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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
LÉLIA ZAMBRANO
DE BRASILEIROS A “BRASIGUAIOS”:
A EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O PARAGUAI A PARTIR DOS ANOS DE
1970
DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
SÃO PAULO
2009
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS
LÉLIA ZAMBRANO
DE BRASILEIROS A “BRASIGUAIOS”:
A EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O PARAGUAI A PARTIR DOS ANOS DE
1970
DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
orientação de
Profª Drª Lucia Maria Machado Bógus
SÃO PAULO
2009
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LÉLIA ZAMBRANO
DE BRASILEIROS A “BRASIGUAIOS”:
A EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O PARAGUAI A PARTIR DOS ANOS DE
1970
Tese de Doutorado apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica, como exigência parcial para
obtenção do título de Doutor em Ciências
Sociais, sob orientação da Profª Drª Lucia
Maria Machado Bógus.
SÃO PAULO
2009
Ficha Catalográfica
ZAMBRANO, Lélia
DE BRASILEIROS A “BRASIGUAIOS”:
A EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O PARAGUAI A PARTIR DOS ANOS DE 1970
241 páginas
Orientadora: Profª Drª Lucia Maria Machado Bógus
Tese de Doutoramento. Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais.
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP.
Palavras-chave: brasiguaios; imigração brasileira; aspectos sócio-culturais; modus
vivendi.
Key-words: brasiguaios; immigrants brasilian; social-cultural aspect; modus viviendi
BANCA EXAMINADORA
Data da Defesa da Tese ___/___/2009
Os dias prósperos não m por acaso;
nascem de muita fadiga e persistência”.
Henry Ford
Ao Clóvis, companheiro e fiel escudeiro.
Às minhas lindas filhas Camila e Caroline,
etapas de uma vida.
À boneca Beatriz, minha neta, meu futuro
e perpetuação.
À minha amada irmã Lílian e meus
queridos irmãos, por me amarem.
À amiga e confidente Beth Rico, por sua
amizade.
Às Marias, Bonacorsi e Bottino, minhas
adoráveis amigas.
Aos meus avós, Balbina e José, meu
passado e alegres lembranças...
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, nas pessoas de seu corpo docente, que em
muito contribuíram para a elucidação dos meandros teóricos deste trabalho.
À adorável orientadora Profª Drª Lucia Bógus, pelo apoio, incentivo, estímulo
e amizade demonstrados em todos os anos de convivência.
À Profª Rosana Baeninger, pelas tardes agradáveis que tivemos durante suas
aulas na Unicamp-SP.
Agradeço à CAPES, pela bolsa que me foi concedida na etapa final, nos anos
de 2006 a 2008, sem a qual não teria sido possível concluir este projeto.
À Profª. Drª. Maria Helena Capelato, pesquisadora e historiadora, que me
incentivou e despertou para o tema “brasiguaios”.
À querida Elisa Rolim, meu ponto de apoio para as pesquisas e pela
hospitalidade no Paraguai.
Ao amigo Mario Rolim, pelas informações prestadas e apoio logístico.
À Profª Drª Júlia Felgar, por sua disponibilidade e seu apoio essencial.
Agradecimento especial aos imigrantes brasileiros entrevistados no Paraguai,
Saul, Geny, Zica, Celso e Miguel, dentre outros, que se dispuseram a contar suas
histórias e seus projetos de vida; por me terem deixado entrar em suas casas, por
terem sido tão disponíveis e colaboradores, proporcionando condições para que este
estudo fosse realizado a contento.
Aos migrantes do mundo todo e de todas as épocas, por seu desprendimento
e espírito de aventura, que transformaram e transcenderam os espaços e as
fronteiras.
À DEUS.
RESUMO
Este estudo focaliza famílias de imigrantes brasileiros que saíram do Brasil a partir
dos anos de 1970, com destino específico a um país fronteiriço - o Paraguai. Esses
brasileiros, que às vezes são chamados de “brasiguaios” ou como se auto-intitulam e
são realmente conhecidos no Paraguai, são indivíduos que iniciaram o processo
migratório naquele período e que ali permanecem até os dias de hoje, encontrando-
se alguns na terceira geração, dedicando-se ao trabalho rural e à cultura da soja nas
regiões do Alto Paraná, Canindeyú e Tapúa, locais de maior concentração de
brasileiros imigrantes. Com o objetivo de ampliar o conhecimento sobre o modus
vivendi desses brasileiros e das gerações que se sucederam, uma vez que o
processo migratório intensificou-se ao longo dos últimos anos, analisa-se como
ocorreu a sua formação familiar, a adaptação aos costumes e à cultura local. A
problemática do Mercosul e da globalização na América Latina é discutida na
medida em que ajuda a esclarecer as formas de interação entre governos e políticas
de imigração na América Latina e no Mercosul e, mais especificamente, no
relacionamento Brasil-Paraguai. A metodologia aplicada na pesquisa de campo
utiliza a trajetória da história de vida desses imigrantes, revelada com a aplicação de
pesquisa-piloto, onde encontramos profissionais de níveis sociais diferenciados, mas
relacionados geralmente, à área rural e ligados pela cultura da soja. Buscamos,
ainda, mediante entrevistas semi-estruturadas e realizadas in loco aprofundar o
conhecimento desse processo migratório.
Palavras-chave: BRASIGUAIOS; IMIGRAÇÃO BRASILEIRA; ASPECTOS SÓCIO-
CULTURAIS; MODUS VIVENDI.
ABSTRACT
This study focuses families as of Brazilians immigrants that it is to they exited from
Brazil from of the years as of 1970, specify destination to a country border the one
Paraguay. Those Brazilians as the times are termed as of “brasiguaios” or as if auto-
entitled and they are quite acquaintances at the Paraguay,
they are Brazilians that it is to they started the flow migratory that year period and
that stay as far as the days today’s, encountering in case that a few at the third
generation, fetching the labour agrestic and culture from the soybean in the region
from the Alto Paraná, Canindeyú and Tapúa, local as of greater concentration as of
Brazilians immigrants. With the brasiguaios; objective as of amplify the knowledge
above the modus vivendi he might give Brazilians and of the generations than it is to
get along, since the migratory process intensified – in case that in the following years,
analyses in case that as a has occurred its formation familiarly, the adaptation to
the customs the one at the cultural local. The Mercosul and the globalization
problematic in Latin America is argued according to it helps to clarify the forms of
interaction between governments and involved politics of immigration in Latin
America with the Mercosul and, more specifically, at the Brazil-Paraguay relationship
and the easier factors of this immigration. The methodology applied on the field
research uses the trajectory of the live history of these immigrants, disclosed with the
application of pilot research, where we enclose differentiated professions and social
level, but related, whenever possible, the agricultural area and the soy culture, we
still search, by means of half-structuralized interviews and carried through in loco the
deepening of this knowledge.
Key-Words: BRASIGUAIOS; BRAZILIANS IMMIGRANTS; SOCIO-CULTURAIS
ASPECTS; MODUS VIVENDI.
LISTA DE SIGLAS
ADM - Artchie Daniel Midland
ALADI - Associação Latino-americana de Integração
ALALC - Associação Latino Americana de Livre Comércio
ANZCERTA - Acordo Comercial sobre Relações Econômicas entre Austrália e Nova
Zelândia
APEC - Fórum Econômico da Ásia e do Pacífico
ASEAN - Associação de Nações do Sudeste Asiático
CAN - Comunidade Andina, Grupo Andino ou Pacto Andino
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CARICOM - Mercado Comum e Comunidade do Caribe
CEI - Comunidade dos Estados Independentes
CELADE - Centro Latino-americano de Demografia
CIME - Comissão Internacional Governamental para Migrações Européias
CSEM - Centro Scalabriniano de Estudos Migratórios
CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
CNPD - Comissão Nacional de População e Desenvolvimento
CPMF - Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira
EFTA - Associação Européia de Livre Comércio
FAO - United Nations´ Food and Agricultural Organization
G-3 - Grupo criado em 1990 por Venezuela, México e Colombia, visando
estabelecer o livre comercio entre os países
IDH - Índice de Desenvolvimento Humano
IMILA - Investigación de la Migración Internacional en Latinoamérica
IME - Instituto Nacional de Estatística
MCCA - Mercado Comum Centro-Americano
MERCOSUL - Mercado Comum do Sul
MST - Movimento dos Sem Terra
NAFTA - Acordo de Livre Comércio da América do Norte
NEPO - Núcleo de Estudos de População
ONGs - Organizações não governamentais
PEA - População Economicamente Ativa
PIB - Produto Interno Bruto
PNUD - Programa das Nações Unidas
SADC - Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral
UNICEF - The United Nation Children’s Fund
UE - União Europeia
UNESCO - United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization
LISTA DE ILUSTRAÇÕES*
Ilustração 1 – Paraguai e Brasil Meridional ..................................................................... 60
Ilustração 2 – Paraguai, divisões regionais e departamentais ......................................... 64
Ilustração 3 – Estrutura Física do Paraguai Oriental ....................................................... 68
Ilustração 4 – Espaços naturais do Paraguai Oriental ..................................................... 69
Ilustração 5 – O contorno geográfico do Paraguai .......................................................... 88
Ilustração 6 – A evolução das fronteiras paraguaias de 1810 aos nossos dias ............... 89
Ilustração 7 – Os latifúndios das fronteiras paraguaias até 1950 .................................. 127
* Fonte: SOUCHAUD, Sylvain. Geografía de la migración brasileña en Paraguay. Asunción: UNFPA,
2007.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO .................................................................................. ....................... 21
INTRODUÇÃO ........................................................................................ ...................... 25
1 GLOBALIZAÇÃO E MERCOSUL: A IMPORTÂNCIA DA RELAÇÃO BRASIL-
PARAGUAI ............................................................................................................... 37
1.1 O processo de globalização ............................................................................... 39
1.2 O surgimento do Mercado Comum do Sul – MERCOSUL ................................. 46
1.3 A cultura na globalização – miscigenação cultural ............................................. 53
1.4 Paraguai: aspectos do desenvolvimento econômico .......................................... 58
1.4.1 A origem da soja e suas características ................................................... 62
2 FLUXOS MIGRATÓRIOS ......................................................................................... 73
2.1 A questão migratória .......................................................................................... 75
2.1.1 A questão migratória frente ao desenvolvimento capitalista do
século XX ................................................................................................. 78
2.2 Os fluxos migratórios internacionais nos últimos anos ....................................... 79
2.2.1 Fatores de atração e de expulsão ............................................................ 84
2.3 Emigração e imigração: um contexto migratório latino-americano ..................... 87
2.4 O movimento migratório no Brasil ...................................................................... 93
2.4.1 A cronologia do contexto migratório brasileiro .......................................... 99
2.4.2 Uma reflexão sobre o fluxo migratório brasileiro ..................................... 104
3 BRASIGUAIOS E COMUNIDADES BRASIGUAIAS: REDES SOCIAIS E
IDENTIDADES ......................................................................................................... 109
3.1 A migração Brasil-Paraguai .............................................................................. 111
3.2 Os brasiguaios: a dicotomia do termo e da identidade ..................................... 113
3.2.1 Volume do fluxo migratório brasileiro para o Paraguai ........................... 129
4 A FORÇA DOS LAÇOS QUE SE FORMAM ........................................................... 131
4.1 A dicotomia da xenofobia com os processos migratórios – reflexos para os
brasiguaios ....................................................................................................... 138
4.1.1 A crise econômica mundial e ainda a questão da xenofobia .................. 139
4.1.2 Quadro dos principais problemas das políticas sociais na América
Latina ............................................................................................................... 142
5 O DEPOIMENTO DOS ENTREVISTADOS ............................................................. 145
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................... .................... 159
REFERÊNCIAS ...................................................................................... ..................... 169
APÊNDICES ............................................................................................................... 193
APÊNDICE A – Convite e apresentação da pesquisa ............................................. 195
APÊNDICE B – Questionário aplicado na pesquisa empírica .................................. 196
APÊNDICE C – Entrevistas realizadas no Paraguai em jan./2006 .......................... 202
APÊNDICE C 1 – Detalhamento do roteiro para as entrevistas ............................... 202
APÊNDICE C 2 – Transcrições das entrevistas ................................. ...................... 204
ANEXOS .................................................................................................................... 237
ANEXO A – Gráfico dos acordos realizados na América Latina .............................. 239
ANEXO B – Mapa mundi dos blocos transnacionais ................................................ 241
Apresentação
23
O fato de ser neta de imigrantes italianos e ter vivido em terra
distante das origens dos meus antepassados, ser estimulada a sonhar com
esses lugares e com pessoas diferentes, foram motivos que me
impulsionaram a buscar conhecimentos sobre a realidade dos imigrantes,
que para mim se apresenta como um mundo encantado. Poder estar em
outros lugares é como ser levado a realizar sonhos que nos permitem ter a
sensação de que conquistamos mais espaço. Espaços ideais ou não, ou
simplesmente espaços em um mundo incerto, em que barreiras
socioculturais transcendem e podem se tornar intransponíveis, ocasionando
traumas significativos.
A decisão de estudar especificamente e de forma mais profunda a
migração de brasileiros para o Paraguai ocorreu pela forte presença naquele
país de trabalhadores brasileiros imigrantes, provenientes na sua maioria
das regiões do Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil; ocorreu, também,
diante do contexto internacional atual, onde se desenvolveram processos de
integração regional e têm se intensificado movimentos migratórios entre
países limítrofes.
Lélia
Introdução
27
O tema da internacionalização da economia mundial tem
assumido relevância crescente. Não acadêmicos têm atentado para a
internacionalização; na verdade, toda a sociedade tem pensado e discutido
esse processo, sofrendo seu reflexo inevitável.
Para muitos, trata-se da instauração de uma sociedade mundial,
com múltiplas dimensões: militar, religiosa, política e científica.
Contudo, o paradigma é o da economia de mercado, aonde o
modelo de organização política é o de uma democracia do tipo
liberal (ROLON, 2000, p. 11).
O processo de internacionalização da economia, também
denominado de globalização, vem se verificando no mundo há algumas
décadas, principalmente em decorrência de uma série de transformações
nos processos produtivos e nos campos da informática, das
telecomunicações e dos transportes, impulsionando fluxo de capitais e de
comércio de uma forma vertiginosa. Isso tem levado os países em
desenvolvimento a buscarem novos mecanismos de inserção no mercado
internacional (MONTEIRO, 2000, p. 53).
Com o estreitamento das fronteiras comerciais no mundo, devido
à globalização e ao conseqüente aumento da troca nas relações culturais e
comerciais entre os povos, inúmeros fluxos migratórios aconteceram no
mundo. Os indivíduos que, especialmente por proximidade física ou de
linguagem, enxergaram em outros países a oportunidade de melhorar
econômica e socialmente e formar novos laços culturais, acabaram
migrando para regiões diferentes da sua terra pátria, embora os fluxos
migratórios internos nos países também sejam uma constante.
Essas migrações acabaram por contribuir ainda mais com o
processo de globalização, visto que, dentro dos países, a diversidade e a
pluralidade culturais se tornaram uma realidade cada vez mais presente,
principalmente com o desenvolvimento e a integração ganhando espaço na
América Latina. O aumento das empresas multinacionais e transnacionais
acentuou esse processo. As organizações começaram a compreender que
seu espaço de atuação era mundial e isso lhes permitia diversificar os
processos de produção, distribuição e administração de seus produtos e
28
serviços pelo mundo, a fim de diminuir os custos, aumentar a produtividade
e se tornarem, então, mais competitivas no mercado global.
O somatório desses dois processos e as políticas pró-
globalização que se formaram em alta escala nos países e nos blocos
comerciais incentivaram a miscigenação cultural, originando novas
comunidades – como os “brasiguaios”.
Na América Latina, a tentativa de se formar um bloco comercial
competitivo no mundo globalizado, o Mercosul Mercado Comum do Sul ,
auxiliou, também, essa nova ordem mundial sociológica. A
representatividade e a importância específica do Paraguai no Mercosul é
tratada no capítulo 1.
Desde o início do processo de formação do Mercosul, muitos têm
sido os trabalhos sobre os dois maiores países-membros, Brasil e Argentina,
registrando-se alguns estudos não tão divulgados ou disponíveis sobre os
outros países do bloco.
As grandes teorias buscam explicar as políticas externas desses
países e os fenômenos ligados às grandes transformações. São poucos os
trabalhos dedicados aos pequenos países e, em geral, tratando-os a partir
de seus vínculos com os mercados maiores.
Principalmente em relação ao Paraguai, pequeno território situado
entre as duas potências do Mercosul, existe certa desatenção ou, como diria
Rolon: “[...] em geral parte-se da desqualificação, o Paraguai é visto como
um exemplo típico de ‘atraso pela questão do contrabando e sua exígua
indústria, desconsiderando-se seu processo histórico” (ROLON, 2000, p. 25).
Entretanto, o Paraguai ao longo da história, tem se mostrado um
forte produtor e exportador agrícola de soja e algodão
1
, razão esta que
contribui para o desenvolvimento econômico desse país. Historicamente, os
1
Souchaud (2002, p. 35) “`Aquilo antes era tudo mato’, dice um brasileño, `cuando llegué sólo había
monte por aquí’, contesta outro paraguayo”. Esclarece o autor, que é muito difícil acreditar que nos
anos de 1960, a fronteira oriental Brasil-Paraguai, era praticamente formada por floresta. A elevada
migração para a região provoca uma modificação brutal, brasileiros e paraguaios se apertam em
um espaço comum e expandem os negócios agro-pastoril.
29
brasileiros fizeram parte das atividades ligadas à produção agrícola de soja
paraguaia desde a década de 1970, quando o número de imigrantes
brasileiros superou os 400 mil, sendo muitos deles, não apenas
trabalhadores rurais, mas empresários e proprietários de grandes fazendas.
Entender qual a razão dos brasileiros terem invadido um território virgem,
mas fértil e fronteiriço, uma vez que o povo paraguaio é tradicionalmente
agrícola e acabou ficando confinado à região central do país, foi tarefa fácil,
quando se tem acesso ao autor Souchaud (2002) que discute os motivos do
avanço do fluxo migratório em estudo.
Los colonos brasileños que entraron al Paraguay a fines de los
años 60 en busca de un medio natural que alimente su actividad
pionera, sientan las bases del actual anclaje en el dispositivo
económico brasileño del Paraguay hacia los años 80
(SOUCHAUD, 2002, p.36).
A relação socioeconômica entre brasileiros e paraguaios no setor
agrícola de soja tem sido pouco explorada e merece atenção especial,
principalmente frente ao panorama de integração entre os países do
Mercosul
2
.
Da relação Brasil-Paraguai, especialmente nos anos de 1970,
iniciou-se então, um grande fluxo migratório de brasileiros para o Paraguai,
na expectativa de melhorar as oportunidades econômicas com o cultivo de
soja paraguaia.
A relação entre os países do Mercosul, embora precária enquanto
bloco econômico ativo fortaleceu as relações fronteiriças e, entre elas, a
relação entre Brasil e Paraguai. Diante desse processo de integração
regional e formação de blocos, a proximidade do território paraguaio com as
fronteiras brasileiras, além da inexistência de uma legislação migratória
2
Saha, (2000, p. 55). Esclarece a formação do Mercosul: “Em março de 1991 os presidentes do
Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai assinaram o Tratado de Assunção para consolidar uma união
aduaneira e uma área de livre mercado abrangendo os quatro países, chamado de Mercosul. A
efetiva inauguração da organização só começou cinco anos depois, em janeiro de 1995. As
barreiras aduaneiras foram retiradas de 80 a 85% de todos os bens comercializados entre esses
países, e uma data-limite foi estabelecida para 2006, quando se firmará um regime de livre
movimento de todas as mercadorias no interior da área. Foi uma atitude corajosa no sentido de
criar uma forte base institucional, uma parceria econômica e, esperamos política, para mais de 200
milhões de pessoas com um Produto Interno Bruto conjunto de quase um trilhão de dólares”.
30
específica para o bloco, vai inserir esse país no contexto das novas
migrações internacionais brasileiras, registrando expressivos movimentos
emigratórios e imigratórios.
Qual seria o número de brasiguaios vivendo hoje no Paraguai?
Mario Rolim, um dos agricultores entrevistados, fala em 600 mil,
aproximadamente. No entanto, pesquisando a exatidão desse dado,
encontra-se em Patarra & Baeninger (2004, p. 7) número em torno de 450
mil, em informações de 2002.
A estrutura desta tese de doutoramento foi planejada de forma
que a temática se desdobre no seu aspecto mais amplo, abarcando as
incertezas políticas e econômicas ocorridas no Brasil a partir do regime
ditatorial iniciado em 1964; o processo de globalização da economia, a partir
dos anos de 1980; as relações Brasil-Paraguai, tendo o Mercosul como pano
de fundo, passando pela função e pelo padrão dos fluxos migratórios
brasileiros. Chega-se, então, ao objeto específico desta tese que se
encontra na dinâmica da nova forma de viver, de se relacionar e organizar a
sobrevivência, das comunidades de brasileiros e
descendentes de
brasileiros que vivem na região do Alto Paraná, Paraguai, denominados de
“brasiguaios”.
Assim, este trabalho visa apresentar e caracterizar a questão da
participação dos brasileiros na economia paraguaia em regiões de fronteira,
em especial no que tange à produção agrícola da soja
, bem como ao seu
modus vivendi naquele país. O perfil dos brasileiros que, por algum motivo,
migraram para o Paraguai que consideram, hoje, seu lar, vivendo em
comunidades brasiguaias, especialmente na região do Alto Paraná, o mais
importante departamento do Paraguai, será o principal objetivo do estudo.
Os fluxos migratórios, sua dinâmica, as idas e vindas da migração
brasileira e a busca das causas e fatores de expulsão e de atração são
abordados no capítulo 2.
No capítulo 3, busca-se trazer a verdadeira significação do
conceito “brasiguaio”, como construção de uma identidade, abordando não
31
a questão migratória, mas também a existência de redes de apoio,
baseada no entendimento de Márcia Sprandel (2006); há, ainda, algumas
interpretações sobre o tema, as quais refletem as outras vertentes
ideológicas ou sociais existentes nos meios literários e acadêmicos. Porém,
não se conseguirá esgotar, ou ainda, unificar a conceituação, como será
visto oportunamente.
Além disso, atualmente, os brasiguaios não se limitam, como
razão migratória, à economia baseada no cultivo da soja e é importante
apontar que, mesmo em período recente, novos brasileiros continuam a
migrar para o Paraguai, como outros retornam, formando uma “rede social
institucionalizada” (SPRANDEL, 2006). Assim, com propostas metodológicas
de caráter empírico, busca-se este esclarecimento de maneira flexível,
mediante informações e dados colhidos pela aplicação de questionários e
pela realização de entrevistas para coleta de depoimentos, o que está sendo
devidamente tratado no capítulo 4.
Existe, ainda, a possibilidade de se utilizar a entrevista semi-
estruturada, quando, apesar de ser construído um rol de perguntas
básicas, há a possibilidades de torná-la mais flexível (ALVES,
2007, p. 66).
Diante do exposto, referente aos estudos existentes sobre o
surgimento do Mercosul e o desenvolvimento econômico paraguaio baseado
na agricultura, principalmente, da soja e do algodão, e a participação de
imigrantes brasileiros como detentores de propriedade e como trabalhadores
rurais, o locus deste estudo, concentrando-se na relação entre brasileiros e
paraguaios no setor agrícola do Paraguai, localiza-se na região do Alto
Paraná, na fronteira com o Brasil.
Decorrente desse contexto e do objetivo maior, os objetivos
específicos desta pesquisa são:
a) Avaliar os principais motivos de imigração dos brasileiros que chegaram
ao Paraguai a partir da década de 1970, especialmente na fronteira da
região do Alto Paraná, Brasil-Paraguai.
32
b) Avaliar os reflexos da imigração no desempenho econômico e social do
Paraguai, principalmente no que tange às relações de trabalho e à
qualidade de vida dos brasileiros, após os anos de 1970.
c) Destacar os aspectos relativos à miscigenação cultural e lingüística
nascida dessa relação.
d) Estabelecer a identidade gerada: o “ser brasiguaio”, conforme Márcia
Sprandel (2006).
A partir da problemática e do objeto exposto, a hipótese deste
trabalho é que a emigração dos brasileiros para o Paraguai criou uma nova
comunidade naquele país Comunidade Brasiguaia - com características
diferentes da população brasileira e da população paraguaia e com função
econômica relevante em ambos os países, mas especialmente no Paraguai,
baseada nos estudos de Sprandel (2006), Fusco (2006) e Matos (2004).
Apesar de contar com vários estudos sobre o tema, esta
abordagem se fundamenta em uma pesquisa descritiva e interpretativa,
seguindo modelos de pesquisas anteriores no campo das ciências sociais e
do estudo de integração
entre países (MARQUES, 1998 e MARAGLIANO,
2000).
A primeira etapa do trabalho consistiu na pesquisa bibliográfica,
mediante coleta e sistematização de dados e informações secundárias
publicados em periódicos, documentos oficiais, relatórios governamentais,
artigos e livros produzidos sobre a situação dos imigrantes brasileiros no
Paraguai e o percurso e desenvolvimento da produção de soja na região
oriental do país.
Em uma segunda etapa, foi realizada pesquisa para caracterizar
os imigrantes brasileiros residentes na região oriental do Paraguai, tendo
sido destacadas suas condições de vida e consideradas as características
da produção de soja naquela área. Nesta etapa, portanto, foi realizado um
levantamento exploratório de campo, na região do Alto Paraná, mediante a
aplicação de
questionários para diagnosticar a situação de vida dos
brasileiros residentes naquela área. Este procedimento foi embasado em
33
modelo de pesquisa realizada por Bógus (2001), conforme pode ser
verificado no Apêndice B e contou com uma amostra de sete participantes
eleitos aleatoriamente.
Além de dados quantitativos sobre desempenho econômico e
sobre a população de imigrantes brasileiros no Paraguai, considerou-se
necessária a utilização de um método que pudesse apreender as
representações e os sentimentos dos indivíduos envolvidos no processo
migratório. Desta forma, também foi realizada pesquisa com abordagem
qualitativa, por intermédio de entrevistas semi-estruturadas, conforme Alves
(2007) sobre a percepção dos sujeitos, das trajetórias vivenciadas e de seus
reflexos socioeconômicos e culturais, para melhor embasar este estudo.
Por conseguinte, em momento subseqüente do trabalho, após o
estabelecimento de contato com os brasileiros produtores de soja no
Paraguai, em janeiro de 2006, foram selecionados, por sorteio simples, sete
proprietários e trabalhadores das fazendas dentre aqueles que concordaram
em ser entrevistados para participar do estudo.
Deve-se registrar que as entrevistas foram elaboradas de acordo
com os objetivos mencionados, tendo como pano de fundo as informações
coletadas na primeira fase do trabalho. O trabalho de campo e os
formulários que foram aplicados nortearam as entrevistas de caráter
qualitativo (roteiro das entrevistas disponível no Apêndice C), com base no
perfil sociodemográfico. Essas entrevistas foram compostas por oito
questões que visaram a compreender:
a) a rotina de vida no Paraguai;
b) os motivos de emigração para o Paraguai;
c) a percepção entre os “brasiguaios” da imagem do Paraguai;
d) a percepção da imagem do Brasil;
e) as vantagens e desvantagens de viver no Brasil ou no Paraguai;
f) a percepção da própria situação no Paraguai e,
34
g) a percepção e a representação acerca do termo “Brasiguaio”.
Como referenciado, entende-se que é apropriada, no caso de
estudos sobre a mobilidade de pessoas, a utilização de um método que
possa apreender aspectos subjetivos, como percepções e sentimentos dos
indivíduos envolvidos no processo migratório. Assim sendo, optou-se pela
coleta de depoimentos e pela análise qualitativa das informações, centrando-
se a síntese analítica nas categorias recorrentes apresentadas nos
resultados.
Este procedimento permite traçar o perfil dos entrevistados com
seus dados biográficos, como resultado da dinâmica de interação do
estrangeiro com o elemento nativo e o modo como se processa a absorção
de valores, hábitos e costumes, pelo imigrante na nova comunidade. A
espontaneidade do contato verbal permite a captação de sotaques,
expressões lingüísticas e gestuais, suficientemente eloqüentes para revelar
um padrão de “miscigenação” em todo o seu conteúdo: aceitação / rejeição,
conflitos, vantagens e desvantagens etc..
Nessa perspectiva, portanto, foram realizadas entrevistas semi-
estruturadas, abordando a percepção, em áreas de recepção migratória,
acerca da imigração e dos reflexos socioeconômicos para os entrevistados.
Participaram da pesquisa brasileiros e paraguaios (filhos e netos
de brasileiros), de ambos os sexos, com idades superiores a 21 anos,
proprietários-agricultores e trabalhadores rurais do setor de produção de
soja no Paraguai. Os sujeitos da amostra são residentes na área que
compreende o maior território de produção de soja naquele país.
A parte textual da tese está sintetizada em considerações finais
que evidenciam a pertinência do estudo, o alcance (ou não) de seus
objetivos, a comprovação (ou não) de sua hipótese, bem como a eficácia de
suas pesquisas quer bibliográficas quer empíricas. Além do que, estas
últimas reflexões buscam evidenciar as conclusões às quais foi possível
chegar após todos os procedimentos adotados.
35
Finalmente, com base nos resultados conseguidos neste estudo,
pôde-se avançar na perspectiva de uma melhor e mais completa apreensão
do movimento migratório Brasil / Paraguai, a partir do qual se configura a
denominada Comunidade Brasiguaia.
Capítulo 1
Globalização e Mercosul:
A Importância na Relação Brasil-Paraguai
39
Pressupomos o trabalho como forma exclusivamente humana.
Uma aranha executa operações semelhantes à do tecelão, e a
abelha supera mais de um arquiteto ao construir sua colméia. Mas
o que distingue o pior arquiteto da melhor abelha em que ela figura
na mente da construção antes de transformá-la em realidade. No
fim do processo do trabalho aparece um resultado que existia
antes idealmente na imaginação do trabalhador. Ele não
transforma apenas o material sobre o qual opera; ele imprime ao
material o projeto que tinha conscientemente em mira (MARX,
1980, p. 220).
1.1 O PROCESSO DE GLOBALIZAÇÃO
A transformação que resultou do crescimento produtivo,
resultando no encurtamento espacial e virtualmente nas distâncias, levou os
países à intercomunicação acelerada em todos os níveis, ou seja, à
globalização
3
, tema amplamente discutido por diversos autores
4
renomados
e presentes nas abordagens acadêmicas sobre globalização, cuja definição
se forma ao mesmo tempo em que esta se efetiva.
É claro que a globalização do capitalismo deve ser vista como um
vasto e complexo processo, que se concretiza em diferentes níveis
e múltiplas situações. Envolve o local, o nacional, o regional e o
mundial, tanto quanto a cidade e o campo, os diferentes setores
produtivos, as diversas forças produtivas e a relação de produção.
E compreende simultaneamente colonialismos e imperialismo,
interdependência e dependências, nova divisão transnacional do
trabalho e da produção e mercados mundiais, multilateralismos e
transnacionalismos, alianças estratégicas e redes de
telecomunicações, cidades globais e tecnoestruturas globais
(IANNI, 1999,
p. 29).
[Grifo nosso].
Com a globalização e, conseqüentemente, com a existência de
uma rede global de informação (por meio de satélites), é inegável que a
3
Leia-se CanclinI (1995, apud RICO, 2002) que complementa a visão do processo da globalização
quando diz que esta: “Supõem uma interação funcional de atividades econômicas e culturais
dispersas, de bens e serviços gerados por um sistema com muitos centros no qual importa mais a
velocidade de percorrer o mundo que as posições geográficas nas quais se atua. A globalização faz
com que as pessoas consumam não tanto para suprir o que lhes falta, mas, porque o que compram
tornou-se desejável, embora possa ter curta duração e/ou se torna obsoleto: é a cultura do efêmero
e descartável que o é justamente para alimentar o fluxo e as leis do mercado globalizado”.
4
Leia-se Chesnais (1996) que discute o fato de que o termo ‘mundialização’ tem o defeito de
diminuir, pelo menos um pouco a falta de nitidez conceitual dos termos global’ e globalização’.
Prefere o termo ‘mundial’ ao ‘global’, por que se a economia se expandiu mundialmente, seria
desejável construir instituições controladoras desse movimento.
40
soberania da informação do Estado Nacional, como parte de sua soberania
política, tenha perdido a força (BECK, 1999), instaurando, assim, a
diminuição do “poder do Estado Nacional” e o aumento do “poder do
mundo”.
Dissolve-se uma premissa aparentemente imprescindível do
sistema de trabalho das sociedades industriais: a necessidade de se
trabalhar conjuntamente em um mesmo lugar para produzir bens ou serviços
perdeu sua validade. Todavia, os empregados podem cooperar
transnacionalmente ou oferecer serviços em contato direto (BECK, 1999).
Essa é a globalização da cooperação ou da produção no trabalho.
Ainda segundo esse autor, a globalização da economia se refere
à desnacionalização da economia, isto é, “o fato de que as economias
nacionais se tornam tão fictícias quanto as etiquetas das firmas nacionais,
fazendo com que a prosperidade da indústria nacional não mais coincida
com a prosperidade dos cidadãos (nacionais)”. É nesse sentido que essa
globalização se relaciona com a virtualização do dinheiro e das finanças,
pois as especulações de mercado e mão-de-obra se sobrepõem muitas
vezes à produção.
“As tendências mundiais apontam, predominantemente, para a
independência política e o autogoverno, por um lado, e para a formação de
alianças econômicas, por outro lado” (NAISBITT, 1994, p. 3).
Os autores citados apontam que a internacionalização
5
é um
conceito diferente da globalização econômica; quando se exportam postos
de trabalho e mercadorias (relação comercial bidirecional), isto se faz,
predominantemente, dentro de um eixo de países altamente industrializados
que pertencem a Europa, América e Oceania.
5
Para Chesnais (1996) quando discute o fim da dicotomia da economia internacional X
economia mundial: “No paradigma tradicional, o capital produtivo, fica colocado por fora
da mundialização do capital. A transformação da economia internacional em economia
mundial coincide justamente com o fim desta dicotomia. A mundialização do capital
produtivo torna-se parte integrante da mundialização do capital”. Reforçado pelo autor
“torna-se o centro dela”.
41
Mix (2003) procura dar um maior esclarecimento aos termos
globalização / mundialização e globalismo, quando define:
[...] Geopolíticamente nos encontramos con un mundo em busca
de un nuevo equilíbrio. La lógica Este-Oeste, que era bipolar, ha
desaparecido para dar lugar a una lógica unipolar, baseada sobre
una superioridade militar sin precedentes y de serio corte
maníqueo, como lo demonstró el reciente conflicto de Irak, [...].En
el marco de esta intervención creo conveniente precisar algunos
términos que a menudo se confunden, y en primer lugar el
concepto de globalización. Tras él suele verse una ideología
neoliberal de domínio del mercado mundial, una lógica capitalista
que tiende a arrinconar la política, desconfia de la democracia y
pretende organizar todos los campos de acuerdo con el modelo
econômico. [...] La globalización es distinta de la mundialización.
Globalización alude al caráter multidisciplinario de los câmbios y
mundialización se cine a la estricta geografia. Reconoce que el
mundo se ha hecho uno, pero en él conviven siglos diferentes. La
globalización es un proceso. Eso la diferencia de “globalismo”,
término que aspira a que los valores de la sociedad de consumo
occidental sean compartidos por 6 millones de habitantes y sean
pertinentes para todos ellos. Hay quien señala que “globalismo” es
una ideología de la dictadura del mercado mundial, en cambio
“globalización” es uma palabra inventada para designar el proceso
de superación de los marcos nacionales que afectan a fenómenos
políticos, sociales, culturales y económicos. [...] La globalización
determina también una homologación cultural del mundo, em
ralación con los modos de vida y las formas del pensamiento (el
pensamiento único). Contra esta homologación se encuentran los
fenómenos de resistencia territorial de la identidad. El problema de
la identidad se convierte frente a la globalización en un problema
central. (MIX, 2003, p. 69-70). [Grifo nosso].
Em suma, a globalização significa a alteração da ideia de que se
vive e interage apenas nos espaços fechados e geograficamente delimitados
dos Estados nacionais e suas respectivas sociedades nacionais.
Assim, esse processo aponta para o desmanche da unidade do
Estado e da sociedade nacional, pois novas relações de poder e de
concorrência ocorrem, novos conflitos e incompatibilidades entre os atores e
unidades do Estado de um lado e novas identidades, atores e processos
sociais transnacionais de outro, (BECK, 1999).
A valorização do capital, no processo de globalização ou
mundialização, abraça um conjunto de regiões do mundo onde recursos
42
e mercado, evidenciando ainda mais o caráter excludente
6
e destrutivo
da lógica do capital, destacado abaixo:
[...] Para muitos, o conceito de massa é suficiente, claro,
explicativo. A massa é naturalmente composta de trabalhadores
assalariados, empregados e desempregados, na cidade e no
campo. É uma coletividade forte, impressionante, mas que
depende de instituições, regras, objetivos e meios para organizar-
se, manifestar-se. Caso contrário transborda dos limites do
razoável, da conveniência, da ordem. Por isso, depende da elite
(IANNI, 1989, p. 12 ).
A polarização ocorre nos países, chamados países
desenvolvidos, por terem maior acumulação de capital, maior poder de
decisão e negociação sobre os países conhecidos como em
desenvolvimento. Os efeitos do desemprego são resultantes do
distanciamento entre os países situados no âmago do oligopólio Estados
Unidos, Japão e Europa – e os da periferia.
Como na época do imperialismo, um intercâmbio desigual
entre os países que assumem o papel de reserva de matérias-primas e os
dominantes. Os países do centro do eixo econômico vêem os que estão em
regiões pobres não como países em desenvolvimento, mas como pesos
mortos cujos imigrantes os ameaçam; e não só, pois vêem possibilidades de
ditar mudanças econômicas, financeiras que os favoreçam, por meio de uma
super apropriação de riquezas (oligopólios).
É o capital que orienta o mercado e o poder afinal, esse é o
sistema capitalista –, mas a exploração dos países que não pertencem ao
oligopólio é cada vez maior. Nesse processo, surgem novos atores nas
relações de poder nacionais e internacionais, que transcendem as fronteiras,
as identidades e os interesses nacionais.
Castells (2003) continua a discussão sobre o tema oligopólio e
ressalta a importância das redes na crescente espiral da globalização; com
6
IANNI, Octavio (1989 p.7-27). A sociologia e o mundo moderno. Aula inaugural proferida no dia
19/03/1988 para os alunos do Curso de Ciências Sociais promovida pelo Departamento de
Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, da Universidade de São Paulo.
Escrita depois da fala. Professor colaborador do Programa de Pós-Graduação do Departamento de
Sociologia FFLCH-USP.
43
efeito, no paradigma instaurado nesse processo, a nova tecnologia passa a
atuar sobre a informação que, como elemento inerente a toda atividade
humana, transcendendo a esfera individual, induz a interação por intermédio
das redes, em diversos níveis.
Dos cinco tipos de redes
7
sustentados por ele, a rede de
produtores é a que mais será tratada neste projeto, não que sejam
desconsideradas as demais redes: rede de fornecedores, rede de clientes,
coalizões-padrão e rede de cooperação tecnológica, mas por ser a rede de
produtores de grande importância para o posterior entendimento deste
trabalho.
Quando citado no livro o texto: “Redes são instrumentos
apropriados para a economia capitalista baseada na inovação, globalização
e concentração descentralizada; para o trabalho, trabalhadores e empresas
[...] e para uma organização social que vise a suplantação do espaço [...]”
(CASTELLS 2003, p. 566), o “nó” de intersecção do agente de produção
(trabalhador agrícola) abre a possibilidade de sua inserção na economia,
segundo as alternativas não só próximas, mas também as remotas (da
imigração).
Na Primeira e na Segunda Revolução Industrial era usada a força
física do homem como um dos principais fatores de produção. a última, a
Terceira Revolução Industrial, requer cada vez com mais intensidade a
utilização da capacidade mental e intelectual do trabalhador. Toffler
8
, em seu
livro A terceira onda, entende essas etapas da evolução tecnológica, pelas
quais a humanidade passou e passa, como “ondas” e considera que, das
três fases da Revolução Industrial, a Terceira está em operação.
7
Definição de Redes citada por Castells: “Rede é um conjunto de nós interconectados. é o ponto
no qual uma curva se entrecorta. Concretamente, o que um nó é, depende do tipo de redes
concretas. (CASTELLS, 2003, p. 566).
8
TOFFLER, Alvin (1980), em A Terceira Onda, discute profundamente as mudanças revolucionárias
da civilização, classificando-as em três grandes etapas: 1
a
Onda Revolução Agrícola (8000aC.
até 1750 dC.); 2
a
Onda Revolução Industrial (final do século XVII e início do século XIX) e 3
a
Onda A Revolução Tecnológica. In: SEABRA, C. Uma nova educação para uma nova era. A
revolução tecnológica e os novos paradigmas da sociedade: IPSO, Toffler, A. Powershift As
mudanças no poder. São Paulo: Record, 1994.
44
Toffler (1980) discute o movimento econômico que tem como forte
ponto de apoio a microeletrônica associada à informática, o que a literatura
especializada denomina de Terceira Revolução Industrial. É a mundialização
econômica capitalista modificando o processo produtivo e exigindo a
reorganização das empresas e das pessoas.
É, portanto, o capitalismo que se organiza em prol das
multinacionais. Tem-se nesse momento histórico alterações nas relações do
homem com o trabalho, não apenas de caráter quantitativo, mas qualitativo.
Nessa Terceira Onda, o valor de conhecimento agregado aos
produtos supera a mão-de-obra do trabalhador e o preço da matéria-prima.
Sem dúvida, as sociedades desenvolvidas estão vivendo a Terceira Onda,
que é tratada como a “revolução da inteligência” enquadrada na Terceira
Revolução Industrial, na qual a informação assume o papel de “moeda
globalizante”: “as decisões tomadas no cotidiano das pessoas são avaliadas
pelo acesso que se tem aos meios intermediários da informação”, segundo
Toffler (1980).
Chesnais, em A mundialização do capital (1996), discute esse
tema sob a ótica da sociologia. Afirma que, na nossa sociedade, o salário
recebido é empregado na aquisição do que é necessário à sobrevivência. Os
produtos fabricados no local do trabalho não pertencem aos trabalhadores.
Todos vendem sua força de trabalho e não se beneficiam dos produtos
finais: “O trabalho humano é, mais do que nunca uma mercadoria, a qual
ainda por cima teve seu valor venal desvalorizado pelo ‘progresso cnico’
[...]” (CHESNAIS, 1996, p. 42)
9
.
As sociedades serão informacionais não porque se encaixem em
um modelo específico de estrutura social, mas porque organizam
seu sistema produtivo em torno de princípios de maximização da
produtividade baseada em conhecimentos, por intermédio do
desenvolvimento e da difusão da tecnologia de informação e pelo
atendimento dos pré-requisitos para sua utilização (principalmente
9
Essa característica capitalista foi constatada in loco, quando da visita ao Paraguai: os
trabalhadores rurais e mesmo os agricultores não se beneficiam dos nutrientes da soja,
não se alimentando com o grão da soja, pois, toda a produção é exportada diretamente
para a China e Estados Unidos, dentre outros.
45
recursos humanos e infra-estrutura de comunicações.
(CASTELLS, 2000, p. 226).
Em suma, o processo de globalização torna maior a possibilidade
de relacionamento entre os países. Entretanto, é excludente para a maioria
dos países que não faz parte do eixo econômico de poder. A questão que
fica dessa aparente contradição entre o processo de globalização econômica
e a formação de novas sociedades globais é se essas sociedades são, real
e amplamente, globais ou apenas um esforço de se posicionar frente ao
mercado mundial.
Ampliando este discurso Bógus (2007, p.165) chama atenção
para os “fenômenos emergentes no processo de globalização
contemporânea”, considerado por muitos autores não como fenômeno novo,
mas como fenômeno desde o século XVI, com as grandes conquistas e no
qual a migração internacional também fez parte do contexto que assume
“novos contornos” e apresenta “novos desafios” tanto na questão do
entendimento, como na questão do processo de globalização propriamente
dito (BÓGUS, 2007, p. 165), e ampliando o entendimento do processo de
globalização,
Tal processo se teria iniciado no século XVI com as conquistas
coloniais e continuado através dos últimos séculos, com a
expansão do capitalismo e seu imperialismo econômico e cultural.
[...] (SANTOS, 1995 in GUS, 2007, p.165)
.
No entanto os fenômenos no processo de globalização
apresentam muitos desafios sendo esclarecido por Bógus (2007) como:
Frente a tais desafios, é necessário pensar o processo de
globalização, entendendo-o como uma nova expansão do
capitalismo, que impõe uma racionalidade, padroniza culturas e
acaba criando a ilusão de uma totalidade que de fato não existe.
(BÓGUS, 2007, p. 165).
Dentre os fenômenos citados por Bógus (2007) a reflexão sobre
cultura, desigualdades nacionais e regionais, mundialização da cultura toma
corpo:
46
A totalização necessária de abrangência mundial aparece como
‘globalização’, ‘mundialização da cultura’, etc. Mundialização que
abstrai a reflexão crítica dessa totalização. Assim, a cultura, a
sociedade global, parecem tornar praticamente absolutas as
formas concretas que se apresentam hoje. Instala-se um
deslumbramento frente à realidade global; a globalização existiria
autonomamente como dado fatual, restando apenas inserir-se nela
(LEO MAT, 1996, p. 3 in BÓGUS, 2007, p. 166).
Ocorre a exclusão social para uma determinada parcela da
população, principalmente nos países de Terceiro Mundo diante da mudança
na relação trabalhador-salário, ocorre a reestruturação no sistema produtivo
além do papel do Estado-Nação se enfraquecer, amplia-se a força dos
blocos regionais.
As fronteiras desaparecem, porém, apenas no interior de cada
bloco, fortalecendo-se para os que estão fora, excluídos dos
grupos hegemônicos, participando de maneira tangencial do
processo de globalização. [...] Nas manifestações de xenofobia
presentes em várias sociedades antes exportadores de população
e hoje receptoras de migrantes caso de vários países europeus
a questão da identidade nacional ressurge num quadro onde,
teoricamente, deveria diluir-se, se consideradas as premissas das
chamada globalização. Entretanto, conforme já firmado, a “diluição
de fronteiras” é pensada como possível apenas no interior dos
blocos, num território bem demarcado. Para os “estrangeiros”,
geralmente oriundos de ex-colônias, edificam-se verdadeiras
“muralhas invisíveis”, e a entrada de imigrantes clandestinos torna-
se assunto da polícia de fronteiras, sendo normatizada e reprimida
enquanto tal. (BÓGUS, 2007, p. 166).
[
Grifo nosso].
Entendendo-se a globalização como possibilidade de exclusão para
alguns grupos sociais e países que não conseguem se incorporar às
determinadas situações.
1.2 O SURGIMENTO DO MERCADO COMUM DO SUL – MERCOSUL
O sentimento de união apareceu na América Latina de forma
progressiva (conforme se visualiza no Anexo A), de modo a encorajar
tendências de união entre Estados soberanos, levando às primeiras
tentativas concretas de integração. Diversas tentativas de projetos de
integração acabaram por fracassar, a saber: Congresso de Lima (1848),
47
Tratado Continental de Aliança e Assistência Recíproca (1858), Sistema
Interamericano e União Internacional das Repúblicas Americanas
(1889/1990), Código Bustamante (1928). No entanto, a necessidade, diante
do mercado mundial, da formação de blocos econômicos entre os países
como estratégia de sobrevivência econômica frente às grandes potências
mundiais, entre elas Estados Unidos e Japão, permaneceu (MEIRELLES,
1999).
Dentre esse panorama de tratados políticos, deve-se citar a
criação, em 1960, da ALALC Associação Latino-Americana de Livre
Comércio –, que tinha como signatários Brasil, Chile, Argentina, México,
Paraguai, Peru e Uruguai. Posteriormente, todos os demais países da
América Latina aderiram ao Tratado. Com a ALALC, buscava-se a
ampliação de mercados e a liberalização de intercâmbio pelo
desmantelamento de medidas protecionistas, por meio de negociações
multilaterais, produto a produto.
Em 1980, a ALALC foi substituída pela ALADI Associação
Latino-Americana de Integração –, mas as tendências protecionistas
persistiram e os países-membro ainda mantinham restrições com relação a
uma visão comum mais ampla. Assim, essa associação não gerou os
benefícios esperados inicialmente pela integração e, dessa forma, resultou
em fracasso. Foi com o fim da ALALC / ALADI que os movimentos de
integração parciais passaram a ganhar força, na medida em que se passou
a entender que o processo de integração somente teria êxito quando seus
objetivos fossem menos ambiciosos, mais pragmáticos e gradativos
(MEIRELLES, 1999).
Assim, a partir do contexto dos anos de 1980, os países latino-
americanos mudaram, pois, seu enfoque no que diz respeito à integração,
dando ênfase a acordos bilaterais mais concretos, precursores dos acordos
integracionistas de hoje.
48
Durante o período das presidências Sarney-Alfonsín (Brasil
Argentina)
10
foi lançada a ideia da criação de um Mercado Comum no Cone
Sul. O Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento Brasil-
Argentina, de 29/11/1988, previa, entre outras linhas, “a liberação completa
do comércio de bens e serviços em prazo máximo de dez anos” e objetivava
a formação de um espaço econômico comum. Assim, o Tratado de 1988
representava uma forma de promover integração por meio de acordos
setoriais.
Sucederam-se mudanças nos governos do Brasil e da Argentina,
o que gerou alterações nos programas econômicos e, com isso, a adoção de
novos critérios de modernização e de competitividade. Em 06/07/1990, foi
assinada a Ata de Buenos Aires entre os presidentes Fernando Collor de
Mello e Carlos Menem, que previa o início do funcionamento do Mercado
Comum até 01/01/1995.
Na América Latina, no entanto, a tentativa mais concreta e
abrangente de se formar um bloco comercial competitivo no mundo
globalizado culminou com a formação do Mercosul que busca essa nova
ordem mundial econômica para a região. Todavia, além de maior integração
entre os países-membros, o bloco tem procurado a inclusão de países que
ainda não se lhe aderiram, mas que geográfica ou historicamente pertencem
a esse bloco. Nesse contexto, observa-se a interpretação de Hassab Zaoual:
10
Antecedentes Cronológicos da Criação do Mercosul segundo consulta ao Consulado General
de la República del Paraguay Em 29/07/1986 Reunión de Alfonsín y Sarney en Buenos Aires;
Integración Argentino Brasileña. Em 07/04/1988 Reunión en Brasília y Sanguinetti; Protocolos de
Cultura y Administración Pública y Moneda. 29/11/1988 Reunión en Buenos Aires: Tratado de
integración y Cooperación Argentino Brasileña. Creación de un espacio económico común en un
plazo de 10 años. 01/08/1990 Reunión de Ministros de Relaciones Exteriores y de Economia de
Argentina, Brasil, Chile, y Uruguay: Propuesta de ampliación de su espacio económico. Invitación al
Paraguay para participar del proceso del Mercado Común. 06/09/1990 Reunión del Grupo Mercado
Común en Buenos Aires: Se inicia la negociación del Tratado Cuatripartito para la formación del
Mercado Común. 02/10/1990 Reunión del Grupo Mercado Común en Brasília: Elaboración del
anteproyecto para el Tratado del Mercado Común. 18/12/1990 Acuerdo de Complementación
Econômica Argentina – Brasil en Montevidéo: Estabelecimiento del calendário de reducciones
arancelarias mutuas pasta el 31 de Diciembre de 1994. 21/02/1991 Reunión del Grupo Mercado
Común; Conclusión del Projecto de Tratado y sus anexos. 26/03/1991 Firma del Tratado de
Asunción: Se da inicio al MERCOSUR. 29/11/1991 Entrada em vigor del Tratado de Asunción.
[Grifo nosso].
49
Tal unicidade fundamenta a diversidade dos múltiplos sítios
11
de
uma região, de uma nação, de um continente e, finalmente, do
conjunto da humanidade. Assim, a diversidade é onipresente e
proliferante em razão dos intercâmbios e da incessante mudança
que caracterizam todos os meios sociais. A humanidade é una e
diversa (ZAOUAL, 2003, p. 112) [Grifo nosso].
Segundo informações da CEPAL - Comissão Econômica para a
América Latina e o Caribe, em março de 2006 a assinatura do Tratado de
Assunção
12
pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai completou quinze
anos, tendo passado por várias etapas que provocaram expectativas
diversas, desde favoráveis até as mais pessimistas
13
.
O Tratado de Assunção do Mercosul estipula diretrizes para a
formação do Mercado Comum, dentre as quais constam: a) livre circulação
de bens, serviços e fatores produtivos entre os países; b) estabelecimento
de uma tarifa externa comum; c) coordenação de políticas macroeconômicas
e setoriais entre os Estados-Parte; d) compromisso dos Estados-Parte de
harmonizar suas legislações (ROLON, 2000).
Apesar da pouca relevância das diferenças estruturais entre os
países vizinhos do Cone Sul, conforme estudo da CEPAL, cada país-
membro encontrou “o seu caminho”, mesmo sem a existência de uma
negociação que fizesse convergir as economias e que “neutralizasse as
diferenças” (CEPAL, 2006, p. X). Nesse sentido, o Mercosul ainda foi pouco
foi explorado como bloco econômico de fato.
11
HASSAN ZOUAL, economista e pensador de origem marroquina, professor da Université du
Littoral Cote d’Opale, em Dunkerque, norte da França, apresenta a elaboração de uma teoria do
local, em sua dialética com o global, designada como teoria dos “sítios simbólicos de
pertencimento” ou de “pertença” (sites symboliques d’appartenance). Um sítio é um local em
sentido geográfico (bairro, cidade, microrregião, região, país etc.) e também em sentido simbólico
(adesão a uma cultura, a uma ideologia, a uma religião).
12
Baumann e Mussi (2006), em documento elaborado para o Escritório da CEPAL no Brasil, referem
que. O exercício de integração criado a partir do Tratado de Assunção é único, em diversos
sentidos. De imediato, é provável que não exista no planeta outro grupo de países de dimensões
tão díspares e com pretensão de constituir uma União Aduaneira. Além disso, nenhum outro
exercício no hemisfério ocidental experimentou aumento tão pronunciado de transações intra-
regionais (comércio e investimento) como o Mercosul até 1998, do mesmo modo que nenhum
outro exercício apresentou retração o intensa nessas mesmas transações quanto o Mercosul
entre 1998 e 2003.
13
Quinze anos é um período suficientemente longo para justificar uma análise dos resultados obtidos. No
entanto, não é fácil atribuir à existência ou ao formato negociador do Mercosul os resultados observados na
estrutura produtiva dos países que transcendem o âmbito do acordo regional (BAUMANN; MUSSI, 2006, p.
2).
50
Acompanhando de perto esse contexto, os dois vizinhos Paraguai
e Uruguai foram convidados, em agosto de 1990, a participar do processo de
integração Brasil-Argentina. Desde esse momento estava presente o
conceito estratégico de que, atuando em bloco, os países do Cone Sul
poderiam entabular negociações econômicas com outras regiões em
posição mais favorável. Em 26/03/1991, foi assinado o Tratado para a
Constituição de um Mercado entre o Brasil, Argentina, Paraguai e o Uruguai,
formando, então, o Mercosul – Mercado Comum do Sul.
O processo de integração desenvolvido no quadro do Mercosul
inscreve-se no esforço realizado pelos governos dos quatro países para
ampliar e aprofundar as medidas de liberalização comercial em curso em
todos eles, mas como um processo lento e gradativo, ao contrário de
acordos anteriores. Assim, o Mercosul torna-se importante na medida em
que reforça o poder de negociação de cada país no contexto internacional.
Entretanto, cabe destacar, ainda, que o Mercosul nasceu como
um grande desafio e sinônimo de avanços nas relações políticas do Cone
Sul, marcadas contudo, por grandes assimetrias e diferenças em qualquer
aspecto que se queira refletir. Argentina e Brasil naturalmente são a mola
mestra sob a qual estão o Paraguai e o Uruguai (ROLON, 2000).
Geralmente, pouca atenção tem sido dada à contribuição desses países
menores no impacto da alteração geral do bloco Mercosul e, menos ainda,
às relações bilaterais entre os países menores e Argentina e Brasil.
Descortinar a importante relação entre Brasil e Paraguai e as consequências
econômicas e, especialmente, sociais provenientes dela, está sendo o
grande desafio.
Cumpre registrar que, juntos, os primeiros países que formam o
bloco ocupam onze milhões de quilômetros quadrados, Beçak (2000)
esclarece que a formação do Mercosul, é mais uma resposta dos reflexos do
mundo europeu e americano, destacando o texto do próprio Tratado de
Assunção (preâmbulo), de 24 de março de l991.
51
Tendo em conta a evolução dos acontecimentos internacionais,
em especial a consolidação de grandes espaços econômicos, e
inserção internacional para seus países [...] expressando que este
processo de integração constitui uma resposta adequada a tais
acontecimentos. (BEÇAK, 2000, p. 83).
No contexto da esfera pública, a formação do Mercosul é mais
uma resposta regional do que uma “consciência da representatividade” dos
países do bloco, apresentando maior intercâmbio comercial entre os países-
membros, decorrente de uma transição primeiramente política (do
autoritarismo para a democracia), pois só depois é que avançaram nas
reformas (econômicas e institucionais) necessárias para a completa
formação do bloco, que até os dias de hoje se encontra em processo de
estruturação.
O Mercosul talvez seja o mais importante projeto de política
externa do Brasil, mas que não conseguiu efetivar concretamente o seu
objetivo de favorecer a economia latino-americana, a ponto de diminuir sua
dependência das economias das grandes empresas transnacionais que
dominam o processo de transformação econômica.
O que se constata é que a relação entre os países do Mercosul,
como bloco econômico ativo, fortaleceu as relações fronteiriças, e entre elas,
a relação Brasil e Paraguai. Daí, especialmente nos anos 1970, ocorreu
aumento no fluxo migratório de brasileiros
14
para o Paraguai, com base na
expectativa de melhorar suas oportunidades econômicas por meio do cultivo
agrícola nas terras paraguaias.
Pelo Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes
do Mercosul (2002), estabeleceu-se que cidadãos de quaisquer países do
bloco, natos ou naturalizados pelo menos cinco anos, têm um processo
simplificado para morar no país escolhido por dois anos, sendo exigido:
passaporte válido, certidão de nascimento, certidão negativa de
antecedentes criminais e, em alguns países, certidão médica de autoridade
14
Para Patarra (2002, p. 31), “[...] a questão da mobilidade espacial transnacional de pessoas e suas
implicações passam a constituir dimensão inerente à relação entre população e desenvolvimento,
bem como parte integrante de políticas populacionais”.
52
migratória. Em alguns casos, comprovada a possibilidade lícita de sustento
próprio e da família, essa residência poderá se transformar em permanente.
Tanto essa possibilidade como as disparidades existentes entre a
legislação tributária
15
dos países envolvidos, neste caso, especificamente,
Brasil e Paraguai, o citadas de forma a reduzir as barreiras existentes na
integração do Mercosul
16
. Essas disparidades se constituem em dificuldades
para o crescimento econômico dos brasileiros, não somente para os
agricultores e pecuaristas, mas para toda uma população onerada por altos
impostos. Publicações recentes do IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística mostram que o Brasil está entre os países de maior tributação
fiscal. Este fato foi citado pelos entrevistados como também sendo um dos
fatores de expulsão.
O surgimento do Mercosul, o acordo de residência e o
desenvolvimento econômico paraguaio baseado na agricultura constituíram,
pois, fatores que permitiram a participação de imigrantes brasileiros como
detentores de propriedades e trabalhadores rurais, estabelecendo-se como
uma comunidade naquele país, tendo conquistado, em geral, um espaço
15
A história econômica do Brasil tem sido tecida pela descontinuidade e arbitrariedade; medidas
econômicas são tomadas ao arrepio da Constituição, como combustíveis eleitorais, sem falar da
corrupção. Exemplo do primeiro caso é a sucessiva troca de moedas: a partir de 1942, tivemos oito
moedas, com valores a cada troca, majorados para mil vezes o seu valor, gerando inflação e
insegurança.
In BC – Banco Central do Brasil - Acesso em 07/01/2008.
Por ocasião do orçamento anual, usa-se do subterfúgio da contribuição temporária, às vezes,
renovada sucessivamente, até se incorporar ao grupo de impostos definitivos e oficiais, como o
caso (recente) da CPMF Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira. Nossa carga
tributária, que se define como a proporção entre o volume de riqueza do país e a arrecadação do
governo cresceu, de 1947 a 2005, de 13,8%, para 37,37% do PIB Produto Interno Bruto –,
baseado em consulta ao site BBC-Brasil.com (2003).
No segundo caso: o sistema paraguaio de impostos contrasta com a nossa pesada carga tributária.
A arrecadação provém mais da exportação, considerando que a economia paraguaia é
basicamente exportadora (75%); não tem Imposto de Renda Pessoa Física. Sobre a circulação de
mercadorias e serviços a taxação é de 10%, circunstâncias essas que reduzem a carga tributária a
9%, contra os 36% / 37% no Brasil do PIB. O IVA Imposto sobre Valor Agregado é equivalente
ao nosso ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços. In BBC Brasil. Com. Acesso
em 07/01/2008.
16
Segundo Flores (2005), o Mercosul originou-se da formação de um “bloco regional periférico, pleno
de simbolismos e representando uma visão de regionalismo aberto”. Evoluiu em várias etapas: “[...]
foi assinado em 26/03/1991 o Tratado de Assunção objetivando a constituição do Mercado Comum
do Sul (Mercosul) pelo Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai”. “Este tratado, que define as bases
para a criação do mercado comum, foi aditado por protocolos adicionais, entre os quais se destaca
o Protocolo de Ouro Preto sob aspectos Institucionais estabelecendo a nova estrutura institucional
do Mercosul destinada a vigorar durante o período de consolidação da união aduaneira”.
53
satisfatório e com qualidade de vida melhor do que aquela que possuíam no
Brasil.
Decorre, por conseguinte, um interessante fenômeno cultural que
surgiu no país: grandes contingentes de brasileiros se fixaram e
desenvolveram sua própria maneira de ser nas regiões do Alto Paraná, no
Paraguai. Essas comunidades, entretanto, ainda m sido pouco estudadas
do ponto de vista econômico-social, no que tange a particularidades do seu
modo de vida e de sua permanência no transcorrer das gerações.
1.3 A CULTURA NA GLOBALIZAÇÃO – MISCIGENAÇÃO CULTURAL
Para Dowbor
17
e colaboradores (2001), no âmbito das relações
internacionais, entendidas como confluência de saberes, a reedificação
institucional das relações internacionais, na rotina acadêmica clássica,
assume, unilateralmente, o agente estatal e suas várias intervenções. Fica aí
patente a desatenção para com o conhecimento da realidade de forma mais
ampla e complexa. Surge a ideia da análise da realidade cultural do povo e
das possíveis miscigenações entre Estados.
Se, com a globalização, o poder do Estado Nacional acaba se
esvaindo, de certa forma faz sentido pensar que a cultura da nação também
acaba sofrendo influências de outros Estados Nacionais por causa do
trânsito de informações, das relações comerciais e sociais que elas
estabelecem. Assim, um pouco em detrimento da Federação e do Estado
Nacional, se fortalece a “identidade cultural mista”, proveniente das diversas
relações entre sociedades diferentes.
17
Profº Dr. Ladislau Dowbor (por Mauro Cezar Pereira), Jornal Valor 23/4/2002. Formado em
Economia Política pela Universidade de Lausanne, Suíça; em Ciências Econômicas, pela Escola
Central de Planejamento e Estatística de Varsóvia, Polônia (1976). Atualmente é professor titular
no setor de pós-graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Presta consultoria às
agências das Nações Unidas, governos, municípios e Senac. Atua como conselheiro na Fundação
Abrinq, Instituto Polis, Transparência Brasil e em outras instituições.
54
Pela via cumulativa do aprimoramento e ampliação do âmbito dos
meios de transmissão dos códigos sociais, fabrica-se o homem
antigo no seu local, o homem moderno na sua nação, o homem
contemporâneo no planeta terra, pela combinação de regras de
comportamento econômico-político-social-cultural (DOWBOR e
cols., 2001, p. 158).
Ainda segundo esse autor, as tradições locais, os Estados
Nacionais ou a hegemonia imperial dos países desenvolvidos impõem
determinada língua, representações por imagens, maneiras de raciocinar, de
decidir, de vestir e de gostar, a ideia de justo e injusto, do verdadeiro e do
falso. Aqui, o paradigma que se forma é o do poder do Estado Nacional
versus a regionalização ou miscigenação, dentro do processo de
globalização.
Dowbor faz uma severa crítica à homogeneidade nacional e
mostra que a quebra desse paradigma se dá em favor de uma miscigenação
cultural:
[...] a quebra da multiplicidade de pertenças no interior do território
nacional se fez, e ainda se faz, a dano de particularidades, a
crédito da homogeneização da vida, entoada em um único hino,
colorida de uma única bandeira, motivada por uma única paixão
(DOWBOR e cols, 2001, p. 158).
Nesse sentido, a categoria de identidade aponta para a
permanência de um determinado modo de ser. O desafio, então, é trabalhar
com novas categorias, no momento em que as tecnologias de comunicação
e informação se fazem porosas às fronteiras, desterritorializando relações. O
chamado processo de mundialização, decorrente dessa intensificação das
comunicações no âmbito da economia, da política, da cultura faz com que
potencialmente tudo exista em rede, ou seja, conectado, entrelaçado,
tramado como os fios de um tecido. Essa ideia vem do fato de se poder viver
melhor e de que para viver bem se devem ter opções de escolha, mesmo
que isso signifique recriar alguns outros aspectos da realidade.
Complementarmente, a categoria de mestiçagem é o que
acesso ao mundo pós-contratual, pois a capacidade de amizade instaura o
55
quadro relacional de constantes recriações individuais e coletivas, gerando,
dessa forma, processos alternativos de sociabilidade, de interação, de troca.
A metáfora da mestiçagem é aqui assumida isenta do
pressuposto de mistura do que é originalmente puro. Interessa-
nos a referência a espaços intermediários, interstícios, espaços in
between, in among, onde se desenvolvem novos modos de
pensar, de viver, novas formas de existência não confinadas,
muito bem informadas e participativas (DOWBOR e cols., 2001,
p. 164).
Com o exposto até o momento, a fragmentação do Estado
Nacional principalmente pelo trânsito mundial de informações e
estabelecimento de relações comerciais transnacionais influenciou uma
nova configuração da sociedade, algumas vezes chamada de “aldeia global”.
A palavra “aldeia” traz o sentido de uma comunidade única, na qual todos os
seus integrantes se relacionam. Acrescentando-se a isso o termo “global”,
tem-se uma metáfora que diz que o mundo todo é uma comunidade única,
na qual todos os seus integrantes se relacionam.
Pondo-se de lado o fato de essa expressão ser um pouco
exagerada e utópica, visto que a internacionalização de forma plena
aconteceu, principalmente, em um determinado eixo de países, é importante
realçar que a influência cultural dessa troca de informações e
relacionamentos gerou novas sociedades.
Um aspecto importante e que não foi mencionado até agora se
refere ao fator “proximidade” como grande facilitador nessas relações.
Países fronteiriços têm, por natureza, a vantagem de se relacionar, em
contraste com países que estão separados geograficamente. Soma-se a
isso o fato de que países em desenvolvimento, muitas vezes fronteiriços,
tentam se agrupar em blocos para fortalecer seu poder de mercado (e sua
economia) e participar dessa “aldeia global” de forma mais competitiva.
Importante, também, é analisar como esse contexto exerce
influência na formação de uma nova cultura que, ao mesmo tempo em que
diminui as fronteiras dos Estados Nacionais, caminhando para uma
56
sociedade global, possui particularidades em sua realidade socioeconômica
e cultural, a ponto de alterar radicalmente a identidade nacional.
O Contexto Diplomático das grandes potências se refere aos
países que, pelo poder que detêm, buscam estabelecer os
parâmetros estruturais da ordem mundial, muitas vezes numa
relação de dominação-submissão. o Contexto Regional resulta
dos inter-relacionamentos que ocorrem entre os países que
compartilham uma mesma área geográfica como veremos a
seguir o caso do Mercosul. E o Contexto Contíguo se refere às
relações estabelecidas entre países que possuem fronteiras em
comum como complementarmente é o caso da relação Brasil
Paraguai, ainda que dentro do Mercosul (ZAOUL, 2003, p.112).
Nesse sentido, diversos fatores e processos interagem para
formar novas identidades culturais que precisam, ainda, ser avaliadas
cuidadosamente. Com efeito, segundo Zauol (2003), existe uma estrutura
simbólica que corresponde a todo o conteúdo imaterial: crenças, conceitos e
comportamentos. Esse universo está presente e impregna todos os
relacionamentos de maneira que existe sempre uma dinâmica funcionando
em direção da interação e da pluralidade:
[...] o sítio simbólico de pertencimento é um marcador imaginário
de espaço vivido. Em outros termos, trata-se de uma entidade
imaterial (ou intangível), que impregna o conjunto do universo local
dos atores. Sempre o sítio é singular, aberto ou fechado. Ele
contém um código de seleção e de evolução própria: nesse
sentido, é dinâmico. Contrariamente ao culturalismo, o estudo dos
sítios (sitologie) é uma abordagem não estática, pensando no
plano de movimento, de complexo e de mestiçagem cultural. [...]
crenças, conceitos e comportamentos se articulam em torno de
um sentido de pertencimento e criam forte relatividade das leis
econômicas no momento em que o mundo parece uniformizar-se
(ZAOUL, 2003, p. 112).
Para Wanderley
18
(2007), a colonização do Planeta adquiriu um
contexto específico nas relações sociais, que considera importante e
significativa tanto para os estudos da questão social francesa como para as
relações sociais que se formaram na América Latina, este entendimento é
de quem transcrevo o texto:
18
WANDERLEY, Luiz Eduardo W. (2007, p. 51-153). A questão social no contexto da globalização: o
caso latino-americano e o caribenho. In Mariangela Belfiore-WANDERLEY, Lucia BÓGUS, Maria
Carmelita YASBEK (orgs). Desigualdade e a questão social. 2. ed. rev. e ampliada. São Paulo:
EDUC, 2007, p. 51-153.
57
Conteúdo especial na multidimensionalidade das relações sociais
e na forma pela qual os sujeitos, individuais e coletivos, são
determinados pelos processos e estruturas sociais e, ao mesmo
tempo, instituem esses processos e estruturas. Ela resulta das
particularidades assumidas pelos modos de produção e pelos
modos de desenvolvimento que se constituíram em cada
sociedade nacional, das quais se pode inferir um conjunto de
elementos comuns válidos para a Região como um todo. Em seu
cerne, ela é fruto das desigualdades e injustiças que se
estruturaram na realidade do continente, ocasionadas pelas
profundas assimetrias nas relações sociais em todos os níveis e
dimensões expressas, principalmente, pela concentração de poder
e de riqueza em certos setores e classes sociais, e pela pobreza e
opressão de outros setores e classes, que foram e continuam
sendo a maioria populacional. Pobreza que vem-se ampliando nas
últimas décadas, em que pese o fato de pequenas variações, aqui
e acolá, que não mudam substancialmente a estrutura social
(WANDERLEY, 2007, p. 8-9).
Acompanhando este entendimento e destacando que no contexto
histórico-estrutural do continente da América Latina ainda apresenta os
“traços indeléveis” da longa história que marca o continente: “colonização,
lutas pela independência, modos de produção, formas de dependência,
planos de desenvolvimento, tipos de Estado, políticas sociais, etc.”
(WANDERLEY, 2007, p.51). E o autor continua a esclarecer suas hipóteses
versus a realidade da América Latina,
A realidade latino-americana é una e diversa. Se ela comporta
características comuns, derivadas exatamente dos referidos
traços, ela se compõe simultaneamente de um mosaico
diferenciado de elementos derivados dos modos como os povos
construíram e estão construindo suas trajetórias de vida
(WANDERLEY, 2007, p.52)
.
[Grifo nosso].
Desta forma as parcas conquistas sociais, as desigualdades que se
apresentam em toda a América, além das injustiças sociais e a trajetória do
crescimento econômico, vão se destacar assimetricamente e com resquícios
de grande desigualdade, tanto no desenvolvimento desigual dos países,
como na produção, na estratificação social e cultural, na dominação política,
“ao lado de outros fatores importantes, tais como territoriais, demográficos,
étnicos, de gênero” (WANDERLEY, 2007, p.55) logo, no pico a seguir será
focado apenas o crescimento econômico do país em questão: o Paraguai.
58
1.4 PARAGUAI: ASPECTOS DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
O Paraguai está dividido pelo rio Paraguai em duas regiões
naturais, configuração topográfica (conforme ilustração 1) importante para
o entendimento do panorama da agricultura e forte imigração ocorrente no
país. Assim, o rio Paraguai divide o país em região oriental, com planícies
irrigadas pelos afluentes fluviais, onde há maior produção agrícola e a região
ocidental – o Chaco Boreal de savanas e secas.
Os anos de 1960 durante a ditadura do governo Stroessner
foram marcados pela expansão da burocracia e da corrupção, que se
estenderiam por décadas no país, mas também pela fase da criação de
instituições e programas nacionais de desenvolvimento da pecuária,
agricultura e colonização (VILLALVA-FILHO, 1998).
Entretanto, é a partir de 1973
19
que o país passa por uma fase
de crescimento e mudanças estruturais. Os altos preços da soja e do
algodão no mercado internacional e mais um tratamento fiscal favorável às
exportações agrícolas, com empréstimos destinados à agricultura,
impulsionam a economia. É também nesse período que se inicia a grande
imigração de agricultores japoneses e brasileiros ao Paraguai, que o
incremento ao perfil agroexportador do país.
Nesse sentido, Rolon (2000) refere que o Paraguai dispõe de
certo potencial econômico e energético que o torna interessante para a
integração na perspectiva dos demais países. O que sugere que a relação
entre o Paraguai e os dois vizinhos maiores, Argentina e Brasil, é mais bem
entendida nos termos da interdependência assimétrica.
19
Segundo Beçak (2000, p. 90-91):“O Paraguai possui uma oferta muito diversificada de produtos,
sendo que os setores que geram maior receita são as sementes oleaginosas (soja), a fibra de
algodão e a madeira, além da grande concentração de hidrelétricas (Itaipu, Paraguai-Paraná,
Paraná-Tietê). [...] As exportações paraguaias tiveram nas décadas de 1960 e 1970 a Argentina
como seu maior parceiro comercial regional, chegando a absorver em média 75,6% do total a
média de exportações paraguaias para os membros do Mercosul, média que caiu para 31,2% na
década de 1980”. [... ] As exportações paraguaias para o Brasil, que foram praticamente
inexpressivas na década de 1960, passaram para uma média de 63,8% na década de 1980. [...] as
importações destinadas ao Brasil subiram de uma média de 2% na década de 1960 para uma
média de 60,3% na década de 1980”.
59
Na verdade, o Paraguai tem um papel de destaque regional e é
importante para o Mercosul tanto por seu potencial econômico relativo e
hidrelétrico, quanto pela questão do equilíbrio de poder na região.
Superada a fase Stroessner a partir de 1973, o Paraguai
experimenta um impulso de crescimento com o sucesso internacional de
suas exportações agrícolas (soja e algodão), com o conseqüente apoio
financeiro à agricultura e é nessa fase que começa a ser atraente para
japoneses e brasileiros.
60
Ilustração 1 – Paraguai e Brasil Meridional
Fonte: Dirección del Servicio Geográfico Militar, Asunción, 1993.
61
No contraponto dessas constatações, segundo as análises de
Rolon (2000), sem nenhuma dúvida, o Paraguai é o país de menor
desenvolvimento relativo dentre os membros do Mercosul. Nele pode-se
observar a baixa qualidade de serviços públicos básicos e o pouco
investimento público no país. Alguns índices podem ilustrar melhor os
problemas de infra-estrutura do país: no setor dos transportes, o Paraguai
dispõe de 32 quilômetros de rodovias para cada mil pessoas (o Brasil, 50; a
Argentina, 82 e o Uruguai, 100). No setor de comunicações, no Paraguai a
média é de 19 linhas para cada mil habitantes em comparação com 47
linhas para o Brasil, 72 da Argentina e 100 para o Uruguai. O Paraguai
possui uma economia com estrutura produtiva e um Estado que não sofreu
reformas econômicas, monetárias e fiscais, que se adequassem às novas
exigências do mercado e do próprio desenvolvimento e crescimento
econômico. E esse modelo é descrito sumariamente por Rolon:
[...] um modelo de crescimento chamado hacia afuera e com a
integração defronta-se com a exigência de ingressar em um
modelo de exportação de manufaturas e de produtos não
tradicionais. Este modelo mais tradicional encontra suas raízes
num modo adotado pela Secretaria Técnica de Planificação do
Paraguai da década de 1960 que consistia basicamente na
exportação de matérias-primas (ROLON, 2000, p. 38).
Assim, ao contrário do Brasil, Argentina e Uruguai que possuem
políticas de estabilização econômica o Paraguai chega ao Mercosul com
uma economia mais aberta
e direcionada, adotando um modelo econômico
de especialização em duas matérias-primas agrícolas exportáveis (soja e
algodão) e o comércio de fronteiras de triangulação ou reexportação. E,
ainda, chega ao Mercosul “para consolidar seu comércio e relações
geopolíticas, para maior articulação entre os países da bacia platina [...] e
para buscar sua ampliação econômica [...]” (ROLON, 2000)
Essa estrutura econômica paraguaia modelo agroexportador e
comércio fronteiriço ilegal – foi colocada em xeque com a entrada do país no
Mercosul, pois o que era tido, talvez, como vantagem competitiva torna-se o
bloqueio do crescimento de sua economia e aparece como entrave a uma
integração vantajosa.
62
Segundo Rolon (2000), existe uma combinação de fatores
positivos, como os provindos das hidrelétricas binacionais - Argentina e
Brasil - e o bom desempenho da soja e do algodão, que tiveram influências
sobre as estruturas econômicas do país. É a partir desses fatores que a
economia paraguaia faz uma ruptura com a Argentina seu maior parceiro
econômico até essa fase – e direciona-se para o Brasil.
Itaipu e o forte desempenho agrícola permitiram o
desenvolvimento do empresariado vinculado aos bancos, às finanças e aos
seguros. Entre 1973-1981 foram criados 12 bancos, 26 financeiras e seis
sociedades de poupança e empréstimos e ainda 30 companhias de seguros
(MONTEIRO, 2000, p. 53).
A soja e o algodão foram fundamentais para as mudanças na
estrutura econômica do Paraguai nesse período, chegando a responder por
mais de 34% da produção agrícola, tendo favorecido não a expansão de
grandes empresas agrícolas, mas também as de tipo familiar, especialmente
na região do Alto Paraná, Canindeyú e Tapúa (conforme ilustração 2),
dominadas por empresas e imigrantes estrangeiros principalmente
brasileiros.
1.4.1 A origem da soja e suas características
Em Hymowitz
20
(1970), pode-se ler: “com base em evidências
históricas e geográficas e achados arqueológicos, concluiu que a soja
emergiu como planta domesticada no nordeste da China por volta do Século
XI a.C.”, mas há indicações de seu uso desde o ano de 2207a.C.
Inicialmente foi na Coréia, no norte da China, e de lá para o Japão
que a soja aparece na forma cultivada, entre o ano 200 a.C. e o culo III
d.C. De lá para cá, a soja tem sido avaliada como o mais importante legume
20
Hymowtiz, T. (1970). On the domestication of the soybean. Econ. Bot. 24:408- 21, 1970 (apud
MORAIS, 1990, p. 1).
63
cultivado; é considerada também planta essencial para a saúde e vida da
população chinesa e demais países do mundo oriental.
Atualmente, no mundo ocidental, a soja tem sido “valorizada” pela
OMS Organização Mundial da Saúde. A representação mitológica, como
planta nutritiva, para o povo japonês, reforça seu valor nutricional
21
.
21
Santos, O. S. (1975, apud MORAIS, 1990, p. 3) afirma: Certo dia, o deus do mar Sasanoo, não
correspondeu à confiança de Izanagi. “Considerando-o ingrato, Izanagi destituiu-o de seus poderes
sagrados. Susanoo tornou-se vagabundo e desprezível. Certo dia, faminto, apelou para a deusa do
alimento. Esta lhe ofereceu o que possuía. Mesmo assim, não se sentiu satisfeito e, encolerizado,
matou-a. No local em que a enterrou brotaram as plantas nutritivas para o povo japonês, entre elas
a soja”.
64
Ilustração 2 – Paraguai, divisões regionais e departamentais
Fonte: Ministério de Agricultura y Ganadería, DCEA, producción agropecuaria 1995/96,
síntesis estadística. Asunción. 1996.
65
O cultivo da soja permaneceu restrito aos países orientais. Esse
“grão é utilizado na preparação de uma variedade de alimentos frescos,
fermentados e secos” [...] e por alguns povos é muito utilizada “em pratos
naturais tradicionais, sem grandes artifícios de industrialização”, segundo
Morais (1990, p. 3).
O povo chinês foi o primeiro a esmagar o grão e transformá-lo em
óleo, iniciando o processo da industrialização da soja
num sistema fordista
22
,
incluindo-a em importantes componentes para as iguarias culinárias,
componente de combustível, aditivo para lubrificantes, componente de
cosmético.
Da soja tudo se aproveita, como acontece com a cana-de-açúcar;
faz parte da alimentação de rebanhos suínos, caprinos, eqüinos e
principalmente bovinos, na sobra do farelo. A soja possui alto valor protéico,
conforme tabela 1.
Tabela 1 -
Composição média de alguns produtos derivados da soja
PRODUTO
PROTEÍNA
(%)
GORDURA
(%)
CARBOIDRATO
(%)
FIBRA
(%)
CINZA
(%)
GRÃO TOTAL 41,0 20,0 31,1 2,3 5,4
FARINHA 50,0 1,0 39,5 3,5 6,0
CONCENTRADO 70,0 1,0 19,5 4,5 5,0
ISOLADO 96,0 0,1 0,3 0,1 3,5
Fonte: Bressani in Morais
23
.
Elaborada pela autora com base no texto supra citado.
No Paraguai, a soja (soybean) é vendida em bushels; sendo um
bushels 27,2 quilos (exemplo do cálculo de custo: fator de multiplicação 55 X
36,7645 = 210 dólares por uma tonelada), conforme o agricultor entrevistado
22
A cultura da soja movimenta a economia mundial, praticamente na mesma proporção que Henry
Ford movimentou a economia americana após o desenvolvimento da Linha de Montagem, na Era
da Revolução Industrial. [Reflexão nossa].
23
MORAIS, A. A. C; SILVA, A. L. (1990) Valor nutricional: biologia da soja, in Soja: suas aplicações.
66
Mario Rolim
24,
que começou a explorar o agronegócio no Paraguai em 1973,
com o cultivo da menta. Ele afirma que: crush é a modalidade da soja
esmagada, da qual sai o óleo e o farelo de soja (soymeal) que é o alimento
para o gado”. E informa ainda que: “O Paraguai possui espaço e silos para
armazenar até 120% da soja plantada, situação que deixa o país, em
situação de conforto, comparado ao Brasil”. Continua: “as empresas que
atuam no processo de armazenagem no mundo são: em primeiro lugar a
ADM Artchie Daniel Midland (americana); em segundo lugar a Cargil
(grupo americano) e em terceiro lugar a Bung (grupo francês)”.
Neste contexto, Zaar (2001) informa ser a cultura da soja e a
presença dos imigrantes a força do governo Paraguaio como país
exportador de produtos agrícolas:
Repetindo uma imigração realizada por seus avós, a partir de
políticas brasileiras no Século XIX e início do Século XX
incentivaram a imigração de italianos e alemães, possuidores de
um pequeno capital, e com experiências em mudanças e
adaptação às novas culturas, estes agricultores se dirigiram à
República do Paraguai, principalmente durante as décadas de
1970 e 1980. Em sua maioria adquiriram terras, construíram suas
casas e passaram a se dedicar principalmente ao cultivo de soja,
o
que fez com que a República Paraguaia também se tornasse
produtor e exportador deste produto agrícola (ZAAR, 2001, p. 88).
[Grifo nosso]
No Paraguai, alguns fatores são responsáveis pelo grande
interesse e aumento da produção da soja: o mercado Chinês e seu o
desenvolvimento, que provocam altas cotações e se transformam em
incentivos para os agricultores; as facilidades governamentais no incentivo à
exportação; a disponibilidade de silos e seu fácil manuseio; a possibilidade
de cultivo do milho na mesma área da soja (entre safra); a disponibilidade de
uma estrutura cooperativista e a adequação do solo para diferentes cultivos
e para a pecuária (conforme ilustrações nº 3 e nº 4 nas páginas seguintes).
Assim, a energia elétrica e uma boa produção agrícola poderiam
compensar a debilidade industrial paraguaia e contribuir para sua
24
ROLIM, Mario, advogado, agricultor no Paraguai, um dos indivíduos entrevistados, que se radicou
no Paraguai desde 1973, acrescenta à sua profissão: empresário do comércio e armazenagem de
silos, para grãos de soja e milho.
67
participação mais equilibrada no processo de integração entre os países do
Mercosul. Nesse sentido, essas carências e vulnerabilidades podem tornar-
se positivas num processo de interdependência e integração regional.
Deve-se destacar, ainda, o fato da cultura da soja ser considerada
como produto agrícola de curto canal de comercialização e exportação. Além
do mais, o agricultor paraguaio se utiliza do porto brasileiro para escoar a
produção.
O advento do Mercosul - com regras estabelecidas para maior
intercâmbio entre os países membros - , torna-se um elemento facilitador
para os pequenos e médios agricultores, mais especificamente para os
brasileiros que lá se fixaram.
68
Ilustração 3 – Estrutura Física do Paraguai Oriental
Fonte: Mapa Mundial de Suelos, América Latina, UNESCO, FAO, Sociedad Internacional de
Ciencias del Suelo, 1971.
69
Ilustração 4 – Espaços naturais do Paraguai Oriental
Fonte: Mapa Mundial de Suelos, América Latina, UNESCO, FAO, Sociedad Internacional de
Ciencias del Suelo, 1971, y Mapa de la Vegetación de América del Sur, UNESCO, 1981.
70
O contingente de brasileiros que se instalou no Paraguai, no
período citado, foi grande. Sem se poder contar com dados oficiais, estima-
se o aumento de cerca de 10 mil colonos em 1969 para 420 mil em 1982,
espalhando-se por uma faixa de 700 quilômetros de extensão por 100 km de
profundidade, o que representa quase 17% do território paraguaio (MELLO
25
apud ROLON, 2000). A literatura conta de alterações positivas na
economia e de incremento no desenvolvimento agrícola do país, o que sem
dúvida passa pela contribuição desses brasiguaios.
Em diversas cidades fronteiriças, a língua predominante é o
português. Os brasileiros são os maiores proprietários de terras e detêm o
poder local, além de a moeda predominante ser o Real. Nesse sentido, o
estudo mais aprofundado da influência e do modus vivendi dos brasileiros,
tanto proprietários quanto trabalhadores agrícolas, se reveste de grande
importância para o melhor entendimento da relação social e econômica
estabelecida no Paraguai, sobretudo na fronteira.
Além disso, como o processo de integração tendo como ponto
central a criação do Mercosul encontra-se em pleno curso, é importante
avaliar essa relação entre brasileiros e paraguaios, focando, essencialmente,
as influências bilaterais nesse processo. O que se pode perceber é que uma
nova sociedade, miscigenada, forma-se naquela região, com grande
influência econômica e cultural do povo brasileiro.
O que se constata, portanto, é que por causa da globalização
econômica, das facilidades em fazer transitar capital e alterar
relacionamentos foram afloradas e ainda estimuladas por acordos regionais
e pelas fronteiras naturais entre os países.
No Brasil, a soja foi introduzida em 1908, por intermédio de
imigrantes japoneses. Sua plantação está avançando para as áreas de
preservação das florestas, provocando desmatamento em grandes áreas da
Floresta Amazônica. Sua cultura é também fator econômico de relevância:
25
Mello apud Leonel Itaussu Almeida. Argentina e a balança do poder regional: Equilíbrio,
preponderância ou hegemonia? 1969-1986. Tese de Doutoramento Departamento Ciência
Política. USP, 1991.
71
“[...] quarta revolução agrícola brasileira e a primeira em que um produto do
Brasil compete, com sucesso, com similares nascidos em países
desenvolvidos, como os Estados Unidos e a ex-União Soviética” (MORAIS,
1990, p. 8).
Quais os benefícios de uma relação como, por exemplo, a do
Brasil com o Paraguai? Existiriam reais vantagens competitivas
principalmente no que tange à exportação de soja?
É verdade que o processo referido entre brasileiros e paraguaios
estimula a produção e a exportação da soja, o que os fortalece nesse
mercado. Todavia, é o caso de se refletir acerca da possibilidade de ser real
o surgimento de um novo tipo de sociedade como a supostamente
formada por “brasiguaios” como um caminho para o fortalecimento de
nações na aldeia global.
Citando Naisbitt, (1994), quando abre a discussão sobre a
globalização e dá a ênfase no pensar local e agir global
. [Grifo nosso]:
A democracia amplia e multiplica grandemente a assertividade das
tribos, enquanto a repressão faz o inverso [...] o tribalismo é a
crença na fidelidade ao próprio grupo, definido pela etnia, pelo
idioma, pela cultura, pela religião ou, no final do Século XX, pela
profissão.[ ...] a união comunitária de seres humanos é a nossa
peculiaridade (NAISBITT, 1994, p. 17-18). [Grifo nosso]
Para que se alcance a “união comunitária dos seres humanos” e
antes que se aborde a comunidade brasiguaia, objeto de estudo desta tese,
considera-se pertinente algumas reflexões a respeito dos fluxos migratórios
aos quais as pessoas se submetem por diferentes razões e em diferentes
momentos de suas vidas. Esta é, pois, a temática do capítulo a seguir.
Capítulo 2
Fluxos Migratórios
75
2.1 A QUESTÃO MIGRARIA
A questão migratória é um fator significante para o conjunto das
ciências sociais: os estudos de migração têm peso determinante em muitas
áreas da pesquisa acadêmica, sobretudo nos estudos da demografia e da
urbanização. Em consequência, são partes integrantes dos fóruns de
discussão, são citados nos meios de comunicação e compõem as
informações para os órgãos governamentais e áreas afins, “Existe hoje uma
grande mobilidade da classe média no mundo”, disse a professora Neide
Patarra (1995): “A internacionalização que marca o mundo neste final de
século propiciou o surgimento desta mão-de-obra qualificada que flutua pelo
planeta. São conhecidos como expatriados”.
Pensando-se em mobilidade espacial da população e sua relação
com processos de urbanização, recorre-se às considerações clássicas de
Ravenstein (1885, in: BND-ETENE, 1980), renomado estudioso
demográfico, precursor dos estudos daquilo que hoje são denominadas as
“Leis da migração
26
”. De fato, desde a época da Revolução Industrial,
vinham aumentando as movimentações migratórias como nunca antes havia
acontecido, em vários países, muito além das fronteiras do Reino Unido,
objeto de estudo de Ravenstein.
27
26
Ravenstein, E.G (1885, in: BNB-ETENE, 1980): As Leis da Migração:
1) A grande maioria dos migrantes se desloca a curta distância, produziu as correntes migratórias,
que se orientam para os grandes centros comerciais e industriais (esses centros são os maiores
absorvedores de migrantes). Ocorrem dois processos no fluxo migratório, o de absorção e o de
dispersão.
2) O processo de absorção segue de forma contínua, pois a população das áreas ao redor de uma
cidade em crescimento desloca-se para o grande centro, enquanto o espaço rural é preenchido por
migrantes oriundos de distritos mais remotos.
3) O processo de dispersão é inverso ao de absorção, acontece em localidades que favorecem a
vontade do migrante de se deslocar, funciona como fonte de alimentação para os locais de
absorção; exemplo: zonas agrícolas.
4) Cada corrente migratória principal produz uma corrente inversa compensatória.
5) As pessoas que se dirigem a longa distância se dirigem preferencialmente para grandes centros
comercial-industriais.
6) Os naturais da cidade migram menos do que os naturais das áreas rurais do País.
7) As mulheres migram mais do que os homens.
27
Os estudos de Ravenstein destinavam-se à Real Sociedade de Estatística. Foram publicados
originalmente no Journal of the statistical society, 47 (pt. 1): 167-227, june, 1885. R
avestein, E. G
(1885, in BRITO, 2004, BNB-ETENE): Os estudos de Ravenstein sobre a demografia e
76
Esse autor estudou o censo de 1881 do Reino Unido e observou
que alguns fatores de forte determinação econômica impulsionavam, com
predominância, a população a migrar de uma região a outra. O autor destaca
os seguintes fatores determinantes para que ocorresse tal mobilidade social
migratória: melhoria das estradas, facilidades oferecidas pelo sistema de
transporte ferroviário, espetacular desenvolvimento da marinha mercante, o
hábito de viajar e a crescente educação dos trabalhadores. Resumidamente,
esses fatores caracterizam o modo de vida urbano, sob o capitalismo com o
advento da Revolução Industrial. Contudo, o autor reconhece que o fator
principal, o verdadeiro indutor do processo migratório, localiza-se na busca
de trabalho ou, mais precisamente, na sua visão, na busca de melhores
condições laborais.
Naquela época, ou seja, no final do século XIX, os fatores
indicados, uns mais e outros menos intensamente, determinaram o fluxo de
pessoas dos locais onde não havia oferta de trabalho, para áreas onde se
manifestava essa oferta de trabalho.
Esse movimento, chamado por Ravenstein (op. cit.), de
“movimento migratório”, foi determinante nos vastos processos de
urbanização que ocorreram naquele período. Por detrás dessas
determinações variáveis, impunha-se a maior de todas elas: a Revolução
Industrial, enquanto mudança da forma de produção, ou seja, enquanto
aprimoramento da forma capitalista de produção.
Como mostra,
ainda, Ravenstein, o processo de urbanização
vincula-se à movimentação migratória e, esta, à busca de trabalho e
melhores condições de vida. Desde então, para diversos estudiosos, em
especial aqueles que se interessam pelo problema da urbanização, os
movimentos migratórios constituem objeto de reflexão.
em meados do século XIX, Karl Marx chamou a atenção, em
sua obra O Capital, para os fatores migratórios que desagregaram regiões
os processos migratórios são reconhecidamente considerados como base ou ponto de
partida teórico nessas áreas, sendo citados em grande número de trabalhos sobre o
assunto.
77
inteiras do Reino Unido, desde o século XV, movimentando populações do
campo em direção aos grandes centros industriais ingleses.
Na sua obra literária Utopia, o escritor e chanceler Thomas Morus
descreve um reino ideal, um país ideal no qual teria cessado esse estado de
migrações das populações do Reino Unido, motivado pela transformação
das terras dos camponeses em pastos para ovelhas, com o objetivo de obter
lã para a nascente indústria têxtil capitalista.
Mas, certamente, Ravenstein
aparece como importante fundador
da disciplina teórica das migrações e das leis sociais atinentes a esse saber,
que hoje faz parte das ciências sociais contemporâneas, estabelecendo a
conexão entre questão migratória e processo de urbanização.
É necessário lembrar, além disso, que o historiador do urbanismo
Lewis Mumford
28
(1998), comentando os fluxos migratórios da primeira
Revolução Industrial, fez algumas observações sobre a urbanização
capitalista daquele período, escrevendo: que na história escrita, até então,
não havia ocorrido “aglomerados tão grandes de pessoas” que pudessem
viver em “ambientes deteriorados”.
A observação de Mumford (1998)
reflete o caos social ocasionado
pela urbanização desordenada e pela implantação de um complexo
industrial que levava em conta o resultado da produção, mas não o seu
agente – o trabalhador.
Desde algumas décadas, tinha se acentuado mundialmente o
declínio das vantagens de se viver em cidades grandes, em relação às
cidades de pequeno e médio porte. Modificou-se a migração, modificaram-se
os processos correspondentes de urbanização. Essa nova fase do
capitalismo está marcada pela reestruturação do processo produtivo e a
28
Mumford, Lewis (NY 1895-1990). Em 1922 estréia na literatura com o livro A história da utopia,
escritor interessado em questões urbanas, além da arte e atenção à comunidade. Em seus textos
e publicações adverte: “A sociedade tecnológica deveria entrar em harmonia com o
desenvolvimento pessoal e as aspirações culturais regionais”. Disse ainda: “A tecnologia ensinou
uma lição à humanidade: nada é impossível”.
78
flexibilização dos direitos trabalhistas, contribuindo para que aconteça
acentuada descentralização espacial e reestruturação de metrópoles.
2.1.1 A questão migratória frente ao desenvolvimento capitalista do
século XX
Durante o século XX, a história do capitalismo foi marcada por
intensa mobilidade espacial da população. Dentro de cada um dos países,
as cidades transformaram-se em espaços hegemônicos de acumulação de
capital, acelerando o processo de urbanização, fruto não do crescimento
acelerado da população, mas, principalmente, das migrações internas
originárias do campo.
Para Balán (1993), a história da formação do capitalismo pode ser
descrita em termos de movimentos da população. Por meio dos fluxos
migratórios, ocorridos durante o culo passado e da forma como esses
fluxos influenciaram a relação entre população e estruturas sociais em
processo de mudança, o capitalismo inicia seu processo de formação real.
Cada país tem a sua própria história e, portanto, processos
específicos de desenvolvimento econômico, de urbanização e de mobilidade
espacial da população; contudo, de modo geral, existiu uma coincidência
entre os processos capitalistas do crescimento econômico mais acelerado e
a intensa mobilidade migratória das populações.
As migrações ocorrem não somente entre os diferentes países
como também entre regiões rural-urbana, o que constitui outro traço
essencial do desenvolvimento do capitalismo do século XX. Tem havido um
permanente fluxo internacional de população que, em determinadas
circunstâncias, tem-se acentuado.
A história não poderia ser bem compreendida se não fosse
considerada a interação entre países por intermédio de suas populações. A
79
própria identidade de muitos deles, a sua constituição como nação, foi um
produto do movimento internacional de diferentes povos.
Alguns países têm como política pública programas voltados
para o estímulo do crescimento de cidades pequenas ou médias, mediante
investimentos na infra-estrutura, incentivo nos impostos etc.
(BILSBORROW
29
, 1996), como resposta urbanística aos novos fluxos
migratórios, em novas direções geográficas, na busca de diferentes formas
de trabalho.
Assim é que o chamado Novo Mundo os países das três
Américas tem a sua formação fortemente marcada pelas migrações
internacionais que, inseridas no antigo sistema colonial, representaram a
confluência dos povos europeus, africanos e asiáticos. Veja-se em particular
o caso do Brasil (BASSANEZI, 1995).
2.2 OS FLUXOS MIGRATÓRIOS INTERNACIONAIS NOS ÚLTIMOS ANOS
Os períodos imediatamente anteriores e posteriores à Segunda
Grande Guerra mereceram a análise de Bassanezi (1975):
As migrações internacionais nos últimos dois séculos podem ser
divididas em pelo menos três fases distintas. A primeira delas, do
século XIX até a Segunda Guerra Mundial; a segunda de 1945 até
o início dos anos 1970 e, a última fase seria aquela que vem
ocorrendo nos últimos trinta anos.
A primeira fase teve como principal característica o fato de que a
grande maioria dos imigrantes era oriunda da Europa, cerca de 50
milhões de europeus deixaram o Velho Continente naquele
período. Outro fator de influência foi a evolução dos meios de
comunicação, especialmente os relacionados à navegação
transoceânica, que contribuíram muito nesse processo migratório.
[...] A imigração internacional também teve como uma das causas
peculiares a forte pressão populacional, resultante da explosão
demográfica pela quais os países do continente europeu vinham
passando desde meados do Século XI. De maneira geral, os
29
BILSBORROW, Richard E. Research Professor of Biostatistics, Adjunct Professor of Ecology and
of City and Regional Planning, andr Fellow, Carolina Population Center. The University of North
Carolina at Chapel Hill.
80
imigrantes europeus se dirigiram para países “novos” como os
EUA, que recebeu a maior parcela de imigrantes, a Argentina, o
Canadá, o Brasil e a Austrália. Somou-se a estes fluxos aqueles
formados por europeus que se dirigiram para as colônias. Um
pouco mais tarde o fluxo aumentou por conta dos asiáticos,
primeiro vieram os chineses e depois os japoneses se deslocaram
para as terras do Novo Mundo. Por volta de 1880, a América do
Norte recebeu cerca de meio milhão de asiáticos (BASSANEZI,
1975, p. 7).
No período entre guerras, o fluxo migratório internacional
começou a se modificar, com baixas consideráveis devido ao alívio das
pressões demográficas na Europa, como também pelas consequências da
Primeira Guerra Mundial.
Outra forte contribuição foi a adoção decisiva, pela maioria dos
países receptores, de inibir a entrada de estrangeiros; foram criadas leis que
restringiam a imigração, especialmente para aqueles que se dirigiam aos
EUA. Por fim, a crise econômica, desencadeada em 1929 contribui de forma
significativa para a redução dos fluxos migratórios no século XX.
Por volta da metade da década de 1970, os fluxos denominados
“migrações para o trabalho” diminuíram ou simplesmente pararam em
função da crise econômica e do aumento para o desemprego. A imigração
clandestina passou a se instaurar cada vez mais, principalmente nas
migrações que se dirigiam à Europa e aos EUA.
Com a criação da União Européia e em função do fechamento
dos destinos tradicionais, a imigração passou a se direcionar para países
como a Itália, Espanha, Portugal e Grécia, que faziam parte do bloco
econômico. Contudo, um fenômeno interessante ocorria: esses países
passaram a ter uma função de “escala temporária” em direção aos países
tradicionais de destino, como a Alemanha e a França.
Outro destino a se observar é a região asiática, que despertou
interesse devido à concentração de produção de petróleo. Os choques
econômicos do petróleo tiveram como efeito diversificar os fluxos
migratórios, que a “decolagem econômica” dos países produtores passou
a atrair imigrantes.
81
Essa não foi uma migração durável e nem familiar, uma vez que,
em função de conjunturas econômicas desfavoráveis, muitos imigrantes
foram obrigados a retornar aos seus países de origem.
Cerca de sete milhões de pessoas se dirigiram para países da
região do Golfo Pérsico, sobretudo originários de países próximos aos
produtores de petróleo, mas também Sul e Sudeste da Ásia (filipinos,
indianos e paquistaneses).
Atualmente, a maioria das migrações internacionais se destina,
preferencialmente, aos EUA e à Europa. Porém, os países que evidenciam
emigrantes são diversos.
Um dos aspectos mais importantes dos recentes movimentos
migratórios refere-se à composição da imigração. As leis restritivas,
paradoxalmente, favoreceram a vinda legal de membros das famílias dos
imigrantes estabelecidos algum tempo (mulheres e crianças), em
detrimento de homens adultos que têm dificuldades no processo; com isso a
imigração ilegal passou a ser cada vez mais frequente.
Nas últimas décadas do século XX, a “imigração familiar”
correspondeu a 55% dos imigrantes entrados na Suíça, 70% na França e
90% na Bélgica, devido em parte à boa acolhida de refugiados advindos de
áreas de conflitos regionais.
As leis norte-americanas de 1980 e 1986 tentaram regularizar
cerca de quatro milhões de imigrantes clandestinos. As quotas, revisadas
periodicamente, são fixadas e privilegiam a chegada de mão-de-obra
qualificada e diplomada. As admissões passaram a ser bastante seletivas;
para o imigrante do Terceiro Mundo sem formação e que não fale a língua
do país, é praticamente nula sua chance de ser aceito. Em alguns casos, o
acolhimento só é possível para refugiados políticos.
O processo migratório é complexo em sua multiplicidade de
aspectos. Por exemplo, o Banco Interamericano de Desenvolvimento BID
calcula em 5,6 bilhões de dólares por ano as remessas enviadas por
migrantes ao Brasil. Mas é sabido que o valor é maior, visto que o Banco
82
Central não registra todo o volume transferido. Por segurança, os migrantes
preferem enviar dinheiro por meios não reconhecidos pelo Estado, para não
serem identificados. É algo a ser considerado, pois que o Brasil é o segundo
país da América Latina em remessas de migrantes, perdendo apenas para o
México.
A problemática das migrações internacionais de e para o Brasil
contemporâneo tem recebido cada vez mais atenção de
especialistas, principalmente depois da Conferência sobre
População e Desenvolvimento do Cairo, em 1995. Dada a
constatação de que os movimentos de brasileiros para o exterior
passaram a constituir uma nova questão social no país a partir dos
anos de 1980, desde então é crescente, também, o mero de
estudos e pesquisas voltadas ao tema, que aparece com
frequência na mídia e adquiriu uma dimensão expressiva nos
programas de governo e no delineamento de políticas sociais.
(PATARRA e BAENINGER, 2006, p. 87).
Pelo exposto, pode-se afirmar que as migrações internacionais
nos últimos dois séculos, podem ser divididas em pelo menos três fases
distintas. A primeira delas, do século XIX até a Segunda Guerra Mundial; a
segunda, de 1945 até o início dos anos 1970 e a última fase seria aquela
que vem ocorrendo nos últimos trinta anos (OLIC, 2008).
Para Matos (1995) e Brito (1997), as variadas e distintas
modalidades de movimentos migratórios observados no período recente não
constituem uma novidade sem precedentes e verifica-se a recorrência e a
concomitância de todos esses tipos de movimentos.
Nesse contexto, definem-se os Fluxos Migratórios
30
como
elementos que contam para fins de estimar o impacto da migração na
30
Sobre o assunto, temos as definições do Profº. Dr. José Marcos Pinto da Cunha Professor do
Programa Pós-Graduação em Demografia. IFCH/UNICAMP, 1) Migração Líquida (ou saldo
migratório): diferença entre imigração e emigração. 2) Migração Bruta: soma da imigração e
emigração; representa a quantidade de movimentos migratórios aos quais esteve exposta uma
determinada região. Sua utilidade consiste em mensurar o nível de “movimentação” existente
nessa área. 3) Corrente ou Fluxo Migratório: número total de translados feitos durante um
determinado intervalo de migração, procedentes de uma mesma zona de origem e dirigidos a uma
mesma zona de destino. 4) Corrente e Contra-Corrente: fluxos nos dois sentidos estabelecidos
entre duas áreas. 5) Corrente àquela de maior volume e, 6) Contra-Corrente a de menor volume.
7)Trocas Migratórias Líquidas: diferença entre a Corrente e Contra-Corrente. 8) Saldo Migratório:
somatória das trocas líquidas com as demais áreas. 9) Matriz Migratória: tabela de duas entradas
(origem e destino do indivíduo) que permite visualizar os fluxos, volumes e imigração e emigração
para cada zona estudada. 10) Migrantes Acumulados / Migrantes Absolutos / Saldo Migratório /
Lifetime Migrants: todas as pessoas que não nasceram na zona de destino. Não considerado,
83
população. Os principais quesitos sobre migrações utilizados como padrão
na avaliação do processo migratório estão disponíveis no censo
demográfico, conforme Manual VI da ONU (United Nations, 1970). São
definições dos conceitos, tipos de informação, avaliação de dados,
potencialidades e limitações, disponibilidades de quesitos e o potencial
analítico.
A partir de 1980, os movimentos migratórios internacionais e no
Brasil reassumem seu papel, mas de forma invertida no Brasil – país
tradicionalmente receptor de migrantes passa para uma sociedade que
“remete migrantes para fora do país” (PATARRA e BAENINGER, 2002, p.
87). “Com constatação de que cerca de 1,5 milhões de brasileiros viviam no
exterior” (PATARRA e BAENINGER, 2002, p. 87) foi o ponto de partida para
os estudos das questões demográficas brasileiras para as autores, diversos
pesquisadores e também para nós.
De acordo com os registros consulares, para o ano de 2002 foram
compatibilizados 1.887.895 brasileiros residentes no exterior, dos
quais 42% se encontravam nos Estados Unidos (quase 700 mil
brasileiros), 24% no Paraguai (em torno de 450 mil); 11% no
Japão (225 mil). Para os países do Primeiro Mundo, em geral,
estima-se em 1,5 milhão de pessoas, o que denota cifras muito
próximas nesses dois anos (PATARRA e BAENINGER, 2002, p.
87).
Estes movimentos migratórios apresentam modalidades diferenciadas
de migração como:
migração para os países de primeiro mundo, com intuito de realizar
poupança financeira em curto espaço de tempo;
migração como solução de posse de terra agrícolas, apresentado nas
regiões fronteiriças do Brasil caso específico dos denominados
“brasiguaios” na tríplice fronteira Argentina-Brasil-Paraguai, e
migração com conotação de menor expressão numérica, buscando novos
relacionamentos internacionais. (PATARRA e BAENINGER, 2002, p. 87)
portanto, o tempo de residência. 11) Seletividade migratória: termo utilizado para referir-se às
características específicas do migrante com relação à população residente no destino ou na
origem. [Aula jun/2004].
84
2.2.1 Fatores de atração e de expulsão
Com base nos dados acima, os estudiosos traçam o perfil do fluxo
migratório de uma região, contextualizado conforme as características sócio-
político-econômicas e culturais dentro de um espaço e tempo histórico
determinados.
Como apontado, a migração
31
não acontece por si; está
atrelada sempre a inúmeros fatores que caracterizam a constituição de uma
população e isso leva aos motivos que geram o fluxo migratório de uma
região. Podem-se observar algumas dessas características, como fatores
macro ambientais que determinam os deslocamentos populacionais e sua
intensificação em vários momentos dos fluxos migratórios, quer tenham sido
internos ou internacionais. A sazonalidade, a temporalidade, as correntes e
contracorrentes
(processo semelhante às idas e vindas dos brasiguaios
objeto deste estudo que serão abordados oportunamente) o
características que constituem o fluxo migratório.
A falta de oportunidades no mercado de trabalho aliada aos
excedentes populacionais, mais que quaisquer outros fatores, dentro do
contexto macro econômico-social, determinam os fluxos migratórios, como
referido neste estudo:
Por traz [sic] das alterações nos fluxos migratórios, da mudança
dos fatores de atração e de expulsão, das diferenças na
seletividade dos migrantes e dos grupos sociais envolvidos, do
aumento das migrações de retorno, da circularidade dos
movimentos, da manutenção de movimentos temporários e
sazonais, entre outras dimensões, situa-se sempre a questão dos
excedentes populacionais foram raras e circunscritas, no tempo
e no espaço, as situações de escassez de mão-de-obra
(PACHECO & PATARRA, 1997, p. 28). [a anotação “sic” é nossa]
Nas situações de fronteira, influenciado pela movimentação
demográfica que provoca as aglomerações urbanas e um processo de
seletividade, cria-se o conceito do “novo urbano”. As migrações são
31
Leia-se Lee (1965), importante contribuição para o entendimento da Migração e na interpretação de
Ravestein.
85
seletivas, por isso os imigrantes que respondem principalmente a fatores
positivos prevalecentes no local de destino tendem a se estruturar.
Esta reflexão ideológica sobre o urbano, vinculada ao processo
capitalista, é discutida por Castells (2003) que propõem novos marcos para
a renovação da reflexão sobre a cidade. Com tal enfoque politiza-se “a
questão urbana e surgem novas questões: os movimentos sociais urbanos,
os meios de consumo coletivo, a estruturação social do território na
sociedade capitalista e o papel do Estado na urbanização (CASTELLS 2003,
vol.1). Avança no entendimento de que:
As pessoas se socializam e interagem em seu ambiente local, seja
ele a vila, a cidade, o subúrbio, formando redes sociais entre seus
vizinhos. Por outro lado, identidades locais entram em intersecção
com outras fontes de significado e reconhecimento social,
seguindo um padrão altamente diversificado que dá margem a
interpretações alternativas (CASTELLS 1999, vol. 2, p. 79).
Os migrantes que respondem primordialmente a fatores negativos
prevalecentes no local de origem tendem a constituir uma seleção negativa;
no caso de áreas onde os fatores são desalentadores para grupos inteiros
de população, pode até mesmo deixar de haver seleção. O grau de seleção
positiva aumenta com a dificuldade dos obstáculos intervenientes. As
características dos migrantes tendem a ser intermediárias entre as
características da população do lugar de origem e da população do lugar de
destino, conforme Lee (1966 in BND, 1980).
Devem-se observar, também, continua o teórico, as
características dos migrantes, as Leis da Migração de Ravenstein. Contudo,
faz uma ressalva e coloca que Ravenstein não formulou as Leis de maneira
categórica de modo que permitissem críticas; mas não deixa de ser ainda
um trabalho de referência para todos os estudiosos da migração.
O volume da migração dentro de um determinado território varia
de acordo com o grau de diversificação entre as áreas incluídas nesse
território. Outro fator variante é a diversidade entre os povos que estão em
processo de migração. Podemos observar, também, como fatores de
variação, o relacionamento com a dificuldade em superar os obstáculos
86
intervenientes e as flutuações da economia. A menos que medidas severas
sejam tomadas, tanto o volume quanto a taxa de migração tenderão a
crescer com o tempo (LEE, 1966 in BND, 1980). O estágio de
desenvolvimento de um país ou de uma área está intrinsecamente ligado a
essas flutuações. Entende-se, portanto, que o governo tem um papel
regulador no volume de fluxos migratórios.
As vantagens das cidades grandes decrescem quando
comparadas com as de pequeno e médio porte, induzindo à
descentralização espacial e à reestruturação das metrópoles. Alguns países
estimulam o crescimento de cidades pequenas ou médias por intermédio de
investimentos na infra-estrutura, incentivo nos impostos etc. (BILSBORROW,
1996).
Devem-se, ainda, a Everett Lee (1966), os termos “fatores de
atração” e “fatores de expulsão” que explicam o impulso ao movimento
migratório positivo em relação ao destino-alvo ou negativo quanto à origem.
O desenvolvimento industrial, comercial e ferroviário contribuiu
para o aumento do volume de migração. Ainda, segundo Lee, numa releitura
de Ravenstein, predomina o motivo econômico identificado como fator de
atração (para imigrar) ou como fator de expulsão (para emigrar):
[...] leis mais ou menos opressivas, tributação onerosa, clima
insalubre, ambiente social incompatível e, até mesmo, coerção
(tráfico de escravos, deportação para colônias penais), produziam
e continuam a produzir correntes migratórias, conquanto nenhuma
delas seja comparável em volume à que resulta do desejo inerente
à maioria dos homens de melhorar sua situação material
(RAVESTEIN 1889, p. 286 apud LEE, 1966, p. 97).
Até o final do século XX, essa teoria era estudada por
economistas, sociólogos e historiadores. Lee desenvolve esquema para
situar a série de movimentos espaciais, com número reduzido de
proposições incontestáveis, para deduzir certa quantidade de conclusões;
desenvolve, ainda, o conceito de correntes e contracorrentes e as
características dos migrantes (LEE,1966 in BND, 1980).
87
Em se tratando de pessoas, os fatores de retenção e de atração
não são de compreensão exatamente científica, nem mesmo pelas próprias
pessoas afetadas, uma vez que a história pessoal ultrapassa qualquer tipo
de registro extra pessoal.
2.3 EMIGRAÇÃO E IMIGRAÇÃO: UM CONTEXTO MIGRATÓRIO
LATINO-AMERICANO
O movimento migratório da América Latina, como os demais
movimentos migratórios, também se prende à história do seu
desenvolvimento econômico e social, modelado por influências decorrentes
da etnia colonizadora, bem como das estratégias de imposição e da
absorção em relação aos valores locais.
A colonização européia, comum aos países latino-americanos,
guarda diferenças e similaridades - influências lusitanas no Brasil e
espanhola nos demais. Os países se formaram com o afluxo de imigrantes
estrangeiros, caracterizando faixas de população etnicamente diferenciadas
veja-se a forte influência africana no nordeste do Brasil e européia no sul.
A diversidade biocultural, a extensão territorial, as lutas políticas, as
lideranças ditatoriais, os ciclos econômicos etc. geraram fatores de expulsão
que motivaram a migração extra-regional, reforçada pela integralização
econômica – Mercosul.
A crescente integração do Mercosul tem favorecido a dinamização
das áreas de fronteira entre os países que fazem parte desse bloco. Os
fluxos e os movimentos populacionais, inclusive o fluxo migratório
estabelecido em regiões e áreas fronteiriças, são relativamente pouco
conhecidos, daí a proposta de se observar esse movimento, pelo qual há até
mesmo a perda de territórios para Argentina, Brasil e Bolívia (conforme
ilustrações nº 5 e nº 6 nas páginas seguintes).
88
Ilustração 5 – O contorno geográfico do Paraguai
Fonte: Elaborado a partir de Contour map. Kleinpenning, 1987.
89
Ilustração 6 – A evolução das fronteiras paraguaias de 1810 aos nossos
dias
Fonte: Barros D. (1988), Kleinpenning J. M. G. (1992), Thompson (1992).
90
Os estudos dos movimentos migratórios levam à pesquisa e à
análise dos vários aspectos socioculturais e econômicos ocorrentes no
espaço em questão, multiplicando em muito a tarefa dos historiadores e
demógrafos, que buscam ampliar conhecimentos de tais fatos geradores,
pretendendo conhecer os movimentos migratórios brasileiros.
Em Balán (1993), encontra-se um Ensaio de interpretações
histórico- comparativas das migrações e desenvolvimento capitalista do
Brasil, baseando-se no Modelo Explicativo, considerando a economia
brasileira como responsável pelas características de seu desenvolvimento.
O processo iniciado em meados do Séc. XIX no Brasil foi o da
formação de uma sociedade nacional sob o signo de uma
estrutura capitalista, partindo de sistemas regionais debilmente
amparados pela centralidade do Império, vinculados mas não
integrados economicamente e cujos setores mais dinâmicos se
baseavam na escravidão (BALÁN – CEBRAP, n. 5, 1993).
O estudo de Balán (1993) relata a história de tal formação, por
intermédio dos fluxos migratórios ocorridos durante o século passado e da
forma como esses fluxos refletiram a relação entre população e estruturas
sociais em processo de mudança. Ele recorre às comparações com México
e Argentina pela semelhança quanto ao predomínio crescente de um
sistema econômico, inicialmente baseado na economia exportadora de uma
classe social que surge deste processo e o lidera.
O movimento migratório da América Latina corresponde, sem
dúvida, a uma exigência da globalização, como o atesta historicamente a
formação do Mercosul.
O intercâmbio de pessoas e a migração o é outra coisa
estabelece uma relação que ultrapassa, em muito, o resultado do
intercâmbio; o crescimento econômico deveria refletir o crescimento
interpessoal, mediante a criação de espaços e oportunidades para as
pessoas agentes desse crescimento.
Esta reflexão começa apresentando uma representação sipnótica-
numérica, abrangendo toda a movimentação migratória na América Latina, o
91
que permite sentir o peso desse movimento para convivência no Cone Sul,
em termos de melhorias relacionais, educacionais, ambientais e econômico-
financeiras.
Os dados demográficos informados em 1990, pelo Ministério das
Relações Exteriores, divulgam a quantidade de brasileiros que
vivem no Paraguai 459 mil, sendo 98 mil em situação legal e 350
mil em situação não legal, vivem numa parte da superfície
territorial do país que é de 406.752 Km². [Grifo nosso].
[...]
A extensão territorial dos demais membros do Mercosul e Chile
totaliza 14.863.353 Km², assim distribuídos: Argentina tem um
espaço de 3.761.274 Km², o Brasil tem 8.514.215 Km², o Paraguai
os 406.752 Km², o Uruguai em 175.016 Km², e o Chile em
2.006.096 Km². No Mercosul incluído o Chile vivem 230.005.080
de pessoas, numa densidade media de 15,47 habitantes por
quilômetros quadrados distribuídos da seguinte forma: no Brasil
com 169.590.690, na Argentina com 36.578.000, no Paraguai com
5.496.450, no Uruguai com 3.322.140 e no Chile 15.017.800,
perfazem uma população de 230.005.080. [Grifo nosso].
colocar a
fonte
Nesse sentido, a questão mais frequente, implícita nos conflitos
gerados no processo de mundialização, refletidos em cadeia sob os países
em desenvolvimento mudanças de ordem política e jurídico-administrativa
– reflete uma preocupação quanto à devolução de parte dos benefícios
auferidos pelos países receptores de imigrantes aos seus acolhidos.
É justamente esse o teor do documento final do II Encontro Cívico
Iberoamericano, realizado em Piriápolis, Uruguai. (BASEGGIO, 2006); teor
que se repete também no estudo da ONU, comentado por Arieff (2004).
Apesar da preocupação generalizada com a migração nos países
industrializados, os imigrantes não reduzem significativamente os
salários e o desemprego nas nações para as quais se mudam,
disse um relatório da ONU [...] Pelo contrário, eles contribuem
economicamente para os países adotados, ao alimentar a
demanda por bens e serviços. Os imigrantes ‘somam [seu
trabalho] ao PIB e geralmente contribuem mais com os cofres do
governo do que retiram deles’, segundo o Levantamento
Econômico e Social do Mundo para 2004.
[...]
Não podemos ignorar as reais dificuldades políticas impostas pela
imigração, mas não devemos também perder de vista seu imenso
potencial para beneficiar os imigrantes, os países que eles deixam
e os [países] para os quais ‘migram’, disse o secretário-geral Kofi
Annan no prefácio do relatório preparado pelo Departamento de
Assuntos Econômicos e Sociais da ONU.
[...]
92
‘E devemos garantir que, na nossa abordagem a esta questão,
atenhamos os valores de tolerância e do respeito aos direitos
humanos’, afirmou ele. O novo estudo sugere aos países que
costumam receber muitos imigrantes que adotem campanhas para
diminuir a oposição da população a esse fenômeno, destacando
seus benefícios para os países industrializados.
[...]
O texto pede também que os governos adotem leis que garantam
a segurança dos imigrantes no local de trabalho, protejam seus
direitos humanos e ampliem seu acesso à educação e treinamento
profissionalizante, tanto nos próprios países quanto nos lugares de
origem dos trabalhadores estrangeiros. O relatório concluiu que,
enquanto os governos se empenharam nos últimos 50 anos para
facilitar o tráfego de produtos, o mesmo não aconteceu com a livre
movimentação de pessoas.
[...]
‘O atual movimento internacional de pessoas é moldado em
grande parte pelas leis e políticas de restrição à migração’, disse
José Antonio O campo, o subsecretário-geral da ONU para
Assuntos Econômicos e Sociais. O número de pessoas que vivem
fora do seu país de origem continuou crescendo na década
passada, segundo o estudo, atingindo 175 milhões em 2000. A
migração para os países mais ricos cresceu 3 por cento nessa
década, mas permaneceu estável no que diz respeito aos países
subdesenvolvimentos. Assim, enquanto um em cada 35 seres
humanos é um migrante, nos países desenvolvidos a taxa sobe
para um a cada 12. [Grifo nosso].
[...]
O relatório afirma que, enquanto os países desenvolvidos se
beneficiam com a migração, os países pobres são prejudicados,
porque seus habitantes mais qualificados são os que mais tendem
a tentar a vida em outro lugar. Por exemplo, o imigrante típico da
América Latina ou da Ásia tem mais do que o dobro da
escolaridade média da população. Na África, a escolaridade dos
imigrantes é o triplo da população geral.
[...]
Sem esse contingente, os países perdem em inovação,
criatividade e arrecadação de impostos. Por outro lado, os
imigrantes enviam grandes quantias de dinheiro para seus
parentes e amigos que ficaram para trás. Os estudos mostram que
60 por cento dos investimentos externos diretos na China é [sic]
fruto da remessa de divisas de chineses no exterior (ARIEFF,
2004 –Nações Unidas -© Reuters).
Enfim, pode-se tratar a migração em termos de impactos
territoriais e assim constar que a migração internacional o é somente um
movimento linear, mas também um elemento em interação com as
dinâmicas dos espaços e sociedades locais e regionais. Analisando esse
fluxo migratório, verificam-se as estruturas do território influenciando os
movimentos da população pelas fronteiras, resultando nas próprias
migrações internacionais.
93
A configuração espacial estudada permite realizar algumas
suposições quanto aos movimentos migratórios internacionais; esses
deslocamentos de população raramente se dão de um espaço vazio a outro.
Em outras palavras, é provável que se observem movimentos de população
oriundos dos poucos lugares que acumulam população e/ou em direção a
estes lugares. Em consequência, é provável que as migrações
transfronteiriças sejam de pouca importância e, quando acontecem, são
ativadas somente entre alguns pólos; e isso nem sempre ocorre em todas as
fronteiras internacionais. Outro elemento provável é que apareça a
importância dos centros regionais na orientação (origem e destino) dos
fluxos migratórios regionais, como vem ocorrendo nas relações de fronteira
Brasil-Paraguai a serem abordadas a seguir.
2.4 O MOVIMENTO MIGRATÓRIO NO BRASIL
A história brasileira apresenta a cada momento do seu
desenvolvimento, amplos processos de migração interna e externa, movidos
pelo caráter dependente da economia nacional (embora determinada pelas
exigências do mercado mundial).
Isso vem ocorrendo, como mostrou Celso Furtado, em Formação
Econômica do Brasil, desde a época do Brasil Colonial, com a cultura da
cana-de-açúcar que demandava trabalho vindo da África, em grandes
deslocamentos populacionais migratórios.
Essa tendência intensificou-se ao longo da história brasileira,
segundo Bassanezi (1995), com a chegada dos colonos europeus,
inicialmente como trabalhadores italianos em busca das lavouras de café de
Minas Gerais e São Paulo; mais tarde espanhóis, japoneses e alemães que,
em fluxos sucessivos, vieram habitar o sul e sudeste do país. Caracterizado
94
por inúmeras variantes, esse movimento pode ser considerado como sendo
objeto de estudo importante no que tange às pesquisas sobre demografia.
Esses europeus, de origem proletária, tinham abandonado seus
países de origem, sobretudo depois da Revolução Social de 1848, que se
tinha espalhado por praticamente todos os países da Europa ocidental.
As migrações de populações européias, no Brasil, durante o
período da economia agroexportadora e, em especial, no auge desse ciclo
econômico, foram favorecidas pelo fim do contrabando de escravos para a
lavoura (em 1850, o país era o maior produtor mundial de café) e pela
demanda crescente provocada pela Revolução Industrial. Como bem
observa Celso Furtado, a economia brasileira era internacional; ela
estava transpassada pelo mercado mundial do café, mesmo antes da
abolição, mas razões econômicas (o baixo rendimento do trabalhador
escravo, o alto custo da manutenção dessa força de trabalho etc.) levaram a
que se substituísse o trabalho escravo por trabalho assalariado.
A pressão internacional, sobretudo a inglesa, para o fim do tráfico
negreiro trouxe consequências profundas para o capitalismo agroexportador
fundado no regime escravocrata. A partir de 1888, pôde-se presenciar um
enorme fluxo de movimentos migratórios de escravos libertos, mas sem
perspectivas sociais, econômicas e políticas. Principalmente nas regiões em
que a o-de-obra escrava era largamente utilizada, houve um profundo
rearranjo da estrutura social diante da nova realidade econômica.
Assim, instaurou-se a desorganização social, juntamente com a
reorganização econômica, a mão-de-obra estrangeira constituiu, então, um
importante fluxo migratório, direcionado para o sul do país. O Brasil foi
pioneiro na América Latina na promoção de planos de colonização, com os
imigrantes alemães e os suíços.
A colonização européia, e mais tarde a asiática, contribuiu para
preencher os espaços territoriais vazios nas regiões sul e sudeste. Mas com
o fracasso dos projetos de colonização oficial, devido à instabilidade
95
econômica, os colonos se dispersaram, regredindo à economia de
subsistência.
Nas décadas seguintes do século XX, ocorre o aumento da
colonização privada (por exemplo, no Oeste Paulista) e surgem as parcerias
com a mão-de-obra estrangeira, regime que logo se deteriorou, porque os
vínculos eram ampliados por meio do endividamento, de modo que logo se
viam frustradas as expectativas de crescimento dos imigrantes e estes
passavam a ser tratados como escravos.
É bom destacar que diversos governos europeus se manifestaram
contra esse sistema de trabalho, aparentemente livre, a que estavam
sendo submetidos os colonos, seus compatriotas.
Em síntese, pode-se dizer que, de modo geral, os fluxos
migratórios marcaram a história do Brasil, sempre tendo como motor
principal causas econômicas relacionadas com a expansão colonial do
capitalismo, a Revolução de 1848 (de motivação vinculada à luta de classes
na Europa).
Portanto, confirmam-se as hipóteses de Ravenstein sobre a
causalidade econômica das migrações a longa distância. Escrevera esse
autor:
Os fluxos migratórios gerados pela busca de melhores condições
materiais de vida superam, em muito, os fluxos cujos motivos não
são econômicos e as correntes migratórias que se dirigem para
centros industriais e comerciais resultam da demanda por mão–
de-obra (RAVENSTEIN, 1885, in: BND, 1980).
Assim, cabe aqui uma pida análise dos estudos de Ravenstein
em contraponto ao processo da migração dos brasileiros para o Paraguai,
considerando que fatos impulsionadores mostram que a motivação do
deslocamento migratório ocorre ao inverso do processo do Reino Unido de
1881; ou seja, ocorre do urbano para o rural, devendo-se, sobretudo às
razões de trabalho, econômicas e sociais, conforme citadas por Sprandel
(2006) como:
96
Homens sem pátria, do qual pretende mostrar as entranhas do
poder político, econômico e social paraguaio e sua relação com
350 mil camponeses brasileiros, atraídos até pelas promessas
de terras fartas e facilidades para o trabalho. Esta atração não se
deu por acaso, mas foi construída com muito carinho a partir de
1959, pelos governos do Paraguai e do Brasil (WAGNER
32
, 1999,
p. 9, Repórter do Jornal Zero Hora, apud SPRANDEL, 2006, p. 5).
Ora, essa situação nos remete ao descaso político brasileiro
quanto ao desinteresse pelo processo agrário e políticas que estimulam a
desigualdade social. Além disso, as cidades industriais inglesas aparecem
como grandes centros urbanos que concentram todos os outros fatores
sociais e culturais de uma sociedade capitalista avançada (facilidades
educacionais; custo de vida mais baixo etc.), o que não ocorreu na região do
Leste paraguaio, quando da maciça migração dos brasileiros para o
Paraguai, estimulados, como informado anteriormente, por fatores políticos e
sociais, tendo em vista a ínfima infra-estrutura apresentada.
“Apesar de terem levado o progresso econômico ao campo,
enfrentam sérios problemas
de documentação, titulação de terras e conflitos
com o movimento camponês paraguaio” (SPRANDEL, 2006).
Segue-se a análise regional das migrações, baseada nos estudos
da população de Baeninger
33
(2000), para introduzir elementos de
comparação, apontando as semelhanças ou diferenças nas migrações
internacionais e suas inserções na América Latina.
Primeiramente, apresenta-se o espaço regional e a dinâmica
demográfica, enfocando as baixas densidades e os locais de concentração
de população. Depois, são examinados os primeiros elementos sobre a
migração internacional, focalizando esse movimento no Brasil e, por último,
tenta-se expor e caracterizar alguns tipos de migrações.
32
WAGNER, Carlos (1999, p. 9), apud SPRANDEL (2006). Repórter do jornal Zero Hora, autor do
livro Brasiguaios: homens sem pátria. Baseado em reportagens jornalísticas sobre a Região Leste
paraguaia.
33
BAENINGER. Rosana (2000). Reportagem: O Brasil no contexto das migrações internacionais da
América Latina. Comciência Brasil.
<ttp://www.comciencia.br/reportagens/migrações/migr09.htm> Acesso em 21/04/2008.
97
Na análise da tabela realizada por Baeninger (2000), destacam-
se:
Tabela 2 Estoques de emigrantes brasileiros e imigrantes no Brasil
(1960-1990)
Países Ano Emigrantes Brasileiros Imigrantes no Brasil
Argentina
1960
1970
1980
1991
48.195
48.600
42.134
33.543
15.877
17.213
26.633
25.468
Paraguai
1960
1972/1970
1980
1990/1991
-
34.276
97.791
107.452
17.748
20.025
17.560
19.018
Bolívia
1960
1970
1980
1992/1991
-
-
-
8.586
8.046
10.712
12.980
15.694
Chile
1960
1970
1982/1980
1992/1991
-
930
2.076
4.610
1.458
1.900
17.830
20.437
Peru
1960
1972/1970
1981/1980
1993/1991
-
3.077
2.926
2.523
2.487
2.410
3.789
5.833
Uruguai
1960
1970
1980
1991
17.748
20.025
17.560
19.018
17.748
20.025
17.560
19.018
Venezuela
1960
1971/1970
1981/1980
1990/1991
-
17.748
20.025
17.560
1.246
989
1.262
1.226
Colômbia
1964/1960
1970
1980
1993/1991
2.267
-
-
1.383
685
870
1.490
2.076
Costa Rica
1960/1963
1973/1970
1984/1980
1991
-
20.025
17.560
-
129
152
327
357
FONTE: CNPD in IMLA/CELADE (2000) Rosana Baeninger Seminário Internacional: Migrações
Internacionais Contribuições para Políticas Brasil 2000. 06 e 07 de dezembro Auditório
do Palácio do Itamaraty. Brasília – DF. Texto para discussão. (2000, p.14)
Elaboração da autora com base no estudo de Rosana Baeninger.
98
Essas evidências permitem caracterizar o Brasil no cenário das
migrações internacionais na América Latina e Caribe, como indica
o Quadro 1(Tabela 1 nesta tese). Quanto aos países com os
quais o Brasil registra evasão de população, destaca-se que com
o Paraguai os anos 80 não demonstraram a mesma força dos
anos 70 e a Argentina com evasão decrescente. Por outro lado,
com a Venezuela o Brasil vem aumentando seu processo de
evasão populacional. Com os demais países, o Brasil vem se
caracterizando como área de recepção crescente de bolivianos,
chilenos e, com particular ênfase a partir dos anos 80, de
peruanos, uruguaios e colombianos. (BAENINGER, 2000, p. 14).
A reportagem publicada na Revista Exame (2000), com o título:
Os Novos Imigrantes, escrita pelo jornalista Ney Caixeta, descreve os mitos
e as realidades em relação aos imigrantes empresários, executivos e
técnicos estrangeiros, que migraram para o Brasil, após a estabilidade da
moeda, que perfazem “1,0 milhão de estrangeiros morando no Brasil, contra
1,5 de brasileiros vivendo no exterior”, formando o novo perfil da imigração
brasileira (CAIXETA, 2000, p. 146-170).
Para Caixeta (op. cit.), a “ordem é ir atrás do trabalho onde quer
que ele se apresente e onde suas habilidades sejam requeridas”. “Esse
lugar, hoje, é o Brasil”.
Desenvolvendo a discussão da questão, Caixeta aponta a
existência de alguns mitos, contrapondo-os com a realidade da situação
migratória no Brasil:
Mitos e realidades Como o Brasil está de fato lidando com a
entrada de trabalhadores estrangeiros.
Mito 1) O Brasil é um país muito aberto. Realidade: mais de
70 anos o Brasil é um país de imigração restrita. No período em
que incentivava a vinda de estrangeiros, entre a segunda metade
do século 19 e no início do século 20, entraram mais de 4 milhões
de pessoas de diferentes nacionalidades. Em 1934 a imigração
começou a ser contida e foi praticamente fechada três anos
depois, pelo Estado Novo. Após a Segunda Guerra Mundial houve
um período de abertura relativa. Na década de 1980, novas
restrições foram criadas e perduram até hoje. Segundo o
Ministério da Justiça, os estrangeiros legalizados no Brasil hoje
somam 1,02 milhão isto é apenas 0,6% da população do país.
Nos estado Unidos a proporção de estrangeiros é de 6% a 7%. Na
Argentina 4%.
Mito 2) Os estrangeiros estão tirando o emprego de brasileiros.
Realidade: Segundo o Ministério do Trabalho, atualmente
cerca de 19 000 estrangeiros com autorizações temporárias de
trabalho no país. É um contingente que está longe de afetar as
99
estatísticas de milhões de desempregados. Fica ainda menos
importante quando comparado com o total da PEA, a População
Economicamente Ativa do país, contabilizada em 77 milhões de
pessoas no final de 1998. A fatia dos estrangeiros com visto
temporário corresponde a 0,025% deste total.
Mito 3) As empresas multinacionais trazem mão-de-obra pouco
qualificada e desnecessária ao país. Realidade: As autorizações
concedidas pelo Ministério do Trabalho têm limites estritos. No
caso de profissionais com grau de formação universitária, as
empresas só conseguem trazer quem comprove pelo menos dois
anos de experiência. No de técnicos, é preciso que tenham pelo
menos nove anos de estudo e mínimo de três anos de
experiência. Além disso, cada transferência para o Brasil precisa
ser acompanhada de justificativas sobre a especialização, o tempo
de permanência e as tarefas que o estrangeiro virá realizar. No
ano passado, as centrais sindicais denunciaram que montadoras
de automóveis estariam transferindo para suas unidades
funcionários recém-formados e de baixa qualificação. A denúncia
provocou a troca do então coordenador de imigração do Ministério
do Trabalho e tornou os processos mais complicados e
demorados (CAIXETA, 2000, p. 146-170).
2.4.1 A cronologia do contexto migratório brasileiro
As diferenças apresentadas no Brasil, em relação aos demais
países, referem-se a estímulos externos que devem ser analisados para
melhor compreensão da formação socioeconômica do Brasil, dados esses
objetos do estudo de renomados autores.
O fenômeno do desenvolvimento econômico do Brasil até o
século XIX foi marcado por contradições e conflitos. Um país de dimensões
continentais, cheio de possibilidades, não poderia deixar de ser alvo dos
interesses migracionistas.
Na primeira metade do século XVII, os holandeses se radicaram
no Nordeste, concentrados na produção de açúcar e permaneceram até
sua expulsão. Ocorre o desenvolvimento urbano e libertações de escravos
de forma espontânea e parcial, anteriores à Abolição que é firmada apenas
em 1888.
O Brasil colonial, líder mundial na produção e exportação de café,
crescendo como agroexportador, exigia mão-de-obra suficiente não para
100
a agricultura, mas também para a indústria incipiente. Com o fim do
contrabando de escravos, a mão-de-obra livre era usada na abertura de
novas terras e na produção para o consumo local.
Assim, a economia colonial exportadora, que nascera e se
desenvolvera lado a lado com a escravidão e às suas custas , resistiu às
instâncias internacionais anti-escravagistas. A economia exigia mão-de-obra
barata – escravos – e o mundo conclamava a liberdade!
Em 1870-1872, a expansão da cafeicultura, o início da política de
subsídios do governo brasileiro provoca a entrada maciça de imigrantes,
predominantemente italianos, no Oeste Paulista e, no final dessa fase
(1902), o governo da Itália proíbe a emigração subsidiada para o Brasil.
O fim do comércio de escravos provocou o aumento do preço do
café. A redução e finalmente a extinção da mão-de-obra escrava foi
provocada pela alta taxa de mortalidade, a interrupção da importação desta
mão-de-obra e a fuga dos escravos, apoiados pelo movimento abolicionista.
A abolição, em 1888 e a Proclamação da República no ano
seguinte, deram início a uma fase no desenvolvimento do Brasil, conflitos,
como os descreve Baer: “A abolição acarretou substancialmente
desorganização de algumas tradicionais regiões agrícolas, provocando o
êxodo de grandes números de fazendeiros para as cidades, onde passaram
a dedicar-se à indústria e ao comércio (BAER
34
1975, p. 4-10).
O governo fascista
35
impõe restrições, reduzindo com isso a
imigração maciça dos italianos. Em 1906 a valorização do café, após o
Convênio de Taubaté, provoca aumento expressivo da imigração portuguesa
e de espanhóis e o início da imigração japonesa, interrompida na Primeira
Guerra Mundial.
34
BAER, Werner. Leia-se o livro que faz menção da trajetória do processo industrial brasileiro de
forma clara e coerente.
35
BASSANEZI (1995, 1-38) refere-se às leis restritivas à emigração/imigração e aos ciclos
econômicos, fatores de expulsão e de recepção, entre países emigrantistas e Brasil.
101
Resumindo, o desenvolvimento econômico do Brasil ao século
XIX compreende não tão somente em relação aos objetivos desse estudo
dois grandes períodos: a fase agrícola, com seu apogeu agroexportador
(até 1930), com a preponderância de imigrantes africanos e portugueses e a
fase industrial, inaugurada com a República, quando a imigração européia
veio suprir o vácuo de mão-de-obra agrícola nas regiões mais ricas,
especialmente São Paulo.
Nas cidades se anunciavam os primeiros resultados da
campanha pró-industrialização. Por outro lado, à debandada em massa dos
escravos libertos correspondeu à importação da mão-de-obra européia.
Tabela 3 – Presença de imigrantes na indústria nacional
Década Portugueses Italianos Japoneses Espanhóis Alemães Outros Total
1900-09 195.586 221.394
861 113.232 13.848
77.486 662.407
1910-19 318.168 138.168
27.432 181.561 25.902
123.819 815.453
1920-29 106.835 106.835
58.284 81.931 75.801
221.881 846.647
1930-39 102.743 22.170
99.222 12.746 27.497
68.390 332.768
Fonte: Merrick, Thomaz, GRAHAM, Douglas. População e Desenvolvimento Econômico no Brasil. Rio
de Janeiro, Jorge Zahar, (1979, p. 91.) In MOTA & BRAICK (2002).
Elaborado pela autora com base no texto supra citado.
Houve uma grande mudança comportamental, provocada também
pelos trabalhadores livres e escravos libertados que se negavam a trabalhar
como assalariados, preferindo a miséria e a desqualificação social. A mão-
de-obra estrangeira atraída para o sul praticamente utilizava a mão-de-obra
escrava apenas como reforço e nunca nas mesmas tarefas.
O fracasso da colonização oficial deve-se às instabilidades
econômicas e à dispersão dos colonos e regride à economia de
subsistência. Nas próximas décadas, cresceu a colonização privada,
principalmente no Oeste Paulista. Surgiram as parcerias com apoio da mão-
de-obra estrangeira e não se descartaram os atritos entre fazendeiros e
102
colonos na manutenção do regime de parcerias para baratear os custos de
manutenção. Os fazendeiros ampliavam a parceria por meio do
endividamento. Logo as expectativas de crescimento dos imigrantes eram
frustradas e estes passavam a ser tratados como “escravos”.
Segundo Bassanezi (1995), o Brasil é considerado um país
emigrantista, em termos de movimento populacional atual, diferente da sua
história marcada desde a colonização pelos portugueses, como receptiva.
Grandes impactos ocasionados pelos imigrantes internacionais ocorreram
durante todo o século XIX e XX, que transformaram a demografia, a
macroeconomia e o macroambiente social do país.
As causas da movimentação migratória no Brasil foram
conjunturais: primeiro, a apropriação militar e econômica pelos portugueses;
a entrada forçada de escravos, graças ao crescimento agrícola; no século
XIX, a necessidade de ocupação do território, os conflitos e transformações
do velho mundo, a expansão do capitalismo, a expansão das comunicações,
o barateamento dos custos de transportes, são alguns dos motivos citados
pela autora.
divergências quanto ao volume migratório no país, devido às
falhas de informação; anotações com critérios divergentes e as disparidades
dos números face à realidade é um espelho falso. Some-se a isto o fato de a
migração ilegal, a reemigração ou migração de retorno, não ser devidamente
computada. Destaque-se, ainda, que o perfil dos imigrantes variara de região
por região, quanto ao volume, nacionalidade, ocupações etc., dependendo
também de fatores e circunstâncias históricas.
De 1872 a 1880, os censos do século XIX mostram a
concentração de imigrantes para a Província do Estado do Rio de Janeiro
(Capital do Império e da República), seguindo-se, em ordem decrescente,
Minas Gerais, Rio Grande do Sul, São Paulo, Santa Catarina e Pernambuco.
São Paulo toma a segunda posição, em 1872, reflexo da política de
subsídios que beneficiava a cafeicultura paulista.
103
Os Censos de 1900 a 1920 revelam acréscimo de imigrantes em
São Paulo e o Rio de Janeiro passa para o segundo lugar. Após a Segunda
Guerra Mundial, nos anos de 1950, a imigração adquire nova face: a
concentração ocorre em São Paulo, Rio de Janeiro e Sul. Não se deve
esquecer o Ciclo da Borracha que também estimulou a procura pelos
imigrantes, nas regiões das cidades portuárias como Manaus, Belém do
Pará.
Menor volume de imigrantes ocorre na época da recuperação da
cafeicultura e do desenvolvimento de outros setores da economia no s-
guerra, destacando-se a imigração dos portugueses e outras nacionalidades,
entre elas os poloneses, os russos, os romenos e os judeus, além dos
japoneses.
No entanto, com o término dos subsídios pelo governo paulista
em 1927 e a crise da superprodução do café, com as restrições impostas à
imigração em 1930 e com a ocorrência da Segunda Guerra Mundial, cessa o
movimento migratório entre1936 e 1945.
Posteriormente, com relaxamento das restrições, a imigração
portuguesa predomina, a indústria e a colonização passam a ter papel
importante. Começa a imigração ”dirigida” e a “chamada por parentes”.
Segundo a CIME (Comissão Intergovernamental para
Migrações Européias) e Comissão Internacional Católica de Migrações, o
Brasil recebeu a 1952, 112 mil europeus trabalhadores industriais. Nos
anos 1960, com o declínio do movimento migratório, com a mudança
mundial globalização e a perda dos atrativos brasileiros, observa-se a
ocorrência de épocas em que o número de entradas foi menor que os de
saída, além das parcelas de reemigração (saídas para outros países ou
retorno para sua pátria).
104
2.4.2 Uma reflexão sobre o fluxo migratório brasileiro
Na complexa dinâmica da economia e da sociedade brasileira,
encontram-se os mais diferentes tipos e modalidades de fluxos migratórios e
é justamente dentro dessa dinâmica que eles assumem um significado
particular. Compreender essas particularidades, em todas as suas
dimensões é um grande desafio.
Pode-se fazer uma reflexão no que se refere ao desenvolvimento
de um conceito para o padrão migratório, procurando diferenciá-lo de tipos
ou modalidades de fluxos, mostrando a sua utilidade para a compreensão
das mudanças recentes no comportamento das migrações internas no
Brasil.
Como as migrações constituem um processo social
36
, elas não
são um evento aleatório; elas têm regularidade empírica que pode ser
observada sob a forma dos fluxos migratórios, nas suas diferentes
modalidades, conforme já abordado anteriormente.
Cita-se Kawamura (2003, p. 227): O encontro de culturas
diversas coloca questões relativas à interação social em diversos setores da
vivência do imigrante, possibilitando influências culturais mútuas, encontros
e desencontros culturais”.
O tribalismo é uma crença na fidelidade ao próprio grupo, definido
pela etnia, pelo idioma pela cultura, pela religião ou, no final do
Século XX, pela profissão. E essa crença está florescendo
(NAISBITT, 1994, p.17).
Muitos destes fluxos migratórios, pela sua importância para a
dinâmica espacial da economia e da sociedade, assumem regularidade de
ordem estrutural. Eles se transformam em trajetórias migratórias que a
sociedade, a economia e o Estado desenham, espacialmente, em função
36
KAWAMURA, L.K. Socióloga que pesquisou a migração dos trabalhadores brasileiros no Japão,
em Nagoya (1993-1994).
105
das suas necessidades e, portanto, podem ser redesenhados, desde que
tais necessidades se modifiquem
37
.
Martine (1990 p. 99-160) diz que “a permanência do imigrante
supõe aculturação; portanto, é receptivo quando exposto ao desafio da
sobrevivência”. O oposto também é verdade; embora não se possa contar
com dados que permitam aferir esses resultados, parecem indicar a
sobrevivência dos mais fortes.
Esse autor refere que aconteceram algumas mudanças
significativas entre as décadas de 1960 e 1980, nos fluxos migratórios para a
região de expansão da fronteira agrícola. O Paraná, por exemplo, perdeu
muito da sua capacidade de atração migratória e se transformou no Estado
com a maior evasão populacional. A região Centro-Oeste aumentou os seus
imigrantes, mas houve uma queda pequena dos originários do Nordeste, e
os de Minas se reduziram praticamente à metade. A participação relativa de
ambos caiu de 56,0 para 39,0%, entre as duas décadas.
Parte dos
emigrantes do Paraná se dirigiu para o Centro-Oeste, na sua grande maioria
para Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Um quarto dos imigrantes do
Centro-Oeste teve origem dentro da própria região. De fato, o que houve foi
uma grande emigração do Mato Grosso do Sul para o Mato Grosso, que se
articulava à expansão da fronteira Norte, e uma grande troca migratória
entre Goiás e o Distrito Federal, (MARTINE 1990, p.99-160).
Entretanto, apesar do grande poder de atração migratória de um
determinado Estado, Município ou Área Metropolitana, essas regiões de
destino nem sempre têm condições de reter uma boa parte dos seus
imigrantes, provocando a chamada reemigração. Ou seja, muitos são os
migrantes que chegam a um destino, mas nem todos são capazes de
superar a seletividade imposta pelos processos sociais e econômicos,
podendo ser empurrados em direção ao retorno ou a uma nova etapa
migratória.
37
MARTINE, G. (1990 p. 99-160), in Trabalho apresentado para 28ª Reunião Anual Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência.
106
Os fatores, que, a princípio, ajudam no processo de fixação e
adaptação interativa dos imigrantes no país, são: o papel desempenhado
pelo governo dos Países de origem, no sentido de proteger e dar suporte
técnico e econômico aos seus emigrantes no país de destino (destacado
entre os japoneses, em menor escala entre os alemães, menos ainda com
os italianos e nada com os espanhóis); e a contribuição da Igreja, no sentido
de dar assistência espiritual e social, garantindo a inclusão, o assentamento
e a manutenção das relações internacionais, (MARTINE, 1990, p. 99-160).
No entanto, merece destaque o desempenho das redes familiares
e de solidariedade no apoio mútuo de seus integrantes que uniram parentes
e amigos, com a inclusão no trabalho e no casamento. Mediante essas
redes, formam-se associações de imigrantes: hospitais, escolas, unidades
produtivas e cooperativas.
As forças da modernização provocaram, em muitas pessoas, uma
sensação de não pertencerem a nenhum lugar ou de nada existir
permanente ou estável em suas vidas. É bastante compreensível
que elas, então, procurem alguma coisa que pareça eterna e que
não lhes possa ser subtraída. Uma delas é ser membro de um
grupo. Outra é um sistema de crenças ou uma religião (NAIBITT,
1994, p.181).
[...]
As redes sociais (de parentesco, amizade e conhecimento), no
âmbito das migrações, possibilitam, através dos vínculos
estabelecidos entre a origem e o destino, a deflagração e a
manutenção dos fluxos (BÓGUS e BASSANEZI 1995).
A bagagem sociocultural (alfabetização, religião, ensinamentos
técnicos) são os vários componentes que dificultam, retardam ou facilitam os
processos de adaptação dos imigrantes. O grau de expectativa de retornar
enriquecido ao país de origem facilita o trabalho árduo e a poupança.
Bassanezi (1995) discute as especificidades em relação aos
movimentos migratórios, como inserção e adaptação, trazidas à luz da
história e das políticas migratórias que ainda persistem em nosso país
(BASSANEZI, 1995).
O fluxo migratório no Brasil é, portanto, um processo que ocorre
desde a descoberta do território pelos portugueses. Caracterizado por
107
inúmeras variantes, pode-se considerá-lo um objeto de estudo rico e
interessante no que tange às pesquisas sobre demografia.
A avaliação quanto ao volume de imigrantes e emigrantes no
Brasil é um pouco divergente. De fato, as anotações apresentam critérios
divergentes e as estatísticas não refletem a realidade. Além disso, o fato
das imigrações ilegais, da reemigração ou migração de retorno não serem
devidamente computadas. Destaque-se, ainda, que o perfil dos imigrantes
variou de região para região, quanto ao volume, nacionalidade, ocupações
etc., acrescido de fatores e circunstâncias históricos que foram descritos a
partir da releitura de Bassanezzi (1996) e outros.
Na perspectiva de trabalhar os emigrantes brasileiros que se
deslocaram para além das fronteiras brasileiras, na direção de terras
paraguaias, o próximo capítulo traz estudos referentes à denominada
comunidade de “brasiguaios”.
Capítulo 3
Brasiguaios e Comunidades Brasiguaias:
Redes Sociais e Identidades
111
3.1 A MIGRAÇÃO BRASIL-PARAGUAI
A observação da área fronteiriça Brasil-Paraguai no âmbito
socioambiental e econômico marca os potenciais de integração e os conflitos
latentes que podem surgir neste processo migratório, importante para este
estudo.
A área em que se desenvolve a pesquisa é a bacia do dio e
Alto Paraná, região de fronteira internacional que abrange o Estado do Mato
Grosso do Sul (Brasil) e ainda a região do Canindeyú
(capital Salto Del
Guariá - primeiro departamento ao norte) e Itapúa (capital Encarnación) no
Paraguai
38
. São áreas de pouca densidade populacional, onde a questão
ambiental é relevante e a agricultura de soja e algodão é o que constitui a
economia da região.
Buscou-se
pesquisar e descrever as formas de mobilidade
populacional
39
, de migração internacional e de inserção social e econômica,
considerando as diferentes escalas espaciais em que esses processos
ocorrem. São considerados os movimentos atuais dos brasileiros e
paraguaios
, principalmente com destino às áreas rurais, tendo em vista que
essa é a principal forma assumida pelos deslocamentos nessa região.
Essa mobilidade populacional é tratada por Souchaud (2002)
como sendo uma particularidade da migração brasileira que pouco a pouco
constrói sua própria rede urbana, independente do modelo das cidades
paraguaias e/ou brasileiras.
A corrente migratória Brasil-Paraguai, foco deste exame, está
intrinsecamente ligada à formação da fronteira entre os dois países,
principalmente a fronteira agrícola, abordada no artigo de Patarra (2002, p.
36-38). A esse propósito leia-se:
38
Departamentos do Paraguai: Alto Paraguay, Alto Paraná, Boquerón, Caaguazú, Caazapá,
Canindeyú, Central, Concepción, Cordillera, Guairá, Itapúa, Misiones, Neembucú, Paraguarí,
Presidente Hayes, San Pedro. Sendo Assunção a capital.
39
Leia-se, PALAU, T. Migration among countries in Mercosul: trends and perspectives. Barcelona:
IUSSP, n. 7-10, mai.1997.
112
Assim sendo, as desigualdades nos processos de
desenvolvimento entre os países provocaram movimentos
migratórios internacionais que constituem uma modalidade da
migração interna dos respectivos países, uma vez que os
deslocamentos significam uma extensão transfronteiriça dos
mesmos processos sociais (PALAU
40
,
2000, p. 2)
).
As primeiras conclusões observadas vão em direção a um sentido
de grande heterogeneidade e complexidade das questões sociais existentes
na faixa de fronteira estudada. Contudo, apontam também para uma
possível integração regional decorrente das complementaridades oriundas
dos laços que se estabelecem entre os espaços nacionais conquistados na
região.
O estudo da distribuição da população e das variações de
densidade demográfica permite apresentar de maneira matizada a questão
da estruturação histórica e atual desse espaço regional.
Considera-se importante introduzir esse assunto para perceber
como a própria organização do território influencia os movimentos
migratórios regionais. No presente, essa migração se concentra na área
rural
41
e se divide em três categorias. Neste estudo está tratado apenas o
agricultor que deu certo, se assim se pode dizer, baseando-se nas
referidas categorias de Palau (2000).
1) Os pequenos e médios empresários familiares, provenientes
dos Estados do Sul do Brasil, que foram atraídos pelas
possibilidades de adquirirem terras a preços até 8 vezes mais
barato que no seu país. Este grupo foi que se assentou, criou e
consolidou colônias agropecuárias prósperas que chegaram
alcançar importante desenvolvimento socioeconômico ao ponto
deles participarem ativamente, hoje, na vida política do Paraguai
(PALAU, 2000, p. 2).
No caso do Chaco paraguaio, a “desertificação” é ainda mais
relevante na faixa da fronteira. Assim, o departamento de Alto Paraguai,
40
Leia-se PALAU, Tomás & HEIKEL, Maria Victoria. (1984).
41
PALAU, T (2000, p. 2): “Os pequenos agricultores, alguns pequenos proprietários, mas geralmente
arrendatários ou trabalhadores diaristas em seu país, que foram traídos pelos colonizadores e,
enviado por seus patrões para enfrentar as tarefas iniciais de habitar em terras agrícolas”. 3) “Os
trabalhadores agrícolas desarraigados (ou dizer: sem terra’) que, não tenham trabalho fixo, e
vivem em condições de total precariedade em terras alheias, com contratos verbais arbitrários e
em parcerias precárias”.
113
divisa com o Mato Grosso do Sul, abriga cerca de três vezes mais habitantes
do que na região de fronteira. De modo geral, existe uma tendência de
concentração de população na região do Chaco paraguaio.
Ambos os governos – brasileiro e paraguaio – promoveram a
povoação das áreas fronteiriças, instaurando a fronteira político-
administrativa. A demanda de terras rteis para o cultivo diferenciado, a
facilidade de comercialização dos produtos pela proximidade de estradas
conducentes a mercados exportadores atraíram o interesse de particulares e
empresas; esse processo nem sempre foi pacífico tais áreas foram palco
de lutas e de exclusão social.
O movimento migratório se intensificou com a venda de terras
paraguaias a companhias agropecuárias estrangeiras e a colonos
brasileiros, que se beneficiaram das condições favoráveis oferecidas pelo
governo paraguaio, como o baixo preço das terras, a redução de taxas, a
oferta de créditos etc. Produtores e arrendatários brasileiros prosperaram no
Paraguai até o final da cada de 1970, quando o assentamento em terras
paraguaias começou a apresentar dificuldades, com a venda preferencial
destas terras a grandes empresas agrícolas e aos farmers”, transformando
antigos ocupantes em assalariados eventuais.
3.2 OS BRASIGUAIOS: A DICOTOMIA DO TERMO E DA IDENTIDADE
A pessoa, como um todo, é o resultado de sua herança genética,
moldado e desenvolvido dentro de uma comunidade, definida e autenticada
pelos valores da cultura em que se insere. Citando Castells (2002, p. 22)
“entende-se por identidade a fonte de significado e experiência de um povo”,
conceito reforçado por Calhoum: “não temos conhecimento de um povo [...]
a identidade de atores sociais é o processo de construção de significado,
com base num atributo cultural”. Pode haver sobreposição de identidades, o
114
que, ainda segundo Castells, pode gerar tensões, tanto naquilo que o ator
diz de si mesmo (representação interna) quanto pela representação social.
Pode ocorrer a confusão de identidade “como papel”, por exemplo, no caso
em pauta, “parecer” brasiguaio se confunde com o brasileiro vivendo no
Paraguai.
Os papéis dependem de acordos ou negociações entre indivíduos
e instituições, como um casamento entre homem-mulher. Identidades, pelo
contrário, são construídas pelo próprio ator social, num processo de
individuação e apropriação de um significado. A identidade também pode ser
atribuída a partir de uma instituição dominante, desde que o ator social a
introjete, apropriando-se e atribuindo-se esse significado, interpretando o
entendimento de Castells (2002).
O termo ‘brasiguaio’ surgiu quando começou o movimento de
retorno dos migrantes brasileiros. Aplicando-se os conceitos de Castells aos
brasiguaios, depara-se com similaridades e disparidades de opinião
começando por Sprandel: na citação de Zaar, a partir da qual se entende
tratar-se de agricultores sem terra, de volta ao Brasil, para o meio de onde
saíram, muitas das vezes, voltam a fazer parte do Movimento dos Sem Terra
MST. Configuram, também, uma personalidade reivindicativa, auto-
assumida.
Os autores consultados coincidem na caracterização dos
brasiguaios como “brasileiros agricultores”, “homens da terra” e, segundo
Patarra e Baeninger (2005), expulsos, o que leva a considerá-los como não
seletivos e com tendência a aumentar. Diante dos inúmeros conflitos (que as
diversas imprensas assinalam), “os brasileiros ou ‘brasiguaios’, como
passaram a ser chamados, iniciaram um processo de retorno”, confirmado
em Sales (2002, p. 98).
Assim, a definição do conceito “brasiguaio” é tratada por diversos
autores que abordam o tema referente à questão migratória. Cabe citar com
115
destaque os trabalhos de Zaar
42
(2001); além de Patarra e Baeninger
43
(2005); também Fusco (2006) na quantificação, localização e
caracterização dos “brasiguaios” e/ou, ainda, o trabalho exaustivo e
amplamente citado nas diversas fontes consultadas como de Palau (2000) e
Sprandel (2006).
Na linha de interpretação do termo, como elemento de
caracterização, encontra-se eco em Celso N. Salim (1995, p.148), quando
conclui, referindo-se aos pioneiros devolvidos ao Rio Grande do Sul: “...
delineando não apenas alguns traços do perfil, como, principalmente, a
dramática trajetória dos brasiguaios nos anos de 1980” Salim (1995, p.148).
Sprandel (2000) considera que o termo “brasiguaios” surge a
partir de 1982, com o retorno dos brasileiros de forma organizada ao
território paraguaio.
Palau (2000) classifica os “brasiguaios” em três grupos, segundo
a proveniência, a atividade, nível da inserção na terra, numa análise atual, a
saber:
i. La de los pequeños y medianos empresarios familiares,
provenientes de los Estados del sur de Brasil, que fueron atraídos
por las posibilidades de adquirir tierra a precios hasta oito veces
más barato que en su país. Este grupo fue el que se afincó, creó y
consolidó prósperas colônias agropecuarias y que lograron
alcanzar un importante desarrollo socioeconómico hasta el punto
que muchos de ellos participan activamente, houy, en la vida
política del Paraguay.
ii.La de los pequeños agricultores, algunos pequeños propietarios
pero generalmente arrendatarios o trabajadores diaristas en su
país, que fueron traídos por las colonizadoras o enviados por sus
patrones para encarar las tareas iniciales de habilitación de la
tierra de monte en agrícola.
iii. La de un trajadores agrícolas desarraigados (va decir, sin tierra)
que, o no tienen trabajo fijo, o viven en condiciones de total
precariedad en tierras ajenas bajo contratos verbales arbitrarios y
en aparcerías precarias. (PALAU, 2000, p. 1).
42
Zaar, Miriam H. (2001, p.5) Doutoranda em Geografia, Universidade de Barcelona, em artigo
publicado na Revista Electrônica de Geografia y Ciências Sociales, refere-se aos brasileiros que se
reproduzem em território da República do Paraguai, com a denominação de “brasiguaios”.
43
Patarra, N., Baeninger, R. (2005) Contribuição ao Congresso de Modelos de Pastoral Triuggio
(IT) Centro de Estudos Migratórios.
116
O fenômeno migratório, a partir do qual se constituiu a categoria
brasiguaio, foi intensificado no Paraguai nos anos de 1950, durante o
governo do ditador Stroessner
44
, quando foi criado um amplo programa de
atração migratória voltado ao desenvolvimento do país e com incentivos que
facilitaram a aquisição de lotes de terras, medida essa que estimulou a
economia local e aumentou a demanda dos brasileiros por novas
oportunidades, o que o Brasil não oferecia na época.
Esse fenômeno despertou o interesse para a presente pesquisa,
uma vez que um contingente expressivo de brasileiros citando Patarra e
Baeninger (2005) em torno de 440 mil – foi atraído por essas medidas.
Diversas alternativas de atração, segundo alguns autores,
estimularam o movimento migratório dos brasileiros para o Paraguai, dentre
as quais se pode citar Salim e Wagner (1990) no trecho que nos remete a
uma destas facilidades impulsionadoras, desenhadas por políticas
intergovernamentais praticadas pelo então Presidente Stroessner.
[...] com o advento da ditadura de Stroessner, inicia-se o processo
de transformação do setor agropecuário, por meio de um conjunto
de políticas dirigidas à colonização e à modernização da fronteira
agrícola. Essa estratégia objetivava o crescimento para fora, via
incremento das exportações agrícolas. Para isso, além de
distribuir terras aos militares e líderes políticos, o governo também
transferiu aos grandes grupos estrangeiros a tarefa de ‘organizar a
colonização’ (SALIM, 1995, p; 146).
Considera-se importante, ainda, descobrir outras situações
decisivas que atuaram como fatores de expulsão e de atração de tantos
brasileiros. Esse fato histórico é citado por Souchaud (2002), contrariando
um paradigma
brasileiro dos séculos XIX e XX, até então preestabelecido,
qual seja ter sido um país que acolheu e atraiu vários povos.
En las postrimerías de la década del 80 (1980) se produce un
fuerte éxodo de brasileños, motivado por vários elementos, Por un
lado el fin del gimen de Stroessner da lugar a un período de
incertidumbres y de inseguridad brasileña”. Incertidumbres
44
Alfredo Stroessner Matiauda (Encarnación, 3 de novembro de 1912 Brasília, 16 de agosto de
2006) foi um político, general-de-exército e presidente do Paraguai, que governou sob um regime
ditatorial, entre 1954 e 1989. “O regime de Stroessner foi sangrento e totalitário. Estima-se em
quatro mil os desaparecidos políticos”. Governava com “mãos de ferro” apoiado pela tríade política:
governo / partido / exército. (BRANDÃO, 2006).
117
concernientes a la suerte reservada a estos brasileños, ilegales en
su mayoria. Inseguridad en razón de los errores del poder central
paraguayo que deja las manos libres a todo tipo de indivíduos sin
escrúpulos que harán más difícil que nunca la vida a los
brasileños, multiplicando extorsiones, expoliaciones, expulsiones
sumarias, violências físicas. Por otra parte debido a los elementos
citados precedentemente, la reciente democratización en Brasil
(1984) hace renacer la posibilidade de un amplio plan de reforma
agrária; serán muchos los que serán repelidos por los militares en
la frontera brasileña y en consecuencia, deberán organizar
retornos colectivos que terminarán en ocupaciones de haciendas
(SOUCHAUD, 2002, p. 151).
Situações de risco, inerentes ao início de uma nova vida em um
lugar diferente, perdem a relevância diante dos fatores de atração, que
provocaram uma demanda representativa de brasileiros. Afinal, deixar o país
de origem não deve ser uma decisão simples, ainda mais quando esse é tido
como modelo de país receptor de migrantes das mais diversas regiões do
mundo e que passa a ser visto também como um país de emigração.
Retoma-se a ideia exposta de que a história do Brasil é escrita
com a migração dos povos portugueses, italianos e africanos, além de tantos
outros imigrantes que ajudaram a desenhar a economia, a agricultura e o
modo de viver do país, formando um povo inspirado por tantos outros povos.
Assim, o Brasil, um país de portas abertas para a imigração, que
exerceu forte atração, recebendo volume expressivo de imigrantes
transcontinentais da África, Europa, Ásia e da própria América, torna-se,
assim, um país de emigração, principalmente entre os anos 1970 e 1980. “A
partir da década de 1980, o Brasil que, até então, apenas recebia imigrantes
provenientes de vários países como Itália, Japão e Espanha, entre outros,
passa a ter seus cidadãos na rota das migrações” (RAMOS, 2002, p. 10).
Por conta da política econômica vigente e inflacionária, nos
tempos finais dos governos militares, ou seja, no macro-ambiente brasileiro
no período 1970-1980, houve o achatamento do poder aquisitivo da classe
118
média, com a redução do volume e da qualidade do emprego, gerando
incertezas políticas
45
e econômicas
46
.
Nesse contexto, observou-se o aumento da violência urbana, a
ausência do Estado em questões fundamentais para a normalização da
coletividade e a falta de perspectivas e futuro para a população das classes
sociais menos favorecidas
47
, que vivem à margem da sociedade de
consumo (RICO, 2001, p. 50).
Esse grupo social apresentava
baixa qualidade de vida, sofria
com a ausência de acesso aos elementos componentes da expansão da
produção e da riqueza, elementos que alteram os fatores componentes do
IDH Índice de Desenvolvimento Humano –, situação essa capaz de gerar
fortes fatores de expulsão (RAMOS, 2002, p. 14).
As rotas internacionais mais procuradas pelos brasileiros, entre os
países mais desenvolvidos, foram os Estados Unidos, o Japão e o Canadá.
Na realidade, esses países fornecem melhor qualidade de vida e,
conseqüentemente, os locais preferidos dos brasileiros quando se trata de
emigração. Porém, segundo Patarra e Baeninger (2005, p. 7), o Paraguai
aparece em segundo lugar, quando se trata de volume migratório:
Se em 1996, dados do Ministério de Relações Exteriores
contabilizavam uma população de brasileiros no exterior na ordem
de 1.548.756, dos quais 598.526 residiam nos Estados Unidos; em
2002, registros consulares calculam em 1.887.895 os brasileiros
45
O processo ditatorial Brasileiro implantado em 1964, pelo militares, representou um expressivo fator
de expulsão da população brasileira não favorecida pelo regime.
46
O descontrole da inflação ocorrido nos anos de 1980, após a crise mundial do petróleo, e provocada
pela ganância de alguns setores da economia e uma elevada dívida externa motivada por altos
gastos públicos. Para Silva (2004, p. 10), “No Brasil que está entre os países mais ricos do planeta,
a inflação foi refreada, mas o desemprego teve um aumento sem precedentes, sendo que mais de
50% dos trabalhadores encontram-se na informalidade. A dependência em relação aos capitais
externos aumentou e a prioridade das contas públicas tem sido o pagamento dos juros aos
credores internos e externos. Grande parte do patrimônio público foi privatizado, sendo que, em
muitos casos, os serviços privatizados tiveram aumentos de tarifas. A renda concentrou-se e o
salário mínimo vale menos de 30% que valia em 1940, quando foi instituído. E os investimentos na
área social declinaram”.
47
De acordo com RICO, 2001 apud RUSSO, 2000, p. 1. O relatório Situação Mundial da Infância, do
UNICEF The United Nation Children’s Fund, constata a gravidade das condições de vida das
crianças e dos adolescentes nos países menos desenvolvidos e em desenvolvimento [...] O Brasil e
a Guatemala apresentam taxas de repetência mais altas acima de 15% - Indicando problemas na
qualidade da educação. Nove mil das 256mil crianças que nasceram no Brasil, em outubro passado,
morrerão antes de completar um ano de idade. Por outro lado, 21% dos pais são analfabetos e 27%
possuem renda familiar inferior a meio salário-mínimo per capita por mês. [...].
119
‘no exterior’, dos quais 42% encontravam-se nos Estados Unidos
(quase 700 mil brasileiros); 24% estavam no Paraguai (em torno
de 450 000) [...] (PATARRA & BAENINGER, 2004, p. 7).
Em relação à emigração
48
para o Paraguai ou demais países da
América Latina, é encontrada uma realidade diferente, conforme vem sendo
demonstrada neste estudo, que traz à tona as condições de vida dos
brasileiros, os quais migraram para o Paraguai e vivem e se relacionam,
muitos dos quais se encontram na terceira geração.
Além disso, ao conhecer o dia-a-dia de brasileiros e paraguaios,
evidenciam-se as contribuições que os brasileiros levaram ao Paraguai e a
relação de reciprocidade entre esses dois povos:
vizinhos tão próximos
territorialmente, mas, ao mesmo tempo, distantes e diferentes em seus
costumes e hábitos, formando um fluxo migratório como uma rede
permanente de migração, conforme refere Souchaud (2002, p. 152) e cujos
dados atuais se encontram adiante.
Apesar de essa migração aparecer concentrada no eixo Este-
Oeste Alto Paraná –, também se espalhou no eixo Norte-Sul do Paraguai.
Mesmo que os dados censitários forneçam as informações que consideram
corretas, tanto Souchaud (2002, p. 152) como esta autora, acreditam
fortemente que tais dados são imprecisos tanto em termos de quantidade de
movimento migratório, quanto à localização espacial.
A situação social dos brasileiros e seus descendentes que vivem
no Paraguai, [...] com suas múltiplas perspectivas, permitem que
se relativizem as narrativas midiáticas e a concepção da região
como ‘lugar difícil’. Ao discorrer sobre trabalhos de diversos
autores, de distintas áreas acadêmicas, o artigo aponta para a
importância de cada um deles na construção de uma análise que
48
POCHMAN, M. economista. Os dados estão no estudo inédito: Nova geoeconomia do emprego no
Brasil: Estados da Federação um balanço de 15 anos. “São Paulo deixou de ser a locomotiva do
país e vive um momento de estagnação da economia e, por consequência da geração de emprego.
O Estado onde migrantes de todas as regiões do país buscavam oportunidades no passado não
absorve mão de obra e registra um dos maiores números de ‘exportação’ de trabalhadores”.
“Em contrapartida, as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, que se desenvolveram mais nos
últimos 15 anos não apresentam resultados tão positivos de forma a equilibrar o emprego no país.
Pelo contrário, onde geração de vagas, principalmente em locais com atividades de
agropecuária, também aumento do desemprego, em função da migração desordenada”. Marcio
Pochmann, coordenador técnico do Instituto DataSol. O trabalho reúne informações sobre a
evolução do PIB, do emprego, da migração e da PEA População Economicamente Ativa, por
Estado e por Região do País de 1990 a 2005.
120
traduza a pluralidade de pontos de vista coexistentes na região e
que são, muitas vezes, inconciliáveis (SPRANDEL, 2006, p.1-2).
A discussão avança sobre a representatividade do termo
“brasiguaio”, pois, entre imigrantes, sociedade, órgãos governamentais e
ONGs - Organizações não-governamentais - há definições divergentes.
Neste estudo são contempladas as discussões temáticas tratadas por
Sprandel (2006, p. 2).
Os “brasiguaios” são apresentados como um grupo social formado
por centenas de milhares de camponeses brasileiros (as
estimativas mais razoáveis variam de trezentas a quinhentas mil
pessoas), que se transferiram para a fronteira leste do Paraguai na
década de 1970, expulsos pela monocultura da soja e pela
construção de Itaipu, num contexto de disputas geopolíticas, e que
no Paraguai (apesar de “terem levado o progresso econômico ao
campo”) enfrentam sérios problemas de documentação, titulação
de terras e conflitos com o movimento camponês paraguaio [...].
Se invertermos o olhar e pesquisarmos em jornais e revistas
paraguaios, como bem demonstra Albuquerque (2005)
49
, teremos
uma outra visão, também homogeneizadora, dos brasileiros que
vivem no Paraguai: empresários ricos, imperialistas, atraídos pelos
baixos preços das terras e pela abolição da proibição de compra
de terra por estrangeiros (promovida por Stroessner, em 1967),
introdutores da monocultura da soja, responsáveis pela expansão
da soja transgênica no país, expulsores de camponeses sem terra
e índios e devastadores das florestas e do meio ambiente
(SPRANDEL, 2006, p. 2-3).
Essa autora, ao realizar um estudo cartográfico da situação social
de brasileiros e seus descendentes que vivem no Paraguai, construiu como
categorias de análise alguns elementos que ela denominou de “mapas”, a
saber:
1 - brasileiros no Paraguai como camponeses em situação de injustiça;
2 - brasileiros no Paraguai como grupo étnico em situação de fronteira;
3 - brasileiros e paraguaios em situação de interação: a dinâmica das
identidades nacionais;
4 - a geografia e a formação de um “espaço brasiguaio”;
5 - brasileiros no Paraguai como grupo lingüístico;
49
A autora refere-se à tese de doutoramento de José Lindomar Coelho Albuquerque: Fronteiras em
movimento e identidades nacionais. A imigração brasileira no Paraguai, defendida no Programa de
Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Ceará em 2005.
121
6 - outras perspectivas acadêmicas;
7 - brasileiros no Paraguai como brasileiros no exterior;
8 - brasileiros no Paraguai do ponto de vista de políticas públicas;
9 - os brasileiros que vivem no Paraguai e os organismos internacionais.
Ao enfocar com mais atenção o mapa de número três, proposto
pela autora, as reflexões se remetem à questão das identidades em suas
expressões e em seu processo de construção. E, nesta direção, considera-
se extremamente relevante a contribuição de Albuquerque (2007).
O termo “brasiguaio”, à primeira vista, poderia ser compreendido
como sinônimo de uma identidade “híbrida e fronteiriça”, sob a qual estariam
subjacentes as identidades brasileira e paraguaia. Em verdade, o termo
adquire sentidos diversos ao longo do tempo, expressando com mais
propriedade uma identidade “ambígua e negociada”, resultante de interesses
nem sempre muito explícitos. Diz Albuquerque que a “identidade brasiguaia”
é “imprecisa e bastante mutável”.
Essa categoria pode ser atribuída: 1) ao imigrante pobre que foi
para o Paraguai, não conseguiu ascender socialmente e que,
muitas vezes, regressou ao Brasil; 2) aos grandes fazendeiros
brasileiros no Paraguai; 3) aos filhos dos imigrantes que
nasceram naquele país e têm a nacionalidade paraguaia; 4) aos
imigrantes e aos descendentes que já misturam a cultura brasileira
com elementos da cultura paraguaia; 5) a todos os imigrantes
brasileiros que vivem na nação vizinha. (ALBUQUERQUE, 2007,
p. 2).
No Paraguai, o termo pode adquirir um significado diferente,
referindo-se àqueles que usurparam terras aos “campesinos” paraguaios
pobres que devem lutar contra os brasiguaios ricos e invasores.
Há, também, os aspectos culturais, em especial a questão
lingüística, uma vez que na fronteira fala-se português, espanhol e guarani,
de onde decorre um vernáculo chamado de “portuñol” ou “portuguarañol”.
Não é possível ignorar, portanto, que os brasileiros imigrantes vivem a
cultura brasileira no ambiente familiar, mas se deparam com a presença da
cultura paraguaia na escola.
122
Ao se reportar à terceira geração de brasiguaios (brasileiros que
emigraram e se instalaram a partir dos anos 1970 em território paraguaio),
não se pode ignorar que os nascidos após essa imigração seriam cidadãos
paraguaios. No entanto, se forem filhos de brasileiros, serão reconhecidos
como brasileiros, mas, se forem filhos de pai brasileiro e mãe paraguaia, por
exemplo, não serão tidos como brasileiros puros.
Assim, o que se depreende é que a identidade “brasiguaia”,
embora negada com freqüência, é utilizada pelos próprios imigrantes, por
religiosos, intelectuais, políticos, jornalistas e pelo movimento camponês
paraguaio.
Sprandel (2002) refere que uma diferença significativa entre os
imigrantes brasileiros no Paraguai - os chamados brasiguaios - e aqueles
instalados em território Argentino os denominados brazucas, sendo este
último tratamento bastante pejorativo e jamais de “auto-atribuição”. Para ela,
o termo “brasiguaio” tem “sua origem nos processos coletivos de volta ao
Brasil e/ou de lutas por terras, sendo organizacional e emblemático”.
Finalmente, como ainda propõe Albuquerque (2007, p. 6), trata-se
de um termo “vivo”, ou seja, em constante redefinição na agregação de
novos sentidos. O termo “brasiguaio” sinaliza a identidade daquele “cidadão
que sintetiza a contraditória experiência de conflito e integração na zona de
fronteiras”.
A compreensão sobre as razões da elevada migração dos
brasileiros ao Paraguai, iniciada na década de 1970 até os nossos dias,
envolve o entendimento de uma identidade “múltipla e híbrida”, como
consequência deste processo.
Eis um grande desafio, considerando que se encontram na
terceira geração, como referido. Sabe-se que as redes sociais
institucionalizadas e estabelecidas prolongam a migração e as idas e vindas
permanecem como vínculos que não se rompem.
123
Tanto a estabilidade dos fluxos migratórios como a sua
continuidade são estimulados pelos laços entre os locais de origem e
destino. Fusco (1997) discute que:
O que ocorre é que não basta a aglomeração de pessoas no
destino para que existam os benefícios que facilitam e estimulam o
ingresso de pessoas num fluxo migratório. A formação de
comunidades no destino é uma condição necessária, mas não
suficiente. É preciso que se desenvolvam redes de relações
confiáveis unindo origem e destino, nos quais o migrante em
potencial possa se apoiar. [...] As regiões que mais atraem
migrantes são as que melhor disponibilizam os recursos
característicos das redes migratórias (FUSCO, 1997, p. 6 ).
[Grifo
nosso].
Mitchel
50
(1969, apud TORRESAN, 1995) conclama que os
indivíduos constituam os marcos de referência das redes sociais. Por
conseguinte, o indivíduo irá perceber-se na relação com outros indivíduos e
na relação consigo mesmo. Dessa percepção, formam-se redes sociais que
expressam a interação entre os membros, a qualidade dos laços de amizade
e/ou de desencontros entre os atores sociais, na perspectiva de um
aconchego adequado às ações de integração e de inserção social.
Para Bógus (2000, p. 11), a literatura (SALES, 1999; TILLY, 1990
e MARGOLIS, 1994, dentre outros) mostra “as redes sociais (de parentesco,
amizade e conhecimento), no âmbito das migrações, as quais possibilitam,
por intermédio dos vínculos estabelecidos entre a origem e o destino, a
deflagração e a manutenção dos fluxos”.
Para Castells (2002), “entende-se por identidade a fonte de
significado e experiência de um povo”.
Nas palavras de Calhoun
51
:
Não temos conhecimento de um povo que não tenha nomes,
idiomas ou culturas em que alguma forma de distinção entre o eu
e o outro, nós e eles, não seja estabelecida [...]. O auto-
conhecimento invariavelmente uma construção - não importa o
quanto possa parecer uma descoberta nunca está totalmente
50
MITCHEL, Clyde. “Preface” in Social Networks in Urban Situations: Analysis of Personal
Relationships in Central Africa Towns. Manchester: Manchester University Press, 1969.
51
CALHOUN, Craig (org.) (1949) in Castells (2002). Social Theory and the Politics of Identity.
Oxford: Blackwel.
124
dissociado da necessidade de ser conhecido, de modos
específicos, pelos outros (CALHOUN in CASTELLS, 2002, p. 22).
A identidade de atores sociais é o processo de construção de
significado, com base num atributo cultural. Pode haver sobreposição de
identidades, o que, ainda segundo Castells (2002), pode gerar tensões, tanto
naquilo que o ator diz de si mesmo (representação interna), quanto pela
representação social, o que não permite a confusão de “identidade” com o
“papel”.
Os papéis dependem de acordos e negociações entre indivíduos
ou instituições. Identidades, pelo contrário, são construídas pelo próprio ator
social, “num processo de individuaçãoe apropriação de um significado. A
identidade também pode ser atribuída por uma instituição dominante, desde
que o ator social a introjete, apropriando-se e atribuindo-se esse significado.
Aplicando esses conceitos aos brasiguaios, depara-se com
similaridades e disparidades de opinião. O termo “brasiguaios” para
Sprandel
52
(2000, in Zaar 2001) apareceu pela primeira vez quando um
grupo de brasileiros retornaram ao Brasil por volta de 1982:
Tal expresión, entretanto, no apareció en ningún documento o
noticía anterior al 14 de junio de 1985, cuando frente a la
divulgación de un Plan Nacional de Reforma Agrária en Brasil
más de mil famílias asi autoidentificadas volvieron masivamente
del Paraguay y armaron un inmenso campamento en la plaza
principal de la ciudad fronteriza de Mundo Novo (Mato Grosso do
Sul), reinvidicando tierras
(SPRANDEL, 2000, in ZAAR, 2001, p.
8).
Lendo essa citação, pode-se entender tratar-se de agricultores
“sem terra” de volta ao Brasil, para o meio de onde saíram. Esse termo
configura também uma personalidade reinvidicativa auto-assumida.
52
SPRANDEL, Marcia. In ZAAR (2001) Una identidad de frontera y sus transformaciones. In:
Collección Signo. Tradução Laura Abramzón. Buenos Aires: Ediciones Ciccus, setembro de 2000:
299-320.
125
Na linha da interpretação do tema como elemento de seletividade,
encontramos eco em Salim (1996) que afirma:
[...] colonos brasileiros, parcela importante dos imigrantes
constituiu-se de pessoas sem terra ou com acesso precário à
mesma, sofrendo, por isso, toda uma série de problemas, ou seja,
um contingente de deserdados, semelhante à dos camponeses
paraguaios, vítimas da ocupação (SALIM, 1996, p. 148).
E conclui, referindo-se aos pioneiros, devolvidos ao Mato Grosso
do Sul, o que delineia alguns traços do perfil, mas também a dramática
trajetória dos brasiguaios, diz:
Hoje, transcorridas mais de duas décadas da história migratória,
os brasiguaios, após terem expandido a fronteira e produzido
riquezas, são impedidos sob a omissão complacente dos governos
de ambos os países, de terem acesso à cidadania e aos direitos
sociais básicos (SALIM, 1996, p. 154-155).
Nessa perspectiva, Salim atesta que a situação dos brasiguaios
tende a piorar: trabalhadores rurais desempregados, tirando o sustendo do
mercado informal e com problemas de documentação: “em condição dúbia,
esses trabalhadores não são brasileiros, porque perderam os seus direitos,
nem paraguaios, porque não se incorporaram à sociedade paraguaia”.
Existe, hoje, fracassada, a fraca tentativa dos dois governos, um
Comitê de Repatriação dos Brasiguaios, com apoio de várias organizações
não governamentais.
Palau (2002), avaliando a região-alvo desta análise, classifica os
migrantes brasileiros em quatro categorias. A primeira é a representada pela
burguesia agrária no Brasil. São os que chegaram em 1970 em Alto Paraná,
Canandeyú e Itapúa. Geralmente têm acima de 100 hectares de terra e são
chamados “farmers” (conforme ilustração 7). Dentro deste grupo, inclui-se
uma faixa de médios/grandes empresários agrícolas, empenhados na
capitalização (compra-venda). Não é representativo em termos numérico,
mas pelo peso econômico. Um segundo grupo é constituído pelos
agricultores médios, com títulos de terra (20 a 100 hectares). O terceiro
grupo é o dos arrendatários, constituído por migrantes capitalizados, mas
sem títulos de terra. Fazem uma agricultura estritamente comercial.
126
O grupo dos “brasiguaios”, propriamente dito, compõe-se de
alguns grupos que são ocupantes de terra, mas sem título de propriedade;
outro grupo, com título provisório (muito frequente), trabalhando por
contratos verbais; finalmente o grupo dos assalariados agrícolas, sem terra e
sem contrato (bóias-frias) que parece ser o maior contingente. Em Palau
(2002), essa classificação parece mais simplificada, reduzida a três grupos,
como referido anteriormente.
Em consonância com a abordagem teórica realizada no capítulo
1, evidenciando a globalização como sinônimo de exclusão de alguns grupos
sociais, observa-se que isto ocorre no caso dos “brasiguaios”, na medida em
que se constata a precariedade e a exclusão presente no processo
migratório em estudo, à luz sobretudo dos avanços da globalização.
127
Ilustração 7 – Os latifúndios das fronteiras paraguaias até 1950
Fonte: según Area under forest in eastm Paraguay. C. 1975. Institute/Klein, 1947, in
Kleinpenning, 1992.
128
Segundo Patarra (2002), o termo “brasiguaio” passou a designar o
imigrante estrangeiro de origem brasileira, inserido no país mediante a
condição de pequeno proprietário agrícola (via de acesso ao país),
aculturado à sociedade receptora, sem perder os laços sócio-hereditários do
país de origem. Mais caracterizadamente, os “brasiguaios” se distinguem por
sua ligação com a terra (pequenos proprietários, arrendatários e outros
assalariados) ou com o grau de penetração no território: os que vivem perto
de Canindeyú e os que se fixaram nas áreas fronteiriças do Mato Grosso do
Sul, do lado brasileiro.
Esses atores são provenientes, na maioria das vezes, da
agricultura e do Estado do Paraná, mas não unicamente são provenientes
dessas situações. Zaar (2001) analisa:
A parcela dos agricultores paranaenses que emigraram em
direção à República do Paraguai, os quais se somaram aos
brasileiros que estavam se reproduzindo no País vizinho,
‘empurrados’ por um sistema que visava à modernização do Brasil
a qualquer preço (ZAAR, 2001, p.5).
O autor continua sua análise interpretativa dos fatos históricos, no
processo da migração dos brasileiros para o Paraguai, buscando os fatos
antecedentes a esse processo. Descendentes alemães e italianos radicados
no Rio Grande do Sul desde o século XIX foram atraídos a se deslocarem
para o Paraná. Durante o processo de colonização da área, por volta de
1960, o governo inaugurou políticas de incremento para a exportação e a
modernização da indústria, situação que se manteve a 1970, quando a
demanda internacional da soja caiu e o estímulo financeiro a então
oferecido, diminuiu. O agricultor tornava-se, então, um candidato em
potencial à emigração.
O Paraguai sofre (ou se beneficia?) com a questão da imigração
brasileira na região oriental, que se constitui, no mínimo, em uma alteração
na formação sociocultural e de etnia.
Todavia, os incrementos na
agroindústria levados pelos brasileiros ajudam, provavelmente, a impulsionar
também a economia do país.
129
Sendo assim, fez-se importante avaliar a relação concreta e
efetiva entre brasileiros e paraguaios, principalmente após o advento do
Mercosul, considerando as influências bilaterais nesse processo e
analisando se alterações e influências no processo econômico e social que
de fato aconteceram, com repercussões (ou não) no modo e na qualidade de
vida dos indivíduos dessas regiões, algo que não pode passar despercebido
na recente formação histórica Brasil/Paraguai.
3.2.1 V
olume do fluxo migratório brasileiro para o Paraguai
No contexto da ocupação da fronteira internacional do Mato
Grosso do Sul, em seu trecho fluvial aqüífero Guarani
53
tem-se uma
região considerada relativamente importante. A microrregião do Baixo
Pantanal era ocupada, segundo o Censo 2000, por uma população de
124.330 habitantes, cuja concentração é maior em algumas áreas urbanas.
Por outro lado, embora a linha de fronteira seja pouco ocupada,
de maneira geral, apresenta contrastes relativos muito fortes, cujas
situações opostas são representadas pelo lado paraguaio população
quase nula e pelo lado brasileiro, uma presença humana concentrada em
maior espaço urbano no trecho, Corumbá-Ladário.
O contingente de brasileiros residentes no Paraguai permanece
alto: em 1992 o Censo Nacional de Población y Viviendas desse ano
registrou a presença de 108.526 brasileiros; esse número cresceu
substancialmente, para 350.000 em 1996, segundo registro do Ministério de
Relações Exteriores do Brasil, preferencialmente para áreas metropolitanas.
53
GUIMARÃES, Luiz Ricardo. Tese de doutorado O Mercosul e os interesses na proteção da maior
reserva de água potável mundial O Projeto do Sistema Aqüífero Guarani: “O termo “aqüífero
Guarani” é uma denominação unificadora de diferentes formações geológicas que foi dada pelo
geólogo uruguaio Danilo Anton em homenagem à grande Nação Guarani, que habitava essa
região nos primórdios do período colonial. O aqüífero foi inicialmente denominado de aqüífero
gigante do Mercosul, por ocorrer nos quatro países participantes do referido acordo comercial”.
PUC – SP 2006.
130
Ciudad Del Leste passou a ser um endereço-alvo de atividades comerciais
paralelas e ilegais, como o contrabando e o tráfico de narcóticos, além do
turismo, dando origem à mescla populacional que passou a ser denominada
de “brasiguaios” que perfazem um total de 250 a 600 mil brasiguaios,
conforme Souchaud (2002).
En los años de 90 (1990) los brasileños del Paraguay conocidos
actualmente como brasiguayos, son entre 250.000 y 600.000
según las estimaciones más probables” [...]Apesar de los datos
del censo de población de 1992 que estableción la presencia
brasileña (primera y segunda generación) en 108.526 indivíduos,
parece posible evaluar el número de brasileños presentes en el
Paraguay, como mínimo en 500.000 (SOUCHAUD, 2002, p.152).
Chega-se, então, ao enfoque que se considera central deste
estudo, ou seja, busca-se uma interlocução com esse novo indivíduo, o
brasiguaio, para saber dele (ou deles) como chegou a essa situação, como a
vivencia e como constrói e define a sua própria identidade.
O próximo capítulo dedica-se a apresentar essa interlocução e
tirar dela as análises que se fazem possíveis, na perspectiva de contribuir de
forma mais efetiva e eficaz para a compreensão do fenômeno migratório, em
especial de brasileiros que buscam novas fronteiras para conduzir sua
existência e sua reprodução como pessoas, como grupo social, enfim como
cidadãos.
Assim, “o brasiguaio é a expressão de uma nova
contemporaneidade em que todos s deixamos de ser cidadãos nacionais
para sermos cidadãos do planeta, na grande aventura humana que a cada
dia mais devemos realizar”. (fala da Profª Drª Júlia A. S. Felgar, em
entrevista realizada em 02/08/2008).
Capítulo 4
A Força dos Laços que se Formam...
133
Os estudos étnicos da migração de Gabaccia (1992) trouxeram
importante contribuição no entendimento dos movimentos migratórios e das
redes sociais que se formam, quando o autor analisa o movimento migratório
das mulheres americanas e das mulheres que migram sozinhas. Esse
processo migratório que, apesar de ter surgido influenciado pelos
movimentos das lutas políticas, por volta dos anos de 1960, demonstra que
os estudos étnicos devem dar enfoque ao gênero, raça e classe numa
abordagem mais multidisciplinar para ampliar o entendimento desses
movimentos que Assis assim descreve:
Os estudos étnicos demonstraram que as velhas visões de
inevitável assimilação e de diminuição da influência da etnicidade
foram contestadas com uma nova visão de persistência dos laços
étnicos e de pluralismo na sociedade americana. Desta forma, a
economia familiar, laços familiares, e comunidades étnicas
passaram a ser vistas como fonte de persistência, de
solidariedade étnica e como uma estratégia de oposição contra a
discriminação e a marginalização. A partir da constatação de que
os grupos emigrantes se tornavam grupos étnicos e que, portanto,
as diferenças não estavam sendo diluídas e sim reafirmadas, o
conceito de etnicidade passaria a problematizar e instrumentalizar
análises sobre as permanências e rupturas das identidades no
contexto da migração. Desta forma, a etnicidade era vista como
uma fonte de solidariedade dentro do grupo migrante [...]
Yanagizako / Weinberg: 1992, p.5) demonstrou como as mulheres
da primeira e segunda geração de imigrantes japonesas,
centradas nas suas redes de parentesco, criaram novos formas
culturais e símbolos no contexto de migração. Neste contexto, a
migração, articulada pelas redes sociais, vai deixando também de
ser vista apenas como uma decisão racional de um indivíduo, mas
como estratégias de grupos familiares, de amizade ou de
vizinhança nas quais as mulheres têm uma importante
participação. Segundo Boyd (1989), as mulheres têm uma
importante participação nas redes sociais, uma vez que,
utilizando-se desta rede de informações, que indica no local de
destino: quem vai receber, como arranjar emprego, quem auxilia
nos primeiros momentos da chegada ao estrangeiro, as famílias
atenuam os riscos da migração de longa distância. Assim, tanto na
sociedade de destino como na sociedade de origem as mulheres
articulam e mantêm estas redes sociais: (ASSIS, 2000, p. 2)
54
.
Este tratamento foi constatado na migração dos brasileiros para o
Paraguai quando do incentivo e apoio das mulheres na busca de novas
oportunidades financeiras e sociais. Também ficou evidenciado quando da
54
ASSIS, Gláucia de Oliveira, 2000, p.2 - XXIV ENCONTRO NACIONAL DA ANPOCS, GT FAMÍLIA
E SOCIEDADE, RUPTURAS E PERMANÊNCIAS: A emigração de brasileiros para os EUA e as
transformações nas relações familiares e de gênero.
134
análise dessa migração no enfoque das redes sociais e na contribuição na
constituição dos grupos étnicos, pois estes são constituídos à medida que os
grupos migrantes se consolidam e, quase sempre, com o apoio e
participação das mulheres – na visão de que o migrante não é um ser
eremita que anda só. Para Assis
55
, o entendimento de o sujeito migrante
é ser um sujeito social:
[...] O enfoque que passou a analisar a migração a partir das redes
sociais no processo migratório contribuiu tanto para perceber a
constituição dos grupos étnicos, pois estes são constituídos à
medida que os grupos migrantes se consolidam, quanto para
analisar a migração numa perspectiva que reconheça o migrante
não como um sujeito sozinho que decide migrar, mas articulado
em relações sociais que envolvem relações familiares e de
gênero, e como aquelas que acompanhavam ou como aquelas
que esperavam por seus maridos ou filhos [...] A inserção no
mercado de trabalho, o aprendizado de uma nova língua, o
contato com outra cultura, a possibilidade de reconstruir suas
identidades, as modificações nas relações familiares provocadas
neste contexto sugerem a importância de um olhar que procure
perceber o processo migratório perpassado por nero (ASSIS,
2000, p. 10) [Grifo nosso].
As redes sociais no processo migratório contribuem
para questionar a imagem da migração como produto de um
cálculo racional, ressaltando a importância particularmente das
redes de parentesco, amizade e origem neste processo. No caso
das migrações de longa distância, quanto mais estabelecidas as
redes, mais chances têm o migrante no local de destino (ASSIS,
2000, p. 10).
Boyd (1989:655, in ASSIS, 2000, p. 10) salientou que
as redes sociais de laços pessoais representam somente um dos
muitos tipos de rede, tais como as políticas (militar, relações
internacionais), ou econômicas (trabalho, investimento
estrangeiro) entre as sociedades de origem e destino. O que a
autora está chamando de laços pessoais seriam as redes de
parentesco, amizade e origem comum (paisanaje
56
argumentando
que o estudo destas redes pode trazer um refinamento para a
análise das origens, persistência e declínio das redes sociais e
comparando a dinâmica das redes pessoais com outras redes.
Partindo desta perspectiva, para a autora as alterações recentes
dos fluxos migratórios, ao lado de suas implicações
macroeconômicas também: "representam a maturidade das
correntes migratórias estimuladas pelas redes sociais baseadas
55
Assis, Gláucia de Oliveira, Professora do departamento de Estudos Básicos / Universidade
Estadual do Estado de Santa Catarina, doutoranda em Ciências Sociais/Universidade Estadual de
Rupturas e Permanências: A emigração de brasileiros para os EUA e as transformações nas
relações familiares e de gênero. Campinas, 2000.
56
O termo paisanaje é a circunstância de ser de um mesmo país, duas ou mais pessoas e a relação
existente entre elas. Para Massey (1987, in Assis, 2000, p.11) é utilizado para indicar origem
comum, poderíamos chamar de conterrâneo, da mesma localidade, paisano.
135
em laços familiares e domésticos de amizade e comunitários.
Ligando migrantes e não migrantes em uma complexa teia de
relações sociais e interpessoais, tais redes conduzem informação,
assistência social e financeira. Elas também modelam os efeitos
da migração desde a o migração, a imigração, a migração de
retorno e a continuidade dos fluxos migratórios" (BOYD, 1989:
639, in ASSIS, 2000, p. 10).
A interação, o aprendizado e a convivência com a família e outros
grupos sociais locais acabam moldando muito das características pessoais,
formando assim, uma nova identidade social
57
- a dos brasiguaios, que neste
contexto estimula a manutenção deste grupo e é determinante para os
negócios, o emprego, a convivência social e familiar. O conceito de rede
social
58
se estabelece. Na fala da dona de casa entrevistada Elisa
percebemos exatamente esta situação (tanto de apoio aos laços que se
formam quanto à questão financeira), quando perguntado sobre as
perspectivas em relação ao país:
É uma coisa que eu acho que tem muito futuro, grandes
perspectivas. Dentre as pessoas que vieram pra cá, os imigrantes
daqui, talvez, alguns tenham vindo com aquela mentalidade de:
“Vou sugar o que eu puder”; mas é uma coisa difícil, porque você
acaba tendo os filhos, acabam fazendo vínculos de amizade,
vínculos carinhosos... Então você vai ficando... porque também, é
óbvio que, quando existe uma rentabilidade
, quando você está
feliz com aquilo que está conseguindo para você, é bom, não
adianta negar o óbvio. [Grifo da autora.]
As alterações do ambiente social podem alterar esta situação,
aumentando ou diminuindo as relações sociais, diante do surgimento de
novas necessidades/oportunidades, provocando um (des)equilíbrio e
determinando o grau de qualidade e intensidade nessas relações. Ocorre
também a ação dos vínculos estabelecidos, sejam eles: os colegas da
escola, os colegas de trabalho, a relação patrão-empregado. A observação
de Souchaud sobre esse processo fica clara no entendimento do valor
estratégico desta relação que se formou com a expansão dos brasileiros em
57
Identidade Social: conjunto de características individuais e pessoais, reconhecidas pela
comunidade que ela faz parte.
C:\wamp\redeviva\arquivos\2008\Palestras\Rio de Janeiro\Artigos\RedesSociaiseInteração.doc.
58
Rede Social “conjunto de relações interpessoais concretas que vinculam indivíduos a outros
indivíduos” – (BARNES, 1987).
136
terras do Paraguai, formando uma força social sem que haja atualmente a
intervenção do Estado: “A originalidade da intervenção da colonização
brasiguaia reside do fato de que ela é uma conquista pacífica de um vasto
território estrangeiro, levada a cabo por simples colonos, num movimento
espontâneo, sem ajuda ou planificação do Estado
59
”.
Nas entrevistas realizadas em janeiro de 2006, ficou claro esta
relação tênue com o Estado, na fala do entrevistado Mario, agricultor,
quando perguntado: Como que você percebe o Paraguai? Em termos de
cultura, de estudo, na política na economia? A resposta:
O Paraguai é um país economicamente estável, é um pais que
para quem trabalha, pra quem quiser trabalhar, fica mais fácil
aqui que em outros lugares. É um país que o imposto é bem
menor que em todos os outros lugares do mundo. Quanto à
política é a mesma, desde que eu estou aqui
60
. Primeiro era uma
ditadura com o Strossner, o partido colorado dominante; o partido
colorado domina até hoje, não teve grandes mudanças.
A vitória do “bispo dos pobres”, como o presidente Fernando Lugo
é chamado pela população local, deveu-se em grande parte aos votos dos
camponeses sem terra e apoiado pelo movimento popular Tekojoja
61
, para
59
SOUCHAUD, SYLVAIN in Espaço brasiguaio: novas práticas coloniais.
http://www.comciencia.br/reportagens/migacoes/migr10.htm. Acesso em 04/07/2008.
60
Em 20/04/2008 o ex-Bispo Fernando Armindo Lugo de Méndez (oposição), nascido em 30/05/1951
em San Solano, departamento de Itapúa, a 400 km ao sul de Assunção, Paraguai, filho de
Guillermo Lugo e Maximina Mendez Fleitas, empossado em 15/08/2008, desbancou o Partido
Colorado no poder a 61 anos. Líder da Alianza Patriótica para el Cambio - APC eleito com mais de
40,83% dos votos apurados, conforme o Tribunal Superior de Justiça Eleitora TSJE. Em 30 de
julho de 2008, o Núncio Apostólico em Assunção, D. Orlando Antonini, anunciou que o Papa Bento
XVI aceitou a renúncia do presidente eleito do Paraguai, Fernando Lugo. Em entrevista, informou
que o Bispo Fernando Lugo é agora considerado como leigo: “Hoje entreguei pessoalmente a Lugo
a carta na qual o Santo Padre aceita a renúncia, esclarecendo que a dispensa é perpétua. Ele não
poderá regressar à condição de clérigo”.
Fernando Lugo, 57 anos, venceu as eleições presidenciais à frente de uma coligação de oposição
ao Partido Colorado.
Internacional/AgênciaEcclesia/30/07/2008/15:57/672Caracteres/522/BentoXVI.
<http://www.agencia.ecclesia.pt/noticia_all.asp?noticiaid=62953&seccaoid=4&tipoid=217
>.Acesso
em 05/01/2008.
61
Movimento Popular Tekojoja - MPT termo guarani com o significado embasado na igualdade, ou
seja, “vida ou modo de vida igual”. Site oficial:
<http://www.tekojoja.org.py/v1/tekojoja.php?op=1
>. Acesso em 05/01/2009. Tekojoja vida, modo
de vida; joja, igual, idêntico, a la par. Vivir en igualdad., Una manera de ser juntos. Cada uno ser
uno mismo sin nadie por encima de otro y nadie por debajo: equidad. Igualdad de poder crear y
creer, igualdad de oportunidades, igualdad en respeto hacia los otros, sin ninguno pesa más ni
menos privilegio que el poseen los demás. Voluntad de ser justos. Ser en justicia. Compromiso de
compartir con solidaridad. Ser dando y recibiendo. Ser para aprender y ser para enseñar. Ser sin
egoísmo. Reciprocidad”. Period. Tekojoja, nº 1.
137
buscar a igualdade entre a população paraguaia. Muito diferente do que se
encontrou por lá, evidenciado no trecho do relato do entrevistado que é
possuidor de terras e que revela a grande desigualdade social que se
encontra instalada no Paraguai.
Existe, de fato existe, por parte dos paraguaios uma preocupação
em cultura para esse povo. Há escola em qualquer lugar, na
medida da economia deles. É um país pobre, mas eles não
deixam de dar educação. Existe um pouco de recurso na parte
médica, tudo muito limitado, como no Brasil, que é (também) tudo
muito limitado, as escolas públicas o fracas! Tudo que
depender de saúde pública é fraca! Mas, os impostos são muito
menores, então, é mais fácil para você, pois sobra recurso pra
você pagar um particular aqui, que é um pouquinho melhor. A
parte da política, da época que eu estou aqui até hoje, não
mudou grande coisa. Houve uma mudança com a caída do
presidente Strossner, mas ai vieram as eleições e continuou nisso
ai...
Na realidade as mudanças propostas pelo novo presidente
também estão sendo percebidas na comunidade brasiguaia, em nova
entrevista na data de 17/08/2008, menos de dois anos da primeira entrevista
realizada, o agricultor Mario quando em visita a São Paulo, declara ao ser
questionado sobre a assistência médica, social e privada, do Paraguai:
As pessoas pensam que nunca ficarão doentes. Com dinheiro
tem jeito. Com dinheiro sempre se tem jeito, tanto no Brasil como
lá – no Paraguai.
As propostas do novo governo são sentidas na questão política e
reflete no aumento da requisição e regularização da cidadania paraguaia.
Para o agricultor até na política no Brasil há a preocupação pela
regularização da documentação dos brasileiros. O seu depoimento reflete
esta preocupação:
A Prefeitura de Foz do Iguaçu criou a Secretaria de Assuntos
Internacionais, para melhorar o atendimento aos brasileiros
residentes no Paraguai, brasileiros residentes na Argentina (lá
também já são muitos brasileiros). No Paraguai, três meses
que estão acumulando as solicitações de brasileiros para
regularizar os documentos para naturalização, abandonando em
definitivo a cidadania brasileira, devido ao novo governo
empossando em 15/08/2008 e eleito em 20/04/2008, o Bispo
Fernando Lugo, derrubando o Partido Colorado no poder a 61
anos.
138
4.1 A DICOTOMIA DA XENOFOBIA
62
COM OS PROCESSOS
MIGRATÓRIOS - REFLEXOS PARA OS BRASIGUAIOS
A tão discutida e a mais americana de todas: a “Nova Ordem
Mundial” não deixa de ser uma releitura dos procedimentos mais antigos,
como os tratados de paz, de controle ambiental, de restrição à produção dos
armamentos bélicos, entre outros, é ameaçada a partir do momento que os
EUA não cumprem a sua parte, provocado também, por fatores que não
consegue controlar inteiramente, entre eles as questões étnicas dos países
árabes que vivem em conflitos religiosos-políticos-radicais; a questão do
poderio da China junto aos países asiáticos, a consolidação da comunidade
européia com suas leis cada vez mais restritivas aos produtos externos e
aos migrantes, com práticas xenófobas esquecendo-se que geraram
imigrantes para a colonização das Américas.
A discriminação racial, religiosa e econômica vai à contramão das
diversas religiões, que desde o início da Civilização, formaram a base da
Humanidade, entre elas, o maometismo, o catolicismo, o budismo, o
islamismo. Então se pergunta: Por que pregar o ódio entre os povos? Por
que criar leis que restringem a migração? Por que dificultar o livre trânsito
entre os povos? Ao invés de estimular a igualdade, a universalidade dos
territórios e o livre trânsito entre os povos?
Estes abismos, agravados por atitudes xenófobas, que trás esta
“Nova Ordem Mundial” em nome do temor da perda da identidade cultural e
social, deixando de lado a espiritualidade, reflete países do Terceiro
Mundo.
62
Xenofobia “é uma aversão apresentada diante do diferente, um medo excessivo, descontrolado, ao
desconhecido, tanto por pessoas quanto por objetos. É um termo utilizado também para se referir a
qualquer forma de preconceito, racial, grupal ou cultural. Porém pode causar polêmica sendo
confundida com preconceitos e vista como a origem dos mesmos. É importante ressaltar que a
xenofobia pode originar aversões que levam ao preconceito, embora nem todo preconceito seja
proveniente de uma fobia. O principal sintoma da xenofobia é o medo excessivo e desequilibrado
do desconhecido, é ocasionado por uma ansiedade provocada depois de um período em que a
pessoa é exposta a algum objeto ou pessoa desconhecida. Isso pode fazer com que a pessoa evite
situações de risco, temendo ter uma crise de pânico, influenciando diretamente na rotina, nos
relacionamentos e nas atividades sociais”.
http://mundoeducacao.uol.com.br/doencas/xenofobia.htm.
139
4.1.1 A crise econômica mundial de 2008 e ainda a questão da
xenofobia
A reportagem de Petry (2008), publicada pela Revista Veja, na
entrevista com Carlos Gutierrez, ministro do Comércio Americano, reflete a
questão da política migratória praticada pelos Estados Unidos nas ultimas
décadas, principalmente o rigor destas políticas em relação aos migrantes
latino-americanos. “O senhor acha que a crise está tornando os americanos
mais xenófagos”? A pergunta nos mostra o quanto a questão da xenofobia
está fazendo parte das questões migratórias.
Carlos Gutierrez enfatiza o desafio que é lidar com esta questão:
Isso é um desafio. Com o mercado financeiro enfrentando
problemas, o livre-comércio, a abertura, os investimentos
estrangeiros ficam mais importantes, e não menos.
Por isso, o
isolamento é tão perigoso. O desafio político é evitar um recuo. É
um desafio para nós e para o mundo.” [Grifo da autora] (PETRY,
2008, p. 21 – Revista Veja).
No editorial Panorama, da mesma revista (p. 62), uma
pequena nota: “PROIBIDA, a compra por estrangeiros de terras paraguaias
oriundas da reforma agrária realizada em 2004. A medida atinge os
agricultores brasileiros residentes no Paraguai, os brasiguaios, alvo de
ataques dos sem-terra naquele país”. Será que estes brasileiros têm plena
consciência do processo da xenofobia no qual estão expostos e são estes
trabalhadores que fazem parte dos indivíduos excluídos do processo de
seguridade social brasileiro? Este questionamento nos remete à análise do
contexto da América Latina na questão e gestão da seguridade social, que
segundo Soares (1999, p. 51-52, apud Silva, 2004, p.116-119), “a despeito
da grande diversidade de situações da política social latino-americana é
possível arrolar os problemas mais comuns, que apresenta de forma
resumida no quadro”, que inserimos a seguir e remete à realidade da
incapacidade dos sistemas políticos e da fragilidade dos trabalhadores.
140
Recorrer somente ao setor privado para encontrar soluções para
um tema de tanta magnitude e importância social como é a
cobertura da invalidez e da velhice de todos os cidadãos é uma
proposta irreal e recorrer somente ao Estado é uma experiência
conhecida que é necessário superar. (CONTE-GRAND, 1999, p.17
apud SILVA, 2004, p.133).
A manchete: Espanha limita emprego para estrangeiro, do
repórter Clóvis Rossi, traz dados oficiais dos brasileiros que exercem
trabalhos que os espanhóis não mais querem exercer, ou seja, profissões
que constam na lista oficial do “catálogo de ocupações de difícil
preenchimento”, são consideradas trabalhos árduos com baixa
remuneração
63
. São 454.717 brasileiros imigrantes com contratos assinados,
que trabalham na Espanha, período de janeiro de 2005 a julho de 2007. Esta
manchete não difere da publicada no Jornal da Tarde
64
sobre os
brasiguaios: Cresce ameaça aos ‘brasiguaios’, os camponeses ameaçam
invadir fazendas pertencentes a brasileiros e o governo Paraguaio aumenta
o contingente de policiais nas áreas rurais. A ameaça dos agricultores sem-
terra é contra a mecanização nas fazendas, principalmente no Departamento
de San Pedro (região central).
Outra reportagem da Revista do Mercosul
65
destaca o sentimento
nacionalista e até xenófobo dos paraguaios em relação aos brasileiros que lá
vivem e são chamados de ‘brasiguaios’:
Atraídos pela promessa de terra e oportunidades, milhares de
famílias brasileiras cruzaram a fronteira, nos últimos anos, para se
estabelecer no Paraguai. A presença desses ‘brasiguaios’, além
de levar um surto de crescimento econômico à região, provocou
um sentimento nacionalista e até xenófobo entre seus relutantes
anfitriões. A situação foi assunto de ampla reportagem no jornal
americano The New York Times, cujo interesse pelo Mercosul
63
Folha de São Paulo. Seção Cotidiano - Espanha limita emprego para estrangeiro: Governo diminui
em um terço lista de profissões que admite imigrantes; na maioria delas oferece baixa
remuneração. Em Madri, o trabalho é para os homens, na construção civil e, para as mulheres
como domésticas que dormem nas residências, os salários em euros é respectivamente €1.100 e
€900. Cotidiano 10 de outubro de 2008– C3.
64
Jornal da Tarde. Seção Radar – Paraguai: Cresce ameaça a ‘brasiguaios’: Camponeses ameaçam
invadir todas as fazendas de brasileiros. Assunção reforça policiamento. Radar 18 de outubro de
2008 -16 A.
65
Revista do Mercosul nº 74 ano 2001 na reportagem O drama dos brasiguaios: Brasileiros enfrentam
a xenofobia dos paraguaios.
<http://www2.uo.com.br/revistadomercosul/pesquisa-public/mercosul/mercosul_74>. Acesso em
17/05/06.
141
cresceu após as pressões do governo Bush para antecipar a
criação da Área de livre Comércio das Américas (ALCA).
Os paraguaios, segundo o jornal, reclamam que a identidade
nacional nas províncias está se diluindo por causa da
predominância dos estrangeiros que falam sua própria língua,
usam sua própria moeda, hasteiam sua própria bandeira e o os
donos das melhores terras. Outras queixas é que seus filhos
crescem falando português com segunda língua, em vez do
guarani. ‘Temos de proteger nossa identidade ou estaremos
perdidos como nação nessa onda de globalização e Mercosul’, diz
Adílio Ramírez López, diretor de uma escola (Revista MERCOSUL
nº 74, p.1 e 2).
O atual presidente do Paraguai, o ex-bispo católico Fernando
Lugo, prevê “uma reforma agrária total”, “respeitando a propriedade privada
e os investimentos estrangeiros no país”. “Mais de 100 mil brasileiros e
descendentes de brasileiros dedicam-se à agropecuária, principalmente nas
regiões de fronteira”, consta na reportagem do Jornal da Tarde.
No seminário do Centro de Estudos de Cultura Contemporânea,
em 30 de setembro de 2008, presentes os paraguaios Ricardo Canese
66
e
Gustavo Codas
67
, além da Delegação da Associação Paraguaios Residentes
em São Paulo deixam clara a questão da xenofobia, não somente pela ação
dos sem-terra contra os brasiguaios, como descrito acima, mas também,
diante da questão de Itaipu
68
.
A questão racial
69
forma outra fonte de atrito, os nativos
possuem características e descendência indígena, os brasileiros
66
Ricardo Canese: Parlamentar paraguaio do Parlasul, coordenador da Comissão governamental
paraguaia para a renegociação de Itaipu.
67
Gustavo Codas: Assessor do chanceler Alejandro Hamed, “enlace” entre o Ministério de Relações
Exteriores e a Comissão paraguaia de renegociação de Itaipu.
68
Itaipu em 22 de junho de 1966, foi assinada a Ata do Iguaçu, como resultado de intensas
negociações, pelos ministros das Relações Exteriores do Brasil Juracy Magalhães, e do Paraguai,
Sapena Pastor. A declaração conjunta manifestava a disposição de estudar o aproveitamento dos
recursos hidráulicos pertencentes em condomínio aos dois países, no trecho do Rio Paraná
“desde inclusive o Salto de Sete Quedas até a foz do Rio Iguaçu”.
Itaipu uma opção ao petróleo. No ano de 1973 quando da assinatura do Tratado de Itaipu,
coincide com a crise mundial provocada pelo petróleo e a intensificação da busca de novas
energias, esta opção tanto para o Brasil como para o Paraguai foi a forma de assegurar um
desenvolvimento sustentável e vigoroso. Torna-se o marco no setor hidroelétrico para os dois
países: o Brasil praticamente dobra a sua capacidade de 16,7 mil megawatts com mais 14 mil
megawatts, o Paraguai tinha apenas uma usina de pequeno porte de Icaray. Em 2004, com 20
anos a Binacional Itaipu gerou energia para abastecer o mundo por 36 dias.
http://www.itaipu.gov.br/?q=node/356 acesso em 26/12/2008.
69
Ver LEITE, Cristine Marques de Rezende Dias. Brasil – Argentina: Migrações e Integração
Regional. PUC-SP, 2002, p.13. (dissertação de mestrado) Quem é o principal grupo migratório
142
considerados ‘brasiguaios’, na sua maioria, possuem olhos azuis e pele
clara, conforme divulgado pelo censo da Igreja Católica realizado vinte
anos.
A migração internacional na América Latina cresceu
gradativamente, bem como a emigração dos brasileiros. Conforme dados do
Itamaraty apontam que em 1990 cerca de 300 mil brasileiros viviam no
exterior; em 2002 eram aproximadamente 2,5 milhões de emigrados.
4.1.2 Quadro dos principais problemas das políticas sociais da
América Latina
Devo acrescentar que os procedimentos metodológicos aplicados
neste estudo foram referendados e embasados nas diversas literaturas que
versam sobre a migração; nos movimentos de idas e vindas, entre os
autores teóricos da história oral, dos estudos das etnias e dos estudos da
rede social e dos resultados das pesquisas qualitativas.
Nesses procedimentos verificamos que as dificuldades e alguns
problemas são comuns entre os povos da América Latina e apresentamos a
seguir, em formato de quadro-resumo, esses principais problemas que
refletem na escolha do movimento migratório.
no Paraguai? “A migração limítrofe na Argentina está diretamente relacionada ao crescimento da
demanda por mão de obra, ocasionado pela expansão da economia Argentina, e à política e
economia dos países fronteiriços. Em relação a este ultimo fator, podemos citar a Guerra Civil do
Paraguai e os adventos dos regimes autoritários no Uruguai e no Chile da década de 70 (1970)
como conjunturas particulares que resultaram no incremento significativo do movimento
migratório” [...]. “A persistência desta migração, verificada atualmente, pode ser compreendida
ainda pela manutenção dos fatores de expulsão populacional nestes países, tais como a falta de
demanda de trabalho em seus mercados, os baixos salários, a precariedade de condições de vida
e os conflitos sociais”.
143
Quadro 1 - Problemas da política social na América Latina
Aspectos
financeiros
Contribuições regressivas.
Opacidade ou transparência do gasto social controle
sobre o gasto.
Financiamento regressivo ou progressivo.
Cálculo de custos.
Problemas de
impacto
redistributivo
Não-cumprimento da vocação de universalidade.
Polarizações regionais do gasto social.
Desatenção com setores pobres da população.
Concentração de subsídios em grupos privilegiados
(efeitos regressivos).
Filtrações do gasto para setores que não são o objetivo.
Aspectos
administrativos
e institucionais
Ausência de trajetória orgânica, coordenada e coerente
das políticas.
Tradicionalismo, inércia e descontinuidade.
Competição entre as diversas instituições da política
social.
Fragmentação, superposição, duplicidade.
Objetivos das
políticas
Contradição entre perspectivas de solidariedade e
diretrizes de cálculos diferenciais de serviços.
Contradição entre intervenções setoriais e busca de
globalidade.
Ausência de diretrizes nacionais para as políticas.
Indefinição dos problemas, sua natureza e dimensão.
Aspectos
políticos
Participação cidadã e da burocracia nas decisões.
Clientelismo e privilégios versus universalidade e
seletividade progressiva.
Corporativismo em diversos níveis.
Debilidade da base social de apoio às políticas devido
ao conflito distributivo e à crise fiscal.
Regimes políticos não democráticos.
Insatisfação dos usuários com os serviços.
Pressões externas para a redução do espaço de ação
estatal.
Qualidade de
serviços
Inadequação em fase do crescimento da população.
Baixa eficiência da cobertura.
Inadequação às necessidades.
Baixos rendimentos.
Segmentação com acesso desigual e diversidade de
prestações em detrimento dos politicamente mais
fracos.
Influências corporativas.
Eficácia e
eficiência dos
serviços e do
gasto social
Custos administrativos excessivos.
Baixa produtividade do investimento.
Corrupção na administração dos fundos.
144
Efeitos
negativos da
política
econômica
sobre o social
Mecanismos regressivos da política econômica.
Redução inadequada do gasto social.
Redução da receita devido a contrações no emprego.
Pressões sobre o gasto para atender a setores que não
podem satisfazer suas necessidades devido a fatores de
distribuição de renda.
Efeitos regressivos da política econômica na estrutura
da receita.
Inadequada participação de diversos grupos sociais no
financiamento do gasto social.
Efeitos
negativos da
estrutura
econômica
sobre a
política social
Excessiva concentração dos ativos com repercussões
na pobreza estrutural.
Estrutura concentrada da renda.
Fonte: SILVA ( 2004, p.118-119) - Quadro preparado pela autora, baseada no modelo da
fonte.
A partir desse quadro que a nosso ver mapeia as condições
subjacentes aos processos migratórios na América Latina, passaremos no
capítulo 5 a analisar algumas situações concretas a partir de depoimentos
dos entrevistados no Paraguai.
Capítulo 5
O Depoimento dos Entrevistados
147
Datas.
Datas. Mas o que são datas?
Datas são pontas de iceberg.
O navegador que singra a imensidão
bendiz a presença dessas pontas emersas,
sólidos geométricos, cubos e cilindros de gelo
visíveis a olho nu e a grandes distâncias.
(BOSI, 1992, p. 19).
Na questão da apologia do tempo e das datas na história, Delgado
(2002, p.1) nos trás a discussão de quanto o tempo é abstrato e ao mesmo
tempo concreto. Os estudos sobre o movimento migratório apresentam as
mudanças nos padrões estabelecidos da população migratória, com intuito
de apreender o processo de fixação da população do país anfitrião.
Massey (1987) e Piore (1979) afirmam que “muitos migrantes tendem
a fixar residência no país que os recebe porque, decorrido algum tempo,
começam a desenvolver vínculos com o novo lugar e a aspirar por melhores
condições de trabalho”.
Porém, não é tarefa simples, fatores econômicos são preponderantes
para a sua permanência, formando-se um ciclo de eventos que Piore (1979)
chama de “ciclo de fixação do imigrante no país anfitrião”. O modelo de
imigrante apresentado pelo autor tem dois elementos em mente:
primeiramente estadia temporária e segundo levantar recursos para retornar.
O que difere do perfil dos brasileiros entrevistados no Paraguai: eles buscam
encontrar não somente estabilidade financeira, mas a permanência
definitiva, conforme se destaca na fala do entrevistado Saul (Administrador
de Companhia de Seguros, casado, reside em zona urbana, chegada em
1998).
[...] o paraguaio - o povo paraguaio é um povo amistoso, tem uma
sensibilidade muito grande, é um povo muito carente em questão
de educação, de distribuição de renda, principalmente, e isso faz
com que seja um povo muito explorado, é um povo lutador. Eu
vejo o Paraguai como um país pequeno e com riquezas naturais
muito grandes. Vejo um país que tem possibilidades de melhorar,
é só uma questão de um investimento maior na área de educação
e, um pouco de câmbio (mudança) de mentalidade do povo. Para
148
que possa ocorrer a mudança. Mas eu vejo o Paraguai como um
país de futuro.
[...] o Brasil tem mais condições de me oferecer uma melhor vida
social e de educação, de saúde até de segurança. A
desvantagem é que é um país bastante competitivo na área
profissional, está mais avançado, as oportunidades existem,
mas já são mais difíceis de alcançar.
A residente Elisa, migrante há mais tempo, relata sua trajetória e as
dificuldades enfrentadas, uma história de vida com sentimento de vitória
conquistada pouco a pouco. (dona de casa, casada, zona urbana e rural,
chegada em 1975),
[...] faz trinta anos que nós estamos no Paraguai, não faz trinta
anos que nós dependemos do Paraguai, mas faz trinta anos que
nós já estamos aqui. Quando deixou de ser uma brincadeira e
passou a ser verdade, você tem que se dedicar. Lógico que não é
fácil, é um outro país, são outros costumes, as coisas são muito
mais precárias. Trinta anos atrás as estradas não existiam, não
existia luz, não existia telefone, não existia luz elétrica, não existia
[...] absolutamente nada e, por outro lado, hoje a gente vê o
quanto foi conseguido. É até aquela criança que cresceu bem.
Aquela menina dos olhos que recebeu alimento, que enfim, foi
desenvolvida e que hoje tem frutos [...] Aquela coisa gostosa que
a gente começa a colher.
Estas dificuldades são relatadas também por Zica (boiadeiro, casado,
zona rural, chegado em 1975).
Eu vim com os pais e, quando nós entramos aqui era difícil. Era
tudo mato. Não tinha estudo, por isso que eu não estudei, não
tenho estudo, gostaria muito de ter estudado, mas não deu [...] na
época que nós entramos aqui, era tudo mata, foi sofrido. Você
tinha que carregar a mercadoria pra comer por 14 km (e carregar)
nas costas, não era fácil. Mas agora, de um tempo pra foi
mudando [...] mudando [...] está mais fácil.
[ ] Eles vieram na época que meu pai trabalhava e trazia
mercadoria da Argentina. Daí começou a enfraquecer (o
comércio) e tinha gente, que era o compadre dele, que morava
aqui e falou: Lá (o Paraguai)
é bom, você vai fazer a vida, vende
o que você tem aqui e vai pra lá! Daí o pai vendeu e viemos, e daí
ele não pode comprar a terra. O dinheiro que ele trouxe dava pra
comprar, mas daí começou a mexer com doença (as crianças
adoeceram). Tudo era mato, nós todos pequenos, nós éramos
oito crianças; o maior tinha 12 anos, daí um irmão meu adoeceu,
ficou aqui oito dias, não tinha recurso pra levar 60 km de estrada
de chão, embaixo de chuva. Quando ele conseguiu levar, chegou
lá e internou na Santa Casa, mas ele faleceu. Internou às 5 horas
e às 11 da noite faleceu. Era difícil, depois uma outra irmã minha
também foi picada de cobra, meu pai gastou bastante, um irmão
149
meu, o mais velho, que mora no Paranambu teve também
problema de amarelão, teve que ser levado para Argentina. O pai
gastou tudo e ele não conseguiu comprar a terra. Era uma época
bem difícil quando aqui nós entramos. Hoje o modo de viver é
muito melhor! É outra vida!
Os brasileiros que migraram a partir dos anos de 1990 encontraram
uma situação mais favorável. A entrevistada Geni (estudante, superior
incompleto, casada, zona urbana, chegada em 1998) relata, quando
questionada sobre a situação financeira e a possibilidade de um retorno:
Pelo trabalho e pela situação financeira dificilmente a gente vai
ter, digamos, o que o meu marido conseguiu aqui em cinco anos:
posição, cargo, conhecimento. No Brasil demoraria muito mais e
não sei se isto estaria acontecendo [...] Digamos na função que
ele ocupa hoje, não sei se em pouco tempo (5 anos) ele estaria.
Acho bem difícil. Aqui já tem certa concorrência, mas não é igual
ao do Brasil.
O modelo de imigrante descoberto nas entrevistas foge ao modelo do
“homem econômico”, que migra somente para estabilidade financeira e
remeter recursos para o Brasil. O modelo de imigrante entrevistado é um
migrante que busca fixar definitivamente suas raízes no Paraguai,
considerando-o sua segunda pátria. Esta situação ficou clara na resposta à
pergunta: Você pretende voltar ao Brasil algum dia para morar?
Mario (agricultor, advogado, casado, zona urbano-rural, proveniente
de São Paulo, desde 1975) responde:
Sair do Paraguai para trabalhar em outro lugar eu não vou!
Pretendo continuar, na parte de trabalho, na parte de ganhar
dinheiro eu nunca mais saio daqui!
Celso (analista de grão, 3º ano de escola, casado, zona urbana,
proveniente de Altamira PR, chegada em 1979) relata, quando
questionado sobre seu futuro:
O que eu acho é que o sonho de todo mundo que as coisas
melhorem. Como eu disse antes, a partir do momento que o país,
o Paraguai, começar a pensar mais no país deles, eu acho que
vai ter uma grande chance de melhoria aqui dentro, não para
os brasiguaios, mas também para os outros.
150
Geni (estudante, superior incompleto, casada, zona urbana, chegada
em 1998) já comenta que retornaria, se possível, para Londrina.
Eu tenho vontade sim. Digamos [...] voltar para Foz pra mim não
faz diferença. Já falei, pra mim está bom aqui, mas é uma
vontade que eu tenho! Até meu marido fala: se for pra voltar ao
Brasil algum dia, a gente volta para Londrina, que é um lugar que
a gente gosta, mas, eu acho um pouco difícil; pelo menos a curto
prazo, eu não vejo a gente saindo do Paraguai.
Com o sétimo entrevistado, Mario (agricultor, advogado, casado, zona
urbana e rural, proveniente de São Paulo, desde 1975), também se percebe
a vontade de permanência no Paraguai, na resposta à pergunta: O que você
pretende fazer nos
próximos cinco anos?
Nos próximos cinco anos a perspectiva é de um dia, não sei se
em cinco, se em oito ou em 10 nos, mas um dia eu reduzir o meu
ritmo de trabalho. Aos poucos ir deixando para alguém ficar no
meu lugar...
O sentimento de ficar residente para sempre no Paraguai – pelo
menos no médio prazo é também transmitido por Saul (Administrador de
Companhia de Seguros, casado, reside em zona urbana, chegada em 1998).
... a curto prazo, o que eu penso é seguir trabalhando no
Paraguai. Tenho intenção de fazer uma pós-graduação esse ano,
na área de finanças, para poder crescer profissionalmente. Estou
fazendo pequenos investimentos na medida do possível, aqui no
próprio Paraguai. A nossa moeda, hoje já não está tão forte e, por
isso, tenho que pensar bem o que eu vou fazer, no que eu vou
investir. Mas, a longo prazo é muito difícil dizer, por que a curto e
a médio prazo, seguirei investindo no Paraguai, seguirei
trabalhando aqui e o amanhã a Deus pertence!
Na realidade, as fracas restrições alfandegárias e a livre circulação de
pessoas no âmbito do Mercosul, promovem o trânsito de pessoas nesta
região, tornando-os binacionais, e os brasiguaios constituem o caso mais
lembrado e citado nos estudos sobre migração da América Latina. É notório
que o trânsito fronteiriço de trabalhadores entre o Brasil e Paraguai foi
motivado pela zona rural (acesso fácil às terras), mas também provocado
pela instabilidade política e econômica brasileira nas décadas de 1970-1980,
o que motiva a vontade dos entrevistados em permanecerem no Paraguai.
151
Baeninger (2000) discute os aspectos da migração intra-regional no
processo de integração do Mercosul, que embora não é fenômeno recente,
mas é crescente a partir de 1980 e pode ser explicado pelas intensas
transformações ocorridas nos países do Mercosul, citando: a
redemocratização, as aproximações políticas e comerciais, as crescentes
desigualdades sociais e econômicas entre Estados, entre os fatores que
colaboraram para a “intensificação de movimentos populacionais de e para
países da região” (BAENINGER, 2001, p. 304), este incremento migratório
regional é apresentado na tabela a seguir:
Quadro 2 - Estoques de emigrantes intra-regionais no Mercosul –
1970/1990 – Emigrantes internacionais intra-regionais
Países 1970 1980 1990
Argentina 63.653 89.640 99.570
Brasil 97.191 152.257 154.546
Paraguai 251.668 278.430 271.660
Uruguai 72.645 133.273 158.823
Mercosul 485.157 653.600 684.569
Fonte: BAENINGER (2001, p. 304)
A questão da “oportunidade” também aparece, o Paraguai é o país
considerado maior “expulsor populacional” é também o de maior atração
para muitos dos emigrantes do Mercosul e apresenta incremento de 30.000
emigrantes em 30 anos, diante das oportunidades que apresentou e
apresenta. O Paraguai apresenta a posição de maior colônia brasileira na
América Latina, aproximadamente 600 mil, conforme relato do agricultor
entrevistado Mario.
A estudante entrevistada, Geni, define muito bem a questão da
oportunidade que o Paraguai apresenta que, aliada ao melhor nível de
152
escolaridade dos brasileiros, permite que acabem ocupando as melhores
vagas nos setores de serviços e setores primários da economia (agricultura):
[...]. e nós brasileiros aqui, que temos alguma formação - um nível
superior - digamos de escolaridade, temos mais oportunidades
que os próprios paraguaios.
Celso (analista de grão, 3º ano de escola, casado, zona urbana,
proveniente de Altamira – PR, chegada em 1979) declara:
Hoje, para mim, a vantagem de eu estar no Paraguai é devida
àquela parte do estudo. Por isso, se fosse para estar no Brasil,
qualquer servicinho ia exigir muito estudo de mim e, eu não tenho
muito estudo. Então, aqui mais chance de achar um emprego
melhor, ganhar um salário até razoável e lá tem muita gente
estudada. Estão competindo com os empreguinhos que
aparecem.
A presença brasileira no Paraguai representa um fenômeno de
consequências importantes para a dinâmica econômica e social: o que se
iniciou como agricultura e terras, transformaram-se em importante mola
propulsora da economia paraguaia. Neste sentido, a presença dos
brasileiros ou dos brasiguaios pode ser considerada benéfica, arriscamos a
compará-la ao papel dos japoneses – no desenvolvimento agrícola da região
de São Paulo. (Celso, analista de grão, ano de escola, casado, zona
urbana, proveniente de Altamira – PR, chegada em 1979) diz:
Primeiro a gente tem morado perto de uma família a gente
procurou seguir bem perto, o vizinho. (modelo) Eles se
preocupam muito com a família, a educação, o filho tem que
respeitar o pai, uma coisa que eu gosto muito daqui. Até no
colégio isso acontece, o filho tem que respeitar ao pai, tem que
obedecer e, na escola é obrigado a obedecer ao professor, é um
ponto muito importante. [...] Eu acho que aqui, no Paraguai, nós
temos nosso amor. É isso ai, porque no Brasil, o professor não
tem voz ativa com os alunos, os alunos deitam e rolam com a
professora. [...] A madrinha da minha esposa é uma professora e
ela reclamou isso pra nós. Ela não tem o direito de repreender um
aluno, (dentro da escola), que ele vai denunciá-la e, tudo vai
contra ela sozinha. Aqui não! Aqui o professor tem o direito de
educar. A disciplina aqui é muito legal, muito boa, ótima, a
disciplina é boa.
Com os pés nos dois países, muitos dos brasileiros que vivem em
Ciudad del Este e região não cortaram os laços com o Brasil. Aqueles que
vivem nas regiões próximas à fronteira, tanto no lado brasileiro como no lado
153
paraguaio, muitas vezes alternam períodos de residências em um ou outro
país, vivendo constantemente em trânsito na Ponte da Amizade. Perguntado
a Geni se Santa Rita é no Paraguai ela responde:
É Paraguai. Mais uma cidade daqui do Paraguai. Porque meu
marido trabalhava lá, e d a gente casou e [...] eu poderia ter
ficado morando em Foz e ele
; que eu o quis, por pior que
fosse, eu queria estar junto. Isso foi uma decisão nossa, porque
ou ele ficaria lá, ou [...] Porque a gente fez uma experiência no
princípio do casamento: ele voltaria pro Brasil (que no principio foi
essa a idéia) por isso que a gente casou, a gente ia morar em
Foz, que as coisas tomaram outros rumos e nós ficamos
[...] Mas a vida aqui como brasileira e como brasiguaia [...] para
mim [...] me sinto brasileira aqui, pra mim [...] eu moro aqui em
Ciudad del Este. Para mim é muito bom. Para mim não faz
diferença entre morar aqui ou em morar em Foz. Vou pra Foz. É
[...] É aquela coisa, eu cresci em Foz, então médico, dentista,
ginecologista, tudo é lá. [Grifos nossos].
Os residentes na região de fronteira com o Brasil-Paraguai mantêm
esta relação estreita e permanente com o Brasil, como trabalhadores que
transitam diariamente pela Ponte da Amizade ou como usuários dos serviços
públicos e de saúde de melhor qualidade que o Brasil oferece e grande
carência no Paraguai: as vantagens e desvantagens entre os dois países
ficaram claro na fala de Celso e da Elisa, administrador e dona de casa
respectivamente:
[...] O Paraguai apesar da deficiência em saúde, educação, o que
quer que seja, é um país que me oferece melhor opção em
crescimento profissional Essas eu diria que são as vantagens de
um e de outro.
[...] não tem, é uma coisa que depois de ter sido aniquilado (o
país). trinta anos que eu estou aqui, agora que recentemente
que nós temos água, luz, telefone. A internet ainda não chegou,
não tem linha baixa, então é tudo muito mais difícil, tudo é muito
mais complicado. As estradas ainda são todas sem asfalto, é
assim... Foi um país que começou muito tempo depois do que o
nosso país. Então ele caminha muito mais devagar, porque ele
tem menos tempo, é um país ainda mais infantil. [Grifo nosso].
A região apresenta um contexto sócio-cultural específico e
interessante, alguns transferem as atividades para o Paraguai simplesmente
porque se cansam de transitar pela Ponte da Amizade e após manterem a
“dupla residência” por bom tempo, são considerados “transmigrantes”:
“sujeitos das novas formas de mobilidade que se desenvolvem nas regiões
154
de fronteira que forma os espaços binacionais” (VICHICH, 1997).
Trabalhadores que moram em um país e possuem a atividade econômica
em outro país, circulam livremente pela fronteira Brasil-Paraguai.
A intensidade desta movimentação é motivada pela demanda de
mão-de-obra especializada e não pela demanda por trabalhadores rurais,
também pela oferta de vagas para atender aos bancos, lojas e restaurantes.
O crescimento econômico provocado pela exportação de soja, provoca
crescimento nas atividades de serviços. O comércio é um dos principais
setores da economia paraguaia e emprega grande mão-de-obra de
brasileiros que cruzam a fronteira diariamente, atraídos por salários em
dólares e livre de imposto de renda.
Como todo imigrante, qualquer que seja o motivo da imigração e em
qualquer parte do mundo que vá, a saudade é um fator que pesa muito. Este
sentimento é citado ou demonstrado. Não se trata apenas de saudade dos
que ficaram no Brasil, mas também das coisas que no Brasil tem, dos
lugares e dos costumes - como passar férias na praia ou pescar,
entretenimento e relacionamento, alimentação ou religião.
Saul (Administrador Companhia de Seguros, casado, zona urbana,
chegada em 1998, paraguaio naturalizado)
Por eu morar numa Tríplice Fronteira, não tenho grandes planos,
porque aqui nós somos três países, Ciudad del Este, Foz do
Iguaçu, Porto Iguaçu. Temos opções bem variadas de
entretenimento, de relacionamento com pessoas, de amizades,
de outras culturas. O Brasil sim, oferece mais isso. O Brasil
oferece mais, mas no Paraguai também é muito bom. Você tem
ótimo relacionamento com as pessoas e é muito bom viver aqui.
Zica (boiadeiro, casado, zona rural, católico, chegada com 8 ou 9
anos - 1973, documentação ilegal)
A alimentação é um pouco diferente dos brasileiros e dos
paraguaios legítimos. Eu já trabalhei com os paraguaios, por 12
anos eu gosto. Mas têm muitos (brasileiros), dependendo do
lugar que trabalham, não vão se adaptar. Não se adapta o
brasileiro quando vem de lá. Se adaptar com a comida, quando
se trabalha com o patrão paraguaio - é difícil.
155
O círculo de amizade fica mais restrito aos brasileiros – como é
observado na fala de Mario (agricultor, advogado, casado, zona urbana e
rural, proveniente de São Paulo, desde 1975):
Sim, temos nosso lazer, fazemos nossas festas, tem muito
brasileiro. Juntamos um dia na casa de um, um dia na casa de
outro. Antigamente eu gostava de pescar, hoje não gosto mais,
tem o rio pertinho. O clima no verão é propicio às festas. O
inverno é mais rigoroso, no inverno todo mundo fica em casa,
mas, como no Brasil, como era nossa vida no Brasil.
Elisa (dona de casa, Superior completo, casada, zona urbana e rural,
proveniente de São Paulo, chegada há 30 anos, documentação legal).
O Brasil por ser já mais antigo, então ele te oferece melhores
oportunidades de conforto, turismo de cultura, de lazer. Essas
coisas você tem, inclusive existe até um passado maior, se você
quiser visitar um museu, vários, você tem.
A minha vida sempre é boa, não posso reclamar de nada, a
minha vida era boa lá, a minha vida é boa aqui, e isso depende
de muitas circunstâncias. Mas é importante que a gente saiba
fazer com que a vida também seja boa. Então lá, eu fiz uma boa
faculdade, trabalhava, vivia bem, super bem, luxo e riqueza e ai
casei. Tivemos as meninas e, viemos para cá, então vim como
companheira de uma idéia, que eu também, lógico, achei que
fosse dar certo, então vamos desenvolver, vamos fazer, vamos
construir uma outra coisa. Meu marido era um advogado muito
bem sucedido, ótimo, muito tranqüilo. tínhamos propriedades,
tínhamos enfim uma vida legal, ai ele largou tudo, abandonou
tudo por um sonho, por uma terra, por um ideal, no qual se
continua investindo até hoje. Lógico, várias realizações
aconteceram nesse tempo, muito mais do que desilusões.
[...] era bem pouco tempo, todo ano eu escutava uma frase, que
na época muito me alegrava: Que era mais um ano! Que no
fim daquele próximo ano ai nós retornaríamos a nossa vida de
antigamente, ou seja, uma vida de São Paulo, uma vida onde o
lazer era bom, onde a cultura era bem superior, enfim, onde a
vida sócio-econômica é muito disputada, muito boa. E as
coisas foram mudando e cada ano nós continuávamos aqui, mais
afundados aqui, e no fundo, não sei se a palavra seria
“apaixonado” exatamente, mas impossível quase de se
desvencilhar e se desvincular daqui. Então...
Quando perguntado sobre as férias
O mundo é muito grande, as minhas férias não coincidem com as
férias normais de ninguém, então onde houver uma condição de
um lazer agradável eu vou desfrutá-lo, aqui ou lá, ou pode ser na
Europa, nos Estados Unidos, onde eu puder ir eu vou, mas aqui
também. Já tive férias aqui, conheci um lugar que eu me encantei
o famoso Chaco”, que eu achava que fosse o fim do mundo,
156
mais muito além do fim do mundo! E foi para mim uma surpresa
extremamente agradável. É um lugar que é o fim do mundo, mas
a civilização é fantástica! É uma cidade colonizada por Menonitas
e de eles fizeram uma jóia, uma preciosidade. Vale a pena
conhecer. Foram umas férias muito gratificantes, aqui no
Paraguai.
Finalmente, uma declaração de reconhecimento da alegria do povo
paraguaio, que sem dúvida contribui é também um dos fatores de
permanência destes brasiguaios no Paraguai, relatada pela dona de casa
Elisa;
Um país excelente, eles adoram, eles estão na pátria deles,
perfeito, para eles muito bom, lógico. Eles tiveram problemas,
passaram por dificuldades terríveis, foi um país praticamente
dizimado por uma guerra que durou muito tempo, mas eles são
patrióticos, eles são felizes. Realmente é um povo feliz, é um
povo feliz, eles não se queixam das agruras da vida deles.
Todos os entrevistados mantêm contato permanente com o Brasil,
dado o próprio ambiente de trabalho que congrega outros brasileiros, e o
principal produto da produção (a soja) que é escoado pelo porto no Brasil
para a China.
O circulo da integração desta comunidade brasileira se amplia, pois
assistem a televisão brasileira, acompanham a programação dos canais
Globo, SBT e Record, além dos que residem na área urbana e assistem a
programação da Globosat via satélite. São imigrantes atualizados nos
assuntos internos do Brasil, acompanham os movimentos políticos, os
problemas de segurança e os principais eventos. Desta forma, promovem
também a aculturação do paraguaio aos costumes brasileiros, como se vê
com o uso do chimarrão e o curtir das musicas e das novelas brasileira.
Esta aproximidade fez com que um descendente de brasileiro Sr.
Romildo Maia de Souza, se elegesse prefeito da cidade de San Alberto de
Mbaracayú, na publicação da Revista do Mercosul (2001-74) traz a
informação que “cerca de 80% dos 23 mil habitantes são descendentes de
brasileiros e, votando em bloco, conseguiram eleger um dos seus”. Em
declaração para a Revista do Mercosul, o prefeito diz: "Estamos começando
157
a ver casamentos entre brasileiros e paraguaios; é assim que se forma uma
nação".
Considerações Finais
161
Há um entendimento discriminatório e pejorativo do termo ‘brasiguaio’,
em função ao discurso político das reivindicações e do poder de negociação,
presentes nas associações de classe como Movimento dos Sem Terra -
MST, aliado a Comissão Pastoral da Terra, diante da problemática dos
agricultores “dos que voltam” e dos fazendeiros ricos que permanecem “os
donos da terra”, a tão problemática Reforma Agrária. Muitos ainda não
aceitam o termo, pois o querem se sentir “diferentes” (SPRANDEL 2006,
p.8-11).
Nos acampamentos a formalidade do termo é diferente do que se
sente, identificação com os valores regionais: gaúchos, nordestinos. Para
Patarra e Baeninger (1995, p.85) há o sentido do termo ‘brasiguaio’ ser
identificado como agricultor brasileiro expulso, para Patarra a relação
com a terra e alto grau de penetração no território. Patarra (2002) ainda
relaciona o termo em três categorias, estrangeiro, brasileiro e imigrante,
estrangeiro pela sua forma de que os pequenos proprietários entram no
país; brasileiro, em relação à consciência de nacionalidade; imigrante é sua
condição jurídica.
Pesquisa recente aponta para a outra caracterização: uma em relação
à terra (pequenos proprietários, arrendatários empregados) e outra, em
relação ao grau de penetração no país; mais para dentro, ou próximo da
fronteira.
Geralmente, a migração brasileira para o Paraguai é igual a
agricultores num processo de retorno, Sales (1995, p.98) e em Celso Salim
(1995, p.155) “em condições dúbias não são brasileiros porque perderam os
seus direitos, nem paraguaios, porque não se incorporam à sociedade. Em
Palau (1995, p. 201-202) “são brasileiros migrantes de origem nem sempre
rural, assentada na zona rural” e “a mobilidade fronteiriça não se reduz aos
brasiguaios”, formando uma corrente emigrante heterogênea não étnica.
Celso Amorim define ‘brasiguaios’ como sendo estrangeiro, brasileiro e
imigrante.
162
Portanto, a expressão é muito mais vasta do que parece ao primeiro
olhar, e complexa; complexa é a multiplicidade de relações que reúne.
Voltando a Castells, o imigrante brasileiro pode assumir o “papel” de
brasiguaio, para se caracterizar externamente como vitima da situação
agrária em seu país e no Paraguai, aliando-se ao MST como recurso de
negociação, o que não o define “por dentro”. Uma característica os reúne a
todos, quer se autodenominem brasiguaios ou não: sua identidade está
intimamente voltada para a posse e o uso da terra. Esse é o sentido que faz
deles o que são: homens e mulheres que procuram o seu lugar ao sol.
Lamentavelmente, os riscos são muito grandes e o resultado fazendo parte
de estudos e projeções.
Não dados precisos, recentes e nem existe consenso entre os
diversos autores citados e pesquisados, as estatísticas não são confiáveis,
muitas famílias se encontram na 3ª geração e ocorre registro tanto no
Paraguai como no Brasil, colaborando com a inexatidão dos dados do
Censo.
Hoje, transcorridas mais de duas décadas, a situação dos brasiguaios
tende a piorar - trabalhadores desempregados, arrancando o sustento do
trabalho informal, e com problemas de documentação. Existe hoje
fracassada a fraca tentativa dos dois governos, além de um Comitê de
Repatriação dos Brasiguaios com o apoio de sérias Organizações Não
Governamentais – ONGs.
Em Palau, (1995, p.201), a migração transfronteiriça, entre Brasil e o
Paraguai, no caso dos ‘brasiguaios’, analisando a região alvo deste estudo,
classifica os migrantes brasileiros em quatro categorias: a primeira é a que
representava a burguesia agrária no Brasil; são os que chegaram em 1970,
em Alto Paraná Canindeyú e Tapúa, que geralmente possuem acima de 100
hectares de terra e são chamados de farmers, dentro deste grupo, inclui-se
uma faixa de médicos, grandes empresários agrícolas, empenhados em
capitalização (compra e venda). Não é representativo em termos numéricos,
mas pelo peso econômico o são. Um segundo grupo é constituído por
163
agricultores médios, com títulos de terra - 20 a 100 hectares. O terceiro
grupo é o dos arrendatários, constituídos por migrantes capitalizados, mas
sem títulos de terra. Fazem uma agricultura estritamente comercial, a dos
‘brasiguaios’, propriamente dito. Nesse grupo, alguns são ocupantes da terra
inferiores a cinco hectares, mas sem titulo de propriedade. Outro grupo
com título provisório de terra (muito freqüentes), trabalha por contratos
verbais, finalmente, o grupo dos assalariados agrícolas, sem terra e sem
contratos (bóias-frias). Parece ser o maior contingente.
Em Palau (2002), essa classificação parece mais simplificada,
reduzida a três grupos parece ter excluído os farmers, talvez por serem
estes os mais aptos à adaptação.
Para finalizar estas considerações, cumpre registrar os problemas
enfrentados por brasiguaios e que ficaram evidenciados neste estudo.
Todos os autores consultados são unânimes em descrever a difícil
situação em que se encontram os migrantes brasileiros no Paraguai. Como
se refere Palau (2002), no III Seminário sobre Migrante Brasileiros no
Paraguai, realizado em Ciudad del Este, em agosto e setembro / 1990, os
resultados apontam para a seguinte situação:
1. Muitos migrantes não têm documentos brasileiros, (certidões de
nascimento, certidões de casamento, cédula de identidade) porque no
Brasil não os tinham (por morarem longe dos grandes centros, ou
outras causas);
2. Outros, registrados no Brasil e no Paraguai, têm problemas nos
estudos. Os nascidos no Paraguai podem ser registrados no Brasil,
mas é ilegal a dupla cidadania;
3. É complicado o ato do registro. O Serviço de identificação Paraguaio
prevê um formulário próprio;
4. Em Alto Paraná Norte, Canindeyiú e San Alberto, o índice estimado de
ausência de documentos é de 30%;
5. Apesar de ser obrigatório o registro de crianças menores no Consulado
Brasileiro, 60% ou 90% (dependendo dos lugares) não o fazem.
164
Os autores são unânimes em descrever a difícil situação que se
encontram os brasiguaios. Como refere Palau (2002) é muitíssimo freqüente
a ausência total de documentação, principal os chegados em 1970. É
obrigatório o registro de criança no consulado Brasileiro, mas não o fazem,
talvez por ignorância ou por falta de dinheiro.
O duplo registro (Brasil-Paraguai é freqüente), mas dupla cidadania é
ilegal. O duplo registro cria também problemas quanto ao reconhecimento de
níveis escolares.
Em Alto Paraná Norte Canindeyiú e San Alberto, o índice estimado de
ausência de documentos é de 30%. O alistamento militar é obrigatório no
consulado, mais de 50% do jovem vai direto a Foz de Iguaçu, sem passar
pelo consulado. relatos de corrupção extrafronteira, quando na entrega
de dulas de identidade brasileira, sem a necessidade de atender o
alistamento militar principalmente na ocasião das eleições brasileiras.
As escolas são ausentes ou deficitárias. Os alunos brasileiros sem
documento podem ser ou não aceitos, os docentes são indicados e sem
capacitação e os docentes brasileiros não são aceitos.
A proximidade da fronteira gera problemas na formação dos
adolescentes, normalmente envolvidos com roubos de carros com a
participação da policia e uso de armas.
Os próprios participantes do III Seminário sobre Migrantes Brasileiros
no Paraguai realizado em Ciudad del Este, fizeram propostas interessantes
para solução de vários desses problemas, principalmente para as questões
voltadas à educação (Palau 2002). Alguns países têm dificultado a
integração cultural, impondo restrições legais à integração de imigrantes.
Para Brito (1995, p.64) os imigrantes acabam vivendo uma “cultura de
passagem”, uma vez que estão em “outro país, têm dificuldades enormes de
se integrar socialmente e, como defesa social, vivem em guetos
onde
recriam os padrões de vida dos países de origem”. A entrevistada Geni
reforça a ideia dos guetos:
165
Eu acho que a gente aqui, tem muito contato com brasileiros. Em
Santa Rita mais ainda; o brasileiro é 90%. Então, eu acho que
deixa um pouco a desejar, o nível cultural do Paraguai. Em minha
opinião, não sei se eu estou certa ou estou errada. Eu acho que
estão um pouco abaixo, Geni - estudante.
Neste contexto, constituem-se as “redes sociais de cooperação,
formando verdadeiras ilhas da cultura de passagem” (BRITO, 1995, p. 64).
Destaca-se a fala do Celso, analista de grãos que reflete algumas das
dificuldades no processo de integração:
É claro que existem alguns que ainda são meio (racistas), como
eu vou dizer pra senhora: - Como se diz, essas pessoas racistas
que existem, isso existem mesmo! Mas não é por causa de um,
que a gente vai condenar todos, não! Tem muita gente boa, que
merece melhoria, para o país deles, porque essas pessoas são
muito boas, Celso – analista de grão. [Grifo nosso].
Logicamente convivem com conflitos: o conflito cultural, o conflito da
mudança, o conflito psicológico o que acaba compensando são os “ganhos
econômicos e financeiros” em detrimento também “das perdas no status e
prestígio social” (BRITO, 1995, p. 64). O autor discute ainda a migração da
periferia para os países mais avançados e a migração nas regiões de
fronteira entre países mais pobre em desenvolvimento, objeto deste estudo,
onde o mercado de trabalho regional tende a internacionalizar, assim como o
mercado de terras.
O Brasil, novamente, é um bom exemplo. Inserido no Mercosul e
fazendo fronteiras com outros países latino-americanos, tem-se
integrado com estes também através de fluxos de população.
Bolivianos, chilenos, peruanos e paraguaios têm emigrado para o
Brasil em grande quantidade. O interessante é que tende a se
reproduzir aqui o que ocorre com os brasileiros que emigram para
os países mais avançados.[...] Além da internacionalização de
mercado de trabalho entre países vizinhos, o mercado de terras
também é decisivo para as migrações. A grande emigração de
brasileiros para o Paraguai foi predominantemente determinada
por projetos de colonização e pelas diferenças no preço da terra
bem mais baixo em regiões paraguaias do que nos estados do sul
do Brasil. Ou seja, a internacionalização de outros mercados de
fatores de produção, como a terra, também é decisiva para as
migrações entre países vizinhos. (BRITO, 1995, p. 64)
As migrações internacionais permanecem não com o mesmo
contexto histórico. Na atualidade é a busca por melhores condições
166
financeiras e o mercado de trabalho que movem as migrações
internacionais, muitas vezes temporárias. Outras vezes os imigrantes são
convidados a saírem – como aconteceu recentemente (2009) quando o
governo japonês propôs que os brasileiros aceitassem ienes para retorno ao
Brasil, e assim aliviarem o efeito da crise mundial e o alto desemprego. A
reportagem do jornal Gambare dirigido à comunidade dekassegui traz a
reportagem em 28/04/2009:
O ministro do Trabalho e Emprego brasileiro, Carlos Lupi,
entregou, segunda-feira 27, uma carta ao embaixador do Japão no
Brasil Ken Shimanouchi criticando a medida do governo japonês
de oferecer 300 mil ienes aos dekasseguis para irem ao Brasil
com a condição de não voltarem ao arquipélago para trabalhar.
“Acontece uma crise […] e a primeira coisa que se faz é criar um
mecanismo, dentre outras muitas medidas corretas, que diz que
para você voltar para seu país o Japão a passagem, mas você
voltará o dia que o Japão achar ‘conveniente’. ‘Ou seja, nós
servimos para dar nossa mão-de-obra? Na hora que aperta o calo,
nós somos os primeiros a ouvir: ‘pode voltar para casa’, afirmou o
ministro em entrevista à Agência Brasil. (GAMBARE, 2009).
Este contexto não foge ao apresentado por Brito (1995) quando
escreve que os migrantes podem ser convidados a se “desfazer” da
América, da Europa ou do Japão, no caso deste estudo podem um dia ser
convidados a se “desfazer” do Paraguai, apesar dos “brasiguaios” se
sentirem como a força da economia paraguaia e como paraguaios, mas não
deixam de serem brasileiros para muitos paraguaios!
Referindo-se ao aprofundamento das biografias e das histórias de
vida de cada sujeito, Lechner (2009, p. 195) destaca a “hermenêutica da
conquista de si” que procura nas experiências individuais a busca pela
compreensão da identidade biográfica.
Mas a compreensão de si nunca é definitiva. A história está
sempre a ser feita, aberta a uma perspectiva de futuro. A forma
que ela adquire está destinada ao transitório e, nesta possibilidade
de coincidir com a sua história narrada, o sujeito faz a experiência
de uma separação construtiva. Este paradoxo da história de vida
(constituição do sujeito na separação de si) traduz uma condição
humana comparável a uma busca incessante de si, sem
possibilidade de se fixar, numa nostalgia de futuro que faz de
todos os sujeitos uns eternos estrangeiros (LECHNER, 2009,
p.195-196).
167
É nesse sentido, quer seja da forma que for, os imigrantes são
excluídos das formas de acesso de direitos sociais e formam uma realidade
cada vez maior e crescente em todos os países do mundo. Por realizarem
um trabalho precário, na maioria das vezes, encontram-se nas mais difíceis
condições de vida, porém fornecendo o suporte necessário à perpetuação
do processo de produção econômica vigente que os utiliza de forma
exploradora e humilhante.
Diante desta perspectiva cabe registrar a dicotomia entre a
precarização e a própria exclusão na qual os brasileiros que residem no
Paraguai estão inseridos e a não percepção desta realizada em virtude do
seu grau de satisfação em termos de condições de vida o que implica, em
grande medida, a permanência no território paraguaio.
Referências
171
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supervivencia en la medición de da migración interna. CELADE Centro
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Material em mídia – CD
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Associação Brasileira de História Oral CNPQ USP 28 a 31 de Maio de
2002
Associação Brasileira de História Oral e do Departamento de História da
FFLCH da USP, o VI Encontro Nacional de História Oral, que se realizou
durante os dias 28 a 31 de maio, na Universidade de São Paulo, 2002.
Apêndices
195
APÊNDICE A – Convite e Apresentação da Pesquisa
O questionário que você está recebendo faz parte de uma
pesquisa de Doutorado, realizada na Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo PUC-SP, e tem por objetivo coletar informações sobre o perfil
dos brasileiros que imigraram para o Paraguai, a partir da década de 1970, e
que ainda hoje residem no país.
As perguntas que você irá responder têm um fim estritamente
acadêmico. Portanto, suas respostas serão mantidas em sigilo, seu nome
será trocado e a divulgação da pesquisa será realizada apenas com caráter
sociológico, isto é, no meio acadêmico e com o objetivo de conhecer o perfil
dos brasiguaios.
Isto significa que sua situação de imigração, seja ela legal ou
ilegal, sua residência e seus dados pessoais não serão divulgados a
quaisquer órgãos governamentais e apenas permanecerão, em sigilo, na
universidade onde a pesquisa está sendo realizada.
Se você estiver de acordo com a participação nessa pesquisa e
tiver entendido sua finalidade, por favor, assine abaixo, autorizando a
utilização de suas respostas para a elaboração da tese de doutorado
apresentada.
Data: ______/____________/_________
Nome:_____________________________
Assinatura:__________________________
196
APÊNDICE B – Questionário Aplicado na Pesquisa Empírica
INFORMAÇÕES PESSOAIS
Nome do participante: _______________________________________________
Idade: _____________ Sexo: __________ Escolaridade: ___________________
Endereço: _________________________________________________________
País: _______________ Cidade: __________________ Região: _____________
Zona: Urbana ( ) ou Rural ( )
Qual a nacionalidade dos seus pais?
a. Pai: _________________
b. Mãe: ________________
Qual o grau de instrução dos seus pais?
a. Pai: _________________
b. Mãe: ________________
Qual seu próprio o grau de instrução?
_________________________________
Atualmente está estudando?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Se estuda, qual curso? ________________________________
Você pratica alguma religião?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Você freqüenta algum templo ou igreja?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
SITUAÇÃO NO BRASIL
Onde morava quando saiu do Brasil
a) Estado: ___________________
b) Município: _________________
c) Zona : Rural 1 ( )
Urbana 2 ( )
Data da saída do Brasil: _____/______/_______
Quais foram as razões que o (a) levaram a sair do Brasil?
a) Conveniência econômica?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
b) Desemprego?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
c) Questões familiares
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
d) Questões de segurança
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
197
e) Questões amorosas
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
f) Busca de novos desafios ou situações de aventura
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
g) Duas ou mais questões acima. Classifique em ordem de importância.
Questões: _________/_______/________/_______
DA IMIGRAÇÀO PARA O PARAGUAI
Quando migrou para o Paraguai, quanto tempo pensava em ficar?________
Houve mudanças em seus planos?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Por quê?
Tinha parentes no Paraguai?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Como foi recebido ao chegar ao Paraguai (nível de receptividade?)
Muito Baixa: ( )
Baixa: ( )
Alta: ( )
Muito Alta: ( )
Nenhuma: ( )
Suas expectativas em relação ao Paraguai foram satisfeitas?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Quais as principais dificuldades que você encontrou?
Como você contornou essas dificuldades?
Sente ou já sentiu alguma discriminação por ser estrangeiro?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Em sua opinião, quais os maiores problemas no dia-a-dia que brasileiros enfrentam
no Paraguai?
198
SITUAÇÃO NO PARAGUAI
Data da chegada ao Paraguai: _____/_______/________
Você é um imigrante legal no Paraguai?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Se ainda está em situação irregular, cite o motivo:
Por que escolheu viver no Paraguai?
a) Facilidades governamentais?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
b) Facilidades comerciais?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
c) Atender chamado de parentes?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
d) Conveniência financeira?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Já morou em outras cidades do Paraguai?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Se morou em outras cidades do Paraguai, quais e por quanto tempo?
a) Quais cidades? b) Quanto tempo (em meses)
1
2
3
4
5
Já morou em outros países da América Latina?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Se morou em outros países da América Latina, quais e por quanto tempo?
SOBRE A FAZENDA / RESIDÊNCIA ATUAL
Quantas famílias moram nesta fazenda? ____________
Quantas pessoas moram nesta fazenda? ____________
Quais?
Por quanto tempo?
199
Nome 18.Parentesco 19.Sexo
F/M
20.Idade 21.Estado
Civil
22.Nacionalidade
1
2
3
4
5
6
23.Religião
24. País
Local
Nascimento
25.Cidade
Local
Nascimento
26. Zona
Rural/Urbana
Local
Nascimento
27.Escolaridade
dos membros
da família
27a.Localidade
do último ano
de estudo
1
2
3
4
5
6
Qual a ocupação dos membros da família antes da migração?
Nome a) principal
atividade
b) localidade c) remuneração
1
2
3
4
5
6
Qual a ocupação atual dos membros da família?
Nome a) principal
atividade
b) localidade c) remuneração
1
2
3
4
5
6
200
RELAÇÃO ENTRE AS CONDIÇÕES DE VIDA BRASIL – PARAGUAI
Pretende regressar definitivamente ao Brasil?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
a) Se pretende voltar, quando?
Antes dos próximos cinco anos: ( )
Após os próximos cinco anos:( )
Somente daqui há 10 anos: ( )
Você incentivou familiares ou amigos a migrarem para o Paraguai?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Você financiou a ida de familiares ou amigos a migrarem para o Paraguai?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Comparando a cidade e o local que você vive atualmente no Paraguai, com a
cidade e local onde vivia no Brasil, aponte as principais vantagens e desvantagens.
Vantagens Desvantagens
Socialmente sua vida melhorou ou piorou após migrar para o Paraguai?
Melhorou: 1 ( )
Piorou: 2 ( )
a) Cite o porquê da melhora ou piora ocorrida.
Fatores de melhoria Fatores da piora
Principais atividades de lazer praticadas atualmente?
É sócio de algum Clube ou Agremiação Esportiva?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
Em seu período de descanso / férias, qual seu destino?
Identifique as principais diferenças entre brasileiros e paraguaios que você
considera relevante? (culturais e/ou comportamentais).
201
PAPEL DAS ORGANIZAÇÕES DE APOIO AOS BRASILEIROS NO PARAGUAI
Você já precisou do Consulado Brasileiro no Paraguai?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
a) Se utilizou os serviços do Consulado, como você classifica os serviços
prestados?
Ruim: ( ) Muito Ruim: ( )
Bom: ( ) Muito Bom: ( ) Ótimo: ( )
Você conhece outros organismos ou associações de brasileiros no Paraguai?
Sim 1 ( ) Não 2 ( )
a) Como é sua atuação em relação a eles?
Ativa: ( )
Passiva: ( )
O que você gostaria de falar sobre o Paraguai?
O que você gostaria de falar sobre o Brasil?
O que você aprecia no Paraguai?
O que você aprecia no Brasil?
O que você não aprecia no Paraguai?
O que você não aprecia no Brasil?
Obrigada!
202
APÊNDICE C - Entrevistas Realizadas no Paraguai em Janeiro 2006
APÊNDICE C1 – Detalhamento do Roteiro para as Entrevistas
Bem, eu queria conversar um pouco com você sobre a sua vida aqui no
Paraguai, sinta-se à vontade para falar o que quiser e não falar sobre algum
assunto caso se sinta desconfortável. Eu espero que seja um bate-papo e não
algo formal...
(LIGAR O GRAVADOR)
#1) Em primeiro lugar, fale um pouco sobre você, sua rotina, sua vida, se
trabalha ou estuda...
Aqui coletei informações sobre:
idade
escolaridade
estado civil
se possui filhos
se é responsável pelo sustento da casa
se mora em zona rural ou urbana
profissão
demais dados de identificação possíveis
#2) E como era no Brasil?
Aqui coletei informações sobre:
onde morava
o que fazia
estilo de vida
família, etc.
#3) Porque você veio ao Paraguai?
Aqui busquei informações sobre:
para onde foi
mudou de cidade / já morou em outros paises/lugares
quanto tempo queria ficar
quando chegou
porque veio
motivos
documentação (legal/ilegal)
se pretende voltar ao Brasil? Quando?
#4) Como você percebe o Paraguai?
Aqui busquei informações em relação a:
o comportamento das pessoas
a cultura
os costumes
a geografia
a política
a economia
203
segurança e saúde
empregabilidade
perspectivas
#5) E como você percebe o Brasil?
Aqui busquei informações em relação a:
o comportamento das pessoas
a cultura
os costumes
a geografia
a política
a economia
segurança e saúde
empregabilidade
perspectivas
#6) Existem vantagens ou desvantagens entre o Brasil e o Paraguai?
Descreva pra mim.
#7) Como você sua situação atual no Paraguai, como é pra você hoje,
aqui?
Coletei informações sobre:
economia
relacionamentos
família
entretenimento / lazer
religião / espiritualidade
discriminação
incentivo de familiares e amigos para vir ao Paraguai
#8) Você sabe o que é um “Brasiguaio”? Poderia definir para mim?
(só depois que a pessoa respondeu a questão acima)
Você se considera um Brasiguaio?
(só depois que a pessoa respondeu a questão acima)
Por quê?
#9) Agora que nosso bate papo já esta acabando...falando um pouco sobre
o futuro, quais são seus planos a curto, dio e longo prazo? Isto é, seus
planos para o próximo ano, para os próximos cinco anos e para os
próximos dez anos?
Obs.: caso a pessoa não falou sobre as questões que buscava, foram
realizadas questões adicionais, sutilmente, para coletar mais informações.
204
APÊNDICE C 2 – Transcrições das Entrevistas
Entrevistadora = Lélia Zambrano
Entrevistado = Geni
* = textos utilizados
ENTREVISTA 1 – ESTUDANTE GENI
Realizada em 09/01/2006; local: residência da entrevistada, Ciudad del Este,
Paraguai.
(Geni, feminino, estudante, superior incompleto (cursando), casada, zona
urbana, evangélica, proveniente de Londrina – PR, documentação legal)
Nós gostaríamos de saber um pouco sobre a sua vida. Como você vive? Se
você trabalha ou estuda?
Eu estudo, eu já trabalhei, quando eu vim pro Paraguai eu fui para Santa Rita que é
um pouco mais longe do que aqui. São 70 km da fronteira, então eu trabalhei, e
morei três anos. Trabalhei o tempo inteiro e também comecei a faculdade. Na
faculdade eu comecei aprender o espanhol, porque eu não tinha vontade de
estudar outra faculdade, fazer outra coisa, o curso que tinha não me agradava, mas
eu me senti na obrigação de aprender alguma coisa. Estava me sentindo um pouco,
talvez assim meio inútil, talvez não sei, perdendo tempo, porque lá, realmente, eu
não gostava de estar lá. Bom eu tinha que tirar alguma coisa de bom daquilo, o que
eu vi que podia fazer era outra faculdade pra aprender a língua, não faria uma
faculdade se tivesse um curso de espanhol ou inglês, mas como não tinha, daí eu
entrei na faculdade. Estou fazendo agora o quarto ano. Não! vou passar para o
quinto ano! Passei pro quinto ano.
Mas, em que área você está?
Contabilidade. No Brasil eu fiz administração, então quando eu vim pra tinha
administração, contabilidade e direito. Direito é uma área que não me atrai e, ainda
mais em um outro país. Eu não me via fazendo direito.
Você faz contabilidade aqui em Ciudad del Este?
Aqui. Comecei em Santa Rita e agora estou por terminar, e daí quando vim pra
em Ciudad del Este, tinha mais opções de cursos; eu podia ter escolhido outro,
que eu estava no terceiro ano. Falei não! Agora eu vou ao fim! Depois que eu
vim para Ciudad del Este também não fui atrás de trabalho. Não trabalho.
estudo eu vivo em casa mesmo. Mas a vida aqui como brasileira e como
brasiguaia... para mim... me sinto brasileira aqui, pra mim... eu moro aqui em
Ciudad del Este. Para mim é muito bom. Para mim não faz diferença entre morar
aqui ou em morar em Foz. Porque eu continuo tendo a minha vida também,
tenho a família do meu marido; a minha família eu já não tenho mais ali.
Passo a ponte e tem uns pequenos transtornos para você passar a ponte
dependendo dos dias. Então, se eu quiser, eu vou bem cedinho, faço banco essas
205
coisas, compras, mercado tanto quanto aqui. Hoje eu diria que eu estou um
pouquinho mais para cá, pelo transtorno da ponte; você vai se habituando também,
porque no começo eu nem ia ao mercado aqui; não me sentia bem, não queria.
Acho que é um pouco também de preconceito que a gente tem. Eu não quero me
desligar de lá, então tudo eu faço lá, aqui eu só moro.
Mas hoje pra mim é tranqüilo. Os amigos perguntam: Por que vocês não moram em
Foz? Trabalham aqui em Ciudad del Este, moram em Foz, que pra mim tá bom
aqui. Mais pelo trabalho do meu marido, que ele trabalha aqui e, para passar a
ponte... A gente já viveu isso! No começo eu morei em Foz e trabalhava aqui.
Logo no principio do nosso casamento eu trabalhava em Ciudad del Este. Passar a
ponte todo dia é terrível, eu passo até bem, agora o Salum... Para ele é um
transtorno.
O curso que você faz aqui, quantos anos são?
Cinco anos.
Cinco anos a graduação? E o preço da universidade?
É bem mais barato que no Brasil. Eu comecei pagando 250 mil, que na época
equivalia a uns 130 reais, digamos assim. Hoje eu pago 350 mil, que equivale a uns
150 reais. Eu estudo na melhor faculdade do Paraguai, que é a Universidade
Católica. Ela é a melhor daqui, de todo o Paraguai, e a universidade católica é a
mais cara, então, você vê a diferença? No Brasil você não faz (um curso) por esse
preço. Não faz.
Por esse preço não. E você é casada? Tem filhos?
Não, não tenho filhos.
Como era a sua vida no Brasil? Assim, onde você morava, o estilo de vida?
Em que cidade você vivia? Era uma região urbana ou rural?
Urbana. Eu morei em Foz muitos anos. Eu vim pra Foz quando tinha nove anos e
ali eu fiquei por quase vinte anos. Daí eu fui embora para Londrina, então quer
dizer, eu cresci em Foz! Mas nos últimos anos eu vivi em Londrina
, que para mim é
uma cidade maravilhosa. Eu adoro Londrina, eu acho fantástica a cidade. Foi um
impacto muito grande sair de Londrina e vir para Santa Rita. Que não foi para aqui
que eu vim! Aqui é bem melhor que Santa Rita! Eu estranhei muito no princípio.
Para Santa Rita você foi por qual motivo?
Por que...
Santa Rita é Paraguai?
É Paraguai. Mais uma cidade daqui do Paraguai. Porque meu marido trabalhava lá,
e daí a gente casou e... eu poderia ter ficado morando em Foz e ele lá; que eu
não quis, por pior que fosse, eu queria estar junto. Isso foi uma decisão nossa,
porque ou ele ficaria lá, ou... Porque a gente fez uma experiência no princípio do
casamento: ele voltaria pro Brasil (que no principio foi essa a ideia) por isso que a
gente casou, a gente ia morar em Foz só que aí as coisas tomaram outros rumos, e
lá nós ficamos...
E você está aqui em situação legal?
Legal.
Você é uma cidadã paraguaia?
206
Não, eu sou uma imigrante, eu sou uma cidadã legal, eu tenho a documentação de
imigrante, meu marido já não; ele fez a nacionalização, ele é um cidadão
paraguaio. Mas eu não, pra mim está bom assim, eu não pretendo fazer...
E a sua cidadania, qual é?
Não! A identidade eu vou fazer. Porque aqui primeiro se faz a de imigrante, depois
faz a identidade do Paraguai. Mas vou fazer como brasileira mesmo, meu marido
fez quando ele tinha os familiares aqui. Ele tem o pai que é paraguaio, o que para
ele facilitou bastante. Mas eu estou legal, não tenho problema nenhum com a
justiça ou com a lei. Tá tudo bem.
Você pretende voltar ao Brasil algum dia para morar? Retornar a sua
condição de Londrina?
Eu tenho vontade sim. Digamos... Voltar para Foz pra mim não faz diferença.
falei, pra mim tá bom aqui, mas é uma vontade que eu tenho! Até meu marido fala:
se for pra voltar ao Brasil algum dia, a gente volta para Londrina, que é um lugar
que a gente gosta, mas, eu acho um pouco difícil; pelo menos a curto prazo, eu não
vejo a gente saindo do Paraguai.
Essa dificuldade que você sente do retorno você acredita que seja por qual
motivo?
Pelo trabalho e pela situação financeira mesmo, que dificilmente a gente vai ter,
digamos, o que o meu marido conseguiu aqui em cinco anos: posição, cargo,
conhecimento. No Brasil demoraria muito mais e não sei se isto estaria
acontecendo. Digamos na função que ele ocupa hoje, não sei se com pouco tempo
(5 anos) ele estaria, acho bem difícil.
Aqui tem uma certa concorrência, mas não é igual ao do Brasil. E nós brasileiros
aqui, que temos alguma formação - um nível superior - digamos de escolaridade,
temos mais oportunidades que os próprios paraguaios.
Você já não sente isso em relação ao Brasil?
Não.
É assim que você percebe o Paraguai? Em relação à parte profissional?
Profissionalmente, aqui eu considero muito boa para os brasileiros. Tanto que aqui
tem muitos brasileiros, ocupando cargos bons. É uma porcentagem nima de
paraguaios que ocupam cargos bons. Assim... de alto nível e de confiança que
brasileiros ocupam em todas as áreas.
Como é que você percebe a cultura do Paraguai em relação aos brasileiros?
Eu acho que a gente aqui, tem muito contato com brasileiros. Em Santa Rita mais
ainda; o brasileiro é 90%. Então, eu acho que deixa um pouco a desejar, o nível
cultural do Paraguai. Na minha opinião, não sei se eu estou certa ou estou errada.
Eu acho que estão um pouco abaixo.
Como é que você percebe a política, a economia, a geografia do Paraguai?
Olha, política eu ouço falar. Também não sou muito de... eu não acompanho muito
e, isso eu acho até uma falha, porque eu estou vivendo aqui mas, eu acompanho o
Brasil. Aqui eu nunca ligo a TV em um canal paraguaio; meu marido assiste o
noticiário e está mais por dentro. Eu sinto que estou por fora mesmo! Acho que eu
ainda não me “joguei” aqui dentro. Ainda não! Eu estou aqui, mas ainda com um pé
lá, não sei o por que disso; mas eu ainda não me... Eu não posso dizer muita coisa
da política, tem muita corrupção, tem muito desvio, assim como no Brasil também
207
Mas eu acho que aqui ainda dá, eu acho que o nível de pobreza está muito grande,
eu não sei... Tem muita miséria, tem muita gente “se dando bem”, entre aspas,
pondo a mão no dinheiro. O Paraguai tem condições, ele tem... foi um país
muito rico, hoje não é mais. Gira dinheiro, que vai para os lugares errados, não
vai para os destinos que teria que ir; até mesmo a construção de Itaipu, foi um
beneficio imenso pro Brasil e pro Paraguai, que Foz aproveitou, o Brasil em si
aproveitou muito o dinheiro que Itaipu pagava: tem colégio, tem Hospital, tem a
própria vila em que moravam os funcionários. Quanto ao Paraguai, não se sabe
onde foi parar o dinheiro que foi investido, que foi deixado; tem as vilas e tudo mas,
que para a educação pouquíssimo desse dinheiro foi aproveitado. Hospital não
tem, a saúde aqui é bem precária.
É... Eu ia perguntar como você percebia a saúde, a segurança, a assistência
médica aqui no Paraguai?
A saúde... Eu não tenho confiança nenhuma, é bem precária mesmo. Em
Santa Rita, tem até um hospital, mas eu sei que foram médicos de Foz que abriram
esse hospital. Dentista, agora tem mais; mas logo que eu fui pra lá, tinha
pouquíssimos. São vários brasileiros que abriram consultório lá; paraguaios não
eram muitos; agora asão, mas confiança mesmo... Assim, por ter mais cidadãos
brasileiros que foram pra lá, não sei se não há confiança. Acho muito precária. Uma
vez, a gente presenciou um fato que nos deixou arrepiados: meu marido foi doar
sangue. Um amigo dele tinha sofrido um acidente e ele foi doar sangue. Ele sempre
doa sangue. Aí, a moça perguntou qual era o tipo sanguíneo dele. Ele falou: - Mas
você não vai fazer análise? Ela falou assim: - Você não está doente, está? Pensa
bem, ela simplesmente tirou o sangue para pôr em outro, sem fazer uma análise
para ver se havia uma doença grave. Aquilo deixou a gente horrorizada. Porque
onde se viu fazer um negócio desses? Podia matar o cara. Até o meu marido
falou: - Se acontecer alguma coisa comigo, você me enfia em uma ambulância e
me leva pra Foz, não me deixe aqui, pelo amor de Deus! Porque não se pode
confiar na medicina daqui; nem na medicina mesma, nem nos profissionais e nas
pessoas que trabalham. muito interesse financeiro. A gente ouve muitas
histórias sobre morrer muita criança; por qualquer coisinha é fazer cirurgia, fazer
cirurgia... E acaba morrendo. Não tem preparo mesmo, então a saúde aqui para
mim...
Então, quando você precisa de alguma coisa você vai para Foz?
Vou pra Foz. É... É aquela coisa, eu cresci em Foz, então médico, dentista,
ginecologista, tudo é lá. Sempre foi lá, mesmo quando eu morava em Londrina. Eu
morei três anos em Londrina e o meu dentista era de Foz; então às vezes, eu vinha
pra cá, e já aproveitava e fazia o que tinha que fazer, porque médico é uma questão
de confiança; você se adapta. É igual cabeleireiro. Mas médico mesmo, para mim é
em Foz.
Então qualquer “probleminha” você freqüenta lá ou aqui?
Agora, até que eu vou aqui; cabeleireiro é ainda, mas manicura e pedicura eu
encontrei um aqui.
São brasileiros que estão aqui?
Não, são paraguaios.
E em relação à empregabilidade no Paraguai, como você percebe e se ainda
existe campo para novas profissões?
208
Eu acho que ainda tem, apesar de muita gente estar vindo para cá, que está se
formando. Se você tem uma boa formação, uma especialização, ainda tem bastante
campo aqui.
Voltando ao Brasil... Como você ainda percebe o Brasil? Pelo menos em
relação à economia, à política, à empregabilidade, à situação da saúde, à
segurança. Como você vê hoje o Brasil?
Olhe, no meu caso, se eu voltar pro Brasil, hoje, em termos de trabalho, acho bem
complicado, porque estou fora do mercado, tô fora, eu tenho consciência disso.
Quanto à segurança, também tenho muito medo; antes eu não tinha medo. Antes
quando eu passava a ponte, ficava tensa porque eu tinha medo do Paraguai.
Porque eu me sentia brasileira, era brasileira, não sabia falar a língua deles.
Hoje não! Hoje eu tenho mais segurança aqui do que lá; assim, em questão de
assalto, aqui nunca aconteceu nada com a gente. Lá eu já passei por um assalto.
No trânsito, eu tenho medo de parar num semáforo à noite, sozinha. De carro não
vou, eu tenho medo. Já aqui, eu tenho uma certa segurança. Vou para a faculdade
à tarde, de carro; eu ando, eu vou, volto. Sabe tenho um pouco de medo, isso em
todos os lugares, mas no Brasil eu me sinto mais insegura, bem mais.
E a economia de lá, digamos que eu acho que é bem mais complicada do que aqui.
Aqui eu posso trabalhar; se eu for atrás, eu tenho. Em algumas áreas em que
posso atuar, eu sei que eu vou, em termos de salário, ter um salário muito melhor
que lá, isso de começo. Aqui eu não estou trabalhando porque não fui procurar,
estou parada mesmo! Porque em Santa Rita eu trabalhava, gostava, mas, quando
eu vim para cá eu fui ficando.
Quais são as vantagens e desvantagens que você observa entre Brasil e
Paraguai? Se você puder catalogar, mais ou menos? O que você acha que
aqui tem vantagens e que lá não tem? Aqui, o que você percebe como
desvantagens e lá você vê que pode ser uma vantagem?
Olha, uma vantagem aqui é a financeira; no Brasil está mais difícil. Uma
desvantagem aqui, é a educação, com menos preparo. Quanto à saúde, eu tenho
confiança de ir a um médico no Brasil; aqui eu não tenho, não tenho mesmo. Então,
mesmo que seja um brasileiro que venha pra cá, eu já vou ficar meio assim, porque
não sei, não sei por que ele está aqui.
A educação! Eu sempre pensava, quando morava em Santa Rita, que é pior
ainda, em termos de educação.
Quanto aos médicos, é bem mais precário que aqui. Aqui, a gente ainda vive
num grande centro; lá é mais interior, se podemos falar assim, e eu sempre
pensava: não vou ter filho aqui: Porque como é que eu vou estudar? Eu não vou
pôr meu filho numa escola aqui. Hoje eu não sei. Se eu tiver um filho aqui, vai
nascer no Brasil! vai ser brasileiro! Vai morar aqui, mas vai ser brasileiro e não sei
se eu não o colocaria para estudar aqui, hoje eu penso, mudei um pouco. Em
Santa Rita eu não faria isso, porque aqui ainda tem melhores escolas que em
Santa Rita. Lá é complicado a educação... Eu acompanhei um pouco, porque
quando eu fui pra lá, em me matriculei numa escola, digamos assim que seria nível
quinta série. E falei: - Eu vou aprender o espanhol. Então freqüentava as aulas
de espanhol deles. Foi terrível! Assim, eu não agüentei ficar, eu ficava pensando:
Meu Deus, como essas crianças vão aprender alguma coisa? Não tem condições
mesmo. Daí, eu ficava vendo um filho meu passando por isso. Sabe, eu não quero.
Eu sempre falava: - Eu não vou ter filho aqui. Daí, quando surgiu a oportunidade de
vir pra cá, eu achei ótimo, porque aqui eu posso estar no Brasil que é perto, tem
transporte que leva, tem transporte que busca. Aqui tem o Colégio Anglo-
americano, que é um colégio bom. Tem uns três colégios que eu considero assim,
209
nunca fui a fundo ver, mas pelo que se ouve falar é bem melhor. Então, hoje, eu
não sei o que faria. Acho que até poderia estudar aqui, porque seria uma opção de
aprender o espanhol, uma segunda língua, porque português com certeza ele iria
aprender com pai e mãe brasileiros! Teria um idioma a mais.
Em relação a entretenimento, lazer, relacionamentos, amizades, como você vê
a sua situação aqui no Paraguai?
Aqui eu posso dizer assim, que amigos mesmo são pouquíssimos. Na faculdade,
eu posso dizer que tenho dois amigos ou três: duas brasileiras e um paraguaio, que
eu posso considerar amigo. Mas é na faculdade. Com uma delas, a gente tem
um contato fora da faculdade, mas isso, amizade fora, não temos com paraguaios.
Em Santa Rita, nosso círculo de amizades era bem maior. Aqui eu acho que é mais
difícil, em Santa Rita era mais fácil, mas também eram todos brasileiros, acho que
havia um ou dois paraguaios.
A parte de entretenimento?
Normalmente, a gente sai. Tem festa, tem baile, mas é nesse padrão. Come-se
bem aqui. Pra sair pra comer, tem rios lugares, que a gente foi descobrindo,
porque antes, também pra sair pra comer, era em Foz. Hoje já não, a gente se vira
muito bem aqui. É que a gente não é muito de sair mesmo, então normalmente
saímos pra comer num barzinho. Eu conheço aqui duas boates que são legais, bem
badaladas mesmo, bem movimentadas, mas eu não as freqüento, nem só pra
conhecer. Mas aqui tem, em Santa Rita não tinha nada.
Teatro, cinema?
Não. Cinema tem aqui, tem no shopping, não conheço. Mas tem, nunca fui.
Quanto à religião, à espiritualidade. Como é que você se situa atualmente, no
Paraguai?
A minha situação, eu diria que não é atéia, porque na verdade não freqüento
nenhuma religião. É e não é, porque estou no Paraguai, ou porque estou no Brasil.
Isso acontecia também, fazia tempo que eu não freqüentava nenhuma
(igreja). Ir à igreja não vou a nenhuma; vou a casamento, batizado. Mas não estou
freqüentando nenhuma. Mas não é por estar no Paraguai, isso estava assim
mesmo.
Mas você lá no Brasil, você foi batizada? É católica?
Não, meu pai era evangélico, eu venho de uma família evangélica; católica eu
nunca fui.
Então você é evangélica?
É cresci dentro...
E aqui não têm cultos?
Tem também, mas eu não cheguei a conhecer nenhum, porque nunca fui. fui
numa igreja católica aqui, mas assim, por um trabalho da faculdade, participar de
alguma coisa, por isso, por eu estudar em uma universidade católica. Às vezes, a
gente tem aula de teologia, tem uns trabalhos extras para fazer, mas não freqüento.
E você incentiva algum amigo, parentes a vir para o Paraguai? Em relação a
trabalho, amigos, que você percebe que estão sem emprego no Brasil?
indicou já alguém pra vir pra cá?
210
Eu até falei com o marido de uma amiga minha, engenheiro agrônomo, que
estava passando por uma situação complicada. Eu falei que aqui no Paraguai todos
os engenheiros agrônomos, que vieram, que quiseram trabalhar, se deram bem.
Todos. É difícil um engenheiro agrônomo desempregado, não tem. Então, até falei
pra ele vir, mas ele tinha essa coisa: Vir para o Paraguai, não quero!
Já pensou? se
ele tivesse vindo, estaria bem melhor do que no Brasil, disso não tenha duvidas, só
que ele não quis vir.
Qual a área de trabalho do seu marido?
Ele é formado em administração, em administração de empresas.
Ele atua na área?
Na área comercial, mas também envolve administração, que ele gosta mais da
área comercial. Está envolvido na administração também. Ele é gerente de uma
companhia de seguros. Ele gosta de atuar mesmo na área comercial, venda e
contato.
Você sabe o que é um brasiguaio? Você poderia definir para mim essa
palavra?
Um brasiguaio, para mim, é um brasileiro que vive no Paraguai. Eu defino assim,
também não sei se é ou não é. Acho que o meu marido vai saber melhor do que eu.
Mas para mim é um brasileiro que veio e está vivendo no Paraguai, porque assim
eles consideram a gente. Também tem filhos de brasileiros que na verdade não são
brasiguaios, porque eles nasceram aqui. Então considere que eu sou uma
brasiguaia, brasileira que vive no Paraguai.
Então você se considera uma brasiguaia?
Eu não gosto muito do termo, mas eu acho que sou. Meu sogro brinca muito
comigo. Ele fala que eu sou uma brasiguaia. Não! Ele fala que eu sou uma
paraguaia. Não, - eu falo não, eu sou brasileira, e não quero deixar de ser
brasileira. Eu levo assim na brincadeira, mas eu não gosto muito desse termo
“brasiguaio”, não sei por quê. Eu gosto de ser brasileira, mas eu acho que eu sou
uma brasiguaia por estar vivendo aqui, eu dependo daqui, eu estudo aqui, eu moro
aqui, o sustento sai daqui do Paraguai, então acredito que eu seja uma brasiguaia.
Então, agora que o nossa conversa está chegando ao fim, se você pudesse
me falar um pouquinho sobre o seu futuro? Quais são os seus planos a curto
prazo?
Olha, a curto prazo eu acho que a gente vai ficar pelo Paraguai mesmo. Trabalhar,
tentar construir alguma coisa pra voltar para o Brasil
. Mas assim digamos, nós
temos projeto de construir alguma coisa, mas construir aqui, aqui mesmo, digamos
o meu marido quer fazer uma aposentadoria,
construir....
211
Entrevistadora = Lélia Zambrano
Entrevistado = Saul
* = textos utilizados
ENTREVISTA 2 – ADMINISTRADOR SAUL
Realizada em 09/01/2006; local: residência do entrevistado, Ciudad del Este,
Paraguai.
(Saul, masculino, Administrador – Companhia de Seguros. 3º grau completo,
casado, zona urbana, chegada em 1998, paraguaio naturalizado)
Em primeiro lugar fale um pouquinho sobre sua vida, sua rotina, enfim, se
você trabalha ou estuda aqui no Paraguai.
Bom, eu vim aqui pro Paraguai pra trabalhar, e tem melhores oportunidades aqui...
Vim no ano de 98, agora está completando praticamente 8 anos que eu estou
aqui e continuo trabalhando. Não cheguei a estudar aqui no Paraguai, mas aqui tive
oportunidade de fazer outros cursos e eu fiquei em função disso. Maior crescimento
profissional e aqui no Paraguai o campo é muito bom para isso.
Falando de você que já está aqui há 8 anos, que idade você tem?
Eu agora tenho 35 anos.
E o seu grau de escolaridade?
3º grau.
Casado, solteiro?
Casado.
Tem filhos?
Tenho 2 filhos.
Você é responsável pelo sustento da sua casa?
Sim.
Você mora na zona urbana ou rural?
Zona urbana.
E qual é a sua profissão?
Eu sou administrador, atualmente ocupo o cargo de gerência numa companhia de
seguros.
Você está aqui e está trabalhando... Você veio para cá para trabalhar e está se
sentindo realizado na sua área profissional?
Sim, me sinto realizado na minha área profissional.
212
Quando você vivia no Brasil o que você fazia? Qual era o seu estilo de vida?
Sua família era de lá, era daqui? Como era sua vida antes de vir pra cá?
A milha filha continua no Brasil. Eu sou o único da família que está aqui no
Paraguai, que está no país. Meu estilo de vida era um estilo modesto, era um
microempresário, realmente não tinha grandes dificuldades no Brasil.
E quando você quis sair do Brasil pra vir pra você falou assim: Vai ser a
minha oportunidade, por exemplo? Você pensou vou experimentar, mas
tendo uma visão de que seria positiva?
Sim, eu tinha contato com alguns amigos que estavam aqui, e os negócios estavam
bem pra eles, e achei que pudesse ter a mesma sorte.
Nós estamos em janeiro de 2006, você está aqui há oito anos, chegou aqui em
1998?
Em 1998.
E você começou a sua vida profissional em que área? Fazendo o que?
Comecei na área comercial e sigo na área comercial, eu vim como vendedor de
uma concessionária da linha Chevrolet de automóveis, eu fazia a área externa
como vendedor de campo e assim fui desenvolvendo o meu trabalho, fui
aprendendo a trabalhar aqui, aprendendo a profissão. Continuo assim na área de
vendas, na área comercial.
Saul, você mora aqui no Paraguai, legalmente. Como está a sua
documentação aqui no Paraguai?
Bom, desde o ano de 1996 eu tinha o meu carnê de imigrante, então eu vim pra
com o documento legal. Em 1998 quando eu vim morar, tinha o carnê de
imigrante do Paraguai. E agora, em 2005 eu tive a minha carteira de identidade
paraguaia. Então eu tenho a identidade paraguaia e por eu ser filho de paraguaio,
atualmente, eu sou paraguaio natural e, assim como eu, a minha esposa também
tem a carteira de imigrante e estou 100% legal dentro do Paraguai, recolhendo
todos os impostos.
Você por acaso pensa em voltar para o Brasil?
Sim, sim nas férias para passear.
Quer dizer que então seria para sempre a sua vida aqui. Ou seria apenas por
uns tempos que você continua no Paraguai?
Continuo aqui no Paraguai.
Aqui você quer construir sua vida?
Sim, já estamos fazendo isso.
Como você percebe o Paraguai? O comportamento das pessoas? A cultura,
costumes, geografia, política, economia? Todas essas áreas, segurança,
saúde? Fale-me um pouquinho de cada uma.
O comportamento das pessoas, por exemplo?
Bom o paraguaio, o povo paraguaio é um povo amistoso, tem uma sensibilidade
muito grande, é um povo muito carente em questão de educação, de distribuição de
renda, principalmente, e isso faz com que seja um povo muito explorado, é um povo
lutador. Eu vejo o Paraguai como um país pequeno e com riquezas naturais muito
grandes. Vejo um país que tem possibilidades de melhorar, é uma questão de
um investimento maior na área de educação e, um pouco de câmbio (mudança) de
213
mentalidade do povo. Para que possa ocorrer a mudança. Mas eu vejo o Paraguai
como um país de futuro.
E a cultura do povo paraguaio?
A cultura do povo paraguaio é infelizmente, um povo que apesar de ser amistoso,
perde pouco a pouco a identidade, especialmente pelos 35 anos de ditadura. Foi
um povo muito oprimido, muito judiado, isso vem de uma história não tão antiga,
que foram as guerras que enfrentou, quase um extermínio da raça, isso fez com
que o país perdesse muito da sua identidade, da sua cultura, foi dominado durante
algum tempo pelo governo da Tríplice Aliança, logo depois teve mais uma guerra e
teve uma abertura de imigração muito grande, isso a partir do governo militar, o
país foi colonizado pelos estrangeiros, que impuseram sua cultura, a cultura do
povo e a colônia brasileira é muito forte, a colônia japonesa, a alemã. Mas isso
também, fez pelo lado negativo a identidade do povo, pelo lado positivo o
desenvolvimento do país, que se não fosse isso o país seria muito mais atrasado
ainda.
E atualmente a política como você a vê?
A política paraguaia, assim com a maioria das políticas sul-americanas, é bastante
corrupta. Nós temos acompanhado o noticiário; dia a dia é uma corrupção, uma
roubalheira muito, muito desenfreada e pouco investimento na área educacional, na
área social, muito desvio de recursos. É uma política viciada, que foi herdada do
governo militar.
Está certo. Agora essa é toda a sua percepção a respeito de Paraguai? Qual é
a sua percepção a respeito do Brasil? Como foi o Brasil e como é o Brasil, no
seu ponto de vista?
Ah! O Brasil é uma grande nação, ele é o país líder da América do Sul, é um país
que tem amplas condições de se tornar uma grande potência, e ele pode e deve
dar segurança para os paises que são mais pobres. Menores em poder econômico
do que ele e o Brasil têm um papel fundamental no que se refere à estabilidade do
Paraguai, também em relação à economia e à política. Então eu vejo o Brasil,
assim como o Paraguai, um país riquíssimo e que é apenas uma questão política a
melhoria em todos os aspectos.
E agora você acha que existem vantagens ou desvantagens entre Brasil e
Paraguai? Se você pudesse assim dizer:
Brasil vantagens – Brasil desvantagens
Paraguai vantagens – Paraguai desvantagens.
Isso você me pergunta quanto ao imigrante ou ao cidadão?
Não na sua vida, as vantagens que o Paraguai lhe proporciona e o Brasil
proporcionaria ou lhe proporcionou ou proporcionará? Ou assim, o que o
Brasil lhe pode oferecer e o que o Paraguai também pode proporcionar?
Quais as vantagens?
Bom, o Brasil tem mais condições de me oferecer uma melhor vida social e de
educação, de saúde até de segurança. A desvantagem é que já é um país bastante
competitivo na área profissional, está mais avançado, as oportunidades existem,
mas são mais difíceis de alcançar. O Paraguai apesar da deficiência em saúde,
educação, o que quer que seja, é um país que me oferece melhor opção em
crescimento profissional Essas eu diria que são as vantagens de um e de outro.
214
Qual é sua situação no Paraguai? Como é hoje para você, em relação aos
seus relacionamentos, a sua família, entretenimento, religião? Como é seu
dia-a-dia no Paraguai? O que você recebe e o que você dá em troca ao
Paraguai?
Por eu morar numa Tríplice Fronteira, não tenho grandes planos, porque aqui nós
somos três países, Ciudad del Este, Foz do Iguaçu, Porto Iguaçu. Temos opções
bem variadas de entretenimento, de relacionamento com pessoas, de amizades, de
outras culturas. O Brasil sim, oferece mais isso. O Brasil oferece mais, mas no
Paraguai também é muito bom. Você tem ótimo relacionamento com as pessoas e
é muito bom viver aqui.
Você sabe o que é ser um brasiguaio? Pode me definir o termo brasiguaio?
Bom o termo brasiguaio, foi encontrado logo no inicio da imigração, da forte
imigração brasileira, para o Paraguai. Isso foi no inicio da década de 1970, final da
década de 1960, quando os primeiros imigrantes começaram a colonizar o Alto
Paraná e eles à medida que foram tendo seus filhos, recebendo parentes,
recebendo outros imigrantes, eles iam perdendo um pouco da identidade. Eles
não eram mais brasileiros, apesar de acontecer, por exemplo, na época de eleição,
os brasileiros iam votar no Brasil, mas de uma forma até ilegal, porque como eles
não eram residentes no Brasil, não deveriam mais estar fazendo isso, a principio
eles foram perdendo a identidade e eram pessoas que viviam no Paraguai, tinham
suas raízes aqui, tinham seus filhos, suas terras, a vida toda aqui, mas ainda
tinham um no Brasil. Então eles não assumiram total identidade do Paraguai e
tampouco são brasileiros, eles são os brasiguaios.
E você se considera um brasiguaio?
Não, hoje eu já me considero um paraguaio. Estou totalmente legal aqui dentro e eu
gosto desse país.
Legal, agora me conte um pouquinho sobre o seu futuro, quais os seus
planos a curto, a médio e a longo prazo? Curto seria no próximo ano, médio
talvez em 5 anos e a longo daqui a 10 anos.
Bem. A curto prazo, o que eu penso é seguir trabalhando no Paraguai. Tenho
intenção de fazer uma pós-graduação esse ano, na área de finanças, para poder
crescer profissionalmente. Estou fazendo pequenos investimentos na medida do
possível, aqui no próprio Paraguai. A nossa moeda, hoje já não está tão forte e, por
isso, tenho que pensar bem o que eu vou fazer, no que eu vou investir. Mas, a
longo prazo é muito difícil dizer, por que a curto e a médio prazo, seguirei investindo
no Paraguai, seguirei trabalhando aqui e o amanhã a Deus pertence!
para finalizar. Onde você passaria a sua velhice? Você tem uma
vontade, ou um pensamento. Ou isso não lhe passou pela cabeça ainda?
Em localização geográfica não passa, não tenho ainda pensado nisso, mas
provavelmente no Paraguai.
Está bom, espero que você tenha gostado de conversar comigo e eu acho que
é só isso. Super obrigadão!
215
Entrevistadora = Lélia Zambrano
Entrevistada = Elisa
* = textos utilizados
ENTREVISTA 3 – DONA DE CASA ELISA
Realizada em 09/01/2006; local: residência da entrevistada, Ciudad del Este,
Paraguai.
(Elisa, feminino, dona de casa, Superior completo casada, zona urbana e
rural, proveniente de São Paulo, chegada há 30 anos, documentação legal).
Boa Noite! Queria que você falasse um pouco sobre você. A sua rotina, a sua
vida, se você trabalha ou se estuda aqui no Paraguai?
Aqui no Paraguai eu faço... Vamos pensar um nome bem simpático, assim de uma
super dama de companhia do meu marido. Então, faz trinta anos que nós estamos
no Paraguai, não faz trinta anos que nós dependemos do Paraguai, mas faz trinta
anos que nós estamos aqui. quando deixou de ser uma brincadeira e
passou a ser verdade, você tem que se dedicar. Lógico que não é fácil é um outro
país, são outros costumes, as coisas são muito mais precárias. Trinta anos atrás as
estradas não existiam, não existia luz, não existia telefone, não existia luz elétrica,
não existia, não existia, não existia absolutamente nada e, por outro lado, hoje a
gente o quanto foi conseguido, é até aquela criança que cresceu bem, aquela
menina dos olhos que recebeu alimento, que enfim, que foi desenvolvida e que hoje
tem frutos... Aquela coisa gostosa que a gente começa a colher.
Você tem filhos?
Tenho duas filhas que moraram na Foz do Iguaçu, durante um período de oito
anos, que foi o começo do desenvolvimento na área de agricultura nossa. Antes
existia outras áreas de pecuária, enfim, a fazenda começou de outra maneira e
chegou o momento que elas saíram, inclusive do país, foram estudar fora e quando
elas regressaram, ai era faculdade, e ai acabou. Nós optamos pela vida cultural
de São Paulo.
Como era a sua vida no Brasil?
A minha vida sempre é boa, não posso reclamar de nada, a minha vida era boa lá,
a minha vida é boa aqui, e isso depende de muitas circunstâncias. Mas é
importante que a gente saiba fazer com que a vida também seja boa. Então lá, eu
fiz uma boa faculdade, trabalhava, vivia bem, super bem, luxo e riqueza e ai casei.
Tivemos as meninas e, viemos para cá, então vim como companheira de uma
ideia, que eu também, lógico, achei que fosse dar certo, então vamos desenvolver,
vamos fazer, vamos construir uma outra coisa. Meu marido era um advogado muito
bem sucedido, ótimo, muito tranqüilo. tínhamos propriedades, nhamos enfim
uma vida legal, ai ele largou tudo, abandonou tudo por um sonho, por uma terra,
216
por um ideal, no qual se continua investindo até hoje. Lógico, várias realizações
aconteceram nesse tempo, muito mais do que desilusões.
Então, hoje praticamente você mora em zona rural ou zona urbana?
Ah! Eu posso me dar ao luxo de viver em todas as zonas. Eu vivo tico-tico no fubá,
um pouco aqui, um pouco lá.
Então você já me falou um pouco dos motivos que a trouxeram para o
Paraguai. Quando vocês vieram por esse sonho, vocês pretendiam ficar por
quanto tempo?
Ah! Era bem pouco tempo, todo ano eu escutava uma frase, que na época muito
me alegrava: Que era só mais um ano! Que no fim daquele próximo ano ai nós
retornaríamos a nossa vida de antigamente, ou seja, uma vida de São Paulo, uma
vida onde o lazer era bom, onde a cultura era bem superior, enfim, onde a vida
sócio-econômica é muito disputada, muito boa. E as coisas foram mudando e
cada ano nós continuávamos aqui, mais afundados aqui, e no fundo, não sei se a
palavra seria “apaixonado” exatamente, mas impossível quase de se desvencilhar e
se desvincular daqui. Então...
A sua documentação no Paraguai é legal?
Super legal. Tenho toda a documentação necessária. Sou uma pessoa
extremamente legalizada, tanto aqui quanto no Brasil.
Você pretende voltar para o Brasil?
Ah! Isso ai só... O futuro pertence a Deus! A mim infelizmente não (pertence),
não consigo mandar no meu dia de amanhã.
Como você percebe o Paraguai? Em relação ao comportamento das pessoas?
Como assim, o Paraguai em relação às pessoas? Aos brasileiros, aos imigrantes,
ou aos próprios paraguaios?
Ao povo, aos próprios paraguaios.
Ah! Um país excelente, eles adoram, eles estão na pátria deles, perfeito, para eles
muito bom, lógico. Eles tiveram problemas, passaram por dificuldades terríveis, foi
um país praticamente dizimado por uma guerra que durou muito tempo, mas eles
são patrióticos, eles são felizes. Realmente é um povo feliz, é um povo feliz, eles
não se queixam das agruras da vida deles.
Os costumes, a cultura desse povo como é?
Para nós é muito diferente, para eles é lógico: Cultura na vida deles é incompatível
com uma realidade de São Paulo, que é uma cidade imensa, industrial, moderna,
uma capital, maior cidade da América do Sul. Muito comum, não existe
comparação, cada um é um, cada um tem uma realidade.
Como você percebe em relação à segurança e à saúde?
Nunca tive o menor problema com relação à segurança. Talvez seja até muito mais
seguro do que uma cidade grande, porque ainda é tudo muito colonial. É uma coisa
ainda tranqüila. Quando começa chegar à cidade muito próxima do campo, começa
aquele problema de desemprego. Enfim esses problemas são os que na verdade
acho que geram e fazem com que aconteça aquilo que gera insegurança: assalto,
crime, enfim essas barbaridades. É mais uma questão econômica do que cultural.
O país, o povo é extremamente calmo, pacífico.
217
Em relação à assistência médica à saúde?
Ah! Não tem, é uma coisa que depois de ter sido aniquilado (o país). trinta anos
que eu estou aqui, agora que recentemente que nós temos água, luz, telefone. A
internet ainda não chegou, não tem linha baixa, então é tudo muito mais difícil, tudo
é muito mais complicado. As estradas ainda são todas sem asfalto, é assim... Foi
um país que começou muito tempo depois do que o nosso país. Então ele caminha
muito mais devagar, porque ele tem menos tempo, é um país ainda mais infantil.
Em relação à empregabilidade aqui?
Obviamente, as oportunidades são muito maiores, porque é um país novo. Quando
o país é mais antigo, como no caso de você encarar uma Europa, você não tem
condições de achar, de encontrar emprego nenhum, a não ser uma mão de obra à
qual você não se sujeitaria. Aqui não. Aqui, se você tem um pouco mais do que
qualquer outra pessoa, uma cultura um pouquinho a mais, se você tem um
diplominha a mais, se você tem qualquer coisinha a mais, você é um Deus! Porque
você tem alguma coisa, eles ainda não têm! Então é fácil conseguir uma colocação,
é fácil você se impor, porque você tem um nimo de conhecimento a mais do que
os outros, os paraguaios.
Como é que você percebe as suas perspectivas em relação a esse país. Essa
situação toda que você está comentando? Alguma coisa você já falou...*
É uma coisa que eu acho que tem muito futuro, grandes perspectivas. Dentre as
pessoas que vieram pra cá, os imigrantes daqui, talvez, alguns tenham vindo com
aquela mentalidade de: “Vou sugar o que eu puder”; mas é uma coisa difícil, porque
você acaba tendo os filhos, acabam fazendo nculos de amizade, vínculos
carinhosos... Então você vai ficando... porque também, é óbvio que, quando existe
uma rentabilidade, quando você está feliz com aquilo que está conseguindo para
você, é bom, não adianta negar o óbvio.
Falando um pouquinho de Brasil, como é que você percebe o Brasil em
relação à empregabilidade, em relação à economia e à política?
É. Cresceu bastante e, obviamente, os recém formados encontram muito mais
dificuldades porque existe certo saturamento no mercado, em todas as áreas.
Então nas grandes capitais fica cada vez mais difícil. Da mesma maneira que
muitos saem, vêm para um Paraguai da vida, se no próprio Brasil eles fossem para
um interior de Mato Grosso, para um interior de Goiás, para um interior de
Rondônia, também tenho certeza que ia ter possibilidades boas como se encontra
aqui. A situação política é diferente, a política do Brasil é diferente da política do
Paraguai.
Em relação à economia, o que você percebe de diferença entre esses dois
paises?
A economia no Paraguai acaba sendo uma economia mais estabilizada, uma coisa
muito mais tranqüila, mais estável, por ser mais nova, por não ter tantas outras... O
Paraguai é um país novo, então as coisas são simples. Você, aqui você conversa
com as pessoas, você anda, jamais vai conversar com secretária eletrônica,
conversa digital, não tem nada disso. Então qualquer problema que você tiver você
olha nos olhos de uma pessoa e você conversa. Olha, se você tiver que fazer uma
reclamação, enfim, em qualquer área, na área doméstica, na área profissional, na
área de serviço público, de qualquer serviço, você conversa diretamente com
alguém, não existe aqui ainda você conversar por telefone e ser atendido por uma
218
voz eletrônica, então tudo é diferente, não tem nunca comparação, aqui é aqui, lá é
lá.
Que você poderia citar de vantagens que o Brasil tem e que são desvantagens
no Paraguai? Vantagens que tem no Paraguai que são desvantagens no
Brasil? Algumas coisas você já falou.
citei quase todas. Fica difícil repeti-las mais que isso. O Brasil por ser mais
antigo, então ele te oferece melhores oportunidades de conforto, turismo de cultura,
de lazer. Essas coisas você tem, inclusive existe até um passado maior, se você
quiser visitar um museu, vários, você tem. Aqui você não tem, porque não tem,
porque está começando agora, o que havia antes foi destruído, o pouco que havia,
muito pouco, porque em 1800 não existia muitas coisas, mas enfim... E aqui as
vantagens que se encontram exatamente são essas, como é novo se você quiser
construir alguma coisa, se você quiser proporcionar alguma coisa, se você quiser
criar alguma coisa, vai ter aceitação, você não compete, ainda não tem
competitividade.
Você acaba de fazer uma bela definição de país.
Você sabe o que é um brasiguaio?
É eu acho que eu sei.
Você poderia definir para mim?
Um brasiguaio é aquela pessoa, é o imigrante que veio morar no Paraguai, mas
que se sente ainda um brasileiro e que não quer assumir que está morando em um
Paraguai. Apesar de comer no prato que come, de beber no copo que bebe, ainda
tem aquela coisa de, ah! Mas Paraguai, o Paraguai é um país de terceiro mundo, o
Paraguai ainda tem isso e aquilo e aquele outro e, no entanto está vivendo
vivendo muito bem, mas existe um preconceito contra você vir de um país Brasil,
que também não é tanta coisa, mas enfim, é o (preconceito) de você estar num
Paraguai.
Você se considera uma brasiguaia?
É difícil, é complicado, porque como eu ainda vivo no Brasil, vivo no Paraguai, não
me sinto nem um, nem outro, eu sou uma pessoa, acho que, muito maleável, muito
flexível, eu tenho facilidade de adaptação. Quando eu estou no Paraguai,
obviamente, eu não tenho intenção, nunca de magoar ninguém e de segregar
ninguém, de nada. Eu me sinto querida e acabo querendo bem as pessoas, então
gosto deles!. Quando eu estou no Brasil, a mesma coisa, então eu acho que se eu
tivesse que morar na Índia, no Japão eu também me adaptaria muito bem.
Em relação ao seu futuro, quais são os seus planos a curto prazo?
Hoje se eu pudesse escolher alguma coisa, eu queria morar numa praia bem legal,
que não tem nada a ver com a minha realidade de São Paulo, nem com a minha
realidade do Paraguai. Óbvio, a minha realidade não depende única e
exclusivamente de mim, depende da pessoa com a qual eu vivo e com a qual eu
me dou muito bem. Agora dinheiro é dinheiro, não adianta, queira bem ou mal a
gente não vive sem ele e o meu dinheiro está aqui, então qual vai ser o meu futuro?
Para os próximos cinco anos, dez anos?
Aqui. Aqui.
Está certo.
219
E se um dia eu puder escolher, eu quero ir para uma praia. Continuo querendo a
praia.
Eu não perguntei em relação as suas férias: Onde você costuma passar
suas férias?
Ah! O mundo é muito grande, as minhas férias não coincidem com as férias
normais de ninguém, então onde houver uma condição de um lazer agradável eu
vou desfrutá-lo, aqui ou lá, ou pode ser na Europa, nos Estados Unidos, onde eu
puder ir eu vou, mas aqui também. tive férias aqui, conheci um lugar que eu me
encantei o famoso “Chaco”, que eu achava que fosse o fim do mundo, mais muito
além do fim do mundo! E foi para mim uma surpresa extremamente agradável. É
um lugar que é o fim do mundo, mas a civilização é fantástica! É uma cidade
colonizada por Menonitas e de eles fizeram uma jóia, uma preciosidade. Vale a
pena conhecer. Foram umas férias muito gratificantes, aqui no Paraguai.
Certo. Muito obrigada!
220
Entrevistadora = Lélia Zambrano
Entrevistado = MIGUEL
* = textos utilizados
ENTREVISTA 4 – MAQUINISTA MIGUEL
Realizada em 10/01/2006; local: residência do fazendeiro, Ciudad del Este,
Paraguai.
(MIGUEL, masculino, maquinista, casado, zona rural, católico, proveniente
de Jovinópolis – PR, chegada com 11 anos, documentação ilegal)
Vamos começar? Vamos fazer a primeira etapa da nossa entrevista.
O que a gente gostaria que você realmente falasse: Da sua rotina, da sua vida.
Se você trabalha, se estuda aqui no Paraguai.
Aqui é uma região que se chama Alto Paraná não é isso?
Alto Paraná, é isso mesmo. Aqui nós trabalhamos ( ), porque estudar
venceu minha época. É continuar trabalhando.
Você é casado?
Sou casado.
Possui Filhos?
Não, não tenho nenhum.
Você é responsável pelo sustento da casa.
Sim.
Você mora em zona rural ou urbana?
Zona rural.
E qual é sua profissão? Em que você trabalha?
Maquinista. Levo trator, carreteira, qualquer caminhão. Qualquer coisa que nós
devemos fazer.
Você atua numa fazenda na área de soja?
É de soja, isso mesmo. Soja, milho, trigo. Estamos aqui plantando.
Você trabalha com o trator?
Sim, com o trator.
Como era a sua vida no Brasil? O que você fazia lá?
No Brasil, eu estudava, ajudava sempre meu pai na roça. Às vezes, ajudava ele
também, mas era pouco, porque eu era fraco e ainda tinha 11 anos.
Você saiu de lá aos 11 anos de qual cidade?
221
De Jovinópolis.
De que estado?
Estado do Paraná.
Por que você veio ao Paraguai?
Nós viemos à procura de uma vida melhor. Porque também não era fácil pra nós
e viemos para cá.
E como você veio pra cá? Com o seu pai... Você tinha 11 anos...
É tinha 11 anos.
E atualmente você tem a documentação legal daqui?
Daqui não, não tenho. Não! Nessa parte estou ilegal, que até hoje nunca me
incomodaram.
Você pretende voltar ao Brasil?
Sim eu queria voltar.
Como você percebe o Paraguai em relação à cultura do povo paraguaio?
Os argumentos (deles) são muito bons, eles não são racistas, esse tipo de coisa
acho que não tem com ele(paraguaios).
Em relação à segurança?
Ah! A segurança é um pouco fraca, né. Acho que não é como no Brasil. No Brasil a
segurança que nós temos, eu acho que é mais forte: tipo policiamento, acho que é
melhor né?
Em relação à saúde e assistência governamental?
Eu acho que a saúde lá também é melhor do que a daqui.
Em relação à perspectiva de emprego aqui no Paraguai.
Eu acho que emprego seria mais fácil aqui.
Tem mais facilidades aqui?
Eu acho que sim.
Como você percebe o Brasil? Em termos de segurança, de saúde, você
falou em relação à perspectiva de vida lá? Se você voltasse para Brasil um
dia...
É eu vim muito novo de lá. Eu teria de rever pra eu (mim) saber bem como eu ia
fazer lá.
Quais as vantagens que você consegue perceber aqui no Paraguai e não tem
no Brasil?
Óia, pelo que a gente escuta o emprego lá é difícil ( né ), por isso que a maioria...
Como você a situação do Paraguai hoje, como ela é para você? Como é
que você se sente em relação à família? Você está bem adaptado?
Eu me sinto muito bem aqui.
Relacionamentos, amigos...
É muito bem também, tenho muitos amigos não tenho inimigos.
222
Em termos de lazer, passeios, divertimentos?
É bom também, a gente se diverte muito também.
Em relação à religião.
Religião, ah! A religião, religião católica, eu estou seguindo ela desde novo ( ).
Então eu acho que vou seguir até o final.
Miguel, você incentivou algum amigo ou parente, para vir ao Paraguai para
trabalhar ou viver aqui?
Não, nunca incentivei.
Você sabe o que é um brasiguaio?
Não, eu não estou muito a par disso não. Brasiguaio deveria ser um brasileiro que
veio de lá, mas...
Aqui vocês não são chamados de brasiguaios?
Não! Não! Não...
Não? Você não se considera então um brasiguaio?
Não, eu acho que não, porque é tudo igual, acho que no modo de...
Assim como o nosso bate papo está acabando, pensando um pouquinho em
termos de futuro, o que você planeja. Quais os seus planos para daqui um
ano? O que você pretende fazer?
Daqui um ano? É daqui um ano eu vou estar (tá) aqui ainda trabalhando.
Nos próximos cinco anos, você prevê alguma mudança?
Ah! Tudo depende do que correr durante esse tempo. Acho que não, a gente vai
mudando em termos, em relação ao trabalho.
E nos próximos dez anos? Você já pensou algum dia?
Não, ainda não. Daqui uns dez anos quem sabe já estou no Brasil.
Você pretende um dia voltar para o Brasil?
Eu quero voltar, mas não vai ser tão cedo.
Está bom Miguel. Muito obrigada!
223
Entrevistadora = Lélia Zambrano
Entrevistado = ZICA
* = textos utilizados
ENTREVISTA 5 – BOIADEIRO ZICA
Realizada em 10/01/2006, local: residência do entrevistado, Ciudad del Este,
Paraguai.
(Zica, masculino, boiadeiro, casado, zona rural, católico, chegada com 8 ou
9 anos - 1973, documentação ilegal)
Você é casado Zica?
Eu sou casado, eu estava juntado há 14 anos e ai casamos em julho.
E tem filhos?
Tenho cinco filhos.
Seus filhos já são paraguaios ou nasceram no Brasil?
Todos eles nasceram no Brasil. Nasceram (nasceu) e registrei todos mesmo,
eu não tenho nenhum registrado aqui. Eu quero registrar dois ainda aqui. As
meninas eu quero registrar aqui. Os meninos (piás) não, porque os meninos (piás)
é mais complicado tem que tirar o exército, essas coisas, e as meninas não têm
essa complicação.
Você trabalha na zona rural?
É.
Você é o sustento da casa?
Sou.
Como era a sua vida no Brasil?
Do Brasil até que eu não posso falar muito, porque eu vim de com nove ou 10
anos.
Então, foram seus pais que o trouxeram?
Eu vim com os pais e, quando nós entramos aqui era difícil. Era tudo mato. Não
tinha estudo, por isso que eu não estudei, não tenho estudo, gostaria muito de ter
estudado, mas não deu. O pai e a mãe, na época que nós entramos aqui, era tudo
mata, foi sofrido. Você tinha que carregar a mercadoria pra comer 14 km (e
carregar) nas costas, não era fácil. Mas agora, de um tempo pra foi mudando,
mudando, está mais fácil.
É como o Mario estava dizendo, chegou a luz e chegou a água.
Chegou tudo, de primeiro não, era tudo no escuro, no escuro mesmo, não era fácil.
224
Porque seus pais vieram pra cá?
Eles vieram em uma época que meu pai trabalhava e trazia mercadoria da
Argentina. Daí começou a enfraquecer, enfraquecer e tinha gente, (que era o
compadre dele), que morava aqui e falou: é bom, você vai fazer a vida, vende o
que você tem aqui e vai pra lá. Daí o pai vendeu e viemos, e daí ele não pode
comprar a terra. O dinheiro que ele trouxe dava pra comprar, mas daí começou a
mexer com doença. Tudo era mato, nós todos pequenos, nós éramos (era) oito
crianças; o maior tinha 12 anos, daí um irmão meu adoeceu, ficou aqui oito dias,
não tinha recurso pra levar 60 km de estrada de chão, embaixo de chuva e, quando
ele conseguiu levar, chegou internou na Santa Casa, mas faleceu. Internou às 5
horas e às 11 da noite faleceu. Era difícil, depois uma outra irminha também foi
picada de cobra, gastou bastante, um irmão meu, o mais velho, que mora no
Paranambu teve também problema de amarelão, teve que levar para Argentina.
Gastou tudo e ele não conseguiu comprar a terra. Era uma época bem difícil aqui
quando nós entramos. O modo de viver hoje é muito melhor! É outra vida!
Então você está aqui há 30 anos?
Quase 30 anos, nós entramos aqui em 1973 e meu irmão fala que é antes. De 1973
para 2006 estaria com 33 (35) anos.
Quantos filhos você tem?
Cinco: duas meninas e três piás.
Como você sente o Paraguai hoje, em relação a sua vida aqui, seu trabalho...
perspectivas para seus filhos...
Eu acho que vai ser melhor do que na época em que nós entramos, porque agora
estão todos eles. Os mais velhos estão estudando, eu acho bom o estudo
deles aqui, eu acho que vai ter algum futuro.
Eles estão estudando agronomia? O que eles estudam?
Não! Eles estão... Ainda são pequenos. O meu menino mais velho está na terceira
série, um na quinta, outro na quarta e, outro na segunda.
E como é que você percebe o Brasil? Que imagem você tem?
Eu sempre tive vontade de voltar para o (pro) Brasil. Sempre tive vontade. Eu gosto
do Brasil, a política agora que está bem complicada. A do Lula a gente pensava que
ia ser (mais) melhor, esperamos que possa melhorar, eu não quero falar sobre isso
daí, mas eu tenho vontade de ir para o (pro) Brasil.
Em relação à segurança como você sente a diferença entre Paraguai e Brasil?
Os dois são bem complicados, tanto que aqui no Paraguai, acho que tem quase
mais segurança que no Brasil. Eu desconfio, eu penso que tem mais. Agora, de
pouco tempo pra que começou acontecer uns casos: dois vizinhos que a própria
polícia estava metida nos rolos, então, que isso, no Brasil também a gente
escuta. Há mais tempo que aqui.
Aqui começou agora?
É. Não é de tanto tempo.
A corrupção policial você quer dizer?
É. A lei aqui no começo era mais dura, agora ela começou a dar uma afrouxadinha.
Mas eu acho que a lei daqui é mais segura que lá. Eu mesmo estou aqui 35
anos. Eu nunca fiz documento do Paraguai e, eu ando por todo lado. Eu vou pro
225
Brasil, volto, quando dependo de doença, a gente (nóis) vai mais pro Brasil do que
aqui.
Eu ia lhe perguntar se você está legalmente ou ilegal no Paraguai. Você
respondeu e estaria ilegal?
Eu estaria ilegal.
E ninguém o incomodou?
Até agora ninguém me incomodou, ninguém me prendeu por causa disso. Sempre
converso com eles e sempre aceitam a minha opinião. Eles aceitam a opinião das
pessoas, tem muitos que não, às vezes vai e não sabe se expressar com a
própria autoridade, a autoridade é ruim, mas eu acho que não é ruim.
Como é hoje você em relação à religião? Você pratica alguma religião? Em
relação ao lazer aqui no Paraguai?
Pratico a religião católica, sou da religião católica, fiz convívio e tudo, eu acho
que é bom, eu acho que cada um tem que ter uma religião, seja lá qual for, que siga
a religião dele.
E para passear? Quando você sai de férias? Onde você passeia?
Ah! Eu mesmo, sinceramente, no serviço que eu trabalho aqui, muito poucas
férias. Meu serviço é mexer com gado, porco, qualquer criação de animal, então
você tem muito poucas férias, daí eu sempre fiquei mais em casa. Aqui a gente
(nós) se diverte, vem gente aqui na fazenda, não vou citar o nome. Mas é divertido
aqui! Eu gosto. É o lugar de que eu mais gostei, do tempo que eu morei. Sobra
lazer.
E você sabe o que é um brasiguaio?
Um brasiguaio é o que vem do Brasil e fica aqui sem documento, fica legalizado
aqui dentro, esse é o brasiguaio, na minha opinião.
Está certo! E você se considera um brasiguaio?
Eu me considero porque eu estou aqui tanto tempo, então eu me considero um
brasiguaio, apesar de que eu não me legalizar, mas eu me considero brasiguaio.
Aqui vocês recebem em dólares ou em guarani? Como é que vocês recebem
aqui? Em real?
Aqui, onde eu estou (to) é em guarani.
O que você tem em relação aos hábitos do pessoal que trabalha aqui e que
são paraguaios e, aos hábitos dos brasileiros que vieram pra cá.
Você acha que são diferentes ou acabam se confundindo como: a comida e a
alimentação, o linguajar.
A alimentação é um pouco diferente dos brasileiros com a dos paraguaios
legítimos. Eu já trabalhei com os paraguaios, por 12 anos, então eu gosto. Mas têm
muitos (brasileiros), dependendo do lugar que trabalham, não vão se adaptar. Não
se adapta o brasileiro vindo de lá. Se adaptar com a comida quando trabalha com o
paraguaio (patrão) é difícil.
É diferente?
É diferente.
Mesmo esse brasileiro que vem do Rio Grande do Sul, Paraná, é diferente?
226
É diferente. A comida do paraguaio com a do brasileiro. É diferente. A deles é mais
sopa, carne, essas coisas. A do brasileiro é mais aquela comida mais enxuta.
É arroz e feijão?
É arroz, feijão. Então, eles mais fazem caldo, sopa. Eles cozinham uns ossos lá,
mandioca, carne também, então fazem aquele sopão. E o brasileiro é difícil se
adaptar com isso.
Certo, Zica! Era isso que a gente queria, muito obrigada por ter nos ajudado!
Às ordens, qualquer coisa que precisar da gente... Não sei se me sai bem.
227
Entrevistadora = Lélia Zambrano
Entrevistado = Celso
* = textos utilizados
ENTREVISTA 6 – ANALISTA DE GRÃOS CELSO
Realizada em 11/01/2006, local: escritório do entrevistado, Cedral, Paraguai.
(Celso, masculino, analista de grão, ano de escola, casado, zona urbana,
proveniente de Altamira – PR, chegada em 1979, documentação legal)
Em primeiro lugar, Celso eu queria que você falasse um pouco sobre sua
vida.
Há quanto tempo, Celso você está aqui no Paraguai?
Há vinte e sete anos.
E quantos anos você tem?
Eu estou com 38 agora.
Ah! Então você veio do Brasil de que cidade?
Eu vim de Altamira no Paraná.
Ah! Você veio do Paraná, Altamira. Você veio com seus pais?
Sim, eu vim com os meus pais.
Criança? Quando você saiu do Brasil. Eu tenho curiosidade em saber, quando
você saiu do Brasil você tinha até quanto de escolaridade. Você fez o
primário?
Eu tinha o 2º ano de escola.
E depois você veio para cá e estudou?
Estudei. Eu estudei o ano brasileiro, que naquela época se falava o ano de
escola e, depois quando fomos voltar à escola, o espanhol era obrigatório, eu voltei
tudo no começo de novo. Então naquele tempo se fosse pra fazer dois anos por
um, eu faria sossegado, mas como tinha que ser no ritmo das outras crianças, que
eram mais atrasadas, então eu tive que seguir eles. Ai eu voltei para (pro) começo
de novo.
E ai, era aqui no Paraguai que você estudava?
Isso.
Aqui no Cedral mesmo?
Não, na colônia Goianista, do Juliano.
Hum...
Era retirado.
228
E ai quantos anos você fez de escola?
Eu fiz quatro anos, quatro anos de escola.
Você teve noções de guarani também ou só castelhano?
Naquele tempo era só castelhano - espanhol, era obrigado fazer o espanhol.
Afinal de contas você estava na terra deles né?
que como tinha também os paraguaizinhos, os garotos paraguaios, surgiam
muitas coisas em guarani que a gente também aprendia ( né). Aprendi a falar.
Você tem filhos?
Quatro
E você mora na zona rural ou urbana?
Agora é urbana.
Por quê? Você morava na zona rural antes?
Antes eu morava na zona rural
Onde?
Aqui no Cedral mesmo.
Aqui no Cedral, você morou quantos anos?
Aqui no Cedral, vamos voltar para (pro) começo, na colônia do Juliano moramos
quatro anos lá, depois até 2000 moramos aqui no Cedral mesmo, mas na zona
rural. Agora estou morando em Foz.
E você mudou-se para Foz por quê?
O que mais nos levou daqui pra Foz foi problema de saúde. Como eu comentei com
o Dr.Wagner, o pai ficou doente e, as meninas precisavam também de fisioterapia.
Então juntaram dois fatores bem complicados, que empurraram a gente... Aquí é
bem difícil, não é?
Difícil como? Precário. Difícil, longe. Difícil em que sentido?
Sentido que aqui não tinha praticamente médico. Tem médico, mas é tudo pago e
naquele tempo a gente não poderia estar pagando e segundo, meu pai é de idade.
Nessa estrada que é de chão, com aquele movimento todo, ele ia acabar morrendo
no meio da estrada, como o médico mesmo disse. Então, tinha que mudar pra Foz
do Iguaçu. Aquela fila (na ponte da Amizade) também é insuportável pra cruzar.
O médico falou: - Traga o seu pai pra cá, que ele vai acabar morrendo nessa fila.
Que fila?
Fila da Ponte da Amizade, né?. A Ponte da Amizade - aquilo mata qualquer um
aquela fila. Então acabou passamos a morar lá. Então em vez do meu pai e a
minha menina que é doente ficar nesse trajeto fico eu, que estou com saúde. Eu
faço esse trajeto, pra ir e visitar minha família.
Então você trabalha aqui no Paraguai? Você tem documentação paraguaia?
Tenho.
Qual é a sua documentação aqui? É correta, você tem tudo?
Tudo certinho. Começa pela imigração que é obrigatória fazer, ai eles pedem a
cédula identidade, que é um documento que tem que se fazer. Eles obrigam, é um
229
documento obrigatório fazer também. Fiz também, por um tempo, eu fiz o titulo de
eleitor também, no caso de votar. Tenho que ver com eles se ainda está valendo.
Mas tenho ele e, tenho o retorno de imigrante, agora estão exigindo este retorno.
Tenho esse retorno. Tenho carteira de motorista. Quer dizer pelo menos tudo o que
pedem pra gente estou tentando fazer.
Qual é a sua profissão no Paraguai?
Hoje eu desenvolvo a profissão de analista de grãos, soja, milho, trigo.
Celso você lembra como era a sua vida no Brasil, que você veio muito
pequeno pra cá? Como era?
A gente morava na colônia, no sitio, era gostoso. A gente tinha gado, tinha uma
roça, a gente tinha tudo. Mantimento tirava da colônia, tudo legal. Muito bom lá! Só
que depois foram nos cercando. A gente se mudou de lá também, porque os
fazendeiros foram comprando a terra e, nós fomos ficando presos no meio
daqueles fazendeiros e não tivemos como ficar.
E ai quando vocês vieram então para o Paraguai, foi por qual razão?
Primeiro, o meu irmão mais velho, que naquele tempo tinha 18/19 anos, tinha um
amigo aqui no Paraguai. Na verdade a gente ia também pra Rondônia, mas como o
meu irmão vinha visitar os amigos aqui, no Paraguai, então pediram para que o pai
também viesse ver, e o pai ia gostar.
Gostaram demais aqui das terras e o meu pai se empolgou, veio ver as terras e
realmente era terra boa. A terra é boa, meu pai veio gostou, vendeu o sitio e
investiu aqui na terra. Comprou esse pedaço de terra um pouco maior (mais
grande). A gente tinha 10 alqueires lá, compramos 15 alqueires aqui. Como a
família era rapaziada o meu pai falou então: - Dá certo esse coreto, vamos tentar!
E ai todos os rapazes começaram a trabalhar?
Todos.
Todos os seus irmãos moram aqui no Paraguai?
Não. Hoje só está aqui um irmão, os outros já voltaram pro Brasil.
Então me conta uma coisa: Como você percebe o Paraguai? Como são as
pessoas? O que você acha da cultura, dos costumes, da política, da
economia. Assim, como é o Paraguai pra você na sua vida? Enfim, como você
vê o Paraguai?
Eu vejo o Paraguai de uma forma assim... Que a gente torce pra entrar uma
pessoa, no caso um político, de faça política séria, que a chance (ao Paraguai)
de virar um ótimo país. Ainda está faltando essa política séria no Paraguai. Não
está sendo um país legal, ainda por causa disso. A partir do momento que entrar
um político que pensar mais no país deles (porque os políticos não estão pensando
no país deles) e quando pensar no país deles tenho certeza que vai ser um ótimo
país. Num bom tempo pra frente vai ser um bom país.
Como são as pessoas? Como eles o tratam? Como você sentiu quando você
veio pra cá? Como você foi recebido, a sua vivência? Como foi com os outros
paraguaios? Qual a receptividade do Paraguai para com você?
Eu diria que foi boa a recepção que eles tiveram conosco (com s). É claro que
sempre tem aquele atrás, aquela cisma, a pessoa estranha com a outra. Não
precisa ser com o paraguaio, até mesmo com o brasileiro quando uma pessoa
estranha. Mas foi bom porque a gente lembra, quando a gente morava em baixo.
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Tinha muito mosquito e, chegam àqueles caras do mosquito da dengue, contra
aqueles mosquitos. Todos com cisma da gente e a gente com cisma deles. Mas
aquilo lá, pra mim, foi um anjo sabe, que veio pra acabar com os mosquitos e a
gente poder dormir a noite toda, foi legal. É claro que existem alguns que ainda são
meios (racistas), como eu vou dizer pra senhora: - Como se diz, essas pessoas
racistas que existem, isso existe mesmo! Mas não é por causa de um, que a gente
vai condenar todos, não! Tem muita gente boa, que merece melhoria, para o país
deles, porque essas pessoas são muito boas.
E o que você acha, da segurança, da economia, da saúde, da
empregabilidade? No Paraguai, como você vê nessas áreas?
É resumir aquela fala dos políticos, quase a mesma coisa a partir do momento que
acho que entrar um político bom e pensar no país deles. Vai melhorar muitas
coisas. Parte do que a senhora está perguntando - vai melhorar bastante porque
por enquanto eles estão judiando muito! Estão (Tão) pensando no bolso deles, eu
acho que vai melhorar muito, na hora que entrar um (político) sério que pensar no
país deles!
E o Brasil como você vê?
O Brasil é, como diz a maioria do povo, não só brasileiro, mas como o mundo diz, é
um diamante grandão e bonito. Todo mundo gosta dele! Todo mundo quer ir pra lá.
Eu acho que o Brasil é assim, então eu pretendo ir pro Brasil! Sim.
Se você pudesse dizer... Assim quais as vantagens que você sente entre o
Brasil e o Paraguai? Quais seriam as vantagens de você estar no Brasil e
quais seriam as vantagens de você estar no Paraguai?
Hoje, para mim, a vantagem de eu estar no Paraguai, resumindo, por causa da
aquela parte do estudo, né? Por isso, se for estar no Brasil, qualquer servicinho ia
exigir muito estudo de mim e, eu não tenho muito estudo. Então, aqui começa
que você tem mais chance de achar um emprego melhor, ganhar um salário até
razoável e lá tem muita gente estudada. Estão lá competindo com os empreguinhos
que aparecem.
Muito bom! Muito boa essa sua resposta. E no Paraguai, seu relacionamento
com a família, entretenimento, lazer, religião: O que o Paraguai lhe oferece?
Como é o seu lazer, como é a sua religião, como é a sua família, como é a
economia Paraguaia na sua vida? Como são essas coisas no Paraguai. E
como país, como se encaixa em você?
Ah! Eu sei lá, religião sim, a religião são muito religiosos levam a sério, são
dedicados com a religião deles, acho que a família pra eu (mim) falar alguma coisa
não entendi bem como eu podia dar essa resposta.
Como você acha a família no Paraguai; É uma família unida? Eles são
extremamente familiares ou é uma coisa mais largada? Eles se preocupam
muito?
Primeiro a gente tem morado perto de uma família a gente procurou seguir bem
perto, o vizinho. (modelo) Eles se preocupam muito com a família, a educação, o
filho tem que respeitar o pai, uma coisa que eu gosto muito daqui. Até no colégio
isso acontece, o filho tem que respeitar ao pai, tem que obedecer e, na escola é
obrigado a obedecer ao professor, é um ponto muito importante. Eu acho que aqui,
no Paraguai, nós temos nosso amor. É isso ai, porque no Brasil, o professor não
tem voz ativa com os alunos, os alunos deitam e rolam com a professora. A
madrinha da minha esposa é uma professora e ela reclamou isso pra nós. Ela não
231
tem o direito de repreender um aluno, (dentro da escola), que ele vai denunciá-la e,
tudo vai contra ela sozinha. Aqui não! Aqui o professor tem o direito de educar. A
disciplina aqui é muito legal, muito boa, ótima, a disciplina é boa.
Celso, você sabe o que é um brasiguaio?
Eu não entendo muito, mas eu acho que eu sou isso aí? Eu sou uma coisinha
dessa.
Então você se considera um brasiguaio? E o que é isso brasiguaio?
Um brasiguaio eu acho que pelo menos o que eu entendo, não sei ao certo, não
sou muito bom. Eu estou (tô) aqui, trabalho aqui e, ao mesmo tempo eu estou no
Brasil. Então eu convivo um pouco com o paraguaio e dependo um pouco do Brasil.
Então não posso dizer que eu sou paraguaio e nem que eu sou brasileiro,
né?
Quer dizer que você é tico-tico no fubá? Um pouquinho aqui, um pouquinho
lá.
Sim, um pouquinho aqui um pouquinho lá.
Celso, agora conta pra mim uma coisa, sobre o seu futuro. Como você o a
curto prazo, a médio prazo e a longo prazo? Quer dizer assim, nos próximos
dois anos, cinco anos e depois de 10 anos. Em relação ao que você vê no
Paraguai?
Ah! Eu não sei não, não pensei muito nisso... Não sei pra frente não, mas a gente
sempre espera que as coisas melhorem, que a gente tenha uma qualidade um
pouco melhor pra frente, né? O que eu acho é que o sonho de todo mundo que
melhore. Como eu disse antes, a partir do momento que o país, o Paraguai,
começar a pensar mais no país deles, eu acho que vai ter uma grande chance de
melhoria aqui dentro, não só pra brasiguaios e aos outros.
É isso ai Celso! Gostei muito que você me contasse um pouquinho de você
em relação ao Paraguai. Muito obrigada!
De nada.
232
Entrevistadora = Lélia Zambrano
Entrevistado = Mario
* = textos utilizados
ENTREVISTA 7 – ADVOGADO, AGRICULTOR, EMPRESÁRIO MARIO
Realizada em 09/01/2006; local: no carro do entrevistado a caminho da
fazenda, de Ciudad del Este até o Rio Paraná, Paraguai.
(Mario, masculino, agricultor, Superior Completo - advogado, casado, zona
urbana-rural, proveniente de São Paulo, desde 1975, documentação legal)
Em primeiro lugar fale um pouco sobre você, sua rotina, se você trabalha ou
estuda aqui no Paraguai?
Eu trabalho no Paraguai. Estou no Paraguai muito tempo, cheguei aqui no ano
de 1975. Primeiramente nesta época eu trabalhava também em São Paulo. Fiquei
com essa propriedade agrícola de 1975 até o ano de 1990, eu ainda trabalhava em
São Paulo. Em 1990 eu mudei definitivamente para cá. Então eu estou aqui,
somando as duas épocas, quase 31 anos. Nosso ramo aqui é agrícola, primeiro nós
trabalhamos com hortelã, depois passamos para pecuária, depois viemos para soja
e milho. Hoje nós plantamos, soja, milho e trigo - é a nossa atividade. Sendo que a
soja representa quase 90% do nosso movimento.
Você é casado?
Sim, sou casado. Minhas filhas são grandes, nasceram depois dessa época
que nós estávamos aqui. Tem documentação Paraguaia.
Você mora em zona rural ou urbana?
Moro em zona rural. Moro em zona rural a maior parte do tempo, e também tenho
um apartamento em Ciudad del Este, que esporadicamente eu uso, mas a maior
parte do meu tempo é na zona rural.
Você é um fazendeiro ou só pecuarista?
Não, quase 100% agricultor, a pecuária nossa é irrelevante. Nós estamos em uma
região onde é quase essencialmente agrícola, não é uma região muito propicia a
pecuária, são poucos os pecuaristas aqui na região, muito poucos.
Como era a sua vida no Brasil? O que você fazia?
Era completamente diferente. Eu advogava. Eu trabalhava em São Paulo, na
capital, e era advogado. Não tinha absolutamente nada a ver com isso daqui, foi
depois que eu tive um pouco de condição vim, comecei pequeno e, ai tudo foi
ajudando, tudo foi dando certo, até ficamos um pouco maior.
Porque você veio realmente para o Paraguai? A busca de que?
Ah! Daí, eu sempre gostei da vida no campo. Era um ideal meu a vida no campo.
Daí foi uma coincidência, não foi uma opção minha, foi uma opção da época do
meu pai. Meu pai que começou e que comprou isso aqui da primeira vez e, logo em
233
seguida ele não quis continuar, e eu continuei, porque era um lugar que dava
condição de trabalhar, desde 1975 pra cá, nós tivemos uma certa estabilidade
econômica. As terras eram muito boas, de primeira qualidade, então nós fomos
ficando, foi dando certo e quando eu vi, eu tava. tinha crescido um tanto aqui
e, no Brasil era uma época de inflação muito grande. Os negócios não eram como
aqui, tudo era mais estável, mais sossegado, e ai eu optei largar e vir embora
para cá. Foi no ano de l990, mais ou menos, ai eu larguei tudo lá e vim embora.
Como que você percebe o Paraguai? Em termos de cultura, de estudo, na
política e na economia? *
O Paraguai é um país economicamente estável, é um pais que para quem trabalha,
pra quem quiser trabalhar, fica mais fácil aqui que em outros lugares. É um país
que o imposto é bem menor que em todos os outros lugares do mundo. Quanto à
política é a mesma, desde que eu estou aqui. Primeiro era uma ditadura, com o
Strossner, o partido colorado dominante, o partido colorado domina até hoje, não
teve grandes mudanças
Existe, de fato existe, por parte dos paraguaios uma preocupação em
cultura para esse povo. escola em qualquer lugar, na medida da
economia deles. É um país pobre, mas eles não deixam de dar educação.
Existe um pouco de recurso na parte médica, tudo muito limitado, como no
Brasil, que é (também) tudo muito limitado, as escolas públicas são fracas!
Tudo que depender de saúde pública é fraca! Mas, os impostos são muito
menores, então, é mais fácil para você, pois sobra recurso pra você pagar
um particular aqui, que é um pouquinho melhor. A parte da política, da época
que eu estou aqui até hoje, não mudou grande coisa. Houve uma mudança
com a caída do presidente Strossner, mas ai vieram as eleições e continuou
nisso ai...
Como você percebe o Brasil atualmente?
Eu percebo pela televisão e, na televisão mostra a corrupção, os impostos terríveis,
custo de vida altíssimo, mais complicado, mais difícil do que aqui. Eu acho aqui
mais fácil, apesar de que aqui também corrupção. Mas no Brasil é bem maior a
corrupção, tem que ser bem maior também.
Em relação a sua atividade, o que você sente de vantagem e desvantagem em
relação Brasil e Paraguai? O que você percebe que lá tem vantagens?
O Brasil tem uma vantagem de ter o mar, nos não temos o mar. Então nós temos
um custo de exportação, porque o nosso produto, na parte agrícola, é todo
exportado, do Brasil também grande parte é exportado. Na parte agrícola, nós
dependemos do Brasil nessa parte.
Para exportar soja?
Para exportar soja, exportar milho, exportar trigo, exportar carne, muitas vezes o
corredor é o Brasil. A parte de corredor, não que o Brasil seja o comprador, mais
nós precisamos usar um porto. Esse último governo paranaense causou
dificuldades, não ao Paraguai, como ao Mato Grosso, como ao Centro-oeste,
como todos aqueles que usavam o porto de Paranaguá. Isso deixa o custo um
pouco elevado. Elevou bastante o custo pra nós aqui, de exportação, por outro lado
a legislação paraguaia permite a importação de insumos genéricos, então isso
custa 50% o valor do produto brasileiro. Nós pagamos aqui todos os herbicidas,
fungicidas muito mais barato que no Brasil. Ai você tem essa grande compensação,
234
temos a nossa qualidade da terra que é melhor, que em grande parte do Brasil e,
temos essa vantagem, com custo bem menor.
Como você vê a situação atual do Paraguai? Perspectiva para o futuro?
Vejo igual ela sempre foi, não vejo grandes modificações. As modificações aqui
acontecem muito devagar, não vejo piora e grandes melhoras, também, estão
crescendo, o agricultor brasileiro vem em massa pra cá, hoje os filhos dos
agricultores brasileiros que são paraguaios, são muitos e, estão desenvolvendo
mais terras. Estão abrindo mais a fronteira agrícola. Aqui cresceu muito. É a mesma
meta que nós tivemos desde o começo que eu estou aqui.
Você sabe o que é um brasiguaio?
Brasiguaio? Somos nós! Os imigrantes. Eu vi três gerações aqui, estamos na
terceira geração. Nós os primeiros - somos os brasiguaios - agora essa (geração)
nascida aqui está formando, mais um pouco, irá terminar os brasiguaios, vai
virar tudo paraguaio.
Você se considera um brasiguaio?
Sim, perfeitamente, brasiguaio.
Por quê?
Porque é uma denominação que foi dada a nós! Nos foi dada essa denominação -
brasileiros que vieram para o Paraguai.
Você já está legalmente no Paraguai?
Sim estou legalmente, desce a minha chegada aqui, que eu estou legal. Eu tenho a
minha legalização que é de 1975.
Fale-me um pouco da parte de lazer, entretenimento que você tem aqui no
Paraguai?
Sim, temos nosso lazer, fazemos nossas festas, tem muito brasileiro. Juntamos um
dia na casa de um, um dia na casa de outro. Antigamente eu gostava de pescar,
hoje não gosto mais, tem o rio pertinho. O clima no verão é propicio às festas. O
inverno é mais rigoroso, no inverno todo mundo fica em casa, mas, como no Brasil,
como era nossa vida no Brasil.
Como você vê a sua perspectiva do Paraguai para os próximos dois anos?
Ah! Para os próximos dois anos, a mesma coisa de sempre, sempre plantando,
sem nenhuma modificação nos próximos dois anos. O que nós fizemos até hoje
vamos continuar.
Nos próximos cinco anos?
Nos próximos cinco anos a perspectiva é de um dia, não sei se em cinco, se em
oito ou em 10 nos, mas um dia eu reduzir o meu ritmo de trabalho. Aos poucos ir
deixando para alguém ficar no meu lugar. Sair do Paraguai para trabalhar em outro
lugar eu não vou! Pretendo continuar, na parte de trabalho, na parte de ganhar
dinheiro eu nunca mais saio daqui!
Você pretende um dia voltar para o Brasil?
Pode ser. Pode ser, na velhice, pode ser questão de saúde, com uma idade
mais avançada e se a saúde quiser ir pra mais perto de médicos. Essas coisas
que a zona rural não oferece. Ciudad del Este não oferece. Foz do Iguaçu não
235
oferece uma assistência médica adequada, então seria minha única opção, era a
única opção, daí seria São Paulo e muito mais pra frente, na velhice pode ser.
Muito obrigada!
Não seja por isso. Sempre às ordens.
Anexos
239
ANEXO A – Gráfico dos acordos realizados na América Latina – Cronologia do Mercosul
ALALC
1960
MCCA
1960
CARICOM
1968
PACTO
ANDINO
1972
ALADI
1980
MERCOSIL
1990
G-3
1990
NAFTA
1990
UE
1990
CEE
1957
EFTA
1959
Argentina
Brasil
Paraguai
Uruguai
Argentina
Brasil
Paraguai
Uruguai
Argentina
Brasil
Paraguai
Uruguai
Alemanha
Bélgica
Dinamarca
Espanha
França
Grécia
Holanda
Itália
Irlanda
Luxemburgo
Portugal
Reino Unido
Noruega
Suécia
Finlândia
Alemanha
Bélgica
Dinamarca
Espanha
França
Grécia
Holanda
Itália
Irlanda
Luxemburgo
Portugal
Reino Unido
Noruega
Suécia
Finlândia
Islândia
Áustria
Liechtenstein
Suíça
Bolívia
Chile
Colômbia
Peru
Venezuela
Bolívia
Chile
Colômbia
Peru
Venezuela
Bolívia
Chile
Colômbia
Peru
Venezuela
Colômbia
Venezuela
Áustria
Suíça
México
Equador
México
Equador
México México
Guatemala
El Salvador
Honduras
Nicarágua
Costa Rica
Barbados / Guianas
Jamaica
Trindad-Tabago
Antígua / Dominica
Granada / Montserrat
S.Cristóvão e Névis
Sta Lúcia / S. Vicente
Suriname / Haiti
EUA
Canadá
Zona de livre
comércio
Mercado
Comum
Mercado Comum Zona de
livre
comércio
Mercado
Comum
Mercado
Comum
Zona de livre
comércio
Zona de livre
comércio
União
Econômica
Mercado
Comum
Zona de livre
comércio
Fonte:
1
Preparado pela autora, baseado em BEÇAK, Peggy, (2000, Anexo, s/p.)
241
ANEXO B – Mapa mundi dos blocos transnacionais
Associação Latino-Americana de Integração - ALADI
Acordo Comercial sobre Relações Econômicas entre Austrália e Nova
Zelândia - ANZCERTA
Fórum Econômico da Ásia e do Pacífico - APEC
Associação de Nações do Sudeste Asiático- ASEAN
Comunidade Andina, Grupo Andino ou Pacto Andino - CAN
Mercado Comum e Comunidade do Caribe - CARICOM
Comunidade dos Estados Independentes - CEI
Associação Européia de Livre Comércio - EFTA
Mercado Comum Centro-Americano - MCCA
Mercado Comum do Sul - MERCOSUL
Acordo de Livre Comércio da América do Norte - NAFTA
Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral - SADC
União Européia - UE
Fonte: http://www2.camara.gov.br/comissoes/cpcms/blocoseconomicos.html
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo