Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO RURAL
KAREN BELTRAME BECKER FRITZ
A INSEGURANÇA ALIMENTAR NO RURAL DO RIO GRANDE DO SUL: análise da
privação de uma capacitação básica
Porto Alegre
2009
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
KAREN BELTRAME BECKER FRITZ
A INSEGURANÇA ALIMENTAR NO RURAL DO RIO GRANDE DO SUL: análise da
privação de uma capacitação básica
Tese submetida ao Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Rural da Faculdade de Ciências
Econômicas da UFRGS, como quesito parcial para
obtenção do título de Doutor em Desenvolvimento
Rural.
Orientador: Prof. Dr. Paulo Dabdab Waquil
Série PGDR – Tese Nº 20
Porto Alegre
2009
ads:
Lugar para a Ficha Catalográfica
KAREN BELTRAME BECKER FRITZ
A INSEGURANÇA ALIMENTAR NO RURAL DO RIO GRANDE DO SUL: análise da
privação de uma capacitação básica
Tese submetida ao Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Rural da Faculdade de Ciências
Econômicas da UFRGS, como quesito parcial para
obtenção do título de Doutor em Desenvolvimento
Rural.
Aprovada em: Porto Alegre, 10 de julho de 2009.
Prof. Dr. Paulo Dabdab Waquil (Orientador, PGDR/UFRGS)
Profª. Drª. Izete Pengo Bagolin (PUC/RS)
Prof. Dr. Egon Roque Fröhlich (PGDR/UFRGS)
Prof. Dr. Sabino da Silva Porto Junior (PPGE/UFRGS)
Prof. Dr. Sérgio Schneider (PGDR/UFRGS)
Dedico este trabalho aos meus amores: Nando, meu marido, meu
grande companheiro, e à Fernanda, nossa filha muito desejada, que
chega, para a nossa felicidade, no final de setembro de 2009.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer às seguintes pessoas e instituições:
Ao meu orientador, de mestrado e doutorado, Professor Paulo Waquil que, pela sua
dedicação à atividade de orientação, muito contribuiu para a elaboração deste trabalho, com
suas sugestões e críticas. Ao professor Paulo, com respeito e admiração, meus sinceros
agradecimentos por todo o conhecimento transmitido ao longo desta caminhada.
Ao Professor Egon Roque Fröhlich, que, com sua dedicação a atividade acadêmica,
acompanhou e transmitiu conhecimento ao longo do curso de mestrado e de doutorado;
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural
(PGDR/UFRGS), pelo incentivo ao crescimento intelectual;
À Professora Izete Bagolin, por disponibilizar-me os livros que trouxe de seu
Doutorado Sanduíche sobre a Abordagem das Capacitações;
Aos colegas de doutorado do PGDR da turma 2005, pelo compartilhar do
conhecimento;
Aos colegas do grupo de pesquisa coordenado pelo Prof. Paulo Waquil. Neste grupo,
realizamos horas de debate e trabalho. Mas também encontrei amigos, como Ely, Daniela,
Luciana e Ana;
À Universidade de Passo Fundo (UPF), pelo apoio financeiro e liberação para
realização do curso de doutorado;
Ao PGDR/UFRGS, por todas as oportunidades e recursos colocados à disposição;
À minha família, que sempre me apoiou e confiou na minha capacidade.
E, por fim, à Deus, que colocou todas essas oportunidades e pessoas no meu caminho.
RESUMO
Para a mensuração da insegurança alimentar freqüentemente são feitas estimativas a partir da
definição de linhas de pobreza ou indigência, associando o grau de carência alimentar ao nível
de rendimentos do domicílio, intuindo que famílias pobres (baixa renda) vivam em condição
de insegurança alimentar. Entretanto, é possível encontrar unidades domiciliares com
rendimentos situados abaixo da linha de pobreza e que vivem em segurança alimentar, do
mesmo modo que existem aquelas com rendimentos acima do corte da pobreza que passa por
restrição alimentar quantitativa. O exercício teórico desenvolvido por Amartya Sen, abrange
uma rie de conceitos que permitem a análise de realidades sociais, como a insegurança
alimentar no Rio Grande do Sul, de maneira multidimensional, incorporando variáveis
quantitativas e indo além delas. Um desses conceitos que pode auxiliar na compreensão das
dificuldades de acesso digno a alimentos adequados, quantitativamente e qualitativamente, é a
noção de intitulamento (entitlement), termo que foi originalmente desenvolvido por Sen para
tratar do problema da fome na Ásia e na África. Através da abordagem das capacitações, o
objetivo deste trabalho é analisar os intitulamentos que se relacionam com a insegurança
alimentar no Rio Grande do Sul, e avaliar os impactos dessa situação para a expansão das
capacitações das famílias rurais gaúchas. Os resultados da análise realizada, através do
Coeficiente de Contingência, Teste Qui-Quadrado e do modelo de regressão Probit, que
permitiram diferenciar e tecer comentários entre os espaços rural e urbano do Rio Grande do
Sul, evidenciam a necessidade de um tratamento multidimensional para a caracterização das
situações de insegurança alimentar no estado gaúcho, sugerindo a inclusão de novas
percepções que permitam melhor caracterizar as dificuldades de acesso à alimentação
adequada, propondo uma alternativa à perspectiva tradicional.
Palavras-chave: Insegurança alimentar. Intitulamentos. Abordagem das Capacitações.
ABSTRACT
Frequently, estimates to measure food insecurity are made based on the definition of poverty
lines or indigence, associating the degree of lack of food considering the household
productivity, and having in mind that poor families (low income) live in a condition of
nutrition insecurity. However, it is possible to find household units with income considered
below the poverty line and that live in a nutritional stability, as well as those ones with
income above poverty line that have quantitative food restriction. The theoretical exercise
developed by Amartya Sen encloses a series of concepts which allows the analysis of social
reality, like food insecurity in Rio Grande do Sul, in a multidimensional way, including
quantitative analysis and venturing beyond them. One of these concepts which can help the
understanding of those difficulties of reaching dignified access to adequate nutritional levels,
quantitatively and qualitatively, is the notion of entitlements, terminology which was
originally developed by Sen to deal with the problem of hunger in Asia and Africa. By means
of the capability approach, the objective of this work is to analyze the entitlements which are
intertwined with food insecurity in Rio Grande do Sul, and evaluate the impacts of this
situation to expand the condition of rural families in the state of Rio Grande do Sul. The
results of this analysis which was performed through contingency coefficient, chi-square tests
and a probit regression model, which allow to differentiate between rural and urban spaces in
Rio Grande do Sul, show clearly the necessity of a multidimensional treatment in the Gaucho
State, suggesting an inclusion of new concepts which allow better characterize the difficulties
of access to adequate alimentation, proposing an alternative to traditional perspective.
Key-words: Food Insecurity. Entitlements. Capability Approach.
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Situações de (in)segurança alimentar de acordo com o setor censitário
Rio Grande do Sul, 2004............................................................................................
82
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Renda domiciliar per capita (RDPC), índice de condições de moradia (ICM) e
acesso a programas de transferência de renda (TRF) de acordo com o setor censitário Rio
Grande do Sul, 2004..................................................................................................................... 81
Tabela 2: Faixas de renda domiciliar, em salários-mínimos (s.m), e suas relações com as
situações de insegurança alimentar, no setor censitário urbano Rio Grande do Sul,
2004...............................................................................................................................................
83
Tabela 3: Faixas de renda domiciliar, em salários-mínimos (s.m), e suas relações com as
situações de insegurança alimentar, no setor censitário rural Rio Grande do Sul,
2004...............................................................................................................................................
84
Tabela 4: Índice de condições de moradia relacionado com insegurança alimentar, no setor
censitário urbano – Rio Grande do Sul, 2004...............................................................................
85
Tabela 5: Índice de condições de moradia relacionado com insegurança alimentar no setor
censitário rural – Rio Grande do Sul, 2004...................................................................................
86
Tabela 6: Acesso a programas sociais de transferência de renda relacionados com insegurança
alimentar, no setor censitário urbano – Rio Grande do Sul, 2004................................................
87
Tabela 7: Acesso a programas sociais de transferência de renda relacionados com insegurança
alimentar, no setor censitário rural – Rio Grande do Sul, 2004....................................................
87
Tabela 8: Estimativas das probabilidades de insegurança alimentar, de acordo com as
variáveis independentes, através do modelo probit, para o rural do Rio Grande do Sul,
2004...............................................................................................................................................
89
Tabela 9: Estimativas das probabilidades de insegurança alimentar, de acordo com as
variáveis independentes, através do modelo probit, para o urbano do Rio Grande do Sul,
2004...............................................................................................................................................
91
Tabela 10: Insegurança alimentar na área rural, Brasil e classes de UF, 2004.............................
97
Tabela 11: Indicadores de presença de agricultura familiar e diversificação agrícola, Brasil e
Rio Grande do Sul, 1995-96, 2005, 2007.....................................................................................
100
Tabela 12: Participação do Rio Grande do Sul no Produto Interno Bruto do País (em %),
1995...............................................................................................................................................
111
Tabela 13: Produto Interno Bruto per capita, Brasil e Rio Grande do Sul, 2000 (em valores
correntes)...................................................................................................................................... 111
Tabela 14: Indicadores de isolamento territorial, Brasil e Rio Grande do Sul, 2000, 2004,
2005...............................................................................................................................................
113
Tabela 15: Razão de dependência demográfica na área rural, Brasil e Rio Grande do Sul,
2000. .............................................................................................................................................
114
Tabela 16: Indicadores de acesso à educação, Brasil e Rio Grande do Sul, 2000 e
2001...............................................................................................................................................
116
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO......................................................................................
13
1.1 A Situação da Insegurança Alimentar no Brasil e o Problema de
Pesquisa....................................................................................................
23
1.2 Hipótese do Estudo................................................................................... 26
1.3 Objetivos do Estudo.................................................................................
26
2 FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA ABORDAGEM MONETÁRIA
E DA ABORDAGEM DAS CAPACITAÇÕES SOBRE POBREZA
E INSEGURANÇA ALIMENTAR.......................................................
28
2.1 A Abordagem Monetária da Pobreza: métodos utilizados para o
estabelecimento de linhas de pobreza.......................................................
28
2.1.1 O Enfoque Biológico................................................................................ 29
2.1.2 Salários Mínimos...................................................................................... 31
2.1.3 O Enfoque das Necessidades Básicas.......................................................
31
2.1.3.1 Uma Evidência Empírica: a contagem global da pobreza através da
abordagem das necessidades básicas........................................................
35
2.2 As Relações entre a Teoria das Necessidades Básicas e a Teoria das
Necessidades Humanas............................................................................
38
2.3 A Abordagem das Capacitações...............................................................
42
2.3.1 Os Intitulamentos......................................................................................
47
2.3.1.1 Pobreza e Intitulamentos.......................................................................... 50
2.4 Insegurança Alimentar..............................................................................
55
2.4.1 Pobreza e Insegurança Alimentar pela Falha nos Intitulamentos............. 57
2.4.2 Agricultura e Desenvolvimento: da insegurança alimentar à segurança
alimentar...................................................................................................
61
2.5 Considerações Adicionais........................................................................
66
3 METODOLOGIA...................................................................................
68
3.1 A Fonte de Dados..................................................................................... 68
3.2 A Formação da Base de Dados para a Análise dos Resultados através
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência............................................................................................................
129
ANEXO B: Resultados completos das estimações - Modelo Probit: rural do Rio
Grande do Sul..........................................................................................................
165
ANEXO C: Resultados completos das estimações - Modelo Probit: urbano do
Rio Grande do Sul...................................................................................................
169
do Teste Qui-Quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência.............................................................................................
70
3.3 Procedimentos Estatísticos Utilizados para a Análise dos Resultados
Através do Teste Qui-Quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência.............................................................................................
74
3.4 O Modelo Probit.......................................................................................
75
4 OS INTITULAMENTOS E A INSEGURANÇA ALIMENTAR
NO RIO GRANDE DO SUL: uma análise a partir da PNAD 2004..
79
4.1 Análise dos Resultados através do Teste Qui-Quadrado de Associação
e do Coeficiente de Contingência.............................................................
79
4.2 Análise dos Resultados através do Modelo de Probabilidade Probit......
88
5 OUTROS INTITULAMENTOS QUE CONTRIBUEM PARA
REDUÇÃO DA INSEGURANÇA ALIMENTAR NO RURAL DO
RIO GRANDE DO SUL .......................................................................
94
5.1 Intitulamentos Associados à Presença da Agricultura Familiar............... 98
5.1.1 Agricultura Familiar e a Produção para o Consumo Doméstico.............. 102
5.1.2 Agricultura Familiar e o Consumo de Alimentos Através dos Mercados 108
5.2 Intitulamentos Associados à Riqueza ou a Dotação Inicial de Fatores.... 110
5.3 Intitulamentos Associados à Integração Territorial.................................. 112
5.4 Intitulamentos Associados aos Fatores Demográficos............................. 113
5.5 Intitulamentos Associados ao Acesso à Educação...................................
114
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................
118
13
1 INTRODUÇÃO
O fim da Primeira Guerra Mundial marcou o início, na Europa, da utilização do termo
“segurança alimentar”. A experiência da guerra deu à alimentação um significado estratégico,
de segurança nacional, enaltecendo a ideia de que a soberania de um país também dependia da
sua capacidade de auto-suprimento de alimentos.
Uma consequência dessa preocupação foi o fortalecimento da noção de que a questão
alimentar de um país estava estritamente vinculada à sua capacidade de produção agrícola.
Nesse período a Revolução Verde buscou difundir a ideia de que o flagelo da fome e da
subnutrição no mundo desapareceria com o aumento significativo da produção agrícola, o que
estaria assegurado ao assumir um modelo agrícola de grandes propriedades monocultoras e o
emprego maciço de insumos químicos (Instituto Cidadania, 2001).
Segundo Mazoyer e Roudart (1997), desde o fim da Segunda Guerra Mundial, centros
internacionais de investigação agrícola, financiados por grandes fundações privadas
americanas e européias, selecionaram variedades de alto rendimento de arroz, de trigo, de
milho e de soja, muito exigentes em adubos e em produtos de tratamento, e ajustaram, em
estações experimentais, os métodos de cultivo correspondentes. Nos anos de 1960-1970, a
difusão dessas variedades e desses métodos de cultivo permitiu aumentar fortemente os
rendimentos e a produção de sementes em muitos países da Ásia, da América Latina, e, em
menor grau, na África. Em 1974, foi ratificada a importância da capacidade de produção
agrícola para a solução dos problemas alimentares na Conferência Mundial de Alimentação,
promovida pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO)
(Instituto Cidadania, 2001).
Os ganhos de rendimento e de produção ligados à Revolução Verde beneficiaram,
sobretudo, as regiões férteis, mais aptas a rentabilizar os custosos produtos químicos
necessários, e os agricultores que dispunham de meios suficientes para comprá-los e aplicar
os conselhos técnicos correspondentes. Por outro lado, muitas culturas de produtos
alimentares, bem como a maior parte das raças locais de gado, não foram objetos de um
esforço de pesquisa, por terem sido considerados como secundários. Assim concebidas, as
políticas de modernização permitiram aumentar a produção em numerosos países, mas pouco
contribuíram para proteger e desenvolver a agricultura camponesa pobre dos países em
desenvolvimento.
14
Binswanger (1994), economista sênior do Banco Mundial, ao tratar o tema da pobreza
e da desigualdade constata o fracasso do que ele chama de estratégias urbanas de
desenvolvimento rural, revelado pela persistência e/ou aumento da pobreza rural e,
principalmente, nos países latino-americanos, pelo rápido aumento da pobreza urbana. Estas
estratégias basearam-se no estímulo à modernização da grande propriedade tradicional,
através de subsídios, o que provocou a redução prematura da mão-de-obra agrícola, além de
inflacionar os preços da terra que acirraram os conflitos fundiários e a consequente expulsão
de pequenos produtores na fronteira agrícola.
O próprio segmento de produtores rurais familiares, subsistindo dentro e nas franjas do
latifúndio foi duramente atingindo pelas políticas de modernização de viés industrial e pela
ausência/insuficiência de políticas voltadas para apoiar, consolidar e expandir a produção
familiar. A adoção dessas estratégias urbanas de desenvolvimento rural, que levaram ao
abandono do segmento da agricultura familiar, se explica, segundo Binswanger (1994), por
razões políticas e econômicas específicas a estes países, em geral relacionadas ao poder das
oligarquias rurais e marcado pela alta concentração de recursos fundiários.
No entanto, esta adoção contou com uma justificativa intelectual proporcionada pela
visão teórica predominante sobre o papel da agricultura no processo de desenvolvimento
econômico. De acordo com esta visão, o potencial da agricultura para estimular o crescimento
econômico era muito limitado. Ao setor agrícola caberia financiar o processo de
industrialização, fornecer mão-de-obra barata e gerar divisas por intermédio, sobretudo, da
exportação de produtos tropicais e de clima semitemperado. O “atraso” da agricultura, visto
como fonte de crises agrárias e estrangulamentos ao crescimento da indústria, deveria ser
enfrentado via modernização do latifúndio, cuja base de recursos permitiria o uso mais
eficiente das tecnologias modernas (necessário para reduzir os preços dos alimentos) e uma
resposta também mais ágil aos estímulos do mercado. A integração do latifúndio à economia
moderna, por intermédio da tecnificação, seria suficiente para assegurar que a agricultura
desempenhasse suas funções e para dinamizar a economia rural. Em nenhum momento
levaram-se em consideração as consequências socioeconômicas e políticas da adoção desta
estratégia, em particular sobre a distribuição de renda, tal era a confiança na leitura teórica
que colocava todas as expectativas na indústria para dinamizar o crescimento, e, nas cidades,
como locus de desenvolvimento. Esta visão limitada da inserção da agricultura na economia
ignorava não apenas os efeitos sociais negativos de um crescimento baseado na modernização
do latifúndio, como também a correlação positiva entre crescimento econômico e distribuição
de renda. A experiência dos países desenvolvidos, onde foi fundamental o papel da agricultura
15
familiar na redução da pobreza e na fundação de sociedades democráticas e politicamente
estáveis, foi amplamente desconsiderada ou interpretada de forma distorcida. A estratégia
adotada era justificada pela necessidade de “modernizar” o campo, de superar as estruturas
arcaicas, bem como as limitações associadas à vida rural e aos camponeses, mediante o
estímulo à difusão de empresas agrícolas capitalistas (BINSWANGER, 1994).
As economias subdesenvolvidas de mercado, ao adotarem essas estratégias de
crescimento, baseadas na crença da superioridade da grande produção agrícola e na
inviabilidade da produção familiar, implementaram custosas (e desastrosas) políticas e
programas de modernização que distorceram fortemente os preços relativos dos fatores de
produção em benefício do capital e favoreceram os grandes produtores à custa dos
agricultores familiares (expulsos do campo) e dos trabalhadores urbanos, que tiveram seus
salários rebaixados estruturalmente pela pressão migratória e insuficientes oportunidades de
trabalho.
Para Guanziroli et al. (2001) o Brasil se destaca entre os países onde esta estratégia
urbana de desenvolvimento rural resultou em um desastre social de significativas proporções,
dada a enorme disponibilidade de terras ociosas, as quais poderiam ter sido apropriadas pelos
pequenos produtores familiares sem ameaçar a expansão das áreas ocupadas produtivamente
pelos produtores comerciais não-familiares. O mesmo autor revela que o país ostenta os
piores indicadores de desenvolvimento humano dentre os países de igual nível de renda per
capita, tendo se tornado um caso emblemático de desenvolvimento desigual.
Este fracasso do desenvolvimento rural das últimas décadas vem gerando uma
sucessão de crises, ao verificar-se a regressão das culturas alimentares, a degradação
ambiental, a dependência alimentar, a multiplicação dos quadriláteros da fome, a dependência
tecnológica, o desemprego, o êxodo rural, a marginalidade e a instabilidade social e política.
O modelo adotado, através da Revolução Verde, embora tenha gerado excedentes para os
setores mais desenvolvidos da agricultura, com incrementos em produção e produtividade
agrícola, não fez com que desaparecessem os problemas sociais associados à fome e à
subnutrição, que persistem em atingir importante parcela da população mundial. É dentro
desse contexto que se começou a perceber que a dificuldade crucial para a segurança
alimentar estava na capacidade de acesso aos alimentos, e não mais atrelada à capacidade de
produção agrícola (MAZOYER, 1991).
A definição de segurança alimentar, apresentada pela FAO, em 1982, na 8
a
Sessão do
Comitê Mundial de Segurança Alimentar, incorpora esta nova noção, embora ainda
enfatizasse a importância da oferta de alimentos em quantidade suficiente, sugerida desde a
16
Conferência de 1974: “o objetivo final da segurança alimentar mundial é assegurar que todas
as pessoas tenham, em todo momento, acesso sico e econômico aos alimentos básicos que
necessitam (...)”. No entanto, não é objetivo aqui negar que fatores ligados à capacidade de
produção possam ser causadores de crises de insegurança alimentar, mas essas situações são
extremas como em períodos de guerra, bloqueio econômico ou catástrofes naturais.
Entre as décadas de 1980 e 1990 inicia-se uma crescente preocupação com a qualidade
dos alimentos (nutricional, biológica, sanitária e tecnológica). A Conferência Internacional de
Nutrição, promovida pela FAO e pela Organização Mundial da Saúde (OMS), realizada em
1992, reafirmou a incorporação desses novos atributos ao conceito de segurança alimentar.
No Brasil, o tema da segurança alimentar surge somente em 1986. A concepção
assumida era similar à adotada pela FAO naquele momento, com ênfase na auto-suficiência
alimentar nacional. Neste mesmo ano, ocorreu a Primeira Conferência Nacional de
Alimentação e Nutrição, reafirmando o entendimento de que a alimentação é um direito
básico. Além disso, essa conferência concebeu a idéia de interdependência entre segurança
alimentar e nutricional, bem como identificou a incapacidade de acesso aos alimentos por
parte significativa da população brasileira, ficando superada a antiga visão que atribuía o
problema ao tema do abastecimento (INSTITUTO CIDADANIA, 2001).
Em 1996, no Brasil, consolidou-se a formulação do conceito de segurança alimentar,
objetivando a elaboração do documento oficial brasileiro para a Cúpula Mundial da
Alimentação, que ocorreu em Roma no mesmo ano. Como resultado do amadurecimento do
conceito no Brasil, o projeto de lei que cria o sistema de Segurança Alimentar e Nutricional
(PLC 81/2006), aprovado pelo Senado Federal, dia 05 de setembro de 2006, define a
Segurança Alimentar e Nutricional como:
A realização do direito de todos ao acesso regular e permanente de alimentos de
qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras
necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de
saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e
ambientalmente sustentáveis (BRASIL..., 2005, art.3).
O conceito abrangente de segurança alimentar
1
, que, em linhas gerais, significa ter
acesso aos alimentos para uma vida ativa, saudável coloca desafios para a classificação das
pessoas ou unidades domiciliares diante do atendimento desse direito. Por consequência, a
1
“Food security: Access to enough food for an active, healthy life. At a minimum, food security includes: (1) the
ready availability of nutritionally adequate and safe foods, and (2) an assured ability to acquire acceptable
foods in socially acceptable ways (e.g., without resorting to emergency food supplies, scavenging or other
coping strategies)” (Brewer et al, 2004, p. 8).
17
mensuração da magnitude da insegurança alimentar abrange problemas relacionados à
quantidade de alimentos para suprir as necessidades humanas, à qualidade e à salubridade da
alimentação e, finalmente, a garantia de acesso digno a esses alimentos. Segundo Brewer et
al. (2004, p. 8) insegurança alimentar significa “uma limitada ou precária disponibilidade de
alimentos nutricionalmente adequados, incluindo a redução involuntária de refeições, porção
dos alimentos ou desconhecer a procedência da próxima refeição
2
. Ou ainda: insegurança
alimentar ocorre sempre que a disponibilidade de alimentos nutricionalmente adequados e
seguros, ou a capacidade de adquirir alimentos aceitáveis por meios socialmente aceitáveis,
é limitada ou incerta/precária
3
(SULLIVAN E CHOI, 2002, p.9). Uma consequência do
consumo de alimentos que são inadequados em quantidade e/ou em qualidade nutricional é a
subnutrição
4
(BREWER et al., 2004, p.8).
A insegurança alimentar abrange famílias que o convivem com o problema da fome
e outras que sofrem essa situação. Segundo Sullivan e Choi (2002) a fome é definida como
uma penosa sensação causada por uma recorrente ou involuntária falta de alimentos e é uma
potencial, mas não necessária, consequência da insegurança alimentar. Para Ruel, Garret e
Cassamo (1998) a fome é um fenômeno que assola as camadas mais vulneráveis da sociedade
e não se restringe à cidade ou ao campo.
As relações que envolvem a pobreza e a insegurança alimentar foram formuladas
por diversos autores. Para Maluf et al. (2006a) a pobreza ocupa lugar de determinante
principal da insegurança alimentar, ou seja, do não acesso regular a uma alimentação
adequada. A pobreza pode ser compreendida tanto como causa quanto consequência da fome,
pois a FAO (2004) assegura que não dúvidas de que a pobreza é uma das causas da fome.
em estudo intitulado O Estado da Insegurança Alimentar no Mundo em 2005, a FAO
(2005) afirma que, devido à importância da fome como uma causa da pobreza, do
analfabetismo, das doenças e da mortalidade, e sabendo que 75% das pessoas que sofrem
restrições alimentares no mundo vivem em áreas rurais, não é surpreendente que estejam
nestas mesmas áreas rurais a vasta maioria das 121 milhões de crianças que não comparecem
à escola, das 11 milhões de crianças que morrem antes de completar cinco anos de idade, das
530 mil mulheres que morrem na gravidez e no parto e mais de um milhão de mortos por
malária a cada ano. Portanto, para a FAO a pobreza é causa e também consequência da fome.
2
“Food insecurity: The limited or uncertain availability of nutritionally adequate foods, including involuntarily
cutting back on meals, food portions or not knowing the source of the next meal” (Brewer et al, 2004, p. 8).
3
“Food insecurity occurs whenever the availability of nutritionally adequate and safe foods, or the ability to
acquire acceptable foods in socially acceptable ways, is limited or uncertain” (Sullivan e Choi, 2002, p.9).
4
“Undernutrition: the consequence of consuming food that is inadequate in quantity and/or nutritional quality”
(Brewer et al, 2004, p. 8).
18
O Projeto das Nações Unidas, denominado Metas de Desenvolvimento do Milênio, que
tem como primeiro objetivo a redução pela metade da extrema pobreza e fome no mundo até
2015, destaca que o epicentro global da extrema pobreza é o pequeno produtor rural, e que
nenhum outro segmento da humanidade depende tão diretamente dos serviços e recursos
ambientais quanto o pobre rural. O estudo da FAO enfatiza ainda que, para o alcance dessa
meta, prioridade deve ser dada às áreas rurais e para a agricultura, apoiando os modos de vida
rural, através de sistemas produtivos sustentáveis e seguros, que forneçam emprego e renda
para os pobres, e, portanto, melhorando o acesso aos alimentos.
A persistência da insegurança alimentar torna lento o progresso das demais metas do
milênio. Ou seja, a fome e a subnutrição, levam à pobreza, que, por sua vez, desencadeia a
insustentabilidade do uso dos recursos naturais, reduz a capacidade de acesso aos mercados e
aos recursos, diminui a frequência à escola e a capacidade de aprendizagem, restringe a
educação e o emprego para mulheres, enfraquece o sistema imunológico e aumenta a
mortalidade de crianças, prejudica a saúde materna e infantil, e, por fim, difunde doenças, a
partir das estratégias de sobrevivência arriscadas (FAO, 2005).
No Brasil e em outros países, para a mensuração da insegurança alimentar no espaço
rural, frequentemente são feitas estimativas a partir da definição de linhas de pobreza ou
indigência, associando o grau de carência alimentar ao vel de rendimentos do domicílio,
intuindo que famílias pobres (baixa renda) vivam em condição de insegurança alimentar.
Entretanto, é possível encontrar unidades domiciliares com rendimentos situados abaixo da
linha de pobreza e que vivem em segurança alimentar, do mesmo modo que existem aquelas
com rendimentos acima do corte da pobreza que passa por restrição alimentar quantitativa
(HALL, 2004).
Para Kakwani e Son (2006) as linhas de pobreza, em sua concepção original, deveriam
refletir o custo de realização das necessidades básicas humanas. Contudo, para os autores, a
linha de pobreza US$ 1 ao dia por pessoa (ou US$ 2 ao dia), produzida pelo Banco Mundial,
não representa o custo de realização de qualquer tipo destas necessidades básicas humanas.
Esse critério foi adotado principalmente por ser a linha de pobreza tipicamente predominante
na década de 1980, a partir de uma amostra de 33 países, que incluiu somente 10 países de
baixa renda. Kakwani (2006) enfatiza a necessidade de revisão das estimativas globais de
pobreza, pois atualmente não refletem a insuficiência de comando sobre os recursos para
alcançar capacitações básicas, como estar adequadamente nutrido.
19
A abordagem das capacitações (Capability Approach)
5
, proposta por Amartya Sen, é
uma alternativa à perspectiva tradicional, que associa a carência alimentar ao nível de
rendimento das famílias, possibilitando uma avaliação multidimensional da pobreza. Nesta
abordagem, pobreza é entendida como privação de capacitações. Diversas formas de privação
humana restringem severamente o que Sen chama de capacitações inerentes às pessoas, ou
seja, as liberdades substantivas de que desfrutam para levarem a vida que preferem. Kakwani
(2006) sugere que capacitações relacionadas com saúde, educação, abrigo, roupas, nutrição e
água potável devam ser acordadas como básicas.
Uma das necessidades humanas básicas é a capacitação para estar adequadamente
nutrido, enfatizando que a privação desta capacitação é uma das dimensões da pobreza. A
falta de capacitação para obter alimentos adequados em qualidade e/ou quantidade,
significando também insegurança alimentar, leva à subnutrição. Segundo Svedberg (2002) a
subnutrição não é somente uma consequência da pobreza, mas é também uma causa. Embora
raramente quantificada com a desejada exatidão, a subnutrição reduz a produtividade das
pessoas diretamente, e também indiretamente, por tornar essas pessoas mais suscetíveis a
doenças.
O exercício teórico desenvolvido por Sen, abrange uma série de conceitos que
permitem a análise de realidades sociais, como a insegurança alimentar no meio rural, de
maneira multidimensional, incorporando variáveis quantitativas e indo além delas. Um desses
conceitos que pode auxiliar para a compreensão das dificuldades de acesso digno a alimentos
adequados, quantitativamente e qualitativamente, é a noção de intitulamento (entitlement)
6
,
termo que foi originalmente desenvolvido por Sen para tratar do problema da fome na Ásia e
na África.
O entitlement de uma pessoa é representado pelo conjunto de pacotes alternativos
de bens que podem ser adquiridos mediante o uso dos vários canais legais de
aquisição facultados a essa pessoa. Em uma economia de mercado com
propriedade privada, o conjunto do entitlement de uma pessoa é determinado pelo
pacote original de bens que ela possui (denominado ‘dotação’) e pelos vários
pacotes alternativos que ela pode adquirir, começando com cada dotação inicial,
5
A palavra capabilitysignifica a confluência de capacity + ability’. O termo expressa a habilidade que os
indivíduos possuem para expandirem suas capacitações. Na versão em português do livro de Amartya Sen
(2000), Desenvolvimento como Liberdade, capabilityfoi traduzido como capacidade. Essa tradução ignora o
elemento de autonomia, de agência, que aparece com uso da expressão ‘habilidade’ que indivíduos possuem para
moldar e escolher suas próprias capacitações. Com isso, perde-se a dimensão de desenvolvimento humano
associada à Abordagem das Capacitações (Bagolin, 2005).
6
O termo “entitlement” foi traduzido em Portugal pela expressão “concessão de direitos”. A edição original é de
1981, mas a tradução portuguesa foi feita em 1999. Entretanto, as traduções mais recentes utilizam a expressão
intitulamento para definir “entitlement”.
20
por meio de comércio e produção (denominado seu entitlement de troca’). Uma
pessoa passa fome quando seu entitlement não inclui, no conjunto [que é formado
pelos pacotes alternativos de bens que ela pode adquirir], nenhum pacote de bens
que contenha uma quantidade adequada de alimentos” (SEN, 2000, p.54).
Intitulamentos são, então, os recursos de que as pessoas dispõem para obter alimentos,
ou outros bens, através de meios legais disponíveis na sociedade, incluindo suas próprias
condições de produção e oportunidades comerciais, além de acesso aos meios providos pelo
Estado. A renda, por exemplo, é um intitulamento, pois capacita o indivíduo a adquirir
alimentos; uma porção de terra, da mesma forma, capacita o indivíduo a produzir alimentos
ou a vendê-los para comprar outros bens (SEN, 1999b).
A análise dos intitulamentos permite o estabelecimento de relações entre situações
estruturais que poderiam incentivar a expansão das capacitações, ou, a partir da falta de
determinados acessos a bens, reter capacitações, impedindo que pessoas tenham ingresso a
determinadas oportunidades. A privação da capacitação estar adequadamente nutrido -,
revelando pobreza e insegurança alimentar, pode ser ocasionada pelo inadequado comando
sobre os recursos, seja por intermédio de mercados, provisão pública ou outros canais não
relacionados com o mercado.
Para Maluf et al. (2006a) as condições em que se o acesso aos alimentos pela
população é também determinada pelas formas sociais sob as quais os alimentos são
produzidos e ofertados (tipo de exploração agrícola, grau de concentração econômica do
processamento agroindustrial e da distribuição comercial, padrões de concorrência nos
mercados de alimentos, etc). A inexistência de condições de produção para o autoconsumo,
devido à carência de recursos (água, área útil, etc.), ou, a perda destas condições pela opção à
especialização produtiva, são causas da insuficiência alimentar, que se somam aos indicadores
de pobreza rural. Já para Svedberg (2000) as principais possibilidades de razões pelas quais
indivíduos podem estar subnutridos relacionam-se com a renda familiar, a distribuição
intrafamiliar dos alimentos e doenças, destacando que estas teorias podem não ser
independentes.
O acesso adequado ou inadequado a fontes de nutrição é um importante indicador de
qualidade de vida, sendo, a saúde, a educação, a habitação e até mesmo a mobilidade,
refletidos pelo estado nutricional, embora de um modo não linear (LIPTON; KAKWANI;
SON, 2006). Essa abordagem mais ampla da privação permite identificar como os diferentes
aspectos da pobreza interagem e se reforçam mutuamente. Dessa maneira, avaliar o modo
como diferentes tipos de entitlements podem contribuir para acessar fontes adequadas de
21
nutrição visa a expansão da liberdade humana, através da redução/erradicação da insegurança
alimentar, tendo, como fim, a promoção de desenvolvimento.
Na Abordagem das Capacitações, o processo de desenvolvimento, que é
compreendido como uma melhoria da qualidade de vida das pessoas, e somente pode ser
“documentado” a partir da identificação de um aumento das oportunidades de escolhas dos
agentes sociais, incorpora o paradigma do desenvolvimento humano, que veio à tona como
uma tentativa de colocar as pessoas de volta ao cerne das discussões na área socioeconômica e
política (KUHN et al., 2006). Na visão de Sen (2000) o desenvolvimento humano é um
processo de aumento das capacitações das pessoas, tornando-as capazes de ser e fazer aquilo
que entendem como algo de valor.
A questão fundamental, em termos empíricos, que levou Sen à compreensão do
desenvolvimento como expansão das liberdades, foram as disparidades existentes em um
mesmo mundo: de um lado, os recursos econômicos parecem estar crescendo cada vez mais
em termos gerais, enquanto de outro, há a persistência de problemas sociais milenares como a
fome (Costa et al, 2005).
1.1 A Situação da Insegurança Alimentar no Brasil e o Problema de Pesquisa
A dificuldade de acesso à alimentação adequada, por parcelas significativas da
população mundial e nacional, vem sendo tema de significativa preocupação por parte de
pesquisadores, organizações não-governamentais, organizações de fomento internacionais e
do poder público. Josué de Castro (1946), médico, geógrafo e antropólogo, realizou um dos
mais profundos estudos brasileiros sobre a insegurança alimentar presente no Brasil. Em sua
obra, Geografia da Fome, a palavra “fome” tem amplo sentido, referindo-se a qualquer falta
de elementos nutritivos necessários à formação do organismo humano, abrangendo a fome
quantitativa ou penúria aguda, e a fome qualitativa, causada por deficiências específicas na
dieta diária. O autor destacou que:
Nenhum plano de desenvolvimento é válido, se não conduzir, em prazo razoável,
à melhoria das condições de alimentação do povo, para que, livre do peso
esmagador da fome, possa este povo produzir em níveis que conduzam ao
verdadeiro desenvolvimento econômico equilibrado, da importância da meta
“Alimentos para o povo”, ou seja, “a libertação da fome” (CASTRO, 1946,
p.270).
22
A compreensão da noção de desenvolvimento das áreas rurais não pode desvincular-se
da busca de oportunidades para a redução da pobreza. A FAO argumenta que caso a
insegurança alimentar no meio rural não seja reduzida, o progresso no alívio à pobreza
necessariamente será lento, pois a “pobreza e a fome dirigem um motor de privações e
sofrimentos” (FAO, 2005).
Ainda hoje mais de 800 milhões de pessoas no mundo não têm alimentos suficientes
para a satisfação das suas necessidades nutricionais básicas e, como evidenciado, a maioria
destas pessoas vive em áreas rurais (FAO, 2005). Recente pesquisa do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE, 2004), estimou que no Brasil vivem em condição de
insegurança alimentar
7
cerca de 72 milhões de pessoas, em 39,8% dos domicílios particulares,
estando no meio rural a maior prevalência domiciliar de insegurança alimentar moderada e
grave e, também, a maior proporção de população vivendo nessa condição. Enquanto na área
urbana 11,4% e 6% dos domicílios estavam em condição de insegurança alimentar moderada
e grave, respectivamente, no meio rural, as prevalências eram 17% e 9%.
No Rio Grande do Sul, de acordo com o IBGE (2004), cerca de 24,8% dos domicílios
particulares encontram-se em situação de insegurança alimentar, sendo que no espaço rural
deste estado, área de estudo deste trabalho, a insegurança alimentar atinge 19,5% dos
domicílios. Os significativos índices de insegurança alimentar, distribuídos em insegurança
leve, moderada e grave, no espaço rural deste estado vêm sendo corroborados por estudos que
traçaram comparativos sobre a pobreza rural e a urbana.
Estudos realizados por Waquil e Mattos (2002, 2003) apresentaram aspectos
quantitativos e qualitativos das situações de pobreza rural e urbana no Rio Grande do Sul,
num sentido amplo: privação de renda, privação do atendimento às necessidades básicas e
privação do desenvolvimento das capacitações dos indivíduos, tendo como fonte dos dados a
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). Os autores apresentam, como um dos
7
O suplemento Segurança Alimentar, produzido pelo IBGE (2004), definiu como domicílio com insegurança
alimentar aquele em que no período de referência dos últimos três meses, ocorreu pelo menos uma das quatro
seguintes situações: a) um ou mais moradores ficaram preocupados por não terem certeza de que os alimentos de
que dispunham durassem até que fosse possível comprar ou receber mais comida que constituía a sua
alimentação habitual; b) a comida disponível para os moradores acabou antes que tivessem dinheiro para
comprar mais alimentos que constituíam as suas refeições habituais, sem considerar a existência dos alimentos
secundários (óleo, manteiga, sal, açúcar, etc.), uma vez que sozinhos não constituem a alimentação básica; c) os
moradores da unidade domiciliar ficaram sem dinheiro para ter uma alimentação saudável e variada; d) os
moradores da unidade domiciliar comeram apenas alguns alimentos que ainda tinham porque o dinheiro acabou.
23
principais resultados do primeiro estudo, que a renda média auferida na área rural é inferior à
auferida na área urbana. Demonstraram também, a partir do número e o percentual da
população abaixo das diversas linhas de pobreza construídas, que, proporcionalmente, há mais
pobres no espaço rural. Para ilustrar, ao utilizarem a linha de pobreza US$ 1/dia, os autores
identificaram que cerca de 23% da população rural situa-se abaixo desse critério de renda,
enquanto no meio urbano esse percentual representou 10% das pessoas.
Procurando caracterizar outras dimensões das situações de pobreza, além da renda, os
autores selecionaram caracterizar as variáveis condições de habitação, escolaridade e saúde,
diferenciando entre os estratos de renda, bem como entre os espaços rural e urbano. Os
resultados permitiram concluir que, em geral, estas condições melhoram à medida em que a
renda aumenta e que tais condições são sempre piores na área rural do que na urbana,
implicando em maiores níveis de pobreza rural do que urbana no estado do Rio Grande do
Sul.
Com o intuito de verificar o grau de associação linear entre renda, condições de
habitação, escolaridade e saúde, os autores calcularam os coeficientes de correlação de
Pearson, gerando matrizes, distinguidas entre o espaço rural e o urbano do estado. Os
resultados revelaram que a renda está associada às demais variáveis que influenciam as
condições de vida e a satisfação das necessidades básicas, bem como ao desenvolvimento de
capacitações. Mas o fato de estas correlações serem fracas permitiu, aos autores, concluir que
nenhuma das variáveis estudadas pode, isoladamente, caracterizar as situações de pobreza
rural no Rio Grande do Sul, reforçando também a visão de que a renda auferida pelos
indivíduos não pode ser considerada como sinônimo de melhores condições de vida ou
segurança alimentar.
É importante enfatizar que a realidade rural é muito peculiar, onde a renda assume
importância diferenciada, quando comparada ao espaço urbano. Além da melhor compreensão
da insegurança alimentar e sua relação com a pobreza, um enfoque multidimensional, além da
renda, busca permitir que as ações de enfrentamento sejam mais eficazes.
A proposta de pesquisa que esta etapa introdutória do estudo procurou apresentar
tratará de responder: Que relações podem ser identificadas entre as oportunidades estruturais
existentes e as situações de insegurança alimentar no Rio Grande do Sul? E ainda: Que tipos
de intitulamentos podem ser evidenciados como aqueles que mais influenciam nas situações
de insegurança alimentar no Rio Grande do Sul?
24
1.2 Hipótese do Estudo
A privação da capacitação ‘estar adequadamente nutrido’ é ocasionada pela falta de
acesso aos recursos, seja por intermédio dos mercados, provisão pública, ou outros canais não
relacionados com o mercado.
1.3 Objetivos do Estudo
1.3.1 Objetivo Geral
Analisar, através da abordagem das capacitações, os intitulamentos que se relacionam
com a insegurança alimentar no Rio Grande do Sul, e avaliar os impactos dessa situação para
a expansão das capacitações das famílias rurais gaúchas.
1.3.2 Objetivos Específicos
- Proceder a uma análise multidimensional, que compreenda as situações de insegurança
alimentar no meio rural além do escopo da renda;
- Testar as relações entre a insegurança alimentar, a renda, as condições de moradia e as
transferências governamentais (intitulamentos) das famílias gaúchas;
- Estimar a probabilidade de insegurança alimentar, de acordo com a escolaridade, a idade, o
sexo, a cor, a renda, as transferências governamentais e as condições de moradia das famílias
gaúchas, sendo analisadas de forma conjunta;
- Analisar as relações entre insegurança alimentar e os intitulamentos produtivos, bem como
sua associação com a integração territorial, a demografia e a educação das famílias rurais
gaúchas;
25
-Verificar as condições favoráveis/desfavoráveis que permitam a superação/continuidade de
situações de insegurança alimentar no Rio Grande do Sul.
Esta tese está dividida em seis capítulos distintos. Além desta introdução, o segundo
capítulo discute os fundamentos teóricos da abordagem monetária e da abordagem das
capacitações sobre pobreza e insegurança alimentar. No terceiro capítulo, é apresentada a
metodologia do trabalho, demonstrando os procedimentos de pesquisa adotados, a
justificativa da escolha das variáveis e as ferramentas utilizadas nos procedimentos
estatísticos desenvolvidos para a compreensão da relação entre os intitulamentos selecionados
e a insegurança alimentar. No quarto capítulo estão os resultados da análise realizada, através
do Coeficiente de Contingência, Teste Qui-Quadrado e do modelo de regressão Probit,
diferenciando e tecendo comentários entre os espaços rural e urbano do Rio Grande do Sul.
No capítulo cinco, realiza-se um esforço analítico sobre outros intitulamentos, além daqueles
apresentados no capítulo anterior, que podem influenciar nas situações de insegurança
alimentar do estado gaúcho. Por fim, no capítulo seis, encontram-se as conclusões desta
pesquisa, evidenciando a necessidade de um tratamento multidimensional para a
caracterização das situações de insegurança alimentar no Rio Grande do Sul e sugerindo a
inclusão de novas percepções que permitam melhor caracterizar as dificuldades de acesso à
alimentação adequada, propondo uma alternativa à perspectiva tradicional, que associa a
carência alimentar ao nível de rendimento das famílias.
26
2 FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA ABORDAGEM MONETÁRIA E DA
ABORDAGEM DAS CAPACITAÇÕES SOBRE POBREZA E INSEGURANÇA
ALIMENTAR
A característica mais visível do subdesenvolvimento é a pobreza. Falar de pobreza é
sempre lembrar subnutrição, analfabetismo, exclusão social, perda da cidadania, o não
atendimento de necessidades básicas tais como habitação, transporte, saneamento, saúde,
emprego, etc. Pobreza, como lembrava Josué de Castro, se traduz em fome em todos os seus
sentidos: fome de alimentos, fome de saber, fome de conhecimentos, de liberdade, de lazer.
Mas nada, segundo o autor, distingue tanto os homens como ter ou não ter o que comer.
Sabendo que a pobreza também pode ser compreendida como causa e consequência da
insegurança alimentar, a primeira seção deste capítulo apresenta como a pobreza vem sendo
tratada pela abordagem monetária. A seguir são apresentadas as abordagens das capacitações
e dos intitulamentos, bem como suas contribuições ao tema da pobreza e da insegurança
alimentar. Na seção três são discutidas as relações entre a insegurança alimentar, a pobreza e
os intitulamentos que envolvem a agricultura e o desenvolvimento, a partir da compreensão
de estudiosos do tema.
2.1 A Abordagem Monetária da Pobreza: métodos utilizados para o estabelecimento de linhas
de pobreza
Para Ray (1998) no centro de todas as discussões sobre pobreza está a noção de linhas
de pobreza: um crítico limiar de renda, consumo, ou, de forma mais geral, acesso a bens e
serviços, abaixo do qual indivíduos são declarados como pobres. A linha de pobreza, portanto,
representa um nível mínimo de aceitável participação econômica em determinada sociedade,
num dado período do tempo. De acordo com autor, é possível argumentar que uma noção
fixa de linha de pobreza é insustentável. Isso decorre de preocupações fundamentais que
cercam as medidas de pobreza, como a relatividade da pobreza ou sua oscilação natural.
Mesmo aderindo a medidas de pobreza baseadas em nutrição, ainda assim haveria
incapacidade para encontrar um nível exato, pois, por exemplo, a subnutrição não é o mesmo
que um imediato e óbvio desastre, sendo mais insidiosa, na medida em que um número
significativo de pessoas subnutridas vivem e produzem sob prejudiciais circunstâncias. O
27
autor enfatiza que linhas de pobreza são sempre aproximações de um limiar que é
verdadeiramente indistinto/insensível, pois os efeitos da prolongada privação frequentemente
são sentidos ao longo do tempo. Destaca ainda que as estimativas de linhas de pobreza devem
ser entendidas basicamente como indicadores para serem aprofundados e menos como um
quantificável conceito. Para Rocha (1997) a noção aparentemente simples de linha de pobreza
subestima as dificuldades de se definir o fenômeno da pobreza em determinada sociedade em
um dado período, o que constitui o aspecto essencial para tornar o parâmetro de renda um
instrumento útil para medir a incidência da pobreza e caracterizar os pobres. A autora ressalta
que, quaisquer que sejam os procedimentos adotados para a valoração das linhas de pobreza, é
sempre importante lembrar que os resultados empíricos obtidos em termos de medições e
indicadores de pobreza, assim como suas aplicações para a política social, devem ser
consideradas tendo em mente os pressupostos utilizados como ponto de partida. A seguir
trata-se dos métodos empregados para estabelecer as linhas de pobreza
1
: o enfoque biológico,
dos salários mínimos e a abordagem das necessidades básicas.
2.1.1 O Enfoque Biológico
As considerações biológicas têm sido usadas com frequência para definir a linha de
pobreza, pois, segundo Sen (1999b), o aspecto mais evidente da pobreza é a fome. O
procedimento usual é fixar a linha de pobreza a partir dos requisitos nutricionais mínimos da
dieta, no caso dos itens alimentares, e uma proxy para a renda gasta nos requisitos mínimos,
quanto aos outros itens. O mais simples desses métodos é aquele em que a proporção do gasto
total com alimentação é estimada, sendo a recíproca desta proporção multiplicada pelo
orçamento alimentar mínimo (calculado com base numa dieta nutricionalmente adequada). O
resultado é a linha de pobreza. Por essa sistemática, quanto maior for a proporção dos gastos
com alimentação, no orçamento das famílias pobres, menor é a linha de pobreza, implicando
na ênfase à satisfação dos requisitos alimentares na mensuração da pobreza.
Romão (1993) enfatiza os vários problemas de mensuração que ocorrem na aplicação
desta abordagem:
1
Estudos como o de Hagenaars e van Praag (1985) e Ravallion (1998) aprofundaram as discussões sobre linhas
de pobreza.
28
a) Há uma arbitrariedade inerente na natureza conceitual de “requisitos nutricionais
mínimos”, na medida em que variam de pessoa para pessoa (e mesmo de dia a dia para
a mesma pessoa), dependendo do clima, das condições de trabalho, etc.;
b) A escolha dos produtos que constituem a dieta de subsistência é feita com vistas a
minimizar custos, ao invés de procurar corresponder aos hábitos alimentares das
pessoas;
c) As exigências não-alimentares mínimas são repletas de muitas dificuldades no que
tange a sua abrangência. Quais são, na verdade, os itens indispensáveis a serem
incluídos, do ponto de vista de subsistência, numa definição de pobreza?
Essas dificuldades, implícitas neste enfoque, revelam que o método pode ser
contestado, mas não pode ser abandonado, pois a desnutrição, segundo Romão (1993) é o
aspecto mais evidente da pobreza. Sen (1999b) também defende que a abordagem biológica
não deva ser ignorada, através de dois argumentos. Primeiro, se o conceito de necessidades
nutricionais é um pouco vago (dado que a proporção gasta em alimentos não varia apenas
com os hábitos e a cultura, mas também com os preços relativos e a disponibilidade de bens e
serviços), não razão particular para supor que o conceito de pobreza deva ser claro e
preciso. Certamente, segundo o autor, está implícita uma certa imprecisão de ambos os
conceitos, e a questão realmente relevante é a medida em que as áreas de imprecisão das duas
noções, tais como são normalmente interpretadas, tendem a coincidir. Segundo, mesmo pelo
procedimento de examinar se a pessoa tem o nível de rendimento necessário para a adequada
nutrição, a tradução de um conjunto de normas nutricionais (ou de conjuntos alternativos
dessas normas), num rendimento de linha de pobreza, pode ser bastante simplificado pelo
amplo predomínio de padrões particulares de comportamento de consumo. A proximidade de
hábitos e comportamento reais torna possível deduzir níveis de rendimento em que as normas
nutricionais serão tipicamente satisfeitas.
Por fim Sen enfatiza que dificilmente é possível negar que a desnutrição apenas capta
um aspecto da ideia de pobreza, embora seja um aspecto importante e particularmente
relevante para muitos países em desenvolvimento. Para o autor parece claro que a desnutrição
deve ter um lugar central na concepção de pobreza, sugerindo que a abordagem biológica
merece uma substancial reformulação, mas não a rejeição, por estar relacionada com o
irredutível núcleo de privação absoluta, ao manter as questões da carência alimentar e da fome
no centro do conceito de pobreza.
29
2.1.2 Salários Mínimos
Outra linha de pobreza que tem sido adotada com frequência é o nível de salários
mínimos. A principal ideia que justifica a adoção desse método está ligada à noção de que o
salário mínimo oficial representa uma aproximação do montante de dinheiro necessário para a
obtenção de um patamar mínimo de subsistência. Por conseguinte, aqueles que têm renda
inferior a esse nível são considerados pobres.
Romão (1993) teceu considerações quanto à aplicação desse método. A primeira se
refere à própria metodologia. O autor questiona sobre a justificativa de usar o salário mínimo
como referencial da linha de pobreza, visto que aquele foi determinado tendo em vista a
fixação de um certo montante de renda necessária ao atendimento das necessidades básicas. O
resultado é a geração de um círculo vicioso, pois não sentido fixar um padrão que foi
determinado pelo próprio padrão.
A segunda consideração enfatiza que o salário mínimo deveria, idealmente, ser
ajustado pelos preços, tamanho da família e sua composição, correndo o risco, caso estas
adaptações não ocorram, de ser um indicador com pouca relação com a realidade. É possível
ocorrer, por exemplo, que famílias pequenas, mesmo com renda total limitada, escapem da
pobreza de algum modo, enquanto unidades familiares maiores, com rendas mais altas, não
consigam atingir o limiar de renda mínimo. Além disso, o salário mínimo monetário necessita
ser ajustado pelas diferenças espaciais de preços, de modo que possa dar uma imagem mais
adequada de seu real poder de compra, de uma região para outra, notadamente em grandes
países como o Brasil.
2.1.3 O Enfoque das Necessidades Básicas
A abordagem das necessidades básicas no combate à pobreza nasceu como uma reação
à posição desenvolvimentista então vigente na erradicação da pobreza, segundo a qual taxas
aceleradas de crescimento econômico beneficiariam a todos os segmentos da população e
melhorariam acentuadamente os níveis de vida dos pobres. Essa posição, vigente desde o pós-
30
guerra, acompanhou a ênfase dada à acumulação de capital e à industrialização, sem enfatizar
questões relativas à distribuição. Do fracasso dessa estratégia emergiu uma nova proposta de
combate à pobreza, que visava atender às ‘necessidades básicas’ dos pobres, mediante
redistribuição de recursos e crescimento econômico.
A ideia central da filosofia das necessidades básicas é atender às necessidades
específicas dos mais pobres: alimentação, moradia e vestuário adequados, além de serviços
essenciais como água potável, saneamento, transporte público, serviços médicos e escolas.
Dito de outra forma, salienta a mobilização de recursos específicos para grupos-alvo
especiais, identificados como carentes desses recursos. Este enfoque oferece prioridade à
produção e distribuição da cesta de produtos básicos para grupos-alvo, visando garantir que os
pobres sejam realmente atendidos e não preteridos por deficiências e falhas de mercado. A
estratégia tem continuidade com uma avaliação da eficácia das políticas e dos programas, para
atender aos objetivos, que deveriam ser implementados segundo certa estrutura de
planejamento participativo.
Romão (1993) destaca que houve uma evolução desde a “abordagem do crescimento”,
visão de seus proponentes desenvolvimentistas, até esta estratégia de desenvolvimento
alternativo, que visa diretamente a erradicação da pobreza absoluta. O autor apresenta ainda
as críticas que podem ser feitas ao enfoque das necessidades básicas.
A primeira relaciona-se à natureza subjetiva implícita na formulação do que se define
como necessidade básica. Segundo o autor, as necessidades básicas, muitas vezes, são
consideradas em termos de parâmetros de política pública, dependendo sua conceituação,
principalmente, das preferências do governo ou da elite dominante, ou de suas ideias sobre
aquilo que essa política deve eliminar. Como as recomendações de política dependem da
avaliação das viabilidades, existe, notadamente, uma diferença entre a noção de ‘privação’ e a
ideia do que deve ser eliminado pela política (Sen apud Romão, 1993).
Outra crítica à filosofia das necessidades básicas é feita pela corrente estruturalista.
Declara que o enfoque proposto estabelece metas, colocando alguns elementos não-
quantificáveis como necessidades básicas juntamente com itens essenciais e, assim, torna-se
redundante e possivelmente enganoso. Destaca ainda que as necessidades sentidas pelos
indivíduos são, em última análise, determinadas pela estrutura de produção e distribuição. Se
a estrutura econômica é a causa da pobreza e da desigualdade observadas, nada vale
determinar as necessidades em termos dessa estrutura vigente (Standing e Szal apud Romão,
1993). Considerando suficientes as provas de perpetuação da pobreza e da desigualdade por
fatores estruturais nos países em desenvolvimento, a crítica estruturalista tem realmente
31
alicerce na medida em que as estratégias delineadas não promovam profundas mudanças no
estilo de desenvolvimento atual, correndo o risco de assumirem um caráter assistencialista.
Entretanto se eliminar a pobreza e satisfazer as necessidades básicas da população constituem
o mesmo objetivo, principalmente nos países de Terceiro Mundo, então as metas
estabelecidas para o atendimento das necessidades básicas são os parâmetros que definem a
magnitude das transformações que devam ser impressas no padrão de desenvolvimento da
sociedade para conseguir eliminar a pobreza.
Segundo Comim e Bagolin (2002) a abordagem das necessidades básicas privilegia os
domicílios, ao invés dos indivíduos, como a unidade de análise da pobreza. Apesar desta
abordagem estar estritamente vinculada à renda, os aspectos monetários não são os únicos a
serem estudados. As medidas originais de Rowntree e de Orshansky dependem das
estimativas dos custos de alimentação, vestuário e habitação, mas podem ser complementadas
por bens oferecidos pelo setor público. As linhas de pobreza são construídas a partir do custo
de necessidades básicas em nível local ou regional e pela provisão de bens públicos. Estas
informações são obtidas de censos, como os elaborados pelo IBGE, ou medidas similares, na
forma de cestas básicas. Os autores salientam que, embora esta abordagem retrate uma
realidade mais completa da pobreza, ela considera os domicílios como se fossem indivíduos.
Ao estimar o custo de uma cesta de bens, as necessidades nutricionais e de energia são tidas
como as mesmas entre indivíduos que vivem sob circunstâncias diferentes, destacando que a
esfera dos domicílios é um indicador imperfeito do que acontece em nível individual. Dessa
maneira, medidas baseadas em domicílios são criticadas por não revelarem o que acontece
dentro dos domicílios.
Por fim, é importante ressaltar que a noção de linhas de pobreza é a mais utilizada para
estudos que tentam comparar diversas situações de pobreza. Ainda que os autores
preocupem-se, em muitos casos, em chamar à atenção à multidimensionalidade que precisa
ser associada ao estudo da pobreza, não raro os estudos resumem-se à análise da variável
renda com o corte da “linha de pobreza”. Baseados nesta linha de pobreza, os pesquisadores
conseguem perceber o percentual da população nacional que vive abaixo ou acima da linha e
comparar a situação dos países.
Apenas para exemplificar, segundo Comim e Bagolin (2002) a medida mais
tradicional de insuficiência de renda, “a proporção de pobres” (P
0
), inicia pela identificação da
renda dos indivíduos. Depois, uma renda ou gasto mínimo, chamada linha de pobreza,
considerando o que é “necessário” para uma vida digna é definida. As pessoas com renda
abaixo deste mínimo são todas classificadas em um grupo homogêneo (pobres) e uma medida
32
de incidência relativa em termos da população total é estabelecida. A medida final,
representando uma fração da população, é nada mais do que uma agregação arbitrária de
indivíduos que possuem uma certa “propriedade”, uma baixa renda ou gasto. O problema
fundamental desta medida é que ela é incapaz de medir a intensidade da pobreza (o hiato entre
a renda do indivíduo e a linha de pobreza) e a distribuição da pobreza entre os pobres.
Os autores ainda destacam que a rationale” em termos de políticas sugerida por esta
medida, busca beneficiar as pessoas cujas rendas estão muito próximas da linha de pobreza. É
mais “eficiente” transferir recursos àqueles “menos pobres” do que aos “mais pobres”. Se a
linha de pobreza coincidir com o valor do salário mínimo (ex. R$ 350,00), a lógica da política
de combate à pobreza, derivada deste conceito, levaria a transferências de renda que
privilegiassem pessoas que recebem, por exemplo, R$ 330,00 ou R$ 340,00 em detrimento
daqueles que ganham, por exemplo, R$ 50,00 ou R$ 70,00 ao mês. Comim e Bagolin (2002)
sugerem que cabe aos gestores dessas políticas questionar se os resultados “mais eficientes”
são também os mais “justos”.
O uso de medidas como a “proporção de pobres”, amplamente utilizado no Brasil por
instituições como IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e FGV (Fundação
Getúlio Vargas), podem levar a resultados que sejam “injustos”. Apesar disso, essa medida de
pobreza é a mais utilizada no Brasil para descrever o estado de vida das pessoas pobres e para
orientar políticas de combate à pobreza. Dessa forma, comumente, a “solução
macroeconômica” para o problema da pobreza tem sido a distribuição de recursos monetários
que permitam aos pobres, não melhorar sua efetiva condição de vida, mas ultrapassar a linha
de pobreza e não constar mais estatisticamente no grupo dos pobres.
2.1.3.1 Uma Evidência Empírica: a contagem global da pobreza através da abordagem das
necessidades básicas
Para Kakwani e Son (2006) estimativas globais de pobreza podem ter um importante
papel no monitoramento do nível e da mudança da pobreza em nível global. Análises
detalhadas do perfil da pobreza específica de um país são úteis para a compreensão da
natureza da pobreza e para criar estratégias de redução da pobreza, enquanto contagens
globais podem ser usadas como um poderoso dispositivo para gerar consciência na prioridade
da redução da pobreza, bem como para fornecer benchmarks para os países, individualmente.
O Banco Mundial é a principal instituição que produz estimativas globais da pobreza, tendo
33
sido apresentadas pela primeira vez em 1990 no Relatório de Desenvolvimento Mundial. O
Relatório escolheu a linha de pobreza US$ 1 ao dia, medida em 1985, pela paridade do poder
de compra (PPC). As taxas de câmbio PPC são usadas por levarem em consideração os preços
locais de bens e serviços que não são comercializados internacionalmente.
Os autores destacam que toda sociedade tem sua própria visão do que constitui um
padrão de vida mínimo, e que, estritamente discutindo, não seria possível construir
comparações, entre os países, de taxas de pobreza, pela dificuldade em definir uma comum
cesta da pobreza, aceita em todos os países.
Apesar disso, estimativas globais desempenham um importante papel no
monitoramento do nível e mudança da pobreza ao redor do mundo. Elas podem ser usadas
como importante ferramenta para aumentar a consciência pública sobre a necessidade de
erradicação da pobreza e realizar os objetivos de desenvolvimento do milênio.
Segundo os autores, os esforços feitos pelo Banco Mundial para produzir contagens
globais da pobreza, sob um limiar internacionalmente comparável, devem ser aplaudidos. Ao
mesmo tempo, o Banco tem demonstrado pouco interesse em melhorias metodológicas para a
construção de tais linhas. Neste estudo os autores buscam apresentar o enfraquecimento da
metodologia utilizada pelo Banco. A linha de pobreza US$ 1 ao dia é entendida como
representativa das linhas de pobreza encontradas nos países de baixa renda e, portanto,
deveria ter sido derivada de uma amostra de países de baixa renda. Na verdade, o Banco
Mundial utilizou-se de uma amostra de 33 países, dos quais somente 10 representavam países
de baixa renda, incluindo muitos países industrializados ricos, que não apresentam pobreza
absoluta, como Japão, Austrália, Alemanha Ocidental, Bélgica, Canadá e Estados Unidos. Os
autores destacam ainda que estes países geralmente utilizam linhas de pobreza relativa.
Isto implica que a linha de pobreza US$ 1 ao dia, construída em meados dos anos 80,
pode não ser aplicável neste novo milênio. Muitos países têm realizado revisões, elaborando,
até mesmo, modificações metodológicas em seus cálculos. Desse fato, os autores justificam a
importância de fixar uma linha de pobreza internacional, que seja representativa das linhas de
pobreza dos países de baixa renda no passado recente.
A tentativa realizada pelos autores, com o intuito de corrigir as deficiências descritas,
foi a de compilar linhas de pobreza nacional, a partir de uma amostra de dezenove países de
baixa renda, estando quinze localizadas na África Subsaariana e quatro na Ásia. Os autores
chegaram a uma linha de pobreza de US$ 1,50, enquanto aquela proposta pelo Banco Mundial
atinge US$ 1,08. Com esta nova linha de pobreza, os autores estimaram que existem,
aproximadamente, 1,9 bilhão de pessoas vivendo na pobreza em 2001, enquanto o relatório do
34
Banco Mundial estimou em 1,1 bilhão o número de pessoas pobres. As estimativas dos
autores são baseadas na mais típica linha de pobreza prevalecente em meados dos anos de
1980 entre os países de baixa renda.
Contudo, o principal objetivo deste estudo dos autores tem sido o de computar um
limiar de pobreza baseado em necessidade de alimentos para assegurar adequada ingestão
calórica entre os mais pobres do mundo. O estudo propõe uma nova metodologia,
fundamentada na teoria do consumidor para prover um limiar de pobreza internacional
baseado em calorias.
Buscando estimativas de nutrição, a partir de uma linha de pobreza de alimentação
internacional, obtidas através desta nova metodologia, os autores realizaram a comparação de
custos calóricos através dos países, convertendo o custo calórico corrente local para PPC em
dólares. O custo calórico em Bangladesh para as pessoas correspondentes ao primeiro quintil
resulta em 41 centavos em 1993 (PPC em dólares). Assim, a linha de pobreza para
Bangladesh em 1993 (PPC em dólares) era igual a 0,41x2.080/1000, correspondendo a 85
centavos por pessoa ao dia. Os autores usaram o primeiro quintil como grupo de referência,
implicando que a linha de pobreza de 85 centavos, por pessoa ao dia, representa o mínimo
absoluto de necessidades de alimentação em Bangladesh e, abaixo do qual, não é possível
encontrar as necessidades nutricionais básicas.
Para o estudo das estimativas globais da fome, os autores definiram como
domicílios/famílias que sofrem de fome aqueles ou aquelas que não têm suficiente renda para
adquirir suas necessidades básicas de alimento. Desde que a linha de pobreza de alimentação
determina o mínimo de necessidades básicas de alimentação do domicílio, é possível afirmar,
segundo os autores, que os domicílios sofrem de fome se o consumo total per capita é menor
do que a linha de pobreza de alimentação. Além disso, os autores assumiram que, se o
domicílio sofre de fome, então todos seus membros também sofrem de extrema pobreza. Sob
estas condições, foi calculado o percentual da população que sofre de fome.
A partir da linha de pobreza de alimentação mediana, 87 centavos por pessoa ao dia
(PPC em lares 1993), os autores concluíram que 13,28% da população mundial sofria de
fome, representando 685,78 milhões de pessoas, em 2001. Na América Latina e Caribe esta
população representou 6,4% da população, totalizando 33,55 milhões de pessoas, enquanto no
sul da Ásia e África reside a maioria das pessoas que sofrem de fome. Estas estimativas serão
úteis para agências doadoras internacionais, preocupadas com o alcance da meta de
desenvolvimento do milênio de redução da fome no mundo.
35
Os autores demonstraram que, conhecendo a linha de pobreza de alimentação, é
possível utilizar a teoria do consumidor para estimar a linha de pobreza não-alimentar, que
leva em conta necessidades básicas específicas não-alimentares.
A ideia básica da teoria do consumidor é que os autores determinaram a pobreza não-
alimentar em um ponto onde o consumo alimentar per capita do domicílio é igual a linha de
pobreza alimentar.
O total das linhas de pobreza para 19 países de baixa renda foram obtidas somando,
respectivamente, as linhas de pobreza alimentares e não-alimentares de 1993, PPC em
dólares. A linha de pobreza mediana entre os 19 países de baixa renda foi calculada como
sendo igual a $1,22 (por pessoa ao dia), variando de $1,05 em Burundi para $1,63, em Costa
do Marfim. Assim, cerca de 26,43% da população mundial ou 1.365 bilhão de pessoas,
viviam na pobreza absoluta em 2001.
Os cálculos dos autores sugerem que deve ser feito um esforço para melhorar a
metodologia que estima o número e o percentual de pessoas pobres no mundo, destacando que
a contagem da pobreza do Banco Mundial necessita de atualização, dado que representa o
mais preciso reflexo da situação dos mais pobres do mundo no novo milênio.
Como enfatizado, análises baseadas na insuficiência de renda como indicador de
pobreza ainda têm predominado, sendo justificadas com base na correlação entre a
insuficiência de renda e as demais privações associadas ao ‘ser pobre’; na indisponibilidade
de outras estatísticas sociais; na dificuldade de ponderação e agregação de diferentes
dimensões sociais; e na necessidade de medidas homogêneas que possibilitem
comparabilidade entre distintas regiões (Comim e Bagolin, 2002). No entanto, conforme
Waquil e Mattos (2002) é importante observar que a mensuração da pobreza, através de
indicadores de apenas uma dimensão, no caso a renda, pode conduzir a discrepâncias na
interpretação e no entendimento do fenômeno mais amplo, multidimensional.
Contudo não se pretende afirmar aqui que o aumento de renda não é importante para a
redução da pobreza. No entanto, para a execução deste trabalho, os recursos monetários são
importantes meios de redução da pobreza (intitulamentos) e não fins para tal. Segundo PNUD
(2001) o desenvolvimento humano está relacionado às oportunidades de desenvolver as
aptidões e a criatividade das pessoas conforme suas necessidades e interesses. O crescimento
econômico e o aumento da renda devem ser meios para que se atinja o desenvolvimento
social, este sim o objetivo final do desenvolvimento. Assim, o processo de desenvolvimento
implica o aumento da liberdade, através da expansão das escolhas que as pessoas têm de levar
36
a vida que desejam. O aumento dessas escolhas se através da expansão das capacitações
dessas pessoas.
2.2 As Relações entre a Teoria das Necessidades Básicas e a Teoria das Necessidades
Humanas
Bagolin (2005) afirmou que a Teoria das Necessidades Básicas é a forma operacional
da Teoria das Necessidades Humanas. Esta teoria, desenvolvida por pensadores como Hegel,
Kant e Marx, consolidou-se a partir das contribuições de diferentes áreas do conhecimento e,
por isso, suas definições e argumentos são encontradas na literatura de diversas formas. No
primeiro estágio da teoria, quando as definições foram desenvolvidas e sistematizadas, a ideia
de necessidades humanas foi relacionada com necessidades de requerimentos espontâneos e
naturais ou com condições prévias para demandas do tipo moral, cultural e de sobrevivência.
A satisfação das necessidades humanas promoveria oportunidades para desenvolver as
potencialidades humanas, como desenvolver capacitações para refletir, agir, tomar decisões,
amar, desfrutar e sofrer.
O segundo estágio da discussão sobre necessidades humanas foi entendido como a
Teoria das Necessidades Básicas. Durante este estágio, a ideia foi usar a definição de
necessidades humanas como estratégia para políticas de desenvolvimento e redução da
pobreza. As críticas direcionadas à Teoria das Necessidades Humanas, segundo a autora,
apresentadas pelos simpatizantes da Abordagem das Capacitações, são apropriadas quando
direcionadas apenas à Teoria das Necessidades Básicas, e não à Teoria das Necessidades
Humanas como um todo.
A autora propõe um questionamento: “Teoria das necessidades básicas ou abordagem
das necessidades materiais: uma visão prática ou operacional das necessidades?”
(BAGOLIN, 2005, p. 56). Durante os anos de 1970, a bandeira das necessidades básicas
justificou-se como uma alternativa ao paradigma do crescimento para resolver os problemas
da pobreza, principalmente nos países em desenvolvimento. Considerando a redução da
pobreza, em um curto período de tempo, como o principal objetivo de desenvolvimento,
instituições internacionais realizaram esforços para alcançar o desenvolvimento utilizando as
abordagens baseadas na renda ao longo dos anos de 1970 e início dos anos de 1980.
37
As principais instituições com este objetivo foram o Banco Mundial, a Organização
Internacional do Trabalho e instituições internacionais oficiais correlatas/correlacionadas. A
adoção das necessidades básicas como principal estratégia de desenvolvimento, para o Banco
Mundial, foi considerada uma evolução, de objetivos abstratos para concretos, da
preocupação com meios para uma renovada conscientização da importância dos fins e das
estratégias negativas de redução do desemprego para uma positiva política de reunião das
necessidades básicas.
Para a autora a utilização prática da Teoria das Necessidades Básicas, a partir dos
estudos e programas desenvolvidos, forneceu mais do que estratégias para a redução da
pobreza, mas estratégias de desenvolvimento gerais, completas. A interpretação conceitual foi
baseada na ideia de que essa Teoria foi uma mudança nas discussões sobre desenvolvimento e
que o conceito de necessidades é intrinsecamente vasto.
Streeten et al. (1981) afirmam que existem duas maneiras de definir a abordagem das
necessidades básicas para o desenvolvimento. De acordo a primeira visão, a teoria das
necessidades básicas abraçou componentes de prévias abordagens e estratégias, tais como
desenvolvimento rural, redução da pobreza, estratégias de trabalho, redistribuição com
crescimento e outras correlatas. O mérito desta definição é que ela reúne uma ampla variedade
de pessoas, interesses e instituições sob atraente bandeira das necessidades básicas.
Mas, para os autores, também existem desvantagens em elevar a abordagem para uma
quase exclusiva estratégia de desenvolvimento. Esta definição tende a obscurecer as
características que distinguem a abordagem das necessidades básicas de outras estratégias,
tornando mais difícil definir áreas de discordância e, portanto, alcançar um acordo/pacto.
A segunda definição da abordagem traz à tona suas características distintivas e a
descreve como complemento de estratégias existentes, enfatizando a mudança de paradigma.
Segundo os autores isto tende a evocar controvérsias, despertar oposição para certos aspectos,
além de reduzir as chances de alcançar um acordo na ação. Para os autores isto tem uma
intelectual e política atração, pois não pode ser acusada de “derramar o velho vinho dentro de
uma nova garrafa” ou de ocultar, atrás de um slogan polêmico, questões que necessitam
análises e experimentos sérios.
Segundo Streeten et al. (1981) existem quatro métodos de implementação prática da
Teoria das Necessidades Básicas: 1) abordagem count, cost e deliver; 2) provisão de
oportunidades de ganhos para os pobres, aumentando sua produtividade e melhorando seu
acesso a inputs e mercados; 3) requerimentos organizacionais e institucionais de encontro das
38
necessidades básicas e 4) necessidade de mobilizar forças políticas e sociais dos pobres e
permitir sua participação completa no planejamento, execução e monitoramento dos projetos
anti-pobreza.
Uma outra contribuição para a operacionalização da Teoria das Necessidades Básicas
(STEWART apud BAGOLIN 2005), resumiu a discussão sobre o significado de necessidades
básicas, enfatizando que existe um acordo geral mostrando que a Teoria das Necessidades
Básicas envolve focar no cumprimento de certas necessidades humanas nimas. No entanto,
existe alguma confusão sobre a justificativa para selecionar um particular conjunto desses
requerimentos. As principais dificuldades para o encontro das necessidades básicas a serem
satisfeitas seriam: 1) a tradução da ideia de necessidades básicas dentro da ação, políticas e
projetos e 2) a compreensão de que a realização de necessidades básicas é complexa, tanto em
termos de identificação de medidas apropriadas, como em termos de mobilização dos
requerimentos políticos.
Contudo, a noção de necessidades humanas foi influenciada por razões práticas, e por
isso, a implementação de políticas públicas foi mais centrada na promoção de recursos e posse
de commodities do que em certos aspectos intrínsecos das necessidades humanas.
A abordagem das necessidades alcançou seu ponto máximo com o desenvolvimento
de políticas ao final da década de 1970, mas foi marginalizada nos anos de 1980 pelo
neoliberalismo – a teoria moderna de alocação de recursos -, focada em preferências baseadas
em moeda, a qual acusa as análises de necessidades de serem rígidas, autoritárias e associais
(não-sociais). Paralelamente uma gama de críticas emergiu, questionando a eficácia da Teoria
das Necessidades Básicas como uma alternativa para o desenvolvimento ético. A principal
crítica dirigida a esta teoria foi à redução do conceito aos seus aspectos operacionais e à
formulação de políticas que promoveram exclusivamente melhorias quanto à posse de
commodities (GASPER’s apud BAGOLIN 2005). Entre os críticos, segundo Bagolin (2005)
está Sen (1985), que argumentou:
1) Necessidades básicas são usualmente definidas em termos de commodities;
2) Commodities são avaliadas como se tivessem o mesmo valor para todas as pessoas;
3) Necessidades básicas são interpretadas em termos de quantidades mínimas;
4) “Necessidade” é um conceito passivo;
5) A teoria das necessidades não trabalhou contra as desigualdades;
39
6) A teoria das necessidades básicas não anexa importância para a questão da
liberdade positiva, e tende a identificar requerimentos de commodities,
independentemente das características pessoais e circunstâncias externas.
Das limitações e críticas enfrentadas pelo segundo estágio da Teoria das Necessidades
Humanas, duas novas abordagens emergiram do debate sobre desenvolvimento ético: 1) A
nova teoria das necessidades humanas, em seu terceiro estágio e 2) a Abordagem das
capacitações.
O terceiro estágio da Teoria das Necessidades Humanas tem recebido contribuições,
revelando o grau de diversidade e riqueza destes esforços em diferentes áreas do
conhecimento. A mesma característica é adequada também ao debate reproduzido no primeiro
estágio de desenvolvimento da abordagem das necessidades humanas (BAGOLIN, 2005).
Portanto, é dentro desse contexto que nasce a Abordagem das Capacitações, como
uma alternativa à teoria das necessidades humanas e teoria das necessidades básicas. De
acordo com Bagolin (2005) mesmo sendo considerada por autores como Gasper (2004) como
um refinamento ou uma evolução da Teoria das Necessidades Básicas, a abordagem das
capacitações tem características distintivas, que permitem caracterizá-la como uma nova
abordagem. Em particular, fornece uma metodologia que permite o uso de um espaço
informacional amplo, incluindo o espaço das necessidades. O aspecto mais peculiar é sua
ênfase na liberdade, autonomia e agência como aspectos fundamentais da vida humana.
Amartya Sen reconhece a existência de ligações entre a abordagem das capacitações e às
abordagens de desenvolvimento anteriores, mas para Sen a abordagem das capacitações é
fundamentalmente diferente de outras abordagens por não depender da expansão dos bens e
serviços, do aumento das utilidades, ou de satisfação de necessidades básicas.
Assim, a abordagem das capacitações pode ser considerada como uma evolução e uma
alternativa a abordagens anteriores, incluindo a Teoria das Necessidades Humanas. A mais
conhecida e aceita semelhança entre a abordagem das capacitações e a teoria das necessidades
humanas é a rejeição à abordagem utilitarista e a visão de que o bem-estar da população é o
principal objetivo de desenvolvimento (BAGOLIN, 2005).
Segundo Bagolin (2005) é possível afirmar que a Teoria das Necessidades Humanas e
a Abordagem das Capacitações são abordagens complementares e, mesmo considerando que
tenham pontos de partida diferentes e que usem terminologias distintas, ambas as abordagens
podem ser usadas para elucidar problemas práticos similares, tais como a redução da pobreza,
privações, fome entre outros.
40
2.3 A Abordagem das Capacitações
Segundo Sen (1993) a literatura das necessidades básicas tem padecido um pouco das
incertezas a respeito de como se deve especificar as necessidades. As formulações originais
frequentemente tomaram a forma de uma definição de necessidades básicas em termos de
necessidades de determinadas quantidades mínimas de mercadorias essenciais como
alimentos, roupas e moradias. Quando a literatura utiliza esse tipo de formulação, ela
permanece prisioneira da avaliação centrada em mercadorias. Os objetos dotados de valor
dificilmente podem ser reduzidos à disponibilidade de mercadorias. Mesmo considerada sob
um ponto de vista simplesmente instrumental, a utilidade da perspectiva das mercadorias é
severamente comprometida pela variabilidade da conversão de mercadorias em capacitação.
Por exemplo, os requerimentos de alimentação e nutrientes para a capacitação de bem
alimentar-se varia muito de pessoa para pessoa, dependendo de características de
metabolismo, tamanho do corpo, gênero, gravidez, idade, condições climáticas, parasitoses e
assim por diante. A avaliação da posse de mercadorias ou de rendimentos (com os quais se
pode adquirir mercadorias) pode, no máximo, ser um substituto das coisas que realmente
importam, porém, na maioria dos casos, não é um substituto particularmente adequado.
No aspecto avaliatório, a abordagem desenvolvida por Sen concentra-se em uma base
factual que a diferencia das análises de políticas econômicas mais tradicionais, como a
concentração econômica na primazia da renda e riqueza. Isso não tem por objetivo negar que
a privação de capacitações individuais pode estar fortemente relacionada a um baixo nível de
renda, relação que se em via de mão dupla: (1) o baixo nível de renda pode ser uma razão
fundamental do analfabetismo e más condições de saúde, além de fome e subnutrição e (2)
inversamente, melhor educação e saúde ajudam a auferir rendas mais elevadas. Mas também
outras influências sobre as capacitações básicas e liberdades efetivas que os indivíduos
desfrutam, e existem boas razões para analisar a natureza e o alcance dessas interrelações
(SEN, 2000, p.34).
De fato, precisamente porque as privações de renda e as privações de capacitação com
frequência apresentam consideráveis encadeamentos correlatos, é importante, segundo Sen
(2000) não cair na ilusão de pensar que levar em conta as primeiras de algum modo revela
alguma coisa sobre as segundas. As conexões não são assim tão fortes, e os afastamentos
41
muitas vezes são bem mais importantes do ponto de vista das políticas do que a limitada
concorrência dos dois conjuntos de variáveis.
À medida que a atenção é desviada de uma concentração exclusiva sobre a pobreza de
renda para a ideia mais inclusiva da privação de capacitação, é possível entender melhor a
pobreza das vidas e liberdades humanas com uma base informacional diferente (envolvendo
certas estatísticas que a perspectiva da renda tende a desconsiderar como ponto de referência
para a análise de políticas). O papel da renda e da riqueza tem de ser integrado a um quadro
mais amplo e completo de êxito e privação.
Pretende-se então ressaltar que os recursos monetários são importantes meios de
redução da pobreza e não fins para tal. O desenvolvimento humano está relacionado às
oportunidades de desenvolver as aptidões e a criatividade das pessoas conforme suas
necessidades e seus interesses. O crescimento econômico e o aumento da renda devem ser
meios para que se atinja o desenvolvimento social, este sim o objetivo final do
desenvolvimento (PNUD, 2001).
Dessa maneira, Kakwani (2006) destaca que a falta de renda não é somente o único
tipo de privação que as pessoas podem sofrer. Na verdade os indivíduos podem sofrer aguda
privação em muitos aspectos da vida, além daqueles definidos como necessidades básicas,
mesmo possuindo adequado comando sobre mercadorias. Neste caso, outros aspectos da
pobreza podem estar sendo deixados de fora.
Uma pessoa indigente poderia não estar mal em termos de utilidade medida pelo seu
estado mental, caso se verificasse que essa pessoa aceita sua situação com resignação. Em
situações de privação por longos períodos, as vítimas não persistem em queixas contínuas e
com frequência fazem esforços para tirar prazer de mínimas coisas, reduzindo seus desejos
pessoais a proporções modestas ou, dito de outra forma, realistas. Assim, a privação de uma
pessoa pode não ser captada por escalas de prazer ou auto-realização, mesmo que ela não
consiga alimentar-se adequadamente, vestir-se decentemente, ser minimamente educada e
assim por diante.
Estas observações conduzem a mais sofisticadas medidas e definições de pobreza, tais
como a abordagem das capacitações, proposta por Amartya Sen. Os argumentos em favor da
abordagem da pobreza como privação de capacitações, ao invés de somente privação de
renda, são apresentados a seguir:
42
1) A pobreza pode ser identificada em termos de privação de capacitações. A
abordagem concentra-se em privações que são intrinsecamente importantes (em contraste com
a renda baixa, que é importante apenas instrumentalmente).
2) Existem outras influências quanto à privação de capacitações além do baixo nível
de renda (a renda não é o único instrumento de geração de capacitações).
3) A relação instrumental entre baixa renda e baixa capacitação é variável entre
famílias e indivíduos (o impacto da renda sobre as capacitações é contingente e condicional)
(SEN, 2000, p.110).
Sen (2000) propõe então uma base informacional mais ampla, onde se possa ter
maiores condições de avaliar o bem-estar humano a partir da capacitação que as pessoas têm
de escolher a vida que elas com justiça valorizam. Isso implica considerar aspectos como:
heterogeneidades pessoais, diversidades ambientais, variações no clima social, diferenças de
perspectivas relativas (visões de mundo), etc. Não é necessário nenhum esforço adicional para
perceber que análises baseadas na renda (ou commodities) não dão conta desta necessidade.
É para enfrentar este desafio teórico que Sen propõe a Abordagem das Capacitações.
Esta abordagem está apoiada na noção de liberdade, onde o que realmente importa é a
possibilidade que indivíduo tem de ser e fazer aquilo que ele julga melhor para si próprio, a
liberdade que ele tem para valorizar aquilo que ele julga melhor, dentro dos princípios da
justiça (MATTOS, 2006).
Sen sugere uma abordagem que analise as situações sociais de uma forma
multidimensional. Ou seja, para a compreensão de alguma parte da realidade social é preciso
focar a análise na incorporação de variáveis quantitativas e indo além delas. É importante,
sim, analisar aquilo a que as pessoas têm acesso - como bens e mercadorias entretanto, é
preciso perceber em que tipo de mercado e de que forma essas pessoas são expostas a essas
oportunidades de aquisição. Isso significa perceber que as pessoas podem ter índices de
consumo, senão iguais, bastante parecidos em diversas regiões, entretanto, o modo de acesso a
esses serviços e bens pode ser distinto. O exemplo clássico na literatura seniana apresenta
duas pessoas com idênticas sensações biológicas correspondentes à situação de fome: uma faz
jejum por motivos religiosos (o que significa que assim que optar por isso ela pode alimentar-
se) e outra tem fome por falta de acesso a alimentos, ou não tem dinheiro para comprá-los ou
a institucionalidade da região não garante o acesso à comida (SEN, 2000). Uma análise
estática e quantitativa em relação à situação do corpo humano dessas duas pessoas não seria
43
capaz de refletir e mostrar aos analistas as cruciais diferenças sociais que distanciam esses
dois seres humanos.
Baseado no exemplo anterior é possível apresentar os principais conceitos
relacionados à abordagem das capacitações. A sugestão teórica, ao utilizar essa abordagem, é
perceber a multiplicidade de situações sociais às quais as pessoas são submetidas. Neste
sentido, a qualidade de vida das pessoas estaria associada às oportunidades a que estão
expostas ao longo da vida, ou seja, quanto mais chances de escolhas as pessoas tiverem,
melhor poderia ser a qualidade de vida
2
. A liberdade das pessoas em escolher o modo de vida
que levam e que razões para valorizar é a chave para a análise seniana (COSTA et al., 2005).
Além da noção de liberdade, os conceitos fundamentais para essa análise são: os
funcionamentos [functionings] e a capacitação [capability]. A noção de funcionamento é a
mais primitiva dentro da abordagem das capacitações e refere-se a ‘atividades’ [activities]
(como ver, comer) ou estados de existência’ [states of existence or being] (como estar bem
nutrido, estar livre de malária, não estar envergonhado pela pobreza da roupa vestida),
resumidos, às vezes, por ‘ações’ [doings] e ‘estados’ [beings] (SEN, 2001, p. 236).
Os funcionamentos são os elementos constitutivos da vida e dizem respeito à pessoa.
Partindo desse nível de informação é possível realizar dois exercícios teóricos de análise. O
primeiro identifica o nível de bem-estar de forma análoga à análise da economia
convencional, uma vez que é possível perceber estaticamente o acesso às mercadorias. É
possível analisar todos os funcionamentos realizados, aqueles efetivamente escolhidos pela
pessoa. Por outro lado, se considerarmos na análise os funcionamentos alternativos, levando
em conta a amplitude do grupo de opções que a pessoa tinha ao escolher realizar
determinados funcionamentos, tem-se uma informação nova, à qual a economia tradicional
não tem dispensado atenção até o momento.
Partindo desses estados de existência ou dessas ações alternativas e realizadas é
possível perceber as capacitações dos agentes sociais. A capacitação é o termo seniano que
abrange a ideia de oportunidade, envolvendo “condições externas para a realização dos
funcionamentos” (SEN, 2001, p. 234).
O conjunto de capacitações representa a liberdade pessoal de realizar várias
combinações para a escolha. São todas relevantes para se avaliar o que é vantajoso
para uma pessoa, mesmo que ele ou ela, não escolha apenas uma alternativa. Nessa
2
Ainda que esse possa ser considerado um aspecto fundamental, Sen alerta-nos, por exemplo, para a necessidade
de percepção em relação a oportunidades que estariam associadas às liberdades negativas. Ou seja, podemos ter
a oportunidade de evitar um assalto, entretanto, se pudéssemos realmente escolher em relação a esta
circunstância, possivelmente escolheríamos estar a quilômetros de distância deste acontecimento.
44
perspectiva, a escolha em si mesma, é uma característica valiosa na vida de uma
pessoa (SEN, 1993, p.324).
A capacitação está, então, associada às possibilidades de escolha e à liberdade do
agente social. Funcionamentos realizados e capacitação são informações relacionadas, mas
que pertencem a espaços informacionais diferentes. Uma pessoa que tem a oportunidade de
estudar durante os anos escolares estabelecidos pela legislação em termos de educação formal
pode não ter interesse em dedicar-se o suficiente para essa atividade. Muitos alunos
simplesmente não gostam de estudar e escolhem ocupar seu tempo com outras atividades.
Essa situação é bastante diversa daquele jovem que não tem acesso ao ensino fundamental
(por exemplo, porque em seu município não há escolas nem há acesso a um transporte público
ou barato que esteja disponível àqueles jovens interessados em continuar estudando).
Ter a informação a respeito do gosto das pessoas (como o caso de gostar ou não de
estudar, gostar ou não da cor amarela) é diferente de conhecer as condições em que a pessoa
pode expandir ou reter capacitações. Em termos de tomada de decisões, uma empresa privada
pode estar atenta ao gosto dos clientes, mas a determinação das políticas públicas deve utilizar
informações referentes às possibilidades de realização dessas escolhas e não simplesmente das
escolhas em si (COSTA et al, 2005).
A construção de um espaço informacional mais amplo não é o único elemento
importante na abordagem normativa de Sen. O autor argumenta que a liberdade de uma
pessoa para viver da maneira que deseja tem também um valor intrínseco e, portanto, é
constitutiva do ser da pessoa. Isso significa que não apenas os funcionamentos obtidos têm
valor, mas também as capacitações dos indivíduos de escolher e discriminar entre os cenários
alternativos. A ênfase na liberdade ou na capacitação reflete o aspecto de agência de uma
pessoa. Entretanto, não é qualquer aumento das possibilidades de escolha que importa, mas
somente aquelas que espelham uma expansão das escolhas de valor (COMIM E BAGOLIN,
2002).
2.3.1 Os Intitulamentos
A análise das possibilidades de escolhas que podem ou não representar um aumento
em termos de capacitação passa, especialmente quando se trata de países com pouca infra-
45
estrutura de atendimento das necessidades de populações mais carentes, pela percepção das
condições em que essas escolhas são oportunizadas à população. Procurando esse tipo de
análise, que diz respeito à estrutura de direitos e deveres legais e de formas de acesso a bens e
serviços, é que a abordagem seniana introduz a noção de intitulamentos [entitlements]
3
. O
intitulamento é a condição ética legal e estrutural que determinada sociedade tem para
aumentar suas possibilidades de escolha. Sen sublinha estes direitos no contexto das
capacitações, para participar dos processos de desenvolvimento e transformar suas próprias
condições de vida.
Originalmente, a expressão foi introduzida na discussão para alterar o foco de análise
em relação ao problema da fome. Neste sentido o autor indica que:
A abordagem da carência alimentar e das fomes em termos de concessão de direitos
[intitulamentos] concentra-se na capacitação de as pessoas disporem dos alimentos
através dos meios legais disponíveis na sociedade, incluindo a utilização de
possibilidades de produção e de oportunidades comerciais, de direitos e relação ao
Estado e de outros métodos de aquisição de alimentos. Uma pessoa morre de fome
ou porque não tem capacitação de dispor de alimentos suficientes, ou porque não
utiliza essa capacitação para evitar a carência alimentar. A abordagem em termos de
concessão de direitos [intitulamentos] concentra-se na primeira possibilidade,
ignorando a última” (SEN, 1999 (a), p. 71).
A noção de intitulamento representa um espaço de análise que requer informações
sobre a estrutura de oferta de bens e serviços de uma maneira geral. A falta de acesso a um
intitulamento, gera uma “falha nas capacitações” ou uma “retenção” nas capacitações dos
agentes sociais (algo como uma “falta de poderes para”) (SEN, 2001). Sendo assim, a variável
quantitativa-chave é o acesso a oportunidades de escolhas que faz da noção de intitulamentos,
uma ideia fundamental para a análise das estruturas sociais nos processos de
desenvolvimento.
Analisar a fome a partir da noção de intitulamentos representa salientar que as pessoas
não passam fome devido à disponibilidade de alimentos no mundo, e sim devido à falta de
oportunidades para aquisição e apropriação em relação a esses alimentos. Dito de outra
maneira, não falta comida, falta o acesso a oportunidades e situações em que as pessoas que
passam fome possam comer.
3
Nesta obra do autor, o termo “entitlement” foi traduzido em Portugal pela expressão “concessão de direitos”. A
edição original é de 1981, mas a tradução portuguesa foi feita em 1999. Entretanto, as traduções mais recentes
utilizam a expressão intitulamento para definir “entitlement”.
46
Entender as fomes pelo declínio da disponibilidade alimentar tem sido questionado
por Sen (1999b) em termos de força lógica. Mesmo nos casos em que a fome é acompanhada
de um declínio da quantidade de alimentos disponíveis por pessoa, o mecanismo causal que
precipita a carência alimentar tem de incluir outras variáveis além da disponibilidade geral de
alimentos. É fundamental discutir as relações que envolvem as pessoas e os alimentos, pois o
panorama alimentar global é uma variável econômica, segundo o autor, demasiado remota
para explicar a carência alimentar.
Quando as pessoas passam por carências alimentares, isso certamente significa que
não comida suficiente. Mas o que deve ser discutido é: por que não comida suficiente?
O que permite a um grupo, em vez de outro, apoderar-se da comida que existe?
São estas as questões que levam à abordagem dos intitulamentos, passando de
fenômenos econômicos às questões sociais, políticas e legais. A capacitação de uma pessoa de
dispor de alimentos, ou de qualquer outra mercadoria, depende das relações de intitulamentos
que governam a posse e o uso em uma sociedade. Depende então do que a pessoa possui, das
possibilidades de troca que lhes são oferecidas, do que lhe é dado gratuitamente e do que lhe é
tirado. Portanto é a totalidade das relações de intitulamentos que determina se uma pessoa terá
capacitação para adquirir alimentos suficientes para evitar a carência alimentar. A oferta de
alimentos é somente uma das muitas influências que afetam as relações de intitulamentos.
Outros compreendem que a carência alimentar pode ser causada não pela escassez de
alimentos, mas pela escassez de rendimentos e de poder de compra. Para Sen (1999b) esse
entendimento é uma maneira rudimentar de tentar captar a essência da abordagem dos
intitulamentos, uma vez que o rendimento fornece, realmente, um direito a alimentos numa
economia de mercado. A inadequação desse ponto de vista resulta do fato de que, mesmo nas
circunstâncias em que o rendimento gera domínio, oferece apenas um panorama parcial do
padrão de intitulamentos. Segundo Sen:
Começar a história pela escassez de rendimento é deixá-la meio contada. As pessoas
morreram porque não tinham rendimentos para comprar alimentos, mas como é que
não tinham rendimentos? O que conseguem ganhar depende do que conseguem
vender e a que preço, e partir dos rendimentos deixa de fora essa parte do panorama
da concessão de direitos (SEN, 1999b, p. 218).
Além disso, muitas vezes o rendimento pode ser apenas “imaginário”. Por exemplo, a
posse por um camponês dos cereais alimentares que produz, torna as questões relacionadas ao
47
rendimento e ao poder de compra um pouco oblíquas. Falar do direito do camponês aos
alimentos que produz é, claramente, mais direto. No entanto, a principal vantagem da
abordagem dos intitulamentos é o fato de fornecer uma informação mais global da
capacitação de uma pessoa em dominar mercadorias em geral e alimentos em particular.
2.3.1.1 Pobreza e Intitulamentos
As relações de propriedade são uma espécie de relações de concessão de direitos
(intitulamentos). É necessário compreender os sistemas de intitulamentos, pois, dentro dos
quais, o problema da insegurança alimentar, que inclui a fome, deve ser analisado. Isso aplica-
se também, mais geralmente, à pobreza como tal.
A segurança alimentar é um resultado dos direitos das pessoas. Amartya Sen identifica
quatro categorias principais de direitos do indivíduo: (1) os direitos à participação no
comércio, significando que uma pessoa pode realizar trocas de seus produtos e seu dinheiro
para satisfazer as suas necessidades; (2) o direito à produção, que corresponde ao acesso de
uma pessoa ao que produz, com seus próprios recursos; (3) o direito ao trabalho, significa a
possibilidade e a capacitação de uma pessoa de vender sua própria força de trabalho; (4) os
direitos sucessórios, sendo os oferecimentos voluntários como remessas, transferências
estatais e distribuição de alimentos.
Numa economia de mercado, uma pessoa pode trocar aquilo de que for proprietária
por outro pacote de mercadorias. Essa troca pode ser realizada através do comércio, ou
através da produção, ou ainda de uma combinação entre ambas. Ao conjunto de todos os lotes
alternativos de mercadorias que é possível adquirir em troca daquilo de que se tem
propriedade pode-se chamar ‘direito à troca’. Entre as influências que determinam o direito
de troca de uma pessoa, dado o seu lote de propriedade (incluindo a força de trabalho),
encontram-se as seguintes:
a) se encontra-se empregado, e se assim for, durante quanto tempo e a que nível salarial;
b) o que é possível ganhar vendendo seus ativos, exceto trabalho, e quanto lhe custa
comprar seja o que queira comprar;
48
c) o que é possível produzir com a sua própria força de trabalho e os recursos (ou serviços)
que consegue comprar ou gerir;
d) o custo da compra de recursos (ou serviços) e o valor dos produtos que consegue
vender;
e) os benefícios de segurança social a que tem direito e os impostos, e outros, que tem de
pagar.
O direito de troca pode piorar por razões distintas daquelas relacionadas com a
diminuição generalizada da disponibilidade de alimentos. Por exemplo, perante uma mesma
disponibilidade total de alimentos, o fato de outros grupos se tornarem mais ricos e
comprarem mais alimentos pode levar ao aumento dos preços dos alimentos, provocando uma
deterioração do direito de troca. Da mesma forma, os salários podem cair mais do que os
preços. Ou o preço dos recursos necessários à produção, em que a pessoa se envolver, pode
subir relativamente. Essas diversas influências nos direitos de troca são tão relevantes como o
volume global da disponibilidade alimentar em relação à população.
No estudo dos modos de produção, Sen (1999b) enfatiza que os direitos de troca de
uma pessoa dependem, claramente, de sua posição na estrutura econômica de classes, bem
como dos modos de produção vigentes na economia. O que uma pessoa possui variará com
sua classe, e mesmo que o levantamento do direito de troca (relação que especifica o conjunto
de direitos de troca em relação a cada lote de propriedade) se mantivesse exatamente para
todos, os direitos reais de troca diferem com a sua situação de propriedade.
Mas mesmo com a mesma situação de propriedade, os direitos de troca serão
diferentes, dependendo das perspectivas econômicas abertas, e isso dependerá dos modos de
produção e da sua posição em termos de relações de produção. O autor exemplifica: enquanto
um lavrador difere de um trabalhador sem terra em termos de propriedade (uma vez que ele é
proprietário de terras, enquanto o trabalhador não é), o meeiro sem terra difere do trabalhador
sem terra não quanto às respectivas propriedades, mas na maneira como podem utilizar o
único recurso de que o proprietários - a força de trabalho. O trabalhador sem terra será
empregado em troca de um salário, enquanto o meeiro fará o cultivo e será proprietário de
uma parte da produção.
Esta diferença pode levar não a comparações dos veis de remuneração típica dos
dois, que podem ser muito divergentes ou não, mas também existem diferenças dos direitos de
49
troca em situações de aperto. Por exemplo, reduzindo um ciclone a necessidade de mão-de-
obra para o cultivo, por destruir uma parte da colheita, isso pode fazer com que alguns
trabalhadores agrícolas eventuais sejam simplesmente despedidos, levando a um colapso dos
seus direitos de troca, enquanto outros são mantidos. Pelo contrário, neste caso os meeiros
podem funcionar todos com menor contribuição de mão-de-obra e menor direito, mas nenhum
pode ficar completamente sem trabalho e, assim, sem rendimento.
No mesmo sentido, se o produto for alimento, por exemplo, arroz ou trigo, o meeiro
recebe o seu retorno numa forma que pode alimentar-se diretamente, sem passar pelo
mercado. o trabalhador agrícola, pago em termos monetários, terá que depender do direito
de troca que o seu salário em moeda lhe confere. Sen afirma que para compreender a pobreza
em geral, ou a regular carência alimentar, ou irrupções de fomes é necessário analisar tanto os
padrões de propriedade e os direitos de troca, quanto as forças existentes atrás deles. Isso
exige que se tenha cuidadosamente em consideração a natureza dos modos de produção e da
estrutura de classes econômicas, bem como as suas inter-relações.
Por fim o autor adverte que os direitos de troca dependem não somente das trocas no
mercado, mas também das trocas, se houver, que o Estado proporciona como parte do seu
programa de segurança social. A partir de um sistema de segurança social, uma pessoa
desempregada pode obter um subsídio, uma pessoa idosa, uma pensão, enquanto os pobres
podem receber benefícios específicos. Segundo Sen (1999b) isso afeta os lotes de
mercadorias que uma pessoa pode controlar, por serem considerados partes dos direitos de
troca de uma pessoa e são condicionais a ausência de outras trocas que uma pessoa possa
fazer. Por exemplo, uma pessoa não tem direito ao subsídio de desemprego se estiver
empregada. Estas provisões de segurança social são essencialmente complementos dos
processos de troca de mercado e de produção, e os dois tipos de oportunidades em conjunto
determinam os direitos de troca de uma pessoa numa economia de mercado de propriedade
privada com provisões de segurança social. Esses arranjos de segurança social são
particularmente importantes no contexto da carência alimentar. Com a alta taxa de
desemprego em países como a Grã-Bretanha e Estados Unidos, se não fossem os arranjos de
segurança social, haveria carências alimentares generalizadas e, possivelmente, uma fome. O
que evita essa situação, não é o elevado rendimento médio ou a riqueza dos britânicos, nem a
opulência geral dos americanos, mas sim os valores mínimos garantidos de direitos de troca
devidos ao sistema de segurança social.
Portanto, a identificação dos intitulamentos depende de “várias influências distintas”
(SEN, 2000, p.190). A princípio, é possível considerar que o intitulamento está associado à
50
noção de dotação, ou seja, à percepção dos recursos que têm algum valor em relação à
humanidade (por exemplo, força de trabalho, água potável). Em segundo lugar, o
intitulamento sofre a influência das possibilidades de produção e de seu uso. Essa questão
envolve diretamente a tecnologia disponível para a reprodução das condições materiais da
estrutura analisada e da disponibilidade de conhecimento disponível para o uso dessas
condições.
No mundo todo, a maioria das pessoas não produz alimentos diretamente;
elas ganham seu potencial para adquirir alimentos empregando-se na
produção de outras mercadorias, as quais podem variar de culturas
agrícolas comerciais a produtos artesanais, artigos industrializados e
serviços diversos, envolvendo uma variedade de ocupações (SEN, 2000, p.
191).
Além da dotação e das possibilidades de produção e uso, as condições de troca
estabelecidas podem determinar a existência ou não de determinado intitulamento dentro da
estrutura social. Uma crise econômica pode, ao alterar drasticamente as condições de trocas,
representar uma verdadeira catástrofe em termos de fome ou de destruição de paisagens
naturais, por exemplo
4
.
Como enfatizado, a análise dos intitulamentos é capaz de permitir ao pesquisador
social o estabelecimento de relações entre situações estruturais que poderiam incentivar a
expansão das capacitações ou, a partir da falta de determinados acessos a bens e serviços,
reter capacitações, impedindo que pessoas tenham acesso a determinadas oportunidades. Os
intitulamentos identificados pelo autor determinam o controle sobre os recursos que as
pessoas podem exercer, em conformidade com as regras e normas impostas pela sociedade
para satisfazer suas necessidades.
Para Sen (1999b) o fim da carência alimentar reflete uma mudança do sistema de
conferência de direitos, tanto na forma da segurança social como (e mais importante) através
de sistemas de emprego garantido com salários que proporcionam um direito de troca
adequado, evitando a carência alimentar. Neste sentido, a análise de políticas públicas, ou a
própria discussão para uma solução mais ética em relação à apropriação dos bens e serviços,
pode valer-se desse conceito de modo a alterar a percepção da apropriação em relação às
oportunidades oferecidas na sociedade.
4
Pode-se pensar no caso da agricultura, por exemplo. A valorização de determinados produtos e de uma forma
de produção que exigia a utilização de uma grande quantidade de agrotóxicos pode ter representado a poluição
de mananciais hídricos inteiros (o intitulamento água potável sem tratamento deixou de existir) e o fato sequer
foi considerado crise. Na realidade, foi durante algum tempo comemorado como uma vitória da modernização
produtiva.
51
No estudo dos intitulamentos é importante distinguir as fomes coletivas e crises desse
tipo dos problemas de fome e pobreza endêmicas, que podem acarretar sofrimento persistente,
mas não incluem nenhuma nova explosão de privação extrema que subitamente acomete uma
parcela da população. Sen (2000) destaca que para a análise da subnutrição endêmica e a
privação persistente e prolongada é possível utilizar alguns dos conceitos que o estudo das
fomes coletivas fornece.
Analisando a grande fome de Bengala de 1943 e mais recentemente a fome em
Bangladesh e na Etiópia, Sen tem demonstrado que o declínio da disponibilidade de alimentos
não foi a maior causa da fome. Em Bengala, gastos militares em áreas urbanas e a
conseqüente inflação nos preços dos alimentos foram os principais responsáveis. Nessas
situações, os mais atingidos foram os trabalhadores da agricultura sem terras e os empregados
rurais por conta própria, os quais tiveram suas rendas reais reduzidas pela inflação. Quando
uma ameaça de fome surge, reduzir o trabalho para fornecer emprego e real poder de compra
para os mais pobres, pode ser importante estratégia para evitar a fome.
Como demonstrado para a Índia, fomes podem ser evitadas, mesmo em eventos como
quebra de safras, através de objetivos e oportunos programas de emprego, reduzindo
diretamente o desemprego aliado ao cuidadoso uso das reservas de alimentos. Sen (1999b)
contrastou a China, que tem reduzido a subnutrição crônica, embora ainda pessoas sofram de
fome aguda, com a Índia que, com um sistema político democrático, pressiona ações
governamentais para evitar a fome aguda, embora ainda conviva com a fome crônica.
Por fim, convém salientar que o enfoque da carência alimentar (subnutrição crônica) é
o mais apropriado ao contexto e área de desenvolvimento deste estudo (o rural do estado do
Rio Grande do Sul), e que pode ser compreendido aqui no sentido mais amplo de pessoas que
passam sem a alimentação adequada, e que deve ser distinguido da fome aguda (starvation e
famine, em inglês).
Outros estudos, como os de Johnson e Schuch (1983) - Role of Markets in the World
Food Economy; Ball (1981) - World Hunger; Mc Bean – Achieving Food Security, in Current
Issues in Development Economics, de Balasutramanyan e Lall (1991), capítulo 4 e Streeten
Hunger, em Equity and Efficiency in Economic Development, de Savoie e Brecher (1992)
realizam estimativas da fome, bem como suas causas e consequências.
52
2.4 Insegurança Alimentar
As Metas de Desenvolvimento do Milênio têm focado na importância crucial de
reduzir a fome, não somente por ser o explícito objetivo número um (1) - Erradicar a extrema
pobreza e a fome -, mas também como uma essencial condição para o alcance das demais
metas. O relatório da FAO (2005) reuniu evidências de que a fome e a subnutrição são as
maiores causas da dificuldade no alcance das demais metas, quais sejam: (2) Educação básica
e de qualidade para todos; (3) Igualdade entre sexos e valorização da mulher; (4) Reduzir a
mortalidade infantil; (5) Melhorar a saúde das gestantes; (6) Combater a AIDS, a malária e
outras doenças; (7) Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente e (8) Todos trabalhando
pelo desenvolvimento.
Por isso, antes de tratar propriamente sobre a insegurança alimentar, que
frequentemente resulta em subnutrição e fome, é necessário tecer esclarecimentos sobre a
importância da segurança alimentar como eixo estratégico de desenvolvimento.
Para Madeley (2003) o alimento é o bem que nos mantém vivos, a necessidade
humana por excelência, o verdadeiro meio de vida, sendo reconhecido na carta das Nações
Unidas como um direito humano. Além disso, o alimento é considerado algo especial e
absolutamente diferente de qualquer outra mercadoria.
Para Maluf (2006b) as estratégias de desenvolvimento centradas na segurança
alimentar contribuem para implementação do direito à alimentação. A proposição de colocar a
segurança alimentar como um eixo estratégico de desenvolvimento pressupõe o
reconhecimento de que uma questão alimentar nos processos de desenvolvimento que se
deve a três fatores. Primeiro, estar adequadamente alimentado constitui um direito humano
fundamental, pois se trata de uma condição vital. Segundo, o conjunto de atividades ligadas à
produção, distribuição e consumo de alimentos (o sistema alimentar) desempenha um papel
central na configuração econômica, social e cultural dos países. Terceiro, as questões ligadas
aos alimentos e à alimentação são sempre fontes de preocupações e de mobilizações sociais,
bem como objetos permanentes de políticas públicas.
As estratégias econômicas e as políticas públicas derivadas desta concepção
diferenciam-se bastante dos enfoques convencionais sobre a questão alimentar, ao sugerir
uma perspectiva que ultrapassa os limites tanto dos enfoques setoriais (agrícolas ou
nutricionais) como das ações simplesmente suplementares ou compensatórias. Ao conceito de
53
segurança alimentar é atribuído um estatuto análogo ao conferido à equidade social e à
sustentabilidade, todos eles colocados como objetivos nucleadores de políticas públicas.
Habitualmente tem-se enfatizado a disponibilidade de renda como o determinante
principal do acesso adequado aos alimentos e, conseqüentemente, da segurança alimentar;
sendo a disponibilidade de renda uma expressão do grau de equidade social. A partir dessa
abordagem, a capacitação de adquirir alimentos, por sua vez, impactaria a produção e o
consumo. Nestes termos, o equacionamento da insuficiência de renda (ou da pobreza)
mediante, por exemplo, políticas de emprego e de salários permitiriam o consumo dos
alimentos e estimulariam a produção destes bens.
Para Maluf (2006b) este enfoque capta um lado do problema, sem dúvida essencial,
mas não todo ele. Isto porque a questão alimentar mantém uma relação de mútua
determinação com a equidade social, não sendo apenas uma resultante desta última. Assim, o
tratamento dos vários aspectos envolvidos na questão alimentar também contribui para uma
maior equidade social. A relação entre ambas é um reflexo e, ao mesmo tempo, contribui para
a configuração do padrão de desenvolvimento socioeconômico vigente numa sociedade.
Assim, se o requisito de renda monetária e o enfrentamento da pobreza contribuem para a
segurança alimentar, as formas sociais em que se organiza a produção dos alimentos e as
condições em que se dá o acesso a estes bens são também determinantes da equidade social.
Segundo Maluf (2006b), para alterar as formas sociais e as condições de acesso ao
alimento é necessário promover uma importante reorientação nas estratégias de
desenvolvimento em vigor na maior parte dos países do Terceiro Mundo, que estão em
contradição com os objetivos da segurança alimentar e da equidade social. Mesmo em países
onde crescimento econômico, existe um componente forte de exclusão social. Associar
crescimento econômico com crescente equidade social pode ser o principal desafio para a
formulação de estratégias econômicas que considerem razões de justiça social e de
sustentabilidade ambiental.
Esta perspectiva tende a atribuir maior importância aos mercados domésticos e à
produção de bens de consumo gerais, caso em que os alimentos e o sistema agroalimentar
desempenhariam um papel central e o objetivo da segurança alimentar adquiriria seu
significado pleno. O potencial para caminhar nesta direção é sem dúvida maior para os países
onde a promoção de crescente equidade social e a conseqüente inclusão dos atuais excluídos
resultariam, pela dimensão da sua população, num mercado interno com porte significativo.
54
Uma consequência desta abordagem é que as políticas de segurança alimentar teriam
como alvo o conjunto da população, e não somente os grupos em situação de pobreza
extrema, e como campo de intervenção, os determinantes das condições de acesso (trabalho e
renda) e de produção (estrutura produtiva, disponibilidade e preço) dos alimentos básicos.
2.4.1 Pobreza e Insegurança Alimentar pela Falha nos Intitulamentos
Para Maluf (2006b) a pobreza é o determinante principal da insegurança alimentar,
isto é, a ausência de acesso regular a uma alimentação adequada, origem dos fenômenos da
fome e da subnutrição. Para Madeley (2003) as pessoas passam fome porque são pobres
demais para plantar ou comprar os alimentos de que precisam. Milhões de pobres do campo
não têm terra ou têm lotes muito pequenos, onde pouco conseguem colher, necessitando
comprar alimentos para sobreviver. O baixo poder de compra dessa população faz com que
muitos passem fome, embora vivam em locais onde os armazéns estão repletos de alimentos.
O autor afirma que enquanto a fome aguda é uma notícia que gera manchetes, a falta
de segurança alimentar, a fome crônica, é um fato corrente e cotidiano para milhões de
pessoas e que raramente se torna manchete. No nível pessoal, a falta de segurança alimentar
pode significar a impossibilidade de comer todos os dias, e não somente a impossibilidade de
receber uma refeição completa por dia. No início do terceiro milênio, milhões de pessoas
carecem de alimento nutritivo o bastante para viverem vidas saudáveis. No sul da Ásia
283,4 milhões de famintos; no Leste e no Sudeste Asiático, 241,6 milhões; na África
Subsaariana, 179,6 milhões; na América Latina, 53,4 milhões; no Oriente Próximo e no Norte
da África, 32,9 milhões. Mais de vinte mil pessoas morrem por dia pelos efeitos da fome, e,
mesmo que em algumas regiões a produtividade por hectare seja baixa, em geral a falta de
alimento não é causada pela falta de produção, mas sim pela baixa renda e pela desigualdade
no acesso a recursos como terra, água, crédito e mercado (MADELEY, 2003).
Nos países de terceiro mundo, o panorama mais ou menos geral é caracterizado por: i)
concentração de renda, ii) os níveis crescentes de pobreza urbana, iii) queda da pobreza rural,
embora os índices de pobreza sejam mais elevados no meio rural. A redução do número
absoluto de pobres das zonas rurais é devido, sobretudo, à migração rural-urbana. A fome,
consequência da pobreza, alcança, importante questão no campo, onde vivem perto de três
55
quartos do total de pessoas sub-alimentadas do planeta, embora o fenômeno da urbanização
estenda o problema às cidades.
Para Maluf (2006b) os estilos de desenvolvimento que emergem pós-ajuste estrutural
tendem a gerar mais desigualdades que os anteriores - ainda que se possa verificar alguma
redução na pobreza relativa - e ampliam a importância das políticas sociais baseadas em redes
de segurança social com cobertura universal. Mesmo nos países (como os da América Latina)
que apresentaram uma gradual melhora em indicadores como os de mortalidade infantil e de
desnutrição, a insegurança alimentar ainda afeta a maioria dos países e uma parcela
significativa de suas populações.
O consumo de alimentos é um indicador fundamental para caracterizar a pobreza. Os
gastos necessários para uma família adquirir o que se considera uma “cesta básica de
alimentos” são a principal (em alguns lugares, a única) referência para determinar o valor do
salário-mínimo e, quando existe, a linha oficial de pobreza e de indigência. A atualização da
noção de “cesta básica” é uma necessidade colocada em muitos países. Além do que, é
indispensável acrescentar à renda monetária o acesso a bens e serviços não-monetários
(saneamento básico, alimentação escolar, etc.) que também determinam a condição alimentar
e o bem estar da população.
A pobreza rural, a fome no campo e o êxodo rural resultam, em significativa medida,
da falência das atividades produtivas rurais de pequena e média dimensão, sobretudo à
produção agrícola, ao que se somam outros fatores. As rendas não-agrícolas, rurais ou
urbanas, que compõem a reprodução das famílias rurais (turismo rural, artesanato, trabalho
qualificado, etc.), representam um significativo auxílio para aqueles que dispõem de recursos
para desenvolvê-las, porém, frequentemente, elas se constituem em fonte precária de recursos
alternativos (ocupações de baixa remuneração).
É preciso ainda acrescentar a questão das expectativas futuras dos jovens, filhos dos
agricultores, elemento-chave de toda estratégia voltada às famílias rurais. As transferências de
renda pela extensão de direitos sociais ao campo (previdência rural) introduzem um forte
potencial para retirar da situação de pobreza as famílias rurais afetadas pelo êxodo dos mais
jovens.
Maluf (2006b) sugere a adoção de uma abordagem espacial, valorizando as dinâmicas
dos territórios e que evidencie a interação urbano-rural, presente em muitos casos, bem como
as redes sociais essenciais à reprodução das famílias neles localizadas.
Madeley (2003) destaca que, se a insegurança alimentar é causada pela pobreza, outros
fatores tendem a exacerbá-la. Um primeiro fator está relacionado com os solos pobres, que
56
somados à baixa fertilidade, limitam em muitos casos a produção do pequeno agricultor. Nos
países em desenvolvimento, cerca de 14% das terras são usadas para produzir cereais e
hortaliças para exportação. Essas terras são sempre as melhores, enquanto os pequenos
produtores rurais são deslocados para terras mais fracas. Com frequência, esses solos também
sofrem erosão, destacando que desde a década de 50, mais de um quinto das terras
agricultáveis do mundo têm sido degradadas. Entre as causas da redução de fertilidade do solo
estão a redução de matéria orgânica no solo, os métodos intensivos de cultivo, a rotação
insuficiente de culturas, a excessiva exploração das pastagens e o corte indiscriminado de
árvores.
Um segundo fator que pode exacerbar a insegurança alimentar está relacionado ao
trabalho rural feminino, que produz parte significativa dos alimentos no mundo. No entanto,
as agricultoras são muitas vezes negligenciadas pelos formuladores de políticas, tendo
dificuldades em obter financiamento em muitos países. Não o levados em consideração os
problemas e as circunstâncias especiais com que elas se defrontam. A produção feminina de
alimentos para subsistência, por não entrar para o mercado, às vezes não é contabilizada nas
estatísticas de renda do país. Portanto, a contribuição feminina o é adequadamente avaliada
e compreendida. A declaração da Cúpula Mundial sobre Alimentação Mundial de 1996
reconheceu que o acesso limitado das mulheres do campo aos meios de produção e seu papel
restrito na tomada de decisão política e econômica agravam a pobreza e são empecilhos à
segurança alimentar, dado que as políticas e os programas de muitos países dão pouca atenção
à igualdade entre homens e mulheres e a falta de informações, discriminadas por sexo, impede
a tomada de decisões sociais e econômicas bem fundamentadas. Além disso, as mulheres não
somente cultivam alimentos, como também se encarregam do processamento posterior à
colheita e da comercialização. Elas são sempre responsáveis pela segurança alimentar e
procuram satisfazer as necessidades alimentícias de suas famílias. Embora as mulheres
produzam a maior parte do alimento nos países em desenvolvimento, elas normalmente
sofrem mais os efeitos da insegurança alimentar. No contexto familiar de muitos países, os
homens recebem porções de alimento maiores do que as mulheres. Nos países em
desenvolvimento, encontram-se dois terços dos analfabetos do mundo, bem como 60% dos
pobres são mulheres.
Um terceiro fator está relacionado a desastres. A agricultura sofre hoje, com maior
frequência, interrupções por desastres, que são, em sua maioria, de origem humana. O
desmatamento deixa encostas nuas e aumenta a probabilidade de deslizamentos de lama,
como foi o caso na Venezuela, em Honduras, na Guatemala, na Nicarágua entre outros. A
57
mudança climática, evidenciada pelo aquecimento global, causado sobretudo pelas emissões
de carbono, repercute sobre a agricultura e a segurança alimentar. A variabilidade da
produção agrícola representa, por si só, um fator determinante da insegurança alimentar,
que, somado à mudança climática, provavelmente acentuará este fenômeno. Para a agricultura
de subsistência e, sobretudo, para a população que sofre com a escassez de alimento, a
diminuição das safras causada por mudanças climáticas poderá acarretar perdas econômicas,
subnutrição e fome.
Também a escassez de água pode resultar em escassez de alimentos. Geralmente,
agricultores com poucos recursos não dispõem de equipamentos para irrigação ou outras
fontes de água e assim suas plantações dependem das chuvas. No início do terceiro milênio,
31 países, com população total de meio bilhão de pessoas, padecem de falta de água crônica.
Todavia, para Madeley (2003), não parece que a solução seja mais irrigação. Os sistemas
atuais de irrigação são em geral caros e ineficientes, além de esgotarem os lençóis freáticos.
solos aqüíferos que estão secando em alguns lugares do Oriente Médio. O autor sugere
que, em lugar de instalações de irrigação, é preferível a captação e o armazenamento de água.
Além disso, para que seja possível desenvolver culturas com maior rendimento,
resistentes a pragas e doenças e que suportem ambientes desfavoráveis, é fundamental a
presença de significativa variedade de plantas, tanto silvestres como cultivadas. A principal
causa da perda da diversidade é o abandono de variedades locais, uma consequência direta da
tecnologia da revolução verde. Para Madeley (2003) a humanidade passou a depender
perigosamente de um baixo número de culturas e a perda de diversidade ameaça o
abastecimento de alimento para a humanidade. Tal situação ainda pode ser revertida com o
manejo adequado e uso sustentável dos recursos.
Segundo a FAO (2005) os desastres naturais são maiores nos países pobres do que nos
países ricos, tanto em termos absolutos como relativos. Essas populações frequentemente não
têm possibilidades de tornar seu abrigo (habitação) e seus cultivos menos vulneráveis, pois a
infraestrutura que os cerca tende a ser menos diversa e mais frágil. Esses desastres naturais
afetam a segurança alimentar por complexos caminhos. Seus impactos em diferentes
comunidades e grupos variam de acordo com a localização, situação, ocupação e status social
das pessoas, bem como dos direcionamentos políticos, econômicos e culturais específicos.
O estudo destaca ainda que, mesmo quando os desastres naturais não reduzem
substancialmente a oferta agregada de alimentos, eles podem ter significativos impactos em
certos grupos populacionais. Frequentemente os mais pobres e vulneráveis são duramente
atingidos, piorando a pobreza e a subnutrição. Esses desastres também afetam modos de vida
58
frágeis, de tal modo que parcelas destas pessoas são deslocadas, necessitando de reabilitação a
longo prazo.
2.4.2 Agricultura e Desenvolvimento: da insegurança alimentar à segurança alimentar
Segundo Maluf (2006b) a atividade agrícola continua sendo, ainda hoje, a mais
importante das fontes de renda (e de alimentos) para a maioria das unidades familiares rurais.
Uma característica importante das atividades que promovem a produção agroalimentar é a de
que elas possibilitam enfrentar, simultaneamente, tanto a necessidade de criar oportunidades
de trabalho e de apropriação de renda para essas famílias, como a de ampliar e melhorar a
oferta de alimentos em nível regional e nacional.
Hoje generaliza-se a perspectiva de agregar valor aos produtos originados da
agricultura familiar, através da produção agroindustrial e da incorporação de serviços a esses
bens com base em empreendimentos de pequeno e médio porte. Desenvolve-se também a
adoção de marcas ou de selos de qualidade com diversos apelos (produtos coloniais, “da
roça”, agricultura orgância ou agroecológicos, etc.).
As questões de mercado despontam, em geral, como o principal determinante das
possibilidades de êxito dos programas de apoio à produção agroalimentar, ao lado do acesso
ao crédito em condições adequadas.
Uma evidência especial deve ser feita ao chamado mercado institucional, que engloba
as compras governamentais de alimentos para serem utilizados em programas e em
organismos públicos (merenda escolar, hospitais, distribuição de cestas básicas, etc.). Alguns
deles, como a alimentação escolar, desempenham um papel central no acesso aos alimentos
por uma parcela vulnerável e numerosa da população. Nos países onde as compras
governamentais são significativas e conta-se com uma gestão transparente, a participação dos
pequenos e médios fornecedores notadamente, as associações de pequenos produtores
agrícolas – nos programas públicos de alimentação, dos quais sempre tiveram excluídos, pode
se revelar um importante instrumento de alavancagem para esse produtores.
As diferentes modalidades de associativismo têm um papel fundamental nos projetos
envolvendo pequenos e médios agricultores. A experiência indica que o grau de
associativismo aumenta pelos laços comunitários entre os participantes e pela valorização das
redes de economia solidária, sobretudo na gestão do crédito e na comercialização da
59
produção. Esses elementos permitem também reduzir os impactos das interrupções de
programas em função da renovação dos mandatos na administração pública.
É preciso mencionar, ainda, que abordar a produção mercantil não implica
necessariamente desconsiderar o papel que assume a produção para autoconsumo, como
integrante da reprodução das famílias rurais e, portanto, de sua segurança alimentar.
Considerada como sinônimo de atraso pelos adeptos da modernização baseada na
especialização produtiva, a presença da produção para autoconsumo ainda constitui um
importante instrumento de proteção frente às incertezas e oscilações da produção mercantil. A
inexistência de condições de produção para autoconsumo, causada pela carência de recursos
(água, superfície agrícola útil,etc.), ou a perda destas condições devido a opções produtivas,
como a especialização, são as causas diretas da insuficiência alimentar que adicionam-se aos
indicadores de pobreza rural mensurados em termos de renda.
Em muitos países, uma correlação direta é estabelecida entre o acesso à terra e aos
alimentos no meio rural. Em outras palavras, onde se realizou um processo de reforma
agrária, e esta se manteve com um razoável grau de consolidação, a situação alimentar e
nutricional destas populações se revela adequada. Inversamente, onde a terra permanece
concentrada com contingentes elevados de trabalhadores rurais sem terra, a situação de
insegurança alimentar é grave. Acrescente-se que o retrocesso ou a reversão dos programas de
redistribuição de terras na maioria dos países onde eles foram implementados em décadas
passadas vem causando impactos sociais negativos maiores do que a penúria a que haviam
sido relegados os beneficiários destes programas.
Segundo Maluf:
O Brasil é o exemplo mais vivo desse último caso, não tendo ainda realizado uma
ampla reforma agrária, como requer sua situação fundiária. A determinação de uma
situação de insegurança alimentar está diretamente relacionada com essa situação de
conflito e exclusão no campo. Do enorme contingente de 30 milhões de pessoas que
passam fome neste país, metade está na área rural, embora apenas 21% de sua
população total viva no campo. Estudos recentes têm revelado que em assentamentos
de reforma agrária no Brasil, que já possuem razoável grau de consolidação, o estado
nutricional encontrado chega a ser superior àquele desfrutado pela agricultura familiar
convencional. Em contraposição, nos acampamentos de sem-terra em áreas ocupadas,
que ainda não foram reconhecidas e, portanto, não se encontram em condições de
produzir, o quadro de desnutrição é gravíssimo (MALUF, 2006b, p.9).
60
A reforma agrária tem quatro impactos favoráveis à segurança alimentar: (i) é uma
importante política de criação de trabalho e de renda, aumentando a possibilidade de acesso
aos alimentos que são adquiridos para consumo; (ii) cria as condições para que as famílias
possam produzir os próprios alimentos que vão consumir; (iii) reforça a chamada segurança
alimentar local” pela garantia de produção de alimentos para as áreas próximas; (iv) as opções
produtivas geralmente adotadas por esta agricultura tendem ao cultivo de alimentos básicos,
fazendo parte da tradição dos produtores. Diante dessas evidências pode-se afirmar que a
reforma agrária, em países onde ainda não foi realizada ou precisa ser retomada, pode ser um
meio fundamental para a redução da insegurança alimentar.
A produção de alimentos para o mercado interno e, mesmo para exportação, não
constitui a única alternativa para a promoção da segurança alimentar das famílias no meio
rural. A segurança alimentar também pode ser obtida pela exploração de produtos não-
alimentares, de atividades rurais não-agrícolas e de ocupações urbanas, todas tendo por
objetivo assegurar trabalho e renda às famílias rurais que são, em sua maioria, pluriativas.
A oferta de bens privados não é a única relação mantida pelos agricultores com a
sociedade, compreendendo um conjunto de outras funções caracterizadas como bens públicos,
tais como a preservação das paisagens, a diversidade agrobiológica, a herança cultural e a
própria segurança alimentar. Para contemplar as múltiplas funções a serem preenchidas pela
agricultura a multifuncionalidade da agricultura é necessário lançar a ideia de um novo
pacto entre os agricultores e a sociedade que espera respostas dos primeiros sobre o território,
a qualidade de vida e a ética. Este último ponto é muito importante quando se considera que
nem toda agricultura é multifuncional, visto que existem os agricultores especializados, que
são os principais beneficiários das políticas de subvenção pública. A multifuncionalidade é
uma noção que engloba todos os aspectos e serviços não-comerciais associados a uma
agricultura de fato capacitada (self-reliant) e sustentável.
Salienta-se ainda o papel ativo que pode (e deve) ser assumido pela administração
pública local, desencadeando processos, em lugar de apenas responder às solicitações de
agentes econômicos, grupos sociais e cidadãos individuais. Este papel será mais importante
quando os administradores assumirem suas condições de agentes promotores de
desenvolvimento no âmbito local ou regional, tendo a segurança alimentar como um dos eixos
estratégicos de intervenção.
Meier e Rauch (2000) enfatizam que, para a garantia de uma adequada nutrição, o
desenvolvimento rural deve preocupar-se simultaneamente com as taxas de crescimento de
produção de alimentos e com os meios pelos quais a produção é elevada. Até mesmo em
61
países “padrão” quanto ao desenvolvimento rural, que possibilitam a absorção de um amplo
segmento da força de trabalho rural, com aumento da produção de alimentos, existem famílias
com inadequado acesso à oferta de alimentos.
Os autores alertam que, ao invés de ser uma concorrência entre alimentos e população,
a equação alimentar deve ser vista como um balanço dinâmico em cada país, entre a oferta e a
demanda de alimentos, que depende de uma relação complexa entre um determinado número
de variáveis. O equilíbrio nesta vital equação alimentar pode oscilar de uma pequena elevação
na oferta de alimentos e baixo poder de compra entre os pobres a altos níveis de cada um
deles. O nível em que a equação da oferta e da demanda de alimentos está em equilíbrio é
amplamente dependente das estratégias de desenvolvimento dos países, especialmente àquelas
que influenciam as taxas de expansão de emprego. Esta visão é apresentada com detalhes em
Mellor e Johnston (1984), em estudo intitulado “The World Food Equation: interrelations
among development, employment and food consumption”.
Os mesmos autores ressaltam que existe hoje uma compreensão das causas e
consequências de fome. A causa não está relacionada à deficiência de alimentos, e sim pela
ausência de intitulamentos e capacitações para as pessoas pobres, que não possuem meios
financeiros ou influência política.
Sen (2000) tem argumentado que o foco em capacitações e requerimentos nutricionais
explicam melhor a questão da fome (do que o consumo de alimentos), estando também
relacionada com os cuidados com a saúde, a educação básica, a ingestão de água potável, o
esgoto e a adequada habitação. O autor aponta que a maioria daqueles que morrem por fome,
sucumbem por doenças e não por inanição.
Nesse sentido, a FAO (2005) tem argumentado que a relação entre educação e
subnutrição tem representado um virtuoso ciclo de alimentação de corpos e mentes,
aclamando a educação como um poderoso mecanismo para a redução da fome e da pobreza.
A falta de educação enfraquece a produtividade, a empregabilidade e ganhos de capacitação,
levando diretamente para a pobreza e a fome. Investimentos em educação tem resultado em
mais altos retornos do que investimentos em capital físico.
Em áreas rurais, onde a vasta maioria dos famintos do mundo vivem, pesquisas
mostram que os agricultores com quatro anos de educação primária são, em média, quase 9%
mais produtivos que os agricultores que não freqüentaram a escola. Quando combinado com a
disponibilidade de insumos, tais como fertilizantes, novas sementes ou máquinas, a
produtividade destes é elevada para 13%.
62
Mas não é somente por meio de aumento de produtividade e de renda que a educação
reduz a fome e a subnutrição. E nessa etapa novamente enfatizam-se questões de gênero. Em
particular, melhor educação para a mulher está significativamente associada com
melhoramentos na nutrição de suas crianças e na saúde da família. No mundo em
desenvolvimento, as mulheres usam quase a totalidade de suas rendas para atender as
necessidades da família, enquanto os homens utilizam pelo menos 25% de seus rendimentos
para outros propósitos. Mas tradições culturais e obstáculos legais frequentemente impedem
mulheres e meninas de comparecer à escola, possuir emprego ou ter acesso a recursos e
serviços que as permitiriam melhorar os meios de vida de suas famílias. Assim juntamente
com a educação, a igualdade de gênero (e empoderamento das mulheres) representam
segundo a FAO (2005) as chaves para o progresso na redução da pobreza e da fome.
2.5 Considerações Adicionais
Os compromissos assumidos em 1996, com a Declaração de Roma sobre a Segurança
Alimentar Mundial e o Plano de Ação para o Combate à Fome, talvez não sejam efetivos, mas
ao menos sinalizam intenções concretas. Nos dois primeiros anos após a Cúpula Mundial da
Alimentação, a FAO (1998), em documento preparado para uma Conferência
Interparlamentar, afirmou que em nenhum lugar estava havendo progresso no ritmo
necessário para atingir o objetivo fixado pela cúpula (reduzir à metade o número de famintos
no mundo até 2015). O mesmo documento indica que a persistência da fome deve-se ao
fracasso do desenvolvimento.
Mesmo que a fome e a subnutrição sejam as manifestações mais cruéis da situação de
insegurança alimentar, estando a incapacidade de acesso aos alimentos entre as principais
causas, outros aspectos devem ser considerados para que sejam identificadas as hipóteses
necessárias para melhores condições alimentares, seja no plano local e nacional ou plano
mundial.
Segundo Maluf (2006b) um primeiro ponto diz respeito à qualidade dos alimentos.
Todos devem ter acesso a alimentos de boa qualidade nutricional, isentos de componentes
químicos que possam ser prejudiciais à saúde humana. Estes elementos são de uma
importância maior sobre o contexto atual, que favorece o desequilíbrio nutricional das dietas
alimentares, bem como que a toxidade dos alimentos, em nome de uma produtividade agrícola
63
aperfeiçoada ou pela utilização de tecnologias cujos efeitos sobre a saúde humana
permanecem ignorados.
Um outro ponto está ligado ao respeito aos hábitos e da cultura alimentar. É necessário
considerar a dimensão do patrimônio cultural que é intrínseco às preferências das
comunidades locais e suas práticas de preparo e consumo. Trata-se de compreender a herança,
transmitida de pais aos filhos e que se inscreve em uma lógica ligada as condições ambientais
e sociais desta comunidade, assim como sua própria história. Isso não significa dizer que todos
os hábitos alimentares são saudáveis. É necessário empreender um aperfeiçoamento desses
hábitos, quando isso for necessário, estando sempre atento as características específicas desses
grupos sociais.
Um terceiro aspecto está ligado à possibilidade de perpetuar o sistema alimentar. A
segurança alimentar não depende somente de um sistema que garanta, no dia a dia, a
produção, a distribuição e o consumo de alimentos, em quantidade e qualidade suficientes,
mas também, de uma boa manutenção da mesma capacidade futura de produção, de
distribuição e de consumo. A importância desta condição cresce ante às dificuldades
engendradas pelos sistemas alimentares atuais, que colocam em perigo a segurança alimentar
do futuro.
A partir desta óptica, pode-se afirmar que a segurança alimentar é controlada por
determinados princípios. Primeiro, a segurança alimentar e a segurança nutricional são como
“duas faces da mesma moeda”, ou seja, uma não pode existir sem a outra. O segundo
princípio destaca que a segurança alimentar e nutricional não podem ser asseguradas sem a
participação conjunta do governo e da sociedade, sem que se diluam os papéis específicos que
cabem à cada parte. Enfim, é necessário considerar o direito humano à alimentação como
primordial, sem importar outra situação econômica ou política, pois é um componente de
direito à vida.
64
3 METODOLOGIA
Evidenciados os principais aspectos teóricos abordados na estruturação desse estudo,
esta parte do trabalho descreve a fonte dos dados e a formação da base de dados, a partir da
composição de intitulamentos que se relacionam com a insegurança alimentar no estado do
Rio Grande do Sul, com a utilização da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD) do IBGE, 2004. Da mesma forma, este capítulo apresenta a justificativa que indica
como cada uma das variáveis selecionadas reflete o acesso a possíveis oportunidades que
permitam a redução da insegurança alimentar. Além disso, são apresentados os procedimentos
estatísticos desenvolvidos para a compreensão da relação entre os intitulamentos selecionados
e a (in)segurança alimentar, através do Coeficiente de Contingência, Teste Qui-Quadrado e o
modelo de regressão Probit.
A abordagem das capacitações permite múltiplas possibilidades de análise,
dependendo da realidade que se pretende compreender e da definição clara dos objetivos
daquilo que se busca no estudo (SEN, 1993). Nesse sentido, o espaço dedicado a esse capítulo
apresenta-se como de fundamental importância para o estabelecimento da relação entre a
abordagem teórica e os resultados obtidos. O exercício de análise realizado procura
identificar, através das variáveis selecionadas, a situação de insegurança alimentar em relação
às oportunidades/intitulamentos disponíveis para a população gaúcha.
3.1 A Fonte de Dados
Os dados utilizados nesta etapa do trabalho são oriundos da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE. Esta pesquisa é realizada pelo IBGE desde 1967,
com a finalidade de coletar informações sobre as características socioeconômicas da
população brasileira. A partir de 1971, a pesquisa é executada anualmente, exceto em anos de
censo demográfico. Desde 1992 a pesquisa cobre todo o Brasil, com exceção de uma parcela
rural da região Norte (Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima e Amapá). Essa parcela do
território, que era até então excluída da amostra, passou a ser incluída na PNAD de 2004
quando a pesquisa passa, então, a cobrir todo o território nacional.
65
A PNAD investiga características das pessoas e dos domicílios onde elas residem.
Entre as variáveis investigadas pela PNAD existem as de caráter permanente, ou seja, que são
coletadas em todas as edições da pesquisa, e outras de caráter periódico não seriado. As
primeiras dizem respeito à educação, trabalho, renda, habitação, entre outras de utilização
recorrente. Já o segundo grupo se refere a estudos específicos que atendem a demandas
pontuais e estratégicas, tais como, investigações sobre nupcialidade, saúde, migração,
segurança alimentar, etc. Por exemplo, em 1998 e 2003 o chamado suplemento (que é o
conjunto de variáveis adicionais) foi sobre saúde, em 1995 sobre educação, em 2001 sobre
trabalho infantil. No ano de 2004 o suplemento, utilizado neste estudo, tratou sobre segurança
alimentar.
Ainda que a PNAD seja uma importante fonte de dados para estudos socioeconômicos
no país, ela também está suscetível a algumas limitações. Uma destas limitações diz respeito à
classificação do espaço rural e urbano. As PNAD’s utilizam a mesma classificação do Censo
Demográfico, ou seja, durante toda uma década é utilizado o mesmo corte rural/urbano do
Censo imediatamente anterior, desconsiderando as alterações que ocorrem com o passar da
década.
Outro aspecto importante que deve ser observado se refere ao conceito de trabalho. As
pesquisas da década de 80 contavam como pessoa ocupada aquela que tinha 15 horas ou mais
de trabalho semanal e 10 anos ou mais de idade, sendo que a produção para próprio consumo
e a construção para uso próprio não existiam como classificações possíveis. A partir da
década seguinte, ocorreram reformulações: agora são contados como ocupados aqueles
indivíduos que têm 10 anos ou mais de idade e que trabalham mais de uma hora semanal,
sendo que, além disso, os que produzem para próprio consumo ou constroem para próprio
uso, desde que respeitem as condições recém impostas, também são computados como
ocupados. Note que isso causa problemas de comparabilidade entre as PNAD’s, quando
tomadas de forma direta para uma análise mais apurada e precisa é necessário manipulação
dos microdados.
Por fim, ainda deve ser mencionada uma limitação com relação à investigação dos
rendimentos das pessoas, principalmente no meio rural (CORREA, 1998, GRAZIANO DA
SILVA, 1999). Os principais problemas são: precariedade de informações sobre rendimentos
variáveis, auto-consumo, transferências e rendas da propriedade; ausência de valores para
rendas ou benefícios em espécie dos produtores agrícolas e trabalhadores por conta própria;
ausência de informações sobre gastos com insumos, o que afeta a renda líquida. Em suma, as
PNAD’s podem subestimar as rendas e superestimar a pobreza no meio rural.
66
3.2 A Formação da Base de Dados para a Análise dos Resultados através do Teste Qui-
quadrado de Associação e do Coeficiente de Contingência
Para este trabalho foram utilizadas as informações sobre os domicílios, rurais e
urbanos, do estado do Rio Grande do Sul (RS). Procedimentos foram realizados a partir dos
microdados, gerando a flexibilidade necessária para delimitar bem a amostra de interesse
deste estudo. Esta amostra consistia em domicílios do meio rural ou urbano, ocupados e
particulares. Com isso, obteve-se uma amostra de 9.598 domicílios
1
.
Neste trabalho, a análise das possibilidades de escolhas que podem ou não representar
um aumento em termos de capacitação, gerando, para os propósitos deste trabalho, segurança
ou insegurança alimentar, passa, especialmente quando se trata de países com pouca infra-
estrutura de atendimento das necessidades de populações mais carentes, pela percepção das
condições em que essas escolhas são oportunizadas à população.
Conforme evidenciado, Sen (1989) tem argumentado que o foco em capacitações e
requerimentos nutricionais explicam melhor a questão da fome (do que o consumo de
alimentos), estando também relacionada com os cuidados com a saúde, a educação básica, a
ingestão de água potável, o esgoto e a adequada habitação. O autor aponta que a maioria
daqueles que morrem por fome, sucumbem por doenças e não por inanição.
Procurando esse tipo de análise, que diz respeito à estrutura de direitos e deveres
legais e de formas de acesso a bens e serviços, este estudo realizou uma aproximação da
noção de intitulamentos [entitlements] com variáveis selecionadas a partir da PNAD de 2004.
O intitulamento é a condição ética legal e estrutural que determinada sociedade tem para
aumentar suas possibilidades de escolha. Ao identificar as condições de acesso da população
gaúcha aos alimentos, os intitulamentos são os direitos evidenciados no contexto das
capacitações, visando a participação nos processos de desenvolvimento e na transformação de
suas próprias condições de vida.
As variáveis consideradas para refletir intitulamentos associados à (in)segurança
alimentar foram:
1
Este número foi obtido após a “limpeza” da base, ou seja, após a eliminação de casos com erros ou impróprios
ao processamento (por exemplo, casos com muitas variáveis em branco).
67
Intitulamentos associados à Renda Domiciliar per Capita
A renda domiciliar per capita é definida como o quociente entre a renda domiciliar e o
número de pessoas do domicílio, excluindo os pensionistas, empregados domésticos e
parentes de empregados domésticos. Esta variável representa um importante meio de acesso
aos alimentos, expandindo as capacitações, ou a partir da falta deste intitulamento, reter
capacitações, impedindo que pessoas tenham acesso a determinadas oportunidades. É
importante destacar que a renda monetária é uma variável significativamente mais relevante
nas áreas urbanas (onde as pessoas precisam de renda para adquirir alimentos) do que nas
áreas rurais (onde as pessoas utilizam outros intitulamentos para produzir seus próprios
alimentos e garantir a segurança alimentar das suas famílias). A expansão da liberdade
humana, como a promoção da segurança alimentar, depende também de outros determinantes,
outros intitulamentos, que são apresentadas, a seguir neste estudo.
Intitulamentos associados ao Índice de Condições de Moradia (ICM)
O Índice de Condições de Moradia reflete a presença, ou não, de cinco itens no
domicílio: água encanada em algum cômodo, sanitário, energia elétrica, geladeira e telefone
fixo. Este indicador é a soma do número de itens disponíveis no domicílio – 5, caso o
domicílio disponha de todos, 0 se não dispõe de nenhum. Estes intitulamentos, relacionados
às condições de moradia, e que também se relacionam com o acesso adequado aos alimentos,
podem ser obtidos através de meios legais disponíveis na sociedade, incluindo suas próprias
condições de produção ou oportunidades comerciais.
Intitulamentos associados ao Recebimento de Recursos de Programas de
Transferência de Renda
O Recebimento de Recursos de Programas de Transferência de Renda é uma variável
binária - se recebeu algum recurso de qualquer programa de transferência de renda do
68
governo
2
, ou não. Estes intitulamentos, que são obtidos através de meios providos pelo
Estado, podem reduzir a insegurança alimentar dos domicílios que recebem o benefício.
Intitulamentos associados à Localização Rural ou Urbana do Domicílio
A variável relacionada com a localização do domicílio, se na zona rural ou urbana,
busca evidenciar para o Rio Grande do Sul, a situação da insegurança alimentar nestas áreas.
Conforme destacado, estudos da FAO (2005) revelaram que a maioria das pessoas no
mundo, assim como no Brasil (IBGE, 2004), que não tem alimentos suficientes para a
satisfação das suas necessidades nutricionais básicas vivem em áreas rurais.
Situação em termos de (In)segurança Alimentar
Foi considerada a classificação oferecida pela PNAD que indica: (i) segurança
alimentar; (ii) insegurança alimentar leve; (iii) insegurança alimentar moderada; e, (iv)
insegurança alimentar grave, destacando que, neste trabalho, a insegurança alimentar é
compreendida como o não atingimento de capacitações. Esta classificação foi feita a partir de
15 perguntas, apresentadas a seguir, que constam no suplemento sobre insegurança alimentar
da PNAD 2004.
1. Moradores tiveram preocupação de que os alimentos acabassem antes de poderem comprar
ou receber mais comida.
2. Alimentos acabaram antes que os moradores tivessem dinheiro para comprar mais comida.
3. Moradores ficaram sem dinheiro para ter uma alimentação saudável e variada.
4. Moradores comeram apenas alguns alimentos que ainda tinham, porque o dinheiro acabou.
5. Algum morador de 18 anos de idade ou mais diminuiu alguma vez a quantidade de
alimentos nas refeições ou deixou de fazer alguma refeição, porque não havia dinheiro para
comprar comida.
6. Algum morador de 18 anos de idade ou mais alguma vez comeu menos, porque não havia
dinheiro para comprar comida.
7. Algum morador de 18 anos de idade ou mais alguma vez sentiu fome, mas não comeu
porque não havia dinheiro para comprar comida.
2
Programas considerados: Auxílio-Gás, Bolsa-Família, Cartão-Alimentação do Programa Fome-Zero, Bolsa-
Alimentação, Benefício Assistencial de Prestação Continuada, Bolsa-Escola, Programa de Erradicação do
Trabalho Infantil, e outros.
69
8. Algum morador de 18 anos de idade ou mais perdeu peso, porque não comeu quantidade
suficiente de comida devido à falta de dinheiro para comprar comida.
9. Algum morador de 18 anos de idade ou mais alguma vez fez apenas uma refeição ou ficou
um dia inteiro sem comer, porque não havia dinheiro para comprar comida.
10. Algum morador com menos de 18 anos de idade alguma vez deixou de ter uma
alimentação saudável e variada, porque não havia dinheiro para comprar comida.
11. Algum morador com menos de 18 anos de idade alguma vez não comeu quantidade
suficiente de comida, porque não havia dinheiro para comprar comida.
12. Algum morador com menos de 18 anos de idade diminuiu a quantidade de alimentos nas
refeições, porque não havia dinheiro para comprar comida.
13. Algum morador com menos de 18 anos de idade alguma vez deixou de fazer uma
refeição, porque não havia dinheiro para comprar comida.
14. Algum morador com menos de 18 anos de idade alguma vez sentiu fome, mas não comeu,
porque não havia dinheiro para comprar comida.
15. Algum morador com menos de 18 anos de idade alguma vez ficou um dia inteiro sem
comer, porque não havia dinheiro para comprar comida.
A pontuação atribuída a cada domicílio é o número de respostas afirmativas. Com
pontuação igual a zero, o domicílio tem segurança alimentar. No caso dos domicílios cujos
moradores têm todos 18 anos de idade ou mais, 1 a 3 pontos corresponde a “insegurança
alimentar leve”, 4 a 6 pontos corresponde a “insegurança alimentar moderada” e 7 a 9 pontos
significa “insegurança alimentar grave”. No caso dos domicílios com pelo menos 1 morador
de menos de 18 anos de idade, categorias de insegurança alimentar leve, moderada e grave
correspondem, respectivamente, aos intervalos de 1 a 5 pontos, 6 a 10 pontos e 11 a 15
pontos. Dessa maneira, obtém-se, para cada domicílio, uma variável “insegurança alimentar”
com quatro níveis: ausente, leve, moderada e grave.
A falta de acesso aos intitulamentos sugeridos será considerada, neste estudo, uma
retenção nas capacitações dos agentes sociais (algo como uma “falta de poderes para”),
gerando, neste estudo, a insegurança alimentar. Da mesma forma, o maior acesso aos
intitulamentos permite a redução da insegurança alimentar. Sendo assim, a variável
quantitativa-chave é o acesso a oportunidades de escolhas que faz da noção de intitulamentos,
uma ideia fundamental para a análise das estruturas sociais nos processos de
desenvolvimento. Analisar a insegurança alimentar a partir da noção de intitulamentos
salienta que as pessoas não passam fome devido à disponibilidade de alimentos no mundo, e
70
sim devido à falta de oportunidades para aquisição e apropriação em relação a esses
alimentos.
3.3 Procedimentos Estatísticos Utilizados para a Análise dos Resultados Através do Teste
Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de Contingência
O primeiro passo em termos de procedimento estatístico foi o de exploração das
variáveis através de estatística descritiva. Através disto foi possível fazer uma primeira
aproximação e se apropriar de maneira mais consistente da base de dados, além, é claro, de
identificar preliminarmente algumas possíveis diferenças entre o espaço rural e urbano.
Posteriormente, foram analisadas as relações entre as variáveis que dizem respeito às
características socioeconômicas dos domicílios (renda, ICM e recebimento de transferências
governamentais) e (in)segurança alimentar. Para tal, usaram-se, como recurso analítico, as
tabelas cruzadas (crosstabs).
Para asseverar as análises e conseguir obter indicativos mais precisos sobre as
relações, foram estimados, para cada relação entre duas variáveis, sendo uma socioeconômica
e a outra de (in)segurança alimentar, um teste qui-quadrado de associação e também o
Coeficiente de Contingência.
O teste qui-quadrado é utilizado para verificar se duas classificações estão ou não
associadas. Este teste parte de tabelas de contingência, que são as tabelas cruzadas que foram
elaboradas. Nas linhas aparece o nível de insegurança alimentar, bem como sua ausência, e
nas colunas a variável socioeconômica considerada. Nas células, portanto, consta o número de
domicílios que apresentam as características da linha e coluna em questão. Se somadas todas
as células, teremos o total da amostra. Como resultado, este teste fornece um valor qui-
quadrado que é comparado, então, com uma distribuição e informa se a associação é
significativa ou não (e em que nível de significância).
No contexto desse trabalho, o Coeficiente de Contingência (C) foi utilizado como
complementar do teste qui-quadrado para medir o grau de associação entre as variáveis.
71
Para cada tabela de contingência, ou seja, para cada comparação entre duas variáveis, existe
um valor para C. O valor de C é dado por:
)/(
22
nC +=
χχ
onde
2
χ
é a estatística calculada anteriormente (qui-quadrado) e n é o número de
observações. Este coeficiente varia entre zero e um, sendo que quanto mais próximo de 1,
maior é o nível de associação entre as variáveis consideradas.
3.4 O Modelo
Probit
Com o objetivo de analisar o efeito das variáveis que podem explicar a probabilidade
de existir ou não insegurança alimentar entre os domicílios gaúchos, rurais e urbanos,
estimou-se um modelo não-linear de regressão
probit
, sendo a Insegurança Alimentar a
variável dependente binária (já apresentada na seção 3.2), assumindo valor igual a 1 quando
existe insegurança alimentar e valor igual a 0 quando não há insegurança alimentar.
Quanto às variáveis independentes do modelo, foram utilizadas a
Renda Domiciliar
per Capita
3
, Índice de Condições de Moradia (ICM) e Recebimento de Recursos de
Programas de Transferência de Renda (TRF),
apresentadas na seção 3.2. Também foram
selecionadas, para esta análise de regressão, variáveis da base de pessoas da PNAD do ano de
2004
4
, descritas a seguir, visando à possibilidade de relacioná-las com as situações de
insegurança alimentar, tanto no meio urbano quanto no rural do Rio Grande do Sul, através da
abordagem das capacitações:
Idade da Pessoa de Referência do Domicílio: Idade, em anos, da pessoa de referência.
3
A Renda Domiciliar per Capita, para esta análise foi estratificada, em variáveis binárias, para distinguir as três
categorias de renda (até 1 S.M.; de 1 a 2 S.M. e 2 a 3 S.M.), pois o modelo não respondeu bem à variável
contínua. Assim, procedeu-se a estratificação para analisá-la de maneira efetiva e validar o modelo.
4
Cabe destacar que, como neste trabalho a unidade de análise é o domicílio, as variáveis da base de pessoas da
PNAD 2004 (Idade, Escolaridade, Sexo e Cor), foram representadas pela pessoa de referência do domicílio.
72
Escolaridade da Pessoa de Referência do Domicílio: Número de anos de estudo da
pessoa de referência.
Sexo da Pessoa de Referência do Domicílio: Variável binária, sendo 1 para mulher e 0
para homem.
Cor da Pessoa de Referência do Domicílio: Variável binária, sendo 1 para pessoa de
cor preta e 0 para as demais.
Reconhecendo que a mensuração da insegurança alimentar através de indicadores que
representem apenas uma dimensão, no caso a renda, pode conduzir a discrepâncias na
interpretação deste fenômeno, as estimativas de probabilidade de insegurança alimentar no
Rio Grande do Sul foram definidas a partir de suas relações com os intitulamentos, de uma
forma abrangente, envolvendo aspectos econômicos, mas também condições sociais e
culturais que se caracterizam por: (a) insuficiência de renda; (b) carência ou acesso limitado a
serviços destinados a satisfazer as necessidades básicas das famílias; e (c) exclusão social e
discriminação devida à origem étnica ou gênero.
Sendo a insegurança alimentar, nesta pesquisa, a variável dependente binária, o
modelo mais simples é o modelo linear de probabilidade, estimado pelo método de mínimos
quadrados ordinários. Neste caso:
γ
=
β
0
+
β
1
χ
1
+...+
β
k
χ
k
+ e
Sendo
ρ
a probabilidade de
γ
assumir o valor igual a um:
E(
γ
) =
ρ
=
β
0
+
β
1
χ
1
+...+
β
k
χ
k
No modelo linear de probabilidade, os coeficientes estimados expressam o efeito de
variações unitárias nas variáveis independentes sobre a probabilidade da variável dependente
assumir o valor um. O problema é que estes efeitos são constantes, e à medida em que χ
1
aumenta, a probabilidade
ρ
continua a aumentar (quando
β
1
é positivo; em caso contrário,
continua a diminuir) a uma razão constante. Entretanto, como 0
ρ
1, é impossível ter uma
taxa constante de crescimento (Hill, Griffiths e Judge, 1999).
73
Além destas dificuldades, o modelo linear de probabilidade apresenta erros
heterocedásticos, tal que os coeficientes estimados não são eficientes. Assim, os testes de
hipóteses e intervalos de confiança podem ser inválidos.
Para contornar estes problemas, foram considerados os modelos não-lineares probit e
logit. Nestes casos, a inclinação não é constante. As probabilidades são restringidas ao
intervalo [0,1], pela utilização de funções densidade de probabilidade. A função probit está
relacionada com a distribuição de probabilidade normal padronizada, enquanto a função logit
está relacionada com a distribuição logística.
Como são modelos não-lineares, a estimação dos coeficientes deve ser feita pelo
método de máxima verossimilhança. Em geral, os coeficientes estimados nos modelos probit
e logit são ligeiramente diferentes e a escolha entre eles pode ser feita de acordo com a
conveniência. No presente estudo, optou-se pelo modelo probit, considerando então que os
erros têm distribuição normal (Maddala, 2003).
Assim,
ρ
= F(
β
0
+
β
1χ1 +...+
β
kχk)
onde novamente
ρ
é a probabilidade de y assumir valor igual a um e F é a função probit, não-
linear nos Bi.
O efeito de uma variação unitária em xi sobre a probabilidade
ρ
de
γ
ser igual a um é
dado por:
∂ρ
/
xi=
F(t)/
(t).
t/
xi= f(.)
β
i
A partir disto, como f(.) é uma função densidade de probabilidade, seu valor é sempre
positivo. Logo, o sinal de
∂ρ
/
xi é determinado pelo sinal de
β
i, à medida que xi varia, o valor
de f(.) também varia. Desta forma, o efeito de uma variação unitária nas variáveis
independentes sobre a probabilidade da variável dependente irá depender dos níveis das
variáveis independentes. Portanto, para estimar o efeito dos coeficientes do modelo probit é
necessário eleger algum nível para as variáveis independentes como referência (Finco, 2003).
Por fim, destaca-se que quando a variável dependente é representada por uma variável
binária, um modelo de escolha discreta, que toma valor 1 ao escolher um resultado, e o valor
0 em caso contrário, a definição do modelo estatístico a ser implementado no estudo é
74
importante para a validade dos resultados. Com isso, no presente trabalho, o modelo probit
mostrou-se adequado para os objetivos do estudo, visto a composição da variável dependente,
que é do tipo “ou-ou”, descrevendo uma escolha entre dois resultados mutuamente
excludentes (HILL, GRIFFITHS E JUDGE, 1999; Finco, 2003).
75
4 OS INTITULAMENTOS E A INSEGURANÇA ALIMENTAR NO RIO GRANDE
DO SUL: uma análise a partir da PNAD 2004
O objetivo principal desta etapa do estudo é analisar a insegurança alimentar no Rio
Grande Sul como privação de capacitações, pois diversas formas de privação humana
restringem severamente o que se compreende por capacitações inerentes às pessoas, ou seja,
as liberdades substantivas de que usufruem para levarem a vida que preferem. A privação da
capacitação ‘estar adequadamente nutrido’, será analisada através dos intitulamentos, ou seja,
das possibilidades de que as pessoas dispõem para obter alimentos, incluindo suas próprias
condições de produção e oportunidades sociais, além de acesso aos meios providos pelo
Estado. O acesso adequado ou inadequado a fontes de nutrição é um importante indicador de
qualidade de vida, sendo a habitação, a saúde, a educação e até mesmo a mobilidade refletida
pelo estado nutricional.
Os resultados da análise das situações de insegurança alimentar da população gaúcha
foram obtidos em duas etapas. Através do Teste Qui-Quadrado de Associação e do
Coeficiente de Contingência, caracterizou-se a relação da insegurança alimentar com a renda
monetária, mas também com outros intitulamentos, associados às condições de moradia e
acesso a programas sociais de transferência de renda, diferenciando e tecendo comentários
entre os espaços rural e urbano do Rio Grande do Sul (Anexo A).
Além disso, através do modelo de regressão Probit, foram estimadas as probabilidades
de insegurança alimentar, de acordo com a escolaridade, a idade, o sexo, a cor, a renda, as
transferências governamentais e as condições de moradia das famílias gaúchas, rurais (Anexo
B) e urbanas (Anexo C). Avaliar o modo como os diferentes tipos de intitulamentos podem
contribuir para acessar fontes adequadas de nutrição visa a expansão da liberdade humana,
através da erradicação/redução da insegurança alimentar, tendo como fim a promoção do
desenvolvimento.
76
4.1 Análise dos Resultados através do Teste Qui-Quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência
Utilizando os dados da PNAD (2004), a Tabela 1 destaca como a renda dia mensal,
o índice de condições de moradia e o acesso a programas sociais de transferência de renda
distribuem-se entre os domicílios dos espaços rural e urbano do Rio Grande do Sul. A renda
domiciliar per capita média mensal (que exclui pensionistas, empregados domésticos e
parentes dos empregados domésticos) auferida pela população rural (R$ 359,70) é
consideravelmente inferior à renda média auferida pela população urbana (R$ 695,69).
Conforme evidenciado, estudos realizados por Waquil e Mattos (2002; 2003) reforçam a
visão de que a renda auferida pelos indivíduos não pode ser considerada como sinônimo de
melhores condições de vida ou segurança alimentar. Os requerimentos de alimentação e
nutrientes para a capacitação de bem alimentar-se varia muito de pessoa para pessoa,
dependendo de características de metabolismo, tamanho do corpo, gênero, gravidez, idade,
condições climáticas, parasitoses entre outras. A avaliação da posse de rendimentos (com os
quais se pode adquirir alimentos) pode, no máximo, ser um substituto das coisas que
realmente importam, porém, na maioria dos casos, não é um substituto particularmente
adequado. Os recursos monetários são importantes intitulamentos (meios) de redução da
insegurança alimentar, enquanto a segurança alimentar é um objetivo final do
desenvolvimento. Ao utilizar a abordagem seniana, a sugestão teórica é perceber a
multiplicidade de situações sociais as quais as pessoas são submetidas. Neste sentido, a
qualidade de vida das pessoas estaria associada às oportunidades a que estão expostas ao
longo da vida, ou seja, quanto mais chances de escolhas as pessoas tiverem, melhor poderia
ser a qualidade de vida.
A análise das possibilidades de escolhas que podem ou não representar um aumento
em termos de capacitações passa, especialmente quando se trata de países com pouca infra-
estrutura de atendimento das necessidades de populações mais carentes, pela percepção das
condições em que essas escolhas são oportunizadas à população. O intitulamento é a condição
ética, legal e estrutural que determinada sociedade tem para aumentar suas possibilidades de
escolha. Sen (2001) sublinha esses direitos no contexto das capacitações, para participar dos
processos de desenvolvimento e transformar suas próprias condições de vida. Procurando esse
tipo de análise, que diz respeito à estrutura de direitos e deveres legais e de formas de acesso a
bens e serviços, foram incorporados neste trabalho os intitulamentos associados ao Índice de
77
Condições de Moradia (ICM) e ao Recebimento de Recursos de Programas de Transferência
de Renda (TRF).
Intitulamentos associados ao ICM são compostos pela existência ou não nos
domicílios de água canalizada em pelo menos um cômodo, de banheiro ou sanitário no
domicílio ou na propriedade, luz elétrica, telefone fixo e geladeira no domicílio. Nesta tabela,
o índice, que pode variar de 0 a 5, representa uma média destas condições básicas, existentes
nos domicílios. No meio rural, em média, os domicílios possuem 3,88 dos cinco itens
apresentados, enquanto na área urbana, a média sobe para 4,56.
os intitulamentos associados às transferências (TRF) são interpretados pelo
recebimento de renda de pelo menos um dos programas sociais da esfera governamental. A
Tabela 1 indica que a proporção dos domicílios rurais que recebeu transferência de renda
(18,74) é maior do que a proporção dos domicílios urbanos que teve acesso a esses programas
sociais (7,75). Ou seja, proporcionalmente mais acesso a programas de transferência de
renda no espaço rural do que na área urbana.
Tabela 1: Renda domiciliar per capita (RDPC), índice de condições de moradia (ICM) e
acesso a programas de transferência de renda (TRF) de acordo com o setor censitário
Rio Grande do Sul, 2004.
Rural (N =1227) Urbano (N=8371) Total (N=9598)
RDPC (R$) 359,70 695,69 652,74
ICM (0 a 5) 3,88 4,56 4,47
TRF (%) 18,74 7,75 9,16
Fonte: Elaborado pela autora, a partir da PNAD (2004).
No Gráfico 1 foram relacionadas as situações de insegurança alimentar, bem como sua
ausência, com a situação censitária. É possível identificar que no Rio Grande do Sul, embora
os domicílios rurais possuam menor renda média domiciliar per capita e piores condições de
moradia, a segurança alimentar é superior na área rural, quando comparada à área urbana.
Essa melhor condição de segurança alimentar se deve, em parte, a maior disponibilidade de
alimentos, principalmente naquelas de tradição da agricultura familiar. Além disso, também
explica a maior segurança alimentar no meio rural do Rio Grande Sul, o maior acesso da
população rural aos programas de transferência de renda governamentais. Tais resultados
diferem dos que, em geral, são apresentados para o Brasil como um todo, indicando maior
insegurança alimentar nas áreas rurais, possivelmente pela forte influência das regiões norte e
78
nordeste do país. De forma análoga, a situação de insegurança alimentar é maior na área
urbana, principalmente na condição de insegurança leve e moderada.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Segurança Insegurança
Leve
Insegurança
Moderada
Insegurança
Grave
%
Urbano Rural
Gráfico 1: Situações de (in)segurança alimentar de acordo com o setor censitário Rio Grande
do Sul, 2004
.
Fonte: elaborado pela autora, a partir da PNAD (2004).
Os resultados obtidos quanto ao teste qui-quadrado (37,386
a
), e o coeficiente de
contingência (0,062), revelam que o grau de associação entre segurança alimentar e o setor
censitário é fraco, mas significativo. Embora exista maior segurança alimentar na área rural, a
maioria dos domicílios, tanto no rural (80,7%), quanto no urbano (72,8%), encontra-se em
segurança alimentar, enquanto 19,3% dos domicílios rurais e 27,2% dos domicílios urbanos,
distribuem-se entre insegurança alimentar, leve, moderada e grave.
As Tabelas 2 e 3 relacionam, respectivamente, no urbano e no rural, os níveis de
insegurança alimentar com as faixas de renda domiciliar. Em relação à área urbana (Tabela 2),
dos domicílios que recebem até 1 s.m., 47,7% têm segurança alimentar e 52,3% sofrem de
insegurança alimentar. À medida que a renda aumenta, o número de domicílios com
segurança alimentar também se eleva, paralelamente à queda na insegurança alimentar.
79
Tabela 2: Faixas de renda domiciliar, em salários-mínimos (s.m), e suas relações com as
situações de insegurança alimentar, no setor censitário urbano – Rio Grande do Sul, 2004.
Situações de
insegurança
alimentar
Menos de 1 s.m.
De 1 a 2 s.m. De 2 a 5 s.m Mais de 5 s.m.
Ausente
47,7% 76,1% 89,0% 97,3%
Insegurança
alimentar leve
25,0% 15,8% 7,7% 2,2%
Insegurança
alimentar
moderada
17,1% 5,5% 2,4% 0,4%
Insegurança
alimentar grave
10,2% 2,6% 0,9% 0,1%
Fonte: elaborado pela autora, a partir da PNAD (2004).
No meio rural (Tabela 3), dos domicílios que recebem até 1 s.m., 69,1% têm
segurança alimentar e 30,9% sofrem de insegurança alimentar. Embora, no meio rural, à
medida que a renda aumenta, o número de domicílios com segurança alimentar também se
eleve, paralelamente à queda na insegurança alimentar, esta relação é menos intensa quando
comparada à área urbana, retratando novamente a atuação da agricultura familiar, com a
alimentação para subsistência.
Tabela 3: Faixas de renda domiciliar, em salários-mínimos (s.m), e suas relações com as
situações de insegurança alimentar, no setor censitário rural – Rio Grande do Sul, 2004.
Situações de
insegurança
alimentar
Menos de 1 s.m.
De 1 a 2 s.m. De 2 a 5 s.m Mais de 5 s.m.
Ausente
69,1% 90,9% 95,7% 100%
Insegurança
alimentar leve
14,6% 4,1% 3,8% 0%
Insegurança
alimentar
moderada
10,8% 2,8% 0,5% 0%
Insegurança
alimentar grave
5,5% 2,2% 0,0% 0%
Fonte: elaborado pela autora, a partir da PNAD (2004).
80
Nas Tabelas 2 e 3 os resultados obtidos quanto ao teste qui-quadrado foram 1550,522
e 115,22, para área urbana e rural, respectivamente, enquanto que o coeficiente de
contingência atingiu 0,395 e 0,293 nos respectivos setores censitários, mostrando uma relação
significativa, entre faixas de renda domiciliar e insegurança alimentar. Cabe destacar que a
metodologia adotada pelo IBGE, para a construção do suplemento de segurança alimentar,
envolveu 15 perguntas, que tratavam sobre a falta de alimentos, ou a preocupação com a
possível falta de alimentos, ou a necessidade de redução da quantidade ou qualidade dos
alimentos nos domicílios. Em todas as questões aparece explicitamente que o problema
constatado deve-se à ‘falta de dinheiro para comprar comida’, impondo metodologicamente
uma correlação entre segurança alimentar e nível de rendimentos nos domicílios.
As Tabelas 4 e 5 apresentam as situações de insegurança alimentar relacionadas com o
índice de condições de moradia (ICM), para o setor urbano e rural, respectivamente. O ICM
igual a 0 significa que o domicílio não possui nenhum dos seguintes itens: água canalizada,
banheiro, luz elétrica, telefone fixo e geladeira. o ICM igual a 1, indica a existência de,
pelo menos, um desses componentes; o ICM igual a 2, evidencia dois desses componentes no
domicílio; e assim sucessivamente até o ICM igual a 5, representando a existência dos cinco
itens no domicílio.
Dos domicílios urbanos, com as piores condições de moradia (ICM=0), 42,9% têm
segurança alimentar, enquanto que 57,1% sofrem de insegurança alimentar grave, destacando
que são apenas 7 casos na amostra. De forma geral, à medida que as condições de moradia
melhoram, o percentual de domicílios com segurança alimentar também se eleva. a
insegurança alimentar nos domicílios tende a diminuir, à medida que as condições de moradia
melhoram.
Tabela 4: Índice de condições de moradia relacionado com insegurança alimentar, no
setor censitário urbano – Rio Grande do Sul, 2004.
ICM Situações de
insegurança
alimentar
0 1 2 3 4 5
Ausente
42,9% 27,3% 31,0% 47,2% 61,3% 81,1%
Insegurança
alimentar
leve
,0% ,0% 20,7% 17,2% 19,6% 12,4%
Insegurança
alimentar
moderada
,0% 27,3% 29,3% 16,3% 12,4% 4,6%
81
Insegurança
alimentar
grave
57,1% 45,4% 19,0% 19,3% 6,7% 1,9%
Fonte: elaborado pela autora, a partir da PNAD (2004).
No meio rural, os domicílios com as piores condições de moradia (ICM=0), e que
possuem segurança alimentar representam 56,3%, enquanto que 43,7% sofrem de insegurança
alimentar leve, moderada ou grave. De modo geral, à medida que as condições de moradia
melhoram, o percentual de domicílios com segurança alimentar também se eleva. a
insegurança alimentar nos domicílios tende a diminuir, à medida que as condições de moradia
melhoram.
Tabela 5: Índice de condições de moradia relacionado com insegurança alimentar no
setor censitário rural – Rio Grande do Sul, 2004.
ICM Situações de
insegurança
alimentar
0 1 2 3 4 5
Ausente
56,3% 55,6% 38,0% 66,7% 84,2% 89,3%
Insegurança
alimentar
leve
12,5% 14,8% 24,0% 15,7% 8,3% 5,9%
Insegurança
alimentar
moderada
12,5% 25,9% 16,0% 11,8% 5,4% 2,8%
Insegurança
alimentar
grave
18,7% 3,7% 22,0% 5,8% 2,1% 2,0%
Fonte: elaborado pela autora, a partir da PNAD (2004).
Nas Tabelas 4 e 5 os resultados encontrados quanto ao teste qui-quadrado foram
813,77 e 142,81, para área urbana e rural, respectivamente, enquanto que o coeficiente de
contingência atingiu 0,298 no setor urbano, e 0,323 no meio rural, demonstrando um grau de
associação ligeiramente superior na área rural, entre o índice de condições de moradia e
insegurança alimentar.
As Tabelas 6 e 7 apresentam as situações de insegurança alimentar relacionadas com o
acesso a programas sociais de transferência de renda, para o setor urbano e rural,
respectivamente. Na área urbana, dos domicílios que não recebem transferências de renda,
82
cerca de 75,8% têm segurança alimentar e somente 37,1 % dos domicílios que tiveram acesso
a transferências de renda, têm segurança alimentar, indicando que 62,9% dos domicílios que
receberam transferências de renda, via programas sociais, ainda sofrem de insegurança
alimentar.
Tabela 6: Acesso a programas sociais de transferência de renda relacionados com
insegurança alimentar, no setor censitário urbano – Rio Grande do Sul, 2004.
Situações de insegurança
alimentar
Não teve acesso a programas
de transferência de renda
Teve acesso a programas de
transferência de renda
Ausente
75,8% 37,1%
Insegurança alimentar leve
14,1% 27,7%
Insegurança alimentar
Moderada
6,7%
20,3%
Insegurança alimentar
grave
3,4%
14,9%
Fonte: elaborado pela autora, a partir da PNAD (2004).
Na área rural, dos domicílios que não recebem transferências de renda, cerca de 84,5%
têm segurança alimentar e 64,3% dos domicílios que tiveram acesso a transferências de renda,
têm segurança alimentar, ressaltando que 35,7% dos domicílios que receberam transferências
de renda, ainda convivem com a insegurança alimentar, principalmente leve e moderada.
Tabela 7: Acesso a programas sociais de transferência de renda relacionados com
insegurança alimentar, no setor censitário rural – Rio Grande do Sul, 2004.
Situações de insegurança
alimentar
Não teve acesso a programas
de transferência de renda
Teve acesso a programas de
transfe
rência de renda
Ausente
84,5% 64,3%
Insegurança alimentar leve
7,9% 15,7%
Insegurança alimentar
moderada
4,8%
13,9%
Insegurança alimentar
grave
2,8%
6,1%
Fonte: elaborado pela autora, a partir da PNAD (2004
).
Nas Tabelas 6 e 7 os resultados obtidos quanto ao teste qui-quadrado foram 521,03 e
50,87, para área urbana e rural, respectivamente, enquanto que o coeficiente de contingência
atingiu 0,24 no setor urbano, e 0,20 no meio rural. Os resultados obtidos demonstram uma
83
relação significativa, em ambos os setores censitários, entre o acesso a programas sociais de
transferência de renda e insegurança alimentar, mas, ainda mais intensa, na área urbana.
Destaca-se que a insegurança alimentar está associada a menores níveis de renda e
piores condições de moradia. Ou seja, a falta de acesso a estes intitulamentos se relaciona com
a dificuldade de acesso à alimentação adequada, gerando a privação de uma capacitação
básica estar adequadamente nutrido. a relação entre insegurança alimentar e maiores
transferências governamentais se estabelece por serem exatamente as famílias que recebem
estas transferências governamentais àquelas que se encontram em situação mais vulnerável
quanto à insegurança alimentar.
Entretanto diferenças marcantes entre os espaços urbano e rural no estado do Rio
Grande do Sul. A insegurança alimentar é menos intensa no meio rural deste Estado, apesar
dos menores veis de renda e das piores condições de moradia, quando comparado à área
urbana. Neste sentido, é importante destacar o papel da agricultura familiar, da diversificação
da produção agrícola e da destinação de parte desta produção para o consumo da família,
possibilitando amenizar as situações de insegurança alimentar. Além disso, na área rural
também está a maior proporção de domicílios que recebem transferências de renda, através de
programas sociais, fato que também pode estar contribuindo para a maior segurança alimentar
no meio rural do Rio Grande do Sul.
4.2 Análise dos Resultados através do Modelo de Probabilidade Probit
Com os dados da PNAD 2004 e um programa de otimização numérica para o modelo
Probit (SPSS 16 - Statistical Package for the Social Sciences), analisou-se a probabilidade de
haver ou não insegurança alimentar entre as famílias gaúchas, através de um grupo de
intitulamentos, observados de forma conjunta, a partir das estimativas de máxima
verossimilhança dos parâmetros. Totalizando 9526 observações validadas, os resultados da
estimação constam na Tabela 8 para o setor rural, com 1208 observações, e na Tabela 9, para
o urbano, com 8318.
Para o setor rural, as variáveis independentes que mostraram-se significativas, ao nível
de 5%, foram a idade da pessoa de referência, a escolaridade da pessoa de referência, o ICM,
com efeito negativo; e as transferências governamentais (TRF), o sexo da pessoa de
referência e a renda até 1 salário-mínimo (s.m.), com efeito positivo.
84
Tabela 8: Estimativas das probabilidades de insegurança alimentar, de acordo com as
variáveis independentes, através do modelo probit, para o rural do Rio Grande do Sul,
2004.
Variáveis independentes
Coeficiente
Estimado
Z
Nível de
Significância
(5% ou 0,05)
Idade da Pessoa de Referência -,010 -2,779 ,005
Escolaridade da Pessoa de Referência -,069 -3,585 ,000
Sexo da Pessoa de Referência ,485 3,709 ,000
Cor da Pessoa de Referência -,107 -,452 ,651
ICM -,273 -4,837 ,000
TRF ,233 2,108 ,035
RDPC – até 1 SM ,884 3,089 ,002
RDPC – De 1 a 2 SM ,242 ,831 ,406
RDPC – De 2 a 3 SM -,103 -,293 ,769
Intercepto ,274 ,641 ,521
Fonte: PNAD (2004) – elaborado pela autora.
Os resultados indicam que os responsáveis pelas famílias, com mais idade, têm maior
probabilidade de ter segurança alimentar, o que pode ser justificado pelo fato de pessoas mais
idosas estarem recebendo aposentadorias rurais, contribuindo para amenizar as situações de
insegurança alimentar. Sendo o coeficiente estimado negativo também para as variáveis
escolaridade do responsável pela família e condições de moradia (ICM), uma ampliação dos
anos de estudo dos chefes de família e melhorias nas condições de moradia refletem em maior
probabilidade de segurança alimentar.
O coeficiente estimado mostrou-se positivo para as variáveis transferências
governamentais, sexo da pessoa de referência e renda domiciliar per capita até 1 salário-
mínimo. Ou seja, quanto mais transferências a família recebe, maior a probabilidade de
insegurança alimentar. É importante destacar que não é pelo fato da família receber
transferências que ela está em probabilidade de insegurança alimentar, não sendo uma relação
de causa/efeito. O resultado indica que a família recebe transferências governamentais por
estar numa situação de vulnerabilidade quanto ao acesso à alimentação adequada.
Quando se analisa o coeficiente associado à variável binária gênero da pessoa de
referência, é possível destacar que as famílias chefiadas por mulheres apresentam maior
85
probabilidade de se encontrarem em situação de insegurança alimentar, controlando o efeito
das demais variáveis. Este resultado está em consonância com a declaração da Cúpula
Mundial sobre Alimentação Mundial de 1996, ao reconhecer que o acesso limitado das
mulheres do campo aos meios de produção e seu papel restrito na tomada de decisão política e
econômica agravam a pobreza e são empecilhos à segurança alimentar, dado que as políticas e
os programas de muitos países dão pouca atenção à igualdade entre homens e mulheres e a
falta de informações, discriminadas por sexo, impede a tomada de decisões sociais e
econômicas bem fundamentadas. Além disso, as mulheres não somente cultivam alimentos,
como também se encarregam do processamento posterior à colheita e da comercialização.
Elas são sempre responsáveis pela segurança alimentar e procuram satisfazer as necessidades
alimentícias de suas famílias. Embora as mulheres produzam a maior parte do alimento nos
países em desenvolvimento, elas normalmente sofrem mais os efeitos da insegurança
alimentar. No contexto familiar de muitos países, os homens recebem porções de alimento
maiores do que as mulheres. No terceiro mundo, 60% dos pobres são mulheres, bem como
dois terços dos analfabetos do mundo.
Utilizando também variáveis binárias para estratificar a renda (até 1 s.m, de 1 até 2
s.m. e de 2 até 3 s.m.) e relacionar com as famílias que se enquadram em cada estrato, o
coeficiente estimado mostrou-se positivo para as famílias com renda mais baixa. Ou seja, as
famílias com renda até 1 s.m. apresentam maior probabilidade de estar em insegurança
alimentar. À medida que as famílias se encontram em estratos de renda mais elevados, não se
percebe a influência da renda sobre a probabilidade de insegurança alimentar.
Quanto à variável cor da pessoa de referência, o coeficiente estimado não é
significativamente diferente de zero, ao nível de significância de 5%. Portanto esta variável
independente não influencia na probabilidade de insegurança alimentar na área rural do Rio
Grande do Sul, existindo sim a probabilidade de insegurança alimentar tanto nas famílias
chefiadas por pessoas de uma cor ou de outra.
Quanto aos resultados encontrados para a área urbana do Rio Grande do Sul, todas as
variáveis independentes do modelo mostraram-se significativamente diferentes de zero, ao
nível de 5%, com efeito negativo nas variáveis idade, escolaridade e condições de moradia.
Ou seja, como o coeficiente é negativo, quanto maior a idade, maior a escolaridade e melhor
moradia, maior a probabilidade de segurança alimentar também na área urbana do Rio Grande
do Sul.
86
Tabela 9: Estimativas das probabilidades de insegurança alimentar, de acordo com as
variáveis independentes, através do modelo probit, para o urbano do Rio Grande do Sul,
2004.
Variáveis independentes
Coeficiente
Estimado
Z
Nível de
Significância
(5% ou 0,05)
Idade da Pessoa de Referência -,004 -3,395 ,001
Escolaridade da Pessoa de Referência -0,44 -8,608 ,000
Sexo da Pessoa de Referência ,272 7,911 ,000
Cor da Pessoa de Referência ,123 2,012 ,044
ICM -,154 -5,544 ,000
TRF ,413 7,243 ,000
RDPC – até 1 s.m. 1,206 19,764 ,000
RDPC – De 1 a 2 s.m. ,640 11,012 ,000
RDPC – De 2 a 3 s.m. ,296 4,396 ,000
Intercepto -,219 -1,416 ,157
Fonte: PNAD (2004) – elaborado pela autora.
Com coeficiente estimado positivo, quanto maiores as transferências governamentais,
maior a probabilidade de insegurança alimentar. Assim como no rural, as famílias urbanas
chefiadas por mulheres, apresentam maior probabilidade de se encontrarem em situação de
insegurança alimentar.
Na área urbana, a variável independente cor é significativamente diferente de zero, ao
nível de significância de 5%, tendo maior probabilidade de insegurança alimentar as famílias
chefiadas por pessoas da cor preta. Também, dado que o coeficiente estimado é positivo,
existe uma relação positiva entre as famílias estarem em cada um dos estratos de renda e a
probabilidade de ter insegurança alimentar. Quanto maior a participação das famílias em cada
um dos estratos de renda, maior a probabilidade de insegurança alimentar entre as famílias
urbanas gaúchas, controladas as demais variáveis. Assim, quanto mais baixa a faixa de renda
domiciliar per capita maior o efeito sobre a insegurança alimentar, obtendo maior
probabilidade de insegurança alimentar as famílias com renda até 1 s.m.
Tanto nas áreas urbanas, quanto rurais, investimentos em escolaridade e condições de
moradia tendem a diminuir a probabilidade de insegurança alimentar. Nos dois setores,
também as transferências estão associadas a maior probabilidade de insegurança alimentar.
Como as famílias, urbanas e rurais, chefiadas por mulheres, têm maior probabilidade de
87
insegurança alimentar, do que aquelas em que a pessoa de referência é masculina, as
transferências governamentais deveriam ser mais direcionadas a essas famílias com esta
característica de gênero.
Cabe destacar também a importância diferenciada da renda nos dois setores
censitários. No setor rural, as famílias com renda até 1 s.m. apresentam maior probabilidade
de estar em insegurança alimentar. Nos demais estratos, não é possível caracterizar a
influência da renda sobre a insegurança alimentar. Já no setor urbano, os três estratos de renda
mostraram-se significativamente diferentes de zero. Esse fato caracteriza a importância
diferenciada da renda monetária entre os setores censitários, ou seja, ela é uma variável mais
relevante nas áreas urbanas, onde as famílias precisam de renda para adquirir alimentos,
enquanto nas áreas rurais as famílias utilizam outros intitulamentos para produzir seus
próprios alimentos e garantir a segurança alimentar das suas famílias.
De forma ilustrativa, visando demonstrar a potencialidade de uso dos
resultados encontrados, é possível ainda estimar a probabilidade de uma família (domicílio)
estar em insegurança alimentar, a partir de um determinado perfil. Por exemplo, numa família,
com índice de condições de moradia igual a 4, sem receber transferências governamentais,
com renda domiciliar per capita até 1 salário-mínimo, chefiada por mulher, de cor preta, com
idade igual a 49 anos e com 5 anos de escolaridade, a probabilidade de insegurança alimentar,
no urbano, é igual a 63%, enquanto na área rural atinge 34%.
Por fim, ao longo deste capítulo, dentre os resultados encontrados para o Rio Grande
do Sul, destaca-se que a insegurança alimentar é menos intensa no meio rural, quando
comparado à área urbana deste estado, diferenciando-se das análises de Hoffmann e
Kageyama (2007) para o Brasil, onde insegurança alimentar atinge mais fortemente a
população pobre e a população rural. Este mesmo estudo apontou que no Brasil, pelos dados
da PNAD (2004), havia 2.390.765 pessoas extremamente pobres com insegurança alimentar,
sendo 695.056 com insegurança alimentar grave. Essa população, com renda abaixo da linha
de pobreza, sem infra-estrutura domiciliar mínima e com insegurança alimentar representa,
segundo os autores, o núcleo da miséria no Brasil. Desse total, 2.253.156 encontram-se na
área rural e 1.794.637 estão na região nordeste.
É importante evidenciar, nesta etapa do estudo, que é um conjunto de intitulamentos,
presentes na área rural do Rio Grande do Sul, que contribuem para tornar a insegurança
alimentar menos intensa, quando comparada à área urbana. A forma de compreensão da
insegurança alimentar no Rio Grande do Sul, neste estudo, é multidimensional, focando a
análise na incorporação de variáveis quantitativas e indo além delas. Neste primeiro capítulo
88
de resultados, a análise foi focada na renda e nos bens e serviços aos quais as pessoas têm
acesso, bem como em características relacionadas à pessoa de referência do domicílio como
idade, escolaridade, sexo e cor.
Entretanto também é preciso analisar, como será destacado no próximo capítulo, em
que tipo de mercado e de que forma essas pessoas são expostas a essas oportunidades de
aquisição. Outros intitulamentos, presentes na área rural do Rio Grande do Sul, com destaque
para o papel da agricultura familiar, da diversificação da produção agrícola e da destinação de
parte desta produção para o consumo da família, possibilitam amenizar as situações de
insegurança alimentar na área rural deste estado, tendo como fim a promoção da segurança
alimentar e possibilitando o desenvolvimento de capacitações dos agentes sociais.
89
5 OUTROS INTITULAMENTOS QUE CONTRIBUEM PARA REDUÇÃO DA
INSEGURANÇA ALIMENTAR NO RURAL DO RIO GRANDE DO SUL
A literatura que estuda a persistência da pobreza e da insegurança alimentar vem
constatando que o estímulo à modernização da grande propriedade tradicional, provocou a
redução prematura da mão-de-obra agrícola, o abandono da produção familiar, o acirramento
dos conflitos fundiários e o aumento da pobreza urbana. Este projeto de desenvolvimento,
com objetivo quase exclusivo do aumento físico de produtos, obedeceu ao que se poderia
chamar de “lógica capitalista”, com uma tendência de concentração da produção. As
consequências do modelo de Desenvolvimento Rural implementado, não atingiram somente o
campo, mas também as cidades, pelo acréscimo populacional com o agravamento dos
problemas de infraestrutura em termos de habitação, saneamento, saúde, escolas, segurança,
etc.
A análise das situações de pobreza e da insegurança alimentar no rural brasileiro passa
necessariamente pela consideração das próprias características do setor agropecuário. Em
países com altos índices de desenvolvimento humano, a agropecuária é uma atividade de
caráter principalmente familiar, enquanto no Brasil, embora a agricultura familiar predomine,
quanto ao número de estabelecimentos e pessoal ocupado, e somente recentemente venha
sendo valorizada, a agricultura patronal prevalece quanto à área ocupada. Segundo Guanziroli
et al. (2001) a prevalência da produção familiar como base principal da produção agrícola nos
países capitalistas avançados pode ser explicada pela sua capacitação de incorporar progresso
técnico e de responder às demandas do setor urbano-industrial em expansão. Uma segunda
explicação está no reconhecimento de sua importância político-estratégica em projetos de
desenvolvimento nacionais não-excludentes.
No entanto, a percepção dessa importância variou bastante segundo às especificidades
dos diferentes países. De um lado está o caso japonês, onde a importância estratégica de
modernizar a agricultura sem produzir uma massa de desempregados era percebida como
vital. Além disso, a permanência de relações comunitárias de caráter feudal representou um
traço cultural específico que facilitou a articulação de um conjunto de políticas com vistas à
modernização a partir da agricultura familiar.
De outro lado está o caso americano, nação de imigrantes onde a abertura da fronteira
agrícola deu origem a uma próspera agricultura de base familiar. A imagem do farmer
90
empreendedor no ideário fundador da nação, assim como o próprio peso político/econômico
destes agricultores tiveram um papel decisivo na definição do conjunto de políticas agrícolas
que iria consolidar a característica familiar da agricultura moderna nos Estados Unidos.
Na Europa do fim do século XIX e início do XX, as considerações estratégicas
também foram importantes para a definição de políticas que conferiram certa proteção e apoio
à agricultura familiar, embora em menor grau quando comparado ao caso do Japão. Por outro
lado, o campesinato, representando a maior parte da população economicamente ativa, tinha
importância significativa no jogo político, facilitando a implementação de tais políticas.
É fundamental ter em conta que o reconhecimento da importância político-estratégica
da produção familiar não teria sido suficiente para justificar as políticas de apoio
implementadas não fosse sua capacidade de produzir de maneira eficiente do ponto de vista
econômico, de absorver progresso técnico e atender à demanda por fibras e, sobretudo, por
alimentos baratos do setor urbano-industrial. A agricultura familiar foi capaz de unir
eficiência econômica com eficiência social (VEIGA, 1991).
Internacionalmente a preocupação com o que seria tecnologicamente apropriado para
pequena produção cresceu com a crítica às implicações sociais da difusão da Revolução
Verde. Embora o cerne tecnológico (variedades selecionadas, agroquímicos e irrigação) fosse
neutro do ponto de vista da escala ótima, os recursos disponíveis para a compra destes
insumos pelos camponeses eram escassos nos países pobres, gerando uma disputa por esses
recursos, a qual foi ganha pelas elites agrícolas locais. Este processo resultou na exclusão dos
agricultores pobres, pela barreira à entrada, representada pela falta de acesso ao crédito.
No caso brasileiro, ainda hoje, cerca de 75% da área utilizada pelo setor agropecuário
pertence a meio milhão de fazendeiros que empregam quase cinco milhões de peões, cabendo
apenas um quarto dessa área (25%) a outros treze milhões de pessoas ocupadas no setor, entre
os quais, pelo menos um quarto, está em situação de autoconsumo (VEIGA, 2000).
Também é bastante conhecido o fato de que a pobreza é proporcionalmente maior no
meio rural de todas as regiões brasileiras e, dentre as regiões, a pior situação de pobreza está
no Nordeste. Veiga (2000) revela que na região mais miserável do país o Nordeste as
diferenças espaciais são tênues, enquanto que no Sudeste/Sul a proporção de pobres no meio
rural chega a ser duas vezes superior à proporção de pobres urbanos.
Tamanha distorção resulta evidentemente de uma herança histórica cuja marca
essencial foi o desprezo e a intolerância das elites pelas formas familiares de propriedade e
uso da terra. Segundo Jungmann (2000), a
pobreza rural tem sua origem, inequivocamente, na
desigual distribuição da terra, e que essa
distribuição constitui-se na matriz principal
91
geradora da pobreza rural e urbana. Os argumentos que são apresentados, direta ou
indiretamente, contra a reforma agrária, têm sua origem na crença da superioridade da grande
produção e na visão do papel da agricultura no processo de desenvolvimento econômico, que
serviram de justificativa intelectual para sua não realização nos anos 60 e para os esforços
bem sucedidos de abortar as tentativas de realizá-las nas décadas seguintes. Em relação ao Rio
Grande do Sul, que se fazer uma exceção quanto ao fluxo colonizador que, partindo do
extremo sul, permitiu uma certa afirmação da agricultura familiar até o sudoeste do Paraná.
Nas demais regiões brasileiras, o padrão agrário foi semelhante ao que predominou no Leste
europeu, onde as elites preferiram impedir que suas populações rurais tivessem acesso à
propriedade da terra.
Para Basso (1993) bem diferente seria se o objetivo de crescimento físico da produção
agrícola estivesse aliado ao objetivo de geração de emprego. Neste caso, a política econômica,
para ser coerente aos objetivos de desenvolvimento, deveria favorecer com prioridade as
explorações de tipo familiar. O mesmo autor revela que este tipo de unidade de produção,
quando adequadamente apoiado, responde positivamente em termos de geração de
excedentes. A agricultura, nessa perspectiva, assume papel central, tanto por abrigar parcela
significativa das famílias que não conseguem acesso ao mercado de trabalho urbano, quanto
por ser o setor de onde se retira um dos componentes básicos da cidadania: o alimento que
permite a própria subsistência, além de também contribuir para a produção de excedente,
aumentando a oferta de produtos agrícolas.
Segundo Kageyama (2008), a insegurança alimentar ainda atinge quase metade da
população rural brasileira, e chega a 65% na região Nordeste e no extremo Norte (Roraima e
Amapá). Nessas áreas, a insegurança alimentar grave também é maior do que no resto do país,
atingindo entre 11% e 18% da população rural. Somente São Paulo e a região Sul destacam-se
em sentido contrário, obtendo os menores valores para a proporção de pessoas com
insegurança alimentar na área rural (Tabela 10).
Tabela 10: Insegurança alimentar na área rural, Brasil e classes de UF, 2004.
Classes de UF % pessoas com
insegurança alimentar
% pessoas com
insegurança alimentar grave
1 (RO, PA, TO) 58,2 15,0
2 (SP) 32,2 2,6
3 (AC, AM) 56,9 13,7
4 (MS, MT) 34,9 4,4
92
5 (MG, ES, GO) 36,6 4,1
6 (MA, PI, BA) 65,4 18,0
7 (PR, SC, RS) 21,6 2,5
8 (RR, AP) 64,5 11,2
9 (RJ) 38,5 4,9
10 (CE, RN, PB, PE, AL, SE) 64,1 15,9
(DF) 36,2 12,0
Brasil 49,7 11,1
Fonte: Kageyama (2008
).
Os resultados encontrados por Kageyama (2008) permitem aproximação com aqueles
encontrados no capítulo anterior deste trabalho, que identificou que a insegurança alimentar é
menos intensa no meio rural do Rio Grande do Sul, apesar dos menores veis de renda e das
piores condições de moradia, quando comparado à área urbana. Realizar um esforço analítico
sobre outros intitulamentos que contribuem para a redução da insegurança alimentar na área
rural do Rio Grande do Sul é o objetivo deste capítulo.
Também nessa etapa do estudo, a insegurança alimentar no Rio Grande do Sul é
analisada a partir da noção de intitulamentos, que evidencia a influência de fatores não
controlados diretamente pelos agentes sociais para a solução de eventuais falhas capacitativas.
Ou seja, no caso da fome, por exemplo, o acesso ao alimento pode não ser um vetor
disponível ao agente social que vivencia o problema. Esse não acesso ao alimento não se dá
por escolha das pessoas (como no caso, daqueles indivíduos que realizam jejum), mas por
uma circunstância estrutural (falta de programas assistenciais, falta de acesso a recursos
monetários, por exemplo) que não permite que essa seja uma possibilidade de realização.
Neste sentido, o agente social não tem oportunidade para adquirir alimento e ser capaz de
realizar um funcionamento (estar adequadamente nutrido).
A disponibilidade de intitulamentos valorizados socialmente para a realização das
escolhas, gera uma ampliação das liberdades do agente social, que poderá realizar, no caso
deste estudo, o funcionamento ‘estar adequadamente nutrido’. Na análise do problema da
fome, Drèze e Sen (2004) evidenciam que o intitulamento de uma pessoa é composto pelas
opções disponíveis nos meios legalmente estabelecidos para a aquisição das mercadorias. A
abordagem dos intitulamentos concentra-se na capacitação das pessoas disporem de
alimentos, através dos meios legais disponíveis na sociedade, incluindo a utilização de
93
possibilidades de produção e de oportunidades comerciais, de direitos, dos meios providos
pelo Estado, além de outros métodos de aquisição de alimentos.
Contemplando os objetivos deste trabalho, esta etapa do estudo reflete sobre outros
intitulamentos, além daqueles analisados no capítulo anterior (renda per capita, índice de
condições de moradia e transferências governamentais recebidas pela família, além de
características da pessoa de referência do domicílio como sexo, idade, escolaridade e cor), que
permitam explicar a menor intensidade da insegurança alimentar na área rural do Rio Grande
do Sul, quando comparada à área urbana, atingindo segurança alimentar em 80,7% destes
domicílios. Reconhecendo a multidimensionalidade desta situação, que não pode ser vista
unicamente pela insuficiência de renda, a seguir são apresentados intitulamentos associados à
presença da agricultura familiar; à riqueza ou à dotação inicial de fatores; à integração
territorial; aos fatores demográficos e ao acesso à educação que, em conjunto, contribuem
para a redução da insegurança alimentar no Rio Grande do Sul, especialmente na área rural,
promovendo uma situação diferenciada quando se compara ao caso brasileiro.
5.1 Intitulamentos Associados à Presença da Agricultura Familiar
Além das pessoas ocupadas na agricultura, como membros da família do produtor,
outros aspectos também estão associados à agricultura familiar e que são fatores que
favorecem o desenvolvimento, contribuindo para a redução da insegurança alimentar, como a
diversificação agrícola (em contraste com as monoculturas e economias de escala associadas
ao modelo de modernização agrícola) e a redução da concentração fundiária.
Kageyama (2008) destaca que a associação entre agricultura familiar e
desenvolvimento rural e, especificamente neste trabalho, a relação entre agricultura familiar e
redução da insegurança alimentar, decorre mais de fatos empíricos do que de alguma
superioridade intrínseca desta forma de organizar a produção. Casos de sucesso dessa
associação são evidenciados na Itália da industrialização difusa, no meio oeste dos Estados
Unidos e na região Sul do Brasil. Além disso, por operar em menor escala e utilizar o trabalho
intensivo de seus membros, a agricultura familiar surge positivamente valorizada frente a
situações em que predomina a grande propriedade extensiva ou o sistema latifúndio-
minifúndio ainda existente nas regiões mais atrasadas no Brasil.
Pelas características acima evidenciadas Buainaim (2006) sustenta que a agricultura
familiar pode ter importantes contribuições econômicas (geração de riquezas), sociais (efeitos
94
distributivos) e políticas (distribuição do poder). Porém o mesmo autor enfatiza que a simples
presença da agricultura familiar não é suficiente para melhorar as condições do
desenvolvimento rural, pois no Nordeste, onde se encontram 50% das pessoas ocupadas na
agricultura familiar, a renda gerada pela maioria dos estabelecimentos familiares forma um
importante bolsão da pobreza rural no Brasil.
Buscando caracterizar a presença da agricultura familiar no Rio Grande do Sul e
diferenciá-la dos resultados para o Brasil como um todo, foram selecionados seis indicadores,
apresentados na Tabela 11. As características da distribuição fundiária foram descritas através
de três indicadores: o índice de Gini, a proporção de área pertencente aos 50% menores
estabelecimentos agropecuários e a área média dos estabelecimentos. Os resultados são de
Hoffmann (2007), a partir do Censo Agropecuário de 1995-96. O índice de Gini e a área
média tendem a variar no mesmo sentido da presença da grande propriedade e, por
consequência, são negativamente associados à agricultura familiar. Quanto maior a fração de
área pertencente aos menores estabelecimentos, maior é a presença da pequena produção e,
possivelmente, os efeitos esperados sobre o desenvolvimento rural e a redução da insegurança
alimentar serão positivos. Para diferenciar a agricultura familiar dinâmica de minifúndios
improdutivos, foi utilizado um indicador de produção nos pequenos estabelecimentos
(proporção do valor da produção agropecuária correspondente aos estabelecimentos menores
de 100 hectares).
A presença da agricultura familiar foi captada pela importância relativa da mão-de-
obra do responsável pelo estabelecimento rural e membros não-remunerados de sua família.
A diversificação da atividade agrícola foi medida pela proporção de área plantada com
culturas, excluindo a principal cultura permanente e a principal, temporária. Quanto maior a
área ocupada com uma única cultura (permanente ou temporária) menor a diversificação. O
indicador mostra a diferença entre a área de monocultura e a área total plantada com culturas,
ou seja, funciona no sentido oposto ao da especialização. Quanto maior o valor do indicador,
maior a diversificação. Os indicadores utilizados na Tabela 11 visam captar indiretamente a
forma de produção predominante nas áreas rurais e foram extraídas de Kageyma (2008), que
utilizou o Censo Agropecuário de 1995-96 e da Pesquisa Agrícola Municipal (PAM) de 2005.
95
Tabela 11: Indicadores de presença de agricultura familiar e diversificação agrícola,
Brasil e Rio Grande do Sul, 1995-96, 2005, 2007.
UF Índice de
Gini para a
distribuição
da posse da
terra
% de área dos
50% menores
estabelecimentos
Área média dos
estabelecimntos
(ha)
% de mão-de-
obra familiar
não-
remunerada
% de área
plantada com
outras
culturas, que
não as duas
principais
% do valor da
produção nos
estabelecimentos
menores de 100
ha
Brasil 0,857 2,3 73,1 75,9 59,9 46,5
RS 0,763 6,9 50,8 85,7 48,7 61,0
Fonte: Kageyama (2008).
O Rio Grande do Sul, acompanhado dos demais estados da Região Sul, Rondônia e
Acre, aparece com valores máximos para os fatores associados à produção familiar e à
diversidade agrícola, que, por sua vez, representam importantes intitulamentos associados à
redução da insegurança alimentar, diferenciando a agricultura familiar gaúcha, de outros
estados brasileiros. Buainaim (2006) revela que as diferenças entre agricultores familiares está
associada à própria formação dos grupos ao longo da história, as várias heranças culturais, à
experiência profissional e de vida particulares, ao acesso e à disponibilidade variável de um
conjunto de fatores, entre os quais os recursos naturais, o capital humano, o capital social
entre outros. Essa diferenciação também está associada à inserção dos grupos em paisagens
agrárias diferenciadas umas das outras, ao acesso diferenciado aos mercados e à inserção
socioeconômica dos produtores, que resultam tanto das condições particulares dos grupos
como de oportunidades criadas pelo movimento da economia como um todo, através de
políticas públicas, etc.
No Rio Grande do Sul, a agricultura familiar, segundo Gazolla (2004), é uma forma social
de trabalho e produção pertencente ao ambiente social e econômico marcado pela mercantilização
crescente das suas estratégias reprodutivas, principalmente, pela mercantilização do consumo de
alimentos.
Além disso, a produção agrícola familiar é tomada como uma forma de produção e
trabalho que gere determinados intitulamentos (terra, força de trabalho e os meios de produção),
que conjugados entre si, pelo produtor familiar, através de suas relações sociais de produção,
determinam um tipo de produto agrícola que, por sua vez, é o resultado material e concreto de um
processo de produção agropecuária. Este produto agrícola pode ser tanto de livre circulação e
valor de troca no mercado, ou, ter valor de uso que, no contexto dos circuitos do mercado, não
96
possui valor algum, a não ser o de ser usado pelo seu possuidor em seu próprio benefício. Este é o
caso dos alimentos, que o agricultor familiar produz com o objetivo único de alimentar o grupo
doméstico, que, no contexto da unidade de produção familiar, não possui valor de troca, pois está
servindo apenas para saciar a fome da família (valor de uso) e gerar e segurança alimentar.
O processo de produção agrícola pode levar a duas diferentes estratégias de produção da
agricultura familiar em diferentes formações socioeconômicas, que são definidas e diferenciadas
pelo grau de mercantilização das relações sociais, denominadas Produção para o Consumo
Doméstico (seção 5.1.1) e
Consumo de Alimentos Através dos Mercados (seção 5.1.2)
1
.
Estas
estratégias, descritas a seguir, não são estáticas, mas dinâmicas no sentido de que um agricultor
que se encontra em um determinado nível de mercantilização do consumo, pode assumir uma
trajetória ascendente ou descendente em seus níveis produtivos.
Buianaim (2006) relata que os agricultores familiares buscam a diversificação e o
máximo de auto-suficiência alimentar e produtiva visando à redução da insegurança alimentar
e de riscos econômicos, mas isso não decorre de nenhum atributo intrínseco da produção
familiar, e sim das condições objetivas do mercado que ele enfrenta (imperfeições no
processo de comercialização, acentuadas variações de preços, distâncias dos mercados,
isolamentos em períodos de chuva, ausência de mecanismos de proteção contra riscos
naturais). Quando as condições se tornam objetivamente mais favoráveis, uma tendência,
entre os agricultores familiares, de maior abertura e integração aos mercados e maior
especialização nos produtos mais rentáveis.
5.1.1
Agricultura Familiar e a Produção para o Consumo Doméstico
Uma primeira estratégia de produção/reprodução social é aquela que se desenvolve onde a
produção para o consumo doméstico não é vulnerabilizada no interior da unidade de produção. A
produção para o consumo da família pode ser definida
como a fração da produção agropecuária
que se realiza no estabelecimento e se destina ao consumo alimentar dos membros das
famílias dos responsáveis, incluindo a alimentação animal e outros usos da atividade
produtiva (LEITE, 2001).
Nesta via, o agricultor familiar, primeiramente, produz o que é
necessário à alimentação e segurança alimentar do grupo doméstico, sendo que a mercantilização
1
As seções 5.1.1 e 5.1.2 estão embasadas nas dissertações de Gazolla (2004) e Grisa (2007).
97
do consumo de alimentos é existente, porém em um grau que não compromete a reprodução social
e alimentar da família. Esta estratégia propicia ao agricultor familiar uma reprodução social
baseada nos seus supostos internos de produção, diminuindo a externalização do consumo
doméstico em bases reais, na qual o agricultor familiar passa a depender menos do contexto social
e econômico e, principalmente, reduz-se a mercantilização do consumo doméstico, já que a
produção/reprodução social e alimentar está assegurada no interior da própria unidade familiar.
Desta forma, o agricultor familiar garante a sua segurança alimentar e reprodutiva, pois
possui a sua produção para o consumo familiar garantida internamente à unidade de produção,
“produzindo” assim, também, num mesmo processo social, a sua autonomia parcial e relativa
frente ao mercado, aos mecanismos de preços e às condições de troca que este lhe imputa.
É a própria produção que assegura a reprodução social e forma uma espécie de “lastro” de
apoio, pelo qual o agricultor familiar pode reagir a sua situação social, buscando diversificar as
suas estratégias de vivência através da ampliação das suas atividades produtivas, rendas, ativos e
capacitações de obtê-los (Sen apud Ellis, 2000). O fortalecimento desta produção permite ao
agricultor familiar a diversificação das suas estratégias de vivência, e representa um dos caminhos
viáveis para o combate da pobreza rural.
Grisa (2007) discute a hipótese de que a produção para subsistência é um dos fatores
explicativos da condição social e econômica das unidades familiares e configura-se como uma
estratégia de fortalecimento da autonomia, gerando às unidades familiares maior controle
sobre o processo produtivo e, por conseguinte, sobre sua reprodução social. A mesma autora
destacou as seguintes funções da produção familiar: (1) internalizar tarefas do processo
produtivo e asseverar a segurança alimentar; (2) diversificar a produção e conferir maior
estabilidade à reprodução social; (3) economizar recursos monetários e potencializar outros
ociosos; (4) reaproveitar e reproduzir recursos estabelecendo a co-produção; (5) atender a
demanda de consumo alimentar das famílias e a criação de valores de troca; (6) promover a
sociabilidade; e (7) contribuir para a identidade social das famílias. A seguir, cada uma dessas
funções será aprofundada.
A internalização das tarefas (1) na agricultura familiar relaciona-se com a redução da
insegurança alimentar, pois as unidades familiares buscam potencializar seu controle sobre o
processo produtivo. Assim a produção para o consumo familiar realiza a importante função de
manter internamente à unidade familiar a satisfação de uma das necessidades principais para a
reprodução social, a alimentação. Além do acesso e da disponibilidade de alimentos, ao
manter interna à unidade de produção a atribuição de produzir alimentos para o próprio
consumo, outro princípio da segurança alimentar é alcançado: a qualidade e a adequação aos
98
hábitos alimentares locais. Para garantir a sanidade e a qualidade dos alimentos, a produção
de consumo familiar geralmente é isenta de agrotóxicos e outros produtos químicos. Além do
uso do esterco animal, utilizam-se cinzas, restos de alimentos e outros materiais que não
comprometem a salubridade. A criação animal também tem manejo diferenciado, com
alimentação proveniente do próprio estabelecimento, como milho e farelos, além da expansão
do período de criação, garantindo qualidade e o sabor da carne. Além da sanidade e da
qualidade, estas práticas garantem manejos sustentáveis, utilizando recursos disponíveis
localmente, numa forma de co-produção, sem agredir o meio ambiente, a capacidade futura de
produção e consumo e fortalecendo assim a condição socioeconômica da família.
Em relação à diversidade cultural, a produção para o consumo da família respeita as
preferências alimentares das comunidades locais, suas práticas de preparo e consumo,
servindo como um instrumento de preservação da cultura, pois muitas práticas são passadas
dos pais para os filhos, de acordo com as condições socioambientais e a própria história local.
Uma segunda função relacionada com a produção familiar é a diversificação da
produção (2), gerando maior estabilidade à reprodução social, face ao processo de
especialização da agricultura, no qual as famílias ficam expostas aos mercados e as relações
por ele estabelecidas. Segundo Ellis (1998, 2000) são estratégias que visam aumentar a
autonomia e minimizar a vulnerabilidade advinda da mercantilização. Mesmo que não
monetária, a produção para o consumo familiar é uma importante fonte de renda, por auxiliar
na estabilidade econômica e social das famílias expostas às oscilações das culturas comerciais
e falhas nas rendas, intensificando o controle sobre o processo produtivo. Segundo Leite
(2004) esta produção confere um efeito anticíclico, compensando as épocas de baixos
rendimentos monetários nos estabelecimentos e as variações destes ao longo do ano agrícola,
proporcionando uma renda total mais constante. É portanto, um importante instrumento de
proteção face às incertezas e oscilações da produção mercantil. Também Brumer (1994)
destaca que manter a produção para o consumo familiar, junto com outras atividades
econômicas, é uma forma de economizar recursos, diminuir riscos de contração de vidas e
extrapolação das despesas necessárias, ao mesmo tempo em que permite a intensificação do
trabalho familiar e a manutenção dos membros na residência familiar, evitando o êxodo rural
e a exposição ao desemprego urbano.
A diversificação da produção familiar é considerada uma estratégia importante, por
contribuir para a estabilidade socieconômica e manutenção das unidades familiares,
permitindo também melhorias na qualidade de vida e infra-estrutura, gerando até mesmo
ascensão e diferenciação social em alguns casos.
99
Segundo Gazolla (2004) a produção de subsistência desempenha um papel
fundamental nas formas sociais de produção e trabalho que está relacionado a propiciar a
diversificação das estratégias de vivência e de desenvolvimento das famílias. Neste sentido, o
que se quer demonstrar é que a produção para o consumo familiar é a base sobre a qual se
assenta expressiva parte da reprodução social e alimentar do grupo doméstico e o ponto de
partida para que as unidades familiares consigam diversificar suas estratégias de vivência
(livelihoods). Segundo Ellis (2000, p.10) as estratégias de vivência compreendem os ativos
2
(capital natural, físico, humano, financeiro e social), as atividades e o acesso para estas
(mediado por instituições e relações sociais) que juntos determinam o ganho de vida pelos
indivíduos e unidades familiares.
As estratégias de vivência podem ser classificadas em dois tipos principais,
dependendo do contexto em que a unidade doméstica está inserida, o nível de riscos e
choques em que está submetida. O primeiro tipo refere-se a ‘escolha e adaptação’ em um
contexto no qual o grupo doméstico está em condição de ascensão social. Neste caso, as
estratégias de vivência, como escolhas colocadas em prática, se referem a uma reação
voluntária e pró-ativa para conduzir a diversificação de ativos, fontes de renda e acessos a
estes (p.55). Ou podem ser definidas como estratégias em que qualquer melhoramento
existente gere segurança e riqueza, visando a redução da vulnerabilidade e da pobreza
(ELLIS, 2000). Neste tipo de estratégia, a unidade de produção possui as condições materiais
e sociais asseguradas para sua reprodução. Tal estratégia pode levar a unidade doméstica à
ascensão e talvez a uma diferenciação social e econômica frente às demais, possivelmente
pelas capacitações, habilidades para realizar o potencial humano (nutrir-se adequadamente,
ser livre de doenças) e fazer (exercer escolhas, desenvolver habilidades e experiências,
participar socialmente). Ellis utiliza o conceito de capacitações para explicar estratégias de
sobrevivência. As diferentes estratégias de sobrevivência colocadas em prática para se atingir
a diversificação são dependentes das capacitações dos indivíduos e das famílias em
operacionalizá-las.
2
Ativos são os estoques de capital que podem ser utilizados, direta ou indiretamente, para gerar meios de
sobrevivência da unidade doméstica (Ellis, 2000, p.31). Dentre estes ativos, o capital natural se refere aos
recursos de base como a terra, água, árvores, etc, que rendem produtos utilizados pela população para a
sobrevivência. O capital físico se refere ao acesso pelo processo de produção econômico de, por exemplo,
instrumentos, máquinas, canais de irrigação, ou seja, obras de infra-estrutura em geral. O capital humano se
refere aos níveis de educação e saúde da população. O capital financeiro é definido pelo estoque de dinheiro que
pode ser acessado para aquisição da produção ou consumo de bens e o acesso ao crédito. O capital social se
refere às redes e associações em que as pessoas participam , gerando ‘suportese que contribuem em suas
estratégias de vivência.
100
Outra estratégia de sobrevivência pode ser de ‘reação e necessidade’ em um contexto
de pobreza rural, de riscos e de choques do grupo doméstico, de acordo com Ellis (2000).
Neste caso, as condições sociais e materiais que lastreiam a reprodução social da unidade
doméstica, estão em processo de desagregação e é necessário lançar mão de estratégias para
continuar sobrevivendo mesmo em um contexto de crise econômica, de riscos, de reprodução
ameaçada e, também, de insegurança alimentar, como no caso da vulnerabilização da
dimensão do autoprovisionamento em função do privilégio à esfera comercial. Neste caso, as
estratégias de necessidade se referem a uma ação involuntária em direção a diversificação de
ativos e tipos de capitais (p.55). No caso de desagregação do grupo doméstico e de
reprodução social ameaçada em que o agricultor está submetido, seriam colocadas em prática
as estratégias de vivência por necessidade e por reação para levá-lo a diversificação das
estratégias de vivência, que segundo Ellis (2000), referem-se ao processo pelo qual as
unidades familiares constroem um incremento diversificado de suas carteiras de
investimentos, de atividades e ativos para sobreviver e para melhorar o padrão de vida.
Para Gazolla (2004) a produção de subsistência é a esfera da unidade doméstica que
fornece a base e o lastro para que haja a diversificação das estratégias de vivência na
agricultura familiar. É com uma produção para consumo familiar fortalecida internamente na
unidade de produção que, por sua vez, o grupo doméstico poderá lançar-se em outras
atividades e obtenção de outras fontes de renda. Isso se justifica devido ao fato de que, sem o
autoprovisionamento, o agricultor familiar não consegue a diversificação de estratégias de
vivência, pois com a renda das atividades que desenvolver necessitará comprar no mercado, a
preços de mercado, os produtos para alimentação da família. Sem a produção para consumo
da família, não são geradas as condições objetivas e materiais para a realização de um
processo de diversificação das fontes de renda e das atividades produtivas. Assim, pode-se
evidenciar a desagregação da unidade doméstica frente a uma crise ou choque, que pode ser
representada por situações de insegurança alimentar pela falta de produção dos seus próprios
alimentos.
Portanto, é o fortalecimento da produção para consumo familiar que leva à
diversificação das estratégias de vivência e à segurança alimentar pela diminuição do grau de
vulnerabilidade das unidades de produção à insegurança alimentar.
Outra função da produção para subsistência refere-se à forma de aproveitar o tempo e
a força de trabalho ociosos do estabelecimento (3), produzindo para o consumo familiar,
economizando recursos monetários, pela própria produção dos bens que poderiam ser
adquiridos nos mercados. Ou seja, trata-se de uma estratégia de maximizar os recursos
101
disponíveis na unidade familiar, principalmente terra e força de trabalho, gerando uma
produção que evita a compra nos mercados da alimentação necessária ao grupo doméstico.
Embora os agricultores familiares reconheçam, segundo Grisa (2007), que se trata de uma
fonte de renda importante, a maioria das unidades familiares não consegue estimá-la em
valores.
Maluf et al. (2006b) destacam que a produção para subsistência cumpre importante
papel no combate à pobreza, ocupando a posição de determinante principal da insegurança
alimentar. Produzir para o consumo da família é uma maneira encontrada pelos agricultores
familiares de melhorar a qualidade de vida e sua condição socieconômica, estratégia que não
está disponível para muitos outros segmentos sociais em situação de pobreza (NORDER,
1998).
A produção para consumo familiar também tem a função de utilizar os recursos
disponíveis no estabelecimento (4) e, ao mesmo tempo, os fortalece e recria para os ciclos
futuros, contribuindo para a autonomia das unidades familiares. Santos e Ferrante (2003)
destacam que a produção vegetal para o consumo familiar geralmente utiliza resíduos da
produção agrícola (palhadas, esterco, etc.) e recursos oferecidos pelo próprio ambiente
(fertilidade natural do solo, por exemplo).
Outros recursos locais importantes utilizados na produção para o consumo da família
são as sementes e o saber-fazer. As sementes geralmente são procedentes dos ciclos
produtivos anteriores. Segundo Grisa (2007, p.144) “há o cuidado de coletar, selecionar e
armazenar as sementes, das quais depende a produção futura”. Além disso, a produção para
consumo da família utiliza o conhecimento e a experiência acumulada ao longo das gerações.
A autora também destaca que a posse destes conhecimentos é um dos fatores que permite que
o atendimento das necessidades alimentares da família seja saciado por ela mesma. Conhecer
os potenciais e as limitações, como e quando plantar cada cultura são elementos que permitem
melhor gestão dos recursos existentes na unidade familiar.
Também ocorre a troca do saber/fazer através dos novos artefatos produzidos pelas
agroindústrias, baseando-se na relação estabelecida entre homem, natureza e produção,
proporcionando o uso mais adequado dos insumos. A produção para o consumo familiar,
sendo uma forma de co-produção, utiliza-se de recursos materiais e sociais disponíveis
localmente e, paralelamente, os reproduz, garantindo os ciclos futuros e uma base de recursos
autocontrolada, resultando, enfim, em maior autonomia sobre o processo produtivo.
A produção para o consumo da família também revela autonomia pela flexibilidade
que certos alimentos possuem (5), ou seja, permitem ao agricultor tanto o consumo direto ou a
102
venda, conforme a demanda da família. Gazolla (2004) evidencia que a característica da
alternatividade permite atender o mínimo alimentar vital e ainda reverter a produção em
recursos monetários, sem provocar a insegurança alimentar.
Destaca-se também que a produção para a alimentação da família é uma importante
forma de sociabilidade (6). Estes alimentos fazem parte de muitos momentos da vida social,
como festas e encontros, além da parte, desta produção, destinada a troca e doações entre
vizinhos, parentes e amigos. Segundo Grisa (2007), por meio das trocas, doações, reuniões e
encontros com a presença de alimentos, característicos da produção familiar, as famílias
socializam saberes e experiências, renovando os sentimentos comunitários, gerando solidez a
estrutura social, importante componente para a autonomia das famílias.
Por fim, produzir para a manutenção das famílias significa mais que simples produção
de alimentos, pois revela também orgulho e demarcação de posição social (7). Segundo
Seyferth (1991) apud Grisa (2007) produzir para o consumo da família integra a identidade do
colono que se caracteriza pelo trabalho familiar, posse de terras em quantidade suficiente, que
permita a atividade de cultivo, produção voltada em primeiro plano para o consumo
doméstico (policultura com criação) e participação nas atividades de solidariedade.
Embora a agricultura venha passando por transformações, como a mercantilização da
agricultura, ser agricultor familiar e produzir para o consumo continuam indissociáveis. Não
possuir produção para consumo doméstico, além de fragilizar sua reprodução social,
compromete a identidade social, a identificação enquanto agricultor. Diferente de outras
funções da produção para consumo da família que se constituem notadamente como fonte de
autonomia para a agricultura familiar, a identidade social resulta desta autonomia. Com a
satisfação das necessidades alimentares (pelo menos em parte) por meio do suor da própria
família, a identidade de agricultor é mantida (GRISA, 2007).
Além de evidenciar que a produção para subsistência é uma estratégia recorrente da
agricultura familiar, demonstra-se que esta produção contribui sobremaneira para a condição
socioeconômica e a autonomia dos agricultores.
5.1.2 Agricultura Familiar e o Consumo de Alimentos Através dos Mercados
A segunda estratégia de produção social é a mercantilização do consumo de alimentos.
Esta via se caracteriza por uma mercantilização crescente do processo produtivo agrícola, na qual
o grau de externalização dos agricultores familiares é elevado. O consumo alimentar se encontra
103
bastante mercantilizado e os agricultores, constantemente, executam a sua reprodução alimentar e
social buscando significativa parte do consumo doméstico nos mercados citadinos locais gerando,
assim, uma perda de autonomia alimentar e uma situação de insegurança alimentar, pois a
produção para o consumo familiar não está assentada nos supostos internos da unidade de
produção (GAZOLLA, 2004).
A mercantilização do consumo, em alguns casos, leva a insegurança alimentar do grupo
doméstico, pois é necessária uma monetarização crescente da família para a realização de compras
no mercado, a preços e condições que este lhe impõe, visando o consumo alimentar necessário à
família. Este contexto gera uma situação em que o grupo doméstico se encontra vulnerável frente
ao mercado, pela sua função de definir os preços e as condições de circulação de mercadorias. A
mercantilização do consumo faz com que o agricultor familiar passe a vivenciar um dilema, pois,
por um lado, este tem que obter excedentes monetários para fazer frente à compra do consumo
alimentar fora da unidade de produção. Entretanto, para isso, necessita obter saldos monetários
crescentes no ano dentro da unidade de produção, e, possivelmente, aumentando a inserção
mercantil via especialização produtiva. Contudo, a lógica da especialização produtiva dos
agricultores, gera uma situação social que pode ampliar o grau de vulnerabilização do
autoprovisionamento alimentar.
A especialização produtiva leva a uma “encruzilhada” reprodutiva para os agricultores, na
qual quanto mais estes se especializam, mais intensamente a produção para consumo doméstico é
deslocada espacialmente e temporalmente no interior da unidade de produção, tornando-se
“marginal” em muitos casos e, em outros, chegando a ponto de serem extintas totalmente. Este
movimento em direção a especialização leva a uma maior dependência do contexto social e
econômico, com uma tendência ao crescente gasto financeiro para o consumo alimentar da família
e a vulnerabilização da reprodução social e alimentar das mesmas (GAZOLLA, 2004).
Neste contexto de especialização produtiva e de atividades que geram maior lucratividade
é que o agricultor familiar perde a alternatividade da produção como se referiu Garcia Jr. (1983;
1989), pois as culturas como a soja e o fumo, que estão entre os principais produtos da agricultura
familiar, não possuem outra “função” senão comercial. No contexto da unidade de produção,
nenhum papel importante em termos de segurança alimentar é desempenhado por estes produtos
que têm a sua valorização somente na esfera do mercado.
Neste contexto quase não espaço para a diversificação das estratégias de vivência das
famílias como definiu Ellis (2000), pois estão em tamanha situação de vulnerabilidade (que se
corporifica em alguns casos através de um empobrecimento rural), que qualquer renda extra
gerada, ativo ou produtos obtidos através das redes de trocas com os vizinhos (reciprocidade
familiar), são usados primeiramente para a garantia da alimentação do grupo doméstico, como
104
formulou Graziano da Silva et al. (2001). A diversificação das estratégias de vivência somente é
possível no momento em que as famílias conseguirem gerar ativos, rendas e possuírem a
capacidade de obter um excedente monetário para fazer frente a outras necessidades e
possibilidades de reprodução social. É por isso que o fortalecimento da produção para consumo
familiar, em contextos de agricultura familiar mercantilizada, é tão importante. Ele forma, em
grande medida, a base para a diversificação das estratégias de vivência e reduz a vulnerabilidade
do grupo doméstico à situações de pobreza rural e de insegurança alimentar.
Assim, a ocorrência da insegurança alimentar entre os agricultores familiares, pode ser
encarada, em grande medida, como efeitos da mercantilização do consumo, que faz com que o
agricultor familiar passe a possuir um limiar de reprodução social e alimentar, cada vez mais
estreito, no qual os limites entre pobreza e o “passar fome”, como se referem os agricultores, são
muito tênues. Assim, a questão da pobreza rural, da insegurança alimentar e da produção para o
consumo familiar são temas correlacionados de forma que, para se compreender um deles, se faz
necessário o entendimento dos outros (GAZOLLA, 2004).
5.2 Intitulamentos Associados à Riqueza ou a Dotação Inicial de Fatores
Segundo Kageyama (2008) um ponto de partida para a compreensão da desigualdade
entre os estados brasileiros, inclusive para explicar porque a insegurança alimentar é menos
intensa no meio rural do Rio Grande do Sul, está ligado ao percurso histórico de ocupação e
desenvolvimento, que condiciona o desenvolvimento dos territórios rurais. Considerando
somente as desigualdades regionais da modernização agrícola, Kageyama e Silveira (1997)
destacam que o processo de convergência de rendas observado entre países ou regiões
dificilmente ocorreria entre os estados brasileiros.
No Brasil, o processo de modernização visou a exploração da base de recursos naturais
e o desenvolvimento de uma infra-estrutura, inclusive agroindustrial, desigualmente
distribuída nas diferentes regiões do país. Outros fatores também contribuíram para gerar uma
forte segmentação regional do nível de desenvolvimento, como a existência de diferenças
significativas nas formas de organização da agricultura. Algumas de suas configurações estão
relacionadas com um dado padrão de especialização regional das atividades agroindustriais,
com impactos nos coeficientes de integração inter-regional do comércio e nos coeficientes de
comércio exterior.
105
A Tabela 12 apresenta a participação do estado do Rio Grande do Sul no valor do PIB
para os anos de 1970, 1975, 1980, 1985, 2000 e 2004, visando ilustrar o tamanho econômico
da unidade de análise.
Tabela 12: Participação do Rio Grande do Sul no Produto Interno Bruto do País (em %), 1995.
UF 1970 1975 1980 1985 2000 2004
RS 8,6 8,5 7,9 7,9 7,7 8,1
Fonte: Kageyama (2008), a partir de IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Contas Nacionais e
Affonso e Silva (1995).
No caso gaúcho, as maiores perdas de participação ocorreram entre os anos de 1975 e
2000, voltando a ampliar a participação no ano de 2004.
Para caracterizar a influência da desigualdade original do estado do Rio Grande do
Sul, comparativamente com o Brasil, sobre o processo recente de desenvolvimento rural
utilizou-se o valor do PIB per capita (Tabela 13), admitindo-se que esse indicador sintetiza o
resultado do processo histórico de desenvolvimento e sua situação atual. A escolha do ano
2000 se deve ao fato de estar próximo do período de referência das demais variáveis utilizadas
para descrever os intitulamentos que reduzem a insegurança alimentar no Rio Grande do Sul.
É importante destacar que o indicador não é específico para a área rural, mas segundo
Kageyama (2008), a ideia é que represente o contexto mais amplo, que condiciona o
desenvolvimento rural.
Tabela 13: Produto Interno Bruto per capita, Brasil e Rio Grande do Sul, 2000.
(em valores correntes)
UF PIB per capita (R$)
RS 8.302
Brasil 6.430
Fonte: Kageyama (2008), a partir de IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Contas Nacionais.
O PIB per capita entre os estados variou de um mínimo de R$1.616 no Maranhão a um
máximo de R$ 9.919 em São Paulo. Os menores valores encontram-se nos estados
nordestinos e os únicos estados com PIB per capita acima da média do país são o Amazonas,
os estados do Sudeste (exceto Minas Gerais) e os estados da Região Sul, incluindo a unidade
de análise – o Rio Grande do Sul.
106
5.3 Intitulamentos Associados à Integração Territorial
Segundo Kageyama (2008), quanto menor o isolamento de uma região (em termos das
distâncias econômicas, dos contatos e da acessibilidade em geral) maiores serão as
possibilidades de um desenvolvimento rural com diversificação, multifuncionalidade e
progresso social. Uma rede de cidades densa e bem distribuída no território é um fator
positivo para o desenvolvimento de áreas rurais adjacentes. Já a concentração da população na
capital ou em poucas cidades grandes atua em sentido oposto. Uma adequada infraestrutura de
transportes e comunicações, por sua vez, favorece a integração territorial e amplia a
acessibilidade das áreas rurais. Com estes pressupostos estabelecidos, a seguir o
apresentados seis indicadores para representar o maior ou menor isolamento territorial no Rio
Grande do Sul.
Os dois primeiros indicadores referem-se à densidade e dispersão da rede urbana, que
afetam positivamente o desenvolvimento territorial rural. Esses indicadores, representados
pela densidade demográfica (hab/km
2
) e a população residente fora da capital do estado
(proporção da população total que reside no interior), são válidos para a população como um
todo, e não apenas para a população rural, ambos tendo como fonte o Censo Demográfico de
2000.
O segundo grupo de indicadores relaciona-se com a infraestrutura de transportes,
representados pela extensão da malha viária e pela frota de veículos automotores, com dados
do ano de 2004, do Ministério dos Transportes. Os indicadores foram calculados de forma
relativa à superfície territorial do Rio Grande do Sul (malha viária total medida em
quilômetros para cada 100 km
2
de superfície e número de veículos automotores por km
2
de
superfície do estado) e seu efeito esperado sobre o desenvolvimento rural é positivo, na
medida em que quanto maior a disponibilidade de transportes, menor o isolamento territorial.
O terceiro grupo de indicadores como fator de isolamento refere-se à
comunicabilidade no território rural de cada estado, representada pelo acesso à Internet
(proporção da população rural com acesso à Internet) e ao telefone fixo ou celular (proporção
da população rural com telefone), com dados da PNAD do ano 2005.
A Tabela 14 apresenta os valores dos indicadores de isolamento para o Rio Grande do
Sul bem como para o Brasil como um todo.
107
Tabela 14: Indicadores de isolamento territorial, Brasil e Rio Grande do Sul, 2000, 2004,
2005.
UF
Porcentagem
da
população
residente no
interior
Densidade
demográfica
(pessoas por
km
2
)
Malha viária
em km por
100 km
2
de
superfície
Número de
veículos por
km
2
Porcentagem
da
população
rural com
acesso à
Internet
Porcentagem
da
população
rural com
telefone
RS 86,6 36,16 54,49 11,65 5,6 80,1
Brasil 76,2 19,94 18,91 4,61 3,4 31,7
Fonte: Kageyama (2008), a partir de IBGE (Censo Demográfico de 2000 e PNAD de 2005) e Ministério
dos Transportes (2004
).
Para o Rio Grande do Sul os fatores de isolamento se diferenciam de forma
significativa dos resultados encontrados para o Brasil, com alta densidade demográfica,
valores elevados para a malha viária, frota de veículos e comunicabilidade, revelando
integração territorial que favorece o desenvolvimento rural.
5.4 Intitulamentos Associados aos Fatores Demográficos
Alguns fatores demográficos representam vantagens ou desvantagens para as famílias
em termos de seu engajamento produtivo ou de seu acesso aos resultados da produção, do
trabalho e do desenvolvimento em geral, como a fecundidade, a distribuição etária, a presença
de cônjuge ou o tipo de família, entre outros. Kageyama (2008), na Tabela 15, considerou
como um fator condicionante do desenvolvimento rural a razão de dependência expressa
como a relação entre o número de crianças (14 anos ou menos) somado ao número de idosos
(65 anos ou mais) e o número de jovens e adultos (entre 15 e 64 anos) na população residente:
Razão de dependência = (menores de 15 anos + maiores de 64 anos)/(pessoas de 15 a
64 anos).
Definindo a razão de dependência demográfica como a relação entre o número de
membros não adultos e os adultos de uma família, a autora expressa que “a baixa renda per
capita de uma família pode advir de apenas dois fatores imediatos: a) uma baixa renda média
de adultos; ou b) uma alta razão de dependência (KAGEYAMA, 2008, p.133)”.
108
Tabela 15: Razão de dependência demográfica na área rural, Brasil e Rio Grande do
Sul, 2000.
UF Razão de dependência média
Brasil 0,691
RS 0,526
Fonte: Kageyama (2008), a partir do Censo Demográfico de 2000, IBGE
.
A razão de dependência na área rural mostrou uma grande variação nos diversos
estados brasileiros, mas o Rio Grande do Sul obteve um mínimo de 0,53 (praticamente dois
adultos para cada dependente).
5.5 Intitulamentos Associados ao Acesso à Educação
Um dos fatores mais importantes para a melhoria das condições de vida e para o
desenvolvimento em geral é a educação, inclusive para as pessoas ocupadas no setor agrícola.
De acordo com Hoffmann (2007) apesar do significativo efeito positivo da riqueza (medida
pela posse de terra) sobre o rendimento das pessoas ocupadas na agricultura, a educação é um
dos determinantes fundamentais da renda.
Na relação entre educação e desigualdade de renda na área rural brasileira, Ney (2005)
observa que além do problema da baixa oferta de educação, uma expressiva participação
de escolas de pequeno porte e de turmas multisseriadas (alunos de primeira à quarta série na
mesma classe) no ensino fundamental no meio rural, comprometendo a qualidade da
educação. Além disso, a evasão escolar nas áreas rurais é mais elevada do que nas áreas
urbanas, em todas as séries iniciais do ensino fundamental. uma forte desigualdade de
oportunidade educacional no meio rural, que se caracteriza pela significativa evasão escolar
nas primeiras séries, por uma grande heterogeneidade educacional gerada pela dificuldade de
acesso da população mais pobre à escola e pela baixa qualidade do ensino que resulta da
multisseriação, da sobrecarga de trabalho dos professores e da dificuldade de obter reforço
escolar dentro de casa, frente a baixa escolaridade dos pais. Como resultado, além da escassez
109
de terra, os jovens da área rural tendem a herdar uma baixa escolaridade, que limita sua
capacidade de desempenhar atividades não-agrícolas e mesmo uma agricultura mais moderna
e lucrativa.
Levando em conta a importância do acesso à educação, especialmente para a
população dos territórios rurais em desenvolvimento, foram utilizados seis indicadores
(Tabela 16), a maioria representando os estados como um todo, face à dificuldade de obter
dados específicos para o meio rural e consideradas as facilidades concretas de deslocamento
dos estudantes das áreas rurais para estudar nas cidades próximas. Para captar a
disponibilidade de escolas e docentes, um fator necessário para o acesso da população à
educação, selecionaram-se indicadores relacionados com o ensino fundamental, médio e
superior. A disponibilidade de docentes foi medida por três indicadores: o primeiro, para o
ensino fundamental e médio, outro, para o ensino superior e um terceiro, específico para o
ensino fundamental no meio rural. Calculou-se o número médio de “funções docentes” (que é
um pouco maior que o número de docentes, pois um docente pode lecionar em mais de um
curso, por isso cada atividade é computada como uma função docente) do ensino superior
disponíveis para cada 1000 pessoas de 18 a 24 anos de idade; a disponibilidade de docentes de
ensino fundamental para cada 1.000 habitantes rurais de 5 a 14 anos de idade e, para
caracterizar o tamanho dos estabelecimentos de ensino, calculou-se também o número médio
de funções docentes por estabelecimento de ensino fundamental e médio.
A interiorização do ensino superior é também fundamental para viabilizar o acesso da
população rural e foi captada pelo indicador de cursos de graduação presenciais situados no
interior dos estados. Outros dois indicadores foram associados com a qualidade do ensino
fundamental: a frequência relativa de escolas com mais de 30 alunos e a frequência de turmas
que não fossem multisseriadas, ou seja, a frequência de turmas seriadas no ensino
fundamental.
Todos os indicadores foram encontrados em Kageyama (2008), a partir dos dados do
INEP, referentes ao Censo Escolar (Sinopse Estatística da Educação Básica de 2000) e do
Censo da Educação Superior (Sinopse Estatística de 2001), encontrado no site do Ministério
da Educação (http://www.inep.gov.br).
Tabela 16: Indicadores de acesso à educação, Brasil e Rio Grande do Sul, 2000 e 2001.
UF Docentes por
estabelecimento de
ensino fundamental
e médio
Docentes de ensino
fundamental no
meio
rural/1000pessoas
% de
estabelecimentos
de ensino
fundamental
% de turmas
seriadas no
ensino
fundamental
% dos cursos
de graduação
presenciais
que ficam no
Docentes no
ensino
superior/1000
pessoas de 18
110
de 5 a 14 anos na
área rural
com mais de 30
alunos
interior do
estado
a 24 anos
Brasil 9,80 37,92 68,9 89,2 64,7 9,41
RS 11,85 60,01 60,6 92,4 87,6 14,48
Fonte: Kageyama (2008), a partir do MEC/INEP (2000; 2001) e IBGE (Censo Demográfico 2000).
O Rio Grande do Sul, incluindo também a metade sul do Brasil, exibe os valores
máximos para quase todos os indicadores, refletindo a melhor condição de acesso à educação.
A disponibilidade de docentes em todos os níveis educacionais chega a ser o dobro ou mais
que em algumas unidades da federação do Norte e Nordeste. Nessas duas regiões menor
disponibilidade de docentes, mais turmas multisseriadas e menos cursos superiores fora da
capital.
Conforme já evidenciado, a relação entre educação e subnutrição tem representado um
virtuoso ciclo de alimentação de corpos e mentes, aclamando a educação como um poderoso
mecanismo para a redução da fome e da pobreza. A falta de educação enfraquece a
produtividade, a empregabilidade e ganhos de capacidade, levando diretamente para a pobreza
e a fome. Investimentos em educação têm resultado em mais altos retornos do que
investimentos em capital físico.
Para a FAO (2005) em áreas rurais, onde a vasta maioria dos famintos do mundo
vivem, pesquisas mostram que os agricultores com quatro anos de educação primária são, em
média, quase 9% mais produtivos que os agricultores que não frequentaram a escola. Quando
combinado com a disponibilidade de insumos, tais como fertilizantes, novas sementes ou
máquinas, a produtividade destes é elevada para 13% .
Esta etapa do estudo buscou corroborar os resultados encontrados no capítulo anterior,
visando justificar a menor intensidade da insegurança alimentar na área rural do Rio Grande
do Sul, na perspectiva de que os intitulamentos precisam ser múltiplos, para que as famílias
tenham acesso adequado à alimentação. Dentre os intitulamentos apresentados, destacam-se
aqueles associados à presença da agricultura familiar, ao evidenciarem a forma pela qual as
famílias têm acesso ao próprio alimento.
Ou seja,
a produção para o consumo da família é uma
estratégia de produção que contribui para a condição socioeconômica e a autonomia dos
agricultores, representando caminhos viáveis de c
ombate à insegurança alimentar.
111
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Estudar a insegurança alimentar na área rural do Rio Grande do Sul, desde o início
desta pesquisa, representou um grande desafio. A insatisfação com o modo de mensuração da
insegurança alimentar, através de estimativas a partir da definição de linhas de pobreza ou
indigência, associando o grau de carência alimentar ao vel de rendimentos do domicílio,
intuindo que famílias pobres (baixa renda) vivam em condição de insegurança alimentar, bem
como o discurso empregado por diversos órgãos de fomento e por muitos governos sobre a
possível superação da insegurança alimentar e da pobreza a partir de políticas de renda,
foram, sem dúvida, motivadores desse estudo. Mas também, foi importante incentivo à
realização deste trabalho, estudar o tema através de um novo olhar, a Abordagem das
Capacitações.
Na análise das situações de insegurança alimentar e da pobreza da população
brasileira, a abordagem seniana vem recebendo maior atenção por parte dos pesquisadores do
tema, que vêm buscando congregar, em seus estudos, aspectos qualitativos e quantitativos,
envolvendo outras dimensões da pobreza, além da renda. Neste contexto se insere o presente
trabalho, contribuindo para o entendimento das situações de insegurança alimentar como um
fenômeno multidimensional.
Reconhecendo que a mensuração da insegurança alimentar através de indicadores que
representem apenas uma dimensão, no caso a renda, pode conduzir a discrepâncias na
interpretação deste fenômeno, este estudo analisou, através da abordagem das capacitações, os
intitulamentos que se relacionam com a insegurança alimentar no Rio Grande do Sul, bem
como avaliou os impactos dessa situação para a expansão das capacitações das famílias rurais
112
gaúchas. Entretanto, ainda que esta pesquisa possa contribuir para avançar em relação a uma
noção mais complexa e multidimensional das situações de insegurança alimentar, claramente
muito mais ainda pode ser desenvolvido. A discussão sugerida neste trabalho ainda necessita
da consolidação de um arcabouço metodológico com ferramentas destinadas especificamente
para a execução dessa abordagem.
Nesta etapa do trabalho, de considerações finais, é importante retomar o problema de
pesquisa, que questionou sobre quais relações podem ser identificadas entre as oportunidades
estruturais existentes e as situações de insegurança alimentar no Rio Grande do Sul, bem
como sobre os impactos das condições de insegurança alimentar no desenvolvimento das
capacitações das famílias rurais gaúchas. A análise das possibilidades de escolhas que podem
ou não representar um aumento em termos de capacitações passa, especialmente quando se
trata de países com pouca infraestrutura de atendimento das necessidades de populações mais
carentes, pela percepção das condições em que essas escolhas são oportunizadas à população.
O intitulamento é a condição ética, legal e estrutural que determinada sociedade tem para
aumentar suas possibilidades de escolha. Conforme evidenciado, Sen (2001) sublinha esses
direitos no contexto das capacitações, para participar dos processos de desenvolvimento e
transformar suas próprias condições de vida. Procurando esse tipo de análise, que diz respeito
à estrutura de direitos e deveres legais e de formas de acesso a bens e serviços, foram
incorporados neste trabalho os intitulamentos associados ao Índice de Condições de Moradia
(ICM) e ao Recebimento de Recursos de Programas de Transferência de Renda (TRF).
No Rio Grande do Sul a insegurança alimentar está associada a menores níveis de
renda e piores condições de moradia. Ou seja, a falta de acesso a estes intitulamentos se
relaciona com a dificuldade de acesso à alimentação adequada, gerando a privação de uma
capacitação básica estar adequadamente nutrido. a relação entre insegurança alimentar e
maiores transferências governamentais se estabelece por serem exatamente as famílias que
recebem estas transferências àquelas que se encontram em situação mais vulnerável quanto à
insegurança alimentar.
Na análise de regressão foram incluídas, além das condições de moradia, renda
domiciliar per capita e transferências governamentais dos domicílios, as variáveis idade,
escolaridade, sexo e cor do responsável pela família, com o objetivo de analisar o efeito destas
variáveis para explicar a probabilidade de existir ou não insegurança alimentar entre os
domicílios gaúchos. Resultados das estimações evidenciaram que tanto nas áreas urbanas,
quanto rurais do Rio Grande do Sul, investimentos em escolaridade e condições de moradia
tendem a diminuir a probabilidade de insegurança alimentar. Nos dois setores, também as
113
transferências estão associadas a maior probabilidade de insegurança alimentar. Além disso,
como as famílias, urbanas e rurais, chefiadas por mulheres, têm maior probabilidade de
insegurança alimentar, do que aquelas em que a pessoa de referência é masculina, indica-se
que, para fins de política pública, as transferências governamentais deveriam ser mais
direcionadas a essas famílias, com esta característica de gênero.
Cabe destacar também a importância diferenciada da renda nos dois setores
censitários. No setor rural, as famílias com renda até 1 salário-mínimo apresentam maior
probabilidade de estar em insegurança alimentar. Nos demais estratos (de 1 a 2 salários-
mínimos e de 2 a 3 salários-mínimos), não é possível caracterizar a influência da renda sobre
a insegurança alimentar. Já no setor urbano, os três estratos de renda mostraram-se
significativamente diferentes de zero. Esse fato caracteriza a importância diferenciada da
renda monetária entre os setores censitários, ou seja, ela é uma variável mais relevante nas
áreas urbanas, onde as famílias precisam de renda para adquirir alimentos, enquanto nas áreas
rurais as famílias utilizam outros intitulamentos para produzir seus próprios alimentos e
garantir a segurança alimentar das suas famílias. Neste sentido, é importante destacar o papel
da agricultura familiar, da diversificação da produção agrícola e da destinação de parte desta
produção para o consumo da família, possibilitando amenizar as situações de insegurança
alimentar.
No entanto, os resultados encontrados para o Rio Grande do Sul, diferenciam-se das
análises de Hoffmann e Kageyama (2007) para o Brasil, onde insegurança alimentar atinge
mais fortemente a população rural. É importante reforçar, nesta etapa do estudo, que é um
conjunto de intitulamentos, presentes na área rural do Rio Grande do Sul, que contribuem
para tornar a insegurança alimentar menos intensa, quando comparada à área urbana. A forma
de compreensão da insegurança alimentar no Rio Grande do Sul, neste estudo, é
multidimensional, focando a análise na incorporação de variáveis quantitativas e indo além
delas. Outros intitulamentos, presentes na área rural do Rio Grande do Sul, associados à
presença da agricultura familiar; à riqueza ou à dotação inicial de fatores; à integração
territorial; aos fatores demográficos e ao acesso à educação, em conjunto, também contribuem
para a redução da insegurança alimentar no Rio Grande do Sul, especialmente na área rural,
promovendo uma situação diferenciada quando se compara ao caso brasileiro, e que
possibilitam amenizar as situações de insegurança alimentar na área rural deste estado, tendo
como fim a promoção da segurança alimentar e possibilitando o desenvolvimento de
capacitações dos agentes sociais. A disponibilidade de intitulamentos valorizados socialmente
para a realização das escolhas, gera uma ampliação das liberdades do agente social, que
114
poderá realizar, no caso deste estudo, o funcionamento ‘estar adequadamente nutrido’. Sen
(2000) destaca o papel da condição de agente: do indivíduo como membro do púbico e como
participante de ações econômicas, políticas e sociais.
Considerando também que para a melhor compreensão da insegurança alimentar, um
enfoque multidimensional, além da renda, permite que as ações de enfrentamento sejam mais
eficazes, os resultados encontrados nesta pesquisa estão em consonância com a hipótese do
estudo: a privação da capacitação ‘estar adequadamente nutrido’ é ocasionada pela falta de
acesso aos recursos, seja por intermédio dos mercados, provisão pública, ou outros canais não
relacionados com o mercado. No entanto, pesquisas futuras que busquem analisar, por
exemplo, os efeitos do bolsa-família ou mesmo as desigualdades regionais no Rio Grande do
Sul permitirão elucidar ainda mais as relações que envolvem a capacitação ‘estar
adequadamente nutrido’.
Por fim, ainda que limitações possam ser apontadas a este trabalho, o objetivo foi
aproximar, metodologicamente, da Abordagem das Capacitações, utilizando uma adaptação
do conceito de intitulamentos, apresentado por Amartya Sen. Através das próprias críticas,
dirigidas a este trabalho, novas discussões, sobre a possibilidade de utilização de uma nova
abordagem teórico-conceitual, serão sugeridas. Mas, através deste trabalho, foi possível
evidenciar a necessidade de uma abordagem multidimensional para a análise das situações de
insegurança alimentar e os processos de desenvolvimento rural.
115
REFERÊNCIAS
BAGOLIN, I. P. Da Renda às Capacitações: analisando e avaliando o desenvolvimento
humano. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Economia da Faculdade de
Ciências Econômicas da UFRGS, 2005. 149p.
BASSO, D. Produção Familiar e Desenvolvimento Agrário: algumas reflexões. Textos para
Discussão, 12. Ijuí (RS): UNIJUÍ, Departamento de economia e contabilidade, 1993.
BINSWANGER, H. P. Agricultural and Rural Development: painful lessons, revised version
of the Simon Brandt Address. Trabalho apresentado. In: at the 32nd annual meeting of the
Agricultural Economics Association of South Africa in Pretoria, September 21, 1994, South
Africa, 1994.
BUAINAIM, A. M. Agricultura Familiar, Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável:
questões para debate. Brasília: IICA, 2006.
BRASIL. Projeto de Lei n. 6047/2005. Cria o sistema nacional de segurança alimentar e
nutricional com vistas a assegurar o direito humano à alimentação adequada e outras
providências. Brasília, DF: Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, 2005.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/consea/static/documentos/losanfinal.pdf>.
Acesso em: ago 2006.
BREWER, J. et al. A Blueprint to End Hunger. Waltham, MA: Brandeis University, Heller
School for Social Policy and Management, Center on Hunger and Poverty, Food Security
Institute, 2004. Disponível em: <http://www.centeronhunger.org/pdf/ understanding. pdf>.
Acesso em: 15 ago. 2006.
BRUMER , A. Transformações e Estratégias Produtivas na Produção Familiar na Agricultura
Familiar. Cadernos de Sociologia, Porto Alegre, v. 6, 1994.
CASTRO, J. de. Geografia da Fome. São Paulo: Civilização Brasileira, 2001.
CHAKRAVARTY, S. R. A. New Index of Poverty. Mathematical Social Sciences, v. 6, n. 3,
p. 307-13, 1983.
COMIM, F. V.; BAGOLIN, I. P. Aspectos Qualitativos da Pobreza no Rio Grande do Sul.
Revista Ensaios (FEE), Porto Alegre, v. 23, p. 467-490, 2002.
CORREA, A.M.C.J. Distribuição de Renda e Pobreza na Agricultura Brasileira: 1981-
1990. Piracicaba, SP: Editora Unimep, 1998.
COSTA, A. M. et al. Pensando o Meio Ambiente Enquanto Intitulamento: a abordagem das
capacitações. In: Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica, 6, 2005, Brasília.
Anais...Brasília, 2005. CD-ROM.
DRÈZE, J.; SEN, A. Introduction to The Political Economy of Hunger. In: DRÈZE, J.; SEN,
A.; HUSSAIN, A. The Political Economy of Hunger: selected essays. New York: Oxford
University Press, 2004.
116
ELLIS, F. Rural Livelihoods and Diversity in Developing Countries. Oxford (U.K):
Oxford University Press, 2000.
_________. Household Strategies and Rural Livelihood Diversifications. The Jornal of
Development Studies, v. 35, n.1, Oct.1998.
FAO. Food and Agriculture Organization of United Nations. Declaração de Roma
sobre Segurança Alimentar Mundial e Plano de Aão da Cimeira Mundial da
Alimentação. Disponível em: http://www.fao.org/docrep/003/w3613p/w3613p00.htm.
Acesso em: ago. 2006.
________. The State of Food Insecurity in the World, 2001. Disponível em:
http://www.fao.org/. Acesso em: out. 2006.
_________. Seguridad Alimentaria como Estrategia de Desarrollo Rural. 28ª Conferencia
Regional de la FAO para América Latina y el Caribe. Guatemala, 14p., Abril de 2004.
Disponível em: http://www.fao.org/. Acesso em: out.2006.
FAO. The State of Food Insecurity in the World, 2005. Disponível em:
http://www.fao.org/. Acesso em: out. 2006.
FINCO. M. V. A. Pobreza Rural e Degradação Ambiental: uma refutação da hipótese do
círculo vicioso no estado do Rio Grande do Sul. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento
Rural) - Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural, Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003.
FOSTER, J.; GREER, J.; THORNBECKE, E. A Class of Decomposable Poverty Measures.
Econometrica, v. 52, n. 3, p. 761-5, 1984.
GARCIA JR. A. R. O Sul: O Caminho do Roçado: estratégias de reprodução camponesa e
transformações sociais. Marco Zero. São Paulo; Brasília, DF, Editora Universitária de Brasília;
MCT-CNPq, 1989.
___________. Terra de Trabalho: trabalho familiar de pequenos produtores. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1983.
GASPER, D. The Ethics of Development: from economism to human development.
Edinburg: Edinburg University Press, 2004.
GAZOLLA , M. Agricultura Familiar, Segurança Alimentar e Políticas Públicas: uma análise
a partir da produção para autoconsumo no território do Alto Uruguai/RS.
Dissertação (Mestrado
em Desenvolvimento Rural) - Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004.
117
GRAZIANO DA SILVA et al. O Brasil Rural Precisa de uma Estratégia de Desenvolvimento. In:
Ministério do Desenvolvimento Agrário/Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural
sustentável/Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, 2001.
GRISA, C. A Produção “pro gasto”: um estudo comparativo do autoconsumo no Rio
Grande do Sul. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Rural) - Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento Rural, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto
Alegre, 2007.
GUANZIROLI, C. E.; ROMEIRO, A. R.; DISABBATO, A.; BUAINAIM, A. M.;
BITTENCOURT, G. A. . Agricultura Familiar e Reforma Agrária no Seculo XXI. Rio de
Janeiro: Editora Garamond, 2001.
HAGENAARS, A.; VAN PRAAG, B. A Synthesis of Poverty Line Definitions. Review of
Income and Wealth, v.31, n.2, p. 139-54, 1985.
HALL, B. Understanding Food Security Data and Methodology. Waltham, MA: Brandeis
University, Heller School for Social Policy and Management, Center on Hunger and Poverty,
Food Security Institute, 2004. Disponível em: <http://www. centeronhunger.org/pdf/
understanding.pdf>. Acesso em: set. 2006.
HILL, R. C.; GRIFFITHS, E. W.; JUDGE, G. G. Econometria. São Paulo: Saraiva, 1999.
HOFFMANN, Rodolfo; KAGEYAMA, A. Pobreza, Insegurança Alimentar e Pluriatividade
no Brasil. In: Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural, 45, 2007, Londrina.
Anais... Brasília: SOBER, 2007.
HOFFMANN, R. Distribuição da Renda e da Posse da Terra no Brasil. In: RAMOS, P. et al.
Dimensões do agronegócio brasileiro: políticas, instituições e perspectivas. Brasília: MDA,
2007, NEAD Estudos 15.
________. Pobreza, Insegurança Alimentar e Desnutrição no Brasil. Estudos Avançados,
São Paulo, v.9, n.24, p.159-72, 1995.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios: suplemento segurança alimentar. Rio de Janeiro: IBGE, 2004.
INSTITUTO CIDADANIA. Projeto Fome Zero: uma proposta de política de segurança
alimentar para o Brasil. São Paulo: Instituto Cidadania/Fundação Djalma Guimarães, 2001.
JUNGMANN, R. Erradicar a Miséria: Missão Essencial do Desenvolvimento Rural.In:
Teófilo, E. et al. (org.). Distribuição de Riqueza e Crescimento Econômico. Brasília:
Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, Conselho Nacional de
Desenvolvimento Rural Sustentável, Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2000.
KAGEYAMA, A. Desenvolvimento Rural: conceitos e aplicações ao caso brasileiro. Porto
Alegre: Editora da UFRGS: Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural, 2008.
118
_____________. Desenvolvimento Rural no Rio Grande do Sul. In: Colóquio Agricultura
Familiar e Desenvolvimento Rural, 1, 2005, Porto Alegre. Anais... Porto Alegre:
GEPAD/PGDR/UFRGS, 2005. CD-ROM.
KAGEYAMA, A.; SILVEIRA; J. M. J. Agricultura e Questão Regional. Revista de
Economia e Sociologia Rural, v.35,n.2, abr-jun/1997.
KAKWANI, N. What is Poverty? Brasília: International Poverty Centre, 2006. (UNDP
working paper, n. 22). Disponível em: <www.undp.org/povertycentre> Acesso em: dez.2006.
KAKWANI, N.; SON, H. New Global Poverty Counts. Brasília: International Poverty
Centre, 2006. (UNDP working paper, n. 29). Disponível em: <www.undp.org/povertycentre>
Acesso em: dez.2006.
KUHN, D. D. et al. Pobreza no Rio Grande do Sul: a heterogeneidade revelada pela
abordagem das capacitações nos municípios gaúchos. Teoria e Evidência Econômica, Passo
Fundo, v. 14, p. 113-134, 2006.
LEITE, S. Autoconsumo y Sustentabilidad em la Agricultura Familiar: uma aproximación a la
experiência Brasilenã. In: BELIK, W. Políticas de Seguridad alimentária y nutrición en
América Latina. São Paulo: Hucetec, 2004.
_________. (Org.). Políticas Públicas e Agricultura no Brasil. Porto Alegre: Ed. da
Universidade/UFRGS, 2001.
MADDALA, G. S. Introdução à Econometria. 3.ed. Rio de Janeiro: LTC Editora, 2003.
MADELEY, J. O Comércio da Fome. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.
MALUF, R. S. et al.
Caderno Segurança Alimentar. Disponível em: < http://www.zooide.com/
>, 35p. Acesso em: nov. 2006a.
MALUF,R.S. et al. Cahier Sécurité Alimentaire. Disponível em:
<www.alliance21.org/2003/IMG/pdf/draft_secalim_fr.pdf> Acesso em: nov. 2006b.
MATTOS, E.J. de. Pobreza Rural no Brasil: um enfoque comparativo entre a abordagem
monetária e a abordagem das capacitações. Porto Alegre: Dissertação (Mestrado em
Desenvolvimento Rural) - Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2006.
MAZOYER, M. Ciência e Tecnologia a Serviço do Desenvolvimento Agrícola: impasses e
perspectivas. Rio de Janeiro: AS-PTA, 1991. 18p. (Texto para debate 37).
MAZOYER, M.; ROUDART, L. Historie des Agricultures du Monde: du néolithique à la
crise contemporaine. Paris: Seuil, 1997. 531p.
MEIER, G. M.; RAUCH, J. E. Leading Issues in Economic Development. New York:
Oxford University Press, 2000.
119
MELLOR, J. W.; JOHNSTON, B. F. The World Food Equation: inter-relations among
development, employment and food consumption. Journal of Economic Literature, n.22, p.
531-74, 1984.
MONTEIRO, C. A. A Dimensão da Pobreza, da Fome e da Desnutrição no Brasil. Estudos
Avançados, São Paulo, v. 9, n. 24, p. 195-207, 1995.
NEY, M. G. Educação e Desigualdade de Renda no Meio Rural Brasileiro. Tese
(Doutorado). Campinas (SP), Instituto de Economia, UNICAMP, 2005.
NORDER, L. A. C. A Construção da Segurança Alimentar em Assentamentos Rurais:
questões, contextos, e métodos. Cadernos de Debate, São Paulo, V.6, 1998.
PAES DE BARROS, R.; CARVALHO, M.; FRANCO, S. Pobreza Multidimensional no
Brasil. Rio de Janeiro: IPEA, 2006. (Texto para discussão n. 1227). Disponível em:
www.ipea.gov.br. Acesso em: dez.2006.
PNUD. Relatório de Desenvolvimento Humano, 2001: Fazendo as Novas Tecnologias
Trabalhar para o Desenvolvimento Humano. 2001. Disponível em: <www.pnud.org.br>
Acesso: 30/03/2005.
RAVALLION, M. Poverty Lines in Theory and Practice. Washington: The World Bank,
1998. (LSMS working paper, n. 133).
RAY, D. Development Economics. New Jersey: Princeton University Press, 1998.
ROCHA, S. Do Consumo Observado à Linha de Pobreza. Pesquisa e Planejamento
Econômico, Rio de Janeiro: IPEA, v. 27, n. 2, p. 313-52, 1997.
ROMÃO, M. C. Pobreza: conceito e mensuração. In: Cadernos de Economia, n.13. Brasília:
IPEA, 1993.
RUEL, M. T; GARRET, J. L.; CASSAMO, S. Food and Nutrition Security in
Moçambique: characteristics, determinants and strategic insights. Maputo:
MPF/UEM/IFPRJ, 1998.
SANTOS, I. P.; FERRANTE, V.L.S.B. Da Terra Nua ao Prato Cheio: produção para o
consumo familiar nos assentamentos rurais do Estado de São Paulo. Araraquara, São Paulo:
Fundação ITESP/UNIARA, 2003.
SEN. A. Desigualdade Reexaminada Rio de Janeiro: Record, 2001.
______. Desenvolvimento como Liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
______. Sobre Ética e Economia. São Paulo: Companhia das Letras, 1999a.
______. Pobreza e Fomes: um ensaio sobre direitos e privações. Lisboa: Terramar, 1999b.
120
______. Choice, Welfare and Measurement. London: Harvard University Press, 1997.
______. O Desenvolvimento como Expansão das Capacitações. Revista de Cultura e
Política, São Paulo, n. 28, p.313-33, 1993.
______. Commodities and Capabilities. Great Britain: Oxford United Press, 1985.
SCHNEIDER. S.; WAQUIL P. D. Desenvolvimento Agrário e Desigualdades Regionais no
Rio Grande do Sul: uma caracterização socioeconômica a partir dos municípios. In:
VERDUM, R.; BASSO, L.A.;SUERTEGARAY, D. M.A. (Orgs.). Rio Grande do Sul:
paisagens e territórios em transformação. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2004. p.127-145.
SILVA, José Graziano da. O Novo Rural Brasileiro. 2. ed. Campinas, SP: UNICAMP/IE,
1999. (Coleção Pesquisa).
STREETEN, P. et al. First Things First: meeting basic needs in developing countries.
Oxford (U.K.): Oxford University Press, 1981.
SULLIVAN, A. F.; CHOI, E. Hunger and Food Insecurity in the Fifty States: 1998-2000.
Waltham, MA: Brandeis University, Heller School for Social Policy and Management, Center
on Hunger and Poverty, Food Security Institute, 2002. Disponível em: <http://www.
centeronhunger.org/pdf/ understanding.pdf>. Acesso em: out. 2006.
SVEDBERG, P. Poverty and Undernutrition: theory, measurement and policy. Oxford
(U.K): Oxford University Press, 2000.
_______. Undernutrition Overestimated. Economic Development and Cultural Change, v.
51, n.1, p. 5-36, 2002.
VALENTE, F. L. S. Fome e Desnutrição: determinantes sociais. São Paulo: Cortez, 1986.
VEIGA. J. E. da. Pobreza Rural, Distribuição da Riqueza e Crescimento: a experiência
brasileira. In: Teófilo, E. et al. (org.). Distribuição de Riqueza e Crescimento Econômico.
Brasília: Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, Conselho Nacional de
Desenvolvimento Rural Sustentável, Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2000.
___________.O Desenvolvimento Agrícola: uma visão histórica. São Paulo: Edusp/Hucitec,
1991.
WAQUIL, Paulo Dabdab; MATTOS, Ely José. Pobreza Rural e Urbana no
Rio Grande do Sul: uma análise além da renda. Redes, Santa Cruz do Sul, v. 8, n. 2, p. 105-
122, 2003.
WAQUIL, Paulo Dabdab; MATTOS, Ely José. Distribuição de Renda no Rio
Grande do Sul: um comparativo entre o rural e o urbano. Revista
Ensaios (FEE), Porto Alegre, v. 23, p. 621-644, 2002.
121
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência.
Frequency Table
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Auxílio-Gás no mês de referência
424 4,3 4,3 4,3
9353 95,7 95,7 100,0
9777 100,0 100,0
1
3
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Família no mês de referência
213 2,2 2,2 2,2
9564 97,8 97,8 100,0
9777 100,0 100,0
1
3
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Cartão-Alimentação do Programa Fome-Zero no mês de referência
15 ,2 ,2 ,2
9762 99,8 99,8 100,0
9777 100,0 100,0
2
4
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Alimentação no mês de referência
46 ,5 ,5 ,5
9731 99,5 99,5 100,0
9777 100,0 100,0
1
3
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador idoso ou deficiente do domicílio recebeu dinheiro do
programa social Benefício Assistencial de Prestação Continuada - BPC
- LOAS no mês de referência
68 ,7 ,7 ,7
9709 99,3 99,3 100,0
9777 100,0 100,0
1
3
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
122
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Algum outro morador do domicílio recebeu dinheiro do programa
social Benefício Assistencial de Prestação Continuada - BPC - LOAS no
mês de referência
6 ,1 ,1 ,1
9771 99,9 99,9 100,0
9777 100,0 100,0
1
3
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Escola no mês de referência
450 4,6 4,6 4,6
9327 95,4 95,4 100,0
9777 100,0 100,0
2
4
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil - PETI no mês de
referência
10 ,1 ,1 ,1
9767 99,9 99,9 100,0
9777 100,0 100,0
2
4
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro de algum outro
programa social do governo federal, estadual ou municipal no mês de
referência
20 ,2 ,2 ,2
9755 99,8 99,8 100,0
2 ,0 ,0 100,0
9777 100,0 100,0
2
4
9
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
123
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Frequency Table
Ano de referência
9796 100,0 100,0 100,0
2004,00Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Unidade da Federação
9796 100,0 100,0 100,0
43,0Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Tipo de entrevista
9796 100,0 100,0 100,0
1,0Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Tem água canalizada em pelo menos um cômodo
9609 98,1 98,1 98,1
187 1,9 1,9 100,0
9796 100,0 100,0
1
3
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Existe banheiro ou sanitário no domicílio ou na propriedade
9644 98,4 98,4 98,4
152 1,6 1,6 100,0
9796 100,0 100,0
1
3
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
124
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Forma de iluminação do domicílio
9717 99,2 99,2 99,2
45 ,5 ,5 99,7
34 ,3 ,3 100,0
9796 100,0 100,0
1
3
5
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Possui telefone fixo
5556 56,7 56,7 56,7
4239 43,3 43,3 100,0
1 ,0 ,0 100,0
9796 100,0 100,0
2
4
9
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Possui geladeira
1495 15,3 15,3 15,3
7883 80,5 80,5 95,7
418 4,3 4,3 100,0
9796 100,0 100,0
2
4
6
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Auxílio-Gás no mês de referência
424 4,3 4,3 4,3
9353 95,5 95,7 100,0
9777 99,8 100,0
19 ,2
9796 100,0
1
3
Total
Valid
SystemMissing
Total
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
125
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Família no mês de referência
213 2,2 2,2 2,2
9564 97,6 97,8 100,0
9777 99,8 100,0
19 ,2
9796 100,0
1
3
Total
Valid
SystemMissing
Total
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Cartão-Alimentação do Programa Fome-Zero no mês de referência
15 ,2 ,2 ,2
9762 99,7 99,8 100,0
9777 99,8 100,0
19 ,2
9796 100,0
2
4
Total
Valid
SystemMissing
Total
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Alimentação no mês de referência
46 ,5 ,5 ,5
9731 99,3 99,5 100,0
9777 99,8 100,0
19 ,2
9796 100,0
1
3
Total
Valid
SystemMissing
Total
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
126
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Algum morador idoso ou deficiente do domicílio recebeu dinheiro do
programa social Benefício Assistencial de Prestação Continuada - BPC -
LOAS no mês de referência
68 ,7 ,7 ,7
9709 99,1 99,3 100,0
9777 99,8 100,0
19 ,2
9796 100,0
1
3
Total
Valid
SystemMissing
Total
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum outro morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Benefício Assistencial de Prestação Continuada - BPC - LOAS no mês de
referência
6 ,1 ,1 ,1
9771 99,7 99,9 100,0
9777 99,8 100,0
19 ,2
9796 100,0
1
3
Total
Valid
SystemMissing
Total
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Escola no mês de referência
450 4,6 4,6 4,6
9327 95,2 95,4 100,0
9777 99,8 100,0
19 ,2
9796 100,0
2
4
Total
Valid
SystemMissing
Total
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
127
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil - PETI no mês de referência
10 ,1 ,1 ,1
9767 99,7 99,9 100,0
9777 99,8 100,0
19 ,2
9796 100,0
2
4
Total
Valid
SystemMissing
Total
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro de algum outro programa
social do governo federal, estadual ou municipal no mês de referência
20 ,2 ,2 ,2
9755 99,6 99,8 100,0
2 ,0 ,0 100,0
9777 99,8 100,0
19 ,2
9796 100,0
2
4
9
Total
Valid
SystemMissing
Total
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Código de situação censitária
8265 84,4 84,4 84,4
237 2,4 2,4 86,8
49 ,5 ,5 87,3
46 ,5 ,5 87,8
10 ,1 ,1 87,9
1189 12,1 12,1 100,0
9796 100,0 100,0
1
2
3
5
7
8
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
128
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Peso do domicílio
2435 24,9 24,9 24,9
3715 37,9 37,9 62,8
3259 33,3 33,3 96,0
387 4,0 4,0 100,0
9796 100,0 100,0
209,00
210,00
582,00
583,00
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Faixa do rendimento domiciliar per capita I (exclusive pensionistas,
empregados domésticos, parentes dos empregados domésticos)
80 ,8 ,8 ,8
295 3,0 3,0 3,8
870 8,9 8,9 12,7
2079 21,2 21,2 33,9
2923 29,8 29,8 63,8
1343 13,7 13,7 77,5
1023 10,4 10,4 87,9
1006 10,3 10,3 98,2
177 1,8 1,8 100,0
9796 100,0 100,0
,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
6,0
7,0
99,0
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Domicílio com segurança alimentar
3523 36,0 36,0 36,0
954 9,7 9,7 45,7
455 4,6 4,6 50,3
223 2,3 2,3 52,6
3724 38,0 38,0 90,6
437 4,5 4,5 95,1
290 3,0 3,0 98,1
190 1,9 1,9 100,0
9796 100,0 100,0
1,0
2,0
3,0
4,0
6,0
7,0
8,0
9,0
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
129
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Frequencies
Statistics
ICM
9796
0
Valid
Missing
N
ICM
23 ,2 ,2 ,2
49 ,5 ,5 ,7
109 1,1 1,1 1,8
338 3,5 3,5 5,3
3762 38,4 38,4 43,7
5515 56,3 56,3 100,0
9796 100,0 100,0
,00
1,00
2,00
3,00
4,00
5,00
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Frequencies
Statistics
9775 9775 9775 9775 9775 9775 9775 9775 9775
0 0 0 0 0 0 0 0 0
Valid
Missing
N
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Auxílio-Gás
no mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Bolsa-Família
no mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Cartão-
Alimentação
do Programa
Fome-Zero no
mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Bolsa-
Alimentação
no mês de
referência
Algum
morador
idoso ou
deficiente do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Benefício
Assistencial
de Prestação
Continuada -
BPC - LOAS
no mês de
referência
Algum outro
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Benefício
Assistencial
de Prestação
Continuada -
BPC - LOAS
no mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Bolsa-Escola
no mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Programa de
Erradicação
do Trabalho
Infantil - PETI
no mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro de
algum outro
programa
social do
governo
federal,
estadual ou
municipal
no mês de
referência
(continua)
130
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Frequency Table
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Auxílio-Gás no mês de referência
9351 95,7 95,7 95,7
424 4,3 4,3 100,0
9775 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Família no mês de referência
9562 97,8 97,8 97,8
213 2,2 2,2 100,0
9775 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Cartão-Alimentação do Programa Fome-Zero no mês de referência
9760 99,8 99,8 99,8
15 ,2 ,2 100,0
9775 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Alimentação no mês de referência
9729 99,5 99,5 99,5
46 ,5 ,5 100,0
9775 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
131
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Algum morador idoso ou deficiente do domicílio recebeu dinheiro do
programa social Benefício Assistencial de Prestação Continuada - BPC
- LOAS no mês de referência
9707 99,3 99,3 99,3
68 ,7 ,7 100,0
9775 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum outro morador do domicílio recebeu dinheiro do programa
social Benefício Assistencial de Prestação Continuada - BPC - LOAS no
mês de referência
9769 99,9 99,9 99,9
6 ,1 ,1 100,0
9775 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Escola no mês de referência
9325 95,4 95,4 95,4
450 4,6 4,6 100,0
9775 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil - PETI no mês de
referência
9765 99,9 99,9 99,9
10 ,1 ,1 100,0
9775 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
132
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro de algum outro
programa social do governo federal, estadual ou municipal no mês de
referência
9755 99,8 99,8 99,8
20 ,2 ,2 100,0
9775 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Frequencies
Statistics
SUMPRG
9775
0
Valid
Missing
N
SUMPRG
8886 90,9 90,9 90,9
601 6,1 6,1 97,1
230 2,4 2,4 99,4
45 ,5 ,5 99,9
9 ,1 ,1 100,0
4 ,0 ,0 100,0
9775 100,0 100,0
,00
1,00
2,00
3,00
4,00
5,00
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
133
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Frequencies
Statistics
SUMPRG
9775
0
Valid
Missing
N
SUMPRG
8886 90,9 90,9 90,9
889 9,1 9,1 100,0
9775 100,0 100,0
,00
1,00
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Frequencies
Statistics
Faixa do rendimento domiciliar per capita I
(exclusive pensionistas, empregados domésticos,
parentes dos empregados domésticos)
9598
0
Valid
Missing
N
Faixa do rendimento domiciliar per capita I (exclusive pensionistas,
empregados domésticos, parentes dos empregados domésticos)
79 ,8 ,8 ,8
291 3,0 3,0 3,9
865 9,0 9,0 12,9
2076 21,6 21,6 34,5
2918 30,4 30,4 64,9
1343 14,0 14,0 78,9
1022 10,6 10,6 89,5
1004 10,5 10,5 100,0
9598 100,0 100,0
,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
6,0
7,0
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
134
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Frequencies
Statistics
Código de situação censitária
9598
0
Valid
Missing
N
Código de situação censitária
8371 87,2 87,2 87,2
1227 12,8 12,8 100,0
9598 100,0 100,0
1
3
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
135
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Frequencies
Statistics
Faixa do rendimento domiciliar per capita I
(exclusive pensionistas, empregados domésticos,
parentes dos empregados domésticos)
9598
0
Valid
Missing
N
Faixa do rendimento domiciliar per capita I (exclusive pensionistas,
empregados domésticos, parentes dos empregados domésticos)
3311 34,5 34,5 34,5
2918 30,4 30,4 64,9
2365 24,6 24,6 89,5
1004 10,5 10,5 100,0
9598 100,0 100,0
1,0
2,0
3,0
4,0
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Frequencies
Statistics
Domicílio com segurança alimentar
9598
0
Valid
Missing
N
Domicílio com segurança alimentar
3448 35,9 35,9 35,9
939 9,8 9,8 45,7
445 4,6 4,6 50,3
218 2,3 2,3 52,6
3638 37,9 37,9 90,5
435 4,5 4,5 95,1
288 3,0 3,0 98,1
187 1,9 1,9 100,0
9598 100,0 100,0
1,0
2,0
3,0
4,0
6,0
7,0
8,0
9,0
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
136
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados através
do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de Contingência (continuação)
Frequencies
Statistics
Domicílio com segurança alimentar
9598
0
Valid
Missing
N
Domicílio com segurança alimentar
7086 73,8 73,8 73,8
1374 14,3 14,3 88,1
733 7,6 7,6 95,8
405 4,2 4,2 100,0
9598 100,0 100,0
1,0
2,0
3,0
4,0
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Frequencies
Statistics
9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598 9598
0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Valid
Missing
N
Tem água
canalizada
em pelo
menos um
cômodo
Existe
banheiro ou
sanitário no
domicílio ou
na
propriedade
Forma de
iluminação
do domicílio
Possui
telefone fixo
Possui
geladeira
ICM
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Auxílio-Gás
no mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Bolsa-Família
no mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Cartão-
Alimentação
do Programa
Fome-Zero no
mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Bolsa-
Alimentação
no mês de
referência
Algum
morador
idoso ou
deficiente do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Benefício
Assistencial
de Prestação
Continuada -
BPC - LOAS
no mês de
referência
Algum outro
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Benefício
Assistencial
de Prestação
Continuada -
BPC - LOAS
no mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Bolsa-Escola
no mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro do
programa
social
Programa de
Erradicação
do Trabalho
Infantil - PETI
no mês de
referência
Algum
morador do
domicílio
recebeu
dinheiro de
algum outro
programa
social do
governo
federal,
estadual ou
municipal
no mês de
referência
Código de
situação
censitária
Peso do
domicílio
Rendimento
domiciliar per
capita
(exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos,
parentes dos
empregados
domésticos)
Faixa do
rendimento
domiciliar per
capita I
(exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos,
parentes dos
empregados
domésticos)
Domicílio
com
segurança
alimentar TRF
Frequency Table
Tem água canalizada em pelo menos um cômodo
186 1,9 1,9 1,9
9412 98,1 98,1 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
137
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Existe banheiro ou sanitário no domicílio ou na propriedade
150 1,6 1,6 1,6
9448 98,4 98,4 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Forma de iluminação do domicílio
79 ,8 ,8 ,8
9519 99,2 99,2 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Possui telefone fixo
4185 43,6 43,6 43,6
5413 56,4 56,4 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Possui geladeira
414 4,3 4,3 4,3
9184 95,7 95,7 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
138
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
ICM
23 ,2 ,2 ,2
49 ,5 ,5 ,8
108 1,1 1,1 1,9
335 3,5 3,5 5,4
3709 38,6 38,6 44,0
5374 56,0 56,0 100,0
9598 100,0 100,0
,00
1,00
2,00
3,00
4,00
5,00
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Auxílio-Gás no mês de referência
9180 95,6 95,6 95,6
418 4,4 4,4 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Família no mês de referência
9387 97,8 97,8 97,8
211 2,2 2,2 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Cartão-Alimentação do Programa Fome-Zero no mês de referência
9584 99,9 99,9 99,9
14 ,1 ,1 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
139
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Alimentação no mês de referência
9552 99,5 99,5 99,5
46 ,5 ,5 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador idoso ou deficiente do domicílio recebeu dinheiro do
programa social Benefício Assistencial de Prestação Continuada - BPC
- LOAS no mês de referência
9532 99,3 99,3 99,3
66 ,7 ,7 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum outro morador do domicílio recebeu dinheiro do programa
social Benefício Assistencial de Prestação Continuada - BPC - LOAS no
mês de referência
9592 99,9 99,9 99,9
6 ,1 ,1 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Bolsa-Escola no mês de referência
9153 95,4 95,4 95,4
445 4,6 4,6 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
140
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro do programa social
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil - PETI no mês de
referência
9588 99,9 99,9 99,9
10 ,1 ,1 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Algum morador do domicílio recebeu dinheiro de algum outro
programa social do governo federal, estadual ou municipal no mês de
referência
9578 99,8 99,8 99,8
20 ,2 ,2 100,0
9598 100,0 100,0
0
1
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Peso do domicílio
2362 24,6 24,6 24,6
3635 37,9 37,9 62,5
3222 33,6 33,6 96,1
379 3,9 3,9 100,0
9598 100,0 100,0
209,00
210,00
582,00
583,00
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Faixa do rendimento domiciliar per capita I (exclusive pensionistas,
empregados domésticos, parentes dos empregados domésticos)
3311 34,5 34,5 34,5
2918 30,4 30,4 64,9
2365 24,6 24,6 89,5
1004 10,5 10,5 100,0
9598 100,0 100,0
1,0
2,0
3,0
4,0
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
(continua)
141
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Domicílio com segurança alimentar
7086 73,8 73,8 73,8
1374 14,3 14,3 88,1
733 7,6 7,6 95,8
405 4,2 4,2 100,0
9598 100,0 100,0
1,0
2,0
3,0
4,0
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
TRF
8719 90,8 90,8 90,8
879 9,2 9,2 100,0
9598 100,0 100,0
,00
1,00
Total
Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Means
Case Processing Summary
9598 100,0% 0 ,0% 9598 100,0%
9598 100,0% 0 ,0% 9598 100,0%
9598 100,0% 0 ,0% 9598 100,0%
ICM * Código de
situação censitária
TRF * Código de
situação censitária
Rendimento domiciliar
per capita (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos) * Código
de situação censitária
N Percent N Percent N Percent
Included Excluded Total
Cases
(continua)
142
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Report
4,5646 ,0775 695,6926
8371 8371 8371
,62560 ,26745 1034,34302
88,9% 73,8% 93,0%
3,8843 ,1874 359,7042
1227 1227 1227
,89842 ,39043 465,35511
11,1% 26,2% 7,0%
4,4776 ,0916 652,7402
9598 9598 9598
,70431 ,28845 986,57643
100,0% 100,0% 100,0%
Mean
N
Std. Deviation
% of Total Sum
Mean
N
Std. Deviation
% of Total Sum
Mean
N
Std. Deviation
% of Total Sum
Código de
situação censitária
1
3
Total
ICM TRF
Rendimento
domiciliar per
capita
(exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos,
parentes dos
empregados
domésticos)
Crosstabs
Case Processing Summary
9598 100,0% 0 ,0% 9598 100,0%
Código de situação
censitária * Domicílio
com segurança alimentar
N Percent N Percent N Percent
Valid Missing Total
Cases
(continua)
143
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Código de situação censitária * Domicílio com segurança alimentar Crosstabulation
6096 1259 653 363 8371
72,8% 15,0% 7,8% 4,3% 100,0%
86,0% 91,6% 89,1% 89,6% 87,2%
63,5% 13,1% 6,8% 3,8% 87,2%
990 115 80 42 1227
80,7% 9,4% 6,5% 3,4% 100,0%
14,0% 8,4% 10,9% 10,4% 12,8%
10,3% 1,2% ,8% ,4% 12,8%
7086 1374 733 405 9598
73,8% 14,3% 7,6% 4,2% 100,0%
100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
73,8% 14,3% 7,6% 4,2% 100,0%
Count
% within Código de
situação censitária
% within Domicílio com
segurança alimentar
% of Total
Count
% within Código de
situação censitária
% within Domicílio com
segurança alimentar
% of Total
Count
% within Código de
situação censitária
% within Domicílio com
segurança alimentar
% of Total
1
3
Código de situação
censitária
Total
1,0 2,0 3,0 4,0
Domicílio com segurança alimentar
Total
Chi-Square Tests
37,386
a
3 ,000
40,278 3 ,000
19,811 1 ,000
9598
Pearson Chi-Square
Likelihood Ratio
Linear-by-Linear
Association
N of Valid Cases
Value df
Asymp. Sig.
(2-sided)
0 cells (,0%) have expected count less than 5. The
minimum expected count is 51,77.
a.
Symmetric Measures
,062 ,000
9598
Contingency CoefficientNominal by Nominal
N of Valid Cases
Value Approx. Sig.
Not assuming the null hypothesis.
a.
Using the asymptotic standard error assuming the null hypothesis.
b.
(continua)
144
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Crosstabs
Case Processing Summary
8371 100,0% 0 ,0% 8371 100,0%
Domicílio com
segurança alimentar *
Faixa do rendimento
domiciliar per capita I
(exclusive pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
N Percent N Percent N Percent
Valid Missing Total
Cases
(continua)
145
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Domicílio com segurança alimentar * Faixa do rendimento domiciliar per capita I (exclusive pensionistas,
empregados domésticos, parentes dos empregados domésticos) Crosstabulation
1280 1926 1941 949 6096
21,0% 31,6% 31,8% 15,6% 100,0%
47,7% 76,1% 89,0% 97,3% 72,8%
15,3% 23,0% 23,2% 11,3% 72,8%
671 399 168 21 1259
53,3% 31,7% 13,3% 1,7% 100,0%
25,0% 15,8% 7,7% 2,2% 15,0%
8,0% 4,8% 2,0% ,3% 15,0%
458 139 52 4 653
70,1% 21,3% 8,0% ,6% 100,0%
17,1% 5,5% 2,4% ,4% 7,8%
5,5% 1,7% ,6% ,0% 7,8%
274 68 20 1 363
75,5% 18,7% 5,5% ,3% 100,0%
10,2% 2,7% ,9% ,1% 4,3%
3,3% ,8% ,2% ,0% 4,3%
2683 2532 2181 975 8371
32,1% 30,2% 26,1% 11,6% 100,0%
100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
32,1% 30,2% 26,1% 11,6% 100,0%
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within Faixa do
rendimento domiciliar
per capita I (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within Faixa do
rendimento domiciliar
per capita I (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within Faixa do
rendimento domiciliar
per capita I (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within Faixa do
rendimento domiciliar
per capita I (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within Faixa do
rendimento domiciliar
per capita I (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
% of Total
1,0
2,0
3,0
4,0
Domicílio com
segurança
alimentar
Total
1,0 2,0 3,0 4,0
Faixa do rendimento domiciliar per capita I
(exclusive pensionistas, empregados
domésticos, parentes dos empregados
domésticos)
Total
(continua)
146
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Chi-Square Tests
1550,522
a
9 ,000
1635,018 9 ,000
1240,916 1 ,000
8371
Pearson Chi-Square
Likelihood Ratio
Linear-by-Linear
Association
N of Valid Cases
Value df
Asymp. Sig.
(2-sided)
0 cells (,0%) have expected count less than 5. The
minimum expected count is 42,28.
a.
Symmetric Measures
,395 ,000
8371
Contingency CoefficientNominal by Nominal
N of Valid Cases
Value Approx. Sig.
Not assuming the null hypothesis.
a.
Using the asymptotic standard error assuming the null hypothesis.
b.
Código de situação censitária
8371 100,0 100,0 100,0
1Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Crosstabs
Case Processing Summary
1227 100,0% 0 ,0% 1227 100,0%
Domicílio com
segurança alimentar *
Faixa do rendimento
domiciliar per capita I
(exclusive pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
N Percent N Percent N Percent
Valid Missing Total
Cases
(continua)
147
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Domicílio com segurança alimentar * Faixa do rendimento domiciliar per capita I (exclusive pensionistas,
empregados domésticos, parentes dos empregados domésticos) Crosstabulation
434 351 176 29 990
43,8% 35,5% 17,8% 2,9% 100,0%
69,1% 90,9% 95,7% 100,0% 80,7%
35,4% 28,6% 14,3% 2,4% 80,7%
92 16 7 0 115
80,0% 13,9% 6,1% ,0% 100,0%
14,6% 4,1% 3,8% ,0% 9,4%
7,5% 1,3% ,6% ,0% 9,4%
68 11 1 0 80
85,0% 13,8% 1,3% ,0% 100,0%
10,8% 2,8% ,5% ,0% 6,5%
5,5% ,9% ,1% ,0% 6,5%
34 8 0 0 42
81,0% 19,0% ,0% ,0% 100,0%
5,4% 2,1% ,0% ,0% 3,4%
2,8% ,7% ,0% ,0% 3,4%
628 386 184 29 1227
51,2% 31,5% 15,0% 2,4% 100,0%
100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
51,2% 31,5% 15,0% 2,4% 100,0%
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within Faixa do
rendimento domiciliar
per capita I (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within Faixa do
rendimento domiciliar
per capita I (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within Faixa do
rendimento domiciliar
per capita I (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within Faixa do
rendimento domiciliar
per capita I (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within Faixa do
rendimento domiciliar
per capita I (exclusive
pensionistas,
empregados
domésticos, parentes
dos empregados
domésticos)
% of Total
1,0
2,0
3,0
4,0
Domicílio com
segurança
alimentar
Total
1,0 2,0 3,0 4,0
Faixa do rendimento domiciliar per capita I
(exclusive pensionistas, empregados
domésticos, parentes dos empregados
domésticos)
Total
(continua)
148
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Chi-Square Tests
115,066
a
9 ,000
134,270 9 ,000
84,625 1 ,000
1227
Pearson Chi-Square
Likelihood Ratio
Linear-by-Linear
Association
N of Valid Cases
Value df
Asymp. Sig.
(2-sided)
3 cells (18,8%) have expected count less than 5. The
minimum expected count is ,99.
a.
Symmetric Measures
,293 ,000
1227
Contingency CoefficientNominal by Nominal
N of Valid Cases
Value Approx. Sig.
Not assuming the null hypothesis.
a.
Using the asymptotic standard error assuming the null hypothesis.
b.
Código de situação censitária
1227 100,0 100,0 100,0
3Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Crosstabs
Case Processing Summary
8371 100,0% 0 ,0% 8371 100,0%
Domicílio com
segurança
alimentar * ICM
N Percent N Percent N Percent
Valid Missing Total
Cases
(continua)
149
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Domicílio com segurança alimentar * ICM Crosstabulation
3 6 18 110 1767 4192 6096
,0% ,1% ,3% 1,8% 29,0% 68,8% 100,0%
42,9% 27,3% 31,0% 47,2% 61,3% 81,1% 72,8%
,0% ,1% ,2% 1,3% 21,1% 50,1% 72,8%
0 0 12 40 565 642 1259
,0% ,0% 1,0% 3,2% 44,9% 51,0% 100,0%
,0% ,0% 20,7% 17,2% 19,6% 12,4% 15,0%
,0% ,0% ,1% ,5% 6,7% 7,7% 15,0%
0 6 17 38 357 235 653
,0% ,9% 2,6% 5,8% 54,7% 36,0% 100,0%
,0% 27,3% 29,3% 16,3% 12,4% 4,5% 7,8%
,0% ,1% ,2% ,5% 4,3% 2,8% 7,8%
4 10 11 45 193 100 363
1,1% 2,8% 3,0% 12,4% 53,2% 27,5% 100,0%
57,1% 45,5% 19,0% 19,3% 6,7% 1,9% 4,3%
,0% ,1% ,1% ,5% 2,3% 1,2% 4,3%
7 22 58 233 2882 5169 8371
,1% ,3% ,7% 2,8% 34,4% 61,7% 100,0%
100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
,1% ,3% ,7% 2,8% 34,4% 61,7% 100,0%
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within ICM
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within ICM
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within ICM
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within ICM
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within ICM
% of Total
1,0
2,0
3,0
4,0
Domicílio com
segurança
alimentar
Total
,00 1,00 2,00 3,00 4,00 5,00
ICM
Total
Chi-Square Tests
813,774
a
15 ,000
658,702 15 ,000
701,841 1 ,000
8371
Pearson Chi-Square
Likelihood Ratio
Linear-by-Linear
Association
N of Valid Cases
Value df
Asymp. Sig.
(2-sided)
8 cells (33,3%) have expected count less than 5. The
minimum expected count is ,30.
a.
(continua)
150
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Symmetric Measures
,298 ,000
8371
Contingency CoefficientNominal by Nominal
N of Valid Cases
Value Approx. Sig.
Not assuming the null hypothesis.
a.
Using the asymptotic standard error assuming the null hypothesis.
b.
Código de situação censitária
8371 100,0 100,0 100,0
1Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Crosstabs
Case Processing Summary
1227 100,0% 0 ,0% 1227 100,0%
Domicílio com
segurança
alimentar * ICM
N Percent N Percent N Percent
Valid Missing Total
Cases
(continua)
151
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Domicílio com segurança alimentar * ICM Crosstabulation
9 15 19 68 696 183 990
,9% 1,5% 1,9% 6,9% 70,3% 18,5% 100,0%
56,3% 55,6% 38,0% 66,7% 84,2% 89,3% 80,7%
,7% 1,2% 1,5% 5,5% 56,7% 14,9% 80,7%
2 4 12 16 69 12 115
1,7% 3,5% 10,4% 13,9% 60,0% 10,4% 100,0%
12,5% 14,8% 24,0% 15,7% 8,3% 5,9% 9,4%
,2% ,3% 1,0% 1,3% 5,6% 1,0% 9,4%
2 7 8 12 45 6 80
2,5% 8,8% 10,0% 15,0% 56,3% 7,5% 100,0%
12,5% 25,9% 16,0% 11,8% 5,4% 2,9% 6,5%
,2% ,6% ,7% 1,0% 3,7% ,5% 6,5%
3 1 11 6 17 4 42
7,1% 2,4% 26,2% 14,3% 40,5% 9,5% 100,0%
18,8% 3,7% 22,0% 5,9% 2,1% 2,0% 3,4%
,2% ,1% ,9% ,5% 1,4% ,3% 3,4%
16 27 50 102 827 205 1227
1,3% 2,2% 4,1% 8,3% 67,4% 16,7% 100,0%
100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
1,3% 2,2% 4,1% 8,3% 67,4% 16,7% 100,0%
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within ICM
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within ICM
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within ICM
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within ICM
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within ICM
% of Total
1,0
2,0
3,0
4,0
Domicílio com
segurança
alimentar
Total
,00 1,00 2,00 3,00 4,00 5,00
ICM
Total
Chi-Square Tests
142,814
a
15 ,000
100,486 15 ,000
88,405 1 ,000
1227
Pearson Chi-Square
Likelihood Ratio
Linear-by-Linear
Association
N of Valid Cases
Value df
Asymp. Sig.
(2-sided)
10 cells (41,7%) have expected count less than 5. The
minimum expected count is ,55.
a.
Symmetric Measures
,323 ,000
1227
Contingency CoefficientNominal by Nominal
N of Valid Cases
Value Approx. Sig.
Not assuming the null hypothesis.
a.
Using the asymptotic standard error assuming the null hypothesis.
b.
(continua)
152
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Código de situação censitária
1227 100,0 100,0 100,0
3Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Crosstabs
Case Processing Summary
8371 100,0% 0 ,0% 8371 100,0%
Domicílio com
segurança
alimentar * TRF
N Percent N Percent N Percent
Valid Missing Total
Cases
(continua)
153
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Domicílio com segurança alimentar * TRF Crosstabulation
5855 241 6096
96,0% 4,0% 100,0%
75,8% 37,1% 72,8%
69,9% 2,9% 72,8%
1080 179 1259
85,8% 14,2% 100,0%
14,0% 27,6% 15,0%
12,9% 2,1% 15,0%
521 132 653
79,8% 20,2% 100,0%
6,7% 20,3% 7,8%
6,2% 1,6% 7,8%
266 97 363
73,3% 26,7% 100,0%
3,4% 14,9% 4,3%
3,2% 1,2% 4,3%
7722 649 8371
92,2% 7,8% 100,0%
100,0% 100,0% 100,0%
92,2% 7,8% 100,0%
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within TRF
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within TRF
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within TRF
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within TRF
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within TRF
% of Total
1,0
2,0
3,0
4,0
Domicílio com
segurança
alimentar
Total
,00 1,00
TRF
Total
Chi-Square Tests
521,034
a
3 ,000
427,544 3 ,000
512,356 1 ,000
8371
Pearson Chi-Square
Likelihood Ratio
Linear-by-Linear
Association
N of Valid Cases
Value df
Asymp. Sig.
(2-sided)
0 cells (,0%) have expected count less than 5. The
minimum expected count is 28,14.
a.
(continua)
154
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Symmetric Measures
,242 ,000
8371
Contingency CoefficientNominal by Nominal
N of Valid Cases
Value Approx. Sig.
Not assuming the null hypothesis.
a.
Using the asymptotic standard error assuming the null hypothesis.
b.
Código de situação censitária
8371 100,0 100,0 100,0
1Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
Crosstabs
Case Processing Summary
1227 100,0% 0 ,0% 1227 100,0%
Domicílio com
segurança
alimentar * TRF
N Percent N Percent N Percent
Valid Missing Total
Cases
(continua)
155
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Domicílio com segurança alimentar * TRF Crosstabulation
842 148 990
85,1% 14,9% 100,0%
84,5% 64,3% 80,7%
68,6% 12,1% 80,7%
79 36 115
68,7% 31,3% 100,0%
7,9% 15,7% 9,4%
6,4% 2,9% 9,4%
48 32 80
60,0% 40,0% 100,0%
4,8% 13,9% 6,5%
3,9% 2,6% 6,5%
28 14 42
66,7% 33,3% 100,0%
2,8% 6,1% 3,4%
2,3% 1,1% 3,4%
997 230 1227
81,3% 18,7% 100,0%
100,0% 100,0% 100,0%
81,3% 18,7% 100,0%
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within TRF
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within TRF
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within TRF
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within TRF
% of Total
Count
% within Domicílio com
segurança alimentar
% within TRF
% of Total
1,0
2,0
3,0
4,0
Domicílio com
segurança
alimentar
Total
,00 1,00
TRF
Total
Chi-Square Tests
50,871
a
3 ,000
44,737 3 ,000
42,968 1 ,000
1227
Pearson Chi-Square
Likelihood Ratio
Linear-by-Linear
Association
N of Valid Cases
Value df
Asymp. Sig.
(2-sided)
0 cells (,0%) have expected count less than 5. The
minimum expected count is 7,87.
a.
(continua)
156
ANEXO A: Procedimentos estatísticos utilizados para a análise dos resultados
através do Teste Qui-quadrado de Associação e do Coeficiente de
Contingência (continuação)
Symmetric Measures
,200 ,000
1227
Contingency CoefficientNominal by Nominal
N of Valid Cases
Value Approx. Sig.
Not assuming the null hypothesis.
a.
Using the asymptotic standard error assuming the null hypothesis.
b.
Código de situação censitária
1227 100,0 100,0 100,0
3Valid
Frequency Percent Valid Percent
Cumulative
Percent
157
ANEXO B: Resultados completos das estimações - Modelo Probit: rural do Rio Grande do
Sul
Data Information
N of Cases
Valid 1208
Missing 0
Rejected
Number of Responses >
Number of Subjects
0
Control Group 5699
Convergence Information
Number of
Iterations
Optimal Solution
Found
PROBIT 21
Yes
Parameter Estimates
95% Confidence Interval
Parameter Estimate Std. Error Z Sig.
Lower Bound Upper Bound
Idade do morador -,010
,004 -2,779
,005 -,017
-,003
Anos de estudo (todas as
pessoas)
-,069
,019 -3,585
,000 -,107
-,031
ICM -,273
,056 -4,837
,000 -,383
-,162
TRF ,233 ,110 2,108
,035 ,016 ,449
sexo em 0 e 1 ,485 ,131 3,709
,000 ,229 ,742
core em 0 e 1 -,107
,237 -,452
,651 -,572
,357
Renda ate 1 SM ,884 ,286 3,089
,002 ,323 1,445
Renda de 1 ate 2 SM ,242 ,291 ,831 ,406 -,329
,813
Renda de 2 ate 3 SM -,103
,350 -,293
,769 -,788
,583
PROBIT
a
Intercept ,274 ,427 ,641 ,521 -,153
,701
a. PROBIT model: PROBIT(p) = Intercept + BX
(continua)
158
ANEXO B: Resultados completos das estimações - Modelo Probit: rural do Rio Grande do
Sul (continuação)
Covariances and Correlations of Parameter Estimates
Idade do
morador
Anos de estudo
(todas as
pessoas) ICM TRF
sexo
em 0
e 1
core
em 0
e 1
Renda
ate 1
SM
Renda de
1 ate 2
SM
Renda de
2 ate 3
SM
Idade do
morador
,000 ,440 -,105
,042
-,233
,113 ,097 ,046 ,029
Anos de
estudo (todas
as pessoas)
,000 ,000 -,190
,020
-,044
,039 ,107 ,070 ,033
ICM ,000 ,000 ,003 ,009
-,046
,106 ,085 ,043 ,042
TRF ,000 ,000 ,000 ,012
,056 -,049
-,108
,003 ,013
sexo em 0 e 1
,000 ,000 ,000 ,001
,017 -,108
,012 -,030
-,023
core em 0 e 1
,000 ,000 ,001
-
,001
-,003
,056 -,009
-,002
,013
Renda ate 1
SM
,000 ,001 ,001
-
,003
,000 ,000 ,082 ,919 ,762
Renda de 1
ate 2 SM
,000 ,000 ,001 ,000
-,001
,000 ,077 ,085 ,746
PROBIT
Renda de 2
ate 3 SM
,000 ,000 ,001 ,001
-,001
,001 ,076 ,076 ,122
Covariances (below) and
Correlations (above).
Chi-Square Tests
Chi-Square df
a
Sig.
PROBIT Pearson Goodness-of-Fit
Test
1157,097
1198
,797
a. Statistics based on individual cases differ from statistics based on aggregated
cases.
(continua)
159
ANEXO B: Resultados completos das estimações - Modelo Probit: rural do Rio Grande
do Sul (continuação)
Data Information
N of Cases
Valid 1208
Missing 0
Rejected
Number of Responses >
Number of Subjects
0
Control Group
2027
Convergence Information
Number of
Iterations
Optimal Solution
Found
PROBIT 16
Yes
Parameter Estimates
95% Confidence Interval
Parameter Estimate Std. Error Z Sig.
Lower Bound Upper Bound
Idade do morador -,014
,004 -4,125
,000 -,021
-,008
Anos de estudo (todas as
pessoas)
-,091
,018 -4,960
,000 -,127
-,055
ICM -,325
,054 -6,008
,000 -,431
-,219
TRF ,481 ,104 4,620
,000 ,277 ,685
sexo em 0 e 1 ,417 ,125 3,323
,001 ,171 ,663
PROBIT
a
Intercept 1,354
,275 4,929
,000 1,079
1,628
a. PROBIT model: PROBIT(p) = Intercept + BX
(continua)
160
ANEXO B: Resultados completos das estimações - Modelo Probit: rural do Rio Grande
do Sul (continuação)
Covariances and Correlations of Parameter Estimates
Idade do
morador
Anos de estudo
(todas as
pessoas) ICM TRF sexo em 0 e 1
Idade do morador ,000 ,421 -,148
,109 -,235
Anos de estudo (todas as
pessoas)
,000 ,000 -,223
,077 -,045
ICM ,000 ,000 ,003 ,049 -,041
TRF ,000 ,000 ,000 ,011 ,080
PROBIT
sexo em 0 e 1 ,000 ,000 ,000 ,001 ,016
Covariances (below) and Correlations (above).
Chi-Square Tests
Chi-Square df
a
Sig.
PROBIT Pearson Goodness-of-Fit
Test
1217,503
1202
,371
a. Statistics based on individual cases differ from statistics based on aggregated
cases.
161
ANEXO C: Resultados completos das estimações - Modelo Probit: urbano do Rio
Grande do Sul
Data Information
N of Cases
Valid 8318
Missing 0
Rejected
Number of Responses >
Number of Subjects
0
Control Group 39627
Convergence Information
Number of
Iterations
Optimal Solution
Found
PROBIT 20
Yes
Anexo C continua na próxima página.
162
Parameter Estimates
95% Confidence Interval
Parameter Estimate Std. Error Z Sig.
Lower Bound Upper Bound
Idade do morador -,004
,001 -3,395
,001 -,007
-,002
Anos de estudo (todas as
pessoas)
-,044
,005 -8,608
,000 -,054
-,034
ICM -,154
,028 -5,544
,000 -,208
-,100
TRF ,413 ,057 7,243
,000 ,301 ,525
sexo em 0 e 1 ,272 ,034 7,911
,000 ,204 ,339
core em 0 e 1 ,123 ,061 2,012
,044 ,003 ,244
Renda ate 1 SM 1,206
,061 19,764
,000 1,087
1,326
Renda de 1 ate 2 SM ,640 ,058 11,012
,000 ,526 ,754
Renda de 2 ate 3 SM ,296 ,067 4,396
,000 ,164 ,428
PROBIT
a
Intercept -,219
,154 -1,416
,157 -,373
-,064
a. PROBIT model: PROBIT(p) = Intercept + BX
163
ANEXO C: Resultados completos das estimações - Modelo Probit: urbano do Rio Grande do
Sul (continuação)
Covariances and Correlations of Parameter Estimates
Idade do
morador
Anos de estudo (todas as
pessoas) ICM TRF
sexo
em 0
e 1
core
em 0
e 1
Renda
ate 1
SM
Renda
de 1 ate
2 SM
Renda
de 2 ate
3 SM
Idade do
morador
,000 ,505 -,230
,086
-,174
,014 ,234 ,185 ,102
Anos de
estudo
(todas as
pessoas)
,000 ,000 -,215
,098
-,072
,023 ,387 ,321 ,192
ICM ,000 ,000 ,001 ,020
,012 ,041 ,149 ,049 ,000
TRF ,000 ,000 ,000 ,003
,001 -,024
-,119
,009 ,019
sexo em 0
e 1
,000 ,000 ,000 ,000
,001 -,027
-,014
,010 -,006
core em 0 e
1
,000 ,000 ,000 ,000
,000 ,004 -,030
-,002
-,009
Renda ate
1 SM
,000 ,000 ,000 ,000
,000 ,000 ,004 ,782 ,620
Renda de 1
ate 2 SM
,000 ,000 ,000 ,000
,000 ,000 ,003 ,003 ,628
PROBIT
Renda de 2
ate 3 SM
,000 ,000 ,000 ,000
,000 ,000 ,003 ,002 ,005
Covariances (below) and
Correlations (above).
Chi-Square Tests
Chi-Square df
a
Sig.
PROBIT Pearson Goodness-of-Fit
Test
8267,701
8308
,621
a. Statistics based on individual cases differ from statistics based on aggregated
cases.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo