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HAMILTON MACHADO
IMAGENS DO COMÉRCIO ANAPOLINO NO JORNAL “O
ANÁPOLIS” (1930-1960): A CONSTRUÇÃO DA MANCHESTER
GOIANA
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOS
GONIA - GO
2009
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HAMILTON MACHADO
IMAGENS DO COMÉRCIO ANAPOLINO NO JORNAL “O
ANÁPOLIS” (1930-1960): A CONSTRUÇÃO DA MANCHESTER
GOIANA
Disser
tação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em História da Universidade
Católica de Goiás, como parte dos
requisitos para obtenção do título de Mestre
em História, Área de Concentração: Cultura
e Poder.
Linha de Pesquisa: Identidade, Tradições e
Territorialidades
Orientadora: Prof. Dra. Adriana Mara Vaz
de Oliveira
GOIÂNIA - GO
Janeiro/2009
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HAMILTON MACHADO
IMAGENS DO COMÉRCIO ANAPOLINO NO JORNAL “O
ANÁPOLIS” (1930-1960): A CONSTRUÇÃO DA MANCHESTER GOIANA.
Dissertação defendida no curo de Mestrado em História da Universidade Católica de
Goiás, apresentada em ___________de ________________de 2009, pela Banca
Examinadora constituída pelos seguintes professores:
________________________________________
Profª Dra. Adriana Mara Vaz de Oliveira (UCG)
________________________________________
Profº Dr. Eliezer Cardoso de Oliveira (UEG)
_______________________________________
Profª Dra. Elane Ribeiro Peixoto (UCG)
_______________________________________
Professora Dra. Heloisa Selma Fernandes Capel (UCG)
Suplente
3
AGRADECIMENTOS
A Deus, que permitiu que o sonho fosse realizado.
À esposa e companheira Bertila Martins de Souza, a meus filhos Wagner,
Fagner, Calebe e Ana Beatriz, pelo amor, incentivo e confiança durante este percurso.
Aos professores do Curso de Mestrado em História da UCG, que transmitiram
com sabedoria os conhecimentos históricos no decorrer do curso.
À orientadora dessa dissertação, professora Adriana Mara Vaz de Oliveira, pela
indicação de livros e textos que me ajudaram a elaborar este trabalho, pelas orientações
valiosas, pela paciência, estímulo e confiança.
À professora Teresinha Mendes Marra, meus sinceros agradecimentos.
À professora rcia Metran de Mello, pelo incentivo na escolha do tema.
Ao pessoal do museu Histórico de Anápolis, Irene Rodrigues de Oliveira e Jairo
Alves Leite, pela presteza no atendimento.
4
RESUMO
A década de 1930 foi rica na produção de imagens. No Brasil, o cenário foi de
mudanças nas ordens política, social e econômica, com a chegada ao poder do governo
Getúlio Vargas. Esse período registrou uma nova dinâmica para a economia nacional,
graças à penetração do capital no interior do país. Em Goiás, a imagem que marcou o
período foi a entrada da estrada de ferro no território goiano, puxada pela produção
cafeeira. Com relão a Anápolis, o ano de 1935 ficou registrado na memória como o ano
da chegada do trem à cidade e, com ele, a modernidade e o progresso. Esse período foi
identificado como o momento de hegemonia do setor terciário, em que houve grande
impulso na troca de mercadorias e serviços. O propósito deste estudo foi captar a imagem
da cidade comercial construída a partir da narrativa do jornal O Apolis e do conjunto de
fotografias do acervo do Museu Histórico de Anápolis. A proposta era, por meio das
imagens publicadas semanalmente, enxergar a evolução e a permanência da materialidade
urbana e, valendo-se da análise dos anúncios, perceber as diferentes maneiras utilizadas
pelo jornal para representar o comércio para o consumidor, além de verificar a relação
entre as metáforas divulgadas pelo jornal O Anápolis e a construção do comércio na
imaginação social da cidade.
Palavras-chave: Anápolis, comércio, imagens, imaginário, jornal O Anápolis.
5
ABSTRACT
In the 1930s is rich in the production of images. In Brazil was the scene of changes in
political, social and economical, with the arrival to power of the government Getúlio Vargas.
This period recorded a new momentum for the national economy, through the penetration of
capital into the country. In Florida the picture that marked the period was the entrance of the
railway in the territory Goias, pulled by coffee production. By Anápolis for the year of 1935,
was recorded in the memory as the year of arrival of the train into town and with it the
modernity and progress. That period of time identified as the hegemony of the tertiary sector,
where there was great momentum in the exchange of goods and services. The purpose of this
study was to capture impressions of the city business built from the narrative of The Journal
Abeokuta, and as a counterpoint photos from the collection of the Museum of History
Ahmadabad. Through pictures, we propose to see the evolution and permanence of urban
materiality. From the analysis of the ads, understand the different ways used by the newspaper
to represent the trade to the consumer, and check the relationship between metaphors disclosed
by the newspaper The Ashburton, and the construction of trade in the social imagination of the
city.
Key-words: Anápolis, trade, images, imagination, newspaper O Anápolis.
6
Lista de Figuras
Figura 1 Museu Histórico de Anápolis...................................................................15
Figura 2 Gravura do Largo de Santana das Antas (1888.)..................................... 24
Figura 3 Mapa da Vila de Santana das Antas em (1902)....................................... 25
Figura 4 Mapa da evolução espacial de Anápolis (1897,1907, 1935)................... 28
Figura 5 Rua Getúlio Vargas (1920) atual Achiles de Pina................................... 31
Figura 6 Artegráfica AS, Editora do Jornal O Anápolis (1935)............................ 43
Figura 7 Rua 15 de Dezembro (1932).................................................................... 49
Figura 8 Rua 15 de Dezembro (1935).................................................................... 51
Figura 9 Festa da chegada do trem de ferro em 1935.............................................56
Figura 10 Desfile vico de 7 de setembro de 1935.................................................57
Figura 11 Casa Luziana (1935)................................................................................ 58
Figura 12 Rua Antonio Carlos atual Manoel D’Abadia (1936)............................... 59
Figura 13 Rua 14 de Julho esquina com A rua Barão de Cotegipe (1937).............. 60
Figura 14 Rua Achiles de Pina (1939)......................................................................63
Figura 15 Praça da Estação, final da década de 1930...............................................65
Figura 16 Logística de embarque e desembarque, estação ferroviária (1940)..........66
Figura 17 Mapa da evolução e ocupação espacial de Apolis (1940/1950)...........68
Figura 18 Anúncio de venda de loteamento (1945)..................................................70
Figura 19 Anúncio de venda de loteamento (1947)..................................................71
Figura 20 Atual Hotel Itamarati (1948).....................................................................72
Figura 21 Escola de Enfermagem (1944)..................................................................73
Figura 22 Casa de Saúde Nossa Senhora de Lourdes (1946)....................................74
Figura 23 Vista da Região Central de Anápolis (1945).............................................75
Figura 24 Sociedade Comercial de Automóveis (1955)............................................80
Figura 25 Posto Ford (1947)..................................................................................... 80
Figura 26 Posto Ford (1948)......................................................................................81
Figura 27 Posto Ford (1955)......................................................................................81
Figura 28 Cia Goiana de Armazéns (1943).............................................................. 83
Figura 29 Banco Imobiliário e Mercantil do Oeste Brasileiro (1945)...................... 85
Figura 30 Banco de Cdito Real de Minas Gerais ................................................. 85
Figura 31 Palhaço Carijó (1943)...............................................................................88
Figura 32 Rádio Karajá (1946)..................................................................................89
Figura 33 Manifestação contra a carestia (1947)......................................................91
Figura 34 Sala de aula do SENAI de Anápolis (1952).............................................94
Figura 35 Rua 15 de Dezembro (1949).....................................................................94
Figura 36 Chácara das Rosas, propriedade de Carlos de Pina...................................96
Figura 37 Rua Engenheiro Portela (1950)............................................................... 97
Figura 38 Sobrado (1955)........................................................................................ 98
Figura 39 Palacete localizado na rua Firmo de Velasco (1955).............................. 99
Figura 40 Mapa da evolução de ocupação espacial de Apolis (1940-1960)...... 100
Figura 41 Rua Antonio Carlos atual Manoel D’Abadia (1955)............................ 102
Figura 42 Largo do Bom Jesus (1935).................................................................. 104
Figura 43 Largo do Bom Jesus (1938).................................................................. 104
Figura 44 Igreja e Praça Bom Jesus (1955)........................................................... 104
Figura 45 Praça João Pessoa (1943)...................................................................... 105
7
Figura 46 Prefeitura Municipal de Anápolis (1940-70)........................................ 105
Figura 47 Mercado Municipal (1952).................................................................... 106
Figura 48 Rua Engenheiro Portela (1957)................................................................106
Figura 49 Rua Barão do Rio Branco, 1960.............................................................107
Figura 50 Rodovia Anápolis-Goiânia (1948)..........................................................112
Figura 51 Transporte Harmonia (1950)...................................................................113
Figura 52 Expresso Brasil Ltda. e Expresso Planalto (1955)..................................114
Figura 53 Expresso Planalto, 1945......................................................................... 114
Figura 54 Rua Manoel D’Abadia (1960).................................................................116
Figura 55 Indicador Profissional (1935)..................................................................121
Figura 56 Anúncio de seção comercial....................................................................122
Figura 57 Anúncio de serviços (1937)....................................................................123
Figura 58 Anúncio de serviços do jornal O Anápolis (1946)..................................124
Figura 59 Anúncio de biotônico Fontoura (1944).................................................. 126
Figura 60 Anúncio da sal de frutas Eno (1950)...................................................... 126
Figura 61 Anúncio de Emulsão de Scott ............................................................... 126
Figura 62 Anúncio de elixir de combate a sifillis (1935)........................................129
Figura 63 Anúncio da casa comercial Rainha da Barateza (1940)......................... 129
Figura 64 Anúncio de roupa masculina das lojas Renner (1951)............................130
Figura 65 Anúncio de roupa feminina das lojas Renner (1951)..............................130
Figura 66 Anúncio da loja A Esmeralda (1951)......................................................131
Figura 67 Anúncio da loja Branco & Preto Cine Foto (1955)................................ 131
Figura 68 Anúncio de automóvel Chevrolet (1940)................................................135
Figura 69 Anúncio de automóvel Plymouth (1954)................................................136
Figura 70 Anúncio do Jeep Willys (1954).............................................................. 136
Figura 71 Anúncio de automóvel Ford (1954)....................................................... 137
Figura 72 Anúncio da Cia Silva Duarte (1946)...................................................... 137
Figura 73 Anúncio Cardoso & Irmão (1946)......................................................... 139
Figura 74 Anúncio deveis e arquivos Amaral (1951)...................................... 140
Figura 75 Anúncio da Sociedade Comercial de Automóveis (1951)..................... 143
Figura 76 Anúncio de geladeira “Frigidaire” (1952).............................................. 143
Figura 77 Anúncio para a senhora frigidaire (1957).............................................. 144
Figura 78 Anúncio de produtos Walita (1959)........................................................144
Figura 79 Casa Ideal (1954)....................................................................................146
Figura 80 Armazém Badauy (1954)........................................................................146
Figura 81 Lojas Marrocos (1955)............................................................................147
Figura 82 Abraão Besborodco (1955).....................................................................148
Figura 83 Oliveira Alfaiate (1955)..........................................................................149
Figura 84 Alfaiataria A Caprichosa (1956).............................................................149
Figura 85 Empório das Sedas (1955)......................................................................150
Figura 86 Casa Bom Dia (1955)..............................................................................150
Figura 87 Casa Brasil (1955)...................................................................................151
Figura 88 Casa Silva (1956) ...................................................................................152
Figura 89 Casa Silva (1956)....................................................................................152
Figura 90 Casa Santa Luzia (1957).........................................................................154
Figura 91 Sapataria Ritz (1960).............................................................................. 155
Figura 92 A Jóia (1955)........................................................................................... 155
Figura 93 Casa Odeon (1955).................................................................................. 155
Figura 94 A sapataria Caraja(1957 ).......................................................................156
Figura 95 Casa Buri(1960 )......................................................................................156
8
Figura 96 Cine Santana(1960).................................................................................157
Figura 97 Bar ARCAG (1957) ...............................................................................157
Figura 98 Café Três Poderes(1960).........................................................................158
9
Lista de quadros
Quadro 1 Comerciantes de Anápolis (1935)...............................................................32
Quadro2 Empresas comerciais de árabes por número de habitantes
(1930-1960.............................................................................................................................
...34
Quadro 3 Licenciamento de prédios em Anápolis (1940-43)....................................67
Quadro 4 População urbana e rural de Anápolis (1930-1960)....................................99
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..........................................................................................................12
1 APOLIS VISÍVEL: O REGISTRO DA CIDADE............................................ 23
1.1 Anápolis e o comércio: nasce uma cidade.............................................................23
1.1.1 Chegaram os “batrícios”.................. ....................................................................33
1.2 Criar e divulgar imagens: o jornal O Anápolis ...................................................37
2 A INVEÃO DA CIDADE COMERCIAL...........................................................46
2.1 Olha o trem: vem chegando a Ribeirão Preto de Gos...................................... 46
2.2 Próxima parada: Terra da Promissão...................................................................64
2.3 O trem passou, o ônibus chegou. Destino: Brasília..............................................96
3 A ENTRONIZÃO DO COMÉRCIO: A MANCHESTER GOIANA............118
3.1 Chegou a miss Frigidaire..................................................................................... 118
3.2 Vende-se de tudo a qualquer preço: Compre nas casas ... ................................145
3.2.1 Hóspedes e viajantes: o corcio na coluna social.............................................159
3.3 As metáforas e o imaginário.................................................................................162
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 172
FONTES CONSULTADAS....................................................................................... 175
REFENCIAS...........................................................................................................178
11
INTRODUÇÃO
A motivação do pesquisador é essencial para a realização de um trabalho
acadêmico, uma vez que irá lidar com indícios, com fragmentos dos fatos, e um
minucioso trabalho de investigação irá conduzi-lo ao resultado esperado. momentos
de angústia causados pela fluidez do tempo, também momentos de alegria e êxtase
quando começa a encontrar as ligações entre as pistas deixadas pelo homem no tempo. É
sua motivação que o impele ao trabalho, à ação como foa motriz de si mesmo.
também as motivações geradas pela curiosidade e pela inquietação do
pesquisador, mas há aquelas que surgem num instante mágico como se sua memória fosse
iluminada pelo flash de uma câmera fotogfica, que deixa gravada a imagem de forma a
instigá-lo.
Neste trabalho, a investigação inicial levou o pesquisador a surpreender-se com
o olhar fixo num texto do jornal O Anápolis do início da cada de 1940, no qual estava
nítida a manchete: “Anápolis a Ribeirão Preto de Goiás”. Continuando a leitura do
mesmo jornal, agora de anos posteriores, mais especificamente 1949 e 1951, deparou-se
com outra metáfora da cidade: “Anápolis, a Terra da Promissão”. A leitura continuava
instigante, pois eram fragmentos da história da cidade que visualizava naquelas páginas
nas quais se misturavam notícias, anúncios, coluna social e algumas poucas imagens. Ao
folhear mais edições, encontrou um poema, ou melhor, dois poemas que exaltavam
Anápolis como a “Manchester Goiana”. Essas metáforas foram a chave do quebra-cabeça,
mas ainda faltava alguma coisa mais concreta para justificar essas comparações sobre
Anápolis.
Como forma de acalentar esta inquietação, pôs-se a fazer uma caminhada pelas
ruas centrais da cidade, como se estivesse andando sobre uma cartografia elaborada
subjetivamente com base em um mapa imaginário. Começa então a circular pelos
caminhos traçados pelas ruas, num movimento de ir e vir, dialogar com os espaços até
juntar seus passos a todos aqueles que iam apressadamente a um evento que nem ele
mesmo sabia qual era. No diálogo consigo mesmo, não percebe onde está, quando, de
repente, se no meio de um burburinho constante provocado por pessoas que
transformam o cotidiano aparentemente desorganizado pela confusão dos pedestres, dos
12
autoveis, dos vendedores ambulantes, dos comerciários elegantemente vestidos, da
propaganda distribuída na calçada, das filas intermináveis nas portas dos bancos.
Tentando fugir desse movimento, visualiza uma escapatória pelas ruelas e becos,
o sobe e desce de escadas e elevadores fazendo valer a racionalização do tempo. Nesse
momento, lembra-se das meforas encontradas no jornal, pois elas indicam a ligação com
o movimento que visualiza no setor central de Anápolis. Este movimento vem desde o
tempo dos tropeiros quando se pensava em construir, nesta rego, um ponto de troca
de mercadorias para abastecer outras localidades. A mesma motivação para o comércio
continuou nas primeiras décadas do século XX, quando apareceram as primeiras casas
comerciais como a Batuta e a Rainha da Barateza, iniciando um movimento que
culminaria com a chegada da estrada de ferro à Anápolis.
A chegada da estrada de ferro, em 1935, promoveu o alargamento das
oportunidades de trabalho e de novos investimentos na região de Anápolis. Esses são
pontos fundamentais para a discussão da pesquisa, no sentido de explicar a existência de
um comércio diversificado, dinâmico e forte, mesmo tendo que competir, no início da
década de 1940, com Goiânia e com Brasília a partir de 1960.
Este estudo teve como objetivo central compreender como foi edificada a
imagem de Anápolis como cidade comercial, discutida aqui com base nos indícios
históricos que apontaram para a formação do comércio na cidade. Pretendeu-se observar
como foi sendo construída essa imagem e, ao mesmo tempo, avaliar a sua permanência no
tempo, limitado ao período de 1930 a 1960. O objeto desta análise foram as fotografias,
os textos e os anúncios do jornal O Anápolis. Para responder ao objetivo desta
investigação, foram levantadas algumas perguntas que se procurou responder no decorrer
deste trabalho.
O primeiro questionamento foi no sentido de saber como foram construídas as
imagens do comércio anapolino no jornal O Anápolis nos anos de 1930 a 1960. Como o
comércio foi percebido na articulação do conjunto de imagens anúncios e textos do
jornal  e nas conexões tecidas entre esse conjunto de imagens e as fotografias do Museu
Histórico? A pesquisa ainda indicou outras formas de representar o comércio e,
consequentemente, construí-lo no imaginário da cidade. Como o jornal O Anápolis, por
meio de textos, fotografias, artigos e anúncios, representou o comércio em sua
diversidade? Quais foram as imagens utilizadas nessa construção?
13
Uma resposta hipotética foi levantada e trouxe a indicação de que, durante as
décadas de 1930-1960, o jornal O Anápolis contribuiu para a construção do imaginário de
Anápolis como cidade comercial por meio de seus textos, artigos, fotografias, impressões
de hóspedes e viajantes e de seus anúncios. Ao mesmo tempo, o comércio era a
representação do progresso e da modernidade para a cidade e tamm garantia de
emprego e de possibilidades de ascensão social para seus habitantes. Para a realização da
pesquisa, partiu-se da análise de textos, fotografias, poemas, impressões de hóspedes e
viajantes e anúncios do jornal O Anápolis, complementados por fotos do arquivo do
Museu Histórico.
O museu ou o “lugar de memória”, conforme denomina Pierre Nora (1993), é
pensado como um espaço de difusão da história do país e de seu povo. Nesse sentido o
museu é repleto de símbolos geradores de imagens que, por extensão, permitem captar
algumas das sensações perdidas num dado passado. Portanto, o museu, aquele
denominado histórico ou patrimonial, por intermédio de seus fragmentos de memória,
pode proporcionar ao espectador que o visita noções e informações sobre seu aparato
museal. Isso porque a peça de museu, ou de casa-museu, o es ali para reproduzir o
mundo e a vida, mas, como afirmou Menezes (2002, p. 23), “[...] é uma maneira de
representar [...] o mundo, os homens, as coisas, as relações sociais do cotidiano”. O
museu lida com o que está presente (o acervo) e não com aquilo que esausente. Assim,
o Museu de Anápolis, denominado histórico, reproduz um pouco da história do povo
anapolino.
O Museu Histórico foi criado pela Portaria 261, de 24 de setembro de 1971,
pelo então prefeito municipal Henrique Santillo. Situa-se na Rua Coronel Batista 323,
no centro, em casa doada pelo neto do Cel. Zeca Batista, o Sr. Alderico Borges de
Carvalho, que lançou a ideia de criação do museu e fez a doação do antigo solar.
O imóvel (Figura 1), em estilo colonial, possui 11 cômodos e está erigido em
terreno de 411m², as janelas e portas são de madeira, possui três portas voltadas para a
rua, preservando a meria do seu antigo residente, José da Silva Batista, comerciante,
ex-deputado, ex-governador de Goiás e der da emancipação política que elevou a Vila
de Santana das Antas à categoria de cidade em 1907.
14
Figura 1 - Casa do coronel Zeca Batista, transformada em museu em 1971.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
O Cel. Zeca Batista faleceu em 1910, mas sua família continuou morando na
casa até o início da década de 1930, quando foi vendida à Igreja Católica e passou a
sediar o Colégio Paroquial Dom Bosco. Na década de 1940, foi residência do nego
Trindade. Em 1959, o neto materno do Cel. Batista adquiriu o solar com o intuito de
torná-lo um centro de memória de seu avô no município.
No início de 1991, por meio da Lei Municipal 1824, o ex-prefeito Anapolino
de Faria determinou o tombamento de alguns prédios históricos pertencentes ao
município de Apolis, entre eles o do museu que passou a integrar o patrimônio histórico
municipal.
No ano de sua criação, em 1971, foi designada uma comissão organizadora do
museu, sendo presidente o professor Jan Magalinski. Essa comissão recebeu, nesse
período, um grande mero de objetos que hoje fazem parte de seu acervo. Dessa
comissão organizadora participavam Tauny Mendes e James Fanstone, entre outros.
James Fanstone era dico e participou ativamente da vida cultural de Anápolis. Foram
ministrados cursos de inglês e alemão nas dependências do museu, tendo como professor
Ernest Heeger.
Todavia, somente no dia 26 de julho de 1975, o museu foi aberto definitivamente
à comunidade, na gestão do ex-prefeito Jamel Cecílio. Jan Magalinski tornou-se o
primeiro diretor da instituição e, desde então, o museu contribui para o resgate da
memória da cidade, sendo um espaço de investigão, interpretação, mapeamento da
documentação e preservação cultural de Anápolis. A fonte documental e iconográfica
utilizada neste estudo foi pesquisada no acervo do Museu Histórico, tendo como um dos
suportes teóricos a noção de representação proposta por Chartier:
15
[...] a realidade é contraditoriamente construída pelos diferentes
grupos que compõem uma sociedade; em seguida, as práticas que
visam a fazer reconhecer uma identidade social, a exibir uma maneira
própria de ser do mundo, a significar simbolicamente um estatuto e
uma posição, enfim, as formas institucionalizadas e objetivas em
virtude das quais representantes” (instâncias coletivas ou indivíduos
singulares marcam de modo visível a existência do grupo, da
comunidade ou da classe. (2002, p. 15-17).
Por meio da contradição imposta pelo tempo, os grupos constroem sua
identidade, fazendo valer suas idéias e seus valores como forma de dar significado ao
grupo a que pertencem.
Também Baczko (1985, p. 308) forneceu base para a compreensão do imaginário
social “[...] como construção da imaginação humana no sentido de dar sentido às coisas”.
As imagens constituem uma interessante forma de evidência histórica. Segundo Burke
(2004, p. 17), “[...] elas registram atos de testemunho ocular”. O testemunho ocular
remete à ideia de que o artista ou fotógrafo presenciaram os acontecimentos registrados
nas imagens, sejam elas obra de arte ou fotografia.
Como todas as ações humanas o passíveis de questionamentos relacionados
com sua veracidade, idoneidade, confiabilidade e autenticidade, assim também o
testemunho ocular de imagens levanta muitos problemas dessa natureza. Para Burke
(2004, p. 18), “[...] as imagens são testemunhas mudas, é difícil, pois, traduzir em
palavras o seu testemunho. “Elas podem ter sido criadas para comunicar uma mensagem
própria”. O historiador ou outro pesquisador, em dado momento do estudo, ignora essa
mensagem e passa a ler as entrelinhas e captar aquilo que os pintores, por exemplo,
desconheciam estar revelando.
No percurso de uma investigão em que se utilizam as imagens como fontes,
Burke (2004, p. 18) salienta que “[...] é necesrio, como no caso de outros tipos de fonte,
estar consciente das suas fragilidades”. No meio da pesquisa histórica, a crítica tem sido
bastante intensa em relação à confiabilidade e à autenticidade do texto produzido. O
historiador ainda argumenta “[...] que se tratando da crítica de evidência visual,
permanece pouco desenvolvida, no campo da pesquisa histórica”. E completa: “o
testemunho de imagens, como o dos textos, suscita problemas de contexto, função
retórica, recordação, testemunha de segunda mão”.
Em relação à evidência e à confiabilidade que as imagens têm para uma
investigação histórica não muito distante no tempo e espaço do pesquisador, será
necessário observar os exemplos demonstrados por Burke (2004, p. 21): “[...] os esboços,
16
por exemplo, desenhos a partir de cenas reais da vida e libertos dos constrangimentos do
grande estilo são mais confiáveis como testemunhos, do que são as pinturas trabalhadas
posteriormente no estúdio do artista”. Em outras palavras, pode-se dizer que, em
determinados momentos, uma cena do cotidiano, registrada em uma fotografia, gravura,
esboço ou pintura, pode apresentar aspectos muito mais significativos do que se houvesse
sido produzida em estúdio, longe dos acontecimentos. O estúdio pode criar a ideia de
afastamento do teatro social, no qual as cenas da trama do cotidiano o se
desenvolvendo.
A fotografia, por sua vez, representa um resíduo do passado, ou como disse
Kossoy (2001, p. 45), “[...] um artefato que contém em si um fragmento determinado da
realidade registrado fotograficamente”. Nesse sentido, as fotografias oferecem indícios
quanto aos elementos históricos de constrão da cidade, implícitos nos prédios
residenciais, comerciais, nas ruas e praças. Por intermédio da fotografia, pode-se
identificar a técnica, o estilo, a arquitetura utilizada em épocas diferentes. É importante
perceber que toda fotografia foi produzida com uma finalidade: retratar um personagem
(público ou anônimo) ou o andamento de obras de implantação de rodovias, estrada de
ferro, praças, ruas, um prédio em obras ou em reforma, ou mesmo a abertura de uma casa
comercial. Segundo Kossoy (2001, p. 48), esses registros fotográficos que “[...] foram
produzidos com a finalidade documental - representarão sempre um meio de
conhecimento, e conterão sempre seu valor documental, iconogfico”.
A intenção, ao se analisar as fotografias do arquivo do Museu Histórico de
Anápolis, foi captar as impressões das pessoas que registraram, intencional ou
espontaneamente, acontecimentos vividos pela cidade nas décadas de 1930-1960. A
proposta era também analisar as motivações que levaram o jornal O Anápolis a publicar
determinada fotografia (do comércio, de festa religiosa, de prédios, de paisagens, de ruas,
de automóveis) nesse período, bem como a ênfase dada aos visitantes que aqui chegavam,
destinando-lhes a primeira página do jornal.
Para a análise do significado das imagens, o ponto de partida foi os conceitos de
Iconografia e Iconologia propostos por Panofsky (1995), buscando entender o significado
de cada artefato, bem como a sua finalidade naquele momento em que foi construído.
Para este autor, “Iconografia é o ramo da História da Arte que trata do tema ou mensagem
das obras de arte em contraposição à sua forma, e a Iconologia seria a interpretação do
historiador desta contraposição” (1995, p. 21-22). Neste caso, a análise iconográfica tem a
17
finalidade de detalhar sistematicamente e inventariar o conteúdo da imagem em seus
elementos icônicos formativos. O assunto registrado é perfeitamente situado no espaço e
no tempo, sendo possível sua identificação. A Iconologia, como um todo de
interpretação, constitui a interpretação síntese. Essa seria a contribuição da teoria
panofskyana como suporte teórico para a compreensão histórica das imagens.
O todo elaborado por Panofsky, conforme demonstrou Burke (2004, p. 45),
distingue três níveis para a interpretação iconográfica e iconológica. O primeiro desses
níveis é a descrição pré-iconográfica voltada para o significado material e consiste na
identificação de objetos (árvores, prédios, animais e pessoas, por exemplo) e eventos
(refeições, batalhas, procissões etc.). O segundo nível é a análise iconográfica no sentido
estrito, voltado para o significado convencional, ou seja, reconhecer o que se na
imagem. O terceiro e principal nível é a interpretação iconológica, que se distingue da
iconografia por se voltar para o significado intrínseco, em outras palavras, busca verificar
a intenção da imagem.
É no vel iconológico que se encontra o ponto chave em que, segundo Burke
(2004, p. 45), “[...] as imagens oferecem evidência útil de fato indispensável para
historiadores culturais”. É importante ressaltar que a análise de determinada imagem não
deve ser realizada com finalidade em si mesma, mas deve estar sempre a serviço de uma
proposta de estudo.
Para Burke (2004, p. 21), “[...] independentemente de sua qualidade estética,
qualquer imagem pode servir como evidência histórica. Mapas, pratos decorados, ex-
votos, manequins encontrados têm alguma coisa a dizer”. As imagens selecionadas para
esta pesquisa variam entre textos, anúncios e fotografias existentes nos arquivos do jornal
O Anápolis, complementadas pelo arquivo de imagens do Museu Histórico Alderico
Borges de Carvalho. São, em sua maioria, fotografias em preto-e-branco.
Esta pesquisa não questiona as potencialidades e fraquezas da Iconografia e
Iconologia, limita-se a adotar o método iconográfico a fim de captar os pontos relevantes
das imagens para o historiador e, a partir daí, ir além das explicações objetivas. Além das
imagens veiculadas no jornal O Anápolis, o avaliadas as fotografias do acervo do
Museu Histórico de Anápolis que mostram a cidade. A adoção do método objetivou
ampliar a análise e abarcar outros enfoques que possibilitassem enxergar além da
superfície da imagem.
18
Sempre have dificuldade na interpretação de determinada imagem, às vezes
porque sua mensagem se encontra oculta, ou seja, não visível na leitura superficial. Neste
caso é preciso fazer a leitura interpretativa da imagem porque ela expressa outros
significados ou evidências não percebidas pelo artista ou fotógrafo, seus produtores ou
idealizadores. Do outro lado está o leitor, o pesquisador tendo que dar significado à
representação da imagem. Segundo Burke:
O historiador necessita ler nas entrelinhas, observando os detalhes
pequenos, mas significativos incluindo ausência significativa
usando-os como pistas para informações que os produtores de
imagens não sabiam que eles sabiam, ou para suposições que eles
estavam conscientes de possuir. (2004, p. 238).
Este trabalho exige tempo e disposição do pesquisador.
No mundo contemporâneo, a imprensa é um dos veículos nos quais essas
representações se manifestam por meio de discursos, imagens, ideias, anúncios e palavras
de ordem que chegam à coletividade e, dependendo do “[...] capital simbólico que
carregam, podem elencar formas de percepção e, por conseguinte, alterar o pensar e o agir
desta coletividade” (BOURDIEU, 2002, p. 133). Portanto, o jornal é um veículo por meio
do qual as relações humanas são mediadas por um conjunto de representações capazes de
construir o mundo social. Essas relações também se configuram nos discursos do jornal.
O discurso se manifesta por meio da “[...] prática da linguagem, isto é, uma
narrativa construída a partir de condições históricas, e sociais especificas” (SILVA, 2006,
p. 101). Assim, todo discurso materializa determinada ideologia na fala em uma língua
específica.
Um dos principais componentes do discurso como fala ou narrativa são os
significados históricos presentes no imaginário de quem o elabora. Cada discurso é,
assim, uma representação do imaginário no qual seu autor está inserido.
Segundo Silva (2005, p. 102), “[...] analisar um discurso não é ler um texto
buscando as informações trazidas por ele. Esse é o método da análise de conteúdo
amplamente empregado em história e nas ciências humanas”. Para a análise do discurso, o
importante o é saber o que um texto quer dizer, mas como ele diz o que diz, ou seja,
como os elementos lingsticos, históricos e sociais que o compõem fazem sentido juntos.
Para fazer a análise do discurso, é preciso ter em mente que essa tarefa se constitui numa
interpretação que vai além do conteúdo do texto.
19
Silva (2005, p. 102) salienta que a “[...] análise do discurso relativiza e
historiciza os significados impregnados nos textos ou nas falas, ressaltando ainda que toda
interpretação é histórica, ou seja, é parcial e feita sob condições sociais específicas”.
Assim, nenhuma interpretação se como histórica, no entanto se considera a única
verdade.
Para Michel Foucault (2007, p. 49), “[...] o discurso nada mais é do que a
reverberação de uma verdade nascendo diante de seus próprios olhos; e, quando tudo
pode, enfim, tomar a forma do discurso, quando tudo pode ser dito e o discurso pode ser
dito a propósito de tudo”. Aqui o discurso toma a forma da palavra dita, interpretada no
sentido de dar significado às coisas, ou seja, é a revelação do conhecimento. Esse
conhecimento sobre as representações do comércio em Anápolis, inscrito nas ginas do
jornal O Anápolis, tinha um significado abrangente: construir um discurso de cidade
comercial, portanto, moderna.
Entre as décadas de 1930 e 1960, foi sendo construída a imagem de Anápolis
como cidade comercial. Essa imagem está representada nas fotografias, nos textos
jornalísticos, nos poemas, nas impressões dos hóspedes e viajantes que aqui chegavam e
nos anúncios do jornal O Anápolis. Essa imagem foi sendo construída de forma
intencional ou o, por pessoas conhecidas ou anônimas que registraram suas
expectativas sobre o que viam na cidade.
Quanto à sua estrutura, este trabalho divide-se em três capítulos. O primeiro trata
da construção da ideia de uma cidade comercial. Para isso, buscou-se nos antecedentes
históricos da cidade os indícios da formão do comércio, até chegar aos tropeiros como
os primeiros mercadores desta região. Outro fator preponderante para a afirmação do
comércio em Anápolis foram os imigrantes, especialmente os árabes (sírios e libaneses),
uma vez que o empreendedores natos. Esse processo teve êxito a partir da abertura de
rodovias, como mecanismo facilitador das trocas comerciais da cidade com outros
municípios do estado de Goiás. Em 1920, foi inaugurada a rodovia Anápolis–Roncador e,
em 1921, achava-se em construção a ligação Anápolis Pirenópolis–Jarag–Corumbá.
No entanto, foi a ferrovia o grande fomentador do comércio nas décadas de 1930 e 1940,
período áureo do crescimento da cidade. Na análise das fotografias, buscou-se, na
Iconografia e Iconologia, o método para a descrição das fotografias no sentido de
compreender o seu significado no momento em que foram feitas, de forma que fossem
identificados os objetos visualizados e os eventos mostrados.
20
No segundo capítulo, o analisadas as imagens da cidade ao longo das décadas
de 1930-1960. Essas imagens consistem em fotografias existentes no Museu Histórico e
no jornal O Anápolis que, ao longo de 25 anos, foi mostrando reportagens e anúncios
sobre o comércio da cidade. o imagens constituídas de fotografias, textos, anúncios,
poemas e artigos que mostram praças, ruas, prédios, mercadorias, meios de transporte
como indícios da existência do comércio. De acordo com Burke (2004, p. 16), “[...] o
termo indícios refere-se a manuscritos, livros impressos, prédios, mobília, paisagem, bem
como diferentes tipos de imagens: pinturas, estátuas, gravuras e fotografias”. Este estudo
ateve-se especificamente a fotografias e textos do jornal e às fotografias do Museu
Histórico.
No terceiro capítulo, discutiu-se, com base na noção de representações sociais,
como o jornal O Anápolis, entronizou a cidade e representou o comércio. Para isso, foram
selecionados anúncios sobre diversos assuntos: saúde, beleza, automobilismo, moda,
mobiliário e alimentação. Ficou evidenciada a materialização da sociedade de consumo,
uma vez que, em cada anúncio de um determinado produto, havia um discurso proposital
sobre o estilo de vida idealizado por essa sociedade. É como se cada produto anunciado
fosse satisfazer uma necessidade do consumidor. Este trabalho restringiu-se a mostrar o
anúncio como uma contribuição para a história cultural, no sentido de compreender como
esse mecanismo de consumo determina as atitudes das pessoas e também como esses
anúncios contribuíram para o fortalecimento do comércio em Apolis.
Propôs-se ainda a discutir teoricamente as imagens construídas para qualificar
Anápolis como: Ribeirão Preto Goiano, Terra da Promissão e Manchester Goiana. E, ao
mesmo tempo, verificar como essas imagens foram permanecendo no imaginário popular
e em que situação econômica e social se encontrava a cidade quando foi associada a cada
uma dessas imagens. Outra tarefa empreendida neste capítulo foi compreender a força e a
permanência dessas imagens no contexto social. É certo que em cada imagem havia uma
relação direta com determinados acontecimentos temporais e espaciais.
Quando o jornal O Anápolis representou Anápolis como Ribeirão Preto Goiano,
a cidade vivia o momento de expansão agrícola que, aliada à chegada da ferrovia,
fortalecia o crescimento urbano e o comércio.
Quando foi representada como a Terra da Promissão, havia um processo
imigratório em curso, fomentado pelos estrangeiros e por pessoas de outras regiões do
21
estado e do Brasil. Esse processo criou, na imaginação daqueles que observavam o que
vinha ocorrendo na cidade, a impressão de uma terra cheia de oportunidades.
Finalmente, surgiu uma representação de Anápolis como a cidade inglesa de
Manchester, pois naquele período a cidade alcançara status de grande centro comercial do
estado de Goiás. Essa imagem vigorou de meados da década de 1940 até 1960, quando o
comércio estava sedimentado e havia um desejo de que a cidade fomentasse indústrias,
mas este tema não entra norito da discussão.
1 ANÁPOLIS VISÍVEL: O REGISTRO DA CIDADE
1.1 Anápolis e o comércio: nasce uma cidade
22
Sobre o nascimento da cidade de Anápolis e seu desenvolvimento econômico e
social, Polonial (1995, p. 33-34) diz: “A primeira fase se inicia em 1871-1907, com a
formação do núcleo urbano até a elevação do mesmo à condição de cidade”. Nesse
período, predominou a economia agropecuária de subsistência, em que o comércio
incipiente era mantido pelos tropeiros.
Foi nesse contexto que, em 1871, Gomes de Souza Ramos e outros moradores
do local deram início à construção de uma capela em homenagem a Nossa Senhora Santa
Ana. Essa capela, segundo Polonial (2007, p. 18) “[...] foi importante para aglutinar mais
pessoas no povoado, pois em 1871 existiam apenas sete casas, no ano seguinte esse
número foi para 20 moradias, com uma população estimada em 120 pessoas no
povoado”. Em 6 de agosto de 1873, pela resolução provincial de 514, foi instalada a
Freguesia de Santana das Antas. Criada com terras de Meia Ponte (Pirenópolis) e Bonfim
(Silvânia), seu território era um local privilegiado pelas boas terras e um rico manancial
de águas formado por várias nascentes de córregos (Piancó, Antas, João Leite e outros).
De acordo com os métodos iconográfico e iconológico, a gravura da Figura 2
mostra duas fileiras com oito casas grandes e pequenas e uma capela. No centro dois
caminhos que se cruzam. Um deles segue em direção à capela, o outro segue para a
esquerda em direção a uma abertura entre as casas. Avista-se também, próximo às casas
da esquerda, um córrego que tem seu curso na vertical. A imagem ilustra o largo de
Santana em 1888, quando as casas foram construídas no entorno da capela de Sant’Ana,
segundo o padrão da época em que as casas eram construídas com portas e janelas
voltadas para a rua. Ao fundo são visíveis duas elevações, provavelmente uma delas seja
o morro da Capuava. A capela em estilo colonial tinha a estrutura de madeira lavrada e
vedação em adobe, com uma porta e duas janelas de madeira voltadas para a rua. A
imagem, que é uma gravura, foi uma das primeiras representações da Freguesia de
Santana das Antas, uma vez que não foram encontrados registros fotogficos sobre o
início do povoado.
23
Figura 2 - Gravura do Largo de Santana em 1888.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Em 19 de julho de 1884, o nome da localidade foi alterado para Freguesia de
Santana dos Campos Ricos, uma alusão ao solo favorável para atividades agrícolas. Dois
anos mais tarde, em 13 de novembro de 1886, a Lei nº 778 restabeleceu o antigo nome da
freguesia. Em 1887, a freguesia foi elevada à condição de Vila de Santana das Antas. No
período destacado, a vila abarcava uma população aproximada de 3.000 habitantes,
distribuídos entre moradores urbanos e da zona rural. Em 1902, a Vila de Santana das
Antas se definia de acordo com a Figura 3: seis ruas, o Largo de Santana, o Largo do
Cemitério e o Largo da Boa Vista.
De acordo com a numeração do mapa, pode-se identificar cerca de 60
residências na vila em 1902. O mapa mostra detalhes que indicam a organização espacial
da Vila de Santana das Antas no período anterior à sua elevação à categoria de cidade,
sendo posvel identificar as casas e suas respectivas fronteiras. É nesses espaços de
fronteiras entre as casas que se encontra o quintal, situado no fundo de cada casa e onde
havia plantações de árvores frutíferas, cultivo de mandioca, milho e legumes. O traçado
das ruas acompanha a disposição das casas. No centro da vila, vê-se a Capela de Nossa
Senhora de Santana.
24
Legenda
1- Rua 15 de dezembro
2- Rua Dez de Maio
3- Rua Coronel Batista
4- Rua do Comércio (atual Rua Manoel D’Abadia)
5- Praça Santana
6- Rua Dr. Jaime
7- Rua 1º de Maio
8- Largo do Cemitério (atualPraça Americano do Brasil)
9- Largo da Boa Vista
Figura 3 - Mapa da Vila de Santana das Antas em 1902-1904. Adaptado do Desenho de Paulino
Horácio Barbosa.
Fonte: Plano Diretor 2005-2006.
A rua comercial destacada no mapa indica que, em 1902, havia indícios
consistentes do estabelecimento de casas comerciais na vila. A denominação “Rua do
Comércio” representa um fato relevante para o desenvolvimento deste estudo.
No início do século XX, quem viajava a Pirenópolis, Goiás e Silvânia
inevitavelmente usava a Vila de Santana das Antas como entreposto para descanso. Os
tropeiros também usavam o local para repousar e aproveitavam os rios da rego para o
banho, para abastecer-se com água para as longas viagens e para refrescar os animais.
Segundo Kossa:
A prática do tropeirismo foi fundamental para a povoação do planalto
goiano e Anápolis não fugiu a essa regra. Com demanda crescente,
surgiu um comércio nas imediações, para abastecimento dos que
passavam por e dos que ali fixavam residência. Também contribuiu
para que esses pioneiros ficassem no local devido à boa terra para a
agricultura, caracterizada por ser um ponto de encontro entre o
cerrado e a região de mata. (2006, p. 13).
25
Em Anápolis, as manifestações de progresso ganharam força após a primeira
década do século XX, como reflexo do que estava acontecendo em Goiás, onde as
transformações foram ocorrendo lentamente. Segundo Estevam (1998, p. 60), “[...] a
população em Goiás, ao longo do culo XIX, foi aumentando de forma aparentemente
substancial”. Esse fenômeno se acentuou, de acordo com o autor (1998, p. 60), “[...] não
em função do crescimento vegetativo, mas também devido a correntes migratórias de
regiões mais próximas”. Os dados demográficos desse período mostram que, “[...] em
1824, Goiás contava com 62.518 habitantes e, em 1890, atingia 227.572, indicando que
seus habitantes quase quadruplicaram” (ESTEVAM, 1998, p. 61).
A atividade comercial em Goiás era bastante reduzida em virtude das distâncias
em relação aos grandes centros como Rio de Janeiro e o Paulo. O pouco que produzia
dificultava a criação de um mercado exportador relevante. A prodão agrícola se
restringia à subsistência. Em termos de importação, Goiás dependia de produtos
essenciais ao trabalho nas fazendas como “[...] o ferro, a pólvora, o chumbo e, sobretudo,
o sal para o gado” (ESTEVAM, 1998, p. 69).
O pequeno corcio denominado “[...] intra-regional consolidou-se e a
exportação de excedente bovino fez parte das negociações dos fazendeiros
goianos” (ESTEVAM, 1998, p. 69). A fazenda goiana era autossuficiente em termos de
alimentos e vestuário artesanal. Se, por um lado, a pecuária era extensiva (gado criado
livre em grandes extensões de pastagens), de acordo com Estevam (1998, p. 71), essa
prática representou “[...] um processo único, uma totalidade e não dois segmentos
produtivos separados”.
As transformões começaram a aparecer em Goiás no fim do século XIX,
quando a economia paulista incorporou áreas próximas ao seu processo de acumulão.
Isso foi possível, segundo Estevam (1998, p. 83), porque “[...] a Mogiana ingressou em
território fora da região paulista transportando produtos manufaturados, alimentos e
matérias-primas”. Essa ferrovia penetrou o solo de Goiás pela rego de Araguari, em
1909, impondo modificações para a região sul do estado.
Em 1889, iniciou-se a República no Brasil, e novas configurações políticas se
formaram tanto em Goiás como em Apolis, especialmente a partir de 1907.
Embora a situação política em nível nacional tenha aparentemente mudado com
o aparecimento da República, a estrutura social, econômica e política do estado de Goiás
não sofreu alterações significativas, conforme destacou Polonial (2001, p. 61): “A base do
26
poder local continuou a ser o setor agrário, que formou a organização coronelística no
período”. Vale ressaltar que não se observaram avanços no sentido de se construir
partidos fundamentados em ideias. O importante no jogo político era manter tudo como
estava, ou seja, garantir a continuidade do poder nas mãos dos grupos familiares, como os
Bulhões e Caiados na cidade de Goiás.
Em Anápolis, a situação política durante a primeira República (1889-1930) se
caracterizava por uma representatividade política inexpressiva, ou praticamente
inexistente. A pouca representatividade política em nível estadual deveu-se, segundo
Polonial, “[...] à baixa densidade demográfica já que possuía 6.292 habitantes em 1900”:
Em todo esse período, a cidade não elegeu nenhum representante para
a câmara federal ou para o Senado e apenas três deputados estaduais,
isso em quarenta anos de história política com os coronéis: Zeca
Batista (1895-1897), Arlindo Costa (1925-1928) e Aquiles de Pina
(1929-1930). (2000, p. 61).
A segunda fase da chamada evolução histórica de Anápolis foi de 1907 a 1935.
Esse período foi marcado “[...] por uma maior inserção da economia goiana na economia
nacional” (POLONIAL, 1995, p. 33-34). A transformação da Vila de Santana das Antas
na cidade de Anápolis ocorreu em 31 de julho de 1907, “[...] pela lei nº 329, assinada pelo
presidente do Estado de Goiás, Miguel Rocha Lima. Nesse período, tem início na
economia do município uma agricultura comercial bem como o embrião de um comércio
urbano (POLONIAL, 2007, p. 33). O mapa apresentado na Figura 2 ilustra a evolução
espacial de Anápolis entre 1897 e 1935. São três períodos distintos que definem Anápolis
com base na ocupação do espaço.
1897
1907
1935
Figura 4 - Mapa
representativo da
evolução espacial da
cidade de Anápolis.
Fonte: Plano Diretor 2005/2006.
Neste mapa o traçado urbano da cidade de Anápolis (Figura 4) é visualizado em
três períodos distintos. O primeiro, em 1897, quando era denominada Vila de Santana das
27
Antas; o segundo, em 1907, quando a vila passou à categoria de cidade e o terceiro, em
1935, quando chegou a ferrovia.
Observando o desenho do mapa de 1897, vê-se o traçado de quatro ruas que
seguem o sentido horizontal e quatro ruas traçadas verticalmente. O desenho que
caracteriza o ano de 1907 retrata o surgimento de novas ruas tanto no traçado horizontal
quanto vertical. Isso demonstra que a expansão da cidade continuou nos anos seguintes.
De 1907 a 1935 houve crescimento acentuado da cidade, expandindo-se o número de
ruas. Esse período representou para a cidade a culminância de seu projeto modernizador,
seguido de um intenso processo de urbanização e de expansão do comércio. No entanto,
no início da década de 1930, ainda não se percebiam essas transformações urbanas na
cidade de Anápolis, uma vez que esse processo começou a se configurar a partir de
1935, com a chegada dos trilhos.
No período entre 1907 e 1930, o município teve seis prefeitos escolhidos pelo
sistema de voto aberto e a principal liderança política era o coronel Arlindo Costa,
pertencente ao grupo Crispim. Aquiles de Pina, de acordo com Polonial (2007, p. 32),
“[...] se apresentou no final dos anos vinte como uma alternativa a essa oligarquia
hegemônica na cidade”. Esse autor aponta algumas melhorias conseguidas nesse período:
Instalação da primeira agência postal telegráfica (1908); criação da
comarca (1914); inauguração da rodovia Anápolis Roncador (1920);
início do fornecimento de energia elétrica (1924); inauguração do
primeiro grupo escolar, que hoje é o Antensina Santana (1926);
fundação do Hospital Evangélico Goiano (1927). (2007, p. 33).
No contexto de desenvolvimento urbano provocado por essas melhorias, a figura
de Graciano Antonio da Silva aparece como o político que fez a transição da Vila de
Santana das Antas para Apolis. Ferreira assim o caracteriza:
Pode ser cognominado o Intendente do Progresso, pois procedeu ao
abaulamento das ruas, que eram esburacadas e irregulares, construiu
sarjetas e calçadas junto às casas, construiu o cemitério. Logo no
início do seu governo deu-se a instalação da luz elétrica. (1981, p. 43).
Essas realizações deram ao lugar uma conotação de cidade, pois representava a
modernização especialmente caracterizada pela energia elétrica, aspecto importante para o
novo tempo que se impunha e que resultou em modificações constantes nos anos
seguintes na cidade. Am disso, essas transformações sinalizavam as condições da cidade
para o crescimento urbano e comercial proporcionado pela chegada da ferrovia em 1935.
28
De 1907 a 1910, Anápolis ainda estava se organizando para se tornar uma
cidade, uma vez que muita coisa precisava ser feita, sobretudo em relação aos transportes.
Nesse âmbito havia grandes dificuldades, conforme descreve Ferreira (1981, p. 37): “Os
transportes eram feitos por carros de bois e muares, penosos e vagarosos”, e as viagens
para o transporte de mercadorias e pessoas levavam dias e até meses dependendo da
distância. No entanto, esse tipo de transporte representou o primeiro momento de
intercâmbio comercial e de serviços com outras cidades dos estados de Goiás, Minas
Gerais e São Paulo.
A partir da segunda década do século XX, os administradores começaram a
preocupar-se com a construção de rodovias que permitissem a ligação do município de
Anápolis com outras regiões do estado de Goiás.
Em 1920, Anápolis teve sua primeira rodovia inaugurada, ligando a cidade ao
município de Roncador, ponto final da estrada de ferro, passando por Bonfim (Silvânia) e
Campo Formoso (Orizona). Em 1921, outras rodovias se achavam em construção,
conforme Ferreira (1981, p. 37): “[...] as rodovias para Pirenópolis, Jaraguá e Corumbá e,
em projeto, uma rodovia para Inhumas passando pelo cerrado (Nerópolis e a Colônia dos
italianos, Nova Veneza)”.
No decorrer da segunda fase, a cidade foi sendo construída para além da capela
de Santana. Esse impulso na expansão da cidade foi provocado pela produção cafeeira,
uma vez que o cultivo do ca foi, de acordo com Castro (2004, p. 17), o “[...] grande
suporte econômico nas primeiras décadas do século XX, dinamizando a economia
anapolina e permitindo uma acumulão do capital para ser tempos depois transferidos”
ao comércio e às finanças. O cultivo do café permitiu que fossem surgindo inovações na
área urbana: “[...] em 1920 chegaram os primeiros construtores de casa de tijolos com
banheiros” (SILVA apud CASTRO 2004, p. 18). A partir daí foram surgindo “[...] as
primeiras olarias em 1921, que na década de 1930 se transformaram em cerâmicas,
produzindo tijolos, telhas e ladrilhos de propriedade do Sr. Jad Salomão e Senhor
Agostinho de Pina” (CASTRO, 2004, p. 18). O grupo Pina, que dominava a política
anapolina, teve participação decisiva no prolongamento dos trilhos entre Leopoldo de
Bulhões e Anápolis, pois esse era um fator fundamental para o fortalecimento de seu
poder.
Foi nesse momento que ocorreu a inserção de Anápolis na economia goiana e
nacional. Esse período corresponde à “[...] expansão do capitalismo para o interior do
29
Brasil (POLONIAL, 1995, p. 5), o que contribuiu para a modernização das reges
incorporadas à economia de mercado na forma de uma economia dependente. Sobre esse
período, Borges (1990, p. 11) explica: “Modernização dependente é entendida como
modernização induzida. Um tipo de modernização imposta às regiões incorporadas ou
inseridas à economia capitalista”.
As ruas da cidade ganharam contornos mais amplos de acordo com a sua
vocação. A Rua Antonio Carlos, atual Rua Manoel D’Abadia, e Rua Getúlio Vargas
(“Rua do Comércio”), atual Rua Aquiles de Pina, ficaram conhecidas pelo comércio, pelo
Cine Teatro Imperial, pelo Clube Recreativo, pela Praça James Fanstone.
Figura 5 Local onde surgiu a Rua Getúlio Vargas (1920), atual Rua Aquiles de Pina, e a casa
A Rainha da Barateza.
Fonte: Jornal A Voz do Planalto, 1970, p. 2.
Na Figura 5, observa-se uma rua, pois à direita cinco casas e, em frente à
primeira, encontram-se pessoas, alguns bois e um cavalo. Entre as casas bananeiras e
mamoeiros, além de lixo espalhado pela rua. Na descrição da fotografia e na indicação no
jornal, o local é identificado como a Rua Getúlio Vargas (Rua do Comércio), atual
Aquiles de Pina. A inscrição identifica a casa comercial Rainha da Barateza, constrda
em 1911 por Antonio Luiz de Pina, comerciante transferido de Pirenópólis. É possível
perceber que as casas são construídas segundo a técnica da época, com a estrutura de
madeira lavrada e a vedação em adobe, com portas e janelas de madeira voltadas para a
rua. A cobertura é feita com telha colonial capa e bica. As casas aparentam ser revestidas
com pintura a cal. A rua bastante desnivelada, com muito capim e lixo, mostra uma trilha
por onde as pessoas circulam. Nesse período, o comércio era estabelecido no interior das
30
casas e se vendia de tudo, por exemplo, alimentos, ferragens e tecidos. A intenção do
registro da imagem pode ter sido mostrar a casa comercial, as pessoas que vinham em
carros de bois e a cavalo para fazer suas compras ou registrar a situação da rua.
O comércio se estabelecia para atender a demanda das famílias ainda em sua
maioria de origem rural, conforme esclarece Polonial (1995, p. 42): “[...] 75,76% da
população viviam na área rural cerca de 29.662, enquanto isso na região urbana viviam
9.486 pessoas”. Decorre deste quadro a comercialização de produtos como arreios,
chapéus e ferragens, de uso diário nas fazendas por agricultores e pecuaristas. Haydée
Jaime Ferreira, nos seus escritos sobre a cidade, relatou:
A primeira grande casa comercial instalada na área urbana de
Anápolis apresentava uma grande variedade de produtos A Rainha da
Barateza, charqueada, torrefação e moagem de café, indústrias,
representante bancário e talvez outros “primeiros” que não me
ocorrem, tiveram como pioneiros os irmãos Tonico, Aquiles, Carrinho
e Augustinho de Pina. (Chico de Bastos montou aqui, nos primeiros
tempos de Antas, a primeira casa comercial). Outros seguiram-lhe os
passos, entretanto nenhuma teve o estoque da Rainha da Barateza.
(1979, p. 435).
A referência à grande casa comercial se deve ao tamanho do estabelecimento, à
quantidade e à variedade dos produtos comercializados no balcão. A casa comercial
Rainha da Barateza vendia por atacado aos comerciantes e compradores do munipio de
Anápolis e de outras localidades próximas e também no varejo. Contava com uma equipe
de vendedores treinados para atender a praça, além de armazéns para a estocagem de
mercadorias. Tinha capital de giro para financiar as compras, telefone e caixa postal para
comunicar-se com os clientes, vendedores e distribuidores.
De 1911 a 1915, Anápolis contava com vários locais caracterizados como
estabelecimentos comerciais. Esses locais de comércio distribuídos por outras ruas além
da Rua Getúlio Vargas (“Rua do Comércio”) ampliaram a visibilidade do comércio na
cidade. A loja Rainha da Barateza ficou conhecida por vender uma grande variedade de
produtos, por isso alcançou o status de uma das maiores do estado de Goiás a partir de
meados da segunda década do século XX até os anos de 1940, quando outras lojas nesse
estilo foram surgindo. Entre os comerciantes havia imigrantes sírios e libaneses, como os
Srs. Elias Jo, João Elias e Pedro Koury.
Quadros 1 - Comerciantes de Anápolis em 1915.
31
Locais
Praça Santana 04
Rua Desembargador
Jayme
02
Praça Moisés Santana 02
Av. Xavier de Almeida 01
Rua 15 de Novembro 01
Rua Rio Branco 01
Praça Coronel Silvério 03
Saída para Bela Vista 03
Total 21
Fonte: Ferreira (1981). Dados trabalhados pelo autor.
Os dados apresentados no Quadro 1 indicam a existência de 21 comerciantes
estabelecidos em Anápolis em 1915, espalhados por diferentes pontos da cidade. Segundo
dados do Censo do IBGE (1939 a 1994), a população de Anápolis entre “[..] 1911-1920
era de 16.037” habitantes (POLONIAL, 1995, p. 37). Esses pontos comerciais ficavam no
interior das casas, localizados em um dos modos, uma vez que era a família quem
atendia a clientela. Nesses pontos ou vendas, podiam ser encontrados produtos como: sal,
farinha de milho, farinha de mandioca, arroz, feijão, banha de porco, charque, cachaça e
outros.
Algumas ruas destacadas no quadro permaneceram com a denominação original:
Rua Coronel Batista, Rua Desembargador Jaime, Rua Dez de Março, Rua de Maio e
Avenida Xavier de Almeida. Outras passaram a ter outra denominação. Com relação às
praças, o destaque é a Praça Santana que manteve sua denominação original.
A imigração foi um elemento fundamental para o processo de crescimento de
Anápolis como cidade comercial, especialmente dos sírios e libaneses que começaram a
chegar à cidade em 1913, intensificando-se esta imigração após a chegada da ferrovia em
1935.
O período de 1935 a 1960 constitui a terceira fase, marcada pela hegemonia do
setor terciário. Esta terceira fase merecerá análise aprofundada ao longo do texto, cujo
foco é a imagem comercial de Anápolis construída no transcurso de 1935 a 1960.
1.1.1 Chegaram os “batrícios”
As razões para a inserção dos imigrantes árabes, pioneiros no comércio goiano,
são de natureza histórica, conforme apontou Nunes (2000, p. 84): “[...] o território
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conhecido como grande Síria, em virtude de sua localização geográfica estratégica entre o
Ocidente e o Oriente, foi por muito tempo um importante centro comercial”. Comprar e
vender são atividades com profundas raízes entre os habitantes do Mediterrâneo. Esse
fator, agregado aos anteriores, explica a opção pelas atividades comerciais dos árabes
instalados em Goiás, além do que, ao chegarem ao estado, encontraram uma sociedade
propícia ao desenvolvimento do comércio e em franco processo de urbanização.
Uma característica importante do imigrante árabe que chegou a Goiás, no início
do século XX, era o seu tino para o comércio. Isso explica o desejo manifestado por todos
esses imigrantes de, ao chegar, abrir o seu próprio negócio, de preferência comercial. No
início de suas atividades, eles “[...] se sujeitavam a um fornecedor de mercadorias
normalmente um atacadista bem sucedido de quem recebiam os produtos para
negociar” (NUNES, 2000, p. 85). Esse fornecedor muitas vezes já havia sido um mascate
1
que, graças ao sucesso de seu trabalho, se estabelecera como comerciante. É importante
destacar que muitos árabes que chegaram a Goiás iniciaram suas atividades como
mascates.
A ferrovia representou um corredor de entrada desses imigrantes na cidade em
maior número a partir de 1935. “A construção de Goiânia foi outro fator importante para
dinamizar o comércio da região de Mato Grosso Goiano, que se articulava com o sul e o
sudeste do Estado de Goiás, bem como com o Centro-Sul do país” (NUNES, 2000, p. 94).
Os registros da estrada de ferro demonstram que havia em Anápolis um grande
movimento de cargas destinadas à construção da infraestrutura da cidade: cimento, ferro,
esquadrias e madeiras. Houve também uma expansão das empresas comerciais instaladas
no município a partir de 1930 até 1960, quando houve um movimento maior, conforme
demonstra o Quadro 2.
Quadro 2 - Empresas comerciais árabes, por número de habitantes no município de
Anápolis, 1935-1960
Década
Empresas Comerciais Instaladas População
1935 29 33.375
1
Vendedor ambulante que andava “[...] a pé, a cavalo, de carro de bois ou de trem”. Trabalhava
intensamente, retornava quando vendia toda a mercadoria e, ao chegar à casa, reabastecia
suas malas e voltava ao campo para continuar seus negócios (NUNES, 2000, p. 87).
33
1940 33 39.148
1950 56 50.338
1960 127 68.735
Total 263
Fonte: Nunes, 2000, p. 95. Dados trabalhados pelo autor.
Os dados do Quadro 2 demonstram o crescimento das empresas comerciais de
propriedade de famílias árabes na cidade de Anápolis. Em 1935, havia 29 empresas
instaladas, isso demonstra que a abertura de novos estabelecimentos teve início com a
abertura da rodovia Anápolis–Roncador e com a instalação da energia elétrica na cidade.
aparecem na estatística aqueles estabelecimentos que estavam registrados na
Prefeitura. Em 1915, havia 21 comerciantes estabelecidos em Anápolis, desses, apenas
três eram sírios e libaneses, permanecendo o mesmomero até 1920.
Segundo Nunes (2000, p. 96): “O desenvolvimento acelerado de Anápolis
oferecia um conjunto de oportunidades excepcionais para os imigrantes que desejavam se
inserir no mercado econômico urbano”. Nesse período, a sociedade anapolina não contava
com uma classe média significativa a ponto de interferir no processo de desenvolvimento
comercial de forma decisiva. Essa população era composta, em grande parte, de ex-
escravos e imigrantes rurais. A classe dominante era composta por fazendeiros, ligados ao
meio rural e ocupados com a política da cidade. Nesse sentido, de acordo com Nunes, o
comércio
[...] passou a ser monopolizado pelos imigrantes árabes, que
chegavam de forma constante. Redes de empregos, indicações,
subcontratações e negócios preferenciais entre conterrâneos e parentes
acabaram por constituir verdadeiros feudos étnico-ocupacionais entre
os árabes. (2000, p. 96).
Em pouco tempo esses imigrantes constituíram uma rede comercial na cidade,
que ia de lojas de distribuição por atacado até o varejo, estabelecendo um monopólio no
setor comercial anapolino. Em razão do número significativo de árabes residentes na
cidade, em dezembro de 1931 foi criada a União Síria. Esse acontecimento foi noticiado
no jornal Voz do Sul, semanário anterior ao jornal O Anápolis: “Os Sírios residentes nesta
cidade acabam de formar um núcleo em defesa da colônia, sob a denominação ‘União
ria’, que muito virá contribuir para o congraçamento da volumosa classe, aqui residente,
na sua maioria de comerciantes” (VOZ DO SUL, 27 dez.1931, p.1).
34
Assim, no primeiro decênio do século XX, a colônia sírio-libanesa se fazia
presente em Anápolis, conforme observou José Asmar (1987, p. 76): “[...] na cada de
1911 a 1920, a colônia sírio-libanesa tinha vulto em Anápolis, ocupando-se de
atividades comerciais, especialmente lojas de armarinhos e de cereais”. Entre esses se
destacaram Miguel João, que esmagava fumo crioulo nas os; Zacarias Alves, dono da
máquina de beneficiar arroz; Abraão José Asmar, que chegou a Goiás como mascate e se
instalou como comerciante em Anápolis em 1910; José Isaac Sobrinho, dono da Casa
Violeta onde se compravam as novidades chegadas de São Paulo. Nesse período, o
comerciante Elias Antonio Jo fundou a firma Onogás, um complexo comercial de
veis e eletrodomésticos com várias filiais no estado, que por várias décadas pertenceu
à família Onofre Quinan, ex-governador de Goiás e ex-senador da República e também de
origem árabe.
O sucesso desses pioneiros árabes, segundo Nunes, contribuiu
[...] para uma mudança de caráter ocupacional na segunda geração,
que diversificou os seus interesses econômicos. Alguns se mantiveram
nos negócios da família, outros ingressaram em cursos universitários;
as mulheres em geral fizeram o curso normal. Assim a colônia sírio-
libanesa começou a formar seus primeiros profissionais liberais.
(2000, p. 97).
Daí surgiram odontólogos, médicos e advogados, entre outros profissionais que
passaram a atuar também no setor de prestação de serviços na cidade.
A imigração teve papel fundamental no desenvolvimento do comércio em
Anápolis, especialmente a dos sírios e libaneses, os quais foram crescendo e ampliando
sua força na cidade. Segundo Rocha, esses imigrantes chegaram a
[...] ter influência social e econômica no município em um grau tão
elevado que determinou a presença destacada dos pioneiros e de seus
descendentes, a partir de 1930, em todos os segmentos anapolinos.
Tornaram-se influentes políticos, médicos, farmacêuticos, donos de
hospitais e de farmácia, de revenda de veículos automotores,
proprietários de casas de comércio atacadista, de estabelecimentos
comerciais varejistas, de estabelecimentos de beneficiamento e
comercialização de cereais e de supermercados. (2007, p. 68).
A influência no comércio foi tão acentuada que a Rua General Joaquim Inácio se
formou com base no comércio sírio-libanês. Ficou conhecida popularmente como a “rua
dos turcos”.
35
Em 1948, houve uma confencia em Goiânia sobre a imigração e colonização
no Brasil Central. O jornal O Anápolis esteve presente e assim descreveu os fatos
ocorridos nessa Conferência: “[...] o nome de Goiás foi conduzido para um plano de
propaganda jamais experimentado. As reservas de solo e as riquezas econômicas deste
Estado tiveram uma difusão do seu valor” (O ANÁPOLIS, 12 maio 1948, p.1). Essa
conferência tinha como objetivo divulgar o estado de Goiás no plano nacional para atrair
imigrantes para aqui desenvolverem seus negócios.
Era importante para o estado permitir e até incentivar a imigração, uma vez que
havia espaço em seu território para ocupação. Em Anápolis, esse processo vinha
ocorrendo, destacando-se a participação ativa dos imigrantes na economia do município,
especialmente no comércio: os irmãos Bittar, proprietários da loja de tecidos Empório das
Sedas; o Sr. Salim Caied, da Casa Amazonas, especialista em secos e molhados; os
irmãos Cecílio, proprietários de comércio destinado a atacado e varejo; Wady Elias Jorge,
dono de uma loja de tintas e óleos para pintura, além de artigos para presentes; o Sr.
Abdalla Badauy, proprietário do Armazém Badauy e Samuel Zacharias & Irmãos, a quem
pertencia o Armazém Anápolis (FRIDMANN, 1954). Durante a análise das fotografias,
dos textos e anúncios, serão mostrados alguns desses comércios. A figura do árabe, tão
peculiar em seus costumes e modo de vestir – o terno branco, longos bigodes retorcidos e
barba bem feita tornou-se familiar na região. Seu jeito especial de falar transformou-o
em personagem de crônicas e sátiras na imprensa local. Em 1932, o jornal O X,
especializado em publicar textos satíricos e charges sobre personagens da rego, publicou
um texto em que satirizava o portugs pronunciado pelos árabes. A dificuldade em
pronunciar o “p os obrigava a dizer “batrício em lugar de patrício, “brimo” em vez de
primo, trocavam o “c” pelo “g” e, além disso, se atrapalhavam na pronúncia de muitas
outras palavras, proporcionando aos humoristas terreno fértil para a criação satírica.
1.2 Criar e divulgar imagens: o jornal O Apolis
A imprensa como ator social desempenha importante papel de apreensão e
construção de formas de percepção e entendimento de acontecimentos ocorridos em
36
determinada sociedade. A imprensa pode ser o lugar do fazer e da memória histórica,
onde estão presentes as ões dos sujeitos sociais intermediadas por inúmeras formas de
controle que se mesclam com a subjetividade daqueles que a utilizam para expressar as
coisas que estão se passando no mundo que os cerca. Ela reflete o mundo de seu tempo e,
ao mesmo tempo, influencia na constrão deste mundo graças à força de representação
que carrega, logo possui história e historicidade.
O conteúdo veiculado pela imprensa reflete, por meio da sistematização de
informações, os momentos políticos, econômicos e culturais de uma sociedade. Quanto
mais completa for esta sociedade, maior se a importância da imprensa na sua leitura.
Com o advento da modernidade, a imprensa tem desempenhado importante papel político,
tem difundido ideias, tomado posições favoráveis ou contrárias em relação às decisões e
ações dos grupos de pressão. Sobre isso Sodafirma:
[...] com a emergência da grande imprensa e seu funcionamento na
lógica capitalista-burguesa, mudaram significativamente suas
características formais, anteriormente compostas por certa boemia-
literária, agora passaram a produzir editoriais com noticiários
eminentemente políticos. (1999, p. 355-356).
A referência de Sodré se baseia nos acontecimentos da República Velha, quando
os governos perceberam a sua influência e trataram de regulamentar as leis de imprensa.
Ao fazer uma leitura do mundo, a imprensa não pode ser entendida como neutra,
pois uma ligação com o mundo de seu tempo no sentido de estabelecer conexões e
relações com sujeitos, instituições e ideias de modo que, por trás daquilo que é
apresentado, existe um conjunto de interesses que precisam ser levados em consideração.
Como ator social e político, a imprensa introduz formas de pensar e ideias que dão
significado às ações humanas e tem uma atuação decisiva na construção dos
acontecimentos. De acordo com Abreu (1998, p. 60-62): “O acontecimento é construído
socialmente através de um processo de seleção e formatação dos fatos elaborados pela
imprensa, os acontecimentos ganham existência e sentido quando entram em contato com
os receptor-consumidores dessas informações”. Assim, a imprensa introduz no sistema
social novas formas de pensar, elabora e interpreta aspirações e demandas da sociedade,
participando como ator social.
Outro aspecto interessante da imprensa e que não pode ser desconsiderado é seu
caráter econômico, pois seu funcionamento exige investimento, demanda capital, portanto
37
precisa ser lucrativa para atender a esta lógica. Ao afirmar o aspecto econômico da
imprensa, Smith pondera que ela é
[...] um ator econômico, pois existindo enquanto propriedade privada
e tendo fins lucrativos, vincula-se com outros meios de comunicação e
empresas a fim de expandir suas vendas e receitas de publicidade,
manter baixos os custos de produção, aumentando a qualidade do
produto a ser colocado no mercado. (2000, p. 20).
Este aspecto reflete a dependência da imprensa dos comerciais e anúncios, do
Estado e do mercado que garantem esse empreendimento. Isso a obriga a adaptar-se a
determinadas regras e a produzir de acordo com elas.
Diante dessas considerações, a leitura histórica por meio da imprensa precisa
levar em conta esses aspectos materiais que, de modo direto ou indireto, acabam sendo
influentes no conteúdo representativo do que é enunciado pelos meios de comunicação.
Existem sujeitos atuantes por trás de um conjunto discursivo; logo, seus interesses, ideias
e comprometimento político e econômico não podem ser negligenciados na tarefa de
compreender a história por meio da imprensa.
Por outro lado, a imprensa tamm produz uma dada realidade pela força
simbólica das representações que veicula. Segundo Bourdieu:
A linguagem possui um poder simbólico, através das operações
sociais de nomeação e dos ritos de instituição, as palavras dão nome
às coisas, logo, linguagem e as representações são construtoras do
mundo social. Assim a imprensa produz representações e estas de
alguma forma vão dar sentido e existência às coisas sociais, atuando
sobre as percepções e representações existentes nos indivíduos. (1996,
p. 79-82).
Esta capacidade de criação histórica também pode ser atribuída à imprensa e é o
que a torna fundamental na história contemponea. A imprensa aparece na
contemporaneidade como um meio de apreensão do mundo social e histórico produzido
pelos indivíduos por meio das representações que eles mesmos produzem. As ações,
ideias, desejos e relações de poder são projetados para o social pela imprensa e sua
influência torna-se significativa porque o mundo contemporâneo, em especial, é
eminentemente marcado pela produção e circulação desse tipo de forma simbólica.
Pensar a imprensa, ou mais especificamente o jornal, como fonte implica a
compreensão de um conjunto de elementos que estão nas entrelinhas dos discursos, das
imagens e dos anúncios produzidos em determinado período de tempo. O entendimento
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dessa compreensão sobre o jornal O Anápolis e do papel que representou para a
construção do comércio na cidade motivou sua utilização como fonte para esta pesquisa.
Assim, cabe aqui a compreensão histórica do aparecimento da imprensa em Goiás e,
posteriormente, em Anápolis, para que se possa situá-la no tempo e espaço.
A história da imprensa em Goiás, no período compreendido entre 1830 e 1945,
pode ser dividida em quatro fases distintas. A primeira fase vai de 1830 a 1834 e é
marcada pelo surgimento do primeiro jornal goiano – a Matutina Meiapontense que era
impresso no antigo Arraial de Meia Ponte, atual Pirenópolis. A segunda fase vai do fim
da Matutina até o período de vida do jornal Correio Oficial de Goiás (3 de junho de 1837
a 1855).
A linha de publicação tanto da Matutina quanto do Correio Oficial de Goiás
seguia o mesmo formato: publicavam as atas do governo da província de Mato Grosso e
de Goiás, os discursos político-doutrinários, além de crônicas, algumas transcritas de
outros semanários e versavam sobre assuntos relacionados à agropecuária.
Nessa segunda fase surgiram outros periódicos com teor ideológico
abolicionista, republicano ou da política local. Em 1864, surgiu o jornal Correio Oficial,
que não apresentava a mesma rigidez do antigo Correio Oficial de Goiás. Sua tiragem era
bissemanal e foi extinto em 1890.
A terceira fase vai do fechamento do Correio Oficial até 1936 com a criação da
Associação Goiana de Imprensa (ABI) e a transferência do Correio Oficial para Goiânia.
Nesse período, surgiram os primeiros jornais em Anápolis, entre os quais se destacaram: o
Correio de Anápolis (1929), Voz do Sul (1930) e o jornal O Anápolis (1935). Essa terceira
fase foi muito rica em termos de informação, pois foram aparecendo jornais em outros
municípios de Goiás.
A quarta fase se estende de 1936 a 1945 quando os meios de comunicação
ganharam relevo na difusão da ideologia estadonovista, fundamental para o pensamento
modernizador brasileiro. Em Goiás, essa fase também representou o aparecimento de
jornais como O Popular (1938), fundado por Jaime Câmara e irmãos, e a Folha de Goiás
(1934), fundada por Gerson de Castro, mas quatro anos depois foi adquirida pelos Diários
Associados. Em 1942, surgiu a revista Oeste, considerada a mais expressiva do estado.
Outro fato que marcou o período foi a criação do Departamento de Imprensa e
Propaganda (DIP) no governo Vargas. A partir desse momento, os jornais tiveram sua
liberdade cerceada pela ação da censura (PINA, 1971).
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Compreender o papel do jornal na difusão dos acontecimentos sociais, políticos
e econômicos de Apolis é relevante, pois representa uma interessante fonte de pesquisa.
Isso porque, além de textos e reportagens, o veículo trazia também imagens, anúncios e
poesias, que agora servem como suporte para a investigação.
Neste trabalho, o interesse está centrado em compreender o sentido que as
imagens provocaram na cidade no período em que foram veiculadas no jornal O
Anápolis. Essas imagens constituídas por fotografias e textos são representações do grupo
de pessoas que utilizava o jornal como meio de divulgar sua visão de mundo. Faziam
parte desse grupo comerciantes, jornalistas, poetas e profissionais liberais que
visualizaram o progresso e a modernidade como forma de transformar Anápolis em um
centro comercial, próspero e dinâmico nas décadas de 1930-1960. Vale lembrar que, em
1910, a cidade tinha pouco mais de 1.990 habitantes e dependia do meio rural como
provedor de trabalho e recursos.
A participação da imprensa, especialmente do jornal pesquisado, foi importante
para o processo de modernização que ocorreu em Anápolis no período destacado. Esse
processo começou a ser definido a partir da construção de rodovias (1921) que abriram
espaço para trocas comerciais entre a cidade e outros municípios do estado, além de
impulsionar a vinda de imigrantes. Em 1929, teve início a imprensa escrita. Em 1933, foi
instalada a rede de energia elétrica, fator essencial para o desenvolvimento social e
econômico do município. Em 1935, chegou a ferrovia para favorecer o processo de
alargamento das condições econômicas, especialmente a expansão do comércio. O que
vinha ocorrendo em Anápolis era visto pelo jornal O Anápolis como progresso e
modernidade, por meio dos quais a cidade e seu povo seriam beneficiados. O jornal
assumia o papel de paladino dessas transformações, tendo como palavra de ordem “tudo
por Anápolis”.
A população, paulatinamente, ia se tornando receptiva às transformações que
aconteciam a todo momento na cidade. O jornal, ao fazer chegar de forma regular as
informações até os leitores, criava uma cadeia de informações, conforme observou
Anderson (2005, p. 113): “[...] a linguagem da imprensa (jornal, ou livros, no caso
romance) tende a aproximar as pessoas, mesmo sem se conhecerem”. Uma informação
transmitida por um meio de comunicação, nesse caso o jornal, tende a ser lida por muitas
pessoas ao mesmo tempo e, dessa forma, a informação passa a fazer parte da imaginação
de um grupo maior de pessoas.
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O jornal O Anápolis era constituído por uma série de elementos que se juntavam
para dar forma às informações contidas em suas páginas, como, por exemplo, o editorial,
o espaçamento entre as informações, as fotografias, os artigos, a parte social, os anúncios
e outros. Esses elementos tinham como finalidade emitir ou completar uma ideia, cuja
leitura era feita por meio da interpretação atenta do leitor do jornal.
Em 1935, a população da cidade de Anápolis era de, aproximadamente, “7.559
habitantes” (POLONIAL,1995, p. 37). Nesse período, circulavam na cidade cinco jornais:
O X, O Operário, O Verbo, Voz do Sul e O Anápolis. Pelo número de jornais que
circulava na cidade na década de 1930, percebe-se a importância que este veículo tinha
como meio de informação e divulgação.
O jornal O X era dirigido pelo advogado Adhayl Lourenço Dias e pelo
Sr.Waldemar B. de Oliveira. Apresentava uma visão satirizada dos acontecimentos
sociais, políticos e econômicos da cidade e teve curta duração, foram apenas alguns
exemplares publicados em 1932 (O X, 1932, p. 1).
O jornal O Operário circulou em 1933 e era direcionado aos trabalhadores. Seu
proprietário e editor, Francisco Garcez Chiquito, identificava-se com o pensamento
marxista, portanto pregava a existência da luta de classes. Esse jornal tinha como lema:
“Igualdade, justiça e fraternidade e Operários ajudemos uns aos outros” (O OPERIO,
1933, p. 1).
O jornal O Verbo, editado entre os anos de 1931 e 1932, teve como diretor
Jarbas Jaime e redator Nicanor Silva. Apoiou os governos pós-revolução de 1930, vindo a
criticar o governo Vargas em 1932 na campanha pela reconstitucionalização do Brasil (O
VERBO, 1931, p. 1).
O jornal Voz do Sul circulou semanalmente em Anápolis entre 1930 e 1934 e
tinha como lema as ideias positivistas defendidas por Rui Barbosa. No alto de sua
primeira página, lia-se a frase: “Com a lei, pela lei e dentro da lei, porque fora da lei não
há salvação” (VOZ DO SUL, 23 nov. 1930). O jornal Voz do Sul identificava-se para seus
leitores como um informativo noticioso, independente e literário. Pertencia ao advogado
JoLourenço Dias. O editor era seu irmão, o também advogado Adahyl Lourenço Dias,
proprietário do extinto jornal O X. Era responsável pela editoração o jornalista Sebastião
Guimarães. Desde a primeira edição, em 23 de novembro de 1930, mostrou-se
sintonizado com os governos interventores. Após a deposição do presidente Washington
Luiz pela Revolução de 1930 e a chegada de Getúlio Vargas ao poder central e a de Pedro
41
Ludovico Teixeira ao governo de Goiás, o jornal assumiu posição de defesa do novo
contexto político. No editorial do 5, de 21 de dezembro de 1930, Augusto Rios,
escritor, poeta e colaborador do jornal desde seu primeiro número, declara:
A conquista da nossa liberdade custou muito; todos trabalhamos com
ardor não houve desfalecimento em nenhum dos que bateram pelos
princípios da regeneração dos nossos costumes políticos, assim é justo
que dentro no belo programa da Aliança Liberal, saibamos fazer os
nossos anseios um digno de realizações que culminaram na
plenitude das nossas mais patrióticas aspirações. (VOZ DO SUL, 21
dez. 1930, p. 1).
Nos quatro anos em que circulou, de 1930 a 1934, sempre apoiou o ideal dos
revolucionários, pois era esta a opinião do jornal:
A Revolução era a renovação do Brasil, pois se fez em torno do paíz
combalido pela politicagem e pelos elementos estragados em longo
espaço de annos por paixões condenáveis, todas as forças vivas todas
as energias latentes, todos os órgãos sãos a fim de se traçarem novas
directrizes à nacionalidade. (VOZ DO SUL, 25 jan. 1931, p. 1).
Os novos rumos tomados pela política propagada após 1930 contavam com total
apoio do jornal Voz do Sul, que almejava a construção de Goiás como um estado livre dos
antigos vícios da República Velha.
O jornal O Anápolis, cujo primeiro número circulou em 31 de março de 1935,
tinha o seguinte lema: “Sem injunções de ordem partidária e visando principalmente a
defesa dos interesses de Anápolis e do Estado de Goiás” (O ANÁPOLIS, 1, 31 mar.
1935, p. 1).
Era também um jornal semanário, que se autodenominava um “[...] boletim
informativo de todas as ocorrências da vida social, intelectual e econômica desta futurosa
região Planaltina” (O ANÁPOLIS, nº 1, 31 mar.1935, p. 1). Foi um de seus fundadores o
engenheiro Luiz Caiado de Godoy, nascido na cidade de Goiás em 21 de agosto de 1898,
filho do desembargador João Francisco de Oliveira Godoy e de Tereza de Alencastro
Godoy. Segundo Ferreira (1981, p. 76), “Luiz Caiado de Godoy exerceu inúmeros cargos,
entre esses foi agrimensor de Intendência Municipal de Goiás, diretor da Escola Normal
de Apolis, professor de Geometria, desenho, Geografia e História Geral”.
42
Figura 6 - Editora do Jornal O Anápolis.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 194.
O editor do jornal O Anápolis era Sebastião Guimarães, oriundo do extinto jornal
Voz do Sul. O jornal O Anápolis nasceu em consequência do desenvolvimento econômico
da cidade, ligado à causa da ferrovia de Goiás. Quando a ferrovia entrou em declínio,
entre as décadas de 1950 e 1960, o jornal assumiu a defesa do projeto rodoviário, pois se
dizia defensor dos interesses econômicos, sociais, culturais e políticos do município de
Anápolis. De acordo com Polonial (2000, p. 99), o jornal “[...] apoiou ativamente a
implantação do Estado Novo, bem como a deposição de Getúlio Vargas. Era fiel ao
interventor Pedro Ludovico Teixeira até sua deposição em 1945”.
Em editorial do dia 31 de março de 1935, afirmou peremptoriamente:
Animados dos mais patrióticos desígnios, expurgaremos
impiedosamente das nossas modestas colunas todos os germes de
desharmonia e da dissolução, pois o nosso lemma é construir com
bases cada vez mais sólidas o majestoso edifício da paz e do progresso
desta gleba. (O ANÁPOLIS, 31 mar. 1935, p. 1).
Para este jornal a defesa da tria estava acima de qualquer desígnio. Quanto à
sua estrutura e formato, dividia-se em oito páginas e até 1939 tinha um formato pequeno,
medindo 30 x 23cm. A partir de 1940, a direção do jornal foi assumida pelo advogado e
empresário Nicanor de Faria e Silva, proprietário da empresa comercial Far de
comércio de vinhos, refrigerantes e xaropes (FRIEDMANN, 1954). Os redatores eram os
jornalistas O. Mota e Costa Ferreira. Nesse período o jornal apresentou-se em tamanho
maior, medindo 30 x 56cm.
43
Na primeira página, estavam a identificação, o nome, a edição, o número, o
diretor, o editor e a data. Ali também estavam o editorial, o noticiário político nacional e
local, além da coluna social. A publicidade ficava dispersa em todas as páginas.
O jornal circulou na cidade de Anápolis, nos distritos de Damolândia,
Brazabrantes, Souzânia, Goianás e Matão, além de Goiânia. Era distribuído aos
assinantes, colaboradores e vendido à população na bancas de jornal e revista. O jornal O
Anápolis manteve a linha de pensamento voltada aos interesses dos comerciantes,
profissionais liberais e daqueles que tinham interesse no desenvolvimento econômico da
cidade. O grupo de gestores e fundadores permaneceu à frente do jornal até 1957. Após
esse período, o jornal passou a ser administrado por um grupo de novos proprietários,
capitaneado pelo político e empresário Jonas Ferreira Duarte (presidente), seguido por
Sebastião P. Junqueira (diretor superintendente), Eliseu Jorge de Campos (diretor
comercial) e Raul dos Santos (técnico de oficinas).
No período em que o grupo Jonas Ferreira Duarte esteve à frente desse
semanário, as atenções se voltaram para os acontecimentos políticos e as críticas ao
descaso imposto à ferrovia.
O jornal O Anápolis circulou na cidade até meados da década de 1970 quando se
extinguiu. Sobre a trajetória desse jornal, Ferreira comenta:
Com o correr dos anos, lutando, ajudando no progresso da nossa
cidade passando de mão em mão mudando sua cor política de acordo
com seus proprietários, o jornal sobreviveu, impávido, por quase
quarenta anos, até que se extinguiu, na década de setenta. (1981,
p. 320).
O jornal O Anápolis foi escolhido como fonte desta pesquisa por noticiar,
durante quase quatro décadas, os acontecimentos da cidade de Anápolis e por seu vínculo
explícito com a “ala” progressista da cidade.
As fotografias não eram publicadas com frequência no jornal O Anápolis,
somente eram colocadas quando havia algum evento de inauguração, reforma ou anúncio
de um novo empreendimento comercial na cidade. Na década de 1930, não havia
fotografias no jornal para ilustrar esses momentos, no entanto o jornal fazia referência a
esses momentos, indicando que haviam sido registrados por fotógrafos da cidade.
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2 A INVENÇÃO DA CIDADE COMERCIAL
2.1 Olha o trem: vem chegando a Ribeirão Preto de Goiás
A fotografia como evidência visual representa um importante suporte para a
análise histórica de determinada época. Referindo-se à importância das paisagens urbanas
45
retratadas em fotografias, Burke (2004, p. 103) diz que “[...] a evidência visual é
particularmente importante para o enfoque da história urbana”. Ela pode apresentar
detalhes da paisagem de uma época: pontes, casas, prédios, alpendres, traçados das ruas,
tipo de calçamento de ruas, paredes, cais do porto, portais, vitrais, janelas, muros e cercas,
entre outros.
As paisagens urbanas retratadas em fotografias ativam a curiosidade do leitor,
uma vez que lhe fornecem uma visão antecipada do texto. A imagem produz no olhar
uma leitura peculiar daquilo que revela. Para Borges:
A fotografia não deve ser considerada um documento neutro, pois cria
novas formas de documentar a vida em sociedade. Mais que a palavra
escrita, o desenho e a pintura, a pretensa objetividade da imagem
fotográfica veiculada nos jornais não apenas informam o leitor sobre
datas, localização nome de pessoas envolvidas nos acontecimentos
sobre as transformações do tempo curto, como também cria verdades
a partir de fantasias do imaginário. (2005, p. 69).
A fotografia, assim concebida e utilizada, opera na construção da memória.
Segundo Burke (2004, p. 104): “Os historiadores urbanos freqüentemente utilizam
pinturas impressas e fotografias para imaginar e possibilitar que seus leitores imaginem a
antiga aparência das cidades não apenas os prédios, mas também, cães, cavalos que
vagueavam pelas ruas”. Nesse sentido, fotografias antigas o muito valiosas e
importantes para a reconstrução da história de vilas antigas, becos, ruas, casarões e
cortiços destruídos, porque imagens podem revelar a vida nesses lugares. As
fotografias selecionadas para esta pesquisa representaram um período da história de
Anápolis marcado pelas transformações econômicas e sociais inseridas no contexto de
modernidade e progresso, conforme enfatizava o jornal O Anápolis.
Modernidade é um termo polissêmico, uma vez que apresenta um sentido
diferente em cada época, ou seja, para cada cultura, cada região, tem um significado.
Neste estudo, o termo modernidade refere-se às transformações materiais que ocorreram
em Anápolis nas décadas de 1930-1960 e, em cada momento, com um aspecto
diferenciado.
A modernidade na década de 1930 foi concebida a partir da vinda da energia
elétrica para a cidade (1933), da construção de rodovias (1930) e da chegada da ferrovia
(1935), acontecimentos que demandaram mudanças nos bitos das pessoas. Em 1940, a
modernidade foi representada pela expansão do comércio, pela urbanização de praças e
ruas e pela ampliação do transporte rodoviário. Em 1950-1960, a ideia de modernidade
46
assumiu outros focos, como cuidar da beleza, construir uma nova capital para o Brasil,
modificar a estrutura das lojas de comércio, vender produtos e serviços por meio dos
anúncios, continuar a urbanizar as praças e construir o saneamento básico.
Assim, o conceito de modernidade, para alguns autores, estaria ligado ao
progresso e suas manifestações na área industrial, técnica e científica que, desde o século
XIII, orientam processos de transformações sociais, políticas culturais como os de
urbanização, nacionalização, secularização e democratização. Segundo a ótica de Trevor-
Hope (1981, p. 53), “[...] se consideramos os trezentos anos de história européia que vão
de 1500-1800, poderemos considerá-los, de uma maneira geral, como um período de
progresso”. A ideia de modernidade es vinculada ao progresso, ou seja, são conceitos
que se cruzam para representar o processo de transformações cnicas por que passou a
sociedade ocidental. Para Oliven (2001, p. 11), a modernização “[...] é associada ao
individualismo que substituiria gradativamente as relações mais pessoais de sociedades
tradicionais”.
Bartholo Jr. (2001, p. 23) incorpora a ideia de tempo para entender o significado
da palavra modernidade. Para esse autor, “[...] o tempo presente é o tempo da
modernidade. Assim a modernidade pode ser vista como um momento histórico”.
Tomando por base a ideia de tempo, é possível identificar, na concepção de Bartholo, a
modernidade em diferentes etapas da história de uma sociedade. Todo acontecimento
marcado pelo tempo como, por exemplo, os avanços técnico-científicos (a era do rádio, o
cinema, a televisão, a juventude rebelde dos anos 60, a construção de Goiânia e de
Brasília, a ferrovia, o automóvel) são símbolos da modernidade.
A modernidade, para Chacon (2007, p. 4), pode ser
[...] encontrada em fases históricas distintas. Portanto, se a
concretização relativa da modernidade ocorre em diferentes momentos
da história, cada momento é um tempo de realização da modernidade,
conforme o sentido que esta incorpora em confronto com o que deve
ser superado, identificado normalmente como tradicional. (2007, p. 4).
A ideia de modernidade apresentada por Chacon inspira nas sociedades
diferentes modos de identificar o moderno, como oposição ao tradicional, superação do
atraso e inserção no mundo tecnológico.
47
A esse respeito Diehl (2002, p. 22) argumenta: “O progresso como ‘modelo de
pensar é um fator social um conseqüente fator social, um conseqüente fator mental dos
princípios de conduta da vida e ele precisa ser colocado, como assim sendo, na ordem do
dia. Desse modo, o progresso está implícito na meria da coletividade e representa a
forma de pensar das pessoas sobre seu tempo, ou seja, os avanços na forma de agir e
pensar dos grupos sociais no tempo e espaço.
O progresso como categoria histórica desenvolveu-se, segundo Diehl, com a
[...] consolidação do progresso de modernização na metade do século
XVIII, quando das revoluções políticas na América do Norte e na
França, quando da Revolução econômica na Inglaterra, em que as
formas de vida começaram a ser operacionalizadas e perspectivas no
horizonte das culturas como algo a ser instrumentalizado. (2002, p.
25).
Com base nessa visão do progresso, foi sendo construída uma profunda e
inquietante experiência do processo de transformação da sociedade dita feudal, baseada
no estamento, em uma sociedade burguesa. Por outro lado, de acordo com Diehl, a ideia
de progresso também se constituiu
[...] como uma perspectiva do agir. O progresso integra e dinamiza as
experiências históricas em uma história ampla e coletiva, cujo sentido
está orientado através de uma inferência humana ativa para alterar as
reações e as vivências e atomizar a qualidade de vida. (2002, p. 26).
A modernidade e o progresso foram conceitos bastante enfocados nos discursos
do jornal para se referir aos acontecimentos verificados em Anápolis na primeira metade
do século XX, quando uma série de modificações foi dando à cidade a visualização de
centro comercial do estado de Goiás.
Os jornais de Anápolis faziam publicidade em defesa do novo, do progresso e do
moderno. O jornal Voz do Sul, que foi anterior ao jornal O Anápolis, via com otimismo o
progresso que seguiu a Estrada de Ferro, pois traria ânimo à população. O jornal
afirmava: “Dentro em pouco, ouviremos o alvo dos pulmões de aço da locomotiva, como
que dizer ao povo anapolino que se desperte que se levante que se anime que não há mais
razão para esmorecimentos” (VOZ DO SUL, 1º out. 1933).
O jornal estava se antecipando aos acontecimentos futuros quando a vida
tranquila, calma e monótona seria sucedida pelo movimento constante e apressado da vida
moderna, simbolizado pela velocidade da locomotiva. Nesse movimento contínuo, a
48
cidade ia sendo definida pelo traçado das ruas, becos e avenidas que se entrelaçavam para
dar-lhe vida.
Figura 7 - Rua 15 de Dezembro, esquina com a Rua Barão do Rio Branco, no fim dos anos 20.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
A Figura 7 ilustra a situação anterior à chegada da ferrovia. A visualização da
cidade tem como referência a Rua 15 de Dezembro no final da década de 1920. É visível
ainda a falta de infraestrutura urbana. Aplicando-se o método panofskyano, a descrição da
fotografia revela três casas e uma pessoa próxima à primeira casa. Vê-se a água
escorrendo pela rua e duas pessoas mais abaixo em atitude de observação. No quintal da
segunda e terceira casas, avistam-se folhas de bananeira além de capim e mato próximo às
casas, que são construídas seguindo as técnicas de períodos anteriores, como a estrutura
de madeira lavrada e a vedação em adobe, com portas e janelas de madeira voltadas para
a rua. A exceção fica por conta da cobertura que é de telha francesa e não colonial capa e
bica. Em frente às casas se observa um local para serem amarrados os cavalos. A primeira
casa apresenta uma cor amarelada, aparentando não ser pintada, sendo as demais
revestidas com pintura a cal.
A rua apresenta muitas deformações causadas pela ação das chuvas, pois é
visível a água escorrendo rua abaixo, além do capim que cresce nas suas proximidades.
Sobre a intenção dessa fotografia ao ser clicada, a descrição indica duas possibilidades:
ilustrar a situação da rua nas épocas de chuva ou ainda registrar as casas como memória
de família. Esta imagem foi doada ao Museu Histórico de Anápolis como parte da
memória histórica dessa rua.
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No decorrer da década de 1930, Anápolis foi aos poucos conhecendo um período
de crescimento urbano como resultado das inovações que chegaram com a iluminação
pública e a definição de ruas e casas residenciais e comerciais. A Figura 8 revela esse
período de crescimento vivenciado pela cidade em 1935. Na descrição da fotografia,
identificam-se casas velhas e novas, dezenas de pessoas que circulam na rua, cavalos,
carro, postes de luz elétrica e uma escavação no centro da rua. Ao se analisar a fotografia,
pode-se identificar uma rua ampla que oferece espaço para a circulação de pessoas,
cavalos e carros. As casas ocupam toda a extensão da rua, permitindo descrevê-las como
sendo comerciais e residenciais. O grande movimento de pessoas indica vida urbana
agitada, sugerindo um lugar de comércio.
Os postes de luz elétrica nas duas extremidades indicam acentuado consumo de
energia. A escavação no centro da rua ou avenida sugere a existência no local de serviços
urbanos, como canalização de água e esgoto. Quanto à intenção dessa fotografia, pelo
close da rua, pode ter sido registrar o crescimento o urbano da cidade que destaca a
extensão da rua. As dimensões da rua asseguravam mais espaço para o tráfego de
veículos, pois a ideia era preparar a cidade para o futuro, uma vez que o movimento que
se projetava para Anápolis era intenso.
Era necessário construir ou pelo menos demonstrar através da imagem o quanto
as ruas deveriam conter espaço para garantir o fluxo de riqueza numa cidade dinâmica.
Esta fotografia pode tamm chamar a atenção para a vala que se no centro da rua.
Observando os detalhes, percebe-se que a vala não fora provocada pela chuva, pois havia
terra nos dois lados. Era uma escavação longitudinal, como se fosse para canalizar a água
que seria levada até as casas ou para a captação das águas pluviais. Esta fotografia
pertencia ao acervo particular do Sr. Marco Antonio Veiga de Almeida, repassado ao
Museu Histórico de Apolis para fazer parte do acervo público destinado à pesquisa.
50
Figura 8 - Rua 15 de Dezembro, 1935.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Em 1935, o aparecimento do jornal O Anápolis se deu em meio às transformações
que estavam ocorrendo na cidade, no estado de Goiás e no Brasil. Foi nesse contexto que
esse jornal se apresentou como instrumento de divulgação da cultura, do trabalho, do
comércio, da política e da economia de Anápolis, conforme traduzia em editorial:
Annápolis é mais uma voz cujo echo de ressoar por toda a terra
Anhanguera exclusivamente, transmitindo aos seus leitores as notícias
da nossa evolução social e econômica de progresso, é o que aqui se
faz pelos altos interesses do Estado e do município da Annápolis cuja
fama já transpôs de muito, as linhas goyanas e quiça fronteiras dos
estados limítrofes. (O ANÁPOLIS, nº 1, 31mar. 1935, p. 1).
A imagem que o jornal construiu sobre Anápolis foi de uma cidade apresentável,
com casas, ruas e praças bem cuidadas, para impressionar o visitante e motivar os
moradores a divulgar o seu lugar. Esses fatores motivariam o visitante bem impressionado
a voltar e até mesmo o ajudariam a escolher a cidade para morar. A preocupação do jornal
com a aparência da cidade pode ser aqui comprovada: “Estão ocorrendo melhoramentos
locais, realizados pela administração municipal. Foram iniciados os preparativos da Praça
Americano do Brasil, em frente à Estação Goyás. Estando sendo feita a retirada dos
túmulos do velho cemitério (O ANÁPOLIS, 5, 28 abr.1935, p. 1). O semanário
insistia em mostrar ao morador da cidade que as coisas estavam mudando, como bem
exemplificava a construção do novo cemitério, uma vez que a modernidade não
combinava com a tradição de sepultar os mortos nas proximidades da cidade. No local do
antigo cemitério seria construída a Praça Americano do Brasil.
51
A perspectiva da chegada do trem impulsionava uma série de outras
transformações na cidade. A visão positiva foi destacada pelo jornal da seguinte forma:
“O local, outrora triste, começa a tomar um aspecto agradável, destacando-se do lado da
estação, as importantes construções dos armazéns e escritórios das firmas comerciais:
Pina & Michael e David Alexandre Tuma” (O APOLIS, 5, 28 abr.1935, p.2). Os
moradores também foram orientados pelas normas da Prefeitura no sentido de reformar
casas e prédios da cidade.
Os proprietários seguiam a regulação estabelecida pela administração municipal,
determinando que os moradores fizessem um esforço para limpar e pintar casas, prédios e
escritórios. Costa (1999, p. 50) considera que “[...] a regulação é o mecanismo de controle
que estimula, incentiva,diversifica, extrai, majora ou exalta comportamentos e
sentimentos até então inexistentes ou imperceptíveis”. Por meio da regulação as pessoas
são conscientizadas a aceitar a ordem não apenas pela abolição das condutas inaceitáveis,
mas, sobretudo, pela produção de novos comportamentos sociais.
Sobre a conduta da população ao atender as determinações do poder municipal, o
jornal assim se manifestou:
Muitos proprietários atendendo ao justo pedido da nossa prefeitura
começaram a reforma e pintura de seus prédios a fim de que os nossos
visitantes, por ocasião da inauguração encontrem uma cidade digna do
nome e progresso de Annapolis. (O ANÁPOLIS, nº 5, 28 abr. 1935, p.
4).
A inauguração a que o jornal se refere é a da Estação Ferroviária que se daria
com a chegada da primeira locomotiva a Anápolis. O jornal foi o canal de intermediação
entre a população e o Estado, assumindo o papel de propagador e divulgador da cidade.
Desencadeou-se, portanto, uma campanha de embelezamento da cidade, o que indicava o
controle do poder público sobre as ações da população, visando adequá-las às finalidades
sociais que se resumiam em preparar o ambiente para receber pessoas que chegavam de
diferentes regiões do estado e do país.
Na realidade, o que se pretendia era mostrar a capacidade de progresso da
cidade, de modo que ela se tornasse polo de atração de investimentos e de pessoas. A
cidade, segundo Costa (1999:53), “[...] em conseqüência, não podia continuar obedecendo
a seus antigos donos”. Nesse momento entram em cena os interesses do mercado
imobiliário, conforme destacou o jornal: “Annápolis está de fato se desenvolvendo, mas
para que seu desenvolvimento seja real é preciso que os proprietários de lotes nas zonas
52
suburbanas facilitem o mais possível a venda dos mesmos” (O ANÁPOLIS, nº 10, 6 jun.
1935, p. 1).
Como o crescimento da cidade era visível e ela necessitava de espaço para
abarcar esse crescimento, o jornal atuou como instrumento de pressão sobre os
proprietários de lotes nos arredores da cidade, no sentido de venderem essas propriedades
para que novos compradores adquirissem esses terrenos neles erguessem novas
edificações. A intenção era facilitar o povoamento da cidade.
A dificuldade observada pelo jornal encontrava-se no fato de que os
proprietários de terrenos nas proximidades do setor central ofereciam resistência em
desfazer de suas propriedades, pois muitas faziam parte de herança familiar. O jornal
representava os interesses dos comerciantes e do mercado imobiliário, por isso trabalhava
em favor da venda dos terrenos. De seu ponto de vista, isso traria investimentos para
Anápolis, ao mesmo tempo em que as pessoas sem condições de investir no seu terreno
seriam empurradas para lugares mais afastados da região central, com isso o mercado
imobiliário tendia a se valorizar. O jornal chamou atenção para a dificuldade que o
comprador enfrentava para adquirir um terreno no subúrbio:
Alguns proprietários, quando são procurados para negócio, pedem
preços absurdos, achando que Annapolis é uma metrópole. É
engano! Facilitemos a venda dos lotes e Annapolis será dentro em
pouco uma cidade grande progressista e cheia de vida. (O
ANÁPOLIS, nº 10, 1º jun. 1935, p. 1).
Nesse período em que as transformações espaciais foram ocorrendo em
Anápolis, é necessário compreender, conforme observou Costa (1998, p. 55), que a “[...]
transformação do espaço urbano procurava atender, exclusivamente, ao bem-estar e ao
enriquecimento da elite anapolina. O discurso do jornal procurava dar ênfase ao
progresso da cidade aliado ao empreendedorismo dos donos de imobiliárias, do governo
municipal, dos produtores rurais e dos comerciantes.
Devemos, portanto trabalhar, produzir e também auxiliar os
empreendedores. Quero em tudo isso referir-me à nossa Annapolis. O
comércio vai expandindo-se dia a dia, os lavradores almejam
aumentar suas lavouras porque, boas terras férteis o município possui.
Portanto de tudo nós temos, nos falta um pouco de boa vontade.
Em breve, muito breve, estaremos na realidade residentes na: Ribeirão
Preto de Goiás. (O ANÁPOLIS, nº 20, 11 ago. 1935, p. 2).
53
Essa metáfora utilizada pelo jornal O Anápolis na cada de 1930, comparando
Anápolis à cidade de Ribeirão Preto (SANTOS, 2006), estava vinculada à cultura do café,
que havia transformado a cidade paulista em um lugar rico e próspero, além de ter
impulsionado o desenvolvimento da ferrovia do café no fim do século XIX e início do
século XX.
Nesse momento foi importante para o jornal divulgar o comércio e a agricultura,
pois representavam a riqueza do município. Esse processo acarretaria, de acordo com
Deaecto (2002, p. 62), “[...] um processo mais amplo de modernização da estrutura
econômica e desenvolvimento urbano”. Esse mecanismo aparece como resposta às
necessidades criadas pela ampliação da produção agrícola, pela abertura de estradas, pela
ferrovia e a imigração. Isso conferiu à cidade de Anápolis um novo dinamismo que se
verificou no decorrer da segunda metade da década de 1930, especialmente quando se deu
a inauguração da estrada de ferro com a chegada da primeira locomotiva a Anápolis.
No dia 7 de setembro de 1935, foi inaugurada a Estação Ferroviária de Anápolis,
conforme registro fotográfico (Figura 4). Esse momento foi registrado pelo jornal O
Anápolis como a culminância de um projeto há muito acalentado pelo povo anapolino, do
qual era participante ativo e confiante nesses novos tempos. O jornal assim noticiou o
evento: “Anápolis viveu no dia 7 do corrente o maior dia de toda a sua história, com a
inauguração da Estrada de Ferro, aspiração máxima de seu povo” (O ANÁPOLIS, 15 set.
1935, p. 1). A ferrovia constituiu representação concreta da modernidade e do progresso
amplamente difundidos pelo jornal.
A expectativa de maior relevância estava depositada na atividade comercial, uma
vez que representava a abertura da cidade para a entrada de capital e a consequente
ampliação de outras atividades como o setor de finanças e serviços. Ao estudar o
comércio em São Paulo com uma visão administrativa, Deaecto (2002, p. 170) observou
que a cidade “[...] deixava de ser uma miniatura do Estado, para se tornar uma corporação
de empreendimentos”. A partir daí a municipalidade atuava para atender os interesses
privados, com isso fomentava as atividades urbanas, especialmente aquelas voltadas para
o comércio. Deaecto (2002, p. 170) completa: “[...] o corcio ganha as ruas, faz
multiplicar suas gentes e suas mercadorias”. o Paulo e Anápolis são realidades
diferentes, no entanto o que se observa é que, em Anápolis, a administração municipal
atuou decisivamente no processo de ampliação do comércio.
54
Para a cidade, era bom esse movimento no sentido de que o comércio ganhasse
outras ruas além da Rua Antonio Carlos. Esse foi o caso das Ruas 14 de Julho, Barão de
Cotegipe, Engenheiro Portela e General Joaquim Inácio, entre outras. Para o comércio,
melhor ainda, porque, am do preparo da cidade e do incremento comercial sugerido pela
ferrovia, a iniciativa privada “[...] arregou as mangas e tornou-se visível o processo de
crescimento de Anápolis” (O ANÁPOLIS, 48, 22 mar.1936, p. 4). Os comerciantes
deixavam-se fotografar juntamente com a família e empregados como forma de
apresentar-se aos clientes.
As mudanças na estética urbana continuaram nos anos seguintes, em razão das
“[...] novas necessidades e novas formas de progresso” (COELHO, 2004, p. 130) que
haviam surgido com a chegada da ferrovia na cidade.
Em 1936, em meio às modificões que estavam ocorrendo na cidade, o jornal
destacou a continuação do processo de sua urbanização com o seguinte comentário:
Com prazer transmitimos aos leitores a notícia de que foram
iniciadas as obras preparatórias para o ajardinamento da Praça
Americano do Brasil, que fica em frente à estação. O trecho da rua
Antonio Carlos além da praça João Pessoa pouco tempo
desagradável aspecto, está sendo completamente transformado pelo
abaulamento e sarjeteamento e bem assim a Avenida Xavier de
Almeida. (O ANÁPOLIS, nº 48, 22 mar. 1936, p. 4).
A arrumação da cidade era uma necessidade, tendo em vista a sua preparação
para acompanhar a modernidade que estava chegando pela ferrovia. Os moradores
acompanhavam os acontecimentos por meio do jornal, que divulgava os lugares em que
estavam sendo realizados trabalhos de melhoria urbana. Aqui o jornal atuou como
interlocutor entre a população e o poder público, no sentido de dizer que a Prefeitura
estava trabalhando em benefício da cidade, ou seja, pelo jornal a população tinha
visibilidade do trabalho que estava sendo realizado na cidade, bem como dos lugares em
que estava acontecendo algum tipo de atividade. No dia da inauguração da estação
ferroviária, o povo compareceu em massa para prestigiar o grande acontecimento.
55
Figura 9 - Festa da chegada do trem de ferro em 7 de setembro de 1935.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Observando a Figura 9, vê-se parte de uma estação ferroviária onde pessoas
estão postas aguardando um acontecimento, uma fanfarra toca enquanto um aglomerado
de pessoas observa uma locomotiva se aproximar da estação. A fotografia retrata a
chegada do primeiro trem na Estação Ferroviária de Anápolis e o momento em que a
população da cidade, autoridades, sicos e convidados assistem à realização desse
acontecimento, uns com entusiasmo, outros por curiosidade. A animação por parte das
pessoas é visível a começar pelas roupas, chapéus e calçados, pois estão vestidas para um
dia especial. Esta imagem mostra um acontecimento histórico de grande importância para
Anápolis, no entanto sua intenção foi registrar o momento em que a primeira locomotiva
chegou à Estação Ferroviária de Anápolis.
A inauguração, propositadamente, ocorreu junto com os festejos vicos do dia
da Independência do Brasil. Esse acontecimento representou para os anapolinos o início
de uma nova era de progresso fundamentada no espírito cívico da população. Claramente
reforçou a intenção de se construir a cidade com base nos fundamentos do positivismo em
que a ordem social e o civismo conduziriam ao progresso.
56
Figura 10 - Desfile Cívico de 7 de setembro de 1935.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
O período no qual essas imagens foram captadas (1935) representa um momento
de efervescência vivido pela cidade. Muita coisa ocorria ao mesmo tempo em virtude da
chegada dos trilhos, o que, para muitos, mudaria os rumos do comércio e da própria
estrutura urbana. Esse momento, segundo Freitas e Polonial, era percebido da seguinte
forma:
Anápolis vivia em efervescência, raro o dia em que não chegavam
pelos vagões de passageiros da Estrada de Ferro Goiás, comerciante
com objetivos definidos de aquisição de mercadorias, um
representante comercial de alguma empresa do sul, com esperança de
abrir ou ampliar o mercado para a empresa que representava ou, ainda,
um aventureiro disposto a realizar o negócio capaz de mudar sua vida.
(1998, p. 74).
O comércio passou a ser o motor da economia anapolina, daí a importância da
chegada dos novos imigrantes que para se dirigiam no intuito de fazer negócios. Esse
momento representou a oportunidade que muitos sonharam, por isso era tão importante
serem fotografados em seu comércio. A fotografia da Figura 11 ilustra um desses
momentos em que o proprietário do comércio faz pose em frente ao seu estabelecimento
juntamente com sua mulher, filhos e empregados.
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A descrição da imagem revela uma casa com telhado de telhas francesas, quatro
portas e duas janelas voltadas para a rua. Observam-se seis pessoas como se estivessem
postadas para a foto. Visualiza-se a calçada por onde as pessoas circulam e, pela inscrição
na fotografia, identifica-se a Casa Luziana em 1935. As pessoas podem ser o
comerciante, sua família e funcionários. Conforme a descrição iconogfica, a imagem
fornece indícios de que as construções das casas comerciais de meados da década de 1930
se diferenciavam das edificações das décadas anteriores. A começar pela cobertura feita
com telha francesa industrializada, com o modelo do telhado tipo chalé, indicando que foi
construído com madeiramento serrado a máquina, ao contrário do trabalho de lavrar a
madeira, como se fazia anteriormente. As portas eram de madeira, assim como as janelas
que já possuíam bandeirolas de vidro.
O comércio está localizado na esquina, ou seja, no cruzamento de ruas e a
calçada simboliza urbanização, pois define o lugar dos veículos de transporte. Ali, nas
calçadas, as pessoas circulam e observam o movimento. A rua é local de circulação de
autoveis, bicicletas, carroças e caminhões. A intenção da fotografia pode estar
vinculada à recordação de família, uma vez que retrata pessoas postadas intencionalmente
para serem fotografadas. Ao ser doada ao Museu Histórico, a fotografia tornou-se
memória e fonte de pesquisa histórica sobre as casas comerciais na década de 1930.
Figura 11 - Casa Luziana, 1935.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
58
Em 1936, a cidade apresentava aspectos visíveis de transformação, como
demonstra a fotografia da Figura 12, na qual se observa a Rua Antônio Carlos (atual
Manoel D’Abadia), uma das ruas mais importantes da cidade na década de 1930. Ao
proceder à descrição da imagem, identificam-se uma rua com pessoas circulando pela
calçada, casas em vários estilos e tamanhos à direita. Olhando à esquerda, observam-se
árvores em toda extensão da calçada, além de postes de iluminação. Esses elementos
fornecem indicações de que a rua fotografada denominava-se Rua Antonio Carlos,
posteriormente Manoel D’Abadia. As casas, em estilo europeu, indicavam que a ferrovia
imprimia sua influência, uma vez que representava o espírito moderno da cidade naquele
momento.
Figura 12 - Rua Antônio Carlos (atual Manoel D’Abadia), 1936.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
A influência da ferrovia podia ser percebida no formato dos telhados dessas
casas, segundo o modelo do chalé europeu. Esse fenômeno era visível em outras cidades,
conforme descreveu Morais:
[...] as estações de ferro tornaram-se importantes referências para as
comunidades. Em torno delas, muitas cidades se desenvolveram e
outras surgiram com a implantação da ferrovia. São edifícios das mais
variadas tendências e representavam na época o que havia de mais
moderno em termos construtivos. (1991, p. 7).
Em Anápolis, a ferrovia atuou como termômetro do que acontecia em outros
lugares, as pessoas imprimiam na cidade as marcas da modernidade importadas da Europa
59
e de outros estados brasileiros mais adiantados. Nessa rua fotografada, residia parte da
elite da cidade. Nela também faziam seus negócios, o que a levou a receber a
denominação de “rua do comércio”, uma referência às lojas que ali se instalaram nas
primeiras décadas do século XX.
Ainda em 1936, o jornal O Anápolis enfocava o intenso trabalho de construções
que estava ocorrendo na cidade, embora destacasse que ainda havia resistência por parte
de alguns moradores em não acompanhar a modernidade. Isso indica que havia aqueles
que resistiam ao novo, preferindo manter a tradição.
Tem sido deveras intenso o movimento de construções em nossa
cidade, entretanto, poucos são os prédios que obedecem a esthetica
moderna ou mesmo, que tenham sido construídos de acordo com as
exigências actuais. temos um número relativamente grande de ruas
beneficiadas, mas os passeios ainda não foram feitos prejudicando
assim não a esthética como também o embelezamento das ruas. (O
ANÁPOLIS, nº 44, 19 abr. 1936, p. 4).
Neste texto, jornal critica o descumprimento das normas estabelecidas para a
estética dos prédios pelos construtores. Essa atitude descaracterizava a intenção de
modernidade exigida pela administração municipal.
Com os trilhos, surgiu a necessidade de construir prédios que acompanhassem a
influência vinda de outros lugares como o Paulo e Minas Gerais, uma vez que a
modernidade partia desses locais, especialmente a arquitetura e a forma urbana. Sobre
isso Coelho (2004, p. 129) esclarece: “[...] essas cidades tiveram a oportunidade de
conhecer, com maior ou menor intensidade, as possibilidades da modernização. Elas
passaram por modificões, tanto físicas quanto culturais, a contar inclusive com a
implantação de serviços de infra-estrutura”.
Figura 13 - Rua 14 de Julho, esquina com Barão de Cotegipe, 1937.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
60
Em 1937, eram visíveis na cidade as marcas do novo tempo tanto no traçado das
ruas quanto nas construções, conforme ilustra a Figura 13. A descrição da imagem
permite identificar uma rua por onde um grupo de ciclistas passeia ou participa de um
campeonato, pessoas que passam e param para observar o movimento, um cavaleiro
próximo ao comércio. No fim e à direita da rua, visualiza-se uma sequência de
construções velhas e novas. A análise aponta para a Rua 14 de Julho, esquina com a Rua
Barão de Cotegipe. Em primeiro plano, observa-se uma casa comercial (Casa Luziana)
localizada em esquina e com quatro portas e, mais ao fundo, vê-se um casarão em estilo
de sobrado. O movimento de ciclistas indica que estava ocorrendo na cidade um passeio
ou uma competição entre eles. Esse acontecimento atraiu a atenção das pessoas que
circulavam pela rua e, próximo ao comércio, um homem a cavalo seguia em direção à
Rua Barão de Cotegipe. São visíveis postes de iluminação pública.
Essa rua também se destacou pelo comércio, pois ali foram se estabelecendo
inúmeros comerciantes atacadistas, com destaque para “[...] a Casa Ideal de propriedade
de Inácio Borges. Encontravam-se ferragens, louças, vidros, roupas feitas, calçados,
chapéus, guarda-chuva, sombrinhas, malas, armarinhos e perfumaria em
geral” (PUBLICIDADE FRIEDMANN, 1957, p. 165). A Rua 14 de Julho foi palco da
boemia da cidade.
Em razão da grande concentração de riqueza da nossa florescente
cidade, ela se tornou o centro boêmio de toda região, principalmente
com o advento da construção de Brasília de onde vinham desaguar os
novos ricos da epopéia que viveu aquele tempo. (ARIMATHÉA,
2007, p. 52).
O local oferecia diversão e prazer aos visitantes e ao morador da cidade com seu
diversificado comércio de bares.
As imagens da cidade veiculadas pelo jornal O Anápolis assumiram a função de
mostrar o comércio como um processo vital para a vida urbana de Anápolis. Reforçando a
idéia de aproximação na relação comércio–cidade, Cardoso e Mauad (1997, p. 406)
salientam que “[...] a cidade constitui um aglomerado humano caracterizado por trocas
comerciais regulares capazes de prover o sustento de seus habitantes”. Esse processo de
trocas comerciais em Anápolis foi construído ao longo do tempo. Outros benefícios
públicos iam sendo oferecidos à população, como a telefonia e a educação. O telefone
oferecia oportunidade para as pessoas se comunicarem a distância; a educação, por sua
vez, era imprescindível para o engajamento do jovem no mercado de trabalho. O
61
conhecimento escolar oferecia oportunidades de trabalho na cidade, pois, à medida que o
comércio se diversificava, havia novas demandas profissionais.
Em 1937, o prefeito José Fernandes Valente assinou o contrato para a instalação
da rede telefônica em Anápolis. O jornal O Anápolis referiu-se ao fato na seguinte nota:
“[...] esse foi mais um passo em direção ao progresso e à modernidade(O ANÁPOLIS,
20 jun. 1937, p. 1). Outro assunto da época foi a vinda para Anápolis das irmãs salesianas
com a finalidade de trabalhar pela educação das moças. Sobre isso Ferreira (1981, p. 67)
comenta: “Com a vinda dessa Congregão os rapazes anapolinos ficarão sem escola
secundária, uma vez que o seu regulamento não aceita alunos do sexo masculino”. Nos
anos 30, as escolas confessionais dirigidas por freiras ministravam educação escolar
para moças, e o mesmo método se aplicava às escolas de padres nas quais eram recebidos
somente rapazes.
Em 1938, com a instalação do Estado Novo, o prefeito passou a ser nomeado
pelo Interventor Pedro Ludovico Teixeira, o qual nomeou o então prefeito Valente para
continuar à frente da administração municipal. Esse período de intervenção foi difícil para
as administrações municipais, pois o Interventor Estadual controlava todos os atos dos
prefeitos. Referindo-se a esse período, Ferreira (1981, p. 69) relatou que, “[...] para a
aquisição de um simples caminhão, a Prefeitura tinha de requerer crédito especial ao
Departamento das Municipalidades, e os processos, geralmente, arrastavam-se com a
mais desinteressada morosidade”.
Durante esse período, a cidade continuava crescendo e modernizando-se
financiada pelo capital que circulava produzido pela cultura do ca e do arroz. Isso
promovia o intercâmbio com outros municípios do estado de Goiás. Nesse período, ao se
olhar a cidade, era visível a rua, a calçada, a iluminação blica, as casas e prédios bem
cuidados pelos moradores. Ao se proceder à descrição da fotografia da Figura 14,
observa-se que na rua crianças que brincam e outras que observam. Nas duas
extremidades, vê-se a calçada por onde pessoas circulam enquanto outras observam as
crianças. São visíveis as sarjetas por onde escorre a água da chuva, também são vistos
postes de iluminação blica e dois prédios grandes, de onde pessoas observam o
movimento na rua. Seguindo a rua, horizontalmente, são visíveis várias casas velhas e
novas. Na extremidade da rua, avista-se uma elevação coberta de pasto.
Na análise dos elementos descritos, eles podem ser reconhecidos como a Rua
Achiles de Pina (antiga Getúlio Vargas), tida como “rua do comércio” por abrigar a casa
62
comercial Rainha da Barateza, o Cine Áurea e a Intendência Municipal. A rua nas duas
extremidades tem sarjetas para facilitar o escoamento da água pluvial, entre as casas e a
rua não afastamento, entre uma casa e outra se percebem muros que demarcam os
terrenos, ou seja, as casas não estão ligadas umas às outras. Isso indica um novo padrão
de construção urbana para a década de 1930. A primeira casa à direita era a residência do
prefeito José Fernandes Valente e a primeira casa à esquerda era a Farmácia Mineira, um
dos primeiros pontos de comércio dessa rua, juntamente com a Rainha da Barateza. Essa
farmácia era propriedade do prefeito. Os desenhos frontais dos dois prédios indicam a
influência da arquitetura paulista e européia no período do café. A terceira casa
situada à esquerda da fotografia mostra ser uma construção antiga, pois se observa capim
no telhado além de portas e janelas voltadas para a rua. Olhando à direita, vê-se a segunda
casa. Analisando-a, atentamente, percebe-se que as colunas que lhe dão sustentação foram
feitas de madeira lavrada e as paredes podem ter sido feitas com adobe. O telhado, em
estilo colonial, era muito utilizado na década de 1930. Esses detalhes nas construções
indicam que essa foi uma das primeiras ruas de Apolis.
A intenção dessa fotografia era focar as crianças brincando ou registrar detalhes
da rua e de sua arquitetura, especialmente os dois prédios de propriedade do prefeito. A
fotografia geralmente era um luxo utilizado pelos ricos, daí esses registros serem feitos
por essas pessoas de forma intencional ou não.
Figura 14 - Rua Achiles de Pina, 1939.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
A década de 1930 terminou com grandes conquistas para a cidade, conforme se
percebeu no decorrer do estudo. No entanto, o progresso continuou na década de 1940,
63
período de solidificação do comércio e de ampliação dos meios de transporte e de
comunicação. A materialidade da cidade ganhou maior visibilidade graças às construções
comerciais e residenciais influenciadas pela arquitetura art déco
2
de Goiânia. As ruas
receberam arborização e pavimentação, as praças tamm foram arborizadas e ganharam
forma por causa dos canteiros de flores e plantas ornamentais.
A imaterialidade ampliava seu espaço na mente das pessoas através da
escolarização, da informação transmitida pelo jornal e pelo rádio. Isso fez com que as
manifestações passassem a fazer parte das reivindicações da população por melhores
condições de trabalho, pela educação, contra a carestia, entre outras. O dinamismo
favorecido pela relação campo–cidade e complementado pela ferrovia fez surgir a
comparação de Anápolis com Ribeirão Preto paulista.
2.2 Próxima parada: Terra da Promissão
Em 1940, Anápolis foi idealizada como a Terra da Promissão, a terra dos sonhos
e das oportunidades, um lugar em que a terra favorecia o cultivo da agricultura e a criação
de gado. Além disso, o comércio varejista e atacadista fazia a riqueza circular num
processo dinâmico, em grande parte fomentado pela produção do campo.
Era raro o dia em que não chegava a Anápolis um trem com mercadorias para ser
descarregado na plataforma da estação ferroviária da cidade. O comércio nesse período
era o principal gerador de riquezas do município. Sobre a dinâmica da economia gerada
pelo comércio, Polonial (2000, p. 75) destacou o crescimento significativo de
estabelecimentos comerciais. “O setor atacadista cresceu 1.533,34% no período de 1935 a
1948, enquanto as máquinas de beneficiamento tiveram um crescimento de 212,50% no
mesmo período”.
Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) destacaram,
no Censo de 1940, a importância do comércio de Anápolis no cenário de Goiás. Segundo
esses dados (POLONIAL, 1995), Anápolis concentrava o maior número de
estabelecimentos comerciais no estado de Goiás, com “10,34% do total”. Os reflexos
desse movimento podem ser percebidos nas fotografias das figuras 15 e 16, nas quais se
2
Art déco: estilo predominante nas primeiras décadas do século XX, manifestando-se na arquitetura,
artes aplicadas e moda. Ver mais em: MELLO, Márcia Metran de. Goiânia: cidade de pedras e de
palavras. Goiânia: Ed. UFG, 2006.
64
constata que o transporte de mercadorias era realizado por veículos de tração animal e
automotores.
As atividades realizadas com a utilização de veículos de tração animal eram
desenvolvidas por trabalhadores autônomos, que não se inseriam nos ofícios de trabalho
formal, no entanto eram muito úteis no dia-a-dia da população. Esses trabalhadores,
carroceiros, realizavam o transporte de cargas desde o vagão até os pontos de distribuição
em diversos locais de Anápolis.
Figura 15 - Praça da Estação (década de 1940).
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Descrevendo as atividades desempenhadas por esses trabalhadores na cidade de
Salvador, Hildelgardes Viana caracterizou o ofício dos carroceiros considerando sua
escala social e sua importância no cotidiano da cidade:
Ser carroceiro era ocupar um degrau bem baixo na escala de
profissões. Mas o carroceiro não é um ser desprezível. A maioria era
rude nas maneiras, difícil no trato e de linguagem desabrida. Mas
nunca se poderá desmentir a sua utilidade, o papel importante que
desempenhavam na vida cotidiana da cidade. (1979, p. 99).
A Figura 15 fornece indicações sobre o papel do carroceiro na plataforma de
embarque e desembarque de pessoas e mercadorias da Estação Ferroviária de Anápolis.
Esta fotografia mostra o desembarque e a distribuição de mercadorias no momento da
chegada do trem durante os anos 40. As carroças, geralmente puxadas por dois cavalos,
65
eram guiadas pelo carroceiro e, eventualmente, por um ajudante. O peso variava entre 100
e 500 kg. Duas rodas grandes de madeira sustentavam o peso transportado.
Na Figura 16, fica evidenciado esse movimento quando se faz a descrição
detalhada dos elementos mostrados: uma composição de trem cargueiro com quatro
vagões, nos quais se visualiza um grande carregamento de mercadorias em sacas de 60
kg. Próximo aos vagões um caminhão sendo carregado por dois homens postos no
vagão e que entregam as sacas para outros dois que as colocam no caminhão. Ainda é
possível ver um homem próximo ao caminhão e dois que aguardam a sua vez em um
pequeno carro puxado a mão, no qual também uma criança sentada. Ao longe se
identifica a estação onde muitas pessoas aguardam o embarque.
Figura 16 - Logística de embarque e desembarque da Estação Ferroviária de Anápolis nas
décadas de 1940-1950.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
A análise dessa imagem revela o grande movimento de embarque e desembarque
de mercadorias em Anápolis nos anos 1940-1950; elas eram transportadas através da
ferrovia. A intenção dessa fotografia foi registrar a importância da ferrovia para a
produção de riqueza no município. Esse movimento de compra e venda de produtos e
serviços transportados por ela propiciou o desenvolvimento de dois segmentos comerciais
que se tornaram pujantes nesse período – os varejistas e atacadistas.
O crescimento econômico de Anápolis foi considerável na década de 1940 e
pode ser percebido nos pedidos de licenciamento expedidos pela Prefeitura nos anos
66
1941-1943. A expansão da cidade era concretizada tanto no número de residências quanto
de prédios comerciais.
Quadro 3 - Licenciamento de prédios em Anápolis: 1940-1943.
Tipo 1941 1942 1943 Total
Residencial 5 29 36 70
Comercial
5 15 70
90
Total Geral
10 44 106
160
Fonte: Polonial (2000, p. 76). Dados trabalhados pelo autor.
Na cidade, desenvolveram-se consideravelmente tanto o comércio atacadista
quanto o varejista. Com uma população estimada em 50.338 habitantes (POLONIAL,
1995), na década de 1950, Anápolis contava com 56 firmas comerciais de propriedade de
sírios e libaneses, algumas das quais se dedicavam ao comércio varejista e outras ao
atacadista.
Os pedidos de licenciamento de novos estabelecimentos comerciais referiam-se,
segundo Polonial,
[...] aos mais variados tipos de comércio, como: perfumaria,
alfaiataria, perfumaria, ferragens, sapataria, padaria, hotel,
beneficiamento de arroz e café, tecidos, verduras secos e molhados,
lanchonetes e botequins, oficina mecânica, móveis, agencia de
bicicleta, couros e peles, autopeças, açougue, roupas, além de
estabelecimentos de diversões e até consultório odontológico. (2000,
p. 77).
O resultado da pesquisa aponta para o crescimento do comércio formal,
licenciado pela Prefeitura nos anos 1941 a 1943, e não leva em consideração a
informalidade. Esse crescimento no número de edificações residenciais e comerciais
provocou a necessidade de urbanização dessas áreas da cidade.
Sobre esse assunto, o jornal O Anápolis registrou sua opinião: “Para que esse
surto de prosperidade se torne mais intenso, é necessário que nossa cidade tenha
67
solucionado um dos seus mais inadiáveis problemas a rede de esgoto sanitário,
abastecimento de água e calçamento” (O ANÁPOLIS, nº 438, 10 jan. 1943, p. 3).
O predonio dos estabelecimentos comerciais, varejistas ou atacadistas, sobre a
indústria de beneficiamento de arroz e café, reforça o que disse Polonial (2000, p. 75): “O
setor terciário passa a ser mais dinâmico do que o setor primário. Esse fator contribuiu
decisivamente, para o impulso na urbanização da cidade, pois cada vez mais as pessoas se
deslocavam para a sede do município, tanto para fixar residência quanto para promover
transações comerciais”.
A construção de casas residenciais e comerciais era constante. O volumoso e
diversificado comércio anapolino objetivava atender “[...] uma vasta região de Goiás, que
correspondia a 36,0% da área do Estado, com uma população de 49,0% dos goianos,
englobando um total de 31 municípios” (POLONIAL, 2000, p. 76). O mapa (Figura 14)
demonstra o espaço ocupado durante as décadas de 1940 e 1950. Novos bairros iam
surgindo em locais distantes da área central com uma morfologia diferente daquela
existente até então.
LEGENDA: Evolução espacial de Anápolis
1940 1950
Figura 17 - Mapa da evolução da ocupação espacial de Anápolis, 1940-1950.
Fonte: Plano Diretor de Anápolis, dez. 2005.
Ao se analisar o mapa da Figura 17, percebe-se que, na década de 1940, houve
um crescimento considerável do espaço habitado em Anápolis. Esse crescimento foi se
68
acentuando após a chegada da ferrovia que permitiu a entrada de imigrantes de todas as
regiões do país, atraídos pelas oportunidades oferecidas pela agricultura e o comércio do
município. No entanto, pela extensão da ocupação verificada no mapa, fica claro que a
década de 1950 foi o período em que houve uma grande ocupação do espaço na cidade.
A ferrovia expôs a cidade a novos desafios, novas demandas para atender a
população (comerciantes, empresários, profissionais liberais, proprietários rurais), bem
como as pessoas que chegavam para fixar residência. O crescimento da cidade
demandava a ampliação dos espaços residenciais. Para atender essa demanda, novos
loteamentos foram lançados por meio da publicidade do jornal O Anápolis. Esses
loteamentos eram destinados a um comprador exigente e disposto a investir em lugares
onde houvesse tranquilidade, conforto, segurança, áreas verdes e fossem distantes do
setor central da cidade.
A ideia de expansão espacial da cidade surgiu logo após a chegada do trem, em
1935, conforme anunciava o jornal O Anápolis do dia 8 de agosto: “Um novo bairro vai
surgir”. Essa ideia de construir um novo bairro afastado do centro, segundo Ferreira
(1981, p. 65-66), “[...] ocorreu porque os terrenos situados a partir da Praça Bom Jesus,
em direção ao poente, pertencentes à fazenda Catingueiro, haviam sido comprados e
loteados pela Prefeitura, com o nome de Bairro Bom Jesus, que passaram a ser vendidos a
partir de 1913”.
Todavia, esse empreendimento imobiliário só se tornou possível em meados dos
anos 40, quando a cidade necessitava expandir-se para atender A demanda dos
moradores. Isso pode ser observado na Figura 18. Em 1945, Anápolis pôs em evidência
um grande empreendimento imobiliário, considerado uma inovação para a época.
Lançou-se o loteamento do Bairro Jundiaí, um empreendimento imobiliário de grande
repercussão na cidade. Esse fato pode ser constatado pela ênfase dada ao assunto pelo
jornal O Anápolis. Além da publicidade semanal, em que publicava a planta do novo
bairro, trazia ainda informações sobre a importância desse investimento para a cidade. O
novo bairro foi denominado “Nova Anápolis”, em virtude das características do local, que
se apresentava como um lugar mais saudável, ou seja, era um prolongamento da cidade,
mas surgia de modo diferente da parte existente, cuja ocupação havia sido espontânea.
Nesse bairro havia planejamento, fora traçado com base em conhecimentos de engenharia
e arquitetura. Na Figura 18, são visíveis os espaços destinados aos equipamentos públicos
como praças e escolas.
69
Figura 18 - Anúncio de venda de loteamento.
Fonte: Jornal O Anápolis, nº 450, jun. 1945, p. 3.
Este loteamento representou um marco na expansão espacial da cidade por ser um
espaço urbano planejado. Era novidade em termos imobiliários, uma vez que fora
planejado com avenidas e praças distribuídas por toda a extensão do novo bairro, de
forma que atendesse a população e privilegiasse a circulação de pessoas e automóveis. A
publicidade veiculada pelo jornal destinava-se, especialmente, ao seu público leitor. Esses
leitores, direta ou indiretamente, divulgavam essas informações à população, pois
atuavam como receptores e divulgadores das idéias veiculadas pelo jornal.
A partir do loteamento do Bairro Jundiaí, novos lançamentos foram aparecendo
para atender a demanda causada pelo crescimento da cidade, resultante do crescimento
econômico impulsionado pela ferrovia. Entre 1935 e 1950, a população urbana de
70
Figura 19 - Anúncio de loteamento.
Fonte: Jornal O Anápolis, n° 688, junho de 1947, p. 2.
Anápolis passou de “7.559 habitantes para 18.350 habitantes, conforme assinala
Polonial (1995, p. 42). Em junho de 1947, o jornal O Anápolis trazia estampado nas
páginas destinadas à publicidade o mapa do bairro Vila Jayara, denominado “Sanatório de
Anápolis” (Figura 19) e localizado no alto da Capuava. A metáfora utilizada fazia alusão
às suas vantagens relacionadas com a saúde da população, graças à sua altitude. Esses
bairros planejados previam energia elétrica, postos de saúde, escolas, água e esgoto e
linha de ônibus entre outros serviços, como forma de higienizar a cidade. Segundo o
jornal:
O novo bairro estaria a 1100 metros de altitude, apresentava um belo
panorama e tinha ótima aguada. Ficava a pouco mais de um
quilômetro da Avenida Tiradentes, além desses requisitos oferecia a
possibilidade de linha de ônibus, hospital, escola igreja, praça de
esportes. A partir de mil cruzeiros (Cr$:1.000,00) esses terrenos
poderiam ser adquiridos. (O ANÁPOLIS, jun. 1947, p. 2).
O bairro Vila Jayara foi um investimento imobiliário destinado às famílias de
baixa renda e de trabalhadores. A comparação com o loteamento do Bairro Jundiaí
evidencia algumas diferenças entre ambos. Enquanto a publicidade direcionada ao Jundi
apresentava-o como a Nova Anápolis, com largas avenidas, espaço verde, praças com
amplo espaço para o lazer da população, o bairro Vila Jayara, além de localizar-se mais
distante do setor central, tinha poucas opções de lazer para a população. Os bairros
populares foram se estabelecendo em áreas mais distantes da área central. Isso indica que
71
o setor central ia se definindo como área comercial, embora nele houvesse espaços
residenciais.
O crescimento da cidade possibilitou que alguns setores ligados aos serviços se
expandissem de forma considerável nas cadas de 1940-1950. Os setores de hotelaria,
diversões, escritórios, saúde, armazenamento, transporte rodoviário de cargas e financeiro
foram os que mais cresceram nesse período.
A constrão do edifício do Hotel Itamarati demandou a utilização de ferragens
e concreto na sua estrutura, o que significou a necessidade de instrumentos de engenharia
moderna como o elevador. O Hotel Itamarati foi construído seguindo o padrão
arquitetônico dos edifícios de Goiânia, especialmente o estilo do Grande Hotel, refletindo
a modernidade e a prosperidade econômica da época. Nas casas comerciais se destacaram
a platibanda e a marquise de concreto. As janelas eram fabricadas com esquadrias de ferro
e vidro, além disso uma feição art déco nas fachadas revelava a influência também
transplantada de Goiânia. O salão de sinuca era indicação de que havia nas proximidades
do hotel diversão para atrair os hóspedes.
Figura 20 - Atual Hotel Itamarati. Primeiro Edifício com elevador construído em 1948.
Fonte: Personalidades- Sociedade, Cultura, Indústria e Comércio, 2004.
72
No período, Anápolis contava com hospitais importantes como o Hospital
Evangélico Goiano, fundado em 1927 pelo dico James Fanstone, especialista em
higiene tropical. Em 1939 foi fundada a Casa de Saúde Nossa Senhora de Lourdes. Na
década de 1950, outros hospitais e clínicas foram surgindo em virtude do aparecimento de
novos profissionais da saúde e do crescimento populacional de Anápolis. Entre esses, o
destaque foi o Hospital Nossa Senhora Aparecida, fundado em 1953, sob a direção dos
médicos Dr. Odorico Silva Leão Jr., Dr. Gibrahyl Miguel e Dr. Ivan Roriz.
Figura 21 - Escola de Enfermagem.
Fonte: Jornal O Anápolis, jan. 1944, p. 4.
A Escola de Enfermagem Florence Nightingale, inaugurada em 1937 como
anexo do Hospital Evangélico Goiano, foi o primeiro edifício em altura com quatro
andares, conforme mostra a fotografia da Figura 21. O segundo foi o edifício do Hotel
Itamarati, identificado na fotografia da Figura 20, com cinco andares, também localizado
na Rua Antonio Carlos (atual Manoel D’Abadia).
Sobre o edifício da Escola de Enfermagem, o jornal assim se expressou: ”[...]
magfico monumento da arquitetura goiana se ergue na Praça João Pessoa, vendo-se à
sua frente, parte do jardim público. Notadamente é o mais alto edifício do Estado de
Goiás, tendo quatro andares, obedecendo aos mais modernos estilos de construção
cosmopolita” (O APOLIS, 17 jan. 1943, p. 7).
A Casa de Saúde Nossa Senhora de Lourdes destacou-se por sua arquitetura art
déco, semelhante àquela que se via em Goiânia. Outra característica da construção estava
73
no afastamento entre a edificação e a rua, conforme mostra a Figura 22, o que permitia a
existência de jardins. Essa relação entre edifício e logradouro blico altera a morfologia
da cidade.
Figura 22 - Casa de Saúde Nossa Senhora de Lourdes.
Fonte: Jornal O Anápolis, jun. 1946, p. 2.
No processo de desenvolvimento da cidade, percebe-se que há uma inter-relação
entre a modernidade e o progresso vinculados ao setor de serviços. O comércio é uma
atividade que provoca outros eventos no seu entorno, como esses que foram mostrados
nos parágrafos anteriores, além daqueles que lhe dão suporte: serviços bancários, serviços
de cafés e outros. Conforme Deaecto (2002, p. 92), “[...] o comércio era justamente a
atividade que, devido ao seu caráter abrangente, servia de base para que pudesse avaliar o
comportamento ecomico” dessas outras atividades que se desenvolveram em seu
entorno.
A fotografia da Figura 23 ilustra esta atividade ao mostrar caminhões de
transporte de cargas estacionados próximo ao comércio. Pessoas ao lado do caminhão
observam o que está ocorrendo. Tudo indica que na rua predomina a atividade comercial,
especialmente pelas características das edificações; em uma delas, com platibanda,
marquise e duas ou mais portas de entrada e saída de clientes, lê-se a inscrição com o
nome da loja; há também prédios com um pavimento superior.
74
Figura 23 - Vista parcial da região central de Anápolis, 1945.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Ao serem analisados os elementos da fotografia, identifica-se a rua ilustrada
como a Barão de Cotegipe, conhecida pela diversificada atividade comercial. Outros
elementos podem ser reconhecidos como o asfalto, a calçada, as árvores plantadas entre a
calçada e a rua. Pelas construções identificam-se casas residenciais e comerciais. No
decorrer da década de 1940, o jornal O Anápolis evidenciava a instalão dessas
concessionárias de diferentes marcas de carros e caminhões, demonstrando a estabilidade
desse setor da economia anapolina.
Nesse período, Anápolis alcançou o status de segunda cidade de Goiás, uma vez
que Goiânia era considerada a primeira. Essa classificação refletia a competição que se
iniciara entre essas importantes cidades do estado. Esse fato foi destaque na primeira
página do jornal O Anápolis do dia 17 de janeiro de 1943: “Anápolis se torna não a
primeira, mas a segunda cidade do Estado de Goiás”. A ênfase a esse status se traduziu
pela presença do governador Pedro Ludovico Teixeira para a assinatura de acordos e
liberação de recursos para o município e, ao mesmo tempo, reconhecer a importância
exercida pelo comércio anapolino para Goiás.
A influência exercida pelo comércio se estende além de suas fronteiras, pois
perpassa por outros segmentos, desencadeando uma série de outros eventos na cidade,
conforme destacou Barata Salgueiro:
75
A importância do comércio transcende a transação comercial, pois o
lugar de mercado é também uma fonte de informação, uma ocasião
para contactos, um sítio de recreio e de ócio. É por isso que no
comércio se pode ver o embrião da vida urbana naquilo que ela
pressupõe de interação, de troca de sentido lato, de produção da
inovação. O comércio e alguns serviços contribuem fortemente para
definir a estrutura dos núcleos de povoamento. (1996, p. 183).
A imagem da cidade em construção e em movimento foi divulgada pelo jornal O
Anápolis quando destacava o significado dinâmico dos investimentos no setor produtivo.
O movimento da cidade era evidenciado pelo número de veículos motorizados, bicicletas
e outros de tração animal circulando nas ruas de Anápolis em 1943, como descreveu o
jornal:
Existe em Anápolis um cem número de veículos que transitam em
suas ruas diariamente: mais de 51 autos particulares (estes atualmente
estacionados em obediência a lei de trânsito); 32 de aluguel; 36
caminhões particulares; 78 caminhões de aluguel; 103 bicicletas; 8
motocicletas; 83 carroças de praça; 01 Inspetoria de veículos, 01
Agência Ford e 01 Chevrolet. Esses veículos cortam a cidade ora
provocando um aspecto de trânsito contínuo e, ora servindo ao
transporte civil e comercial. (O ANÁPOLIS, 17 jan. 1943, p. 4).
o constam deste levantamento os veículos não inspecionados ou licenciados.
Nesse período a população urbana de Anápolis era de 9.486 habitantes e a população
rural, predominante, era de 29.662 habitantes (CASTRO, 2004), incluindo-se a
população dos distritos.
No início de 1943, o jornal O Anápolis fez uma descrição geral da imagem da
cidade:
Anápolis, a cidade ampla em todos os quadrantes, está situada num
ponto ótimo. Tem 30 ruas, 4 avenidas e 6 travessas, contando ainda
com extensa rede rodoviária, num total de 450 quilômetros dentro do
município. A localidade não tem retrocesso que a detenha em sua
marcha através dos tempos. Sobe, cresce, aumenta dia a dia, nas
diversas partes, nos diversos setores urbanos. É uma força que a
impulsiona num ímpeto de suntuosidade, fazendo-a nobre e bem
organizada. (O ANÁPOLIS, 17 jan. 1943, p. 7).
O texto ilustra a situação da cidade a partir do traçado das ruas e avenidas, ao
mesmo tempo em que indica o crescimento vertical e horizontal da cidade. Esse
crescimento revela-se bastante significativo ao se comparar os dados com aqueles de
1907, quando Anápolis tinha apenas as seguintes ruas: 15 de Dezembro (atual Rua
76
Eugênio Jardim), Dez de Março, Coronel Batista, Rua do Comércio (Manoel D’Abadia),
Desembargador Jaime, de Maio, Largo do Cemitério (Americano do Brasil), Largo da
Boa Vista (Praça Moisés Santana) e Praça Santana. Esse crescimento alcançou maior
visibilidade com o desenvolvimento do setor financeiro (bancário), responsável pelo giro
de capital para ser investido na agricultura e no comércio da cidade.
Outro destaque da arquitetura art déco foi a Casa Comercial de Autoveis,
que, impulsionada pelo comércio de automóveis, representou um investimento de grande
proporções para o município. Sob o título “Expande-se o comércio”, o jornal O Anápolis
vinculou a expansão do corcio de um modo geral à implantação das concessionárias de
autoveis importados. Os prédios comerciais ganharam novos estilos, de modo que a
competição tornaria os negócios mais atrativos com inovações, construções mais
arrojadas, impondo à cidade uma nova visibilidade. Na Figura 24, tem-se a visualização
de uma concessionária de automóveis instalada em 1948 na cidade de Anápolis. A figura
mostra a Sociedade Comercial de Automóveis Importados em épocas distintas. Na parte
inferior, tem-se a visualização do prédio no período da inauguração em 1948; na parte
superior, visualiza-se o comércio em 1955, quando o prédio foi remodelado para se
adaptar aos anos 50. O jornal assim descreveu esse empreendimento comercial que foi
construído por descendentes de sírios e libaneses:
Denominada de Sociedade Comercial de Automóveis Importadores
em que foi representante das concessionárias da General Motors do
Brasil S/A- Linhas GMC-Pontiac- opel, com capital de R$
6.000.000.00. Idealizada pelas mentes lúcidas de dois filhos de
Anápolis Sr. José Abdala e Dr. José Elias Isaac, tornou-se realidade
em 1948. (O ANÁPOLIS, 1948, p. 2).
O processo de implantação do mercado automobilístico desenvolveu-se de
forma que abarcou grande parte do mercado mundial, inclusive do chamado terceiro
mundo. O historiador Eric Hobsbawm (1995) denominou de a “Era de Ouro” o período
que vai do fim da Segunda Guerra Mundial até o fim da década de 1980. Nesse período, o
mercado de automóveis, especialmente a General Motors, que havia sido implantada em
cerca de quarenta países, incluindo o Brasil, operava no sentido de obter mercado
consumidor fora do país de origem. Essa capacidade de operar no exterior reforçava a
tendência de acumulação de capital do país de origem.
Em Anápolis, o comércio de automóveis se desenvolveu e deu suporte para o
aparecimento de uma rede de oficinas, autopeças, postos e agências de revenda. Esse
77
fenômeno entra de forma definitiva no gosto popular, tornando-se uma forma de
manifestação do prazer masculino, porque o automóvel atrai, num primeiro momento, os
homens. Sevcenko avalia:
Era como uma modalidade esportiva que os carros eram encarados em
suas primeiras aparições na cena urbana, importados pelos novos
protagonistas sociais, o que contribuiu de forma decisiva para sua
instantânea identificação como o clímax da modernidade. (1998, p.
558).
A velocidade foi um emblema da modernidade porque provocou uma série de
transformações que permitiram ao homem imaginar além do seu próprio espaço.
As figuras 25, 26 e 27 mostram esse período de alargamento do comércio
automobilístico em Anápolis no fim dos anos 40. O jornal O Apolis comentou:
Podemos admirar um dos grandes postos de mecânica da cidade o
Posto e Agência Ford, de propriedade dos Srs. Silva & Cia. Esse
prédio está localizado na esquina da Travessa do Barão do Rio Branco
com a rua do Engenheiro Portela e fica também à praça da Bandeira
( Bom Jesus), o centro da cidade. Nesse ponto se nota diariamente, um
grande movimento de veículos, que estacionam nas imediações. (O
ANÁPOLIS, 11 jan. 1948, p. 8).
A relação entre o desenvolvimento do comércio e o progresso da cidade era
evidenciada em anúncios de publicidade e artigos do jornal O Anápolis do mês de maio
de 1947: Expande-se o comércio os que pugnam pelo nosso progresso”. O comercial
expressava a legitimação da representação de um grupo social, o dos comerciantes. No
entanto, Apolis, como cidade comercial, interessava a muita gente: políticos,
intelectuais, profissionais liberais, trabalhadores e consumidores em geral. Por meio do
jornal, esses grupos sociais se apropriaram do espaço urbano a fim de conceber para si
identidades que atendessem seus interesses.
Conforme expressou Chartier:
[...] essa relação entre representação de um grupo e o mundo material
é buscada pelos que detêm o poder de classificar e de nomear e a
definição, de aceitação ou resistência, cada comunidade produz de si
mesmo. É pensada a partir da construção das identidades sociais como
resultado sempre de uma relação de força entre as representações
impostas. (1999, p. 16).
78
Esse tipo de exposição de ideias parece pensado propositalmente, uma vez que
está em jogo a compreensão, por parte dos leitores do jornal, dos ideais de construção de
um comércio dinâmico e diversificado em Anápolis.
Para atender as expectativas e mesmo as reivindicações do povo em geral, o
poder público teve de acelerar a conclusão da urbanização da cidade iniciada na segunda
metade da década de 1940. O jornal debitava o progresso de Anápolis ao seu povo, que
“[...] estava olhando sempre para frente e trabalhando sem desfalecimentos, para manter a
liderança nessa onda que vem transformando a fisionomia do Estado de Goiás”. Em toda
parte havia trabalho construtivo. O jornal dizia: “Quem percorrer a cidade nota sempre
um empreendimento novo traduzindo a inabalável vontade desse povo lutador (O
ANÁPOLIS, 10 jun. 1948, p. 1).
O jornal ainda destacou: “As obras de pavimentação das ruas prosseguem
tamm em ritmo acelerado bem como a rede de esgotos sanitários quase terminadas [...],
acrescentando que “[...] o abastecimento de água potável, de cuja falta se ressente a
população Anapolina, os serviços da Caixa d’água se acham bastante adiantados” e
concluiu: “Com a execução desse plano de urbanização, Anápolis torna-se uma das mais
modernas cidades do interior do Brasil(O ANÁPOLIS, 10 jun. 1948, p. 1). A conclusão
dessas obras, aparentemente, deu à cidade uma visibilidade um pouco maior que a
observada nos períodos anteriores.
Concluídas as obras de urbanização, a cidade ganhou novos contornos, como o
formato das ruas e lojas, que iam se diversificando para atender as novas exigências da
modernidade e da população. Nesse sentido, uma variedade de novas lojas comerciais foi
surgindo na região central. Isso fez com que a cidade, no fim da década de 1940, fosse
considerada um centro comercial importante em Goiás. Para dar suporte ao crescimento
do comércio, era necessário investir na reforma de rodovias, uma vez que elas passaram a
suportar um número maior de veículos trafegando entre Anápolis e Goiânia ou Anápolis e
outros munipios de Goiás.
79
Figura 24 - Sociedade Comercial de Automóveis.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 48.
Figura 25 - Posto Ford.
Fonte: Jornal O Anápolis, fev. 1947, p. 4.
80
Figura 26 - Posto Ford.
Fonte: Jornal O Anápolis, jan. 1948, p. 8.
Figura 27 - Posto Ford.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955.
Alguns dados apontados revelam o crescimento do número de veículos
motorizados em Anápolis em meados dos anos 50, tanto os destinados ao aluguel quanto
os de passeio, mas os veículos de tração animal (carroças e charretes) ainda constituíam
um meio de transporte muito utilizado pela população. Os caminhões, 114 no total,
formavam uma frota significativa para o transporte rodoviário de cargas. A Inspetoria era
81
responsável pelo licenciamento desses veículos. Em 1955, havia na cidade as seguintes
concessionárias de autoveis e caminhões, de acordo com o Guia Prático da Cidade de
Anápolis:
A CIA. Silva Duarte S. A, Concessionária de Veículos Ford
(automóveis e caminhões) e as marcas Mercury e Lincoln. A
BEROCAN S. A, possuía uma frota de caminhões para transportar
produtos SHELL. Concessionários Chevrolet (caminhões e
automóveis) e concessionária da General Motors do Brasil S/A linhas
GMC Pontiac e Opel. (1955, p. 33-43).
Com o crescimento da frota de caminhões, Anápolis pôde oferecer o serviço de
armazenamento e estocagem de produtos agrícolas, pois possuía grandes armazéns para o
recebimento desses produtos.
O serviço de estocagem de produtos agrícolas foi intenso graças à estrutura
apresentada pela cidade para esse tipo de atividade, um bom exemplo era a Cia. Goiana
de Armazéns. A fotografia da Figura 28 mostra o prédio da Cia. Goiana de Armazéns
Gerais de Anápolis, localizado nas proximidades da Praça da Estação (atual Americano
do Brasil). A empresa foi criada com a finalidade de comprar, guardar e exportar produtos
agrícolas, especialmente café em grãos e arroz. O jornal O Anápolis descreveu este prédio
dando-lhe destaque:
Em várias partes da cidade notam-se prédios como este, construídos
na melhor harmonia de formas, bem apresentáveis e que se elevam de
um solo que até bem pouco tempo era coberto de árvores silvestres. O
que vemos na gravura é de propriedade do Sr. David Alexandre Tuma,
e serve atualmente, para armazém e máquinas de arroz, no primeiro
pavimento e, no segundo, para uma bela residência dos proprietários
do comércio. (O ANÁPOLIS, 17 jan. 1943, p. 4).
A referência feita pelo jornal a este prédio tinha o objetivo de mostrar a
arquitetura da década de 1940, que era diferente daquela dos anos 30 quando ainda
prevaleciam construções modestas. O jornal observa que outros prédios modernos eram
erguidos em vários pontos da cidade, configurando os novos tempos de prosperidade para
Anápolis.
82
Figura 28 – Cia. Goiana de Armazéns.
Fonte: Jornal O Anápolis, maio 1943, p. 4.
Sobre a companhia, o jornal O Apolis trazia a seguinte publicidade:
O objetivo da CIA. Goiana de Armazéns Gerais se fundamentava em
receber em Anápolis para guarda e conservação qualquer quantidade
de café, cereais e mercadorias em geral. Faz adiantamentos de
dinheiro para pagamentos de fretes em postos. Entrega-se mediante
autorização dos depositantes da colocação das mercadorias
armazenadas. (O ANÁPOLIS, 12 maio 1943, p. 3).
A Companhia Goiana de Armazéns Gerais atuava entre os produtores
emprestando-lhes dinheiro. Desse modo, mantinha o produtor rural preso aos seus
serviços, caracterizando a existência de monopólio. Esse sistema perdurou até meados da
década de 1940, quando entrou em ação a concorrência de outros compradores instalados
em Goiânia.
Nos anos que se seguiram, as duas maiores cidades do estado de Goiás, Goiânia
e Anápolis, desenvolveram o que Castro denominou de:
[...] um comércio concorrencial e complementar. Concorrencial
porque Anápolis está localizada numa direção estratégica no
entroncamento das estradas Centro-Sul Goiano, enquanto Goiânia
constituía apenas uma aposta no desenvolvimento da região. Porém no
aspecto comercial Anápolis monopolizava o transporte ferroviário e
Goiânia as ligações rodoviárias. (2004, p. 22).
Essa posição permaneceu até meados dos anos 50, quando começou a mudar o
panorama ecomico sob influência de uma série de fatores, entre eles a crise ferroviária
83
e a expansão rodoviária. O outro motivo de mudança econômica em Anápolis foi a perda
da hegemonia do comércio regional para Goiânia no início de 1950.
Antes de se verificar essa mudança na acomodação de forças entre Anápolis e
Goiânia, deve-se ressaltar a força do setor bancário na cidade, considerado o grande
financiador do progresso econômico nas décadas de 1940-1960.
Esse setor se desenvolveu impulsionado pela riqueza produzida pelo município
de Anápolis, balizada pelos setores agrícola e comercial especificamente. O jornal
divulgou o lançamento do projeto para a implantação do Banco Comercial e Industrial de
Goiás, inaugurado em setembro de 1942. Sobre as atividades bancárias que foram
surgindo, amparadas pelo surto comercial dos anos 40, o jornal O Anápolis destacou a
abertura de agências como mais uma realização que vinha projetar ainda mais o
município no cenário econômico de Goiás:
Duas grandes realizações se projetam no magnífico cenário de nossas
atividades sociais que bem demonstram o acrisolado amor de uma
plêiade de batalhadores pelo progresso e engrandecimento desta terra
privilegiada [...] a fundação de um Estabelecimento Bancário(Banco
Comercial e Industrial de Goiás). (O ANÁPOLIS, 236, 13 out.
1940, p. 1).
Em 1942, inaugurou-se o primeiro banco genuinamente anapolino, denominado
Banco Comercial do Estado de Goiás S.A. Esse evento foi traduzido no seguinte
comentário pelo jornal O Apolis:
[...] um acontecimento significativo foi sem dúvida para nossa cidade,
quiçá para o Estado de Goiás, o que se festejou conjuntamente com o
aniversário de nossa independência, no dia sete de setembro, a
inauguração do Banco Comercial do Estado de Goiás S.A. (O
ANÁPOLIS, nº 366, 12 set. 1942, p. 1).
A formão do referido banco se deu por iniciativa do grupo Pina, tendo como
presidente Antonio Luiz de Pina e como gerente crates Diniz. Este foi um
empreendimento privado com capital oriundo do corcio local.
O segundo, o Banco Imobiliário Mercantil do Oeste Brasileiro, identificado na
Figura 29, foi fundado em 1945 “[...] por um grupo de comerciantes que, politicamente,
eram opositores aos Pina, tendo à frente, o Sr. Jonas Duarte como presidente, o Sr.
Plácido de Campos como vice-presidente (POLONIAL, 2000, p. 78). Entretanto,
havia agências de instituições bancárias oriundas de outros estados brasileiros instaladas
na cidade, conforme destaca Ferreira (1981, p. 383-384): “[...] o Banco Hipotecário e
84
Agcola do Estado de Minas Gerais inaugurado em 15 de janeiro de 1934, vindo
transferido de Vianópolis para Anápolis”. Em 1939, foi instalada a agência do Banco de
Crédito Real de Minas Gerais, como se vê na Figura 30.
Figura 29 - Banco Imobiliário e Mercantil do Oeste Brasileiro.
Fonte: Jornal O Anápolis, 1945, p. 2.
Figura 30 - Banco de Crédito Real de Minas Gerais.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
85
A economia de Anápolis foi considerada forte, diversificada, chegando a ser
denominada opulenta, em virtude do número de estabelecimentos bancários instalados na
cidade. Segundo França:
A rede bancária, cujos serviços se estendiam além dos limites
municipais, concorreu para a projeção de Anápolis e, o alargamento
de sua área de influência. Em 1949, cinco agências de bancos
funcionavam na cidade e um escritório de correspondência do Banco
do Brasil. Dois desses estabelecimentos eram matrizes, pois foram
fundados com capital anapolino. (1974, p. 637).
A presença de instituições financeiras demonstra que havia em Anápolis uma
economia forte que respondia aos interesses do capital. Isso representava mais
investimentos, saneamento, lucro e, acima de tudo, um mercado consumidor que
respondia a essas demandas. Não dúvida de que Anápolis era um polo produtor forte,
com um mercado exportador que respondia ao conjunto da economia local e regional.
Esses dois fatores bancos e comércio fomentaram na cidade um ostensivo
movimento urbano refletido na arquitetura dos prédios e casas da região central. Essas
inovações indicavam aspectos de modernidade no decorrer da década de 1940.
Os anos 40 simbolizaram transformação e organização do espaço urbano, uma
vez que Anápolis apresentava aspectos de crescimento e desenvolvimento, portanto era
importante divulgar a necessidade de urbanizar a cidade. Uma cidade que crescia em
ritmo acelerado precisava se organizar para acomodar outras atividades e eventos que
foram acontecendo no decorrer da década. Isso era sinal de vida urbana agitada. No
contexto da vida social, o movimento fez surgir instituições como a Escola de Avião
Civil de Anápolis, inaugurada em maio de 1940. De acordo com o jornal O Anápolis, esse
foi
[...] mais um facto de suma importância para os annais da história do
progresso de nossa terra, verificou-se domingo passado com a
inauguração da Escola de Aviação Civil, fundada pelo Aero Club de
Goiáz e que nossa folha fiel à defesa do sagrado lema: Tudo por
Annapolis e Goiaz-, divulga com o mais intimo jubilo. Empenhado em
preparar o futuro e defesa de nossa pátria, o governo Federal como
Estadual, vem dispensando especial carinho à aviação civil,
procurando despertar em todos os brasileiros o gosto por essa arma
poderosa sem a qual nação alguma poderá se julgar forte. (O
ANÁPOLIS, nº 213, 5 maio 1940, p. 1).
A Escola de Avião Civil tinha a finalidade de preparar pilotos para o mercado
de aviação que vinha se expandindo no Brasil nas décadas de 1940 e 1950. Isso indica
86
tamm o interesse que Anápolis demonstrou por receber a Aeronáutica em seu território,
fato este consolidado no início dos anos 70 quando foi instalada a Base Aérea da
Aeronáutica Brasileira na cidade. O munipio reconhecia-se como área estratégica para o
país.
Outros eventos iam se sucedendo em Anápolis e o jornal os noticiava para que
seus leitores tomassem conhecimento do que estava ocorrendo na cidade, como foi o caso
da compra de uma empresa comercial por empresários anapolinos. O jornal O Anápolis
descreveu o ocorrido com o olhar empreendedor dos novos proprietários.
Dotado de um fino critério commercial, alliado a um entranhado amor
ao progresso comercial desta terra, os Srs. Pina & Naghetini acabam
de adquirir a conceituada Distilaria Santa Martha, com firme propósito
de ampliar a sua produtividade, melhorando o quanto for necessário a
qualidade de seus produtos. Está, pois de parabéns Annapolis pela
intensificação de mais um poderoso factor que muito virá concorrer
para a elevação de seu nome como cidade progressista e comercial. (O
ANÁPOLIS, nº 236, 13 out. 1940, p. 1).
À medida que a vida urbana ia se tornando movimentada, a informação também
se inseria nesse processo, especialmente com a presença do cinema na cidade, desde a
década de 1930, e do rádio, importante meio para informar e distrair a população. O auge
do rádio em Anápolis ocorreu nos anos 40 a 60.
De acordo com Sevcenko, o rádio foi
[...] o milagre dos milagres da tecnologia que foi aos poucos sendo
estruturado no modelo norte-americano de radiodifusão [e] tinha como
base as agências de publicidade, cujo interesse em explorar e testar
recursos os mais variados para conquistar audiências acirrou a
concorrência desenvolvendo as técnicas de administração,
programação, edição, locução, propaganda, distribuição e controle de
mercados. (1998, p. 586-587).
No Brasil, o rádio representou, a partir da década de 1930, a grande novidade em
termos de informação e entretenimento para a população de todas as camadas sociais. Ao
mesmo tempo atuou como instrumento poderoso nas mãos dos comerciantes, pois
anunciava produtos e serviços prestados na cidade. Foi olhando nessa direção que o jornal
O Anápolis vislumbrou o rádio como instrumento catalisador do progresso econômico e
social de Anápolis. Em 20 de outubro de 1940, o jornal destacou o papel do rádio: “[...]
ao lado de recursos materiais indispensáveis a todo o movimento econômico e social um
veículo poderoso que transportará nas asas da fama através dos espaços a glória de seu
87
nome edificada pelos esforços de um povo inteligente e laborioso”. Além de ser um
veículo de informação para a população, o rádio tamm servia ao comércio, pois sua
programação ultrapassava as fronteiras do município, fazendo com que Anápolis tivesse
sua imagem vendida para outras cidades do interior e até mesmo de outros estados.
Na década de 1940, foi instalada a radiofonia em Goiás pela família Simonetti,
proprietária da então Rádio PRG8 em Bauru, o Paulo. Na cidade de Anápolis fixaram
residência o casal Simonetti Hermetti e sua esposa, Elidia Simonetti e a família do
irmão da Sra. Elidia, o Sr. Antônio Eleutério de Oliveira (Carijó) e sua esposa, Maria
Eleutério. Ele, palhaço, de vida exclusivamente circense (Figura 31), fixou-se em
Anápolis. As duas famílias fundaram a primeira emissora de rádio do estado de Goiás, a
Rádio Karade Apolis.
Figura 31- Palhaço Carijó, 1946.
Fonte: Acervo particular da professora Hermogênia Eleotério de Oliveira.
Esta rádio era veículo de notícias e entretenimento musical. Havia o programa
humorístico “Carijó na Karajá” e programas de auditório como “Calourinhos”,
Calouros e o “Cirquinho do Carijó”, quando se armava um circo no palco e o artista
fazia o humor da época que atraía o povo e lotava o auditório da Rádio Karajá. Cari
fazia um número contracenando com sua filha Geninha que, na época, tinha 5 anos de
idade. Era a cena de um palhaço e uma minibailarina que ele nunca deixara dançar, daí
88
vinha o humor do quadro. Além disso, havia novelas radiofônicas, dirigidas pela atriz
Elidia Simoneti, que roubavam as donas de casa dos seus afazeres à cata das emoções dos
folhetins.
Assim era a Rádio Karajá nos seus primórdios; a emissora acompanhou com
seus noticiários todos os acontecimentos e o crescimento da cidade de Anápolis até ser
desativada no fim do século XX.
Figura 32 - Rádio Karajá, 1946.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Em 1941, o cenário apontava para a ampliação do espaço comercial e social da
cidade, protagonizado pela inauguração do Cine Teatro Imperial. O jornal O Anápolis
registrou como “[...] uma das maiores realizações em favor do progresso de Annápolis e
temos plena certeza de que o povo dessa cidade, compreendendo os esforços de seus
dirigentes ocorrerá em massa às sessões inaugurais de domingo próximo” (O
ANÁPOLIS, nº 256, 6 fev. 1941, p. 1).
Esses acontecimentos que marcaram os anos 30 e 40, conforme observou Saliba
(1998, p. 331), podem ser assim entendidos: “[...] as exincias e valores de uma nova
sociabilidade pareciam apenas aumentar o hiato entre passado e presente, sobretudo
quando a modernidade parecia apenas mais um jogo de cena”. As cenas projetadas nos
filmes nacionais e norte-americanos, mais especificamente de Hollywood, eram
89
incorporadas na vida cotidiana, “[...] tornando as cidades verdadeiros álbuns de
projeções” (SALIBA, 1998, p. 337).
O cinema conquistou tanta importância que a população lotava as sessões de
segunda a domingo. Esse fenômeno, segundo Sevcenko (1998, p. 598-599), foi
impulsionado pelo
[...] mercado de distribuição [que] cresceu rapidamente e as salas de
cinema se multiplicaram por toda parte, se tornando mais imponentes
suntuosas, edificadas segundo o código modernista e ousado do art
déco. Ir ao cinema pelo menos uma vez por semana vestido com a
melhor roupa tornou-se uma obrigação para garantir a condição de
moderno e manter o reconhecimento social. (1998, p. 598-599).
Em Anápolis, mais que uma diversão, o cinema representou um importante
mecanismo de informação sobre costumes, moda e estilo de vida de outros países,
especialmente dos Estados Unidos. No cinema nacional, imperavam os gostos e os
costumes do Rio de Janeiro e de o Paulo da época das chanchadas. A cidade se
constituía num grande teatro em que as pessoas sonhavam realizar suas expectativas
sociais e econômicas. Viver na cidade representava para as pessoas participar dos
acontecimentos que se multiplicavam a todo instante. O jornal O Anápolis, quando trazia
os anúncios sobre a cidade, representava-os como algo espetacular, ou seja, a
modernidade e o progresso eram vistos como espetáculo. Portanto, a cada nova
construção havia uma nota de divulgação feita pelo jornal, destacando-a como algo
grande para a cidade:
Mais um empreendimento dos Irmãos Jardim José e Sebastião de
Morais Jardim, temos o prazer de comunicar aos seus distintos amigos
desta praça e das demais vizinhas que em de julho próximo se
estabelecerão com armazém de secos e molhados, louças, bijuterias e
muitas outras miudezas que serão também especialistas em gêneros do
país. Este estabelecimento que será inaugurado naquela data com o
nome de Empório Jardim fica situado à rua 15 de dezembro. (O
ANÁPOLIS, nº 254, 18 jun. 1941, p. 1).
Esses acontecimentos estavam direcionados para a crescente produção de bens
simbólicos, imagens e informações, transformando Anápolis não em centro de
consumo cotidiano, mas também em produtora e consumidora externa de uma série de
mercadorias e experiências produzidas pela chamada indústria cultural, conforme
observou Lefevre (1971, p. 14): “[...] na cidade tem-se consumo de espetáculos,
espetáculos de consumo de signos, signos de consumo”. Ao representar Anápolis com
90
base no comércio, o jornal inseriu a cidade num contexto de crescente transformação:
Annápolis é o maior parque comercial de Goyaz e o melhor centro dico do oeste
brasileiro” (O APOLIS, nº 357, 19 jun. 1942, p. 1).
Figura 33 - Manifestação contra a carestia.
Fonte: Jornal O Anápolis, 10 abr. 1947, p. 1.
Se por um lado Anápolis despontava como a segunda cidade do estado de Goiás
pelo seu comércio pujante, por outro, os problemas sociais também se mostravam
evidentes. Isso era demonstrado pelas manifestações da populão trabalhadora que saía
às ruas para protestar contra a escassez de alimentos, conforme descreveu o jornal O
Anápolis: “Não vai longe o mês em que os operários da cidade, premidos pela falta de
alimentos básicos como a carne suína, ou tendo preço alto, realizaram uma passeata da
fome significativa e ao mesmo tempo tocante em Anápolis” (O ANÁPOLIS, 10 abr.
1947, p. 1). No período de 1947 a 1949, esses movimentos eram constantes na cidade e os
protestos (Figura 33) eram contra a escassez dos alimentos, a carestia, o desemprego ou a
poeira das ruaso urbanizadas.
Por trás das manifestações sociais havia a indignação pelas condições sociais a
que eram submetidos os trabalhadores em contraposição com o estilo de vida da elite.
91
Esse período compreendido entre as décadas de 1930 e 1960 representou o que Sevcenko
(1998:38) analisou como:
Uma ordem mundial centrada nos estímulos sensoriais das imagens e
dos sons tecnicamente ampliados fornece uma indicação da trajetória
da sociedade brasileira nesse período de mudanças intensas e rápidas.
Isso porque a população foi colocada de um lado, de outro as pressões
de um mercado intrusivo e de outro às intervenções das elites
dirigentes, empenhadas em modelar as formas e as expressões da vida
social. (1998, p. 38).
Como resultado desse processo, as pessoas e os grupos se viram forçados a
mudar, ajustar e reajustar seu modo de vida, ideias e valores sucessivas vezes. “Suas vidas
privadas foram fortemente afetadas pelas [...] transformações provocadas no espaço
territorial e social e também na mente dos indivíduos no transcurso da
“história” (SEVCENKO, 1998, p. 38). Esse processo foi sendo observado em cada rua,
praça, prédio comercial e residencial construído e reconstruído no percurso trilhado pelos
construtores da cidade de Anápolis no decorrer dos anos 1930-1960.
Ao aproximar-se do final da década de 1940, o jornal O Anápolis fez um
levantamento sobre o capital físico da cidade com o objetivo de demonstrar o progresso
material do município nos 15 anos em que acompanhara sua história.
Em meados de 1949, uma edição se intitulava: “O que é Anápolis, Cidade-
trabalho de Goiaz”. Dela constavam dados estasticos sobre bens materiais e humanos do
município. A análise dessas informações revela uma aproximão entre os dados
coletados por Polonial (1995) e os do jornal O Anápolis. Ambos mostram dados
relevantes que justificam o que foi sendo discutido durante a pesquisa. A única diferença
refere-se às fontes. Polonial utilizou os dados do IBGE, do início da década de 1950; o
jornal O Anápolis, por sua vez, utilizou dados da coletoria estadual do fim de 1948.
A predominância da população rural sobre a urbana se explica porque o
município de Anápolis ainda possuía grande extensão territorial, pois abarcava distritos
importantes como Nerópolis. Merece destaque também o quantitativo de casas
comerciais, acima de 500, distribuídas entre varejistas e atacadistas, o que indica a força
do comércio no desenvolvimento do município.
Havia em Anápolis um tipo de comércio que, em alguns textos do jornal O
Anápolis, era denominado de indústria: eram os armazéns, as olarias e destilarias,
distribuídos em vários ramos conforme se lê na citação do jornal. Esses dados colocavam
Anápolis em posição de destaque em relação a outros municípios do estado de Goiás. O
92
crescimento das agências de venda de caminhões para o transporte de mercadorias
fornece indicativos sobre a era rodoviária que ganharia força nas décadas de 1950 e 1960.
A análise dos dados demonstrou a ênfase dada pelo jornal à estrutura comercial da cidade.
O que é Anápolis a cidade-trabalho de Goiáz
Altitude – 1000 metros
Prédios construídos – 3500
População da cidade – 18 000 habitantes
População do município 40 000 habitantes. (O ANÁPOLIS, 10 set.
1949, p. 3).
O jornal fez a descrição dos prédios comerciais juntamente com a frota de
veículos motorizados, indicando que a expansão do comércio estava relacionada ao
transporte rodoviário.
Comércio
A cidade conta com mais de 500 casas comerciais de todos os
gêneros, entre atacadistas e varejistas, 90 indústrias diversas, 15
confeitarias, diversas casas de diversões populares, diversos salões de
Snooker, casas e fabricas de móveis, 40 pensões familiares, 6 hotéis,
sendo um moderno e com 5 andares e elevadores, uma agência de
automóveis, Ford, Mercury, Lincoln e caminhões Ford, 1 agência de
automóveis Pontiac e caminhões internacionais. 1 agência de
automóveis Plimouth Crysler e caminhões fargo. 1 agência de
automóveis Studebraker. Possui 5 estabelecimentos bancários, 10
maquinas de beneficiar Café, 14 maquinas de beneficiar arroz, 1
maquina de beneficiar algodão, 1 fabrica de mosaicos, 4 tipografias e
papelarias, 2 jornais sendo 1 bi-semanal, 8 oficiais mecânicos. (O
ANÁPOLIS, 10 set. 1949, p. 3).
Comparando-se o número de estabelecimentos comerciais identificados por
Ferreira (1981, p. 40-41) em 1915 (21 comerciantes) com os dados apresentados pelo
jornal 34 anos depois (500 casas comerciais), fica evidente que ocorreu um crescimento
significativo. Esse crescimento é também percebido na década seguinte quando a
urbanização da cidade atingiu seu ápice e a população urbana ultrapassou a população
rural. Esse processo foi posvel graças a todos os fatores destacados no decorrer deste
estudo: rodovias, energia elétrica, ferrovia, imigração, comércio aliado à participação da
imprensa, especialmente do jornal O Anápolis que atuou como divulgador da cidade.
A diversificação das atividades urbanas permitiu que novas ocupações
profissionais fossem surgindo para atender a demanda cada vez mais exigente. Entre essas
mudanças a mais significativa veio com a profissionalização da força de trabalho
representada pela Escola Roberto Mange (SENAI) .
93
Figura 34 - Sala de aula do SENAI de Anápolis.
Fonte: Jornal O Anápolis, jan. 1952, p. 2.
Na fotografia ilustrada na Figura 34, são observados alunos em uma aula prática
na qual aprendem rias atividades ligadas ao comércio e aos serviços: mecânico,
eletricista, montagem de máquinas e constrão civil. Com o crescimento do número de
veículos automotores, surgiu a necessidade de amplião das oficinas mecânicas para
atender a demanda. A construção civil também demandou a ampliação do número de
trabalhadores, tornando bastante intensa a procura pelos cursos técnicos ofertados pelo
SENAI no cenário anapolino.
Figura 35 - Rua 15 de Dezembro, 1949.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
94
A fotografia estampada na Figura 35 permite a identificão de casas comerciais
e residenciais e da rua por onde pessoas circulam. Pela descrição, a casa comercial está
identificada pelo nome na parte frontal e lateral, em que se lê: Casa Barateira,
especializada em tecidos. A casa residencial é um sobrado em estilo europeu, com
afastamento entre a rua e a calçada. Esse afastamento é demarcado pelo muro e, na parte
interna, é possível ver um jardim.
O surto de prosperidade verificado em Anápolis pelo crescimento do comércio a
partir de 1935, quando os trilhos aqui chegaram, ainda era percebido no fim da década de
1940, quando as residências começaram a refletir a pujança da elite. O jornal O Anápolis
ilustrou essa prosperidade refletida nos prédios residenciais, como mostra a Figura 36, em
que aparecem as casas de propriedade dos Srs. Carlos de Pina (político e comerciante) e
Eurico Vilela Filho (comerciante).
Na parte superior do clichê admiramos a excelente e bela chácara das
rosas de propriedade do Sr. Carlos de Pina, situada nos arredores da
cidade. Pelo conforto e elegância que se encontra ali e pela distinção
dos seus prédios, com salas amplas, vários quartos, cozinha, quarto de
empregados, piscina, jardins etc. Em baixo verificamos a residência
do Sr. Eurico Vilela Filho, membro da importante Casa Lili, da firma
Levy Curado & Cia. Está situada num ângulo da rua Antonio Carlos
(Manoel D’Abadia) com a Avenida Xavier de Almeida, próxima à
Estação de Goiás. (O ANÁPOLIS, 17 jan. 1948, p. 7).
Essas residências caracterizavam um novo espaço que ia sendo definido pela
elite anapolina, em contraposição à cada de 1930; o estilo rústico e simples das
residências cedeu lugar a uma arquitetura moderna que iluminava a paisagem urbana. As
casas dominavam quase um quarteirão do bairro, diferenciando-se dos seus antecedentes
dos anos 1930. Grandes casas com vários telhados imponentes, portas e janelas bem
amplas informavam a opulência dos ricos de Anápolis nos anos 1950-1960.
Pela descrição dos casarões, percebe-se que havia concorrência entre a elite no
sentido de mostrar para a cidade quem possuía a melhor e mais moderna residência. Isso
era visível na aparência do prédio, nos jardins e piscinas que forneciam a ideia de uma
obra de arte. Além desses elementos eram visíveis, nessas construções, vários carros de
passeio à disposição da falia, além de cavalos para o passeio no campo.
95
Figura 36 - No alto, a Chácara das Rosas de propriedade do Sr. Carlos de Pina e, embaixo, a
residência de Eurico V. Filho, proprietário da casa comercial Lili.
Fonte: Jornal O Anápolis, abr. 1948, p. 7.
A vida urbana anapolina nas décadas de 1940 e 1950 tinha significado
expressivo quando comparada com os tempos passados, em que os acontecimentos
estavam vinculados ao dia-a-dia dos moradores – entre o ir e vir da fazenda para a cidade.
Mais intensa foi a década de 1950 quando o jornal, o rádio, o automóvel e outras
modernidades passaram a fazer parte do cotidiano das pessoas. Isso fez mudar os
costumes, os gostos e as atitudes da população.
2.3 O trem passou, o ônibus chegou. Destino: Brasília
Anápolis agora era uma cidade em franco desenvolvimento, voltada para o
futuro, conforme se identifica em todas as fontes analisadas. Exemplo disso é a Figura 37
que retrata um espaço amplo, ladeado por árvores e prédios em toda a extensão da rua. É
marcante a presença do comércio no entorno da praça, não o comércio atacadista e
varejista, como também a prestação de serviços, indicada pela presença da Casa de Saúde
Nossa Senhora de Lourdes e do laboratório de mesmo nome. Destacam-se as residências,
a telefonia e a rede de energia elétrica; sobressaindo por cima dos prédios, a caixa d’água
indica a existência de abastecimento de água na cidade..
Pela descrição da imagem desta fotografia, identifica-se a Rua Engenheiro
Portela e à direita a lateral da Praça Bom Jesus. Entre a praça e a rua sobressai a
arquitetura de estilo art déco e a arborização, indicando a influência de Gonia.
96
Comparada a arquitetura da década de 1950 com as décadas anteriores,
percebem-se diferenças significativas entre ambas. Exemplos disso são a inexistência, em
1930, do recuo da construção em relação à rua e a construção e a arborização de ruas e
avenidas que só veio a aparecer no fim dos anos 40, quando as praças foram revitalizadas
no sentido de dar visibilidade ao verde, ao monumento e ao descanso.
Figura 37 - Rua Engenheiro Portela, 1950.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Na década de 1950, percebeu-se a definição dos espaços pela elite, pois “[...] a
diferenciação espacial entre as ruas e os lotes das resincias abastadas prosseguia nos
ambientes internos” (MARINS, 1998, p. 177). Essas resincias evidenciavam uma
intensa especialização dos modos, definindo as atitudes das famílias. Segundo Marins
(1998, p. 178): “A marcante diferenciação dos espaços privados pelas elites em suas
próprias residências pode representar um protótipo das distinções espaciais, da ordem que
desejavam disseminar por toda cidade”.
A Figura 38 ilustra um sobrado construído na Rua General Joaquim Inácio,
esquina com a Avenida Goiás, nas proximidades da Praça Bom Jesus. O estilo do sobrado
lembra os chalés europeus do início do século, em que, na parte superior, sobressaía um
sótão, local reservado para as atividades diversas da família. A rua arborizada era um
sinal dos tempos modernos em que a arquitetura urbana deveria conviver com o verde das
plantas numa proposta de embelezamento. Provavelmente, a inspiração teria vindo de
Goiânia e seus boulevares ajardinados.
97
Figura 38 - Sobrado localizado entre a Avenida Goiás e a Rua Gal. Joaquim Inácio, 1950.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
O estilo de vida dos ricos ficava evidenciado no luxo de suas residências, nas
quais o terreno ajardinado obedecia a recuos da rua. Grandes espaços eram tomados para
a edificação das residências. Nesse processo, segundo Marins (1998, p. 178), “[...] a
normatização do privado acabava, pois, se entrelando com a própria configuração dos
espaços públicos”. Havia em Anápolis uma elite formada por comerciantes e proprietários
de bancos que estava construindo a cidade nos pametros da modernidade. Como seus
representantes, os intelectuais ligados a esses grupos (jornalistas, engenheiros, professores
etc.) eram responsáveis por difundir as ideias de modernidade importadas de centros
como São Paulo e Rio de Janeiro e, especialmente, Goiânia, por estar mais próxima e
representar, naquele momento, um símbolo da novidade.
Na paisagem da cidade, também era visível o surgimento de palacetes dos mais
variados estilos arquitetônicos como forma de ostentar a riqueza de seus proprietários.
Esse período também foi muito rico porque uma gama de novos engenheiros e arquitetos,
atuantes na cidade, colocava em prática a criatividade inspirada nos novos
conhecimentos. A Figura 39 ilustra esse período de prosperidade que a cidade viveu,
conforme demonstram as imponentes construções residenciais.
98
Figura 39 - Palacete localizado na Rua Firmo de Velasco, 1955.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 59.
As obras residenciais construídas com imponência eram importantes para atrair
novos empreendimentos e novos moradores afortunados para Anápolis. A paisagem
urbanizada configurou uma nova morfologia para as ruas e as edificações, ou seja, para os
espaços públicos e privados, apresentando a cidade de outra forma.
As décadas de 1950-1960 foram palco do processo definitivo de urbanização da
cidade de Anápolis, alimentado por uma imigração substancial. Percebe-se que a
população cresceu impulsionada pelas ondas de imigração que chegaram à cidade a partir
dos anos 30 e em maior proporção nas décadas seguintes; primeiro, vindas do campo e
depois também a imigração estrangeira (sírios e libaneses).
Observando os dados apresentados, tem-se a evolução da população do
município de Anápolis em suas dimensões rural e urbana, a partir da segunda metade da
década de 1930 até 1960. É interessante destacar que a população rural predominou até a
década de 1950 quando começou a declinar; na década de 1960, a população urbana já se
sobrepunha à rural. Esse processo torna-se visível na análise do mapa da Figura 17.
Quadro 4 - População Urbana e Rural de Anápolis – 1930 – 1960
Ano Rural Urbana Total
1935 25.816 7.559 33.375
1940 29.662 9.486 39.148
1950 31.988 18.350 50.338
1960 19.785 48.947 68.732
Fonte: Polonial (1995, p. 42). Dados revistos pelo autor.
99
Comparando-se os dados do Quadro 4 com o mapa representativo da evolução
espacial de Anápolis (Figura 40), verifica-se a confirmação dos dados que apontam o
crescimento demogfico percebido nas décadas de 1940-1960, em que a população
urbana superou a população rural, criando uma nova dinâmica espacial para o município.
Legenda
1940. Ocupação espacial até o fim da década de 1940.
1950. Ocupação espacial até o fim da década de 1950.
1960. Ocupação espacial durante a década de 1960.
Figura 40 - Mapa da evolução da ocupação espacial de Anápolis.
Fonte: Plano Diretor de Anápolis, dez. 2005.
100
O mapa da Figura 40 mostra a evolução da ocupação espacial durante as décadas
de 1940-1960, período que marca a intensificação desse processo. A análise do mapa
indica que a década de 1950 foi considerada como o período em que mais se intensificou
o processo de expansão das áreas de ocupação. Nesse período, também cresceu a
ocupação desordenada, o que é percebido pelo número de loteamentos mais afastados da
região central.
O progresso norteado pela ocupação espacial também apresenta seus paradoxos,
especialmente quando o leva em consideração a permanência dos locais naturais
destinados à população. Isso foi observado por um morador da cidade – o Sr. Ursulino T.
Leão – ao expressar saudade do tempo de menino em que brincava com outros garotos às
margens do ribeirão Chico Bastos. O jornal expressa o mesmo sentimento: “O progresso
de Anápolis acabou com todos esses locais onde se escorregou a nossa infância. Hoje
tudo mudou. Junto ao ‘Chico Bastos’ se enfileiraram as casas novas que separam o
Jundiaí das velhas ruas da Freguesia de Sant’Ana de Antas (O ANÁPOLIS, 11 maio
1951, p. 1).
Na Figura 41, percebe-se a rua pavimentada, a calçada por onde várias pessoas
transitam e um carro estacionado, prédios comerciais tomam conta da paisagem. Entre
esses prédios, um se destaca dos demais pela altura. O local em destaque é a Rua Antonio
Carlos, atual Manoel D’Abadia, conhecida pelo comércio em geral. Na parte frontal,
identifica-se a loja A Jóia, tradicional “[...] comércio de relógios, bijuterias, rádios, jóias e
artigos finos e decoração” (GUIA PRÁTICO DA CIDADE DE ANÁPOLIS, 1955, p. 77).
Percebe-se a existência da platibanda e da marquise em algumas lojas. As janelas têm
esquadrias de ferro e vidro e as portas são de ferro.
Ao ser analisado atentamente o ângulo clicado pelo fotógrafo, depreende-se que
a intenção era registrar as modificações que ocorreram nesta rua com o decorrer do
tempo. Ao se fazer a análise comparativa entre a Figura 41 e a Figura 12, ficam evidentes
transformações significativas na paisagem urbana, especialmente nas construções, uma
vez que, em lugar das residências, surgiram inúmeras casas de comércio e o primeiro
edifício com elevador construído em Anápolis (Figura 20). A rua, antes com sarjetas para
evitar a formação de lama na época das chuvas, agora es asfaltada. A infraestrutura
visualizada na Figura 39 mostra que havia na cidade um setor de serviços em expansão,
conforme se constatou no início da década de 1950.
101
Figura 41- Rua Antônio Carlos (atual Manoel D’Abadia) em 1955.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Como forma urbana, Anápolis teve início no entorno da Igreja Santana, ou seja,
no antigo Largo de Santana (Figura 1), atual Praça Santana. Ao investigar o nascimento
das cidades na América portuguesa, Holanda (1995, p. 97) verificou que “[...] a
construção da cidade começaria sempre pela chamada praça maior. Quando em costa de
mar, essa praça ficaria no lugar de desembarque do porto, quando em zona mediterrânea,
ao centro da povoação. A forma da praça seria em quadrilátero”. Em Anápolis, esse
processo definido pelo historiador também ocorreu, no entanto a expansão urbana da
cidade permitiu o aparecimento de outras praças que, ao longo do tempo, tamm foram
ganhando destaque.
A Praça João Pessoa (atual James Fanstone), na Figura 45, foi destaque nos
anos 30, porque nela se localizava o Cine Teatro Áurea, a Escola de Enfermagem, o
Hospital Evangélico Goiano e a “rua do comércio”. A Praça da Estação (Americano do
Brasil) passou a ser o cartão de visitas para quem chegava a Anápolis após a inauguração
da ferrovia; também a Praça da Bandeira, antigo Largo do Bom Jesus e, posteriormente, a
Praça Bom Jesus, todas na região central. Além das características apresentadas, essas
praças também serviram de base para o traçado das ruas.
Nas figuras 42 e 43, es retratado antigo Largo do Bom Jesus nas cadas de
1930-1940 e, na Figura 44, a atual Praça Bom Jesus cuja arquitetura e arborização
indicam a influência de Goiânia. A urbanização que surgiu após as Praças Santana e João
Pessoa (James Fanstone) apresentou diferença significativa na arquitetura das casas e
prédios já sob inspiração do estilo de Goiânia, conforme detalhes da Figura 42.
102
A praça é essencialmente um cenário em que ocorrem os negócios informais
(vendedores ambulantes, engraxates, cantores e artistas desconhecidos), é também local
de festas religiosas, de eventos políticos, de descanso, de movimentos sociais. Enfim, a
praça faz parte do cotidiano da cidade e, por ela, muitas tramas da vida urbana se
desenvolvem. Palco da história das cidades e cenário da vida, a praça sempre foi
coadjuvante dos acontecimentos.
A praça reúne, converge e, nas palavras de Saldanha (1993, p. 14), é “[...] um
espaço aberto na natureza, e em sendo aberta é épica, convexa, extrovertida, ela retém a
história: da pessoa e do mundo social”. Nesse sentido, a praça é um lugar da cidade
construído para ser um pequeno paraíso, com árvores, flores, ornamentos e arte
(monumento) para o deleite do homem.
A Praça Santana foi local da primeira capela, portanto marco inicial do
povoamento e não deixou de ter sua importância histórica para a cidade. No entanto, foi a
Praça Bom Jesus que ganhou notoriedade nesse cenário urbano. Em primeiro lugar,
porque era a maior praça de Anápolis; em segundo, porque abrigava a Catedral do Bom
Jesus; em terceiro, abrigava a Prefeitura e, posteriormente, o fórum e, por último, nela
cruzam a Avenida Goiás, as ruas General Joaquim Inácio, Engenheiro Portela e a
Travessa Barão do Rio Branco, consequentemente convergia para esse local um fluxo
intenso de corcio e serviços. Arimathéa descreve o processo de formação das ruas
importantes de Anápolis próximas à Praça Bom Jesus:
Formada pela Avenida Goiás, Rua General Joaquim Inácio, Rua
Barão do Rio Branco e Engenheiro Portela é a maior praça e a que tem
a estátua de bronze do fundador da cidade, senhor Gomes de Souza
Ramos, e um busto erguido à memória do monsenhor João Olimpio
Pitaluga, um dos primeiros padres da paróquia do Bom Jesus e o que
mais tempo exerceu o sacerdócio em Anápolis. Também funcionou
nessa praça a prefeitura municipal e posteriormente o Fórum, este por
algumas décadas. (ARIMATHÉA, 2007, p. 50).
A Avenida Goiás e demais ruas citadas pelo autor são locais predominantemente
comerciais. Esse processo foi favorecido pelas ruas Engenheiro Portela e General
Joaquim Inácio (“rua dos turcos”), que atravessam a Praça Bom Jesus à direita e à
esquerda no sentido norte sul, alargando o comércio para além da praça.
103
Figura 42 - Largo do Bom Jesus, 1935.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Figura 43 - Largo do Bom Jesus, 1938.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Figura 44 - Igreja e Praça Bom Jesus.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 28.
104
Figura 45 - Praça João Pessoa, atual James Fanstone.
Fonte: Jornal O Anápolis, abr. 1942, p. 7.
A Figura 46 mostra a Prefeitura de Anápolis construída na década de 1940: este
prédio tem características da arquitetura utilizada nos prédios públicos de Goiânia. A
administração municipal funcionou nesta edificação, localizada na Praça Bom Jesus, até o
fim da década de 1970, quando um novo prédio foi construído nas proximidades da
Avenida Brasil com a Avenida Goiás para abrigar o poder executivo do município.
Posteriormente, cedeu lugar ao fórum, que funcionou ali a meados da cada de 1990.
Mesmo mostrando os locais públicos da cidade em fotografias e reportagens, o jornal O
Anápoliso descuidava de um de seus objetivos, que era promover o comércio na cidade
de Anápolis. O estilo moderno predominante em Goiânia também inspirou os prédios
públicos de Anápolis.
Figura 46 - Prefeitura de Anápolis (1940-1970).
Fonte: Jornal O Anápolis, 1949, p. 7.
105
O processo de urbanização conduziu Anápolis a inúmeras transformações em
todo o conjunto da cidade na década de 1950. Esse processo teve consequências na
estrutura das ruas, das casas, das lojas e no saneamento da cidade, conforme apontou o
jornal O Anápolis em 17 de janeiro de 1952. Segundo o jornal, “[...] o mercado municipal,
que é o maior do Brasil Central havia sido inaugurado no dia 25 de dezembro último”.
Esse seria um grande feito para a cidade, uma vez que muitos negócios passariam a ser
realizados naquele local, além de representar um impulso para os produtores agrícolas. A
finalidade do mercado municipal (Figura 47) era atender os hortifrutigranjeiros da região,
oferecendo-lhes condições para que seus produtos fossem comercializados na cidade. O
mercado municipal representou um avanço no sentido de promover a comercializão dos
produtos locais e de outras regiões do Brasil.
Figura 47 - Mercado Municipal.
Fonte: Jornal O Anápolis, jan. 1952, p. 2.
Figura 48 - Rua Engenheiro Portela, 1957.
Fonte: Jornal O Anápolis, jul. 1957, p. 3.
106
No fim dos anos 50, Anápolis configurava-se como um centro comercial
importante em relação aos demais municípios do estado de Goiás. Isso se deveu ao papel
que passou a ocupar na relação entre Brasília e Goiânia. Sua localizão entre
entroncamentos possibilitou atuar como fornecedora de produtos e serviços o para
Brasília como também para a região norte do país. Com a abertura das rodovias Belém-
Brasília, na década de 1960, e Transamazônica, no início dos anos 70, a cidade, com seu
comércio atacadista forte e diversificado, expandiu suas fronteiras comerciais.
Essa fisionomia de cidade comercial pode ser visualizada na Figura 48, em que
se têm vários elementos da morfologia urbana que a colocam em destaque nos cenários
estadual e nacional: a rua ampla e bem movimentada, os prédios que sobressaem na
paisagem nos quais funcionavam agências bancárias, cartórios e lojas comerciais nos
pavimentos térreos e, nos pavimentos superiores, escritórios comerciais e de advocacia.
Esta paisagem descrita é a Rua Engenheiro Portela, um dos locais em que o comércio era
bastante intenso.
Figura 49 - Rua Barão do Rio Branco, 1960.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
Em 1960, a Rua Barão do Rio Branco, vista na fotografia da Figura 49,
demonstrava como a paisagem da região central fora modificada, comparando-se com as
107
décadas de 1930-1940, quando esse processo de expansão do comércio, aliado ao
crescimento populacional, se acentuou. O movimento de pessoas em dia de
funcionamento do comércio indica a força da atividade comercial na cidade. Percebe-se
que o fluxo de veículos era intenso. Em primeiro plano se um fusca, um dos
símbolos dos anos 60. As laterais da rua são tomadas pelos prédios com dois e três
andares. Ao referir-se ao que vinha ocorrendo na cidade, o jornal O Anápolis comentou:
“[...] sobe através de seus prédios, cresce em número de habitantes, e aumenta dia-a-dia
nas diversas partes” (O APOLIS, 10 fev. 1960, p. 7).
A fotografia representa o que observou Marins (1998, p. 213) sobre as cidades
no Brasil após os anos 50. “Veriam a consolidação da proeminência quantitativa das
populações urbanas sobre as rurais” em virtude da expectativa de emprego, escola e
saúde. Dados estatísticos sobre a população de Anápolis confirmam esse posicionamento,
pois a população urbana da cidade ultrapassou a rural. Tudo isso era o resultado de uma
série de mudanças que vinham ocorrendo em seu entorno, por exemplo, a construção da
nova capital do Brasil distante a apenas 160 quilômetros.
Este fato provocaria uma cadeia de outros acontecimentos. Referindo-se à
importância de Brasília como um centro de irradiação de progresso para a região e,
especialmente para Anápolis, o jornal manifestou sua expectativa em relação a esse
acontecimento:
A construção de Brasília não é um acontecimento isolado na marcha
da civilização brasileira. A verdade é que, ao mesmo tempo em que se
erguem nas glebas do Planalto central as estruturas metálicas e os
edifícios de concreto, as estradas de rodagem e as ferrovias vão
demandando o futuro centro de irradiação da civilização brasileira, a
fim de que sua ligação com núcleos de trabalho existentes seja
contínua e eficaz. (O ANÁPOLIS, 7 jan. 1960, p. 3).
O jornal referiu-se às possibilidades de trabalho e de investimentos que a nova
capital traria para a rego, além de aproximar os grandes centros (São Paulo, Belo
Horizonte e Rio de Janeiro) do restante do país. Quanto à cidade de Anápolis, o jornal
chegou a manifestar-se dizendo que esta seria a sua hora:
Anápolis, talvez mais do qualquer outra cidade, em virtude de sua
situação e de seu desenvolvimento, é que deverá aportar a maioria
dessas pessoas com a sua decisão para o trabalho honesto e
progressista. É por isto que Anápolis precisa com urgência e
determinação se preparar para receber e dar permanência a esse
inestimável contingente de progresso. (O ANÁPOLIS, 28 jan. 1960, p.
3).
108
Anápolis tinha no setor de infraestrutura algumas vantagens para oferecer ao
visitante em relação às cidades próximas de Brasília, como um sistema de água e esgotos,
ruas pavimentadas e praças e também um bom serviço de hotéis, além de um comércio
forte e bem estruturado que poderia oferecer apoio à nova capital.
Nem mesmo a crise da ferrovia e a falta de energia elétrica interromperam o
crescimento urbano e o desenvolvimento do comércio anapolino nesse período. A energia
elétrica tornou-se insuficiente para atender a demanda, uma vez que a cidade cresceu
acentuadamente nas décadas de 1940-1950. Além disso, segundo Polonial (2000, p. 78),
“[...] o elevado consumo de energia decorrente do dinamismo econômico, fez com que
houvesse racionamento de energia”. O que ocorreu foi excesso de demanda, problema
que aos poucos foi sendo superado. Um fator pode ser destacado como inibidor do
comércio de Anápolis: o crescimento de Goiânia que concorreu para tirar de Anápolis a
liderança no corcio.
A crise ferroviária, segundo França, ocorreu, em parte, porque:
A via férrea de bitola estreita e com composição em número reduzido,
era insuficiente para exportação dos volumes estocados. Além disso, a
relativa velocidade das locomotivas, as baldeações de cargas, as
retenções de cargas pela articulação com a máquina e os problemas de
extravios e danificações de mercadorias, afetaram tanto a exportação
como a importação de bens. (1974, p. 654).
Esse problema foi se agravando até a estagnação total da via férrea em 1976,
quando foi desativada e retirada da cidade. Desaparecia o símbolo do progresso de
Anápolis dos anos 35 e 40.
O jornal O Anápolis lamentou a situação vivenciada pela ferrovia e, em uma
reportagem de abril de 1957, assim descreveu a situação:
No setor de transporte de passageiros a coisa continua se agravando
cada vez mais. Composições que partem de Araguari chegam aqui
com 1 ou 2 dias de atraso. Os carros cada vez mais sujos e mal
cheirosos, obrigando, como vem acontecendo durante o período das
chuvas, que se viaje com guarda-chuvas abertos dentro das
composições em decomposição. Devemos ainda registrar o modo
grosseiro e pouco cordial dos funcionários da estrada para com os
desavisados que dela se servem. (O ANÁPOLIS, 7 abr. 1957, p. 1).
A deterioração da estrada de ferro, aliada ao abandono dos vagões evidenciado
pela falta de reparo e reposição por composições novas, provocou uma situação crítica no
transporte ferroviário de Anápolis nos anos 50. Com o crescimento populacional, o
109
transporte ferroviário passou também a ser um problema no interior da cidade. A
necessidade de reorganização do espaço central exigiu a retirada dos trilhos dessa região
na década de 1970.
As atenções do jornal também se voltaram para a mudança da capital federal.
Referindo-se ao assunto, fez o seguinte comentário: “A interiorização da capital federal
será um empreendimento fecundo, pois trará grandes benefícios para Anápolis. Na região
do futuro Distrito Federal, o clima é dos mais agradáveis e propícios à vida do homem
(O ANÁPOLIS, nº 1700, 1º maio 1953, p. 1).
O jornal debitou à construção de Brasília o novo impulso no desenvolvimento da
cidade, pois o município possuía um comércio bem estruturado para atuar como suporte
no fornecimento de mercadorias e material para a construção da nova capital do Brasil.
A situação de abandono do transporte ferroviário não representou um problema
para Anápolis. As ferrovias brasileiras também haviam sido deixadas de lado. Para
Polonial (2000, p. 79), “[...] as rodovias passaram a ser prioridade dos governos,
principalmente após a Primeira Guerra Mundial, fenômeno conhecido como Era
Rodoviária. De certa maneira era a transição da locomotiva para o automóvel”. No Brasil,
as rodovias haviam crescido em extensão, chegando a 177 mil kilômetros em 1944,
embora a maior parte da rede não fosse pavimentada. O transporte rodoviário de cargas
iniciou sua fase de expansão, constituindo-se, a partir daí, a principal modalidade de
transporte disponível no ps. Barsanufo Borges constatou:
A reorientação da política de transporte do governo federal de 1930
priorizou o transporte rodoviário abandonando as ferrovias. No meio
da crise do sistema ferroviário brasileiro, a estrada de ferro de Goiás
entrou em decadência após 1940, e o trem de ferro gradativamente,
substituído pelo caminhão como o principal meio de transporte do
estado. (1990, p. 1).
Esta nova orientação satisfazia os interesses dos fabricantes de automóveis e
caminhões vinculados à política de transporte rodoviário de Getúlio Vargas, em nível
federal, e de Pedro Ludovico Teixeira em Goiás. Política esta fortalecida pelo governo
Juscelino no fim da década de 1950.
Com Juscelino Kubitschek no governo federal, um novo impulso foi dado ao
modelo rodoviário no Brasil. Segundo Rodrigues:
Até o início da década de 50, as rodovias existentes no Brasil eram
precaríssimas. O governo Juscelino criou o slogan 50 anos em 5.
Construiu Brasília, trouxe a indústria automobilística para o país e
110
rasgou estradas ao longo do território nacional, fomentando a
demanda pelo transporte rodoviário. A partir de então a rodovia
passou a ser encarada como fator de modernidade, enquanto a ferrovia
virou símbolo do passado. (2000, p. 33).
A indústria automobilística assumiu papel preponderante no processo de
industrialização. O Brasil optou pelas rodovias no final da década de 1950, quando a
indústria automobilística se instalou no país. As empreiteiras Camargo Corrêa e Queiroz
Galvão, grandes construtoras de estradas, hidrelétricas, pontes e viadutos nas décadas de
1960 e 1970, perceberam a possibilidade de ganhar dinheiro construindo obras públicas.
Assim, nesse período (década de 1950 a 1970), a implantação da indústria
automobilística passou a viabilizar a criação do sistema de Transporte Rodoviário de
Cargas (TRC) em substituição ao sistema ferroviário.
Rodrigues destaca:
Neste período, constituíram-se diversas empresas transportadoras.
Paulatinamente alguns proprietários individuais de caminhões
começaram também a participar deste ainda incipiente mercado.
(2000, p. 33).
Em Anápolis, a administração municipal passou a investir nas rodovias que
ligavam a cidade a outros municípios do interior de Goiás. Dizia o jornal: “Todas as
rodovias foram reconstruídas com excão de Matão a Souzânia que será atacada em
breve” (O ANÁPOLIS, 17 jan. 1952, p. 2).
A Rodovia Anápolis–Goiânia também foi reconstruída para facilitar o intenso
fluxo de veículos entre as duas cidades. Este fato deve ser destacado nesse período de
construções e reconstruções que ocorriam no fim da década de 1940.
A Figura 50 (“Anápolis em Goiânia”) mostra um pouco da paisagem formada
pelo cerrado e matas no trecho da rodovia Anápolis–Goiânia em 1948, quando da
reinauguração após a reforma feita pelo governo do estado de Goiás. Esta rodovia
colocou a capital em “contato com o interior do Estado. Na fotografia, observa-se uma
casa de alvenaria, em estilo moderno, com três telhados e varanda, indicando que a
modernidade havia chegado ao meio rural e, no seu entorno, uma cerca de arame com
roupas estendidas; na estrada, um automóvel provavelmente um fusca seguia na direção
de Goiânia.
111
Figura 50 - Rodovia Anápolis–Goiânia, 1948.
Fonte: Jornal O Anápolis, set. 1948, p. 8.
Nesse cenário de desenvolvimento do transporte rodoviário, o empresariado
anapolino aproveitou para investir neste ramo de atividade impulsionado pela posição
geográfica do município. Sua localização entre a capital do estado de Goiás, a futura
capital do Brasil e a Região Norte fez com que Anápolis atraísse para seu território essas
concessionárias, o que representa um indicativo de que o setor de prestação de serviços
ganhava espaço em Anápolis durante a década de 1950.
O comércio atacadista e varejista atraía muitos compradores de outras cidades e
regiões. Isso fez surgir as transportadoras e, com elas, o transporte de passageiros. O que
ocorreu foi o desenvolvimento do setor de serviços, que contribuiu para um novo impulso
no comércio da cidade.
O transporte na versão rodoviária apresentava algumas características vantajosas,
conforme a opinião de Mello (1995, p. 101): “Devido ao uso do caminhão; este apresenta
a vantagem de possibilitar o deslocamento de mercadorias porta-a-porta, o que pode
configurar na maior vantagem deste modal. O caminhão, portanto, oferecia flexibilidade
na escolha de rotas e nas diferentes capacidades de carga oferecida.
Faria (2001, p. 17), por sua vez, acrescentou que o “[...] transporte rodoviário
caracteriza-se pela excepcional capacidade de distribuição final dos produtos e grande
versatilidade, permitindo operações de carga e descarga mais simplificadas”. O transporte
rodoviário de cargas, foi responsável pelo abastecimento de mercadorias de grande parte
da rede comercial da cidade.
112
Em Anápolis o transporte rodoviário ganhou força nos anos 1950-1960, período
em que existiam na cidade empresas direcionadas à prestação de serviços de transporte de
cargas e pessoas. Nesse período, destacou-se o Transporte Harmonia (Figura 51),
proprietário de uma frota de caminhões que transportava a produção agrícola da rego até
os armazéns de estocagem da cidade, além de mercadorias de Anápolis até outras regiões
do país.
Figura 51 - Transporte Harmonia.
Fonte: Jornal O Anápolis, 10 fev. 1950, p. 2.
No transporte de passageiros, destacavam-se a empresa de ônibus Expresso
Brasil Ltda., de propriedade de Inácio Bezze, e o Expresso Planalto, de Antônio Puglisi.
A primeira fazia escalas de Anápolis a Goiânia, Anápolis a Inhumas, Anápolis a Itapací e
a outras cidades de Goiás. A escala de viagens entre Anápolis e Goiânia era feita em
vários horários durante o dia. Na tabela visualizada nas figuras 52 e 53, há seis escalas de
horários alternados. A segunda oferecia linhas de ônibus de Anápolis a Corumbá,
Anápolis a Aparecida, Anápolis a Campo Limpo, além das cidades próximas à nova
capital do Brasil. Para essas cidades, a escala era Anápolis a Braslândia, Anápolis a
Planaltina e Anápolis a Formosa.
113
Figura 52 - Expresso Brasil Ltda.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 100.
Figura 53 - Expresso Planalto.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 100.
Em 1957, às vésperas de completar seu cinquentenário, Anápolis se organizou
para competir com mais uma grande cidade, a capital federal, que vinha sendo construída
no planalto central. Para isso era necessário mostrar o que a cidade tinha para oferecer ao
hóspede e visitante. Foi organizada a revista A Cinqüentenária, em edição única
comemorativa dos 50 anos da cidade. Idealizada pelo ex-governador Jonas Duarte, coube-
114
lhe a tarefa de lançar nos meios de comunicação o jovem jornalista Fernando Cunha
nior.
Esta revista também registrou o momento pelo qual passou a cidade de Anápolis
com a construção de Brasília. A localização geográfica da cidade tornou-a uma espécie de
passagem obrigatória de todos aqueles que para se dirigiam. A revista assim relatou o
movimento do transporte rodoviário com destino à nova capital:
Desde o início à construção das primeiras casas no futuro Distrito
Federal, que vimos notando, em Anápolis um novo ritmo de vida.
Caminhões cheios de materiais de construção por aqui passam
constantemente, com destino àquela futura metrópole. Nessas casas
comerciais fazem fornecimento de mercadorias diversas para a
Novacap e outras vimos notando em Anápolis um novo ritmo de vida.
Caminhões e Companhias que ali trabalham. (A
CINQÜENTENÁRIA, Edição única, 1957).
O otimismo era percebido nas pessoas (comerciantes e proprietários de imóveis)
interessadas na amplião dos negócios, serviços e, especialmente, na continuidade da
urbanização da cidade.
Em relação ao que vinha acontecendo na cidade, A Cinentenária relatou:
Seu povo cheio de entusiasmo e otimismo contagiante surpreendente
pelo amor a terra e ao trabalho. Todos os que aqui aportam e fixaram
residência, vindos de todas as bandas são recebidos com um grande
sorriso largo e braços abertos por esse mesmo povo dinâmico e
trabalhador, cujo lema principal é a grandeza de sua cidade. Seu
comércio intenso com as cidades circunvizinhas, notadamente com o
norte do Estado, coloca-na em situação privilegiada, principalmente
com a transferência da capital da República para Brasília, com a qual
ficará ligada por magnífica estrada asfaltada, cujas obras foram
iniciadas. (A CINQÜENTENÁRIA, Edição única, 1957).
O empreendedorismo ganhou novos direcionamentos para os investimentos na
cidade, a crise da ferrovia havia ficado no passado. Houve uma espécie de ufanismo nos
meios de comunicação especialmente no jornal O Anápolis. A revista A Cinqüentenária,
por ser uma edição comemorativa, manifestou-se otimista em relação ao crescimento
econômico e social da cidade dinamizado pelo comércio.
Ainda na década de 1960, construiu-se um trecho pavimentado da ligação
Anápolis–Brasília, começo da BR-060, obra concluída no tempo recorde de apenas dez
meses. era intenso o movimento de tráfego assim que foi aberta ao uso e muito mais
ainda na semana em que a nova capital brasileira foi inaugurada, no dia 21 de abril de
1960.
115
Deve-se ressaltar que Anápolis respondia positivamente a esse movimento
provocado pela abertura de estradas, pela inauguração de Brasília, pela proximidade com
Goiânia. O jornal descreveu esse processo destacando:
[...] observa-se em Anápolis uma onda de progresso jamais vista,
vemos invadindo a cidade na época atual, uma onda de
desenvolvimento nunca visto antes verificado. A cidade cresce e
progride em todos os setores de atividade. Agora mesmo, por
exemplo, vemos o panorama urbano sendo modificado com o
surgimento de prédios, que em pouco tempo estarão dando uma nova
fisionomia à cidade. (O ANÁPOLIS, 29 jul. 1960, p. 4).
Esse quadro é visualizado na Figura 54, fotografia em que esses prédios
sobressaem ao longo da Rua Manoel D’Abadia no início dos anos 60. São identificados
pelo menos cinco prédios, um deles com cinco andares. Observa-se o escritório da Real
Transporte Aéreo, empresa de aviação civil que fazia escalas entre Goiânia, Anápolis,
Januária, Lapa e Salvador. O pouco movimento oferece uma visão nítida da rua como um
todo, no entanto percebe-se um automóvel especificamente um Jeep, uma bicicleta e duas
crianças.
Figura 54 - Rua Manoel D’Abadia, 1960.
Fonte: Museu Histórico de Anápolis.
116
Durante trinta anos (1930-1960), o jornal O Anápolis divulgou a imagem da
cidade, impulsionada pelo progresso que culminou num surto de modernidade jamais
visto. Isso demonstra a receptividade que esse discurso teve na população, o que
assegurou sua permanência.
No decorrer da análise sobre a década de 1950, percebeu-se a ampliação dos
espaços urbanos pressionada pela migração campo–cidade. Esse fenômeno foi
impulsionado pela perspectiva de vida que a cidade acalentava no imaginário do
trabalhador do campo.
A ferrovia não atendia às expectativas da cidade como meio de transporte de
passageiros e de carga, isso mais em relação à velocidade do que à capacidade. A
modernidade agora caminhava a passos largos, impulsionada pelo transporte rodoviário
mais veloz e que enfrentava qualquer tipo de estrada. Em lugar do vagão de passageiros,
surge o ônibus com destino a diferentes lugares.
É perceptível o fato de que a imaterialidade expressa no conhecimento, no desejo
e na vontade de transformar foi refletida na materialidade, como fruto do trabalho das
pessoas imbuídas em construir a cidade comercial. A materialização do progresso foi
sendo visível nas grandes casas residenciais espalhadas pela cidade. Nesse sentido, pode-
se dizer que as motivações foram alteradas, mas o discurso da cidade progressista
persistiu no tempo. Diante da visualização da cidade nas imagens fotográficas, é possível
avaliar em que medida os anúncios de mercadorias, veiculados no jornal, permitiram a
continuidade do discurso da cidade comercial.
117
3 A ENTRONIZAÇÃO DO COMÉRCIO: A MANCHESTER
GOIANA
3.1 Chegou a miss Frigidaire!
Para compreender como o jornal imprimiu a imagem do comércio como uma
vocação da cidade, decidiu-se trabalhar com a noção de representação de Roger Chartier
(1990, p. 2002). Para o autor, as
[...] relações sociais como formadoras de entendimento do mundo [...],
adotadas pelos indivíduos e grupos, lhes conferem uma dada
identidade. Ao estabelecer relações com o mundo e com as coisas
esses grupos criam representações sobre o seu mundo social a fim de
representá-los em sua ausência. (1990, p. 17).
Assim, é possível afirmar que os grupos sociais disputam a construção de
representações, por meio das quais fazem leituras particulares do mundo, concebem, para
si e para os outros, identidades que atendam seus interesses. Como momento de
legitimação, as representações sociais se mostram como um espaço de disputa entre
diferentes grupos com intuito de tornar legítima a sua visão de mundo. Estabelecida a
visão de mundo, fica sedimentada a dominância, e o campo simlico atua como campo
de exercício do poder, não necessariamente pela repressão e pela coação, mas pelos
valores que impõe à coletividade.
É um poder que não coage fisicamente, mas constrói no interior dos indivíduos
esses valores considerados necessários à manutenção das estruturas sociais, justificando
determinadas práticas sociais em detrimento de outras. Esse entendimento sugere que o
jornal O Anápolis, como um órgão pertencente a um grupo de pessoas formadoras de
opinião na sociedade, funcionava como o veículo por meio do qual esse grupo expunha
suas ideias: no editorial, nas reportagens, nos artigos, nos poemas, nas fotografias, nos
anúncios e sociabilidades. Como instrumento de informação e divulgação, atendia o
grupo que representava, ou seja, veiculava sua visão de mundo. Para isso forjaram-se
representações por meio de imagens que informavam como as coisas aconteciam e como
deveriam acontecer para a cidade atingir o progresso econômico e social. O meio
identificado como propulsor do progresso foi o comércio, uma vez que, por seu
intermédio, a cidade alcançaria a modernidade. Essas foram as representações que esse
118
grupo social criou para identificar a si, seu pensamento sobre Anápolis e sua
materialidade física, que deu unidade à coletividade, formando ligações simbólicas entre
ele e a sociedade. Isso aconteceu em cada texto, em cada fotografia, em cada anúncio.
De acordo com Chartier, ao querer impor sua vontade com base nessas ligações
simbólicas com Anápolis, esses grupos
[...] descrevem a sociedade tal como pensam que ela é ou como
gostariam que fosse. Portanto, essas práticas visam fazer reconhecer
uma identidade social, a exibir uma maneira própria de ser no mundo
as que resultam da representação que o grupo constrói de si. (1990,
p. 17).
Conferem, assim, uma identidade coletiva, a partir da qual cada indivíduo passa
a ser reconhecido. Como o grupo construiu essas representações e ao mesmo tempo lhe
conferiram identidade coletiva, ou como o indivíduo passou a ser reconhecido no interior
da coletividade, tem a ver com a substituição da pessoa por uma representação. Para
responder a esse questionamento, Chartier argumenta:
A representação como dando a ver uma coisa ausente, o que supõe
uma distinção radical entre aquilo que representa e aquilo que é
representado, e afirma que, a representação é instrumento de um
conhecimento mediato que faz ver um objeto ausente através da
substituição por uma imagem capaz de, o reconstruir em memória e
de, o figurar tal como ele é. (1990, p. 20).
No discurso da mídia impressa nos anos 40, observa-se que, mesmo de forma um
tanto rudimentar para os padrões atuais, as imagens davam uma conotação de substituto
em relação ao produto, ou ao local em que se encontrava a loja, ou seja, a imagem
substituía o objeto, colocando-se em seu lugar de forma que a população entendesse a
verossimilhança e a observasse com atenção. Desse modo seria aguçado o desejo de
consumo. Jodelet avança no estudo das representações ao atribuir conotação social ao
termo. Segundo essa autora:
Representar ou se representar corresponde a um ato de pensamento
pelo qual um sujeito se reporta a um objeto. Este pode ser tanto uma
pessoa, quanto uma coisa, um acontecimento material, psíquico ou
social, pode ser tanto real quanto imaginário ou mítico. (2001, p. 22).
Para essa autora, não representação sem objeto. A representação social tem
como objeto uma relação de simbolização (substituição) e de interpretação (conferindo-
lhe significações).
119
O aqui e agora faz parte do cotidiano da cidade, ou o cotidiano produz o
existente no contexto da cidade, onde cada individualidade é o lugar em que atua a
pluralidade incoerente e contraditória de suas determinações relacionais. Determinações
essas que seguem uma trajetória na qual o sujeito faz suas escolhas a partir de algo posto,
dado pela informação apresentada pela imagem observada no jornal. Certeau (1994, p.
40) fala da apropriação ou reapropriação da língua por locutores e interlocutores na
construção de “[...] uma rede de lugares e de relações”. Essa relação comunicativa existe
entre a linguagem simbólica dos comerciais e o leitor disposto a dar novos contornos,
nova interpretação ao objeto figurado pelos anúncios, o que representa a ação e reação da
prática social dos indivíduos. Completando esse entendimento, Capelato (1998, p. 27)
ressalta: “[...] o indivíduo o seria, portanto, tão passivo quanto se poderia supor.
Passou-se a buscar uma identificação dos espaços onde ocorre o consumo do que é
produzido pelos meios, mais do que o consumo propriamente dito”. Talvez a passividade
do indivíduo esteja no ato de se deixar levar pela sedução do anúncio, embora esteja
consciente de sua ação. Nesse sentido não seria passivo e sim, influenciado, conquistado
pela imagem que o levaria ao produto.
Os anúncios publicados entre 1935 e 1940 no jornal O Anápolis eram pouco
ilustrativos, ofereciam ao leitor muita informão escrita. As edições do jornal eram
rígidas, ou seja, um mesmo anúncio circulava por um longo tempo sem muita inovação. O
exemplo da Figura 55 mostra um tipo de anúncio de classificados que representava um
indicador profissional da cidade de Anápolis. Esse indicador apareceu no jornal de 1935
até o fim da década de 1940, o que indica que os profissionais liberais ali expostos
provavelmente pagaram para aparecer na primeira página do jornal. Além disso, apontava
a diversidade dos profissionais e serviços oferecidos na cidade, comprovando a chamada
dos anúncios classificados: “Anápolis é o maior centro de atividades do Estado”. A força
dessa chamada indicava que Anápolis era um lugar de oportunidades e de grande
movimento impulsionado pela pujança vivida pela cidade, além de expressar a
contemporaneidade trazida pela modernidade.
120
Figura 55 - Indicador Profissional.
Fonte: Jornal O Anápolis, maio 1935, p. 1.
Os principais anúncios encontrados no período indicado geralmente se referiam
a serviços dicos, de escritório de contabilidade e advocacia, de venda de terras, de
armazéns e eventos culturais, além de produtos agrícolas. De acordo com Martins,
[...] com o advento do jornalismo no Brasil, a partir de 1808, foi
adotada a prática européia de venda de espaço destinada a
informações para a comunidade, de venda de casas a captura de
escravos, esses reclames, como eram chamados, já possuíam
linguagem objetiva e adjetivada. Em boa parte dos anúncios não havia
a preocupação com os textos, apareciam as palavras “atenção” ou
“aviso”. (1997, p. 40).
Somente no fim do século XIX muitos jornais optaram “[...] pela modernidade
incluindo cores e gravuras em seus anúncios, e alguns desses veículos dedicavam-se à
publicidade” (RAMOS; MARCONDES, 1995, p. 35). No jornal O Anápolis, este tipo de
anúncio com fotografias em preto e branco ou em cores comou a aparecer em
meados da década de 1940. Esses anúncios, de acordo com Martins (1992, p. 42), “[...]
121
eram classificados, às vezes em ginas inteiras de reclames, mostravam a preocupação
de seus anunciantes em fixar a marca de seus produtos e serviços”.
Os anúncios estampados nas figuras 56 e 57 mostram esse formato adotado pelo
Jornal O Anápolis, em que os produtos eram listados contendo seu valor de venda.
Escritos em forma de texto, continham a expressão “vende-se”, comum nos periódicos da
época. O formato vinha do século XIX e se caracterizava por serem listas com os nomes
dos produtos ou terem a forma de textos curtos.
A Figura 56 mostra um anúncio denominado seção comercial, em que aparecem
diversos produtos com os respectivos preços. Na época, produtos como toucinho, arroz
em casca, feijão em saco, galinha, frangos, ovos, sabão artesanal e guariroba eram
classificados como produtos da terra. No anúncio, aparecem também produtos
industrializados: arame farpado, sacarias, macarrão, sal e farinha de trigo. É interessante
observar que esses produtos eram vendidos por quilo ou em litros.
Figura 56 - Anúncio de seção comercial.
Fonte: Jornal O Anápolis, maio 1935, p. 1.
122
Figura 57- Anúncio de serviços.
Fonte: Jornal O Anápolis, jun. 1937, p. 1.
A figura 57 apresenta seis tipos de anúncios: o primeiro oferece serviços de
guarda-livros; o segundo, venda de imóveis; o terceiro e o quarto, produtos como doces,
macarrão, vinho e tecidos; o quinto é a publicação de um edital de proclama; o sexto tipo
anuncia a venda de medicamentos.
123
O anúncio também enaltecia as qualidades da publicão como veículo de
informação: “Todo comerciante que anuncia torna seu produto conhecido pelo público
consumidor”, “Anunciar é dar a conhecer(O ANÁPOLIS, 28 nov. 1946, p. 2). O jornal
(Figura 58) colocava-se como o caminho para o sucesso, para a riqueza, ao justificar as
vantagens que o anunciante teria ao anunciar no periódico. A transpancia na publicação
dos anúncios, a grande tiragem e a regularidade asseguravam a conceituação e a
credibilidade entre os leitores, aspecto fundamental para o anunciante. A organização
gráfica se constituía em atração, por isso o jornal estava em todas as mãos com suas
matérias e notícias.
O Anápolis assim enfatizava a vantagem da propaganda em jornais:
A propaganda pelo jornal é muito mais eficiente, mais difundida e por
menor preço. E, quanto ao jornal devem-se olhar não os seus preços,
mais a sua circulação, a sua apresentação gráfica e noticiosa ou de
artigos, para ver se a propaganda ser olhada. E, sobre isso, a
circulação e o conceito são importantes. (O ANÁPOLIS, 28 nov.
1946, p. 2).
No jornal O Anápolis existia espaço para informações, críticas, anúncios,
homenagens, divulgão de atividades sociais e culturais, ou seja, havia espaço
diversificado. Por isso ocupou lugar de destaque entre as mídias impressas. Por conter
uma gama bastante variada de informões, o jornal atingia todos os tipos de leitores, o
que possibilitava os anunciantes conquistarem mais consumidores.
124
Figura 58 - O jornal O Anápolis anunciando seus serviços, 28 nov. 1946, p. 2.
Na cada de 1930, os anúncios de medicamentos, como elixir, biotônicos,
digestivos, emulsão de Scott e outros, apareciam constantemente no jornal O Anápolis.
Muitos desses anúncios circulavam em outros jornais do país, o que demonstrava a
inclusão de Anápolis na economia nacional. Além disso, esse jornal circulava em outros
municípios de Goiás, ampliando a sua influência como divulgador do comércio
anapolino. Produtos destinados à saúde tamm eram anunciados no jornal O Anápolis,
especialmente fortificantes, o comprimido Melhoral, vermífugos e digestivos.
O anúncio da Figura 59 apresenta o biotônico Fontoura como um fortificante
para todas as idades. No entanto, a imagem refletida no anúncio é a de um jovem
estudante e o texto argumenta que, com o uso desse fortificante, o aluno teria prazer e
alegria em estudar. Esse tipo de anúncio era veiculado com frequência tamm nas
décadas de 1940 e 1950, quando a saúde e a higiene se mantinham como articuladoras da
modernidade na qual a cidade queria integrar-se. Para isso era necessário ter indivíduos
saudáveis e com disposição para ingressar no mercado de trabalho.
De acordo com os anúncios dirigidos à saúde, quem fizesse uso dos fortificantes
teria bom desempenho na escola, seria o craque do time e ainda apresentaria um sorriso
125
bonito. Essa era a forma utilizada para induzir o consumo desses medicamentos pela
população.
O anúncio da Emulsão de Scott (Figura 61) adiantava-se em prescrever: um
jovem para ser forte e vencedor deveria tomar a Emulsão. O creme dental Kolynos
tamm completava o discurso higienista em defesa de dentes limpos e saudáveis,
difundindo, assim, hábitos de higiene pessoal. O anúncio do creme dental Kolynos
indicava a internacionalização da economia, uma vez que era um produto internacional
não fabricado no Brasil. Os digestivos (Figura 60) completavam o catálogo de produtos
indicados para a saúde popular, portanto estavam presentes em todas as listas de anúncios
nas cadas de 1930 a 1960. Esses produtos eram facilmente encontrados em farmácias,
casas comerciais, bares e cafés. Esse discurso, segundo Sevcenko (1998, p. 559), indicava
como tendência
[...] a grande vocação para o corpo e a saúde despertada no coração
dos “novos homens” pelo seu impulso instintivo para a concorrência,
a agressividade e o sucesso. A saúde nesse sentido imprimiu uma
conotação de auto-estima, autoconfiança e combatividade, inscrita na
colaboração irradiante da pele, nos músculos tonificados, na estrutura
sólida, nas proporções adequadas, nas formas esbeltas e na insinuação
de uma sexualidade desperta e fértil. A saúde, enfim, era a chave de
um corpo moderno. (1998, p. 559).
Os produtos de higiene pessoal e de saúde passaram a fazer parte da imaginação
popular, pois imprimiam a marca de um novo homem, destacando a força, a agilidade e o
corpo esbelto. Para uma população acostumada a viver no campo, onde a vida era uma
extensão da natureza, esses novos mecanismos de consumo possibilitavam imaginar
novos contornos para o corpo, especialmente a obtenção de uma nova aparência. Era uma
exincia posta pelo mercado de consumo aos novos moradores da cidade, embora o
anúncio fosse extensivo a todos os consumidores.
126
Figura 59 - Anúncio de biotônico Fontoura. Fonte: Jornal O Anápolis, abr. 1944, p. 2.
Figura 60 - Anúncio de Sal de fruta ENO. Fonte: Jornal O Anápolis, jan. 1950, p. 2.
Figura 61 - Anúncio de Emulsão de Scott. Fonte: Jornal O Anápolis, jan. 1950, p. 2.
Observando as figuras 59, 60 e 61, percebe-se que as imagens dos anúncios eram
desenhos que tentavam reproduzir os prováveis efeitos do medicamento nas pessoas, em
geral representadas por crianças e jovens. Ao publicar anúncios de medicamentos de
combate à sífilis e às verminoses, o jornal afirmava-se também como anunciante das
127
campanhas públicas de saúde direcionadas à população. O anúncio de fortificantes
tamm reforçava as campanhas higienistas que vinham ocorrendo nas regiões urbanas e
rurais do Brasil no início do século, especificamente entre 1900 e 1930. Os médicos que
chegaram a Anápolis no início do século XX se destacaram por realizar um trabalho
preventivo com a população. A esse respeito João Friedmann narrou:
A partir de 1922, chegou à cidade o médico Genserico Gonzaga Jaime
formado pela Universidade de Medicina do Rio de Janeiro sendo,
portanto o primeiro médico a atuar em Anápolis, no entanto em 1925
com a chegada do médico James Fanstone e sua esposa instalou sua
residência à rua Desembargador Jayme ali instalou seu consultório
médico. (1955, p. 129).
Esse momento marcou a chegada dos primeiros médicos na cidade, fato que
resultou na disseminação dos conceitos de higiene no meio da população. Referindo-se ao
trabalho dodico James Fanstone, João Friedmann destaca:
Era um médico diferente. A todos atendia com a mesma solicitude. Os
mesmos cuidados que dispensava opulentos comerciantes, abastados
fazendeiros e prestigiosos políticos também dedicava a míseros
camponeses, opilados e subnutridos. Todos recebiam do Dr. Fanstone,
os benefícios de seu sólido e respeitável preparo científico, de seu
sincero interesse pelo bem-estar de seus clientes e de seu otimismo
contagiante e confortador. (FRIEDMANN, 1955, p. 128).
James Fanstone nasceu em Recife, Pernambuco, no dia 8 de agosto de 1890. Foi
educado na Inglaterra, formou-se pela Universidade de Londres em 1915, no curso de
medicina e cirurgia, com distinção em Patologia e Clínica Médica. No ano de 1921,
conquistou o título de M.D. (Doutor em Medicina) e neste mesmo ano lhe foi conferido o
diploma de Medicina e Higiene Tropical. O Dr. James Fanstone foi um médico higienista.
Os dicos desta especialidade eram reconhecidos pela população pelo trabalho que
prestavam no sentido de melhorar as condições de higiene e saúde, bem como por sua
atuação nas questões de cidadania. Lima (1999, p. 94) ressalta que “[...] os dicos que
se dedicavam à saúde pública participaram ativamente do debate sobre regeneração.
Falava-se da regeneração do homem, enfatizando-se o aprimoramento da moral e da
solidariedade social”. Com seu envolvimento na saúde na rego de Anápolis, James
Fanstone fundou o Hospital Evangélico Goiano em 1927 e, em 1937, a Escola de
Enfermagem (Figura 18). Pela descrição de Friedmann, este hospital era uma
[...] casa brasileira com três grandes salas, que haviam sido
transformadas em enfermarias. Uma sala menor é a sala de operações,
128
com paredes caiadas de branco e assoalho de madeira cheio de
buracos. Outro cômodo pequeno é usado como consultório. As camas
são bastante agradáveis, cobertas com colchas tecidas em casa e os
criados-mudos são caixotes de gasolina. Tudo isto tem um delicioso
aspecto de primitivo e simples. (1954, p. 135).
No início, os médicos trabalhavam num sistema de improvisação, em razão das
condições precárias do lugar. Para realizar o trabalho preventivo e curativo das doenças, o
médico ia até as casas e prescrevia a medicação, uma vez que não havia espaço suficiente
no hospital improvisado.
Outro fator fundamental do trabalho do dico James Fanstone foi sua
preocupação em aliar a questão religiosa à saúde, pois, na sua opinião, esses fatores
conjugados alcançariam êxito na formulação de novos hábitos entre a população. James
Fanstone atuou como médico e missionário; além fundar o Hospital Evangélico, também
fundou a Primeira Igreja Presbiteriana de Anápolis.
Entre as doenças contagiosas, deve-se destacar a sífilis, cuja propagação era
estimulada, sobretudo, pela falta de esclarecimento da população sobre a prevenção, uma
vez que o contágio ocorre nas relões sexuais.
O anúncio de combate à sífilis, observado na Figura 62, apresentava ao leitor do
jornal O Anápolis uma conotação preventiva, pois estava representando o discurso da
saúde e higiene adotado pelos médicos no início do século XX. O jornal O Anápolis
reproduzia os “conselhos oficiais” sobre a prevenção dessa doença, na expectativa de que
os pontos destacados ajudassem as famílias a evitar a contaminação com uma doença
contagiosa e perigosa. Também manifestava preocupação com a família e a raça,
conforme observou Costa (1999, p. 57): “[...] o sucesso da higiene indica essa revisão
estratégica no trabalho de fissão e reestruturação do núcleo familiar”, responsável pela
formação e manutenção da falia nuclear burguesa.
129
Figura 62 - Anúncio de elixir de combate à sifilis.
Fonte: Jornal O Anápolis, abr. 1935, p. 1.
No anúncio da Figura 63, a casa comercial Rainha da Barateza anuncia seus
produtos: “Vende-se por atacado e varejo, fazendas, armarinhos, calçados, chapéus e
outros artigos, em grande quantidade. O anúncio destacou a tradição da casa comercial
como indicador para continuar alcançando o consumidor; além disso, anunciava possuir
amplo espaço para o armazenamento de mercadorias. Era uma forma de dizer ao
comprador que havia muito estoque para ser vendido e garantia de que os produtos seriam
despachados caso o comprador viesse de lugares distantes.
Figura 63 - Anúncio da casa Rainha da Barateza.
Fonte: Jornal O Anápolis, jan. 1940, p. 4.
130
A influência exercida pela estrada de ferro sobre o comércio em Anápolis foi
considerável, a ponto de, no rodapé do comercial, vir a inscrição – “Annapolis- Estrada de
Ferro de Goyas”. Pela estrada de ferro garantia-se a venda e a entrega do produto. O
jornal também veiculou anúncios voltados à moda masculina e feminina.
Era uma forma de anunciar com o fim de influenciar o modo de viver, andar e
vestir do homem e da mulher. Isso era sentido nos anúncios destinados a promover o
comportamento masculino e feminino nas décadas de 1950-1960.
A família burguesa representada na figura homem–mulher pode ser vista nos
anúncios, geralmente em postura sóbria, refinada pela boa educação. A sociedade, para
alcançar o desenvolvimento social, precisava de pessoas que encarnassem o espírito
almejado. A representação da modernidade estava no corpo saudável, forte e na beleza
estética desse homem e dessa mulher (figuras 64 e 65).
A figura feminina, segundo Maluf e Mott (1998, p. 373), nas três primeiras
décadas do século XX, esteve assentada no discurso: “O lugar da mulher é o lar, e sua
função consiste em casar, gerar filhos para a pátria e plasmar o caráter dos cidadãos de
amanhã. Essa função de mãe–esposa–dona de casa representava os ensinamentos da
igreja, dos dicos e dos juristas, que eram legitimados pelo estado e divulgados na
imprensa (em anúncios, artigos e fotografias da família). A mulher representada nos
anúncios expressava beleza e feminilidade sem exageros. A estética feminina era
entendida no contexto do lar, em que a vaidade da mulher se expressava para agradar o
marido e educar os filhos.
Figura 64 - Anúncio das Lojas Renner. Fonte: Jornal O Anápolis, 30 mar. 1951, p. 3.
Figura 65 - Anúncio das Lojas Renner. Fonte: Jornal O Anápolis, 23 dez. 1951, p. 3.
131
Figura 66 - Anúncio da Loja A Esmeralda.
Fonte: Jornal O Anápolis, 4 nov. 1951, p. 4.
Figura 67 - Anúncio da loja Branco & Preto Cine Foto.
Fonte: Jornal O Anápolis, 1955, p. 4.
Os tempos modernos vinham definindo o padrão de consumo a partir das
máquinas, visando conquistar o homem. A mulher mostrava-se disposta a disputar com
esse homem os novos espaços, traduzidos numa grande quantidade de objetos de
132
consumo, em especial aqueles destinados à estética do corpo como os produtos de beleza.
“A maquiagem estava na moda nos anos 50, valorizava o olhar, o que levou, a uma
infinidade de lançamentos de produtos para os olhos, um verdadeiro arsenal composto por
sombras, além do impensável delineador (GARCIA, 2008, p. 5). A época também foi
marcada pelo auge das tintas para cabelos que passaram a fazer parte da vida das
mulheres. Esse período da história, segundo Garcia (2008, p. 5), [...] proporcionou para
a mulher tornar-se mais feminina e glamorosa”. Essas representações da beleza feminina
através dos produtos de maquiagem são visíveis nas figuras 66 e 67.
No campo profissional, as mulheres brasileiras experimentaram certo progresso
inspirado nos acontecimentos em curso nos Estados Unidos e Europa do s-guerra,
embora dentro de certos limites, conforme apontaram Maluf e Mott (1998, p. 402): “As
ofertas disponíveis, em geral, estavam próximas daquilo que se considerava uma extensão
das atribuições das mulheres: professora, enfermeira, datilógrafa, taquigrafa, secretária,
telefonista, operária das indústrias de confecções e alimentícia”. Esse panorama começou
a mudar somente na década de 1960, quando os movimentos feministas penetraram de
forma significativa nas camadas médias da sociedade brasileira, configurando as lutas das
mulheres no sentido de conquistar novos espaços sociais ao lado do homem.
Se, por um lado, a beleza feminina era presença garantida em anúncios de
produtos de beleza, de consumo no lar e do comércio da moda, o gosto pela moda,
conforto e elegância também fazia parte da figura do homem educado. Mas, para ser
elegante e moderno, usufruir do progresso como um luxo e conforto e, acima de tudo,
com sobriedade, era preciso representar a inteligência por trás dos estereótipos
construídos para a sociedade burguesa.
Os produtos Renner (figuras 64 e 65) simbolizaram as indústrias de confecções
vindas de São Paulo para conquistar consumidores num cenário ainda dominado pelos
alfaiates e costureiras.
Os anúncios da moda masculina e feminina voltados para a classe dia
anapolina, nos anos 1950-1960, representaram o corpo com elegância, “[...] ressaltando a
comodidade e a beleza do corte de suas roupas” (PADILHA, 2001, p. 86).
A moda se compõe de algo novo e está sempre vinculada aos acontecimentos
que marcaram época, ora simbolizando-os, ora assumindo uma reação crítica. É certo que
está vinculada ao que a elite pensa sobre estilos e gostos. Nesse sentido:
[...] a moda está presente na arquitetura, no mobiliário, nos bitos
alimentares, mas, sobretudo nas formas de conduta da sociedade.
133
Essas preocupações em viver com elegância, sinônimo de civilidade,
permitem maiores investimentos nos setores de vestiários e
quinquilharias. Pode-se mesmo afirmar que quanto mais desenvolvida
se apresenta a cultura urbana, maior será o mercado consumidor de
supérfluos. (DEAECTO, 2002, p. 171).
A moda é um elemento importante da sociedade moderna, uma vez que
representa o belo, o extravagante, o novo, o diferente, que seduz quem deseja ser
elegante, embora seu sentido seja efêmero, pois do mesmo jeito que aparece também
desaparece. Talvez resida aí tanto interesse pela moda por parte da sociedade moderna, da
ideia de que ser elegante e estar na moda é pertencer a uma sociedade civilizada.
Se, por um lado, saúde e beleza tornaram-se expressão da sociedade de consumo
no Brasil, com reflexos perceptíveis em Anápolis, por outro, o conforto e a praticidade,
impulsionados pela tecnologia, criaram novos bitos e gostos na população em geral. O
aparecimento do automóvel ofereceu ao homem a oportunidade para superar limites,
encurtar distâncias, além de criar hábitos de prazer por determinadas marcas e modelos de
veículos. Para o homem, o autovel veio representar não comodidade pessoal e
familiar, conforme Sevcenko:
É um emblema de poder e força para atrair mulheres. O carro permite
multiplicar as oportunidades de contato, convívio e desfrute da
companhia feminina. O carro é ele mesmo uma mulher, digno de
conhecimento íntimo, zelo, atavios, carinho e amor. Daí a volúpia de
ter de dividir vários carros, de cobiçar o alheio e de tocá-los tão
freqüentemente quanto possível. A publicidade desde cedo se
apercebera desse potencial erótico associado aos automóveis e
passaria a explorá-lo em extremo. (1998, p. 559).
Desde que chegou a Anápolis, no início da década de 1930, o automóvel
despertava o desejo do consumidor anapolino. Em 1932, foi instalada uma revendedora
de propriedade de Graciano Antônio da Silva. Nessa época, de acordo com Ferreira
(1981, p. 435), “[...] havia na cidade vários automóveis, ninguém dizia carro, pois carro
era de bois. Dizia-se automóvel, auto ou quina”. O automóvel havia chegado para
conquistar consumidores, uma vez que o eram muitos. Com o passar dos anos, o
autovel, o caminhão e outros tipos e modelos de automotores foram conquistando o
interesse do comprador anapolino. Os veículos automotores passaram a ser
imprescindíveis para a economia da cidade.
Os anúncios da Figura 68 mostram o Chevrolet 1940, primeiro na lista de
vendagens, segundo o anúncio, graças ao seu conforto e à facilidade em dirigir e trocar de
134
marcha, além de apresentar características modernas. No mesmo espaço do anúncio em
que o jornal O Anápolis apresentou o novo Chevrolet, também alardeou a inauguração de
um Posto Chevrolet destinado à Concessionária, embora houvesse um agente de
representação e vendas Chevrolet situado na Rua Antonio Carlos. Essas concessionárias
eram equipadas com uma série de instrumentos para facilitar as negociações com os
clientes. Entre eles o telefone representava a modernidade, pois facilitava o contato com o
cliente a distância.
Em 1946, a marca Ford, concorrente direta da Chevrolet, disputava o interesse
dos consumidores, destacando as vantagens sobre a concorrente. Em Anápolis, os
autoveis Ford eram revendidos pela Companhia Silva Duarte S.A. (figuras 71 e 72).
Deve-se ressaltar que, na concessionária, vendiam-se, além de Ford, as marcas Mercury e
Lincoln, bem como rádios, geladeiras, ferragens, vidros e tintas.
Nas décadas de 1950-1960, outras marcas estavam presentes no comércio
automobilístico de Anápolis, como a Plymouth, de carros de luxo, e o Jeep Willys,
indicado para o transporte em lugares de difícil acesso, como as fazendas, o que era
assegurado pela tração nas quatro rodas, conforme demonstra a Figura 70. O Plymouth,
na Figura 69, ilustra o que foi observado por Sevcenko (1998), configurando-se como um
atrativo para conquistar mulheres, pois representava o máximo em luxo, segurança,
conforto e estilo.
Nos anos 1940-1950, o jornal O Anápolis trazia encartes anunciando ao
consumidor as novidades sobre essas marcas de automóveis. Sempre que havia novos
lançamentos e exposição de novos veículos, o jornal, além da imagem do veículo,
apresentava as inovações para atrair o consumidor, conforme Padilha:
Embora a novidade ainda causasse certo estranhamento, a indústria
automobilística movimentava mercado importante e desde o seu
inicio, esteve atenta para a importância da publicidade. Os anúncios-
além das feiras e exposições-não divulgavam o produto como
também era instrumento mais eficaz para incorporá-lo à vida e à
paisagem urbana quebrando as resistências que o invento causara.
(2001, p. 115).
O comércio de veículos automotores simbolizou a internacionalização da
economia nacional, ao mesmo tempo foi se tornando importante mecanismo de
desenvolvimento econômico para o país e, consequentemente, para Anápolis. Os anúncios
de automóveis chegaram desbravando territórios e conquistando consumidores,
referendando o que disse Hobsbawm:
135
A era do automóvel muito chegava à América do Norte, mas
depois da Guerra atingiu a Europa e mais tarde, mais modestamente o
mundo socialista e as classes médias latino-americanas enquanto o
combustível barato fazia do caminhão e do ônibus o grande meio de
transporte na maior parte do globo. (1995, p. 259).
O autovel, nas décadas de 1930-1950, era o sonho de consumo das classes
média e alta, que eram formadas por profissionais liberais, comerciantes e fazendeiros.
Note-se que houve o predomínio da indústria automobilística americana nas revendedoras
de veículos de Anápolis, representada pelas marcas Ford, Chevrolet e outras. Esse
processo foi fundamental, de acordo com Hobsbawm (1995, p. 268), para “[...] a
reestruturação do Capitalismo e o avanço na internacionalização da economia em
direção a outras partes do mundo, impulsionando o que seria a formação do mercado
global, com atuação em diferentes países, influenciando culturas. Ainda, segundo o
historiador, “[...] a revolução tecnológica entrou na consciência do consumidor em tal
medida que a novidade se tornou o principal recurso de venda para tudo, desde os
detergentes sintéticos” até o disco de vinil, a vitrola e o armário de aço (Figura 74).
Figura 68 - Anúncio Chevrolet, 1940.
Fonte: Jornal O Anápolis, abr. 1940, p. 2.
136
Figura 69 - Anúncio Plymouth, 1954.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1954, p. 53.
Figura 70 - Anúncio Jeep Willys, 1954.
Fonte: Jornal O Anápolis, 1954.
137
Figura 71 – Anúncio da Ford, 1954.
Fonte: Jornal O Anápolis, jan. 1954, p. 4.
Figura 72 – Cia. Silva Duarte.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 36.
138
A modernidade estava presente em diferentes formas nos anúncios do jornal O
Anápolis e nos textos (artigos, reportagens), sob o auspício da tecnologia e da
motorização. Os anúncios buscavam alcançar a sensibilidade do consumidor de modo
geral. Os reclames vendiam os produtos com mensagens que induziam a busca pelo
conforto e pelo prazer em saciar os desejos de consumir novidades. Esses desejos foram
surgindo graças ao avanço das tecnologias que, por sua ão, produziram o que Mello e
Novais denominaram “as maravilhas eletrodomésticas”:
O ferro elétrico que substituiu o ferro a carvão; o fogão a gás o de
botijão, que veio tomar o lugar do fogão elétrico na casa dos ricos, ou
do fogão a carvão, do fogão a lenha do fogareiro e da espiriteira dos
remediados ou pobres; em cima dos fogões, estavam, agora panelas
inclusive a de pressão ou frigideiras de alumínio e não de barro ou
de ferro; o chuveiro elétrico, o liquidificador e a batedeira de bolo, a
geladeira [...]. (1998, p. 563).
Embora os anúncios do jornal O Anápolis procurassem mostrar o produto
enfocando sua utilidade para os consumidores, muitos ainda não dispunham de condições
necessárias para adquirir esses utensílios, conforme afirmaram Maluf e Mott:
Apesar da aparente facilidade, traduzida por uma gama variada de
aparelhos elétricos, oferecidos ao público e por anúncios, nos quais as
mulheres executavam os mais difíceis e sujos serviços domésticos
sempre sorrindo, ainda era muito restrito o acesso a novos utensílios e
a serviços como eletricidade e água encanada. (1998, p. 403).
Esses novos produtos para o consumo doméstico alcançaram a parcela da
população de Anápolis composta por pessoas que podiam pagar e também por aqueles
que foram seduzidos pelas novidades, uma vez que essa relação entre consumidores e os
produtos não foi imediata, foi ocorrendo ao longo dos anos.
O comercial da Casa Cardoso & Irmãos, da Figura 73, tinha claros os seus
objetivos em relação ao consumidor: visava atraí-lo com o seguinte texto: “Goze do
conforto que lhes proporcionam os novos tempos (O ANÁPOLIS, nº. 567, 1946, p. 4),
fazendo uma referência clara ao conforto que essa tecnologia podia proporcionar às
pessoas. Isso dava a entender para a população consumidora que o encanto do século XX
era constituído pelos artefatos com os quais os avanços tecnológicos presenteavam a
humanidade.
Essa modernidade era configurada pela tecnologia e pelo maquinário, retratados
como veículos facilitadores da vida urbana. Neste contexto, as pessoas ocupadas em
139
diferentes funções tinham os benefícios dessa maquinaria, como foi o caso de uma
reportagem sobre a lavagem a seco proporcionada pela máquina Dry Cleaning. Esse
serviço foi assim descrito pelo jornal:
A lavagem faz-se a seco pelo moderníssimo sistema denominado Dry
Cleaning. As roupas são passadas em aparelho especial sob vapor.
Magnificamente, que são de fabricação nacional, fato este de que se
pode orgulhar a indústria paulista, apresenta um conjunto harmônico
para todos os trabalhadores relativos à lavagem, limpeza e secagem de
roupas. (O ANÁPOLIS, 15 jul. 1951, p. 2).
Essa máquina era um produto da indústria paulista e seus componentes eram de
fabricação nacional. A finalidade de sua aquisição era atender a clientela ocupada e sem
tempo para cuidar da lavagem de roupas.
Para atender a burocracia da cidade, materializada em escritórios e cartórios,
com muitas secretárias e outros funcionários, vendiam-se veis fabricados em aço. O
anúncio partia do princípio de que a marca era um ponto importante para o comprador. O
representante comercial Alberto & Amaral Companhia Ltda. apresentava seu anúncio
(Figura 68) da seguinte forma: “A marca Amaral em mobiliário é símbolo de eficiência,
segurança, durabilidade e distinção” (O ANÁPOLIS, 13 abr. 1951, p. 2). Ser diferente,
inovador proporcionava algumas vantagens sobre o concorrente, pois era a novidade, a
qualidade e o preço acessível que alcançariam o consumidor. Essas qualidades, no
entanto, deveriam estar aliadas à delicadeza, ao conforto e à eficiência. Nesse período, os
revendedores comerciais dos produtos Amaral instalados em Anápolis e Goiânia,
indicando a expansão e a concorrência entre as duas cidades goianas.
Figura 73 - Anúncio da empresa Cardoso & Irmão.
Fonte: Jornal O Anápolis, ano XI, nº 567, mar. 1946, p. 4.
140
Figura 74 - Móveis e arquivos Amaral.
Fonte: Jornal O Anápolis, 13 set. 1951, p. 2.
Outros exemplos da tecnologia nas décadas de 1940 e 1950 foram o rádio e a
geladeira, produtos que passaram a disputar a atenção do consumidor moderno. A Figura
54 apresenta o rádio como artefato de consumo destinado à informação. Através do rádio
as pessoas ouviam informações, música, orientações de saúde e higiene e novelas. Odio
foi importante porque atuou como instrumento difusor da cultura, uma vez que
transformou a vida cotidiana das pessoas, conforme observou Hobsbawm:
O rádio podia agora, graças ao transistor e à miniaturizada bateria de
longa duração, chegar às mais remotas aldeias, [e a geladeira de
acordo com o historiador] a maior parte do conteúdo da geladeira ou
freezer é novo: comida desidratada congelada, hortigrangeiros
industrializados, carne recheada de enzimas e vários produtos
químicos para modificar o seu gosto, ou mesmo feita por simulação de
carne de primeira sem osso. (1995, p. 260).
O comercial dos produtos Philco (Figura 75) apresenta as mercadorias utilizando
o recurso da aproximação: deixa mais afastado o mais antigo e coloca em destaque o
lançamento; ao lado, duas caricaturas representam os consumidores indecisos ante as
exclamões: Ouça que som!” e “Veja que linhas!”. Esses comerciais, especialmente o
referente à geladeira Frigidaire, carregavam o lado fetichista da mercadoria de que falou
Marx (1982):
Uma mercadoria é um objeto externo, uma coisa que satisfaz para seus
proprietários uma necessidade qualquer. Toda coisa útil [...], deve ser
considerada sobre um duplo aspecto: a qualidade e a quantidade. Cada
um é um conjunto de qualidades numerosas e podem ser úteis as mais
diversas finalidades. É a utilidade que lhe dá valor de uso [...]. O valor
de troca aparece de início como a relação quantitativa pela qual os
valores de uso de uma espécie se trocam pelos valores de uso de outra.
(p. 24-25).
141
Para a compreensão das palavras de Marx, entende-se que nem tudo o que o
homem produz é considerado como mercadoria. Um produto do trabalho humano se
transforma em mercadoria a partir do momento em que é produzido não para o uso, mas
para ser trocado, e isso só ocorre quando deixa de ser útil para o seu produtor e continua a
ser útil para outra pessoa, que, por sua vez, deve dispor de outra mercadoria para trocar,
que não lhe seja útil, mas o seja para o primeiro sujeito da troca. A mercadoria é,
portanto, um produto social, ou a materialização do trabalho humano em um valor de uso
passível de troca por outro valor de uso.
A mercadoria, como valor de uso, é resultado de trabalho concreto, ao passo que
o valor de trabalho é abstrato. Assim, o caráter abstrato do trabalho do homem, cuja
centralidade ecomica é específica da economia de mercado, é constrdo pelo
capitalismo.
Nesse sentido, o caráter abstrato do trabalho do homem produz valor, mas o
valores de uso, enquanto seu caráter concreto produz valores de uso, mas não produz
valor. A produção de valores de uso não é determinada em primeiro lugar pela efetiva
utilidade dos produtos, mas por sua propriedade de valorização do valor de troca.
Portanto, o valor não é um fetiche somente por ser um princípio abstrato, mas porque
organiza o conjunto das relações sociais, subordinando o homem a si por meio do valor
de troca das mercadorias socialmente produzidas.
Ao se estabelecer o caráter fetichista do anúncio destacado na figuras 76 e 77,
observa-se a representação da geladeira como meio de satisfazer necessidades humanas
(valor de uso) e sua expressão de valor (seu valor de troca). O fetiche também é percebido
quando o produto é vinculado a uma mulher jovem, à beleza implícita nas atrizes de
Hollywood, conforme lembra Sevcenko (1998, p. 602): “O glamour dos astros do cinema
se transmitia diretamente para tudo o que estivesse ao seu redor, o que eles vestiam, o que
eles tocavam e aquilo sobre o que falavam. A coroa na cabeça da modelo era a
representação da mulher rainha do lar.
Na Figura 77, a geladeira representa o objeto de admiração da mulher, isso aguça
o desejo de consumo e ao mesmo tempo subordina a mulher a si, através do seu valor de
troca. Essa representação exemplifica o fetiche, pois a geladeira facilita a vida da dona-
de-casa. O anúncio dizia: “Eis o ODR-95 luxo, de 9,5 pés cúbicos”. A geladeira
apresentava como novidade, em 1957, o supercongelador, dois hidratores para frutas e
legumes e grandes prateleiras internas na porta que asseguravam o máximo espaço útil
142
para maior economia nas compras. O anúncio dos produtos Walita (Figura 78) mostrava
uma série de inovações tecnológicas em termos de acessórios domésticos para auxiliar a
dona de casa. Esses produtos variavam desde ferro elétrico, aspirador de pó, batedeira de
bolos, liquidificador até enceradeira.
Os anúncios atuavam como propagadores das ideias de consumo de massa entre
os consumidores anapolinos e, ao mesmo tempo, serviam de vitrine do que surgia em
outros centros do país como Rio de Janeiro e São Paulo. Muitas novidades que eram
lançadas nesses centros eram reproduzidas pelo jornal O Anápolis, como forma de
inserção do comércio anapolino no mercado nacional. Essa inserção permitiu o
intercâmbio e este, por sua vez, possibilitou a inovação do corcio de Apolis ao longo
do período estudado. O anúncio atuou como uma representação do comércio para o
consumidor, pois a imagem do produto o substituía como forma de ativar o desejo do
comprador. O produto era o ausente que se fazia presente por meio de sua imagem no
comercial do jornal e, acima de tudo, estava associado à imagem de pessoas admiradas.
Durante a análise dos anúncios, percebeu-se que a representação do comércio na
mercadoria revelava um discurso que ia além do meramente ilustrado, pois estavam
implícitos não os fatores econômicos da mercadoria (preço, embalagem, destinação,
lucro), com também os aspectos socioculturais (moda, beleza, satisfação pessoal, força,
identidade, valores e outros) que são projetados na população. Eram, enfim, elementos
novos para uma cidade onde o nculo com o campo ainda era muito forte. No entanto,
esses novos padrões de consumo foram, ao longo da primeira metade do século XX,
funcionando como desagregadores dos velhos padrões observados no início do período de
1930-1940. Mudaram-se aos poucos os pontos referenciais e não dúvidas de que o
comércio se impregnou desses novos valores que ditavam o consumo, tornando-se, de
certa forma, o ponto de apoio para aqueles que emigraram do campo para a cidade. Nesse
momento, viver na cidade, estudar, trabalhar, comprar uma casa, um carro ou bicicleta
eram ações que povoavam a imaginação das pessoas que deixavam o campo.
Para a cidade, esse foi o período em que sua população urbana ultrapassou o
campo, fazendo emergir imagens que deram sentido ao imaginário coletivo de uma cidade
comercial.
143
Figura 75 - Anúncio da Sociedade Comercial de Automóveis.
Fonte: Jornal O Anápolis, 13 set. 1951, p. 2.
Figura 76 - Geladeira Frigidaire.
Fonte: Jornal O Anápolis, ano 12, nº 567, mar. 1952, p. 2.
144
Figura 77 - Senhora Frigidaire.
Fonte: Jornal O Anápolis, dez. 1957, p. 4.
Figura 78 - Produtos Walita.
Fonte: Jornal O Anápolis, dez. 1959, p. 4.
145
3.2 Vende-se de tudo a qualquer preço: Compre nas casas...
As primeiras casas comerciais eram chamadas de vendas e nelas se vendiam os
produtos da terra a granel, além de bebidas como cachaça, vinho e outras. Esses locais de
comércio funcionavam em um ou mais ambientes das casas até se converterem em lojas
ou casas comerciais.
Nos anos 40, por exemplo, essas casas comerciais traziam escritas na fachada
frontal a sua denominação e a especialidade dos produtos comercializados. Ao estudar o
comércio em São Paulo no início do século XX, Deaecto (2002, p. 81), percebeu que esse
estilo de casa comercial era de “[...] comércio de tecidos e roupas feitas, como na casa dos
armarinhos, o de alimentos sob a forma de armans e padarias e os serviços de costura,
alfaiate”. Em Anápolis, no período estudado, percebeu-se que determinadas lojas
comerciais evoluíram e se especializaram em certa linha de produto, outras permaneceram
com o mesmo formato encontrado na década de 1930. Somente no fim da década de
1940, surgiram as primeiras lojas especializadas em determinados ramos de produtos,
como vestuário, eletrodomésticos e calçados.
Como exemplo da permanência do formato, a Casa Ideal, fundada em 1944,
manteve-se fiel à tradição, atendendo o cliente no balcão e oferecendo uma variedade de
produtos como ferragens, louças, roupas, calçados, perfumaria, malas e outros. Na Figura
79, tem-se uma ideia do formato da loja. Externamente, visualiza-se na fotografia um
prédio com quatro portas de ferro para entrada e saída dos clientes. Acima das portas
uma marquise de concreto; na platibanda, observam-se três locais destinados à ventilação
e à iluminação solar. Na parte interna da loja, as mercadorias estão dispostas em
prateleiras que cobrem toda a extensão da parede, à vista do cliente. Na prateleira
fotografada, filtros de barro, pratos, panelas, chapéus, peneiras e armarinhos. Ainda é
visível uma mesa sobre a qual estão alguns objetos como os rolos de papel para embrulhar
as mercadorias.
146
Figura 79 - Casa Ideal.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1954, p. 86.
Outro exemplo é o Armazém Badauy, retratado na Figura 80, de propriedade do
Sr. Abdalla Badauy, comerciante árabe, cujo ramo de negócios era voltado para a
exportação de cereais como arroz e feijão. O estilo do prédio mostra um telhado do tipo
cha inspirado na década de 1940, quando a parede frontal cobria grande parte da
cobertura. A inscrição com a denominação do comércio está pintada em letras grandes
para facilitar a identificação a distância. Duas portas de madeira permitiam a entrada e
saída do prédio.
147
Figura 80 – Armazém Badauy.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1954, p. 88.
Em 1954, o jornal O Anápolis anunciava a elaboração da segunda edição do
Guia Prático da Cidade de Anápolis (O ANÁPOLIS, 19 dez. 1954, p. 1). O Guia Prático
era uma publicação elaborada pela Publicidade Friedmann de Goiás, em parceria com o
jornal O Anápolis e patrocinada pela Prefeitura. Tinha a finalidade de divulgar o comércio
e o setor de serviços da cidade e de seus distritos, entre eles Damondia, Matão,
Interlândia e Goianápolis.
O Guia Prático teve três edições: 1953, 1954 e 1955. Com cerca de 290 páginas,
oferecia ao morador da cidade informações, por meio de imagens, sobre os diversos
ramos de atividade empresarial: comércio em geral, serviços de saúde, beleza, moda e
transportes. A direção de reportagem e fotografia era do Sr. Walter Friedmann e a
redação era assinada por João Friedmann. Entre as imagens do comércio mostradas pelo
Guia Prático da Cidade de Anápolis, destacaram-se as do comércio dos árabes.
A Loja Marrocos (Figura 81) era especializada em armarinhos e considerada, em
1955, a maior organização comercial do ramo no Brasil Central: “As lojas Marrocos
possuíam grande estoque de armarinhos, bijuterias, perfumarias, artigos elétricos. Louças,
ferragens, armas e munições, relógios e cutelarias nacionais e estrangeiras” (GUIA
PRÁTICO DA CIDADE DE ANÁPOLIS, 19 dez. 1954, p. 82).
Figura 81- Lojas Marrocos, 1955.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 82.
148
A Loja Marrocos situava-se na Praça Bom Jesus 60, sendo diretor o Sr. Sem
Buslik. Possuía 12 funcionários que, uniformizados, recebiam o público no balcão de
atendimento. Comparando-a com a loja da Figura 80, percebe-se que o prédio tinha
aspectos modernos, destacando-se a inscrição com o nome da loja colocada na platibanda.
Acima das portas, a marquise cobria a calçada e, mais acima, aberturas fechadas com
vidro permitiam a penetração da luz solar. O prédio tinha três portas; a do meio ocupava
quase toda a parte frontal, as duas menores estavam localizadas uma à direita e outra à
esquerda.
A casa comercial Abrahão Besborodco (Figura 82), especializada em importação
e exportação de peles, localizava-se na Avenida Tiradentes n
os
23 e 27. O estilo do prédio
seguia o padrão verificado nas décadas de 1930-1940, em que a identificação da loja
ficava acima das portas, evidentemente para facilitar a identificação. A exposição de peles
de onças indicava a importação desse produto da Rego Norte, uma vez que a rego
naquela época oferecia uma fauna abundante por ser ainda pouco explorada pelo homem.
Figura 82 - Casa Comercial Abrahão Besborodco.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 88.
Além dessas lojas que se mantiveram fiéis ao padrão original, outro tipo de
atividade comercial que procurou manter a originalidade foram as alfaiatarias. Voltadas
especialmente para o público masculino, estavam espalhadas pela cidade. Havia as
populares e as mais sofisticadas, como a Alfaiataria Caprichosa, identificada no anúncio
da Figura 84. O trabalho nas alfaiatarias era realizado de forma artesanal; em alguns
casos, quando havia grande clientela, outros profissionais realizavam atividades de apoio
na produção.
149
A Alfaiataria Caprichosa, localizada na Praça Bom Jesus, anunciava a seus
clientes confecções finas e linhos tropicais, além de identificar-se como especialista em
tailleurs.
Oliveira Alfaiate, detalhe da Figura 83, por sua vez, oferecia camisarias e
tropicais ingleses. O alfaiate controlava todo o processo de produção, desenhava, cortava
e costurava o tecido transformando-o em produto pronto.
Figura 83 – Oliveira Alfaiate.
Fonte: Jornal O Anápolis, set. 1955, p. 6.
Figura 84 - A caprichosa.
Fonte: Jornal O Anápolis, ago. 1956, p.4.
O comércio de artigos têxteis e o ramo de secos e molhados resguardavam suas
peculiaridades, de acordo com a dimensão e a potencialidade dos estabelecimentos
comerciais. A Figura 86 mostra a Casa Bom Dia que mantinha duas lojas especializadas
em roupas feitas masculinas, femininas e infantis, além de armarinhos em geral. Seus
proprietários eram dois comerciantes árabes, o que confirma a presença desses imigrantes
na atividade comercial. O Empório das Sedas (Figura 85) era revendedor de fazendas
150
(tecidos de seda) no balcão, na peça completa ou no corte. Esse tipo de comércio em que
se vendia um tipo de produto, no caso tecidos, era denominado comércio por segmento.
O comércio de artigos de vestuário, acessórios, armarinhos e fazendas, de modo
geral, era forte, pois havia um número considerável dessas lojas espalhadas pela cidade.
Seu funcionamento envolvia o proprietário e mais dois a cinco funcionários para atender
o público e repor estoque. A especialização das lojas permitiu a expansão do comércio na
cidade, além da divisão entre atacadistas e varejistas. A partir da década de 1950, o
comércio atacadista foi se organizando e se especializando; o comércio varejista se
expandiu pela cidade numa grande quantidade de pequenas e médias lojas.
Figura 85 - Empório das Sedas.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 94.
Figura 86 - Casa Bom Dia.
Fonte: Jornal O Anápolis, mar. 1955, p. 4.
O pequeno comércio também se desenvolveu nos bairros afastados da região
central. Deaecto (2002, p. 81) comenta que “[...] o pequeno comércio alimentício e de
151
bebidas vai se instalar nos arredores da cidade, seja nos bairros populares onde o valor
imobiliário é razoavelmente acessível, seja nos bairros de classe média, onde predominam
os estabelecimentos de médio porte”. Na década de 1950, o comércio anapolino estava
localizado predominantemente no setor central, embora nos bairros houvesse os pequenos
comércios denominados “vendas”, nos quais se vendiam alimentos, bebidas, vassouras,
frutas e verduras.
Os produtos alimentícios constituíam o gênero ao qual se dedicava uma parcela
considerável dos estabelecimentos comerciais da cidade de Anápolis, independentemente
dos diversos ramos aos quais estavam vinculados. Circulavam mercadorias produzidas no
local, como sabão, bebidas, banha, arroz, feijão, milho e outros, além dos produtos
importados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Exemplo desse tipo de casa
comercial, a Casa Brasil (Figura 87) revendia produtos como: ferragens, latarias, bebidas,
sal, arame, macarrão e querosene. Note-se também que seus proprietários eram imigrantes
árabes.
Figura 87 - Casa Brasil.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 84.
A segmentação do corcio começou a se definir por volta da segunda metade
da década de 1950, quando teve início uma nova formatação para as lojas. Nesse período
surgiram as relojoarias, sapatarias, lojas de veis, magazines, confecções em geral e os
mercados destinados ao comércio de alimentos, bebidas e enlatados. Com essas
transformações no comércio, no fim da década de 1950, foram aparecendo,
gradualmente, filiais de lojas de rede nacional, como foi o caso das Lojas Riachuelo e
Casas Buri. Isso era reflexo da evolução da cidade.
152
Aos poucos, o número de habitantes da zona urbana ultrapassou a populão que
vivia no campo. A imigração também contribuiu para uma nova leitura urbana, pois se
formou uma elite burguesa urbana com maior poder de consumo, somando-se a esses
fatores, as exigências de consumo foram decisivas na formação urbana.
Figura 88 - Casa Silva, parte externa.
Fonte: Jornal O Anápolis, jan. 1956, p. 3.
Figura 89 - Casa Silva, parte interna.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1956, p. 80.
Nessa época, “[...] começaram a surgir, nas construções [...] ainda sem vitrines,
os anúncios de identificação” (O ANÁPOLIS, 18 jun. 1949, p. 3). Agora maiores, eles
apareciam pintados (com letras maiúsculas) na própria edificação ou em suportes de
madeira ou metal instalados na fachada, acima das portas de metal. Em destaque na
Figura 95, está o prédio das Casas Buri. A identificação principal está na fachada, mas há
outros anúncios de identificação; três pintados acima das portas e placas penduradas entre
as portas nas quais se leem informações sobre a loja, portanto têm tamm a função de
divulgação.
As Casas Buri chegaram a Anápolis em 1949 e tinham o seguinte lema:
“Focalizando o comércio anapolino da fábrica ao consumidor” (O ANÁPOLIS, 7 ago.
1957, p. 3). O jornal enfatizava o incremento no comércio brasileiro e, mais
especificamente no anapolino, que passava a adotar novas medidas já utilizadas em outros
países.
153
Houve o que se poderia e com razão dizer-se uma modernização no
processo de venda. Assim é que vai introduzindo maravilhosa
concatenação entre indústria e comércio de maneira a evitar-se, tanto
quanto possível, grande número de intermediários. (O ANÁPOLIS, 7
ago. 1957, p. 2).
Esse processo adotado pelo comércio, especialmente pelas Casas Buri, trazia, de
acordo com o jornal, enormes vantagens para o público em geral, pois a mercadoria
chegaria ao seu destino final com um custo muito menor, ou seja, chegaria às mãos do
consumidor diretamente da fábrica.
As Casas Buri S/A, com sede em São Paulo e possuidora de grandes
fábricas de tecidos, visando proporcionar maiores vantagens aos
compradores, resolveu instituir as famosas “Casas Buri” que se
espalharam pelos Estados de São Paulo, Paraná, Minas Gerais e
Goiás. (O ANÁPOLIS, 7 ago. 1957, p. 2).
Esse tipo de comércio era praticado pelas grandes redes cuja sede ficava em São
Paulo, com filiais em diferentes cidades do país. A implantação da filial de uma loja de
rede nacional teve dois significados importantes para Anápolis. O primeiro indicava as
potencialidades que a cidade oferecia em termos de mercado consumidor. O segundo
confirmava a inserção de Anápolis na economia nacional, ou seja, nesse momento a
cidade se interligava ao mercado nacional. Assim, esperava-se que ocorresse uma
dinamização maior no intercâmbio comercial com outros estados, o que permitiria que as
novidades chegassem com mais facilidade ao consumidor de Apolis.
Nos anúncios das figuras 88 e 89, observa-se a inscrição da loja na parte lateral,
pintada em letras maiúsculas na vertical. Também é visível a identificação na sacada do
andar superior, facilitando a identificão de quem estivesse distante da loja.
Os anúncios de identificação, portanto, o se restringiam mais a tabuletas
pintadas, instaladas acima das portas ou, quando em prédios, acima de dois andares nas
varandas do andar superior. A Casa Santa Luzia (Figura 90) atendia seus clientes no
balcão, que era considerado o local de atendimento. No balcão, os vendedores falavam
dos produtos aos clientes com o fim de convencê-los a comprar. Essa casa comercial era
especializada em armarinhos, roupas feitas, chapéus, calçados, ferragens e comércio de
secos e molhados.
154
Figura 90 – Casa Santa Luzia.
Fonte: Jornal O Anápolis, ago. 1957, p. 4.
A preocupação com a instalação de anúncios de identificação nas edificações
tornou-se evidente a partir da segunda metade da década de 1940. Nesse período, nota-se,
em Anápolis, certa concorrência entre os anúncios e o esforço dos anunciantes para
destacá-los na paisagem urbana. Segundo Mendes (2006, p. 99): “Aos poucos, os
anúncios se tornaram maiores, chegando a obstruir detalhes das fachadas, principalmente
quando eram instalados nas sacadas”. Um exemplo foi a Sapataria Ritz (Figura 91), cujo
anúncio de identificação ocupava a parte frontal acima das portas, encobrindo alguns
detalhes da loja.
Nota-se a existência de vitrines nas quais os sapatos em exposição podiam ser
apreciados. O tipo de loja com vitrine foi se definindo em Anápolis no fim de 1950 e
início da década de 1960. A loja A Jóia foi pioneira na exposição de produtos em vitrines.
Essa loja, uma das mais antigas da cidade, foi fundada na década de 1930 (Figura 92). Ao
se observar seu anúncio, percebe-se a oferta de uma variedade de produtos: cômodas,
acordeom (sanfona), lustres, ias e relógios, dios e produtos de beleza. O anúncio se
dirigia ao consumidor, apresentando a loja como o “mais belo estabelecimento de Goiás”
no nero; além disso, havia uma identificação internacional (Fritz Burger) impressa
abaixo do nome da loja. Essa identificação poderia simbolizar artigos finos de luxo.
A Casa Odeon (Figura 93) expunha em sua vitrine relógios, abajures, discos,
jóias e outros objetos como forma de atrair a clientela. De propriedade de Plínio A.
155
Gonzaga Jaime, tinha como diretor e secretário Achiles de Pina Filho, nomes que
exerceram muita influência na política e no processo de modernização da cidade.
Figura 91 - Sapataria Ritz.
Fonte: Jornal O Anápolis, 22 ago. 1960.
Figura 92 - Loja A Jóia.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 77.
Figura 93 - Casa Odeon.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1955, p. 76.
156
A sapataria também representou um ramo de comércio diversificado. Fabricavam-
se sapatos, botinas, sandálias, chinelos, botas, chuteiras e outros calçados. A Sapataria
Carajá (Figura 94) possuía uma equipe de sapateiros treinados para receber encomendas
e fabricar por atacado e varejo. Os produtos desse tipo de comércio atendiam homens,
mulheres e crianças.
Figura 94 - Sapataria Carajá.
Fonte: Jornal O Anápolis, 5 ago. 1957, p. 4.
Figura 95 - Casas Buri.
Fonte: Jornal O Anápolis, 1960, p. 3.
157
Figura 96 - Cine Santana.
Fonte: Jornal O Anápolis, jan. 1960, p. 3.
Os bares e cafés são parte integrante de uma cidade, uma vez que representam os
momentos de ociosidade quando são frequentados pelos boêmios, passantes,
frequentadores esporádicos, trabalhadores em geral. Os bares o locais em que as
pessoas se reúnem para bater papo, lanchar, tomar um café ou uma bebida nas horas de
folga, ou seja, representam o charme da vida urbana. O bar e restaurante A.R.C.E.G.
(Figura 97) foi um desses locais; a fotografia mostra um homem e uma mulher enquanto
tomam alguma bebida e conversam com os atendentes.
Figura 97 - Bar A.R.C.A.G.
Fonte: Guia Prático da Cidade de Anápolis, 1957, p. 65.
158
Os bares, cafés e restaurantes tornaram-se os espaços de sociabilidade da
população, uma vez que esses estabelecimentos se distribuíam por vários locais de
Anápolis e eram frequentados por vários grupos sociais, o que lhes conferiu popularidade.
Assim era o Bar e Restaurante do Titio, localizado na Rua Manoel D’Abadia; o Ca e
Pastelaria do Antônio, situado na Rua Barão do Rio Branco, e o Bar Marabá, localizado
na Rua General Joaquim Inácio. Nesse bar havia bebidas nacionais e estrangeiras, doces,
quitandas, enlatados e cigarros.
O ca é uma bebida presente em quase todas as casas da população anapolina.
Como representação desse produto, destacava-se o Ca 3 Poderes (Figura 98), fundado
em 1960 por Joaquim Neto e Wilson Lisboa de Alencar. O nome da torrefação fazia
refencia aos três poderes instalados na nova capital do Brasil naquele ano.
Essa torrefação e distribuidora de café torrado, moído e empacotado
tinha a sua disposição uma frota de produtos Ford, composta por 7
veículos com carrocerias especiais que transportavam, diariamente
pelas longas estradas goianas, incluindo a Belém-Brasília e outras. (O
ANÁPOLIS, 5 nov. 1960, p. 1).
Figura 98 - Café Três Poderes.
Fonte:Jornal O Anápolis, nov. 1960, p. 1.
O dinamismo do comércio impulsionou a arte nos anos 1950-1960,
especialmente o cinema. Isso fez com que Apolis contasse com dois grandes cinemas, o
Cine Teatro Imperial, localizado na Praça James Fanstone, e o Cine Teatro Santana,
localizado nas proximidades da Praça Bom Jesus.
159
A fotografia da Figura 98 traz detalhes da parte frontal do Cine Teatro Santana.
O jornal assim se referiu a essa imagem: “Completou dia 31.01.1960, seu nono ano de
fundão, sendo nesse momento nosso principal cinema, o importante e luxuoso cine
Teatro Santana” (O ANÁPOLIS, 2 fev. 1960, p. 3). Na fotografia são visíveis os prédios,
indicando que havia uma nova dinâmica para as construções na década de 1960.
A diversificação do comércio pode ser percebida pelas casas comerciais dos anos
1940-1950, quando muitas imagens fotográficas registraram uma variedade de estilos
dessas construções. A partir dessas imagens, tentou-se construir uma narrativa sobre o
que evoluiu e o que permaneceu no comércio anapolino no período estudado. A
diversificação também possibilitou a especialização ou segmentação quando foram
surgindo as grandes lojas como as Casas Buri (1949), Lojas Riachuelo (1952) e outras
que apareceram no transcurso da década 1960, época em que o mercado foi cedendo lugar
ao supermercado.
3.2.1 Hóspedes e viajantes: o corcio na coluna social
Para alimentar a propagação das casas comerciais mencionadas e incentivar a
vinda de novos empreendimentos para a cidade, o jornal O Anápolis mantinha uma
coluna denominada “Hóspedes e viajantes”, destinada a divulgar o nome de comerciantes
e viajantes que vinham a passeio e deixavam sua impressão sobre a cidade. Havia aqueles
que chegavam e aqui fixavam residência, outros que residindo na cidade viajavam a o
Paulo para realizar trocas comerciais. Nesse espaço, o jornal O Anápolis dizia aos seus
leitores: “Estamos recebendo pessoas influentes, comerciantes, que poderão permanecer
na cidade e montar seu negócio”.
nas primeiras publicações, o jornal referiu-se a essa sociabilidade da seguinte
forma: “A fim de assumir a gerência das casas Pernambucanas, chegou de Itaberahy,
acompanhado de sua excelentíssima família e duas cunhadas, distinto moço Sr. Declieux
Chrispim” (O ANÁPOLIS, 5 maio 1935, p. 1).
As Casas Pernambucanas já funcionavam em Anápolis nesse período, indicando
a integração no mercado nacional. Essa loja tornou-se muito conhecida por atingir as
camadas populares.
O proprietário das Casas Pernambucanas é de origem francesa.
Instalou em Pernambuco a Cia. de Tecidos Paulista, de onde vem todo
160
o tecido comercializado em suas lojas. Por isso, as casas
Pernambucanas são bastante populares, pois só vendem fazendas
nacionais e a baixo preço. (DEAECTO, 2002, p. 183).
Outro anúncio dizia: “Já está nesta cidade o Sr. Tarcis de Almeida Monteiro,
agente da Cia. Singer, nesta cidade para realizar negócios” (O ANÁPOLIS, 26 maio
1935, p. 4). A cidade recebia representantes comerciais que aqui chegavam para conhecer
o lugar e realizar novos negócios. Esse tipo de divulgação procurava mostrar o
movimento comercial da cidade.
Quando determinado comerciante viajava a negócios, o jornal ilustrava esse
acontecimento, como no seguinte exemplo: “Viajou pela VASP, para S. Paulo, o Sr,
Alberico Borges de Carvalho, forte comerciante e capitalista da nossa praça” (O
ANÁPOLIS, 26 abr.1940, p. 1). Havia nos anos 50 uma escala de viagens aéreas que
partia de Apolis e Goiânia com destino a Miami, São Paulo e Salvador.
Esse tipo de anúncio fazia parte da estratégia de concorrência num processo em
que “[...] a urbanização pida [vai] criando novas oportunidades de vida, oportunidades
de investimento de trabalho (MELLO; NOVAIS, 1998, p. 581). Em um sistema de
concorrência, os comerciantes são motivados a buscar novidades e a enxergar as
oportunidades, por isso o jornal o deixou de noticiar as novas aquisições de um
comerciante árabe bastante conhecido no meio comercial de Anápolis.
Sr. Fares Falluh, um dos fortes comerciantes da nossa praça
proprietário da conhecidíssima Casa das Sedas. O Sr. Fares Falluh
adquiriu grandes novidades para o seu estabelecimento, pois pretende
reformar completamente o seu estoque e acompanhar os preços atuais
na baixa, (O ANÁPOLIS, 24 jul. 1947, p. 1).
O envolvimento do homem com os negócios exige, além do capital para ser
investido, que ele tenha sensibilidade para perceber como alcançar o cliente. A
sensibilidade atua “[...] como um reduto de representação da realidade através das
emoções e dos sentidos” (PESAVENTO, 2004, p. 2).
Outro anúncio evidenciou a presença de empresário de nacionalidade árabe em
visita à cidade: “Sr. Tufy Patah, alto industrial paulista proprietário da grande fábrica de
camisas Goyânia de São Paulo (O ANÁPOLIS, 22 maio 1940, p. 1). Sua visita de
negócios a Anápolis representava um momento oportuno de divulgão das
potencialidades que a cidade oferecia a novos empreendimentos comerciais. Esse
momento poderia render novos investimentos. Demonstrava também o interesse
comercial recíproco entre o comércio anapolino e o paulista. Deve-se ressaltar que
161
algumas empresas de São Paulo tinham filiais na cidade de Anápolis na década de
1940, conforme se observa em nota do jornal: “A empresa das grandes iniciativas.
Informamos nesta cidade, a Rua Antonio Carlos, 35 – junto à Pharmacia S. João – Matriz
– São Paulo. Teley Construtora” (O ANÁPOLIS, 26 maio 1940, p. 1).
A instalação na cidade do escritório de uma empresa construtora de nível
nacional representava para Anápolis a existência de um mercado voltado para a
construção civil que se expandia. Em outro ancio do jornal, lia-se:
Visitou Anápolis um representante de “A Revolução”. Em dias de
semana inspirante visitou esta cidade o Sr. Osvaldo Cesar de
Figueiredo, representante de A Revolução, grande casa comercial
brasileira, que tem filiais no Rio, Juiz de Fora, Itajubá, Campo Belo,
Formosa, Patrocínio, Patos e Presidente Olegário, veio o Sr.
Figueiredo em Anápolis, a fim de providenciar prédios para instalar
também aqui mais uma filial, para muito breve. (O ANÁPOLIS, 16
ago. 1942, p. 1).
A Revolução era uma casa comercial especializada em armarinhos e tecidos que
veio se instalar em Anápolis no fim dos anos 40. Esse momento representava a existência
de novas sensibilidades para perceber oportunidades de crescimento e de investimento no
ramo comercial. Segundo Pesavento (2004, p. 2): “Os homens aprendem a sentir e a
pensar, ou seja, a traduzir o mundo em razões e sentimentos”. Havia essa vontade em
representar o que estava ocorrendo, transformando a energia empreendedora em
resultados pticos para a cidade.
No campo concorrencial do capitalismo, segundo Mello e Novais (1998, p. 581),
“A concorncia entre os homens formalmente livre e igual é um processo objetivo que
determina quem escolhe os que se apropriarão das oportunidades de investimento mais ou
menos lucrativos”. Essa é uma escolha feita pelo chamado tino comercial, ou seja,
vocação empreendedora. Nesse sentido, o movimento verificado na cidade em detrimento
do comércio e das oportunidades lucrativas que oferecia a quem manifestava interesse em
lidar nessa área era promissor.
Se, por um lado, havia na cidade um surto de crescimento representado pelo
comércio, por outro, o desemprego também trazia desespero, conforme observou o jornal:
“Estamos passando fome. Declaram trabalhadores despedidos da Cia Rezende Costa O
infalível sistema de vales – A voz do desamparo” (O APOLIS, 9 maio 1946, p. 1).
Na sociedade moderna, liberal e concorrencial, ocorre o que Mello e Novais
(1998, p. 581) observaram: “O capitalismo cria a ilusão de que as oportunidades são
162
iguais para todos, a ilusão de que triunfam os melhores, os mais diligentes, os mais
econômicos”. Nesse mercado de concorrência, cada pessoa vale o que o mercado
determina quanto ela vale. É bem verdade que não havia nenhuma consideração por parte
do mercado pelas virtudes do indivíduo. Viver entre o sonho e a ilusão produzida pelas
imagens da modernidade parece ser a marca da sociedade de consumo, em que todos
estão envoltos pelos imaginários sociais daí advindos.
3.3 As metáforas e o imaginário
No decorrer da pesquisa, deparou-se com uma série de imagens ou
representações que o jornal O Anápolis divulgou sobre a cidade no período delimitado
entre 1930-1960. As representações produziram imagens do comércio por meio do qual a
cidade crescia ancorada pelo progresso em busca da modernidade, que, por sua vez,
passou a fazer parte da imaginação das pessoas, como demonstram as metáforas
utilizadas: Ribeirão Preto Goiano, Terra da Promissão
3
e Manchester Goiana.
4
Para
compreender como esse imaginário foi construído, foi necessário investigar um conjunto
de imagens que, ao surgirem, foram se entrelaçando até se materializarem na imaginação
popular. O indutor dessas imagens foi o corcio. Segundo Silva (2006, p. 213), o
imaginário “[...] significa o conjunto de imagens guardadas no inconsciente coletivo de
uma sociedade ou de um grupo social; é o depósito de imagens de memória e
imaginação”. Isso posto, entende-se que o imaginário é formado pela experiência
humana, coletiva ou individual, ou seja, são idéias constituídas sobre as coisas que
povoam a imaginação das pessoas e está diretamente vinculado às formas de viver e de
pensar da população.
As imagens que constituem o imaginário não são concretas, são figuras de
memória, imagens formadas mentalmente e representam as coisas que fazem parte do
cotidiano. No entanto, representações e imaginário podem ser estudados a partir de
imagens, fotografias, textos, pois ambos reproduzem figuras da memória. Para Michael
Maffessoli:
3
“Desci para [...] fazê-lo subir daquela terra a uma terra boa e ampla, terra que mana leite e
mel.” (ÊXODO 3:8).
4
Cidade do Reino Unido localizada no noroeste da Inglaterra, conhecida por ser um grande centro
industrial e econômico.
163
Imaginário é o estado de espírito de um grupo, de um país, de um
estado-nação, de uma comunidade. O imaginário estabelece vínculo. É
cimento social. Logo se o imaginário liga, une numa mesma
atmosfera, não pode ser individual. Nesse sentido não é a imagem que
produz o imaginário, mas o contrário. A existência de um imaginário
determina a existência de conjuntos de imagens. A imagem não é o
suporte, mas o resultado. (2001, p. 76).
o os imaginários de uma determinada cidade que geram uma forma particular
de pensar a arquitetura, os jardins públicos, a decoração das casas, a arrumação dos
lugares, a apresentação das lojas comerciais, entre outras coisas. O imaginário faz a
cidade ser o que é. Isso é uma construção histórica, bem como o resultado de uma época,
por isso mesmo uma aura que continua a produzir novas imagens.
Durand (1997, p. 14) afirma: “O imaginário é o conjunto das imagens e das
relações de imagens que constituem o capital pensado do homem, o grande fundamental
denominador onde se encaixam todos os procedimentos do pensamento humano”. É a
partir de uma série de imagens produzidas pelo pensamento humano e das relações entre
elas que se constitui o imaginário.
Para a materialização do imaginário com base na visualização do comércio,
partiu-se da imagem formada pelas metáforas elaboradas para dar significado à evolução
comercial da cidade.
Pessoas influentes também visitavam a cidade e manifestavam sua opinião,
como o Dr. José Mendonça que, segundo o jornal,
[...] declarou que saía daqui excelentemente impressionado pelo
movimento e pelo trabalho da população. Notou ele as menores
particularidades do esforço popular percorrendo a urbes esclarecendo
ainda que o movimento estava distribuído e não se localizava num
ponto, capaz de provocar apenas desenvolvimento parcial. (O
ANÁPOLIS, 27 jun. 1946, p. 1).
Por trás dessas impressões sobre a cidade, mais especificamente sobre o
comércio, estava a imaginação humana que é de onde “[...] emerge o imaginário como
força fundante (CASTORIADIS, 1999, p. 243). Esse imaginário permite que as
experiências criem imagens na relação com o mundo por meio da qual se produz história,
tecnologia e arte. Todas as imagens sobre Anápolis analisadas nesta pesquisa foram
formuladas pelo jornal O Anápolis e representavam sua visão, cuja síntese vinha sempre
na primeira página: “Tudo por Anápolis”. Tem-se aqui a representação de um slogan,
pois havia uma associação entre imaginação e poder expressa pelo jornal.
164
Nas palavras de Baczko (1985, p. 296): “Essa acepção corrente designava uma
faculdade produtora de ilusões, sonhos, símbolos, e que pertencia o domínio das artes,
irrompia agora num terreno reservado às coisas sérias e reais”. Desse ponto de vista, o
slogan eleva a imaginação ao nível de um símbolo. Tomando o slogan citado como
elemento de uma aspiração do jornal, tem-se o que Baczko (1985, p. 297) observou: “Os
slogans exaltavam somente as funções criadoras da imaginação e, ao investirem o termo
com funções simbólicas, concentravam nele as aspirações a uma vida social diferente”.
Esse slogan foi o ponto de partida para as aspirações maiores do jornal como
representação da vocação comercial de Anápolis. Acreditava-se que a partir daí a
coletividade estaria sendo beneficiada, pois o jornal desencadearia um processo de
transformação que mobilizaria a imaginação da coletividade para pensar a cidade como a
Ribeirão Preto de Goiás.
Essa imagem surgiu aliada a novas instalações do comércio na cidade,
inauguração de bancos, concessionárias de automóveis e novos prédios que surgiam
dando uma conotação de progresso. Em razão desses acontecimentos, a edição do dia 20
de janeiro de 1940 declarou:
E assim Anápolis fazendo jus ao seu bastante significativo cognome
de Ribeirão Preto Goiana terá ao lado de recursos materiais,
indispensáveis a todo o movimento econômico e social, um veículo
poderoso que transportará nas asas da fama, através dos espaços a
glória de seu nome edificada pelos esforços de um povo inteligente e
laborioso. (O ANÁPOLIS, 20 jan. 1940, p. 1).
Para que essa imagem fosse apreendida pela coletividade, o jornal sempre
utilizava a estratégia de vincular ao povo a imagem criada por ele (o jornal), pois sabia
que o slogan precisava ser absorvido pela imaginação popular. Essa constatação se
coaduna com o que Baczko (1985, p. 299) diz sobre como lidar com tais representações
no nível da coletividade: “Ao produzir um sistema de representações que
simultaneamente traduz e legitima a sua ordem qualquer sociedade instala guardiões do
sistema que dispõe de certa técnica de manejo das representações e símbolos”.
Dessa perspectiva, o jornal teria uma série de dispositivos técnicos elaborados
para difundir as representações produzidas sobre a cidade. Os guardiões dessas
representações seriam, por exemplo, o diretor de jornalismo, o redator de textos e de
imagens, os repórteres; as técnicas estariam nas reportagens, na formação do jornal, nas
sociabilidades, nos anúncios e nos artigos Isso foi possível, de acordo com Baczko
165
(1985, p. 300), a “[...] partir da invenção das novas técnicas, bem como de seu
refinamento e diferenciação”, pois isso implicou a passagem de um simples manejo dos
imaginários sociais à sua manipulão cada vez mais sofisticada e especializada.
Com o advento da modernidade, os meios de comunicação de massa passaram a
exercer certo controle do imaginário social, o que se deveu, segundo Baczko (1985, p.
300), ao “[...] desabrochar das técnicas de propaganda nos tempos modernos e a
importância cada vez maior que esta ganhava no conjunto da vida pública”. O jornal O
Anápolis percebeu esse caminho e apropriou-se das técnicas da palavra bem formulada
para atuar no imaginário coletivo. De acordo com Maffessoli (2001), não imaginário
individual, isso porque está associado a alguma coisa que é coletiva. Uma imagem se
torna sedimentada quando permanece na imaginação popular.
Portanto, conjuntos de imagens determinam a existência de um imaginário, o que
facilita a compreensão da imagem Anápolis a Ribeirão Preto de Goiás, que se
sedimentou nos anos 1930-1940 por força de um conjunto de imagens que foram sendo
construídas e lhe davam sustentação. Esse conjunto de imagens foi possível porque o
homem, em muitas de suas atitudes, age pelo coração, através do “[...] lume de suas
paixões e seus desejos” (BACZKO, 1985, p. 301). A imaginação é a faculdade por meio
da qual o lume das paixões se acende, a ela se dirige a linguagem dos símbolos e dos
emblemas. A maioria das representações coletivas o está associada a uma única coisa,
“[...] mas sim [...] [a] uma representação escolhida mais ou menos arbitrariamente a fim
de significar outras e de exercer um comando sobre as práticas” (BACZKO,1985, p. 306).
Frequentemente, os comportamentos sociais não se dirigem tanto às coisas em si, mas aos
símbolos dessas coisas.
Todas essas imagens tinham fundamentação em torno da produção do café e do
arroz, da chegada dos trilhos, da chegada dos imigrantes, do crescimento urbano e do
crescimento do comércio que elevou Anápolis à condição de centro comercial do estado.
Assim, retomando o pensamento de Durand (1997), o imaginário é o que é através do
pensamento humano, pois é que se torna imaginação e ganha sentido. Logo, não
somente um único imaginário. Grupos sociais formam o imaginário sobre a cidade. Em
1951, o jornal O Apolis representou Apolis como a
[...] Terra da Promissão. Desde seu clima Anápolis é uma das
melhores cidades para se viver. Alimentação farta e variadíssima.
Terra de abundantes frutas e hortaliças, que constituem a base de uma
alimentação sadia e boa . (O ANÁPOLIS, 1951, p. 2).
166
O sentido dado a essa imagem reporta-se a uma passagem bíblica: a terra da
promessa para a qual Deus promete levar o povo que saíra do Egito uma terra grande e
boa, terra que é fonte de leite e mel. A metáfora utilizada pelo jornal se deveu à imigração
que chegava à cidade continuamente atrás da terra fértil, do lugar das oportunidades, de
trabalho e de investimentos para quem quisesse montar seu negócio. A metáfora também
era utilizada pelos viajantes que por aqui passavam e deixavam sua impressão sobre o que
viam: A cidade de Souza Ramos não conhece o impaludismo, e seus moradores dão
magfica impressão de saúde e otimismo. Há de tudo em abundancia, o seu comércio é
diversificado” (O APOLIS, 10 ago. 1949, p. 1). Souza Ramos foi o fundador da antiga
Freguesia de Santana das Antas em 1870, quando construiu juntamente com moradores
do lugar a capela em homenagem a Nossa Senhora de Santana.
Nas palavras de Baczko (1985, p. 302), “[...] a vida social é produtora de valores
e normas e, ao mesmo tempo, de sistemas de representações que se fixam e traduzem”.
Esse processo define um código coletivo segundo o qual se exprimem as necessidades e
as expectativas, as esperanças e as angústias dos agentes sociais. Nesse caso a população
seria a receptora desses valores e normas. Essa imagem, de acordo com Pesavento (1995,
p. 16), estaria ligada ao imaginário, uma vez que envolve uma coletividade, pois “[...]
nessa medida a sociedade é instituída imaginariamente, uma vez que ela se expressa
simbolicamente por um sistema de idéias – imagens que constituem a representação real”.
Nesse sentido, as imagens funcionavam na imaginação das pessoas como uma
representação do acontecimento bíblico, ou seja, transportaria o mito para o presente, em
que o sonho e a esperança de muitos seriam agora realizados na nova terra.
Para Baczko (1985, p. 309), “[...] cada geração traz consigo certa definição do
homem, simultaneamente descritiva e normativa, ao mesmo tempo em que se dota, a
partir dela, de uma determinada idéia da imaginação, daquilo que ela é ou daquilo que
deveria ser”.
Na imaginação popular, isso funciona como um conforto, uma forma de
bloquear a verdadeira realidade. Esta seria uma das funções dos imaginários coletivos,
controlar o tempo no plano simbólico. Conforme Baczko (1985, p. 312), “[...] esses
imaginários intervém ativamente na memória coletiva, para a qual [...] os acontecimentos
contam muitas vezes menos do que as representações a que dão origem”. A força desses
imaginários está em produzir visões futuras, designadamente na projeção das angústias,
esperanças e sonhos coletivos sobre o futuro. Por que foram afirmadas essas metáforas
167
em tempos diferentes? A resposta pode estar vinculada ao que disse Baczko (1985, p.
309): “[...] todas as épocas têm as suas modalidades específicas de imaginar, reproduzir e
renovar o imaginário, assim como possuem modalidades espeficas de acreditar, sentir,
pensar”.
Como se vê, não há apenas um imaginário e sim diferentes imaginários que são
construídos pelos grupos sociais e estão diretamente ligados às diferentes imagens que
emergem da imaginação coletiva, embora representem grupos sociais. As imagens estão
vinculadas a fatos e acontecimentos da época, como foi o caso da vinculação de Anápolis
à cidade inglesa Manchester pelo jornal O Anápolis:
Anápolis foi crismada pelo justo ufanismo de seus moradores de
Manchester Goiana”. Não há exagero algum, Anápolis nasceu ontem.
Os primeiros habitantes aí estão. O morro da Capuava já viu as chuvas
lavarem a terra vermelha por largos anos. O coronel Leão assistiu à
chegada do primeiro trem de Goiás e a penetração dos ministros e
zebuzeiros do triângulo, homens cheios de cobre, polainas amarelas e
lenço no pescoço, em busca das terras roxas. (O ANÁPOLIS, 1953, p.
1).
Manchester é uma cidade do Reino Unido, no noroeste da Inglaterra. A cidade
foi e continua sendo um grande polo econômico, destacando-se por ser sede de um grande
parque industrial e comercial, além de sediar grandes companhias. A cidade inglesa teve
um papel primordial na Revolução Industrial. Ali a quina a vapor foi utilizada na
indústria têxtil pela primeira vez, em 1789, e foi aberta a primeira linha férrea de
passageiros ligando a cidade com Liverpool. Ao se referir a Anápolis como sendo a
Manchester Goiana, o jornal O Anápolis utilizou o discurso ufanista para comunicar-se
com a população. Essa estratégia, segundo Baczko (1985,p. 313), é apropriada para o
imaginário social, “[...] pois se torna inteligível e comunicável através da produção dos
discursos nos quais e pelos quais se efetua a reunião das representações coletivas numa
linguagem. A Manchester Goiana seria um símbolo do progresso, no entanto o mbolo
seria o intermediário entre o sinal e o signo, tão concreto quanto o primeiro e inscrito
numa constelação de relações como o segundo. O signo seria a modernidade com todos os
circundantes, daí entender-se que o signo objetiva mais do que o mbolo pode fazê-lo, e
cada signo está inscrito numa rede de signos.
O processo de significação por meio da projeção é menos controlado e menos
preciso do que nas linguagens. Isso assim ocorre porque os símbolos projetados instituem
significados mais amplos que a linguagem, mas esta tem alcance mais objetivo e, de certa
168
forma, com resultados mais imediatos. Segundo Baczko (1985, p. 311), “[...] a função do
símbolo não é apenas instituir uma classificação, mas também introduzir valores,
modelando os comportamentos individuais e coletivos e indicando as possibilidades de
êxito dos seus empreendimentos”.
Essa imagem foi construída em decorrência dos acontecimentos relacionados
com o progresso material, a construção da ferrovia e estradas que ligavam Anápolis a
outros municípios de Goiás, a produtividade agrícola do arroz e do café, a ampliação do
comércio e o crescimento espacial urbano provocado por esses fatores. Esse processo
tamm contribuiu para a imigração, uma vez que as pessoas imigram levadas pelas
oportunidades de trabalho, de investimento, de segurança, de saúde e educação que são
oferecidas pela cidade.
Aqui a imaginação criadora elabora imagens do mundo e estas formam o
imaginário que, por sua vez, assume a função de elaborar o significado que a cidade
assumiu na percepção das pessoas e mais: “O imaginário não se manifestou como
atividade que transforma o mundo, como imaginação criadora, mas, sobretudo, como
transformação eufêmica do mundo” (DURAND, 1997, p. 432). Neste caso, ao criar essa
imagem da cidade, a imaginação fez a transposição da cidade inglesa de Manchester para
o imaginário coletivo, em que as pessoas se viam imaginariamente vivendo numa cidade
próspera, com uma série de oportunidades que as faria enriquecer. Esse fato vem ao
encontro das palavras de Deleuze (1942, p. 86): “O imaginário seria a potência do falso; o
tempo substituiria o verdadeiro pela potencia do devir”. Isso porque o imaginário é
construção idealizada e irreal. Na sociedade moderna, as imagens assumem papel
preponderante, são capazes de mudar o sentido das coisas, objetos, pessoas, lugares. Essas
imagens, quando apresentadas no jornal O Anápolis, foram construídas pelas
representações a partir do simbólico, ou seja, carregando sentidos ocultos que,
construídos social e historicamente, se internalizaram no inconsciente coletivo.
É interessante observar que a cidade de Anápolis demonstrava absorver essa
visão ufanista, como mostram os dados financeiros do munipio em 1943, publicados no
jornal O Anápolis:
Habitado por um povo ordeiro e notoriamente progressista, o seu
índice de desenvolvimento se tem manifestado, de modo decisivo, nos
mais diversos e variados setores de atividades. As rendas da Coletoria
Estadual daquele município constituem a respeito, em expressivo
índice do quanto Anápolis tem progredido de 1943 a esta parte, no
setor econômico. Naquele ano as rendas estaduais na referida coletoria
169
não iam além de Cr$:109.406,90, no entanto hoje se elevou em
escala sempre crescente para mais de Cr$:1.268.038,30. (O
ANÁPOLIS, 21 fev. 1943 , p. 1).
A imagem – Anápolis: a Manchester Goiana – também se refletiu na poesia:
Saudações a Anápolis
Crescente, superaste as mais cidades
Comércio sem igual, prosperidade
Sacodem teu viver...
Andando em passo firme, florescente
Sempre, sempre a crescer!
Segue, pois teu destino, honra a fama
De Manchester goiana que proclama
Teu porte de rainha
Numa unidade Santa, na harmonia
Conduz a tua glória, essa ufania
De povo que caminha. (O ANÁPOLIS, out. 1953, p. 2).
O comércio foi o suporte para o crescimento e prosperidade vivenciados pela
cidade. A visão do poeta decorre do fato que, conforme Baczko (1985,p. 313), os “[...]
sistemas simbólicos em que se assenta e através do qual opera o imaginário social são
construídos a partir da experiência dos agentes sociais, mas também a partir dos seus
desejos, aspirações e motivações”. Qualquer campo de experiência social está repleto de
expectativas e de recusas, de temores e de esperanças. Essa percepção manifestada pelos
poemas, afirmam o presente, fundamentado nos acontecimentos do passado, podendo
com isso imaginar o futuro.
Em 1957, o jornal publicou um poema de Augusto Rios exaltando os feitos da
cidade:
Manchester Goiana eu te saúdo.
O teu cinqüentenário tem o escudo
Da vibração geral...
Teu povo todo, eu sei ora palpita
Na glória de te ver nessa infinita
Ventania sem igual. (O ANÁPOLIS, 12 jul. 1957, p. 1).
Para o autor, o progresso era debitado ao labor do povo, pois era ele o
responsável pelas transformações vivenciadas na cidade, ou seja, o povo era o
170
homenageado. Isso se devia, em parte, à grande expansão populacional: em 30 anos a
população saltou de 7.559 para 48.947 habitantes.
Desta forma as categorias do espaço e do tempo, assim como todas as
demais modalidades de atribuição de sentido qualificam o real como
a própria natureza, a qual se refere o espaço e história, que remete ao
tempo -, não estão no mundo empírico como produto mental, sob a
forma de representações. (PESAVENTO, 2004, p. 5).
A poesia representa a idealização do poeta sobre os acontecimentos. Os
imaginários sociais fornecem, desse modo, um sistema de orientações expressivas e
afetivas que correspondem a outros tantos estereótipos oferecidos aos agentes sociais.
Isso é caracterizado no poema, uma vez que o autor se utiliza de estereótipos para
qualificar Anápolis como a Manchester Goiana. Entra na discussão a força de unificação
dos imaginários sociais, pois eles asseguram a fusão entre verdade e normatividade,
informações e valores, que opera no simbolismo e por meio dele. Nesse ponto, segundo
Baczko (1985, p.313), “[...] o imaginário social informa acerca da realidade, ao mesmo
tempo em que constitui um apelo à ação, um apelo a comportar-se de determinada
maneira”. O dispositivo imaginário suscita a adesão a um sistema de valores e interm
eficazmente nos processos da sua interiorização pelos indivíduos, modelando os
comportamentos, capturando as energias. Por meio do discurso de exaltação pautado nos
50 anos de história, o povo é chamado a aclamar a mensagem de prosperidade proferida
para a cidade. Era uma forma utilizada pelo jornal para captar energias da população para
a construção da cidade do futuro, a cidade industrial. Para chegar à cidade industrial que o
imaginário social projetava, era necessário, porém, trazer a ferrovia, que representava o
caminho para a modernidade que, por sua vez, traria o progresso material para Anápolis.
Esse progresso foi representado pelo comércio.
A eficácia dos imaginários sociais sobre as mentalidades depende do seu alcance
e dos meios que asseguram tal difusão. Os tipos de emissão e controle eficazes alteram-se
de acordo com a evolução do suporte “[...] tecnológico e cultural que assegura a
circulação das informações e imagens” (BACZKO, 1985, p. 313). Percebeu-se que, à
medida que o tempo passava e as tecnologias e a cultura do povo de Anápolis evoluíam,
as imagens também assumiam sentidos diferentes para serem absorvidas pela população,
porque cada metáfora fora criada para um tempo específico. Ribeirão Preto de Goiás era
uma comparação com a cidade do interior de São Paulo, conhecida pela riqueza produzida
pela chamada ferrovia do café. A Terra da Promissão foi uma tentativa de chamar a
171
atenção para a fertilidade da terra do munipio de Anápolis. A Manchester Goiana
significou a culminância do imaginário construído sobre o futuro da cidade.
O jornal O Anápolis foi difusor desse imaginário social, porque como um
veículo de comunicação de massa construiu uma relação entre informação e imaginação
através das diferentes possibilidades que foram oferecidas por seus textos, imagens e
anúncios. A construção dessa relação foi possível, segundo Baczko (1985, p. 313), porque
como um meio de “[...] comunicação de massa garantia a um único emissor a
possibilidade de atingir simultaneamente uma audiência enorme”. Nesse contexto
tamm contribuíram para o alcance desse imaginário entre a população os meios
técnicos que amplificaram significativamente as funções performativas dos discursos
difundidos e, nomeadamente, dos imaginários sociais que eles veiculavam no jornal O
Anápolis.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Buscou-se, ao longo do trabalho, investigar e discutir os processos históricos dos
quais resultaram a construção do comércio anapolino. Para tal empreendimento, partiu-se
do jornal O Anápolis que, durante trinta anos, acompanhou e divulgou Anápolis e seu
comércio nos textos informativos, nos anúncios comerciais, nas fotografias e nas colunas
sociais. Como complemento do jornal, foram utilizadas as fotografias do acervo do
Museu Histórico de Anápolis e do Guia Prático da Cidade de Anápolis, uma publicação
de três volumes datados de 1953, 1954 e 1955, am das obras da historiografia regional.
172
Procurou-se enfrentar o problema tendo convicção de sua dificuldade uma vez
que exigiria muita pesquisa empírica, portanto seria necessário percorrer um longo
caminho delimitado em, aproximadamente, trinta anos. A feitura de um trabalho com esse
nível de complexidade exigiu uma volta no tempo em busca dos indícios do problema
desde o nascimento da cidade em 1888, quando surgiu a Vila de Santana das Antas;
depois foi necessário fazer o caminho de volta até a chegada da ferrovia em 1935.
Percorrer esse caminho, mesmo que brevemente, possibilitou a compreensão de que a
origem do comércio em Anápolis se deu com os tropeiros que tinham o lugar como
passagem.
Partiu-se do pressuposto de que a construção histórica do comércio em Anápolis
deveria se estabelecer com base em três metáforas noticiadas e sedimentadas pelo jornal
para qualificar o momento vivido pela cidade. Durante a década de 1940, a cidade foi
chamada de Ribeirão Preto goiano em virtude da cultura do ca e da instalão da
ferrovia, indutores da modernidade e do progresso vivenciado no período. A outra
metáfora era fundamentada na comparação de Anápolis com a terra da promessa bíblica.
O jornal, em alguns momentos, referia-se à cidade como a Terra da Promissão por ter um
solo fértil, propício à agricultura e também pelas oportunidades de necio e trabalho. Na
década de 1950, a imagem construída idealizava o futuro quando se pensava na
industrialização de Anápolis. Daí surgiu a Manchester Goiana como suporte para o
imaginário que se constituiria nos anos 1970, tempo que não entrou no mérito desta
pesquisa.
Ao percorrer os relatos sobre Apolis na historiografia, observou-se a utilização
não muito recorrente das mesmas fontes trabalhadas nesta pesquisa. Os autores que até
agora se dedicaram a estudar Anápolis se limitaram a fazer um necessário e indispensável
exercício intelectual, com pouca ênfase no jornal O Anápolis como fonte primária de
pesquisa. O mesmo quadro pode ser verificado em relação às fotografias, muito utilizadas
para mostrar a cidade no passado.
Se houver algum mérito no presente texto, que se submete à critica dos
historiadores entendidos, dir-se-ia que o maior foi o tratamento dado às fontes com a
utilização do método panofskyano (1995) na análise das fotografias do primeiro capítulo,
seguido da utilização da noção de representação proposta por Roger Chartier (2002) e do
conceito de imaginação social em Baczko (1985).
173
A relevância do jornal O Anápolis para responder ao problema proposto na
pesquisa se deve, em primeiro lugar, ao fato de que foi o jornal que mais tempo circulou
na cidade e a acompanhou desde a chegada do trem até o aparecimento do Distrito
Agroindustrial de Anápolis (DAIA). Segundo, durante a sua longa duração, procurou
fazer a ponte entre as oportunidades de investimento e trabalho que poderiam surgir em
Anápolis e os ideais de uma elite desejosa de ver concretizada sua visão de mundo
embasada no progresso, na modernização da cidade. Procurou ainda divulgar os
benefícios advindos da transferência da capital da República para o Planalto Central. O
estudo permitiu verificar que foi, por intermédio dos comerciais, textos jornalísticos e
fotografias publicadas no jornal, que se construiu um ideário de progresso e crescimento
urbano. Os textos difundiam um conjunto de valores e de idéias sobre a cidade.
Durante o percurso de análise das imagens da cidade, procurou-se aproximar as
diversas narrativas para alcançar a visualização proposta no início desta pesquisa. É como
se a caminhada pelos anos fosse passando e repassando pelos lugares da cidade e, de
repente, houvesse a percepção de que ocorria uma metamorfose constante. A cidade está
sempre construindo e reconstruindo a si mesma; nesse processo, o passado sobrevive na
memória, nos arquivos e nas imagens. Para construir a trajetória dos acontecimentos, é
necessário recolher, minuciosamente, os fragmentos, reconstituí-los e analisá-los para, a
partir daí, ligá-los um a um até chegar ao texto.
Pode-se dizer o que as imagens tinham algo a revelar sobre o que representam no
contexto em que foram clicadas e, acima de tudo, a impressão que deixaram sobre os
costumes, as formas e os contrastes da época em que foram produzidas. Elas podem
revelar muito mais de uma época do que se pode imaginar. A imagem que fica é de
continuação da investigação sobre este assunto, uma vez que não pôde ser dito tudo
aquilo que se pretendia, pois nem sempre o tempo colabora, ou mesmo as fontes nem
sempre dizem o que se queria saber.
Durante a elaboração do estudo, percebeu-se o idealismo daqueles que escreviam
sobre a cidade no jornal O Anápolis, no sentido de inseri-la num contexto de modernidade
e progresso. Modernidade esta representada na nova arquitetura dos prédios e casas, mas
muito mais que isso estava presente na energia depositada pelos empreendimentos em
cada detalhe da cidade e no investimento no comércio para torná-la uma referência e,
acima de tudo, ser reconhecida em sua importância econômica e cultural entre seus
moradores e no contexto estadual e nacional.
174
Como conclusão parcial deste trabalho, pôde-se compreender que o jornal O
Anápolis foi um meio de comunicação que esteve presente no processo de
desenvolvimento da cidade. Este semanário divulgava as condições propícias para os
investimentos que o local oferecia e as oportunidades de trabalho, tratava de temas como
as condições da terra, das ruas, do povo e, acima de tudo, destacava a localização
privilegiada da cidade, criando um imaginário da cidade industrial.
FONTES CONSULTADAS
1- Acervo do Museu Histórico Alderico Borges de Carvalho
1.1 Fotografias (1930-1960)
01: Casa do coronel Zeca Batista transformada em Museu Histórico pela Portaria
261/09/1971.
Nº 07: Rua 15 de Dezembro (1932)
Nº 08: Rua 15 de Dezembro (1935)
Nº 09: Inauguração da estação ferroviária (1935)
Nº 10: Desfile cívico de 7 de setembro de 1935
175
Nº 11: Casa Luziana (1935)
Nº 12: Rua Antonio Carlos (1936)
Nº 13: Rua 14 de Julho (1937)
Nº 14: Rua Achiles de Pina (1939)
Nº 15: Praça da estação no fim da década de 1930
Nº 30: Banco de Crédito Real de Minas Gerais
Nº 39: Rua Manoel D’Abadia (1955)
Nº 40: Largo do Bom Jesus (1935)
Nº 41: Largo do Bom Jesus (1938);
Nº 47: Rua Barão do Rio Branco (1960)
Nº 51: Rua Manoel D’Abadia (1960).
1.2 Jornais
1.2.1 Jornal O Anápolis, 1935-1960
1935: nº 01; nº 05; nº 10; nº 15; nº 20, nº 25; nº 30; nº 35, nº 36; nº 37; nº 38; nº 39.
1936: nº 40; nº 41;nº 44; nº 48; nº 53; nº 54; nº 57; nº 60
1939: nº 160; n 165; nº 168; nº 170
1940: nº 212; nº213, nº 214; nº 215, nº 216; nº 217; nº 220; nº 225; nº 226; nº 228;
nº 230: nº 233; nº 235; nº 237; nº 237; nº 239, 240; nº 243; nº 245; nº 247
1941: nº 248; nº 249; nº 250; nº 253; nº 259; nº 263; nº 264; nº 267; nº 272; nº 274;
nº 276; nº 280; nº 287; nº 292; nº 296; nº 298; nº 300; nº 303; nº 307; nº 310; nº 314.
1942: nº 331; nº 332; nº 336; nº 337, nº 336; nº 341; nº 343; nº 347; nº 350; nº 352;
nº 360; nº 363; nº 364; nº 366; nº 375
1943: nº 382; nº 383; nº 385; nº 386; nº 390; nº392; nº 396; nº 409; nº 411; nº415;
nº 420; nº 423; nº 425; nº 427; nº 431
1944: nº 432; nº 433; nº 440; nº 443; nº 445; nº 449; nº 450; nº 453; nº 456; nº 460;
nº 464; nº 466; nº 473; nº 477; nº 480; nº 482
1945: nº 483; nº 485; nº 488; nº 491; nº 495; nº496; nº 497; nº 499; nº 503; nº 507; n 508;
nº 515; nº 520; nº 528; nº 530; nº 542
1946: nº 545; nº 546; nº 547; nº 549; nº 552; n 554; nº 557; nº 556; nº 558; nº 563;
nº 567; nº 570; nº 575; nº 580; nº 586; nº 590; nº 598; nº 600; nº 612; nº 623; nº 640
1947: nº 641; nº 646 nº 648; nº 650; nº 651; nº 652; nº 668, nº 670; nº 681; nº 683;
176
nº 695; nº 696; nº 697; nº 702; nº 712; nº 721; nº 726; nº 730; nº 736; nº 740; nº 742
1948: nº 743; nº 750; nº 755; nº 764; nº 772; nº 790, nº 795; nº 800; nº 805; nº 810;
nº 816; nº 820; nº 822; nº 827; nº 830; nº 833; nº 834; nº 836; nº 842
1949: nº 846; nº 847; nº 850; nº 854; nº 858; nº 863; nº 870; nº 875; nº 877; nº 880;
nº 882; nº 884; nº 890; nº 904; nº 909; nº 912; nº 920; nº 925; nº 932; nº 940; nº 945
1950: 948; nº 955; nº 960; nº 961; nº 976; nº 980; nº 1005; n 1014; nº 1015; nº 1020; nº
1032; nº 1038; nº 1040; nº 1045; nº 1053; nº 1061
1951: nº 1062, nº 1065; nº 1076; nº 1078; nº 1128; nº 1135; nº 1140; nº 1142; nº 1145; nº
1148; nº 1150; nº 1156; nº 1158; 1160
1952: nº 1161; nº 1170; nº 1172; nº 1174; nº 1176; nº 1178; nº 1180; nº 1196; nº 1220; nº
1230; nº 1238; nº 1260; nº 1262
1953: nº 1263; nº 1265; nº 1270; nº 1278; nº 1289; nº 1294; nº 1300; nº 1335; nº 1340
1954: nº 1761; nº 1765; nº 1766; nº 1669; nº 1774; nº 1776; n 1784; nº 1785
1955: nº 2891; nº 2893; nº 2895; nº 2904; nº 2910; nº 2917; nº 2923; nº 2926; nº 2933; nº
2936; nº 2940; nº 2942; nº 2946
1956: 2946; nº 2948; nº 2954; nº 2959; nº 2965; nº 2970; n º 2976; nº 2985; nº 2990; nº
2992; nº 3009; nº3012; nº3016; nº 3023; nº3030; nº3038; nº3045; nº 3056; nº 3066; 1957:
nº 3079; nº 3085; nº 3093; nº 3112; nº 3125; nº 3133; nº 3145; nº 3153; nº 3155
1958: nº3158; nº3163; nº3170; nº3172; nº3184; nº3188; nº3193; nº 3199; nº3200; nº3206;
nº3210; 3215; nº3218; nº3220; nº3226; 3230; nº3235; nº3237; nº3241; nº3244;
nº3249; nº3250; nº3252; nº 3255
1959: 3256; 3261; nº3266; 3270; nº3274; nº3280; nº3286; nº3288; nº3291;
nº3294; nº3300; nº3307; nº3310; 3323; nº3338; 3332; nº3340; nº3349; nº3356;
nº3370; nº 3387; nº3392; nº 3393; nº3402; nº3415; nº3425; nº3457
1960: 3668; 3673; 3679; 3684; nº3693; nº3696; 3704; nº3730; nº3743;
nº3755; nº3767; 3774; nº3781; nº3792; nº3805; 3810; nº3815; 3824; nº3832;
nº3844; nº3851; nº3858; nº3862; nº3869; nº3878; nº 3882; nº3888; nº3891; nº3896;
nº 3902; nº 3913; nº 3920; nº 3925; nº 3932; nº 3938; nº 3941; nº3947; nº 3951
1.2.2 Jornal Voz do Sul. Edições de 1930-1934
1930: nº 01
1931: nº 02; nº 03; nº 04; nº 05; nº 06; nº 07; nº 08, nº10; nº11; nº 12; nº 13; nº 14; nº 16;
nº 18; nº20; nº 23; nº 27; nº 32; nº 35; nº 37; nº 42; nº 44; nº 53; nº 57
177
1932: nº 58; nº 59; nº 60; nº 65; nº 70; nº 74; nº 79; nº 81; nº 87; nº 92; nº 94; nº 97;
nº 100; nº 104; nº 109; nº 110.
1933: n° 120; nº 123; n 130; nº 135; nº 137
1.3 Revistas
1.3.1 A Cinqüentenária. 1957 - Volume Único.
1.3.2 Guia Prático da Cidade de Anápolis (1954-1955)
1.3.3 Personalidades- Sociedade, Cultura, Indústria, Comércio, Anápolis: Contexto &
Marketing Ltda., 2004.
178
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