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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Antonia Teresinha de Oliveira
O Estado como agente educacional na Constituição de 1988
DOUTORADO EM DIREITO DO ESTADO
SÃO PAULO
2009
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Antonia Teresinha de Oliveira
O Estado como agente educacional na Constituição de 1988
DOUTORADO EM DIREITO DO ESTADO
Tese apresentada à Banca Examinadora
como exigência parcial para obtenção do
título de Doutor em Direito do Estado, área
de concentração em Direito Constitucional
pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, sob a orientação da Profª
Doutora Dinorá Adelaide Musetti Grotti
SÃO PAULO
2009
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Banca Examinadora
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____________________________________
DEDICATÓRIA
À Inteligência Superior que preside e guia a nossa atuação e a nossa experiência a
minha gratidão.
Ao meus pais, a Ruy Cavalieri Costa e à Professora Dinorá Adelaide Musetti Grotti..
AGRADECIMENTOS
À professora Dinorá Adelaide Musetti Grotti pela amizade, apoio e
incomensuráveis ensinamentos.
Ao professor Celso Antônio Bandeira de Mello pelo exemplo.
À Maria Aparecida Pires Lopes pela generosa colaboração e extremada
dedicação na correção, digitação e formatação deste estudo.
RESUMO
OLIVEIRA, Antonia Teresinha de. O Estado como agente educacional na Constitucional de 1988
A proposta da tese fundamenta-se na convicção de que o entrelaçamento entre
direito, educação e Estado trará solução para os graves problemas sociais que vivemos
atualmente.
As causas de dissolução social vivenciadas hodiernamente partem da ausência de
educação, perpassam sua condução ineficiente e resultam nas grandes comoções sociais.
Entendemos que a Constituição Federal traça um amplo programa educacional, o
qual necessita de implementação em todas as áreas de atuação humana.
Dentro desse ambicioso programa, entendemos igualmente importante atendendo à
determinação constituinte de eficiência e excelência na atuação e implementação de políticas
públicas uma estruturação independente da educação nacional, objetivando especialização,
eficiência e atenção, assunto que constitui proposta, de lege ferenda, apresentada nesta tese.
Considerando que, no Estado soberano, é, o elemento humano, quem promove
ações e pratica atos numa determinada base territorial, julgamos constituir função, ou dever
do Estado, educá-lo para os valores sociais da democracia em regime de participação e
convivência solidária, em bases de liberdade e respeito mútuo.
Considerando, ainda, que existem multifacetados aspectos da educação humana, que
requerem urgente atenção, propomos a especialização de função com vistas ao
desenvolvimento de ações entre Estado e sociedade.
Queremos afastar desta proposta qualquer ideia que vincule educação a determinadas
e específicas ideologias, pois a educação deve ter por objetivo o homem e os valores que
promovem a vida e a liberdade, o respeito à coisa pública, a moralidade administrativa e
social, os verdadeiros ideais da cidadania.
Projetamos, igualmente, envolver neste processo a família do educando, com a sua
cultura, a compor, com a cultura universal, novos patamares de compreensão e progresso.
Tal educação, voltada para os valores humanos, combaterá a descrença, que corrói, e
a desilusão, que mata, pela apresentação de novos objetivos e novos fundamentos para a vida
em sociedade.
Palavras-chave: Educação.Constituição. Estado. Sociedade.
ABSTRACT
OLIVEIRA, Antonia Teresinha de. The State as an educational agent, in the Constitution of
1988
The proposition of this thesis is based on the belief that the interlacing of law,
education and State will bring solution to the grievous social problems presently faced. The
causes of social dissolution experienced at present by the totality of sovereign states, begin
with the absence of education, as well as their inefficient conduction, and result in the huge
social commotions.
We understand that the Federal Constitution draws a wide educational program rhat
needs implementation in ali areas of human acting within such ambitious program, we
understand that it would be equally important and in accordance to the constitutional
determination of efficiency and excellence in the actuation and implementation of public
policies - an independent structuring of national education, aiming to specialization,
efficiency, attention and not dispension, subject that constitutes a proposition de lege ferenda
presented in this thesis.
Considering that, in the sovereign state, it is the human element who promotes actions
and practices acts in a determined territorial basis, we consider to be a function or duty of the
state, to educate towards the social values of democracy in a regimen of sympathetic
participation and co-existence, on bases of freedom and mutual respect.
Taking into consideration, as well, that there are multifaceted aspects of human
education which require urgent attention, we suggest the specialization of function with a
view to the development of actions shared by the State and society.
We wish to keep away from this proposal any idea that may tie education to
determined and specific ideologies since education must have as target the man and the values
that promote life and freedom, the respect for the public stuff, the administrative and social
morality, the true ideals of citizenship.
We have projected, as well, to involve, in this process, the family of the educating
person, with their culture, this way composing, with the universal culture, new levels to
understanding and progress. Such education, towards human values, will fight disbelief,
which erodes, and disillusion, which kills, by means of the introduction of new targets and
new bases for life in society.
Key words: Education. Constitution. State. Society.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................................... 9
1 O CONSTITUCIONALISMO........................................................................................................................20
1.1 CONSTITUCIONALISMO ANTIGO ............................................................................................................... 24
1.2 O CONSTITUCIONALISMO MEDIEVAL ....................................................................................................... 26
1.3 CONSTITUCIONALISMO MODERNO........................................................................................................... 27
1.4 O CONSTITUCIONALISMO CONTEMPORÂNEO E O NEOCONSTITUCIONALISMO..........................................29
1.5 O CONSTITUCIONALISMO DO PORVIR ...................................................................................................... 30
2 O DIREITO À EDUCAÇÃO E OS INSTRUMENTOS INTERNACIONAIS..................................... 34
3 O ESTADO E A DIGNIDADE HUMANA, O ESTADO E A DIGNIDADE SOCIAL – ESTADO –
EDUCAÇÃO E ORDEM JURÍDICA. O ESTADO DO BEM-ESTAR SOCIAL................................ 41
3.1 ESTADO ................................................................................................................................................... 41
3.2 O ESTADO BRASILEIRO ............................................................................................................................ 48
3.3 A ESTRUTURAÇÃO DOS PODERES DO ESTADO ..........................................................................................48
4 A EDUCAÇÃO E A LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL NO BRASIL: UMA VISÃO HISTÓRICA ....... 53
4.1 A CONSTITUIÇÃO REPUBLICANA DE 1891 E AS NORMAS EDUCACIONAIS NA PRIMEIRA REPÚBLICA ........64
4.2 CONSTITUIÇÃO DE 1934 E A EDUCAÇÃO .................................................................................................. 68
4.3 A EDUCAÇÃO NA CONSTITUIÇÃO DE 1937............................................................................................... 70
4.4 A CONSTITUIÇÃO DE 1946 ....................................................................................................................... 73
4.5 A CONSTITUIÇÃO DE 24 DE JANEIRO DE 1967 .......................................................................................... 78
4.6 A CONSTITUIÇÃO DE 5 DE OUTUBRO DE 1988 .......................................................................................... 81
4.7 VISÃO GERAL DA EDUCAÇÃO NO BRASIL NOS ANOS 2000 ...................................................................... 91
5 O PROGRAMA EDUCACIONAL DA CONSTITUIÇÃO DE 1988........................................................107
5.1 ENSINAMENTOS NECESSÁRIOS À REALIZAÇÃO DOS PRIMEIROS OBJETIVOS DA EDUCAÇÃO..................... 120
6 O CONCEITO DE EDUCAÇÃO IMBRICADO NO CONCEITO DE CONSTITUIÇÃO.................... 125
6.1 O CONCEITO DE EDUCAÇÃO .................................................................................................................. 129
6.2 A NATUREZA JURÍDICA DOS SERVIÇOS EDUCACIONAIS ............................................................................. 131
7 UMA ESTRUTURA INDEPENDENTE PARA A EDUCAÇÃO – UMA PROPOSTA DE LEGE
FERENDA ................................................................................................................................................ 140
7.1 INICIATIVA DAS LEIS DE ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO NACIONAL........................................................ 150
7.2 ORGANIZAÇÃO E ACESSO A CARGOS, EMPREGOS PÚBLICOS .................................................................. 152
7.3 DO ORÇAMENTO.................................................................................................................................... 154
CONCLUSÃO ................................................................................................................................................... 157
REFERÊNCIAS ................................................................................................................................................ 164
9
INTRODUÇÃO
Este trabalho é o resultado de reflexões a respeito do papel do Estado, da educação e
do direito na sociedade.
Propusemo-nos a escrever esta tese porque, a nosso juízo, a congregação entre Estado,
educação e direito resultará, inarredavelmente, em condição propícia a uma realização
saudável da vida social, promovida por meio de uma ação educacional coletiva ininterrupta, a
ser criada, regulada, organizada, estruturada e fiscalizada pelo Estado.
Por cultivarmos em nossa vida uma profunda crença no valor da educação para a
sociedade humana e por acreditarmos que o Estado tem o dever de efetivar ações que
promovam a educação em todos os níveis e em todos os campos que a requeiram ou que, por
alguma maneira, a possibilitem, é que optamos por estabelecer, como objeto desta tese,
uma análise sobre o projeto educacional traçado na Constituição Federal, promulgada
em 5 de outubro de 1988. Com esta análise, buscamos apresentar, também, uma proposta,
de lege ferenda, para a criação de uma estrutura independente e especializada da função
educacional.
É bem verdade que o trabalho, que nos propusemos realizar, é árduo e, apenas a
inflexível convicção e a obsessiva ideia de que a educação é a solução para todos os
problemas sociais dos países, que adotam o regime democrático; o único caminho para a
efetiva construção da liberdade e da igualdade real entre os indivíduos, e, ainda, de que o
direito é o único meio para evidenciá-la, é que nos levaram a adotar o tema ora apresentado.
Apenas pela consideração da educação, disciplinada com preponderância pela ordem
jurídica, que é a criadora do Estado, podemos pensar em uma efetiva ordem social, pois é essa
ordem jurídica que estrutura as bases do Estado, e é a educação que proporciona bases
seguras. Sendo, a ordem jurídica, a criadora do Estado, é a ela que caberá estruturá-lo nas
bases ora propostas.
Um novo modelo, eis o que propomos! Modelo que tenha a educação por base, por
fundamento e por meta de organização e direcionamento. Que seja, o Estado, uma entidade
multidisciplinar, que atenda às exigências necessárias e justificadoras da sua própria
existência, porque a organização estatal apenas encontra a sua razão de existir na promoção
constante das condições dignas de vida.
O Estado legitima-se por sua organização e disciplina, o que é tarefa da ordem
jurídica. O Estado nasce concebido por essa ordem jurídica. É criado e disciplinado pelo
10
direito. E é este que, legitimando a sua criação, passará a legitimar todas as transformações,
que surgirão a partir da sua criação, ditadas pelo processo de evolução social.
No Brasil, país que possui conotações, peculiaridades e modelos muito próprios e que,
muitas vezes, imprime a sua marca singular a institutos seculares e aos modelos tradicionais,
não é fácil propor alterações de estrutura. Com efeito, o Brasil adota expressamente o modelo
capitalista, com os paradigmas que o distinguem; não o capitalismo tradicional, mas, sim, um
capitalismo com marcas e cores próprias, uma vez que a interferência estatal, na iniciativa
privada, não é totalmente excluída e, na Constituição Federal, o próprio capítulo consagrado à
ordem econômica é marcado por traços interventivos e marcantes tendências sociais, o que
nos leva a concluir que o Estado adotou um capitalismo com fortes preocupações voltadas ao
atendimento de interesses sociais.
Disso resultam inúmeras conseqüências. A primeira, que poderá ser apontada, por
oportuna a este trabalho, é a dificuldade da própria definição da natureza jurídica do serviço
de educação. Seria um serviço público em sentido estrito? Seria um serviço econômico?
Seria a educação um serviço público, quando prestado diretamente pelo Estado e um
serviço econômico, quando prestado por particulares?
A depender da resposta, a esta primeira questão, está a disciplina jurídica a ser adotada
em relação ao tema.
De início, já ressaltamos que não pretendemos, aqui, incluir a educação entre os
assuntos que apenas devam ser tratados, adotados e executados pelo Estado. Não defendemos
aqui estatizações e não é esta, de forma nenhuma, a intenção que nos move. Democracia e
liberdade são direcionamentos inarredáveis do Estado de Direito e do Estado Democrático de
Direito. O que defendemos no trabalho é a identificação do programa educacional
adotado na Constituição Federal de 1988 e a especialização de função, requerida pelo
texto constitucional, como forma e caminho de realização desse programa.
Pregamos a promoção do indivíduo pela educação. Trabalhar o indivíduo não é
individualismo, nos moldes e conotações históricos do vocábulo. Em outras palavras,
queremos afirmar que não cuidamos, aqui, de abraçar o individualismo por si mesmo, ou o
direito natural como o defensor máximo do individualismo, característica do jusnaturalismo
que, para alguns, parece colocar o indivíduo em franca contraposição à sociedade. Queremos,
sim, afirmar que o individualismo não pode ser o oposto do socialismo, já que o indivíduo não
é apenas a matriz do direito e do Estado, mas é a matriz da sociedade.
O legislador constituinte de 1988
, queremos ressaltar, não apenas traçou o
programa educacional, mas também os meios para a sua execução. Isto nos parece claro
11
pela adoção de um texto com substanciais possibilidades hermenêuticas, absolutamente
legitimado e genuinamente advindo do poder popular que, com as suas possibilidades e
construções jurídicas, vem possibilitando conquistas institucionais jamais pensadas.
Esse programa
permitirá a promoção da educação nacional em patamares jamais
imaginados, e essa política trará consigo efetivo progresso e bem-estar social.
No capítulo primeiro, procuramos mostrar as várias fases do movimento
constitucionalista, com o objetivo de demonstrar a sua evolução histórica, para evidenciar a
importância desse pensamento e as alterações estruturais que tão-somente a força desse
movimento logrou alcançar. Para isto, analisamos o constitucionalismo primitivo, o
constitucionalismo antigo, o constitucionalismo medieval, o constitucionalismo moderno, o
constitucionalismo contemporâneo, o neoconstitucionalismo e o constitucionalismo do porvir,
com as suas promessas civilizatórias e solidárias.
No transcorrer da nossa exposição, é possível entender a pujança desse pensamento
que, por meio de construções hermenêuticas, cada vez mais aprimoradas, vem incorporando
novos valores, novas bases e novas estruturas, pela abertura de imensuráveis possibilidades e
construções, tendo por fundamento a dignidade da pessoa humana, princípio univalente que se
põe à base e à frente, como objetivo máximo de realização, cada vez mais elevada, da
personalidade humana.
No segundo capítulo, procuramos fazer uma breve análise do direito à educação, tal
como disciplinado nos instrumentos internacionais, com o objetivo de demonstrar a sua
importância, que ultrapassa limites e fronteiras.
No terceiro capítulo, procuramos apresentar proposta de reflexão sobre o Estado e a
sua função, o seu papel, insistindo na relevância de uma análise profunda dessa secular
instituição que, ainda nos dias atuais, pede ajustes e solicita novas compreensões em relação
às suas finalidades. Procuramos, ainda, observar os efeitos da sua atuação e verificar se esta
atuação vem realizando, de fato, os objetivos que justificam a existência de tão vetusta
organização.
Se é certo que não prescindimos das instituições historicamente construídas, não é
menos verdadeiro que elas podem ser aperfeiçoadas no sentido especial do refinamento das
suas relações, no seu agir em relação à condição de vida em sociedade.
Essa reflexão leva-nos à própria sociedade, pois, ao analisarmos a condição humana
dos indivíduos que compõem o Estado, estaremos, igualmente, observando a sociedade em
que vivemos.
12
No quarto capítulo, procuramos desenvolver uma visão histórica do processo
educacional no Brasil, desde o tempo colonial, perpassando por várias fases e governos. Com
essa pesquisa, verificamos que a matéria sempre foi tratada de forma fragmentada, sem um
projeto uniforme e sem objetivos claros.
Perseveramos na ideia de que educar requer um amplo programa, pois, como afirma
Dora Incontri,
1
“ Educar é pois elevar, estimular a busca da perfeição, despertar a consciência,
facilitar o progresso integral do ser.” Isto requer políticas públicas diferenciadas para o
despertar da vontade de se educar, pois a educação para o pleno desenvolvimento da pessoa
humana requer, como passo inicial fundamental, vontade inicial férrea de educar-se, de ser
educado e de educar os outros.É processo contínuo e que deve durar por toda a vida humana.
Nesse sentido, concordamos com Dora Incontri, ao afirmar que “educar não é apenas
socializar ou integrar o indivíduo na sociedade, o que pode, segundo a autora, redundar em
simples esforço de modelação, o que torna o homem produto acabado de uma dada cultura e
de todas as mazelas sociais”.
2
Alerta, a autora, que a educação tem um aspecto socializador,
mas socializar deve significar:
1) familiarizar a pessoa com a cultura e a organização social em que está
inserida, mas não modelá-la absolutamente de acordo com esses padrões. O
desenvolvimento da capacidade crítica, da criatividade e da autonomia de
pensamento afasta esse perigo;
2) despertar o sentido de justiça, solidariedade e amor ao próximo,
porque esses são os valores essenciais para uma sociedade justa.
3
Ressaltamos que, embora adotado, pela Constituição de 1988, um federalismo
cooperativo, pouco se fez, em termos de realização e eficiência, em relação ao projeto
educacional, persistindo a educação nacional com inúmeras falhas, que se revelam desde
aspectos mais simples, como falta de vagas em escolas públicas, até aspectos muito mais
complexos, como a compreensão do papel da educação para o Estado, do papel da ordem
jurídica na disciplina desses assuntos, bem como do papel da educação para a realização, em
completude, da ordem jurídica.
A Constituição, pela descentralização de competências, procurou traçar uma maneira
segura e harmônica de atuação entre os entes federativos.
4
Todavia, não foi suficiente a
1
A educação segundo o espiritismo. 8. ed. Bragança Paulista: Comenius, 2008, p. 42.
2
Ibidem, p 43.
3
Ibidem, p. 43.
4
Paulo Bonavides, discorrendo sobre a transformação federalista, afirma: “Raro tema de
ciência política ostenta talvez traços tão sedutores quanto o federalismo. Abrange ele uma
pluralidade de aspectos a que se prendem na época contemporânea os destinos da liberdade
humana e sua segurança, com raízes no lento esforço dos que promovem ou intentam
13
descentralização, e o país se ressente da ausência de execução de um programa nacional de
educação, nos moldes previstos na Carta de 1988, na qual a educação tem como objetivo o
pleno desenvolvimento da pessoa humana (artigo 205 da CF).
Transportando a ideia de espiral para o âmbito jurídico educacional, concebemos
direito e educação como os dois lados do processo de aprimoramento humano, constituindo, a
espiral, o movimento ideal para demonstrar essa relação. O direito também educa. Educa por
meio das leis que são estabelecidas e que impõem comportamentos. São normas de conduta
humana e, portanto, educativas. Contudo, não prescinde, a ciência jurídica, para atingir o seu
desiderato e disciplinar a contento a conduta humana, da educação e dos métodos
pedagógicos necessários.
A ordem jurídica, à qual tanto interessa a justiça, deve cuidar de ensiná-la aos
cidadãos. Despertar, no cidadão, desde a mais tenra idade, a ideia de justiça, deve ser assunto
de interesse do direito. Ao direito interessa ensinar a correta forma de socialização do
indivíduo, que o direito regula o comportamento humano. Portanto, ao direito interessa o
processo educacional.
Dora Incontri, na obra citada, afirma: “A finalidade da educação está embutida em
seu próprio conceito: é ajudar o outro a evoluir. Essa meta está em consonância com a
finalidade da vida universal. Tudo evolui para a perfeição. E está em harmonia com a
finalidade particular da nossa existência”.
5
É a educação que, de fato, tornará possível e
realizável a tarefa da ordem jurídica, qual seja, a realização, não total, mas paulatina e na
medida das possibilidades humanas, da harmonia a que se propõe o direito.
Com esse objetivo, no capítulo quinto, procuramos abordar o ambicioso programa
educacional da Constituição de 1988, analisando-o desde o preâmbulo e ressaltando as suas
singularidades, para evidenciar, acima de qualquer dúvida, as metas traçadas pelo legislador
constituinte originário. A Constituição Federal, promulgada em 5 de outubro de 1988, é
portadora de indelével mensagem educativa.
Com o objetivo de evidenciar o amplo programa educacional do constituinte de
1988, apontamos e analisamos inúmeros artigos e incisos e identificamos, neles, insofismável
programa de educação individual e social.
promover, tanto quanto possível, uma organização sábia e racional do poder”. (Teoria do
Estado. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p 177).
5
A educação segundo o espiritismo, p. 45.
14
Ainda no capítulo quinto, analisamos o pensamento de vários autores e, entre eles,
Aristóteles, ressaltando suas idéias, voltadas à educação do cidadão. Procuramos salientar que
esta visão, para muitos, idealista, é, em verdade, a mais adequada para a vida em sociedade.
Referimo-nos, ainda, ao pensamento de Julien Benda e Karl Popper, quanto à
importância de afastarmos, definitivamente, do conhecimento, as teorias negativistas, niilistas
e relativistas e que, nas palavras textuais de Dora Incontri, “não aceitam qualquer
possibilidade de verdade, esvaziando assim a busca milenar da humanidade por conhecimento
e progresso”.
6
No capítulo sexto, procuramos conceituar educação e constituição e demonstrar o
quanto os dois conceitos estão imbricados na formação do Estado e da sociedade.
A educação forma, produz o senso de cidadania, a capacidade crítica do indivíduo, a
autonomia do seu pensamento. É a educação que faz nascer o sentido de justiça, de
solidariedade e dos valores essenciais à organização e à vida do Estado. O poder da educação,
orientado para o desenvolvimento humano, em bases de liberdade e democracia, é a garantia
da realização da justiça e do Direito - e, portanto, o corolário do Estado Democrático de
Direito e da realização concreta dos ideais humanos de justiça social e liberdade, no mais
alto grau.
Em todos os tempos, mas, especialmente, no momento atual, e em razão dos graves
problemas e das crises da sociedade, surgidos da complexidade de suas relações e de urgentes
e constantes modificações e transformações, a educação, como um processo a ser patrocinado,
pelo constitucionalismo do porvir, tem o significado de realização dos princípios libertários da
igualdade e da solidariedade, abraçados há muito pelo movimento constitucionalista.
Neste sexto capítulo, propomos, ainda, a análise da natureza jurídica dos serviços de
educação, tarefa nada fácil, já que o assunto envolve histórica e conhecida polêmica jurídica e
política, a respeito do próprio conceito e da abrangência do regime jurídico dos serviços de
educação.
Ao estudarmos a ordem econômica e jungirmos o seu conteúdo às notórias discussões
a respeito do tema, especialmente no Brasil, repetimos o que dissemos em outro momento
desta introdução: a ordem econômica capitalista, e expressamente capitalista, a teor do artigo
170 da Constituição, surge com nuanças muito particulares, que esse modelo,
expressamente adotado na Constituição, traz cores e peculiaridades muito próprias e
características, que o diferenciam do dos demais países, pois mescla o explícito capitalismo
6
A educação segundo o espiritismo, p. 17.
15
com direcionamentos francamente sociais, não excluindo, como bem ressalta Egon Bockmann
Moreira, intervenções estatais no domínio econômico privado.
7
Neste capítulo, que cuida do serviço público, tema fundamental do Direito
Administrativo, importante ponto promotor de mudanças e evoluções e, para muitos,
veiculador do próprio núcleo conceitual da disciplina, ressaltamos a incidência de processo
evolutivo provocado pelas alterações nos paradigmas e cujas interações e movimentos são,
igualmente, promotores de grandes mudanças sociais, proporcionando o surgimento de novas
figuras e ideias no âmbito do direito administrativo.
O serviço público é posto, por Léon Duguit, como verdadeira essência do direito
administrativo e surge, na lição do mestre francês, com a proposta inovadora de substituição
da vetusta noção de “poder. Pretende Duguit que a noção de poder seja substituída pela ideia
de serviço aos administrados”.
8
Mas a grande discussão gira em torno da natureza jurídica da educação. Seria, ela, um
serviço público em sentido estrito? Será, a educação, um serviço econômico, sujeita, portanto,
às regras de mercado, com todas as suas flutuações e, como quer Egon Bockmann Moreira,
com as peculiaridades do sistema brasileiro ? Ou, sob outro ângulo, seria, esse serviço,
possuidor de características mistas ou, ainda, quem sabe, possuidor de cores e traços tão
singulares e tão próprios, aptos a separá-lo e distingui-lo de todos os demais serviços
públicos?
Nesse aspecto, procuramos, desde o início do nosso projeto, ressaltar a importância da
educação para o Estado e para a sociedade, como uma genuína função do Estado, não para
retirar a sua prestação das mãos da iniciativa privada, mas, sim, para que o Estado assuma e
incorpore um plano educacional em âmbito nacional, com ideias de educação universal e
educação para o pleno desenvolvimento da pessoa humana, nos moldes traçados no artigo 205
da CF.
Insistimos, em todo o desenrolar do trabalho e, mais especialmente neste capítulo, que
a função educacional deve cuidar de forma especializada do projeto educacional traçado na
Carta da República e que se inicia, no preâmbulo, perpassando por todos os seus artigos,
7
O direito administrativo contemporâneo e a intervenção do Estado na ordem econômica. In:
Luiz Guilherme da Costa Wagner Júnior. (Org.). Direito público: estudos em homenagem ao
Professor Adilson de Abreu Dallari. Del Rey, Belo Horizonte; 2004, p. 257-281. p 257.
8
Celso Antonio Bandeira de Mello. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo:
Malheiros, 2004, p 620.
16
merecendo destaque a enumeração dos princípios fundamentais da República, (art. CF).
9
Mais adiante, destacamos o programa de educação para os direitos fundamentais (art.5º CF),
educação para e nas relações internacionais (art. CF), educação como objetivo para a
construção de uma sociedade cujas bases, fundamentos e desideratos foram traçados pelo
legislador constituinte, educação para a edificação em bases sólidas dos direitos sociais (art.
6º), educação para o exercício livre de trabalho, ofício e profissão nos moldes estabelecidos
nos artigos e da CF, educação para a liberdade de organização sindical, e educação para
o exercício do direito de greve, de modo que este possa ser exercido sem prejuízos
sociais(arts. e 10º CF). A nacionalidade e a pátria ainda são assuntos disciplinados em
tratados internacionais e que permeiam os direitos de cidadania e os direitos humanos e, na
Constituição, estão disciplinados no artigo 12 e parágrafos. A educação para o exercício dos
direitos de soberania popular, dos direitos políticos ativos e passivos está, igualmente, a
requerer programa educacional, que torne o cidadão mais amadurecido para os valores da
democracia (arts. 15, 16, 17 CF); para o exercício correto e harmônico das competências
legislativas e administrativas (arts. 20, a 34 da CF), para a continência de conduta no
exercício dos cargos públicos e das funções de poder (art. 37, 44 a 58 CF). Devem ser
mencionadas, ainda, a educação para o processo legislativo, que, por certo, afastará a edição
de leis inadequadas e inoportunas, pondo fim, de outro modo, à omissão legislativa e a
educação para a fiscalização e o acompanhamento das ações executivas pelos Tribunais de
Contas (art. 70 da CF).
A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa,
com a finalidade de assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social
(art. 170), desafia, com a sua complexidade, um programa educacional que, de fato,
transforme, em igualdade real, a igualdade formal classicamente garantida desde 1789. A
implementação da política urbana, prevista no artigo 182 da Constituição Federal, muitas
vezes não executada, nem por administradores, nem por cidadãos, que teimam em
desrespeitar os limites e diretrizes traçados pelos Poderes Públicos, é outro desafio.
9
Merece menção a discussão sobre constituírem, os princípios, normas ou valores. Todavia,
sob qualquer enfoque, a educação é processo inafastável do direito. Se normas, é necessária a
educação para a sua efetiva observância e, se valores, temos que entender que essa ordem
objetiva de valores está a desafiar a sua regulamentação e real incorporação não apenas nas
relações entre cidadão e Estado mas também em todas as áreas do Direito. Essa execução e
aplicação prática requerem a implementação do programa educacional estabelecido na
Constituição Federal.
17
A política fundiária, os movimentos de reforma agrária e o exercício correto da
competência estabelecida no artigo 184 requerem educação.
A estruturação do sistema financeiro, de modo que atenda às exigências do artigo 192,
da Constituição Federal, também requer educação.
A ordem social, seguridade, saúde e previdência e assistência (art. 194 a 203 CF), a
comunicação social, nos termos traçados no texto magno, o meio ambiente e o princípio da
solidariedade, previstos como comportamentos devidos às presentes e às futuras gerações (art.
225), bem como a responsabilidade para com o habitat são assuntos que requerem um amplo
programa educacional para a cidadania.
Muitos outros aspectos, a requerer educação cidadã, poderiam ser apontados. Nossa
proposta teórica é, em primeiro lugar, propugnar pela adoção, por parte da ordem jurídica,
do programa educacional previsto no texto magno. Ao invés de suprimir artigos por emendas,
o legislador constituinte derivado deverá realizar os ditames do texto de 1988.
O programa educacional, traçado na Constituição de 1988, requer estruturação
jurídica, inclusive, para possibilitar o estabelecimento de caminhos e investigações a respeito
de como se aprende e sobre a melhor forma de ensinar. É identificável, na nossa sociedade,
grave crise comportamental, especialmente nas áreas da política, do direito e em assuntos de
cidadania e soberania popular. São temas pertinentes à ciência jurídica e cujas implicações,
relações e correlações repercutem diretamente no Direito, pois, como oportunamente
esclarece Glaucia Leal,
10
“desde a primeira molécula sobrevivemos graças à
aprendizagem, à adaptação e à comunicação.”
Pelos motivos apontados, o programa educacional da Constituição de 1988, em sua
execução, deverá incluir métodos que desafiem a aprendizagem, em âmbito nacional. Isto
porque, cadas, a psicologia e a neurologia difundem que o desafio do aprendizado
provoca mudanças físicas e químicas nas sinapses, facilitando o acolhimento e a reconstrução
de informações adquiridas.
11
10
Aprender a ensinar. Viver Mente e Cérebro, São Paulo, nº 8, Edição Especial, abr/2009, p 17.
11
Segundo Gláucia Leal, a pedagogia neurocientífica pode ser compreendida como o estudo da
estrutura, do desenvolvimento, da evolução e do funcionamento do sistema nervoso com
enfoque plural: biológico, neurológico, psicológico, matemático, físico, filosófico e
computacional. Nessa equação complexa, processos químicos e interações ambientais se
aproximam e se complementam, propiciando a aquisição de informações, resolução de
problemas e mudanças de comportamento. A autora afirma: Os benefícios são bem-vindos,
mas principalmente necessários. Afinal, a realidade é preocupante. Levantamento do
Ministério da Educação revela que 20% dos brasileiros entre 15 e 19 anos são analfabetos, o
que representa 12% da população brasileira. Segundo o relatório da Organização das Nações
18
Com os conhecimentos e as conquistas da pedagogia, psicologia, neurologia,
esquematizados e disciplinados pelo direito, por meio de plano educacional pedagógico
traçado em regulamentação aos artigos da Constituição Federal, abrem-se positivas
perspectivas.
Cremos que o objeto da educação muito se aproxima do objeto do direito e,
considerando que a tarefa da ciência, nos dias contemporâneos, vai além do seu próprio
objeto,uma vez que, como bem ressaltam Adorno e Horkheimer, “[...] no colapso atual da
civilização burguesa, o que se torna problemático é não apenas a atividade em si, mas o
sentido da ciência”,
12
parece-nos factível a tese ora apresentada.
No capítulo sétimo, procuramos apresentar, de lege ferenda, uma estrutura
independente da função educacional, objetivando, com a especialização de função e a
concentração de programas e de gestão (não de execução), atingir, paulatinamente e por
esforço máximo em estudos, aprimoramentos, cursos, preparo de professores e promoção de
uma consciência educativa nacional, a excelência nessa área de ação social
Sempre com metas voltadas para a finalidade a ser atingida, é necessário ter em mente
que a educação não é apenas dirigida ao educando, ou àquele que se põe na condição de
aprendiz, mas também aos educadores e gestores, pois é conceito global, que abrange “todo
conhecimento verdadeiro de transformação positiva do homem”.
13
Paulo Bonavides, em inolvidável lição afirma:
[...] Em época de reacomodação de valores, quando cumpre abster-se de
configurações pessimistas sobre o processo em curso, o século agônico e
definhante inclina o homem contemporâneo para a dúvida e o desalento.
Uma reflexão acerca dos fundamentos do Estado e do Direito, debaixo da
melhor inspiração histórica, talvez seja o único meio de recobrar a confiança
perdida, desde que o declínio das instituições liberais fez aluir as doutrinas
de um sistema político e social inspirado na direta preservação dos direitos
humanos.
Outras civilizações, onde se enraíza a mais remota genealogia de nossas
ideias, cursaram também períodos críticos e difíceis como este, atravessados
Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) divulgado em novembro de 2005, o
Brasil tem o sétimo maior contingente de analfabetos do planeta. Mais que mapear o cérebro,
desvendar meandros de seu funcionamento, compreender fluxos e refluxos de
neurotransmissores, acompanhar dinâmicas complexas e transformar passos da resolução de
um problema e modelos matemáticos,, observar e diagnosticar, pesquisadores de diferentes
segmentos estão interessados nas implicações sociais da aquisição de conhecimentos, que
possibilitem a inclusão de milhares de crianças, adolescentes e adultos e não apenas no que
diz respeito à quantidade de pessoas com acesso à escola, mas também levando em conta a
qualidade da educação oferecida. (Aprender a ensinar p. 15-16).
12
Theodor Adorno; Max Horheimer. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1985,
p 11.
13
A educação segundo o espiritismo, p. 45.
19
de assombro e inquietude. Mas, desgraçadamente a viagem conduziu tais
civilizações ao túmulo da história, onde desde muito jazem.
O advento dos sofistas na Grécia marcou no quadro daquela época a
emergência de uma crise sem paralelo, precursora no Mediterrâneo da
desintegração e colapso daquilo que outrora foi a hegemonia dos povos
gregos.
14
Paulo Bonavides finaliza o prefácio à segunda edição de seu livro com a formulação
de questão, que motiva reflexões:
Estamos no limiar de crise semelhante?” O autor prossegue
respondendo a própria indagação: “O irracionalismo do Estado e da
Sociedade durante o século XX, tendo resultado já numa tragédia
ideológica de opressões e negações sistemáticas da Liberdade e do
Direito, parece responder que sim. Nunca, pois, a noite foi mais longa
nem o amanhecer mais difícil.
15
Com as palavras de Paulo Bonavides encerramos esta introdução, não sem antes
afirmar, ainda uma vez, que a educação, como aprimoramento humano para a toda a vida e
não como simples instrução, processo que tem por objetivo o pleno desenvolvimento da
pessoa humana, constitui a nossa esperança regenerativa. Na força da nossa crença,
entendemos que esse processo educacional constante, em todos os níveis, tornará possível
novas bases e novos níveis de convivência humana e social, apoiados na solidariedade
pedagógica. Solidariedade, instrução e educação pedagógica devem constituir a meta da
filosofia educacional, livre dos seculares preconceitos e jungida aos princípios de democracia
e liberdade, disciplinada em plano pedagógico nacional, que incentive a inteligência
intelectual, moral, artística, espiritual. Esse disciplinamento e essas novas bases constituem a
tarefa da ordem jurídica.
14
Teoria do Estado, p. 30.
15
Teoria do Estado, p. 30.
20
1 O CONSTITUCIONALISMO
16
A paz e a segurança social, uma sociedade digna, justa e solidária são aspirações do
homem atual, que julga atingi-las disciplinando positivamente institutos, normatizando
matérias, alterando a norma positiva, mudando o nome dos institutos e, até mesmo, as fases
de evolução social, política, jurídica.
Todavia, pessoas que ignoram e que desconhecem a sua própria natureza. Como
poderão, essas pessoas, participar de escolhas em uma sociedade cada vez mais complexa e
tomar decisões públicas, se não receberem preparo mínimo para compreender, sequer, essa
abstração que é o Estado?
Afirmar que a educação jamais recebeu do Estado tratamento adequado é lugar
comum. Todavia, posta de lado qualquer presunção, entendemos que não alcançou, até o
momento, o lugar que, por justiça, lhe é devido na estruturação do próprio Estado, que o
bom Estado é aquele que investe todos os seus recursos no cidadão; essa vetusta verdade,
ainda não aceita em nossos dias, era clara e veementemente defendida por Aristóteles, na
Grécia antiga.
Muitos, por certo, entenderão que essas afirmações são por demais idealistas e não
suscetíveis de se concretizarem na prática. A esses descrentes responderemos com outro
questionamento. Será normal, então, este estado de desorganização social, de corrupção, de
violência e agressão? Será esse o estado normal da humanidade? Imaginar tal estado normal e
aceitável é ideia por demais elitista, que nos recusamos a acolher. O que torna diferente o
comportamento é a educação. Todos podemos adquirir educação cidadã se ela estiver
disponível, e, até mesmo, for exigida pelo Estado, em termos democráticos.
16
Luis Roberto Barroso ensina que “Constitucionalismo significa Estado de direito, poder
limitado, respeito aos direitos fundamentais. Sua trajetória longa e acidentada tem como
marco inicial simbólico a experiência em Atenas, nos séculos V e VI a.C., seguida pela
República de Roma. Com a formação do Império Romano, às vésperas do início da era cristã,
o constitucionalismo desapareceu do mundo ocidental por mais de mil anos. Ao final da Idade
Média, surge o Estado moderno, de feição absolutista, fundado na ideia de soberania do
monarca, investido por direito divino. As revoluções liberais do século XVII e XVIII abriram
caminho para o Estado liberal e para o surgimento do constitucionalismo moderno, com
destaque para as experiências inglesa, americana e francesa. No século XX, ressurgindo da
tragédia do nazismo e da guerra, a Alemanha desenvolveu um modelo constitucional de
sucesso. (Curso de direito constitucional contemporâneo. São Paulo: Saraiva; 2009, p. 395).
21
Com acerto, Condorcet inicia o livro As cinco memórias sobre a instrução pública
com a frase : “A sociedade deve ao povo uma instrução pública como meio de tornar real a
igualdade de direitos”.
17
E é nesse sentido que identificamos a importância do
constitucionalismo contemporâneo, o qual proporciona, se assim quiser a sociedade, uma
estruturação, ou a construção de um novo Estado, em novas bases, em que a educação seja
constituída como poder-dever independente, com órgãos próprios, intensa especialização,
autoridades próprias, desvinculadas do executivo e participação popular na eleição dessas
autoridade, especialmente de pais, alunos e educadores.
A pedagogia, como bem afirma Franco Cambi,
18
é ciência, mas é política e é filosofia.
Como ciência, na definição de Antônio Houaiss, é processo racional, que possibilita, ao ser
humano, relacionar-se com a natureza e assim obter resultados que lhe sejam úteis. A
pedagogia é corpo de conhecimento sistematizado, adquirido por meio de observação,
identificação, pesquisa, explicação de determinadas categorias de fenômenos e fatos,
formulados metódica e racionalmente, que atua e deve ser explorado como instrumento do
Estado.
A pedagogia refere-se à política, à arte, à ciência da organização, direção e
administração de nações ou Estados. Aplicação desta arte aos negócios internos da nação
(política interna) ou aos negócios externos (política externa), ou ainda, vista como uma série
de medidas que objetiva a um fim,
19
interessa ao Estado e à sociedade
A pedagogia, como filosofia, utilizando conceito platônico, como investigação da
dimensão essencial e ontológica do mundo real, ultrapassando a mera opinião irrefletida do
senso comum, que se mantém cativa da realidade empírica e das aparências sensíveis,
20
como
conjunto de conhecimento teórico, que fundamenta, avalia e sintetiza informações, interessa
ao Estado e à sociedade. Como conjunto de métodos, que assegura a adaptação recíproca do
conteúdo informativo aos indivíduos que deseja formar,
21
é de fundamental importância para
o Estado, pela ordem e organização que patrocina.
Assim, entendemos correto afirmar que o constitucionalismo deve promover acesso,
por meio de suas amplas portas, a uma nova reestruturação do Estado, de forma que abranja a
função educacional pedagógica independente.
17
Cinco memórias sobre a instrução pública. São Paulo: Unesp, 2008, p. 17.
18
História da pedagogia. São Paulo: Unesp, 1999, p. 635.
19
Antonio Houaiss. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007,
p. 2.253.
20
Ibidem, p. 1.344.
21
Ibidem, p. 2.162
22
Ao termo constitucionalismo, são atribuídas diversas concepções, no âmbito
doutrinário.
De acordo com George Salomão Leite, constitucionalismo significa um ideal de
constituição.
22
Canotilho, por sua vez, considera o constitucionalismo um movimento constitucional.
A afirmação de que o constitucionalismo é movimento “implica dizer que se trata de uma
ideologia constitucional”. Existe, em cada movimento social, ideologia, bem como a
pretensão de implantá-la. Assim, o constitucionalismo é impulsionado por uma ideia
constitucional, que se concretiza ao assumir a forma de constituição. Constitucionalismo, na
definição de Canotilho, é “a teoria (ou ideologia) que ergue o princípio do governo limitador
indispensável à garantia dos direitos em dimensão estruturante da organização político-social
de uma comunidade. Neste sentido, o constitucionalismo moderno representará uma teoria
específica de limitação do poder com fins garantísticos”; seria a “teoria normativa da
política”.
23
Ou, ainda, a técnica da tutela das liberdades públicas, com regras e princípios
asseguradores do exercício dos direitos e garantias fundamentais.
André Ramos Tavares enumera quatro concepções de constitucionalismo:
Numa primeira acepção, emprega-se a referência ao movimento politico-
social com origens históricas bastante remotas que pretende, em especial,
limitar o poder arbitrário. Numa segunda acepção, é identificado com a
imposição de que haja cartas constitucionais escritas. Tem-se utilizado,
numa terceira concepção possível, para indicar os propósitos mais latentes e
atuais da função e posição das constituições nas sociedades. Numa vertente
mais restrita, o constitucionalismo é reduzido à evolução histórico-
constitucional de um determinado Estado.
24
O constitucionalismo, compreendido em sentido amplo, como fenômeno, por meio do
qual todo Estado, em qualquer época ou momento histórico, possui uma constituição, leva-
nos a refletir na afirmação de Uadi Lammêgo Bullos de que constitucionalismo é palavra
recente numa ideia assaz remota.
25
Analisando o termo em seu ângulo restrito, identificamo-lo como sendo o movimento
político que aparece mais delineado nos fins do século XVIII, com objetivos claros de tutela
22
George Salomão Leite. Constitucionalismo e jurisdição constitucional. Disponível em:
<www.esmafe.jfpb.gov.br>. Acesso em: 19 ago. 2009.
23
José Joaquim Gomes Canotilho. 3. ed. Direito constitucional e teoria da Constituição.
Coimbra: Almedina, 1999,
23
24
André Ramos Tavares. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 1.
25
Constituição Federal anotada. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p.7.
23
das liberdades e voltado, aí, para um fim definido, embora nem sempre compreendido: a
tutela da pessoa humana, na sua dignidade ínsita, intrínseca.
Trata-se de movimento singular, em razão da histórica preocupação de erigir o Estado
adequado à realização do homem, por meio dos seus vários sistemas, direitos, garantias,
prerrogativas, distribuição de competências e, hoje, com mais nítidas preocupações voltadas
para a realização e promoção, em grau máximo, da dignidade humana.
Esse trabalho secular procura, com persistência incansável, a realização e construção
de uma sociedade mais adequada e dirigida a valores solidários, como bem anotam os
constitucionalistas hodiernos, constituindo as aspirações e os objetivos bem definidos do
constitucionalismo do porvir.
Nesse contexto é que entendemos constituir papel preponderante, do movimento
constitucionalista, promover as adaptações necessárias à construção dessa sociedade
naturalmente inclusiva, posto que sua amplitude e abrangência, a largueza de princípios de
seu objeto, e seu conteúdo permitirão repensar o próprio Estado e refletir sobre o seu real
fundamento e razão ontológicos. Nas suas raízes e sustentáculos erguer-se-ão os novos
alicerces e as novas bases dessa sociedade racional e fraternalmente possível.
Essa importância do constitucionalismo, se possível dizer, é ainda mais ressaltada nas
democracias, pois se faz necessário promover a sociedade, a paz e a própria compreensão das
instituições do Estado, mas em regime de liberdade.
Peter Häberle, discorrendo sobre hermenêutica e teoria da interpretação, afirma “ser
impensável uma interpretação da constituição sem o cidadão ativo...”.
26
Democracia, constitucionalismo, educação e liberdade são vocábulos intimamente
imbricados. Fazendo uma análise da evolução histórica da sociedade, percebemos a
importância do constitucionalismo, pois, quando o homem sequer suspeitava da sua
existência, identidade e compreensão, ele já se fazia presente na organização dos povos
primitivos.
Marcello Caetano, ao falar sobre o fato político, afirma: “a vida do homem decorre em
convivência: os indivíduos mantêm entre si, do berço ao túmulo, mútuas e constantes relações
de colaboração e de dependência. A vida em sociedade é o modo natural de existência da
espécie humana” [...].
27
26
Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: contribuição
para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Tradução Gilmar Ferreira
Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2002, p. 14.
27
Ciência política. Coimbra: Almedina, 2006, p. 1.
24
A necessidade de estar juntos, de viver uma experiência comum, existe sempre e vem-
nos à memória a narração de Geofrey Blainey , afirmando que: “Há dois milhões de anos,
eles viviam na África e eram poucos. Eram seres quase humanos, embora tendessem a ser
menores que os seus descendentes que hoje povoam o planeta. Andavam eretos e subiam
montanhas com enorme habilidade”.
28
A comunidade regia-se por costumes próprios e independentes das demais, com fortes
crenças em forças superiores e sobrenaturais. A religião legitimava a autoridade divina dos
governantes, vistos como representantes da divindade.
Na época primitiva, não identificamos um movimento organizado. Todavia, é presente
a ideia de que todo o Estado em qualquer tempo possui uma constituição.
29
Surgem, a longa caminhada do constitucionalismo e a grande luta pelo aprimoramento
das instituições, por novas compreensões, novas estruturações, que possam trazer paz e
conforto social, numa sociedade que deve estar voltada para valores transcendentes e que
privilegiem os aspectos mais humanos e mais dignos da vida (artigo da CF ). Não
acreditamos em descontinuidade entre o mundo antigo e o contemporâneo, mas, sim, em
desenvolvimento progressivo. Não se trata de mundos diferentes ou sociedades distintas, mas
de um processo histórico evolutivo paulatino, de maneira que as conquistas de ontem servem
de base e são experiências que contribuem para o mundo contemporâneo.
Tudo isso nos ajuda a entender o movimento constitucionalista em seu sentido amplo.
Uadi Bulos
30
fala-nos desse constitucionalismo nascente na sua forma mais singela, na sua
organização consuetudinária, em que os chefes familiais ou os líderes dos clãs organizavam e
vida grupal e estabeleciam normas disciplinadoras, hoje identificadas como a mônada da
organização jurídica estatal, esclarecendo:
A primeira etapa de desenvolvimento do constitucionalismo antecedeu ao
advento da dicotomia constituição formal e constituição material.
Alicerçava-se na observância reiterada dos padrões de comportamento dos
povos primitivos. Não existiam constituições escritas e os esforços de
formulação das pautas jurídicas de comportamento eram muito limitados.
Mesmo assim, apareciam os vestígios do que hoje chamamos de direito
público.
31
1.1 Constitucionalismo antigo
28
Uma história do mundo. São Paulo: Fundamento, 2007, p. 7.
29
Constituição Federal anotada, p. 14.
30
Ibidem, p. 9.
31
Ibidem, p. 9.
25
é possível perceber a presença da ideia remota do constitucionalismo na
organização da sociedade antiga, muito embora prevalecessem os acordos e não estivessem,
os reis e imperadores, obrigados a observar pautas de conduta previamente estabelecidas,
nem a assumir responsabilidade pelos atos praticados.
Tampouco cremos que a história das cidades-estado seja geograficamente localizada e
circunscrita, Na verdade, é parte de um processo evolutivo, onde não se quebram anéis. A
compreensão, que temos hoje, de respeito à cidadania, não é fruto de um estado de graça e
superioridade, sem nenhum vínculo com o passado; é o resultado de todo o trabalho
empreendido por nossos antepassados, transmitido às sucessivas gerações. Nesse sentido, a
história antiga é, sim, parte essencial da história do mundo. As ideias e decisões coletivas, os
conselhos de anciãos, o senado romano, entre tantas outras instituições, são experiências que
nos auxiliam a compreender o estágio atual da sociedade.
Em 390 a.C., Roma ainda lutava para sobreviver. governava algumas ilhas do lado
oeste do Mediterrâneo e apresentava peculiar organização, sendo possível identificar a
utilização do vocábulo constitutio, com significado diverso do sentido atual; era o termo
utilizado para designar qualquer lei feita pelo imperador.
Relembra, o autor que, na República Romana, o constitucionalismo desintegrou-se
com as guerras civis dos primeiros séculos antes de Cristo, que acarretaram o fim do domínio
de Cesar e seu imperialismo despótico. Antes disso, contudo, despontaram os interditos que
procuravam proteger os direitos individuais contra o arbítrio e a opressão do Estado.
32
Em face do domínio de Roma sobre o Mediterrâneo, a sua organização foi imposta às
cidades subjugadas. era uma organização que possibilitava identificar a existência desse
movimento.
Norberto Luiz Guarinello informa a situação de Roma:
O império que, por fim, unificaria todas as cidades-estado e toda a bacia do
Mediterrâneo fosse oriundo de uma cidade-estado cuja cidadania era mais
aberta do que a regra geral: Roma, que conseguiu unificar a Itália sob sua
égide, formando a maior aliança de cidades-estado que o mundo antigo
conheceu.
33
32
Uadi Lammêgo Bulos. Curso de Direito Constitucional,. 2. ed. São Paulo:Saraiva, p. 14.
33
Cidades-Estado na antiguidade clássica. In: Jaime Pinski; Carla Pinski (Org.). História da cidadania.o Paulo:
Contexto, 2003, p. 42.
26
1.2 O Constitucionalismo medieval
O constitucionalismo é identificado, na Idade Média, sob o governo dos Plantagenetas,
que, segundo Winston Churchill
34
“foram senhores rudes e violentos, mas com a violência do
rigor e não da decadência”.
Alguns autores chegam a fixar o marco inicial do movimento e é muito comum a
menção ao Rei João sem Terra. Todavia, é na singular figura de Henrique II, rei da Inglaterra,
que percebemos o franco fortalecimento e unificação da justiça nos tribunais do rei.
A Inglaterra teve reis mais diplomatas que Henrique II, mas nenhum deixou
marca mais profunda em nossas leis e instituições. Suas estranhas explosões
de frenética energia não se esgotavam na política, na guerra e na caça. Como
seus predecessores normandos e seus filhos, Henrique II era dotado de um
instinto para os problemas de governo e da lei, e é aqui que se encontram as
suas realizações. Os nomes de suas batalhas desvaneceram-se com a sua
poeira, mas sua fama viverá com a Constituição Inglesa e o Direito Comum
Inglês.
35
Henrique de Anjou, Henrique II ou Henrique Plantageneta, substituiu os tribunais
feudais, em que se ministrava justiça que, segundo Churchill, variava segundo o local,
temperamento da área e os costumes, por tribunais comuns
36
que aplicavam uma lei comum,
para toda a Inglaterra.
Muito antes de João Sem Terra, seu terceiro filho a ocupar o trono inglês, Henrique
Plantageneta, na Constituição de Claredon, procurou fixar a relação entre Igreja e Estado,
enfrentando o descontentamento dos Barões do Reino, que haviam conquistado grande poder,
desde os tempos de Guilherme I, o Conquistador.
37
Henrique II, com a astúcia característica,
procurou manter o conservadorismo e, segundo Churchill, vestiu a inovação com a respeitada
roupagem do conservantismo.
Numa constituição não escrita, os limites dos direitos tradicionais do rei não eram
muito definidos, e Henrique aproveitou-se do elástico conceito de Paz do Rei para levar todos
os casos criminais aos seus tribunais. Cada cidadão tinha a sua própria paz e era crime violá-
la. O maior crime, entretanto, era a violação da Paz do Rei; quem a violasse seria julgado em
um Tribunal do Rei. No início, a Paz do Rei era restrita a fatos praticados diante do Rei ou, no
34
História dos povos de língua inglesa. São Paulo: Ibrasa, 2005. p. 208.
35
Ibidem, p. 201.
36
Henrique II, ainda em vida fez coroar seu primeiro filho, também de nome Henrique e com a
morte deste, assume Ricardo I, o Coração de Leão e, apenas após a sua morte assume o
lendário rei João Sem Terra.
37
Winston Churchill. História dos povos de língua inglesa, p. 202.
27
máximo, na estrada ou nas terras do rei. Henrique, no entanto, astutamente, passou a defender
a tese de que a Paz do Rei se estendia a todo o território inglês e sob dominação inglesa. Onde
quer que ela fosse desrespeitada, era imposto, ao transgressor, julgamento perante um
Tribunal do Rei.
Os casos civis também foram atraídos para os seus Tribunais, sob a alegação, do
vetusto direito, de que tinham que ser julgadas apelações, em casos nos quais a justiça
houvesse sido recusada, e, protegidos, os homens na posse de suas terras.
38
Essas mudanças foram introduzidas gradualmente, sem legislação e, segundo
Churchill afirma, inicialmente sequer foram percebidas. O primeiro princípio era atrair
litigantes e causas para os seus tribunais e, o, obrigá-los; por isto, o rei deveria oferecer
uma justiça melhor do que a obtida nas mãos dos Lordes. Por este motivo, Henrique II
colocou, à disposição de seus súditos, o julgamento por júri. Não criou o júri, mas deu-lhe
uma nova finalidade, estendendo o seu uso regular nos tribunais, como instrumento que, até
então, só fora empregado para atividades administrativas.
A ideia de constitucionalismo emerge das palavras de Winston Churchill:
O sistema de júri surgiu para representar tudo quanto entendemos por justiça
inglesa, porque, quando um caso é examinado por doze homens honestos,
tanto o réu como o queixoso dispõe de garantia contra a arbitrária deturpação
da lei. Isso é que distingue a lei administrada nos tribunais ingleses dos
sistemas jurídicos continentais baseados no direito romano. Assim, em meio
ao processo de centralização, foi preservado e perdura até hoje o antigo
princípio de que a lei deriva do povo e não é outorgada pelo rei.
39
Após a morte do jovem Henrique, coroado quando ainda vivia seu pai, o Rei Henrique
II, assume o poder o outro filho do monarca, Ricardo I, o Coração de Leão e, posteriormente,
João Sem Terra, ao qual foi imposta a Magna Charta Libertatum. Como salientamos,
muitos a identificam como o marco do importante movimento e, para os que apenas admitem
o constitucionalismo em sentido estrito, ou seja, fundado em constituições escritas, significa o
seu verdadeiro nascimento.
1.3 Constitucionalismo Moderno
38
Winston Churchill. História dos povos de língua inglesa, p. 202
39
Ibidem, p. 212.
28
A Guerra dos Sete Anos, travada entre os povos inglês e francês, na América do Norte,
durou de 1754 a 1763, ficando conhecida como guerra francesa e indígena; na Europa, de
1756 a 1763, saindo vencedores os ingleses, com a transferência, para a Coroa britânica, da
maioria das possessões francesas, afetando, profundamente, as relações entre a Inglaterra e as
suas colônias na América do Norte.
40
Tendo saído do conflito enfraquecida, sofrendo as consequências de uma política de
antagonismo histórico com a França e diante de Luiz XVI, um monarca com ideias liberais, a
Inglaterra, vencedora do conflito, caminhou a passos largos para a perda das suas possessões
na América.
A partir da insurrreição contra as ações da Coroa na colônia de Massachusetts,
disseminou-se a ideia de que poderiam surgir intervenções em outras colônias e de que a
resistência só viria com a união e ação coletiva.
Por sugestão da Virginia, em 5 de setembro de 1774,
41
reuniram-se, em Filadélfia, 55
delegados das assembléias legislativas das colônias (com exceção da Geórgia). As instruções
dirigidas à delegação da Virgínia foram redigidas por Thomas Jefferson, que insistia na
autonomia do poder legislativo colonial. Thomas Jefferson foi o redator da Declaração de
Independência, o primeiro secretário de Estado norte-americano (1789-1794), segundo vice-
presidente (1797-1801) e terceiro presidente dos Estados Unidos (1801-1809).
No primeiro mês de 1776, com a publicação do importante e eloquente panfleto de
Thomas Paine, Common Sense, do qual foram vendidas 100 mil cópias em 3 meses, o
Congresso Continental recomendou que as colônias formassem novos governos e designou o
comitê, liderado por Jefferson, para redigir a declaração de independência.
Surge, assim, em fins do século XVIII, como processo político, jurídico e cultural, o
constitucionalismo, agora, como um movimento organizado e consciente, que procura não
apenas estruturar os poderes do Estado, estabelecer um rol de direitos e garantias individuais e
fundamentais, mas, também, traçar, claramente, estruturas e mecanismos, que limitam e
restringem o poder do governante.
Afonso Arinos adverte que
O chamado constitucionalismo começa por ser uma tentativa de construção
racional aplicável aos governos dos povos civilizados. Apesar de entrevisto
em algumas tentativas anteriores poderemos situar o seu aparecimento, e o
seu sucesso, nos escritos do inglês John Locke, que foi o primeiro, em
começo do século XVIII, a justificar juridicamente o individualismo e o
40
Olivia Raposo da Silva Telles. Direito eleitoral comparado. Brasil, Estados Unidos, França. São Paulo: Saraiva,
2009, p. 159
41
Ibidem, p.162
29
liberalismo como sendo as bases naturais da estrutura das sociedades
humanas.
42
Em seguida, irrompe a Revolução Francesa e, com ela, a Constituição de 1791, que
influencia outras tantas, na ideia obsessiva de fixar princípios e mecanismos de contenção do
poder, bem como na transcrição de um rol de direitos fundamentais, tudo isto na esteira da
Declaração Americana, como bem ressalta Bullos:
A ideia de fixar princípios e normas numa constituição escrita adveio muito
antes de 1787. Foi com a criação das treze colônias norte-americanas que
adquiriram independência, entre os anos 1776 e 1780. A partir daí a palavra
constituição ficou reservada para designar o ato legislativo escrito, dotado de
superior hierarquia, responsável pelo delineamento das vigas mestras do
Estado.
43
O mesmo autor adverte que “a grande novidade do constitucionalismo moderno não
foi propriamente especificar os princípios que deveriam integrar as constituições escritas, mas
sim reconhecer-lhes a dimensão normativa que se lhes encontra subjacente.
44
1.4 O Constitucionalismo Contemporâneo e o Neoconstitucionalismo.
O constitucionalismo contemporâneo surge na esteira das questões sociais, da doutrina
de Marx e Engels e da crise mundial de 1929. O liberalismo de Adam Smith cede ao
intervencionismo econômico de Keynes e o novo Estado capitalista altera o caráter do
constitucionalismo ocidental. Neste novo panorama, surgem as constituições mexicana de
1917 e a alemã de 1919, que se refletiriam na constituição brasileira de 1934.
São traços do constitucionalismo contemporâneo, entre outros, a afirmação dos
direitos econômicos e sociais; a possibilidade de intervenção estatal no domínio econômico,
por meio de instrumentos específicos; a relativização do princípio da separação dos poderes,
admitida função legiferante do Poder Executivo; a evolução do controle de
constitucionalidade, com o reconhecimento da inconstitucionalidade por omissão estatal.
42
O constitucionalismo de D. Pedro I no Brasil e em Portugal. Brasília: Ministério da Justiça,
1994, p. 1, apud Uadi Lammego Bulos. Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo:
Saraiva, 2008, p. 17.
43
Curso de direito constitucional, p. 18.
44
Ibidem, p. 20.
30
O neoconstitucionalismo coincide com o fim da segunda Grande Guerra mundial. São
deste período as constituições alemã de 1949; italiana, de 1947; portuguesa, de 1976 e
espanhola, de 1978.
No Brasil, surge com o início do processo de redemocratização, culminando com a
Constituição Federal de 1988.
Possui, como registro altamente positivo, o fato de veicular técnica de positivação
constitucional das liberdades públicas. Traduz e expressa uma luta de titãs, por uma sociedade
mais justa, digna, pacífica, igualitária e solidária.
Nunca se falou tanto em dignidade humana, em combate a qualquer tipo de
preconceito, que possa significar ofensa ao homem. Os textos contemporâneos buscam
combater a tirania, abominam a tortura e procuram positivar instrumentos e garantias aos
direitos fundamentais, como, por exemplo, no Brasil, a ação constitucional do mandado de
segurança, a ação popular, a ação civil pública, o habeas corpus, o habeas data, etc.
São documentos que procuram fomentar a solidariedade e a responsabilidade
ambiental, como é possível verificar nos artigos 225 da Constituição do Brasil, 35, 1 da
Constituição da Coréia e 19, parágrafo 8º da Constituição do Chile.
45
1.5 O Constitucionalismo do Porvir
É exatamente o constitucionalismo do porvir que consolidará tantas ideias de
fraternidade e liberdade e garantirá não mais a esperança de melhores dias, mas sua
sustentação e fundamentação, especialmente pela promoção da dignidade humana e das
liberdades, que se realizarão pela educação.
É esse movimento que proporcionará o refinamento das técnicas de governo, da
estruturação das funções do poder, da construção de mecanismos racionais e humanos e a
conformação mais adequada das instituições e dos órgãos do Estado.
A base de qualquer evolução para o bem-estar e para a paz está na educação do
indivíduo. Sem essa educação é impensável qualquer espécie de verdadeira evolução e
refinamento. Obviamente, acreditamos e temos a convicção de que o constitucionalismo do
futuro primará por cuidar do homem e iniciará toda a ação pelo cidadão, proporcionando-lhe a
45
Uadi Lammego Bulos. Curso de direito constitucional, p. 406.
31
iluminação pelo conhecimento livre e o aperfeiçoamento de ideias, acarretando ações
engajadas e de cumprimento dos textos constitucionais.
Esse constitucionalismo rejeitará, definitivamente, as constituições nominais e
superará, pela educação, os ciclos de atraso social.
José Roberto Dromi prenuncia seis valores fundamentais das constituições do porvir, a
saber:
veracidade as constituições não conterão promessas impossíveis de serem
realizadas, nem consagrarão mentiras. Tornar-se-ão documentos verdadeiros
e íntegros;
solidariedade – as constituições do porvir aproximar-se-ão de uma nova
ideia de igualdade, baseada na solidariedade dos povos, no tratamento digno
do homem e na justiça social;
continuidade – as reformas constitucionais ocorrerão com ponderação e
equilíbrio. Ao invés de destruir as vigas mestras das constituições,
subvertendo-lhes o sentido original, darão continuidade ao caminho traçado;
participatividade – o povo será convocado a participar de forma ativa e
integral, equilibrada e responsável dos negócios do Estado;
integracionalidade as constituições propiciarão um sentido integracionista
entre o plano interno e o externo. Nesse passo, refletirão a integração
espiritual, moral, ética e institucional dos povos, visando ao
desenvolvimento dos Estados;
universalidade o constitucionalismo do porvir dará especial atenção aos
direitos fundamentais internacionais, confirmando o primado universal da
dignidade do homem e banindo todas as formas de desumanização.FONTE
Ao belo texto de José Roberto Dromi queremos acrescentar que todos os estágios e
valores do constitucionalismo do porvir, tão necessários, possíveis, humanos e realizáveis
potencialmente, apenas lograrão sucesso quando a educação for a pauta primeira de qualquer
governo. É nesse intuito a nossa proposta, na qual apontamos a necessidade inadiável de uma
estrutura independente e especializada para a educação.
Apenas a racionalização do poder é insuficiente. Necessário que os Estados invistam
no cidadão em termos de educação em regime de absoluta liberdade; proporcionem, a todos ,
democraticamente, a possibilidade de desenvolver os seus pendores e os seus potenciais
intelectuais, espirituais, humanos e profissionais.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho denomina racionalização essa tendência de impor, às
novas Constituições, o resultado de elocubrações de gabinete com objetivos de racionalizar o
poder.
Segundo o autor, essa denominação é conferida, assim, à “tendência de incorporar nas
Constituições as sutilezas do jurista e enquadrar pela lei, inteiramente, a vida política, o que
32
acabou por desmoronar”, pois essa “racionalização não logrou, segundo alerta, manter de
as constituições e os governos democráticos” . E conclui que a
Estados como a Alemanha, Polônia e Estados Bálticos, faltavam as
condições mínimas para que um poder democrático pudesse subsistir. Crise
econômica, minorias raciais em conflito, agitação extremista, ausência de
tradição liberal etc. [...] A racionalização tentou obviar a lacuna da falta de
substrato econômico e social própria a cada regime.
46
Termina por afirmar a tendência e a vida do constitucionalismo.
47
O constitucionalismo do porvir e a abertura que promoverá, para os valores sociais
fundamentais, propiciarão a realização, cada vez mais crescente, da justiça, como o mais
importante objetivo da atividade humana. Cada vez mais, o constitucionalismo abre as portas
para a esperança e para o descobrimento dos valores profundos do ser humano e da sociedade.
Esse movimento promoverá consciência e legitimidade de novas conquistas e novos
métodos, muitas vezes desafiadores, mas que redundarão em maturação paulatina da
formação de uma consciência social compatível com um nível de vida harmônico, pela
superação de conflitos pela educação, que, como instrumento de atuação do direito, da ordem
jurídica e do Estado, promoverá com segurança.
Ressalta Aristóteles:
Como vimos, duas espécies de excelência: a intelectual e a moral. Em
grande parte a excelência intelectual deve tanto o seu nascimento quanto o
seu crescimento à instrução (por isso ela requer experiência e tempo) ...E as
disposições morais resultam das atividades correspondentes às mesmas . É
por isso que devemos desenvolver nossas atividades de uma maneira
predeterminada.
48
Predeterminação dos objetivos fundamentais da educação, vinculados aos valores
humanos, e orientação segura às disposições intelectuais e morais, em regime de liberdade e
democracia, como oportunidades para desvendar pendores e talentos voltados para o respeito
aos direitos fundamentais, comporão os objetivos essenciais da República Federativa do
Brasil.
Peter Härbele afirma:
Entre os textos constitucionais mais importantes com conteúdos diretamente
relacionados à verdade figuram os catálogos dos objetivos educacionais da
República Federal da Alemanha. Tais objetivos, essências das Constituições
46
Curso de direito constitucional. 34 ed. São Paulo. Saraiva, 2009, p. 9.
47
Ibidem, p. 9.
48
Ética a Nicômacos. Tradução Mario da Gama Kury. 4.ed. Brasília: UNB, 2001, p. 35-36.
33
do Estado Constitucional, fixam os valores básicos na profundidade e
representam como o soft low, elementos teóricos consensuais.
49
Neste capítulo, afirmamos a nossa crença nos valores constitucionais e no
constitucionalismo, movimento que permitirá a reestruturação independente da função
educacional.
49
Os problemas da verdade no Estado constitucional. Tradução Urbano Carvell. Porto Alegre:
Sergio Antonio Fabris, 2008, p. 37-38.
34
2 O DIREITO À EDUCAÇÃO E OS INSTRUMENTOS
INTERNACIONAIS
Tardio é o reconhecimento deste direito, que é a base e a garantia de um mundo novo e
de uma sociedade mais justa.
50
A educação é verdadeira revolução íntima individual, a promover efetivas mudanças
sociais e benefícios imensuráveis à humanidade; promotora de justiça social, mais do que
qualquer outra ação, ato ou processo de renascimento e refundação da compreensão e
sensibilidade humanas.
51
A educação até hoje não foi alçada à fundamentalidade e
supremacia que lhe competem, dentro das ações estatais, nem tampouco no interior do corpo
social.
das as
etapas
Na Europa, o direito à educação surgiu no final do século XIX e início do século XX.
Sob outro enfoque, se afirmarmos, com Rudolph Von Jhering,
52
que a essência do
direito reside na noção de interesse juridicamente protegido, tal assertiva nos remeterá à ideia,
exposta e defendida, em todos os capítulos desta tese, de que o direito à educação se apresenta
sob três perspectivas, a saber: a) direito-dever do Estado, de atrair para si a atribuição
inalienável e intransferível de educar em regime de liberdade e democracia; b) direito
inalienável do cidadão de receber educação para o seu pleno desenvolvimento e em to
de sua vida; c) o direito inalienável da sociedade à educação dos seus cidadãos.
50
Comparato, escrevendo sobre a Revolução Francesa, afirma: A consciência de que a
Revolução Francesa inaugurava um mundo novo tomou conta dos espíritos desde as primeiras
jornadas revolucionárias. Victorine de Chastenay, em suas memórias (1771-1815), ao
comentar a tomada da Bastilha, reproduziu toda a emoção que o extraordinário acontecimento
suscitara: “Sim, a Revolução. A palavra foi consagrada naquele dia, e essa palavra, que
supunha uma ordem inteiramente nova, uma refundação completa, uma criação total, acelerou
o movimento das coisas e não deixou de subsistir mais nenhum ponto de apoio. (A afirmação
histórica dos direitos humanos, 3. ed. rev. e amp. Saraiva, 2003, p. 126).
51
Comparato
, ao falar da Revolução Francesa, cita o Evangelho de João e a questão do
renascimento do homem na Bíblia: Havia entre os fariseus, um membro do Sinédrio chamado
Nicodemos. Veio ele à noite ter com Jesus e lhe disse: Rabi, sabemos que vens da parte de
Deus como um mestre, pois ninguém pode fazer os sinais que fazes, se Deus não estiver com
ele. Respondeu-lhe Jesus: Em verdade, em verdade te digo: quem não nasce do alto não pode
ver o Reino de Deus. Disse-lhe Nicodemos: Como pode um homem nascer, sendo velho?
Poderá entrar uma segunda vez no seio de sua mãe e nascer? Respondeu-lhe Jesus: Em
verdade, em verdade te digo: quem não nasce da água e do Espírito não pode entrar no Reino
de Deus. (A afirmação histórica dos direitos humanos, p.128).
52
A luta pelo direito. Bauru: EDIPRO, 2001, p.35
.
35
No Brasil, o ensino fundamental foi tido como um direito em 1934 e, como direito
público subjetivo, a partir da sua inserção na Constituição da República Federativa do Brasil
de 1988.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10 de dezembro de 1948, prevê, em
seu artigo 26:
I) Todo homem tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos
nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será
obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível, bem como a
instrução superior, esta baseada no mérito.
II) A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da
personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do
homem e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a
compreensão, a tolerância e amizade entre todas as nações e grupos raciais
ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da
manutenção da paz.
III) Os pais têm prioridade de Direito na escolha do gênero de instrução que
será ministrada a seus filhos.
Nesse documento, o processo educacional é posto como o realizador da personalidade
humana, a exemplo do que ocorre com o artigo 205 da Constituição da República Federativa
do Brasil, em que lemos: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento
da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
De fato, a Declaração de 1948 refere-se à educação como processo contínuo de
aprimoramento. Dever do cidadão e dever do Estado é, também, realização do indivíduo,
como sujeito de sua história e do processo de sua realização, por meio de transformações
íntimas profundas, que o tornarão melhor para o mundo, pois mais identificado na sua
condição de homem e na sua humanidade, afastando, de vez, os conflitos irreconciliáveis com
essa condição.
A educação transformará também o mundo, porque o mundo, em sua verdade
absoluta, é expressão e resultado da atuação do homem.
Pensar e refletir a educação, como fator possível de uma grande revolução, faz
emergir outro direito: o direito inalienável de crer num mundo melhor, o direito ao otimismo,
o direito à esperança e o direito à alegria,
53
o que é confirmado pelo conteúdo do artigo XII da
53
Nesse sentido, discordamos totalmente da crítica de John Gray a Voltaire em seu livro sob o
título Voltaire”, em que averba: [...] Como Santo Agostino e Pascal, Voltaire reconhecia
que a humanidade talvez não consiga alcançar o bem que, com tanta clareza, discerne. No
entanto, como esses grandes pensadores cristãos, tinha certeza de que o bem era um e não
muitos, não podendo, por isso, dar azo a conflitos irreconciliáveis. Juntamente com
Condorcet, Diderot, Paine, Jefferson e muitos projetistas menores da chamada cidade celestial
36
Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, aprovada pela Resolução XXX da
IX Conferência Internacional Americana, realizada em abril de 1948, em Bogotá: “Toda
pessoa tem direito à educação, que deve inspirar-se nos princípios da liberdade, moralidade e
solidariedade humana”.
Em 20 de novembro de 1959, surge a Declaração Universal dos Direitos da Criança
que deduz, no seu sétimo princípio:
A criança tem direito a receber educação escolar, a qual será gratuita e
obrigatória, ao menos nas etapas elementares. Dar-se-á à criança uma
educação que favoreça a sua cultura geral e lhe permita em condições de
igualdade de oportunidades desenvolver suas aptidões e sua
individualidade, seu senso de responsabilidade social e moral e tornar-se um
membro útil da sociedade.
O interesse superior da criança deverá ser o interesse diretor daqueles que
têm a responsabilidade por sua educação e orientação; tal responsabilidade
incumbe, em primeira instância, a seus pais.
A criança deve desfrutar plenamente de jogos e brincadeiras, os quais
deverão estar dirigidos para a educação; a sociedade e as autoridades
públicas se esforçarão para promover o exercício deste direito.
O Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 16 de
dezembro de 1966, promulgado pelo Decreto nº 591, de 06 de julho de 1992, também
reconhece a importância da educação no desenvolvimento da pessoa humana no seu artigo 13:
Art.13
1. Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de
toda pessoa à educação. Concordam em que a educação deverá visar
ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e do sentido de
sua dignidade e a fortalecer o respeito pelos direitos humanos e
liberdades fundamentais. Concordam ainda em que a educação deverá
capacitar todas as pessoas a participar efetivamente de uma sociedade
livre, favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as
nações e entre todos os grupos raciais, étnicos ou religiosos e
promover as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da
paz.
2. Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem que, com o
objetivo de assegurar o pleno exercício desse direito:
a) A educação primária deverá ser obrigatória e acessível
gratuitamente a todos;
dos filósofos do século XVIII, Voltaire sem dúvida chegou quase a desesperar da estupidez
humana. Mas nunca logrou duvidar que uma civilização universal pudesse ser concebida e,
em princípio, edificada se não logo, pelo menos no futuro distante se não completamente e
para sempre, ao menos em parte e durante algum tempo. Em sua convicção inabalável de que
o bem é um só, universal e harmonioso, Voltaire pertence ao passado, aos filósofos medievais
e clássicos como Tomás de Aquino, Platão e os Estóicos, não ao futuro que ora vivemos.
(Voltaire. Tradução Gilson Cesar Cardoso de Sousa. São Paulo: UNESP,1999, p.24).
37
b) A educação secundária em suas diferentes formas, inclusive a
educação secundária técnica e profissional, deverá ser generalizada e
tornar-se acessível a todos, por meios apropriados e, principalmente,
pela implementação progressiva do ensino gratuito;
c) A educação de nível superior deverá igualmente tornar-se
acessível a todos, com base na capacidade de cada um, por todos os
meios apropriados e, principalmente, pela implementação progressiva
do ensino gratuito;
d) Dever-se-á fomentar e intensificar, na medida do possível, a
educação de base para aquelas pessoas que não receberam educação
primária ou não concluíram o ciclo completo de educação primária.
e) Será preciso prosseguir ativamente o desenvolvimento de uma
rede escolar em todos os níveis de ensino, implementar-se um sistema
adequado de bolsas de estudo e melhorar continuamente as condições
materiais do corpo docente.
3. Os Estados Partes do presente Pacto, comprometem-se a
respeitar a liberdade dos pais e, quando for o caso, dos tutores legais,
de escolher para seus filhos escolas distintas daquelas criadas pelas
autoridades públicas, sempre que atendam aos padrões mínimos de
ensino prescritos ou aprovados pelo estado, e de fazer com que seus
filhos venham a receber educação religiosa ou moral que esteja de
acordo com as próprias convicções.
4. Nenhuma das disposições do presente artigo poderá ser
interpretada no sentido de restringir a liberdade de indivíduos e de
entidades de criar e dirigir instituições de ensino, desde que
respeitados os princípios enunciados no parágrafo 1 do presente artigo
e que essas instituições observem os padrões mínimos prescritos pelo
Estado.
É importante citar, ainda, que o direito à educação é igualmente garantido pela
Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica, de 06 de
novembro de 1969, ratificado pelo Brasil em 25 de setembro de 1992 e promulgado pelo
Decreto n. 678, de 06 de novembro de 1992), que prevê o seu desenvolvimento progressivo, o
que é prescrito no artigo 26:
Os estados-partes comprometem-se a adotar as providências, tanto no âmbito
interno, como mediante cooperação internacional, especialmente econômica
e técnica, a fim de conseguir progressivamente a plena efetividade dos
direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação,
ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados
Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos
recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios apropriados.
Em 17 de novembro de 1988, foi aprovado o Protocolo Adicional à Convenção
Americana sobre Direitos Humanos (Protocolo de San Salvador), promulgado em 30 de
dezembro de 1999, por meio do Decreto nº 3.321.
38
O artigo 13, deste Protocolo, cuida do direito à educação, assegurando-o a toda
pessoa. A educação deverá orientar-se para o pleno desenvolvimento da personalidade
humana e do sentido de sua dignidade, devendo fortalecer o respeito pelos direitos humanos,
pelo pluralismo ideológico, pelas liberdades fundamentais, pela justiça e pela paz. A
educação deve, também, “capacitar todas as pessoas para participar efetivamente de uma
sociedade democrática e pluralista, conseguir uma subsistência digna, favorecer a
compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais, étnicos
ou religiosos e promover as atividades em prol da manutenção da paz..”
O artigo 16 do Protocolo, por sua vez, assegura, a toda criança, “direito à educação
gratuita e obrigatória, pelo menos no nível básico, e a continuar sua formação em níveis mais
elevados do sistema educacional.”
Em 21 de novembro de 1990, foi promulgada, pelo Decreto 99.710, a Convenção
sobre os Direitos da Criança, cujo objetivo mais evidente é a educação, como verbera o
artigo 28:
Art. 28.
I Os Estados Partes reconhecem o direito da criança à educação e a fim de
que ela possa exercer progressivamente e em igualdade de condições esse
direito, deverão especialmente:
a) tornar o ensino primário obrigatório e disponível gratuitamente para
todos;
b) estimular o desenvolvimento do ensino secundário em suas diferentes
formas, inclusive o ensino geral e profissionalizante, tornando-o disponível e
acessível a todas as crianças, e adotar medidas apropriadas tais como a
implantação do ensino gratuito e a concessão de assistência financeira em
caso de necessidade;
c) tornar o ensino superior acessível a todos, com base na capacidade e por
todos os meios adequados;
d) tornar a informação e a orientação educacionais e profissionais
disponíveis e acessíveis a todas as crianças;
e) adotar medidas para estimular a frequência regular às escolas e a redução
do índice de evasão escolar.
Como é possível verificar, embora previstas como direito, as medidas tomadas para
implementar a simples educação básica são muito tímidas, e as previsões textuais o
demonstram, pela ausência de mecanismos efetivos, que assegurem a educação e as técnicas
educacionais e instrucionais para toda a vida humana, como deve ser.
Nesse sentido, muito bem se coloca o relatório, para a UNESCO, da Comissão
Internacional sobre Educação para o século XXI. Em seu prefácio, Jacques Delors afirma:
Ante os múltiplos desafios do futuro, a educação surge como um trunfo
indispensável à humanidade na sua construção dos ideais da paz, da
liberdade e da justiça social.
[...]
39
As políticas educativas não podiam deixar de se sentir questionadas por estes
três grandes desafios. A Comissão não podia deixar de chamar a atenção
para o fato de estas políticas poderem contribuir para um mundo melhor,
para um desenvolvimento humano sustentável, para a compreensão mútua
entre os povos, para a renovação de uma vivência concreta da democracia.
54
Seguindo o seu raciocínio, Jacques Delors passa a enumerar as tensões que deverão ser
vencidas, denominando-as de tensões a ultrapassar.
Para ele, é imprescindível que se encarem, para melhor ultrapassá-las, as principais
tensões que, não sendo novas, constituem o cerne da problemática do século XXI.
Identifica a necessidade de conciliar o global e o local, por tornar-se o indivíduo
cidadão do mundo, sem perder as suas raízes e com participação ativa nos assuntos do país em
que nasceu e nos assuntos de sua comunidade de base.
Chama a atenção para a globalização da cultura que, paulatinamente, vai se realizando,
de forma parcial, mas progressiva. Afirma, o renomado autor, que a globalização, com todos
os seus riscos, é inevitável e que devemos estar preparados para o risco, grave e equivocado,
de enfrentá-la, esquecendo de que cada pessoa possui caráter único e vocação para escolher o
seu destino e realizar as suas potencialidades, mantendo a riqueza das suas tradições e da sua
própria cultura ameaçada, se não tivermos cuidado com as evoluções em curso.
Propugna pela construção de uma autonomia dialética com a liberdade e a evolução do
outro e o controle do progresso científico, o que significa controlar a tensão entre a tradição e
a modernidade.
Alerta para o cuidado com as tensões entre as soluções em curto e em longo prazo, por
serem, esta tensões, alimentadas pelo domínio do efêmero e do instantâneo, num contexto em
que o processo de informações e emoções efêmeras levam a uma constante concentração
sobre os problemas imediatos. As opiniões pretendem respostas e soluções rápidas, enquanto
muito dos problemas enfrentados necessitam de uma estratégia paciente.
Chama especial atenção para o fato de que a pressão da competição faz com que
muitos responsáveis esqueçam a missão de dar, a cada ser humano, os meios para poder
realizar todas as suas oportunidades. Consciente disto é que a comissão retomou e atualizou o
conceito de educação ao longo de toda a vida, de modo que se conciliem a competição, que
estimula; a cooperação, que reforça, e a solidariedade, que une.
54
Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional
sobre Educação para o século XXI, p 15-16.
40
Ao exposto, a Comissão acrescentou novas disciplinas e propôs o desenvolvimento de
conhecimentos, tais como o conhecimento de si mesmo e o dos meios de manter a saúde física
e psicológica, ou mesmo matérias que estimulem o conhecimento e a preservação do meio
ambiente natural.
É necessário ensinar a viver melhor, por meio do conhecimento, da experiência e da
construção de uma cultura pessoal.
A Comissão tratou, também, da tensão entre o espiritual e o material, alertando que,
muitas vezes, sem se aperceber disto, ou sem ter capacidade para exprimi-lo, o mundo tem
sede de ideal e de valores, a que chamaremos morais. Cabe, à educação, a nobre tarefa de
despertar em todos, segundo as tradições e convicções de cada um, respeitando inteiramente o
pluralismo, a elevação do pensamento e do espírito para o universal e para uma espécie de
superação de si mesmo, pois está em jogo a sobrevivência da própria humanidade.
55
55
Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional
sobre Educação para o século XXI, p 15-16.
41
3 O ESTADO E A DIGNIDADE HUMANA, O ESTADO E A
DIGNIDADE SOCIAL ESTADO EDUCAÇÃO E ORDEM JURÍDICA.
O ESTADO DO BEM-ESTAR SOCIAL
3.1 Estado
Constitui requisito essencial da força normativa de uma Constituição que ela
leve em conta não os elementos sociais, políticos, e econômicos
dominantes, mas também que, principalmente, incorpore o estado espiritual
(geistige Situation) de seu tempo. Isso lhe de assegurar, enquanto ordem
adequada e justa, o apoio e a defesa da consciência geral.
56
(grifos nossos).
Com as possibilidades efetivamente delineadas pelo constitucionalismo
contemporâneo, queremos salientar que a experiência social, como ressaltamos acima, nos
leva a refletir sobre o modelo de Estado, bem como sua organização jurídica, conformação
funcional e atuação.
Maria Garcia afirma “que nessa sociedade humana, visualizada na sua complexidade,
e por força dessa complexidade surgem as instituições”.
57
Nesse diapasão, vemo-nos forçados a refletir sobre o Estado. É especialmente
relevante pensar na realização dessa instituição secular que, ainda nos dias atuais, requer
ajustes e solicita novas compreensões em relação às suas finalidades, bem como observar os
efetivos resultados dessa atuação e se esta, de fato, vem realizando os objetivos que justificam
a existência da organização do Estado em seus múltiplos aspectos.
Se é certo que não prescindimos das instituições historicamente construídas, não é
menos verdadeiro que elas podem ser aperfeiçoadas no sentido especial do refinamento das
suas relações, no seu agir em relação à condição de vida em sociedade.
Esta reflexão leva-nos à própria sociedade, pois, ao analisarmos a condição humana
dos indivíduos, que compõem o Estado, estaremos, igualmente, observando a sociedade em
que vivemos.
O Estado adquire vida e atuação pelo direito. Muito bem afirmava Tobias Barreto,
citando Hermam Post:
56
Konrad Hesse. A força normativa da Constituição. Tradução Gilmar Ferreira Mendes. Porto
Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1991, p.20.
57
Direito à família. In: Marcelo Figueiredo; Valmir Pontes Filho. Estudos de direito público em
homenagem a Celso Antônio Bandeira de Mello. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 450.
42
Assim como de todos os modos possíveis de abreviar o caminho entre dois
pontos dados, a linha reta é o melhor; assim como, de todos os modos
imagináveis de um corpo girar em torno de outro corpo, o círculo é o mais
regular; assim também, de todos os modos possíveis de coexistência
humana, o direito é o melhor modo. (grifos nossos)
58
Tal é a concepção que está de acordo com a intuição monística do mundo. Perante a
consciência moderna, o direito é um modus vivendi; é a pacificação do antagonismo das
forças sociais, da mesma forma que, perante o telescópio moderno, os sistemas planetários
são tratados de paz entre as estrelas [...].
E citando o professor Holtzendorff, fala-nos belissimamente do cosmos do direito e da
moral:
realmente um cosmos do direito, mas este, não menos do que o cosmos
físico, é um produto da lei do fieri, da lei do desenvolvimento contínuo;
e
assim como no mundo material é presumível que exista apenas uma pequena
parte, em que a matéria chegou ao seu estado de equilíbrio, assim também
no cosmos do direito uma parte diminuta, em que as forças se acham
equilibradas e não tenham mais necessidade de lutar.
59
Olhada por este lado, apreciada deste ponto de vista, a ciência do direito remoça e
torna-se digna de nossas meditações.
60
(grifos nossos)
E é ainda Tobias Barreto, citando Hermam Post : “o Estado chamou a si toda a
produção e execução do direito... Ele mantém-se para com este, como o corpo humano para
com os processos fisiológicos que regulam a relação das células e dos órgãos uns com os
outros e com a totalidade da pessoa do homem [...]”.
61
E é que entendemos o “poder” do Estado e do direito que, com e sob o seu manto,
delineará a sociedade cada vez mais justa.
Diante disso, impõe-se a quebra da resistência do Estado à compreensão de que,
apenas e verdadeiramente, se manterá pela educação do cidadão e de que é seu papel trazer
para si, pelas amplas possibilidades do constitucionalismo, o dever-poder de educar os seus
cidadãos, em regras de liberdade e respeito aos ideais democráticos e de respeito à vida e aos
direitos humanos e ambientais.
O texto da Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia evidencia, no item 3, a
justificativa da existência de governos:
58
Tobias Barreto. Estudos de Direito. Campinas, São Paulo: Bookseller, 2000, p. 157
59
Tobias Barreto. Estudos de Direito. Campinas, São Paulo: Bookseller, 2000, p. 157.
60
Ibidem, p.157.
61
Ibidem, p. 54.
43
O governo deve ser instituído para comum benefício, proteção e segurança
do povo, nação ou comunidade. De todas as formas de governo, a melhor é
aquela capaz de produzir o maior grau de felicidade e segurança, e a que
mais efetivamente ofereça garantia contra o perigo da má administração.
Toda vez que algum governo for considerado inepto ou contrário a esses
fins, a maioria da comunidade tem o direito indubitável, inalienável e
irrevogável de reformá-lo, modificá-lo ou aboli-lo, da maneira que julgar
mais proveitosa ao bem-estar geral.
Nessa esteira, afirmamos que não existem direitos do Estado; existem, sim, direitos da
sociedade. E refletindo sobre essas ideias e sobre o papel do Estado, identificamos diversas
compreensões, maneiras, estilos, formas de concebê-lo; em última análise, nos grandes
pensadores, identificamos a sociedade como o fundamento, a base, o objetivo, a justificação e
a meta do Estado.
No positivismo de Hans Kelsen, o Estado surge legitimado pela norma jurídica; no
constitucionalismo clássico de Emmanuel Joseph Sieyès, é a própria nação; na doutrina de
Carl Schmitt, é o fruto de uma decisão política fundamental; em Santi Romano, é a
instituição.
62
Analisando-o, porém, sob qualquer enfoque, não é possível separar Estado da
sociedade ou, mais logicamente, é impossível negar que apenas logra legitimidade e
justificativa ontológica na organização social, na sociedade, na sua completude, e em cada
indivíduo, em particular, como partícipe que atua e interage no interior desse corpo social,
sendo este decisivo para sua conformação.
Assistimos, nos séculos XVIII, XIX e XX, a grandes conflitos que geraram
transformações sociais ditadas pelas mudanças tecnológicas, filosóficas, econômicas.
Travamos duas guerras mundiais. Destruímos e erguemos instituições. Alteramos velhos
costumes, destruímos antigas tradições e estruturas. Todavia, os velhos problemas e desafios
persistem e prosseguem, agora mais agravados pelo crescimento demográfico, pela
degradação ambiental, pela presença constante do fantasma da insegurança, pelo aumento da
corrupção, pelo aparecimento de inúmeras doenças a desafiar a nossa capacidade de
orientação e solução.
62
“Não pode existir direito antes e fora da instituição justamente porque falta a organização que
torna jurídica a norma. O direito não pode ser somente a norma posta pela organização social,
como frequentemente se afirma, mas é a organização social que, entre as suas outras
manifestações, põe também a norma. Se é verdade que o caráter jurídico da norma é fornecido
pelo poder social que a determina ou, ao menos, a sanciona, disto advém que este caráter deve
ser encontrado na instituição, que não poderia atribuí-lo à norma se essa mesma não o
possuísse. A verdade é que o direito é, antes de tudo, instalação, organização de uma entidade
social.” (Santi Romano. Ordenamento Jurídico. Tradução de Arno dal Ri Júnior.
Florianópolis: Fundação Boiteux, 2008, p. 95).
44
Nos dias atuais, após a grande contribuição iluminista e, partindo dela, sentimos ainda
a premente necessidade de pensar o modelo de Estado e o seu principal e único protagonista:
o homem.
Nesse sentido, parece-nos constituir o dever primeiro do Estado não apenas pensar nos
assuntos educacionais e cuidar deles, mas, igualmente, estabelecer uma educação em bases de
liberdade, mas com valores que sejam relevantes para a sociedade. A essa educação importa
abordar, com objetividade, assuntos como respeito social, ambiental, moralidade pública e
privada, enfim, tudo aquilo que possa constituir bases de respeito, quando se trata de
convivência social pública e privada.
As constituições modernas são principiológicas. Os princípios são valores, e, os
valores, para serem apreendidos, requerem certo amadurecimento, certa sensibilidade, que
além das coisas tangíveis, visíveis e concretas.
De outra forma, as constituições falam em promoção da dignidade humana. Parece-
nos, porém, que a dignidade, até agora compreendida, o inclui a promoção de uma
autoconscientização do indivíduo, que continua sem conhecer-se e sem condições culturais,
educacionais, intelectuais para compreender o que é o próprio Estado, esse ente abstrato que,
para ser compreendido, deve ser pensado, refletido, estudado.
A vida social, a convivência, o comportamento em sociedade carecem de
discernimento, pois conviver requer discernimento. E é seguindo esta linha de raciocínio que
afirmamos constituir, o papel preponderante do Estado Democrático de Direito, exigir, assim
como exige obediência às leis, que cada cidadão trabalhe pelos seus pendores e talentos,
procurando adaptar-se e aprimorar-se para a convivência social, realizando em si a dignidade
humana pela possibilidade de escolhas maduras e ditadas por mente com capacidade para
discernir e fazer escolhas.
Os constitucionalistas e estudiosos do direito do Estado, como Konrad Hesse,
destacam a importância da constituição como ordem jurídica fundamental, material, aberta da
comunidade. Joaquim José Gomes Canotilho apregoa o papel dirigente das constituições,
ressalta e enaltece a sua função de vetor e indicador de caminhos, que procura assentar as
bases de um Estado racional, humano, solidário e mais adaptado à vida em comum.
Diante da contingência da vida social, afirmamos a importância do constitucionalismo,
esse movimento histórico aberto à evolução e que deve abraçar a educação como o principal
caminho na promoção da dignidade do homem.
Pesquisadores e estudiosos da Teoria Geral do Estado e das suas funções, em todas as
épocas, identificaram a importância da educação para a sociedade, mas não a estruturaram no
45
âmbito do poder estatal. Por quê? Essa é uma indagação que leva a profundas reflexões. Se
falamos em um poder legislativo, encarregado de elaborar as espécies normativas, seria
necessário, igualmente, um poder educacional, para garantir cidadãos aptos a compreender o
sentido e o porquê das leis.
Se vivemos em uma democracia, que pressupõe alternância no poder, seria necessário
um poder educacional que, estruturado independentemente, possuísse orçamento próprio,
especialização de competências, organização interna hierárquica e disciplinar, competência
para iniciativas de leis em relação às suas matérias específicas e que promovesse, de forma
eficiente, a educação, em todos os níveis, dos cidadãos, como iniciativas nos diferentes
setores de aperfeiçoamento humano, segundo os talentos, propensões e aptidões apresentados.
Maria Garcia, falando sobre a família, mas ressaltando o papel do Estado, afirma:
Jurídica e politicamente equiparada ao Estado na sua tarefa educacional, a
família “tem especial proteção do Estado” (art. 226) e compõe os objetivos
de assistência social, em si mesma considerada (art.203, I), abrangendo a
maternidade, a infância, a adolescência e a velhice.
Como o Estado e a sociedade (art.227), cabe-lhe assegurar “[...] à criança e
ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação [...]”.
63
De outro modo, estaríamos mais preparados para o exercício do poder se possuíssemos
a percepção política que, segundo afirmação de Hanna Arendt, analisando a obra de
Aristóteles, “ por excelência é ver o mundo sob o ponto de vista do outro”
64
:
Se quiséssemos definir, mais tradicionalmente, a virtude mais extraordinária
do estadista, poderíamos dizer que ela consiste em compreender a maior
quantidade e variedade possível de realidades...e ao mesmo tempo em ser
capaz de comunicar-se com os cidadãos e suas opiniões de modo a tornar
visível o caráter comum deste mundo.
65
Continua explicando que:
O pré-requisito para que essa compreensão e a ação por ela inspirada
ocorresse sem a ajuda do estadista seria que cada cidadão fosse
suficientemente articulado para mostrar a veracidade de sua opinião e,
consequentemente, compreender a de cada um de seus concidadãos. Sócrates
parece ter acreditado que a função política do filósofo era ajudar a criar esse
tipo de mundo comum [...] Para isso Sócrates recorria a duas ideias, uma
contida na frase de Apolo délfico, gnõthi sautob – conhece-te a ti mesmo.
66
Assim, Sócrates, Platão, Aristóteles, Locke, Montesquieu, Arendt, entre tantos outros,
identificaram a importância da educação do homem para a política, para as ciências, para a
63
O direito à família, p. 460
.
64
A promessa da política. Tradução Pedro Jorgensen Junior. Difel: Rio de Janeiro, 2008, p. 60.
65
Ibidem, p. 60.
66
Ibidem, p. 60.
46
humanidade, de vez que inexiste a política sem o político, a ciência, sem o cientista e, a
humanidade ,sem o homem.
Aristóteles, em A política, afirma que “cada família é uma porção do Estado e que a
virtude da parte deve ser aquela do todo”.
67
Assevera, ao discorrer sobre o objeto da ciência
política, que “toda cidade é uma espécie de associação, e que toda associação se forma
almejando algum bem, pois o homem trabalha somente pelo que ele considera um bem”.
68
Se assim é, acrescenta:“É preciso que todos os cidadãos participem em comum de tudo
ou de nada, de certas coisas e não de outras. Não participar de nada é impossível, porque a
sociedade política é uma espécie de comunidade”.
69
Admitindo que a perpetuidade no poder é incompatível com a igualdade natural e
entendendo justo que todos participem do poder, mesmo considerando-o um bem ou um mal,
acentua ser, a unidade do Estado, “a obra da boa união entre os cidadãos”.
70
E, ao referir-se à
cidade, afirma ser esta:
Uma multidão de cidadãos [...] e cidadão aquele que pode ser juiz e
governante [...] Cidadão é aquele que participa legalmente da autoridade
deliberativa e da autoridade judiciária eis o que chamamos de cidadãos da
cidade assim construída. E chamamos de cidade a multidão de cidadãos
capaz de bastar a si mesma e de obter, em geral, tudo o que é necessário à
subsistência.
71
E, depois de inúmeras observações, Aristóteles arremata:
Seja como for, louva-se aquele que sabe mandar e obedecer. E parece que a
virtude do cidadão experiente consiste em poder fazer igualmente ambas as
coisas [...] Sem dúvida, a virtude inerente ao mando e à obediência não é a
mesma; mas é preciso que o bom cidadão saiba e possa obedecer e mandar;
o que faz a própria virtude é formar homens livres sob essa dupla relação.
72
Visualizando essa dupla relação, lembremos Montesquieu, em O espírito das leis: “O
povo, na democracia, é, em certos aspectos, o monarca, e, em outros aspectos, o súdito”.
73
Quanto à educação no governo republicano Montesquieu afirma:
Ser neste que precisamos de todo o poder da educação
. O temor dos
governos despóticos nasce desse mesmo temor, entre as ameaças e os
castigos; a honra das monarquias é favorecida pelas paixões, e, por seu
turno, as favorece; mas a virtude política é uma renúncia a si próprio, o que é
sempre uma coisa muito penosa. (grifos nossos)
67
A política, p. 60.
68
Ibidem, p. 60
69
Ibidem, p. 37
70
Ibidem, p. 41.
71
Ibidem, p. 75-77.
72
Ibidem, p. 81-82
73
O espírito das leis. 7. ed. Tradução Pedro Vieira Mota. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 23.
47
Podemos definir essa virtude como o amor às leis e à pátria. Esse amor,
sempre requerendo a supremacia do interesse público sobre o interesse
privado, produz todas as virtudes individuais, as quais nada mais são do que
essa supremacia.
Esse amor é singularmente afeto às democracias. Somente nestas o governo
é confiado a cada cidadão. Ora, o governo é como todas as coisas do mundo:
para conservá-lo é preciso amá-lo.
Nunca se ouviu dizer que os reis não amassem a monarquia, nem que os
déspotas odiassem o despotismo. Tudo depende, então de estabelecer esse
amor na república, e é para inspirá-lo que a educação deve estar atenta. Mas,
para que as crianças possam tê-lo, um meio seguro: é preciso que os pais
também o tenham.
Somos, via de regra, senhores de proporcionar a nossos filhos os nossos
conhecimentos; e ainda mais o somos senhores de incutir nossas paixões.
Quando isso não acontece, é porque tudo o que foi feito na casa paterna é
destruído pelas impressões externas.
Não é a nova geração que degenera: esta não se perde senão quando os
homens maduros já estão corrompidos”.
74
John Locke, por sua vez, ao discorrer sobre o pátrio poder, afirma:
Quando alguém está sob a lei da natureza, o que o liberta dessa lei? O que
lhe dá a liberdade de dispor da propriedade, segundo sua vontade, dentro dos
limites da lei? Respondo: uma condição de maturidade que faz supô-lo capaz
de conhecer aquela lei, de modo que possa manter as suas ações dentro dos
limites dela...Por conseguinte, a liberdade do homem e a liberdade de agir
consoante à própria vontade baseiam-se no fato de possuir ele razão bastante
para instruí-lo na lei que terá de ser o seu rumo, dando-lhe a saber até que
ponto estará ao sabor da própria vontade.
75
(grifos nossos)
Nesse sentido, é que somos todos convocados para, de uma maneira ou de outra,
deixar a marca do nosso trabalho, do nosso entendimento, do nosso tempo e da nossa
compreensão histórica nas instituições.
É isso que Konrad Hesse identifica como a
vontade de Constituição, aquela que origina-se de três vertentes diversas.
Baseia-se na compreensão da necessidade e do valor de uma ordem
normativa inquebrantável, que proteja o Estado contra o arbítrio desmedido e
disforme. Reside, igualmente, na compreensão de que essa ordem
constituída é mais do que uma ordem legitimada pelos fatos ( e que. por isso,
necessita de estar em constante processo de legitimação). Assenta-se
também na consciência de que, ao contrário do que se com uma lei do
pensamento, essa ordem não logra ser eficaz sem o concurso da vontade
humana. Essa ordem adquire e mantém sua vigência através de atos de
vontade. Essa vontade tem consequência porque a vida do Estado, tal como a
vida humana, não está abandonada à ação surda de forças aparentemente
inelutáveis. Ao contrário, todos nós estamos permanentemente convocados a
dar conformação à vida do Estado, assumindo e resolvendo as tarefas por ele
colocadas.
76
74
Charles Louis de Secondat, Barão de Montesquieu. O espírito das leis, p. 48-49.
75
John Locke. Segundo tratado sobre o Governo. 2. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 1967, p. 56.
76
A força normativa da Constituição, p. 19
48
3.2 O Estado brasileiro
Tais são, Magníficos, Honradíssimos e Soberanos Senhores, as vantagens que eu
procuraria na pátria que escolhesse para mim. Se a Providência lhe acrescentara uma
localização encantadora, um clima temperado, uma terra fértil e a perspectiva mais deliciosa
que existisse sob o céu, eu não desejaria, para rematar a minha felicidade, senão gozar todos
esses bens no seio dessa pátria feliz, vivendo tranquilamente numa agradável sociedade com
meus cidadãos, praticando com eles, e segundo o seu exemplo, a humanidade, a amizade e
todas as virtudes, e deixando após mim a honrada memória de um homem de bem e de um
patriota honesto e virtuoso.
77
O Estado brasileiro tem como fundamento a dignidade da pessoa humana e, como
objetivo fundamental, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
É Estado que, a analisar os termos da Constituição Federal, objetiva constituir-se em
Estado do bem e que tem por princípio fundamental a dignidade da pessoa humana. Contudo,
para a realização desse ideário, não é suficiente colocá-lo como postulado ou dogma, bem
como entendemos não suficiente inscrevê-lo no texto fundamental. É necessário, sim, que se
estabeleçam reais mecanismos de transformação social, criando instrumentos que viabilizem e
realizem a constituição e sua vontade imanente.
Constitui nossa firme convicção que o desencadear desse processo, de forma segura e
efetiva, inicia-se com a educação. Não queremos afirmar que apenas a educação promove a
dignidade humana, mas afirmamos, convictos, que, sem ela, a personalidade cidadã não atinge
a plenitude prevista no artigo 205 da Constituição Federal. “A educação, direito de todos e
dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e a
sua qualificação para o trabalho”.
3.3 A estruturação dos poderes do Estado
77
Jean Jacques Rousseau. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os
homens. In: Rousseau. Tradução Lourdes Santos Machado. Introdução e notas Paul Arbousse-
Bastide e Lourival Gomes Machado. São Paulo: Nova Cultural, 1999, p. 37.
49
No Congresso, a Câmara reúne os representantes do povo brasileiro, e, no Senado,
encontramos a representação das ordens regionais ou dos estados-membros, modelados
segundo a teoria da representação, concebida por Jean-Jacques Rousseau e que ensina os
homens a unir-se e a orientar-se pela forças existentes, formando um conjunto, que possa
sobrepujar, impelindo-as para um só móvel, levando-as a operar em concerto.
78
Era na força de associação que, segundo Jean-Jacques Rousseau, a pessoa e os seus
bens encontrariam defesa.
Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens
de cada associado com toda a força comum, e pela qual cada um, unindo-se
a todos, obedece, contudo, a si mesmo, permanecendo - assim, tão livre
quanto antes. Esse, o problema fundamental que o contrato social oferece.
79
Observe-se que Rousseau, ao conceber a sua construção teórica, simultaneamente
tratava de Emilio, o que evidencia a sua preocupação com a educação, matéria essencial para
o Estado. Assim como Montesquieu, o autor genebrino não ficou alheio ao tema educação,
provando que o assunto se liga intimamente ao Estado e que, quanto mais bem tratado, mais
demonstra a evolução do Estado.
A função legislativa, por meio do processo legislativo, seja ele ordinário, sumário ou
especial, elabora as espécies normativas. O processo legislativo, na Constituição de 1988, está
disciplinado na seção VI, enumerando, o artigo 59 do texto maior, as espécies normativas. A
seguir, encontra-se o rito, o procedimento de elaboração de cada um dos instrumentos
arrolados no citado artigo 59.
A função jurisdicional, com as atribuições de decidir conflitos de interesses e
solucionar as pretensões resistidas, tem a sua disciplina traçada no Capítulo III, Seção I, da
Constituição Federal. São outorgadas, aos órgãos jurisdicionais, as competências não somente
para a decisão de assuntos subjetivamente referidos aos cidadãos, nos termos dos incisos
XXXV, LIV e LV do artigo da Constituição Federal, mas também a eles compete zelar
pela higidez do ordenamento jurídico constitucional, como guardiões, que são, da lei magna.
O poder executivo, com a tarefa de concretizar os comandos normativos oriundos da
função legislativa, deve concretizar esses mandamentos, administrando os interesses da
sociedade, sob a ordem constitucional e legal, com absoluta obediência à Constituição e aos
78
Jean Jacques Rousseau. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os
homens. In: Rousseau, p 69.
79
Contrato social. In: Rousseau. Tradução Lourdes Santos Machado. Introdução e notas Paul
Arbousse-Bastide e Lourival Gomes Machado. São Paulo: Nova Cultural, 1999, p. 69-70.
50
princípios jurídicos de direito público, com atuação orientada pelo regime jurídico
administrativo e suas pilastras fundamentais: o princípio da supremacia do interesse público
sobre o interesse privado, o princípio da indisponibilidade dos interesses públicos, os
princípios da moralidade administrativa e da eficiência (artigo37 caput e 70 da CF).
Perdida entre as multifacetadas atividades administrativas, está a educação nacional,
ainda hoje construída sobre conceitos e ideias imediatistas e materialistas, o que leva à
inamovível conclusão de que a qualidade do ensino, a iniquidade persistente no acesso à
educação de melhor qualidade, o atendimento a jovens e adultos, que não conseguem
completar a sua educação e a questão da relevância e pertinência dos conteúdos da educação
para a vida das pessoas são, de fato, na palavra autorizada de Simon Schwartzman
80
, ao lado
do mau direcionamento e da aplicação dos recursos da educação, apenas parte de uma
atuação historicamente equivocada e ineficiente dos condutores desses assuntos.
Sob outro ângulo e sem refletir sobre a educação para o pleno desenvolvimento da
pessoa humana, educação para a cidadania e para os direitos fundamentais, os homens
públicos pautam a sua atuação, quando o fazem, pela ideia da ação mínima e legalmente
exigível, evidenciando persistente equívoco nessa atuação menor.
A ineficiência e a indiferença indicam que o administrador público está inabilitado
para tratar de assunto de tal relevância e que a educação nacional está a requerer pessoas com
experiência, seriedade, técnica e vivência.
É igualmente notável a fragmentação do ensino. Diga-se, forte fragmentação, pois
parece-nos que os nossos homens públicos entendem ser excessivamente complexo pensar o
homem dentro das suas múltiplas necessidades educacionais, seus aspectos intelectuais,
espirituais, emocionais, psicológicos, físicos etc.
Sob a perspectiva dos professores, a realidade brasileira não é melhor. O profissional
do ensino ganha pouco, deve lecionar, às vezes, três períodos para compor uma insuficiente
renda de sobrevivência, em muitas ocasiões defrontando-se com violência e agressões de toda
ordem.
Essa realidade impõe-lhe sacrifícios ingentes e impossibilita a necessária permanência
em cursos de especialização, necessários em uma sociedade, que se transforma e modifica
80
A gestão educacional no Brasil é tão ruim que Simon Schwartzman conclui que gastamos
mal e que colocar recursos neste sistema
, sem uma ideia clara das transformações e reformas
de que a educação necessita,
implica o risco de, simplesmente, colocar dinheiro bom em
investimentos ruins, sem muita perspectiva de resultados. (Simon S
chwartzman. Educação: a
nova geração de reformas. In: Fábio Reis Giambiagi; José Guilherme; André Urani.
Reformas no Brasil: balanço e agenda. Rio: Nova Fronteira, 2004, p. 488)
51
ininterruptamente. Ressentem-se da falta de preparo, da excessiva carga de trabalho e da
ausência de condições de aprimoramento contínuo, exigência que não pode ser afastada de
todo educador.
Além disto, existe a preocupação, na prática pedagógica, com ideologias, tendências
políticas; escolas esvaziadas de conteúdo humano e que nada dizem sobre o homem em
seus aspectos psicológicos, moral, emocional, espiritual, familiar; não o situam em um
contexto histórico e muito mal o direcionam, sem qualquer preocupação com qualidade, para
o que Simon Schwartzman
81
denomina de tradição bacharelesca.
Nota-se intensa dificuldade de adaptação de certa parcela de educadores, que atuam
sem o despertar da consciência para a prática pedagógica e agem como se nenhum
compromisso tivessem com o futuro e com a sociedade.
Questões de ordem material constituem problemas, a impedir que a educação
aconteça: subnutrição, dificuldade de acesso às escolas, dificuldades relacionadas ao
transporte, nas zonas alagadas e nas cidades mais distantes, entre muitos outros.
A qualidade do ensino é preocupante, e esse dado é demonstrado pelo último exame
do ENEM/2009.
Até o momento, não identificamos nenhuma educação com conteúdos constitucionais
e de direitos fundamentais, que se inicie na educação básica e se estenda por todos os níveis
educacionais.
Promover e incentivar a educação de todos deve ser o objetivo da nação brasileira e,
sem que possa constituir qualquer pretensão inoportuna, essa educação deve objetivar o
homem, o cidadão do mundo. Procuramos destacar que, nesse processo, muitas vezes, ocorreu
o esquecimento dessa ideia básica.
É necessário educar sem paixões ideológicas, partidárias e, sim, com
comprometimento com a liberdade, a democracia e com os valores fundamentais, ensinando
compromissos com a coerência e a verdade da humanidade, tendo, como nota comum, nas
palavras de Gofredo Telles Júnior, a comunhão humana em razão da ideia de um bem a
realizar.
82
(grifos nossos)
81
Educação: a nova geração de reformas , p. 482.
82
O povo e o poder. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 25.
Num grupo social, os homens não se
acham, simplesmente justapostos, uns ao lado dos outros, como paus num monte de lenha, ou
como caminhantes isolados, andando pela mesma estrada. Acham-se, isto sim, associados, de
maneira a se completarem reciprocamente. Num grupo social, não uma simples agregação
material de homens, mas uma comunidade organizada. Essa comunidade ou comunhão é a
condição necessária à remoção de obstáculos que impedem os homens isolados de atingir
52
E, com Gofredo Telles Júnior, que conceitua poder
83
como a força de uma idéia
sobre consciências solidarizadas pelo comum anseio de torná-la realidade, queremos registrar
a nossa confiança nas possibilidades ora aventadas, da instituição da função educacional, num
único núcleo estrutural organizatório, a expandir sua força, coerência, eficiência, zelo,
pesquisa, organização, controle para toda a nação brasileira.
A teor do texto magno, não registramos nenhum óbice à estruturação independente da
educação brasileira, com a iniciativa de suas próprias leis, poder para a estruturação e criação
de cargos próprios, orçamento próprio, servidores próprios, responsabilidade própria, nos
termos do artigo 37, parágrafo 6º da CF .
A partir de tais fundamentos e argumentos, propomos a criação de uma estrutura
independente para a educação, como expressão do dever-poder educacional do Estado,
ditado pelo programa educacional previsto na Constituição de 1988.
A criação de uma estrutura independente, para a educação, não ofende; ao contrário,
parece-nos, encontra fundamentação nas regras da Constituição Federal.
A ideia de criação de função estatal independente para a educação harmoniza-se
com a Constituição Federal desde o seu rtico, com os valores expressos no Preâmbulo, a
definição da República Federativa, cujos princípios fundamentais se voltam analiticamente
para a cidadania, para a dignidade da pessoa humana, para a prevalência dos direitos
humanos. Essa função terá por objetivo desenvolver com eficiência o projeto educacional
previsto na Constituição Federal.
certos bens. Ela é, portanto, um meio. Sendo meio, deve ordenar-se para um fim, em razão do
qual o grupo se constituiu. Em consequência, a ordem da comunhão humana em cada grupo
social despende das repercussões da ideia a realizar, nas consciências dos componentes do
grupo.”
83
O povo e o poder, p. 25.
53
4 A EDUCAÇÃO E A LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL NO BRASIL:
UMA VISÃO HISTÓRICA
Analisaremos a evolução histórica da educação, com o objetivo de demonstrar a
necessidade de atenção e especialização da estrutura independente, que ora propomos, e a de
tornar mais evidente a ineficiência do processo na forma como vem, historicamente, se
desenvolvendo no Brasil.
A análise histórica do processo educacional, em todas as suas vertentes, especialmente
a análise das leis educacionais do Brasil, desde a fase colonial até os dias atuais, é deveras
decepcionante, pois revela desatenção dos poderes públicos para com o assunto mais
importante do Estado.
Informa Mônica Sifuentes que:
Antes da chegada dos portugueses o território brasileiro era povoado por
indígenas, que subsistiam da caça, da pesca e da coleta, não manifestando
qualquer preocupação no sentido de construir uma nação da forma como
concebida em outras partes do mundo, dos povos já chamados civilizados.
84
As relações de produção dos povos indígenas brasileiros eram comunitárias, ou seja,
todos trabalhavam em função da satisfação das necessidades do grupo. Não existia nenhuma
prática que lembrasse algum tipo de educação escolar.
85
Saviani
86
esclarece que, quando a esquadra de Pedro Álvares Cabral aportou deste
lado do Atlântico, encontrou populações séculos estabelecidas nas terras que vieram a ser
chamadas de Brasil. Essas populações viviam em condições semelhantes àquelas que foram
definidas como correspondentes ao comunismo primitivo. Ou seja, não eram sociedades
estruturadas em classes. Apropriavam-se de forma coletiva dos meios necessários à sua
subsistência. Na época da colonização, período em que o Brasil permaneceu sob o jugo da
coroa portuguesa, a educação se manteve sob a orientação e atuação prática dos jesuítas,
inexistindo normas que disciplinassem a matéria, permanecendo, o Reino de Portugal,
distante das necessidades dos súditos brasileiros, sob todos os aspectos, em especial no
aspecto educação.
84
Direito fundamental à educação. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2009, p. 82-83
85
Mônica Sifuentes. Direito fundamental à educação. Porto Alegre: Nuria Fabris, 2009, p. 82-83
86
Demerval Saviani. História das ideias pedagógicas no Brasil. 2. ed. rev. atual. Campinas:
Autores Associados, 2008, p. 25.
54
A famosa Companhia de Jesus, o exatamente alheia aos movimentos educacionais
que se manifestavam na Europa, possuía práticas pedagógicas próprias e, embora presa,
sob muitos aspectos, à sacristia e à necessidade de atuar, levando em conta a situação de
vínculo colonial com Portugal, à singularidade do educando e às práticas educacionais,
adaptou ideias e métodos de educação à realidade local.
Aqui desenvolveu, sob a enérgica atuação do Padre Manoel da Nóbrega, que aportara
na Bahia com Tomé de Souza, o primeiro governador-geral da Colônia, em 1549, notável
trabalho de catequese e esclarecimento.
87
Anchieta chegaria em 1553, com Duarte da Costa.
Padre Manoel da Nóbrega, Padre Anchieta e Padre Fabiano de Cristo são nomes
inolvidáveis pela história e pelos atos.
A primeira fase da educação jesuítica foi marcada pelo plano de instrução elaborado
pelo Padre Manoel da Nóbrega. Iniciava-se com o aprendizado do português para os
indígenas; prosseguia com a doutrina cristã, a escola de ler e escrever e, opcionalmente, canto
orfeônico e música instrumental; e culminava, de um lado, com o aprendizado profissional e
agrícola e, de outro lado, com a gramática latina para aqueles que se destinavam à realização
de estudos superiores na Europa.
88
Segundo Saviani, os jesuítas brasileiros, desenvolvendo a sua ação educativa nas
condições de um Brasil que se incorporava ao império português, o fizeram sob a evidência
de três elementos, que se entrelaçaram compondo um mesmo movimento, ainda que se
opusessem entre si: a colonização, a catequese e a educação.
89
A Companhia de Jesus não atuava apenas na América e adentrou o século XVIII com
mais de 600 colégios
90
em todo o mundo. Procurava manter aprendizes e alunos distantes dos
assuntos temporais e materiais, buscava incutir alguns fundamentos e, em especial, o ensino
religioso.
A preocupação investigativa mais voltada para os assuntos da religião, embora fossem
utilizadas práticas pedagógicas próprias, acabou, segundo alguns autores, por manter a escola
distante da realidade material e temporal, afastada de assuntos concretos e imediatos.
87
Muitos insistem em ressaltar os graves erros da Companhia de Jesus, mas o Brasil deve aos
seus Jesuítas
, que aqui aportaram enfrentando sacrifícios e incompreensões, verdadeiros
apóstolos de seu Mestre, a gratidão que se deve aos grandes mártires que se sacrificaram pela
pátria.
88
Demerval Saviani. História das ideias pedagógicas no Brasil, p. 43.
89
Ibidem, p 43.
90
Maria Lúcia de Arruda Aranha. História da educação. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Moderna, 1996, p. 115.
55
Enquanto, na Europa, se faziam sentir nas ciências, artes e pedagogia, as ideias e o
pensamento racionalista de La Haye, de René Descartes e das influências do renascimento
científico advindas dos iluministas, com a sua constante busca de métodos, processos,
aperfeiçoamentos e sua aplicação não apenas nas demais ciências, mas também na pedagogia,
pela adoção de diferentes métodos e multifacetadas investigações, sob a forte influência de
João Amós Comênios e de sua Didática Magna, em Portugal perpetuava-se a indiferença com
relação aos assuntos da educação na Colônia.
Surgiu, alhures, a busca por novos instrumentos e processos de ensino; no Brasil, por
essa época, a grande causa permanecia ainda nas mãos dos padres.
No século XVII, o ensino no Brasil, como leciona Maria Lucia de Arruda Aranha,
continuava sendo monopólio dos jesuítas. A autora afirma:
(os jesuítas) mantêm a escola conservadora, alheia à revolução intelectual
representada pelo racionalismo cartesiano e pelo renascimento científico [...]
A educação interessa a poucos elementos da classe dirigente e, ainda assim,
como ornamento e erudição. É literária, abstrata [...].
91
A escola era frequentada por nobres e brancos, mas os graus acadêmicos significavam
degraus de ascensão social, despertando o interesse de pessoas mestiças, ocasionando o
movimento dos moços pardos, de 1688 .
92
Naquela ocasião, o colégio recusou a admissão de
moços pardos, considerados demasiado irrequietos e numerosos. Como, em Coimbra e Évora,
todos pudessem cursar as universidades, recorreram, eles, ao rei e D. Pedro II, em 09 de
fevereiro de 1689, mandou que fossem admitidos, pois se tratava de escola pública, mantida
pela Coroa.
Os jesuítas permaneceram à frente do ensino ainda no século XVIII, muito embora
sofressem fortes críticas por parte do pensamento laico, que “denunciava o dogmatismo da
escolástica decadente”.
93
Com a Reforma Pombalina e o desmantelamento da Companhia de Jesus, a educação
no Brasil sofreu ainda mais o impacto da ausência de medidas educacionais aplicáveis à
colônia, uma vez que a estrutura da Companhia de Jesus foi extinta, foram fechados os
estabelecimentos de ensino, livros foram queimados sem que ocorresse nenhuma substituição,
ficando o Brasil ainda mais, se é possível dizer, órfão de atuação na área de uma organização
legislativa educacional.
91
Maria Lúcia de Arruda Aranha. História da educação, p. 115.
92
Ibidem,, p. 115.
93
Ibidem, p. 125.
.
56
Segundo o magistério de Maria Lúcia de Arruda Aranha, apenas dez anos depois, o
Marquês de Pombal iniciou a reconstrução do ensino, provocando o retrocesso de todo o
sistema educacional: “várias medidas desconexas e fragmentadas antecedem as primeiras
providências mais efetivas, levadas a efeito a partir de 1772, com a implantação do ensino
público oficial. A coroa nomeia professores e estabelece plano de estudo e inspeção”.
94
O ensino sofreu forte centralização; os professores eram mal pagos e proliferavam as
reclamações a respeito da deficiência de ensino, ministrado sem uniformidade e de forma
fragmentada: a centralização dificultava sobremaneira qualquer espécie de controle e
fiscalização, em relação à efetiva ocorrência das aulas.
Em Portugal, a nova direção, a Ordem do Oratório, encarregada de oferecer novas
bases e novos fundamentos ao pensamento pedagógico, bem como às estruturas mestras do
ensino, agora com visão mais alargada, pois abraçava as ideias iluministas, assumiu suas
atribuições, sem grandes preocupações com as colônias portuguesas.
A despeito desse quadro negativo, não é possível deixar de reconhecer que a Colônia,
indiretamente, se beneficiou da reforma universitária portuguesa de 1772, pois lá foram
formados os filhos de brasileiros abastados e de portugueses que vieram para o Brasil e,
assim, surgiu, em 1724, a Academia Brasílica dos Esquecidos; em 1752, a Academia dos
Seletos e, em 1759, a Academia Brasílica dos Renascidos.
Sobre as reformas pombalinas no Brasil, ensina Saviani: “no Brasil, o processo de
implantação das reformas pombalinas iniciou-se logo após a aprovação do alvará de 1759
com os concursos realizados na Bahia para as cadeiras de latim e retórica e a nomeação dos
primeiros professores régios de Pernambuco”.
95
A Inconfidência Mineira, com todas as suas motivações, é exemplo vivo de
movimento que agrega intelectuais portugueses e brasileiros e não deixa de constituir forte
94
História da educação, p. 205.
95
Mas o desenvolvimento das aulas régias deu-se em ritmo lento, pelas resistências encontradas
e pela falta de recursos financeiros. Após a criação do subsídio literário, em 1772, recebeu um
novo impulso, mas foi no reinado de D Maria I que os números previstos no plano de
distribuição das aulas elaborado pela Real Mesa Censória e anexado à Lei de 6 de novembro
de 1772 foram ultrapassados. Pode-se conjecturar que isso se deveu a duas razões básicas. De
um lado o caráter mais qualitativo do que quantitativo que marcou as reformas pombalinas.
Estas tinham por objetivo criar a escola útil aos fins do Estado em substituição aquela que
servia aos fins eclesiásticos. Na visão de Ribeiro Sanches, um dos próceres da reforma,
tratava-se de instituir umas poucas escolas bem aparelhadas e voltadas para setores
estratégicos, antes que multiplicar o seu número. De outro lado, no reinado de Dona Maria
ocorreu, de algum modo, um retorno dos religiosos ao magistério, como professores de aulas
régias. (História das ideias pedagógicas no Brasil, p. 107).
57
indício de questionamento, por esses intelectuais, do status quo. Por essa época surgem os
grandes vultos da Inconfidência, que também influenciam com a sua poesia e prosa. São
exemplos, Cláudio Manoel da Costa, brasileiro, e Tomás Antônio Gonzaga, português a
serviço da Coroa.
Após a proclamação da Independência, em 1822, eram necessárias, como primeiro
passo, a elaboração e promulgação de uma Constituição. A Assembleia Constituinte foi
convocada pelo Decreto baixado em 3 de junho de 1823.
No seu discurso, D. Pedro I destacou a necessidade de legislar sobre educação e
instrução pública, e a Comissão de Instrução Pública da Assembleia Nacional Constituinte e
Legislativa criou um prêmio para quem apresentasse a melhor proposta. Esta foi a versão
preliminar apresentada na sessão de 4 de junho de 1823:
Será reputado benemérito da pátria e como tal condecorado com a Ordem
Imperial do Cruzeiro, ou nela adiantado se a tiver, aquele cidadão que até
o fim do corrente ano apresentar à Assembleia melhor tratado de educação
física, moral e intelectual para a mocidade brasileira.
Uma comissão composta de sete cidadãos de conhecida literatura e
patriotismo, nomeados pela Assembleia, decidirá qual dos tratados
oferecidos merece a preferência.
Não havendo concorrência e aparecendo um tratado, ainda assim
verificar-se-á o prêmio determinado pelo parágrafo primeiro se a comissão o
julgar digno de ser impresso.
96
Saviani ressalta que a existência da discussão é, por si só, indicativa da importância
dada ao tema,
97
pois havia a intenção de organizar um sistema de escolas públicas, segundo
um plano comum a ser implantado em todo o território nacional.
Esse plano fez ressurgirem estudos de autoria de Martin Francisco Ribeiro D’Andrada
Machado, anteriormente apresentados à Capitania de São Paulo em 1816 e fortemente
influenciados por Condorcet, alterados para adaptá-los ao Império nascente.
98
A Assembleia Constituinte foi, todavia, dissolvida, e a Memória de Martin Francisco e
o Projeto de Estímulo ao Tratado Completo de Educação da Mocidade Brasileira foram
deixados de lado, antes mesmo da dissolução da Assembléia, por D. Pedro I, concentrando-se,
aquela, no projeto de criação das universidades brasileiras, que, depois de acalorados debates,
foi aprovado em 4 de novembro:
96
Annaes, 182ª, p.80, apud Demerval Saviani, História das ideias pedagógicas no Brasil, p 119.
97
Ibidem, p.120-123.
98
Condorcet concebe cinco memórias para a instrução pública. Primeira: natureza e objeto da
instrução pública; segunda memória: da instrução comum para as crianças; terceira memória:
sobre a instrução comum para os homens; quarta memória: sobre a instrução relativa às
profissões; quinta memória: sobre a instrução relativa às ciências. (Cinco memórias sobre a
instrução pública, p. 17-261).
58
Haverá duas universidades, uma na cidade de São Paulo e outra na de
Olinda, facultando-se a cada uma das províncias, a fundação de iguais
estabelecimentos dentro de si, logo que os seus respectivos habitantes
ofereçam para si os fundos;
Estatutos próprios regularão o número de professores, a ordem e o
arranjamento dos estudos;
3º Em tempo competente se designarão os fundos precisos a ambos os
estabelecimentos, fornecidas as despesas pela Fazenda Nacional;
Entretanto haverá desde dois cursos jurídicos, um na cidade de São
Paulo e outro na cidade de Olinda, para os quais o governo nomeará mestres
idôneos, os quais se governarão provisoriamente pelos estatutos da
Universidade de Coimbra, com aquelas alterações e mudanças que eles em
mesa presidida pelo vice-reitor, julgarem adequadas às circunstâncias e luzes
do século.
Sua Majestade, o Imperador escolherá dentre os mestres um para
servir interinamente de vice-reitor.
Esse projeto também não chegou a ser concretizado e foi definitivamente afastado em
12 de novembro de 1823, quando D. Pedro I dissolveu a Assembleia Nacional Constituinte.
Em 25 de março de 1824, foi outorgada a primeira Constituição que, apesar de
inaugurar o Império do Brasil, perdeu a grande oportunidade de estruturar um sistema
educacional em melhores bases, e, segundo a observação de Saviani, em sintonia com as
normas modernas adotadas em outros países.
99
A matéria, segundo os termos da Carta Imperial, era tema da alçada do Poder
Moderador, tratado no Título 5, sob a denominação “Do Imperador”. No capítulo I, o artigo
98 preceituava:
O Poder Moderador é a chave de toda organização política, e é delegado
privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação, e seu
Primeiro Representante, para que incessantemente vele sobre a manutenção
da Independência, equilíbrio e harmonia, dos demais poderes políticos.
A Constituição do Império, em suas Disposições Gerais, tratava da matéria
educacional em dois incisos. Ambos constam do artigo 179, sob o título Da inviolabilidade
dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros. Ali, no inciso XXXII, é possível
identificar que, na fase imperial, era garantida “a instrução primária, e gratuita a todos os
cidadãos”; já o inciso XXXIII afirmava que, nos colégios e universidades, serão ensinados os
elementos das ciências, belas letras e artes.
A Carta Imperial preocupava-se com a educação dos membros da família real e previa
a competência do Imperador para a escolha dos mestres dos príncipes, bem como a sua
nomeação, competindo à Assembleia designar os ordenados, que eram pagos pelo Tesouro
Nacional.
99
Demerval Saviani, História das ideias pedagógicas no Brasil, p. 123.
59
Expressamente, previa que na primeira sessão de cada Legislatura, “a Câmara dos
Deputados exigirá dos mestres uma conta do Estado do adiantamento dos seus Augustos
Discípulos”.
É notável, na Constituição de 1824, o seu artigo 81: “compete ao Presidente da
Província a atribuição para instruir, a cada instalação do Conselho Geral, ao Presidente para
providências com relação aos negócios públicos e de medidas necessárias ao seu
aprimoramento”.
Por certo a educação local inseria-se no rol dos negócios públicos. Atribuia, ainda,
competência ao Conselho para “propor, discutir e deliberar sobre os negócios mais
interessantes das suas províncias; traçar a possibilidade de projetos peculiares, e acomodados
às suas peculiaridades e urgências”.
100
Todavia, existia forte centralização de todos os negócios em torno da pessoa do
Imperador que, com isso, procurava afastar a repartição de competências, a qual poderia
significar forte abalo ao absolutismo e fragilização do Estado Imperial.
A disciplina por lei da instrução pública e a descentralização viriam com a primeira lei
geral de ensino, de 15 de outubro de 1827, que, em seu artigo 1º, determinava que as escolas
de primeiras letras deveriam ensinar, para os meninos, a leitura, a escrita, as quatro operações
de cálculo e as noções mais gerais de geometria prática.
A lei excluía as mulheres do aprendizado da geometria prática. Aprenderiam, elas, as
prendas para a economia doméstica.
Uma análise mais acurada do problema leva-nos a constatar que os mesmos objetivos
e as mesmas finalidades, perseguidos pela Lei de 1827, são os abraçados atualmente, o que
vem corroborar a nossa assertiva de que, neste país, praticamente nada se realizou nos
assuntos de educação. Ao pesquisarmos o passado, constatamos que caminhamos para trás.
Houve, de fato, retrocesso no aspecto educação, se é que assim podemos nos manifestar ao
investigarmos os objetivos estabelecidos na Lei Imperial de 1827, confrontando-os com
aqueles previstos na atual Lei Geral da Educação Nacional, Lei de Diretrizes e Bases da
Educação, n. 9.394/1996.
Pela lei de 1827, procurou-se promover a descentralização do ensino com a
transferência de competências e atribuições aos Presidentes das Províncias que, em Conselho
e com audiência das respectivas Câmaras, enquanto não fossem constituídos os Conselhos
Gerais, deveriam marcar número e localidades das escolas, bem como extinguir aquelas
100
Alexandre Sanches Cunha .Todas as Constituições Brasileiras. Campinas: Bookseller,
2001, p. 17-18.
60
estabelecidas em lugares menos populosos, removendo os professores para as que fossem, a
partir daí, criadas.
O artigo da referida lei causa surpresa até mesmo nos dias atuais, pois demonstra
maior sensibilidade e efetiva preocupação com a remuneração dos professores; procura traçar
a política de pagamento, submetendo o ato de aprovação da remuneração à Assembleia Geral.
Em homenagem a essa primeira lei geral do Império, de 15 de outubro de 1827, foi
criado, pelo Decreto Federal n. 52.682, de 1963, o Dia do Professor, que seria, a partir daí,
comemorado naquela data.
Autores, como Maria Lucia de Arruda Aranha,
101
noticiam o fracasso da lei, por várias
razões. Segundo informa, o golpe de misericórdia, que prejudicou de vez a educação, veio
com o Ato Adicional de 1834, que promoveu a reforma constitucional e descentralizou ainda
mais o ensino, atribuindo à Coroa a função de promover e orientar o ensino superior,
deixando às Províncias a tarefa de organizar, orientar e gerir a educação elementar e a
secundária.
Com a cisão, ficou estabelecida de vez a separação entre a educação superior e a
educação elementar e secundária, promovendo visão fragmentada dos assuntos atinentes à
educação e impedindo, com essa divisão, que houvesse um conhecimento e uma visão
sistêmica da educação, a mais importante função do Estado e, talvez, resida, aí, o nascimento
do grande equívoco histórico nacional, presente no pensamento político-educacional e
permanente amesmo na mídia até os nossos dias, de que há de se fazer uma escolha entre
educação superior e educação básica.
As províncias desempenharam mal o seu papel e, em razão do grande despreparo, leis
e decretos tornaram-se ineficazes em curto prazo. Sem controle eficiente das ações
administrativas, dificultadas pela grande extensão territorial, prosseguimos e atravessamos
anos e séculos marcando, com o nosso abandono, a educação nacional.
Mônica Sifuentes informa:
Em linhas gerais, o sistema educacional brasileiro, a partir da
descentralização estabelecida pelo Ato Adicional de 1834, evoluiu no
sentido de um crescente centralismo, que se consubstanciou, na terceira
década do século passado, na criação do Ministério da Educação e Saúde.
Desde então a situação do ensino não sofreu grandes modificações, nem
mesmo depois da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional de 1961, que se limitou a regulamentar, com algumas inovações, o
sistema em vigor no país da época.
102
101
História da educação, p. 153
.
102
Direito fundamental à educação, p. 118.
61
Projetos de reforma foram elaborados pelos então Ministros Paulino de Souza e João
Alfredo. Pretendiam que a gratuidade da instrução primária, prevista na Constituição de 1824,
permanecesse, bem como a obrigatoriedade do ensino para as crianças dos 7 aos 14 anos de
idade, determinada na reforma de 1834.
Preconizava-se a necessidade de escolas, que atendessem à demanda e possibilitassem
a efetividade e realização dos preceitos constitucionais de 1824 em relação à educação.
Constam propostas de construção de novas escolas e investimentos na formação de
professores como medidas e políticas aptas a favorecer a instrução no Brasil.
O Ministro João Alfredo defendia a liberdade de ensino. Segundo sua proposta, a
pessoa que se dedicasse ao ensino deveria apenas dar provas da sua moralidade.
Lourdes Margareth Calvi e Maria Cristina Gomes Machado, ao discorrerem sobre os
Projetos de Reforma Educacional e os Relatórios Ministeriais de 1868 a 1879 no Brasil,
afirmam que a precariedade da instrução primária fazia com que os ministros propusessem
também mudanças na inspeção escolar.
103
Em 11 de agosto de 1827, foram criadas as faculdades de direito. Porém, Adriano de
Assis Ferreira
104
noticia que, em 1859, quando D. Pedro II visitou a Universidade do Recife,
estupefato, teria recomendado expressamente às autoridades locais que jamais a mostrassem a
estrangeiros. Não queria que levassem de nosso país uma impressão desabonadora. Comenta,
o autor, que o Presidente da Província, indo além, recomendava que nem mesmo aos
brasileiros se mostrasse o prédio da Faculdade de Direito.
Esclarece que, em todo o século XIX, o governo imperial se deparou com críticas
públicas relativamente ao baixo nível e à má qualidade do ensino praticado nas Universidades
de São Paulo e do Recife.
A Reforma Leôncio de Carvalho ou Reforma Ensino Livre foi levada a efeito em um
dos períodos mais difíceis da história do Brasil, pois as pressões existiam e provinham de
todos os lados em razão do problema angustiante da escravidão e da premência de sua
abolição. Eclodiam debates e evidenciava-se a necessidade de educação pública que pudesse
ofertar conhecimentos e preparar a mão-de-obra trabalhadora, para estágios posteriores à
abolição.
Após uma explanação geral a respeito da situação da instrução pública, o texto da
Reforma Leôncio de Carvalho prioriza a liberdade de ensino, a obrigatoriedade da instrução
103
A reforma do ensino livre. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina>. Acesso em: 4
nov. 2008.
104
Ibidem.
62
primária e, em especial, o programa das escolas primárias de 1º e 2º graus, as caixas escolares,
a criação de museus escolares e bibliotecas, a construção de escolas, as escolas ambulantes, a
alfabetização de adultos, a formação de professores e as conferências pedagógicas.
A Reforma Leôncio de Carvalho, regulamentada pelo Decreto n. 7.247, de 1879,
estabelecia, em seu artigo 1º, ser “completamente livre o ensino primário e o secundário no
município da Corte e o superior em todo o Império, salvo a inspeção necessária para garantir
as condições de moralidade e higiene.”
Foi, de fato, uma reforma significativa, a do ensino livre, até mesmo pela abrangência
de assuntos tratados. Entretanto, ao disciplinar o ensino superior, admitiu a prestação de
exame a qualquer pessoa que o requeresse, sem exigência de frequência, uma vez que,
segundo o parágrafo do artigo 20, não eram marcadas faltas aos alunos e, tampouco, eram
chamados a lições e sabatinas.
A reforma suspendia, assim, a frequência obrigatória dos alunos aos estabelecimentos
de instrução superior; autorizava a associação de particulares para o ensino de disciplinas
ministradas nos cursos superiores oficiais; autorizava as faculdades livres, mantidas por
associações de particulares, após sete anos consecutivos de funcionamento, a se
regularizarem; introduzia os exames livres para as matérias ensinadas nas faculdades ou
escolas dependentes do Ministério do Império, defendia a liberdade de credo religioso, criava
as escolas normais, criava os cursos livres, em faculdades do Estado, referentes a disciplinas
ali oferecidas por professores particulares e, com mérito, propunha, tarde, o fim da
proibição da matrícula de escravos.
Vale destacar que o fato de estar praticamente dispensada a frequência dos alunos
motivou grande preocupação entre os senadores do Império, pois, meses após a reforma, as
universidades e faculdades estavam desertas.
105
Maria Lucia de Arruda Aranha
106
diz que, em 1882, o Conselheiro Rodolfo Dantas
apresentou, ao Parlamento, um projeto de reforma, que nem chegou a ser discutido, mas foi
estudado por uma comissão especialmente nomeada, tendo Rui Barbosa como relator.
O documento, que ficou famoso pela sua erudição e eloquência, faz uma análise da
educação em países mais adiantados, redundando, porém, em um plano ideal e teórico, porque
distante da realidade brasileira.
105
Larissa Camacho Carvalho. Rui Barbosa e a Reforma do Ensino Primário. Disponível em:
<http://www.seer.furg.br/ojs/index.php/dbh/article/viewRST/418/102. Acesso em: 26 mar. 2009.
106
História da educação, p. 156.
63
Na verdade, a Reforma do Ensino Primário, de autoria de Rui Barbosa, é, de fato,
interessante e a primeira ideia defendida é a liberdade de modelos de ensino, afirmando ser
esta uma das primeiras liberdades humanas. Critica o fato de o Estado estabelecer cultos no
ensino, porque isso perpetua a intolerância, e arremata que: “exercida ontem pela Inquisição
em nome da infalibilidade da Igreja, sê-lo-á amanhã pelo materialismo pela invocação da
certeza científica”.
107
Rui Barbosa defendeu, com veemência, o ensino obrigatório e afirmou, com
conhecimento de causa, que:
Obrigar à instrução elementar é necessidade e justiça. Necessidade porque a
sociedade humana carece imprescindivelmente de que a inteligência dos seus
membros preencha, ao menos, as suas funções rudimentares, as quais sem
certas bases de instrução não podem atingir o estado normal. Justiça, porque
a paternidade não pode justificar a sua soberania, até ao ponto de condenar a
prole indefesa ao estado mentalmente embrionário da ignorância absoluta.
108
Rui Barbosa justificou amplamente a obrigatoriedade do ensino. Estimulou a
concorrência entre as escolas do Estado e os institutos particulares. Abordou o tema da
inspeção de moralidade e questionou as condições da boa moral escolar. Comentou questões
de salubridade nas escolas e, também, questões de controle e fiscalização.
O trabalho de Rui Barbosa é criticado. Todavia, seu Relatório, tido por muitos como
idealista, sem dúvida constituiu o melhor e o mais lúcido trabalho que tivemos até então.
Dinorá Adelaide Musetti Grotti, Francisco Sant’ana de Lima Rodrigues, Helena de
Campos Malachias, Maria Miranda e Nelson Corrêa Barbosa, escrevendo sobre a educação no
Primeiro Período, assim denominado pelos autores o lapso temporal entre 1500 e 1930, em
trabalho não publicado, afirmam:
Podemos analisar a política educacional do primeiro período à luz da
organização econômica e da especificidade da formação do povo brasileiro.
A organização econômica da produção predominantemente agrária destinada
à exportação para as metrópoles, fundamentava-se no modelo
agroexportador implantado na época da colônia. Havendo perdurado esse
modelo, até a crise do café, gerada pela crise econômica mundial em 1929,
dependente das oscilações do mercado dos países de economia
Pregemônica.
109
Os autores ressaltam que, no período, uma política de educação estatal era quase
inexistente, ressalvado o sistema desenvolvido pelos jesuítas, cumprindo uma série de
funções, também importantes para a coroa portuguesa. E destacam:
108
Reforma do ensino primário e várias instituições complementares de instrução pública,
1883, apud A política educacional brasileira. São Paulo, 1983, p. 3. Mimeo.
109
A política educacional brasileira, p. 5.
64
Os fatores que favoreceram essa ação educativa foram de um lado a
organização social fundada na grande propriedade e na mão de obra escrava
favorecendo o aparecimento da unidade básica do sistema de produção, de
vida social e do sistema de poder. Era, portanto, a um grupo limitado de
pessoas pertencentes à classe dominante que estava destinada a educação
escolarizada ficando excluídas dessa minoria as mulheres e os filhos
primogênitos, aos quais se reserva a direção futura dos negócios paternos,
estes recebiam, apenas, uma rudimentar educação escolar, e a preparação
para assumir a direção do clã, da família e dos negócios, no futuro. E, por
outro lado, o conteúdo cultural que foi transportado para a colônia, através
da formação dos padres jesuítas, conteúdo esse que era a materialização do
espírito da Contra-Reforma, caracterizado por uma enérgica reação ao
espírito crítico que surgia na Europa contra as formas dogmáticas do
pensamento medieval. Adotavam portanto filosofias e métodos que viessem
revalorizar a escolástica e reafirmar a autoridade da igreja, da família e do
Estado. Tinham como finalidade robustecer a memória e capacitar o
raciocínio para fazer comentários de textos. Apresentando um desinteresse
pela ciência e pelas atividades técnicas e artísticas destinavam-se a formar
letrados eruditos, o que caracterizava a educação modelada pela metrópole
que se manteve irredutível ao espírito crítico, a análise e pesquisa e a
experimentação.
110
4.1 A Constituição Republicana de 1891 e as normas educacionais na Primeira
República
Segundo José Maria Bello,
111
em 3 de dezembro de 1889, ou seja, 18 dias após a
Proclamação da República, o Governo Provisório nomeou uma comissão de cinco juristas
para elaborar o projeto de Constituição Republicana e, em 21 do mesmo mês, convocou a
Assembléia Constituinte. Daquela comissão, presidida por Saldanha Marinho, signatário do
Manifesto de 1870 e acatado como o patriarca da República, resultaram três anteprojetos
Américo Brasilense, Santos Werneck-Rangel Pestana e J. A. Magalhães Castro, fundidos,
afinal, em um único. Entregue a Rui Barbosa para revisão, não se limitou este a polir-lhe a
forma; alterou-lhe muitas vezes a substância.
A República, proclamada na manhã de 15 de novembro de 1889, organizou a
educação, adotando em suas escolas o modelo positivista de Augusto Comte que, fortemente,
influenciou Benjamim Constant.
O Projeto de Constituição, quase todo revisto por Ruy Barbosa em menos de 30 dias,
abraçava a crença de que uma Constituição é a miniatura política da fisionomia de uma
110
A política educacional brasileira, p. 6.
111
História da República. 8. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1983, p. 68.
65
nacionalidade” e de que “educação do povo é o primeiro elemento de ordem, a mais decisiva
condição de superioridade militar e a maior de todas as forças produtoras.
112
Veio a lume em 24 de fevereiro de 1891, pelos representantes do povo brasileiro,
reunidos em Congresso Constituinte e estabelecia, na Seção II, sob o título “Declaração de
Direitos”, artigo 72, parágrafo 6º: Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos
públicos.
Previa, em seu artigo 35, que:
Incumbe ao Congresso, mas não privativamente:
[...]
Parágrafo 3º – Criar instituições de ensino superior e secundário nos Estados.
Parágrafo 4º – Prover á instrução secundária nos Estados.
Parágrafo 5º – Prover a instrução secundária no Distrito Federal.
A educação, na República, sofreu grande influência positivista e abriu-se para a
reforma de Benjamim Constant, que surgiu com o Decreto n. 981, de 8 de novembro de 1890,
tendo por princípios a liberdade, a laicidade do ensino, a gratuidade das escolas primárias,
objetivava uma formação educativa.
Na reforma de Benjamin Constant, o Colégio Pedro II passou a chamar-se Ginásio
Nacional e a ministrar o ensino secundário. Solange Aparecida Zotti afirma que essa reforma
buscou a reconciliação do humanismo com o enciclopedismo.
113
A intenção, abraçada na reforma levada a efeito por Benjamin Constant, era de
transformar o ensino em formador de alunos para os cursos superiores, e, não, apenas
preparador, substituindo a predominância literária pela científica.
Sob os princípios positivistas da reforma de Benjamin Constant, seguiu, a educação,
debaixo de fortes críticas. De um lado, os positivistas entendiam haver distorção da sua
filosofia, na forma como era tratado o assunto. De outro lado, os opositores do modelo,
proposto por Benjamim Constant, entendiam que, a par do aumento do número de disciplinas
ministradas, teria havido efetivos prejuízos à literatura e à filosofia, tornando o estudo muito
mais enciclopédico.
112
Larissa Camacho Carvalho. Rui Barbosa e a reforma do ensino primário. Disponível em:
<http://www.seer.furg.br/ojs/index.php/dbh/article/viewRST/418/102. Acesso em: 26 mar.
2009.
113
Solange Aparecida Zotti. O currículo do ensino secundário e a formação das elites
republicanas. Disponível em:
<http://www.anpuh.uepg.br/xxiiisimposio/anais/textos/SOLANGE%20APARECIDA%20ZO
TTI.pdf>. Acesso em: 04 jan. 2009, p. 3.
66
José Maria Bello afirma que “desde a independência, o Brasil tenta descobrir o seu destino ou
o sentido da sua vida; fartando-se depressa das experiências iniciadas entre entusiasmos ruidosos e
messianismos ingênuos, entrega-se facilmente a novas tentativas [...]”.
114
Na área da educação, os problemas seguem, sempre, no sentido do agravamento, do
recrudescimento e, em 1900, os índices de analfabetismo superavam 75% da população
nacional.
E é Solange Aparecida Zotti quem noticia que, na prática, a reforma de Constant não
se efetivou, pois foi descaracterizada por inúmeras sub-reformas.Com base nessas sub-
reformas, foi editado o Código Epitácio Pessoa (Decreto n. 3.890, de de janeiro de 1901),
que, entre outros pontos, buscou a uniformização do ensino secundário, estabelecendo
requisitos para a equiparação de todas as escolas do Brasil ao Ginásio Nacional. Propôs a
manutenção dos exames de madureza e o seu objetivo maior era o preparo para os cursos
superiores. Retiraram-se do regulamento menções à função formativa do ensino, exaltada na
reforma de Benjamin Constant.
115
O Código Epitácio Pessoa incluiu a lógica entre as matérias curriculares, excluindo a
biologia, a sociologia e a moral. A educação prosseguiu totalmente desorganizada e acessível
apenas a um pequeno grupo de ilustres cidadãos, a maioria educada nas melhores escolas
europeias.
Essa reforma, duramente criticada, segundo Bello, foi a razão da demissão de Epitácio
Pessoa, operoso Ministro da Justiça de Campos Salles, por divergências com o próprio
Presidente que o havia nomeado. Posteriormente, contudo, foi novamente nomeado, pelo
próprio Campos Salles, Ministro do Supremo Tribunal Federal.
Rivadávia Correa que, em 1910, havia feito sérias críticas à educação no Brasil,
acabou provocando o surgimento da Reforma Rivadávia Correa de 1911. Pretendeu que o
curso secundário se tornasse formador de cidadãos, numa tentativa de mudar a ideia geral da
época, de um curso com a função de constituir-se, exclusivamente, em intermediário e
promotor para o curso seguinte. Essa reforma retomou a anterior concepção positivista;
pregou a liberdade de ensino por instituições não oficiais. Preconizou a substituição do
diploma por certificado de assistência e aproveitamento e transferiu os testes de admissão às
universidades para o ensino superior.
Posteriormente, para substituir a Reforma Rivadávia Correa, surgiu, em 1915, a
reforma de Carlos Maximiliano, a qual, para muitos, deixou a desejar.
114
História da República, p. 1.
115
O currículo do ensino secundário e a formação das elites republicanas, p. 4.
67
Esta reforma autorizou a organização de uma Universidade Federal, constituída de
Faculdade de Medicina, de Escola Politécnica, das duas Faculdades Livres de Direito do Rio
de Janeiro, universidade, essa, que apenas veio a ser criada em 1920, no governo do
Presidente Epitácio Pessoa.
Surgiu, com a edição do Decreto n. 16.782, de 13 de janeiro de 1925, a Reforma Luiz
Alves, que se caracteriza por ser a última da denominada Primeira República. E surgiu em um
contexto de transição, com grandes transformações sociais impostas pela Revolução
Industrial, que sinaliza a necessidade de mão-de-obra para a indústria. na exposição de
motivos, enfatizou que “o ensino secundário deve ser encarado como um preparo fundamental
e geral para a vida, qualquer que seja a profissão a que se dedicar o indivíduo.”
Esta reforma introduziu a disciplina Moral e Cívica no currículo escolar, já no governo
Arthur Bernardes.
Enfim, como bem assinala Bello:
Implantara-se a República em contagioso entusiasmo pelo progresso
material, como reação à estagnação da Monarquia. vimos como o seu
Governo Provisório tentou precipitar o desenvolvimento industrial por todos
os métodos e artifícios possíveis: protecionismo alfandegário, emissões do
Tesouro, inflação do crédito etc., para tudo terminar no ruidoso desastre do
encilhamento. O governo de Floriano Peixoto, lutando contra as revoluções,
e o de Prudente de Moraes, pela restauração da ordem civil, mal podiam
elevar dos expedientes ocasionais, que lhes permitiam o funcionamento da
máquina administrativa e o serviço da dívida externa que, na época, a tudo se
sobrepunha. A áspera política inflacionista de Campos Sales conseguira
enfim por ordem nas finanças públicas. O governo de Rodrigues Alves
soube aproveitar-se com inteligência e perfeito prumo das condições
propícias que lhe foram transmitidas.
116
E arremata Bello:
Como da história política do Segundo Reinado pudera dizer Joaquim
Nabuco que se resumira na formação e queda de gabinetes, dela (da
República) se poderia escrever que se sintetizaria na substituição periódica
dos chefes de seu governo, problema supremo, causa frequente de ameaças e
inquietações. Vida um pouco sem história, parecendo mais de crônica, pela
ausência quase completa de ideias, monotonia da repetição dos fatos,
revezamento dos mesmos homens e processos.
117
Desnecessário afirmar que a educação permaneceu sem progressos identificáveis,
continuando incipiente e com múltiplos erros, quase nenhum acerto e, certamente, merecendo
muito pouca ou, talvez, inadequada atenção dos homens públicos da época.
O Brasil caminhava a passos largos para a Revolução de 1930.
116
História da República, p. 292.
117
Ibidem, p. 293.
68
No Governo de Getúlio Vargas, foi criado o Ministério da Educação e Saúde, em
1930; elaborado um sistema nacional de ensino blico; promovidas reformas sociais,
surgindo, em 1934, a nova Constituição.
Escrevendo sobre esse período, esclarecem Dinorá Adelaide Musetti Grotti, Francisco
Sant’ana de Lima Rodrigues, Helena de Campos Malachias, Maria Miranda e Nelson Corrêa
Barbosa:
[...] A crise mundial de 1929 encaminha as mudanças estruturais que vão
caracterizar o modelo de substituição das importações, correspondente ao
segundo período que nos propusemos a analisar nessa retrospectiva histórica.
A consequente baixa dos preços do café fez com que capitais de
investimentos se deslocassem para outros setores produtivos passando
a ser esse modelo uma decorrência imediata da crise cafeeira
provocada pela crise mundial.
118
Esclarecem que a falta de divisas impôs a restrição da importação dos bens de
consumo, contribuindo todos esses fatores para o fortalecimento da produção industrial no
Brasil, principalmente concentrada na produção dos bens de consumo, antes importados. Essa
substituição das importações deu origem ao surgimento de uma nova burguesia urbano-
industrial, em virtude de haver produzido uma diversificação da produção e “[...] Essas
mudanças levaram a uma reestruturação global do poder estatal, tanto na instância da
sociedade política como da sociedade civil”.
119
4.2 Constituição de 1934 e a Educação
É interessante anotar que a Constituição de 1934 foi promulgada por Assembleia
Constituinte instalada pelo Governo Provisório, após a Revolução Constitucionalista de 1932
e sob o comando de Getúlio Vargas, que o fez sob intensa pressão dos paulistas e dos
acontecimentos de 1932.
Bello afirma que:
Processaram-se em paz as eleições para a Constituinte instalada em
novembro e que, no ano imediato, dava ao Brasil a sua segunda Carta
política. A representação das classes foi a sua inovação. Traduzia ela uma
concepção de origem socialista, completando as funções dos sindicatos na
118
A política educacional brasileira, p. 9.
119
Ibidem, p. 10.
69
direção do Estado. Na democracia formal o Estado é uma estrutura
puramente política; da mesma natureza, pois, a sua representação.
120
Bello observa que, à época:
A representação política, mesmo que legítima, era incompleta. O indivíduo
pertence a uma classe, a uma profissão de específicos interesses econômicos.
Á representação de classes, aliaria, assim, o econômico ao político [...] Os
constituintes de 1934, não ousando ir até o corporativismo integral do
fascismo, e tampouco repetir a experiência, aliás fracassada da República
Alemã de Weimar, a de duas câmaras distintas, a política e a econômica
confundiu-as no mesmo ramo do Poder legislativo... Destarte, aos 250
políticos somaram-se 50 representantes de classes eleitos pelos sufrágios
diretos das associações profissionais.
A Constituição de 1934, embora de duração efêmera, conservava a estrutura
federalista, incorporada na Constituição de 1891, o sistema de governo era
Presidencialista, mas trazia certo controle aos atos presidenciais e procurava
instituir um federalismo de equilíbrio. A despeito de uma certa confusão, de
certa forma natural pelos embates de forças sociais, recebe encômios pela
intensidade de ideias democráticos e sociais que surgiram sob a inspiração
das ideias provindas de uma Europa pós guerra e sob as luzes da
Constituição de Weimar de 1919, bem como da Constituição Mexicana.
121
Sobre o tema educação, preceituava o artigo 149 da Constituição de 1934:
A educação é direito de todos e deve ser ministrada pela família e pelos
poderes públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a brasileiros e
estrangeiros domiciliados no País, de modo que possibilite eficientes fatores
da vida moral e econômica da Nação, e desenvolva num espírito brasileiro a
consciência da solidariedade humana.
É interessante notar que esta Constituição foi influenciada pelo Manifesto dos
Pioneiros da Educação Nova, cujos signatários, desde 1930, sonhavam com um Plano
Nacional de Educação e, em 1932, lançaram o movimento em âmbito nacional com muita
repercussão, significando grande vitória, desse grupo, a inclusão, no artigo 150, alínea “a”, da
Constituição de 1934, da competência da União para criar o Plano Nacional de Educação.
Esse plano abrangia todos os graus e ramos de ensino, comuns e, também,
especializados e estabelecia a competência para coordenar e fiscalizar a sua execução em todo
o território nacional.
A Constituição de 1934 foi a primeira a vincular percentual de recursos federais, a
serem aplicados na educação.
Em 11 de abril de 1931, havia sido criado o Conselho Nacional de Educação, nos
termos do Decreto n. 19.850. Na mesma data, fora editado o Decreto n. 19.851, disciplinando
a atuação das universidades brasileiras - Estatuto das Universidades Brasileiras. Em 18 de
120
História da República, p. 309.
121
História da República, p. 310.
70
abril de 1931, o Decreto n. 19.890 dispusera sobre a organização do ensino secundário e, em
30 de junho de 1931, o Decreto n. 20.158, organizara o ensino comercial.
Por força da Lei n. 174, de 06 de janeiro de 1936, o Conselho Nacional de Educação
foi reorganizado, passando a ser órgão colaborador do Executivo, competindo-lhe o preparo
de projetos de lei e aplicação da legislação de ensino, além do exercício de atividade
consultiva dos poderes federal e estadual, na área de educação e cultura.
Dinorá Adelaide Musetti Grotti acrescenta: “podemos afirmar que esse período
caracterizou-se pela coexistência contraditória, e às vezes abertamente conflitiva, de uma
tendência populista e de uma tendência antipopulista”.
122
4.3 A Educação na Constituição de 1937
Trata-se de constituição outorgada em uma época de exceção e que sobreviveu em
uma fase difícil, posterior ao golpe de Estado de 10 de novembro de 1937.
Por sua inspiração na Constituição da Polônia, de 1935, ficou conhecida como
polaca” e, de fato, exacerbava os poderes presidenciais, ao atribuir, a Getúlio Vargas,
competências que, por natureza, pertenceriam ao Congresso Nacional.
Sob o título “Da Educação e da Cultura”, o artigo 128 da Constituição de 1937
estabelecia: “A arte, a ciência e o seu ensino são livres à iniciativa individual e à de
associações ou pessoas coletivas, públicas e particulares”. Afirmava o dever do Estado de
contribuir, direta e indiretamente, para o estímulo e desenvolvimento de umas e de outro,
favorecendo ou fundando instituições artísticas, científicas e de ensino.
Também constituía dever do Estado, segundo os termos do artigo 129, a educação da
infância e da juventude a que faltassem os recursos necessários. O texto previa a fundação de
instituições públicas de ensino em todos os seus graus, assegurando a todos a possibilidade de
receber educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais.
Estatuía que o ensino pré-vocacional e profissional das classes menos favorecidas era
o primeiro dever do Estado, prevendo, igualmente, a criação de institutos de ensino
profissional e subsidiando os de iniciativa dos Estados e Municípios e dos indivíduos ou
associações particulares e profissionais.
122
A política educacional brasileira, p. 15.
71
As escolas de aprendizagem, destinadas aos filhos de operários e associados, deveriam
ser criadas pelas indústrias e pelos sindicatos. A Constituição estatuía, ainda, que a lei
regularia o cumprimento desse dever e disporia sobre o papel do Estado nessa relação, bem
como de auxílios, facilidades e subsídios, a serem concedidos pelo Poder Público.
O ensino primário era obrigatório e gratuito, mas a gratuidade não excluía o dever de
solidariedade dos menos para com os mais necessitados. Assim, por ocasião da matrícula, era
exigida, aos que não alegassem ou que, notoriamente, não pudessem alegar escassez de
recursos, uma contribuição módica e mensal para a caixa escolar.
Eram obrigatórios a educação física, o ensino cívico e o de trabalhos manuais em
todas as escolas primárias, normais e secundárias, sendo necessárias a sua efetiva instalação e
desenvolvimento até para a obtenção de reconhecimento.
A Carta de 1937 aboliu, porém, a vinculação de recursos para exclusiva aplicação na
educação.
É curioso que essa Constituição, embora editada numa época de exceção, dedicasse
grande parcela da sua atenção à educação. Criava, para o Estado, o dever de fundar
instituições ou dar a elas proteção, ainda que fossem associações civis, mas que tivessem por
fim organizar para a juventude períodos de trabalho anual nos campos e oficinas, assim como
promover-lhe a disciplina moral e o adestramento físico, de maneira a prepará-la para o
cumprimento de seus deveres.
O ensino religioso poderia ser contemplado nas escolas primárias, normais e
secundárias, mas o poderia constituir objeto de obrigação dos mestres ou professores, nem,
tampouco, ser obrigatório.
A nação protegeria os monumentos históricos, artísticos e naturais, assim como
paisagens ou os locais particularmente dotados pela natureza. Qualquer atentado a esses bens
seria considerado atentado ao patrimônio nacional. A Constituição de 1937 dispunha que:
Art. 128. A arte, a ciência e o seu ensino são livres à iniciativa individual e a
de associações ou pessoas coletivas, públicas e particulares.
É dever de o Estado contribuir, direta e indiretamente, para o estímulo e
desenvolvimento de umas e de outro, favorecendo ou fundando instituições
artísticas, científicas e de ensino.
As ideias do Estado Novo, nos assuntos de educação e direito educacional, foram
abraçadas por Gustavo Capanema, ministro de Getúlio Vargas, entre os anos de 1934 e 1945.
Nesta fase da história da educação brasileira, foram criadas a Universidade do Brasil, atual
Universidade do Rio de Janeiro e a Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional,
bem como o Instituto do Livro.
72
Com forte personalidade política, ensina Karla Hansen,
123
o Ministro da Educação e
Saúde é a figura central do governo Getulio Vargas e, durante a sua gestão, efetivou-se a
reforma do ensino secundário e promoveu-se, sobremaneira, o ensino técnico
profissionalizante. Sempre cercado de intelectuais como Carlos Drummond de Andrade,
Mario de Andrade, Rodrigo Melo Franco e outros, Capanema tinha por objetivo modernizar a
educação, incentivar a pesquisa e redescobrir as raízes culturais brasileiras, metas nem sempre
alcançadas, devido ao alto grau de burocratização.
Sobre essa atuação ministerial e, especialmente, sobre a ação cultural do Ministro
Gustavo Capanema, transcrevemos:
Se a tarefa educativa visava, mais do que a transmissão de conhecimentos, à
formação de mentalidades, era natural que as atividades do ministério se
ramificassem por muitas outras esferas, além da simples reforma do sistema
escolar. Era necessário desenvolver alta cultura do país, sua arte, sua música,
suas letras; era necessário ter uma ação sobre os jovens e sobre as mulheres
que garantisse o compromisso dos primeiros com os valores da nação que se
construía, e o lugar das segundas na preservação de suas instituições básicas;
era preciso, finalmente, impedir que a nacionalidade, ainda em fase tão
incipiente de construção, fosse ameaçada por agentes abertos ou ocultos de
outras culturas, outras ideologias e nações.
124
Os autores afirmam que, no segundo governo Vargas, não se identificou o mesmo
fervor pela educação. Continuaram os problemas educacionais, tais como o analfabetismo,
muito embora fosse aquele o momento de surgimento de instituições como o Banco Nacional
de Desenvolvimento, atual BNDES, o Conselho Nacional de Pesquisa – CNPQ e a Campanha
Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CAPES, os quais, desde a
década de 1950, até os dias atuais, desempenham importantes funções no ensino pós-
graduado stricto sensu.
Hoje, no Brasil, segundo noticia Helena Bomeny,
125
existem mais de 1581 programas
de pós-graduação, com oferta de mais de 1549 para mestrado e 862 para doutorado.
Em âmbito infraconstitucional, podem-se apontar como principais medidas adotadas, a
partir da Constituição de 1937:
em 4 de maio de 1938, foi editado o Decreto n. 406, estabelecendo novos
currículos para o ensino primário;
em 18 de novembro de 1938, foi editado o Decreto n. 868, criando a
Comissão Nacional do Ensino Primário;
123
Gustavo Capanema: educação, saúde e cultura na Era Vargas. Disponível em:
<http://www.educacaopublica.rj.gov.br/biblioteca/educacao/0069_10.html>. Acesso em: 15 dez. 2008.
124
SCHWARTZMAN, Simon; BOMENY, Helena Maria; COSTA, Vanda Maria Ribeiro; Tempos de Capanema.
São Paulo: Paz e Terra, 2000, p. 97.
125
A educação no segundo Governo Vargas . Disponível em:
<http://www.cpdoc.fgv.br/nav_gv/htm/3E_ele_voltou/Cenário_educacional.asp>. Acesso em: 17 jul. 2008.
73
em 13 de dezembro de 1938, edita-se o Decreto n. 948 que determinava
medidas a serem tomadas para a nacionalização do ensino;
– em 22 de janeiro de 1942, foi editado o Decreto-lei 4.048, criando o
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI;
em30 de janeiro de 1942, foi editado o Decreto-lei 4.073, criando a Lei
Orgânica do Ensino Industrial;
– em 9 de abril de 1942, foi editado o Decreto-lei n. 4.244 – Lei Orgânica do
Ensino Secundário;
em 28 de fevereiro de 1943, foi editado o Decreto-lei n. 6.141, Lei
Orgânica do Ensino Comercial;
em 2 de janeiro de 1946, foi editado o Decreto-lei n. 8.529 Lei Orgânica
do Ensino Primário;
– em 2 de janeiro de 1946, foi editado o Decreto-lei 8.530 – Lei Orgânica do
Ensino Normal;
– em 10 de janeiro de 1946, foi editado o Decreto-lei 8.621, criando o
Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC;
em 20 de agosto de 1946, edita-se o Decreto-lei 9.613, Lei Orgânica do
Ensino Agrícola.
126
4.4 A Constituição de 1946
A Constituição de 1946 foi promulgada a 18 de setembro, por uma Assembléia, que
elegeu o Presidente da República, Eurico Gaspar Dutra, em 2 de dezembro de 1945.
Interessante observar que Dutra derrotou, na eleição, o Brigadeiro Eduardo Gomes,
após o interregno em que esteve à frente da Presidência da República o Ministro do Supremo
Tribunal Federal, José Linhares, magistrado de carreira que, na oportunidade constituiu um
ministério de emergência, alheio às atividades partidárias.
Como bem ressalta Bello: “pela sua própria natureza circunstancial, não podia o
governo Linhares formular definido programa de ação; a preservação da ordem interna, a
normalidade dos serviços administrativos, e, principalmente a garantia de eleições imparciais
resumiam-lhe a missão”.
127
Com o apoio do Partido Trabalhista e do próprio Getúlio Vargas, que desempenhou
papel decisivo ao recomendar o voto ao seu ex-ministro da guerra, venceu Eurico Gaspar
Dutra, com maioria absoluta de votos. Como ressalta Bello:
não houve eleição para a vice-presidência da República, inexistente no
regime de 1937, em cuja vigência fora convocado o pleito. A Constituição
de 1946, restabelecendo o cargo, atribui ao Congresso a faculdade de
126
Silvia Helena Andrade Brito. A educação no projeto nacionalista do primeiro governo Vargas (1930-1945)
Disponível em: <http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/referenciais_silvia%20A>. Acesso em: 11 nov.
2008.
127
História da República, p. 335
74
preenchê-lo por próprio voto para o prazo inicial, eleito para o cargo o
Senador Nereu Ramos, de Santa Catarina.
128
A Assembleia Constituinte possuía ilimitados poderes, não apenas por força das
disposições contidas na Lei Constitucional 13, de 12 de novembro de 1945, mas também
em razão de interpretação do Tribunal Superior Eleitoral.
A Carta de 1946, no título VI, sob a denominação Da família, da educação e da
Cultura”, de início parece abraçar a compreensão da importância de ações e esforços
concentrados de todos os segmentos sociais para a formação da pessoa humana. Envolve no
seu projeto a família, o Estado e as empresas e procura estabelecer princípios para o êxito
dessa ação educacional.
Ainda sob a impressão deixada pelo regime anterior, os constituintes de 1946,
anelando por liberdade e pela possibilidade de restaurá-la, evidenciam aspecto liberal no texto
constitucional, refletindo o processo de redemocratização do Brasil. Retornam à luta os
pioneiros da educação nova, com a defesa de valores expostos desde a Constituição de 1934.
O texto de 1946 trata da educação no capítulo II, sob o título “Da educação e da
cultura”, preceituando, no artigo 166: “A educação é direito de todos e será dada no lar e na
escola. Deve inspirar-se nos princípios de liberdade e nos ideias de solidariedade humana”.
Afirmava que o ensino dos diferentes ramos seria ministrado pelos poderes públicos,
sendo livre à iniciativa particular, respeitadas as leis que o regulassem.
É notável, na Constituição de 1946, a enumeração de princípios da legislação de
ensino, contidos no artigo 168, quais sejam:
Primeiro princípio O ensino primário é obrigatório e será dado na
língua nacional.
Segundo princípio O ensino primário oficial é gratuito para todos; o
ensino oficial ulterior ao primário sê-lo-á para quantos provarem falta ou
insuficiência de recursos.
Terceiro princípio As empresas industriais, comerciais e agrícolas, em
que trabalhem mais de cem pessoas, são obrigadas a manter ensino primário
gratuito para os seus servidores e os filhos destes.
Quarto princípio As empresas industriais e comerciais são obrigadas a
ministrar, em cooperação, aprendizagem aos seus trabalhadores menores,
pela forma que a lei estabelecer, respeitados os direitos dos professores.
Quinto princípio O ensino religioso constitui disciplina dos horários das
escolas oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado de acordo com a
confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz, ou pelo seu
representante legal ou responsável.
Sexto princípio Para o provimento das cátedras, nos ensinos secundário
oficial e no superior oficial ou livre, exigir-se-à concurso de títulos e provas.
Aos professores admitidos por concurso de títulos e provas será assegurada a
vitaliciedade.
128
Ibidem, p. 336.
75
Sétimo princípio – É garantida a liberdade de cátedra.
A Constituição de 1946 restabeleceu, no artigo 169, o “percentual a ser aplicado em
educação”. No dispositivo citado, existe a previsão de que a “União não deixará de aplicar
pelo menos 10% e os Estados, Distrito Federal e os Municípios nunca menos de 20% da renda
resultante dos impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino”.
Competia à União, nos termos do artigo 170 da CF 1946, a organização do sistema
federal de ensino, bem como a organização do ensino nos territórios, prevendo, o texto, que
esse sistema:
teria caráter supletivo, estendendo-se a todo país nos estritos limites das
deficiências locais. Competindo, aos Estados e ao Distrito Federal a
organização dos seus sistemas de ensino e para desenvolvimento desses
sistemas a União cooperaria com o auxílio pecuniário, o qual, em relação ao
ensino primário proviria do respectivo Fundo Nacional.
Estatuía, a Carta de 1946, que cada sistema de ensino teria, obrigatoriamente, serviços
de assistência educacional, que assegurassem aos alunos necessitados condições de eficiência
escolar e, no artigo 174, denunciando a sua tendência liberal, preceituava “As ciências, as
letras e as artes são livres”.
Assumia, como dever do Estado, o amparo à cultura e estabelecia a criação, por lei, de
institutos de pesquisas, de preferência, associados a estabelecimentos de ensino superior.
Por fim, colocava sob a proteção do Estado obras, monumentos e documentos de valor
histórico e artístico, bem como os monumentos naturais, as paisagens e os locais dotados de
particular beleza.
Também em 1946, são instituídos o Serviço Social da Indústria SESI e o Serviço
Social do Comércio – SESC.
Em 1948 foram criadas a Escola Superior de Guerra (ESG) e a Fundação da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência.
Em 1948, o então Ministro Clemente Mariani apresentou anteprojeto da LDB, baseado
em um trabalho confiado a educadores, sob orientação de Lourenço Filho. Esse projeto
provocou acirradas discussões nos meios políticos, permanecendo em tramitação até 1961.
Desenhavam-se, no cenário nacional, novas eleições presidenciais e, em 1950, as
forças políticas e populares começam a mobilizar-se para eleger um novo Presidente da
República. O Presidente Eurico Gaspar Dutra deu o seu apoio ao mineiro Cristiano Machado,
cuja chapa fora apresentada pelo PSD. A UDN apresentou, como candidato à disputa,
Eduardo Gomes; no entanto, quem assumiu a Presidência da República, sempre apoiado pelo
Partido dos Trabalhadores, foi Getúlio Vargas.
76
Neste novo governo de Getúlio Vargas, o ministério, que cuidava, simultaneamente,
da educação e da saúde, foi desmembrado, tendo Antonio Balbino assumido a pasta da
educação e cultura. No final desse governo, esteve à frente dos assuntos de educação Edgar
Santos.
Apesar dos ares liberais e sob a égide da Constituição de 1946, muitas crises advieram
e as instituições ficaram abaladas. Getúlio Vargas perdeu o apoio das Forças Armadas e
governou sob intensa pressão até o ato extremo de acabar com a própria vida, em 24 de agosto
de 1954. Assumiu o governo o Vice-Presidente Café Filho, até a vitória de Juscelino
Kubitschek de Oliveira, nas eleições de 3 de outubro de 1955.
Sob o seu governo, tivemos a construção da atual capital da República, Brasília,
intenso progresso da indústria e a proliferação de grupos estrangeiros, que acorreram ao Brasil
em busca de novos e promissores mercados.
A época, não obstante o grande otimismo, trouxe, também, novos embates, pois a
inflação assumiu altos patamares, e o déficit público cresceu.
Claudio Bojunga lembra que Juscelino afirmava que “O Brasil estava condenado a ser
grande”.
129
E, todavia, a despeito dos planos grandiosos, a verdade é que a educação não
ocupou lugar de destaque em seu governo.
Nomeou para a pasta da educação Clóvis Salgado, que prosseguiu no Ministério até o
término do governo Kubitschek e, nesse período, criaram-se a Universidade de Brasília e
alguns cursos superiores na área de administração.
Janio Quadros, alçado à presidência com profundo desagrado das classes
conservadoras, renunciou sete meses depois de sua eleição. Essa renúncia permanece, até
hoje, sob escuro manto, mas, sem dúvida, promoveu forte reação militar, que impediu a posse
do Vice-Presidente João Goulart. Como reação, foi votada a Emenda Constitucional
Parlamentarista n. 4, de 2 de setembro de 1961, denominada Ato Adicional, que pretendia
estabelecer o Regime Parlamentarista no país. Realizado o plebiscito, o Parlamentarismo foi
rejeitado. Nesse ambiente conturbado, o Congresso aprovou a EC n. 6 de 23 de janeiro de
1963, e João Goulart, sem apoio político, foi derrubado em de abril de 1964, quando
assumiu o poder o Comando Militar Revolucionário.
Em 1961, no governo João Goulart, foi aprovado o anteprojeto apresentado, em
1948, pelo então ministro Clemente Mariani, resultando daí a lei 4.024. Foi a primeira lei
brasileira a disciplinar as diretrizes e bases da educação nacional. Maria Lúcia de Arruda
129
Claudio Bojunga. JK: o artista do impossível. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
77
Aranha afirma que: “A Lei 4.024, publicada em 1961, se encontrava ultrapassada. Embora
fosse uma proposta avançada para época da apresentação do anteprojeto, envelheceu no
decorrer dos debates e do confronto de interesses”.
130
São os seus principais aspectos:
1) permanece a mesma estrutura de Gustavo Capanema, com quebra da rigidez do
sistema, ao tornar possível a mobilidade entre os cursos; cria-se curso secundário
menos enciclopédico e com menor número de disciplinas;
2) são previstos recursos financeiros da União para as escolas dos Estados e
Municípios e, ainda, para as particulares, para compra e reforma de prédios;
3) são criados o Conselho Federal de Educação e Conselhos Estaduais, com
permissão para que as escolas particulares se façam representar;
4) a lei não dispensa atenção especial ao ensino técnico, o que agrava a necessidade
já existente de mão-de-obra especializada.
Cláudio Haddad afirma:
Independentemente de razões teológicas ou ideológicas, sistemas de
educação compulsórios passaram a ser universais a partir do final do século
XIX. No Brasil, apenas em 1961, com a primeira Lei de Diretrizes e Bases,
foi estabelecido o ensino compulsório aa quarta rie primária, o que foi
ampliado em versões posteriores. O Brasil começou tarde, de forma
acanhada e, ahoje, apesar dos progressos feitos, ainda engatinha. A falta
de teologia ou ideologia explica em parte o atraso. Mas não explica tudo.
131
Os objetivos e fins da educação foram disciplinados na Lei n. 4.024/1961, nos
seguintes termos:
Art. 2º A educação nacional é direito de todos e será dada no lar e na escola.
Parágrafo único: À família cabe escolher o gênero de educação que deve dar
aos seus filhos.
Art. 3º O direito à educação é assegurado:
Inciso I pela obrigação do poder público e pela liberdade de iniciativa
particular de ministrarem o ensino em todos os graus, na forma da lei em
vigor;
Inciso II pela obrigação do Estado em fornecer recursos indispensáveis
para que a família e, na falta desta, os demais membros da sociedade se
desobriguem dos encargos da educação, quando provada a insuficiência de
meios, de modo que sejam asseguradas iguais oportunidades a todos.
Sobre os fins da educação, a lei afirmava, no artigo 1º, constituir sua finalidade
Uma educação nacional inspirada nos princípios de solidariedade humana e
ainda a compreensão dos direitos e deveres da pessoa humana, do cidadão,
130
História da educação, p 204.
131
Brasil: quem tem medo da educação? Valor Econômico, 21 dez. 2006. Disponível em:
<http://clipping.planejamento.gov.br/noticias.asp?NOTCod=327872>. Acesso em: 21 fev.
2009.
78
do Estado, da família e dos demais grupos que compõem a comunidade; o
respeito à dignidade e às liberdades fundamentais do homem; o
fortalecimento da unidade nacional e da solidariedade internacional, o
desenvolvimento integral da personalidade humana e a sua participação na
obra do bem comum.
Nesse mesmo artigo, prevê, ainda, constituírem objetivos da educação: o preparo do
indivíduo e da sociedade para o domínio de recursos científicos e tecnológicos, que lhes
permitam utilizar as possibilidades e vencer as dificuldades do meio; a preservação e
expansão do patrimônio cultural; a condenação a qualquer tratamento desigual por motivo de
convicção filosófica, política ou religiosa, bem como quaisquer preconceitos de classe ou de
raça.
Note-se, todavia, que os belos e necessários fins e objetivos, expostos nos artigos
acima citados, não poderiam, de fato, para usarmos estritamente de honestidade científica, ser
atingidos com tímida atuação política dos nossos órgãos executivos, muitas vezes até bem
intencionados, mas sem o aparato tecnológico, humano e científico necessário à realização
efetiva das necessidades educacionais brasileiras.
A Lei n. 4.024, de 20 de dezembro de 1961, foi revogada pela Lei n. 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, em vigor até hoje, com exceção dos artigos e da Lei n. 4.024/1961,
que permanecem em vigor com as alterações da Lei n. 9.131, de 24 de dezembro de 1995.
4.5 A Constituição de 24 de janeiro de 1967
Em de 9 de abril de 1964, é editado o Ato Institucional 1, que mantém a vigência
da Constituição de 1946, e, logo após, surge a Constituição de 1967 para atender aos objetivos
do Poder Revolucionário.
Ainda quando das discussões, que propugnavam por uma nova Constituição,
identificou-se acirrado debate entre os educadores e economistas, cujos objetivos centrais
giravam, segundo Mônica Sifuentes, em dois vértices: a) o da legislação, defendido pelos
educadores (direito à educação); e b) o do planejamento, na forma pretendida pelos
economistas (plano de educação).
Defendiam, ambas, a obrigatoriedade da educação primária e a intenção, que restou
bem evidenciada à época, era a expansão da educação básica, com claros objetivos de formar
mão-de-obra trabalhadora.
79
Discutiu-se muito a respeito de ser, a obrigatoriedade, incidente sobre a faixa etária ou
sobre o nível de ensino, e o artigo 168 veio a lume, preceituando: “A educação é direito de
todos e será dada no lar e na escola; assegurada a igualdade de oportunidade, deve inspirar-se
no princípio de unidade nacional e nos ideais de unidade e solidariedade humana.”
A Constituição também estabelece que o ensino será ministrado, nos diferentes graus,
pelos poderes públicos, assegurando-o livre à iniciativa particular, com o amparo técnico e
financeiro dos poderes públicos, inclusive bolsas de estudos.
A Carta de 1967 é centralizadora e procura manter grande parte do poder político e
administrativo nas mãos do poder central e, mais, com grande fortalecimento do poder
executivo; abriga vários princípios de uma constituição democrática, mas, ainda assim, reduz,
sob o pavor do comunismo, alguns direitos individuais e suspende determinadas garantias
constitucionais. Contudo, é necessário fazer-lhe justiça, pois é com a Emenda 1, àquela
Constituição, que surge a primeira referência à educação dos excepcionais, primeira menção à
pessoa portadora de deficiência. Não previu a aplicação de porcentuais mínimos da
arrecadação de impostos em educação.
No artigo 8º, incisos XIV e XVII, letras “q” e “r” e artigos 43, IV, 176, 177, 178,
parágrafo único e 179, é possível identificar que à União competia estabelecer planos
nacionais de educação e cuidar de sua concepção e cogência, entendendo Pontes de Miranda
que:
À União compete, mas não somente compete, mas incumbe, conforme a
interpretação que se de dar aos artigos 8, inciso XIV e XVII letras q e r,
artigo 43, IV, 176, 177 e 178 parágrafo único, bem como 179 parágrafo
único e, principalmente, artigo 180, a concepção e a cogência dos planos.
[...]
A planificação pode abranger qualquer nível de educação, desde a
alfabetização, voluntária ou compulsória, os cursos públicos, primários,
médios e os superiores, inclusive as especializações a latere dos cursos ou
acima ou após eles.
132
A Constituição de 1967 também adotou princípios, arrolados no parágrafo 3º do artigo
168:
Princípio primeiro O ensino primário somente deveria ser ministrado em
língua nacional.
Princípio segundo O ensino dos sete aos quatorze anos era obrigatório a
para todos e gratuito nos estabelecimentos primários oficiais.
Princípio terceiro O ensino oficial ulterior ao primário era também
gratuito para quantos, demonstrando efetivo aproveitamento, provassem falta
ou insuficiência de recursos. Sempre que possível o regime de gratuidade
132
Comentários à Constituição de 1967. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1973, p. 37.
80
seria substituído pela concessão de bolsas de estudos, exigindo-se posterior
reembolso no caso de ensino de grau superior.
Princípio quarto O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituía
disciplina dos horários normais das escolas oficiais de grau primário e
médio.
Princípio quinto – O provimento dos cargos iniciais e finais das carreiras do
magistério de grau médio e superior seria feito, sempre, mediante prova de
habilitação, consistindo em concurso público de provas e títulos, quando se
tratasse de ensino oficial.
Princípio sexto – Era garantida a liberdade de cátedra.
O artigo 169 prevê a distribuição de competências educacionais, ficando, os Estados e
o Distrito Federal, com a incumbência de organizar os seus sistemas de ensino e, a União,
com atribuições para organizar o sistema federal, bem como o sistema dos territórios,
exigindo que cada sistema mantivesse, obrigatoriamente, serviços de assistência educacional,
que assegurassem, aos alunos necessitados, condições de eficiência escolar.
Incumbia, às empresas comerciais, industriais e agrícolas, o dever de manter, na forma
estabelecida em lei, o ensino primário gratuito dos empregados e de seus filhos. Também a
elas eram impostas obrigações relativamente à aprendizagem de trabalhadores menores.
A despeito dos limites impostos aos direitos individuais, o texto constitucional
estabelecia que as ciências, as letras e as artes eram livres e que o Poder Público incentivaria a
pesquisa científica e tecnológica. O artigo 172 previa, como dever do Estado, o amparo à
cultura, ficando, sob a proteção especial do Poder Público, os documentos, as obras e os locais
de valor histórico ou artístico, os monumentos e as paisagens naturais notáveis, bem como as
jazidas arqueológicas.
No início deste tópico, afirmamos que foi com a Emenda Constitucional nº 1 à
Constituição de 1967 que surgiu, pela primeira vez, menção à educação dos deficientes
físicos. Posteriormente, com a Emenda Constitucional 12, de 17 de outubro de 1978,
assistimos ao surgimento de novas medidas, a resguardar o direito à educação dessa parcela
tão importante da sociedade brasileira, que, até então, vivia relegada ao esquecimento.
A Emenda Constitucional 12 assegura aos deficientes a melhoria de sua condição
social e econômica, especialmente:
I – educação especial e gratuita;
II – assistência, reabilitação e reinserção na vida econômica e social do País;
III proibição de discriminação, inclusive quanto à admissão ao trabalho ou
ao serviço público e a salários;
IV – possibilidade de acesso a edifícios e logradouros públicos.
Nesse período, foi editada a Lei n. 5540/1968, exigindo, no artigo 2º, que o ensino
universitário passasse, a partir daí, a ser ministrado em universidades e, apenas em caráter
81
excepcional, em estabelecimentos isolados. Ao Conselho Federal de Educação foi atribuído o
dever de promover estudos e pesquisas, que pudessem indicar e fixar os distritos
geoeducacionais, reunindo os estabelecimentos de ensino superior em universidades ou
federação de escolas, com objetivos de maior racionalização, economia e produtividade nos
recursos a serem aplicados.
A maior fração da estrutura universitária passa a ser o Departamento, congregando
disciplinas afins.
133
Nessa época, o Estado mantinha-se como o estimulador e disciplinador da
universidade. O controle universitário permaneceu, pois, nas mãos da União, que fiscalizava o
uso adequado dos recursos disponíveis.
Previa, a lei n. 5.540/1968 (Lei da Reforma Universitária), no artigo 3º, a autonomia
didático-científica, disciplinar, administrativa e financeira, exercida na forma da lei, e, sobre
essa disposição, vale conferir:
Quanto à autonomia, porém, importa observar que, passando a universidade
como instituição capaz de atender às necessidades da política do
desenvolvimento planejado, não foi deixada à universidade qualquer espaço
para discussão e reformulação dessa política. A política é traçada pelo órgão
de planejamento. Este órgão está desligado da realidade e, a seu turno, não
cabe à universidade discutir o plano, analisar seus objetivos, denunciar seus
princípios. Não compete também à universidade participar do processo nem
orientar a sociedade para uma participação efetiva e consciente na
formulação de qualquer política de desenvolvimento.
134
A nova Lei de Diretrizes e Bases para o Ensino de e 2º graus Lei n. 5.692/1971
modificou a estrutura do ensino: o curso primário e o ginásio foram unificados, passando a
denominar-se primeiro grau, com oito anos de duração; o segundo grau, por sua vez, tornou-
se profissionalizante. Esta reforma fracassou e a Lei n. 7.044, de 18 de outubro de 1982,
deixou a critério dos estabelecimentos de ensino o oferecimento de habilitação profissional.
4.6 A Constituição de 5 de outubro de 1988
A Constituição brasileira, promulgada em 5 de outubro de 1988, procura promover a
educação cidadã, já em seu preâmbulo:
133
Dinorá Adelaide Musetti Grotti et al. A política educacional brasileira, p. 35.
134
Ibidem, p. 35.
82
sob a proteção de Deus, os representantes do povo se comprometem a
instituir um Estado Democrático de Direito, destinado a assegurar o
exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem
estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de
uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia
social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica das controvérsias.
Lembramos, por oportuno, que regimes democráticos “pressupõem a educação e
educação para o respeito às leis, as virtudes e o amor à vivência cidadã”, como instrumentos
hábeis a fortalecer o indivíduo e a vida social.
A Constituição de 1988 não se limita ao preâmbulo e, analiticamente, em todo o seu
corpo normativo, exalta a cidadania e os direitos fundamentais, entre estes a educação e, como
corolário, no artigo 1º, inciso III, estabelece, como princípio fundamental desta República , “a
dignidade da pessoa humana”.
Dignidade humana é conquista social e conquista de cidadania que se concretizam
com a efetividade da educação de todos. Ao estabelecer, como objetivos fundamentais da
República, “a construção de uma sociedade livre, justa e solidária”, por óbvio, pressupõe,
como processo lógico antecedente, a educação contínua.
Insistimos que liberdade e cidadania são educação, pois livre é o indivíduo que
consegue autodeterminar-se, autoconhecer-se, ser agente; esses estágios constituem patamares
de compreensão apenas alcançados com e pela educação.
O direito à educação deve observar os princípios da universalidade, progressividade,
indivisibilidade, interdependência, exigibilidade, participação e, especialmente, o princípio da
educação por valores éticos. Devem, ainda, informá-lo os princípios da excelência
educacional e do comprometimento, como determinantes de efetividade do direito à educação
de qualidade e educação para a cidadania. Enfim, esse objetivo impõe pauta de ensino
fortemente informada por todos os princípios que regem a cidadania e pelos princípios do
constitucionalismo, os quais, por se referirem intimamente ao Estado, dizem respeito a todos.
Observe-se, assim, que educação é pressuposto para o atingimento dos objetivos
fundamentais preceituados no artigo 3º da CF; é pela educação que construiremos de fato uma
sociedade solidária.
De igual modo, não se conhece país no mundo que tenha logrado atingir grande
desenvolvimento nacional sem educar o seu povo; a pobreza é erradicada pela promoção da
liberdade, pela conquista do conhecimento, que torna o homem agente e promotor do próprio
aprimoramento, dispensando medidas assistencialistas.
83
Com esse processo de promoção intelectual, espiritual e emocional do indivíduo, os
preconceitos desaparecem, a harmonia social surge como corolário, atingindo-se o bem de
todos pela compreensão da existência de uma identidade humana. Essa compreensão se
adquire pelo esclarecimento e pela educação.
No título II da Constituição Federal, em todos os incisos do art. 5º, notamos o
desenvolvimento de propósitos para uma educação cidadã, pela promoção dos direitos
individuais. No artigo 6º, identificamos a preocupação com os direitos sociais e, entre estes,
figura com destaque a educação. No artigo 7º, identificamos rol de direitos que objetivam a
melhoria da condição social do trabalhador, e, no artigo 8º, normas para a educação sindical
dos trabalhadores.
No Capítulo III, sob o título “Da educação, da cultura e do desporto”, a Constituição
afirma que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família e será promovida e
incentivada com a colaboração da sociedade, “visando o pleno desenvolvimento da pessoa,
seu preparo para o exercício da cidadania” e sua qualificação para o trabalho.
Esse dispositivo apresenta singular significação; afirma que a educação não é mera
transmissão de conhecimentos ou mesmo preparo intelectual, enaltecendo seu papel no pleno
desenvolvimento da pessoa (art 205). Antes de significar qualificação para o trabalho, indica
que, de fato, existe uma exigência, mais emergencial do que preparar profissionais, e afirma
que, além do pleno desenvolvimento da pessoa, “a educação é para o preparo da cidadania
”,
denotando que o legislador constituinte compreendeu bem a importância do processo
educacional para o desenvolvimento da sociedade brasileira.(grifos nossos)
No artigo 206, a Constituição estabelece os princípios que servirão de base ao
processo educacional:
Princípio primeiro Igualdade de condições para o acesso e permanência
na escola.
Princípio segundo Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o
pensamento, a arte e o saber.
Princípio terceiro Pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e
coexistência de instituições públicas e privadas de ensino.
Princípio quarto Gratuidade do ensino público em estabelecimentos
oficiais.
Princípio quinto Valorização dos profissionais do ensino, garantido, na
forma da lei, plano de carreira para o magistério público, com piso salarial
profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e
títulos, assegurado regime jurídico único para todas as instituições mantidas
pela União.
Princípio sexto – Gestão democrática do ensino público, na forma da lei.
Princípio sétimo – Garantia de padrão de qualidade.
84
O artigo 207 do texto constitucional assegura a autonomia didático-científica,
administrativa e de gestão financeira e patrimonial das universidades, que obedecerão ao
princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.
Permite a admissão de professores, técnicos e cientistas estrangeiros, na forma da lei,
estendendo-a às instituições científicas e tecnológicas.
O artigo 208 afirma a educação como dever do Estado a ser efetivado mediante a
garantia de:
I ensino fundamental obrigatório e gratuito, inclusive para os que
não tiveram acesso a ele na idade própria; (EC 14)
II progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade do ensino
médio; (EC 14)
III atendimento educacional especializado aos portadores de
deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV –educação infantil em creche e pré-escola, às crianças de até 5 anos
de idade; (EC 53)
V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da
criação artística, segundo a capacidade de cada um;
VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do
educando;
VII atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de
programas suplementares de material didático-escolar, alimentação e
assistência à saúde.
O parágrafo primeiro contém uma regra áurea: o acesso ao ensino obrigatório e
gratuito é direito público subjetivo”. No parágrafo segundo do art. 208, o legislador
constituinte procurou assegurar o cumprimento e atendimento do preceito, ao asseverar que o
seu não-oferecimento pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade
da autoridade competente.
Bem salienta Sifuentes que:
Apesar dos percalços, é forçoso concluir que nenhum outro direito social, de
todos os previstos na Constituição da República Federativa do Brasil de
1988, recebeu tratamento tão cuidadoso como o referente à educação,
podendo ser considerado o primeiro e o mais importante dos direitos
sociais.
135
Todavia, a despeito disso e do teor do artigo 205 da CF, que fala em “educação para o
pleno desenvolvimento da pessoa humana”, a ão política prossegue ineficaz, tíbia, mínima.
E isto nos leva a defender a exigência impreterível de educação para formação integral e não
apenas direcionada para o ensino fundamental.
135
Direito fundamental à educação, p. 127
.
85
A República Federativa do Brasil fundamenta-se na dignidade da pessoa humana; esta
dignidade não se constrói apenas com ensino fundamental. Deve e tem que existir efetiva
promoção para o pleno desenvolvimento do homem”; é esse o processo de educação integral,
que deve prevalecer e ser observado.
O ensino é livre à iniciativa privada desde que atendidas determinadas condições, tais
como: o cumprimento das normas gerais da educação nacional e a autorização e avaliação de
qualidade pelo poder público. Para o ensino fundamental, serão fixados conteúdos mínimos, a
fim de assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos,
nacionais e regionais.
Todavia, nenhuma qualidade de ensino vem sendo assegurada. Não se presta educação
de qualidade no setor público e, tampouco, no setor privado. No âmbito privado, a procura por
lucros desordenados vem justificando o acolhimento, pelas universidades, de alunos que não
atingiram o aproveitamento necessário para o curso superior.
Não vislumbramos, também, nenhuma preocupação com a formação humana; todos os
recursos são direcionados à formação técnico-profissional do indivíduo. Pouca atenção foi
dedicada ao ensino religioso que, por sua importância, mereceria maior destaque dentro do
princípio da liberdade de crença, assegurado no artigo 5º, inciso VI da CF.
A ideia de transcendência espiritual desempenha importante papel para a formação da
personalidade humana e, pensamos, deveria ser grandemente utilizada dentro de um regime
de liberdade de consciência e sem nenhum prejuízo para a laicidade do Estado brasileiro.
Corrobora essa nossa compreensão a previsão de prestação de assistência religiosa,
preceituada no inciso VII do artigo da Constituição Federal, bem como o ensino religioso
de matrícula facultativa nas escolas públicas de ensino fundamental.
Afirma, o texto de 1988, que o ensino fundamental regular será ministrado em língua
portuguesa, assegurando às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas
maternas e processos próprios de aprendizagem. Sem entrar no mérito do ensino da língua
indígena, vimo-nos questionando se manter os índios em suas aldeias não significa alijá-los da
sociedade brasileira, promovendo discriminações, uma vez que a proximidade material e a
distância cultural promovem conflitos e distanciamento psicológico, acarretando o
separatismo secular, ao invés da aproximação necessária ao gênero humano.
Entendemos que as nossas semelhanças são muito mais marcantes e que devemos
promover o convívio fraterno e, cremos, sinceramente, que isto é educação.
Concomitantemente, deve-se promover, entendemos, a cultura indígena. Não consideramos
86
correto o distanciamento histórico da sociedade brasileira em relação ao índio por
entendermos positiva a integração das culturas.
A Constituição atribui competências aos entes federativos para organizarem, em
regime de colaboração, seus sistemas de ensino e, no parágrafo do artigo 211, afirma que a
União organizará e financiará o sistema federal de ensino e o dos Territórios e prestará
assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o
desenvolvimento de seus sistemas de ensino e o atendimento prioritário à escolaridade
obrigatória.
Assevera que os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e pré-
escolar.
No artigo 212, estabelece o mínimo da receita a ser aplicada em educação,
preceituando:
A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da
receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de
transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.
Afirma, ainda, que a parcela da arrecadação de impostos transferida pela União aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, ou pelos Estados aos respectivos Municípios,
não é considerada, para efeito de cálculo previsto neste artigo, receita do governo que a
transferir.
Além disto, assegura prioridade na distribuição dos recursos para o atendimento das
necessidades do ensino obrigatório.
Note-se que os recursos são insuficientes num país com altos índices de analfabetos e,
é ainda forçoso considerar, o número de analfabetos funcionais.
A priorização apenas do ensino fundamental e, ás vezes, nem mesmo deste; o descaso
com tudo o que se refere à educação e a consequente impossibilidade do que Paulo Freire
afirma ser “leitura política do mundo” trazem imensuráveis prejuízos sociais.
Ademais, nem sempre a aplicação dos porcentuais exigidos no texto magno é
respeitada, sendo muito comum o desvio de recursos da educação para outros setores.
Os programas suplementares de alimentação e assistência à saúde, segundo o artigo
208, VII, serão financiados com recursos orçamentários e provenientes de contribuições
sociais.
Também aqui existe crise de gestão, haja vista as perdas em termos de merenda
escolar, o desperdício e o desrespeito à saúde e aos recursos públicos.
87
A contribuição social do salário educação, recolhida pelas empresas, é fonte adicional
de financiamento para o ensino fundamental, prevendo que, além das escolas públicas, os
recursos públicos poderão ser destinados às escolas comunitárias, confessionais ou
filantrópicas definidas em lei e que comprovem finalidade não lucrativa e apliquem os seus
excedentes financeiros em educação, assegurem a destinação de seu patrimônio a outra escola
comunitária, filantrópica ou confessional, ou ao Poder Público, no caso de encerramento de
suas atividades. Esses recursos podem, ainda, ser destinados a bolsas de estudos para o ensino
fundamental e médio, na forma da lei, para os que demonstrarem insuficiência de recursos,
quando houver falta de vagas em cursos regulares da rede pública na localidade da residência
do educando, ficando o poder público obrigado a investir prioritariamente na expansão de sua
rede na localidade.
O salário educação, previsto no artigo 212, § 5º, da Constituição Federal, foi
regulamentado pelas leis 9.424/1996, 9.766/1998, 11.457/2007 e pelo Decreto
6.003/2006.
As atividades universitárias de pesquisa e extensão, em razão de maior especialização,
lograrão resultados imprevisíveis, que esse setor se ressente, historicamente, da ausência de
maior atenção para com seus assuntos fundamentais. O espírito científico poderá ser
incentivado por meio de multiformes caminhos e alternativas, que se descortinarão dessa ação
independente.
Prevê, ainda, a Carta de 1988, Plano Nacional de Educação, de duração plurianual,
com objetivos de articular e desenvolver o ensino em seus diversos níveis e promover a
integração das ações do poder público, as quais conduzam à erradicação do analfabetismo, à
universalização do atendimento escolar, à melhoria da qualidade de ensino, à formação para o
trabalho, à promoção humanística, científica e tecnológica do País
Sobre a promoção das pessoas portadoras de necessidades especiais e anotando as suas
multifacetadas necessidades, é importante ressaltar que a atuação especializada tornará
possível a efetivação de um aspecto bem positivo da Constituição de 1988, que é, exatamente,
a busca da integração dessas pessoas á sociedade. Há, de fato, uma notável preocupação do
legislador constituinte, demonstrada no artigo 227, parágrafo 1º, inciso II, ao prever a
criação de programas de prevenção e atendimento especializado para os
portadores de deficiência física, sensorial e mental, bem como de integração
social do adolescente portador de deficiência, mediante o treinamento para o
trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços
coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos.
88
Este dispositivo evidencia a sensibilidade do legislador constituinte para aspecto que,
historicamente, esteve à margem da preocupação da lei, ou seja, a integração dos portadores
de necessidades especiais, envolvendo aspectos físicos de acessibilidade a prédios e
logradouros e outras providências que facilitem sua integração à sociedade.
Ressalte-se, todavia, que as políticas públicas de integração deixam muito a desejar e a
pessoa portadora de necessidades especiais, mesmo nos dias atuais, ainda se
impossibilitada de frequentar escolas, teatros, jogos e bibliotecas por falta de estrutura mínima
de acesso, muito embora, ressalte-se, o legislador constituinte tenha traçado regras de
proteção e tenha se preocupado em assegurar o acesso e a locomoção desses brasileiros até
mesmo em edifícios não públicos. O preceito, todavia, não vem sendo observado em sua força
e necessidade.
Na Seção II, sob o título Da cultura, entendemos que o legislador constituinte
assegura que o Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às
fontes da cultura nacional, comprometendo-se a apoiar e incentivar a valorização e a difusão
das manifestações culturais.
Ainda privilegiando o espírito humano, o artigo 216 da Constituição Federal prevê
proteção ao patrimônio cultural brasileiro, aos bens de natureza material e imaterial, tomados
individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos
diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: as formas de
expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas artísticas e tecnológicas; as
obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações
artístico-culturais; os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.
Ainda apreciando os instrumentos normativos que disciplinam a educação nacional,
queremos anotar que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n. 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, insiste, no artigo 4º, no ensino fundamental obrigatório, inclusive para os
que a ele não tiveram acesso na idade própria e prevê a extensão da gratuidade ao ensino
médio. Responsabiliza autoridades pelo não oferecimento do ensino obrigatório e, também,
pela sua oferta irregular, podendo ser-lhes imputado crime de responsabilidade, se
comprovada negligência na garantia do oferecimento do ensino obrigatório (art. 5º, § 4º).
Nina Beatriz Ranieri observa que a Lei n. 9.394/1996 procurou estabelecer um novo
padrão de articulação entre a União e os Estados e entre estes e a esfera privada, assentado
sobre dois pilares: “a) o da descentralização expresso na discriminação de competências
das unidades federadas e dos sistemas de ensino; b) o do estímulo à inovação – expresso pela
89
margem de liberdade de processos que concede aos sistemas e às instituições de ensino”.
Esclarece, igualmente, que essas medidas
não promoveram a efetiva descentralização ou a autonomia dos processos,
nem a retração da função credenciadora do Estado: a discriminação de
competências aos entes federados não foi suficiente para diminuir o
centralismo que preside o controle exercido pela União na avaliação de
cursos, alunos e instituições, o que, por via de consequência, restringe a
autonomia dos processos.
136
Depois de sua edição, surgiram inúmeros diplomas legislativos para disciplinar os
assuntos mais relevantes.
São exemplos:
x Lei n. 9.539/1997: regulamenta a transferência de ofício de alunos;
x Decreto n. 2.668/1998: cria gratificação de estimulo à docência no magistério
superior;
x Decreto n. 3.276/1999: disciplina a formação em nível superior de professores para
atuar na educação básica;
x Lei n. 10.287/2001: obriga as escolas a comunicar, ao Conselho Tutelar do Município,
ao juiz competente da Comarca e ao Ministério Público, a relação de alunos com
índice de falta superior a 50%;
x Lei n. 10.639/2003: inclui no currículo oficial a obrigatoriedade da temática História e
Cultura Afro-Brasileira;
x Lei n. 10.793/2003: incumbe Estados e Municípios de assumirem o transporte escolar
dos alunos da rede estadual e municipal, respectivamente;
x Lei n. 10.793/2003: inclui, no currículo escolar, a disciplina Educação Física;
x Decreto n. 5.154/2004: regulamenta a Educação Profissional;
x Lei n. 11.114/2005: torna obrigatório o início do ensino fundamental aos 6 anos de
idade;
x Lei n. 11.183/2005: disciplina o enquadramento, na categoria das comunitárias, das
instituições privadas criadas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas
jurídicas, inclusive cooperativas de pais, professores e alunos, que incluam em sua
entidade mantenedora representantes da comunidade;
x Decreto n. 5.622/2005: regulamenta a educação à distância;
136
Educação superior, direito e Estado na Lei de Diretrizes e Base (Lei 9.394/96). São
Paulo: Edusp/Fapesp, 2000, p. 255.
90
x Lei n. 11.274/2006: nova redação ao artigo 32 da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, lei 9.394, de 20 de dezembro de 1.996, com o objetivo de
introduzir a obrigatoriedade de ensino gratuito, com duração de nove anos, iniciando-
se aos seis anos de idade. Prevê, ainda, o recenseamento dos educandos no ensino
fundamental, com especial atenção aos educandos entre 6 (seis) e 14 (quatorze) anos e
de 15 (quinze) a 16 (dezesseis) anos de idade. Prevê a matrícula obrigatória aos seis
anos e não mais aos sete anos de idade (artigos 87, parágrafo e 7, parágrafo 3º,
inciso I);
x Decreto n. 5.773/2006: dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão
e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e
sequenciais no sistema federal de ensino;
x
Lei n. 11.301/2006: acrescenta parágrafo, ao artigo 67 da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, que conceitua funções de magistério para os efeitos do disposto
no § 5º do art. 40 e § 8º do art. 201 da Constituição Federal;
x Lei n. 11.330/2006: inclui, entre as obrigações do Distrito Federal, aquela atribuída
aos Estados e Municípios, consistente no dever de matricular todos os educandos, a
partir dos seis anos de idade, no ensino fundamental;
x Lei n. 11.331/2006: acrescenta parágrafo ao artigo 44 da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional e disciplina o processo seletivo e o acesso de alunos aos cursos
superiores de graduação;
x Lei n. 11.525/2007: insere o parágrafo no artigo 32 da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, com o objetivo de estabelecer a obrigatoriedade de inclusão de
conteúdo relativo aos direitos da criança e do adolescente no ensino fundamental;
x Lei n. 11.632/2007: acrescenta o requisito de conclusão do ensino médio e equivalente
para o ingresso em cursos sequenciais de educação superior por campo de saber, de
diferentes níveis de abrangência, abertos a candidatos que atendam aos requisitos
estabelecidos pelas instituições de ensino;
x Lei n. 11.645/2008: inclui, no currículo oficial da rede de ensino, a obrigatoriedade da
temática História da Cultura Afro-Brasileira e Indígena;
x Lei n. 11.684/2008: inclui a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias nos
currículos do ensino médio;
x Lei n. 11.700/2009: assegura vagas em escolas públicas de educação infantil ou de
ensino fundamental, próximas à residência do educando;
91
x Lei n. 11.378/2008: institui o piso salarial nacional para os profissionais do magistério
público da educação básica.
Apontamos, aqui, apenas alguns instrumentos normativos; na maioria, aqueles que
surgiram recentemente, com o intuito de demonstrar o emaranhado normativo, que compõe o
sistema legislativo brasileiro de ensino e dificulta a aplicação, gestão, fiscalização e controle
de todo esse arcabouço.
O desequilíbrio normativo é tal que torna impossível a tarefa de conduzir com
eficiência os assuntos de educação diante de elementos tão numerosos, esparsos,
contraditórios.
Escrevendo sobre o ensino superior, Nina Ranieri assim se manifesta:
O sistema legislativo brasileiro de ensino superior é integrado pelas (a)
normas e princípios educacionais previstos na Constituição Federal, pela (b)
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e pelas (c) leis
estaduais supletivas, eventualmente editadas ao abrigo do art. 24, parágrafo
2º, da Constituição Federal.
“Além da Constituição e das leis, integra ainda esse sistema a extensa e
complexa teia normativa que regulamenta a educação nacional. Refiro-me às
múltiplas regras provisórias e voláteis (medidas provisórias, decretos,
resoluções, portarias, deliberações) editadas por inúmeras fontes normativas
(o Congresso Nacional, o Presidente da República, o Ministério da Educação
e do Desporto, o Conselho Nacional de Educação, os Conselhos Estaduais de
Educação), no mais das vezes em reação a circunstâncias conjunturais e em
nome da garantia da qualidade de ensino.
“Tais elementos podem apresentar-se contraditórios e sem conexão
constitucional ou legal com os demais elementos que compõem o sistema,
estando longe de garantir eficácia da Constituição e da legislação de
diretrizes e bases na promoção da educação superior.
137
4.7 Visão Geral da Educação no Brasil nos Anos 2000
De acordo com Nelson Joaquim, são inegáveis os avanços na área educacional, a partir
da década de 90 e, especialmente, na “Década da Educação” (1997-2007), com reflexos no
contexto do direito educacional
138
.
Dentre as diversas medidas adotadas na área da educação, desde a década de 90
139
,
incluindo políticas educacionais de incentivo à demanda e oferta de educação, bem como
inovações no sistema de avaliação básica, a partir de 2005, destacamos:
137
Direito educacional: aspectos jurídicos e práticos. São Paulo: Quartier Latin , 2008, p. 61.
138
Nelson Joaquim. Direito educacional brasileiro: história, teoria e prática. Rio de Janeiro:
Livre Expressão, 2009, p. 91.
92
a) elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Lei 9.493/96,
editada em consonância com as propostas firmadas na Conferência Mundial sobre
Educação para Todos, realizada em Jomtien, Tailândia, no período de 5 a 9 de
março de 1990. Nesta conferência, foi aprovada a Declaração Mundial sobre
Educação para Todos Plano de ação para satisfazer as necessidades básicas de
aprendizagem. O Brasil assumiu o compromisso de satisfazer as necessidades
básicas de aprendizagem de crianças, jovens e adultos. Daí resultou, também, a
elaboração do Plano Decenal de Educação para Todos, cujo objetivo principal era
assegurar, em dez anos (1993-2003), conteúdos mínimos que atendessem às
necessidades elementares da vida contemporânea;
140
b) positivação do direito à educação, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente Lei
n. 8.069, de 13 de julho de 1990;
c) disciplina da prestação do serviço educacional, pelo Código de Defesa do
Consumidor – Lei n. 8.78, de 11 de setembro de 1990;
d) criação do FUNDEF Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério, pela Emenda Constitucional n. 14,
de 12 de setembro de 1996, regulamentada pela Lei n. 9.424, de 24 de dezembro
de 1996 e pelo Decreto n. 2.264, de 27 de junho de 1997; implementado a partir de
1º de janeiro de 1998. De acordo com Fernando Veloso, “a ideia básica do
FUNDEF foi criar um mecanismo de redistribuição de recursos do ensino
fundamental entre redes municipais e estaduais, de forma a reduzir a desigualdade
do gasto por aluno e aumentar a eficiência da alocação de recursos. Com esse
objetivo, o FUNDEF destinou 15% da arrecadação dos estados e municípios para a
formação de um fundo fiscal, no âmbito de cada estado, cujos recursos seriam
distribuídos entre o estado e seus municípios de acordo com o número de alunos
matriculados na rede local (estado ou município) de ensino fundamental. Isso criou
um incentivo para que os prefeitos incorporassem mais alunos à escola e, com isso,
aumentassem os recursos municipais. Com isso, o FUNDEF induziu uma profunda
139
Ibidem, p. 91-102.
140
Sheila Graziele Acosta Dias; Ângela Maria de Barros Lara. A conferência de Jomtien e
suas principais expressões na legislação educacional brasileira da década de 1990: o caso da
LDB, do PCN, p. 6. Artigo Simpósio Nacional de Educação XX Semana de Pedagogia,
11/13 de novembro de 2008, Unioeste, Cascavel, PR. Disponível em:
<www.unioeste.br/cursos/cascavel/pedagogia/eventos/2008/5artigo%2003.pdf>. Acesso em:
20 ago. 2009.
93
municipalização da oferta de vagas no ensino fundamental.”
141
A EC n. 14
também destinou 60% dos recursos do fundo ao pagamento dos salários dos
professores, acarretando melhores salários e o ingresso de professores com nível
de qualificação mais elevado;
e) aprovação do Plano Nacional de Educação PNE, pela Lei 10.172, de 09 de
janeiro de 2001. De acordo com Nelson Joaquim,
142
o PNE foi criado em sintonia
com a Declaração Mundial de Educação Para Todos (Jomtien). Seus objetivos são:
a elevação global do nível de escolaridade da população; a melhoria da qualidade
do ensino em todos os níveis; a redução das desigualdades sociais e regionais no
tocante ao acesso e à permanência, com sucesso, na educação pública;
democratização da gestão do ensino público, nos estabelecimentos oficias,
obedecendo aos princípios da participação dos profissionais da educação na
elaboração do projeto pedagógico da escola e a participação das comunidades
escolar e local, em conselhos escolares ou equivalentes;
f) criação do Programa Nacional de Renda Mínima vinculada à educação “Bolsa
Escola”, pela Lei nº 10.219, de 11 de abril de 2001. O programa tem, como
beneficiárias, famílias com renda familiar per capita inferior ao valor fixado
nacionalmente, em ato do Poder Executivo, para cada exercício, e que possuam,
sob sua responsabilidade, crianças com idade entre seis e quinze anos,
matriculadas em estabelecimentos de ensino fundamental regular, com freqüência
escolar igual ou superior a oitenta e cinco por cento;
g) implantação do Programa Diversidade na Universidade, por meio da Lei n. 10.558,
de 13 de novembro de 2002. Sua finalidade é implementar e avaliar estratégias
para a promoção do acesso ao ensino superior de pessoas pertencentes a grupos
socialmente desfavorecidos, especialmente os dos afrodescendentes e dos
indígenas brasileiros;
h) introdução do Programa Bolsa Família, criado pela Lei n. 10.836, de 09 de janeiro
de 2004. A finalidade do programa, destinado ás ações de transferência de renda,
com condicionalidades, é a unificação dos procedimentos de gestão e execução de
transferência de renda do Governo Federal, especialmente as do Programa
Nacional de Renda Mínima, vinculado à Educação Bolsa Escola; do Programa
141
Fernando Veloso. 15 anos de avanços na educação no Brasil: onde estamos ? In: Veloso,
Fernando Veloso et al.o. Educação básica no Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009, p.14-15.
142
Joaquim, Nelson. Direito educacional brasileiro: história, teoria e prática. p. 95.
94
Nacional de Acesso à Alimentação PNAA; do Programa Nacional de Renda
Mínima vinculada à Saúde Bolsa Alimentação; do Programa Auxílio Gás e do
Cadastramento Único do Governo Federal. Prevê concessão de benefício
financeiro a unidades familiares em situação de pobreza e extrema pobreza e que
tenham em sua composição crianças de zero a doze anos ou adolescentes até
quinze anos (Benefício Variável), bem como unidades em que haja adolescente,
com idade entre dezesseis e dezessete anos, como apoio e estímulo para que
crianças e adolescentes freqüentem a escola (Benefício Variável Vinculado ao
Adolescente). É exigida freqüência escolar de oitenta e cinco por cento, no
primeiro caso, e de setenta e cinco por cento, no segundo. Fernando Veloso
comenta não haver “evidências claras de que o Bolsa Família teve um efeito
positivo na frequência escolar, mas vários estudos mostram que o programa
contribuiu de forma significativa para a queda recente da desigualdade de renda no
Brasil”;
143
i) implementação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior
SINAES, voltado para a avaliação de instituições, cursos e do desempenho
acadêmico dos estudantes. De acordo com o § 1
o
do art. da Lei n. 10.861, de 14
de abril de 2004, “o SINAES tem por finalidades a melhoria da qualidade da
educação superior, a orientação da expansão da sua oferta, o aumento permanente
da sua eficácia institucional e efetividade acadêmica e social e, especialmente, a
promoção do aprofundamento dos compromissos e responsabilidades sociais das
instituições de educação superior, por meio da valorização de sua missão pública,
da promoção dos valores democráticos, do respeito à diferença e à diversidade, da
afirmação da autonomia e da identidade institucional.” Um dos procedimentos de
avaliação do SINAES é o ENADE Exame Nacional de Desempenho de
Estudantes, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira – INEP, observadas diretrizes da Comissão Nacional de Avaliação
da Educação Superior CONAES. O objetivo do ENADE é o acompanhamento
do processo de aprendizagem e do desempenho acadêmico dos estudos;
j) desenvolvimento do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica SAEB,
instituído pela Portaria n. 931, do Ministério da Educação, de 21 de março de
2005. Este sistema havia sido criado em 1988; todavia, a metodologia adotada em
143
Fernando Veloso. 15 anos de avanços na educação no Brasil: onde estamos, p. 18.
95
suas avaliações iniciais não possibilitava a comparação dos resultados em anos
diferentes, inviabilizando o uso do exame como ferramenta de avaliação do efeito
das políticas educacionais na qualidade da educação. A partir de 1995, várias
modificações permitiram que os resultados da avaliação fossem comparados, ano a
ano; houve, também, a inclusão das escolas privadas, criando um parâmetro para a
avaliação das escolas públicas.
144
O SAEB engloba a Avaliação Nacional da
Educação Básica - Aneb e a Avaliação Nacional do Rendimento escolar – Anresc;
a primeira avalia, por amostragem, as redes de ensino de cada unidade da
Federação; a segunda volta-se para a unidade escolar e recebe, para divulgação, a
denominação de Prova Brasil, por seu caráter universal. Fernando Veloso esclarece
que, desde 2007, “o SAEB e a Prova Brasil se fundiram em uma única avaliação,
realizada a cada dois anos, que passou a se chamar SAEB, da qual a Prova Brasil
representa um segmento censitário e, o antigo SAEB é um estrato amostral”;
145
k) aplicação do ENEM Exame Nacional do Ensino Médio, avaliação criada pela
Portaria MEC n. 438, de 28 de maio de 1998, complementada pela portaria MEC
n. 318, de 22 de fevereiro de 2001. Promove a avaliação do desempenho
acadêmico dos alunos da terceira série do ensino médio, bem como dos estudantes
que tenham se formado e queiram ingressar nas instituições de ensino superior.
A participação dos alunos é voluntária. De acordo com Fernando Veloso, um dos
méritos do ENEM é “o fato de ser elaborado de forma a avaliar a proficiência dos
alunos em termos de determinadas competências, como capacidade de
interpretação de texto, argumentação lógica e raciocínio analítico. Nesse sentido, o
ENEM foi concebido como um instrumento de indução de uma reforma do
currículo do ensino médio, na direção de um foco maior em competências, em
contraposição à natureza enciclopédica da maioria dos vestibulares.”
146
A partir de
2009, o exame pode ser utilizado como ferramenta de seleção, de maneira integral
ou parcial, por instituições de ensino superior, passando, na primeira hipótese, a
substituir os exames vestibulares;
l) instituição do Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior - FIES,
por meio da Lei n. 10.260, de 12 de julho de 2001. O fundo destina-se à concessão
de financiamento a estudantes regularmente matriculados em cursos superiores não
144
Ibidem, p. 16.
145
Fernando Veloso. 15 anos de avanços na educação no Brasil: onde estamos, p. 20.
146
Ibidem, p. 16-17.
96
gratuitos e com avaliação positiva, ou seja, conceito maior ou igual a três no
ENADE (cursos de graduação) ou que obedeçam aos padrões de qualidade
propostos pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoas de Nível Superior
CAPES (mestrado e doutorado). São beneficiários estudantes comprovadamente
carentes, que tenham deixado de beneficiar-se de bolsas de estudos integrais ou
parciais concedidas pelas instituições referidas no art. da Lei n. 9.732, de 1998,
em valor correspondente à bolsa anteriormente recebida;
m) criação do PROUNI Programa Universidade para Todos, disciplinado pela Lei
n. 11.096, de 13 de janeiro de 2005. O objetivo do programa é a concessão de
bolsas de estudos integrais e bolsas de estudo parciais, de 50% ou de 25%, para
estudantes de cursos de graduação e seqüenciais de formação específica em
instituições privadas de ensino superior, com ou sem fins lucrativos. As bolsas
integrais são destinadas ao brasileiro, cuja renda familiar mensal per capita não
exceda o valor de até um salário mínimo e meio; para a concessão de bolsas
parciais, a renda familiar mensal per capita não pode exceder o valor de até três
salários mínimos. Podem ser beneficiários da bolsa: a) o estudante, que tenha
cursado o ensino médio completo, em escola da rede pública, ou em instituições
privadas na condição de bolsista integral; b) o portador de deficiência, na forma da
lei; c) o professor da rede pública de ensino, para os cursos de licenciatura, normal
superior e pedagogia, destinados à formação do magistério da educação básica,
independentemente da renda mencionada. A seleção dos estudantes será feita pelos
resultados e pelo perfil socioeconômico do ENEM e, na etapa final, pela
instituição de ensino superior, segundo seus próprios critérios. O programa oferece
como contrapartida, às universidades, por sua adesão, isenção de alguns tributos;
n) caracterização da educação a distância como modalidade educacional, por meio do
Decreto n. 5.622, de 19 de dezembro de 2005, que regulamenta o art. 80 da Lei de
Diretrizes e Bases;
o) extensão do benefício do salário educação, previsto, no § do artigo 212 da
Constituição Federal, como recurso adicional do ensino, a todos os segmentos da
educação básica, por força da Emenda Constitucional 53, de 19 de dezembro de
2006;
p) criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação FUNDEB, pela Lei n. 11.494, de 20
de junho de 2007. Consiste em um fundo de financiamento para a educação básica
97
em cada estado, nas mesmas linhas do FUNDEF, distribuindo recursos para as
redes estaduais e municipais, de acordo com o número de alunos matriculados. Foi
fixado gasto mínimo por aluno, complementado pela União, se o estado não
dispuser de recursos suficientes. De outro lado, 60% dos recursos do fundo devem
ser empregados no pagamento dos salários dos professores;
q) lançamento, em março de 2007, do Plano de Desenvolvimento da Educação
PDE, que consiste em um “conjunto de quarenta ações com quatro eixos:
alfabetização, educação infantil, educação básica e educação superior.”
147
O
programa criou um indicador, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica –
IDEB, como parte do Plano de Desenvolvimento da Educação. Além de
instrumento de avaliação e análise, o IDEB estabelece sistema de metas, fixadas de
acordo com o patamar atual de cada instituição, visando a sua melhoria. Integra, o
PDE, o Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação (sistema de
responsabilização do governo federal), que não se confunda com o movimento
Todos pela Educação, de 2006, resultante do engajamento da sociedade civil. Este
último criou cinco metas de desempenho educacional, que complementam o
IDEB: toda criança e jovem de 4 a 17 anos na escola; toda criança plenamente
alfabetizada até os 8 anos; todo aluno com aprendizado adequado à sua série; todo
jovem com o ensino médio concluído até os 19 anos; e investimento em educação
ampliado e bem gerido;
148
r) instituição, pela Lei n. 11.738, de 16 de julho de 2008, do piso salarial profissional
nacional R$ 950,00 - para os profissionais do magistério público da educação
básica, para jornada de quarenta horas semanais.
Não obstante todos os avanços apontados, a educação no Brasil, hoje como ontem,
continua a enfrentar grave crise, que se intensifica a cada dia, pela recusa dos setores
envolvidos em aceitar: a) que as modificações devem ocorrer até mesmo nos conceitos
básicos, que explicam e procuram fundamentar o assunto; b) que deve haver coordenação
harmônica entre a teoria e a prática das políticas públicas educacionais.
Considerando dados recentemente divulgados pela Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), os gastos com educação, no Brasil, correspondem a
cerca de 4,4% do Produto Interno Bruto, superando os do Japão, da ordem de 3,5% do PIB e
igualando-se aos da Coréia do Sul; são, porém, menores que os dos países desenvolvidos, tais
147
Nelson Joaquim. Direito educacional brasileiro: história, teoria e prática. p 101.
148
Fernando Veloso. 15 anos de avanços na educação no Brasil: onde estamos , p. 21.
98
como França, com 5,7%, Reino Unido com 5,5% e, por fim, Estados Unidos, com 5,3% do
PIB.
149
Porém, sendo maior, no Brasil, a população em idade escolar, os gastos por aluno, em
nosso país, são inferiores aos dos países desenvolvidos.
O relatório aponta o Brasil como o campeão de investimento no ensino superior,
superando aqui, também, o Japão e a Coréia do Sul. O investimento percentual menor em
Ensino Fundamental e médio (de 15% e 11%, respectivamente), em relação ao alto valor
gasto por aluno, no ensino superior, remontando a 95% da renda per capita, evidencia a
tendência existente entre nós - e que se manifesta desde a época colonial - de privilegiar o
ensino superior.
150
Esta política contribui para os baixos índices de aproveitamento obtidos
nos níveis fundamental e médio, afetando-os e contribuindo para que apenas 12% dos alunos
do nível fundamental cheguem às universidades e, assim mesmo, mal preparados segundo a
análise de Paulo Nathanael Pereira de Souza.
151
O Brasil é conhecido, no contexto internacional, pelo baixo nível educacional de sua
população.
Considerada a escolaridade média da população, medida pelo número de anos de
estudo, como indicador mais utilizado do nível educacional de um país, a escolaridade no
Brasil é baixa: 5 anos, para a população de 15 anos de idade ou mais, contra 6 anos, esperados
em países com o mesmo nível de renda per capita.
152
Apenas 30% da população brasileira, entre 25 e 64 anos, completaram o ensino médio
no Brasil. Nos Estados Unidos, essa parcela é de 88%; no Chile, de 50% e, no México, de
32%.
Todavia, a quantidade de educação aumentou. Nos últimos 15 anos, foi praticamente
atingido o objetivo de colocar na escola todas as crianças entre 7 e 14 anos.
153
Houve
aumento na freqüência escolar dos jovens entre 15 e 17 anos. Verificou-se importante
aumento nos índices de conclusão dos ensinos fundamental e médio.
Fernando Veloso salienta que os progressos mais significativos na política educacional
do Brasil, nos últimos quinze anos, prendem-se à quantidade de educação quase
universalização do acesso ao ensino fundamental e elevação das taxas de conclusão no ensino
149
Ibidem, p. 11.
150
Fernando Veloso. 15 anos de avanços na educação no Brasil: onde estamos, p. 12.
151
Paulo Nathanael Pereira de Souza. Educação e desenvolvimento no Brasil. o Paulo:
Integrare, 2008, p. 51.
152
Ibidem, p 51
153
Fernando Veloso. 15 anos de avanços na educação no Brasil: onde estamos , p. 3
99
fundamental e médio –, sendo bastante insatisfatórios os resultados relativos à qualidade da
educação.
154
No mesmo sentido, afirma, Simon Schwartzman,
155
que não existem, no Brasil,
problemas significativos de falta de acesso à escola ou falta de escolas; tampouco existe
problema importante de abandono escolar, antes do 14 anos de idade; o país mantém um
sistema de educação fundamental que é 20% maior do que seria necessário, sendo possível
melhor investimento desse porcentual se não houver tantos alunos desajustados. Os dados do
IBGE mostram que “a quase totalidade das crianças do país entra na escola, e permanece
por vários anos; o abandono começa a se tornar significativo a partir dos 14 anso de idade,
quando a percentagem fora da escola atinge os 7,5%”.
156
Após minuciosa narrativa sobre a situação da educação no Brasil, Schwartzman
afirma:
Os problemas centrais da educação básica brasileira são a qualidade do
ensino, a iniquidade que persiste no acesso à educação de melhor qualidade,
o atendimento a jovens e adultos que o conseguem completar sua
educação, e a questão da relevância e pertinência dos conteúdos da educação
para a vida das pessoas.
157
Com relação aos indicadores de qualidade da educação no Brasil, são mais utilizados
os dados do SAEB – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica. São avaliações em
relação ao aprendizado nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática, para três séries: 4ª
e séries do ensino fundamental e série do ensino médio. A análise considera a
distribuição das notas dos alunos e não apenas sua média. Isso ocorre fazendo-se o cálculo da
proporção de alunos que se encontra acima de um nível de proficiência para a sua série. Em
2007, o resultado foi que mais de 75% dos avaliados estão em nível abaixo dos desejados para
a sua série. Apenas 28% dos alunos da série do ensino fundamental tiveram desempenho
adequado, para a sua série, em Língua Portuguesa. Esses percentuais também são muito
baixos na oitava série do ensino fundamental (21%) e na série do ensino médio (25%). Os
resultado são ainda piores em matemática: apenas 24% dos alunos da série do ensino
fundamental tiveram desempenho adequado para a sua série, enquanto, na série do ensino
fundamental e na terceira série do ensino médio, foram 14% e 10%, respectivamente.
158
154
Ibidem, p. 14.
155
Simon Schwartzman. Educação: a nova geração de reformas, p. 486.
156
Simon Schwartzman. Educação: a nova geração de reformas , p. 486.
157
Ibidem, p. 489.
158
Fernando Veloso. 15 anos de avanços na educação no Brasil: onde estamos ?, p. 6-7.
100
No Estado de São Paulo, a crise não é menor. O Sistema de Avaliação de Rendimento
Escolar do Estado de São Paulo SARESP concluiu, ao avaliar os alunos das últimas séries
dos ensinos fundamental e médio da rede pública, em 2007, que 80% dos avaliados não
sabem Língua Portuguesa e Matemática, nos níveis adequados às séries escolares que
freqüentam.
159
Simon Schwartzman analisa os dados fornecidos pelo SAEB, em 2001, identificando
características de alunos, professores e escolas nas quais os testes são aplicados e fazendo
análise estatística dos determinantes do desempenho escolar, afirmando:
o desempenho desses alunos depende fundamentalmente do nível
socioeconômico de suas famílias, que muito afeta tanto o capital cultural,
que o aluno traz para a escola ( a linguagem usada em casa, os hábitos de
leitura da família, o apoio para as atividades escolares, o valor atribuído á
educação); quanto o tipo de qualidade das escolas em que o aluno vai
estudar: estudantes de famílias mais pobres, na área rural, tendem a estudar
em escolas públicas com menos recursos, e os de famílias mais ricas e
urbanas tendem a estudar em escolas urbanas, mais bem equipadas, ou em
escolas particulares.
160
De acordo com o autor, os problemas da desigualdade econômica são tão avultados
que, se não forem compensados de alguma forma, continuarão a limitar as chances dessas
crianças menos privilegiadas nas mesmas oportunidades de aprender.
Lembra, o autor que, para evitar discriminações a alunos reprovados, criaram-se
políticas de promoção automática ou de ciclos escolares, que buscam manter os alunos com o
seu grupo de idade, ainda que o seu aproveitamento escolar não seja satisfatório, e garante
que, na pior das hipóteses, essa política não é pior que a anterior, de excluir os alunos de mau
desempenho pela reprovação.
Alerta, contudo, que essas políticas precisam ser acompanhadas de procedimentos
bem claros de avaliação de resultados e apoio aos estudantes de desempenho inadequado,
sob pena de transmitirem a mensagem equivocada, e deletéria, de que aprender e demonstrar
competência já não são mais importantes.
161
Noticia, Simon Schwartzman, a evasão escolar que, segundo ele, começa a se
intensificar aos 14 anos, o que promove uma geração de jovens que não consegue obter o
diploma de primeiro grau, cada vez mais solicitado pelo mercado de trabalho, e não tem
competências mínimas para a leitura, escrita, o uso culto da língua. Em 2001, 18,3% dos
159
Paulo Nathanael Pereira de Souza. Educação e desenvolvimento no Brasil, p. 63.
160
Simon Schwartzman. Educação: a nova geração de reformas, p 489-490.
161
Ibidem, p. 490.
101
jovens brasileiros de 18 anos nem estudavam nem trabalhavam; entre as mulheres, essa
proporção era de 25%, e continuava a aumentar com a idade.
162
É necessário, ainda considerar o fenômeno da regressão da aprendizagem, pois o que é
insuficientemente apreendido acaba produzindo poucos resultados ou promovendo, a curto ou
longo prazo, aquele fenômeno.
Após análise de dados, Schwartzman apresenta suas conclusões:
Primeira: não existe, no Brasil, um problema significativo de falta de acesso
à escola ou falta de escolas;
Segunda: tampouco existe um problema importante de abandono escolar,
antes dos 14 anos de idade;
Terceira: o país mantém um sistema de educação fundamental, que é cerca
de 20% maior do que seria necessário, ou seja, poderia estar investindo mais
20% de recursos por aluno se não houvesse tantos alunos desajustados;
Quarta: os dados sugerem, ainda, que o Fundef pode estar provocando uma
inflação de matrículas no ensino fundamental, seja pela incorporação
prematura de crianças menores de sete anos de idade, seja pela presença,
neste nível, de estudantes que deveriam estar nos cursos de educação de
jovens e adultos;
Quinta: a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2001
mostra a presença de 830 mil crianças de menos de sete anos e 2,3 milhões
de pessoas de 18 anos ou mais na educação fundamental;
Sexta: o segundo grau tem cerca de oito milhões de alunos, pouco mais ou
menos, conforme a fonte, o que daria uma cobertura entre 74 e 81% em
relação ao grupo de idade, não fosse o fato de que cerca de metade destes
alunos tem 18 anos ou mais. Observa, Simon Schwartzman, ser este um dos
setores que mais tem crescido nos últimos anos, um aumento de 210% entre
1992 e 2001. A maioria dos estudantes está em escolas públicas e estuda à
noite. Denuncia a inexistência de ensino técnico de nível médio no Brasil,
em contraste com o que ocorre na maioria dos países;
Sétima: o terceiro grau, de nível superior, teve uma expansão ainda maior
do que o nível médio, passando de 1,3 para 3,4 milhões de estudantes entre
1992 e 2001 (hoje, 2009, passam de cinco milhões). Afirma Simon que
parte dessa expansão foi em resposta a um longo período de estagnação,
durante toda a década de 1980; e em parte responde à demanda criada pela
expansão do nível médio. O que mais chama a atenção, nesse nível, é a
presença dominante do setor privado, que hoje atende a 2/3 dos estudantes;
163
Oitava: o Brasil tem um amplo programa de s-graduação, com cerca de
cem mil alunos matriculados, segundo informação disponível no Ministério
de Ciência e Tecnologia, restrito aos cursos de mestrado e doutorado “estrito
senso”; 270 mil, conforme a PNAD, que tem uma definição mais ampla. A
pós-graduação “estrito senso” encontra-se quase exclusivamente em
universidades públicas; pouco se sabe, no entanto, sobre outras modalidades
de pós-graduação, que não são reguladas, e parecem crescer em grande
velocidade.
164
162
Ibidem, p. 490.
163
Lembrando, ainda uma vez, que o autor trabalha com dados de 2001.
164
Simon Schwartzman. Educação: a nova geração de reformas, p. 486-487.
102
Os resultados muito ruins, em todas as avaliações aplicadas - SAEB, ENEM, PISA,
Prova Brasil - levam-nos a refletir a respeito da formação de professores e da sua constante
preparação para o ato de ensinar.
Paulo Nathanael, refletindo sobre o assunto, pondera
a capacitação docente está a exigir profundas revisões. O pedagogismo
extremado dos cursos profissionalizantes dos professores talvez tenha de ser
compensado com algum tipo de interdisciplinaridade mais pragmática, que
forme um educador versátil, criativo, livre para ajustar-se a situações
inesperadas, e com claro domínio do que fazer para formar jovens para um
mundo em velocíssima transformação.
165
Propugna por mestres que se aprofundem em filosofia, tecnologia educacional,
psicologia do desenvolvimento, antropologia cultural, dinâmica de grupo, moral e ética,
cidadania e democracia, processos demonstrativos de valores agregados pela aprendizagem e
campos outros, que ajudem os alunos a se orientar diante dos desafios competitivos da
atualidade socioeconômica em que vivem, hoje, e viverão, no futuro.
O estudante, segundo Swartzman,
precisa adquirir os conhecimentos e as habilidades que o capacitem para
viver em sociedade, de forma tão plena quanto possível. Isto implica tanto
valores quanto conhecimentos e habilidades de comunicação, busca e uso da
informação. Não deve haver incompatibilidade, muito pelo contrário, entre
capacitar as pessoas para a vida do trabalho e para a vida social.
E arremata: “A principal habilidade a ser adquirida na escola é o domínio da língua, a
capacidade de ler e escrever. Depois, o uso dos números, o raciocínio abstrato. A partir daí,
todo o resto”.
166
Após essas observações, passemos à universidade, que, no magistério de Paulo
Nathanael é “a mais complexa estrutura de ensino jamais engendrada pela inteligência
humana. Dentro dela combinam-se cursos de graduação e pós-graduação, pesquisas,
seminários e conferências, workshops, debates, além do uso intensivo de bibliotecas,
laboratórios, experiências diversas, e, modernamente, de toda a tecnologia de ponta da
comunicação humana e da investigação da natureza.”
O legislador constituinte de 1988 estabelece, no artigo 207 do texto magno, a
indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. É inadiável a articulação entre
universidade e sociedade, devendo, aquela, contribuir para a melhoria do ensino, não apenas
pela disponibilização de excelentes cursos, como ainda pela especial preocupação com a
formação dos professores e a sua qualificação.
165
Ibidem, p 72.
166
Simon Schwartzman. Educação: a nova geração de reformas, p. 491-492.
103
Possuem, as universidades, como objetivos centrais, a busca, o aprofundamento do
conhecimento e a promoção do surgimento de novos conhecimentos, bem como a sua
adequada evolução e aprimoramento por meio da pesquisa, com a missão de gerar,
aprofundar, disponibilizar, difundir e zelar por novos conhecimentos, contribuindo, assim, de
forma efetiva, para a evolução social, uma vez que o conhecimento promove a verdadeira
valorização do ser humano e do cidadão.
Para esse desiderato, as universidades deverão adaptar-se a todas as evoluções
tecnológicas, utilizando as novas tecnologias da informação e comunicação, promovendo e
aprimorando a educação a distância e os seus métodos de avaliação e controle.
A universidade, no Brasil, possui cerca de 5 milhões de estudantes.
167
Esses números
são superiores aos da Argentina, do Chile e do México. Existem hoje, no Brasil, cerca de 17
mil cursos, 67% dos quais destinados a formar profissionais liberais.
Todavia, essa proliferação de cursos superiores e a conclusão de cursos, por jovens
sem os conhecimentos mínimos necessários, vêm sofrendo críticas por parte de educadores e
pedagogos, que vêem, nesse aumento de matrículas, prejuízos imensuráveias à educação.
Nesse sentido, expressa-se Paulo Nathanael:
Com a massificação de matrículas havida nos últimos anos, em nome de uma
pseudodemocratização de oportunidades, o ensino universitário perdeu o
caráter superior para alinhar-se num pobre modelo de nível quase colegial,
no qual se segue a lei dos comboios e se abandona a LDB: a velocidade de
cruzeiro obedece à velocidade da unidade mais lenta. São os piores alunos
que geralmente ditam o ritmo de aprendizagem nos cursos superiores. E
assim o conhecimento vai caindo.
168
Também nesse sentido, manifesta-se Arnaldo Niskier:
pensa-se pouco no conteúdo da educação, sendo comum jovens chegarem ao
diploma salvador sem os mínimos conhecimentos básicos, especialmente em
História, Literatura, Ciências, sem nos aprofundarmos na tragédia que
representa, pelos seus resultados, o desconforto com que é tratada a Língua
Portuguesa..
E questiona:
Quantos advogados falham primariamente na elaboração de um parecer?
Tudo ocorre em função da volúpia da formação profissional de qualquer
jeito, quando isso não é mais tolerado no mundo desenvolvido. Defendemos
a existência de um bom preparo humanístico e tecnológico, necessariamente
nessa ordem, para inserir o país na Sociedade do Conhecimento.
169
167
Arnaldo Niskier. Direito educacional: aspectos práticos e jurídicos, In: Antonio Jorge da
Silva Pereira et al (org). Direito educacional: aspectos práticos e jurídicos. São Paulo:
Quartier Latin, 2008, 372
168
Educação e desenvolvimento no Brasil, 132.
169
Direito educacional: aspectos práticos e jurídicos,374.
104
Percebe-se que a universidade atual não assumiu o compromisso com a competência e
com a melhora dos resultados e desempenho; compromisso com a formação de profissionais,
mestres e doutores de qualidade.
Outro fator preocupante, no âmbito das universidades, mencionado anteriormente, é
o acesso doas alunos às tecnologias da informação e à Internet. É grande a exclusão digital no
Brasil; apenas 8% da população têm acesso à Internet e, desses, 87% pertencem às classes A
e B. Ora, na era do mundo virtual e digital, com a educação à distancia oferecendo
oportunidades para aprimoramento e complementação dos conhecimentos, o sucesso na
atuação das universidades depende, também, do acesso às citadas tecnologias da informação.
A preocupação com o currículo, o oferecimento de condições adequadas à oferta dos
cursos, a preocupação com a qualidade do ensino ministrado, o preparo dos professores, o
investimento na qualidade dos recursos humanos, a preocupação com a infra-estrutura
(conforto, segurança e modernidade nas instalações) são fatores importantes e que auxiliam e
favorecem em termos competitivos. A educação de qualidade, contudo deve ser a
preocupação fundamental de todas as universidades.
Um sistema de avaliação adequado é fundamental. Todavia, é imprescindível que a
fiscalização incida sobre os mecanismos de acesso e seleção, considerando que a qualidade
do aluno, nas universidades particulares é, por vezes, muito ruim, comprometendo
decisivamente o desempenho da própria instituição de ensino, posto que o resgate de
conhecimentos das etapas inferiores ocorre de forma a não apagar as deficiências do aluno.
No Brasil, existem diversas iniciativas para a avaliação da qualidade nas
universidades. Merecem menção as elaboradas pelo Ministério da Educação e Cultura, MEC e
pelo Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras. (CRUB)
170
e, mais recentemente,
pela Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (ABMES). A realizada pelo
CRUB trabalha com aproximadamente vinte universidades; a empreendida pela ABMES tem
por objetivo separar o processo de avaliação da atuação governamental, concedendo algo
que, segundo o magistério de Paulo Alcântara Gomes,
171
pode ser interpretado como um selo
de qualidade.
A avaliação do desempenho das universidades tem sido efetuada, desde os idos de
1990, pelo Programa Inter América D, o qual, à época iniciou um processo de avaliação das
instituições de ensino superior, estabelecendo, como pilastras básicas, a competência, a
pertinência e a equidade.
170
Direito Educacional, aspectos práticos e jurídicos p 295.
171
Ibidem, p. 295.
105
Com esses três pontos, ressalta Paulo Alcantara Gomes,
172
é possível construir um
triângulo escaleno, ou seja, com três lados desiguais; esta figura retrata o que vem ocorrendo
com a universidade brasileira, que atua mais nos projetos de extensão, sem atentar para a
qualidade do ensino.
Em 2005, foi apresentado anteprojeto da Lei de Educação Superior, para debates,
discussões e sugestões da sociedade e da comunidade acadêmica, abrindo-se prazo, até 30 de
junho de 2005, para apresentação de sugestões e propostas de alteração. Em 29 de julho de
2005, a versão final do projeto de reforma universitária foi apresentada pelo Ministério da
Educação e encaminhada à Câmara Federal, passando a tramitar, como projeto de lei, sob
número 7.200/2006.
O Projeto de Lei n. 7200/2006 é unanimemente criticado por estudantes, gestores e
professores e, segundo alguns, portador de inconstitucionalidades e graves ofensas à
autonomia das universidades. Todavia, sem configurar simples defesa do PL, entendemos
que muitas das críticas não se sustentam.
Na discussão do projeto, surgiu debate a respeito da expressão “A educação superior é
bem público que cumpre sua função social “, insculpida no seu artigo 3º, sob o argumento de
que a educação é um dever do Estado e da família, constituindo direito subjetivo do cidadão.
Esquecem, os críticos, de que a família é a componente mais importante da sociedade e que
possui, por sua vez, uma dimensão pública ao compor essa mesma sociedade.
Crítica maior, contudo, vem merecendo o parágrafo único do mesmo artigo 3º, que
preceitua que a “liberdade de ensino à iniciativa privada será exercida em razão e nos limites
da função social da educação superior.” Ora, em um Estado Democrático de Direito, por que
temer tais expressões da lei ? Ademais, temos a propriedade voltada ao atendimento da sua
função social, a própria ordem econômica, embora capitalista, assegura a valorização do
trabalho humano e a atuação voltada ao respeito à função social da propriedade. Por que, no
âmbito da educação, temer tal preceito?
Razão assiste a Paulo Nathanael: “A autonomia universitária não poderia ser invocada
para impedir medidas como essas de controle externo, até porque o instituto da autonomia
nasceu para preservar a qualidade do ensino e não para acobertar a sua degenerescência
pedagógica”.
173
O plano peca pela ausência de preocupações com: a interdisciplinaridade;
mecanismos efetivos que assegurem a importante e imprescindível preparação e
172
Direito Educacional, aspectos práticos e jurídicos p 382.
173
Educação e desenvolvimento no Brasil, 27.
106
complementação constante de conhecimentos; práticas e pesquisas dos docentes; estudos e
aprimoramento de currículos; educação especial de qualidade, com a disciplina de
mecanismos necessários ao acesso do portador de necessidades especiais, inclusive com a
promoção de programas que incentivem as universidade a promover cada vez mais o seu
acesso e inclusão; formas efetivas de apoio à pesquisa de qualidade; aprimoramento e
aplicação das novas tecnologias da informação, essenciais na educação a distância e na
complementação dos conhecimentos; a integração universidade/sociedade/empresa e o
incentivo a estágios; exigência de programa e currículo que promovam os valores
civilizatórios, a cidadania, a ética e a moral.
Peca, igualmente, por não prever formas que possibilitem a veiculação de
informações, ou a efetivação de políticas, que promovam a educação e as suas vantagens e
benefícios junto aos pais e alunos.
174
174
Discorrendo sobre educação básica, Marcelo Côrtes Neri propõe o estudo das causas de
evasão a partir de três tipos básicos de motivações, a saber: a primeira é a miopia ou o
desconhecimento dos gestores da política pública, restringindo a oferta de serviços
educacionais tal como reportada pelos alunos potenciais. Outra, é a falta de interesse
intrínseco dos pais e dos alunos sobre a educação ofertada, seja péla baixa qualidade
percebida ou por miopia ou desconhecimento dos seus impactos potenciais. Uma terceira é a
operação de restrições de renda e do mercado de crédito, que impedem as pessoas de explorar
os altos retornos oferecidos pela educação no longo prazo. Educação básica no Brasil: o
paradoxo da evasão e as motivações dos sem escola, Rio de Janeiro: Elsevier, 2009, p 47.
107
5 O PROGRAMA EDUCACIONAL DA CONSTITUIÇÃO DE 1988
A Constituição Federal, promulgada em 5 de outubro de 1988, é portadora de
indelével mensagem educativa, nem sempre com adequada aplicação, interpretação e
compreensão. Base de reformulação dos padrões de cidadania, promove programa político-
pedagógico e de participação popular na democracia em construção.
É um texto que vem nos ensinando os valores de liberdade e que nos exorta a procurar
a realização do princípio da igualdade material. Traça programa educativo e de cidadania,
com pretensões de estabelecer plano de ensino com múltiplas ações educativas para a vida e
para o desenvolvimento das potencialidades humanas. Politiza, no mais alto, grau as relações
entre indivíduo e Estado e investe intensamente na participação cidadã. Sem descurar da
instrução, exige educação no seu mais alto grau e intensidade, quando adota a expressão:
“educação para o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho” (art. 205)
Pleno desenvolvimento é inquestionável menção ao desenvolvimento de todas as
potencialidades humanas, em todas as suas possíveis áreas de atuação e o próprio texto de
1988, a nosso ver, inicia a sua ação educacional no preâmbulo, com a previsão de contínuo
processo educacional democrático e social.
Portadora de uma mensagem programática e com a previsão inequívoca de amplo
processo de educação humana e democrática, a Constituição Federal enuncia de forma clara e
inequívoca uma ordem deflagradora da ação educadora universal, pela enumeração de amplo
e complexo sistema e de exigências de posturas educacionais mais elevadas para todo o povo
brasileiro.
No artigo da Constituição Federal, o legislador constituinte enumera os princípios
fundamentais da República Federativa do Brasil.
No artigo 2º, a Constituição apresenta a estruturação dos poderes do Estado e o faz de
forma a estabelecer que são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o
Legislativo, o Executivo e o Judiciário, exigindo atuação uníssona na persecução das
finalidades traçadas na Carta.
O artigo estabelece objetivos, cuja persecução e atingimento apenas lograrão
concretude com um amplo programa de educação humana e social.
108
A garantia do desenvolvimento nacional tem, obviamente, por pressuposto, a
educação, pois só se desenvolve e se torna desenvolvido o país que educa os seus cidadãos. A
erradicação da pobreza e a marginalização e, mais, a erradicação das desigualdades sociais e
regionais apenas serão alcançadas com a educação de todos. Igualdade e liberdade, princípios
básicos estampados na luta travada na experiência revolucionária francesa, não lograram
concretude. Embora dentro das liberdades clássicas, que justificaram a luta de 1789, estão
ainda irrealizados por ausência de educação, que ninguém é livre sem oportunidade de
escolha e ninguém é igual, sequer perante a lei, sem educação humana plena.
Liberdade e igualdade. Princípios de liberdade e de isonomia são os estágios de
desenvolvimento humano e social que mais exigem a educação de todos. Não nos enganemos,
pois tais estágios estão absolutamente irrealizados. Todavia, a Constituição Federal traz
mensagem veiculadora de virtudes políticas realizáveis somente por meio da educação como
forma de concretização não apenas de cidadania brasileira, mas de formação para a cidadania
universal.
A promoção do bem de todos é a cláusula geral estabelecida no artigo 3º, inciso IV da
CF, a esclarecer que o bem de todos deve ser construído sem preconceitos de origem, raça,
cor, sexo, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Esta, também, não é realização
que ocorra sem efetiva e concreta educação humana.
No artigo da Constituição Federal, identificamos o mais amplo programa de
educação para o desenvolvimento humano, para os direitos fundamentais e para a cidadania.
Esses direitos fundamentais, que apregoamos não absolutos, exigem ponderação,
sopesamento, aplicação de princípios, como os da razoabilidade e da proporcionalidade.
O postulado da proporcionalidade, tão bem desenvolvido pela doutrina alemã,
175
subdividido em três outros princípios, quais sejam, o princípio da adequação, o princípio da
necessidade e o princípio da proporcionalidade em sentido estrito, requer, para que não se
desnature, efetiva educação humana.
No que tange aos direitos fundamentais, costuma-se referir, com freqüência, a
balanceamento, sopesamento, ponderação, como forma de atingir uma construção jurídica que
não implique riscos para o direito e para a racionalidade e que aproxime e harmonize direito,
cidadania, educação, pedagogia, neuropedagogia, solidariedade na vida cotidiana. Isso requer
educação contínua.
175
Robert Alexy Direitos fundamentais, balanceamento e racionalização. Ratio Juris, v. 16, n.
2, jun. 2003, p 131-140.
109
No balanceamento, especialmente com relação aos direitos fundamentais, é necessária
e irrefutável a educação para excluir, definitivamente, os riscos da degradação do direito,
riscos, estes, que serão alijados e, em especial, definitivamente afastados pela gradativa
aproximação, até a total coincidência entre decisões judiciais e efetiva justiça.
No artigo 6º, estão indicados os direitos sociais, que são os direitos fundamentais de
segunda geração; o primeiro a ser identificado é a educação.
No artigo e incisos, o legislador constituinte enumera os direitos trabalhistas; a sua
amplitude e dignidade é programa que requer profunda educação social; no artigo 8º, temos os
direitos sindicais que requerem, por sua vez a educação sindical e a educação trabalhista e, no
artigo 9º, o legislador constituinte previu o direito de greve. Aqui, a greve não é tolerada, mas
é prescrita como lídimo direito, cujo exercício requer educação sindical, trabalhista e humana.
O legislador constituinte, no artigo 10, previu a participação dos trabalhadores e
empregadores nos colegiados dos órgãos públicos, em que seus interesses profissionais e
previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação.
Ao tratar da cidadania, a Constituição brasileira adota um tratamento humano
universal que requer educação e, ao disciplinar os direitos políticos, põe, nas mãos do povo, o
direito e o dever do exercício da democracia.
Quando iniciamos as nossas investigações sobre as sociedades humanas e sobre o
Estado e a sua organização, foi comum e, ao mesmo tempo, surpreendente, identificarmos
uma real distância entre o Estado e a sociedade, não sendo raro, ainda nos dias atuais,
marcados por forte evolução tecnológica e humana, depararmo-nos com a ideia do Estado
apenas como expressão de um poder fortemente coativo, detentor de aparatos que, num
sistema social organizado, exerce forte poder de contenção.
176
Poder, este, algumas vezes
nominado de extroverso. Como seu contraponto, apresenta-se a sociedade civil, composta
pela massa humana, que deve estar sob constante coação.
Essa ideia, aparentemente muito antiga, ainda não foi substituída por outra, mais
recente e adequada, de condução equilibrada e coerente de maturidade social, pela promoção
de educação real do povo, elemento e dimensão pessoal do Estado e a sua própria razão de
ser.
O povo, temos afirmado, não é simplesmente a dimensão pessoal do Estado; é também
a sua razão de existir, é o seu fundamento lógico e justificador e, neste sentido, entendemos
que o papel do Estado deve ser redefinido para, definitivamente, abraçar a sua função de
176
Norberto Bobbio Estado, Governo e Sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p. 33.
110
condutor de inteligências e personalidades para a liberdade, para a verdadeira igualdade e para
o efetivo exercício da cidadania.
O Estado é o povo, são os cidadãos, e, nesse sentido, vale relembrar a clássica ideia de
Thomas Paine
177
de que uma Constituição é a propriedade de uma Nação e não daqueles que
exercem o governo. Todas as Constituições da América são declaradas como
estabelecidas com a autoridade do povo. Na França, a palavra Nação é
empregada em lugar de povo ; porém, em ambos os casos uma Constituição
é algo que antecede o governo e sempre alguma coisa distinta deste.
178
A sociedade deve ao povo uma instrução pública.
Aquele que não sabe escrever e ignora a Aritmética depende realmente do
homem mais instruído, ao qual é obrigado a recorrer sempre. Ele não é igual
aos outros a quem a educação ofereceu tais conhecimentos; ele não pode
exercer os mesmos direitos com a mesma extensão e com a mesma
independência. Aquele que não é instruído sobre as leis básicas que regulam
o direito de propriedade não goza desse direito da mesma forma que aquele
que as conhece [...]
A desigualdade da instrução é uma das principais fontes de tirania.
179
(grifos
nossos).
Sob a inspiração de Condorcet e refletindo sobre a função estatal e a importância dos
valores da cidadania, a sua dimensão axiológica na Constituição Federal e, motivados pela
força renovadora do movimento constitucionalista, dirigimos nossa atenção ao artigo da
Carta da República Federativa do Brasil.
180
177
Thomas Paine, vale lembrar, não nos deixa olvidar que é do povo e para o povo. A sua
finalidade, a única possível, é o bem da sociedade. “ Talvez não fosse impróprio observar que
nesses dois exemplos (o de Pensilvânia e o dos Estados Unidos da América) não algo com
uma ideia de um pacto entre o povo de um lado e o governo, de outro. O pacto foi entre os
povos dos Estados americanos para produzir e constituir um governo. Supor que qualquer
governo possa ser uma parte num pacto com todo o povo é supor que ele exista antes que
possa ter um direito a existir. O único exemplo no qual um pacto pode ocorrer entre o povo e
aqueles que exercem o governo seria aquele no qual o povo os pagaria enquanto optasse por
empregá-los...Governo não é uma transação que qualquer homem, ou qualquer grupo de
homens tem o direito de estabelecer e exercer para o seu próprio lucro, mas inteiramente um
depósito de confiança em direito daqueles pelos quais o depósito de confiança é delegado, e
por quem é sempre reassumível. Por isso mesmo ele não possui direitos São integralmente
deveres.” (Os direitos do homem: uma resposta ao ataque do senhor Burke à Revolução
Francesa. Tradução Jaime A. Clasen. Petrópolis: Vozes, 1989. P.166.
178
Os direitos do homem: uma resposta ao ataque do senhor Burke à Revolução Francesa, p
169.
179
Condorcet . Cinco memórias sobre a instrução pública, p. 18-19
180
- Dos Princípios Fundamentais.
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos:
111
O texto magno, na sua abordagem de objetivos e fundamentos, deixa clara a intenção
de promoção da cidadania, colocando, como seu epicentro, o homem, cidadão que é o ator
social, o protagonista da convivência em sociedade, deixando igualmente clara a intenção
constituinte de promoção dessa mesma sociedade, pela realização do indivíduo e de sua
dignidade, que, individualmente, ele se aperfeiçoa, aprimora e refina, mas se realiza
vivendo socialmente.
Na Grécia antiga, com Aristóteles,
181
se refletia sobre o conceito de cidadania, de
dignidade humana e de educação, quando se levantavam questões sobre a natureza social do
homem, a importância da educação e da palavra para a convivência.
Compreender o que é útil e prejudicial e, consequentemente, o que é justo e
injusto. O que distingue o homem de um modo geral é que ele sabe discernir
o bem do mal, o justo do injusto, e assim todos os sentimentos da mesma
ordem, cuja comunicação constitui a família do Estado.
182
(grifos nossos).
Em sua Política, Aristóteles coloca o Estado antes da família e de cada indivíduo,
porque o entende como o resultado da reunião dos homens, afirmando que “o todo deve se
colocar antes das partes: o Estado está na ordem da natureza antes do indivíduo, pois se cada
indivíduo isolado não se basta a si mesmo, assim também se dará com as partes em relação ao
todo”.
183
Arremata afirmando que “é evidente, então, que se deve pensar mais na administração
dos homens que na aquisição das coisas inanimadas, mais no seu aperfeiçoamento que na
aquisição daquilo que se chama riqueza”.
184
Ao refletir sobre o “pensar na administração dos homens”, Aristóteles conclui que o
início e o fim do processo é o indivíduo como integrante e parte do todo que é o Estado.
185
Aristóteles fala em virtude. O que Aristóteles chama de virtude, ao afirmar que “sem
virtude o homem é o mais cruel e feroz de todos os seres vivos,
186
são conquistas que se
I – a soberania;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana;
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V – o pluralismo político.
181
Alexis de Toqueville afirma: “Não há literatura que ponha mais em relevo que a dos antigos
as qualidades que falam naturalmente aos escritores das democracias. Não há, portanto,
literatura que mais convenha estudar nas eras democráticas. Esse estudo é, dentre todos, o
mais apto a combater os defeitos literários inerentes a tais eras...(A democracia na América.
Tradução Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 72).
182
Aristóteles. A política. Tradução Nestor Silveira Chaves. São Paulo: Ícone, 2007, p. 16.
183
Ibidem, p. 34.
184
Ibidem, p. 34.
185
Ibidem, p. 34.
112
fazem por um processo racional de educação individual do cidadão, partindo de uma
atividade educacional ampla, ininterrupta e adequada a todos.
Conhecer o pensamento do filósofo de Estagira leva-nos a entender e concluir que a
educação é matéria de todas as épocas, uma vez que constitui o próprio sentido da vida e,
simultaneamente, se mostra, também, indispensável à vida, até o extremo de resultar, a sua
falta, na negação da própria existência, na impossibilidade de autodeterminação do homem.
Nesse sentido, afirma Helder Baruffi:
Os direitos fundamentais expressos nos diferentes diplomas registram a
garantia de liberdade, consciência, participação, autonomia. Entretanto,
participar e usufruir destes direitos requer: (a) a consciência destes direitos e
(b) a garantia de participação naquilo que a sociedade produz. Em outros
termos, é ter direito aos direitos reconhecidos pela sociedade. O homem, ser
social, constrói a sua interação homem-mundo e a sua identidade por meio
de um processo educativo que, ao longo do tempo, se realiza em ambiente
estruturado e formal: a escola, instituição em constante crise.
187
Quando propugnamos insistentemente por educação, não queremos nos referir a uma
educação ideológica, pois esta palavra perdeu sua substância original e, se de alguma forma
tivermos de adotar uma ideologia, queremos adotar a ideologia do esclarecimento humano, da
iluminação pelo conhecimento, pois temos apenas uma ideologia. É a ideologia da educação
humana para o esclarecimento, para a compreensão, para a autodeterminação do indivíduo por
meio de um processo racional, persistente e contínuo de aprendizagem, mas com absoluta
liberdade de ensino e com meios e técnicas apropriados.
Recusamos, também, qualquer concepção exclusivamente idealista, por entendermos
que a educação é necessidade humana realizável e se faz com a ciência e a adoção de métodos
científicos concretos e possíveis. Entendemos que idealizar um Estado orientado para o bem,
sem a promoção da educação, é trabalho vão.
Estudiosos e pesquisadores falam de paz, de ciência, de conhecimento, de segurança,
de aprimoramento, de respeito social, respeito às instituições como coroamento do Estado
ideal, como se esses estágios fossem adquiridos por processos mágicos, não científicos, não
esquematizados, não estudados e como se os problemas de convivência social, entre muitos,
segurança pública, educação, saúde, lazer, cultura constituíssem sempre problemas alheios
que não nos dizem respeito.
186
Ibidem, p 34.
187
A educação como direito fundamental: um princípio a ser realizado In: Zulmar Fachin
(coord.). Direitos fundamentais e cidadania. São Paulo: Método, 2008, p. 83.
113
A indiferença dos Estados soberanos em relação à formação dos homens torna-os, na
abalizada expressão de John Stuart Mill, verdadeiramente anões e fantoches, pois incapazes
de se instruírem com as ideias e as experiências dos outros, por ausência de capacidades de
desenvolvimento, comparação e crítica.
Stuart Mill alerta:
Um Estado que torne os homens anões, a fim de que possam ser nas suas
mãos instrumentos mais dóceis de seus projetos (mesmo para propósitos
benéficos), descobrirá que não é possível fazer coisas grandes com homens
pequenos, e que a perfeição da máquina a que sacrificou tudo afinal não lhe
servirá de nada, por faltar-lhe o poder vital que preferiu pôr de lado para
tornar mais suave o funcionamento da máquina.
188
Nessas reflexões é que surge a indagação sobre o modelo e o papel do Estado
contemporâneo. Aprendemos que as nossas instituições seguem as monumentais construções
teóricas de Aristóteles, Rousseau, John Locke e Montesquieu, mas a vida cotidiana e os
conflitos sociais indicam muito mais a adoção das ideias de Hobbes e Maquiavel. Diante de
tal paradoxo, é que se impõe indagar sobre o porquê do descompasso entre a ação humana
concreta na sociedade e a adoção de modelos adotados pelas instituições, cujos padrões e
regras as próprias autoridades ignoram.
A resposta, para muitos evidente, não se apresenta com a mesma clareza a todos. Pois
se é certo que existe unanimidade na admissão da importância da educação para o homem e a
sociedade, o certo é que a extensão desse poder reformador íntimo sofre os ataques da
descrença e da malícia.
Bem ressalta, com razão, Helder Baruffi
O primado da educação é um princípio que se encontra nas fontes clássicas
do pensamento pedagógico. É um primado antropológico, psicológico,
moral, econômico, político, jurídico. Em todos os campos do saber, a
educação encontra um espaço de destaque, mesmo porque a educação é
inerente ao ser humano.
189
Na Constituição brasileira, a educação é para o pleno desenvolvimento da pessoa.
Maria Garcia ensina que
toda ordem contém a obsessão de sua finalidade. Toda ordem, toda
ordenação pressupõe um sistema a impor uma visão regular e harmoniosa.
Lembramos também, na Grécia antiga, a busca de uma ordem natural e
perfeita onde tudo encontra o lugar que lhe pertence. Dentro desta ideia de
uma harmonia de coisas é que penso a educação superior. Repetindo, um
desejo de que o pequeno aluno da escola básica possa ter a ascensão a um
188
Mauro Cardoso Simões. John Stuart Mill e a liberdade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.
189
A educação como direito fundamental: um princípio a ser realizado In: Zulmar Fachin
(coord.). Direitos fundamentais e cidadania, p 84.
114
nível superior de conhecimento, onde verdadeiramente o pensamento se
torna mais livre e especulativo. Essa aspiração, esse aperfeiçoamento, essa
ordenação está contida no artigo 205 da Constituição. Diz ele: A educação,
direito de todos e dever do Estado e da família será promovida, incentivada
com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho.
190
Enumera, a seguir, os três objetivos da educação nacional:
1) o pleno desenvolvimento da pessoa, abrangendo, portanto, a sua formação
física e psíquica, assim como temos dois hemisférios cerebrais: o direito, criativo,
emocional e o esquerdo, racional e prático. A educação deve abranger também essas
potencialidades da pessoa humana;
2) o preparo para a cidadania;
3) a qualificação para o trabalho.
191
Educação é a porta segura para a construção de uma sociedade hígida e é o
constitucionalismo que trará, a essa importante função, uma nova e independente
reestruturação.
A função pública, no Estado Democrático de Direito, na lúcida lição de Celso Antônio
Bandeira de Mello, é a atividade exercida no cumprimento do dever de alcançar o interesse
público, mediante o uso de poderes instrumentalmente necessários conferidos pela ordem
jurídica.
192
O autor substitui a noção de poder por dever e estabelece, como dever do ocupante de
função, a atividade de alcançar o interesse público, pela utilização de instrumentos
necessários e colocados à disposição pela ordem jurídica.
É com essa ideia de função, como dever do Estado, que escrevemos este trabalho e,
com a convicção, que nos impele para esse objetivo, entendemos ser factível, ao
constitucionalismo, permitir que, por suas portas largas e de substancial potência axiológica,
em cumprimento ao programa educacional traçado na Constituição Federal, possa adentrar
uma nova e independente estrutura, a função educacional do Estado , e da mesma maneira
que existiu, no ordenamento jurídico pátrio, e alhures, uma quarta função,
193
entendemos
190
Competência Legislativa. In: Antonio Jorge da Silva Pereira et al (org). Direito educacional:
aspectos práticos e jurídicos. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 34-46. p 34-35
191
Competência Legislativa. In: Antonio Jorge da Silva Pereira et al (org). Direito educacional:
aspectos práticos e pjurídicos, p. 35.
192
Curso de direito administrativo, p 27.
193
Francis-Paul Benoit defende a existência de uma multiplicidade de funções. Estabelece a
distinção das funções do Estado-Nação das funções do que denomina Estado-Coletividade.
115
ser conveniente nesse nosso momento histórico o tratamento ou a estruturação independente
da educação ou a organização da educação nacional em novas bases e especialização, com
orçamento próprio, legitimidade para a propositura de projetos de lei, estruturação e acesso a
cargos e salários, gestão especializada e por pessoas que, de fato, possuam qualificações
pedagógicas e administrativas, tudo isso a ser estruturado e disciplinado em lei.
194
Fundamentamos a proposta no fato incontestável de que o exercício e a eficiência, da
e na atuação estatal, dependem da formação dos cidadãos, fato admitido amplamente pelos
teóricos do Estado.
De outro modo, é também unânime a compreensão de que, entre as funções estatais,
ocupa lugar de relevo a segurança pública e que ao Estado competiria, como compete,
assegurar a paz social. Isto não ocorre. Vivemos todos na mais absoluta insegurança; medo e
pavor tornaram-se a companhia inarredável de todas as horas.
No Estado-Nação reconhece a função parlamentar e a função governamental. No Estado-
Coletividade também que distinguir dois grupos de funções: uma, a função administrativa
e outra que compreende uma variedade de serviços sob regimes que não são administrativos,
quais a função judiciária, e a função de ensino
, a função de defesa etc. (Le droit administratif
français. Paris: Daloz, 1968, 27-52
194
Celso Antônio Bandeira de Mello ensina “Em geral, a doutrina assinala que a função mais
difícil de ser conceituada é a função administrativa, pela grande heterogeneidade das
atividades que nela se compreendem.
Assim, por exemplo, Kelsen sustenta que as funções estatais na verdade são duas: a de criar o
Direito, legislação, e a de executar o Direito, o que tanto é feito pela Administração como pela
Jurisdição (Teoria general del derecho y del Estado. Tradução de Eduardo Garcia Maynez
México: Imprensa Universitária, 1950, p. 268-269). Entre nós, o Prof. Oswaldo Aranha
Bandeira de Mello, embora em posição muito distinta da de Kelsen, também considera que
duas funções no Estado: a administrativa e a jurisdicional. A administrativa visa a integrar
a ordem jurídico-social, mediante duas atividades: a de legislar e a de executar, possuindo,
portanto, um caráter político de programação e de realização dos objetivos públicos. A
jurisdicional tem por objeto o próprio direito, possuindo, portanto, um caráter manifestamente
jurídico. Visa manter a ordem jurídica vigente ameaçada ou violada (Princípios gerais de
direito administrativo. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense,1979, v. I, p. 24-33) Assim como os
que reduzem o número das funções do Estado, os que as ampliam. Assim, Francis-Paul
Benoit, pretende que uma pluralidade de funções. Após efetuar uma crítica demolidora e
irrespondível aos que afirmam existir a tripartição das funções do Poder e das funções no
sistema constitucional francês, sustenta que, à luz deste, devem ser distinguidas as funções do
que denomina Estado-Nação das funções do que denomina Estado-Coletividade. Para ele são
reconhecíveis no Estado-Nação, duas funções: a parlamentar, de criação do direito interno, de
direção geral da política externa e interna. No Estado-coletividade que distinguir dois
grupos de funções: uma a função administrativa e outra que compreende uma variedade de
serviços sob regime diferentes do da função administrativa, quais a função judiciária, a função
de ensino, a função de defesa e, possivelmente outras,, notadamente uma função de pesquisa
(Le droit administratif français. Paris: Daloz, 1968, p. 27-52). Curso de direito administrativo,
p 28.
116
Sob esse ângulo, anotamos que o Estado contemporâneo, especialmente aquele de
desenvolvimento tardio, não consegue cumprir satisfatoriamente o seu papel, permanecendo a
inquietude pela ausência de Estado na vida social que, histórica e hodiernamente, sempre se
fez e se faz presente nas cobranças fiscais e, ausente, na instauração de políticas públicas, que
promovam, de fato, a dignidade humana.
As convulsões e problemas sociais multiplicam-se e diversificam-se. Insegurança,
criminalidade, corrupção, miséria são estados de desumanidade aceitos quase
pacificamente, como se constituíssem estados naturais do ser humano. A ausência de
sensibilidade nos faz olhar com absoluta indiferença para esse estado de coisas, sem sequer
refletirmos sobre as suas razões.
Luiz Roberto Barroso oferece-nos singular texto para reflexão:
A pós modernidade e o direito.
Planeta Terra. Início do século XXI. Ainda sem contato com outros mundos
habitados. Entre luz e sombra, descortina-se a Pós-Modernidade. O rótulo
genérico abriga a mistura de estilos, a descrença no poder absoluto da razão,
o desprestígio do Estado. A era da velocidade. A imagem acima do
conteúdo, o efêmero e o volátil parecem derrotar o permanente e o essencial.
Vive-se a angústia do que não pôde ser e a perplexidade de um tempo sem
verdades seguras. Uma época aparentemente pós tudo: pós-marxista, pós
kelseniana, pós-freudiana.
[...]
A paisagem é complexa e fragmentada. No plano internacional vive-se a
decadência do conceito tradicional de soberania. As fronteiras rígidas
cederam à formação de grandes blocos políticos e econômicos, à
intensificação do movimento de pessoas e mercadorias e, mais recentemente,
ao fetiche da circulação de capitais. A globalização como conceito e como
símbolo, é a manchete que anuncia a chegada do novo século. A
desigualdade ofusca a conquista da civilização (...)
A obsessão por eficiência tem elevado a exigência de escolaridade,
especialização e produtividade, acirrando a competição no mercado de
trabalho e ampliando a exclusão social dos que não são competitivos porque
não podem ser. O Estado não cuida de miudezas como pessoas, seus
projetos, e sonhos e abandonou o discurso igualitário ou emancipatório.
195
(grifos nossos).
O desprestígio e o desrespeito às leis, a imoralidade, inclusive na Administração
Pública, a criminalidade o situações extremas cuja causa pode ser apontada, em vários
aspectos e fatos convergentes, para uma conclusão muito simples e óbvia: como assegurar o
cumprimento de leis, a observância de regras, de princípios e de valores tão abstratos sem
195
Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro. In: Eros Grau;
Sergio Sérvulo da Cunha (orgs.). Estudos de direito constitucional em homenagem a José
Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2003, p 22-23
117
amadurecimento? Sem o desenvolvimento daquilo que Aristóteles denomina a condição de
bastar-se a si mesmo” ?.
196
Logo, ao atribuirmos ao Estado
197
o papel de garantidor da segurança pública, por
meio de atos de Administração, e a função de legislar e de julgar, pelo Poder Legislativo e
Jurisdicional, respectivamente, por que não atribuir, a ele, Estado, a função de educar
198
para
o bem social? Qual é, de fato, a garantia de segurança pública, que poderá oferecer o Estado
que não educa os seus cidadãos e que é habitado por indivíduos que não receberam nenhuma
atenção? A que leis obedecerão se sequer as conhecem ou, se as conhecem, não as
compreendem?
È bem verdade que a Lei de Introdução ao Direito, também denominada Lei de
Introdução ao Código Civil, estabelece uma absurda, irreal, necessária e cruel presunção de
conhecimento de textos complexos e de difícil compreensão, até mesmo para aqueles que
detêm certo grau de educação técnica.
Basicamente, a totalidade dos direitos exige um mínimo de cultura e compreensão
para o seu exercício. Veja-se, como exemplo, a afirmação da bela Declaração Universal dos
Direitos do Homem, formulada pela Assembleia das Nações Unidas, de 10 de dezembro de
1948:
8º: Toda pessoa tem um recurso perante os Tribunais Nacionais
competentes, que a ampara contra atos que violam seus direitos
fundamentais, reconhecidos pela constituição ou pela lei;
[...]
10º Toda pessoa tem direito, em condições de plena igualdade, a ser ouvida
publicamente e com justiça, perante Tribunal independente e imparcial, para
determinação de seus direitos e obrigações ou para que se examine qualquer
acusação que pese contra ela em matéria penal.
196
A política, p. 17.
197
Paulo Bonavides, ao falar sobre os fins do Estado, esclarece: “O problema da teleologia
estatal, voltou, nos últimos anos, a prender o interesse do direito e da sociologia. A obra de
Marcel de La Bigne, L’Ativité Étatique, é prova de que se renovam esses estudos e de que o
organismo jurídico das modernas doutrinas pragmatistas, assim como o mecanicismo
antiestatal de Marx, não sepultaram, em definitivo, qual fora de supor, esse capítulo deveras
fascinante da doutrina, pelo ângulo jurídico, pelo aspecto sociológico que o mesmo
comporta. Nunca alcançará o pensador riscá-lo da ciência jurídica enquanto o direito for
também filosofia. E sê-lo-á sempre, pois quem haverá de arredar do espírito humano essa
ansiosa indagação de verdade, essa eterna insatisfação perante o ser e o dever ser, as formas
realizadas e não realizadas da vida?(Teoria do Estado, p 109).
198
José Joaquim Calmon de Passos define o Poder como “capacidade, para qualquer instância
que seja (pessoal ou impessoal) de levar alguém (ou vários) a fazer (ou a não fazer) o que,
entregue a si mesmo, ele não faria necessariamente ( ou faria talvez ) (Direito, poder, justiça e
processo: julgando os que nos julgam. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p 45).
118
A educação para a reflexão, a razão e para a crença nos valores espirituais, sociais e
morais impõe-se a uma sociedade que se pretende civilizada. O Estado deve trazer para si o
poder de educar em liberdade e democraticamente
os seus cidadãos, pois nos dias atuais,
apenas se legitima o atuar segundo leis de democracia e liberdade, especialmente por ser, o
povo, o titular do Poder.
199
Falando sobre a busca da razão possível, Luis Roberto Barroso propugna:
A despeito de seus eventuais limites, ela (a razão) conserva dois conteúdos
de especial valia para o espírito humano: (i) o ideal de conhecimento, a
busca do sentido para a realidade, para o mundo natural e cultural e para as
pessoas, suas ações e obras; (ii) o potencial da transformação, o instrumento
crítico para compreender as condições em que vivem os seres humanos e a
energia para interferir na realidade, alterando-a quando necessário.
200
De outro ponto de vista, ser educado para o pleno desenvolvimento de todas as suas
potencialidades é direito fundamental e inalienável de todo homem. Somente com a educação
plena e para o desenvolvimento das múltiplas inteligências e das suas múltiplas capacidades é
que, de fato, a ordem jurídica poderá pretender efetivo respeito e realização do princípio da
igualdade humana e da isonomia.
Não propiciar aos homens a experiência do autoconhecimento e do conhecimento do
mundo, bem como impedir o desenvolvimento de espírito crítico implica efetiva construção
de desigualdades e equivale a cerrar as portas da evolução humana e a esvaziar o sentido da
vida.
A educação, a nosso ver, deve ser função do Estado,
201
apresentando-se em três faces
essenciais: a) é a mais inafastável função
202
estatal; b) é o mais legítimo e inalienável direito
do homem, ao qual todos os demais devem reverência; e, c) é legítimo direito da sociedade,
no exato significado de possuir, essa sociedade, o direito e o dever de exigir educação social
para o pleno desenvolvimento da pessoa humana, como condição viabilizadora da vida em
coletividade.
199
Nada mais inadequado nos dias atuais que a ideia maquiavélica de um poder central
soberano, legiferante e capaz de decidir sem compartilhar esse poder com ninguém.
200
Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro. In: Eros Grau;
Sergio Sérvulo da Cunha (orgs.). Estudos de direito constitucional em homenagem a José
Afonso da Silva, p 28.
201
Condorcet defende que além de necessária, a instrução deve ser pública, pois ela diz respeito
ao exercício da soberania, sendo assim, uma questão de liberdade pública e não de liberdade
privada. (Cinco memórias sobre a instrução pública, p 17).
202
Não nos esqueçamos que função é DEVER.
119
Educar para o exercício da liberdade
203
e da razão
204
é dever fundamental do Estado e
constitui, para o cidadão, o direito inalienável de ser educado, um direito fundamental que se
sobrepõe, pela importância, a qualquer outro direito.
É urgente educar para a convivência ética, para a liberdade e para a fraternidade, e é
aqui, no campo da fraternidade, que tentaremos ir além dos gregos, “pois o mundo grego é um
mundo aristocrático, quer dizer, um universo que repousa inteiramente na convicção de que
existe uma hierarquia natural dos seres.”
205
É urgente educar para o exercício consciente do livre-arbítrio,
206
pois como bem expõe
Luc Ferry,
A força, a beleza, a inteligência, a memória etc., em resumo, todos os dons
naturais herdados no nascimento, são, com certeza, qualidades, mas não no
plano moral, pois todos podem ser postos a serviço do pior ou do melhor. Se
você utiliza sua força e inteligência ou beleza para realizar o crime mais
abjeto, você demonstra, por esse fato mesmo, que os talentos naturais não
têm absolutamente nada de virtuosos em si.
207
203
Talvez, quem sabe, lográssemos vivenciar, verdadeiramente o sentido de liberdade e o
princípio da liberdade que, em muitas democracias ainda são mais formais que reais. Maria
Garcia chama atenção para o fato, quando notícia que, em muitos países europeus e
Constituições, as liberdades individuais são garantidas mais formalmente do que
materialmente. Sua validez absoluta estará restringida por cláusulas limitativas, de forma que
somente poderão ser exercidas dentro dos limites das leis gerais. (Maria Garcia.
Desobediência civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 288).
204
Spinoza, afirma: “Por vida Humana entendo a que se caracteriza, não pela circulação do
sangue e outras funções comuns a todos os animais, mas pela razão, sobretudo pela virtude e a
verdadeira vida.” (Tratado político. Tradução Norberto de Paula Lima. São Paulo: Ícone,
2005, p 59).
205
Luc Ferry. Aprender a viver: filosofia para os novos tempos. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007,
p. 91.
206
Luc Ferry lembra, quando fala de ética, liberdade, igualdade e fraternidade que “O que é
moral ou imoral é a liberdade de escolha, o que os filósofos vão chamar de livre-arbítrio, e, de
modo algum, os talentos da natureza enquanto tais. Esse ponto pode lhe parecer secundário ou
evidente...Para falar com clareza: com o cristianismo, saímos do universo aristocrático para
entrar no da meritocracia, quer dizer, num mundo que vai, inicialmente e antes de tudo,
valorizar não as qualidades naturais da origem, mas o mérito que cada um desenvolve ao usá-
las. Assim, saímos do mundo natural das desigualdades parar no mundo artificial, no sentido
em que é construído por nós, da igualdade. Pois a dignidade dos seres humanos é a mesma
para todos, quaisquer que sejam as desigualdades de fato, que ela repousa, desde então, na
liberdade e não mais nos talentos naturais. A argumentação cristã é ao mesmo tempo simples
e forte. Substancialmente, ela nos diz o seguinte: existe uma prova indiscutível de que os
talentos herdados naturalmente não são intrinsecamente virtuosos, que não têm nada de moral
em si mesmos, e que todos, sem exceção, podem ser utilizados tanto para o bem como para o
mal. (Aprender a viver: filosofia para os novos tempos, p. 92-93).
207
Aprender a viver: filosofia para os novos tempos , p. 91.
120
É necessário pensar o mundo e nos situarmos nele de forma ativa e produtiva, que
somos os construtores da sociedade e a própria sociedade. É urgente que construamos leis que
deem um sentido lógico ao agir humano e que ofereçamos, aos cidadãos, a oportunidade e o
direito de escaparem à superficialidade, pois como bem ressalta Luc Ferry, [...] a partir daí
cabe ao homem, pelo esforço de seu pensamento, introduzir sentido e coerência num mundo
que parece a priori não possuir nenhum, contrariamente ao cosmos dos antigos”.
208
5.1 Ensinamentos necessários à realização dos primeiros objetivos da educação
Para atingir o objetivo maior de constituir uma sociedade avançada em termos
humanos, cremos serem necessários determinadas aprendizagens fundamentais e processos,
que passamos a descrever em itens.
1) Entendemos serem necessários a aquisição de conhecimentos e o
desenvolvimento de um processo cognitivo, que perdurem por toda a existência
humana, pois o conhecimento e a solução de problemas levam-nos sempre a
novas descobertas e a novos problemas, que requerem sempre novas soluções.
Para assumir a humildade do eterno aprendiz, vale refletir sobre ensinar a
modéstia socrática, conclamada por Platão na Apologia a Sócrates e sobre a qual
tão bem discorre Karl R. Popper.
209
2) Tal ensinamento atuará de forma que promova, em todo cidadão, a ânsia por
conhecimentos novos e a busca constante de informações que, certamente,
contribuirão para o desenvolvimento do pensamento consciente e para a
assimilação e valoração dessa sede obsessiva de aprendizagem.
A modéstia socrática é importante ensinamento de vida, pois nos conclama não
apenas à humildade intelectual, mas também à espontaneidade, e nos exorta ao
espírito investigativo, à pesquisa, à procura por novos conhecimentos e à
especialização dos conhecimentos adquiridos, sem a arrogância que obscurece a
mente, mas com espírito curioso e aberto a novas descobertas.
210
208
Ibidem, p.126.
209
Em busca de um mundo melhor. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 50
.
210
Ernest Renan, falando sobre a instrução em Jerusalém na época de Jesus, afirma a existência,
no Oriente, de uma cultura moral e, principalmente, que o espírito geral da época se transmite
121
3) De outro modo, a amplitude dos sentidos humanos indica-nos que muito existe
a ser aprendido, apreendido e descoberto a respeito da própria personalidade
humana, e isso só será possível por meio de correta ação educacional, que
patrocine o espírito investigativo e a honestidade científica, na busca constante
de esclarecimentos e de mais verdades. Não certezas, pois, como bem ressalta
Popper,
211
a certeza é relativa, mas a verdade no sentido kantiano, de
correspondência entre o conhecimento e o objeto.
4) É necessário ensinar, desde a mais tenra idade, a identidade humana,
212
a moral
humana, o respeito aos direitos fundamentais, aos direitos de cidadania, o direito
constitucional e os direitos do homem, bem como os limites, que são postos pelo
ordenamento jurídico, ao exercício do poder.
Em outro momento,
213
afirmamos a necessidade de refletir e repassar os
ensinamentos de Edgard Morin, a respeito dos sete saberes necessários à educação do futuro
que, novamente, transcrevemos:
a. O primeiro saber, que todo ser humano deve adquirir, é conhecimento.
Conhecimento que, segundo ele, não é um problema restrito aos filósofos. É
um problema de todos, e cada um deve levá-lo em conta desde muito cedo e
explorar as possibilidades de erro, para ter condições de ver a realidade.
b. O segundo saber é o conhecimento pertinente que, afirma o autor, é aquele
que não mutila o seu objeto e que o obriga à contextualização.
entre os homens. Um árabe que nunca teve professor pode, muitas vezes, ser bastante culto,
pois a tenda é uma espécie de academia sempre aberta em que, do encontro de pessoas bem
educadas, nasce um grande movimento intelectual e até literário. (A vida de Jesus. São Paulo:
Martin Claret ,2006, p.110).
211
Em busca de um mundo melhor, p. 15-17.
212
Ensinamento que, segundo Renan, ao falar de Jesus no Templo, constava decididamente da
prática e do ensino cristãos naquela época. São Palavras de Renan: “Eis, na prática, seu ato
de mestre e criador. O templo exclui os não-judeus de seu recinto com cartazes desdenhosos.
Jesus não se aborrece com isso. Essa lei restrita, dura, sem caridade, é feita apenas para os
filhos de Abraão. O orgulho do sangue se apresenta para ele como o inimigo capital que
precisa ser combatido. Em outra palavras, Jesus não é mais judeu. Ele é revolucionário no
mais alto grau. Conclama todos os homens para um culto baseado em sua única qualidade de
filhos de Deus. Proclama os direitos do homem, não os direitos do judeu; a religião do
homem, não a religião do judeu; a libertação do homem, não a libertação do judeu. Ah! Como
estamos longe de um Judas Gaulonita, de um Matias Margalot, pregando a revolução em
nome da Lei! Está fundada a religião da humanidade, estabelecida não sobre o sangue, mas
sobre o coração. Moisés está ultrapassado: o Templo não tem mais razão de ser e está
irrevogavelmente condenado.” (A vida de Jesus, p. 245).
213
Antonia Teresinha de Oliveira. Políticas públicas e atividade administrativa. São Paulo:
Fiuza Editores, 2005, p. 123.
122
c. O terceiro saber é o descobrimento da identidade humana, identidade, esta,
totalmente ignorada pelos programas de instrução.
d. Esclarece a importância da educação para todas as manifestações humanas,
quando afirma ser preciso lembrar que rir, chorar, sorrir, não são atos
aprendidos ao longo da educação; são inatos, mas modulados de acordo com
a educação. Esclarece que é necessário fazer convergir todas as disciplinas
conhecidas para a identidade e para a condição humana.
e. O quarto saber é a “compreensão humana.” Ensina Morin que compreender
vem do latim, compreendere, que quer dizer colocar junto todos os
elementos de explicação, ou seja, não ter apenas um elemento de explicação.
É compreender não o outro, mas a si mesmo; a necessidade de
autoexaminar-se, de analisar a autojustificação, pois, afirma o estudioso, o
mundo está cada vez mais devastado pela incompreensão, que é o câncer do
relacionamento entre os seres humanos.
f. O quinto saber é a incerteza. Ressalta a importância de ensiná-la; lembra que
as escolas ensinam as certezas. Essa incerteza é uma incitação à coragem.
Enaltece a necessidade de futuras decisões serem tomadas, contando com o
risco do erro, e de estabelecer estratégias, que possam ser corrigidas no
processo da ação, a partir dos imprevistos e das informações disponíveis.
g. O sexto saber é o conhecimento da condição planetária, o conhecimento do
planeta e de seus problemas, sobretudo na era da globalização. Chama a
atenção para os perigos de vida e morte para a humanidade, como a ameaça
nuclear, a ameaça ecológica, o desencadeamento dos nacionalismos
acentuados pelas religiões. É preciso mostrar que a humanidade vive agora
em uma comunidade de destino comum.
h. O sétimo saber é o conhecimento que denomina de antropo-ético,
ressaltando a necessidade de o ser humano desenvolver, ao mesmo tempo, a
ética e a autonomia pessoal, por responsabilidade pessoal, além de
desenvolver a participação social ou responsabilidades sociais, uma vez que
compartilhamos um destino comum.
214
5) É necessário ensinar que a Teoria da Evolução, em vez de constituir teoria de
predadores, pode, com otimismo, aplicar-se às instituições que, por meio de ação
214
Os sete saberes necessários à educação do futuro. 5. ed. Tradução Catarina Eleonora F. da
Silva e Jeanne Sawaya. São Paulo: Cortez. 2002, p. 17.
123
efetiva de trabalho, consciência, valores éticos e morais, aperfeiçoamento
tecnológico e cultural, sofrerão o impacto de processo de aperfeiçoamento de
funções e órgãos estatais e sociais, tornando mais pacifica e harmoniosa a
sociedade.
6) Importante é compreender, com Julien Benda, que “os valores intelectuais, cujos
principais são a justiça, a verdade e a razão, destacam-se pelas três
características seguintes: eles são estáticos; eles o desinteressados, eles são
racionais.”
215
É obvio que Julien Benda se refere à verdade e, não, à certeza. Pois a certeza
comporta graus, o dissemos e repetimos, mas a verdade, no sentido kantiano de
correspondência entre conhecimento e objeto, pode ser encontrada e constitui valor absoluto e
não relativo, como querem alguns.
Desse modo, ressaltamos, conhecimento estático, para Julien Benda, não significa
conhecimento definitivo, nem tampouco ciência estática. Significa um combate ferrenho ao
relativismo, que afirma estar cada um certo na sua maneira de pensar ou, como afirma Popper,
quando admitimos que o outro tem razão e que talvez tenhamos
errado, isso não significa que importa apenas o ponto de vista e que,
como dizem os relativistas, cada um está certo do seu ponto de vista e
errado de um outro ponto de vista. Nas democracias ocidentais muitos
aprenderam que às vezes estão errados e seus adversários, certos; mas
muitos deles que absorveram essa importante lição caíram no
relativismo. Em nossa grande tarefa histórica de criar uma sociedade
livre, pluralista – como moldura social para uma autoemancipação
pelo conhecimento -, nada nos é mais necessário do que nos
educarmos para uma atitude que nos permita ver criticamente nossas
próprias ideias, sem nos tornarmos relativistas ou céticos; e sem
perdermos a coragem e a determinação para lutar por nossas
convicções.
216
7) É necessário estabelecer a compreensão definitiva de que a liberdade
217
existe com a educação, como já tivemos oportunidade de escrever.
8) Liberdade e otimismo, pois o descrente e o pessimista nada realizam, nada
constroem. Não confiam em nada e porque não confiam, não podem acreditar.
Evidenciamos a lição de Popper.
215
Julien Benda. A traição dos intelectuais. Tradução Paulo Neves. São Paulo: Peixoto Neto, 2007, p. 105.
216
Em busca de um mundo melhor, p. 189-190
217
Amartya Sen ensina que “a condição de agente dos indivíduos é, em última análise, central
para lidar com as privações. Por outro lado, a condição de agente de cada um é
inescapavelmente restrita e limitada pelas oportunidades sociais, políticas e econômicas de
que dispomos” (Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000,
p. 10).
124
é necessária uma visão otimista que afaste o mito da malignidade
radical do mundo, pois a pressão ativa da seleção interna é a busca por
melhores ambientes, por melhores nichos ecológicos, por um mundo
melhor. Ela é no mais alto grau favorável a vida, torna o ambiente
mais favorável à vida e mais amistoso aos seres humanos...Os
organismos são ativos: estão constantemente ocupados em solucionar
problemas. A solução é, com frequência, a escolha ou a construção de
um novo nicho ecológico. Os organismos não são apenas ativos; sua
atividade está em contínuo crescimento[...].
218
E, por fim, Karl R. Popper, ao discorrer sobre a formação da realidade, aborda, para
essa formação, três mundos enumerados hipoteticamente: número 1, o mundo físico; número
2, o mundo das vivências dos seres humanos; o número 3, o mundo dos produtos objetivos do
espírito humano. Ele afirma que a formação da realidade é a
interação entre o mundo 1 e o mundo 2 e o mundo 3 e que esta interação
consiste em múltiplos mecanismos de feedback na qual trabalhamos com o
método de tentativa e erro. Isto é, nós intervimos conscientemente nessa
espiral de mecanismos de feedback. s: o espírito humano, nossos sonhos,
nossos objetivos. Somos autores da obra, do produto, e, ao mesmo tempo,
somos moldados por essa obra.
219
(grifos nossos)
E, concluindo o raciocínio, sustenta que “isto é de fato o que há de criativo no homem:
nós, na medida em que criamos, somos ao mesmo tempo transformados por nossa obra. A
formação da realidade é, portanto nossa, obra”.
220
E é na qualidade de artífice da obra, afirmamos nós, que o espírito humano poderá
aprimorá-la e aperfeiçoá-la pelo seu próprio desenvolvimento e pela especialização dessa
função educacional, que patrocinará mais seguramente essa evolução, com maior detença nos
problemas e na compreensão das inteligências intelectual, espiritual, emocional, moral do
homem. Estas requerem especial atenção, não apenas em relação ao aprendiz, mas também
em relação ao mestre, ao professor, ao educador, que é referencial e paradigma, nessa relação
ensino/aprendizagem. Proporcionará, assim, preparo especializado e concentração de funções
a agentes e órgãos que atuam no desempenho dessa atividade.
218
Em busca de um mundo melhor, p. 31.
219
Ibidem, p. 45
.
220
Ibidem, p. 45.
125
6 O CONCEITO DE EDUCAÇÃO IMBRICADO NO CONCEITO DE
CONSTITUIÇÃO
Refletir a respeito do Estado, da sociedade e da organização jurídica e sobre a sua
modelagem e efeitos sociais, implica a imposição de enfrentarmos a necessidade de pensar o
humanismo, com a perspectiva de oferecer um sentido lógico à vida humana, pois todas as
criaturas possuem direito a um projeto de vida social bem elaborado, bem estruturado e em
regime de liberdade; à educação para a cidadania, para a democracia, para a vivência fraterna
sob as mesmas leis, projeto, este, direcionado por políticas públicas efetivas, que tornem real
o desenvolvimento humano pelo conhecimento, primeiro, de si mesmo e, depois, do mundo à
sua volta.
John Rawls observa que:
[...] em se tratando de cidadãos, um certo tipo de organização das
instituições políticas e sociais básicas é mais apropriado à realização
dos valores de liberdade e igualdade. Os dois princípios de justiça são:
todas as pessoas têm igual direito a um projeto inteiramente
satisfatório de direitos e liberdades básicas iguais para todos, projeto
este compatível com todos os demais; e, nesse projeto, as liberdades
políticas, e somente estas, deverão ter seu valor equitativo garantido;
as desigualdades sociais e econômicas devem satisfazer dois
requisitos: primeiro, devem estar vinculadas a posições e cargos
abertos a todos, em condições de igualdade equitativa de
oportunidades; e, segundo, devem representar o maior benefício
possível aos membros menos privilegiados da sociedade.
221
A esse projeto estruturante, apenas o constitucionalismo, esse movimento inovador,
utilizando-se do seu importante meio e instrumento de atuação, que é o direito constitucional,
poderá oferecer respostas e soluções.
Em face dos graves problemas e crises da sociedade atual, que surgem em razão da
complexidade de suas relações e de urgentes e constantes modificações e transformações,
requerendo pronta solução de problemas jurídico-políticos, tornando as constituições
modernas verdadeiros instrumentos abertos às transformações sociais, o constitucionalismo
abrir-se-á para abrigar as emergências libertárias e educacionais.
Konrad Hesse, com razão, expõe:
221
O liberalismo político. Tradução Dinah de Abreu Azevedo. Revisão Alvaro de Vita. 2. ed.
São Paulo: Ática, 2000, p. 47.
126
A força normativa da Constituição não reside, tão-somente, na adaptação inteligente a
uma dada realidade. A Constituição jurídica logra converter-se, ela mesma, em força ativa,
que se assenta na natureza singular do presente (individuelle Beschaffenheit der Gegenwart).
Embora a Constituição não possa, por si só, realizar nada, ela pode impor tarefas. A
Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem efetivamente realizadas, se
existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se, a
despeito de todos os questionamentos e reservas provenientes dos juízos de conveniência, se
puder identificar a vontade de concretizar essa ordem.
222
(grifos nossos)
Nessa linha de raciocínio, surge a constitucionalização positiva de determinados
valores sociais, como solução para os mais aflitivos problemas sem, contudo, constituir,
por si, garantia de solução, numa sociedade cada vez mais complexa e para a qual não é mais
suficiente a disciplina jurídica constitucional, mas essencial, imprescindível, a formação
educacional/constitucional dos seus cidadãos.
Peter Härberle procura compreender o texto constitucional como o documento de uma
sociedade pluralista e aberta, como obra de vários partícipes, como ordem jurídica
fundamental do Estado e da sociedade. Enfatiza que as constituições não são atos
voluntaristas do poder constituinte, porque dizem respeito á evolução social da comunidade. É
o texto constitucional o reflexo de um processo interpretativo aberto. A democracia não se
desenvolve apenas no contexto de delegação de responsabilidade formal do povo para os
órgãos estatais (legitimação mediante eleições), até o último intérprete formalmente
competente, a Corte Constitucional. Numa sociedade aberta ela se desenvolve também por
meio de formas refinadas de mediação do processo público e pluralista da política e da práxis
cotidiana, especialmente mediante a realização dos direitos fundamentais.
223
O autor ressalta, ainda, que povo é também elemento pluralista na interpretação
constitucional: como partido político, como opinião científica, como grupo de interesse, como
cidadão. E arremata que a sua competência objetiva para a interpretação constitucional é um
direito da cidadania, no sentido exposto no artigo 33 da Lei Fundamental Alemã.
224
Com supedâneo nos ensinamentos de Peter Härberle, anotamos que a legitimação da
participação popular só será efetivamente concreta se o cidadão possuir amplas possibilidades
de efetuar escolhas, ditadas pelo grau de maturidade educacional e cultural, fomentadas pelas
222
A força normativa da Constituição, p. 19.
223
Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição:
contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Tradução
Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2002, p. 36-37.
224
Ibidem, p. 37.
127
forças políticas progressistas e éticas, que têm o dever de formar a realidade social sobre a
qual atuam.
O direito, legitimador da ação do Estado, deverá promover e incentivar a criação de
meios eficientes, pluralistas e democráticos, que possibilitem o mais alto grau de educação
para cidadania, como a única forma de realizar a verdadeira democracia e a justiça social,
meta e ideal dos seres humanos em todos os tempos e lugares.
Não podendo resolver, por simples juridicização, os difíceis problemas sociais, o
constitucionalismo poderá, todavia, permitir inovações e aperfeiçoamentos no próprio
mecanismo e nas estruturações estatais, permitindo e possibilitando que o modelo seja
aperfeiçoado, pois, como o dissemos, as suas formidáveis possibilidades inovadoras
permitem novas bases e estruturas, uma nova conformação de Estado.
A função educacional, a possibilitar a formação da pessoa humana cidadã muito mais
consciente, com valores morais, sociais e democráticos sólidos, é a resposta segura a um
número imensurável de problemas humanos.
A especialização da função educacional afastará o caos social hodierno e os sofismas
políticos, as soluções paliativas e eleitoreiras, os enganos e a indiferença. Afasta-se, assim, a
educação sem valores e sem comprometimentos com o bem social.
Com o título deste capítulo “Conceito de Constituição imbricado no conceito de
Educação” e considerando que o verbo “imbricar” tem o sentido de superposição e que a
palavra constituição possui significado complexo como bem ressalta José Afonso da Silva,
o termo é empregado em vários sentidos, tais como: a) o conjunto dos elementos essenciais de
alguma coisa; b) temperamento, compleição do corpo humano; c) organização, formação d) o
ato de estabelecer juridicamente e) conjunto de normas que regem uma corporação; e, por
último, f) a lei fundamental de um Estado –, queremos afirmar que, tanto a constituição,
quanto a educação possuem, essencialmente, o poder de formar”, “estruturar”. A
constituição forma o Estado, e a educação forma o cidadão que comporá, como elemento
necessário, esse Estado. Ambos os termos, constituição e educação, trazem ínsitos em seu
significado a ideia de formação, organização, estruturação.
José Afonso da Silva, ao explicar o vocábulo “constituição”, ensina que todas as
acepções são analógicas, pois exprimem a ideia de modo de ser de alguma coisa, a de
organização interna de seres e entidades e arremata que é “nesse sentido que se diz que todo
Estado tem Constituição, que é o simples modo de ser do Estado”:
A constituição do Estado, considerada sua lei fundamental, seria, então, a organização
dos seus elementos essenciais: um sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, que
128
regula a forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisição e o exercício do
poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação, os direitos fundamentais do
homem e as respectivas garantias. Em síntese, a constituição é o conjunto de normas que
organiza os elementos constitutivos do Estado.
225
Em termos jurídicos, constituição significa a organização normativa de um Estado,
que Bulos define como “organismo vivo delimitador da organização estrutural do Estado, da
forma de governo, da garantia das liberdades públicas, do modo de aquisição do exercício do
poder”.
226
E ensina: “O termo constituição encontra origem no verbo latino constituere,
exteriorizando a ideia de constituir, estabelecer, firmar, formar, organizar, delimitar”.
227
Bulos também ressalta que o conceito está em constante crise, pois inexiste consenso a
seu respeito, pluralizando-o sob muitos enfoques, tais como: o sociológico, exposto por
Ferdinand Lassalle; o jurídico, exposto por Hans Kelsen; o político, exposto por Karl Schmitt;
o jus naturalista, cujo defensor é Victor Cathrein; o positivista, exposto por Laband e Jellinek;
o sentido marxista, exposto por Karl Marx; o institucionalista, exposto por estudiosos como
Santi Romano, Maurice Hauriou, Georges Renard e Constantino Mortati.
228
Marcello Cerqueira afirma que:
A precariedade do estudo diacrônico das constituições escritas impõe uma visão
sincrônica de princípios e de problemas estruturais do constitucionalismo, além do exame de
determinadas práticas políticas e jurídicas. Mais do que o sentido manifesto dos textos (dos
fatos), interessa o sentido implícito que esses textos (esses fatos) cobram quando relacionados
com outros textos.
229
Canotilho, discorrendo sobre o constitucionalismo e aquilo que denomina “os diversos
movimentos constitucionais”, afirma que o constitucionalismo moderno legitimou a
constituição moderna que “é a ordenação sistemática e racional da comunidade política
através de um documento escrito no qual se declaram as liberdades e os direitos e se fixam os
limites do poder político”.
230
Após desdobrar o conceito com o objetivo de captar as suas dimensões fundamentais,
afirma que esse conceito não corresponde a nenhum dos modelos históricos de
225
Curso de direito constitucional positivo. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003
226
Uadi Lammego Bulos. Curso de direito constitucional, p. 28.
227
Ibidem, p. 28.
228
Ibidem, p. 28.
229
A Constituição na história: sentido e reforma. 2. ed. rev. Rio de Janeiro: Revan, 2006
, .
230
Direito constitucional e teoria da Constituição, p.48.
129
constitucionalismo e acentua que um “Englishman sentir-se-á arrepiado ao falar de ordenação
sistemática e racional da comunidade através de um documento escrito”, pois para ele a
Constituição - The English Constitution - será a sedimentação histórica dos direitos adquiridos
pelos ingleses e o alicerçamento, também histórico, de um governo balanceado e moderado, e
alerta:
Podemos desdobrar o conceito, de forma a captarmos as dimensões fundamentais que
ele incorpora: (1) ordenação jurídico-politica plasmada num documento escrito (2) declaração
nesta carta escrita de um conjunto de direitos fundamentais e do respectivo modo de garantia
(3) organização do poder político segundo esquemas tendentes a torná-lo um poder limitado e
moderado.
231
Com essas linhas, ressaltamos a inamovibilidade da ideia de uma constituição,
presente em todas as épocas, remotas ou contemporâneas, e a remota ideia do
constitucionalismo, que reside alicerçada na compreensão inarredável de “formação”,
“instituição”, “criaçãodo Estado soberano, enquanto a educação cuida da formação do seu
elemento fundamental: o povo.
6.1 O Conceito de Educação
Presente, igualmente, repetimos, no conceito de educação, a ideia ínsita de “criar”,
“formar”, constituir e organizar o espírito humano pela atuação de políticas do Estado e
outras, como projeção do Estado Democrático instituído no preâmbulo da Carta de 1988 e,
também, explícito nos objetivos fundamentais do Estado, estabelecidos no artigo da
Constituição Federal e que se expressam nos firmes desideratos de construir uma sociedade
livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a
marginalização, reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Essas finalidades, obviamente, não são realizadas por milagrosos decretos ou por
miraculosas leis. A verdadeira desigualdade é combatida eficazmente com a educação para o
pleno desenvolvimento da pessoa humana, em bases de liberdade, democracia.(artigo 205 CF)
e por trabalho constante e especializado em prol do aprimoramento do cidadão, como ousa
231
Direito constitucional e teoria da Constituição, p. 48.
130
prometer Comenius (o grande educador Jan Amos Seges, depois Komensky, da aldeia de
Komna), em sua Didática Magna:
Educar é a arte de ensinar tudo a todos: de ensinar de modo certo, para obter
resultados; de ensinar de modo fácil, portanto sem que docentes e discentes
se molestem ou enfadem, mas ao contrário, tenham grande alegria; de
ensinar de modo sólido, não superficialmente, de qualquer maneira, mas para
conduzir à verdadeira cultura, aos bons costumes, a uma piedade mais
profunda.
232
Em notável lição, ensina a arte de ensinar tudo a todos, ou seja, o modo certo e
excelente para criar em todas as comunidades, cidades ou vilarejos de qualquer reino cristão,
escolas em que a juventude dos dois sexos, sem excluir ninguém, possa receber uma
formação em letras, ser aprimorada nos costumes, educada para a piedade e, assim, nos anos
da primeira juventude, receba a instrução sobre tudo o que é da vida presente e futura, de
maneira sintética, agradável, sólida.(grifos nossos)
Os princípios de tudo o que se aconselha são extraídos da natureza das
coisas; a verdade é demonstrada através de exemplos paralelos das artes
mecânicas; a ordem dos estudos é disposta segundo anos, meses, dias, horas;
o caminho, enfim, fácil e seguro, é mostrado para pôr essas coisas em prática
com bom êxito.
Que a proa e a popa da nossa didática sejam: buscar e encontrar um método
para que os docentes ensinem menos e os discentes aprendam mais, que nas
escolas haja menos conversa, menos enfado e trabalhos inúteis, mais tempo
livre, mais alegria e mais proveito; que na república cristã haja menos trevas,
menos confusão, menos dissensões, mais luz, mais ordem, mais paz e
tranquilidade.
Didática significa a arte de ensinar: de não muito tempo a esta parte homens
ilustres têm-se empenhado em estudar essa arte.
Alguns saíram em busca de compêndios para ensinarem, mais facilmente
apenas esta ou aquela língua; outros tentaram caminhos mais rápidos para
poder ensinar esta ou aquela ciência ou arte. Outros buscaram outras coisas.
Quase todos obraram com observações extrínsecas extraídas de uma prática
demasiado superficial, ou, como se diz, a posteriori [...]
Finalmente, demonstramos essas coisa a priori, partindo da própria natureza
das coisas, como se fizéssemos brotar de uma fonte viva regatos perenes,
que se unissem depois num único rio para constituir uma arte universal, a
fim de fundar escolas universais”
Ensinar é, portanto, tarefa árdua que requer juízo atento não de um só
homem, mas de muitos, porque ninguém pode ser tão atilado que não lhe
escapem muitas coisas.
233
Ensinar é, enfim, trabalho que requer persistência, especialização de funções,
eficiência, constância, controle, fiscalização, acompanhamento e aparelhos estruturais
próprios.
232
Didática magna. Tradução Ivone Castilho Benedetti. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p.
13-14.
233
Ibidem, p. 12-14.
131
Rousseau afirma que “a educação natural deve tornar um homem próprio para todas as
condições humanas” , e o verbo tornar tem aqui o significado de formar; Norberto Bobbio,
citando Kant, preceitua:
É fato hoje inquestionável que a Declaração Universal dos Direitos do
Homem, de 10 de dezembro de 1948, colocou as premissas para transformar
também os indivíduos singulares e não mais apenas os Estados, em sujeitos
jurídicos de Direito Internacional, tendo assim, por conseguinte, iniciado
uma nova fase do direito internacional, a que torna esse direito não apenas o
direito de todas as gentes, mas o direito de todos os indivíduos.
234
Instamos possa, quiçá, ser, igualmente, o sujeito de direito a construir a sua própria
história, sujeito de direito a construir o seu próprio caminhar, a compreender o sentido que
empresta ao seu caminhar, com consciência e conhecimento.
Deveras, pois, ao investigar o pensamento dos mais renomados educadores, constata-
se a presença da ideia de que a educação é a formação, a organização do espírito humano e da
cidadania.
6.2 A Natureza Jurídica dos Serviços Educacionais
Analisar a natureza jurídica dos serviços públicos não é tarefa fácil, que o assunto
envolve histórica e conhecida polêmica jurídica e política a respeito do próprio conceito e
abrangência, bem como da sua permanência e extensão nos dias atuais.
Tema fundamental do direito administrativo, importante ponto nuclear da disciplina,
sobre ele incide toda a tensão originária da evolução tecnológica e científica, que altera e
promove mudanças e evoluções nas atribuições do Estado.
Para muitos, cuida-se do núcleo central conceitual da disciplina. Sobre ele, jorra toda a
força inovadora jurídico-tecnológica, a desencadear processo evolutivo e, repetimos, a impor-
lhe alterações, modificações, substituições de tradicionais paradigmas. Nesse fluxo e refluxo,
promove, ele mesmo, inúmeras alterações.
Dinorá Adelaide Musetti Grotti salienta:
Serviço público é tema polêmico desde o instante mesmo em que
surgiu, pois leva a enfrentar questões políticas e jurídicas essenciais.
Trata-se de definir a função do Estado, avaliar os seus limites de
234
A era dos direitos. Tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p
93.
132
atuação e o âmbito reservado à livre iniciativa dos particulares. O
tema não é novo, mas, digamos, apresenta-se renovado.
As instituições jurídicas estão intimamente ligadas às relações entre
Estado e sociedade no momento histórico em que se desenvolvem.
Essas relações são dinâmicas e vão-se alterando de acordo com as
circunstâncias ideológicas, econômicas, políticas e sociais que se vão
apresentando nas diferentes épocas e nos diferentes países.
235
De forma abreviada, indicaremos os pontos principais da evolução do conceito de
serviço público, desde a sua formulação inicial.
O conceito sócio-político de serviço público (Rousseau) migra para o plano jurídico,
na França e em outros países onde se enraizou aquela noção, com duas conotações: é
atividade estatal e atividade destinada a satisfazer necessidade coletiva da sociedade.
No Estado liberal do século XIX, prevalecia o distanciamento do Estado da vida
social, econômica e religiosa dos indivíduos. As reduzidas funções do Estado implicavam sua
não interferência na sociedade.
Com o passar do tempo e até meados do século XIX, não havendo grupos interpostos
entre o Estado e a sociedade, caracterizando-se o isolamento político do indivíduo diante do
Estado, este teve que assumir, aos poucos, tarefas até então consideradas estranhas às suas
funções. Eram atividades desenvolvidas pela sociedade, organicamente estruturada, ou seja,
pela Igreja, universidades, fundações e corporações.
Neste contexto, do Estado liberal ou abstencionista, surge o conceito técnico-jurídico
de serviço público, no campo do direito administrativo.
No início do século XX, desenvolve-se a teoria do serviço público, com a Escola do
Serviço Público, chefiada por Duguit, seguido de Jèze, Bonnard, Rolland e De Laubadère.
O serviço público é reconhecido, no pensamento de Léon Duguit e na França, como
verdadeira essência do Direito Administrativo. Surgiu, naquele país, com a proposta
inovadora de substituir a noção de “poder pela ideia de serviço aos administrados”.
236
Maria Sylvia Zanella Di Pietro informa que León Duguit “considerava o serviço
público como atividade ou organização, em sentido amplo, abrangendo todas as funções do
Estado, sem distinguir o regime jurídico a que se sujeita essa atividade”.
237
Para Jèze,
dizer que, em determinada hipótese, existe serviço público, equivale a
afirmar que os agentes públicos, para darem satisfação regular e contínua a
235
Dinorá Adelaide Musetti Grotti. O serviço público e a Constituição brasileira de 1988
. São
Paulo: Malheiros, 2003, p 13.
236
Celso Antonio Bandeira de Mello. Curso de direito administrativo, p 620.
237
Direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 44.
133
certa categoria de necessidades de interesse geral, podem aplicar os
procedimentos de direito público, isto é, um regime jurídico especial, e que
as leis e regulamentos podem modificar a qualquer momento a organização
do serviço público, sem que a isto se possa opor qualquer obstáculo
insuperável de ordem jurídica. Sempre que se estiver na presença de um
serviço público, estar-se-á diante de um conjunto de regras jurídicas
especiais, de teorias jurídicas especiais que, em sua totalidade, têm por
objeto facilitar o funcionamento regular e contínuo do serviço público,
satisfazendo, do modo mais rápido e completo possível, as necessidades de
interesse geral.
238
O conceito clássico de serviço público compreendia três elementos: subjetivo (o
serviço público é o prestado pelo Estado), material (serviço público é a atividade que visa
satisfazer necessidades coletivas) e formal (serviço público é o prestado sob regime de direito
público).
Distanciando-se do liberalismo, o Estado, a par do crescimento de suas intervenções,
aumentou a relação de atividades próprias, definidas como serviço público. Diversas
atividades comerciais e industriais, peculiares da iniciativa privada, passaram a ser tidas
como serviços públicos.
Surgiu, também, a gestão de serviços públicos levada a cabo por particulares, por
meio de concessões e de pessoas jurídicas de direito privado, cridas para esse fim específico,
e subordinadas a regime jurídico de direito privado. De outro lado, atividades exercidas por
empresas privadas passaram a ser consideradas de caráter público.
A partir dos anos 50, a doutrina começou a discutir a crise da noção de serviço
público, que não havia acompanhado a mudança das condições sociais verificadas no Estado
pós-liberal. Firmou-se o entendimento de que os três elementos essenciais, doutrinariamente
utilizados para caracterizar o serviço público, não são essenciais, pois, às vezes, um, e até
dois, estão ausentes.
Ressaltando a existencia de elementos, na ideia de serviços públicos, Agustín Gordillo
afirma:
Dos três elementos essenciais da noção tradicional de serviço público
apenas o segundo permanece que é o fim que o serviço persegue; a pessoa
que o presta e o regime jurídico são os dois elementos desta noção que
entraram em crise há muito tempo.
239
238
Principios generales del derecho administrativo. Trad. da 3. ed. francesa por Julio N. San Millán Almagro.
Buenos Aires: Depalma, 1949. v. 2, t.1, p. 4.
239
Tratado de derecho administrativo. 3. ed. Buenos Aires: Fundación de Derecho
Administrativo, 1998. t. 2, p. 54.
134
A partir da última quadra do século XX, com as alterações advindas do Estado neo-
liberal, que pode ser caracterizado pela privatização e pela desregulação, o perfil do serviço
público sofreu importantes inovações.
Dinorá Adelaide Musetti Grotti discorre sobre as alterações ocorridas no modelo
europeu, tradicional berço da noção de serviço público, ressaltando que, devido às “alterações
no modelo de Estado o perfil do serviço público sofreu significativas inovações decorrentes
de normas oriundas da Comunidade Europeia, que buscaram dar um tratamento econômico a
atividades que sempre foram consideradas serviços públicos, em especial mediante a inserção
da concorrência nessas atividades”.
240
E acrescenta:
No primeiro momento, não se formulou qualquer distinção entre serviço
público e atividade econômica em sentido restrito. Veja-se que o Direito
Comunitário não consagrou tratamento próprio e distinto para o serviço
público aludindo antes a “serviços econômicos de interesse geral,”, referido
originariamente no art. 90-2 e depois no art. 86-2, do Tratado de Roma e a
que o Tratado de Amsterdã de 1997 deu ênfase especial, consolidando os
avanços da Comunidade ao erguê-lo ao plano dos valores comuns da União,
destacando sua importância na promoção e coesão social e territorial da
União, em seu art. 86. Nessa linha caminharam a Carta dos Direitos
Fundamentais da União Europeia, de 08.12.2000, publicada no Diário
Oficial das Comunidades Europeias de 18.12 e o Tratado que estabelece uma
Constituição para a Europa, assinada em 19.10.2004, e publicado no Diário
Oficial da União Europeia de 16.12.2004.
241
Escrevendo também sobre o tema, Jacques Chevallier lembra que:
Evocar as grandes linhas de evolução do serviço público nos alvores
deste século XXI defronta-se de imediato com obstáculo considerável:
o que se deve entender por serviço público? Não conduziria a
expressão a um contexto específico europeu, mesmo francês (os
franceses gostam de evocar a concepção francesa de serviço público,
que seria uma das manifestações da excepcionalidade francesa)?
242
Embora considere esse aspecto uma simples querela semântica, o autor noticia o
distanciamento da expressão “serviço público”, e registra a aparente preferência das instâncias
comunitárias, pelo menos até período recente, por expressões: “serviço de interesse
econômico geral,” “serviço universal,” “serviço de interesse geral”, esclarecendo que:
O serviço público evoca, no entanto, uma realidade mais simples e
corriqueira, a saber, a existência em todas as sociedades de um conjunto de
atividades consideradas como sendo de interesse comum e devendo ser, a
esse título, assumidas pela coletividade, ou seja, uma esfera de funções
240
A política educacional brasileira, p. 38.
241
Ibidem, p. 39.
242
As novas fronteiras do serviço público. Tradução Ana Carolina Wanderley Teixeira. Revista
Interesse Público, Belo Horizonte, n 51, p.146-166, set./out 2008, p. 146.
135
coletivas. Essa esfera pode ser concebida de maneira bastante variável. Ela é
indispensável à constituição e à sobrevivência dos grupos sociais.
Desprovida de referências demasiado contingentes, o serviço público
aparece como realidade bastante antiga, tão antiga quanto a história da
sociedade.
243
Afirma que “a impressão dominante, quando se observa a evolução que se produziu no
curso de duas décadas, é a de um estremecimento profundo e geral das concepções, que, no
curso do século XX balizavam a organização das funções coletivas.”
244
Lembramos que, enquanto o conceito de serviço público é conceito jurídico, o que
consta do tratado de Roma tem índole econômica, jungido à ideia de inamovibilidade, em
princípio, da concorrência.
A influência comunitária enfraqueceu a distinção entre regimes jurídicos de atividade
econômica privada e serviço público, suscitando discussões a respeito da utilidade da
permanência do conceito de serviço público ou, pelo menos, da sua utilidade, em face de
profundas alterações sofridas pelos pressupostos econômicos, sociais, políticos e culturais,
que foram a origem do serviço público e sustentaram seu desenvolvimento.
Do novo serviço público, marcado por nítida conotação econômica, emana modelo de
regulação para a competição, que pressupõe transformação dos modos de interpretação e de
aplicação de muitos dos princípios de organização e regime jurídico dos serviços públicos, na
tradição continental européia e na brasileira.
Os novos serviços públicos revestem formas diversas, tornando necessário, às vezes,
especial tratamento jurídico. Diante de sua diversificação e especialização, requerem
disciplina específica, desaparecendo a uniformidade de regime jurídico.
Veio à luz uma nova ordem, de grande complexidade, em que a competência
regulatória é retirada dos órgãos encarregados da prestação dos serviços públicos. Surgem
novos tipos de ajuste, decorrentes de consenso, acordo, cooperação, parceria.
A doutrina afirma que o conceito de serviço público enfrenta nova crise. Assim,
após a primeira, oriunda da assunção, pelo Estado, de atividades que não lhe eram próprias,
surge a segunda crise, a partir do abandono, pelo Estado, de atividades a ele atribuídas.
A respeito, afirma Alexandre Santos de Aragão, embasado na teoria desenvolvida por
Manuel Aragón Reyes:
As crises podem ter basicamente dois sentidos: situação de um instituto
quando se duvida de sua continuação; ou a sua relevante modificação no
decorrer de um processo. No primeiro caso, o sentido de “crise” incorpora da
243
Ibidem, p 147.
244
As novas fronteiras do serviço público. Tradução Ana Carolina Wanderley Teixeira.
Revista Interesse Público, Belo Horizonte, n 51, p.146-166, set./out 2008, p. 146.
136
dúvida sobre a própria continuidade da existência do instituto ou fenômeno;
no segundo, denota que ele prossegue existindo, ainda que transformado. É
nesse segundo sentido que se deve considerar que o serviço público está em
crise, que os serviços públicos continuam existindo e não nada que
possa nos levar a crer que, em um futuro razoavelmente próximo,
desaparecerão, o que não ilide, contudo, que já tenham sofrido e, atualmente,
mais uma vez, estejam sofrendo notáveis modificações.
245
As alterações introduzidas, na União Europeia, embora possam provocar mudanças
progressivas, não chegarão a eliminar a existência do serviço público.
Ensina Ruy Cirne Lima :
A definição do que seja, ou não, serviço público pode, entre nós, em caráter
determinante, formular-se somente na Constituição Federal e, quando não
explícita, de ter-se suposta no texto daquela. A lei ordinária que definir o
que seja, ou não, serviço público terá de ser contrastada com a definição
expressa ou suposta pela Constituição.
246
A Constituição Federal de 1988 qualificou algumas atividades como serviços
públicos, atribuindo-os à União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Sua prestação não
foi constitucionalmente limitada ao Estado, ou a quem lhe faça as vezes; por isto, os serviços
públicos podem ser privativos (exclusivos) do Estado, tais como os enumerados no artigo 21,
X e XI, e não privativos (não exclusivos). Nesta última categoria estão os serviços de
educação (arts. 205 e 209) e saúde (arts. 196 e 199).
Não é pacífico o entendimento a respeito da natureza jurídica dos serviços de
educação prestados por particulares, em contexto de exploração de atividade econômica. No
entendimento de Celso Antônio Bandeira de Mello,
247
de Maria Sylvia Zanella Di Pietro,
248
de Dinorá Adelaide Musetti Grotti,
249
tais serviços não serão públicos; submetendo-se,
somente, à autorização e fiscalização do poder público, no normal exercício do poder de
polícia.
Outra corrente, que se desenvolveu sob a inspiração das ideias de Léon Duguit e, no
Brasil, é defendida, entre outros, por Eros Roberto Grau, diverge deste entendimento.O autor,
abandonando a tese de que os chamados serviços públicos não-privativos deveriam ser
classificados como atividade econômica em sentido estrito, quando desenvolvidos pelo setor
privado e como serviços públicos, quando desenvolvidos pelo Estado, passou a considerar a
245
Alexandre Santos de Aragão. Direito dos serviços públicos. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 240.
246
Ruy Cirne Lima. Pareceres: direito público. Porto Alegre: Sulina, 1963. p. 122
247
Curso de direito administrativo, p. 650.
248
Direito administrativo, p. 122
249
O serviço público e a Constituição Brasileira de 1988, p. 97.
137
educação
250
e a saúde, prestadas pelo setor privado, como serviços públicos.
251
Assevera que
o raciocínio anterior lhe parece equivocado, pois a mesma atividade caracterizava-se, ou não,
como serviço público, conforme fosse desenvolvida pelo Estado ou por particular, o que se
lhe afigura insustentável, pois “o que torna os chamados serviços públicos não-privativos
distintos dos privativos é a circunstância de os primeiros poderem ser prestados pelo setor
privado independentemente de concessão, permissão ou autorização, ao passo que os últimos
apenas poderão ser prestados pelo setor privado sob um desses regimes”.
252
Eros Grau, citando Duguit e Cirne Lima, diz: “assume o caráter de serviço público
qualquer atividade cuja consecução se torne indispensável à realização e ao desenvolvimento
da coesão e interdependência social, ou em outros termos, qualquer atividade que
consubstancie serviço existencial relativamente á sociedade”
253
Com o objetivo de tornar clara a nossa exposição, queremos retomar o pensamento de
Eros Grau: “ a identificação dos casos nos quais a realização e o desenvolvimento da coesão e
da interdependência social reclamam a prestação de determinada atividade pelo Estado ( =
casos nos quais essa atividade assume caráter existencial em relação à sociedade) é
conformada pela Constituição.”
254
Também defensora desta corrente de pensamento é Odete Medauar, para quem:
250
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 10.989/93 DO ESTADO DE
PERNAMBUCO. EDUCAÇÃO: SERVIÇO PÚBLICO NÃO PRIVATIVO. MENSALIDADES
ESCOLARES. FIXAÇÃO DA DATA DE VENCIMENTO. MATÉRIA DE DIREITO CONTRATUAL.
VÍCIO DE INICIATIVA. 1. Os serviços de educação, seja os prestados pelo Estado, seja os prestados por
particulares, configuram serviço público não-privativo, podendo ser desenvolvidos pelo setor privado
independentemente de concessão, permissão ou autorização. 2. Nos termos do artigo 22, inciso I, da
Constituição do Brasil, compete à União legislar sobre direito civil. 3. Pedido de declaração de
inconstitucionalidade julgado procedente.
Decisão Após o voto do Senhor Ministro Eros Grau (relator), que dava pela procedência da ação, no que foi
acompanhado pelos Senhores Ministros Cezar Peluso e Carlos Velloso, e dos votos dos Senhores Ministros
Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Celso de Mello, que davam pela improcedência da ação, pediu vista dos
autos o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Ausente, justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro
Nelson Jobim (Presidente). Presidiu o julgamento a Senhora Ministra Ellen Gracie (Vice-Presidente). Plenário,
03.03.2005.
Decisão: Renovado o pedido de vista do Senhor Ministro Joaquim Barbosa,justificadamente, nos termos do §
do artigo da Resolução 278,de 15 de dezembro de 2003. Presidência do Senhor Ministro Nelson
Jobim.
Plenário, 30.03.2005.
Decisão: O Tribunal, por maioria, nos termos do voto do relator, julgou procedente a ação para declarar a
inconstitucionalidade da Lei 10.989, de 07 de dezembro de 1993, do Estado de Pernambuco, vencidos os
Senhores Ministros Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Celso de Mello, que a julgavam improcedente. Votou o
Presidente, Ministro Nelson Jobim. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Plenário,
31.08.2005.
251
Eros Roberto Grau. A ordem econômica na Constituição de 1988. 8. ed. São Paulo:
Malheiros, 2003, p. 108.
252
Ibidem, p.105-106.
253
Ibidem, p. 107.
254
Ibidem, p. 107.
138
A Constituição Federal fixou um vínculo de presença do Poder Público na
atividade qualificada como serviço público presença, esta, que pode ser
forte ou fraca, mas que não pode ser abolida. Esta presença se expressa na
escolha do modo de realização da atividade, na sua destinação ao
atendimento das necessidades da coletividade.
255
Paulo Modesto admite uma outra espécie de atividade,
256
ao lado dos serviços
públicos e das atividades econômicas e, nesta categoria, insere esses serviços: a categoria das
“atividades de relevância pública.” Os serviços de relevância pública não são serviços
públicos, nem atividades de exploração econômica; configuram zona jurídica intermediária,
que se destaca no fornecimento de utilidades vitais para os cidadãos e recebe proteção
diferenciada da Constituição Federal ( v.g.,art. 129,II)
Carlos Ari Sundfeld,
257
por sua vez, considera como serviços sociais, e não como
serviços públicos
258
, as atividades cujo desenvolvimento, pelos particulares, independe de
delegação estatal. Os “serviços sociais” têm como traço característico o não serem de
titularidade estatal, sendo livres aos particulares. A prestação daqueles serviços configura
dever inafastável do Estado, competência constitucionalmente outorgada para obrigar o seu
exercício, em contraponto ao direito subjetivo dos indivíduos de usufruí-los.
Assim, na linha de raciocínio do autor, ao serem prestados pelo poder público, os
serviços sociais subordinam-se ao regime de direito público e, desenvolvidos por particular,
255
Estudos de direito constitucional. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 537.
256
Reforma do Estado, formas de prestação de serviços ao público e parcerias público-
privadas: demarcando as fronteiras dos conceitos de “serviço público”, “serviços de
relevância pública”e “serviços de exploração econômica” para as parcerias público-
privadas. In Carlos Ari Sundfeld (coord.) Parcerias público-privadas. São Paulo:
Malheiros, 2005, p.464.
257
Fundamentos de direito público. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 83-84.
258
Carlos Ari Sundfeld, considerando seu conteúdo, sistematiza as atividades estatais em dois
grandes grupos: o das atividades instrumentais e o das atividades-fim. As primeiras servem
apenas ao aparelhamento do Estado para a realização das atividades-fim; as últimas
justificam a sua existência. As atividades-fim são classificáveis em três grupos distintos: o
das atividades de relacionamento com outros Estados ou com entidades internacionais; o das
atividades de controle social, que objetivam regular a vida em sociedade, utilizando o poder
de coerção (legislativa, judicial e de administração ordenadora); e o das atividades de gestão
administrativa. Estas últimas destinam-se a criar utilidades em favor do corpo social por
força direta da atuação estatal e incluem a prestação de serviços públicos; a prestação de
serviços sociais; a emissão de moeda e a administração cambial; outras atividades, ou seja,
as atividades desenvolvidas pelo Estado, úteis à sociedade, mas sem caráter econômico a
atividade de fomento; a realização de atividades culturais; os serviços estatísticos; a
construção de obras públicas que não sirvam de suporte a atividades estatais como os
monumentos (Fundamentos de direito público, p. 79-85).
139
ficam adstritos ao direito privado. A justificativa desta dualidade reside em que os serviços
sociais têm, simultaneamente, o caráter de atividade do Estado e atividade dos particulares.
259
.
Em face das divergências doutrinárias, adotamos a corrente segundo a qual, ao ser
prestada pelo Estado, a atividade subsume-se ao conceito de serviço público, e,
desempenhada pelos particulares, é conceituada como atividade prestada sob regime jurídico
privado, no âmbito de exploração de atividade econômica, resguardados os princípios que
orientam tal atividade (art.170 da CF).
Embora conte com a possibilidade de recorrer a parcerias para aumentar a efetiva
oferta dos serviços sociais, o Estado não pode, nem deve, eximir-se da responsabilidade de
assegurar e garantir os direitos sociais. Se não os executar, deverá fomentar ou financiar
diretamente os serviços sociais básicos.
259
Fundamentos de direito público , p. 84.
140
7 UMA ESTRUTURA INDEPENDENTE PARA A EDUCAÇÃO UMA
PROPOSTA DE LEGE FERENDA
A formação de nosso ambiente social com objetivo da paz e da não violência
não é apenas um sonho. É uma meta possível e, do ponto de vista biológico,
obviamente necessária para a humanidade.
260
Considerando que as instituições humanas e o seu modelo são escolhas humanas e
entendendo-as como escolhas feitas por homens, que vivem submersos num processo de
constantes experiências, justo é acreditarmos que essas instituições, assim como os
indivíduos, seus criadores, se submetem a um processo evolutivo, e que podemos, como
muito bem ensina John Stuart Mill, escrevendo sobre as instituições de governo, aperfeiçoá-
las. Verbis:
[...] Lembremos, então, em primeiro lugar, que as instituições políticas são
obras dos homens (embora vez por outra se ignore a proposição), devendo a
origem e a existência inteira à vontade humana [...] Sendo de início feito
pelos homens, estes terão de fazê-lo funcionar [...] torna-se necessário então
não a simples aquiescência, mas a participação ativa.
261
Ressalte-se, ainda, o fato de que a Constituição Federal nos impõe o dever de
solidariedade com relação ao meio ambiente ecológico, conforme expresso no artigo 225 do
texto fundamental, com relação à responsabilidade que nos compete em termos de meio
ambiente socialmente equilibrado e educado.
Devemos às gerações futuras meios e mecanismos mais seguros e saudáveis de
desenvolvimento. Devemos o exemplo de solidariedade, pois o homem sempre viveu e
sempre viverá em sociedade, e este, no dizer de Léon Duguit, é um fato primário e natural e
não o produto de uma vontade humana.” E é Duguit quem nos alerta:
Portanto, e sempre houve grupos sociais, e os homens que fazem parte
desses grupos têm, ao mesmo tempo, consciência da sua individualidade
própria e dos laços que os unem aos outros homens. Quais são esses laços?
Designam-se com uma expressão de que atualmente se abusa, mas que
permanece, apesar do descrédito que os políticos lançaram sobre ela, a mais
exata e a mais cômoda. O homem, diremos nós está ligado aos outros
homens pelos laços de solidariedade social. Para evitar a palavra
solidariedade, pode-se dizer interdependência social.
262
260
Karl R Popper. Em busca de um mundo melhor, p. 49.
261
O governo representativo. 3. ed. São Paulo: Ibrasa, 1995, p.6.
262
Fundamentos do direito. Tradução Ricardo Rodrigues Gama. São Paulo/Campinas, SP: LZN, 2003, p. 15-16.
141
Fundamentados na ideia de Léon Duguit de que uma regra de conduta só pode impor-
se a seres dotados de consciência e vontade”,
263
acreditamos ser possível e, mais, de todo
recomendável, que a República Federativa do Brasil promova uma estruturação independente
para a educação, cabendo-nos, a partir deste ponto, indagar como isso seria possível.
Como entidade que possui a obrigação jurídica de assegurar o cumprimento e a
realização do direito, entendemos que ao Estado e pela ação do constitucionalismo
264
compete a sua própria reestruturação em novas e racionais bases, em que a educação do ser
humano possa constituir uma função fundamental.
Jacques Delors, em seu livro Educação: Um Tesouro a Descobrir, afirma que
As novas tecnologias fizeram a humanidade entrar na era da comunicação
universal; abolindo as distâncias, concorrem muitíssimo para moldar a
sociedade do futuro, que o corresponderá, por isso mesmo, a nenhum
modelo do passado. As informações mais rigorosas e atualizadas podem ser
postas ao dispor de quem quer que seja, em qualquer parte do mundo, muitas
vezes em tempo real, e atingem as regiões mais recônditas... e conclui: “A
educação tem, sem dúvida, um papel importante a desempenhar, se se quiser
dominar o desenvolvimento do entrecruzar de redes de comunicação que,
pondo os homens a escutar-se uns aos outros, faz deles verdadeiros
vizinhos.
265
O Estado que se propuser a eleger, como função fundamental, a educação, será o
Estado mais poderoso e evoluído, pois se fortalecerá pela força das ideias, das convicções, da
maturação de consciências, pela cultura, pela segurança social, pela paz grupal que emergirá
desse concerto social harmônico. Será o Estado da segurança, do desenvolvimento, da cultura,
da fraternidade e da paz. Este é o Estado que não teme a educação.
O Estado que não tem medo da educação será estruturado pelo constitucionalismo.
Como fundamento da nossa assertiva, queremos já aqui citar Jorge Miranda:
A Constituição emerge do constitucionalismo. Mas que coisa é o
constitucionalismo? Nesse lugar, devemos contentarmo-nos com afirmar que
é um produto perfeito do racionalismo jurídico, social e político. Ou para
citar os fatores imediatos e mais vultosos: racionalismo, jus naturalismo,
iluminismo, enciclopedismo, contratualismo, individualismo, tudo convergiu
para a Constituição.
266
263
Fundamentos do direito, p. 19.
264
José Alfredo de Oliveira Baracho afirma: “o constitucionalismo, que pode ser examinado
nos mais diversos regimes políticos, tem propiciado, na atualidade, o desenvolvimento de
vários novos temas como direito jurisprudencial e legislativo, com preocupações constantes
sobre liberdade e cidadania”. (Direito processual constitucional: aspectos contemporâneos.
Belo Horizonte: Forum; 2008, p.131
265
Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional
sobre Educação para o século XXI. 10. ed.. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO,
2006, p. 39.
266
Contributo para uma teoria da inconstitucionalidade. Coimbra: Editora Coimbra, 1996, p. 31.
142
A educação, como função fundamental do Estado, é factível em razão da existência do
movimento constitucionalista. Pelas portas amplas e acolhedoras do constitucionalismo é
possível pensar uma proposta de mudança na própria estrutura do Estado, ditada pelas
necessidades de aprimoramento da própria sociedade. Sobre esses imperativos
transformadores de realidades, vale refletir sobre a escrita de Konrad Hesse, quando questiona
a força normativa da Constituição, perguntando: “Existiria, ao lado do poder determinante das
relações fáticas, expressas pelas forças políticas e sociais, também uma força determinante do
Direito Constitucional? Qual o fundamento dessa força do Direito Constitucional?”
E ele mesmo responde:
O significado da ordenação jurídica na realidade e em face dela somente
pode ser apreciado se ambas ordenação e realidade forem consideradas
em sua relação, em seu inseparável contexto, e no seu condicionamento
recíproco.
[...] A radical separação, no plano constitucional, entre realidade e norma,
entre ser (sein) e dever ser (solein) não leva a qualquer avanço na nossa
indagação. Como anteriormente observado, essa separação pode levar a uma
confirmação, confessa ou não, da tese que atribui exclusiva força
determinante às relações fáticas. Eventual ênfase numa ou noutra direção
leva quase inevitavelmente aos extremos de uma norma despida de qualquer
elemento de realidade esvaziada de qualquer elemento normativo. Faz-se
mister encontrar, portanto, um caminho entre o abandono da normatividade
em favor do domínio das relações fáticas de um lado, e a normatividade
despida de qualquer elemento da realidade, de outro.
267
E é ainda ele a afirmar: “Graças à pretensão de eficácia, a Constituição procura
imprimir ordem e conformação à realidade política e social”.
268
É graças a essa pretensão da eficácia das constituições, identificada e apontada por
Konrad Hesse, que ousamos propor uma estruturação independente para a educação nacional.
Quando defendemos a estruturação de uma função independente para a educação
nacional, em última análise, queremos discutir o regime jurídico constitucional dos direitos
fundamentais sociais e, em especial, o direito à educação, sua aplicabilidade e eficácia.
Sem olvidarmos que educação constitui, de fato, um processo contínuo de realização
de justiça social e do princípio da igualdade material, apresentando-se como o ideal maior do
Estado Democrático Social, torna-se de fundamental importância estabelecer o seu regime
jurídico-constitucional e, mais, estabelecer bases e fundamentos que, no dizer de Ingo
267
A força normativa da Constituição, p.12-15.
268
Ibidem, p. 15.
143
Wolfgang Sarlet, lhe confiram um regime jurídico privilegiado no contexto da arquitetura
constitucional.
269
De outra maneira, sobre a proposta de estruturação independente da função
educacional, queremos observar, ainda - e com o objetivo de fundamentar a nossa tese - que
a Constituição Federal, com as suas quase 60 emendas, e ao longo do Capítulo III, seção I,
não faz qualquer menção ou referencia ao poder executivo e não lhe atribui competências
ou quaisquer atribuições específicas em âmbito educacional. Existe, sim, menção à
educação como dever do estado, claramente indicando o Estado soberano. A educação é
tratada como questão de Estado.
O texto de 1988, expressamente, menciona o Estado e a este atribui o dever de, com a
família, promover e incentivar a educação, traçando-lhe competências e atribuições.
Igualmente, ao se referir a Estados, Municípios e Distrito Federal, o faz com a clara
intenção de indicar os entes que compõem a federação brasileira. Ora, não é correto
confundi-los com poder executivo, pois o texto magno refere-se expressamente às unidades
autônomas e em termos que não autorizam ilações semânticas em sentido diverso.
Isso significa afirmar que não existe menção de que, ao executivo, compete
implementar e executar políticas públicas educacionais. Desta forma, essa estrutura
independente que propomos é a ideal, em democracias, para conduzir, com especialização, a
mais importante função estatal. Entendemos, pelos fundamentos jurídicos aqui expostos, não
encontrar óbices jurídicos/normativos que possam impedir a sua concretização. Nesse sentido
lembramos Ferdinand Lassalle, para quem as questões constitucionais são muito mais
questões de poder do que propriamente questões jurídicas.
Norberto Bobbio afirma “Aquilo que o Estado e política têm em comum (...) é a
referência ao fenômeno do poder (...) não teoria política que não parta, direta ou
indiretamente, de uma definição de poder e de uma análise do fenômeno do poder (...) Para
ir a um texto canonico de nossos dias Poder e Sociedade de Lasswell e Kaplan (1952) o
processo político é ali definido como a formação, a distribuição e o exercício do poder.
270
A educação é assunto que assume evidência jurídica, ao ser apontada como o primeiro
direito social previsto no artigo da CF. Como direito fundamental, por um ângulo, tem
269
Direitos fundamentais e Estado Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p
225-224.
270
Estado, governo e sociedade, p 76-77.
144
aplicação imediata nos termos do artigo parágrafo da CF e, sob outro ângulo, impõe-se
como processo educativo disciplinado pelo direito e tendo como destinatário toda a sociedade.
Pela sua importância como direito fundamental e, dentro do Estado Soberano, que tem
o dever de assegurar paz social e desenvolvimento econômico, a educação assume o relevo
que ora lhe imprimimos, em virtude da necessária atuação estatal, no sentido de trabalhar,
conformar, aprimorar o seu componente mais importante, que é o homem.
Correta a lição de Luciano Feldens, para quem, “na medida em que o Estado Liberal
de Direito evolui para formas de Estado Social de Direito os direitos fundamentais dinamizam
a sua própria significação deixando de figurar como meros limites ao exercício do Poder
Político para se tornarem um conjunto de fins diretivos da ação positiva dos poderes
públicos.”
271
Ao destacar os direitos fundamentais, Luciano Feldens ressalta sua dupla função na
atualidade: a) por um lado, subsistiria a sua construção clássica de direitos subjetivos, ou seja,
de direitos de defesa do particular em face do Estado (aspecto negativo), impondo-se a este o
dever de abster-se de intervenções desproporcionais no âmbito dos direitos fundamentais
(concepção tradicional) b) por outro lado, os direitos fundamentais operariam em uma
dimensão objetiva, isto é, como imperativos de tutela, exigindo uma atuação ativa positiva do
Estado, obrigando os poderes públicos a agir de forma adequada na sua realização efetiva
(proteção eficiente), mediante um conjunto de prestações.
272
Segundo o nosso entendimento, do texto de 1988 emerge a intenção constituinte de
oferecer, à educação nacional, o lugar de destaque que merece e que elevará o país a novos
níveis de compreensão e desenvolvimento social. Essa intenção constituinte, todavia, não
deve permanecer mínima, atrofiada, não evolutiva, pois as instituições sociais o são
perfeitas e ainda requerem refinamentos. O caminho foi traçado pelo constituinte de 1988 e,
nesse sentido, merecem destaque as palavras de Frank I Michelman: “ Independentemente de
outras funções que possa ter, o catálogo de direitos escritos em uma Constituição é norma
271
Deveres de proteção penal na perspectiva dos tribunais internacionais de direitos humanos.
Revista Brasileira de Direitos Fundamentais e Justiça - Revista do Programa de Pós-
Gradução em Direito da PUCRS, Porto Alegre, ano 1 n. 1, p. 214-230, out./dez.2007, p 220
272
Ibidem, p. 220-221.
145
reguladora de maior hierarquia, um estatuto do qual se extraem conseqüências jurídicas
diretas.”
273
Quando sustentamos a estruturação independente da educação nacional, objetivando
eficiência, presteza, especialização, sem que signifique estatização, fundamentamo-nos,
igualmente, na necessidade de oferecer impulso àqueles movimentos, que surgiram com a
Constituição de 1988 e colocaram o Brasil em destaque,
274
os dos direitos sociais.
Todavia, para que todos os direitos sociais possam atingir plena eficácia, faz-se
necessária uma decisão em prol da fundamentalidade. Para que se sujeitem, efetivamente, à
lógica do artigo 5º, parágrafo 1º, é necessário que a educação seja alçada a questão de Estado,
como preconiza o próprio texto maior e, não, tratada como questão de Administração
pública.
275
Ao propormos a estruturação independente da educação nacional, é necessária a
corporificação jurídica da estrutura proposta e nesse sentido é cabível cuidar da criação, mas,
também, pensar em iniciativas de lei e apresentação de projetos; acesso a cargos; assuntos
relacionados a remuneração, controle e fiscalização financeira e orçamentária, competências
que não aquelas que estão expressas na Constituição como atribuições e deveres-poderes
no âmbito da educação nacional.
Como já procuramos salientar, não consideramos correta a assunção dessas atribuições
pelo poder Executivo, haja vista as multifacetadas tarefas da Administração, o que torna
difícil a condução, com eficiência, dos assuntos educacionais.
Sobre a estruturação jurídico-constitucional, vale observar:
273
A Constituição, os direitos sociais e a justificativa política liberal. In: George Salomão Leite
e Ingo Sarlet ( Coord.). Direitos Fundamentais e Estado Constitucional: estudos em
homenagem a J.J. Canotilho. São Paulo: Revista dos Tribunais , 2009, p. 254.
274
Isso de fato efetivará as promessas de modernidade.
275
Nesse sentido Ingo Wolffgang Sarlet ensina: “Como corolário desta decisão em prol da
fundamntalidade dos direitos sociais na ordem constitucional brasileira, por mais que se
possa, e até mesmo que se deva reconhecer possíveis diferenças de tratamento, os direitos
sociais por serem fundamentais, comungam do regime pleno da dupla fundamentalidade
formal e material dos direitos fundamentais. Com efeito, para além de serem reconhecidos
como protegidos contra a supressão e erosão pelo poder de reforma constitucional (por força
de uma exegese necessariamente inclusiva do art. 60 parágrafo da CF) os direitos sociais
(negativos e positivos) encontram-se sujeitos à lógica do artigo parágrafo da CF. A
Constituição, os direitos sociais e a justificativa política liberal. In: George Salomão Leite e
Ingo Sarlet ( Coord.). Direitos Fundamentais e Estado Constitucional: estudos em
homenagem a J.J. Canotilho. São Paulo: Revista dos Tribunais , 2009, p. 254
146
1. sendo, a Educação, disciplinada como assunto de Estado e, não, do Executivo,
entendemos que não haveria óbice à criação de um órgão para o exercício exclusivo e
especializado da função e, se se tratasse apenas de organização, juridicamente, a nossa
ver, não haveria impedimento a que essa medida fosse objeto de lei;
2. todavia, como outros órgãos independentes têm previsão constitucional, tais como os
Tribunais de Contas e o Ministério Público, seria mais adequado que essa reorganização
fosse efetivada por meio de emenda à Constituição Federal, com o trâmite previsto no
artigo 60 da Carta maior;
3. consideramos a expressão “instituição estatal independente” mais adequada à natureza
da estrutura independente que propomos, bem como à dos Tribunais de Contas e do
Ministério Público, tal como ensina Odete Medauar
276
;
4. importante é a noção de total independência dessa estrutura em relação aos poderes do
estado, evitandose- a possibilidade de associação ao poder executivo;
5. evidentemente, a proposta de criação da estrutura educacional somente poderá ser
apresentada por um dos legitimados à propositura de emendas à Constituição Federal,
(art. 60 CF);
6. obviamente, essa estrutura independente terá os seus órgãos de cúpula e, nesse sentido,
propugnamos pela criação de uma presidência e de um conselho gestor, com
competência nacional para tratar dos assuntos educacionais e suas relações. Assim como
ocorre com o Ministério Público, o postulado da independência deverá constituir
verdadeiro alicerce e princípio a nortear a condução dos assuntos educacionais no
Brasil;
7. a esta estrutura, igualmente, devem ser asseguradas a autonomia funcional e
administrativa, inclusive pela possibilidade de propor, ao Poder Legislativo, a criação
e a extinção de seus cargos e serviços auxiliares, provendo-os por concurso público de
provas e títulos, não afastada a possibilidade, como dissemos alhures, de eleições.
Estas, como tivemos a oportunidade de ressaltar, a exemplo de outros países e, em
específico, dos Estados Unidos, poderiam ocorrer simultaneamente à eleição para os
cargos do Executivo;
8. igualmente, deve ser reconhecida, a essa estrutura, a possibilidade de apresentar projetos
de lei referentes à organização da carreira, sua política remuneratória, bem como à
disciplina da sua organização e funcionamento;
276
Direito administrativo moderno. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2003. P 45
147
9. com relação aos recursos orçamentários e às várias fontes de custeio, cumpre afirmar
que estão definidos na Constituição Federal e que deverão ser repassados, incontinenti, a
essa estrutura, que elaborará e administrará os seus orçamentos, gerindo-os nos termos
estabelecidos na Constituição Federal;
10. igualmente importantes são o controle e a fiscalização contábil, financeira,
orçamentária e operacional, a serem exercidos pelo Tribunal de Contas da União. O
controle, amplo, afere a legitimidade das condutas e possui a natureza de princípio
fundamental;
11. o controle deverá ser exercido, também, pelo Poder Legislativo, que possui, como
representante do povo, competência fiscalizatória;
12. a estrutura educacional proposta organizar-se-á, internamente, segundo os assuntos a
serem cuidados, constituindo um dos seus princípios fundamentais a atuação harmônica
e coordenada de órgãos, secretarias e repartições, que vierem a ser criadas.
Importantes, igualmente, são a unificação ou codificação das leis da educação nacional
e a edição de leis adequadas, com disposições coerentes e uniformização de assuntos e
métodos, que evitem fragmentação e dispersão nos atos por elas disciplinados.
Dentro dessa estrutura, e por meio de leis, deve-se disciplinar os mecanismos de
cooperação internacional para a educação, com a disciplina do intercâmbio e difusão de fontes
culturais, respondendo, essa estrutura, juridicamente, por sua especialidade.
Essa estrutura independente funcionará como um sintagma
277
e considerará, como
princípio fundamental e em resposta às determinações constitucionais, a dignidade da
277
Apropriamo-nos da expressão utilizada por Carlos Alberto Molináro para significar coisa
alinhada com outra. Para Carlos Molinaro este Sintagma garantista está sustentado por quatro
grandes pilares, sem os quais qualquer garantia é insubsistente, qualquer fundamentação é
ineficaz, qualquer processo pegagógico é inútil, que são: o primeiro pilar (1) implica que uma
educação para os direitos humanos deve envolver uma atitude ética inovadora, e está obrigada
a resgatar: a) a recuperação do político, que os direitos humanos não são prévios ou
posteriores ao político, sim que neles se uma entre bens e necessidades, num círculo onde
a conquista dos bens necessários à vida digna es no normativo jurídico positivado (direitos
fundamentais); (b) recuperar o social, sem desenvolvimento social não podemos falar de
direitos humanos, que necessária à integração contextual, sem integração contextual,
qualquer pretensão de garantia é mera abstração e o valor dignidade uma ficção c) recuperar
a concepção de ser humano integral, medida de todas as coisas como afirmou um filósofo
grego, pois o ser humano é o metropoiós de que fala Aristóteles, o criador de gramáticas
medidas, sem essa perspectiva qualquer garantia é inócua d) o agir para a recuperação do
entorno, desde a estimulação de uma consciência ecosocial e política, que a consciência é
ecosociopolítica (significante) e a segurança ou garantia dado pelo jurídico (significado)
148
pessoa humana e a pretensão de segurança ou garantia, atribuída pelo ordenamento
jurídico”.
Competência, na definição de José Afonso da Silva, é a faculdade juridicamente
atribuída a uma entidade, órgão ou agente do Poder Público para emitir decisões.
Competência são as diversas modalidades de poder de que se servem os órgãos ou entidades
estatais para realizar suas funções.
278
Devem constituir princípios fundamentais, a direcionar o exercício das competências
da estrutura educacional proposta:
a) independência funcional;
b) eficiência e especialização;
c) atuação coordenada e harmônica;
d) respeito aos recursos públicos;
compõem uma única imagem (até mesmo arbitrária) onde não existe semelhança de forma
entre significado e significante, mas ambos exigem-se mutuamente; (e) recuperar uma visão
relacional do humano estabelecer o diálogo intercultural pois necessitamos abandonar a
noção de construir o outro, própria do pensamento ocidental, não a construção do outro, o
que impossibilitaria qualquer dignidade e refutaria qualquer garantia , há, sim, o abrirmo-nos
para o outro, solidarizarmo-nos com ele (...) (f) recuperar as noções de espaço e tempo
existenciais, adotando-se concepções que os uma a particulares contextos do nosso cotidiano
(onde estão incluídas até mesmo as utopias), pois toda garantia assegura uma periodicidade e
uma extensão, atesta uma fidúcia nos recursos com que podemos contar, e uma certeza de
pertencimento e respeito ao grupo social em que estamos inseridos.
O segundo pilar (2) está assentado em uma postura crítica que saiba conciliar a tensão
existente entre o debate que se entre as posturas particularistas e as universalistas, pois
nem uma nem outra, desde o ponto de vista prático, são sustentáveis em suas formas
extremas: por um lado os particularistas se apóiam amiúde, num conceito excessivamente
estático e monolítico das relações inter- humanas havidas num cronotopos dado,
demonstrando incapacidade de registrar as tensões e as mutações internas de cada
comunidade (círculo social); de outro, os universalistas se expõem a uma crítica de signo
oposto, não alcançando a compreensão das implicações culturais contidas no próprio
processo de difusão da linguagem no âmbito dos direitos humanos e dos direitos
fundamentais.
O terceiro pilar (3) está centrado em um compromisso relacional de matriz materialista, um
compromisso que é o resultado da assunção do outro desde o seu reconhecimento, como
sujeito pleno de direitos e deveres, o que origem a uma série de referências irrefutáveis e
necessárias
Finalmente o quarto pilar (4) se funda na adoção de uma visão holística, funcional e sistêmica
do direitos (humanos e fundamentais) enquanto mecanismos de adaptação e corrigenda de
adaptação das relações sociais , esta característica é fundamental a qualquer pretensão de
segurança e ínsito ao modo consciencial de perceber a dignidade humana. in Direitos
Fundamentais e Justiça, ano 1, nº 1, out/dez. 2007, p. 120-138.
278
Curso de direito constitucional 16 ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 419.
149
e) racionalidade na condução dos assuntos educacionais e coordenação das várias
atividades.;
f) o respeito aos direitos humanos.
g) o princípio democrático;
h) os valores da democracia e da cidadania;
i) economicidade;
j) princípio da integração à cultura universal, a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar
e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
k) efetiva igualdade de condições para o acesso ao ensino e ao saber em tempo integral;
l) pluralismo de idéias e concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas
e privadas de ensino;
m) efetiva valorização dos profissionais do ensino, com planos de carreira, salários
adequados e a garantia de processo de constante atualização pedagógico e cultural;
n) o cuidado constante com a qualidade do ensino.
Essa estrutura independente terá por objetivos:
a) a gestão, a coordenação, a orientação, o controle da educação nacional;
b) a construção do espírito crítico;
c) o ensino da ética e da moralidade nas funções públicas;
d) a proteção e a promoção dos valores ambientais;
e) a recuperação do político e da ética;
f) a recuperação da visão relacional do ser humano
279
;
g) a programação, implementação e fiscalização das ações empreendidas, com a
sociedade, para a promoção da educação nacional;
h) o incentivo constante aos meios de comunicação social para a produção de programas
com bom nível cultural;
279
Nesse sentido Carlos Alberto Molinaro leciona que necessitamos desvelar pela educação, o
contrapor da política ao Estado, o fortalecimento da esfera público/política através de : a)
uma formação política cidadã no sentido de uma verdadeira cultura republicana b) o
aprofundamento político das liberdades científicas e culturais; c) a imperativa exigência de
de responsabilidade social dos políticos e dos demais agentes públicos, bem como
democratização interna dos partidos políticos e, d) o empoderamento efetivo do cidadão sobre
o aparato do Estado, exercendo o controle sobre a Administração e postulando pela extensão
da participação social-democrática e legislativa em assembléias, audiências públicas, pelos
plebiscitos e referendos e pela internet. Curso de Direito Constitucional. P. 138.
150
i) a criação e o incentivo, bem como a materialização de mecanismos jurídicos e
políticos, por meio dos quais serão exercidas a função educacional, sua fiscalização e
revisão anual de todas as atividades e programas implantados.
7.1 Iniciativa das leis de organização da educação nacional
A Constituição Federal, no artigo 59, enumera as espécies normativas e estabelece
normas de processo legislativo, prevendo, no artigo 61, que a iniciativa das leis,
complementares e ordinárias, cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos
Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao
Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador Geral da República e aos
cidadãos.
É o ato inicial que desencadeia o processo legislativo. É ação propulsora por meio da
qual se busca a edição dos atos primários previstos no artigo 59 do texto maior. Atos
primários, esses, enumerados no dispositivo citado, que possuem a singular característica de
inovar a ordem jurídica nacional, modificando o universo jurídico pela criação, por meio de
rito procedimental delineado no texto maior, de direito novo.
Todo o desenrolar de atos e ações, ritos e procedimentos legislativos, que busquem ou
culminem em uma das espécies previstas no citado artigo 59 da CF, constitui o processo
legislativo, que se inicia pela propositura de um projeto de lei.
Processo legislativo, ensina Bullos,
280
é o conjunto de atos pré-ordenados que permite
a feitura, a mudança, a substituição de espécies normativas. Esses atos pré-ordenados são: a)
iniciativa legislativa; b) emendas; c) votação d) sanção e veto; e e) promulgação e publicação.
Ressalta, ainda, que o objetivo de estudar o processo legislativo é aferir o trâmite
correto dos atos jurídicos normativos, evitando inconstitucionalidades.
281
Em relação a atos normativos, certo é afirmar que, em razão do princípio da autonomia
dos entes federados, prevista no artigo 18 da CF, e pela capacidade de autolegislação,
compete ao estado federado organizar-se por meio de sua constituição e de leis próprias.
Todavia, na elaboração de normas, as entidades federativas devem obediência às regras de
processo legislativo federal.
280
Curso de direito constitucional, p. 948.
281
Curso de direito constitucional, p 858.
151
Tais regras de processo legislativo possuem tanta importância no Estado Democrático
de Direito que a sua desobediência enseja a inconstitucionalidade formal da lei ou ato
normativo, e o Supremo Tribunal Federal, em sua jurisprudência, vem entendendo no sentido
da observância obrigatória, também pelos Estados-membros, das regras básicas do processo
legislativo nacional. (Precedentes: ADI 822, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence; ADIn 766 e
ADIn 774, Rel. Ministro Celso de Mello; ADIn 152/MG Rel. Ministro Ilmar Galvão.
282
Na decisão proferida na ADIn 1.434, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, a leitura é
esclarecedora:
Processo Legislativo Federal Regras de absorção compulsória: As regras
básicas de processo legislativo federal são de absorção compulsória pelos
Estados-Membros em tudo aquilo que diga respeito como ocorre às que
enumeram casos de iniciativa legislativa reservada - ao princípio
fundamental de independência e harmonia dos poderes, como delineado na
Constituição da República. Essa orientação malgrado circunscrita em
princípio ao regime dos poderes constituídos do Estado-Membro – é de
aplicar-se ao poder constituinte local, quando seu trato, na Constituição
estadual traduza fraude ou obstrução antecipada ao jogo, na legislação
ordinária, das regras básicas de processo legislativo, a exemplo da área de
iniciativa reservada ao executivo e ao Judiciário: é o que se quando se
eleva ao nível constitucional do Estado-Membro assuntos miúdos do regime
jurídico dos servidores públicos [...].
283
A iniciativa das leis pode ser comum, quando couber a qualquer membro ou comissão
da Câmara, do Senado ou do Congresso, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal
Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador Geral da República e aos cidadãos.
A iniciativa é concorrente quando acometida a vários legitimados ao mesmo tempo.
Exemplo: artigo 61, parágrafo 1º, II “d” c/c artigo 128, parágrafo 5º, da Constituição Federal.
E será reservada, por sua vez, se partir de órgãos designados especificamente. Ex.:
artigo 61, parágrafo da Carta Maior. São, também, reservadas, as iniciativas previstas no
artigo 51, IV, Câmara dos Deputados, artigo 52, XIII, Senado Federal, artigo 96, I, Poder
Judiciário e, por fim, artigos 127, parágrafo 2º e 128, parágrafo 5º, Procuradoria Geral.
Popular, se partir, apenas, dos cidadãos. (artigo 14, III c/c artigo 61, parágrafo 2º).
Exclusiva
284
, se pertencer apenas a determinada categoria ou órgão, a exemplo do artigo 61,
282
Uadi Lammêgo Bulos. Curso de direito constitucional, p. 859.
283
STF. ADIn 1.434/SP, Pleno, rel. Ministro Sepúlveda Pertence, j. 10-11-1999, m.v., DJ 25-
02-2000, p. 50.
284
Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino alertam para o fato de que: “Em se tratando de
iniciativa de lei, as terminologias privativas, reservadas e exclusivas têm significado jurídico
semelhante. O mesmo não acontece quando nos referimos ao estudo do tópico repartição de
competências, em que a competência administrativa exclusiva da União (artigo 21) não se
152
parágrafo da CF. Neste dispositivo constitucional, podemos perceber que são de iniciativa
privativa do Presidente da República as leis que “[...] disponham sobre a criação de cargos,
funções ou empregos públicos na Administração direta e autárquica ou aumento de sua
remuneração.”
O Supremo Tribunal Federal entende competir, aos Tribunais de Contas, a iniciativa
das leis de organização do Ministério Público Especial, que atua nas respectivas Cortes de
Contas.
285
.
Dessa forma, a estrutura independente proposta deverá possuir também competência
para a propositura dos projetos de leis que se relacionem aos interesses da educação, de forma
que se torne possível o exercício eficiente das suas atribuições e competências e, cada vez
mais especializada e excelente, a atuação dessa função independente.
7.2 Organização e acesso a cargos, empregos públicos
A experiência brasileira vem demonstrando que, na prática, as nomeações para cargos
públicos, sem qualquer submissão a concurso, são nocivas ao interesse público e social.
Referindo-se à Administração indireta, mas, pela similitude, aplicáveis a esta proposta,
são as palavras de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, ressaltando a inadequação e, até mesmo, a
falência desse modelo, que prevê indicações políticas para determinados cargos públicos:
No caso de descentralização por serviço, o ente descentralizado passa a deter
a titularidade e execução do serviço; em consequência, ele desempenha o
serviço com independência em relação à pessoa que lhe deu vida, podendo
opor-se a interferências indevidas; essas somente são admissíveis nos limites
expressamente estabelecidos em lei e têm por objetivo garantir que a
entidade não se desvie dos fins para os quais foi instituída. Essa a razão do
controle ou tutela a que entidades se submetem nos limites da lei.
[...]
Aliás, para assegurar essa independência, o ideal seria que os dirigentes
dessas entidades fossem eleitos por seus próprios membros, o que raramente
ocorre. Em regra, a escolha dos dirigentes fica por conta da Administração
Direta, ocupando eles cargos de confiança do Chefe do Executivo; isso cria
uma vinculação prejudicial à independência da entidade, que acaba sendo
dirigida pela própria pessoa jurídica que a criou precisamente para dar-lhe
confunde com a competência legislativa privativa da União (artigo 22) (Direito
constitucional. Rio de Janeiro: Impetus, 2007, p. 461).
285
Vicente Paulo; Marcelo Alexandrino. Direito constitucional, p. 466.
153
certa autonomia; torna-se, pois, imperfeita e, por vezes, inútil e onerosa a
descentralização.
286
(grifos nossos)
A democracia norte-americana, apontada como o modelo ideal de democracia
moderna, demonstra que não apenas os cargos de dirigentes máximos da nação devem ser
providos por eleições indiretas (nesse caso) ou diretas (para outros cargos), mas também
sempre com participação do povo ou efetivo sufrágio popular; informa, também, que essa
maneira de prover cargos é muito mais isonômica e atende melhor aos reais ideais
democráticos e à verdadeira independência no exercício de funções públicas do que a
nomeação para cargos em comissão, cargos de confiança, entre outros.
De fato, nesse país, o traço característico de sua organização político-constitucional é a
importância e inafastabilidade da soberania popular. Neste sentido, leciona Olivia Raposo da
Silva Telles:
Outro traço característico da organização constitucional dos Estados Unidos,
como nota Zoller, é a importância do princípio da soberania popular, no
sentido de que não há autoridade pública que não provenha do sufrágio
popular. No âmbito dos Estados, é o caso dos membros das Casas
Legislativas, e é também o caso dos juízes e do chefe do Ministério Público
estadual (attorney general), além, evidentemente do governador.
287
O acesso aos cargos da estrutura educacional proposta deverá ter por fundamento a
mais perfeita adequação, integração, conhecimento e preparo do agente público. Se esse
provimento for por concurso ou, nos cargos de direção, por eleições, para o concurso ou para
o pleito devem ser necessários os mais profundos conhecimentos pedagógicos-educacionais e
jurídicos-políticos, com experiência amplamente comprovada nas pedagogias e métodos do
ensino, que constituirão pressupostos para o preenchimento do cargo.
Este procedimento atende muito mais aos princípios da moralidade administrativa e,
também, da eficiência, previstos no artigo 37, caput da CF; ademais, promove e realiza a
verdadeira democracia e o robustecimento da cidadania.
Afastamos dessa proposta toda a nomeação por indicação. Defendemos que essa
independência ocorra não apenas em aspectos formais, mas também na efetiva prática
educacional. Assim, pensamos devam esses assuntos afastar-se definitivamente do Executivo,
que possui multifacetados aspectos, setores e competências a serem administrados, uma vez
que, no processo histórico brasileiro, não logrou eficiência no trato dos assuntos educacionais,
tendo mesmo malogrado infaustamente nas ações; impõe-se, portanto, que se lhe retire a
competência e a transfira para órgão independente e que priorize exclusivamente a tarefa.
286
Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Direito administrativo, p. 392.
287
Direito eleitoral comparado: Brasil, Estados Unidos, França, p.174.
154
Outro importante aspecto a ser ressaltado é que, com a esse poder independente,
devem funcionar os Conselhos de Educação, compostos por pessoas verdadeiramente
preparadas e bem formadas nas áreas de educação e pedagogia bem como representantes da
sociedade, cuja investidura, pensamos, deva dar-se por meio de processo eletivo.
Os conselhos atuantes e bem compostos são instrumentos de transparência, controle de
legalidade e de eficiência de grande importância em Estados Democrático de Direito.
7.3 Do Orçamento
Para que possamos, de fato, viabilizar uma estrutura independente para a educação
nacional, são necessários recursos financeiros consideráveis, que possam fazer face não
apenas à execução, de forma excelente e especializada, das competências e atribuições a esses
órgãos transferidas, mas também prever e prover recursos, que possibilitem a sua
criação/estruturação inicial.
Para isso, é fundamental, antes de tudo, que pensemos nas regras orçamentárias e as
analisemos.
Orçamento é palavra de origem incerta. Segundo alguns estudiosos, vem de orçar,
encontrando a sua etimologia no latim ordior, orsus, ordiri. Outros entendem que a expressão
promana do italiano orzare. O vocábulo exterioriza a ideia de computar, planizar, avaliar,
urdir, tecer, calcular, isto é, fazer o cálculo, apreciar a despesa.
O vocábulo orçamento possui dimensão lata e dimensão estrita, conforme o contexto
em que é empregada.
Em sentido lato, engloba despesas e receitas, públicas e privadas; em sentido estrito,
designa finanças públicas, ou o ato que prevê e autoriza a receita e a despesa das entidades
públicas por certo lapso de tempo.
288
Desse modo, orçamento é o instituto de caráter jurídico, governamental,
econômico e técnico, traduzido numa lei cuja responsabilidade é programar,
planejar e aprovar obras, serviços e encargos públicos, bem como estipular
plano financeiro anual para as entidades constitucionais, com previsão da
receita e autorização da despesa.
289
288
Uadi Lammego Bulos. Curso de direito constitucional, p. 1234.
289
Ibidem, p. 1235.
155
É o instrumento que discrimina, disciplina, enumera e autoriza a despesa e estima,
prevê receitas.
A Constituição Federal, promulgada a 5 de outubro de 1988, exige que a disciplina do
orçamento seja veiculada por meio de lei. (artigo 165 CF). Todavia, desde a reforma de 1926,
até a Constituição de 1891, os orçamentos no Brasil são disciplinados em lei, cuidando-se de
ato legislativo com peculiaridades e características muito especiais, relacionadas ao seu
processo de elaboração, com iniciativa vinculada, a ser exercida no prazo determinado pelo
Chefe do Executivo.
Assim, a teor do artigo 165, são previstas a) lei que disciplina o orçamento financeiro;
b) lei do plano plurianual; c) lei de diretrizes orçamentárias e d) a lei orçamentária anual.
Por força do disposto no artigo 165, § 5º, I a III da CF, a lei orçamentária anual
compreende três tipos de orçamento:
a) orçamento fiscal, que diz respeito aos poderes da União, seus fundos existentes,
órgãos e entidades da Administração direta e indireta, inclusive fundações
instituídas e mantidas pelo Poder Público;
b) orçamento de investimento, que diz respeito a investimentos das empresas em que
a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a
voto;
c) orçamento da seguridade social, relativo à seguridade social.
Anote-se, ainda, a existência de um orçamento-programa, com objetivos de
reestruturação da economia estatal, lembrando, Bulos, que o orçamento clássico não
objetivava a ação direta do Estado na economia.
290
Em relação à educação, a Constituição Federal de 1988 previu forma de financiamento
do ensino público, financiamento, esse, a cargo das pessoas federativas, fixando, para a
União, o porcentual não inferior a 18% de sua receita, advinda de transferências, e, aos
Estados-Membros e Municípios, o dever de aplicação anual de, no mínimo, 25% de sua
receita advinda de transferências.
Enumera Bulos
291
outras determinações a serem observadas pelos entes federativos,
tais como:
a) a parcela de arrecadação de impostos, transferida pela União aos Estados e
Distrito Federal e aos Municípios, ou pelos Estados aos respectivos Municípios,
290
Curso de direito constitucional, p. 1233
291
Curso de direito constitucional, p.1312.
156
não é considerada, para efeito do cálculo previsto no artigo 212, receita do
governo a transferir;
b) a distribuição dos recursos públicos assegurará prioridade ao atendimento das
necessidades do ensino obrigatório nos termos do plano nacional de educação;
c) tais programas serão financiados com recursos provenientes de contribuições
sociais e outros recursos orçamentários;
d) a educação básica pública terá como fonte adicional de financiamento a
contribuição social do salário-educação, recolhidas pelas empresas na forma da
lei.
Do exposto, compreendemos que a substancial importância da educação nacional
justifica a utilização não apenas dos recursos previstos no orçamento programa; entendemos
constitucional a instituição de uma fonte fiscal de rendas que possibilite a efetivação da
proposta ora apresentada.
157
CONCLUSÃO
A questão que se coloca é, e ainda será, por muito tempo, o problema dos fins do
Estado. Correto está Paulo Bonavides, a esse respeito: “Nunca alcançará o pensador riscá-lo
da ciência jurídica, enquanto o direito for também filosofia”.
292
A busca da razão, o culto do direito e da vida, a luta pelos direitos fundamentais e a
sua realização. Ordem social no sentido de paz nas relações sociais. Evidentemente que
administradores e governos têm responsabilidades educativas com a população. Esta nos
parece uma finalidade que atende a elevados princípios de justiça.
A educação da população constitui elevada finalidade. A Constituição Federal, ao
estabelecer, como objetivos fundamentais, a construção de uma sociedade livre, justa e
solidária e a garantia do desenvolvimento nacional, (art. 3º, I e II), bem como, no artigo 4º,
enumerar os princípios, que regerão as suas relações internacionais e
, entre os quais a
prevalência dos direitos humanos e o compromisso de cooperação entre os povos para o
progresso da humanidade (incisos II e IX), assume, definitivamente, para o Estado brasileiro,
o compromisso com a educação nacional.
A Constituição, cognominada, por um dos seus mais importantes mentores, de
“constituição cidadã”, traz um programa de educação humana e para a cidadania, com o
significado expresso na fórmula “educação para o pleno desenvolvimento da pessoa humana”
(art. 205 CF). Este projeto requer um plano nacional e especializado, no sentido de excelência
na sua execução e com a consideração, utilização, descobertas e aperfeiçoamento das
múltiplas fontes de educação.
tantas fontes de educação inexploradas, tantas disciplinas a ser regulamentadas
pelo Direito. Há tanto por fazer...
O artigo 206 da Constituição Federal enumera os princípios que devem embasar o
ensino. Em seu inciso I, encontra-se um princípio até hoje inobservado: igualdade de
condições para o acesso e permanência na escola. É certo que essa igualdade ainda não existe
para todas as crianças, pois o acesso das crianças, filhas de pais economicamente abastados,
difere do das crianças que frequentam a “Cracolândia”, em São Paulo.
O princípio da liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a
arte e o saber, está inscrito no inciso II do artigo 206.
292
Teoria do Estado, p. 108.
158
Como primeiro aprendizado ou, talvez, o mais oportuno e inarredável, dentro do
princípio da liberdade de aprender, temos que considerar o direito de aprender os valores
civilizatórios. É direito inalienável, constituindo dever dos poderes públicos viabilizar, por
todos os meios e instrumentos, o ensino desses valores civilizatórios, tais como os direitos
humanos, os direitos sociais etc.
O princípio da liberdade de aprender com o trabalho é importante fonte de realização
humana e de saber. É nesse sentido o grande legado do marxismo, “ele nos mostra uma
direção na fórmula metodológica do trabalho como princípio educativo”.
293
É possível projetar imagens, idéias e pensamentos, no espírito humano, que criarão
atos e impulsos. Por esta razão, é necessário evocar a responsabilidade do Estado para que
seja um ato coordenado, ordenado, com absoluta beleza e com valores que possam exaltar o
espírito humano e a sociedade.
É necessário programa educativo que respeite a inteligência humana e, que, na
linguagem de Espinosa, “promova uma vida propriamente humana”.
294
O educar com liberdade, na forma prevista no artigo 206, inciso II, evidentemente não
pode significar o abandono do ser à própria sorte, esquecendo-se de suas necessidades básicas
de alimento físico e espiritual. Educar com liberdade não é permitir a degradação de crianças,
como temos assistido, passiva e covardemente, nas ruas das grandes cidades brasileiras.
A Constituição não nos permite negligenciar a postura mental das nossas crianças. A
Constituição brasileira, a lei das leis, não autoriza postura de descaso. Não permaneçamos
indiferentes e insensíveis aos destinos das crianças e do nosso povo, pois o legislador
constituinte de 1988 não o foi.
A Constituição demonstra, nos seus artigos, incisos e alíneas, que o legislador de 1988
entendeu e procurou deixar a mensagem de constituir a educação como o vínculo que
promove o elo universal da solidariedade no espírito humano.
É no texto magno, também, que encontraremos a exigência de determinadas ações; a
exigência de programa amplo, que envolva Estado e sociedade de forma ordenada.
É necessário, por meio desse programa, promover uma consciência educacional.
Educar exige determinadas compreensões.
295
293
Maria José Aviz do Rosário e Ronaldo Marcos de Lima Araújo. Políticas públicas
educacionais. Campinas/SP: Alínea, 2008, p. 18.
294
Spinosa afirma: Quando dizemos que o melhor Estado é aquele em que os homens vivem
na concórdia, entendo que vivem uma vida propriamente humana, uma vida que não se define
pela circulação do sangue e realização das outras funções comuns a todos os animais, mas
principalmente pela razão, a virtude da alma e a vida verdadeira. Tratado político, p 49
159
A Constituição assume um compromisso com a cultura universal e, em especial, com a
cultura da América Latina e assume, em gigantescas proporções, compromisso ambiental de
solidariedade com esta e com as futuras gerações, o que pressupõe plano pedagógico
complexo ainda não elaborado.
Para a efetivação desse programa, propugnamos pela reestruturação independente da
educação nacional, e o fazemos por acreditar que a especialização, na área mais importante
das necessidades humanas e sociais, constitui imperativo lógico para a evolução das
instituições e para a consecução de objetivos de paz e progresso, que apenas uma educação
em direitos humanos, democracia e liberdade, promovendo a vida, o meio ambiente e a
convivência fraterna, sob as mesmas leis, logrará atingir.
A especialização da função educativa, aliada ao compromisso de todos os ocupantes
de cargos próprios dessa função especializada, bem como de todos os parceiros e
colaboradores que virão, atraídos por esse novo modelo e por essa nova consciência, é o
caminho para que tenhamos ação segura, efetiva, aprimorada, enérgica, uniforme, capaz em
termos técnicos, humanos, pedagógicos, culturais psicológicos, filosóficos de tornar este país
o primeiro a dedicar e a especializar parcela do aparelhamento estatal a uma função, com o
dever especial e específico de definir e pôr em prática, com exclusividade, ações e políticas
no âmbito da educação.
Para a gestão e a efetivação de políticas públicas, é possível e aconselhável a
concretização de parcerias entre a estrutura independente proposta para a educação e
empresas privadas que tenham interesse em participar, colaborando com a sociedade.
Note-se que a Constituição de 1988 estabelece, no artigo 215 e no artigo 216, a
previsão de atuação conjunta com a comunidade na promoção e proteção do patrimônio
nacional. “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às
fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e difusão das manifestações
culturais”.
De outra forma, é sabido que o Estado brasileiro jamais possuiu e não possui
atualmente recursos técnicos, humanos e pedagógicos suficientes para desempenhar a
contento tão importante função.
295
Paulo Freire ensina que “O saber ensinar não é transferir conhecimento é fundamentalmente pensar certo é
uma postura exigente, difícil, às vezes penosa que temos de assumir diante dos outros e com os outros, em face
do mundo e dos fatos , ante nós mesmos. É difícil não porque pensar certo seja forma própria de pensar de santos
e dos anjos e a que nós arrogantemente aspirássemos. É difícil entre outras coisas pela vigilância constante que
temos de exercer sobre nós próprios para evitar os simplismos, as facilidades, as incoerências grosseiras.
(Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 24. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002, p.
54).
160
A descentralização é medida que se impõe. Todavia, a descentralização não impede a
especialização de funções nem tampouco a gestão especializada.
A execução do serviço de educação poderá ser efetivada diretamente ou por
particulares, mas a criação, implementação, gestão, fiscalização do programa educacional,
previsto na Constituição de 1988, deverão ser efetivadas pelo Estado.
Daí porque propugnamos por uma função independente, que é mais bem representada
pela ideia de uma estrutura independente, que trace um programa organizado e eficiente de
educação para os mais diversos níveis e setores, com ação voltada para a especialização e
eficiência e que, de fato, possibilite, por meio da especialização dessa função, dos seus órgãos
e agentes, efetiva eficiência nos termos exigidos na Constituição Federal, artigos 1º, inciso III
e 70 e seguintes, sem que isso se confunda com simples execução direta de serviço público ou
qualquer proposta de estatização.
Uma estrutura independente poderia, ainda, viabilizar e facilitar ainda mais os
convênios e o oferecimento de educação por instituições estrangeiras, já que não existe
monopólio educacional no Brasil, tampouco, como acentua Nina Stocco Ranieri
Não reserva de mercado para instituições nacionais como ocorre v.g., em
relação às empresas jornalísticas de radiodifusão, sonora e por imagens, na
forma do artigo 222 da Constituição Federal. Não há, tampouco qualquer
conotação xenófoba (e nem poderia haver, por força do princípio da
isonomia) na disposição do artigo 209 da Constituição Federal, que garante o
oferecimento do ensino pela iniciativa privada, desde que atendidos os
requisitos de autorização e avaliação pelo poder publico e submissão às
normas gerais de educação.
296
É neste sentido que temos afirmado que educação nacional é função estatal do mais
alto grau e importância, devendo constituir-se em uma pilastra básica, a compor as vigas
mestras do Estado contemporâneo, com atuação ordenada e harmônica, o que promoverá a
conquista de valores civilizatórios e realizará direitos fundamentais.
Pensamos em alta especialização e na promoção de uma consciência nacional de
educação que aplique, de fato, o programa educacional contido na Constituição de 1988, por
meio de regime jurídico com marcas próprias e com as necessárias peculiaridades impostas,
naturalmente, pela importância da função educacional do Estado.
Dentro de tão vasto contexto, falar em uniformidade de regime jurídico seria atar
amarras ao pensamento e à ação. É ação extrínseca e intrínseca. Extrínseca, no sentido de se
estabelecer métodos e pesquisas que objetivem o conhecimento da realidade, o conhecimento
296
Direito educacional: aspectos práticos e jurídicos, p.67.
161
do outro e o autoconhecimento pelo aprimorar das inteligências emocional, intelectual, moral,
crítica, histórica, artística, espiritual.
Essas são ideias que pensam em função, estrutura independente, sem que isso
signifique concentração. Essa estrutura executará o programa constitucional pedagógico em
relação ao aluno e, também, em relação ao professor, atendendo às suas necessidades
pedagógicas, psicológicas, materiais.
Igualmente, estruturará o aperfeiçoamento dos docentes e da sua atuação, num mundo
dinâmico, cujas informações surgem de forma vertiginosa e cada vez mais, se é possível
afirmar, multidisciplinar. Deve dedicar expressiva atenção ao aprimoramento perpétuo e
ininterrupto de professores, pois, como bem questiona André Comte-Sponville “Quem pode
ensinar sem aprender?”
297
Outras questões relacionadas a material pedagógico, questões de ordem alimentar
transporte de estudantes, especialmente em regiões distantes dos centros urbanos ou regiões
alagadas, são assuntos que deverão merecer atenção
A educação especial para os jovens infratores, envolvendo trabalhos de ordem
psicológica e artística, a procura de pendores e talentos inatos na pessoa, são tarefas que
competirão a esse órgão estatal.
A educação contínua e particularizada para os presos, essa categoria de brasileiros
absolutamente abandonada e esquecida, sem nenhuma oportunidade de reintegração à
sociedade. Ao contrário, o Estado joga-os em ambiente nocivo à personalidade humana e
deles se esquece, como se não fosse responsabilidade sua a adoção de uma política
pedagógica adequada para presos e como se o fato de estarem não indicasse, por si só,
flagrante falha do aparelhamento estatal e da própria sociedade.
A função estatal deve cuidar da educação constitucional de cada cidadão desde a mais
tenra idade, para que cresça conhecendo os seus direitos e os direitos fundamentais dos seus
pares.
Deve cuidar, igualmente, da interlocução entre a filosofia da educação
298
e a didática
para a busca de melhores mecanismos e de maior socialização e humanização nas relações
297
Uma educação filosófica. Tradução Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p
40.
298
Terezinha Azeredo Rios, afirma que “aprender é preciso, para viver. É preciso aprender a
viver. E este viver não é algo abstrato, mas algo que transcorre na polis, na sociedade
organizada, na relação com os outros” (Compreender e ensinar. São Paulo: Cortez, 2001, p.
62)
.
162
humanas e deve ter por objetivo criar escolas que se aperfeiçoem como espaços de reflexão e
ética.
Essa estrutura teria por objetivo a realização concreta do preceito constitucional do
artigo 205, no sentido de estabelecerem-se ações organizadas entre o Estado e a sociedade
para a formação da pessoa em todos os níveis, aprimoramento de todos os seus potenciais e
inteligências. A combinação Estado e família, de forma organizada e coerente, significará
promoção e estimulo ordenado à educação nacional, tornando-os responsáveis, responsáveis
não apenas nominalmente e de direito, mas de fato. Precisamos realizar os valores
constitucionais. Dizer que os princípios apenas apontam para o futuro, significa não trabalhar
no presente e descrer na realização do presente. Os princípios indicam que possuímos valores
a serem observados e realizados nesse nosso momento histórico.
De outra maneira, essa especialização, por meio de uma estrutura independente,
possibilitará incentivos e exercício da fiscalização em relação às responsabilizações previstas
no artigo 208, parágrafo 2º da CF.
Acreditamos no valor de todas as doutrinas pedagógicas e no valor das conquistas
intelectuais da humanidade e, com convicção, entendemos que todas as correntes científicas e
as escolas de pensamentos, perpassando por ideias marxistas e ideias liberais; positivistas,
racionalistas e empiristas e tantas outras, todas contribuem e contribuíram para a evolução
humana e observamos, hoje, muito mais um movimento de convergência, cujo epicentro é o
homem e a sua dignidade humana.
Gostaríamos, aqui, de lembrar o conselho de Alexis de Tocqueville:
[...] Portanto, é necessário que todos os nossos contemporâneos que desejem
criar ou assegurar a independência e a dignidade de seus semelhantes se
mostrem amigos da igualdade; e o único meio digno de se mostrarem tais é
sê-lo: o sucesso de sua santa iniciativa disso depende.
Assim, não se trata de reconstruir uma sociedade aristocrática, mas de fazer
a liberdade sair do ventre da sociedade democrática em que Deus nos faz
viver.
299
E igualdade material, para além da igualdade formal, apenas se torna real e efetiva na
medida da realização das possibilidades educacionais do povo. Essas possibilidades
educacionais não prescindem do direito e do Estado.
O Estado, seja potência soberana de Bodin, seja na sociedade política como realização
da lei de Grócio , seja no princípio do Estado de Locke, tem na educação humana a sua
299
A democracia na América, p. 395.
163
função mais sublime. Educação que nele encontra o seu locus natural e, nos objetivos do
Estado, a sua racionalidade incita a sua legitimação.
Na ordem jurídica, a educação surge como a expressão máxima da vida que confere a
todos o direito humano inalienável de conhecer-se e conhecer o mundo à sua volta, o direito
de procurar desvendar o sentido da vida pela racionalidade, o direito de possuir mente crítica.
É direito à igualdade e, também, direito à esperança de realização do mais alto ideário
humano, que é justiça como valor supremo.
Quero finalizar este trabalho com as palavras textuais de Miguel Reale, com a
sensibilidade e agudeza de suas lições:
De uma forma ou de outra, a validade de um preceito não decorre do fato de
ter sido emanado de órgão competente, nem tampouco do assentimento dado
ao seu conteúdo, mas resulta de um complexo de motivos, e, em última
análise, de sua correspondência racional com o valor-fim do Direito em
função de condições objetivas de ordem cultural [...] Compreendo a Justiça
como um valor fim a que se prendem múltiplos valores-meio primários e
secundários, desdobrando-se através dos diferentes sistemas de cultura,
torna-se possível penetrar na razão de ser da obrigatoriedade da norma sem
perder contato com a experiência e ligando ao mesmo tempo, a solução do
problema particular à solução dada à questão do fundamento último do
Direito.
“Em conclusão, a vida social apresenta uma incessante renovação de valores
explicando a incessante renovação da ordem jurídica positiva.
“Nem todos os valores, porém, estão sujeitos a variação. valores que têm
sua fonte imediata na própria natureza humana, sendo de tal sorte que sem
eles o valor fim que é a justiça não seria mais que uma forma destituída de
conteúdo.
300
Assim, com a lição do mestre, terminamos, afirmando ainda uma vez e sempre, que
não concebemos ordem social justa sem educação e lembramos que a solidariedade e a
instrução são as condições estabelecidas secularmente pela filosofia cristã, como condição
imposta ao homem para alçar os cimos celestes. Que possamos e tenhamos efetiva
oportunidade de, por meio da educação, descortinar os cimos celestiais da personalidade
humana. Para esse desiderato, contudo, não prescindiremos da ordem jurídica
300
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