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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP
FACULDADE DE CIÊNCIAS E LETRAS – FCL
CÂMPUS DE ARARAQUARA
Rodrigo Boldrin Bacchin
REALITY-SHOW:
A TV NA ERA DA
GLOBALIZAÇÃO
ARARAQUARA – SÃO PAULO
2008
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Rodrigo Boldrin Bacchin
REALITY-SHOW:
A TV NA ERA DA
GLOBALIZAÇÃO
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Sociologia da Faculdade
de Ciências e Letras Unesp/Araraquara,
como requisito para obtenção do título de
Mestre em Sociologia.
Linha de pesquisa: Cultura e Ideologia.
Orientador: Prof. Dr. Livre-Docente Raul
Fiker.
Co-orientador: Prof. Dr. Livre-Docente
Renato Bueno Franco.
ARARAQUARA
SÃO
PAULO
2008
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Rodrigo Boldrin Bacchin
REALITY-SHOW:
A TV NA ERA DA
GLOBALIZAÇÃO
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Sociologia da Faculdade
de Ciências e Letras Unesp/Araraquara,
como requisito para obtenção do título de
Mestre em Sociologia.
Linha de pesquisa: Cultura e Ideologia.
Orientador: Prof. Dr. Livre-Docente Raul
Fiker.
Co-orientador: Prof. Dr. Livre-Docente
Renato Bueno Franco.
Data da defesa: 26/09/2008
M
EMBROS COMPONENTES DA
B
ANCA
E
XAMINADORA
:
Presidente e Orientador: Prof. Dr. RAUL FIKER
Departamento de Antropologia, Política e Filosofia/ FCL- UNESP/
Araraquara.
Membro Titular: Prof. Dr. JOSÉ PEDRO ANTUNES
Departamento de Letras Modernas/ FCL-UNESP/Araraquara.
Membro Titular: Prof. Dr. LUIS ANTONIO CALMON NABUCO LASTÓRIA
UNIMEP/ Piracicaba.
Local: Universidade Estadual Paulista
Faculdade de Ciências e Letras
UNESP – Campus de Araraquara
5
Aos meus pais – Valdir e Célia – pois sem o seu apoio incondicional eu não teria
conseguido completar essa etapa.
A Letícia, por estar sempre disposta a me ouvir, e por me ajudar a ver esperança
mesmo nos momentos mais difíceis.
6
AGRADECIMENTOS
Agradeço a meus pais – Valdir e Célia – pelo amor e apoio incondicional que
demonstraram ao longo desse percurso e por me ensinarem as mais valiosas lições
da vida.
Meus especiais agradecimentos a Bruno, meu irmão, pelo apoio e a amizade
sincera.
Agradeço a Letícia, por ser minha companheira ao longo dessa jornada, pela
compreensão, paciência e por me fazer ter esperanças quando tudo parecia
acabado.
A Lucas e Samuel – Le Malditèpor nossas longas conversas e pela amizade
sincera, pois sem elas não teria tido condições de concluir este trabalho.
Agradeço ao meu orientador Renato Bueno Franco, por me acompanhar ao longo de
tantos anos neste percurso de descoberta e crescimento intelectual.
A CAPES, pela bolsa de pesquisa.
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BACCHIN, Rodrigo Boldrin. Big Brother: a TV na era da globalização. 2008. 176 p.
Dissertação de Mestrado em Sociologia. Faculdade de Ciências e Letras, Universidade
Estadual Paulista, Araraquara, 2008.
RESUMO
A presente dissertação tem por objetivo analisar o Big Brother programa freqüentemente
caracterizado como o maior destaque dentre os reality-shows como um produto
característico da indústria cultural na era da globalização. Idealizado pela produtora holandesa
Endemol, ele foi o primeiro programa do mundo a ser simultaneamente apresentado em TV
aberta, TV a cabo (pay-per-view) e pela Internet. Ele se tornou rapidamente um fenômeno
mundial tendo sido, até hoje, exibido em 70 países diferentes. Sua principal característica é
ser um programa interativo, produzido para ser consumido em diferentes mídias. Assim
sendo, a pesquisa procura compreender como se configura a indústria cultural a partir das
novas possibilidades trazidas pelo processo de globalização. Portanto, propõe uma avaliação
da validade deste conceito no mundo globalizado, após assinalar algumas das principais
características da globalização. Considerando que se trata de um programa televisivo, foi
realizada uma análise crítica da televisão, a fim de demonstrar a falsidade da tese de que ela é
um meio de comunicação neutro, isento e sem conseqüências. Também, a partir das
possibilidades abertas pelo processo de globalização, a dissertação assinala as principais
características da televisão na era da globalização, dando destaque à convergência entre a
televisão e a Internet. Finalmente, demonstra a especificidade da relação entre os reality-
shows e a globalização, principalmente com o programa Big Brother. Ainda, destaca a
proximidade da produtora Endemol com a dinâmica da globalização, que desponta como um
importante ator para a compreensão do objeto de pesquisa. Por fim, debate questões
importantes suscitadas pelos reality-shows e especialmente pelo Big Brother, relacionadas a
proximidade destes programas com a etapa globalizada do capitalismo.
Palavras-chave: Reality-show; Big Brother; Televisão; Globalização; Indústria Cultural.
8
ABSTRACT
This dissertation intents to analyze the Big Brother – a TV show usually presented as the most
important among the reality-shows – as a typical product of the culture industry in the
globalization age. Idealized by the dutch producer Endemol, it was the first program in the
world to be simultaneously presented in broadcast TV, cable TV (pay-per-view) and Internet.
It quickly became a global phenomenon and, until today, it has been broadcast in 70 different
countries. It’s main characteristic is to be a interactive TV show, produced to be consumed in
different medias. Therefore, this research intends to comprehend the configuration of the
culture industry as a result of the new possibities brought by the globalization process.
Consequently, it proposes an evaluation of the validity of this concept in the globalized world,
after indicating some of the main characteristic of globalization. Considering that it is a TV
show, it was performed a critical analysis about television, intending to demonstrate the
falsehood of the thesis that it is a neutral, exempt and without consequences mass media.
Besides, through the possibilities brought by the globalization process, this dissertation
indicates the main characteristic of television in the globalization age, emphasizing the
convergence between television and Internet. Finally, it demonstrates the specificity of the
relation between the reality-shows and the globalization, especially the Big Brother. Yet, it
emphasizes the proximity involving the producer Endemol with the globalization dinamics,
which appears as an important player to comprehend the research object. In conclusion, it
discusses important issues brought up by the reality-shows and, specially, by the Big Brother,
both related with the proximity of these TV shows with the globalized stage of capitalism.
Keywords: Reality-show; Big Brother; television; globalization; culture industry.
9
SUMÁRIO
Introdução________________________________________________________________11
1. Indústria Cultural e globalização. __________________________________________14
1.1 A Indústria cultural em questão. ____________________________________________15
1.1.1 O conceito de indústria cultural: Theodor Adorno e Max Horkheimer. ____________15
1.1.2 Uma revisão do conceito de indústria cultural: a proposta de Douglas Kelner. ______19
1.1.3 A atualidade do conceito: Christoph Türcke. _________________________________23
1.2. Cultura e globalização em questão. _________________________________________28
1.2.1 Rodrigo Duarte: indústria cultural e globalização. ____________________________28
1.2.2 Ulrich Beck: globalização e glocalização. ___________________________________33
1.2.3 Frederic Jameson: globalização e pós-modernidade – a cultura como economia. ____39
1.3. No calor da hora: primeira passagem – conclusões. ____________________________44
2. A televisão enquanto meio de comunicação: apontamentos críticos.______________48
2.1. A crítica inaugural de Theodor Adorno. _____________________________________49
2.1.1 Televisão, consciência e indústria cultural. __________________________________49
2.1.2 A televisão como ideologia. ______________________________________________52
2.2. Giovanni Sartori: A primazia da imagem. ____________________________________54
2.3. Umberto Eco: a nova e a velha televisão. ____________________________________60
2.4. Sobre a televisão: Pierre Bourdieu. _________________________________________62
2.5. Caminhos da televisão na era da globalização. ________________________________66
2.5.1 A convergência anunciada: televisão e Internet. ______________________________67
2.5.2 O futuro da TV: a televisão digital e interativa. _______________________________70
2.5.3 A interatividade do ponto de vista tecnológico. _______________________________76
2.6. Segunda passagem - conclusões.___________________________________________80
10
3. Possibilidades da TV na era da globalização: os reality-shows.__________________85
3.1. As origens dos reality-shows.______________________________________________86
3.2. A Endemol: uma empresa de entretenimento inserida no processo de globalização. ___89
3.3. O Big Brother e a TV globalizada.__________________________________________94
3.4. Big Brother Brasil: o encontro entre o global e o local.__________________________99
3.5. Os reality-shows em questão._____________________________________________105
3.6. Terceira passagem – conclusões.__________________________________________116
Conclusões_______________________________________________________________120
Apêndice A – Primeiras impressões sobre os reality-shows._________________________124
Anexos._________________________________________________________________142
Anexo A – Ato de concentração Endemol Globo S/A._____________________________143
Anexo B – The Loft Story Case.______________________________________________148
Anexo C – O Big Brother pelo mundo._________________________________________154
Referências bibliográficas.___________________________________________________156
Fontes. __________________________________________________________________158
Bibliografia consultada._____________________________________________________170
11
Introdução
IntroduçãoIntrodução
Introdução
12
O objetivo da presente dissertação é analisar os reality-shows dentre eles
destacamos o Big Brother, possivelmente o melhor exemplo deste tipo de programa como
um produto característico da indústria cultural na era da globalização. A primeira edição do
programa foi ao ar em 1999, junto a uma onda de programas que percorreu o mundo todo
muito criticada por sua evidente baixa qualidade, mas que obteve expressivos resultados
comerciais e de audiência. Estes programas foram chamados de reality-shows por terem como
característica comum o registro através de câmeras de TV de pessoas anônimas, nas mais
variadas situações. O Big Brother, idealizado pela produtora holandesa Endemol, foi o
primeiro programa do mundo a ser simultaneamente apresentado em TV aberta (ao vivo e em
versão gravada e editada), em canais por assinatura (pay-per-view) e pela Internet. Ele se
tornou rapidamente um fenômeno mundial, tendo sido, até hoje, exibido em 70 países
diferentes, com grande sucesso. Sua principal característica é permitir a interação dos
telespectadores com o conteúdo do programa através de diferentes tecnologias.
Deste modo, no primeiro capítulo questionaremos a atualidade do conceito de
indústria cultural no mundo globalizado. O conceito está fortemente relacionado com as
características do capitalismo monopolista, marcado pelo modo de produção fordista, baseado
na produção massiva e padronizada. O desenvolvimento das tecnologias de informação e
comunicação, ocorrido intensamente nas últimas décadas, coloca novas questões para a
própria indústria cultural e seus desdobramentos. A globalização proporciona, dentre outras
conseqüências, a flexibilização, o fluxo global de investimento e a formação de oligopólios
globais, que modificam profundamente o capitalismo dos dias atuais e, conseqüentemente,
também a indústria cultural. Em muitos aspectos, estas modificações fazem por distanciá-la
drasticamente da concepção ‘clássica’, sendo possível chamá-la hoje de indústria cultural
global, ou ainda de indústria cultural globalizada. Além das diferenças já apontadas, podemos
ainda assinalar que, quando Adorno e Horkeimer (1985) a analisaram, a indústria cultural era
dependente dos setores de ponta do capitalismo, ao passo que, hoje, a indústria do
entretenimento se tornou um setor de vanguarda do capitalismo, um ramo altamente lucrativo
e que atrai investimentos de outros setores.
Dado ser o objeto desta pesquisa um programa de televisão grande parte do público
o conhece assim necessário se faz analisar criticamente, no segundo capítulo, este veículo
de comunicação e assinalar suas principais características, especialmente no período da
globalização. Neste sentido, fez-se necessário realizar uma crítica à televisão como meio de
comunicação, a fim de desfazer o véu ideológico que a envolve, destacando os elementos que
estruturam o seu funcionamento. Além disso, o processo de globalização também abre novas
13
possibilidades para o futuro da televisão, portanto, ainda no segundo capítulo procuraremos
compreender como se configura a TV na era da globalização. O intenso processo de
aquisições e fusões com empresas de outros setores pelo qual passa a indústria do
entretenimento tem como característica marcante a convergência de tecnologias. Dentre
outras características, este processo origem à globalização. Deste ponto de vista, o
principal acontecimento é a digitalização que, tecnicamente, permite a convergência entre
televisão e computador, através da Internet, que por sua vez, abre um enorme leque de
possibilidades de usos, oferta de novos produtos e serviços. É consenso entre muitos autores a
tese de que o futuro está na convergência entre as características do computador pessoal,
associado à Internet, e a televisão.
No terceiro capítulo apontaremos os reality-shows como uma das principais
possibilidades da TV na era da globalização. Entre eles, destacaremos o Big Brother como o
melhor exemplo deste tipo de programas, uma vez que reúne suas principais características.
Ele foi exibido pela primeira vez em 1999, na Holanda, conquistando expressivos dados de
audiência não na TV aberta, mas também em TV fechada e na Internet. A interação da
audiência com os rumos do programa, através do telefone e da Internet, é o seu maior atrativo.
O Big Brother foi idealizado pela produtora holandesa Endemol, que se especializou em
produzir conteúdos baseados em múltiplas plataformas, isto é, que podem ser consumidos não
apenas através da televisão, mas também através da Internet e do telefone. Ela é uma
produtora que tem atuação global, mas que tem por objetivo adaptar-se a cultura local. O
conjunto de atividades desenvolvido por esta companhia faz dela um tipo inédito de empresa
no setor das comunicações, o que nos permite considerá-la como exemplo de um fenômeno
novo, sintomático da etapa globalizada do capitalismo. Deste modo, a Endemol apresenta-se
como um ator de fundamental importância para a compreensão da dinâmica do capitalismo
atual, no âmbito das comunicações.
14
1.
1.1.
1. Indústria cultural e globalização
Indústria cultural e globalizaçãoIndústria cultural e globalização
Indústria cultural e globalização
15
1.1. A indústria cultural em questão.
1.1.1. O conceito de indústria cultural: Theodor Adorno e Max Horkheimer.
Adorno e Horkheimer estudaram o sistema formado pela cultura apropriada pelos
meios de comunicação de massa – que se desenvolvia em grande escala nos Estados Unidos e
na Europa e, principalmente, as conseqüências deste sobre os indivíduos, em “A Indústria
Cultural: O esclarecimento como mistificação das massas” (Dialética do esclarecimento,
1947). De acordo com eles, as principais metas desta forma contemporânea de cultura são, em
primeiro lugar, gerar lucro e, em segundo, garantir o controle social. As teses sobre a indústria
cultural também podem ser encontradas em outra versão, escrita por Adorno em 1968.
Os autores cunharam o termo ‘indústria cultural’ com o objetivo de substituir a
expressão ‘cultura de massa’, que, segundo eles, daria margem à interpretação de que se
tratava de uma cultura que surgiria espontaneamente das massas, como querem nos fazer crer
seus apologistas. Na verdade, segundo Adorno (1971), a indústria cultural, em todos os seus
ramos, não apenas fabrica produtos adaptados ao consumo das massas, como também
determina em grande parte esse consumo. Afirmam ainda que a cultura contemporânea
confere a tudo um ar de semelhança. Dessa forma, o cinema, o rádio e as revistas hoje
poderíamos incluir também a televisão e a Internet constituem um sistema articulado que
não deixa espaço entre eles para que se perceba outra manifestação que não seja a da própria
indústria cultural. Dentre outras características significativas, esta diferenciação estabelecida
pelos autores deixa claro que o fenômeno que analisaram é um ramo da atividade econômica e
nos permite identificar a proximidade das operações dessa indústria com um período histórico
determinado, a saber, o capitalismo monopolista.
De acordo com os defensores desta forma contemporânea de cultura, existe uma
explicação tecnológica para sua padronização, qual seja, o contraste entre poucos centros de
produção e uma receão dispersa, a condicionar a organização e o planejamento. Os
defensores da indústria cultural argumentam que seus padrões têm origem na necessidade dos
consumidores. Na realidade, segundo a crítica de Adorno e Horkheimer (1985), o que explica
o planejamento e a padronização de seus produtos é o rculo formado pela manipulação e a
necessidade produzida, no qual a unidade do sistema se torna cada vez mais harmônica. De
acordo com eles, este argumento oculta que o terreno no qual a técnica conquista poder sobre
16
a sociedade é aquele em que o poder é exercido pelos economicamente mais fortes sobre ela.
Assim, a racionalidade cnica hoje é a racionalidade da própria dominação. Dessa forma, os
autores demonstram como a técnica é apropriada pela economia atual, relacionando-a ao
processo social em que ela está inserida.
A unidade dessa indústria dada pela justaposição de capitais que se sobrepõe à
diferenciação dos setores técnicos e das diferentes empresas – “[...] atesta a unidade em
formação da política” (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p.116). Este é um elemento de
fundamental importância para compreendermos o funcionamento da indústria cultural. Ela
opera através da articulação entre a esfera cultural e a econômica, através de seus produtos, a
fim de classificar, organizar e, no limite, exercer o controle sobre a sociedade revelando,
assim, a sua dimensão política, pois a ela interessa a administração e a manutenção da
sociedade em seu estado atual. De acordo com os autores, a indústria cultural é a integração
de seus consumidores a partir do alto. Ela tem algo previsto para todos e, como uma maneira
de não deixar que ninguém escape, ela acentua e difunde as diferenças. No entanto, estas se
referem apenas às diferentes possibilidades de consumo postas a disposição dos indivíduos, de
acordo com suas condições econômicas. A oferta de diferentes produtos para o consumo
(filmes, revistas, DVDs, etc.) está mais relacionada com a utilidade para a classificação e
organização estatística dos consumidores em faixas etárias e grupos econômicos do que com o
conteúdo. Portanto, cada um deve se comportar e consumir, basicamente de acordo com sua
condição sócio-econômica, os produtos fabricados para o seu tipo
1
. O esquematismo desse
procedimento, segundo Adorno e Horkheimer (1985), é observável no fato de que os produtos
da indústria cultural, por mais que se esforcem para se diferenciarem, acabam se revelando
sempre a mesma coisa.
O princípio da indústria cultural impõe que todas as necessidades sejam
apresentadas ao consumidor como passíveis de serem satisfeitas por ela, mas, por outro lado,
essas necessidades devem ser previamente organizadas, de tal modo que ele se veja nelas
unicamente como um eterno consumidor, como seu objeto. O resultado dessa operação é que
as mercadorias da indústria cultural são criadas de acordo com o princípio da comercialização
1
É interessante notarmos que a época em que foi redigido este capítulo da Dialética do Esclarecimento, a
distinção existente entre os produtos era basicamente econômica (produtos fabricados de acordo com o poder
aquisitivo do público a que se destinava, por exemplo, os filmes A e B, as revistas de diferentes preços, etc.,
conforme apontado pelos próprios autores). Atualmente essa distinção se mantém, mas a indústria cultural
apresenta significativas modificações nesse sentido, adaptando-se às tendências verificadas no comportamento e
no gosto do consumidor. O melhor exemplo disso é a segmentação existente em todos os seus ramos, visando a
explorar os nichos de mercado. Isso é facilmente observável com relação ao mercado de revistas: existem
revistas destinadas ao público feminino, masculino, infantil, adolescente e adulto, revista de cultura afro, revistas
para músicos, amantes de carro, jardinagem, etc.
17
e não segundo seu conteúdo. A novidade trazida por essa forma de cultura é o predomínio do
efeito motivo pelo qual ela se desenvolveu –, que é calculado em todos os produtos. É
importante aqui estabelecermos uma diferenciação entre os objetos culturais. Existem alguns
objetos que são concebidos de acordo com sua lógica interna, como por exemplo, um livro,
uma obra de arte, mas que são reproduzidos pela indústria cultural. Por sua vez, existem
também aqueles produtos típicos dessa indústria, feitos inteiramente para serem mercadorias,
planejadas para produzirem efeito sobre os consumidores
2
. Este deslocamento em que o
produto se torna integralmente mercadoria é tão grande que produz fenômenos
completamente novos. Assim, a indústria cultural o é mais obrigada a visar aos interesses
do lucro dos quais ela partiu, pois estes se objetivaram em sua ideologia. Ainda, ela se torna
relações públicas de si mesma, procura o cliente para lhe vender um consentimento total e
acrítico, pois cada um de seus produtos é o seu próprio reclame. Este argumento reforça
novamente a idéia de unidade da indústria cultural, evidenciando que todos os seus produtos
mais típicos, apesar das sutis diferenças, estão em perfeita sintonia com a totalidade do
sistema. Dessa forma, todo objeto dessa indústria não se refere apenas a si, mas a toda
indústria. O consumidor, consequentemente, ao aderir a um de seus produtos, acaba por aderir
a indústria como um todo. De acordo com os autores, no entanto, aquilo que ela apresenta
como progresso, como novidade constante, nada mais é do que o antigo com roupagem nova.
Este é um tema importante para o desenvolvimento da presente dissertação e deverá ser
retomado adiante para um exame mais cuidadoso.
A indústria cultural é a indústria da diversão. É através da mediação da diversão que
ela exerce seu controle sobre os consumidores. A diversão nesta indústria, no entanto, tem
uma função específica dentro do processo social. No capitalismo tardio sua função é adaptar
as pessoas ao processo de trabalho e colocá-las novamente em condições de enfrentá-lo. Ela
ocupa o tempo do lazer, isto é, o tempo afastado do ambiente de trabalho, mas acaba por se
mostrar como um prolongamento do mesmo. A questão central relativa à diversão é a
denúncia de que se pode escapar ao processo de trabalho adaptando-se a ele no período de
descanso. Outro ponto importante envolvendo a diversão é sua proximidade com os negócios.
Seu sentido é a apologia da sociedade. Divertir-se é concordar com as coisas como estão, com
a sociedade, da maneira em que ela se encontra. É, ainda, não ter que pensar, “[...] esquecer o
sofrimento até mesmo onde é mostrado.” (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 135). É a
2
Podem ser exemplos de produtos típicos da indústria cultural muitos dos filmes de Hollywood os chamados
blockbusters ou os discos de música pop, recheados de hits e, ambos, atrelados a diversos outros produtos
comercializados com a sua ‘marca’.
18
negação do pensamento. Assim, o que inicialmente deveria ser um prazer, acaba se tornando
um aborrecimento e, para continuar sendo um prazer, não deve exigir nenhum esforço, deve
mover-se no campo das associações costumeiras. Segundo Adorno e Horkheimer (1985), o
espectador o deve ter a necessidade de nenhum pensamento próprio, pois toda reação é
prescrita pelo produto: não por sua estrutura temática, mas através de sinais. Tudo aquilo que
pressuponha esforço intelectual deve ser evitado. Os desenvolvimentos devem ser resultados
da situação imediatamente anterior.
O termo ‘indústria não deve ser tomado literalmente, pois ele diz respeito à
estandardização da própria coisa e à racionalização das técnicas de distribuição, mas não faz
referência exclusivamente ao processo de produção. De acordo com os autores, cada produto
da indústria cultural apresenta-se como individual, despertando a ilusão de que aquilo que é
coisificado e mediatizado é um refúgio do imediatismo da vida. Ela mantém sua afinidade
com o processo de circulação do capital, no qual tem sua origem, essa é a sua ideologia. Seu
caráter industrial se no sentido da assimilação das formas industriais de organização e
racionalização do trabalho nos escritórios, especialmente com relação a uma produção
racionalizada do ponto de vista tecnológico. Na medida em que diz respeito mais à
distribuição e à reprodução mecânica, a técnica da indústria cultural permanece externa ao
objeto. Segundo Adorno (1971), o suporte ideológico dessa indústria reside no fato dela
abster-se de tirar todas as conseqüências de suas técnicas em seus produtos.
Segundo os autores, as elucubrações desta indústria não são nem regras para se ter
uma vida feliz, nem uma nova arte da responsabilidade moral, mas exortações a conformar-se
naquilo atrás do qual estão os interesses poderosos. Desse modo, sua principal característica é
que os padrões de comportamento reforçados por ela são extremamente conformistas. As
idéias de ordem inculcadas por esta indústria são sempre as do status quo e são aceitas
passivamente. Este ponto das teses de Adorno (1971) apresenta importantes desdobramentos
políticos, e também aponta importantes aspectos para a análise do objeto desta pesquisa, como
veremos no terceiro capítulo. O conformismo e a passividade a que se refere o autor dizem
respeito a uma atitude política, uma opção pela o-ação e não uma imobilidade total por
incapacidade do indivíduo. Eles são os resultados de uma adesão ao processo social, em que o
indivíduo se conforma e abre mão de fazer qualquer atividade. Portanto, a ideologia da
indústria cultural serve de instrumento para que o conformismo substitua a consciência. As
mensagens que ela transmite não são nada mais do que exortações ao conformismo em
relação aos interesses dos poderosos.
19
De acordo com a argumentação de Adorno (1971), a indústria cultural oferece às
pessoas uma satisfação compensatória ao despertar nelas a sensação confortável de que o
mundo está em ordem e as frustra nessa mesma ilusão de felicidade que ela propicia. Portanto,
o efeito que o conjunto dessa indústria produz é a mistificação e o des-esclarecimento; nela, a
dominação técnica progressiva se transforma em engodo das massas. O que ela faz, na
verdade, é impedir a formação de indivíduos autônomos, que sejam capazes de julgar e
decidir conscientemente, portanto, ela anula as condições prévias à existência de uma
sociedade democrática, que apenas se desenvolveria através de homens o tutelados. A
conclusão dos autores, portanto, é que a indústria cultural é contrária à democracia.
1.1.2. Uma revisão do conceito de indústria cultural: a proposta de Douglas Kelner.
Douglas Kelner, importante autor norte-americano, cujo trabalho apresenta
intersecções com os estudos culturais britânicos e também com a teoria crítica, inicia o livro A
cultura da mídia, publicado no Brasil em 2001, fazendo um balanço das teorias recentes e
necessárias para a compreensão do que ele conceituou como “cultura da dia”. Sua
observação inicial é que existem algumas deficiências no programa original da Teoria Crítica
que, de acordo com sua argumentação, exigem uma reconstrução do modelo clássico de
indústria cultural. Ele propõe inicialmente a substituição do modelo baseado na divisão entre
cultura superior e inferior por um modelo que tome a cultura como uma totalidade e aplique
semelhantes métodos críticos a todas as produções culturais, desde a ópera até a música
popular. A diferença entre Kelner e os autores da Teoria Crítica fica explícita com este livro,
de tal modo que ele detecta a necessidade de formular um conceito diferente para analisar a
cultura contemporânea, a “cultura da mídia”, se colocando na perspectiva do
“multiculturalismo”. Outro ponto questionado pelo autor é a proposição, feita pelos autores da
Escola de Frankfurt, de que toda cultura de massa é ideológica e tem por efeito enganar as
massas passivas de consumidores. É necessário esclarecer, no entanto, o uso do termo
passividade para Adorno e Horkheimer. Ele é um termo que está intimamente ligado à idéia
de conformismo e de adesão, isto é, o indivíduo que se conforma abdica de fazer qualquer
atividade contrária à sua adesão. Ao contrário de como é normalmente interpretada, a
passividade não significa uma imobilização imposta externamente, ou uma espécie de
paralisia por incapacitação. Ela é, na verdade, uma ação: é a opção do indivíduo pela o-
20
ação, pela não-transformação, o que lhe confere também um forte aspecto político. Ao
contrário da proposta dos autores da Escola de Frankfurt, Kelner (2001) sugere que devemos
ver momentos críticos e ideológicos em todo o espectro da cultura. Assim, ele chama a
atenção para a necessidade de pensarmos na possibilidade de se detectar momentos críticos e
subversivos tanto nas produções da indústria cultural como nos clássicos da cultura superior
modernista. Entretanto, o autor reconhece a importância da análise crítica da cultura da mídia
a partir da perspectiva da mercadorização, reificação, ideologia e dominação, contra
abordagens acríticas dessa mesma cultura.
Além da proximidade com os autores da teoria crítica, o trabalho de Douglas Kelner
(2001) também recebe forte influência da perspectiva dos estudos culturais britânicos e de seu
legado. Segundo essa perspectiva teórica, a cultura situa-se no âmbito de uma teoria da
produção e reprodução social e as formas culturais podem, ao mesmo tempo, aumentar a
dominação social e possibilitar a resistência e luta contra a dominação, dependendo da
maneira como se analisa o objeto. A sociedade é concebida por eles como um conjunto
hierárquico e antagônico de relações sociais caracterizadas pela opressão de classes, sexos,
raças, etnias, e estratos nacionais subalternos. De acordo com os autores dos estudos culturais,
a cultura é um campo de luta pela hegemonia.
O autor defende a necessidade de se ler politicamente a cultura da dia, isto é,
situá-la historicamente e analisar o modo como ela incorpora determinadas posições políticas
e ideológicas e produz efeitos políticos. Significa também ver como as produções culturais da
mídia reproduzem as lutas sociais existentes através de suas imagens, espetáculos e narrativas.
Ele expande o conceito de crítica ideológica da tradição marxista, pois, de acordo com sua
argumentação, reduzir o conceito de ideologia a interesses de classe deixa claro que a única
dominação importante na sociedade é a de classe, ou econômica, enquanto a opressão de sexo,
sexualidade e etnia o tão importantes quanto a opressão econômica, pois estão imbricadas
nela. Esta crítica empreendida por Kelner (2001) é multicultural, distinguindo um espectro de
formas de opressão de pessoas de diferentes etnias, sexo e preferências sexuais, traçando os
modos como os discursos culturais ideológicos perpetuam a opressão.
As tecnologias surgidas nas últimas décadas mudaram os padrões da vida cotidiana e
reestruturaram o trabalho e o lazer. Enquanto fenômeno histórico, a cultura da mídia
3
é
3
De acordo com Douglas Kelner (2001), a cultura da mídia é a cultura dominante contemporaneamente. Ela
veicula uma forma comercial de cultura, produzida para gerar lucro e ser divulgada como mercadoria. Ainda, ela
submete os indivíduos a um fluxo sem precedentes de sons e imagens dentro de seu próprio ambiente doméstico,
que tem como efeito reordenar as percepções de espaço e tempo, anular a separação entre realidade e imagem,
enquanto produz novas formas de experiência e subjetividade.
21
relativamente recente. Apesar de as formas da indústria cultural descritas por Adorno e
Horkheimer, na década de 1940, terem começado a ocupar o centro do sistema de cultura e de
comunicação, Kelner (2001) defende que apenas com o advento da televisão, no pós-guerra
4
,
a mídia se transformou em força dominante na cultura, na socialização, na política e na vida
social. A partir de então, as diversas tecnologias de entretenimento doméstico (a cabo, via
satélite, videocassete, e mais recentemente, o computador pessoal) ajudaram a disseminar e
acelerar o aumento do poder da cultura veiculada pela dia. Isto evidencia a forte relação
existente entre cultura e tecnologia, e como esta acaba por modificar significativamente
aquela. O desenvolvimento das diferentes tecnologias de mídia e comunicação transforma a
esfera da cultura e potencializa seus efeitos e sua força.
De acordo com o autor, a cultura da mídia é a cultura dominante nos dias atuais; ela
substitui as formas de cultura elevada como foco de atenção e impacto para um grande
número de pessoas. Além disso, suas formas visuais e verbais estão substituindo as formas de
cultura livresca, exigindo novos tipos de conhecimentos para decodificá-los. Ainda, a cultura
veiculada pela mídia transformou-se em uma força dominante de socialização: suas imagens e
celebridades substituem a família, a escola e a Igreja como árbitros do gosto, valor e
pensamento, produzindo novos modelos de identificação e imagens vibrantes de estilo, moda
e comportamento. Esta perspectiva descrita por Kelner (2001) nos permite refletir sobre
algumas de suas implicações. Deste modo, a substituição das diversas instituições sociais,
com seus amplos objetivos, por uma cultura em que o único objetivo é gerar lucro para os
proprietários das grandes empresas de comunicação pode acarretar muitas conseqüências
prejudiciais para os indivíduos que vivenciam esse processo, tanto subjetiva quanto
objetivamente, bem como para o conjunto da sociedade. Muitas destas questões foram
apontadas por Adorno e Horkheimer, e esta perspectiva será desenvolvida também por Kelner
(2001), como poderemos acompanhar ao longo da exposição de seus argumentos.
O advento da cultura da mídia submete os indivíduos a um fluxo sem precedentes de
imagens e sons dentro de sua própria casa, e um mundo virtual de entretenimento,
informação, sexo e política passa a reordenar as percepções de espaço e tempo, anulando a
separação entre realidade e imagem, ao mesmo tempo em que produz novos modos de
experiência e subjetividade.
4
É necessário, no entanto, fazer uma ressalva com relação a este argumento e Kelner (2001). O papel social dos
meios de comunicação de massa não é exatamente uma novidade como o autor afirma. Basta retomarmos a
experiência do nazismo e o papel fundamental desempenhado pelo rádio nesta experiência totalitária, para
percebermos que este processo se encontrava em movimento e, portanto, a televisão neste sentido não é uma
novidade, mas apenas dá seqüência a um processo que é anterior a ela.
22
Para Douglas Kelner (2001), existe uma cultura veiculada pela mídia cujas imagens e
sons ajudam a organizar a vida cotidiana, dominando o tempo do lazer, modelando opiniões
políticas e comportamentos sociais, fornecendo material para as pessoas forjarem suas
identidades. No limite, estes procedimentos nos permitem identificar uma forte tendência de
controle social exercida por esta forma de cultura, que aponta para o fim da autonomia do
indivíduo perante a sociedade. A indústria cultural, de acordo com sua argumentação, fornece
modelos daquilo que significa ser homem ou mulher, bem-sucedido ou fracassado, poderoso
ou impotente. Ela também fornece material com os quais as pessoas constroem o seu senso de
classe, de etnia e raça, de nacionalidade, de sexualidade. As imagens da mídia fornecem os
recursos que ajudam a construir uma cultura comum para a maioria dos indivíduos em
diferentes pontos do globo hoje. A cultura da mídia fornece o material que cria as identidades
pelas quais os indivíduos se inserem nas sociedades capitalistas tecnológicas contemporâneas,
produzindo assim uma nova forma de cultura global (KELNER, 2001, p.09).
Esta cultura é formada por sistemas de rádio e reprodução de som; de filmes e seus
modos de distribuição; pela imprensa; e ela tem seu ponto central no sistema de televisão.
Segundo Kelner (2001), esta é uma cultura da imagem, que explora a visão e a audição. A
cultura da mídia é industrial, pois ela está organizada de acordo com o modelo de produção de
massa e é produzida para a massa de acordo com tipos (gêneros), segundo fórmulas, códigos e
normas convencionais. Portanto, é uma cultura comercial, e seus produtos são mercadorias
que visam o lucro privado produzido por empresas gigantescas que estão interessadas na
acumulação de capital. Este fato traz conseqüências importantes. A produção visando o lucro,
em primeiro lugar, significa produzir coisas populares, que vendam e atraiam a grande
audiência. Isso significa, em muitos casos, produzir um mínimo denominador comum que não
ofenda as massas e possa atrair o máximo de compradores. Mas, apesar da cultura da mídia
promover em grande parte o interesse das classes que possuem e controlam os grandes
conglomerados dos meios de comunicação, seus produtos também participam dos conflitos
sociais entre grupos concorrentes e veiculam posições conflitantes, promovendo às vezes
forças de resistência e progresso. Ela pode ser contrária à democracia quando reproduz
discursos reacionários, promovendo o preconceito de raça, sexo, idade, classe, entre outros,
mas também pode propiciar progressos quando ataca formas de segregação racial ou sexual,
ou pelo menos, as enfraquece com representações mais positivas de raça e sexo. Ela também
explora a tecnologia mais avançada, sendo um dos setores mais lucrativos da economia,
atingindo dimensões globais. Ela é uma mescla de cultura e tecnologia, que produz novos
tipos de sociedade em que mídia e tecnologia se tornam princípios organizadores. Neste ponto
23
o conceito de ‘cultura da mídiamostra-se de fundamental importância para a compreensão
dos reality-shows, a partir da perspectiva adotada por este trabalho e, além disso, articula-se
com discussão a respeito da globalização, como veremos mais a frente.
A posição defendida pelo autor é que a cultura da dia é um terreno de disputa no
qual grupos sociais importantes e ideologias rivais lutam pelo domínio, e que essas lutas são
vivenciadas pelos indivíduos por meio de imagens, discursos, mitos e espetáculos veiculados
pela mídia. A novidade trazida por esta cultura, de acordo com Douglas Kelner (2001), é que
ela passa a dominar a vida cotidiana, servindo de pano de fundo onipresente – quando não é o
‘sedutor primeiro plano’ – para o qual convergem nossa atenção e nossas atividades, algo que
alguns autores afirmam estar minando a potencialidade criativa humana
5
(KELNER, 2001,
p.11).
A cultura veiculada pela mídia induz à identificação dos indiduos com as sociedades
capitalistas existentes através dos prazeres propiciados pela mídia e pelo consumo, e não por
um sistema de doutrinação ideológica rígida. O espetáculo seduz o público e o leva a
identificar-se com certas opiniões, atitudes e sentimentos. Kelner (2001) afirma que a cultura
da dia e a cultura do consumo atuam juntas no sentido de gerar pensamentos e
comportamentos ajustados aos valores, às instituições, às crenças e às práticas vigentes. No
entanto, o autor não menospreza a capacidade de resistência do público, que tem a
possibilidade de criar seus próprios significados. A fim de interrogar de modo crítico a cultura
contemporânea, o autor defende que se estude a maneira como a indústria cultural cria
produtos específicos que reproduzem os discursos sociais encravados nos conflitos e lutas
fundamentais de uma época.
1.1.3. A atualidade do conceito: Christoph Türcke.
Christoph Türcke, importante pesquisador alemão herdeiro do legado teórico da
Escola de Frankfurt, no instigante ensaio “Prazeres preliminares virtualidade
expropriação. Indústria cultural hoje”, publicado no livro As luzes da arte, em 1999, analisa as
condições atuais da indústria cultural a partir de suas manifestações contemporâneas, com
mais possibilidades de desdobramentos futuros, a saber: realidade virtual, ciberespaço,
5
No capítulo seguinte veremos como Sartori (2001) extrai conseqüências importantes dessa tendência a partir do
estudo da televisão.
24
capacetes de realidade virtual, comunicação multimídia e interação. Para tanto, Türcke (1999)
trabalha com os conceitos de ‘prazeres preliminares, ‘virtualidade’ e ‘expropriação da
faculdade de imaginação’, que segundo ele estão presentes na cultura hoje. O ciberespaço
um ‘espaço dirigido’, onde o olho não distingue mais o real e o virtual, e que pode ser
reconfigurado através de um simples toque, formando um universo de imagens próprio é o
que mais expressa essa tendência de nossa sociedade. No entanto, segundo o autor, os
sentidos que deveriam percorrer ativamente este espaço virtual são passivizados até a letargia,
passando apenas a reagir a estímulos previamente calculados. Isto coloca um problema para a
indústria cultural, que tem que descobrir novas formas de estimular os sentidos fatigados, para
que continuem a consumir os seus produtos.
Christoph Türcke (1999) inicia sua argumentação a partir da retomada de uma
constatação feita por Adorno, em 1938, de que “Em momentos íntimos, as mulheres cuidam
mais de conservar o penteado e a maquiagem do que a situação, à qual o penteado e a
maquiagem se destinam”. Segundo Adorno, essas mulheres são como símbolos da tendência
da cultura moderna que converte os causadores do prazer nos próprios objetos do prazer e no
ponto mais alto de todo o prazer naquilo que ele chama de ‘pré-prazer’. Hoje em dia, para
Türcke (1999), a palavra que melhor expressa essa tendência é o termo ‘virtual’. Ele significa
existente segundo a força ou a possibilidade. Aquilo que é possível ainda está longe de ser
real, mas também deixa de ser um nada. É por esta razão que a expressão ‘realidade virtual
pode ser vista, de acordo com o autor, como a expressão de fenômenos-limite nos quais a
‘virtualidade’ não se apresenta como estágio que antecede o real, mas como o próprio real.
Existe uma pré-condição para que se possa falar em realidade virtual, a saber,
combinar duas faculdades técnicas: a primeira é a de sugerir ao olho humano a
tridimensionalidade de forma que ele não mais possa resistir à impressão de encontrar-se
efetivamente no espaço sugerido, ao invés de estar apenas frente a imagens; em segundo
lugar, o poder de intervir no espaço sugerido e reconfigurá-lo com um leve toque de sua mão.
Assim, o autor afirma que o ciberespaço é um espaço dirigido: um espaço onde o olho não
consegue distinguir entre o real e o virtual, e que ele pode arranjar em um universo de
imagens próprio, com a ajuda da mão, criando um espaço singular.
Dessa maneira, são criados ‘capacetes de realidade virtual’, que expõem o usuário a
um espetáculo audiovisual e a sensações na pele. No espaço que é criado por estes
equipamentos a pessoa se move como em um sonho, pois o sonho também sugere sensações e
impressões às quais é impossível resistir. De acordo com Türcke (1999), o sonho é uma forma
primitiva de realidade virtual. O ingresso nesse estado está sujeito a uma condição: o ‘ego-
25
controlador’ deve ser reduzido até aproximar-se da sua disfunção. O teatro pode ser visto
como um meio ‘artificial’ para efetuar essa redução. Logicamente, o teatro deixa claramente
marcado que, por um lado, os acontecimentos efetivamente ocorrem no palco; por outro, dá a
entender que as coisas não se passam bem assim. O cinema e a televisão dão um passo além.
Com eles não é possível reconhecer claramente se as pessoas em frente às meras estão
apenas representando; mas o espectador costuma saber que as imagens o são a própria
coisa.
Segundo Christoph Türcke (1999), o que é atacado pelos novos meios de
comunicação é o ‘resíduo de distância consciente’. O artifício consiste em não atingir o estado
desperto do indivíduo e, mesmo assim, neutralizá-lo, a fim de produzir um efeito sobre o
órgão sensorial respectivo através de um estímulo ao qual este reaja exclusivamente como um
reflexo. Este artifício que é utilizado meio século pela publicidade audiovisual pode
se tornar uma ‘disposição estética universal’, graças aos novos meios de comunicação, que
orientam a perceão. É necessário ressaltar que a indústria cultural como um todo, e em
especial a televisão, operam de modo muito semelhante ao que Türcke (1999) argumenta.
Elas operam através da passividade e do conformismo que despertam em seus consumidores.
Dessa maneira funciona o capacete tridimensional. Seu efeito se deve ao fato de isolar o olho,
e tratá-lo em ‘condições laboratoriais’. O olho não pode desviar, não pode certificar-se, como
faz diante da televisão, de que está apenas assistindo a um espetáculo. Os ciberuniformes
submetem o olho a uma atividade direcionada que lhe implantam as imagens tridimensionais
– passando longe da consciência de que se trate apenas de imagens. Toda dimensão do
movimento e da tensão do corpo e da psique está previamente amputada desse novo espaço de
vivências, no qual se adentra acionando o botão.
Aqueles sentidos que se espera que percorram o ciberespaço ativamente são
passivizados até a letargia: cada um deles é estimulado isoladamente, de maneira que ele pode
unicamente reagir ao estímulo calculado, com o qual ele é massageado. A sensação que se
deseja em cada caso é ligada pelo estímulo correspondente, e se acaba no momento mesmo
em que ele não ocorre. Desta forma, ela não consegue ir além do estado inicial de estímulo,
que deve ser aprofundado para que a experiência de fruição e de prazer possa ocorrer.
O autor ressalva que os capacetes de realidade virtual constituem apenas um caso
extremo, mas, no entanto, estão plenos de realizações futuras. Eles objetivam de maneira
drástica o princípio fundamental da multimídia: desenvolver para cada um dos sentidos
humanos o respectivo sistema de transmissão de dados para somar aos outros e obter uma
impressão global. Outras ferramentas, além do capacete de tridimensionalidade, são
26
desenvolvidas para outros tipos de atividades, como por exemplo, as redes de comunicação
que possibilitam as videoconferências simultâneas. Elas operam através do mesmo princípio
básico: interligar os órgãos sensoriais com lugares distantes, cada um a sua maneira, mas
simultaneamente uns aos outros. A comunicação multimídia consegue eliminar tudo o que
distrai do objetivo comum. Tudo aquilo que lhe serve é isolado, é assim que ela consegue
reduzir determinados processos de formação da tomada de decisões. Desta forma, ela desperta
o interesse em função de suas enormes possibilidades de redução de custos. Mas o tipo de
proximidade que ela instaura consiste apenas em estabelecer uma ligação para vencer a
distância no tempo e no espaço com um fim estreitamente delimitado, não devendo ser
confundida, como nos alerta rcke (1999), com ‘proximidade humana’, que depende de
outros fatores, tais como convívio e vivências partilhadas.
O ponto central contido neste texto é a discussão a respeito do termo ‘interativo’,
muito usado para caracterizar os atuais meios de comunicação multimídia. O autor remonta as
raízes deste termo a partir do ‘interacionismo simbólico’, fundado por G. H. Mead, que tem
como referência o comportamento de emissor e do receptor, num esquema behaviorista de
estímulo e resposta, acrescido da idéia de ‘efeito recíproco’. Inicialmente este modelo foi
pensado para a comunicação entre seres vivos, mas foi também rapidamente utilizado para a
análise da comunicação entre seres humanos através de meios tecnológicos. Para Türcke
(1999), o primeiro aspecto a ser ressaltado é que a idéia de interação é a ação inserida dentro
do esquema estímulo-resposta. O prefixo ‘inter’ transmite a idéia de um canal dentro do qual
se age. Além disso, o autor critica a exaltação dos novos meios de comunicação como
interativos – e que, portanto, seriam supostamente libertários ou democráticos, uma vez que o
indivíduo pode finalmente reagir e intervir, não estando mais apenas exposto a inundação de
informação pois esta atitude não permite conscientizar os indivíduos a respeito do esquema
fundamental behaviorista, no qual ela se baseia, nem sobre a restrição e filtragem que o meio
efetua antes mesmo do usuário fazer o primeiro clique com o mouse.
A perversidade de todo esse processo, de acordo com Christoph Türcke (1999),
reside no seguinte fato: na medida em que as máquinas vão se tornando mais refinadas, a
capacidade de imaginação dos indivíduos se torna mais pobre. Se no passado a imaginação
necessitava de pequenas fotografias para formular fantasias eróticas, hoje ela necessita cada
vez mais de cenários audiovisuais tridimensionais para ser seriamente excitada. Neste ponto
se torna manifesto o sentido oculto da virtualização, que é a ‘expropriação’. Mas não é a
realidade que é expropriada, e sim a imaginação, as conquistas culturais. Pois a faculdade da
imaginação exposta ao bombardeio audiovisual perde a capacidade de absorver os estímulos
27
externos e transformá-los na sua própria experiência. O autor esclarece que a expropriação
sempre existiu, anteriormente agindo sobre os bem materiais. O que hoje presenciamos é uma
forma distinta de expropriação, que busca apoderar-se dos sentidos interiores do indivíduo,
por meio da inundação de informação, que é uma criação do século XX. Adorno e
Horkheimer a chamaram de indústria cultural. Türcke (1999) conclui, então, que esses novos
meios de comunicação, que fundem o computador e a telecomunicação não são o indicativo
de uma nova época, mas apenas uma nova fase desta indústria. A partir da análise das
conclusões de Adorno e Horkheimer, o autor afirma que as massas não apenas são enganadas
pelos clichês pré-produzidos, mas também se enganam a si mesmas, na medida em que
deixam que eles se tornem as formas das suas percepções e de seu próprio pensamento. Ele
destaca, ainda, que o engodo das massas o tem apenas uma dimensão político-moral, mas
também uma dimensão sensorial-estética. Por sua vez, esta consiste em oferecer o prazer aos
sentidos de modo a simultaneamente impedi-los, e expondo novamente o objeto de desejo.
Christoph Türcke (1999) trabalha a idéia de que atualmente são necessários
estímulos cada vez mais fortes para excitar o pré-prazer, e afirma que o masoquismo hoje se
tornou uma disposição quase que estética das massas. Segundo ele, os jovens estão a cultivá-
la e a tirar dela um prazer novo e de natureza duvidosa. O autor afirma que o símbolo dos
anos 90, para os jovens, é a penetração do body piercing, a fim de deixar a pessoa mais
atraente, e seria para estes indivíduos mais excitante do que a penetração sexual. Para
Türcke (1999), a mudança de um ‘masoquismo defensivo’ para o ‘masoquismo ofensivo’
serve como um modelo para a mudança da indústria cultural contra si mesma. Hoje o
problema dela não é mais saber como martelar padrões nas massas, mas como ainda conseguir
despertar os sentidos fatigados por este processo, a fim de que consumam novos estímulos. A
luta da indústria cultural, hoje, é contra suas próprias manifestações de desgaste. E, lutando
contra seus próprios efeitos, ela termina por reforçá-los. Atualmente um olho que apenas vê e
um ouvido que apenas ouve somente reagem a um estímulo ao invés de integrar uma
experiência sensorial global.
O autor vê a postura de negação como única forma possível de resistência, como uma
maneira de proteger a dimensão sensorial dos sentidos da inundação causada pela multimídia,
a resistência à expropriação da faculdade de imaginação. Assim como Adorno, o autor na
arte um papel importante na resistência contra a indústria cultural. Ele constata que a arte e a
legítima defesa se interpenetram, demonstrando de um ponto de vista negativo, em sua
fraqueza estética e política, o poder alcançado por esta indústria. Christoph Türcke (1999)
28
conclui este texto afirmando que o estágio primitivo em que ela se encontrava cinqüenta
anos atrás é quase inofensivo em relação à realidade virtual dos nossos tempos.
1.2. Cultura e globalização em questão.
1.2.1. Rodrigo Duarte: indústria cultural e globalização.
Em seu livro Teoria Crítica da indústria cultural, publicado em 2003 pela editora
UFMG, o professor e pesquisador Rodrigo Duarte procura avaliar a atualidade das posições
defendidas pelos autores da Escola de Frankfurt, especialmente de Adorno e Horkheimer, a
partir das alterações do capitalismo desde os anos de 1940 até hoje, com foco especial sobre o
processo de globalização que vivenciamos atualmente. Apesar das dificuldades de se abordar
esse tema, em função das disputas ideológicas e da proximidade histórica, dentre outros,
Duarte (2003) não abre o de apresentar, mesmo que esquematicamente, os aspectos mais
evidentes da globalização, especialmente no que diz respeito às suas conexões com o tema da
indústria cultural.
Ele fará o exame das principais teses dos sociólogos Ulrich Beck e Sott Lash
6
, visto
que ambos os autores tem como pano de fundo a discussão do que eles chamam de
“modernidade reflexiva”
7
, além de considerarem o advento e a inter-relação entre os novos
meios de comunicação e de tecnologia de informação. Uma idéia comum aos autores sobre a
globalização é com relação à perda de poder da classe operária organizada – que até finais do
6
As teses analisadas por Rodrigo Duarte encontram-se publicadas em O que é globalização? Equívocos do
globalismo: respostas à globalização”, de Ulrich Beck, e em um artigo de Scott Lash no jornal alemão Die Zeit,
em 5 de março de 1998. O referido artigo faz uso do termo ‘indústria cultural global’ e remete a um livro com o
mesmo título, escrito em conjunto com J. Urry, mas que não havia sido publicado até a época da redação do livro
de Rodrigo Duarte. Portanto, as teses de Scott Lash analisadas pelo autor restringem-se ao artigo mencionado
e ao livro publicado juntamente com Beck e Giddens Modernização reflexiva. Política, tradição e estética na
ordem social moderna (São Paulo: Editora Unesp, 1997). Isto explica a desproporção da extensão entre uma e
outra análise.
7
Como apontado na nota anterior, a esta discussão os autores mencionados juntam-se também a Anthony
Giddens, no livro Modernização reflexiva. Política, tradição e estética na ordem social moderna (São Paulo:
Editora Unesp, 1997). O que eles chamam de ‘modernidade reflexiva’ ou segunda modernidadeé um modelo
de sociabilidade potencialmente efetivo a partir do advento da globalização, no qual tanto a ‘comunidade’ dos
povos tradicionais quanto a ‘sociedade’ – concepção típica da modernidade “simples” ou primeira – são
superadas em benefício de um tipo de “sociedade reflexiva”, na qual seus membros se aproximam a um retorno à
comunidade, mas sem os elementos que restringem a liberdade individual característicos dos povos tradicionais.
Agora a comunidade é mediatizada pelos modernos recursos da microeletrônica relacionados às
telecomunicações, exigindo de seus usuários uma ‘abordagem reflexiva’.
29
século XIX exercia forte contrapeso à tendência de internacionalização do capital que se
transformou numa espécie de ‘subclasse’ sem poder político e foi tecnologicamente superada
pelos detentores de conhecimentos estratégicos (a saber, as tecnologias de informação e
comunicação), que constituem a nova e próspera classe média dos países desenvolvidos. Este
é um dado de grande importância para a compreensão da dinâmica da globalização, pois os
‘empreendedores globais’, ou global players, não encontram mais resistência. Seu aumento
progressivo tem como contrapartida o enfraquecimento das instâncias estatais, que tiveram
importante papel de mediação e organização das sociedades, especialmente no período de
apogeu do Estado de Bem-Estar Social (Cf. DUARTE, R., 2003, p.148-149).
A fase de altíssimo desenvolvimento tecnológico em que vivemos atualmente,
segundo Beck, proporciona aos empreendedores transnacionais a possibilidade de atuarem
globalmente e dividirem as diversas etapas da confecção e distribuição da produção, de
acordo com os menores custos e até mesmo das vagas de trabalho –, além da possibilidade
de colocarem Estados nacionais uns contra os outros para aumentarem suas próprias
lucratividades. Estas possibilidades colocam em xeque a capacidade de tributação do Estado e
onde existe um Estado de Bem-Estar Social, como em muitos países europeus, significa não
apenas quedas bruscas nas fontes de arrecadação e gastos crescendo exponencialmente, mas
também a falta de meios aos Estados de pacificar e mediar os conflitos provenientes das
desigualdades, em evidente crescimento. Apesar disso, o autor identifica um ‘otimismo
moderado’ nas posições de Ulrich Beck e Scott Lash, quanto às possibilidades abertas a pelo
menos uma parcela da população mundial com o advento da globalização (Cf. DUARTE, R.,
2003, p.150). O sociólogo alemão diferencia ‘globalismo’, que é a ideologia do
neoliberalismo, de ‘globalidade’, a conscientização de que vivemos em uma sociedade
internacionalizada há muito tempo. O que diferencia a primeira da segunda modernidade, para
ele, é a incontestável existência da globalidade.
Para Beck, globalização é um processo objetivo que ocasiona conexões e espaços
sociais transnacionais, valoriza culturas locais e impulsiona culturas essencialmente mistas.
Segundo o autor, a globalização das ações econômicas é seguida por ondas de transformações
culturais processo também conhecido como ‘globalização cultural’, que apresenta intensas
conexões com o tema da indústria cultural globalizada. Com relação àquela, sua posição é que
ela não implica na pura e simples McDonaldização do mundo’, isto é, na padronização da
cultura e dos estilos de vida, mas seria antes uma oportunidade de se alcançar uma associação
30
positiva entre o próximo e o distante, o local e o global. Esta simbiose é sintetizada pelo autor
com o termo ‘glocalizão’
8
.
No entanto, apesar do que foi exposto, Ulrich Beck acredita na possibilidade da
existência de certa ‘dialética’ na globalização cultural e que os paradoxos e ambivalências
existentes impedem a padronização em escala mundial dos conteúdos e formas culturais. Uma
razão para a inexistência dessa padronização, levantada pelo sociólogo alemão, seria o fato de
o capitalismo mundializado bem como o tradicional ser atingido por crises e, portanto,
necessitar da diversidade e da contradição, que só as culturas locais possuem para se afirmar
na concorrência mundial. Dessa forma, o capitalismo eventualmente recorre aos elementos
locais para obter as inovações necessárias a seus produtos e mercados.
Segundo Rodrigo Duarte (2003), as posições de Scott Lash sobre a ‘indústria cultural
global’ podem ser observadas em suas considerações sobre a modernidade reflexiva. O ponto
de partida deste autor é semelhante ao de Beck, isto é, a ‘globalização’ é o resultado do
advento da segunda modernidade (ou modernidade reflexiva). Mas pode-se perceber uma
crítica mais contundente, pois ele trata mais abertamente sobre o fenômeno da exclusão
crônica que ameaça não apenas os países de Terceiro mundo, como também os menos
favorecidos nos países capitalistas mais avançados, em função da política neoliberal e,
conseqüentemente, do desmonte do Estado de Bem-Estar Social. O autor também tem o seu
traço otimista com relação às possibilidades da modernização reflexiva e da globalização a ela
associada.
De acordo com Rodrigo Duarte (2003), o ano de 1990 é considerado o marco inicial
do processo de globalização
9
. A partir de então, o âmbito dos meios de comunicação vem
passando por gigantescas transformações, que correspondem exatamente aos movimentos
ocorridos na sociedade e na política do mundo ‘globalizado’. De acordo com ele, é possível
observar, por exemplo, uma enorme concentração de capitais nesse ramo, cujo resultado é
pouco mais de uma dúzia de grandes corporações controlar quase toda a oferta de mercadorias
culturais à disposição no mercado mundial. Apesar de afirmações em contrário, como é o caso
de Ulrich Beck, Duarte (2003) chama a atenção para o caráter avassalador e padronizado da
oferta atual da ‘cultura de massa’. Outro ponto a ser destacado é o predomínio do mercado
americano sobre os demais, não simplesmente como centro produtor e irradiador dos
conteúdos consumidos em todo o mundo, mas também como o principal mercado consumidor
8
Este conceito será analisado com maior profundidade no tópico seguinte.
9
É importante ressaltar que a globalização é um processo, portanto, torna-se difícil estipular marcos preciso para
uma cronologia. O próprio texto de Duarte (2003) aponta essa dificuldade ao realizar um levantamento dos
principais acontecimentos envolvidos no processo da globalização.
31
de produtos culturais industrializados. Ele observa ainda que, na formação de enormes
oligopólios dos meios de comunicação de massa, uma tendência ao predomínio de
corporações transnacionais que atuavam em outros ramos, especialmente os conglomerados
de eletro-eletrônicos japoneses, que foram migrando progressivamente ou diversificando
seus investimentos – para a indústria do entretenimento.
O processo de globalização cultural é marcado pela intensa atuação de global players
em processos de aquisição de, ou associação, a empresas do ramo do entretenimento. Os
conglomerados japoneses, juntamente com o bilionário dos meios de comunicação Rupert
Murdock, adquiriram os mais tradicionais estúdios cinematográficos norte-americanos (a
Twentieth Century-Fox, comprado por Murdoch, a Columbia, adquirido pela Sony e a
MCA/Universal, da Matsushita) entre 1985 e 1990. Mas o desenvolvimento da indústria
cultural não se limitou à compra de grandes empresas de entretenimento por corporações
japonesas do ramo da eletrônica. Em 1989, duas gigantes entre as empresas norte-americanas
de media formaram um império ainda maior. Por 14 bilhões de dólares a Warner
Communications foi vendida para o grupo editorial Time-Life, constituindo a Time Warner,
que se tornou o maior e mais lucrativo conglomerado do mundo é deles o canal de notícias
‘global’ CNN. Rodrigo Duarte (2003), porém, considera a MTV como o exemplo acabado da
indústria cultural global, pois, apesar de certa regionalização, o núcleo da programação
exibida é “internacional” (ou seja, norte-americana, ou pelo menos de língua inglesa) para um
público de duzentos milhões de lares em dezenas de países.
Do ponto de vista tecnológico, o que caracteriza a indústria cultural global é o advento
e o desenvolvimento do sistema digital de registro, geração e transmissão de som e imagem.
Este sistema possibilita, por exemplo, a compressão de informações que são tratadas como
dados computacionais - economizando tanta capacidade de transmissão que possibilita a
transmissão de som e imagem de alta qualidade inclusive através de cabos telefônicos. Isto
abre a possibilidade de transmissão de centenas de canais a cabo ao redor do globo, através de
satélites com transmissão digital. Por sua vez, a enorme oferta de canais (a cabo ou via
satélite) possibilita o surgimento de uma forma de comercialização de produtos audiovisuais
chamada de video on demand: escolhe-se o programa desejado e pode-se recebê-lo
transmitido na sua própria televisão ou computador.
No entanto, como aponta Rodrigo Duarte (2003), várias corporações dos media estão
se voltando para o desenvolvimento de modelos de “televisão interativa”, nas quais o
espectador não se limita a escolher, dentre a oferta existente, o programa que quer assistir ou a
mercadoria que deseja comprar. Paralelamente a este processo, é possível observar o
32
gigantesco desenvolvimento dos computadores pessoais e, posteriormente, da Internet. A rede
mundial dos computadores experimentou, e continua experimentando, enorme expansão
desde o início dos anos 90. O surgimento da World Wide Web teve um impacto importante na
transformação dos microcomputadores em concorrentes dos veículos tradicionais de
telecomunicação da indústria cultural. As atuais técnicas de compressão de vídeo e
transmissão via fibra ótica permitem enviar ao microcomputador, através da Internet,
programas inteiros, concorrendo diretamente com os meios tradicionais, indicando a
tendência à fusão desses meios no futuro.
À luz dos dados mencionados sobre a formação de oligopólios globais de
entretenimento, nos últimos dez anos, Rodrigo Duarte (2003) propõe reavaliar as posições de
Ulrich Beck e Scott Lash. Para o autor, por exemplo, a abordagem de Beck vai além da
simples apologia do status quo. Para o sociólogo alemão está claro que a globalização, do
ponto de vista econômico, promoveu o desmonte de obstáculos ao investimento em escala
mundial. Ele identifica que existem limites para a globalização, isto é, a extensão de seus
efeitos a todos os cantos do planeta é relativa. Por exemplo, as relações de comércio se o
principalmente entre América, Europa e países banhados pelo Oceano Pacífico. Isto contrasta
com o quadro igualmente real de uma humanidade esfacelada em Estados e identidades
nacionais, com suas concepções de soberania e origem. Da mesma forma, ele se mostra ciente
de que as formas de violência específicas da realidade dos países capitalistas mais avançados
estão relacionadas às tensões e acomodações dos efeitos da globalização sobre o mercado de
trabalho.
Scott Lash, por sua vez, não se mostra entusiasmado com a indústria cultural global,
embora a encare como uma realidade típica de nossa época, em relação à qual se torna difícil
uma resistência efetiva. Ele considera este modelo recente de indústria cultural diferente dos
anteriores, na medida em que é menos dependente de conteúdo e mais de tecnologia, embora
continuidade e aprofunde a formação de monopólio traço básico do modelo anterior. A
existência de oligopólios, inclusive, leva ao consumo compulsório de determinada tecnologia
e tem multiplicado o faturamento de corporações. Outra característica da indústria cultural
global é a fusão entre os equipamentos (hardware) e o conteúdo (software), como se pode
observar nos processos de fusão mencionados anteriormente. De acordo com o sociólogo
inglês, atualmente a cultura se torna menos apresentação e mais tecnologia.
Das características da “indústria cultural global” discutidas por Scott Lash, Rodrigo
Duarte (2003) considera interessante a idéia de que, no capitalismo atual, existe uma
proximidade muito maior quase uma imbricação entre a superestrutura ideológica e a
33
infra-estrutura material do que na época em que Adorno e Horkheimer redigiram a Dialética
do Esclarecimento. A própria indústria do entretenimento se adensou economicamente de tal
forma que pode hoje ser incluída entre os setores de vanguarda do capitalismo mundial, não
sendo mais dependente da indústria eletrônica, petrolífera, siderúrgica, química, etc., como
afirmaram os autores. Um indício dessa nova situação, segundo Duarte (2003), é o fato de que
tantos conglomerados industriais do ramo da eletrônica (principalmente japoneses) tenham se
interessado em adquirir empresas de entretenimento ou a elas se associar.
Outro tema analisado por Rodrigo Duarte (2003) é o consumo em massa ‘globalizado’
de produtos culturais chamados ‘étnicos’, oferecidos pelas grandes redes de TV a cabo. Outro
fato destacado pelo autor é presença pelo mundo todo da música popular africana, árabe,
cubana, brasileira, etc., concorrendo inclusive com os líderes do setor: criadores de língua
inglesa, vindo principalmente da Europa e dos Estados Unidos. duas possíveis
interpretações para este fato: a primeira diz respeito ao reconhecimento, por parte do
stablishment, de que outras culturas e outros povos têm uma contribuição a dar à vida cultural
desgastada dos países capitalistas centrais; a segunda afirma ser um aprofundamento da
exploração, pela indústria cultural global, da cultura popular. Para Rodrigo Duarte (2003), o
fato de o mundo globalizado prestar mais atenção a culturas antes desprezadas está ligado à
carência de conteúdo por parte das centenas de canais a cabo, adensados agora por
transmissões diretas via Internet. Neste ponto, o autor aproxima-se da posição de Ulrich Beck,
quando este afirma que a diversidade cultural e podemos usar o exemplo do aumento da
oferta de produtos culturais étnicos pode ser incluída entre os fatores que poderão garantir
futuramente a sobrevivência de uma sociedade de mercado com liberdade política e direitos
fundamentais da pessoa garantidos.
1.2.2. Ulrich Beck: globalização e glocalização.
Ulrich Beck, em seu livro O que é globalização? Equívocos do globalismo: resposta à
globalização, publicado no Brasil pela editora Paz e Terra, em 1999, procura levantar
argumentos e exemplos para responder a esta pergunta/título que tem tomado conta dos
debates dentro das ciências sociais nos últimos anos. A primeira constatação do autor é a da
existência de uma controvérsia fundamental que permeia a literatura a respeito da
globalização buscando responder o que impulsiona esse processo. Ele divide os autores
34
envolvidos nessa controvérsia basicamente em dois grupos. O primeiro destaca a existência de
uma “lógica” dominante, o segundo grupo de autores defende a existência de lógicas
complexas e multicausais da globalização. Neste primeiro grupo Ulrich Beck (1999) analisa
autores como Immanuel Wallerstein, James Rosneau, Gilpin
10
e David Held, dentre outros. O
conceito de ‘sistema mundial’ foi introduzido por Immanuel Wallerstein, para quem o
capitalismo é o motor da globalização. Outros autores desse grupo questionam a ortodoxia
nacional-estatal e ressaltam o significado da globalização tecnológica, muito em voga
atualmente através das idéias de sociedade do conhecimento e da informação. Por outro lado,
Roland Robertson, Arjun Appadurai, Martin Albrow, Scott Lash, Zygmund Bauman, entre
outros, pertencentes ao segundo grupo de autores, refutam energicamente a idéia de uma
McDonaldização do mundo’. Para estes autores,
A globalização cultural não significa a homogeneização mundial.
Globalização quer muito mais dizer ‘glocalização’, isto é, um processo
altamente contraditório, tanto no que envolve o seu conteúdo como suas
conseqüências (BECK, 1999, p. 66).
Cada um dos diferentes autores analisados por Beck (1999) têm diferentes posições e
argumentos sobre a globalização. Do confronto entre as diferentes perspectivas emerge o
quadro de uma sociologia plural da globalização, que o autor objetiva traçar.
Pertencente ao grupo de autores que defendem a existência de uma lógica dominante
na globalização, Immanuel Wallerstein sustenta a teoria dos espaços sociais transnacionais,
rompendo com uma visão estatal-nacional de sociedade em função da substituição da teoria
do container social por formas de vida integradas transnacionalmente, que ultrapassam
fronteiras, por espaços mais amplos de atuação social. Nesse sentido, ‘transnacional’ significa
o surgimento de formas de vida e atuação cuja lógica interna pode ser explicada pela riqueza
de descobertas que conduziriam os homens a erigir e sustentar mundos de convivência e
relações de intercâmbio ‘sem distâncias’.
Wallerstein substitui radicalmente a idéia de sociedades individuais, fechadas e
separadas umas das outras pelo seu oposto, isto é, um ‘sistema mundial’ em que todos (ou
seja, sociedades, governos, empresas, culturas, classes, famílias e indivíduos) precisam estar
situados numa divisão do trabalho. Este ‘sistema mundial’, que favorece o quadro de
10
O livro de Ulrich Beck o nos fornece a referência completa do referido autor no corpo do texto e nem
mesmo na bibliografia que encontra-se ao final do livro. No entanto, pesquisando algumas referências que o
texto nos fornece, tudo leva a crer que se trata de GILPIN, Robert. The political economy of international
relations. Princeton: Princeton University Press, 1987.
35
desigualdades em escala mundial, é o capitalismo: sua lógica interna o leva necessariamente a
ser global. A universalização e o aprofundamento da lógica capitalista, por suas próprias
contradições, provocam resistências em escala mundial. Entre elas podemos destacar, segundo
Wallerstein, as reações anti-ocidentais, anti-modernas e fundamentalistas, bem como os
movimentos ambientalistas e o ressurgimento de diversos nacionalismos. De acordo com o
autor, a globalização está determinada só e exclusivamente como institucionalização do
mercado mundial.
Dentro deste mesmo grupo de autores, James Rosneau propõe que a globalização
significa termos ultrapassado a era da política internacional, caracterizada pelo predomínio e
monopólio do cenário internacional por parte dos Estados Nacionais. Inicia-se agora uma era
pós-política internacional, na qual os atores nacionais são obrigados a compartilhar o cenário
e o poder global com organizações internacionais, companhias, movimentos políticos e
sociais transnacionais. A transição do Estado Nacional para a era transnacional se dacom
uma nova configuração do sistema político, com a substituição da estrutura monocêntrica de
poder dos Estados Nacionais, que rivalizam entre si, por uma distribuição policêntrica de
poder, na qual uma grande diversidade de atores transnacionais e nacionais cooperam e
concorrem entre si.
Gilpin
11
, por sua vez, é cético em relação à retórica da novidade, mas não deixa de
reconhecer que os Estados nacionais estão mais do que nunca interligados. A globalização é
produto de uma ordem global ‘permissiva’. Ou seja, entendida como expansão de espaços e
atores transnacionais, a globalização permanece dependente da autoridade do Estado
Nacional, ou, dito de outra forma, de um poder hegemônico. De acordo com o autor, a
globalização pressupõe a ‘autorização silenciosa’ do Estado Nacional. Ela, todavia,
permanece ameaçada, pois o surgimento de atores transnacionais tem como pressuposto a
existência de uma estrutura hegemônica de poder e um regime político internacional.
Finalmente, a tese central de David Held é que o principal efeito da globalização sobre
os Estados Nacionais é a perda da soberania estatal e da autonomia. Através de acordos
internacionais, das crescentes relações de dependência das políticas de segurança, dentre
outros fatores, a política nacional-estatal perde o núcleo de seu poder, a saber, a soberania.
Esta, no entanto, deve ser compreendida hoje como um poder nas mãos de diversos atores
nacionais, regionais e internacionais – que é limitado por essa pluralidade.
11
Ver nota anterior.
36
Por outro lado, a globalização da economia é seguida por ondas de transformação das
culturas, em um processo que se convencionou chamar de ‘globalização cultural’. Uma
parcela das ciências sociais adotou a tese da ‘convergência da cultura global’, ou
McDonaldização do mundo’. Esta tese afirma a existência de uma imposição crescente de
certa universalização, ao menos no que diz respeito à unificação dos estilos de vida, símbolos
culturais e formas transnacionais de convivência. Em resumo, poderíamos dizer que a
indústria cultural global significa cada vez mais a ‘convergência’ de símbolos culturais e
formas de convivência. Na medida em que até mesmo os pontos mais distantes do planeta são
integrados no mercado mundial surge o ‘mundo único’, mas não como reconhecimento das
diversidades, e sim como um mundo de mercadoria. Isto é, as identidades e culturas locais são
retiradas de cena e substituídas por símbolos do mundo das mercadorias provenientes das
companhias multinacionais de propaganda, aparência e imagem.
Incluído por Ulrich Beck (1999) no segundo grupo de autores, Roland Robertson
defende que a globalização sempre acarreta consigo uma ‘localização’, um processo imanente
e dialético da ‘globalização cultural’. O ponto principal é: globalização o significa uma
globalização unilateral, automática e unidimensional. Ela diz respeito muito mais de uma
‘nova consideração do elemento local’. Este aspecto da argumentação de Robertson mostra-se
de fundamental importância para a compreensão do meu objeto de estudo. É possível entender
os reality-shows, especialmente aqueles de maior sucesso, como é o caso do Big Brother, a
partir dessa perspectiva, como se demonstrará nos próximos capítulos. Mesmo do ponto de
vista econômico, segundo Beck (1999), podemos perceber que a globalização não significa
apenas des-localização, mas também re-localização. Até mesmo porque se pode constatar que
é impossível produzir globalmente, no sentido estrito da palavra. No limite, global quer dizer
“em vários lugares ao mesmo tempo”, ou seja, translocal. Essa relação global-local tem papel
decisivo no cálculo das grandes multinacionais. Grandes empresas, como Coca-Cola e Sony,
definem suas estratégias como ‘localização global’. A Endemol, produtora que detém os
direitos sobre o Big Brother, utiliza-se de um conceito semelhante a esse para definir sua
estratégia de negócios, como se observará no terceiro capítulo. O sociólogo alemão analisa as
conseqüências de as fronteiras da globalização cultural serem compreendidas conforme o
modelo da McDonaldização. Para ele, uma cultura mundial universalizada na qual, por um
lado, as culturas locais acabam, e por outro, todos obedecem a um padrão de consumo, seria o
fim do mercado mundial. Seu argumento é que o capitalismo mundial necessita da
diversidade e das contradições locais para permanecer na concorrência mundial. Des-
localização e re-localização não representam automaticamente o renascimento da cultura
37
local. Reunidas, trazem consigo diversas conseqüências, mas também impedem as culturas
regionais de justificar, determinar e se associarem contra o mundo. Em substituição a esta
fundamentação limitada, “das tradições com meios tradicionais”, surge a obrigação de re-
localizar as tradições des-tradicionalizadas ‘dentro do contexto global’, do diálogo, do
intercâmbio e do conflito translocais. Podemos pensar a islamização, a renacionalização e, até
mesmo, o carnaval brasileiro nos EUA, ou similares, como possíveis exemplos do que foi
argumentado acima.
Para Ulrich Beck (1999), a globalização coloca em curso uma intensificação da mútua
dependência, que vai além das fronteiras nacionais. Num primeiro momento, como vimos,
ocorreu a substituição do modelo de mundos separados pelo modelo de interdependência
transnacional. Roland Robertson vai além, destacando que nesse meio-tempo surgiu a
consciência que considera o mundo como um espaço singular. Portanto, o autor considera a
‘globalização no tempo presente’ e a ‘globalização consciente’, refletida pela mídia, como
duas faces de um mesmo processo. Assim, a fabricação dessa reflexividade simbólico-cultural
passa a ser a questão central da sociologia cultural da globalização. A globalização cultural
impede a equiparação do Estado nacional com a sociedade nacional-estatal, uma vez que se
estabelecem e se entrechocam as formas transculturais de vida e de comunicação, as
atribuições, as responsabilidades, as imagens de si mesmo e do outro que grupos e indivíduos
constroem.
De acordo com a argumentação de Robertson, o local e o global não se excluem. Pelo
contrário, ele propõe que o local deve ser compreendido como um aspecto do global. Nesse
sentido, globalização diz respeito também à união e o encontro de culturas locais, que deverão
ainda ser redefinidas em meio a esta colisão de localidades. O autor propõe a substituição do
conceito de globalização cultural por ‘glocalização’ o cruzamento das palavras globalização
e localização. Segundo Beck (1999), a ‘cultura global’ não pode ser compreendida nos termos
do Estado, mas apenas como um processo contingente e dialético mas que o permanece
restrito à economia segundo o modelo da ‘glocalização’, que compreende e torna claros
elementos contraditórios em sua própria unidade. Nesse sentido, pode-se falar em paradoxos
de culturas ‘glocais’. Este é um conceito de extrema importância para a compreensão do
objeto desta dissertação. Ele nos ajuda a compreender, como veremos no terceiro capítulo,
alguns aspectos importantes sobre os reality-shows, especialmente a respeito do Big Brother.
Ainda de acordo com o sociólogo alemão, a globalização se torna compreensível em
pequenos elementos concretos no próprio espaço, na vida de cada um, nos diversos símbolos
culturais. Em todas elas é possível encontrar a assinatura do ‘glocal. A conclusão dele é que,
38
dessa maneira, generalização e unificação de instituições, símbolos e modos de vida (como
McDonald’s, democracia, informática, direitos humanos, etc.), a redescoberta e a valorização
de culturas ou identidades locais (por exemplo, a islamização, a renacionalização,etc.) não
mais representam uma contradição. Pode-se dizer que estas culturas estão, em primeiro lugar,
representando direitos universais e que, em segundo, o representadas e postas em cena
diferentemente, conforme cada contexto.
Arjun Appadurai amplia o ponto de vista de Robertson a respeito das ‘culturas
glocais’, ao postular a autonomia relativa, a independência e a lógica peculiar dessas culturas
e economias ‘glocais’. Dentro desse contexto, ele faz referência ao conceito de ethnoscapes,
isto é, ‘paisagens de pessoas’, em constantes deslocamentos, que tomam conta do mundo em
que vivemos. Segundo o autor, deles emanam os impulsos essenciais para a transformação
política dentro das nações e entre elas. Associados a este primeiro conceito, estão os conceitos
de technoscapes – referente aos movimentos promovidos pela tecnologia que minam as
fronteiras, e as diferenças entre tecnologias obsoletas e as mais desenvolvidas –, financescape
relativo aos astronômicos fluxos de capitais que escapam do campo de atuação das nações
, mediascape – diz respeito ao aumento da possibilidade de produção e difusão de imagens e
ideoscape encadeamento de imagens freqüentemente associadas a ideologias. As correntes
de imagens e estas novas paisagens questionam a tradicional distinção entre centro e periferia,
tornando-se as ‘pedras fundamentais’ dos “mundos imaginados” a que o autor se refere
(BECK, 1999, p.102).
Para ele, as culturas glocais emergentes não estão atreladas a nenhum tempo e nenhum
espaço. Elas não possuem um contexto, são uma mistura de elementos diversos, nascidas do
moderno tanque do sistema global de comunicação. Isto significa que a imaginação adquire
um poder especial no cotidiano dos homens. Ou seja, um número maior de pessoas, em
diversas partes do mundo, fantasia sobre uma enorme gama de “vidas possíveis”. A fonte
principal dessas mudanças são os meios de comunicação de massa, que colocam à disposição
uma vasta e sempre renovada oferta de “vidas possíveis”.
Em linhas gerais, os observadores da cena global da cultural theory se afastaram da
tese da McDonaldização do mundo. Eles concordam que a globalização não impõe uma
unificação cultural; a produção de símbolos culturais e informações em massa não conduz ao
surgimento de algo semelhante a uma “cultura global”. De acordo com Beck (1999), os
contextos glocais, que ainda estão em processo de formação, devem muito mais ser
compreendidos como as duas faces opostas da “imaginação de vidas possíveis”, que permitam
uma imensa variedade de combinações, sejam compostos a partir de infinitas coleções,
39
sempre oscilantes, de vidas e identidades grupais desiguais (Idem, p.104-105). Zygmund
Bauman, por fim, discute algumas questões relativas às conseqüências preocupantes e
fundamentais resultantes da desigualdade global. De acordo com sua argumentação,
globalização e localização não são apenas dois momentos ou duas faces de um mesmo objeto:
são simultaneamente as forças propulsoras e as formas de expressão de uma nova polarização
e estratificação da população mundial em ricos globalizados que superam a barreira do
espaço e não têm tempo – e pobres localizados – que estão presos aos seus lugares e precisam
matar o tempo que não conseguem preencher. Ele completa afirmando que a glocalização é,
antes de qualquer coisa, uma redistribuição de privilégios e destituição de direitos, de riqueza
e de pobreza. A novidade da era global, de acordo com Bauman, é a perda do nexo entre
pobreza e riqueza, precisamente por conta da globalização.
1.2.3. Frederic Jameson: globalização e pós-modernidade – a cultura como economia.
No instigante ensaio “Notas sobre a globalização enquanto questão filosófica”,
publicado no livro Cultura do dinheiro (editora Vozes, 2001), Frederic Jameson, importante
intelectual norte-americano ligado à Teoria Crítica, identifica a existência de quatro posições
possíveis sobre a globalização. A primeira opinião é que ela o existe, pois ainda vivemos
em estados-nações e situações nacionais, portanto, não existe nada de novo. A segunda
também sustenta que ela não é uma novidade, pois sempre existiu globalização e a troca entre
os povos, desde a Antiguidade. Uma terceira posição sustenta uma relação entre a
globalização e o mercado mundial que seria o horizonte final do capitalismo que as redes
mundiais de hoje não são o diferentes do que existia. A última possibilidade, que mais
agrada ao autor, postula a vigência de um novo estágio, o terceiro estágio multinacional do
capitalismo, do qual a globalização, associada à pós-modernidade, é uma característica
intrínseca. Além dessas posições, podemos encontrar dois julgamentos sobre o assunto: ou se
lamenta ou se celebra a globalização; ou se apreciam as novidades da revolução tecnológica
ou se lamenta o desaparecimento do moderno.
Para ele, a integração econômica trazida pela globalização é acompanhada por
reflexos no campo social e da cultura, pois para ele a pós-modernidade demanda uma
manifestação cultural própria, pois
40
[...] globalização é um conceito comunicacional que ora mascara ora
transmite significados culturais ou econômicos. Sabemos que hoje há, no
mundo todo, redes de comunicação que são mais intrincadas e extensas, por
um lado, um resultado de inovações notáveis na tecnologia da comunicação
e, por outro lado, dependem da ampliação tendencial da modernização em
todos os países do mundo, ou pelo menos em suas grandes cidades, o que
inclui a implantação dessa tecnologia
(JAMENSON, 2001, p.44).
Mas um conceito de globalização que enfoque apenas as comunicações é, segundo o autor,
incompleto. O progresso das comunicações em nossos dias não se relaciona mais com o
Iluminismo, é apenas progresso em novas tecnologias. Por esta razão, uma outra dimensão, a
cultural, acaba se infiltrando em um conceito comunicacional de globalização. Dessa forma,
requerer a ampliação de redes de comunicação acaba se transformando em uma posição sobre
a nova cultura mundial. A outra dimensão possível de deslocamento desse conceito é a do
econômico. Nesse sentido, globalização está relacionada a transferências financeiras e
investimentos pelo mundo todo. A nova produção flexibilizada apenas se tornou possível
através da informatização, e os próprios computadores e seus programas estão hoje entre as
formas mais lucrativas de troca de mercadoria entre as nações. Assim, um conceito
comunicacional se transforma em uma visão do mercado mundial e sua interdependência,
uma divisão internacional do trabalho em escala nunca vista e novas rotas eletrônicas de
comércio.
O debate em torno da globalização produz, de acordo com Jameson (2001), dois tipos
de posição. Pelos conteúdos culturais chega-se à celebração pós-moderna da diferença e da
diferenciação: todas as culturas do mundo estão em um contato simpático umas com as outras.
Intimamente relacionada a essa celebração da diferença está a celebração do aparecimento, na
esfera pública, das vozes de grupos, raças, gêneros e etnias através da evolução dos meios de
comunicação de massa. Por outro lado, pensar a globalização do ponto de vista econômico
equivale a uma padronização em uma escala inédita de integração forçada em um sistema
mundial, de tal forma que ‘desconectar-sedele é inconcebível, até mesmo impossível. Na
realidade, estas duas perspectivas estão ligadas dialeticamente, na forma de uma antinomia
insolúvel. Entretanto, se transferirmos a noção de identidade para o domínio cultural teremos
a estandardização ou americanização da cultura mundial, a destruição das diferenças locais e a
massificação. Fazendo o movimento contrário, isto é, se transferirmos a diferença alegre da
dimensão cultural para a esfera econômica teremos a retórica do mercado livre para todo o
mundo.
41
Uma possibilidade elementar de encarar a globalização é através da exportação e
importação de cultura, afirma Jameson (2001). Esta é uma questão comercial, mas com o
pressuposto de que as culturas nacionais se inter-relacionem com uma intensidade impensável
em outros tempos. Um ponto muito importante, a respeito de todo pluralismo e diversidade
cultural que o autor constata, é a existência de uma assimetria fundamental nas relações dos
Estados Unidos com os outros países do mundo, tanto os do Terceiro Mundo como os países
mais desenvolvidos, como os da Europa Ocidental e o Japão. Um exemplo mais concreto
disso é a questão dos idiomas no novo sistema mundial: algumas poucas línguas são
canonizadas pela mídia, as demais acabam sendo esmagadas. Da mesma forma, o prestígio da
cultura de massas americana é prejudicial para grande parte da produção cultural doméstica,
que acaba sendo obrigada a desaparecer ou é a tal ponto cooptada e transformada que se torna
irreconhecível. Isto se dá, em grande parte, através das clausulas culturais dos acordos do
GATT e NAFTA
12
, nas quais os Estados Unidos abrem fronteira para o cinema, a televisão e
a música americanas, e os demais estados-nações disputam para preservar o desenvolvimento
das culturas nacionais dos danos causados pelo poder nivelador da cultura de massa
americana.
Isto leva o autor a uma longa reflexão sobre o significado dos acordos do GATT e do
NAFTA, que são peças fundamentais do esforço americano de destruir as políticas culturais
de subsídios em outros lugares do mundo, especialmente a Europa Ocidental. A pós-
modernidade é frequentemente caracterizada como a transformação do cultural em econômico
e do econômico em cultural. Essa transformação traz conseqüências fundamentais para o
estatuto da própria cultura de massas. Segundo Frederic Jameson (2001), as conversações do
GATT demonstram que os filmes e a televisão americanos são tanto economia quanto cultura,
e, junto com o agro-negócio e a indústria bélica, são os principais produtos de exportação dos
Estados Unidos, uma enorme fonte de lucros.
Ele nos lembra que são necessários subsídios governamentais para se poder criar uma
indústria cinematográfica nacional independente como nos casos bem sucedidos da
Alemanha, França, Inglaterra e Canadá. Mas o ponto ao qual o autor quer nos chamar a
atenção é o fato de que as convenções do GATT foram projetadas, do ponto de vista
americano, para desmontar todas essas formas de subsídios nacionais como forma de
competição internacional “desleal”. O sucesso americano nessa área significa de imediato a
12
GATT: General Agreement on Tarifs and Trade Acordo Geral de Tarifas e Comércio foi substituído pela
Organização Mundial do Comércio, OMC / WTO. NAFTA: North American Free Trade Agreement Acordo
Norte-Americano de Livre Comércio.
42
extinção gradual de novas produções artísticas e culturais nacionais em todos os outros
lugares do mundo. No entanto este não é um fato novo, pois desde o Plano Marshall, a ajuda
americana aos países Europeus, no pós-Segunda Guerra Mundial, era acompanhada da
obrigação de ser admitida certa quantidade de filmes americanos nos mercados europeus. Em
muitos casos, essa inundação de filmes significou o fim da indústria nacional.
Frederic Jameson (2001) propõe que olhemos cada cultura e vida cotidiana numa
nação como um tecido de hábitos e práticas costumeiras entrelaçadas que formam uma
totalidade ou sistema. Isso também inclui o modo como as pessoas se relacionam com seus
corpos, usam a linguagem, lidam uns com os outros. Desse modo, fazendo referência a
indústria do entretenimento, o autor afirma
A questão é que, em combinação com a ideologia do mercado livre, o
consumo das formas cinematográficas hollywoodianas é o aprendizado de
uma cultura específica, de uma vida cotidiana como prática cultural uma
prática cuja expressão estética é a narrativa mercantilizada –, de tal forma
que a população em questão aprende as duas coisas ao mesmo tempo.
Hollywood não é apenas o nome de um negócio altamente rentável, mas é
também o nome de uma revolução fundamental do capitalismo tardio, na
qual se destroem antigos modos de vida e se colocam novos em seu lugar.
(JAMESON, 2001- p.54-5).
O autor enfatiza a assimetria fundamental entre os Estados Unidos e as outras culturas,
ressaltando que não haverá paridade nessas áreas, porque na nova cultura global nãonovos
pontos de partida e, provavelmente, nenhuma outra indústria de entretenimento terá um
alcance global tão bem sucedido quanto Hollywood. Para Jameson (2001), interessa
intensificar a incompatibilidade e a oposição entre as visões celebratórias e pessimistas sobre
a globalização, de forma a permitir-nos viver essa contradição. De um lado, eso ponto de
vista de que a globalização significa união e estandardização: intermediada por grandes
corporações multinacionais, baseadas em grande parte nos Estados Unidos, uma forma padrão
de vida material americana, junto com valores e formas culturais norte-americanas, está sendo
sistematicamente transmitida a outras culturas. Os interesses econômicos e a influência
cultural americana coincidem para produzir todo um modo de vida.
Jameson (2001) descarta as idéias de ‘individualismo corrosivo’ e materialismo
consumista’ como conceitos moralistas e incapazes de identificar as forças destrutivas que se
originam nos EUA, resultante de sua primazia, da primazia do American way of life e da
cultura americana dos meios de comunicação de massa. Para ele, essa força é o consumismo,
ponto central do sistema econômico americano, modo de vida para o qual os americanos são
43
treinados todos os dias, incessantemente, por toda cultura de massa e indústria do
entretenimento, com uma intensidade sem precedentes. De outro lado, no campo da cultura,
temos uma visão mais celebrativa, como a do teórico mexicano Nestor Garcia Canclini,
segundo a qual vivemos em um festival global urbano e intelectual, descentralizado e sem
dominantes. O quadro geral de possibilidades de contrabalancear o processo de
americanização, apresentado pelo autor, é de incapacidade de geração de uma cultura original
e um modo de vida diferente
13
, que possa se apresentar como alternativa viável, tanto no
Japão e na Europa quanto nos antigos países socialistas e no Terceiro Mundo. Após o colapso
da União Soviética e do socialismo, apenas o fundamentalismo religioso parece capaz de
oferecer um modo de vida diferente do consumismo americano.
Frederic Jameson (2001) propõe que os termos até agora identificados como níveis de
uma mesma coisa democracia, mercado livre, livre iniciativa, consumismo, etc. –, estejam
em contradição. Ele parte, portanto, da suposição de que o consumismo é incompatível com a
democracia, tomando o exemplo dos Estados Unidos. O sistema único de cultura de massas e
de consumo teve um papel fundamental para os EUA, pois possibilitou o federalismo, a
mistura de raças e a administração da luta de classes, deslocando as energias sociais em
direções governadas para um consenso. Por esse argumento, o autor discorda daqueles que
apresentam a cultura de massa como espaço de democratização, ou ainda resistência, como
fazem muitos dos participantes do debate sobre a globalização. Diversos teóricos também
celebram os ‘efeitos libertários’ da cultura comercial de massas, principalmente na América
Latina. Jameson (2001) demonstra que, apesar da qualidade cultural, essas produções acabam
sendo cooptadas por empresas transnacionais, que investem nessas indústrias culturais. Isso
enfatiza a dependência econômica da esfera cultural.
Segundo o autor, na América Latina a cultura e o apoio à cultura estão identificados
com o estado; até mesmo o poder é identificado com o estado, não com o capitalismo, como
ocorre nos países do primeiro mundo. Dessa forma, privilegiar o comércio e a troca em uma
situação de predomínio do poder estatal equivale a privilegiar justamente o momento da
multiplicidade como um lugar de liberdade e de resistência: o mercado funciona na América
Latina como aquilo que escapa à dominação atrasada do estado. Comparado com os Estados
Unidos, na América Latina celebra-se a multiplicidade em oposição à unidade opressiva; na
outra situação defende-se uma unidade positiva contra a multiplicidade opressiva. A análise
de Frederic Jameson (2001) examina também a possibilidade da Europa, Japão e os antigos
13
“Dizer produção de cultura equivale a dizer produção da vida cotidiana e sem isso um sistema econômico
não consegue continuar a se implantar e expandir” (JAMESON, 2001, p. 60).
44
países socialistas conseguirem contrabalançar o processo de americanização. De acordo com
o autor, nenhuma dessas possibilidades apresenta condições de fornecer um modo de vida
diferente, uma alternativa viável. Apenas o fundamentalismo religioso parece capaz de ter
força ou vontade de resistir à americanização.
1.3. No calor da hora: primeira paisagem – conclusões.
O objetivo dessa pesquisa é analisar os reality-shows, e em especial o Big Brother,
como um produto característico da indústria cultural na era da globalização. Este formato
televisivo passa a ter viabilidade econômica a partir da década de 1990 e início do ano 2000,
quando passa a ser fenômeno de audiência em várias partes do mundo, através de programas
como o Survivor, da rede americana CBS, e o Big Brother, da produtora holandesa Endemol.
Sua análise faz necessária a compreensão sobre algumas características do capitalismo
globalizado – que, dentre outras características, torna-se flexibilizado, permitindo a livre
atuação de empreendedores globais e da indústria cultural em sua etapa globalizada tendo
a indústria do entretenimento como um setor de vanguarda do capitalismo e havendo um
intenso processo de formação de oligopólios, que atuam como global players.
Assim, o Big Brother foi exibido pela primeira vez em 1999, na Holanda, sendo
vendido na seqüência para 25 países com grande sucesso. Até hoje ele foi exibido em 70
países diferentes, nos cinco continentes. Ele foi idealizado pela produtora holandesa Endemol,
que posteriormente, em função do sucesso possibilitado por este programa, especializou-se na
produção de conteúdos para televisão do mundo todo. Esta produtora tem uma atuação global
presente atualmente em 27 países, nos cinco continentes mas que tem o objetivo de
adaptar-se à cultura local, segundo o conceito da própria empresa Think global. Act local
("Pense globalmente. Atue localmente"). O seu principal produto é a venda de reality-shows
para exibidores locais. Ela atua através de parcerias (joint-venture) com redes nacionais de
TV, como é o caso da Endemol Globo S/A para a produção do Big Brother Brasil, exibido
pela Rede Globo. Este programa, por sua vez, pode ser tomado como um produto
característico da indústria cultural global, visto que é um formato televisivo globalizado, mas
que assume ‘cores locais’, quando se associa às redes de televisão locais.
Quando Adorno e Horkheimer formularam o conceito de indústria cultural, nos anos
1940, tinham como referência uma forma muito específica de capitalismo, isto é, o
45
capitalismo monopolista, marcado fortemente pelo modelo de produção fordista, baseado em
grandes plantas industriais, na produção massiva e padronizada, no trabalho fabril e
mecanizado, dentre outras características. Eles tiveram grandes méritos em identificar que
essa lógica social o se restringia apenas ao âmbito da economia, mas exercia um papel
decisivo na forma como era produzida a cultura nos países centrais do capitalismo, que depois
se estenderam aos demais países.
Os autores identificaram importantes características dessa indústria, que ainda hoje
podem ser observadas. Segundo eles, as principais metas da indústria cultural o gerar lucro
e exercer o controle sobre a sociedade, as produções culturais o sendo mais produzidas em
função de seu conteúdo, mas tratadas inteiramente como mercadorias. Assim, ela busca
continuamente o efeito sobre seus consumidores. A mencionada articulação entre as esferas
cultural e econômica, através dos produtos da indústria cultural, tem o objetivo de organizar e
classificar estatisticamente os indivíduos em faixas etárias e grupos econômicos, isto é, no
limite, exercer o controle sobre a sociedade – revelando assim a sua dimensão política.
No entanto, ao longo dos anos este conceito foi alvo de diversas críticas e alguns
autores propuseram reformulações. A proposta de Douglas Kelner (2001) parece interessante
para a presente discussão. Apesar das formas da indústria cultural ‘clássicas’ começarem a
ocupar o centro do sistema de cultura e comunicação, ele defende que foi apenas com o
advento da televisão e com as diversas tecnologias de entretenimento doméstico surgidas
posteriormente que a mídia se transformou em força dominante na cultura, na política e na
vida social. Desse modo, a cultura da mídia originada a partir desse processo submete os
indivíduos a um fluxo sem precedentes de imagens e sons no ambiente doméstico,
reordenando as percepções de espaço e tempo, anulando a separação entre realidade e
imagem. Ela é uma cultura industrial, organizada para a produção em massa, e comercial,
portanto, seus produtos são mercadorias que visam o lucro privado.
Segundo Kelner (2001), a cultura veiculada pela mídia, através de suas imagens,
espetáculos e narrativas, reproduz as lutas sociais existentes. Desse modo, ele propõe uma
leitura potica da cultura da mídia, situando-a historicamente e analisando como ela incorpora
posições políticas e ideológicas, além de produzir efeitos políticos. Portanto, a proposta do
autor é ir além da dimensão econômica ressaltada, demonstrando que a mídia é um terreno
de disputa no qual diversos grupos sociais lutam pelo domínio, podendo exercer um papel
reacionário ou progressista com relação às representações de sexo, sexualidade, etnia, raça,
nacionalidade, entre outros.
46
O desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação, das últimas
décadas, levanta novas questões sobre a própria indústria cultural e o seu desenvolvimento,
fazendo-se necessária uma revisão do conceito. Nesse sentido, a análise de Christoph Türcke
(1999) das manifestações contemporâneas dessa indústria mostra-se muito interessante, como
uma possível atualização da crítica adorniana. Ele demonstra como as novidades apresentadas
pela indústria cultural, tais como, a realidade virtual, o ciberespaço, os capacetes de realidade
virtual e a comunicação multimídia atuam de tal modo que os sentidos, que deveriam
percorrer ativamente estes espaços virtuais, são passivizados até a letargia, passando a reagir
apenas a estímulos previamente calculados. O autor conclui que esses novos meios de
comunicação, que fundem o computador e a telecomunicação, não indicam uma nova época,
mas apenas uma nova fase dessa indústria. Isto coloca um novo problema para a indústria
cultural, que precisa descobrir novas formas de estimular os sentidos fatigados, para que
continuem a consumir os seus produtos.
A revisão crítica empreendida por Rodrigo Duarte (2003) aponta muitos dados
interessantes para a presente tentativa de avaliação da atualidade do conceito de indústria
cultural tal como formulado por Adorno e Horkheimer, nos anos 1940. Sua análise demonstra
objetivamente as mudanças ocorridas em conseqüência da globalização, que alteram
significativamente o capitalismo dos dias atuais. A flexibilização proporcionada pela
globalização, o fluxo global de investimentos e a formação de oligopólios globais, dentre
outras características significantes, produzem intensas modificações também na indústria
cultural. Estas modificações a separam drasticamente, em muitos sentidos, da concepção
‘clássica’ formulada no final dos anos 1940.
Para Rodrigo Duarte (2003), um dado interessante é a imbricação, no capitalismo
atual, entre a superestrutura ideológica e a infra-estrutura material, mais intensa do que
quando Adorno e Horkheimer escreveram. Quando analisada pela primeira vez, a indústria
cultural era dependente dos setores de ponta do capitalismo da época. Como apontada em sua
análise, a indústria do entretenimento é hoje um setor de vanguarda do capitalismo, um ramo
altamente lucrativo, que atrai inclusive investimentos de outros setores, como o autor
demonstra com o processo de fusões bilionárias entre empresas do ramo de eletro-eletrônico e
de entretenimento, por exemplo.
O processo de globalização é um tema difícil de ser abordado em sua totalidade, em
função das paixões e das disputas ideológicas que o tema provoca. Muitos autores se colocam
nesse debate, a partir de diversos pontos de vista. Ulrich Beck (1999), no entanto, apresenta
um quadro interessante deste processo, apontando as diferentes posições adotadas pelos
47
principais autores inseridos nesse debate. Sua principal contribuição se relaciona ao
esclarecimento da dinâmica da globalização, especialmente no que diz respeito às
transformações da cultura. Ele é crítico da tese que afirma a universalização crescente de
estilos de vida e símbolos culturais, em primeiro lugar, por não dizer respeito ao
reconhecimento da diversidade, mas ao mundo da mercadoria. Num segundo momento, ele
identifica que a globalização acarreta também um processo de localização, que por sua vez, é
imanente e dialético. Ou seja, globalização não significa apenas globalização unilateral e
unidimensional, mas também uma nova consideração do elemento local. Segundo o autor,
isso ocorre porque o capitalismo necessita da diversidade e das contradições para permanecer
na concorrência mundial. Sua proposta consiste na substituição do conceito de globalização
cultural por ‘glocalização’ – o cruzamento das palavras globalização e localização.
Outro autor inserido no debate a cerca da globalização é Frederic Jameson (2001), que
traz uma perspectiva diferenciada e crítica a respeito desse processo complexo. Segundo ele a
globalização, associada à pós-modernidade, é uma característica intrínseca do terceiro estágio
do capitalismo, o estágio multinacional, e traz conseqüências fundamentais para o estatuto da
própria cultura de massa.
Apesar de todo discurso a respeito da diversidade e do pluralismo, o autor destaca a
assimetria fundamental existente na relação dos Estados Unidos com os demais países do
mundo. Um exemplo disso é o prestígio da cultura de massas americana, que coopta e destrói
as culturas locais. Este movimento se dá, como demonstra Jameson (2001), através das
cláusulas culturais em acordos comerciais, que tem o objetivo de destruir políticas culturais de
subsídios em outros lugares do mundo. Com isso, fica evidente que os filmes e seriados de
televisão americanos são tanto economia quanto cultura. O autor destaca, ainda, que
Hollywood não é apenas o nome de um negócio altamente lucrativo, mas é também o nome
de uma revolução cultural fundamental do capitalismo tardio, na qual se destroem antigos
modos de vida e se colocam novos em seu lugar.
48
2.
2.2.
2. A televisão
A televisão A televisão
A televisão com
comcom
como meio de comunicação:
o meio de comunicação: o meio de comunicação:
o meio de comunicação:
apon
aponapon
apontamentos críticos
tamentos críticostamentos críticos
tamentos críticos
49
2.1. A crítica de Theodor Adorno.
Após o seu intenso estudo sobre a indústria cultural, que tem o ponto central no
segundo capítulo da Dialética do Esclarecimento, Adorno dedica-se a análise da recém-
chegada televisão. Apesar de terem sidos escritos na década de 1960, muitos aspectos de sua
análise feita quando o meio ainda o havia desenvolvido plenamente suas potencialidades
mostram-se lidos para a análise deste meio mesmo na etapa globalizada do capitalismo,
como pretendemos constatar no andamento desta pesquisa. Dentre outros aspectos, o
desvendamento do véu ideológico que envolve a televisão e a conseqüente crítica à televisão
como meio de comunicação de massa mostram-se ainda hoje pertinentes e necessários, talvez
ainda mais do que quando foram formulados.
2.1.1. Televisão, consciência e indústria cultural.
Publicado originalmente em alemão, em 1963, ‘Prólogo à televisão’, foi lançado em
tradução brasileira na coletânea Comunicação e Indústria Cultural, organizada por Gabriel
Cohn, de 1971. Ele é complementado pelo ensaio ‘A televisão como ideologia’, ainda inédito
no Brasil, no qual Adorno realiza uma análise empírica sobre o meio, a partir do estudo dos
roteiros de alguns programas. Em ‘Prólogo à televisão’, Adorno procura contrapor as
promessas do novo meio aos reais efeitos por ele causados. Para ele, a televisão, tanto por
estar envolvida pelo sistema da indústria cultural como por suas características próprias, não
pode ser compreendida corretamente se forem isolados os aspectos sociais, técnicos e
artísticos que a compõe, uma vez que são interdependentes. Esta concepção investe contra a
idéia comum de que a televisão seja um simples meio de comunicação, um suporte neutro
para as mais variadas mensagens. Necessário se faz levar em conta, alerta o ensaísta, a origem
material da televisão,
[...] a qual resulta de forte tendência, verificável em todos os principais
setores de atividade do capitalismo tardio, para fusão de capitais de origens
diversas, que concretiza dessa forma seu movimento rumo à concentração,
fenômeno também verificável no terreno da tecnologia ou no campo relativo
às atividades de poder. (FRANCO, 2006, p.02)
50
Ela pode ser compreendida como a combinação de características do cinema e do rádio,
seguindo a tendência da indústria cultural de “[...] cercar e capturar a consciência do público
por todos os lados.” (ADORNO, 1971, p. 346). No limite, a televisão é compreendida pelo
autor como um objeto tecnológico destinado ao consumo doméstico.
Ela tem a possibilidade de aproximar-se da meta de ter a totalidade do mundo sensível
em uma imagem que alcança todos os órgãos, ao mesmo tempo em que introduz aquilo que
considera adequado ao real. Sua configuração material não deixa dúvidas sobre sua natureza,
isto é, ela ocupa o espaço que ainda restava para a existência privada antes da indústria
cultural, enquanto esta o dominava toda a dimensão do visível. Para Adorno (1971), a
televisão é mais eficiente que o rádio ou mesmo o cinema, pois ela está continuamente à
disposição dos usuários, além de dirigir-se simultaneamente à visão e à audição. A análise
adorniana identifica a pretensão da TV ao realismo, desde seus primórdios, dando evidência
para o fato de a indústria cultural articular seus diversos ramos e a televisão é a
manifestação de maior destaque desta indústria, não permitindo ao indivíduo perceber que o
mundo que ela oferece não passa de uma imagem do mundo. Assim, esse pretenso realismo
14
da TV, ou pseudo-realismo, é diferente da realidade. O mundo mostrado por ela é a sua
representação de mundo, não o mundo ‘em si’. Desse modo, Adorno (1971) rompe o véu
ideológico que envolve a televisão, criticando a imagem de simples meio de comunicação, de
suporte neutro de diferentes mensagens.
A análise adorniana enfatiza que os poderosos efeitos da televisão são reforçados pela
totalidade do sistema da indústria cultural formado pela articulação entre cinema, televisão,
rádio, revistas, etc. Assim, o autor reafirma mais uma vez que o meio não tem a função de
veicular algo novo, uma linguagem original, mas trabalha oferecendo fluxos de imagens e
sons em sintonia com a necessidade de reforçar as formas de consciência predominantes em
uma época, necessidade esta proveniente da totalidade do sistema. Dessa forma, ele constata
que as pessoas tendem a se conformar ao inevitável, muito mais do que tentar se modificar,
supondo que a televisão contribua para que isso ocorra. Isso se relaciona, segundo o Adorno
(1971), a uma tendência econômica global, da sociedade contemporânea, de não ir mais além
de si própria em suas formas de consciência, reforçar o status quo e reconstituí-lo toda vez
que ele for ameaçado. Deste modo, a televisão como parte da indústria cultural contribui
14
Vale à pena destacar que o tema do realismo não é uma novidade trazida apenas pela televisão. Ele é um tema
recorrente, que já se manifestara em outros meios como podemos observar, por exemplo, na literatura ou mesmo
na pintura.
51
para beneficiar as instituições e os interesses dos poderosos que lhe dão suporte, pois quanto
mais o mundo é visto como aparência, mais difícil perceber a aparência como ideologia.
A televisão se torna próxima ao consumidor, e assim como o rádio, se instala dentro
de sua casa. Como integrante da indústria cultural, ela atua reforçando a tendência desta de
diminuir a distancia entre o produto e o espectador. Ela traz o mundo violento e ameaçador de
maneira confiável, como se fosse íntimo do telespectador, tudo lhe é apresentado como se
pertencesse a ele, pois segundo o autor, ele próprio não se pertence. A mencionada falta de
distância que foi inicialmente um dos motivos da popularidade desse novo meio causaria
certa proximidade e um efeito comunitário, argumentos que também são refutados por
Adorno (1971), pois o que a TV faz é aumentar a distância real entre as pessoas e entre as
pessoas e as coisas.
Dessa mesma perspectiva, ele sugere que o uso doméstico da televisão oferece um
leque de sensações que, no entanto, são destinadas a tornar aceitável o isolamento ao qual a
organização industrial submete os homens. Esta socialização artificial promovida pela TV os
conduz à resignação com as exigências do mundo hostil. Ela afeta, ainda, a consciência, pois a
fronteira entre a realidade e a imagem é diminuída, dado que a imagem é tida como parte da
realidade, como um acessório que se adquiriu junto com o aparelho. Da mesma maneira, o
seria exagero dizer que a realidade é olhada através dos ‘óculos da TV’ e que o sentido do
cotidiano volta a refletir-se nele. A conclusão de Adorno (1971) é que a televisão comercial é
responsável pelo retrocesso da consciência.
O autor é enfaticamente contrário à visão, muito comum para a maioria das pessoas,
de que a televisão seria uma evolução da cultura de massa e da tecnologia, sendo o resultado
espontâneo, portanto, do jogo de forças da sociedade. De acordo com sua argumentação, ela é
um produto planejado em moldes industriais, ou seja, ela é padronizada, planejada, e está
sempre buscando o efeito. Pois a indústria ainda tem que ter os consumidores em seus
cálculos. A conclusão dele é que, na verdade, o que a TV faz é vender audiência para seus
patrocinadores, consumidores para os produtos anunciados. Esta é uma das grandes
contribuições trazidas por Adorno (1971), uma inversão no olhar sobre a televisão. Seu
produto de maior valor não é a programação oferecida ao público, mas sim a audiência que
ela é capaz de cativar para os seus patrocinadores.
A regressão da consciência não é produzida apenas pelo suposto baixo nível cultural a
que a televisão comercial submete os seus consumidores, mas principalmente pelo conjunto
de aspectos relacionados ao consumo doméstico deste aparato tecnológico. O início da
transformação do espectador em objeto da televisão se na expectativa que ele alimenta de
52
receber dela algo recompensador. Isso se intensifica com o fato da televisão operar com uma
linguagem própria, ou uma “linguagem-imagem”. Adorno (1971) identifica na indústria
cultural uma tendência ao fortalecimento da linguagem imagética, em oposição à linguagem
verbal e conceitual. Desse modo, a imagem funciona como regressão, como eliminação da
dimensão conceitual, que propicia a reflexão. A linguagem das imagens utilizada pela
televisão comercial recorre a elementos que mobilizam o inconsciente dos espectadores. Elas
não são destinadas à contemplação demorada, como nas artes plásticas, que exige um
exercício de interpretação, mas à absorção imediata. O espectador é conduzido pela seqüência
das imagens que não deixam espaço para a imaginação. A televisão, como um dos mais
importantes ramos da indústria cultural e, conseqüentemente, representante de uma classe
social, apresenta, através de suas imagens, a vontade daqueles que a possuem como sendo a
dos que a recebem. Estas imagens apresentadas por ela são modelos de comportamento
conformista, correspondentes à vontade dos que a controlam. Assim, Adorno (1971) termina
por desvendar o significado político da televisão.
2.1.2. A televisão como ideologia.
Em ‘A televisão como ideologia’ (Venezuela, Monte Ávila Editores, 1969) Adorno
retoma os argumentos expostos em ‘Televisão, consciência e indústria cultural’, para
aprofundá-los e esclarecer a natureza do material veiculado pela televisão. Ele ressalta a
importância de se estudarem os significados ocultos juntamente com os manifestos, para a
compreensão dos efeitos da TV sobre o espectador. Dessa forma, ele examina o conteúdo
específico de suas apresentações com o objetivo de completar as características formais da
televisão. O autor examinou o roteiro de 34 peças escritas para ela, de diversos tipos e níveis,
entretanto, sem esquecer-se que existe a possibilidade de o texto não coincidir com o
programa acabado, transformado em imagens, como parte da programação. No entanto, essa
análise continua sendo válida e pertinente, pois, de acordo com Franco (2006), esses roteiros
planejam explicitamente provocar um conjunto de efeitos no espectador, sendo boa parte
deles dirigidas ao inconsciente. Ainda, Adorno (1969) realça não se tratar de um caso isolado,
mas integram um sistema que se repete diversas vezes, o que comprova o caráter planejado
deles.
53
Ele aponta a semelhança entre essas obras escritas para a TV e os filmes de cinema.
Neles, a principal diferença reside na duração de no máximo meia hora. Com isso, a qualidade
e o desenvolvimento da ação e dos personagens, mais cuidadoso em um filme, se vêem
afetados. Por supostas necessidades técnicas, que provém na realidade do sistema comercial, a
indústria se beneficia do recurso a estereótipos e à paralisia ideológica. A similaridade com os
filmes “[...] é prova da unidade da indústria cultural: é quase indiferente por onde se a
aborde.” (ADORNO, 1969, p. 76). Para enfatizar a importância dessas peças escritas para
televisão, Adorno aponta que eles ocupam grande parte da programação das emissoras,
especialmente no horário nobre.
No exame da natureza da linguagem da televisão comercial, Adorno (1969) identifica
os procedimentos básicos segundo os quais ela opera e que aparecem constantemente nos
diversos tipos de programas oferecidos ao espectador. Dentre eles, tanto o recurso à reiteração
como a elaboração de mensagens ‘latentes’ sobrepostas às imagens ‘manifestas’. A partir
destes elementos, como argumenta Franco (2006), a televisão não apenas reafirma
constantemente o existente, como pretende induzir o comportamento do espectador. No
entanto, essa indução do comportamento de espectador é resultado não da ação de um
programa isolado, mas de uma série infindável deles.
Em razão de seus interesses econômicos, uma vez que ela não pode excluir uma parte
de seus espectadores, a televisão se utiliza de imagens capazes de reproduzir minuciosamente
o mundo social do espectador. Nesse sentido, ela faz uso de [...] imagens naturalistas, sem
profundidade, carregadas de estereótipos, sempre reforçadas com o uso de clichês morais [...]”
(FRANCO, 2006, p.11). A análise adorniana identifica ainda a tendência à infantilização das
questões políticas e o fomento à identificação com a figura do herói. A essa indução ao
conformismo, conforme destaca Franco (2006), alia-se o recurso ao tom moralizante, que
sugere o cultivo dos valores do espírito’ e o desprezo para com as condições materiais de
existência.
Em relação à construção de personagens, Adorno (1969) identifica a tendência da
televisão em apresentar as mulheres ou como a mulher fatal”, bem-sucedida por explorar a
atitude socialmente parasitária, ou em explorar grosseiramente os aspectos físicos da mulher.
Simultaneamente, a construção de personagens masculinos tende a valorizar o homem de ação
e a estigmatizar o intelectual e o artista. Franco (2006) chama a atenção para o fato de estes
serem usualmente identificados como tipos perversos, neuróticos e homossexuais. Semelhante
tendência pode ser verificada na representação das relações entre homens e mulheres como
54
feliz, contanto que o homem sujeite a mulher, e esta, uma vez derrotada, abandone seus
desejos como se tratassem de meros caprichos.
O conceito de ‘múltiplos estratos estéticos’, que caracteriza o modo amplo como as
obras de arte incidem sobre seus observadores, ocupa lugar central na análise de Adorno
(1969). Isso significa que toda obra artística possui diversas significações, possibilitando
várias interpretações diferentes. Segundo o autor, isso não ocorreria com as obras da indústria
cultural e este aspecto serve para distinguir as obras dos dois campos distintos. Assim como o
cinema comercial, a televisão é resultado de uma planificação comercial e desconhece essa
riqueza de significados. Sua função é aumentar a taxa de conformismo do espectador e
reafirmar o status quo.
Para finalizar seu ensaio, Adorno sugere uma discussão pública sobre a adoção de um
conjunto de normas reguladoras, as quais poderiam vacinar” o público contra a ideologia
propagada pela televisão. Tal proposta pode parecer utópica, mas, como Franco (2006)
ressalta em sua análise, teríamos muito a ganhar se fossem estabelecidos critérios racionais
capazes de proteger social e psicologicamente as crianças, os espectadores menos dotados de
recursos para resistir às seduções deste meio de comunicação, desde cedo treinadas que são
para aderir sem recuo à televisão, a qual se utiliza de todos os meios para conquistar seus
objetivos.
2.2. Giovanni Sartori: A primazia da imagem.
Em seu livro Homo Videns. Televisão e pós-pensamento’, publicado em 2001 pela
editora EDUSC, o pensador italiano Giovanni Sartori dedica-se à investigação do rapidíssimo
processo revolucionário dos meios de comunicação que estamos vivendo, dedicando especial
atenção à televisão e ao processo de mudança da natureza do ser humano por ela
desencadeado, transformando o homo sapiens, produzido pela cultura escrita, em homo
videns, adestrado para absorver um mundo em que a palavra e a capacidade de abstração
dá lugar a imagem.
O que diferencia o homo sapiens e o torna único é a sua capacidade simbólica, que
abrange todas as formas da vida cultural humana. Ela se desdobra na linguagem, isto é, na
capacidade de se comunicar por meio de sons e signos que tenham significados. O que
55
diferencia o homem do animal é que o ser humano possui uma linguagem capaz de raciocinar
sobre si mesmo e, ainda, refletir sobre o que diz. Essa linguagem não se restringe apenas à
comunicação, mas diz respeito também ao pensamento e ao conhecimento que caracterizam o
homem como animal simbólico e são construídos ‘em forma’ de linguagem e ‘pela
linguagem’.
De acordo com Sartori (2001, p.13), o desenvolvimento das civilizações se pela
escrita, deste modo, é a passagem da civilização oral para a palavra escrita que desenvolve a
civilização. Entretanto, até a invenção da imprensa, a cultura de qualquer sociedade
permanecia amplamente baseada na transmissão oral. Apenas com a imprensa de Gutemberg
que a transmissão escrita da cultura se torna potencialmente acessível a todos. O progresso da
reprodução impressa encontra seu ponto alto com o advento do ‘jornal diário’, no final do
século XVIII e início do século XIX. A invenção do telégrafo, seguida pela do telefone,
inauguram a era das comunicações diretas. Posteriormente, o rádio se somou para eliminar
distâncias. Todos estes objetos enumerados acima são elementos portadores de comunicação
lingüística. Todavia, a invenção da televisão, na metade do século XX, rompe com este
sistema de comunicação. Sartori (2001) define a televisão a partir do fato dela levar coisas
para ver a um público de espectadores. Ainda,
[...] na televisão o fato de ver predomina sobre o falar, no sentido que a voz
ao vivo, ou de um locutor, é secundária, pois está em função da imagem e
comenta a imagem. É por causa disso que o telespectador passa a ser mais
um animal vidente do que um animal simbólico. Para ele as coisas
representadas por meio de imagens passam a contar e pesar mais do que as
coisas ditas por palavras. Este fato constitui realmente uma virada radical de
direção, pois enquanto a capacidade simbólica distancia o homo sapiens do
animal, o predomínio da visão o aproxima de novo às suas capacidades
ancestrais, isto é, ao gênero do qual o homo sapiens é a espécie. (SARTORI,
2001, p.15-16)
O autor argumenta que todo o progresso tecnológico foi temido e até mesmo
combatido quando do seu aparecimento. Historicamente, a inovação mais combatida foi a da
máquina e do maquinário industrial. Comparada com a revolução industrial, a invenção da
imprensa e o progresso das comunicações não mereceram hostilidades relevantes. Neste caso,
as objeções e os medos se voltaram contra o seu conteúdo e não contra os instrumentos. Até o
advento da televisão, em meados do século XX, a capacidade visual do homem havia se
desenvolvido em duas direções: conseguíamos ampliar o que era extremamente pequeno (por
exemplo, através dos microscópios) e conseguíamos ver objetos distantes (com binóculos ou
telescópios). Com a televisão, porém, podemos ao menos em tese, ‘ver tudo’ sem precisarmos
56
ir ao encontro dos objetos. Em algumas décadas o progresso tecnológico nos introduziu na era
da cibernética, ultrapassando a própria televisão. Ela deixa de ser o centro, dividindo o espaço
com outros meios. O computador aparece como elemento importante, que não apenas unifica
a palavra, o som e as imagens, mas também introduz nos objetos visíveis realidades
simuladas, ou seja, realidades virtuais. Para Sartori (2001), é importante fixar que existem
duas formas diferentes e extremamente diversas de ver as coisas. Enquanto a televisão nos faz
ver imagens de coisas reais, o computador nos conforta com imagens imaginárias. Assim, o
virtual e suas simulações ampliam ilimitadamente as possibilidades do real; mas, em essência,
não são realidades.
O “ponto de virada” na comunicação é dado pela informação visual. Esta virada
inicia-se com a televisão e, segundo ele, é ela que vai modificar a natureza da comunicação,
deslocando-a do contexto da palavra (seja ela impressa ou transmitida pelo rádio) para o
contexto da imagem. uma diferença radical nesse fato. A palavra é um símbolo resolvido
naquilo que significa. E a palavra leva alguém a compreender somente quando for entendida,
ou seja, quando conhecemos a língua a que pertence. A imagem, ao contrário, é pura e
simples representação visual. Para entender uma imagem basta vê-la. Enquanto a palavra é
parte integrante e constitutiva de um universo simbólico, a imagem não é nada disso. O autor
defende o argumento de que o caso da televisão não pode ser tratado como se ela fosse uma
continuação e uma simples ampliação dos instrumentos de comunicação que a precederam. A
televisão nos conduz a uma realidade radicalmente nova. Por isso, a televisão é, antes de
qualquer coisa, uma substituição que derruba a relação entre o ver e o entender. E este é um
de seus principais argumentos. Até o advento da televisão nós conhecíamos o mundo e seus
acontecimentos através da narração oral ou escrita; hoje podemos vê-los, e a narração é
apenas uma função das imagens que aparecem no vídeo. Vale ressaltar que Giovanni Sartori
(2001), mesmo sem fazer referência direta, é fortemente influenciado pela análise que Adorno
faz da televisão. Seu “ponto de virada” se aproxima do ponto de vista adorniano sobre a
‘linguagem-imagem’, segundo a qual opera a TV. É uma tendência da indústria cultural como
um todo fortalecer a linguagem das imagens, em oposição à linguagem verbal e conceitual. A
imagem, para Adorno (1971), funciona como regressão, eliminando a dimensão conceitual,
que permite a reflexão do indivíduo. No limite, também se pode ler em Adorno (1971) o fim
de um tipo de homem formado em uma época anterior à televisão e a possibilidade do
surgimento de um novo tipo de formação dos indivíduos. Neste sentido também é possível
apontar o papel desempenhado pelos reality-shows, produtos da etapa globalizada da indústria
57
cultural, como agentes no processo de construção de um indivíduo que cada vez mais se
forma através das imagens.
Todavia, a tese central de Giovanni Sartori (2001) é que a televisão não é somente
um instrumento de comunicação; ela é, ao mesmo tempo, também um meio que gera um novo
tipo de ser humano. Esta tese se baseia no simples fato de que nossas crianças ficam olhando
a televisão por horas a fio antes mesmo de aprender a ler e a escrever. A primeira escola da
criança é a televisão, é um animal simbólico que recebe o seu molde formativo de um mundo
feito de imagens, totalmente centralizados no ver. O verdadeiro problema, para o autor, não é
a violência mostrada pela televisão, mas sim o fato de ela estar moldando um homem que não
lê, que revela um preocupante entorpecimento mental, um viciado na vida dos videogames.
Uma conseqüência importante a ser destacada é a formação de uma geração de
pessoas educadas pela TV e, de acordo com o autor,
A verdade mais abrangente é que a primeira escola da criança (a escola
divertida que precede a escola enfadonha) é a televisão, é um animal
simbólico que recebe o seu imprint, o seu molde formativo, de um mundo
feito de imagens, totalmente centralizados no ver. [...] tratar-se-á sempre de
um adulto que continua surdo, durante a vida, aos estímulos da leitura e do
saber transmitidos pela cultura escrita. Os estímulos a que continua
respondendo, quando adulto, são quase que exclusivamente audiovisuais.
Por conseguinte, a geração-TV não tem como crescer mais do que isso.
(SARTORI, 2001, p.24-5)
Neste estudo sobre importantes aspectos da cultura de massa contemporânea, o autor
analisa a importância do termo ‘cultura’ e identifica dois sentidos para este termo. Na acepção
antropológica e sociológica qualquer ser humano vive no âmbito de uma cultura própria, ou
seja, possui valores, crenças, concepções que constituem a sua cultura. Assim, também o
homem primitivo ou o analfabeto possuem cultura. Mas a palavra cultura pode ser também
sinônima de ‘saber’, isto é, uma pessoa culta é uma pessoa formada por boas leituras, bem
informada. Esta acepção de cultura refere-se aos eruditos e não aos ignorantes. Nesse sentido,
a propaganda dessa nova cultura é que a cultura do livro pertence a poucos, ou seja, é elitista,
enquanto a cultura audiovisual pertence a muitos. Porém, o número de usuários o modifica
a natureza e o valor de uma cultura. Sua conclusão é que se o preço de uma cultura para todos
é a desqualificação em uma sub-cultura que, afinal, é uma ‘não-cultura’, então a percepção
resulta apenas em uma perda.
A idéia de progresso também é problematizada por Sartori (2001), que analisa
algumas das principais concepções envolvidas neste termo. Progresso significa acréscimo, “ir
58
em frente”, mas nem sempre esse acréscimo é necessariamente positivo. Até mesmo um
tumor progride, mas no caso o que está aumentando é um mal, uma doença. Logo, em muitos
contextos, a noção de progresso é neutra. Entretanto, com relação ao progredir da história a
noção de progresso é positiva, implica um aumento da civilização, segundo a concepção
iluminista. Daí, quando se afirma que a televisão é um progresso, está implícita a idéia que tal
crescimento é bom. No entanto, o autor não está se referindo ao crescimento (progresso) da
televisão, mas de uma televisão que produz progresso. É importante esclarecer que um
aumento quantitativo não é em si um progresso qualitativo, isto é, um progresso no sentido
positivo do termo. Assim, a difusão extensiva de alguma coisa representa um progresso se
o seu conteúdo for positivo, ou ao menos o acarrete o aumento do prejuízo se a coisa
difundida estiver numa situação de perda.
Após estes esclarecimentos é possível perguntar: em que sentido a televisão é
‘progressista’? (em outras palavras, em que medida ela serve para melhorar um estado de
coisas preexistente). Em linhas gerais, o dúvidas que a televisão oferece entretenimento
e diversão. Uma segunda generalização possível é que a televisão ‘desperta’ o indivíduo para
o mundo, para o global. Este despertar, de acordo com Sartori (2001), é a abertura para o
progresso na acepção iluminista do termo. Por outro lado, está igualmente comprovado que na
frente desses progressos existe um retrocesso fundamental, a saber, o empobrecimento da
capacidade de entender.
A espécie humana deve todo seu saber e seu progresso no conhecimento à sua
‘capacidade de abstração’. As palavras que articulam a linguagem humana são símbolos que
evocam representações, imagens de coisas visíveis, como vimos acima. Mas isso se dá apenas
com nomes próprios e palavras concretas, tais como: casa, mesa, esposa e semelhantes.
Quanto ao resto, quase todo nosso vocabulário consiste de ‘palavras abstratas’, que não têm
correspondência exata com coisas visíveis, e cujo significado não pode ser traduzido em
imagens, como por exemplo, as palavras ‘nação’, ‘Estados’, ‘burocracia’, e assim por diante.
Segundo Sartori (2001), todo nosso controle da natureza, assim como nossa capacidade de
criar política e economicamente o ambiente em que vivemos, tem seu eixo exclusivo no
‘pensar mediante conceitos’ que são entidades invisíveis e inexistentes. A grande questão aqui
reside no fato de a televisão inverter o progredir do sensível para o inteligível, provocando um
retorno ao puro e simples ver. Para o autor, a televisão, na realidade, produz imagens e apaga
conceitos, atrofiando nossa capacidade de abstração e também nossa capacidade de
compreensão. Em suas próprias palavras
59
[...] o que nós vemos e percebemos concretamente não produz ‘idéias’, mas se insere
nas idéias (ou conceitos) que o classificam e ‘significam’. É justamente esse
processo que vem sendo atrofiado quando o homo sapiens é suplantado pelo homo
videns. (SARTORI, 2001, p.33).
O autor procura rebater alguns dos principais argumentos dos defensores da
qualidade da televisão com relação ao que foi exposto anteriormente. O primeiro argumento é
que qualquer descoberta tecnológica sempre se deparou com opositores. Ele argumenta que
tal afirmação é falsa e afirma, ainda, que responder apelando a opositores sem sequer nomeá-
los é uma forma de responder que extrapola o problema proposto. Uma segunda resposta é
que o fato inevitável deve ser aceito. É fato que ninguém pode deter o progresso tecnológico,
mas nem por isso devemos deixá-lo escapar do nosso controle e nos submeter servilmente à
rendição. O terceiro argumento é que não existiria oposição entre palavra e imagem. O autor o
refuta demonstrando que o número de pessoas que lêem encontra-se em rápida queda, seja o
leitor de livros ou de jornais. Segundo ele, não interação entre essas duas esferas, mas sim
uma diminuição, isto é, o ver está atrofiando o compreender. O quarto, e último, argumento, é
que o empobrecimento decorrente do ver é compensado pela sua acessibilidade a todos.
Sartori (2001) conclui afirmando que um ‘saber adquirido só com imagens’ não é um saber no
sentido cognitivo do termo e que, mais do que difundir, corrói os pressupostos do próprio
saber.
Sua análise não se restringe apenas a este meio de comunicação, o que leva o autor a
também estabelecer algumas comparações entre a televisão com os seus cinqüenta anos de
existência e a nova era digital que se apresenta com os computadores pessoais e a Internet.
A primeira diferença que se apresenta é que a televisão emite imagens para um observador
passivo, enquanto o mundo do multimídia pressupõe que o usuário navegue interativamente
por seus ambientes. Do ponto de vista tecnológico, o computador é claramente superior à
televisão. Esta tem seu ponto fraco no fato de ser ‘generalista’, isto é, não oferecer produtos
suficientemente diferenciados. Os produtos que ela oferece são para a massa, para um público
mais amplo. A Internet, ao contrário, fornece produtos sob medida. Ela trabalha com nichos
específicos de mercado. Essa tentativa de atingir nichos específicos na televisão já se verifica,
mais recentemente, com os sistemas de TV a cabo ou via satélite. O autor relativiza também a
vantagem da interatividade que a Internet tem sobre a televisão, pois segundo ele, as crianças
desde os três ou quatro anos já são acostumadas com a passividade televisiva. Para ser
interativo deve ser mentalmente ativo desde o começo. Sartori (2001) chega à conclusão de
60
que no fim do século XX o homo sapiens entra em crise, perdendo a sabedoria e a capacidade
de conhecer.
2.3. Umberto Eco: a nova e a velha televisão.
Em Viagem na irrealidade cotidiana, publicado em 1984 pela editora Nova
Fronteira, Umberto Eco dedica um dos ensaios Tevê: a transparência perdida à reflexão
sobre a televisão e o significado das modificações pelas quais ela passa. Inicialmente, ele
identifica a existência de dois tipos de televisão a Paleotelevisão e a Neotelevisão. O primeiro
tipo é o que segue o modelo tradicional de televisão aberta, conhecido também como
broadcasting que transmite a partir de uma cidade, um ponto, para uma massa irrestrita de
telespectadores. No limite, ele pretende atingir todos os espectadores a mais ampla
audiência – que possam consumir os produtos por ela anunciados, podendo manipular o
conteúdo e transmiti-lo segundo seu interesse. O segundo tipo se caracteriza pela
segmentação, por um discurso voltado para um universo restrito de telespectadores. Ele não
tem a pretensão, como tinha a Paleotevê, de falar ao mundo todo e do mundo todo. Ela fala de
si mesma e da interação com o próprio público. Esta é, inclusive, sua característica mais
distinta: a Neotelevisão
15
interage com seu público (Cf. ECO, 1984, p. 182).
Segundo a constatação do autor, existe tanto no senso comum quanto nas teorias da
comunicação uma percepção que divide os programas de televisão em duas categorias: os
‘programas de informação’ e os ‘programas de ficção’. Na primeira, a tevê fornece
enunciados que se verificam independentemente dela. Podem ser eventos políticos, do
cotidiano, esportivos ou culturais. O público espera que a tevê cumpra com sua suposta
obrigação e a) diga a verdade’, b) diga-a segundo critérios de ‘relevância e proporçãoe, c)
separe ‘informação e comentário’. A segunda categoria inclui filmes, dramas e comédias,
muitos deles feitos especialmente para a televisão. No caso, o espectador aceita como válido e
15
Alguns autores propõem que esta divisão entre Paleotelevisão e Neotelevisão, proposta por Eco (1984), está
superada e precisa ser revisada. Cosette Castro (2006), por exemplo, argumenta que desde o Big Brother a
televisão mundial encontra-se em um novo momento: o da Pós-televisão, isto é, uma televisão que se dirige a
públicos cada vez mais diversificados. De acordo com a autora, os programas estão cada vez mais híbridos e a
ficção está constantemente misturada à realidade, assim como a realidade à ficção, utilizando diferentes recursos
tecnológicos como a TV aberta e por assinatura, a telefonia fixa ou celular, e também a Internet. Além destas
características, a pós-televisão apresenta programas transnacionais de caráter glocalizado, isto é, formatos
globais adaptados às características culturais e valores de cada país. Este ponto é de fundamental importância
para a presente pesquisa e será retomado adiante para uma análise mais cuidadosa.
61
verdadeiro aquilo que é sabidamente uma fantasia. O autor ressalta que a diferença entre as
duas categorias, de acordo com a opinião generalizada, é que os programas de informação têm
relevância ‘política’, ao passo que os programas de ficção possuem relevância ‘cultural’.
Umberto Eco (1984) argumenta que essa dicotomia vem sendo neutralizada, desde o
começo da tevê, por um fenômeno observável tanto em programas de informação quanto de
ficção. O fenômeno diz respeito à oposição entre ‘quem fala olhando para a câmera’ e ‘quem
fala sem olhar para a câmera. Os do primeiro grupo representam a si próprios o caso do
locutor, do apresentador de programa), enquanto os do segundo representam um outro (o ator
interpretando um personagem, por exemplo). Os que não olham para a câmera fazem algo que
consideram que aconteceria mesmo que a televisão não existisse, enquanto quem olha para a
câmera ênfase ao fato de a televisão existir e de que seu próprio discurso “acontece”
justamente pelo fato de ela existir. Apenas em função deste fenômeno, apontado por Eco
(1984), é que podemos pensar os reality-shows. Eles existem, desenvolvem uma espécie de
narrativa específica, a partir da importância adquirida pela televisão e sua narrativa, que
fazem com que as coisas ‘aconteçam’ pelo fato de ela existir.
Ao invés de questionar a verdade do enunciado pela televisão, ou seja, a relação
entre o enunciado e o fato, a verdade da enunciação se mede pela cota de realidade do que
aconteceu no vídeo, e não do que foi dito através do vídeo. Umberto Eco (1984) analisa
diferentes formatos de programas de entretenimento, e sua conclusão é que estaríamos diante
de programas em que informação e ficção se misturam de modo indissolúvel, sendo
irrelevante o quanto o público possa distinguir entre notícias ditas verdadeiras ou de ficção. A
característica destes programas é que conta sempre mais o fato de a tevê ser ‘verdadeira’, de
estar falando ao público e com a participação do público, do que a verdade daquilo que se diz.
A relação de verdade factual sobre a qual repousava a dicotomia entre
programas de informação e programas de ficção entra em crise e tende cada
vez mais a envolver a televisão em seu conjunto, transformando-a de um
veículo de fatos (considerado neutro) em um aparato para a produção de
fatos, de espelho da realidade em produtor da realidade. (ECO, 1984, p. 192)
Este argumento permite-nos também pensar sobre o objeto dessa dissertação, na medida em
que a proposta inicial destes programas é mostrar a realidade dos acontecimentos. Na verdade,
como discutiremos no capítulo seguinte, a edição exerce um papel fundamental
especialmente no caso do Big Brother e, portanto fica comprometido este caráter de
transmitir a ‘verdade factual’ dos acontecimentos proposta pelo programa. Ainda, neste ponto
Eco (1984) se aproxima dos demais autores analisados neste capítulo, na medida em que
62
também aponta como a televisão não é um veículo neutro, mas que produz a realidade de
acordo com seus critérios (ou interesses). O autor analisa o papel desempenhado por certos
aspectos que deveriam permanecer ocultos para o público na Paleotevê, mas que se tornam
manifestos na Neotevê. São eles: o microfone que capta o áudio, a câmara televisiva, a
interação via telefone e o aplauso. Estes elementos denotam a tentativa da paleotevê de exibir
claramente uma realidade criada e programada para a tevê, enquanto a neotevê apóia-se na
quebra desse ‘paradigma’ para seu sucesso.
Segundo a constatação de Umberto Eco (1984), a televisão mostra cada vez menos
eventos e fatos que acontecem por conta própria, independentemente da tevê. O telespectador
de bom senso sabe, por exemplo, que quando a atriz beija o ator no campo, mesmo quando é
um campo verdadeiro, trata-se de um campo preestabelecido, selecionado, e de certa forma,
‘falsificado’ para a filmagem. Esta percepção torna-se um pouco mais complicada quando se
trata de um evento ao vivo. Mas como o autor ressalta, percebe-se que essas transmissões ao
vivo pressupõem uma escolha e, portanto, uma manipulação. No limite, a tevê interpreta o
fato para o telespectador. Ela interpreta um acontecimento autônomo e devolve um ponto de
vista. Essa análise não questiona o fato de que os eventos aconteceriam independentemente da
transmissão. No entanto, o fato de se saber que o acontecimento será filmado, e a presença de
câmeras de televisão influem na preparação e no curso do evento. A conclusão do autor é que
isso faz com que os eventos transmitidos ao vivo sejam concebidos para serem transmitidos
pelas câmeras de tevê.
2.4. Sobre a televisão: Pierre Bourdieu.
Em Sobre a televisão, publicado em 1997 pela Jorge Zahar Editor, Pierre Bourdieu
examina importantes mecanismos que regem o funcionamento da TV e a relação deste meio
de comunicação com os demais campos da produção cultural. A tese central explorada pelo
autor é a das conseqüências trazidas pela pressão comercial sobre a televisão e desta, em
razão de seu grande peso simbólico e econômico, sobre os demais campos da produção
cultural. Pautada na busca pela maior audiência princípio regulador de maior importância
para este meio a televisão pode expor a grande perigo as diferentes esferas da produção
cultural, podendo, em função do seu peso simbólico e econômico interferir e modificar a
lógica interna de campos inicialmente autônomos, bem como a vida política e democrática, ao
63
abrir indiscriminadamente espaço para todo tipo de manifestação, como até mesmo o racismo
e a xenofobia, e explorando largamente as ‘paixões primárias dos homens’.
Aqueles que aceitam participar de seus programas devem tomar consciência de que a
televisão acarreta uma perda da autonomia. Isso acontece porque as condições de
comunicação são dadas, ou seja, o assunto (ou pauta) é imposto e o possibilidade de
alterá-lo, sendo o tempo bastante limitado. Além disso, o indivíduo comum não tem nenhum
domínio sobre os instrumentos de produção, ficando estes restritos aos profissionais da
comunicação. Portanto, é possível concluir que aqueles que, mesmo assim, o à televisão,
não o fazem para dizer algo, mas por outro motivo. Este é seu principal atrativo: a televisão,
para Bourdieu (1997), é fundamentalmente um lugar de exibição. Exibir-se nessa nova
espécie de praça pública, na expectativa de novos convites, novas oportunidades profissionais.
Esta tese é de fundamental importância para a análise do objeto desta pesquisa, pois
observamos a validade deste argumento. Ele traz conseqüências para a forma como se faz
televisão atualmente. O desenvolvimento de um novo formato televisivo, como os reality-
shows, não apenas comprova esta tendência como também explora suas potencialidades ao
máximo, como será possível observar mais adiante.
Um ponto importante da argumentação de Bourdieu (1997) é que através de seus
mecanismos invisíveis de censura, a TV se torna um eficiente instrumento de manutenção da
ordem simbólica. Sua análise procura desvendar mecanismos visíveis e invisíveis da
televisão, desde sua estrutura e posição dentro da produção cultural até a composição do
estúdio e os seus elementos. Como vimos no parágrafo anterior, tanto a perda da autonomia
em função das condições da comunicação serem dadas, como a limitação temporal exercem
uma espécie de censura. Existe também a censura econômica, exercida pelos proprietários,
anunciantes e até mesmo pelo Estado, que acarreta uma série de mediações e conseqüências.
A estas duas formas o autor denomina de censura invisível, pois elas atuam sobre o que é
vinculado pela televisão sem que ninguém as veja ou reclame, mas que assim mesmo exercem
um grande papel no resultado final de todas as mediações.
Grande parte da sua ão simbólica se através do fato de a TV chamar a atenção
para os ‘fatos-ônibus’ notícias que a princípio devem interessar a todo mundo, que não
devem chocar ninguém, nem dividir opiniões ou criar consensos. Isso é uma espécie de lei do
jornalismo e da televisão, que busca sempre agregar audiência, aumentá-la, e nunca colocar
no ar fatos ou notícias que possam dividir opiniões ou causar incômodos ao espectador. Essas
informações têm o objetivo de despolitizar e conformizar a audiência. Um tipo particular
desse tipo de informação são as chamadas ‘notícias de variedade’ – notícias que, sem maiores
64
conseqüências, interessam a todo mundo e ocupam na TV um tempo que poderia (e deveria)
ser usado para realmente informar, exibindo todo tipo de notícia sem restrições. Isso é um
dado muito importante, pois existe um grande número de pessoas que não lêem jornais e que
têm na televisão sua única fonte de informações. No Brasil, especialmente, este dado ganha
peculiar relevância, pois ainda registramos altas taxas de analfabetismo, e a televisão se torna
a única fonte de informações dessa população.
Outro mecanismo importante desvendado pelo autor é que a televisão pode ‘ocultar
mostrando’, isto é, ela exibe fatos diferentes do que seria preciso se ela realmente informasse
as pessoas, ou ainda transmitindo o que é preciso, mas de tal maneira que a informação
termina por adquirir um sentido que não corresponde à realidade. Este é um ponto de grande
importância para a compreensão do funcionamento da televisão e também do cinema, se
quisermos pois ambas as dias são essencialmente baseadas na seleção e edição das
imagens a serem exibidas, e estas exercem um papel de destaque nesse mecanismo. Segundo
Bourdieu (1997), os jornalistas e editores operam através da noção de ‘óculos’ estruturas
invisíveis que organizam aquilo que percebemos, determinando aquilo que vemos e o que não
vemos – fazendo a seleção das informações. O princípio que rege essa seleção de conteúdos é
a busca do sensacional, do espetacular e, em especial na televisão, o ‘convite à dramatização’,
a exagerada importância dada aos acontecimentos. Isso gera, entre os diferentes jornalistas e
os diferentes canais, a busca pela exclusividade, pelo ‘furo de reportagem’. O resultado desse
processo é a uniformização e a banalização da informação, pois todos acabam fazendo a
mesma coisa. O que provoca todas essas conseqüências são as pressões do índice de audiência
a que estão todos sujeitos. Na televisão, ele se retraduz na pressão da urgência, ou seja, alguns
objetos são impostos aos telespectadores porque primeiro se impõem aos produtores.
Bourdieu (1997) destaca o percurso percorrido pela televisão desde os anos 1950,
quando ela ainda estava pouco presente no campo jornalístico e não tinha peso simbólico.
Com o passar dos anos, no entanto, essa relação se inverteu e ela tende cada vez mais a
exercer domínio no campo jornalístico, tanto do ponto de vista econômico como do ponto de
vista simbólico. Sobre o peso simbólico do jornal escrito, o autor aponta para o enorme
potencial da TV, capaz de, numa única noite, reunir um número incrivelmente maior de
pessoas frente ao jornal das 20 horas do que o número de leitores de todos os jornais escritos
de um dia. Ele ressalta, ainda, uma lei conhecida no meio jornalístico: quanto mais um órgão
de imprensa pretende atingir um público maior, mais ele tem de deixar de lado tudo aquilo
que possa dividir ou excluir, porque, longe de levantar problemas, ele deve simplesmente
comentar problemas sem história. Assim, quanto mais um jornal amplia sua difusão, mais
65
caminha para os ‘assuntos-ônibus’. Esse trabalho de ‘conformizar’ e ‘despolitizar’ convém
perfeitamente, mas, segundo Bourdieu (1997), ele não é pensado ou desejado por ninguém,
não um sujeito propriamente dito. O ‘jornal televisivo’ é um produto que convém a todo
mundo, pois confirma aquilo que já é conhecido e deixa intactas as estruturas mentais. Isso só
ocorre em função da lógica da concorrência, e dos mecanismos evocados pelo autor. Segundo
ele, “[...] a televisão está perfeitamente ajustada às estruturas mentais do público.”
(BOURDIEU, 1997, p. 64). Para o autor, em função de sua moral pequeno-burguesa, a
televisão, através de seus apresentadores, comentarista, etc, diz ‘o que se deve pensar’ sobre
os ‘problemas da sociedade’.
De acordo com a argumentação desenvolvida por Bourdieu (1997), nos anos 1950, a
televisão tinha pretensões culturais e se utilizava de seus produtos, isto é, documentários,
adaptações de obras clássicas, debates, etc., para formar os gostos do grande público. A TV
dos anos 90, por sua vez, visa a explorar esses gostos para atingir a maior audiência possível,
oferecendo aos telespectadores produtos brutos, que encontram seu paradigma nos talk shows,
exibições de fatias de vida, experiências vividas, frequentemente extremas e, segundo ele,
capazes de satisfazer uma forma de voyeurismo e exibicionismo como nos jogos
televisionados, dos quais se deseja participar, mesmo como espectador, para ter acesso a um
instante de visibilidade. É possível observar claramente, neste ponto, que a descrição do autor
já prefigura o que se constituiria em um novo formato, os reality-shows, alguns anos depois.
Bourdieu (1997) destaca o aumento do peso simbólico da televisão sobre os demais
campos da produção cultural como, por exemplo, o jornalismo escrito, e que cada vez mais
ela define aquilo que é importante falar, o que é preciso ou não falar. Com isso certa visão da
informação ganha destaque. As notícias de variedades e esportivas têm cada vez mais espaço,
quando o todo o espaço dos telejornais. Estas notícias têm por efeito a despolitização, a
redução do mundo a piadas e fofocas, dando atenção a tudo que o tem conseqüências
políticas. O autor afirma que, na televisão, o ‘peso’ da economia se pela pressão do índice
de audiência, que conseqüentemente impõe seu peso aos demais campos da produção cultural.
A conclusão é que a autoridade conferida pela TV pode mudar a lógica interna de um campo,
seja por permitir a influência de alguém de fora de determinado campo em função de seu
sucesso midiático, seja pela inserção do ‘peso’ da economia em determinado campo.
Bourdieu (1997) propõe defender as condições de produção necessárias para progredir o
universal, e ao mesmo tempo, trabalhar para generalizar as condições de acesso ao universal.
Ele defende a posição de que se deve lutar contra o índice de audiência pela democracia.
66
2.5. Caminhos da televisão na era da globalização
Como discutido no primeiro capítulo, a partir do processo de globalização, os meios
de comunicação passam por grandes transformações. Ocorre uma enorme concentração de
capitais nesse ramo, resultando no controle de toda a oferta de mercadorias disponíveis no
mercado mundial por pouco mais de uma dúzia de corporações. Portanto, a indústria do
entretenimento passa a ser alvo de investimentos e aquisições por parte de grandes grupos
industriais de outros setores. Esse intenso processo de aquisição de, ou associação a empresas
do ramo do entretenimento tem como uma de suas principais conseqüências a convergência
de tecnologias. Deste ponto de vista, o principal acontecimento se a partir do
desenvolvimento do sistema digital de registro, geração e transmissão de som, imagens e
dados. A televisão, que é um dos meios de comunicação mais lucrativos, passa a ser
pesquisada por diversas corporações para o desenvolvimento de modelos de televisão
interativa, possibilitados pela televisão digital, nos quais o telespectador não se restrinja a
escolher, dentro de uma oferta limitada, o programa que quer assistir. Paralelamente, ocorre
um gigantesco desenvolvimento dos computadores pessoais, seguidos pela expansão da
Internet desde os anos 1990. A expansão da World Wide Web transformou os computadores
em concorrentes dos veículos tradicionais de comunicação, como o dio e a TV. Assim, é
possível identificar uma profunda relação entre o que possa vir a ser a televisão no futuro e o
processo de globalização.
O processo de digitalização torna possível a convergência tecnológica entre a televisão
e o computador, através da Internet, o que abre um enorme leque de possibilidades de usos,
oferta de novos produtos e serviços. Por se tratar de um processo recente, e inacabado,
diversos autores posicionam-se no debate teórico sobre as possibilidades apontadas para o
futuro da televisão. Encontramos desde autores entusiasmados com as novidades propostas
pela tecnologia até autores mais ponderados com relação às possibilidades que se apresentam.
Escolhemos para essa seção alguns autores que sintetizam as principais posições no debate
sobre as possibilidades abertas pelas convergências entre as mídias. Dessa forma, o artigo de
Sérgio Capparelli, Murilo César Ramos e Suzy dos Santos (2000) mapeia as mudanças
estruturais ocorridas na televisão a partir de sua relação com as telecomunicações e com a
Internet, no sentido de convergência destas mídias. Ana Vitória Joly (2001, 2003), por sua
vez, explora as potencialidades da interatividade na televisão digital, além de procurar
67
conhecer os recursos técnicos que estarão disponíveis nessa nova mídia com o objetivo de
propor formatos específicos de programas televisivos interativos que possam entreter e educar
informalmente. Finalmente, José Manuel Moran (2002) analisa criticamente a interatividade
proposta pela TV digital, a partir do ponto de vista da tecnologia e da comunicação.
2.5.1. A convergência anunciada: televisão e Internet.
Em um instigante artigo publicado na Revista Brasileira de Ciências da Comunicação,
no ano 2000, os pesquisadores rgio Capparelli, Murilo César Ramos e Suzy dos Santos
propõem-se a estudar as mudanças ocorridas na televisão com o objetivo de mapear as
mudanças estruturais que ocorreram com ela, a partir de sua relação com as telecomunicações
e com a Internet, no sentido da convergência destas mídias. Eles se propõem analisar a
revolução tecnológica e as chamadas novas tecnologias, como sendo o motor da
reorganização do modelo fordista de produção e desenvolvimento capitalista, abalado por
diversas crises desde a década de 1970, em transição para um modelo pós-fordista. Conforme
o cenário apresentado, a convergência atual de tecnologias de distribuição de dados, imagens
e sons através da digitalização da informação se em diversas instâncias, a saber: a
convergência de equipamentos de comunicação, telecomunicações e informática; a
convergência de modelos de consumo de informação, entre comunicação de massa e
comunicação interativa; a convergência dos produtos das indústrias culturais em um único
produto multimídia; a convergência da economia das comunicações que engloba diversos
setores mediada pela informática. Além disso, a convergência das comunicações não pode
ser analisada apenas sob o prisma das inovações tecnológicas, dado que as mudanças que as
trouxeram à tona estão alinhadas ao modelo neoliberal de desenvolvimento capitalista, na
busca de alternativas para a sua manutenção.
A partir da constante evolução tecnológica, a televisão gerou no final dos anos 1970
outra forma de transmissão com grandes possibilidades comerciais: a televisão por assinatura.
Esta abriu a possibilidade de desenvolver diversas características, em contato com outras
áreas de produção, dando origem a novos produtos e serviços. De acordo com os autores, é
possível, por exemplo, que ela deixe de ser nomeada televisão e passe a chamar-se
cibertelevisão (NOAM, 1995), porque estaríamos entrando na época da pós-televisão
(PISCITELLI, 1998), uma vez que se tem a possibilidade de oferecer serviços a então
68
separados como telecomunicações, comunicação massiva e transporte de dados assim
como outros produtos, a partir da dinâmica impulsionada pelas mega-fusões.
A TV por assinatura nas suas três modalidades: a cabo, DTH e MMDS chega ao
Brasil com atraso em relação a Europa e EUA, próximo ao momento em que, nestes países, se
a convergência entre as mídias de entretenimento, as telecomunicações e a informática, o
que abre diferentes possibilidades de negócios na exploração o apenas dos serviços de
vídeo, mas também de outros serviços digitais em banda larga (CAPARELLI; RAMOS;
SANTOS, 2000). Além disso, as alterações nas políticas normativas constituem importantes
atrativos para uma indústria que até então era vista simplesmente como provedora de televisão
mediante assinaturas. Isso abre caminho para que, por exemplo, as empresas de telefonia
também possam, em um futuro não muito distante, produzir conteúdo, como uma empresa de
televisão. No entanto, é preciso destacar que até o momento esta possibilidade, ao menos no
Brasil
16
, está descartada. O modelo de televisão digital japonês (ISDB) adotado pelo
governo brasileiro a partir de 2006 continua a impedir as empresas de telefonia de se tornarem
também produtoras de conteúdo, mantendo, desta forma, intacta a estrutura de oligopólio das
grandes redes de televisão brasileiras
17
.
A evolução das novas tecnologias de distribuição da programação televisiva
multiplicou a quantidade e a qualidade da oferta de serviços. Estas mudanças levam alguns
autores, como Garnhan (1995) e Richieri (1994), a considerar esse novo sistema como um dos
principais motores da convergência das comunicações. A nova estrutura de redes, seja via
satélite ou por cabos de fibra ótica, tem a capacidade para oferecer serviços que vão muito
além da transmissão de imagens e áudio. De acordo com os autores, neste momento não
ocorre apenas a convergência tecnológica de setores diversos, mas também convergências
econômicas e políticas. É a passagem de um modelo de capitalismo industrial, de consumo e
produção massiva, regulado através do Estado de Bem Estar Social, para um capitalismo
convergente, globalizado, caracterizado pela re-regulamentação que vem ocorrendo nos
últimos anos.
16
Para uma análise mais atualizada sobre esse assunto ver também CAPARELLI; SANTOS, 2005.
17
É preciso esclarecer que este veto diz respeito apenas às possibilidades da entrada de novos atores no mercado
de TV Digital, no Brasil. Com relação ao mercado brasileiro de TV por assinatura, a disputa entre as atuais
operadoras e as empresas de telefonia fixa (especialmente entre a NET e a Telefonica, respectivamente) está se
acirrando cada vez mais, forçando inclusive mudanças nos marcos regulatórios do setor. As teles entraram neste
mercado a partir de brechas na legislação vigente e hoje oferecem serviços de triple play (TV por assinatura,
telefone e Internet banda larga). O cenário continua indefinido, mas a operação das teles já é uma realidade neste
mercado, favorecendo, inclusive, a associação entre empresas de diferentes setores para competirem pelo
mercado de TV por assinatura (MATTOS, A., 2006; CRUZ, 2006; PEREIRA, 2006; ZIMMERMANN, 2007;
MARQUES, 2007; CRUZ, 2007; FOLHA DE SÃO PAULO, 2008).
69
Além da programação de áudio e vídeo tradicionais, também podem ser oferecidos
serviços de home-banking, home shopping, telefonia, teleconferência e Internet tanto pelas
operadoras de televisão por assinatura quanto pelas telecomunicações. O processo de
digitalização gera grandes transformações tanto na TV quanto na Internet. Com isso, de
acordo com os autores, abrem-se duas possibilidades: pode-se levar Internet para a TV,
tornando-a navegável através do controle remoto; ou fazer com que os canais de televisão
possam ser assistidos via Internet, na tela do computador.
18
A TV Digital, que associa
televisão e Internet, ainda encontra-se num estágio lento de desenvolvimento, não apenas no
Brasil. Apesar de o governo brasileiro ter escolhido em 2006 o modelo japonês (ISDB), a real
possibilidade de utilização de todos esses recursos enumerados acima ainda leva alguns
anos. Ao momento, nas pouquíssimas localidades nas quais se pode receber o sinal digital,
a única diferença encontra-se na qualidade de som e imagem. Os serviços possibilitados por
essa tecnologia ainda não estão sendo comercializados.
Não existem apenas os acordos entre empresas para uma convergência econômica,
mas também a convergência tecnológica de equipamentos. As principais tecnologias surgidas
no final da década de 1990, no que diz respeito aos equipamentos, ou hardware, são os cable
modem e os set-top boxes, e estão sendo implantadas pelos principais global traders
(CAPARELLI; RAMOS; SANTOS, 2000). O cable modem converte informações enviadas
pelo computador em sinais elétricos, que depois de recebidos por equipamentos equivalentes,
convertem os sinais em dados. Um modem usa apenas a linha telefônica para a transferência
de informações, a uma velocidade média de 56 kbps. O cable modem transmite estas mesmas
informações por cabos de fibra ótica, a uma velocidade de 30 Mbps. O set-top box, por sua
vez, é um dispositivo de interface entre a rede (de cabos) e o televisor do assinante. Ele
permite o acesso à Internet, transmissão de dados, entre outros serviços.
É consenso entre diversos estudiosos que vivemos hoje uma fase de transição na
comunicação eletrônica de massa. No início, tínhamos um modelo de televisão
predominantemente massiva, que ainda se mantém; posteriormente, passamos para um
período caracterizado pela televisão por assinatura e pelas novas linguagens dos media; agora,
nos aproximamos de outro tipo de televisão, que pode ser chamada de interativa,
cibertelevisão, ou ainda, pós-televisão, isto é, um misto de televisão e computador.
18
É importante destacar que a convergência entre o computador e a televisão, ou ainda, da Internet com a
televisão é constatado por diversos autores. Giovanni Sartori (2001) e Rodrigo Duarte (2003), nos textos
analisados anteriormente, também apontaram a convergência entre esses meios como sendo o futuro da
televisão.
70
Com a hegemonia de empresas privadas, portanto, do capital financeiro internacional,
e com o resultante afastamento do Estado das atividades de operador de telecomunicações
em conformidade com o receituário neoliberal as medidas de desregulamentação e as re-
regulamentações demonstram a crueza da realidade presente na metáfora das super vias da
informação. Estas medidas, na verdade, quebram definitivamente a possibilidade de uma
participação forte do Estado nas comunicações como operador. No Brasil, a
desregulamentação do setor, que abriu a possibilidade de exploração das TVs por assinatura
a cabo, MMDS e DTH acabou tendo como resultado não a entrada de novos atores na
produção audiovisual, mas o controle da televisão a cabo pelo mesmo grupo que detém a
principal rede de televisão do país.
Os autores concluem que, no que diz respeito à convergência entre as teles e a TV o
caminho está consolidado. As tecnologias e o volume de capitais permitiram a construção
desse cenário no país. no que diz respeito às aproximações entre a televisão e a Internet, o
cenário é mais difícil. Em primeiro lugar, porque as experiências ainda estão no começo e as
mais significativas acontecem em outros países, especialmente nos EUA, Japão e Europa.
Para eles, no entanto, os investimentos de grupos locais ou o interesse de investidores
estrangeiros no mercado brasileiro mostram que, num mundo globalizado e conectado à
grande rede, será um locus privilegiado para a aplicação e reprodução do capital.
2.5.2. O futuro da TV: a televisão digital e interativa.
As pesquisas, tanto na área das novas tecnologias quanto na área da comunicação,
apontam a TV digital como o futuro da convergência entre televisão e Internet. Muitos autores
escrevem sobre esse assunto de diversas perspectivas. Os argumentos de Ana Vitória Joly
sintetizam o que, de maneira geral, defendem os entusiastas desse novo meio. Ela explora as
possibilidades da interatividade na televisão digital, além de procurar conhecer os recursos
técnicos que poderão estar disponíveis nessa nova mídia, a propiciar formatos específicos de
programas interativos capazes de entreter e educar informalmente. Comunicóloga, Joly tem
pesquisas reconhecidas e premiadas sobre a televisão e mídias interativas, tendo trabalhado
nessa área em algumas emissoras estrangeiras e produzido um vídeo experimental a partir do
conceito de narrativa interativa, possibilitada pelas novas mídias. Os argumentos aqui
apresentados tomam como base os artigos ‘A interatividade na Televisão Digital’ e
71
‘Programação Educativa destinada à Televisão Interativa’, ambos disponíveis na Biblioteca
On-line de Ciências da Comunicação, publicados respectivamente em 2001 e 2003.
Seu objetivo inicial é explorar a associação do envolvimento que a TV proporciona ao
espectador, com o acesso à diversidade de informação comum à Internet, visando uma
programação de qualidade, que forneça interação, exploração e imersão. Até o momento, a
televisão caracteriza-se como um produto industrial desenvolvido a partir de regras que visam
à racionalização da produção. Padrões técnicos com baixa resolução de imagem, programação
linear e de caráter unidirecional, que oferece um leque de opções limitadas e mínima
possibilidade de personalização, foram esses os principais elementos de um sistema de
produção que acabaram por interferir no produto a ser veiculado. O recurso da tecnologia
digital na produção melhorou a qualidade de imagens e sons, mas as mudanças não se
refletiram no formato dos programas. Entretanto, com o advento da televisão digital as
grandes redes de TV passarão pela convergência entre televisão e Internet, entre outros
suportes, tendo em vista o desenvolvimento de programas interativos.
A tecnologia da interatividade permite o surgimento de novas formas de
agenciamentos coletivos que, segundo Joly (2001), modificam o papel da mídia na sociedade
contemporânea. A partir dessas transformações é possível reavaliar experiências pioneiras na
televisão brasileira, como Você decide, veiculado pela Rede Globo, para a construção de
complexos mundos ficcionais, levando em consideração o potencial dialógico da televisão
digital interativa. No entanto, necessárias se fazem algumas ponderações com relação à
chamada “interatividade” proposta por programas como o citado, o Itercine, ou mesmo o Big
Brother Brasil. Em primeiro lugar, trata-se de uma resposta muito mais ‘reativa’ do que
propriamente interativa, como aponta a própria autora. Em segundo lugar, que
desmistificar este conceito, pois longe de escolher livremente a continuação, o público é
levado a se decidir pelas opções previa e cuidadosamente selecionadas pela rede de televisão
entre o final A ou B de determinada história, ou entre o filme muito conhecido ou outro
desconhecido. O Big Brother Brasil pode ser apontado como uma exceção, posto que as
escolhas dos espectadores ficam na dependência das decisões dos participantes do programa.
Contudo, vale frisar que a emissora tem grande poder de decisão sobre os acontecimentos,
uma vez que é a produção do programa quem seleciona e edita as imagens a partir das quais o
público fará suas escolhas. Além disso, o se trata apenas de “convidar” o público a intervir
na seqüência da narrativa de determinado programa, ou mesmo da programação da emissora.
O principal papel dessa ‘interação’, na verdade, é servir como uma enorme pesquisa de
mercado para a emissora, pois através das respostas ela tem a possibilidade de conhecer o que
72
o público aprova ou desaprova. Isto lhe permite identificar tendências, traçar o perfil da
audiência, o gosto, a aprovação a determinados ‘tipos sociais’ e comportamentos.
Em mais de cinco décadas de existência, a televisão passou por poucas modificações
significativas. A mais expressiva foi a mudança da transmissão em preto e branco para a
transmissão a cores. A digitalização do sinal televisivo, segundo a autora, causará impacto
semelhante. Esta transição do sistema analógico para o digital vem ocorrendo em vários
países, como Estados Unidos e Inglaterra. No Brasil, apenas recentemente decidiu-se pela
adoção do padrão japonês, que se encontra nos estágios iniciais de implantação. Mas, essa
transição não significa apenas uma mudança na forma de transmissão e recepção de sinais,
pois possibilita a interação do receptor com a programação. De acordo com a autora, o
telespectador desde o início tende a dialogar com a programação. É o caso das telenovelas
brasileiras, feitas à medida que o transmitidas com o objetivo de corresponder às
expectativas do público, que vai direcionando a narrativa. Todavia, a interatividade apenas
acontece quando o espectador deixa de ser passivo e passa a ser ativo em relação à televisão.
Ainda o dispomos de nenhum meio efetivo de intervir na programação e, segundo Joly
(2001), ações como ligar e desligar, ou trocar de canal, são intervenções reativas, e o
interativas. Atualmente, a televisão usa de outros artifícios como o telefone, o celular, o fax e
a Internet para promover a interação indireta do telespectador com a programação, não
dispondo ainda de um canal específico para esse diálogo.
Aumentadas as possibilidades de escolha pessoal, não serão mais grupos, e sim
indivíduos, os destinatários de novas tecnologias como a televisão interativa. Ao invés de
celebrar a cultura de massa, ela irá intensificar o individualismo. A autora, por isso mesmo,
defende que a Internet e os jogos de computadores possam servir de modelos para a
programação televisiva no futuro, posto que fazem uso da interatividade de maneira específica
e individual. Serem jogados em primeira pessoa e integrarem cultura e entretenimento, são
suas principais características. Obras abertas, eles se atualizam a cada intervenção do jogador.
Também existem experiências de bidirecionalidade na Internet para gerar produtos
interativos, como é o caso da allTV, que utiliza tecnologia de televisão associada à
versatilidade da Internet transmitindo uma programação baseada em variedades,
entretenimento, serviço e informação. Tais experiências, para Joly (2001), permitem
vislumbrar a TV interativa que não somente conecta os espectadores ao mundo, mas os
conectará entre si, possibilitando uma comunicação horizontal, não apenas do centro emissor
aos milhares de receptores, mas principalmente dos receptores entre si. Faz-se necessário,
neste ponto, destacar que a autora trata de um leque de “possibilidades” abertas pela
73
tecnologia que, no entanto, podem não se tornar realidade. Mas não custa relembrar que a
televisão é um meio engendrado por uma lógica social, por um modo de produção específico,
como foi destacado acima. No limite, esta lógica econômica vai determinar como a tecnologia
será usada. Como lembra Moran (2002), existe uma grande diferença entre o que é possível
tecnologicamente e o que é economicamente viável.
Joly (2001) conclui que, apesar de algumas características já estarem surgindo e
delineando a nova dia, a TV digital ainda não possui conteúdo específico, sendo apenas
almejada para o comércio televisivo (t-commerce), e seu potencial para programas específicos
está no começo das suas investigações. Atualmente a televisão aberta utiliza os artifícios de
outros meios de comunicação (como o telefone, a Internet e o fax) para fomentar a
participação indireta do telespectador na programação. Com a televisão digital, é possível que
o diálogo do espectador com o programa se através do canal de retorno ou do acesso de
dados recebidos e armazenados no Set Top Box (STB), como veremos com detalhes adiante.
A televisão alcança todas as faixas etárias e classes sociais, em qualquer horário ou
lugar. Segundo a autora, ela é a principal fonte de entretenimento, informação e cultura de
grande parte da população, especialmente a brasileira. No entanto, como foi discutido no
início do capítulo, é necessário aqui retomar as críticas a esta forma de conceber a televisão.
A bibliografia mobilizada anteriormente nos esclarece que este não é um meio de
comunicação neutro e imparcial, que ela está voltada para a geração de lucro para seus
proprietários e isto determina suas possibilidades. Não se trata de um meio de comunicação,
mas de um meio tecnológico em perfeita sintonia com a lógica social em que está inserido.
Para Joly (2003), o potencial educativo da TV pode ser ampliado com a digitalização do sinal,
em decorrência da maior possibilidade de interação do telespectador com a programação. Nos
países em que já foi implantada a TV digital são oferecidos aos telespectadores serviços como
o video-on-demand, home-banking, e-mail, previsão do tempo, jogos e informações
complementares à programação como, por exemplo, estatísticas, detalhes de eventos, recursos
multi-câmeras, comércio televisivo interativo (t-commerce) e guia interativo de programação.
Todavia, ela defende que a próxima etapa da programação digital use os recursos tecnológicos
tanto para gerar novas formas de entretenimento, permitindo ao telespectador redirecionar as
narrativas, como, principalmente, para incrementar o ensino e a aprendizagem baseados na
interação, também conhecidos por t-learning
19
.
19
T-learning é uma formulação que designa basicamente o ensino e aprendizado com base na TV interativa.
74
De acordo com Joly (2003), a transmissão televisiva é, atualmente, um exemplo de
veículo no qual toda a inteligência encontra-se no ponto de origem. Ou seja, toda a criação e
elaboração estão na empresa que emite os conteúdos, restando aos aparelhos a mera recepção
de um sinal, sem a possibilidade efetiva de interação, ao contrário do que ocorre com os
computadores, por exemplo, em que os usuários interagem o tempo todo com a máquina.
vimos que, em linhas gerais, os autores que pesquisam o futuro da televisão, especialmente a
TV digital, concordam que a nova forma de televisão se bidirecional e proverá ao
telespectador interatividade. Deste modo, a implantação da TV digital abria possibilidade
de os aparelhos receberem milhares de informações e selecionarem algumas poucas,
dependendo do interesse ou dos hábitos do telespectador.
A transição dos sistemas analógicos para os digitais, segundo argumenta a autora, trará
inúmeros benefícios aos telespectadores. Em primeiro lugar, haverá uma melhoria na
qualidade da imagem e do som, tanto no SDTV (TV digital padrão) quanto na TV digital de
alta definição (HDTV). O segundo benefício será o maior número de canais disponíveis, uma
vez que os canais digitais ocupam menos lugar no espectro que os canais digitais atuais.
Também será possível a TV móvel, isto é, os sinais de televisão poderão ser captados por
ônibus, automóveis, televisores portáteis e celulares, gerando uma audiência complementar.
Temos que ressaltar que este dado reforça a tese adorniana, exposta no primeiro capítulo desta
dissertação, de que a indústria cultural se articula de forma a não deixar nenhum espaço para
que o indivíduo possa ver outras manifestações que não as suas. Ela agora não ocupa apenas
os espaços dedicados à diversão, ou ainda o espaço doméstico, mas passa a ocupar todo o
espaço em que o indivíduo se movimenta, esteja ele no automóvel, no ônibus ou em qualquer
outro espaço com um celular. Desta forma, completa-se o ‘sistema total’ da indústria cultural
apontado por Adorno (1971, 1985). Joly (2003) destaca que outras características da mídia
digital o: facilidade de manipulação, pois os dados podem ser processados, possibilitando a
busca e a interatividade; o armazenamento, que abre a possibilidade da programação
assincrônica; e a reprodução e transmissão, com compactação, sem perda de qualidade e
bidirecional.
A bidirecionalidade da TV digital interativa abre a possibilidade dos espectadores
interagirem com a programação, através de um canal de retorno, pelo acionamento do
controle remoto, requisitando programações específicas, opinando ou mesmo escolhendo o
ângulo de câmera ou o final de uma história. Porém, é possível que essa nova realidade não
aconteça na televisão digital aberta, devido ao grande número de pessoas enviando sinais, o
que congestionaria o espectro e impossibilitaria a emissora de responder a todos os pedidos.
75
Portanto, segundo a autora, é provável que esse tipo de interatividade fique restrito às
televisões por assinatura.
Todos os serviços de interatividade se dão através do Set Top Box (STB), um
decodificador. Suas principais funções, de acordo com Joly (2003), são a capacidade de
armazenar dados e a capacidade de receber e armazenar apenas o conteúdo de interesse de um
usuário específico. Desse modo, a interação ficará independente do espectro, se dando apenas
com o aparelho. Além disso, o STB possibilita a programação assincrônica, isto é, o usuário
não é mais vinculado à grade de programação das emissoras, que o aparelho pode ser
programado para gravar os programas desejados através do PVR (Personal Video Recorder).
Este dado provoca mudanças em diversas áreas: muda o conceito de medição de audiência,
afeta a indústria dos comerciais (que, em tese, podem não ser mais vistos), possibilita a edição
pessoal de qualquer programa ou filme e a cópia de PVR para PVR, via email, sem
interferência das redes de TV, o que também coloca novos desafios para os direitos autorais.
Segundo a autora, a reprodução, compactação e armazenamento de obras audiovisuais
sem perda de qualidade são viabilizados pelos padrões MPEGs. Estes são um conjunto de
normas para compressão, formatação e distribuição de produtos audiovisuais, concebidos por
um grupo de pesquisadores denominado Motion Pictures Expert Group. A partir das normas
MPEGs, aumentam cada vez mais a compressão e os sinais digitais ocupam menos espaço no
espectro, conseqüentemente, o multiplicadas as ofertas de canais e programação
disponíveis. Dessa forma, torna-se importante a existência de um EPG (Expert Program
Guide), um guia eletrônico de programação que possibilita a pesquisa, a gravação automática
de programas selecionados, entre outros serviços. Contudo, Joly (2003) ressalta que o Set Top
Box pode interferir na privacidade dos telespectadores, uma vez que dispõe de um endereço IP
(Internet Protocol) que pode identificar o receptor e saber exatamente qual o tipo de
programação de seu interesse, e qual o tipo de produto pode se mais propício para o
consumidor. É preciso refletir sobre as conseqüências desse dado. As novas tecnologias
aparentam ser mais meios de controle, de reconhecimento e identificação do que meios de
comunicação. Na realidade, podemos afirmar que elas são meios técnicos de espionagem,
meios de ‘verificação’, de ‘monitoramento’ das atividades do cidadão. Isto abre possibilidades
preocupantes com relação à liberdade e à autonomia do indivíduo, ao menos aquela que ainda
resta. Basta nos recordamos do que ocorreu nos EUA após os ataques de 11/09, quando o
governo aprovou o Patriotic Act. Esta lei permite que as agências de inteligência americanas
monitorem e cruzem dados de qualquer cidadão americanos com atividades consideradas
‘suspeitas’, seja através de correspondências, e-mails, telefones, compras com cartão de
76
crédito, etc
20
. Este dado permite, ainda, pensarmos a respeito do objeto desta pesquisa. Não é
à toa que o mote do Big Brother Brasil é ‘espiar’. É possível pensar em diversas implicações
que este programa pode suscitar. As idéias de controle e monitoramento estão intimamente
relacionadas com a concepção do programa. Não apenas daqueles que se submetem a estarem
sob a vigilância das câmeras, mas de todos aqueles que estão trancados em frente ao aparelho
de televisão. Na verdade são eles os controlados, os que são espiados. Como apontado
anteriormente, ao interagir com o programa, o indivíduo passa informações. A emissora passa
a conhecer a massa dos espectadores, quais atitudes aprovam, quais desaprovam. Dessa
maneira, por exemplo, ela pode produzir novos produtos que atendam estas tendências.
A autora levanta a hipótese de que os serviços acima citados, como por exemplo, o
video-on-demand e o home-banking, oferecidos onde a TV digital foi implantada, talvez
sejam os motivos do fracasso da televisão interativa nesses países. Além disso, ela defende
que o potencial criativo da televisão brasileira, demonstrada pela TV aberta, podem ser um
diferencial do Brasil. No entanto, ela alerta que o sucesso dessa nova forma de televisão
depende de conteúdos atrativos e específicos para mídia interativa que atraiam os
telespectadores. Segundo sua argumentação, as narrativas interativas podem incentivar o
sucesso dessa nova mídia em nosso país, dada a tradição em produção de telenovelas, que são
de certa forma, interativas, na medida em que são escritas à medida que são transmitidas, de
acordo com o índice de audiência. A proposta das novelas interativas, ou narrativas
interativas, uma narrativa não-linear, é acostumar o telespectador a assistir televisão de
maneira ativa, na qual cada um vai construindo sua própria narrativa.
2.5.3. A interatividade do ponto de vista tecnológico.
O pesquisador e professor da USP, José Manuel Moran, analisa o processo de
convergência entre televisão e Internet e o discurso da interatividade da TV digital de um
modo crítico, do ponto de vista tecnológico. Da forma como a conhecemos até hoje, a
televisão é um meio parcialmente analógico inserido num universo audiovisual digital. A
Internet, um meio digital, por sua vez, avança em todos os campos da sociedade, desde o
econômico até o educacional. Segundo ele, expressões como e-commerce, e-business, e-
20
Para mais detalhes ver CANDELORI, 2003.
77
learning denotam a ampliação do comércio, dos negócios e da educação virtuais. A televisão
digital e o computador desenvolvem-se paralelamente, o que possibilita a transferência de
dados, áudio e vídeo simultaneamente a grandes velocidades. De acordo com o autor, a
necessidade de desenvolver serviços multimídia exige a renovação da televisão e,
conseqüentemente, a sua convergência. Esta se inicia com a TV por assinatura, via cabo ou
satélite, a fibra ótica e a compressão de sinais digitais como o MPEG –, permitem maior
escolha e até a compra de produtos diretamente, algo impossível anteriormente. A partir do
broadcasting da TV a Internet incorpora um novo conceito, o digicasting, ao transmitir sons e
imagens, o que obriga à TV a inclusão de softwares que permitam a navegação mais livre, o
acesso a banco de dados junto com as narrações da televisão, fazendo com que a navegação
pela televisão se torne mais próxima à navegação na Internet, e que, pela primeira vez, a
televisão se transforme num caminho de duas mãos e, potencialmente, muito mais interativo.
Atualmente muitas aplicações estão sendo testadas, e segundo Moran (2002), os
maiores destaques são para o video-on-demand e o pay per view. O primeiro permite a
escolha de filmes, programas gravados e vídeos, na hora que o espectador desejar. A segunda
aplicação diz respeito à programação exibida em vários canais pagos exclusivos, nos quais o
telespectador pode escolher o ângulo de transmissão, o horário de acesso, informações
complementares, serviços integrados (compra, pacotes financeiros), a criação de ambientes de
comunicação virtuais (jogos on-line, grupos de afinidade). Em geral o canais esportivos,
infantis, musicais e eróticos. Também se oferece acesso à Internet por canais de TV por
assinatura. Dessa forma, a televisão passa a incorporar a interatividade da Internet e a Internet
está ampliando sua rapidez de transmissão para transmitir também televisão em tempo real, a
la carte, permitindo interações de áudio e vídeo que antes eram impossíveis. O autor conclui,
então, que muitas das possibilidades da televisão provêm da transmissão digital, de sua
aproximação com o computador.
De acordo com Moran (2002), a televisão digital pode ser de alta definição ou normal.
A TV de alta definição é uma forma de transmissão com definição de imagem muito maior do
que conhecemos até agora, com uma proporção de tela mais adequada à vista humana (16x9,
contra os 4x3 atuais), além de cinco canais digitais de áudio. Além dessas características, a
tecnologia digital possibilita à emissora transmitir mais de um programa no mesmo canal.
Tecnicamente existem cinco possibilidades diferentes de transmissão: 1) transmitir um único
programa em alta definição (HDTV); 2) um programa em alta definição e outro em baixa
definição (LDTV) esta última é mais adequada para aparelhos celulares de terceira geração;
3) um programa em alta definição e um programa em definição padrão (SDTV) similar à das
78
TVs analógicas atuais; 4) quatro programas em definição padrão, de tela larga (16x9); 5)
quatro programas em definição padrão (SDTV) e um em baixa definição (LDTV). De acordo
com o autor, a TV de alta definição ocupa o dobro de largura de banda de transmissão,
enquanto que a TV digital normal permite que vários sinais digitais trafeguem no mesmo
espaço. Com isso, é possível que onde hoje passa uma freqüência possam passar de quatro a
seis canais digitais convencionais. Isto significa, por exemplo, que o espectador poderá
escolher entre diversas imagens que lhe são enviadas de um mesmo evento. Mas implica
também, na prática, que as emissoras acabam de ganhar novos canais: em dia, três novos
para cada emissora existente. Existe, ainda, a possibilidade de a televisão utilizar uma parte da
freqüência de transmissão supérflua ou residual para enviar dados, com velocidade 350 vezes
superior a de um modem de 56k utilizado nos computadores. Isso abre a possibilidade para
que muitos serviços interativos que rodam na Internet sejam integrados à transmissão do
conteúdo televisivo.
Os sinais de televisão, como nós os conhecemos hoje, analógicos, chegam até nós de
três formas: 1) por uma antena comum; 2) por cabo ou antena de microondas; e 3) por uma
parabólica apontada para um satélite. Estas duas últimas formas de transmissão são pagas. A
primeira a TV aberta, como é chamada – é gratuita. Com a TV paga o número de canais foi
multiplicado por 30, em dez anos. Na TV aberta 100% das receitas são provenientes de
anúncios publicitários, enquanto na TV paga mais de 80% vêm de assinaturas. De acordo com
Moran (2002), as empresas de televisão conseguiram fazer um acordo para definir padrões e
protocolos em HTML para TV, o que permite aos criadores de conteúdo entregar a
programação em todos os formatos e meios de transporte (análogo, digital, por cabo e satélite)
para difusão pela Internet. Com isso, a televisão se parece mais com a Internet e a Internet
começa a se aproximar da qualidade da TV, com mais interatividade e não rodará
exclusivamente em computadores, mas em laptops, palmtops, celulares, eletrodomésticos,
ampliando de forma inimaginável o acesso, a mobilidade, a liberdade de conexão. A intenção
é intensificar a convergência entre televisão e Internet, fazendo com que programas que
rodam na Internet sejam compatíveis com os de produção de televisão. É isso, segundo o
autor, que se prepara com a chegada da TV digital: plataformas comuns e intercambiáveis de
navegação pela TV/Internet ou pela Internet/TV, com muitos mais serviços, interação e
negócios. Outro aspecto importante é que as TVs por assinatura e os telefones celulares
estão se adequando à tecnologia digital, pois existe um forte consenso de que a telefonia
móvel integrará telecomunicações e radiodifusão quando se fala em novos negócios. Segundo
79
ele, as aplicações oferecidas pela TV digital possibilitarão, de maneira interativa, a recepção
de notícias e a visualização de programas de TV em palmtops e celulares de terceira geração
que poderão vir a serem aparelhos de TV móvel e portátil.
Para Moran (2002), o processo que hoje observamos diz respeito a passagem de um
conceito de televisão com programação de entretenimento e informação para uma televisão de
serviços vendas, Internet, home-banking aproximando-se rapidamente de computador em
rede. De uma televisão que recebíamos praticamente tudo pronto, cada vez mais temos a
possibilidade de “participar”: desde o simples controle remoto ao pay per view. Podemos
passar de uma televisão que organiza o nosso tempo para uma programação a la carte, onde
poderemos escolher assistir muitos programas na hora que nos for mais favorável.
A situação atual da TV digital ainda é de relativa incerteza, tanto com relação a sua
implantação quanto a adesão dos usuários a ela e aos seus serviços interativos. A Inglaterra é
o país em que ela está evoluindo com maior rapidez. Nos Estados Unidos ela avança em ritmo
lento, abaixo do previsto. No Brasil apenas recentemente foi definido a adoção do padrão
japonês de TV digital e encontra-se ainda em seus estágios iniciais de desenvolvimento. A
reação do telespectador as mudanças possibilitadas pela TV digital ainda são incertas. Para
Moran (2002), ainda estamos em uma fase em que a TV e o computador exercem funções
bem diferentes. Por exemplo, serviços bancários avançam mais rapidamente na Internet do
que na TV digital. Até o momento, o computador é visto como um meio mais privado que a
televisão e mais adequado para esse relacionamento. No entanto, o autor identifica que nos
últimos anos cresceu significativamente a participação do público na elaboração dos
programas de TV. Isto é, através do auxílio indireto de outros meios ou veículos. É importante
lembrar, como Joly (2001) esclareceu anteriormente, que esta é uma participação reativa do
público e não interativa. Além do telefone, usado com sucesso em programas como Você
decide e Intercine, da Rede Globo, a Internet também tem sido bem aproveitada para a
interação, como nos programas jornalísticos da TV Cultura Opinião Brasil e Roda viva, entre
outros. A conclusão a que se chega após analisar o quadro atual da TV digital é que existe
uma grande diferença entre o que é possível tecnologicamente e o que é comercialmente
viável.
Cada vez mais as tecnologias de comunicação permitem escolhas. No entanto, na
prática, existem muito mais possibilidades de interação do que interações efetivas. De acordo
com Moran (2002), existe uma espécie de acordo ‘tácito’ entre produtores e consumidores:
são oferecidas muitas alternativas na área do entretenimento (como filmes e jogos) e de
80
serviços (telemarketing, home-banking) do que em outros campos, como o da informação ou
de debates. O desenvolvimento de tecnologias pessoais, móveis e interativas, proporciona
mudanças significativas nas formas de trabalho, lazer, de comunicação com pessoas próximas
e distantes. Frente a esta expansão das tecnologias encontramos tanto o deslumbramento com
elas com discursos que afirmam que elas poderão resolver os grandes problemas que nos
afligem e que as tecnologias diminuirão as desigualdades sociais, democratizarão o acesso aos
bens culturais e econômicosquanto discursos críticos e radicais – defendendo a posição que
elas acentuam a acomodação das pessoas, enquanto aumentam o individualismo e a alienação.
No entanto, nenhuma dessas posições podem nos ajudar a compreender como lidar com as
tecnologias. Para o autor, nenhuma tecnologia é inocente. Elas são introduzidas na sociedade
por grandes grupos econômicos, com o intuito de facilitar a nossa vida. Passada a fase inicial
de resistência, o seu uso torna-se majoritário e é imposto socialmente.
Moran (2002) argumenta que é possível criar múltiplos e diferenciados usos para as
tecnologias, pois nisso residiria o seu encantamento e o seu poder de sedução. Ele defende a
idéia de que é possível fazer coisas diferentes com as mesmas tecnologias. Além disso, o
autor destaca que cada tecnologia modifica algumas dimensões da nossa inter-relação com o
mundo, da percepção com a realidade. A extrema redução de tamanho das tecnologias de
comunicação possibilita uma grande mobilidade, personalização que facilitam a
individualização dos processos de comunicação. Essas tecnologias portáteis expressam
claramente a ênfase do capitalismo no individual sobre o coletivo, na valorização da liberdade
de escolha, de acordo com a vontade do indivíduo e das leis de mercado.
O autor identifica que assim como se discute nos dias atuais com a digitalização e as
possibilidades de convergência de televisão e Internet, também se afirmavam sobre as
possibilidades educacionais e culturais do rádio, do cinema e da televisão quando de seu
surgimento. No entanto, estes meios são apropriados pelo capitalismo, que os industrializam
buscando o lucro, os levando ao predomínio de conteúdos de entretenimento e as formas de
comunicação mais dirigida do que participativas. Portanto, sua conclusão é que as limitações
a interação não eram principalmente técnicas, assim como atualmente também não são, mas
da forma de organização empresarial capitalista.
2.6. Segunda passagem – conclusões.
81
A compreensão dos reality-shows como um todo, e em especial do Big Brother,
necessariamente passa pelo conhecimento dos diversos aspectos que caracterizam a televisão,
principalmente no período da globalização, em que surgem novas possibilidades, entre elas a
convergência entre diferentes mídias. Nesse sentido, faz-se necessário realizar uma crítica à
televisão como meio de comunicação, a fim de desfazer o véu ideológico que a envolve e
destacar os elementos que estruturam o seu funcionamento. A exceção de Joly (2001, 2003),
que é uma entusiasta das possibilidades abertas pela TV Digital, os autores reunidos neste
capítulo têm em comum a visão crítica da televisão como meio de comunicação, cada um
destacando um aspecto de seu funcionamento, demonstrando a falsidade da tese de que a
televisão é um meio de comunicação neutro, isento e sem conseqüências.
A análise de Adorno (1969, 1971) tem importância por desvendar suas possibilidades
e seu funcionamento dentro do modo de produção em que ela esinserida. Portanto, o autor
defende que a televisão deve ser compreendida em sua totalidade, e não a partir de aspectos
isolados, pois não se trata apenas de um meio de comunicação neutro e imparcial, mas sim de
um meio tecnológico. Com isso, a análise adorniana fornece uma nova dimensão para o
estudo da televisão, desvendando os contornos do véu tecnológico que a envolve. Ele
demonstra que as imagens televisivas não transmitem apenas a realidade dos fatos, mas
realizam uma série de mediações e intervenções. Isto mostra novamente a falsidade da
imagem de aparente neutralidade desse meio e desvenda mais um traço do véu tecnológico
que o envolve.
Para o autor, o meio não tem a função de veicular algo novo, uma linguagem original,
mas trabalha oferecendo fluxos de imagem e sons em sintonia com a necessidade de reforçar
as formas de consciência predominantes em uma época, necessidade esta proveniente da
totalidade do sistema. A crítica à televisão como meio de comunicação leva Adorno (1969,
1971) a concebê-la como forma, isto é, como meio apto a ser explorado pelo capital, isto
determina sua forma, ou seja, suas possibilidades, seu funcionamento. Não se trata de
ideologia, mas sim de seu modo de produção.
Giovanni Sartori (2001) defende que a televisão rompe com o sistema de comunicação
existente em razão do ver predominar sobre o falar, que é transformado em elemento
secundário, pois está em função da imagem. Este é um acontecimento de grande importância.
82
Como principal conseqüência, provoca uma mudança no telespectador, que passa a ser mais
um animal ‘vidente’ do que um animal simbólico, isto é, a coisa representada por meio de
imagens tem mais importância do que coisas ditas por palavras. Segundo ele, a televisão não é
a simples continuação dos meios de comunicação que a precederam, ela nos conduz a uma
realidade radicalmente nova. Ela é primeiramente uma substituição que derruba a relação
entre o ver e o entender. A tese central do autor é que a televisão não é somente um
instrumento de comunicação, ela ao mesmo tempo é um meio que gera um novo tipo de ser
humano, isto é, que altera sua natureza, transformando o homo sapiens produzido pela
cultura escrita em homo videns no qual a palavra e a capacidade de abstração dão lugar à
imagem. De acordo com Sartori (2001), a televisão inverte o progredir do sensível para o
inteligível, isto é, o pensamento através de conceitos, provocando um retorno ao puro e
simples ver. Ele argumenta que, na realidade, ela produz imagens e apaga conceitos,
atrofiando nossa capacidade de abstração e também nossa capacidade de compreensão. A
análise do autor se estende a outros meios de comunicação e às possibilidades da nova ‘era
digital’. Contudo, ele relativiza a vantagem interativa da Internet sobre a televisão, pelo fato
de que desde pequenos somos acostumados intensamente com a passividade televisiva. Para
ser interativo, argumenta o autor, é necessário ser mentalmente ativo desde o começo.
Umberto Eco (1984), por sua vez, analisa o significado das modificações pelas quais a
televisão passou desde o seu surgimento até a época em que escreveu o ensaio analisado neste
capítulo. Para tanto, ele estabelece uma distinção entre dois tipos diferente de televisão, a
partir dos conceitos de Paleotelevisão e Neotelevisão. O primeiro diz respeito ao modelo
tradicional de TV aberta, que visa a mais ampla audiência, que possa consumir os produtos
que ela anuncia. O segundo tipo se caracteriza pela segmentação da audiência, pelo discurso
voltado para si mesmo e de sua interação com o público sua característica mais distinta.
Alguns autores apontam a superação da neotelevisão, afirmando que vivemos agora na era da
pós-televisão. Castro (2006), como veremos adiante, afirma que desde o Big Brother a
televisão mundial encontra-se em um novo momento, dirigindo-se a públicos cada vez mais
diversificados. Cada vez mais os programas são híbridos entre realidade e ficção, utilizando-
se de dos diversos meios de comunicação (como telefone e Internet). O ponto central da
argumentação de Eco (1984) é a diferença entre fatos que aconteceriam mesmo se a televisão
não existisse e fatos que ‘acontecem’ pelo fato de ela existir. Relacionada a este aspecto está a
transformação, sofrida por ela, de um ‘veículo de fatos’ neutros para um ‘aparato para a
produção de fatos’, isto é, passando de uma espécie de espelho da realidade para um produtor
83
da realidade. Ele constata que, no limite, a televisão interpreta o fato para o telespectador,
devolvendo-lhe um ponto de vista.
A idéia central desenvolvida por Pierre Bourdieu (1997) é a análise das conseqüências
trazidas pela pressão comercial sobre a televisão e desta, em decorrência de seu grande peso
simbólico e econômico, nos demais campos da produção cultural, modificando-os. A
principal contribuição dele é sua crítica à televisão enquanto meio de comunicação. De acordo
com o autor, ela não é um meio que comunica, mas é fundamentalmente um lugar de
exibição. Um lugar em que as pessoas se dirigem para verem e serem vistas. Este dado traz
como conseqüência a modificação da forma como se faz televisão contemporaneamente. Os
reality-shows exploram essa potencialidade ao máximo, pois operam a partir da proposta da
observação de pessoas anônimas nas mais diversas situações e estas, por sua vez, aceitam
participar para serem vistas pelos outros, por sonhar em serem famosas.
Bourdieu (1997) desvenda o funcionamento de importantes mecanismos que atuam
sob a televisão, antes mesmo dos conteúdos serem exibidos, e que exercem um grande papel
no resultado final de todas as mediações. Dentre eles destaca-se a censura invisível que atua
sobre o que a televisão vincula. Esta se dá através da perda da autonomia em função das
condições de comunicação serem dadas e a limitação quanto ao tempo, ou ainda, pela censura
econômica exercida por proprietários, anunciantes e até mesmo o Estado, o que acarreta uma
série de mediações e conseqüências sob o que é exibido por este veículo. O autor conclui que
a autoridade conferida pela TV pode mudar a lógica interna de um campo, especialmente pela
inserção do ‘peso’ da economia em determinado campo.
Além da crítica à televisão como meio de comunicação, é preciso também
compreender como se configura a TV na era da globalização, ou ainda, quais as
possibilidades abertas para o futuro da televisão a partir do processo de globalização. A este
respeito, muitos autores compartilham da tese de que o futuro está na convergência das
características do computador pessoal com a Internet e a televisão. Neste sentido, Capparelli;
Ramos; Santos (2000) realizam um importante mapeamento das mudanças estruturais em
curso na televisão, a partir de perspectiva da convergência desta com as telecomunicações e
com a Internet. Assim, os autores analisam as movimentações globais e locais das indústrias
de telecomunicações e a adaptações dos modelos reguladores do mercado. Para Joly (2001),
esta convergência se materializa especificamente na TV Digital, que tem como uma de suas
principais características a interatividade. A autora argumenta que ela combina o
envolvimento do espectador proporcionado pela TV, com acesso à diversidade de informação
84
como na Internet, podendo fornecer uma programação de qualidade e interativa. José Manuel
Moran (2002) compartilha do argumento de que a convergência de televisão e Internet se
materializa com a TV Digital. Ele investiga as diversas possibilidades tecnológicas de
interação permitidas por essa televisão. Todavia ele conclui que os impedimentos para a
interatividade não são apenas de ordem técnica, mas da forma de organização empresarial
capitalista.
A partir do panorama traçado acima é possível afirmar que os reality-shows são
exemplos de programas que se servem da convergência das mídias como forma de ampliar a
participação da audiência. No caso estudado, o Big Brother Brasil, o programa usa de
recursos interativos através da Internet, do telefone fixo e do celular, além dos canais pay per
view disponíveis aos telespectadores de TV por assinatura. O site do programa permite a
votação para a eliminação de um dos participantes, além de jogos e chats entre os
telespectadores. Os telefones, tanto o fixo quanto o celular, são usados para que o espectador
escolha o participante a ser eliminado e em outras oportunidades em que ele é convidado a
intervir no desdobramento do programa. Todas essas características de interação e intervenção
no desenvolvimento da narrativa do programa nos permitem afirmar que este programa
delineia o que pode vir a ser a TV digital/ a televisão na era da globalização.
85
3.
3.3.
3. Possibilidades da TV na era da globalização:
Possibilidades da TV na era da globalização: Possibilidades da TV na era da globalização:
Possibilidades da TV na era da globalização:
os reality
os realityos reality
os reality-
--
-shows
showsshows
shows
86
3.1. As origens dos reality-shows.
A partir do final da década de 1990 as televisões de todo o mundo foram sacudidas por
uma onda de programas de significativo sucesso de audiência e rentabilidade comercial. Uma
característica comum é que ela também foi protagonista de muitas polêmicas em torno da
qualidade da programação televisiva e ditou a pauta de boa parte da mídia. Programas como
Survivor, Big Brother ou Operación Triunfo, entre muitos outros, eram vendidos como a
maior novidade da programação televisiva dos últimos tempos. Estes programas passaram a
ser denominados reality-shows por terem como principal atração a participação de pessoas
anônimas, submetidas a diferentes situações pretensamente reais. Apesar de toda a
propaganda em torno da “novidade”, de que eles estariam colocando em cheque as formas
tradicionais de televisão, estes programas não são exatamente um formato novo. A partir das
varias características como, por exemplo, a vigilância consentida de câmeras de televisão,
ou a auto-vigilância – exploradas pelos atuais programas que levam essa denominação, alguns
dos autores consultados propõem reconstruir a história desse tipo de show televisivo. Eles
identificam precursores dos reality-shows tanto na televisão pública européia e norte-
americana quanto na televisão brasileira, que também traz alguns elementos difusos que,
pode-se dizer, confluíram para dar forma aos atuais programas.
O professor Arlindo Machado, em artigo publicado no ano de 2002, assinala alguns
programas que podem dar algumas ‘pistas’ para remontar o passado dos reality-shows. A
primeira referência possível levantada pelo autor é o programa Candid Camera, de Allen
Funt, exibido nos anos 1940, na televisão norte-americana. O programa consistia em observar,
através de câmeras escondidas, situações cômicas ou vexatórias, preparadas pela produção,
sem que seus protagonistas soubessem que estavam sendo filmados. Este programa também
pode ser apontado como um dos antecessores das ‘pegadinhas’ do Silvio Santos e do Sérgio
Malandro. Mas, na verdade, este gênero televisual, se é que podemos chamá-lo assim, é
derivado de um programa de rádio chamado Candid Microphone, do mesmo Allen Funt.
Nenhuma grande novidade, portanto.
A primeira experiência explicita de vigilância consentida, de acordo com os diversos
autores que se propuseram a reconstruir a história dos reality-shows, foi o programa An
American Family, exibido em 1973, pela rede de televisão pública norte-americana PBS. Ele
deu origem ao gênero ‘televisão-verdade’. O programa baseava-se na observação minuciosa
87
da privacidade da vida cotidiana de uma família americana, através de câmeras de televisão
durante sete meses seguidos. Ele foi relativamente bem sucedido para sua época, tendo sido
assistido por 20 milhões de pessoas. Este polêmico seriado acabou por mostrar o que acontece
quando um grupo de pessoas é submetido sistematicamente ao olhar voyeurista das câmeras.
No ano seguinte foi produzido, na Inglaterra, um programa similar, chamado The Family.
De acordo com Machado (2002), a idéia de auto-vigilância é incorporada por outro
‘gênero’ televisual. São as chamadas ‘vídeo-cassetadas’, como são conhecidas no Brasil, mas
sua matriz tem inspiração na série America’s Funniest Home Videos, iniciada em 1990, pela
rede ABC. O conceito destes programas é que tudo o que acontece está potencialmente apto a
aparecer numa tela de televisão. Para o autor, em última instância, todos nós fazemos parte
desse Big Brother permanente e universal e, a qualquer momento, nossa vida privada pode
estar sendo mostrada através da televisão. Ainda tendo a televisão norte-americana como
referência, podemos ressaltar o programa The Real World, produzido pela MTV, em 1992.
Ele misturava realidade e ficção ao mostrar a vida de um grupo de jovens, durante seis meses,
através de câmeras ocultas. Este programa merece destaque, pois a partir dele o gênero ganha
dimensões comerciais. Ele também foi exibido no Brasil, com o nome Na real, alguns anos
depois.
Cosette Castro (2006), retomando a periodização elaborada por Umberto Eco (1984),
destaca o aparecimento dos reality-shows nas televisões públicas européias no período da
paleotelevisão período em que havia apenas TVs públicas na Europa no final dos anos
1960 e início dos anos 1970, especialmente na Alemanha, Inglaterra e Itália. Estes, inclusive,
foram os primeiros países a transmitir esse gênero televisivo em suas televisões públicas.
Após a desregulamentação do meio audiovisual europeu e o aparecimento dos canais
privados, nos anos 1990 período em que começa a neotelevisão na Europa os reality-
shows se expandem em diferentes faixas horárias em busca de novas audiências. A autora
destaca, ainda, que este gênero, e suas variações, sobrevivem a três fases distintas na
televisão, a saber: 1) os anos 1970, quando a TV se voltava para as pessoas, em busca de
audiência; 2) os anos 1980, quando as audiências começam a ir até a televisão e contar as suas
vidas e problemas; 3) os anos 1990, quando as exigências de recuperar os investimentos, de
produzir programas de baixo custo e aumentar as audiências possibilitaram o aumento da
produção de reality-shows, nos quais as pessoas expõem a vida privada no espaço público.
A partir de certo conceito de realidade (mostrar a realidade dos fatos, “a vida como ela
é”), ou ainda da mistura de ficção e realidade, também é possível identificar alguns programas
como precursores dos atuais reality-shows. Cosette Castro (2006), por exemplo, faz um
88
levantamento de diversos programas da TV brasileira que trabalham com este conceito. No
jornalismo, ela aponta o Aqui Agora, do SBT, lançado em 1991, como um precursor dos
reality-shows no Brasil. Outros programas similares vieram na seqüência, como o Cidade
Alerta, da Record, e outros. A Globo, em 1990, cria o Linha Direta, misturando ficção e
realidade. Essa tendência se estende também a programas de auditório, como o Programa do
Ratinho, do SBT, desde 1998. Além dos programas citados, não podemos deixar de lado
também o programa Você Decide, da Rede Globo, exibido de 1992 até o ano 2000, que pela
primeira vez na televisão brasileira propunha ao público a escolha do final de uma história
dramática.
O rótulo de reality-show é usado não apenas pelos autores aqui consultados, mas
freqüentemente também pelos meios de comunicação para designar uma ampla gama de
programas televisivos, o que nos conduz a problematizar o seu uso indiscriminado. A
tentativa de filiar estes programas a uma espécie de ‘história da televisão’, por exemplo, como
deixam transparecer os autores acima, nos permite interpretar que os reality-shows são uma
conseqüência natural da televisão e, portanto, não há nenhuma novidade. No entanto, eles não
são o produto natural do meio, e sim produtos do atual estágio do capitalismo globalizado.
Como demonstramos nos capítulos anteriores, o processo de convergência de tecnologias e
fusão de empresas de diferentes setores gerou a globalização, que por sua vez, provocou
importantes mudanças no meio televisivo. Deste modo, proponho estabelecer uma divisão
destes programas entre o conceito de reality-show e, por exemplo, conceito de ‘televisão-
verdade’. Este, diz respeito a programas que se baseiam em determinado conceito de
realidade, estão centrados na participação de pessoas comuns e não em profissionais de
televisão, não possuem um roteiro pré-determinado dos acontecimentos. Fazem parte, se
quisermos, de uma evolução natural do meio e, portanto, não apresentam nenhuma novidade
enquanto formato. Grande parte dos programas que atualmente levam o rótulo de reality-show
e também aqueles assinalados anteriormente como sendo seus predecessores fazem parte
desta classificação. O reality-show, para os fins deste trabalho, diz respeito a um tipo
específico de programa televisivo surgido a partir da década de 1990, que opera não apenas na
televisão, mas em múltiplas plataformas (como a Internet e a telefonia tanto fixa quanto
celular). A sua principal característica é a interação do telespectador com o conteúdo,
alterando os rumos do programa. Isto é, são programas de televisão que se baseiam na
convergência de diferentes tecnologias de comunicação, portanto, só se tornam possíveis na
etapa globalizada do capitalismo. Desse modo, o que se altera não é o formato do programa,
89
mas o meio em que ele passa a ser veiculado, permitindo que se prenda ainda mais a atenção
dos espectadores nos produtos veiculados pela indústria cultural globalizada. O melhor
exemplo desta classificação é o programa Big Brother
21
, objeto de estudos desta pesquisa.
Como veremos no andamento do capítulo, ele é produzido para ser consumido em TV aberta
e por assinatura, telefone fixo ou celular, além da Internet.
3.2. A Endemol: uma empresa de entretenimento inserida no processo de globalização.
Uma das principais empresas envolvidas no recente episódio dos reality-shows é uma
produtora independente, de origem holandesa, chamada Endemol. Ela surgiu a partir da fusão
dos dois principais produtores de televisão da Holanda, Joop van den Ende e John de Mol, em
1994, com o objetivo de formar uma empresa global. O grupo formado cresceu rapidamente e
se expandiu para se tornar uma empresa líder em criação de formatos e produção. Atualmente
ela está presente em 25 países, dos cinco continentes. Ela é uma der global em televisão e
entretenimento audiovisual, conforme afirmação do site da produtora. Os principais mercados
em que atua são: Estados Unidos, Reino Unido, Itália, França, Alemanha, Espanha e Holanda.
Seu modelo de negócio reside na associação da produtora com as principais emissoras e/ou
produtoras de cada país onde atua. A partir de então ela cria programas e desenvolve toda a
produção, que envolve desde o cenário até o posicionamento das câmeras. Depois ela vende o
formato pronto e recebe os royalties pela exibição e pelos licenciamentos que o produto gera.
Com o apoio de empresas locais, ela produz tudo e realiza as adaptações necessárias para o
gosto do público
22
. Ela mantém equipes de criação que não apenas geram novos conceitos e
programas, mas também adaptam os formatos existentes para as audiências locais. Estas
equipes operam a partir do conceito desenvolvido pela produtora Think Global, Act local, que
pode ser traduzido como “pense globalmente, atue localmente” (CIRELLI, 2006). Aat
Schouwenaar, presidente do conselho da Endemol, a define como uma empresa que cruza o
21
Podemos observar, através das informações do Anexo B, que a interação, especialmente pela Internet, com o
programa é um de seus principais aspectos.
22
Antes de sua exibição, os programas são adaptados de acordo com a cultura local onde serão exibidos e de
acordo com o blico-alvo (target) focado pela emissora que compra os direitos dos formatos, como veremos
adiante com a análise do Big Brother.
90
conceito global com aplicações locais, explorando idéias criativas de programação
desenvolvidas em um determinado país que possam ser estendidas ao resto do mundo
(COMIN, 2004).
Conforme apresenta o site oficial da Endemol, a produtora cria conteúdos que
abrangem programas com roteiro, como dramas, comédias e novelas; programas sem roteiros,
que incluem reality-shows ou TV realidade, game-shows e programas de talentos; e também,
produtos de dia digital, isto é, licenciamento dos principais programas da Endemol,
incluindo toques de celulares (ringtones), papel de parede para PCs, fluxos de vídeo
(streaming) dos programas para Internet e celulares, jogos on-line e para celulares. De acordo
com dados da produtora holandesa, nos últimos cinco anos, ela criou mais de 100 novos
formatos a cada ano e possui uma biblioteca de mais de 1200 formatos sem roteiro e mais de
150 títulos. São exemplos de reality-shows produzidos por ela o Big Brother, Operacion
Triunfo
23
, Extreme Makeover: home edition
24
, The Farm
25
, Kid Nation
26
, The Big Donor
Show
27
. Além destes, ela também produz alguns game-shows muito conhecidos, como Fear
Factor
28
, Deal or no Deal
29
e Who Wants to be a Milionaire
30
. Este conjunto de atividades
desenvolvidas pela Endemol evidencia a existência de um novo tipo de empresa, de atuação
global, que necessita de certas condições sociais e materiais. A própria empresa pode ser
considerada como um fenômeno novo, sintomático da globalização, pelo segmento de
atividades e de produtos em que ela atua. Assim, é de grande importância para este trabalho
compreender o funcionamento de uma produtora com estas características.
O crescimento da empresa em dimensões globais foi possível a partir do programa Big
Brother, criado por John de Mol, em 1999. O programa rapidamente alcançou índices
23
Exibido em mais de 50 países, a versão nacional chamou-se Fama e foi exibida pela Rede Globo, entre 2002 e
2004, e produzida através da joint-veture Endemol Globo S/A. Os participantes competem e desenvolvem suas
habilidades artísticas. Foi inicialmente produzido na Espanha, tornando-se rapidamente um grande sucesso de
audiência.
24
Série exibida pela rede americana ABC e pela People&Arts, no Brasil. Feita sob encomenda da rede Sears
(CIRELLI, 2006). Ver adiante.
25
Reality-show que mistura confinamento e a subsistência de pessoas famosas, exibido apenas na Europa. A
versão italiana do programa foi filmada no Brasil, com o apoio logístico da Endemol Globo S/A (JACINTHO,
2005).
26
Controvertido reality-show que reuniu diversas crianças em uma cidade, com mínima interferência de adultos,
com o objetivo de reproduzir uma pequena organização social (FREITAS, 2007).
27
Reality-show holandês que causou polêmica por ter como tema a doação de um rim de uma pessoa doente,
para ser ‘escolhido’ entre três pessoas que necessitavam de doação (PADIGLIONE, 2007b).
28
No Brasil foi exibido pela Rede Globo com o nome de Hipertensão. Causou polêmica na opinião pública
pelas condições a que eram submetidos os participantes (JACINTHO, 2002).
29
Exibido pelo SBT com o nome ‘Topa ou o Topa’. É um programa de grande sucesso em 48 países e o 17º
mais visto nos EUA (CASTRO, D., 2006).
30
Um dos programas de maior sucesso da Endemol, junto com Big Brother, Operacion Triunfo e Deal or no
Deal. O SBT fez uma versão similar com o nome Show do Milhão.
91
expressivos de audiência na Holanda, tanto em TV aberta quanto em telefonia e número de
acessos ao site oficial. Em apenas dois anos, período relativamente curto de tempo, o
programa havia sido vendido para 21 países
31
. Como conseqüência da visibilidade obtida
com o programa, em março de 2000 a empresa foi adquirida pelo grupo espanhol Telefónica,
por US$ 5,3 bilhões, antes do estouro da bolha de tecnologia. O objetivo do grupo, na época,
era ter uma empresa com experiência na produção de conteúdos para televisão e que
operassem com a convergência de diferentes tecnologias, o que era então apontado como uma
das principais tendências no mercado de telecomunicações. A compra da empresa pela
Telefónica destaque à trama dos negócios globais, especialmente no setor de
comunicações. A fusão das empresas aponta para as novas possibilidades dos meios de
comunicação possibilitadas pela globalização, como enfatizamos no primeiro capítulo.
Enquanto o mercado de entretenimento estava em crise, a Endemol apresentou 73,4% de
crescimento em 2001 (MATTOS, 2001). O faturamento mundial, no ano 2000, foi de EUROS
520 milhões. Neste mesmo ano ela havia produzido cerca de 300 programas, ficando no ar
aproximadamente 14 mil horas, se somada as edições dos vários países. A Endemol
Internacional encerrou o ano de 2002 com um faturamento de US$ 935 milhões
(PARAJARA, 2003). no ano de 2003 ela movimentou 868,8 milhões de euros (COMIN,
2004). Em maio de 2007 um consórcio formado pelo grupo Mediaset, do premie italiano
Silvio Berlusconi, o banco Goldman Sachs e John DeMol, comprou por US$ 3,56 bilhões a
participação da Telefónica na Endemol. Entre os grupos interessados na compra estavam a
Televisa, o grupo Disney e a News Corp (PADIGLIONE, 2007).
Em 2001 a Endemol forma uma joint-venture com a Rede Globo de Televisão, a
Endemol Globo S/A, a fim de viabilizar a produção do Big Brother nacional, além de vender
outros programas de seu catálogo. De acordo com o Ato de Concentração, expedido pelo
CADE, o objetivo da parceria é “[...] desenvolver, explorar, licenciar e produzir programas de
televisão aberta, fechada e internet no Brasil [...]”
32
. Portanto, ela é caracterizada como uma
produtora brasileira de conteúdo, ou de propriedade intelectual, multi-plataforma, que tem a
televisão como o principal veículo. De acordo com Carla Affonso, gerente geral da Endemol
Globo, a empresa foi criada com três objetivos principais: trazer ao Brasil, com exclusividade,
os formatos produzidos pela Endemol em outros países; criar novos formatos para as TVs
brasileiras e estrangeiras; e produzir, no mercado nacional, formatos sob encomenda dos
31
O Big Brother foi exibido em vinte e um países antes de ser comprado pela Rede Globo, em 2002, para
produzir a edição nacional do programa (MENDONÇA, 2002).
32
Cf. Anexo A, p.145.
92
anunciantes (CIRELLI, 2006). De acordo com essa parceria a Rede Globo tem prioridade de
escolha dos formatos licenciados pela produtora, somente após a recusa da emissora é que os
mesmos podem ser apresentados a outros exibidores. É importante destacar, neste ponto, que
a Endemol Globo S/A é uma empresa nacional, com possibilidade de atuação no mercado
mundial. Ela é de fundamental importância para a compreensão do objeto desta pesquisa, pois
como destacado anteriormente, ela é uma empresa inserida na dinâmica da globalização. Sua
atuação articula o local e o global, através da adaptação de formatos produzidos em outros
países para o mercado nacional, além de ter a possibilidade de produzir programas no Brasil e
que possam ser exportados a outros países. A associação da Rede Globo com uma empresa
global como a Endemol é, como assinalamos no primeiro capítulo, uma característica da
época da globalização. Ela evidencia uma produtora global de televisão com associações
locais, além de destacar a proximidade de uma rede de televisão e indústrias transnacionais.
Além do reality-show ‘Big Brother Brasil’, a Endemol Globo tamm produziu o
‘Fama’ (Operaciòn Triunfo
33
), ‘Hipertensão’ (Fear Factor), ‘Acorrentados’, ‘Amor a Bordo’
(Love Boat) e ‘A Guerra do Sono’ estes três últimos foram apresentados como quadros no
programa Caldeirão do Huck, todos pela Rede Globo, a partir de 2002. Também foram
apresentados ‘Dança dos Famosos’
34
(Dancing with the stars) e ‘Circo do Faustão’
35
(Circus
with Celebrity), como quadros do programa ‘Domingão do Faustão’. A produtora também
produziu algumas atrações em outras emissoras além da Rede Globo. São exemplos os
programas ‘Na pressão’ (Choose or Lose!)
36
, em 2004, e ‘É o Amor’
37
(All You Need is
Love), na Rede Bandeirantes; no SBT foi produzido o ‘Topa ou não Topa’
38
(Deal or no
Deal). A Endemol Globo fez parcerias não em TV aberta como também em TV por
assinatura. Em 2003 o canal Multishow exibiu dois reality-shows da produtora holandesa:
Meet the Marks, no qual os espectadores são apresentados a uma família de classe média
americana, e Spy TV, que segue a linha de pegadinhas estilo Candid Camera (GALLO, 2003).
Através dessa parceria também foi produzido o programa La Fattoria, um reality-show
italiano, filmado no Brasil e exibido na Itália. A produção ficou sob responsabilidade da
33
Em 2002, a versão espanhola do programa bateu recorde de audiência na TVE, emissora pública do país. Um
em cada três espanhóis assistiu ao episódio final do programa (MATTOS, 2002). No Brasil foram produzidas 3
edições, as duas primeiras em 2002 e a última em 2004.
34
Foram produzidas 5 edições do programa, entre os anos de 2005 e 2008.
35
Originalmente produzido pela Endemol Portugal, também foi exibido em países como Itália e Argentina. Foi
ao ar em 2007.
36
Estreou em 2004 e foi a primeira produção da Endemol fora da Rede Globo (CASTRO, D., 2004f).
37
Iniciado em abril de 2008 e ainda permanece na grade de emissora.
38
O programa foi comprado pelo SBT em junho de 2006, reatando relações com a Endemol pela primeira vez
depois de deflagrada a disputa com a Rede Globo a respeito do programa Casa dos Artistas. (CASTRO, D.,
2006). Ainda figura na grade de programação da emissora.
93
Endemol italiana e a Endemol Globo deu o apoio logístico para a parceira. Além deste, ela
havia produzido um reality-show de transformação, exibido na Inglaterra, chamado Cosmetic
Surgery. O Fear Factor também foi filmado, pela Endemol, na Argentina para 18 países
diferentes (JACINTHO, 2005).
A Endemol também é considerada uma das maiores produtoras de programas sob
encomenda para anunciantes do mundo. Nos Estados Unidos, ela produziu o Extreme
makeover: home edition (exibido no Brasil pelo canal People&Arts) sob pedido da loja de
departamentos Sears, que visava renovar sua marca. No programa, uma pessoa recebe a
chance de ter sua casa completamente reformada e decorada. Ele custa à loja em torno de
US$1 milhão. Existem ainda exemplos em que o investimento não é tão alto. Na Holanda, o
programa 6 pack , patrocinado pela Heineken, uma produção simples onde jovens filmam o
que bem querem em situações inusitadas, de orçamento baixo, virou sucesso no país. Na
Inglaterra a operadora de celular Orange encomendou o Orange Playlist, no qual os artistas
falam de suas preferências musicais ao mesmo tempo em que os telespectadores participam
por meio de mensagens SMS (CIRELLI, 2006). Também na Holanda, a Endemol produz um
programa chamado Life in Cooking, patrocinado pela Unilever. É um talk-show sobre
comidas e tem o envolvimento dos produtos da empresa (COMIN, 2004).
De acordo com o presidente do conselho da Endemol, Aat Schouwenaar, a empresa
passa por uma mudança de visão: deixa de ser apenas uma produtora de TV para se tornar
uma provedora multimídia. O objetivo da empresa é produzir conteúdos para diferentes
plataformas, especialmente para telefonia celular e Internet (COMIN, 2004). Esta mudança de
visão da empresa é extremamente importante para a presente dissertação. Como vimos no
segundo capítulo, a televisão na época da globalização se configura a partir da convergência
entre diferentes tecnologias, diferentes plataformas. Assim, a Endemol apresenta-se como um
ator de fundamental importância para esta dissertação, pois, como vimos, ela atua a partir da
produção de conteúdos que, normalmente, tem a televisão aberta como base, mas que também
se articulam com a telefonia celular e Internet. Os exemplos apontados acima nos o
algumas pistas dessa mudança, mas na seqüência apontaremos algumas ações efetivas da
empresa neste sentido. Um exemplo é um seriado, produzido na Holanda, Bad Candy Was
Here
39
transmitido pelo canal infantil Nickelodeon e levado a celulares de terceira geração do
mundo todo por meio de um operador de serviço UMTS (Universal Mobile
39
O seriado mostra as integrantes da banda – que existe de fato – tentando agendar um megashow (PAGLIONE,
2005b).
94
Telecommunications System) (PAGLIONE, 2005b). Outro exemplo que pode ser citado é a
associação entre a Eletronic Arts e o Grupo Endemol para o desenvolvimento do Virtual Me,
um novo conceito de entretenimento digital que acaba com a separação entre a TV tradicional
e os videogames. De acordo com as empresas, o Virtual Me é a combinação de Avatar da
Eletronic Arts – com os formatos de TV populares – da Endemol – para dar aos consumidores
um meio inovador para se reunir, competir e fazer contatos sociais nos mundos digitais online
(BBC Brasil, 16/04/2007). Ainda, podemos destacar a parceria global firmada entre a
Ericsson e a Endemol para o desenvolvimento do aplicativo de TV interativa e conteúdo
gerado pelo usuário por meio da solução Me-on-TV
40
, da Ericsson. Esta tecnologia será
oferecida como serviço que pode incorporar a marca de agregadores de conteúdo como
emissoras, sites de Internet e operadoras de redes. O serviço foi implementado na Holanda
pela Endemol (Ericsson press release, 06/09/2007). Estas ações da produtora possibilitam o
esclarecimento das condições materiais (tanto com relação às dimensões do poder, do capital
quanto da tecnologia) do que é a globalização e como ela ocorre na área das
telecomunicações. No limite, elas nos apontam como se configura a TV na era da
globalização, ou ainda, em TV globalizada.
3.3. O Big Brother e a TV globalizada.
O programa de maior destaque dentre os reality-shows surgidos a partir do final dos
anos 1990 é, de acordo com diversos autores, o Big Brother. Sua primeira edição foi ao ar em
16 de setembro de 1999, na Holanda, através do canal Veronica e produzido pela produtora
holandesa Endemol. O programa oferecia um prêmio de US$ 120 mil ao último, de nove
participantes, a sair da casa em que estariam confinados por cem dias. Todos os
40
Me-on-TV é uma tecnologia para múltiplas redes e aparelhos, que permite ao consumidor fazer upload,
publicar e compartilhar vídeos gravados ou ao vivo por meio de qualquer aparelho móvel, de qualquer lugar para
qualquer tela do mundo. O consumidor poderá transmitir para a internet, emissoras de televisão ou manter
contato com amigos numa comunidade. O sistema permite, ainda, a gestão direta de conteúdo ao vivo e sob
demanda por emissoras, sites da internet e operadoras de redes móveis, por meio de ferramentas de gestão
editorial de última geração (Ericsson press release, 06/09/2007).
95
acontecimentos da casa eram monitorados ininterruptamente por 24 câmeras e 59 microfones.
O programa alcançou recordes de audiência na televisão holandesa e no ano seguinte foi
vendido para países como Alemanha, Espanha, Estados Unidos, Inglaterra
41
, Portugal, Suíça,
Suécia e Bélgica. Até hoje, se considerarmos as edições que reúnem diversos países de uma
região em um único programa, o Big Brother foi exibido em 70 países diferentes
42
. A idéia,
apesar de inovadora, é relativamente simples: manter em confinamento voluntário um grupo
de pessoas, normalmente 12 participantes, numa casa em que são vigiadas por câmeras e
microfones 24 horas por dia, além de não poderem manter contato com o exterior (isto é, não
tem acesso a telefones, televisão, jornal, rádio, Internet, etc.). O programa foi criado por John
De Mol, um dos proprietários da Endemol, que se inspirou num projeto científico, realizada
nos EUA, chamado Biosfera 2. O projeto foi construído no Arizona e consistia em uma
redoma de vidro com 12 mil metros quadrados em que oito cientistas ficaram confinados,
entre os anos de 1991 a 1993. O objetivo era simular como seria a vida em outro planeta, mas
fracassou. O nome do programa foi inspirado no livro 1984, de George Orwell (FRANZOIA,
2002; MARTHE, 2003). O programa é resultado de muitas pesquisas, ele foi concebido
originalmente três anos antes de ter sido exibido, segundo afirmação de Aat Schouwenaar
(COMIN, 2004).
Como apontado acima, o programa mostra aos espectadores a vida de um grupo de
jovens, normalmente 12, confinados em uma casa sem direito a receber informações ou
estabelecer contato com o exterior, fora as exceções permitidas pela produção, por um período
de dois a três meses. Toda semana um participante é eliminado até restar um, que é o
vencedor de um prêmio em dinheiro. Estas são as regras básicas do programa, que podem
sofrer variações de edição para edição, ou ainda ser adaptadas em função da cultura local de
cada país onde é exibido. Segundo afirmação de Aat Schouwenaar, o sucesso do programa
está justamente em não ser um formato fixo, mas uma idéia em constante mudança, que
precisa de inovação para se manter interessante ao público. O formato pode, ainda, variar de
acordo com os interesses da emissora. Algumas, por exemplo, focam o público mais jovem e
outras o espectador em geral, o que leva o formato a sofrer alterações (COMIN, 2004). De
acordo com a produtora Endemol, o formato é centrado sob quatro elementos: 1) o ambiente,
41
O programa coleciona uma série de acontecimentos polêmicos e números impressionantes nas diversas edições
realizadas ao redor do globo. para ser citado como exemplo, na Inglaterra quase 70 por cento da população
assistiu a pelo menos um episódio da primeira edição de Big Brother. A final do programa contabilizou mais de
7 milhões de votos pelo telefone, um recorde na televisão inglesa. Ainda, seu site oficial recebeu mais de 3
milhões de acesso por dia durante a exibição do reality-show, o que fez o site ser o primeiro colocado em
número de acessos na Europa durante aquele período ( CAMPANELLA, 2007).
42
Cf. Anexo C – O Big Brother pelo mundo.
96
de retorno ao básico
43
, em que os participantes vivem; 2) o sistema de eliminação através dos
quais os participantes deixam a casa, a partir da escolha da audiência em casa; 3) as provas,
propostas pela produção do programa, nas quais os participantes devem completar
semanalmente; 4) o confessionário, no qual os participantes devem falar sobre como estão se
sentindo, suas frustrações, pensamentos e suas indicações.
As imagens da convivência na casa são editadas e veiculadas diariamente, com
duração variada, indo desde pequenos flashes até programas com mais de uma hora de
duração com interferência de apresentadores. Os participantes do Big Brother passam por
provas, dificuldades derivadas da convivência e da falta de contato com o exterior da casa. O
programa não é feito somente para ser exibido pela TV aberta, também é possível acompanhá-
lo através de canais pay-per-view, nos sistemas de TV por assinatura, e pela Internet. De
acordo com Cosette Castro (2006), o Big Brother foi o primeiro programa do mundo a ser
simultaneamente apresentado pela televisão aberta (ao vivo e editado), em canais por
assinatura (ao vivo, sem cortes, 24 h) e na Internet. Seu maior atrativo é a interação da
audiência com os rumos do programa. Ela é possível através de telefones fixo e celulares, e
também através do site oficial do Big Brother
44
. Schouwenaar afirma que não se trata
simplesmente de um programa de televisão, mas de um produto interativo, em que a Internet
43
A idéia de retorno ao básico era um dos elementos mais fortes das primeiras edições do programa, mas que foi
se modificando com o passar dos anos, permitindo cada vez mais o acréscimo de itens de luxo. Para se ter uma
idéia, na primeira edição alemã do programa realizada em 2000, muito semelhante ao primeiro Big Brother
holandês o grupo ficava confinado em uma área de 153 metros quadrados com um pequeno quintal anexo e
tinham que assar seu próprio pão, colher legumes e cuidar das galinhas que forneciam os ovos. Havia também
uma pequena mesada para ser trocada por outros produtos. Cada participante tinha direito a um minuto e meio de
chuveiro por dia. A eliminação do programa acontecia a cada duas semanas, através da votação do público, por
telefone (LEITA, 2000).
44
O case da segunda edição do Loft Story (França), como se pode observar detalhadamente no anexo B, traz
importantes informações sobre como a emissora M6 explorou as múltiplas plataformas em que o programa é
exibido, especialmente o site oficial, para torná-lo lucrativo. As ferramentas de interação colocadas a disposição
dos espectadores do programa, através do site do Lof Story como as votações, jogos, notícias atualizadas,
câmeras exclusivas, etc. foram desenvolvidas no sentido de ligar a marca do patrocinador ao programa e
aumentar o tempo que as pessoas estavam expostas a marca dos patrocinadores, seguindo uma forte tendência
atual da publicidade. Além disso, ofereceram-se chats e serviços exclusivos a fim de aumentar a fidelidade do
público ao programa e também estimulá-lo a acompanhar o apenas na TV, mas também nas demais
plataformas. O diferencial da edição francesa foi o patrocinador cross-media, que além da tradicional
propaganda televisiva também tinha mídia através de colocação de produtos (product placement), jogos
patrocinados no site e jogos pagos através do telefone. De tal forma que o sistema multi-plataforma passa a ser a
parte mais importante do programa. Assim, o programa se torna uma propaganda/promoção do que está
acontecendo na Internet e nas outras plataformas interativas. Pode-se observar aqui claramente que a interação
do telespectador possibilitada pela convergência de tecnologias é utilizada a fim de conectar ainda mais o
espectador aos patrocinadores do programa. Assim, é possível afirmar que a interatividade dos reality-shows é
uma resposta da indústria cultural na era da globalização para as novas possibilidades de consumo de conteúdos
em diferentes plataformas, indo além da televisão. Eles se constituem como programas de TV que e articulam
com outras plataformas para, através de diferentes atividades, ligarem os espectadores as marcas dos
patrocinadores.
97
tem importância fundamental (COMIN, 2004). Estas são as principais características do
programa e merecem destaque. Como demonstramos no segundo capítulo, a convergência de
tecnologias (e de capitais) dá origem ao processo de globalização, o que nos possibilita
afirmar que o Big Brother, por exemplo, é um produto característico da atual etapa do
capitalismo. Assim, estas características permitem-no estabelecer uma separação entre os
reality-shows, produzidos a partir da década de 1990 e seus predecessores, conforme
assinalamos no início deste capítulo. Esta convergência tecnológica explorada pelo programa
possibilita diferentes maneiras de participação das audiências no programa: 1) pela Internet
por meio das indicações, pelo envio de mensagens aos participantes, chats e fóruns entre os
s do programa e também o acompanhamento e criação de sites oficiais e não-oficiais sobre o
programa; 2) pelo uso de telefone fixo para eliminar candidatos; 3) pelo uso de telefones
celulares, para eliminação de candidatos e downloads de ringtones oficiais do programa
(CASTRO, C., 2006, p.29-30).
Devido à repercussão do programa, diversos autores puseram-se a refletir sobre as
questões suscitadas pelo Big Brother, portanto, comentaremos brevemente algumas das
principais idéias dos autores que consideramos mais relevantes para a perspectiva adotada
para este trabalho
45
. Campanella (2007) procura entender, especialmente o Big Brother
Brasil, a partir da perspectiva da economia política, a fim de compreender o sucesso de
exportação dos reality-shows. Curvello (2002) classifica este tipo de programa como um novo
gênero televisivo. Duarte (2003), por sua vez, defende que estes programas estabelecem um
‘antes’ e um ‘depois’. Ele aponta para uma reconfiguração do campo televisivo, a partir da
convergência entre canais abertos e por assinatura, telefones e Internet, convocando os
telespectadores a participarem diretamente nos rumos do programa e do processo de produção
televisiva. Cosette Castro (2006) compartilha desta mesma perspectiva, mas vai além,
afirmando que o Big Brother tornou-se um clássico, um programa paradigmático dos
primeiros anos da televisão no século XXI, estabelecendo um ‘antes’ e um ‘depois’ na
televisão mundial. Isso ocorre pela mistura de gêneros, que segundo a autora, tem a função de
situar a audiência em relação aos diferentes programas, permitindo sua classificação em
modelos e formas reconhecíveis. Para ela, os reality-shows são uma mescla de programas de
concurso, programas de auditório, confessionário, telenovelas, telejornalismo e documentário.
45
No Apêndice A comentamos alguns artigos e ensaios que repercutem as primeiras impressões sobre os reality-
shows por importantes autores brasileiros.
98
Esta mistura de gêneros traz a sensação de novidade. Seu sucesso pode, ainda, ser explicado
pela convergência de diversas tecnologias de comunicação em um único programa.
Um dos motivos que possibilitaram a identificação da audiência com o Big Brother, de
acordo com Cosette Castro (2004), foi o fato de ele ter sido realizado em torno de uma casa,
com a formação de casais e de um possível futuro núcleo familiar (com final feliz). Ela nos
recorda que a organização do cotidiano ocorre em relação a casa (comer, tomar banho,
descansar, dormir), uma série de atividades cíclicas e orientadas de acordo com o modelo de
vida familiar. Ou seja, a casa não é apenas um alojamento, é um lugar simbólico que nos faz
sentir seguros, estáveis. Se levarmos em consideração que a sociedade ocidental está
organizada em torno da família, o fato de que o programa esteja organizado em torno do
núcleo familiar, de acordo com a autora, é um atrativo a mais para as audiências que se
reconhecem e se identificam neste espaço e com estas pessoas. Ou seja, o programa possui um
caráter universal acessível a diferentes culturas, o que faz com que ele se aproxime do
‘elemento local’ de cada comunidade (por meio dos jogos, festas e música), ainda que
originalmente ele tenha sido pensado como um ‘programa global (pois todos seguem as
mesmas regras básicas, vivem nos mesmos tipos de casa). Ainda de acordo com a autora, não
existe novidade na realização de programas transnacionais ou na venda de roteiro na TV
mundial. A novidade reside na adaptação desses roteiros à cultura e à realidade de cada país,
utilizando participantes do país onde o programa é transmitido, o que, para Castro (2006), lhe
garante o caráter, o tom cultural e a ‘cor local’.
Cosette Castro (2004) caracteriza o Big Brother como: 1) um formato brido que
estimulou o voyeurismo; 2) propiciou a discussão sobre espaço público e espaço privado; 3)
possibilitou o reconhecimento (e a identificação) das audiências através de atividades
cotidianas que todos fazemos (e que temos curiosidade de ver como os outros fazem); 4)
possibilitou a identificação das audiências através de sentimentos universais (amor, ódio,
amizade, ciúmes, solidariedade, etc.); 5) renovou o formato das telenovelas ao apresentar um
formato de programa em que se mistura ficção e realidade. A ficção é apresentada através de
edição de imagens, fundo musical, formação de casais e final feliz. A realidade é mostrada em
entrevistas e nos flashes ao vivo; 6) possibilitou a audiência a se comparar com pessoas de
carne e osso (‘reais’); 7) a audiência acompanhou o programa ao vivo, em ‘tempo real’, ainda
que na televisão aberta tenha sido possível observar a edição, a seleção de imagens, a
construção de personagens, através de resumos musicais ou a edição com os melhores
momentos.
99
3.4. Big Brother Brasil: o encontro entre o global e o local.
O Big Brother estreou no Brasil com índices de audiência elevados e envolvido em
polêmicas, no ano de 2002, mas ele não foi o primeiro reality-show a ser exibido em
televisões brasileiras. Antes dele haviam sido exibidos o No limite, pela própria Globo, em
2000, e Casa dos Artistas, pelo SBT, em 2001. A realização de No limite foi a produção mais
cara da TV brasileira, por episódio, custando cerca de R$ 2 milhões à emissora. Ele gerou
bastante repercussão e alcançou uma audiência média de 50% (BORGES, 2000). No entanto,
a estréia de Big Brother Brasil se em meio a uma disputa judicial entre Globo e SBT. A
Rede Globo comprou os direitos de produção do programa e constituiu, em agosto de 2001,
uma joint venture a Endemol Globo S/A com a produtora holandesa Endemol, dona do
formato, para a exibição da versão nacional do reality-show. A exibição do programa havia
sido programada para o ano de 2002. Alguns meses antes, no final de 2001, o SBT lançou um
programa muito similar ao programa original – a emissora de Sílvio Santos havia sido
contatada pela Endemol e teve acesso a informações privilegiadas, mas não comprou os
direitos do formato chamado Casa dos Artistas. Este programa alcançou audiências recordes
para os padrões da emissora em que estava sendo exibido e provocou uma enorme
repercussão na opinião pública. A Rede Globo e a Endemol processaram o SBT por plágio
(MATTOS, 2001). Como conseqüência desse fato a Globo teve de adiantar em seis meses a
estréia de BBB1 em meio a uma crise de audiência que ameaçou a situação de “quase
monopólio”
46
desfrutada pela emissora nas últimas três décadas (BORELLI, 2005).
Em decorrência desta disputa judicial e do grande sucesso do programa do SBT, a
Rede Globo realizou um expressivo investimento monetário para evitar um possível fracasso
de seu reality-show. O investimento da emissora a época girou em torno de R$ 24 milhões,
entre a compra dos direitos sobre o programa e compra de equipamentos, construção da casa e
46
Para uma análise aprofundada sobre a queda de audiência da Rede Globo ver: BORELLI, Silvia H. e
PRIOLLI, Gabriel (coord.) A deusa ferida. São Paulo: Summus, 2000.
100
demais custos (GOULART, 2002). Mas sua ação não ficou restrita apenas a um grande
investimento monetário. A emissora também lançou o plano de mídia mais ousado de sua
história. Todos os veículos das organizações Globo trabalharam o produto Big Brother,
envolvendo TV aberta e fechada, Internet, rádio, jornal e revista. A emissora também
mobilizou grandes nomes do seu elenco de artistas como Xuxa, Soares, Ana Maria
Braga, Tom Cavalcante e a turma do Casseta e Planeta para fazerem participações no
programa (REIS, 2002). A produção do programa ficou sob a responsabilidade da Central
Globo de Produções e de Jornalismo. O diretor Boninho – filho de José Bonifácio de Oliveira
Sobrinho, o Boni, personagem central na história da televisão brasileira foi escolhido para
comandar a equipe de 250 profissionais, as 38 câmeras e 60 microfones (BORELLI, 2005). A
apresentação do programa ficou a cargo do jornalista Pedro Bial
47
. O programa seguiu os
mesmos moldes e as mesmas regras das outras versões exibidas internacionalmente. O
programa foi veiculado diariamente, com horário variável, ao vivo e em versão gravada e
editada, pela Rede Globo. Além disso, o canal MultiShow, da GloboSat, transmitiu ao vivo,
todos os dias, por vinte minutos após a transmissão da Globo. Ainda, foi possível acompanhar
o programa integralmente pelo sistema pay-per-view.
Ao longo de seis anos de exibição e oito edições realizadas, a versão nacional do Big
Brother apresenta números muito interessantes tanto com relação os custos de produção e
cotas de patrocínio, quanto aos índices de audiência. A produção do programa custou
inicialmente à Rede Globo cerca de US$ 5 milhões para a compra dos direitos e mais US$ 5
milhões para a construção da casa, compra de equipamentos e todos os demais custos
envolvidos na realização do programa (MATTOS, 2002). Para a primeira edição, exibida de
29 de janeiro a 2 de abril de 2002, a emissora vendeu quatro cotas de patrocínio ‘master’
que além da Rede Globo incluía mídia no portal globo.com por R$ 3,75 milhões, para a
Fiat, Kaiser e BomBril, além de duas cotas ‘nacionais restrita apenas a Rede Globo
adquiridas por Brastemp e Unilever, por R$ 1,2 milhão cada. Calcula-se que a primeira edição
do Big Brother tenha gerado um faturamento de R$ 25 milhões a emissora (COMIN, 2002).
Ainda, foram comercializadas inserções de merchandising de três marcas Fiat, Kaiser e
Brastemp por R$ 500 mil, cada (BALBYS, 2002b). O plano comercial ainda previa espaço
para outros anunciantes, com o custo de R$ 82 mil a inserção de 30 segundos (PEREIRA
JUNIOR, 2002). Além da TV aberta, a Globosat ainda comercializou quatro cotas de
47
A atriz Marisa Orth fez dupla com Pedro Bial no início da primeira versão, mas depois foi afastada pela
produção por “escolhas artísticas”.
101
patrocínio especiais para o Big Brother, ao valor de R$ 260 mil cada, para o canal Multishow
(JIMENEZ, 2002a). A primeira edição do programa também aponta números bastante
impressionantes de audiência não apenas na TV aberta, como também na TV fechada e no site
oficial. A média do BBB1 foi de 39,9 pontos no Ibope (JIMENEZ, 2002b), uma das maiores
audiências da emissora. No episódio final, exibido em 2 de abril, o programa atingiu uma
audiência histórica de 59 pontos de média, no Ibope, e a expressiva marca de 76% de share,
índice que corresponde ao percentual de televisões ligadas na Rede Globo naquele momento
(CASTRO, D., 2002a). A grande repercussão do programa não ficou restrita apenas a TV
aberta. O portal globo.com e o canal por assinatura Multishow também registraram elevados
índices de audiência. O site oficial do reality-show recebeu 275 mil visitantes diários e 350
milhões de pageviews, e o canal Multishow foi der de audiência na TV fechada
(GALBRAITH, 2002). Para essa primeira edição também foram vendidos 85 mil pacotes de
pay-per-view (CASTRO, D., 2004b).
O BBB 2 exibido ainda em 2002, entre 14 de maio e 23 de julho teve elevação no
preço das cotas ‘masters’ de patrocínio, comercializadas a R$ 4,55 milhões, cada (CASTRO,
D., 2002b). A audiência do programa, em TV aberta, foi de 45% de média e 65% de share. O
episódio final recebeu mais de 10 milhões de votos, entre telefonemas e a votação pelo site
oficial (GONZALES, 2002). Foram vendidos 44 mil pacotes de pay-per-view (CASTRO, D.,
2004b). A terceira edição do Big Brother ocorrida entre 14 de janeiro e 01 de abril de 2003
– apresentou uma pequena redução no preço das cotas, R$ 4,3 milhões, cada, e foram
vendidas para Fiat, Kaiser, Minuano e Assolan (BORGES, 2003). A inserção publicitária de
30 segundos foi comercializada a R$ 115 mil, cada (MANSUR, 2004). A terceira edição do
programa traz alguns índices de audiência que chamam bastante a atenção. De acordo com
relatório da Endemol, a edição brasileira foi a mais vista no mundo: BBB3 teve média de 33
milhões de telespectadores por programa (CASTRO, D., 2004d). A audiência em TV aberta,
na final, obteve dia de 50% e 69% de share (SILVA, 2003). A venda de pay-per-view
atingiu a marca de 107 mil pacotes vendidos (CASTRO, D., 2004b). Nas duas primeiras
semanas desta edição o programa recebeu 1,8 milhão de telefonemas e 1 milhão de
mensagens via celular, e o site oficial recebeu 50 milhões de pageviews (CASTRO, D.,
2004c). O canal por assinatura Multishow, da Globosat, foi por três anos seguidos a maior
audiência da TV paga através da exibição do Big Brother Brasil (CASTRO, D., 2004a).
Em conseqüência dos elevados índices de audiência e de interatividade conseguidos
pela edição anterior, as cotas de patrocínio da quarta temporada de Big Brotherque foi ao ar
102
no período de 13 de janeiro a 30 de abril de 2004 foram vendidas por R$ 5 milhões, cada,
para Minuano, Assolan e Fiat, que renovaram o contrato, e Azaléia, nova cotista
(KNOPLOCH, 2003). O comercial avulso foi comercializado por R$ 132 mil, cada inserção
de 30 segundos (MANSUR, 2004). O BBB 4 apresentou altos números de audiência,
superando algumas marcas anteriores do programa. Antes da final ele vinha registrando média
de 48 pontos no Ibope e 69% de share, em TV aberta (JIMENEZ; PADIGLIONE, 2004). O
episódio final alcançou a maior audiência, com 56 pontos no Ibope. E, somados os votos
pelo telefone e pelo site oficial, a final do programa contabilizou 11 milhões de votos
(CROITOR, 2004). A interação da audiência através das votações, nesta edição, foi das mais
expressivas. O programa recebeu um número enorme de votos, no total foram 123 milhões
registrados entre todas as votações. Ainda, BBB4 gerou 12 milhões de minutos em telefonia
celular somente com o produto em que o usuário ouvia o que era captado pelo microfone de
determinado participante (CASTRO, D., 2004e).
A quinta edição exibida entre 10 de janeiro e 29 de março de 2005 contou com a
promoção Quero ser um Big Brother”, na qual foram sorteados participantes para o
programa. A Telemar foi a empresa responsável por esse ato promocional. Entre
licenciamento, promoção e veiculação de anúncios a Rede Globo recebeu da Telemar R$ 6
milhões (CASTRO,D., 2004h). As cotas de patrocínio do BBB5 foram vendidas por R$ 6,5
milhões, cada uma, para Fiat, Assolan, Minuano, Azaléia e Niely (CASTRO, D., 2004g). As
inserções de 30 segundos foram comercializadas a R$ 150 mil, cada, para Pepsi, Guaraná
Antarctica, os supermercados Sendas, Champion e Carrefour, Prezunic, Casa & Vídeo, Casa
& Construção, Sustagem Kids, Bob's, Mastercard e Luftal (ROSA, 2005). A final da quinta
edição teve média de 57 pontos no Ibope, consolidando a maior audiência do programa em
finais, superando a marca do BBB4 (MATTOS, 2007). O “paredão” de 02/02/2005 teve
votação recorde de 22 milhões de votos, sendo que 19,2 milhões foram via globo.com, o que
equivale a incrível média de 500 votos por segundo (CASTRO, D., 2005). O BBB6 que foi
ao ar no período de 10 de janeiro e 28 de março de 2006 teve suas cotas de patrocínio
comercializadas a R$ 7,7 milhões, cada, para Niely, Assolan, Fiat, Azaléia e Minuano. É
interessante notar que os cotistas do programa praticamente o se alteram, eles têm
preferência sobre os demais para renovação do contrato de patrocínio. Na sexta edição a Rede
Globo comercializou por R$ 1,5 milhão cada cota de merchandising. Unilever (com o sorvete
Kibon), Cadbury Adams (dona da marca Halls), Henkel (com o seu SuperBonder) e Johnson
& Jonhson (que fabrica o protetor solar Sundown) pagaram para terem a publicidade de seus
103
produtos vinculados ao programa (ROSA, 2006). O site oficial do programa teve mais de 2,5
milhões de acessos nos quatro primeiros dias do programa. Na estréia houve um crescimento
de 98% no acesso aos vídeos e de 147% nas visitas ao site em relação à estréia da edição
passada (ENTRELINHAS, 20/01/2006). A final do programa teve 51 pontos de audiência
(MATTOS, 2007).
A sétima edição exibida entre 09 de janeiro e 04 de abril de 2007 teve as cotas de
patrocínio vendidas para Fiat, Niely, Assolan que eram cotistas , HSBC e Sundown
(Johnson&Johnson) novos cotistas por R$ 8,5 milhões cada uma (GAZETA
MERCANTIL, 07/03/2007). Um dado curioso é que 11 setores da economia, através de 26
anunciantes, estiveram presentes na sexta edição do Big Brother. Já o BBB7 teve o anuncio de
12 setores da economia, através de 25 anunciantes (JACINTHO, 2007a). Esta edição teve
média de 48 pontos de audiência, em TV aberta, na final. Foram computados, além disso, 26
milhões de votos no último episódio (MATTOS, 2007). O mero está abaixo das edições
anteriores, mas o programa apresenta ainda continua apresentando dados bastante expressivos
em outras mídias. Nos primeiros 30 dias foram registrados mais de 13 milhões de acessos ao
site oficial. Até o dia 04/03/2007 foram 70 milhões de vídeos acessados, o que representa um
aumento de 772% na comparação com a edição anterior (MOUSSE, 2007). Em um único
‘paredão’ foram computados 55 milhões de votos (VICTAL, 2007). De acordo com a
Globosat, foram vendidos 153 mil pacotes de pay-per-view (CASTRO, D., 2007b). O
Multishow teve audiência recorde no dia da final, após a exibição do programa pela Rede
Globo, sendo visto por 1,6 milhão de telespectadores – a maior audiência da TV paga
(CASTRO, D., 2007a). A oitava, e mais recente, edição do Big Brother que foi ao no
período de 08 de janeiro a 25 de março de 2008 teve suas cotas de patrocínio
comercializadas por R$ 9,75 milhões, cada uma, vendidas para Fiat, Assolan, HSBC, Niely e
Sundown (Johnson&Johnson) (SACCHITIELLO, 2008). Antes mesmo do início do
programa, a Rede Globo disponibilizou uma espécie de rede de relacionamento social, como o
Orkut, para que as pessoas pudessem se inscrever e postar vídeos e fotos, no seu site oficial.
Ela contou com 90 mil inscritos e, ainda, promoveu 3,5 milhões de acessos ao portal
globo.com (CASTRO, D., 2007c). O BBB8 teve duas votações recordes, em 05/03/2008, no
‘paredão’ entre Marcelo e Juliana, o programa recebeu 64 milhões de votos (CASTRO, D.,
2008a). A final do programa marcou o recorde mundial de votação no Big Brother, com 75,6
milhões de votos (CASTRO, D., 2008b).
104
Através do levantamento de dados exposto acima, podemos observar que a versão
brasileira do Big Brother apresenta índices de audiência expressivos, tanto na TV aberta
quanto nas outras mídias nas quais ele é vinculado. Foram produzidas aqui oito edições do
programa, em seis anos, o que indícios da rentabilidade de tal atração. Podemos ver que,
apesar de certa flutuação normal, os índices de audiência em TV aberta alcançados pelo Big
Brother Brasil permanecem em patamares bastante elevados a média do programa está
sempre próxima dos 40 pontos no Ibope –, sendo uma das maiores audiências da Rede Globo
a cada ano. Isto reflete, por exemplo, no aumento significativo cobrado para as cotas de
patrocínio do programa. O valor inicial cobrado para a primeira edição era de R$ 3,75 milhões
por cota (BALBYS, 2002b), esse valor foi aumentado a cada ano, chegando ao patamar de R$
9, 75 milhões cada cota de patrocínio, na oitava edição (SACCHITIELLO, 2008). Por se
tratar de um programa multi-plataforma, entretanto, os números mais interessantes dizem
respeito a outras mídias. O Multishow, canal de TV por assinatura da Globosat, é o canal de
TV fechada de maior audiência desde que o programa começou a ser exibido, em 2002. Em
2007 ele alcançou um recorde neste segmento, registrando em apenas um dia, 1,6 milhões de
telespectadores (CASTRO, D., 2007a). A venda de pacotes de pay-per-view também
contabiliza números bastante elevados, sendo o segundo maior evento de vendas a cada ano,
ficando atrás apenas das vendas de pacotes do Campeonato Brasileiro de futebol. Se na
primeira edição foram vendidos apenas 85 mil pacotes (CASTRO, D., 2004b), o crescimento
constante do programa permitiu que a sétima edição contabilizasse a venda de 153 mil
pacotes (CASTRO, D., 2007b). Este dado é importante, pois ele aponta para um aumento na
base de assinantes nas TV fechadas. Os dados mais expressivos, no entanto, dizem respeito às
possibilidades de interação oferecidas pelo programa
48
. Os telespectadores podem interagir
com o programa através do telefone fixo e do celular para eliminar os concorrentes e
interferir na rotina da casa –, e através do site oficial no qual, além de eliminarem
concorrentes, também podem ver vídeos, fotos, notícias, participar de chats e fóruns. O
número de acessos ao site oficial é crescente a cada ano, assim como as ligações telefônicas,
que registraram recordes consecutivos, estabelecendo em 2008 um recorde mundial de
votação (CASTRO, D., 2008c). É preciso, no entanto, observar alguns fatos. Os números
apresentados para a discussão são provenientes de levantamento feito em matérias publicadas
em jornais e revistas nacionais e de grande circulação. A fonte de tais informações em muitos
casos é a própria emissora, o que pode gerar questionamentos a respeito da parcialidade de
48
A interação é um tema de extrema importância o apenas para o Big Brother, mas também para os demais
reality-shows, como vimos no início deste capítulo, e será analisado com mais detalhes na seqüência do trabalho.
105
tais informações. Apesar disto, estes dados nos permitem afirmar, a partir da análise das
versões brasileiras do Big Brother, que este tipo de programa é uma atualização da indústria
cultural na era da globalização. Isto porque, como os dados apontaram, em primeiro lugar, ele
é um programa extremamente lucrativo – tanto na televisão quanto nos diversos meios em que
é transmitido. Em segundo lugar, porque a interatividade e a convergência de diferentes
plataformas propostas pelo programa servem para reforçar a dominação social. Os reality-
shows ampliam a esfera de influencia da indústria cultural para espaços onde o indivíduo
ainda podia resistir, propondo a ele uma experiência total, que não se restringe apenas ao
programa televisivo. Ela pode ser estendida para o telefone, principalmente celular, e para a
Internet espaços nos quais as pessoas “se desligavam” de determinadas influências da
televisão.
3.5. Os reality-shows em questão.
Depois de estabelecermos uma distinção entre os reality-shows surgidos no final dos
anos 1990 e aqueles programas que são freqüentemente apontados como seus predecessores,
assinalarmos as principais características do Big Brother tanto com relação à repercussão
internacional quanto nacional e de sua produtora a Endemol é necessário analisarmos
criticamente algumas questões que os envolvem, tentando ir além do discurso de euforia e
novidade de seus entusiastas. Apesar de ainda ser um tema recente e relativamente pouco
estudado, alguns pesquisadores brasileiros escreveram artigos importantes
49
. O espectro
teórico destes artigos é o mais variado, indo de estudos de comunicação, estudos culturais,
antropologia, até a economia política das comunicações. Portanto, propomos inicialmente
analisar seus principais argumentos e, em seguida, fazer algumas ponderações a partir da
perspectiva deste trabalho.
Vanessa Curvello (2002) classifica os reality-shows como um novo gênero televisivo,
que se destaca como a grande tendência da televisão mundial. Eles envolvem diferentes
49
Cf. também o Apêndice A.
106
situações, desde a veiculação de imagens de pessoas confinadas em uma casa, ou de disputa
por sobrevivência em ambientes “hostis”, transmissão de competição por fama, até programas
onde casais têm sua fidelidade posta à prova por modelos contratados, dentre outras situações.
A principal contribuição da autora, com este artigo, é desvendar algumas estratégias
discursivas e comunicativas usada pela Rede Globo com relação ao Big Brother Brasil. Ela
identifica que a emissora lança mão de diversas estratégias comunicativas a fim de promover
o seu programa. Segundo Curvello (2002), esta promoção envolve diferentes espaços
midiáticos pertencentes à emissora, além daquele dedicado ao programa na grade de
programação. Existem matérias sobre o BBB nos programas Vídeo Show, Domingão do
Faustão, Fantástico, além das ações permitidas pelo site oficial. De acordo com a autora, isso
cria um universo simbólico em torno do programa, que se configura como uma promoção do
próprio produto televisivo. O site oficial também oferece várias opções de interferência dos
telespectadores. Estas possibilidades incluem participação em fóruns eletrônicos de opinião e
conversação on-line, disponibilização de fotos e vídeos, possibilidade de envio de mensagens
via Internet aos participantes. a mesmo a venda on-line de objetos com a marca Big
Brother Brasil (CURVELLO, 2002, p.03).
A estratégia discursiva central do BBB, de acordo com Curvello (2002), é a
apresentação de uma construção em ‘ficção’ como se fosse ‘realidade’, isto é, a criação de
‘efeitos de realidade’. Isto se dá pela situação em que se encontram os participantes –
constantemente observados por meras e competindo entre si pela aprovação do público e
pela edição das imagens. Dentre outras estratégias discursivas, a autora destaca a importância
da ‘participação ordenadora do apresentador’. Segundo ela, as interferências e sugestões do
apresentador acabam por adequar as participações dos concorrentes às estruturas narrativas
semelhantes a qualquer programa televisivo (configuração dos blocos, presença de
dramatização, exposição de emoções). Outra estratégia é a exclusão paulatina dos
concorrentes. Isso se configura como uma estratégia discursiva, de acordo com Curvello
(2002), na medida em que, através de todas as questões que envolvem a eliminação (votação
do líder, indicação, disputas, dúvidas, etc.), cria-se uma construção simbólica em torno da
regra do programa que determina a eliminação de um participante a cada semana. Outro ponto
importante a ser destacado é a relação que o programa estabelece com os espectadores
mediante as estratégias de interação. De acordo com suas regras, a exclusão dos concorrentes
se pela votação do público, o que gera, segundo a autora, o efeito de sentido na interação.
Esta estratégia tem por objetivo envolver o telespectador nas construções simbólicas do
107
programa. As tarefas que permeiam o cotidiano dos participantes de Big Brother Brasil
também são estratégias discursivas do programa. Elas têm o papel de interferir e provocar
atitudes decorrentes da convivência entre os participantes envolvidos no jogo proposto
(CURVELLO, 2002, p.04).
Silvia Borelli (2005) é contraria ao discurso de novidade dos reality-shows. Ela propõe
uma analise destes programas para além do discurso de um novo gênero, de novidade,
destacado principalmente pelas emissoras
50
. Para ela, o formato é o resultado da hibridação
de outros existentes. Das telenovelas, o BBB herdou o conteúdo dramático. Em especial no
Brasil, os receptores se depararam com uma narrativa familiar e com a qual o público já es
bastante acostumado. Dessa forma, a partir do melodrama e da comédia, por mecanismos de
projeção e de identificação, novas mediações são reconstruídas e reiteradas na relação entre
produtores e receptores. Além das telenovelas, o BBB resgata também os jogos, as gincanas e
provas características dos programas de auditório; dos talk-shows ele absorve o estilo de
entrevistas e histórias da vida. Diretamente vinculado a esta hibridação, de acordo com Borelli
(2005), estão os padrões de edição, que marcam a versão veiculada pelo canal aberto
destinada ao grande público. Ainda, este recurso a edição reforça o espaço da “ficcionalidade”
dentro de um formato que se propõe a ser “realidade” (BORELLI, 2005, p. 366-68).
A autora aponta algumas matrizes que compõe o imaginário coletivo que podem
explicar a recepção deste tipo de programa pela grande audiência. A primeira, e mais
evidente, diz respeito ao eterno desejo que as pessoas têm em saber sobre a vida alheia. De
acordo com ela, os reality-shows parecem liberar os receptores da culpa de bisbilhotar e
institucionalizam a prática do vouyerismo. A esta prática agrega-se o exibicionismo dos
participantes, o desejo que eles têm de serem vistos”. A grande proposta do Big Brother
Brasil, para Silvia Borelli (2005), é propor que a TV não seja mais ‘rua de mão única’ e possa
se tornar um veículo de mediação, de interação, de troca entre mídia e receptores. Outro ponto
que compõe o imaginário coletivo diz respeito à relação entre o real e o ficcional. O Big
Brother sugere a possibilidade de resgatar a realidade em sua máxima expressão, numa
50
Como assinalamos no início do capítulo, é necessário estabelecer uma diferenciação entre estes programas
classificados sob o rótulo comum de reality-show. Propomos que o conceito de reality-show diz respeito aos
programas de televisão surgidos a partir da década de 1990, que tem como características a interação do
telespectador com o conteúdo eo difundidos simultaneamente em múltiplas plataformas (como a TV fechada,
a telefonia e a Internet). Estes programas podem ser considerados como novidade não com relação ao formato ou
linguagem, mas com relação aos meios em que eles passam a ser difundidos. Neste sentido, os reality-shows
podem ser considerados como resultados das modificações geradas pelo processo de globalização. O melhor
exemplo deste conceito é o Big Brother. Os demais programas, na verdade, podem ser classificados como
‘televisão-verdade’, pois representam uma continuidade, com o único diferencial de os principais eventos dos
programas serem desempenhados por pessoas comuns e não possuírem um roteiro pré-determinando os
acontecimentos.
108
aparente relação de neutralidade. No entanto, como pondera a autora, as meras não são
apenas instrumentos de captação e veiculação; os produtores e suas escolhas exercem efeito
sobre o que é visto; a edição é uma etapa fundamental neste processo de produção de imagens
e imaginários (BORELLI, 2005, p. 369-70).
Bruno Campanella (2007) destaca a importância mercadológica de programas como o
Big Brother Brasil, especialmente sob o ponto de vista da economia política, a fim de
compreender de maneira ampla o sucesso de exportação dos reality-shows. O ponto de partida
do autor é que a grande importância mercadológica do Big Brother se deve a dois fatores
essenciais: a sua capacidade de explorar de maneira inovadora a convergência das mídias, e o
grande potencial de criação de novas fontes de receita para além da tradicional venda de
espaço publicitário para televisão. A interatividade e a convergência de mídias são
características marcantes de nossa época, como acompanhamos no capítulo anterior. A partir
dos anos 1990 o Grupo Globo adota a convergência de mídia como estratégia de mercado.
Algumas tentativas foram feitas, mas não obtiveram muito sucesso. No entanto, segundo o
autor, o processo de convergência continuou sendo prioridade, entretanto, o foco passa a ser a
produção de conteúdos e a busca de canais alternativos para distribuí-los (CAMPANELLA,
2007, p.06).
Neste novo ambiente multi-midiático, o Big Brother, da produtora Endemol, aparece
com grande destaque. Ele é produzido para ser consumido tanto em TV aberta, TV paga, pay-
per-view, Internet quanto telefonia fixa e celular. Campanella (2007) considera que sua versão
para Internetpor sua capacidade de agregar um volume considerável de usuários para o seu
site oficial talvez ofereça maiores vantagens ao grupo Globo. De acordo com o autor, os
índices de audiência do Big Brother Brasil, tanto com relação a TV paga quanto ao número de
acessos ao site oficial
51
, indicam que a força deste evento midiático encontra-se na grande
capacidade de ativar inúmeras mídias alternativas com especial destaque à Internet e não
somente no seu desempenho na TV aberta, mesmo que este esteja longe de ser desprezível.
Outra característica importante do Big Brother, para Campanella (2007) é a
capacidade de gerar fontes alternativas de receita. Além da tradicional venda de espaço
publicitário e merchandising veiculados na Rede Globo, como pudemos acompanhar acima, o
programa ainda gera receitas com a venda de pacotes em pay-per-view, venda de espaço
publicitário para o Multishow (realizada de forma independente das vendas da Rede Globo),
51
O autor analisa os números da sétima edição do Big Brother Brasil e, de acordo com ele, ela obteve a maior
audiência da história da TV paga, com 7,5 pontos. No primeiro mês de exibição, a página oficial do BBB por 13
milhões de pessoas, acessando os deos disponíveis 71 milhões de vezes, o que representou um aumento de
772% com relação à edição anterior do reality-show (CAMPANELLA, 2007).
109
participação nas ligações e mensagens de texto feitas pela audiência através de parcerias com
operadoras de telefonia celular e fixa, venda de espaço publicitário no portal globo.com,
licenciamento de produtos e vendas de roupas e acessórios Big Brother feitas pelo site oficial.
O programa ainda rende alguns benefícios indiretos, como o aumento na base de assinantes da
NET, em função das compras de pacotes pay-per-view, que resulta em maior receita para os
canais Globosat
52
. O autor destaca que o importante quanto os lucros financeiros gerados
pelo Big Brother é a sua capacidade de interagir com os outros canais de veiculação e
empresas do grupo que detém seus direitos. A conclusão de Campanella (2007) é que este
programa aponta para novos caminhos no relacionamento entre sociedade e conteúdo
midiático (CAMPANELLA, 2007, p.14).
Cosette Castro (2004) realizou um importante estudo comparativo entre as edições do
Big Brother/Gran Hermano exibidas em Portugal, Espanha e Brasil, possibilitando a autora
uma melhor compreensão da dimensão globalizada destes programas. Assim como Silvia
Borelli (2005), Castro (2004, 2006) afirma que os reality-shows, como o Big Brother, são um
tipo híbrido de programas que trazem características de programas de concursos, programa
de auditório, confessionário, telenovela, jornalismo e documentário que, assim como os
seriados e as telenovelas, tem eficácia porque representam situações humanas elementares
como o amor, raiva, ciúmes, paixão, etc. E, segundo a autora, este é um dos pontos que
ajudaram a seduzir as audiências: a maneira como a televisão ‘narra’ a vida social, como a
constrói e interpreta, como constrói a noção de família ou, neste caso, de jovem, com o
objetivo de produzir sentido entre as audiências. De acordo com Castro (2004), outro ponto a
ser destacado é que o Gran Hermano, assim como o Big Brother, pautou a agenda midiática
durante o tempo em que foi transmitido e permitiu uma importante rentabilização econômica
não para os canais de televisão, como para os demais meios de comunicação que
aumentaram suas tiragens a partir da transmissão do programa. Prova do sucesso de toda essa
rentabilidade econômica, segundo ela, são as várias edições que o programa alcançou tanto na
Espanha quanto em Portugal e no Brasil. Uma possível explicação, de acordo com Castro
(2004), para o sucesso dos reality-shows é que a globalização se estende também à televisão –
aberta e a cabo e à Internet, através da adaptação de formatos híbridos, que não só mesclam
gêneros, como também ficção e realidade à ‘cultura local’ de cada país, através do fenômeno
52
É interessante notar, neste ponto, o vínculo do programa com as necessidades materiais da emissora, que é
uma das controladoras da NET. Esta nova rede de atuação da Rede Globo, no mercado de TV paga, encontrava-
se em situação deficitária por muitos anos. O aumento na base de assinantes, inicialmente com a venda de
pacotes de pay-per-view dos quais o Big Brother é um dos maiores atrativos depois do campeonato brasileiro
de futebol e recentemente com a venda de serviços triple play (TV por assinatura, telefonia e Internet banda
larga) permitiu ao grupo sustentar a posição de liderança neste segmento.
110
conhecido como glocalização. Uma glocalização
53
que permite conectar-se com o mundo
sem desligar-se do local, possibilitando a união de territórios distintos através de uma cultura
audiovisual, que além do cinema e da televisão, também é reforçada pelos jogos, pelos filmes
ou jogos da Internet.
Outra explicação possível para o sucesso de programas como o Big Brother, de acordo
com a autora, é o fato de ele reunir diferentes tecnologias de comunicação como a televisão,
aberta e por assinatura, além da Internet, do telefone fixo e celular para a participação da
audiência no programa. Castro (2006) considera que tais mudanças estabelecem um marco
nos períodos televisivos. Já não é mais possível, de acordo com ela, falar em neotelevisão nos
termos propostos por Umberto Eco. Ela argumenta que, desde o Big Brother, a televisão
mundial encontra-se em um novo momento: o da pós-televisão, isto é, uma televisão que se
dirige a públicos cada vez mais diversificados. Segundo a autora, os programas estão cada vez
mais híbridos e a ficção está constantemente misturada à realidade, assim como a realidade à
ficção, utilizando diferentes recursos tecnológicos como a TV aberta e por assinatura, a
telefonia fixa ou celular, e também a Internet. Além destas características, a pós-televisão
apresenta programas transnacionais de caráter glocalizado, isto é, formatos globais adaptados
às características culturais e valores de cada país.
O reality-show é um revelador, de acordo com Castro (2006), das mudanças ocorridas
na televisão, que incluem: 1) o papel da realidade que vai até a televisão através do indivíduo
que a protagoniza (buscando reconhecimento e visibilidade pública); 2) o fim da fronteira
entre espaço público e privado que, com a pós-televisão, se encontram cada vez mais
cruzados; 3) o próprio reality-show, onde o sentimento tem prioridade, além do processo de
espetacularização desse sentimento; 4) a mudança das estrelas de TV e cinema (star system)
para personagens anônimos (Cf. CASTRO, C., 2006, 39-40). Ela identifica também, nos
reality-shows, o estímulo aos finais felizes, à formação de casais e à renovação do corpo. Ou
seja, o ideal de felicidade está centrado no corpo perfeito, na beleza e na juventude. A
conclusão da autora é que estes programas ainda têm grande perspectiva de continuidade e
vida longa. Isto porque eles incluem as novas tecnologias digitais e possibilitam o uso de
várias delas ao mesmo tempo, através da convergência entre TV aberta e por assinatura,
telefonia fixa e celular, e também Internet.
Após a exposição de alguns dos principais argumentos da bibliografia sobre os reality-
shows, propomos analisar determinadas questões que envolvem estes programas que
53
O conceito de glocalização foi extensamente discutido no primeiro capítulo, a partir da contribuição de Ulrich
Bech (1999), conferir p.35. A perspectiva adotada pela autora, no entanto, difere-se um pouco desta.
111
consideramos relevantes para a perspectiva adotada por esta pesquisa e o discurso sob os
quais eles se apóiam. Inicialmente, pensamos que é necessário destacar alguns dos pilares e
pressupostos sobre os quais se apóia este novo formato. Nesse sentido, a análise de Umberto
Eco (1984) sobre a televisão nos fornece importantes elementos para a compreensão do nosso
objeto de estudo. Ele destaca a importância da câmera televisiva, que dá realidade aos
discursos em função de serem transmitidos pela televisão, dando ‘existência’ aos
acontecimentos por ela registrados. Estes programas utilizam-se ao máximo desta
característica, sendo um dos principais pilares de apoio de seu discurso: a realidade dos
acontecimentos registrada pelas câmeras. Outro ponto importante que o autor destaca é o fato
de que importa mais ao telespectador o fato de a TV ser ‘verdadeira’ do que se aquilo que ela
diz é verdade ou não. O objeto desta pesquisa faz uso deste expediente constantemente,
especialmente o Big Brother, não evidenciando o fato de que por trás do programa existe uma
equipe de produção que constantemente interfere nos acontecimentos da casa – seja através de
mudanças nas regras do programa, na proposição de provas ou festas, na inserção de novos
elementos no cotidiano da casa, entre outros e que edita as imagens e constrói aquilo que é
visto pela grande audiência. Este ponto reforça, ainda, a tese do autor que a televisão
interpreta os acontecimentos para os telespectadores, dando a eles um ponto de vista. Neste
sentido, a edição do Big Brother Brasil é um exemplo, pois a partir dos acontecimentos da
casa, ela devolve ao telespectador um ponto de vista, normalmente realçando polarizações
entre o bem e o mal, mocinhos e bandidos, histórias de amor, etc.
A análise de Pierre Bourdieu (1997), por sua vez, destaca um elemento de
fundamental importância para a compreensão dos reality-shows. A televisão é
fundamentalmente um meio de exibição, um lugar que as pessoas se dirigem para serem
vistas, uma espécie de praça pública, na esperança de conseguirem novas oportunidades de
destaque. Este é um dos principais pilares sobre os quais se apóiam os programas deste tipo.
O próprio desenvolvimento de um novo formato televisivo, como os reality-shows, comprova
essa tendência. Mas estes programas não apenas o validade a esta tese, como também
exploram ao máximo suas potencialidades, como se pode observar no breve levantamento
realizado no início do capítulo a diversidade de temáticas e de programas que fazem uso
dessa tendência. A argumentação do autor aponta elementos do que alguns anos mais tarde
viriam a ser os reality-shows. Segundo ele, o paradigma da televisão nos anos 1990, na busca
da maior audiência possível, é o talk show, programa que se baseia na exibição de
experiências vividas, freqüentemente extremas, que satisfaz uma espécie de voyeurimo e
112
exibicionismo do público elementos que também estão presentes com bastante destaque no
objeto de estudo desta pesquisa.
Os reality-shows freqüentemente aparecem envolvidos sob o discurso da novidade e
da euforia, destacado principalmente pelas emissoras, de que se trata de um gênero novo, de
uma linguagem nova. No entanto, propomos que eles reforçam a tese adorniana de que se
trata do ‘antigo com roupagem nova’. Como assinalamos no início do capítulo, desde o início
das transmissões televisivas, por exemplo, existiam programas que trabalhavam com certo
conceito de realidade e alguns autores os reputam como precursores deste formato. Ainda,
como demonstram os artigos de Cosette Castro (2004, 2006) e Silvia Borelli (2005), o se
trata de um formato inédito que inaugura uma nova linguagem televisiva, constituindo-se,
portanto em uma novidade mas é um tipo híbrido de programas que mesclam características
de diversas fórmulas consagradas. Borelli (2005) aponta que este tipo de programa, na
verdade, é o resultado da hibridação de formas conhecidas, tais como as telenovelas, os
programas de auditório e também dos talk-shows. Castro (2004, 2006) afirma que este é um
tipo híbrido de programa e que, além das formas apontadas acima, também traz características
dos programas de concursos, programas de confessionário, jornalismo e documentário. Por
outro lado, podemos considerar os reality-shows como uma novidade levando-se em conta
que são um tipo específico de programas que só se tornam possível com a globalização. Como
assinalamos no início do capítulo, eles são programas de televisão surgidos no final da década
de 1990 que tem como características a interação do telespectador com o conteúdo e são
difundidos simultaneamente em múltiplas plataformas (como a TV fechada, a telefonia e a
Internet). Dessa forma, o programas que se utilizam largamente da convergência entre
diferentes mídias, possibilitadas apenas na etapa globalizada do capitalismo. O programa que
mais explora estas características é o Big Brother.
A análise dos dados a respeito do Big Brother, tanto com relação a sua dimensão
global quanto a sua versão nacional, permite-nos concluir que este tipo de programa reforça a
tese de Adorno, de que a televisão não tem a função de veicular algo novo e original, uma
linguagem nova, mas que oferece fluxos de imagens e sons em sintonia com o sistema social
em que ela está inserida. Como vimos no capítulo anterior, o autor concebe a televisão
enquanto forma, como um meio apto a ser explorado pelo capital e que, portanto, isso
determina suas possibilidades e seu funcionamento. Conforme assinalamos inicialmente,
trata-se de um programa televisivo, exibido em TV aberta, mas que também pode ser
consumido em TV fechada, através do pay-per-view, via Internet e também por telefone. O
grande atrativo do programa, portanto, é a possibilidade de gerar novas receitas e aumentar
113
audiência não apenas na televisão como também nas diferentes mídias em que se apóia, como
apontou Campanella (2007). Por conseguinte, afirmamos que, para além do discurso de
novidade a respeito do programa e dos reality-shows como um todo, trata-se de um formato
em perfeita sintonia com a necessidade de exploração do capital, de diferentes origens, com
relação à televisão. Esta necessidade de ordem econômica determina seu funcionamento e
suas possibilidades. É importante destacar este aspecto de programas como estes,
especialmente em uma época em que as emissoras enfrentam uma crise generalizada de
audiência
54
e buscam programas de baixo custo e de alta lucratividade. Por sua vez, essa
necessidade reforça a crítica de que a TV não é um meio de comunicação neutro, isento e sem
conseqüências.
Uma das principais características deste tipo de programa, especialmente aqueles de
confinamento, é a interatividade, propalada por seus entusiastas como uma grande novidade
trazida pelos reality-shows. Portanto, pela importância que ela apresenta para o
desenvolvimento do programa como foi possível observar através da análise dos números
do Big Brother Brasil faz-se necessário tecer algumas ponderações a respeito dessa noção.
Em primeiro lugar, é preciso desmistificar esse conceito do caráter supostamente democrático
e libertário que muitos analistas o investem, principalmente com relação aos reality-shows.
Inicialmente, devemos questionar qual o tipo de interatividade estes programas propõem. O
telespectador tem liberdade efetiva de intervir na história desenvolvida pelo programa, ou
existem mediações? Para tanto, o principal aspecto a ser ressaltado, como nos aponta
Christoph Türcke (1999), é que a interação se baseia na ação inserida dentro de um esquema
behaviorista de estímulo-resposta. Ele pressupõe a existência de um emissor e um (ou vários)
receptor (es). Para que isso ocorra, há a necessidade de um canal dentro do qual se possa agir.
Ainda, é necessário conscientizar-se sobre as restrições e a filtragem que o meio realiza antes
mesmo do usuário esboçar a primeira reação. No Big Brother Brasil os telespectadores são
estimulados a interagir com o programa via Internet ou telefone através de duas formas
principais: para eliminação de um dos participantes, escolhidos conforme a regra do
programa; e para intervirem nos acontecimentos dentro da casa, através do Big Boss
55
. Nesta
segunda forma, os telespectadores escolhem entre uma das opções oferecidas pela produção
54
Sobre as razões da diminuição das audiências televisivas, no geral, e especialmente sobre o caso da Rede
Globo, ver: BORELLI, Silvia H. e PRIOLLI, Gabriel (coord.) A deusa ferida. São Paulo: Summus, 2000.
55
Também chamada de Big God, esta forma foi inserida no programa brasileiro a partir da quarta temporada. Os
telespectadores são estimulados a decidir sobre alguns acontecimentos da casa: se determinados participantes
deverão usar perucas ou saias; se todos devem cuidar de um ovo como se fosse um bicho de estimação, etc. Na
realidade, esta é mais uma forma da produção do programa inserir conflitos e acontecimentos que possam
provocar reações entre os participantes.
114
do programa. A escolha dos telespectadores para eliminação do participante, por sua vez,
acontece mediante as informações que ele consegue obter sobre os acontecimentos da casa. A
televisão aberta é a maior fonte de informação sobre o programa para grande parte da
audiência, se compararmos os números com a Internet e com o sistema de pay-per-view, deste
modo, devemos levar em consideração o papel fundamental exercido pela edição e a produção
do programa. São eles quem selecionam o que deve ser levado ao conhecimento do público e
de que forma isso se dará. Dessa maneira, o programa exibe resumos diários dos
acontecimentos, monta ‘perfis’ dos participantes indicados ao paredão, histórias de intrigas,
comédias e amores envolvendo os participantes, dentre outros. Como argumenta Borelli
(2005), a edição do programa exerce papel fundamental nesse processo de produção de
imagens e imaginários.
A interação do espectador com o Big Brother – ao contrário de demonstrar um
telespectador ativo e agindo autonomamente para expressar sua vontade de interferir na
história do programa é um sintoma da sua passividade. É um sinal de sua aceitação da
proposta do programa e da televisão, de seu deleite com o que lhe está sendo apresentado,
incapaz de criticar o que lhe é oferecido e exigir alterações. Como demonstraram Adorno e
Horkheimer (1985), a passividade está intimamente ligada à idéia de conformismo e de
adesão, isto é, o indivíduo que se conforma abdica de fazer qualquer atividade contrária a sua
adesão. Ela é uma atitude política, uma opção pela não-ação e não uma imobilidade total por
incapacidade do indivíduo, como é normalmente interpretada. Ela é o resultado de uma
adesão ao processo social, em que o indivíduo se conforma e abre mão de fazer qualquer
atividade. Os números bastante expressivos e sempre crescentes registrados pelas edições
brasileiras do Big Brother, tanto com relação à audiência do programa quanto à interação com
o mesmo que englobam o número de acessos ao site oficial do programa a cada edição, o
volume de ligações e de dados registrado em telefonia fixa e celular e os números da votação
a cada paredão demonstram a passividade e a adesão crescente dos telespectadores a este
tipo de programa televisivo.
Uma das principais características dos reality-shows é a proeminência dada as imagens
sobre qualquer outro fato, como a linguagem ou a narração. Um de seus principais motes é o
registro de acontecimentos ditos reais, nas mais variadas situações, pelas câmeras de
televisão. Este fato, central para programas como o Big Brother, destaca a importância da
linguagem das imagens sobre a linguagem falada, ou escrita, na televisão. Retomando Sartori
(2001), este é um acontecimento de grande importância provocado pela televisão e que gera
conseqüências. Ela nos conduz a realidades radicalmente novas, gerando um novo tipo de ser
115
humano no qual a capacidade de abstração dá lugar a assimilação de imagens. Portanto, a tese
do autor é que a televisão reforça a passividade do telespectador. Os números crescentes de
audiência e da interação com o Big Brother Brasil como vimos anteriormente podem
ratificar esta tese, de que programas deste tipo reforçam a passividade da audiência, ao
estimular não apenas que os telespectadores vejam as imagens produzidas pelo programa, mas
reajam de diversas maneiras a elas, aumentando o envolvimento deles com a televisão. É uma
forma de manter o telespectador na frente da televisão eo exercendo outras atividades.
Ainda com relação à interatividade proposta no Brasil inicialmente por programas
como Você Decide e o Itercine, e usada especialmente pelo Big Brother algumas questões
precisam ser refletidas. Em primeiro lugar, trata-se de uma resposta muito mais ‘reativa’ do
que propriamente interativa, como Joly (2001) apontou em seu artigo. Em segundo lugar, o
público não escolhe livremente a continuação. Ele é levado a escolher entre as opções previa e
cuidadosamente selecionadas pela rede de televisão seja o final A ou B de determinada
história, no caso do Você Decide, ou entre o filme muito conhecido e outro desconhecido, que
será exibido, em programas como o Intercine. O Big Brother Brasil pode ser apontado como
uma exceção, pelas escolhas dos espectadores serem dependentes das decisões dos
participantes do programa. Contudo, é preciso frisar que a emissora tem grande poder de
decisão sobre o que ocorre na casa, uma vez que é a produção do programa quem seleciona e
edita as imagens a partir das quais o público fará as suas escolhas. Além disso, não se trata
apenas de “convidar” o público a intervir na seqüência da narrativa de determinado programa,
ou mesmo da programação da emissora. O principal papel desta ‘interação’, na verdade, é
servir como uma enorme pesquisa de mercado para a emissora, pois através das respostas ela
tem a possibilidade de conhecer o que o público aprova ou desaprova. Isto permite a ela
identificar tendências, traçar o perfil da audiência, o gosto, a aprovação a determinados ‘tipos
sociais’ e comportamentos.
Como argumentamos no capítulo anterior, as novas tecnologias e o Big Brother,
por utilizar-se de algumas dessas novas tecnologias, pode ser também incluído aqui
aparentam ser mais meios de controle, de reconhecimento e identificação do que meios de
comunicação. Na realidade, podemos afirmar que elas são meios técnicos de espionagem,
meios de ‘verificação’, de ‘monitoramento’ das atividades do cidadão. Não é a toa que o mote
do Big Brother Brasil é ‘espiar’. Este programa suscita diversas implicações. As idéias de
controle e monitoramento estão intimamente relacionadas com a concepção do programa. Não
apenas dos participantes, que se submetem a estarem sob a vigilância das câmeras, mas de
todos aqueles que estão trancados em frente ao aparelho de televisão. Na verdade são eles os
116
controlados, os que são espiados. Como apontado anteriormente, ao interagir com o
programa, o indivíduo transmite informações. A emissora passa a conhecer a massa dos
espectadores, quais atitudes aprovam, quais desaprovam. Isso permite, por exemplo, que ela
produza novos produtos ou programas que atendam estas tendências.
Os reality-shows se apresentam como programas de televisão de sucesso mundial.
Uma de suas principais características é a adaptação de determinado formato bem-sucedido
em diversos países diferentes. O exemplo de maior expressão, nesse sentido, provavelmente
seja o Big Brother, que foi exibido em 70 países diferentes, mas mantendo o mesmo
formato e conjunto de regras básico. Uma de suas maiores características é a adaptação a
cultura de cada local onde é exibido. Esta relação de um programa de dimensões globais, mas
que se adapta as mais variadas culturas locais, pode ser explicada, segundo alguns autores,
pelo conceito de glocalização
56
. De acordo com Beck (1999), globalização o significa um
processo unilateral, mas uma nova consideração do elemento local. Ela não é apenas a des-
localização, mas também a re-localização. Esta perspectiva ressalta que o local e o global não
se excluem, pelo contrário, o local é um aspecto fundamental do global. No limite,
glocalização é um processo contingente e dialético. O Big Brother, como vimos
anteriormente, é um formato difundido pelo mundo todo. Em cada país e a cada edição ele
sofre adaptações e assume as ‘cores locais’, mas mantém as mesmas características que o
definem como programa. A casa onde convivem são similares. O conjunto de regras no que
diz respeito à competição, ao confinamento, à perda total de privacidade e à impossibilidade
de contato com o exterior da casa – permanece o mesmo. O que garante ao programa o caráter
‘local, ou a cor ‘local’, além das adaptações realizadas pela produção
57
, é o fato de o
programa utilizar-se de participantes do local onde o programa essendo exibido que, no
limite, são os elementos centrais de identificação do público com o programa.
3.6. Terceira passagem – conclusões.
56
Para maiores detalhes sobre o conceito de glocalização conferir p. 35.
57
O exemplo de intervenção mais explicita para adaptação da casa ao contexto da cultura local foi feito no Big
Brother Barein, batizado de Al Rais (o Chefe), em 2004. Foi necessário construir duas casas separadas, com
quartos e banheiros separados, em função dos costumes mulçumanos. Foram, inclusive, construídas mesquitas
separadas. A única área de convivência comum era o jardim. Além disso, homens gravam e editavam a parte
masculina e mulheres faziam a parte feminina (COMIN, 2004; KNOPLOCH, 2005; LIMA, I., 2005). A casa
pode também ser adaptada ao clima. Por isso, por exemplo, a casa da edição brasileira do reality-show é a que
tem a maior área externa de todas as edições do Big Brother (BARTOLOMEI, 2005).
117
A pesquisa tem por objetivo analisar os reality-shows como um produto característico
da indústria cultural e também, conseqüentemente, da televisão, na era da globalização.
Inicialmente foram selecionados autores que apontaram alguns dos possíveis antecessores
deste formato televisivo, numa tentativa de filiação destes programas a uma espécie de
história natural da televisão. Esta perspectiva foi analisada criticamente sob o prisma analítico
adotado por este trabalho, assinalando sua deficiência. O estudo sobre as características da
produtora Endemol revelou-nos aspectos interessantes do objeto de pesquisa. Ela desponta
como um importante ator inserido na dinâmica da globalização. A análise do programa Big
Brother, tanto em sua dimensão global quanto em sua versão local, foram importantes para a
compreensão do funcionamento da TV na era da globalização.
É comum a uma parcela significativa da bibliografia consultada para a redação deste
capítulo a perspectiva de que os reality-shows não são exatamente uma novidade, como
propagam seus entusiastas. As críticas neste sentido vão desde a discussão sobre os neros
televisivos ou mesmo sobre o recurso a determinado conceito de realidade em programas de
televisão, como vimos anteriormente. No entanto, esta tentativa de filiação dos atuais reality-
shows a uma ‘história da televisão’ impede-nos de observar aspectos importantes deste objeto.
Portanto, propomos uma separação destes programas entre os conceitos de ‘televisão-verdade
– diz respeito a programas que se baseiam em determinado conceito de realidade, não
apresentam novidades e fazem parte, se quisermos, de uma história natural do meio e
reality-show um tipo específico de programa televisivo, surgido no final da década de 1990,
que faz convergir diversas tecnologias de comunicação (como por exemplo, o telefone e a
Internet). Este último tem como principal característica possibilitar ao espectador a interação
com o conteúdo. Como demonstramos no segundo capítulo, o estágio globalizado do
capitalismo gera importantes mudanças no meio televisivo e a principal delas é a
convergência tecnológica. Logo, por terem a convergência de diferentes tecnologias de
comunicação como base, podemos afirmar que os reality-shows se tornam possíveis na
etapa globalizada do capitalismo. O melhor exemplo desta classificação é o programa Big
Brother.
A produtora holandesa Endemol, que na segunda metade dos anos 1990 se
caracterizava como uma empresa de televisão e de entretenimento audiovisual, de atuação
restrita ao mercado europeu, passou por significativas mudanças. Ela se expande em
dimensões globais a partir do programa Big Brother, criado em 1999. O programa
rapidamente obteve expressivos índices de audiência tanto em TV aberta quanto em telefonia
e número de acessos ao site oficial. Com a visibilidade obtida com o programa, a empresa foi
118
vendida ao grupo Telefónica inserindo-se, assim, na trama dos negócios globais, com a
fusão entre uma empresa produtora de conteúdo e uma de telecomunicações. Ela passa por um
processo de transição e deixa de ser apenas uma produtora de TV para se tornar uma
provedora de conteúdos multimídia, que integram especialmente a Internet e a telefonia
celular. Ela atua a partir da comercialização de formatos prontos para redes de televisão de
todo o mundo, adaptando-os para as audiências locais.
O conjunto de atividades desenvolvido pela Endemol torna evidente que ela é um
novo tipo de empresa no setor das comunicações, o que nos permite considerá-la como
exemplo de um fenômeno novo, sintomático da etapa globalizada do capitalismo. A
convergência de tecnologias que geram a globalização também trazem importantes
modificações para o meio televisivo. Deste modo, a Endemol apresenta-se como um ator de
fundamental importância para a compreensão da dinâmica do capitalismo atual, com relação
às comunicações. A Endemol Globo, por sua vez, pode ser citada como um exemplo de
empresa inserida na dinâmica da globalização, articulando a dimensão local e global, através
da adaptação de formatos produzidos em outros países para o mercado nacional.
Muitos analistas apontam o Big Brother como o programa de maior destaque dentre os
reality-shows surgidos a partir do final da década de 1990. A estrutura básica do programa
baseia-se no confinamento de um grupo de pessoas em uma casa, por certo período de tempo,
na qual são vigiadas constantemente por câmeras e microfones. Este formato pode ser
adaptado à cultura local onde será exibido, ou ainda ser adaptado em função da audiência
focada pela emissora. As principais características do programa são a interação com os
telespectadores e sua vinculação em múltiplas plataformas, o que pode ser apontado como a
novidade trazida pelos reality-shows para a TV globalizada. Deste modo, estas características
do Big Brother nos permitem afirmar que ele é um programa que só se torna possível na etapa
globalizada do capitalismo. Além disso, estas características nos permitem estabelecer uma
distinção entre os reality-shows produzidos a partir da década de 1990 e seus predecessores,
como assinalamos acima.
Os reality-shows freqüentemente aparecem envolvidos por um discurso eufórico em
torno da novidade, de que se trata de um gênero televisivo novo, de uma linguagem nova. Ao
contrário da perspectiva adotada por Vanessa Curvello (2002), os artigos de Silvia Borelli
(2005) e Cosette Castro (2004, 2006) demonstram que não se trata de um formato novo no
sentido de inaugurar uma nova linguagem televisiva, mas de um tipo de programa que mescla
características de diversas fórmulas consagradas. Por outro lado, podemos considerá-los como
uma novidade, levando em conta que são um tipo específico de programa que se torna
119
possível com a globalização. Eles surgem a partir do final da década de 1990 e tem como
principais características, como observamos anteriormente, a interação do espectador com o
conteúdo e são difundidos em múltiplas plataformas.
A interatividade é propalada como uma das principais características dos reality-
shows. Cabe, no entanto, nos questionarmos sobre as condições de interação às quais os
telespectadores são submetidos, se eles têm a liberdade efetiva de intervir no programa ou se
existem mediações. No caso estudado, o Big Brother Brasil, a audiência é estimulada através
de duas formas a interagir com o programa: para a eliminação do candidato e para intervir nos
acontecimentos da casa. Como nossa análise demonstrou, existe uma filtragem realizada pela
produção e edição do programa antes mesmo do telespectador esboçar a primeira reação.
Ainda, não se trata de um simples ‘convite’ ao público para interagir com o programa. O
principal papel desta interação, na verdade, é servir como uma pesquisa de mercado, pois as
respostas permitem à emissora identificar tendências, traçar o perfil da audiência, a aprovação
a determinados ‘tipos sociais’ e comportamentos. As idéias de controle e monitoramento estão
intimamente relacionadas à concepção do Big Brother. Ao interagir com o programa, o
indivíduo transmite informações. A emissora passa a conhecer a massa dos espectadores,
quais atitudes aprovam ou desaprovam. Assim, ela tem a possibilidade de produzir programas
que respondam a estas demandas.
Outro ponto importante a ser destacado é a compreensão da maneira como os reality-
shows se relacionam com o processo de globalização. No final da década de 1990 eles foram
difundidos mundialmente, sendo adaptados em diferentes países. Nesse sentido, o Big Brother
pode ser apontado com o exemplo de maior expressão, uma vez que já foi exibido em 70
países, mas mantendo o mesmo conjunto de regras sico. Como vimos anteriormente, em
cada país e a cada edição o programa é adaptado e assume ‘cores locais’, mas mantém as
mesmas características que definem como um formato. O conjunto de regras no que diz
respeito à competição, ao confinamento, à perda total de privacidade e à impossibilidade de
contato com o exterior da casa permanece o mesmo. O que garante ao programa o caráter
‘local, ou a cor ‘local’, além das adaptações realizadas pela produção, é o fato de o programa
utilizar-se de participantes do local onde o programa está sendo exibido que, no limite, são
os elementos centrais de identificação do público com o programa.
120
Conclusões
ConclusõesConclusões
Conclusões
121
Os reality-shows são programas de televisão que tem como principais características a
operação em diferentes plataformas e a interatividade, eles surgem no final da década de 1990
e foram difundidos mundialmente. Isto é, eles se baseiam na convergência de diversas
tecnologias de comunicação, portanto, são produtos característicos da etapa globalizada do
capitalismo. O melhor exemplo dentre estes programas é o Big Brother, pois ele é transmitido
em canais pay-per-view e via Internet, além de possibilitar a interação com o programa via
telefone fixo e celular e site oficial, através de votações, jogos, notícias e conteúdos
exclusivos.
A partir destes programas foi possível fazer um balanço sobre a atualidade do conceito
de indústria cultural na era da globalização. Como discutido no primeiro capítulo, o
desenvolvimento das tecnologias no sentido da sua convergência resulta na associação de
capitais de diversos setores, especialmente no setor das comunicações, alterando
significativamente o capitalismo atual. O resultado deste processo é a indústria do
entretenimento tornar-se um setor altamente lucrativo, atraindo investimentos de capitais de
outras áreas. Portanto, o conceito de indústria cultural não pode ser tomado tal como foi
formulado por Adorno e Horkheimer (1985), sendo necessário atualizarmos os termos em que
é possível seu emprego. Douglas Kelner (2001) argumenta que a atual relação entre cultura e
tecnologia é tão distinta da situação em que estes autores escreveram que propõe o uso de um
novo conceito, o de cultura da dia. Cristoph Türcke (1999) defende que os novos meios
de comunicação, que convergem o computador e a telecomunicação, indicam uma nova fase
da indústria cultural. Além das características apontadas acima, é importante ressaltar que a
globalização não é um processo unilateral e unidimensional, ela acarreta também um processo
de localização. Assim, Ulrich Beck (1999) propõe a substituição do conceito de globalização
cultural pelo conceito de ‘glocalização’, evidenciando a necessidade de uma nova
consideração do elemento local. Esta proposta ajuda-nos a compreender a difusão de um
programa dito global, mas que é adaptado em diferentes culturas locais, alcançando
expressivos resultados comerciais, como é o caso do Big Brother.
Com os reality-shows os programas exibidos na televisão passam a ser propaganda do
que está acontecendo nas outras plataformas. Ainda, por ser o meio em que a maior parte das
pessoas tem contato com o programa, fez-se necessário no segundo capítulo uma análise
crítica sobre esse meio, a fim de identificar suas principais implicações. Dessa forma, pode-se
demonstrar que a televisão não é um meio neutro e sem conseqüência, como podem acreditar
alguns observadores desatentos, mas realiza uma rie de mediações e intervenções naquilo
que é exibido. Ela é um meio que está apto a ser explorado pelo capital, e isto determina o seu
122
funcionamento, como desvenda a análise de Adorno (1971). A tese de Saroti (2001) é que a
televisão o é somente um instrumento de comunicação, ao mesmo tempo ela também gera
um novo tipo de ser humano, provocando um retorno ao puro e simples ver, atrofiando nossa
capacidade de abstração. Ainda, para Bourdieu (1997), ela não é um meio que comunica, mas
é essencialmente um lugar de exibição.
Todavia, apenas estas características demonstraram-se insuficientes para o estudo dos
reality-shows, portanto, debatemos as principais características da TV na etapa globalizada do
capitalismo. Como a discussão do primeiro capítulo já havia deixado claro, a convergência de
tecnologias é um aspecto fundamental para a compreensão do processo de globalização. A
televisão não está excluída deste processo e, conseqüentemente, a convergência é apontada
por diversos autores como a principal tendência para este meio. Ainda não existe um consenso
a respeito de quais modos isso se dará, mas a associação entre televisão e Internet é destacada
com freqüência. Desta forma, propusemos que os reality-shows podem ser considerados
exemplos de programas que fazem uso desta convergência entre as dias como forma de
ampliar a participação da audiência e, portanto, o tempo que o telespectador fica exposto aos
patrocinadores do programa. Ainda, apontamos que o Big Brother é um programa que
delineia o que pode vir a ser a televisão na era da globalização.
No terceiro capítulo destacamos a especificidade dos reality-shows – surgidos na
segunda metade da década de 1990 através da interatividade com os espectadores e a partir
da utilização de múltiplas plataformas para difundir os conteúdos audiovisuais. Portanto, por
se basearem na convergência de diferentes tecnologias de comunicação, afirmamos que são
produtos característicos da indústria cultural na etapa globalizada do capitalismo. Deste modo,
a novidade trazida por estes programas não reside no formato ou na linguagem, mas
especificamente na diversidade de meios em que os programas são vinculados. Como
apontamos anteriormente, o programa de televisão passa a ser uma propaganda do que é
oferecido nas demais plataformas. Propusemos que o Big Brother é o melhor exemplo deste
tipo de programa, uma vez que ele é transmitido em TV aberta e fechada, pela Internet e pelo
telefone. Ele ainda possibilita ao espectador a interação com o programa tanto por telefone
fixo e celular – como pelo site oficial, através de votações, jogos, notícias e conteúdos
exclusivos. Neste sentido também destacamos a atuação da produtora do programa, a
Endemol. Ela passou a ter uma atuação global no final da década de 1990 e especializou-se na
produção de conteúdos multimídia, baseados em múltiplas plataformas, Por estas
características destacamos esta produtora como exemplo de um fenômeno novo, sintomático
da globalização. Assim, ela apresenta-se como um ator de fundamental importância para a
123
compreensão da dinâmica do capitalismo globalizado, especialmente com relação às
comunicações.
124
Apêndices
ApêndicesApêndices
Apêndices
125
Apêndice A – Primeiras impressões sobre os reality-shows.
Reunimos nesta seção textos por nós analisados em outros momentos, em que os
autores registram algumas das primeiras impressões sobre os reality-shows no Brasil. O
caderno MAIS!, da Folha de São Paulo, publicou um número especial para tratar dos reality-
shows, em 2002 o ano em que foram ao ar os primeiros programas desse gênero no Brasil.
Foram escolhidos três autores para escreverem sobre o assunto: o psicanalista e professor da
Universidade do Rio de Janeiro, Jurandir Freire Costa; Ivana Bentes, professora da Escola de
Comunicação da Universidade do Rio de Janeiro e Ciro Marcondes Filho, professor na Escola
de Comunicações e Artes da USP. Em 2004, Eugênio Bucci e Maria Rita Kehl publicaram um
importante estudo sobre diversos aspectos da televisão, chamado Videologias. Nele a
psicanalista Maria Rita Kehl desvenda traços muito importantes sobre os reality-shows.
1. Jurandir Freire Costa: Diversão ou Desatino?
Jurandir Freire Costa (2002) introduz seu ensaio com uma indagação: Porque o
interesse pela privacidade de artistas ou de pessoas comuns, fechados numa casa? Ao tentar
responder, ele pretende ir além das explicações que se sucederam ao fenômeno: voyeurismo,
alienação política, alienação cultural, ganância por parte dos produtores e patrocinadores, etc.
Portanto, o que inicialmente chama sua atenção é a idéia de sucesso, de aprovação do público.
Isso o leva a propor a seguinte questão: ‘quais visões de mundo transformaram tais programas
em sucesso de audiência?’. Ele destaca a ‘mudança do valor da moral da intimidade’.
Programas como o Big Brother ou Casa dos Artistas eram impensáveis para os padrões do
século XIX e início do século XX, pois na cultura burguesa dessa época a intimidade era vista
com curiosidade, desconfiança, respeito, mas nunca como algo a ser ostentado. Na ‘cultura
pós-burguesa’ esse modo de vida é transformado. A intimidade passa então a ser usada de
diversas maneiras, por diversos grupos de pessoas: pelos conservadores, pelos contestadores
para denunciar o machismo da ‘família burguesa’, e pelo mercado que a como um
‘produto’ que se vende, principalmente como marca do estilo de vida dos vencedores. É
retirada da intimidade toda a sua atração moral e emocional. O autor conclui, portanto, que
programas como Casa dos Artistas e Big Brother não desrespeitam a privacidade, eles apenas
126
a configuram sem os ideais ‘tradicionais’. Para ele, todos os participantes compartilham, com
maior ou menor grau de consciência, daquilo que ele chama de ‘moral do capricho’ e
‘amoralidade do lucro’. Esta pode ser descrita como sendo o que valemos em dinheiro, a
medida do que se é se em função daquilo que se tem. A ‘moral do capricho’ diz respeito
aos telespectadores, que decidem o que vai ser dos moradores, ‘em razão do humor ou da
convicção moral momentâneos’.
As regras do julgamento estariam, teoricamente, baseadas na avaliação da
personalidade e aptidão dos jogadores para viver em coletividade. Mas o que acontece na
prática é outra coisa. “O que se quer mesmo é, de um lado, o prêmio em dinheiro, e do outro,
entretenimento inconseqüente e gozo de poder sem o ônus do comando. (...) Pois, se a
brincadeira ultrapassa os limites e o bom-mocismo esperado descamba para o imprevisto,
muda-se de canal e cessa o desconforto. Ninguém é interpelado pela escolha feita; ninguém se
compromete com aquilo que escolheu”.
Costa (2002) argumenta que o que está por trás dessa moralidade pós-burguesa
politicamente correta com relação ao sexo e cuidados corporais, entre outros pontos da cultura
urbana contemporânea é uma versão recauchutada da manobra ‘circo’ para as massas e
‘sarau’ para as elites. Este é o segundo aspecto importante para ressaltar. Enquanto de um
lado temos as elites brasileiras consumindo viagens sofisticadas, ‘bom gosto’ na TV a cabo,
etc., a classe média e os miseráveis intimidados pela violência urbana se trancam em casa
para decidir sobre a sorte de outros trancafiados. Ao contrário do que acontece no livro de
Orwell que inspira o título de um dos programas na televisão, os espiões e os espionados
são guardiões extremamente convictos do status quo político. Segundo o autor, aqueles que
espiam não passeiam. Estão trancados em suas casas aguardando dias melhores, enquanto
olham a metáfora do próprio enclausuramento com a satisfação de quem cobiça o que
despreza e não ousa dizer aquilo que pensa: “Pena que não sou eu! Mas já que não sou eu,
será quem eu quiser!”. Jurandir Freire Costa (2002) termina argumentando que as pessoas são
induzidas a crer que controlam o quefoi controlado, e o que, de fato, limita suas liberdades
continua onde sempre esteve.
2. Ivana Bentes: Guerrilha de sofá.
127
Ivana Bentes (2002) inicia o ensaio argumentando que a TV promove mudanças
sociais significativas, reflete um ‘certo estado de coisas’, cria um senso comum público e
sempre busca antecipar o futuro. Olhando para a TV brasileira ela propõem a seguinte
questão: que tipo de cultura essa televisão reflete, e de certa maneira prefigura? A autora
afirma que a televisão está passando por uma reconfiguração, em função de sua convergência
com a Internet. A idéia central do texto, sobre a qual vai se desenrolar toda a análise e a
conclusão a respeito dos reality-shows é a constatação, feita por Bentes (2002), de que “A
oferta global de informações supera num nível estupidamente grande a capacidade humana de
consumo”. Isso gera uma enorme disputa por comprar a nossa atenção, afim de que ao menos
uma parte dessa produção seja consumida. Uma tentativa por parte da TV de prender nossa
atenção, segundo ela, é a ‘interação’. Os ‘programas de convivência’, como a autora os
chama, e todos aqueles que trabalham com a comercialização da intimidade ou criam vínculos
entre grupos de participantes e telespectadores ‘atuantes’, são outra forma de resposta a este
quadro de disputa pela atenção dos espectadores.
Ela afirma que a televisão vem concretizando um ‘desejo utópico’ ao ligar
indivíduos e suas necessidades pessoais a espaços públicos ‘mentes coletivas’. Instrumentos
como o computador, o telefone, a TV e a Internet, ao mesmo tempo em que servem à
produção, podem servir também ao lazer. Dessa forma ocorre uma continuidade e uma
extensão entre o tempo de vida, o tempo de trabalho e o tempo de lazer que são, segundo a
autora, características do capitalismo s-industrial. A televisão aposta nos ‘jogos de
convivência’ como simulações de certa vida social, onde se criam vínculos, um formato em
expansão e que obtém grande sucesso. Em sua contínua busca por novos fatos, a fim de
comprar nosso tempo, ela chama o espectador a participar do processo de produção. Ele é o
‘consumidor-produtor’, de Benjamim. As novas tecnologias doméstico-industriais nos
transformam em unidades móveis de produção de imagens e informação, que vão alimentar o
sistema de comunicação.
De acordo com Bentes (2002), a instabilidade provoca mudanças significativas nas
fórmulas consagradas de se fazer TV. Em conseqüência disso, o campo televisivo e suas
exigências comerciais se sobrepõem a todo princípio. Ela afirma que uma demanda por
parte da audiência, por ver pessoas anônimas na TV, que se apresentam como um desejo
difuso na sociedade e que a própria televisão se antecipa e da vazão a este desejo, seja através
do show de calouros ou pelos ‘repórteres por um dia’, ou ainda, atualmente também na forma
dos reality-shows. Programas como o Big Brother ou a Casa dos Artistas revelam a formação
de celebridades televisivas. Uma nova vida que virá após o programa e o capital midiático que
128
é acumulado. Segundo a autora, o que virá a ser deles depois do programa é o assunto mais
recorrente entre os próprios participantes. ainda a questão dos novos tipos sociais que
surgem e o legitimados nesses programas. Contrariamente a programas como A praça é
nossa, Ratinho e Zorra total, em que os personagens são basicamente o machão, a gostosa, a
virgem, todos fazendo parte de um imaginário popular e rural. Os novos tipos sociais
representados nestes programas em especial o da Rede Globo são parte de um imaginário
próximo da classe média urbana: a empresária paulista, o artista plástico, a designer, o
cabeleireiro chique, o dançarino de axé, a modelo manequim, a socialite.
Confissão e vigilância tornam-se entretenimento, espetáculo. Poder ter acesso às
confissões, vigiar, poder julgar e excluir através de um voto anônimo são as bases daquilo que
a autora chama de ‘democratismo difuso’, que em sua opinião é socialmente inoperante, visto
que na realidade os telespectadores nunca decidem nada de importante. A idéia de criação de
comunidades de telespectadores, que de certa forma seriam atuantes é presente na análise de
muitos escritores. autores, como Nestor Garcia Canclini e Antonio Negri que o
contrários ao ‘lugar comum da ‘irracionalidade’ e ‘passividade’ no consumo do
telespectador. Tal possibilidade é descartada Guy Debord, que argumenta: “Quem fica
sempre olhando, para saber o que vem depois, nunca age: assim deve ser o bom espectador”.
Para Bentes (2002), resta ainda saber como tomar posse da TV e fazer uma ‘guerrilha de
sofá’.
3. Ciro Marcondes Filho: A devoração da telinha.
O autor classifica o Big Brother como o primeiro programa genuinamente mundial
de televisão, começando na Holanda e sendo vendido para 25 países com grande sucesso. A
idéia básica do programa é apresentar pessoas normais (o que, segundo o autor, não foi bem o
caso brasileiro) que não representam nenhum papel ou emoção, tudo muito real daí a idéia
de reality. A concepção original do programa é que o isolamento e a constante observação se
traduzam em sentimentos verdadeiros por parte dos participantes. Marcondes Filho (2002) vai
destacar que, curiosamente, o atrativo não está no sexo ou na nudez, mas nas conversas;
seriam estas as que prenderiam o telespectador nessa ‘encenação do cotidiano’, que de acordo
com ele, ‘é muito chato’. Segundo o autor, o Big Brother se separou de seu precursor o
fenômeno das webcam, em que pessoas comuns exibem imagens particulares, de suas vidas
129
cotidianas, a partir de suas casas, via Internet com um sistema técnico sofisticado, com
regras de concorrência e exclusão e receitas banais de televisão. ‘Algo mudou na vida das
pessoas.
A pretensão de Ciro Marcondes Filho (2002) é ir além de toda a ‘verborragia’ que
pretende explicar o fenômeno, afim de não perder a dimensão do que de fato está
acontecendo. O processo de desenvolvimento tecnológico leva a um processo muito curioso,
ao qual ele o nome de ‘selva tecnológica’, onde um meio de comunicação supera o outro.
Do mesmo modo como a TV havia desbancado o cinema, agora é a Internet que passa a ter
uma hegemonia na cena do entretenimento. um processo de mudança das sensibilidades
que provocou o fenômeno de corrosão das intimidades. Nos últimos cem anos, o autor
identifica um movimento da cultura em que o cinema passou a condensar em uma tela todo o
universo do sonho e do prazer. Logo em seguida, a televisão leva o cinema pra dentro de casa,
acrescentando esportes, humor, informação, retirando as pessoas da rua. Com o advento e
popularização da Internet, esse processo se radicaliza, trazendo os bancos, bibliotecas, enfim,
todo um universo para dentro de casa. O autor então constata que ‘a realidade externa esta se
evaporando’, a vida está cada vez mais deixando as ruas e se concentrando nas telas. A
cultura contemporânea proporciona meios para que o indivíduo possa fazer quase tudo sem
sair de casa, a televisão e a Internet trazem inúmeras opções ao indivíduo. Elas trazem essa
possibilidade para que ele faça tudo sem ter que sair de sua casa, sem necessariamente ter que
freqüentar espaços públicos, ‘ir à rua’; no entanto, isso não quer dizer que as pessoas estão se
trancando dentro de casa definitivamente, isto sugere apenas uma possibilidade indicada pelo
movimento da cultura contemporânea.
ainda outro fenômeno explicativo. No passado, a religião exercia um forte papel
de controle na sociedade e hoje em dia isso não ocorre mais, esse lugar foi ocupado pela
tecnologia. Com esse aparato tecnológico as pessoas se sentem sem rumo, sem direção, como
se as coisas estivessem fora de ordem. Nesse sentido, o autor trabalha a idéia de que o Big
Brother ‘recoloca algumas coisas no lugar’ na medida em que restitui um sentimento de
onipotência aos telespectadores diante de personagens ‘frágeis’, de fácil leitura, que
sugeririam ‘autenticidade’. Seria – ao menos no caso analisado pelo nosso autor – uma
substituição das ‘meninas bonitas e idéias de beleza’ por formas mais rudes. Além disso, o
programa reinventa o sentido de comunidade entre seus s os fuxicos e as especulações
acabam se tornando mais interessante que a própria série.
Neste texto Marcondes Filho (2002) identifica ainda uma necessidade que as pessoas
têm de serem vistas, pois segundo ele “a tragédia do mundo atual é não ser observado”. Dessa
130
forma, torna-se irrelevante discutir o conteúdo da série. O segredo estaria na superfície, na
pulsão que o indivíduo tem de mostrar sua intimidade ao outro. No entanto, defendemos o
argumento que o conteúdo do programa também traz muitas informações importantes para a
compreensão desse fenômeno de uma maneira mais abrangente. As edições de imagens que
são realizadas através do ‘perfis’ dos participantes que vão para o ‘paredão’ e as ‘novelinhas’
que são editadas com acontecimentos da casa, são também importantes para compreendermos
o objeto de outra perspectiva. O papel desempenhado pelo apresentador também é importante
no desenrolar do programa, como foi discutido anteriormente. Estes elementos ajudam a
prender a atenção do telespectador no programa e indicam o andamento seguinte do mesmo,
uma vez que seguem uma tendência.
De acordo com o autor, a intimidade exposta parece ser hoje a resposta ao vazio
criado pelo desaparecimento de crenças e religião e pelo branco que vem acoplado a esta
cultura tecnológica. O íntimo, que em outras épocas era o ‘tesouro’ de cada um, sofre uma
forte mudança e nos dias de hoje não encontra mais demanda para o seu ‘segredo’. “A
facilidade de exposição, aliada a uma alta sensação de insignificância (não mais Deus,
nenhum valor é mais alto que a própria prova da existência), escancarou as comportas da
subjetividade. Vale provar que, se existe a qualquer preço, é porque ninguém esta mais aí para
comprová-lo”.
4. Maria Rita Kehl: O espetáculo como meio de subjetivação.
A autora pretende com esse ensaio, publicado em 2004 no livro Videologias, escrito
juntamente com Eugênio Bucci, discutir a atualidade do texto A indústria cultural: o
esclarecimento como mistificação das massas (1947) de Theodor Adorno e Max Horkheimer,
em diálogo com o livro A sociedade do espetáculo (1967) de Guy Debord, escrito com duas
décadas de diferença entre um e outro. Esse diálogo tem como pano de fundo, hoje, a
gigantesca expansão da televisão nos anos que nos distanciam daqueles autores. Segundo
Maria Rita Kehl (2004) , a televisão é a mais espetacular tradução da indústria cultural.
Adorno e Debord têm interesse comum pelos efeitos da expansão em escala dos objetos da
cultura, produzidos em série, sobre a sociedade contemporânea. Esta discussão está
fortemente associada à ideologia, pois não afeta apenas indivíduos isolados, mas diz respeito
ao laço social.
131
Para ela, a passagem do conceito de ‘indústria cultural’ para o de ‘sociedade do
espetáculo’ não representa uma quebra de paradigma; ela considera a hipótese de que essa
passagem seja uma expansão da indústria cultural com o auxílio da televisão. Para a autora, a
passagem de um conceito ao outro aconteceu através de um enorme aperfeiçoamento técnico
dos meios de traduzir a vida em imagem, até que se pudesse abarcar toda a extensão da vida
social. O que marca a diferença de um texto para o outro é que a expansão dos meios técnicos
de produção de informação e imagens resultou em um novo objeto para o pensamento crítico.
As idéias de produção industrial de imagens, trabalho alienado e fetiche da mercadoria são
pontos fundamentais tanto no texto de Adorno quanto no de Debord.
Para Debord, o espetáculo é o momento em que a mercadoria ocupou toda a vida
social, portanto, a alienação do trabalhador completa-se quando ele é transformado em
consumidor. Consumir, aqui, é entendido pela autora como a identificação com as imagens
dos meios de comunicação. A partir do momento que a mercadoria detém todo o campo das
imagens e, em conseqüência, é capaz de ocupar toda a vida social, a indústria cultural,
conceituada por Adorno, perde os seus contornos. A televisão, para ele, diferencia-se do
cinema por ser um veículo doméstico, cotidiano, onipresente e que liga a individualidade
privatizada e o espaço público que ela substitui. A TV consagra a plasticidade do capital, ou
como observa Debord, ‘o espetáculo é a outra face do dinheiro’.
Podemos perceber em Adorno uma crítica ao indivíduo que sofre os efeitos da
indústria cultural, mas que também se aproxima de uma nostalgia de um ideal de ‘indivíduo’
que não se realizou plenamente. Lacan entende o indivíduo como um ideal que promove
‘identificações’. Para Adorno, os indivíduos reduzem-se a uma massa indiferenciada de
pessoas que perseguem os seus fins privados. Portanto, o indivíduo, quando perde suas
referências simbólicas, no capitalismo tardio, fica à mercê de imagens que o representam para
si mesmo.
Na argumentação de Debord, o espetáculo não é um conjunto de imagens, mas sim
uma relação social entre pessoas e que é mediada pelas imagens – a imagem industrial
aparece aqui como um fetiche, sintetizando o modo contemporâneo de alienação, o modo de
expropriação simbólico equivalente ao produzido pela mais-valia. O reconhecimento social
desses indivíduos depende totalmente da visibilidade, não de uma visibilidade qualquer, mas
uma visibilidade em que o único agente do espetáculo é ele mesmo. Nesse sentido, como foi
formulada por Isleide Fontenelle, a sociedade do espetáculo pode ser vista como um momento
da sociedade capitalista em que o princípio da diferenciação se pela imagem. Em última
132
instância, ‘dependemos do espetáculo para confirmar que existimos e para nos orientar em
meio a nossos semelhantes, dos quais nos isolamos' (BUCCI & KEHL, 2004, p.50).
A autora argumenta que se o ‘indivíduo’ não é reduzido a mais um competidor na
massa, ele passa a ser tratado como um ‘consumidor’. Essa operação se realiza apelando à
dimensão do desejo, singular, e dando como resposta a ela o fetiche da mercadoria. Promove-
se uma confusão entre os objetos de consumo e objetos de desejo, que desarticula a relação
dos sujeitos com a dimensão simbólica do desejo, lançando todos no registro da satisfação da
necessidade, que é real. Neste processo, o indivíduo perde a singularidade das produções
subjetivas, enquanto tentativa de formação de símbolos. Para Guy Debord, quanto mais o
espectador contempla, menos ele vive; quanto mais ele se reconhece nas imagens, menos ele
compreende a sua existência. Adorno irá dizer que o desejo excitado pela indústria cultural
remete o indivíduo de volta ao cotidiano cinzento de que ele gostaria de escapar. A indústria
cultural apresenta todas as necessidades como podendo ser satisfeitas, mas de maneira que o
indivíduo se veja nelas somente como um ‘eterno consumidor’, um objeto dessa indústria. O
princípio da ‘diversão’, que é reforçado pela indústria cultural, apresenta um dado
problemático, pois segundo Adorno, divertir-se é estar de acordo. O objetivo último dessa
indústria não é o consumidor enquanto ‘sujeito pensante’ e sim um sujeito totalmente
desacostumado da subjetividade, desamparado.
Quanto mais o indivíduo perde a direção de suas produções subjetivas singulares,
mais a indústria devolve a ele uma ‘subjetividade reificada’, produzida em série,
espetacularizada. Ele consome essa subjetividade industrializada a fim de preencher o vazio
da vida interior, do qual ele abre mão em função da paixão de pertencer à massa, identificar-
se com ela da maneira como propõe o espetáculo. A autora afirma que é por isso que se
explica o interesse pelos reality-shows. É a tentativa de flagrar uma expressão espontânea da
subjetividade do Outro, sem perceber que aqueles que participam estão tão ‘formatados’ pela
televisão – desacostumados da subjetividade – quanto o telespectador.
A indústria cultural produz ‘pseudo-indivíduos’ e reconhece aqueles que ela é
capaz de incluir no seu sistema. Debord afirma que o ‘espetáculo é o dinheiro que se olha’,
uma vez que apaga o homem enquanto agente social. Para Adorno, o espetáculo
instrumentaliza o imaginário a fim de tornar a dominação desejável. O espetáculo visa à
identificação entre bens e mercadorias, no sentido de que ‘a lógica da produção alienada é
aperfeiçoada pelo consumo alienado’ (BUCCI & KEHL, 2004, p. 56).
Adorno, nos anos 40, propõe pensar a relação entre a liberdade da indústria cultural e
o ‘recalcamento’ do pensamento e da libido. Esta relação se estabelece entre as obras da
133
indústria cultural e as representações da subjetividade reificada, e fazem com que a
sexualidade seja constantemente convocada, a fim de reforçar o recalcamento da finalidade
principal. Kehl (2004) nos propõe pensar separadamente o recalcamento do pensamento e da
libido. A televisão e outros produtos da ‘cultura industrializada’ dispensam o sujeito da
atividade de pensar, ao menos enquanto estes se encontram na posição de telespectadores. O
binômio ‘diversão/distração’, proposta por essa cultura, é a realização de uma ocupação do
tempo livre que não requer o trabalho do pensamento. Retomando Adorno, divertir-se é estar
de acordo, e para isso o pensamento é desnecessário.
A autora defende a idéia que a evolução da relação da indústria cultural com o
inconsciente das massas produz um fenômeno mais eficiente que o ‘recalcamento’. Pois o
imaginário proposto pela sociedade de consumo é diferente daquele proposto pelo estágio
inicial do capitalismo. Portanto, se no período seguinte à revolução industrial as massas
urbanas eram chamadas enquanto força de trabalho, das quais se exigiam esforços e
sacrifícios imediatos e adiava as gratificações que se esperavam, nas atuais condições, em que
os homens valem mais como consumidores do que como força de trabalho, os valores que
condicionam sua inclusão se inverteram. Não são mais exigidos o esforço e os sacrifícios da
massa, mas é dado o ‘direito ao prazer’. Não é mais proposto o adiamento das gratificações,
mas sim o gozo imediato de tudo o que é oferecido com essa finalidade. Hoje o se trata
mais de recalcar o desejo e sim de ‘seduzir o sujeito do desejo’. A grande força de sedução da
imagem enquanto espetáculo realiza-se na propriedade do fetiche, pois o fetiche torna
possível a naturalização de uma relação social, ou seja, ela apaga a história.
O desejo se apóia na interdição do gozo. A publicidade constantemente apela ao
gozo, que apaga a dimensão do desejo. Ela oferece a realização das representações recalcadas
do desejo, projetadas nas mercadorias que, segundo Kehl (2004), são o modo de inclusão de
todos os valores de uso na linguagem do espetáculo. A saturação de imagens que se
relacionam com representações do desejo inconsciente deixa os consumidores/espectadores
livres da responsabilidade pela dimensão singular do inconsciente, o que é o oposto do
recalcamento. Isso é a mercantilização do inconsciente. Ela afirma, ainda, que o
desenvolvimento das técnicas de sedução do consumidor, por parte da publicidade, foi além
do objetivo inicial de promover a venda de mercadorias. Hoje a publicidade não serve apenas
para vender a marca X ou Y de um determinado produto. Junto com as mercadorias que ela
vende, e que são acessíveis apenas a uma parcela da sociedade, a publicidade vende sonhos e
ideais para a sociedade inteira. Até mesmo os que não consomem as mercadorias
propagandeadas como a ‘chave da felicidade’ consomem a imagem deles e o desejo de
134
possuí-los. Ainda segundo a autora, os publicitários descobriram ser possível fazer o
inconsciente do consumidor trabalhar em favor do lucro, pois o inconsciente é amoral. Ele
trabalha com a lógica da realização imediata do desejo, que, de acordo com ela, não é
individual e sim social. Nós desejamos aquilo que os outros desejam, ou ainda, o que nos
convidam a desejar. Enfim, o que a publicidade oferece aos consumidores é uma ‘pseudo-
escolha’, a escolha de compra entre a marca X ou Y.
5. Maria Rita Kehl: Visibilidade e espetáculo.
Neste ensaio, também publicado em 2004, no livro Videologias, escrito
conjuntamente com Eugênio Bucci, Maria Rita Kehl destaca que a onipresença da televisão
na vida doméstica dos brasileiros tem provocado alterações nas relações entre o público e o
privado. Nos dois últimos séculos a moral burguesa e o bom gosto pregavam que algumas
coisas não se dizem, não se mostram e não se fazem em público. No entanto, vemos hoje estas
mesmas coisas, que eram reservadas à esfera privada, ocupando papel de grande destaque na
televisão. Esta inversão dos valores estabelecidos dá, no mínimo, muito o que pensar.
Podemos concluir que pelo menos a burguesia do século XXI não é a mesma que ditou os
costumes nos séculos anteriores. Em última análise, os fundamentos que ordenavam a vida
social nos séculos XIX e XX se modificaram e vivemos hoje numa sociedade pós-burguesa.
Essa sociedade pós-burguesa, no tocante aos valores, seria uma sociedade de massas, mas
apenas como movimento necessário da expansão da cultura burguesa. Ela parte do princípio
de que tanto a televisão quanto a publicidade monopolizavam o imaginário dessa sociedade.
Dentre as diversas possibilidades de denominação dessa sociedade, Kehl (2004) toma
como ponto de partida para sua análise o fato de que seria viável a hipótese explicativa da
‘sociedade do espetáculo’. Tomando a colocação de Guy Debord, ela irá afirmar que é
possível que a inversão que vemos hoje na relação público/privado seja conseqüência de
vivermos em uma sociedade que é regulada fundamentalmente pelo espetáculo e não mais
pela política ou pela religião. Nesta ‘sociedade do espetáculo’, o efeito midiático de um
evento chega a ser mais importante do que seu papel na história ou de que as conseqüências
políticas que ele possa vir a ter. Até mesmo o fato de que os homens são parte desses
acontecimentos, pois são os únicos agentes da história, é apagado diante da dimensão do
espetáculo.
135
Uma modificação da dimensão do poder e da dominação na sociedade do espetáculo
é o ‘ocultamento’ de tudo aquilo que não pode ser compreendido pela linguagem da imagem e
de tudo o que depende do trabalho e do esforço do pensamento. Este é um ponto central dessa
lógica, mas não necessariamente ele é proposital. Dessa forma, o espetáculo organiza a
ignorância daquilo que acontece e o conseqüente esquecimento daquilo que porventura se
torna conhecido.
Na sociedade do espetáculo, onde a política é traçada pela visibilidade instantânea, a
fama acaba por tornar-se mais importante do que a cidadania. E, ainda, a exibição tem maior
efeito no laço social do que a participação na sociedade. A diminuição aparente da
importância dos assuntos públicos, segundo a autora, tem como correspondente um ‘excesso
de interesse pelos detalhes mais insignificantes da vida privada. A autora passa, então, a
examinar com inquietação o sucesso dos reality-shows, principalmente o fato de pessoas
‘comuns’ submeterem-se a situações degradantes atrás de um pouco de fama. Segundo ela, se
a invasão da privacidade é consentida nesses programas, então o exibicionismo dos
protagonistas é bem maior que o voyeurismo das câmeras.
O que interessa ao espectador fiel é a esperança de que a exibição, pela televisão, da
banalidade de um cotidiano parecido com o seu, ponha em evidência migalhas de
brilho e sentido que sua vida, condenada à domesticidade, não tem
(BUCCI &
KEHL, 2004, p.144).
Com os ‘ideais’ esquecidos e fora do alcance dos homens comuns, somente o brilho fugaz da
‘fama’ pode compensar a mediocridade da vida cotidiana.
De acordo com Kehl (2004), a prova mais evidente de que na sociedade do
espetáculo as pessoas preferem ver os ideais pelo avesso é que o interesse por esse tipo de
reality-show concorre, em popularidade, com o que ela chama de ‘gincana de horrores’, onde
o vencedor não é escolhido por suas qualidades que pertencem aos ‘ideais socialmente
valorizados’. Como uma metáfora da situação do espectador frente ao lixo da televisão, o
vencedor destas competições é aquele capaz de suportar a maior humilhação ou aquele que
emprega as táticas mais baixas para eliminar seus concorrentes.
A autora passa a analisar o programa Nem Big, Nem Brother: uma seleção com
aqueles que não foram escolhidos para participar do Big Brother Brasil. A padronização do
que se encontra nestas imagens revela um traço importante do Brasil. Não o Brasil pobre e
favelado, mas um Brasil da ‘classe C’, ou classe média baixa. O Brasil das salinhas pequenas
136
e mobiliadas com crediário das Casas Bahia. Este Brasil é todo igual, e, portanto, ela afirma
que o ‘grande sucesso da empreitada colonizadora da TV é a classe C’.
A análise dos excluídos de Nem Big, Nem Brother revelam, na crueza de sua
imperfeição, o padrão estético que serve de referência para o Brasil colonizado pela TV. As
mulheres que se apresentam como ‘popozudas’ e os homens como os ‘saradões musculosos’.
Todos, sem exceção, sonham o mesmo sonho: ser famoso! O sonho, que é a mais íntima
representação do desejo, também já está formatado pela indústria do espetáculo.
A pobreza dos sonhos de fama dos que se candidataram ao cativeiro de luxo do Big
Brother Brasil espelha a pobreza dos sonhos do espectador cativo, que espera o
espetáculo recomeçar (BUCCI & KEHL, 2004
, p. 147).
Para a autora, estes programas levantam a questão sobre o lugar da visibilidade no
mundo contemporâneo, capaz de levar as pessoas a pagarem qualquer preço por ela? O
pensamento Ocidental da modernidade nos leva a crer que é a atividade do pensamento que
nos garante a respeito do ser, como demonstra o todo da incerteza e da dúvida sistemática
de Descartes. Porém, se a capacidade do pensamento e da dúvida garante uma forma de
acesso à verdade, a atividade isolada do pensamento não garante, para ‘um’ homem, a sua
existência entre seus semelhantes. O pensamento é o diálogo interno que necessariamente
inclui o Outro. Disso Kehl (2004) conclui que talvez o pensamento marque a distinção entre o
homem e os demais animais, porém ele não é suficiente para distinguir um ser humano do
outro. A certeza subjetiva que garante nossa existência provém de nossa identificação com
uma imagem. Segundo Hannah Arendt, o que garante o ser, para um sujeito, é a sua
visibilidade para o outro sujeito.
Tal afirmação está muito próxima da psicanálise. O Outro seria, nesta visão, ao
mesmo tempo uma instância pública, simbólica, onde todas as figuras que servem para sua
‘encarnação’ são usadas como mediação entre o sujeito e o espaço público, que é onde se dá a
vida em sociedade. O que pode ser compreendido, ainda, da psicanálise é que do ponto de
vista do sujeito, o Outro é sempre uma instancia de poder, este entendido como aquilo que
ordena as relações entre os homens. De acordo com Kehl (2004), o Outro seria para o sujeito
algo que é anterior a ele, que o determina e vai além da sua esfera individual. Existir é, antes
de tudo, apresentar a própria imagem no espaço público. Esta visibilidade no espaço público
depende, porém, da ação. Retomando Hannah Arendt, esta ação seria a ação política.
Nos tempos modernos, e principalmente nas sociedades de massa, o sujeito não
tem como referência a comunidade, a tradição, o reconhecimento dos amigos e da família que
137
o viu nascer, ele corre constantemente o risco de ser um “ninguém”. A visibilidade possível é
a da ‘identificação’. Nas grandes cidades, fora da família e das relações de amizade no
ambiente de trabalho, o sujeito não tem visibilidade nenhuma. Portanto, a insignificância
perante o espaço público dos homens na sociedade de massa é compensada pelo mecanismo
de identificação com a imagem de um líder ou de um ídolo.
Antes de dar prosseguimento é preciso relembrar duas idéias fundamentais de
Hannah Arendt: primeiro, existir é fazer-se visível no espaço público, e conseqüentemente a
segunda, fazer-se visível depende da articulação entre discurso e ação. Na sociedade de massa
o sujeito não se torna mais visível ao fazer parte dela, muito pelo contrário, porém ele
compensa sua invisibilidade ao se identificar com a imagem do líder ou do ídolo.
A sociedade do espetáculo é o estágio mais avançado da sociedade de massa. A
autora argumenta que a expansão da televisão, tanto do ponto de vista tecnológico quanto do
econômico, enquanto meio de comunicação mais avançado, e sua conseqüente associação
com a lógica de acumulação do capital foram desenvolvendo progressivamente um espaço de
visibilidade paralelo ao da política, autônomo em relação à política tradicional.
Como escreve Eugênio Bucci, a televisão é a substituta do espaço público e no seu
lugar ela coloca o espaço virtual do espetáculo. No entanto, o existe nada que obrigue o
espetáculo a ser fiel à realidade social. A substituição do espaço público pela visibilidade
através da televisão, cujo poder vem englobando parcelas cada vez maiores da vida, segundo
afirma Kehl (2004), consolida um tipo de ‘ficção totalitária’ ao articular jornalismo,
entretenimento e publicidade numa única seqüência infinita de imagens, dirigidas pelas leis
da concorrência comercial entre os diversos canais de televisão e o pelas características de
objeto que elas tentam representar. Dessa maneira, tudo o que se representa na linguagem da
televisão independente de sua história ou das relações que estabelecem – deve ser traduzido
a uma mesma linguagem e às mesmas leis. Estas dizem respeito à rapidez e a fluidez, a fim de
manter a atenção do espectador e impedir que ele mude de canal. Elas dizem respeito ao
aspecto de ‘novidade permanente’ que o evento deve ter, dessa forma apagando a história e
limitando o tempo a um eterno presente. Na sociedade do espetáculo toda imagem se
apresenta com caráter de mercadoria e todo acontecimento é limitado à dimensão do
‘aparecimento’. Esta ‘lei’ da produção de imagens, que é o ‘imperativo da novidade’, ao
apagar a história dos acontecimentos produz a repetição do mesmo.
Segundo afirma a autora, na sociedade do espetáculo, a dimensão dos ideais perde
lugar para a dimensão do consumo. Pois se a lógica que rege o espetáculo é a mesma que rege
a acumulação de capital, para ser eficiente ela não depende do pretexto de nenhum ideal. Os
138
objetos e as imagens – apresentadas como capazes de satisfazer nossas necessidades –
formam um horizonte absoluto, onde não existe a necessidade de nenhum significante que se
destaque de um lugar diferenciado, dos ideais. Razão pela qual os objetos da sociedade do
espetáculo chamam o sujeito a aparecer como consumidor: sua visibilidade é reconhecida
no ato de consumir e não mais na ação política.
Na sociedade do espetáculo, que é a sociedade de consumo, o que garante ao sujeito
a visibilidade para que ele possa existir socialmente (para o Outro) não é a ‘identificação’.
Segundo Kehl (2004), na relação horizontal da circulação das ‘imagens/mercadorias’ a
‘identificação’ é substituída por uma tentativa de ‘produção de identidade’. Ela conclui que,
Então, a imagem do corpo próprio tornado o mais parecido possível com o
corpo do Outro, sem história, sem sofrimento e sem falhas pode servir de suporte
para a construção de uma ilusão de identidade para os sujeitos da sociedade do
espetáculo (BUCCI & KEHL, 2004,
p. 159).
A visibilidade na sociedade do espetáculo depende unicamente da aparição da
imagem corporal para o Outro, representado pela televisão. Isso o significa que todos
possam ter essa visibilidade. Pelo contrário, ela representa a ‘esperança de visibilidade’ para a
qual os sujeitos conduzem suas escolhas de vida, mesmo que de uma forma inconsciente. O
caráter totalitário da sujeição às imagens reside na ausência de um líder que possa servir
como referência; o discurso onipresente da televisão tem a aparência da responsabilidade de
‘ninguém’. Disso pode se concluir que a hipervisibilidade da sociedade do espetáculo oculta
muito eficazmente e distancia o homem comum dos mecanismos de poder.
A televisão, que é a grande mediadora entre o espaço público e o espaço privado,
abrange a cena pública também, que de início ela deveria apenas transmitir. A autora conclui
o texto afirmando que os reality-shows são o sintoma do sofrimento do sujeito
contemporâneo, que não tem a dimensão pública de seus atos e também de sua existência e
busca substituí-la pelo espetáculo, pelo ‘aparecimento’ da imagem de seu corpo. Isso vale
tanto para os que participam, e que fazem de tudo para ‘aparecer’, quanto para quem assiste,
buscando identificar a banalidade da vida espetacularizada com a banalidade de sua própria
vida. Isso seria um indicativo da falta de recursos do sujeito das sociedades do espetáculo,
para construir, de um lado, a dimensão única do ser, e do outro, o espaço público do qual
depende sua existência.
139
6. Maria Rita Kehl: Três observações sobre os reality-shows.
O presente ensaio foi publicado no livro Videologias, escrito em parceria com
Eugênio Bucci, em 2004. A primeira das três observações No (nosso) limite começa
marcada pelo mal-estar sentido pela autora na primeira vez que assistiu No limite, da TV
Globo. Este programa consiste basicamente de um grupo selecionado de pessoas, dentre uma
multidão, dispostos a pagar qualquer preço para estar na televisão. O quê chama a atenção é a
crueldade das regras do programa, especificamente da eliminação, principalmente em função
dos usos feitos pelos participantes. De início, a tendência era eliminar o mais fraco. Aos
poucos esse critério foi se alterando até o ‘mais chato’, ou ainda, ao menos igual seja em
função da raça, idade, tipo sico ou de classe social. Passado algum tempo, outra lógica veio
à tona, a da eliminação dos mais fortes. Para Kehl (2004), a proposta de No limite baseia-se
numa moral conservadora, com a finalidade de demonstrar, com todo ‘realismo’, que a
natureza humana é vil. Sob as duras condições de sobrevivência os jogadores acabavam por
mostrar o que tinham de pior, o que reafirma o pacto do mundo neoliberal.
Em 2001, roubando a atenção do já decadente No limite, Casa dos Artistas desponta.
Neste programa permanece ainda a idéia de concorrência feroz. Esquecidos pela mídia, uma
dúzia de artistas submeteram-se a passar semanas presos em uma casa, em uma convivência
‘vazia’ e numa ‘vidinha besta’, que, segundo a autora, parece representar o ideal de milhões
de telespectadores cujas vidas foram formatadas pela televisão. De acordo com Kehl (2004), o
sucesso dos ‘piores programas de televisão’ reside no fato de eles encenarem em público algo
similar à realização dos nossos desejos inconfessáveis. A ‘educação’ e o ‘bom gosto’, que nos
identifica com nossas elites, é o resultado de ideais políticos e estéticos que fazem sentido
em sociedades nas quais estes ideais encontrem algum respaldo na coletividade. Se a
dimensão pública de nossa existência, que justifica a renúncia ao gozo, cai em descrença,
ficamos condenados a nos interessar pelas nossas próprias idéias. Ela conclui que a vida gira
em torno da televisão e que perdeu a sua dimensão pública, que se ‘privatizou’.
Maria Rita Kehl (2004) inicia a segunda observação – Espiar o que? – dando
destaque à notícia de que nos EUA os reality-shows estão deixando para trás as tradicionais
formas de teledramaturgia, o que representaria o fim da ficção na televisão. Na TV brasileira
eles também ameaçam o Ibope dos programas de ficção. Eles são muito atraentes para as
emissoras, uma vez que sua produção é mais simples e mais barata. Mas, como já foi
colocado por Eugênio Bucci, ninguém vive sem ficção. É muito difícil transformar uma fatia
140
da vida, mesmo que se trate da vida espetacular, em entretenimento para as massas, se ela não
receber um mínimo de recorte ficcional.
O que diferencia a terceira edição do Big Brother Brasil de suas anteriores – que é o
centro das discussões da autora nesta observação é a direção da trama que a emissora tem
feito, editando as conversas sem assunto, produzindo todo o possível para criar uma tensão
dramática a cada “capítulo”. Curiosamente, o que seria o principal atrativo da trama, o
erotismo, não tem despertado o interesse dos participantes. Isso porque, segundo ela, o sexo
quando ‘tornado obrigatório’ perde grande parte do interesse. O que excita os participantes é o
paredão: este é o grande tema do BBB. A atração do programa é a festa neoliberal do cálculo,
o incansável jogo das estratégias e da concorrência sem barreiras. ‘Dinheiro é melhor que
sexo’, e a partir dessa constatação a autora conclui que os participantes querem mesmo é
conspirar.
A primeira impressão que se tem é que o público não quer ser mais enganado com a
‘bela vida’ das novelas. Para Kehl (2004) isso é um engano, o público na verdade quer ser
iludido ‘melhor’. De acordo com ela, os reality-shows seriam a forma mais eficiente de ilusão
produzido pela cultura de massas. Isso porque eles vendem aos telespectadores a imagem
reproduzida de sua vida mesquinha, submetida às ‘leis de mercado’. Eles vendem a imagem
do capitalismo selvagem da concorrência que transformou as relações humanas, agora
elevadas à qualidade de espetáculo.
Na terceira e última observação A outra cena perversa –, a autora nega a
observação de que seria voyeurista o prazer de espionar a vida alheia nos reality-shows. O
prazer voyeurista consiste em captar o corpo do outro onde ele não deveria estar, na sua
dimensão obscena, buscando realizar outra cena, inconsciente. Ela descarta essa possibilidade
para o Big Brother Brasil, pois os participantes sabem que estão sendo filmados. Para Kehl
(2004), se possibilidade de alguma perversão neste programa, esta se encontra do lado do
exibicionismo consentido dos participantes e não no voyeurismo do público.
No entanto, a autora constata que a perversão dos participantes tem sido cada vez
menos sexual. O que atraiu o público e os participantes para o programa foi a encenação,
‘realista’, da concorrência perversa – que é característica do capitalismo selvagem a que
estamos todos submetidos. A concorrência nas sociedades capitalistas com grande indústria
de comunicação e de imagens é mais opressiva que o esforço do trabalho braçal. Ela é mais
eficiente e opressiva porque estende seu alcance ao mais íntimo da vida privada. Segundo
Kehl (2004), isto é o que se no Big Brother Brasil. Os participantes estão envolvidos em
um verdadeiro ‘topa-tudo por dinheiro’ e, em busca do prêmio final, conspiram, manipulam,
141
traem uns aos outros, sendo esta a verdadeira dimensão ‘obscena’ do programa. Para ela, a
perda da dimensão pública da vida humana, a conseqüente privatização do sentido da vida e
também a consagração do homem subjetivo em substituição ao homem político, como
paradigmas do melhor de nossa sociedade, são os ‘componentes secretos’ do sucesso desse
tipo de programa. Portanto, se o espaço público é invadido por representações da vida
privada, aquele que não quiser ser excluído do jogo tem que comprometer todo o seu ‘ser’
nesta alienação.
142
Anexos
AnexosAnexos
Anexos
143
Anexo A – Ato de Concentração Endemol Globo S/A.
Ministério da Justiça
CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA – CADE
Gabinete do Conselheiro Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer
Ato de Concentração nº 08012.005396/2001-43
Requerentes: Endemol Finance B.V. e TV Globo Ltda.
Advogados: Altamiro Boscoli, Rogério Cruz Themudo Lessa, Carmem Laíze Coelho
Monteiro, Andréa Brito Lustosa da Costa, José Setti Diaz, Simone Lahorgue Nunes,
Luciana Muller Chaves, Antonio Cláudio Ferreira Netto e outros.
Conselheiro-Relator: Roberto Pfeiffer
RELATÓRIO
58
Trata-se o presente Ato de Concentração da constituição de uma joint venture entre a
Endemol Finance B.V. e TV Globo Ltda.. A sociedade constituída foi denominada de
Endemol Globo S/A, nos termos do contrato firmado em 09 de agosto de 2001, cujas
atividades estarão centradas no desenvolvimento, exploração, licenciamento e produção de
programas de televisão no Brasil, a serem distribuído para televisão aberta, fechada e Internet,
fls. 80/117.
A operação foi notificada, tempestivamente, na SDE/MJ em 30.08.2001, face ao
preenchimento de pressupostos objetivos contidos no artigo 54, §3º, da Lei 8.884/94,
faturamento superior a R$ 400 milhões de reais anual, no último exercício, das Organizações
Globo.
A SDE/MJ, a SEAE/MF e a Procuradoria do CADE consideraram a operação
tempestiva e recomendam a aprovação da operação sem restrições.
Adoto como relatório o Parecer da SEAE/MF, em anexo, por considerar que este
contém todas as informações necessárias para a formação de juízo quanto ao impacto da
operação sobre a concorrência.
É o Relatório.
Brasília, 21 de maio de 2002.
Roberto Pfeiffer
Conselheiro-Relator
58
Colaboração de Maria dos Anjos Alves Quaresma de Andrade, Procuradora Federal, cedida ao CADE.
146
Ministério da Justiça
CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA – CADE
Gabinete do Conselheiro Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer
Ato de Concentração nº 08012.005396/2001-43
Requerentes: Endemol Finance B.V. e TV Globo Ltda.
Advogados: Altamiro Boscoli, Rogério Cruz Themudo Lessa, Carmem Laíze Coelho
Monteiro, Andréa Brito Lustosa da Costa, José Setti Diaz, Simone Lahorgue Nunes,
Luciana Muller Chaves, Antonio Cláudio Ferreira Netto e outros.
Conselheiro-Relator: Roberto Pfeiffer
VOTO
EMENTA: Ato de Concentração constituição da Joint Venture
denominada ENDEMOL GLOBO S/A, pelas empresas TV Globo Ltda. e
Endemol Finance B.V. Hipótese enquadrável nos critérios de admissibilidade
prevista no § 3º do art. 54, da Lei nº 8.884/94. Submissão face ao faturamento
dos Grupos associados. Mercado relevante de licenciamento de programas de
televisão e licenciamento de formatos para programas de televisão. Mercado
geográfico mundial. Ausência de danos à concorrência. Apresentação
tempestiva. Aprovação sem restrições.
O presente Ato de Concentração consiste na constituição da joint venture denominada
Endemol Globo S/A pelas empresas Endemol Finance B.V. e TV Globo Ltda., objetivando
desenvolver, explorar, licenciar e produzir programas de televisão para a TV aberta, fechada e
internet no Brasil, consoante Contrato de Associação celebrado entre as Requerentes em 09 de
agosto de 2001. (fls. 40/79).
A ENDEMOL FINANCE B.V. “ENDEMOL” é uma holding holandesa, subsidiária
integral da empresa, de mesma nacionalidade, ENDEMOL ENTERNAIMENT HOLDING
N.V. que, por sua vez, pertence ao grupo espanhol TELEFÔNICA. Este Grupo tem atuação
diversa no setor de comunicações, sendo que, no Brasil, opera serviços de telefonia fixa e
móvel, call center, acesso à internet, entre outros.
A ENDEMOL cria, desenvolve e produz formatos para programas de televisão. É
caracterizada como uma produtora independente que vende os formatos e programas
produzidos para redes de televisão e distribuidores de certos países do mundo. Obteve, no
exercício de 2000, faturamento mundial de EUROS 520 milhões. Esta empresa não atua no
Brasil nos mercados relevantes identificados.
A TV GLOBO LTDA. “GLOBO”, empresa brasileira, atua nos setores de
comunicação e entretenimento, especificamente na radiofusão de sons e imagens em televisão
aberta, e criação, desenvolvimento e produção de programas de televisão. Pertence às
ORGANIZAÇÕES GLOBO, grupo igualmente brasileiro que atua no setor de comunicações
operando TV aberta e por assinatura, jornais impressos, livros, revistas, internet e rádio.
Obteve faturamento, no exercício de 2000, de cerca de R$ 6.288.064.000,00.
O Contrato firmado entre as Requerentes, às fls. 74 e seguintes, define que “formatos”
são todas as idéias ou conceitos originais, que ou não dispostos por escrito, possam ser usados
para exploração pela televisão, quer especificados em detalhes quer o, inclusive, entre
outros, sinopses, desenvolvimentos narrativos, roteiros, títulos, logotipos, marcas, jogos,
instruções, documentação e dados, e inclui (entre outros) a maneira pela qual o objeto de um
147
programa televisivo de entretenimento leve é apresentado, inclusive tipos de roupas,
seqüências de título, música tema, seqüência das cenas, local, tipo de apresentadores,
quaisquer frases comumente recorrentes e quaisquer outras características distintivas.
No mercado relevante percebe-se que as Requerentes possuem duas atividades em
comum: o desenvolvimento de formatos de programas de televisão e a produção de programas
de televisão. A obtenção de faturamento dessas atividades se por meio do licenciamento,
onde se verifica a ocorrência de dois mercados relevantes para a operação: O licenciamento
de formatos para programas de televisão e o licenciamento de programas para a televisão.
O Grupo Globo o comercializava seus produtos no mercado interno antes da
operação, atuando somente com produções para seu próprio uso. Entretanto, ressalte-se que
com a criação da Associação entre as empresas os produtos podem ser comercializados para
outras empresas que não somente a TV GLOBO, ficando, contudo, a ressalva de que o direito
de preferência na aquisição é da TV GLOBO.
Quanto ao mercado geográfico defino como sendo em nível mundial, acompanhando,
também, as considerações tecidas no Parecer da SEAE/MF, principalmente sob o ponto de
vista da demanda, uma vez que as redes de televisão brasileiras e as operadoras de televisão
por assinatura (ou programadoras) podem adquirir formatos e programas de qualquer parte do
mundo, não havendo razão para limitar a dimensão geográfica neste caso.
O negócio foi concretizado nos termos das disposições contidas no Contrato de
Associação celebrado em 09.08.01 e apresentado tempestivamente na Secretaria de Direito
Econômico em 30.08.01.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, e frisando que o negócio foi notificado tempestivamente, entendo
que a operação não possui aptidão para gerar efeitos anticoncorrenciais no mercado relevante,
por tratar-se da criação de uma produtora independente que atuará em mercados até então
inexplorados pelas Requerentes. A operação em tela não possui aptidão para gerar efeitos
anticoncorrenciais nos mercados relevantes identificados, pois consubstancia mera entrada de
novo concorrente nesses mercados. Portanto, conheço o Ato, e aprovo a operação sem
restrições.
É o voto.
Brasília, 29 de maio de 2002.
Conselheiro-Relator
Roberto Pfeiffer
148
Anexo B – The Loft Story case.
The Loft Story case
Multi-platform for a TV show
Big Brother is a TV show format created by Endemol in 1999.
The plot was rather new: a bunch of people taken from the civil society have to live
together in a house covered by microphones and cameras following them on a 24/7 basis and
each week one of the contestants is voted out by the audience.
The show attracted the world’s attention: it was first aired in the Netherlands, on the
Veronica channel, and got adapted in 20 other countries.
An important thing to realise is that Big Brother was the first ever interactive reality
TV show. It laid out the foundations of a new way of consuming a television program: a TV
show can be consumed not only on TV on a daily and weekly basis but also on the web, on
your mobile, in a magazine, on a special channel broadcasting the life in the house 24 hours a
day, via interactive TV devices, WAP applications, etc.
In France we had to wait until April 2001 to see the first season of the Big Brother
format adaptation. The show was named Loft Story and was aired for 10 weeks on M6, the
second biggest commercial network in France. High ratings and huge media coverage turned
the show into a big success. Consequently, the year after, in April 2002, Loft Story season 2
was aired again for 12 weeks.
My name is Damien Marchi and I was the cross-media project manager for the
company who helped Endemol France and M6 adapting the show for the web. This company
is based in Paris and is called Streampower. It’s Endemol France’s preferred partner for web-
based projects around TV programs.
During this presentation, I’ll explain to you the cross-media system we built for this
season 2 of Loft Story. I’ll present you the website, some of its features and we’ll see how
they were designed to reach certain goals. Then I’ll give you some figures and feedback on
the usage of the site. We’ll continue with the financial aspect of the project, by far the most
important from a broadcaster’s perspective and we’ll conclude with some general remarks and
analysis.
A. The Loft Story website
Big Brother was the first ever program sold to a TV channel along with a website. We
have to take into account that the cross-media adaptation of the show is part of the overall
Endemol offer to the broadcaster.
149
Let’s go through the 6 goals we wanted to pursue when building the cross-media
system around Loft Story 2. I’ll explain to you the 6 “commandments”, as I like to call them,
that drove us and I’ll show you what we actually did to reach them…
1. Give users access to exclusive content not seen on television.
The contestants are followed 24 hours a day and everyday a one-hour long highlight
show is broadcast on television. So, the only place where you can watch what is really
happening in the Big Brother house when it is actually happening Live is on the web
(and on the special subscription-based cable TV channel). For the first time, a value is
really given to all the un-used but already produced pieces of content. And users like it
because it’s raw, it’s fresh and they have exclusive access to it.
Other exclusive pieces of content given away were a) the 360 degrees videos recorded
thanks to 2 special web-only cameras placed in the house and b) the full-length almost un-
edited videos from the Confession Room: When you only see on TV a few images of, for
example, a contestant crying in the Confession Room, registered users were able to see the
whole sequence online if they were ready to pay for it. The usage of the service was really
depending on the type of content we were pushing to users. We were all expecting to have
content as “interesting” (understand: hot, sexy or cruel) as it was during the first season
and we were disappointed.
2. Interact with the show - Give the power to the audience.
Why Big Brother had been such a success?? Because the audience could decide for the
first time how the show should evolve and who should leave the house. The audience likes
to participate. The website gives them this chance: users were able to vote for their
favorite contestant, to have a say on the next game given in the house, to ask questions, to
write to the contestants and even change the weekly TOP5 of the best moments and
couples presented during the Saturday show.
3. Increase users’ stickiness - Extend the life length of the show.
Imagine you’re a fan… You like Big Brother and want more of it? No problem, you
just have to go on the web, to grab your mobile or even to make a phone call! Something
is always happening in the house, but the show is only aired one hour everyday. Fans who
want to be in touch all the time with the life in the house, people who want to consume
more of the show can do so with the web. The audience was really kept stuck to the
program even when the show was not on air.
For examples, we were posting the latest info on the life in the house from 8am to
11pm everyday (when the TV show was always one day late) and we had also a really
sticky game called the Candy Cool Cam:
A camera was placed in the fridge and was taking a picture every 3 seconds. Users had
to catch a moment when a contestant opened the fridge door and then send the picture
back to us in order to get selected and maybe win a dishwasher, a laundry machine, etc.
We clearly created the game to link the brand to the show and to increase the time
people were exposed to the sponsor’s brand, Candy. The game really succeeded in its
mission!
During the 3 months period, the server served more than 90 million pictures. That
means that, in one visit, users were exposed to the Candy logo for more than 2 minutes on
average.
150
4. Increase users’ loyalty.
Fans can meet each other on the web; react on the show and chat. By giving them
access to an extensive range of exclusive services on the cross-media website, users
become even more loyal to the show. We all have in mind the regular community tools
that a TV channel can use to keep its audience on the web, but these are not the only
possibilities. We used other functions such as games with an even higher success rate.
Viral Games: a game based on the number of people playing (the more people, the
higher the prize), sticky game to make people come back and answer new questions.
Fan Club: 3 days access to exclusive content (backstage interviews, live chats…)
accessible via a special application users have to install on their computer.
5. Follow the TV show.
In the Loft Story case, the TV show will always drive the other platforms. Higher
ratings on the website were coming when the site was quoted on TV, when events were
happening in the TV show. You have to keep this in mind; it’s the success of the
television show that makes the success of the site and not the contrary. As a consequence,
we created special pages for each Loft Story show (prime time show on Thursday and late
show on Saturday) with host information and interviews, highlights and special features.
6. Enhance the watching experience.
Studies proved that more and more “active TV watchers” are watching TV while
surfing on the Internet. During the weekly Saturday night show, people were able to ask
their questions live via payphone system, SMS and the web. Many users were driven to
the site.
By surfing on the show’s website while watching the show on TV, the attention of the
users toward Loft Story was complete.
Overall usages:
Regarding the overall usage of the site, I have to say that we were quite happy. If M6
finally reported that the second season of Loft Story lost an average of 8% of the viewers
compared to the first season of the show, the website got even more successful! During Loft
Story 1, it made 60 million pages viewed when the second season achieved to serve 88
million pages.
As you can see, the interest of the users was complete. The usage of the site was good
and people were responding really well to it and were attached to it: 28% of visitors were
coming back from everyday to every 7 days. Users really wanted to participate.
But now, here is the most important question then: when you have achieved keeping
your audience stuck how do you manage to earn money??
151
B. Financial aspect
A multi-platform system built for a TV show allows channels to increase the number
of revenue streams around the show. The selling of on-air ad space or the finding of a sponsor
are not the only revenues streams for TV channels anymore. From banners and billboards
before the videos to the selling of merchandising items, possibilities to earn money are almost
endless.
1. Business models
The Loft Story website was sold by Endemol to M6Web, the interactive sister
company of the broadcaster. It was then M6Web’s duty to make the website profitable.
Several business models had been tried by M6: prepaid SMS, FanClub, Pay per view videos
and live feed, etc.
I have to admit that most of the models tried weren’t successful. People reacted quite
badly to all the features that were free during the first season and for which they had to pay
for the second season such as the Live Feed and the FanClub (weekly chats).
The lack of content really created a problem with the Confession Room pay-per-view
email service. When we had good pieces of content, people were really ready to pay for it but
when we were expecting to send over 3 stories a week we only sent one story a week. That is
why SMS and payphone systems were extensively used: users are already confident with
these mediums and you can easily generate revenues fast.
But cross-media around Loft Story is also about using the importance of the project to
try new models and educate the audience: Loft Story 1 helped the development of streaming
video and broadband connections in France. Loft Story 2 made the audience aware that they
should start paying for content and it’s getting better and better.
2. The Loft Story 2 lessons
Find a cross-media sponsor!
The aspect of the business model that was by far the most successful was the
sponsoring one. This sponsor was Candy.
The money brought by the sponsor was divided as followed: on-air ad space, product
placement (really restricted in France), sponsored games on the site, pay phone games, the
right to use the Loft Story brand and contestants to promote the products and money for
Endemol, M6, M6Web and Streampower.
On the web, several spaces and functionalities where sponsored by Candy and even
renamed after Candy: Candy Cool Cam (fridge cam), Candy Cool Game. Candy Party and
Candy Cool Attitude (popularity vote).
Conclude well-integrated ecommerce deals
Concluded with an e-commerce flower site, a deal allowed users to send flowers to the
contestants when they leave the house the offer was placed on each of the contestants pages
and was linking to a specially designed page on the partner’s website.
152
Have someone pay for what costs more: the Live Feed
Last year, M gave access to the Live Feed for free and spent millions on streaming.
For your information, 20% of the overall French Internet traffic was made with Loft Story
content!
For the second season of Loft Story they got wiser and sold the Live Feed to an ISP
sponsor – Club-Internet – who took the streaming costs on itself
C. General Remarks
Some general thoughts on our experience…
Loft Story is profitable
M6 really wanted to be profitable on this cross-media operation and, actually, they
were profitable! Overall revenues: M6 gained around 4 times what they spent to buy the
show.
When it comes to the cross-media based activities, the system was just profitable. But
compared to last year’s experience with Loft Story 1, M6Web got extremely happy.
You can earn money!
The M6Web example shows that it is actually possible for a TV channel to earn
money on cross-media activities: after 4 years of existence the company is now profitable and
is the first interactive branch of a broadcaster to be profitable in France.
Tf1 announced that 60% of their overall revenues come from derivated products
revenue streams.
Find a sponsor!
The Loft Story experience made everyone realise that having a sponsor who is well
integrated within the site and who is paying for that is a really stable revenue stream. This
model proved its efficiency as well on the users who got interested because the brand was
well linked to the TV show.
The brand values have to be taken into account to make the sponsoring operation
successful: the pages have to be fully branded, it’s not about placing a logo on the top right
corner of the page, it’s about making people linking the brand to what they see on the show,
what they can do on the site and so forth.
Cross-media is more than only increase viewers
Having a cross-media system around Loft Story goes beyond the simple fact of
increasing TV watchers. The broadcaster wants to extend its brand on the largest number of
platforms possible starting with the brand of its famous program.
With the development of multi-platform systems it’s the way we see television that
will change: the program aired becomes one of the elements of a wider branding system.
153
More and more programs are created where the cross-media system is not adapted to the
show but where the multi-platform system is the most important part of the program.
To illustrate this, let’s have a look at the Loft Story case as I described it to you. The
show sells to the audience that they will have the possibility to follow the contestants in the
house on a 24/7 basis; this is what makes the show popular. But, when you really think about
it, the only place were it is actually possible for anyone to watch the contestants at any time is
on the website (or on the special TV channel) and definitely not during the TV show that only
shows highlights of the life in the house.
So, which platform is the closest to reality, the aim of the program? If you look at it
this way, the TV show becomes a promotion show of what is really happening on the web or
other interactive platforms…
Now Loft Story 2 is over and right now in France, Streampower is working with
Endemol France on the second season of Star Academy (Popstars meets Big Brother format)
that started in the beginning of September on TF1.
The website goes beyond all the ratings expected by the broadcaster: the interest of the
users is even bigger (more than 1,5 million pages viewed per day!) and the amount of money
earned by the TV channel is even higher.
Everyone’s really happy and this really shows that it works and that the run for
television branding has only started…
Fonte: Europrix 2002 – Scholars Conference.
Disponível em: http://www.acten.net/uploads/258/65/Marchi.doc. Acesso em: 04/05/2007.
154
Anexo C – O Big Brother pelo mundo.
País Título local
África do Sul Big Brother África do Sul/ Celebrity Big
Brother
Alemanha Big Brother
Argentina Gran Hermano/ Gran Hermano Famosos
(VIP)
Austrália Big Brother Austrália/ Big Brother das
Celebridades
Balcãs Veliki Brat/ Velik Brat Proba/ Velik Brat
VIP
Bélgica Big Brother/ Big Brother VIPs/ Big Brother
All Star
Brasil Big Brother
Bulgária
Big Brother/ VIP Big Brother
Canadá Loft story
Colombia Big Brother
Continente Africano
Big Brother Africa
Croácia Big Brother
Dinamarca Big Brother/ Big Brother VIP/ Big Brother
Reality All Star
Equador Big Brother
Eslováquia Big Brother Sùboj
Eslovênia
Big Brother
Espanha Gran Hermano/ Gran Hermano VIP
Estados
Unidos
Big Brother/ Big Brother All Star
Filipinas Pinoy Big Brother/ Pinoy Big Brother
Celebrity Edition/ Pinoy Big Brother Teen
Edition
Finlândia
Big Brother Finlandia
França Loft Story/ Secret Story
Grécia
Big Brother: O muro/ Big Mother
Holanda Big Brother/ Big Brother VIP/ Hotel Big
Brother
Hungria Big Brother Nagy Testvér/ Big Brother VIP
India
Big Boss
Inglaterra Big Brother/ Celebrity Big Brother/ Teen
Big Brother/ Panto Big Brother
Itália Grande Fratello
México
Big Brother Mexico/ Big B
rother VIP
Nigéria
Big Brother Nigeria
Noruega Big Brother Norge/ Big Brother De volta a
casa
155
Oriente Médio Big Brother The Boss
Península Escandinávia
Big Brother
Polônia Big Brother Wielki Brat/ Big Brother: Você
decide
Portugal Big Brother: O grande Irmão/ BigBrother
Famosos
Região do Pacífico
Gran Hermano del Pacífico
Republica Tcheca
Big Brother
Romênia Big Brother Fratele Cel Mare
Russia
Big Brother
Suécia Big Brother/ Big Brother: Semana das
Celebridades
Suíça Big Brother
Tailândia Big Brother Tailândia
Fonte: TV pesquisa – Banco de Dados sobre a televisão – PUC Rio.
Disponível em: http://www.tv-pesquisa.com.puc-rio.br. Acesso em: 08/09/2007.
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