Download PDF
ads:
A INSTITUIÇÃO DA SUPERVISÃO DE ENSINO E A MUNICIPALIZAÇÃO
EM
VALINHOS: TENSÕES, CONFLITOS E INCERTEZAS
Aluna: Marina Quintanilha Macedo
Orientadora: Profª Drª Sandra Aparecida Riscal
Este exemplar corresponde à redação final da
Dissertação de Mestrado defendida por Marina
Quintanilha Macedo e aprovada pela Comissão
Julgadora.
Data: 29/08/2008
_______
________________________
Profª Dra. Sandra Aparecida Riscal
Orientadora
São Carlos
Agosto/2008
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUA
Ç
ÃO EM EDUCA
Ç
ÃO
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
Ficha catalográfica elaborada pelo DePT da
Biblioteca Comunitária da UFSCar
M141is
Macedo, Marina Quintanilha.
A instituição da supervisão de ensino e a municipalização
em Valinhos : tensões, conflitos e incertezas / Marina
Quintanilha Macedo. -- São Carlos : UFSCar, 2008.
137 f.
Dissertação (Mestrado) -- Universidade Federal de São
Carlos, 2008.
1. Supervisão escolar. 2. Municipalização. I. Título.
CDD: 371.2013 (20
a
)
ads:
ii
Ao meu marido Luiz,
sempre um grande incentivador.
iii
A
GRADECIMENTOS
Este trabalho é o resultado do apoio de amigos e familiares que ajudaram a
viabilizar um projeto antigo.
Primeiramente, quero agradecer à Professora Sandra Riscal, pela orientação
segura e amiga.
Quero ressaltar o apoio e o estímulo recebido pelo Professor Newton Bryan.
A minha irmã Silvia, que com muita competência, carinho e estimulo, realizou
a correção da primeira fase do trabalho.
A competente colaboração da minha filha Isabella foi fundamental na
formatação do trabalho.
A Márcia Gomes Gregório que gentilmente colaborou no abstract.
Ao apoio de Cleide Rezende, sem o qual inviabilizaria minhas viagens para
São Carlos.
Aos amigos, que de uma maneira ou de outra, sempre estiveram ao meu lado:
Sergio Castro de Almeida, Vanessa Rôvere, Maria Aparecida Fernandes e Marta
Susana Reinoso.
A Secretaria de Educação de Valinhos, que ajudou na viabilização deste
trabalho.
iv
R
ESUMO
Este trabalho se propõe a analisar a instituição da supervisão de ensino no município
de Valinhos, após a municipalização, procurando explicitar as tensões e conflitos presentes
nesse processo, demonstrado pela ausência de conhecimento do papel do Supervisor de
Ensino. Evidencia-se a existência de um confronto entre uma organização administrativa
tradicional e patrimonialista, pautada em um sistema de crenças e valores, e o novo desenho
institucional racionalizante, proposto pelo Estado, por meio da municipalização da
educação.
Para a realização deste estudo utilizou-se o referencial teórico desenvolvido por
Max Weber relativo ao papel da racionalidade técnica e substantiva na constituição do
capitalismo ocidental e do Estado Moderno. Em especial, são fundamentais para o
desenvolvimento da pesquisa os conceitos e categorias relativos à racionalização
administrativa, às formas de organização e desenvolvimento dos quadros administrativos.
Neste ponto, interessa-nos em particular, o desenvolvimento do cargo e da função de
supervisão e os conceitos de patrimonialismo e organização burocrática.
Palavras-chave: supervisão de ensino, municipalização, patrimonialismo.
A
BSTRACT
This dissertation analyses the establishment of the educational supervision in
Valinhos municipality, after the municipalization, presenting the tensions and conflicts that
this process raised, made explicit by the lack of knowledge of the School Supervisor’s hole,
demonstrating the existence of a confrontation between a traditional and patrimonialist
administrative organization, based on a system of values and beliefs and the new rational
institutional structure proposed by the State, through the municipalization of the education.
This study used the theory developed by Max Weber related to the role of the
technical and substantive rationality in the constitution of the western capitalism and the
Modern State. The concepts and categories concerning the administrative rationalism and
the forms of organization and development of the administrative structure are fundamental
to the development of this research. At this point, we are particularly interested in the
development of the function and post of the supervisor and the concepts of patrimonialism
and bureaucratic organization.
Key words: educational supervision, municipalization, patrimonialismo.
v
S
UMÁRIO
Agradecimentos ...................................................................................................................iii
Resumo .................................................................................................................................iv
Índice de Figuras e Tabelas ...............................................................................................vii
Siglas ...................................................................................................................................viii
Introdução............................................................................................................................. 1
Capítulo I (O Processo de Modernização no Ocidente com Base na Racionalidade
Formal e o Desenvolvimento da Concepção Burocrática com Bases
Patrimonialistas no Brasil) .......................................................................................... 7
1. Introdução...................................................................................................................... 7
2. A racionalidade Formal e os Fundamentos do Estado Moderno................................... 8
3. Racionalidade Formal e Racionalidade Material ou Substantiva em Max Weber ........ 9
4. A Burocracia................................................................................................................ 17
5. Algumas Notas sobre o Patrimonialismo e a Constituição da Administração Pública
Brasileira.......................................................................................................................... 20
Capítulo II (Supervisão de Ensino, Racionalização e Modernização) .......................... 25
1. Introdução.................................................................................................................... 25
2. Da Função Supervisora ao Cargo de Supervisor de Ensino ........................................ 26
A) Brasil Colônia ........................................................................................................ 26
B) Brasil Império ........................................................................................................ 27
C) Primeira República................................................................................................. 28
D) Era Vargas.............................................................................................................. 37
E) Restauração do Estado Democrático...................................................................... 43
F) Regime Militar........................................................................................................ 46
G) Nova República...................................................................................................... 53
3. Conclusão..................................................................................................................... 59
vi
Capítulo III (Modernização, Racionalização e Municipalização em São Paulo) ......... 61
1. Introdução.................................................................................................................... 61
2. Apontamentos sobre as Concepções de Modernização e Racionalização: a Política
Educacional Paulista a Partir de 1995.............................................................................. 62
3. A Reforma Gerencial da Educação em São Paulo....................................................... 65
4. O Processo de Municipalização do Ensino em São Paulo........................................... 67
A) A Municipalização no Brasil ................................................................................. 68
B) A Municipalização no Estado de São Paulo .......................................................... 80
I. Governo de Franco Montoro (PMDB – 1983/1987) ....................................... 81
II. Governo de Orestes Quércia (PMDB – 1987/1990) ...................................... 82
III. Governo de Antonio Fleury Filho (PMDB – 1991/1994) ............................. 83
IV. Governo de Mário Covas (PMDB/PSDB – 1995/1998) ............................... 84
5. Conclusão..................................................................................................................... 93
Capítulo IV (A Supervisão de Ensino na Municipalização em Valinhos) .................... 96
1. Introdução.................................................................................................................... 96
2. A Cidade de Valinhos.................................................................................................. 97
3. Algumas Anotações sobre a História do Município de Valinhos................................ 99
4. Características da Rede Municipal de Educação no Ano de 1997 ............................ 103
A) Demanda Escolar ................................................................................................. 103
B) Organização Administrativa da SE...................................................................... 104
C) Projetos Educacionais .......................................................................................... 104
5. A Implementação da Municipalização em Valinhos ................................................. 108
6. Primeira Fase da municipalização ............................................................................. 112
7. Segunda Fase da municipalização ............................................................................. 115
8. Os Primeiros Anos da Supervisão de Ensino no Município de Valinhos.................. 118
9. Elaboração do Novo Estatuto e Quadro de Carreira do Magistério Público ............. 122
10. Conclusão................................................................................................................. 124
Capítulo V (Considerações Finais) ................................................................................. 126
Bibliografia........................................................................................................................ 129
vii
Í
NDICE DE FIGURAS E TABELAS
F
IGURAS
Figura 1- Organograma da estrutura administrativa da rede escolar paulista introduzida pela
Reforma de 1855
Figura 2- Organograma dos Órgãos Superiores de Administração do sistema escolar
paulista de 1930 a 1931.
Figura 3 - Os processos interativos e articuladores da ação supervisora.
Figura 4- Representação do organograma da secretaria de educação de Valinhos
T
ABELAS
Tabela 1- Escolas Estaduais por número de turnos.
Tabela 2 - Evolução do Ensino Fundamental Público no Estado de São Paulo – 1995/1996.
Tabela 3 - Evolução do Atendimento ao Ensino Fundamental na Rede Pública do Estado de
São Pulo – 1994/2001.
Tabela 4 - Demanda de Alunos do Município.
Tabela 5 - Demanda de alunos do ensino fundamental do Município.
Tabela 6 - Demanda de alunos do município
viii
S
IGLAS
ABE- Associação Brasileira de Educação
ACTs - Admitidos em Caráter Temporário
APASE - Sindicato dos Supervisores do Estado de São Paulo
APMs - Associações de Pais e Mestres
C.M.V – Camara Municipal de Valinhos
CAPI - Centro de Aprimoramento para a Escola Inclusiva
CEE - Conselho Estadual de Educação
CME - Conselho Municipal de Educação
CNE- Conferência Nacional de Educação
DASP- Departamento Administrativo do Serviço Público
EJA – Educação de Jovens e Adultos
FDE - Fundação para o Desenvolvimento da Educação
FUNDEF- Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
Valorização do Magistério.
IBAM - Instituto Brasileiro de Administração Municipal
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INEP- Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MARE - Ministério da Administração e Reforma do Estado
PAC - Programa de Ação Cooperativa Estado-Município
PDT- Partido Democrata Trabalhista
PEC - Programa de Formação Continuada
PFL - Partido da Frente Liberal
PIB - Produto Interno Bruto
PL- Partido Liberal
PMDB - Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PMV- Prefeitura Municipal de Valinhos
PRASEM – Programa de Apoio aos Secretários Municipais de Educação
PROFA – Programa de Formação de Professores Alfabetizadores
PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira
ix
QESE - Quota Estadual do Salário-Educação
RMC - Região Metropolitana de Campinas
SARESP - Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar no Estado de São Paulo
SARESP - Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar no Estado de São Paulo
SE - Secretaria da Educação
SEADE – Sistema Estadual de Análise de Dados
SEMOR – Subsecretaria de Modernização e Reforma Administrativa, do Ministério do
Planejamento.
SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SESI – Serviço Social da Indústria
UNDIME – União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura
UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas
1
I
NTRODUÇÃO
A reforma educacional implementada no Estado de São Paulo a partir de 1995, sob
o governo de Mário Covas e da então Secretária de Estado da Educação Tereza Roserley
Neubauer da Silva, constituiu a primeira fase de um processo que seria estendido para todo
o país, na gestão de Paulo Renato Costa Souza como ministro da Educação, durante o
governo de Fernando Henrique Cardoso.
De uma forma geral, o diagnóstico era o mesmo para a educação nacional e a rede
paulista de ensino: o sistema enfrentaria uma crise de eficiência, de eficácia e de
produtividade e os problemas educacionais apontados eram identificados como
disfuncionalidades do sistema educacional, expressando a incapacidade do Estado em
administrar as políticas educacionais.
Essa ineficiência seria demonstrada pelos baixos índices de desempenho do sistema,
os quais indicariam claramente o quanto ele era ineficaz. No caso de São Paulo, a ineficácia
era atribuída, em grande parte, ao gigantismo da máquina burocrática e à ausência de
mecanismos de controle do sistema de ensino.
Mas é certo que o gigantismo, a desorganização, as más condições de
trabalho dos professores, a insuficiência de tempo dos períodos escolares e a
pobreza dos materiais contribuíram para o sucateamento da rede física no
Estado e para a deterioração dos padrões educacionais que competia à escola
manter, culminando com a perda de 25% do alunado a cada ano, por evasão ou
repetência. A situação poderia ser definida como uma tragédia educacional,
que enfrentada exigia a mobilização de todos os recursos do sistema. (SÃO
PAULO,SE, 2002)
A reforma de ensino iniciada em São Paulo constituía um projeto de modernização
da sociedade brasileira que, para ser realizado, exigiria a correção das disfuncionalidades
do sistema educacional. O ponto para o qual apontam as reformas de São Paulo e a nacional
seria a ausência de mecanismos de controle social e econômico. Como conseqüência, a
superação dos problemas educacionais e a modernização social deveriam ter início com a
racionalização de custos da produção da educação escolar. Como observa Souza (2001),
2
desloca-se a ênfase dos processos educativos para a reorganização das funções
administrativas e de gestão.
A reforma implementada pela Secretaria de Estado da Educação de São Paulo partia
do princípio de que a baixa qualidade da educação escolar teria como causa o uso irracional
dos equipamentos e prédios escolares e uma administração ineficiente dos negócios
públicos. Assim, as diretrizes desta reforma seguiam os princípios de uma racionalidade
modernizadora, que deveria ter início com a racionalização organizacional promovendo o
enxugamento da máquina, eliminando duplicidades e informatizando a administração.
Fundamental para a racionalização do sistema era a mudança nos padrões de gestão,
que deveria iniciar um processo de desconcentração e de descentralização da gestão da
educação (extinção das Divisões Regionais de Ensino, transferência de recursos financeiros
para as escolas e municipalização do ensino).
Finalmente, a melhoria da qualidade de ensino seria alcançada por uma mudança no
padrão de gestão econômica, mediante a distribuição eficiente dos recursos destinados à
educação, (municipalização e reorganização da rede de ensino) acompanhada pelo controle
eficaz da produtividade das instituições escolares. Os resultados da reforma e a eficácia do
sistema seriam verificados pela introdução de um mecanismo de avaliação do rendimento
escolar (Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar no Estado de São Paulo/ SARESP).
O projeto da reforma educacional que a Secretaria de Estado de São Paulo
ambicionava implementar, abrangia duas esferas de ação institucional: a reforma da rede
estadual e a implantação dos sistemas municipais de ensino, como forma de desafogar
econômica e burocraticamente a máquina estadual. Para alcançar este objetivo, entretanto,
deveria, ambigüamente, promover um processo de descentralização de funções e
responsabilidades educacionais, realizado por intermédio da municipalização, que
transferiria as instituições escolares para os municípios ao mesmo tempo em que
implementaria a centralização do sistema de organização legal, de informações,
gerenciamento e avaliação, que facilitariam o planejamento, o controle e a tomada de
decisões.
A municipalização do ensino fundamental, a partir de 1995, constituiu um dos eixos
estratégicos da política educacional do governo do Estado de São Paulo, que já previra o
regime de colaboração entre Estados e municípios. Como definido pela Constituição
3
Federal de 1988, Estados e Municípios deveriam partilhar da formulação e implantação de
uma política educacional, pois passavam a assumir a condição de entes federados
autônomos.
Reforçando o regime de colaboração, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, promulgada em 1996, definiu que a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios deveriam organizar em regime de colaboração os respectivos sistemas de
ensino. Assim, os municípios passaram a ter a possibilidade de optar com relação aos seus
sistemas de ensino, integrando-se aos estaduais ou compondo-se com o Estado em um
sistema único.
Em qualquer das hipóteses, caberia ao Município dar cumprimento a sua
responsabilidade constitucional e legal em relação à educação infantil e ao ensino
fundamental, dando prioridade ao ensino fundamental.
Nesse sentido, os municípios passariam a organizar seus sistemas em regime de
colaboração, acarretando um intercâmbio de responsabilidades recíprocas, cabendo aos
estados a tarefa de integrar os vários sistemas existentes em seus territórios.
Logo, a criação do Sistema Municipal de Ensino passou a constituir uma
oportunidade histórica para o Município, dentro da nova ordem estabelecida a partir da
Constituição Federal de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
Mas para que o Sistema Municipal de Ensino pudesse surgir em sua plenitude, o
Conselho Estadual de Educação esclarece através da Indicação do nº 33/2003, que seriam
necessárias algumas providências e condições, sem as quais a ação municipal poderia
mostrar-se insuficiente e até mesmo contraproducente.
a) uma rede escolar que se enquadre na tipologia estabelecida nos incisos I e
II do Artigo 18 da LDB e nas prioridades fixadas no inciso V do Artigo 11 da
mesma lei; b) órgãos que normatizem o sistema nos termos das exigências e
das aspirações da municipalidade e se encarreguem da articulação com o
sistema estadual e nacional nos termos da LDB; c) um órgão executivo
encarregado de viabilizar as políticas públicas e supervisionar os
estabelecimentos de ensino de seu sistema. (SÃO PAULO,CEE, 2003)
Assim, são atribuídas ao cargo de supervisor de ensino, na carreira do magistério
público, as funções técnicas, administrativas e políticas necessárias para garantir a
viabilização das políticas educacionais e supervisionar os estabelecimentos de ensino do
4
seu sistema, conforme determinação legal. Levando-se em consideração os conteúdos da
reforma da educação nacional e paulista, pode-se dizer que o papel do supervisor de ensino
seria o de garantir a realização da organização legal racional e burocrática do sistema
municipal tornando-se o responsável por viabilizar a modernização e racionalização dos
sistemas.
Nesta perspectiva, este trabalho se propõe a analisar a implantação do processo de
supervisão de ensino no município de Valinhos, após a municipalização, procurando
explicitar as tensões e conflitos presentes nesse processo.
A escolha deste tema decorreu da minha perplexidade diante de situações
constrangedoras que fizeram parte desde o início de meu percurso como a primeira
Supervisora do Ensino Municipal de Valinhos. Qual não foi minha perplexidade, ao
assumir o cargo, com a indagação da Secretária de Educação, em reunião com Diretores e
Coordenadores da Rede Municipal: “o que fazer com a nova Supervisora de Ensino?”.
Neste mesmo ano, deparei-me com outra situação, não menos constrangedora: em reunião
pública com diretores da rede municipal, a Secretária da Educação solicita que a
Supervisora de Ensino se retire da sala, pois considerava que o assunto não era de sua
competência.
Isto denota o total desconhecimento do papel do supervisor de ensino, de suas
atribuições e funções, podendo-se afirmar que o concurso para o provimento do cargo de
supervisor foi realizado em função de exigências impostas pela legislação que disciplinava
o processo de municipalização.
Assim, detectou-se a ausência de procedimentos para o desenvolvimento e atuação
do Supervisor de Ensino, o que comprometia a eficiência e a eficácia do processo ensino
aprendizagem. Associado a este problema, percebeu-se indefinições e sobreposições de
competências, entre o cargo de Supervisor de Ensino e outros cargos da estrutura
administrativa da Secretaria da Educação.
O campo de tensão constituído nesse processo, demonstrado pela ausência de
conhecimento do papel do Supervisor de Ensino, determinou decisões discriminatórias que
estavam sempre presentes nos procedimentos da Secretária da Educação, evidenciando a
existência de um confronto entre uma organização administrativa tradicional e
5
patrimonialista, pautada em um sistema de crenças e valores, e o novo desenho institucional
racionalizante, proposto pelo Estado, por meio da municipalização da educação.
Dessa forma, passei a questionar as causas que motivavam a depreciação da função
supervisora municipal. Qual seria a função de um supervisor de ensino municipal?
Respeitadas as peculiaridades, a atuação, as funções e as competências da supervisão
municipal deveriam equivaler aos da supervisão estadual? Quais crenças e valores que
tornavam a
administração antiga tão adversa ao novo desenho institucional que estava
sendo delineado pela municipalização? A Secretaria da Educação conhecia efetivamente o
novo desenho de administração proposto pela municipalização? Por que este novo desenho
não se efetivou?
A partir desses questionamentos, formulamos a hipótese de que as distorções na
atuação da Supervisão de Ensino aconteceram devido ao não rompimento da estrutura
tradicional de administração, estabelecida sobre crenças e valores que se opunham à nova
forma de administração imposta pela municipalização.
Assim, considerando a pertinência das questões problematizadoras, decidiu-se
realizar um estudo que atendesse os objetivos:
a) compreender as tensões decorrentes da obrigatoriedade de implementação
do processo de municipalização imposto pelo governo estadual, que baseado em um
modelo legal racional burocrático, teria entrado em conflito com a tendência conservadora
das estruturas de poder municipal baseadas em uma organização administrativa tradicional-
patrimonial.
b) compreender em que medida a tensão entre as exigências impostas pela esfera
estadual e as resistências patrimonialistas locais determinou a depreciação da função de
supervisão;
c) compreender, ainda, em que medida esta desvalorização da supervisão pode
apontar para uma resistência à institucionalização do sistema municipal por meio da
incorporação de normas racionais centralizadoras.
Para atingir os objetivos propostos utilizaremos o referencial teórico desenvolvido
por Max Weber relativo ao papel da racionalidade técnica e substantiva na constituição do
capitalismo ocidental e do Estado Moderno. Em especial, são fundamentais para o
desenvolvimento da pesquisa os conceitos e categorias relativos à racionalização
6
administrativa, às formas de organização e desenvolvimento dos quadros administrativos.
Neste ponto, interessa-nos em particular, o desenvolvimento do cargo e da função de
supervisão e os conceitos de patrimonialismo e organização burocrática.
Em função da diversidade das questões envolvidas, delimitou-se o universo desse
estudo ao município de Valinhos, no período de 1997 a 2004, correspondente aos primeiros
anos da implementação da municipalização da educação municipal. Utilizou-se como fonte
de pesquisa diferentes fontes bibliográficas e também documentos como leis
complementares, leis estaduais e municipais, projetos de lei das secretarias de educação,
câmaras municipais; portarias, resoluções, instruções normativas, da secretaria estadual e
municipal, pareceres e pronunciamentos dos Conselhos Estadual e Municipal de Educação.
Além desse material legislativo e normativo, também se consultou documentos
institucionais, como propostas pedagógicas, regimentos escolares, além de reportagens,
conferências, etc.
O texto está organizado em cinco capítulos: no primeiro capítulo trataremos das
bases conceituais que caracterizariam de um lado a concepção tradicional, que segundo
Weber estaria fundamentado em uma racionalidade substantiva, de outro a concepção legal
racional burocrática, que seria fundamentada em uma racionalidade formal ou técnica.
No segundo capítulo - trataremos especificamente da supervisão de ensino.
Iniciaremos com a apresentação do processo de racionalização do sistema de ensino
paulista, ainda no século XIX. Em seguida apresentaremos o conceito de supervisão e de
sua constituição como espaço de ação pedagógico.
No terceiro capítulo - trataremos das tentativas de modernização que teriam
caracterizado a reforma da educação paulista a partir de 1995. Baseada na critica ao
patrimonialismo e na ineficiência da administração pública, a reforma educacional levada
adiante pela Secretaria de Estado da Educação de São Paulo teria adotado a forma e as
estratégias propostas por Bresser Pereira, quando ministro da Reforma do Estado.
No quarto capítulo - sem perder o foco na supervisão de ensino, trataremos da
implantação da municipalização da educação em Valinhos.
No quinto capítulo, apresentaremos nossas considerações finais.
7
C
APÍTULO I
O
PROCESSO DE MODERNIZAÇÃO NO OCIDENTE COM BASE NA RACIONALIDADE
FORMAL E O DESENVOLVIMENTO DA CONCEPÇÃO BUROCRÁTICA COM BASES
PATRIMONIALISTAS NO BRASIL
1.
INTRODUÇÃO
Como apresentamos na introdução deste trabalho, o nosso objetivo é compreender
as tensões decorrentes da obrigatoriedade de implementação do processo de
municipalização imposto pelo governo estadual, que baseado em um modelo legal racional
burocrático, teria entrado em conflito com a tendência conservadora das estruturas de poder
municipal baseadas em uma organização administrativa tradicional patrimonial. Nossa
intenção é compreender em que medida essa tensão teria provocado a depreciação do papel
do supervisor na implementação do sistema municipal de ensino.
Para tanto, iniciaremos esta apresentação da pesquisa partindo do pressuposto de
que a supervisão de ensino constituiria, no campo educacional, uma estratégia de ordem
burocrática legal racional. Desta forma, para compreender as resistências oferecidas à
implementação da supervisão, será necessário estudar os aspectos da concepção
conservadora tradicional em contraposição à concepção legal racional burocrática.
Neste capítulo, procuraremos apresentar as bases conceituais que caracterizariam,
de um lado a concepção tradicional, que segundo Weber estaria fundamentada em uma
racionalidade substantiva, de outro à concepção legal racional burocrática, que seria
fundamentada em uma racionalidade formal ou técnica.
Em particular, para compreender as reformas que foram implementadas na educação
a partir de 1995, interessa-nos apresentar os aspectos da concepção de modernização que
acompanharam a constituição do Estado moderno, sob as bases legal e administrativa.
Trata-se de reformas ocorridas nas esferas municipais, estaduais e federais que foram
justificadas como tentativas de superação da ordem administrativa tradicional patrimonial.
Por este motivo, apresentaremos ainda neste capítulo algumas anotações sobre a
persistência da administração patrimonialista no Brasil.
8
2.
A RACIONALIDADE FORMAL E OS FUNDAMENTOS DO ESTADO MODERNO
O fundamento do poder político, no Estado Moderno, remete a uma concepção de
legitimidade que vincula a autoridade à sua performance nas atividades públicas. Estas
atividades exigem o desenvolvimento de capacidades de previsão, prevenção e execução
por meio do estabelecimento de programas de diagnóstico e planejamento, capazes de
reduzir o grau de interferência de efeitos de fatores imprevisíveis de acasos como as
paixões e desejos pessoais, flutuações econômicas, mudanças naturais, demográficas etc.
A ação política passa a ser compreendida como cálculo político, cujas bases são
tomadas do desenvolvimento de ciências como a estatística, economia, demografia,
sociologia que permitem a ações táticas e estratégicas. Neste sentido, governar implica no
conhecimento de diferentes dados relativos ao corpo do Estado: indicadores de
desenvolvimento econômico e social da população, crescimento demográfico, mortalidade,
emprego, desempenho dos diferentes campos da economia, distribuição dos bens
produzidos, balanças comercial, mercado financeiro, etc. que possibilitariam determinar a
ação mais adequada a partir da pluralidade de possibilidades. (Riscal, 2008)
De acordo com Riscal (2008) para Weber, um dos principais aspectos que teriam
determinado o progresso em direção ao capitalismo desde a Idade Média, teria sido o
processo de racionalização, que possivelmente possibilitou a expansão de uma economia de
mercado no mesmo processo em que se estabeleceria uma dominação estatal legal, cujo
desenvolvimento dependeu da estruturação de um funcionalismo burocrático permanente
baseado em contrato, salário pensão, carreira, treinamento especializado e divisão do
trabalho, competências fixas, documentação ordem hierárquica.
De acordo com a concepção de Weber, o Estado moderno possui características
únicas, resultantes de um processo de racionalização específico da cultura ocidental que
teria culminado com o advento de uma forma de Estado racional. Apenas no Ocidente teria
se desenvolvido um processo de laicização.
Se a tendência ao acúmulo de riquezas, a usura e cobiça teriam sempre existido, em
qualquer período da história humana, no capitalismo ocidental moderno, ganhar e acumular
dinheiro não mais era concebido como ação de exceção de marginais especuladores, avaros
ou de homens com espírito aventureiro. A grande transformação cultural do ocidente tornou
9
a exceção em norma e a obrigação moral é ganhar dinheiro, a medida do homem é o capital
que tem acumulado.
Esse processo foi caracterizado por uma tendência cada vez maior à mensuração do
mundo, acompanhada de demonstração racional com base nas matemáticas ou em
experimentações. Essa racionalização não ficou limitada a um setor único das atividades
humanas, mas propagou-se e passou a constituir o próprio sentido da vida coletiva. Trata-se
de uma intelectualização progressiva de toda a diversidade das atividades humanas que
passam a ser concebidas como parte de um universo mecânico passível de ser
esquadrinhado pela razão. (Riscal, 2008)
Modernidade passa ser sinônimo de racionalidade e todas as esferas do
conhecimento, que mereçam receber este estatuto devem atender às premissas da
impessoalidade e objetividade. Nesta perspectiva, a técnica, a divisão do trabalho e a
especialização nada mais são do que conseqüências lógicas do próprio processo de
racionalização do ocidente.
Como observa Habermas
Max Weber introduziu o conceito de “racionalidade” a
fim de determinar a forma da atividade econômica capitalista, das relações de
direito privado burguesas e da dominação burocrática. Racionalização quer
dizer, antes de mais nada, a ampliação dos setores sociais submetidos a padrões
de decisão racional. A isso corresponde a industrialização do trabalho social,
com a conseqüência de que os padrões de ação instrumental penetram também
outros domínios da vida (urbanização dos modos de viver, tecnicização dos
transportes e da comunicação). (HABERMAS, 1975:303)
3.
RACIONALIDADE FORMAL E RACIONALIDADE MATERIAL OU SUBSTANTIVA EM MAX
WEBER
Desde as suas origens, a burguesia tem desenvolvido uma racionalidade formal em
substituição à racionalidade substantiva que caracterizara o pensamento medieval e
clássico.
10
Segundo Max Weber, o que teria permitido à burguesia em ascensão (sec. XV/XVI)
a superação de seu caráter tradicional foi o desenvolvimento de uma forma própria de
dominação, moderna e racional.
Weber (1994) apresenta em seu livro “Economia e Sociedade” uma distinção entre
racionalidade formal e substantiva. Em uma dada sociedade a racionalidade formal é
definida pelo o grau de calculabilidade técnica real a que está submetida. Por seu lado, a
racionalidade substantiva é a que toma como fim as exigências éticas, políticas, de caráter
valorativo e maximiza um conjunto determinado de objetivos independentemente das
regras ou regulamentos formais.
Enquanto as sociedades tradicionais seriam baseadas na racionalidade substantiva, a
sociedade moderna teria seu desenvolvimento possibilitado graças, exatamente, à expansão
do processo de racionalidade formal. A ascensão burguesa foi possibilitada pelo
desenvolvimento de um aparato cultural, (econômico, religioso, científico) que aparecem
com um valor e significado universal. A redução de todo o real, a dimensão da
racionalidade formal seria a marca específica da modernidade burguesa transformando toda
atividade em atividade econômica, convertida em campo da produção das condições
materiais de existência que, como natureza, adquire autonomia e independência do homem,
fazendo parecer que a natureza é, em si mesma, racional.
O desenvolvimento do capitalismo foi acompanhado de um desenvolvimento do
conhecimento empírico e técnico, de fundamentação matemática, baseado no todo
experimental, sistemático e especializado como campo científico. Corresponde a um
tratamento racional do mundo e da natureza, que permite a percepção deste mundo como
natural e sua redução a este modelo.
Toda a instância da vida moderna, a partir do capitalismo, teria sido categorizada e
reduzida a conceitos por meio do cálculo racional, estabelecendo e deduzindo leis naturais,
que passam a ser concebidas como objetivas independentes do sujeito e, portanto, sem
valor em si mesmas.
Também as funções quotidianas na vida social passam a ser objeto de cálculo e lei.
E é assim que o capitalismo gradualmente se realiza através de um processo que gera a
absoluta e completa dependência tanto das condições políticas, técnicas e econômicas,
quanto de um conjunto de funcionários técnicos especialmente treinados. O Estado, tomado
11
como entidade política, com uma “Constituição” racionalmente redigida, com um aparato
jurídico racionalmente ordenado e administrado por funcionários especializados é o
resultado desta racionalidade formal. (Riscal, 2008)
A Ação econômica capitalista, por sua vez, é baseada na expectativa de lucro
através da utilização das oportunidades de troca. A apropriação capitalista é racionalmente
efetuada porque a ação é racionalmente calculada em termos de capital. Desde a sua
origem, na empresa capitalista, tudo é feito em termos de balanço: previsão no início do
processo da criação da empresa ou de qualquer decisão - balanço final para a verificação do
lucro obtido.
Neste sentido, perceberemos que toda a inovação científica e técnica, incluindo a
globalização, se caracterizariam por constituir um desdobramento deste tipo de
racionalidade cujo objetivo seria a acumulação de capital.
Este racionalismo técnico e econômico, embora dependa parcialmente da técnica e
do direito racional, é, ao mesmo tempo determinado pela capacidade e disposição dos
homens em adotar certos tipos de conduta racional. Logo, de acordo com Weber (1994),
Onde elas foram obstruídas por obstáculos espirituais, o desenvolvimento de uma conduta
econômica também tem encontrado uma resistência interna."
Weber retoma o conceito de racionalidade formal e substantiva ao tratar da
sociedade tradicional e da administração legal burocrática que caracteriza a sociedade
capitalista. Trata-se de uma administração de caráter racional que se realiza através de uma
série de leis, regras, normas explícitas de comportamento que definem tecnicamente o
modo como deve agir o administrador. Esta administração é concebida como uma
dominação pelo saber, baseada na especialização na qual domina a técnica e a
impessoalidade. Trata-se de uma despersonalização formal na qual o afastamento dos
sujeitos dá-se por uma suposta administração racional dos bens públicos, sine ira et Studio,
sem ódio nem paixão. Tal seria o processo de reifícação das relações que, não trataria mais
com sujeitos, pessoas, mas com números e leis. (Riscal, 2008)
Assim, como observa Habermas (1975), Max Weber ao introduzir o conceito de
racionalidade para determinar a forma da atividade econômica capitalista, acaba por
demonstrar que não apenas o trabalho passa a seguir os padrões de ação instrumental, mas
12
também todos os demais domínios da vida são tomados pelo padrão de ação técnico-
racional.
A propagação desta ação racional com-respeito-a-fins, permite que o próprio
sistema busque através do planejamento-planificação sua ampliação. Quanto mais o
progresso científico-técnico se institucionaliza, maior é a racionalização progressiva da
sociedade. Racionalidade crescente do agir social significaria, portanto, secularização e
desencantamento do mundo. Desta maneira, a racionalidade técnica, de caráter formal,
reduz o real a categorias gerais e abstratas capazes de ser operadas e manipuladas por leis
de caráter universal.
Como observa Habermas, trata-se da propagação do tipo de agir racional – com-
espeito-a-fins que se relaciona com a organização dos meios e à escolha racional entre
possibilidades. A crescente planificação que passaria a dominar todos os setores do agir
humano poderia ser concebida assim como parte necessária do processo de instituição,
aperfeiçoamento e ampliação do sistema de ação racional com-respeito-a-fins.
(HABERMAS, 1975:303)
Para Weber, o “costume seria uma maneira coletiva de agir, perpetuada por cada
indivíduo. Esta ação se apresenta a este indivíduo como natural e o hábito e tradição
garante a sua legitimidade.
A respeito da concepção de Weber, Bendix observa que costumes e convenções
podem tornar-se tão habituais, que passa a haver pouca orientação consciente em relação a
normas que eles implicam. (BENDIX, 1986:304)
Ações baseadas nos costumes estariam, para Weber, relacionadas à dominação
tradicional e ainda que se trate de um tipo ideal puro, o que significa que se possa encontrar
formas hibridas de dominação, sua ocorrência em uma organização burocrática moderna
pode determinar tensões, distorções e problemas com relação a autoridade e hierarquia.
Na análise de Weber o processo de racionalização do Ocidente foi acompanhado do
processo de sistematização legal e de administração que permitiria às autoridades
estabelecidas, maiores possibilidades para escolha e tomada de decisão.
Como observa Bendix, essa tendência das autoridades estabelecidas deve ser
compreendida por meio da análise de Weber que distingue a racionalidade formal, ou
racionalidade com-respeito-a-fins, da racionalidade substantiva.
13
Weber criou um instrumento de análise que chamou de tipo puro ou ideal que
deveria ser compreendido como um norteador da análise científica. O tipo ideal, tal como é
concebido por Weber, é um instrumento de interpretação, que não existe enquanto tal na
realidade, nas quais as características são tomadas em sua forma mais extrema e pura. Neste
sentido, como observa Veyne, deve ser compreendido como um “conceito-limite”,
Uma utopia que não está realizada em nenhum lado, mas que serve para
medir quanto a realidade se aproxima ou afasta do quadro ideal; só tem valor
heurístico (...) e entra na linha de conta unicamente como meio de
conhecimento e não se deve confundir tipo ideal e história. (...). (VEYNE,
1986)
Seguindo a lógica weberiana, estudar a administração seria também estudar a
dominação. Em particular Weber estuda a dominação legítima que é definida como a
probabilidade de alguém impor o seu arbítrio sobre o comportamento de outrem
legalmente, isto é legitimamente. De acordo com Motta:
Na dominação, que é um tipo de autoridade estabelecida, existem sempre
princípios ou crenças que tornam legítimo aos olhos do governante e
governados o exercício do poder. Esses princípios e crenças são muito
importantes para a dominação, porque conferem estabilidade. (MOTTA: 27)
Weber compreende o Estado como o campo da ação política legítima, isto é o
campo no qual os diferentes agentes têm sua expectativa de ação norteada pelos limites da
ordem estabelecida, cuja ruptura seria punida pelo Estado. É neste sentido que Max Weber
anuncia que o Estado detém o monopólio da violência legítima. Assim, a dominação
legítima é instituída por um determinado tipo de ordem e corresponde à própria expectativa
e interesses dos agentes políticos.
Weber destaca três tipos de dominação: o burocrático-legal, o tradicional e o
carismático, que procuraremos esclarecer.
A dominação legal tem como aparato administrativo a burocracia. Nas organizações
burocráticas vigoram os princípios ordenados de acordo com leis ou normas
administrativas.
14
O princípio da hierarquia e dos níveis de autoridade é concretizado num sistema de
mando no qual há uma supervisão dos postos inferiores pelos superiores.
No tipo burocrático de administração, os cargos, quase em sua totalidade, passam a
ser ocupados por funcionários independentes, mas vinculados com normas específicas.
O exercício de um cargo se baseia em documentos escritos e preservados em
arquivos. Um quadro de funcionários juntamente com seus arquivos constitui uma
repartição, que é por sua vez, totalmente separada do domicílio privado do funcionário.
Para Weber (1994), o tipo mais puro de dominação legal é o que se exerce por meio
de um quadro administrativo burocrático, composto por funcionários individuais
(monocráticos). São pessoas livres, que obedecem somente às obrigações objetivas do seu
cargo e exercem sua função como profissionais.
Na organização burocrática há uma rigorosa hierarquia dos cargos, com
competências funcionais fixas, devendo se apresentar qualificação profissional – que pode
ser verificada mediante prova e certificada por diploma. Os salários são fixos em dinheiro e
contam com a perspectiva de progressão na “carreira” por tempo de serviço ou eficiência,
ou ambas as coisas, dependendo do critério dos superiores
Freqüentemente são submetidos a um sistema rigoroso e homogêneo de disciplina e
controle do serviço.
Weber procurou sintetizar o espírito da burocracia racional como:
Formalismo, reclamado por todos os interessados na proteção de
oportunidade pessoais de vida, de qualquer espécie – porque, de outro modo, a
conseqüência seria arbitrariedade e porque o formalismo é a tendência que
exige menos esforço. (WEBER, 1994:147)
A dominação tradicional ocorre quando a sua legitimidade repousa da crença na
santidade das ordenações e poderes senhoriais, considerando a dominação patriarcal o seu
tipo mais puro.
Quem ordena é o senhor e os súditos obedecem, numa situação onde o quadro
administrativo é formado por servidores. A obediência está vinculada a tradição
concretizada na fidelidade.
As ordens são ancoradas na tradição, cujo desrespeito põe em risco a legitimidade
do seu domínio.
15
No quadro administrativo as pessoas devem estar ligadas por um vínculo de
fidelidade.
As relações gerais são reguladas pela tradição, pelo privilégio, pelas
relações de fidelidade feudais ou patrimoniais, pela honra estamental e pela
“boa vontade.” O poder senhorial acha-se, pois, repartido entre o senhor e o
quadro administrativo com título de propriedade e de privilégio, e esta divisão
de poderes estamental imprime um caráter altamente estereotipado ao tipo de
administração. (COHN,1991: 133)
Nesta situação o conceito burocrático de “competência” torna-se ausente.
Weber (1994) denomina de patrimonial toda “dominação que originariamente
orientada pela tradição é exercida em virtude de pleno direito pessoal”
O servidor patrimonial pode obter seu sustento por alimentação na mesa do senhor,
por lucros derivados dos bens ou dinheiros do senhor, por terras funcionais, por
apropriações de rendas, taxas ou impostos ou por feudos.
Weber considera a ocorrência de prebendalismo, quando existir um quadro
administrativo mantido principalmente dentro da segunda forma citada acima.
A dominação carismática advém dos dotes sobrenaturais (carisma), atribuídas a
uma pessoa com poderes ou qualidades sobrenaturais, enviados por Deus, personificados na
figura de um líder, representado por um profeta, um herói guerreiro ou por um grande
demagogo. É obedecido devido a suas qualidades sobrenaturais e não em virtude de suas
qualificações profissional.
Assim, o quadro administrativo é escolhido segundo o carisma e vocação, faltando o
conceito racional de competência. A administração carece de qualquer orientação dada por
regras estatuídas ou tradicionais
A dominação carismática, entendida como algo que extrapola o cotidiano, opõe-se
estritamente tanto a dominação racional - burocrática, quanto à tradicional – patriarcal e
patrimonial ou estamental.
A dominação burocrática é especificamente racional no sentido da
vinculação a regras discursivamente analisáveis; a carismática é
especificamente irracional no sentido de não conhecer regras. A dominação
tradicional está vinculada aos precedentes do passado e, nesse sentido, é
também orientada por regras; a carismática derruba o passado (dentro de seu
âmbito) e, nesse sentido, é especificamente revolucionária. Esta não conhece a
16
apropriação do poder senhorial ao modo de uma propriedade de bens, seja pelo
senhor seja por poderes estamentais. Só se “legitima” enquanto e na medida em
que “vale”, isto é, encontra reconhecimento, o carisma pessoal, em virtude de
provas; e os homens de confiança, discípulos ou sequazes só lhe são “úteis”
enquanto tem vigência sua confirmação carismática. (WEBER: 160)
É importante que se compreenda que para Weber os três tipos de dominação
apresentados não existem em lugar algum em sua forma pura. Na realidade o que
encontraremos são tipos mistos, na qual uma ou outra destas formas possa prevalecer.
Para a finalidade deste estudo, nos interessa aqui, principalmente a relação entre o processo
de racionalização, a constituição de uma ordem legal racional e a constituição de uma
burocracia como superação de uma ordem tradicional, baseada em uma racionalidade
substantiva.
A ação administrativa e legal anterior ao processo de racionalização ocidental
obedeceria a critérios irracionais. Na dominação de tipo tradicional, prevaleceria a
racionalidade substantiva. As questões legais atenderiam a critérios de conveniência
política, ignorando limitações de caráter formal ou lógico.
O processo de racionalização formal ocidental teria sido acompanhado de uma
crescente institucionalização de normas e leis, impostas pelas autoridades estabelecidas.
Essas autoridades, entretanto, confrontavam continuamente com um inevitável conflito
entre o formalismo abstrato legal e o desejo de realizar objetivos substantivos.
Inicialmente a autoridade destes governantes era estabelecida em virtude da origem
patriarcal deste poder. A unificação do sistema legal e da administração pública foi
resultado direto da vitória política dos poderosos governantes patrimoniais contra os demais
pretendentes do poder.
O processo de centralização legal e administrativo foi o resultado da crescente
redução das pretensões de poder por parte de grupos e detentores de benefícios patrimoniais
rivais. O fortalecimento da autoridade foi obtido por meio da constituição de um aparato
administrativo com um funcionalismo centralizado que colocou em funcionamento
procedimentos que favoreceram o desenvolvimento da racionalidade formal.
O estabelecimento da autoridade e do efetivo poder do soberano dependia da
eficiência de sua administração fiscal e legal e na mesma medida em que este sistema se
tornava eficiente, crescia o prestígio dos funcionários responsáveis por sua administração.
17
Governante e funcionários apresentavam, assim, interesses coincidentes na centralização
legal e administrativa.
O estabelecimento do aparato administrativo permitiu a constituição de uma
burocracia centralizada, que exigia funcionários permanentes para seu funcionamento
eficiente. Abre-se assim um imenso campo a ser explorado pelos funcionários, cujo poder
se ampliará na medida em que predomine em todo o território estatal a racionalização
administrativa.
O processo de racionalização do Ocidente que acompanhou a constituição do Estado
Moderno acabou por estabelecer uma ordem jurídica e administrativa que são estabelecidas
e alteradas apenas por meio de uma legislação apropriada. Este Estado configura-se como
uma organização legal administrativa, que precisa de um aparato administrativo composto
por funcionários que conduzem os assuntos públicos de forma oficial e formal, de acordo
com uma regulamentação legislativa. Gradualmente a autoridade tradicional e patrimonial,
baseada no costume foi sucedida pela autoridade legal, baseada na lei.
A autoridade estatal assume, assim, um caráter impessoal, uma vez que a
legitimação de seu poder não se encontraria mais na sua autoridade pessoal, familiar ou
baseada em alguma norma consuetudinária, mas na lei. Nesta perspectiva, as pessoas em
posição de autoridade governamental não são possuem cargos em função de sua pessoa,
mas são investidos em um cargo para exercer uma função específica por um tempo
determinado, em virtude do qual possuem autoridade limitada. A obediência não devida à
pessoa do soberano, pois não se tratam mais de súditos, mas de cidadãos que obedecem às
leis e não à pessoa que as aplica. A ordem estabelecida é, portanto impessoal, da mesma
forma que o exercício da autoridade.
4.
A BUROCRACIA
Em uma ordem estatal que se caracterize pelo domínio legal, prevalecem às
organizações burocráticas, que seriam norteadas por princípios que garantiriam a
implementação das normas promulgadas. Estes princípios teriam como base a continuidade
dos negócios oficiais, a delimitação da autoridade por meio de regras, a supervisão do
18
exercício da autoridade, a separação entre a pessoa do ocupante do cargo e o cargo, a
documentação dos negócios oficiais.
a) Os negócios oficiais são conduzidos segundo estatutos permanentes e contínuos.
b) A condução destes negócios obedece a regras estipuladas em um órgão
administrativo caracterizado por funcionários com atribuições especificadas que
devem executar um tipo de trabalho delimitado em termos de critérios
impessoais. Para que o funcionário possa exercer a função para a qual foi
designado, é necessário que seja oficialmente investido da autoridade que
permita o exercício desta função. Este funcionário, no exercício de função
pública, deve dispor de meios de coação legal limitados ao exercício de sua
função de forma que sejam claramente definidas as condições em que seu
emprego é legítimo.
c) Deve ser estabelecida uma clara hierarquia de autoridades com jurisdições
perfeitamente definidas e responsabilidades determinadas de forma que as
responsabilidades, autoridade e posição hierárquica específicas constituam da
própria definição do cargo. Os cargos mais elevados são investidos da função de
supervisão e os mais baixos de direito de apelação.
d) Há estrita separação dos bens, negócios e rendas públicos e oficiais dos bens,
negócios e rendas privados. Os funcionários não são donos dos meios materiais e
dos recursos necessários ao desempenho de suas funções, mas têm a
responsabilidade de zelar por estes recursos.
e) Os cargos não podem ser considerados propriedade pessoal de seus ocupantes,
sendo-lhes vedada sua venda, negociação ou transmissão hereditária.
f) Todos os assuntos oficiais devem ser conduzidos por meio de documentos
escritos.
Bendix observa apropriadamente que a especificação do aparelho burocrático,
forma de dominação legal, pode ser compreendida por meio do contraste com a forma de
administração patrimonial.
Em primeiro lugar, se o dirigente patrimonial e seus funcionários conduzem os
assuntos administrativos ou não, é geralmente, uma questão de arbítrio; normalmente, eles
só o fazem quando são pagos pelos incômodos que passam.
19
Segundo, um dirigente patrimonial resiste à delimitação de sua autoridade pela
estipulação de regras. Ele pode observar limitações tradicionais ou costumeiras, mas estas
não são escritas; de fato, a tradição endossa o princípio da arbitrariedade do dirigente.
Terceiro, essa combinação de tradição e arbitrariedade reflete-se na delegação e
supervisão da autoridade. Dentro dos limites da tradição sagrada, o dirigente decide se
delega ou não a autoridade e a contratação, inteiramente pessoal, que faz de “funcionários”,
tornando a supervisão de seu trabalho uma questão de preferência pessoal e de lealdade.
Em quarto e quintos lugares, todos os cargos administrativos no regime patrimonial
são parte do grupo familiar e da propriedade privada pessoal do dirigente; seus
“funcionários” são empregados pessoais e os gastos administrativos são pagos com seu
tesouro. Sexto, os assuntos oficiais são tratados em encontros pessoais e por comunicação
oral, não através de documentos oficiais. (BENDIX: 1986, 328)
Em contraste com a ordem patrimonial, na dominação legal o funcionário é
designado para um cargo por meio de contrato e não possui dívida pessoal em relação à
autoridade que o designou. Sua designação não é fruto de relações pessoais ou de
parentesco, mas das suas qualificações profissionais e técnicas, adequadas ao cargo que
deverá exercer. Deve lealdade apenas à lei e sua autoridade obedece aos ditames legais e
impessoais. Sua condição é de um profissional por isso seu trabalho administrativo deve ser
sua ocupação em tempo integral. Por esse motivo, seu trabalho deve ser recompensado por
um salário regular, compatível com suas atividades e com perspectivas de promoções
regulares e carreira estável.
O contraste entre a ordem patrimonial e legal racional burocrática permite perceber
que se a ordem legal permite a calculabilidade das decisões, despersonalizando e excluindo
do campo das decisões todo sentimento puramente pessoais, o dirigente patrimonial exerce
sua autoridade por meio do favor, simpatia ou gratidão.
Os cargos são objeto de exploração econômica, ou de prestígio social por parte de
seus ocupantes e por isso constituem uma recompensa por favores fornecidos a autoridade
que o designou.
Segundo Tragtenberg (2006) a burocracia seria para Weber, a realização da
racionalidade formal e se constituiria acima de tudo como fenômeno de dominação. Trata-
20
se de uma forma de dominação pela impessoalidade. Sua ação técnica e eficiente,
fundamenta-se em um saber especializado, acessível a poucos.
Na burocracia legal racional os privilégios são substituídos por uma remuneração
regular em troca de uma dedicação à função em tempo integral. Na administração
patrimonial como os ocupantes das funções não são designados por sua qualificação
técnica, mas em função das relações pessoais com a autoridade que o designou, constituem
freqüentemente administrações amadoras.
Tendo em vista os aspectos apresentados do desenvolvimento da racionalidade
formal e a constituição do Estado moderno, trataremos, em seguida, de alguns aspectos
patrimonialistas na constituição do Estado brasileiro.
5. ALGUMAS NOTAS SOBRE O PATRIMONIALISMO E A CONSTITUIÇÃO DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA
Segundo Raymundo Faoro, o patrimonialismo teria caracterizado as relações
políticas que determinaram a formação do Estado brasileiro. Desde o início da presença
portuguesa teriam sido estabelecidas instituições administrativas no território colonial
herdadas da concepção política portuguesa baseada no prebendalismo. O processo que
desde a colonização portuguesa levou a formação das elites e das instituições políticas foi
constituído por relações patrimonialistas aliadas a um estilo burocrático que favoreceu a
centralização administrativa
No Brasil, o desenvolvimento do capitalismo teria seguido uma linha diversa do
apresentado pelo tipo ideal de Weber. O desenvolvimento de uma racionalidade formal não
teria sido acompanhado de uma modernização aos moldes do capitalismo europeu e não se
teria aqui desenvolvido um sistema político liberal que teria sua forma de legitimação na
concepção moderna de Estado burguês de direito. Esta concepção de Estado é baseada na
liberdade individual, livre concorrência e direito de comercializar, de contratar, contestar.
Daí o dogma do direito natural da soberania popular, que reduz a intervenção estatal a um
mecanismo de garantia do indivíduo e das relações capitalistas baseadas na liberdade
concorrencial. O Estado burguês de direito é fundamentado na liberdade individual
21
garantida por um sistema legal que representa a vontade geral. A esfera do Estado é
limitada a interferências estritamente previstas e mensuráveis, separadas da esfera social.
No caso brasileiro estaríamos segundo Faoro, diante de um capitalismo
politicamente orientado, baseado na racionalidade e na técnica, todavia estruturado a partir
de um estamento político, que conduz comanda e supervisiona os negócios públicos. O
Estado é concebido como um aparelho que permite explorar e manipular a matéria pública
e social de acordo com os fins estabelecidos pela comunidade política. Estas características
do capitalismo politicamente orientado teriam gerado uma forma de poder
institucionalizada - o patrimonialismo estatal - que tem dado orientação política ao
capitalismo no Brasil, obedecendo aos interesses dos quadros administrativos. (Faoro,
2003:738)
Faoro observa que no caso brasileiro não há uma burocracia no sentido definido
Weber, expresso formal do domínio racional, própria ao Estado e à empresa modernos
(FAORO, 2003: 738) Em nosso Estado, não impera uma burocracia, camada profissional
que assegura o funcionamento do governo e da administração, mas o estamento político.
(Idem, idem) Se a burocracia aos moldes weberianos almejaria a impessoalidade da
neutralidade e a objetividade do universal, encontraríamos aqui uma política particular
voltada para os interesses do estamento burocrático.
Por outro lado, são inúmeros os estudos que apresentam as dificuldades da
constituição de um sistema administrativo baseado em uma concepção legal racional
burocrática.
Gandini e Riscal (2007) observam que o processo de organização administrativa
brasileiro desenvolveu-se segundo condições localizadas e pragmáticas o que teria sido
acentuado a transferência da Corte e da família real. A tendência ao prebendalismo
português teria se unido às práticas de estabelecimentos de legislação adequadas às
necessidades imediatas. Esta mistura de organização baseada no pragmatismo e
prebendalismo teriam produzido um sistema que Uricoechea (1978:94) denomina de
patrimonialismo burocrático, avesso a processos de mudanças, resultando daí, um tipo
estático de organização.
O processo de prebendalização teria acompanhado a instituição de estruturas
governamentais que teriam tornado difícil o processo de racionalização da burocracia e,
22
portanto, o desenvolvimento de uma concepção administrativa de caráter racional-legal. O
resultado disso, segundo Uricoechea, teria sido uma burocracia patrimonial que se expandiu
sem modernização. A ausência das pressões concorrenciais do capitalismo europeu, que
forçavam o sistema em direção à maior racionalidade técnica, a administração colonial e
depois imperial não assume a forma de uma burocracia baseada em um princípio racional
que vise maior eficiência em sua organização.
Segundo Gandini e Riscal (2007), o estabelecimento de um aparato administrativo
institucional adequado à organização de uma ordem legal começa a firmar-se na segunda
metade do século XIX, com instauração de novas práticas resultantes da renovação das
relações econômicas cafeeiras. Como observa Florestan Fernandes (1987) a introdução de
uma nova concepção de homem de negócios que poderia ter proporcionado uma concepção
burguesa das relações econômicas e sociais acabou por sucumbir à concepção política
patrimonialista, com traços tradicionais, não permitindo a superação das relações
escravocratas. Neste sentido, não se consolidou uma ordem social competitiva, sendo
mantido o que Florestan Fernandes denominou de privilégios fechados,
(...) a começar pelo monopólio da riqueza e do poder que tornou a
dominação oligárquica sob a República uma “democracia entre iguais”, ou seja,
uma rígida ditadura de classe. (FERNANDES, 1987:196)
A tendência ao prebendalismo acabou por alimentar o patrimonialismo na esfera
administrativa. Os servidores públicos acabavam se orientando muito mais pelos interesses
locais aos quais se encontravam vinculados do que pelo poder central distante e abstrato.
(FRANCO,1997). Embora a codificação escrita legitimasse a organização e funcionamento
dos serviços públicos, nos quadros municipais os procedimentos eram negligenciados e se
omitia ou perdia o registro dos atos do poder legislativo. Assim, segundo Franco (1997)
(...) pode-se constatar que as ordenações que regiam as práticas
administrativas, num setor fundamental como o da garantia dos meios para o
aparelho governamental, não tinham, realmente, o caráter abstrato e geral que
distingue os preceitos jurídicos sobre os quais se assenta a estrutura
burocrática. Pelo material coligido, verifica-se que a decisão em cada caso
concreto orientava-se preponderantemente pelos valores ou situação de
interesses aos quais os agentes do governo estavam imediatamente vinculados.
Assim, observa-se a instabilidade da validade efetiva das ordenações que, de
23
forma freqüente eram abertamente desobedecidas, inclusive pelos próprios
agentes destinados a sua imposição. (FRANCO, 1997)
De acordo com Gandini e Riscal (2007) a autoridade pública assentava-se em
concepções de dominação tradicional e as práticas administrativas eram orientadas por
costumes prebendários e clientelistas. Os agentes do serviço público evitavam situações que
implicassem no reconhecimento ou controle de caráter legal racional preferindo agir
segundo improvisações que deveriam atender aos requisitos do costume e clientelismo. Tal
fato impedia qualquer tipo de supervisão, planejamento ou uma simples fixação de regras
gerais.
Uricoechea apresenta mais um obstáculo à constituição de um aparato burocrático: a
ausência de quadros qualificados em que confiar a administração local:
Esta carência foi particularmente severa na esfera judiciária, e acarretou
como conseqüência imediata que as funções a serem formalmente
desempenhadas por advogados profissionais enviados pela administração
central foram de fato preenchidas pelo serviço amadorístico dos “honoráveis”
locais. (Uricochea: 1978:113)
Sendo obrigado a fazer uso de práticas clientelistas e patrimonialistas, os
governantes acabavam tendo que contar com mão-de-obra amadora na administração o que
acabava por tornar ainda mais precária as condições de racionalização e institucionalização
da administração. Além disso, tornava-se cada vez mais distante a possibilidade de uma
impessoalidade e neutralidade do corpo administrativo.
As conclusões apresentadas pelos autores citados sugerem a permanência das
relações patrimonialista e clientelistas na administração pública brasileira. Estes traços
teriam acompanhado toda a história administrativa brasileira e permaneceriam até os dias
de hoje.
Em síntese, ao iniciarmos o capítulo, estabelecemos que as tensões sofridas pela
supervisão de ensino municipal, relacionavam-se com o conflito entre a tendência
conservadora das estruturas de poder municipal, que estavam baseadas em uma organização
administrativa tradicional patrimonial e o modelo legal racional burocrático, instituído pelo
processo de municipalização.
24
Procurou-se relacionar a reforma de 1995, implementada pelo governo brasileiro,
como uma tentativa governamental de substituir sob decreto, a ordem administrativa
tradicional patrimonialista, por uma organização considerada moderna, constituída sob base
legal e racional.
Assim, tornou-se importante esclarecer os principais conceitos weberianos
relacionados com a concepção tradicional, fundamentada em uma racionalidade substantiva
e concepção legal, que seria fundamentada na racionalidade formal.
Atrelado a estes conceitos, apresentou-se os três tipos de dominação definidas por
Weber, como: burocrático-legal, tradicional e carismática. Entretanto, nosso interesse
concentra-se no confronto entre a dominação legal, que tem no aparato administrativo a
burocracia, e a dominação tradicional patrimonialista, caracterizada pelo uso da tradição
para o exercício do direito pessoal.
O interesse nesse confronto origina-se exatamente na questão da racionalidade
econômica e burocrática, imposta pela reforma do estado brasileiro de 1995, que serviu de
base para a reforma educacional paulista, no período de 1995 a 1998, desencadeando o
processo de municipalização do Estado de São Paulo.
A implementação da municipalização trouxe a tona, principalmente após a chegada
da supervisão municipal, a tensão gerada entre a estrutura de poder municipal, baseada em
uma organização administrativa patrimonial, e o modelo de municipalização imposta pelo
governo paulista, baseado na organização legal racional burocrática.
25
C
APÍTULO II
S
UPERVISÃO DE ENSINO, RACIONALIZAÇÃO E MODERNIZAÇÃO
1.
INTRODUÇÃO
Como observamos anteriormente, partimos da hipótese de que as resistências ao
processo de municipalização poderiam ser observadas a partir da depreciação das ações de
caráter modernizador que visavam a racionalização do sistema. Dentre estas resistências,
interessa-nos particularmente as relativas à supervisão.
Até aqui pudemos concluir que o processo de modernização das estruturas
administrativas, tal como pensadas por Weber, só poderiam ocorrer mediante uma mudança
não apenas na atitude administrativa, mas na adoção de um tipo de racionalidade formal, de
caráter técnico, cuja origem se encontraria em uma mudança de valores, neste caso
daqueles que corresponderiam à própria expansão capitalista.
No caso brasileiro pudemos constatar a resistência de relações de caráter
patrimonialista, o que corresponderia a uma permanência de valores característicos de uma
ordem social e econômica tradicional.
Este é o contexto no qual são implementadas as primeiras ações com caráter de
supervisão. A concepção de supervisão, na forma como foi constituída no campo
educacional, teria sua fundamentação em uma ordem burocrática legal racional. No caso
brasileiro ganhou destaque no período das reformas educacionais da década de 1970, em
particular às mudanças decorrentes da lei 5692/71.
Entretanto, já poderíamos encontrar no final do século XVI ações com o sentido de
supervisão. Neste capítulo trataremos especificamente da supervisão de ensino. Iniciaremos
com a apresentação do processo de racionalização do sistema de ensino paulista, ainda no
século XIX. Em seguida trataremos do conceito de supervisão e de sua constituição como
espaço de ação pedagógico.
26
2.
DA FUNÇÃO SUPERVISORA AO CARGO DE SUPERVISOR DE ENSINO
A) BRASIL COLÔNIA
Encontramos as primeiras “ações supervisoras” no período colonial, com a
nomeação do “prefeito geral de estudos”, responsável pelo acompanhamento do “plano de
estudos” da Companhia de Jesus, denominado Ratio Studiorum.
Segundo Saviani (2002), esse plano além de determinar cada disciplina, também
especificava todas as atividades dos responsáveis pelo ensino provincial, dentre os quais se
destaca a figura do reitor, que respondia pela direção geral, além do prefeito de estudos e
professores.
As funções do prefeito de estudos regulavam-se por meio de trinta
regras. A de número1 estabelece que é dever do prefeito “organizar
estudos, orientar e dirigir as aulas, de tal arte que os as freqüentam,
façam o maior progresso na virtude, nas boas letras e na ciência, para a
maior glória de Deus” (SAVIANI, 2002:138).
A regra nº5 determina que o prefeito deve lembrar aos professores a
obrigação de explicar toda a matéria de modo a esgotar, a cada ano, toda
a programação que lhe foi atribuída. A regra nº17, se refere à função de
“ouvir e observar os professores”; ela estipula: “de quando em quando,
ao menos uma vez por mês, assista às aulas dos professores; leia também,
por vezes, os apontamentos dos alunos. Se observar ou ouvir de outrem
alguma cousa mereça advertência, uma vez averiguada, chame a atenção
do professor com delicadeza e afabilidade, e, se for mister, leve tudo ao
conhecimento do P. Reitor” (FRANCA, 1952 apud SAVIANI, 2002:21).
Com a expulsão da Companhia de Jesus em 1759, na fase pombalina da
administração portuguesa, é proposto um ensino que forme o indivíduo para o Estado,
rompendo dessa maneira com a formação para Igreja.
Assim, o Alvará de 28 de junho de 1759, que instituiu as reformas pombalinas da
instrução pública, criou o cargo de diretor geral dos estudos que designava “comissários”.
Estes também exerciam a função de “diretor de estudos,” para o levantamento sobre a
situação das escolas e dos professores.
A associação entre essas duas funções demonstra que a idéia de
supervisão englobava os aspectos político-administrativos (inspeção e direção)
em nível de sistema concentrados na figura do diretor geral, e os aspectos de
27
direção, fiscalização, coordenação e orientação do ensino, em nível local, a
cargo dos comissários ou diretores dos estudos, os quais operavam por
comissão do diretor geral dos estudos. (SAVIANI D, 2002)
O Alvará também determinava que os professores passassem por exames para que
adquirissem uma licença, sem a qual não poderiam lecionar.
Ribeiro (2003) esclarece que nesse período foram realizados concursos para o
provimento das cátedras de latim e retórica na Bahia e Rio de Janeiro, e que também foram
enviados professores régios portugueses para Pernambuco.
B) BRASIL IMPÉRIO
No período imperial, a lei de 15 de outubro de 1827, a única relativa ao ensino
elementar, propunha que a escola fosse organizada de forma autônoma, estabelecendo que
os estudos devessem seguir o “método do Ensino Mútuo”, que segundo Saviani (2002),
fazia com que o professor absorvesse as funções de docência e supervisão.
Em 1834, a necessidade da criação do cargo de “Inspetor de Estudos” é apresentada
no relatório do ministro Chicharro da Gama,
Nesse mesmo relatório, vos fiz notar que as escolas de ensino mútuo,
por uma razão qualquer, não corresponderam às nossas esperanças; eu me
vejo obrigado a confirmar esta observação. O bem do serviço, Senhores,
reclama imperiosamente a criação de um Inspetor de Estudos, ao menos
na capital do Império.
É uma coisa impraticável, em um país nascente, onde tudo está para
ser criado, e com o péssimo sistema de administração que herdamos, que
um ministro presida ele próprio aos exames, supervisione as escola e entre
em todos os detalhes. É bom dizer que as Câmaras Municipais tomam
parte na vigilância das escolas, mas estas corporações, sobretudo fora das
grandes cidades, não são as mais para este serviço. (ALMEIDA, 1989
apud, SAVIANI, 2002)
Na década de 1850, ainda no Império, encontram-se várias realizações na área do
ensino, mas quase todas restritas ao município da Corte. No ano de 1854 foi criada a
Inspetoria Geral da Instrução Primária e Secundária no Rio de Janeiro, a fim de fiscalizar e
orientar o ensino público e particular.
28
Saviani (2002) apresenta o regulamento de 17 de fevereiro de 1854, que faz parte
das reformas de Couto Ferraz. Estas relacionam a missão do inspetor-geral com o ato de
“supervisionar”, pessoalmente ou por seus representantes, todos os tipos de
estabelecimentos de ensino, público ou privado. Também é sua ‘função presidir os exames
dos professores e lhes conferir o diploma, autorizar a abertura de escolas particulares e até
mesmo rever os livros, corrigi-los ou substituí-los por outros’’.
Ribeiro do Nascimento (1980) afirma em sua dissertação A Administração do
Ensino Público Paulista na Primeira República, que no final do Império o ensino público
na Província de São Paulo continuava muito precário, com quase 71% da população acima
de seis anos analfabeta e apresentava a seguinte estrutura organizacional burocrática
Figura 1: Organograma da estrutura administrativa da rede escolar paulista introduzida pela
Reforma de 1855. (RIBEIRO DO NASCIMENTO, 1980)
C)
PRIMEIRA REPÚBLICA
Nos primeiros anos da República, no Estado de São Paulo, o Regulamento da
Instrução Pública de 27 de novembro de 1893 estabeleceu que a inspeção escolar deveria
ser exercida pelo Inspetor de Distrito. Segundo Casemiro dos Reis Filho (1995), o inspetor
29
era escolhido entre os professores normalistas com três anos de exercício de magistério,
nomeados pelo Presidente do Estado e tinham mandato de três anos, podendo ser
renovados.
Suas atribuições eram determinadas pelo artigo 40 e seus parágrafos, do
Regulamento de 27 de novembro de 1893. Abaixo, destacamos algumas de suas funções.
“Visitar com freqüência todas as escolas do distrito; providenciar os
exames nas escolas públicas e presidi-los, propor ao Conselho Superior a
localização mais conveniente às escolas; visitar os títulos dos professores de
ensino primário que forem nomeados e providenciar sobre a abertura das
respectivas escolas; remeter ao Conselho Superior, nas épocas por estes
fixadas, relatórios circunstanciados sobre o ensino do distrito, indicando as
modificações que julgar necessárias e dando conta do procedimento de cada
professor; inquirir de cada professor as modificações que porventura convenha
introduzir no regime escolar do distrito; providenciar no sentido de fazer com
que os professores realizem conferências públicas sobre assuntos que
contribuam para a educação cívica do povo; comunicar ao diretor geral o início
do exercício dos professores, as interrupções que se derem, as datas do gozo de
licenças e quaisquer ocorrências sobre o funcionamento das escolas; atestar aos
professores a conveniência de sua remoção ou da permuta de suas cadeiras;
entender-se com a municipalidade sobre o serviço de recenseamento dos
respectivos municípios; admoestar e repreender os professores por faltas e, em
caso de reincidência, levá-las ao conhecimento do Conselho Superior; lavrar
em livro especial o termo de sua visita a cada escola, observando tudo que lhe
aparecer digno de louvor ou de censura; nomear e presidir comissões de
exames para professores interinos de escolas provisórias, enviando o resultado
ao diretor geral, de acordo com o artigo 106 deste regulamento; .... nomear
quem substitua os professores das escolas preliminares e intermédias, nos
impedimentos temporários não excedentes a 30 dias, na falta de adjuntos,
providenciando sobre nova nomeação para as escolas provisórias, quando
sobrevier qualquer impedimento aos respectivos professores .... abrir, numerar
rubricar e encerrar todos os livros das escolas públicas sob sua jurisdição; dar
cumprimento aos atos do Presidente do Estado... exercer em geral todas as
atribuições conferidas pela Lei 81 de abril de 1887 aos conselhos municipais,
que não forem contrárias a este regulamento, acarretando todos os papéis
existentes nos arquivos de tais conselhos” (SÃO PAULO, 1893 apud Reis
Filho, 1995)
Nessa regulamentação das funções do inspetor, Reis Filho (1995) observa a dominância das
atribuições burocráticas sobre as técnico-pedagógicas. Considera que a atividade de
30
inspeção está relacionada principalmente com a definição de fiscalização, acarretando dessa
forma um prejuízo pedagógico.
(...) esse defeito das regulamentações parece ser insanável e leva sempre
ao mesmo resultado: burocratizar a ação educativa e fazer incidir sobre a rotina
as preocupações do inspetor, que deveriam ser orientadoras (REIS FILHO,
1995).
Por outro lado, a implantação do sistema de inspetores de distrito permitiu a coleta
de dados sobre o funcionamento das escolas nos mais distantes lugares do Estado,
proporcionando, mesmo em condições precárias, maior controle da rede escolar.
Embora esses dados não se prestassem ao controle da obrigatoriedade escolar,
indicavam, como observa Reis Filho (1995), as diferentes dificuldades para o
estabelecimento do atendimento educacional, a falta de escolas para todas as crianças em
idade escolar e também a grande evasão escolar devido à situação de miséria de muitas
famílias.
A atuação desses inspetores para o atendimento de seus municípios estava associada
a grandes dificuldades como:
Falta de verbas para transporte; falta de prédios escolares, de livros e
objetos para as escolas; necessidade de transformar em escolas provisórias as
escolas vagas; designação de professores adjuntos e de criação de cursos
noturnos para adultos. As substituições de professores são quase impossíveis
devido a falta de pessoal habilitado em muitas localidades e a exigüidade do
vencimento pago ao substituto, que ainda é obrigado a pagar aluguel da casa
onde funciona a escola (REIS FILHO, 1995)
Para ilustrar as adversidades enfrentadas pelos inspetores no desempenho de suas
funções, apresentaremos trechos retirados do relatório de um Inspetor baiano chamado
Abílio César Borges, titular da Diretoria Geral os Estudos da Bahia, encontrado no Arquivo
Público do Estado pelo pesquisador Luís Henrique Tavares
do Centro Regional de Estudos
Pedagógicos da Bahia, publicada na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (1957)
Encontramos em seus relatos as mesmas dificuldades apontadas no texto do
professor Casemiro dos Reis Filho, apesar de suas visitas terem acontecidas no final do
Império, na data de 31 de janeiro de 1857.
O Inspetor inicia o relatório com a seguinte saudação:
31
Il.mo e Ex.mo Sr.
Acabo de chegar da minha viagem ao interior da Província e apresso-me
em dar imediatamente conta a V. Ex.a do resultado da inspeção que exerci em
diversas aulas públicas e particulares.
Durante minha ausência desta Capital, havendo percorrido uma distância
de mais de cento e cinqüenta léguas, visitei as aulas primárias da cidade de
Cachoeira, do Curato de São Félix, da Vila da Feira de Santana, da Freguesia
do Riachão de Jacuípe, e das Vilas de Jacobina, Xique-Xique e Barra do Rio
Grande; e também a aula de gramática latina desta última Vila. Para maior
clareza na exposição, tratarei de cada uma destas localidades em artigo
especial. (RBEP, 1957)
No relatório do Inspetor, encontramos situações que descrevem questões tanto
pedagógicas quanto administrativas e como eram realizadas as suas intervenções.
Aula da Prof.ª, Cassiana Joaquina de Sales — Nada satisfeito retireime
(sic) da visita que fiz a esta escola; achei-a mal regida, e as alunas em geral
atrasadíssimas. Corrigi alguns defeitos de seu regime interno, e admoestei
convenientemente à professora, já quanto ao pouco adiantamento das suas
discípulas, já quanto a algumas representações que me foram feitas por diversos
pais de família acerca da nenhuma delicadeza com que costuma ela tratá-las.
(RBEP, 1957)
Aula particular de F. Q. Bastos. — Tem este indivíduo um
estabelecimento com caráter de colégio, no qual achei admitidos
indistintamente, seja interno, seja externamente, alunos de ambos os sexos. Fiz
imediatamente suspender o ensino do sexo feminino, e por ser já fim de ano,
tolerei que continuasse a funcionar o estabelecimento com os alunos do sexo
masculino, embora não estivesse o seu Diretor munido de tulo legal, que se
comprometeu me alcançar para começo do presente ano. O senhor Bastos não
possui habilitações superiores; pareceu-me, todavia, capaz dereger aquele
estabelecimento nos limites da instrução primária: é de moralidade
reconhecida, tendo, como tem, confiança dos pais de família, pode prestar
alguns serviços à educação da infância. (RBEP, 1957)
Aula particular de P. G. B. Cabral — Também encontrei na aula dele o
ensino promíscuo de ambos os sexos; e assim, como no estabelecimento do
Prof. Bastos, fiz imediatamente suspender aqui o ensino do sexo feminino,
tolerando, pelas mesmas razões, que continuasse o ensino do sexo masculino,
não obstante carecer este indivíduo de autorização legal para o exercício do
magistério, com a condição de regularmente habilitar-se para poder abrir sua
escola no corrente ano. A cidade da Cachoeira reclama com urgência a criação
de mais uma cadeira do sexo feminino. (RBEP, 1957)
O currículo do período também pode ser visualizado no relatório:
32
Aula do Prof. J. N. Gomes — Doze alunos apenas encontrei nesta aula, e
todos em estado de atraso, e ignorância, que me causou pasmo. Alunos de 2, 3
e 4 anos fazendo leitura soletrada, escrevendo muito mal e quase nada sabendo
de Contabilidade e Doutrina Cristã! Alguns com mais de um ano de escola, não
sabiam ainda assinar o nome. É incompreensível como, tão à face desta Capital,
haja este professor, do modo mais negligente e até bárbaro, exercido o
magistério por espaço de 16 anos, com manifesto desproveito, se não com
grandíssimo prejuízo da infância. (RBEP, 1957)
Aula de D. Firmina Pedreira França — Mantém esta senhora um
pequeno estabelecimento em forma de colégio, que conta quatro pensionistas e
algumas discípulas externas; parece-me inteligente e seu zelo e moralidade me
foram abonados pela Comissão de Instrução Publica. Suas discípulas
mostraram sofrível aproveitamento em leitura, escrita, instrução religiosa e
trabalhos de Agulha. (RBEP, 1957)
A falta de preparo dos professores:
Vila de Jacobina:
Encontram-se apenas nesta Vila duas aulas públicas primárias para um e
outro sexo, regida uma pelo professor Estanislau José Gomes e outra por d.
Maria da Glória. E. J. -Gomes — Achando-se ausente, por haver obtido licença
o proprietário desta cadeira, está êle substituído por um indivíduo que quase
nenhuma habilitação possui. Também observei nos alunos o maior atraso em
todos os exercícios escolares. O edifício em que funciona é o mais impróprio
que se pode dar: muito conviria aproveitar-se para esta cadeira uma parte do
espaçoso consistório da Matriz daquela Vila. (RBEP, 1957)
Vila de Xinquexique:
Esta malfadada Vila possui unicamente uma escola pública primária,
regida pelo professor Antônio Manuel da Costa, que bem mal pode regê-la,
quando êle mesmo necessita de ser regido, pois, além de há muito sofrer
bastante da vista, padece, demais, das faculdades mentais. Este professor conta
mais de 20 anos de exercício; já requereu sua jubilação, sobre o que informou
esta Diretoria no sentido de ser deferido, porquanto sua conservação no
magistério importa em grave prejuízo à infância daquela Vila, que, para
instruir-se, outro recurso não possui fora da escola pública. (RBEP, 1957)
A situação precária dos prédios escolares, suas improvisações e falta de mobiliário
adequado, estão sempre presentes no relato do Inspetor.
Escola para o sexo feminino — É esta escola regida por uma professora
interina, D. Maria da Glória, que parece ter sido fadada pela Providência para a
vida do magistério. Afora os conhecimentos e inteligência não vulgares que
33
possui, esta senhora é animada de tão decidido gosto pela profissão que adotou,
que bem poucas serão as professoras da Província que possam com ela sofrer
comparação; também nenhuma outra merece maior confiança desta Diretoria.
Funciona, porém, em uma sala da casa em que habita, de tão apertadas
dimensões, que mal pode conter os dois terços de suas numerosas alunas (40 de
freqüência ordinária), circunstância que a embaraça consideravelmente. É de
necessidade indeclinável proporcionar-se-lhe mais amplo edifício (RBEP,
1957)
Aula da Professora Florinda Moreira dos Santos. — É hábil e zelosa
esta professora: achei suas alunas satisfatoriamente adiantadas em todos os
exercícios escolares. A sala em que funciona é apertada demais para o número
de alunos (44) que a freqüentam, e está completamente desprovida de mobília:
as alunas assentam-se em cadeiras que de suas casas trazem. (RBEP, 1957)
Ao finalizar seu relatório registra a seguinte conclusão:
Terminando, devo declarar a V. Excelência que não encontrei uma só aula
que possuísse mobília completa; antes quase geralmente ou não na possuíam,
ou então a tinham péssima e incompleta.
Eis, Ex.mo P., o que entendi dever levar desde já ao conhecimento de V.
Ex.a, guardando maiores desenvolvimentos para quando tiver de apresentar a
V. Ex.a o relatório anual da Repartiçãoao meu cargo, conforme determina a lei.
Deus guarde a V. Ex.a
Diretoria Geral dos Estudos da Bahia. 31 de Janeiro de 1857.
a) Abílio César Borges
(RBEP, 1957)
A questão da obrigatoriedade do ensino estabelecida ainda no Império, pela lei de
1827, tornou-se um problema, que continuou sendo discutida na Primeira República. Dessa
imposição legal, que esbarrava no gigantismo do país agravado pela falta de escolas,
professores e principalmente de investimentos, a idéia que se firmava era da necessidade de
uma coordenação nacional dos serviços de educação, que se concretizou com a criação da
Secretaria de Negócios da Instrução Pública, Correios e Telégrafos logo no primeiro ano
após a Proclamação da República.
Segundo Jorge Nagle (1985) esta Secretaria, assumida por Benjamin Constant,
durou apenas um ano e foi qualificada de “esdrúxulo Ministério”, pois a sua criação foi
uma forma delicada e ardilosa de afastá-lo da pasta da Guerra.
Assim, as idéias de propagação do ensino elementar foram deixadas de lado devido
à consolidação do poder oligárquico e a hegemonia do grupo agrário-comercial e só
34
voltaram à tona a partir da Primeira Guerra Mundial, quando foi iniciada uma grande
campanha contra o analfabetismo.Constata-se, assim o forte obstáculo imposto pelos
poderes de caráter patrimonialista local à instituição de um sistema legal-racional de
ensino.
Este período de transformação na Primeira República, segundo Paiva (1973)
coincide com o fortalecimento do grupo industrial-urbano com a ampliação dos setores
médios e do proletariado urbano e com nacionalismo promovido pela guerra.
Pode-se constatar também um esforço por parte dos dirigentes paulistas que no
final do século XIX e nas primeiras décadas do século XX procuraram constituir um
burocratizante sistema escolar com base em um sistema público de funções e cargos,
preenchidos por meio de concurso.
Entretanto a institucionalização do sistema só poderia ocorrer se fossem instauradas
inspeções autônomas, com inspetores desvinculados das constantes interferências dos
poderes locais. Daí o esforço da Diretoria de Ensino de São Paulo em procurar estudar as
relações das inspeções e poderes municipais como também a preocupação em dar uma
estrutura mais orgânica à rede de escolas por meio de constantes reuniões de avaliação e
integração entre os inspetores, dirigentes regionais, locais, diretores de escola e professores.
Na pesquisa realizada por Gandini e Riscal (2007) sobre a constituição do sistema
de ensino paulista, encontramos referência ao Anuário do Ensino de 1935 – 1936,
elaborado por Almeida Junior, que apresenta os seguintes dados sobre a organização do
serviço de inspeção.
No Annuário do Ensino de 1935-1936, Antonio Ferreira de Almeida
Júnior, apresenta um retrospecto do período de 1846 a 1936, por meio do qual
se pode verificar que inicialmente, de 1846 a 1851, a administração da
educação era realizada por comissões de inspetores municipais; de 1851 a
1868, por meio de inspeção individual, com a divisão da província em
distritos; de 1868 a 1874, através da inspeção simultânea dos inspetores de
distrito e presidentes das Câmaras; de 1846 a 1851 por meio de comissões de
inspetores municipais; de 1892 a 1897, com uma nova divisão de distritos,
inspeção individual, por inspetores técnicos remunerados; de 1897 a 1906,
inspeção individual associada à fiscalização municipal, sem divisão de
distritos. (GANDINI & RISCAL, 2007)
35
Segundo as autoras, os ensaios para fixação dos inspetores eram necessários, devido
às constantes interferências de forças municipais. Destacam também que o inicio da
remuneração dos inspetores técnicos no período de 1892, indicava a tentativa de
profissionalização do inspetor de ensino e a sua concepção como cargo técnico. (GANDINI
& RISCAL, 2007)
Esclarecem que as tensões constantes determinaram a continuidade dos ensaios e
que de 1906 a 1920 continuou a inspeção individual, associado à fiscalização municipal,
sem divisão de distritos, significando que todos os inspetores, para ficarem distantes das
interferências das autoridades locais, residiam na Capital.
Entretanto esta situação muda no período de 1920 a 1925, porque todos os
inspetores passaram a residir nos seus distritos ou regiões, devido à mudança na inspeção,
que passa a ser exclusiva de inspetores técnicos, superintendidos os distritais a um inspetor
regional. Na opinião de Almeida Júnior, segundo as autoras, tratava-se de uma
“descentralização centralizada”, uma vez que embora residindo nas respectivas regiões de
inspeção encontravam-se os inspetores subordinados a um inspetor regional. É criado o
cargo de auxiliar de inspeção, função fiscalizadora das câmaras municipais.
A descentralização tinha tido início com a divisão em regiões em 1920,
mas com a implantação das delegacias regionais, tinha sido retirada a
autonomia do inspetor regional. A justificativa encontrava-se nas questões
decorrentes das interferências políticas municipais.
Acima de tudo, Almeida Júnior apontava o que parecia ser um dos
principais problemas para a instituição do sistema de inspeção: a escolha
política do delegado regional. A ação da Delegacia regional deve ficar
resguardada dos choques partidários locais e, por constituir um órgão cuja
função é de árbitro em matéria educacional deve, como tal, manter-se
imparcial diante das disputas políticas locais.
(GANDINI & RISCAL, 2007)
A partir de 1915, surge um movimento contra o analfabetismo, que acaba
assumindo um cunho nacionalista muito grande, denominado por Nagle (1985) como
“entusiasmo na educação”.
São idéias, planos e soluções oferecidos. Há aqui uma parcela que se liga
ao fervor ideológico do final do Império; mas, agora, este é manifestado pelos
próprios republicanos desiludidos com a República existente, República que
36
procuram redimir. Trata-se de um movimento de “Republicanização da
República” pela difusão do processo educacional – movimento tipicamente
estadual, de matriz nacionalista e principalmente voltado para a escola
primária, a escola popular. (NAGLE, 1985)
A percepção romântica dos problemas da sociedade brasileira e de suas soluções
resultou numa supervalorização do processo educacional, fazendo com que surgissem
idéias da escola renovada, estimulando a preocupação com a qualidade de ensino. Dessa
forma, surgem os primeiros “profissionais da educação” o que coincide com a introdução
dos ideais da Escola Nova, dando origem a um segundo movimento denominado por Nagle
de “otimismo pedagógico.
Este caracteriza-se pela crença nas virtudes dos novos modelos.
Enquanto o entusiasmo pela educação se manifesta pela alteração de um ou
outro aspecto do processo, especialmente, pelo esforço de difundir a escola
(modelo) existente, no otimismo pedagógico pretende-se a substituição de um
modelo pelo outro. Por essa razão, o entusiasmo pela educação se realiza com
os movimentos reformistas, enquanto o otimismo pedagógico realiza-se como
os da remodelação. Não importa muito qualquer esforço para difundir a escola
que reproduz um novo modelo (otimismo). Assim sendo, a forma mais acabada
do otimismo pedagógico só vai aparecer a partir de 1927, quando se processa a
introdução sistemática das idéias da Escola Nova, simultaneamente com a sua
aplicação nas escolas primárias e normais de vários Estados: nessa ocasião
surge a disputa entre os modelos da “escola tradicional” e da “escola nova”.
(NAGLE, 1985)
Para Nagle, o otimismo pedagógico encontra sua forma mais acabada nos
movimentos reformistas estaduais das escolas primárias e normais da década de vinte que
foram influenciados pelo ideário escolanovista, presentes tanto na Europa quanto nos
Estados Unidos. Estes novos valores passaram a fundamentar desde a organização escolar
até os novos modos de relacionamento entre professor e aluno, constituindo dessa forma
um novo modelo, estruturado nos avanços da psicologia e suas influências sobre a
pedagogia.
Essa inversão de modelos apontada pelo autor está relacionada com a
predominância dos princípios pedagógicos sobre os políticos, que passaria a influenciar
tanto o pensamento pedagógico brasileiro como na formação dos futuros profissionais da
educação.
37
Os primeiros “profissionais da educação” freqüentemente não possuem
formação específica; são autodidatas dispostos a estudar o assunto e dar
opiniões que deixam de lado o aspecto político da questão. Voltam-se para o
funcionamento dos sistemas escolares, sua eficiência e seu rendimento.
Oferecem soluções para a elaboração de currículos e métodos, para a
organização dos cursos. (PAIVA, 1973)
Na década de 20, os profissionais da educação formaram a Associação Brasileira de
Educação (ABE), fundada por Heitor Lira em 1924, que tinha um caráter nacional e sua
atuação se dava através das Conferências Nacionais de Educação promovidas a partir de
1927.
Segundo Ferreira (1993), os organizadores da I Conferência Nacional de Educação
propuseram quatro temas para serem debatidos durante o encontro:
a) A Unidade nacional (pela cultura literária, pela cultura cívica e pela cultura
moral).
b) A Uniformização do Ensino Primário nas suas idéias capitais, mantida a
liberdade de programas.
c) A Criação de Escolas Normais Superiores, em diferentes pontos do país para O
preparo pedagógico.
d) A Organização dos Quadros Nacional, corporações de aperfeiçoamento técnico,
científico e literário.
As Conferências promovidas pela ABE tinham como objetivo a discussão dos
problemas educativos. As trocas de experiências entre educadores que aconteciam durante
o evento proporcionaram gradualmente, certa unidade ao pensamento pedagógico no país.
Os aspectos técnicos eram predominantes nessas discussões, tornando as idéias de
tecnificação pedagógica, defendidas principalmente pela escola nova, uma forma de pensar
quase que absoluta em todo o país, afastando-se dos ideais propostos pelo “entusiasmo pela
educação”.
D) ERA VARGAS
Ao assumir o poder, Vargas em sua fase mais revolucionária, propõe um programa
de reconstrução nacional, que prioriza o ensino técnico-profissional em detrimento da
educação elementar.
38
Assim, o aumento quantitativo das redes de ensino elementar devia-se aos esforços
estaduais e de alguma aplicação municipal. Paiva (1973) informa que os Estados como São
Paulo e Rio de Janeiro chegavam a gastar 30 vezes mais que os Estados do Nordeste nesta
modalidade de ensino.
Seguindo a tendência que se aproxima mais de uma concepção legal-racional o
prestígio dos “profissionais da educação” atinge seu auge, reforçando a idéia da educação
como uma área mais técnica, dando mais ênfase às teorias educacionais com ajuda de
instrumentos científicos. Conseqüentemente as Conferências Nacionais de Educação
tornaram-se o pólo das informações educacionais no país.
No início do Governo Provisório, coerente ao apelo de “unidade nacional”, foi
criado um Ministério de Educação e Saúde (decreto nº 19.402 de 14 de novembro de 1930)
e no ano seguinte, o Conselho Nacional de Educação.
A partir da nova Constituição de 1934, ficou estabelecida a necessidade da
elaboração de um Plano Nacional de Educação, que coordenasse e supervisionasse as
atividades de ensino em todos os níveis.
Art. 150 - Compete à União: fixar o plano nacional de educação,
compreensivo do ensino de todos os graus e ramos, comuns e
especializados; e coordenar e fiscalizar a sua execução, em todo o
território do País; (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1934)
Pela primeira vez foram estabelecidas quotas fixas para o financiamento do ensino,
em nível Federal, Estadual e Municipal;
Art. 156 - A União e os Municípios aplicarão nunca menos de dez
por cento, e os Estados e o Distrito Federal nunca menos de vinte por
cento, da renda resultante dos impostos na manutenção e no
desenvolvimento dos sistemas educativos.
Parágrafo único - Para a realização do ensino nas zonas rurais, a
União reservará no mínimo, vinte por cento das cotas destinadas à
educação no respectivo orçamento anual.
Art. 157 - A União, os Estados e o Distrito Federal reservarão uma
parte dos seus patrimônios territoriais para a formação dos respectivos
fundos de educação.
§ 1º - As sobras das dotações orçamentárias acrescidas das doações,
percentagens sobre o produto de vendas de terras públicas, taxas
especiais e outros recursos financeiros, constituirão, na União, nos
39
Estados e nos Municípios, esses fundos especiais, que serão aplicados
exclusivamente em obras educativas, determinadas em lei.
§ 2º - Parte dos mesmos fundos se aplicará em auxílios a alunos
necessitados, mediante fornecimento gratuito de material escolar, bolsas
de estudo, assistência alimentar, dentária e médica, e para vilegiaturas.
(CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1934)
Os efeitos dessas ações que buscavam uma organização mais sistematizada foram
sentidos no Estado de São Paulo, com o aumento da legislação escolar, a partir dos anos 30.
Encontramos em Arraes (1980) em seu estudo sobre o Estado e a Administração
Pública na Segunda República, a criação da Diretoria Geral do Ensino, subordinada à
Secretaria dos Negócios do Interior. Foi criada em substituição a Diretoria Geral da
Instrução Pública e era considerada como um órgão de administração superior encarregado
da organização técnica e fiscalização de todos os ramos de ensino público e particular no
Estado de São Paulo, não respondendo apenas pelo ensino superior.
Arraes apresenta o organograma da estrutura administrativa do ensino em São Paulo
no período de 1930 -1931, destacando os órgãos superiores de Administração.
Figura 2: Organograma dos Órgãos Superiores de Administração do sistema escolar paulista de
1930 a 1931. (ARRAES, 1980)
Secretaria dos negócios do interior
Diretoria geral do
ensino
Conselho de
educação
Conselho
su
p
erio
r
Secretaria
Serviço de
assistência técnica
e ins
p
eção escola
r
Biblioteca
pedagógica central
e museu da criança
Inspeção médica
escolar
Almoxarifado da
instituição pública
Seção de
protocolo
Departamento de
educação física
Movimento e
estatística
Arquivo
40
As funções da Inspeção Escolar, segundo Arraes (1980) são estabelecidas em
Regimento e Instrões baixadas pelo Diretor Geral do Ensino, com a aprovação do
Secretário do Interior.
Ao Diretor Geral do Ensino compete a Superintendência técnica e administrativa do
ensino público em todos os seus graus, exceto o superior e o ginasial e a fiscalização do
ensino particular. É ele quem estabelece as normas de ação centralizando todos os serviços,
pois a ele compete:
Regulamentar o trabalho nas Delegacias Regionais;
Ordenar sindicâncias e processos administrativos;
Aprovar os programas de ensino
Nomear, periodicamente, comissões de professores sob sua presidência para
fixarem as bases desses programas de ensino;
Elaborar o regimento interno de todas as repartições;
Autorizar reformas e concertos nos prédios escolares dando conhecimento
ao governo;
Autorizar a compra de material escolar e superintender a distribuição nas
escolas públicas. (ARRAES, 1980)
Neste processo de organização da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo,
encontramos a tendência de instituir órgãos próprios de administração do ensino, em
substituição às Inspetorias de Instrução Pública, demonstrando a tendência da separação
entre a parte administrativa e parte técnica fato que Saviani (2002) destaca como condição
para o surgimento da figura do supervisor.
As alterações na administração e inspeção do ensino primário, secundário e normal,
surgem segundo pesquisa de Gandini e Riscal (2007), primeiramente por meio do Código
de 1933 e posteriormente pelo Decreto de 5 de julho de 1935.
Segundo as autoras, pode-se perceber que diferentes ações tomadas durante este
período, manifestam a intenção de garantir à Diretoria de Ensino o estatuto de único órgão
responsável pela organização e fiscalização do ensino em São Paulo, que se tornaria
responsável pela institucionalização da ação dos seus servidores como serviço público, com
base na autonomia das funções administrativas e no caráter público dos cargos.
41
Ressaltam também que as inspeções possuíam um papel fundamental, ao
garantirem, por meio da fiscalização, que as ações locais seguissem o mesmo princípio
adotado na administração de todo o sistema.
Desta forma, a organização administrativa da rede estadual de ensino em São Paulo,
a partir de 1935, segundo Gandini e Riscal (2007) tornou-se cada vez mais complexa e mais
ativa, estabelecendo-se como centro gerador não apenas da política educacional do Estado,
mas também como impulsionador de debates pedagógicos no espaço escolar.
São indicadas no Anuário de 1935-1936 uma série de ações da Diretoria
de ensino trabalhos de organização e fiscalização da rede estadual, que incluem
a reunião dos delegados para estudo dos temas relacionados à orientação e
fiscalização; reuniões pedagógicas de diretores e inspetores que conta com a
participação de 702 autoridades escolares para estudo de temas pedagógicos e
de administração; curso abreviado de administração escolar freqüentado por 45
diretores de grupos escolares do interior; Publicação de boletins da Diretoria
versando sobre assuntos de orientação do ensino. Note-se a preocupação da
Diretoria, já naquela época, com as reprovações. Neste sentido foram
organizados estudos do problema das reprovações na escola primária, com a
participação dos delegados, inspetores e diretores de escolas e a publicação de
boletim da diretoria sobre o tema, com indicações práticas
. (GANDINI &
RISCAL, 2007)
Apesar do fortalecimento do caráter fiscalizador do inspetor, sua intervenção nas
questões pedagógicas é reforçada pela Recomendação nº 10, sugerida pela Conferência
Internacional de Instrução Pública, realizada na cidade de Genebra em 1937. Pasquale
(1965), na apresentação do livro que reúne as Recomendações de 1934 a 1963, esclarece
que esse evento iniciou em 1934, com reuniões em Genebra, promovidas inicialmente pela
UNESCO.
Seu principal objetivo consistia na apresentação de relatórios de noventa países,
sobre o movimento educativo, que posteriormente serviriam para orientar as discussões e
votações de Recomendações aos Ministérios de Educação. Pasquale (1965) ressalta que
essas Recomendações, apesar de não terem a força de decisões, constituíam um conjunto de
normas “da mais ampla autoridade técnica e moral, por serem elaboradas com fundamento
na realidade escolar dos países participantes
42
A Recomendação nº10, de 1937, que trata especificamente da Inspeção de Ensino,
apresentava como justificativa a sua proposta a “elevada significação das recentes
conquistas para melhor conhecimento da psicologia da criança e ciências da educação,
implica na adoção de métodos ativos, mais intuitivos e concretos”, mostrando sua estreita
relação com os princípios da escola novo ou ativa, predominante no período.
As Recomendações foram às seguintes:
1. Que a escolha de inspetores de todos os graus de ensino seja feita por
meio de rigoroso inquérito sobre suas aptidões morais e intelectuais, tendo em
vista as dificuldades da função.
2. Que nenhum candidato possa ser selecionado sem haver previamente
demonstrado seu interesse e compreensão dos assuntos relativos à educação,
seja durante estágios prolongados, seja através de preparo especializado em
Instituto Pedagógico de nível superior. Esse preparo deve compreender o
estudo da educação comparada e dos sistemas de organização educacional de
outros países.
3. Que o exame de ingresso à carreira ou à função de Inspetor, onde
exista, verifique não apenas os conhecimentos em geral, mas também, pela
análise de casos concretos, aptidões para orientar com inteligência, tato e
justiça.
4. Que a missão dos inspetores consista, sobretudo, em compreender e
aconselhar os professores sob sua coordenação, respeitando ao mesmo tempo
sua liberdade intelectual e seu espírito de iniciativa em questões pedagógicas.
5. Que, tendo em vista a conveniente execução de tarefas, bem como a
atualização pedagógica, não se atribuam encargos complexos aos inspetores de
circunscrições muito amplas; e que no ensino secundário particular o controle
administrativo seja exercido por outros funcionários, e que a orientação
pedagógica seja essencialmente a missão dos inspetores.
6. Que sejam oferecidas facilidades aos inspetores para se manterem a
par dos programas da pedagogia moderna, por meio de viagens ao estrangeiro,
estágios e cursos especiais, de colaboração com os professores de Institutos
Pedagógicos e de Escolas Normais.
7. Que reuniões e conferências de Inspetores sejam realizadas, a fim de
definir pontos de vista compatíveis com a liberdade de ação de cada um.
8. Que, no próprio interesse das crianças e dos estabelecimentos
particulares, estes últimos recebam inspeção, tal como os estabelecimentos
públicos; que, no ensino das escolas maternais, crianças retardadas, cegos e
surdos-mudos possam receber a orientação e os conselhos de inspetores
especiais; que no ensino primário, sobretudo nas grandes cidades, a missão de
dirigir a educação artística, a educação física e o trabalho manual e o ensino de
artes domésticas seja confiada a inspetores especiais; que no ensino secundário
e profissional, onde as condições se tornem favoráveis, a especialização de
inspetores se torne regular. (MEC,INEP, 1965)
43
Concomitante à organização administrativa da rede estadual de ensino em São
Paulo, que a tornou mais complexa e mais ativa a partir de 1935, realizou-se a Reforma
Burocrática estabelecida por Vargas, em 1938, responsável pela criação do DASP
(Departamento Administrativo do Serviço Público) que passou a ser seu órgão executor e,
também formulador de uma nova forma de pensar e organizar a administração pública
.
Esta nova proposta de organização burocrática demonstrava que a tendência
centralizadora do período era considerada uma forma de superar os domínios oligárquicos
ainda reinantes, passando a reunir em si, o princípio da homogeneidade.
Bresser Pereira (2001) baseando-se no livro de Beatriz Wahrlich, sobre a Reforma
Administrativa da Era Vargas, resume as principais realizações do DASP:
(...) o ingresso no serviço público por concurso, critérios gerais e
uniformes de classificação de cargos, organização dos serviços de pessoal e de
seu aperfeiçoamento sistemático, administração orçamentária, padronização
das compras do Estado, racionalização geral de métodos. Além disso, o DASP
cooperou no estabelecimento de uma série de órgãos reguladores da época
(conselhos, comissões e institutos), nas áreas econômica e social. A partir
destes foi criado, entre os anos 30 e os anos 50, um pequeno grupo de
empresas estatais, que se constituíram no núcleo do desenvolvimento industrial
por substituição de importações. (BRESSER PEREIRA, 2001:11)
E) RESTAURAÇÃO DO ESTADO DEMOCRÁTICO
A reforma de 1938, segundo Bresser Pereira (2001), que fora imposta de cima para
baixo, não respondia às reais necessidades da sociedade e da política brasileiras. O Estado,
segundo o autor, necessitava de uma burocracia profissional, mas fazia concessões ao velho
patrimonialismo, que na democracia nascente assumia a forma de clientelismo.
Portanto, logo após a queda de Vargas, Bresser Pereira (2001) explica que os velhos
componentes patrimonialistas e os novos fatores clientelistas reaparecem no contexto social
Brasileiro, dificultando a continuidade da Reforma Burocrática de 1938, fazendo com que o
DASP perdesse grande parte de suas atribuições.
Os esforços no sentido de completar a implantação de uma administração
pública burocrático no país não chegaram a ter impacto efetivo sobre a
administração. Tornava-se claro que não eram apenas as forças atrasadas do
patrimonialismo e do clientelismo que jogavam contra as tentativas de
44
prosseguir a Reforma Burocrática de 1936. As forças comprometidas com o
governo Vargas, teriam continuidade com Kubitschek (1956 – 1960) e se
reorganizariam no regime militar (1964 – 1984), também a ela se opunham, na
medida em que o formalismo burocrático se revelava com as necessidades do
país. (BRESSER PEREIRA, 2001:13)
Apoiando-se na idéia da organização burocrática legal racional da escola, criou-se o
Ministério da Educação, dando origem as Secretarias Estaduais de Educação. Este conjunto
de circunstâncias acabou desencadeando a necessidade de um olhar mais atento para os
chamados “profissionais da educação” que passariam a agentes responsáveis pela operação
dessa complexaquina burocrática.
O suporte para o fortalecimento desse processo de estruturação do ensino nacional
veio, segundo Saviani, (2002:28) através das Reformas de Francisco Campos, de 1931 e
Capanema de 1942 – 1946, destacando-se o Decreto nº 19.851 de 11 de abril de 1931, que
estabelece os Estatutos das Universidades Brasileiras. Este documento previa a implantação
de Faculdades de Educação, Ciências e Letras, que tinham a finalidade de formar os
professores das diferentes disciplinas das escolas secundárias.
Para atender essa demanda, foram criados os cursos de Pedagogia visando à
formação de professores das disciplinas específicas do Curso Normal, bem como “os
técnicos de educação. Estes tinham um sentido genérico – pedagogo generalista – termo
usado por Saviani (2002), que permanece até os anos 60.
Nesta perspectiva, encontramos em um documento do MEC “Supervisão de
Ensino, Tentativas de Modelo e Análise de Custos” (1974), a referência da primeira
iniciativa de capacitação na área de supervisão de ensino, a nível federal, com o objetivo de
fortalecer a supervisão em todo território nacional. Esta capacitação, denominada como
Programa de Aperfeiçoamento do Magistério Primário (PAMP), ficou sob responsabilidade
do Departamento Nacional de Educação, criado em 1963.
Este documento também expõe a falta de clareza entre a figura do Inspetor e a do
Supervisor, principalmente nos Estados onde havia grande concentração de professores
leigos, fazendo com que a supervisão assumisse um caráter mais pedagógico, responsável
pelo “treinamento” desses docentes, tendo em vista a melhoria do seu desempenho.
45
Subsiste a confusão entre o inspetor e o supervisor. Alguns quadros
profissionais apontam, ainda, orientador pedagógico e coordenador
pedagógico, que compartilham com supervisores e inspetores funções de
supervisão de ensino no mesmo sistema educacional. O que parece
constante é a localização dos dois primeiros nas escolas. (MEC, 1974:12)
A partir da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº
4.024/61, foi criada a “inspeção escolar aos moldes de supervisão,” principalmente nos
sistemas de ensino que tinham menos professores leigos, devido ao seu maior
desenvolvimento econômico, com intuito de estabelecer a de inspeção nos estabelecimentos
de ensino privado que optavam pela jurisdição estadual.
Consideramos que os pontos levantados por este documento do MEC (1974),
demonstram que as questões administrativas voltam a ser agregadas à função do Inspetor
ou Supervisor, após a promulgação da 4.024/61, tornando seu local de atuação o principal
fator de distinção entre estes especialistas.
Situar a supervisão num órgão central, coordenador do funcionamento
do ensino de 1º e 2º grau, e superior e supletivo, quando é o caso;
Situar a supervisão em nível do órgão administrativo central do ensino
de 1º grau.
A grande incidência recai na segunda opção, adotada por 20 das 24
unidades federadas abrangidas pelo estudo. Apenas quatro não subordinam a
supervisão ao órgão específico de 1º grau o que leva a crer que o serviço nas
20 unidades restantes só se envolve com o ensino deste nível, podendo esta
realidade resultar de haver sido a supervisão, originariamente, destinada ao
antigo ensino primário.
Qualquer que seja a subordinação, em nível do órgão central, evidencia-
se, no quadro brasileiro, que a supervisão se efetiva no âmbito das Secretarias
de Educação, das regiões educacionais (Delegacias, Núcleos, etc.), dos
municípios e das escolas. Na região nordeste, a maior concentração é de
supervisão nas Secretarias de Educação e em regiões educacionais, enquanto
na região sudeste todos os Estados mantêm supervisores nas escolas. A maior
incidência, sem dúvida, é a de supervisores na Secretaria de Educação, o que
ocorre nas 27 unidades brasileiras - Territórios, inclusive (MEC, 1974)
Dentro desta perspectiva, entendemos que a implementação do cargo de
Supervisor de Ensino passa pela racionalização da estrutura administrativa do processo
educativo, presente no Brasil desde início do século XX, mas que, segundo Saviani
46
(2002:30), foi oficialmente assumida pelo Estado Brasileiro a partir de 1969, passando a
envolver o planejamento sob o controle dos “técnicos supostamente habilitados”.
Planejamento regional e planejamento nacional surgem, assim, como
condições de seguro processo, ou de desenvolvimento nacional, pois que,
tão-somente por estudos desse gênero, poderão ser devidamente
aclaradas as relações entre estrutura administrativa e a estrutura técnica
nos serviços da educação de um país. (LOURENÇO FILHO, 1952:66)
F) REGIME MILITAR
Em 1964, os militares intervêm por quase vinte e quatro anos no Estado brasileiro,
trazendo um regime autoritário modernizador, burocrático e capitalista, promovendo a
reforma administrativa de 1967 consubstanciada no Decreto-Lei 200, que procurou,
segundo Bresser Pereira (2001), substituir a administração pública burocrática por uma
administração para o desenvolvimento.
Da edição do Decreto-Lei nº 200 até 1979, a reforma desenvolvimentista foi
conduzida principalmente pela Subsecretaria de Modernização e Reforma Administrativa,
do Ministério do Planejamento. Segundo Bresser Pereira (2001) durante a década de 1970,
a SEMOR promoveu revisões periódicas da estrutura organizacional existente e examinou
projetos encaminhados por outros órgãos públicos, visando além de instituir novos
programas, desenvolver recursos humanos para o sistema de planejamento.
Nos parâmetros da Reforma de 1967, o conceito de “carreira” manteve-se limitado
aos escalões inferiores, enquanto os cargos de direção superior passavam a ser preenchidos
a critério da Presidência da República.
Em síntese o Decreto-Lei 200 foi uma tentativa de superação da rigidez
burocrática, podendo ser considerado como um primeiro momento da
administração gerencial no Brasil. A reforma, teve, entretanto, duas
conseqüências inesperadas e indesejáveis. De um lado, ao permitir a contratação
de empregados sem concurso público, facilitou a sobrevivência de práticas
clientelistas ou fisiológicas. De outro lado, ao não se preocupar com mudanças
no âmbito da administração direta ou central, que foi vista pejorativamente como
‘burocrática’ ou rígida, deixou de realizar concursos e desenvolver carreiras
de altos administradores (BRESSER PEREIRA, 2001) grifos nossos
47
Neste contexto, foi aprovada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
5692/71, que introduziu uma mudança estrutural na educação, ao estabelecer a reforma do
ensino do 1º e 2º graus, unificando o chamado ensino primário e o ginasial em um só nível,
ampliando a obrigatoriedade escolar para oito anos, dentro da faixa etária dos sete aos 14
anos. Dessa forma, a lei eliminou o exame de admissão e conferiu como objetivo
primordial, a habilitação profissional ao ensino secundário.
Essa reformulação educacional também tinha o objetivo de atender à chamada
“retomada econômica” implementada pelos militares, que exigia um aumento geral da
escolaridade do trabalhador que atendesse às exigências da industrialização crescente,
desenvolvesse a capacidade de aquisição de algum treinamento e também que introduzisse
o indivíduo nas técnicas de produção.
Romanelli (2006) chama atenção para o fato de ser a primeira vez no Brasil que o
Estado se impõe a tarefa de organizar a educação com base em sua política de
desenvolvimento econômico. Nesse sentido, a racionalização, a eficiência e a produtividade
tornaram-se valores absolutos na reforma do ensino de 1º e 2º grau. Conseqüentemente,
através de uma pretensa neutralidade técnica fortalecia-se, uma estrutura de poder pautada
na decisão de poucos, reforçando o controle político e pedagógico das instituições
educacionais.
Assim, os Estados viram-se obrigados a propiciar condições para a implantação da
reforma de ensino, tornando a supervisão um importante instrumento para a efetivação e
acompanhamento da nova proposta educacional.
O Departamento de Ensino Fundamental, do Ministério da Educação e
Cultura – DEF/MEC, atendendo ao proposto no Plano Setorial de
Educação e Cultura - Projeto 27 – Assistência Técnica aos Estados,
Territórios e Distrito Federal, partiu para uma programação de assistência
às Unidades da Federação na implantação e implementação da Reforma
de ensino de 1º grau. Dentre as estratégias estabelecidas pelo DEF em
atendimento ao disposto do mencionado Projeto coloca-se a de fazer da
Supervisão um mecanismo básico capaz de realizar o
acompanhamento, controle e avaliação das novas propostas
curriculares a serem implantadas nos diferentes sistemas de ensino de
1º grau. Nesse sentido, como uma providência primeira e de grande
importância, surgiu a necessidade de se configurar a Supervisão existente
como trabalho indispensável ao estabelecimento de novas diretrizes de
48
ação supervisora para o ensino de 1º grau. (BRASIL/MEC, 1976 - grifos
nossos)
Dessa forma, a supervisão de ensino passou a ser discutida e organizada pelos
órgãos oficiais, como se pode verificar no 1º Relatório publicado pelo MEC em 1976,
elaborado pelo “Subprojeto Melhoria dos Serviços de Supervisão dos Sistemas de Ensino,
do Centro de Recursos Humanos João Pinheiro – integrante do Projeto de
Acompanhamento da Implantação e implementação da Lei 5.692/71 – Ensino de 1º grau”.
Este levantamento, de acordo com o documento, foi realizado em nível de Secretaria da
Educação, em todo país, por assessores técnicos do referido projeto, no ano de 1973.
O Relatório e suas análises delinearam-se o seguinte perfil da Supervisão de Ensino
no país, neste período:
a) Não há uma política definida de Supervisão, mesmo considerando a
orientação dada pelo extinto Programa de Aperfeiçoamento do Magistério
(atendimento ao leigo).
b) Não há uma linha geral em relação às funções e atribuições do
supervisor, o que foi constatado pela grande variedade de funções e atribuições
mencionadas nas entrevistas.
c) Não há qualificação adequada do supervisor, em decorrência da
indeterminação de suas funções e atribuições. Não se pode precisar se o
número de supervisores existente, no País é ou não suficiente para o
desempenho da Supervisão, uma vez que não foi definido o tipo de trabalho a
ser realizado nesse campo.
d) Não se tem controle da relação Supervisão e produtividade do ensino,
a ausência de um sistema eficaz, coerente de avaliação impede o conhecimento
da própria produtividade da Supervisão.
e) Não se pode afirmar que os planejamentos apresentados do trabalho de
Supervisão sejam adequados à realidade, pela deficiência do fluxo de
informações e ausência de dados constatados nas Unidades da Federação.
f) O levantamento revela condenação dos supervisores nas Capitais e
centros mais desenvolvidos, deixando de lado, talvez, localidades de maior
carência.
g) Há evidência de que a Supervisão é exercida em todas as Unidades
Federadas, com regulamentação anterior ou posterior à Lei 5.692/71,
regulamentação essa que varia desde leis até a simples aprovação de
planejamentos anuais.
h) A carência de dados nas Secretarias de Educação das Unidades
Federadas dificultou
Uma caracterização mais realista da Supervisão de Ensino de 1º Grau, no
País. (BRASIL,MEC, 1976)
49
Sugestão dos Pontos Fundamentais para elaboração de um modelo de supervisão
nacional:
Prevê a supervisão inserida em sistema mais amplo, incluindo sistemas
menores.
Define operacionalmente os objetivos da supervisão.
Busca a otimização do todo - equilíbrio e unidade, que constituem
suportes importantes para a consecução do objetivo geral.
Constitui-se de estrutura (do ponto de vista estático) e processo (do
ponto de vista dinâmico).
Especifica funções, define limites da ação supervisora, garantindo a
interdependência de suas partes.
Prevê a avaliação tanto do processo como do produto, estabelecendo
fluxo e refluxo de informações para realimentação do sistema.
Prevê controle centralizado e execução descentralizada
Diversidade de âmbitos para efeito de ação e tratamento de dados.
Prevê interfaces com outros sistemas.
Determina a avaliação em termos de eficácia e eficiência.
Abrange toda a rede escolar da Unidade Federada, direta ou
indiretamente
Estratégias diversificadas. (BRASIL,MEC, 1976)
Faz previsão orçamentária.
Busca o melhor aproveitamento possível de recursos humanos, físicos e
materiais, visando a otimização de resultados.
É investimento - visa retorno: relação custo/benefício.
Prevê coerência entre exigências em relação ao supervisor (qualificação,
jornada de trabalho e produtividade) e condições (remuneração,
recursos físicos e materiais).
Visa à rentabilidade - custo/aluno. (BRASIL,MEC, 1976)
50
Prevê engajamento de pessoas e coesão de grupo.
Preconiza liderança emergente.
Prevêem a utilização adequada de métodos básicos, técnicas apropriadas
a cada caso e pessoa: método diretivo, não diretivo e eclético, favorecendo a
criatividade. (BRASIL,MEC, 1976)
Visa à valorização do pessoal envolvido: titulação específica,
treinamento, específico, aperfeiçoamento e atualização constantes.
Estabelecem direitos e deveres.
Prevê equilíbrio entre remuneração do trabalho e qualificação do pessoal
envolvido. (BRASIL,MEC, 1976)
Visa à implementação da Proposta Curricular.
Objetiva melhorar a atuação do professor sem criar dependência.
(BRASIL,MEC, 1976)
Prevê compatibilização com a realidade.
Possibilita progressividade de implantação. (BRASIL,MEC, 1976)
51
Numa rápida análise do relatório, percebe-se que tanto seu teor quanto a forma de
apresentação são coerentes aos princípios tecnicistas, que tem como pressuposto a
neutralidade científica inspirada nos princípios da racionalidade, eficiência e produtividade
(SAVIANI, 1985). Nesta perspectiva, o governo militar de 64 transferiu a técnica de
planejamento da política estatal para a educação, procurando estruturá-la como uma
organização racional, colocando a modernização como expressão, tanto de integração como
de dominação.
Internamente, ela aciona mecanismos mais eficientes de controle, quer no
setor da administração pública, quer no setor da administração privada,
enquanto compartimentaliza a produção e o trabalho em qualquer âmbito
interno e externo, eliminando ou diminuindo os perigos da integração social
dos trabalhadores e a visão crítica do conjunto do sistema produtivo
(ROMANELLI, 2006)
Se nas décadas de 60 e 70 predominou a ânsia pelo desenvolvimentismo econômico
aliado à crença do planejamento central, após 1964, essa metodologia passa a ser utilizada
como instrumento fundamental para o controle praticado pelo regime militar, onde o
planejamento passa a ser bandeira altamente eficaz para o controle e o ordenamento de
todo o sistema educativo (GARCIA, 1990 apud Oliveira, 2002)
Nesse sentido, encontramos ao final deste relatório, uma proposta de
regulamentação da profissão do supervisor escolar. Logo na introdução desta proposta, há a
preocupação de esclarecer que a denominação Supervisão Escolar deve ser compreendida
da mesma forma da adotada pelo Parecer nº 252/69, que trata das Habilitações do
Especialista da Educação.
O mesmo documento ainda destaca que a institucionalização da Supervisão Escolar
no Sistema Educacional Brasileiro é um fenômeno recente, que vem atender às exigências
de pessoal especializado que dinamize a função pedagógica dos Sistemas Estaduais de
Ensino. Em seguida, preocupa-se em diferenciar a supervio da inspeção escolar,
atribuindo exclusivamente à inspeção o caráter fiscalizador. (BRASIL,MEC, 1976)
Destaca que a Lei 5.692/71, em seu artigo 33, mantém a distinção entre Supervisão
e a Inspeção quando dispõe que: “a formação de administradores, planejadores,
52
orientadores, inspetores, supervisores e demais especialistas da educação será feita em
curso superior de graduação, com duração plena ou curta, ou pós-graduação.”
A proposta de regulamentação do cargo de supervisor apresenta a seguinte forma as
áreas de atuação do supervisor escolar:
O Supervisor Escolar terá como áreas de ação: o Currículo, o subsistema
Ensino-Aprendizigem e o Processo Educacional.
A — Na área de Currículo, a atuação do Supervisor será em Órgãos de
Coordenação do Sistema Educacional (em nível Federal, Estadual ou
Municipal) e em Unidades Escolares (nos diferentes graus e modalidades de
Ensino).
1. Nos Órgãos de Coordenação do Sistema Educacional, serão de sua
competência:
• Planejamento da implementação do Currículo;
• Coordenação da execução das Diretrizes Curriculares;
• Acompanhamento e avaliação das Propostas de Currículo das Unidades
Escolares.
2. Nas Unidades Escolares, serão de sua competência:
• Coordenação de Planejamento Curricular;
• Acompanhamento das atividades curriculares;
• Avaliação do Currículo.
B - Na área do subsistema Ensino-Aprendizagem, a atuação do Supervisor
será em Unidades Escolares de todos os graus e modalidades de ensino.
Serão de sua competência:
• Planejamento, coordenação, acompanhamento e avaliação do sistema;
• Treinamento em serviço, do Pessoal Docente.
C - Na área do Processo Educacional, a atuação do Supervisor será em
Órgãos de Coordenação do Sistema Educacional (em nível Federal, Estadual
ou Municipal).
Serão de sua competência:
• Participação no planejamento e na avaliação do sistema educacional;
• Coordenação e acompanhamento do processo educacional;
• Coordenação do Sistema de Supervisão;
• Avaliação do Sistema de Supervisão;
• Participação no treinamento de Supervisores e Professores.
Compete ainda ao Supervisor:
• Desenvolver atividades integradas com os demais Especialistas que
atuam no campo educacional;
• Assessorar os órgãos Superiores nas decisões educacionais;
• Participar de atividades, junto a Empresas e Instituições sociais que
visem integrara Escola no meio-ambiente;
• Prestar cooperação técnica em Supervisão a órgãos nacionais, estaduais
• Desenvolver atividades profissionais em outras instituições públicas ou
particulares. (MEC: 1976)
53
No estado de São Paulo, segundo o Sindicato dos Supervisores do Estado de São
Paulo – APASE, a figura oficial do Supervisor aparece no Estatuto do Magistério – Lei
Complementar nº114 de 13 de novembro de 1974. Posteriormente, nos Decretos 5.596/75 e
7.510/76 são definidas as atribuições desse especialista. A denominação “Supervisor de
Ensino”, segundo o Sindicato, só seria efetivamente adotada na Lei Complementar 201/78.
O Sindicato de Supervisores de Ensino do Magistério Oficial – APASE foi criado
em novembro de 1981, inicialmente como Associação Paulista de Supervisores de Ensino,
transformando-se em sindicato nos anos de 1990.
Como princípio, o Sindicato dos Supervisores de Ensino do Magistério
Oficial no Estado de São Paulo, é organização sindical de 1º grau a nível
estadual, autônomo, apartidário, sem fins lucrativos, democrático,
comprometido com a defesa dos interesses dos Supervisores de Educação do
Magistério Oficial do Estado de São Paulo e lutará pela melhoria salarial e
condições de trabalho engajado no processo de transformação da sociedade na
direção da democracia. (APASE, 2008)
No Estado de São Paulo, as competências da supervisão de ensino seriam
determinadas pela Lei Complementar 744/93, artigo 9º, para a qual o supervisor deveria:
I - exercer, por meio de visita aos estabelecimentos de ensino, a supervisão e a
fiscalização das unidades escolares incluídas no setor de trabalho que lhe for
atribuído, prestando a necessária orientação técnica e providenciando a correção de
falhas administrativas e pedagógicas, sob pena de responsabilidade;
II - realizar estudos e pesquisa visando ao desenvolvimento do sistema de ensino.
G) NOVA REPÚBLICA
As conquistas democráticas da sociedade brasileira foram especialmente marcantes
para a educação pública na década de 80, porque propunham mudanças em sua gestão e
organização.
Com a democracia, o poder volta a descentralizar-se para os estados da federação e
municípios. Os governadores dos estados recuperam o poder e ao mesmo tempo, os
prefeitos surgem como novos atores políticos relevantes.
54
Em 1984, apesar da mobilização popular reivindicar o retorno das eleições diretas, a
presidência do país continuou sendo definida de forma indireta. Mas em 1986, os
congressistas eleitos foram convocados na condição de constituintes para elaborarem a
nova Constituição, que foi aprovada em cinco de outubro de 1998.
Considerada por muitos como “Constituição Cidadã” devido à sua condução
democrática, e aos seus princípios baseados na autonomia e flexibilidade, Bresser Pereira
via na Constituição de 1988, um retrocesso burocrático.
Em síntese, o retrocesso burocrático ocorrido no país entre 1985 e 1989
foi uma reação ao clientelismo que dominou o país naqueles anos, mas
também foi uma afirmação de privilégios corporativistas incompatíveis com o
ethos burocrático. Foi, além disso, uma conseqüência de uma atitude defensiva
da alta burocracia, que, sentido-se acuada, injustamente acusada, defendeu-se
de forma irracional. O resultado foi o desprestígio da administração pública
brasileira, não obstante o fato de que esta seja majoritariamente formada por
profissionais competentes, honestos e dotados de espírito público. (BRESSER
PEREIRA, 2001:21)
Em relação à educação, a nova Constituição prescreve no inciso V do art. 206, os
princípios pelos quais a educação escolar deve ser ministrada no país, determinado a
valorização dos profissionais do ensino, garantindo planos de carreira para o magistério
público, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de
provas e títulos.
Após a Constituição de 1988, consolida-se o entendimento de que a
questão da desvalorização do magistério é um processo nacional, que não pode
ter soluções locais, necessariamente parciais e de difícil expansão para o
conjunto do País. Ao mesmo tempo, passa-se a compreender a valorização
profissional do magistério como condição para a garantia de um padrão de
qualidade da educação pública no Brasil (BRASIL, MEC/FUNDESCOLA,
1999)
Dessa forma, o debate sobre a valorização do magistério em nível nacional
centralizou-se no Poder Legislativo, nas discussões realizadas durante a tramitação do
projeto da nova lei de diretrizes e bases da educação, que desde a versão original
55
apresentada em 1988 até sua aprovação em 1996, apresentou dispositivos sobre os
profissionais da educação, referentes à formação e carreira do magistério público.
(...) a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394 de
20 de dezembro de 1996, retomando o texto constitucional, dispõe (art.67) que
os sistemas de ensino devem assegurar estatutos e planos de carreira para o
magistério público e define, em seis incisos desse artigo, diretrizes que esses
planos devem concretizar. (BRASIL,MEC/FUNDESCOLA, 1999)
Assim, observa-se que a nomenclatura “profissionais da educação”, que começou a
ser usada a partir do surgimento das idéias da escola renovada dos anos de 1915, passa a ser
utilizada como conceito que ajudará a definir um novo modelo de gestão do ensino público
e dividir a administração dos recursos e das responsabilidades dos órgãos centrais para os
locais.
Nesta perspectiva, a Resolução nº03/97 da Câmara de Educação Básica define que
são os profissionais da educação são aqueles que exercem a docência e os que oferecem
suporte pedagógico direto a tais atividades, que de acordo com o artigo 64 da Lei 9394/96,
atuam na administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional.
O documento do MEC/FUNDESCOLA (1999) preocupa-se em apontar e
diferenciar as variantes decorrentes do termo “profissionais da educação”:
Trabalhadores em educação: conjunto de servidores que atuam na
educação, nas instituições de ensino e órgãos da educação em atividades-fim
ou atividades-meio necessárias ao funcionamento do sistema de ensino;
incluem o magistério e o pessoal de apoio e técnico administrativo, como
motoristas, vigias, serventes, merendeiras e o pessoal de apoio e técnico-
administrativo, como motoristas, vigias, serventes, merendeiras, secretários de
escola, assim como profissionais de nível superior, por exemplo,
bibliotecários, psicólogos e nutricionistas;
Profissionais da educação ou magistério
: profissionais que exercem a
docência e as atividades de suporte pedagógico direto à docência, incluindo,
portanto docentes e os profissionais de administração, supervisão, inspeção e
orientação educacional;
Docentes:
profissionais da educação no exercício da docência, sendo a
palavra professores e a expressão profissional do ensino, em alguns textos,
utilizadas como sinônimo de docentes. (BRASIL, MEC/FUNDESCOLA,
1999:18)
56
O documento MEC/FUNDESCOLA procura reforçar que as diretrizes da
Resolução nº3 do Conselho Nacional de Educação não são extensivas a todos os
trabalhadores da educação, devendo ser excluídos da carreira do magistério o pessoal de
apoio e técnico administrativo, como secretários de escola ou aqueles servidores que
integram os cargos relativos aos servidores em geral.
Nesse sentido, a nova LDB, ao definir os princípios e fins da educação retoma as
questões sobre a valorização dos profissionais do ensino e gestão democrática do ensino
público, já mencionadas no artigo 206 da Constituição Federal.
A Lei 9394/96 procura esclarecer nos artigos 14 e 15, no capítulo que trata sobre a
organização da educação nacional, os princípios da gestão democrática, delegando aos
municípios a competência de organizá-la tendo em vista:
A participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto
pedagógico da escola, assegurando às unidades escolares públicas,
progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão
financeira, observadas às normas gerais de direito financeiro público.
(BRASIL,MEC, 1971)
Nesta perspectiva, a supervisão de ensino passa de um contexto político
centralizador e autoritário, de inspiração tecnicista, para assumir, com a redemocratização
do país, uma postura mais construtiva, coerente aos princípios democráticos da educação
proclamados tanto pela Constituição quanto pela nova LDB.
A Supervisão Educacional compõe a gestão democrática da educação. Ela
é responsável pelo “controle” das políticas educacionais que necessitam ser
desenvolvidas com qualidade e construídas coletivamente no espaço escolar. A
Supervisão Escolar é responsável pela formação humana que se realiza na
escola. (FERREIRA, 2007)
Assim, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, depois de um recesso de
sete anos sem a realização de concurso público para supervisor de ensino, publica
comunicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo no dia 30 de julho de 2002,
definindo “novo perfil” para a ação supervisora.
Observa-se que a abertura desse concurso pode ser considerada como um marco
para a supervisão estadual, porque significava o fortalecimento da categoria no sentido de
57
que seus quadros voltariam a ser preenchidos por concurso público, terminando o período
em que as vagas ociosas eram preenchidas por indicações. A reação do Sindicato dos
Supervisores do Estado é expressa no editorial do jornal da categoria, por sua presidente,
Maria Clara Paes Tobo, que declara:
Os pessimistas e os oportunistas de plantão, todos aqueles que queriam
ver o fim da Supervisão de Ensino em nosso Estado, ou transformá-la em
cabide de empregos para seus nefastos apadrinhados, foram derrotados...
A supervisão de ensino, em nível de sistema, sendo função de estado,
deve ser exercida por funcionários que não dependam dos que estão
passageiramente no poder, para efetivamente, servir ao público, aos alunos,
aos pais e à sociedade, tendo por norte a efetivação da política da política
educacional prevista em nossa Constituição e na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional.
Vitória da Escola Pública que anseia por ensino de boa qualidade, que
atenda a todos os cidadãos brasileiros em seus interesses, necessidades e
possibilidades.
A história dos Supervisores e de sua organização representativa tem
comprovado a luta profissional compromissada com a construção de uma
sociedade mais democrática, em que a escola pública seja efetivamente
valorizada. (TOBO, 2002)
O novo perfil da supervisão de ensino, comunicado realização pela Secretaria de
Estado da Educação, no período da abertura do concurso de 2002, define o supervisor como
elemento articulador e mediador entre as políticas e as propostas pedagógicas
desenvolvidas em cada uma das escolas das redes pública e privada. Esclarece que como
membro de Equipe de Supervisão, que compõe a estrutura básica da instância regional
(Diretoria de Ensino), é partícipe da definição de políticas públicas educacionais referentes
à educação básica e educação profissional, atuando junto aos órgãos formuladores dessas
políticas, em nível central, regional e local. Considera o supervisor de ensino co-
responsável pela qualidade do ensino oferecido pelas escolas, resultante da implementação
das políticas educacionais centrais, regionais e locais. (SÃO PAULO,SE, 2002b)
Com a definição do novo perfil do supervisor de ensino, a supervisão estadual viu-
se obrigada a desenvolver uma prática coerente aos princípios da gestão democrática
preocupando-se em realizar adequações da ação supervisora aos princípios adotados pela
LDB e Constituição Federal.
58
Dentro desta perspectiva encontramos no suplemento do Jornal da APASE (2004)
uma proposta de ação supervisora, apresentada pelos Supervisores de Ensino do Estado de
São Paulo, Moura e Silva & Luz, de como definir os objetivos e metas a partir da
elaboração de um “planejamento estratégico da escola”, elaborado de forma participativa
pela comunidade escolar e posteriormente apresentado a equipe de supervisão, a quem
caberia propor diferentes encaminhamentos, subsidiando a elaboração de projetos imediatos
e reelaborando os Planos das Escolas e das Diretorias de Ensino.
A figura 3, segundo Moura e Silva & Luz (2004) representa o supervisor, o qual
viabiliza mudanças ao mesmo tempo que exerce função reguladora do sistema, tendo em
vista a correta aplicação das normas gerais, leis, decretos, resolões, deliberações, da
educação nacional e estadual, se responsabilizado de compatibilizar o papel de profissional
facilitador da tomada de decisões em diferentes níveis do sistema, com a função de
estimulador das organizações.
Figura 3 – Os processos interativos e articuladores da ação supervisora
59
3. CONCLUSÃO
Em síntese, ao longo deste capítulo, percebemos que o desenvolvimento da
supervisão de ensino não pode ser analisado de forma isolada, mas como parte integrante
da estrutura escolar, constituída por uma organização legal e burocrática.
Vimos também que no Brasil se desenvolveu uma dominação burocrática
patrimonial imperial que foi determinante no desenvolvimento do estado burocrático
moderno, responsável pelo o desenvolvimento da intenção, no final do século XIX, do
estabelecimento de um sistema de ensino.
Esta preocupação com a organização mais sistematizada do ensino, detectada em
diferentes províncias, resultou na presença do inspetor escolar, sempre nomeado pelo
Estado, tornando-se o responsável pelo controle dos aspectos pedagógicos e da educação
organização das escolas.
Agregado ao controle surgiu a necessidade do registro. Assim, chamamos a atenção
para os registros do Inspetor Abílio Cesar Borges, onde encontramos de forma detalhada,
situações e minúcias da educação da época, permitindo a reconstrução em diferentes
matizes e sentidos dos cenários da educação do período.
Conservando-se ainda os elementos da velha aristocracia, a Revolução de 30
formou um Estado autoritário e burocrático em uma sociedade em que o capitalismo
industrial estava emergindo.
Neste período destacou-se a reforma burocrática brasileira de 1936, orquestrada por
Vargas, que se consolidou com a criação do DASP (Departamento Administrativo do
Serviço Público), que passou a ser seu órgão executor.
Assim, formou-se um contexto favorável na educação, para a constituição de um
aparato burocrático próprio e autônomo formado por profissionais que possibilitassem o
crescimento da rede educacional, mediante estratégias que permitiram superar as
influências de caráter patrimonialista.
A partir desse momento, percebe-se que a necessidade da criação e o
desenvolvimento de um sistema de ensino exigia órgãos formuladores e planejadores de
60
políticas para a educação, capazes de articular os diferentes elementos e instituições
responsáveis pelos diferentes aspectos envolvidos no problema.
Nesse sentido, a supervisão de ensino, torna-se uma função de estado, com
condições técnicas e responsabilidade para realizar análise de problemas, estudo de
soluções, viabilidade técnica e financeira de programas e projetos educacionais, em todos
os níveis de ensino.
Dessa forma, sabe-se que para ser constituir e institucionalizar um sistema de ensino
é necessário a existência de unidades escolares próprias, mas também se deve contar com
órgãos capazes de prover estudos para o desenvolvimento das condições de ensino nessas
unidades.
61
C
APÍTULO III
M
ODERNIZAÇÃO, RACIONALIZAÇÃO E MUNICIPALIZAÇÃO EM SÃO PAULO
1.
INTRODUÇÃO
Como pudemos constatar nos capítulos anteriores, no Brasil o desenvolvimento do
capitalismo teria seguido uma linha política diversa do modelo considerado típico do
capitalismo ocidental, e, portanto não teria desenvolvido estruturas políticas, econômicas e
administrativas características do liberalismo clássico, que teria sua forma de legitimação
na concepção moderna de Estado burguês de direito. Segundo a concepção de Weber, o
desenvolvimento de uma racionalidade formal, no ocidente, teria levado à constituição do
Estado burguês de direito, fundamentado na liberdade individual garantida por um sistema
legal que representaria a vontade geral.
Observamos que para Faoro, no caso brasileiro estaríamos diante de um sistema
hibrido, o qual denomina de capitalismo politicamente orientado, baseado na racionalidade
e na técnica, todavia estruturado a partir de uma comunidade política, que conduz comanda
e supervisiona os negócios públicos. O Estado é concebido como um aparelho que permite
explorar e manipular a matéria pública e social de acordo com os fins estabelecidos pela
comunidade política, obedecendo aqui, portanto, a uma racionalidade substantiva. Estas
características do capitalismo politicamente orientado teriam gerado uma forma de poder
institucionalizada - o patrimonialismo estatal - que tem dado orientação política ao
capitalismo no Brasil, obedecendo aos interesses dos quadros administrativos.
O patrimonialismo teria caracterizado as relações políticas que determinaram a
formação do Estado brasileiro. O processo que desde a colonização portuguesa levou a
formação das elites e das instituições políticas, foi constituído por relações patrimonialistas
aliadas a um estilo burocrático que favoreceu a centralização administrativa e subordinou a
sociedade civil através de relações de poder paternalistas, a um Estado que se apresenta
como provedor. Foram inibidos os processos que permitiriam a participação política da
maioria da população e a democratização das decisões.
Neste capitulo trataremos das tentativas de modernização que teriam caracterizado a
reforma da educação paulista a partir de 1995. Baseada na critica ao patrimonialismo e na
62
ineficiência da administração pública, a reforma educacional levada adiante pela Secretaria
de Estado da Educação de São Paulo teria adotado a forma e as estratégias propostas por
Bresser Pereira, quando ministro da Reforma do Estado. Por esse motivo, nos
debruçaremos inicialmente sobre os principais aspectos da reforma paulista para, em
seguida, situar a municipalização neste processo. Em relação ao estudo da municipalização,
apresentaremos um breve histórico dos precedentes deste processo no Brasil. Finalmente
trataremos da municipalização em São Paulo.
Cabe aqui lembrar que Bresser Pereira, como já se pode constatar nos capítulos
anteriores, considera que um dos principais problemas da administração pública brasileira é
a permanência das relações patrimonialistas e clientelistas.
A reforma do Estado que propôs adequar as estruturas administrativas brasileiras
aos padrões de racionalidade técnica dos países capitalistas de primeiro mundo. Neste
mesmo sentido, as reformas promovidas na educação, neste período, seguem os moldes de
padronização e homogeneização proposto pelos organismos multilaterais para elevar a
eficiência e a eficácia do sistema de ensino
2.
APONTAMENTOS SOBRE AS CONCEPÇÕES DE MODERNIZAÇÃO E RACIONALIZAÇÃO:
A POLÍTICA
EDUCACIONAL PAULISTA A PARTIR DE 1995
A partir da análise de uma série de documentos relativos à política educacional
estabelecida pela Secretaria de Educação de São Paulo desde 1995, destacaremos a seguir
os aspectos mais importantes das mudanças administrativas e que teriam apresentado
reflexos no processo de municipalização: a racionalização organizacional e a mudança nos
padrões de gestão.
Pretendemos demonstrar que um dos aspectos fundamentais dessa política seria a
reforma gerencial, caracterizada por uma administração pública orientada por resultados,
pela descentralização, flexibilidade, competitividade e por um direcionamento estratégico.
Neste sentido, a reforma educacional, cuja finalidade seria melhorar o desempenho da
escola, deve ser compreendida como uma reestruturação gerencial, fundamentada na
revisão das concepções de gestão, planejamento e avaliação.
Nos documentos oficiais são apresentados os aspectos reconhecidos pela Secretaria
63
de Educação de São Paulo como crucial para a reforma gerencial da educação no Estado de
São Paulo.
A reforma gerencial da educação tem constituído um dos principais aspectos dos
programas de formação de professores e gestores da Secretaria de Educação do Estado. O
problema é apresentado da seguinte forma: O mundo de hoje se caracteriza pela contínua
modernização produtiva, isto é, pelas inovações tecnológicas permanentes e pelo
surgimento de novos processos de organização do trabalho e gerência. A globalização teria
levado à abertura dos mercados internos, à concorrência internacional e exigiu a
modernização administrativa do Estado e das demais instituições sociais. A educação
deveria acompanhar esse processo de modernização com uma contínua renovação dos
processos de produção, veiculação e acesso aos conhecimentos utilizando as novas
tecnologias.
Nestes termos, para que ocorra uma modernização da educação deve também ocorrer
a uma reorganização no processo de trabalho educacional e uma reforma, de caráter
gerencial, na administração escolar. Essa reorganização deveria ser uma reforma realizada
segundo os termos propostos em 1995 pelo então ministro Luiz Carlos Bresser Pereira no
Plano Diretor da Reforma do Estado do extinto MARE
1
. Segundo Bresser Pereira, o
objetivo da reforma do Estado seria substituir o atual modelo de administração pública de
caráter burocrático, com influências de práticas clientelistas e patrimonialistas, por um
novo padrão de administração gerencial, que adotaria os princípios da nova gestão pública
(new public management). (BRESSER PEREIRA, 1999:6)
Segundo Bresser Pereira a Constituição de 1988 teria promovido um retrocesso
burocrático, que teria resultado em um encarecimento da máquina administrativa tanto no
que se refere a gastos com pessoal como bens e serviços e um enorme aumento da
ineficiência dos serviços públicos. (Pereira, 1995:1) Bresser Pereira recusa o modelo
administrativo adotado pelos constituintes por ser uma versão burocrática- subdesenvolvida
com ranços nacional-desenvolvimentista, protecionista e estadista, herdeiras do
1
Em 1995, Luiz Carlos Bresser Pereira, à frente do Ministério da Administração e Reforma do Estado
apresentou o Plano Diretor da Reforma do Estado que constituiu a base para as reformas administrativas da
União e dos estados.
64
keynesianismo, concepção que considera falida e que, no caso brasileiro, teria resultado na
elevação dos gastos públicos aprofundando a crise fiscal.
Para Bresser Pereira, os dispositivos sobre a administração pública na Constituição de
1988 teriam sido o resultado deliberado do esforço dos grupos burocráticos para que se
adotassem os princípios administrativos públicos ultrapassados: hierárquica funcional
rígida; pouca distinção entre administração direta e indireta; regime jurídico único dos
funcionários da União e em cada nível da federação. Apoiados em estratégias clientelistas
tradicionais, esses grupos burocráticos teriam aproveitado, para estabelecerem para si,
privilégios como a aposentadoria com vencimentos plenos sem qualquer relação com o
tempo e valor das contribuições e estabilidade adquirida quase que automaticamente a
partir do concurso público. (Riscal, 2003)
Era necessário, para Bresser Pereira, pensar-se uma nova forma de administração
pública, capaz de enfrentar os problemas relativos ao ajuste fiscal e de reduzir a máquina
administrativa sem deixar, entretanto, de atender às crescentes demandas sociais. (Riscal,
2003)
Segundo o autor do Plano Diretor da Reforma do Estado, a nova concepção de
administração gerencial lhe teria sido surgida pelos trabalhos de Osborne e Gaebler (1992),
Reinventando o Governo e de suas concepções uma nova administração pública.
Seguindo os preceitos desta nova concepção de administração pública, a
reforma da administração constituiria na verdade uma reforma gerencial,
prevendo, entre outras providências, a reorganização das ações estatais. Esta
reorganização teria, como seu aspecto fundamental a modernização do sistema,
que deveria ser adaptado às mudanças exigidas pelo mundo globalizado. Neste
sentido, a reforma administrativa de Bresser Pereira visaria a superação da
antiga ordem burocrática patrimonialista tradicional, apontada por autores
como Raymundo Faoro, Fernando Uricoechea entre outros. Tratar-se-ia,
portanto da transformação de instituições culturais arraigadas no hábito
administrativo brasileiro, por meio de uma mudança no agir administrativo.
Pretendia Bresser, portanto, avançar em direção a modernização econômica,
mediante uma reforma administrativa, que permitiria ao Brasil competir no
campo do capitalismo avançado. Para tanto, deveriam se estabelecer estruturas
de natureza liberal segundo a racionalidade formal. (Riscal, 2003)
65
3.
A REFORMA GERENCIAL DA EDUCAÇÃO EM SÃO PAULO
A política educacional definida pela Secretaria de Educação de São Paulo desde 1995
tem realizado importantes mudanças no sistema educacional paulista e teria como
finalidade um planejamento eficiente da oferta de vagas por meio de um processo de
racionalização da estrutura administrativa, otimização na gestão dos recursos materiais e
humanos, preparação de quadros tecnicamente preparados, adotando novas estratégias com
a finalidade de otimizar o sistema o que permitiria elevar a cobertura por meio de estruturas
educacionais flexíveis. Tendo em vista esses objetivos, foram estabelecidos três eixos
norteadores: racionalização organizacional, mudança nos padrões de gestão e melhoria na
qualidade do ensino.
Em relação ao primeiro desses eixos, foram promovidas diversas mudanças no
sentido de racionalizar e otimizar o sistema, por meio de um “enxugamento da máquina”, a
qual, passaria a funcionar com uma estrutura mais ágil e eficiente na tomada de decisões e
acompanhamento das políticas educacionais e na informatização dos dados gerenciais
educacionais.
O segundo eixo refere-se a autonomia da escola. De acordo com o discurso oficial,
a autonomia financeira, pedagógica e administrativa das escolas é condição
indispensável para que estas possam transformar-se em centros de aprendizagem e de
difusão de conhecimentos para professores e alunos.(SÃO PAULO, Secretaria de Estado
da Educação, PEC: 2001: 3)
O último dos eixos refere-se à política da valorização profissional do quadro do
magistério, e nesse sentido a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo aprovou em
1997 um novo Plano de Carreira, Vencimentos e Salários, no qual teria procurado eliminar
as distorções incorporando gratificações e abonos ao salário docente bem como
redimensionar a jornada de trabalho, tornando-a mais racional.
Em última instância, os três eixos constituem aspectos de uma mesma estratégia:
racionalização e otimização por meio de redução dos custos com pessoal, materiais, e
espaços físicos, garantidos pelo novo padrão de gestão.
A nova política educacional de São Paulo expressava a intenção de implementar uma
política de expansão de acesso a escola. Era explicitamente afirmada a necessidade de
66
reduzir os elevados índices de reprovação e abandono escolar por meio de uma estratégia
de gerenciamento que incidiria prioritariamente sobre o controle dos resultados em
detrimento da avaliação dos meios.
A universalização e regularização do fluxo do ensino deveriam ser planejadas com
soluções diversificadas, que exigiria um processo distinto do convencional, oferecendo
como alternativas o atendimento à distância e o aprimoramento de estruturas curriculares e
metodológicas adequadas. São adotadas novas estratégias com a finalidade de otimizar o
sistema, que permitiriam aumentar a cobertura por meio de estruturas educacionais
flexíveis que atenderiam diferentes necessidades, correspondendo a uma diversificação e
racionalização dos tipos e nos usos de recursos materiais e humanos.
Por esse motivo a política adotada é de reordenamento da rede, ou seja, a reorganização da
infra-estrutura física e a redistribuição dos recursos humanos, materiais e financeiros,
compra descentralizada de insumos e equipamentos, tais como bibliotecas,
microcomputadores, aparelhos de televisão e videocassete. Deve-se salientar que o próprio
processo de municipalização é introduzido como estratégia para o reordenamento da rede
estadual e como forma de diminuir o seu gigantismo.
As possíveis resistências aos projetos da Secretaria de Educação foram consideradas
posições retrógradas e contrárias à modernização e, por esse motivo seriam
antidemocráticas, pois se oporiam, na verdade à modernização de toda a sociedade.
A modernização é apresentada como o resultado de uma reforma administrativa que
precisa de pessoas com “vontade de mudar”, pessoas cujo entusiasmo seja capaz de trazer
uma nova visão de sucesso
2
. Um novo perfil de gestor, identificado com o modelo de uma
civilização globalizada, que exigira a inserção em um sistema dominado por novas
tecnologias de informação é exigido, como se pode observar no discurso do Secretário da
educação de São Paulo, Gabriel Chalita:
(...) Vivemos uma época ímpar. A era da informação, da tecnologia, da
rapidez dos processos. Presenciamos mudanças e revoluções diárias. O novo
invade nossos lares e nos faz aprender a cada dia. Como educar crianças e
jovens nessa roda-viva? (...) As salas de aula serão páreo para a rapidez e cores
dos games virtuais, dos computadores, dos programas televisivos? Encontrar
as respostas para todas essas questões não será fácil, mas, certamente, teremos
2
Ver texto “A Importância do entusiasmo” que acompanha o texto “Módulo V do Circuito Gestão”.
67
uma busca menos árdua se tivermos em mãos o mapa que nos levará a elas.
Um mapa precioso que indica com certeza de detalhes o caminho do afeto.
(SÃO PAULO, Secretaria de Estado da Educação, Gestão do Projeto
Pedagógico. FDE/Circuito Gestão, 2002)
Os resultados das avaliações comparativas são um dos principais focos da política
educacional como forma de diagnosticar problemas e avaliar o impacto das mudanças, o
que possibilitaria o planejamento de novas estratégias ou a manutenção daquelas cujo
resultado vem sendo satisfatório. Daí a importância atribuída ao Sistema de Informações
Educacionais que constituem sinalizadores da política educacional para cada escola.
Neste contexto pode-se observar que o investimento da Secretaria de Estado de
Educação de São Paulo, no processo de municipalização decorreu e uma política que
pretendia racionalizar o atendimento e os recursos da administração pública.
4.
O PROCESSO DE MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO EM SÃO PAULO
Antes de abordarmos o processo de municipalização em São Paulo, a partir de 1995,
apresentaremos um breve histórico da concepção de municipalização no Brasil. Nossa
intenção é apresentar alguns aspectos, relevantes para este trabalho, desta concepção na
história da educação brasileira, buscando estabelecer as relações entre municipalização do
ensino e as concepções de centralização e descentralização.
Segundo Raymundo Faoro, a centralização administrativa teria sido a principal
estratégia para manutenção do poder nas mãos de uma comunidade política administrativa.
Esta forma de organização teria impedido o desenvolvimento de processos que
possibilitassem a participação política da maioria da população, da mesma forma que teria
vinculado o seu próprio desenvolvimento como grupo dominante, aos interesses capitalistas
internacionais.
O crescente e exclusivo controle da ordem e do aparato governamental subordinou a
sociedade civil um Estado que se apresentou sempre como o provedor da ordem, da justiça
e dos direitos e, acima de tudo, provedor de favores. O Ato Adicional de 1834 à
Constituição de 1824 teria sido um dos primeiros instrumentos de caráter liberal e
68
descentralizador e teve, como verificaremos, importante repercussão na trajetória da
educação brasileira
A) A MUNICIPALIZAÇÃO NO BRASIL
Desde o Império, a problemática da educação municipal no Brasil encontra-se
presente nas discussões políticas e nos textos legislativos relacionados à descentralização
do ensino. O Ato Adicional de 1834, promulgado ainda no período imperial, reforçou o
propósito descentralizador da corrente liberal, representando um empecilho para o
desenvolvimento da instrução pública no país, quando delegou às Províncias, extremamente
carentes, a responsabilidade de organização do ensino primário e secundário.
O Ato Adicional de 1834, que atendia aos propósitos descentralizadores
da corrente liberal triunfante, incumbia as Províncias de organizar o ensino
primário e secundário e reservava à União a administração do ensino superior
em todo o país e a organização escolar no Município Neutro. Em outras
palavras, a União abandonava o ensino a sua própria sorte. (VILLALOBOS,
1960)
Villalobos (1960) afirma que durante toda República Velha, não foi proposto
nenhum plano geral e orgânico para a educação nacional, que repercutisse a fundo em todo
país, embora se tenha aumentado o número de escolas primárias públicas que continuavam
insuficientes para dar conta dos 60% dos analfabetos existentes no ano de 1920.
Por outro lado, encontramos nos anos 20, como já vimos no capítulo anterior, um
grupo de educadores brasileiros com propostas consideradas “renovadoras”, que tinham
seus princípios baseados no chamado “Movimento de Escolas Novas”, muito forte na
Europa e Estados Unidos. Fundaram a Associação Brasileira de Educação (ABE), e
organizaram várias Conferências Nacionais de Educação, sendo que as mais famosas,
segundo Romanelli (2002), foram a IV e a V, que motivaram a redação do “Manifesto dos
Pioneiros da Educação Nacional”, fruto dos debates em torno de questões como a
gratuidade e obrigatoriedade do ensino, a laicidade, a co-eduação e Plano Nacional de
Educação.
Este grupo, liderado por Anísio Teixeira, também foi responsável pela introdução,
no cenário nacional, da discussão sobre a municipalização do ensino primário como uma
69
política de democratização, que segundo Paiva (1986) não significava uma mera reforma
administrativa ou pedagógica, podendo ser considerada uma reforma política no seu âmago,
ao defender o reconhecimento da maioridade de nossas comunidades municipais.
A defesa da municipalização do ensino fundamental era realizada a partir
da crítica ao excessivo centralismo administrativo exercido pelo ministério e
pelas secretarias estaduais de ensino, que seria responsável pelo irrealismo dos
programas e pelo imobilismo das escolas brasileiras, bloqueando as energias
criativas difusas em nosso povo. (PAIVA&PAIVA, 1986)
Embora os renovadores contassem com prestígio na política nacional na década de
trinta, antes da instauração do Estado Novo, constatou-se que as propostas de
municipalização foram desconsideras pelas autoridades competentes, haja vista a
Constituição de 1934, que “atribui à União competência privativa para traçar diretrizes para
a educação nacional de educação que abranja todos os graus e ramos, sendo a primeira a
determinar a elaboração de um Plano Nacional de Educação” (BARRETO&ARELARO,
1986)
É inquestionável que a Constituição de 1934 trouxe o fortalecimento da autonomia
municipal, mas continuou permitindo que os Estados exercessem tutela administrativa e
política sobre as cidades. Em relação à educação, limitou-se a responsabilidade do
município com a obrigação de aplicar não menos de 20% de sua renda resultante de
impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino primário, e aos Estados e Distrito
Federal cabia igual percentagem e à União 10% das mesmas receitas para aplicação no
ensino primário.
Por considerar insatisfatória a Constituição de 1934, Vargas solicitou a Francisco
Campos que preparasse o texto de uma nova Constituição que seria chamada de “polaca”,
que segundo Mendes (1990), foi inspirada na Constituição do ditador polonês Jósef
Pìlsudski.
Com a “polaca” todos os poderes agrupavam-se nas mãos do Presidente.
O Congresso Nacional, que havia sido fechado à força, entraria em longo
recesso (...). No dia 2 de dezembro de 1937, um decreto presidencial dissolve
todos os partidos políticos (inclusive a Ação Integralista, para desencanto de
Plínio Salgado e seu séquito) proibindo, “até a promulgação da Lei eleitoral, a
organização de partidos políticos seja qual for a forma de que se revista a sua
constituição” (MENDES, 1990:43)
70
O Estado Novo consagrou-se pelo centralismo de Vargas, cujo governo assumia
formas ditatoriais, dissolvendo as Câmaras Legislativas, nomeando interventores federais
para função de governar os Estados e ainda escolher os Prefeitos.
Segundo Leal (1975), o que vigorou durante essa fase foi o regime declarado
provisório, que culminou com um sistema de tutela.
Não só o município ficou privado de qualquer órgão local representativo
ou pseudo-representativo, como ainda ficou a sua administração sujeita a um
severo sistema de controle. (LEAL, 1975:92)
Em relação à educação, a Constituição de 1937 é omissa quanto à vinculação de
verbas para o ensino primário, mas segundo Barreto e Arelaro (1986) o princípio de
cooperação é mantido com a criação do Fundo Nacional do Ensino Primário, em 1942, que
estabelece formas de cooperação financeira das três instâncias administrativas em benefício
do ensino, de modo a restaurar o emprego de recursos financeiros próprios a partir de
quotas que tendem a se ampliar anualmente nos estados, partido de 16% até 20% e, nos
municípios, de 10 a 15% até 1949.
Com o fim do Estado Novo e a eleição da Assembléia Constituinte, a nova
Constituição foi promulgada em 18 de setembro de 1946. Fortaleceu o Município, agregou
o que já havia conquistado nas legislações anteriores e tornou possível as três divisões
político-administrativas do País, Município, União, Estados. A população passa a eleger o
Prefeito e Vereadores.
A autonomia dos municípios foi garantida: pela eleição do prefeito e dos
vereadores; pela administração própria, no que concerne seu peculiar interesse.
Conceituou-se o peculiar interesse do município, especialmente, pela
decretação e arrecadação dos tributos de sua competência, aplicação de suas
rendas e organização dos serviços públicos locais (LEAL, 1975:94).
Apesar dessa mudança estrutural, a eleição dos prefeitos das capitais continuou
restrita, com exceções das estâncias hidrominerais e dos Municípios definidos por lei
federal como base ou porto militar de importância para a defesa nacional. Todos eram
nomeados pelo governador do estado. Dezoito municípios foram considerados como de
importância para a defesa externa (nove eram capitais de Estado)
71
Em relação à vinculação de recursos para educação, Barreto e Arelaro (1986)
esclarecem que a Constituição de 1946 retoma a fórmula de cooperação das três instâncias
administrativas fixadas em 1934: “anualmente a União aplicará nunca menos de 10%, e os
Estados, o Distrito Federal e os municípios nunca menos de 20% da renda resultante dos
impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino”.
O parâmetro norteador do “quantum” a ser vinculado para cada esfera ficou
relacionado, segundo Oliveira (2005), com a possibilidade efetiva de seu cumprimento,
expressada na preocupação de Gustavo Capanema em definir claramente os limites da
fixação desses valores.
(...) Se estabelecemos para a União o limite ideal, isto é, o de 20%,
veremos que não será executado e teremos (...) a desmoralização do
preceito(...) Agora se cautelosamente, para evitarmos que a Constituição se
desrespeite,estabeleceremos um limite pequeno, nesse caso, estamos
trabalhando contra a educação nacional. Esse limite baixo poderia ser visto
sempre com uma espécie de teto obrigatório. (OLIVEIRA, 2005)
Vinculada à distribuição dos recursos, encontra-se a questão das responsabilidades
de cada nível da administração pública para com a educação. Nesse sentido, a discussão
sobre a municipalização é retomada na Constituinte por Ataliba Nogueira (PSD - SP), que
era considerado, segundo Oliveira (op.cit.) um grande defensor das teses municipalistas. No
debate sobre municipalização, Ataliba, demonstra grande inabilidade ao defender a
municipalização, tornando-se alvo fácil para o contra argumento de Gustavo Capanema.
Argumentos de Ataliba Nogueira
(...) ninguém melhor do que o munícipe entende dos assuntos municipais.
No Brasil quem deve dar o ensino, são os particulares. Eles que façam o
ensino. Não podendo os particulares, façam-no as entidades públicas: em
primeiro lugar o Município, em segundo o Estado, em terceiro a União. (...).
Quero libertar a escola primária, entregando-a ao Município.
O Município pobre, não podendo mantê-la, em seu socorro há de vir o
Estado e até mesmo a União, supletiva e subsidiariamente. Conheço mal a
legislação nos últimos tempos e chego à conclusão de que, quanto mais
peiamos o município, tanto menos se ministra a instrução. (...)
O princípio até certo ponto, poderá trazer dificuldades de ordem político
administrativa. Mas, devemos tender para isto: porque os sistemas educativos
72
estaduais trarão como conseqüência imediata, a criação de larga burocracia,
para verificar se os sistemas são executados nos Municípios, o que seria a
morte das escolas municipais ou de a sua fraca disseminação. (C.C. V.III,
1948, p. 199 apud Oliveira, 2005)
Posicionamento de Gustavo Capanema contra a formulação de Ataliba Nogueira:
A Constituição de 1934 orientou-se convenientemente nessa matéria,
quando prescreveu a organização de sistemas educativos estaduais. Ela não se
referiu, entretanto, a sistemas educativos municipais. E, isto por uma razão
óbvia: ela visou sem dúvida, evitar que, dentro de cada Estado se constituísse
uma multiplicidade de sistemas educativos, dificilmente ordenáveis e
harmonizáveis. (C.C., V. III, 1948, p. 199 apud Oliveira, 2005
)
Desta forma, a questão referente à municipalização é encerrada neste período,
facultando aos municípios a possibilidade de assumirem o ensino primário, desde que os
municípios não constituam sistema autônomo. Entretanto, a discussão volta novamente à
pauta, durante os debates para elaboração da primeira lei de Diretrizes e Bases da
Educação, ainda durante a vigência da Constituição de 1946, sem muita repercussão, por
Anísio Teixeira, então Diretor do INEP – Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos.
Destaca o fato de ser a primeira vez em que se pensa uma legislação educacional,
em nível nacional, com o objetivo de desenvolver uma educação para o sistema escolar do
país. Assim, abre-se um espaço na nova lei educacional – Lei nº 4024/61, para a
municipalização, que recebe maior ênfase nos aspectos financeiros, ao reiterar a vinculação
orçamentária definida pela Constituição de 1946, aumentando a cota federal de recursos
para a educação de 10% para 12%, e mantendo os 20% correspondentes às dotações na
área, feitas pelos estados e municípios.
Segundo Barreto e Arelaro (1986), a idéia da municipalização do ensino
potencialmente contida na lei, teria se enfraquecido devido à incapacidade dos sistemas
estaduais de formularem suas próprias diretrizes que caracterizassem a organização de seus
sistemas de ensino.
(...) nos anos que se seguiram à institucionalização da LDB/61, o máximo
que os estados fizeram foi a montagem de estruturas legais de
descentralização, mas não de recursos financeiros e incentivos. Propôs-se a
criação dos Conselhos Municipais de Educação, que quando instalados, em
73
geral ficaram sem funções, entre outros motivos, pois pelas deficiências da
delegação de competências por parte dos Conselhos Estaduais. Os convênios
estados-município também não funcionaram a contento (...) (BARRETO&
ARELARO, 1986)
Após a Constituição de 1946, defrontamo-nos com outra Constituição promulgada
em 1967, alterada em 1969 por uma Emenda Constitucional, durante o período da ditadura
militar iniciado em 1964. Consideradas mais centralizadoras e alinhadas ao pensamento
tecnoburocratas, mantiveram as conquistas municipais, herdadas da Constituição de 1934:
unidade político-administrativa, juntamente com Estados e Municípios; autonomia política,
administrativa e financeira; inclusão da autonomia municipal entre os princípios
constitucionais da União e manutenção de impostos partilhados.
Em 1966, o Congresso foi fechado pelo regime militar e reaberto em 1967, após a
aprovação de uma nova Constituição, elaborada por juristas do governo militar. A
centralização de poderes na União ampliou as atribuições do Poder Executivo, único
responsável pela iniciativa na elaboração de projetos de lei sobre segurança e orçamento.
No contexto educacional, retirou-se do Conselho Federal de Educação a
competência da elaboração dos planos nacionais de educação, que novamente passaram à
responsabilidade da União, como também desvincularam a obrigatoriedade os percentuais
fixos na educação, tanto na esfera federal como na estadual, apesar de ser mantido o
percentual de 20% da renda resultante de impostos para os municípios.
Barreto e Arelaro (1986) apontam que, a nova Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional, Lei nº 5692/71 conserva tanto o discurso liberal da LDB/61 quanto a
tônica descentralizadora, adotados segundo os princípios das Constituições de 1967 e 1969,
propondo a centralização das decisões e a descentralização da execução como forma de
atingir maior racionalização e eficiência da máquina administrativa, como expresso
claramente no Decreto nº 200/67, que fundamentava a Reforma Administrativa.
Assim, União reafirma seu papel supletivo na organização dos sistemas federais do
ensino de 1º e 2º grau e atribui a responsabilidade do provimento dos sistemas de ensino a
cargo dos estados e municípios. Assim, os Estados deveriam estabelecer sua própria
legislação como também para os seus municípios, nos diferentes graus de ensino.
74
Art. 58 A legislação estadual supletiva, observado o disposto no artigo 15
da Constituição Federal, estabelecerá as responsabilidades do próprio Estado e
dos seus municípios no desenvolvimento dos diferentes graus de ensino e
disporá sobre medidas que visem a tornar mais eficiente a aplicação dos
recursos públicos destinados à educação.
Parágrafo único – As providências de que trata este artigo visarão à
progressiva passagem para a responsabilidade municipal de encargos e
serviços de educação, especialmente de 1º grau, que pela natureza possam ser
realizados mais satisfatoriamente pelas administrações locais.
(BRASIL,MEC, 1971)
A Lei 5692/71, ao determinar as medidas do art. 58, complementadas pelo parágrafo
único, manifesta sua intenção de realizar progressivamente, a passagem para a
responsabilidade municipal dos encargos e serviços da educação, principalmente de 1º grau,
demonstrando através dessa exigência legal uma tendência de política educacional.
A questão da municipalização, presente na LDB/71 favoreceu ao Ministério da
Educação a implementação de um amplo programa de apoio às administrações municipais,
conhecido como Promunicípio - Projeto de Coordenação e Assistência Técnica do Ensino
Municipal - que, segundo Arelaro (2005), foi o responsável pela municipalização
antecipada das séries iniciais da Região Nordeste, em relação ao conjunto das regiões
brasileiras, fruto de acordo internacional do Brasil com Banco Mundial (1974).
A garantia de recursos financeiros para os municípios pobres ou muito pobres da
região relacionava-se exclusivamente com a adesão dos mesmos ao programa. Dessa
forma, o Promunicípio foi concebido como um instrumento que viabilizasse as condições
para que o município assumisse a responsabilidade do ensino de 1º grau, enquanto o Estado
caberia definir as diretrizes gerais, prestar assistência técnica e cooperação financeira.
Felix (1997), ao analisar relatório produzido pelo Instituto Brasileiro de
Administração Municipal – IBAM, relata que a maioria dos 234 municípios participantes
do Promunicípio possuía boas condições financeiras, contrariando a proposta inicial e
demonstrado a interferência clientelista no repasse de recursos feito pelas Secretarias da
Educação. Segundo a autora, o documento mostrava que, com o Promunicípio, os Órgãos
Municipais de Educação tinham a autonomia prejudicada devido a sua subordinação às
definições políticas do prefeito e seu grupo de sustentação política. Outro problema
apontado no relatório era a existência de superposição de programas e projetos estaduais e
75
federais que exigiam resultados que eram dificultados pela falta de infra-estrutura
necessária e de pessoal qualificado para gerenciar essas ações.
Embora reconhecendo toda essa problemática, as recomendações técnicas
do MEC limitavam-se ao âmbito da instrumentalização das secretarias de
educação para a realização de diagnósticos municipais da educação, elaboração
de Plano Municipal de Educação articulado ao Plano Estadual, supervisão de
ensino e outras medidas no sentido de racionalizar o funcionamento das
estruturas e implementar uma ação integrada dos órgãos estaduais e federais
junto aos órgãos municipais. (FELIX, 1997)
Dessa forma, pode-se dizer que, nos anos 70, a proposta de municipalização
introduzida pela Lei 5692/71 era modesta e buscava de alguma forma viabilizar o proposto
no artigo 58 da LDB/71, que era buscar melhores condições para o ensino fundamental por
meio de uma modernização administrativa que atendesse aos princípios do Decreto 200/67,
como também proporcionasse transferência de recursos financeiros com vistas à integração
das redes municipais de ensino aos respectivos sistemas estaduais de educação.
Neste sentido, Paiva (1986) avalia que, neste período os instrumentos legais,
surgidos a partir da Lei 5692/71, primavam pela cautela, sendo raros os estados que
estabeleceram a legislação supletiva prevista que definisse as responsabilidades e poderes
das administrações municipais no âmbito da educação.
A partir dos anos 80, após vinte e um anos de ditadura militar, o país iniciou o
período de abertura política, momento em que vieram à tona diferentes manifestações de
luta de trabalhadores, destacando-se as greves promovidas pelos trabalhadores da educação.
Assim, os anos 80 também representaram um período em que as mudanças fiscais
seguiam algumas tendências que eram manifestadas em reformas políticas e programas
sociais na América Latina. Algumas destas tendências foram estudadas pela pesquisadora
Sonia Draibe através de uma análise comparativa, separando-as em três grupos:
Os episódios de ajustamentos fiscais da primeira metade dos anos 80, que
exigiam do gasto social maior eficiência e principalmente uma forte
adequação aos objetivos macroeconômicos. Em seguida, tratava-se de
reorientar o gasto social para atender ao previsível empobrecimento da
população, resultante dos impactos do ajustamento recessivo sobre o emprego,
renda e redução dos serviços sociais. Para tanto, a focalização do gasto, a
76
opção por fundos sociais de emergência e por programas compensatórios
dirigidos exclusivamente aos grupos pobres e vulneráveis passam a compor o
núcleo da estratégia de reforma social. Por fim, o gasto social teria de priorizar
ações básicas de saúde, nutrição e principalmente programas de caráter
produtivo, como investimento de capital humano. (OLIVEIRA, 2002b:128)
Nesse sentido, a crise fiscal e o endividamento dos Estados, fez com que as
burocracias estatais, tivessem sua ineficiência ressaltada. Os Estados passaram a ser
apontados como uma instituição morosa, pesada e ineficiente, aos padrões da iniciativa
privada. Oliveira (2002a) afirma que nessa concepção, o liberalismo coloca-se como
vitorioso ante uma economia estadista que “fracassou” tornando o neoliberalismo como a
única saída para a crise, o único meio de sobrevivência das nações endividadas
Coerente a este cenário, ainda segundo a autora, as reformas administrativas
características dos anos 80 são apresentadas com tendência à descentralização e
descontração de poderes de decisão e à restauração da capacidade de coordenação e
planejamento, correspondendo ainda à organização administrativa, proposta pelo decreto-
lei nº200 de 1967, cujos princípios fundamentais eram o de planejamento, descentralização,
delegação de competência e controle tornando a autonomia uma forma de resposta ao
planejamento descentralizado.
O que indica que estamos diante de mudanças não apenas de metodologia
operacionais, mas do deslocamento do eixo do poder, do lócus de decisão. O
momento atual não parece estar mais para o planejamento burocrático e
centralizado, deve agora ajustar-se à realidade imediata, sem, contudo abalar o
equilíbrio do todo, a que deve sobreviver apesar das especificidades locais. A
realidade não emana mais exclusivamente do Estado nacional, classicamente
constituído, mas de novas estruturas de poder, onde o Estado funciona como
mais um instrumento legitimador de práticas e políticas elaboradas de fora
dele. (OLIVEIRA, 2002a)
No Brasil, no ano de 1983 foi aprovada a “Emenda Calmon” que determinava a
alteração dos mínimos orçamentários para a educação, cabendo à União a aplicação de pelo
menos 13% e aos Estados, Distrito Federal e Municípios 25% da receita de impostos e
transferências, ficando sua regulamentação para 1985 e sua aplicação a partir do exercício
de 1986.
77
Em 1986, foi criada a UNDIME – União Nacional dos Dirigentes Municipais de
Educação, entidade que incrementou a participação dos municípios nas questões
educacionais, conclamando maior descentralização da educação e conseqüentemente sua
municipalização.
Durante a elaboração da nova Constituição, a questão da municipalização
do ensino voltou, com mais vigor, a ser discutida. No art.40, Título IX, das
disposições Transitórias, do Projeto da Comissão de Sistematização, foi dado
um prazo máximo de cinco anos para a transferência do município do ensino
pré-escolar e fundamental. A reação por parte dos educadores, entidades e
associações de classe, foi imediata. Um assunto tão controvertido foi colocado
nas Disposições Transitórias, além do que, na ocasião, a atenção dos
constituintes estava voltada para a duração do mandato do presidente e não
para o problema da municipalização. Diante de tantas manifestações e
ponderações, o texto final da Constituição teve esse artigo suprimido.
(OLIVEIRA,1999:27)
Nesse contexto, a Constituição de 1988 foi promulgada no dia 5 de outubro de
1988, com a determinação expressa de ampliação da autonomia dos Estados e Municípios,
promovendo-os à condição de entes federados.
A garantia da autonomia municipal está definida no artigo 29, ao determinar que o
município deva reger-se por Lei Orgânica própria, ditada pela câmara municipal, com
competência de promulgá-la. Rompe-se, assim, com a interferência do legislador ordinário
estadual em assuntos de organização do município.
Desta forma, pode-se afirmar que o governo municipal não está mais subordinado a
qualquer autoridade estadual ou federal no desempenho de suas atribuições exclusivas e
que as leis municipais, sobre qualquer assunto de competência expressa e exclusiva do
município, prevalecem sobre a estadual e a federal, inclusive sobre a Constituição Estadual
em caso de conflito.
Em matéria de receita municipal, a Constituição, no artigo 158 determinou que
pertencessem aos municípios:
I - o produto da arrecadação do imposto da União sobre a renda e os
proventos de qualquer natureza incidente, na frente, sobre rendimentos pagos,
a qualquer título, por eles, suas autarquias e pelas fundações que instituírem e
mantiverem;
78
II - cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto da União
sobre a propriedade territorial rural, relativamente aos imóveis neles situados,
cabendo a totalidade na hipótese da opção a que se refere o art. 153, § 4º;
III - cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado
sobre a propriedade de veículos automotores licenciados em seus territórios;
IV - vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do
Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre
prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de
comunicação. (BRASIL, 1988)
Quanto à educação, a Constituição estabeleceu no artigo 211 que a “União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão seus sistemas de ensino em regime
de colaboração”, apontando no seu §2º que atuação dos municípios se dê prioritariamente
no ensino fundamental e pré- escolar. É importante ressaltar que o regime de colaboração
fortalece a descentralização político- administrativa e a autonomia de ente federado,
conferida aos municípios neste artigo.
Carneiro (2000) considera o Regime de Colaboração uma estratégia de organização
da educação nacional que tem o objetivo de favorecer um diálogo entre iguais, envolvendo
União, Estados e Municípios, cada um com responsabilidades próprias, partilhadas e
executadas cooperativamente.
Nesse sentido o Regime de Colaboração torna-se um importante instrumento para
viabilização da municipalização, tornando-se a base para a criação de um fundo para o
financiamento da educação que será proposto pela Emenda Constitucional (PEC) 233/95,
dando origem à Emenda Constitucional 14/96, cujo objetivo era aliar financiamento com
gestão da educação. Este fundo foi regulamentado pela Lei 9.424, passando a ser conhecido
como FUNDEF- Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
Valorização do Magistério.
Ainda em relação à educação, destaca-se também o inciso VI do artigo 206, que
incorpora aos princípios da educação pública a gestão democrática da educação, marcando
segundo Oliveira (2002) a flexibilização destes novos modelos de gestão, que ao mesmo
tempo em que aparentam ser resultantes das lutas dos trabalhadores, conservam na prática
pressupostos autoritários.
Em relação à década de 90, percebe-se que as reformas em sua grande maioria
apresentam-se em formas mais flexíveis, participativas e descentralizadas de administração
79
dos recursos e das responsabilidades, que de acordo com Oliveira (2002), são coerentes aos
compromissos assumidos pelo Brasil na Conferência Mundial de Educação para Todos,
realizada em março de 1990, em Jontiem, na Tailândia, e na Declaração de Nova Delhi de
dezembro de 1993, de atendimento à demanda de universalização do ensino básico.
A descentralização, como orientação para o planejamento, presente na reforma do
Estado desde a década de 60 através do Decreto 200/67, será reforçada e na década de 90,
segundo Oliveira (2002b), apresentará como eixo principal a flexibilização e
desregulamentação da gestão pública, com a justificativa de buscar a melhoria no
atendimento do cidadão.
Aliada ao processo de descentralização, a municipalização aparece como uma
alternativa de gestão que, através da proximidade física da população com os meios de
decisão, possibilitava maior controle sobre a gestão pública. Nesse sentido, segundo
Oliveira (2002b), o processo de descentralização do país fez aumentar o interesse por
movimentos descentralizadores, como se descentralização fosse sinônimo de democracia.
Para regulamentar todas as determinações apresentadas na Constituição de 88, de
forma coerente aos princípios de descentralização, flexibilização e autonomia foi aprovada,
após oito anos de tramitação no Congresso Nacional, a nova Lei de Diretrizes e Bases da
Educação, de número 9.394/96.
Assim, em relação às responsabilidades, determinou-se aos municípios a garantia
prioritária da educação infantil e ensino fundamental, cabendo aos Estados o ensino
fundamental e médio. Dentro do princípio do Regime de Colaboração, instituído pela
Constituição de 88, facultou aos sistemas de ensino o estabelecimento de formas de
cooperação e parceiras entre si.
Nesse contexto, a LDB propõe a organização dos sistemas municipais de educação
como uma das opções de organização da educação nacional. Determina que o município
que constituir seu sistema educacional deverá organizar, manter e desenvolver os órgãos e
instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, de forma integrada às políticas e planos
educacionais da União e Estados. Assim, além de exercer ação redistributiva às suas
escolas, deverá também baixar normas complementares para o seu sistema de ensino,
obtendo a responsabilidade de autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do
seu sistema de ensino.
80
A referida lei trouxe também mudanças tanto na administração quanto na
organização escolar, ao considerar a educação infantil a primeira etapa da Educação Básica,
a obrigatoriedade progressiva do ensino médio, a descentralização da gestão com ênfase na
autonomia da escola e avaliação. Estas questões, coerentes à tendência descentralizadora,
foram reforçadas no Plano Nacional de Educação, que deu origem à Lei 10.172 aprovada
em janeiro de 2001, que estabelece como os seus objetivos:
- A elevação global do nível de escolaridade da população;
- A melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis;
- A redução das desigualdades sociais e regionais no tocante ao aceso e a
permanência, com sucesso, na educação pública e;
- Democratização da gestão do ensino público, nos estabelecimentos
oficiais, obedecendo aos princípios da participação dos profissionais da
educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e a participação
das comunidades escolar e o local em conselhos escolares ou equivalentes
(BRASIL, 2001)
Nesse sentido, o município tornou-se obrigado em pensar sua estrutura
administrativa dentro dos novos parâmetros organizacionais instituídos pela Constituição
Federal de 88, Lei 9394/96 e Plano Nacional de Educação, devendo não só realizar
adequações normativas ou procedimentais, mas realizando mudanças de a cultura
administrativa perpetuada por anos no espaço da Secretaria da Educação do município.
B) A MUNICIPALIZAÇÃO NO ESTADO DE SÃO PAULO
O Processo de municipalização em São Paulo não foi e não poderia ter sido
diferente do contexto brasileiro, principalmente a partir do estabelecimento da LDB
5.692/71. Na concepção de Arelaro (1989) a municipalização pode ser entendida como a
transferência de funções do governo federal e estadual para o nível municipal, envolvendo
uma variada e complexa discussão sobre as competências dos diferentes níveis de governo,
principalmente no que se refere à descentralização de poder e a autonomia municipal.
A autora também considera que, freqüentemente, estas iniciativas são frutos de
pressão internacional, com o objetivo de adequar o Estado aos novos modelos de
racionalidade adotados pela administração pública, podendo proporcionar até um
enxugamento do aparelho estatal.
81
Assim, vamos considerar como pertencentes à história da municipalização do
Estado de São Paulo projetos impostos pelo governo que se caracterizavam primeiramente
pela transferência de funções, mas que também buscavam a autonomia e a descentralização,
a partir da promulgação da Lei 5.592/71, que pode ser considerada um marco das reformas
educacionais que aconteceram no Brasil.
Dessa forma, apresentaremos o desenvolvimento dos projetos de municipalização
do ensino em São Paulo a partir de 1983, ano em que se iniciou a municipalização da pré-
escola, no governo de Franco Montoro até a implementação no ensino fundamental em
1995, no governo de Mário Covas.
I.
GOVERNO DE FRANCO MONTORO (PMDB - 1983/1987)
Depois de vinte anos de ditadura militar, Franco Montoro é eleito Governador de
São Paulo. Assume a Secretaria da Educação do Estado, Paulo de Tarso, que havia sido
Ministro da Educação no Governo João Goulart (1961/64). Segundo Arelaro (1999) o clima
de reconstrução democrática neste período foi traduzido politicamente na forma de
descentralização, representando um antagonismo ao governo militar. A autora relata que no
final de 1983, a descentralização já fazia parte da agenda do governo estadual, manifestada
em conversas com prefeitos no sentido de se municipalizar a pré-escola, a partir de
convênios especiais em que se transferiam matrículas e supostamente recursos financeiros
da rede estadual para municipal.
(...) São Paulo iniciou um processo de municipalização da pré-escola
(entendida como o atendimento escolar de crianças de 4 a 6 anos de idade), a
partir do atendimento preferencial de crianças de 6 anos de idade, visando a
preparação para a alfabetização, como era justificado o atendimento. Tratava-
se de estratégia pedagógica para reduzir os altos índices de reprovação e
evasão na 1ª série do ensino de 1º grau, nome do ensino fundamental na época.
(ARELARO, 1999)
Outro projeto importante na gestão de Montoro foi o da Municipalização da
Merenda Escolar, implementado pelo novo Secretário da Educação, Paulo Renato de
Souza, ex-reitor da Universidade Estadual de Campinas. Arelaro (1999) explica que para o
desenvolvimento deste projeto, o governo estadual se comprometia em repassar para os
municípios recursos financeiros, em geral da Quota Estadual do Salário-Educação (QESE),
82
correspondentes às despesas assumidas. Relata que um número significativo de Municípios
que assumiram o encargo não teve o retorno esperado, chegando a arcarem com 80% das
despesas totais do empreendimento.
Fica evidente, que o processo de municipalização do ensino inicia-se no
Governo Montoro, a partir de transferências de responsabilidades e de tarefas
para os municípios, sem necessariamente existir uma transferência de recursos
financeiros proporcional às novas responsabilidades propostas. Isso é importante
porque, mesmo políticos municipalistas, em curto prazo, ficam em dúvida sobre
a conveniência político econômica de assumirem mais responsabilidades, sem
garantia real de contrapartida por parte do governo estadual. (ARELARO,1999)
II. GOVERNO DE ORESTES QUÉRCIA (PMDB 1987/1990)
Orestes Quércia ao assumir o Governo Estadual, nomeia inicialmente Chopin
Tavares de Lima como Secretário de Educação. Implanta, com relativo sucesso, o projeto
“a municipalização de construções escolares”. Segundo Arelaro (1999) o governo estadual
repassava recursos financeiros para o Município, acreditando-se que as construções ali
licitadas propiciariam uma saudável disputa entre os empreiteiros locais, valorizando a mão
de obra da região e baixando os custos de construção, em função da alta inflação da época.
Nesse mesmo período, a Secretaria do Estado da Educação inicia um projeto de
“nucleação” das escolas rurais que, segundo Arelaro (1999) vai provocar pela sua
inviabilidade de implantação, um processo forçado de municipalização em várias regiões de
Estado.
Ou seja, como as crianças não tinham condições de chegar, por seus
próprios meios, na nova escola sede, nem se ampliou o número de alunos
instantaneamente, ou o Município manteve – agora as suas custas – as salas de
aula no local original onde funcionavam ou ele acabou assumindo o transporte
escolar dessas crianças (ARELARO,1999)
Entretanto, para Arelaro (1999) o projeto mais polêmico de Quércia na educação
chamava-se PROMDEPAR – Programa de Municipalização e Descentralização de Pessoal
de Apoio Administrativo das Escolas da Rede Pública Estadual. Segundo a autora, iniciava-
se, historicamente, pela via do município, ou pela via da iniciativa da escola por meio das
83
Associações de Pais e Mestres (APMs), a transferência de responsabilidades
administrativo-financeiras em relação ao pessoal de apoio escolar.
Em 1989, Quércia nomeia outro Secretário de Educação Wagner Rossi, que propõe,
pela primeira vez e de forma explícita, a municipalização do ensino, através do Decreto nº
30.375 de 13 de setembro de 1989, estabelecendo o “Programa de Municipalização do
Ensino Oficial do Estado de São Paulo” Entretanto, na opinião de Arelaro (1999), nada de
prático aconteceu apesar de o programa contar com muitos recursos financeiros, porque não
existiu – para além do discurso – um empenho do Governador municipalista nessa direção.
O que se efetivou foi, (...) a nucleação e/ou a municipalização das escolas
rurais, ficando o transporte sob responsabilidade municipal, o que significava
um gasto significativo de recursos financeiros por parte do município. Consta
que a adesão dos Prefeitos a esse Programa de Municipalização do Ensino, era
condição para liberação de recursos estaduais para outros projetos municipais.
(ARELARO, 1999)
III.
GOVERNO DE ANTONIO FLEURY FILHO (PMDB 1991/1994)
Antonio Fleury Filho assume o Governo do Estado e Fernando Morais a Secretaria
da Educação. Segundo Arelaro (1999), esta gestão ficou conhecida como a que menos
investiu nos últimos 20 anos na escola pública, além de ser responsável por grande redução
de gastos na educação.
Começa a torna-se mais evidente que os projetos de “descentralização” de
recursos e fortalecimento da “decisão” das comunidades eram argumentos
utilizados pelo governo junto à rede de ensino, para o início de processo legal
de privatização da escola. A partir da participação financeira indispensável dos
pais e mães, o objetivo governamental era o de estabelecer estratégias visando
à redução de investimento na área educacional e nos custos diretos do ensino
público estatal. (ARELARO,1999)
Após enfrentar greves de professores, Fernando de Morais demite-se e assume em
seu lugar, o Prof. Carlos Estevão Martins. Ao entrar em exercício, revoga o Decreto do
Governo anterior que havia criado o Programa de Municipalização do Ensino Oficial e
estabelece um novo programa para relacionamento entre Estado e Município. Cria-se então,
o Programa de Ação Cooperativa Estado-Município (PAC), que oferecia verbas estaduais
84
para a construção, reformas e ampliações das unidades estaduais aos municípios que
assinassem esse Convênio.
No último ano do governo Fleury, a Secretaria da Educação, através da
Resolução/SE nº 244 de 09/11/93, proíbe as escolas estaduais de instalarem ou ampliarem
classes de pré-escola, uma vez que, segundo Arelaro (1999), considerava-se que o ciclo de
municipalização desse nível de ensino havia se completado.
Olhando os números, constata-se uma curva crescente no atendimento
municipal, pois de 356.255 atendimentos na pré-escola, em 1985, atinge-se
734.107 em 1994, sendo que o Estado, nesse mesmo ano, atende somente
1.346 crianças, e em 1985 ainda atendia 82.801. Estava, portanto, na prática,
municipalizado o ensino pré-escolar no Estado de São Paulo. (ARELARO,
1999)
IV.
GOVERNO DE MARIO COVAS (PMDB/PSDB - 1995/1998)
Mário Covas, ex-integrante do PMDB e fundador do PSDB, assume como
Governador de São Paulo; e Tereza Roserley Neubauer da Silva, professora da Faculdade
de Educação da Universidade de São Paulo, como Secretária da Educação.
Pode-se dizer que esta gestão foi marcada pela implantação do Projeto de
Reestruturação Estadual, que entrou em vigor no início do ano letivo de 1996,
proporcionando uma nova estrutura à rede física estadual, facilitando o processo de
implementação da municipalização da educação no Estado.
Percebe-se que as mudanças propiciadas por estes projetos estavam alinhadas às
reformas administrativas características dos anos 80, que apresentavam a descentralização e
a descontração de poderes de decisão aliadas restauração da capacidade de coordenação e
planejamento. Nesse sentido, pode-se dizer que esta concepção de organização
administrativa ainda correspondia à proposta do decreto-lei nº200 de 1967, cujos princípios
fundamentais eram o de planejamento, descentralização, delegação de competência e
controle, tornando a autonomia uma forma de resposta ao planejamento descentralizado.
(...) Mas o sistema falhava totalmente em sua responsabilidade de oferecer
às crianças e jovens que dele dependiam as condições de permanência na
escola e de efetivo aprendizado: a cada ano, cerca de 25% do total de alunos
matriculados na rede eram reprovados ou se evadiam (....)Era urgente o
estabelecimento de uma política que levasse à verdadeira democratização da
85
educação pública no Estado de São Paulo. Isto implicava não apenas em
descentralização de poderes e competências, como em construção de novos
níveis de autonomia que possibilitassem a verdadeira participação de
instituições e de comunidades. (SÃO PAULO/SE, 2002)
A rede física de ensino das escolas estaduais foi reorganizada, destinando parte
dos prédios escolares ao atendimento de crianças de 1ª a 4ª série do ensino fundamental e
outra ao atendimento de adolescentes de 5ª a 8ª série e jovens do ensino médio. Aleraro
(1999) alerta que esta reestruturação proporcionou separações físicas e sociais de forma
abrupta; colegas, grupos de amigo, projetos educacionais em execução, nada foi levado em
consideração ou dado algum tempo para que se realizassem as adequações necessárias.
Foi idealizada e posta em prática pela Secretaria da Educação, no início de
1996, visando uma mudança de caráter pedagógico. A junção de crianças e
adolescentes de todas as idades e níveis de ensino em um mesmo espaço físico,
que era o que vigorava nas escolas de todo Estado de São Paulo, tornava
impossível uma organização pedagógica adequada para qualquer uma dessas
faixas etárias. Com a reorganização tornou-se possível corrigir uma série de
distorções que até então prejudicavam grandemente a qualidade da educação
oferecida pelas escolas. (SÃO PAULO/SE, 2002)
Como conseqüência houve a diminuição de turnos de funcionamento em várias
escolas, como demonstra a Tabela 4:
Tabela 1- Escolas Estaduais por número de turnos
Números absolutos Percentual
Turnos
1995 1998 1995 1998
Mais de dois turnos diurnos
1.293 343 19,1 5,8
Dois turnos diurnos e um
noturno
4.344 3.067 64.0 51,8
Dois turnos diurnos
999 2.297 14,7 38,8
Um turno diurno
147 212 2,2 3,6
TOTAL 6.783 5.919 100,0 100,0
Fonte: Centro de Informações Educacionais/SEE – São Paulo – 1999 apud Arelaro (1999)
86
Esta diminuição de turnos, como demonstra o quadro acima, gerou, segundo
Arelaro (1999) um expressivo aumento de alunos em sala de aula, resultando numa
diminuição em torno de 50.000 professores desde o início do Governo Covas/Neubauer.
Constata-se que o número médio de alunos, por classe, aumentou de 24/25
para 32/35, encontrando-se, em especial nas séries a partir da 5ª, classes com
mais de 45 alunos. Atente-se para uma significativa modificação nas
orientações centrais dos critérios que devem nortear a acomodação de
demanda, pois, se até 1994 a orientação administrativo-pedagógica era de se
matricular “até 35 alunos por classe” (ARELARO,1999)
Apesar de os argumentos oficiais reforçarem que esta reorganização visava criar
melhores condições de ensino para os professores e de aprendizagem para os alunos,
reconhecia-se também que este procedimento facilitava a implementação da
municipalização. A estratégia de separar, em prédios distintos, os ciclos de 1ª a 4ª séries dos
ciclos de 5ª a 8ª série visava estimular os prefeitos a assumirem, pelo menos inicialmente, o
ensino de 1ª a 4ª série, consideradas mais próximas da educação infantil, evitando-se assim,
o envolvimento com professores especialistas, currículos específicos e uma demanda de
alunos e pais.
No entanto, lidar com professores de 1ª a 4ª série, com perfil semelhante
aos da educação infantil, era como dar oportunidade ao trabalho da pré-escola
que eles vinham fazendo. Além disso, nessa pré-escola os municípios já
investiam em alfabetização, suas equipes estavam acostumadas a lidar como
essa faixa. (SÃO PAULO/SE, 2002)
No sentido de continuar “organizando” a educação pública estadual, implementou-
se o projeto especial de aceleração, que tinha o objetivo de recuperar, para um nível mais
condizente com sua idade, os milhares de alunos que se encontravam estacionados há dois
ou três anos na mesma série.
Revolucionada, a educação pública estadual paulista começava a atingir
novos patamares de organização, gestão participação das comunidades e de
qualidade dos serviços prestados à população. E isso também animava os
prefeitos a participar. (SÃO PAULO/SE, 2002)
87
Enquanto isso, a Secretaria de Estado da Educação constitui uma equipe para
estudar a municipalização e procurar respostas administrativas, gerenciais e econômico-
financeiras que viabilizassem o denominado Projeto de Parceria Educacional
Estado/Município. Segundo documento oficial (SÃO PAULO/SE, 2002), no primeiro
semestre de 1995, 384 prefeituras demonstraram interesse em participar do Programa.
Na verdade, os municípios não tinham ainda uma noção muito clara do
que fosse gerenciar uma rede própria de ensino fundamental e mostravam
grande receio de iniciar um processo que não pudessem depois sustentar – a
exemplo do que havia acontecido na saúde, na qual, segundo reclamavam,
“nós levamos apenas os doentes, não os recursos para atendê-los”. (SÃO
PAULO/SE, 2002)
No início de 1996, foi legalmente instituído o Programa de Parceria Educacional
Estado/Município, tendo como instrumento administrativo, criado para operá-lo, o Termo
de Convênio. Este era constituído por um Plano de Trabalho do município, com objetivos e
metas, um Plano de Aplicação dos Recursos e um Cronograma de Desembolso Financeiro.
Neste ano, segundo a Secretaria da Educação, apenas 46 municípios apresentaram
condições legais e financeiras para aderir à parceria, que envolvia a transferência de alunos,
escolas, classes, professores e recursos considerados patrimoniais como prédios e bens
móveis, materiais didáticos, equipamentos etc.
A legislação estadual admitia a “permissão de uso dos prédios escolares”
e de tudo o que estivesse dentro deles, bem como a cessão do quadro do
Magistério efetivo. Assim, as prefeituras municipalizavam os alunos e levavam
também a permissão de uso do prédio da escola, como todos os seus materiais
móveis e equipamentos e, por empréstimos, os professores efetivos que nela
trabalhavam, sem ter de pagar seus salários, que continuavam a cargo do
Governo Estadual. (SÃO PAULO/SE, 2002)
Assim, percebe-se a intensificação de esforços do governo estadual em estimular a
adesão dos municípios ao Convênio, pontuando em seus argumentos, a determinação
constitucional da responsabilidade municipal em relação ao ensino fundamental. Por outro
lado, destacava-se que ao assumir o ensino fundamental, o município conquistaria maior
autonomia além de poder viabilizar a valorização do magistério.
88
Conseqüentemente, se tiraria do Estado a condição de ser o único a cuidar de todo
ensino fundamental e médio, fato que prejudicava, segundo a Secretaria da Educação, a
divisão do bolo dos recursos da educação.
Enquanto o Governo do Estado contava moedas para conseguir que o
orçamento satisfizesse a tantas demandas, eram muitas prefeituras paulistas
que dispunham de recursos volumosos, algumas vezes maiores do que eram
capazes para atender apenas à educação infantil e de adultos (...) em 1996 um
aluno custava à rede estadual entre $300 e $400 por ano, havia municípios que
gastavam bem mais de $1.000 per capita na educação infantil. (SÃO
PAULO/SE, 2002)
Pode-se perceber na Tabela 5, segundo os dados da Secretaria da Educação, a
evolução do Ensino Fundamental Público no Estado de São Paulo no período de 1995
1996.
Tabela 2 – Evolução do Ensino Fundamental Público no Estado de São Paulo – 1995/1996
Ano
Rede
Estadual
Rede
Municipal
Total
Participação do
Estado
Participação
Municipação
1995 5.263.112 646.500 5.909.612 89,1% 10,9%
1996 5.078.539 726.704 5.805.243 87,5% 12,5
Fonte: (SÃO PAULO/SE, 2002)
Este quadro começa ser alterado a partir da regulamentação da Emenda 14 com a
criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Magistério - FUNDEF, aprovado
no dia 12 de setembro de 1996, entrando em vigor partir de 1º de janeiro de 1997.
A Emenda 14 disciplinava o emprego dos 25% da receita de impostos, definidos
pela Constituição, na área da Educação nos Estados e Municípios, reforçando a prioridade
ao ensino fundamental, e determinava que 60% da receita destinada à Educação, ou seja,
15% daqueles 25% da receita de impostos
3
teriam que ser gastos exclusivamente com a
manutenção do ensino de 1ª a 8ª série.
3
São os seguintes impostos que devem ser retidos em 15% de sua arrecadação, para uso no ensino
fundamental: ICMS devido a Estados e Municípios; Fundo de Participação dos Estados (FPE) e Municípios
(FPM); Impostos sobre Produtos Industrializados (IPI) – Exportação – devido aos Estados. Os restantes 10%
(dos 25% devidos à Educação) não são retidos e continuam com os municípios para financiar a Educação
Infantil.
89
Além disso, criava o FUNDEF, que retinha esses 60% da receita da Educação de
Estados e Municípios, liberando-os de acordo com o número de alunos matriculados na
rede pública de cada local, com base no censo escolar do Ministério da Educação – MEC.
Segundo a Secretaria da Educação (2002), no caso de São Paulo, a estimativa para
1997 era que se gastasse R$649,46 por aluno. O valor resultava da divisão do volume total
de recursos do Fundo no Estado de São Paulo pelo número de alunos de 1ª a 8ªrie das
redes públicas estaduais e municipais.
O FUNDEF previa também que 60% da verba destinada ao ensino fundamental, ou
seja, 60% dos 60% retirados das receitas de impostos devidos à educação teriam de ser
empregados no pagamento dos professores que estivessem em efetivo exercício nesse nível
de ensino.
De uma só penada, o Governo Federal “carimbava” os recursos devidos
ao ensino fundamental, arrecadando-os de Estados e municípios. Na
redistribuição feita em seguida, recebia os recursos quem estivesse mantendo
os alunos. As prefeituras que se ocupassem apenas da Educação Infantil seriam
obrigadas a depositar no Fundão 60% de sua receita da Educação. Esses
recursos seriam encaminhados ao Estado, pois essa a instituição que
proporcionava aos alunos desse município o ensino fundamental. (SÃO
PAULO/SE, 2002)
Para que as prefeituras tivessem tempo de realizar as adequações necessárias, o
MEC estabeleceu que o FUNDEF passasse a reter a verba destinada ao ensino fundamental
a partir do início de 1998. Dessa forma, segundo a Secretaria Estadual de Educação (2002),
procurou-se esclarecer que a municipalização se constituía em uma obrigação
constitucional e que não implicava necessariamente em novas construções escolares, mas
no estabelecimento de uma parceria pela qual o município assumia a responsabilidade
administrativa e pedagógica sobre uma nova rede escolar.
Algumas estratégias para a implementação da municipalização foram estabelecidas
com cada prefeito, levando-se em consideração a capacidade do município de atender a
nova demanda.
Eles (os prefeitos) tinham a garantia de que, com relação às escolas que
fossem municipalizadas, as prefeituras receberiam não apenas os alunos, mas
também a permissão de uso dos prédios estaduais e de todos os materiais
90
didáticos e equipamentos que contivessem, além dos serviços profissionais das
equipes pedagógicas que quisessem permanecer trabalhando “sob nova
direção”. Os professores, diretores e coordenadores pedagógicos, funcionários
efetivos do Estado, seriam cedidos pelos cinco anos de vigência dos
Convênios, embora sua situação funcional não se alterasse. (SÃO PAULO/SE,
2002)
Este tipo de organização determinado pela Secretaria Estadual de Educação no
início da implementação da municipalização, foi denominado por Martins (2003) como
“condomínios”, porque propunha às escolas municipalizadas que funcionassem dentro das
escolas estaduais, durante um período de tempo, fazendo com que professores diretores e
coordenadores pedagógicos, municipais e estaduais, convivessem no mesmo espaço físico,
Segundo a autora, este tipo de situação gerou pólos de tensão, estabelecendo uma profunda
disputa entre os profissionais das duas redes de ensino.
Durante o início da implementação da municipalização, a Secretaria Estadual de
Educação contou com o importante apoio da União dos Dirigentes Municipais de Ensino –
UNDIME, que atuou como intermediária entre os municípios e o estado, esclarecendo
dúvidas e auxiliando na organização de dados.
A municipalização também foi fortalecida pela reformulação do Programa de Ação
Cooperativa Estado e Município - PAC, já existente no estado desde o final do governo
Fleury, tornado-o válido também para as escolas municipais. Segundo a Secretaria Estadual
de Educação (2002), a partir do Decreto 40.904 que instituiu sua reformulação, o PAC
passou a permitir que as prefeituras, mediante disponibilização do terreno, tivessem acesso
ao financiamento estadual para a construção, gerenciada pelo próprio município.
O PAC revelou-se ao longo dos anos como um dos programas mais
solicitados pelas prefeituras à Secretaria da Educação e tem servido a elas
como um poderoso instrumento de construção da autonomia do município na
criação e desenvolvimento de sua rede de ensino fundamental. (SÃO
PAULO/SE, 2002)
Outro ponto destacado no documento da Secretaria Estadual de Educação (2002),
que pode ser compreendido como um diferencial do Projeto de Parceria Educacional
Estado/Município em relação às outras propostas municipalizadoras do Estado de São
Paulo, que falhavam na contrapartida financeira do Estado, foi a redistribuição da Quota
91
Estadual do Salário-Educação – QESE. Seus recursos, provenientes do salário educação,
eram repassados pelo MEC aos Estados, para o desenvolvimento do ensino fundamental.
Nesta questão, o documento esclarece que o Estado de São Paulo, antecipando o
governo federal, regulamentou a redistribuição dos recursos aos municípios que
mantivessem alunos no ensino fundamental e optou por favorecer os municípios mais
pobres.
Para tanto, estabeleceu a consideração de três variáveis na determinação
do índice de participação de cada município: sua população, o número de
matrículas de alunos no ensino regular e supletivo e sua receita de impostos.
Quanto menor a receita de impostos per capita, maior o percentual da QESE
destinado a cada aluno (grifos do autor) (SÃO PAULO/SE, 2002)
Com a expansão da municipalização e conseqüentemente das matrículas, surgiu
necessidade de se empreender um controle rigoroso das matrículas, já que os recursos do
FUNDEF e da QESE eram repassados a cada rede de acordo com o número de alunos
atendidos.
Assim, implementou-se, a partir do segundo semestre de 1995, o Sistema de
Cadastro de Alunos do Estado de São Paulo, que continha as informações básicas
necessárias para identificar cada aluno da Educação Básica de todo Estado de São Paulo,
que segundo a Secretaria Estadual de Educação (2002) permitiam eliminar a duplicidade de
matrículas e dimensionar o volume real de matrículas nas redes estadual, municipais e
particulares do Estado.
Paralelamente, foram estabelecidos procedimentos destinados a garantir, de forma
automática, a continuidade de estudos dos alunos de ensino fundamental e de ensino médio.
Assim, passaram a ser matriculados na série seguinte, até o ensino médio, sem a
necessidade de confirmação de matrícula por parte dos pais.
A expansão do processo de informatização da Secretaria da Educação
integrou, no início de 1997, todas as unidades da rede pública estadual. Estava
formada uma grande rede que conectava as seis mil escolas e os órgãos
centrais ao Sistema de Cadastro de Alunos. (SÃO PAULO/SE, 2002)
Desta forma, na avaliação da Secretaria Estadual da Educação, que pode ser
visualizada na Tabela 6, a parceria entre Estado e Município pode ser considerada um
92
grande empreendimento que trouxe vantagens tanto para os alunos e seus familiares, como
também para os gestores dos sistemas de ensino.
Tabela 3 – Evolução do Atendimento ao Ensino Fundamental na Rede Pública do Estado de São
Paulo – 1994/2001
% de Participação
Ano
Rede
Estadual
Rede
Municipal
Total
Estadu
al
Municip
al
Nº de municípios
que atendem ao
ensino
fundamental
199
4
5.280.229 646.230
5.926.45
0
89,1 10,9 64
199
5
5.263.112 646.500
5.909.61
2
89,1 10,9 72
199
6
5.078.539 726.704
5.805.24
3
87,5 12,5 121
199
7
4.634.560 1.075.850
5.710.41
0
81,2 18,8 410
199
8
4.436.407 1.194.819
5.631.21
8
78,8 21,2 442
199
9
4.052.972 1.511.184
5.564.15
6
72,8 27,2 498
200
0
3.865.320 1.595.881
5.461.20
1
70,8 29,2 503
200
1
3.550.793 1.771.767
5.322.56
0
66,7 33,3 538
Fonte: SEESP/CIE apud (SÃO PAULO,SE, 2002)
Segundo dados da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, a reforma
administrativa entre 1996 e 2001 foi responsável pela transferência de 2.700 escolas
estaduais para as administrações municipais, com o seu mobiliário e equipamentos.
Também, foram afastados 10.312 profissionais do magistério, entre professores, diretores
de escolas e assistentes de diretor, para exercerem suas atribuições nas escolas municipais.
Embora a Secretaria Estadual de Educação tenha constituído equipes específicas,
desenvolvido publicações próprias para orientar os municípios na implantação e
organização do seu sistema de ensino
4
, pode-se afirmar que a municipalização não consistia
apenas em questões técnicas, mas sobretudo em questões políticas, sociais e culturais.
4
Formada por três volumes, (primeiro tratava sobre os aspectos Financeiros da Municipalização, o
segundo propostas para a Organização da Rede de Ensino Fundamental nos Municípios e o último volume
sobre transferências de Patrimônio e recursos humanos),
93
5. CONCLUSÃO
Neste capítulo, procuramos mostrar que a municipalização não é um tema novo e
que freqüentemente aparece atrelada às questões da descentralização, autonomia e
democracia.
Desde os anos 20 até o final da ditadura Vargas, a ala dos educadores renovadores,
liderados pela figura de Anísio Teixeira, brigava pela descentralização dos serviços
educacionais, cujas normas de administração tinham sido herdadas do Estado Novo.
A municipalização do então chamado ensino primário não significava uma mera
reforma administrativa ou pedagógica. Pleiteava-se a implantação, no nível de ensino
fundamental, de um só regime: o das escolas locais, administradas pelas autoridades locais,
de órbita municipal, sujeitas à organização ditada pelas leis estaduais e conformadas aos
objetivos das leis federais de diretrizes e bases. Estas escolas seriam mantidas com os
próprios recursos municipais, complementados em caso de necessidade por recursos
estaduais e federais.
A defesa da municipalização do ensino fundamental era realizada a partir da crítica
ao excessivo centralismo administrativo exercido pelo ministério e pelas secretarias
estaduais de ensino. Insistia-se sobre a necessidade de uma real transferência de poderes de
ação e decisão para os municípios como prova de autoconfiança dos brasileiros e com a
finalidade de adequar as escolas ao meio local e liberá-las da sufocante tutela
administrativa estadual e federal.
A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sancionada em 1961,
ao mesmo tempo em que se apresenta como uma proposta pela descentralização da
educação, representa uma legislação de caráter nacional e unificadora da educação.
Aprovada 10 anos depois, a Lei 5.692/71 reacende o debate e induz o Ministério da
Educação a programar, a partir de 1977, um amplo programa de apoio às administrações
municipais que ficou conhecido como Promunicípio.
Porém, os objetivos proclamados pelo programa de municipalização do ensino
iniciado a partir da década de 70 são definidos pelos militares, por meio de um regime
94
autoritário modernizador, burocrático e capitalista. Promovem a reforma administrativa de
1967 consubstanciada no Decreto-Lei 200, que procurou substituir a administração pública
burocrática por uma “administração para o desenvolvimento”.
Esta reforma administrativa, pautada no Decreto-Lei 200, propunha-se conquistar
basicamente a melhoria das condições do ensino municipal através da modernização
administrativa. Sua finalidade seria integrar as redes municipais de ensino aos respectivos
sistemas estaduais de educação, criando uma divisão de atribuições, na qual o ensino rural
caberia aos governos municipais.
As ações desenvolvidas não tiveram como meta a transferência de poderes, mas
tão-somente o fortalecimento e a melhoria das redes municipais, mantendo o seu
paralelismo com a rede estadual e buscando, no máximo, uma maior integração com as
diretrizes e metas da política educacional dos estados.
As reformas administrativas características dos anos 80 são apresentadas com
tendência à descentralização e descontração de poderes de decisão e à restauração da
capacidade de coordenação e planejamento, correspondendo ainda à organização
administrativa, proposta pelo decreto-lei nº200 de 1967, cujos princípios fundamentais
eram o de planejamento, descentralização, delegação de competência e controle tornando a
autonomia uma forma de resposta ao planejamento descentralizado.
A Constituição de 1988, promulgada no dia 5 de outubro de 1988, apresenta
expressa determinação de ampliação da autonomia dos Estados e Municípios, promovendo-
os à condição de entes federados.
No Estado de São Paulo, a municipalização entendida como transferência de
funções do governo federal e estadual para o nível municipal, principalmente no que se
refere à descentralização de poder e a autonomia municipal, pode ser identificada a partir
de 1983, com a municipalização da educação infantil, no governo de Franco Montoro.
Ao longo do capítulo, sustentamos que até 1995, diversos projetos e propostas
municipalizadoras não deram certo pela falta da contrapartida financeira do Estado para
com os municípios, proporcional às novas responsabilidades assumidas.
Entretanto, a partir de 1995, vimos que a política educacional desenvolvida pelo
Governo Mario Covas na Secretaria de Educação de São Paulo, estava atrelada à reforma
gerencial do estado brasileiro, caracterizada por uma administração pública orientada por
95
resultados, pela descentralização, flexibilidade, competitividade e por um direcionamento
estratégico. Neste sentido, a reforma educacional, cuja finalidade seria melhorar o
desempenho da escola, deveria ser compreendida como uma reestruturação gerencial,
fundamentada na revisão das concepções de gestão, planejamento e avaliação
Esta reforma educacional baseou-se na reforma administrativa formulada por
Bresser Pereira, que constituiria na verdade uma reforma gerencial, prevendo, entre outras
providências, a reorganização das ações estatais. Esta reorganização teria como seu aspecto
fundamental, a modernização do sistema, que deveria ser adaptado às mudanças exigidas
pelo mundo globalizado. Neste sentido, a reforma administrativa de Bresser Pereira visaria
à superação da antiga ordem burocrática patrimonialista tradicional.
Para dar sustentação financeira a esta reforma na educação, o governo federal criou
o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Magistério FUNDEF, que retinha 60% da
receita da Educação de Estados e Municípios, liberando-os de acordo com o número de
alunos matriculados na rede pública de cada local, com base no censo escolar do Ministério
da Educação – MEC.
Assim, a reforma administrativa é apresentada como a modernização que exigia um
novo perfil de gestor, identificado com o modelo de uma civilização globalizada, que exige
sua inserção em um sistema dominado por novas tecnologias de informação.
Desta forma, procuraremos no próximo capítulo, compreender como ocorreu a
organização da supervisão de ensino durante a implementação da municipalização em
Valinhos.
96
C
APÍTULO IV
A
SUPERVISÃO DE ENSINO NA MUNICIPALIZAÇÃO EM VALINHOS
1.
INTRODUÇÃO
Para que se possa compreender a organização da supervisão de ensino municipal,
torna-se necessária a analisar o processo de municipalização de Valinhos, no contexto das
reformas brasileiras da década de 90.
Em sua grande maioria, estas reformas, apresentavam formas mais flexíveis,
participativas e descentralizadas de administração dos recursos e das responsabilidades,
coerentes aos compromissos assumidos pelo Brasil na Conferência Mundial de Educação
para Todos, realizada em março de 1990, em Jontiem, na Tailândia, e na Declaração de
Nova Delhi de dezembro de 1993, de atendimento à demanda de universalização do ensino
básico.
A descentralização, com orientação para o planejamento, presente na Reforma do
Estado brasileiro, desde década de 60 por meio do Decreto 200/67, manteve-se como eixo
principal a flexibilização e desregulamentação da gestão pública, com a justificativa de
buscar a melhoria no atendimento do cidadão.
Neste contexto, a racionalização organizacional e a mudança nos padrões tornaram-
se num dos aspectos mais importantes destas modificações administrativas que teriam
apresentado reflexos no processo de municipalização. Assim, a municipalização insere-se
dentro dessa reforma gerencial da educação como uma proposta de modernização
administrativa do Estado e alternativa de gestão pública.
Para viabilizar a implementação da municipalização, definida pela Constituição
Federal de 1988 e intensificada pela Lei 9394/96, foi criado em setembro de 1996 o
FUNDEF, Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Magistério, responsável pelo
repasse da verba destinada ao ensino federal, que entraria em vigor a partir de 1998.
O período em que a municipalização foi implementada em Valinhos corresponde ao
início do governo de Vitório Humberto Antoniazzi – PL, eleito em 1996, com 41,64% dos
votos válidos, pela coligação: PPB/PDT/PL e PFL, segundo dados SEADE. Nomeou como
97
Secretária da Educação, Maria Cecília Amaral, Diretora aposentada da escola SESI nº 299,
de Valinhos.
Procuraremos tratar neste capítulo, sem perder o foco na supervisão de ensino, a
implantação da municipalização da educação em Valinhos, que se deu em duas fases, a
partir do ano de 1998. A primeira aconteceu no ano de 1998, com a municipalização no
primeiro semestre, apenas das escolas de 1ª a 4ª séries, rurais ou consideradas menor porte,
ficando o restante destas escolas para serem municipalizadas até o segundo semestre deste
mesmo ano. A segunda fase, que pode ser considerada mais complexa, aconteceu no
segundo semestre de 2001, com a municipalização de 5ª a 8ª série.
Assim, para que possamos compreender melhor a supervisão de ensino na
municipalização, retomaremos alguns aspectos da rede municipal em 1997, ano que
precedeu a concretização da parceria Estado de São Paulo e Município.
Neste contexto, apresentaremos algumas considerações dos aspectos mais relevantes
para a nossa pesquisa tanto sobre a cidade, quanto sobre sua história.
2.
A CIDADE DE VALINHOS
A cidade de Valinhos é o 8º Município mais populoso da Região Metropolitana de
Campinas, composta por 19 cidades do Estado de São Paulo. Ocupa uma área de 148,9
km
2
. Segundo dados do IBGE (outubro/2007), Valinhos possui 92.538 habitantes, e até
Setembro de 2006 contava com 95% da população na zona urbana e 5% na zona rural. Seu
território e está dividido na seguinte proporção: 65,9 km
2
de área urbana e 83,0 km
2
de área
rural e seu Índice de Desenvolvimento Humano Municipal, referente ao ano de 2000, é de
0, 842
Segundo dados da Prefeitura Municipal (2007), o município possui produção
industrial diversificada que coloca a cidade no 42° lugar em Valor Adicionado no Estado e
63º lugar em Valor Adicionado per capita. O Produto Interno Bruto (PIB) total é de
aproximadamente R$2.170.065,85 (dados de 2005). O PIB per capita é de R$23.479,21, o
5º dentre as 19 cidades da RMC (Região Metropolitana de Campinas) e 39º do Estado.
98
A agricultura também pode ser considerada um setor importante na economia de
Valinhos. Até da década de 70, o cultivo do figo roxo era predominante nas propriedades
rurais. Atualmente, o município já é considerado um grande produtor e exportador de
goiaba in natura. Este fato pode ser constatado com a incorporação em 1994 da “Expo
goiaba” na tradicional “Festa do Figo”, que é realizada no município desde 1949.
O figo roxo é, há 50 anos, base da riqueza de Valinhos, cidade com 92
mil habitantes, distante 86 quilômetros de São Paulo. Com problemas
persistentes na produção, os fruticultores tradicionais estão abrindo espaço para
a goiaba, mais rentável, e levando o figo para os municípios vizinhos, para
áreas menos valorizadas, em geral nas encostas. 'Valinhos ainda vai virar terra
da goiaba', prevê a produtora Geni Aparecida Catelan. (O ESTADO DE SÃO
PAULO, 2008; CADERNO AGRÍCOLA)
Este quadro de desenvolvimento econômico de Valinhos justifica a classificação da
cidade na 10ª posição dos municípios com menor grau de exclusão da Região
Metropolitana de Campinas, segundo reportagem realizada em janeiro de 2003 por de José
de Lima da Agencia Anhanguera (2007), ao comentar o lançamento do “Atlas da Exclusão
Social no Brasil” promovido pelo Conselho de Economia.
O artigo esclarece que foram dois anos de pesquisa realizada a partir dos dados do
Censo 2000 (IBGE). Foram ranqueados 5.503 municípios do País, através de um índice
fixado entre zero e um. Para chegar ao índice, os pesquisadores consideram três
componentes: padrão de vida digno, onde foram considerados os índices de pobreza,
emprego e desigualdade; conhecimento calculado com base no índice de anos de estudo e
alfabetização; e também risco juvenil, calculado de acordo com o índice de concentração de
jovens e índice de violência.
Segundo os pesquisadores, um dos pontos fortes de todos os nove municípios
colocados entre os 100 de menores exclusão do Atlas é o índice de alfabetização igual ou
superior a 0,9 numa escala fixada entre zero e um.
A educação de Valinhos possui 52 escolas públicas, entre municipais e estaduais,
SENAI, quatro escolas do ensino fundamental da rede SESI, além de escolas técnicas e
uma faculdade particular.
99
No ensino particular, o município reúne algumas escolas pertencentes a grandes
redes de ensino como o Colégio Visconde de Porto Seguro, Anglo, Objetivo e mais
recentemente o Colégio Etapa.
Segundo Plano Diretor (2003) a rede municipal de ensino neste período atendia
48% do total de alunos do ensino fundamental, ficando 11% para a rede estadual e os 41%
restantes pela rede SESI e particular.
3.
ALGUMAS ANOTAÇÕES SOBRE A HISTÓRIA DO MUNICÍPIO DE VALINHOS
A fertilidade da terra, o bom clima, a presença de água, favorecera o surgimento de
Valinhos, que recebeu este nome, ao que tudo indica, por se tratar de uma região formada
por vales. Segundo Memorial do Centenário, publicado pela Câmara Municipal em 1996,
estas terras serviram de passagem e pouso para os bandeirantes que iam para Minas Gerais
e Goiás à procura de ouro e pedras preciosas, percorrendo principalmente as margens do
Ribeirão Pinheiros, abrindo trilhas que mais tarde transformaram-se em cidades.
A região de Valinhos atraiu muitos fazendeiros. As primeiras fazendas cultivaram a
cana-de-açúcar passando posteriormente para o café. Assim, houve o fortalecimento e
conseqüentemente a expansão e o surgimento de um pequeno núcleo de pessoas e vilas
dispersas.
A inauguração da estação ferroviária da Companhia Paulista da Estrada de Ferro de
Valinhos, em 28 de março de 1827, proporcionou a ampliação do núcleo urbano ao redor
da estação. Ao citar Pires, Spézi (2004) mostra a importância da ferrovia para a cidade.
A ferrovia servia o tronco Campinas-Jundiaí e escoava a produção
cafeeira até o porto de Santos, além de se configurar com o espaço muito usado
para o encontro social da população. Muitos passageiros, entre eles os barões
de café e seus familiares, embarcavam nos “luxuosos vagões” com destino à
capital paulista. O café e o sistema de transporte ferroviário fizeram com que a
Vila de Valinhos tivesse grande desenvolvimento comercial e em serviços,
chegando a ser a maior estação de despacho de café da Província de São Paulo,
até a chegada dos trilhos em Campinas e Rio Claro, quando passa a ocupar o 3º
lugar em volume embarcado (PIRES, 2000 – apud Spézi, 2004)
100
O final da escravidão no Brasil, em 1888, obrigou a substituição da mão-de-obra
escrava pelos migrantes italianos que começaram a chegar a Valinhos. Segundo Spézi
(2004), as primeiras famílias de migrantes italianos que chegaram procedentes do norte da
Itália (Vêneto), desembarcaram no porto de Santos e seguiram de trem para Valinhos.
Em 1889 a região foi acometida por uma epidemia de febre amarela que reduziu a
população de Campinas de 20 mil para 4 mil habitantes .Valinhos que pouco sofreu com a
doença, serviu de abrigo para muitos campineiros.
Este fato favoreceu a transferência da Sexta Secção Eleitoral de Campinas para
Valinhos, o que facilitou sua transformação em Distrito, publicado na página 7840, no
Diário Oficial do Estado do dia 1º de setembro de 1893, dentro do Expediente da Secretaria
dos Negócios da Justiça, ato de criação do “Distrito Policial de Valinhos”. (C.M.V, 1996).
A 21 de dezembro de 1900, o distrito é elevado à categoria de Paróquia, elegendo, São
Sebastião como santo padroeiro, desvencilhando Valinhos da Paróquia de Nossa Senhora
da Conceição de Campinas.
A crise cafeeira no começo de século XX obrigou os fazendeiros a se desfazerem de
partes de suas terras, muitos imigrantes compraram estas terras e diversificaram a produção
agrícola, dando início ao cultivo das frutas e cereais.
A cultura do figo roxo foi introduzida em 1901, pelo o imigrante italiano Lino
Buzatto com mudas que vieram da Itália. Começou então em Valinhos o ciclo da
fruticultura. A produção de figos no distrito atinge escala comercial em 1910 e se fortaleceu
após a crise de 1929, com a derrocada do café. No final da década de 40, a vila-sede do
Distrito constituía-se de mais de 400 prédios.
Suas vias públicas eram calçadas com paralelepípedos, e já possuía luz
elétrica, telefone e serviço de abastecimento de água, inaugurado no dia 4 de
janeiro de 1941, com a presença do governador Adhemar de Barros. Além disso,
havia também matadouro público, sub-prefeitura e sub-delegacia de Policia,
todos com prédios próprios e outras benfeitorias. Por ser Distrito de Campinas,
as principais decisões políticas e administrativas eram tomadas ou pela Câmara
Municipal ou pela Prefeitura. No período de 1.896 a 1.955, leis, atos e decretos
que diretamente interferiam na vida dos valinhenses vinham de Campinas, como
é o caso do orçamento dos Distritos (C.M.V, 2007)
101
Neste período, Spadaccia (1985) estima que a população de Valinhos era 90%
italiana ou seus descendentes, e os outros 10% repartia-se entre brasileiros negros, ou
descendentes de portugueses, espanhóis, alemães e sírios. Fato que segundo o autor, levou
o jornal Diário do Povo de Campinas a se referir a Valinhos como “Pícola Itália
Criaram-se novos setores comerciais e industriais como armazéns, olarias,
barbearias, serralherias, carpintarias, farmácias etc, favorecendo o fortalecimento da
economia.
Spézi (2004) conta que em 1897, o italiano José Milani, dono de uma sapataria e de
um armazém de secos e molhados, criou a primeira indústria do município, inicialmente no
fundo de seu quintal, com a fabricação de sabão; a fabriqueta expandiu-se durante o 1º
Guerra Mundial, com a importação de perfumes. Esta fábrica em 1932 muda a razão social
para Cia Gessy Industrial; vendida em 1960 para o grupo anglo-holandês Unilever,
transfamdo-se em multinacional.
Na década de vinte, além da Gessy, Valinhos contava com importantes empresas
como a Fábrica de Papel e Papelão Ribeiro Gerin S/A e o Cartonifício Valinhos.
Entre 1910 e 1920 e após 1935, as cerâmicas e olarias, situadas ao longo
do Ribeirão Pinheiros, tornam-se muito importantes no desenvolvimento
econômico da localidade e na urbanização do Distrito. A produção de telhas e
tijolos era transportada por trem para toda a região e capital. (SPÉZI, 2004)
Em relação à educação, o Memorial do Centenário (1996:30) relata que Cristiano
Wolkart foi o primeiro professor nomeado em 1885 para assumir a classe recém-criada no
vilarejo. Ao chegar não encontrou nada que parecesse com uma sala de aula ou alguém que
a patrocinasse. Mas o professor não se deu por vencido. Pediu uma estrebaria emprestada e
instalou oficialmente a primeira escola de Valinhos.
No ano de 1911, as escolas isoladas existentes no Distrito foram reunidas num único
grupo conhecidas como Escolas Reunidas, que em 1945 deram origem ao Grupo Escolar.
Percebe-se como diferencial neste período em que a educação no país era para poucos,
principalmente para as mulheres, Valinhos no início do século, em 1914, contava com duas
escolas femininas e uma mista, que segundo Memorial do Centenário (1996) chamavam-se:
Primeira Feminina, regida pela professora Regina Santos, Segunda Feminina, regida pela
102
professora Maria Amélia Castro Serra e Mista pela professora Natalina Pontes. (C.M.V,
1996)
Spadaccia (1985) relata que na década de 20 estudava nas Escolas Reunidas de
Valinhos, localizada em um casarão, que em 1945 passou a chamar-se Escola Estadual
Professor Alves Aranha.
É importante frisar que o curso primário naquele tempo terminava no 4º
ano, terminando praticamente o aprendizado de 90% dos alunos, uma vez que
não existiam em nossa Vila, escolas superiores e era muito difícil uma
matrícula nos poucos colégios de Campinas. (SPADACCIA, 1985:89)
Segundo Spézi (2004), em 1950 iniciou a imigração japonesa, concentrada no
Bairro Macuco. Os japoneses transformaram a cultura da goiaba num produto agrícola de
grande importância para a cidade. Além da goiaba, também se destacaram no cultivo do
figo e da uva.
Este cenário despertou na população uma exigência por mais autonomia. Valinhos
já contava com importantes empresas, muitas cerâmicas se instalam ao longo do leito do
Ribeirão Pinheiros e a agricultura valinhense, com lastro na fruticultura, passou a ser
valorizada nos grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro.
O desejo de se tornar uma cidade e de ter autonomia política e administrativa ganha
impulso a partir do final da década de 40 e, em 1952, nasce o Movimento
Emancipacionista.
No Memorial do Centenário (1996:37), encontramos a referência, que a Câmara
Municipal de Campinas, apresentou grande resistência ao movimento emancipacionista,
manifestada principalmente por um vereador do Partido Trabalhista Brasileiro, que
determinou como represália, a suspensão de todas as obras de vulto projetadas para
Valinhos, como a pavimentação da rodovia Campinas/Valinhos e a ligação asfaltada com a
Via Anhanguera.
Apesar da pressão contrária da Câmara de Campinas, no dia 29 de novembro de
1953 realizou-se o plebiscito sobre a emancipação. Compareceram 875 eleitores e o
resultado foi 866 votos a favor da emancipação, 8 contrários e 1 voto em branco. Um dia
depois o Governo do Estado promulgou a lei nº 2456, criando o município de Valinhos.
103
A primeira eleição municipal realizou-se no dia 03 de outubro de 1954. Em um total
de 3.435 eleitores, elegeu-se o Sr. Jerônimo Alves Correa como primeiro prefeito da cidade
com 1.832 votos contra 1.708 do seu adverrio José Spadaccia. Segundo o Memorial do
Centenário (1996), ao todo votaram 3.435 eleitores, sendo que a população neste ano era de
10.601 habitantes, de acordo com o Departamento Estadual de Estatística do Estado.
Os votos entre os partidos que elegeram vereadores nesta primeira eleição ficou
distribuída em: PSP - 5 vereadores (1091 votos), PTB – 5 vereadores (1008 votos) e PRP-3
vereadores (564 votos).
4.
CARACTERÍSTICAS DA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO NO ANO DE 1997
A) DEMANDA ESCOLAR
O ano 1997 se inicia com uma nova gestão. Maria Cecília Amaral, ex-diretora da
Escola SESI 299 de Valinhos, é nomeada Secretária de Educação pelo Prefeito recém eleito
Vitório Humberto Antoniazi, do Partido Liberal. A Secretária encontrou a rede municipal
formada exclusivamente por escolas de Educação Infantil. A demanda escolar do
município, como apresenta a Tabela 7, demonstra que o município tinha assumido
integralmente a educação infantil, já municipalizada no Estado de São Paulo.
Tabela 4 - Demanda de Alunos do Município.
Ano
Rede Estadual Ensino
Fundamental
Rede Municipal
Ensino Fundamental/EJA
Rede Municipal
Educação Infantil
1997 9.052 533 2.509
Fonte: IBRAP: 1996 / INEP – Censo Escolar 1997
As escolas de Educação Infantil eram organizadas nos seguintes níveis:
Jardim I – para crianças de 4 a 5 anos incompletos
Jardim II – para crianças de 4 a 6 anos incompletos
Jardim III – par crianças de 6 a 7 anos incompletos
104
B) ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA DA SE
A Secretaria da Educação, neste período era organizada pelas normatizações de um
Estatuto específico para Magistério Municipal, Lei 2.693/93, complementada pelas
determinações do Estatuto do Servidor Municipal, Lei 2.018/96.
O Estatuto do Magistério em vigor estabelecia que ingresso do professor deveria
ser realizado por concurso público de provas e títulos. Entretanto, se o servidor em
exercício fosse aprovado, lhe seria concedida à vantagem de somar até cinco pontos, “meio
ponto por ano”, em sua classificação final.
Por outro lado, o preenchimento do cargo de especialista, como Diretor, Assistente
de Diretor ou Supervisor de Ensino se daria por indicação, remoção ou acesso, exigindo-se
no caso de acesso aos dois primeiros cargos, que o professor contasse no mínimo com três
anos de serviço no Quadro de Carreira do Magistério Público. Entretanto, não há nenhuma
referência aos critérios para o preenchimento do cargo de Supervisor de Ensino, como
também não se esclarecem os critérios de seleção os outros cargos.
Neste sentido, pode-se afirmar que o Estatuto do Magistério, vigente no período,
procurava adequar uma administração tradicional à nova Constituição de 88, que
estabelecia a exigência de concurso público para o ingresso em cargo público. Dessa forma,
mantinha-se uma estrutura administrativa patrimonialista de organização, marcada por uma
cultura de favorecimentos, que procurava conservar, atribuindo pontuação por tempo de
serviço, mesmo realizando concurso, para os servidores mais antigos, já adaptados ao tipo
de administração local.
C) PROJETOS EDUCACIONAIS
Ao assumir a rede municipal de educação, a Profª Maria Cecília apresentou
propostas que promoveram tanto a descontinuidade como a mudanças de muitas atividades,
viabilizando também projetos que trouxeram profundas alterações à educação infantil e ao
ensino fundamental.
Nesta situação encontramos o projeto de educação especial denominado (Re)
Integrar, que desde 1993 era desenvolvido pelo município no Centro de Aprimoramento
para a Escola Inclusiva – CAPI. Tinha como objetivo a integração escolar de alunos que
105
apresentavam déficits intelectuais nos diferentes níveis e tipos de ensino, desenvolvidos
pela rede de Valinhos.
O projeto (Re)Integrar foi gradualmente substituído por uma proposta considerada
inovadora de inclusão escolar, apresentada pela professora da Universidade Estadual de
Campinas, Dra. Maria Teresa Egler Montoan. Mas este programa também foi extinto,
praticamente um ano após sua implementação, ficando a rede municipal de educação
desprovida de qualquer projeto voltado para educação especial.
A mudança curricular para a educação infantil ocorreu no segundo semestre de
1997, quando se implantou na rede municipal o Programa do Pré-Escolar – PROEPRE.
Fundamentado na psicologia genética piagetiana e no construtivismo pedagógico. O
programa era desenvolvido pela Professora Doutora Orly Zucatto Mantovani, do
Laboratório de Psicologia Genética da UNICAMP. Este programa estava voltado para a
educação infantil e tinha a finalidade, segundo sua autora, de promover o desenvolvimento
da criança no seu aspecto físico, intelectual, social, moral e afetivo.
A Secretaria de Educação firmou um contrato com a UNICAMP, no
valor de R$60.000,00 para que seus professores e coordenadores recebam um
treinamento de 240 horas, distribuídas em seis módulos, durante os meses de
Julho a Dezembro de 1997, e em Fevereiro, Março, Maio e Julho de 1998. Os
coordenadores do curso se comprometeram ainda a oferecer mais 160 horas de
supervisão direta, nas salas de aula. (NOTÍCIAS DE VALINHOS, 1997)
Entre as novas propostas de caráter modernizador da Secretaria da Educação,
insere-se a municipalização da educação em Valinhos, que já estava sendo articulada há
algum tempo com o governo do Estado de São Paulo.
O caminho seguido pela implementação da municipalização apresentou-se cheio de
fissuras, controvérsias, incertezas, demonstrando que estas mudanças no sistema
educacional paulista teriam como finalidade a racionalização da estrutura administrativa,
otimização na gestão dos recursos materiais e humanos.
Estas questões aparecem nas declarações de Maria Cecília Amaral, ao jornal
Correio de Valinhos (14/08/1997), ao afirmar que a prefeitura deveria entregar o projeto da
municipalização, exigido pelo governo federal, até 1º de outubro daquele ano. Reconhecia,
106
na reportagem, que a municipalização mexeria com todo processo de educação e que
precisaria ser analisada cautelosamente para que não houvesse erros graves.
Adiantou, ainda na mesma entrevista, que estudaria primeiramente as questões
administrativas para depois discutir as questões pedagógicas, afirmando também que as
mudanças ocorreriam gradativamente. Alinhada às estratégias de municipalização da
Secretaria do Estado de Educação de São Paulo, afirmou que inicialmente seriam
municipalizadas todas as escolas de 1ª a 4ª série, num total de 15 estabelecimentos de
ensino envolvendo 120 professores e 4.800 alunos. Os períodos (manhã/tarde) separariam
os alunos municipalizados de 1º a 4º dos de 5º a 8º da rede estadual.
Aproveitou para comunicar que a prefeitura faria uma reunião com todos os
professores e interessados, para informar sobre as linhas de orientação quando o projeto
estivesse pronto.
Procurou reforçar as vantagens da municipalização ao pontuar a existência de vários
projetos de construção e reformas de prédios escolares para o primeiro semestre do ano
seguinte e destacou que a municipalização visava melhorar o ensino no Brasil, devido a
descentralizações das decisões.
Por outro lado, assegurou que não haveria diminuição da verba para do ensino pré-
primário após a assinatura do Convênio, pois o governo municipal continuaria empenhado
em manter a mesma qualidade de ensino para os alunos das escolas de educação infantil de
Valinhos.
Entretanto, a condução do processo de municipalização passou a ser alvo de
preocupação da opinião pública, que culminou no comparecimento de Maria Cecília
Amaral à Câmara Municipal para prestar esclarecimentos sobre o assunto, conforme
reportagem do Jornal Terceira Visão (15/08/97).
As dúvidas e incertezas foram novamente destaques do Jornal de Valinhos (22/08/97)
ao salientar que a própria Secretária de Educação havia declarado que a “municipalização
do ensino ainda seria um mistério”, porque só seria definida em audiência marcada para o
dia 30 de setembro na Secretaria de Estado da Educação de São Paulo.
Maria Cecília também explica nesta edição do jornal, que os professores efetivos da
rede estadual continuariam recebendo seus salários do Estado, mesmo que optassem por
trabalhar no município, mas que os contratados (ACTs) deveriam ingressar por meio
107
concurso público municipal para regularizar sua situação. O jornal deu como consumada a
municipalização em Valinhos, ou seja, não teria mais volta, pois seu início já estaria
definido para o dia 1° de janeiro de 1998.
A reportagem também abordou a aprovação pela Câmara Municipal, de três projetos
de lei necessários para a municipalização. O primeiro deles autorizava o Prefeito a assinar o
Convênio com o Estado; o segundo determinava a composição do Conselho Municipal de
Educação; e o terceiro estabelecia a formação do Conselho Municipal de Acompanhamento
e Controle Social do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
de Valorização do Magistério, atendendo determinação do FUNDEF.
Nesse sentido, é importante observar que os três projetos citados no artigo já haviam
sido aprovados desde abril do ano de 1997 e foram transformados nas seguintes leis:
a) Lei nº 3107 de 27 de abril de 1997 – “dispõe sobre a criação do Conselho
Municipal de Acompanhamento e Controle Social do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento e Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério.”
b) Lei nº 3110 de 27 de abril de 1997 – “autoriza o Poder Executivo Municipal a
celebrar convênio com o Estado de São Paulo, por intermédio da Secretaria da
Educação objetivando a implantação e o desenvolvimento de Programas na
Área da Educação”
c) Lei nº 3111 de 27 de abril de 1997 – “dispõe sobre a criação do Conselho
Municipal de Educação”
Essas normatizações, aprovadas tão antecipadamente pelo legislativo, eram
consideradas pré-requisito para a assinatura Termo de Convênio, que seria o documento
legal de normatização da municipalização no Estado de São Paulo.
Assim, antes de encerrar o ano de 1997, efetivou-se a eleição dos representantes
tanto do Conselho Municipal de Educação, quanto do Conselho Municipal de
Acompanhamento e Controle Social do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do
Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério.
Em entrevista ao jornal Correio de Valinhos (27/03/98) sobre a posse dos
Conselhos Municipais de Educação e do FUNDEF, Professora Maria Cecília Amaral, de
forma conciliadora, procurou explicitar sua proposta para as reuniões do referido Conselho:
108
(...) que nossas reuniões sejam proveitosas, visando o bem das
crianças; dos adolescentes, enfim, da educação. “Vamos deixar de lado
nossas discórdias, porque a nossa meta deve ser uma educação melhor,
para formar indivíduos melhores e tornar o mundo melhor” (CORREIO
DE VALINHOS, 1998)
O artigo é encerrado com o seguinte comentário do então prefeito Vitório
Antoniazi: A Municipalização ainda vai ser muito discutida. Mas temos que exercer a
democracia, que a é arte de convergir às divergências, e escolher o melhor caminho para a
educação. A prioridade é a classe estudantil.
5.
A IMPLEMENTAÇÃO DA MUNICIPALIZAÇÃO EM VALINHOS.
A implementação da municipalização em Valinhos se iniciou no ano de 1998 e foi
dividida em duas fases. A primeira aconteceu com a municipalização apenas das escolas de
1ª a 4ª séries, rurais ou consideradas de menor porte, ficando o restante destas escolas para
serem municipalizadas até o segundo semestre deste mesmo ano.
A segunda fase, que pode ser considerada mais problemática, aconteceu no segundo
semestre de 2001, com a municipalização de 5ª a 8ª série. Era mais complexa porque exigia
uma organização diferenciada que envolvia professores especialistas, currículos específicos
e uma demanda de alunos e pais muito diferente da 1ª a 4ª série, que apresentam um perfil
semelhante aos da educação infantil.
A estratégia de dividir a municipalização em duas fases atendia ao planejamento
realizado pela Secretaria de Estado da Educação, como demonstra o documento elaborado
por esta Secretaria, sobre a implantação da municipalização de São Paulo.
Eram números impressionantes e efetivamente causavam impacto nos
prefeitos. Mas havia uma questão a ser resolvida: a empreitada de assumir de
uma só vez todos os alunos de ensino fundamental parecia aos municípios uma
aventura perigosa. (...) Aos (prefeitos) que chegavam pensando em começar a
municipalização apenas com as escolas rurais, por exemplo, aconselhava-se
que incluíssem em seu projeto um ou duas escolas urbanas, que agregavam
números mais substantivos de matrículas, para que sua receita financeira global
pudesse cobrir os custos das rurais, que tradicionalmente atendem a números
reduzidos de alunos. (SÃO PAULO/SE, 2002)
109
Torna-se importante ressaltar que todo o processo de municipalização do Estado de
São Paulo foi organizado a partir do Programa de Parceria Educacional Estado/Município,
que criou, como instrumento administrativo, o Termo de Convênio, que era constituído por
um Plano de Trabalho do município, com objetivos e metas, um Plano de Aplicação dos
Recursos e um Cronograma de Desembolso Financeiro.
Este Termo de Convênio tem como base legal o artigo 211 da Constituição Federal
de 1988, que estabelece como estratégia de organização da educação nacional o regime de
colaboração entre sistemas de ensino da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios. Esta disposição constitucional é reiterada no artigo 8º da Lei 9394/96.
O regime de colaboração pode ser entendido como a diretriz legal que tem como
objetivo resolver a fragmentação da organização da educação nacional por meio da
organização de sistemas de ensino autônomos.
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. (grifos
nossos. C.F, 1988)
Assim, o regime de colaboração, segundo documento do PRASEM (1999) devia-se
constituir numa forma de relacionamento entre sistemas de ensino, tornando-se necessária a
organização dos Sistemas Municipais de Ensino. Ao organizarem os seus sistemas, os
municípios poderiam se relacionar como iguais, de maneira autônoma, sem subordinação
nem hierarquia, com a União e o estado, estabelecendo com estas instâncias formas de
colaboração.
Por outro lado, a Deliberação do Conselho Estadual de Educação 11/97, que dispõe
sobre os sistemas municipais de ensino, orienta que o município que optar pela criação de
seu Sistema Municipal de Educação, além de comunicar sua decisão ao Conselho Estadual
de Educação, deverá dispor de estrutura administrativa suficiente para a autorização,
credenciamento e supervio de escolas, por seus órgãos próprios.
O próprio Conselho Estadual de Educação explica, na Indicação 10/97, que uma das
condições para se formar um sistema educacional é a existência de, além do Conselho
Municipal de Educação, um órgão executivo (Secretaria de Educação, Departamento de
110
Educação ou órgão equivalente) para o exercício de funções próprias, destinadas à
administração do sistema e à supervisão das escolas.
Entretanto, além da possibilidade de organizar o sistema educacional de forma
gradual, o regime de colaboração também exige, segundo o documento do PRASEM
(1999), a realização de parcerias entre as diferentes instâncias administrativas do país, no
que se refere à educação.
Estados e municípios podem celebrar convênios nos quais a transferências
de responsabilidades por determinado número de matrículas no ensino
fundamental seja acompanhada da correspondente transferência de recursos
financeiros (Lei nº 9.424/96, art.3º,§9º) (BRASIL/PRASEM, 1999)
Este emaranhado de normas legais, ao mesmo tempo em que orienta a organização
dos sistemas municipais de educação e a realização de parcerias municipalizadoras
concretizadas através de convênios normatizadores, abre a possibilidade ao município de
integrar-se ao sistema estadual ou compor com o estado um sistema único enquanto não
houver condições de constituir seu sistema de ensino autônomo.
Desta forma, Valinhos ao assumir a municipalização e assinar o termo de Convênio,
passou a ter as seguintes obrigações:
Criar ou adequar o Conselho Municipal de Educação.
Elaborar o Plano Municipal de Educação, de forma integrada às políticas e
planos educacionais do Estado, tendo em vista as diretrizes e planos nacionais de
educação;
Realizar processo seletivo ou concurso público para ingresso, em quadros
próprios do município, de profissionais do magistério, pessoal técnico e
administrativo, necessários à execução das ações previstas no Plano de Trabalho.
Instituir ou adequar o Plano de Carreira e Remuneração do Magistério
Municipal.
Criar mecanismos de controle de freqüência dos docentes e do pessoal técnico e
administrativo, seus diferentes regimes
111
Estes aspectos normatizadores do Termo de Convênio nos remetem aos princípios
norteadores que apoiavam a reforma administrativa de 1995: racionalização e otimização
por meio de redução dos custos com pessoal, materiais e espaços físicos, garantidos pelo
novo padrão de gestão. Assim, torna-se importante reforçar que a municipalização do
Estado de São Paulo, apresentada como uma forma racionalização da estrutura
administrativa baseava-se nos seguintes eixos:
a) O primeiro desses eixos relaciona-se com o objetivo de racionalizar e otimizar o
sistema, por meio de um “enxugamento da máquina”, a qual passaria a funcionar
com uma estrutura mais ágil e eficiente na tomada de decisões e
acompanhamento das políticas educacionais e na informatização dos dados
gerenciais educacionais.
b) O segundo eixo refere-se à autonomia da escola, entendida de acordo com o
discurso oficial, com a autonomia financeira, pedagógica e administrativa das
escolas;
c) O último dos eixos refere-se à política da valorização profissional do quadro do
magistério, e nesse sentido a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo
propõe que cada município deverá elaborar ou adequar um novo Plano de
Carreira, Vencimentos e Salários, procurado eliminar as distorções incorporando
gratificações e abonos ao salário docente bem como redimensionar a jornada de
trabalho, tornando-a mais racional.
Desta forma, pode-se dizer que a rede municipal de Valinhos procurou fazer as
adequações que julgava necessárias, procurando “adequar” sua organização antiga e
tradicional, às exigências do Termo de Convênio.
112
6.
PRIMEIRA FASE DA MUNICIPALIZAÇÃO
O censo escolar do ano de 1998, como demonstra a Tabela 8, acusou um aumento
na demanda municipal de 611% em relação ao ano anterior.
Tabela 5 - Demanda de alunos do ensino fundamental do município
Fonte: INEP, Censo Escolar.1998
Este crescimento veio acompanhado de muitas novidades. Logo no mês de março,
começaram a funcionar os Conselhos da Educação e do FUNDEF, que passaram a
reunirem-se mensalmente ou de acordo com as necessidades.
O Conselho Municipal de Educação passou a funcionar com a seguinte
configuração:
Secretária de Educação na condição de Presidente
Docentes de Educação Infantil
Docentes de Ensino Fundamental
Corpo administrativo da Secretaria da Educação do Município
Entidades e associações de classes ligadas à Educação atuando no Município
Pais de alunos de educação infantil
Pais de alunos das escolas particulares
Docentes da rede estadual de ensino
Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do adolescente
Pais de alunos do ensino fundamental
Servidores municipais que atuam na área da educação
Representantes dos alunos das escolas particulares
Representantes dos alunos da rede pública
Ano Rede Estadual Fundamental
Rede Municipal
Fundamental/EJA
Crescimento
1997 9.052 533 -
1998 5.713 3.790 611%
113
Dentro do processo de adequações, foi promulgada a Lei Municipal nº 3182/98 que
alterou toda estrutura administrativa da Prefeitura Municipal, propondo uma organização
menos centralizadora, criando as Secretarias, que teriam seus Departamentos específicos
que também seriam divididos em seções:
I - Primeiro Nível: Secretaria Municipal
II - Segundo Nível: Departamento;
III- Terceiro Nível: Seção
Em decorrência dessa Lei, a Secretaria de Educação organizou-se estabelecendo o
seguinte organograma (Figura 4)
114
Figura 4: Representação do organograma da secretaria de educação de Valinhos.
No contexto destas mudanças administrativas, agregadas a preocupação de
preencher as vagas decorrentes da nova situação da Secretaria da Educação, abriu-se um
concurso público, com edital publicado no Boletim Municipal nº 521 de 11 de agosto de
1998, para os cargos de chefe de seção, como também para quase todos os cargos da
carreira do magistério (professor, coordenador e professor) excetuando-se o cargo de
supervisor de ensino.
Destaca-se neste edital, no item que se refere a “Classificação” a determinação de
que seriam considerados títulos o tempo de serviço dos Servidores da Prefeitura do
SECRETARIA DA EDUCAÇÃO
115
Município de Valinhos que foram considerados estáveis nos termos da Constituição
Federal, somando-se 20 (pontos) para quem se enquadrasse nesta situação.
Neste sentido, mais uma vez, a velha estrutura organizacional patrimonial, mostrou-
se fortalecida, encontrado formas de perpetuar as relações tradicionais, pesar de todo
discurso de modernização e democratização, excluindo a supervisão de ensino desta
primeira fase da municipalização.
As relações gerais são reguladas pela tradição, pelo privilégio, pelas
relações de fidelidade feudais ou patrimoniais, pela honra estamental e pela
“boa vontade.” O poder senhorial acha-se, pois, repartido entre o senhor e o
quadro administrativo com título de propriedade e de privilégio, e esta divisão
de poderes estamental imprime um caráter altamente estereotipado ao tipo de
administração. (COHN: 133)
7.
SEGUNDA FASE DA MUNICIPALIZAÇÃO
Com o crescimento da rede de ensino em de 611 % na demanda de alunos, em
apenas um ano, aumentaram-se também os problemas, que exigiam soluções mais rápidas e
complexas. Percebe-se que a estrutura organizacional da Secretaria da Educação não foi
alterada, mantendo o mesmo tipo de organização tradicional do período anterior a
municipalização.
Mas esta cultura institucional começou a sofrer mudanças, na segunda fase da
municipalização em Valinhos, que aconteceu em agosto de 2001. A incorporação à rede
municipal das 5ª a 8ª séries do fundamental representava uma demanda muito diferente das
1ª a 4ª séries, exigindo uma nova organização que envolvia professores especialistas,
currículos específicos. Como mostra a Tabela 8, o acréscimo deste nível do fundamental,
fez com que a rede de Valinhos aumentasse mais em 76,3% neste ano de 2001, totalizando
1.073,5% em quatro anos de municipalização.
116
Tabela 6 - Demanda de alunos do município
Fonte: INEP, Censo Escolar.
Além desse elevado crescimento da demanda, os novos padrões solicitados pelo
Termo de Convênio, FUNDEF, faziam com que o município passasse a assumir novas
competências de gestão que esbarravam na administração antiga, centralizada, pautada no
apadrinhamento e favorecimentos.
A cultura institucional – o sistema de crenças, valores e de interação dos
atores entre si e entre estes e a própria organização – ao ser instada a se
modificar, metaforiza parte do ritual normativo, incorporando o velho no novo
desenho que se forma como estratégia de sobrevivência. (MARTINS, 2004)
Entretanto, um pouco antes de iniciar esta última fase da municipalização, percebeu-
se um movimento na Secretaria da Educação para a realização de algumas adequações ao
novo desenho institucional, exigido pelas normatizações contratuais. Nesse contexto,
encontramos no edital 1/1999, publicado no Boletim Municipal, a abertura de apenas uma
vaga para o cargo de Supervisor de Ensino, além de mais 09 vagas para Coordenador
Pedagógico/Pedagogo.
Surpreendemente, o cargo de Supervisor de Ensino não foi preenchido porque o
único classificado, Diretor de unidade escolar da própria rede municipal de Valinhos,
desistiu de assumir vaga, ao perceber que a referência salarial do cargo pretendido era
equivalente ao cargo de Coordenador Pedagógico, ou seja, duas referências de vencimento
abaixo do cargo que ocupava como Diretor de escola. Lembramos que a hierarquia da
Carreira do Magistério é constituída inicialmente pelo Professor, seguido pelo Coordenador
Pedagógico/Pedagogo, Diretor de Unidade Escolar e Supervisor de Ensino.
Ano
Rede Estadual
Fundamental
Rede Municipal
Fundamental
Crescimento Rede
Municipal (%)
1997 9.052 - -
1998 5.713 3.790 611,1
1999 5.837 3.653 -3,6
2000 5.282 3.548 -2,9
2001 2.643 6.255 76,3
117
Percebe-se que para os responsáveis pela Secretaria de Educação de Valinhos, não
estava ainda claro como seria a organização de um sistema educacional, no qual o
Supervisor de Ensino deveria possuir a atribuição legal para autorizar, credenciar e
supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino.
A necessidade de forjar novas formas de desempenho das políticas
educacionais exige que as instituições envolvidas em sua implementação
adquiram um corpo de informações e de conhecimentos burocráticos
administrativos para assumir suas novas funções, o que sem dúvida, gera um
período de tensão política e de vácuo normativo-legal, pois sua racionalidade
não responde mais às necessidades do cotidiano. (MARTINS, 2004)
Este período de transição conduz a Secretaria da Educação a rumos inesperados,
configurando um período de instabilidade institucional, apontado por Martins (2004), como
responsável pela necessidade de romper os paradigmas de uma cultura administrativa
antiga, enraizada nos seus órgãos gestores e nas escolas.
É nesse vácuo que os professores, diretores e coordenadores
pedagógicos têm sido chamados a desempenhar suas funções, enfrentando as
inovações propostas pela Secretarias Municipais de Educação, estas próprias
protagonistas estreantes em seus novos papéis institucionais, pois acabaram de
assumi-los. (MARTINS,2004)
O município assumiu, portanto, diferentes obrigações relativas à implementação da
municipalização. A atenção para o Quadro do Magistério priorizou inicialmente a situação
dos professores, seguidos pela necessidade de contratação de Diretores e Coordenadores
Pedagógicos, cargos que já existiam no município.
Pode-se dizer que a implantação da segunda fase da municipalização, fixada no
meio do ano letivo, foi marcada por situações improvisadas, confusas e até mesmo
arbitrárias. A Lei Municipal nº 3544, de 25 de julho de 2001, que criou 100 cargos de
professores especialistas, só foi promulgada um mês antes de iniciarem as aulas.
Foram criados os cargos para as disciplinas: Português (5 vagas), Matemática
(5vagas), Ciências (15 vagas), Geografia (15 vagas), Educação Física (15 vagas), Educação
Artística (15vagas), Inglês (15vagas) História (15vagas) além de 15 cargos para Diretor de
Unidade Educacional, 15 para Assistente de Direção de Unidade e 03 para Pedagogo.
118
Apesar de não ter sido criado nenhum cargo para a supervisão de ensino, destaca-se
nesta normatização, no parágrafo único do artigo 1º, a elevação de duas categorias da
referência de vencimentos para o supervisor de ensino. Esta correção, que ao mesmo tempo
repara um erro administrativo, pode ser considerada a primeira manifestação do executivo
em relação ao cargo de supervisão de ensino.
Parágrafo único – é alterada a referência de vencimentos de 24 para 26,
dos cargos de provimento efetivo, que requerem formação universitária
compatível ao seu exercício, de Supervisor de Ensino, constante na Estrutura
de Cargos, aprovada pela Lei Municipal nº3509/00, junto à Secretaria da
Educação. (VALINHOS, 2001)
No final do ano abriu-se novo concurso para o quadro do magistério municipal,
publicado no Boletim Municipal de 06 de novembro de 2001, sem apresentar qualquer
situação privilegiada, como nos concursos anteriores. Aumentou-se para 35 as vagas para
Professores de Português e Matemática, mantendo as 15 vagas já publicadas na Lei
Municipal 3544/2001 para as outras disciplinas e criou-se mais 30 vagas para o cargo de
Coordenador Pedagógico e 05 vagas para o cargo de Supervisor de Ensino.
Assim, o ano letivo de 2001 que iniciou dentro das normas do sistema estadual de
ensino, terminou antes que sistema municipal de educação concluísse sua organização, mas
com a promessa da contratação do Supervisor Municipal.
8.
OS PRIMEIROS ANOS DA SUPERVISÃO DE ENSINO NO MUNICÍPIO DE VALINHOS.
No início do ano de 2002, efetivou-se o primeiro Supervisor de Ensino Municipal,
quatro anos após o início da municipalização. Ficou lotado na sede da Secretaria da
Educação. De forma precária e improvisada foi instalado na mesma sala das chefias do
Fundamental I, da Educação Infantil e da Assessora contratada para organizar o
Fundamental II.
É importante esclarecer que o CAPI, após a extinção do programa para o
atendimento do aluno especial, transformou-se em um espaço para reuniões pedagógicas e
119
desenvolvimento de cursos, que eram definidos e coordenados pelo Chefe de Projetos, que
posteriormente acabou fixando-se definitivamente no CAPI.
Na primeira semana de exercício, o novo Supervisor de Ensino participou de uma
“capacitação”, com Coordenadores e Vice-Diretores, ministrada pelo Assessor do
Fundamental II, para apresentar os fundamentos do Regimento das escolas de ensino
fundamental da rede de Valinhos,
Este Assessor, ex-diretor de escola estadual, foi contratado para organizar o ensino
fundamental II nos moldes da administração estadual. Freqüentemente, suas ações que
estavam calcadas em um autoritarismo legal burocrático, típico das escolas estaduais,
entravam em conflito com a organização tradicional patrimonialista existente na Secretaria,
onde as decisões variavam segundo condições localizadas e pragmáticas.
O encontro entre o Supervisor de Ensino e a Secretária da Educação, aconteceu mais
de uma semana após sua posse, de forma casual, nas dependências da secretaria, pois a sala
da dirigente ficava ao lado da sala das “chefias”, onde estava instalado o novo Supervisor.
Neste período, observava-se que o grupo formador do quadro administrativo
burocrático da Secretaria da Educação, apresentava nítidas características patrimonialistas,
constituindo o estamento burocrático, no sentido weberiano.
Assim, verificava-se que as chefias tratavam suas seções como pequenos feudos,
que possuíam regras próprias, chegando a limitar as ações da própria Secretária da
Educação. Conseqüentemente, o princípio da fidelidade entre os chefes e seus
subordinados, regia a norma vigente.
O poder pessoal, a arrogância típica de quem pensa ser dono do cargo que ocupa,
acabava dificultando o relacionamento entre os diferentes segmentos da Secretaria da
Educação, entendendo-se que este tipo de conduta caracteriza o que Holanda (1997)
denomina por funcionário patrimonial.
Para o funcionário “patrimonial” a própria gestão política apresenta-se
como assunto de seu interesse particular; as funções, os empregos e os
benefícios que deles auferem relacionam-se a direitos pessoais do funcionário
e não a interesses objetivos. (HOLANDA, 1997:146)
120
Logo de início, ao novo Supervisor de Ensino foi atribuído como sua única
competência, a organização das dez escolas particulares de educação infantil , sendo que
neste período sempre era excluído de reuniões deliberativas, para definições de rotinas
administrativas ou pedagógicas.
Aos poucos, foi-se percebendo que não se registrava os procedimentos, ou seja, a
norma era não registrar. A tradição servia de apoio a arbitrariedade do dirigente. Embora
existisse um organograma, as atribuições não eram bem definidas. A lacuna entre os cargos
de Chefia e Supervisão se manifestava na confusão tanto da hierarquia como das
responsabilidades dos referidos cargos.
Esta caracterização permite compreender um tipo de burocratização
pertencente ao Estado não moderno, nascida do patrimonialismo, por ele
alimentado e dele alimentador, uma vez que se amolda às mudanças, adotando,
tão somente, a aparência de modernidade. O ajustamento às técnicas modernas,
porém, não aproxima o estamento burocrático da burocracia como expressão
mais pura da dominação legal e aparelho administrativo que assegura o
funcionamento do governo. (MENDES, 2001)
Assim, pode-se entender que neste período o Supervisor de Ensino representava o
confronto entre a dominação legal, que tem no aparato administrativo a burocracia, com a
dominação tradicional patrimonialista, caracterizada pelo uso da tradição para o exercício
do direito pessoal.
Neste cenário conflituoso, a ação supervisora se limitava apenas as visitas em
escolas infantis particulares. Percebia-se a perplexidade dos Diretores municipais, pela
ausência da atuação do novo supervisor. Ao mesmo tempo, estes também tinham suas
ações limitadas pela centralização das decisões na figura da Secretária da Educação, bem
como, pela falta de normatização, que variava de acordo com a ocasião, com a pessoa e
interesses, demonstrando dessa forma, toda a arbitrariedade nas decisões.
Até neste período, que correspondia à metade do segundo mandato do Prefeito Luiz
Antoniazzi, ainda não havia sido elaborado o Plano Municipal da Educação. O projeto
político pedagógico, que as escolas deveriam elaborar junto com a comunidade local e
escolar, correspondente a um dos aspectos da gestão democrática, foi proposto como uma
tarefa burocrática, que resultou em projetos completamente desconexos com o contexto
escolar.
121
Apesar das restrições impostas à supervisão esta, por iniciativa própria, iniciou
visitas, destituídas de qualquer tipo de intervenção, apenas nas escolas de ensino
fundamental municipal, pois não era autorizado, em hipótese alguma, o contato com as
escolas de educação infantil, consideradas mais tradicionais e avessas a qualquer tipo de
mudança.
Diante das dificuldades enfrentadas, este supervisor procurou apoio junto a
Diretoria de Ensino Regional, onde não foi compreendido, pois se limitavam às orientações
ao próprio processo burocrático da municipalização, que eram repassados exclusivamente à
Assessora do Fundamental II. Na busca de um apoio legal, procurou-se filiar-se a APASE,
que negou sua filiação por não pertencer ao quadro do magistério do Estado de São Paulo.
O desconhecimento tanto da função quanto da existência do cargo evidenciava-se
também nos eventos oficiais da Secretaria da Educação, quando o Prefeito, ou a própria
Secretária da Educação, nomeavam em suas saudações, os cargos dos presentes, como
Diretores de escola, Coordenadores Pedagógicos, Professores, Merendeiras, Faxineiros, etc,
mas “nunca” mencionavam ou se referiam à presença do Supervisor de Ensino. Neste
sentido, procurou-se saber o motivo deste “esquecimento”. Esclareceram que o Supervisor
era considerado um Coordenador Pedagógico.
Pode-se dizer que a Supervisão de Ensino de Valinhos começou a ser descoberta no
ano de 2003, quando começaram os debates para a elaboração do Estatuto do Magistério de
Valinhos. Apesar de não ter nenhuma de suas reivindicações contempladas no Estatuto, a
maior vitória foi o reconhecimento da Secretária de Educação, durante uma das reuniões
para a elaboração do Estatuto, que não tinha se dado conta, até aquele momento, que a
supervisão de ensino seria responsável pelas escolas municipais da rede de educação
Valinhos.
No ano de 2004 foram chamados do concurso mais dois supervisores de ensino,
apesar dos protestos de toda “equipe pedagógica”, que foram empossados no período em
que o Chefe de Projetos havia sido promovido para o cargo de Diretor do Departamento de
Educação.
Assim, o novo Diretor de Educação determinou, de forma arbitrária, que o primeiro
Supervisor passasse a ministrar para os professores da rede municipal, o curso de
alfabetização, PROFA, de 180 horas de duração, limitando dessa forma, sua atuação nas
122
escolas. Para o segundo supervisor determinou-se que deveria “assessorar” o Chefe da
Educação Infantil, sem exercer qualquer tipo de interferência nas escolas de educação
infantil, pois se considerava que a supervisão de ensino estava subordinada as chefias.
Neste contexto, percebe-se que mesmo aumentando o número de supervisores, a
situação permanecia a mesma. A estrutura tradicional de organização lutava de todas as
formas para permanecer no poder. A posse do novo Diretor de Educação representou o
fortalecimento de uma administração mais pessoal, com o predomínio constante das
vontades particulares em detrimento de uma proposta que sugerisse a substituição dos
padrões tradicionais, autoritários e pessoais por uma mais ampla e democrática.
9.
ELABORAÇÃO DO NOVO ESTATUTO E QUADRO DE CARREIRA DO MAGISTÉRIO PÚBLICO
Em 1998, ao assinar o Convênio de parceria com a Secretaria de Educação do
Estado de São Paulo, o município assumiu a obrigação de instituir ou adequar o Plano de
Carreira e Remuneração do Magistério de acordo com as diretrizes do Conselho Nacional
de Educação.
Nesse período o Conselho Municipal de Educação iniciou estudo sobre a elaboração
de um plano de carreira e adequação do Estatuto do Magistério, a fim de atender as novas
características da educação do município, ocorridos a partir da municipalização da 5ª a 8ª
série.
Depois de concluída em 2002, ou seja, após quatro anos de discussões e debates,
essa proposta do Conselho de Educação foi totalmente descartada e substituída por uma
minuta apresentada pelo Departamento de Recursos Humanos, no sentido de responder a
pressões realizadas pelos integrantes do magistério público municipal em maio 2003.
Para discussão dessa minuta, formou-se uma comissão eleita pelas diferentes
categorias do quadro do magistério, juntamente com representantes da Secretaria de
Recursos Humanos e Secretaria de Negócios Jurídicos. Essa comissão deveria apresentar
uma proposta ao executivo até o final de junho daquele ano; a entrega efetivou-se em
outubro.
123
Posteriormente reuniram-se a essa comissão representantes dos docentes estáveis,
que defendiam sua inclusão no novo estatuto, com a incorporação dos mesmos direitos dos
concursados.
Tal posição criou uma cisão nos debates, levando seus representantes a procurarem
apoio com os vereadores municipais, em defesa daquela causa.
O impasse permaneceu até o momento da votação do Estatuto na Câmara
Municipal; o conflito intensificou-se diante das ameaças de bloqueio da votação,
oportunidade tão aguardada pelos integrantes do quadro do magistério, cuja esperança
dirigia-se ao novo Estatuto, visto como meio de melhorar suas condições de trabalho e
salário.
Apesar de toda discussão, expectativa e esperança, não houve consenso entre o
conteúdo do texto elaborado pela comissão, durante o processo de discussão, e o texto
aprovado pela Câmara. Isto porque o executivo preservou parte do que se referia à
organização burocrática da Secretaria da Educação, mas desconsiderou quase na totalidade
o Plano de Carreira e de Remuneração do Magistério proposto pela “comissão eleita”.
A participação da “comissão eleita” serviu principalmente para criar uma ilusão de
participação democrática no estabelecimento do novo estatuto, escamoteando-se a forma
autoritária e intervencionista do Executivo municipal, no processo de votação que resultou
na Lei Municipal nº 3759, de 22 de Dezembro de 2003.
Para contornar a situação das docentes estáveis revoltadas, prometeu-se a
elaboração de um estatuto específico, que adequasse as reivindicações das solicitantes, às
condições estabelecidas pela Constituição de 1988 aos servidores estáveis. A resolução
transformou-se na Lei Municipal nº 3776, de 5 de abril de 2004.
Esta situação apresentada durante a elaboração do Estatuto do Magistério pode ser
compreendida, segundo análise de Mendonça (2001), como uma forma de conformação do
patrimonialismo às técnicas racionais e democráticas
Se no Estado brasileiro em geral a presença dos valores patrimoniais é
marcante, no campo educacional, em particular, essa presença se dá também
pela característica acentuadamente doméstica das relações sociais que se
travam no ambiente escolar. Também na escola, um jogo de forças
burocráticas e patrimoniais revela-se em permanente tensão. Ao esforço de
modernização e de implantação de normas racionais e patrimoniais revela-se
124
em permanente tensão. Ao esforço de modernização e de implantação de
normas racionais legais contrapõe a resistência de forças tradicionais. O
arcabouço legal que regula o sistema e o conjunto dos seus órgãos
administrativos aproximam-se da característica burocrática, mas os sujeitos
concretos que os sustentam e lhes dão a vida continuam regidos por valores
tradicionalistas. (MENDONÇA, 2001)
10.
CONCLUSÃO
Neste capítulo, pode-se perceber o embate gerado com a chegada da supervisão
municipal após a implementação da municipalização, promovida pela reforma educacional
paulista e a estrutura de poder municipal, baseada em uma organização administrativa
patrimonial existente na Secretaria da Educação de Valinhos.
Em 1997, ano que antecedeu a municipalização, a política de favorecimento estava
presente tanto no Estatuto do Magistério vigente como no concurso público realizado no
ano de 1998.
Assim, manteve-se mesmo após a municipalização um corpo de servidores, já
adaptados ao tipo de administração existente, seguindo um organograma que desde sua
aprovação, em 1998, mostrava-se ultrapassado, demonstrando o descaso com um tipo de
organização mais impessoal.
Neste sentido, destaca-se também o descaso para a elaboração do Plano Municipal de
Educação, que apesar de ser uma exigência legal, deveria representar as necessidades do
município, devidamente discutidas com todos os seguimentos da comunidade local.
Dessa forma, evidencia-se que a administração no período da municipalização
organizava-se por meio de normatizações próprias que atendiam as necessidades imediatas,
adquirindo características semelhantes ao que Uricoechea (1978) denomina
patrimonialismo burocrático. Trata-se de um tipo estático de organização avessa a
processos de mudanças, como já assinalamos anteriormente.
Além da presença dos valores patrimoniais constata-se uma organização marcada por
relações domésticas que caracterizava decisões e atitudes discriminatórias, revelando-se
permanente tensão entre forças burocráticas e patrimoniais.
125
Pode-se dizer que todas as propostas de aparência modernizadoras implementadas
no município, já demonstravam uma maneira autocrática e autoritária de organização,
permitindo que as políticas públicas fossem constantemente alteradas fazendo da vontade
pessoal uma vontade pública. Esta situação de acordo com Mendonça (2001) demonstra a
relação entre o poder pessoal e a descontinuidade de políticas educacionais, pois segundo o
autor, cada Secretário cada Governador ou Prefeito tem seu plano, a sua proposta curricular
a sua lei, julgando-se como dono do cargo que ocupa.
Assim, concluímos que a Supervisão de Ensino apresentava-se de alguma forma, a
representação da implantação de normas racionais legais, que acaba se contrapondo às
resistências de forças tradicionais, evidenciado uma administração em que o aparato legal
que regula o sistema e o conjunto dos seus órgãos administrativos aproximam-se da
característica burocrática, mas os sujeitos concretos que os sustentam e lhes dão a vida
continuam regidos por valores tradicionalistas. (Mendonça,2001)
126
C
APÍTULO V
C
ONSIDERAÇÕES FINAIS
Desde a implantação das primeiras ações de inspeção de ensino, ainda no século
XIX, predominaram as atribuições burocráticas sobre as pedagógicas. A atividade de
supervisão esteve sempre diretamente relacionada com a fiscalização e possibilitava pelo
conhecimento do funcionamento das escolas maior controle da rede escolar.
A partir da centralização promovida na década de 1930, passou a existir uma maior
diferenciação entre o papel do inspetor de ensino e do supervisor agora responsável pela
fiscalização e aplicação de punições.
A institucionalização de supervisão escolar é um fenômeno recente no sistema
educacional brasileiro e veio atender às exigências de racionalização e modernização do
sistema de ensino, que mostra necessitar de pessoal especializado para exercer
exclusivamente a tarefa de fiscalização.
Em particular, destaca-se a função de avaliação do sistema educacional e de
assessoramento dos órgãos superiores nas decisões educacionais.
As atribuições dos supervisores assumem, nas décadas de 1960 e 1970, caráter
eminentemente técnico, voltado principalmente para a correção de falhas administrativas e
pedagógicas.
A partir de 2002, o papel do supervisor veio a ser descrito como de mediação e
articulação entre as políticas educacionais e as propostas pedagógicas dos diferentes
sistemas.
O supervisor sofre uma redefinição, assumindo-se como agente de democratização
que participa de definições das políticas públicas e educacionais, além de intermediar
intermedia a aplicação destas políticas nas unidades escolares.
É considerado, portanto, formulador e mediador das políticas educacionais e propõe
exercer uma função reguladora do sistema, zelando pela aplicação correta de normas gerais,
leis, decretos, resoluções, deliberações de caráter nacional, estadual ou municipal.
O termo que tradicionalmente se caracterizava a atividade do supervisor, a
fiscalização, substitui-se pela concepção de mediador-articulador, cuja função precípua
127
consiste em “facilitar” a tomada de decisões e compatibilizar os diferentes níveis do
sistema.
Como se pode observar cumpre assim, ao supervisor, “estimular a organização” dos
sistemas e das escolas, de acordo com as políticas educacionais previstas para os diversos
níveis e modalidades de ensino.
É importante notar que a função tradicional de fiscalização, transformada em
compatibilizadora, mediadora e articuladora, acrescenta ao supervisor o papel de
formulador das políticas educacionais, na esfera em que atua. O que significa que deve
zelar, para que as ações da instância de poder responsável pela aplicação das práticas
educacionais cumpram os princípios e legislações estabelecidas.
Neste sentido, pode-se afirmar que a atuação do supervisor de ensino de Valinhos
nos primeiros anos da implantação da municipalização da educação de Valinhos, (1998
2004) caracterizou-se por uma atuação tradicional, restrita inicialmente à fiscalização das
escolas de educação infantil da rede particular.
Constata-se também que a organização administrativa da Secretaria da Educação,
marcada por relações domésticas, responsáveis por decisões e atitudes discriminatórias,
entrava em confronto com a supervisão de ensino. Esta representava a implantação de
normas racionais legais, evidenciando uma administração cujo aparato legal burocrático era
dirigido por sujeitos regidos por valores tradicionalistas.
Em diferentes momentos aqui mencionados, percebe-se que a própria gestão política
apresenta-se como assunto de interesse particular; comprometendo-se com os direitos
pessoais do funcionário e não com os interesses objetivos.
Por essa via, a figura do supervisor de ensino é negada porque, no contexto da
reforma administrativa do Estado de São Paulo, deveria assumir o papel de integrar as
políticas educacionais das esferas municipal, estadual e federal com as escolas, cuidando
para que as ações da instância de poder a que está atrelado, sigam os princípios e as
legislações estabelecidas.
Portanto, podemos afirmar que as tensões, os conflitos e as incertezas vivenciados
pelo primeiro Supervisor de Ensino de Valinhos, podem também ser enquadrados como um
confronto entre a racionalidade formal e a racionalidade substantiva, na perspectiva
weberiana.
128
Entretanto, não se deve perder de vista que a racionalidade imposta pela reforma
administrativa, elaborada por Bresser Pereira, propunha adequar as estruturas
administrativas brasileiras aos padrões de racionalidade técnica dos países capitalistas de
Primeiro Mundo. Desse modo, substitui-se o atual modelo de administração pública de
caráter burocrático, com influências de práticas clientelistas e patrimonialistas, por um
novo padrão de administração gerencial.
Lembramos que o aparato administrativo da dominação racional legal é a
burocracia, fundamentada nas leis e na ordem legal. Caracteriza-se por regras impessoais,
que estabelecem os deveres e os direitos de cada cargo, as formas de recrutamento e seleção
de novos funcionários e todos os procedimentos do aparato administrativo.
Não podemos esquecer que a burocracia é uma forma de dominação, que formadora
de um grupo social que se separa do resto da sociedade, para se impor e conseqüentemente
dominá-la. A burocracia procura transmitir um modo de pensar que tende a deixar de lado
todos os valores que não sejam absolutamente práticos
A análise dos conflitos, vivenciados pela supervisão de ensino em Valinhos,
permitiu compreender que o campo de tensão relacionava-se ao embate entre uma estrutura
de poder baseada em uma organização administrativa tradicional-patrimonial, com um
modelo legal racional burocrático, imposto pelo governo federal.
Portanto, concluímos que não podemos simplesmente acreditar que a instituição de
um modelo racional burocrático, baixado por decreto, seja a solução para tornar a
Secretaria da Educação de Valinhos mais democrática, menos patrimonialista e clientelista.
Também sabemos que a burocracia é inevitável, mas seu domínio absoluto na sociedade
deve ser combatido.
129
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, M.H.T. (1995). Federalismo e políticas sociais. Revista Brasileira de Ciências
Sociais , 28, 88 - 108.
APASE. (2008). www.sindicatoapase.org.br/conteúdo. Acesso em 25 de janeiro de 2008, d
ARELARO, L. (maio de 1989). A municipalização do ensino: avaliação preliminar. Revista
Educação Municipal nº 4. São Paulo: Cortez Editora.
ARELARO, L. (1999). A municipalização do ensino no Estado de São Paulo:antecedentes
históricos e tendências. In: C. Oliveira, Municipalização do ensino no Brasil. Belo
Horizonte, MG: Autênca.
ARELARO, L. (out. de 2005). O ensino fundamental no Brasil: avanços, perpexidades e
tendências. Educação e Sociedade .Disponível em www.scielo.com.br. Acesso em 2007
ARRAES, R. (1980). O estado e a administrção do ensino público paulista na segunda
república (1930 - 1945)- Dissertação de Mestrado. Faculdade de Educação: UNICAMP.
BARRETO,E.&ARELARO,L (jan/mar de 1986). A municipalização do ensino de 1º
grau:tese controvertida. Em Aberto .Disponível em www.mec.gov.Domínio Público.
Acesso em 2004
BENDIX, R. (1986). Max Weber, um perfil intelectual. (E. H. Filho, Trad.) Brasília:
Univesidade de Brasilia.
BOBBIO, N. (2000). O futuro da democracia. São Paulo: Editora Paz e Terra.
BRASIL. (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.
BRASIL. (2001). Plano Decenal de Educação para Todos.
BRASIL. (1995). Plano diretor da reforma do aparelho do Estado.Ministério da
Administração Federal e Reforma do Estado. Brasília.
130
BRASIL. (1995). Plano Diretor da Reforma do Estado . Ministério da Administração
Federal e Reforma do Estado. Brasília.
BRASIL, MEC. (1976). Regulamentação da profissão do supervisor de ensino. In:
Seminário de supervisão pedagógica - Relatório nº1 . Disponível em www.mec.gov.br.
Domínio Público. Acesso em 2006
BRASIL, MEC. (1974). Supervisão de Ensino - Tentativas de Modelo e Análise de Custos.
Brasília. Disponível em www.mec.gov.br. Domínio Público. Acesso em 2006.
BRASIL,Decreto200. (1967). Decreto Lei nº 200. Brasília.
BRASIL,MEC. (1976). 1º Seminário de Supervisão Pedagógica. Disponível em
www.mec.gov.br. Domínio Público. Acesso em 2006.
BRASIL,MEC. (1961). LEI 4.024/61 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
BRASIL,MEC. (1971). LEI 5.692/71 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
BRASIL,MEC. (1974). Supervisão de ensino. Tentativas de modelo e análise de custos.
Brasília. Disponível em www.mec.gov.br. Domínio Público. Acesso em 2006.
BRASIL,MEC/FUNDESCOLA. (1999). Plano de Carreira e Remuneração do Magistério
Público - LDB, FUNDEF,diretrizes nacionais e nova concepção de carreira. Brasília.
BRASIL/PRASEM. (1999). Regime de colaboração entre os sistemas de ensino. In:
PRASEM, Guia de Consultas - Programa de Apoio aos Secretários Muncipais de
Educação.
BRESSER PEREIRA,L.C. (1999). Reflexões sobre a reforma gerencial brasileira de 1995.
Revista do Serviço Público , nº 4 .Disponível em www.bresserpereira.com.br. Acesso em
2002.
BRESSER PEREIRA,L.C. (2001). Do Estado Patrimonial ao Gerencial. disponível em
www.bresserpereira.com.br. Acesso em 04 de 07 de 2005.
131
C.M.V. (1996). Camara Municipal de Valinhos- Memorial do Centenário de Valinhos.
Valinhos. Valinhos.
C.M.V.(2007). Câmara Municipal de Valinhos. Disponível em
www.camaravalinhos.sp.gov.br. Acesso em 2007.
COHN, Gabriel. (1991) Weber. Col. Grandes Cientistas Sociais. Vol.13. S.P.: Ática
CARNEIRO, E.M.F (2002). O regime de colaboração sem suborninação ou hierarquia.
Revista Educação Municipal Nº 5. Brasília: UNDIME
CAVALCANTI, Z. (1987). Municipalização do ensino de 1º grau: uma questão que vai e
volta. Cadernos de Estudos Sociais , v3, pp. 217 - 224. Disponível em www.scielo.com.br.
Acesso em 2007.
CORREIO DE VALINHOS. (27 de março de 1998). Conselho Municipal de Educação
toma posse e vai dirigir rumos da municipalização.
CORREIO DE VALINHOS. (14 de agosto de 1997). Prefeitura elabora projeto educacional
exigido pelo governo.
FAORO, R. (2003). Os Donos do poder. Formação do patornato político brasileiro
(Vol. 1).
São Paulo: Editora Globo.
FELIX,R.M.F. (1997). A municipalização como estratégia de descentralização e de
descontrução do sistema educacional brasileiro. In: D. OLIVEIRA, Gestão democrática da
educação. Petropolis: Editora Vozes.
FERNANDES, F. (1987). A Revolução burguesa no Brasil - Ensaio de interpretação
sociológica. Rio de Janeiro: Editora Guanabara.
FERREIRA, N. (Jun. de 2007). Supervisão de sistema:formação,experiência e provimento.
Revista APASE nº7. São Paulo
132
FERREIRA, S. (1993). A I Conferência da Educação (contribuição para o estudo das
origens da escola nova no Brasil). Brasília: MEC/INEP. Disponível em www.mec.gov.br,
Domínio Público. Acesso em 19 de abril de 2006.
FRANCO, M.S.C (1997). Homens livres na ordem escravocrata. São Paulo: Editora
UNESP.
FREUND, J. (1987). Sociologia de Max Weber. Rio de Janeiro: Forense Universitária.
GANDINI,R.&RISCAL,S. (jan/abr de 2007). A constituição do Sistema de Ensino
Paulista: das diretorias regionais e serviços de inspeção. Revista Brasileira de Política e
Administração da Educação .
HABERMAS, J. (1975). Técnica e ciência como ideologia. Os Pesandores (Vol. XLVIII).
São Paulo: Abril Cultural.
HOLANDA, S. (1997). O homem cordial. In: S. HOLANDA, Raízes do Brasil. São Paulo:
Companhia das Letras.
IBRAP. (1996). Estatística Municipal - Educação. Revista Brasileira de Planejameto
Municipal .
JORNAL DE VALINHOS. (22 de agosto de 1997). Municipalização de ensino ainda é
mistério.
JORNAL TERCEIRA VISÃO. (15 de agosto de 1997). Ensino de 1ª a 4ª séries será
municipalizado em 98.
LEAL,V.N. (1975). Coronelismo, enxada e voto. São Paulo: Editora Alfa-Omega.
LIMA,J. (2008). Conselho de economia lança atlas da exclusão social no Brasil.
Disponível em www.cosmo.com.br. Acesso em 2008.
LOURENÇO FILHO. (1952). Estrutura administrativa e tecnica da educação. Revista
Brasileira de Estudos Pedagógicos . Disponível em www.mec.gov.br. Domínio Público.
Acesso em 2006.
133
MARTINS,A. (2004). O processo de municipalização no Estado de São Paulo:um novo
desenho da política educacional? In: A. Martins(org), Descentralização do Estado e
Muncipalização do Ensino. Problemas e Perspectivas. Rio de Janeiro: DP&A.
MEC,INEP. (1965). Conferências Internacionais de Instrução Publica - Recomendações
(1934 -1963). Brasília. Disponível em www.mec.gov.br. Domínio Público. Acesso em
2006.
MENDES, E.F. (2001). Estado patrimonial e gestão democrática do ensino público no
brasil. Educação e Sociedade .
MENDES, O. (1986). Getúlio Vargas. São Paulo: Editora Moderna.
MENDONÇA,E. F. (2001). Estado patrimonial e gestão democrática do ensino público.
Educação e Sociedade , V.22. Disponível em www.scielo.com.br. Acesso em 2007.
MOTTA,F.C.P. (1981) O que é burocracia. Col. Primeiros Passos. São Paulo: Ed.
Brasiliense.
MOURA E SILVA,Z.A.P & LUZ,S.E da (Fevereiro de 2004). Ano Novo: programando a
ação supervisora. Jornal APASE .São Paulo.
NAGLE, J. (1985). A Educação na primeira república. In: B. FAUSTO, O Brasil
republicano: sociedade e instituições. São Paulo: Difel.
NOTÍCIAS DE VALINHOS. (4 de Julho de 1997). O ensino de valinhos vai mudar?
O ESTADO DE SÃO PAULO. (janeiro de 2008). Valinhos ainda vai virar terra da goiaba.
O Estado de São Paulo .
OLIVEIRA, C. (1999). A municipalização do ensino brasileiro. In: C. Oliveira(org),
Municipalização do ensino no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica Editora.
OLIVEIRA, D. (2002a). Educação e Planejamento:a escola como núcleo de gestão. In: D.
A. Oliveira(org), Gestão democrática da educação. Petrópoles: Editora Vozes.
134
OLIVEIRA,D. (2002b). Mudanças na organização e na gestão do trabalho na escola. In: D.
Oliveira(org), Política e gestão da educação. Belo Horizonte: Editora Autêntica.
OLIVEIRA, R.P. (2005). A educação na assembélia constituinte de 1946. In: O. FÁVERO,
A educação nas constituintes brasileiras 1823 - 1988. Campinas: Autores Associados.
PAIVA, V. (1973). A educação popular e a educação de adultos. São Paulo: Edições
Loyola.
PAIVA,V.& PAIVA C. (jan/mar de 1986). A questão da municipalização do ensino. Em
Aberto . Disponível em www.mec.gov.br. Domínio Público. Acesso em 2006.
PASQUALE, C. (1965). Apresentação. Conferências Internacionais de Instrução Pública -
Recomendações (1934 - 1963) - MEC/INEP . Disponível em www.mec.gov.br. Domínio
Público. Acesso em 2006.
REIS FILHO, C. (1995). A educação e a ilusão liberal:orígens do ensino público. São
Paulo: Editora Autores Associados.
RBEP (julho-setembro de 1957). Relatório da inspeção nas escolas do interior da província
da Bahia realizada em 1857. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Disponível em
www.mec.gov.br, Domínio Público. Acesso em 2006.
RIBEIRO DO NASCIMENTO, T. (1980). A administração do ensino público paulista na
primeira República - Dissertação de Mestrado. Faculdade de Educação : UNICAMP.
RIBEIRO, M.L. (2003). História da educação brasileira - A organização escolar.
Campinas: Editora Autores Associados.
RISCAL,S.A. (2003). Técnica e racionalidade na ação economica capitalista. mimeo.
RISCAL,S.A.(2008). Racionalidade formal, modernização e política educacional. Mimeo.
São Carlos.
ROMANELLI, O. (2006). História da educação no Brasi. Petrópolis: Editora Vozes.
135
SANTOS, B. de S.; Avritizer, L. (2002). Para ampliar o cânone democrático. In: SANTOS,
Democratizar a democracia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.
SÃO PAULO(2003). Perto dos livros, longe das ruas., disponível em
www.saopaulo.sp.gov.br/sis/lerartigos.asp. Acesso em 28 de maio de 2003.
SÃO PAULO, SE. (2000a). PEC - Circuito Gestão - Formação Continuada de Gestores da
Educação - Módulo II - Gestão Pedagógica. São Paulo: FDE.
SÃO PAULO,CEE. (1997). Deliberação nº11/97. Dispõe sobre os Sistemas Municipais de
Ensino. SãoPaulo
SÃO PAULO,CEE. (1997). Indicação nº 10/97. Sistema Municipal de Ensino. São Paulo.
SÃO PAULO,CEE. (2003). Indicação nº 33/2003 - Organização dos Sistemas Municipais
de Educação. São Paulo.
SÃO PAULO,SE. (2002). A municipalição do ensino fundamental no Estado de São Paulo:
O sucesso e o Processo - A história de uma política educacional que deu certo -
1995/2002. São Paulo.
SÃO PAULO,SE. (2002). Comunicado SEE. Legislação APASE. p. 21-24.
SÃO PAULO,SE. (2002). PEC - Circuito Gestão - Gestão do Projeto Pedagógico -
alavancado o sucesso da escola. São Paulo: FDE.
SÃO PAULO,SE. (2001). PEC - Circuito Gestão - Formação Continuada de Gestores da
Educação - Módulo II - Gestão Pedagógica - Textos de Apoio. São Paulo: FDE.
SÃO PAULO,SE. (2001). PEC - Circuito Gestão - Formação Continuada de Gestores da
Educação - Módulo IV - Gestão Educacional no Cotidiano das Escolas. São Paulo: FDE.
SÃO PAULO,SE. (2001). PEC - Formação universitária de professores em
exercício.Programa Especial de Formação de professores de 1ª a 4ª séries do Ensino
Fundamental. São Paulo.
136
SAVIANI D. (2002). A supervisão educacional em perspectiva histórica:da função à
profissão pela mediação da idéia. In: FERREIRA.N(org), Supervisão Educacional para
uma escola de qualidade. São Paulo:Cortez Editora.
SAVIANI, D. (1983). Escola e democracia. São Paulo: Editores Associados/Cortez.
SEADE . (2008). Perfil Municipal de Valinhos.Disponível em www.seade.gov.br. Acesso
em 30 de maio de 2008.
SILVA,T.R.N.da. (1999). Descentralização da educação no Estado de São Paulo. In: Costa,
Descentralização da educação:novas formas de coordenação e financiamento. São Paulo:
Fundap/Cortez.
SOLA, L. (1999). Reformas do Estado para qual democracia? O lugar a política. In: L.
PEREIRA, & L. SOLA, Sociedade e Estado em Transformação. São Paulo: Editora
Unesp/Enap/Imprensa Oficial.
SOUZA, A.N. (2001). Racionalidade economica na política educacional em São Paulo.
Disponível em www.anped.org.br/reuniões/textos/0911t. Acesso em 12 de janeiro de 2008
SPADACCIA, J. (1988). Monografia histórica de Valinhos. Editora Palmeiras .
SPÉZI, M. (2004). Valinhos: 50 anos da emancipaçãopolitico-administrativa. Editora
Lince.
TOBO, M. C. (Julho de 2002). Uma grande vitória. Jornal APASE .São Paulo
TRAGTENBERG, M. (2006). Burocracia e Ideologia. São Paulo: Editora UNESP.
URICOECHEA, F. (1978). O minotauro imperial. A burocratização do estado patrimonial
brasileiro no século XIX. Rio de Janeiro: Difel.
VALINHOS.(1986) Lei n.º 2.018, de 17 de janeiro de 1.986. Dispõe sobre o Regime
Jurídico dos Funcionários Públicos do Município de Valinhos.
137
VALINHOS (1993). Lei nº 2693 de 30 de dezembro de 1993. Dispõe sobre o Estatuto do
Magistério Público Municipal de Valinhos.
VALINHOS.(1997) Lei nº 3107 de 27 de abril de 1997. Dispõe sobre a Criação do
Conselho Municipal de Acompanhamento e Controle Social do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento e Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério.
VALINHOS (1997) Lei nº 3110 de 27 de abril de 1997 – Autoriza o Poder Executivo
Municipal a celebrar convênio com o Estado de São Paulo, por intermédio da Secretaria da
Educação objetivando a implantação e o desenvolvimento de Programas na Área da
Educação.
VALINHOS (1997) Lei nº 3111 de 27 de abril de 1997. Dispõe sobre a criação do
Conselho Municipal de Educação.
VALINHOS (1998). Edital do Concurso Público nº2/98. Boletim Municipal nº 521 de 11
de agosto de 1998.
VALINHOS (2001) Lei nº 3544 de 25 de julho de 2001 . Cria cargos na Estrutura de
Cargos da Prefeitura Muncipal, aprovada pela Lei 3509/00. Publicada no Boletim
Municipal nº 695 de 17 de julho de 2001.
VALINHOS (2003) Lei nº 3759, de 22 de dezembro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto dos
Servidores do Magistério Público do Município de Valinhos.
VEYNE, Paul. (1986) Como se escreve a história. Lisboa: Edições Setenta.
VILLALOBOS, J. (1960). A luta pela escola pública e seu significado histórico. In: R.
BARROS(org), Diretrizes e bases da educação nacional.o Paulo: Livraria Pioneira
Editora.
WEBER, M. (1994). Economia e Sociedade (Vol. 1). São Paulo: UNB.
WEBER, M. (1982). Ensaios de Sociologia. Rio de Janeiro: Guanabara S.A.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo