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cuidados, notícias, tudo nessa ordem. Li e reli, primeiro com pressa, depois
mais devagar, depois lentamente, nas entrelinhas, algo que pudesse conter.
A segunda do meu ex-sogro, dava notícias dos meus filhos, dos parentes
em geral. A última, finalmente, consistia em uma folha de papel cheia de
desenhos e garatujas e desenhos de meus queridos: barquinhos, casas,
bandeiras, e, por baixo de tudo, alguém guiara-lhes as mãozinhas para
escreverem a palavra ‘papai’.
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Muitas vezes, o serviço do correio atrasava a entrega da correspondência aos
soldados, o que acarretava momentos instigantes, porque, além desse problema, às
vezes as cartas mais recentes eram entregues antes das mais antigas. Por essa
razão, as notícias tinham de ser entendidas como um quebra-cabeça.
Francis Hallawell, correspondente da B.B.C., durante o período em que
permaneceu entre os brasileiros, fez uma estatística sobre a maneira como os
soldados se correspondiam com seus familiares. Segundo seu levantamento, o meio
mais utilizado era o telegrama, que custava torno de 60 liras, ou seja, em torno de 12
cruzeiros. Essas mensagens versavam sobre os seguintes assuntos:
correspondência, saudações de Natal, Ano Novo, saúde, promoção, dinheiro,
felicitações e outros. Como havia censura prévia, dispunha-se de 124 frases prontas,
dentre as quais o remetente podia escolher três para dar o recado que desejava. É
possível imaginar a confusão que muitas das frases prontas acarretavam. O
remetente, no balcão do correio, indicava o número da palavra. Hipoteticamente,
quem pretendia mandar um recado dizendo que estava bem de saúde e desejando
feliz Natal: saúde (22), cidade (20), Natal (32). Os números fornecidos eram
deixados com o telegrafista, que, por conta e risco, juntava os números. Como as
mensagens chegavam ao Brasil? É possível imaginar.
Tal serviço não agradava ao usuário, mas era algo que podia ser feito, na
ânsia de manter contato com os familiares. Frases cifradas, escolhidas às pressas,
pelo numero indicado, não correspondiam exatamente ao que se queria dizer e
talvez não fossem compreendidas por quem as recebeu.
Se telegrama era um meio lento de levar as notícias até as casas, as cartas,
por sua vez, tinham uma demora muito superior. Segundo muitos, levavam de vinte
dias a um mês para chegar ao destino. Mas nada se igualava, segundo os
combatentes, ao momento da chegada do correio até um acampamento. Para quem
estava na retaguarda, ou para os que estavam na zona limítrofe do inimigo, de
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FONSECA, op. cit., p. 77.