Ambiental
(EPA) incluiu em 1996, no seu Plano de Diretrizes para Efluentes, a poluição por águas
pluviais (Von Sperling, 1996).
A perspectiva do controle de poluição difusa parece distante, em um cenário em que
nem a poluição pontual tem sido, na prática, controlada. Portanto, a concentração de esforços
e recursos indica a necessidade de se priorizar no Brasil o controle de lançamentos industriais
e domésticos pontuais. Não obstante, a poluição difusa e seus efeitos não podem ser
desconsiderados, e seu equacionamento deve ser articulado com as fontes pontuais, pois as
relações causais destes problemas se inter-relacionam e são interdependentes.
O sistema de drenagem pluvial urbano, devido à precariedade dos serviços ou por sua
inadequada interação com as deficiências dos sistemas de esgotamento sanitário,
abastecimento de água e gestão de resíduos sólidos, está sujeito a propiciar a transmissão de
doenças. Nas enchentes comumente são enfocadas as vítimas fatais, decorrentes das
inundações, escorregamentos de encostas ou casas destruídas, subestimando-se os riscos de
transmissão de doenças e mortes que podem, inclusive, persistir após a ocorrência de chuvas.
Nos assentamentos humanos pauperizados, esta realidade torna-se mais evidente pelas
péssimas condições ambientais. Deve ser compreendida e ratificada na drenagem pluvial sua
relevância como uma questão de saúde pública e ambiental, muitas vezes negligenciada.
As Figuras 58a, 58b e 58c apresentadas na gina seguinte, revelam as condições de
insalubridade das habitações da favela Rio das Pedras, em Jacarepaguá, com detalhe para o
despejo de esgotos domésticos nos corpos receptores.
172
(b)
(a)
(c)
Figura 58. Ligações irregulares de esgoto doméstico na favela Rio das Pedras
(Revista CREA-RJ, fev.-mar. 2003).
Através de consulta iterativa a diversos especialistas, Souza et al (2002) desenvolveu
um modelo causal, denominado Carência ou Precariedade dos Serviços de Drenagem
Urbana - Ocorrência de Doenças (CPSDU), onde classifica as doenças em quatro grupos, a
saber:
Grupo I: doenças transmitidas por vetores alados que podem proliferar em
empoçamentos e alagadiços, como: febre amarela urbana, dengue, filariose e malária;
Grupo II: doenças cujo agente etiológico utiliza um hospedeiro aquático
intermediário que prolifera em alagadiços, como a esquistossomose;
Grupo III: doenças transmitidas pelo contato direto com água ou solo cuja
contaminação é favorecida por inundações e alagadiços, como a leptospirose;
Grupo IV: doenças transmitidas pela ingestão de água contaminada por agentes
etiológicos presentes em alagadiços e inundações e que penetram na rede de
abastecimento de água; doenças transmitidas pelo contato direto com solos cuja
contaminação por esses agentes é favorecida por inundações e alagadiços, como:
febre tifóide, cólera e outras diarréias, hepatite A, ascaridíase e tricuríase, todas pela
água e a ancilostomíase pela água e solo.
173
O modelo causal CPSDU, representado pelas ilustrações da Figura 59, a seguir, indica
diversas condições precárias de drenagem. Não obstante, a autora adverte que o modelo não
abrange a complexidade das relações multicausais que ocorrem na natureza, relativamente à
etiologia das doenças nele incluídas.
Figura 59. Modelo causal de doenças relacionadas à drenagem urbana
(Souza et al., 2002).
Nascimento Jr., J.A. 1999.
Nascimento Jr., J.A. 1999.
CPSDU
subpressão
na rede de
distribuição
de água
ingestão de água
contaminada
ocorrência de
diarréias,
hepatite A e
febre tifóide
alagadiço
alagadiços
contaminação da
água pela penetração
de agentes patogênicos
existentes nos
alagadiços e áreas
inundadas
contaminação do
solo por larvas
infectantes ou
ovos de helmintos
contato direto com
solo contaminado,
ingestão de ovos pela
água, alimentos,
ou os contaminadas
ocorrência de
helmintoses
como ascaridíase,
tricuríase e
ancilostomíase
CPSDU
alagadiços
e inundações
proliferação
do caramujo
hospedeiro
lançamento de
resíduos sólidos na
macrodrenagem
contaminão da
água e infecção
do caramujo por
S. mansoni
contato direto
com água
contaminada
ocorrência de
esquistossomose
lançamento de
esgotos na
macrodrenagem
CPSDU
empoçamentos
lançamento de
resíduos sólidos
e esgotos no sistema
de DU
proliferação de
vetores
ocorrência de
dengue e febre
amarela urbana
empoçamento em boca-de-lobo
picada do vetor
infectado pelos vírus
DEN 1, 2, 3 ou 4 ou
amarílico
empoçamentos
e alagadiços
proliferação
de vetores
picada do
vetor
infectado
pela
W. bancrofti
ocorrência
de
filariose
empoçamentos
lançamento de
resíduos sólidos
e esgotos no
sistema de DU
(drenagem urbana
)
picada do vetor
infectado pelo
Plasmodium
ocorrência
de malária
empoçamento em vala
proliferação
de vetores
CPSDU
Abreu,
L
Revista ECOS
. DMAE, Porto Alegre (12), p.21, 1998
inundação
CPSDU
lançamento de
resíduos sólidos
no sistema de DU
lançamento de
esgotos no sistema
de DU, introduzindo
leptospiras eliminadas
pelos ratos que habitam as
redes coletoras
inundações
disseminação das
leptospiras
oriundas
dos esgotos e do
ambiente
contato direto
com águas
contaminadas
ocorrência
de
leptospirose
leptospirose
Tavares, E.
Revista ECOS
. DMAE,
Porto Alegre (13), capa, 1998
174
O empoçamento em vala a céu aberto funciona como criadouro de mosquitos vetores
da malária. Associado ao lançamento de resíduos sólidos e ao descarte de esgotos no sistema
de drenagem, favorece a proliferação dos mosquitos vetores da filariose, os quais têm
preferência por criadouros ricos em matéria orgânica em decomposição. O empoçamento em
boca-de-lobo, causado pelo lançamento de resíduos sólidos e esgotos no sistema de drenagem,
favorece o desenvolvimento de vetores transmissores da dengue e da febre amarela urbana.
O alagadiço, uma vez que é resultante do lançamento de resíduos sólidos nos canais de
drenagem, ao receber matéria orgânica em abundância proveniente do descarte de esgotos,
pode apresentar condições propícias à proliferação do caramujo hospedeiro do agente causal
da esquistossomose, o qual, igualmente, é introduzido nesse meio pelos esgotos. O contato
direto com águas contaminadas favorece a ocorrência da doença. Da mesma forma, os esgotos
podem causar a contaminação do solo por larvas infectantes ou ovos de helmintos causadores
da ascaridíase, da ancilostomíase e da tricuríase. Quanto à ascaridíase, o mecanismo de
transmissão consiste na contaminação do solo pela eliminação de ovos do parasita, juntamente
com excrementos de indivíduos doentes, seguida da contaminação da água e alimentos e da
ingestão destes por indivíduos sadios. No caso da ancilostomíase, a contaminação pode
ocorrer por meio do contato direto com solos onde estejam presentes larvas infectantes do
helminto causador, ou ainda pela ingestão de água e alimentos contaminados por ovos ou
larvas. Com relação a tricuríase, os ovos embrionados ou infectantes do parasita, depositados
no solo juntamente com excrementos de indivíduos doentes, podem ser ingeridos por meio da
água ou alimentos, dando curso à infestação de indivíduos sãos (Souza, 2002).
Favorece-se também, a contaminação da água potável distribuída à população por
meio de redes de abastecimento, quando estas se encontram em contato direto com água
parada. Nesse caso, havendo subpressão na rede, os agentes causais da hepatite A, da febre
tifóide e de diversos tipos de diarréia, bem como a cólera, uma vez presente no alagadiço,
poderá ser succionado para o interior da rede.
Um ponto de alto risco de contaminação são as cisternas, reservatórios enterrados para
acúmulo de água potável. A dificuldade em garantir o fornecimento contínuo de água potável
em algumas áreas da cidade resultou na disseminação de cisternas nas residências para
reservação a fim de garantir o suprimento nos períodos de descontinuidade no abastecimento.
Estas estruturas enterradas tornaram-se vulneráveis mediante o contato com solo e águas
subterrâneas contaminadas pela percolação de esgotos sanitários.
As inundações causadas pela obstrução dos sistemas de drenagem pelo lançamento de
resíduos sólidos disseminam no ambiente a bactéria do gênero Leptospira, introduzidas
175
pelo descarte de esgoto sanitário que traz consigo o agente etiológico da leptospirose
eliminado pelos ratos que habitam as redes coletoras de esgoto sanitário (Souza et al, 2002).
Os corpos hídricos degradados e as tubulações de esgotos sanitários e pluviais, podem
ser habitatsde ratos, moscas e baratas, que encontram fontes de alimento e abrigo. Estes
vetores, em interação com populações de microorganismos, são componentes potenciais das
cadeias epidemiológicas em ambiente urbano, onde vários mecanismos de regulação de
populações estão ausentes. A intensidade desse contato pela ausência ou deficiência dos
sistemas de saneamento, é medida pelo confronto entre a densidade populacional humana na
área e a população de parasitos. A dimensão cultural amplificam ou diminuem os efeitos
dessas barreiras, através das condutas e comportamentos individuais e familiares.
O plano diretor de drenagem da cidade do Rio de Janeiro, a ser desenvolvido, deverá,
segundo termo de referência de seu edital de licitação, realizar a caracterização e diagnóstico
preliminar dos problemas de saúde pública decorrentes da inexistência ou ao inadequado
funcionamento dos sistemas de drenagem das águas pluviais e para sua redução e controle,
propor ações no sistema (PCRJ, 1999). Este estudo de referência está abordado no item #
7.2.4.
A Figura 60, apresentada abaixo, representa esquematicamente a formas em que se
dão as trocas entre as diversas fontes de poluição e os corpos receptores entendidos como as
coleções hídricas continentais, orla marítima e solo.
Figura 60. Modelo de troca “esgoto - coleções hídricas”
(Adaptado de COPPETEC, 2001).
TROCAS ACIDENTAIS
Extravazamentos e
acidentes do sistema
de esgoto sanitário
Dragagens
Poluição Difusa
(” ”)run off
Inverno (seca)
Verão (chuva)
Lençol Freático
Contaminado
TROCAS SAZONAIS
Galeria de
Águas Pluviais
Sistema de esgoto
sanitário
TROCAS CONTÍNUAS
Rios / Canais
176
Os rios e canais poluídos geram condições vulneráveis de contaminação à população
uma vez que os cursos d’água não possuem a devida proteção nas bordas das calhas para
impedir possíveis contatos, nem informações sobre os riscos existentes. O poder blico, ao
negligenciar as informações necessárias à população acerca dos riscos epidemiológicos
provenientes das águas de drenagem e dos corpos receptores contaminados, aumenta a
possibilidade de contato primário e, conseqüentemente, de insalubridade. De toda a
população, são as crianças mais particularmente expostas à contaminação por brincarem ou
tomarem banho em águas superficiais contaminadas e sem proteção, ou simplesmente por
andarem sobre terrenos contaminados e com “valas negras”.
Para a redução de casos de morbidade e mortalidade por doenças infecto-contagiosas,
a implantação de sistemas adequados de esgotamento sanitário e pluvial são necessárias, mas
não suficientes. As doenças normalmente possuem determinantes múltiplos e configuram em
alguns casos uma complexa cadeia causal. É necessário, portanto, um conjunto de ações
sistêmicas nas diversas escalas espaciais e temporais. Como exemplo, tem-se o estudo do
marco causal da diarréia
8
em crianças de até 5 anos, realizado por Heller, em 1995 (apud
Heller, 1997) para a cidade de Betim (MG). O modelo desenvolvido neste estudo de caso,
apresentado na Figura 61, a seguir, demonstra a inter-relação condicional entre os sistemas de
saneamento, o nível sócio-econômico da população, seus hábitos e a relação com vetores.
Posse de geladeira
ABASTECIMENTO
DE ÁGUA
Existência de
reservatório
domiciliar
ESGOTAMENTO
SANITÁRIO
Esgotos escoando
na via pública
DISPOSIÇÃO DE
LIXO
Acondicionamento
Disposição
Disposição fraldas
ÁGUA PLUVIAL
Inundação do lote
ESTRUTURA FAMILIAR
Número crianças na casa
Idade da criança
Religião da mãe
HÁBITOS
HIGIÊNICOS
Preparo de
alimentos
PRESENÇA
DE VETORES
Baratas
Moscas (?)
DIARRÉIA
INFANTIL
NÍVEL SÓCIO-
ECONÔMICO
Figura 61. Marco casual da diarréia em Betim, MG (Heller, 1997).
8
A diarréia constitui sintoma de diversas etiologias, cada qual com seus respectivos fatores de risco. O emprego
do indicador de morbidade por enfermidades diarréicas tem sido referendado pelos estudos de impacto das
intervenções de saneamento.
177
Devido à periculosidade do esgoto sanitário, alguns estudos de aplicação de novos
materiais, equipamentos e tecnologias se justificam ou orientam a concepção a fim de
diminuir ao máximo o possível contato físico de operários e dos próprios operadores com
estes sistemas (Sautchúk, 2001). Mesmo sendo proibida pelas companhias de saneamento,
ainda assim, em muitas situações, o contato com esgotos continua ocorrendo. São necessários
para os técnicos de operação e manutenção treinamento e qualificação permanentes.
Infelizmente em relação a outros estados, o Rio de Janeiro encontra-se atrasado aos cuidados
neste aspecto. O aumento gradual de mão de obra terceirizada reduz a qualidade dos serviços,
dificultando o processo de aperfeiçoamento contínuo e aumentando os riscos embutidos.
6.5. Discussão
O fato de os coletores de drenagem pluvial receberem aportes de esgoto sanitário
devido as interconexões, em áreas contempladas pelo sistema separador absoluto, não o torna
um sistema unitário, uma vez que o tipo de efluente define diversas características das
unidades que compõe os respectivos sistemas. Além disso, cada concepção deve ser
previamente estabelecida e dimensionada para suas próprias condições operacionais. Os
esgotos sanitários, diferentemente das águas pluviais, não podem ser transportados em canais
(seção aberta), mas em condutos subterrâneos que garantam a estanqueidade necessária.
Outrossim, estes efluentes não podem ser lançados nos corpos receptores sem tratamento
prévio, o que é permitido às águas lançadas pelas galerias de águas pluviais.
Portanto, o transporte de esgoto sanitário pelo sistema de drenagem pluvial e o aporte
de águas pluviais no sistema de esgotamento sanitário, conforme detalhado no subitem # 6.3.,
são situações atípicas ao sistema separador absoluto. Para serem implementadas deveriam ser
submetidas à rigorosa análise de alternativas, devidamente justificadas e subsidiadas por
estudos de impacto ambiental, que considere os riscos sanitários e ambientais.
Em sistemas unitários adequadamente concebidos e projetados, dispositivos de
regulagem e manobras, bem como vertedores e tanques de acumulação, reduzem
apreciavelmente a poluição dos corpos receptores. Após a ocorrência de chuvas, a água
armazenada pode ser bombeada para estações de tratamento. A aplicação de extravasores em
um sistema de esgotamento do tipo unitário ou misto requer estudos de hidrogramas de
contribuições a fim de se conhecer a freqüência, as vazões e os volumes de extravasamento,
mantendo-se assim as condições de qualidade desejadas para os corpos receptores. Este
esgotamento é concebido para tratar um determinado limite de vazão, superior à vazão de
tempo seco, podendo inclusive, contemplar tanques de acumulação capazes de reter
178
determinado volume de água pluvial correspondente a um tempo de recorrência fixado
(Tourinho, 2001). Desta forma, o projeto sofre uma análise de custo-benefício, onde os riscos
sanitários e ambientais devem estar inseridos, sendo os extravasores, parte da
operacionalização do sistema. Situação completamente distinta da que vem acontecendo
desde longa data, na cidade do Rio de Janeiro.
O próprio Interceptor Oceânico da Zona Sul, projetado para receber, além das
contribuições do sistema de esgotamento sanitário, os esgotos que afluíam das galerias de
drenagem contribuintes à orla marítima - subsistema concebido como unitário - passaram a
ter, por acumulo de problemas operacionais, a disfunção de extravasar os esgotos coletados,
promovendo a poluição das praias em determinadas condições de chuvas.
Estas improvisações emergenciais quase nunca são desfeitas, deixando o sistema
sujeito a mau funcionamento hidráulico, sem autolimpeza, com incremento de material
sedimentável, distanciando-se da original organização de esgotamento das bacias. Esta
desfiguração é um empecilho a estudos, projetos e análises de desempenho. Em muitos casos,
não há registros destas obras, nem identificação dos extravasamentos e rompimentos na rede.
Quanto as interconexões dos sistemas de esgotos provenientes de inadequadas
instalações prediais e ligações prediais nos coletores públicos, assunto devidamente
detalhado, vale, neste momento, ressaltar sua relevância através das palavras, ainda atuais, de
Brito (Obras, v.II, 1909): não raro deverão atribuir ao mau funcionamento do esgoto - o
intestino da casa - certos males que em vão procurem combater nos moradores doentes, será
então preciso sanear a casa para curar o doente”.
Mesmo com a permuta de poder, os diversos governos de estado identificam os
extravasores e as ligações prediais irregulares como um problema que deve ser solucionado,
conforme apresentado no item # 6.3. Entretanto, até o momento não foi implantado nenhum
programa contínuo em larga escala, que priorizasse esta finalidade e possibilitasse recuperar a
configuração original dos sistemas, orientando-se por estudos, projetos e cadastros técnicos.
As soluções atípicas ao sistema separador absoluto, decorrentes das interconexões
arbitrárias, sem projetos formais de alteração, improvisadas, ou mesmo as concebidas e
fundamentadas em projetos, conforme apresentado nos subitens # 6.3.2. e 6.3.3, são
implementadas com a precária justificativa da viabilidade emergencial ou provisória, mas
muitas vezes acabam por funcionar definitivamente, com reflexos sobre a eficiência dos
sistemas de saneamento e sua credibilidade.
Parece redundante a afirmação de que os sistemas devem operar conforme concebidos
em projetos. Não obstante, observa-se ser este um dos maiores problemas dos sistemas de
esgotos do município do Rio de Janeiro. As práticas precárias e informais de
179
operacionalização da rede coletora de esgoto sanitário são, em muitos casos, executadas sem a
mínima condição técnica, limitando-se a impedir o transbordamento de esgotos nas vias
públicas. Com isso, não são avaliados os impactos dos sistemas envolvidos no meio ambiente.
A falta de cadastro do sistema e de suas alterações torna-o vulnerável, como se constata na
avaliação da auditoria ambiental da Lagoa Rodrigo de Freitas (COPPETEC, 2001), que pode,
inclusive, ser estendida para outras áreas da cidade.
(...) Com efeito a indisponibilidade nos locais de trabalho de documentos técnicos de
engenharia (por exemplo, plantas de situação e cortes & elevações, folhas de dados de
equipamentos e fluxogramas de engenharia, entre outros), a deficiência da comunicação
entre o cadastro e as unidades operacionais (o que determina a não revisão & atualização
dos desenhos das instalações para manutenção), a inexistência de procedimentos
operacionais escritos e documentados e consolidados em um Manual de Operações (tanto
os relacionados com a operação do sistema em regime normal, quanto os relacionados com
situações e eventos de emergência), a inexistência de um programa de inspeção e
manutenção preventiva dos elementos do sistema (a manutenção é corretiva, sendo, a
maioria das vezes, iniciada por situações de anormalidade operacional; em uma palavra:
“manutenção tipo apagar incêndio”) e a constatação da não realização de treinamento do
operadores, caracteriza um quadro de improvisação gerencial.
Nas Captações de Tempo Seco, também atípicas, para sua aplicação adequada, deves-
se verificar o excedente de vazão, conhecer a freqüência dos extravasamentos, as vazões e os
respectivos volumes dos esgotos eliminados nos corpos hídricos (Goldenfum et al., 1997). Ao
que tudo indica, este estudo não é realizado no Rio de Janeiro e conseqüentemente, não são
avaliados os impactos no sistema de drenagem pluvial e nos corpos receptores. Este recurso
também é feito, de forma precária, diretamente nas galerias de drenagem, através da
implantação de soleiras vertentes nos próprios condutos.
A aplicação da idéia de coletar e tratar apenas as vazões de “tempo seco” do sistema
pluvial conectado ao esgotamento sanitário conduzirá certamente a um sistema não confiável.
Por ocasião das cheias, o esgoto sanitário misturado às águas pluviais sem tratamento
continuará a ter como destino final o solo, as coleções hídricas continentais e a orla marítima,
aumentando o risco epidemiológico das inundações.
As Galerias de Cintura ao longo da orla marítima da Zona Sul foram utilizadas para
transferir os poluentes para outros pontos menos valorizados ou visíveis em um dado
momento, mantendo-se o problema. Algumas foram conectadas ao emissário e outras,
posteriormente adequadas a esta situação.
A questão ficou reduzida à destinação final mais adequada das águas residuárias. Esta
alternativa mantém as águas transportadas pelas galerias de águas pluviais poluídas pelo
aporte irregular de esgoto sanitário. Os pontos de deságüe das galerias de drenagem
distribuem-se naturalmente por toda a orla marítima e a implantação de galerias de cintura
180
para impedir a poluição das praias pelas línguas negras se torna infactível, não garantindo a
segurança do sistema diante de chuvas intensas.
Com esta superposição de barreiras sanitárias, não se considera a necessidade de
melhorias no sistema de esgotamento sanitário, concebido exatamente para impedir a poluição
das praias, dos sistemas de drenagem pluvial e do solo. Atualmente as línguas negras se
espalham por vários pontos da orla marítima, inclusive nos trechos contemplados por estas
galerias de cintura, que inclusive se encontram depreciadas.
A opção pelos Aterros e Desvios de Rios e Canais incorre no mesmo erro de
transferência de poluição, solução que no passado podia ter alguma justificativa, atualmente
se torna obsoleta e inadequada, frente à limitação dos recursos naturais, à condição de
saturação da cidade e seu entorno e à consciência ambiental.
No caso da Lagoa Rodrigo de Freitas permanece o impasse, a partir do momento que
não se opte pela recuperação dos rios afluentes aos canais e do monitoramento destes.
Para o rio Guandu, a proposta de transferência do deságüe dos rios dos Poços,
Queimados e Ipiranga, de montante para jusante do ponto de tomada d’água, mesmo com a
proposta de tratamento pontual no final curso do rio, significa incorrer em erro, pois não
recupera a condição ambiental ao longo da bacia hidrográfica, a qual não dispõe de redes de
esgotamento sanitário. Com a possível implantação de nova estação de tratamento no rio
associada ao desvio reitera-se a superposição de barreiras sanitárias.
Mesmo nos países com excelentes meios de controle técnico de equipamentos
públicos, as duas redes de esgotos jamais atingem uma total separação. A diferença está no
nível desta interconexão e na respectiva vulnerabilidade e comprometimento do sistema que,
em nosso caso, vem tornando-se incapaz de atender às premissas ambientais, o que é
exemplificado pelo estado de degradação das coleções hídricas.
Deve-se procurar equilibrar o grau de eficiência ou nível de segurança sanitária e
ambiental requerida à disponibilidade de recursos para implantação, operação e manutenção.
Não obstante, estes recursos devem ser suficientes para que a capacidade de proteção dos
sistemas seja efetiva e não resulte em desperdício de investimentos em sistemas obsoletos,
podendo eliminar as vantagens que o sistema separador absoluto possui frente aos outros
tipos de esgotamento.
A desatenção com as causas da poluição dos corpos hídricos vem trazendo aumento do
nível e expansão desta, o que resulta no acréscimo dos níveis de tratamento de água, com a
implantação de tecnologias cada vez mais sofisticadas e superposição de tratamentos com a
implantação de barreiras múltiplas de estações ao longo do curso das águas, requerendo
insumos de produtos e energia cada vez mais vultosos. Dada a poluição das águas, o processo
181
denominado “filtração rápida”, antes considerado o ápice em termos de tratamento de água,
está hoje em dia comprometido (Kligerman, 2001).
Até mesmo o principal manancial que abastece a cidade do Rio de Janeiro vem
sofrendo com a poluição por esgotos sanitários e industriais. Os problemas ocorridos no verão
de 2002 tiveram como principal destaque as algas azuis - cianobactérias - que proliferam em
ambientes aquáticos poluídos por esgotos.
Segundo a CEDAE, em artigo publicado na Revista da FAPERJ (2002), cerca de
seis anos é adicionado ao tratamento, junto ao sulfato de alumínio, sais de ferro e polímeros, e
estão em estudo novos produtos químicos para otimizar e intensificar o tratamento. dez
anos os filtros funcionavam 24 horas seguidas. Hoje a operação de limpeza, pode ser
readequada para 18 ou 12 horas.
Atualmente, a tecnologia de tratamento de água vem necessitando de técnicas
adicionais aos processos denominados “convencionais”
9
, dentre eles: a oxidação química,
adsorção em carvão ativado e filtração em membranas de alta pressão, que foram evoluindo e
sendo adicionadas ao processo, em decorrência do aumento do nível e variedade de poluentes.
Isto gera a necessidade de mudança nos limites de parâmetros e a incorporação de outros,
decorrentes de novos contaminantes, inclusive por suas ações sinérgicas.
Vale ressaltar que todas estas alterações partem do pressuposto de que haja uma
administração eficiente das estações de tratamento, com recursos suficientes e contínuos para
atender as novas demandas operacionais.
O aumento da eficiência dos tratamentos gera acréscimo nos rejeitos líquidos e
sólidos que saem das estações. O lodo gerado necessita de soluções e disposição final
adequada e definitiva para não impactar o meio ambiente.
Os problemas no tratamento dos esgotos sanitários começam antes da chegada nas
estações. Com a fragilidade dos sistemas de coleta e transporte, estas estações ficam com suas
rotinas operacionais e gerenciais comprometidas. A concepção adotada no Rio de Janeiro
possui como característica a concentração das águas residuárias em unidades de tratamento de
grande porte. Entretanto, o não atendimento à eficiência concebida pode resultar no
agravamento das condições ambientais. As ETEs devem estar submetidas, portanto, a um
controle operacional rigoroso e sistemático.
A proposta da Estação de Despoluição do Rio Carioca e de outras novas estações em
cursos d’água no país e no Rio de Janeiro minimiza o problema da poluição hídrica, como no
deságüe na praia do Flamengo, mas não deixa de ser paliativa. Sua eficácia ainda de ser
9
As estações de tratamento de água, do tipo convencionais, são constituídas pelos processos: coagulação,
floculação, decantação, filtração e desinfecção.
182
comprovada no caso de ser feito algum monitoramento ambiental, tanto nos aspectos
epidemiológicos como mesológicos.
Não se pode concordar que uma intervenção atípica seja ambientalmente satisfatória.
Sua própria concepção encerra caráter emergencial, provocado pelo acúmulo histórico dos
problemas de defasagem e manutenção dos sistemas de esgotamento sanitário e pluvial. O
tratamento somente no desemboque propõe-se a garantir a balneabilidade da praia, próximo
ao deságüe, mas não devolve à população local o curso do rio, que permanece poluído.
Neste caso, esta concepção é agravada por passar em áreas contíguas densamente
ocupadas por diversas classes sociais, incluindo comunidades carentes, dentre outros serviços,
da eficiência dos sistemas de saneamento. No passado, diversas iniciativas foram
implementadas visando à despoluição deste importante rio, conforme apresentado no trabalho
Anexo. Diante da implantação da estação, estas passaram a ser secundarizadas, quando não
inviabilizadas. A ampliação desta alternativa assume conceitualmente a ineficiência dos
sistemas de esgotos enquanto barreiras sanitárias e transforma oficialmente o próprio rio em
um canal de esgoto, permitindo o contato deste com a população, principalmente a infantil.
Projetos como estes prevêem e legitimam a contaminação por esgoto sanitário e industrial.
A complexidade operacional deste sistema, relacionada com os altos custos dos
insumos, elencados no subitem # 6.3.3., além das dificuldades decorrentes da ampla faixa de
vazão do rio e da constante mudança no grau de poluição de suas águas, o torna muito
oneroso. Esta variação quantitativa e qualitativa das águas a serem tratadas, associada aos
altos custos de operação e manutenção, pode comprometer sua eficiência e eficácia.
Outro ponto a se considerar é a interligação com as águas da Baía de Guanabara, cuja
hidrodinâmica é condicionada aos movimentos das marés astronômicas e outras variáveis
ambientais peculiares das áreas costeiras que podem trazer problemas no regime de operação
e tratamento em uma estação tão próxima ao deságüe.
Atuando na conseqüência da falta de coleta e transporte dos esgotos sanitários
gerados, a Estação de Despoluição do Canal da Rocinha não impede a proximidade dos
resíduos com a população, pois nas áreas peridomicilares não melhoria nas condições
sanitárias. O resultado do tratamento proposto só será percebido na praia de São Conrado,
cartão postal da cidade. Como apontado na implantação dos sistemas condominiais, a solução
neste caso requer sustentabilidade, possível mediante o envolvimento da comunidade. As
alternativas tecnológicas que não levam em consideração os usuários dos equipamentos
desvinculam-se de qualquer processo de mudança social.
A Estação de Tratamento de Praias, representada aqui pelo Parque Ambiental da
Praia de Ramos, coincide com a alternativa anterior em não eliminar as fontes de poluição do
183
corpo receptor, neste caso as praias. Prioriza o tratamento das águas já poluídas para o uso em
atividades recreativas de balneabilidade. Novamente, outras ações integradas relativas à
melhoria efetiva do ecossistema marinho foram secundarizadas. A implantação de uma
piscina artificial não devolveu ao carioca, e suprimiu ao ecossistema, a praia de Ramos,
outrora intensamente usufruída. Neste caso uma superposição de ações, uma vez que esta
área está contemplada no PDBG, o que até o momento não trouxe melhorias significativas ao
controle da poluição desta área.
Algumas das estruturas existentes no Rio de Janeiro estão representadas
esquematicamente nos fluxogramas apresentados nas páginas seguintes. A Figura 62
representa a Solução Convencional Eficiente, onde o ciclo antropogênico das águas segue um
fluxo bem definido nas fases de entrada e saída dos processos.
Neste fluxograma está representada a possibilidade da prática do reúso de esgotos
domésticos tratados para fins não potáveis, tais como: atividades agrícolas, urbanas,
industriais, paisagísticos, recreacionais, etc. Isto se através do aproveitamento direto das
águas anteriormente utilizadas, uma ou mais vezes, para suprir demandas de outras atividades,
ou de uso original (Giordani, 2003). Esta alternativa vem sofrendo intenso desenvolvimento
tecnológico com altos investimentos, plenamente justificados pela limitação dos ecossistemas
em assimilar o atual aporte de esgotos e a necessidade de racionalizar o consumo de água.
O aproveitamento de subprodutos das atividades humanas aponta como uma das
melhores alternativas no controle da poluição visando à otimização da utilização hídrica e a
melhoria da qualidade ambiental. Esta otimização se pelo uso racional das águas para as
diversas funções residências (profiláticos, cocção e fisiológico), descritos no subitem # 4.2.,
como reduz o aporte de esgoto nos corpos hídricos, diminuindo o nível e extensão da poluição
e a pressão sobre os ecossistemas nos dois extremos do fluxograma. Esta concepção
transforma resíduo em matéria-prima e vem de encontro aos princípios estabelecidos na
Agenda 21 estando em consonância ao conceito de desenvolvimento sustentável, abordado no
item # 5.1.
As estações de tratamento de água e esgoto com suas respectivas redes obedecem de
forma eficiente as funções claramente definidas de barreiras de proteção às atividades
antrópicas e de proteção mesológica, respectivamente, permitindo assim o processo de
assimilação dos ecossistemas. Nesta parcela do ciclo das águas não pode ser encarado como
fechado por não ser permitido o lançamento direto de efluentes nos mananciais.
Na Figura 63, estão representadas as Soluções Atípicas Insustentáveis, que diferem
significativamente do fluxograma anterior, pois além de possuírem o encaminhamento
convencional do sistema de esgotamento sanitário, representado em seu término pelas
184
estações de tratamento de esgoto ou pela disposição oceânica através do emissário submarino,
o esgoto sanitário subdivide-se indevidamente na rede coletora por caminhos distintos nos
subsistemas de drenagem pluvial. Mesmo no sentido convencional, está identificada a
sobrecarga submetida a ETA (Guandu) para tratar as águas poluídas do manancial e o
deficitário tratamento dos esgotos.
A contribuição direta dos esgotos residenciais (representada pelo consumo humano)
para os corpos hídricos também se através das ligações prediais irregulares. Parcelas de
esgotos são lançadas diretamente nas coleções hídricas, ou preliminarmente no sistema de
drenagem pluvial, através dos extravasores da rede coletora pública. A interconexão entre as
redes coletoras de esgoto sanitário e pluvial se nos dois sentidos, uma vez que os aportes
indevidos ocorrem nessas duas situações em condições peculiares.
Na tentativa de trazer de volta parcela dos esgotos sanitários, antes perdidos pelo
sistema de esgotamento sanitário, são implementadas estruturas de captação de tempo seco
nas galerias de águas pluviais contaminadas. Outra iniciativa consiste em interceptar as
galerias de águas pluviais pelas galerias de cintura e pelo interceptor oceânico. Em todas estas
situações verificam-se deficiências com o extravasamento nos corpos hídricos.
Estão representadas também as estações de tratamento atípicas do rio Carioca e do
Parque Ambiental de Ramos, ambas destinadas a garantir a balneabilidade perdida nas praias
pela poluição advinda das situações citadas anteriormente. Os lodos separados no tratamento
dessas estações são lançados nas redes coletoras de esgoto sanitário e encaminhados para as
estações de tratamento de esgoto convencionais, para novamente serem separados para
destino final adequado, como os aterros sanitários.
Figura 62. Fluxograma da “Solução Convencional Eficiente”.
ÁGUA ÁGUA
ÁGUA
ESGOTO
ESGOTO
ETA
ETE
CONSUMO
HUMANO
DE ÁGUA
DISTRIBUIDORA
REDE
ESGOTO SANITÁRIO
COLETORA DE
REDE
HÍDRICO
CORPO
HÍDRICO
CORPO
FINAL
DESTINO
LODO
FINAL
DESTINO
LODO
ESGOTO
BRUTA TRATADA
TRATADA SANITÁRIO
SANITÁRIO TRATATO
ESGOTO TRATADO
(REUSO)
ÁGUA
ÁGUA
ESGOTO
ETE
CONSUMO
HUMANO
DE ÁGUA
DISTRIBUIDORA
REDE
HÍDRICO
CORPO
FINAL
DESTINO
LODO
REDE
ESGOTO SANITÁRIO
COLETORA DE
ÁGUAS PLUVIAIS
GALERIA DE
ÁGUAS
ESGOTO SANITÁRIO
ÁGUAS PLUVIAIS
INTERCEPTOR
OCEÂNICO
ÁGUAS PLUVIAIS
ESGOTO SANITÁRIO
GALERIAS DE CINTURA
ÁGUAS PLUVIAIS +
EMISSÁRIO SUBMARINO
DE IPANEMA
ESGOTO
ESGOTO SANITÁRIO
PARQUE AMBIENTAL
DA PRAIA DE RAMOS
ÁGUAS PLUVIAIS + ESGOTO SANITÁRIOS
ÁGUA SALGADA +
ÁGUA TRATADA
ESTAÇÃO DE TRATAMENTO
DA PRAIA DE RAMOS
BRUTA +
TRATADO
TRATADO SANITÁRIO
PLUVIAIS
ESGOTO SANITÁRIO
SANITÁRIO
ÁGUAS
RESIDUÁRIAS
ÁGUA
ÁGUAS RESIDUÁRIAS
ESGOTO
PARCIALMENTE TRATADO
FINAL
DESTINO
LODO
ÁGUAS PLUVIAIS
GALERIA DE
ÁGUAS PLUVIAIS +
ESGOTO SANITÁRIO
ESGOTO SANITÁRIO
LODO
HÍDRICO
CORPO
R
I
O
C
A
R
I
O
C
A
ESGOTO SANITÁRIO
ÁGUAS PLUVIAIS
Á
G
U
A
S
P
L
U
V
I
A
I
S
+
TEMPO SECO
CAPTAÇÕES DE
Á
G
U
A
P
L
U
V
I
A
I
S
+
E
S
G
O
T
O
S
A
N
I
T
Á
R
I
O
ESGOTO SANITÁRIO
PLUVIAIS +
ESGOTO
SANITÁRIO
ÁGUAS
ESTAÇÃO DE DESPOLUIÇÃO
LODO
ÁGUA BRUTA +
ESGOTO SANITÁRIO
ÁGUA
PARCIALMENTE TRATADA
E
S
G
O
T
O
S
A
N
I
T
Á
R
I
O
DO RIO CARIOCA
ÁGUA BRUTA +
ESGOTO SANITÁRIO
ESGOTO SANITÁRIO
ÁGUAS PLUVIAIS
LODO
(DISPOSIÇÃO OCEÂNICA)
ESGOTO SANITÁRIO (EXTRAVASORES)
ÁGUAS PLUVIAIS +
ESGOTO SANITÁRIO
LODO
LODO
ESGOTO SANITÁRIO (LIGAÇÕES PREDIAIS IRREGULARES)
(
L
I
G
A
Ç
Õ
E
S
P
R
E
D
I
A
I
S
I
R
R
E
G
U
L
A
R
E
S
)
E
S
G
O
T
O
S
A
N
I
T
Á
R
I
O
(LIGAÇÕES PREDIAIS IRREGULARES)
ESGOTO SANITÁRIO
(EXTRAVASORES)
(EXTRAVASORES)
GALERIAS DE CINTURA
ÁGUAS PLUVIAIS +
ESGOTO SANITÁRIO
ÁGUA BRUTA +
ESGOTO SANITÁRIO
ÁGUAS PLUVIAIS + ESGOTO SANITÁRIOS
ESGOTO SANITÁRIO
ÁGUAS PLUVIAIS +
ÁGUAS PLUVIAIS +
ESGOTO SANITÁRIO
C
O
R
P
O
H
Í
D
R
I
C
O
ÁGUAS PLUVIAIS + ESGOTO SANITÁRIO
(CHUVAS)
ESGOTO SANITÁRIO
(INEFICIENTE)
(EM SOBRECARGA)
ETA - GUANDU
Figura 63. Fluxograma das “Soluções Atípicas Insustentáveis”.
187
O aspecto que generaliza as intervenções aqui abordadas obedece a um padrão
tecnológico complexo, envolvendo altos custos de implantação, operação e manutenção. A
solução tecnológica e construtiva escolhida mantém as condições atuais de degradação
ambiental dos corpos hídricos e não impede o incremento progressivo e cumulativo das fontes
de poluentes provenientes das interconexões.
As diversas estruturas e condições de operação atípicas, gradualmente adotadas nos
sistemas de esgotos do Rio de Janeiro, apresentam-se cada vez mais insustentáveis, sob as
perspectivas operacional, sanitária e ambiental, com consumo de espaço, tempo e energia
elevados, fato evidente ao se extrapolar para uma possível necessidade de tratamento artificial
em todos os rios e praias poluídos.
O poder público não deve estar vulnerável a antecipação de soluções, devido às
naturais pressões exercidas pelos interesses dos envolvidos, como construtores, projetistas e
vendedores de equipamentos, além da própria pressão política exercida pela população,
carente de espaços públicos para lazer e ansiosa por respostas imediatas.
A compreensão de pluralidade e da não neutralidade das opções técnicas, tangíveis ou
não, as suas múltiplas determinações e a estreita vinculação entre estas opções tecnológicas e
seus impactos sociais e ambientais (Tudela, 1982 apud Kligerman, 1995).
As práticas adotadas, em sua grande maioria, desconsideram o papel fundamental
exercido pela população atendida, que alijada das alternativas implementadas, não
desempenha uma postura pró-ativa de valorização e proteção dos sistemas de esgotos e dos
corpos hídricos, mantendo-se com isso, bitos e costumes indevidos, arraigados
culturalmente, alimentados pela falta de educação sanitária e ambiental, impactando
negativamente os sistemas naturais e artificiais com seus resíduos.
Os padrões tecnológicos devem ser revistos no sentido de garantirem uma melhor
qualidade ambiental, aproximando-se do conceito de tecnologia apropriada, que parte da
idéia de que a tecnologia não seja somente técnica e econômica, mas adaptável ao meio
ambiente sócio-cultural da inovação e que desenvolva a autoconfiança da comunidade.
Implica em um julgamento tanto dos que desenvolveram a tecnologia como daqueles que vão
utilizá-la e dela se beneficiar (Kligerman, 1995).
A análise de que o sistema deve ser entendido como um todo constituinte do
ecossistema urbano é pertinente para a abordagem dessas questões, uma vez que as soluções a
serem adotadas nos componentes dos sistemas trazem reflexos ao conjunto, em relações
cíclicas e cumulativas.
O esgotamento sanitário da Cidade do Rio de Janeiro é de responsabilidade do Estado,
através da CEDAE. A drenagem pluvial é de competência da PCRJ, através da Fundação
188
Instituto das Águas do Município do Rio de Janeiro (Rio-Águas). O que se verifica é que não
existem ações integradas entre estes órgãos, estando as intervenções de ambas ocorrendo,
como se fosse possível, de maneira autônoma entre si, não levando em consideração a alta
interdependência destes sistemas.
O controle do aporte de esgotos, o manejo ambiental e até mesmo a revitalização de
rios são, sem dúvida, as melhores formas de recuperação da qualidade ambiental de qualquer
corpo d’água. Tais ações dependem mais de vontade política que da execução de obras
fragmentadas ou desarticuladas, ou de um único programa de governo. Devem estar
relacionadas à melhoria dos atuais sistemas de esgotamento (sanitário e pluvial) e a um
planejamento ambiental urbano que considere a inter-relação entre os sistemas de
saneamento, a sociedade e o ecossistema, em sua forma mais abrangente.
Pelo acima exposto, conclui-se que o equacionamento desta problemática, enquanto
um conjunto de ações que não contemplem monitoramento, controle e fiscalização na redução
dos aportes de poluição através de um programa contínuo de eliminação das interconexões
apresenta-se inadequado, devendo haver uma mudança de curso nas soluções implementadas
no controle da poluição urbana dos corpos hídricos, proposta abordada no próximo capítulo.
Em tese, o sistema separador absoluto adotado no país é, via de regra, considerado
por muitos o mais adequado e de maior segurança sanitária e ambiental. Não obstante, outras
alternativas, em condições específicas, podem ser mais recomendáveis, desde que sejam
adequadamente projetadas, construídas e operacionalizadas. As condições planialtimétricas e
mesmo as de economia social podem variar dentro da mesma cidade, exigindo que se
procure, através de investigação local, em cada processo, os elementos mais adaptáveis em
cada sítio, de modo a firmar com critérios técnicos, a melhor alternativa de esgotamento.
A compreensão do problema e a proposição de alternativas técnicas fazem parte da
aplicação e do próprio exercício da engenharia. O fato dos sistemas de esgotos envolverem
questões hidráulicas, eletromecânicas, construtivas, topográficas, ambientais, sociais, de
hábitos e higiene, etc., requer estudos detalhados que contemplem todos estes aspectos a fim
de se obterem soluções duradouras e sustentáveis.
189
7. VALORIZAÇÃO DAS COLEÇÕES HÍDRICAS - UMA NOVA PERSPECTIVA
“O que as pessoas não compreendem, não valorizam; o que elas não valorizam
não protegem, e o que não protegem elas perdem” (Charles Jordan).
7.1. Generalidades
A água se distribui nos diferentes reservatórios do planeta: oceanos, geleiras, rios, lagos,
represas, subsolos e atmosfera, ficando cada vez mais indisponível para aqueles queo zelam pela
qualidade das colões dricas e de suas nascentes.
A relação entre os corpos hídricos e o esgotamento sanitário é naturalmente
interdependente, uma vez que pertencem ao mesmo ciclo antropogênico de uso das águas, em
que a captação deste recurso mineral, sua adução, tratamento, reservação e distribuição
para os diversos usos. Geram-se os efluentes que por sua vez devem ser coletados,
transportados e tratados para poderem ter como destino final as coleções hídricas. A água
pode ser considerada elemento integrador de planejamento das ações antrópicas. A sua
qualidade deve ser vista como ponto de partida e de chegada na perspectiva de construção de
uma gestão ambiental integrada entre saneamento e saúde.
O planejamento urbano ambiental deve compreender o ciclo hidrológico (incluindo-se a
fase antropogênica) como elemento-chave na gestão do saneamento dos centros urbanos,
monitorando o estado do meio receptor, as fontes poluidoras e o impacto dos poluentes sobre os
cursos d’água, gerando informações que condicionem a regulação dos veis de tratamento dos
rejeitos urbanos em fuão do estado atual dos corpos hídricos para o estabelecimento de metas de
qualidade que devem ser, acima de tudo, fiscalizadas, para de fato minimizarem os impactos
ambientais.
Os sistemas urbanos devem estar integrados a fim de constituir uma estrutura ampla e
ambientalmente sauvel na organização complexa, dimica e instável das cidades. A defesa do
meio ambiente é ao mesmo tempo uma premissa, uma alise impermeada e um objetivo final. A
combinação das diversas atividades, bem como a imporncia de cada um dos sistemas, variarão
segundo as taxas de produção de reduos, as condições físicas e cio-econômicas locais e as
prioridades estabelecidas pelo poder blico, fundamentalmente.
O sistema de esgotamento sanitário, enquanto barreira sanitária e ecológica dos meios:
hídrico, edáfico, atmosférico e antrópico, deve estar articulado principalmente com o da
drenagem urbana, o parcelamento, ocupação e uso dos solos, o sistema viário e a gestão dos
resíduos sólidos.
190
A bacia hidrográfica, além de se configurar como um ecossistema propício ao
gerenciamento prático, possibilita a medição e avaliação do quanto as sociedades humanas
interferem nos sistemas naturais e quais as conseqüências para a sustentabilidade das cidades.
Esta possibilidade de controle se principalmente através de indicadores de quantidade e
qualidade do sistema de drenagem da bacia, face ao papel integrador da água no ecossistema
(Schult, 2000).
Na publicação Revitalização de Rios - Orientação Técnica, da antiga Secretaria de
Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Rio de Janeiro, 2001) afirma-se a
importância do reconhecimento dos seguintes aspectos:
Rios e córregos são mais que simples transportadores de água;
Rios e córregos devem ser protegidos contra lixo e esgotos com vistas à saúde pública;
Rios e córregos necessitam de espaço natural de escoamento, suficiente para evitar os
danos provocados pelas enchentes;
Rios e córregos são áreas de recreação, esporte, lazer e contemplação;
Rios e córregos têm influência determinante no bem-estar e equilíbrio emocional do
homem, o que torna relevante a preocupação com as paisagens;
Rios e córregos têm papel decisivo no processo histórico de desenvolvimento dos
núcleos urbanos e das comunidades rurais;
Rios e córregos são ecossistemas complexos;
Rios e córregos apresentam múltiplos usos, mas precisam de quantidade e qualidade
mínimas para sua sobrevivência;
Rios e córregos necessitam da assistência e do envolvimento da população na sua
preservação;
Rios e córregos não são somente áreas de exploração econômica para o homem;
Rios e córregos são essenciais à vida.
Barros (1995) considera a água sob três aspectos distintos: enquanto elemento ou
componente físico da natureza, ambiente para vida aquática e fator indispensável à vida.
Enquanto elemento ou componente físico da natureza promove a manutenção da umidade do
ar e a estabilidade climática.
A inserção das coleções hídricas no ambiente é essencial ao equilíbrio do ecossistema
urbano. A conveniência de um maior contato com os corpos hídricos naturais e artificiais se
sob várias justificativas, algumas ainda não suficientemente reconhecidas. Os ambientes
191
aquáticos podem desempenhar funções ambientais, recreativas e de harmonia paisagística.
Permite a realização de atividades diversas, tais como caminhar, correr e receber a função
relaxante das águas (efeito de espelho, movimentação ao vento, quietude, presença de
pássaros, linhas de curvas em contraste com a arquitetura urbana de características lineares).
Favorece maior vínculo entre vizinhos, provocado pela maior probabilidade de encontros no
entorno do ambiente aquático e conferindo maior sensação de segurança (Von Sperling,
2003a).
Segundo Von Sperling (2003a), pesquisas em Los Angeles concluem que os corpos
d’água urbanos diminuem a criminalidade e reduzem a agressividade em pessoas portadoras
do mal de Alzheimer. Além disso, contribuem significativamente para educação ambiental de
crianças e adultos, constituindo-se em habitat para a vida selvagem e em um excelente espaço
para apresentação e discussão de iniciativas pedagógicas. É direito natural de cada habitante
do planeta usufruir o saudável e relaxante contato com a água.
O atual comprometimento dos principais rios utilizados como mananciais no Rio de
Janeiro e em outros estados, conforme descrito no subitem # 6.2.2., vem fazendo com que as
atenções quanto ao controle de poluição e sua recuperação aumentem. Os mananciais
justificam ações prioritárias de recuperação ambiental e controle. Entretanto, mesmo sob este
enfoque, os resultados ainda são diminutos frente ao acelerado processo de degradação
ambiental.
Outrossim, as atenções e investimentos devem ser também direcionados para as outras
possíveis utilizações das águas ao longo das bacias hidrográficas antropizadas, incluindo-as
de forma mais harmônica no cenário urbano. O processo tecnológico adotado de
transformação urbana foi subtraindo da vida dos habitantes das cidades o significado histórico
dos rios e várzeas. O espaço resultante segue a lógica utilitária positivista, que visa
incessantemente maiores rentabilidades e gera uma relação abstrata com os espaços, artificiais
e estranhos às culturas das populações.
Observam-se no município e no país, raras experiências de valorização dos cursos
d’água urbanos. Provocam-se preferencialmente drásticas desconfigurações das bacias
hidrográficas, com a descaracterização ou exclusão dos cursos d’água naturais através de
aterros, desvios, retificação e canalização com revestimentos diversos (predominância do
concreto), além da priorização de redes subterrâneas para o escoamento. Estas intervenções
são feitas sob as seguintes justificativas:
Ampliação das áreas para assentamentos humanos;
Viabilização de vias férreas e estradas;
192
Drenagem de áreas de baixadas úmidas;
Aumento de velocidade de escoamento, com redução de níveis de pico das cheias e da
possibilidade de inundações;
Dimensionamento das canalizações por métodos amplamente conhecidos;
Implantação de interceptores de esgoto sanitário;
Manutenção facilitada;
Transformação dos cursos d’água em “canais de esgoto a céu aberto”;
Desejo expresso pelas comunidades.
O desejo expresso pelas comunidades em canalizar cursos d’água ambientalmente
comprometidos é justificável e conseqüência dos riscos à salubridade trazidos pelos mesmos,
intensificados nas inundações. A supressão do rio expressa a necessidade de solução imediata
frente às péssimas condições de vida nas construções próximas às margens dos corpos
hídricos, onde exercem e sofrem impactos ambientais diretos.
Este desejo de mudança vem sendo aproveitado historicamente pelos responsáveis
pelos traçados das cidades, por ser menos custoso do que outras soluções, que necessitariam,
dentre outras ações, de realização de desapropriações custosas. Em contraposição às
habitações localizadas indevidamente nas margens dos rios, Brito (Obras, v.XX, 1927) propõe
em diversos artigos, as avenidas marginas
1
, como segue:
(...) Os cursos de água atravessando os quarteirões habitados, sem avenidas laterais,
constituem elemento de insalubridade em vez de fatores para a higiene e o aformoseamento;
cobri-los, mais tarde, será um remendo pouco satisfatório para a velha inadvertência.
Atualmente na drenagem urbana tem sido amplamente aceito pela comunidade
acadêmico-científica, a concepção de controle de cheias através da redução da velocidade de
escoamento, com a redução dos problemas de inundação a jusante. Para isso tem sido
indicado a regularização das vazões, priorizando a criação de áreas de infiltração e bacias de
retenção, reflorestamento, etc. ao longo de toda bacia hidrográfica, técnicas denominadas
ações não estruturais. A utilização de áreas de várzea para retenção das águas pluviais era
amplamente defendida por Saturnino de Brito, nas propostas de melhoramentos do Rio Tietê.
Não obstante, a alternativa de bacias de retenção encontra dificuldades de implementação
quando a drenagem pluvial se encontra com elevado grau de poluição, uma vez que a retenção
das águas poluídas aumenta os riscos epidemiológicos e ambientais, além de causar
1
As avenidas sanitárias são a utilização dos fundos de vale pela combinação de sistemas viários e de
interceptores de esgotos sanitários que passam pelas margens de canais abertos (Barros, 1995).
193
problemas operacionais e de manutenção. Assim, a redução da poluição das águas pluviais e
fluviais passa a ser, para esta conceituação, uma premissa técnica.
No Brasil, a fase Higienista, apresentada no capítulo # 5.1, ainda manifesta grande
influência na organização do espaço urbano por meio de concepções correntes de tratamento
de água nas cidades (esgotos pluvial e doméstico, cursos d’água, lagos naturais e artificiais,
etc.), as freqüentemente chamadas soluções clássicas de drenagem. Seu principal objetivo é
remover, tão rápido quanto possível, os esgotos do meio urbano (Nascimento, 1999). A partir
dos anos 70, observa-se em países da Europa e da América do Norte, a construção de novos
modelos e concepções para tratar os problemas de drenagem com a valorização da água em
meio urbano, antagonistas ao modelo de inspiração higienista.
O Quadro 10, apresentado abaixo, discrimina as mudanças conceituais e práticas
relativas aos sistemas de drenagem.
Quadro 10. Contraponto entre conceitos higienistas e alternativos de drenagem.
Higienismo Soluções Alternativas
Drenagem rápida das águas pluviais.
Favorecimento à infiltração, ao armazenamento e
ao aumento do tempo de percurso do
escoamento.
Redes subterrâneas, canalização de cursos d’água
naturais.
Valorização da presença da água na cidade,
busca de menor interferência sobre o sistema
natural de drenagem.
Associação do sistema de drenagem ao sistema
viário.
Desenvolvimento de soluções técnicas
multifuncionais, combinando o sistema de
drenagem com a implantação de áreas verdes,
terrenos de esporte, parques lineares, etc.
Sistema de drenagem gravitacional, não
controlado, configuração fixa da rede de
drenagem.
Sistema de drenagem controlado, possibilidade
de alteração na configuração da rede de
drenagem.
Concepção e dimensionamento segundo um nível
único de risco de inundação pré-estabelecido,
para atender a um único objetivo.
Concepção e dimensionamento segundo
diferentes níveis de risco de inundação, para
atender a objetivos diferenciados.
Não previsão e inoperância em face de eventos de
tempos de retorno superiores aos de projeto.
Avaliação do funcionamento do sistema para
eventos de tempos de retorno superiores aos de
projeto, gestão do risco de inundação.
Ênfase na garantia de condições de saúde pública
e de conforto no meio urbano;
Despreocupação com os impactos da urbanização
sobre os meios receptores.
Preocupação com a garantia de condições
adequadas de saúde pública e conforto no meio
urbano e de redução dos impactos da
urbanização sobre os meios receptores.
Fonte: Nascimento, 1999.
A inclusão dos cursos d’água na paisagem urbana é uma exigência do mundo
moderno, onde a valorização ambiental deve incluir as águas que circulam no interior das
cidades e as que as circundam. Devem ser para isso desenvolvidos estudos abrangentes sobre
os efeitos da poluição hídrica na qualidade ambiental urbana local.
194
Dentre as possibilidades decorrentes das melhorias dos sistemas de esgoto sanirio e
valorizão do sistema de drenagem urbano, destacam-se:
Recuperação da qualidade dos recursos hídricos e do ecossistema urbano em geral;
Melhoria da qualidade de vida e bem-estar da população, principalmente daquela
localizada em bairros adjacentes aos corpos hídricos;
Diminuição dos riscos ambientais e epidemiológicos, com conseqüente redução de
acidentes e impactos ambientais;
Otimização dos sistemas, com manutenção corretiva e economia de insumos;
Melhoria da imagem da Cidade do Rio de Janeiro, no que se refere às políticas
ambientais e de preservação do meio ambiente urbano;
Maior credibilidade às políticas públicas do meio ambiente junto à sociedade;
Conscientização ambiental, confiança na cidadania e na participação comunitária
como elementos agregadores e de difusão de posturas cooperativas;
Melhoria da imagem do poder público e das concessionárias responsáveis pelos
sistemas envolvidos;
Valorização profissional e motivação do quadro de funcionários responsáveis pelos
sistemas de saneamento;
Redução de conflitos com a comunidade e apoio aos serviços públicos;
Diminuição da vulnerabilidade das empresas concessionárias às sanções
administrativas (multas e encargos), sanções civis (indenização por danos ambientais)
e sanções criminais (responsabilização por crime ambiental).
Diversas experiências de recomposição de rios realizadas na Europa (Rio de Janeiro,
2002) e nos Estados Unidos (Revista Rio-Águas, 2002), buscando restabelecer características
mais naturais, mostraram-se em alguns casos factíveis, mesmo com as restrições impostas
pelo meio urbano. Renaturalizar, termo utilizado neste tipo de intervenção, não significa
devolver à situação natural, mas criar um sistema sustentável, em harmonia com a paisagem
urbana.
A realidade brasileira impõe restrições específicas de recursos e viabilidade técnica.
Não obstante, a natureza e seus limitados recursos urgem por um novo paradigma nas relações
com os ecossistemas urbanos, que não pode reduzir as águas à econômica categoria de
recursos hídricos.
195
7.2. Estudos de Referência
Diversos projetos, programas de saneamento, planos diretores
2
e leis apontam e
ratificam a necessidade de mudança de postura frente ao tratamento dado as águas urbanas
(internas e do entorno). O desafio está no cumprimento desses estudos, plenamente
justificados.
7.2.1. Política de Recursos Hídricos
A lei federal 9.433/97, conhecida como Lei das Águas”, coloca o Brasil entre os
países de legislação mais avançada do mundo no setor de recursos hídricos. Pode ser
considerada um marco da organização e articulação entre os setores afins. A Política
Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes fundamentos:
A água é um bem de domínio público;
A água é um recurso natural limitado dotado de valor econômico;
A bacia hidrográfica é a unidade de territorial (de planejamento) para implantação da
Política Nacional de Recursos Hídricos;
A gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do
Poder Público, dos usuários e das comunidades;
Em situação de escassez, o uso prioritário dos recursos dricos é o consumo humano
e a dessedentação de animais;
A gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas.
Como diretrizes gerais de ação para implementação desta política estabelecem-se:
Gestão sistemática dos recursos hídricos, sem dissociação dos aspectos quantidade e
qualidade;
Adequação às diversidades físicas, bióticas, demográficas, econômicas, sociais e
culturais das diversas regiões do País;
Integração com a gestão ambiental;
2
Os Planos Diretores, neste caso, referem-se aos documentos normalmente produzidos pelas empresas de
saneamento, podendo contar com a contratação de empresas de consultoria. Tais planos são concebidos a partir
de um diagnóstico das condições ambientais, sociais e econômicas, a fim de identificar demandas atuais e futuras
dos sistemas de abastecimento de água, esgotamento sanitário, drenagem pluvial e gestão de resíduos sólidos de
uma cidade ou região, planejando um conjunto de obras, ações e investimentos pertinentes aos objetivos
estabelecidos, para um período fixado.
196
Articulação do planejamento com os setores usuários e com os planejamentos
regionais, estaduais e nacionais;
Articulação com o uso dos solos;
Integração da gestão das bacias hidrográficas com a dos sistemas estuarinos e zonas
costeiras.
A lei estadual 3.239/99, que institui a Política Estadual de Recursos Hídricos,
complementa a lei federal 9.433/97 e ratifica a resolução CONAMA n
o
20/86. O
enquadramento dos corpos d’água em classes, segundo os usos preponderantes, é um dos
instrumentos da Política Nacional (Lei 9.433/97) e Estadual (Lei 3.239/99) de Recursos
Hídricos e visa assegurar às águas qualidade compatível com os usos mais exigentes a que
forem destinadas, além de diminuir custos de combate à poluição, mediante ações preventivas
permanentes.
7.2.2. Classificação e Uso dos Corpos Hídricos
A política de preservação ambiental dos corpos d’água no Brasil, através da resolução
CONAMA n
o
20/86, estabelece níveis mínimos de qualidade para os corpos hídricos em
função dos seus usos preponderantes ou dos que se pretende alcançar. A classificação e
enquadramento das águas no Rio de Janeiro devem seguir este instrumento legal, uma vez que
não possui, em nível estadual, critérios específicos mais restritivos.
A gestão de recursos hídricos inclui atualmente os usos múltiplos das águas. Despoluir
os cursos d’água é imprescindível para possibilidade de (re)introdução de outros usos, além
do transporte de águas residuárias, de resíduos sólidos e como meio drenante. Neste sentido, a
conservação de cursos d’água, em áreas urbanas e rurais, bem como a proteção de águas
subterrâneas, constituem instrumentos integrais da gestão de recursos hídricos.
A legislação estabelece padrões de qualidade através de critérios científicos que
buscam quantificar a qualidade da água em termos de parâmetros e características físicas,
químicas, biológicas e estéticas. Os limites fixados objetivam garantir, de acordo com a
classificação das águas, as possibilidades de usos designados, contanto que não causem
efeitos prejudiciais.
A resolução, portanto, classifica as águas em doces (salinidade < 0,05%), salobras
(salinidade entre 0,05% e 3%) e salinas (salinidade > 3%). Em função dos usos previstos,
foram estabelecidas nove classes, são elas: especial, 1, 2, 3, e 4 para águas doces; 5 e 6,
relativas às salobras e 7 e 8 para as salinas.
197
Os usos previstos das águas doces, de acordo com sua classificação, estão listados no
Quadro 11, apresentado na página seguinte.
Quadro 11.
Classificação das águas doces em função dos usos preponderantes.
Uso Preponderante Classe
Abastecimento doméstico, sem prévia ou com simples desinfecção
Especial
Preservação do equilíbrio natural das comunidades aquáticas Especial
Abastecimento doméstico após tratamento simplificado 1
Irrigação de hortaliças e frutas rentes ao solo e que sejam ingeridas cruas 1
Proteção das comunidades aquáticas 1, 2
Recreação de contato primário 1, 2
Criação de espécies natural e/ou intensiva (aqüicultura) destinadas à
alimentação humana
1, 2
Irrigação de hortaliças ou plantas frutíferas 2
Abastecimento doméstico após tratamento convencional 2, 3
Dessedentação de animais 3
Irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas e forrageiras 3
Navegação 4
Harmonia paisagística 4
Usos menos exigentes 4
Fonte: Resolução CONAMA n
0
20/86.
Como pode ser verificado, a assimilação dos esgotos não é colocada diretamente pela
resolução enquanto possibilidade de uso. Entretanto, é permitido seu lançamento dentro dos
limites estabelecidos às alterações nos corpos hídricos de acordo com a classificação.
Em seu endereço eletrônico oficial, na internet, a FEEMA divide a utilização das
coleções hídricos em dois grupos, a saber:
Grupo I: Usos que implicam na retirada
de água das coleções hídricas:
Abastecimento público;
Abastecimento industrial;
Irrigação.
Grupo II: Usos que não implicam em
retirar a água das coleções hídricas:
Recreação e lazer;
Preservação da fauna e flora;
Geração de energia;
Diluição de despejos.
198
Outras possibilidades de usos dos recursos hídricos, seus requisitos de qualidade e
efeitos podem se apresentados, conforme o Quadro 12 e representados esquematicamente nos
usos múltiplos pela Figura 64, subseqüente.
Quadro 12. Usos diversos das águas.
Forma Finalidade Tipo de Uso
Uso
Consuntivo
Requisitos de
Qualidade
Efeitos nas
Águas
Abastecimento
Urbano
Abastecimento
doméstico,
industrial,comercial e
público
Baixo, de 10%
sem contar as
perdas nas redes
Altos ou
médios,
influindo no
custo do
tratamento
Poluição orgânica
e bacteriológica
Abastecimento
Industrial
Sanitário, de processo,
incorporação de
produto, refrigeração e
geração de vapor
Médio, de 20%
variando com
tipo de uso e de
Indústria
Médios,
variando com o
tipo de uso
Poluição orgânica,
substâncias
tóxicas, elevação
de temperatura
Irrigação
Irrigação artificial de
culturas agrícolas
segundo diversos
métodos
Alto, de 90%
Médios,
dependendo do
tipo de cultura
Carreamento de
agrotóxicos e
fertilizantes
Abastecimento
Doméstico,
dessedentação de
animais
Baixo, de 10% Médios
Alterações na
qualidade com
efeitos difusos
Com
derivação
de águas
Aqüicultura
Estações de
piscicultura e outras
Baixo, de 10% Altos
Carreamento de
matéria orgânica
Geração
hidrelétrica
Acionamento de
turbinas hidráulicas
Perdas por
evaporação do
reservatório
Baixos
Alterações no
regime e na
qualidade de água
Navegação
fluvial
Manutenção de
calados mínimos e
eclusagem
Não há Baixos
Lançamento de
óleos e
combustíveis
Recreação, Lazer
e Harmonia
Paisagística
Natação e outros
esportes com contato
direto, iatismo e
motonáutica
Lazer
contemplativo
Não há
Altos,
especialmente
recreações de
contato primário
Pesca
Com fins comerciais
de espécies naturais ou
introduzidas através de
estações de
pisciculturas
Não há
Altos, nos
corpos de água
corrente, lagos
ou reservatórios
artificiais
Alterações na
qualidade após
mortandade de
peixes
Assimilação de
Esgotos
Diluição,
autodepuração e
transporte de esgotos
urbanos e industriais
Não há Não há
Poluição orgânica,
física, química,
bacteriológica
Sem
derivação
de águas
Usos de
preservação
Vazões para assegurar
o equilíbrio ecológico
Não há Não há
Melhoria da
qualidade da água
Fonte: Barth, 1994 apud Silva, 1998.
199
Figura 64. Usos das Águas (Braga, et al., 2002).
Outra função, não evidenciada no Quadro 12, mas exposta no Quadro 10 é
representada na Figura 64, é que lagos, lagoas, represas e áreas de depressão em geral,
naturais ou não, podem exercer função importante no controle e mitigação das inundações,
funcionando como reservatórios de acumulação e de tratamento de água.
Dentro de uma visão geral de gestão de recursos hídricos, na área cnica outras
possibilidades vêm ganhando espaço, tais como a captação, a reservação e a utilização das
águas pluviais para atividades residenciais. As habitações podem ser concebidas no sentido de
complementar a gestão das águas pluviais, pois as que caem dentro dos lotes privados podem
ser retidas ou reutilizadas a fim de reduzirem sua parcela de contribuição para o run off.
Estudos de viabilidade vêm sendo desenvolvidos para implantação de novas tecnologias no
âmbito privado: eco-arquitetura, “arquitetura bioclimática”, “arquitetura das águas”, etc.
Como exemplo, a lei n
o
13.276, da Prefeitura do Município de São Paulo, que torna
obrigatória a execução de reservatório para as águas coletadas por coberturas e pavimentos
nos lotes, edificados ou não, que tenham área impermeabilizada superior a 500 m
2
.
Outra possibilidade seria o encaminhamento de uma parcela das águas pluviais já
coletadas nas galerias para finalidades diversas, como limpeza de logradouros, por exemplo. É
mister apontar que em muitos casos os usos são cumulativos, podendo agregar diversas
vantagens concomitantemente.
200
A indicação das classes e dos respectivos padrões de qualidade dos corpos d’água
constitui-se também em uma decisão política. Fatores de natureza legal, técnica, social,
econômica e ecológica estão presentes. Em águas das Classes 1 a 8 são tolerados lançamentos
de despejos, desde que não sejam ultrapassados os limites estabelecidos.
A Tabela 5, apresentada abaixo, destaca alguns destes principais parâmetros:
Tabela 5. Padrões de qualidade dos principais parâmetros das águas, de acordo com a
classificação da Resolução CONAMA n
o
20/86.
Classe (Padrão para corpo d’água)
Parâmetro
1 2 3 4 5 6 7 8
DBO
5
(mg/L) 3 5 10 - 5 10 5 -
OD (mg/L) 6 5 4 2 6 4 5 3
Turbidez (UNT) 40 100 100 - - - - -
Cor (mg Pt/L) 30 75 75 - - - - -
pH 6,0-9,0
6,0-9,0 6,0-9,0
6,0-9,0
6,5-8,5
6,5-8,5
6,5-8,5
5,0-9,0
Obs.:
1. Consultar a legislação para a lista completa dos parâmetros.
2. Na Classe Especial não são permitidos lançamentos de qualquer natureza, mesmo que tratados.
Em princípio, um efluente deve satisfazer tanto ao padrão de qualidade do corpo
receptor (segundo sua classe) quanto ao seu padrão de lançamento (independente da classe do
corpo receptor). Para o enquadramento de cada corpo hídrico corresponderão padrões de
qualidade a serem mantidos, e, de acordo com as capacidades de diluição e autodepuração
deste mesmo corpo hídrico, as características máximas aceitáveis para o lançamento de
esgotos e seus respectivos graus de tratamento. Quanto aos padrões de lançamento, no Estado
do Rio de Janeiro, além do CONAMA n
o
20/86, deve-se obedecer ao prescrito na norma
técnica da FEEMA: NT-202. R.10, Critérios e Padrões para Lançamento de Efluentes
Líquidos, uma vez que os órgãos de controle ambiental estaduais podem acrescentar outros
parâmetros ou tornar mais restritivos os estabelecidos pela legislação federal. O padrão de
lançamento pode ser excedido, também com permissão do órgão ambiental, caso os padrões
de qualidade do corpo receptor sejam resguardados, mediante estudo de impacto ambiental, e
desde que fixados o tipo de tratamento e suas condições de lançamento.
Estudos de Sperling (1999) identificam que algumas legislações estaduais, como a do
Estado do Rio de Janeiro (FEEMA: NT-202 R.10) estabelecem limites para os parâmetros
típicos de esgoto doméstico, diferentes daqueles estabelecidos pela legislação nacional
(CONAMA n
o
20/86), onde são ausentes. Este fato demonstra maior preocupação em
disciplinar o lançamento de esgoto doméstico, usualmente menos fiscalizado e controlado
pela maioria dos órgãos ambientais estaduais, em comparação aos efluentes industriais.
201
Através da Comissão Estadual de Controle Ambiental (CECA), o Governo do Estado
do Rio de Janeiro deveria promover o enquadramento dos corpos d’água nas classes previstas
estabelecendo programas de controle de poluição para sua efetivação. À FEEMA, enquanto
órgão técnico ambiental do estado, cabe a proposição deste enquadramento. As últimas
classificações datam de 1979, e estão, portanto, baseadas na legislação anterior, em que o
número e tipo de classes eram diferentes dos atuais (CEDAE, 1994; Kligerman, 2001).
Segundo o Art. 20-f do CONAMA n
o
20/86, para os casos em que os corpos d’água
não estão enquadrados, as águas doces serão consideradas Classe 2; as salinas, Classe 5 e as
salobras, Classe 7, porém, aquelas enquadradas na legislação anterior permanecerão na
mesma classe, até seu reenquadramento. Um critério simplificado e aproximado foi
estabelecido para indicar, de forma expedita, a situação em que se apresentavam os corpos
d’água do estado. A partir deste critério as águas foram classificadas em: livre, de transição e
crítico, de acordo com as condições descritas na Tabela 6, a seguir. Este critério foi adotado
por ocasião dos levantamentos de qualidade dos mananciais, no Plano Diretor de
Abastecimento de Água da RMRJ e utilizado no Plano Diretor de Esgotamento Sanitário
(CEDAE, 1994).
Tabela 6. Classificação expedita da situação dos corpos d’água.
Critério OD (mg/L) DBO (mg/L)
Livre 8,2 a 6,0 < 6,0
Transição 6,4 a 4,0 6,0 a 10,0
Crítico < 4,0 > 10,0
Fonte: CEDAE, 1994.
Segundo o PDES-RMRJ (1994), tem-se:
O Relatório de Trabalho R-401: Qualidade dos Corpos Receptores - Diagnóstico,
apresentou no seu Anexo II uma listagem dos diversos corpos d’água da RMRJ com as
respectivas classes em que se acham enquadrados. Do exame dessa listagem, se pode
verificar que nem sempre (grifo nosso) o enquadramento atual corresponde às
características de qualidade existentes nos corpos d’água.
Esta citação poderia estar mais de acordo com a realidade atual se fosse substituída a
expressão “nem sempre” por “em sua grande maioria”.
A lei estadual n° 3.239/99, onde se define que o enquadramento dos corpos d’água é
de responsabilidade dos Comitês de Bacia Hidrográfica. Em seu cap. IV, seção II - do
enquadramento dos corpos de água em classes, art. 17, tem-se:
Os enquadramentos dos corpos de água, nas respectivas classes de uso, serão feitos, na
forma da lei, pelos Comitês de Bacia Hidrográfica (CBH's) e homologados pelo Conselho
Estadual de Recursos Hídricos (CERHI), após avaliação técnica pelo órgão competente do
Poder Executivo.
202
Não obstante, o artigo supracitado deveria esclarecer e ratificar a necessidade do poder
público classificar todos os corpos hídricos, mesmo aqueles que não disponham no momento
de comitês de bacia para, em conjunto com os órgãos ambientais, definir as perspectivas do
controle de poluição. O poder público é responsável pela garantia da atualização e
enquadramento das coleções hídricas.
7.2.3. Plano Diretor de Esgotamento Sanitário
A qualidade que se almeja para os cursos d’água no Rio de Janeiro está contemplada
na proposta de enquadramento dos rios da RMRJ elaborada pelo Plano Diretor de
Esgotamento Sanitário da RMRJ e das Bacias Contribuintes à Baía de Guanabara (PDES-
RMRJ) de 1994, atualmente em vigor.
O plano propõe uma melhora gradativa dos corpos dricos, considerando o aspecto
dinâmico do enquadramento e dos próprios padrões de qualidade. Sugere que as metas de
qualidade sejam propostas em etapas e considera necessária:
(...) a construção gradativa da rede de esgotos, dos coletores tronco e interceptores, das
estações de tratamento e destino final, além do trabalho de polícia administrativa a ser
exercido sobre as indústrias.
A proposta apresentada pelo plano diretor para os rios que passam por centros urbanos
densamente ocupados, pertencentes à Bacia da Baía de Guanabara e à Baía de Sepetiba, é
dividida em uma etapa inicial, de transição, que os enquadra na Classe 4
3
(último nível menos
exigentes para águas doces) e outra, posterior, sem prazo definido, em que ascenderiam à
Classe 2. Com os usos preponderantes, descritos anteriormente no Quadro 11, estariam
submetidos às seguintes fases:
Etapa inicial:
Esses cursos d’água certamente continuarão a receber o escoamento superficial urbano
com diferentes graus de poluição orgânica, das ruas, das favelas, de ligações clandestinas
de esgotos, porém não mais esgotos brutos da rede coletora, devendo manter um aspecto
compatível com o ambiente urbano que se deseja preservar – a harmonia paisagística.
Etapa posterior:
Os rios enquadrados como classe 4, mesmo atravessando centros urbanos densamente
ocupados, poderiam ascender à classe 2, apresentando melhor qualidade em termos de OD,
coliformes e aparência geral, uma vez que a poluição gerada diretamente nas favelas, ou de
ligações clandestinas de esgotos na rede de águas pluviais, ou de extravasores da rede de
esgotos na de águas pluviais, poderia ter sido reduzida, de acordo com programas de
melhoria e modernização do sistema de coleta.
3
Nas águas de Classe 4 são estabelecidos os limites e condições: materiais flutuantes, inclusive espumas não
naturais virtualmente ausente; odor e aspectos não objetáveis; para óleos e graxas toleram-se iridicências;
substâncias facilmente sedimentáveis que contribuam para o assoreamento de canais de navegação, virtualmente
ausentes; índices de fenóis até 1,0 mg/L C
6
H
5
OH; OD superior a 2,0 mg/L O
2
, em qualquer amostra e pH entre 6
e 9.
203
Para as bacias do sistema litorâneo de Jacarepaguá, o plano recomenda uma única
etapa, considerando a Classe 2 para enquadramento desses cursos d’água, qualidade
compatível com a melhoria desejada para a água no interior do complexo lagunar.
Estas proposições partem evidentemente de uma consideração de usos benéficos para
os corpos d’água, que fica na dependência de atos legais a serem promulgados pela CECA,
por indicação técnica da FEEMA. Porém as diretrizes não foram, modificadas, vigorando
oficialmente o enquadramento anterior à resolução CONAMA n
o
20/86.
7.2.4. Plano Diretor de Drenagem Urbana
A metodologia para futura elaboração do Plano Diretor de Drenagem da Cidade do
Rio de Janeiro, consubstanciada no Termo de Referência, parte constitutiva do Edital de
Licitação (CO-Nº 01/999), elaborada pela Fundação Instituto das Águas do Município do Rio
de Janeiro (Rio-Águas), introduz elementos inovadores na prática da engenharia de drenagem
nacional:
Visão global do sistema de drenagem e de suas interfaces com outras problemáticas de
gestão urbana, não unicamente uma visão hidráulica do problema;
Utilização de técnicas modernas de investigação (modelos matemáticos
hidrodinâmicos do sistema de drenagem e dos meios receptores);
Monitoramento pluviométrico, liminimétrico, fluviométrico e polutométrico (grifo
nosso) do sistema de drenagem a fim de definir as ações necessárias, em função de seu
comportamento real;
Afirmação da água como elemento estruturante do urbanismo (e não o inverso) através
de uma política voluntarista de valorização dos cursos d'água e lagos urbanos como
mecanismo de dinamização das relações sociais;
Modernização do sistema de gestão como elemento imprescindível para a viabilidade
do plano diretor;
Disponibilização de instrumental de acompanhamento, planejamento e apoio à
decisão;
Modernização dos instrumentos regulamentares de gestão das águas pluviais urbanas;
Equacionamento econômico-institucional dos recursos financeiros necessários à
viabilidade do plano diretor.
204
Essa abordagem, defendida por Adacto Ottoni (1996) supõe que a solução para os
problemas de drenagem urbana das cidades passe por uma mudança na lógica da engenharia
de drenagem de transporte rápido das águas pluviais a jusante para uma concepção de
retenção e de regulação do transporte das águas pluviais, ao longo do tecido urbano.
Dentro das diversas ações de planejamento inclusas no termo de referência do plano
diretor de drenagem da cidade está o programa de valorização dos cursos d’água, que, por
meio de intervenções no leito maior, incorporaria águas pluviais à paisagem urbana com a
criação de parques lineares, ciclovias, áreas destinadas a atividades esportivas, recreativas, e
jardins, dentre outras.
A orientação do plano contempla caracterização e diagnóstico do problema de
lançamentos de esgotos no sistema de drenagem e nos corpos receptores e propõe identificar e
avaliar a adequação, eficiência e realização efetiva dos programas de melhoria da qualidade
da água e dos meios receptores.
7.3. Programa de Despoluição da Baía de Guanabara
O Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG), oficializado em 1994,
com início das obras em 1995, envolvia recursos da ordem de US$ 926 milhões, financiados
pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), pela agência de fomento japonesa,
Japan Bank for Internacional Cooperation (JBIC), pelo Governo do Estado e pela CEDAE.
Compreende obras, bens e serviços que abrangem as áreas de abastecimento de água,
esgotamento sanitário, macrodrenagem, coleta e condicionamento de resíduos sólidos,
educação ambiental, cadastramentos e mapeamentos digitalizados e controle ambiental.
Envolve ações com as prefeituras dos municípios do entorno da baía e órgãos governamentais
como a CEDAE, a FEEMA e a SERLA.
Pelo Relatório de Desenvolvimento Humano do Rio de Janeiro Meio Ambiente e
Sustentabilidade (PCRJ, 2001), o PDBG não é um programa de despoluição de amplo escopo.
Trata-se de um programa de saneamento básico, como pode ser verificado na destinação dos
recursos: 91,84% aplicados em projetos que prevêem abastecimento de água, coleta e destino
adequado dos esgotos e lixo. Em sua primeira fase foram priorizadas as obras de coleta e
tratamento de esgoto sanitário, que correspondem a mais de 80% de seus recursos (AEERJ,
1998).
O prazo inicial para conclusão da primeira fase foi 2000 e o da segunda, 2010
Entretanto, devido a sucessivas prorrogações, a primeira fase ainda se encontra em
andamento, e sua previsão de conclusão se estendeu para o primeiro semestre de 2004.
205
O Relatório de Desenvolvimento Urbano Humano do Rio de Janeiro, Meio Ambiente e
Sustentabilidade da PCRJ (2001) afirma que os relatórios de acompanhamento do próprio
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e os de algumas organizações não-
governamentais junto ao desenvolvimento do programa concluem que o tão esperado impacto
positivo esperado ainda não se fez presente, e seu desempenho está aquém das expectativas.
Apesar dos resultados, até o momento diminutos frente ao grau de degradação
ambiental do ecossistema da bacia da Baía de Guanabara, este programa é de alta relevância
para o controle de poluição da RMRJ, em especial para os sistemas de esgotamento sanitário.
Compreende: a implantação das ETEs de Alegria, Pavuna, Sarapuí, São Gonçalo (Sistema II)
e Paquetá; melhoria e ampliação das ETEs de Icaraí, Ilha do Governador e Penha; construção
de 1.247,8 km de rede coletora, cerca de 100 km de coletores-tronco e interceptores, 26,6 km
de emissários e 27 elevatórias.
Estas intervenções poderão permitir a interligação entre as partes dos sistemas, que até
então operam isoladamente, com exceções das bacias contribuintes à ETE da Penha e os
sistemas que contribuem para o ESEI. Segundo a CEDAE (2003), na primeira fase foram
instaladas 178 mil ligações domiciliares. Estas obras, e a conseqüente possibilidade de
integração do sistema são imprescindíveis à eliminação das ligações clandestinas e dos
diversos extravasores das redes, o que vem ocorrendo em algumas áreas, por conexão da
rede oficial às estações de tratamento construídas ou reformadas.
Os coletores tronco que chegarão a ETE Alegria, tais como: Haddock Lobo-Alegria,
Zona Portuária e Faria Timbó-Alegria poderão eliminar elevatórias e extravasores das bacias
que lhes são contribuintes. Em condições adequadas de operação e com um programa de
melhorias do sistema existente, a ampliação do sistema como um todo poderá colocar o Rio
de Janeiro em outro patamar no controle da poluição, que aponta cenários bem mais
promissores para a qualidade ambiental da cidade. Para isso, é necessário que as estações
elevatórias e de tratamento de esgoto sanitário operem com a vazão e a eficiência para as
quais foram concebidos e que as ligações prediais, redes coletoras e emissários sofram ampla
e contínua manutenção, contemplando ações emergenciais e de rotina (manutenção preventiva
e corretiva).
Antes da realização das obras contempladas pelo programa, apenas 51% do esgoto
sanitário afluente à Baia de Guanabara era coletado em rede e apenas 14% era tratado
adequadamente antes do lançamento. Com a conclusão das obras é previsto o aumento do
percentual de coleta em rede para 66,7%, e do tratamento, para 51,7%. Valores significativos,
porém não suficientes para a recuperação ambiental da baía (Zee, 2000).
206
Dentro do escopo do programa estão os Projetos Ambientais Complementares, que
objetivam proporcionar meios para a preparação das futuras ações de todos os setores da
sociedade no sentido de aprimorar a qualidade ambiental melhorando as condições de
controle e preservação. Estão contempladas atividades de controle de poluição industrial,
monitoramento da qualidade das águas da bacia hidrográfica e das praias da bacia da Baía de
Guanabara, dentre outros. Incorporando uma visão ecológica da Baía de Guanabara, as ações
sistêmicas de monitoramento, fiscalização e controle, de caráter preventivo, podem viabilizar
condições de continuidade e sustentabilidade.
7.4. Indicadores de Desempenho dos Sistemas de Esgotos
A eficiência dos sistemas de saneamento vem se configurando como uma exigência da
sociedade através de seus interesses difusos, coletivos e representativos. Danos ambientais
decorrentes de obras públicas e de deficiências na gestão do sistema de esgotamento sanitário
são atualmente objetos de Ações Civis Públicas Ambientais
4
contra particulares e contra o
próprio poder público, e tem como um de seus autores o Ministério Público do Estado do Rio
de Janeiro
5
(Guerra, 2001).
Informações normalmente veiculadas pelos órgãos oficiais e pela imprensa, tais como:
número de ligações prediais, extensão de rede de esgoto assentada, vazão máxima de projeto
das estações de tratamento, índice de tratamento, dentre outros, enquanto dados e indicadores
operacionais, abordam aspectos quantitativos de ampliação do vel de cobertura; porém
sobre os aspectos qualitativos dos serviços, pouco traduz.
Embora a pesquisa: Desenvolvimento Humano e Condições de Vida na Cidade do Rio
de Janeiro e seus Bairros (PCRJ, 2001b), mostre que 95% da população do município é
atendida por rede de esgoto ou tanque séptico, este número genérico não representa as
especificidades e deficiências do sistema de esgotamento sanitário.
Persiste a necessidade de se estabelecer parâmetros de qualidade e índices de
eficiência para os sistemas de esgotamento sanitário e de drenagem pluvial a fim de se obter
um quadro elucidativo das condições dos sistemas de saneamento, atuais e futuras.
4
Disciplinadas pela Lei n. 7.347, de 24/07/85.
5
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro atua na proteção ambiental do município através do Centro
de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça com Atribuição de Proteção ao Meio Ambiente e Patrimônio
Cultural.
207
A eficiência deve se referir à obtenção dos objetivos propostos, com os menores custos
econômicos e sociais possíveis. É imprescindível estabelecer uma parametrização de
desempenho, que deve ser atendida pelos sistemas de esgotos a fim de viabilizar a
qualificação de sua gestão, assim como seu planejamento. A eficácia do sistema refere-se ao
cumprimento das metas norteadas pelos fundamentos e princípios descritos no subitem #
3.4.2. Isto leva a uma análise das demandas e aplicações destes sistemas enquanto barreiras
sanitária e ambiental.
Diversos fatores são condicionantes para a eficiência dos sistemas de esgotos.
Destacam-se: características naturais, investimentos, qualidade dos projetos, planejamento
urbano, ocupação do solo, interação com outros serviços de infra-estrutura urbana, serviços de
operação, manutenção e conservação, aspectos psico-sociais e sócio-econômicos das
populações atendidas, qualificação e treinamento do corpo técnico, dentre outros.
Alguns parâmetros e indicadores de medição da qualidade estão em plena fase de
desenvolvimento no país. Serão apresentados a seguir, exemplos de parametrização
relacionada aos sistemas de esgotos e suas interconexões.
De acordo com o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Brasil, 2002),
têm-se como indicadores de desempenho da rede coletora de esgoto, relativos a
extravasamento:
duração média dos reparos de extravasamento (horas/extravasamento): duração dos
extravasamentos pela quantidade de extravasamento de esgoto registrado;
extravasamento de esgotos por extensão de rede: quantidade de extravasamento de
esgotos registrados sobre a extensão da rede de esgoto.
Até o momento, no SNIS não foram desenvolvidos indicadores referentes a
contribuições indevidas provenientes de ligações prediais irregulares.
A auditoria ambiental da Lagoa Rodrigo de Freitas (COPPETEC, 2001) estabelece
Indicadores de Desempenho Ambiental
6
dos sistemas de esgotamento sanitário, com base nos
documentos: “Diagnóstico Nacional de Informações sobre Saneamento – SNIS” (1995) e nos
anexos do Plano Estadual de Desestatização. Uma das categorias de indicadores ambientais,
referente às condições operacionais do sistema de esgotamento (rede coletora, linha de
recalque, elevatórias e extravasores), é denominada: Indicadores de Desempenho Operacional
(IDO), e aponta:
6
O conceito dos Indicadores de Desempenho Ambiental está preconizado pela Norma ISO14031-
Environmental Performance Evaluation - Guidelines”.
208
atendimento de esgoto;
descargas ilegais;
índice de perda física – água;
quedas de bombeamento;
extravasamentos;
obstruções na rede de coleta;
índice de capacidade (EE);
idade da rede, material;
tempo médio de intervenções;
índice de esgoto transportado;
índice de esgoto tratado;
tempo de resposta às reclamações;
intensidade de mão-de-obra;
gastos totais.
Dos indicadores supracitados, as interconexões estão contempladas enquanto categoria
de indicador operacional nos itens referentes à descarga ilegal (irregulares) e extravasamento,
sendo portanto sua redução indicadora de melhoria operacional do sistema.
O índice de descarga ilegal corresponde à porcentagem entre o volume de esgoto
ilegal (em m
3
) sobre o volume total transportado pela rede, conforme projeto (em m
3
). O
índice de extravasamento de esgotos corresponde à quantidade de extravasamento por km de
rede de coleta.
A pesquisa desenvolvida por Borja & Moraes (2003) sobre Avaliação das Condições
Sanitárias de Micro-Áreas do Estudo do Impacto Epidemiológico do Programa Bahia Azul
teve como um dos procedimentos de avaliação a condição sanitária dos logradouros. Dentro
dos campos de análise de esgotamento sanitário e de drenagem de águas pluviais foram
criados, além de indicadores: o percentual de vias com as respectivas redes, o percentual de
vias com problemas de operação e manutenção nas redes, o percentual de vias com destino de
esgoto sanitário inadequados e o percentual de vias com problemas de inundação e
alagamentos.
Pretendendo-se obter um quadro mais elucidativo na qualificação do estado dos
ecossistemas urbanos, a avaliação dos sistemas de saneamento implantados e as suas
projeções devem fazer parte de um conjunto mais amplo de parâmetros, que possa estabelecer
indicadores ambientais ou contemplar indicadores de saúde, econômicos, ecológicos, sociais,
incluindo-se os valores e percepções dos atores sociais que produzem os espaços urbanos,
suas prioridades e subjetividades. Neste enfoque, Borja & Moraes (2003) enfatiza a
necessidade metodológica de se incorporar o aspecto cultural da sociedade, através de
entrevistas e reuniões com grupos focais.
O Quadro 13, na página seguinte, apresenta a contribuição metodológica para
avaliação da Qualidade Ambiental Urbana (QAU).
209
Quadro 13. Categorias de análise e variáveis propostas de indicadores ambientais.
Item
Categoria de
análise
Variáveis
1 Moradia
Conforto e segurança construtiva, acesso à propriedade/posse da Terra,
localização e higiene.
2 Saneamento
Abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana,
drenagem urbana.
3
Infra-estrutura
urbana
Energia elétrica, iluminação e sistema viário (mobilidade e acesso).
4 Serviços urbanos Abastecimento comercial, comunicação e transporte público.
5
Infra-estrutura
social e cultural
Saúde, educação e lazer/cultura.
6
Conforto do
ambiente
Conforto acústico, térmico e visual e qualidade do ar.
7 Paisagem urbana
Espaços públicos, patrimônio histórico/artístico, patrimônio construído
e áreas verdes, arborização, elementos e atributos naturais e
comunicação visual.
8 Cidadania
Segurança pública, justiça e informação, acesso e participação na
gestão pública e organização popular.
Fonte: Borja, 1997 apud Borja & Moraes, 2003.
A parametrização de indicadores de desempenho dos sistemas de saneamento, bem
como o desenvolvimento de indicadores de saúde ambiental, poderão dar subsídios
complementares no cruzamento com macroindicadores, como o IDH, IDH-M (descritos no
subitem # 5.3.5.), e ICV
7.
Os cidadãos devem poder ver, através dos indicadores, a medida de proteção à saúde
em sua comunidade, os êxitos ou fracassos das políticas, programas e projetos adotados. Para
tanto, é necessária a promoção da transparência e da responsabilidade nas gestões pública e
privada. Mais que instrumento de apoio à decisão no planejamento urbano, a acessibilidade a
estas informações, a participação da comunidade no desenvolvimento e a operação de um
sistema de indicadores qualidade permite a possibilidade de pressão e cobrança, efetivando
assim o exercício do controle direto sobre o poder público e as concessionárias, visando a
satisfação das necessidades coletivas.
7
O Índice de Condições de Vida (ICV) estende o IDH, incluindo tanto um mero maior de indicadores básicos para
representar suas três dimensões, como também incorporando três dimensões adicionais: condições habitacionais, acesso ao
trabalho, e oportunidades para o desenvolvimento infantil. No total, o IDH é a síntese de 4 indicadores básicos, e o ICV a
síntese de 27 indicadores, agrupados em seis dimensões.
210
8. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente saudável e equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, impondo-se a
todos, em especial ao Poder Público, o dever de defendê-lo, zelar por sua
recuperação e proteção em beneficio das gerações atuais e futuras gerações”
(Capítulo 8, Art. 261 da Constituição do Estado do RJ).
8.1. Conclusões
O estudo dos sistemas de esgotos da Cidade do Rio de Janeiro, riquíssimo em detalhes,
fatos históricos e contribuição tecnológica para o país, revelou uma posição de pioneirismo
mundial. As proposições para a mudança na política de saneamento devem ser alicerçadas no
acúmulo das experiências do passado, que dão subsídios ao estabelecimento de novas
perspectivas. O passado mantém relações de compromisso com o presente e indica as
possibilidades para o futuro.
A abordagem do saneamento e seus desafios, dentro de uma contextualização
histórica, ainda é pequena em nosso país, e torna-se escassa quando focalizados, dentro de
uma análise crítica, os sistemas de esgotos, especificamente na Cidade do Rio de Janeiro. O
desenvolvimento de pesquisas com este teor é necessário para a compreensão da
configuração atual dos serviços de infra-estrutura urbana, resgate do papel vital dos serviços
públicos de esgotos, dos esforços desprendidos pelas gerações de técnicos envolvidos e dos
anseios da sociedade.
A cidade foi, desde tempos remotos, objeto de várias críticas quanto à qualidade
operacional dos sistemas de esgotos, pela defasagem dos seus componentes e pelas
dificuldades operacionais. As ações privilegiavam o abastecimento de água, enquanto o
esgotamento sanitário e a drenagem pluvial eram secundarizados. A concepção higienista
focalizava o afastamento dos esgotos das residências, devido às justas e urgentes necessidades
relacionadas às péssimas condições epidemiológicas, que foram agravadas pelo crescimento
demográfico imposto pelo modelo de crescimento adotado. O problema das águas residuárias
era tratado basicamente com a implantação de rede coletora em determinada região.
Prevalecia o raciocínio de “esgoto afastado, problema resolvido”. Os esgotos canalizados
quase sempre eram conduzidos in naturaa um curso d’água. Raras vezes as intervenções
contemplavam também estações de tratamento, que na grande maioria dos casos
apresentavam problemas de eficiência. O que na realidade se fazia
era apenas afastar “o mal”
da população, ainda que com essa medida se viesse a poluir em outro local o meio ambiente.
211
Outrossim, o Higienismo, enquanto abordagem científica, contribuiu para uma
considerável melhoria da qualidade de vida no meio urbano, para a formulação de políticas de
saúde pública e para o traçado dos planos urbanísticos. Entretanto, face à urbanização intensa
observada no decorrer do século XX, as soluções de inspiração higienista mostraram-se
insuficientes e inadequadas, mas manteve-se como paradigma reinante. São recorrentes nas
grandes cidades brasileiras os problemas de poluição dos meios receptores d’água e aumento
da freqüência de inundações, algumas catastróficas.
Os elementos atípicos ao sistema separador absoluto, implementados na Cidade do
Rio de Janeiro, como as galerias de cintura, estruturas de captação de tempo seco, aterros e
desvios de rios e canais, “extravasores permanentes” e, mais recentemente, as estações de
tratamento nos cursos dos rios e praias, identificados e apresentados nesta dissertação, são
velhas novidades de cunho higienista, que encara o sistema de drenagem pluvial como
auxiliar ao sistema de esgotamento sanitário, incluindo-se os rios, naturais ou não. Desta
forma, a poluição dessas águas passa a ser compreendida como inevitável.
As limitações ambientais dos sistemas quanto à sua função de barreiras de proteção
dos ecossistemas eram decorrentes da pouca preocupação ambiental, de certa forma explicada
pelos baixos níveis de comprometimento dos ecossistemas em relação à capacidade de
assimilação geral e de conhecimento da natureza da poluição. Situação que começou a mudar
com o início do processo de industrialização no país a partir da década de 50, durante o Plano
de Metas de Juscelino Kubitschek.
A evolução técnica na destinação dos esgotos domésticos passou pelas fases de
transporte estático das excretas, sofreu grandes melhorias com o transporte hidrodinâmico e
atualmente aponta a necessidade da redução do consumo de água para esta finalidade, através
da otimização dos sistemas, qualificação das águas de acordo com usos distintos, reúso e o
desenvolvimento de tecnologias de baixo consumo de água para transporte de esgotos.
A gradual passagem de atribuição dos projetos e execução das instalações prediais das
concessionárias dos serviços de esgotos para particulares, inevitável no processo de ampliação
das cidades, trouxe deficiências técnicas a estas instalações, que repercutiram nas condições
do sistema público de coleta e tratamento de esgoto sanitário. Na época da City, não era
permitida a construção de cozinhas e banheiros nas casas do Rio de Janeiro, sem a devida
autorização desta companhia. Na atualidade, cabe à concessionária apenas fiscalizar e
notificar a aceitação das ligações prediais executadas por particulares autorizados. Serviço
imprescindível, de grande envergadura e de difícil controle.
212
As principais cidades brasileiras, incluindo-se o Rio de Janeiro, ainda possuem uma
condição vulnerável em seus sistemas de saneamento, onde as questões sócio-ambientais se
inter-relacionam de forma intensa e singular. São diversos os problemas acumulados, mais
especificamente no caso do esgotamento sanitário e pluvial. Em determinadas localidades, a
atual exaustão dos recursos hídricos indica que a disponibilidade para o abastecimento de
água está cada vez mais relacionada às deficiências dos sistemas de esgotos.
Frente à contínua e acelerada degradação ambiental promovida pelas águas
residuárias, o processo de poluição das coleções hídricas foi por muito tempo negligenciado.
Este impacto ambiental é de grande intensidade e extensão, atingindo inclusive os cursos
d’água de uso prioritário, os mananciais. Na forma de utilização das coleções hídricas
urbanas, quando muito, têm sido considerados certos aspectos setoriais, negligenciado os
aspectos sanitários, ecológicos, urbanísticos, paisagísticos e culturais. O sistema de drenagem
pluvial não é definido para transportar esgoto sanitário, pois dentre vários requisitos, não
possui a estanqueidade exigida. O esgoto sanitário não deve ser transportado em canal aberto,
somente em condutos fechados, o que é ratificado pelas especificações, normas técnicas e
legislações vigentes.
As interconexões nos sistemas de esgotamento sanitário e de drenagem pluvial não
somente se traduzem em impactos ambientais negativos ao ecossistema urbano, como
também comprometem a integridade física e as condições hidráulicas dos sistemas
envolvidos, com diminuição da eficiência das estruturas e redução de sua vida útil. A
eliminação das diversas origens e formas destas interconexões teria como conseqüência o
equacionamento de diversos problemas, tais como: remansos, águas de infiltração, entrada de
sedimentos, obstruções, colapso nas redes com transbordamento, vazamentos em juntas sob
pressão, abatimento das tubulações, elevação do consumo de energia, tratamento deficitário,
etc. Desta forma, preservariam-se estes e outros sistemas de saneamento, como o de
abastecimento de água, de gestão de resíduos, de controle de vetores, os logradouros e
equipamentos urbanos, o meio ambiente e a população. Por outro lado, a falta de manutenção
preventiva e sistemática intensificam estes problemas, que por sua vez aumentam a
possibilidade de novas interconexões com a drenagem pluvial, retroalimentando, de forma
sinérgica e cumulativa, as deficiências técnicas, como ficou comprovado nos estudos.
As estruturas atípicas decorrentes das interconexões revelou-se como uma tentativa de
solução que insere riscos sanitários e ambientais complexos, difíceis de quantificar e
equacionar. Não são soluções definitivas e sim pontuais, “remendadas”, que revertem às
prioridades e dão continuidade aos erros. Este alto padrão tecnológico adotado gera
213
necessidade de intervenções sucessivas, acumulativas, a custos crescentes e resultados cada
vez mais efêmeros, contrariando as tendências naturais de recuperação dos ecossistemas,
caracterizadas pelo modelo ecológico.
A poluição pelo aporte de esgoto sanitário é o exemplo cristalino das deficiências dos
sistemas de saneamento e da falta de ação integrada entre os serviços de esgotamento
sanitário e de drenagem pluvial na cidade, o que reduz a utilização dos corpos d’água ao
simples transporte de águas residuárias. Ficou comprovada desta forma a hipótese inicial de
que os sistemas de saneamento não estão funcionando efetivamente enquanto barreiras de
proteção sanitária e ecológica.
A continuar as condições observadas, a tendência é o aumento de volume e de
concentração dos esgotos conduzidos pelo sistema de drenagem pluvial, associados ao
acréscimo no valor dos gastos incorridos, pelo setor público, para a redução dos mesmos. É
possível, ainda, apontar a depreciação do valor dos imóveis situados no entorno das coleções
hídricas, bem como a proliferação de vetores responsáveis pela incidência de doenças.
O engenheiro Azevedo Netto (1983), que como o engenheiro Saturnino de Brito, era
defensor árduo do sistema separador, contestava o insistente argumento da época de que não
havia condições para se controlar devidamente e na prática este sistema, por falta ou
deficiência de fiscalização. Ele remetia ao fato de que muitas cidades brasileiras, durante
muito tempo, exerceram controle adequado de seus sistemas, e que aquela que não tivesse
condições para exercê-lo, provavelmente não teria também condições para fiscalizar o
recebimento de despejos industriais nocivos e operar satisfatoriamente suas estações de
tratamento.
O problema está em admitir níveis aceitáveis de intromissão de águas pluviais e de
esgoto sanitário nos sistemas de esgotamento sanitário e de drenagem pluvial,
respectivamente, e de se tomar providências para que esses níveis não sejam ultrapassados. A
magnitude destas contribuições indevidas depende da aceitação de determinados riscos
epidemiológicos e ambientais, dos impactos ambientais, das condições de operacionalidade e
durabilidade dos sistemas. A qualidade das coleções hídricas, além de ser objetivo dos
sistemas de saneamento, é a principal indicadora de desempenho na condição ambiental, do
sistema de esgotamento sanitário e pluvial.
Trabalhos que abordam a problemática da poluição das coleções hídricas ampliam-se e
novas leis são implantadas reforçando este enfoque. O sistema separador, concepção
amplamente adotada no país, está regulamentado em diversas legislações. Portanto, a
eliminação das interconexões é requisito ao atendimento das legislações ambientais e
214
urbanísticas. Os estudos de referência sobre a Política de Recursos Hídricos, implementadas
pela lei federal n
o
9.433/97 e pela lei estadual n
o
3.239/99, a classificação e uso dos corpos
hídricos, estabelecidos na resolução CONAMA n
o
20/86, fortalecem a relação entre os
sistemas de esgotos e a gestão dos recursos hídricos. O PDES-RMRJ (1994) e o termo de
referência do futuro Plano Diretor de Drenagem Urbana da Cidade do Rio de Janeiro
ratificam a necessidade de ações graduais e constantes de recuperação ambiental das coleções
hídricas urbanas, através do controle da poluição por aporte de esgoto sanitário.
O que se observa é uma deficitária fiscalização dos órgãos competentes quanto ao
cumprimento destes procedimentos, o que compromete seriamente a adequação da coleta,
tratamento e disposição final do esgoto sanitário.
Com a divisão gradual das metas de recuperação dos recursos hídricos estabelecidos
pelo PDES-RMRJ (1994) ainda vigente, verifica-se que com o postergar do início e as
sucessivas prorrogações na conclusão das principais obras de esgotamento sanitário nas
respectivas bacias hidrográficas, não se viabilizou o atendimento às condições mínimas
estabelecidas, mesmo para a Classe 4, prescritas no plano diretor. O longo atraso na revisão
dos usos benéficos e na classificação dos corpos d’água não modificada até o momento,
dificulta o monitoramento, controle e fiscalização ambiental no estado.
Apesar do Rio de Janeiro estar passando por uma série de obras de saneamento
patrocinadas por programas de grande porte, o quadro ambiental da cidade não vem sofrendo
melhorias significativas. O avançado processo de degradação dos corpos hídricos identifica
limitações conceituais e técnicas referentes aos atuais sistemas de esgotos (sanitário e pluvial)
além da falta de um planejamento ambiental urbano que considere a inter-relação entre os
sistemas de saneamento, a sociedade e o ecossistema urbano em geral.
É inquestionável a evolução dos sistemas de esgotamento sanitário, que passou,
inclusive, a ter maior inserção sobre as comunidades carentes. Nas últimas quatro décadas
houve uma redução das disparidades entre as coberturas dos serviços nas classes sociais, o
que representa uma democratização do acesso aos sistemas, na direção do ainda longo
objetivo da eqüidade dos serviços de saneamento.
As intervenções ambientais sistêmicas de saneamento apresentam efeitos a curto e
longo prazo sobre a saúde, substancialmente superiores aos de intervenções médicas. A partir
daí se insere o conceito do saneamento constituído por ações preventivas. Esta perspectiva
pode ser correlacionada para os corpos hídricos que devem também sofrer ações preventivas
que garantam a saúde ambiental do ecossistema, atuando nas causas da poluição e não nas
conseqüências. Da mesma forma que na situação anterior, dentro do ciclo antropogênico da
215
água, a utilização em série de múltiplas barreiras ao longo de sua trajetória enquadra as
soluções enquanto ações curativas sobre os corpos hídricos. As intervenções sobre as coleções
hídricas doentes (poluídas) são de efeitos menores, mais custosos e de retorno retardado
sobre a qualidade de vida da população, portanto insustentáveis. Desta forma, a inversão desta
lógica é necessária a fim de garantir o caráter preventivo de manutenção da salubridade em
detrimento de um saneamento apenas corretivo.
Objetivando evidenciar os riscos epidemiológicos que ainda são decorrentes da
poluição do sistema de drenagem, o modelo causal de Carência ou Precariedade dos
Serviços de Drenagem Urbana (CPSDU), desenvolvido por Souza et al. (2002) mostrou-se
esclarecedor, inclusive para uma abordagem ainda pouco explorada no Rio de Janeiro, sobre
os impactos das inundações à saúde pública. Neste enfoque, a poluição pontual pelo aporte de
efluentes domésticos e industriais nas galerias de águas pluviais e nas coleções hídricas
intensifica e amplia a poluição difusa expandida pelas águas previamente contaminadas,
interferindo também nas enchentes e nas dificuldades do seu equacionamento.
No acervo bibliográfico analisado, verificou-se que o problema das interconexões dos
sistemas de esgotos está sendo abordado em diversas ações e programas corretivos de várias
localidades do país. Entretanto, esta deficiência é discutida com pouca profundidade no Rio
de Janeiro, lacuna técnica agravada pelo alto grau de disseminação em que se apresenta. A
aceitação - em tese - do escopo do Saneamento Ambiental, em seu sentido lato, entra em
contradição com as sucessivas implantações de soluções paliativas e parciais no combate à
poluição, que procuram evitar, precariamente, seus efeitos, colocando para futuro incerto as
soluções das causas, inter-relacionadas às fontes de poluição. Os programas de despoluição,
com raras exceções, vêm em geral aplicar recursos novos repetindo as mesmas desgastadas
estratégias, sem conseguir avançar de fato na melhoria da qualidade das bacias hidrográficas e
das águas costeiras. Se por um lado, estas ações representam a implantação tardia de etapas do
sistema de esgotamento sanitário, por outro, esforçam-se para corrigir os efeitos da aplicação
ineficaz das estratégias de controle das fontes de poluição doméstica e industrial.
É imperativa a correção das deficiências do sistema de esgoto do Rio de Janeiro, além
de seu aprimoramento mediante ampliações, de modo que ele passe a funcionar de fato como
sistema separador absoluto, podendo ser incorporadas outras alternativas de esgotamento
locais, contanto que estas sejam detalhadamente estudadas e concebidas em projetos de
engenharia. A escolha do tipo de esgotamento em um determinado sítio, seja ele separador
absoluto, misto ou unitário, deve ser feita através da análise de todas as vertentes possíveis do
problema, não devendo haver espaço para soluções provisórias”. O assunto é amplo,
216
complexo e polêmico, e devem ser respeitadas as especificidades de cada área e de cada
comunidade. Antes da adoção de qualquer alternativa é necessária a realização de intenso
trabalho de pesquisa, contemplando: investigações de campo, ensaios, planejamento e estudos
de viabilidade. Para valorização da drenagem urbana sob uma perspectiva ambiental, os
objetivos devem ser múltiplos, complementares e integrarem o tratamento adequado de
eventos de diferentes probabilidades de ocorrência. O antagonismo entre as concepções e
opiniões contraditórias nesta temática vem de longo tempo e provocou profundas cisões na
área de saneamento.
O planejamento urbano ambiental deve efetivamente articular, orientar e permear os
projetos e intervenções, a fim de superar as limitações setoriais, instâncias governamentais e
descontinuidades de programas em prol de um projeto urbanístico e de ações governamentais
que cumpram a função social das cidades. O encerramento das concessões firmadas sob a
égide do PLANASA tem trazido novas possibilidades, muitas vezes conflitantes e
antagônicas. A opção a ser adotada podeaprofundar os efeitos da crise, sua superação ou
criar novos cenários, imprevisíveis (Rezende & Heller, 2002). Na visão de Costa (1994), a
criação dos serviços públicos foi uma conseqüência da qualidade dos serviços prestados
pelo setor privado e pela falta de fiscalização do próprio Estado, num processo inverso ao que
hoje se pretende com as privatizações.
A transformação do saneamento em negócio seja pela concessão privada dos serviços
pelos municípios ou pela limitação das ações por “viabilidade financeira” e tarifária,
compromete, pela desarticulação das ações do planejamento ambiental integrado, a
valorização do conceito de saneamento ambiental, tornando ainda mais difícil a necessária
integração entre o saneamento dito “básico” e as ações do município na provisão de infra-
estrutura dos bairros pobres de nossas cidades. uma maior interação entre a operação dos
serviços, a prefeitura e a população poderão superar as dificuldades à universalização dos
serviços. A incorporação dos avanços tecnológicos, a qualidade dos serviços prestados e a
implantação de mecanismos de regulação democrática também são questões que estão na
ordem do dia (Rezende & Heller, 2002).
Os serviços públicos de saneamento possuem “concorrência” com relação à
necessidade de desempenhar projetos e serviços de qualidade a fim de conseguirem
investimentos necessários e aceitação da sociedade - que se reverte em menor inadimplência
e maior respeito aos serviços de infra-estrutura urbana. A mais aguerrida das concorrências é
relativa aos interesses privados em terceirizar e privatizar os serviços, eminentemente
públicos. A expressão “competitividade” deve aqui ser entendida num contexto de empresa
217
pública de prestação de serviços vitais de saneamento e não pode perder o referencial de
prover a saúde ambiental. De acordo com esta missão e os fundamentos básicos descritos no
subitem # 3.4.2., deverão ser definidas e implantadas as ações no presente, a visão de futuro,
as metas e os objetivos estratégicos.
A solução dos problemas do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara, a
continuidade das obras de esgotamento da Baixada de Jacarepaguá, bem como as obras no
Recreio e da Zona Oeste em geral vêm suprir uma demanda de longo tempo e abre a
possibilidade de se estabelecer um outro patamar no controle da poluição por esgoto
sanitário na cidade. Para sua efetivação, devem ser considerados os recursos necessários às
novas demandas na operação, manutenção e conservação dessas ampliações e o incremento
da relação a ser construída entre os sistemas e os usuários. Daí o entendimento de que as
obras de saneamento o garantem por si a proteção ambiental, mas apenas iniciam um
processo que funciona na forma sistêmica, ou seja, mediante a integração de seus
componentes, estruturas e usuários.
O conceito de saneamento caminha para a consolidação de um novo paradigma que
implica e ampliar a visão da Engenharia Sanitária, superando os limites a ela impostos pelo
processo histórico, pelas concepções cartesianas e ideário desenvolvimentista, ainda reinantes.
A consolidação de intervenções interdisciplinares deve orientar o saneamento ambiental, a
fim de expressar seu robustecimento, inclusive a se considerar o alcance de seu escopo, onde
a largueza da expressão retrata o grau de complexidade da vida contemporânea. O desafio
maior é justamente a dificuldade prática de integração dos diferentes atores, provenientes de
áreas setoriais diversas e da sociedade em geral, nos espaços urbanos e hidrológicos.
A análise histórica revelou que o crescimento desordenado e a alta densidade
populacional atual são conseqüências do modelo econômico adotado, sob orientação
importada de outros países, num processo que resultou na expansão urbana sem planejamento
com as conseqüentes degradações ao meio ambiente. Contrariando muitos documentos e
artigos publicados, principalmente no setor de saneamento - muitas vezes como justificativa
de deficiências operacionais do sistema - o crescimento populacional não pode ser encarado
como causa da poluição e sim como uma das conseqüências da produção e acumulação do
capital.
Com relação à questão da ocupação urbana, ficou demonstrado que as ações
prioritárias de saneamento ambiental nas comunidades carentes, encontram justificativas
sociais, mesológicas e de viabilidade dos sistemas de esgotos. A maior concentração
populacional estabelece maior importância às medidas de saneamento, segundo o primeiro
218
princípio de Cynamon (1975). São as áreas favelizadas as que possuem as piores condições
ambientais, ao tempo em que exercem grande pressão antrópica sobre o meio. Quanto à
gestão dos sistemas e serviços de infra-estrutura urbana, verificou-se a necessidade de garantir
eficiência na operacionalização, tanto nessas comunidades quanto em suas áreas contíguas.
Esta conclusão foi evidenciada na historiografia do saneamento da cidade, de forma empírica
e dramática.
Dialeticamente, a mudança de paradigma necessária à garantia de um saneamento
ambiental poderá se dar justamente nestas condições mais complexas, desprovidas da maioria
dos serviços de infra-estrutura e ações sociais, e que estão sendo gradualmente contempladas
em projetos de amplo escopo. Entretanto, as várias ações simultâneas em determinado sítio,
por si só, não são suficientes para um funcionamento sistêmico. O que indica a superação do
isolamento das ações é a análise acurada da inter-relação entre as variáveis e do nível de
vínculos entre elas, norteadas por ações sincronizadas no tempo e no espaço, de forma que os
resultados principais e secundários contribuam para o alcance dos objetivos e metas
previamente estabelecidos e renovados.
A pesquisa demonstrou que o saneamento vem sofrendo evolução conceitual, de
ampliação de escopo, não se limitando às demandas reprimidas do Saneamento Básico. Ações
de saneamento cada vez mais seguirão as tendências ambientais: Saneamento Ambiental,
Saúde Ambiental, Gestão Ambiental e Engenharia Ambiental. Por conseguinte, a superação
de determinados paradigmas poderá nortear transformações significativas nas tecnologias
aplicadas, utilizando-se para isso dos amplos recursos de modelagem computacional.
O enfrentamento destas questões requer a superação do artificial distanciamento entre
o sujeito observador-conceituador e o objeto (sistema), bem como a reconciliação entre a
filosofia e a técnica. Silva (1975), na aula inaugural da Faculdade de Engenharia em 1974,
afirmou:
Vivemos, pois, sob o lema de dividir e conquistar o que nos faz extremamente eficientes na
resolução de problemas limitados e localizados, porém que nos torna inoperantes, diante de
qualquer assunto cuja compreensão não possa ser decomposta. Assim paralelamente ao
grande desenvolvimento das ciências e técnicas, nos encontramos numa situação de
estagnação face às filosofias.
Os estudos demonstraram a pertinência da concepção sistêmica como marco teórico e
instrumento de análise para a compreensão e interpretação da problemática da poluição. A
filosofia básica que norteou os estudos, o holismo, é o preceito filosófico que deve permear as
ações sanitárias e ambientais para que se atinjam efetivamente os objetivos pretendidos.
Procurou-se valorizar os diversos níveis de conhecimento, dentre eles os aspectos culturais e
219
subjetivos de interpretação da realidade, de acordo com pontos de vista condicionados aos
aspectos sócio-econômicos, psíquicos, culturais e de relações de poder.
A discussão sobre o presente e futuro do saneamento ambiental, bem como das ações
de engenharia e das ciências do ambiente devem passar por uma reflexão epistemológica, com
a revisão na demarcação do conhecimento científico e de suas contribuições para seu
desenvolvimento. A concepção sistêmica vem se afirmando como uma perspectiva de
compreensão da realidade, estando diversos componentes da comunidade científica,
empenhados no seu estudo epistemológico e teorização. A pesquisa identificou que as
instituições de ensino superior e os centros avançados de pesquisa estão cada vez mais
interessados nestes estudos, desenvolvendo, inclusive, métodos de implantação da
interdisciplinaridade e transdisciplinaridade.
A compreensão da interdependência entre os diversos elementos dos sistemas de
saneamento, dentro do complexo urbanístico, permite uma melhor compreensão da fisiologia
urbana onde a sociedade e as estruturas sociais são os principais agentes, construtores e
transformadores das estruturas espaciais urbanas. Desta forma, o pensamento sistêmico torna-
se um pensamento ambientalista e pode orientar com maior clareza a dinâmica das cidades e
das políticas de saneamento.
A ideologia dominante sinaliza, através dos processos de alienação, articulados pelos
veículos de propaganda, o individualismo como única solução na luta pela sobrevivência.
Justifica-se e valoriza-se a concorrência como um processo seletivo natural. Esta visão
distorcida da natureza traz consigo alta capacidade destrutiva e inviabiliza possibilidades de
ações coletivas e cooperativas para resultados mais abrangentes e saudáveis. Estão no auge as
contradições da indevida relação com o meio ambiente, a compreensão das relações de
interdependência e a necessidade de mudança de concepção frente ao problema da poluição,
suas origens e, por conseguinte, suas adequadas soluções.
É necessária uma mudança na percepção da sociedade quanto à sua relação com os
corpos hídricos, uma transformação da conduta individual em relação ao seu entorno,
estabelecendo-se novos nculos e compreensão do meio onde habita, para que sejam
respeitadas as legislações e normas de proteção ambiental. Para isso, o poder público precisa
previamente demonstrar mudança qualitativa na gestão dos sistemas de saneamento e na sua
própria relação com os corpos hídricos. A confiabilidade e segurança nos serviços devem ser
considerados como premissa básica. Demonstrar que os ecossistemas que antes eram tidos
com adversos, hoje são necessários à manutenção e reprodução da vida.
220
Não se pretende com isso, esgotar o assunto, uma vez que os estudos dos problemas
dos sistemas de esgoto sanitários e de drenagem pluviais estão relacionados à evolução
tecnológica desses sistemas e da necessidade de ampliação de pesquisas sobre tecnologias
apropriadas a diversas situações em que se circunscrevem os sistemas de saneamento nos
sítios da Cidade do Rio de Janeiro, incluindo a necessária interação entre os sistemas de
saneamento e as comunidades carentes.
Os princípios da Ecologia, sua aplicação no desenvolvimento de modelos que simulem
a realidade e as ações simultâneas são prerrogativas para interpretar as respostas dos
ecossistemas diante das ações antropogênicas. Segundo Capra (1996) “São estes, então,
alguns princípios básicos da ecologia - interdependência, reciclagem, parceria, flexibilidade,
diversidade e, como conseqüência de todos estes, sustentabilidade (...) a sobrevivência da
humanidade dependerá de nossa alfabetização ecológica, da nossa capacidade para entender
esses princípios da ecologia e viver em conformidade com eles”.
Está assim exposta a evolução na percepção do problema de poluição, as técnicas de
coleta e transporte dos esgotos sanitários que obedecem as diretrizes e, muitas vezes a
ausência delas, daqueles que detém o poder de modificar o traçado e delinear a própria
concepção de cidade e do modelo de desenvolvimento.
8.2 Proposições e Perspectivas
O melhor aproveitamento dos sistemas de esgotos, ou sua adequada utilização,
conforme especificado em projeto, vem de encontro às idéias de racionalização e otimização
através do menor dispêndio possível das grandezas fundamentais: espaço, tempo e energia.
Medidas que evitem o refazer e o desperdício remetem-se à própria conceituação da
engenharia, pois contemplam a adoção da melhor solução, de forma otimizada e engenhosa,
por ser mais econômica e eficaz.
Os projetos de engenharia, através do estudo de alternativas, da concepção básica
estabelecida e da metodologia executiva adotada, cada vez mais incorporam na análise custo-
benefício a variável ambiental. Sobremaneira, há hoje que se admitir soluções de alto custo
social, econômico, financeiro e político para apaziguar os conflitos ambientais, notadamente
de interesse da sociedade, já que põe em risco a própria sobrevivência da espécie humana.
Em essência, os projetos de saneamento, propiciam efeitos sociais e ambientais
positivos. Não obstante, sua não avaliação ecológica e aspectos quanto à vulnerabilidade
operacional podem trazer efeito inverso às funções para as quais foram originalmente
concebidos. Estudos demonstram a necessidade de valorização dos condicionantes
221
ambientais, em vel dos projetos de saneamento e, em nível gerencial, a urgência na
implementação gradativa e contínua, do Sistema de Gestão Ambiental (SGA) nas empresas
estaduais e municipais de saneamento (Brasil, 1998).
A Agenda 21, em seu capítulo 18.39, propõe:
Dar início a programas eficazes de prevenção e controle da poluição da água, baseados
numa combinação adequada de estratégias para reduzi-la na sua fonte, (grifo nosso)
avaliações do impacto ambiental e normas obrigatórias aplicáveis para descargas de fontes
definidas importantes e fontes não definidas de alto risco, proporcionais ao
desenvolvimento sócio-econômico delas.
A redução das interconexões para níveis que garantam a segurança da
operacionalização dos sistemas de esgotos, sem comprometimento dos objetivos sanitários e
ecológicos, está correlacionada às condições de operação, manutenção e conservação (OMC).
Seu controle somente poderá ser efetivado se incorporado na rotina operacional e gerencial
das concessionárias responsáveis. As dificuldades atuais para a gestão adequada dos serviços
de esgotos têm origens diversas e em algumas questões são provenientes da forma como se
deram e se dão a dinâmica dos serviços públicos e privados, na íntima relação existente entre
eles no Brasil. Neste aspecto, cabe destacar as colocações de Brito (Obras, v.XXII, 1925), que
primam pela justeza e atualidade:
Não é preciso definir o que se entende por conservação e refazimento de obras de
engenharia. Sabe-se que consertar para bem conservar é uma tarefa e que outra tarefa, bem
diversa no ponto de vista econômico, é refazer ou restaurar obras arruinadas por má
conservação, por acidente ou por defeito de plano ou de construção. Sabe-se que por
descuidada conservação um pequeno estrago aumenta rapidamente e as despesas em
consertos seguem a mesma progressão. O prejuízo, em certos casos, assume grande valor
desde que se somem todos os danos causados pelo descuido inicial e pelas tardias
providências para a restauração e pior ainda quando não resulte aproveitamento da lição e
os trabalhos das restaurações se sucedam em ciclos, acarretando despesas evitáveis.
Como resposta às diversas críticas, nem sempre justas, aos problemas de conservação
e seus verdadeiros responsáveis, ele adverte (Obras, v.XXII, 1925):
Uns atribuem o mal aos encarregados da conservação; outros acusam a administração
superior das empresas ou das obras públicas; em certos casos atribui-se o mal a defeito de
projeto ou de construção.
- Que responsabilidade poderá caber ao autor ou executor de um plano desde, que por
conservação, as obras se estraguem ou seja mau o funcionamento do sistema?
- Que responsabilidade poderão ter os encarregados da conservação se a administração
pública recusar as autorizações e verbas para o custeio e consertos, ou se as conceder fora
de tempo ou insuficientes, após os morosos processos de uma burocracia complicada e
vexatória?
- Que parcela de responsabilidade poderá caber à administração, quando as verbas para o
custeio sejam bastantes para uma boa conservação, mas o pessoal dela encarregado as
emprega mal, por ignorância ou incúria? para apurar as coisas, nesse caso, será preciso
saber se a administração está iludida ou se conhece a falta e mantém o pessoal desidioso
por interesse da nefasta política.
222
Nesta citação, parte-se do pressuposto de que os projetos e a construção seriam
realizados a contento. Vale ressaltar entretanto, que projetos de saneamento que não se atém à
importância das etapas de OMC, comprometem sensivelmente a realização adequada dos
serviços. Os aspectos da construção e da necessidade de uma fiscalização competente e
idônea, que garantam o atendimento às normas e especificações técnicas subsidiadas por um
controle tecnológico de obras
O combate às ligações irregulares deve sofrer ação fiscalizadora nas obras de
implantação de redes coletoras e na autorização das ligações prediais, que, no caso da Cidade
do Rio de Janeiro, devem ser executadas por empresas credenciadas pela CEDAE e sofrer
vistorias desta para a aceitação final, de acordo com o Decreto Estadual n
o
553/76.
O funcionamento integral dos sistemas de esgotos tem que ser necessariamente
viabilizado por um conjunto de ações que promovam a restauração da configuração dos
sistemas ao estabelecido em dimensionamento, atendendo-se às normalizações, especificações
e parâmetros dos projetos de engenharia.
Para redução do lançamento de esgoto sanitário no sistema de drenagem e,
inversamente, da contribuição pluvial no esgotamento sanitário, faz-se necessária uma
proposta de plano de ações, para efeito de referência, Programa Caça-Esgoto. Deve ser
estabelecido com metas claras, sem precipitações e interrupções, tendo em vista uma melhora
contínua da qualidade das águas urbanas. Neste programa de despoluição ambiental deverão
constar as seguintes ações, de acordo com as demandas específicas:
Atualização, preferencialmente informatizada, do cadastro técnico dos sistemas de
esgotos sanitário e pluvial;
Conhecimento da evolução histórica das ampliações e modificações físicas e
operacionais desses sistemas;
Inspeção e identificação das interconexões e dos pontos de aporte de esgoto sanitário
na drenagem pluvial e da contribuição pluvial no sistema de esgotamento sanitário;
Inspeção e identificação dos aportes de esgotos sanitários nas coleções hídricas e na
orla marítima;
Caracterização e diagnóstico do comportamento real (hidrodinâmico) dos sistemas de
esgotos e de suas interconexões, nos períodos seco e chuvoso, através de
monitoramento pluviométrico, liminimétrico, fluviométrico e polutométrico;
Avaliação das deficiências operacionais dos sistemas de esgotos decorrentes das
contribuições indevidas;
223
Estimativa das vazões de contribuições indevidas em ambos os sistemas,
hierarquizando as principais fontes/origens de lançamentos indevidos;
Classificação e reenquadramento das coleções hídricas;
Avaliação dos impactos ambientais dos despejos irregulares sobre os meios receptores;
Vistoria nos domicílios residenciais, comerciais e industriais, quanto ao uso, ou não,
da rede coletora de esgoto sanitário como destino dos efluentes domésticos e inspeção
dos requisitos dos sistemas prediais necessários à proteção da rede pública (caixas
retentoras, ventilação, caixas de inspeção, etc);
Correção das ligações prediais irregulares, eliminação dos extravasores e readequação
das partes referentes à admissibilidade de recebimento das contribuições pertinentes a
cada sistema (incluindo obras de substituição ou ampliação da rede blica), após
avaliação do vel de integridade e capacidade hidráulica demandados pelo sistema
diante da eliminação das interconexões;
Redução dos pontos de ingresso das águas pluviais no sistema de esgotamento
sanitário com remoção das interligações de esgoto sanitário/pluvial (ligações
irregulares e extravasores), das águas de infiltração (subterrâneas), das águas
provenientes das contribuições parasitárias da rede coletora e órgãos acessórios (águas
pluviais superficiais), além do aporte pelas elevatórias (grelhas, grades, bueiros, caixa
de areia, etc);
Desativação gradativa das estruturas atípicas ao sistema separador absoluto;
Análise do processo de despoluição dos cursos d’água, em função da eliminação do
aporte de esgoto sanitário, de acordo com um planejamento de recuperação gradual;
Formação de equipe de campo, preferencialmente com pessoas da comunidade e
estagiários, obrigatoriamente coordenados por funcionários efetivos das empresas
concessionárias envolvidas;
Implementação de programa de treinamento interdisciplinar para equipe também
interdisciplinar, contemplando capacitação técnica, conceitos de educação ambiental,
relações causa-efeito e inter-relação entre sistemas de saneamento e comunidade;
Divulgação ampla dos objetivos das intervenções nos meios de comunicação para a
sociedade em geral, e previamente detalhada, nas áreas de intervenção efetiva,
esclarecendo as atividades necessárias para sua implementação;
Incentivo à participação da sociedade na construção e avaliação do programa em suas
diversas etapas;
224
Identificação das motivações negativas relacionadas às ligações irregulares no âmbito
privado a fim de nortear a construção e uso das motivações positivas de adequação;
Educação sanitária e ambiental para conscientização dos usuários quanto ao uso
correto dos sistemas prediais de esgoto sanitário e pluvial, evidenciando sua relação
com o sistema público, levando-se em consideração aspectos sócio-econômicos e
culturais;
Identificação de atores ligados ao tema, governamentais e não governamentais, que
possam desenvolver com equipes interinstitucionais, através de sistemas em rede,
ações de redução do aporte indevido de esgotos;
Implantação de um programa de manutenção preventiva, corretiva e emergencial nos
sistemas de esgotos, com ênfase na prevenção;
Monitoramento antes, durante e após as intervenções, com fiscalização permanente e
sistemática dos corpos hídricos, dos sistemas de esgotos e das fontes de poluição
pontuais e difusas, a fim de impedir novas conexões;
Emissão de relatórios de acompanhamento, com resultados alcançados (pontos e
volume eliminados, redução de carga poluidora, equivalente populacional, etc);
Disponibilidade dos relatórios ao público, obrigatória e facilitada, inclusive pela
internet, garantindo a participação da sociedade e registro de seus pontos de vista;
Manutenção de um serviço especial de controle de ligações irregulares, com vistoria
nos domicílios, de acordo com as exigências preconizadas na legislação pertinente;
Estímulo ao desenvolvimento tecnológico na área, a fim de dar suporte técnico e
otimizar ações conjuntas;
Após avisos prévios, como últimas mas não menos importantes, medidas coercitivas
(autuação e multa) sobre as ligações irregulares.
É mister observar que as ações supracitadas são referentes, especificamente, a um
plano de melhoria da qualidade das águas dos meios receptores e controle de poluição
decorrente do aporte de esgoto sanitário. Para a recuperação integral dos corpos hídricos, estas
ações devem fazer parte de um programa que contemple a eliminação ou a mitigação dos
impactos ambientais descritos no subitem # 6.2.2., para um efetivo sistema de gestão de
bacias hidrográficas.
Um Programa Caça-esgoto de recuperação ambiental, deve estar fundamentado em
requisitos legais e regulamentos; conceitos científicos e técnicos; questões ambientais e de
saúde publica; necessidades, expectativas e percepções da sociedade.
225
Cada bacia de esgotamento possui características específicas em diferentes escalas,
havendo demandas diferenciadas no processo de adequação das condições operacionais.
Como os sistemas possuem carências acumulativas, as medidas iniciais se apresentam com
maior necessidade. Após sua otimização poderão apresentar melhoria evolutiva, com redução
de custos corretivos e emergenciais, com importantes reflexos na sociedade. É um trabalho
que exige continuidade, e, não obstante, promove desde o início uma regressão gradual no
processo de poluição dos corpos hídricos, de reflexo direto sobre a sociedade
1
, o meio
ambiente e a própria melhoria operacional dos sistemas envolvidos.
Quando a eliminação de ligações irregulares é realizada sem a sensibilização da
comunidade e sem a devida clareza dos propósitos das intervenções, o resultado efetivo é a
manutenção do status quoexistente por efeito da inércia, que atua tanto na natureza física,
quanto social. Se for produzida uma ão fiscal isolada sem estudo acurado da repercussão
econômico-social, o resultado poderá ser inócuo ou contrário à intenção que o gerou (Silva,
1976).
Técnicas mais simples, como o lançamento de traçadores (corantes) nas instalações
sanitárias das residências, indústrias, estabelecimentos comerciais; métodos expeditos de
contaminação por matéria orgânica (Método de Nessler), e/ou tecnologias mais sofisticadas
como: inspeção por circuito interno de televisão, monitoramento das lâminas d’água de GAP
por sensores de ultra-som, comparação através de fotografias aéreas, monitoramento por
sensoriamento remoto, mapeamento digital, sistema de informação geográficas (SIG), dentre
outras, são recursos que estão disponíveis para viabilizar o monitoramento e o controle
sistemáticos.
De acordo com o engenheiro Maurício Gomberg, em palestra proferida na SEAERJ
em dezembro de 2002, a CEDAE dispõe de estudos pormenorizados, com detalhamento em
cadastro e projetos, de eliminação de extravasores e readequação da rede pública de esgoto,
apresentando, como exemplo, os estudos relativos à área correspondente ao Sistema Alegria, e
que aguardam a disponibilidade de recursos para realização das devidas correções.
Conforme apresentado no subitem # 6.3.1., a eliminação, nos corpos receptores, das
contribuições indevidas provenientes do sistema de coleta e transporte de esgoto sanitário
depende preliminarmente da superação do histórico déficit de unidades de tratamento dos
esgotos sanitários.
1
Um dos aspectos da aceitação da sociedade pode ser traduzida em redução de inadimplência, que segundo a
recém criada Diretoria Comercial da CEDAE, o número de inadimplentes chega a 600 mil consumidores,
correspondendo a uma divida de cerca de R$ 2 bilhões. A inadimplência mensal está acima de 30% (Boletim
CEDAE, 2003).
226
Quanto aos efluentes industriais, torna-se eminente um plano de recadastramento e
licenciamento para recebimento de efluentes não domésticos na rede coletora da CEDAE,
uma vez que as águas residuárias devem estar em conformidade, sob o ponto de vista
quantitativo e qualitativo, para o lançamento na rede coletora de esgoto e nos corpos hídricos.
Um conjunto de ações para eliminação das interconexões, como as previstas no
Programa Caça-Esgoto, pode fazer parte de programas especiais de sistema de gestão
ambiental, subsidiar estudos de caracterização e diagnóstico do sistema de esgoto sanitário, ou
fazer parte do escopo dos planos diretores de esgotamento sanitário e de drenagem pluvial.
A questão exige grandes e constantes investimentos, e obviamente não pode ser feita
somente com os esforços de concessionárias. Um plano integrado de ações visando eliminar o
aporte de esgoto sanitário, associado ao controle de outras fontes de poluição, gera resultados
profundos, inclusive com a possibilidade de redução da inadimplência.
Para o provimento da infra-estrutura urbana adequada ao equacionamento dos
efluentes domésticos e a concretização de cenários futuros melhores, seguem algumas
proposições e perspectivas correlacionadas à temática abordada.
1. Necessidade de um processo de integração multisetorial, prioritariamente: gestão dos
recursos hídricos, ocupação urbana, concessionárias de esgoto sanitário, drenagem pluvial
e saúde pública. O saneamento ambiental é, em grande parte, a expressão da atuação
desses setores. Quando não entendidas suas inter-relações e interdependências, os
resultados são limitados e superficiais. O cenário de desarticulação dessas intervenções é
marcado pela ausência de uma política de saneamento e de um planejamento estratégico
representada pelo deficitário cumprimento de planos diretores;
2. Revisão do plano diretor de esgoto sanitário, articulada com a implantação urgente do
plano diretor de drenagem pluvial na cidade. Estes devem fazer uma análise quantitativa e
qualitativa da contribuição de esgoto sanitário e de águas pluviais no sistema de drenagem
pluvial e de esgotamento sanitário, respectivamente, e avaliar seus efeitos sobre esses
sistemas e o meio ambiente, além de propor um programa integrado de reversão do atual
cenário de degradação ambiental;
3. O poder público estadual, através do fortalecimento de seus órgãos ambientais, como a
FEEMA - outrora referência nacional no controle da poluição - deve rever os usos
benéficos e a classificação dos corpos d’água, realizando amplo reenquadramento. Esta
responsabilidade não pode ser postergada ou transferida. Deve ser compartilhada com a
comunidade, estimulando e incentivando a criação de comitês de bacia, de modo a manter
227
a condição de um segmento de corpo d’água em correspondência com a sua classe. As
técnicas utilizadas na gestão dos sistemas devem ser orientadas no sentido de incidir sobre
a participação e organização social. O processo educativo é instrumento essencial nos
processos de despoluição das coleções hídricas;
4. Atualmente as ações sistêmicas de monitoramento, controle e fiscalização das coleções
hídricas na cidade ocorrem de forma tênue, sendo fundamental para o manejo adequado, a
capacidade de realização desses serviços por parte das concessionárias e órgãos de
controle ambiental;
5. Política ambiental formalmente endossada pela alta administração das concessionárias,
cujo conteúdo atinja os níveis operacionais dos sistemas de saneamento. A consciência
ambiental dos trabalhadores deve ser formada estabelecendo-se um panorama da relação
causal entre a operação do sistema de esgotamento e os impactos ambientais gerados por
sua operação;
6. Atividades que forneçam subsídios à CEDAE para as intervenções físicas no sistema,
inclusive as relativas às instalações prediais privadas. Melhora nas ações de apoio
operacional e gerencial. Atividades de estudos e projetos, apoio jurídico, treinamento e
comunicação externa;
7. Maior controle das intervenções subterrâneas que possam interferir e danificar partes e
componentes dos esgotos implantados;
8. Por serem, em sua maioria, estruturas subterrâneas, as características construtivas dos
sistemas de esgotos exigem grande atenção por parte da fiscalização. Esta deve ser
formada por uma equipe proporcional ao empreendimento, com competência técnica.
Deve-se, através de um plano de controle tecnológico de obras, contemplar ensaios de
serviços, materiais, artefatos e equipamentos determinantes para a qualidade, segurança e
durabilidade das estruturas, dos processos e do sistema;
9. Plano de remanejamento gradual dos trechos de redes coletoras de esgoto sanitário e de
GAP, com integridade e funcionabilidade comprometidas. Este empreendimento se torna
oneroso e complexo pela magnitude e diversidade de impactos que gera, principalmente
nas áreas de alta densidade urbana. Entretanto, se faz necessário frente aos impactos
negativos decorrentes da sua não realização e à garantia das condições de funcionamento
do sistema separador absoluto;
228
10. Ampliação dos índices de cobertura de esgotamento sanitário e melhoria dos serviços de
operação, manutenção e conservação. Adoção de política voltada para a recuperação da
capacidade dos sistemas implantados. É imprescindível realizar um amplo debate cultural
no meio técnico sobre os acertos e desacertos do passado e as dificuldades atuais do
sistema, complexo por sua escala e características;
11. O atendimento a 100% da população deve ser uma meta e esforços devem ser
convergidos, principalmente nas comunidades carentes, para a implantação de redes e
integração adequada com os sistemas existentes;
12. A coleta e transporte de esgoto sanitário devem avançar no sentido de garantir a
estanqueidade de seus componentes e a eficiência dos sistemas de tratamento a fim de
melhorar as condições de salubridade pública e diminuir o risco ambiental.
13. Em alguns casos, o problema não é de saneamento, mas sim de ocupação do solo em áreas
inadequadas para a fixação humana - áreas de risco, proteção ambiental, áreas inviáveis
para implantação dos serviços de infra-estrutura. Caso seja imprescindível haver
remoções, estas devem ser acompanhadas de apresentação de melhores alternativas
habitacionais, dentro de uma política de participação social e equacionamento de conflitos.
A melhoria sanitária e ambiental da cidade como um todo acontecerá se houver o
atendimento às carências de saneamento e serviços públicos acumulada historicamente nas
áreas favelizadas, através do equacionamento do déficit habitacional e da distribuição de
renda;
14. A constatação do avanço tecnológico em que nos encontramos é irrefutável. Na
atualmente denominada “Era do Conhecimento”, a capacidade deste poder de
transformação gerar melhorias concretas para a maioria da sociedade está ameaçada pela
apropriação e monetarização do saber. O conhecimento técnico não deve ser tratado como
propriedade privada, mas utilizado como instrumento socializante, uma vez que é
patrimônio da humanidade, fruto da contribuição de sucessivas gerações. Deve ser
descartada a visão retrógrada e tecnicista do ser humano “apolítico” e outras definições
inconsistentes. A pesquisa não pode limitar-se ao desenvolvimentismo, mas também à
transferência e aplicabilidade de tecnologia, com o objetivo final de garantir amplo acesso
à população;
15. O estudo da história da Engenharia Sanitária e Ambiental nos impõe a necessidade de
concentrar esforços no resgate de sua memória. Para isso, é de extrema valia a reativação
da iniciativa do Espaço Memória do Saneamento.Criado em 1991, inicialmente através de
229
convênio da CEDAE com a ABES e reativado pela Associação dos Empregados de Nível
Superior da CEDAE (ASEAC), que em razão de dificuldades financeiras, foi paralisado.
Um espaço que privilegiasse o resgate da história do saneamento, seria uma medida de
incentivo à pesquisa e de valorização da empresa pública de saneamento;
16. A educação ambiental é um instrumento de ação sistêmica, que deve ter caráter
interdisciplinar, sendo necessária quando o objeto em questão for o sistema de esgoto, a
participação dos engenheiros responsáveis e dos especialistas, uma vez que a educação
sanitária é parte constituinte indispensável;
17. Para a obtenção de resultados mais satisfatórios na gestão ambiental, reafirma-se a
necessária implicação e responsabilidades da sociedade civil quanto ao uso dos recursos e
espaços que formam o horizonte das atividades cotidianas. O engajamento desloca o eixo
do controle imposto pela lógica utilitarista do mercado e da administração tecnocrática.
Este é, sem dúvida, um desafio que consiste em modificar as relações existentes, alterando
o quadro de referência que orienta os padrões de comportamento dos atores individuais
(Silva, 1998);
18. A análise e utilização de indicadores de desempenho dos sistemas de saneamento podem
promover, de forma catalisadora, o monitoramento e controle ambiental, ações sistêmicas
imprescindíveis em qualquer conjunto de intervenções que visem à saúde ambiental. São
fundamentais para a vivacidade e validade de programas de saneamento, como os
direcionados para as comunidades carentes. Através de uma engenharia socialmente
comprometida é possível definir critérios de projetos e obras de engenharia, avaliar acertos
e erros cometidos em programas, análise das alternativas e concepções adotadas. Em
síntese, confirmar o desenvolvimento tecnológico a serviço da sociedade. Em vez de
desenvolvimento sustentável deve-se trabalhar para uma sociedade sustentável, incluindo-
se em todo novo projeto de viabilidade técnico-econômica a viabilidade da vida, do custo
social e do respeito ao homem e a natureza.
230
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impermeabilizada superior a 500 m
2
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de Janeiro: ABES, 1999. 9 p.
ANEXO
ANEXO - RIO CARIOCA: DA SUA HISTÓRIA, O QUE PRESERVAR?
Desprovida de planejamento urbano adequado às demandas sanitárias e ambientais, a
metropolização da Cidade do Rio de Janeiro potencializou os impactos negativos nas suas
bacias hidrográficas urbanas. Um exemplo singular dessa situação pode ser visto na Bacia
Hidrográfica do Rio Carioca. Sua importância histórica para o crescimento da urbe é narrada
por vários especialistas e reconhecida pela sociedade. Entretanto, este corpo hídrico encontra-
se gravemente comprometido em seus aspectos ambientais.
Introdução
A historiografia do rio Carioca se confunde com a própria história do Rio de Janeiro,
na trajetória de sua organização social e espacial e na relação antrópica com os ecossistemas
localizados em sítios urbanos. Enquanto primeiro manancial superficial utilizado, foi palco de
grandes lutas pelo aproveitamento de suas águas e pela conquista e domínio das terras a ele
contíguas. A fim de viabilizar sua utilização para dessedentação, foi construída a maior obra
de saneamento do período colonial - os Arcos da Lapa.
Compreender os esforços desprendidos na solução dos problemas sanitários e
ambientais deste corpo hídrico dentro de uma contextualização histórica é fundamental para
que se complete a visão do problema da poluição urbana e suas origens. A relação entre
natureza e sociedade é historicamente determinada pelo desenvolvimento econômico e social.
É dentro dessa perspectiva que esse trabalho se apresenta. O conhecimento das diversas
intervenções realizadas no rio Carioca, tanto de agressão ambiental quanto de tentativas de
proteção e controle da poluição, certamente apresenta experiências importantes sobre os
sistemas de saneamento no município e auxiliam no entendimento do atual estágio de
degradação ambiental, subsidiando possíveis propostas de valorização ambiental da drenagem
urbana que, viabilizadas, poderiam se tornar referência à mudança de paradigma das
intervenções de saneamento na Cidade do Rio de Janeiro.
Caracterização do Rio Carioca
O rio Carioca, independente das dúvidas etimológicas que seu nome encerra, deu
origem ao nome dos habitantes do Rio de Janeiro. É uma pequena sub-bacia contribuinte da
Baía de Guanabara com 7,9 km², extensão de 7,1 km e vazão total em tempo seco de 575
L/s
(Schlee, 2001).
Nasce nas Paineiras, próximo à Estrada do Sumaré, na Serra da Carioca, pertencente
ao Maciço da Tijuca (Figuras 1a e 1b, localização geral). Seu leito principal desce pelo
interior das florestas, passando pelas vertentes do Cosme Velho, Laranjeiras e Catete. Na
Estrada das Paineiras, próximo ao estacionamento do Corcovado, em ambiente bucólico,
amplamente visitado por moradores e turistas, encontra-se a primeira represa de controle de
vazão.
Figuras 1a e 1b. Localização geral do Maciço da Tijuca
(www.rio.rj.gov.br).
Na rua Almirante Alexandrino - outrora rua do Aqueduto - no Morro do Inglês, estão o
Reservatório da Ladeira do Ascurra e a caixa de derivação, datados de 1868 e 1744,
respectivamente (Figuras 2a e 2b) e de onde as águas eram conduzidas para o Aqueduto da
Carioca a fim de abastecer a cidade. Seculares, estas estruturas encontram-se atualmente em
estado precário de conservação. O reservatório encontra-se escondido por matagal.
(b) Reservatório da Ladeira do Ascurra
(Revista de Engenharia, jan.-mar., 1965).
(a) Caixa de derivação
(Foto: Dias, A.P. fev. 2002).
Figuras 2. Reservatório da Ladeira do Ascurra e caixa de derivação do aqueduto.
Nos limites do Parque Nacional da Floresta da Tijuca, o Carioca ainda conserva parte
significativa das suas características geomorfológicas originais. Este rio passa ao lado da rua
Conselheiro Lampréia dos Guararapes e desce pela ladeira da rua Cosme Velho. Nesse trecho
a qualidade de suas águas se encontra totalmente comprometida. Passa em galeria sob a
saída do túnel Rebouças para em seguida ressurgir para ser contemplado nas proximidades do
Largo do Boticário - Área de Proteção do Ambiente Cultural do Cosme Velho. As Figuras 3a
e 3b, a seguir, apresentam detalhes deste patrimônio histórico-paisagístico.
(a) Acesso ao Largo do Boticário.
(b) Bica d’água no centro do largo.
Figura 3. Aspecto do Largo do Boticário (Fotos: Dias, A.P. fev. 2002).
Logo abaixo, na Praça do Cosme Velho, o rio desaparece sob o pavimento
transformando-se em uma grande galeria de drenagem que prossegue pelo trajeto aproximado
paralelo às ruas: Cosme Velho, das Laranjeiras, Conde de Baependi e Barão do Flamengo,
seguindo até o Parque do Flamengo e a praia.
Em tempos remotos, o Carioca possuía uma ramificação intermitente,
aproximadamente paralela à rua do Catete, denominado rio Catete. Desembocava próximo à
outrora praia do Russel, no antigo Saco da Glória, onde, após aterros, localiza-se atualmente a
rua do Russel. Na confluência do Carioca e o Catete, em época de chuva formava-se uma
lagoa cujo aterramento deu origem ao Largo do Machado. O braço principal, que naturalmente
tinha sua foz na Baía de Guanabara, foi posteriormente capturado por uma galeria de cintura
construída na praia do Flamengo, desviando novamente sua foz para um enrocamento
artificial, localizado ao lado do restaurante Porção Rio, na praia do Flamengo.
A Figura 4 traz a delimitação da Bacia Hidrográfica do Rio Carioca e a Figura 5 (de
a a l), nas páginas subseqüentes, registram através de relatório fotográfico (Dias & Rosso,
2003), os diversos aspectos do leito principal do rio Carioca. Ambas encontram-se ao final
deste anexo.
Importância do Rio Carioca para a Cidade do Rio de Janeiro
Desde tempos imemoriais, o rio Carioca era utilizado e venerado pelos verdadeiros
donos desta terra, os índios. Antes mesmo do nascimento da cidade, este rio era fonte de água
potável para as embarcações que passavam próximas à sua foz, lugar que ficou conhecido
como Praia da Aguada dos Marinheiros, hoje aterro contíguo à Praia do Flamengo. Suas águas
abasteceram índios, franceses, flamengos, portugueses e brasileiros provenientes de outras
capitanias, se tornando uma área estratégica, palco de sangrentas disputas.
Em 1° de março de 1565, o capitão-mor Estácio de Sá fundou a Cidade de São
Sebastião do Rio de Janeiro, no istmo situado entre os morros Cara de Cão e Pão de Açúcar,
localizado estrategicamente na entrada da Baía de Guanabara. A primeira providência tomada
foi mandar escavar ali mesmo no sopé do Morro Cara de Cão, um poço para abastecimento de
água, que logo se mostrou insuficiente. Ainda do sítio que ficou conhecido como Vila Velha,
saíam embarcações portuguesas que iam em busca das águas límpidas do Carioca.
Dois anos depois, devido à área ser imprópria para expansão e mediante a vitória sobre
os franceses em batalha travada próximo ao rio Carioca, houve a transferência do núcleo
primitivo de colonização para o morro do Castelo, e a partir daí sua expansão para as várzeas,
ficando alguns poucos remanescente na antiga vila.
O morro do Castelo era desprovido de nascentes e em seus arredores as águas salobras
eram inadequadas para dessedentação. Assim, construiu-se uma ladeira em direção ao rio
Carioca, por ser este a fonte mais próxima e acessível para o abastecimento de água, sendo
utilizado como manancial por longo período, tanto na foz como em diversos pontos mais a
montante.
A Figura 6, apresentada na página seguinte, representa os primeiros traçados
realizados pelos colonizadores. Na descida da vertente sul do morro do Castelo formava-se
um estreito caminho entre as lagoas de Santo Antônio e Boqueirão, chamado de Caminho do
Desterro (atual rua Evaristo da Veiga). O seu prolongamento à esquerda servia aos que iam
em demanda das distantes águas do rio Carioca, dando origem aos traçados das futuras ruas da
Lapa, Glória e do Catete, primeiro eixo longitudinal a cortar o vale em direção a região sul
(Coaracy, 1965). Contornando a outra face do morro de Santo Antônio, surgiu o caminho que
viria a ser a estrada Mata-Cavalos, que continuava pela Mata-Porcos, origem das atuais ruas
do Riachuelo e Frei Caneca, respectivamente.
Figura 6. Primeiros caminhos na época da fundação da cidade
(Revista Municipal de Engenharia, jan.março 1986).
Como fonte de abastecimento, as águas do rio Carioca eram utilizadas diretamente
para o consumo dos senhores de escravos, indígenas e posteriormente pelos negros, ou
vendidas aos habitantes que não dispunham de escravos próprios. Surgiu assim a figura dos
aguadeiros (Figura 7), o que pode ser considerado o “primeiro serviço de água da cidade”.
Figura 7. Pretos de ganho, Chamberlaim, 1820
(Biblioteca Nacional, Divisão de Iconografia).
Os pontos de abastecimento de água foram subindo o curso do rio em conseqüência do
avanço do processo de ocupação e poluição e, como esta era uma tarefa longa, dispendiosa e
perigosa, aumentava a pressão dos moradores. Sucessivas reclamações pediam uma solução
definitiva para o problema do abastecimento da cidade.
Cresce sua importância enquanto manancial com a construção do Aqueduto dos Arcos
da Lapa, que permitiu o encaminhamento das águas até o Largo de Santo Antônio (atual Largo
da Carioca), onde foi instalado o primeiro chafariz da cidade, vindo de Portugal, conforme
representado na Figura 8, a seguir.
Figura 8. Chafariz do Largo de Santo Antônio (W. Smith, 1833)
Inicia-se nesse período, a Época dos Chafarizes, que juntamente com as bicas, poços e
cisternas, constitui-se no primeiro sistema oficial de abastecimento de água no Brasil, embrião
das obras públicas de saneamento na cidade e que permaneceu praticamente por todo o século
XIX.
Ao longo de sua trajetória, este curso d’água abriga diversos testemunhos que
registram marcos históricos da evolução técnica da engenharia e dos sistemas de
abastecimento de água da cidade, em uma paisagem marcada pela diversidade social, cultural
e biológica.
Arcos da Lapa
Verdadeiro ícone da atuação da engenharia nacional, cartão postal da cidade, os Arcos
da Lapa são reconhecidos internacionalmente como um dos principais monumento históricos
do país. Todavia, este empreendimento foi marcado por uma sucessão de percalços que
consumiram mais de um século para a conclusão.
Devido à constante pressão dos habitantes, em 23 de dezembro de 1617, o
Governador Geral criava um imposto sobre os vinhos a fim de financiar as obras do futuro
aqueduto. Em 1623, a Câmara do Rio de Janeiro contrata os serviços para execução das obras,
que sofreram, por diversos motivos, sucessivas interrupções. As obras reiniciaram-se
intensamente em 1719, no governo de Aires Saldanha, estando concluídas em 1723 com a
inauguração do Chafariz da Carioca e suas dezesseis torneiras de bronze (Silva, 1988).
O Aqueduto do Carioca possuía 6,6 km, recolhendo as águas das diversas nascentes
que compunham a bacia do rio Carioca. O trecho pela encosta das montanhas possuía paredes
laterais com arcadas em alvenaria de até 1,8 m de altura e 2,0 m de largura. Próximo ao final
do aqueduto foram construídos os arcos, conhecidos como Arcos Velhos da Carioca, a fim de
vencer o vale localizado entre as faldas do morro do Desterro (Santa Tereza), ao pé do
Convento das Carmelitas até o morro de Santo Antônio, ainda existindo atualmente uma
pequena nesga, testemunho do desmonte do morro. As ruas Almirante Alexandrino e Joaquim
Murtinho nasceram em conseqüência do traçado da antiga canalização, caminho conhecido na
época como rua do Aqueduto. Para estas obras também foram usadas manilhas de barro
produzidas na Bahia, porém executadas de forma precária.
A Figura 9, apresentada abaixo, traz o traçado sinuoso da rua Joaquim Murtinho,
próximo ao início dos Arcos da Lapa, por onde passava o aqueduto.
Figura 9. Trecho final da rua Joaquim Murtinho
próximo aos arcos (Fotos: Dias, A.P. fev. 2002).
A concepção inicial definia a construção do aqueduto ao longo do Morro do Desterro,
em seu pequeno prolongamento denominado Morro das Mangueiras, e margeava o Caminho
do Desterro (Rua Evaristo da Veiga) até o Campo da Ajuda (Praça Marechal Floriano). O
Morro das Mangueiras, que chegava próximo ao local onde atualmente é o Largo da Lapa, foi
em 1779 o primeiro morro do Rio de Janeiro a ser arrasado objetivando aterrar-se uma parte
remanescente da Lagoa do Boqueirão. No governo de Aires de Saldanha (1719-1725), após
uma avaliação do plano primitivo, o traçado do aqueduto sofreu modificações, dentre elas a
inflexão do traçado para seu novo destino final, o Largo de Santo Antônio.
As condições estruturais dos chamados Arcos Velhos, devido a descuidos na sua
construção e conservação, tornaram-se precárias, com indícios evidentes de ruína. Fez-se
necessária no governo de Gomes Freire de Andrade (1733-1763), sua substituição por novos
arcos (1744-1750), de traçado retilíneo, solidamente construídos pela mão de obra escrava, em
alvenaria de pedras brasileiras (contrariando a lei que impunha a importação de materiais de
construção), com rejuntamento de argamassa de cal hidratada e terra misturada a óleo de
baleia, cuja resistência ficou comprovada através dos séculos. Sobre o topo dos arcos foram
instaladas canaletas, segmentos de pedra esculpida, pré-fabricadas em pedra natural trazidas
de Portugal. Ainda sob determinação do governador, o aqueduto foi coberto com abóbadas de
tijolos a fim de evitar sangrias, sujeiras e a incidência de sol (Corrêa, 1939). Com o passar dos
tempos o aqueduto foi sendo substituído por encanamentos de ferro fundido, sendo raros os
vestígios que dele perduram. Existiam ao longo do seu trajeto diversos reservatórios para
regularização de vazão.
Na Figura 10, abaixo, é apresentada a considerada mais antiga ilustração dos Arcos da
Lapa, reprodução dos painéis de Leandro Joaquim, do final do século XVIII, ainda com a
Lagoa do Boqueirão à sua frente, que depois de sucessivos aterros deu lugar ao Jardim do
Passeio Público (1779-1783), primeira obra urbanística de embelezamento da cidade.
Figura 10. Lagoa do Boqueirão e o Aqueduto de Santa Tereza
Óleo de Leandro Joaquim (Coaracy, 1965).
Os Arcos da Lapa são uma ponte canal em estilo romano, com 270m de comprimento
e altura máxima de 17,6m, constituídos por dupla arcada de quarenta e dois arcos. Perdura
firme até os dias de hoje, sendo, a partir de 1896, utilizados como viaduto para os
remanescentes bondes elétricos de Santa Tereza.
Nas Figuras 11a e 11b, apresentadas abaixo, podem ser observadas vistas do Arcos da
Lapa em dois momentos distintos de urbanização do município.
(a) Arcos e arredores a cerca de 1890.
(b) Arcos da Lapa na atualidade.
Figura 11. Aspectos dos Arcos da Lapa.
(a) Litografia de Victor Frond (Telles,1984); (b) (www.rio.rj.gov.br).
As Figuras 12a e 12b, abaixo, apresentam detalhes do leito do viaduto férreo, situado
ao topo da estrutura dos arcos com o Bondinho de Santa Teresa.
(a) Vista do leito do viaduto.
(b) Bondinho de Santa Tereza.
Figura 12. Vista de cima dos arcos adaptado para a passagem do bondinho
de Santa Teresa (Fotos: Dias, A.P. fev. 2002).
Agonia de um Rio
Ao passar dos tempos persistem ao longo do rio diversas estruturas hidráulicas de
valor histórico-cultural e beleza inestimáveis. Verdadeiro marco memorial do nascimento da
cidade, outrora fonte de água potável, com abundância de peixes, navegável em determinados
trechos, infelizmente nos dias de hoje é testemunha do processo de degradação ambiental pelo
qual passaram as coleções hídricas da cidade. A mudança de trajetória do leito natural e a
canalização de grande parte de sua extensão descaracterizaram sua configuração original. De
jusante para montante, o rio foi desaparecendo gradualmente.
Como demonstra a Figura 13, abaixo, era possível reconhecê-lo, mesmo canalizado, e
contemplar suas águas na rua Conde de Baependi. Posteriormente, Pereira Passos, em 1905,
visando resolver problema das inundações canalizou o Carioca em galeria subterrânea, desde
o mar até o Cosme Velho na altura do Largo do Boticário (Roxo & Ferreira. In: Silva, 1965).
Figura 13. Aspectos do rio Carioca em canal
(Revista FEEMA, maio/junho 1995).
Análises de dados bioquímicos feitas por Schlee (2002), no período entre 1991e 2001,
indicaram um progressivo declínio da qualidade da água do rio ao longo da última década. O
aporte de esgotos doméstico e industrial, através de ligações irregulares e extravasores, além
do lançamento de resíduos sólidos, transformaram as antigas águas cristalinas em um valão de
águas residuárias. Mesmo o trecho entre Silvestre e Paineiras possui piscinas e cascatas
naturais em estado de degradação. O atual aspecto de degradação pode ser verificado na
Figura 14, a seguir:
Figura 14. Poluição do rio Carioca.
(Foto: Dias. A.P., fev. 2002).
O rio Carioca encontra-se como a maior parte dos pequenos e poucos rios existentes
do Rio de Janeiro: agonizante ou sepultado sob os seus pavimentos. Com o crescimento
populacional e a conseqüente expansão das áreas ocupadas, novos mananciais foram
explorados e posteriormente abandonados na exclusiva função menos nobre de escoamento
dos esgotos sanitários e transporte de resíduos sólidos.
Iniciativas de Recuperação
Face ao seu papel vital para o abastecimento da cidade, várias ações foram realizadas
na tentativa de se preservar o rio Carioca. Segundo Abreu (1992), houve tentativas de
proteção através de atos legais desde o início do século XVII (1611 e 1638).
Em 1817, determinou-se o cercamento de todos os terrenos do alto da serra que
estavam ao redor das nascentes do Carioca e ao longo do aqueduto até Santa Tereza, com o
espaço de três braças de terreno de cada lado do aqueduto (Corrêa, 1939). O aumento
progressivo da necessidade de abastecimento devido ao crescimento da população carioca, fez
com que uma série de medidas fossem tomadas pelas autoridades locais. A crise no
abastecimento teve como conseqüência o reflorestamento da Floresta da Tijuca que tinha sido
quase totalmente dizimada pela monocultura de café. Segundo Abreu (1992), em 1843 o
governo imperial constituiu um grupo de trabalho para estudar as causas da grave falta d’água
pela qual passava a cidade, que propunha:
que se providencie, quanto antes, sobre a conservação das matas, tanto das Paineiras,
como da Tijuca, em toda a extensão das cabeceiras e vertentes dos rios Carioca e
Maracanã; proibindo-se eficazmente a continuação das derrubadas naqueles lugares, e
desapropriando-se, se necessário for, os terrenos que tenham sido dados sem cláusulas.
Em 1846, foi realizado o primeiro levantamento hidrostático do maciço da Tijuca, que
indicava todos os aquedutos, encanamentos, fontes, chafarizes, córregos, rios, minas e
mananciais ali existentes, apontando a quantidade de água fornecida e aproveitada, incluindo
informações sobre seu peso específico.
Dentre as medidas adotadas para a proteção do manancial destacam-se: controle,
fiscalização das nascentes e ao longo das linhas de abastecimento, desapropriações das
fazendas de cae implantação de um programa audacioso e pioneiro de reflorestamento para
proteger os mananciais e as encostas do maciço (Abreu, 1992).
Com nova escassez, em 1860 o governo propôs a elaboração de um plano geral de
abastecimento d’água nomeando uma comissão especial. Duas soluções foram apresentadas: a
primeira delas se baseava na utilização das águas das encostas da serra do Tinguá, na serra do
Mar, além das fronteiras do Município Neutro; a segunda, vencedora, propunha a
continuidade na utilização dos mananciais do Maciço da Tijuca, argumentando que seus rios
ainda poderiam suprir as necessidades da cidade, bastando que para isso, fossem preservados,
além de oferecer solução para o problema das inundações (Abreu, 1992).
Esta decisão de engenharia ambiental possibilitou o renascimento da floresta no
início da década de 1870. Mesmo não se tornando solução definitiva frente ao aumento na
demanda de água, possibilitou a recuperação do que hoje é a maior floresta urbana do mundo
(Figura 15), com seus 3.300 ha, trazendo inúmeros impactos ambientais positivos para a
cidade e dando origem ao primeiro parque nacional brasileiro.
Figura 15. Vista aérea do Maciço da Tijuca.
A promulgação pelo governo municipal de leis ambientais, a partir de 1985, com a
criação de Unidades de Conservação Ambiental (UCA) favoreceu o processo de proteção das
florestas e do rio. Em 1986, teve início um programa municipal de reflorestamento. A
proteção dos bairros do Cosme Velho e parte de Laranjeiras foi declarada através de decreto
municipal de 1987, que visava preservar o patrimônio edificado e a ambiência da área. Em
1991, os objetivos foram ampliados, através de lei municipal que estabeleceu Área de
Proteção Ambiental do Cosme Velho e Laranjeiras. No mesmo ano, a Fundação Parques e
Jardins deu início ao reflorestamento das encostas do Cosme Velho (PCRJ, 1998b). A partir
dos anos 90 houve a participação comunitária nos esforços de reflorestamento no vale do rio
Carioca (Schlee, 2002).
O Projeto Mutirão de Revitalização do rio Carioca, coordenado por agentes do
programa Vida Nova, compreende ações de educação ambiental junto a alunos da rede
municipal de ensino, com coleta de lixo no leito do rio, plantio de mudas de árvores, etc.
Outras iniciativas se deram, como em 1992, quando, em atendimento ao Projeto
Ambiente Rio, foram eliminadas 155 ligações clandestinas de esgotos do rio Carioca como
uma das medidas para despoluir as praias da Zona Sul (Silva, 2002). Não obstante, a falta de
controle permitiu a posterior expansão de diversas ligações irregulares.
O rio possui rede coletora concebida em sistema separador absoluto, que segue sua
trajetória lançando os esgotos coletados da bacia no Interceptor Oceânico da Zona Sul, às
margens da Baía de Guanabara. Porém, durante as chuvas a capacidade deste interceptor fica
comprometida e o excesso de esgoto sanitário é desviado para a rede de drenagem e,
conseqüentemente, para o Carioca.
Na tentativa de melhorar as condições de balneabilidade da praia do Flamengo foi
construída pela prefeitura, em 1992, uma galeria de cintura (parte subterrânea e outra em canal
aberto) desviando o curso final do rio, visando afastar as águas poluídas e as contribuições de
drenagem pluvial que também poluíam ao desembocar ao longo da extensão da praia. Através
da galeria, as águas poluídas são concentradas e direcionadas para o atual desemboque
localizado ao lado do restaurante Porcão Rio. Posteriormente, foi inaugurada nesta galeria, em
setembro de 2002, a Estação de Despoluição do rio Carioca, cujo tratamento das águas,
somente no desemboque, não se traduz em melhorias para o curso d’água e não agrega
benefícios diretos para os habitantes que ocupam áreas contíguas. A concepção e os aspectos
destas intervenções foram abordados no subitem # 6.3.3.
Considerações Finais
É inegável a importância do rio Carioca para a população do Rio de Janeiro. A
poluição de suas águas foi por muito tempo negligenciada com ações insuficientes frente ao
contínuo processo de degradação ambiental. Um conjunto de intervenções foram realizadas ao
longo do tempo e de seu percurso.Não obstante, foram marcadas pela descontinuidade e pelo
não envolvimento dos diversos atores que se relacionam com esta bacia hidrográfica. Este
cenário é motivado pela não compreensão e valorização do rio enquanto ecossistema e pela
secundarização de suas relações ecológicas e dos diversos benefícios que poderia trazer à
qualidade de vida da população local, além de outros, provenientes do turismo.
As causas da poluição do rio persistem relacionadas principalmente aos sistemas de
esgotamento sanitário, pluvial, gestão de resíduos sólidos, desmatamento, uso e ocupação
irregular do solo.
A revitalização de rios é sem nenhuma dúvida a melhor forma de se preservar a
qualidade ambiental de qualquer corpo d’água. Mesmo não sendo possível retornar às
condições naturais, a implantação de um Plano de Manejo do Rio Carioca que o encarasse
como um ecossistema que mantém relações de interdependência com os sistemas artificiais
(dentre eles os sistemas de saneamento) e a população, poderia mudar o curso de sua história.
O fato de ser um rio genuinamente carioca, de pequenas dimensões, situado em área
nobre, com habitantes de diversas classes sociais, de alto valor histórico e paisagístico,
viabiliza a implantação de um programa de ações sistêmicas e sustentáveis, de impactos
ambientais positivos diversos e sinérgicos. Devem estar relacionadas à melhoria contínua dos
sistemas de saneamento, à educação ambiental e à participação da comunidade, através de um
planejamento ambiental urbano que analise os conflitos ambientais em suas diversas
dimensões: afetiva, cultural, conceitual e estratégica, de forma a permitir suas superações e
promover interações mais dinâmicas e equilibradas. Um conjunto de estudos já realizados
nesta área poderia servir de importante subsídio. Somente com uma mudança na abordagem
dos valores e dos objetivos de cunho ecológico será possível reincorporar coleções hídricas ao
ambiente urbano e estabelecer uma convivência mais harmoniosa entre os homens e o meio
ambiente.
Figura 4. Bacia Hidrográfica do Rio Carioca (Schlee, 2002).
(a) Características naturais próximas a nascente.
(b) Primeira represa de controle de vazão.
(c) Trecho na Comunidade dos Guararapes.
(d) Trecho ao longo da rua Cosme Velho.
(e) Trecho a montante do Largo do Boticário.
(f) Trecho na altura do Largo do Boticário.
Figura 5. Relatório fotográfico do rio Carioca (Fotos: Dias, A.P. fev. 2002).
(g) Trecho a jusante do Largo do Boticário.
(h) Passagem para revestimento em concreto.
(i) Início em galeria na Praça do Cosme Velho.
(j) Estação de despoluição na galeria de cintura.
(k) Trecho final da galeria de cintura.
(l) Desembocadura na praia do Flamengo.
Figura 5. Relatório fotográfico do rio Carioca (Fotos: Dias, A.P. fev. 2002).
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