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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
Faculdade de Ciências e Letras
Campus de Araraquara - SP
ALEX NERY CAETITÉ
EVOLUÇÃO RECENTE DOS MERCADOS DE CRÉDITO E
DE TÍTULOS NO BRASIL E SUA ATUAÇÃO NO
FINANCIAMENTO DOS MACRO-SETORES INDÚSTRIA,
COMÉRCIO E SERVIÇOS (1996–2007): UMA
INTERPRETAÇÃO PÓS-KEYNESIANA
ARARAQUARA - SP
2009
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II
ALEX NERY CAETITÉ
EVOLUÇÃO RECENTE DOS MERCADOS DE CRÉDITO E
DE TÍTULOS NO BRASIL E SUA ATUAÇÃO NO
FINANCIAMENTO DOS MACRO-SETORES INDÚSTRIA,
COMÉRCIO E SERVIÇOS (1996–2007): UMA
INTERPRETAÇÃO PÓS-KEYNESIANA
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Economia
da Faculdade de Ciências e Letras
Unesp/Araraquara, como requisito para
obtenção do título de Mestre em Economia.
Linha de pesquisa: Política Econômica, Finanças e Desenvolvimento
Orientador: Prof. Dr. Eduardo Strachman
ARARAQUARA - SP
2009
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III
ALEX NERY CAETITÉ
EVOLUÇÃO RECENTE DOS MERCADOS DE CRÉDITO E
DE TÍTULOS NO BRASIL E SUA ATUAÇÃO NO
FINANCIAMENTO DOS MACRO-SETORES INDÚSTRIA,
COMÉRCIO E SERVIÇOS (1996–2007): UMA
INTERPRETAÇÃO PÓS-KEYNESIANA
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Economia
da Faculdade de Ciências e Letras
Unesp/Araraquara, como requisito para
obtenção do título de Mestre em Economia.
Linha de pesquisa: Política Econômica, Finanças e Desenvolvimento
Orientador: Prof. Dr. Eduardo Strachman
Data da defesa: 23/10/2009.
MEMBROS COMPONENTES DA BANCA EXAMINADORA:
_____________________________________________________
Presidente e Orientador: Prof. Dr. Eduardo Strachman
UNESP - FCLAr
_____________________________________________________
Membro Titular: Prof. Dr. Rogério Gomes
UNESP - FCLAr
_____________________________________________________
Membro Titular: Prof. Dr. Frederico Gonzaga Jayme Júnior
UFMG - Cedeplar
Local: Universidade Estadual Paulista
Faculdade de Ciências e Letras
UNESP – Campus de Araraquara
IV
Ao Povo Brasileiro.
V
AGRADECIMENTOS
Aos professores da UNESP Araraquara pelos longos anos de aprendizado durante
meus cursos de graduação e mestrado. Um agradecimento especial ao meu orientador e
amigo, Professor Dr. Eduardo Strachman, pela sua educação, paciência, generosidade,
amplo saber e inúmeras contribuições ao longo do desenvolvimento desta dissertação. Sem
ele este trabalho não seria uma realidade.
À Banca de Qualificação, nas pessoas do Prof. Dr. Carlos Eduardo de Carvalho, da
PUC São Paulo, e do Prof. Dr. Elton Eustáquio Casagrande, da Unesp, que com suas críticas e
sugestões contribuíram para o aperfeiçoamento deste trabalho.
Aos funcionários da pós-graduação e, em especial, à Cristina que sempre foi muito
atenciosa ao atender as solicitões dos alunos.
À Lilian Nery, minha esposa, pela paciência e compreensão durante o período de
realização deste trabalho.
À minha mãe por tudo o que ela fez, faz e fará por mim.
Durante o período de aula tive a oportunidade de conhecer pessoas interessantes,
formadas em boas e respeitadas universidades, o que contribuiu para o meu
aperfeiçoamento pessoal. Por esse motivo, meu muito obrigado aos colegas de mestrado.
Dentre esses colegas destaco meu grande amigo, Guilherme Costa, a quem devo bons
momentos de descontração e companheirismo ao longo da dura jornada do mestrado. Meu
agradecimento especial a você “guri”.
Outra pessoa importantíssima para a realização deste trabalho foi meu irmão por
consideração, Felipe Branco, que me aturou em sua casa durante um ano! Minha eterna
gratidão a este grande amigo.
Um agradecimento especial também a Maurílio Benite, mestre em economia pela
Fea-USP Ribeirão Preto, pela leitura atenta seguida de válidas contribuições.
Agradeço a todos os autores dos livros que li e espero um dia contribuir para o
desenvolvimento da Ciência Econômica de maneira semelhante às contribuições que eles
prestam.
Por fim, agradeço a todos aqueles que, direta ou indiretamente, contribuíram para a
realização deste trabalho.
VI
RESUMO
Esta dissertação apresenta uma análise, a partir de uma ótica pós-keynesiana, da
trajetória do volume total de crédito e de títulos para o financiamento empresarial e, mais
especificamente, para os macro-setores indústria, comércio e serviços, no Brasil, entre os
anos 1996-2007. Esse período é dividido em dois (1996-2003 e 2004-2007) sendo o
primeiro caracterizado pela estabilidade do volume e fluxo desses recursos e o último pela
evolução consistente dos mesmos.
Palavras-chave: Mercado de crédito; Mercado de títulos; Teoria pós-keynesiana; Bancos;
BNDES; Bolsa de Valores.
VII
ABSTRACT
This thesis analyses, through a post-keynesian perspective, the trajectory of the total
volume of credit and bonds to finance business and, more specifically, for the industrial
macro-sectors, commerce and service, in Brazil, between 1996-2007. The period is two
folded (1996-2003 and 2004-2007), being the former characterized by the volume and flow
of those resources and the later through its consistent evolution.
Key-words: Credit market; Bond market; Post-Keynesian theory; Banks; BNDES; Stock
Exchange.
VIII
ÍNDICE
LISTA DE TABELAS ....................................................................................................... IX
LISTA DE GRÁFICOS ...................................................................................................... X
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 11
1. EVOLUÇÃO DO MERCADO BRASILEIRO DE CRÉDITO (1996-2007) ............. 17
1.1 Referencial teórico ........................................................................................................ 19
1.2 Evolução do mercado brasileiro de crédito no período 1996-2003: a estabilidade .... 27
1.2.1 Apreciação dos fatos históricos .......................................................................... 27
1.2.2 Apreciação crítica dos fatos ................................................................................ 43
1.3 Evolução do mercado brasileiro de crédito no período 2004-2007: o crescimento ..... 45
1.3.1 Apreciação dos fatos históricos .......................................................................... 45
1.3.2 Apreciação crítica dos fatos ................................................................................ 49
2. EVOLUÇÃO DO MERCADO BRASILEIRO DE TÍTULOS (1996-2007) ............. 56
2.1 Referencial teórico ........................................................................................................ 59
2.2 Evolução do mercado brasileiro de títulos no período 1996-2003: a estabilidade ...... 63
2.2.1 Apreciação dos fatos históricos .......................................................................... 63
2.2.2 Apreciação crítica dos fatos ................................................................................ 73
2.3 Evolução do mercado brasileiro de títulos no período 2004-2007: o crescimento ...... 74
2.3.1 Apreciação dos fatos históricos .......................................................................... 74
2.3.2 Apreciação crítica dos fatos ................................................................................ 80
3. A ATUAÇÃO DOS MERCADOS DE CRÉDITO E DE TÍTULOS NO
FINANCIAMENTO EMPRESARIAL NO BRASIL (1996-2007) ............................ 82
3.1 Evolução do volume de empréstimos com recursos livres para empresas no Mercado
Brasileiro de Crédito, no período 1996-2007: a atuação dos bancos .......................... 85
3.2 Evolução do volume de financiamentos com recursos controlados para empresas no
Mercado Brasileiro de Crédito, no período 1996-2007: a atuação do BNDES ........... 96
3.3 Evolução das emissões primárias de títulos privados no mercado brasileiro de tulos:
a atuação da Bolsa de Valores .................................................................................... 108
CONCLUSÃO ................................................................................................................... 112
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 115
IX
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Indicadores macroeconômicos (1995-2007) ................................................. 13
Tabela 2 – O efeito das expectativas assimétricas sobre o racionamento de crédito ..... 27
Tabela 3 Alíquotas de recolhimento sobre encaixes obrigatórios (compulsório) - (Jun.
1994 – Out. 1999) ........................................................................................................ 29
Tabela 4 - Alíquotas de recolhimento sobre encaixes obrigatórios (compulsórios) - (Out.
1999 – Ago. 2003) ........................................................................................................ 34
Tabela 5 – Percentual de PCLD por faixa de risco de crédito ......................................... 35
Tabela 6 Volume de operações de crédito (recursos livres e direcionados) do Sistema
Financeiro Nacional por atividade econômica (1996-2003) ........................................... 40
Tabela 7 Volume de operações de crédito (recursos livres e direcionados) do Sistema
Financeiro Nacional por atividade econômica (2004-2007) ........................................... 48
Tabela 8 Tendências das trajetórias das operações de crédito do SFN por atividade
econômica (1996-2007) ............................................................................................... 50
Tabela 9 – Volatilidade do Ibovespa em diferentes períodos ........................................ 66
Tabela 10 – Emissões primárias no mercado de capitais nacional (1997-2004) ............. 69
Tabela 11 – Emissões de CRI e FIDC (1996-2007) ........................................................... 76
Tabela 12 – Volume total de compras e vendas de títulos na Bovespa, por tipo de
investidor (2001-2007) ................................................................................................. 78
Tabela 13 Emissões primárias de títulos no mercado de capitais nacional (2004-2007)
................................................................................................................................... 80
Tabela 14 Prazo médio diário consodidado* das operações de crédito com recursos
Livres/Referenciais para taxas de juros ........................................................................ 90
Tabela 15 Volume de operações de crédito do SFN com Recursos Livres - Volume total
por modalidade de operações .................................................................................... 93
Tabela 16 Percentual do volume de operações de crédito com recursos livres em
relação ao volume de operações com recursos livres e direcionados aos macro-setores
indústria, comércio e serviços (2002-2007) ................................................................... 95
Tabela 17 - Volume de recursos financeiros do sistema bancário às atividades
empresariais indústria, comércio e serviços (2002-2007) .............................................. 95
Tabela 18 - Efeitos do trade-off risco x qualidade dos projetos nas decisões de
enquadramento do BNDES ........................................................................................ 100
Tabela 19 - Volume de recursos financeiros do sistema BNDES às atividades empresariais
indústria, comércio e serviços (2002-2007) ................................................................ 105
Tabela 20 Participação percentual das atividades empresariais mais representativas
no total dos desembolsos realizados pelo Sistema BNDES (2002-2007) ....................... 106
Tabela 21 Emissões primárias* no mercado de títulos, divididas entre as atividades
indústria, comércio e serviços (2002-2007) ................................................................. 110
Tabela 22 Participação percentual das atividades empresariais mais representativas
no total de emissões primárias de ações, debêntures e notas promissórias (2002-2007)
................................................................................................................................. 110
X
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Quantidade de Cédula de Crédito Bancário (ago. 2001-set.2003) ................. 36
Gráfico 2 Volume de operações de crédito (recursos livres e direcionados) do Sistema
Financeiro Nacional por atividade econômica (1996-2003) ........................................... 41
Gráfico 3 – Fluxo dos investimentos estrangeiros ao Brasil (1996-2007) ....................... 47
Gráfico 4 Volume de operações de crédito (recursos livre e direcionados) do Sistema
Financeiro Nacional por atividade econômica (2004-2007) ........................................... 49
Gráfico 5 – Saldo das operações de crédito consignado (2004-2008) ............................. 51
Gráfico 6 – Distribuição do volume de crédito no SFN por nível de risco (AA, A, B e C), nos
anos 2000, 2004 e 2007 ............................................................................................... 55
Gráfico 7 Emissões primárias de títulos selecionados no mercado de tulos nacional
(1996-2007) ................................................................................................................. 59
Gráfico 8 – Variação acumulada do Ibovespa em final de período (1996-2003) ............. 65
Gráfico 9 - Participação percentual no total de compras e vendas na Bovespa, por tipo de
investidor - (2001-2007) ............................................................................................... 77
Gráfico 10 – Variação acumulada do Ibovespa em final de período (2004-2007) ........... 79
Gráfico 11 – Operações de crédito do SFN por origem de recursos ................................ 85
Gráfico 12 – Taxas de juros pré-fixadas por modalidade de operações com recursos livres
- 1996-2007 (em final de período) ................................................................................ 91
Gráfico 13 Prazo médio diário consolidado das operações de crédito com Recursos
Livres (2002-2007) ....................................................................................................... 91
Gráfico 14 – Saldos das operações de Crédito Referencial PJ (recursos livres) ................ 92
Gráfico 15 Saldos de operações de crédito com recursos livres e direcionados (1996-
2007) ........................................................................................................................... 97
Gráfico 16 – Sistema BNDES – Total de desembolsos anuais (1996-2007) .................... 102
Gráfico 17 – Sistema BNDES – Total de desembolsos anuais “ajustado” (1996-2007) .. 103
Gráfico 18: Sistema BNDES – desembolsos anuais por porte de empresa (1996-2007) . 108
11
INTRODUÇÃO
O crédito é definido como uma relação financeira entre duas partes, uma credora e
outra devedora, na qual uma delas (a credora) concede liquidez à outra (a devedora),
mediante um prêmio de liquidez e risco/incerteza comumente intitulado juro. Essa relação
financeira tem como noções fundamentais a confiança, expressa na promessa de pagamento
pelo devedor, o risco/incerteza e o tempo transcorrido entre a aquisição e o pagamento da
dívida. Nas economias capitalistas, a concessão de crédito tem se concentrado nas
chamadas instituições financeiras, devido ao seu poder de arregimentar recursos financeiros
e informações acerca dos devedores, e do seu grau de especialização em emprestar e,
principalmente, receber o crédito concedido (JACOB, 2003).
A importância dos sistemas de crédito para a economia tem sido analisada pelos
mais importantes teóricos da ciência econômica. Schumpeter (1985), por exemplo,
destacou como característica mais distintiva do capitalismo, o desenvolvimento dos
sistemas de crédito, uma vez que a organização desses sistemas liberta o empreendedor da
necessidade de nascer rico ou ter capital próprio para realizar seus empreendimentos. Na
visão schumpeteriana, os bancos são os credores típicos do capitalismo e a função essencial
do crédito é conferir poder de compra ao empresário para que este possa realizar
investimentos inovadores (LUCCHESI, 2008).
Stiglitz e Greenwald (2004), por sua vez, ao destacarem a importância dos sistemas
de crédito para a ciência econômica, escreveram que a abordagem tradicional da economia
monetária, baseada na demanda de moeda para transações, apresenta várias falhas e não
fornece uma explicação convincente de como e porque a moeda tem importância. O
argumento deles é que a chave para compreender a economia monetária está na demanda e
oferta de crédito e, conseqüentemente, no entendimento profundo da função dos bancos.
Opinião similar é dada pelo megainvestidor George Soros (1996, p. 29), quando afirma que
“é o crédito que importa, não o dinheiro [ou a moeda]”.
Para Levine e Zervos (1996, p. 29), a importância do crédito se expressa na sua
influência sobre as variáveis reais de uma economia. Eles afirmam que um sistema bancário
desenvolvido (além de um mercado de capitais líquido) está fortemente correlacionado com
taxas atuais e futuras de crescimento econômico, acumulação de capital e crescimento da
produtividade. Para eles, a existência de uma forte ligação entre o desenvolvimento
12
financeiro e o crescimento econômico sugere que os fatores financeiros são parte integrante
do processo de crescimento econômico.
Visão semelhante é dada pela teoria pós-keynesiana, que também considera o
crédito como uma variável essencial na determinação das variáveis reais da economia,
como o produto e o emprego. Para os pós-keynesianos, os bancos, principais agentes no
fornecimento de crédito, são entendidos como instituições que visam o lucro e que estão
conscientes dos riscos associados à sua atividade e da sua capacidade de inovar e de criar
depósitos (ALVES; DYMSKI; PAULA, 2008). Como qualquer outra firma, eles têm
preferência pela liquidez e, com base em suas expectativas, administram dinamicamente
seus balanços com o intuito contínuo de conciliar lucratividade e liquidez (OLIVEIRA &
CARVALHO, 2007; CARVALHO, 2007). As atitudes das firmas bancárias exercem
impactos no meio circulante e, conseqüentemente, afetam as variáveis reais da economia,
dado que, para esses teóricos, a moeda não é neutra nem no curto e nem no longo prazo
(PAULA, 1999).
Essas opiniões não esgotam todo o montante de teorias que defendem posições
semelhantes sobre a importância do crédito no estudo da ciência econômica. Elas apenas
fornecem uma noção dessa importância que, atualmente, tem ganhado ainda mais vulto,
tendo em vista a grave crise financeira desencadeada nos Estados Unidos, a partir de 2007.
Trata-se de uma crise originada no sistema financeiro americano, em virtude de uma cadeia
de empréstimos (originalmente imobiliários), baseada em devedores que apresentavam
maiores possibilidades de insolvência e que, posteriormente, quando do aumento da
preferência pela liquidez dos agentes econômicos (o que os motivou a liquidarem seus
créditos), levou bancos e outras instituições financeiras ao redor do mundo a uma situação
de falência (BRESSER-PEREIRA, 2008), impactando negativamente todo o sistema
econômico mundial.
Para o caso brasileiro, a importância do crédito tem ganhado cada vez mais
visibilidade em razão da ampliação do volume de recursos no mercado financeiro a partir
de 2004. Borges (2008, p. 38), por exemplo, destacou que “pela primeira vez em muitos
anos, os bancos brasileiros estão cumprindo o seu papel de dar crédito às pessoas e às
empresas, algo que durante muito tempo não foi possível devido à instabilidade
econômica”.
13
Em que pese esse movimento ser recente, para alguns autores, as condições
macroeconômicas para o crescimento do volume de crédito no Brasil começaram a parecer
propícias já a partir da implantação do Plano Real, em julho de 1994, com o fim do período
de alta inflação. A tabela 1 mostra que, no primeiro ano completo de existência da nova
moeda, 1995, o PIB apresentou crescimento de 4,2% e foi acompanhado por um nível de
inflação que, embora elevado, se mostrou bastante reduzido frente às taxas apresentas na
década anterior.
Tabela 1 – Indicadores macroeconômicos (1995-2007)
Ano PIB* PIB TAXA SELIC TJLP** PTAX IPCA****
R$ milhões var. real (%) média % a.a. % a.a. taxa*** var. %
1995
1.846.112 4,2 41,22 17,72 0,9174 22,41
1996
1.885.812 2,2 23,94 11,02 1,0051 9,56
1997
1.949.464 3,4 39,79 9,89 1,0780 5,22
1998
1.950.153 0,0 31,24 18,06 1,1606 1,65
1999
1.955.108 0,3 19,03 12,50 1,8147 8,94
2000
2.039.299 4,3 16,19 9,75 1,8302 5,97
2001
2.066.021 1,3 19,05 10,00 2,3504 7,67
2002
2.120.943 2,7 23,03 10,00 2,9212 12,53
2003
2.145.265 1,1 16,92 11,00 3,0783 9,30
2004
2.267.893 5,7 17,50 9,75 3,0751 7,60
2005
2.339.522 3,2 18,24 9,75 2,7032 5,69
2006
2.427.370 3,8 13,19 6,85 2,1499 3,14
2007
2.558.821 5,4 11,18 6,25 1,8533 4,46
***taxa média anual dombio comercial de compra
****variação percentual acumulada
Fonte: Banco Central do Brasil (2008)/ IBGE/ Conjuntura Econômica (2008)
* a preços de 2007
** Taxa vigente de outubro a dezembro de cada ano
*** Taxas de dezembro
Ao longo dos dois anos seguintes (1996 e 1997), o PIB continuou a apresentar taxas
positivas (embora menores), e foi acompanhado de redução do índice inflacionário (IPCA),
das taxas de juros que indexam operações de longo prazo (TJLP) e, de maneira menos
acentuada, da taxa básica de juros (SELIC)
1
. Assim, diante de um cenário de abertura
comercial e financeira, crescimento do produto, redução da taxa básica de juros e
estabilidade dos preços, esperava-se que os agentes econômicos demandassem mais
1
O aumento da taxa de juros em 1997 foi uma conseqüência da crise na Ásia, que discutiremos no primeiro capítulo desta
dissertação.
14
recursos, fosse para consumo ou para investimentos, após 1994, com a implantação do
Plano Real.
De fato, nos primeiros meses após a implantação do Plano, o volume de crédito
apresentou elevações, com alguns autores destacando esse comportamento. Puga (1999, p.
46-47) escreveu que, nos primeiros meses do Plano Real, a queda das transferências
inflacionárias pós-estabilização da economia exigiu uma profunda reestruturação do
sistema financeiro brasileiro e motivou o aumento das operações de crédito que, por sua
vez, também foram favorecidas pelo rápido crescimento econômico decorrente da
estabilização.
De maneira similar, Cerqueira (1998) afirmou que, dentre os desdobramentos que se
seguiram à estabilização, um dos mais importantes foi o reaparecimento do crédito, em
especial do crédito para consumo. Esse reaparecimento, por um lado, atendia a uma
demanda reprimida por quase duas décadas de inflação elevada e, por outro, respondia à
necessidade dos bancos de encontrarem um substituto para as transferências inflacionárias,
responsáveis por parcela expressiva dos seus ganhos passados.
Por fim, Paula (1999, p. 1) destacou que
"no primeiro momento do Real, os bancos, no contexto de forte crescimento da
demanda por crédito, compensaram as perdas das receitas inflacionárias
expandindo crédito e adotando uma postura financeira mais ousada; no segundo
momento, a partir da crise bancária de 1995 e, posteriormente, com a crise
externa de 1997/1998, passaram a adotar uma postura mais defensiva, expressão
de sua maior preferência pela liquidez e aversão ao risco"
Assim, pode-se dizer que esse crescimento inicial do crédito foi momentâneo, pois,
além do costumeiro comportamento defensivo do sistema bancário brasileiro,
externalidades negativas afetaram seu desempenho. O volume de recursos do sistema
financeiro (tanto para o setor público quanto o privado), quando visualizado em final de
período (dezembro de cada ano) e deflacionado pelo Índice de Preços ao Consumidor
Amplo (IPCA), mostrou uma tendência estável (em torno de R$ 500 bilhões), entre 1996 e
2003 (tabela 6 e gráfico 2). Com a estabilidade do volume de recursos no mercado de
crédito, poderia se esperar que outras fontes de financiamento adquirissem maior
participação no endividamento empresarial, como as emissões primárias de títulos privados,
no chamado Mercado de Títulos.
15
Nesse mercado e, mais especificamente, na Bolsa de Valores, a resposta inicial às
modificações macroeconômicas do período pós-Plano Real, também foi de crescimento do
volume de transações. As emissões primárias de debêntures, ações e notas promissórias
atingiram um recorde de cerca de 8,3% da poupança interna bruta, em 1995. Cysne e Faria
(1997) atribuíram esses resultados positivos a três fatores: primeiro, a abertura do mercado
de títulos ao exterior que permitiu a entrada de recursos amparados em análise técnica mais
rigorosa, aproveitando o crescimento dos fluxos de capitais em direção às economias
emergentes. Segundo, o processo de reformas estruturais, acelerado a partir de 1990, em
particular, pelas privatizações de empresas estatais. Terceiro, a queda drástica da inflação
propiciada pelo Plano Real, sendo este claramente um fator de estabilização dos preços e
dos volumes de negócios no mercado de ações.
No entanto, essa trajetória de crescimento de emissão de títulos no mercado
primário de capitais mudou, a partir de 1998, em conseqüência dos impactos negativos da
seqüência de crises financeiras, do racionamento de recursos financeiros no mercado
internacional, do racionamento de crédito no mercado interno, além de problemas internos
que serão identificados ao longo desta dissertação, se mostrando bastante volátil até 2004
quando, por razões que serão tratadas no segundo capítulo deste estudo, começou a
apresentar crescimento de forma consistente.
A motivação para a realização desta dissertação parte então de duas proposições
fundamentais: primeiro, a grande influência do tema crédito e financiamento para a teoria e
os sistemas econômicos e, segundo, a análise da trajetória dos mercados de crédito e de
títulos no Brasil, após a conquista da estabilidade monetária com o Plano Real. O principal
interesse desta obra é construir um texto que busque analisar e compreender de que forma o
sistema financeiro, via mercado de crédito e de títulos, tem se comportado no
financiamento dos agentes econômicos e, mais especificamente, no financiamento
empresarial, ao longo dos últimos doze anos (1996-2007).
Será feita a apresentação e análise da trajetória recente da oferta de recursos pelo
sistema financeiro nacional, via mercado de crédito (MC) e de títulos (MT)
2
em geral e, em
particular, aos macro-setores empresariais indústria, comércio e serviços (setorizado
2
Quando se busca identificar a natureza e o contrato resultantes da relação financeira (crédito) faz-se a divisão do
mercado financeiro em dois, o mercado de crédito e o mercado de títulos, nos quais essas características se mostram
bastante distintas. Maiores detalhes sobre a definição desses conceitos serão apresentados no decorrer do texto.
16
conforme classificação CNAE
3
), ao longo do período 1996-2007. A escolha desse período
justifica-se pela sua importância econômica, tendo em vista se tratar da segunda metade da
década de 1990, marcada por grandes transformações na economia brasileira,
principalmente após a implantação do Plano Real, em julho de 1994, e do período mais
recente para o qual se tem disponibilidade de dados. O estudo parte de 1996 em função da
escassez de dados mais detalhados anteriores a esse ano.
A estrutura do texto é composta por três capítulos. No primeiro capítulo, será
analisada, à luz da teoria pós-keynesiana, a trajetória do volume de crédito disponibilizado
para empresas via MC, frente ao volume total de crédito fornecido para os demais agentes
(pessoas físicas e governos). Serão feitas considerações sobre os impactos no MC exercidos
pelas crises nacionais e internacionais, pelas regulamentações financeiras e pelos
programas de reestruturação adotados ao longo de cada um desses períodos. Para facilitar a
análise o período será dividido em dois: de 1996 a 2003, no qual se observará um período
de estabilidade do volume geral de crédito, e de 2004 a 2007, no qual se observa o
crescimento deste volume.
No segundo capítulo será apresentada a evolução do fluxo de recursos e do número
de emissões primárias no mercado brasileiro de títulos, entre os anos de 1996 e 2007. O
intuito será visualizar as causas e as conseqüências da abertura financeira, característica da
segunda metade da década de 1990, sobre a estabilidade do fluxo de emissões de títulos nos
primeiros anos doculo XXI e do crescimento desse fluxo após 2004. Mais uma vez, para
facilitar a análise, o período será dividido em dois, de 1996 a 2003 e de 2004 a 2007,
assumindo critérios semelhantes aos atribuídos para o mercado de crédito, em que se
considerarão os fatos mais relevantes que impactaram a trajetória da emissão dos títulos
nesses períodos. A análise dos dados desse mercado será baseada no conceito pós-
keynesianos de alocação de portfólio em ambientes com incerteza fundamental.
3
A CNAE - Classificação Nacional de Atividades Econômicas - é o instrumento de padronização nacional dos códigos de
atividade econômica e dos critérios de enquadramento utilizados pelos diversos órgãos da Administração Tributária do
país.Trata-se de um detalhamento aplicado a todos os agentes econômicos que estão engajados na produção de bens e
serviços, podendo compreender estabelecimentos de empresas privadas ou públicas, estabelecimentos agrícolas,
organismos públicos e privados, instituições sem fins lucrativos e agentes autônomos(pessoa física).
A CNAE resulta de um trabalho conjunto das três esferas de governo, elaborada sob a coordenação da Secretaria da
Receita Federal e orientação técnica do IBGE, com representantes da União, dos Estados e dos Municípios, na
Subcomissão Técnica da CNAE, que atua em caráter permanente no âmbito da Comissão Nacional de Classificação -
CONCLA (http://www.receita.fazenda.gov.br/PessoaJuridica/CNAEFiscal/txtcnae.htm, acesso em 13 jun. 2009).
17
No terceiro capítulo da dissertação, a análise se concentrará no detalhamento do
crédito para empresas. Será feita uma análise dos créditos livres que, caracteristicamente,
são fornecidos por bancos; dos créditos controlados, caracteristicamente fornecidos pelo
sistema BNDES; e dos recursos captados via MT, com a emissão de títulos de dívida
(debêntures, notas promissórias, etc.) e de propriedade (ações), na Bolsa de Valores. A
análise procurará revelar como se deu a distribuição desses recursos entre os macro-setores
indústria, comércio e serviços
4
, com o objetivo de compreender qual (is) o (s) setor(es)
mais beneficiado(s), em termos de recursos do sistema financeiro, com o crescimento
recente do volume de crédito na economia brasileira.
Por fim, na conclusão, serão sumariadas as principais observações apresentadas ao
longo da dissertação.
1. EVOLUÇÃO DO MERCADO BRASILEIRO DE CRÉDITO (1996-2007)
O MC se caracteriza por funcionar a partir de normas contratuais definidas de
acordo com as necessidades específicas (prazos, garantias, juros, etc.) das duas partes
envolvidas na relação financeira, a credora e a devedora, claramente identificadas
5
, e que
negociam basicamente operações de empréstimos, arrendamentos e financiamentos. As
operações nesse mercado ocorrem tipicamente no âmbito das instituições financeiras
bancárias (bancos comerciais e múltiplos) e das sociedades financeiras com operações de
financiamento de bens de consumo duráveis. Os contratos resultantes desse mercado são,
na sua maioria, não negociáveis
6
, ou seja, não revendidos em um mercado secundário,
como acontece com os títulos privados, como as ações, por exemplo (CARVALHO et.al,
2000).
A disponibilização dos dados referentes a esse mercado é feita, no caso brasileiro,
pelo Banco Central do Brasil (Bacen). É importante ressaltar que o Bacen computa e
consolida somente as estatísticas de crédito do Sistema Financeiro Nacional, de forma que
as operações de crédito contratadas diretamente no exterior (financeiras ou não) não são
4
Foi excluído dessa análise o setor agrícola, pois os recursos direcionados a esse setor possuem características muito
específicas.
5
As transações nesse mercado geralmente ocorrem de forma individualizada, o que permite que as partes envolvidas
sejam facilmente e/ou claramente identificadas.
6
Recentemente, essa característica tem se modificado em face da securitização, uma inovação financeira que permite a
negociação de carteiras de crédito entre bancos. Vale ressaltar que as discussões atuais sobre esse tema, tendo em vista a
atual crise do chamado subprime, podem criar regulamentações no mercado que diminuam a freqüência e/ou a intensidade
dessa inovação financeira.
18
registradas. Assim, por exemplo, “se uma empresa toma recursos no Banco Itaú Europa
(sediado em Luxemburgo) ou com o Citibank de Nova Iorque, estas operações não entram
nas estatísticas do Banco Central” (LUCCHESI, 2008, p. 111).
Os dados são apresentados em termos de estoque, ou seja, em saldos no final de
período. Isto é relevante, pois, como se verá no segundo capítulo desta dissertação, as
informações referentes à evolução do MT são disponibilizadas em termos de fluxo, o que
exige muito cuidado em eventuais comparações diretas da evolução de ambos os mercados.
Em razão dessa particularidade, a análise dos dados referentes aos dois mercados será
realizada separadamente ao longo do texto.
Cabe ressaltar uma dificuldade verificada na pesquisa e que decorre do próprio
conceito de mercado de crédito. Em muitas definições desse termo, considera-se que neste
mercado são negociados os empréstimos e financiamentos de prazos curtos e médios,
ficando a cargo do mercado de capitais, os de longo prazo. Com isso, nessas definições,
freqüentemente o BNDES não é considerado um fornecedor de recursos no mercado de
crédito, mas sim no mercado de capitais.
Entretanto, essa classificação dos mercados financeiros em termos de prazos (curto,
médio e longo) não parece adequada ao mercado financeiro brasileiro. Como ressalta
Lucchesi (2008) o conceito de prazos no Brasil é divergente entre os vários veículos de
comunicação que se propõem a defini-lo. A autora, que no seu trabalho está mais
preocupada em definir o termo longo prazo, escreve que há uma “ausência de conceituação
rigorosa sobre o que se entende sobre financiamento de longo prazo” (Ibid, 2008, p. 15).
Portanto, se não definição nem mesmo sobre o próprio conceito de prazo (curto,
médio ou longo) não parece razoável, tampouco, a divisão do mercado financeiro sob o
enfoque dos prazos relativos às operações fornecidas pelos seus mercados. Por isso será
considerada, nesta dissertação, a dicotomia do mercado financeiro em termos da natureza e
do contrato resultantes da relação financeira (mercado de crédito e de títulos), e não em
termos de prazos (curto, médio e longo), como freqüentemente se faz em trabalhos que
consideram a divisão do mercado em “de crédito” e “de capitais”. Não é inoportuno
ressaltar que, com a definição adotada, é mais prudente considerar o BNDES como
fornecedor de recursos no âmbito do mercado de crédito do que no mercado de títulos.
19
Este primeiro capítulo está dividido em três seções. A primeira apresenta o
referencial teórico pós-keynesiano sobre o qual será embasada a análise da evolução do
mercado de crédito nos dois períodos considerados (1996-2003 e 2004-2007). Não será
objetivo desta primeira seção apresentar toda a teoria pós-keynesiana acerca do mercado de
crédito, mas sim expor aqueles conceitos que se mostram mais úteis para a análise a ser
desenvolvida.
A segunda seção está dividida duas subseções. Na primeira destas subseções se
analisam os dados históricos referentes à evolução do volume de recursos disponibilizados
pelos agentes financeiros do mercado de crédito brasileiro (principalmente bancos), ao
longo do período 1996-2003. Serão apresentados apenas os fatos históricos recentes acerca
do desempenho desse mercado, com breves comentários teóricos. Na segunda subseção,
será feita a apreciação, com base no referencial pós-keynesiano apresentado na seção 1.1,
dos principias motivos identificados como os responsáveis pela trajetória de estabilidade
(ver gráfico 2) do volume de crédito nesse período.
Por fim, na terceira e última seção, que tem estrutura idêntica à segunda, serão
apresentados os dados históricos referentes à evolução do volume de recursos
disponibilizados pelos agentes financeiros do mercado de crédito (principalmente bancos),
ao longo do período 2004-2007, para em seguida, analisá-los com base no referencial
teórico pós-keynesiano, apresentado na seção 1.1.
1.1 Referencial teórico
Essa seção tem por objetivo apresentar alguns conceitos desenvolvidos pela teoria
keynesiana, que servem de base para a análise da evolução do mercado de crédito, a ser
apresentada na seção seguinte. Ao longo dos anos, esses conceitos têm se mostrado
importantes para a explicação de muitos fenômenos econômicos, dentre os quais o processo
de decisão dos bancos em ambientes de incerteza e o impacto desse processo na oferta de
crédito. No que tange à incerteza, Knight, em Risk, Uncertainty and Profit (1921[1972])
aponta que os agentes não possuem conhecimento perfeito acerca do futuro, o que implica
na existência de incertezas inerentes à atividade humana, em geral, e econômica, em
particular.
Uma parte dessas incertezas pode ser mensurada com o uso de lculos
probabilísticos (Knight dá como exemplo para esses casos, o lançamento de um dado
20
perfeito), mas outra parte não possui bases científicas que permitam o cálculo da
probabilidade de sua ocorrência (o exemplo para esses casos é a possibilidade de um
edifício pegar fogo). Segundo Knight (ibid., p. 232), a primeira forma de incerteza
praticamente nunca se encontra no mundo dos negócios, enquanto que a segunda é
extremamente comum, motivo pelo qual merece toda a atenção dos economistas.
Keynes, como se sabe, em alguns estudos sobre Moore e Burke, pensava por
volta de 1905, em eventos para os quais não se podem determinar cientificamente
probabilidades (Skidelsky, 1983). Em 1910, por exemplo, Keynes escreveu que o
investidor
will be affected, as is obvious, not by the net income which he will actually
receive from his investment in the long run, but by his expectations. These will
often depend upon fashion, upon advertisement, or upon purely irrational waves
of optimism or depression. Similarly by risk we mean not the real risk as
measured by the actual average of the class of investment over the period of
years to which the expectation refers, but the risk as it is estimated, wisely or
foolishly, by the investor. His desire that the net rate of interest shall be as high
as possible will be modified by the usually conflicting desire that the rate of risk
shall be as low as possible. But no mathematical rule can be laid down
respecting the exact compromise which will be struck between the fear of loss
and the desire for a high rate of interestSince the risk of which we must take
account is the subjective risk… its magnitude very largely depends upon the
amount of relevant information regarding the investment that is easily accessible
to him. What would be a risky investment for an ignorant speculator may be
exceptionally safe for the well-informed expert. The amount of risk to any
investor practically depends, in fact, upon the degree of his ignorance respecting
the circumstances and prospects of the investment he is considering. It will,
however, also depend on what we may term the objective risk, so far as that is
known to him, arising, for instance, out of bad unstable government or the
uncertainty of the seasons.”(apud Skidelsky, 1983, p. 208).
Posteriormente, Keynes (1973b, p. 113-114) apresentou sua definição de incerteza
da seguinte maneira:
“Por conhecimento “incerto” (...) eu não pretendo simplesmente distinguir o que
é conhecido por certo, daquilo que é apenas provável. O jogo de roleta não está
sujeito, nesse sentido, à incerteza (...). Até as condições climáticas são apenas
moderadamente incertas. O sentido no qual eu estou usando o termo se refere à
incerteza que há na perspectiva de uma guerra na Europa, ou do preço do cobre
ou da taxa de juros para os próximos vinte anos (...). Sobre esses acontecimentos
não bases científicas sobre as quais formar qualquer cálculo probabilístico.
Nós simplesmente não os conhecemos.”
A incerteza está presente naquelas situações em que o conhecimento não é
suficiente para uma tomada plenamente racional de decisões (uma vez que parte do
conhecimento, inclusive sua probabilidade, simplesmente inexiste), de forma que a ação
21
não pode ser totalmente baseada em conhecimento (DEQUECH, 1996). Em tal situação,
portanto, as decisões são ao menos parcialmente tomadas com fundamentos a-racionais,
pois, não podem ser completamente racionais decisões baseadas, ao menos parcialmente,
em eventos desconhecidos e com probabilidade desconhecida (DEQUECH, 1998).
Essa forma de conhecimento “incerto” passou a ser chamada de incerteza não-
probabilística, uma vez que reflete a idéia de que o futuro não pode ser reduzido a um
cálculo probabilístico atuarial, pois, os agentes econômicos simplesmente desconhecem
muitos dos principais eventos futuros, inclusive suas probabilidades (WOLFSON, 1996),
em razão de interações por demais complexas, inovações, etc. Alguns economistas
passaram a empregar o termo “incerteza em um sentido forte” e/ou incerteza
fundamental”, para refletir aquelas situações em que o conhecimento não é suficiente para a
tomada de decisões, de forma que a ação não pode ser totalmente baseada em
conhecimento (DEQUECH, 1996).
Em oposição a essa forma de incerteza o conceito de incerteza probabilística ou
mensurável (KNIGHT, 1972), ou ainda, segundo terminologia alternativa, incerteza fraca
(DEQUECH, 2000). Para que se destaque bem a diferença entre essas duas formas de
incerteza, Knight (ibid.) sugere que se nomeie essa última de “risco”, deixando o termo
“incerteza” somente para expressar o conceito de incerteza não-probabilística/forte/não
mensurável. Seguindo esta sugestão, Ferrari Filho e Conceição (2001, p. 101) definem
então que o risco se manifesta em situações nas quais a tomada de decisão acerca de um
determinado evento é realizada em um contexto no qual a distribuição de probabilidade
deste evento é conhecida, ao passo que a incerteza está presente nas situações nas quais a
tomada de decisão sobre um evento específico é realizada em um contexto em que inexiste
uma distribuição de probabilidade para ele
7
.
Outra distinção que merece cuidado está na confusão relativa à associação da idéia
de incerteza com a de ignorância total dos agentes sobre os eventos futuros. Dequech
(1996, p. 122) chama a atenção para isso, ao afirmar que incerteza não significa ignorância
completa (não é completa, mas implica, obviamente, algum grau de ignorância), pois, os
agentes econômicos estão ou pelo menos deveriam estar cientes da incerteza, ou, em
7
Essa distinção é sugerida por Knight mais como uma ferramenta didática que auxilie na compreensão do conceito de
incerteza, do que como um dogma gido que deva ser seguido pelos teóricos econômicos que, porventura, façam uso
desses conceitos.
22
outras palavras, as pessoas sabem ou deveriam saber que não sabem o suficiente. Um
dos aspectos da realidade sobre os quais algum conhecimento é possível, diminuindo a
incerteza geral sobre os eventos, encontra-se na existência de instituições que reduzem a
incerteza.
Dentre essas instituições estão os contratos, as leis, as hierarquias, os costumes e as
crenças que, em conjunto, recebem o nome de convenções. As convenções funcionam
como redutoras da incerteza, sem que jamais, no entanto, a eliminem por completo. A
aceitação da existência de convenções como instrumentos redutores da incerteza constitui-
se em um aspecto importante para compreender como as decisões são tomadas em
ambientes de incerteza fundamental ou não-probabilística (PAULA, 2003 e DEQUECH,
2000).
Segundo Keynes (1973), decisões humanas que envolvam o futuro, sejam elas
pessoais, políticas ou econômicas, não podem depender de estrita expectativa matemática,
tendo em vista que, bases totalmente objetivas para realizar tais cálculos não existem. É o
impulso inato para a atividade (os animal spirits, não fundamentalmente, portanto,
assentados sobre dados objetivos) o que, muitas vezes, faz com que os gastos produtivos
ocorram. Para Keynes, então, os agentes econômicos são, ao menos em parte, movidos pelo
que ele chamou de otimismo espontâneo, que se aprecia ou se deprecia em razão de
alterações do estado de confiança dos agentes
8
.
“O estado de confiança expressa o grau limitado de certeza sobre a ocorrência de
um determinado evento e é, portanto, inversamente proporcional à incerteza presente nas
expectativas formuladas pelos agentes” (PAULA, 2003, p. 337). Isso significa que, a
depreciação ou apreciação do estado de confiança dos agentes decorre de eventos que
causem, respectivamente, aumento ou diminuição das incertezas nas expectativas
formuladas pela maioria ou pela média dos agentes econômicos (ou, em alguns casos, por
um único agente especificamente). Assim, quando o ambiente possui baixa incerteza, os
agentes tendem a apresentar um estado de confiança maior do que quando o ambiente
possui alta incerteza.
8
Acerca dessa afirmação, Keynes alerta que não se deve concluir que tudo depende de ondas de psicologia irracional,
pois, o estado de expectativa de longo prazo é, na maioria das vezes, estável e, mesmo quando não o é, outros fatores
exercem seus efeitos compensatórios. Assim, o importante, alerta Keynes, é perceber “que a nossa inteligência faz o
melhor possível para escolher o melhor que pode haver entre as diversas alternativas, calculando sempre que se pode, mas
retraindo-se, muitas vezes, diante do capricho, do sentimento ou do azar (KEYNES, 1985, p. 118)”
23
Nesse sentido, Oreiro (2001, p. 26) argumenta que, no que tange ao processo de
tomada de decisão, cada indivíduo poderá procurar imitar o comportamento médio dos
demais indivíduos, seja por acreditar que os outros têm mais informação do que a que ele
possui, seja porque o conjunto das expectativas dos agentes conforma uma tendência mais
provável para algumas variáveis econômicas, ou ainda, segundo Keynes (1973), porque,
para muitos agentes, em especial os banqueiros, é melhor, do ponto de vista de suas
reputações, fracassar com o mercado do que vencer contra ele
9
. Os agentes assumem,
portanto, em grande parte das vezes, comportamentos convencionais, os quais levam em
conta o estado vigente de opiniões sobre o futuro, incluindo a opinião da média dos
participantes do mercado acerca da percepção quanto ao grau de incerteza do ambiente.
Nas palavras de Paula (2003, p. 337, aspas no original), “os agentes buscam, assim,
criar regras, convenções, rotinas e práticas que, ao invés de eliminar, permitam ‘contornar
a incerteza de suas expectativas quanto ao futuro.” Um desses comportamentos
convencionais manifesta-se na demanda por liquidez ou preferência pela liquidez que, na
sua forma mais extrema, se reflete na demanda/preferência por moeda, o ativo de maior
liquidez existente. Como define Bernstein (1998, p. 16), liquidez significa a habilidade para
reverter uma decisão ao menor custo de transação possível. Isso implica que a demanda por
liquidez é uma função da incerteza, uma vez que, sem incerteza, os agentes nunca iriam
precisar, ou mesmo querer, reverter uma decisão, pois, se eles conhecessem todo o futuro,
ou ao menos todas as probabilidades quanto a ele, não teriam dificuldades, em qualquer
momento, para uma tomada de decisões ótimas que dispensariam sua atenção para o resto
da vida.
A preferência pela liquidez, portanto, constitui-se em um hedge contra as incertezas
do futuro, sendo diretamente proporcional a esta última (CARVALHO, 2005; FERRARI
FILHO; CONCEIÇÃO, 2001), de forma que quanto maior (menor) a incerteza do
ambiente, maior (menor) a preferência pela liquidez. Quando o comportamento médio dos
agentes tende ao aumento da preferência pela liquidez e/ou da demanda por moeda e outros
ativos líquidos, em detrimento da demanda por ativos de menor liquidez, como bens capital
e/ou ativos fixos, em geral ocorre uma redução da demanda agregada e, conseqüentemente,
9
Para uma visão em que um agente, inclusive um banco, pode ter vantagens em seguir contra a maioria, ver Dequech
(1998).
24
da atividade econômica (PAULA; ALVES JR., 2003).
Pode-se afirmar, portanto, que é a existência de incerteza que explica a volatilidade
do investimento (dado o estado de confiança da maioria dos agentes econômicos) e, por
conseguinte, a racionalidade em relação à maior ou menor preferência pela liquidez, tem
como principais conseqüências as flutuações da demanda efetiva e do desemprego.
“Incerteza, portanto, é a razão para as pessoas reterem moeda. Quanto maior a incerteza em
relação às expectativas dos agentes econômicos, mais esses estarão inclinados a postergar
decisões de gasto e, por conseguinte, a preferência pela liquidez crescerá” (FERRARI
FILHO; CONCEIÇÃO, 2001, p. 103).
Quando se analisa o mercado bancário a partir desses conceitos, alguns resultados
interessantes são observados. Para os pós-keynesianos, bancos são instituições que visam o
lucro e que estão conscientes dos riscos associados à sua atividade e da sua capacidade de
inovar e criar depósitos. Como qualquer outra firma que atua sob condições de incerteza, os
bancos m preferência pela liquidez e, com base em suas expectativas sobre o futuro,
adaptam seu portfólio de modo a conciliar o trade-off percebido entre lucratividade (ou
rendimento) e liquidez (ALVES JR; DYMSKI; PAULA, 2008). Em outras palavras, a
preferência pela liquidez desses agentes é fortemente determinada por suas expectativas, e
suas estratégias são definidas de acordo com suas percepções de risco (não quantificável) e
oportunidades de lucro (PAULA, 2003; PAULA, 2006).
Ademais, os bancos são vistos pelos pós-keynesianos como agentes ativos, que
administram dinamicamente seu balanço patrimonial (ativo e passivo), procurando
influenciar as preferências dos clientes/depositantes através do gerenciamento das suas
obrigações e da introdução de inovações técnicas e financeiras. Essas características e
comportamentos das firmas bancárias têm impacto decisivo sobre as condições de
financiamento dos agentes, afetando as variáveis reais da economia, como o produto e o
emprego (MINSKY, 1986; PAULA, 1999).
Assim, a escolha entre os ativos que compõem o portfólio dos bancos dependerá das
expectativas e do estado de confiança destes em relação ao retorno esperado e da avaliação
dos riscos/incerteza
10
(trade off risco-rentabilidade) associados a cada alternativa de
10
Segundo Carvalho et al. (2000), esses riscos o o descritos por distribuições fixas de probabilidade como sugere a
abordagem neoclássica, mas variam com a própria conjuntura.
25
empréstimo, os quais, em grande medida, dependem da informação
11
sobre os
emprestadores e do ciclo econômico. Quando as expectativas dos bancos em relação ao
futuro são otimistas, isto é, quando a incerteza e a expectativa de elevados riscos diminuem,
eles privilegiam a rentabilidade à liquidez e mantêm em seus balanços patrimoniais mais
empréstimos a clientes (mesmo aqueles com risco calculado mais elevado) e ativos de
maior risco, do que títulos públicos ou privados não provenientes de crédito, o que tende a
provocar um aumento da oferta de crédito na economia. Do contrário, quando as
expectativas são pessimistas (incerteza mais elevada), os bancos aumentam sua preferência
pela liquidez em relação à rentabilidade potencial de créditos mais lucrativos, porém com
maiores riscos, ampliando então a participação de ativos líquidos nos seus balanços em
relação aos provenientes de créditos (mas com elevado grau de risco), de forma que a oferta
de crédito na economia tende a reduzir-se (CARVALHO, 1999).
Seguindo esta lógica, Paula e Alves Jr. (2003) afirmam que as escolhas ativas dos
bancos dependem, portanto, do estado de expectativas ou de confiança dos dirigentes
dessas instituições em relação ao risco, à rentabilidade e à liquidez dos ativos, assim como,
em relação ao desempenho futuro da economia (percepção do grau de incerteza do
mercado). Além disso, essas escolhas ativas serão definitivas para causarem ou evitarem o
racionamento de crédito, uma vez, que as condições de oferta no mercado de crédito são
soberanas sobre as condições de demanda.
Essa afirmação está expressa na visão de economistas pós-keynesianos como Chick
(1994) e Minsky (1957), que sugerem que o volume de negócios bancários e de depósitos
não depende exclusivamente das decisões dos clientes, ou seja, da demanda por crédito
12
,
nem tampouco da restrição de reservas impostas pelas autoridades monetárias, mas depende
também, e em maior medida, do interesse negocial dos ofertantes de crédito (bancos) que,
quando estão dispostos a negociar, procuram inovar tanto em relação à captação de recursos
(administração de passivos e gerenciamento de reservas) quanto na busca de novas
oportunidades de empréstimos e outras operações financeiras (inovações financeiras –
ZENDRON, 2006).
11
Informação é essencial no processo de crédito, ou como afirma Stiglitz (2004, p. 57), o crédito se baseia em
informação”.
26
Isso significa que, dadas as expectativas dos bancos, eles tendem a apoiar projetos
que apresentem perspectivas favoráveis na relação risco/incerteza x retorno. Assim, se
determinados projetos apresentarem rentabilidade que compense os riscos assumidos, os
bancos provavelmente irão apoiá-los com o fornecimento de crédito. No que se refere à
demanda por crédito, a análise risco/incerteza x retorno também é válida, de forma que a
decisão de investimento do empresário está relacionada à sua percepção de que o retorno,
em geral, deve ser maior do que o risco uma vez mais, não inteiramente quantificável
de determinado projeto. Se, na visão do empresário, a rentabilidade for maior do que o risco
do projeto, ele tenderá a investir seus recursos nesse empreendimento e buscar
financiamento no mercado de crédito para financiar o capital faltante (GITMAN, 2004). O
problema nessa relação de oferta e demanda por crédito reside justamente na diferença de
percepção que bancos e empresários têm em relação ao trade off risco/incerteza x
rentabilidade.
Segundo Wolfson (1996, p. 450-451), embora ofertantes e demandantes de crédito
estejam sujeitos à incerteza fundamental, isto não implica que ambos tenham as mesmas
percepções acerca da lucratividade e riscos/incertezas futuros de determinado projeto. Na
verdade, o mais provável é que eles tenham percepções diferentes, uma vez que ofertantes,
em geral, são mais avessos ao risco do que os demandantes (que comumente são otimistas
em relação aos seus próprios projetos, bem como ao valor das garantias que oferecem),
além de, acrescente-se, normalmente conhecerem melhor o futuro empreendimento do que
seus financiadores (Stiglitz, 1989). Para Wolfson (1996), tudo o que é necessário para
compreender a teoria de racionamento de crédito baseada na incerteza keynesiana é,
portanto, que ofertantes e demandantes de crédito avaliam o futuro diferentemente, ou seja,
eles têm expectativas assimétricas.
Wolfson (ibid.) defende que a existência de expectativas assimétricas implica em
duas conclusões: 1. alguns projetos podem ser considerados seguros (com rentabilidade
superior ao risco) tanto por ofertantes quanto por demandantes de crédito e; 2. alguns
projetos podem ser considerados seguros pelos demandantes, mas julgados como de alto
12
Embora não dependa exclusivamente da decisão de clientes, a oferta de empréstimos bancários nunca é independente da
demanda, pois como escreve Wray (2003, p. 132, aspas no original), os “bancos oferecem empréstimos somente porque
alguém está querendo ‘tomar emprestada’ moeda bancária.”
27
risco pelos ofertantes
13
. No primeiro caso, provavelmente haverá a concessão de
empréstimos, pois, os bancos, ao confiarem nas expectativas dos empreendedores (e nas
suas próprias) e avaliarem os empreendimentos como seguros, os considerarão uma
oportunidade de auferir lucro sem comprometer sobremaneira seus ativos. No segundo
caso, provavelmente haverá racionamento de crédito, pois, os bancos não comprometerão
seus ativos em empreendimentos que considerem de risco muito elevado
14
. Essas
implicações estão sistematizadas na tabela abaixo:
Tabela 2 – O efeito das expectativas assimétricas sobre o racionamento de crédito
Seguro Arriscado
Seguro
Empréstimo ****
Arriscado Racionamento ****
Ofertantes de crédito
(bancos)
Demandantes de crédito
(empreendedor/consumidor)
Fonte: Wolfson (1996, p.452)
Essa tabela sugere, portanto, assim como Chick (1994) e Minsky (1957), que os
bancos desempenham papel decisivo no tocante ao racionamento ou não do crédito, uma
vez que são os agentes do mercado que, em última análise, decidem sobre esse
racionamento (ALVES JR.; DYMSKI; PAULA, 2008). Assim, tanto a diminuição quanto a
elevação do volume de crédito na economia são definidas, segundo a teoria pós-keynesiana,
pelas estratégias dos bancos, em conjunto com as expectativas e estratégias dos
demandantes de crédito (sendo esta última, menos decisiva na decisão final).
1.2 Evolução do mercado brasileiro de crédito no período 1996-2003: a estabilidade
1.2.1 Apreciação dos fatos históricos
Na década de 1990, o Brasil passou por grandes mudanças econômicas, dentre as
quais se destacaram: a abertura comercial; a abertura da conta de capital do balanço de
pagamentos; a reforma do Estado, com privatizações de empresas estatais; a securitização
13
Não se considera que os demandantes avaliem seus os projetos como sendo de alto risco, uma vez que, teoricamente, se
isto ocorrer, eles não irão investir seus recursos no empreendimento e não procurarão os bancos para financiarem o capital
restante.
14
Na prática os bancos brasileiros atribuem níveis de risco para os empreendimentos conforme critérios definidos pela
Resolução do Banco Central n. 2.682, de 21 de dezembro de 1999, racionando crédito para os empreendimentos cuja
28
dos empréstimos da dívida externa via Plano Brady; e o lançamento de um novo plano
econômico de estabilização monetária, o Plano Real (ZONENSCHAIN, 1998).
Inicialmente, as expectativas (de curto prazo) favoráveis dos agentes em relação a
esse conjunto de medidas provocaram grande crescimento do consumo e expansão do nível
de atividade econômica do país. Todavia, o crescente desequilíbrio do balanço de
pagamentos brasileiro e a crise mexicana de 1994/1995, que iniciara uma reversão dos
fluxos de capitais internacionais ao Brasil, frustraram as expectativas dos agentes
econômicos e provocaram o fim dessa expansão em 1995, quando o país entrou numa
fase de estagnação (FILGUEIRAS, 2000). Em reação a esse cenário, ao longo de todo o
ano de 1995, o governo federal buscou contrair a liquidez financeira no país com a
promoção de um aperto na política monetária, por meio da manutenção de elevadas
alíquotas sobre os depósitos compulsórios e de aumentos sucessivos da taxa básica de
juros, a SELIC, que encerrou o ano com uma média anual expressiva de 41,22%
15
.
As constantes elevações dos níveis da taxa SELIC, após a decisão do aperto
monetário, tiveram por objetivo afetar negativamente a demanda por crédito, pois,
indiretamente provocaram um aumento dos custos dos empréstimos bancários. Essa
influência da taxa SELIC sobre o custo dos empréstimos bancários é destacada em muitos
estudos (KOYAMA; NAKANE, 2002; AFANASIEFF; LHACER; NAKANE, 2001;
OREIRO et al. 2006; BIGNOTTO; RODRIGUES, 2006) que apresentam evidências de
significância na relação positiva entre a taxa SELIC e o spread bancário, e concluem que os
bancos aumentam as margens cobradas nas taxas de empréstimos à medida que há aumento
da taxa SELIC. Uma das explicações desse efeito está no fato de os bancos manterem em
seus portfólios títulos indexados à SELIC (títulos quase livres de risco, com alta liquidez e
rentabilidade positiva), o que aumenta o custo de oportunidade para os bancos
emprestarem, passando a embutirem um elevado prêmio de risco na concessão de crédito
(LEAL, 2007).
Da mesma forma, a manutenção de altos níveis das alíquotas de recolhimento dos
compulsórios sobre depósitos e aplicações financeiras também objetivou influenciar
negativamente a demanda por crédito. Essa relação é mais evidente, dado que um dos usos
avaliação apresente risco calculado maior do que o determinado em suas políticas internas (em geral, os riscos que são
considerados elevados e desaconselháveis de apoio financeiro são E, F, G e H).
15
Ver tabela 1, página 13.
29
dos recolhimentos compulsórios é justamente o controle do crédito
16
, sendo uma elevação
das suas alíquotas equivalente a uma taxação sobre a captação de recursos e um aumento do
custo de oportunidade na manutenção de encaixes ociosos. A tabela 3 mostra o
comportamento dos depósitos compulsórios no período 1994-1999.
Tabela 3 – Alíquotas de recolhimento sobre encaixes obrigatórios (compulsórios)
(Jun. 1994 – Out. 1999)
Recursos
a vista
Depósitos
a prazo
Depósitos
de
poupança
Operações
de Crédito
FIF
curto
prazo
FIF 30
dias
FIF 60
dias
40% 15%
1994 Jun
100% 20% 20%
Ago
30% 30%
Out
15%
Dez
90% 27%
1995 Abr
30%
Mai
12%
Jun
10%
Jul
83% 35% 10% 5%
Ago
20% 15% 8% 40% 5% 0%
Set
5%
Nov
0%
1996 Ago
82% 42%
Set
81% 44%
Out
80% 46%
Nov
79% 48%
Dez
78% 50%
1997 Jan
75%
1999 Mar
30%
Mai
25%
Jul
20%
Ago
0% 0%
Set
10%
Out
65% 0%
Anterior ao plano
real
Fonte: Banco Central do Brasil (2007)
Até novembro de 1995, todas as fontes de recursos estavam sujeitas aos depósitos
compulsórios e, além disso, a principal dessas fontes (os depósitos à vista) teve sua alíquota
mantida em níveis superiores a 75% em quase toda a segunda metade da década
17
. Isso
reflete a preocupação das autoridades monetárias à época, em restringir a capacidade de
expansão do crédito bancário e, conseqüentemente, a expansão da demanda e da produção,
16
Os outros usos desse instrumento são: fornecer (ou não) liquidez ao sistema bancário, estabilizar a demanda por
reservas bancárias (ao tornar mais fácil e estável o gerenciamento de liquidez por parte de cada banco) e controlar os
agregados monetários via multiplicador monetário (CARVALHO, et al. 2000).
30
com vistas a manter a estabilidade de preços nos primeiros anos do Plano Real. No tocante
ao crédito com prazos mais extensos, a restrição dava-se com a manutenção de elevados
níveis da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP)
18
, uma vez que essa se constitui no
principal indexador das operações do BNDES.
O uso conjunto da SELIC, da TJLP e dos compulsórios como instrumentos de
contenção da liquidez da economia foram eficazes para manter estável o volume de crédito
do sistema financeiro. Entretanto, é mister ressaltar que esses instrumentos visavam, em
primeiro lugar, sanar dificuldades econômicas internas geradas pelo cenário de crise
internacional.
Mais adiante, em abril de 1996, a economia apresentou alguns sinais de recuperação
e voltou a crescer influenciada, principalmente, pelo retorno à normalidade dos mercados
financeiros internacionais. No entanto, esse crescimento teve breve duração e, a partir de
1997, o país apresentou novamente desempenho recessivo em conseqüência da
sobreapreciação do real e das novas crises mundiais na Ásia, em outubro de 1997, e na
Rússia, em agosto de 1998, que influenciaram negativamente as expectativas dos
investidores internacionais sobre os mercados emergentes, incluindo o próprio Brasil, e
provocaram uma recomposição do portfólio desses agentes, em âmbito mundial, a favor de
ativos de menor risco (FILGUEIRAS, 2000), provocando uma fuga de capitais dos
mercados emergentes.
No caso do Brasil, esse ambiente de fuga de capitais foi acompanhado de
movimentos especulativos contínuos contra o real (que se mantinha sobreapreciado),
implicando em aumentos significativos da taxa de juros interna. No fim de 1998, a pressão
de especulação se intensificou e as reservas estrangeiras do Brasil começaram a se esvair
muito rapidamente (KRUGMAN; OBSTFELD, 2001). Com isso, surgiram novas
dificuldades para o financiamento do déficit em transações correntes brasileiro e as
autoridades monetárias se viram forçadas à tomada de medidas para a contenção da fuga
excessiva de capitais externos do país.
17
Em junho de 1994, ou seja, exatamente um mês antes da introdução da nova moeda (o real), a alíquota de compulsórios
sobre os depósitos a vista chegou a 100%.
18
A TJLP é calculada pelo Bacen, que considera a rentabilidade média atualizada dos títulos da dívida externa emitidos
pelo Brasil durante a negociação das condições do Plano Brady, e dos títulos da dívida pública interna federal emitidos no
mercado primário. Apesar de ser uma taxa anual, seu período de vigência é trimestral. O BNDES é a única instituição que
oferece recursos atrelados a essa taxa, visto ser igualmente o único órgão a possuir passivos (PIS/Pasep, Fundo de Amparo
ao Trabalhador – FAT – e Fundo da Marinha Mercante – FMM) sobre os quais paga TJLP.
31
Da mesma forma, o FMI se mostrou preocupado com a possibilidade de uma crise
brasileira ameaçar a estabilidade (ainda que breve) conquistada por países vizinhos como a
Argentina, o Chile e o México, e ajudou a formar um fundo de estabilização de mais de
US$ 40 bilhões para contribuir com a defesa do real. “Duplicando com eficiência as
reservas estrangeiras no Brasil, o recurso do empréstimo visava acalmar os temores dos
investidores enquanto o governo do Brasil colocava a casa fiscal em ordem” (Ibid., p.730).
Assim, em 1998, foi anunciado pelo governo brasileiro um acordo internacional
com organismos multilaterais e governos estrangeiros, através do qual o país recebeu,
aproximadamente, US$ 41,5 bilhões, ao mesmo tempo em que conduziu a privatização de
empresas nacionais, principalmente as de telefonia. No entanto, esse auxílio dos
organismos internacionais não foi suficiente para evitar que a situação se agravasse,
chegando a saída diária de capitais a atingir US$ 1 bilhão, ao longo de 1998 (SIQUEIRA,
2007).
Para conter essa fuga de capitais e estancar a perda de reservas, no dia 15 de janeiro
de 1999, o Banco Central adotou o regime de câmbio flutuante, deixando o real flutuar
livremente depois de ter, sem sucesso, alargado a banda cambial por três dias consecutivos.
Em julho do mesmo ano, o Banco Central adotou também o regime de metas inflacionárias
(BAHRY, 2003, p. 20), planejando, com o uso conjunto desses dois regimes, criar
condições institucionais para direcionar a política monetária ao objetivo de assegurar a
estabilidade de preços e reduzir a necessidade de manutenção de elevadas taxas de juros, a
fim de equilibrar o balanço de pagamentos (BACEN, 2000).
Contudo, esses objetivos não foram alcançados, pois, nos primeiros anos do século
XXI, novas crises internas e externas exigiram a manutenção de elevadas taxas de juros, ao
mesmo tempo em que a taxa de inflação se mostrava crescente, atingindo variação anual de
12,53%, no seu momento mais crítico, em 2002 (ver tabela 1).
Com relação ao setor bancário, essa situação de retração da liquidez financeira, via
restrições ao crédito, dentre outras conseqüências, agravou (ainda mais) o mau desempenho
dos bancos que, desde o início do Plano Real, já se mostravam em dificuldades em razão da
perda das chamadas receitas inflacionárias
19
. Essas receitas, que decorriam da não correção
monetária integral dos depósitos a vista e de outras aplicações de curtíssimo prazo mantidas
32
por pessoas físicas e jurídicas nos bancos, com o Plano Real e o fim da inflação alta, foram
reduzidas, o que provocou uma alteração nas perspectivas de rentabilidade e estratégias de
concorrência dos bancos no Brasil (CINTRA, 2006).
Diante do cenário de restrição ao crédito e redução de receitas, alguns bancos
concederam empréstimos de maneira desorganizada e não criteriosa, de forma que o
aumento da inadimplência foi questão de tempo. Esta elevação da inadimplência levou
alguns bancos a privilegiarem as operações de tesouraria, sobretudo as operações de
mercado de títulos da dívida pública, o que resultou em graves dificuldades para algumas
instituições. Inicialmente, os pequenos bancos e aqueles criados a partir de instituições não-
bancárias foram os mais atingidos, pois, não tinham estrutura adequada para operarem em
um ambiente não-inflacionário.
Neste contexto, entre julho de 1994 e agosto de 1997, foram liquidados ou sofreram
intervenção extrajudicial do Banco Central 41 bancos, dos quais os casos mais críticos
foram os do Banespa, Banerj, Bamerindus, Econômico e Nacional, haja vista a importância
dessas instituições para o setor financeiro (SIQUEIRA, 2007). A eclosão de uma crise
bancária sistêmica se mostrava cada vez mais provável e era nítida a fragilidade do sistema
financeiro nesse período, de forma que as autoridades monetárias adotaram ações com o
intuito de fortalecer e reestruturar o sistema através de programas e medidas que se
estenderam por toda a segunda metade da década de 1990 (VASCONCELOS et al., 2004).
Dentre essas medidas se destacaram o Programa de Incentivo à Redução do Setor
Público Estadual na Atividade Bancária (PROES), em agosto de 1996, que teve como
objetivo retirar do mercado bancos públicos considerados ineficientes
20
, através de
privatizações, liquidações ou transformações desses em instituições não-bancárias; o
Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro
Nacional (PROER), também em agosto de 1996, que permitiu o saneamento e a
concentração do sistema bancário brasileiro; a criação do Fundo Garantidor de Créditos
(FGC), para garantir depósitos bancários limitados ao valor de R$ 20 mil, oferecendo maior
19
Tamm chamadas receitas com floating, cujo nome cnico é ganho com passivos sem encargos, deduzidos da perda
com ativos não-remunerados.
20
Conforme informações do Bacen (1998), a necessidade de redução da presença estatal em instituições financeiras
decorreu do histórico de iliquidez dos ativos das instituições administradas por entes públicos, refletida nos constantes
usos dos recursos de assistência financeira de liquidez do Banco Central. Com essa redução, esperava-se que a União
ficasse desobrigada de realizar aporte de recursos a estas instituições, tidas como ineficientes, e pudesse transferir os
passivos com o público destes bancos estatais para instituições financeiras melhor estruturadas.
33
segurança aos poupadores de recursos; as exigências para a implantação de sistemas
formais de controles internos pelas instituições integrantes do SFN (Resolução n. 2.554, de
24 de setembro de 1998), com o objetivo de melhorar a mensuração e administração de
riscos; a Resolução 2.493, de maio de 1998, através da qual se permitiu que os bancos
vendessem parte ou toda sua carteira de crédito para as denominadas Companhias
Securitizadoras de Créditos Financeiros, abrindo margem nos seus passivos para a
concessão de novos empréstimos (VASCONCELOS; STRACHMAN, 2002; ANDREZZO;
LIMA, 2002).
Em conjunto com essas medidas e sob a justificativa de estimular a concorrência e
ampliar o crédito
21
, foi incentivada a abertura do setor financeiro ao capital estrangeiro,
inclusive com a venda de grandes instituições varejistas domésticas, como o Banco Real
(comprado pelo holandês ABN Amro Bank), o Bamerindus (comprado pelo britânico
HSBC) e o Noroeste (comprado pelo espanhol Santander). Segundo Paula e Marques
(2006, p. 248), através da Exposição de Motivos n. 311, encaminhada pelo Ministro da
Fazenda à Presidência da República ainda em agosto de 1995, o aumento da participação de
instituições financeiras estrangeiras no sistema financeiro nacional foi considerado de
interesse nacional, uma vez que elas agregariam mais capital, conhecimento, tecnologias e
concorrência ao sistema bancário doméstico.
De fato a internacionalização do setor bancário, seguida por uma reação positiva de
grandes instituições financeiras nacionais que também “entraram na onda” de fusões e
aquisições, contribuiu para evitar a eclosão da temida crise sistêmica, constituindo-se em
mais uma solução de saneamento das instituições financeiras em dificuldades. Além disso,
entre o final de 1999 e o início de 2000, o cenário econômico interno novamente começou a
mostrar sinais de recuperação, melhorando a expectativa dos agentes econômicos.
Essa nova fase de expansão econômica foi motivada pela retomada da estabilidade
da conjuntura internacional, pela ampliação da oferta mundial de recursos financeiros e
pela melhora das expectativas dos agentes nacionais e internacionais sobre a economia
brasileira. Os prognósticos dos analistas financeiros nesse período eram de crescimento do
21
Segundo Vasconcelos e Strachman (2002, p. 57) “(...) uma das justificativas [apresentadas como] favoráveis ao ingresso
de bancos estrangeiros no Brasil é a de que esses seriam mais propensos a realizarem operações de crédito do que as
instituições nacionais, pois teriam o acúmulo de experiência e técnicas nessa área em seus países de origem. A esperança
era de que a migração para o Brasil de instituições bancárias originárias de economias em que a proporção de crédito em
relação ao PIB fosse muito mais alta que a brasileira trouxesse junto esse mesmo nível de crédito.”
34
PIB, impulsionado pela ação conjunta do dinamismo da indústria, estabilidade do câmbio e
inflação, expansão do crédito e redução da taxa de juros (UNIBANCO, 1999; ITAÚ, 1999).
Em outubro de 1999, as alíquotas de recolhimento sobre encaixes compulsórios
incidentes sobre os recursos a vista foram reduzidas de 75% para 65% e tornaram-se nulas
sobre os depósitos a prazo (redução de 10% para 0%). Tais reduções, segundo o Banco
Central
22
, implicaram transferência dos montantes de recursos vinculados em títulos
23
para
as carteiras livres das instituições, conferindo-lhes maior flexibilidade. Posteriormente, em
março e junho de 2000, houve novas reduções na alíquota de depósitos à vista para 55% e
45%, respectivamente.
Tabela 4 - Alíquotas de recolhimento sobre encaixes obrigatórios (compulsórios)
(Out. 1999 – Ago. 2003)
Recursos a
vista
Depósitos
a prazo
Depósitos
de
poupança
Operações
de Crédito
FIF curto
prazo
FIF 30 dias FIF 60 dias
1999 Out 65% 0%
2000 Mar
55%
Jun 45%
2001 Set 10%
2002 Jun 15%
Jul 20%
2003 Fev 60%
Ago 45%
Fonte: Bacen (2007)
Além disso, a SELIC média do ano 2000 foi reduzida para 16,19% a.a., nível
significativamente baixo para os padrões nacionais, considerando que na maior parte do
período 1996-1999 a taxa foi superior a 30 % a.a. Isso contribuiu para a redução das taxas
de juros das operações prefixadas com pessoas físicas e jurídicas, as quais decresceram de
62,3% a.a., ao final de 1999, para 51% a.a., ao término do ano 2000 (ibid.). A TJLP, taxa
básica nas operações do BNDES, também sofreu redução, passando de 12,5% a.a. para
9,75% a.a., com o intuito de estimular o uso de operações desta instituição, voltadas,
caracteristicamente, ao financiamento de investimentos de maior maturação.
22
Ainda segundo o Bacen (1999, p. 45), “[a] desativação dos recolhimentos compulsórios sobre recursos a prazo implicou
desvinculação de títulos da ordem de R$ 27 bilhões.
23
Os compulsórios relativos a depósitos a prazo são recolhidos em tulos públicos federais e registrados no Sistema
Eletrônico de Liquidação e Custódia (SELIC).
35
Com essas medidas novamente esperou-se uma elevação do volume de crédito e,
preventivamente, no intuito de evitar a eclosão de uma crise de inadimplência como a
ocorrida em meados dos anos 1990 e, ao mesmo tempo, minimizar as assimetrias de
informação e a seleção adversa no mercado de crédito nacional, as autoridades monetárias,
por meio da Resolução n. 2.682, de 21 de dezembro de 1999, mas que entrou em vigência
somente em de março de 2000, estabeleceram critérios mais rigorosos para a análise de
risco de crédito.
Antes dessa Resolução, as regras para classificação da carteira de crédito eram
baseadas, exclusivamente, no prazo de inadimplência, desconsiderando o risco potencial do
tomador de recursos e da própria operação, sendo os créditos classificados de maneira
simples em: normal (vencidos até 60 dias), atraso (vencidos há mais de 60 dias e menos de
180 e com garantias suficientes) e liquidação (vencidos mais de 60 dias sem garantias e
há mais de 180 dias, mesmo que com garantias suficientes).
Com a Resolução n. 2.682 houve uma sofisticação na atribuição de níveis de risco
para as operações bancárias, com os ativos de crédito passando a ser classificados em nove
níveis, seguindo uma ordem crescente de risco (AA, A, B, C, D, E, F, G, H) com as
provisões sobre créditos de liquidação duvidosa (PCLD) sendo requeridas gradualmente e
constituídas mensalmente a partir do segundo nível, não podendo ser inferiores ao
somatório dos percentuais sobre o valor total das operações de crédito apresentado na
tabela 5.
Tabela 5 – Percentual de PCLD por faixa de risco de crédito
Nível de risco da operação Percentual de provisão
AA
0%
A
0,5%
B
1%
C
3%
D
10%
E
30%
F
50%
G
70%
H
100%
Fonte: Bacen (2007)
Outra inovação desse período, que também teve por objetivo reduzir os riscos das
operações de crédito, veio por meio da Medida Provisória n. 1.925, de 14 de outubro de
36
1999, que criou a Cédula de Crédito Bancário, um título de crédito que pode ser emitido
por pessoas físicas ou jurídicas, com ou sem garantias, em favor de instituições cedentes de
recursos, representando a promessa de pagamento em dinheiro dos compromissos
assumidos por meio de empréstimos (BACEN, 2000).
Esta cédula pode ser utilizada em qualquer modalidade de operação de crédito e
possibilita às instituições financeiras securitizarem seus recebíveis, por meio da emissão de
certificados lastreados nesses títulos, a fim de negociarem esses créditos no mercado
nacional ou internacional, abrindo margem em seus passivos para concessão de novos
empréstimos. Além disso, a CCB tem um trâmite mais simples e rápido no processo de
execução judicial, visto não se submeter à fase de reconhecimento da legitimidade do
crédito (ibid.). O gráfico 1 deixa evidente o sucesso inicial desse instrumento no mercado
de crédito, ao mostrar a quantidade crescente desses títulos nos seus primeiros anos de
existência.
Gráfico 1 - Quantidade de Cédula de Crédito Bancário (ago. 2001-set.2003)
Fonte: Cetip apud Bacen (2003a)
Todo o cenário se mostrava, assim, favorável à retomada do crescimento do crédito,
até que alguns eventos causaram mudanças dessa expectativa, já a partir do segundo
semestre de 2000. A iminência da crise argentina e o desaquecimento da economia
37
americana, após a explosão da bolha especulativa relacionada às chamadas empresas
“pontocom”, que afetou o desempenho das bolsas de valores de vários países, deterioram as
expectativas dos agentes e causaram impactos que foram sentidos no segundo semestre de
2000 e, mais intensamente, no ano seguinte. Os prognósticos sobre os números da
economia se deterioraram abruptamente frente a essas perspectivas e muitos analistas
previram para o final do ano 2000, recessão, alto desemprego, inflação de dois dígitos,
dólar acima de R$ 3,00 e um forte choque dos juros (UNIBANCO, 2000).
Contudo, mesmo com a diminuição do otimismo dos agentes, as medidas favoráveis
ao mercado de crédito, adotadas ao longo do ano 2000, associadas às expectativas
favoráveis dos agentes sobre a situação econômica nacional, foram responsáveis por um
leve crescimento (8,2%) do volume de operações de crédito do sistema financeiro
destinadas ao setor privado, de forma que, ao final de 2000, se alcançou o maior volume de
operações de crédito destinadas a este setor, desde os cinco anos anteriores. Com isso,
mesmo com a continuidade do decréscimo do crédito ao setor público, tanto na esfera
federal quanto na estadual-municipal (redução total de 33,7%), o crédito total do sistema
financeiro teve evolução real de 5,7%, entre 1999 e 2000, atingindo o montante de R$ 524
bilhões (em valores de 2007) ao final do período.
A partir de 2001, com a crise argentina e a desaceleração da economia americana,
além do surgimento de um novo complicador, o racionamento de energia elétrica no Brasil
(SOUZA, 2007), criou-se um cenário que causou prejuízos significativos ao desempenho
da economia brasileira e provocou elevação das pressões inflacionárias e tendência
ascendente para a taxa de câmbio. A resposta das autoridades monetárias se deu com o
estímulo do aumento da oferta de moeda estrangeira no mercado interno por meio de
elevações das metas para taxa SELIC, que foram fixadas em 19% a.a., em 18 de julho de
2001 (a taxa média do ano anterior fora de 16,19% a.a.).
No entanto, em 11 de setembro de 2001, os ataques aos EUA intensificaram a
desaceleração da economia americana e reforçaram as oscilações no valor do dólar
(BACEN, 2001). Alguns agentes do mercado financeiro passaram a reter moeda
estrangeira, com o intuito de especularem com as oscilações do mercado cambial. Isso
exigiu nova resposta das autoridades monetárias, de maneira que,
“[a]o final de setembro, medidas adicionais foram adotadas com vistas a
38
desestimular a retenção de moeda estrangeira por agentes internos. Nesse
sentido, foram reativados os recolhimentos compulsórios sobre depósitos a
prazo, cuja alíquota foi elevada de 0% para 10%. Como essas exigibilidades são
cumpridas em títulos federais, a reativação reduziu o potencial do sistema
financeiro em se posicionar em moeda estrangeira. Adicionalmente, a parcela
mínima das exigibilidades sobre recursos à vista que deve ser mantida como
reservas bancárias passou de 60% para 80% da posição média, visando reduzir o
potencial para retenção de moeda estrangeira no curtíssimo prazo. Assinale-se
que a alíquota de recolhimento compulsório sobre recursos à vista, que é
cumprida pelo critério de posição média em duas semanas de movimentação, foi
mantida em 45%” (BACEN, 2001, p. 54).
Neste contexto, ao final de 2001, a média anual da taxa SELIC foi superior em três
pontos percentuais à média do ano anterior, o câmbio continuou a se depreciar, atingindo
média anual de R$ 2,35/dólar contra R$ 1,83/dólar em 2000, a inflação também evoluiu,
passando de 5,97% a.a., em 2000, para 7,67% a.a., ao final de 2001, e o PIB apresentou
variação real de 1,3% contra 4,3% do ano anterior. O mercado de crédito refletiu esse
cenário desfavorável e também sofreu quedas, apresentado um montante de operações de
crédito de R$ 505 bilhões em dezembro de 2001, contra os R$ 524 bilhões de dezembro de
2000.
No ano seguinte surgiram indícios de melhora das expectativas sobre o cenário
econômico nacional. No entanto, essas expectativas se diluíram rapidamente em virtude do
cenário desfavorável de baixo crescimento mundial, incertezas quanto à futura política
econômica interna no período pré-eleitoral (“efeito-Lula”), maior aversão ao risco por parte
dos investidores internacionais e perspectivas de guerra no Golfo Pérsico, de maneira que, a
partir de meados do terceiro trimestre de 2002, a condução da política monetária nacional
se caracterizou por uma postura conservadora, tendo em vista o aumento na preferência
pela liquidez dos agentes econômicos.
Em fins de 2002, a variação real da inflação foi de 12,53%, com taxa média do
câmbio a R$ 2,92/dólar e SELIC média de 23% a.a. (nível semelhante ao de 1996). Além
disso, houve redução do crédito externo e excessiva volatilidade no mercado cambial, que
provocaram, no início de 2003, a elevação das expectativas inflacionárias brasileiras de
curto prazo. Como conseqüência desses eventos, as autoridades monetárias ampliaram a
meta de inflação para 2003 de 4% para 8,5%, e, paralelamente, a meta de superávit fiscal de
3,75% para 4,25% do PIB, visando manter a trajetória da dívida pública em níveis
considerados sustentáveis. Da mesma forma, a taxa de juros foi elevada, em fevereiro de
39
2003, para 26,5% a.a. e, adicionalmente, no mesmo mês, a alíquota sobre os depósitos a
vista aumentou de 45% para 60%, retirando de circulação cerca de R$ 8 bilhões com o
objetivo de reverter o crescimento da inflação
24
(BACEN, 2003).
Ao final de 2003 o volume de crédito permaneceu no mesmo patamar de 2002 que,
de certa maneira, se manteve em patamares semelhantes aos anos anteriores (1996-2001).
Para visualizarmos a evolução do volume de crédito no sistema financeiro no período todo
(1996-2003), a tabela 6 e o gráfico 2 apresentam esse volume dividido entre setor privado e
público, considerando as seguintes definições do Bacen, baseadas na Carta-Circular nr.
2.903, de 23.3.2000.
Rural: compreende as operações realizadas em conformidade com as normas
específicas do crédito rural, deferidas a produtores rurais e demais pessoas físicas e
jurídicas que satisfaçam as condições para contratação de operações da espécie;
Indústria: engloba o crédito direcionado ao financiamento das atividades de
extração, beneficiamento e transformação, inclusive de produtos agropecuários, construção
de edificações e outras obras contratadas por pessoas jurídicas, serviços industriais de
utilidade pública, produção, transmissão e distribuição de energia elétrica, distribuição de
gás encanado e água, serviços de saneamento e operações voltadas a empreendimentos
imobiliários não residenciais;
Comércio: refere-se às operações contratadas por entidades que operam como
intermediários na compra e venda de bens, abrangendo as atividades atacadistas e
varejistas;
Habitação: abrange as operações realizadas com pessoas físicas ou cooperativas
habitacionais, com a finalidade de construção, reforma ou aquisição de unidades
residenciais. As operações voltadas a empreendimentos imobiliários não residenciais
classificam-se em indústria;
Pessoas físicas: referem-se às operações de responsabilidade direta de pessoas
físicas, exceto as deferidas para construção, reforma ou aquisição de habitações;
Outros serviços: refere-se às entidades não classificadas nos itens anteriores e que
atuam, entre outras, nas áreas de transporte, serviços postais e de telecomunicações,
educação e cultura, assistência médico-hospitalar, conservação e reparação, diversões,
24
Em valores de 2003.
40
jornais, rádio e televisão, publicidade e propaganda, informática, segurança, mão-de-obra,
assessoria e consultoria, filantropia, etc.
Setor público: inclui governo administração direta (governos federal, estaduais e
municipais, além de ministérios e secretarias estaduais e municipais), indireta (autarquias,
fundações, institutos e outros órgãos mantidos, principalmente, com recursos orçamentários
do governo) e atividades de empresas públicas (unidades econômicas de propriedade de
governos, ou sob seu controle, que atuam no sentido de produzir e vender ao público bens e
serviços. Devem ser incluídas neste grupo as empresas blicas e as sociedades de
economia mista, referentes aos governos federal, estadual e municipal).
Tabela 6 – Volume de operações de crédito (recursos livres e direcionados) do Sistema
Financeiro Nacional por atividade econômica (1996-2003)
R$ milhões (valores constantes de 2007) - Saldos de dezembro
Rural Indústria Comércio
Outros
Serviços
Habitação
Pessoas
Físicas
Total
Setor
Privado
Governo
Federal
Gov.
Estaduais
e
Municipais
Total
Setor
Público
TOTAL
1996
38.304 120.182 56.554 58.153 96.074 47.031 416.299 9.597 80.257 89.854 506.152
1997
43.091 127.752 55.188 59.935 95.495 66.736 448.197 6.660 39.759 46.419 494.616
1998
47.290 134.823 47.474 80.990 101.099 67.953 479.629 9.055 30.004 39.059 518.688
1999
44.850 143.923 48.984 65.279 91.047 71.913 465.995 6.561 23.445 30.006 496.001
2000
46.328 139.198 51.514 74.889 90.803 101.578 504.310 5.473 14.434 19.907 524.217
2001
41.007 148.712 54.809 90.136 36.083 120.062 490.810 5.850 8.579 14.429 505.240
2002
49.454 155.234 54.065 91.585 32.659 113.691 496.687 4.434 12.734 17.168 513.855
2003
57.959 143.170 53.010 87.987 30.642 121.279 494.047 5.806 12.556 18.363 512.410
Fonte: Bacen (2008)
SETOR PRIVADO SETOR PÚBLICO
Setorização conforme Carta-Circular nr. 2.903, de 23.3.2000
Nota-se que o volume de crédito para o setor privado apresentou elevação de
aproximadamente 18,6%, entre o final dos períodos 1996 e 2003, refletindo basicamente a
incorporação de encargos financeiros ao principal, enquanto que o crédito para o setor
público sofreu redução de 79,5% no mesmo período. De maneira geral o volume total de
crédito do sistema financeiro nacional se manteve praticamente constante (elevação de
aproximadamente 1,2%), no período 1996-2003. Como foi dito em outra oportunidade,
esse comportamento do volume de crédito contrariou as previsões de muitos analistas e
agentes do sistema financeiro, que acreditavam em uma expansão do crédito após a
estabilização da moeda (SOARES, 2001).
41
Gráfico 2 – Volume de operações de crédito (recursos livres e direcionados) do
Sistema Financeiro Nacional por atividade econômica (1996-2003)
Saldos de dezembro
Fonte: Bacen (2008)
No âmbito microeconômico algumas particularidades que ressaltamos a seguir: a
expressiva redução do crédito ao setor público verificada neste período foi motivada,
principalmente, pela estratégia do governo federal de liquidar os empréstimos estatais
contraídos com bancos públicos, principalmente os estaduais
25
(CORRÊA, 2006), no
intuito de tornar esses bancos mais atraentes para o processo de privatização, além de
atender aos objetivos propostos no âmbito do PROES. Da mesma maneira, o crescimento
atípico do crédito ao governo federal (aproximadamente 36%), no período 1997-1998, teve
como principais causas, segundo o Bacen (1998, p. 62).
“a contratação de empréstimos para financiamento de atividades das frentes
emergenciais contra a seca no Nordeste, com recursos do Fundo de Amparo ao
Trabalhador (FAT); assunção de dívida ao amparo da MP n. 1.773-32, de
14.12.98, referente à equalização da taxa de juros prevista nos contratos de
25
Sobre a relevância que tinha o setor financeiro nas dívidas dos estaduais valem as considerações de Corrêa (2006, p.
110): “(...) em termos dos Bancos Comerciais Oficiais, verificamos uma forte deterioração dos ativos, pois são efetuados
empréstimos incobráveis, concedidos a governos estaduais e empresas estatais. Os governos estaduais valeram-se do
comando político sobre os Bancos Públicos Estaduais, usando-os, tanto para carregar os títulos da dívida mobiliária não
colocados junto ao setor privado, quanto para tomar empréstimos com o objetivo de atender aos gastos públicos e aos
problemas emergenciais. Assim, o Estado aparecia como principal tomador dos créditos destes bancos, sendo que em
1984, chega a ser responsável por 70% das operações de crédito dos mesmos.”
42
renegociação das dívidas estaduais (IGP-DI + 5% a.a. a 7,5% a.a.) e a taxa de
juros over/Selic utilizada nas linhas de crédito do Proes, para bancos federais, na
aquisição de passivos de bancos estaduais junto ao público, nos termos das
Circulares n. 2.745, de 18.3.97, e 2.871, de 4.3.98.”
No tocante ao setor privado, os movimentos atípicos se mostraram na elevação do
crédito ao setor de outros serviços e à habitação, entre 1997-1998, e às pessoas físicas, entre
1996-1997, tendo em vista que os demais setores apresentaram trajetórias mais regulares,
seja de crescimento (no caso da indústria) ou de decréscimo (no caso do comércio). O
aumento do crédito ao setor de serviços, no período 1997-1998, deveu-se, em grande
medida, “à assunção de créditos do Tesouro Nacional pelo BNDES, contra consórcios
adquirentes de empresas do Sistema Telebrás, no valor de R$ 6,7 bilhões” (BACEN, 1998,
p. 58), que, em valores de 2007, correspondem a aproximadamente R$ 12,6 bilhões.
Já no tocante ao setor habitacional, o crescimento de aproximadamente 6% no
período 1997-1998 refletiu o impacto de algumas medidas adotadas pelo governo federal,
como a constituição de companhias hipotecárias e de maturação dos fundos de investimento
imobiliário, assim como de companhias securitizadoras de recebíveis, constituídas por
agentes econômicos ligados especificamente ao setor habitacional (ibid.). Por sua vez, o
crescimento do crédito às pessoas sicas, entre 1996 e 1997, deveu-se ao crescimento de
971% das operações de leasing, em 1997, após a elevação da alíquota do imposto sobre
operações financeiras (IOF), de 6% para 15%, incidente sobre as operações de crédito, mas
não incidente sobre as operações de leasing (BACEN, 1997).
O destaque de alta entre os setores deu-se entre 2000 e 2001 para os créditos
destinados às pessoas físicas, os quais foram ampliados, porém, como conseqüência do
crescimento das operações de crédito rotativo (cheque especial), indicando um
endividamento não planejado, derivado mais de dificuldades financeiras das famílias do
que do direcionamento de recursos para a aquisição de bens de consumo duráveis (BACEN,
2001). De 2001 a 2003, esses créditos se mantiveram relativamente estáveis, com média de
R$ 118 bilhões por ano.
O destaque de queda (de aproximadamente 60%) deu-se com os recursos destinados
à habitação, entre 2000 e 2001, e foi determinado basicamente pelo montante de recursos
repassados pela Caixa Econômica Federal (CEF) à Empresa Gestora de Ativos (Emgea) e
43
para a União, no intuito de amparar o Programa de Fortalecimento das Instituições
Financeiras Federais, em conformidade com a Medida Provisória n. 2.196, de 28 de junho
de 2001. Além disso, a queda desses recursos foi motivada pela suspensão de algumas
linhas de crédito pela Caixa Econômica Federal, que alegou haver descasamento entre o
custo de captação e a receita financeira dos créditos concedidos por essas linhas (BACEN,
2001). Por fim, vale destacar que o volume de recursos destinados ao setor rural cresceu, ao
longo do período, em função de políticas agrícolas expressas, por exemplo, no maior
volume de recursos disponibilizados para a safra 2003/2004.
1.2.2 Apreciação crítica dos fatos
Em um primeiro esforço de análise acerca da evolução do volume de crédito nesse
período pode-se dividi-lo em dois, de acordo com características particulares, embora
ambos tenham se destacado pela inércia da evolução dos recursos transacionados no
mercado de crédito. O primeiro período abrange os anos entre 1996 e 1999 e se
caracterizou, em termos de evolução do crédito do sistema financeiro, pelo pequeno
crescimento (11,94%) do crédito destinado ao setor privado, e pelo forte decréscimo
(66,61%) do crédito ao setor público (destacadamente aos governos estaduais e
municipais).
O segundo período, que vai de 2000 a 2003, se caracterizou pela relativa
estabilidade do crédito destinado ao setor privado (decréscimo de 2,04%), e ainda por uma
mais elevada redução dos empréstimos ao setor público, de 7,76%, de maneira que o
volume geral de operações de crédito do sistema financeiro também permaneceu
praticamente estável, apresentando decréscimo de 2,25% no período.
Com essas considerações sobre as variações da trajetória do volume de crédito,
pode-se afirmar que, de maneira geral, o volume de crédito se manteve em níveis
relativamente estáveis ao longo do período 1996-2003, refletindo tanto a tendência de
postergação das decisões de investimento das empresas e de consumo das famílias,
sobretudo de bens de maior valor unitário, quanto (e principalmente) o conservadorismo da
política econômica e dos bancos, além da seletividade desses últimos na concessão de
novos empréstimos.
Uma interpretação a partir dos conceitos pós-keynesianos de preferência pela
liquidez e avaliação de riscos por parte dos bancos, considera que esse posicionamento de
44
conservadorismo e seletividade dos bancos na concessão de novos empréstimos, pode ser
entendido como uma maior preferência pela liquidez desses agentes diante da elevação das
incertezas, agravadas pelas crises que marcaram esse período e pelas condições
desfavoráveis predominantes nos cenários externo e interno traduzidas, segundo o BACEN
(2002, p. 60), em contração de financiamentos internacionais e volatilidade da taxa de
câmbio, com repercussões adversas sobre os níveis da atividade econômica, das taxas de
juros e do nível de preços. A isso se somou o conservadorismo da política econômica, que
elevou e manteve elevadas (em média) as taxas básicas de juros, as quais, como vimos,
estabelecem uma maior ou menor preferência pela liquidez dos bancos, via “custo de
oportunidade”, mas também reduzem a Eficácia Marginal do Capital em geral.
Então, em função do ambiente de alta incerteza gerado pelas seguidas crises
financeiras internacionais e pelas respostas inadequadas dos gestores domésticos da política
econômica a elas, os bancos privilegiaram a liquidez à rentabilidade e evitaram a ampliação
de empréstimos, tendo em vista a baixa liquidez desse ativo frente aos demais ativos que
compõem o balanço bancário. Esse comportamento dos bancos foi identificado por Paula
(2006, p. 91-92) quando, ao analisar o crédito no Brasil no período junho/1998
dezembro/2004, afirmou que a alocação de portfólio dos bancos tem estado dominada pelo
curtoprazismo e alta preferência pela liquidez, que tem resultado em baixa oferta de crédito
e elevado spread.”
Os efeitos das medidas adotadas pelas autoridades monetárias no sentido de reduzir
incertezas do mercado (PROES, PROER, FGC, controles internos pelas instituições do
SFN, Resolução 2.493, abertura do setor financeiro ao capital estrangeiro, entre outras) e,
conseqüentemente, reforçar a participação do sistema financeiro no desenvolvimento do
país, causaram apenas leves aumentos do volume de crédito em determinados momentos e,
em outros, algumas pequenas reduções desse volume, de forma que não se mostraram
capazes, no geral, nem para reduzir e nem para aumentar de forma significativa o volume
de recursos financeiros, ao longo do período analisado.
Além disso, os efeitos resultantes dessas alterações no volume de crédito foram
momentâneos, ou seja, tiveram curta duração. Mesmo com a intensificação de medidas
favoráveis à expansão do crédito após 2000, esse volume não apresentou a elevação
contínua que, em princípio, se desejou. Esse comportamento parece indicar que houve uma
45
predominância das condições do ambiente econômico sobre as medidas políticas
direcionadas a melhora do desempenho do mercado, de forma que essas condições foram a
base para os agentes formarem suas expectativas, durante o período analisado.
Tendo em vista o aumento das incertezas em função do cenário econômico
internacional e nacional desfavorável, os agentes econômicos adotaram nesse período outra
convenção que, por experiência, lhes parecia mais prudente: a preferência pela liquidez.
Esse comportamento, quando analisado em relação aos ofertantes de crédito (bancos),
indica racionamento de crédito, pois, quando as expectativas dos banqueiros são
pessimistas (incerteza e expectativa de altos riscos mais elevadas), os bancos aumentam sua
preferência pela liquidez em relação à rentabilidade (CARVALHO, 1999).
1.3 Evolução do mercado brasileiro de crédito no período 2004-2007: o crescimento
1.3.1 Apreciação dos fatos históricos
O ano de 2003 teve um início problemático. As especulações sobre possíveis
alterações de rumo da política econômica e sobre a existência de um “Plano B” do novo
governo que, teoricamente, colocaria em prática políticas econômicas de eficiência
duvidosa, defendidas por parte do Partido dos Trabalhadores (PT), aumentavam a incerteza
do mercado acerca dos rumos que a economia tomaria, prejudicando investimentos e
consumo e, conseqüentemente, prejudicando o alcance das metas almejadas para as taxas
de juros e de inflação.
No final de 2003, ao término do primeiro ano do governo Lula, as citadas incertezas
foram superadas em virtude das repetidas ações políticas consideradas responsáveis por
grande parte dos agentes econômicos ainda que objetos de críticas acerbas por parte de
vários economistas, empresários e trabalhadores. Com isso os temores de vários agentes
acerca das políticas econômicas que seriam adotadas pelo governo petista foram
substituídos pela convicção de que a nova equipe estava dando continuidade às principais
políticas do governo anterior, tendo em vista a manutenção de instrumentos característicos
da antiga administração como as metas de inflação, os elevados níveis da taxa básica de
juros, o ajuste fiscal permanente e o regime de câmbio flutuante.
Os impactos negativos daquilo que passou a ser chamado de “efeito-Lula”
decresceram e tornou-se possível o crescimento do Produto, ao mesmo tempo em que a
46
taxa de variação da inflação reduzia-se constantemente, alcançando 9,3%, em 2003 e 7,6%,
em 2004, enquanto que a taxa SELIC se elevou em apenas 0,5%, no mesmo período.
Obviamente a melhora das expectativas dos agentes acerca do mercado não foi
motivada apenas pelos fatores políticos e econômicos internos. A conjuntura internacional
desse período se mostrava favorável ao aparecimento desses resultados. Segundo Filgueiras
e Gonçalves (2007, p. 57) “[d]esde 2003 a economia mundial tem experimentado
dinamismo extraordinário, que se reflete nas esferas produtivo-real, comercial, tecnológica
e monetário-financeira das relações internacionais”.
Cabe destacar que essa expansão econômica pós-2003 (mas que apresentaria
resultados mais consistentes a partir de 2004) foi impulsionada pelo crescimento do volume
de comércio exterior e pela elevação dos preços internacionais, sendo que o determinante
desse último foi a pressão de demanda, decorrente das elevadas taxas de crescimento da
renda mundial, com destaque para a China e os EUA (CARNEIRO, 2007).
O mais importante notar é que, no tocante à esfera monetário-financeira, os indícios
foram de crescimento do nível de liquidez internacional (quantidade de ativos monetários) e
da quantidade de ativos financeiros negociados internacionalmente
26
, como conseqüência
do dinamismo da economia mundial desse período e também da valorização financeira
(fictícia) de uma boa parcela destes ativos, nesse período. Grande parte desses recursos, no
período em análise, foi direcionada para a compra de títulos privados e públicos nos
mercados emergentes (investimentos em portfólio), dentre eles o Brasil, haja vista a maior
rentabilidade desses títulos em relação aos ofertados pelos países centrais, e a redução da
aversão ao risco dos investidores, característica de momentos de expansão econômica.
No tocante aos investimentos diretos, houve uma concentração do fluxo de capitais
externos ao Brasil nesses investimentos, e mais especificamente, na conta participação no
capital, de 1997 a 2000, como conseqüência do processo de desestatização de setores de
utilidade pública (com destaque para as telecomunicações) e da onda global de expansão
das grandes corporações produtivas e financeiras, impulsionada pelas operações de fusão e
aquisição. A partir de 2000, esses investimentos se reduziram, em decorrência,
26
“A evidência da expansão da liquidez internacional é dada pelo volume de recursos internacionais mundiais. Essas
reservas mais do que duplicam em 2002 e 2006: passam de US$ 2,4 trilhões no final de 2002 para US$ 4,9 trilhões em
2006 (...) A relação entre as reservas internacionais e o PIB mundial aumentou continuamente, de 10,9% em 2002 para
14,1% em 2006.” (FILGUEIRAS; GONÇALVES, 2007, p. 43).
47
principalmente, do menor número de privatizações, da baixa taxa de crescimento doméstica
e da desaceleração econômica dos países centrais, em especial, dos Estados Unidos,
principal país de origem dos investimentos diretos ao Brasil (CINTRA; PRATES, 2004).
Gráfico 3 – Fluxo dos investimentos estrangeiros ao Brasil (1996-2007)
Fonte: Bacen (2008)
De maneira geral, o fluxo de investimentos estrangeiros ao Brasil, tanto em carteira
quanto direto, apresentou trajetória declinante, a partir de 1998
27
, e voltou a crescer
somente a partir de 2004 (gráfico 3) como conseqüência do crescimento dos valores totais
dos ativos financeiros mundiais e do dinamismo da economia mundial que, conforme
destacado, motivaram a redução da aversão ao risco dos investidores internacionais. Os
impactos exatos dessa entrada de recursos no país não são mensurados nesse trabalho, mas
é visível a importância que esses recursos têm para o desempenho econômico brasileiro,
tendo em vista sua participação decisiva na apresentação dos saldos positivos do balanço de
pagamentos ao longo nos últimos sete anos.
Esse aumento das condições internacionais de liquidez foi também responsável pela
valorização expressiva dos títulos da dívida brasileira, de forma que, segundo o Bacen
27
Houve elevação do montante desses investimentos entre 1999 e 2000 em função, principalmente, da rápida melhora de
cenário em 2000.
48
(2003, p. 53), “o spread entre os títulos americanos e brasileiros reduziu-se
progressivamente, de 1.324 pontos bases, em janeiro [de 2003], para 569, em média, em
dezembro, favorecendo novas captações no exterior”, influenciando diretamente o custo das
operações de crédito no sistema bancário e incentivando o aumento da demanda por
operações de crédito.
Isso reforça a tese de que o cenário econômico internacional foi fundamental para
que o cenário interno, a partir do final de 2003, se mostrasse mais estimulante à melhora
inicial das expectativas dos agentes. Com o tempo essas expectativas se reforçaram com a
apresentação de taxas de crescimento do PIB brasileiro mais consistentes do que as
apresentadas nos períodos anteriores
28
, e com a redução gradual da taxa SELIC e do nível
de preços.
Neste contexto, a partir de 2004 teve início o tão esperado crescimento do volume
de operações de crédito, com destaque para as operações ao setor privado, em todos os
níveis. O volume de operações para o setor público, por sua vez, apresentou leve
decréscimo, nesse período, sem variações atípicas que mereçam maiores comentários. Ao
longo do quadriênio 2004-2007, houve forte crescimento (67,6%) do volume de crédito do
sistema financeiro ao setor privado e baixo decréscimo desses recursos ao setor público,
como observamos na tabela e gráfico abaixo:
Tabela 7 – Volume de operações de crédito (recursos livres e direcionados) do Sistema
Financeiro Nacional por atividade econômica (2004-2007)
R$ milhões (valores constantes de 2007) – Saldos de dezembro
Rural Indústria Comércio
Outros
Serviços
Habitação
Pessoas
Físicas
Total
Setor
Privado
Governo
Federal
Gov.
Estaduais
e
Municipais
Total
Setor
Público
TOTAL
2004
66.657 142.527 62.555 90.608 29.349 155.327 547.023 5.742 16.135 21.878 568.901
2005
71.061 149.704 69.508 106.864 31.330 203.395 631.862 4.914 17.235 22.149 654.011
2006
81.146 171.921 81.931 126.938 37.281 246.333 745.550 4.381 15.333 19.714 765.264
2007
89.202 213.901 97.661 156.232 45.852 314.286 917.134 3.588 15.245 18.833 935.967
Fonte: Bacen (2008)
SETOR PRIVADO SETOR PÚBLICO
28
Esse período concentra os dois melhores desempenhos do PIB dos últimos doze anos: 5,7% de variação real, em 2004, e
5,4%, em 2007.
49
Gráfico 4 – Volume de operações de crédito (recursos livre e direcionados) do Sistema
Financeiro Nacional por atividade econômica (2004-2007)
Fonte: Bacen (2008)
1.3.2 Apreciação crítica dos fatos
De forma geral, foram verificadas tendências para cada um dos períodos analisados
que, em síntese, foram: estabilidade da trajetória do volume de crédito entre 1996-2003 e
crescimento a partir de 2004. Como já salientado, os oito primeiros anos de estabilidade, se
divididos em dois períodos de quatro anos, apresentaram variações distintas para o crédito
ao setor privado e ao setor público. Entre 1996 e 1999 houve pequeno crescimento do
crédito destinado ao setor privado (11,94%) e forte decréscimo do crédito ao setor público
(66,61%), enquanto que, entre 2000 e 2003, houve uma relativa estabilidade do crédito
destinado ao setor privado (decréscimo de 2,04%) e uma elevada redução dos empréstimos
ao setor público (7,76%). A tabela 8 sistematiza essas tendências das trajetórias para cada
período.
A hipótese até aqui é de que o principal motivador desse crescimento do volume de
crédito tem sido o cenário econômico sem crises e a influência deste sobre as expectativas
dos agentes econômicos. Outros fatores também tiveram influência sobre esse
comportamento do mercado de crédito, mas suas influências são menores. Tome-se, por
exemplo, a influência de políticas discricionárias de incentivo ao crédito. O destaque dessas
50
políticas está com o crédito em consignação, instituído em setembro de 2003, mas com
fortes efeitos sobre o volume de crédito pessoal, a partir de 2004.
Tabela 8 – Tendências das trajetórias das operações de crédito do SFN por
atividade econômica (1996-2007)
Tendência Var. % Tendência Var. % Tendência Var. %
1996-1999
Baixo crescimento 11,94% Forte decréscimo -66,61% Estabilidade -2,01%
2000-2003
Estabilidade -2,04% Estabilidade -7,76% Estabilidade -2,25%
2004-2007
Forte crescimento 67,66% Baixo decréscimo -13,92% Forte crescimento 64,52%
Fonte: Elaboração própria
Critérios assumidos para classificar a tendência da trajetória das operações de crédito:| 0%| <estabilidade |10%| - |10%| <baixo
crescimento/decréscimo |20%| - |20%|<forte crescimento/decréscimo |%|
Período
Setor Privado Setor Público Total
Essa modalidade de crédito prevê o desconto em folha de pagamento das prestações
de dívidas contraídas por pessoas físicas com o sistema financeiro (limitado a 30% da
remuneração do indivíduo), a partir da negociação entre sindicatos de trabalhadores,
empresas e o sistema financeiro. A estrutura dessa modalidade de crédito, teoricamente,
reduz as assimetrias de informação e o risco de crédito para o emprestador e permite, por
conseqüência, a redução do custo financeiro para o tomador do empréstimo, ao mesmo
tempo em que amplia o vel de segurança dos contratos entre bancos e tomadores,
estimulando a demanda por crédito. Com o gráfico 5 se nota a expressiva evolução do saldo
das operações contratadas no âmbito desta modalidade de crédito, a partir de 2004.
Contudo, afora o crédito consignado, não foram adotadas políticas de crédito de
grande vulto que justificassem o crescimento do volume total de crédito, após 2004. A
maioria das Resoluções do Banco Central foi direcionada a medidas de regulamentação do
sistema financeiro e, de forma geral, não foram mais expressivas do que as medidas
adotadas antes de 2004, apresentadas na primeira parte deste trabalho. Dentre estas medidas
se destacaram o Comunicado n. 12.746, de 2004, referente aos procedimentos de adesão ao
novo Acordo de Basiléia (Basiléia II), que pretendia ampliar o requerimento de capital das
instituições financeiras também para risco operacional (o Basiléia I considerava
requerimento de capital somente para riscos de crédito e de mercado); e a Resolução 3.400,
de 2006, que ampliou o valor máximo de garantia proporcionada pelo FGC de R$ 20 mil
para R$ 60 mil e autorizou o conselho de administração deste Fundo a reduzir o percentual
da contribuição mensal devida pelas instituições associadas, de 0,025% para 0,0125%.
51
Gráfico 5 – Saldo das operações de crédito consignado (2004-2008)
Fonte: Bacen (2008)
Outro fator de influência se encontra na redução da taxa interna de juros. Como
observado, houve progressiva queda da taxa SELIC nesse período, o que diminuiu o custo
dos empréstimos bancários, tendo em vista a analisada influência da primeira sobre o
segundo. Contudo, como será visto no capítulo 3, essa diminuição nos custos dos
empréstimos bancários (ao menos para as empresas, o foco deste estudo) não teve efeitos
tão significativos no volume de crédito total. Isso porque as operações que tiveram maior
crescimento relativo nesse período, capital de giro e conta garantida, não foram aquelas de
menor custo financeiro (conta garantida, por exemplo, manteve-se como a operação de
maior custo ver gráfico 12 e tabela 15), não deixando evidente, portanto, uma relação que
justifique que o aumento do volume de crédito foi conseqüência da diminuição do custo das
operações de empréstimo.
Por fim, outro instrumento de política monetária que poderia justificar o
crescimento das operações de crédito após 2004 são os recolhimentos compulsórios. No
entanto, eles foram alterados pela última vez em 8 agosto de 2003, quando a alíquota dos
recolhimentos compulsórios sobre depósitos a vista passou de 60% para 45%, não sofrendo
novas alterações. As alíquotas relativas aos demais depósitos se mantiveram nos níveis
indicados na tabela 4, de forma que não podemos atribuir aos recolhimentos compulsórios
os méritos sobre o crescimento do volume de crédito observado após 2004.
52
Assim, com base nessas observações, pode-se notar que parece bastante plausível a
suposição de que o crescimento do volume de crédito decorreu da melhora nas expectativas
dos agentes econômicos numa análise semelhante, porém em sentido contrário à proposta
para o período 1996-2003. Assim, recorrendo novamente à teoria pós-keynesiana, a
sugestão é de que o cenário econômico de estabilidade interna e externa foi fundamental
para esse comportamento do crédito, uma vez que favoreceu as expectativas dos agentes
financeiros para o fornecimento de empréstimos.
O encadeamento dos fatos decorrentes dessa idéia parte da suposição de que a
melhora nas expectativas dos bancos em relação ao futuro, em virtude da melhora do
cenário econômico, diminuiu suas incertezas e sua preferência pela liquidez, de forma que
esses agentes privilegiaram um pouco mais a rentabilidade em detrimento da liquidez,
fornecendo mais empréstimos aos agentes econômicos.
Além disso, pode-se dizer que as políticas econômicas, no Brasil, ao longo do
período 1996-2007, não foram capazes de isolar o país aos choques internacionais, no que
tange ao crescimento econômico, o qual se manteve baixo quando comparado ao
crescimento econômico médio mundial, mas, sobretudo, quando cotejado ao dos países em
desenvolvimento. No entanto, a política econômica conseguiu certo isolamento do país e
este é o ponto geralmente destacado por economistas e outros analistas quanto a crises
externas
29
e a fortes surtos inflacionários, dado que a inflação anual, medida pelo IPCA,
manteve-se abaixo de dois dígitos em todos os anos do período 1996-2008, com exceção de
2002, quando atingiu 12,53%. Grande parte deste “sucesso” foi alcançado via flutuações
acentuadas da taxa de câmbio, com suas repercussões sobre
o crescimento econômico do
país, sobrevivência de certos setores e integração de cadeias produtivas, taxa de
investimento agregada e em setores e cadeias produtivas, Balança de Transações Correntes,
Balanço de Pagamentos e possibilidades recorrentes de crise externa.
Neste momento, vale lembrar que, para os pós-keynesianos, os bancos
desempenham papel decisivo no tocante ao racionamento ou não do crédito, tendo em vista
as implicações da assimetria de expectativas e informações entre ofertantes e demandantes
de crédito. Assim, sem perder de vista que a causa primeira dos movimentos no mercado de
29
A maior exceção de períodos anteriores mais recentes foi 1998-99, quando os gestores que assumiram, em janeiro de
1999, tiveram um bom desempenho, debelando de forma razoavelmente rápida uma crise externa de grande magnitude
que se avizinhava.
53
crédito foi conseqüência dos impactos do cenário econômico sobre as expectativas dos
agentes, pode-se deduzir que os bancos foram, dentre todos os agentes que compõem o
mercado, os principais responsáveis pelo aumento do volume de crédito verificado neste
período, da mesma forma que foram eles os responsáveis pela estabilidade do volume de
crédito analisada na subseção 1.2.2.
Como destaca Paula (2008), bancos têm comportamento pró-cíclico e na fase de
boom econômico eles tendem a acomodar a demanda por crédito dos agentes, na suposição
da continuidade do crescimento dos lucros e da renda na economia. No entanto, pode-se
perguntar: de que maneira os bancos obtêm os recursos necessários para acomodarem a
demanda por crédito dos agentes nesses períodos de boom?
Segundo os pós-keynesianos, a resposta a esta pergunta está na capacidade de os
bancos alavancarem suas operações ativas através do aumento do volume de recursos
captados junto ao público e do uso de técnicas de administração do passivo, cujos efeitos
principais são a alteração da composição de seu passivo em direção ao que lhes é mais
conveniente, de acordo com o trade off risco-rentabilidade (PAULA, 2006, p. 88). Outra
fonte de recursos está no “multiplicador bancário”, i.e., no aumento de depósitos a partir de
empréstimos, com o que emerge a possibilidade de ampliação de empréstimos (WRAY,
1998; CHICK e DOW, 2002; FONTANA, 2004; ALVES JR; DYMSKI; PAULA, 2008),
em sucessivas rodadas, desde que demandantes e ofertantes de crédito estejam de acordo
quanto ao desejo de emprestarem e as condições de crédito.
Na prática, em momentos de boom econômico, quando os bancos querem aumentar
o volume de crédito na economia, eles redirecionam os recursos financeiros investidos em
títulos públicos para as operações de empréstimo, ao mesmo tempo em que ampliam a
captação de recursos por meio de inovações financeiras. Abaixo, a descrição do Bacen
(2005a, p. 65) sobre a composição da carteira de crédito bancário e da trajetória do CDB no
período 2003-2005, corrobora essas suposições:
“Considerando-se os bancos comerciais, múltiplos e a Caixa Econômica Federal,
grupo denominado de sistema bancário, observa-se que a distribuição de ativos
reforça a participação das operações de crédito em comparação com a carteira de
títulos e valores mobiliários, excetuando-se as operações com derivativos.
Em dezembro de 2005, a carteira de crédito representava 31,3% dos ativos,
mesmo percentual de 2004, ante 28,6% em dezembro de 2003. Por outro lado, a
parcela dos haveres em títulos reduziu-se de 26,7%, no final de 2003, para 25,7%,
54
em dezembro de 2005. Quanto à composição da carteira de títulos, observa-se
maior diversificação nas aplicações, tendo em vista que a participação dos títulos
públicos reduziu-se de 88,6% no final de 2003, para 88,3% em 2004, e 83,1% em
dezembro de 2005. Essa trajetória foi influenciada, principalmente, pelo
crescimento na participação de debêntures.
Quanto às fontes de financiamento, destaca-se o crescimento da emissão de
Certificado de Depósitos Bancários (CDB), que tem se constituído em uma das
principais fontes de recursos para a ampliação do crédito ao setor privado. De
fato, observa-se que, nos últimos dois anos, período de expressivo crescimento
das operações de crédito, essas captações ampliaram sua participação na
exigibilidade do sistema. Em dezembro de 2005, o estoque desses depósitos
representava 18% do passivo exigível do sistema bancário, ante 16,7%, em 2004,
e 13,8% em 2003.”
Os relatórios dos anos seguintes também apresentam dados interessantes acerca da
composição do passivo bancário, que evidenciam a utilização da técnica de administração
de passivos pelos bancos. Segundo esses relatórios, a participação dos tulos públicos no
total dos ativos bancários passou de 28,1%, em 2003, para 27,8%, em 2006, e 24,8%, em
2007, enquanto que a participação das operações de crédito, que era de 28,6% em 2003,
passou para 30,8%, em 2006, e, finalmente, 32,2%, em 2007. Ou seja, os bancos, nesse
período, efetivamente administraram seus passivos e aumentaram suas fontes de
financiamento, com o intuito de ampararem a necessidade de crédito dos agentes, tendo em
vista a suposição de continuidade do crescimento dos lucros e da renda na economia.
Outra mudança no comportamento dos bancos em momentos de boom econômico é
a maior tolerância ao risco por parte desses agentes. Segundo Paula (2006), quando as
expectativas dos bancos se tornam mais otimistas, em razão de uma fase ascendente do
ciclo, eles passam a privilegiar rentabilidade à liquidez, procurando elevar os prazos e
adquirir ativos que embutam maiores riscos e rentabilidade. A busca por maiores lucros em
uma conjuntura expansionista induz os bancos a adotarem uma postura mais agressiva
(ALVES JR; DYMSKI; PAULA, 2008). Os banqueiros aceitam ativos de mais longo termo
e/ou de mais alto risco, ao mesmo tempo em que diminuem a taxa paga nas suas
obrigações, oferecendo maiores promessas de segurança e garantias especiais aos
depositantes. Como resultado destas estratégias bancárias, a disponibilidade de recursos
para o financiamento de gastos dos agentes aumenta (ou seja, o volume de crédito aumenta)
e cria-se uma condição necessária para a expansão do nível de produto na economia
(MINSKY, 1986).
Essa maior tolerância ao risco por parte dos bancos esteve presente no período de
55
expansão creditícia recente da economia brasileira e pode ser observada nos dados
disponibilizados pelo Bacen, apresentados abaixo:
Gráfico 6 – Distribuição do volume de crédito no SFN por nível de risco (AA, A, B e
C), nos anos 2000, 2004 e 2007
Fonte: Bacen (2008)
Os gráficos apresentam o total de operações de crédito bancário distribuídos entre
os riscos AA ao C nos anos 2000, 2004 e 2007. As operações classificadas nesse intervalo
de risco constituem, em média, 90% do total de operações de crédito bancário no período
analisado. Tomamos por base de comparação o ano 2000 porque este foi o primeiro ano em
que se usou essa metodologia de classificação de risco, seguindo instruções da Resolução n.
2.682, de 21 de dezembro de 1999. Esses dados evidenciam o crescimento da tolerância ao
risco dos banqueiros no início da fase de crescimento do crédito (em 2004), tendo em vista
o crescimento das operações de risco B e C, e corroboram as expectativas acerca da maior
tolerância dos bancos em relação ao nível de risco, em períodos ascendentes do ciclo
econômico.
Todo o comportamento desses agentes parece indicar, portanto, que houve uma
predominância das condições do ambiente econômico sobre as medidas políticas
direcionadas à melhora do desempenho do mercado, de forma que essas condições foram a
base para os agentes (bancos, principalmente) formarem suas expectativas, durante o
período analisado neste estudo. Em outros termos, os fatos indicam que os agentes
econômicos atuantes no mercado de crédito, durante o período 1996-2007, formaram suas
expectativas baseados intensamente nas condições macroeconômicas, não se devendo
menosprezar, neste exato sentido, a extrema relevância da política econômica
excessivamente conservadora, que adotou políticas contracionistas, ao longo de todo o
período.
56
Por fim, vale ressaltar que, para os pós-keynesianos, o comportamento dos bancos é
capaz de ampliar ainda mais o crescimento econômico durante a fase expansionista do
ciclo, uma vez que, ao suprirem as necessidades de crédito das firmas, estão também
financiando o crescimento econômico, ou seja, estão praticando ato fundamental para que
uma economia monetária possa crescer (PAULA, 2006).
2. EVOLUÇÃO DO MERCADO BRASILEIRO DE TÍTULOS (1996-2007)
O mercado de títulos (MT) é divido em mercado primário e secundário. O primeiro
refere-se ao mercado no qual ocorre a colocação inicial de um título, ou seja, a sua primeira
operação de compra e venda. O segundo foi criado para permitir a negociação contínua de
papéis emitidos no mercado primário, ou seja, para operações de compra e venda
posteriores à primeira colocação. A função do mercado primário é proporcionar às
empresas fontes alternativas de recursos para financiamento, enquanto que a do secundário
é proporcionar liquidez aos papéis existentes, permitindo que os detentores dos títulos
emitidos no mercado primário possam vendê-los quando não os desejarem mais
(CARVALHO et al, 2000).
Mercados secundários líquidos e organizados contribuem indiretamente para o
financiamento da atividade de investimento, na medida em que alterações no estado de
negócios na Bolsa (altas e baixas do índice que refletem o preço médio de uma carteia de
ativos composta pelas ações mais negociadas na Bolsa) podem afetar as decisões de investir
dos capitalistas. Numa conjuntura de aquecimento da bolsa, em que as ações são
transacionadas a cotações crescentes (alta do índice), será mais fácil ofertar ações e vendê-
las a uma cotação satisfatória, captando maior volume de recursos. numa conjuntura
inversa, de desaquecimento da bolsa, um aumento da oferta de títulos tenderá a deprimir
ainda mais a cotação das ações (baixa do índice) sendo, portanto, desvantajoso o
lançamento primário de ações (SILVA, 1999).
Nesse sentido Silva (ibid., p. 309, grifos no original) afirma que:
“As ações são normalmente colocadas no mercado por instituições
especializadas, como os bancos de investimento. Essas instituições adiantam às
empresas os recursos necessários ao investimento, tornando-se proprietárias de
uma parte das ações e/ou responsabilizando-se pelo timing segundo o qual as
ações são ofertadas na bolsa. Cabe a essas instituições avaliar, juntamente com as
empresas, a conveniência de uma nova emissão de ações. Numa conjuntura de
baixa, haverá pouca receptividade a novas emissões, dada a possibilidade de que
57
um aumento da oferta deprima as cotações dos títulos existentes nas carteiras das
próprias instituições (...)”
Assim, embora o interesse desse capítulo esteja mais direcionado ao mercado
primário, visto ser este o responsável direto pelo financiamento empresarial no MT, não se
deixará de analisar as oscilações do mercado secundário quando oportuno, tendo em vista
sua influência no desempenho do mercado primário.
Os títulos negociados no MT são divididos, basicamente, em dois grupos: os títulos
de propriedade, representados pelas ações, cuja negociação envolve a compra e venda de
parte do capital das empresas; e os títulos de dívida, que são provenientes de empréstimos
contraídos junto a terceiros e representados, principalmente, pelas debêntures, bônus de
subscrição e notas promissórias. Os portadores de títulos de dívida são credores da empresa
que os emitiu, ao contrário dos acionistas, que são proprietários dela.
De maneira sucinta, ações são definidas como títulos de renda variável, emitidos por
Sociedades Anônimas (S.A.), que representam a menor fração do capital da empresa
emitente. As debêntures, por sua vez, são títulos representativos de uma dívida contraída
pela empresa emitente, cujas garantias são seus ativos ou a fiança dos seus representantes.
Os emissores de debêntures têm direito de resgate mediante pagamento do principal e
rendimentos preestabelecidos em Assembléia Geral dos Acionistas ou, ainda, em virtude de
cláusula de resgate mediante conversão em ações. Do ponto de vista dos compradores, as
debêntures podem ser definidas como títulos mobiliários que lhes garantem uma renda fixa,
ao contrário das ações, cuja renda é variável (CAVALCANTE; MISUMI, 2003).
Os Bônus de subscrição, por sua vez, são títulos negociáveis emitidos por
companhias de capital autorizado que conferem aos seus acionistas o direito de
subscreverem novas ões em quantidade proporcional às possuídas. Os acionistas
possuidores desses títulos podem transferir o direito de subscrição a terceiros, através da
venda desse direito em pregão. A emissão dos bônus de subscrição é limitada pelo aumento
de capital previsto no estatuto da companhia (Ibid.).
Por fim, notas promissórias são definidas como títulos cuja emissão visa à captação
pública de recursos para o capital de giro das empresas (prazo mínimo de 30 e máximo de
180 dias). Como não exigem garantias, as Notas Promissórias são acessíveis apenas para
empresas comprovadamente idôneas e capazes de emitir valores suficientemente altos que,
58
no mínimo, compensem o custo de um lançamento (registro na CVM, publicação de
anúncios de distribuição nos jornais, etc.) (Ibid.).
No que se refere às diferenças entre esse mercado e o mercado de crédito, pode-se
destacar que as transações realizadas no MT obedecem a regras mais genéricas do que as
do MC
30
, de forma que as idiossincrasias de cada parte envolvida nas negociações
realizadas nesse mercado são desprezadas. Em geral, os agentes que se relacionam nesse
mercado não precisam ser claramente identificáveis como ocorre no MC, o que implica em
uma característica distintiva referente à segurança atribuída à negociação realizada. No MC
os agentes estabelecem relacionamentos de longa duração enquanto que no MT as
transações são normalmente anônimas, especialmente se têm lugar em mercados públicos
como as bolsas de valores (CARVALHO et al., 2000). Assim, é de se esperar que as
transações realizadas no MC se mostrem mais seguras do que as do MT, tendo em vista a
menor assimetria de informações entre as partes envolvidas no primeiro.
Além disso, os contratos resultantes no MT são, na sua maioria, negociáveis, ou
seja, revendidos em mercados secundários (cuja principal função, como visto, é conferir
liquidez ao mercado), o que faz com que no MT, em comparação com ao MC, os agentes
apresentem respostas mais rápidas diante de eventuais mudanças do cenário político e
econômico que influenciem suas expectativas. Essa característica se mostrará importante
para o entendimento do porque a trajetória do volume de crédito foi diferente da trajetória
do fluxo de emissões de títulos em alguns momentos do período analisado, mesmo
considerando que os efeitos das variações do ciclo econômico sobre ambos os mercados
sejam similares.
A seção inicial da primeira parte deste segundo capítulo apresenta o referencial
teórico pós-keynesiano sobre o qual será embasada a análise da evolução do mercado de
títulos nos dois períodos considerados neste trabalho (1996-2003 e 2004-2007). Não será
objetivo desta primeira seção apresentar toda a teoria pós-keynesiana acerca do mercado de
títulos, mas sim expor conceitos que se mostrarem úteis para a análise a ser desenvolvida.
A segunda seção está dividida em duas subseções. Na primeira seapresentada a
evolução do fluxo de recursos no âmbito do mercado de títulos, com destaque para os
30
As operações envolvidas no mercado de títulos não são “desenhadas” com o intuito de satisfazerem as demandas
específicas dos tomadores e emprestadores em termos de taxas de juros, prazos, garantias, etc. como ocorre no mercado de
crédito, conforme já mencionado no capítulo anterior.
59
títulos de propriedade e de dívida. Serão expostos fatos históricos recentes acerca do
desempenho desse mercado ao longo do período 1996-2003. Em seguida, será feita a
apreciação crítica dos fatos identificados como os responsáveis pela trajetória do fluxo de
emissões primárias de títulos visualizadas no gráfico 7. Na subseção seguinte será feita a
mesma análise para o período 2004-2007.
Gráfico 7 – Emissões primárias de títulos selecionados no mercado de títulos nacional
(1996-2007)
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados disponíveis em <www.cvm.gov.br> e <www.bovespa.com.br>
2.1 Referencial teórico
Para subsidiar a análise do desempenho do MT, no Brasil, no período 1996-2007,
esta seção tem o objetivo de apresentar os conceitos relativos à teoria da alocação de
portfólio desenvolvida por John Maynard Keynes, cujos conceitos básicos foram
apresentados no capítulo 17 da Teoria Geral. O modelo keynesiano parte do pressuposto de
que os agentes alocam seus portfólios de acordo com suas expectativas de retorno sobre
cada um dos ativos que detêm. Esse retorno é medido pela interação entre quatro
componentes que os diversos tipos de ativos, em graus diferentes, possuem, e é
representado pela seguinte equação: q – c + l ± a, em que
31
:
“q”, conhecido como quase-renda, representa o fluxo de rendimento que se espera
31
A descrição dos componentes é baseada em Keynes (1985), Wray (2006), Dequech (2000) e Carvalho et al. (2000).
60
obter pelo uso de determinado ativo. No caso de um título de renda fixa, como as
debêntures e as notas promissórias, esse componente representa os juros líquidos de
impostos a serem pagos sobre o montante aplicado e, no caso das ações, os dividendos
(também líquidos de impostos) distribuídos proporcionalmente à quantidade de ações que
determinado agente possui. O termo quase-renda é mais indicado para os fluxos de
rendimento sobre bens de capital, mas ele é utilizado também para expressar os fluxos de
rendimento dos demais ativos.
“c” é o custo de manutenção ou custo de carregamento (carrying costs) de um ativo,
medido em termos de si mesmo, representando os custos nominais envolvidos na
manutenção desse ativo. No caso dos títulos financeiros, esse custo é representado pelo
custo de custódia, pagos à corretora ou ao banco no qual o investidores mantém os papéis
que representam seus ativos financeiros.
“l” é o prêmio de liquidez e representa o montante que as pessoas estão dispostas a
pagar pela conveniência ou segurança potenciais, proporcionadas pelo poder de dispor de
determinado ativo (KEYNES, 1973). Quanto maior (menor) o prêmio de liquidez, ou seja,
quanto maior (menor) a liquidez de determinado ativo ou ainda quanto mais (menos) rápido
puder seu proprietário vendê-lo, maior (menor) será a conveniência e/ou a segurança de
retorno financeiro em relação a posse desse ativo. Um título emitido no mercado de títulos
(e não de crédito) tem, em geral, um prêmio de liquidez mais elevado, pois existem
mercados secundários organizados para sua comercialização. Destaque-se que a avaliação
da liquidez de um ativo é sempre um exercício subjetivo.
Por fim, “a” representa a valorização esperada (ou desvalorização, se negativa) do
preço do ativo ao longo do tempo em comparação com todos os demais ativos, medida em
termos de moeda. No caso dos ativos financeiros e, mais especificamente, no caso das
ações, esse componente representa a diferença entre o preço de venda (ou preço futuro) e o
preço de compra (ou preço spot) do ativo.
O retorno total indicado pela equação resultante da interação desses componentes
varia de ativo para ativo. Os ativos não líquidos têm a maior parte do seu retorno em termos
de q-c, visto que os demais componentes que compõem seu retorno são quase nulos
(máquinas, por exemplo, têm baixo prêmio de liquidez e, na maioria das vezes,
desvalorização esperada decorrente da depreciação). Ativos líquidos, por outro lado, têm a
61
maior parte do seu retorno voltada para a liquidez, valorização esperada (com destaque para
as ações, que são demandadas também pelas expectativas acerca da apreciação no tempo
transcorrido entre sua compra e sua venda) e quase-rendas (destaque para os títulos de
renda fixa e ações de empresas com boas políticas de distribuição de dividendos).
Contudo, seja para os ativos líquidos, seja para os ilíquidos, o processo de avaliação
dos componentes que formam o retorno total dos ativos em ambientes de incerteza sempre
envolverá as expectativas dos agentes. Essas expectativas são heterogêneas, potencialmente
instáveis e relativas a ativos com características distintas. Quanto à heterogeneidade das
expectativas, sua existência implica que, ao se falar do retorno esperado de determinado
ativo, sempre se estará fazendo referência às médias das taxas esperadas pelos diferentes
agentes atuantes nos diversos mercados (CARVALHO et al., 2000). Isso porque as taxas
esperadas jamais serão totalmente iguais para todos os agentes, pois, caso fossem, não
haveria especulação e conseqüentemente, não haveria as figuras dos compradores e
vendedores (no extremo, o mercado não existiria).
No que se refere à instabilidade potencial das expectativas dos agentes, sua
existência parte da incerteza não probabilística sobre o futuro que envolve as negociações
de quaisquer ativos e que faz com que os agentes calquem suas projeções de ganhos
financeiros tanto em fatores objetivos quanto subjetivos. Isso implica que os fluxos de
rendimento futuros dos ativos estão condicionados ao estado de expectativas dos agentes
em relação aos eventos considerados significativos para a avaliação do mercado (ibid.).
Além disso, o estado de expectativas dos agentes, determinado pelas expectativas e pela
confiança acerca do retorno esperado de determinados ativos, também é modificado em
razão das suas percepções do grau de incerteza que envolve o mercado (DEQUECH, 2000).
Por fim, no que se refere às características distintas dos vários ativos, a implicação
sobre o retorno total é que variações dos preços de ativos distintos gerarão respostas
distintas de oferta e demanda. Quando se associa essa implicação com a heterogeneidade de
expectativas mencionada acima, tem-se que mudanças nas expectativas dos agentes geram
impactos diferentes sobre o retorno total esperado dos diferentes tipos de ativos. Assim,
como exemplo, o aumento da confiança sobre o desempenho futuro da economia pode
causar um aumento das expectativas de recebimento das quase-rendas (q) e da valorização
dos ativos (a) e uma diminuição dessas em relação aos valores subjetivos atribuídos às
62
posições de liquidez queda do “l” (WRAY, 2006) , o que, em última instância,
significaria demandas distintas entre os diferentes ativos, como um aumento da demanda
por bens de capital, títulos de renda fixa e ações, e uma diminuição da demanda por moeda.
Todas essas implicações introduzidas ao modelo por meio das considerações acerca
das expectativas dos agentes em ambientes de incerteza influenciam, então, diretamente o
cálculo do retorno esperado dos diferentes ativos. Nesse sentido, Dequech (2000) propõe
uma ampliação do modelo keynesiano de forma a abranger esses efeitos. Sua sugestão é
que se representem estes efeitos descontando o fluxo de rendimento esperado de cada ativo
por uma taxa de desconto específica a cada ativo. Em termos formais o modelo ampliado
proposto é:
(q – c + l ± a) / (1 + α)P, em que:
α é uma taxa de desconto que reflete o grau de incerteza específica associada com
determinado ativo, que vai além do nível geral de incerteza comum para todos os ativos; e
P é o preço de mercado do ativo.
As implicações menos importantes do modelo são aquelas que sugerem que um
aumento do preço do ativo provocará uma diminuição da sua taxa de retorno esperada,
desde que o grau de incerteza associado se mantenha constante. Isso parece óbvio, pois, se
o preço de mercado de um ativo aumenta e seu retorno é o mesmo, sua taxa de retorno
decrescerá.
Da mesma forma, pode-se pensar nas implicações que sugerem que
aumentos/diminuições no grau de incerteza associada ao ativo, seguidos por
diminuições/aumentos proporcionais do preço do ativo, não têm influência alguma sobre a
taxa de retorno do ativo. Embora essa implicação seja muito improvável no mundo real, ela
sugere que se o grau de incerteza aumentar e o preço dos ativos diminuir
proporcionalmente, a taxa de retorno não será alterada uma vez que haverá especulações
suficientes sobre o preço do ativo, que manterão os negócios do mercado. Alguns agentes
se desfarão dos títulos em função da incerteza (agentes mais avessos à incerteza) e outros
os comprarão em função da queda do seu preço de mercado (agentes menos avessos à
incerteza).
A implicação relevante do modelo ampliado de Dequech é que, quanto maior a
incerteza associada a determinado ativo, menor será o seu retorno esperado e vice-versa,
63
desde que seu preço de mercado se mantenha inalterado. Isso sugere que um aumento
(diminuição) da incerteza leva a um aumento (diminuição) da preferência pela liquidez que,
na sua forma mais extrema, reflete-se no aumento (diminuição) da demanda por moeda, o
ativo de maior liquidez. Como a moeda possui quase-renda e valorização praticamente
nulas, a maior (menor) demanda por ela provocará uma tendência de queda (aumento) do
retorno esperado total do portfólio de ativos do agente (ibid., 2000).
Esse modelo ampliado torna a proposta de Keynes mais adequada para explicar
como os agentes atuantes no MT tomam suas decisões de alocação de portfólio em
ambientes de incerteza. De maneira sucinta: os agentes formarão suas carteiras de títulos
com o intuito de maximizarem seus retornos, que são baseados em suas expectativas. Essas
expectativas são heterogêneas, potencialmente instáveis e relativas a ativos com
características distintas, o que implica que são afetadas pelo valor médio dos retornos de
todos os ativos e pela percepção diferenciada de incerteza (e maior ou menor aversão à
incerteza por parte) dos agentes em relação ao mercado no qual atuam.
Por fim, vale reforçar que as implicações relativas às interações entre otimismo
espontâneo, preferência pela liquidez, estado de confiança e expectativas tratadas na seção
1.1 também impactam a demanda e oferta de títulos no MT.
2.2 Evolução do mercado brasileiro de títulos no período 1996-2003: a estabilidade
2.2.1 Apreciação dos fatos históricos
Como mencionado no capítulo anterior, a partir de abril de 1996, a economia
brasileira seguiu uma tendência mundial de manutenção do ritmo de crescimento
econômico e apresentou taxas positivas de evolução do PIB de 2,2%, em 1996, e de 3,4%,
em 1997. Diante desses números, que pareciam indicar uma tendência de crescimento
contínuo e de longa duração, os investidores internacionais (principalmente os dos países
centrais) sentiram-se mais propensos ao risco e direcionaram seus recursos para títulos
privados negociados na Bolsa de Valores de São Paulo, a Bovespa
32
.
Ademais, as boas perspectivas para as aplicações financeiras no Brasil, derivadas da
32
Prates (1998) argumenta que o direcionamento de recursos de investidores dos países centrais para as economias
periféricas já vinha ocorrendo (em menor intensidade) desde o final da década de 1980, em função de um processo de
diversificação internacional dos portfólios dos investidores institucionais dos países centrais, estimulado pela baixa
correlação entre o desempenho dos mercados acionários desenvolvidos e emergentes e pelas perspectivas de lucro em
64
avaliação positiva dos detentores do capital externo sobre as reformas adotadas com o
Plano Real (principalmente as privatizações), e os instrumentos criados pelas autoridades
monetárias para facilitar o ingresso do capital estrangeiro no país
33
, contribuíram para
intensificar o direcionamento desses recursos ao mercado de títulos brasileiro, no período
1994-1997. Para se ter uma idéia da entrada de investidores estrangeiros na Bovespa, Prates
(1998) apresenta a evolução da participação percentual do capital internacional no total de
recursos negociados nessa bolsa para os anos de 1991, 1993, 1996 e 1997 que
corresponderam, respectivamente, a 6%, 14,4%, 33,3% e 29,4%
34
.
Essa entrada de recursos favoreceu o desempenho do mercado secundário de ações,
de maneira que a bolsa se destacou como uma das melhores aplicações em termos de
rentabilidade, no biênio 1996-1997. O Ibovespa
35
acumulou alta de 63,8% em 1996 e
44,8%, em 1997 (ver gráfico 8), contra uma desvalorização nominal de 1,3%, apresentada
em 1995. Com tendência semelhante comportou-se o movimento financeiro médio diário
na Bovespa, que passou de R$ 266,5 milhões, em 1995, para R$ 406,7 milhões, em 1996, e
para R$ 829,1 milhões, em 1997
36
.
No mercado primário, no entanto, os efeitos iniciais da abertura financeira não
superaram a desconfiança do empresariado sobre a consistência e a manutenção do cenário
aparentemente promissor da economia brasileira, e a capitalização via mercado de ações
sofreu queda de aproximadamente 40%, entre 1995-1996. No entanto, a partir de 1997,
diante da continuidade dos bons números da economia, dos aperfeiçoamentos no mercado
inseridos pela Lei n. 9.447, de 15 de março de 1997
37
, das boas perspectivas para a
razão das baixas cotações dos papéis das economias emergentes, além da sua maior volatilidade e do avanço dos
processos de privatização.
33
Destacam-se entre esses instrumentos os Fundos de Investimento em Empresas Emergentes, compostos de valores
mobiliários de empresas com elevado potencial de crescimento; os Fundos de Investimento Imobiliário, cujos recursos são
direcionados a empreendimentos imobiliários; e o Anexo IV à Resolução nº 1.289/87, que disciplina os investimentos
estrangeiros em títulos e valores mobiliários de companhias abertas no Brasil. Esse último, nos anos 1990, foi a principal
modalidade de investimento em portfólio estrangeiro no Brasil, sendo responsável pelo ingresso de US$ 32 bilhões em
1997 (PRATES, 1998).
34
A diminuição identificada de 1996 para 1997 reflete os efeitos da crise asiática que, como já destacado, influenciou
negativamente as expectativas dos agentes sobre os mercados emergentes, incluindo o Brasil, e provocou uma
recomposição do portfólio dos investidores, em âmbito mundial, a favor de ativos de menor risco (FILGUEIRAS, 2000).
35
O Ibovespa é um índice composto por um conjunto (ou uma carteira hipotética) de ações que representam 80% do
volume negociado à vista nos doze meses anteriores à sua formação. Sua reavaliação é feita quadrimestralmente.
36
Em valores constantes de 1997 (PRATES, 1998, p. 49).
37
Dentre as principais medidas adotadas com essa Lei estão a transferência de bens e direitos, a possibilidade de
determinação compulsória pelo Bacen da pronta capitalização de instituições ou de mecanismos de reestruturação em
geral, com a cessão do controle e reorganizações societárias diversas. Um dos subprodutos dessa nova regra foi a
possibilidade de divisão da instituição financeira em duas partes, separando ‘a parte saudável’ das suas atividades (good
65
economia brasileira refletidas nas estimativas de aumento do produto, em relação a 1996, e
da implementação do novo sistema de pregão eletrônico, o Mega Bolsa, que ampliou o
volume potencial de processamento de informações e facilitou a negociação dos títulos, o
empresariado mostrou-se mais confiante na tomada de recursos de terceiros, e o mercado
primário apresentou crescimento, com destaque para a emissão de ações e, principalmente,
de notas promissórias (títulos de curto prazo).
Gráfico 8 – Variação acumulada do Ibovespa em final de período (1996-2003)
Fonte: elaboração própria a partir dos dados disponíveis em <www.bovespa.com.br>
Contudo, esse desempenho foi revertido em outubro de 1997, com a
intensificação da crise na Ásia, de maneira que a influência positiva das medidas citadas foi
superada pelo aumento da incerteza e conseqüente deterioração das expectativas dos
agentes. Muitos dos investidores institucionais estrangeiros que mantinham negócios na
Bolsa venderam suas posições com objetivos diversos (cobrir perdas em outros mercados,
aumentar recursos em caixa com o objetivo de suprir os regastes dos cotistas e/ou recompor
seus portfólios a favor de ativos de menor risco), diminuindo sua participação percentual no
total de recursos negociados na Bolsa de 33,3%, em 1996, para 29,4%, em 1997.
bank) daquela que se encontrava insolvente (bad bank) e permitindo a cessão da primeira a outra instituição” (YAZBEK,
2007, p. 227).
66
Em razão dessa fuga de capital da Bolsa, a partir do segundo semestre de 1997, o
Ibovespa apresentou expressivas desvalorizações e uma alta volatilidade, semelhante à
verificada durante a crise do Plano Collor, em 1990 (tabela 9). Essa mudança de cenário só
não comprometeu o crescimento da emissão de títulos no mercado primário verificado ao
longo do ano porque seu efeito foi sentido apenas durante os últimos três meses de 1997.
Tabela 9 – Volatilidade do Ibovespa em diferentes períodos
Plano Collor (13/03/90 a 05/04/90)
12,90
Crise do México (19/12/94 a 16/01/95)
6,70
Início da crise da Ásia (10/07/97 a 22/07/97)
6,90
Crash de 1997 (23/10/97 a 30/10/97)
13,20
Fonte: Balarin (1997) apud Prates (1998).
Período
Volatilidade (oscilação
média diária)
Ao longo de 1998, a volatilidade das bolsas continuou e o índice Bovespa oscilou
intensamente, acompanhando as expectativas dos agentes econômicos, que se modificavam
com a mesma rapidez que fatos positivos e negativos se alternavam. Nos primeiros meses
daquele ano, o avanço das privatizações estimulou positivamente os ânimos dos
aplicadores, de maneira que os índices das bolsas apresentaram alta. Em seguida, com a
moratória russa em agosto desse mesmo ano, o segmento de renda variável teve um mau
desempenho e as bolsas acumularam queda de aproximadamente 40% no mês.
Em outubro, com as expectativas quanto ao anúncio do Programa de Estabilização
Fiscal, a redução dos gastos e o aumento de receitas, os agentes se animaram para as
compras no mercado secundário e o Ibovespa voltou a subir, alcançando valorização de
6,9%. Em novembro, esse otimismo foi intensificado com a redução da fuga de recursos
estrangeiros das bolsas, motivada, por sua vez, pela reeleição de Fernando Henrique
Cardoso à Presidência da República e pelo acordo firmado com os organismos
internacionais (através do qual o país recebeu, aproximadamente, US$ 41,5 bilhões), de
forma que as valorizações nas bolsas superaram 20%, ao final de novembro de 1998.
Por fim, com as dificuldades do Governo para a aprovação de medidas fiscais, na
Câmara dos Deputados, em dezembro de 1998, houve uma repercussão negativa no
mercado de títulos e o Ibovespa acumulou queda de 21,4%. De forma geral, na média desse
67
“sobe e desce” do índice Bovespa, a rentabilidade acumulada nas duas principais bolsas em
1998, situou-se em -33,5% em São Paulo e em -38,2% no Rio de Janeiro (BACEN, 1998).
Diante de um mercado tão volátil, a percepção de incerteza dos agentes atuantes no
mercado de títulos aumentou. Com a maior incerteza no mercado, as empresas que
buscavam fontes de financiamento via emissão de títulos passaram a reduzir o horizonte de
vencimento dos seus títulos, com o intuito de reduzir também, em certa medida, o risco de
mercado. Dessa forma, as empresas emissoras passaram a preferir títulos de curto prazo,
como as notas promissórias, em detrimento aos de longo prazo, como debêntures e ações.
Essa preferência se refletiu na evolução das emissões primárias de títulos da
seguinte maneira: de 1997 a 1998, ações e debêntures apresentaram evolução real de 3,5%
e 26,4%, respectivamente, enquanto as emissões de notas promissórias, para o mesmo
período, evoluíram em 152,7%. No gráfico 7, pudemos visualizar essas trajetórias e
identificar estas evoluções.
A partir de 1999, o ambiente de incerteza se intensificou com a crise cambial, e a
capitalização via mercado de títulos sofreu reduções constantes, que se estenderam até
2003. Por outro lado, o mercado secundário começou a apresentar bons resultados, como
conseqüência do aumento do ingresso de capitais estrangeiros na Bolsa, associados, em
grande medida, às atividades especulativas. Esses capitais vinham em busca de altos
retornos financeiros de curto prazo que se tornaram freqüentes, nesse período, por duas
razões: a redução do valor de mercado das empresas listadas na Bolsa, em conseqüência da
forte desvalorização cambial desse período
38
, e a freqüência de alterações significativas na
cotação das ações
39
, decorrente da instabilidade econômica (BACEN, 1999).
Além disso, ao longo de 1999, a Bovespa adotou o uso de vários instrumentos que
contribuíram para a ampliação das atividades especulativas e, conseqüentemente, para a
intensificação da concentração dos recursos financeiros no mercado secundário
40
. Eram
instrumentos baseados na intensificação do uso da informática para a negociação de títulos
e cujos objetivos foram: facilitar as negociações, reduzir os custos de transação e atrair
38
“A desvalorização cambial de 70,8%, ocorrida nos dois primeiros meses do ano [1999], beneficiou o mercado
acionário, contribuindo para que o valor das empresas listadas na Bovespa passasse de US$ 327 bilhões, em julho de
1997, para US$ 107 bilhões em janeiro de 1999, tornando o preço em dólar das ações bastante atrativo.” (BACEN, 1999,
p. 78).
39
Em apenas um dia (15 de janeiro de 1999), o Ibovespa apresentou valorização de 33,4%, em decorrência do anúncio da
adoção do regime de câmbio flutuante.
68
novos investidores ao mercado, principalmente, pequenos e médios (interessados,
exclusivamente, na obtenção de ganhos financeiros de curto prazo). Os destaques entre
esses instrumentos foram o home broker, lançado em março de 1999 e o After Market,
lançado em setembro do mesmo ano.
Com o primeiro, qualquer cidadão que se julgasse investidor passou a ter o poder
de transmitir, via internet, ordens de compra e venda de títulos mobiliários diretamente para
o Sistema de Negociação da Bovespa, sem a necessidade de passar pela mesa de operações
de uma corretora. Isso aumentou a facilidade, a rapidez e a praticidade de negociação de
títulos e provocou um forte ingresso de investidores no mercado, de forma que, entre abril e
dezembro de 1999, o número de transações diárias subiu de 3.118 para 29.178, das quais,
aproximadamente, 15.000 foram fechadas pelo novo sistema (ANDREZO; LIMA, 2002).
O After Market, por sua vez, criou a possibilidade de negociação de ações e opções
exclusivamente no Sistema Eletrônico da Bovespa e fora do horário regular do pregão,
ampliando as oportunidades de negócios e oferecendo maior flexibilidade aos investidores.
Com esse instrumento, os investidores passaram a comprar e vender seus títulos até as
19h30min
41
, respeitando determinadas condições como: negociar somente no mercado à
vista e com ações que registram pelo menos um negócio no pregão regular do dia, e
negociar dentro do limite de 2% de variação máxima do preço de fechamento do preo
regular, de modo a evitar que os preços oscilem muito em um período de menor liquidez
(ibid.).
No entanto, como destacado, essas medidas contribuíram apenas para intensificar
a atividade especulativa no mercado secundário de ações, não oferecendo praticamente
nenhuma contribuição imediata ao mercado primário. Dessa forma, enquanto o volume
financeiro diário negociado na Bovespa aumentou de R$ 479 milhões, em junho de 1999,
para R$ 916 milhões, em dezembro do mesmo ano, como reflexo, principalmente, das
atividades especulativas, as emissões primárias de ações, debêntures e notas promissórias
sofreram redução tanto em volume quanto em número de emissões, como demonstra a
tabela 10.
40
Como escreve Keynes (1985, p. 116), “[à] medida que progride a organização dos mercados de investimento, o risco de
um predomínio da especulação, entretanto, aumenta.”
41
O horário do pregão eletrônico regular tem início às 11hs e término às 18hs.
69
Tabela 10 – Emissões primárias no mercado de capitais nacional (1997-2004)
R$ milhões (valores constantes de 2007)
Período Ações Debêntures
Notas
Promissórias
Bonus de
subscrição
qtde
qtde
qtde
qtde
1996
2.320 - 16.839 - 1.006 - 0 -
1997
7.441 - 14.313 - 9.562 - 0 -
1998
7.702 20 18.089 61 24.169 68 3.542 14
1999
4.727 10 11.479 38 13.831 67 567 5
2000
2.288 6 14.194 42 12.317 44 0 1
2001
2.039 6 22.849 41 7.937 32 0 0
2002
1.406 4 19.600 25 5.191 20 0 0
2003
282 2 6.472 17 2.607 12 0 0
Fonte: Bacen (2008) / <www.cvm.gov.br>
*Ações em 1996 excluída emissão de US$ 8 biles que esteve associado ao processo de capitalização do Banco do
Brasil através de aporte de capital do Tesouro Nacional.
Portanto, embora o início do período em análise tenha apresentado bons resultados
para o mercado secundário, com destaque para o desempenho do Ibovespa (valorização de
63,8%, em 1996, e 44,8%, em 1997), o resultado do mercado de ações, ao final do período,
não se mostrava muito promissor, visto que o número de empresas entrantes no mercado
era cada vez menor. Esse desestímulo às emissões primárias se agravou ainda mais com o
encerramento das privatizações mais importantes, o aumento dos custos de transação
(CPMF) e o crescimento do acesso às bolsas internacionais, principalmente a bolsa de Nova
York, através dos ADR’s. Em resumo:
“No final da década de 90, o mercado de ações no Brasil apresentava perspectivas
sombrias: um baixo valor agregado de capitalização das empresas listadas, a
preponderância de acionistas controladores alheios aos interesses dos
minoritários, o crescente fechamento do capital de empresas, freqüência
baixíssima de IPOs e a contração do volume de operações nas bolsas brasileiras
(...) (ALDRIGHI, 2007, p. 22).
Contudo, como exposto no primeiro capítulo, no início de 2000, o cenário
econômico começou a mostrar sinais de recuperação e as autoridades nacionais adotaram
medidas políticas pró-cíclicas com “vistas a concorrer para o desenvolvimento econômico
calcado na ampliação do papel do setor privado.” (BACEN, 2000, p. 48). No Mercado de
Crédito foram adotadas medidas de estímulo à ampliação do volume de recursos com
redução das taxas SELIC e TJLP e das alíquotas de recolhimento sobre encaixes
compulsórios incidentes sobre os depósitos a vista.
70
De maneira semelhante, no Mercado de Títulos as ações das autoridades
competentes também indicaram o desejo de promover a expansão do volume de recursos
negociados, tendo em vista a adoção de medidas que visavam adequar o mercado nacional
aos padrões de competência verificados nos principais mercados do mundo. Um primeiro
exemplo desse empenho das autoridades se deu em 27 de janeiro de 2000, com a adoção de
uma importante modificação institucional: a unificação das bolsas de valores brasileiras.
Até o ano 2000, havia nove entidades espalhadas por todo o território brasileiro.
Essa quantidade de instituições foi necessária por muito tempo, em razão da dificuldade de
comunicação e, conseqüentemente, de troca de informações que havia entre os investidores
residentes nas várias regiões do extenso território nacional. Entretanto, com a evolução
tecnológica, a intensificação do uso de recursos de informática (principalmente, a internet)
e o desenvolvimento dos chamados investidores institucionais, houve uma concentração
natural de negócios nas bolsas localizadas nos principais centros financeiros do país, a
saber, São Paulo e Rio de Janeiro.
Ao longo dos anos essa concentração foi aumentando e, com mais intensidade na
Bovespa, de forma que, em 1998, essa entidade passou a concentrar 95% do volume total
de operações do país (ANDREZZO, LIMA, 2002). Com isso, a manutenção de nove bolsas
de valores, das quais oito apresentavam baixíssimos volumes de negócios, passou a se
mostrar ineficiente, e a unificação foi realizada em maio de 2000 com o intuito de reduzir
essa ineficiência.
Além disso, vale ressaltar que, nesse período, as bolsas de todo o mundo estavam
em processo de unificação através de fusões e acordos para redução de custos e aumento de
investimentos em tecnologia, com o objetivo de atrair investidores, o que exigiu uma
reação das bolsas brasileiras, no intuito de se manterem competitivas. Dois exemplos que
retratam a tendência mundial desse processo foram: a fusão, em março de 2000, da Bolsa
de Tokyo com as Bolsas de Hiroshima e Niigata (Hiroshima Stock Exchange e Niigata
Stock Exchange) e a criação da EURONEXT, em setembro de 2000, como resultado da
fusão entre as Bolsas de Valores de Amsterdam (Amsterdam Exchanges), Bruxelas
(Brussels Exchanges) e Paris (Paris Bourse).
Além dessa modificação estrutural no mercado de títulos brasileiro, outra inovação
desenvolvida pela Bovespa, implantada em dezembro de 2000, foi a criação de segmentos
71
especiais de negociação de ações, a saber: o Novo Mercado e os Níveis Diferenciados de
Governança Corporativa (Nível 1 e Nível 2). Embora esses segmentos tenham fundamentos
semelhantes, o primeiro é mais direcionado à listagem de empresas que abrem capital e
iniciam seus negócios na Bolsa de valores e o segundo, por sua vez, é mais direcionados às
empresas já listadas na Bolsa.
A premissa básica dessa inovação era que a adoção de boas práticas de governança
corporativa pelas companhias reduziria as incertezas do processo de avaliação de títulos e,
com isso, aumentaria sua credibilidade e reduziria o risco do mercado, o custo de captação
das ações e, conseqüentemente, o preço dessas. O resultado pretendido seria o aumento da
confiança e da disposição dos investidores em adquirir ações estimulando assim o fluxo de
recursos financeiros para a Bovespa (SILVA, 2006).
Essas inovações, no entanto, não foram suficientes para a superação das
expectativas pessimistas dos agentes, decorrentes da incerteza sobre os rumos da economia
mundial, as quais se reforçavam com a iminência da crise argentina e com a desaceleração
da economia americana. Os efeitos negativos do desempenho econômico internacional
sobre as expectativas dos agentes passaram a afetar também o mercado secundário, de
maneira que o Ibovespa registrou queda de 10,7% e encerrou o ano 2000 com 15.264
pontos, embora o valor de mercado das companhias listadas na Bovespa neste ano tenha
aumentado 7,9%, em relação a 1999.
A partir de 2001, o cenário econômico externo e interno voltou a apresentar pioras e
se mostrou adverso para novos investimentos. Além disso, os prognósticos de alguns
analistas sobre os principais números da economia brasileira se deterioraram rapidamente e
influenciaram negativamente o desempenho do mercado, de maneira que, no primeiro
trimestre de 2001, a variação do Ibovespa acumulou queda de 5,4%. O racionamento de
energia e os ataques de 11 de setembro foram decisivos para a intensificação desse
movimento de queda do Ibovespa, de forma que, em 14 de setembro, o índice atingiu
10.034 pontos, o menor nível desde agosto de 1999. Neste contexto, o valor de mercado das
companhias listadas na Bovespa sofreu queda de 36,7% no ano e o Ibovespa encerrou 2001
com variação negativa de 11,5%, aos 13.509 pontos.
Em 2002, os problemas continuaram. As expectativas de baixo crescimento
mundial, o “efeito-Lula”, a maior aversão ao risco por parte dos investidores internacionais
72
e as perspectivas de guerra no Golfo Pérsico, contribuíram para que a política monetária
nacional fosse conduzida com uma postura conservadora de contração da liquidez
financeira, desestimulante para novos investimentos. Ademais, relatórios privados,
elaborados por instituições financeiras internacionais reduziram a recomendação de
investimentos no Brasil com as agências de risco rebaixando a classificação dos papéis
brasileiros e questionando a evolução das dívidas pública e externa, no longo prazo
42
.
Nesse cenário adverso, que abrangeu quase todo o exercício de 2002, os
investidores realocaram seus portfólios em prejuízo ao mercado de títulos brasileiro e
provocaram uma redução do volume de recursos financeiros destinados à compra e venda
de ativos negociados na Bovespa, intensificando a piora do seu desempenho. O volume de
recursos de compra e venda de ativos passou de R$ 451,8 bilhões, em 2001, para R$ 366,3
bilhões
43
, em 2002, sendo os principais responsáveis por essa queda, as instituições
financeiras (bancos, DTVMs e Corretoras) e os investidores estrangeiros que, juntos,
responderam pela saída de R$ 54,4 bilhões da Bovespa, nesse período.
Contudo, a redução das incertezas decorrentes do término do processo eleitoral
brasileiro, associada com a queda na aversão ao risco dos investidores internacionais,
atenuou a forte restrição aos fluxos de capitais, durante 2003 (CINTRA; PRATES, 2004).
O retorno dos investidores estrangeiros à Bovespa que, ao final do ano, destinaram R$
120,3 bilhões para transações de compra e venda de títulos, impulsionou o mercado
secundário e contribuiu para que o Ibovespa valorizasse 97,3%, no ano, com o nível
recorde de 22.236 pontos, interrompendo a seqüência de resultados negativos observados
desde 2000.
No entanto, essa recuperação do movimento financeiro na Bovespa não representou
elevação da capitalização das empresas no mercado de títulos, pois, como observado na
tabela 10, as emissões primárias de títulos, em 2003, declinaram tanto em volume quanto
em quantidade. Essa situação demonstrou que, mesmo com o ressurgimento da liquidez
financeira na Bovespa, os empresários brasileiros mantiveram a tendência cautelosa de
postergação das decisões de investimento, nesse período, verificado também na demanda
por recursos no mercado de crédito.
42
“Alguns analistas chegaram a sugerir a possibilidade de uma moratória da dívida externa e até da dívida pública interna
brasileira.” (CINTRA; PRATES, 2004, p. 19)
43
Em valores de 2007 atualizados pelo IPCA.
73
A exceção à regra da redução de emissões primárias foram as debêntures. No
entanto, a elevação do volume desses títulos, nesse período, deve ser observada com
cuidado, pois, como destacado por Lopes, Antunes e Cardoso (2007, p. 47-48), a emissão
de debêntures esteve vinculada, em sua maioria, à renegociação de dívidas bancárias, na
qual os bancos credores participaram como coordenadores e ofereceram garantia firme na
colocação de debêntures, não se constituindo, portanto, em investimentos em ativos reais.
Desse modo, observa-se que a elevação do volume de debêntures, embora expressiva, não
invalida a percepção de que, nesse período, o empresariado nacional se manteve avesso à
emissão de títulos para captação de recursos no MT.
2.2.2 Apreciação crítica dos fatos
Como visto, nos dois primeiros anos do período em estudo (1996 e 1997), o
Ibovespa aumentou (crescimento de 63,8%, em 1996, e 44,8%, em 1997), em função do
aumento do fluxo de capital estrangeiro na Bovespa, das boas perspectivas para a economia
brasileira derivadas da avaliação positiva dos detentores do capital externo sobre as
reformas estruturais adotadas com o Plano Real (principalmente as privatizações), dos
instrumentos criados pelas autoridades monetárias para facilitar o ingresso do capital
estrangeiro no país e do cenário econômico favorável.
No mercado primário, no entanto, os efeitos iniciais da abertura financeira não
foram significativos. Contudo, em 1997, diante de fatores positivos elencados no
início da seção anterior, o empresariado se mostrou mais confiante na tomada de recursos
de terceiros, e o mercado primário apresentou crescimento, com destaque para a emissão de
ações e, principalmente, de notas promissórias (títulos de curto prazo).
Entretanto, tendo em vista que a incerteza do mercado ainda se mantinha elevada,
como conseqüência da intensidade da crise passada (México/1994-1995) e da grande
possibilidade de crises futuras, os agentes privilegiaram ativos com maior prêmio de
liquidez como as ações e, principalmente, as notas promissórias, títulos caracteristicamente
de curto prazo (prazo mínimo de 30 e máximo de 180 dias). Essa preferência pela liquidez
dos agentes refletiu o fenômeno identificado como “instabilidade potencial das
expectativas”, uma vez que foi o estado futuro da macroeconomia que condicionou a ação
dos agentes.
A partir de outubro de 1997, o fluxo de capitais estrangeiros ao Brasil sofreu quedas
74
(ver gráfico 3) em função do aumento da aversão ao risco dos investidores internacionais
frente às freqüentes crises econômicas internacionais; da diminuição na intensidade do
processo de privatização, uma vez que os setores de maior interesse haviam sido
privatizados; e, por fim, porque o efeito positivo inicial da estabilização de preços perdeu
sua intensidade em virtude da acomodação das expectativas dos agentes econômicos ao
novo cenário.
Com isso, a influência positiva dos acontecimentos que marcaram o biênio 1996-
1997 foi gradativamente substituída pelo impacto negativo da seqüência de crises
financeiras, do racionamento de recursos financeiros no mercado internacional, do
racionamento de crédito no mercado interno, além dos problemas internos já identificados
ao longo desta dissertação, como o câmbio sobre-apreciado. Dessa forma, a incerteza foi
intensificada e os agentes alocaram seus ativos em direção a ativos com maior prêmio de
liquidez.
Observando o gráfico 3, na página 47, e comparando as altas e baixas dos fluxos de
recursos estrangeiros ao Brasil com o desempenho do Ibovespa, percebe-se que o “sobe-
desce” do Ibovespa acompanhou os ânimos e as disponibilidades financeiras dos
investidores estrangeiros, de forma que as significativas altas do índice coincidiram com os
períodos de elevação dos fluxos de recursos estrangeiros (1996, 1997, 1999 e 2003) e as
baixas, por sua vez, com os períodos de diminuição desses recursos (1998, 2000, 2001 e
2002). Ressalte-se que essa relação é auto-explicável, dado que os estrangeiros foram (e
ainda são) um dos principais investidores do mercado de títulos brasileiro (os outros dois
mais importantes são: instituições financeiras e investidores institucionais).
Em resumo, o período 1997-2003 foi marcado pelo decréscimo do número e volume
de emissões primárias de ações e dos principais de títulos de dívida. A principal razão desse
desempenho parece estar associada à mudança das expectativas (instáveis) dos agentes
frente ao crescimento da incerteza sobre o futuro da economia brasileira.
2.3 Evolução do mercado brasileiro de títulos no período 2004-2007: o crescimento
2.3.1 Apreciação dos fatos históricos
O ano de 2004, assim como no mercado de crédito, marcou o início da expansão
recente do mercado de tulos no Brasil. O bom desempenho da economia mundial,
75
associado aos bons resultados para a economia brasileira, foi um dos principais
motivadores do maior dinamismo dos mercados primário e secundário da Bolsa de Valores
de São Paulo. Os demais motivos que explicam esse crescimento derivam desse ambiente
econômico favorável e, em certa medida, estão relacionados à maturação de inovações
institucionais, com destaque para a ampliação do uso de recursos de informática na
negociação de títulos.
Os motivos destacados pelo Grupo de Conjuntura da FUNDAP (2008) como sendo
os principais para a expansão do mercado de tulos, após 2004, reforçam essa afirmação.
São eles: mudanças regulatórias que permitiram a criação e/ou o aperfeiçoamento de
instrumentos de securitização
44
de dívida, como o Certificado de Recebíveis Imobiliários
(CRI) e o Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC); o ciclo de liquidez
financeira para os países periféricos traduzidos na ampliação dos fluxos de investimento
estrangeiro em carteira; a apreciação cambial do real decorrente do afluxo crescente de
capital externo que aumentou a atratividade das ações e demais títulos negociados no
mercado de títulos; as expectativas de obtenção do grau de investimento para a economia
brasileira junto às agências internacionais de classificação de risco em virtude da maior
estabilidade do ambiente macroeconômico interno; e a progressiva redução da taxa Selic
que motivou os investidores a realocarem seus recursos para ativos que, embora mais
arriscados, ofereciam maior rentabilidade.
Em relação ao primeiro desses motivos, ou seja, aos instrumentos de securitização
de dívidas, antes da identificação de sua importância, por motivos didáticos, apresentam-se
as definições dos dois títulos citados, o CRI e o FIDC (Fortuna, 2005):
O CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários) é um título de emissão exclusiva de
companhias securitizadoras, representativo de valores mobiliários lastreados em créditos
imobiliários. Foi criado em 1997, com o objetivo de captar recursos junto aos investidores
institucionais para financiar investimentos imobiliários com custos menores dos que os
oferecidos pelas linhas de financiamento tradicionais do mercado bancário e com prazos
mais alongados e compatíveis com as características do financiamento imobiliário.
Por sua vez, o FIDC (Fundo de Investimento em Direitos Creditórios), também
44
O termo securitização é oriundo da palavra inglesa security, e representa o processo de transformação de uma dívida
com determinado credor em uma dívida com compradores de títulos originados do montante desta dívida. Trata-se
76
chamado de fundo de recebíveis, é um fundo de investimento que destina parcela
preponderante do seu patrimônio líquido (acima de 50%) à aplicação em direitos
creditórios
45
(e em títulos representativos desses direitos) originários de operações nos
segmentos financeiro, comercial, industrial, de arrendamento mercantil e de prestação de
serviços. A autorização para o funcionamento desses títulos ocorreu em 29 de novembro de
2001 e seu objetivo primeiro foi dar liquidez ao mercado de crédito por meio da redução do
risco e ampliação da oferta de recursos, visto que, por meio desses títulos os bancos podem
vender seus créditos para os fundos e, com isso, “abrir espaço” em seu balanço para novas
operações de crédito.
O argumento de que esses tulos são causa (ou uma das causas) do crescimento do
mercado de títulos não se mantém quando se compara a evolução desses, desde a sua
criação (ver tabela 11), com a evolução dos demais tulos negociados no MT (ver tabelas
10 e 13). O que se percebe é que a evolução em seus volumes, de 1999 a 2007,
acompanhou a evolução dos demais títulos do MT, parecendo, portanto, que eles também
sofreram os efeitos positivos que marcaram o período 2004-2007. O que parece mais
adequado, portanto, é considerar o seu crescimento uma conseqüência, e não uma causa, da
expansão do MT.
Tabela 11 – Emissões de CRI e FIDC (1996-2007)
R$ milhões (valores constantes de 2007)
1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007
CRI
22 279 336 190 353 459 2.265 1.119 868
FIDC
0 0 0 268 1.887 5.847 9.243 13.347 9.962
Fonte: Bacen (2008) / <www.cvm.gov.br>
Os demais motivos
46
são, justamente, os reflexos do bom desempenho do mercado
econômico internacional. Viu-se, no primeiro capítulo, que a entrada de recursos
estrangeiros no país foi acentuada no período 2004-2007 e que uma das conseqüências
desse fluxo foi a valorização expressiva dos títulos da dívida brasileira, o que influenciou
portanto, de uma conversão de empréstimos em títulos (securities) vendidos a investidores que passam a ser os novos
credores da dívida (SANDRONI, 2005).
45
Direito a determinado crédito e títulos representativos deste direito, originário de operações realizadas nos segmentos
financeiro, comercial, industrial, imobiliário, de hipotecas, de arrendamento mercantil e de prestação de serviços, bem
como em outros ativos financeiros e modalidades de investimento (FORTUNA, 2005).
46
Resumidamente: o ciclo de liquidez financeira para os países periféricos, afluxo crescente de capital externo, maior
estabilidade do ambiente macroeconômico interno e a progressiva redução da taxa Selic.
77
diretamente o custo das operações de crédito no sistema bancário e estimulou o aumento da
demanda por operações de crédito.
No mercado de títulos, o crescimento da participação dos investidores estrangeiros
se traduziu em ampliação dos fluxos de investimento estrangeiro em carteira e,
conseqüentemente, em aumento da participação percentual dos investidores estrangeiros
nas operações da Bovespa. Para se ter uma idéia desse aumento, em 2001, a participação
dos investidores estrangeiros representou 25,1% do total de operações de compra e venda
na Bolsa, passando, após pequenas alterações nos anos que se seguiram, para 32,8% do
total destas operações, em 2005, 35,5% ,em 2006, e 34,5%, em 2007, conforme exposto no
gráfico abaixo.
Gráfico 9 - Participação percentual no total de compras e vendas na Bovespa, por tipo
de investidor - (2001-2007)
% média anual
Fonte: <www.bovespa.com..br> - Elaboração própria.
O que se extrai desses resultados é que mais de um terço do capital ingressante na
Bovespa nos últimos três anos do período analisado neste trabalho teve origem em recursos
de investidores estrangeiros. Isso demonstra a importância relativa desses agentes na
recente capitalização bursátil brasileira. Em termos absolutos essa importância fica ainda
mais evidente, como se pode notar com a tabela 12.
78
Tabela 12 – Volume total de compras e vendas de títulos na Bovespa, por tipo de
investidor (2001-2007)
Em R$ milhões (valores constantes de 2007)
2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007
Tipos de Investidores
Pessoas Físicas 92.483 76.062 121.854 188.861 218.449 306.156 550.786
Institucionais 77.749 64.640 146.375 192.902 236.357 339.363 712.508
Estrangeiros 113.609 95.281 120.374 187.627 282.136 442.726 826.222
Empresas Públicas e Privadas 13.480 12.238 18.201 20.788 19.741 26.889 51.461
Instituições financeiras 153.661 117.541 89.668 95.000 100.932 129.827 248.365
Outros 824 615 2.028 2.464 2.406 1.432 4.058
Total 451.811 366.379 498.504 687.644 860.024 1.246.396 2.393.403
Fonte: <www.bovespa.com.br> - elaboração própria
Esses dados deixam evidente o maior crescimento percentual dos recursos de
investidores estrangeiros frente aos demais. Analisando-os nota-se que enquanto o volume
de recursos financeiros de pessoas físicas, por exemplo, apresentou evolução real de
191,64%, entre 2004 e 2007, como conseqüência, principalmente, da intensificação do uso
dos recursos de informática (como o home broker, por exemplo), a evolução real do volume
de recursos dos investidores estrangeiros foi de 340,3%, no mesmo período.
Obviamente, essa situação aumentou a fragilidade da Bovespa, visto que, em teoria,
eventuais abalos na economia global podiam alterar os ânimos dos investidores e provocar
uma realocação de portfólio em favor de ativos de menor risco (principalmente títulos
públicos dos países centrais), causando uma redução do capital aplicado em ativos
nacionais e, conseqüentemente, provocando prejuízos significativos no desempenho e
desenvolvimento do mercado de títulos brasileiro. Entretanto, a despeito desse risco
oriundo do aumento da fragilidade financeira da Bolsa, o fato é que essa se beneficiou
desse cenário externo de grande liquidez financeira e ampliou o volume de negociação de
títulos de forma geral.
Em termos de desempenho, a Bovespa encerrou 2004 com alta acumulada de
17,8%, aos 26.196 pontos, a maior pontuação de toda a história da Bolsa (SANT’ANNA,
2008). A média diária de negócios (53.751 operações) foi 35,7% superior a 2003 e o
volume de negócios evoluiu 48,6%, de um ano para o outro. Ao final de 2004, o valor de
mercado das empresas listadas na Bovespa havia evoluído em 33,7%, sobre o valor de
dezembro do ano anterior, sobressaindo-se as empresas integrantes do Índice Bovespa. No
79
mercado primário, houve crescimento na quantidade e volume de emissões de ações e
debêntures
47
, após 2004.
Gráfico 10 – Variação acumulada do Ibovespa em final de período (2004-2007)
Fonte: www.bovespa.com.br - Elaboração própria.
47
Aqui, mais uma vez, merecem ressalvas as emissões de debêntures tendo em vista algumas particularidades dessas
emissões. Segundo Sant’Anna (2008, p. 3), uma das características marcantes da evolução recente do mercado de
debêntures é a elevada presença de lançamentos de empresas de leasing que, depois de ter apresentado um desempenho
residual em 2003 e 2004, lideraram as emissões desses títulos nos dois anos seguintes com participação no total de
lançamentos de 72,2%, em 2005 e 67,2%, em 2006.
Lopes, Antunes e Cardoso (2007, p. 51-52) acrescentam que
“as empresas de leasing são a única instituição financeira com autorização para emitir
debêntures. Em geral, esses títulos são subscritos com o próprio grupo financeiro para
alocação nos fundos de investimento ou repasse a clientes do banco como substituto das
emissões de CDBs (sendo revendidas pelos bancos aos clientes por meio de operações com
compromisso de recompra, isentas de compulsórios e de recolhimentos ao Fundo Garantidor
de Crédito) ou, secundariamente, financiamento de operações de leasing do grupo.
Dada a natureza das operações de leasing, os volumes, prazos e taxas dessas operações não
representam as condições que poderiam ser obtidas por outros emissores em operações de
mercado propriamente ditas. Por esse motivo, estatísticas gerais das emissões de debêntures
que não levem em conta essas especificidades são altamente distorcidas.”
Assim, diversos analistas consideram que as debêntures emitidas pelas empresas de leasing não constituem um
operação típica de mercado de capital, sendo na realidade uma captação bancária disfarçada (FUNDAP, 2008). Assim,
com o exposto sobre as emissões de debêntures até aqui, e considerando ainda que as empresas de leasing mais
importantes pertencem aos conglomerados comandados pelos grandes bancos comerciais e, postula-se que as
características dessas emissões obedecem a uma lógica de captação de recursos e a um cálculo de risco diferente dos
lançamentos das demais empresas o financeiras. Em consequência, a análise sobre essas emissões a ser realizada no
próximo capítulo, levará em consideração somente a emissão de títulos por empresas não financeiras.
80
Nos anos que se seguiram, a Bolsa manteve o ritmo constante de crescimento tanto
no mercado primário como no secundário, de forma que a rentabilidade nominal e as
pontuações acumuladas ao final dos exercícios apresentaram evoluções históricas: 30,1%
aos 33,5 mil pontos, em 2005, 32,9% aos 44,5 mil pontos, em 2006, e 43,7% aos 63,8 mil
pontos, em 2007. Esse último ano foi singular, pois superou 2006, que, de acordo com
Sant’Anna (2008), havia registrado os maiores valores de emissões primárias de toda a
história da Bolsa brasileira. O maior destaque de 2007 ficou com as emissões de ações, que
atingiram o volume recorde de R$ 33,2 bilhões (com 59 emissões), contra R$ 14,8 bilhões
(com 29 emissões) de 2006.
Tabela 13 – Emissões primárias de títulos no mercado de capitais nacional
(2004-2007)
Em R$ milhões (valores constantes de 2007)
Período Ações Debêntures
Notas
Promissórias
Bonus de
subscrição
qtde
qtde
qtde
qtde
2004 5.149 9 10.948 38 2.552 5 0 0
2005 4.913 13 44.754 45 2.835 9 0 0
2006 14.847 29 72.562 47 5.513 17 0 0
2007 33.201 59 46.534 43 9.725 20 0 0
Fontes: Bacen (2008) e <www.cvm.gov.br>
EMISSÕES PRIMÁRIAS NO MERCADO DE CAPITAIS BRASILEIRO 2004-2007
Valores constantes de 2007
Registro de emissões na CVM (milhões R$)
2.3.2 Apreciação crítica dos fatos
Embora o bom desempenho dos mercados primário e secundário de títulos privados,
no período 2004-2007, também tenha sido influenciado pela maturação do uso de
inovações e instrumentos instituídos no início da década, como o home broker
48
, o After
market e o Novo Mercado, ele decorreu, em grande medida, da manutenção das
externalidades positivas mencionadas no início da seção anterior, com destaque para o
crescimento dos fluxos de investimento estrangeiro em carteira.
48
Como exemplo dessa maturação, destaque-se que o volume médio mensal de negócios via home broker aumentou
153,5%, em 2007, chegando a R$ 15,6 bilhões, contra R$ 6 bilhões, em 2006. Por número de aplicadores, a média mensal
cresceu 117,78% no ano atingindo um contingente de 135.603 usuários. O número de transações via home broker em
2007, respondeu por 8,4% do total negociado na Bovespa naquele ano (http://www.bovespa.com.br/Principal.asp).
81
A continuidade dos bons resultados da economia após 2004 diminuiu a incerteza
sobre o futuro do mercado brasileiro, aumentou a confiança sobre o desempenho futuro da
economia, melhorou as expectativas dos agentes acerca dos fluxos de rendimentos futuros
dos ativos reais e financeiros e provocou o aumento das quase-rendas (q) e das expectativas
de valorização dos ativos financeiros (a). Isso resultou em um aumento da demanda por
títulos de renda fixa e ações que, de outro lado, encontrou uma oferta mais aquecida, em
virtude da maior propensão a investir do empresariado nacional.
No tocante ao prêmio de liquidez, sua importância relativa frente aos demais
componentes do retorno esperado foi menor, nesse período, pois, com a queda da incerteza
os agentes ampliaram a preferência pela rentabilidade em detrimento da preferência pela
liquidez. Isso implicou no maior crescimento proporcional dos títulos de maior período de
maturação (ações e debêntures) frente aos títulos considerados de curto/curtíssimo prazo
(notas promissórias). que se destacar, contudo, que o prêmio de liquidez de todos os
títulos negociados no MT aumentou nesse período, como conseqüência dos
aperfeiçoamentos no mercado (inovação tecnológica e regulamentação) e do maior
movimento financeiro nos mercados secundários.
Portanto, ao longo do período 2004-2007, na medida em que as atividades
econômicas prosseguiram sem choques e as expectativas acerca do bom desempenho da
economia e, particularmente, do mercado de títulos se confirmaram, algumas empresas se
sentiram seguras para captar recursos via emissão de títulos, seja com o intuito de
investirem ou de readequarem seu passivo. Pelas mesmas razões, os agentes do mercado
financeiro, otimistas com respeito às quase-rendas e às expectativas de valorização,
passaram a apostar em uma tendência ascendente do valor dos ativos reais e financeiros, de
forma que as altas margens de segurança que se mantiveram até 2003 (motivadas pelo
cenário econômico desfavorável), começaram a ceder espaço para o aumento da demanda
por recursos financeiros destinados aos investimentos, via crescimento do crédito e da
compra de títulos no MT.
Outra questão relevante para o entendimento dessa evolução do mercado de títulos
remete à compreensão da gênese do processo de expansão do volume de negócios nos
mercados primários e secundários de títulos. Uma característica marcante dos mercados
financeiros modernos é a inerente instabilidade das expectativas de curto prazo que regem
82
esses mercados. Trata-se do que se conhece como “efeito manada”, em que, mesmo que por
parte dos especialistas prevaleçam análises objetivas sobre o retorno esperado dos ativos,
em determinados momentos, especialmente em períodos de alta incerteza, é preferível
“seguir a manada” do que arriscar “perder sozinho” (CARVALHO et al., 2000).
O efeito manada”, embora quase sempre esteja associado à debandada de
investidores do mercado, também pode ser associado ao movimento oposto, ou seja, a
entrada dos investidores no mercado que, ao “seguirem a manada” esperam não serem os
únicos a não ganharem nada. Foi essa forma de otimismo que motivou o conjunto dos
agentes do MT a ampliarem suas negociações no mercado secundário e, conseqüentemente
as emissões de títulos, visto que, como já dito, em conjunturas de aquecimento da bolsa, em
que as ações existentes no mercado são transacionadas a cotações crescentes, é mais fácil
ofertar novas ações e vendê-las a uma cotação satisfatória, captando maior volume de
recursos.
Os agentes responsáveis por esse comportamento do mercado primário se dividiram,
basicamente, em dois grupos: empresas e grandes investidores (investidores estrangeiros,
bancos e investidores institucionais). Particularmente, os grandes investidores, ao decidirem
pela diminuição da sua liquidez financeira, aumentaram suas aplicações e,
conseqüentemente, a oferta de recursos no MT. As empresas, por outro lado, ao decidirem
pela realização imediata de novos investimentos, decidiram também pelo aumento das
atividades de lançamento de títulos no mercado primário e, conseqüentemente, pelo
aumento da demanda de recursos via MT.
Por fim, vale destacar que, enquanto no MC a trajetória do volume de recursos foi
definida, em maior medida, pelos ofertantes de recursos (bancos), no MT essa trajetória
dependeu tanto dos ofertantes quanto dos demandantes de recursos. Em outras palavras,
enquanto no MC o determinante da trajetória esteve basicamente na oferta de recursos, no
MT a trajetória foi dependente tanto de fatores relacionados à oferta quanto à demanda por
recursos.
3. A ATUAÇÃO DOS MERCADOS DE CRÉDITO E DE TÍTULOS NO
FINANCIAMENTO EMPRESARIAL NO BRASIL (1996-2007)
Nos capítulos anteriores, foram identificados: o período de crescimento recente do
volume de crédito e emissão de títulos, os principais acontecimentos econômicos que
83
marcaram esse período e os principais responsáveis pela trajetória do volume de recursos
nos mercados de crédito e de títulos no Brasil. Neste terceiro capítulo, a análise se
restringirá aos recursos destinados às empresas no Brasil, com o objetivo de apresentar as
principais características e distribuição setorial desses recursos. Com isso, espera-se
entender a atuação dos agentes responsáveis pela trajetória do volume de recursos
fornecidos pelo sistema financeiro, ao longo do período analisado, no financiamento de três
macro-setores que compõem a economia brasileira: indústria, comércio e serviços
49
.
A análise se concentrará no período 2000-2007, uma vez que, somente a partir de
2000, o Bacen passou a divulgar dados mais detalhados do mercado financeiro. Isso
porque, a partir daquele ano, o Bacen adotou uma nova metodologia de análise da trajetória
do crédito, na qual, além dos setores beneficiados, a origem dos recursos dos créditos
financeiros também passou a ser divulgada. Essa nova metodologia derivou de uma
programação para a implantação de medidas de redução do spread bancário, com o objetivo
de ampliação do volume de crédito na economia.
Dessa programação surgiu o projeto “Juros e Spread Bancário no Brasil”, o qual,
por meio de relatórios anuais, forneceu informações detalhadas sobre a evolução dos juros e
das operações de crédito bancárias, e sobre os componentes e determinantes do spread
bancário, no Brasil. Para a obtenção dessas informações, o Bacen passou a exigir das
instituições financeiras maiores detalhes sobre as operações de crédito de pessoas físicas e
jurídicas, por meio da Circular 2.957, de 30 de dezembro de 1999, sob a justificativa de
conferir maior transparência às operações bancárias e obter informações que permitissem a
criação de instrumentos para redução destes spreads bancários.
Dessa forma, as instituições financeiras passaram a fornecer diariamente, ao Bacen,
informações sobre as taxas médias ponderadas, taxas mínimas e máximas, valor liberado na
data-base, saldos em fim de mês, respectivos níveis de atraso e prazos dios das
principais modalidades de crédito concedidos, tanto para pessoas físicas quanto jurídicas
(BACEN, 2000a). Todas essas informações passaram a ser divulgadas pelo Bacen, e o
volume de créditos do sistema financeiro nacional começou a ser exposto, não pela
divisão de setores beneficiados, mas tamm pela origem dos seus recursos, os quais foram
49
Como já mencionado na introdução desta dissertação, o setor de agronegócios foi excluído da análise, tendo em vista as
particularidades do financiamento direcionado a esse macro-setor.
84
classificados em: livres (quando possuem taxas de juros livremente pactuadas entre os
mutuários e as instituições financeiras) e direcionados (com taxas estabelecidas em
programas ou repasses governamentais, geralmente destinadas aos setores rural,
habitacional e de infra-estrutura).
Em relação à distribuição setorial dos recursos, o período de análise será 2002-2007,
tendo em vista que os dados disponibilizados pelo BNDES relativos à distribuição setorial
(em volumes e não em desembolsos) estão disponíveis somente a partir de 2002, ano em
que foi realizada uma revisão das notas explicativas às demonstrações contábeis do Banco.
Na primeira seção deste capítulo, é apresentado o volume de recursos livres
utilizados pelas empresas no Brasil, dividido em modalidades de operações de crédito,
conforme classificação e organização do Bacen, disponíveis nos Boletins Anuais dessa
instituição. As modalidades são: Capital de Giro, Conta Garantida, Aquisição de Bens,
Vendor, Hot Money, Desconto de Duplicatas, Desconto de Nota Promissória,
Financiamentos Imobiliários, ACC, Export Notes, Resolução 63 e Outros. O objetivo é
visualizar detalhadamente o endividamento empresarial no Mercado de Crédito (MC), no
qual os principais agentes fornecedores de recursos são bancos comerciais e múltiplos.
Em seguida, é apresentado o volume de recursos direcionados utilizados pelas
empresas, no Brasil. Visto que a principal instituição nacional que oferece recursos para
financiamento com essa característica é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
e Social (BNDES), são utilizados os Relatórios Anuais e as informações disponíveis no site
dessa instituição, para a apresentação e análise do volume e fluxo (desembolsos) de
recursos disponibilizados pelo Banco e suas subsidiárias (FINAME e BNDESPAR). O
objetivo é visualizar a evolução desses financiamentos e complementar o estudo do
endividamento empresarial no MC.
Em um terceiro momento, a análise se concentrará no endividamento empresarial no
mercado de títulos, quando serão apresentadas as emissões primárias de ações, debêntures e
notas promissórias (commercial papers). Para a descrição dos volumes de recursos
disponibilizados por esses meios, são utilizados os Boletins do Banco Central do Brasil e os
dados disponíveis no site da BM&F Bovespa.
Em todas as subseções se procurará expor e analisar a distribuição desses recursos
aos macro-setores empresariais indústria, comércio e serviços, com o objetivo de verificar
85
quais os setores mais beneficiados por esses recursos, recentemente.
3.1 Evolução do volume de empréstimos com recursos livres para empresas no
Mercado Brasileiro de Crédito, no período 1996-2007: a atuação dos bancos
Características
Recursos livres são as fontes de recursos que as instituições financeiras dispõem
para a concessão de empréstimos às pessoas físicas ou jurídicas, que não são direcionadas,
por força de lei, a financiamentos de atividades ou projetos específicos. Esses recursos
representam a maior parte do volume total de financiamentos concedidos pelo SFN, ao
setor privado, como demonstra o gráfico abaixo.
Gráfico 11 – Operações de crédito do SFN por origem de recursos
Obs. Crédito Referencial PJ e PF referem-se a créditos com recursos livres para Pessoas Jurídicas e Pessoas Físicas.
Fonte: <www.bacen.gov.br> - elaboração própria.
As operações de crédito que se utilizam dos recursos livres, também conhecidas
como operações de crédito referencial para taxas de juros, são aquelas contempladas na
Circular nr. 2.957/1999 do Bacen, assim chamadas por serem formalizados com taxas de
juros livremente pactuadas entre os mutuários (contratados) e as instituições financeiras
(contratantes). Do seu conjunto, excluem-se as operações de crédito rural, de repasses do
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social ou quaisquer outras lastreadas
86
em recursos compulsórios ou governamentais.
Os bancos são as instituições financeiras especializadas no fornecimento de
operações de crédito dessa natureza. Esses agentes criaram, tanto para o financiamento de
pessoas físicas quanto jurídicas, várias modalidades e/ou linhas de crédito, que têm os
recursos livres como fonte. Dado que o interesse desta dissertação é o financiamento
empresarial, nossa apresentação se restringirá apenas às linhas voltadas às pessoas
jurídicas.
As principais linhas de crédito voltadas às empresas que têm como fonte os recursos
livres são, conforme classificação e organização do Bacen, disponíveis nos Boletins Anuais
dessa instituição: Capital de Giro, Conta Garantida, Aquisição de Bens, Vendor, Hot
Money, Desconto de Duplicatas, Desconto de Nota Promissória, Financiamentos
Imobiliários, Adiantamento de Contratos de Câmbio (ACC), Export Notes, Resolução 63
(Repasses Externos), além de Outras, de menor expressão. Neste capítulo, serão abordadas
todas essas linhas, com exceção dos financiamentos imobiliários que, por estarem
direcionados ao mercado imobilário, fogem aos objetivos deste trabalho.
Para uma melhor compreensão dessas modalidades de empréstimo, apresenta-se a
seguir uma breve descrição delas, seguindo as definições obtidas no site do Banco Central
do Brasil (www.bacen.gov.br) e comentários baseados em Jacob (2003), Assaf Neto (2001)
e Fortuna (2005):
Capital de giro:
São empréstimos que se destinam a financiar atividades operacionais da empresa
(capital de giro) e que são caracterizados por uma formalização contratual que estabelece as
condições básicas da operação, como garantias, prazos de pagamento, encargos financeiros
e valores. As garantias exigidas para operações dessa natureza são variadas (duplicatas,
avais, notas promissórias, hipotecas, etc.) e dependem do nível de risco calculado pela
instituição financeira e do relacionamento firmado entre essa e o tomador dos recursos.
Contas garantidas:
Assemelha-se ao cheque especial, pois, trata-se de uma conta paralela à conta-
corrente da empresa, que sofre débitos (tendo como contrapartida créditos na conta
corrente) e créditos (com a contrapartida de débitos na conta-corrente), conforme as
eventuais e urgentes necessidades de caixa do tomador. Os encargos financeiros são
87
calculados sobre o saldo devedor verificado durante o período de utilização dos recursos e
são cobrados do tomador uma vez ao mês.
Vendor:
É uma operação de crédito que permite a uma empresa vender seu produto a prazo e
transferir o direito de recebimento para o seu banco que, mediante uma taxa de juros, a
paga à vista, financiando a empresa compradora. A empresa vendedora garante a
compradora, assumindo o risco do negócio junto ao banco, contudo, a responsabilidade
principal do pagamento dos títulos ao banco é da empresa compradora, motivo pelo qual é
exigido que essa seja um agente com boas referências no mercado em que atua.
A principal vantagem desta operação para a empresa comercial vendedora é a
possibilidade de recebimento à vista das suas vendas a prazo, o que resulta em um menor
comprometimento do seu capital de giro. Para a empresa compradora, o interesse maior são
as taxas de juros cobradas pelo banco na operação, geralmente mais baixas quando
comparadas a outras modalidades de crédito (ver gráfico 12). A operação é formalizada
com a assinatura de um convênio, com direito de regresso entre o banco e a empresa
vendedora, e de um contrato de abertura de crédito entre as três partes (a vendedora, a
compradora e o banco).
Aquisição de bens:
Trata-se de uma modalidade operação de crédito inversa ao Vendor, motivo pelo
qual ela é popularmente conhecida como Compror. Nessa operação a dilatação do prazo
de pagamento da compra, sem envolver o vendedor. A empresa compradora, ao adquirir
determinado bem, vai ao seu banco e solicita financiamento para pagar essa aquisição. O
banco, ao conceder o crédito, paga diretamente o vendedor vista) e cobra a empresa
compradora, no prazo ajustado em contrato. O crédito está vinculado, portanto, à aquisição
de determinado bem que, quase sempre, constitui a garantia da operação.
Hot Money:
São operações de empréstimo de curto e curtíssimo prazo (média de 12 dias),
demandadas para cobrir desencaixes nos fluxos de caixa das empresas, principalmente,
folha de pagamento e encargos fiscais. As taxas do hot money são formadas com base nas
taxas de mercado interfinanceiro (taxa CDI) e são repactuadas diariamente.
Desconto bancário de títulos (duplicatas e promissórias):
88
São operações de crédito em que o banco concede um empréstimo mediante a
garantia de um título representativo de um crédito futuro (duplicatas ou notas
promissórias). Constitui-se, para a empresa contratante, em uma forma de antecipar o
recebimento das suas vendas ou serviços, por meio de cessão de seus direitos a um
mutuante (no caso, um banco). Nas operações de desconto bancário de tulos, a
responsabilidade final da liquidação do título negociado, caso o comprador (conhecido
como sacador) não pague no vencimento, é do tomador de recursos (conhecido como
cedente).
Financiamentos imobiliários:
São operações não vinculadas ao Sistema Financeiro de Habitação, que são
destinadas a financiar a aquisição, construção ou reforma de imóveis retomados,
adjudicados ou recebidos em dação de pagamento por força de financiamentos
habitacionais anteriores. Constituem-se em financiamentos específicos de instituições
financeiras captadoras de depósitos à vista, que operam com crédito imobiliário (inclusive a
Caixa Econômica Federal), conforme Resolução n. 2.789, de 30 de novembro de 2000
(BACEN, 2000). Como mencionado, dada a especificidade dessa modalidade de crédito,
não nos ateremos a ela em nossa análise.
Adiantamentos de Contrato de Câmbio – ACC:
São operações nas quais as instituições financeiras autorizadas a operar com
câmbio, com base em contratos de fornecimento firmados entre exportadores e
importadores, adiantam aos exportadores recursos financeiros em moeda nacional
equivalentes à quantia de moeda estrangeira que será gerada por uma futura exportação. Os
contratos devem conter, dentre outras coisas, o prazo para embarque da mercadoria que não
pode exceder o período de um ano. A operação objetiva financiar a produção e/ou
comercialização da mercadoria a ser embarcada para o exterior.
A operação recebe nome de ACC quando se refere ao financiamento da produção.
Quando a mercadoria está embarcada, a operação é chamada de ACE (Adiantamento
sobre Cambiais Entregues) e se assemelha ao desconto de duplicatas. Esta segunda
modalidade da operação pode ser solicitada ao banco até 60 dias após o embarque e tem
prazo para pagamento de até 180 dias, a contar da data de embarque da mercadoria.
Export Note:
89
O export note é um título representativo de uma operação de cessão de créditos de
exportação feita por uma empresa exportadora por conta do embarque que realizará no
futuro. Os direitos creditícios desse título são cedidos pelo seu proprietário a um tomador
(empresa ou banco) com o intuito de obter recursos para financiar a produção de
mercadorias a serem exportadas. Difere do ACC por não apresentar prazo para embarque.
Repasse de recursos externos – Resolução 63:
A operação de empréstimo regulamentada pela Resolução n. 63, do CMN, de
21/08/1967, constitui-se em um repasse de recursos captados em moeda estrangeira no
exterior, por bancos comerciais e múltiplos e/ou bancos de investimentos. Esses recursos
são obtidos pelas instituições financeiras por meio de empréstimos ou colocação de títulos
(bônus/eurobônus) nos mercados internacionais e repassados às empresas nacionais,
visando o financiamento de capital de giro e capital fixo dessas empresas. Para maior
segurança da operação, os bancos procuram repassar os recursos externos seguindo as
mesmas condições de prazo e de formação de taxas de juros no exterior.
Atualmente, em razão das constantes inovações financeiras desenvolvidas pelas
instituições financeiras nacionais e internacionais, existe um grande número de subprodutos
e/ou submodalidades derivadas dessas modalidades mais amplas de linhas de crédito. Para
os interesses desta dissertação, contudo, seria desnecessário apresentar todas as
submodalidades e suas características, motivo pelo qual nos restringiremos à análise dos
grandes grupos citados acima.
Todas as linhas mencionadas (com exceção dos financiamentos imobiliários) são
destinadas majoritariamente ao financiamento do capital de giro das empresas, visto suas
reposições serem exigidas no curto, ou ainda, às vezes, no curtíssimo prazo. A média diária
para pagamento de operações com recursos livres, entre junho de 2000 e dezembro de
2007, variou de 11,95 a 339,91 dias, refletindo a característica “curtoprazista” dessas
operações, como demonstra a tabela 14.
A característica “curtoprazista” desses empréstimos tem sido motivo de críticas,
muito tempo. Sochaczewski (1993, p. 26), em estudo de análise do sistema financeiro
brasileiro, entre os anos 1952 e 1968, destacava essa tendência, a partir da década de
1940:
“Durante a guerra, o crédito bancário esteve fora de controle e a inflação foi
seguida de perto por uma forte expansão de depósitos, que se elevaram em quase
90
quatro vezes entre 1939 e 1946 (...) A inflação crônica que acompanhou a
expansão dos bancos e da economia em geral teve uma conseqüência importante
que não seria solucionada, até a década de 60: a excessiva concentração bancária
nas atividades correntes (isto é, crédito de curto prazo) em detrimento do crédito
para investimento.”
Tabela 14 – Prazo médio diário consodidado* das operações de crédito com recursos
Livres/Referenciais para taxas de juros
(média dos dados contidos entre jun. 2000 e dez. 2007)
Hot money
Desconto de
duplicatas
Desconto de
notas
promissórias
Capital de
giro
Conta garantida
Repasses
externos
(resolução 63)
DIA
11,95
33,99
36,11
286,81
22,87
339,91
Aquisição de
bens - Pessoa
jurídica
Vendor ACC
Export
notes
Outras
operações -
Pessoa jurídica
DIA
284,87
78,07
112,06
229,29
149,28
* Envolve operações com taxas prefixadas, posfixadas, flutuantes e com base em índices de preços.
Fonte: Bacen (2008) - Elaboração própria
Carvalho (2003, p. 12), em artigo preparado para o Seminário do Desenvolvimento
promovido pelo IE/UFRJ, CEPAL e DDAS/UFRJ que analisou o sistema financeiro
brasileiro, destacou a continuidade dessa tendência do crédito bancário no período recente,
ao escrever que “[o] Brasil padece de carência de oferta de serviços financeiros no
segmento de médio e longo prazos ainda maior do que no de curto prazo.”
E, por fim, a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), em documento entregue
ao Presidente da República Luís Inácio Lula da Silva, em abril de 2003, destacou a
predominância de recursos de curto prazo no financiamento empresarial, como uma das
grandes dificuldades para o desenvolvimento do setor produtivo nacional. A CNI (2003)
acrescentou ainda, a esta dificuldade, outras que considerou fundamentais para o
entendimento do mau desempenho histórico do crédito no Brasil. Foram elas: as elevadas
taxas de juros dos empréstimos bancários e a insuficiência quantitativa dos créditos
fornecidos pelo Sistema Financeiro Nacional.
Essas duas dificuldades apontadas pela CNI foram amenizadas muito discretamente,
ao longo do período recente de crescimento do volume de crédito, após 2004. O primeiro
desses avanços foi verificado na trajetória da taxa de juros de cada uma das operações de
crédito referencial para taxa de juros PJ que, embora tímida, sofreu redução, sobretudo após
2005, conforme se observa no gráfico 12.
91
Gráfico 12 – Taxas de juros pré-fixadas por modalidade de operações com recursos
livres - 1996-2007 (em final de período)
Fonte: <www.bacen.gov.br> - Elaboração própria.
Da mesma maneira, o prazo dessas operações foi ampliado, amenizando (também
discretamente) a citada dificuldade de prazos para financiamento da necessidade de capital
de giro empresarial, como se observa no gráfico 13.
Gráfico 13 – Prazo médio diário consolidado das operações de crédito com Recursos
Livres (2002-2007)
Fonte: <www.bacen.gov.br> - Elaboração própria.
92
Essas duas melhoras qualitativas das operações de crédito referencial para taxa de
juros PJ, embora insuficientes para resolver o problema de crédito no Brasil, indicaram
alguma disposição dos bancos para ampliar o volume de crédito com fontes de recursos
livres, na economia brasileira. Essa disposição resultou da diminuição da preferência pela
liquidez dos bancos, nesse período, conseqüência também da redução do grau de incerteza
do mercado, após 2004. O gráfico 14 deixa evidente os resultados dessa maior disposição
dos bancos em emprestar recursos, ao mostrar a evolução desses recursos ao longo do
período 1996-2007.
Gráfico 14 – Saldos das operações de Crédito Referencial PJ (recursos livres)
1996-2007 (saldos de dezembro)
Fonte: Bacen (2008) – Elaboração própria.
Houve uma relativa estabilidade do volume desses créditos, no quadriênio 1996-
1999, seguida por uma elevação desse volume, a partir de 2000 e 2001, a qual se
estabilizou novamente até 2003, e, por fim, um crescimento mais consistente a partir de
2004, em virtude da redução do grau de incerteza e conseqüente diminuição da preferência
pela liquidez dos bancos. Infere-se, portanto, que as causas apresentadas no primeiro
capítulo para explicar as alterações na trajetória do crédito geral na economia brasileira,
afetaram também diretamente o fornecimento de crédito com recursos livres às pessoas
93
jurídicas. A tabela a seguir detalha a evolução desses recursos por modalidade de operações
e permite outras ponderações.
Tabela 15 – Volume de operações de crédito do SFN com Recursos Livres
Volume total por modalidade de operações (saldos de dezembro)
R$ milhões (valores constantes de 2007)
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007
Capital de Giro 23.790 25.070 24.579 26.003 26.841 33.320 39.508 40.335 45.779 55.455 70.839 97.428
Outros 11.866 12.098 13.174 12.892 30.973 35.598 28.605 24.561 28.699 33.249 37.162 46.568
Conta Garantida 12.297 15.782 16.138 17.648 24.352 29.929 27.115 26.865 28.566 32.021 34.320 39.135
ACC 21.371 22.435 19.448 24.810 28.079 31.116 33.489 31.567 27.359 25.692 26.335 30.841
Resolução 63 23.039 20.367 20.821 20.951 26.622 29.457 26.740 17.047 15.607 17.276 19.898 24.887
Aquisição de Bens 1.788 2.268 1.659 1.993 3.571 5.415 5.728 5.753 9.110 12.011 14.093 17.937
Desconto de Duplicatas 6.205 6.700 4.824 5.874 8.551 9.075 8.035 9.145 11.824 11.802 12.548 13.742
Vendor 8.642 8.025 6.862 7.820 10.498 10.251 10.515 9.651 11.673 10.756 10.837 10.968
Financiamento Imobiliários 0 0 0 0 4.344 1.184 908 675 486 656 767 1.146
Hot Money 3.891 1.545 1.133 1.185 946 696 816 656 447 505 371 675
Desconto de Nota Promisria 1.170 918 539 1.001 1.408 960 696 306 253 237 167 152
Export Notes 1.130 1.280 494 370 331 113 325 228 178 61 1 0
Total
115.188
116.486
109.671
120.547
166.516
187.115
182.480
166.789
179.980
199.720
227.336
283.479
Fonte: Bacen (2008)
Com o detalhamento das modalidades de crédito, percebe-se que houve uma
predominância das operações de Capital de Giro, Conta Garantida, ACC e Resolução 63, ao
longo de todo o período, mesmo com essas modalidades apresentando taxas de juros mais
elevadas do que as demais. A linha de crédito Capital de Giro, por exemplo, apresentou
taxa de juros média superior às médias das taxas das operações de aquisição de bens e
vendor, e ainda assim seus saldos foram superiores a essas duas, em praticamente todo o
período. Da mesma maneira, a linha de crédito Conta Garantida apresentou-se como a de
maior custo dentre todas as outras modalidades de crédito (gráfico 12) e, no entanto, foi a
segunda operação em volume de recursos.
Portanto, a suposição de que as taxas são fatores preponderantes para a decisão de
financiamento por parte das empresas, clássica em manuais de finanças (GITMAN, 2004),
não se sustentou no mercado de crédito brasileiro, no período analisado. O direcionamento
estratégico adotado pelos bancos ao uso dessas linhas, bem como as peculiaridades
operacionais de cada uma das linhas de crédito são, ou pelo menos foram, no período
recente, predominantes sobre as condições de preço/taxa de juros das operações e não
foram modificadas com a evolução recente do volume de crédito bancário na economia
94
nacional. As condições de oferta (estratégias dos bancos) foram superiores às condições de
demanda (busca por fontes mais baratas de crédito), ao longo de todo o período de
crescimento do volume de crédito.
Isso está em consonância com o entendimento de Chick (1994) e Minsky (1957) de
que os bancos desempenham papel decisivo no tocante a oferta de crédito, uma vez que são
eles que, em última análise, decidem as condições nas quais o crédito será disponibilizado.
Tanto a diminuição quanto a elevação do volume de crédito na economia, bem como o
preço ao qual este será ofertado, são definido pelas estratégias dos bancos, em conjunto
com as expectativas e estratégias dos demandantes de crédito (sendo esta última, menos
decisiva na decisão final).
Distribuição setorial
No tocante à distribuição setorial desses recursos, as informações disponibilizadas
pelo Bacen referem-se a créditos livres e direcionados somados, conforme exposto na
tabela 6 (no primeiro capítulo), o que não permite identificar a distribuição dos créditos
livres entre os diversos setores. Uma comparação entre essas informações e as
disponibilizadas pelo BNDES, que, teoricamente, permitiria calcular o montante de
recursos livres por atividade econômica (subtraindo do total disponibilizado pelo Bacen o
volume de operações por atividade econômica disponibilizado pelo BNDES), não é
possível, pois, o Bacen adota as convenções da Carta Circular nr. 2.903, de 23.03.2000,
para a setorização econômica das atividades, enquanto que o BNDES se utiliza da CNAE
(Classificação Nacional de Atividades Econômicas).
A solução para tal impasse é considerar os dados totais de operações de crédito por
atividade econômica (indústria, comércio e serviços), como uma aproximação da
distribuição setorial dos recursos livres. Embora não haja exatidão nessa análise, trata-se de
uma boa amostra, tendo em vista que o volume de recursos livres representou, em média,
60% do total de crédito ao setor privado, ao longo do período 2000-2007, como
demonstrado na tabela 16.
95
Tabela 16 – Percentual do volume de operações de crédito com recursos livres em
relação ao volume de operações com recursos livres e direcionados aos macro-setores
indústria, comércio e serviços (2002-2007)
R$ milhões (valores constantes de 2007)
Indústria Comércio
Outros
Serviços
TOTAL (a)
Crédito
Referencial PJ:
recursos livres
domésticos e
externos * (b)
Representatividade
de (b) em relação a
(a)
2000
139.198 51.514 74.889 265.600 162.172 61,06%
2001
148.712 54.809 90.136 293.658 185.930 63,32%
2002
155.234 54.065 91.585 300.883 181.572 60,35%
2003
143.170 53.010 87.987 284.168 166.114 58,46%
2004
142.527 62.555 90.608 295.690 179.494 60,70%
2005
149.704 69.508 106.864 326.076 199.064 61,05%
2006
171.921 81.931 126.938 380.790 226.570 59,50%
2007
213.901 97.661 156.232 467.794 282.333 60,35%
* Capital de giro, conta garantida, Resolução 63, Hot money, aquisição de receveis, Vendor, Descontos de
duplicatas e notas promissórias, ACC, export Notes e outros (exceto financiamentos imobiliários,
leasing
rural e outros)
Fonte: Bacen (2008) - Elaboração própria
Pode-se considerar, portanto, que a distribuição setorial dos recursos livres deu-se,
ao longo do período 2002-2007, aproximadamente, da seguinte maneira:
Tabela 17 - Volume de recursos financeiros do sistema bancário às atividades
empresariais indústria, comércio e serviços (2002-2007)
R$ milhões (valores constantes de 2007)
Saldos em 31 de dezembro
INDÚSTRIA
% do
total
COMÉRCIO
% do
total
SERVIÇOS
% do
total
TOTAL
2002
155.234
51,6%
54.065
18,0%
91.585
30,4%
300.883
2003
143.170
50,4%
53.010
18,7% 87.987 31,0% 284.168
2004
142.527 48,2% 62.555 21,2% 90.608 30,6% 295.690
2005
149.704 45,9% 69.508 21,3% 106.864 32,8% 326.076
2006
171.921
45,1%
81.931
21,5%
126.938
33,3%
380.790
2007
213.901 45,7% 97.661 20,9% 156.232 33,4% 467.794
Fonte: Bacen (2008) - Elaboração própria
A maior parte dos recursos se concentrou na indústria. O comércio ficou com o
menor percentual de utilização desses recursos. A falta de detalhamento desses dados em
subclasses de atividade econômica dificulta o entendimento dos motivos dessa distribuição,
porém, o que se pode dizer é que essa depende da estratégia dos bancos e que a estratégia
dos bancos no tocante à distribuição setorial não se alterou significativamente com a
96
evolução recente do crédito, pois, como se vê, a distribuição dos recursos entre os macro-
setores de atividade econômica permaneceu praticamente inalterada ao longo do período.
O que se nota é que houve apenas um pequeno aumento da participação do
comércio, após 2004. Tendo em vista que esse é o setor menos beneficiado pelo crédito
bancário ao longo do período (algo que se repete com os recursos do BNDES e no mercado
de títulos, como veremos adiante), o aumento da sua participação percentual no total do
volume de operações, após 2004, pode indicar uma demanda reprimida satisfeita, que se
aproveitou do momento de maior tolerância ao risco e menor preferência pela liquidez por
parte dos bancos, no Brasil. Contudo, vale destacar que, em termos de volume, a indústria
manteve-se como o setor preferido pelos bancos, durante todo o período.
3.2 Evolução do volume de financiamentos com recursos controlados para empresas
no Mercado Brasileiro de Crédito, no período 1996-2007: a atuação do BNDES
Características
Créditos controlados e/ou direcionados são aqueles que se utilizam de recursos que
recebem algum tipo de direcionamento alocativo inclusive taxas de juros por parte do
Estado, com o intuito de atender determinadas prioridades políticas em áreas específicas
como habitação, agricultura, infra-estrutura, comércio exterior, entre outros (TORRES
FILHO, 2006). Esses créditos têm representado, aproximadamente, um terço do saldo total
das operações de crédito disponíveis na economia nacional, mas com tendência de queda,
como demonstra o gráfico 15.
Em geral, as operações que fazem uso desses recursos possuem prazos mais longos
do que os empréstimos bancários convencionais, apresentados na seção anterior, pois são
direcionadas a empreendimentos com longa maturação (infra-estrutura, por exemplo) e/ou
cujo público alvo tenha capacidade de pagamento reduzida (crédito imobiliário para
construção de casas populares, por exemplo). Em razão dessas características, operações
dessa natureza são consideradas de risco elevado, o que evita, restringe ou mesmo impede,
a atuação do sistema financeiro privado neste segmento (ZENDRON, 2006).
Esses créditos são intermediados, na sua maioria, por bancos oficiais, com grande
destaque para a atuação do BNDES, que, desde 2001, tem sido responsável por
aproximadamente 60% do total de desembolsos de créditos direcionados (BACEN, 2007).
O BNDES destaca-se, portanto, como o principal instrumento do Governo Federal para os
97
financiamentos de médio e longo prazos, que tenham como objetivo o apoio a
empreendimentos que contribuam para o desenvolvimento do país. Dentre as prioridades
desse banco se destacam os financiamentos à indústria e aos setores de infra-estrutura, o
apoio às exportações brasileiras e o fomento às pequenas e médias empresas.
Adicionalmente, o BNDES contribui para o desenvolvimento do mercado de capitais e para
a formulação de políticas de desenvolvimento nacional e identificação de soluções para
problemas estruturais da economia brasileira (ZENDRON, 2006).
Gráfico 15 – Saldos de operações de crédito com recursos livres e direcionados
1996-2007 (saldos de dezembro)
Fonte: <www.bacen.gov.br> - Elaboração própria.
O BNDES foi criado em 20 de junho de 1952, pela Lei n. 1.628, com o nome de
BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico) e somente em 1982, por meio do
Decreto n. 1.940, de 25 de maio de 1982, passou a ser denominado BNDES. Com a Lei
5.662 e o Decreto n. 68.786, ambos de 21 de junho de 1971, o BNDES foi transformado em
empresa pública, dotada de personalidade jurídica de direito privado e patrimônio próprio, e
sujeito às normas gerais orçamentárias e contábeis e à disciplina normativa do Conselho
Monetário Nacional. Atualmente, é uma empresa pública federal vinculada ao Ministério
do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (SOCHACZEWSKI, 1993).
98
Apesar de algumas vezes operar de forma direta, é comum sua atuação ocorrer por
meio de agentes financeiros, como Bancos Comerciais, Bancos de Investimento e
Sociedades Financeiras, que atuam como co-responsáveis pelos financiamentos concedidos
e recebem uma comissão (chamada del credere) para executarem a intermediação. O
BNDES possui duas subsidiárias: a FINAME (Agência Especial de Financiamento
Industrial), cujo objetivo é apoiar o financiamento da compra de máquinas e equipamentos
e a exportação de bens de capital e serviços, e o BNDESPAR (BNDES Participações S.A.),
cuja função é investir em empresas nacionais através da subscrição de ações e debêntures
conversíveis. Em conjunto essas três entidades recebem o nome de Sistema BNDES
(ASSAF NETO, 2001).
O Sistema BNDES tem as características de um banco de desenvolvimento e, como
tal, não dispõe de depósitos como fonte de recursos para suas aplicações, característica essa
de bancos comerciais e/ou múltiplos. Segundo Zendron (2006), bancos de desenvolvimento
mobilizam recursos através de captações no mercado internacional (muitas vezes
envolvendo a transferência de recursos de países desenvolvidos para os países em
desenvolvimento), através de captações no mercado doméstico e através de diferentes
formas de mobilização de poupanças.
Todas essas formas de mobilização de recursos são utilizadas pelo Sistema BNDES,
cujas fontes são: Recursos Vinculados (Fundo da Marinha Mercante e Recursos do Tesouro
Nacional), Captações Institucionais (FAT Depósitos Especiais, Fundo Nacional de
Desenvolvimento e Organismos Internacionais), Ingressos Automáticos (FAT
Constitucional), Retornos Líquidos (contrapartidas de financiamentos concedidos),
Captações em Mercado (com o uso de instrumentos de renda variável, renda fixa, renda
fixa-bônus e empréstimos no mercado externo), além de Outras Entradas (ajustes de saldo
de fundos e programas especiais e fluxos de equalização no Tesouro Nacional)
50
Dentre essas fontes, as mais importantes em termos de volume são os Retornos
Líquidos, as Captações em Mercado e os Ingressos Automáticos, que juntos representaram
uma média de 75% do total de ingressos de recursos no Sistema BNDES, entre os anos
2000 e 2007. As três fontes possuem alto grau de flexibilidade na sua aplicação, ou seja,
50
Para maiores detalhes dessas fontes, ver Prochnik e Machado (2008).
99
não são vinculadas a destinação específica, como ocorre com o Fundo da Marinha
Mercante, por exemplo, que tem sua destinação vinculada ao financiamento de melhorias
em estaleiros brasileiros e a projetos de pesquisa e desenvolvimento científico voltados
somente para a marinha mercante (PROCHNIK; MACHADO, 2008).
Isso significa que o Sistema BNDES possui relativa liberdade de aplicação sobre
75% do total das suas fontes de recursos, podendo, teoricamente, financiar com esses
recursos quaisquer empreendimentos que considerar interessante, social e/ou
economicamente. Na prática essa decisão é um pouco mais complicada, pois, mesmo com a
alta flexibilidade dessas fontes, o enquadramento das operações propostas ao Sistema
BNDES sempre depende de duas condições básicas: 1) a existência de mérito do projeto
apresentado à luz de políticas públicas; e 2) a verificação de que a empresa proponente está
em um nível de risco de crédito considerado aceitável (BERGAMINI JUNIOR;
GIAMBIAGI, 2005), de acordo com os parâmetros estabelecidos pela Resolução do Bacen,
n. 2.682, de 21 de dezembro de 1999, que requer a análise periódica da carteira de crédito
da instituição e sua classificação em nove níveis de risco, sendo AA o risco mínimo e H o
risco máximo – ver tabela 5 (BACEN, 2008).
Dessa forma, para a concessão de crédito, o Sistema BNDES tem sempre que
compatibilizar os objetivos de desenvolvimento econômico e social (qualidade do projeto)
com medidas prudenciais relativas ao risco de crédito (qualidade do empreendedor). O
cruzamento dessas duas condições básicas implica no surgimento de quatro hipóteses
relacionadas à concessão ou não de financiamentos pelo Banco: a) empresas de baixo risco
implementando projetos meritórios, o que constitui situação ideal; b) empresas de alto risco
implementando projetos sem mérito, situação em que deve ser negado o enquadramento
51
;
c) empresas de baixo risco implementando projetos sem mérito, situação em que deve ser
negado o enquadramento; e d) empresas de alto risco implementando projetos de mérito,
situação em que se deve procurar meios de mitigação do risco ou, no limite, ser negado o
enquadramento (BERGAMINI JUNIOR; GIAMBIAGI, 2005).
Essas quatro hipóteses estão esquematizadas no quadro abaixo:
51
Enquadramento é definido como a pré-avaliação da adequação do pedido de apoio financeiro às políticas operacionais
do BNDES, conforme informação constante no site da instituição – www.bndes.gov.br.
100
Tabela 18 - Efeitos do trade-off risco x qualidade dos projetos nas decisões de
enquadramento do BNDES
Com Mérito Sem Mérito
Baixo
Enquadramento (situação ideal) Enquadramento Negado
Alto
Mitigar risco ou negar
enquadramento
Enquadramento Negado
RISCO
(qualidade do
empreendedor)
PROJETOS (qualidade do projeto)
Fonte: Elaboração própria a partir de Bergamini Junior e Giambiagi (2005)
Depreende-se deste quadro que o principal critério para a concessão de
empréstimos, pelo Sistema BNDES, está no mérito do projeto, ou seja, na relevância
econômica e social do projeto, ou ainda, na adequação dos objetivos do projeto às políticas
governamentais de desenvolvimento econômico e social. Interesse econômico e social dos
projetos é uma das características dos bancos de desenvolvimento que os distingue das
demais instituições financeiras (Zendron, 2006). Junto com esta característica, o fato de
os bancos de desenvolvimento atuarem em segmentos não atendidos pelas demais
instituições financeiras (em razão do risco elevado das operações e do predomínio de
operações de longo prazo) e a incapacidade de captação de recursos por meio de depósitos.
Esse conjunto de características dos bancos de desenvolvimento pode sugerir que esses
agentes seguem comportamentos diferentes dos demais bancos, quando se considera a
preferência pela liquidez em instituições bancárias.
Zendron (2006, p. 122) nega essa suposição ao afirmar que:
“(...) a preferência pela liquidez é um padrão de comportamento das instituições
financeiras que possuem ativos cuja realização está sujeita à incerteza e que, por
outro lado, assumem compromissos contratuais. Os bancos de desenvolvimento
(...) combinam estas duas características: a realização de seus ativos é incerta, em
especial dos empréstimos de longo prazo que possuem significativo risco de
crédito, e a captação de recursos de terceiros cria compromissos financeiros.”
Para a autora, portanto, bancos de desenvolvimento têm preferência pela liquidez e
esta se manifesta na necessidade que esses agentes têm em se manterem financeiramente
líquidos para honrarem as obrigações assumidas no mercado interno e externo (pagamentos
correntes, eventuais empréstimos de curto prazo e outros, referentes a serviços, inclusive
pagamentos de swaps e outros derivativos), de maneira a garantir a continuidade das
101
operações financeiras. Essa necessidade de liquidez permanente se constitui em um grande
problema, pois quase a totalidade dos recursos emprestados pelos bancos de
desenvolvimento é de longo prazo.
Como se sabe, quanto maior o prazo das operações, maior é a dificuldade de se
fazer previsões ou de se construir cenários para o fluxo de retorno desses recursos, tendo
em vista o maior grau de incerteza e o menor grau de confiança nas expectativas dos
agentes. Isso implica que, teoricamente, bancos de desenvolvimento têm elevada
preferência pela liquidez, tendo em vista a relação diretamente proporcional entre incerteza
e preferência pela liquidez (CARVALHO, 2005; FERRARI FILHO; CONCEIÇÃO, 2001),
e inversamente proporcional entre estado de confiança e preferência pela liquidez (PAULA;
ALVES JR., 2003). Isso implica que os desembolsos do Sistema BNDES devem, ou pelo
menos deveriam, seguir tendência semelhante à apresentada para os créditos com recursos
livres, a saber: estabilidade entre 1996-2003 (possivelmente, um aumento não consistente
no período 2000-2003) e crescimento consistente após 2004
52
.
Contudo, em um primeiro momento, o que se observa é que os desembolsos do
BNDES se mostraram instáveis ao longo de todo o período, apresentando picos de
crescimento nos anos 1997 (75% de evolução em relação a 1996) e 2002 (31,8% de
evolução em relação a 2001), com crescimento constante somente a partir de 2004, como
demonstra o gráfico 16.
Um olhar mais crítico desses desembolsos revela que esses picos de crescimento do
volume de recursos disponibilizados pelo Sistema BNDES estão associados às aplicações
em setores relacionados à infra-estrutura, com destaque para as empresas de geração,
transmissão e distribuição de energia elétrica; transporte; telecomunicações; e construção
civil, setores tradicionalmente privilegiados pelos bancos de desenvolvimento (Zendron,
2006, p. 117):
“Dentre os setores privilegiados pelos bancos de desenvolvimento destaca-se o
setor de infra-estrutura. Energia, transportes e telecomunicações são importantes
para todas as demais atividades do país. Entretanto, os prazos de maturação de
investimentos nestes setores são elevados, requerendo financiamentos
52
A semelhança mencionada se refere aos comportamentos do BNDES e dos bancos comerciais e não aos dados dos
volumes de crédito com recursos livres e dos desembolsos realizados pelo BNDES, tendo em vista que o primeiro se
refere a estoques e o segundo a fluxos, sendo inadequada uma comparação em termos de volume.
102
compatíveis. A necessidade de recursos de longo prazo tornou o setor de infra-
estrutura um foco tradicional dos bancos de desenvolvimento.”
Gráfico 16 – Sistema BNDES – Total de desembolsos anuais (1996-2007)
.
Fonte: <www.bndes.gov.br> - Elaboração própria.
Além desses setores, os de papel e celulose, metalurgia básica e agropecuária
também fizeram parte desses picos de desembolsos de recursos pelo BNDES, refletindo
outra preocupação das instituições oficiais, também destacada por Zendron (2006, p. 117)
“(...) a indústria está ao lado do setor de infra-estrutura nos setores que merecem
especial atenção das instituições. Bancos de desenvolvimento se preocupam com
a construção de uma base industrial competitiva e com o apoio a mudanças
estruturais de acordo com a estratégia de desenvolvimento dos governos”
Se descontarmos os desembolsos desses setores do total de desembolsos realizados
pelo Sistema BNDES, ao longo do período em análise, teremos uma trajetória bastante
diferente da apresentada no gráfico anterior (gráfico 16). Essa nova trajetória indica que
houve uma relativa estabilidade dos desembolsos dos recursos do Sistema BNDES, de 1996
a 2003, e um crescimento consistente desses recursos a partir de 2004. Pode-se dizer,
portanto, que foi a função social e desenvolvimentista do Sistema BNDES que contribuiu
para a trajetória irregular do volume de recursos desembolsados por ele, ao longo do
103
período em análise, e que, se descontados os efeitos dessa função, essa trajetória guarda
semelhança com a apresentada para os bancos comerciais.
Gráfico 17 – Sistema BNDES – Total de desembolsos anuais “ajustado”
(1996-2007)
.
Fonte: <www.bndes.gov.br> - Elaboração própria
A função social e desenvolvimentista do Sistema BNDES fica ainda mais evidente
quando se analisam suas fontes de recursos. De acordo com Prochnik e Machado (2008),
houve aumento, no período 1997-1998, das captações em mercado do BNDES em razão da
monetização de ativos de renda variável, aproveitando o ainda alto volume de recursos
internacionais na economia brasileira nesse período. Em valores constantes de 2007, houve
uma elevação de R$ 6,75 bilhões na fonte Captações de Mercado Renda Variável, nesse
período, e, de maneira geral, houve um aumento de R$ 17,7 bilhões, no total de ingressos
de recursos no BNDES.
Entre 2001 e 2002, em decorrência da crise de abastecimento de energia elétrica, o
Tesouro Nacional direcionou R$ 9,32 bilhões ao Sistema BNDES para o saneamento do
setor de eletricidade. Segundo Prochnik e Machado (2008, p. 29),
“(...) em 2002, a mudança no patamar dos ingressos de R$ 40 bilhões para R$ 60
bilhões, teve um caráter temporário e foi possibilitada pelo repasse de recursos do
104
Tesouro Nacional direcionados ao revigoramento do setor elétrico. Entretanto, a
manutenção nesse novo patamar não se perpetuou, já que os recursos que
retornaram desses financiamentos foram devolvidos ao Tesouro Nacional (...) a
partir de 2004 os ingressos totais assumiram trajetória crescente, com o aumento
relativo das captações em mercado, principalmente em operações de renda
variável”
Esses dados reforçam a afirmação de que a atuação do Sistema BNDES, quando se
excetuam as influências da sua função social e desenvolvimentista, se assemelha àquela
apresentada pelos demais bancos comerciais
53
. A razão dessa semelhança pode estar na
constatação de que o comportamento dos bancos de desenvolvimento também é baseado na
preferência pela liquidez e, conseqüentemente, sofre as conseqüências do grau de incerteza
percebido.
Dessa maneira, pode-se sugerir que, em função da ampliação da incerteza
fundamental do período 1996-2003 (relacionada ao cenário de constantes crises
internacionais) e das expectativas de altos riscos associados aos empréstimos presentes e
futuros, as expectativas dos agentes financeiros, dentre eles o BNDES, foram depreciadas e,
conseqüentemente, houve um aumento da preferência pela liquidez desses agentes. Esse
comportamento, quando analisado em relação aos ofertantes de crédito (bancos comerciais
e de desenvolvimento), indica, como já citado, racionamento de crédito, pois, quando as
expectativas dos banqueiros são pessimistas (incerteza e expectativa de altos riscos
elevadas), os bancos preferem liquidez à rentabilidade (CARVALHO, 1999).
Para o período 2004-2007, frente à melhora nas expectativas em relação ao
desempenho econômico, houve uma diminuição das incertezas e, conseqüentemente, da
preferência pela liquidez do BNDES (e dos bancos comerciais, como já analisado no
capítulo 1). Em que pese essa constatação, não se pode desprezar, contudo, a modificação
de objetivos com relação ao BNDES que se deu com a mudança de governo, em 2003, que
conferiu um novo realce ao papel dos bancos públicos, tanto comerciais como o de
desenvolvimento, ou seja, o BNDES (Camargo, 2009).
Para fazer frente a esse aumento dos desembolsos, tendo em vista que o Sistema
BNDES não pode captar depósitos, houve um aumento significativo das captações em
mercado de renda fixa e variável por parte do banco. Segundo Prochnik e Machado (2008,
53
A semelhança está nos comportamentos do BNDES e dos bancos comerciais, os quais se mostraram dispostos a
aumentar suas participações no endividamento dos agentes econômicos somente a partir de 2004. Essa semelhança não se
105
p. 29), o BNDES aproveitou a janela de oportunidades que se abriu nesse período “com o
bom desempenho da economia mundial e com a estabilidade da economia brasileira, que
viabilizaram a realização de ganhos sem precedentes na bolsa de valores”, e captou R$
39,39 bilhões entre 2004-2007, quantia bastante superior à que captou no quadriênio
anterior, 1999-2003 (R$ 21,77 bilhões
54
).
Distribuição setorial
Em termos de alocação setorial dos recursos disponibilizados pelo Sistema BNDES,
no período 2002-2007, vê-se uma concentração desses recursos no financiamento ao setor
de serviços, como demonstrado na tabela abaixo:
Tabela 19 - Volume de recursos financeiros do sistema BNDES às atividades
empresariais indústria, comércio e serviços (2002-2007)
R$ milhões (valores constantes de 2007)
Saldos em 31 de dezembro
INDÚSTRIA
% do
total
COMÉRCIO
% do
total
SERVIÇOS
% do
total
TOTAL
2002
39.265
69,2%
836
1,5%
16.629
29,3%
56.730
2003
34.725 45,9% 555 0,7% 40.425 53,4% 75.704
2004
32.223 43,2% 494 0,7% 41.876 56,1% 74.593
2005
31.500 41,9% 315 0,4% 43.435 57,7% 75.250
2006
32.226
41,6%
459
0,6%
44.826
57,8%
77.510
2007
36.199 46,7% 710 0,9% 40.544 52,3% 77.453
Fonte: <www.bndes.gov.br> - Elaboração própria
Os dados acima representam saldos em final de período e não desembolsos, como
os demais dados analisados até aqui. Isso significa que os dados dessa tabela representam
estoques de recursos e não fluxos (representados pelos desembolsos), como enfatizado
55
.
Eles, diferentemente dos desembolsos, não são divididos em subclasses, o que dificulta
uma análise mais apurada sobre qual sub-atividade teve maior responsabilidade pela
predominância dos recursos na atividade serviços.
Contudo, algumas conjecturas podem ser feitas, a partir dos desembolsos (fluxos)
relaciona aos dados dos volumes de crédito com recursos livres e dos desembolsos realizados pelo BNDES, tendo em
vista que o primeiro se refere a estoques e o segundo a fluxos, sendo inadequada sua comparação.
54
Em valores constantes de 2007.
55
Esses dados foram disponibilizados pela Central de Atendimento do BNDES, em consulta efetuada por e-mail, em 26 de
junho de 2008.
106
que, em última instância formam os saldos em final de período (estoques)
56
. Como foi
afirmado, os setores mais beneficiados pelos desembolsos do Sistema BNDES estão
associados às aplicações em setores relacionados à infra-estrutura, com destaque para as
empresas de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica; transporte;
telecomunicações; e construção civil, todos ligados a serviços. Além disso, os setores de
papel e celulose, metalurgia, química e agropecuária também apresentaram expressiva
participação no total dos recursos desembolsados pelo Sistema BNDES.
A tabela 20 mostra que, no período 2002-2007, esses setores apresentaram grande
participação percentual no total de recursos desembolsados pelo Sistema BNDES, sendo
responsáveis, em conjunto, por mais de 70% do total dos desembolsos realizados, como
havia sido assinalado, anteriormente.
Tabela 20 – Participação percentual das atividades empresariais mais representativas
no total dos desembolsos realizados pelo Sistema BNDES (2002-2007)
Em % do total dos desembolsos anuais
2002 2003 2004 2005 2006 2007
AGROPECUÁRIA
12,05% 13,70% 17,40% 8,64% 6,67% 7,70%
Agropecuária 12,05% 13,70% 17,40% 8,64% 6,67% 7,70%
IND. DE TRANSFORMAÇÃO
30,46% 32,62% 27,26% 31,35% 31,84% 20,61%
Coque,petróleo e combustível 0,49% 0,14% 0,18% 0,36% 2,71% 2,77%
Química 2,34% 3,15% 1,14% 2,16% 2,07% 2,90%
Metalurgia 2,72% 2,97% 1,86% 2,91% 4,21% 4,81%
Celulose e papel 3,40% 1,28% 2,64% 3,01% 4,51% 2,79%
Veiculo reboque e carroceria 3,90% 7,92% 6,47% 10,04% 10,11% 4,72%
Outros equip transporte 17,60% 17,16% 14,97% 12,86% 8,23% 2,62%
COMÉRCIO E SERVIÇOS
36,12% 31,73% 37,39% 35,25% 34,08% 44,09%
Eletricidade e gas 23,66% 15,40% 16,73% 13,61% 9,33% 12,42%
Construção 2,04% 2,43% 3,06% 3,58% 3,00% 4,82%
Comércio 2,97% 4,61% 2,18% 1,99% 3,56% 3,97%
Transporte terrestre 5,71% 8,54% 11,29% 12,51% 14,03% 17,68%
Telecomunicações 1,75% 0,75% 4,13% 3,56% 4,16% 5,21%
TOTAL
78,63% 78,05% 82,05% 75,24% 72,59% 72,40%
Fonte: elaboração própria a partir dos dados disponíveis em <www.bndes.gov.br>
* Classificação Nacional de Atividades (CNAE)
Isso implica que, em um universo de quarenta e cinco subclasses de atividade
56
Saldos em final de período são formados pelas concessões (desembolsos), mais a apropriação de encargos financeiros,
menos as amortizações realizadas em cada período (LUCCHESI, 2008).
107
empresarial, consideradas pelo Sistema BNDES, doze foram responsáveis por 70% do total
dos desembolsos, o que sugere, uma vez mais, que foram essas que concentraram o volume
de recursos nos macro setores serviços e indústria, como destacado na tabela 19.
Esses resultados indicam, como sabido, que o BNDES, por ser um banco de
desenvolvimento, tem concentrado seus recursos em setores ligados à infra-estrutura, com
destaque para energia, transportes e telecomunicações. Como destacou Zendron (2006), em
virtude dos prazos de maturação de investimentos nestes setores serem elevados, a
necessidade de recursos de longo prazo torna o setor de infra-estrutura um foco tradicional
dos bancos de desenvolvimento, não sendo o BNDES uma exceção a esta regra.
Como afirma Nascimento (2003, p.114):
“O papel de um banco de desenvolvimento, como é o BNDES, em um projeto de
desenvolvimento coordenado para o país, exigirá estímulos a setores de infra-
estrutura e tecnologia, com maiores riscos intrínsecos e maior incerteza, mas com
grandes externalidades positivas para toda a economia e, portanto, taxas de
retorno social superiores às privadas (...)
Além disso, os dados disponibilizados pelo BNDES revelam que, além de
concentrados em poucos setores de atividade econômica, os recursos disponibilizados pelo
Sistema também estiveram concentrados nas grandes empresas (gráfico 18). A classificação
por porte empresarial adotada pelo BNDES, considera a receita operacional bruta (ROB)
anual
57
da empresa como critério de diferenciação, sendo classificada como microempresas
aquelas com ROB anual (ou anualizada) de até R$ 1.200 mil, pequena empresa, ROB
superior a R$ 1.200 mil e inferior ou igual a R$ 10.500 mil, média empresa, ROB superior
a R$ 10.500 mil e inferior ou igual a R$ 60 milhões e grande empresa, ROB superior a R$
60 milhões.
O que se nota com o gráfico 18 é que, em volume de recursos desembolsados, as
empresas cujo ROB anual supera R$ 60 milhões se mantiveram, ao longo dos últimos doze
anos, como as maiores consumidoras dos recursos do Sistema BNDES, apresentando
participação média em todo o período de aproximadamente 80% dos recursos totais (de
1996 a 1999 esta participação foi ainda maior, ficando em torno de 85% e 88%, em todos
57
Considera-se receita operacional bruta anual como a receita auferida no ano-calendário com o produto da venda de bens
e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não
incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos (www.bndes.gov.br).
108
os anos). Isso revela que, além de direcionar grande parte dos seus desembolsos para os
setores de infra-estrutura (em especial, energia elétrica, transporte e telecomunicação), o
Sistema BNDES privilegiou o financiamento de grandes empresas.
58
Gráfico 18: Sistema BNDES – desembolsos anuais por porte de empresa (1996-2007)
em % do total
Obs.: de 1996 até 1998 os desembolsos para micro-pequenas empresas contém os valores desembolsados para
pessoas físicas. A partir de 1998, o BNDES apresenta esses dados separados.
Fonte: <www.bndes.gov.br> - Elaboração própria
Por fim, vale destacar que, em termos de alocação de recursos, a atuação do BNDES
após o período de crescimento do volume de crédito, em 2004, assim como ocorreu com os
bancos comerciais, também não sofreu alterações significativas.
3.3 Evolução das emissões primárias de títulos privados no mercado brasileiro de
títulos: a atuação da Bolsa de Valores
Distribuição setorial
Sobre a trajetória das emissões primárias de títulos privados, bem como sobre suas
principais características, foram feitas considerações suficientes no capítulo dois. Sendo
58
Essa informação pode ser redundante, pois as empresas dos setores de infra-estrutura também se enquadram como
grandes empresas nos critérios do BNDES. No entanto, o que se quer indicar é que a maior parte dos recursos do BNDES
é direcionada para grandes empresas.
109
assim, nesta seção o foco estará em discutir a distribuição setorial dos principais títulos
(ações, debêntures e notas promissórias) emitidos no Mercado de Títulos (MT) nacional. Os
“outros títulos”
59
não são considerados nesta análise, ou por serem direcionados ao
financiamento de setores muito específicos, como o setores imobiliário, no caso da CRI, ou
áudio e vídeo, no caso do CIA, ou por estarem vinculados a atividades financeiras
(securitização), como no caso do FDIC, QFI e QFFI, (sendo difícil avaliar se os recursos
captados por esses meios foram direcionados ou não ao financiamento empresarial), ou
ainda, por sua baixíssima participação no total das emissões, como no caso das emissões de
FMIEE e QFI .
Como não informações esquematizadas sobre a distribuição setorial das
emissões primárias de títulos, no MT nacional, para a realização deste trabalho, foram
coletadas no site da Comissão de Valores Mobiliários (www.cvm.gov.br) informações
sobre o valor das emissões de ações, debêntures e notas promissórias, relativas a cada uma
das empresas emissoras.
Em seguida, classificamos as empresas emissoras entre os macro-setores indústria,
comércio e serviços, baseados nos critérios adotados pela Classificação Nacional de
Atividades Econômicas (CNAE)
60
. Após isso, os valores relativos às emissões dos títulos
citados foram deflacionados com base no IPCA e consolidados por tulos e por macro-
setor de atividade econômica. Foram excluídas dessa consolidação as empresas de leasing,
tendo em vista que os títulos (na maior parte, debêntures) emitidos por essas empresas não
constituem uma operação pica de mercado de capital, sendo na realidade uma captação
bancária disfarçada (FUNDAP, 2008; ver nota de rodapé 48).
Com isso, na tabela 21, visualizam-se os valores das emissões primárias de ações,
debêntures e notas promissórias, ao longo do período 2002-2007, divididos entre os macro-
setores de atividade econômica indústria, comércio e serviços.
59
CTEE (Certificado a Termo de Energia Elétrica), CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários), FIDC (Fundo de
Investimento em Direitos Creditórios), CIA (Certificado de Investimentos Audivisuais), TIC (Títulos de Investimento
Coletivo), QFI (Quotas de fundo Imobiliário), QFFI (Quotas de Fundo Fechado de Investimento), QF (Quotas de
Funcine), CDA (Certificado de Depósito de Ações), FIP (Fundo de Investimento em Participações) e FMIEE (Fundo
Mútuo de Investimentos em Empresas Emergentes).
60
Tabela foi obtida no site da Receita Federal do Brasil (http://www.receita.fazenda.gov.br/PessoaJuridica/CNAEFiscal
/txtcnae. htm), em 13 de junho de 2009.
110
Tabela 21 – Emissões primárias* no mercado de títulos, divididas entre as atividades
indústria, comércio e serviços (2002-2007)
R$ milhões (valores constantes de 2007)
INDÚSTRIA
% do
total
COMÉRCIO
% do
total
SERVIÇOS**
% do
total
TOTAL
2002
7.253
37,7%
670
3,5%
11.311
58,8%
19.234
2003
2.627
28,6%
18
0,2%
6.532
71,2%
9.177
2004
4.901 26,4% 262 1,4% 13.373 72,1% 18.536
2005
4.790 22,1% 991 4,6% 15.853 73,3% 21.634
2006
16.042 36,5% 635 1,4% 27.254 62,0% 43.931
2007
15.645 27,8% 1.751 3,1% 38.964 69,1% 56.360
* emissão de ações, debêntures e notas promissórias.
** exceto empresas de leasing
Fonte: elaboração própria a partir dos dados obtidos em <www.cvm.gov.br>
Nota-se que as emissões de títulos, ao longo do período 2002-2007, também se
concentraram mais intensamente em empresas ligadas ao setor de serviços e, em menor
medida, à indústria. De maneira semelhante ao que ocorreu com os desembolsos do
BNDES, as sub-atividades relacionadas a esses setores estiveram associadas à infra-
estrutura, com destaque para as empresas de geração, transmissão e distribuição de energia
elétrica, além de transportes e telecomunicações. Ademais, os setores de papel e celulose,
metalurgia, química e petróleo/combustível também apresentaram expressiva participação
no total de emissões primárias de ações, debêntures e notas promissórias, como demonstra
a tabela 22.
Tabela 22 – Participação percentual das atividades empresariais mais representativas
no total de emissões primárias de ações, debêntures e notas promissórias (2002-2007)
Em % do total
2002 2003 2004 2005 2006 2007
IND. DE TRANSFORMAÇÃO
34,68% 27,36% 25,89% 18,83% 8,05% 3,26%
Coque, petróleo e combustível 11,87% 0,92% 0,92% 6,80% 1,73% 2,36%
Química 0,00% 0,87% 16,53% 4,63% 1,19% 0,36%
Metalurgia e Siderurgia 15,59% 23,56% 3,44% 7,40% 4,24% 0,00%
Celulose e papel 7,21% 2,00% 5,00% 0,00% 0,89% 0,54%
COMÉRCIO E SERVIÇOS
46,28% 66,71% 54,05% 55,87% 49,75% 49,59%
Transportes 0,62% 1,17% 8,47% 11,99% 4,78% 1,30%
Eletricidade e gas 27,89% 42,18% 19,46% 30,11% 28,92% 15,79%
Construção 0,00% 1,27% 0,00% 0,89% 4,68% 17,33%
Telecomunicações 17,77% 22,09% 26,12% 12,88% 11,37% 15,17%
TOTAL
80,95% 94,07% 79,93% 74,70% 57,80% 52,85%
Fonte: elaboração própria a partir dos dados obtidos em <www.cvm.gov.br>
* Classificação Nacional de Atividades (CNAE)
111
A representatividade dos setores de eletricidade e telecomunicações merece
destaque, pois, ao longo dos seis anos considerados na tabela acima, esses setores
apresentaram concentrações (nas emissões) maiores do que os outros seis setores (também
de expressiva representação entre o total) somados. Isso indica, de forma similar ao que
aconteceu com os desembolsos do BNDES, uma concentração de recursos no
financiamento de poucos setores ligados, majoritariamente, à infra-estrutura e, mais
especificamente, aos setores de eletricidade e telecomunicações, a despeito da queda
acentuada desta concentração, sobretudo em 2006 e 2007.
Esta queda no percentual de participação desses setores verificada nos últimos dois
anos (2006 e 2007) está relacionada às recentes emissões primárias de empresas ligadas ao
setor de alimentos, como a Perdigão (R$ 920 milhões em ações) e Vigor (R$ 50 milhões
em debêntures), em 2006, e Marfrig (R$ 684,25 milhões em ações), Perdigão (R$ 1.035
milhões em ações) e JBS (R$ 1.200 milhões em ações), em 2007. Além disso, grandes
emissões individuais de empresas não ligadas aos setores de infra-estutura ocorreram
nesses anos, como no caso da Vale (R$ 5.500 milhões em ações), em 2006, e BNDESPAR
(R$ 1.350 milhões em debêntures) e Itaú Seguros (R$ 2.025 milhões em debêntures), em
2007.
Assim, esses dados não invalidam a afirmação sobre a concentração de recursos do
mercado de capitais em apenas alguns setores e, além disso, indicam que o mercado de
capitais nacional tem sido viável apenas para poucas e grandes empresas, de maneira
similar ao que ocorre com os recursos do BNDES. Fica latente, portanto, a ineficiência do
financiamento de longa maturação no Brasil, visto que, embora este tenha apresentado
evolução real, após 2004, a citada concentração de recursos em basicamente três setores,
indica que não se tem financiado com recursos de longa maturação outros investimentos
também importantes, como os intensivos em tecnologia (informática, materiais eletrônicos,
fármacos e química fina, por exemplo), e outros ligados à indústria pesada (máquinas e
equipamentos) e as necessidades sociais (saúde, educação, cultura, etc.).
Por fim, vale notar que, em termos de alocação setorial, não houve grandes
mudanças na estrutura das emissões de títulos, após o crescimento das emissões primárias,
iniciado em 2004. A atividade econômica mais beneficiada continuou a ser serviços e as
emissões continuaram reservadas a poucas e grandes empresas.
112
CONCLUSÃO
Este trabalho apresentou a evolução do mercado de crédito no Brasil, no período
1996-2007, e identificou tendências para cada um dos períodos analisados que, em síntese,
foram: estabilidade da trajetória do volume de crédito entre 1996-2003 e crescimento a
partir de 2004. A estabilidade do primeiro período (1996-2003) foi reflexo tanto da
tendência de postergação das decisões de investimento das empresas e de consumo das
famílias, sobretudo de bens de maior valor unitário, quanto (e principalmente) do
conservadorismo da política econômica e dos bancos, além da seletividade desses últimos
na concessão de novos empréstimos.
Uma interpretação a partir dos conceitos pós-keynesianos de preferência pela
liquidez e avaliação de riscos por parte dos bancos, considerou que esse posicionamento de
conservadorismo e seletividade dos bancos na concessão de novos empréstimos foi, por usa
vez, resultado da maior preferência pela liquidez desses agentes diante da elevação das
incertezas, agravada pelas crises e pelas condições desfavoráveis predominantes nos
cenários externo e interno, traduzidas em contração de financiamentos internacionais e
volatilidade da taxa de câmbio, com repercussões adversas sobre os níveis da atividade
econômica, das taxas de juros e do nível de preços.
Os efeitos das medidas adotadas pelas autoridades monetárias no sentido de reduzir
incertezas do mercado (PROES, PROER, FGC, controles internos pelas instituições do
SFN, Resolução 2.493, abertura do setor financeiro ao capital estrangeiro, entre outras) e,
conseqüentemente, reforçar a participação do sistema financeiro no desenvolvimento do
país, causaram apenas leves aumentos do volume de crédito em determinados momentos e,
em outros, algumas pequenas reduções desse volume, de forma que não se mostraram
capazes, no geral, nem para reduzir e nem para aumentar de forma significativa o volume
de recursos financeiros, ao longo do período analisado.
A partir de 2004 teve início o tão esperado crescimento do volume de operações de
crédito, com destaque para as operações ao setor privado, em todos os níveis. O volume de
operações para o setor público, por sua vez, apresentou leve decréscimo, nesse período,
sem variações atípicas que merecessem maiores comentários. Ao longo do quadriênio
2004-2007, houve forte crescimento (67,6%) do volume de crédito do sistema financeiro ao
setor privado e baixo decréscimo desses recursos ao setor público.
113
Além disso, vimos que as políticas econômicas, no Brasil, ao longo do período
1996-2007, não foram capazes de isolar o país aos choques internacionais, no que tange ao
crescimento econômico, o qual se manteve baixo quando comparado ao crescimento
econômico médio mundial, mas, sobretudo, quando cotejado ao dos países em
desenvolvimento. No entanto, a política econômica conseguiu certo isolamento do país
quanto a crises externas e a fortes surtos inflacionários, dado que a inflação anual, medida
pelo IPCA, manteve-se abaixo de dois dígitos em todos os anos do período 1996-2008, com
exceção de 2002.
Concluiu-se parcialmente que esse conjunto de atitudes indicou uma predominância
das condições do ambiente econômico sobre as medidas políticas direcionadas à melhora
do desempenho do mercado, de forma que essas condições foram a base para os agentes
(bancos, principalmente) formarem suas expectativas. Em outros termos, os fatos indicaram
que os agentes econômicos atuantes no mercado de crédito, durante o período 1996-2007,
formaram suas expectativas baseados intensamente nas condições macroeconômicas, não se
devendo menosprezar a extrema relevância da política econômica excessivamente
conservadora, que adotou políticas contracionistas, ao longo de todo o período.
No tocante ao mercado de títulos e, mais especificamente, à evolução do mercado
primário de títulos, os efeitos iniciais da abertura financeira na segunda metade da década
de 1990 não foram significativos. O período 1997-2003 foi marcado pelo decréscimo do
número e volume de emissões primárias de ações e dos principais de tulos de dívida. A
principal razão desse desempenho parece estar associada à mudança das expectativas
(instáveis) dos agentes frente ao crescimento da incerteza sobre o futuro da economia
brasileira.
Ao longo do período 2004-2007, na medida em que as atividades econômicas
prosseguiram sem choques e as expectativas acerca do bom desempenho da economia e,
particularmente, do mercado de títulos se confirmaram, os agentes do mercado financeiro,
otimistas com respeito às quase-rendas e às expectativas de valorização, passaram a apostar
em uma tendência ascendente do valor dos ativos reais e financeiros, de forma que as altas
margens de segurança que se mantiveram até 2003 (motivadas pelo cenário econômico
desfavorável) começaram a ceder espaço, a partir de 2004, para o aumento da demanda por
114
recursos financeiros destinados aos investimentos, via crescimento do crédito e da compra
de títulos no Mercado de Títulos.
No último capítulo discutiu-se sobre a alocação setorial dos recursos ofertados pelos
mercados de crédito e de títulos ao longo do período 2000-2007, com o intuito de
identificar se houve mudanças significativas na estrutura desses mercados após o período
de expansão.
Em relação aos créditos livres, cujos ofertantes são predominantemente bancos
comerciais, a maior parte dos recursos se concentrou na indústria. O comércio ficou com o
menor percentual de utilização desses recursos. A falta de detalhamento desses dados em
subclasses de atividade econômica dificultou o entendimento dos motivos dessa
distribuição, porém, foi possível dizer que a estratégia dos bancos no tocante à distribuição
setorial não se alterou significativamente com a evolução recente do crédito, pois, como se
viu, a distribuição dos recursos entre os macro-setores de atividade econômica permaneceu
praticamente inalterada ao longo do período.
No tocante os créditos controlados, com atuação predominante do BNDES, o que se
notou foi que os setores mais beneficiados pelos desembolsos do Sistema BNDES estão
associados à infra-estrutura, com destaque para as empresas de geração, transmissão e
distribuição de energia elétrica; transporte; telecomunicações; e construção civil, todos
ligados a serviços. Além disso, os setores de papel e celulose, metalurgia, química e
agropecuária também apresentaram expressiva participação no total dos recursos
desembolsados pelo Sistema BNDES.
Esses resultados indicaram, como sabido, que o BNDES, por ser um banco de
desenvolvimento, tem concentrado seus recursos em setores ligados à infra-estrutura. Além
disso, os dados disponibilizados pelo BNDES revelaram que, além de concentrados em
poucos setores de atividade econômica, os recursos disponibilizados pelo Sistema também
estiveram concentrados em grandes empresas, ou seja, em empresas com ROB anual
superior a R$ 60 milhões. Portanto, além de direcionar grande parte dos seus desembolsos
para os setores de infra-estrutura (em especial, energia elétrica, transporte e
telecomunicação), o Sistema BNDES privilegiou o financiamento de grandes empresas.
Eem termos de alocação de recursos, a atuação do BNDES após o período de crescimento
do volume de crédito, em 2004, assim como ocorreu com os bancos comerciais, também
115
não sofreu alterações significativas.
No tocante as emissões de tulos, ao longo do período 2002-2007, houve
concentração dos recursos em empresas ligadas ao setor de serviços e, em menor medida, à
indústria. De maneira semelhante ao que ocorreu com os desembolsos do BNDES, as sub-
atividades relacionadas a esses setores estiveram associadas à infra-estrutura, com destaque
para as empresas de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, além de
transportes e telecomunicações. Ademais, os setores de papel e celulose, metalurgia,
química e petróleo/combustível também apresentaram expressiva participação no total de
emissões primárias de ações, debêntures e notas promissórias.
Além da concentração de recursos do mercado de capitais em apenas alguns setores,
ele tem sido viável apenas para poucas e grandes empresas, de maneira similar ao que
ocorre com os recursos do BNDES. Ficou latente a ineficiência do financiamento de longa
maturação no Brasil, visto que, embora este tenha apresentado evolução real, após 2004, a
citada concentração de recursos em basicamente três setores, indica que não se tem
financiado com recursos de longa maturação outros investimentos também importantes,
como os intensivos em tecnologia (informática, materiais eletrônicos, fármacos e química
fina, por exemplo), e outros ligados à indústria pesada (máquinas e equipamentos) e as
necessidades sociais (saúde, educação, cultura, etc.).
Por fim, vale notar que, em termos de alocação setorial, não houve grandes
mudanças na estrutura das emissões de títulos, após o crescimento das emissões primárias,
iniciado em 2004. A atividade econômica mais beneficiada continuou a ser serviços e as
emissões continuaram reservadas a poucas e grandes empresas.
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