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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DAS RELIGIÕES
PAULO EMANUEL SILVA
AIDS E RELIGIOSIDADE: influências intersubjetivas aos acometidos pela epidemia
JOÃO PESSOA – PB
2009
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2
PAULO EMANUEL SILVA
AIDS E RELIGIOSIDADE: influências intersubjetivas aos acometidos pela epidemia
Dissertação apresentada ao colegiado do
Programa de Pós-graduação em Ciências das
Religiões nível Mestrado, do Centro de Ciências
Humanas Letras e Artes, da Universidade
Federal da Paraíba.
Linha de pesquisa: Espiritualidade e Saúde
ORIENTADOR: Prof. Dr. José Antônio Novaes da Silva
JOÃO PESSOA – PB
2009
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PAULO EMANUEL SILVA
AIDS E RELIGIOSIDADE: influências intersubjetivas aos acometidos pela epidemia
Dissertação apresentada ao colegiado do Programa de Pós-graduação em Ciências das
Religiões nível Mestrado. Linha de pesquisa: Espiritualidade e saúde, do Centro de
Ciências Humanas Letras e Artes, da Universidade Federal da Paraíba, tendo obtido o
conceito ____________________, conforme apreciação da banca examinadora constituída
pelos professores:
Aprovado em: _____/_____/2009
___________________________________________
Prof. Dr. José Antônio Novaes da Silva
Orientador
____________________________________________
Prof. Dr. Severino Celestino da Silva
Membro
_____________________________________________
Profª. Drª. Lenilde Duarte de Sá
Membro
____________________________________________
Prpfº Dr. Thiago Antonio Avellar de Aquino
Membro Externo
JOÃO PESSOA – PB
2009
4
S586a
Silva, Paulo Emanuel.
AIDS e religiosidade: influências intersubjetivas aos acometidos pela epidemia /
Paulo Emanuel Silva. - - João Pessoa: UFPB, 2009.
127f.: il.
Orientador: José Antonio Novaes da Silva
Dissertação (Mestrado) – UFPB/CCHLA.
1.Religião. 2.AIDS - Enfrentamento da doença. 3.Qualidade
de Vida.
UFPB/BC CDU:
2:616.97(043)
5
“Eu apenas queria que você soubesse que essa criança brinca nessa roda, e não tem o corte
das novas feridas, pois tem a saúde que aprendeu na vida” (Gonzaguinha)
6
AGRADECIMENTOS
Agradecer sempre é um momento difícil em um trabalho monográfico,
principalmente porque em se tratando da última coisa que se faz, bate uma sensação de
alívio e de saudade, alivio por sentir que o dever foi cumprido ou ao menos se pensa que
foi, e saudade porque após dois anos de compartilhamento com os colegas de turma, as
brincadeiras vividas em sala de aula e fora dela, deixam marcas indizíveis, mas que ficarão
para sempre como uma cicatriz que ao olharmos para ela sempre nos lembramos do seu
causador.
Portanto agradeço primeiramente a Deus, que durante o percurso deste trabalho
sempre me deu inspirações nos momentos difíceis, sendo a inspiração primeira a
construção do projeto que me fez entrar no programa. E durante os dois anos do curso por
conduzir os meus passos nos momentos de ‘agonias’ e perigos que a vida nos apresenta.
À minha família que sempre fica orgulhosa por cada conquista minha.
Para não cometer a injustiça de esquecer o nome de alguém, agradeço a todos os
meus amigos de trabalho, incluindo as duas instituições nas quais dedico boa parte do meu
tempo, portanto passo mais tempo com eles do que propriamente em casa, e assim eles são
como uma extensão da minha família.
Aos mestres que com os seus conhecimentos contribuíram para meu
engrandecimento cognitivo, em especial aos professores que compuseram a banca de
qualificação Profº Celestino e Profª Lenilde e ao Profº Thiago Antonio que compôs a banca
final.
Com muito apreço agradeço a todos os contribuintes do estudo, que sem restrição
alguma responderam aos questionários, tornando possível a concretização deste estudo,
assim como a diretoria da instituição na qual foi realizada a pesquisa, meu muito obrigado.
Por fim agradeço ao meu orientador, não por ser o menos importante na construção
deste trabalho, mas justamente ao contrário, pois sem a sua maestria na condução do toque
desta “banda”, com certeza a música ficaria desentoada, e neste aspecto vou levar tudo que
aprendi com ele, para a condução dos meus orientandos daqui por diante.
7
RESUMO
AIDS E RELIGIOSIDADE: INFLUÊNCIAS INTERSUBJETIVAS AOS
ACOMETIDOS PELA EPIDEMIA
Nos dias atuais, apesar de todas as informações inerentes aos mais diversos tipos de
doenças, algumas delas ainda são motivos de angústia, receios e preconceitos. Na
antiguidade, a lepra e a peste e, a partir do século XIX, o câncer, a sífilis e a tuberculose
permeavam as mentalidades e marcavam seus portadores, uma vez que os significados das
doenças iam além de seus diferentes sintomas. Algo semelhante vem ocorrendo no mundo
contemporâneo no que diz respeito à Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS).
Para muitos, a soropositividade, entendida como a pessoa portadora do HIV, ainda é
sinônimo de morte, nesse sentido, a pessoa é estimulada a profundas reflexões sobre a
própria vida; se lhe foi satisfatória sua trajetória de vida, se houve algum desenvolvimento
emocional, se pôde criar vínculos afetivos fortes e permanentes ou mesmo se pôde auxiliar
a outros seres humanos. Portanto as crenças, opiniões, valores pessoais e de grupo devem
ser valorizados no diálogo e considerados tanto no formato como no conteúdo das
abordagens no campo da promoção da saúde. O estudo teve como objetivo: Avaliar a
qualidade de vida dos portadores de HIV/aids na cidade de João Pessoa/PB; Investigar a
influência da religiosidade no enfrentamento da aids; Verificar a influência da categoria
“raça”/cor aliada ao fator religioso na forma de enfrentamento do soropositivo. Trata-se de
um estudo exploratório descritivo com abordagem quanti-qualitativa, realizado em um
hospital de referencia da cidade de João Pessoa. Foram entrevistadas 76 pessoas, nessa
amostra foi constatado que 50% dos participantes do estudo são do sexo masculino e 50%
do sexo feminino, com idade em ambos os sexos variando entre 20 e acima de 60 anos,
também foi verificado que a maioria dos entrevistados pertencem a raça negra com pouco
grau de instrução. Ao se fazer um cruzamento entre o grau de instrução e o poder
aquisitivo observou-se que esse fato, aliado a baixa escolaridade reforça a evidência a
respeito da pauperização da epidemia. Quanto ao perfil religioso observou-se uma alta
incidência entre católicos e evangélicos. A aproximação com os sentidos percebidos no
estudo mostram que o diagnóstico da aids se apresenta com significados que mobilizam,
nos indivíduos, surpresa e dor psíquica, em virtude de esperarem um desfecho duvidoso,
tanto que eles não apresentam medo do futuro, no sentido de não guardarem grandes
perspectivas. Isso reforça a necessidade de uma assistência interdisciplinar entre todos os
soropositivos e não apenas com o doente de aids com o objetivo de construir, com eles,
outros sentidos para sua vida e, até mesmo, possibilidades para que eles se sintam
participantes do processo de superação da doença. A partir do enfoque religioso constatou-
se que a “cara da aids” pode não mais ser uma “cara” da morte, mas uma “cara” da vida,
porque as pessoas tentam aprender a viver com a doença, transformando seu dia-a-dia em
uma “batalha” constante para encontrar um sentido de vida, para dessa forma resgatar o
respeito e a dignidade, e, assim, dizimar os estigmas causados no transcurso da epidemia,
que as fazem ficar quase que isolados, sem o direito de viver como as demais pessoas. Essa
luta fará com que as pessoas que tem o vírus circulando no sangue não sejam vistas como
pessoas anormais, dessa forma subjetivando a sua condição de portador e relegando a aids
como mais um percalço que terão que ultrapassar em sua jornada de vida.
Palavras chave: Qualidade de vida; aids; enfrentamento; religião.
8
ABSTRACT
AIDS AND RELIGIOSITY: INFLUENCES ON INTERSUBJECTIVE AFFECTED
BY EPIDEMIC
Nowadays, despite all the information related to several types of diseases, some of them
are still cause for anxiety, fears and prejudices. In ancient leprosy and the plague and from
the nineteenth century, cancer, syphilis and tuberculosis, permeated the mentality and
marked their bearers, as the meanings of illness were different than their symptoms,
something similar is happening in the contemporary world as with respect to Acquired
Immunodeficiency Syndrome (AIDS). For many, the positivity for HIV understood here as
the person with HIV is still synonymous with death, in this sense, the person is stimulated
to profound reflections on life itself, if it was satisfactory trajectory of their life, if there
were any emotional development, to create strong emotional bonds and permanent or if it
could help other human beings. Thus the beliefs, opinions, personal values and group
should be valued and considered in the dialogue both in format and content of the
approaches in the field of health promotion. To assess the quality of life of HIV / AIDS in
the city of João Pessoa / PB; investigate the influence of religiosity in the face of aids;
check the influence of the "race" or color along religious factor in the way of coping
positivity for HIV. This is a descriptive exploratory study with quantitative and qualitative
approach, performed in a reference hospital in the city of João Pessoa. We interviewed 76
people, this sample was found that 50% of the study participants were male and 50%
female, with age in both sexes ranging from 20 to over 60 years, was also found that most
of the interviewees belong to black with little schooling. When you make a cross between
the level of education and purchasing power can be seen that this, combined with low
education increases the evidence about the pauperization of the epidemic. As for the
religious profile was observed a high incidence among Catholics and evangelicals. The
approach to the senses perceive in the study show that the diagnosis of AIDS appears to
involve meanings in people, surprise and mental pain due to waiting an outcome uncertain,
so much that they have no fear of the future in not to keep large prospects. This reinforces
the need for interdisciplinary care of all HIV positive and not only with the patient of aids
with the goal of building with them, other senses to life and even opportunities for them to
feel involved in the process of overcoming the disease. From the religious approach found
that the "face of aids" can no longer be a "face" of death, but a "face" of life, because
people try to learn to live with the disease, making their day-to-day in a "battle" to find a
constant sense of life, so to redeem the respect and dignity, and thus decimating the stigma
of the epidemic caused in passing, that the form is almost isolated, without the right to live
as other people . This fight will make the people who have the virus circulating in the
blood, people are not seen as abnormal, so they will subjectfied bearer of their condition,
and relegate aids as a hitch that will have to overcome in their journey of life .
Keywords: Quality of life, AIDS, coping; religion.
9
LISTA DE TABELAS
Tabela 01
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo a faixa
etária e o sexo. Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga -
João Pessoa - PB, 2008.
53
Tabela 02
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo o
desdobramento do nível de instrução formal em relação a “raça”/cor
60
Tabela 03
Freqüências e medidas descritivas das facetas do domínio físico X
“raça”/cor referente a questão 16 do Whoqol HIV Bref
61
Tabela 04
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo o
questionamento: Como você acha que foi infectado pelo hiv?
68
Tabela 05
Freqüências e medidas descritivas das facetas do domínio
espiritualidade X “raça”/cor referente a questão 9 do Whoqol HIV Bref
73
Tabela 06
Freqüências e medidas descritivas acerca da importância da
religião/espiritualidade para lidar com fatores estressantes atuais
75
Tabela 07
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo o
desdobramento da importância da religião/espiritualidade em relação a
“raça”/cor
76
Tabela 08
Freqüências e medidas descritivas das facetas do domínio
espiritualidade X “raça”/cor referente a questão 24 do Whoqol HIV
Bref
77
10
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo o
questionamento:Qual sua “raça”/cor/? Ambulatório/Complexo
Hospitalar Clementino Fraga -João Pessoa - PB, 2008.
56
Gráfico 2
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo o grau de
instrução. Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga -João
Pessoa - PB, 2008.
58
Gráfico 3
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo o estado
civil. Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga -João
Pessoa - PB, 2008.
64
Gráfico 4
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo o
questionamento: Com relação à sua religião/doutrina/seita/crença, vo
se considera:. Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga -
João Pessoa - PB, 2008.
66
Gráfico 5
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo o
questionamento: Em que ano você fez o primeiro teste HIV positivo?
Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga –João Pessoa
PB, 2008.
69
Gráfico 6
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo o
questionamento: Em que ano você acha que foi infectado pelo HIV?
Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga –João Pessoa
PB, 2008.
70
Gráfico 7
Distribuição dos participantes (n=40) da pesquisa segundo o
questionamento: Como está a sua saúde? Ambulatório/Complexo
Hospitalar Clementino Fraga -João Pessoa - PB, 2008
71
11
LISTA DE QUADROS
Quadro 1
Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do
estudo em resposta a questão para você o que é Deus, onde Deus é
percebido como “tudo”.
81
Quadro 2
Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do
estudo em resposta a questão para você o que é Deus, onde Deus é
percebido como um “amigo”.
84
Quadro 3
Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do
estudo em resposta a questão para você o que é Deus, onde Deus é
percebido como um “ser inquestionável”.
86
Quadro 4
Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do
estudo em resposta a questão para você o que é Deus, onde Deus é
percebido como um “ser castigador mas que perdoa”.
89
Quadro 5
Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do
estudo em resposta a questão para você o que é Deus, onde Deus é
percebido como um “ser supremo”.
93
Quadro 6
Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do
estudo em resposta a questão para você o que é Deus, onde Deus é
percebido como um “Deus que dar saúde”.
96
Quadro 7
Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do
estudo em resposta a questão para você o que é Deus, onde Deus a
percepção de Deus causa um conflito de ideologias.
98
12
LISTA DE SIGLAS
AIDS -
Acquired immunodeficiency syndrome/ Síndrome da Imunodeficiência
adquirida
AZT - Zidovudina
BES - Bem Estar Subjetivo
CEP - Comitê de Ética e Pesquisa
DNA - Ácido Desoxirribonucleico
DSC - Discurso do Sujeito Coletivo
DST - Doença Sexualmente Transmissível
ER - Enfrentamento Religioso
HIV -
Human immunodeficiency vírus/Vírus da Imunodeficiência Humana
HSH - Homens que fazem sexo com Homens
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica
LDB - Lei de Diretrizes e Base
OMS - Organização Mundial de Saúde
PGR - Procuradoria Geral da República
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
QV - Qualidade de Vida
QVG - Qualidade de Vida Geral
SUS - Sistema Único de saúde
SINAM-
Sistema de Informação de Notificação de Agravos
TARV -
Terapia Anti-retroviral
13
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO
12
1.2 Objetivos 20
2. REVISÃO DE LITERATURA
21
2.1 Traçando um perfil epidemiológico da aids no Brasil 22
2.2 Um enfoque na dimensão da Qualidade de Vida (QV) entre os portadores de
HIV/aids
29
2.3 Estratégias subjetivas no enfrentamento da aids 31
2.4 Religiosidade e saúde
36
2.5 A questão da cor/raça nos serviços de saúde
39
3 CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS
43
4 CONHECENDO OS PARTICIPANTES DO ESTUDO
52
4.1 Caracterização da amostra 53
4.2 A doença e condição atual de saúde 67
4.3 Espiritualidade e novas perspectivas 73
5 REPRESENTAÇÃO DE DEUS PARA OS PORTADORES DE HIV/AIDS
79
6 CONSIDERAÕES FINAIS
102
REFERÊNCIAS
106
APÊNDICES
115
APENDICE A: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 116
APENDICE B: Questões relativas a cor/etnia e religiosidade 117
ANEXOS
119
INSTRUMENTO WHOQOL-HIV BREF
CERTIDÃO DO COMITÊ DE ÉTICA E PESQUISA
14
1 INTRODUÇÃO
1 INTRODUÇÃO1 INTRODUÇÃO
1 INTRODUÇÃO
“Sê senhor da tua vontade... Bem, sou senhor da minha vontade pelo fato de
ser pessoa, contanto que entenda corretamente este meu ser-pessoa, que é ser
livre e plenamente responsável” (Viktor E. Frankl)
15
os dias atuais, apesar de todas as informações inerentes aos mais diversos
tipos de doenças, algumas delas ainda são motivos de angústia, receios e
preconceitos. Na antiguidade, a lepra e a peste e, a partir do século XIX, o câncer, a sífilis
e a tuberculose permeavam as mentalidades e marcavam seus portadores, uma vez que os
significados das doenças iam além de seus diferentes sintomas: “a doença é o réu, mas ao
doente cabe a culpa” (SONTAG, 2002, p. 75).
Algo semelhante vem ocorrendo no mundo contemporâneo no que diz respeito à
Síndrome
1
da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), pois os portadores da aids
2
também
passaram a ficar marcados, esse tipo de marca ficou presente no imaginário de um grande
número de pessoas, contribuindo para a formação de um estigma relacionado a essa
doença.
Formiga (2007) afirma que o tema sobre o preconceito ainda sugere muitos estudos,
principalmente, no que diz respeito à explicação da estabilidade desse fenômeno nas
relações interpessoais, sendo essa condição motivo de geração de diversas perspectivas
teóricas, seja na área psicanalítica, sociológica, sócio-cognitiva ou psicossocial. O autor
acrescenta ainda que essa interdisciplinaridade procura contribuir para a compreensão da
manifestação do preconceito, por perceber que as pessoas não são tão estáticas, mas,
cognitiva e socialmente dinâmicas, o que leva a pensar que o processo de construção da
realidade social do preconceito flutua justamente na interação social, permitindo discutir
sobre a dinâmica e a origem das atitudes preconceituosas.
Seguindo o mesmo raciocínio de Formiga (2007), apesar de tantos enfoques e
investimentos na busca de inibir ou diminuir a desigualdade social, principalmente, em
relação às formas de discriminação frente aos diversos grupos sociais e à manutenção do
bem-estar social e psicológico das pessoas que sofrem com esse problema, parece que,
concretamente, não se tem mostrado uma diminuição significativa quanto à manifestação
1
Síndrome é o estado mórbido caracterizado por um conjunto de sinais e sintomas, que pode ser produzido
por mais de uma causa (FERREIRA, 1999). No que se refere a aids, a síndrome está instalada quando há uma
combinação de sintomas e/ou doenças associada à infecção do HIV, ao decréscimo do número de células
CD4 do organismo e a uma ou mais infecções oportunistas (PELA VIDDA, 1998).
2
A Coordenação Nacional de DST/AIDS no Ministério da Saúde, do Brasil, deliberou que a palavra aids dever ser
considerada substantivo comum, apesar de ser originária de uma sigla estrangeira. Assim quando se referir à epidemia,
sua grafia deverá ser com todas as letras minúsculas. Quando for nome de um setor ou título, a primeira letra deverá ser
maiúscula e as demais minúsculas. Se o termo aids estiver acompanhado de outras siglas escritas em maiúsculo, sua
grafia seguirá a mesma regra, por exemplo: CN-DST/AIDS (LOPES, 2003, p. 1).
N
16
social do preconceito, ao contrário, ele vem se apresentando sob uma versão sutil e
camuflada, ou seja, nem sempre o discurso é condizente com a prática.
Com relação à síndrome em foco, pode-se inferir que a questão do preconceito pode
estar relacionada à sua origem, quando a principio foi configurada como uma doença
exclusiva dos “gays”. No entanto, além do preconceito, essa doença da contemporaneidade
gerou também medo e desespero diante do fato que a epidemia “atinge 33 milhões de
pessoas, e que somente em 2007, 2 milhões de pessoas morreram e outros 2,5 milhões se
infectaram com o HIV” (TEMPORÃO, 2007).
Reportando-se ao princípio da epidemia, Santos et al (2002) afirmam que, embora
inicialmente vinculado aos homens que fazem sexo com outros homens (HSH),
particularmente nos países industrializados e na América Latina, o HIV se disseminou
rapidamente entre os diversos segmentos da sociedade, alcançando paulatinamente
mulheres e homens com prática heterossexual. O aumento do número de mulheres
portadoras do vírus levou ao surgimento da transmissão vertical do HIV, a principal forma
de infecção de bebes e crianças. Portanto, percebe-se diferentes padrões de transmissão da
infecção pelo HIV entre as distintas formas de organização social.
Nesse contexto é importante destacar, de acordo com Santos et al (2002), que se no
início a infecção pelo HIV parecia limitar-se a determinados “grupos de risco” compostos
por homossexuais, hemofílicos e usuários de drogas injetáveis, com o correr do tempo ela
foi buscando caminhos, tomando espaços na população geral e “socializando” a sua
possibilidade de ocorrência, ressaltando que antes essa doença parecia restrita aos
“diferentes e famosos”, passando progressivamente por um processo de pauperização e
feminização da epidemia.
Apesar das mudanças ocorridas ao longo dos anos, no que se refere ao perfil
epidemiológico da aids, Temporão (2007), ao fazer uma reflexão sobre os 26 anos de
epidemia, afirma que:
No Brasil, a tendência da estabilização começou a ser demonstrada desde o
início deste século e mostrou que estávamos certos. O país adota uma política
que combina três fatores decisivos para o sucesso: 1) garantia de acesso universal
ao tratamento a todas as pessoas que vivem com HIV; 2) expansão do acesso ao
diagnóstico e aos insumos de prevenção; e 3) fundamentalmente, o
estabelecimento de uma relação pró-ativa com a sociedade civil, sem ferir sua
autonomia e independência. A construção da solidariedade tornou-se um dos
17
pilares da resposta brasileira e nos ensinou que a comunhão e o diálogo se
afirmam quando reconhecemos o direito à diversidade, à liberdade e à equidade.
Esse gesto generoso também nos ensinou a ver que muito a ser realizado e
que é preciso deter uma epidemia que atinge a todos nós, pois seu impacto não se
resume à dimensão biológica: vai além, ao colocar-nos, frente a frente, com
questões sociais e comportamentais, como o preconceito, o estigma e o
abandono. Deter este movimento nos fortalece e traz de volta a razão de viver e
de resistir [...] (TEMPORÃO, 2007).
Silva (2004) faz um elo entre a questão da resistência, referida por Temporão
(2007), mediante a possibilidade de as pessoas se verem na iminência de uma doença para
a qual não se conseguiu a cura até o momento, quando sugere que a aids trouxe consigo
uma série de impactos para a humanidade: impactos sociais, políticos, psicológicos e até
religiosos, pois “várias vertentes declaravam publicamente que a aids era o ‘castigo’
infligido aos que ousavam praticar o sexo sem fins de procriação” (BRASIL, 2002a, p.91).
O que demonstra um importante fator de morbi-mortalidade, repercutindo em um pânico
generalizado diante de uma sigla tão estigmatizada, que poderia também significar:
Ame Intensamente a Deus Sobretudo.
Nesse sentido, percebe-se que a religiosidade
3
;
4
está fortemente ligada à questão de
as pessoas terem medo de serem castigadas por atos que tenham cometido e que inflijam
sua religião, aliada ao fato de que o ser humano tende a se “apegar” a algo superior que lhe
dê sustentação para seguir adiante, no enfrentamento de situações difíceis como no caso de
doenças graves. Corroborando com essa afirmativa pode-se destacar que
As crenças religiosas de alguém fornecem força, uma tranquilidade interior e a
fé, com as quais se luta para contornar os problemas da vida. A religião pode
fornecer uma base de apoio para que alguém viva a sua vida, o que inclui rituais,
orações, exercícios espirituais, certos princípios, conduta diária, e assim por
diante (ATKINSON; MURRAY, 1989).
Para muitos, a soropositividade entendida como a pessoa portadora do HIV, ainda
é sinônimo de morte. Contudo vale ressaltar a afirmação de Ballone (2002) ao dizer que
d
urante a fase de enfrentamento da morte, a pessoa é estimulada a profundas reflexões
sobre a própria vida; se lhe foi satisfatória sua trajetória de vida, se houve algum
3
Ferreira (1999) conceitua religiosidade a partir da etimologia da palavra que deriva do latim religiositate,
significando “qualidade de religioso; disposição ou tendência para a religião ou às coisas sagradas;
escrúpulos religiosos”.
4
Reafirmando o peso que a religiosidade exerce sobre as pessoas, destaca-se um depoimento feito por uma
portadora do HIV, quando declarou que colocou sua saúde em risco, por causa de orientação do seu líder ao
induzi-la a deixar de tomar sua medicação, alegando que apenas a fé iria curá-la.
18
desenvolvimento emocional, se pôde criar vínculos afetivos fortes e permanentes ou
mesmo se pôde auxiliar outros seres humanos.
Sampaio (2002) argumenta que a aids, em seu princípio histórico, trouxe à luz
um repertório de preconceitos e estigmatizações que estava ou adormecida na consciência
de muitas pessoas ou silenciada propositalmente por outras, e a constatação do vírus faz
emergir não apenas as questões de ordem da saúde, mas traz à tona questões de cunho
moral e religioso que prontamente se organizam em um discurso normativo culpabilizador
do corpo e de suas relações.
Silva (2004),
em estudo com Organizações não Governamentais (ONGs) que
desenvolvem atividades junto a pacientes soropositivos no âmbito do Estado da Paraíba,
observa que, entre os rios pontos abordados com relação ao funcionamento das ONGs
estudadas, destaca-se o que se refere as suas missões. Nesse estudo foram estabelecidas
várias categorias de missões, entre elas a referente à religiosidade que, apesar de ser
apontada como missão por apenas duas ONGs, exprime relevância na vida de algumas
pessoas, principalmente quando se veem diante de uma doença que até o presente
momento não se encontrou a cura, como a aids, pois
quando se descobrem portadoras do HIV, buscam na fé a força que precisam
para superar as dificuldades e enfrentar o diagnóstico que as coloca diante da
única certeza que se tem nesta vida: a de que um dia todos iremos morrer,
independentemente de sermos soropositivos ou não (GUILHERME, 2003, p. 12)
Consequentemente, o enfoque religioso no interior das ONGs torna-se positivo,
que as crenças religiosas podem fornecer força, tranquilidade interior e para contornar
os desafios que a doença impõe às pessoas acometidas pelo vírus. Assim, o interesse em
aprofundar o tema através dessa pesquisa, que enfoca a religiosidade entre os acometidos
pela epidemia da aids, nasceu a partir do estudo mencionado
5
e das observações enquanto
profissional da área de saúde, assim como enquanto docente, procurando através das
aulas ministradas reforçar a importância da abordagem holística dos clientes, atendo-os
de forma integral, ou seja, observando seus aspectos bio-psiquico-social e espiritual.
5
SILVA, P. E. Organizações não-governamentais na Paraíba: estruturas e ações de controle para a epidemia
do HIV/Aids. Monografia de especialização, João Pessoa: UFPB, 2004.
19
Paiva (2008) pondera que as crenças, opiniões, valores pessoais e de grupo devem
ser valorizados no diálogo e considerados tanto no formato como no conteúdo das
abordagens no campo da promoção da saúde sexual e reprodutiva, assim como nas
iniciativas de prevenção das doenças sexualmente transmitidas. No entanto,
historicamente, de acordo com Vasconcelos (2007), no Brasil, a assistência à saúde
desenvolveu-se pelo atendimento clínico e individual, relegando a um plano secundário
os fatores sociais, fato talvez relacionado ao sistema de ensino que segue um modelo
cartesiano, fragmentando o indivíduo, que passa a ser visto não mais como um todo, mas
como partes de um todo, surgindo com esse enfoque as especialidades médicas, e dessa
forma o ser humano pode ficar descontextualizado, como se não possuísse sentimentos
ou emoções.
Vale salientar que, no processo de formação, os profissionais procuram não
demonstrar seus sentimentos e emoções. Vasconcelos (2007) afirma que um
preconceito contra a emoção e a intuição no trabalho em saúde e na discussão teórica dos
problemas de saúde, mas efetivamente a emoção e a intuição estão fortemente presentes,
de forma descontrolada e não discutida no âmbito do trabalho em saúde. É importante
destacar que “a medida em que o profissional trabalha com momentos de crise mais
intensas das pessoas, tem acesso e é envolvido num turbilhão de sentimentos e
pensamentos, onde os elementos inconscientes da subjetividade se tornam poderosos”
(VASCONCELOS, 2007, p. 13).
No entanto, para que ocorra a promoção da saúde perpassando pelos aspectos da
religiosidade/espiritualidade, faz-se necessário tanto um auto conhecimento do
profissional quanto conhecer os valores e crenças de seus clientes, no intuito humanizar a
assistência à saúde. Huf (2002) afirma que o auto conhecimento é um momento de
reconciliação consigo mesmo, fato importante tanto para quem presta o cuidado, quanto
para aquele que o recebe. Segundo a referida autora:
A importância do profissional de saúde conhecer os valores, as crenças e as
atitudes de si próprio e daquele que recebe o seu cuidado, estabelece um
relacionamento de ajuda mais efetivo e desenvolve maior habilidade na
identificação das necessidades integrais do ser humano (HUF, 2002).
20
Quanto aos portadores do HIV, fica uma lacuna no sentido de se averiguar se a
religião/religiosidade influi positiva ou negativamente, que algumas instituições
religiosas reforçam a culpa e justificam o castigo, valendo ressaltar que:
As testemunhas de Jeová, referindo-se a aids, afirmam que “a imoralidade uma
doença do espírito tem colhido abundante tributo de epidemias físicas”. A
Igreja Universal afirma que a “aids é um tapa de Deus na cara dos homossexuais.
Para os Batistas “a aids é uma interferência misericordiosa do Criador, não será
isso um aviso contra essa abominação (a homossexualidade) vindo do Deus
Altíssimo?” Para alguns representantes da ala conservadora da Igreja Católica
“os flagelos sociais servem de instrumento para despertar a consciência,
exprobar a moralidade reinante, fazer o homem retornar aos caminhos de Deus”,
ou então “o vírus da aids pode aprovocar uma reação positiva como obrigar as
pessoas a revisar a sua própria sexualidade e seu modus vivendi (Ferreira 1994
apud Soares; Lima 2005, p. 34).
Além da religiosidade, uma questão importante a se considerar é que existe uma
nuance no que se refere à epidemia da aids que nem sempre é levada em consideração:
trata-se da questão da “raça”/cor. De acordo com Lopes (2003), esse aspecto raramente é
considerado na construção das imagens epidemiológicas. Negros e brancos inserem-se de
formas diferentes nas redes sociais, contudo, os especialistas do campo da aids têm evitado
considerar esse fato, anulando de forma sistemática e persistente as possibilidades de
discussão sobre vulnerabilidades e raça. É importante destacar ainda que:
O dispositivo ideológico da omissão contribui para a perpetuação de ações
discriminatórias, portanto, a disponibilidade de informações concretas e
qualificadas sobre os diferentes grupos de cor possibilitará a elaboração de
políticas públicas equânimes e a implementação de um modelo de atenção que
contemple necessidades individuais e coletivas, respeite as diferenças e promova
a igualdade (LOPES, 2003).
No que diz respeito a atitudes discriminatórias, Moura (1983) afirma que o negro é
atingido por um impacto secular que atua negativamente na formação da sua
personalidade, da sua economia individual, familiar ou grupal, em que o negro brasileiro
tem sido visto como uma peça subsidiária na formação econômica, social e cultural.
É oportuno ressaltar que “essa visão alienada serve como elemento justificador da
sua situação de marginalização no conjunto da sociedade brasileira” (MOURA, 1983). O
autor enfatiza ainda que o branco brasileiro é etnocêntrico, porque há uma herança
histórica e ideológica que ele assimilou, assim como a necessidade de que essas
camadas se resguardem contra a ameaça de perderem o lugar que ocupam nessa sociedade
de capitalismo independente. Esse histórico negativo que permeia as atitudes atuais no que
se refere aos negros, reflete a conjuntura onde os menos favorecidos são postos à parte. È
21
interessante notar que ainda hoje os negros estão incluídos nessa camada da população que
ficam à margem da sociedade.
Mediante as reflexões apresentadas, entende-se ser de suma importância à
realização deste estudo, uma vez que permite estabelecer através da percepção dos
participantes a relação entre religiosidade e a condição de ser portador do vírus da aids,
assim como questões de “raça”/cor e consequentemente, os fatores que influenciam essas
dimensões. Dessa forma, estar-se-á contribuindo com subsídios para a adoção de medidas
que visem à melhoria da qualidade de vida dos acometidos pela epidemia.
Além disso, é necessário uma reflexão por parte dos profissionais que cuidam das
pessoas soropositivas, no sentido do aprofundamento do tema, incluindo as questões
religiosas e raciais, para dessa forma saber lidar com situações que possam interferir no
tratamento dos pacientes, a partir da re-significação de conceitos. Ressalta-se a importância
do “olhar” para a espiritualidade do paciente, visto que, enquanto profissional de saúde,
deve-se contemplar um dos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) que é a
integralidade, visando assistir o paciente sob todas as dimensões.
No que tange ao princípio da integralidade, observa-se que ele se torna bastante
abrangente, podendo alcançar conotações amplas. Segundo Ciaris (2006), a integralidade
exige a multidisciplinaridade no sentido da soma, sendo assim, o conjunto das ciências
humanas e sociais tentam explicar a vida individual e social, que é sempre uma globalidade
e esta não pode ser interpretada unicamente a partir da história, da demografia, da
geografia, da economia, da sociologia, da psicologia, da antropologia e da ciência política.
Mas cada uma delas tem uma especificidade e o objetivo é fazer uma aproximação
conjunta que destaque mais os denominadores comuns que as diferenças.
Portanto, este estudo visa nortear ou ampliar os horizontes do pesquisador, visto
que uma nova visão “extra-muro” da enfermagem, na perspectiva das ciências das religiões
poderá contribuir para novos paradigmas, repercutindo na contribuição para uma melhor
assistência aos pacientes soropositivos, através da sua divulgação no âmbito dos serviços
de saúde em todos os níveis de assistência, o que poderá resultar, em consequência, na
melhoria da qualidade de vida dos pacientes.
22
Para tanto, considerando a necessidade de conhecer a interferência ocasionada pela
religião aos portadores de HIV/AIDS, assim como a vulnerabilidade no que diz respeito à
“raça”, a partir da percepção dos pacientes, surgiram os seguintes questionamentos: Como
está a qualidade de vida das pessoas soropositivas na cidade de João Pessoa? Qual a
influência exercida pela religiosidade nos pacientes com aids? Como o paciente com aids
percebe a religiosidade? Como se encontra o binômio qualidade de vida/população negra?
Na tentativa de responder aos questionamentos e concretizar as conjecturas
epistemológicas levantadas, foram traçados para esse estudo os seguintes objetivos:
1.2 Objetivos
Avaliar a qualidade de vida dos portadores de HIV/aids na cidade de João
Pessoa/PB;
Investigar a influência da religiosidade no enfrentamento da aids;
Verificar a influência da categoria “raça”/cor aliada ao fator religioso na forma de
enfrentamento do soropositivo.
Para tanto este estudo consta de seis capítulos, estando inclusas a introdução e as
considerações finais. No capitulo 2 foi realizada uma revisão da literatura como suporte
para embasar o estudo. Nesse capítulo abordamos os seguintes sub-itens: perfil
epidemiológico da aids no Brasil; dimensão da qualidade de vida entre os portadores de
HIV/aids; formas de enfrentamento da aids; religiosidade e saúde e a introdução do quesito
cor/raça nos serviços de saúde.
O capitulo 3 descreve as considerações metodológicas sobre a pesquisa, neste
sentido, delineamos esse estudo em configuração do tipo exploratória descritiva com
abordagem quanti-qualitativa. O capitulo 4, caracteriza os participantes do estudo, onde foi
traçado seu perfil sócio-econômico entre outras variáveis como sexo, religião e raça. O
capitulo 5 analisa a subjetividade dos sujeitos do estudo no que se refere à representação de
Deus a partir do contexto em que a amostra do estudo está inserida, que nesse caso
específico são os portadores de HIV/Aids.
23
2 REVISÃO DE LITERATURA
2 REVISÃO DE LITERATURA2 REVISÃO DE LITERATURA
2 REVISÃO DE LITERATURA
“Não há tentativa sem erro, não há conhecimento sem limitação, e não há
revelação sem compreender a eterna imperfeição” (Lukas & Eberle).
24
aids trouxe consigo, juntamente com os estigmas gerados ao longo da
epidemia, percalços para a reconstrução de uma nova vida, um novo modo
de encarar as situações do dia-a-dia.
O contexto das pessoas que vivem e convivem com a aids trouxe paradigmas que as
levam a encarar suas vidas sob um novo enfoque, perpassando por esse ínterim questões de
cunho religioso ou espiritual e de raça. É interessante ressaltar que, durante as últimas três
décadas, houve importantes modificações no transcurso epidemiológico da doença. Nesse
sentido, este capítulo se detém a fazer uma breve revisão de literatura sobre as reflexões
que os estudiosos da área fazem acerca do tema.
É importante destacar as considerações de Sampaio (2002), ao lembrar que
historiadores como Delumeau e Le Goff contribuíram para o conhecimento sobre a Idade
Média, no que diz respeito à construção do pensamento e das marcas profundas sobre a
concepção ocidental de mundo, os quais apontam para o fato de que as pestes, as doenças
graves sem perspectivas de curas eram atribuídas a pecados individuais ou coletivos.
Esse fato gerou ao longo da história inúmeros processos de exclusão social, de
rituais de sepultamento de pessoas vivas e incontáveis condenações à morte, como
mecanismos de proteção e “salvação” da coletividade.
2.1 Perfil epidemiológico da aids no Brasil
A epidemia da aids vem apresentando diferentes aspectos desde a sua descoberta e
disseminação. Seguindo essa linha de pensamento, Santos et al (2002) afirmam a
existência de diferentes padrões de transmissão da infecção pelo HIV que dependem do
contexto social em que os indivíduos estão inseridos, citando como exemplo o continente
africano, onde as principais formas de transmissão do HIV sempre foram as relações
heterossexuais e a transmissão materno-infantil.
Os referidos autores acrescentam que na Europa Ocidental, EUA e em vários países
da América Latina, apesar da relevância da transmissão entre Homens que fazem Sexo
com Homens (HSH), particularmente nos primórdios da epidemia, o compartilhamento de
seringas e agulhas por usuários de drogas injetáveis surgiu como uma importante forma de
disseminação do HIV.
A
25
De acordo com o Boletim Epidemiológico, no Brasil foram notificados 506.499,
entre 1980 e 2008. No que diz respeito às regiões do país, de 1980 a 1995 a região Sudeste
liderava com 81.954 casos, seguida da região Sul, com 13.051, depois região Nordeste com
8.641, a região Centro-Oeste com 5.190 e a região Norte, com 1.531. Em 2008, a região
sudeste continua no rank no número de casos em detrimento das demais regiões do país, no
entanto, se for considerado a área territorial de cada região, aliada ao número de habitantes,
pode-se perceber que houve um aumento considerável dos casos notificados nas demais
regiões onde até 2008 houve um acúmulo de casos notificados de 305.725 na região
Sudeste, 95.552 casos na região Sul, 58.348 na região Nordeste, 23.746 casos na região
Centro-Oeste e 28.719 na região Norte.
(BRASIL, 2008a).
No estado da Paraíba, os números também não deixam de ser alarmantes, que o
Boletim Epidemiológico registra um total de 3.745 casos no Estado. De acordo com Vaz
(2007), a esfera governamental em nível de estado vem trabalhando um plano de forma
participativa, que tem como base o perfil e as tendências do HIV/Aids e outras DSTs no
município. Essa autora acrescenta, que em relação aos números da aids no Estado, com
base no Sistema de Informação de Notificação de Agravos (SINAM) e na Vigilância
Epidemiológica da SMS, de 2000 a 2007, foram registrados 561 casos de pessoas
portadoras de HIV/Aids em João Pessoa. Nesse período, contabilizou-se 179 mortes, tendo
a doença como causa direta do óbito.
De acordo com Vaz (2009), deste universo de casos de HIV/Aids registrados 71%
são homens e 29% mulheres. Em João Pessoa, no ano 2002, é observado um aumento
progressivo da incidência da contaminação pelo rus, sendo que, em 2007, a faixa etária
acima dos 50 anos é um público mais propenso a contrair a doença. Vaz (2007) argumenta
que, enquanto na faixa etária dos 15 aos 49 anos existe uma tendência ao decréscimo do
HIV/Aids, na população acima dos 50 anos observa-se um aumento, que pode estar
relacionado a dois fatores: o primeiro é o uso de medicações que permitem o
prolongamento da vida sexual das pessoas nessa faixa etária; em seguida, está a questão
cultural desse público, que possui uma certa resistência ao uso do preservativo.
Com relação à incidência de morbidade por aids no país, ou seja, ao adoecimento
relacionado a contaminação pelo HIV, os dados revelam que na região Sudeste houve uma
queda dessa incidência de 24,9 %, em 1996, para 20,5 %, em 2006, havendo variação
26
nesse intervalo de tempo. Entretanto, nas demais regiões ocorre o contrário, havendo um
aumento dessa incidência, a exemplo da região Norte, onde em 2006, a incidência da
morbidade aumentou para 13,9 %, quando em 1996 essa taxa estava em torno de 4,2 %.
Enquanto isso, a região Nordeste em 1996 apresentava uma incidência de morbidade de
4,7 %, passando para 10,1, em 2006. a região Sul teve elevação da taxa de incidência de
16,8% para 25,6% no intervalo de 1996 a 2006; e a região Centro-Oeste teve uma variação
em sua incidência de morbidade, de 12,3 % para 15,8 % (BRASIL, 2007)
6
.
Em se tratando das notificações quanto ao sexo de 1980 a 2008 foram registrados
333.485 casos do sexo masculino e 172.995 casos do sexo feminino. Segundo ainda o
boletim em questão, o ano de 2003 corresponde ao ano com maior número de notificações
em ambos os sexos, correspondendo a um total de 29.927 casos notificados, sendo 18.212
e 11.715, respectivamente, para o sexo masculino e feminino (BRASIL, 2008a).
Na variável faixa etária, no que se relaciona ao sexo masculino, segundo o boletim
(BRASIL, 2008a), foram notificados casos em todas as faixas etárias de 1980 a 2008. Vale
ressaltar que o núcleo de DST/Aids agrupou as faixas etárias em grupos que correspondem
desde as crianças menores de 5 anos até pessoas com 60 anos e mais. Entretanto, ao se
fazer uma leitura apurada dos dados contidos na tabela relacionada à faixa etária de acordo
com o ano de diagnóstico, percebe-se que a maior incidência dos casos encontram-se nas
faixas etárias correspondentes aos grupos de 25 a 29 anos, 30 a 34 anos, 35 a 39 e 40 a 49
anos de idade, destacando que na faixa etária que corresponde ao grupo de 40 a 49 anos
houve um aumento crescente na taxa de incidência nos últimos anos.
no tocante ao sexo feminino, as faixas etárias foram agrupadas de forma
semelhante as do sexo masculino e, assim como no masculino, o sexo feminino apresentou
incidência significativa na mesma faixa etária observada no sexo masculino, o que torna
esses dados preocupantes, devido à probabilidade da transmissão vertical no caso de
gravidez, principalmente quando em ambos os sexos a incidência vem ocorrendo com
pessoas que estão em plena idade produtiva e reprodutiva.
6
Os dados apresentados no que se refere a incidência de morbidade por aids se relaciona ao Boletim
Epidemiológico de 2007, já que no boletim de 2008 esses dados não foram atualizados pelo Ministério da
Saúde.
27
A “raça”/cor das pessoas soropositivas passou a ser coletada em todos os censos do
boletim epidemiológico a partir do ano 2000. De acordo com os registros dos casos
notificados segundo a “raça”/cor por sexo e ano de diagnóstico do boletim epidemiológico
(BRASIL, 2008a, p.13), com relação a essa variável, no que se refere ao sexo masculino,
percebe-se que até o ano de 2008 houve uma diminuição na taxa de incidência em
indivíduos da cor branca, observando-se um percentual em torno de 63 % no ano 2000. No
ano de 2008 esses percentuais estavam em torno de 57,7%. Em contra partida, no mesmo
período, houve um crescente aumento de casos notificados de indivíduos que se
declararam de cor parda, que saltaram de 25,7% no ano 2000, para 31,7% em 2008. Os
auto-declarados pretos representavam 10,1% dos casos no ano 2000 e 9,8% em 2008. No
período observado, a variação percentual entre os homens brancos, pretos e pardos foi de -
5,3%; -0,3% e 6,0%. Assim, o percentual de diminuição entre os homens brancos
praticamente se equivale, ao aumento entre os representantes da população negra (pretos e
pardos). As diferenças entre os números observados nos remetem a afirmação de que
a atual freqüência, distribuição e causalidade das doenças mais incidentes na
população brasileira afro descendente é influenciada por estas características de
ordem genética e ainda fortemente por fatores socioeconômicos que incluem o
regime de escravatura vivido até o final do século XIX e a posterior situação de
exclusão social, presente a nossos dias, de grande parcela da população
(HAMANN;TAUIL, 2000, p. 9).
No Brasil, desde o primeiro de caso aids notificado em 1980, houve mudanças
consideráveis no perfil epidemiológico da doença, a exemplo das diversas regiões, onde a
epidemia teve como porta de entrada as regiões Sul e Sudeste, se espalhando depois para o
restante do país, assim como houve mudanças relacionadas ao sexo, “raça/cor” e idade,
entre outras variáveis.
É importante considerar também mudanças perceptíveis com relação às condições
socioeconômicas dos acometidos pela epidemia, em que se objetivamente que vem
ocorrendo um aumento da incidência dos casos entre as pessoas economicamente menos
favorecidas. É o que alguns autores denominam de “pauperização da aids” (BASTOS;
BARCELLOS, 1995; BASTOS, 1996). Corroborando com essa denominação, é
importante destacar que “a pauperização do HIV ocorreu com o avanço da disseminação
da doença, que pôde ser constatado quando se relacionaram os casos notificados com o
nível de escolaridade disponível nas fichas de notificação, permitindo traçar
aproximadamente um perfil sócio econômico dessas pessoas” (BRASIL, 2002, p. 112).
28
Santos et al (2002) também estão em sintonia com esse pensamento ao afirmarem
que a aids aparece em todas as camadas sociais, sendo que ao longo dos anos tem havido
um aumento do número de casos entre pacientes com escolaridade mais baixa e ocupações
menos qualificadas.
No âmbito do Estado da Paraíba, esse fato também se mostra evidente. De acordo
com Soares (2006), apesar da frequente veiculação pela mídia de campanhas educativas,
muitas pessoas ainda não acreditam na existência da doença, fato que pode apontar para a
premissa de que algumas pessoas ou não dão crédito suficiente a doença, ou não estão
tendo acesso a essas informações, ficando mais vulneráveis a adquirir o vírus. A autora cita
o exemplo de um morador de um bairro popular da cidade de João Pessoa que não
acreditava na existência da aids e até o momento do seu diagnóstico, ele achava que a aids
era “coisa de artista, de gente da televisão” (SILVA, 2005 apud SOARES, 2006, p. 32).
Portanto segundo Guerreiro et al (2002) e Vermelho et al (1999) pode-se inferir
que a vulnerabilidade de grupos sociais menos favorecidos, mostra-se muito mais
acentuada e que muitas pessoas ainda estão insensíveis às campanhas de conscientização, o
que reforça a necessidade de uma ampliação no que concerne à divulgação, em todos os
âmbitos, e de forma mais clara e objetiva, para que a população de uma forma geral,
independente do contexto em que esteja inserida compreenda a gravidade da situação e
introjete as informações de maneira que possa uni-las a sua prática diária.
No que tange a questão da auto declaração da cor, é preciso considerar que nem
sempre as pessoas se declaram como sendo da população negra. Portanto, neste estudo,
segue-se uma padronização proposta por Buchalla e Ayres (2007) e Silva (2007), que em
seus estudos obtiveram o resultado da população negra com o somatório das pessoas que se
declararam de cor parda com as de cor morena e preta.
Saliente-se que a introdução das cotas, nas quais se reservam vagas nas
universidades públicas para negros, índios e estudantes pobres, pode ter causado mudanças
quanto a auto-declaração da cor, não porque as pessoas se sintam à vontade para se
declararem negras mas sim visando interesses próprios. Loyola et al (2009) afirmam que a
experiência mostra que as cotas realmente se transformaram em território de interesse e
manipulação, e que no Brasil as reivindicações das cotas não são feita por multidões
29
injustiçadas, mas por grupos organizados, levando-se a crer que a discussão se transformou
em uma disputa política por um beneficio jurídico.
Buchalla e Ayres (2007) acrescentam que, embora se reconheça que a classificação
auto referida de cor seja negada ou afirmada a partir do olhar do outro, e que haja
tendência de embranquecimento das pessoas, na medida em que suas possibilidades de
acesso aos bens materiais e simbólicos aumentam, essa tendência é ampliada.
Se for levado em conta esse argumento, pode-se inferir que o percentual de
indivíduos da população negra do sexo masculino vem aumentando consideravelmente nos
últimos anos, que de acordo com o boletim em 2000 havia um percentual de 10,1 % de
cor preta e 25,7 % de cor parda (BRASIL, 2008a). Nesse sentido, somando os percentuais
apontados no boletim epidemiológico entre os pretos e os pardos, obtém-se um percentual
de 35,8% em 2000 contra 41,5 % em 2008.
Algo semelhante ocorreu entre as mulheres, quando no ano 2000 havia 60,0 % de
casos notificados de mulheres brancas contra 11,5 % de mulheres pretas e 27,4 % de
mulheres que se declararam de cor parda. Ao se fazer o mesmo somatório feito no caso
masculino, obtém-se em 2008 um aumento de 44,2 %, em detrimento de 38,9 % do ano
2000, na incidência de aids na população negra feminina (BRASIL, 2008a).
Nessa perspectiva, a cor do indivíduo mostra-se relacionada à vulnerabilidade da
epidemia. Anjos (2004, p. 97-119) ressalta que “se o Estado moderno exerce seu poder
de morte ‘deixando morrer’ o fato de os negros no Brasil estarem mais sujeitos à falta de
informação, meios de prevenção e acesso a serviços de saúde se inscreve no quadro de uma
formação social historicamente racista”. Nesse sentido, ainda de acordo com Anjos (2004),
a expansão da aids afetando mais a negros deve assim ser equacionada a um sistema de
correlações de força não projetado em sua integralidade, mas que funciona sob o
pressuposto racista da seleção de proteção da raça branca contra as demais raças.
No que tange a taxa de mortalidade, de acordo com as regiões do Brasil no período
de 1980 a 2007, a região Norte acumulou uma taxa de 5.633casos; a região Nordeste,
20.136; a região Sudeste, 137.551; a região Sul, 32.632; enquanto que a região Centro-
Oeste acumulou 9.457 casos de óbitos. Levando em consideração que no período
compreendido entre 1980 e 1993 foram notificados 110.367 casos, e deste total houve
30
40.079 óbitos, e que entre 1994 e 2008 foram notificados 368.990, tendo 165.330 óbitos,
pode-se verificar que, apesar do alto índice de mortalidade, houve uma diminuição de
óbitos no Brasil.
Sob a perspectiva de diminuição de óbitos, Santos et al (2002) afirmam que esse
fato vem ocorrendo em numerosos países, entre eles o Brasil, os quais têm apresentado nos
últimos anos uma tendência de queda dos óbitos por aids, com significativa mudança no
perfil de mortalidade da epidemia. Entretanto, segundo os autores em foco, a crescente
desigualdade entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento reflete-se tanto na
magnitude da propagação do HIV quanto na mortalidade por essa doença.
Na medida em que se acentuam as diferenças de acesso ao tratamento, a
mortalidade diminui nos países mais ricos e aumenta nos países mais pobres, exceção feita
ao Brasil, que é um dos poucos países do mundo que adotaram a política de distribuição
gratuita de antiretrovirais, assim como de preservativos.
Torna-se importante levar em consideração a variável relacionada aos casos de
óbitos no que diz respeito a “raça/cor” e ao sexo por ano de diagnóstico. Em 1998, ano a
partir do qual foram registrados casos de óbitos, fazendo-se distinção entre “raça/cor”, dos
casos do sexo masculino registrados, 64,8 % eram de cor branca, 10,6 % de cor preta e
23,9 % de cor parda. No entanto, no ano de 2007, dos casos notificados, 52,4 % eram de
cor branca, 12,6 % de cor preta e 34,6 % de cor parda, o que leva a inferir, que mais uma
vez, somando os percentuais dos indivíduos que se declararam de cor preta com os de cor
parda, teremos um total de 34,5 % em 1998 contra um total de 47,6 % em 2007, ou seja,
houve um aumento de 13,1 % de casos de óbitos na raça negra masculina entre 1998 e
2007 (BRASIL, 2008a).
Com relação à população feminina, nota-se também mudanças quanto ao perfil de
mortalidade na variável “raça/cor”, quando, em 1998, foram registrados um percentual de
58,9 % de óbitos em mulheres brancas, 12,8 % em mulheres pretas e 27,3 % em mulheres
pardas, enquanto que em 2007, 50,5 % dos casos de óbitos foram em mulheres brancas,
15,3 % em mulheres pretas e 39,9 % em mulheres pardas. Seguindo a mesma linha de
raciocínio do somatório dos dados entre mulheres pretas e pardas como parte do mesmo
grupo racial, obtém-se em 1998 um percentual de 40,1 % de óbitos na população negra
feminina, contra um percentual de 55,2 % no ano de 2007 (BRASIL, 2008a).
31
2.2 Enfoque na dimensão da Qualidade de Vida (QV) entre os portadores de HIV/aids
Em seu advento, a aids era sinônimo de morte. No entanto, com o avanço das
descobertas científicas, principalmente, com a introdução das medicações que minimizam
a quantidade de vírus circulante no sangue ao mesmo tempo em que elevam o número de
células de defesa do organismo, os chamados antirretrovirais contribuíram para a melhora
da QV dos portadores de HIV/AIDS.
Segundo Oliveira; Santos e Mello (2001), a possibilidade do tratamento específico
para o HIV surge em 1987 com a identificação do primeiro antirretroviral, o AZT, sendo
que esse fármaco fora desenvolvido na década de 60 para o tratamento de neoplasias
sanguíneas. Corroborando com a afirmação de que essa terapia tem contribuído para a
melhoria da QV dos portadores do vírus HIV, pode-se destacar que ela é “eficaz para
fortalecer o sistema imunológico, suprimir a presença de vírus no sangue e reduzir as
infecções oportunistas” (GIV, 2003, p.8).
A Terapia Antirretroviral (TARV) conta com 17 medicamentos que estão divididos
em quatro classes: os inibidores de transcriptase reversa, análogos de nucleosídeos ou
nucleotídeo, que atuam na enzima transcriptase reversa, incorporando-se à cadeia de DNA
que o vírus cria, e tornam essa cadeia defeituosa, impedindo que o vírus se reproduza; os
inibidores de transcriptase reversa não análogos de nucleosídeos, estes bloqueiam
diretamente a ação da enzima, sua multiplicação e o desenvolvimento da infestação no
organismo; os inibidores de protease, que impedem a produção de novas cópias de células
infectadas com HIV e os inibidores de fusão que impedem a entrada do vírus na célula.
(Brasil, 2008b).
Portanto nos dias atuais falar do cliente com aids reporta não mais à morte, mas à
possibilidade de investimentos em sua QV. Nesse sentido, faz-se necessário uma
abordagem acerca desse tema, ou seja, da qualidade de vida tão difundida no âmbito da
saúde.
Seidl e Zannon (2004) afirmam que indícios de que o termo qualidade de vida
surgiu pela primeira vez na literatura na década de 30, segundo um levantamento de
estudos que tinham por objetivo a sua definição e que faziam referência à avaliação da QV.
No entanto, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), através do Grupo
32
Whoqol (1998), a expressão qualidade de vida foi empregada pela primeira vez em 1964,
pelo presidente dos Estados Unidos Lyndon Johnson, quando declarou que os padrões de
vida não poderiam ser medidos pelos balanços dos bancos, mas pela qualidade de vida que
eles proporcionavam às pessoas. Permeando tudo isso, encontra-se o fato histórico de que,
nos Estados Unidos, após a segunda Guerra Mundial, o termo qualidade de vida passou a
ser utilizado com um sentido de “vida boa”, referindo-se à conquista de bens materiais, ao
fato de se possuir: casa, carro, aparelhos domésticos, investimentos financeiros, boa
aposentadoria, entre outros (PASCHOAL, 2000; KAWAKAME; MIYADAHIRA, 2005).
Na área da saúde, segundo Seidl e Zannon (2004) o interesse pelo conceito de QV é
relativamente recente e decorre, em parte, dos novos paradigmas que têm influenciado as
políticas e as práticas do setor nas últimas décadas. As autoras afirmam que os
determinantes e condicionantes do processo saúde-doença são multifatoriais e complexos,
assim, saúde e doença configuram processos compreendidos como um continuum,
relacionados aos aspectos econômicos, socioculturais, à experiência pessoal e estilos de
vida. Nesse sentido, a melhoria da QV passou a ser um dos resultados esperados, tanto das
práticas assistenciais quanto das políticas públicas para o setor nos campos da promoção da
saúde e da prevenção de doenças.
Para Araújo (2007), a expressão qualidade de vida tem sido muito utilizada na
atualidade, mas nem sempre é empregada corretamente, pois tem sido vista no sentido
material, como significando “vida boa é possuir casa de praia e de campo, barcos de
recreio, entre outros, muito lazer e pouco trabalho”. Araújo (2007) acrescenta que a
expressão qualidade de vida passa a ser foco, nas últimas décadas, de estudos constantes,
não apenas em termos teóricos, mas também na aplicabilidade em todos os campos da
existência e da relação humana.
Desse modo, o interesse no conceito de qualidade de vida refere-se a um
movimento dentro das ciências humanas e biológicas, que procura enfatizar parâmetros
mais amplos, não se detendo apenas em controle de sintomas, em diminuição da
mortalidade ou em aumento da expectativa de vida. No entanto, apesar de não haver um
consenso em relação ao conceito de QV, é importante ressaltar a existência de três aspectos
fundamentais desse construto, como: subjetividade, multidimensionalidade, e dimensões
positivas e negativas (FLECK et al., 1999).
33
Seidl e Zannon (2004) também comungam dessa afirmação, ao dizerem que a partir
dos anos 90 parece se consolidar um consenso entre os estudiosos da área quanto a dois
aspectos relevantes do conceito de QV: subjetividade e multidimensionalidade. De acordo
com as autoras, no que se relaciona à subjetividade, esse é um aspecto que leva em
consideração a percepção da pessoa sobre o seu estado de saúde e sobre os aspectos não-
médicos do seu contexto de vida; em outras palavras, como o indivíduo avalia a sua
situação pessoal em cada uma das dimensões relacionadas à qualidade de vida. Já o
consenso quanto à multidimensionalidade refere-se ao reconhecimento de que o construto
é composto por diferentes dimensões, e a identificação dessas dimensões tem sido objeto
de pesquisa científica, em estudos empíricos, usando metodologias qualitativas e
quantitativas.
2.3 Estratégias subjetivas no enfrentamento da aids
A construção da história da aids se configurou como uma doença relacionada ao
desvio, à sexualidade e à morte, cuja revelação para a sociedade tráz sérios problemas para
o cotidiano das pessoas. Portanto a aids, quando diagnosticada, assola seu portador de
dúvidas e incertezas, dúvidas a respeito de desenvolvê-la ou não e do quão doloroso e
inevitável poderá ser o progresso da doença, ou seja, algumas pessoas não vêm
perspectivas futuras.
Embora haja avanços sobre a aids, a exemplo da sua forma de transmissão, terapias
medicamentosas mais eficazes e marcadores laboratoriais altamente precisos terem
contribuído sobremaneira para os manejos colaborativos no enfrentamento da doença,
ainda é evidente o preconceito que as pessoas sofrem após a realização do diagnóstico, o
que pode tornar o momento da confirmação crucial e desafiador para o acometido pelo
vírus. Nesse sentido, pode-se evidenciar o que aponta Gadelha (2001) ao afirmar que a
condição de soropositivo é sempre descrita de forma muito extrema, como se fosse uma
“morte”, uma sensação de perda de sentidos. Carvalho e Galvão (2006) dizem que as
pessoas que vivem com HIV/aids enfrentam um conjunto de problemas específicos, pois
muitos pacientes têm que conviver com o estigma e a discriminação, o que os leva a
ficarem reticentes em falar de seu estado de infectado, fato que pode contribuir para
aumentar seus sentimentos de isolamento, assim como a tendência em nunca revelar sua
condição de soropositivo.
34
No entanto percebe-se que, apesar de todos os transtornos ocorridos com a
confirmação da soropositividade, os portadores do vírus mantêm sempre uma expectativa,
muitos na verdade buscam nessa expectativa um sentido de vida. Gadelha (2001) confirma
esse raciocínio ao dizer que “os portadores do HIV conseguem reelaborar a sua vida após a
descoberta do contágio”.
Silva (2008), ao fazer uma relação com o que Guattari e Rolnik (1993) chamam de
“desterritorialização” que é o momento em que o indivíduo percebe que seu território
existencial não faz mais sentido, uma vez que ocorre uma espécie de desabamento, uma
ruptura de sentidos, afirma que para as pessoas que se descobrem portadoras do HIV, seus
territórios, que pareciam tão estáveis, desabam, o porque os portadores não possam mais
realizar seus projetos, mas sim porque eles sofreram uma alteração nos sentidos que eles
atribuíram a própria vida. Sentem um esvaziamento de sentidos, havendo dessa forma a
necessidade de reelaborar os seus conceitos, de criar novas perspectivas de vida, de
construir um novo território existencial e, portanto, uma nova expectativa de vida.
Nem sempre é cil identificar as formas de enfrentamento que as pessoas utilizam
para “driblar” situações estressantes, ou situações de doenças nas quais estão envolvidas.
Seidl; Zannon e Troccoli (2005) dizem que, após mais de 30 anos de pesquisas, ainda
parece haver divergências quanto a como identificar e medir estratégias de enfrentamento
nos estudos publicados ultimamente, necessitando da construção de instrumentos que
preconizem a compreensão do que as pessoas fazem e/ou pensam diante de situações
específicas que demandam esforços adaptativos, assim como, o desenvolvimento de
medidas sistematizadas, fidedignas e válidas, que captem a utilização das estratégias de
enfrentamento em situações diversas ou ao longo de uma mesma situação.
Enfrentar doenças crônicas, cuja cura ainda está configurada como uma
possibilidade e não como uma certeza, como a aids por exemplo, leva os acometidos a
enfrentarem tal situação sob vários aspectos, entre eles os relacionados na confiança das
medidas, ou nos manejos clínicos para o controle do vírus no organismo, ou o
enfrentamento pode estar atrelado a questões mais subjetivas, como a confiança em uma
força que lhes proporcionem equilíbrio físico e emocional, podendo esse equilíbrio ser
encontrado em sua religião ou espiritualidade.
35
Para um melhor entendimento acerca do enfrentamento, sem a pretensão de esgotar
o assunto, é importante registrar o que alguns pesquisadores entendem sobre esse termo.
Partindo do conceito de que enfrentamentos são “esforços cognitivos voltados para
o manejo de exigências ou demandas internas ou externas” (FOLKMAN, et al 1998, apud
FARIA; SEIDL, 2006), a seleção das respostas de enfrentamento diante de situações
estressantes na perspectiva da mediação de avaliações cognitivas, podem ocorrer em dois
momentos; denominados de avaliação primária e avaliação secundária. Especificamente na
avaliação primária, o indivíduo analisa se a situação é potencialmente desafiadora,
prejudicial ou ameaçadora, enquanto que na avaliação secundária o indivíduo examina seus
recursos disponíveis para enfrentar a situação estressante, buscando alternativas mediante
as quais a ameaça ou o dano pode ser contornado ou quais recompensas podem ser obtidas,
ressaltando que as conclusões decorrentes dessas avaliações iniciais podem ser
modificadas no transcorrer do processo.
Antoniazzi; Dell'Aglio e Bandeira
(1998)
dizem que o enfrentamento tem sido
estudado também em função de seus estilos, estratégias ou como processo. Sendo que os
estilos estão mais relacionados a características de personalidade do indivíduo ou aos
resultados do próprio enfrentamento, enquanto as estratégias referem-se a cognições ou a
comportamentos direcionados a uma situação específica causadora de estresse. Já no
enfrentamento enquanto processo as respostas apresentadas por uma pessoa podem mudar
ao longo do tempo e do contexto em que ocorre. Dessa forma, um indivíduo pode
apresentar estratégias de enfrentamento que variam dependendo da situação na qual está
inserido.
Faria e Seidl (2006) argumentam que se deve levar em consideração que o
enfrentamento é influenciado pela cultura, já que ela pode modelar, por exemplo, as
avaliações da situação, o sistema de orientação das pessoas no mundo e as estratégias de
enfrentamento que podem ser ensinadas e privilegiadas em um contexto sociocultural, que
pode não ser o mesmo em decorrência da diversidade cultural existente. È evidente que
essa diversidade é percebida não só em nível nacional, mas em todos os lugares do mundo.
Reafirmando a diversidade de enfrentamentos que as pessoas buscam para
contornar, ou mesmo reelaborar uma nova dimensão para sua vida, Carvalho e Galvão
(2006) avaliaram o enfrentamento da aids entre mulheres, ressaltando que para a mulher o
36
diagnóstico pode acarretar traumas de natureza física, emocional e social, de modo que
abordar aids entre mulheres pode não ser tão simples, visto que discutir esse assunto exige
levantar questões relacionadas ao casamento, à maternidade, à sexualidade, à relação de
gênero e a outros aspectos íntimos da natureza feminina. Nesse sentido, em suas pesquisas,
as referidas autoras detectaram quatro momentos na fase de enfrentamento após o
diagnóstico da aids: fragilidade diante da descoberta da doença; ocultamento do
diagnóstico; convivência com a doença e medo da morte. Portanto, para as mulheres, o
diagnóstico de soropositividade traz consigo uma profunda ruptura, uma desordem, uma
desorientação, o futuro no momento do diagnóstico deixa de existir destruindo também o
seu presente, trazendo ainda uma série de consequências para a vida, como por exemplo a
desconstrução de sua família.
No que se relaciona à fragilidade diante do diagnóstico da aids, Carvalho e Galvão
(2006) dizem que essa fragilidade pode ocorrer devido ao fato de que esse diagnóstico
representa na visão das pessoas com pouco conhecimento sobre o assunto, um evento
catastrófico, por estar associado à evolução clínica e à rápida deterioração do indivíduo,
além de não se dispor de qualquer tratamento curativo e de apresentar um prognóstico
extremamente ruim. Assim, o fato de saber ser portadora de doença letal gera uma
diversidade de sentimentos angustiantes, como o medo, a vergonha, a ansiedade e a
depressão, ainda associados a todos esses sentimentos, vivenciam o estigma, o preconceito,
o isolamento e, muitas vezes, o abandono.
Outro momento na fase de enfrentamento é o ocultamento do diagnóstico, fato que
pode está associado ao inicio da epidemia em que doença estava atrelada a
comportamentos socialmente desviantes e, por isso mesmo, sujeitos à condenação da
sociedade. Portanto, os portadores sentem medo de tornar pública sua condição de
infectados. Assim, um dos dilemas vivido pelas mulheres é a revelação do diagnóstico,
que pode está associada às dificuldades que enfrentarão em decorrência da sua infecção.
Desse modo, elas são levadas a ocultar o seu diagnóstico devido ao medo de serem
estigmatizadas, rejeitadas, ou que se tornem vítimas do preconceito das pessoas.
O medo do julgamento e da exclusão social desencoraja a declaração de
responsabilidade pessoal pela ocorrência do infortúnio, criando um portador
clandestino. Na condição de clandestinidade, pelo menos por algum tempo, o
paciente não sofre perdas, seja do parceiro afetivo, do emprego, dos amigos ou
de sua família (CARVALHO; GALVÃO, 2006, p. 93)
.
37
Conviver com a doença, segundo Carvalho e Galvão (2006), levam as mulheres a
se depararem com situações de discriminação, segregação, falta de recursos sociais e
financeiros, ruptura nas relações afetivas e problemas com a sexualidade. Diante desse
panorama, viver e enfrentar a doença torna-se cada vez mais problemático e, como
consequência, a qualidade de vida pode ser comprometida. A dificuldade de enfrentamento
da doença acaba gerando entre os doentes um prejuízo ao próprio tratamento. Essa situação
ocorre em detrimento da inabilidade do paciente para enfrentar as diversas situações de
estresse causadas após o diagnóstico da infecção pelo HIV.
No que se relaciona ao medo da morte, quarto momento identificado nos estudos de
Carvalho e Galvão (2006), a relação entre a doença e a morte parece inevitável, trazendo
aspectos relacionados com a vida íntima e com profundas repercussões na vida social do
doente. A vida é colocada em questionamento para a grande maioria das pessoas, que
passam a rever suas histórias, seus planos e reavaliar aquilo que consideram essencial.
Mesmo com os avanços no diagnóstico e tratamento, persiste a idéia da aids como morte,
seja física ou dos projetos de futuro. Essa idéia estigmatizante pode afastar o portador de
HIV/aids e seus cuidadores do usufruto da sua vida pessoal e social, produzindo sofrimento
físico e mental.
O diagnóstico do HIV pode trazer uma mensagem de morte para muitas pessoas,
uma vez que carrega consigo a ameaça dos sonhos desfeitos o universo de significações e
desejos que dava o sentido a vida das pessoas, e esse sentido passa então a ser questionado.
É interessante notar que no meio científico, muitas vezes, comete-se o erro de discutir
muito mais a questão da morte pela aids que propriamente a vida com aids. Em
contrapartida, os portadores do HIV/aids nem sempre se preocupam apenas com a questão
da morte, mas, sim, buscam incessantemente o direito à vida, a certas situações, como
filhos pequenos, projetos de vida em construção, novos relacionamentos, enfim sonhos que
conduzem esses pacientes a enfrentarem a morte em busca da vida.
Zannon e Troccoli (2005) percebem que o enfrentamento pode ser alcançado sob
outros enfoques, ressaltando a existência de dois tipos de enfrentamentos, um focalizado
no problema e outro focalizado na emoção, podendo-se incluir nesse caso a busca por
práticas religiosas, cuja repercussão influencia diretamente na qualidade de vida do
portador do vírus.
38
De acordo com esses pesquisadores observa-se que o enfrentamento do HIV
repercute diretamente na qualidade de vida do acometido, devido a isso, os escores obtidos
nas diversas pesquisas podem variar porque as pessoas soropostivas mais pobres podem
apresentar médias mais baixas, exatamente porque a qualidade de vida é diferente, tendo
uma relação com o contexto social em que o individuo está inserido. Nesse caso, algumas
variáveis podem entrar em questão como, por exemplo: a qualidade de vida geral, o bem-
estar emocional, o funcionamento cognitivo, assim como o funcionamento social.É
interessante ressaltar que, além desses aspectos, a condição do portador, ou seja, o
momento em que o portador está enquadrado na doença, como sendo sintomático ou
assintomático, pode mudar os resultados das avaliações, já que entre as inúmeras
dificuldades, algumas pessoas enfrentam, além da condição da enfermidade, carências
sociais e econômicas que repercutem com certeza na sua qualidade de vida.
2.4 Religiosidade e Saúde
Prandi (1996) argumenta que no inicio do culo XX, estava-se inserido em um
momento conhecido como século da razão, onde a hegemonia da ciência e as formas de
explicação do mundo estavam desencantadas, desprovidas de um apelo ao sobrenatural, ou
seja, as pessoas não buscavamm explicações que pudessem fugir do seu controle
racional. No que se refere ao desencantamento do mundo podemos destacar, que esse
período apresentava muitos problemas relacionados à saúde, educação, habitação,
emprego, ou seja, problemas relacionados a tudo aquilo que o homem necessita para ter no
mínimo uma vida mais digna, em que diferentes instituições desvinculadas de sacralidade
são, ou deveriam ser, responsáveis por solucionar tal situação, sendo este aspecto o que
autor chama de mundo desencantado.
Desencantado porque diante das questões problemáticas referidas, as pessoas
podem buscar mecanismos de soluções, fora da competência religiosa, de forma que
ninguém precisaria consultar a religião para resolver questões que não estão diretamente
relacionadas ao sagrado. No entanto, no mundo contemporâneo, imaginava-se que aquilo
que foi a grande fonte de transcendência e ao mesmo tempo de orientação racional na
formação da sociedade ocidental, que foi a religião cristã, está desencantada. A princípio, a
religião protestante e posteriormente, a católica, deveria consolidar os princípios de forma
que as pessoas deveriam deveríamos estar mais dependentes de soluções oferecidas pelo
39
pensamento racional, seja ele científico ou não, em detrimento do pensamento mágico,
religioso ou não (PRANDI, 1996).
No âmbito da saúde, a busca de suas explicações, assim como de explicações da
doença como causas sobrenaturais ou como manifestação da vontade dos deuses, segundo
Monteiro (1999), é uma realidade observada em diferentes civilizações desde a
antiguidade, onde cada sociedade com maior ou menor intensidade recorreu às tradições
religiosas disponíveis para ler e enfrentar seu cotidiano. Reafirmando o exposto, Faria e
Seidl (2006) argumentam que, em contextos de cuidados à saúde, observa-se alusão
frequente à influência de aspectos religiosos como auxiliares na cura e no tratamento de
enfermidades e ainda, que pessoas atribuem a Deus o aparecimento ou a resolução dos
problemas de saúde que as acometem recorrendo, muitas vezes, a Ele como recurso
cognitivo, emocional ou comportamental para enfrentá-los.
No contexto da epidemia da aids, de acordo com Soares (2001), o imaginário
social, povoado de compreensões quanto a determinadas doenças graves estarem
relacionadas ao mal que advém sobre uma sociedade e intimamente relacionadas à culpa
de suas vítimas, teve no advento da aids a oportunidade de substituir doenças como a lepra,
na Idade Média, e a tuberculose, no século XIX, todas marcadas por um conjunto
simbólico negativo que de tempos em tempos reincidem nessa construção simbólica que
associa doença e cura a processos de bem e mal, com contornos religiosos. Em se tratando
de dimensões religiosas, Sampaio (2002) enfatiza que:
Na tradição judaico-cristã, uma das matrizes religiosas predominantes na
realidade brasileira, prevaleceu uma concepção teológica sacerdotal oriunda do
século IV a.C., na qual as purezas e impurezas do corpo manifestavam a bênção
ou castigo de Deus. A despeito de não ser essa a única concepção teológica
veiculada na Bíblia sobre saúde e doença, foi essa a que prevaleceu em sintonia
com outros simbolismos culturais e religiosos de outras matrizes.
No entanto, é importante destacar, de acordo com Ellison (1994) apud Faria e Seidl
(2006), que certas pessoas costumam recorrer a instituições religiosas em tempos de
doenças severas, pelo fato de elas estarem historicamente identificadas com a oferta de
apoio emocional, prática assistencial e caridade aos enfermos e necessitados.
Diante o exposto, torna-se relevante diferenciar religião de religiosidade, no sentido
da etimologia da palavra, para percebermos a dicotomia dessas duas palavras que, apesar
de estarem intrinsecamente ligadas, podem possuir conotações diferentes.
40
A religiosidade, segundo Santos (2002), pode ser tratada como fundamentalmente o
modo como o cristianismo se encarnou nas várias culturas e grupos étnicos, e é
profundamente vivido e se manifesta no povo. Sendo que dessa religiosidade popular,
manifestada no sentido de Deus e da sua providência, na proteção de Nossa Senhora e dos
Santos, e na atitude fundamental diante da vida e da morte, deriva as devoções, ou seja,
rosário, novenas, peregrinações, celebrações sacramentais etc. Ferreira (1999) define
religiosidade como a palavra que deriva do latim religiositate, que significa “qualidade de
religioso; disposição ou tendência para a religião ou as coisas sagradas; escrúpulos
religiosos.
religião pode ser conceituada como “uma forma concreta, visível e social, de
relacionamento pessoal e comunitário com Deus” (SCHLESSINGER; PORTO, 1982). Em
se tratando da etimologia da palavra, o termo religião vem do latim Religio, que significa:
Fidelidade ao dever, lealdade, consciência do dever, escrúpulo religioso,
obrigação religiosa, culto religioso, práticas religiosas, religião, que Cícero (106-
43 a.C.) liga o verbo latim releges, ‘retomar o que tinha sido abandonado, tornar
a revestir, reler’, enquanto que os autores tardios como Lactâncio (260 e 325
d.C.) e Santo Agostinho (354-430 d.C.) derivam do latim religáre ‘ligar, apertar,
atar’. Nos estudiosos étimos, que o latim religio muitas vezes significa o
mesmo que o latim obligatio ‘ação de prender-se, de se ligar, de tornar a si uma
obrigação’ (ENCICLOPEDIA MIRADOR INTERNACIONAL, 1980).
Schlessinger e Porto (1982) corroboram com essa afirmação, quando dizem que
religião tem sentido de tornar a unir (re-ligare) e de trazer de novo à mente, pressupondo
algo que, em algum momento, já esteve unido, e hoje não está mais, algo que está além dos
homens, que o transcende e ao mesmo tempo está nele. Já Ferreira (1999) define religião
como “crença na existência de uma força ou forças sobrenaturais, considerada(s) como
criadora(s) do Universo, e que como tal deve(m) ser adorada(s) e obedecida(s)” ou ainda
como “a manifestação de tal crença por meio de doutrina e ritual próprios, que envolvem,
em geral, preceitos éticos”.
Diante dessas considerações, pode-se inferir que a religião exerce papel importante
na vida dos seres humanos que acreditam se sentirem confortados por uma força superior
que lhes dá sentido para viver nesse plano espiritual, e justamente em momentos de
“crises” psicológicas, nas quais incluem-se as experiências com doenças graves, essa pode
ser uma válvula de escape, para onde poderão ser redirecionadas todas as suas angústias.
41
É importante destacar, de acordo com Schlessinger e Porto (1982), que não
povo, por mais primitivo que seja, sem religião, e ainda que, considerando a religião com
sua estrutura e objetivo, descobrem-se alguns elementos que são próprios das religiões
como: mitos, ritos, elementos de filosofia natural, dogmas e artigos de fé, moral,
meditação, oração e místico. No entanto, dependendo da composição, esses elementos
podem variar de religião para religião.
2.5 Questão da cor/raça nos serviços de saúde
Nos anos recentes, os estudos sobre desigualdade racial, bem como os avanços
políticos observados no interior do movimento negro, teriam colocado definitivamente em
risco o mito da democracia racial. Costa (2002) argumenta que em tal corpo ideológico, a
afirmação de uma “brasilidade mestiça” como unidade da diversidade é mantida como pré-
requisito da constituição da comunidade política nacional. Não obstante, em sua
transposição para a política, tal ideário ganha novas determinações, e a principal delas
corresponde à crença na construção de um futuro próspero comum como objetivo universal
e lugar imaginário no qual todos os membros da nação, separados pelo passado distinto, se
encontrariam.
Costa (2002) acrescenta que a incursão dos estudos raciais no processo de formação
nacional apresenta uma conotação positiva, já que eles identificam um valioso contra ponto
às tentativas impróprias observadas nos últimos anos de reabilitação do pensamento
político, como se tratasse de expressão da tolerância e do apelo pela convivência plural.
A aplicação do conceito de “raça” é hoje uma necessidade teórica e prática nos
estudos e nos processos sobre identidade étnica, conquista de direitos e justiça social de
grupos fenotipicamente distintos. Nesse sentido, a erradicação do racismo e a luta contra
raça como um critério de segregação social e de exclusão de oportunidades requer que o
termo ou conceitos correlatos como cor e fenótipo seja mantido nas coletas de dados e nos
registros e notificações das instituições, públicas ou particulares, ao menos enquanto
perdurar essa situação de flagrante desigualdade (PNUD, 2005).
A introdução da variável “raça/cor” é uma questão que vem sendo reivindicada pelo
movimento negro para sua inclusão nas estatísticas oficiais de saúde no Brasil bastante
tempo. Sendo importante destacar que “com a justificativa equivocada de que a inclusão
42
desse quesito poderia ser interpretada como uma medida discriminatória e/ou racista, as
autoridades sanitárias do país furtaram-se, durante muito tempo, de incluir esse dado nas
estatísticas de saúde” (GIOVANETTI et al 2007, p. 164).
Machado e Carvalho (2004) acrescentam que no Brasil impera um discurso que
enfatiza uma democracia racial em que os indivíduos usufruem os mesmos direitos civis e
sociais, não havendo, portanto, a necessidade de discriminá-los. No enfoque dessa
filosofia, a informação sobre cor/raça constante nos censos demográficos de 1940 e 1950
foi excluída do censo de 1960, com consequente ausência de informações sobre a
demografia da população negra por um longo período. Enfatizando o discurso acerca dessa
variável deve-se levar em consideração que
a noção equivocada de que os piores indicadores de saúdemortalidade infantil,
mortalidade materna e taxas de mortalidade da população adulta encontrados na
população negra devem-se à questão socioeconômica e não tem relação com a
questão étnico-racial perpetua as dificuldades para a implantação concreta e a
análise adequada do quesito cor/raça no setor saúde (BATISTA;
KALCHMANN, 2005, p. 165)
Nesse sentido, Bento (1999) diz que, ao longo do tempo, diversas tentativas de
obtenção da informação sobre o quesito cor/raça têm sido efetuadas no setor saúde, sem,
entretanto, ter conseguido, até os dias de hoje, uma coleta contínua e sistemática desse
dado.
Ao contrário dos bancos de dados de outros países, como os Estados Unidos, que
têm na raça uma variável fundamental, a inclusão dessa variável nos grandes bancos de
dados nacionais no Brasil, segundo Giovanetti et al (2007), não é recente como ainda
bastante deficiente, seja na perspectiva da utilização de classificações contrastantes nos
diferentes sistemas de informação, seja na perspectiva do não preenchimento da variável.
Fry et al (2007) afirmam que, no Brasil, a introdução da variável “raça” nos bancos
de dados nacionais que sistematizam, direta ou indiretamente, informações referentes ao
HIV/AIDS, como no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), em 1996, ou no
Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), em 2001, é tão recente que
impossibilita a análise de tendências a longo prazo. Sendo assim, a variável “cor/raça”,
terminologia utilizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2001), e
pelo PN-DST/AIDS (BRASIL, 2008a) na base de dados sobre aids, serve de exemplo
43
acerca dessas dificuldades. É interessante mencionar que os autores enfatizam que são
análises dessa natureza que de fato importam em uma perspectiva epidemiológica.
Em estudo realizado por Fry et al (2007), os autores observam que, em 2000,
somente 3,9% dos registros apresentavam a classificação racial dos casos, sendo que uma
proporção mais expressiva desse preenchimento somente aconteceu a partir de 2003,
quando mais de dois terços dos casos passaram a contar com essa informação. Isso implica
dizer que com proporções de respostas tão baixas, qualquer interpretação pode se tornar
inconclusiva ou não mostrar a realidade do contexto estudado.
De acordo com Osório (2003), as definições do IBGE para as categorias de
cor/raça/etnia são: preto: de pele bem escura; branco: de aparência e de pele clara;
amarelo: asiáticos (japonês, chinês e coreano); pardo: de pele mais clara (filhos de branco
e preto, indígena e preto, indígena e branco) e indígena: descendentes de índios brasileiros.
Fry et al (2007), afirmam ainda que uma outra complicação no caso das análises
epidemiológicas utilizando a variável “cor/raça” relaciona-se aos diferentes sistemas de
classificação utilizados autorreferida (autoclassificação) ou por terceiros
(heteroclassificação), porque enquanto o quesito “cor/raça” no banco de dados do PN-
DST/AIDS deriva de classificação feita por profissionais de saúde (via de regra, médicos),
na construção das taxas de prevalência de aids segundo “cor/raça” são utilizados nos
denominadores os dados do IBGE, que derivam de autoclassificação.
44
3 CONSIDERAÇÕES METODOLÓGIC
3 CONSIDERAÇÕES METODOLÓGIC3 CONSIDERAÇÕES METODOLÓGIC
3 CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS
ASAS
AS
“Toda discriminação é insana e inumana. Nunca se diminua ou se considere
superior a alguém. Estenda as mãos, a partir de hoje, para as pessoas que
pensam diferente de você. Você também comete erros e nem sempre é fácil
suportá-los” (Augusto Cury)
45
Conhecimento é uma capacidade própria do homem que pode ser analisado,
de acordo com Mendonça (2006), a partir da multidisciplinaridade, podendo
esse conhecimento ser obtido a partir do enfoque popular, filosófico ou científico no
processo de apreensão da realidade do objeto de estudo. No entanto, apesar de haver uma
separação metodológica, segundo o autor em foco, entre os tipos de conhecimentos, o
sujeito cognoscente pode penetrar nas diversas áreas. Ao estudar o homem, por exemplo,
pode-se tirar uma série de conclusões sobre sua atuação na sociedade, baseada no senso
comum ou na experiência cotidiana; pode-se analisá-lo como um ser biológico, verificando
através de investigação experimental as relações existentes entre determinados órgãos e
suas funções; pode-se questioná-lo quanto a sua origem e destino ou liberdade; enfim,
pode-se observá-lo como ser criado pela divindade à sua imagem e semelhança e meditar
sobre o que dele dizem os livros sagrados.
Portanto, as ciências das religiões permitem a possibilidade de estudar o fenômeno
religioso no âmbito da multidisciplinaridade. Nesse sentido, o referencial metodológico
utilizado neste estudo aponta para uma ótica de mundo no contexto da saúde. Desse modo,
sua construção engloba a opinião de que o ser humano, em momentos de fragilidade, busca
na espiritualidade uma âncora, por compreender que esse enfoque precisa ser vivenciado
mais intensamente como suporte, ou mesmo como alternativa para enfrentar os problemas
emocionais acarretados pela doença.
A partir desse breve entendimento, optou-se por um estudo configurado como do
tipo exploratório com uma abordagem integrada quantitativa e qualitativa, por considerá-lo
adequado para o seu delineamento. Segundo Polit; Beck e Hungler (2004) esta é uma
tendência que obtém destaque, quando a abordagem quantitativa proporciona resposta mais
exata, imparcial e interpretável possível e propicia resultados replicáveis, enquanto que a
abordagem qualitativa tende a ser criativa e intuitiva, chegando ao entendimento holístico
de um fenômeno. Ainda para os autores, um delineamento integrado que combina dados
quantitativos e qualitativos em uma única investigação (pesquisa multimétodo) pode ser
vantajoso, porque as abordagens quanti-qualitativas possuem pontos complementares.
Quanto à abordagem qualitativa, de acordo com Denzin e Lincoln (2006), essa é
uma tendência que passou a ser empregada em estudos nas diversas áreas do
conhecimento, nas ciências sociais e comportamentais, em que estão incluídas as áreas de
O
46
educação, história, ciência política, medicina, enfermagem, assistência social e
comunicações.
Carvalho e Galvão (2006) afirmam que, no âmbito da enfermagem, a pesquisa
qualitativa combina as naturezas científicas e artísticas para aumentar a compreensão da
experiência de saúde humana, e estudam fenômenos em seus cenários naturais, tentando
compreender, ou interpretar, em termos dos significados que as pessoas trazem para eles.
Assim, esse tipo de pesquisa baseia-se na premissa de que os conhecimentos sobre os
indivíduos só são possíveis com a descrição da experiência humana, tal como ela é vivida e
tal como ela é definida por seus próprios atores.
No que se refere à abordagem quantitativa, de acordo com Tanaka; Melo (2001),
essa busca descrever significados que são considerados como inerentes aos objetos e atos,
por isso, é definida como objetiva, tendo como característica permitir uma abordagem
focalizada, pontual e estruturada. A coleta de dados é realizada através da obtenção de
respostas estruturadas e são utilizadas técnicas de análise indutivas, isto é, partem do geral
para o particular, podendo ser os resultados generalizáveis.
Este estudo foi desenvolvido em uma unidade ambulatorial do Hospital de
referência para Doenças Infecciosas de João Pessoa - PB, de julho a setembro de 2008. 76
pacientes com diagnóstico positivo para o HIV, com idade superior a 18 anos e que
aceitaram livremente a participar do estudo. A pretensão inicial era entrevistar 100
pacientes, no entanto, determinou-se o tamanho da amostra do estudo quando se alcançou a
saturação das informações. De acordo com Carvalho e Galvão (2006), o limite de
entrevistas remete à sua utilidade e ao seu aproveitamento. Portanto, a medida em que os
argumentos começam a ficar repetidos, deve-se parar. Além disso, durante as abordagens
para a entrevista, 23 pessoas se recusaram a participar do estudo.
É oportuno destacar, que os pesquisadores levaram em consideração as
observâncias éticas preconizadas para a pesquisa envolvendo seres humanos, de acordo
com Resolução 169/96 do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 2000). Atendendo ao
principio ético, principalmente no que diz respeito ao Termo de Consentimento Livre e
47
Esclarecido
7
, utilizou-se esse instrumento imprescindível para desenvolver pesquisa com
seres humanos, considerando-se sua dignidade e vulnerabilidade.
Torna-se importante ressaltar ainda, no que diz respeito aos preceitos éticos, que o
levantamento de dados foi iniciado após a apreciação do Comide Ética e Pesquisa
(CEP), em reunião realizada no dia 03 de julho de 2008, do qual recebemos o protocolo
sob número 60/08 e CAAE número 0022.0.351.351-08
8
, assim como encaminhamento
através de um ofício à diretoria da instituição pesquisada informando os objetivos do
estudo e a pretensão para a sua realização.
Em consonância com esses aspectos éticos, foi mantido um contato prévio com os
pacientes, quando foram informados a respeito da pesquisa e de seus objetivos,
enfatizando-se importância de sua participação no estudo. Vale ressaltar que os referenciais
básicos da bioética: autonomia, não maleficência, beneficência e justiça, foram respeitados,
à medida que:
Foram garantidos o anonimato dos sujeitos e sua liberdade em retirar o
consentimento a qualquer momento, sem prejuízo na sua relação com a instituição
ou com o pesquisador, assim como a confidencialidade dos dados;
Todo o material obtido na coleta dos dados acerca do perfil dos pacientes, material
colhido nas entrevistas e sua transcrição será mantido sob a guarda do pesquisador
por cinco anos, sendo destruído após esse período;
Não existiram riscos relacionados à participação dos sujeitos, assim como não
foram previstas despesas nem remuneração;
Não existiram malefícios relacionados ao desenvolvimento da pesquisa;
Como benefício estava previsto: a contribuição para a produção de conhecimento
sobre o tema religiosidade e aids, que podeser utilizado no serviço ambulatorial
de referência e/ou em outros serviços de saúde na melhora da qualidade da
assistência;
7
Apêndice A
8
Ver certidão em anexo
48
O pesquisador se compromete a divulgar os resultados da pesquisa sob a forma de
publicação em revistas científicas ou de apresentação em eventos científicos.
Para a coleta de dados foram utilizados dois instrumentos. O primeiro
9
, visou a
atender às necessidades de buscar informações acerca da religiosidade do participante do
estudo, assim como caracterizar a amostra do estudo segundo a cor/raça
10
; o segundo, foi o
questionário WHOQOL - HIV BREF
11
, que é um instrumento utilizado pela Organização
Mundial de Saúde (OMS) para mensurar qualidade de vida de pacientes soropositivos.
Através desse instrumento foi possível também fazer uma caracterização sóciocultural dos
participantes.
De acordo com OMS (2002), o WHOQOL-120 HIV BREF foi desenvolvido a
partir de um extenso teste piloto, seguido de um teste de campo em 115 questões, mais o
WHOQOL-100, em 10 centros ao redor do mundo. Essas questões representam a versão
final do WHOQOL-HIV para serem usadas em testes de campo. Essas versão foi
construída pelas 120 questões correspondentes e escalas de respostas exatamente como
elas estavam na versão do idioma usado no teste piloto. Deve-se salientar que existem
algumas variações, até mesmo entre as versões dos três centros do idioma inglês. Essas
perguntas atendem à definição de Qualidade de Vida como “as percepções do indivíduo a
partir da sua posição na vida, no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive
e em relação às suas metas, expectativas, padrões e preocupações” (OMS, 2002). Sendo
assim, o WHOQOL-HIV BREF está baseado no WHOQOL-BREF, a forma abreviada do
WHOQOL-100. Ele contém cinco questões extras, HIV-específicas, para pessoas que
vivem com HIV/AIDS e contabiliza, no total, 31questões (OMS, 2002).
O instrumento WHOQOL-HIV BREF encontra-se estruturado segundo Fleck et al
(2000) e o Grupo Whoqol (1998), da seguinte forma:
Domínio 1 – Físico:
- Dor e desconforto
- Energia e fadiga
9
Apêndice B
10
A classificação raça/cor foi seguida de acordo com as categorias branca, parda, preta, amarela e indígena
proposta pelo IBGE (2000)
11
Anexo A
49
- Sono e repouso
- Sintomas de PVHAs
Domínio 2 – Psicológico:
- Sentimentos positivos
- Pensar, aprender, memória e concentração
- Imagem corporal e aparência
- Autoestima
- Sentimentos negativos
Domínio 3 – Nível de Independência
- Mobilidade
- Atividade de vida cotidiana
- Dependência de medicação ou tratamento
- Aptidão ao trabalho
Domínio 4 – Relações Sociais:
- Relações Pessoais
- Atividade sexual
- Suporte (apoio) social
- Inclusão social
Domínio 5 – Meio Ambiente:
- Segurança física e proteção
- Ambiente físico: (poluição/ruído/trânsito/clima)
- Recursos Financeiros
- Oportunidade de adquirir novas informações e habilidades
- Participação em, e oportunidades de recreação/lazer
- Ambiente no lar
50
- Cuidados de saúde e sociais: disponibilidade e qualidade
- Transporte
Domínio 6 – Espiritualidade/Religião/Crenças Pessoais:
- ERCP (Espiritualidade/religião/crenças pessoais)
- Perdão e culpa
- Preocupações sobre o futuro
- Morte e morrer
Os dados quantitativos foram dispostos em um programa estatístico computacional
(Microssoft Excel), em que foi construída uma base de dados com as variáveis contidas no
instrumento e o respectivo escore obtido para cada variável. Utilizou-se para os cálculos
dos escores a sintaxe disponibilizada pelo Grupo Whoqol (1998), que calcula os escores da
qualidade de vida geral (questões 1 e 2, calculadas em conjunto, fornecendo um único
escore) e dos domínios (questões 3 a 31).
Tanto a qualidade de vida geral (QVG) quanto os domínios são medidos em direção
positiva, assim, escores mais altos indicam melhor avaliação da qualidade de vida. Os
valores das questões 3, 4, 5 e 31 são dispostos no instrumento em sentido oposto, devido à
formulação da pergunta, para que possam ser trabalhadas positivamente, seguindo as
orientações dadas pela sintaxe Whoqol-Bref (GRUPO WHOQOL,1998).
Em seguida foi feito um cruzamento de dados entre todos os domínios do
WHOQOL-HV-BREF com a “raça”/cor dos participantes do estudo. Vale ressaltar a opção
por selecionar alguns dados da base construída, levando-se em consideração a imensa
quantidade de dados levantados, o que tornaria inviável analisá-los em sua íntegra.
Os dados qualitativos foram analisados a partir de uma pergunta subjetiva contida
no primeiro instrumento de coleta de dados, que trata da percepção do que seja Deus para
os sujeitos envolvidos. Para esta análise, foi utilizada a técnica do discurso do sujeito
coletivo, seguindo os pressupostos de Lefèvre; Lefèvre e Teixeira (2000), em que os
autores orientam que para a análise do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), necessita-se da
utilização de quatro figuras metodológicas para ajudar a organizar e interpretar os
51
depoimentos, sendo essas figuras: a ancoragem, a idéia central, as expressões chaves e o
discurso do sujeito coletivo.
De acordo com os autores supracitados, um discurso está ancorado quando é
possível encontrar nele traços linguísticos explícitos de teorias, hipóteses, conceitos,
ideologias existentes na sociedade e na cultura e que estejam internalizados no indivíduo.
A idéia central pode ser entendida como as afirmações que permitem traduzir o essencial
do conteúdo discursivo dos depoimentos. As expressões-chaves são constituídas por
transcrições literais de partes dos depoimentos, e o discurso do sujeito coletivo busca
resgatar o discurso como signo de conhecimentos dos próprios discursos.
Lefèvre, Lefreve e Teixeira (2000), destacam ainda que:
Para elaboração do DSC, parte-se dos discursos em estado puro que são
submetidos a um trabalho analítico inicial de decomposição que consiste,
basicamente, na seleção das principais [...] idéias centrais presentes em cada um
dos discursos individuais e em todos eles reunidos e que termina sob forma
sintética, onde se busca a reconstituição discursiva da representação social.
Nesse sentido, para a realização dessa técnica, faz-se necessário seguir os seguintes
passos operacionais:
1- Seleção das expressões chaves de cada discurso particular. As expressões chaves são
segmentos contínuos ou descontínuos do discurso que revelam o principal do conteúdo
discursivo;
2- Identificação da idéia central de cada uma dessas expressões chaves, o que constitui a
síntese do conteúdo dessas expressões, ou seja, o que elas querem efetivamente expressar;
3- Identificação das idéias centrais semelhantes ou complementares;
4- Reunião das expressões chaves referente às idéias centrais, semelhantes ou
complementares, em um discurso síntese, que é o discurso do sujeito coletivo.
Como suporte para analisar os discursos obtidos após o uso da técnica descrita,
foram utilizados os pressupostos de Macedo et al (2008) ao afirmarem que consideram a
Análise do Discurso (AD) como uma possibilidade de captar o sentido não explícito no
discurso. Portanto, torna-se uma forma de aproximação do processo saúde-doença por
meio da interpretação da linguagem, pois é no terreno da linguagem que se explica a
52
determinação de vários fenômenos e conceitos, sendo a palavra uma espécie de ponte
lançada entre um ou mais locutores e um ou mais interlocutores.
Portanto, a análise do discurso dos sujeitos participantes desse estudo emergiu do
questionamento: para você, o que é Deus? A partir da análise das respostas surgiram sete
(07) idéias centrais. É oportuno frisar que diante do universo das respostas obtidas, as quais
muitas se repetiram ou apresentaram sentido semelhantes, foram selecionadas as
expressões mais relevantes para dar suporte aos discurso. Como intuito de não identificar
os participantes, foram usados pseudônimos (nomes de Deus
12
; e nomes de Orixás
13
) para
representar os sujeitos, no sentido de se manter o anonimato e a privacidade dos
participantes do estudo. É oportuno destacar que os nomes de Deus e dos Orixás foram
introduzidos como forma de fazer um sincretismo religioso, que este estudo aborda
Ciências das Religiões. Assim adotou-se os pseudônimos dos Orixás para as pessoas de
raça negra, não que não existam pessoas de cor branca nessa religião, mas por a Umbanda
ter uma matriz afro-descendente.
12
Nomes de Deus extraídos da Bíblia (MACÊDO, 2009).
13
Os Orixás não são Deuses como muitas pessoas podem conceber como em outras religiões, mas sim
Divindades criadas por um único Deus: Olorun (dentro da corrente Nagô) ou Zamby (dentro da corrente
Bantu e das correntes sincréticas). Disponível em: www.umbanda.etc.br/orixas/orixas.html.
53
4
4 4
4 OS
OSOS
OS PARTICIPANTES DO ESTUDO
PARTICIPANTES DO ESTUDO PARTICIPANTES DO ESTUDO
PARTICIPANTES DO ESTUDO
“Sou sem dúvida, um animal superior, mas sem a palavra a condição humana
é digna de lástima” (Einstein, 1981, p.14)
54
s dados apresentados e analisados neste capítulo são o resultado da pesquisa
levantada junto aos portadores do HIV/AIDS. Para análise dos dados, após
uma leitura criteriosa, foram selecionados e agrupados os dados em gráficos e tabelas para
facilitar a compreensão dos possíveis leitores. Nesse enfoque, os dados encontram-se
expostos em quatro momentos: caracterização da amostra, doença e condição atual de
saúde, espiritualidade e novas perspectivas, e representação de Deus para os portadores de
HIV/AIDS. Sendo que os três primeiros tópicos fazem parte da análise quantitativa dos
dados, enquanto que o último representa a análise qualitativa do estudo. Vale ressaltar que,
devido à importância dos dados obtidos, foi construído um capítulo à parte com os dados
qualitativos.
4.1 Caracterização da amostra
No período de julho a setembro de 2008, no Complexo de Doenças Infecto
Contagiosas Clementino Fraga, foram entrevistadas um total de 76 pessoas. É importante
salientar que, durante o contato inicial, no qual se explica o motivo da entrevista, 23
pessoas se recusaram a participar do estudo. Como forma de caracterizar os sujeitos do
estudo, a análise inicia-se com base nos dados relacionados à idade e ao sexo dos
participantes, os quais se encontram expostos na Tabela 01 apresentada abaixo.
Tabela 01 Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo a faixa etária e o
sexo.
Sexo Feminino Masculino Total
Idade n % n % n %
20 a 24 1 1,3 2 2,6 3 3,9
25 a 29 9 11,8 5 6,6 14 18,4
30 a 34 7 9,2 6 7,9 13 17,1
35 a 39 6 7,9 8 10,5 14 18,4
40 a 49 11 14,5 12 15,8 23 30,3
50 a 59 3 3,9 5 6,6 8 10,5
60 ou+ 1 1,3 0 0,0 1 1,3
Total 38 50,0 38 50,0 76 100,0
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
Configurando a caracterização dos sujeitos do estudo no que diz respeito ao sexo
dos participantes, a Tabela 01 mostra que, do total de entrevistados, 50% (38)
eram
O
55
homens e 50% (38) mulheres. Com relação à faixa etária houve uma semelhança na
predominância de casos quando observa-se o sexo das pessoas entrevistadas. Nesse
sentido, os dados apresentados revelam que entre as mulheres e os homens a maior
incidência ocorreu entre 25 a 49 anos.
Fazendo uma confirmação dos números apresentados em comparação com os
números do Ministério da Saúde, no que diz respeito à faixa etária, os mesmos constatam
que a maioria dos casos femininos coincidem com a ocorrência nacional, ou seja, entre 25
a 34 anos. Na população masculina, a maior proporção de casos é observada entre 35 a 49
anos, faixa etária que concentra um importante número de casos quando se observa o
panorama nacional (BRASIL, 2008b, p. 7). Esses dados podem indicar que a ocorrência de
casos, em nível de Brasil, mantém uma uniformidade nos vários Estados da federação.
A alta incidência de casos no sexo feminino, repercutindo na feminização da aids,
torna-se preocupante à medida que existem particularidades da mulher que a diferem do
homem, como os fatores biológicos e sociais, que aumentam a vulnerabilidade feminina,
facilitando a infecção pelo vírus e o desenvolvimento da doença. Abdalla e Nichiata (2008)
afirmam que no processo saúde-doença, em meio às particularidades existentes entre
homens e mulheres, destacam-se as diferenças anatômicas; a maior concentração do vírus
no sêmen do que na mucosa vaginal; as inflamações e irritações bem como a
vulnerabilidade para as doenças sexualmente transmissíveis; a desigualdade social; as
questões de gênero; a falta de percepção de risco, principalmente, em mulheres envolvidas
em relacionamentos estáveis.
No que se refere à não percepção do risco, principalmente para as mulheres
envolvidas em relacionamentos estáveis, monogâmicas e com parceiros fixos, observa-se
uma certeza de proteção contra a aids ou outras doenças sexualmente transmissíveis. Nesse
contexto, o uso do preservativo passa a se apresentar como um método unicamente
contraceptivo e “baseado na representação social que essas mulheres têm da aids, visto que
suas percepções acabam por lhes fornecer uma falsa sensação de imunidade, pois elas não
se encaixam dentro do perfil que imaginam como sendo de quem apresenta o vírus ou a
própria doença”(NASCIMENTO;BARBOSA; MEDRADO, 2005, p. 85).
Além disso, após o diagnóstico da infecção, as mulheres enfrentam dificuldades das
mais variadas formas, desde aquelas relacionadas diretamente à infecção e ao adoecimento,
56
ao tratamento e aos cuidados diários, até aquelas referidas ao campo afetivo-relacional. No
que se refere ao campo afetivo-relacional, Tunala (2002) analisa que essas são as principais
fontes cotidianas de estresse indicadas pelas mulheres portadoras do vírus, derivadas,
muitas vezes, do estigma associado ao HIV, gerando sentimentos de medo, solidão e
abandono.
A Tabela 01 revela, ainda, que os participantes do estudo encontram-se na faixa
etária entre 20-60 anos ou mais, sendo que os maiores índices estão concentrados entre 30-
34 anos, com 13 participantes (17,1%), seguidos da faixa etária de 25-39 anos, com 14
participantes (18,4 %), de 35-39 anos, com 14 participantes (18,4 %), e da faixa
compreendida entre 40-49 com 23 participantes (30,3%), faixa com maior incidência.
A faixa etária de 20 a 60 anos ou mais, observada neste estudo, retrata que a
população estudada é constituída por pessoas que estão em plena fase de produtividade, de
construção familiar, com expectativas de progressão intelectual, social e ascensão
funcional. Xavier et al (1997) também corroboram com essa afirmação ao constatarem que
“cerca de 83 % dos casos, tanto em homens quanto em mulheres, encontra-se nas faixas
etárias compreendidas entre 20 e 49 anos, ou seja, uma população em idade reprodutiva,
sexualmente e economicamente ativa” (XAVIER et al, 1997, p.67).
Tal situação é referida pelos indicadores demográficos do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística - IBGE (RAZÃO..., 2003), quando destaca o segmento etário de 15
a 64 anos como potencialmente produtivo. No entanto, é oportuno ressaltar que no caso
específico da população deste estudo, a produtividade que se espera de pessoas nesta faixa
etária pode ser “interrompida” devido a falta de perspectivas de alguns portadores do vírus,
que vêem na doença uma sentença de morte.
Um fato a ser avaliado, levando em consideração os dados levantados no que
concerne à idade dos participantes, é que, de acordo com Lopes e Fraga (1998) se for
levado em conta que o período de incubação da infecção aguda do HIV varia em média de
2 a 6 anos, pode-se inferir que a contaminação dos sujeitos deste estudo ocorreu em uma
fase em que os mesmos são caracterizados como adultos jovens. Essa ocorrência suscita
uma reflexão para os profissionais de saúde, assim como dos poderes governamentais, no
sentido de investir maiores esforços para conscientizar os portadores do vírus de que a
contaminação pelo HIV não significa o fim da vida, por que se assim for haverá milhares
57
de cidadãos “inúteis”, sem perspectivas de vida, sem produtividade, à mercê de uma
contribuição financeira por parte das esferas governamentais.
O Gráfico 01 apresenta a auto-identificação dos(as) entrevistados(as).
2,6%
Indígena
18,4%
Branca
76,3%
Negra
1,3% Amarela
1,3%
Outra
Gráfico 01 Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo o questionamento: Qual sua
“raça”/cor/? Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga -João Pessoa - PB, 2008.
Fonte: Pesquisa direta
Os dados do gráfico apresenta a seguinte proporção: 1,3 % amarela; 2,6 %
indígena; 1,3 % outra; 18,4 % branca e 76,3 % negra. Vale ressaltar que a categoria cor
negra representa o somatório dos pretos, que apresentou um percentual de 14,5 %;
morenos com 27,6 %; e pardos com 4,2 %, seguindo os pressupostos de Buchalla e Ayres
(2007), bem como de Silva (2007), fato justificado segundo os autores citados pelo motivo
de que nem sempre as pessoas se auto-declaram como pertencentes a população negra.
Em uma análise do Gráfico 01, observa-se uma maior proporção de pessoas negras,
seguida de brancas. Os percentuais obtidos diferem de forma significativa da composição
populacional paraibana apresentada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, por
meio do levantamento Pesquisa Nacional de Amostra Familiar do ano 2000, na qual se
observa 0,7 % de amarelos; 42,6 % de brancos; 56,2 % de negros e 0,2 % de indígenas. A
maior proporção de pessoas negras, na amostra da atual pesquisa, pode apontar para uma
maior vulnerabilidade desse grupo populacional à epidemia de HIV/AIDS. O mesmo o
pode ser afirmado em relação aos autodeclarados(as) amerelos(as), uma vez que no estado
da Paraíba, esta mais do que uma categoria censitária torna-se uma categoria nativa, pois
um grande número de pessoas, sem ascendência oriental, se autoidentificam como
amarelos.
58
Como forma de não se fazer uma generalização da afirmação em decorrência dos
dados levantados, deve-se levar em consideração o conceito de vulnerabilidade. Costa-
Couto (2007) enfatiza que existem dois termos que abrangem esse enfoque: risco e
vulnerabilidade, termos que a autora julga serem compostos por vários outros conceitos,
usos e apreensões.
Seguindo os pressupostos da autora supracitada, para uma imagem adequada do
quadro teórico-conceitual, pode-se usar as palavras polissêmico e polifônico, ou seja, são
conceitos carregados de ltiplos sentidos e, portanto, ouvidos e utilizados de diferentes
maneiras. Nesse sentido, risco e vulnerabilidade possuem ampla aplicabilidade na
produção de diferentes áreas de conhecimento: ciências humanas, biológicas, sociais,
tecnológicas e jurídicas. Portanto as duas palavras são semanticamente orientadas:
Mudam de significado no tempo e no espaço, de acordo com a sociedade e o
contexto em que são utilizadas. Ou seja, intervalos temporais, espaços
geográficos, padrões culturais, econômicos e interesses políticos produzem e
modificam a concepção, o uso e o sentido de um termo (Costa-Couto, 2007, p.
32).
Ainda que o conceito de vulnerabilidade no contexto epidemiológico tenha
ampliado sua visão, percebe-se uma predominância do termo risco aplicado à epidemia de
HIV/AIDS. Sua clara subordinação conceitual à ciência biomédica faz com que fenômenos
complexos ligados a essa epidemia continuem a ser reduzidos e respondidos enquanto
questão biomédica e epidemiológica.
De acordo com o Relatório de Desenvolvimento Humano (PNUD, 2005) desde
2000, quando o Ministério de Saúde passou a contabilizar os casos de incidência de aids
por cor/raça, vem ocorrendo um processo de alteração da composição racial da doença no
país, onde se observa que em 2000 o percentual de homens brancos representava 65,6% do
total de infectados. Entretanto, apesar da notificação de HIV ser maior para esse grupo, ele
foi perdendo participação relativa ao longo dos anos, caindo para 62% em 2004.
Por outro lado, ainda em consonância com o PNUD (2005), o percentual de homens
negros timas da síndrome aumentou ligeiramente no período considerado, passando de
34,4% para 37,2%. Em relação à epidemia de aids, a situação das mulheres negras é pior
que a dos homens negros, pelo fato de que, em 2000, elas respondiam por
59
aproximadamente 36% do total dos casos entre as mulheres, passando para 42,4% em
2004, ressaltando que essa tendência foi verificada em todas as regiões brasileiras.
O nível de instrução formal, dos(as) entrevistados(as), se encontra apresentado no
Gráfico 02.
26,3%
Nenhum
5,3%
Grau
47,4%
1º Grau
21,1%
Grau
Gráfico 02 Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo o grau de instrução.
Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga -João Pessoa - PB, 2008.
Fonte: Pesquisa direta
Com relação ao grau de instrução preconizado no Brasil, vale ressaltar o que diz a
Lei de Diretrizes de Bases (LDB) sobre a composição dos níveis escolares. De acordo com
o Ministério da Educação (BRASIL, 1996), essa composição está dividida em: educação
básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, e ensino
superior.
Sendo que a educação básica tem por finalidade desenvolver o educando,
assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-
lhe meios para progredir no trabalho e em estudos subsequentes ao da educação básica. O
ensino fundamental proporciona o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo
como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo, assim como o
desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de
conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores (BRASIL, 1996).
o ensino médio que é a etapa final da educação básica, tem entre outras, como
finalidade: a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino
fundamental, possibilitando o prosseguimento dos estudos. Enquanto o ensino superior tem
a finalidade de estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do
60
pensamento reflexivo (BRASIL, 1996). Nesse sentido, quanto ao grau de escolaridade dos
participantes do estudo, o Gráfico 02 mostra que há um grande percentual dos participantes
com nenhum grau de instrução (26,3%) e os que possuem apenas o grau (47,4%) que,
quando somados, representam 73,7% da amostra; no entanto, 21,1 % possuem o grau
completo e 5,3 % possuem o 3º grau.
Esses dados mostram que a maioria dos participantes do estudo alegou ter primeiro
grau como mostra o Gráfico 02, entretanto nota-se que na verdade, muitos deles sabem
apenas escrever o nome, ou mesmo “desenhar o seu nome”, o que configura que os atores
envolvidos podem ser classificados como semianalfabetos. Um fato interessante,
observado entre os participantes do estudo, foi que apesar de alguns deles apenas saberem
escrever os seus nomes, ainda assim se sentem orgulhosos em dizerem que são
alfabetizados.
Em consonância com essa argumentação podemos destacar o que afirma Figueiredo
(2003), ao dizer que essa realidade relacionada ao analfabetismo ou semianalfabetismo
reflete o que acontece em nível de Brasil, onde existe um índice de analfabetismo alto.
Figueiredo (2003) ressalta que a alfabetização não visa limitar a competência ao seu nível
mais simples, a exemplo de ler e escrever enunciados simples referidos à vida diária, mas
abriga graus e tipos diversos de habilidades, de acordo com a necessidade imposta pelos
contextos econômicos, políticos ou socioeconômicos.
O desdobramento do nível de instrução formal em relação a raça”/cor dos
participantes, é apresentado na Tabela 02.
Tabela 02 Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo o desdobramento
do nível de instrução formal em relação a “raça”/cor.
Desdobramento do nível de instrução formal em relação a “raça”/cor
Nenhum Fundamental Médio Superior Total
n % n % n % n % n %
Amarela 0 0,0 1 1,3 0 0,0 0 0,0 1 2,5
Branca 5 6,6 5 6,6 4 5,3 0 0,0 14 20,0
Indígena 0 0,0 2 2,6 0 0,0 0 0,0 2 2,5
Negra
15 19,7 28 36,8 12 15,8
3 5,3 58 72,5
Outra 1 1,3 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 2,5
Total 20 26,3 36 47,4 16 21,1 3 5,3 76 100,0
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
61
Na tabela acima, pode-se observar através dos dados que 1,3 % da população
amarela alegam possuir ensino fundamental, na população branca observa-se um
percentual de 6,6 % para os que alegam não possuir nenhum grau de instrução e ensino
fundamental, respectivamente, enquanto 5,3 % dessa mesma população possui ensino
médio completo. Quanto às demais categorias populacionais elencadas no estudo, a
indígena possui 2,6 % dos participantes com estudo fundamental. Outras categorias que
não se encaixam nas demais alegam não possuir nenhum grau de estudo, representando
1,3% da amostra, e a população negra que apresentou os seguintes dados: 19,7% com
nenhum grau de instrução, 36,8 % com ensino fundamental, 15,8 % possui ensino médio,
enquanto 5,3 % dessa categoria possui ensino superior.
Os dados apresentados na Tabela 02 revelam que a população apresenta importante
proporção com um menor número de anos de estudo, sendo que 56,5% dos entrevistados
com menos de 5 anos de estudo são negros.
O PNUD (2005) enfatiza em seu relatório que, embora a partir de 1991 tenha
começado a recuar, a diferença em 2000 na taxa de analfabetismo de negros e brancos era
de 125%. Sendo importante ressaltar que a redução do analfabetismo foi acompanhada do
aumento na escolarização da população brasileira, sobretudo entre os mais jovens. Mas,
apesar disso, a expansão não foi suficiente para superar as desigualdades raciais,
contribuindo ainda mais para sua ampliação. Contudo é inegável que uma das conquistas
mais importantes do Brasil no final do século XX e no início do século XXI foi ter atingido
a quase universalização do ensino fundamental, e a expansão educacional alcançou
crianças tanto brancas como negras. Apesar da melhora dos indicadores, uma análise mais
detalhada feita pelo PNUD (2005) recomenda cautela antes de concluir que se conquistou
um padrão mais democrático e menos discriminatório de acesso educacional.
A primeira vista poderia parecer que essa situação reflete meramente a
distribuição de renda, os negros estariam em pior situação porque são mais
pobres, e portanto uma melhor repartição da renda eliminaria essa suposta
desigualdade racial. Entretanto, uma abordagem que leve em consideração as
crianças que se encontravam entre os 10% mais pobres mostra que nessa faixa a
proporção de negros fora da escola é maior que na média da população, e essa
situação não se alterou na última década (PNUD, 2005, p. 68).
Tendo em vista que ocorre uma maior concentração de crianças negras nas camadas
mais pobres, a proporção delas entre as excluídas do sistema educacional na verdade teve
uma pequena elevação. Se levarmos em consideração este fato é possível inferir que
62
promover a expansão do ensino fundamental, sem dar atenção especial à inclusão racial,
significa perpetuar os padrões de desigualdade presentes décadas no sistema
educacional brasileiro.
Tabela 03 — Freqüências e medidas descritivas das facetas do domínio físico X “raça”/cor
referente a questão 16 do Whoqol HIV Bref.
Q16 Você tem dinheiro suficiente para satisfazer suas necessidades?
amarela branca indígena negro Outra total
n % n % n % n % n % n %
nada 1 1,3 3 7,5 1 1,3 11 14,5 1 1,3 9 19,7
muito pouco 0 0,0 6 7,9 1 1,3 29 38,2 0 0,0 17 47,4
médio 0 0,0 4 5,3 0 0,0 15 19,7 0 0,0 10 25,0
muito 0 0,0 1 1,3 0 0,0 3 3,9 0 0,0 4 7,9
completamente
0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0
total 1 2,5 14 18,4 2 2,6 58 76,3 1 1,3 76 100,0
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
A Tabela 03 apresenta a dificuldade econômica das pessoas entrevistadas no que se
refere a suprir suas necessidades. Pode ser observado que 47,4% dos participantes do
estudo afirmam apresentar muito pouco dinheiro para a satisfação de suas necessidades.
Esse fato, aliado à baixa escolaridade, reforça a evidência a respeito da pauperização da
epidemia.
Os dados contidos na Tabela 03 confirmam o que vem ocorrendo no Brasil acerca
da pauperização, pois com o avanço da disseminação da doença, as camadas mais pobres
da sociedade foram atingidas pela epidemia, fato que pôde ser constatado quando “se
relacionaram os casos notificados com o nível de escolaridade disponível nas fichas de
notificação, permitindo traçar aproximadamente um perfil sócioeconômico dessas pessoas”
(BRASIL, 2002, p. 112).
Um dado importante configurado na tabela 03, diz respeito ao percentual
considerável de pessoas negras com poder aquisitivo aquém do necessário no atendimento
das suas necessidades básicas, onde se observa que 38,2 % da população negra do estudo
alegam possuir muito pouco dinheiro para suprir suas necessidades.
A verificação de desigualdades socioeconômicas entre grupos raciais de acordo
com Bastos et al (2008), constitui uma importante indicação da existência do racismo
institucionalizado. Nesse enfoque, os autores definem esse tipo de racismo pela existência
de um acesso diferencial a bens, serviços e oportunidades em uma sociedade de acordo
63
com a cor/raça. Os autores acrescentam que, sob esse ponto de vista, a associação entre
condições socioeconômicas e cor/raça comumente encontrada seria consequência dessa
forma de discriminação.
Kalckmann et al (2007) comungam com a afirmação dos autores supracitados, ao
evidenciarem que em estudos nacionais e internacionais há desigualdades importantes
entre a saúde de brancos e negros, homens e mulheres, explicitando interações sinérgicas
entre desigualdades sociais, raciais e de gênero. No que se refere ao racismo institucional,
as autoras acrescentam que este se configura como um
fracasso coletivo de uma organização para prover um serviço apropriado e
profissional para as pessoas por causa de sua cor, cultura ou origem étnica. Ele
pode ser visto ou detectado em processos, atitudes e comportamentos que
totalizam em discriminação por preconceito involuntário, ignorância, negligência
e estereotipação racista, que causa desvantagens a pessoas de minoria étnica
(KALCKMANN et al, 2007, p. 147).
Portanto não como negar o peso da dimensão étnico-racial nos profundos
problemas sociais que assolam o país, que poderá trazer como consequência “bloqueios
nas relações sociais, possibilidades de participação, inibir aspirações, mutilar a práxis
humana, e dessa forma acentuar a alienação de uns e de outros indivíduos assim como a
coletividade” (IANNI, 2004, p. 23).
Pereira et al (2003) e Lopes (2005) argumentam que a discriminação por cor/raça,
na maioria das vezes, apresenta-se de forma velada, em virtude de leis que a proíbem.
Dessa forma, a discriminação é praticada através de mecanismos de expressão que não
ferem abertamente essas normas. Sendo que essa prática poderá determinar diferenças
importantes no acesso e na assistência nas diferentes esferas da sociedade, como, por
exemplo, na menor oportunidade de escolarização, na polícia e em outras forças de
autoridade e controle social através de prisões ilegais e detenções arbitrárias, na justiça,
como reflexo da falta de informação e da relação melhor rendimento econômico, bem
como na melhor defesa e de penas distintas.
É notório que na dimensão da renda podem ser percebidas as maiores discrepâncias
entre negros e brancos. A análise de indicadores desagregados por cor/raça e sexo o
deixa dúvidas quanto aos aspectos fundamentais da questão racial na construção do
panorama social do Brasil. No PNUD (2005) consta que do total dos rendimentos de todas
as fontes apropriadas pelas famílias brasileiras em 2000, 50% provinham de homens
64
brancos e 24% de mulheres brancas (ou seja, a população branca respondia por 74% do
total); na outra ponta, os homens negros detinham 18% do total de rendimentos e as
mulheres negras apenas 8%.
Esses dados sinalizam que do total dos rendimentos disponíveis para as famílias no
Brasil, apenas 26% tinham por origem alguma forma de remuneração de pessoas negras.
Embora mulheres e homens negros representem 44,7% da população brasileira, segundo
dados do Censo 2000, publicados no portal do IBGE (2001), sua participação chega a 70%
entre os 10% mais pobres. À medida que se avança em direção aos estratos mais altos, sua
presença diminui, até atingir apenas 16% no último estrato (os 10% mais ricos). Essa
situação permaneceu praticamente inalterada ao longo dos anos 1990. Além disso, em
todas as faixas, sem exceção, o rendimento médio dos brancos é superior ao dos negros
(PNUD, 2005).
No contexto das desigualdades sociais, Schilkowsky (2008) ressalta que o seu
aumento nas últimas décadas, particularmente do Brasil, com o empobrecimento da
população e o crescimento insuportável da violência urbana, aliados à omissão do Estado,
caracterizada pela falta de investimentos nos serviços públicos, produziram efeitos
perversos no sistema de saúde brasileiro. Portanto, esse quadro aumenta a dificuldade de se
constituir e coordenar uma rede pública de serviços que garanta o acesso da população a
todos os níveis de assistência.
Gráfico 03 Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo o estado civil.
Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga -João Pessoa - PB, 2008.
Fonte: Pesquisa direta
65
O Gráfico 03 configura a amostra estudada no que diz respeito ao estado civil, no
qual se observa que 10,5 % são separados ou divorciados legalmente; 9,2 % são casados;
15,8 % vivem como casados e 52,6 % são solteiros. Do total de pessoas que se declararam
solteiras, 34,2% são do sexo masculino, sendo que desse percentual 31,6 %
14
são
homossexuais, fato que justifica a predominância da amostra como solteira.
A questão da homossexualidade pode levar a uma reflexão no sentido de se avaliar
sua situação afetiva, porque não como negar que existem muitos casais homossexuais,
seja de homens ou de mulheres, que mantêm vínculo amoroso, muitos moram juntos,
constroem uma vida, mantendo uma relação monogâmica. Nesse sentido, os homossexuais
dessa amostra que se declaram solteiros podem está vivendo uma situação semelhante, no
entanto não se declaram como “vivendo como casado” pelo medo de se expor, devido ao
fato de viverem em sociedade altamente “heterossexualizada”.
A homossexualidade tem sido um dos temas mais controversos da atualidade nas
sociedades. Musskopf (2005) afirma que depois dos Movimentos de Libertação Negro e
Feminista, a presença articulada e visível de grupos homossexuais tem sacudido as
estruturas das sociedades. O autor enfatiza que se trata de questionamentos e grupos ora
assimilados, ora silenciados, mas que raramente alcançam êxitos em suas reivindicações de
mudança estrutural.
Em sua análise, Musskopf (2005) argumenta que a reivindicação de direitos civis e
humanos questiona não apenas os fundamentos sociais e culturais, mas também os
fundamentos da organização e prática eclesiástica, bem como o discurso teológico que a
fundamenta. Portanto, de uma forma geral, tem havido um descompasso entre a discussão
no âmbito público, ou seja, entre as esferas governamentais, e a discussão na esfera das
igrejas sobre o tema da homossexualidade. Em diversos países, determinados direitos
(registro de uniões homoafetivas com a consequente garantia de direitos previdenciários,
adoção de filhos, ou, até mesmo, a proibição de discriminação) são assegurados
constitucionalmente.
No Brasil os direitos dos homossexuais perpassam por tramitações judiciais. A ação
proposta pela Procuradoria Geral da Republica (PGR) sustenta que a união entre pessoas
14
O percentual apresentado emerge da pergunta: como você acha que foi contaminado pelo vírus HIV?
Pergunta contida no instrumento WHOQOL-HIV-BREF.
66
do mesmo sexo “é, hoje, uma realidade fática inegável, no mundo e no Brasil” (STF, 2009,
p. 1). Lembra ainda que, em sintonia com essa realidade, muitos países vêm estabelecendo
diversas formas de reconhecimento e proteção dessas relações.
A premissa destas iniciativas é a idéia de que os homossexuais devem ser
tratados com o mesmo respeito e consideração que os demais cidadãos e que a
recusa estatal ao reconhecimento das suas uniões implica não privá-los de
uma série de direitos importantíssimos de conteúdo patrimonial e
extrapatrimonial, como também importa em menosprezo a sua própria identidade
e dignidade (STF, 2009, p. 1).
Segundo a Duprat (2009), na qualidade de Procuradora Geral da República, deve-se
extrair diretamente da Constituição de 88 notadamente os princípios da dignidade da
pessoa humana (art. 1º, inciso III), da igualdade (art. 5º, caput), da vedação das
discriminações odiosas (art. 3º, inciso IV), da liberdade (art. 5º, caput) e da proteção à
segurança jurídica a obrigatoriedade do reconhecimento da união entre pessoas do
mesmo sexo como entidade familiar. E, diante da inexistência de legislação
infraconstitucional regulamentadora, deve ser aplicada analogicamente ao caso as normas
que tratam da união estável entre homem e mulher.
27,6%
Evanlico
18,4%
Sem religião
1,3%
Umbandista
3,9%
Espírita
48,7%
Católico
Gráfico 04 Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo o questionamento: Com relação à
sua religião/doutrina/seita/crença, como você se considera? Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino
Fraga -João Pessoa - PB, 2008.
Fonte: Pesquisa direta
O perfil religioso dos(as) entrevistados(as) é apresentado no Gráfico 04,
observando-se a alta proporção de católicos e evangélicos, um perfil próximo ao descrito
por Guilhem (2005, p. 152); Torres et al (2008, p. 58) e Belo e Silva (2004, p. 482), que
trabalhando, respectivamente, com mulheres de classe popular de Brasília e Rio de Janeiro
67
e com adolescentes e gestantes atendidas por um Hospital Universitário da cidade de
Campinas, observaram a predominância de católicas e evangélicas.
A predominância de católicos no Brasil também é observada pelo IBGE (2000),
quando, em censo demográfico realizado no ano 2000, foi verificado um total de
124.980.132 pessoas que declararam como religião a Católica Apostólica Romana, e um
total de 26.184.941 de Evangélicos. Em nível do Estado da Paraíba, ainda de acordo com o
IBGE (2000), os números apontam também para uma maior proporção de católicos em
detrimento dos evangélicos com 2.924.154 e 303.151, respectivamente. Chama a atenção o
percentual de entrevistados que se autodeclararam umbandistas (1,3%), uma vez que a
proporção dos mesmos na população em geral oscila em torno de 0,26% (PIERUCCI,
2004).
Esstes dados mostram que no Brasil impera as religiões que tiveram como raiz o
cristianismo, cujo termo pode ser entendido como “o conjunto de igrejas, comunidades,
seitas e grupo, assim como de idéias e concepções, que se referem às palavras daquele que
costuma ser reconhecido como o fundador dessa religião: Jesus de Nazaré” (FILORAMO,
2005, p.60). O autor em foco acrescenta que
Ainda que com uma grande variedade histórica de crenças e práticas, o
cristianismo manteve como elemento comum a profissão de fé em Jesus, filho do
único Deus Senhor e Criador, encarnado, morto e ressuscitado, o messias
prometido e como tal “Cristo”, isto é, “ungidopelo Senhor (origem do nome
“cristão” com o qual logo foram denominados seus seguidores), o cristianismo é
junto com outras religiões como o Islamismo ou o Budismo, uma religião
historicamente fundada, não apenas no sentido de ter um inicio em um dado
momento da história, mas no sentido de que sua origem pode ser remetida à ação
de um fundador (FILORAMO, 2005, p.60).
Portanto esse fato ficou enraizado no imaginário popular, repercutindo na
concepção de que o cristianismo teve uma origem sólida, no sentido de se compreender
que o mesmo não “nasceu do nada”, devendo-se levar em consideração que, na
autocompreensão cristã, Jesus também foi visto como fundador no sentido de pessoa
sempre presente na comunidade, e dessa forma funda continuamente sua igreja.
68
4.2 A doença e a condição atual de saúde
Com o intuito de se avaliar a percepção dos participantes do estudo no que se refere
a sua própria saúde, relacionando a sua condição de portador do vírus da aids, neste
subitem, os sujeitos do estudo são analisados no que se refere aos dados inerentes a sua
condição de saúde atual, de que forma foram infectados pelo vírus e ano de confirmação do
diagnóstico.
A Tabela 04 apresenta a categoria de exposição ao HIV pelos entrevistados no
presente trabalho. Onde pode ser observado um significativo percentual de pessoas que
contraíram o vírus por meio de relações homossexuais.
Tabela 04 Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo o questionamento:
Como você acha que foi infectado pelo hiv?
Como você acha que foi infectado pelo HIV?
n %
Agulha contaminada 1 1,3
Acidente com material perfuro-cortante 1 1,3
Derivados de sangue 2 2,6
Usuário de droga injetável 2 2,6
Relação homossexual 31 40,8
Relação heterossexual 38 50,0
Tatuagem 1 1,3
Total 76 100,00
Fonte: Levantamentos obtidos no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
Em relação à categoria de infecção, os dados publicados pelo Ministério da Saúde
indicam uma diminuição da transmissão do vírus HIV por meio de relações homossexuais.
Os dados revelam que, entre os anos de 1995 e 2008, a diminuição observada foi de 7%
(Brasil, 2008, p.10). Mesmo com esta diminuição, para a presente amostra a via de
transmissão homossexual mostrou-se de significativa importância, não havendo até o
presente momento indicadores que possam explicar essa realidade local.
No entanto, os dados também mostram um importante percentual da amostra que
foi infectada em relação heterossexual. Fato que demonstra que as pessoas que se declaram
heterossexuais ainda o acreditam que podem estar em situação de comportamento de
risco. No que diz respeito a essa afirmação, Maia, Guilhem e Freitas (2008) comungam
com esse argumento ao dizer que o HIV/AIDS ainda é visto como “doença da rua” ou a
“doença do outro”, portanto, há pouca discussão sobre o tema entre casais.
69
As representações de gênero são observadas nos valores culturais sobre amor e
fidelidade expressos, por exemplo, pelo “mito do amor romântico” como atributo essencial
da felicidade. Essa visão romântica e eternizada do amor segundo Maia, Guilhem e Freitas
(2008), pode fazer com que o casal abandone a utilização de preservativos e acredite que
está realmente protegido contra o HIV/AIDS.
É interessante notar que a população de um modo geral possui conhecimentos
importantes sobre transmissão do HIV/AIDS, entretanto suas percepções conjugais
expressam a cultura em que estão inseridos no que se diz respeito aos papéis de gênero e
hierarquização da relação efetivo-sexual. Isso pode explicar a restrição da adoção de
comportamentos preventivos, o que torna essas pessoas vulneráveis à infecção pelo HIV.
Nesse contexto, pode-se inferir que os comportamentos preventivos, mesmo conhecidos
pelos sujeitos, não são praticados na maioria das situações. Podemos ainda inferir que tal
comportamento pode estar relacionado ao grau de escolaridade dos participantes, que a
maioria apresentam pouco grau de escolaridade.
6,6%
Não sabe
27,6%
1990-1999
65,8%
2000-2009
Gráfico 05Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo o questionamento: Em que ano você
fez o primeiro teste HIV positivo? Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga –João Pessoa PB,
2008.
Fonte: Pesquisa direta
Um fato conhecido desde os primórdios da epidemia é o tempo de incubação
relativamente longo do vírus HIV, o que significa a existência de um tempo relativamente
longo entre a exposição e infecção ao agente e o surgimento dos primeiros sintomas. O
Gráfico 05 apresenta o ano no qual as pessoas entrevistadas descobriram que estavam
infectados(as).
70
Os dados configurados no Gráfico 05 revelam que 6,6% da amostra não lembram
em que ano fez seu primeiro teste com resultado positivo para o HIV; enquanto que 27, 6%
tiveram sua confirmação entre 1990 e 1999 e 65,8 % tiveram sua primeira confirmação
entre os anos 2000 e 2009. Ressalte-se que a amostra foi agrupada de 10 em 10, porque o
intervalo de tempo relacionado às respostas tornou-se de mais fácil visualização,
repercutindo em uma avaliação mais operante.
O percentual considerável no intervalo entre 2000 e 2009 apresentado no Gráfico
05, condiz com as estatísticas em nível nacional (BRASIL, 2008a), em que nesse mesmo
intervalo houve um aumento de casos notificados em todos os Estados da federação.
30,3%
2000-2009
21,1%
1990-1999
48,7%
o sabe
Gráfico 06 Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo o questionamento: Em que ano você
acha que foi infectado pelo HIV? Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga –João Pessoa PB,
2008.
Fonte: Pesquisa direta
No Gráfico 06 é apresentado o ano no qual as pessoas pesquisadas consideram que
foram infectadas pelo vírus. Através da leitura desse gráfico, pode-se perceber que 21,1 %
dos entrevistados acham que foram infectados entre 1990 e 1999; enquanto 30,3 % acham
que foram infectados entre 2000 e 2009; entretanto, 48,7% dos entrevistados não possuem
conhecimento do ano em que foram infectadas pelo vírus.
Esses dados mostram que, apesar da grande gravidade da doença, um importante
número de pessoas não se lembra do ano no qual se tornou soropositivo, não havendo
lembrança, também quanto ao ano de infecção. O que nos sugere o desconhecimento, por
parte de algumas pessoas do grupo, do período de tempo entre a infecção e o surgimento
dos primeiros sintomas.
71
Diante do exposto, é preciso refletir sobre a necessidade de um esforço para a
divulgação do conhecimento científico acumulado sobre a aids, no sentido de trazer
benefícios para a prevenção dessa epidemia, partindo da premissa de que a obtenção de um
conhecimento mais aprofundado da doença possa ter mais efeito do que simples
mensagens preventivas de natureza sintética.
7,9%
Muito boa
27,6%
Boa
5,3%
Muito ruim
11,8%
Ruim
47,4%
Nem ruim nem
boa
Gráfico 07Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo o questionamento: Como está a sua
saúde? Ambulatório/Complexo Hospitalar Clementino Fraga -João Pessoa - PB, 2008.
Fonte: Pesquisa direta
No que diz respeito ao estado de saúde dos participantes do estudo, o Gráfico 07
apresenta os seguintes resultados: 5,3 % da amostra consideram sua saúde muito ruim;
11,8% consideram sua saúde ruim; 27,6 % disseram que sua saúde está boa; 47,4 %
ficaram no meio termo, alegando que sua saúde o está nem ruim nem boa; e 7,9 %
consideram sua saúde muito boa.
Apesar de a infecção pelo HIV ser de grande gravidade, por destruir células
importantes que permitem ao ser humano se defender de doenças que podem se agravar, ao
somarmos os percentuais de respostas dos participantes no que concernem às variáveis:
boa; nem ruim nem boa e muito boa, obteremos um percentual de 82,9 % de pessoas que
acham que possuem uma boa saúde.
Em se tratando de saúde, deve-se levar em consideração o seu sentido que se torna
amplo. De acordo com o Ministério da Saúde, inicialmente o conceito foi considerado
como sendo “a ausência de doença ou de invalidez” (BRASIL, 2002b, p. 16). Esse
conceito foi considerado impróprio devido às restrições que conotam o julgamento de cada
indivíduo, nesse sentido, a OMS definiu a saúde do indivíduo como aquele que apresenta
72
em suas características “um estado de completo bem-estar físico, mental e social”
(BRASIL, 2002, p. 17). No entanto pode-se ir além quando se acrescenta que a saúde pode
ser atribuída a uma “gestão autônoma, solidária e prazerosa na forma de vida”
(BUSQUETS; LEAL, 1999, p. 63).
Na perspectiva de expandir o conceito de saúde no mundo contemporâneo, deve-se
partir da concepção de que o modelo biomédico enfoca a saúde ainda como ausência de
doença. Jarvis (2002) afirma que a saúde e a doença são opostos extremos de um
continuum linear, assim, a doença é causada por agentes ou patógenos específicos e, por
conseguinte, o foco biomédico consistiria no diagnóstico e tratamento desses agentes
patogênicos com consequente cura da doença.
Nesse contexto, não se pode deixar de ter em mente que “por traz” desse ínterim
existe um ser humano com todas as suas subjetividades e ele pode não se considerar doente
mesmo tendo contraído um patógeno específico. Sendo assim, Jarvis (2002) define saúde
como uma sensação de bem estar, logo o bem estar consiste em um processo dinâmico em
direção ao ponto de funcionamento do organismo considerado ótimo.
Portanto pode-se perceber que o conceito de saúde pode ser codificado em vários
significados, sendo provavelmente melhor definido pelo próprio indivíduo, mas não se
pode esquecer que qualquer definição de saúde precisa levar em consideração que o ser
humano compõe-se de corpo e mente, sendo essas partes inseparáveis e, no entanto,
interdependentes. Nesse enfoque, “saúde é o estado de pleno funcionamento de um ser
humano, de uma pessoa que usa a mente e o corpo para viver de modo que seja
particularmente satisfatório e aceitável” (ATKINSON; MURRAY, 1989, p. 12).
Ao levar em conta o argumento dos autores supracitados, uma pessoa com algum
defeito físico, a exemplo de distúrbios visuais, ou paraplegias, é capaz de atingir esse
estado de saúde, além do mais a saúde não é uma condição do tudo ou nada. Em cada
determinado momento, um indivíduo pode se encontrar em algum ponto de uma doença
aguda ou da saúde ideal. Nesse sentido, a posição do indivíduo modifica porque o seu
estado de saúde se altera, apresentando flutuações, mostrando que a vida é dinâmica e não
estática.
4.3 Espiritualidade e novas perspectivas
73
Neste tópico foram selecionados dados que concernem à espiritualidade dos
participantes do estudo, em que, questões do tipo medo do futuro, importância da religião
ou espiritualidade, nível de satisfação, podem representar o universo espiritual dos
indivíduos, sendo esses aspectos analisados nas tabelas apresentadas a seguir.
Tabela 05 Freqüências e medidas descritivas das facetas do domínio espiritualidade X
“raça”/cor referente a questão 9 do Whoqol HIV Bref.
Q9 O quanto você tem medo do futuro?
amarela branca indígena
negro Outra total
n % n % n % n % n
% n %
nada 1 1,3 9 11,8 1 1,3 28 36,8 1
1,3 40
52,6
muito pouco 0 0,0 3 3,9 0 0,0 4 5,3 0
0,0 7 9,2
mais ou menos 0 0,0 0 0,0 0 0,0 7 9,2 0
0,0 7 9,2
bastante 0 0,0 0 0,0 1 1,3 14 18,4 0
0,0 15
19,7
extremamente 0 0,0 2 2,6 0 0,0 5 6,6 0
0,0 7 9,2
total 1 1,3 14
18,4 2 2,6 58 76,3 1
1,3 76
100,0
Fonte: Levantamentos obtidos no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
A Tabela 05 apresenta a perspectiva de futuro das pessoas entrevistadas, podendo-
se observar que 52,6% dos participantes não apresentam maiores preocupações com o seu
futuro, o que pode refletir em uma desesperança frente a uma doença para a qual ainda não
se descobriu a cura, valendo ressaltar que esse argumento não foi investigado entre os
participantes do estudo. A despreocupação com o futuro foi captada por Almeida e
Labroncini (2007), pois um de seus entrevistados afirmou: “Eu tenho aids, e qual o destino
de quem tem AIDS? Não é morrer?”
Neste estudo, os participantes não foram avaliados segundo a renda individual e/ou
familiar, mas ao se observar o nível de escolaridade dos sujeitos é possível perceber que os
mesmos possuem pouco grau de instrução e, como conseqüência, menor poder aquisitivo,
em detrimento das exigências do mercado de trabalho que requerem cada vez mais pessoas
qualificadas. Portanto, ao analisar a questão sob esse prisma, pode-se fazer analogia ao
estudo de Schilkowsky, ao afirmar que
A vergonha, a negação e outras defesas contra o sofrimento psíquico emergem
dos elementos condicionantes do abandono do tratamento. Tais condicionantes,
aliados à frequente situação de miséria ou às precárias condições
socioeconômicas, às dificuldades de construção de redes sociais de apoio e à
intolerância aos anti-retrovirais, impedem a construção de um imaginário motor
15
15
Um imaginário que favorece a criatividade, a espontaneidade, que permite a utopia, a experimentação e o
pensamento questionador (AZEVEDO, BRAGA NETO E SÁ, 2002, apud SCHILKOWSKY, 2008).
74
que permita a ação, o não aprisionamento na impotência e a construção de
projetos ou o desenho de um futuro (SCHILKOWSKY, 2008, p. 86).
O reflexo das dificuldades socioeconômicas como o desemprego ou as relações de
trabalho extremamente precárias, a falta de moradia, a violência urbana e a falta de uma
rede social de apoio confirmam, de acordo com a autora supracitada, uma situação de
desamparo de tal ordem que, muitas vezes, chega até a obscurecer ou a superar, em
dramaticidade, o real significado de se viver com o HIV e com a aids.
O desamparo social no processo de construção de perspectivas futuras é semelhante
aos relacionados às questões de estigma, preconceito ou impacto do diagnóstico. Na
verdade, todos esses fatores se apresentam de forma interligada, uma vez que o próprio
estigma acaba conduzindo o sujeito à exclusão social, sendo a exclusão social “um
fenômeno multidimensional que superpõe uma multiplicidade de trajetórias de
desvinculação” (WANDERLEY, 2001, p. 23).
Segundo Wanderley (2001) a “fragilização” dos vínculos sociais, como a família,
os vizinhos e os amigos, podem produzir rupturas que viriam conduzir o indivíduo ao
isolamento social e à solidão. Dessa forma, ao seguir os pressupostos dos autores em foco,
pode-se inferir que os participantes deste estudo não têm medo do futuro, talvez pelo fato
de se sentirem socialmente excluídos. Portanto, não vêem futuro, e se não vêem futuro, não
há necessidade de se preocupar ou de ter medo “dele”.
Tabela 06 Freqüências e medidas descritivas acerca da importância da
religião/espiritualidade para lidar com fatores estressantes atuais.
Quão importante tem sido a religião/espiritualidade para lidar com os
fatores estressantes atuais de sua vida?
n %
Não é importante 3 3,9
Um pouco importante 1 1,3
Relativamente importante 5 6,6
Importante 24 31,6
Muito importante 43 56,6
Total 76 100,0
Fonte: Levantamentos obtidos no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
Existe uma incessante busca do homem para encontrar um sentido para a sua vida.
Por isso, torna-se tão importante o conhecimento sobre o sentido da vida mediante a
prática das crenças pessoais e da força que emana delas para enfrentar e entender as
75
dificuldades vividas, e assim vencê-las (VILARTA; GONÇALVES, 2004). A
espiritualidade na vida do homem favorece a busca do equilíbrio interior e,
consequentemente, a qualidade de vida.
Cury (2004) enfatiza que a ou espiritualidade pode e deve dar uma importante
contribuição para o desenvolvimento da qualidade de vida. E, para expandir a qualidade de
vida, a espiritualidade deve favorecer o desenvolvimento das funções mais importantes da
inteligência como: aprender a expor e não impor as idéias; pensar antes de reagir;
capacidade de tolerância e solidariedade; o amor pela vida e pelo ser humano e sabedoria.
Portanto, a religião e/ou espiritualidade torna-se um fator de extrema relevância na vida de
algumas pessoas, independente de sua situação de saúde.
No caso da população estudada, o aspecto subjetivo do ser portador do vírus HIV
também se confirma, na medida em que a Tabela 06 revela que 56,6% dos participantes do
estudo consideram que a religião/espiritualidade torna-se muito importante em sua vida,
seguidos de 31,6 % que acham a religião/espiritualidade importante. A religião pode ser
considerada uma importante âncora que dará suporte em muitos sentidos para o ser
humano, uma vez que
oferece recursos sociais de reestruturação: nova rede de amizades, ocupação do
tempo livre em trabalhos voluntários, atendimento "psicológico" individualizado,
valorização das potencialidades individuais, coesão do grupo, apoio
incondicional dos líderes religiosos, sem julgamentos e, em especial, entre
evangélicos, a formação de uma "nova família" (SANCHEZ, NAPPO, 2008, P.
271).
Calvetti, Muller e Nunes (2008) afirmam que as crenças religiosas e espirituais têm
demonstrado ser um recurso auxiliar no enfrentamento de eventos estressores, como o
processo saúde-doença e o tratamento da saúde na Psicologia da Saúde. Em estudo
realizado pelos autores em foco, o bem-estar religioso foi percebido como um apoio social,
contribuindo para uma sensação de conforto, que tende a auxiliar na convivência com o
HIV/AIDS. Nesse enfoque, pode-se pensar que, pela enfermidade, as pessoas tendem a
desenvolver religiosidade como uma fonte de apoio social.
Os autores acrescentam que o bem-estar espiritual pode ser destacado como uma
das variáveis presentes na capacidade de resiliência
16,17
e protetor da saúde. Essa
16
Capacidade de vencer as dificuldades, os obstáculos, por mais fortes e traumáticos que elas sejam
(BARBOSA, 2006).
76
capacidade pode auxiliar as pessoas que vivem com HIV ou aids na manutenção e
diminuição de agravos do processo saúde-doença, contribuindo para o desenvolvimento da
qualidade de vida. É interessante destacar que as pessoas soropositivas, em sua maioria,
consideram-se não-doentes, mas com uma boa saúde. Nesse sentido, a resiliência pode ser
desenvolvida também conforme a vivência e o enfrentamento de situações adversas, como,
por exemplo, o HIV/AIDS, levando a pessoa ao seu fortalecimento.
Na Tabela 7 a seguir, encontra-se o desdobramento da importância da
religião/espiritualidade de acordo com a “raça”/cor dos participantes.
Tabela 07 Distribuição dos participantes (n=76) da pesquisa segundo o desdobramento
da importância da religião/espiritualidade para lidar com fatores estressantes atuais em
relação a “raça”/cor.
Importante Muito
importante
Não é
importante
Relativamente
importante
Total
n % n % n % n % n %
Amarela 0 0,0 1 1,3 0 0,0 0 0,0 1 1,3
Branca 5 6,6 5 6,6 2 2,6 2 2,6 14 18,4
Indígena 0 0,0 2 2,6 0 0,0 0 0,0 0 2,6
Negra 18 23,7 35 46,1 1 1,3 4 2,5 58 76,3
Outra 1 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 1,3
Total 9 22,5 27 67,5 2 5,0 2 5,0 40 100,0
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
Esse dados mostra que 69,8 % das pessoas conferem maior significância, no que se
refere à religião/espiritualidade, no manejo de situações estressantes, são negras, quando
somado os valores de 23,7 % como importante e 46,1 % como muito importante.
Viana et al (2007, p.48), trabalhando com estudantes de escolas públicas de Minas
Gerais, relacionaram o “baixo percentual de estudantes que usam preservativos estão entre
aqueles que creditam uma grande importância a religião, um resultado que não chega a
surpreender desde que muitas religiões brasileiras proíbem o uso de contraceptivos”.
Embora os autores não tenham entrecruzado a cor da pele com a importância dada a
religião, pode ser encontrado no trabalho que um maior percentual de estudantes não
brancos (58,5 %) mantêm relações sexuais desprotegidas, com parceiras eventuais. Dados,
17
Propriedade que alguns corpos apresentam de retornar a forma original após submetidos a uma deformação
elástica (HOUAISS; VILAR, 2001, p. 2437).
77
tabulados a partir do censo do IBGE do ano 2000, referentes à composição da população
mineira, nos dão conta de que a mesma é formada por 53,5% de brancos. O percentual de
não brancos, constituído por: pretos (7,8), pardos (37,6), amarelos (0,1) e indígenas (0,2) é
de 45,7%. Do total de não brancos, a grande maioria, 45,4%, é formada por pretos e
pardos. Esses dados podem apontar para uma maior vulnerabilidade desses grupos
populacionais.
Tabela 08 Freqüências e medidas descritivas das facetas do domínio espiritualidade X
“raça”/cor referente a questão 24 do Whoqol HIV Bref.
Quão satisfeito(a) você está consigo mesmo?
amarela branca indígena
negro
Outra total
n % n % n %
n %
n % n %
muito insatisfeito
0 0,0 0 0,0 0 0,0
4 5,3
0 0,0 4 5,3
insatisfeito 0 0,0 0 0,0 0 0,0
10 13,2
0 0,0 10
13,2
nem satisfeito
nem insatisfeito 0 0,0 7 9,2 1 0,0
15 19,7
1 1,3 24
31,6
satisfeito 1 1,3 7 9,2 1 2,5 20 26,3 0 0,0 29
38,2
muito satisfeito 0 0,0 0 0,0 0 0,0
9 11.8
0 0,0 9 11,8
total 1 1,3 8 18,4 2 2,6
58 76,3
1 1,3 76
100,0
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
No que diz respeito ao nível de satisfação que o indivíduo tem consigo mesmo, a
Tabela 08 revela que a maioria dos entrevistados representada por 38,2 %, estão satisfeitos
enquanto que 31,6% deles se encontram em uma situação intermediária, não estando nem
satisfeitos nem insatisfeitos. No que se refere à população negra pode-se perceber que o
percentual apresenta valores altos quanto ao nível de satisfação.
O nível de satisfação apresentado pelos participantes do estudo nos remete ao que
Faria e Seidl (2006) denomina de bem-estar subjetivo (BES), termo utilizado para referir-
se ao que as pessoas pensam e sentem em relação à própria vida. As autoras afirmam que
essa avaliação ocorre quando a pessoa faz julgamentos sobre sua vida como um todo ou
sobre aspectos específicos a exemplo das condições de saúde, lazer ou trabalho, incluindo
neste ínterim componente afetivos. Dessa forma, consideram que são componentes do BES
a satisfação com a vida, o afeto positivo ou prazeroso e o afeto negativo ou desprazeroso.
Os componentes afetivos do BES ainda de acordo com Faria e Seidl (2006),
referem-se à presença de afetos positivos em relação aos afetos desprazerosos. Sendo esses
componentes caracterizados por emoções e sentimentos específicos, como alegria,
78
exaltação, contentamento, orgulho, afeição e felicidade, para os afetos positivos; culpa,
vergonha, tristeza, ansiedade, preocupação, raiva, estresse, depressão e inveja, no que
concerne ao afeto negativo.
Os dados apresentados na Tabela 08, também podem levar a uma reflexão acerca
do interesse por pesquisas em psicologia relacionada a autoestima. Nesse sentido, Seidl et
al (2007) afirmam que a autoestima é um componente da personalidade que se caracteriza
pela avaliação que a pessoa faz de si mesma. A autoestima pode se tornar perigosa que,
de acordo com as autoras, sentimentos de menos valia podem favorecer a negligência nos
cuidados de saúde, enquanto auto-estima elevada pode levar a crenças de invulnerabilidade
pelo fato de a pessoa possuir sentimentos excessivamente positivos sobre si mesma.
79
5
55
5
REPRESENTAÇÃO DE DEUS PARA OS PORTADORES DE HIV/AIDS
REPRESENTAÇÃO DE DEUS PARA OS PORTADORES DE HIV/AIDSREPRESENTAÇÃO DE DEUS PARA OS PORTADORES DE HIV/AIDS
REPRESENTAÇÃO DE DEUS PARA OS PORTADORES DE HIV/AIDS
“Os ignorantes são mais felizes, eles não sabem quando vão morrer eu não...
eu sei que eu tenho um encontro marcado.
As pessoas esquecem o que precisam fazer, eu não posso me dar esse luxo.
Faço tudo caber nos meus próximos poucos dias. Todas as idéias que eu teria,
as pessoas que eu conheceria, o que eu ainda fosse cantar... Estou grávido,
mas não posso esperar.
O tempo não pára e a gente ainda passa correndo, eu fiquei aqui, tentando
agarrar o que eu puder... Ando fraco tem um mundo ao redor que a gente
nem percebe.
To ficando magro e pequeno para as minhas roupas.
Sinto que estou reunindo as minhas coisinhas, me concentrando, se pudesse
guardava tudo numa garrafa e bebia de uma vez.
Penso no que vai ficar de mim
Eu, só sei insistir!”
Cazuza
80
ara uma melhor compreensão do estudo e por considerar que a fala dos
respondentes é de suma importância, por se tratar da subjetividade relacionada
à percepção do que representa Deus para os participantes do estudo, optou-se
por analisá-la através de uma abordagem qualitativa, pela técnica de Discurso do Sujeito
Coletivo de Lefévre; Lefévre e Teixeira (2000), para a questão relacionada a essa
subjetividade. Porque se compreende que a fala do indivíduo extrapola a quantidade das
expressões, além disso, André (1995) afirma que a abordagem qualitativa assume a missão
de compreender e interpretar a conduta e os processos sócioculturais da sociedade,
fundamentando-se nos valores e nas atitudes de que depende a participação individual e
coletiva na vida social.
Reforçando o exposto nas considerações metodológicas a análise do discurso dos
sujeitos participantes deste estudo emergiu do questionamento: para você o que é Deus? A
partir da análise das respostas surgiram sete (07) idéias centrais que estão apresentadas a
seguir.
Expressões chaves que embasaram a idéia central 1 diante da questão: para você, o
que é Deus?
EXU - sexo feminino, 57 anos, religião católica, cor autodeclarada morena É tudo, sem
Deus não somos nada, é uma maravilha, sem Deus não sobrevivo”.
‘ADONAY sexo masculino, 40 anos, religião católica, cor auto-declarada branca “Deus é
o meu amparo para os momentos de solidão, é a luz no final do túnel”.
‘EL - sexo feminino, 36 anos, religião evangélica, etnia indígena “Temos sempre que
agradecer e colocá-lo sempre à frente porque Ele é tudo, é a minha vida(...)”.
OGUN - sexo masculino, 54 anos, religião católica, cor autodeclarada parda “Ele é quem
nos guia é uma maravilha”
OBÁ - sexo feminino, 47 anos, religião evangélica, cor auto-declarada morena “É a
esperança de um novo amanhã, sem Ele eu não sou ninguém (...)”.
ORIXALA - sexo feminino, 57 anos, religião Umbandista, cor autodeclarada parda “Eu
acredito em Deus, e ainda consigo muita coisa por causa dele(...)”.
P
81
Idéia Central 1 Discurso do sujeito coletivo
Deus é tudo
Deus para mim é tudo, sem Deus não somos nada,
porque Ele é uma maravilha com o qual conto para
minha sobrevivência, é o meu refúgio para os momentos
de solidão, é o meu amparo, é a luz no final do túnel. Por
Ele ser tudo, temos que agradecer e colocá-lo sempre na
frente, porque Ele é minha vida, é maravilhoso, durante o
tratamento tenho Jesus no coração, sinto que tenho mais
saúde, Ele é quem nos guia, sem Deus não sobrevivo, é o
motivo da minha existência, sem Ele eu não sou ninguém.
E por acreditar e ainda consigo muita coisa por causa
dele.
Quadro 1- Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do estudo em resposta a questão
Para você, o que é Deus, onde Deus é percebido como “tudo”.
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
Análise do discurso
A idéia central 1, do discurso do sujeito coletivo, sugere que os participantes,
evangélicos(as), católicos(as) e Umbandista, entrevistados(as) no presente estudo,
imaginam Deus como um ser que parece indissociável para os momentos de angústia, de
solidão ou de desamparo, embora observe-se uma pequena diferença na intensidade desse
discurso, quando além da fala, observa-se o sexo da pessoa entrevistada, pois a visão de
um Deus sem o qual não se é ninguém, ou ligado a sobreviência e ao tudo na vida mostra-
se ligado as entrevistadas do sexo feminino. O discurso masculino, por sua vez tráz um
Deus como um guia, um indicador de um caminho.
Diyer (2003, p. 26), analisando o pensamento de Jung sobre Deus, percebe que
sempre que se fala de assuntos religiosos, transporta-se a um mundo de imagens que
aponta para algo incapaz de ser expresso em palavras. O autor afirma que, segundo Jung,
ao dizermos a palavra Deus, expressamos um conceito ou imagem verbal que sofreu
mudanças com o tempo e não se sabe se tais mudanças afetam apenas os conceitos e
imagens ou o próprio indizível. O autor acrescenta ainda que “afinal de contas, podemos
imaginar Deus como um fluxo eterno de energia vital que indefinidamente muda de forma,
82
com tanta facilidade, que podemos imaginá-lo como uma essência eternamente imutável e
inamonível”.
Em uma análise da proposta de Eliade realizada por Possebon (2006), verifica-se
que o estudioso dos povos primitivos dois modos de ser no mundo, denominado de
profano e religioso. Sendo que o modo religioso dominou os povos da antiguidade,
perpetuando-se até os dias de hoje. Nesse sentido, o autor define o que é o homem
religioso.
Segundo Possebon (2006), o homo religiosus é aquele que vive de maneira plena a
experiência do sagrado, dessa forma torna-se predisposto a crer que qualquer manifestação
na natureza que se apresente como diferente, terrível, assustadora e superior à experiência
do quotidiano, dá-lhe a certeza da força e do poder de sua própria existência, integrando-o
ao mundo real, por oposição ao não-real ou pseudo-real; é o que se denomina hierofania.
Dessa forma, todos os aspectos importantes de sua existência são vistos como divindades:
o chão onde pisa; o mar em que navega; os movimentos do ar que renovam a estação; o
raiar do dia; a escuridão noturna; a desordem do caos.
A partir dessa leitura, fazendo uma conexão com os dados apresentados, pode-se
perceber que a concepção da hierofania ficou arraigada até hoje, suscitando no imaginário
das pessoas espiritualizadas ou pertencentes a alguma religião que Deus é tudo como a
idéia central desse discurso coletivo representa. Essa percepção a respeito de Deus foi
também captada por Leal (2005) que trabalhou com gestantes soropositivas, o que sugere
que tal percepção não seja influenciada pelas construções de gênero, uma vez que a mesma
se expressa em homens e mulheres, refletindo um sentimento de busca de segurança frente
a uma doença estigmatizante e ainda sem cura.
No campo das representações espirituais, o significado da presença de Deus, ou do
próprio Deus como representando tudo, pode estar aliado ao fato de que a ou a crença
em algo se torna verdadeiro. Acerca da concepção de crença, podemos nos ancorar na
afirmativa de que “uma crença é direcionada sempre a um determinado estado de coisas”
(MOSER; MULDER; TROUT, 2004, p. 48). Dessa forma, a crença está imbuída de
propriedades, e em virtude dessa propriedade, a crença é intencional e, de um modo mais
abrangente ela tem significado. De acordo com a seguinte analogia:
83
Assim como o significado de uma frase é dado pela proposição que expressa, o
significado de um estado mental como uma crença, é proporcionado pelo estado
de coisas, ou a proposição que tem de existir para que a crença seja verdadeira
(MOSER; MULDER; TROUT, 2004, p. 48).
Portanto, a partir do enfoque de que a crença possui uma característica intencional,
as crenças podem ser vistas como representativas, que funcionam como uma estratégia
pelas quais se retratam o mundo e a forma como ele é visto, representando a configuração
do contexto que direciona ao transcendente. Os autores em foco argumentam que pouco
tempo os filósofos e psicólogos passaram a estudar a crença em diversos papéis cognitivos:
na formação de atitudes; na indução; na sua contribuição para os desvios cognitivos entre
outros processos psicológicos, levando os estudiosos ao consenso de que as crenças são
estados que contêm informações, sendo que o tipo de informação contida nas crenças
depende do modo pelo qual essas crenças representam o mundo.
Expressões chaves que embasaram a idéia central 2 diante da questão: para você, o
que é Deus?
OXOSSI - sexo masculino, 39 anos, religião católica, cor autodeclarada parda Deus me
auxilia em tudo, me mostra os erros, é tudo de bom(...) mas Ele só vem se você chamar (...)
converso muito com Ele, porque Ele é pai, amigo”.
OXUMARÉ - sexo feminino, 39 anos, religião católica, cor autodeclarada morena “(...)
Deus é o meu refúgio, para me fazer feliz, agradeço por mais um dia porque me da
tranqüilidade para me libertar dos problemas, ele abençoa minha vida sentimental (...)”.
Idéia Central 2 Discurso do sujeito coletivo
Deus como um amigo
Deus me auxilia em tudo, me mostra os erros, é tudo de bom,
mas Ele vem se você chamar, assim eu converso muito com
Ele, porque Ele é pai, amigo. Como amigo Deus é o meu
refúgio, para me fazer feliz, agradeço por mais um dia porque
me da tranquilidade para me libertar dos problemas, ele
abençoa minha vida sentimental.
Quadro 2- Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do estudo em resposta à questão
para você, o que é Deus, em que Deus é percebido como um “amigo”.
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
Análise do discurso
84
Na idéia central 2 do discurso do sujeito coletivo, os participantes do estudo
percebem Deus como um amigo, com o qual se pode “contar” a qualquer momento. No
entanto, o que chama a atenção é a parte do discurso (...) Ele só vem se você chamar (...).
De acordo com Dyer (2003), é apenas através da psique humana que podemos
estabelecer que Deus age sobre nós. O autor enfatiza que esse conceito diz respeito não
apenas às experiências originadas na própria psique, mas às experiências externas que são
processadas por ela.
Nesse contexto utilizou-se como suporte para compreender as falas do discurso da
idéia central 2 a teoria da adaptação, por considerar que o indivíduo se adapta às situações,
no sentido de aliviar seu estresse, buscando em Deus essa adaptação. De tal modo,
encontra-se em Oliveira e Araújo (2002) considerações acerca dessa teoria.
A teórica Roy (1999), apud Oliveira e Araújo (2002) menciona que a visão da
pessoa, como um sistema adaptativo, possui quatro elementos: o input, que são os
estímulos; os controles, que são os mecanismos de enfrentamento; o output, que são as
respostas e o feedback ou retroalimentação. O Input ou estímulos são definidos como
aqueles que provocam uma resposta e podem se originar do ambiente interno ou externo.
Por exemplo, certos eventos podem constituir estímulos internos específicos, como o nível
de adaptação.
As referidas autoras descrevem três classes de estímulos: focais, contextuais e
residuais. Os estímulos internos ou externos, que confrontam imediatamente a pessoa,
constituem os estímulos focais. Os estímulos contextuais são todos os outros estímulos
presentes na situação e que contribuem para o efeito do estímulo focal. E, por fim, os
residuais, são estímulos presentes, ou não na pessoa, relevantes à situação, mas cujos
efeitos são indefinidos.
Nesse panorama, Oliveira e Araújo (2002) afirmam que os estímulos residuais
ativam mecanismos de enfrentamento que irão servir de controle, sendo que esses
mecanismos podem ser inatos ou adquiridos, servindo para responder às mudanças do
ambiente. Assim os mecanismos de enfrentamento inatos são geneticamente determinados,
sendo geralmente vistos como processos automáticos, com respostas automáticas,
inconscientes e inatas. os mecanismos de enfrentamento adquiridos são desenvolvidos
85
mediante estratégias, como a aprendizagem, sendo a resposta deliberada, consciente e
adquirida.
Nesse processo, tais mecanismos irão desencadear respostas (output), que podem
ser classificadas em adaptativas e ineficazes. As respostas denominadas de adaptativas são
todas aquelas que promovem a integridade da pessoa, em termos de metas de
sobrevivência, crescimento, reprodução e controle; as respostas ineficazes, são as que
interrompem ou não contribuem para essa integridade (OLIVEIRA; ARAÚJO, 2002).
Em consideração ao indivíduo, como um sistema adaptativo, o modelo de Roy, na
interpretação de Oliveira e Araújo (2002), categoriza os mecanismos de enfrentamento em
inato e adquirido, dentro de dois subsistemas maiores: o regulador e o cognoscente. O
subsistema regulador recebe estímulos provenientes do meio interno da pessoa,
processando respostas, automaticamente, através dos sistemas químico, neuronal e
endócrino. E o subsistema cognoscente recebe estímulos tanto do ambiente interno quanto
do externo, respondendo aos mesmos através de quatro canais cognitivos emocionais: o
perceptual e processamento de informações, representando a atividade de atenção
seletiva, codificação e memória; a aprendizagem, envolvendo processos de imitação,
reforço e "insight"; o julgamento, voltado para solucionar problemas e tomar decisões; e a
emoção, através da qual a pessoa busca o alívio da ansiedade e afeto.
Relacionando o processo de adaptação da teórica em foco com a idéia central 2,
elencada das falas dos entrevistados, pode-se perceber, que houve uma adaptação entre
aquilo que os sujeitos julgam certo ou errado, transferindo a responsabilidade para um ser
imbuído de poderes, mas na verdade cada ser humano investido de sua inteligência possue
as suas próprias respostas, no entanto, necessitam de uma força espiritual que lhes auxiliem
na compreensão de sua própria vida, buscando nessa dimensão alívio para seus estresses.
Nesse sentido, os indivíduos, percebendo Deus como um amigo, procuram um “caminho”
mais fácil para encontrarem sua válvula de escape, “válvula” necessária a todo ser humano,
onde pode descarregar todas as suas angústias, anseios, preocupações, na tentativa de não
guardar tudo para si, não se fechar para o mundo carreado de “coisas” pesadas que o façam
sofrer.
Expressões chaves que embasaram a idéia central 3 diante da questão: para você o que
é Deus?
86
IANSÃ - sexo feminino, 35 anos, religião evangélica, cor auto-declarada morena (...)
Temos que crer em Deus, o que o homem não pode só Jesus na vida da gente”.
OSSÃE - sexo feminino, 35 anos, religião evangélica, cor auto-declarada morena Temos
que nos conformar sem questionar nada em amanhecer vivo mais um dia para
caminhar na vida (...)”.
NANÃ - sexo feminino, 31 anos, religião evangélica, cor auto-declarada parda “(...)Ele é
quem determina o dia em que agente nasce e quando vamos morrer(...)”.
Idéia Central 3 Discurso do sujeito coletivo
Deus como um Ser
inquestionável
Temos que crer em Deus, o que o homem não pode Jesus
na vida da gente, temos que nos conformar sem questionar
nada, só em amanhecer vivo mais um dia para caminhar na
vida, tudo isso basta para sentido a tudo. Ele é quem
determina o dia em que agente nasce e quando vamos
morrer, portanto não podemos e nem devemos questioná-lo.
Quadro 3- Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do estudo em resposta a questão
para você o que é Deus, onde Deus é percebido como um “ser inquestionável”.
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008.
Análise do discurso
De acordo com a idéia central 3 do discurso do sujeito coletivo, os participantes do
estudo veem Deus como um “ser” que não pode ser questionado. A inquestionabilidade da
vontade de Deus mostrou-se associada a três mulheres de ascendência negra e evangélicas.
As três falas reforçam a perspectiva de gênero previamente observada na análise do
discurso 1. A cristandade evangélica cobra, com mais intensidade, uma postura menos
empoderada das mulheres que professam essa fé. Paiva (2000) aponta para a
vulnerabilidade desse grupo, principalmente para aquelas ligadas a linhas mais
fundamentalistas, nas quais se observa a proibição de participação das mesmas em
programas educativos.
Dyer (2003), recorrendo a Jung, diz que “Deus nunca foi inventado, mas ocorreu
como experiência psicológica, e ainda ocorre”. No entanto, o autor alerta que no século
XIX as pessoas tinham suposições sobre Deus a partir do pensar consciente delas, e uma
vez que Deus era objeto de culto, algo definido deveria ser dito sobre Deus. Portanto esses
87
atributos da doutrina cristã, segundo Dyer (2003), incluíam onipresença (estar em todos os
lugares e coisas), onipotência (poder sobre todas as coisas), onisciência (saber todas as
coisas), imutabilidade (imutável e inalterável), eterno (existindo sem princípio nem fim),
criador e mantenedor do mundo, e ser moralmente perfeito.
No discurso coletivo da idéia central em questão, percebe-se que, apesar de tudo,
fica permeado certo sentido de vida, o que nos leva a contextualizar o que Frankl (2007)
denominou de logoterapia, cuja palavra logos, originada do grego significa “sentido”. A
logoterapia tem como base a busca de significados da existência do ser humano. Nesse tipo
de terapia, o homem é livre, responsável e tendo consciência de sua responsabilidade busca
um sentido para sua vida.
Em uma análise existencial Frankliana, nota-se que “suas bases são a
responsabilidade e a liberdade incondicionada, sendo a liberdade uma expressão do que
de mais humano em cada ser que ao assumir a liberdade vive as angústias do seu
cotidiano” (LIMA; ROSA, 2008, p. 549). Nota-se nessa afirmação que o ser humano
necessita está consciente de suas atitudes, no entanto, segundo Frankl (2007), na verdade,
aquilo que chamamos de consciência se estende até uma profundidade inconsciente,
significando dizer que a consciência tem suas origens em um fundo inconsciente. O autor
afirma que as grandes e autênticas decisões na existência humana ocorrem sempre de
maneira irrefletida e, portanto, inconsciente, nesse sentido, na sua origem, a consciência
está imersa no inconsciente.
Para Frankl (2007), existe uma espiritualidade inconsciente e uma religiosidade
inconsciente inserida nessa espiritualidade, no sentido de um relacionamento inconsciente
com Deus, de uma relação com o transcendente, imanente do ser humano. Essa
inconsciente da pessoa, sugerida por Frankl, está englobada e incluída no conceito de seu
inconsciente transcendente, significando que sempre houve em nós uma tendência
inconsciente em direção a Deus, que sempre tivemos uma ligação intencional, embora
inconsciente, com Deus, e é justamente esse Deus que Frankl denomina de Deus
inconsciente.
No ponto em que o homem percebe ou descobre a transcendência, poderá buscar
um sentido de vida nessa transcendência, em um relacionamento com o divino. Lima e
Rosa (2008) afirmam que as pessoas tornam-se plena de e esperança na vida quando
88
acreditam em um sentido, porém é no sentimento de angústia intensa que a aparece,
sendo a a esperança em um futuro o qual faz emergir o sentido da vida e a crença em
Deus.
Dessa forma pode-se entender que o Deus que vive em uma intimidade de uma
pessoa é uma força que emerge quando todas as outras desaparecem, caracterizando o que
se denomina de dimensão noética
18
que, segundo Gomes (1987), é uma dimensão que
revela a sensação que surge como uma luz sustentadora e que parecia estar escondida no
mais íntimo de cada um. Lima e Rosa (2008) acrescentam que, na perspectiva da dimensão
noética, o ser humano é constituído de três dimensões: a fisiológica; a psicológica e a
noológica, as quais, respectivamente, constituem o corpo, a alma e o espírito, dessa forma
a pessoa torna-se um ser indivisível, um total de todas as partes. É importante acrescentar
que o espiritual é compreendido como uma dimensão especificamente humana, muito
embora não seja a única, porque o homem é ao mesmo tempo uma unidade e uma
totalidade.
Portanto, como questionar um ser que, segundo as entrelinhas do discurso
analisado, lhe sustentação para caminhar na vida”, no sentido de que ainda resta uma
esperança? uma perspectiva futura? Desse modo, é preferível não questioná-lo, na certeza
de que Deus tudo sabe.
Expressões chaves que embasaram a idéia central 4 diante da questão: para você o que
é Deus?
OGUM MEGÊ - sexo masculino, 31anos, religião evangélica, cor autodeclarada parda
“(...) Pedir misericórdia e isto que aconteceu foi fruto do meu próprio pecado(...)”.
Idéia Central 4 Discurso do sujeito coletivo
Deus como um Ser
castigador mas que perdoa
“Diante da situação temos que pedir misericórdia a Deus,
porque isto que aconteceu foi fruto do meu próprio
pecado, fruto das coisas mundanas, que só nos leva a
pecar, por isso temos que abaixar a cabeça e a
18
A palavra noético de origem grega nous, significa mente e espírito, esse espiritual no homem constitui-se
na sua personalidade (HUF, 1999)..
89
misericórdia de Deus”
Quadro 4- Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do estudo em resposta a questão
para você o que é Deus, onde Deus é percebido como um “ser castigador mas que perdoa”.
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008
Análise do discurso
A idéia central 4 do discurso do sujeito coletivo remete ao medo e à esperança de
ser perdoado, sendo a percepção da soropositividade como um castigo, uma visão também
descrita por Merchán-Hamann (1995), ao trabalhar com adolescentes de classe popular do
Rio de Janeiro, que descreviam a aids como um castigo por excessos e pecados, e por
Meneguel et al (2008), que trabalharam com mulheres de classe popular no Vale dos
Sinos.
Essa idéia central remete ao que Dyer (2003) chama de opostos, afirmando que os
opostos são o amor e o temor, que pressupõem uma contradição aparentemente
irreconciliável.
Tal suposição ainda deve ser esperada sempre que somos confrontados com uma
imensa energia. Se supormos que a deidade
19
é um fenômeno dinâmico em nossa
experiência, sua origem deve ser uma oposição ou um paradoxo. Se tentarmos
imaginar o que a total aceitação de tal imagem significa descobriremos logo por
que a maioria das pessoas tem medo dela” (DYER, 2003, p. 39).
Ferreira, Almeida e Rasera (2008), em uma análise acerca da vivência do
diagnóstico do câncer de mama entre casais, sugerem que a partir do surgimento do
cristianismo, houve uma influência relevante acerca do significado do câncer, ao moralizá-
lo, associando-o a um doente vitimizado por uma enfermidade que podia ser um castigo até
justo e adequado. No século XIX, a idéia da doença como punição foi substituída pela
noção de que a enfermidade expressa o caráter do doente. Essa versão coloca o doente não
mais na posição de vítima, mas de culpado pela sua doença. Nesse contexto, o doente passa
a ser visto como um indivíduo que não conseguiu dar vazão às suas emoções, isto é, uma
pessoa que fracassou em sua expressividade.
De acordo com os referidos autores, a noção de que o doente é culpado pela sua
enfermidade, origina-se na crença de que o câncer seria uma doença adquirida por meio da
sujeira, assim como a sífilis, uma “sujeira” não do corpo, mas da alma também. Dessa
19
Divindade mitológica; Deusa (FERREIRA, 1999).
90
forma, o doente teria de suportar seu sofrimento de forma isolada até a morte, por sofrer de
uma enfermidade inglória. O que pode nos remeter ao fato de que o doente de aids se
enquadre nesse patamar, onde ele se sinta culpado de estar na situação de “contaminado”,
sugerindo que a pessoa vítima da epidemia tenha sido castigada por cometer atitudes que a
levaram à condição de soropositivo.
Apesar de Aquino, Zago (2007) afirmarem que a busca religiosa em pacientes com
doenças graves não deva ser entendida como uma forma de fuga da realidade, mas como
uma possibilidade de vislumbrar um futuro a despeito do sofrimento causado pela doença,
ou ainda uma ajuda no processo de cura e de aceitação da doença, pode-se inferir que,
junto à religião, a disponibilidade de outras formas de construção de sentidos para a doença
possibilita ao doente, e até os seus familiares, um maior empoderamento para vivenciarem
essa experiência.
As falas dos participantes do estudo na idéia central em foco (Deus como um ser
castigador) deixa entremeada a idéia de um sentimento de angústia, diante da situação de
se verem acometidos por uma doença que teve no seu bojo uma história de estigmatização
e acusações de uma vida leviana. Werle (2003), em um estudo sobre a morte na
perspectiva da filosofia da existência de Heidegger, destaca que um traço totalizante que
define a essência do ser-humano se encontra no conceito de angústia, enquanto disposição
compreensiva que oferece o solo fenomenológico-hermenêutico para a apreensão explícita
da totalidade originária do Dasein
20
.
Sob esse ponto de vista, Werle (2003) afirma que a angústia não é somente um
fenômeno psicológico e ôntico, isto é, que se refere somente a um ente ou a algo dado, e
sim sua dimensão é ontológica, pois nos remete à totalidade da existência como ser-no-
mundo. Nesse sentido, a angústia assume em Heidegger, ainda de acordo com Werle
(2003), um cunho existencial essencialmente humano: o homem se angustia, não o
animal, bem como apenas o homem existe e tem uma compreensão do ser. Fazendo uma
analogia, o autor diz: O rochedo é, mas não existe, o anjo é, mas não existe, somente o
homem existe. No entanto, o estudioso ressalta a existência de ideologias diferentes
20
Heidegger afirma que a questão do ser não se coloca senão ao ente privilegiado que é capaz de questionar o
ser, que possui uma compreensão do ser (seinverständnis). Este ente é o homem, que Heidegger chama de
“ser-aí” (Dasein), o homem enquanto um ente que existe imediatamente em um mundo. (WERLE, 2003, p.
99).
91
segundo alguns pensadores, em análise comparativa entre Kierkegaard e Heidegger, e
afirma que a divergência entre os dois filósofos reside no fato de que em Kierkegaard a
angústia revela o ser finito, o nada de sua existência diante da infinitude de Deus, do
caráter eterno de Deus, ao passo que Heidegger abandona essa perspectiva teológica e
pensa a angústia apenas como fenômeno existencial da finitude humana.
É interessante ressaltar, segundo Werle (2003), que o homem tem medo, sendo que
o medo é uma disposição central na nossa existência pelo fato de que manifesta o mundo
no ato de fuga. No entanto, embora o homem tema por algo que é objetivo no mundo, o
seu temor não é o objeto fora dele, mas sim ele mesmo. O homem somente teme por algo
determinado porque em última instância é ele mesmo afetado e o maior interessado, é
como se o medo se voltasse para quem teme e não para o que se teme. Nesse contexto, o
medo volta-se apenas aparentemente para “fora”; na verdade, ele se dirige ao ser íntimo.
Diante dessa contextualização, os participantes do estudo revelam o medo de ser
castigado, não sob o ponto de vista das consequências da doença, mas no ponto de vista de
seus valores, dos seus preceitos religiosos, do que eles acreditam. Gadelha (2001) afirma
que o corpo do portador do vírus da aids é construído socialmente, portanto, é um corpo
que deve ser vigiado, porque ele é uma ameaça social, em decorrência de um vírus que
causa uma doença sem cura. Dessa forma, o corpo passa a ser culpado, punido pelo próprio
portador o que o faz temer, ser punido pelo social em que está inserido.
Sampaio (2002) argumenta que do ponto de vista teológico, o enfrentamento dessa
questão deve fundar-se na perspectiva de um Deus identificado com a vida, e vida digna
para todas as pessoas. A autora acrescenta que essa máxima da tradição judaico-cristã
precisa ser afirmada a fim de que a negação de imagens de Deus condenatórias seja
possível, ficando evidente, pelo debate histórico da formação de um imaginário social que
vincula a saúde/doença de uma pessoa, a questões de ordem religiosa, que essa esfera de
concepções precisa ser des-construída sob pena de não avançarmos nos processos de
dignidade nas relações humanas e sociais exigidas pelo corpo soropositivo. Aspectos como
a sexualidade, o próprio sacrifício em sua atual apropriação pela lógica da economia de
mercado, como as questões de gênero, entram na sequência da reflexão no intuito de
compor um quadro de contribuições teológicas ao debate que se tem travado nas igrejas e
sociedade no que concerne à aids e seu enfrentamento.
92
Portanto, esse controle social é uma teia que se estende, cresce alicerçada, na
maioria das vezes, em fofocas de comadres, que podem repercutir em um efeito destruidor
sobre os portadores, porque lhes desqualifica socialmente, assim como pode lhes tirar a
oportunidade de novas experiências, de viver uma vida como qualquer pessoa que não tem
um vírus circulando em seu sangue. Essa cadeia de fofocas que resulta como uma rede
poderosa de controle, de vigilância, pode desencadear em uma solidão forçada, a que
muitos estão condenados se não tiverem força para lutar.
Expressões chaves que embasaram a idéia central 5 diante da questão: para você o que
é Deus?
XANGÔ - sexo masculino, 42 anos, religião católica, cor autodeclarada parda Deus é um
ser supremo que pode fazer o impossível para a minha vida”.
OXALÁ - sexo masculino, 42 anos, religião católica, cor autodeclarada parda (...) Ele
realizou várias transformações na minha vida”.
OXUM - sexo masculino, 34 anos, religião católica, cor autodeclarada parda“(...) não
tem como definir Deus, sou calmo por acreditar Nele”.
OBALUAYÊ - sexo masculino, 41 anos, religião evangélica, cor auto-declarada preta
“Para mim, no meu conhecimento é o Nosso Criador, que criou nós seres humanos e tudo
que há no céu e na terra, nosso ser supremo”.
Idéia Central 5 Discurso do sujeito coletivo
Deus como um Ser
supremo
Deus é um ser supremo que pode fazer o impossível para a
minha vida, ele realizou várias transformações na minha
vida, por isso não sabemos como definir Deus, sou calmo por
acreditar Nele. Diante de tudo, a partir do meu conhecimento
acho que Deus é o nosso Criador, porque Ele criou nós seres
humanos e tudo que no céu e na terra, portanto é o nosso
ser supremo.
Quadro 5- Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do estudo em resposta a questão
para você o que é Deus, onde Deus é percebido como um “ser supremo”.
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008
93
Análise do discurso
A idéia central 5 do discurso do sujeito coletivo revela que os participantes do
estudo veem Deus como um ser que toma decisões para suas vidas e, portanto, tem que se
acreditar nele para aceitar as eventuais circunstâncias ocorridas na vida.
Dyer (2003) em referência a Jung, diz que “Deus deve ser considerado
representativo de uma certa quantidade de energia”, que aparece projetada porque vem do
mundo exterior inconsciente. Observou que Deus é a força suprema na psicologia de uma
pessoa, sendo dessa forma o fator supremo e decisivo. O autor concebe a idéia de energia e
a sua conservação deve ser uma imagem primordial dormente nas profundezas do
inconsciente coletivo, de forma que esse conceito de poder é a primeira forma de um
conceito de Deus entre os primitivos.
Vale ressaltar, no entanto, que o conceito de energia sofreu incontáveis variações ao
longo da história, tais como “poder gico da sarça ardente e a compostura de Moisés no
Antigo Testamento, as línguas de fogo divinas descendo com o Espírito Santo no Novo
Testamento” (DYER, 2003, p. 30). O mesmo autor, fazendo uma reflexão do pensamento
de Jung, acrescenta “se, por instancia, eu faço uso de um Deus-conceito ou de um conceito
igualmente metafísico de energia, faço isso porque são imagens encontradas na psique
desde o princípio” (DYER, 2003, p. 30).
Na concepção de Deus enquanto energia pode-se fazer uma alusão a esse conceito
quando se afirma que
Esse Deus, não é um deus mágico, no sentido espiritual, mas uma energia que
aparece no momento em que todas as outras sumiram. Aparece como um alento,
uma luz alentadora que parecia estar escondida no mais íntimo de cada um. Esta
é a dimensão noética, é incorruptível e lúcida, ainda que a doença e o sofrer
sejam finitos (
LIMA; ROSA, 2008, p. 550)
.
Quanto à dimensão noética referida pelas autoras acima, pode-se recorrer a Morin
(2005) quando enfatiza que todas as sociedades humanas engendram uma noosfera, esfera
das coisas do espírito, saberes, crenças, mitos, lendas, idéias, em que os seres nascidos do
espírito, gênios, deuses, ganham vida a partir da crença e da fé. De acordo com o autor, a
noosfera é um meio condutor e mensageiro do espírito humano, pondo o ser humano em
comunicação com o mundo ao mesmo tempo em que serve de tela entre o homem e o
mundo, abrindo dessa forma a cultura humana ao mundo enquanto o encerra em sua
94
nebulosa espiritualidade, valendo ressaltar que esse fato é extremamente diverso, variando
de uma sociedade para outra, encadeando todas as sociedades.
Morin (2005) acrescenta que a noosfera é uma duplicação transformadora e
transfiguradora do real e parece se confundir com ele, neste sentido, a noosfera envolve os
seres humanos ao mesmo tempo em que faz parte deles, sem ela nada do que é humano
poderia realizar-se, mesmo sendo dependente dos espíritos humanos e de uma cultura,
emerge de maneira autônoma por essa dependência.
Sendo assim, os seres humanos permeados pelos valores apreendidos ao longo da
história, na perspectiva de doenças graves, agregam-se a essa energia transcendente
(Deus), colocando nela toda sua como uma força soberana que conduz todos os
intercalços pelos quais os indivíduos humanos têm que ultrapassar.
Levando em consideração a importância da religião ou da espiritualidade dos
participantes do estudo, relatados como muito importante
21
, observou-se um versículo da
Bíblia que descreve um Deus com poder supremo:
Porque os cavalos de Faraó, com os seus carros e com os seus cavalarianos
entraram no mar, e o Senhor fez tornar sobre ele as águas do mar; mas os filhos
de Israel passaram a enxuto pelo meio do mar (A BLIA VIDA NOVA,
2005).
O fato de a religião estar muito presente na vida da amostra estudada leva a inferir
que os participantes do estudo possuem algum conhecimento, ou alguma leitura da Bíblia.
Nesse sentido, as palavras bíblicas, levam as pessoas a fazerem reflexões, reportando o
sentido das palavras contidas no texto sagrado como forma de seguirem uma doutrina, por
acreditarem em sua religião, que no caso da amostra deste estudo foi composta em sua
maioria por católicos e evangélicos. Logo possuem como texto sagrado a Bíblia. Portanto,
o versículo apresentado representa a supremacia de Deus para os cristãos, os quais podem
recorrer a Ele como forma de conforto na explicação das “provações” inerentes aos seus
sofrimentos.
Expressões chaves que embasaram a idéia central 6 diante da questão: para você o que
é Deus?
21
Ver capítulo 4:Importância da religião/espiritualidade para lidar com fatores estressantes atuais da vida.
95
OGUM BEIRA MAR sexo masculino, 34 anos, religião evangélica, cor autodeclarada
morena(...)Deus é muito bom, depois da descoberta aceitei ele como meu salvador”
SHADDAY - sexo masculino, 48 anos, religião católica, cor autodeclarada branca É
quem me dar força para viver (...)”.
EL - sexo feminino, 36 anos, religião evangélica, etnia indígena “Deus é minha vida, é
maravilhoso, durante o tratamento tenho Jesus no coração, mais saúde (...)”.
IEMANJÁ - sexo feminino, 44 anos, religião católica, cor autodeclarada parda
(...)saúde para me libertar dos problemas”.
OGUM SETE ONDAS - sexo masculino, 31anos, religião evangélica, cor autodeclarada
parda (...)É claro Ele é que dar força (...)”.
Idéia Central 6 Discurso do sujeito coletivo
Deus que dar Saúde
Deus é muito bom a descoberta da minha soropositividade
fez com que eu aceitasse Ele como meu salvador, porque
ele me dar força para viver. Pensando assim acho que ele
é minha vida, é maravilhoso, durante o tratamento tenho
Jesus no coração, tenho mais saúde para me libertar dos
problemas, ao mesmo tempo em que sou abençoado na
minha vida sentimental, portanto Ele é bom porque está
me dando a minha saúde, e é claro que Ele me dar força.
Quadro 6- Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do estudo em resposta a questão
para você o que é Deus, onde Deus é percebido como um “Deus que dar saúde”.
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008
Análise do discurso
A idéia central 6 do discurso do sujeito coletivo, através das falas dos participantes
sugere que muitos indivíduos buscam no transcendente um refúgio para suas dores, o que
remete para a seguinte afirmação: “observa-se que muitas pessoas atribuem a Deus o
aparecimento ou a resolução dos problemas de saúde que as acometem e recorrem
96
frequentemente a Ele como recurso cognitivo, emocional ou comportamental para
enfrentá-los” (PARGAMENT, 1990 apud FARIA; SEIDL, 2005).
Esse fato também foi observado, em estudo realizado por Teixeira e Lefévre
(2005), ao fazerem entrevistas com enfermeiras que prestam assistência a pacientes com
câncer. No referido estudo, pode-se destacar que as enfermeiras em seus discursos
ressaltam que o ser humano em situações de perigo tende a uma busca pelo divino, sendo
que essa situação frequentemente ocorre quando o paciente enfrenta resultados
desagradáveis que poderão mudar o destino de sua vida.
Assim como o câncer a aids muda o destino da vida de seus portadores, o que leva a
afirmar que também o doente de aids, no enfrentamento da sua sorologia busca um apoio
divino, como forma de adquirir força suficiente para a melhoria de sua saúde. Faria e Seidl
(2005), em análise dos estudos de Pargament (1990), concordam que as estratégias
comportamentais utilizadas pelas pessoas nessa situação, quando provenientes da religião
ou da espiritualidade, são definidas como Enfrentamento Religioso (ER).
No tocante ao ER, Paiva (2007) afirma que frequentemente as urgências pessoais
ou situacionais são enfrentadas pelas pessoas com o recurso religioso de orações,
promessas, peregrinações, exercícios ascéticos e ações rituais, conforme as várias religiões,
inclusive cristãs. O autor acrescenta que no cristianismo, em particular, uma das
manifestações mais indicativas da presença do reino de Deus foram as curas físicas e
algumas curas hoje chamadas de psíquicas ou de psicossomáticas, curas essas, muitas
vezes, solicitadas pelo doente ou por outras pessoas.
É interessante ressaltar o que dizem Teixeira e Lefévre (2005) quando afirmam que
Deus se torna um diferencial para ultrapassar a fase da doença com mais segurança. Nesse
contexto, pode-se verificar que Deus “não a saúde” no sentido restrito das palavras
proferidas pelos participantes do estudo, mas os indivíduos imbuídos por essa buscam
ou melhoram sua qualidade de vida, já que encontram um sentido para viver. Portanto, a
esperança nunca deverá ser abafada e, sempre que possível, os profissionais de saúde e os
familiares dos pacientes com doenças graves devem assegurar-lhes que nessa “batalha”,
eles nunca estarão sós, pois assim estarão os ajudando no enfrentamento da doença.
97
Expressões chaves que embasaram a idéia central 7 diante da questão: para você o que
é Deus?
‘EL SHADDAY - sexo feminino, 45 anos, ateu, cor autodeclarada branca (...)Não
acredito nele,(...) Ele permitiu que eu ficasse doente”.
OGUM ROMPE MATO - sexo masculino, 51 anos, sem religião, mas espiritualizado, cor
autodeclarada morena “(...)
Nem sei dizer, mas acho que é alguém importante (...)”.
Idéia Central 7 Discurso do sujeito coletivo
Conflito existencial
Eu não acredito Nele, porque se Ele realmente existisse não
permitiria que eu ficasse doente. Não sei expressar o que seja
Deus, no entanto acho que deva ser alguém importante, porque
muita gente fala Nele.
Quadro 7- Idéia Central e Discurso do Sujeito Coletivo dos participantes do estudo em resposta a questão
para você o que é Deus, onde Deus a percepção de Deus causa um conflito de ideologias.
Fonte: Levantamento obtido no ambulatório do Complexo Hospitalar Clementino Fraga de João Pessoa,
2008
Análise do discurso
Na idéia central 7, o discurso do sujeito coletivo proporcionado revela que a fala a
princípio mostra uma incredulidade na existência de Deus, e uma segunda fala, na qual se
capta a dúvida quanto a sua importância ou não. Nesse ponto confrontam-se duas opiniões:
a de uma pessoa atéia e a de uma segunda sem religião. No primeiro caso, uma mulher que
não crê em Deus, culpa algo inexistente por sua doença. o segundo, “um sem religião”,
que poderia ser considerado como a pessoa sem um vínculo institucional, mas que pode ser
confundido com uma pessoa religiosa por apresentar crenças próprias e particulares,
compondo um “cardápio” bem pessoal, que não freqüenta assiduamente os centros
religiosos (ALMEIDA, 2004; SIQUEIRA, 2008).
Embora se perceba uma assincronia em ambos os discursos, esses apresentam uma
lógica interna que emerge devido à pressão psicológica causada pela doença, pois não se
“envolvem pessoalmente com a comunidade moral, mas mantêm uma disposição religiosa
diante de um mundo, principalmente, em situações de insegurança sica emocional,
financeira etc” (ALMEIDA, 2004, p. 18). Assim o “devoto não é estar praticando algum
ato de devoção, mas ser capaz de praticá-lo” (GEERTZ, 1978, p. 110). A proximidade
98
entre os com e os “sem” religião pode ser exemplificada de acordo com as evidências de
Tavares e Camurça (2006), quando captaram a resposta de componentes dos dois grupos
para a seguinte pergunta: “Deus manda em tudo que acontece no mundo?”. Segundo os
dados obtidos pelos autores, a resposta afirmativa é partilhada por 38,9% dos com religião
e por 36,8% dos “sem”.
Em uma análise mais apurada pode-se perceber que as informações contidas no
discurso do sujeito coletivo apresentam uma dicotomia, pois como podem não acreditar e
ao mesmo tempo não aceitar que Deus permitiu que eles ficassem doentes? Quando eles
dizem “Deus permitiu”, na verdade, estão afirmando a existência de Deus. Esse fato leva a
crer que esses sujeitos estão passando por uma crise existencial, em que podem não aceitar
a doença como um fato concreto e dessa forma negam também a existência de Deus.
Partindo desse entendimento, Silveira e Mahfoud (2008) fazendo uma análise
acerca do conceito de resiliência
22
de Viktor Frankl, afirmam que, em momentos de
sofrimento inevitável e extremo, o que se requer da pessoa é que suporte a incapacidade de
compreender racionalmente que a vida tem um sentido incondicional, independente das
circunstâncias, sendo esse sentido incondicional chamado de supra-sentido.
Os referidos autores ressaltam que esse supra-sentido é apreendido pela fé, pela
confiança e pelo amor, ou seja, o supra-sentido não pode ser compreendido pelo raciocínio
que responde à pergunta do “por quê?”, a exemplo de por que aconteceu a doença
terminal? a catástrofe natural? a situação inesperada? Na dimensão do supra-sentido, a
religião autêntica torna-se uma grande força de segurança para o homem, “a segurança e a
ancoragem na transcendência, no Absoluto” (Frankl, 1946/1989, apud SILVEIRA;
MAHFOUD, 2008, p. 571).
O homem ancorado na transcendência é, para Frankl segundo Silveira e Mahfoud
(2008), o homem religioso, no sentido de ser aquele capaz de completar a sua dinâmica
ontológica. Ele é responsável e consciente, vive sua vida como uma missão a ser
cumprida, portanto, na busca de sentido, está embasada na experiência religiosa. Nessa
dimensão, a pessoa que busca uma religiosidade encontra tradições e valores que a
direcionam a um relacionamento com o que ela considera ser “o criador”, e isso a torna
22
Para um melhor entendimento acerca da palavra resiliência ver capítulo 4, p. 73 desta dissertação.
99
portanto, aberta ao outro e à transcendência. Essa abertura faz com que se concretize
melhor o sentido de sua vida que, segundo essa concepção, apresenta uma missão para casa
pessoa. Ao realizar sua missão, pode-se concluir que o homem religioso foi capaz de
completar a sua dinâmica ontológica.
Silveira e Mahfoud (2008) afirmam que o ser humano possui uma
autotranscendência inerente a sua própria essência, ou seja, a pessoa é aberta ao mundo,
coloca-se em relação, volta-se para algo ou alguém diferente de si. Buscando analogias que
explicitem esse entendimento, os autores extraíram das palavras de Viktor Frankl: “Ser
homem significa ... ser para além de si mesmo. ... Ser humano significa ordenar-se em
direção a algo ou a alguém: entregar-se ... a uma obra a que se dedica, a uma pessoa que
ama, ou a Deus, a quem serve”.
Dessa forma, a autotranscendência mostra que o ser humano não se fecha em
condicionamentos, mas transcende os condicionamentos psicofísicos. A experiência de
Viktor Frankl, segundo Silveira e Mahfoud (2008), como prisioneiro de campos de
concentração confirma a realidade, em que a sobrevivência dependia da capacidade de
orientar a própria vida em direção a um ‘para que coisa’ ou um ‘para quem’. Portanto, o
interesse mais profundo do ser humano não é olhar para si mesmo, mas volver o olhar para
o mundo exterior, em busca de um sentido. A pessoa se autorrealiza justamente na
proporção em que “esquece de si mesmo” enquanto se dedica a um trabalho ou a uma
pessoa, por exemplo, no encontro amoroso entre duas pessoas, o sujeito pode intuir a
unicidade do outro.
Portanto, a partir do argumento apresentado, pode-se perceber que os indivíduos
que disseram não acreditar em Deus, na verdade não conseguiram transcender, não
conseguiram até o momento, colocar um sentido em suas vidas, talvez devido ao fato de se
perceberem como portadores de uma doença incurável e carreada de estigmatizações,
fazendo com que eles não percebam o sentido da resiliência, negando assim, a existência
de Deus.
100
CONSIDERAÇÕES FINAIS
CONSIDERAÇÕES FINAISCONSIDERAÇÕES FINAIS
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Entra no labirinto
E mata o Minotauro.
Em nenhum instante
Tem medo da morte.
Ariadne enfeitiçada
Vela por sua sorte.
(poema extraído do livro: O Fio de Ariadne ou o percurso de uma vida de José Ribeiro Ferreira)
101
final desta dissertação não representa o final das pesquisas, uma vez que a
partir dela, elenca-se várias informações com possibilidades de outros
estudos, o que faz lembrar uma lenda em que a personagem Ariadne é uma jovem princesa
que presenteou seu amado com um longo fio para que este, ao entrar em um labirinto,
matasse um minotauro e, assim, com a ajuda do fio, encontrasse a saída do labirinto.
Embora o minotauro seja descrito na estória como um monstro, uma aberração da
natureza instituída como castigo ao rei Minos, que ousou desobedecer ao poder dos deuses,
aqui ele é entendido como um ser múltiplo, híbrido, que está constantemente se permitindo
explorar novas normas e formas de vida, subvertendo as linearidades e a repetição na
subjetividade da vida.
O labirinto costuma ser visto como lugar de confusão, de erros, mas aqui é adotado
como metáfora da complexidade, lugar das dobras, do inesperado, do múltiplo. Também
pode ser visto como lugar das incertezas, pois a cada momento pode-se encontrar algo
novo, uma surpresa com a qual não se está contando. Nesse sentido, um labirinto poderia
explicar a sensação que o diagnóstico do HIV provoca nas pessoas, quando elas se sentem
perdidas diante de uma situação que não tem mais volta, e que, ao mesmo tempo, pode
encontrar nele uma saída para suas inquietações.
Diante dessa realidade, este estudo buscou os fios, que representariam as diversas
subjetividades que dão as cores sombrias e fortes que a cada dia elabora e reelabora o
discurso sobre a aids e, a partir desses discursos, no sentido abrangente de seu conceito,
procura-se delinear, compor, arrumar ou obter um discurso sobre a aids que esteja
perpassado ou traçado entre as linhas transversais que formam a subjetividade.
Portanto, ao lançar um olhar para o percurso transcorrido ao longo deste estudo,
podemos perceber que a aids ainda transita para uma epidemia social, em que os menos
favorecidos economicamente continuam sendo discriminados duplamente, primeiro pela
condição sócioeconômica e, segundo, pela sua condição de doente de aids, cuja
estigmatização ficou arraigada nesses quase trinta anos de epidemia.
No patamar de pessoas discriminadas socialmente, neste estudo também configura-
se a imagem da pessoa negra, que no transcurso da história sempre sofreu discriminações,
e, no contexto da aids, pode-se dizer que sofre uma discriminação tripla, conforme
O
102
evidenciado pela amostra, que também encontram-se com o vel sócioeconômico
aquém do necessário para ter uma boa qualidade de vida. Nesse sentido, o que se pode
denominar de aids social continua sorrateira e sinistra, porque leva a uma condenação
social, transmutando os indivíduos a viverem uma vida na sombra, com medo de revelarem
seu diagnóstico.
Neste estudo foi possível perceber que os participantes estão em busca de um
sentido para suas vidas. No entanto outros ainda não encontraram esse sentido, fato que
aponta para a necessidade de uma assistência interdisciplinar. Uma assistência com o
intuito de dispor a eles outras possibilidades de construção de sentidos para a enfermidade
ou para a vida, capaz de ajudá-los a se perceberem, também, como participantes do
processo de superação da doença, além disso, ao desconstruir a associação da imagem da
aids à dor e ao sofrimento, que pode proporcionar a melhora da autoestima dos acometidos
pelo vírus.
A aproximação dos sentidos percebida no estudo mostra que o diagnóstico da aids
se apresenta com significados que mobilizam, nos indivíduos, surpresa e dor psíquica, em
virtude de esperarem um desfecho duvidoso, tanto que eles não apresentam medo do
futuro, no sentido de não guardarem grandes perspectivas. Isso reforça a necessidade de
uma assistência interdisciplinar a todos os soropositivos, e não apenas com o doente de
aids, com o objetivo de construir, com eles, outros sentidos para a vida e, até mesmo,
possibilidades para que eles se sintam participantes do processo de superação da doença.
É interessante ressaltar que os significados construídos acerca da aids, ao longo de
sua história, parece ter colocado os participantes, independente da cor de sua pele, em uma
posição de fragilidade, o que os fazem buscar em Deus, ou no mundo divino, as forças para
enfrentarem esse momento, fato percebido em todas as religiões declaradas no estudo. O
discurso religioso referido pelos participantes deste estudo possibilita uma reflexão sobre
essa realidade para que os profissionais de saúde, que assistem essa população, percebam
esse diferencial, no sentido de abranger na sistematização da assistência o aspecto religioso
do cliente.
No que tange à população negra, a sua percepção religiosa se assemelha a da
população branca, fato elencado ao longo dos discursos analisados. No entanto, chamou a
atenção a ocorrência da inquestionabilidade acerca de Deus por mulheres negras, o que
103
pode está aliado à perspectiva de gênero, fato que leva a acreditar que exista uma
submissão dessas mulheres também no que se relaciona ao plano espiritual.
O profissional de saúde que fizer uma relação com o mundo divino em sua
assistência, ao apresentar essa relação como uma possibilidade de ajuda para os doentes e
seus acompanhantes, apresentará, assim, uma ferramenta de diálogo entre cuidadores e
cuidados, não enquanto um discurso moralizador, mas como mais uma possibilidade de
auxílio na aceitação e superação da doença. Diante dessa realidade, o estudo apresentado,
ao buscar a compreensão dos sentidos que os indivíduos constroem para a aids e sobre as
formas de se relacionarem com o adoecimento por essa enfermidade, amplia as
possibilidades de construção de práticas assistenciais para acolher essas pessoas.
A partir desse enfoque religioso constatou-se que a “cara da aids” pode não mais
ser uma “cara” da morte, mas uma “cara” da vida, porque as pessoas tentam aprender a
viver com a doença, transformando seu dia-a-dia em uma “batalha” constante para
encontrar um sentido de vida, para dessa forma resgatar o respeito e a dignidade, e, assim,
dizimar os estigmas causados no transcurso da epidemia, que as fazem ficar quase que
isolados, sem o direito de viver como as demais pessoas. Essa luta fará com que as pessoas
que tem o vírus circulando no sangue não sejam vistas como pessoas anormais, dessa
forma subjetivando a sua condição de portador e relegando a aids como mais um percalço
que terão que ultrapassar em sua jornada de vida.
Portanto, todas as pessoas são capazes de construir suas trajetórias de vida,
interpretando e recriando discursos de maneira autônoma para o seu contexto sociocultural,
de forma que todas independentemente de sua religião, cor/raça, devam ser consideradas
no planejamento de políticas públicas que promovam a sua saúde e os seus direitos de
cidadãos, pondo um fim no racismo institucionalizado que as bloqueiam, na maioria das
vezes, em suas relações sociais, dificultando dessa forma suas possibilidades de
participação e aspirações por uma melhor qualidade de vida.
104
REFERÊNCIAS
REFERÊNCIASREFERÊNCIAS
REFERÊNCIAS
“se alguém quer realmente buscar a verdade, não deve escolher uma ciência
particular; elas estão todas unidas e dependem uma das outras.” (Descartes)
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113
APÊNDICES
APÊNDICESAPÊNDICES
APÊNDICES
114
APÊNDICE A
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Caro(a) Senhor(a)
Eu, Paulo Emanuel Silva, pretendo realizar uma pesquisa intitulada Aids e
religiosidade: influências intersubjetivas aos acometidos pela epidemia”. Esta tem por
objetivos: Avaliar a qualidade de vida dos portadores de HIV/aids na cidade de João
Pessoa/PB; Investigar a influência da religiosidade no enfrentamento da aids; Relacionar a
religiosidade e a aids entre as pessoas acometidas pela epidemia e verificar a influência da
categoria “raça”/cor aliada ao fator religioso na forma de enfrentamento do soropositivo.
Para realizar a pesquisa necessito de sua colaboração para responder algumas
perguntas. Durante a pesquisa garanto esclarecer todas as suas dúvidas. Quero lhe
informar, também, que me comprometo em manter o seu nome e seus relatos confidenciais
em sigilo, além de aceitar sua livre decisão em participar ou não do estudo ou de se retirar
do mesmo a qualquer momento, não será efetuada nenhuma forma de gratificação da sua
participação, informo também que este estudo poderá ser publicado em revistas e/ou
congressos que sejam pertinentes ao tema a nível nacional ou internacional.
A sua participação é voluntária, o senhor (a) não é obrigado (a) a fornecer as
informações solicitadas. Caso decida não participar do estudo, ou resolver a qualquer
momento desistir do mesmo não sofrerá nenhum dano. Os pesquisadores estarão a sua
disposição para qualquer esclarecimento que considere necessário em qualquer etapa da
pesquisa. Diante do exposto, agradecemos à contribuição do senhor (a) na realização dessa
pesquisa.
Eu, _______________________________________________, concordo em
participar da pesquisa declarando que cedo os direitos do material coletado e que fui
devidamente esclarecido, estando ciente dos objetivos da pesquisa, com a liberdade de
retirar o consentimento sem que isso me traga qualquer prejuízo.
Participante do estudo
Pesquisador responsável
Paulo Emanuel Silva Fone (0xx83) 88015570
115
APÊNDICE B
Questões relativas a “raça”/cor e religiosidade
1) Você acredita em Deus (poder, espírito, inteligência ou força superior, etc)?
( ) Sim ( ) Não
2) Para você, o que é Deus?
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
_____________
3) Com relação à sua religião/doutrina/seita/crença, você se considera...
( ) Ateu (não acredita em Deus)
( ) Sem religião, mas espiritualizado (acredita em Deus, mas não pertence a nenhuma
religião)
( ) Católico
( ) Espírita
( ) Judeu
( ) Protestante
( ) Budista
( ) Muçulmano
( ) Evangélico
( ) Umbandista
( ) Outro. Especifique: _____________
4) Alguma vez você mudou de religião/doutrina/crença ao longo da vida?
( ) Não ( ) Sim, mudei de ________________ para __________________
5) Caso a resposta anterior tenha sido positiva essa mudança foi após o diagnóstico de sua
soropositividade?
( ) Sim ( ) Não
6) Quão importante tem sido a religião/espiritualidade para lidar com os fatores
estressantes atuais de sua vida?
( ) Não é importante
( ) Um pouco importante
( ) Relativamente importante
( ) Importante
( ) Muito importante
7) Qual a freqüência com que você freqüenta igreja/templo/centro/terreiro/sinagoga
ou quaisquer outros encontros de natureza religiosa?
116
( ) Nunca
( ) Raramente
( ) Uma vez por ano
( ) Uma vez por mês
( ) Duas vezes por mês
( ) Uma vez por semana
( ) Mais de uma vez por semana
( ) Uma vez ao dia.
Quantas?______________
8) Quanto tempo você dedica para atividades religiosas privativas, como oração, meditação
ou estudo de livros sagrados (tipo Bíblia, Talmud, Alcorão, etc.) ou outros livros de caráter
religioso?
( ) Nunca
( ) Raramente
( ) Uma vez por ano
( ) Uma vez ao mês
( ) Uma vez na semana
( ) Duas a três vezes na semana
( ) Uma vez ao dia
( ) Mais de uma vez ao dia
9) Independentemente de você freqüentar ou não encontros de natureza religiosa, quão
importante é a religião para você?
( ) Não é importante
( ) Um pouco importante
( ) Relativamente importante
( ) Importante
( ) Muito importante
10) O quanto a religião/espiritualidade tem lhe ajudado a manejar ou enfrentar as situações
estressantes que você vive/viveu?
( ) Não tem ajudado.
( ) Tem ajudado pouco..
( ) Tem ajudado mais ou menos..
( ) Tem ajudado
( ) Tem ajudado muito
11) “Raça”/Cor/: ( )branca ( ) morena ( )parda ( )preta ( )indígena ( )amarela ( )outra, qual
______
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