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MARCO AURÉLIO PEDROSA DE MELO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA COMUNIDADE
RURAL TAQUARI EM IPORÁ/GO
Dissertação apresentada como
exigência parcial à obtenção do
título de Mestre em Sociologia, pela
Universidade Federal de Goiás -
Faculdade de Ciências Sociais.
Orientadora: Professora Doutora Cintya Maria Rodrigues
GOIÂNIA
2009
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Resumo
Ao estudar as práticas de sustentabilidade em grupos rurais e perceber a visão
ambiental no seu meio, definidas a partir das relações estabelecidas pelos
membros de uma comunidade rural, torna-se necessária a utilização de um
referencial teórico que discuta as situações mais significativas para produção
de uma interpretação do sentido da vida social no meio rural, entrelaçada com
a questão ambiental. O estudo das relações entre as práticas de
sustentabilidade de grupos rurais com o processo produtivo particular por eles
organizados com uso de trabalho agrícola ou não-agrícola será aprofundado no
presente estudo. A tônica desta problemática está na aplicabilidade das
metodologias para populações isoladas, como as comunidades rurais de Iporá,
no Estado de Goiás, que dependem de uma forma de apropriação comum dos
espaços e recursos naturais, que devem ser pensados e recriados
coletivamente de maneira a garantir a reprodução social e simbólica. Este
trabalho restringe-se a analisar a Comunidade Rural Taquari observando sua
produção agrícola e a organização do trabalho rural; entendendo as
representações da religiosidade católica no grupo e delineando as formas de
prática ambiental e desenvolvimento sustentável em propriedades rurais. Este
estudo das relações entre o homem e o meio ambiente dentro das
comunidades rurais esclarece as inovações no desenvolvimento da agricultura
de subsistência.
Palavras-chave: desenvolvimento ambiental; comunidades rurais; agricultura
familiar
2
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Abstract
While studying the sustainable practices among country groups and realizing
the environment understanding among them established from rural members
community relations, we noticed the need of a theoretical reference theory that
tells about the meaning of a social life attached with environment issues. My
deeper concern goes into the sustainable practices study with country groups
and its exclusive and organized productive process achieved with their
agricultural and non-agricultural work. The main concern relies on isolated
population methodologies and its applicability, for instance, the rural groups in
the city of Iporá, State of Goiás - Brazil which depends on customary usage of
natural resources and land that should be reconsidered in order to consolidate
its symbolic and social reproduction. This dissertation limits itself to analyze the
Taquari Community observing yours agricultural production and the
organization of the rural work; understanding the representation of catholic
religion in the group and limited the way of environment practice and
sustainable development inside rural properties. This study of relations between
the man and the environment inside rural communities explain the innovation of
overcome developing of the subsistence farming.
Key-words: enviromente devoloping; rural communities; family agricultural
3
SUMÁRIO
Introdução 9
Capítulo I - A pesquisa na Comunidade Taquari
1- Configuração regional na Taquari 14
2- Comunidade Rural da Taquari: sua constituição 19
3- Comunidades rurais no passado e no presente em Iporá 25
4- Eventos e histórias de origem 29
4.1- Associação ou Comunidade? 34
4.2- Análise sobre narrativas 36
5- Tradições e Religiosidade 38
5.1- Religiosidade e campesinato 47
6- Os grupos e a sustentabilidade na Comunidade Taquari 53
7- Solidariedade, reciprocidade e questão ambiental 58
Capítulo II – Análise da produtividade e sustentabilidade rural em Taquari
1- Trabalho rural e prática ambiental 64
2- A propriedade rural sustentável no Taquari 69
3- Os Produtores em Taquari 78
4- A produção rural na Comunidade Taquari 85
5- Trabalho e Sustentabilidade na Comunidade Taquari 90
6- O rural, a localidade e a natureza na região do Taquari 99
Capítulo III – A terra, o trabalhador rural e a natureza não imaculada
1- Terra sustentável, natureza e trabalho rural 111
2- Práticas de interação na discussão ambiental no Taquari 117
Conclusão 136
Referências 140
4
INTRODUÇÃO
A relação entre natureza e espaço para produção agrícola e pecuária é
uma preocupação para o trabalhador rural que procura manter sua
sustentabilidade. As discussões acadêmicas nos últimos trinta anos, procuram
conceituar a sustentabilidade e desenvolvimento ambiental. Até então esses
conceitos foram explicados interdisciplinarmente, com base em argumentações
sobre a economia ambiental e produção agropecuária no meio de pequenos
grupos rurais (VIEIRA, 1998; CAVALCANTI, 1999).
As questões ambientais estão sendo estudadas com maior intensidade
nas três últimas décadas. A intensificação de estudos sobre a temática
promoveram discussões que serão tratadas neste trabalho, como o impacto
das formas de trabalho não-agrícola; a constituição do trabalho rural na
organização social; e a prática de desenvolvimento sustentável em
propriedades rurais e seus reflexos no processo produtivo. Esses tópicos serão
trabalhados na análise que fizemos sobre a Comunidade rural do Taquari em
Iporá/GO
1
.
O agrupamento social em forma de comunidade apresenta-se na Região
do Taquari de duas formas. A primeira é a Comunidade Taquari que tem vida
social organizada nos moldes das tradicionais comunidades rurais do meio rual
brasileiro e goiano (CANDIDO, 1997; BRANDÃO, 1981), a segunda
configuração do grupo é através da Associação de produtores rurais que
mantém uma rede de solidariedade, que vai além da necessidade econômica.
Estes ambientes sociais são focos do trabalho para entendermos como o
processo produtivo rural pode criar uma visão ambiental compartilhada.
A preocupação em estudar a Comunidade Taquari surgiu em função do
interesse de procurar entender as práticas sustentáveis e compreender os tipos
de relações sociais baseadas na agricultura familiar identificadas no grupo. A
necessidade deste estudo aprofunda o entendimento sobre os conceitos de
1
Ao utilizar o termo “comunidade” estou adotando o modo pelo qual os membros do grupo rural Taquari
se denominam. O conceito “comunidade” é o termo coletivo utilizado por aqueles que dizem vinculados
ou pertencentes à Taquari, para referirem-se a um grupo.
9
comunidade, desenvolvimento e sustentabilidade através das práticas de
produção e suas implicações para com a natureza. A tentativa de mostrar as
características delineadoras de equilíbrio ambiental e produção possibilita o
estudo das relações identificadas nas práticas de sustentabilidade de grupos
rurais locais no Cerrado Goiano, e apresentação do trabalho rural ou não-rural
(pluriativo).
A região do Taquari é caracterizada pela presença de agricultores com
diversos tamanhos de propriedade, com o tamanho abrangendo de meio
alqueire até 50 alqueires. Esta desproporção da estrutura fundiária regional não
impede a realização de interações entre os membros da Comunidade Taquari.
Mesmo espacialmente dispersos na região compartilham a vida comum no
campo. Percebe-se a unidade do agrupamento pela produção coletiva e
organização social baseada nas orientações das CEBs (Comunidades
Eclesiais de Base). A Comunidade Taquari desenvolveu discursos e práticas
de sustentabilidade proveniente com base em fundamentos da igreja católica,
assim como a CEBs. A religiosidade católica auxiliou e fortalece a construção
da identidade dos grupos rurais, o simbolismo compartilhado e a
representatividade do trabalho rural na localidade (OLIVEIRA, 2001;
RODRIGUES, 2002).
Neste estudo, veremos que as comunidades rurais podem se agrupar
por motivações econômicas, a fim de garantirem a subsistência, a produção
própria de seus alimentos ou de produtos para comercialização, o que fortalece
os laços culturais, como ritos ou mitos sobre o grupo, e estes devem ser
mantidos, daí vem a percepção do sentido que têm as tradições e a vida
coletiva. Os integrantes da Comunidade Taquari são identificados nos
processos de produção e organização social, e têm entendimento de
sustentabilidade, que é a capacidade de satisfazer as necessidades dos grupos
sem comprometer a necessidades de satisfação das gerações futuras. Soma-
se ainda o conhecimento tecnológico com viés ambiental com a racionalização
dos recursos naturais. No caso da Taquari, o que impressiona é a forma de
apropriação comum dos espaços e recursos naturais.
As observações focaram-se nas relações existentes na Comunidade do
Taquari, e dela tive três vertentes para abordagens sociológicas. A primeira é a
da relação indivíduo, grupo social e religião; a segunda, sobre a interação
10
grupo social e produção rural e a terceira, é a relação do grupo com um
conhecimento sobre a questão ambiental, que constitui neles uma identidade
ou cultura ambiental.
Goffman (1988) compreende identidade como produto social, ou seja,
não pode ser concebida através de atributos essenciais, mas unicamente
ocasionais. Nesta noção o autor acredita que muitos fatos da vida de um
indivíduo são idênticos a de outros indivíduos, formando uma identidade. A
cultura ambiental pode ser entendida na visão de Leff (2001) como todo
processo de significação do mundo e de apropriação da natureza.
A configuração da identidade do rural no grupo e as práticas e saberes
que orientam sua vida no campo explicam a manutenção e reprodução de um
grupo que busca a sustentabilidade, simultaneamente, ampliam a produção e o
trabalho de caráter não agrícola. Estas questões aparecem nas analises
propostas na Comunidade Taquari.
Para as discussões sobre o trabalho e o desenvolvimento da
produtividade e análise da organização social nas comunidades rurais, têm-se
como base análises de Carlos Rodrigues Brandão, Antônio Candido e Erick
Wolf, além de novos aportes sobre o tema.
Para este trabalho, o enfoque antropológico no método de pesquisa se
torna essencial na observação, descrição e acompanhamento do
desenvolvimento das atividades produtivas e culturais da Comunidade Taquari.
Procurou-se estabelecer um contato direto permitindo ouvir os membros da
comunidade para entender as relações produtivas e as práticas de
sustentabilidade que são objeto desta pesquisa. O trabalho de campo
participativo com o grupo estudado foi feito através da observação participante
na rotina dos membros da Comunidade Rural do Taquari.
As discussões sobre as narrativas serão referenciadas em autores que
buscam entender a representação simbólica do espaço e as práticas nela
inseridas para reprodução e manutenção das estruturas sociais. Assim, autores
como Pierre Bourdieu e De Certau darão o amparo teórico para falarmos sobre
as trajetórias e cotidiano que analisaremos na Comunidade Taquari.
a relação entre natureza e grupo social, seguirá a propostas de
Ignacy Sanchs e Enri Leff para entendermos a racionalidade ambiental nos
11
discursos compartilhados tanto na Comunidade quanto na Associação, e
compreendermos o desenvolvimento sustentável da produção.
Outro ponto de importante discussão nesta dissertação é a religiosidade
na Comunidade Taquari. A religião fundamenta a comunidade e celebra a
produção rural e o meio ambiente dentro de eventos tradicionais e (re)criados
pelo grupo. Esta explicação se faz necessária para caracterizar as
comunidades rurais, que os membros não pensam isoladamente em ações
para o presente e nem sempre souberam fazer a manutenção da paisagem
frente ao processo de produção (MOREIRA, 1997).
Explicar as motivações empíricas e teóricas que fizeram instigar um
estudo sobre a temática comunidade rural e sustentabilidade ambiental foram
os pontos norteadores do texto que será apresentado aqui. Assim, a
distribuição dos temas e discussões que serão abordados desenvolveram-se
na forma descrita.
No primeiro capítulo, “A pesquisa na Comunidade Taquari”, apresenta a
localidade da Comunidade Taquari, sua história de origem e a abordagem
realizada para imersão no grupo e as práticas relacionadas à sua religiosidade
e a própria organização social da comunidade rural. Também foi analisada a
organização socio-espacial dos membros da Taquari e as formas de interação
com as instituições presentes no local, como a Igreja Católica e Associação
dos Pequenos Produtores Rurais da região.
A primeira parte do trabalho tem-se uma descrição da origem da
comunidade, mostrando como o grupo se formou com a participação da Igreja
Católica através das CEBs (Comunidades Eclesiais de Base). O trabalho
etnográfico realizado com o grupo sobre a organização social e práticas
religiosas e ambientais no meio rural, serviram para caracterizar o objeto de
pesquisa a partir dos membros que integram a comunidade.
Analisamos a formação de práticas econômicas e de subsistência de
caráter sustentável para o grupo na região. Descrevemos a localização e
dispersão do grupo para evidenciar o grau de transformação e conservação do
meio ambiente. Compreendemos também como se apresenta desenvolvimento
da produção com a agricultura familiar. Os personagens dispersos
espacialmente foram categorizados com um perfil construído com base no
12
trabalhador rural, nas relações econômicas rurais, ambientais e religiosas no
grupo.
Para se ter maior significância do grupo elaborou-se um comparativo
rápido sobre a origem do grupo frente a outras comunidades rurais que são
próximas ou formadas em épocas diferentes da Comunidade Taquari.
No segundo capítulo, “Análise da produtividade e sustentabilidade rural
em Taquari”, trabalhamos os conceitos relativos ao trabalho rural e trabalho
não-agrícola. Contextualizamos o trabalho pluriativo no meio rural e as formas
de apresentação dentro da comunidade rural e seus reflexos para organização
social na Taquari. Buscou-se compreender os conceitos que definam o que é
prática ambiental, e mostramos se é possível existir tais práticas ambientais
dentro de comunidades rurais, no nosso caso entre os membros da
Comunidade Taquari. E delineamos as práticas de desenvolvimento
sustentável no trabalho rural que são executadas na produção e propriedade.
Nesta segunda sessão procuramos explicar a importância e participação
dos membros da comunidade na economia do grupo com a produção de
mandioca e farinha, leiteira, pastoril e outras que o são consideradas
agrícolas, mas pluriatividades. A análise dos dados foi feita com base as
informações coletadas em fontes como IBGE, SEPLAN e de questionários
aplicados na Comunidade Taquari, que auxiliaram na diferenciação das
práticas econômicas que promovem com o desenvolvimento sustentável,
caracterizando a inserção do produtor rural frente a questão ambiental. A
análise da configuração dos grupos familiares, sua produção e seu trabalho
trouxerem contribuições para o debate do desenvolvimento sustentável
No último capítulo do resultado desta pesquisa, “A terra, o trabalho rural
e natureza não imaculada”, procurou-se mostrar a compreensão de como os
proprietários de terra na Comunidade Taquari possuem um entendimento e
discurso compartilhado sobre o que é sustentabilidade ambiental, a partir de
ações de preservação e conservação da natureza nas propriedades rurais,
relacionando com os referenciais teóricos pertinentes (sustentabilidade
ambiental).
Além da discussão teórica sobre sustentabilidade e relação trabalho e
produção rural, mostrou-se como a comunidade rural tem um discurso e ou um
pensamento ambiental. Para esta análise das práticas de produção de médio e
13
longo prazo como viabilizador de mudanças que garantam a sustentabilidade
das futuras gerações e mantenha preservada a ligação do homem à terra,
foram relacionados os discursos dos indivíduos e grupos (associados e não
associados) da Comunidade Taquari, analisando o entendimento
compartilhado sobre o que é sustentabilidade ambiental, a partir de ações de
preservação e conservação da natureza nas propriedades rurais. Dessa forma,
ficou evidente como o conceito de desenvolvimento sustentável pode ser
entendido como prática de uma comunidade rural. E, finalmente, explicamos
qual o desenvolvimento sustentável aplicado pelo grupo e qual o perfil da
comunidade rural com pensamento ambiental.
CAPÍTULO I
A PESQUISA NA COMUNIDADE TAQUARI
1- Configuração regional na Taquari
A proposta deste trabalho está fundada nas discussões sobre as
práticas de desenvolvimento sustentável. As formas de organização social
implicam em práticas sociais que podem ser observadas na produção rural,
caracterizada pela agricultura familiar. Neste estudo de caso apresentado aqui,
a Comunidade Rural Taquari no município de Iporá GO, será o foco de
análise das relações entre o processo produtivo no campo frente às práticas
para constituição de um meio ambiente sustentável.
O grupo social de que trata esta pesquisa denomina-se Comunidade
Taquari, e localiza-se a 8 km da sede do município de Iporá
2
, município da
2
A rodovia que acesso ao município de Iporá é a GO-060, principal rota de escoamento de produção e
entrada comercial para o estado do Mato-Grosso. Como pólo fazendário e jurídico da micro-região, Iporá
14
micro-região do Oeste Goiano, no Estado de Goiás, que fica a 254 km da
capital, Goiânia, conforme mapa da Figura 1. Trata-se de um grupo de
pequenos produtores que, de forma associativa, produzem farinha de
mandioca, leite e iogurte. Localizada no bioma Cerrado, em área rural, a
Comunidade Taquari é formada por mais de vinte famílias proprietárias de
terra, das quais são organizadas em esquema de associação naquele mesmo
local. A localidade está às margens da GO-320, uma estrada não asfaltada que
acesso ao município de Ivolândia. A Comunidade Taquari mantém uma
organização social com base na produção agrícola coletiva e apresenta
discursos e práticas de sustentabilidade entrelaçadas aos fundamentos das
“comunidades eclesiais de base” (CEBs), oriunda da igreja católica. O grupo se
preocupa com a subsistência através do trabalho rural, ao mesmo tempo em
que discute os impactos ambientais que são promovidos ou restaurados, no
decorrer do desenvolvimento sustentável na localidade.
Ao imergir sobre o assunto e grupo a serem estudados é necessário
localizar historicamente a região da pesquisa, relatada em material bibliográfico
da região, que mostra a origem de Iporá em 1748 e seus desdobramentos até
o final do século XX (GOMIS, 2002). No começo desse período, a região era
conhecida pelos mineradores de diamante por Arraial de Pilões, situado às
margens do Rio Claro. Por influência da Paróquia daquela região, ficou
conhecida também como Arraial do Senhor Jesus do Bonfim, ainda no século
XVIII, mostrando as origens da presença religiosa católica na história desse
povo; fato que se apresenta na formação das comunidades rurais no século
XX. Na metade do século XVIII, o ciclo de mineração declina iniciando uma
nova organização econômica da sociedade goiana. Essa nova organização
atinge a então região do Arrarial e o povoado muda-se para outras áreas. No
ano de 1943, é batizada finalmente com o nome de Iporá, tendo sua
emancipação em 1949.
Entre o final do culo XIX e a primeira metade do século XX, houve a
influência da formação de lideranças coronelísticas que ocuparam a região por
meio de grilagem de terras. Após os anos da implantação da República de
1889 e Revolução de 1930, a configuração socio-espacial passou a ser
tem influência sobre os seguintes municípios com que faz divisa: Diorama, Jaupaci, Israelândia,
Amorinópolis, Ivolândia, Moiporá e Arenópolis.
15
formada por proprietários que compraram suas terras ou por posseiros que se
infiltraram no território local, a fim de formalizar a constituição de uma zona
rural para o novo município que se originava. A partir dessa época, a economia
inclina-se para a agropecuária. Nos anos de 1940 a 1960, a interiorização do
país promoveu o desenvolvimento do comércio e da burocracia estatal,
movimentando a circulação de capital com a formalização de negócios,
tributação e assalariamento da população do setor privado e serviço público. A
atualidade econômica da região e especificamente do Taquari será discutida no
Capítulo II, baseada em dados quantitativos sobre o uso do espaço e da
população,os quais serão confrontados com os discursos, memórias e
lembranças de fundadores e membros dos grupos.
A composição geográfica do município de Iporá, onde está localizada a
comunidade objeto deste estudo, abrange uma área é de 1.045 km
2
, com 450
m de altitude média acima do nível do mar. Predomina no município um relevo
plano, representando 60% da extensão total, 35% é ondulado e 5%
montanhoso. formações montanhosas importantes na região, como: Serra
do Caiapó, Serra dos Pilões, Serra do Rio Claro. A região do município onde o
grupo está é próxima ao Morro do Macaco, ponto que se tornou reserva
ecológica e referência para história das comunidades rurais da localidade. Os
rios e córregos também aparecem citados como parte do cotidiano e origens
dos grupos locais (Veja Imagem 1).
16
A maioria das comunidades presentes na região assimilou os nomes das
bacias hidrográficas, afluentes ou áreas com acidentes geográficos existentes
na região do município de Iporá, outros grupos acataram o nome de
padroeiros(as), conciliando as fronteiras dos territórios com as representações
religiosas, econômicas e sociais que os grupos apresentam nesse espaço.
Adiante ampliaremos as problemáticas da hidrografia da região e sua
relação com a organização espacial e configuração das comunidades rurais as
quais são banhadas pelas águas que atravessam propriedades de vários
tamanhos e abastecem os municípios da micro-região. O interessante é que a
vida do grupo e da própria história de vários outros, inclusive das cidades está
ligado em algum momento aos rios que sofrem impacto do homem. O uso das
águas para abastecimento, investimento comercial como tanques pesque-page
ou lava-jatos e presença de poluição, principalmente esgoto, são parte do
problema na zona urbana quanto na rural.
Imagem 1 - Paisagem do Morro do Macaco próximo a Serra do Rio Claro
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
17
z
Figura 1 - Localização e distância da Comunidade Taquari da zona urbana
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. SOUZA, Flávio Alves de. 2008.
18
Entre os rios e córregos que se destacam pelo abastecimento de água
do município de Iporá e de outras localidades, temos o Rio Claro e Rio Caiapó.
Estes afluentes da bacia do Araguaia foram importantes na história do
município e da região, neles a procura de ouro e diamantes permanece até os
dias atuais, sendo que o rendimento não é mais o mesmo, por causa das
poucas pedras que se encontram e na dificuldade de se fazer um garimpo
numa área rochosa. Outra função dos rios é de lazer, como pesca durante o
ano todo e nas praias na época de seca. Outra questão são as margens do Rio
Claro e do Rio Caiapó que estão em parte desmatadas e seus leitos foram
assoreados pelo garimpo que hoje não é mais praticado, porém na sua maior
extensão, permanecem conservadas as matas ciliares. Apesar das tentativas
de reflorestamento nos leitos desses rios e mudanças na forma de
manipulação das terras para pastagens a fim de evitar os assoreamentos os
resultados não foram satisfatórios. Em alguns pontos houve diminuição do
volume de água em vários afluentes: Ribeirão Santo Antônio que corta a cidade
de Iporá; Ribeirão Santa Marta e Rio Claro que se estendem por várias
propriedades das comunidades rurais. Esses rios e outros acidentes
geográficos acabaram designando o espaço onde se originou vários grupos
locais, como a Comunidade Taquari, cujo nome vem da presença do Rio
Taquari. Vale ressaltar a presença de inúmeras minas d'água presentes em
cerca de 80% das propriedades rurais. Mesmo assim, a vegetação
predominante é o campo de pastagens, que substituiu em larga escala a
vegetação do cerrado (Veja Imagem 2).
19
Imagem 1 -Pastagem com restos de mata natural do cerrado
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
O cerrado da região tem como plantas mais comuns: pequizeiro, baru,
aroeira, peroba, jatobá, cedro, sucupira, vinhático, bacuri, babaçu, murici, caju
etc. Dessas plantas, as que são frutíferas dependem do clima e da estação do
ano para produzirem. O que ocorre no município são dois períodos: um que vai
de novembro a março, com fortes chuvas, e outro que vai de abril a outubro,
com calor e pico de seca nos meses de agosto e setembro. Durante todo o
ano, os ventos são freqüentes e fortes, tanto é que no auge, de julho a
setembro, praticantes de esportes radicais levantam voos a partir do Morro do
Macaco, usando equipamentos de parapente (paraquedismo de contemplação
de voo).
2- Comunidade Rural da Taquari: sua constituição
Hoje, a população de Iporá, segundo dados mostrados pelo censo do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, registra um total de 31.300
habitantes, dos quais 28.192 residem na área urbana e o restante, 3.108
habitantes, na área rural (IBGE, 2000). Este dado ilustra que aproximadamente
10% da população vive no campo, e parte deste quantitativo depende do
trabalho rural para subsistência, o que analisaremos agora é a formação de
20
grupos, os quais apresentam formas de organização social, e desenvolvem
uma produtividade diversificada com a produção rural coletiva e em forma de
associação. A Comunidade Taquari é um dos locais que observamos maior
ordem na realização de projetos e consolidação das tradições e solidariedade,
a seguir entraremos no universo cotidiano e do trabalho dos membros e
famílias que constituem o grupo.
O grupo da região do Taquari é formado por vinte e nove proprietários
de terra, sendo as famílias residentes, 22 no total, organizadas em forma de
comunidade rural ou associadas naquele local. Entre as famílias que moram na
região algumas pertencem e participam dos eventos da Comunidade Taquari,
as famílias que não possuem laços sociais com a Taquari estão vinculadas
pela Associação dos Pequenos Produtores da Região do Taquari, essa
instituição é administrada por membros da comunidade. A Associação
agrupa os produtores para comercializar e negociar melhor alguns produtos
como o leite, além da produção de farinha de mandioca. A configuração social
que vimos na Comunidade Taquari apresenta uma flexibilidade em termos do
ingresso e da saída do grupo. Cada membro ou família tem a liberdade de
participar ou não das atividades desenvolvidas na região. É por isso que nem
todos os moradores de Taquari participam da Associação e de algumas outras
atividades. A densidade demográfica na comunidade teve seu aumento com a
formação de alguns quase-grupos
3
na região a partir da década de 1950, e
estende a os dias de hoje, que a Comunidade Taquari originou-se no ano
de 1997. A fixação e dispersão dos grupos rurais na região promoveu a
necessidade de preparar a terra, utilizando-se do desmatamento para produção
agrícola e pecuária. Essa constatação foi verificada em dados do IBGE (2005),
que relataram a presença de criadores de ovinos, bovinos e bufalinos, além de
produção de soja, cana-de-açúcar, arroz e outros cereais. Esta relação entre
natureza transformada e produção para manutenção da subsistência dos
grupos serão apontamentos úteis nas interpretações da Comunidade Taquari.
3
Mayer (In: Feldman-Bianco, p. 128), “quase-grupos como entidades organizadas centradas em um ego,
onde as ações de qualquer membro do grupo tornam-se relevantes apenas na medida em que são
interações com o próprio ego, ou seu intermediário”. O ego no grupo seria a reciprocidade que cada
indivíduo cria com o grupo. Cabe ressaltar contudo que embora este conceito de quase-grupo tenha
contribuído para uma “etnografia [...] tendo em vista uma preocupação em explicitar os princípios
estruturais organizando a ação de ‘não-grupos’ e de organizações invisíveis e informais em contextos
considerados complexos” (Feldman-Bianco, ibid., p. 28).
21
A partir das relações econômicas de subsistência podemos explorar e
analisar a comunidade rural. Ao analisar a organização para produção
conforme Marx, sabemos que a associação de homens livres que trabalhem de
forma coletiva os meios de produção, o trabalho deixa de ser individual para se
tornar trabalho social, o mesmo ocorre com o produto do trabalho que deixa de
ser privado e se torna social. Nessa perspectiva a comunidade rural com base
na agricultura familiar determina o tamanho da produção e da propriedade.
Segundo Soto (2002) a agricultura familiar não adotou a racionalidade da
produção agrícola capitalista, por não compartilhar a necessidade de produção
excedente em grande escala, mesmo que tenha potencial para isto. Assim, a
comunidade rural surge como alternativa para um desenvolvimento
sustentável, baseado na agricultura familiar e, conservando estratégias de
interação de relação entre a natureza e o ambiente social e econômico, sem
descaracterizar os aspectos culturais e simbólicos presentes nas relações
domesticas (parentesco, gênero etc.).
A região da Taquari possui proprietários rurais que participam da vida
econômica através da produção pecuária, pois a presença de curtumes e
frigoríficos na região estimulou esse mercado. Tal fato não eliminou as práticas
tradicionais de cultivo de cereais e implantação de novas culturas, como a
cana-de-açúcar e soja. Estas práticas são desempenhadas pelos latifundiários
e minifundiários da região, que ainda conservam o trabalho rural tradicional,
mas hoje o que ocorre é uma maior inserção dos produtores em atividades e
ocupações com características de pluriatividade
4
. O trabalho não-rural, que
nessa pesquisa será denominado, o trabalho pluriativo, tem como exemplo a
produção de farinha de mandioca e produtos derivados do leite (iogurte).
Destaca-se também uma organização crescente dos proprietários rurais em
comunidades cooperativistas, decorrido da influencia de membros participantes
ou ligados a movimentos sociais presentes na região, como o Movimento dos
Sem Terra e as Comunidades Eclesiais de Base. Essa organização social de
4
Nos últimos anos, mais precisamente a partir da década de 90 vêm aprofundando a discussão sobre o
assunto pluriatividade, que é uma estratégia de reprodução social dos agricultores familiares em contextos
onde sua articulação com o mercado se através de atividades não-agrícolas ou para-agrícolas.Termo
surgido das definições como: agricultor em tempo parcial, atividades não-agrícolas no meio rural,
empregos múltiplos e fontes de renda diversificadas, o conceito foi moldado para permitir juntar as
atividades agrícolas a outras atividades que gerem ganhos monetários e não-monetários,
independentemente de serem internas ou externas à exploração agropecuária com produção de
organização e trabalho do grupo familiar (SCHNEIDER, 2003).
22
forma cooperativa ou associativa é discutida por autores como Schneider
(2003) e Garcia Júnior (1983). Na visão desses autores o que devemos
compreender sobre as estratégias de sobrevivência do camponês na
modernidade, é a transformação do trabalho rural com tecnologias e a
produtividade advinda dos trabalhos não-agrícolas.
Para melhor conhecer a Comunidade Taquari, e as relações sociais
estabelecidas por seus membros, foi considerada a distribuição espacial entre
os integrantes do grupo, entre os locais de trabalho e de moradia (Veja Figura
2). A distribuição espacial do grupo caracteriza-se de uma forma geral, pelo
afastamento da zona urbana, e internamente, por uma diferenciação do uso do
solo, finalidade da produção e presença da família.
A população em Taquari se agrupa mais densamente nas proximidades
da Paróquia Nossa Senhora das Mães, local chamado de “rancho” pelos
moradores locais. Além da igreja católica há um espaço construído para festas.
Nessa área, concentra-se um cleo de vizinhos mais próximos. Os que estão
mais afastados criaram naquele espaço um vinculo de solidariedade pela base
religiosa. Mais afastado desse núcleo, localiza-se o galpão que abriga a cede
da Associação dos Pequenos Produtores Rurais do Taquari. Nela funciona a
fábrica de farinha de mandioca, que abriga também o tanque de resfriamento
de leite, e outras atividades que serão analisadas na perspectiva da prática
ambiental e de desenvolvimento sustentável.
23
Figura 2 Representação da distribuição espacial da Comunidade Taquari
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa.
Sobre o grupo Taquari, podem ser destacados, na sua descrição, três
fatores que serão aprofundados no decorrer do capítulo: o primeiro fator a ser
observado é a organização familiar do grupo e suas relações com a terra. O
segundo diz respeito ao trabalho e a produção no campo e aos modos de
desenvolvimento de práticas não relacionados diretamente com a terra, como o
de serviços, administração e negócios comerciais. Por último, permeando e
24
entrelaçando os fatos anteriores, o aspecto cultural, dos vínculos a
religiosidade católica simbolizados na realização de rituais e eventos (Veja
Imagem 3). Cada um dos aspectos destacados relacionam se com as
incursões do pesquisador durante a pesquisa direta com a Comunidade
Taquari, de modo, que torna-se importante também tratar, paralelamente, da
etnografia realizada, como um processo revelador das diferenças internas e
das interações existentes fora do grupo.
Imagem 2 - Romaria dos Santos Reis feita pelas Comunidade do Taquari e
Santa Marta
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2007.
A aproximação ao grupo em Taquari através da pesquisa desenvolvida
mostrou quão importante seria compreender os significados dos eventos
religiosos praticados coletivamente. Esses eventos em um papel importante
para o entendimento das relações entre o simbólico e a organização social
dentro da discussão sobre meio ambiente e sustentabilidade.
Na busca por conceitos que auxiliassem na explicação dos eventos
observados lancei mão de definições antropológicas tais como a de Peirano
(2000) e de Sahlins (1990). O primeiro foco que temos para entender o evento
é o rito. Para Peirano (2000, p. 14) os “[...] ritos – esses fenômenos que podem
ser recortados na seqüência dos atos sociais - são bons para revelar
mecanismos também existentes no dia-a-dia e, até mesmo, para se examinar,
25
detectar e confrontar as estruturas elementares da vida social.” Além disto, os
ritos ou eventos “[...] sustentam em um repertório cujos elementos são
usualmente selecionados das formas cotidianas de sociabilidade, do calendário
ritual de festividades [...]” (idem, p. 17). Nessas perspectivas o evento é reflexo
das formas de expressão e organização da vida social.
Marshal Sahlins (1990) entende o evento sendo construindo e
vivenciado como “a forma institucional dos acontecimentos históricos”, ou seja,
o cotidiano se apresenta como algo reprodutivo no processo histórico. Ambos
os autores, Peirano (2000) e Sahlins (1990) entendem que para o evento ser
efetivo considerarmos a cultura e a história como elementos essenciais para
analisarmos os contextos sociais. As representações simbólicas e os
processos de desenvolvimento de laços culturais e sociais, baseados na
religião ou no trabalho se fixam historicamente e criam dinâmicas para
organização social nos agrupamentos, tal como esse de Taquari.
Os mesmos indivíduos e famílias que participam dos eventos acima,
também procuram a produção rural e buscam um mercado de trabalho para si,
esta ação desenvolve um tipo de agricultura familiar que pode se apresentar
em forma de campesinato ou de trabalho o-agrícola, proporcionando a
personalização dos vínculos sociais, culturais e tradicionais do grupo no meio
rural (ABRAMOVAY, 1992).
Os atores sociais participam dos ritos e eventos de caráter social,
religioso ou solidário. O caráter social são eventos como festas de aniversário e
inaugurações de obras ou maquinário. O rito religioso segue os dogmas e
regras do catolicismo para missas, batismos, crimas, celebração para benção
da produção, etc. A participação em eventos solidários como mutirões são o
tipo bem frequente em toda comunidade rural (CANDIDO, 1997; BRANDÃO,
1986). Nesses momentos não caracterizamos camponeses, trabalhadores
rurais ou proprietários, mas delineamos o alcance da participação quando se é
membro de um grupo com práticas tradicionais e de socialização.
3- Comunidades rurais no passado e no presente em Iporá
26
A compreensão das relações de produção e os laços de sustentação
dos vínculos entre os membros do grupo podem ser entendidos através de
uma análise da origem das comunidades rurais. Neste trabalho, serão
analisadas as bases religiosas as quais o grupo Taquari aderiu para construir a
solidariedade daquela região. Assim, a comunidade pode ser explicada pela
sua busca por subsistência e manutenção de laços que garantam a condição
de existência do grupo acima dos mínimos sociais e vitais, conceituado por
Candido (1997):
Dir-se-á, então, que um grupo ou camada vive segundo
mínimos vitais e sociais quando se pode,
verossimilmente, supor que com menos recursos de
subsistência a vida orgânica não seria possível, e com
menor organização das relações o seria viável a vida
social [...] (idem, p. 27)
A pesquisa teve início com a busca informações sobre a origem de
alguns grupos na região. A experiência do campo trabalho de campo promoveu
duas oportunidades para aproximar os contatos com as comunidades rurais da
localidade. A primeira resultou das três primeiras visitas que fiz às
comunidades rurais do Taquari e Cruzeirinho
5
. A segunda foi resultado da
participação como observador de um evento promovido por representantes das
comunidades e da igreja católica. Estabelecerei uma comparação das
comunidades apenas para contextualizar a Taquari na lista das comunidades
rurais da região. Depois analisaremos separadamente as falas de origens,
sendo que o amparo teórico e analítico será sobre a fala da representante da
Comunidade Taquari.
A observação dos grupos rurais em Iporá-GO, sobretudo a Taquari
ajudaram na definição da etnografia como metodologia para o estudo aqui
proposto. Para este trabalho, o enfoque antropológico no método de pesquisa
se torna essencial uma vez que objetiva-se observar, descrever e acompanhar
o desenvolvimento das atividades produtivas e culturais da Comunidade
5
A Comunidade Taquari e a Comunidade Cruzeirinho são localidades próximas e ficam dentro do
município. A principal diferença entre elas, além da época de formação, é que a primeira tem as
propriedades dispersas espacialmente, a segunda tem uma organização aglomerada. Outro fator de
diferenciação é que as práticas rurais ainda são a base do trabalho do Taquari, e no Cruzeirinho as pessoas
vivem mais do trabalho da cidade. Mas ambas começaram sua organização com a ajuda da Igreja
Católica.
27
Taquari, assim como, estabelecer um contato direto que permita ouvi-los e
entender as relações sociais com o trabalho etnográfico (CLIFFORD, 1998).
Ao dar continuidade ao trabalho de campo na Comunidade Taquari
buscamos interpretar as motivações coletivas e associativas que promovam
ações nas comunidades rurais para um desenvolvimento sustentável. O
trabalho de campo com a observação direta dos comportamentos e
manifestações coletivas dos agentes sociais, é necessária para o pesquisador
conhecer e interpretar a realidade (RUDIO, 1986). Como foi dito antes este
trabalho seguirá a orientação do trabalho etnográfico de Bronislaw Malinowski
(1979). Para esse antropólogo o trabalho de campo se fundamenta na
interpretação da realidade social, subordinando-a regras gerais. Na mesma
linha Gil (2002), delineia o estudo de caso exploratórios na busca por respostas
relativas as causas de determinados fenômenos. Baseados em Em Malinowski
(1979) o campo é o local onde deve-se cobrir tanto fenômenos irrelevantes, por
serem, banis e rotineiros, quanto aqueles de atenção surpreendente ou
estranhos, ou seja, o estudo apesar de ter um foco no tempo e na cultura, tem-
se que construir um realidade coerente a partir de dados caóticos que ordenam
e dão sentido aos costumes cristalizadores do comportamento e conduta
humana. Na Comunidade Taquari foi feita uma observação direta do
comportamento com convívio nas etapas produtivas do grupo e nos eventos
organizados pelo grupo, esclarecendo as motivações da organização do grupo
no meio rural permitem uma maior interpretação sócio-cultural.
Na Comunidade Taquari, o uso de informantes e o tratamento dado ao
objeto ao afastarmos do que é familiar para interpretação no olhar do outro,
buscou-se trazer a tona as regras da vida cotidiana no meio rural. Ao
compreendermos as normas institucionalizadas e compartilhadas para o
desenvolvimento sustentável, entendemos as práticas de produção e a forma
de apresentação do grupo nas narrativas de origem do grupo na região.
Esta
situação de sustentabilidade na comunidade rural está transcrita na fala
antropológica:
Estudar as instituições, costumes e códigos, ou
estudar o comportamento e mentalidade do homem,
sem atingir os desejos e sentimentos subjetivos
pelos quais ele vive, e sem o intuito de compreender
28
o que é, para ele, a essência de sua felicidade, é,
em minha opinião, perder a maior recompensa que
se possa esperar do estudo do homem
(MALINOSKI, 1979: 34)
Em complementação a abordagem malinowskiana prevê-se a
atualização dessa perspectiva etnográfica com a inclusão de discussões mais
recentes neste campo, autores como Clifford Geertz (1989), que propõe o
estudo das redes de representações para a construção de interpretações da
carga simbólica interiorizada no indivíduo e exteriorizada pela fala ou pela
ação, ou ambas em determinado meio social, o que condicionaria a forma de
organização do grupo a ser estudado. Esta perspectiva interpretativa ajuda a
entender as redes de significados incorporados às relações sociais, bem como,
os discursos narrativos dos sujeitos dentro da Comunidade Taquari.
Vale ressaltar que o método etnográfico prevê também a utilização de
recursos tais como: a confecção de mapas, pesquisa documental, estudo
bibliográfico; referências diversificadas como revistas eletrônicas
especializadas, mídia impressa ou áudio-visual (vídeo e fotos) sobre os temas
mencionados. Nesse contexto da pesquisa prevê-se também a realização de
entrevistas com lideranças e com algumas pessoas das famílias da
comunidade que participam ou não do trabalho da Associação do grupo.
Entende-se que para compreender melhor como a comunidade taquari
produz suas relações sociais, culturais e de produção incorporando valores
religiosos, econômico e ambiental, ter-se-á que saber como o grupo se
manifesta, seja em festas ou em outros eventos. Por isto, a etnografia da vida
social grupo será na perspectiva da coleta de opinião, a qual Babie (1999)
propõe as entrevistas feitas de maneira aberta com roteiros, neste caso serão
focados elementos pertinentes ao conhecimento forma de trabalho solidário e
coletivo na Comunidade Taquari, na tentativa de entender como conseguem
manter as relações nestes campos de discussão levantados para pesquisa.
As primeiras visitas que fiz à região do Morro do Macaco fizeram-me
conhecer, além de Taquari, outras comunidades que se relacionam entre si e
se encontram em eventos específicos, o que ajudou a entender melhor o lugar
de Taquari nos contexto social mais particular. A Comunidade do Cruzeirinho
teve a sua formação baseada na mesma origem histórica da região. As terras
29
foram conseguidas por meio de posse e recentemente, nos últimos 15 anos,
por compra de propriedades. Essa comunidade, de origem mais antiga em
relação a qualquer outra na região teve formação na década de 1980, com a
presença da CEB (Comunidade Eclesiais de Base) que organizou missas no
grupo e ampliou esta unidade de base religiosa católica para orientações na
atividade produtiva agrícola (arroz, feijão e milho no passado e hoje a
mandioca e sua farinha).
O resultado da Comunidade Cruzeirinho é uma organização nos moldes
urbanos com arquitetura em forma de bairro periférico, com casas de alvenaria,
feitas de forma padronizada por meio de mutirão e ação governamental.
Contém área de lazer como campo de futebol de grama, em ótimo estado de
conservação, quadra de concreto, sem cuidados, além de Barracão para
reuniões feito de madeira (Ver Imagem 4). Apesar de ter estruturas físicas e
sociais consolidadas mais antigas do que a Comunidade Taquari, o
Comunidade Cruzeirinho não conseguiu manter uma organização econômica e
social que favorecesse a construção de novos projetos ou ampliasse
solidariedade com outros grupos rurais. Exemplo disto é a falta de captação de
recursos de verbas federais e estaduais para aquisição de maquinários
agrícolas ou compra de sementes, e até da produção, garantindo a
subsistência do grupo.
30
Imagem 3 - Rua da Comunidade Cruzeirinho
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2007.
As entrevistas feitas com moradores desse grupo mostram as diferenças
com uma situação no passado quando a Comunidade Cruzerinho que
conseguiu uma série de benefícios, mas não deu continuidade a ações que
promovessem a unidade do grupo para questões de sustentabilidade,
principalmente, econômica. Esta situação pode ser confirmada numa conversa
com Dona Maria Bárbara (aposentada rural), moradora mais de 30 anos no
local, na qual constata-se que a produção da cooperativa que existia na
comunidade era muito forte, mas com o tempo houve um enfraquecimento nos
investimentos para se manter a produção. A consequência para a Cruzeirinho é
a existência de apenas um único produtor dependente do trabalho rural. Muitos
moram na comunidade e trabalham na cidade de Iporá. Diferente do que
acontece em outras comunidades, as áreas de produção não pertencem ao
grupo, mas ainda assim, persistem as práticas coletivas, as missas católicas
realizadas mensalmente e a participação de seus membros em festas tal como
existe em outras comunidades, como romarias em julho, festas para
padroeiros, São Sebastião e Nossa Senhora, feitas em janeiro e maio.
A apresentação sucinta da Comunidade Cruzeirinho trouxe para
discussão uma contextualização da Taquari na região. Compreender a
31
configuração social e econômica que regem as comunidades rurais na
localidade é uma fonte de dados para categorizar os grupos que compõe que
habitam e produzem na região. Na continuidade da investigação sobre a
Comunidade Taquari houve observações participantes que culminaram no
esclarecimento da origem do grupo, compreensão de sua estrutura e
organização social e econômica, além do entendimento da presença religiosa
no grupo. A seguir uma etnografia de rituais presenciados dentro da Taquari
que explicam as relações dos proprietários rurais com o catolicismo.
4- Eventos e histórias de origem
A etnografia desenvolvida neste trabalho procurou coletar o maior
volume de informações sem a interferência do pesquisador. Os informantes no
trabalho etnográfico expõem diferenças e semelhanças no modo de vida dos
grupos sociais no meio rural, esclarecendo sua configuração social. As etapas
desse trabalho etnográfico foram as observações do grupo em eventos e
cotidiano rural e as conversas e entrevistas com os membros da comunidade
rural. As interpretações sobre a organização familiar, o trabalho rural e os
eventos e representações simbólicas católicas serão analisadas na busca de
práticas ambientais ou discursos que questionem as transformações da
natureza e suas consequências.
Ao coletar informações sobre o grupo o Sr. Adão, um dos membros da
Comunidade Taquari e líder nos eventos na localidade, informou e convidou a
comunidade geral, inclusive perímetro urbano, para o Primeiro encontro das
comunidades da Sagrada Família, Santa Marta, São Paulo da Cruz e Taquari.
Esse evento teve o propósito de mostrar os ganhos que a Comunidade Taquari
conseguiu ao organizar a produção e regularizarem a continuidade dos
trabalhos coletivos no campo com a criação da Associação. Os relatos contidos
no evento e analisados neste trabalho tentam mostrar como a origem dos
grupos não é muito distante da origem do Cruzeirinho ou de outras
comunidades. As quatro comunidades rurais foram compreendidas pela origem
32
da vida social compartilhada no evento, mostrando as relações sociais e sua
interação com a religiosidade e produção. Candido (1997) valoriza o estudo do
espaço e da socialização para se entender e avaliar o grau de solidariedade
que forma a comunidade rural.
O Primeiro encontro das comunidades teve uma programação, que foi
confeccionada em planfetos fotocopiados e distribuídos como convite na cidade
e vizinhança, nela constava esta ordem de momentos: 8:30- música ambiente
(sertaneja); 9:02- café da manhã; 9:30- rádio, na verdade uma mesa de som
com um microsstem ligado com dois microfones (mensagens, recados e
brincadeiras); às 9:45- teve inicio das atividades para apresentação das
histórias das comunidades.
O condutor da programação foi o Sr. Adão. As comunidades chegaram
vestidas uniformizadas, cada uma confeccionou uma camiseta com o nome da
comunidade que pertencia, somente a do Taquari não segui esta linha, cada
grupo ficou separado pela vestimenta e quando assentados nas mesas
dispostas para o pessoal, se agrupavam entre si. O café da manhã, foi servido
com leite, achocolatado em pó, café, pão de queijo, petas e bolos de fubá, tudo
de maneira self-service. Após este momento fomos convidados a visitar a
fábrica de farinha, nela as pessoas viram os equipamentos e fizeram perguntas
sobre a viabilidade econômica do projeto, o Sr. Joseli que orientou o grupo
também falou dos planos futuros.
Depois de voltáramos a Paróquia. Neste momento, o Sr. Deuseli, um ex-
integrante do movimento da “CEB” organizado em Iporá nos anos de 1990
6
fez
uma mistura de evangelização católica, brincadeiras de fundo moral
cooperativista/coletivista com uma pequena gincana misturando os integrantes
da comunidade em equipes separadas por grupos de animais (urso, pato, gato,
leão).
No começo da fala do Deuseli, ele fala da função da igreja católica
matriz de Iporá em auxiliar na articulação e animação dos membros da
comunidade para que haja uma maior integração e troca de experiências entre
elas. Ele comenta que tal atividade não é isolada, mas será ampliada a outras
comunidades. Para afirmar a importância do evento, o Sr. Deuseli lembra de
6
Esta pessoa conhecia as comunidades, e ele é ligado a Paróquia de Iporá (Matriz) a qual foi treinado
quando participava da Pastoral da Juventude e das Comunidades Eclesiais de Bases que se constituíram
na região de Iporá.
33
passagens bíblicas, em relação a organização de encontros comunitários com
os apóstolos, lembrando do exemplo das experiências de sucesso da
Comunidade do Taquari, ele lembra também da falta de algumas pessoas e
agradece a participação da CEB. Depois ele canta com todos “A comunidade
canta alegre canta, a comum das horas, a palavra santa”, e ele diz que está
palavra é a vida deles.
Logo depois deste momento o Sr. Leon, membro da “Comunidade da
Sagrada Família”, lembra que a data do evento coincide com a data de
comemoração da lembrança da importância da família, este dia festejasse a
Sagrada Família, diz que o evento pode ser exemplo para outras experiências
em outras comunidades. Logo depois, um rapaz da Comunidade Sagrada
Família convida, a Renata, que é ligada ao movimento jovem da igreja católica,
para fazer cantar cânticos que as pessoas conheciam ou foram distribuídos
em folhas copiadas. Após esse momento, inicia-se as falas sobre as histórias
destas comunidades
7
. É possível antecipar pelo evento uma relação entre a
igreja católica e as comunidades como algo responsável pela passagem da
tradição. Entretanto, esse é um aspecto ainda não aprofundado teoricamente
neste trabalho.
A primeira história, da Comunidade Sagrada Família, é contada pela
Senhora Ocília, vice-coordenadora da comunidade, e descreve o início do
grupo com a primeira reza do terço na residência do Sr. José Baiochi e Dona
Rosalina, no dia 22 de setembro de 2003. Após algumas missas realizadas no
local o Padre Wiro
8
que celebrou todas as outras até a fundação da
Comunidade Taquari. A existência da comunidade naquela não se mostrou tão
organizada com a produção agrícola ou leiteira em conjunto, mas de forma de
subsistência.
7
Não sei a que ponto tem a relação igreja e comunidades, mas a presença dela entre eles é
uma coisa que passa a tradição, fato que devo melhorar a analise e lembrar de teorias
durkheimianas e weberianas sobre a presença e influencia da religião na organização social
dos indivíduos presentes.
8
Padre Wiro Van Vliet imigrante holandês, que tem sua igreja num bairro periférico de Iporá, ajudou na
formação da maioria das comunidades, pertencia a Congregação dos Passionistas. Juntos a outros
missionários trabalhou em várias cidades da diocese de São Luís de Montes Belos, como Iporá, Diorama,
Montes Claros, Israelândia, Amorinópolis, Jaupaci, Ivolândia, Moiporá, Cachoeira de Goiás, Aurilândia,
Firminópolis e São Luís de Montes Belos Ele chegou na Diocese de São Luis de Montes Belos em janeiro
de 1959 e estava presente em Iporá desde o dia 7 de janeiro de 1964, portanto, com 45 anos na cidade, e
tinha 55 anos dedicado a vida sacerdotal.
34
A segunda história, da Comunidade São Paulo da Cruz, foi anunciada
pela Senhora Mercina, que conta sobre a organização de uma missa
comemorando o “Natal em Família” em outra localidade do município, na
Comunidade Santa Marta. A primeira novena foi celebrada em 1996, na casa
da narradora e de seu cônjuge, onde não houve participação dos vizinhos, por
estarem distantes ou morarem na cidade. No segundo encontro, houve maior
integração. Eles destacam a participação, em 1999, na “Campanha da
Fraternidade” e depois dela o “Círculo Bíblico”, indo de casa em casa, forçando
a interação do grupo. Logo depois, houve a eleição para representação da
Associação. Esse grupo se organizou numa forma mais produtiva, quando
pensamos em soma de trabalho para melhoria do grupo; fator também
compartilhado pela Comunidade Taquari. A Comunidade São Paulo da Cruz
entende que conquistas passam por percalços, e a organização do grupo
permitiu a compra de imóvel e propriedade para construção de um espaço para
a igreja (Paróquia São Paulo da Cruz). Festividades e discussão de práticas
produtivas associadas que, na verdade, resultaram apenas na coleta de leite e
produção de mandioca de maneira coletiva.
Em comparação com a primeira história, esta apresenta maior riqueza
em número de personagens, acontecimentos e realizações. Mas não fica clara
a participação da igreja católica na organização da comunidade, sugerindo que
tudo foi conduzido de maneira autônoma e independente, apenas interferências
de membros e atores secundários.
A terceira história, da Comunidade Santa Marta, foi narrada pela
Senhora Rosimar Barbosa, coordenadora da comunidade. Ela conta que a
comunidade surgiu em dezembro de 1984. O grupo organizou-se,
primeiramente, pelas novenas realizadas na casa de um casal da comunidade
no período do “Natal em Família”. Um personagem que estava na história das
outras comunidades aparece ajudando com materiais e doações de terras para
os membros da localidade. Atividades religiosas como procissão com a
imagem de Nossa Senhora Aparecida
9
e missas na localidade, dentro da
unidade escolar que atendia as crianças da região, são o que fazem o grupo ter
maior interação, além dos batizados, festejos e celebrações, como “Natal em
9
A padroeira da comunidade é Nossa Senhora Aparecida, e o nome da comunidade se pela presença
do Ribeirão Santa Marta que corta das propriedades da localidade.
35
Família” e a “Campanha da Fraternidade”. Por sete anos foi nesse ritmo a
comunidade, mas com a ajuda do Padre Wiro e os holandeses, doadores da
comunidade, fizeram a capela no ano de 2000. O próprio padre celebrou a
primeira missa, que teve uma grande festividade com a participação de várias
comunidades. Aqui realmente vemos o início da comunidade como grupo,
ligado à manifestação religiosa, e com relações de ajuda próxima do grupo
católico.
Em relação às outras duas apresentadas, essa comunidade teve uma
trajetória mais extensa pela origem mais antiga. Ao mesmo tempo, as
conquistas que as comunidades destacam é a consolidação da capela ou
paróquia dentro da localidade, garantindo o direito de atividades na região.
Esse fato, que constataremos também no Taquari; comunidade que avançou
em outras áreas, demonstra a interação entre igreja católica e a fundação das
comunidades.
Mas a mais importante é a quarta história. A jovem Renata se apresenta
para falar sobre o Taquari. Ela nasceu e sempre morou na comunidade e
auxilia nas ações eclesiais da Pastoral da Terra na Comunidade Taquari. A
origem da comunidade é contada, fazendo uma contextualização entre o
momento religioso, a união da comunidade e a relação com meio ambiente.
Veja:
[...] A nossa Comunidade é a Comunidade Taquari. Tem
como padroeira é Nossa Senhora Mãe da Igreja. A
Comunidade Taquari nasceu no dia 13 de junho de 1992
onde o pessoal reuniu lá para celebrar o culto dentro de
um curral de baixo de um de Baru. Pra vocês verem
que interessante, a natureza sempre está presente está
presente em nossa vida. [...] (Fala da Renata sobre a
origem da Comunidade Taquari)
No decorrer do discurso, ela mostra que agentes internos e externos
criam tradições e institucionalizam os locais para cumprimento dos ritos e
festas.
[...] A primeira missa foi celebrada pelo Padre Wiro em 22
de agosto de 1992, num rancho no lado do curral. Que
havia construído um rancho, que foi feito para
celebrações da comunidade. No ano de 1993, realizou a
Festa de o Sebastião, nossa primeira festa. O
36
encontro da campanha da fraternidade no dia 18 de abril
de 1993, decidiu então o local da Igreja... No terreno
doado pelo Seu Abadio. A Igreja foi construída por uma
doação de entidade da Espanha e a Paróquia Caroço
Pedreiros, e a comunidade entrou com os serventes e a
comunidade... Atualmente a comunidade faz a festa de
São Sebastião, Campanha da Fraternidade; Festa Nossa
Senhora das mães, que é a atual padroeira, que é a
padroeira; Encontro Vocacional; Culto, Missa que o
culto e a missa são mensalmente; Culto do Natal em
Família, Celebração da Colheita, onde damos graças
pelo que colhemos durante o ano e Folia de Reis, que a
gente e a saída é aqui mais, e o pessoal São Paulo da
Cruz recebe. [...] (Fala da Renata sobre a origem da
Comunidade Taquari)
As comunidades rurais podem apresentar uma origem de vida e história
própria ligadas de maneira diversa àquelas que tradicionalmente se têm visto,
digo isto numa ilustração. Se as comunidades agrupam-se por motivações
econômicas a fim de garantirem a subsistência no decorrer do tempo, ela
mesma de produzir algo além laços culturais, como ritos ou mitos sobre o
grupo, e estes devem ser mantidos, daí vem a percepção do sentido que tem
as tradições e a vida coletiva, porque se pegarmos indivíduos que fazem dois
discursos de narração da origem deles próprios podemos ter uma fala mais
enobrecedora da comunidade e do esforço para garantir a subsistência com a
produção rural. Outra fala pode dizer que a consagração e salvação da
existência daquele grupo se devem aos laços de solidariedade manifestadas
na ajuda mútua e na religiosidade presente desde tempos passados e
conservados por aqueles que confiam no místico da religião como fator de
manutenção da unidade. Adiante iremos mostrar que no mesmo evento a
atividade econômica associada também caracteriza a solidariedade e coesão
da Comunidade Taquari.
4.1- Associação ou Comunidade?
Brandão (1981) analisou os hábitos rurais e a ideologia de camponeses
do interior do Brasil (Mossâmedes, Goiás) referentes às práticas sociais de
produção e de consumo da comida cotidiana, explica que ao entrevistar os
37
lavradores, percebe-se o quanto o processo de “plantar, colher e comer”
permeia a maior parte dos momentos de suas vidas
Quando convidado a falar sobre a sua vida, o lavrador de
Mossâmedes fala sobre o seu trabalho. Quando ele fala
a respeito do seu trabalho, está falando sobre como e
onde produz, adquire e consome alimentos. Entre as
muitas e complexas atividades e relações da produção
direta de alimentos de origem vegetal e animal; entre
esforços por fazer circularem tipos de “mantimento” e os
momentos de consumo da comida, o lavrador emprega a
maior parte do seu tempo de cotidiano e organiza o
núcleo mais motivado de representações sobre o seu
mundo. (idem, p.7)
No final da narrativa da Comunidade do Taquari, a Renata se retira e o
Sr. Adão anuncia que Joseli o presidente da Associação dos pequenos
produtores da Região do Taquari faria um histórico da formação e atividades
deles. A data de inauguração da Associação se dá com a reunião de 13 d maio
de 1997, no mesmo dia é eleita a Diretoria Provisória, que representaria os
sócios da região que na verdade engloba os moradores sócios da Região da
Santa Marta. Ao falar da história Joseli (tem mais de 40 anos) usa um jaleco
com logo da feira de pequenos produtores realizada em São Paulo, onde a
comunidade exibiu seus produtos, o principal sendo a farinha. Toda fala se
de maneira cronológica lembrando os membros que participaram da
consolidação da Associação e da organização estatutária seguindo um padrão
existente com presidente, vice, secretário, tesoureiro e conselho fiscal, sendo
as tomadas de decisão feitas por meio de assembléia. A primeira eleição da
diretoria (1997), a segunda (2002) e a terceira e atual (2004) sempre tiveram
em seus quadros a participação de Adão que foi por duas gestões presidente e
Joseli, Tesoureiro.
Joseli lembra o sonho que tinham com a Associação entre os realizados:
trator
10
, compras conjuntas, parcerias com a prefeitura, espaço para sede,
energia elétrica, fabrica de farinha e mutirões, o que ficou ainda a fazer foi a
farmácia. Ele fala das dívidas da comunidade que giram em torno de 18 mil
reais de fundos privados e públicos (nível federal), todos investidos nestes
10
Este trator foi fruto de recursos do programa Economia Solidária do Governo Federal, gestão do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
38
sonhos, além de outros como caminhonete e ônibus para transporte escolar.
No meu ponto de vista, essas ações evidenciam a importância do grupo para a
educação dos jovens a fim de que não precisem sair do meio rural para
estudarem, pois o trabalho viria do desenvolvimento da sustentabilidade da
economia solidária na comunidade. A Associação também focou na preparação
das pessoas associadas, como cursos de vaqueiro, defumados, derivados de
leite (eles produzem e vendem iogurte) e a curso para plantação da mandioca,
isto preparou o grupo para se lançar nas empreitadas. Das atividades que
garantem um retorno para o grupo a compra da farinha subsidiada pelo
Governo (CONAN) e divisão da carne da vaca abatida para o grupo, além de
outros projetos como variedades de mandiocas.
Nestes momentos vemos um outro tipo de realização da comunidade
com pertencimento, que a presença da religiosidade em momentos
eventuais e de consolidação de projetos do grupo tem uma relação estreita.
Compreender as táticas que a comunidade utiliza para conseguir apoio em
seus projetos e as articulações com interesses da Taquari, é possível quando a
organização de uma instituição como a Associação canaliza os esforços para
melhoria da qualidade de vida do grupo.
O evento descrito nesta sessão apresenta as comunidades e destaca a
igreja católica sempre presente na origem da comunidade, mas sua atividade
fica explicita em momentos de festividade religiosa, ficando obscurecida
quando ressaltasse a participação em situações financeiras que esteja
envolvida intermediando doadores e organizando arrecadações para
comunidade é o caso das Romarias (celebração de rezas do terço e leilões de
presentes frangos assados, leitoas, brindes para ajudar a comunidade)
realizadas no período da Festa de Maio
11
ou em outro tipo de evento ou
projeto. O que fica fora do alcance da religião é agregado pela organização
legitima de parte do grupo das comunidades rurais, no caso da Taquari a
Associação faz a ponte entre as necessidades econômicas e satisfação dos
mínimos vitais entre os membros da comunidade. A seguir analisaremos o
peso dos discursos
11
Este evento é na cidade, e envolve a comemoração de festejos em homenagens a Nossa Senhora do
Rosário, acontece na terceira semana de maio e dura uma semana, com a organização de uma feira de
roupas, comidas, bares, circo e missas na Matriz de Iporá. Apesar da comunidade ser em zona rural, um
bairro urbano apóia concedendo que o grupo faça a romaria na cidade.
39
4.2- Análise sobre narrativas
Com base nas observações agora feitas e narrativas é possível traçar
num primeiro esboço interpretativo dos elementos da pesquisa. Sobre as
narrativas, que trazem uma primeira construção verbal e de grupo. Os
discursos eram a priore pois foram emitidos pela próprio sujeito que narra tem
toda a atenção para que sua história contextualizada e uma textualização
criando uma identidade narrativa de maneira a invocar o campo fictício,
(re)elaborando e auto-inventado o próprio relato autobiográfico do grupo e
biografia da realidade. Ainda assim, a pergunta que perpassa por questões
éticas e metodológicas é saber como aproximar o real e cercar a ficção a fim
de que não aconteça que o que Bourdieu (1996, p. 58) alertou que é “a relação
entre o mundo social e as obras culturais na lógica do reflexo, circula
diretamente as obras às características sociais dos autores sua origem
social) ou dos grupos que eram seus destinatários reais ou supostos, e causas
expectativas eles supostamente atendem.”
O processo de rememorar leva em consideração a forma cristalizada da
temporalidade, ou seja, o contexto das narrativas devem se refletir na
linguagem, e esta complementaria as lacunas das narrativas que compõem as
trajetórias de vida com seqüências nem sempre cronológicas ordenadas, mas
compartilhadas pelos entrevistador e entrevistado numa situação de biografia,
onde o narrador compete a apreensão da vida e da história, pois este Bourdieu
(1996) coloca em evidência a possibilidade de entendermos através da história
de vida dos sujeitos ou das narrativas que tem dele mesmo ou do grupo a qual
compartilha o espaço social, o sentido compreensivo e explicativo dos
fenômenos sociais aos quais estão presentes na memória e lembranças das
pessoas sociais que relatam após um agenciamento da direção, ou seja, do
sentido da história (KOFES, 2001).
A transposição dos personagens narrativos para produção textual, leva
em consideração as escolhas objetivas e subjetivas que passam o(s)
informante(s) na construção estrutura e processos sociais relevantes nos
40
valores e representações complexas inerentes ao sócio-simbólico presentes
nas narrativas (BERTAUX, 1980).
Segundo Bertaux (1980) a coleta de informações diretamente feita por
meio de perguntas em entrevistas, questionários, conversas livres fazem
saturar o número de variáveis que possam validar e invalidar a comprovação
da história e comprometer o texto final, pois este pode apreender as ideologias
particulares distanciando o recorte de vida que interessa sociologicamente para
compreensão da essência do todo generalizado no simbolismo social presente
na realidade objetiva.
A autoridade de quem fala sempre pesa, pois quem fala (narrador)
muitas vezes não pode ter a instrução e o discernimento apropriado para
mostrar a realidade, quanto mais reconstruir um passado que é minado por
ideologias políticas e culturais que transformam no passar do tempo a real
situação. Para fechar estas discussões é bom lembrar das normas que seguem
o todo etnográfico e antropológico onde o treino do observador e a vivência
cultural ajudam a familiarizar com o objeto, para isto o estudo material e
bibliográfico como a observação participante incrementa a visão sobre o
universo que será transposto. Na produção o foco, a descrição e a
interpretação tendem a classificar e catalogar as estruturas presentes no
decorrer da história conjuntural dos sujeitos, grupos ou fenômenos estudados
ou presentes nos discursos daqueles que contribuem na lógica da construção
de uma realidade estranha ao pesquisador (MALINOWSKI, 1979).
O tratamento que devemos dar aos relatos de grupos tem uma
preocupação nos sujeitos, estes estão sempre atualizando as ações na
conjuntura sócio-cultural de maneira subjetiva, ou seja, o passado persiste,
mas os atores que passam por uma experiência não precisam ter visões iguais,
mesmo em situações diferentes, cada indivíduo cria conceitos para
responsabilizar suas próprias, e isto se manifesta nas tradições.
A preocupação das ciências que utilizam as narrativas e as memórias
tem fundamento nos elementos que constituem a memória. Nesta discussão
Pollack (1992) destaca em primeiro lugar os acontecimentos vividos pelo
sujeito; e em segundo lugar os acontecimentos vividos pelo grupo ou pela
coletividade à qual a pessoa sente pertencer; e por último o lugar que faz
conectar o lugar com a memória. Estes três critérios, acontecimentos,
41
personagens e lugares podem fazer saber qual é a ligação real do relato com a
construção da estrutura social e simbólica cognitiva compartilhada. As
tradições são representações da memória herdada por aqueles que não
viveram as épocas passadas, mas preservam na lembrança dos antepassados
a (re)afirmação da identidade.
5- Tradições e Religiosidade
Ao analisar o desenvolvimento e a sustentabilidade da Taquari retomo o
tema dos eventos religiosos tradicionais da igreja católica, abordado no item 2
do Capítulo I, como a missa e outro evento com particularidade, denominado
“Festa da Colheita”. Esses eventos se constituíram após a Comunidade
Taquari, que se formou com base nas CEBs aproximando o discurso religioso
com a necessidade de promover a vida social e a sua existência. Assim,
A religião como um lugar de reza, de oração e de
reafirmação da fé; da novena e da procissão, da reflexão,
da discussão das agruras e alegrias cotidianas; do
negócio e do ócio, do encanto e do desencanto, da
recriação de um espaço utópico chamado de
“comunidade”, enfim, onde se celebra a vida. (TOSTA,
1997. p. 60)
As festas e os rituais católicos que constituem um espaço para análise
das mudanças e novas formas de apresentação das comunidades rurais,
evidenciam mais que uma soma de produtos resultantes da convivência,
solidariedade e processos sociais, mas mostra a constante recriação num
espaço socialmente determinado (TOSTA, 1997). A organização da família e
da vizinhança na Comunidade Taquari tem uma transformação em seus
discursos quando se misturam dois fundamentos do grupo, um tradicional, a
religião católica e outro de discussão recente no grupo, como o meio ambiente,
que foi levantado na história de origem relatada. A problemática que se
apresenta nesse grupo é perceber como estes quatro elementos família,
42
religiosidade, vizinhança e meio ambiente sustentável podem surgir dentro de
um espaço e quais as mudanças nas estruturas e relações sociais do grupo de
forma endógena e exógena. Tosta (1997) pensa esta problemática de como
pensar um espaço na perspectiva antropológica construindo um entendimento
da junção da explicação cultural e espacial. Para isso, ela considera que:
Espaços que têm sua lógica de criação e recriação
determinada e limitada por uma série de fatores
estruturais que constituem a rede de relações sociais,
políticas e econômicas nas quais estes grupos estão
inseridos. Claro não estamos tratando de grupos
isolados, fechados sobre si mesmos, com um corpo de
rituais e com uma explicação da natureza e de seus
próprios processos sociais contida num conjunto de
mitos, como os povos primitivos de Lei-Strauss,
Malinowski, R. Brown, V Turner e outros autores. (idem,
p. 59)
Essa visão sobre a religião na Taquari é percebida em alguns eventos
que foram registrados na comunidade nos meses de julho e setembro de 2007
e 2008, quando foi desenvolvido o trabalho de campo na região (Veja as
imagens 5 e 6)
12
. Nos eventos registrados, podemos detectar duas dimensões
que são celebradas distintamente: a primeira, diz respeito a própria força
religiosa do grupo; e a segunda está relacionada a comemoração da produção
do grupo. Em ambos os eventos existem dois rituais; um mais tradicional e não
muito diferente do que é descrito em trabalhos antropológicos que analisam
diversos aspectos da Romaria em outros locais do Brasil. O outro evento com
características religiosas, mas com celebração distinta de outras, é a Festa da
Colheita que mistura a eucaristia do ritual da missa da igreja católica com um
momento de oferendas para serem abençoadas. A Festa da Colheita tem
referencia na festa homônima, narrada na Bíblia em Êxodo capítulo 23,
versículo 16, que diz: “[...] igualmente guardarás a festa da colheita à saída do
ano, quando tiveres colhido do campo os frutos do teu trabalho”. O detalhe fica
nos espaços decorados; altares de representação de acontecimentos, como
12
A completa participação nos eventos “Romaria dos Santos Reis” e “Festa da Colheita” aconteceram em
2007 e 2008, respectivamente. Sendo também utilizada para análise da Festa da Colheita fotos de 2007
feitas pelos membros da Comunidade Taquari.
43
nascimento de Jesus exposição e mostra dos produtos colhidos nas
plantações.
Imagem 5 - Romaria feita no início do mês de julho com a participação da
Comunidade Taquari e Comunidade Santa Marta
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2009
Imagem 6 - Missa realizada por membros da Comunidade Taquari na
celebração da Festa da Colheita
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa. 2008.
44
A Romaria dos Santos Reis é a representação da peregrinação que os
três reis magos fizeram ao menino Jesus quando nasceu. A organização do
evento se no ano anterior quando uma família recebe a incumbência de
realizar a romaria. A dois anos a saída é feita na Paróquia Nossa Senhora das
Mães na Comunidade Taquari e o encerramento é feito numa fazenda na
Comunidade São Paulo da Cruz. Tanto no início como no fim do evento
uma devoção e pedidos de oração para bandeira que fica numa mesa com
arranjo florido (Ver Imagem 7 e 8).
Imagem 7 - Bandeira da Romaria dos Santos Reis
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa. 2007.
45
Imagem 8 - Momento de devoção e orações
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa. 2007.
Os itens essenciais para o evento (Ver Imagem 9) são pontuados a
seguir:
a bandeira com a imagem de Nossa Senhora simbolizando o cortejo;
os músicos que entoam passagens bíblicas de maneira mantrica com
suas vozes agudas, a letra são passagens bíblicas, utilizam diversos
instrumentos musicais como bumbo, caixa, viola e sanfona;
o rei e a rainha que carregam a bandeira;
os donos da casa que recebem a romaria;
e os palhaços que impede de acharem o menino Jesus todos com
indumentárias de caráter artísticos e históricos.
A organização do evento e todo o simbolismo que cerca o evento implica
num sentido de solidariedade que existe nas comunidades formadas pelas
orientações religiosas. A celebração de tal evento é percebida nas imagens
com o grau de participação dos membros da comunidade, a quantidade de
vizinhos e convidados que partilham da felicidade da comemoração de evento
com tanta fartura e volume de bênçãos que são representadas pelo alimento
compartilhado.
46
Imagem 9 - Rei e Rainha que carregam a bandeira, Donos da Casa que
recebem a romaria, palhaço e ao fundo cantores
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa. 2007.
Durante a semana de peregrinação são visitas das várias propriedades,
correspondendo a todas as famílias das duas comunidades, o detalhe é que
para cada turno existe uma para onde é fornecida alimentação para os
romeiros e feitas orações e cantos (Ver Imagem 10 e 11). Mas a romaria não é
peregrinação, pode ser também uma festa popular de arraial que, com
danças, comidas etc, se celebra a festividade com grande número gente que
busca o entretenimento, fartura de alimentos e a religiosidade no grupo.
47
Imagem 10 - Momento da janta, com canto, oração e encenação da
passagem da coroa para próxima família que organizará a romaria
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa. 2007.
Imagem 11 - Momento de devoção dos cantores e palhaço em frente ao
presépio sem o menino Jesus
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa. 2007.
Em todos os momentos da romaria, assim como, na Festa da Colheita
os alimentos são celebrados. No primeiro caso o agradecimento da fartura é
apresentada aos convidados num banquete com fartura de arroz, feijão, carnes
e salada. No outro evento o benção divina é feita com oferta de itens que foram
48
produzidos ou objetivos que representam o trabalho. A natureza é vista nestes
eventos como local de aquisição de mercadorias, satisfação das necessidades
e subsistência. Ao pensarmos sustentabilidade dentro dos eventos, podemos
compreender a fatura de oferta de alimentos mostra o agradecimento do
retorno que o campo nos dá com o trabalho rural.
Tosta (1997) procurou compreender como as celebrações da missa se
realiza nas Comunidades de Base, que este ritual sofre com a dinâmica
cultural, sendo os eventos mais fundamentais da história do bairro. O exemplo
deste acontecimento é a Festa da Colheita que emerge com mecanismos
simbólicos que operam os sentimentos dos participantes em suas experiências
nos rituais. No caso deste evento o que analisaremos adiante é a dramatização
e o simbolismo que fazem ao celebrarem a missa de agradecimento a colheita.
Imagem 12 - Altar e arrumação e demonstração de oferendas feitas dentro
da Paróquia Nossa Senhora das Mães na Comunidade Taquari
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008
O interessante nas imagens 9, 10, 11 e, 12 é destacar os itens que são
expostos. Enquanto na Romaria Santo Rei, a bandeira e a encenação de um
presépio invocam a devoção e lembrança da presença da religiosidade cristã, a
49
Festa da Colheita faz um altar com oferendas que pedem bênçãos: a Ata da
Associação dos Produtores da Região do Taquari; alimentos diversos que são
produzidos na comunidade e na fábrica, como a farinha; além de outros
produtos e objetos (fotos, cabaça, etc). A participação de jovens e de membros
mais velhos do grupo mostra como a reprodução dos eventos
13
está ficando
arraigada desde cedo. Esses jovens ainda recebem uma formação de liderança
com a Pastoral da Juventude e com a própria Igreja Católica. Toda essa
movimentação aproxima o pensamento sobre a produção e a religiosidade,
mas ainda não explicita a importância do meio ambiente para o grupo.
Isso porque, na Festa da Colheita de 2007, houve uma maior encenação
da importância da colheita e da natureza. Nesse evento, um homem interpretou
o papel de uma árvore que recebia tratamento do homem, como terra e água.
A retribuição da árvore é a produção de frutos (Veja Imagem 13). Em meio a
orações, cânticos e palavra evangelizadora, os membros da comunidade que
assistiam a encenação dentro da paróquia, absorveram um discurso da
importância do meio ambiente de maneira mais direta do que em outros
eventos.
13
Na foto não existem pessoas pois foram tiradas antes do começo do rito, onde o desenvolvimento dos
acontecimentos acontecem justamente em frente as oferendas não sendo possível capturar uma cena sobre
o espaço e as ações.
50
Imagem 13 - Homem representando uma árvore na Festa da Colheita em
meio a um ritual litúrgico
Fonte: Associação dos Produtores da Região do Taquari, 2007.
O que temos, ao relacionar sustentabilidade e religiosidade, é que o
primeiro, em relação ao segundo, tem o caráter de “[...] diminuir a
desigualdade, para a proteção das pessoas hoje e no futuro, e pra conservar
sistemas de apoio à vida - o meio ambiente -, sistemas esses que, para os
crentes, são criação de Deus” (GOODLAND, 1999. p. 291). Esta interpretação
pode ser vista na análise da encenação feita pelo grupo, se considerarmos a
mudança na forma de uso do espaço e do contexto da pregação.
Esses eventos são anuais e representam a fatura conquistada em cada
ano decorrido. A Comunidade Taquari como local de avaliação dessas
conquistas e visível nos eventos de caráter tradicional como a romaria.
Também percebemos que a Associação dos Produtores da Região do Taquari
se aproxima da religiosidade, ao fazerem comemorações agradecendo a
aquisição de produtos, compras e vendas de mercadorias para subsistência de
seus associados e de garantir a renda dos membros da Comunidade Taquari,
mesmo aqueles que não são associados. Um fundamento bíblico do grupo gira
em torno do princípio de que, se todos o irmãos na comunidade, por isto,
51
devem se ajudar. Os associados não excluem inteiramente os outros membros,
pois essa instituição compra a produção de não-membros e faz ações de
mutirão para ajudar o grupo a superar os problemas e dificuldades.
As comunidades rurais dependem de uma origem para se afirmarem
como possuidores de vida e história próprias, ligadas de maneira diversa
daquelas que tradicionalmente se têm visto, podendo variar a perspectiva de
análise para visão antropológica ou sociológica. Refletiremos sobre isto numa
ilustração. Imaginando as comunidades rurais, e acreditando que elas se
agrupam por motivações econômicas, sendo elas institucionalizadas em
associações ou cooperativas, a fim de garantirem a subsistência, este
fenômeno pode produzir laços culturais. Os ritos ou mitos religiosos do grupo
ao serem mantidos com a instituição social tendem a ser tradições na vida
coletiva, caso seja incorporado aos discursos da comunidade. No discurso a
consagração da produtividade e dos negócios advindos da associação e os
laços de solidariedade, manifestados na ajuda mútua e na religiosidade podem
explicar a manutenção da coesão social. Esta hipótese pode ser observada a
seguir na análise na vida rural e no cotidiano religioso da comunidade onde o
evento e o trabalho rural se consolidaram.
5.1- Religiosidade e campesinato
É importante entender que a comunidade precisa ser um grupo unido,
que compartilha experiências num tempo histórico, a fim de garantir uma
reciprocidade e interação numa rede social mais bem tecida, como Baumann
(2003) diz, ao falar do agrupamento humano:
[...] nenhum agregado de seres humanos é sentido como
“comunidade” a menos que seja “bem tecido” de
biografias compartilhadas ao longo de uma história
duradoura e uma expectativa ainda mais longa de
interação freqüente e intensa. (idem, p. 48)
Ao citarmos Baumann (2003), podemos observar a Comunidade Taquari
além das tradições existentes com as práticas tradicionais católicas, e ver
52
como existe uma criatividade no lidar com situações novas. Um exemplo dessa
criatividade que confirmam a singularidade da comunidade, é o ritual religioso,
com orientação católica, denominado por eles de “Festa da Colheita”, momento
de agradecimento pela fartura produzida pela comunidade. Mais adiante serão
analisados esta festa e outro evento com influências da eucaristia católica e
simbolismos tradicionais do meio rural. As comunidades rurais de Iporá
apresentam uma ligação com a produção, mas em Taquari os ritos se mesclam
de tal forma que a produção é uma manifestação dos desejos e esforços
depositados nas forças sobrenaturais da religião.
A Comunidade Taquari é aqui entendida como comunidade também
porque seus membros se organizam em torno de uma paróquia, por iniciativa
de padres, leigos e integrantes do grupo os quais estão se unindo, com a
finalidade de manter uma natureza religiosa pastoral e não estarem dispersos
(BETTO, 1981). No Taquari, a participação do Padre Wiro, da Senhora
Dovernila e de alguns proprietários rurais que, com suas famílias, decidiram
fazer reuniões para celebração de missas na zona rural foi o primeiro passo
para se ter uma comunidade orientada pela CEBs.
Também considera-se comunidade com esse vínculo particular,
conforme compreendido por Tosta (1997):
São comunidades porque reúnem pessoas de uma
mesma fé, mesma Igreja e moram numa mesma região,
vivendo uma “comum-união” em torno de problemas de
moradia, alimentação, saúde etc. e lutando por melhores
condições de vida e partilham anseios e esperanças
comuns.
São eclesiais, porque são congregadas à Igreja como
núcleos básicos de fé.
São de base porque integradas por pessoas que
trabalham pelas próprias mãos. Camadas populares
compreendidas como donas de casa, operários,
subempregados, aposentados, jovens etc. na zona rural
são os pequenos proprietários, arrendatários, peões e
seus familiares. (idem, p. 61)
A compreensão da CEB passa, portanto, por uma interpretação política
da vontade dos oprimidos, que tentam se organizar de maneira consciente e
crítica contra a ordem social injusta (BETTO, 1981). Se a desigualdade
53
persiste, isto não aconteceu com as CEBs. Tosta (1997) mostra como o
processo se desacelerou por dois motivos. O primeiro, relativo ao novo quadro
social e de motivação política brasileira, nas mãos de partidos e outras
organizações. O segundo, o afastamento da CEBs do discurso evangelizador e
religioso, se tornando mais político e sem carisma.
O aprofundamento na questão comunitária se também no aspecto
religioso. O movimento das Comunidades Eclesiais de Base (CEB) influencia
no trabalho rural e na organização social dos grupos rurais no cerrado. Sua
expressão em ritos de festas e tradições presentes no grupo, demonstram a
organização da comunidade. Essa comunidade é definida com grupo formado
em torno da capela da Igreja Católica, iniciado por leigos que têm a mesma fé e
moram na mesma região, motivados pela comum-união em torno de seus
problemas de sobrevivência e por melhores condições de vida para as classes
populares como: assalariados agrícolas, pequenos proprietários, peões e seus
familiares (BETTO, 1981). Esse aspecto deve ser observado nas práticas
religiosas e nos eventos culturais e tradicionais das comunidades rurais locais,
das quais o Taquari participa. Nesse sentido a observação buscar
compreender o sentido do discurso das CEBs, ainda existente no interior das
práticas dos discursos da Comunidade Taquari, nesses momentos de
expressão religiosa e de organização coletiva.
Houve um tempo em que não havia muita necessidade de explicar o
significado da sigla "CEBs". Fazia parte do imaginário e do vocabulário de
muitos cristãos católicos. Suscitava entusiasmos e esperanças, assim como
perplexidades e interrogações. Mas hoje, muitos nem se lembram da luta das
CEBs no processo de democratização. Naquela época, existiam, em todo o
país, pequenas comunidades ligadas principalmente à Igreja católica. Eram
grupos de pessoas que, morando no mesmo bairro, na definição de Candido
(1997), se encontravam para refletir e transformar a realidade à luz da palavra
de Deus e das motivações religiosas. Daí o nome de Comunidades Eclesiais
de Base (CEBs). As reivindicações por melhorias nas localidades promoveram
uma caminhada para tomada de consciência da situação social e política do
país. Queriam a transformação da sociedade, baseando-se no método "Paulo
Freire" de alfabetização de adultos e na Teologia de Libertação, da qual
54
Leonardo Boff foi um dos destaques. Ambas executavam uma metodologia que
levasse da conscientização à ação, ou seja, uma prática social.
A Comunidade Taquari está organizada por vinte e nove produtores
rurais, sendo que alguns desses, cerca de 20%, não são proprietários de
terras, mas trabalham para outros e têm um espaço para criação de animais e
uma pequena plantação. No começo, somente doze famílias faziam parte do
grupo. É interessante lembrar que a Comunidade Taquari é um grupo
heterogêneo quando, se pensa em recursos materiais e propriedade, e que
somente quatorze famílias são associadas. O que se observa é que o grupo
teve inicio pela religiosidade e que a associação surge para compensar a
situação de pobreza que alguns têm. No trabalho de campo, percebi a situação
de pobreza pela aparência das residências e pelos bens que as famílias
possuem. Muitas casas são incompletas, sem acabamento. Os indivíduos com
melhor condição financeira, além de possuirem mais animais, maior área da
propriedade, maquinário agrícola e automotivo apresentam uma diversificação
em sua propriedade, como lavouras e criações de gado, suíno, aves, búfalos,
entre outros.
Antonio Candido (1997) ao observar as transformações nas relações
econômicas do caipira, mostra a interferência do capitalismo na organização
social e cultural do grupo, quando este se necessitado de uma produção
excedente, para manter uma sustentabilidade econômica e ambiental. Assim,
haveria uma abertura para entender como ações explicitas e implícitas
configura a Comunidade Taquari como integrada ao sentido de
desenvolvimento sustentável como processo de racionalização do capital
(LEFF, 2001; CAVALCANTI, 1999). No caso desta comunidade, é a forma de
apropriação comum dos espaços e recursos naturais, na propriedade privada,
que devem ser pensados e recriados coletivamente de maneira a serem
usados com moderação, na medida em que deles dependem a reprodução
social e simbólica do grupo (KRISCHKE, 1998).
Taquari apresenta um modo de organização que coincide com aquele de
pequenos grupos rurais, organizados como “comunitários”. Esses grupos
desenvolvem experiências que demonstram os objetivos de conciliar a
produção econômica e preocupação com o meio ambiente e organização
sócio-cultural. Isso é visto nos mutirões para roças, festas, colheitas, nos quais
55
existe uma preocupação de não agredir o espaço, escolhendo locais
apropriados para que o meio ambiente não sofra impactos danosos da
presença humana. Alguns autores como Brandão (1986), Ellen F. Woortemann
(1995), Diegues (2002) e Vieira e Weber (2002), percebem que o modo de vida
das populações com esse tipo de organização tem garantido não a
conservação ecológica e a manutenção da produção, mas também a
diversidade cultural; o comportamento e valores culturais; a identidade da
familiar e a unidade da organização doméstica, mostrando a dimensão das
relações sociais internas e externas do grupo local.
Neste momento, pode-se fazer uma retomada da distinção de dois
conceitos presentes na Comunidade Taquari. Quando os membros de uma
família possuem uma produção que não contém excedentes para subsistência,
então eles podem ser definidos como camponeses, como afirmava Brandão
(1981). Em se tratando da agricultura familiar, de acordo com Gazolla (2006)
pode-se dizer que além da participação do núcleo familiar pai, e e filhos
existe uma preocupação na diversidade produtiva, na produção para auto-
consumo e na sustentabilidade dos processos produtivos, mas que hoje, este
grupo se reproduz com base no mercado de produção especializada. Estas
duas formas se encontram no Taquari, mas ao generalizarmos o grupo tem-se
percebido, pelos seus aspectos pertinentes, que a Agricultura Familiar é o que
mais se assemelha às novas formas de produção rural encontradas na região.
Pois as formas de cooperação no grupo e de solidariedade se tornam mais
fortes quando estes estão envolvidos numa produção, principalmente se
atendem a demandas externas. Todo o trabalho do grupo é voltado para que
os membros possam superar suas limitações, por isso, a criação de uma
associação.
O trabalho que se apresenta no meio rural atende a sociedade de “fora”,
fato que Brandão (1981) expõe, mostrando as limitações de grupos que não
conseguem manter a sua subsistência no campo e procuram trabalhos do tipo
não-agricola. Schneider (1999) tem esta preocupação do mercado, trabalho e
produção também e ambos os autores tem conclusões que são vistas na
Comunidade Taquari. Ela apresenta alguns indivíduos com produção sem
excedente, mas que se envolvem em outros tipos de atividades, como venda
56
da produção de mandioca ou leite e trabalho na fábrica de farinha para
conseguirem seus mínimos.
Os trabalhos de caráter antropológico e sociológico que investigaram a
vida rural relacionada à preocupação com o equilíbrio social e ecológico,
consideraram o mundo agrícola e seus agentes como algo estável passando
por inovações teóricas chegando a conceituações de mudança social. Nesse
processo, as pesquisas feitas com esta preocupação tiveram foco na família,
parentesco e gênero; no trabalhador rural e em seus meios de produção; na
alimentação; na análise quantitativa e qualitativa da distribuição da produção e
do uso da terra (BRANDÃO, 1981). Também foram feitos estudos na
Comunidade Taquari observando sobre a organização social e do sistema rural
através da cultura e das redes sociais produzidas internamente e
externamente. Essas discussões necessitam integrar argumentos sobre
relações sociais no campo, que envolvem questões ambientais, práticas
comunitárias, trabalho rural, entre outros, de modo a conceituar melhor o meio
e a produção rural que se apresenta na Comunidade Taquari, com trabalho
comunitário de organização assosiativista.
Neste trabalho, entedemos a comunidade rural e seu desenvolvimento
sustentável, observando o tratamento dado a quem compartilha a terra e sua
produção; verificando sua proximidade com as relações de trabalho, a tradição
e a religiosidade do grupo que explicam as relações comunitárias. Os focos
principais são a agricultura familiar e suas organizações de cooperativismo ou
associativismo frente ao mercado (PLOEG, 2006), no estabelecimento redes
sociais que promovam o desenvolvimento rural, no entendimento da nova
condição do lavrador.
Através dos estudos sobre campesinato e agricultura familiar é que as
formas de organização da Comunidade Taquari adquiriram sentido e
direcionam a procurar as formas e práticas de sustentabilidade, que nos
processos de pluriatividades promovidas pela tecnologia e mercantilização da
produção rural, fizeram transformar uma comunidade numa organização
assosiativista (SCHNEIDER, 2003; 2006). Ao mesmo tempo, observou-se as
tradições culturais e religiosas que parecem dar identidade ao grupo
(WOORTMANN, 1995). As vantagens dessa comunidade de permanecer no
trabalho direto na terra e adotar práticas modernas nas relações de produção
57
constituem uma intencionalidade compartilhada de ações que garantam a
qualidade de vida dos membros desse grupo associativista.
O entendimento de sustentabilidade passa por uma investigação da
noção de estado tecnológico e econômico do grupo, nas condições atuais e na
perspectiva de inovações de produção no futuro. O reflexo das decisões para o
grupo forma uma realidade social integrada ao processo produtivo rural, de
maneira a não excluir do mercado o pequeno produtor frente a outras
propriedades de maior participação econômica com incrementos não
diversificados na produção, mas de capital e produtividade excedente, mesmo
que o grupo seja disperso no espaço, conforme nos diz os estudos de Brandão
(1981; 1986), Antonio Candido (1997) e Wolf (1976).
Adiante, será possível entender como o trabalho no meio rural pode
estar relacionado com as práticas ambientais. Nesta análise, serão abordados
o trabalho na propriedade e qual é o uso da terra para que se possa ter um
desenvolvimento e crescimento da produtividade sem deixar as questões
ambientais impedirem o processo de modernização do campo.
6- Os grupos e a sustentabilidade na Comunidade Taquari
A organização de grupos rurais promove uma integração melhor
para superação e defesa de determinadas situações de competitividade e
subsistência no campo. As novas formas de obtenção de capital e utilização
dos recursos naturais, principalmente a terra para plantio e criação de animais,
fazem surgir campos de conhecimento que não eram almejados ou esperados
pelo grupo. Assim, o uso da força de trabalho dentro e fora do grupo familiar e
comunidade se torna uma necessidade. A possibilidade de transformação da
propriedade e do trabalhador rural acompanha um ritmo ao qual a propriedade
rural se adapta de acordo com necessidades iminentes ao grupo. Na
sequencia, será possível compreender mais essa nova situação que mescla de
forma complexa a organização social rural e a sustentabilidade produtiva do
grupo.
58
Candido (1997) cita rgio Buarque de Holanda quando este entende a
problemática da incorporação das novas práticas culturais e sociais num grupo
já estabelecido e homogênea com sua organização. Diz ele:
[...] para a análise histórica das influências que podem
transformar os modos de vida de uma sociedade é
preciso nunca perder de vista a presença, no interior do
corpo social, de fatores que ajudam a admitir ou a rejeitar
a intrusão de hábitos, condutas, técnicas e instituições
estranhas à sua herança de cultura. Longe de
representarem aglomerados inânimes e aluviais, sem
defesa contra sugestões ou imposições externas, as
sociedades, inclusive e sobretudo entre povos naturais,
de sua unidade orgânica, preservando-as de tudo quanto
possa transformar essa unidade. Ou modificando as
novas aquisições até o ponto em que se integrem na
estrutura tradicional. (HOLANDA, 1949. p. 213 apud
CANDIDO, 1997. pp. 36-37)
Sabe-se que a terra produtiva como ponto de discussões ambientais
surge com um processo de maturação na década de 1970, com os primeiros
congressos de alerta ambiental. Essas discussões prosseguem com o
surgimento do conceito de desenvolvimento sustentável nos anos 80,
culminando no encontro RIO 92 e RIO +10, que foram acontecimentos
paralelos à construção de medidas legais e empíricas que procuraram discutir
o futuro do meio ambiente na sociedade moderna. O Tratado de Quioto, que
prevê redução de emissão da poluentes e as ações de alerta para manutenção
da flora e fauna, como também o uso racional das águas são exemplos das
tentativas de manter o equilíbrio entre o homem e a natureza (SCOTTO et all,
2007). Todo esse esforço político atuou e atua no meio rural através de
medidas governamentais, e é discutido por entidades não-governamentais. O
reflexo disso são as críticas ao uso de alimentos transgênicos e uso
responsável da água e de pesticidas, aprimorando o manejo da produção agro-
industrial.
No Brasil, além da economia nacional, também contribuíram para o
desequilíbrio ambiental: o desmatamento florestal, o avanço das lavouras de
monocultura como cana-de-açúcar e soja em áreas como o Cerrado, que é um
bioma com importante papel de transição entre todos os demais biomas
59
brasileiros. As pastagens para rebanho bovino, relatadas no Relatório de 2007
pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação),
são os vilões enquanto não se discute e se controla, de maneira ecológica, as
grandes e pequenas propriedades produtivas. Essa situação coloca em
discussão a questão da manipulação da natureza frente à economia ambiental
sustentável (SCOTTO et all, 2007).
O que vemos na Taquari são as relações que o homem e o meio
ambiente tem através das práticas desenvolvidas por comunidades rurais com
tradições culturais coletivas baseadas na religiosidade, e ainda adotam certas
inovações tecnológicas e formas de produção que ultrapassam o que se define
como “agricultura de subsistência” (BRANDÃO, 1981; CANDIDO, 1997).
Considera-se que as rendas provindas da produtividade agrícola que garantem
a satisfação das necessidades do grupo familiar recebem a contribuição das
inovações tecnológicas no campo, das políticas públicas e da crescente
participação do trabalho não-agrícola no meio rural (ABROMOVAY, 1992).
Essas transformações serão consideradas na análise de uma
comunidade rural produtora de mandioca e outras mercadorias, sendo que
parte do grupo produz sem excedentes e outro nicho dentro do grupo produz
excedentes para um mercado urbano não estabilizado na demanda.
A organização social é um fator que nos faz entender melhor o grupo.
Percebe-se que no Taquari, hoje existe unidade, liderança e uma organização
produtiva que possibilita aos membros do grupo acreditarem numa melhoria do
passado e em um futuro promissor.
A Comunidade Taquari apresenta uma configuração heterogênea
quando analisamos a diferenciação dos membros por categorias, como
“agricultores familiares”, “camponeses” e “trabalhador rural”. De acordo com as
leituras feitas por Brandão (1981), Woortman (1995) e Schneider (1999)
podemos compreender agricultores familiares, como agrupamentos de
parentesco consanguíneo ou família nuclear onde somente estes trabalham e
fazem os serviços necessários para a produção de subsistência ou lavouras
com finalidade comercial.
A definição de Brandão (1981) de camponês ou pequeno proprietário
rural é a que mais se aproxima dos membros Comunidade Taquari. Em seu
conceito temos:
60
Camponês ou pequeno proprietário é o produtor agrícola
dono de porções de terra de pequenas dimensões [...];
trabalhador direto em regime de produção familiar e, em
geral, não apropriador de forma de trabalho. (idem, p. 7)
Brandão (1986) ao definir o camponês entende que este não possui
posse da terra onde trabalha, mas cria acordos, muitas vezes informais, para
receber sobre os serviços prestados e participar com percentuais na colheita
da lavoura do proprietário da terra. Brandão (1981 e 1986) categorizam o
trabalhador rural como aquele que vende sua força de trabalho no campo,
sendo que parte destes podem ser proprietários rurais. No caso do Taquari,
cerca de 2% grupo é formado de trabalhadores rurais que não são
proprietários. O restante são proprietários com pratica de agricultura familiar ou
são proprietários que se utilizam dos serviços dos trabalhadores rurais,
normalmente vizinhos, para cuidarem de serviços de manutenção da terra, da
lavoura, do gado e da vigilância da propriedade. Adiante serão analisados os
proprietários que fazem parte da Associação dos Produtores Rurais do Taquari
e da comunidade.
Na Comunidade Taquari, 52% dos produtores da região são membros
do grupo, mas não fazem parte da Associação e 48% são membros da
comunidade e da Associação. Destes, 25% pertencem a Comunidade Taquari.
A Associação dos Produtores Rurais do Taquari foi criada em 1997, com
eleição de Diretoria.
A consolidação da Associação e da organização estatutária para
representar os sócios das regiões de Santa Marta e Taquari por meio de
assembléia e garantiram não a institucionalização de parte do grupo na
Comunidade Taquari, mas outras conquistas, como: trator, compras conjuntas
com o uso do CNPJ, parcerias com a prefeitura na aquisição de bens com
recursos federais, construção de sede, rede elétrica, fábrica de farinha. Os
mutirões resultantes também da atuação da Associação, favorecem tanto os
membros que têm agricultura familiar como aqueles que são camponeses. Eles
provam que a Comunidade Taquari é uma organização cujos membros terão
amparo solidário enquanto sua proposta tiver foco na melhoria da qualidade de
61
vida deles, com o aperfeiçoamento das práticas produtivas e diversificação de
rendas.
Assim, as propriedades dos membros da Comunidade Taquari podem
ser descritos em duas categorias: 1- baseadas no tamanho da propriedade; 2-
em relação ao porte da produção, sendo ela de subsistência ou sustentável.
Para auxiliar nessa tarefa serão utilizadas imagens fotográficas tiradas nas
incursões do trabalho de campo etnográfico, para que seja visualizada a
situação da propriedade (Ver Imagens 14, 15 e 16).
Imagem 14 - Vista de uma pequena propriedade sem muito recursos de
um membro da Comunidade Taquari
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
62
Imagem 15 – Propriedade do Sr. Adão membro da Comunidade Taquari e
ex-presiendente da Associação dos Produtores da Região do Taquari em
1997 e 2005-2007.
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
Imagem 16 - Propriedade de membro com mais estrutura da Comunidade
Taquari
63
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
O primeiro destaque que se faz é sobre o tamanho das propriedades
que variam de menos de um alqueire a mais de cinquenta alqueires. Essas
medidas são referentes aos membros da Comunidade Taquari, pois em dados
do INCRA, IBGE e SEPLAN tem-se uma visão macro da situação, o que pode
ser comparado com o que existe nas propriedades analisadas. A visão que se
tem nas visitas é que nas áreas de maior extensão o proprietário é o que tem
maior porte de produção e consegue superar um mínimo de subsistência,
enquanto em outras propriedades é notório o estado precário dos alicerces das
propriedades.
Ao analisar as propriedade e comparar as imagens foram buscadas
bases teóricas nos baseamos em Brandão (1986) para definir “os ricos” e “os
pobres”. Assim, a qualidade da residência da propriedade rural e a posse de
veículos e, sobretudo, os critérios ligados ao quantitativo da produção
diferenciam as propriedade no Taquari.
Brandão (1986) ainda esclarece:
Rico, ou pelo menos-pessoas de “alguma posse”, são os
fazendeiros, ainda mais quanto não precisam morar na
propriedade ou “botam casa na cidade para a família”.
São aqueles que possuem pelo menos um “gerente” ou
um “vaqueiro” a seu serviço, dispensando-se até mesmo
da administração diária da propriedade.
Abaixo deles estão os que possuem fazenda [...] não
residem na propriedade rural e somente se aproxima de
força de trabalho agrícola em épocas de atividades mais
intensas nas pequenas roças próprias de cereais, muitas
vezes destinadas apenas “ao gasta da família”. [...]
No limite entre os ricos e pobres estão os pequenos
proprietários, mas, tal como os lavradores, presos ao
trabalho direto da lavoura, eles e suas famílias
camponesas. A produção obtida pouco ultrapassa as
necessidades anuais de consumo familiar. (idem, p. 144-
145)
Na Comunidade Taquari, tais situações são presentes é podem ser
utilizadas para caracterizar os proprietários da região, que se enquadram
melhor na categoria “entre ricos e pobres”. que muitos buscam completar
sua dieta alimentícia comprando nos armazéns e supermercados da cidade. A
64
simplicidade ou refinamento no acabamento das propriedades também
evidencia o poder econômico daquelas famílias, como pode ser visto nas
imagens.
7- Solidariedade, reciprocidade e questão ambiental
Entender a Comunidade Taquari perpassa pela questão que diz respeito
ao modo como os membros da comunidade se relacionam com a natureza e,
simultaneamente, criem um aumento na produtividade sustentável. Outra
questão é a preocupação apresentada pelos grupos rurais, inseridos em
determinados processos de produção e que procuram manter sua
sustentabilidade (FILHO, 2001; VIEIRA, 1998; CAVALCANTI, 1999).
Pensar a produtividade na Comunidade Taquari exige-se análise de
duas variáveis: 1- os impactos causados pelo homem a natureza e seus
reflexos no uso do solo e; 2- a necessidade de arranjar mais parceiros, dentro e
fora da Taquari, que queiram investir na associação, ou cooperativa. Entender
como essa associação se articula com a comunidade, assim como,
compreender como as estratégias para prática do que pode ser um
desenvolvimento sustentável, são preocupações que cercam o Taquari.
Nas entrevistas feitas na Comunidade Taquari, descobrimos que a
presença de indivíduos migrantes é intensa na região, para que não haja
problemas na produção, como falta de manutenção da lavoura e do solo.
Entende as práticas que são recíprocas entre os proprietários rurais depende
de um aprofundamento daquilo que Bourdieu (1996) definiu como arranjo
socialmente constituído para orientar a ação. Bourdieu ao definir prática,
acredita que o homem, o agente social, tenha interiorizado de modo
sistemático e coerente as estruturas das relações de poder que mantém o
conhecimento. Se isto é verdade qualquer membro de uma comunidade, a
partir do lugar e da posição que nelas ocupa, e exterioriza em práticas as
disposições que antes interiorizou. Se a explicação estiver correta, todo
agrupamento que possua cultura a ser transmitida irá implantar nas novas
65
gerações as práticas ambientais e uma racionalidade ambiental na produção
de alimentos e nos cuidados com o ar, o solo e a água, elementos essenciais
para o meio rural.
O sujeito que executa uma ação consciente para preservação da
natureza, ou que muda sua postura ao tratar o lixo, gera então uma estrutura
social que suporte a um campo de conhecimento a qual a sociedade
compartilha (BOURDIEU, 1996: 157).
O que encontramos na Comunidade Taquari são ações e práticas que
possibilitam entender que o meio ambiente é um local de eterna manutenção,
como foi feito na Paróquia da comunidade, onde os membros fizeram um
reflorestamento (Veja Imagem 17). Quando está ação se espalha em outras
propriedades significa que a reciprocidade do grupo adaptou a questão
ambiental nos limites da produção rural.
Imagem 17 - Área de reflorestamento, reposicionamento de cercas e
plantio em propriedade de um dos membros da Comunidade Taquari
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
Segundo Michel de Certeau (1994), o cotidiano pode ser entendido
como um ambiente onde se formalizam as práticas sociais que, por sua vez,
66
sofrem influências exteriores a partir das diversas atividades que se exercem
na vida cotidiana – profissionais, sociais, políticas e culturais.
Assim sendo, e considerando os elementos que compõem as práticas
cotidianas, De Certeau (1994) esclarece que as práticas devem ser analisadas
enquanto operacionalizações, como manifestação de “táticas” e de
“estratégias”. Para tal, é importante verificar se algumas delas se encontram
mais concentradas em determinados locais que em outros, se são mais
específicas de determinados meios ou de determinada conjuntura em que
algum indivíduo se encontra.
Para Pierre Bourdieu, as práticas são interiorizadas pelo habitus, sendo
ela parte da estrutura social. De Certeau (1994) propõe tratar as práticas
cotidianas também como grupos de estratégias, sem desconsiderar, também,
os aspectos estruturais da sociedade. Porém, essas estratégias são produzidas
e recriadas pelos sujeitos através das práticas cotidianas que, por sua vez,
possuem sua própria lógica. A lógica da ação, de acordo com o autor, é toda
uma rede de operacionalização na qual estão envolvidas as relações de força
que consistem em construções de táticas de ações “próprias” desenvolvidas
pelos sujeitos em um determinado ambiente que, todavia, se estabelece
quando as ações se transformam em práticas cotidianas e em práticas
discursivas tornando-se, portanto, indissociáveis (DE CERTEAU, 1994: p. 153).
De acordo com De Certeau (1994), o conhecimento das práticas
cotidianas, centra-se muito mais na busca da compreensão das estratégias e
táticas das práticas cotidianas dos sujeitos sociais do que na identificação e
estruturação dos conceitos nas múltiplas realidades. O que De Certeau chama
de estratégia é o cálculo ou a manipulação de relações de força que se tornam
possíveis a partir do momento em que um sujeito tem o controle de poder ou
saber. “A tática é a ação calculada ou a manipulação da relação de força
quando não se tem um lugar, mas dentro do campo do outro” (idem, pp. 97-
102). Assim, na visão do autor, as táticas são muito mais sutis porque são
dependentes do tempo, dos momentos e das oportunidades que consolidam a
ordem social.
No caso desta pesquisa, procura-se compreender a Comunidade
Taquari através dos sujeitos que formam esse grupo, como produtores rurais,
participantes de uma comunidade religiosa. Tanto para Bourdieu como para De
67
Certeau, ambos propõem uma melhor aproximação da interpretação da
realidade cotidiana e da reprodução das estruturas sociais, fatores que
explicam os comportamentos de manutenção e transformação, nas práticas de
cultivo da terra e os reflexos nos discursos ambientais produzidos pelo grupo.
De acordo com Wolf (1976) o trabalho no campo, onde as relações de
produção e condicionamento da vida rural são fatores de permanência e
reprodução da organização social do grupo. Candido (1997) completa o
pensamento ao entender que os trabalhadores do campo podem formar
indivíduos organizados para superar a subsistência, desde que tendo um
excedente da produção para consumo. Esta relação na visão de Brandão
(1981) é o que garante a sobrevivência da comunidade rural e inserção ao
mercado.
As formas de apresentação do trabalho no campo de caráter pluriativo,
tendo várias culturas e produtos mercantilizados do campo, promovem um
desenvolvimento de tipo sustentável nas comunidades que se organizam de
forma cooperativista ou associativista, por garantirem uma possibilidade de
diversificação das estratégias de sobrevivência do grupo (SCHNEIDER, 2003).
Essas formas de exploração do trabalho no campo são distintas à de
Abromovay (1992) que traz como foco da discussão o trabalho excedente e de
alienação. Observar as práticas de produção que condicionam o
desenvolvimento sustentável em grupos de economia do tipo solidária; ou seja,
em arranjos comunitários e de trabalho coletivo.
Toma-se como base para o desenvolvimento desse projeto dois
conceitos de sustentabilidade elaborados por Ignacy Sanchs (2002), o qual
define sustentabilidade social e sustentabilidade econômica como
componentes do desenvolvimento sustentável: o que é entendido pelos órgãos
ambientais nacionais e internacionais, descrito por Filho (2001) como a
capacidade de satisfazer as necessidades dos grupos, sem comprometer a
necessidades de satisfação das gerações futuras. Para isso, usa-se o
conhecimento tecnológico com viés ambiental como uso mais racional dos
recursos naturais. Esta explicação se faz necessária para evitar que as
comunidades rurais sejam caracterizadas como grupos que não pensam
isoladamente em ações para o presente e nem estão interessados na
manutenção da paisagem frente ao processo de produção (MOREIRA, 1997)
68
Goulet (1977) caracteriza o desenvolvimento sustentável por dois pontos
que nos interessam. O primeiro deles, é a valorização da solidariedade do
grupo, estendendo o sentimento de grupo para além da preservação da
natureza e do uso do campo. O segundo é a necessidade de um fundamento
jurídico, legalizando a posse e o trabalho para satisfação das necessidades. O
grupo do Taquari não seria explicado apenas pelos fatores ambientais ou de
produção rural. O que garante a sustentabilidade e o desenvolvimento do grupo
seriam as formas de socialização e de transformação da natureza. Nesse
ponto, a delimitação do conceito de desenvolvimento sustentável contribuiria
para entender comunidades rurais que fazem da pluriatividade um caminho
para o crescimento, igualdade social e distribuição dos meios de produção.
Nesse sentido, a Comunidade Taquari ao implantar novas formas de
produção no meio rural para comércio e simultaneamente produzir alimento
para subsistência com plantações de arroz, soja, algodão, feijão e milho,
desperta o interesse de saber como a exploração da terra e o impacto das
inovações tecnológicas e institucionais podem estabelecer um processo de
desenvolvimento continuo e estável. Brandão (1981) acredita que o acesso a
renda proveniente da terra e os meios de produção afetam a qualidade de vida
do grupo. Para auxiliar a sustentação dessa hipótese é necessário saber se a
organização produtiva da Comunidade Taquari e de sua Associação têm uma a
atuação eficiente na transformação da natureza e da pluriatividade do trabalho
(SCHNIEDER, 2003). A organização da produção também se desenvolve no
grupo como aspectos de estratégias de reprodução da comunidade rural e de
transformação do trabalho rural (GARCIA JÚNIOR, 1989).
A Comunidade Taquari, ao permanecer nas tradições do campo de
maneira diversificada daquela imposta pela grande propriedade rural,
apresenta a importância do compartilhamento da visão de resistência através
da organização coletiva na produção familiar para subsistência econômica e
cultural (WOORTMANN, 1995). A forma econômica que mais persistiu, a
agropecuária, e que pode influenciar outras comunidades afastadas no espaço
e no tempo e a agricultura familiar criam laços de comunicação compartilhando
as experiências comuns da produção, mostrando a solidariedade dos grupos
de maneira exemplar para reprodução e conservação do meio rural; ou seja,
um modelo que oriente a conduta de outros agentes sociais para realização de
69
projetos de princípios ideológicos ou organizatórios (BRANDÃO e RAMALHO,
1986) .
CAPÍTULO II
ANÁLISE DA PRODUTIVIDADE E SUSTENTABILIDADE RURAL EM
TAQUARI
1- Trabalho rural e prática ambiental
O meio rural pode ser caracterizado, basicamente, pelo crescimento das
atividades não agrícolas no seu espaço e seu ator principal seria o agricultor ou
família rural que exerce múltiplas atividades, o que pode ser chamado de
pluriatividade. Dessa forma, Schneider (2003) entende a dinâmica não seria
mais dada pela exclusividade do crescimento agrícola, mas pelas novas
atividades não-agrícolas.
Segundo Gonçalves e Souza (2005), na legislação brasileira, a definição
de propriedade familiar consta do inciso II, do artigo , do Estatuto da Terra,
70
estabelecido pela Lei 4.504, de 30 de novembro de 1964, com a seguinte
redação:
[...] propriedade familiar: o imóvel que, direta e
pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família,
lhes absorva toda a força de trabalho, garantindo-lhes a
subsistência e o progresso social e econômico, com área
máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e
eventualmente trabalhado com a ajuda de terceiros [...]
(Lei nº 8629, de 25 de fevereiro de 1993)
O que temos nas comunidades rurais, como a do Taquari, é uma mistura
de funções e papéis que estão sendo assumidos dentro de todas as
propriedades. Saber qual é o trabalho não é mais a questão principal, mas sim,
quando terá trabalho. Pois a definição de agricultor familiar é aquele que tem
sua fonte de renda no uso da força de trabalho no estabelecimento com
participação dos membros da família. Mesmo assim, é permitido o emprego de
terceiros temporariamente, quando a atividade agrícola assim necessitar.
Essas situações se apresentam em algumas propriedades da Comunidade
Taquari e a Associação também faz uso temporário de homens e mulheres na
produção de farinha, iogurte, tratamento do leite, entre outros.
Na Associação, a mão-de-obra familiar é superior ao trabalho contratado,
pois a propriedade tem renda gerada pela atividade agrícola, onde a família
assume o trabalho no estabelecimento. Schneider (2003) entende com a
definição de pluriatividade que as propriedades podem alocar o trabalho em
diferentes atividades, além da agricultura familiar. A Comunidade Taquari,
apresenta os grupos familiares como organização do grupo e ainda a
Associação, que é uma unidade produtiva multidimensional, onde se pratica a
agricultura e outras atividades, tanto dentro como fora da propriedade, pelas
quais são recebidos diferentes tipos de remuneração, permitindo combinar a
mão-de-obra familiar agrícola e não-agrícola na manutenção do
estabelecimento agrícola, assegurando sua reprodução socioeconômica. O
trabalho agrícola e não-agrícola, exercidos de forma complementar pelos
membros da família que residem na propriedade ou estão associados,
freqüentemente se deve à pouca disponibilidade de terra e às dificuldades de
modernização tecnológica, o que compromete sua renda, obrigando essas
71
pequenas unidades a buscarem uma alternativa complementar de renda, no
caso mutirões, compras coletivas, participação na produção.
Assim, o trabalho extra-agrícola, realizado por membros residentes no
estabelecimento agrícola familiar, tem duas funções sociais: a primeira função
é de complementar a renda da família e a segunda diz respeito à permanência
dessas famílias no meio rural, ou seja, garantir a propriedade do bem rural. Ao
se definir a agricultura familiar contemporânea e os tipos de trabalhadores que
nela estão, deve-se levar em conta todas as formas que essa categoria social
apresenta, seja ela baseada no trabalho familiar não-agrícola (pluriatividade) ou
com a participação do trabalho assalariado, mas que a essência da mão-de-
obra familiar (agrícola ou não-agrícola) seja preservada.
Do ponto de vista sociológico deve-se considerar duas características
fundamentais do meio rural: a relação específica da população rural com a
natureza, dado que o meio rural é um espaço transformado pelo homem e as
relações sociais resultantes da complexidade das comunidades rurais. Essas
comunidades apresentam a necessidade da melhoria nos sistemas de
transporte e de comunicação, além de melhora das suas condições de vida
(habitação, saúde, etc.) e de qualificação (ensino básico e técnico). Essas
demandas sempre ocuparam o discurso dos camponeses, tendo destaque na
modernidade do século XX, mas no final deste mesmo período, as zonas rurais
começaram a ter necessidades de discussão do papel ambiental do homem no
campo e quais as reflexões dela no meio social.
Ao tentar potencializar a produção através de um desenvolvimento
equilibrado e sustentado que garanta a abertura de opções e espaços de
criatividade que facilitem a multiplicação de experiências como a Comunidade
Taquari e a busca permanente de alternativas para um desenvolvimento que
respeite as características dos lugares e as vocações do trabalhador rural, não
promovem a satisfação das necessidades básicas e da elevação da
qualidade de vida dos membros da comunidade, mas criam novas formas de
melhoramento da qualidade ambiental.
A tentativa da criação da comunidade e as atitudes ambientais vaõ ao
encontro do objetivo de distribuição da riqueza, do acesso a ela e ao poder
através da descentralização econômica e da gestão participativa e democrática
dos recursos. Podem orientar toda a população a aceitar simultaneamente a
72
conservação de valores históricos-tradicionais e culturais - como a religiosidade
-, através de diferentes projetos de desenvolvimento, como se tem na
Associação.
A produção de tecnologias ecologicamente adequadas e culturalmente
apropriadas, são introduzidas na comunidade de maneira gradual e
incorporadas em discursos e em eventos coletivos, que fortalecem a
preparação para uma autogestão da Comunidade Taquari, com direito a
participar na tomada de decisões que afetam os estilos de desenvolvimento de
cada indivíduo e da comunidade.
Dessa forma, a situação ambiental que o grupo deseja poderia ser
inseridas nos modos e padrões de vida ao se basearem em princípios
igualitários e de reciprocidade. A solidariedade do grupo evita a exploração e
permite o estabelecimento de mecanismos coletivos de controle e correção no
manejo da natureza. Conjuntamente a transformação das estruturas
econômicas e sociais em busca da elevação da qualidade de vida da
população, obtendo a progressiva formação de novos valores éticos (LEFF,
2001).
Leff (2007) posiciona o ator social para buscar a obtenção da
sustentabilidade marcando o contexto da luta política fundamentada
cientificamente. Sachz (2002) acredita que a sustentabilidade o será
implantada rápidamente, muito pelo contrário, será obtida de forma gradual e
por meio de diversas e variadas contribuições, com a preparação e
organização dos agentes sociais que trabalham na propriedade rural e se
associam para produção agrícola para conduzir o grupo à sustentabilidade.
No caso desta pesquisa, o interesse no trabalho rural e na forma de
organização do grupo, tendo como base vínculos a família e o comunitarismo
de inspiração religiosa, pode fazer entender que o campesinato procura na
terra algo além da renda. A procura e a concretização de um modo de vida
pautado na autonomia do trabalho na terra e na reprodução social da
localidade é o que manteria o grupo, mas existem problemas para o camponês
em relação à propriedade.
O indivíduo para manter seu status social e promover o melhor
desempenho e manutenção de seu papel deve ter atitudes de coerência com o
ambiente no qual está inserido. A “aparência” da pessoa surge como
73
mecanismo de posicionamento dos atores na mobilidade social e a “maneira”
de desempanhar o comando desta situação garante a interação. Todo esse
esquema garante a fachada social, institucionalizando uma estabilidade de
fator de identificação coletiva dentro do agrupamento social (GOFFMAN, 1999).
A produção desse grupo é percebida por aqueles que estão de fora da
Associação, pois a melhoria da condição de vida dos associados é vista a cada
dia pelos membros da Comunidade Taquari como algo real e de retorno para
sustentabilidade do grupo, desde que haja uma participação efetiva no trabalho
e na produção do grupo.
O que se também é uma crescente presença familiar no meio rural. Os
mais velhos que acreditam na sustentabilidade e desenvolvimento da
Associação deixam de ser meros personagens da vida religiosa e pacata entre
os proprietários rurais, para viverem uma possibilidade de maior grau de
desenvolvimento econômico. Os jovens percebendo este processo de
consolidação da mão-de-obra no meio rural não fogem mais para centros
urbanos, a não ser para estudos. O que acontece nesse processo de produção
coletiva é que a união dos proprietários do Taquari garante sua
sustentabilidade ao negociarem para o grupo e não para individualidade.
Goffman (1999) descobre que são nesses papéis que nos conhecemos uns
aos outros; é nesses papéis que nos conhecemos a nós mesmos. Entramos no
mundo como indivíduos, adquirimos um caráter social e nos tornamos pessoas
sociabilizadas.
A Taquari mostra em sua formação familiar que a religiosidade entre outro
fatores têm aumento crescente da conscientização para o trabalho no campo.
As formas de produções rurais avançam com técnicas e tradicionalismos que
garantem a manutenção do meio rural com características de um grupo
inserido nas relações mercadológicas. A formação de mão de obra fora do
grupo, como o estudo dos filhos dos membros do Taquari garante uma
possibilidade de aumento na participação de membros da comunidade na
realização de uma ampliação da produção.
A sustentabilidade, que se vem tentando entender no grupo, depende
dessa participação dos membros da Associação e da Comunidade Taquari
como um todo, pois ambas dão base para uma proposta de planejamentos e
estratégias que garantam uma produção mais ampla, de mercadorias com
74
valor agregado maior, pois nas comunidades o objetivo é fornecer sem
atravessadores. Max Weber acreditava que o pensamento para estas ações de
união poderia gerar uma melhor reciprocidade e alteridade entre os indivíduos
(LEFF, 2001).
Na comunidade, um indivíduo tende a incorporar os valores do meio em
que convive. Ao fazer isso, traz para generalidade a impressão idealizada das
formas possíveis de idealização conduzidas por um líder e compartilhadas por
outros atores, sem que a hierarquia seja colocada em risco e desarticule a
interação das pessoas, independente da posição social que ocupam. Essa
situação é discutida por Goffman (1999) onde diz que “se um indivíduo tem de
dar expressão a padrões ideais na representação, então terá de abandonar ou
esconder ações que não sejam compatíveis” (idem, p. 46).
Ao analisarmos o Taquari, vemos duas possibilidades de melhoria da
qualidade de vida. Uma visão mais sombria para o grupo diz que a falência e
desarticulação dos capitais que circulam na comunidade pode ser um material.
O segundo argumento é que, por terem uma agregação maior de valor sobre
suas mercadorias, os agentes sociais irão exigir uma melhor qualificação e
maior produtividade para garantir a reprodução sustentável da economia e
meio social.
A Comunidade Taquari tem representações de si mesma e de outros
inseridos no discurso narrativo. A análise das informações recolhidas para
construir com maior clareza a comunidade e a questão ambiental com
crescimento econômico são explicações que seguem tarefas para
compreensão da comunidade rural perante as transformações na divisão social
do trabalho no campo, a organização social e familiar no meio rural e a
presença da religião com novos mecanismos de atuação.
Ao considerar a família como um dos alicerces da vida no campo, pode-
se compreender como a produção econômica configura a própria produção
social do grupo (WOORTMAN, 1995). Apesar da presença de exploração nos
ramos estratégicos para o acolhimento e manutenção do camponês no meio
rural, estamos percebendo o agravamento e a diversificação das escolhas
75
individuais e interesses coletivos, os quais permitem entender, quando
colocados em público, um grupo que perpassa por atualizações.
2- A propriedade rural sustentável no Taquari
Depois de sua criação, a Associação e Comunidade vem recebendo
adesão de outras famílias e proprietários da região Taquari, e também
desenvolve atividades que, direta ou indiretamente, beneficiam os membros
associados e não associados
14
. Ao falar da propriedade rural na localidade,
podemos fazer algumas observações e compará-las com alguns dados obtidos
nas visitas às propriedades e nas entrevistas com lideranças e outros
membros, que participam da organização e planejamento das ações
comunitárias.
A configuração espacial e a forma de arranjo social do agrupamentoo
entendidas a partir da organização que as CEBs promoveram para as
propriedades e grupo rural. Esse processo consistia na busca por uma
qualidade de vida melhor no campo. Para alcançar esse objetivo, a
comunidade rural buscou nos fundamentos religiosos do movimento eclesial da
igreja católica um discurso que fizesse uma conscientização dos novos sujeitos
sociais no campesinato sobre os problemas sociais no campo. Macedo (1986)
orienta para que busquemos as representações simbólicas da religiosidade
para configurar as formas de coesão que promovam o aperfeiçoamento da
comunidade. No caso da Comunidade Taquari o catolicismo da CEBs orienta
para uma interpretação coerente do que seria o movimento religioso e sua
relação com a ruralidade que a família camponesa compartilha.
O caso da Comunidade Taquari apresenta uma discussão pertinente,
pois sua fundação como um núcleo da CEBs aconteceu numa época onde tais
ações não ocorriam, como na década de 1980. O que tornou a história da
região do Taquari interessante foi a organização para um desenvolvimento
14
Podê-se perceber com a pesquisa, um processo de desmembramento de terras decorrente pelo aumento
da família e a chegada de novos proprietários. Outra situação inversa é a ampliação de propriedades com
aquisição de porções de terras vizinhas. A possibilidade de desmembramentos de terra para construção de
moradias dentro das propriedades onde os herdeiros não optam pela repartição da terra é uma realidade
presente no Taquari.
76
econômico, o aumento no grau de solidariedade do grupo com as práticas de
rituais católicos e o desejo de realizar ações que promovessem
sustentabilidade com práticas ambientais.
A análise da estrutura fundiária da região do município de Iporá mostra
que a presença significativa de pequenos proprietários, como pode ser visto na
Tabela 1. Na área da Comunidade Taquari, somente quatro propriedades
passam de mais de 10 alqueires, e um percentual de 80% de ocupação de
terras com menos de um alqueire.
Tabela 1 - Imóveis rurais cadastrados no INCRA
no município de Iporá
Imóveis Área (há) Quantidade
Pequena
Propriedade
De 0 a 120 744
Média propriedade Mais de 120 a 450 161
Grande
propriedade
Mais de 450 26
Fonte: IBGE, com elaboração da SEPLAN-GO / SEPIN /
Gerência de Estatística Socioeconômica - 2005
A utilização das propriedades pela Comunidade Taquari supera um
rendimento de 80%, como colocado pelo INCRA, ao analisar o município de
Iporá. As propriedades com 30ha (hectares)
15
são consideradas de grande
extensão, comparadas com maioria de pequenas propriedades existentes na
região. Essas propriedade menores classificadas como minifúndios possuem
menos de 5ha. São áreas com perfil para receberem benefícios, como o do
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar PRONAF.
Especificamente com a Comunidade Taquari existe uma parceria para
produção de arroz. Nesse acordo a prefeitura de Iporá, que auxilia na
plantação e comercialização do produto. A dimensão espacial da propriedade
em hectares traz um total de 160ha de propriedade. No município, 22% é
destinado para lavouras permanentes e temporárias; 31% para pecuária e mais
de 37% da área de propriedade rural serão utilizados como reserva florestal.
15
O INCRA ( Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) define a propriedade rural como
módulo, medido em alqueires. Em Goiás o alqueire goiano corresponde a 4,84 hectares (ha), sendo 1ha
do tamanho de um campo de futebol. Autores como Brandão, Lamarche, Woortman, Garcia Júnior usam
as categorias como fazenda, sítio e roçado para definir o espaço rural. No caso das propriedades no
Taquari a maioria delas de pequeno porte são quase do tamanho de 2,5 campos de futebol.
77
Uma parcela de mais de 9% não tem produção, mas concentra uma
especulação ou limite para o desenvolvimento do setor.
Ao analisarmos os dados da situação fundiária na Taquari, percebe-se
que 20% não exploram a propriedade, mas vivem de rendimentos do INSS e
trabalho de caráter pluriativo; cerca de 41% deles vivem da pecuária e do
rendimento do leite; 39% fazem somente plantações comunitárias de arroz, de
subsistência de milho e de mandioca para comércio com a fábrica da
Associação dos Produtores da Região do Taquari. Os dados apresentados
descrevem a situação das propriedades produtivas na Comunidade Taquari,
que individualmente representam um percentual mínimo considerando sua
produção diversificada, mas ao adicionar-se a produção de todas as pequenas
propriedades da região constata-se que apresentam um quantitativo maior do
que a soma das propriedades latifundiárias, já que estas apresentam
monocultura e foco na pecuária como fonte de renda (Veja Imagem 18).
Imagem 18 - Área de pastagem e curral da propriedade do Sr. José
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
O perfil da distribuição do número de imóveis no município de Iporá feita
pelo INCRA (2005) indica a presença de 1.082 imóveis rurais, sendo 2% de
78
grandes propriedades; 16% de médias propriedades; 43% de pequenas
propriedades e 38% de minifúndio. A distribuição na Comunidade Taquari se
apresenta de maneira mais concentrada em duas categorias: a dos médios
proprietários, que representam 20%, com tamanhos de 30 a 60 ha, 40% de
pequenos proprietários com tamanhos de 20ha a 5 ha, e 40% de minifúndios,
com menos de 5ha.
Os latifúndios são os que têm maior impacto na produção do município,
mas a contração de pequenas propriedades, principalmente aquelas
organizadas em comunidades rurais, consegue um destaque diversificado com
uma produção agropecuária e com participação de um capital vindo da cidade
com as pluriatividades. Na Comunidade Taquari os minifúndios, sendo
chácaras de descanso ou propriedade nos limites urbanos, com características
que promovem um limiar da organização da propriedade mais como um refugio
do que como área produtora existem em propriedades de grande e médio
porte. Essa produção baseada no gado de corte ou de leite, é um fator que
predomina também nas pequenas propriedades, sendo o leite vendido tanto
em forma coletiva, com os tanques de refrigeração, ou de maneira individual
para o lacticínio. Observa-se que a organização das propriedades do Taquari
se adaptam para garantir o vinculo da cidade com suas produções associadas.
Na análise da situação fundiária, existe a prática de criação animal e
áreas destinadas as matas, florestas e pastagens naturais, como áreas que
limitam a interferência humana para produção agropecuária, o significativo
peso da produção agropecuária para cadeia produtiva que vai do produtor até
os curtumes, frigoríficos e laticínios da região não se apresenta como salvador
da desigualdade social que existe no meio rural da localidade. Assim, a falta de
emprego ou a baixa produtividade continuam as mesmas para os pequenos
produtores que não adotaram novas posturas para aumentar e diversificar a
produção rural. No saldo de lavouras e matas, a pastagem natural mantida sem
impacto ambiental grave não é uma constante, mas pelo menos, existem áreas
de matas ciliares e projetos para ampliação das reservas dentro das
propriedades e em erosões na Comunidade Taquari, que sofrem ações que
beneficiam a natureza. Mas podem indicar uma falta de desenvolvimento e
crescimento sustentável economicamente ao grupo (VIEIRA, 1998).
79
Em se tratando da finalidade das áreas para proteção de espaços
naturais, elas mostram que somadas não chegam a se comparar ao total de
estabelecimentos agropecuários ou propriedades rurais (IBGE, 2001), exposto
na Tabela 2. Esta realidade é bem visível em toda região, pois no trabalho de
campo foi detectado que a manutenção de áreas de pastagem e lavouras. Na
Comunidade Taquari o que registramos nas conversas e entrevistas com os
membros do grupo é que a prática de desmatamento seja substituída por uma
racionalidade de uso das áreas existentes para produção, aumentando a
produtividade.
Tabela 2 – Mata versus Propriedades de agropecuária
Descrição Valor Unidade
Área de lavouras permanentes 134 Hectare
Área de lavouras temporárias 2051 Hectare
Área de Matas e florestas 12073 Hectare
Área de pastagens naturais 68057 Hectare
Área dos estabelecimentos
agropecuários 84199 Hectare
Fonte: INCRA, 2005.
A produção animal é diversificada no município (Veja Tabela 3); o gado
tem mais peso na constituição da produção em relação a valor, comparado às
aves, suínos e ovinos (INCRA, 2005).
Tabela 3 - Pecuária
Descrição Valor Unidade
Número de cabeças de
aves 36414 Cabeças
Número de cabeças de
bovinos 81635 Cabeças
Número de cabeças de
ovinos 443 Cabeças
Número de cabeças de
suínos 6204 Cabeças
Fonte: INCRA, 2005.
Em relação ao tipo de estabelecimento com tecnologias e diversificação
de produção, com uso ou não da natureza ou de animais de confino, as
propriedades do Taquari apresentam todas as funções produtivas listadas na
Tabela 4. Pelo tamanho das propriedades e suas produções percebe-se ao
80
comparar o quantitativo de animais com a extensão das propriedades na região
do Taquari, que a proteção ambiental, poderia estar presente em mais de 15%
das propriedades, pois as áreas não utilizadas para lavouras ou pastagens
serviria para conservação de matas, florestas e pastagens naturais. Este
pensamento de conversão de áreas dos estabelecimentos agropecuários em
áreas de caráter conservativo da natureza são, na visão de Vernier (1994),
uma das possibilidades de se tratar a natureza.
Tabela 4 – Estabelecimentos e função produtiva
Descrição Valor Unidade
Número de estabelecimentos agropecuários com
tratores 94 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos agropecuários 1002 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com matas e
florestas 794 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com pastagens
naturais 943 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com aves 799 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com bovinos 861 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com bufalinos 1 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com caprinos 2 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com lavouras
permanentes 41 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com lavouras
temporárias 538 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com ovinos 21 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com produção de leite
de búfala 1 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com produção de leite
de cabra 2 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com produção de leite
de vaca 653 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com produção de
ovos de galinha 668 Estabelecimentos
Número de estabelecimentos com suínos 599 Estabelecimentos
Fonte: INCRA, 2005.
A frota de maquinário agrícola impera para atividades de médias e
grandes propriedades rurais. As produções de leite e de ovos ganham mercado
por ofertarem mais um produto com demanda, que se mantenha vantajoso
para o produtor (Veja Tabela 5).
Tabela 5 – Perfil de produção na terra
81
(animais e máquinas)
Número de tratores
existentes nos
estabelecimentos
agropecuários 120 Tratores
Produção de leite de
vaca 19126 Mil litros
Produção de ovos de
galinha 96 Mil dúzias
Fonte: INCRA, 2005.
A Comunidade Taquari apresenta grau de parentesco maior dentro das
atividades econômicas relacionadas a agricultura familiar, entretanto, a
contratação para cargos estratégicos e administrativos para Associação é
assumido por alguém externo e com remuneração salarial, fato que é
diferenciado do trabalho agrícola familiar, onde o serviço é em beneficio ao
próprio núcleo familiar, como pode ser visto na Tabela 6. Mesmo no sistema
cooperativo na Comunidade Taquari o capital circula como na cidade, porém
com menos freqüência e efervescência dos atos. Na Comunidade Taquari, o
parentesco nas comunidades começa a se ampliar agora, com aquisição de
novas terras e a partilha da herança da propriedade do patriarca da família.
Esta situação mostra que a possibilidade de manutenção do campo através
das novas gerações é algo real, desde que continue os investimentos e amplie
os mercados para o desenvolvimento sustentável dos membros das
comunidades rurais (SCHNEIDER, 2003).
Tabela 6 - Parentesco
Total de pessoal ocupado com laço de parentesco
com o produtor 2240 Pessoas
Total de pessoal ocupado sem laço de parentesco
com o produtor 409 Pessoas
Fonte: INCRA, 2005.
Com o trabalho de campo para esta pesquisa, observou-se a
disparidade de utilização da propriedade. Enquanto as maiores têm áreas de
pasto e plantio bem definidas, as pequenas possuem áreas concentradas em
suas portas e ao seu redor, destinadas desde a plantação de culturas e criação
de animais até às reservas de mata. Mas em ambos os casos o uso da
propriedade tem finalidade agrícola e pecuária, obedecendo uma ordem
82
estabelecida na região de economia agropecuária, movimento presente em
todo Taquari.
As propriedades que existem na região de Ipo seguem um sistema
rústico de rotatividade de culturas e manejo de espaços destinados às
seguintes finalidades: áreas para as lavouras permanentes e temporárias;
pastagens para criação de rebanhos e matas de reserva ambiental; e áreas de
descanso para produção posterior. No período de 2003 a 2005, algumas das
lavouras plantadas e colhidas tiveram aumento no rendimento médio da
produção em kg/ha. A produção de arroz, banana, cana-de-açúcar, côco da
Bahia, feijão, milho, mandioca e soja foram os produtos que sempre tiveram
área para plantio e ampliação do investimento e, consequentemente, um
aumento da produção. A mandioca apresenta-se como o produto de maior
popularidade entre os produtores.
As diferenças de fertilidade das terras em uso, ao potencializarem de
forma diferenciada o trabalho aplicado às terras, conformaram diferenças na
produtividade do trabalho. Essa situação pode ser observada, quando
comparamos tamanhos e tipos de produção dentro das propriedades: aquelas
que apresentam menor produtividade têm trabalhadores do grupo familiar
exercendo atividades agropecuárias para manutenção da propriedade e, ainda,
atividades não-agrícolas fora da propriedade familiar para conseguir recursos
que garantam a sobrevivência daquele grupo familiar. É evidente nessas
observações que o grau de sustentabilidade ao comparar as propriedades
rurais mostra que um mesmo conjunto técnico organizado pelo capital no
campo vai apresentar uma eficiência produtiva diferenciada, que se reflete em
diferentes custos unitários de produção (MOREIRA, 2007).
No levantamento de dados sobre outras produções na área rural do
município de Iporá verificou-se que o rebanho bovino, suíno e avícola têm
sofrido queda no número de cabeças. os derivados dessa produção como
leite e concorrentes como rebanho asinino, bubalino, caprino, eqüino, muar e
ovino têm recebido maior investimento como fator de diversificação. O que não
ocorre com os hortifrutigranjeiros, que perdem para a produção de mel de
abelhas, em número de propriedades que participam da produção.
Os proprietários que estão na região do Taquari se aproximam das
típicas representações camponesas que tem uma produção de subsistência, e
83
que possuem pequenas e algumas meias extensões de terras ocupadas por
famílias nucleares, em maioria. Essa característica é muito parecida com a
origem dos grupos rurais de Diolândia, estudado por Brandão (1981).
Os estudos sobre fatores determinantes da atual estrutura do sistema de
posse e uso da terra, avaliados por Brandão (1981), limitou o entendimento da
“economia de subsistência” aos grupos dos produtores rurais (camponeses,
lavradores, “rústicos”, caipiras, sertanejos, etc) que não produzem excedentes
ou quando produzem não têm um mercado existente. O que se percebe nas
comunidades rurais de hoje é que ainda se mantém a organização da família
para o exercício do trabalho produtor de alimentos e o regime atual de contrato
com outros produtores rurais na compra de mantimentos dentro e fora dos
limites da cidade.
A análise da reprodução camponesa, de geração em geração, elabora
por Woortmann (1995) baseia-se nas relações de parentesco que se
transformam ou se conservam tanto pela produção econômica pela família,
quanto pela, produção social da família, estas são reflexo dos “[...] modos pelos
quais o campesinato resiste e se adapta às transformações que lhe são
impostas” (idem, p. 24). Brandão (1986) também entende que
“[...] a formação de unidades de produção em sociedades
complexas, a organização de sistemas de poder e
controle da ação social e a distribuição das
possibilidades de acesso aos meios de produção estão
estreitamente relacionadas aos modos de organização
da família, de grupos domésticos ou de unidades de
parentesco em sua dimensão mais ampla” (idem, p. 15).
As dinâmicas da realidade econômica do grupo, como sua produção e a
organização social se fundamentam nos cuidados com o patrimônio que é
herdado e tendo como função proporcionar ajuda econômica mútua, se
aproximam das realidades das comunidades rurais brasileiras atuais, que
promovem a agricultura familiar como escape da cidade e fortalecimento do
meio rural e da sustentabilidade, advindos do trabalho no campo.
Essa situação do campo não exclui a presença do trabalho não-agrícola
e industrial em ambiente com maior movimentação comercial relacionada ao
agronegócio no meio rural na região do oeste-goiano, como se vê na Tabela 7.
84
Tabela 7- Estabelecimentos industriais cadastrados na região de Iporá
por gênero e porte
Municípios Total Madeira Couros, peles e
similares.
Produção de
alimentícios
Iporá 74 1 1 32
Micro 54 1 - 20
Pequeno 11 - - 15
Médio 3 - 1 1
Grande 2 - - 2
Sem porte 4 - - 4
Fonte: Secretaria da Fazenda
do Estado de Goiás, com
elaboração da SEPLAN-GO /
SEPIN / Gerência de
Estatística Socioeconômica -
2005
Ao analisarmos o município de Iporá, fica exposto o tipo de produto ou
matéria prima com maior peso comercial para região, assegurado pela
presença de uma agricultura e pecuária voltada para o mercado. A indústria
que se destaca é aquela ligada a agropecuária, sendo que a Comunidade
Taquari promove no meio rural a modernização com sua fábrica de farinha de
mandioca e de lacticínios.
Ao analisar a propriedade rural em Ipo caracterizou-se o uso da terra,
e mesmo mostrando a diversificação do uso do solo percebemos que existe
uma extração vegetal de carvão, lenha, madeira em tora e pequi, que
configuram produtos de uso das propriedades tradicionais do cerrado, sem
danos maiores à natureza ou aos custos e a produção de cultura, quando
comparados aos impactos de novas áreas para lavouras ou rebanhos. Essa
comparação entre o uso do espaço no tempo antigo e nos dias de hoje foi
analisada por Brandão (1981), que conclui que “[...] uma natureza controlada
pelo homem é a principal aliada de uma sociedade rural em equilíbrio e farta.
Hoje ela é uma natureza destruída pela ação do homem” (idem, p. 46). Toda
esta situação depende do reconhecimento dos recursos da natureza, os quais
fazem o proprietário rural avaliar o ambiente segundo seus critérios definidos
na utilidade para a subsistência, reserva de floresta, caça, pesca e agricultura
rudimentar ou modernizada.
85
O acesso aos meios de produção e aos bens produzidos determinam os
modos de acesso ao poder local, manifestado pelo poder econômico e pela
extensão da propriedade, e estabelece os limites entre a produção rural, a
modernização do campo e os impactos ambientais na transformação da
natureza, quando esta se faz necessária. O que devemos compreender é que o
desenvolvimento e o crescimento das comunidades rurais estão ligado ao
processo de tecnologização dos produtores rurais e ao mesmo tempo que
surgem as consequências da ação antropica no meio ambiente os impactos
surgirão. Mesmo as ações de conservação do meio, replantio de áreas
degradas e a própria preservação de matas causaram mudanças no sistema
ecológico o qual o grupo está inserido. Adiante aprofundaremos as análises da
produção das propriedades do Taquari, e discutiremos as propriedades como
locais de discussão ambiental e sustentáveis.
3- Os Produtores em Taquari
A configuração atualizada que o rural pode apresentar é basicamente
caracterizado pelo crescimento das atividades não-agrícolas no seu espaço e
seu ator principal seria o agricultor ou família rural que exerce múltiplas
atividades (a chamada pluriatividade). Dessa forma, a dinâmica não seria mais
dada pela exclusividade do crescimento agrícola, mas pelas novas atividades
não agrícolas (SCHNEIDER, 2003).
Do ponto de vista sociológico, consideram-se duas características
fundamentais do meio rural. A primeira, diz respeito à relação entre a
população rural com a natureza a ser transformada pela ação humana. A
segunda é que o meio rural é um espaço predominantemente não construído
pelo homem, mas a partir das relações sociais resultantes dos contatos com os
vizinhos ou dentro das comunidades rurais, torna-se possível identificar os
rumos de uma orientação sustentável. Essas comunidades rurais nem sempre
estão preparadas para planejar melhorias sociais ou econômicas, mas
apresentam necessidades de melhoria nos sistemas de transporte e de
86
comunicação, habitação, acesso à educação e saúde etc. Essas demandas
sempre ocuparam o discurso dos camponeses, tendo destaque na
modernidade do século XX, mas no final desse mesmo período, as zonas
rurais começaram a ter necessidades de discutir o papel ambiental do homem
no campo e quais os reflexos dele no meio social.
No caso desta pesquisa, o interesse no trabalho rural e na forma de
organização do grupo está vinculado ao estudo da família, especificamente nas
representações da agricultura familiar. Além disso, a compreensão das
relações comunitárias e a base religiosa católica explicam a formação do
campesinato. A procura e a concretização de um modo de vida pautado na
autonomia do trabalho na terra e na reprodução social da localidade é o que
manteria o grupo, mas existem problemas para o camponês em relação à
propriedade, no que concerne à produção e questão ambiental.
A Comunidade Taquari possui um quantitativo apresentado
anteriormente de um número maior de membros participando da Associação
dos Pequenos Produtores da Região do Taquari. Isso não significa que os não-
associados na comunidade não possam ser beneficiados pelos projetos. Esse
fato demonstra que a organização cultural e social não consegue por si
manter a participação de proprietários nas diversas produções desenvolvidas.
Foi necessário haver uma mobilização de dentro do grupo para buscarem
recursos e uma representação legítima para os interesses da comunidade
rural.
Desde a fundação da Associação pode-se perceber ao cruzar os nomes
de seus fundadores, com os fundadores da Comunidade Taquari que uma
diferença na participação. Enquanto na Associação, todos são membros da
Comunidade, o inverso não se realiza. Entre as famílias nucleares do Taquari,
os não-membros não possuem uma participação econômica ativa na
Associação, mas estão presentes nas atividades culturais e religiosas que se
realizam no calendário do grupo. Esses dados foram mensurados tendo como
base o levantamento feito em trabalho de campo nas propriedades da
Comunidade Taquari, onde foram pesquisadas as propriedades familiares que
compõem o grupo.
87
A produção desse grupo é percebida por aqueles que estão de fora da
Associação, pois a melhoria da condição de vida dos associados é vista a cada
dia pelos membros da Comunidade Taquari como algo real e de retorno para
sustentabilidade do grupo. A explicação para esse sucesso é a participação
direta dos membros no trabalho e na produção. Como a mobilidade horizontal
do grupo é a única possibilidade entre os membros que buscam seu status
social, a alternativa é melhorar o desempenho nas ações direcionadas ao
ambiente no qual estão inseridos. Nesse processo, a fachada social estabelece
um fator de identificação coletiva dentro do agrupamento social (GOFFMAN,
1999). O que ocorre com esse trabalho em prol do meio ambiente é uma
melhor articulação e interação das forças para o desenvolvimento e
crescimento da comunidade.
O que vemos também é uma crescente presença familiar no meio rural.
Os membros mais velhos da Comunidade Taquari acreditam na
sustentabilidade e no desenvolvimento da Associação, deixando de ser meros
personagens da vida religiosa, estagnados entre os proprietários rurais, para
viverem uma possibilidade de maior grau de desenvolvimento econômico. A
lógica da Comunidade é fazer ações que possam ser vistas e entendidas como
melhor forma de sobrevivência; ou seja, os mínimos vitais serão satisfeitos com
o uso da Associação para compra de mantimentos. Hoje, os associados
compram e repartem mensalmente a carne de duas novilhas, além de
economizarem com mantimentos comprados diretamente dos fornecedores,
utilizando a inscrição do CNPJ da Associação
16
.
Desde a fundação da Associação, pode-se perceber ao cruzar os nomes
daqueles que são fundadores, com os fundadores da Comunidade Taquari,
uma diferença na participação. Enquanto na Associação todos são membros
da Comunidade, o inverso não se realiza. Entre as famílias nucleares do
Taquari, estes não possuem uma participação econômica ativa na Associação,
mas estão presentes nas atividades culturais e religiosas que se realizam no
calendário do grupo.
16
A economia da carne é de mais de 30 reais mês por familia, fazendo render melhor a compra
de produtos da cesta básica (são 13 alimentos: carne, leite, feijão, arroz, farinha, batata,
tomate, pão, café, banana, açúcar, óleo e manteiga). No Brasil, a quantidade de cada
ingrediente varia de acordo com a tradição alimentar de três grandes áreas do país: a Região
Sudeste, as regiões Sul/Centro-Oeste e as regiões Norte/Nordeste.
88
A aposta dos jovens no processo de consolidação da mão-de-obra no
meio rural diminui a fuga deles para centros urbanos a não ser para estudos.
Mas existe uma explicação para esse fato, que é a influência de um grupo
externo no cotidiano da comunidade.
O que acontece nesse processo de produção coletiva é que a união dos
proprietários do Taquari garante sua sustentabilidade ao negociarem para o
grupo e não para individualidade. São nesses papéis que nos conhecemos uns
aos outros; e também nos conhecemos a nós mesmos. Assim, “[...] o passado
construído de um espaço, de um temo social, é a afetividade do momento
presente que se destaca e que se investe no cenário como memória de um
tempo vivido num grupo” (TEDESCO, 1999, p. 58). Seguindo esta lógica de
participação, Garcia Júnior. (1983) entende que o trabalho familiar dentro do
ciclo de produção agrícola é o que perpetua a reprodução da unidade familiar
e, consequentemente, para nossa compreensão, a solidariedade nas
comunidades rurais é fortalecida pelo compartilhamento do trabalho e da base
religiosa que rege o grupo. Entramos no mundo como indivíduos, adquirimos
um caráter social e nos tornamos pessoas sociabilizadas. Essa sequência
funciona quando colocamos um camponês entrando numa comunidade; suas
relações de trabalho e interação na agricultura familiar garantem a socialização
não do indivíduo, mas de todo grupo familiar envolvido nos ciclos agrícolas
ou atividades rurais.
As formas de produções rurais avançam com técnicas e tradicionalismos
que garantem a manutenção do meio rural com características de um grupo
inserido nas relações mercadológicas. A formação de mão-de-obra fora do
grupo, como o estudo dos filhos dos membros do Taquari garante uma
possibilidade de aumento na participação de membros da comunidade na
realização de uma ampliação da produção.
A sustentabilidade produtiva praticada pelo grupo depende dessa
participação dos membros da Associação e da Comunidade Taquari como um
todo, pois ambas dão base para uma proposta de planejamentos e estratégias
que garantam uma produção mais ampla de mercadorias com valor agregado
maior, decorrente da qualidade ou origem. Essa participação também
possibilita ao grupo buscar estratégias para evitar atravessadores, como
transportadores de mercadorias para distribuição e venda. Max Weber
89
acreditou que o pensamento para estas ações de união poderia gerar uma
melhor reciprocidade e alteridade entre os indivíduos.
Membros de comunidades tendem a incorporar os valores do meio em
que convivem. Ao fazer isto, trazem para a generalidade a impressão
idealizada das formas possíveis de idealização conduzidas por um líder e
compartilhadas por outros atores sem que a hierarquia seja colocada em risco
e interação das pessoas, independente da posição social que ocupam, se
desarticule. Esta situação é discutida por Goffman (1999) ao dizer que “se um
indivíduo tem de dar expressão a padrões ideais na representação, então terá
de abandonar ou esconder ações que não sejam compatíveis” (idem, p. 46).
Para entendermos a propriedade e a produção na Comunidade Taquari
é necessário termos algumas definições feitas em relação à produção
mercantil. Schneider (2006) indica que na “pequena produção mercantil” o
resultado da produção é comercializado e visto como um conjunto de
mercadorias. Nesse modo de produção agrícola, é essencial que a força de
trabalho e outros recursos (terra, água, sementes, animais, conhecimento,
redes de trabalho etc.) não entrem no processo de trabalho como mercadorias.
Essas últimas não estão incluídas quando pensamos na produção na
Associação, mas não devem ser descartadas quando se pensa no proprietário
rural. No caso da Associação a produção passa a ser de “produção simples de
mercadorias”, pois com exceção do trabalho, todos os demais recursos
materiais e sociais entram no processo de trabalho como mercadoria
(SCHNEIDER, 2006).
Ao analisar o Taquari descobriu-se duas possibilidades de melhoria da
qualidade de vida. Na primeira visão, mais sombria, ao concordar com a
falência e desarticulação dos capitais, o grupo procura novas formas de suprir
sua perda material. No segundo argumento, a comunidade procura agregar um
valor maior às suas mercadorias, corroborando para que os agentes sociais
exijam uma melhor qualificação e maior produtividade, garantindo a reprodução
sustentável da economia e meio social.
As comunidades apresentam uma familiaridade maior dentro das
atividades econômicas do grupo; mesmo no sistema cooperativo o capital
circula como na cidade, que com menos freqüência e efervescência. A
busca pela aquisição de novas terras e a partilha da herança de propriedades
90
são fatores que colaboram diretamente para presença de pessoas com laços
de parentesco (Veja Tabela 8).
Tabela 8 - Parentesco entre os produtores no município de Iporá
Total de pessoal ocupado com laço de parentesco com
o produtor
2240
Total de pessoal ocupado sem laço de parentesco com
o produtor
409
Fonte: IBGE, com
elaboração da SEPLAN-
GO / SEPIN / Gerência
de Estatística
Socioeconômica - 2005
Essa situação mostra uma de correlação entre agricultura familiar e
disponibilidade de mão de obra no meio rural, pois sendo os parentes a maior
presença no meio rural, acabam assumindo o papel do trabalhador do campo.
O panorama apresentado tem reflexos na Comunidade Taquari, que possui um
planejamento e uma série de medidas para compartilhar o o trabalho,
mas todo o sistema simbólico que se pode ter no campo. Sendo assim, as
questões culturais serão mantidas não pelo qualitativo, mas também pelo
quantitativo produzido e o meio ambiente que foi alterado, se apresenta como
espaço de consolidação das práticas do grupo; práticas que podem otimizar a
comunidade se todos compartilharem e participarem do projeto de organização
social.
Tabela 9 - População por gênero e situação de domicílio
População residente, por situação do
domicílio e sexo
Iporá
TOTAL 3.300
HOMENS 15.319
MULHERES 15.981
TOTAL URBANA 28.192
TOTAL URBANA HOMENS 13,665
TOTAL URBANA MULHERES 14.527
TOTAL RURAL 31.08
TOTAL RURAL HOMENS 1.654
TOTAL RURAL MULHERES 1.454
Fonte: Secretaria da
Fazenda do Estado
de Goiás, com
elaboração da
91
SEPLAN-GO /
SEPIN / Gerência de
Estatística
Socioeconômica
2005
Essa situação de parentesco também atrai uma reflexão sobre a
configuração da família em relação ao gênero. Como base temos a Tabela 9. A
presença de homens e mulheres no campo ainda está atrelada ao trabalho
rural com divisão social do trabalho a partir de gêneros. No Taquari, as funções
braçais ainda são de maioria masculina, as atividades femininas estão
relacionadas, em sua maioria aos tradicionais trabalhos domésticos. É
interessante ressaltarmos que Ellen F. Worrtmann percebeu que o processo de
modernização e transformações técnico-produtivas afetaram os conhecimento
e práticas repassadas de geração em geração, o que acarretaria na
reprodução do conhecimento necessário para se obter os produtos e realizar
serviços que garantissem o autoconsumo. Nessa abordagem os gêneros e a
juventude da Comunidade Taquari reproduziam aqueles afazeres tradicionais
para a subsistência no campo, e na verdade, queremos mostrar que os
membros do grupo ampliam os conhecimentos, as práticas com uso
tecnológico e o universo simbólico.
Tabela 10 – População em faixa de idade
economicamente ativa
Idade Iporá Homens Mulheres
10 a 19 6143 3070 3073
20 a 29 5159 2505 2654
30 a 39 5285 3478 2807
40 a 49 3841 1885 1956
50 a 59 2541 1253 1288
Fonte: Secretaria da
Fazenda do Estado de
Goiás, com elaboração da
SEPLAN-
GO/SEPIN/Gerência de
Estatística
Socioeconômica - 2005
Essa relação entre gênero e ocupação pode ser vista também quando
analisamos a distribuição quantitativa de homens e mulheres por faixa etária
92
em situação economicamente ativa, como se na Tabela 10. Percebe-se que
as mulheres superam os homens, o que evidencia uma competição no mundo
do trabalho. No campo, as funções podem se distanciar, mas a necessidade de
inserção num emprego acirra a disputa por uma oportunidade. Por outro lado, a
participação dos jovens em formações e treinamentos pela Comissão da
Pastoral Terra e Pastoral da Juventude se ampliam e são consolidadas no
Taquari. Na Comunidade, essa competição é mais acirrada em trabalhos com
características não-agrícolas, e com estes painéis é que os gêneros no grupo
apresentam a dinâmica do grupo em manter seus jovens através de
modernização do campo, industrialização e comércio na localidade.
A realidade do município se expressa na comunidade rural, pois as
famílias rurais ainda se apresentam com características relatadas em analises
de Wolf (1976); Candido (1987) e BRANDÃO (1981). A família nuclear é
sustentada pela parte masculina que trabalha no campo e a Comunidade
Taquari não foge a regra, mas incorpora os trabalhadores em funções
diferentes. A mulher, por exemplo, não faz o trabalho domestico, mas
estuda e trabalha em setores como a secretária da fabrica de mandioca ou na
organização de eventos para a comunidade, mostrando a atividade não-
agrícola como pertencente às novas realidades do campo.
4- A produção rural na Comunidade Taquari
Os autores José de Souza Martins e Antonio Candido analisaram em
suas obras o avanço do capitalismo no campo através da modernização da
agropecuária, somado a isso, ambos consideraram os impactos do
assalariamento do trabalhador rural. Essas análises contribuem para o
entendimento da diminuição das práticas da agricultura tradicional, implicando
numa luta de classes que se desenvolve no campo. Os grupos antagônicos em
conflito seriam aqueles que buscam a propriedade como terra de negócio, ou
seja, a propriedade capitalista; contra aqueles que reivindicam a terra de
trabalho e de cultura de subsistência. A primeira não é de proveito para as
93
comunidades, que as terras devem ser cultiváveis e utilizadas sem
especulação, mas a segunda deve ter uma característica básica de ser local de
produção. O problema fica na posse da terra, mas mesmo resolvido isso, o
produtor não pode valer-se de um conhecimento prévio do que vai receber para
fixar os custos e, assim, associar produtividade e rentabilidade (MARTINS,
1995).
A escassez de recursos disponíveis é uma realidade que afeta a
chamada eficiência do produtor, como foi analisado por Garcia Júnior (1983),
Brandão (1986) e Candido (1997). A falta de bens como tratores, ferramentas e
insumos, e o conhecimento agrotécnico criam dificuldades para melhorias na
produtividade; ou seja, a capacidade técnica dos agricultores sendo um dos
campos centrais de justificação do modo de produção camponês, sofre
redução dos resultados, a medida que a quantidade recursos é reduzida,
implicando numa deterioração da qualidade dos produtos e,
consequentemente, na renda da agricultura familiar.
Na região do Taquari, a existência de propriedades que não possuem à
sua disposição bens de produção, e que ainda utilizam práticas rústicas para
limpeza do pasto, preparação da terra (arado com tração animal), uso da terra
sem adubo ou correções do solo para uso, promove na comunidade uma
dicotomia entre “tempo antigo” e os “dias de hoje”. Esse jogo do tempo e
espaço foi falado anteriormente, e está relacionado ao que Brandão (1981)
compreendeu como memórias de superação do passado, tendo um contraste
com a situação econômica atual do grupo.
Mesmo quando descreve um espaço natural
empobrecido e devastado como sendo o lugar das
lavouras e dos pastos de hoje, uma certeza de que os
produtos da terra aumentam muito de um ano para outro
porque, “pra quem tem recursos”, não faltam incentivos e
instrumentos vindo “de fora”, compensadores das perdas
naturais havidas na região. (idem, p.. 85)
O que acontece na Comunidade Taquari é que a oferta de recursos
naturais dão base para formas diversificadas de produção e implicam na busca
por mão de obra qualificada, resultando também na necessidade de afastar-se
de objetos de trabalho ultrapassados (terra, animais etc), que ficam escassos
94
frente a modernização das fazendas
17
. Ou seja, para contornar essa dificuldade
o grupo deve fazer uma produção com desenvolvimento marcado pela
intensificação dos investimentos e incrementos no volume das produções
(SCHNEIDER, 1996).
Tabela 11 – Pecuária
Descrição Quantidade Unidade
Número de cabeças de
aves
36414 Cabeças
Número de cabeças de
bovinos
81635 Cabeças
Número de cabeças de
ovinos
443 Cabeças
Número de cabeças de
suínos
6204 Cabeças
Fonte: Secretaria da
Fazenda do Estado de
Goiás, com elaboração da
SEPLAN-GO / SEPIN /
Gerência de Estatística
Socioeconômica - 2005
A produção animal é diversificada no município, como se na Tabela
11. O gado tem mais peso na constituição da produção em relação a valor, se
comparado às aves, suínos e ovinos (IBEGE, 2001).
O problema de calcular o peso da produção da farinha mandioca do
Taquari começa na falta de organização de dados da compra de matéria-prima
e controle na saída da produção. Todo esse processo é feito por filhos das
famílias da Comunidade ou por membros que moram nas propriedades como
peões ou lavradores bóias-frias
18
. Nesta situação, podemos observar que o
jovem rural sente que é possível permanecer no campo, mas para ajudar o
desenvolvimento da produção é necessário
17
Tanto Brandão (1981) quanto Garcia Júnior (1983) definem os espaços de produção e as propriedades
(terra), pela disponibilidade de recursos materiais. No entendimento destes autores propriedades com
maior produção, extensão de terras e número de insumos e bens é classifica como fazendas. Já
propriedades como local de lazer ou com pequena área produtiva são consideradas sítios ou chácaras.
18
Denominação dada ao trabalhador agrícola que não tem emprego de caráter permanente com um
mesmo empregador. O bóia fria vive em condições precárias na periferia das cidades pequenas ou médias
e trabalha por curtos períodos de tempo em várias fazendas, podendo se fixar nelas, sendo contratado por
intermediários ou diretamente. Portanto, não tem vínculo empregatício com o seu real empregador, que,
por meio desse mecanismo, se exime de pagar os encargos sociais correspondentes. (MELLO, 1975)
95
[...] um emprego condizente com uma boa qualidade de
vida, ou como filho de proprietário rural, deve convencer,
principalmente o pai, a buscar maior eficiência das
atividades econômicas, apropriação de novas
tecnologias, e uma retaguarda de serviços sociais.
(COMISSÃO ESTADUAL DA AGENDA 21 E POLÍTICAS
DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, Janeiro de
2006, p. 49)
Pensar o desenvolvimento do Taquari a partir de relações ligadas
diretamente ao desenvolvimento do grupo e do indivíduo que participa do
processo de produção é algo que vai além dos objetivos mercadológicos para
satisfação e melhoria de condições de vida no campo. Ignacy Sachs, citado por
Veiga (2005), está cada vez mais convicto da que idéia de que:
[...] o desenvolvimento pode permitir que cada
indivíduo revele suas capacidades, seus talentos e
sua imaginação na busca da auto-realização e da
felicidade, mediante esforços coletivos e individuais,
combinação de trabalho autônomo e heterônomo e
de tempo gasto em atividades não econômicas. [...]
Maneiras viáveis de produzir meios de vida não
podem depender de esforços excessivos e
extenuantes por parte de seus produtores, de
empregos mal remunerados exercidos em condições
insalubres, da prestação inadequada de serviços
públicos e de padrões subumanos de moradia.
(VEIGA, 2005, p. 80-81).
Enfatizamos aqui os aspectos qualitativos são essenciais para melhor
manipulação da realidade encontrada nas novas práticas instaladas nas
sociedades complexas.
No caso da fábrica, na Comunidade Taquari, a presença de membros na
organização do trabalho na produção da farinha promove melhores ações a
longo prazo, tanto na administração como na implantação de balanço da
produção. Esse processo poderia ter sido implantado no início do projeto, em
2005, pois o sucesso com a produção de farinha incentivou a criação de outros
projetos, porque os produtores se sentiram motivados pela possibilidade de
melhoria das condições de vida dos associados na comunidade. A crença
nesse tipo de trabalho na zona rural traz expectativas melhores para os
96
moradores antigos e jovens, que o trabalho é o que lhes sentido como
pertencentes ao grupo (TEDESCO, 1999).
“Do ângulo da análise econômica, a noção de recursos, seja ele
renovável ou não, está ligada à existência de mercados e de processos de
externalização” (VIEIRA, 2002, p 28). O mercado da Comunidade Taquari
obedece à reprodutibilidade dos recursos oriundos das atividades agrícolas; ou
seja, a produção segue tanto um calendário propicio para os plantios, quanto a
escolha das tendências observadas no mercado.
Em relação aos números da produção da fábrica da Associação, não
existe uma quantidade fixa, pois não se tem dados com notas fiscais ou de
compra e venda de mandioca e farinha. Conforme informações da pessoa
responsável pelo controle financeiro da produção e valor gerado nos últimos
três anos (2005, 2006, 2007), foi o seguinte:
Tabela 12 - Estimativa do quantitativo de mandioca e de farinha produzido
Tempo da
produção
Compra
de
mandioca
Produção de
farinha em
sacos de 25kg
Produção Total
1 semana 5000kg 50 1250 kg/semana
1 mês 20000kg 200 5000 kg/mês
Fonte: Associação dos Produtores Rurais do Taquari
O que pode ser observado, na Tabela 12, é que a produção por tonelada
de mandioca gera uma quantidade pequena de farinha. A produção é rápida,
mas o que dificulta é a distribuição e venda da mercadoria, fazendo o
associado vender a mercadoria para atravessadores, a contra gosto do grupo,
que não existe uma mediação direta com o mercado consumidor da cidade.
Por causa desse distanciamento das zonas urbanas, os produtores e a
gerência da Associação sabem que perdem no preço por quilo do produto, se
compararmos o preço de custo com o valor de venda final ao consumidor. Uma
saída para alterar essa cadeia produtiva seria a Associação assumir a
distribuição e venda direta de sua mercadoria no mercado consumidor.
Assim, os valores cobrados pela farinha diferem pela forma de
embalagem. As vendas a granel, sem uso de pacotes etiquetados no peso de 1
kg ou 500g é de R$40,00, para um saco de 25 kg. S se for um saco com
embalagens menores, o preço sobe para R$45,00. Logo, o valor gerado seria
97
de R$2.000,00 semanais para a venda a granel e de R$2.250,00 para venda
de embalagens etiquetadas. Se utilizassemos um padrão de produção
poderíamos calcular os gastos para a produção de 250 kg de mandioca, o que
seria 10 sacos de 25 kg. Nesse caso, usaríamos a compra de sacos de 25 kg
com embalagens de 1 kg, além de 3m
3
de lenha e R$4,50 de gasto de energia,
num dia de produção. Nesse panorama, a produção teria um gasto de
R$144,50, mas como a venda do saco é de R$45,00 um valor de venda de
R$450,00, logo a diferença do valor de venda da farinha e do gasto para sua
produção é de R$305,05; ou seja, gerou mais do que o dobro do valor da
produção.
Essa análise é de caráter econômico, mas o entendimento das trocas de
valores pelas mercadorias, mostram que um entendimento marxista sobre a
produção pode contribuir para compreensão dos custos e demandas da farinha
de mandioca. Brandão (1986), ao analisar a produção para consumo de
subsistência da família rural e o destino do excedente da produção, demonstra
que o trabalho do grupo não é agrícola, mas perpassa pela articulação de
tarefas pluriativas, como percebido por Schneider (1996). O interessante é que
no levantamento de dados na Comunidade Taquari descobrimos como a
sustentabilidade no meio rural, pode ser vista com a integração da produção,
ou seja, mesmo sendo a lavoura ou a cadeia produtiva da fabricação de farinha
fenômenos que ocorrem de maneira dispersa na comunidade, a realização do
grupo se apresenta quando somados os esforços do trabalho.
A questão que ainda permanece no grupo é quando se pensa no
prolongamento da conexão entre o campo e cidade (mercados), e sua relação
com a capacidade produtiva de uma agricultura familiar que superou a
subsistência, ou mínimos vitais que Antonio Candido cita. Abramovay (1992, p.
22 e 127) entende os camponeses como
[...] sociedades parciais com uma cultura parcial,
integrados de modo incompleto a mercados imperfeitos,
representando um modo de vida caracterizado pela
personalização dos vínculos sociais e pela ausência de
uma contabilidade nas operações produtivas, a
agricultura familiar [...]
98
O impede a agricultura familiar de progredir e conquistar uma integração
com o mercado, é a deficiência na capitação e aplicação de recursos para
incorporar os principais avanços tecnológicos, a fim de responder a
profissionalização do trabalho no campo. O que ainda fica sem resposta é a
relação do trabalho e o uso do espaço natural utilizado pelo produtor, fato que
tentaremos analisar adiante.
5- A relação entre Trabalho e Sustentabilidade na Comunidade Taquari
As discussões feitas até o momento neste trabalho ainda não
consideraram o estreitamento da relação entre o meio ambiente, recursos
naturais e ação antrópica do trabalho rural. Neste tópico procuramos esclarecer
algumas questões sobre as práticas ambientais na Comunidade Taquari e, o
entendimento do que seria uma qualidade de equilíbrio ambiental e qualidade
de vida. Dependendo da resposta que se a estas questões e dos diferentes
interesses sociais que elas expressem, teremos distinções entre os conceitos
de sustentabilidade. Esse conceito leva em consideração a radicalidade das
ações e práticas políticas e sócias no espaço rural (MOREIRA, 2007).
Com a hipótese de que a produção de mandioca é uma atividade viável
e sustentável no grupo, foram levantados dados sobre o número de produtores
que participam na fabricação da farinha. Descobriu-se que dos 12 (doze)
produtores que participam, 6 (seis), além de fazerem parte da Comunidade
Taquari, também o membros da Associação. Entre os 12, 3 (pai e filhos)
fazem parte de família e outros 2 (pai e filho) estão envolvidos na produção e
administração da Associação.
Independente de ser na propriedade familiar ou na Associação, o
pensamento sobre produção, meio ambiente e trabalho se misturam quando
vemos de que forma que é tratada cada produção, na Comunidade Taquari. O
trabalho dos jovens e outros membros contribui para o crescimento do grupo e,
ao mesmo tempo, práticas que são desenvolvidas por causa do trabalho, como
conservação e manipulação de áreas e restos de plantações vão ao encontro
de:
99
O estudo da agricultura familiar requer uma análise
sociológica multidimensional sobre a diversidade das
formas sociais familiares, que pode começar estudo da
organização do trabalho e da produção e sua relação com
a natureza, mas passa pelo entendimento dos mecanismos
de construção das estratégias de interação com o
ambiente social e econômico e reclama a compreensão
dos aspectos culturais e simbólicos que caracterizam as
suas relações domésticas (parentesco, gênero etc.) [...]
(SCHNEIDER, 2006, p. 9)
O que podemos entender com isto é que: primeiro, a agricultura familiar
abrange duas constelações contrastantes: a forma camponesa e a forma
empresarial de se fazer a agricultura. Segundo, a essência e as principais
diferenças entre esses dois contrastantes modos de produção não residem
tanto nas relações de propriedade, mas nas diferentes formas de produção,
distribuição e apropriação de valores. A terceira: ao se definir a especificidade
do modo de produção camponês em termos de produção de valor, esta pode
ser articulada, de forma frutífera, com o debate sobre desenvolvimento
(SCHNEIDER, 2006).
A produção que se tem no Taquari se por base no processo de
produção, no modo de produção camponês, que é estruturado sobre uma
reprodução relativamente autônoma e historicamente garantida. Sendo assim,
cada ciclo de produção é construído a partir dos recursos produzidos e
reproduzidos nos ciclos anteriores. Esta situação, descrita por Schneider
(2006), coloca os membros da Comunidade Taquari na posição solidária na
compra das produções de mandioca e na manutenção da rotina de produção
da farinha como podemos ver na seqüência de imagens.
O modo empresarial na agricultura é percebido quando entendemos a
dinâmica da Associação, pois esta reorganiza a divisão espacial do trabalho na
agricultura, deixando um local próprio para produção de tipo fabril. Este local,
por ser uma unidade maior, concentrará a produção quando esta estiver
passando por uma mecanização, o que implicará em efeitos positivos nos
custos e preços negociados com o mercado (SCHNEIDER, 1006).
Em relação ao maquinário da fábrica, podemos observar nas imagens
19 e 20 o contraste entre o rústico e o moderno, o que mostra que valores
tradicionais ainda permanecem com a prática da produção. O interessante é
100
que a produção tem a participação de jovens, fazendo o conhecimento passar
de geração a geração com a própria prática do trabalho rural, como se fazia
antigamente. É bom lembrar que a colheita, o descascamento da mandioca e a
lavagem sem processos manuais são feitos, principalmente, da mão-de-obra
feminina, que é remunerada para o serviço. A participação feminina em
trabalhos braçais se mais quando estão relacionados a cozinha, fato
frequente quando se realizam mutirões, eventos ou rituais que envolvam toda
comunidade, vizinhos da zona rural e visitantes vindo da cidade, como
autoridades públicas (prefeito, vereadores e funcionários municipais, federais
ou municipais), personalidades da cidade (normalmente comerciantes) e
parentes e amigos que vivem na zona urbana.
Imagem 19 - Prensa da massa de mandioca
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
101
Imagem 20 - Segunda moagem para preparo da massa antes da torragem
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
Na produção não se tem muitos envolvidos, as etapas que consomem
mais mão de obras são a colheita e descascamento da mandioca. O mais
velho fica com a responsabilidade da torra, pois calibrar a temperatura e o
tempo de cozimento da farinha são processos que requerem pessoas com
maior grau de experiência, como pode ser visto na Imagem 21. O trabalho feito
dentro da fábrica é desempenhado por duas pessoas, o detalhe fica para as
funções. O trabalho é conjunto em alguns momentos da produção, sendo os
jovens a frente de funções que envolvem maquinário elétrico, eletrônico e no
cálculo, com a pesagem e distribuição do ensacamento (Veja a imagem 22 e
23).
102
Imagem 21 - Torra da farinha
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
Imagem 22 - Pesagem e ensacamento da farinha de mandioca
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
Imagem 23 - Ensacamento da farinha feito por trabalho conjunto
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2008.
103
Essa divisão social do trabalho dentro da fábrica garante a participação
tanto da nova geração quanto dos mais velhos no desenvolvimento do grupo.
Na imagem 18, um funcionário jovem e outro mais velho, desempenham
funções no processo produtivo da fabricação da farinha. Isso mostra que
existem momentos em que parte dos agentes sociais dentro da comunidade
podem participar de etapas do desenvolvimento do Taquari, sem abandonar as
práticas agrícolas tradicionais. O que vemos é uma interação dos membros
dentro da comunidade rural Taquari em prol do bem comum, focado no
crescimento e sustentabilidade econômica da localidade.
Toda esta sequência de produção tem uma base que não é consolidada
apenas nos esforços dos membros da Comunidade Taquari e nem somente na
orientação produtiva que existe na Associação dos Produtores Rurais do
Taquari. O que vemos é uma associação e constante intervenção estatal na
agricultura, que mantém a estabilidade dos preços no mercado. No caso da
produção de farinha da Associação, um acordo firmado com o Governo
Federal, no ano de 2007, resultou na venda de parte da produção por um preço
que garantiu a rentabilidade do produto. Os produtos comercializados foram
destinados às cantinas e merendas das escolas públicas da cidade de Iporá.
Essa situação permite que a propaganda sobre a origem dos produtos
alimentícios seja feita no boca a boca, pois a falta de propaganda para outros
comércios dentro e fora do município necessitam de referências que são
construídas com um público consumidor de larga escala, e torna entidades
como escolas, creches e lanchonetes pontos estratégicos de divulgação no
espaço urbano.
O espaço rural é configurado por grandes, médias e pequenas
propriedades, produções e patrimônios produtivos, com as mais variadas
relações de trabalho a eles associadas. Além destas, outras instituições são
incluídas nesse contexto, como empresas agropecuárias, empresas de
insumos e ferramentas comercializadas para o campo, financiamento rural etc.
Se atentarmos para esse espaço, a partir dos diferentes interesses que
revelam a base local percebemos qual é a dificuldade de obtenção de
consenso sobre o conceito de sustentabilidade com trabalho no meio rural e
produção de víeis capitalistas, quando toda estrutura empresarial estiver
instalada (MOREIRA, 2007).
104
Com relação ao tamanho das propriedades na Comunidade Taquari,
percebe-se que existe uma disparidade significativa entre os grandes e
pequenos proprietários, sendo a presença destes é de 20% e 80%
respectivamente, como parte do grupo. A média do tamanho das propriedades
é 11,8 alqueires, a partir da média por proprietários não mudaria muita coisa,
sendo de 9,8 alqueires para cada proprietário produzir. Chama a atenção a
produção mensal da fábrica, quando 50% das propriedades produzem 2 (duas)
toneladas de farinha, mostrando uma produção de caráter econômico peculiar
para uma viabilidade do negócio.
A partir do que foi apresentado, nota-se que a comunidade, ao unir
forças e compartilhar a produção de mandioca convertendo numa produção de
farinha que faça todos ganharem seus investimentos, traz a compreensão de
que não basta ter a propriedade, mas sim disponibilizar os recursos em prol do
grupo.
Além da mandioca existe também problemas na produção planejada e
organizada de leite, atividade que se consolidou recentemente entre os
produtores do Taquari mostra uma realidade diferenciada com relação à
rentabilidade, que é muito grande. O projeto para melhoria da renda com a
ordenha do leite foi possível graças aos fundos oriundos de ações
missionários na Holanda por parte da Igreja Católica da cidade de Iporá. Com
essa parceria, conseguiram-se dez mil dólares para compra de um tanque de
resfriamento, onde os produtores associados e não associados podem estocar
a produção mantendo um valor melhor na venda por litro de leite para grandes
empresas. Atualmente, a venda é feita para lacticínios organizados como
cooperativa. A Associação dos Pequenos Produtores do Taquari segue com
sua função de atender a comunidade. Por isso, é grande o envolvimento a
participação de pessoas da comunidade que não participam da associação, em
atividades econômicas como a venda do leite e também, como mencionado,
como vendedores de mandioca.
A frota de maquinário agrícola impera para atividades de médias e
grandes propriedades rurais. Existem várias produções ganhando mercado na
região do Taquari, por ofertarem mais de um produto com demanda garantida
na cidade, principalmente, mantendo vantajoso para o produtor (Veja Tabela
13). Na verdade, o que existe na Comunidade Taquari e uma ajuda mutua
105
quando se trata de implementos agrícolas, pois a medida que surge a
necessidade de se usar carretas ou de preparo da terra com roçado ou
gradeado, os membros com maquinários emprestam sem custo, a única coisa
que existe é a compra de combustível diesel.
Tabela 13 - Perfil da produção na Terra no município de Iporá
Número de tratores existentes nos
estabelecimentos agropecuários
120 Tratores
Produção de leite de vaca 19126 Mil litros
Produção de ovos de galinha 96 Mil
dúzias
Fonte: Secretaria da Fazenda do
Estado de Goiás, com elaboração
da SEPLAN-GO/ SEPIN / Gerência
de Estatística Socioeconômica -
2005
No começo, a arrecadação de leite de forma associada não teve adesão,
pois foi pequena com dois produtores gerando um valor no mês de janeiro de
2008 de R$1.819,85, para uma quantidade de 3.079 litros de leite. No final do
terceiro mês (março de 2008), existiam 30 produtores enchendo o tanque,
gerando um total de R$19.602,68 com um quantitativo de 35.780 litros por mês.
Tabela 14 – Quantidade e valores gerados pelos produtores de leite
no primeiro trimestre de 2008
Quantitativos Leite em
litros
Valor em
R$
TOTAL DOS PRODUTORES 70.939 38.259,38
MÉDIA DOS PRODUTORES 1.202,36 648,46
MAIOR PRODUÇÃO DOS
PRODUTORES
3.834 2.377,08
MENOR PRODUÇÃO DOS
PRODUTORES
68 35,36
Fonte: Associação dos Produtores Rurais do Taquari
Na Tabela 14, pode-se observar quanto foi gerado por associados que
têm a entrega feita por conta própria ou com frete, somado com não-
associados que fazem entrega do leite ou usam frete.
Tabela 15 – Valores pagos por litro de leite aos produtores classificados
pela forma de entrega
106
Preço unitário por litro de Leite
em R$
Classificação do produtor pela forma de
entrega da produção no tanque de
resfriamento
Antes de
Março de 2008
Depois de
Março de 2008
0,52 0,55 NÃO ASSOCIADOS QUE UTILIZA O FRETE
0,56 0,59 NÃO ASSOCIADOS QUE NÃOUTILIZA O
FRETE
0,59 0,62 ASSOCIADOS QUE UTILIZA O FRETE
0,62 0,65 ASSOCIADOS NÃO QUE UTILIZA O FRETE
Fonte: Associação dos Produtores Rurais do Taquari
Quando se analisa separadamente a produção dos produtores tem-se
que levar em consideração qual a sua classificação e participação, pois a forma
de entrega do leite interfere no valor recebido. Na Tabela 15, vê-se a
discrepância dos valores pagos, o que é bom salientar é que com o aumento
da produção os valores pagos pelo leite também melhoram, independente do
vinculo que o associado tem com a comunidade. Na verdade a situação de
estar na associação para aqueles que não possuem meio de transporte que
faça escoar a produção, é um sinal das vantagens da organização da
Comunidade Taquari.
Tabela 16 – Valores pagos por litro de leite aos produtores classificados
pela forma de entrega
Quantitativos Associado Não Associado
Leite em
litros
Valor em
R$
Leite em
litros
Valor em
R$
TOTAL DOS PRODUTORES 28.542 15.257,37 42.387 23.002,01
MÉDIA DOS PRODUTORES 1.678,74 897,49 1.009,45 547,67
MAIOR PRODUÇÃO DOS
PRODUTORES
3.834 2.377,08 2.589 1.423,95
MENOR PRODUÇÃO DOS
PRODUTORES
226 140,10 68 35,36
Fonte: Associação dos Produtores Rurais do Taquari
Ao analisar a produção dos associados e não-associados, em relação ao
leite entregue, é possível descobrir que entre os associados e os não-
associados tem pesos diferentes por terem propriedades e número de animais
maiores. E o que vemos é uma produção proporcionalmente maior entre os
associados (Veja Tabela 16). A diferença entre esta produção é a da mandioca
está em dois aspectos: primeiro, em relação aos fornecedores, pois a
107
mandioca é comprada de qualquer produtor da região para suprir a demanda
da produção; e segundo, o valor conseguido com o leite é maior e com menos
trabalho no processo de produção. Em ambos os casos (mandioca e leite) o
que interessa para o grupo é poder ampliar a comercialização de produtos
industrializados, como iogurtes e farinha.
Se avaliar a produção, independente do valor pago com ou sem frete na
entrega do leite, constata-se que o associado recebe e produz quantidades
maiores. A rentabilidade da produção de leite é mais visível do que a da
mandioca por dois fatores: primeiro, a quantidade negociada e segundo, a
regularidade da produção e da venda. Em entrevista com o grupo responsável
pela organização e controle do tanque de leite, entende-se que pelas leis do
mercado de oferta e procura a condição de quem tem mais daquele produto é
quem faz o preço. Nesse sentido, o que a Comunidade Taquari percebe é que
o preço não está ligado ao quantitativo de produção individual, mas no peso
que a arrecadação coletiva tem, frente às indústrias, podendo o produtor
leiteiro ter rendimento aumentado de 30% a 50% sobre o valor do litro de leite.
A plantação de mandioca precisa de tempo e espaço apropriados para
que a produção possa ser comercializada, diferente do leite que se tem uma
constante produção durante o ano inteiro. Estas características fazem a
economia do Taquari ser mais dinâmica para própria sustentabilidade do local.
Tanto na lavoura de mandioca como na comercialização de leite, os produtores
buscam um equilíbrio constante para sua renda. O objetivo do grupo é
desenvolver em forma coletiva práticas de subsistência e desenvolvimento para
as gerações futuras.
Mas nem todos têm uma produção satisfatória, fazendo com que os
pequenos produtores com produção inferiores saiam do grupo por acreditarem
que vendendo diretamente para o varejo, ou seja, fazendo um trabalho informal
de venda de leite de porta em porta, com uso de motos, conseguem um ganho
maior do que com a venda direta em grande quantidade.
Qualquer que seja a proposta de união para produção, a comunidade
Taquari sairá ganhando, com a participação de associados e de o-
associados que podem se transformar em futuros membros. Trata-se, portanto,
de fortalecer as atividades que cultivam essencialmente relações de
proximidade, criadoras de cidadania (sistemas de trocas locais, redes de trocas
108
recíprocas e de saber, vida associativa etc.), ou de orientação de objetivo não
lucrativo e poder partilhado pelo conjunto dos membros da comunidade para
que as atividades e a rentabilidade seja social e de longo prazo, fomentando a
criatividade, as relações de cooperação, de solidariedade, de ajuda mútua e
não de competição e exclusão.
6- O rural, a localidade e a natureza na região do Taquari
A Comunidade Taquari apresenta em sua localidade duas constatações.
Em entrevistas e visitas às propriedades observamos as formas de alteração
da paisagem e intervenções na natureza para desenvolvimento e crescimento
das ações econômicas e comercias do grupo e da Associação. Os acessos às
condições mínimas de habitação, educação, transporte etc., necessárias à
população local, promoveram no grupo a busca por uma maior inserção nas
relações capitalistas diversificadas com a cidade – trabalho não-agrícola.
As observações feitas na comunidade levam em consideração o
discurso como instrumento mais eficiente para circulação da informação entre
os proprietários, melhorando sua rede de relações internas da comunidade
(com a Igreja, Escolas, família, vizinhança) e fora dela (comércio com a
cidade), que concorrem para um desenvolvimento maior do grupo. Essas
situações do modo de produção e dificuldade de distribuição de bens de capital
econômico e cultural, somados à necessidade de consumo do grupo e a falta
de rentabilidade na produção são pontos a serem analisados para confirmação
da potencialidade de desenvolvimento sustentável no Taquari.
Ignacy Sachs, ao delinear o ecodesenvolvimento, propôs que um
desenvolvimento verdadeiro ultrapassa a necessidade de garantia da
satisfação das necessidades básicas, a fim de consolidar a justiça social. Na
medida em que a natureza e outros fatores correlacionados com o crescimento
educacional, econômico ou político estiverem sustentando a rede social do
grupo, o desenvolvimento sustentável começará a ampliar sua ação. Esse
desenvolvimento estará carregado de preceitos como a dimensão econômica
do grupo rural; os laços sociopolíticos que se tem dentro e fora da comunidade
e o impacto a biofísica (MOREIRA, 2007).
109
Ao entendermos como a Comunidade Taquari percebe a diferença entre
as propriedades e a cultura de sua população rústica, podemos relacionar a
organização social com o arranjo espacial, que é transformado pelas novas
formas de interação, como a Associação dos Produtores Rurais do Taquari e a
própria Comunidade Taquari. Essas entidades criaram uma ajuda mútua para
os membros da comunidade, tanto no aspecto tradicional das manifestações
católicas, quanto em acordos de caráter capitalista.
Ao fazer um reconhecimento da região local, fiz também incursões nas
paisagens formadas pelos acidentes geográficos de grande atrativo turístico no
município de Iporá, como o Morro do Macaco (Veja Imagem 24). Na
observação vimos na localidade propriedades com cercados que definem seus
limites em relação a suas pastagens, áreas de moradia, espaços diversos (lago
ou represas) e mata de reserva florestal. Outra característica do terreno das
propriedade é a conservação da mata ciliar, principalmente próximos aos
acidentes geográficos como declives do terreno ou em margens de rios que
cortam parte da propriedade. Infelizmente como em toda área com presença
humana e produção para subsistência e práticas capitalistas de latifúndio o
impacto ambiental é visível em todas as propriedades, mesmo assim na
Comunidade Taquari, os membros do grupo procuram discutir o que está
acontecendo com a natureza e provem práticas de recuperação, além de
procurarem nas discussões argumentos que justifiquem os benefícios de tais
ações.
110
Imagem 24 -Morro do Macaco paisagem turística do município de Iporá
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2007
Do ponto de vista ecológico, os modos de exploração dos recursos
renováveis e as perturbações ambientais decorrentes devem ser analisadas,
em termos de suas implicações relativas à matéria, à energia, ao espaço, ao
tempo e à diversidade. Esses fatores presentes da região. Na Comunidade
Taquari, a transformação da natureza tem estes propósitos tanto dentro das
propriedades como dentro da Associação, a qual alguns membros pertencem e
todos compartilham as expectativas de melhoria da condição vida, e para isto
tentam abordar a questão ambiental dentro das propriedades rurais.
Na Imagem 25, que mostra a partir da vista do Morro do Macaco
algumas áreas com impacto da ação do homem na região do Taquari, percebe-
se que todas as propriedades destinaram suas terras para o plantio ou criação,
pois não existe uma dominação de áreas verdes para preservação, e sim nas
margens de leitos de rios ou em pequenas áreas de uma floresta de cerrado
com pouca arborização. No alto do Morro do Macaco, nota-se que em todas as
direções do município a incidência de áreas com maior concentração de
vegetação está relacionada aos acidentes geográficos do terreno.
111
Imagem 25 - Paisagem de propriedades da Região do Taquari
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2007
As propriedades que foram visitadas na Comunidade Taquari todas
apresentavam em parte de sua propriedade uma área destinada a conservação
do meio ambiente, por menores que fossem todas não destruíam ou
desmatavam novas áreas. O acordo entre os proprietários do Taquari inclui
melhorar as plantações (nas plantas geneticamente ou tratamento orgânico no
solo) e manter ou ampliar a área destinada a floresta, todas estas ações foram
planejadas pelo grupo e são seguidas, seguindo três procedimentos. Primeiro,
sensibilização do grupo em reuniões; segundo, deliberação de lideres ou
grupos dentro da comunidade para promover a ação e terceiro participação de
várias famílias no processo e execução da ação. Esses procedimentos
possibilitam aquilo que subjetivamente age como canalizador do pertencimento
ao grupo e práticas ambientais. Pela legislação, as áreas estariam fora do
exigido por lei, para serem consideradas áreas de preservação, mas pensando
que não exista fiscalização e com a necessidade de ampliar a produção e a
produtividade, como objetivos comuns dos membros da Comunidade Taquari e
de outras comunidades rurais vizinhas, o que ocorre é a prática de ampliação
112
de cultivo de terras promovendo, consequentemente, os lucros ou estoque
próprio, tanto do pequeno, médio ou grande produtor.
As propriedades podem ser vistas pelos limites com outras
propriedades, definidos pelas árvores que são permanentes e próximas às
cercas, margens de rios e estradas para marcarem o inicio e final da terra de
um dono ou família. Muitas das propriedades apresentam rios ou riachos como
o que se apresenta na imagem 26. Esses leitos apresentam rochas e areia,
sendo que a parte mais densa da floresta segue o rio, o que muitas vezes,
dentro da propriedade, não dificulta o acesso as águas. O problema de tais
hidrografias consiste no assoreamento causado pela devastação das matas
ciliares, que é visto até no trajeto para as propriedades. Outro impacto são os
esgotos dos bairros urbanos, mas tal fato não afeta o Taquari, pois seus
afluentes não estão próximos do perímetro urbano, diferente dos que são
apresentado na imagem. O que preocupa é que a região quando está na época
de chuvas ocorrem verdadeiras enxurradas de grande volume de água o que
arrasta e movimenta para o rio terra e areia que causam o assoreamento. Ao
mesmo tempo as propriedades rurais sofrem com a carga de produtos
químicos despejados nas grandes lavouras de arroz e soja principalmente, que
ao chegarem as fortes chuvas contaminam as águas.
113
Imagem 26 - Rio Santo Antônio que corta o município de Iporá
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de.
O abandono fica, pois, somente, em áreas destinadas à conservação de
floresta ou sem validade para produção, por serem inférteis para lavoura ou
criação de rebanhos, como pode se ver na Imagem 27.
Imagem 27 – Vegetação típica e clima da localidade (seco e quente no
inverno e chuvoso com ventos no verão)
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa.
114
As propriedades apresentam diferenças estruturais, quando
comparamos sua área de produção extensiva de gado e os espaços definidos
para plantio de lavouras. Veja, em seguida, a imagem 28. Além de haver uma
organização melhor de locais para manuseio da criação (curral e pastagens)
percebe-se que existe uma proximidade com áreas de proteção ambiental
dentro da propriedade.
Imagem 28 - Foto de uma grande propriedade na Comunidade Taquari
com da área do curral, pastagem e área de preservação ao fundo
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa. 2007.
Ao observarmos as propriedades, entendemos sua organização a
partir dos discursos dos proprietários. Nos depoimentos levantados em
entrevistas temos o discurso como modo compartilhado de apreender o mundo
por meio de narrativas ou histórias que a Comunidade Taquari cria, em relação
ao mundo social e ambiental. O conceito de discurso como “um conjunto
específico de idéias, conceitos e categorizações que são produzidas,
reproduzidas e transformadas a partir de um conjunto particular de práticas
através das quais um significado é dado à realidade física e social” (HAJAR,
1995, p. 44 apud LENZI, 2005: p. 57). Esta interpretação pode nos auxiliar a
entendermos como as práticas que são feitas nas propriedades são também
conversadas entre os membros, mas somente com ajuda ou com condições
115
financeiras próprias os proprietários podem fazer melhorias e pensar em ações
que rendam produtividade e conservação do meio ambiente.
O que norteia este discurso são linhas narrativas sobre a realidade
social e ambiental, possibilitando que elementos distintos desses domínios
sejam combinados de tal forma a tornar possível, a diferentes atores sociais,
chegar a um entendimento comum em visão sobre essas áreas (HAJAR, 1995,
p. 22 apud LENZI, 2005, p. 57). O que temos é uma conciliação e um
compartilhamento dos feitos (práticas econômicas, sociais e religiosas) dentro
da comunidade, que fazem aproximação com as forças de conservação
ambiental presentes nas discussões das sociedades modernas, e que
começam a se inserir com mais profundidade nas comunidades rurais.
Esse processo, que é entendido como recampesinização, pode
evidenciar as forçar, que agem na agricultura e transformam a produção em
mercadoria. Onde os recursos para produção são orientados a satisfazer os
mercados ou são produzidos e reproduzidos na própria unidade produtiva (ou
comunidade rural), que busca sempre na visão empresarial fazer novos
produtos, de caráter multiproduto. Nessa procura , a reconexão da agricultura
com a natureza tem desempenhado um papel central na pluriatividade e na
descoberta de novas formas de cooperação e volta ao artesanato (PLOEG,
2006).
Ao pensar estas transformações, ainda devemos considerar que alguns
grupos rurais apresentam, no geral, características de uma prática de
agricultura familiar que está associada às noções de pequena propriedade,
pequena produção e de laços familiares e almeja, objetiva, luta e produz,
visando a sua reprodução social. A noção de reprodução social, se sedimenta
ideologicamente como subsistência e não como progresso social, que novos
contextos, como as questões ambientais, passam a ser interpretados como o
uso dos recursos naturais de forma sustentável (MORREIRA, 2007).
Na tentativa de mostrar as propriedades pequenas na região do Taquari,
apresentamos ter o seguinte esquema na Figura 3. Destacamos que todos os
elementos serão encontrados nas grandes propriedades da região, mas a
maioria se dispõe como na Figura 4. A disparidade entre as propriedades, além
da extensão das terras e recursos para cultivo e manutenção das propriedades,
se fundamenta na falta de investimentos. Em alguns casos, as propriedades
116
por não renderem lucro maior, acabam desmotivando financeiramente os
proprietários para continuarem com a produção, por estes motivos os membros
da Associação aderem-se ou desvinculam-se por não terem retorno de curto
prazo.
Figura 3
Ilustração simulada do arranjo espacial das grandes propriedades
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2009.
É necessário entender que as práticas de sustentabilidade ambiental,
como as práticas agrícolas dependem de resultados de médio a longo prazo.
Pois o que diz respeito ao desenvolvimento da sustentabilidade tanto ambiental
como econômica dentro da comunidade estará relacionado a preocupação do
entendimento do homem e seu hábitat, pois foco não é o protecinismo da
natureza, mas sim a administração racional dos recursos naturais, como o solo,
a água e a biosfera, conforme sinalizou Franco (2000). Ao analisarmos as
propriedades, vimos que a maioria da Comunidade Taquari é formada pelos
mini-fundiários. Essas pequenas propriedades contam com metade dos
117
elementos de uma grande propriedade e mesmo assim garantem sua
subsistência, estes dados podem ser superados quando compreendemos a
forma de organização do grupo com um arranjo associativo entre os membros.
Está parceria da Associação dos Produtores Rurais do Taquari é o que garante
a subsistência de alguns elementos do grupo, pois a compra e venda da
produção é feita a dentro do grupo associado e pertencente à Comunidade
Taquari.
Figura 4
Ilustração simulada do arranjo espacial das pequenas propriedades
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2009.
O trabalho dentro das propriedades depende da extensão da mesma. No
Taquari, a presença de trabalhadores que não pertencem aocleo familiar se
118
em propriedades maiores e com mais serviços. Isso não significa quer dizer
que as pequenas propriedades não tenham tantos afazeres, o que acontece é
que a agricultura familiar desenvolvida na localidade consegue suprir a
necessidade de mão-de-obra com a família nuclear. E na localidade as
mesmas famílias suprem os médios e grandes proprietários com trabalhadores
que não estão ocupados na manutenção de suas propriedades, como os filhos
e netos dos pequenos proprietários. Em ambos os espaços, os membros da
comunidade trabalham dentro e fora de sua propriedade, seja para mutirões ou
obrigações, mas também trabalham conforme suas necessidades particulares
e coletivas. O interessante é que na Comunidade Taquari os desejos e
esforços para uma produção que supere a subsistência são expectativas
compartilhadas dentro de todas as propriedades, e garantem a sustentabilidade
da agricultura familiar e por conseguinte o trabalhador rural. Pois a presença de
trabalho não-agrícola, somada ao trabalho tradicional no campo podem ser
possibilidades de continuidade da presença humana no meio rural.
As unidades individuais de produção, sejam elas pequenas ou maiores,
estão empenhadas em progredir com e através de suas próprias unidades de
produção. No plano da comunidade, um crescimento geral na economia, o
que coincide com o padrão típico de produção agropecuária capitalista e/ou
empresarial. Esta visão de Schneider (2006) abre espaço para discussão que o
campo será fomentador de postos de trabalho e gerador de riquezas
agregadas, e é neste caminho que segue a Comunidade Taquari, ao apostar
na Associação dos Produtores Rurais do Taquari.
Esses dois lados do mesmo mundo social podem ser entendidos com a
ideia de como Bourdieu representa a sociedade:
Pode-se assim representar o mundo social em forma de
um espaço (a várias dimensões) construído na base de
princípios de diferenciação ou de distribuição constituídos
pelo conjunto das propriedades que actuam no universo
social considerado, quer dizer, apropriadas a conferir, ao
detentor delas, forças ou poder neste universo. Os agentes
e grupos de agentes são assim definidos pelas suas
posições relativas neste espaço. Cada um deles está
acantonado numa posição ou numa classe precisa de
posições vizinhas, quer dizer, numa região determinada do
espaço, e não se podem ocupar realmente duas regiões
119
opostas do espaço mesmo que tal seja concebível.
(idem, 1988, p. 133-134)
Tal perspectiva, traçada por Bourdieu, nos parece de grande valia para
buscar uma compreensão da maneira como se articulam idéias, ações e
instituições que começam a surgir em torno do que estamos caracterizando
como questão ambiental.
As propriedades no Taquari conseguem ser autônomas para produção
de diversos alimentos e artigos (no caso da Associação especificamente), e
nesta produção considera-se uma sustentabilidade ambiental. Ao analisar, no
trabalho de campo, a produção da farinha de mandioca percebemos que as
fornalhas que são utilizadas para torrar a farinha, queimam lenhas provindas
das matas das propriedades rurais, não sendo utilizadas madeiras de árvores
derrubadas. (Veja Imagem 29).
Imagem 29 - Fornalha tradicional para produção da farinha de mandioca
na fábrica da Associação dos Produtores Rurais do Taquari
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2007.
É importante entendermos o que faz estas propriedades serem
consideradas uma constituição que origem a uma comunidade de caráter
sustentável. Para compreender um pouco mais podemos utilizar o conceito de
“comunidade real” de Bauman:
120
[...] a comunidade é fiel à sua natureza (ou a seu modelo
ideal) apenas na medida em que ela é distinta de outros
agrupamentos humanos visível onde a comunidade
começa e onde ela termina ) pequena (a ponto de estar
à vista de todos seus membros) e auto-suficiente (de
modo [...] oferece todas as atividades e atende a todas
a necessidades das pessoas que fazem parte dela [...])
(idem, 2003, p. 17)
O conceito de Zygmunt Bauman descreve os limites que podem ser
aplicados à Comunidade Taquari, pois esta se destaca de outras comunidades
vizinhas não pelo caráter de reconhecimento humano entre o grupo, mas
pela regionalização das paróquias, logo o humano tem proximidade, que o
grupo não é extenso, além disso, a organização social e econômica do grupo
caminha para uma auto-suficiência em questão de trabalho, renda e produção.
Baseado no que foi observado em Taquari, considerou-se que as terras
agricultáveis, recursos técnicos, e mão-de-obra qualificada serão a força
estratégica para consolidação dos grupos. As terras de especulação podem vir
a ser terras de gestação de novas alternativas de trabalho, para aqueles que
não conseguem produzir por falta de recursos. Tanto uma quanto a outra
situação podem ser alteradas quando a agricultura familiar e as novas
experiências com cooperativas e associações orientam as ações humanas no
campo. No caso de ações relativas ao meio ambiente, é comum que as
articulações criem novas pressões na construção de desenvolvimento
sustentável.
121
CAPÍTULO III
A TERRA, O TRABALHADOR RURAL E A NATUREZA NÃO IMACULADA
1- Terra sustentável, natureza e trabalho rural
A necessidade de uma articulação para estabelecer conexões entre os
setores existentes dentro da sociedade, a fim de promover um pensamento de
caráter ideológico ou político sobre questões ambientais, depende do grau de
participação e envolvimento dos membros de uma comunidade. No caso das
comunidades rurais na região do Taquari, o pensamento ecológico ou
ambiental, tem se apresentado, como um ambientalismo de cunho religioso, na
tentativa de manter uma ligação e laços de proximidade do universo simbólico
dos grupos. Outro fator necessário é que as tradições religiosas na
Comunidade Taquari, assim como em outras, tenham o trabalho rural, a
produção agrícola e a agricultura familiar como pontos de conscientização da
relevância da questão ética e moral sobre a posição do homem do campo
frente às transformações do espaço em que vivem.
122
Esse processo de confluência da formação e coesão religiosa do grupo,
da solidariedade no trabalho rural - sendo dentro e fora da comunidade - e o
pensamento ambiental que é construído pelo grupo, são questões que
fomentam uma auto-regulação para organização consciente e inconsciente
tanto dos indivíduos quanto do grupo. O que se propõe aqui é entender as
práticas e discursos que estão sendo compartilhados e reproduzidos dentro
e fora da comunidade rural, e são compreendidos como algo próprio do grupo e
necessário para o resto da sociedade.
Os momentos nos quais foram feitas estas observações e entrevistas
foram as reuniões e nas comunidades. Nas reuniões, quando existe alguma
discussão sobre afazeres como plantações e mutirões para construção de
cercas ou manejo de animais surgem discursos acerca das áreas de proteção
e qualidade do solo. Os espaços são pensados na comunidade rural como
potenciais para uma finalidade mais ligada a agropecuária ou busca por ações
de trabalho não-agrícola (construção de currais, serviço na fábrica ou ajuda em
ações de treinamento).
O que fica claro tanto na Comunidade Taquari quanto na Associação
dos Pequenos Produtores da Região do Taquari, é que a presença e o discurso
das lideranças para execução, planejamento e organização das tarefas são os
momentos de intensificação e reprodução dos valores para proteção e
conservação ambiental dentro das propriedades do grupo. E esse pensamento
é aceito porque, segundo os líderes, “Nas reuniões, o grupo acredita e acha
que a Associação vai melhorar nossas vidas”. Ou seja, o grupo dá respaldo aos
acordos conjuntos quando se reúne para comparar as melhorias que alguns
tiveram e outros não, por adotarem ações nas propriedades que garantam a
melhoria para produção e sustento da família.
Assim, apesar do líder necessitar de atributos básicos, tais como uma
visão de futuro, confiança em si mesmo e capacidade de alinhamento dos
funcionários, ele deve, concomitantemente, ser capaz de trabalhar com novas
parcerias, obtendo sucesso por uma rede de relações, assumindo não o
desempenho por suas instituições, como também sendo responsável pela
comunidade como um todo, o que requer comprometimento, convicção e
dedicação ao bem comum. Então, a constituição da autonomia para uma
organização com princípios ambientais num processo consciente,
123
culturalmente aceito na busca por um controle instrumental cada vez mais
sofisticado sobre o modo de vida, promove uma reflexão da concepção de
mundo nas relações sociais com outras culturas (urbana e rural) e com a
dinâmica ambiental. Ou seja, as comunidades rurais procuram averiguar qual a
pontencialidade que o grupo tem em relação a uma produção rural efetiva para
a comercialização e tentam compartilhar a visão ambiental que deve-se
promover dentro das unidades produtivas.
Sachs (1986) esclarece com o conceito de ecodesenvolvimento o estilo
de desenvolvimento que cada localidade ou região poderia procurar para as
soluções específicas de seus problemas, levando em conta os dados
ecológicos e culturais, para as necessidades imediatas, como também para
aquelas a longo prazo. O que se dá, então, é um voto de confiança à
capacidade dos membros das sociedades de identificar os seus problemas e
de lhes dar soluções originais, ainda que se inspirando em experiências
alheias.
Cada pessoa tem sua própria concepção de meio ambiente, cujas
características dependem de seus interesses e crenças individuais, sejam elas
científicas, religiosas, artísticas, políticas, profissionais ou filosóficas. Sendo
assim, ao debater a questão do meio ambiente ou propor projetos relacionados
é necessário, primeiramente, conhecer as concepções de meio ambiente das
pessoas envolvidas na atividade (SACHZ, 1986). É nesse momento que a
socialização da comunidade deve fazer efeito com discursos orientados para
uniformidade do que se deve fazer com as matas, com os pastos, com casos
de áreas degradas em nascentes, leitos de rios ou na própria preparação da
terra para uma produção.
A família no meio rural é o maior disseminador das práticas e saber
ambiental, pois a proximidade com o trabalho no campo implica na
responsabilidade nas consequências da transformação da natureza, como
explica Brandão (1986):
A tarefa de controle da natureza é feita pela família
camponesa como um grupo, em várias etapas e
alternativas de corporação e, assim, o mundo do trabalho
se determina pela ordem da família que, por sua vez, se
organiza e modifica de acordo com os princípios que
124
regem a organização dos sistemas: o da produção e o de
parentesco, unidos e complementares quase a ponto de
se constituírem em um só. (idem, p. 78)
Em relação ao segundo momento de análise, pode-se entender que a
comunidade rural ao compartilhar idéias e problemas pode criar uma proposta
ambiental para um desenvolvimento sustentável. Isso é possível apenas
estabelecendo a relação entre os aspectos éticos do grupo e sua percepção
ambiental. Embora a concepção do projeto ou do pensamento ambiental tenha
sido realizada contemplando todas as premissas básicas para uma
sustentabilidade, a efetivação somente será desenvolvimento sustentável se
houver, por parte dos membros da comunidade, a percepção do meio e um
compromisso de interferir nesse processo. É nesta visão que se percebe que
no Taquari é possível haver esse desenvolvimento e pensamento ambiental,
pois a liderança e até seus membros menos atuantes tentam compartilhar o
entendimento da importância da busca da conservação e crescimento da
produção nas propriedades.
O pensamento ambiental, pelo fato de ser um campo do saber
relativamente novo e por dialogar com um vasto enfoque multidisciplinar, acaba
sendo vítima de uma grande imprecisão de definições e de seus próprios
objetos de estudo. A necessidade de serem definidos alguns conceitos
essenciais à compreensão das questões ambientais, melhoram as
considerações conclusivas no aprofundamento do tema proposto por este
trabalho, reflete essa imprecisão e mostra que uma convergência da
comunidade científica a respeito dessas definições e objetos é urgente e
indispensável para tornar os estudos ambientais mais claros e concisos.
De acordo com essa definição, os homens, com suas diferentes culturas
e tecnologias, também agem e transformam o meio ambiente, na medida em
que constroem diferentes tipos de relações com a natureza e com
organizações sociais e políticas. Portanto, a palavra meio ambiente diz respeito
tanto ao meio natural quanto ao meio social, diferentemente da palavra
natureza, que, na escala da percepção sensorial do homem, diz respeito
somente ao meio natural.
Vale lembrar aqui qual é a base de entendimento do que é meio
ambiente por duas concepções. A primeira, a Lei Brasileira 6.938,
125
caracteriza meio ambiente como “o conjunto de condições, leis, influências e
interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a
vida em todas as suas formas" (art. 3º, I, da Lei 6.938, de 31.8.81). A segunda
definição de meio ambiente adotada é a proposta por Marcos Reigota, que o
define como
[..] um lugar determinado e/ou percebido onde estão em
relações dinâmicas e em constante interação os
aspectos naturais e sociais. Essas relações acarretam
processos de criação cultural e tecnológica e processos
históricos e políticos de transformação da natureza e da
sociedade [..] (REIGOTA, 2004, p. 21).
Para se explorar essa questão de qual a perspectiva de meio ambiente e
sustentabilidade que a sociedade adotou de maneira consciente e subjetiva é
necessário compreender o naturalismo como integrante do culturalismo do
grupo, “passando de uma proteção ingênua do mundo natural para a afirmação
de uma nova relação entre homem/natureza” (Diegues, 2002, p. 48). Nessa
visão, deve-se ter o membro da comunidade categorizado, com base em três
idéias de Diegues (2002): a) o homem produz o meio e é ao mesmo tempo seu
produto; b) a natureza é sempre histórica e a história sempre natural; c) a
coletividade e não o indivíduo se relaciona com a natureza.
Os membros de um grupo ao entrarem em contato com a natureza
sofrem ações de duas vias; ou seja, quando o homem altera o meio e quer
melhorá-lo necessita de mudar seu próprio comportamento. Ao mesmo tempo
a natureza sofre as transformações durante o processo histórico, mas continua
sendo a mesma ao atender as necessidades do grupo sendo para produção,
lazer, moradia etc. Nesse processo, o que se percebe é o beneficio coletivo
garantido com a participação e solidariedade de todos ao manterem esforços
para um equilíbrio ambiental com menos devastação e impactos no solo e
consequências sociais, como por exemplo, a falta de água por erosão que
implica em dificuldades para produção e permanência na localidade. Esse
exemplo não se refere ao Taquari, graças aos planos de reflorestamento nas
propriedades.
Contudo, embora as necessidades humanas sejam socialmente
construídas, a possibilidade de satisfazê-las é determinada pela disponibilidade
126
de recursos naturais em quantidade suficiente. “Recursos naturais é o nome
que se aos elementos da natureza em referência ao seu potencial de uso
para os seres humanos” (Pádua, 2004, p. 30). Assim, o homem se apropria da
matéria natural para satisfazer suas necessidades através de seu trabalho e,
no caso das comunidades rurais, o trabalho é realizado na terra. Na
Comunidade Taquari especificamente, isso está presente tanto no campo, com
a agropecuária como na fabrica, com trabalho de caráter não-agrícola. Essa
relação de trabalho agrícola e não-agrícola também é observada em trabalhos
de Brandão (1981, 1986) e Candido (1997).
Ainda no âmbito da relação homem e natureza, apresenta-se também a
discussão que conflita a questão ambiental com o próprio movimento do
desenvolvimento e crescimento do trabalho no meio rural. Pensar nos rumos
que um grupo deve traçar para conseguir sua sustentabilidade e ainda expandir
seu poder econômico garantindo a qualidade de vida relacionado com a idéia
de que:
O pensamento ecológico é de certa forma, bastante
materialista. Ele está mais preocupado com a ação
concreta das estruturas sociais no mundo real do que
com a maneira ideológica pela qual elas se autodefinem
politicamente. (Pádua, 2004, p. 61).
O homem rural só consegue tomar posse daquilo que transforma ou
adquire através do seu trabalho. Sobre o processo de trabalho, Marx afirma
que:
O trabalho é um processo entre o homem e a natureza,
um processo em que o homem, por sua própria ação,
media, regula e controla seu metabolismo com a
natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural
como uma força natural. Ele põe em movimento as forças
naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e
pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria
natural numa forma útil para sua própria vida. (apud
Antunes, 2005, p. 36)
No centro das relações materiais que os homens estabelecem com a
natureza, opera sempre um complexo de representações que informam as
ações direcionadas ao meio, bem como delineiam um espectro mais ou menos
127
definido de expectativas sobre os resultados daquelas ações. Marx chega a
dizer que o modo de produção da vida material condiciona o processo em geral
de vida social, política e espiritual (condiciona também a consciência).
[...] o trabalho é um processo entre o homem e a
natureza, um processo em que o homem, por sua própria
ação, media, regula e controla seu metabolismo com a
natureza. Ele mesmo se defronta com a matéria natural
como uma força natural. Ele põe em movimento as forças
naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e
pernas, cabeça e mão, a fim de apropriar-se da matéria
numa forma útil para sua própria vida. Ao atuar, por meio
desse movimento, sobre a natureza externa a ele e ao
modificá-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria
natureza. Ele desenvolve as potências nela adormecidas
e sujeita o jogo de suas forças ao seu próprio domínio.
(MARX, 1983 p. 149)
Conforme apontou Enrique Leff (2001, p. 134):
A lógica da unidade econômica rural e o estilo étnico
próprio de uma cultura remetem a racionalidades sociais
constituídas como sistemas complexos de ideologias-
valores-práticas-comportamentos-ações que são
irredutíveis a uma lógica unificadora. Neste sentido, a
racionalidade ambiental não é a expressão de uma
lógica, mas o efeito de um conjunto de interesses e de
práticas sociais que articulam ordens materiais diversas
que dão sentido e organizam processos sociais através
de certas regras, meios e fins socialmente construídos.
Estes processos especificam o campo das contradições
e relações [...] entre a dinâmica dos processos
ecológicos e as transformações dos sistemas
socioambientais.
Sachs (2004) defende que o objetivo supremo é o emprego decente e/ou
autoemprego para todos, trata-se da melhor forma de assegurar
simultaneamente a sustentabilidade social e o crescimento econômico. Em
outras palavras, a ênfase deve ser colocada na mudança da distribuição
primária de renda, ao invés de se persistir com o padrão excludente de
crescimento, a ser corrigido posteriormente por meio de políticas sociais
compensatórias, como políticas assistencialistas.
128
Percebe-se que a problemática ambiental, da forma complexa como se
apresenta, exige por toda a sociedade, um esforço maior no sentido de pensar
o meio ambiente a partir de bases teóricas mais concretas, que de acordo com
os contextos ou paradigmas culturais possam possibilitar aos sujeitos um novo
pensar, a construção de novos saberes.
Pensar a complexidade ambiental situa-se na dimensão
do “por pensar”, mas que apenas se torna pensável a
partir do pensado. É um pensamento que se constrói
mediante estratégias de reapropriação do mundo; é uma
compreensão que segue as trilhas do ser com a
natureza, [..] das articulações do conhecimento e do
diálogo de saberes. A complexidade ambiental inscreve-
se no terreno do poder que atravessa todo saber, do ser
que sustenta todo saber e do saber que configura
identidades diferenciadas. (LEFF, 2007, p. 221).
A possibilidade de impor um custo maior para gerações futuras,
moralmente demanda que a atual proposta de desenvolvimento leve em
consideração que o uso racional de recursos naturais seja visto sob uma
perspectiva de médio e longo prazo. É algo pensado dentro da Comunidade
Taquari, e o resultado de tal situação pode ser exibido com conquistas
materiais como aquisição de propriedades ou com maior renda para as famílias
que participam das ações seguindo as propostas do grupo. Portanto, as ações
de desenvolvimento são, sobretudo, um processo baseado em, e sujeito a,
relações de poder de intervenção que buscam atingir objetivos políticos,
sociais, culturais, econômicos, e ambientais.
2- Práticas de interação na discussão ambiental no Taquari
A Comunidade Taquari, como foi dito, teve um início baseado na
organização do grupo da região com delimitação espacial e cultural. O
processo de unidade dos habitantes da localidade do Taquari teve participação
de indivíduos externos para consolidação e formação da Comunidade Taquari.
Nesse ponto, dois fatores se destacam como a CEBs e indivíduos que se
129
destacaram promovendo a união dos camponeses de base religiosa católica.
Desde o começo da formação do grupo local em comunidade rural não houve
uma real participação de todos, por isso o entendimento que se faz sobre eles,
comentado anteriormente, pode ser baseado no entendimento do conceito de
bairro delimitado por Antonio Candido, pois a proximidade espacial não garante
a estabilidade da confiança mútua entre os indivíduos e se traduz na
estabilidade das instituições, normas e obrigações recíprocas garantindo a
eficiência e a eficácia dos investimentos individuais e coletivos.
O que une os camponeses do Taquari é o que constitui uma
organização social de base, como “confiança, normas e sistemas que
contribuem para aumentar a eficiência da sociedade, facilitando as ações
coordenadas” (PUTNAM, 1996, p. 177) e o fato de constituírem “estruturas de
relações sociais que lhes permitam tingir coletivamente seus próprios objetivos
individuais” (COLEMAN, 1994, p. 300), que são os fundamentos de uma
comunidade de base.
Outra justificativa para confirmação da unidade de um grupo é a unidade
religiosa, e nesse sentido Émile Durkheim uma amplitude no entendimento
da vida social que pode ser aplicada à realidade do Taquari, pois nela vemos o
que o autor traduz “por um conjunto de concepções ideais nas quais se
exprime a vida nova”
19
. Se antes a falta de unidade no Taquari para pensar os
problemas comuns era a vida velha, a nova passa a ser uma esperança para
se erguerem, e neste processo a consolidação de ideais para uma melhor
produtividade e importância do meio ambiente perpassa entre seus membros
como grupo.
É necessário, então, fazermos uma demarcação do grupo a partir de sua
organização social e espacial, na tentativa de mostrarmos a diversidade
cultural como fator de validação do compartilhamento da prática ambiental e na
construção de um discurso que tenha sentido sustentável, a qual discutiremos
a diante. Nesse processo, é fundamental perceber que nos levantamentos
feitos a dispersão espacial promove então no grupo uma necessidade de ações
para consolidação da Comunidade Taquari. Essa efetivação dependeria de
dois fatores: a origens dos membros e suas trajetórias de vida. Para auxiliar
nessa configuração faremos duas divisões e duas subdivisões em relação às
19
Durkheim, 1989, p. 466.
130
origens dos membros dentro e fora do município de Iporá, além da presença de
pessoas vindas da zona urbana ou zona rural.
Assim, temos as seguintes configurações de origem das pessoas: na
primeira delas temos as que vieram da zona urbana de Iporá que na maioria
não tiveram infância e juventude na área urbana; sendo os ascendentes (avós
e pais) proprietários de terras quando seus filhos nascem. A segunda categoria
seria dos ascendentes que quase sempre moraram na área rural, fazendo com
que os descendentes saíssem para estudos ou melhorias de condições de
trabalho (sem esforço físico). Alguns dos netos e filhos de membros da
comunidade já possuíam um pensamento de não ir embora e o próprio trabalho
do grupo na Associação faz com que o haja um êxodo em busca por
trabalho não-agrícola, sendo que o sustento das famílias se baseie do trabalho
da agricultura familiar.
Diferente das duas primeiras constatações, o terceiro grupo veio de fora
da zona urbana, de fora de Iporá. Essas pessoas com posses (imóveis para
aluguel) ou trabalhos na área urbana, como funcionários públicos ou
comerciantes, têm propriedades adquiridas por eles ou pelos ascendentes.
Para estes, a área rural tornou-se refúgio para descanso ou fonte de uma
renda extra que pelo menos sustente os gastos da propriedade, podendo ser a
conta de energia e/ou caseiros ou apadrinhados nas proximidades da
propriedade que prestam serviços sem vinculo empregatício. E a última
categoria de habitantes que formaram a Comunidade Taquari e que são da
zona rural exterior a Iporá tem normalmente os antecedentes dos moradores
que compram grandes glebas de terra, são “capitalistas rurais”, ou seja,
fazem produção em escala industrial, seja para a pecuária de corte (gado em
criação extensiva) ou agricultores de culturas tradicionais (arroz, feijão e milho)
ou das novas culturas que se implantam cada vez mais rápido e em diversos
pontos do estado de Goiás (trigo e cana-de-açúcar).
O que podemos ver é que existe uma relação entre o urbano e rural
precedente à formação da comunidade rural, e iremos aprofundar em como,
independente a estas origens, essa relação se alterou e como se criou o
entendimento de desenvolvimento ambiental e de sustentabilidade dentro do
grupo no Taquari. O que sempre temos como base, no discurso de origem da
Comunidade de Taquari, onde sempre que era abordada a história das
131
primeiras reuniões para celebração das missas na localidade, a lembrança da
árvore de castanha de Baru se mantinha presente como o elo entre
natureza/meio ambiente e a importância do grupo religioso unido. As origens
dos membros do Taquari se confluíam no discurso do valor de serem um grupo
que pode unir forças, para superar as dificuldades da sustentabilidade e
mesclaram, com o passar do tempo, uma perspectiva ambientalista através de
reuniões com membros treinados pela CEBs, Pastoral da Juventude, entidades
governamentais (IBAMA, Ministério da Agricultura, Agencia Rural de Goiás) e
organizações não-governamentais de caráter religioso, entre outros. O
resultado é um discurso coletivo que se propaga através das gerações.
A configuração da Comunidade Taquari pode ser observada como uma
nova configuração espacial para satisfação de necessidades de densidade
demográfica, isto é, foram construídos territórios a partir das vivências e
estratégias das famílias de agricultores estimuladas pela possibilidade de
conjugação dos seguintes fatores: a) a ocorrência de outras funções do espaço
rural, além daquelas de características agrícolas. A crescente demanda por
acesso aos serviços públicos: escola, energia, água e assistência médica; b) a
possibilidade de conjugar trabalho para um ou mais membros da família,
complemento da renda com a agricultura, aposentadoria, pensão e
transferências de renda do governo; c) a difusão dos meios de transporte,
circulação e informação.
Estas orientações que cercam uma sociedade institucionalizada podem
ser referenciadas por Bourdieu (1998, p. 65), que considera que:
O capital social é o conjunto de recursos atuais ou
potenciais que estão ligados à posse de uma rede
durável de relações mais ou menos institucionalizadas e
de inter-reconheicmento ou, em outros termos, à
vinculação a um grupo, como um conjunto de agentes
que, não somente são dotados de propriedades comuns
[..] mas também são unidos por ligações permanentes e
úteis. Essas relações são irredutíveis a relação 7
objetivas de proximidade no espaço físico (geográfico) ou
no espaço econômico e social porque são fundadas em
trocas inseparavelmente materiais e simbólicas cuja
instauração e perpetuação supõem o reconhecimento
dessa proximidade.
132
Assim, a Comunidade Taquari pode ser considerada como espaço
estável e para a construção da cidadania porque se constroem identidades
coletivas, como referências simbólicas e relações interpessoais duráveis, como
apresentado por Pierre Bourdieu no conceito de capital social. Ao mesmo
tempo, esta situação não significa dizer que se a comunidade passasse por
uma injustiça social ou uma nova práxis que conduzisse a um discernimento
diante das contradições do mundo rural e urbano, ainda assim, o povo poderia
permanecer com sua maneira própria de agir e discernir, pois o agente não
capta todas as formas e modificações do ensinar, converter, politizar, que são
disponibilizados de maneira comum aos membros da comunidade.
Esta reorganização espacial, em comunidades rurais, possibilita a uma
pessoa conjugar vários papéis, associados à renda ou à participação social que
oferece ao morador dessas comunidades possibilidades plurais: o de agricultor
e trabalhador em empresas; de aposentado, líder comunitário e agricultor;
agricultora e gestora da renda advinda dos programas sociais; de agricultor e
comerciante. Surge daí a figura da pluriatividade vinculada à variável espacial.
Tanto a conformação espacial quanto a social da Comunidade Taquari
expressam que o meio rural se amplia nas práticas sócio-econômicas. O que
temos, então, é a aglomeração dos novos aspectos da moral ou política
humana; nesse sentido, a questão ambiental apresenta-se como aglutinador
dos valores e práticas do mundo urbano no rural, como o trabalho, o mercado,
a produção, a escassez da natureza etc.
Antes de pensarmos propriamente na questão ambiental no Taquari
devemos lembrar que a agricultura que tentou se instalar no local não se
enveredou somente por uma busca compulsiva por produtividade, mas
podemos partir de uma perspectiva economicista, sendo que a determinante de
análise do grupo passa pelas relações sociais. O que observamos no Taquari é
a busca pela diminuição dos custos para o ambiente e a população, desde que
sendo o uso e a ocupação do solo a partir de uma estrutura agrária não
coincida com a compulsória de concentração da terra.
A partir das plantações tradicionais na região, como arroz, milho, feijão e
mandioca, vemos que existe uma homogeneização da economia rural local,
onde a integração do capital e a um estilo de desenvolvimento produziram uma
desigualdade espacial para competição. Logo, não haveria um futuro promissor
133
para aquelas unidades de produção que não conseguiram se “modernizar” e
que se concentram. É nesse momento que a organização das comunidades
rurais faz sentido. E a ajuda da CEBs para consolidação da Comunidade
Taquari fez valer com o discurso religioso da necessidade de organização dos
proprietários rurais
No Taquari a compreensão que temos da propriedade rural, é de um
local com possibilidades de desenvolvimento a partir de idéias que buscam no
agronegócio, maneiras diferenciadas de sustentabilidade típicas do latifúndio,
da monocultura, etc. O que ocorre então é a concentração do trabalho na terra
em pequenas glebas que comportem uma produção produtiva e criem espaço
para sustentabilidade ambiental. Assim como as experiências de
“modernização ecológica” e de desenvolvimento territorial sustentável são fatos
que podem ser percebidos ao observamos todas as práticas agrícolas,
ambientais e seus reflexos nos discursos. Nesta pesquisa, foram levantadas
as praticas agrícolas e pecuárias que a Comunidade Taquari desenvolve na
região, e aprofundaremos as ações no plantio, na produção de farrinha e outras
idéias que se tem na localidade criam um pensamento sobre a questão
ambiental.
É no último ponto citado que devemos delinear para nós o que
procuramos como desenvolvimento sustentável, que pode ser concebido como
“o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer
a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”
(ALMEIDA, 1997, p. 42).
Sendo assim,
O desenvolvimento rural deve combinar o aspecto
econômico (aumento do nível e estabilidade da renda
familiar), o aspecto social (obtenção de um nível de vida
socialmente aceitável) e o ambiental e que uma de suas
trajetórias principais reside na diversificação das
atividades que geram renda (pluriatividade)
(KAGEYAMA, 2008, p.71).
No entanto, a integração desses três pontos (econômico, social e
ambiental) não pode se dar por meio de uma composição, mas por um
planejamento estratégicos, que provocaria numa economia comunitária:
134
[..] uma modificação profunda dos objetivos
tradicionalmente fixados em cada um desses três
domínios, p.assar da busca da rentabilidade econômica
no curto prazo a uma ´eficácia alocativa de longo prazo`;
da busca da igualdade à promoção da ´eficiência
distributiva`; e finalmente, do ecologismo estritamente
ecologista à formulação de uma prática de ´equidade
ambiental` (THEYS, 2003, p. 186).
O espaço rural na Comunidade Taquari a partir destas ponderações não
pode ser pensado apenas como lugar produtor de mercadorias agrárias e
ofertador de mão-de-obra. A localidade deve ser pensada levando-se em
consideração a possibilidade de uma gestão de multipropósito do espaço rural
combinando postos de trabalho com pequenas e médias empresas através de
práticas pluriativas. É o caso da fábrica de mandioca e da cadeia produtiva em
torno dela (Veja Esquema 1 e do Capítulo II).
Um processo produtivo construído sobre o conceito de produtividade
conduz à ánalise das condições ecológicas, tecnológicas, econômicas e
culturais que torne fragmentado um aproveitamento e transformação dos
recursos naturais, preservando e potencializando a produção e minimizando a
superexploração e esgotamento dos recursos naturais, assim como a descarga
e acumulação de resíduos dos processos de produção e de consumo (LEFF,
2007). O que temos nas comunidades rurais é o conhecimento dos diferentes
níveis de articulação desses processos materiais para garantir um processo
histórico de transformações produtivas e sociais.
Esquema 1
Etapas da produção da farinha de mandioca na Fábrica da Associação
135
PROCESSO DE FABRICAÇÃO DA FARINHA DE MADIOCA NA COMUNIDADE TAQUARI
Colheita
A colheita da mandioca, em sua totalidade, é feita manualmente. Após realizar o arranque da planta de
mandioca do solo faz-se a divisão da parte aérea da planta (rama, folhas) da parte subterrânea (raízes de
mandioca), sendo esta última à matéria prima para a produção de farinha.
Descascamento
O descascamento pode ser manual ou mecânico. O descascamento manual é realizado com facas afiadas,
tomando-se os devidos cuidados para que não fiquem pedaços de cascas sem retirar e para que se retirem os
pontos pretos existentes na mandioca, fatores esses que tem grande relevância, pois influenciam na qualidade
do produto final.
Ralação
Essa etapa do processamento da mandioca pode ser mecânica ou manual. A ralação manual da mandioca pode
ser feita em ralo simples de inox, esfregando a mandioca contra o ralo, sendo este processo moroso e
demorado, diminuindo o rendimento de produção de farinha. A ralação mecânica é realizada por um motor
que rotaciona um cilindro de madeira revestido com aço cheio de ranhuras. Quando a mandioca é atritada
contra o cilindro, ocorre a ralação da mesma, resultando em uma massa branca que cai em um cocho. Este
processo mecânico possui o mesmo funcionamento do processo manual anterior, porém no mecânico a rotação
resulta de um motor elétrico e no anterior a rotação é resultante da força humana.
Prensagem
Essa etapa do processamento da mandioca pode ser manual ou mecânica. A prensagem manual pode ser feita
através de prensa de madeira ou metal. Esta prensa possui uma estrutura com formato de trave de futebol, de
madeira, no qual na sua parte superior é feita uma rosca na madeira artesanalmente, a qual vai dar encaixe a
um parafuso de madeira de 1,5 m aproximadamente, também confeccionado a mão. É um sistema de porca de
parafuso, porém feito artesanalmente em madeira e em tamanho grande. Nessa prensa coloca-se a massa
proveniente da ralação em sacos com pequenas perfurações, exercendo pressão sobre os mesmos para a
retirada da água da massa.
Esfarelamento
Essa etapa do processo pode ser mecânica ou manual e consiste basicamente em soltar a massa que foi
prensada, na fase anterior. No esfarelamento manual retira-se a massa da prensa, abrem-se os sacos que foram
prensados e despeja-se a massa prensada, que está compactada, em um cocho, geralmente de madeira, e com
as mãos se faz a descompactação da massa.
Torração
Essa fase do processo é realizada em uma chapa, alimentados por lenha, podendo ser o processo de mexer a
massa realizado manualmente ou mecanicamente. Este processo consiste basicamente em retirar a água
existente no produto e torrar o mesmo. A massa proveniente do cocho, que está esfarelada, no processo
manual, a massa é mexida com uma vassoura de piaçaba.
Embalamento
Essa etapa pode ser manual, e consiste em colocar o produto final (farinha) em embalagem plástica
transparente. É colocada a quantidade de 1 kg em um saco plástico que recebe o rotulo com informações
nutricionais e comerciais (Veja, Imagem 13), com o auxilio de uma balança. Após estes sacos de 1 kg são
agrupados e colocados em embalagens maiores.
Fonte: MELO, Marco Aurélio Pedrosa de. 2009.
A partir do Esquema 1, levantamos a seguinte questão proposta por
Gadard (2002) sobre “gestão integrada”, onde o desenvolvimento encontra a
antiga dicotomia entre os fenômenos de degrada e as ações corretivas ou
reparadoras a serem empreendidas, além da disponibilidade dos recursos para
satisfação das necessidades. No caso da fabricação da farinha a preocupação
foca-se no uso da lenha, na área destinada a produção de mandioca e o
136
destino dos resíduos. Mas como promover a conservação ambiental e a
promoção do desenvolvimento sócio-econômico?
As definições de desenvolvimento sustentado de empresários são um
índice da recepção das discussões ambientalistas entre industriais
"esclarecidos" e como eles tentam casar a idéia de sustentabilidade com várias
de suas preocupações, sobretudo com uma das essências da noção de
desenvolvimento para o empresário: crescimento. O desenvolvimento
sustentável reafirma o atual modelo de desenvolvimento, aperfeiçoando-o, à
medida em que propõe um melhor manejo de seus custos sociais e ambientais.
O fato de advogar uma sociedade mais produtiva com um menor custo
socioambiental não implica necessariamente uma opção por uma ordem mais
justa e participativa.
A Comunidade Taquari, através da fábrica de farinha da Associação,
tem três práticas de graus variados de ação conservacionista. Sobre o
consumo da lenha a prática ainda é rústica, que é utilizar madeira coletada das
matas, mas sem danificar as árvores. A ideia do grupo é utilizar o resíduo
líquido da lavagem e da prensa de mandioca para armazenamento e produção
de gás ecológico com a fermentação desse resíduo. Os resíduos sólidos como
as cascas, são utilizados na fabricação de compostagem. Perto da fábrica,
uma vala de 25m de comprimento, 5m de largura e 40cm de profundidade é
utilizada para armazenar todo material, que é coberto e após 45 a 60 dias é
retirado para uso nas lavouras como fertilizante, fazendo uma economia de
30% nos gastos com esse insumo.
Em todas as propriedades visitadas existe um discurso organizado
para falar da importância da conservação das matas de proteção (reservas
naturais) e ainda a colaboração para reflorestamento de áreas degradadas,
além de aumento da área protegida existente. Quando questionados sobre a
aquisição de tal fala, muitos respondiam, “Foi na própria comunidade mesmo!”
ou “Quando temos reuniões na Paróquia com o pessoal da Comunidade a
gente discute.”, mas na verdade muitos não sabiam muito bem o que poderiam
fazer mais. O que foi observado e mencionado antes, é que as propriedades
aproveitam todo espaço para plantio de lavouras (milho e mandioca
principalmente) e criação de animais.
137
Nestes três exemplos, a Comunidade Taquari apresenta uma gestão
que tem como “objetivo satisfazer os diversos tipos de demanda com o menor
custo, limitar certos efeitos negativos ou excessivos e levar em conta os
interesses dos diversos atores sociais ou institucionais na medida de seu peso
social ou de suas possibilidades de ação” (GADARD, 2007: 210). A lógica da
comunidade rural garante com o planejamento e com a gestão a proteção dos
“bens público”, que “são indivisíveis e não são passíveis de distribuição aos
consumidores” (LENZI, 2006, p. 66), pois todos são consumidores em
potencial, indo de frente com o ideal capitalista de consumo do bem-estar.
Mas esta situação não provoca uma diminuição ou estagnação do
crescimento econômico da comunidade. O que acontece é que ao se adotar
práticas ambientais para conservação e preservação da natureza, as
consequências econômicas para o grupo pode ser a elevação da renda, como
exemplo na comunidade Taquari se tem a prática da compostagem como
adubo. Essa ação de reduzir o uso de insumo químicos ou o plenejamento para
produção de gás natural a partir de resíduos de mandioca promovem
benefícios na produção gastos de energia para o forno. O uso seletivo dos
recursos na localidade permitem uma geração mínima de impacto ambiental.
Pois, a produção sempre terá uma geração degradação ,seja pelo uso
exaustivo do solo ou das águas.
Lenzi (2006) explica que o Estado pode criar mecanismos que garantam
um processo com impactos ambientais menos dolosos. Mecanismos
voluntários para aquelas ações que indivíduos, grupos e empresas realizam
para proteger o meio ambiente, mas que não são coagidas pela lei e nem
movidas por incentivos fiscais. No caso do Taquari, a fábrica da Associação
possibilita isso por terem iniciativas próprias sem ônus ou bônus para o Estado.
A Comunidade Taquari, quando representada pela Associação de
Pequenos Produtores do Taquari, demonstra que um sistema de produção está
associado no tempo e no espaço: a um modo de vida, a um contexto
ambiental, um fator demográfico, uma estrutura fundiária, um referencial de
valor, uma peculiaridade econômica que subverte a lógica capitalista
predominante. Há, por conseguinte, uma equação complexa de variáveis que
suscitam esta análise: a família (tanto na sua composição, quanto nos aspectos
demográficos), a cultura, a terra (como espaço vital), o valor do trabalho, a
138
apropriação, a hereditariedade, o consumo, os fluxos (entre urbano e rural) e
as perspectivas de sustentabilidade.
Dessa forma, ao invés de agricultura familiar deveríamos usar o termo
produção familiar, visto que a agricultura não é mais a principal renda familiar
como se tem no Taquari, aonde a renda vem de outras produções,
promovendo o desenvolvimento e crescimento da comunidade rural. O termo
desenvolvimento, o qual muitas vezes é confundido com crescimento
econômico, deve incluir outros aspectos como a cultura, o social, enfim, implica
a cidadania efetiva. Schneider (2006), designa desenvolvimento como “[..] uma
condição de bem-estar humana, garantia das liberdades individuais e respeito
ao meio ambiente que é alcançada a medida que o resultado do crescimento
econômico ´prioriza a melhoria das condições sociais de vida da população`”.
A manutenção dos recursos naturais e da produtividade
agrícola no longo prazo, a realização de ações produtivas
que produzam o mínimo de impactos adversos ao meio
ambiente, a garantia de retornos adequados aos
agricultores, a maximização da produção com o uso
mínimo de insumos agroindustriais, o atendimento das
necessidades sociais das famílias e das comunidades
rurais, etc. (NAVARRO, 1997, p. 10).
Schneider (2006) entende que entre as características da agricultura
familiar representa uma forma estável de organização social no meio rural
conservando práticas hegemônicas e historicamente garantidas. E nesse
processo histórico se constituiu os territórios onde as unidades de produção
ganharam características diferenciadas pelo seu porte econômico e
sustentável, construído a partir dos recursos produzido e reproduzidos nos
ciclos anteriores.
Assim, o que temos é uma relação entre espaço, trabalho e força de
trabalho, mas antes podemos observar o espaço e seu uso familiar e
comercial, que foi abordado por Brandão (1986) como terra de trabalho. Nessa
configuração fazemos a delimitação e analise de três tópicos sobre território
destinado a moradia da família e trabalho dela, são eles: o roçado ou roça; o
sítio e fazenda. Garcia Júnior (1981, p. 57-59) define essas três tipologias, a
primeira, o roçado, designando as lavouras de subsistência de pequena
139
produção. O segundo tipo, os sítios seriam as propriedades de média e grande
extensão onde existe uma lavoura de produção comercial, nisso inclui leite,
criação de aves, suínos e rebanhos. A terceira configuração a qual queremos
nos prender é a fazenda, que seria parecida com o sítio sendo o destino da
terra a criação de pastos para os rebanhos, além de lavouras em áreas de
latifúndio.
Todos estes espaços possuem um trabalho rural, para Garcia Júnior,
esse trabalho é a força empregada no trabalho necessário para produção
daquilo que o grupo familiar necessita para o consumo. Ao analisar a família no
meio rural Brandão (1986, p. 61) entende-se que o trabalho desempenhado é
aquele que o “conjunto de ações de serviço que respondem pelas condições de
coesão, sobrevivência e reprodução da família”. Essas definições envolvem
tanto o grupo familiar quanto o trabalho em si, pois retiramos nesse momento
os trabalhos não-agrícolas ou pluriativos que autores como Wolf, Woortman,
Candido e Schneider, além dos próprios Brandão e Garcia Júnior, discutem
relações capitalistas mais presentes na meio urbano (trabalho assalariado e
produção mercantilista) mas com presença ativa de pessoas vindas do meio
rural e da própria mercantilização do campo.
Ao observar neste trabalho a relação terra, trabalho e trabalhador, nos
aproximamos da definição de que
[..] sítio pode designar um estabelecimento que não é
uma grande propriedade, [...] ou fazenda, cujas
dimensões são compatíveis com o cultivo mediante o uso
da força de trabalho familiar. Por outro lado, mesmo se
tratando de grandes propriedades, o sítio não supõe
necessariamente uma única exploração, um processo de
trabalho unificado, mas é compatível com explorações
em bases familiares. (GARCIA JÚNIOR., 1981, p. 25)
A produção familiar na Comunidade Taquari é representada pelos
sistemas de pequenos sítios e roçados, ou seja, áreas de produção sazonal. O
principal produto para comercialização é obtido de cultivos no subsistema roça.
Portanto, observa-se que os sistemas tradicionais constituídos dos sistemas de
fazenda, sítio ou roça são responsáveis pela sustentabilidade socioeconômica
140
da localidade pesquisada servindo, portanto, como alternativa agrícola melhor
adaptada às condições locais.
“A exploração familiar, tal como a concebemos,
corresponde a uma unidade de produção agrícola onde
propriedade e trabalho estão intimamente ligados à
família”. (LAMARCHE, 1993, p.14).
Lamarche (1993) considera que, embora os estabelecimentos
camponeses sejam familiares, nem todos os estabelecimentos familiares
podem ser considerados camponeses. Para o autor, os estabelecimentos
familiares - partindo de um modelo tradicional camponês - se organizam
socialmente em função de um eixo dado pelo seu grau de integração ao
mercado; concebido em seu sentido mais absoluto, ou seja, tanto no plano
técnico-econômico como no sócio-cultural. Nessa linha de interpretação, tal
“modelo inicial” camponês continuaria exercendo influência sobre esses
agricultores através de seus costumes e tradições, embora a inserção no
mercado e na sociedade englobante de maneira geral provoque modificações
em tal modelo. Os agricultores familiares se posicionariam na sociedade em
função das duas forças referidas: a tradição camponesa e a sociedade de
mercado que os engloba.
Porém, o conhecimento dos povos tradicionais devido
consequentemente à “modernização” do meio rural procura transformar o modo
de ocupação da região. As características principais desse sistema são:
reduzido ou nenhum uso de insumos e material convencional (implementos e
máquinas); alta diversidade específica e genética (melhoria genética da
mandioca); uso da regeneração natural das espécies florestais do bioma
cerrado; a utilização de sistema de descanso da terra e uma alta proporção de
produtos usado para fins de subsistência, pouco emprego de mão-de-obra
externa, sendo a força de trabalho maior, a familiar (SCHENEIDER, 2006).
Baseando-se nisso, buscou-se compreender as diferentes formas de
apropriação dos espaços e dos recursos naturais nos sistemas sítio ou quintal-
roça (WOORTMANN, 1981), ou como Candido (1997) definiu bairro, como
alternativas sustentáveis para a Comunidade Taquari.
141
As técnicas empregadas neste estudo foram: aplicação de questionário,
realização de entrevistas abertas, conversas informais, diário de campo e
observação. Os contados para esta parte da pesquisa foram as famílias de
agricultores mais antigos indicados pelo presidente das comunidades. A
aplicação de questionário e as entrevistas com roteiros semi-estruturados
foram realizadas nas residências dos participantes da pesquisa. Nas áreas
produtivas foram feitas observações no momento em que as atividades no
rancho da Comunidade Taquari, nas pastagens e áreas de confinamento de
animais, na fábrica, nas roças ou áreas de reservas florestais.
O que se procurou avaliar foi o tipo de discurso que os membros e das
famílias do Taquari, e fomos confirmando à medida que íamos desvendando as
práticas de produção, relações familiares e representação religiosa no cotidiano
rural onde estas formas se apresentassem, em discursos religiosos e discursos
políticos, e para isto é preciso apreender a sabedoria popular, as
representações simbólicas nos rituais e narrativas de memórias. Na prática no
Taquari quando vemos os campos de produção sendo eles extensos (rebanhos
ou lavouras) ou intensivos (aviário ou suíno) compreendo que a satisfação das
necessidades vitais é agradecida por um universo simbólico da religião, a
função integradora do mito (missa sob a árvore de Baru) e mobilização do povo
(construção de espaços paróquia, Associação, plantações). Todas as ações
interagem de tal forma que se constrói um discurso com elementos que
agraciam a natureza e promovem uma reflexão de como devemos trabalhar o
meio ambiente tanto na alteração como conservação dele.
Mas como fazer a conexão entre a prática e conhecimento cultural?
Enrique Leff (2001, p. 138) propõe a “racionalidade cultural entendida como
um sistema singular e diverso de significações que não se submetem os
valores homogêneos nem a uma lógica ambiental geral”, ou seja, uma
comunidade rural cria uma identidade e sua cultura promove práticas sociais e
produtivas em relação às suas potencialidades no espaço físico-geográfico.
Nessa perspectiva, a racionalidade ambiental (racionalidade dos estilos de uso
da natureza) defende um Estado que contemple a diversidade cultural
integrando as diversas organizações comunitárias e identidades culturais.
Nesse sentido, o desenvolvimento sustentável deve integrar as diferentes
formações socioeconômicas e de grupos (urbanos ou rurais), e implica a
142
participação das comunidades na percepção, gestão e manejo de seus
recursos.
Em momentos anteriores foi falado sobre as propriedades rurais, mas
falta um delineamento mais delicado para imaginarmos e visualizarmos o
espaço. Por isso, utilizaremos a definição de Sítios (WOORTEMAN, 1981) que
são lugares onde os produtores de Taquari plantam árvores frutíferas,
hortaliças, plantas ornamentais e medicinais. Estas plantas recebem poucos
tratos culturais: capina e podas e, recentemente, às vezes, adubação orgânica
com resíduos da propriedade ou da mata produzidos em compostagem na área
da fábrica. Aqui, os trabalhos de plantio, limpeza de roça e produção de farinha
de mandioca são executados, prioritariamente, pelos homens, as mulheres são
mais requisitadas na plantação ou na limpeza da mandioca ou produção de
iogurte.
Além destas tarefas, outras tarefas realizadas por esses membros da
família são: varrição do quintal, capina, amontoa de folhas para a queima com
a finalidade de limpeza e produção de adubos para o cultivo das hortaliças. Os
insumos para essa atividade são obtidos na maioria fora da propriedade, o que
não permite aos membros da comunidade um grau de autonomia em relação
ao uso de insumos “modernos” vindo da cidade.
O compromisso da disponibilidade da família e consequentemente do
grupo para comunidade rural é indispensável ao funcionamento e à reprodução
da unidade produtiva, configurando a comunidade local (WANDERLEY, 2007).
A Comunidade Taquari é o espaço do trabalho, do grupo de amigos mais
próximos e das formas tradicionais de lazer, religiosidade e de vida cotidiana.
Devo destacar aqui que a cultura e a identidade local não são isoladas, basta
observar os jovens da Comunidade Taquari que se vestem de maneira
semelhante aos padrões da moda jovem urbana, utilizam celulares que
reproduzem músicas e vídeos, sintonizam rádios com conteúdos cosmopolitas
que vemos em nossos televisores ou no acesso na rede digital. O que nos
mostra que devemos considerar o meio rural como pertencente a um mundo,
integrado à sociedade mais ampla em que vivem.
Apesar de haver uma rejeição à atividade agrícola, esta não significa
necessariamente rejeição a vida do meio rural, que apresenta um modo
particular de utilização do espaço e de vida social, constituído pelas dinâmicas
143
sociais locais e mais amplas (WANDERLEY, 2007). Na Comunidade Taquari
podemos observar isto com dois momentos: o primeiro seria o investimento da
comunidade em plantações de mandioca ao longo do tempo para comércio, no
segundo momento a modernização do meio rural através da fábrica de farinha
garantindo o comércio e a produção na busca do bem-estar do grupo. Qualquer
ruptura nessa historicidade causaria quebra na sucessão no meio rural, e todo
trabalho desenvolvido para atrair o jovem e promover a estabilidade na
ampliação criaria uma crise na reprodução social, apontada por Bourdieu
(1998).
A reprodução que foi constituída na Comunidade Taquari começou como
unidades de produção e de consumo, estas famílias e as gerações que as
antecederam tinham como objetivo a reprodução da própria unidade familiar.
Wanderley (2007) ao confrontar a ideia de que não existiria o “fim do rural”,
pois o que garante a reprodução imediata (alimento) do grupo são as
estratégias que possibilitam a reprodução da condição social de agricultor
(gerenciamento da produção), apresentam a possibilidade de organização de
base social para sustentabilidade do grupo, garantindo algum nível de
investimento e acumulação dentro dos sítios e atingindo toda comunidade.
Nos sítios, os processos de trabalhos ocorrem com uma divisão de
trabalho, onde mulheres, além de participarem nas tarefas dos lares participam
dos trabalhos na unidade de produção, descritos acima. As principais tarefas
realizadas por esses membros da família são: varrição do quintal, capina,
amontoa de folhas para a queima com a finalidade de limpeza e produção de
grãos (milho, arroz e feijão), cana-de-açúcar (ração em tempos de seca) e
cultivo das hortaliças. Para que estas produções sejam eficazes e respeitem o
espaço ecológico é fundamental a ação planejadora como um conjunto de
métodos destinados a captar e sistematizar informações, objetivando
racionalizar processos decisórios, instigando modificações que controlem a
dinâmica de funcionamento dos sistemas ecossociais “sob condições de
carência de informações e recursos [...] e interesses entre os segmentos
sociais envolvidos” (VIERA, 1998).
A produção para autoconsumo também se relaciona com manejos
sustentáveis, conforme demanda a noção de segurança alimentar. Geralmente
esta prática utiliza os recursos disponíveis localmente numa forma de co-
144
produção entre homem, trabalho e natureza (Ploeg, 2006), sem agredir o meio
ambiente, a capacidade futura de produção e consumo, e sem comprometer a
condição socioeconômica da família, antes pelo contrário, fortalecendo-a ainda
mais. Resíduos desta produção (palhadas, estercos etc.) podem ser a base
para ciclos procedentes e também podem ser destinados à alimentação dos
animais, ou seja, uma produção está conectada à outra. Ademais, imbricado
nessas relações encontra-se o saber-fazer transmitido ao longo de gerações.
Para engajar todos os setores da comunidade e da sociedade geral na
perseguição de um tipo de desenvolvimento sustentável, equacionado,
economicamente eficiente e politicamente viável com o mínimo de atrito entre
os valores e saberes do passado e as novas práticas educacionais e gestão
participativa. Escolhas ecologicamente corretas podem ser efetuadas por um
processo de diálogos entre os membros da sociedade, sendo eles de base
cientifica e/ou com valorização dos saberes populares no meio rural,
procurando uma aproximação e participação da população, criando um
sentimento de responsabilidade quanto às escolhas feitas (CAVALCANTI,
1999).
A Comunidade Taquari promove diversos tipos reuniões, como eventos
religiosos (missas ou romarias) ou na discussão de problemas (convocações
da Comunidade e Associação) as lideranças do grupo procuram valorizar e
inculcar uma responsabilidade para questão ambiental, educando sobre o lixo
(recicláveis) e a importância da mata preservada, conservada e reflorestada
são pontos de arguição pertinentes. A sustentabilidade por viés político se
baseia em dar a todos os membros da sociedade uma responsabilidade na sua
sobrevivência: isto não pode ser conseguido, a menos que todos gozem de
liberdade, de segurança econômica e de um sistema político que garantam o
bem comum, e não interesses particulares (DENIS, 1999). O desenvolvimento
na Comunidade Taquari deve ser social e culturalmente sustentável, o que é
alcançado com os ritos católicos e com as práticas de mutirão no roçado,
plantio ou colheita que potencializam os fundamentos da vida comunitária e os
sistemas simbólicos de significação a fim de que fiquem protegidos e se
reproduzam.
Em relação à diversidade cultural, o autoconsumo é uma forma de
produção que respeita as preferências alimentares das comunidades locais,
145
suas práticas de preparo e consumo, e serve como um instrumento de
preservação da cultura, dada que muitas destas práticas são passadas de pais
para filhos, em consonância com as condições socioambientais e a própria
história local.
Na discussão teórica feita nos primeiros capítulos, atenta ao problema
da caracterização desses atores sociais do meio rural ou rústico, buscou-se
recuperar na literatura as diferentes formas de analisar o mundo rural e seus
atores, bem como as implicações que tais definições acarretam. O conceito de
agricultura familiar emerge dessa discussão teórica como aquele que mais se
adequa à caracterização dos produtores rurais em análise. Conseqüentemente,
a forma como se distribui o trabalho no interior do estabelecimento (se
predomina o uso de mão de obra familiar ou contratada) representa o melhor
indicador para a divisão dos grupos sociais.
Sabendo que o hábit dispersos, a precariedade do acesso a bens e
serviços socialmente necessários, somados ao acesso a ocupações não
agrícolas configuram um mundo rural onde o agente social forma sua
identidade e estratégias de sobrevivência centradas em três eixos, como citado
por Wanderley (2007):
a) arranjos familiares, que garantem o acesso, mesmo
precário, à terra;
b) uma grande diversificação da produção (culturas e
criações), de forma a combinar o aprovisionamento
alimentar direto e a comercialização;
c) o engajamento de todos os membros da família em um
sistema de atividades centra no próprio estabelecimento.
(idem, p. 23)
A denominação destes agentes de desenvolvimento varia de acordo
com os seus domínios de intervenção e as suas competências, podendo ser
representados por agentes de saúde, enfermeiros, técnicos agrícolas,
agrônomos, veterinários, agentes de alfabetização, assistentes sociais,
educadores ou extensionistas. Estes, participando da Comunidade Taquari ou
da Associação, escutam demandas, fazem discursos, legitimam
procedimentos, valorizam práticas e, em contextos diversos, apóiam e
condenam comportamentos e técnicas. Suas ações são realizadas através de
146
palestras, reuniões, cursos, dias de campo, entrevistas, visitas, projetos e
pareceres. Os agentes de desenvolvimento rural, no passado e no presente da
Comunidade Taquari tem a presença da juventude, sendo estes ligados no
passado à CEBs e hoje à Pastoral da Juventude e geralmente estão vinculados
a um projeto de desenvolvimento em que as idéias, as previsibilidades e as
intenções dos agricultores se expressam por um exercício de encontro e
confronto com os objetivos institucionais que os agentes de desenvolvimento
representam, no caso lideranças da comunidade ou representantes de
instituições governamentais e não-governamentais.
O processo de intervenção caracteriza-se pela presença de diferentes
percepções culturais, interesses sociais e lutas políticas entre os agentes
envolvidos. Assim, os projetos de desenvolvimento baseados no modelo
mecânico e de natureza linear - implementação -> execução -> resultados
esperados - perdem poder explicativo. A análise do processo de intervenção
deve considerar as arenas, as interfaces, as negociações, os acordos, os
compromissos, as transformações evidenciando os agentes envolvidos, suas
identidades, interesses e perspectivas. A análise da intervenção deve
considerar o caráter dinâmico e de mútua determinação entre os fatores
externos e internos. A intervenção não é um processo linear com limites claros
no tempo e no espaço, portanto, é importante compreender esse processo
dentro do espaço sócio-vital dos envolvidos, compreendendo os diferentes
significados por eles atribuídos, implicando, assim, na confrontação e
interpretação de visões de mundo diferentes. Aproximar ou distanciar os
projetos dos agentes e das agências de desenvolvimento depende da
capacidade de tradução e da habilidade de manusear as contradições.
Portanto, a mediação faz-se presente em todas as partes do processo de
intervenção.
Os agentes de desenvolvimento (dentre eles o principal a família)
convivem constantemente com a gestão de conflitos, porque o espaço rural e
agrícola é o resultado de freqüentes negociações entre os agentes. Os conflitos
também ocorrem na seara do conhecimento técnico-científico e do
conhecimento local. Neste caso, muitas vezes se valoriza um tipo de
conhecimento em detrimento de outro, favorecendo uma dicotimização. Para
análise do saber ambiental dos agricultores, o foco foi feito sobre a superação
147
da dicotomia entre condições sociais de uso do espaço e limites da gerência na
transformação da natureza, com este esboço procuramos compreender a troca
de informações, readaptações e mudanças que são feitas dentro das
comunidades.
A intervenção no meio ambiente, sendo uma relação social, também
implica em diferentes posições de poder e assimetria na disponibilidade de
recursos. A incorporação de saberes diversos pelos agentes de
desenvolvimento legitima-os a imporem sua visão de mundo e a experiência de
vida acumulada pelo agricultor é, muitas vezes, desqualificada e negada,
conforme o grau de inserção das idéias ambientais, econômicas ou políticas
que o grupo compartilha. Assim, na Comunidade Taquari, cada agente
apresenta uma determinada posição no espaço social, sendo a própria
comunidade rural ou Associação.
A forma de ver e construir o mundo, ou seja, impor uma ordem social é
proporcional ao poder obtido através do capital simbólico (Bourdieu, 1998). Os
agentes sociais ou de desenvolvimento (lideranças, líderes, agentes externos
de apoio e treinamento), ao passarem aos agricultores instrumentos para que
estes possam construir a sua visão de mundo dentro e fora do grupo, e isto é
feito desde a migração dos habitantes da localidade, como ocorreu no Taquari.
No entanto, ressalta-se que os agricultores também possuem iniciativas, muitas
vezes ofensivas e autônomas, as quais permitem reconfigurar o espaço social
e apresentar readaptações, recriações e transformações. Neste sentido é
válido analisar, no âmbito do rural e do agrícola, o papel que assumem os
agentes que buscam promover o desenvolvimento e articular mundos sociais
diferentes.
O ambiente é essa falta de conhecimento que não se completa nem se
totaliza, que anima um processo interminável de contração de um saber que
orienta ações, que gera direitos, que produz técnicas para pensar e construir
um mundo sustentável, segundo outros valores que se constituem na ordem
simbólica e no reconhecimento de outros potenciais na ordem do real (LEFF,
2004). A Comunidade Taquari apresenta-se como um local de manifestação do
saber e de reconhecimento na importância das práticas ambientais. Portanto, a
complexidade ambiental é o campo no qual as formas de conhecimento e os
processos de apreensão cognoscitiva do real transformam o próprio rela, que
148
ao mesmo tempo constrói e destrói a realidade. A complexidade ambiental é o
espaço em que convergem diferentes olhares e linguagens sobre o real, que se
constroem mediante a imaginários e simbolismos religiosos, capitalistas e
ambientais.
Segundo ainda que se convoquem os agentes de desenvolvimento a
“escutar” o conhecimento local dos agricultores e a desenvolver estratégias
alternativas desde baixo, ainda continuará existindo a contradição de que são
agentes externos que têm a tarefa de fortalecer o balanço de forças na direção
dos interesses locais. O desenvolvimento rural deve ser pensado a partir das
inter-relações que passam a existir entre as atividades agrícolas e não
agrícolas, cuja tendência é cada vez mais crescente.
CONCLUSÕES
149
O foco deste trabalho foi as relações existentes na Comunidade do
Taquari, e dela tive três vertentes para abordagens sociológicas. A primeira da
relação indivíduo e religião, a segunda da interação grupo social e produção
rural e a terceira é a de celebração de eventos religiosos.
A relação entre natureza e grupo, o cruzamento dos discursos da
motivação religiosa para a associação comunitária, é reforçada pela produção
que cria todo um antagonismo do desenvolvimento sustentável. Essa relação
faz com que esses eventos mostrem a religiosidade, mas por traz dela
apresenta se uma lacuna entre a produção e a importância ou respeito pelo
meio ambiente. Isso se torna claro no discurso de alguns indivíduos, mas não
generalizado em outras comunidades, que ainda tem a base religiosa como
fator de integração, coisa que no Taquari pode estar ganhando mais força
porque esta comunidade têm o desenvolvimento econômico diversificado. Daí
minha preocupação com as lideranças tanto do grupo como dos indivíduos,
que aguardam com as articulações a imposição de alternativas de
sustentabilidade integrada ao mercado.
A Comunidade Taquari, ao implantar novas formas de produção no meio
rural (fábrica de farinha, produção de leite, iogurte) para comércio e,
simultaneamente, produzir alimento para subsistência com plantações de arroz
e milho, desperta o interesse de saber como a exploração da terra e o impacto
da inovações tecnológicas e institucionais podem estabelecer um processo de
desenvolvimento continuo e estável, com distribuição justa de renda e dos
meios de produção de maneira compartilhada através de mecanismos de
direito que garantam uma melhoria na qualidade de vida do grupo (BRANDÃO,
1981).
A organização produtiva da Comunidade Taquari e de sua Associação
têm uma atuação eficiente na transformação da natureza e da pluriatividade do
trabalho (SCHNIEDER, 2003). A organização da produção também se
desenvolve no grupo como aspectos de estratégias de reprodução da
comunidade rural e de transformação do trabalho rural (GARCIA NIOR,
1989). Ao permanecerem nas tradições do campo de maneira diversificada,
150
apresentam resistência através da organização coletiva na produção familiar
para subsistência econômica e cultural (WOORTMANN, 1995). A forma
econômica que mais persistiu, a agropecuária, e que pode influenciar outras
comunidades afastadas no espaço e no tempo e a agricultura familiar a criaram
laços de comunicação, compartilhando as experiências comuns da produção,
mostrando a solidariedade dos grupos de maneira exemplar para reprodução e
conservação do meio rural; ou seja, um modelo que oriente a conduta de
outros agentes sociais para realização de trabalhos de princípios ideológicos
ou organizatórios (BRANDÃO E RAMALHO, 1986: 121-124) .
No caso da Comunidade Taquari, é a forma de apropriação comum dos
espaços e recursos naturais, na propriedade privada, que deve ser pensada e
recriada coletivamente de maneira que os recursos naturais sejam usados com
moderação, na medida em que deles depende a reprodução social e simbólica
do grupo (KRISCHKE, 1998: 182-196). Taquari apresenta um modo de
organização que coincide com aquele de pequenos grupos rurais organizados
como “comunitários” que desenvolvem experiências que demonstram os
objetivos de conciliar a produção econômica e preocupação com o meio
ambiente e organização sócio-cultural. Isto é visto nos mutirões para roças,
festas, colheitas épocas em que existe uma preocupação de não agredir o
espaço, escolhendo locais apropriados para que o meio ambiente não sofra
impactos danosos da presença humana. Alguns autores como Diegues (2002),
Ellen F. Woortemann (1995) e Brandão (1986) percebem que o modo de vida
das populações com um tipo de organização social tem garantido não a
conservação ecológica e a manutenção da produção, mas também a
diversidade cultural. O comportamento, os valores culturais, a identidade da
familiar e a unidade da organização doméstica mostram a dimensão das
relações sociais internas e externas do grupo local.
A relação religiosidade, comunidade rural e meio ambiente, foi analisada
de descrevendo-se a formação e tradição da Comunidade rural Taquari. Nessa
explicação, a religiosidade premiou todo o universo da Taquari desde sua
origem. O trabalho rural e o meio ambiente o exemplificados e analisados
pelas práticas que podem ser consideradas um desenvolvimento sustentável
para grupo. Esse aspecto foi mostrado quando as práticas em processo de
desenvolvimento ou consolidadas no grupo faziam parte do cotidiano e eram
151
apreendidos pelos membros que valorizavam os esforços para conservação da
natureza ou manutenção de ações ligadas a produção, aumento da
produtividade e, consequentemente, a ações de caráter ecológico ou de
diminuição de impactos ambientais.
Concluir este trabalho dissertativo ressaltando a importância da
organização social em nível micro e mostrar a possibilidade de sustentabilidade
econômica e ambiental no meio rural, pode trazer elementos para uma reflexão
para grupos de pesos distintos na sociedade complexa, que pensam o
ambientalismo em questões globais e muitas vezes distantes dos universos
que precisam de organização para garantirem sua sustentabilidade econômica,
social, cultural e política.
A Comunidade Taquari tenta fomentar no meio rural um pensamento e
práticas com características de sustentabilidade ambiental, sendo a
compreensão da importância do trabalho e da organização coletivas algo que
faça com que os membros das comunidades rurais vizinhas e dentro do próprio
grupo multipliquem um compartilhamento de como fazer a mudança ou
implantação de práticas produtivas mais modernas, sem destruírem o meio
ambiente. Entender os esforços para uma permanência no campo, tanto para o
trabalhador rural, quanto para família que o jovem ir para cidade, cria uma
necessidade de busca de alternativas que mantenham as gerações futuras em
suas localidades.
Para que a população das comunidades rurais sobrevivam é preciso
buscar uma modernização de caráter sustentável, e nesse processo devem
observar as formas de manutenção da subsistência e de ampliação da
produção e da produtividade, de forma a agregar mais indivíduos ao coletivo de
esforços para satisfação das necessidades de todos os membros participantes
daquela comunidade. O interessante é que o discurso ambiental entrou de
forma mítica ao ser lembrada, na história da origem da Comunidade Taquari, a
árvore de baru. Essa referência, permanecendo no imaginário do grupo, fez
com que todos os membros fossem instruídos, por meio de discussões e
ações, para preservação do meio ambiente e, vinculado a isto, o pensamento
de cuidado com a terra.
Esta ação de preservar e cuidar da terra de maneira mais eficiente
promove no grupo o empreendedorismo, com a associação de produtores,
152
além de forças externas como a igreja católica, o poder público, parceria com
comunidades vizinhas e comércio da zona urbana, que são fundamentais para
que o Taquari se sobressaia no mercado competitivo.
O interessante de perceber que o capital no campo e as práticas
religiosas para confraternização, aliados à solidariedade do grupo, que
perpassa a questão produtiva e ambiental, tornam a Comunidade Taquari um
local de incursões que estão sendo discutidas em diversas instâncias e
particularidades, pois o trabalho apresentado aqui contribui para as pesquisas
desenvolvidas com a mesma problemática: religiosidade, produção e trabalho
rural, e meio ambiente.
153
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