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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
CENTRO DE ESTUDOS GERAIS
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
CARLA VALÉRIA FREITAS DE ARAÚJO
ECOTURISMO, SUA PRÁTICA, SEU ESPAÇO
NITERÓI, NOVEMBRO DE 2003
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CARLA VALÉRIA FREITAS DE ARAÚJO
ECOTURISMO, SUA PRÁTICA, SEU ESPAÇO
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Geografia da
Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para obtenção
do Grau de Mestre em Geografia
NITERÓI, NOVEMBRO DE 2003
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CARLA VALÉRIA FREITAS DE ARAÚJO
ECOTURISMO, SUA PRÁTICA, SEU ESPAÇO
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Geografia da
Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para
obtenção do Grau de Mestre em Geografia
Aprovada em novembro de 2003.
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________
Profª. Drª. Ester Limonad
Programa de Pós-Graduação em Geografia
Universidade Federal Fluminense
(orientadora)
_________________________________________________
Prof. Dr. Jacob Binsztok
Programa de Pós-Graduação em Geografia
Universidade Federal Fluminense
_________________________________________________
Prof. Dr. Rainer Randolph
Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Niterói
2003
A663 Araújo, Carla Valéria Freitas de
Ecoturismo, sua prática, seu espaço/Carla Valéria Freitas
de Araújo. – Niterói: s.n., 2003.
105 p.
Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade
Federal Fluminense, 2003.
1. Ecoturismo. 2. Turismo – Aspectos ambientais.
I. Título.
CDD 338.4791
ii
Dedicatória
Dedico este trabalho à Maria Emília.
iii
Agradecimentos
Foram muitos os que contribuíram com o desenvolvimento deste trabalho.
Começo agradecendo à Ester Limonad, orientadora cujas palavras de incentivo
nunca faltaram.
Sou grata à amiga Tilda, por não ter deixado que o ânimo de continuar
trabalhando me faltasse.
Agradeço à minha família querida, pelo companheirismo e, especialmente,
pela compreensão em perdermos tantos momentos juntos.
Também agradeço a meus grandes amigos, por me darem tanta força
durante todo esse tempo.
Agradeço a Alessandro, companheiro verdadeiro, sempre disposto a ouvir e
ajudar nas horas mais difíceis.
E agradeço especialmente à Maria Emília, mãe maravilhosa, por todo o
esforço e dedicação dispensados a mim durante toda a vida.
Obrigada a todos.
iv
Resumo
O presente trabalho busca realizar uma análise da possível contribuição do
estudo da questão ambiental e da sustentabilidade, sem perder de vista a justiça
ambiental, para o desenvolvimento de práticas de ecoturismo.
O ecoturismo, enquanto segmento do turismo, é considerado a atividade
capaz de conciliar a conservação do patrimônio natural e cultural com o uso
sustentável do mesmo.
Sendo assim, o trabalho consiste em um estudo com duas vertentes, uma
primeira voltada à discussão do turismo e ecoturismo e, uma segunda, preocupada
em situá-los frente às questões que servem de base legitimadora para estas
atividades.
Além disso, a prática do turismo e do ecoturismo no Brasil é aqui descrita,
no sentido de mostrar as proposições oficiais voltadas para direcionar e
regulamentar essas atividades no país.
A título de conclusão, o trabalho trata do distanciamento entre as
proposições (o ideal) e as práticas (o real) na implementação das atividades de
ecoturismo, buscando mostrar as potencialidades da atividade.
Turismo; Ecoturismo; Sustentabilidade.
v
Abstract
The present work search to analyze the possible contribution of the
environmental question and the sustainability for the ecotourism practices
development.
The ecotourism, how a tourism segment, is considerate the activity able to
conciliate the conservation of the natural and the cultural patrimony with the
sustainable use of them.
This work consist in a study divided in two parts: the first one referring to the
tourism and ecotourism; and the second one worried about to situate them in front of
the questions that serve of the legitimated base for his activities.
Besides, the tourism end ecotourism practice in Brazil is described here to
show the official propositions that are responsible to direct and regulated this
activities.
The conclusion discuss about the distance that exists between the
propositions (the ideal) and the practices (the real) in the ecotourism activities
implementation, searching to show the potentialities of this activity.
Tourism; Ecotourism; Sustainability.
vi
Lista de Mapas, Figuras e Tabelas
Figura 1 – Fluxograma com dois níveis de segmentação do turismo 29
Mapa 4.2.3 – Mapa do Ecoturismo no Brasil 75
Tabela 4.2.3.a – Pólos de Desenvolvimento do Ecoturismo no Brasil – 2001 73
Tabela 4.2.3.b – Distribuição Regional dos Pólos de Ecoturismo em 2000 76
Tabela 4.2.3.c – Caracterização da Oferta Ecoturística por Ecotemas 77
vii
Lista de Abreviaturas, Siglas e Símbolos
ANAMMA Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
CAB Coordenadoria de Abastecimento da Secretaria da Agricultura e
Abastecimento
CEPAL Comissão Econômica para a América Latina
CETESB Companhia Estadual de Saneamento Básico
CNUMAD (ECO 92) Conferência do Rio de Janeiro ou Conferência das Nações Unidas sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento
EAA Ecotourism Association of Australia
ECOBRASIL Associação Brasileira de Ecoturismo
EMATER Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
EMBRATUR Instituto Brasileiro de Turismo
FAO Organização Mundial para a Agricultura e Alimentação
FINEP Financiadora de Estudos e Projetos
IBAMA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICOMOS Conselho Internacional de Monumentos e Sítios
IEB Instituto de Ecoturismo do Brasil
IUCN União Internacional para a Conservação da Natureza
MICT Ministério da Indústria, Comércio e Turismo
MMA Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal
NEAP Programa Nacional de Certificação de Ecoturismo da Austrália
NEPAM Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais
OEA Organização dos Estados Americanos
OMT ou WTO Organização Mundial de Turismo ou World Tourism Organization
ONG Organização Não-Governamental
ONU Organização das Nações Unidas
PATA Pacific Asia Travel Association
PNMT Programa Nacional de Municipalização do Turismo
PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PROECOTUR Programa para o Desenvolvimento do Ecoturismo na Amazônia Legal
SEBRAE Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SEMA-SP Secretaria Estadual de Meio Ambiente de São Paulo
SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
TIES The International Ecotourism Society
UCs Unidades de Conservação
WWF Fundo Mundial para a Vida Selvagem
WWTC World Travel and Tourism Council (Conselho Mundial de Viagem e Turismo)
viii
“Quem planeja a curto prazo, deve plantar
cereais;
a médio prazo, deve plantar árvores;
e a longo prazo, deve educar as pessoas”.
Kwantzu, Filósofo Chinês A.C.
ix
Sumário
1. UMA PRIMEIRA APROXIMAÇÃO AO PROBLEMA............................................1
2. TURISMO E ECOTURISMO..................................................................................4
2.1. TURISMO .......................................................................................................6
2.1.1. Breve resgate histórico do turismo........................................................6
2.1.2. Aspectos conceituais do turismo.........................................................11
2.1.3. Prática do turismo...............................................................................13
2.2. ECOTURISMO..............................................................................................17
2.2.1. Breve resgate histórico do ecoturismo................................................17
2.2.2. Aspectos conceituais do ecoturismo...................................................18
2.2.3. Os diferentes segmentos do ecoturismo.............................................20
2.3.4. O ecoturismo.......................................................................................23
3. ECOTURISMO, A QUESTÃO AMBIENTAL E A SUSTENTABILIDADE........31
3.1. A QUESTÃO AMBIENTAL............................................................................33
3.2. SUSTENTABILIDADE ..................................................................................40
3.3. AS ORIGENS DO ENTRELAÇAMENTO ENTRE A QUESTÃO AMBIENTAL,
A SUSTENTABILIDADE E O ECOTURISMO..........................................................48
3.4. ECOTURISMO, A QUESTÃO AMBIENTAL E A SUSTENTABILIDADE......53
4. TURISMO E ECOTURISMO NO BRASIL...........................................................61
4.1. TURISMO NO BRASIL .................................................................................63
a) Programa de Desenvolvimento Sustentado Avança Brasil .......................64
b) Programa Nacional de Municipalização do Turismo - PNMT....................65
4.2. O ECOTURISMO NO BRASIL......................................................................69
5. À GUISA DE CONCLUSÃO - ECOTURISMO ENTRE O IDEAL E O REAL......79
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................83
7. ANEXOS..............................................................................................................87
ANEXO I – Principais Modalidades e Destinos Turísticos – EMBRATUR
(2002).......................................................................................................................87
ANEXO II – Declaração de Ecoturismo de Quebec.........................................89
ANEXO III – Carta do Turismo Sustentável do Icomos ..................................95
x
1. UMA PRIMEIRA APROXIMAÇÃO AO PROBLEMA
A escolha do tema foi feita com base no trabalho de conclusão do curso de
graduação em arquitetura e urbanismo da Universidade Federal Fluminense,
intitulado “Ecoturismo em Itaipuaçu: Uma forma de Preservação Ambiental aliada
ao Desenvolvimento Sustentável” (ARAÚJO, 2000), onde se buscou apresentar
uma proposta urbanística voltada para o desenvolvimento da atividade ecoturística
no Distrito de Itaipuaçu, em Maricá, município pertencente à Região Metropolitana
do Estado do Rio de Janeiro, vizinho da Região das Baixadas Litorâneas.
Aos poucos, o interesse pelo tema e a busca por novas idéias e opiniões a
esse respeito fizeram perceber a relevância do estudo do ecoturismo
1
, bem como a
pertinência de desenvolver um trabalho dentro desta temática, no intuito de
contribuir com a produção acadêmica.
O objetivo do trabalho é realizar uma análise da possível contribuição do
estudo da questão ambiental e da sustentabilidade, sem perder de vista a justiça
ambiental – na perspectiva de Acselrad & Leroy (1999) – para o desenvolvimento
de práticas de ecoturismo.
1
Denominação dada ao deslocamento de pessoas a espaços naturais delimitados e protegidos pelo
Estado, iniciativa privada ou controlados em parceria com associações locais e ONGs. Pressupõe
sempre uma utilização controlada da área com planejamento de uso sustentável de seus recursos
naturais e culturais, por meio de estudos de impacto ambiental, estimativa da capacidade de carga e
suporte do local, monitoramento e avaliações constantes, com plano de manejo e sistema de gestão
responsável. É claro que todas as atividades turísticas no turismo ecológico podem, em geral, ser
realizadas, desde que rigorosamente observadas as restrições do uso do espaço. No Brasil, o
ecoturismo, além de ser comumente confundido com o turismo ecológico, está até o momento
circunscrito a poucos casos, levando em conta que as nossas áreas de conservação e proteção
ambiental ainda não dispõem de uma política integrada e de um planejamento estratégico de uso e
ocupação voltados especificamente para o turismo (BENI, 1999).
1
A atividade ecoturística surge como um segmento da atividade turística que
se coloca como capaz de conciliar a conservação do patrimônio natural e cultural
com o uso sustentável do mesmo. Nesse contexto, envolve os temas questão
ambiental e sustentabilidade, o que se pode comprovar através da definição de
ecoturismo apresentada pelo documento “Diretrizes para uma Política Nacional de
Ecoturismo” (MICT/MMA, 1995):
Ecoturismo é um segmento da atividade turística que utiliza, de forma
sustentável, o patrimônio natural e cultural, incentiva sua conservação e
busca a formação de uma consciência ambientalista através da
interpretação do ambiente, promovendo o bem-estar das populações
envolvidas.
Comprovando ainda a pertinência deste estudo, tem-se o ecoturismo como
tema do ano de 2002, Ano Internacional do Ecoturismo. Essa foi uma estratégia da
Organização das Nações Unidas (ONU) para voltar a atenção dos governos ao
segmento da indústria de viagens que mais cresce no mundo. De acordo com a
EMBRATUR (2002), o ecoturismo cresce 20% ao ano, enquanto o turismo
tradicional apenas 8%. A ECOBRASIL (Associação Brasileira de Ecoturismo) prevê
que o Brasil alcance um crescimento de cerca de 10% ao ano.
O norte geral do trabalho é caracterizar e situar a atividade do ecoturismo,
que se propõe enquanto um meio de contribuir para a conservação da natureza e
para o desenvolvimento local.
Neste sentido, serão trabalhadas as noções chave de turismo e ecoturismo,
e para situar a discussão e avançar nessa reflexão será aprofundada a discussão
relativa à questão ambiental e à sustentabilidade. O trabalho consiste, portanto, em
um estudo com duas vertentes, uma primeira voltada para a discussão do turismo-
ecoturismo propriamente ditos, e uma segunda preocupada em situá-los frente às
questões que servem de base legitimadora para estas atividades.
Essas categorias vêm sendo discutidas em todo o mundo, tendo em vista
que a deterioração ambiental da cidade e do campo sempre existiu na história da
humanidade. Porém, atualmente, observa-se que os processos de degradação do
meio ambiente, que acompanham a urbanização, são ainda maiores. Problema que
vem sendo agravado pela intensidade de concentração urbana (BONDUKI, 1996, p.
28).
Neste sentido, no segundo capítulo, tratar-se-á inicialmente do turismo, seu
2
surgimento e desenvolvimento, para a seguir serem caracterizadas as
especificidades do ecoturismo, as limitações e imprecisões das definições
existentes.
No terceiro capítulo, serão discutidas as do ecoturismo com a problemática
ambiental e a sustentabilidade, em virtude do amplo leque de definições existentes
a respeito de ecoturismo e do fato destas haverem integrado às suas preocupações
a problemática ambiental e posteriormente a sustentabilidade do desenvolvimento.
A idéia de sustentabilidade no contexto do ecoturismo é evocada como uma
forma de minimizar os efeitos perversos da atividade. Esta noção surge sempre
ligada à questão ambiental e tem sido tratada de diversas formas ao longo do
tempo, de acordo com a ideologia de desenvolvimento de cada governo e dos
agentes responsáveis por sua idealização. No terceiro capítulo, portanto, situar-se-á
a implementação da atividade do ecoturismo frente às questões assinaladas, com o
intuito de mostrar que a sustentabilidade deve ser entendida não como um dado
técnico, mas no campo das relações sociais, relacionada não apenas aos recursos
e ao meio ambiente, mas também às formas sociais de apropriação e uso dos
recursos naturais.
No capítulo 4, será descrita a prática do turismo e do ecoturismo no Brasil,
no sentido de mostrar as proposições oficiais voltadas para direcionar e
regulamentar as atividades de turismo e ecoturismo e a abrangência geográfica e o
leque de atividades de ecoturismo desenvolvidas no Brasil.
No capítulo 5, a título de conclusão, tratar-se-á do distanciamento entre as
proposições (o ideal) e as práticas (o real) na implementação das atividades de
ecoturismo, buscando, ainda que de maneira simples, mostrar as potencialidades
da atividade desde que considerados os pontos levantados no terceiro capítulo.
3
2. TURISMO E ECOTURISMO
Nas últimas décadas, a assim chamada indústria do turismo conquistou um
importante papel econômico. Segundo dados do World Travel Tourism Council
WTTC (apud LINDBERG & HAWKINS, 1995, p. 24), a indústria do turismo é a
maior e mais importante do mundo, sendo mais expressiva que a do automóvel, do
aço, da eletrônica ou da agricultura. A indústria de viagens e turismo empregava,
em 1992, 127.000.000 de trabalhadores (um em cada 15 trabalhadores em todo
mundo), com expectativas para sua duplicação até o ano 2005.
De acordo com a Organização Mundial de Turismo (OMT)
2
, o turismo
movimenta mais de US$ 3,5 trilhões anualmente, bem como é considerado por
vários órgãos de pesquisa como um dos ramos de atividade comercial que mais
cresce no mundo, com um crescimento de 4 a 5% ao ano e um índice de ocupação
em torno de 10% da população
economicamente ativa (SEMA-SP, [200-], p. 4).
Calcula-se que mais de 180 milhões de pessoas vivem direta ou indiretamente
desta atividade.
Com o advento da Internet, o turismo é alavancado, trazendo maiores
expectativas econômicas, devido à facilidade e rapidez de informação
proporcionadas. Os empresários e comerciantes já encontraram o caminho para
fazer negócios com a rede mundial, aproveitando todas as possibilidades que o
mundo virtual pode oferecer. Atualmente, nessa passagem de milênio, um dos
2
A Organização Mundial de Turismo é um organismo intergovernamental, com sede em Madri, ao
qual as Nações Unidas confiaram a promoção e o desenvolvimento do turismo. Ela é composta por
cento e trinta e nove países e territórios e também fazem parte dela trezentos e cinqüenta
representantes do setor do setor privado, como companhias aéreas e grupos hoteleiros.
4
setores do turismo na Internet que possui maior ênfase no mercado é justamente o
ecoturismo. (Revista Guia da Internet. br, fev. 98, n.
21, p. 42).
Dentro da indústria do turismo, segundo a Secretaria Estadual de Meio
Ambiente de São Paulo – SEMA-SP ([200-], p. 4), o segmento do ecoturismo seria
o de maior expansão (20% ao ano), em virtude da relevância que os temas ligados
ao meio ambiente conquistaram na contemporaneidade.
O ecoturismo vem sendo celebrado por órgãos governamentais, bem como
pela mídia, como uma atividade de baixo impacto ambiental, uma possibilidade de
sustentação econômica para unidades de conservação ambiental e uma alternativa
às economias das regiões onde atividades tradicionais (como a pequena agricultura
familiar, o extrativismo, a pesca artesanal, entre outras) não têm se conseguido
manter: seja por estas atividades terem se tornado insuficientes para manterem as
populações; seja em razão das restrições legais ambientais que tornam tais
atividades incompatíveis com a conservação ambiental, agravando o quadro de
subsistência destas populações.
A despeito do avanço das questões ambientais e da importância do
ecoturismo enquanto atividade surgida na década de 80, persiste tanto nos debates
e na reflexão sobre o tema quanto na prática do ecoturismo uma grande indefinição
sobre o que poderia ser de fato o ecoturismo. Há que se ressaltar a multiplicidade
de acepções com que o termo pode ser empregado, servindo para abrigar uma
ampla gama de atividades que garantem o “contato” com a natureza, indo da
prática de caminhadas à observação de aves em locais isolados e de difícil acesso.
Como será visto adiante, o termo ecoturismo apresenta uma diversidade de
definições que dificultam a sua delimitação e categorização analítica, uma vez que
estas definições apresentam diferenças no que concerne aos atores envolvidos e
às práticas do turismo em si.
Enfim, não se pode esquecer do fato do ecoturismo ser um segmento
particular da assim chamada indústria do turismo, o que lhe confere algumas
particularidades, as quais devem ser tomadas em consideração ao se situar o
ecoturismo como uma prática espacial que, entre outras práticas, contribui para
uma organização particular do espaço. Neste sentido, no presente capítulo, tratar-
se-á inicialmente do turismo, seu surgimento e desenvolvimento, para a seguir
5
serem caracterizadas as especificidades do ecoturismo, as limitações e imprecisões
das definições existentes a seu respeito.
2.1. TURISMO
Para situar o surgimento das atividades de turismo e ecoturismo, tratar-se-á
aqui do surgimento do turismo enquanto atividade social, de seus aspectos
conceituais e de sua prática. Para tanto, contar-se-á principalmente com as
contribuições de: Krippendorf (1989); Andrade (1992); Dumazedier (1994); Beni
(1998); Lash & Urry (1998); Martins (2001); e Fratucci (2002).
2.1.1. Breve resgate histórico do turismo
Muitos estudos sobre o turismo afirmam que o ato de viajar ou de se
deslocar pelo território é característico do homem enquanto ser racional. O homem
aos poucos passou a planejar seus deslocamentos, a estudar os roteiros, o tempo
gasto e como suprir suas necessidades básicas durante eles.
Existem algumas evidências, enumeradas por Acerenza e Padilla (apud
FRATUCCI, 2000, p. 28), de que as viagens já existiam na Antigüidade: desde a
Odisséia escrita por Homero, mostrando que os gregos viajavam entre suas
cidades, por ocasião dos jogos olímpicos, bem como Heródoto, em diversas obras,
descreve muitas viagens realizadas.
Existem fartas evidências históricas de que os romanos desenvolveram o
hábito dos banhos termais e da construção de “villas” em localidades próximas ao
litoral, além de realizarem extensas viagens pelo seu império. Não podemos
esquecer da fundação de cidades como Bath na Inglaterra, que procuravam
explorar as fontes termais, bem como das cidades de Pompéia e Herculano aos
pés do Vesúvio, destruídas por erupções deste vulcão, voltadas para o veraneio e
lazer dos ricos patrícios romanos nos períodos mais quentes do ano. Enfim, os
romanos já apresentavam uma preocupação com o calçamento de estradas,
sistemas de comunicação e com o tempo livre para alguns súditos do império.
6
Com o fim do Império Romano, no entanto, as viagens sofreram uma
retração por conta da insegurança provocada pelas invasões bárbaras no
continente europeu. Séculos mais tarde, com as Cruzadas, ressurgem as viagens
de peregrinos, soldados e mercadores, que contribuíram para revitalizar o comércio
na Europa Medieval.
No século XV, surgem viagens com motivação diferente da dos peregrinos
e, para Acerenza (apud FRATUCCI, 2000, p. 29), “no período que se inicia no
século XVI e que vai até quase meados do século XIX, se estabelecem as bases do
turismo moderno”.
Um sistema elaborado de pousadas exclusivas e para estranhos começou a
se desenvolver no final do século XVI. De acordo com Heak (apud LASH & URRY,
1998, p. 347), “A hospedagem começava a comercializar-se e a se remover do
contexto da casa”. Para este autor, isso ocorreu devido ao fato da Inglaterra, nesta
fase pré-capitalista, possuir uma estrutura social e econômica muito sensível às
forças do mercado.
Com o advento da Primeira Revolução Industrial e da máquina a vapor, uma
organização mais comercial surge sobretudo ligada ao trem e, em fins do século
XIX, à construção de muitos grandes hotéis, em Londres. Estes últimos eram
lugares públicos, voltados para satisfazer as necessidades e desejos das classes
mais abastadas.
Foi nessa fase da história que surgiu o hábito do grand tour, quando os
ingleses apenas consideravam detentores de cultura aqueles que tivessem sua
educação ou formação profissional coroada por um grand tour através da Europa.
De acordo com Andrade (1992, p. 10), as descobertas de novas terras
fizeram com que os mais abastados incluíssem nos seus grand tours, as viagens às
Américas, às Índias Orientais, ao Extremo Oriente, ao Brasil, mais especificamente
ao Rio de Janeiro, e ao sul da África.
O hábito dos banhos termais, conhecidos e difundidos na Grécia Antiga e no
Império Romano, foi então retomado no século XVIII, que no caso da Inglaterra
contribuiu para o reflorescimento de Bath, em particular durante o reinado da rainha
Victória.
7
Deve-se destacar que, em razão da concretização das duas revoluções
industriais concluídas antes da metade do século XIX, temos entre outras
conseqüências e desdobramentos a constituição de uma classe média próspera,
com direito a férias. Somando-se a isso o acelerado desenvolvimento dos
transportes, pode-se notar um aumento significativo no número de pessoas que
viajavam por prazer a partir de meados do século XIX – regalia até então reservada
apenas aos aristocratas, nobres e ricos.
O ano considerado por diversos autores como marco inicial do turismo
moderno é 1841, pois foi o ano em que Thomas Cook fundou, na Inglaterra, a
primeira agência de viagens do mundo, a Thomas Cook and Sons, e, durante a
década de 1840, foi o principal agente de viagens e operador de turismo. Na
mesma época, Henry Wells criava a American Express Company, nos Estados
Unidos, e, na cidade do Porto (Portugal), surgia a agência de viagens Abreu. Essas
três instituições, dentre outras, foram responsáveis pela implantação de muitos dos
aspectos operacionais da atividade turística, tais como reservas antecipadas.
Segundo Lash e Urry (1998, p. 339-340), as modalidades de viagens não
extraíam todo o proveito da última forma de tecnologia, pois apenas algumas
inovações na organização asseguraram, em certos casos, o sucesso destas novas
tecnologias. Como exemplo disto, temos os trens e vapores do final do século XIX,
que passaram a desenvolver seu potencial no mercado internacional a partir da
criação do sistema de vouchers (bilhetes de viagem) por Thomas Cook.
Ou ainda, anos mais tarde, o sucesso das viagens a jato se deu através da
inovação das férias com alojamento e comida incluídos, organizados pelos
operadores de viagens. É, portanto, imprescindível que as inovações na tecnologia
sejam acompanhadas por transformações organizativas para que alcancem
sucesso.
No entender de Fratucci (2000, p. 30), as raízes do turismo classificado
como moderno teria por base “o surgimento da sociedade capitalista industrial e a
aceleração do processo de urbanização”. Lefèbvre também contribui neste sentido
ao assinalar como um dos resultados do advento do capitalismo industrial a
mercantilização dos lugares. Chamar ainda a atenção para o fato de que, referindo-
se às cidades mais antigas, “o núcleo urbano torna-se assim produto de consumo
de uma alta qualidade para estrangeiros, turistas, pessoas oriundas da periferia,
8
suburbanos. Sobrevive graças a este duplo papel: lugar de consumo e consumo do
lugar” (1969, p. 17).
O turismo moderno começou a ser praticado inicialmente pela elite européia
no final do século XIX, cujas riquezas e terras arrendadas a outros, permitia-lhes o
lazer e o turismo. As estações balneárias, bem como a hotelaria de maior porte,
começaram a ser produzidas a partir da demanda desta classe (MARTINS, 2001, p.
11).
Apesar das conquistas obtidas com as suas lutas e organização, o
proletariado, que emergiu como classe no decorrer dos séculos XVIII e XIX, ainda
estará lutando pelo direito ao ócio, férias e jornada de oito horas de trabalho até as
primeiras décadas do século XX. Não podemos esquecer das contribuições de Paul
Lafargue (1978) que escreveu sobre a necessidade de descanso do trabalhador e
sobre as lutas sociais nesta perspectiva na França, em O Direito à Preguiça, bem
como Weffort (1980), que caracteriza a questão operária como caso de polícia em
seu livro sobre populismo no Brasil.
Portanto, é principalmente a partir da Segunda Guerra Mundial, com o
advento dos anos dourados do fordismo, e concomitante regulamentação das
relações industriais, que os trabalhadores passaram a dispor de um tempo livre
remunerado, sem atividades laborais. Isto, segundo Martins (2001, p. 12), contribuiu
para permitir a participação de amplas massas no processo turístico, intensificado
pelo surgimento acelerado de novos meios de comunicação de massa, pelo
desenvolvimento dos transportes, das férias remuneradas e da melhor organização
da própria atividade turística, com implantação das indústrias do entretenimento.
De acordo com Lash e Urry (1998, p. 341), algumas inovações organizativas
mudaram a maneira de ser dos viajantes, como, por exemplo, de hotéis
monumentais no centro de metrópoles em fins do século XIX, localizados junto às
grandes estações ferroviárias; o desenvolvimento de lugares de férias entre as
duas guerras, com serviços superiores para massas de turistas; e, no período pós-
guerra, a proliferação de pacotes de férias, pondo a viagem ao estrangeiro ao
alcance de um mercado de massas no Norte da Europa. Assim, ainda segundo
estes autores, o tour em pacote, ou seja, com tudo incluído, foi o mais importante
serviço criado por ocasião do turismo organizado (1998, p. 360).
9
Confirmando o que foi dito, Lash e Urry (1998, p. 349) afirmam que o
turismo organizado ou turismo de massa, expressão mais marcante do turismo
moderno, deve sua origem a uma série de desenvolvimentos econômicos, técnicos
e sociais. Podemos citar: um processo de urbanização acelerado; um aumento do
tempo livre, devido à sistematização do trabalho e à melhor regulação dos horários
e condições do trabalho; a criação de novos métodos para facilitar e organizar a
viagem; e os grandes avanços tecnológicos dos sistemas de comunicação e de
transportes. A viagem deixou então de ser privilégio da classe mais abastada e
sinal de status, passando a ser acessível a um maior número de pessoas.
Parece que, atualmente, as pessoas desejam viajar pela necessidade de se
distanciar do ritmo estressante de suas vidas cotidianas, situação imposta pelas
próprias condições sociais da nossa sociedade.
Para Krippendorf (1989, p. 17), as características do cotidiano da sociedade
moderna – trabalho cada vez mais mecanizado, fragmentado e determinado fora da
esfera da vontade do indivíduo – criam uma sensação de monotonia, de repressão
dos sentimentos, isolamento e
[...] geram o stress, o esgotamento físico e psíquico, o vazio interior e o
tédio [...]. Para encontrarmos uma compensação a tudo que nos falta no
cotidiano [...] viajamos [...]. Com efeito, viajamos para viver, para
sobreviver. Assim, o grande êxodo das massas que caracteriza nossa
época é conseqüência das condições geradas pelo desenvolvimento da
nossa sociedade industrial.
A lógica do capitalismo, assim, se reproduz uma vez mais. O turista viaja
para relaxar e revigorar-se e ao fazê-lo torna-se consumidor de objetos, coisas e
lugares. Neste sentido, pode-se dizer que o capitalismo acaba por tirar proveito do
turismo para garantir sua reprodução, na medida que o capital apropria-se do
tempo livre dos trabalhadores para transformá-lo em tempo de consumo. Através
da ação da mídia e comunicação de massa, a recreação, o lazer e a viagem
passaram a ser necessidades fundamentais para muitos trabalhadores.
De acordo com Milton Santos (1996), pode-se dizer que, mesmo em férias,
os trabalhadores, e, assim como eles, todos aqueles que praticam o turismo,
convertem-se em consumidores de fixos e fluxos específicos: certos lugares
(cidades, vilas, povoados) e determinadas localizações (sítios, acidentes
geográficos) convertem-se em objetos de consumo. Ao mesmo tempo, para
viabilizar este consumo, são necessárias infra-estruturas de acomodações,
10
alimentação e entretenimento (fixos) e de transportes e comunicações (fluxos).
Uma vez acabadas as férias, resta-lhes o retorno ao trabalho, o que significa voltar
mais uma vez a vender sua força de trabalho. Trabalha-se para tirar férias, e tira-se
férias para voltar a trabalhar.
2.1.2. Aspectos conceituais do turismo
Para Andrade (1992, p. 30-31), “a matriz do radical tour é do latim, através
do substantivo tornus, do verbo tornare, cujo significado é giro, volta, viagem ou
movimento de sair e retornar ao local de partida”. Este autor afirma ainda que
anterior ao termo latino tornus é a palavra tour, não da língua francesa, mas do
hebraico antigo, em seu sentido puro e literal, como expressão designativa de
viagem, de exploração, de descoberta, de reconhecimento. Em seu entender, a
palavra teria chegado à língua portuguesa através da transposição do vocábulo
inglês tour, que teria sido usado pela primeira vez na Inglaterra, em 1760, conforme
registro da edição de 1950 do The Shortes Oxford English Dictionary.
O estudo do turismo, segundo Fratucci (2000, p. 24-25), teve início na
Alemanha motivado por interesses econômicos e empresariais e, desde o início do
século XX, o fenômeno turístico tem sido estudado de maneira sistemática e
científica. Pode-se considerar a Escola de Berlim um ponto de referência para os
estudos que estruturam a teoria do turismo nos dias de hoje, apesar de seus
conceitos limitados aos aspectos econômicos do fenômeno.
O turismo é entendido pela maior parte dos estudiosos como um fenômeno
complexo e amplo, que exigiria, portanto, uma abordagem multidisciplinar. Nos
últimos anos, foi produzida uma ampla gama de conceituações a respeito do
fenômeno turístico.
Neste sentido, Fratucci (2000, p. 26-27), em quem serão baseadas as
citações a seguir, oferece um vasto leque de exemplos, como Mathieson e Wall,
que fornecem uma definição relativamente limitada do turismo ao considerarem-no
a partir dos movimentos pendulares cotidianos - trabalho-residência. Nas palavras
destes autores, o turismo seria basicamente “o movimento temporário de pessoas
para destinos distintos de seus lugares normais de trabalho e residência [...]”. Oras,
o turismo pode se iniciar com um movimento temporário distinto do movimento
11
cotidiano trabalho-residência, todavia, não é redutível a isso.
Acerenza, por sua vez, nas palavras de Fratucci, apresenta-nos uma visão
mais complexa e ampla do que seria o turismo ao defini-lo como “um fenômeno
social de caráter complexo [...], um conjunto de relações e fenômenos produzidos
pelo deslocamento e permanência de pessoas [...]”. Acerenza considera ainda que
estas relações e fenômenos ocorrem fora do lugar de residência permanente
dessas pessoas, tal como Mathieson e Wall, e que as pessoas que praticam o
turismo possuem motivações, principalmente por atividades não lucrativas.
A OMT, por sua vez, define tecnicamente o turismo como o conjunto de
atividades realizadas pelas pessoas “durante suas viagens e estadas em lugares
distintos ao de sua residência habitual, por um período de tempo consecutivo
inferior a um ano (...)”. No entanto, esta organização considera a possibilidade do
motivo da viagem ser por ócio, negócios ou ainda outros motivos não especificados.
Fratucci ainda cita Paiva, que afirma que “o turismo abrange
componentes sociais, culturais, políticos, ecológicos, psicológicos,
tecnológicos, econômicos, pressupondo um tratamento não parcial [grifo
nosso]”. Esta afirmação denota com clareza a multiplicidade disciplinar atribuída por
todos os autores ao turismo. Deve-se ter sempre em mente todos estes
componentes itemizados por Paiva, dada sua importância para o entendimento do
tema.
Para Jafari (apud BENI, 1998, p. 38), o turismo seria o estudo de três fatos:
a) do homem longe de seu local de residência; b) da indústria que satisfaz suas
necessidades; e c) dos impactos que o homem e a indústria geram sobre os
ambientes físicos, econômicos e sócio-culturais da área receptora.
Esta definição de Jafari é importante na medida em que inter-relaciona de
forma direta ao estudo do turismo, os impactos gerados por esta atividade, ao
contrário de outros autores que se detêm mera e exclusivamente ao
desenvolvimento da atividade em si.
É importante destacar aqui a visão genérica e abrangente de turismo da
12
EMBRATUR
3
(2002), para quem o
Turismo é a atividade humana que envolve o deslocamento temporário
de indivíduos ou grupos, para outro local diferente de sua residência
tradicional e fora do seu município ou cidade, por mais de 24 horas, de
forma não remunerada, por prestação de serviços desta atividade.
2.1.3. Prática do turismo
A prática do turismo torna-se possível a partir da confiança que as pessoas
têm nas instituições que garantem um profissionalismo ao lidarem com a atividade.
Segundo Lash e Urry (1998, p. 342), a confiança surge ao se desenvolver um saber
profissional, pois as pessoas precisam ter fé em instituições e processos sobre os
quais seu conhecimento é limitado.
Para estes autores, “a modalidade baseia-se no desenvolvimento da
confiança em profissionais ‘experts’ que tenham idealizado sistemas de viagens e
transportes em massa que ao menos inicialmente reduzam os riscos implícitos”
(idem).
Thomas e John Cook, citados anteriormente, foram os primeiros a construir
uma perícia profissional em viagens e turismo, que praticamente eliminava os riscos
das excursões.
Martins (2001, p. 14), ao tratar da prática da atividade turística, estabelece a
ligação entre a idéia de lazer e de turismo. Dumazedier (1994, p. 51), por sua vez,
define lazer, de modo geral, enquanto “[...] uma condição para se usar o tempo de
viver”, porém delimita a definição ao assinalar que o lazer constitui “[...] a aspiração
ao direito de viver por viver, em interdependência com as normas legítimas do
dever ser que a produção das coisas e a sociedade dos homens impõem. [...] é o
tempo no qual explodimos”.
Martins (2001, p. 14) acredita que um dos itens básicos para garantir a
sustentabilidade da atividade turística é a conjunção destes dois termos – turismo e
lazer – e, portanto, entende que ao praticarmos a atividade turística, também
consigamos liberar nossas emoções, “vivenciando situações interessantes e ricas
3
Empresa Brasileira de Turismo, órgão governamental criado em substituição ao Conselho Nacional
de Turismo. Disponível em: http://www.embratur.gov.br.
13
tanto socialmente quanto culturalmente”. Entende assim que se não houver uma
rica experiência sensorial e emocional, ou seja, se não forem criadas “motivações”,
perde-se a garantia de retorno do turista ao lugar visitado ou o interesse pela visita
a outros lugares.
Já Dumazedier (1994, p. 50) aborda o dinamismo no uso do tempo livre,
onde a atividade e criatividade pessoais, o comportamento ativo, a espontaneidade,
a fantasia, os contatos humanos e espírito comunitário, a descontração e o bem-
estar são elementos privilegiados.
A este dinamismo a que se refere Dumazedier, Martins (2001, p. 15)
acrescenta o fato de que:
O homem está refazendo suas rotinas, suas práticas cotidianas, seus
hábitos... assim procedendo ele cria novas motivações, impulsiona a
cultura, gera novos tipos de trabalho e promove o desenvolvimento das
cidades e das regiões especializadas em algumas das atividades que
promovem o turismo e/ou o lazer.
Neste sentido, tem-se que as práticas turísticas transformam o espaço e
provocam o que se pode chamar de turistificação dos lugares, neologismo utilizado
por alguns autores para indicar a apropriação dos lugares pela atividade turística.
(FRATUCCI, 2000, p. 33)
No entanto, ao invés de turistificação dos lugares, Martins (2001, p. 16)
introduz a idéia de “(re)criação do espaço (no sentido territorial, social, cultural e
econômico)”, ao considerar que o próprio sistema sócio-econômico enriqueceu-se,
e que está em constante processo de enriquecimento, com novas opções, ao
promover e induzir novas motivações. Assim, faz referência à emergência de novos
lugares em função do desenvolvimento e implementação de novas práticas de
turismo surgidas a todo o momento, tais como rafting (descida de corredeiras),
trekking (caminhada) ou rapel (escalada).
Esta (re)criação do espaço de que trata Martins, permite pensar na
atribuição de novos significados e formas de apropriação de espaços “naturais”,
que de certa forma seriam essenciais para o ecoturismo, tratado adiante.
Deve-se ainda considerar que a implementação da própria atividade turística
propicia um contato entre diferentes gêneros de vida, ainda que de forma
intermitente, pois os turistas trazem idéias e valores sociais distintos daqueles que
14
a sociedade local possui, fazendo com que esta última, por conta das exigências do
mundo globalizado, venha a adotar uma das três posturas apresentadas por
Martins (2001, p. 16), quais sejam: ceder aos novos valores; radicalizar seus
valores; ou ainda, recriá-los, adaptando-os às novas situações.
A turistificação ou (re)criação do espaço, portanto, englobaria, de acordo
com Martins (2001, p. 16), a introdução no ambiente de novos usos e valores
sociais e espaciais, pois povos diferentes em um espaço “do outro” alterariam a
estrutura social deste. E, em última instância, pode-se dizer que tal tipo de contato
teria um caráter civilizatório, que tende a extinguir as manifestações espontâneas e
culturais locais.
Neste sentido, Martins (2001, p. 17) ressalta que “a dinâmica social é
irrefreável”. A economia aparece, então, como um dos elementos responsáveis por
esta dinâmica, não podendo, no entanto, ser o mais importante, pois acabaria por
desgastar o principal produto, o espaço turístico, já que este necessita da
manutenção de suas peculiaridades, seus atrativos, especialmente quando o
processo possa vir a ser prejudicial ao patrimônio cultural e/ou ao ambiente natural
ou construído. Portanto, a garantia de reprodução do capital não pode governar
exclusivamente o processo de turistificação, com o risco de promover o próprio “fim”
da atividade.
As técnicas contemporâneas, segundo Lash e Urry (1998, p. 348), são
capazes de fabricar qualquer lugar, envolvendo as pessoas em uma rede de
símbolos cada vez mais semelhantes que se fabricam e se tornam a fabricar de
acordo com a vontade do mercado. A proliferação de símbolos e imagens,
característica da globalização, que são essencialmente os mesmos, tendem a
reduzir as diferenças entre lugares, homogeneizando-os. Produzir-se-ia, assim,
“[...]um abandono do turismo organizado característico do período moderno em
favor de uma pauta de mobilidade muito mais diferenciada e fragmentada, que
definiríamos quase como ‘final do turismo’ em si” (LASH & URRY, 1998, p. 361).
Para Lash e Urry (1998, p. 362-363), o “fim do turismo” pode se concretizar
a partir de três relações principais de troca, que preferiu-se chamar de relações de
consumo, que vêm ocorrendo:
- o pagamento por direitos temporários de ocupar uma propriedade
móvel, tal como o aluguel de uma cabine reservada num trem ou um
15
assento no ônibus;
- o pagamento pela posse temporária de alojamentos e comodidades
fora do lugar de residência e trabalho das pessoas, tal como camas de
hotel ou mesas de restaurantes;
- o pagamento por uma propriedade visual, ou seja, pelo direito de olhar
e registrar vistas rurais e urbanas para recordar-se.
A primeira relação de consumo é considerada por estes autores como a
mais comum nos dias de hoje, quando houve um aumento expressivo do número
de viagens que as pessoas fazem, além de sua duração. Isso devido ao
crescimento das áreas urbanas e conseqüentemente das distâncias a serem
percorridas, ao aumento do número de automóveis e das viagens neles, e ao
desenvolvimento de transportes mais velozes que reduzem o tempo de viagem.
Nesse sentido, Lash e Urry (1998, p. 362-363) afirmam que a viagem de
férias tem perdido parte de sua importância, não servindo para distinguir a condição
de turista das muitas outras classes de atividades sociais relacionadas ao ato de
viajar. Assim, ida a congressos, visitas de negócios e viagens com fins acadêmicos
se utilizam da segunda relação de consumo, sem, no entanto, serem atividades
turísticas.
Em função da idéia de que o haja o “fim” da atividade turística, Martins
(2001, p. 18) introduz ainda a expressão “curva de vida da atividade turística”, que
representa a capacidade de reprodução da atividade turística em cada local em que
se apresenta, através da criação, preservação ou recriação de atrativos capazes de
motivar a visitação. Estes atrativos podem ser bens, valores, espaços, história,
personagens, obras, enfim, elementos que denotarão o tipo de atividade turística
que se desenvolverá em um determinado local. No entanto, caso não haja o
respeito para com o ambiente, a comunidade ou a cultura locais, com alteração da
identidade e do atrativo que oferece, este processo de turistificação pode, então,
afetar a “curva de vida da atividade turística”, podendo inclusive determinar o
término da atividade em um determinado local.
Lash e Urry (1998, p. 367-368) falam ainda em “pós-turismo”. Esse
fenômeno seria caracterizado pela existência do pós-turista, sujeito que pode
usufruir experiências “turísticas” em sua própria casa, através da TV, repetindo-as
quantas vezes queira, sem promover a degradação ambiental. O pós-turista tem
consciência de que é um turista e de que o turismo nada mais é do que uma série
16
de jogos com textos múltiplos e não uma experiência singular autêntica. Desta
forma, para estes autores, concretizar-se-ia o “fim do turismo”.
No entanto, essa questão não será aqui aprofundada. Buscar-se-á abordar o
tema ecoturismo, tomando como base o princípio de que deve haver o respeito
para com o ambiente natural e/ou construído, a comunidade e a cultura locais, para
que sejam reduzidos os riscos de término da atividade em determinados locais,
afetando de maneira reduzida a “curva de vida da atividade turística”.
2.2. ECOTURISMO
Para o desenvolvimento do tema ecoturismo, contar-se-á principalmente
com as contribuições de: Lindberg e Hawkins (1995); Niefer e Garzel Leodoro da
Silva (1999); Martins (2001); Costa (2002); e da EMBRATUR (2002); além do
documento resultante da Reunião da Cúpula de Especialistas em Ecoturismo,
realizada em Quebec, Canadá, em 2002, denominado “Declaração de Ecoturismo
de Quebec” (vide Anexo II).
2.2.1. Breve resgate histórico do ecoturismo
Ao se pensar em antecedentes históricos do ecoturismo, pode-se citar: as
caminhadas de longo curso, com a busca por novos conhecimentos e lugares; as
expedições, como a procura pela fonte de eterna juventude ou pelo “fim da terra”; e
ainda, as peregrinações por trilhas sagradas e áreas intocadas cultuadas por povos
antigos, tal como destaca Costa (2002, p. 14).
Tem-se, assim, a busca por conhecimento cultural, desde a Antigüidade,
seja por interesse pela natureza ou pela sociedade, ou ainda deslocamentos de
pessoas ou grupos sociais para cumprir ritos e preceitos de cunho cultural e
religioso. São exemplos disto: as viagens em busca de resposta ao oráculo de
Delfos na Grécia antiga; as peregrinações cristãs à Terra Santa desde a Idade
Média; as peregrinações muçulmanas a Meca; e até o cumprimento de ritos tribais
que envolvem a peregrinação e sobrevivência em ambientes hostis, como é
praticado ainda hoje, desde as planícies desérticas da Mongólia até o Kalahari
17
africano.
No entanto, a palavra ecoturismo não existia há alguns anos, muito menos
seus princípios. Esta atividade passou a ser um fenômeno característico do final do
século XX, e tudo indica que do século XXI também. Este fato se deve à enorme
popularidade dos documentários televisivos sobre a natureza e sobre as viagens,
ao interesse crescente em questões ligadas à conservação e ao ambiente e ao
surgimento de novos meios de transporte e o incremento destes.
A crescente procura por experiências turísticas em ambientes naturais
relativamente intactos fez com que o ecoturismo se tornasse o segmento do
mercado internacional de turismo com os maiores índices de crescimento nos
últimos cinco anos.
Castilho e Herrscher (1997; apud NIEFER & GARZEL LEODORO DA
SILVA, 1999) afirmam que o ecoturismo gera bilhões de dólares por ano e que ele
está crescendo a taxas de 10 a 15% ao ano. Em 1990, teriam sido gastos US$ 220
bilhões em atividades ecoturísticas e o número de chegadas em países
desenvolvidos teria crescido cerca de 3,5% ao ano, enquanto o hemisfério sul
apresentava um crescimento de 6% ao ano, devido às suas riquezas naturais e
suas culturas indígenas.
Uma prova do reconhecimento da importância econômica e social que o
ecoturismo tem alcançado em todo o mundo é o fato da Organização Mundial de
Turismo (OMT), organismo setorial das Nações Unidas, haver estabelecido o ano
de 2002 como o Ano Internacional do Ecoturismo.
2.2.2. Aspectos conceituais do ecoturismo
Com o incremento da atividade turística e de interesses distintos em sua
prática, ela passou a apresentar diversos segmentos, em diferentes áreas de
atuação, sendo o ecoturismo um deles.
Todavia, dentre as nomenclaturas com as quais se depara, referentes a
estes segmentos, pode-se destacar aquelas cujos conceitos se aproximam dos
apresentados ao termo ecoturismo, por poderem ter ligação intrínseca com o
ambiente natural, gerando bastante confusão na literatura referente ao assunto.
18
São estas: turismo rural, agroturismo, turismo verde, turismo ecológico, turismo
ambiental, turismo esportivo, turismo de aventura, turismo científico e turismo
cultural.
Não há um consenso acerca da definição da atividade turística, o mesmo
ocorrendo com essa grande variedade de termos e expressões referentes aos seus
segmentos. A literatura existente apresenta conceitos ligados a estes que podem
ainda variar de acordo com cada país ou localidade.
No intuito de se alcançar uma definição mais precisa e diferenciada do
termo ecoturismo, serão apresentadas, a seguir, diversas definições dos segmentos
turísticos relacionados ao ecoturismo.
Costa (2002, p. 22-23) trabalha com uma distinção entre ambiente natural e
rural. Segundo esta autora, o agroturismo e o turismo rural possuem conceitos
baseados na realidade européia de espaço, pois a Europa utiliza suas áreas não
urbanizadas como propriedades rurais, provedoras de alimento à população.
Portanto, suas áreas naturais são praticamente inexistentes, restando apenas as
que “não puderam ser exploradas (belezas naturais tombadas, áreas de difícil
acesso, locais com clima de difícil adaptação...)”. Assim, Costa afirma que os
estudiosos do turismo de países europeus, especialmente os de pequenos países,
consideram ecoturismo e agroturismo ligados ao ambiente rural, já que não
possuem o ambiente natural desvencilhado da atividade rural.
A autora ainda acredita que no caso do Brasil, um país de inúmeras belezas
naturais e um território de dimensões continentais, seria mais fácil estabelecer
distinções entre os diferentes segmentos da atividade turística por possuir ambiente
natural e também rural, ambos vastos e diversos.
No entanto, a confusão em se conceituar e definir cada atividade
permanece, pois alguns autores associam o espaço rural ao espaço agrícola,
enquanto outros tomam como base os mesmos critérios definidos pelo IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ou seja, critérios populacionais.
Costa (2002, p. 24) entende lugares rurais, atualmente, como “lugares
afastados dos núcleos urbanos e centros industriais, caracterizados por baixa
densidade demográfica e que mantêm vivas as tradições culturais”.
19
Esta definição de Costa, na atualidade, mostra-se extremamente vaga, e
poder-se-ia dizer que se aproxima de uma proposta às avessas da ecologia
humana da Escola de Chicago, uma vez que não esclarece o que seria o rural e o
articula ao cultural, uma vez que se prende mais à aparência da paisagem do que à
sua qualificação. Há vários estudos hoje sobre a urbanização do território, já
assinalada pioneiramente por Lefèbvre (1991), e mais tarde por Santos (1996),
além de ser enfocada por diversos geógrafos e estudiosos (LIMONAD, 1996 &
MONTE MÓR, 1996, entre outros), que destacam a tendência de urbanização do
campo e o crescimento disperso das cidades interioranas de porte médio – o que
faz com que, nas palavras de Limonad (1999), o urbano extrapole os limites do
perímetro das cidades.
2.2.3. Os diferentes segmentos do ecoturismo
Costa (2002, p. 24-27) fornece uma rica sistematização dos diferentes
segmentos turísticos, com base nas definições da EMATER (1998) e de Fuentes
(1995), conforme o que se segue.
O agroturismo, de acordo com a EMATER (1998; apud COSTA, 2002, p. 24-
25), seria o segmento do turismo baseado na oferta de serviços ligados à empresa
ou ao cultivo agrícola, tais como alimentação, hospedagem e venda de produtos
manufaturados.
O turismo rural, por sua vez, segundo a definição da EMATER (1998; apud
COSTA, 2002, p. 25), seria um segmento do turismo baseado na oferta de serviços
que atuam no meio rural, mas teria por base uma economia não agrícola, como em
fazendas de gado, haras, entre outros.
Turismo no espaço rural, para Fuentes (1995; apud COSTA, 2002, p. 26),
possui como motivação principal o contato com o autóctone, garantindo ao turista
uma inter-relação com a sociedade local.
Já para o turismo verde, temos a definição de Domingues (1990; apud
COSTA, 2002, p. 27) que garante que este é o nome dado, na França, ao turismo
praticado em zonas rurais.
Como se pode perceber, estas definições estabelecem uma fronteira muito
20
tênue entre agroturismo, turismo rural e turismo verde, na medida em que estariam
relacionados às atividades-fim, que podem estar mescladas e comprometer assim
uma definição mais precisa deste tipo de turismo, pois nada impede que em um
hotel-fazenda sejam desenvolvidas atividades agrícolas que resultem na venda de
produtos manufaturados ou não, como mel, doces caseiros e manteigas artesanais,
por exemplo.
A EMBRATUR (2002), por sua vez, considera mais dois segmentos do
turismo além do ecoturismo, que envolvem atividades ligadas ao ambiente natural:
o já citado turismo rural e o turismo de aventura.
O turismo rural, segundo este órgão, ocorre no Brasil devido à existência de
muitas propriedades rurais de enorme riqueza cultural e de paisagens naturais,
sendo uma nova fonte de geração de renda e criação de novos postos de trabalho
nestas propriedades. O objetivo desta atividade seria promover a interação entre o
homem da cidade e o homem do campo, através de atrativos históricos e culturais,
de fazendas onde viveram escravos e do período do cultivo de café no Brasil.
Além disso, a EMBRATUR acredita que esta atividade seria capaz de
promover a melhoria da qualidade de vida na zona rural, conservar os recursos
naturais e reabilitar o patrimônio sócio-cultural. Para tanto, o turismo rural não seria
um turismo com padrão convencional de hotelaria, ao contrário, deveria prevalecer
um clima de familiaridade e informalidade, garantindo a já então referida interação
entre o homem da cidade com o do campo. A EMBRATUR aparentemente se
esquece que aí está implícita uma relação de consumo de serviços e “amenidades”
que muitas vezes corresponde a uma representação idealizada da vida no campo.
Quanto ao turismo de aventura, a EMBRATUR (2002) o define como
Segmento do mercado turístico que promove a prática de atividades de
aventura e esporte recreacional, em ambientes naturais e espaços
urbanos ao ar livre, que envolvam emoções e riscos controlados,
exigindo o uso de técnicas e equipamentos específicos, a adoção de
procedimentos para garantir a segurança pessoal e de terceiros e o
respeito ao patrimônio ambiental e sócio-cultural.
Este órgão ainda faz referência às principais modalidades, bem como aos
principais destinos turísticos deste segmento, os quais achamos conveniente
apresentar em anexo, a título de curiosidade (vide Anexo I).
21
A EMATER estabeleceu de fato uma distinção entre os termos agroturismo
e turismo rural. Sendo no primeiro imperativo, como o próprio nome sugere, que a
atividade principal da propriedade seja o cultivo agrícola. No entanto, será
considerada a definição apresentada pela EMBRATUR, que tem turismo rural como
uma atividade a ser realizada em propriedades rurais, independente da atividade
principal ser agrícola.
Entretanto, as definições apresentadas aos termos turismo no espaço rural e
turismo verde são ambas restritas, e, portanto, pode-se considerá-las inseridas na
definição de turismo rural, tanto de acordo com a definição apresentada pela
EMATER, quanto com a da EMBRATUR.
É interessante notar que as definições oficiais de turismo rural conjugam-no
ao contato e vivência com atividades praticadas em propriedades rurais. Ou seja,
ao contrário de Costa (2002), estas definições trabalham com o tipo de atividade e
prática implementada e não necessariamente com a sua localização espacial.
Neste contexto, pode-se ter parques temáticos voltados para o turismo rural em
áreas próximas a zonas urbanas ou resorts e hotéis-fazendas com todas as
benesses do progresso, voltados para o desenvolvimento de “atividades turísticas
desenvolvidas no meio rural com produção agropecuária, capaz de resgatar e
promover o ambiente cultural e natural da comunidade, e agregar valor a produtos e
serviços”, conforme propõe a EMBRATUR (2002).
Além disso, conta-se com os termos turismo esportivo, turismo ecológico,
turismo ambiental, turismo científico e turismo cultural.
Quanto ao turismo esportivo, nota-se que a definição dada pela EMBRATUR
para turismo de aventura a tem enquanto atividade de aventura e esporte
recreacional. Pode-se então estabelecer aqui uma distinção entre esportivo e de
aventura ao se considerar que o turismo de aventura também pode estar
relacionado à prática de esportes, no entanto, como uma prática estritamente
recreacional, enquanto o turismo esportivo seria aquele com fins competitivos.
Já os termos turismo ecológico e turismo ambiental costumam aparecem
como sinônimos de ecoturismo.
Quanto ao termo turismo científico, este pode aparece associado a
22
ambientes naturais, especialmente aqueles que são intactos e merecem estudo.
Este é mais um termo que, por sua ligação com o meio ambiente natural, confunde-
se com o ecoturismo.
É importante perceber que a palavra cultural aparece nas definições de
turismo rural e de turismo de aventura, apresentadas pela EMBRATUR, estando
presente também em praticamente todas as conceituações dadas ao ecoturismo,
como será visto adiante. Este é mais um complicador no estabelecimento da
definição de outro termo: o turismo cultural.
O turismo cultural, segundo Martins (2001, p. 24), está voltado para o turista
que associa a atividade turística à sua necessidade mental de conhecimento, além
de descanso. Portanto, o caráter pedagógico, educacional do turismo cultural não
pode ser negligenciado, havendo a conscientização do cidadão e da coletividade,
não só do morador como também do turista, mantendo respeito entre si e também
com o ambiente natural e construído.
Sendo assim, adiante será visto o ecoturismo propriamente dito e sua
relação com os termos até agora apresentados.
2.3.4. O ecoturismo
Nessa recuperação bibliográfica, foram encontrados inúmeros conceitos a
respeito de ecoturismo. Alguns deles serão apresentados a seguir, considerando-
se, no entanto, que todos possuem a mesma essência, pois atentam para o fato
desta atividade estar relacionada ao meio ambiente natural.
A palavra ecoturismo, devido ao seu prefixo “eco”, que se originou do grego
oîkos cujo significado é casa, habitat, o que sugere a relação da natureza enquanto
moradia primeira do homem, denota uma interação com atividades a serem
desempenhadas ao ar livre, o que faz com que seja reputada por muitos como uma
atividade exclusivamente de deslocamentos para áreas naturais. Um dos primeiros
a definir a atividade ecoturística foi Ceballos-Lascuráin, na década de 1980, cujo
conceito para turismo ecológico seria “a realização de viagens para áreas naturais
não perturbadas ou contaminadas, com o objetivo de admirar, gozar e estudar a
paisagem, sua flora e fauna, assim como as culturas passadas e presentes em tais
áreas” (COSTA, 2002, p. 27).
23
Depreende-se de tal concepção que a prática teria um caráter mais
contemplativo e/ou de pesquisa, sem ter uma preocupação com a preservação
ambiental, ou como o definiria Costa (2002, p. 15) mais tarde, o ecoturismo seria
“[...], antes de mais nada, uma atividade que compreende em si um posicionamento
ambiental de conservação do patrimônio natural e cultural, tanto em áreas naturais
como não naturais”.
Entre a definição de Ceballos-Lascuráin e a de Costa pode-se perceber um
avanço em termos da relação turistas e espaço do turismo – à medida em que
Costa está preocupada tanto com áreas naturais quanto com áreas não-naturais.
No final da década de 1980, surge a nomenclatura turismo ecológico no
Brasil, que antes recebeu o nome de Turismo de Natureza, Turismo Verde e
Turismo Natural. Sua prática não era comum e não possuía orientação adequada.
Foi em 1987 que surgiu a primeira iniciativa governamental de ordenação deste
mercado, por intermédio da EMBRATUR e do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente
e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA).
A terminologia turismo ecológico não é mais utilizada pelos órgãos oficiais,
sejam eles nacionais ou internacionais. O IBAMA e a EMBRATUR utilizam o termo
ecoturismo, assim como a OMT e a TIES (The International Ecotourism Society,
com sede nos Estados Unidos).
O ecoturismo é considerado por alguns autores como uma “indústria não
poluidora” e apontado como uma atividade capaz de garantir a conservação do
ambiente e proporcionar o desenvolvimento sócio-econômico. Muitas conferências
e simpósios têm sido organizados, desde 1990, com esse tema. Atualmente, a
maior parte dos governos e investidores privados tem interesse no assunto.
Em 1990, quando se convencionou chamar a atividade de ecoturismo,
terminologia absorvida com o tempo pelo setor de atividade de turismo, a
EMBRATUR (2002) passou a definir o ecoturismo como:
Turismo desenvolvido em localidades com potencial ecológico, de forma
conservacionista, procurando conciliar a exploração turística com o meio
ambiente, harmonizando as ações com a natureza, bem como oferecer
aos turistas um contato íntimo com os recursos naturais e culturais da
região, buscando a formação de uma consciência ecológica.
Embora a EMBRATUR não explicite o que seriam as “localidades com
24
potencial ecológico”, deixa clara uma preocupação com a conservação ambiental,
apesar de propor uma atividade que vai além da mera contemplação proposta por
Ceballos-Lascuráin. De certa forma, emerge desta proposição um problema
potencial relacionado à “exploração turística” e ao “contato íntimo” com os recursos
naturais. Pois mesmo tendo como meta a formação de uma “consciência
ecológica“, as atividades desenvolvidas, conforme noticiado pela imprensa, na
maior parte das vezes, acabam por ter um caráter mais predatório do que
educacional, como é o caso das visitas às dunas do Rio Grande do Norte.
A Organização dos Estados Americanos (OEA, 1990) apresenta uma
definição vaga ao afirmar que os principais atributos do ecoturismo estariam
relacionados com o turismo educativo, com a capacidade do governo para o
manejo das áreas naturais, profissionalismo, legislação e políticas claras e
concretas, capacidade de trabalho, investigação e população local, devendo-se
também considerar o turismo científico, que realiza descobertas ambientais e
culturais.
O ecoturismo foi considerado, no início, como o reencontro do homem com
a natureza em seu estado primitivo. Foi em 1992 que o Congresso Mundial de
Ecoturismo (Belize) apresentou uma outra abordagem sobre este segmento do
turismo e passou a vê-lo não mais enquanto uma atividade passiva, mas enquanto
uma atividade ativa, na medida em que o ecoturismo passou a ser entendido como:
[...] dedicado à apreciação da natureza em forma ativa, com o objetivo de
conhecer e interpretar os valores naturais e culturais existentes, em
estreita interação e integração com as comunidades locais e com o
mínimo de impacto sobre os recursos, e ser base de apoio aos esforços
dedicados à preservação e ao manejo das áreas naturais onde se
desenvolvem as atividades ou naquelas cuja prioridade seja manutenção
da biodiversidade.
É interessante notar o peso que conquista a relação dos turistas com as
“comunidades locais”, sem que haja uma preocupação com a preservação dos
“valores naturais e culturais existentes”, em paralelo com a preocupação ambiental
estrita que estaria mais relacionada a um viés de preservação da natureza com a
exclusão do homem (vide a respeito ACSELRAD).
Nesta mesma perspectiva, Chavez (apud COSTA, 2002, p. 28) integra à
definição de ecoturismo a preocupação com a preservação dos valores naturais e
culturais existentes ao considerar o ecoturismo como o “aproveitamento econômico
25
não destrutivo e conservacionista da natureza, realizado em certas áreas
protegidas onde existam atrativos naturais e culturais a serem preservados”.
Western (apud LINDBERG & HAWKINS, 1995, p. 18) segue esta linha ao
definir ecoturismo como a atividade destinada a “provocar e satisfazer o desejo que
temos de estar em contato com a natureza, é explorar o potencial turístico visando
à conservação e ao desenvolvimento, é evitar o impacto negativo sobre a ecologia,
a cultura e a estética”.
A conceituação de ecoturismo começou, portanto, considerando-o apenas
como uma atividade passiva de “contemplação” e utilização de áreas naturais
protegidas, e passou, ao longo do tempo, a ser considerado uma atividade com
uma interação ativa, além de abarcar também os aspectos culturais dos locais,
considerando ainda a preocupação social e garantindo a relação comercial,
existente através do lucro. A estas preocupações, como será visto no próximo
capítulo, foi incorporada aquela relativa à sustentabilidade.
De acordo com a “Declaração de Ecoturismo de Quebec” de 2002 (Anexo
II), as organizações autorizadas pelas Nações Unidas e encarregadas pelas
atividades internacionais no ano de 2002, cientes da variedade de interpretações
dadas ao termo ecoturismo através do mundo, concordam que o
Ecoturismo inclui todas as formas de turismo com base na natureza em
que a motivação principal dos turistas seja a observação ou apreciação
da natureza, bem como das culturas tradicionais que prevalecem em
áreas naturais. Ele inclui uma experiência de interpretação/aprendizado.
Percebe-se na “Declaração de Ecoturismo de Quebec” uma diferença básica
em relação à formulação da EMBRATUR, também de 2002, citada anteriormente.
Enquanto a “Declaração de Ecoturismo de Quebec” explicita que o ecoturismo
abrangeria “todas as formas de turismo com base na natureza, bem como das
culturas tradicionais”; a EMBRATUR refere-se a “localidades com potencial
ecológico”. Parece que a definição da EMBRATUR teria um caráter mais restrito, à
medida que, de acordo com a “Declaração de Ecoturismo de Quebec”, uma mera
travessia Rio-Niterói, de barca ou “catamarã”, poderia, em última análise, ser
considerada como uma atividade ecoturística. De fato, deve-se atentar para a
imprecisão da abrangência das definições de ecoturismo.
Esta imprecisão permite, neste sentido, um relatório mais amplo, na medida
26
em que todas as atividades turísticas entrelaçadas com a natureza teriam o caráter
de ecoturismo. O que também pode ter um viés mercadológico, no sentido de
ampliar o mercado potencial do ecoturismo, com atividades que antes pertenceriam
ao circuito do que se poderia chamar de turismo convencional – neste sentido,
tradicionais excursões lacustres ou marítimas seriam passíveis, por exemplo, de
serem transformadas em atividades de ecoturismo – com um caráter mais
“moderno”.
Ainda segundo essa declaração, tem-se que o ecoturismo não seria uma
atividade para poucos na medida em que
Ele é geralmente, porém não exclusivamente, organizado para viajantes
independentes e grupos pequenos, por empresas especializadas e
pequenas, de propriedade local. Operadores estrangeiros de tamanhos
variados também organizam, operam e/ou comercializam passeios
ecoturísticos, geralmente para pequenos grupos.
Porém, há que se destacar que, apesar de haver uma multiplicidade de
pequenas empresas que comercializam os passeios turísticos e as atividades
ecológicas, via de regra, os que executam as atividades são em número reduzido e
são servidos por esta multiplicidade de operadoras – como é o caso das excursões
lacustres na Patagônia Argentina ou na Terra do Fogo, onde há apenas um barco,
mas as excursões e atividades são comercializadas por diversas empresas. O
mesmo ocorre aqui no Brasil e em outras partes do mundo.
De fato, parece que a “Declaração de Ecoturismo de Quebec” (vide Anexo
II), ao mesmo tempo em que procura destacar o caráter benfazejo do ecoturismo,
deixa claro também suas preocupações com o desenvolvimento econômico e
sustentável da atividade na medida em que: 1) estabelece uma definição mais
abrangente para a atividade que ampliaria potencialmente seu mercado
consumidor; 2) mostra que não é uma atividade restrita a uns poucos eleitos – há
que se destacar que as cavalgadas ecológicas destinam-se inclusive para aqueles
que nunca andaram a cavalo; 3) destaca as oportunidades de geração de emprego
e renda para as comunidades locais.
Portanto, as definições apresentadas convergem para alguns pontos
comuns, a saber: respeito às comunidades locais; envolvimento econômico efetivo
das comunidades locais; respeito às condições naturais e conservação ambiental; e
interação educacional - garantia de que o turista incorpore para a sua vida o que
27
aprende em sua visita, gerando consciência para a preservação da natureza e dos
patrimônios histórico, cultural e étnico.
A proposição apresentada pela “Declaração de Ecoturismo de Quebec”
parece demasiado ampla, pois pode englobar atividades que estariam além do
ecoturismo, sendo inclusive mais completa que a das “Diretrizes para uma Política
Nacional de Ecoturismo” (MICT/MMA, 1995), que considera o ecoturismo enquanto
um segmento da atividade turística que utiliza o patrimônio natural e cultural de
forma sustentável, incentivando sua conservação e buscando a formação de uma
consciência ambientalista e o bem-estar das populações envolvidas.
Em primeiro lugar, a contemplação da natureza e das culturas tradicionais
faz parte de todo e qualquer tipo de atividade turística. A respeito dos elementos
educacionais e de interpretação, estes também estão presentes em parques
temáticos, por exemplo. Quanto à dimensão do grupo que praticaria a atividade,
este não é um fator determinante do tipo de atividade que se pratica.
Sendo assim, pode-se dizer que as atividades de ecoturismo seriam aquelas
que ao procurar reduzir ao mínimo os impactos negativos sobre o entorno natural e
o sócio-cultural: contribuiriam para a proteção de áreas naturais; gerariam
benefícios econômicos para as comunidades, as organizações e as autoridades
locais, controlando áreas naturais com finalidades de conservação; forneceriam
oportunidades alternativas de emprego e renda para comunidades locais; bem
como conscientizariam a conservação de recursos naturais e culturais entre
habitantes locais e turistas.
Esta definição pode ainda parecer ampla, pois atividades como turismo
rural, turismo de aventura, turismo esportivo e turismo cultural podem possuir estas
mesmas características, onde a contemplação da natureza e/ou apreciação das
culturas tradicionais também fazem parte de seus objetivos.
Para resolver esta falta de clareza entre os diversos termos abordados até
então, propõe-se a segmentação do próprio ecoturismo. Ou seja, atividades como
turismo rural, turismo de aventura, turismo esportivo, turismo científico e turismo
cultural também podem ser uma atividade ecoturística, desde que:
procurem reduzir ao mínimo os impactos negativos sobre o entorno
28
natural e o sócio-cultural, contribuindo para a proteção de áreas
naturais;
gerem benefícios econômicos para as comunidades, as
organizações e as autoridades locais, controlando áreas naturais
com finalidades de conservação;
forneçam oportunidades alternativas de emprego e renda para
comunidades locais;
e conscientizem a conservação de recursos naturais e culturais entre
habitantes locais e turistas.
Nesse contexto, pode-se apresentar dois níveis de segmentação do turismo,
tal como mostra o fluxograma a seguir:
TURISMO
CULTURAL
OUTROS
DE AVENTURA
ECOTURISMO
RURAL
DE AVENTURA
CULTURAL
OUTROS
RURAL
Figura 1 – Fluxograma com dois níveis de segmentação do turismo.
O primeiro nível mostra o turismo segmentado em turismo rural, turismo
esportivo, ecoturismo, turismo de aventura, turismo científico, turismo cultural e
outros. O segundo nível mostra a segmentação do ecoturismo em rural, esportivo,
de aventura, científico, cultural, podendo ainda se considerar que outros segmentos
podem vir a ser criados.
Comprovando esta necessidade de uma segmentação do próprio
ecoturismo, tem-se a definição apresentada por Almeida e Caccia-Bava (1997) que
aponta o ecoturismo como uma tendência mundial em crescimento e que responde
29
a várias demandas: “desde a prática do esporte radical ao estudo científico dos
ecossistemas”.
É importante perceber que todos estes segmentos envolvem um contato
intenso com o ambiente natural. Apesar das inúmeras distinções estabelecidas
entre eles, o que se observa é que, para fins de marketing, estas atividades
costumam ser agrupadas por agentes de viagens e geralmente com o nome de
ecoturismo, mesmo quando envolvem a depredação e impactam negativamente o
ambiente.
Torna-se claro que o ecoturismo padece ainda da falta de uma definição
precisa, e diversos organismos, organizações e órgãos de governo em busca de
uma definição mais precisa começaram a articular a prática do ecoturismo à
perspectiva do desenvolvimento sustentável e integração dos atores envolvidos,
através de um processo de conscientização e educação ambiental.
Tal preocupação é patente em documentos de órgãos oficiais, como na
“Declaração de Ecoturismo de Quebec” (vide Anexo II) ou na proposta da
EMBRATUR (2002) de que o caminho ideal para o ecoturismo é o chamado
desenvolvimento sustentável, com a integração da comunidade local com
atividades que possam promover a conservação e o uso sustentável dos recursos
naturais e culturais.
Torna-se necessário, assim, que sejam consideradas a questão ambiental e
a sustentabilidade, que serão objetos de destaque no próximo capítulo.
30
3. ECOTURISMO, A QUESTÃO AMBIENTAL E A
SUSTENTABILIDADE
O crescimento da prática do ecoturismo evidencia-se à medida que as
visitas realizadas por turistas a áreas naturais têm aumentado nos últimos anos, de
acordo com dados divulgados pelo WTTC e pela OMT, conforme salientado no
capítulo anterior.
Um dos motivos de se considerar o ecoturismo uma atividade de enorme
potencial econômico e conservacional é o fato do turismo enquanto atividade
econômica ser comprovadamente capaz de cooperar com o aumento no número de
empregos, tendo em vista que o setor que mais emprega atualmente no país é o
terciário.
Nos últimos dez anos, conforme dissertado anteriormente, as definições de
ecoturismo passaram a considerar a questão da sustentabilidade do
desenvolvimento, questão extremamente controversa, como será visto adiante.
Um exemplo disso é o fato de que, em agosto de 1994, no Brasil, o grupo de
trabalho Interministerial em Ecoturismo, que reuniu o Ministério da Indústria,
Comércio e Turismo e o Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal, além da
EMBRATUR, IBAMA, empresários e consultores, passou a conceituar o ecoturismo
como uma atividade turística que traz em si mesma um potencial de
sustentabilidade e conservação do meio ambiente natural, conforme se pode
depreender da passagem a seguir:
Ecoturismo é um segmento da atividade turística que utiliza, de forma
sustentável [grifo nosso], o patrimônio natural e cultural, incentiva sua
conservação e busca a formação de uma consciência ambientalista
através da interpretação do ambiente, promovendo o bem-estar das
31
populações envolvidas. (Diretrizes para uma Política Nacional de
Ecoturismo, MICT/MMA, março de 1995).
O Instituto de Ecoturismo do Brasil (IEB), representante oficial do segmento
empresarial brasileiro ligado diretamente ao ecoturismo, chamado trade
ecoturístico, com base nesta definição elaborada pelo Ministério da Indústria,
Comércio e Turismo (MICT) e pelo Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia
Legal (MMA), elaborou sua própria:
O ecoturismo é a prática do turismo recreativo, esportivo e educativo,
que se utiliza de forma sustentável [grifo nosso] dos patrimônios
natural e cultural, incentiva a sua conservação, promove a formação de
consciência ambientalista e garante o bem-estar das populações
envolvidas.
No entanto, as instituições públicas e privadas brasileiras não se encontram
sozinhas, uma vez que a “Declaração de Ecoturismo de Quebec”, por exemplo,
enfatiza o caráter de prevenção de impactos ambientais da atividade ao destacar
que o ecoturismo “minimiza impactos negativos sobre o meio ambiente natural e
sócio-cultural”, além de auxiliar
na proteção de áreas naturais por gerar benefícios econômicos para as
comunidades anfitriãs, organizações e autoridades locais, controlando
áreas naturais com propósitos de conservação, promovendo
oportunidades alternativas de emprego e renda para comunidades
locais, aumentando a consciência acerca dos recursos naturais e
culturais entre habitantes locais e turistas.
Conforme destacado anteriormente, nos últimos anos, houve uma
significativa expansão e difusão do ecoturismo, com a inserção de mais e mais
lugares no circuito de viagens que têm a atividade como atrativo, especialmente
através da internet.
No entanto, ainda a respeito dos impactos causados pela prática da
atividade ecoturística, observa-se que muitas operadoras e empresas de turismo,
juntamente com órgãos governamentais, têm se apropriado de maneira inadequada
da atividade, sem uma preocupação com o leque de impactos negativos que podem
ser gerados, tais como: saturação e conseqüente deficiência na infra-estrutura
básica, de transportes, de espaços destinados ao lazer, bem como influência na
perda de identidade local através da inserção de novas culturas.
Neste contexto, a idéia de sustentabilidade é evocada como uma forma de
minimizar os efeitos perversos da atividade. Esta noção surge sempre ligada à
questão ambiental e tem sido tratada de diversas formas ao longo do tempo, de
32
acordo com a ideologia de desenvolvimento de cada governo e dos agentes
responsáveis por sua idealização.
Portanto, para poder avançar na compreensão do ecoturismo e de suas
práticas, será considerado o incremento da preocupação com o meio ambiente
natural e com as questões ligadas à sustentabilidade.
Nesse sentido, proceder-se-á, nesse capítulo, a uma breve abordagem da
questão ambiental, para em seguida ser discutida a problemática da
sustentabilidade e avaliado o papel do ecoturismo enquanto atividade passível de
contribuir com a conservação ambiental e o desenvolvimento sustentável.
3.1. A QUESTÃO AMBIENTAL
Deve-se assinalar que diversos autores, tais como Gonçalves (1989),
Becker (1997), Viola (1997), Leroy (1997), já trataram da questão ambiental, bem
como dos antecedentes de sua institucionalização. Tratar-se-á aqui de proceder
apenas a um breve resgate que contextualize a reflexão sobre as relações entre o
ecoturismo e a questão ambiental.
A transformação do meio natural se deve ao desenvolvimento da técnica, tal
como Brüseke (1998, p. 19) apresenta quando afirma que a técnica “tem a mesma
idade do homem”, ao indicar que ela está presente em todo e qualquer
desenvolvimento que o homem já ousou experimentar, desde o surgimento da
espécie humana. Ou seja, o homem é capaz de transformar o meio em que vive,
através do desenvolvimento das técnicas que apreende ao longo de sua existência.
Esta transformação promovida pelo desenvolvimento da técnica seria
responsável pela conquista de uma melhor qualidade de vida do ser humano. No
entanto, essa conquista da qualidade é relativa. Primeiro, porque se há de fato uma
melhora da qualidade de vida, através de inventos técnico-científicos, apenas a
minoria detentora do capital pode desfrutar destes benefícios. Em segundo lugar,
porque o próprio desenvolvimento da técnica tem nos levado a experimentar as
suas conseqüências ambientais, tais como as diversas formas de poluição com as
quais se convive.
33
Frente ao atual quadro de degradação ambiental com o qual nos deparamos
e que, de acordo com alguns ambientalistas, compromete a continuidade de nossa
existência no planeta, pode-se dizer que esta seria a era das grandes
preocupações ecológicas. Conforme Lefèbvre (1991, p. 30), “todos querem proteger
e salvar a natureza”.
Várias análises admitem o fato de que o desenvolvimento e expansão das
atividades econômicas seriam os principais responsáveis pela degradação
ambiental ao poluírem o ambiente, promoverem os desmatamentos, a exploração
irracional dos recursos naturais e outras agressões, que atingiram níveis
considerados inadmissíveis, principalmente no século XX.
Concorda-se com Becker (1997) quando a autora afirma que a questão
ambiental conquistou um caráter geopolítico, em que a degradação ambiental pode
ser entendida como a resultante do confronto de diferentes grupos políticos e
econômicos com interesses distintos em disputa pelos recursos naturais.
Pode-se dizer que as preocupações ambientais emergem, de um lado, de
um reconhecimento, em uma perspectiva neo-malthusiana, de órgãos oficiais e
organizações não-governamentais de que o crescimento populacional e em
especial o modelo sócio-econômico e político instaurado em todo o mundo
contribuem para o uso irracional dos recursos naturais. E, por outro lado, tem-se
uma vertente preservacionista, que atribui à humanidade e às suas atividades a
responsabilidade pela degradação (ver a respeito ACSELRAD, 1999). Tais
correntes serviam-se e servem-se destes argumentos e da sustentabilidade para
justificar a expulsão e exclusão de grupos sociais de nichos ecológicos e unidades
de conservação (UCs)
4
em risco.
No início da década de 1970, os problemas ambientais eram pensados pela
elite capitalista como motivos para o estabelecimento de limites de crescimento, de
acordo com uma perspectiva neo-malthusiana. Pois, a partir do pós-guerra, os trinta
anos de produção crescente apresentaram situações em que os insumos primários
4
De acordo com o art. 2º, inciso I, da Lei nº 9.985 de 18 de junho de 2000, que institui o Sistema
Nacional de Unidades de Conservação, a unidade de conservação é: “espaço territorial e seus
recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes,
legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime
especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção”.
34
podiam ser reduzidos, considerando-se inclusive que muitos destes não são
renováveis.
As expectativas de restrição ao ritmo de acumulação promoveram o debate
ambiental nos núcleos do capitalismo mundial. Assim, os debates internacionais
acerca da questão ambiental intensificaram-se a partir da década de 1970.
Neste sentido, podemos destacar a criação do Clube de Roma, em 1968, na
Academia dei Lincei (Academia de Leonardo da Vinci), em Roma. Este organismo
era integrado por cientistas de vários países, em sua maioria economistas, cujo
objetivo era estudar e propor soluções para os problemas decorrentes da explosão
demográfica sobre o equilíbrio dos ecossistemas e dos recursos naturais não
renováveis no mundo. A esse Clube foram submetidos três relatórios.
Em 1971, o primeiro, denominado “Os Limites do Crescimento” (The Limits
of Grouth), realizou uma avaliação de crescimento do capitalismo, e concluiu que
este deveria esgotar-se no prazo máximo de cem anos, caso não se passasse a
preservar os recursos naturais. Elaborado com base em um complexo modelo
matemático mundial, sua recomendação era, portanto, a imediata adoção de uma
política mundial de contenção do crescimento, também conhecida como
“crescimento zero”, para que se chegasse a um equilíbrio. Essa política foi
entendida pelos países subdesenvolvidos como uma maneira de manterem sua
situação de subdesenvolvimento e, portanto, não foi aprovada por estes.
Em 1973, o segundo, denominado “Momento de Decisão” (Mankind at the
Turning Point), propunha a elaboração de uma estratégia cooperativa para todos os
países, orientada por um plano global, denominado “crescimento orgânico”.
Em 1976, o terceiro, denominado “Para uma Nova Ordem Internacional”
(Reshaping the International Order), previa que, antes de serem atingidos os limites
físicos do nosso planeta, ocorreriam grandes convulsões sociais, econômicas e
políticas. Estas convulsões seriam provocadas pelo enorme desequilíbrio entre os
países desenvolvidos e os subdesenvolvidos, pois a relação média de renda dos
países desenvolvidos em relação aos subdesenvolvidos era de 13/1, considerada
inaceitável.
Ainda em 1971, houve a Reunião de Founeux, Suíça (preparatória para a
35
Conferência de Estocolmo), onde surgiu o conceito de “ecodesenvolvimento”. Este
novo conceito previa um desenvolvimento baseado na potencialidade de cada
ecossistema, considerando ainda a participação das populações, a redução dos
desperdícios de qualquer ordem e a reciclagem dos resíduos.
Neste mesmo ano, ocorreu então a Conferência de Estocolmo, onde foi
elaborada a “Declaração de Estocolmo sobre Meio Ambiente” e onde surgiu o
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), cuja sede está
instalada em Nairobi, Quênia.
O objetivo do PNUMA era “catalisar e coordenar as atividades de proteção
ambiental dentro do sistema das Nações Unidas e entre os vários organismos de
âmbito regional e internacional, além de entidades governamentais” (LEMOS, 2003,
p. 8). Também foi criado um Fundo Voluntário para o Meio Ambiente gerido pelo
PNUMA.
No início dos anos 80, foi lançada a “Estratégia Mundial para a
Conservação” (World Conservation Strategy), que lançou o conceito de
“desenvolvimento sustentado”, seguindo as linhas do “ecodesenvolvimento”, porém
com maior ênfase na preservação da biodiversidade. Enfatizou mais a conservação
do que o gerenciamento dos recursos naturais para um desenvolvimento
sustentável, tendo em vista a satisfação das necessidades básicas das sociedades.
Em 1982, houve a Sessão Especial do Conselho de Administração do
PNUMA, em Nairobi, Quênia. O PNUMA resolveu comemorar os dez anos da
Conferência de Estocolmo. Por esta ocasião, notou-se que os problemas
ambientais no mundo indicavam que a geração de resíduos e poluição pelas
atividades humanas já estava excedendo a capacidade de assimilação da biosfera.
Somou-se então à preocupação com o esgotamento das fontes de recursos
naturais, a preocupação com os limites de absorção dos resíduos das atividades
humanas.
O PNUMA propôs então a criação de uma Comissão Mundial Independente
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, com o intuito de estudar as questões
ambientais e de desenvolvimento até o ano de 2000 e depois apresentar soluções
aos problemas verificados.
36
Foi então a partir da década de 1980, com o relatório elaborado pela
Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
5
, que surgiu uma
proposta que relacionava meio ambiente e desenvolvimento econômico, inspirada
na idéia de sustentabilidade, emprestada das ciências biológicas. Essa visão
econômica dos sistemas biológicos trata-os como estoques de excedentes de
biomassa. Os agentes promotores do desenvolvimento, assim, poderiam se
apropriar desses fluxos excedentes da natureza, sem comprometê-la.
Além disso, o Relatório “Brundtland”, como ficou conhecido, sugeria que o
crescimento econômico caminhasse junto a um progresso tecnológico, que fosse
capaz de poupar os recursos materiais. Essa Comissão analisou vários aspectos
como o crescimento populacional, a crise urbana nos países em desenvolvimento,
a pobreza, a desigualdade dos níveis de consumo entre os países industrializados
e em desenvolvimento e a disponibilidade de água. O relatório alerta, assim, para o
fato do agravamento da crise urbana e da pobreza contribuírem para reduzir a
capacidade das pessoas para usar os recursos naturais de forma racional, levando-
as a exercer maior pressão sobre o meio ambiente e para o problema da escassez
futura de água.
Apenas em 1987, o Relatório Final da Comissão, denominado “Nosso
Futuro Comum” foi divulgado, consagrando o termo desenvolvimento sustentável
como a única alternativa para o futuro da humanidade, mas sem se ater à
incontrolável mortandade da população prevista nos dois primeiros modelos do
Clube de Roma e às graves convulsões sociais previstas no terceiro informe do
Clube, tal como conclui Lemos (2003, p. 15).
Em 1988, a Assembléia Geral das Nações Unidas convocou para junho de
1992 a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
(CNUMAD), com o objetivo de discutir as conclusões e propostas do Relatório
“Brundtland” e comemorar os 20 anos da Conferência de Estocolmo.
Ocorreram também diversas reuniões preparatórias, em diversos países,
organizadas por ONGs ambientalistas, pela comunidade científica, pelos
5
O termo Desenvolvimento Sustentável foi consagrado no relatório “Nosso Futuro Comum”, publicado
em 1987 e produzido pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada no final
de 1983 e presidida pela norueguesa Gro Harlem Brundtland, ex-Primeira Ministra da Noruega, a
37
empresários e outros setores independentes.
Desde então, os governos de diversos países passaram a incorporar em
diferentes graus a discussão ambiental.
No entanto, a questão não permaneceu restrita ao âmbito governamental e
a Conferência do Rio de Janeiro ou Eco 92 ou CNUMAD ocorreu de fato em 1992,
com a participação de cento e setenta e nove países, contando com dois eventos
principais: a Conferência das Nações Unidas (governamental); e o Fórum Global,
uma conferência paralela dos setores independentes (ONGs ambientalistas e
ligadas a outros setores do desenvolvimento, às industrias, aos povos tradicionais,
às mulheres, etc.).
Nesta ocasião, foram aprovados os seguintes documentos (com força moral
e não legal):
Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento;
Declaração sobre Florestas;
Convenção sobre a Diversidade Biológica;
Convenção Quadro sobre Mudanças Climáticas;
Agenda 21.
Destes documentos, a “Agenda 21” foi o que ficou mais conhecido, sendo
popularizado até em forma de cartilha, publicada pela Comissão “Pró-Agenda 21
Local do Rio de Janeiro”, que foi criada em 1996 com a missão de divulgá-la ao
nível local e incentivar ações que visem implementá-la, tendo por base o conceito
de desenvolvimento sustentável. A “Agenda 21” é um abrangente plano de ação a
ser implementado por todos os governos, sendo composto de 40 capítulos, 115
programas e aproximadamente 2.500 ações previstas para o século XXI, visando a
promoção do desenvolvimento sustentável em todo o planeta, dando efeito prático
aos princípios aprovados na “Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento”.
Embora sem força legal, ela contém um roteiro detalhado de ações
concretas a serem adotadas pelos governos, instituições das Nações Unidas,
agências de desenvolvimento e setores independentes, para iniciar o processo de
pedido da Assembléia Geral da ONU.
38
transição na direção do desenvolvimento sustentável.
Ao final de 1992, foi lançado o Relatório “Além dos Limites”, por um grupo
de cientistas, alguns dos quais haviam participado do primeiro relatório apresentado
ao Clube de Roma, “Os Limites do Crescimento”. Esses cientistas refizeram o
modelo matemático utilizado no primeiro relatório de 1971, utilizando computadores
mais eficientes e um conjunto de dados mundiais mais confiável e completo. Essa
nova publicação descreve as características de uma sociedade que cresceu além
dos seus limites, através de uma utilização veloz dos recursos naturais, em um
ritmo maior do que sua possível restauração com a eliminação de resíduos e
poluentes acima da capacidade de absorção da biosfera (LEMOS, 2003, p. 22).
Na década de 1980, diversos órgãos governamentais voltados para a
questão ambiental foram criados. Dentre eles temos o Office of Technology
Assessment (OTA), nos Estados Unidos, cujo surgimento segundo Brüseke (1998,
p. 42-43), deve-se ao fato de, no início da década de 1970, haver-se iniciado uma
consciência ecológica e uma nova postura por parte dos consumidores. Esta
instituição americana foi a primeira a tentar calcular as conseqüências das
inovações técnicas, avaliando os impactos sobre a sociedade e o meio ambiente.
Instituições semelhantes ao OTA surgiram, na Europa, em 1986, e na Alemanha,
em 1990. São eles, respectivamente, o Scientific and Technological Options
Assessment Project (STOA) e o Büro für Technikfolgenabschätzung des Deutschen
Bundestages (Escritório para a Avaliação das Conseqüências de Técnicas do
Parlamento Alemão).
No caso do Brasil, tem-se o surgimento pioneiro, em 1966, da Companhia
Estadual de Saneamento Básico (CETESB), no Estado de São Paulo, que em
menos de oito anos estava direcionada para o controle da poluição ambiental do ar
e da água. E na década seguinte contou-se com a implantação, no Estado do Rio
de Janeiro, da Fundação Estadual de Estudos do Meio Ambiente. Cabe ressaltar
que atualmente a CETESB é uma das companhias que servem de padrão à
Organização das Nações Unidas para outras similares no mundo (vide LIMONAD,
2003a).
Enfim, no âmbito da complexificação da questão ambiental, até o Banco
Mundial tornou-se mais um agente na luta pela preservação ambiental e
conservação da natureza – dando mais força ao comentário de Lefèbvre, conforme
39
assinalado anteriormente.
Cabe, neste sentido, ressaltar o fato de que nem todos os atores envolvidos
na luta pela natureza têm os mesmos interesses. Há que se reconhecer a
existência de diferentes agendas de gestão ambiental, que envolvem desde
organismos como o Banco Mundial, sem tradição nesta área, até organizações não-
governamentais com preocupações ambientais, como o Greenpeace (LIMONAD,
2003).
Em 2002, em consecução à Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD) de 1992, foi realizada a Cúpula Mundial
para o Desenvolvimento Sustentável (Rio+10) – World Summit for Sustainable
Development – promovida pelas Nações Unidas entre 26 de agosto e 04 de
setembro, em Johannesburgo, África do Sul. A Rio+10 produziu um Plano de
Implementação e uma declaração política, a “Declaração de Johannesburgo sobre
Desenvolvimento Sustentável”.
O ano de 2002 contou ainda com a divulgação do Relatório “Planeta Vivo
2002”, pelo Fundo Mundial para a Vida Selvagem (WWF) em Genebra, na Suíça.
Esse estudo registra uma super exploração de recursos naturais no planeta, sendo
de 20% o excedente de degradação.
De fato, como se pode perceber, há um amplo leque de definições sobre
que ambiente deveria ser preservado e defendido, aparecendo associada à
temática ambiental a temática da sustentabilidade, como o faz o próprio Relatório
Bruntland e os documentos subseqüentes. Para tratar-se da interação entre a
prática do ecoturismo, a conservação ambiental e a sustentabilidade, que como
acaba de ser visto estão inter-relacionadas, abordar-se-á a seguir a temática da
sustentabilidade.
3.2. SUSTENTABILIDADE
A noção de sustentabilidade tem sua origem na economia, entretanto, a
partir do acirramento dos debates a respeito da questão ambiental na década de
1990, passou a estar intimamente associada a esta.
40
Do momento em que se remete à sustentabilidade, não apenas à
conservação da natureza ou à administração de ecossistemas, e sim a um conceito
mais amplo, que aponta para novos modelos de desenvolvimento e de
transformações sociais, é necessário que haja um esforço ainda maior por parte de
cientistas, dos movimentos sociais e dos formuladores de políticas, no sentido de
se obter a tecnologia, os mecanismos, a consciência e a postura necessários à
práxis eficaz de tal conceito.
Para alguns autores, o problema da sustentabilidade estaria relacionado ao
papel da técnica. Haveria uma contradição entre as exigências da busca de um
modelo de desenvolvimento sustentável e a tecnologia subordinada à lógica
econômica dominante. A solução residiria na ciência, enquanto um meio de se
estabelecer os padrões e critérios mais justos a serem utilizados, com a meta de se
equacionar o desenvolvimento e a preservação do meio ambiente, como, por
exemplo, identificando fontes de poluição, ou ajudando a definir padrões
alternativos de transporte público e de produção e uso de energia. Nesta
perspectiva, transformar a crítica da técnica moderna em uma ciência de avaliação
dos impactos das tecnologias seria um meio para garantir que o meio ambiente não
seja totalmente degradado.
Neste sentido, temos as ponderações de Brüseke (1998, p. 42), que chama
a atenção para o fato de que, nos dias atuais, publicações e eventos científicos
estão voltados às instabilidades e riscos que podem existir através do uso de novas
técnicas em ambientes despreparados para recebê-las. Considera ainda o fato de
que cientistas, políticos, organizações não-governamentais e até grandes empresas
especializadas têm buscado técnicas alternativas que melhor se adaptem ao meio
ambiente e diminuam o desgaste humano na produção e no consumo do produto.
Ainda segundo Brüseke (1998, p. 43-44), as pesquisas têm se voltado à
gênese da técnica e/ou às suas conseqüências, com o intuito de garantir que o
desenvolvimento da técnica não promova danos ecológicos, nem conseqüências
econômicas negativas, com proposições de técnicas que estejam integradas “numa
outra prática social”. Ao que se pode dizer que a prática ecoturística se propõe.
Acselrad e Leroy (1999, p. 18) assinalam que se deve ter sempre em mente
que o desenvolvimento sustentável não foge à lógica do mercado, reconhecidas as
necessidades de crescimento econômico.
41
Assim sendo, existe uma contradição entre as exigências da busca de um
modelo de desenvolvimento sustentável e a tecnologia subordinada à lógica
econômica dominante.
Porém, parece que não se pode reduzir a questão ambiental à dimensão
técnica, com o risco de se perder de vista a sua complexidade e as questões
sociais envolvidas. Pois, conforme assinala Limonad (2003) para Topalov e outros
autores que o seguiram, a questão ambiental antes de tudo seria parte de uma
questão social mais ampla.
Neste sentido, temos a contribuição de Ignacy Sachs (1993), que usa a
expressão Ecodesenvolvimento no lugar de desenvolvimento sustentável, e
identifica cinco dimensões simultâneas de sustentabilidade, que devem ser
consideradas no processo de planejamento com fins ao desenvolvimento, a saber:
a sustentabilidade social
6
, a sustentabilidade econômica
7
, a sustentabilidade
ecológica
8
, a sustentabilidade espacial
9
e a sustentabilidade cultural
10
. Todas estas
6
“Sustentabilidade social, que seria a criação de um processo de desenvolvimento cuja meta seja
construir uma sociedade com maior equidade na distribuição de renda e de bens” (IGNACY SACHS,
1993).
7
“Sustentabilidade econômica, cuja eficiência econômica seja avaliada em termos macro-sociais e
não apenas através do critério da rentabilidade empresarial de caráter microeconômico. Como
exemplo, temos o caso da atividade extrativa dos seringueiros na Amazônia, onde alguns alegam que
o governo investe muito mais do que lucra com a atividade, porém, se a avaliarmos em termos macro-
sociais, veremos que a preservação da floresta e a cultura dessas famílias estão garantidas graças a
estes investimentos” (IGNACY SACHS, 1993).
8
“Sustentabilidade ecológica, que pode ser melhorada das seguintes maneiras:
a)Intensificando o uso do potencial de recursos dos diversos ecossistemas, com um mínimo de danos
aos sistemas de sustentação da vida;
b) limitando o consumo de combustíveis fósseis e de outros recursos ou produtos esgotáveis ou
danosos ao meio ambiente, substituindo-os por outros recursos ou produtos renováveis e abundantes,
não agressivos ao mesmo;
c) reduzindo o volume de resíduos e de poluição, através da conservação de energia e de recursos e
da reciclagem;
d) promovendo a auto-limitação no consumo de materiais por parte dos países ricos e dos indivíduos
em todo o planeta, ou seja, garantindo uma equidade dos padrões de consumo, pois uma criança de
um país de 1º Mundo é capaz de consumir, num mesmo período de tempo, o que inúmeras crianças
de 3º Mundo consomem;
e) intensificando a pesquisa para a obtenção de tecnologias de baixo teor de resíduos e eficientes no
uso de recursos para o desenvolvimento urbano, rural e industrial;
f) definindo formas para uma adequada proteção ambiental;
g) desenhando a máquina institucional e criando instrumentos econômicos, legais e administrativos
necessários para seu cumprimento“ (IGNACY SACHS, 1993).
9
Sustentabilidade espacial, para que haja uma configuração rural-urbana mais
equilibrada e uma melhor distribuição territorial dos assentamentos humanos e das
atividades econômicas, com ênfase no que se segue:
a) reduzindo a concentração excessiva em áreas metropolitanas;
b) freando a destruição de ecossistemas frágeis, porém de importância vital;
c) promovendo a agricultura e a exploração agrícola das florestas através de técnicas modernas,
42
cinco dimensões da sustentabilidade de Sachs convergem para a questão social.
Logo de início, Sachs salienta o papel chave da “sustentabilidade social” ao
associar o desenvolvimento econômico com a construção de uma sociedade com
maior equidade na distribuição de renda e de bens.
A sustentabilidade econômica e ecológica estariam também relacionadas à
questão social, seja ao ressaltar a importância das iniciativas de grupos sociais
empenhados em práticas tradicionais, como é o caso dos seringueiros na Amazônia
(GONÇALVES, 1999), seja ao defender novos padrões de consumo de recursos e
energia e uma redefinição dos órgãos estatais e governamentais.
A sustentabilidade espacial, em seu entender, contribuiria para uma
configuração territorial mais equilibrada dos assentamentos humanos e distribuição
de renda, que em parte já é um desdobramento das três dimensões anteriores,
associada a uma desconcentração das áreas metropolitanas, paralelamente à
promoção de políticas agrícolas de fixação dos trabalhadores à terra e à exploração
da industrialização descentralizada com garantia de novos empregos não agrícolas
nas áreas rurais.
Os problemas ambientais expressam os modos predominantes de
apropriação e uso dos recursos materiais da sociedade, decorrentes dos modelos
de produção e consumo instaurados. A idéia de sustentabilidade explicita uma
concepção expressa em quantidades. No entanto, cresce a preocupação não só
com a redução de consumo, mas com a transformação do modelo, pois não se
pode ignorar as dimensões qualitativas e culturais que predeterminam as
quantidades de matéria e energia apropriadas socialmente. As questões de
qualidade envolvem o que se produz, para que e para quem, ou seja, se a “soja vai
para o gado europeu ou para o óleo de mesa do nordestino flagelado”. Essas
questões estão fora do mercado, devendo-se caminhar em direção “a um projeto de
regenerativas, por pequenos agricultores, através do uso de pacotes tecnológicos adequados, do
crédito e do acesso a mercado;
d)explorando o potencial da industrialização descentralizada, acoplada à nova geração de tecnologias,
com referência especial às indústrias de biomassa e ao seu papel na criação de oportunidades de
empregos não-agrícolas nas áreas rurais;
e) criando uma rede de reservas naturais e de biosfera para proteger a biodiversidade“ (IGNACY
SACHS, 1993).
10
“Sustentabilidade cultural, que garanta propostas tecnológicas e de modernização, buscando
mudanças sempre dentro de uma continuidade cultural e traduzindo o conceito de normas de
ecodesenvolvimento em conjunto com soluções específicas para o local, o ecossistema, a cultura e a
43
economia solidária”, que vise alcançar um modelo de justiça ambiental (ACSELRAD
& LEROY, 1999. p. 22-23).
Acselrad e Leroy (1999, p. 28) destacam cinco eixos distintos de reflexão
sobre sustentabilidade, que estariam direcionados à elaboração coletiva de um
projeto de desenvolvimento, a saber: eficiência
11
, eqüidade
12
, novos padrões de
produção e consumo
13
, auto-suficiência
14
e ética
15
. Assim como Sachs, estes
autores associam a questão ambiental à questão social, porém em um viés que
procura destacar a justiça e eqüidade ambiental; principalmente ao considerarem
que há uma relação intrínseca entre desigualdade social e degradação ambiental e
ao enfatizarem o papel da responsabilidade social de todos os atores envolvidos.
Para Acselrad e Leroy (1999, p. 44), devem ser considerados ainda dois
problemas: a diferença de tempo entre os ciclos do capital e os da natureza e a
concorrência entre os diversos usuários do meio ambiente.
Quanto ao primeiro problema, tem-se uma contradição entre a necessidade
do lucro imediato por parte das empresas e o tempo exigido pelos diversos ciclos
da natureza para seu restabelecimento, e que deve a todo custo ser considerado.
O segundo trata do desenvolvimento com vistas ao mercado, reforçando a
concentração do controle sobre os recursos naturais nas mãos de poucos agentes
sociais. Essa concentração e a privatização do meio ambiente comum são partes
de um desenvolvimento que acaba com a diversidade sócio-cultural e forma uma
massa populacional à margem da sociedade de consumo. A privatização de um
área” (IGNACY SACHS, 1993).
11
“Eficiência – Aponta para a criação de novas tecnologias capazes de tornar os recursos mais
duradouros, garantindo os meios materiais para a continuidade do desenvolvimento econômico e
social” (ACSELRAD & LEROY, 1999, p. 28).
12
“Eqüidade – Considera que há uma relação intrínseca entre desigualdade social e degradação
ambiental, pois estas possuem raízes comuns e devem ser tratadas em conjunto” (ACSELRAD &
LEROY, 1999, p. 28).
13
“Novos padrões de produção e consumo – Deixa claro que as camadas sociais de maior renda
devem limitar seu consumo de bens materiais, já que a satisfação de demandas por bens de consumo
não-essenciais são incompatíveis com um desenvolvimento ecologicamente benigno” (ACSELRAD &
LEROY, 1999, p. 28).
14
“Auto-suficiência – Aponta os riscos que a expansão generalizada das relações de mercado
representa para a preservação da estabilidade cultural e da capacidade reprodutiva da base material
das comunidades tradicionais” (ACSELRAD & LEROY, 1999, p. 28).
15
“Ética – Ressalta os valores, deveres e obrigações morais relativos à preservação das condições
de vida no planeta, articulando a discussão sobre sustentabilidade à responsabilidade social na
construção e preservação de um mundo comum” (ACSELRAD & LEROY, 1999, p. 28).
44
território e dos seus recursos extermina a identidade sócio-cultural deste local,
fazendo a população ficar longe de sua história e de seu território.
De fato, há que se ressaltar que o conceito de sustentabilidade tem sofrido
alterações que mostram projetos de mudança do modelo dominante de
desenvolvimento baseados em princípios de justiça social. Nesse caso, não se
deve negar às classes e setores sociais fora do poder, ou que não estejam ao seu
redor, a possibilidade e a capacidade de pensar e construir suas próprias propostas
de desenvolvimento.
Concorda-se, assim, com Acselrad e Leroy, para quem a sustentabilidade
surge como possibilidade de criação, por parte da sociedade, de práticas “que
estabeleçam relações sólidas e de longo prazo entre esta sociedade e a base
material de sua existência” (1999, p. 33).
Por conseguinte, a sustentabilidade deve ser discutida no campo das
relações sociais, tratando não apenas dos recursos e do meio ambiente, mas
também das formas sociais de apropriação e uso destes.
Pode-se dizer, portanto, a partir das proposições de Acselrad e Leroy
(1999), que o desenvolvimento sustentável está diretamente ligado à democracia,
pois a sustentabilidade só pode ser alcançada através da participação de todos,
especialmente daqueles que pertencem às camadas mais populares e que
costumam ficar à margem das decisões de seus próprios meios natural, cultural,
social ou econômico, por não receberem o mínimo de instrução que lhes tornem
capazes de reivindicar seus próprios direitos.
A proposta apresentada por Acselrad e Leroy (1999, p. 47), “frente à
concentração de poder sobre os recursos naturais e o meio ambiente”, é de que se
construa “um caminho que considere a diversidade, permitindo que se afirmem
diferentes formas culturais de relação com a natureza, diferentes estratégias e
propostas para o futuro. Dessa forma, pensar o território torna-se importante para
construir uma geografia política alternativa”.
Seguindo essa linha de raciocínio, tem-se que, à medida que se define um
território como espaço de realização da sociedade, de acordo com a identificação
de suas potencialidades, com o reconhecimento das habilidades e experiência
45
histórica que acumularam, os sujeitos sociais acabam se firmando enquanto
cidadãos.
Neste contexto, apenas uma luta democrática, onde todos sejam agentes
com verdadeira possibilidade de influência, onde o meio ambiente apareça antes de
tudo como um bem público, subordinando sua exploração e a dos recursos naturais
às necessidades básicas da população, ou seja, apenas uma luta por justiça social
e ambiental pode apontar para um “Brasil Sustentável e Democrático”. (ACSELRAD
& LEROY, 1999, p. 51).
Neste sentido, com base na definição de ambientalismo
16
de Castells (1999,
p. 43), pode-se dizer que tudo o que se refere à questão ambiental não deve estar
dissociado da vida em sociedade, do que foi e está sendo socialmente construído
(ou destruído) pelo homem, e, portanto, das reivindicações de muitos por justiça
social. A partir desta proposição, pode-se estabelecer a relação entre justiça
ambiental e justiça social. A distinção entre ambas está no enfoque diferenciado
que lhes é dado.
A justiça social focaliza questões relativas às condições de vida, tais como o
trabalho, a educação, a moradia e a saúde, considerando a inexistência de igual
condições a todos os indivíduos. Tem, portanto, como premissa básica a busca por
uma sociedade onde esteja garantida uma equidade social, ou seja, uma sociedade
onde todos tenham as mesmas possibilidades de acesso a serviços básicos (como
educação, saúde e moradia) e de obtenção de bens de consumo.
A justiça ambiental tem também por base um discurso social, que considera
os problemas sociais existentes (como má distribuição de recursos, desigualdade
social, etc.). Entretanto, focaliza a comprovação de fatos ligados ao meio ambiente,
tais como a constatação de que muitas pessoas encontram-se hoje expostas a
riscos ambientais, seja nos locais de trabalho, de moradia ou no ambiente em que
circulam, especialmente grupos sociais excluídos, de menor renda.
Como visto anteriormente, são cada vez mais freqüentes os debates
16
Para Castells (1999, p. 43), o ambientalismo se refere “a todas as formas de comportamento
coletivo que, tanto em seus discursos como em sua prática, visam corrigir formas destrutivas de
relacionamento entre o homem e seu ambiente natural, contrariando a lógica estrutural e institucional
atualmente predominante”.
46
ambientais que se propõem à compatibilizar o desenvolvimento com a preservação
ambiental, com vistas à melhoria da qualidade de vida do ser humano, garantindo a
equidade social.
Essa nova filosofia que abrange o tema da sustentabilidade, como única
forma de garantir a preservação ambiental, sem perder de vista a possibilidade de
desenvolvimento, sem que para isso seja necessário que haja uma paralisação da
reprodução de mercadorias, base da economia capitalista em vigor, vem de
encontro com a prática da atividade ecoturística. É preciso lembrar que essa
atividade requer planejamento para que a população local não sofra com os riscos
ambientais, enquanto uma minoria usufrui o que um local tem de melhor a oferecer.
Atualmente, como reconhecido por Acselrad e Leroy (1999, p. 27), muitos
projetos referem-se ao direito dos cidadãos de participarem ativamente da
construção do seu espaço, no sentido mais amplo, através de suas organizações e
de seus grupos de interesse, reconhecendo-se com isso “o direito e dever de
opinar, propor, deliberar, gerir, executar, fiscalizar seus governos e as instâncias
públicas internacionais”. Só assim a cidadania ativa, enquanto participante de um
projeto de desenvolvimento, sobrepor-se-á às forças do mercado.
De fato, os que mais sofrem com os riscos ambientais são os indivíduos que
compõem a parcela da população de menor renda, ou seja, a maioria da
população. Esse fato é conseqüência de um sistema econômico gerador de um
processo de exclusão territorial e social das camadas populares e da concentração
de poder na apropriação de recursos ambientais nas mãos da minoria rica e
poderosa.
Os responsáveis pelo modelo de injustiça social e irresponsabilidade
ambiental em que vivemos são as empresas e governos, que numa troca de
interesses políticos e, conseqüentemente, monetários, fazem lobbys que acabam
indo de encontro aos interesses das comunidades, prejudicando tanto a população
quanto o meio ambiente.
O importante é que as discussões a respeito da questão ambiental,
equidade, justiça social e justiça ambiental continuem a fervilhar nos debates
teóricos e sejam alcançados na prática, para que possamos ver de fato um
desenvolvimento pautado na sustentabilidade, enquanto conquista de um mundo
47
melhor para todos.
Como pôde ser observado, a sustentabilidade adquire uma importância
crescente no seio da questão ambiental. Sendo assim, tratar-se-á a seguir do
entrelaçamento destas questões com o ecoturismo.
3.3. AS ORIGENS DO ENTRELAÇAMENTO ENTRE A QUESTÃO AMBIENTAL,
A SUSTENTABILIDADE E O ECOTURISMO
É importante perceber que as diversas definições e eventos relacionados ao
ecoturismo têm, em sua essência, um caráter ambiental, onde o importante é
garantir um desenvolvimento da atividade sem que ocorram perdas (danos)
ambientais.
Observa-se assim, desde 1990, que muitas conferências e simpósios foram
organizados sobre o tema ecoturismo e, notadamente, este foi o período em que,
como acabou de ser visto, os debates ambientais fervilhavam em todo o mundo.
A década de 90 foi especialmente marcada pela formulação de algumas
tentativas em se estabelecer diretrizes para operadoras ecoturísticas e/ou a
certificação e credenciamento das mesmas. Estes seriam mecanismos para
garantir aos turistas um serviço de qualidade e a certeza de cooperarem para a não
degradação do meio ambiente, pois a avaliação das operadoras deverá ter, como
base, a análise dos impactos gerados pela atividade sobre a comunidade, o meio
ambiente, os turistas, além de outros elementos constitutivos da atividade.
Os mecanismos de garantia de um serviço de qualidade na prática da
atividade ecoturística, apresentados a seguir, foram retirados do documento
“Critérios para um ecoturismo ambientalmente saudável”, escrito por Niefer e
Garzel Leodoro da Silva em 1999
17
.
Uma proposta para a certificação e credenciamento de operadoras turísticas
17
NIEFER, I. A. & GARZEL LEODORO DA SILVA, J. C. Critérios para um ecoturismo ambientalmente
saudável. Cadernos da Biodiversidade, Curitiba, v. 2, n. 1, jul. 1999, p. 53-61.
48
é a adoção de um selo ambiental para os serviços turísticos. Neste caso, Troumbis
(1991) realça que o uso deste selo requereria uma definição do que estaria a ser
certificado: o local, o vetor (a indústria turística), o turista ou a combinação de todos,
e propõe uma matriz para possibilitar a avaliação do impacto ambiental a partir do
desenvolvimento da atividade de ecoturismo, tal como exposta abaixo.
FASE DE DESENVOLVIMENTO
CAMPOS AMBIENTAIS CONSTRUÇÃO OPERAÇÃO EXTENSÃO
Degradação ou destruição da
paisagem natural
Conservação da vida selvagem
Tratamento do lixo
Consumo de água
Consumo de energia
Fonte: NIEFER & GARZEL LEODORO DA SILVA. Critérios para um ecoturismo ambientalmente
saudável. Cadernos de Biodiversidade, Curitiba, v. 2, n. 1, jul. 1999.
Para Troumbis (idem), através desta matriz, seria possível avaliar os
impactos ambientais durante o que ele define como as três fases do ciclo de vida
do turismo. Na primeira, a fase de construção, quando é implantada a infra-
estrutura; na segunda, a fase de operação, quando prevalece o uso desta infra-
estrutura; e na terceira, a fase de extensão, quando ocorrem as instalações além
das inicialmente planejadas, o que, geralmente, causa os maiores danos
ambientais. O autor ainda sugere que, para a classificação dos impactos, seja
usada uma escala simples, como: baixo impacto, impacto moderado e impacto
considerável.
Esta matriz proposta por Troumbis poderia servir de ponto de partida na
avaliação de impactos produzidos pela prática da atividade ecoturística. No entanto,
para a adoção de um selo ambiental, parece-nos que seria necessário criar um
mecanismo de classificação das operadoras ecoturísticas, tal como a escala
proposta por Shores (1997, 1998).
Shores (idem) propõe uma escala de seis níveis para classificar a atividade
ecoturística conforme seus impactos ambientais. A escala seria assim:
O nível 0 exigiria somente que a operadora conscientizasse os turistas sobre a
fragilidade do ecossistema visitado. Neste nível, encontraria-se, por exemplo, uma
viagem casual para um ambiente natural.
No nível 1, deveria existir algum retorno financeiro para o ecossistema visitado.
Poderia ser cobrado em forma de taxas de aeroporto ou pedágio.
Já no nível 2, os ecoturistas deveriam engajar-se de alguma forma na conservação
do ambiente, como, por exemplo, plantando árvores ou coletando lixos.
49
No nível 3, seria requerida a certificação de que a viagem, incluindo a parte aérea,
seria benéfica ou pelo menos neutra para o ambiente.
Para ser classificado no nível 4, deveria ser demonstrado que o saldo do impacto
dos visitantes seria positivo para o ambiente. Efeitos negativos do sistema de
viagem poderiam ser compensados por ações benéficas para o ambiente, como,
por exemplo, uso de energia alternativa, tecnologias adequadas, reciclagem do lixo,
agricultura orgânica.
O nível 5 deveria ser aplicado para viagens cujo sistema inteiro operasse de uma
maneira ambientalmente saudável. Isto incluiria a propaganda para a viagem,
transporte, acomodação, produção de alimentos e de lembranças, tratamento do
lixo e esgoto.
Em 1992, houve o Congresso Mundial de Ecoturismo, em Belize, que
apresentou uma abordagem nova para o ecoturismo, ao passar a considerá-lo uma
atividade cujo objetivo também consideraria a interpretação dos valores naturais e
culturais existentes, prevendo ainda a interação e a integração com as
comunidades anfitriãs, promovendo o mínimo de impacto sobre os recursos, sendo
ainda “base de apoio aos esforços dedicados à preservação e ao manejo das áreas
naturais onde se desenvolvem as atividades ou naquelas cuja prioridade seja
manutenção da biodiversidade”.
A partir de então, surge uma perspectiva sustentável na prática da atividade
que não era considerada em seus primórdios e baseada nas formulações sobre
sustentabilidade estabelecidas nos diversos debates ambientalistas travados em
todo o mundo.
Comprovando a tendência de relacionar o turismo à sustentabilidade,
diversas associações de operadoras de viagens passaram a orientar seus membros
para oferecerem um serviço ambientalmente responsável. Diversas entidades
elaboraram códigos e normas neste sentido. Dentre elas, pode-se citar:
a “Pacific Asia Travel Association” (PATA), que, em 1992, lançou o código para
viagens ambientalmente responsáveis, chamado “The Green Leaf”. Este código
18
18
Princípios do código para viagens ambientalmente responsáveis, elaborado pela PATA:
- adotar as práticas necessárias para conservar o ambiente, como p.ex. o uso sustentável de recursos
renováveis e a conservação de recursos não-renováveis;
- contribuir para a conservação de qualquer habitat de flora ou fauna e de qualquer lugar natural ou
cultural que pode ser afetado pelo turismo;
- encorajar autoridades a identificar áreas dignas de conservação e a determinar o nível de
desenvolvimento, se houver algum, que garanta a conservação destas áreas;
- assegurar que atitudes da comunidade, valores culturais, incluindo costumes e crenças locais, sejam
considerados no planejamento de projetos turísticos;
- procedimentos de avaliação devem identificar como os impactos cumulativos e individuais do
desenvolvimento afetam o meio-ambiente;
- seguir todas as convenções internacionais relacionadas com o meio ambiente;
50
recomendava a seus membros a obediência a uma série de princípios relacionados
à conservação do ambiente e dos valores envolvidos com vistas à manutenção das
atividades de turismo.
a “The Ecotourism Society” (1997), uma organização internacional sem fins
lucrativos que visa disseminar informações sobre ecoturismo, que, em 1993, lançou
um livro de vinte páginas com diretrizes para operadoras de ecoturismo
19
,
semelhantes aos princípios do código elaborado pela PATA.
Em novembro de 1996, a “Ecotourism Association of Australia” (EAA) em parceria
com a Associação Australiana de Operadoras Turísticas lançaram o Programa
Nacional de Certificação de Ecoturismo da Austrália (NEAP), em que são feitas
recomendações a respeito de quem deve receber a certificação, quais critérios e
padrões mínimos que devem ser cumpridos para que uma operadora possa ser
chamada de ecoturística. Mais tarde, o Código de Práticas para Operadoras de
Ecoturismo, desenvolvido pela EAA, relacionava os aspectos
20
que deveriam ser
- obedecer a legislação ambiental nacional e local;
- encorajar todos os envolvidos com turismo a consentir com as políticas de planejamento locais,
regionais e nacionais e participar no processo de planejamento;
- providenciar oportunidades para a comunidade participar no planejamento que afeta a indústria de
turismo e a comunidade;
- reconhecer responsabilidade para os impactos ambientais de todos as atividades e projetos turísticos
e fazer o possível para mudar estas práticas;
- promover práticas ambientalmente responsáveis, incluindo administração do lixo, reciclagem e uso
de energia;
- criar na administração e no pessoal consciência sobre princípios ambientais e de conservação;
- apoiar a inclusão de princípios profissionais de conservação na educação, no treinamento e no
planejamento turístico;
- fornecer informação adequada e precisa ao turista;
- estabelecer políticas e/ou diretrizes ambientais para os setores da indústria de turismo.
19
Itens abordados pelas diretrizes para operadoras de ecoturismo, elaboradas pela “The Ecotourism
Society”:
- preparar os viajantes visando minimizar os seus impactos negativos, tanto em aspectos ambientais
quanto culturais;
- preparar os viajantes para cada encontro com culturas locais, animais e plantas nativas;
- minimizar os impactos dos visitantes no meio-ambiente, fornecendo literatura e instruções
específicas, guiando pelo exemplo e tomando ações corretivas;
- usar liderança adequada e manter grupos suficientemente pequenos para garantir um impacto
mínimo no destino. Evitar áreas com manejo insuficiente e super-visitação;
- assegurar que administradores, pessoal e empregados contratados saibam e participem da política
da empresa para prevenir impactos no ambiente e na cultura local;
- fornecer programas de treinamento aos administradores, pessoal e empregados contratados. Estes
programas devem visar a melhor orientação do visitante de ecossistemas frágeis;
- contribuir para a conservação das regiões visitadas;
- ofertar empregos competitivos à população local;
- oferecer acomodações adequadas ao local, que não estejam desperdiçando recursos ou destruindo
o meio-ambiente. Elas devem fornecer ampla oportunidade para o estudo do ambiente e um
intercâmbio harmonioso com as comunidades locais.
20
Aspectos abordados pelo Código de Práticas para Operadoras de Ecoturismo, desenvolvido pela
EAA:
- fortalecer os esforços para a conservação e aumentar a integridade natural dos locais visitados;
- respeitar as características de outras culturas;
- ser eficiente no uso de recursos naturais (água, energia);
- garantir que o descarte do lixo tenha um impacto mínimo, ambiental e estético;
- desenvolver um programa de reciclagem do lixo;
- apoiar fornecedores que seguem uma ética de conservação;
- manter-se atualizado em assuntos políticos e ambientais da região visitada;
- trabalhar em rede com outros interessados, para trocas de informações a respeito de
desenvolvimentos relevantes, bem como estimular o uso deste Código de Práticas;
- divulgar as diretrizes para aumentar a consciência ambiental dos consumidores;
51
inerentes à prática da atividade (EAA, 1998).
Uma breve análise das diretrizes elaboradas por estas entidades para a
prática ambientalmente responsável da atividade ecoturística, dizem respeito às
premissas básicas consideradas no Capítulo 2, onde se considera atividades
ecoturísticas aquelas que: 1) procurem reduzir ao mínimo os impactos negativos
sobre o entorno natural e o sócio-cultural, contribuindo para a proteção de áreas
naturais; 2) gerem benefícios econômicos para as comunidades, as organizações e
as autoridades locais, controlando áreas naturais com finalidades de conservação;
3) forneçam oportunidades alternativas de emprego e renda para comunidades
locais e; 4) conscientizem a conservação de recursos naturais e culturais entre
habitantes locais e turistas.
A ligação entre ecoturismo e a questão ambiental é ainda ressaltada
quando, no ano de 2002, contou-se com a Reunião da Cúpula de Especialistas em
Ecoturismo, que ocorreu em Quebec, Canadá, de 19 a 22 de maio, onde se
enfatizou que o turismo deve ser mundialmente visto como prioridade por sua
potencial contribuição para a erradicação da pobreza e conservação dos
ecossistemas ameaçados.
Este evento foi de extrema relevância para o desenvolvimento da atividade
ecoturística, por indicar para a prática contemporânea do ecoturismo inúmeras
recomendações tanto para o setor privado, governos, organizações não
governamentais, associações de base comunitária, quanto para instituições de
ensino e pesquisa, agências financiadoras e de auxílio ao desenvolvimento e até
mesmo para comunidades indígenas e locais (vide Anexo II).
- apoiar a educação e o treinamento ecoturístico para guias e administradores;
- empregar guias instruídos, que respeitem os ambientes e culturas locais;
- fornecer educação, interpretação e diretrizes apropriadas aos clientes, respeitando a história natural
e cultural da área visitada;
- usar produtos locais, que beneficiem a comunidade, sem estimular o comércio de artefatos feitos a
partir de espécies ameaçadas;
- não perturbar intencionalmente ou encorajar a perturbação da vida selvagem, bem como dos seus
habitats;
- manter veículos nas rotas indicadas;
- aceitar as regras de áreas naturais;
- concordar com os padrões de segurança australianas;
- assegurar verdade na publicidade;
- maximizar a qualidade da experiência para hóspede e anfitrião.
52
3.4. ECOTURISMO, A QUESTÃO AMBIENTAL E A SUSTENTABILIDADE
A Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1987,
definiu, conforme já assinalado anteriormente, que “desenvolvimento sustentável é
aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer as
possibilidades das gerações futuras de satisfazerem suas próprias necessidades”.
Foi a partir dessa definição de sustentabilidade que surgiram as definições de
Turismo Sustentável e a “Carta do Turismo Sustentável” do Conselho Internacional
de Monumentos e Sítios (ICOMOS) em 1997 (MARTINS, 2001, p. 18).
Há que se salientar a idéia implícita dos recursos enquanto capital a ser
preservado para as gerações futuras, como fica patente na concepção de Martins
de que em cada troca ou preservação de valores locais, cabe à comunidade a
escolha e a medida de cada elemento para que a atividade turística seja
sustentável, de forma a permitir às novas gerações “uma melhor qualidade da
experiência de viver os lugares e de visitá-los” (MARTINS, 2001. p. 18), ou ainda
quando esta autora salienta que
(...) a sustentabilidade do turismo depende do espaço existente (base
material), dos eventos oferecidos, do engajamento da população local e,
principalmente, da capacidade e da criatividade para gerar uma base
econômica e valores ligados às especificidades do turismo no local.
Para Lemos (1999, p. 83), por sua vez, o Turismo Sustentável seria a
modalidade de atividade turística que tem por meta:
(...) otimizar o desenvolvimento econômico com base local sob
condições que assegurem não só a qualidade dos serviços oferecidos,
mas também e principalmente a salvaguarda do patrimônio, que deve
ser mantido melhorado e restaurado pelos recursos auferidos.
Garantindo-se assim a manutenção das atividades no presente e no
futuro, tendo em vista o ciclo de vida do turismo [grifo nosso].
Esta definição é mais pragmática e objetiva do que as anteriores ao deixar
de lado a questão da sustentabilidade e ao enfatizar claramente a sua intenção de
propiciar o “desenvolvimento econômico com base local” – com uma proposta de
salvaguarda e manutenção do patrimônio a partir dos recursos auferidos durante o
tempo em que a atividade se mantiver – ou seja “tendo em vista o ciclo de vida do
turismo” ou, como MARTINS (2001) prefere, “a curva de vida da atividade turística”.
Não se trata de uma prática de preservação ambiental, mas sim de uma
preservação dos elementos que tenham interesse para a atividade turística em si e
53
que contribuam para a geração de renda e o desenvolvimento local. Neste sentido,
a “Carta do Turismo Sustentável” do ICOMOS (vide Anexo IV) é exemplar (extraída
de MARTINS, 2001, p. 19-20).
Esta Carta estabelece de forma objetiva e pragmática dez diretrizes para a
promoção desta atividade. As diretrizes desta Carta já deixam claro, em seu próprio
texto, seus propósitos mercadológicos e financeiros ao:
a) Associar a conservação e o uso sustentável dos recursos à longevidade e
mesmo existência da atividade econômica, enquanto fonte de geração de lucro e
renda, seja ao assinalar na primeira diretriz que “1) Devemos usar os recursos de
uma forma sustentável”. A conservação e o uso sustentável dos recursos – natural,
social e cultural – “é crucial e propícia a negócios a longo prazo” (grifo nosso),
seja ao enfatizar que “3) Manter e promover a diversidade natural, social e cultural é
essencial para o turismo sustentável de longo prazo”.
b) Reconhecer a necessidade de minimizar os impactos ambientais, não em
nome de um “futuro comum”, seja para reduzir os custos, seja para não
comprometer a atividade em si ao assinalar que a esta deve “2) Reduzir o excesso
de consumo e gasto: isto evitaria os custos, a longo prazo, de restauração do meio
ambiente danificado e contribuiria para a melhora da qualidade do turismo”, bem
como quando destaca a necessidade de “4) Integrar o turismo ao planejamento: o
desenvolvimento do turismo deve ser integrado ao planejamento nacional e local,
estrategicamente e sem causar impacto ambiental, o que torna viável a longo prazo
o turismo”.
c) Procurar legitimar e viabilizar as atividades turísticas através do apelo ao
desenvolvimento local, ao destacar a necessidade de
5. Sustentar o desenvolvimento de economias locais: o turismo comporta
um vasto percentual de atividades econômicas locais e leva em
consideração custos ambientais e valores que protegem aquelas
economias e evita danos ambientais.
bem como o envolvimento das comunidades locais e integração dos atores
envolvidos tendo em vista o “aprimoramento” dos serviços e da “qualidade” do
produto oferecido, como denota a diretriz abaixo:
6. Envolver as comunidades locais no processo de turistificação: o pleno
envolvimento de comunidades locais no setor do turismo não apenas as
beneficia, mas beneficia também ao ambiente em geral e aprimora a
54
qualidade da experiência do turismo.
e a possibilidade de comprometimento dos envolvidos, de modo a ganhar
uma maior legitimidade e evitar a emergência de conflitos que possam
comprometer a atividade em si, ao propor
7. Consultar constantemente os investidores e o público: as consultas
tanto à indústria do turismo quanto às comunidades locais, organizações
e instituições são essenciais para um trabalho de equipe e para resolver
possíveis conflitos potenciais de interesse.
Há que se ressaltar que as três últimas diretrizes da Carta apresentam um
caráter mais relacionado ao treinamento e marketing em si para a promoção da
atividade turística, como se pode depreender abaixo:
8. Treinar a equipe de trabalho: a equipe de treinamento que integra o
turismo sustentável deve recrutar empregados de todos os níveis com
diferentes práticas de trabalho, para que haja a melhora da qualidade do
produto do turismo.
9. Promover um marketing turístico responsável: o marketing que provê
os turistas de informação completa e responsável, aumenta o respeito
pelos lugares de destinação (ambientes natural, social e cultural) e pela
satisfação do freguês.
10. Promover pesquisas na área: a pesquisa contínua deste setor e o
seu monitoramento usando uma coleção e análise de dados (registros)
são essenciais para auxiliar na solução de problemas e trazer benefícios
aos lugares onde estão presentes, à indústria turística e aos turistas.
Havia e há, portanto, uma forte consciência no setor turístico quanto ao
potencial do que viria a se constituir mais tarde no ecoturismo e nos meios e
mecanismos necessários para viabilizar econômica e lucrativamente as atividades
do setor. Não há, assim, porque se espantar com o ulterior desenvolvimento e
expansão do que passa a ser caracterizado como atividades ecoturísticas, por parte
das empresas promotoras e operadoras.
Martins (2001, p. 20-21) acredita que ao seguir e divulgar esta carta poder-
se-ia obter um turismo amparado na conscientização, na obtenção de recursos
econômicos, com grande oferta de empregos a longo prazo, garantindo a
manutenção do processo de turistificação para as gerações futuras. Porém, como
nos mostram as diretrizes da “Carta do Turismo Sustentável” do ICOMOS, as suas
metas são muito mais pragmáticas e voltadas para o potencial econômico do que
para a preservação e conservação ambiental em si.
De fato, deve-se reconhecer que o desenvolvimento das atividades
relacionadas ao ecoturismo estaria intimamente ligado ao aumento das
55
preocupações ambientais ao redor do mundo. Antes de 1980, eram raros aqueles
que se preocupavam com a sustentabilidade do desenvolvimento e a possível
escassez dos recursos naturais, a não ser pelos poços de petróleo.
Ao pensar em como se deu o início da prática do ecoturismo, assim
denominado e dentro dos parâmetros até aqui apresentados, percebe-se que este
corresponde ao incremento de uma preocupação com o ambiente natural no
mundo.
Como visto anteriormente, o ecoturismo gera bilhões de dólares por ano e
vem crescendo a taxas de 10
a 15% ao ano, de acordo com Castilho & Herrscher
(1997; apud NIEFER & GARZEL LEODORO DA SILVA, 1999), o que justifica, por
exemplo, a existência em 2002 de eventos internacionais ligados ao tema, tais
como: a Conferência Mundial de Ecoturismo, no Canadá, que gerou a “Declaração
de Ecoturismo de Quebec”; e a Conferência Rio+10 (Eco 2002), que ocorreu na
África do Sul e teve o ecoturismo como um dos pontos de debate em sua pauta.
Estes são dois eventos recentes de destaque para o debate a respeito da
utilização “sustentável” dos recursos naturais, o que prova a relação entre os temas
desenvolvimento sustentável, a questão ambiental e a atividade ecoturística no
mundo.
Assim, a atividade ecoturística carrega consigo a bandeira da preservação
ambiental, sempre ligada ao termo sustentabilidade posto como objetivo final.
A “Declaração de Ecoturismo de Quebec” enfatiza ainda que o turismo deve
ser mundialmente visto como prioridade por sua potencial contribuição para a
erradicação da pobreza e conservação dos ecossistemas ameaçados.
Seus participantes ainda reconhecem que há um crescente interesse das
pessoas em visitar áreas naturais, que a atividade ecoturística tem tido um papel
primordial na introdução de práticas sustentáveis no setor do turismo e que o
turismo sustentável pode ser uma importante fonte de receita para as áreas
protegidas. Afirmam também que o ecoturismo é uma valiosa oportunidade
econômica para as populações locais e pode contribuir intensamente com a
conservação, se realizada de forma sustentável. Fica assim estabelecida a relação
ecoturismo, desenvolvimento sustentável e a questão ambiental neste documento.
56
Mesmo apresentando grande importância econômica, principalmente para
os países em desenvolvimento, não há um consenso a respeito do termo
ecoturismo entre as operadoras turísticas, os consumidores e outros interessados.
Isto propicia o uso indiscriminado do mesmo. Dentro do contexto do marketing
ambiental, “a palavra ecoturismo tornou-se um rótulo desejado e está sendo
utilizado de forma abusiva por inúmeras operadoras de turismo”, que com isso
garantem um nome “limpo” no mercado de viagens, sem garantirem o respeito ao
ambiente natural e/ou cultural, podendo fazer com que o conceito de ecoturismo se
torne vago (HEADLY et al., 1998; apud NIEFER & GARZEL LEODORO DA SILVA,
1999).
Nesta linha, segundo os seus formuladores, para que o ecoturismo faça
parte fundamental de um desenvolvimento pautado na conservação do ambiente
natural, seria necessária uma abordagem multidisciplinar, com um planejamento
cuidadoso (tanto físico, quanto gerencial) e diretrizes e regulamentos rígidos, para
que tenha um funcionamento estável.
Como visto anteriormente, primeiro há que se considerar a complexidade e
o caráter multidisciplinar da questão ambiental, onde não devem ser considerados
apenas os aspectos biológicos dos ecossistemas, e as abordagens técnicas, mas
principalmente, a partir do exposto até aqui, os fatores políticos, econômicos e
sociais envolvidos.
Ceballos-Lascuráin (apud LINDBERG & HAWKINS, 1995, p. 27) apresenta
uma visão crítica em relação ao ecoturismo, ao apontar para a existência de
problemas crônicos, como a falta de orçamento e a falta de mão-de-obra
especializada de muitas áreas protegidas, especialmente em países em
desenvolvimento. Porém, acredita que estes poderiam começar a ser resolvidos, se
fossem criados mecanismos adequados para fazer as divisas deste turismo ficarem
nos próprios locais de sua aplicação. Também enfatiza que o ecoturismo não deve
ser restrito às áreas protegidas legalmente, uma vez que podem acabar sofrendo
muita pressão. Se este se desenvolver em áreas naturais que não têm nenhuma
proteção oficial, pode vir a estimular as comunidades locais a conservarem os
recursos e as áreas naturais próximas, por iniciativa própria, sem pressões
externas. Esses seriam, em seu entender, princípios básicos para se atingir o tão
almejado desenvolvimento sustentável.
57
Os impactos da prática do ecoturismo, segundo Boo (apud LINDBERG &
HAWKINS, 1995, p. 34), podem ser negativos ou positivos. Entre os primeiros,
estão os chamados “custos” potenciais que abrangem a degradação do meio
ambiente, as injustiças e instabilidades econômicas, as mudanças sócio-culturais
negativas. Entre os segundos, temos os chamados “benefícios” potenciais que
consistem na geração de receita para as áreas protegidas, a criação de empregos
para as pessoas que vivem junto a essas áreas e a promoção de educação
ambiental e de conscientização sobre a conservação.
Há um perigo em potencial que seria a conversão de áreas protegidas que
recebem os ecoturistas em recursos naturais internacionais, mediante o fato de que
a maior parte dos ecoturistas seria de países de Primeiro Mundo ou da elite do
país, com capacidade para pagar as experiências. Assim sendo, a capacidade dos
visitantes locais excederia e ocorreria a exclusão dos cidadãos locais e nacionais,
devido aos custos, tornando estes turistas não bem vindos à própria terra e com
suas necessidades de recreação e melhora de seus níveis de vida ignoradas.
A partir desse quadro, Boo (apud LINDBERG & HAWKINS, 1995, p. 34)
acredita que a tarefa hoje, para aqueles que se preocupam em promover o
ecoturismo como uma atividade que garanta a conservação do meio ambiente,
seria “procurar os pontos em comum entre o ecoturismo, a conservação e o
desenvolvimento, e encontrar formas de minimizar custos e maximizar benefícios”.
Todas as proposições relativas ao ecoturismo concordam que a
implementação de atividades de ecoturismo contribui para o desenvolvimento
econômico, em diferentes escalas, através da geração de emprego e renda, da
melhoria de equipamentos urbanos e de infra-estrutura. Há que se considerar,
todavia, que a implementação de atividades de ecoturismo, principalmente em
Unidades de Conservação, podem acarretar sérios danos e impactos ao ambiente.
Com base em um documento da SEMA-SP ([200-], p. 7), pode-se destacar o
comprometimento da fauna e flora em razão da presença humana com: o
pisoteamento, compactação, erosão e abertura de atalhos em trilhas; o aumento
e/ou disposição inadequada do lixo e efluentes; a transformação da paisagem e
depredação de elementos naturais, dada a necessidade de "sacrifício" de áreas
para instalação de infra-estrutura; o aumento do risco de incêndios. Além de poder
acarretar, no caso de estâncias de veraneio ou inverno, fluxos migratórios,
58
adensamentos urbanos não planejados e favelização, com o aumento do custo de
vida, supervalorização dos bens imobiliários e conseqüente perda da propriedade
de terras, habitações e meios de produção por parte das populações locais.
Ao considerar o panorama exposto até aqui, percebe-se que se tornou
premente o estabelecimento de negociações, políticas e regras que garantam a
conciliação entre a conservação dos recursos naturais, do patrimônio histórico e
cultural e de modos de vida e culturas peculiares em face dos interesses
econômicos envolvidos.
Enfim, parece que para serem conduzidas de forma coerente com a
preservação dos ambientes naturais, as atividades ligadas ao ecoturismo devem
considerar a fragilidade dos ecossistemas onde se desenvolve e os fatores
restritivos à sua exploração.
Trata-se de reconhecer, a partir do exposto até o presente, que:
1. A escassez é socialmente criada em distintos momentos históricos e
está relacionada aos interesses dos diferentes atores sociais em disputa
pelo espaço (ver a este respeito HARVEY, 1996; LIMONAD, 2003;
COSTA, 2002).
2. Não há desenvolvimento que não seja sustentável (LIMONAD, 2003),
além do fato de ser impossível, a quem quer que seja, opor-se à
sustentabilidade (HARVEY, 1996). A questão que se coloca está mais
relacionada à justiça ambiental em relação aos atores envolvidos do que
necessariamente à sustentabilidade do desenvolvimento, uma vez que,
em nome da sustentabilidade, práticas de exclusão social podem buscar
uma legitimidade em nome de preservar um capital natural para as
gerações futuras.
3. A proposta do ecoturismo como atividade que promova o
desenvolvimento sustentável mostra-se, assim, como uma proposição
extremamente complexa, uma vez que, como qualquer outra atividade
no sistema capitalista, busca o lucro e sua legitimação, através de um
discurso ambiental e de envolvimento das comunidades afetadas, entre
outros fatores.
59
4. Enfim, parece que a prática do ecoturismo possui potencialidades em
termos de permitir o desenvolvimento local e uma relativa preservação e
conservação dos recursos naturais e culturais envolvidos, todavia,
acredita-se ser essencial que toda e qualquer proposta parta do
reconhecimento de suas limitações em termos da proteção ambiental e
de seu caráter econômico, bem como de seu papel na produção e
organização do espaço social.
Por conseguinte, entende-se que a sustentabilidade deve ser entendida, não
como um dado técnico, mas no campo das relações sociais, relacionada não
apenas aos recursos e ao meio ambiente, mas também às formas sociais de
apropriação e uso dos recursos naturais. À medida que se partilha a concepção de
Acselrad e Leroy (1999, p. 93) de que a sustentabilidade só pode ser alcançada
mediante a participação de todos os envolvidos, especialmente dos que costumam
ficar à margem das decisões, parece de fundamental importância tal participação
para a prática do ecoturismo, pois a população só tomará como seu patrimônio
aquilo em que tiver participação ativa, direta. Por isso, seria de suma importância a
participação dos grupos sociais atingidos e envolvidos no processo de instalação e
desenvolvimento da atividade de ecoturismo. Porém, nem sempre isso acontece, e
via de regra permanece nas intenções ou no discurso.
Na prática do ecoturismo, observa-se que muitas vezes a exploração dos
recursos naturais, tais como a água, a floresta e até mesmo o ar, não é feita
adequadamente, especialmente por parte dos patrocinadores da atividade, ou seja,
empresas e governos. A falta de preocupação com o lixo ou o ruído produzidos e a
conseqüente saturação da infra-estrutura geram a má qualidade de vida da
população local, mas sempre garantindo aos visitantes os melhores ambientes. No
entanto, os impactos negativos ao meio ambiente podem ser irreversíveis e
promover até mesmo o fim da prática ecoturística no local.
Uma vez definidos estes parâmetros e cuidados em termos da questão
ambiental, da sustentabilidade e do ecoturismo, o próximo capítulo será dedicado à
prática do ecoturismo no Brasil e seus desdobramentos, tendo claro que “as
práticas e instituições que se pretendem portadoras da sustentabilidade são ficções
sociais” (ACSELRAD, 2001, p. 31).
60
4. TURISMO E ECOTURISMO NO BRASIL
Neste segmento do trabalho, serão apresentadas várias informações
referentes ao turismo coletadas junto a EMBRATUR, pois este órgão possui
destaque no Brasil em tudo que se relaciona ao desenvolvimento e à prática desta
atividade. Além disso, contar-se-á com a contribuição de Hilsdorf (2003), que
resgata informações divulgadas pela OMT e pelo WTTC (World Travel and Tourism
Council).
Segundo dados da OMT, o turismo movimenta mais de US$ 3,5 trilhões
anualmente, bem como é considerado por vários órgãos de pesquisas como um
dos ramos da atividade comercial que mais cresce no mundo. Calcula-se que mais
de 180 milhões de pessoas vivem direta ou indiretamente desta atividade
(HILSDORF, 2003).
Não é de admirar que o turismo seja considerado um setor estratégico para
geração de renda e emprego no país, já que a EMBRATUR (2002) afirma que, em
1998, a indústria mundial do turismo respondeu pelo ingresso de divisas no valor de
US$ 439 bilhões, em decorrência de 625 milhões de chegadas de turistas, que
geraram 260 milhões de empregos.
Ainda de acordo com a OMT e também com o WTTC, em 1998, houve a
captação de 4,8 milhões de turistas estrangeiros, total que, em 1994, era inferior a 2
milhões. Os investimentos estrangeiros diretos na atividade turística chegaram à
média anual de US$ 6,04 bilhões e crescem a uma taxa média de 5% ao ano.
A vocação brasileira para o turismo é reconhecida pela EMBRATUR (2002),
devido aos inúmeros atrativos de nosso país, desde praias e serras a acervos
61
naturais e culturais. Não obstante, considera imprescindível o planejamento para a
devida exploração destes atrativos.
A partir de 1995, o Governo Federal passou a encarar a indústria do turismo
como setor estratégico, frente às mudanças do sistema produtivo mundial na
primeira metade da década de 90, decorrentes do processo de globalização da
economia. Isto se deve ao reconhecimento da capacidade de geração de emprego
e renda desta atividade, que impacta mais de cinqüenta e dois segmentos da
economia produtiva. Assim, a indústria do turismo teria se expandido
significativamente nos últimos anos, movimentando, em 1998, 32,2 milhões de
turistas domésticos, que em conseqüência geraram US$ 13,2 bilhões em receitas
diretas.
A comprovação disto é que o turismo no Brasil cresceu nos últimos anos em
média 3,5% ao ano, crescimento muito mais elevado do que outros setores da
economia nacional, o que significou uma contribuição de 7% para formação do
Produto Nacional Bruto brasileiro no ano de 2000. Nesse mesmo ano, as
exportações brasileiras foram da ordem de US$ 55 bilhões, que, se comparadas às
receitas obtidas através dos gastos diretos dos turistas estrangeiros, levam a uma
participação relativa das mesmas num percentual aproximado de 10% naquele ano.
O Brasil encontra-se à frente, nos próximos dez anos, enquanto destino
turístico devido ao aumento da procura pelo turismo baseado na preservação e
conservação da natureza, além da valorização do patrimônio histórico e cultural.
Isso implica em dizermos que o ecoturismo tem tido bastante procura e que o Brasil
é um foco expressivo desta atividade no cenário mundial.
O objetivo apresentado pela EMBRATUR (2002) é fazer com que o Brasil
figure entre os vinte primeiros destinos no turismo receptivo internacional, através
da ação de mensuração e apresentação dos impactos econômicos decorrentes do
avanço no setor turístico, passada aos gestores públicos e privados. Antes de se
prosseguir na abordagem sobre a prática do ecoturismo no Brasil, tratar-se-á do
desenvolvimento da prática do turismo.
62
4.1 TURISMO NO BRASIL
O desenvolvimento da prática turística no Brasil pode ser percebido através
de programas de âmbito nacional que têm sido promovidos por órgãos
governamentais. Deve-se atentar para o fato de que estes programas nacionais
encontram-se em fase de reformulação pelo atual Governo. No entanto, serão
apresentados alguns dos programas elaborados até meados de 2003, com o intuito
de mostrar seus objetivos e conquistas.
Entre um dos fatores que propiciaram o ingresso da Região Nordeste no
mapa do turismo internacional tem-se o “Programa Nacional da Municipalização do
Turismo” (PNMT), como um mecanismo estratégico que garantiu a implementação
de ações nas áreas de capacitação profissional, adequação da legislação,
marketing e implantação de metodologia da gestão turística.
Este programa implicou no investimento, na última década, de mais de US$
8 bilhões no Nordeste em obras de infra-estrutura básica – o que contribuiu,
inclusive, para um expressivo desenvolvimento do ecoturismo nesta região, como
será visto mais adiante (ver Mapa 4.2.3).
Merece destaque também o montante de verbas reservado para o
desenvolvimento do turismo pelo último governo do Presidente Fernando Henrique
Cardoso (1989-2002), cujo “Programa de Desenvolvimento Sustentado Avança
Brasil” possuía no Plano Plurianual de Ação uma provisão de recursos superiores a
R$ 800 milhões para a EMBRATUR investir em programas e promoção do turismo.
Todavia, não se pode deixar de reconhecer que outros programas e
investimentos governamentais voltados para outras áreas e setores contribuíram,
ainda que de forma indireta, para o desenvolvimento da atividade, como os
programas de desenvolvimento da infra-estrutura nacional de transportes, a
despeito de seus impactos, como foi o caso do programa federal do primeiro
governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-1998), “Brasil em Ação”. Programa
que pensava o Brasil não enquanto território ou regiões, mas enquanto eixos
nacionais. No caso do programa “Brasil em Ação”, o Ministério dos Transportes
tinha por metas a melhoria das condições de navegabilidade dos principais rios do
país, bem como melhorar o escoamento de bens e produtos. O objetivo deste
programa tinha a intenção de interligar as hidrovias às rodovias, ferrovias, portos e
63
aeroportos, de modo a contribuir para a redução de distâncias, já que o Brasil
possui 42.000 quilômetros de vias navegáveis. Em última análise, sem entrar no
mérito destes projetos, uma vez que isto não integra os objetivos desta dissertação,
se tais metas houvessem sido alcançadas plenamente, criariam condições para a
ampliação e diversificação das atividades de turismo e ecoturismo no país.
O próprio Ministério dos Transportes destaca uma série de benefícios das
hidrovias à atividade ecoturística, tais como: a) aumentar a acessibilidade a
localizações isoladas, de rara beleza e biodiversidade preservada, com uma
intervenção mínima; b) favorecer atividades de observação da fauna, bem como o
mergulho em águas preservadas; c) a possibilidade de navegação de barcos de
grande porte; d) a capacidade de tornar os rios navegáveis durante o ano inteiro; e)
permitir a manutenção de programas permanentes de monitoramento para o
controle da qualidade das águas. No entanto, há que se atentar para os possíveis
riscos e impactos ambientais e sociais se tais atividades não forem conduzidas com
um monitoramento eficiente e acompanhadas de uma educação ambiental não só
dos usuários e dos agentes, mas também dos grupos sociais locais atingidos e/ou
envolvidos.
Serão apresentados a seguir dois programas nacionais de turismo de
destaque no país para caracterizar o papel estratégico que esta atividade vem
assumindo na economia nacional. São eles: O “Programa de Desenvolvimento
Sustentado Avança Brasil” e o “Programa Nacional de Municipalização do Turismo”.
a) Programa de Desenvolvimento Sustentado Avança Brasil
Serão expostas algumas das principais características do plano até o início
de sua reformulação pelo atual Governo.
O “Programa Avança Brasil”, como era chamado, tinha entre suas metas
voltadas para o turismo o objetivo de captar, até 2003, 6,5 milhões de turistas
estrangeiros, e de expandir para 57 milhões de consumidores o fluxo do turismo
doméstico com a geração de 500 mil novos empregos. A intenção deste Programa
era privilegiar todas as macro-regiões do país, ao abranger as áreas de
desenvolvimento, capacitação e marketing do produto turístico, com previsão de:
financiar a estrutura turística e qualificar agentes de turismo nos municípios;
64
realizar campanhas publicitárias para promoção do turismo regionalizado;
criar roteiros regionais;
promover eventos para divulgar o turismo interno e a imagem do Brasil no exterior.
Além disso, “o Programa Avança Brasil”, ao pretender promover o
desenvolvimento sustentado por intermédio do turismo, estabeleceu projetos
complementares com o intuito de criar empregos e reduzir as desigualdades
sociais. Foram criados, neste sentido, programas específicos para as regiões
Centro-Oeste, Nordeste, Sudeste e Sul, com o objetivo de assegurar
competitividade internacional ao produto turístico brasileiro; modelar produtos
integrados, caracterizados pela multiplicidade de diferenciais, capazes de viabilizar
o aumento do fluxo turístico, a taxa de permanência e os gastos dos turistas; e
melhorar a qualidade de vida das pessoas que vivem nessas regiões.
Há que se reconhecer que houve de fato transformações significativas no
desenvolvimento do turismo interno, todavia ainda se fazem esperar os resultados
em termos da melhoria da qualidade de vida das pessoas. Não se pode esquecer
que muitas vezes o desenvolvimento de atividades turísticas e de ecoturismo em
enclaves espaciais tendem a não promover o desenvolvimento local, como buscam
argumentar os operadores e agentes turísticos.
Tem-se, neste sentido, a experiência dos resorts isolados, como são os
Mediterraneé – em Itaparica (RJ), Mangaratiba (BA), Porto Frade (Angra dos Reis –
RJ), Porto Galinhas (PE) e o mais recente entre eles na Costa do Sauipé (BA),
entre outros, em que os turistas são trasladados diretamente dos aeroportos para
estas ilhas de lazer que buscam reproduzir o ar local – com a expulsão das
populações originárias locais e a degradação de suas atividades de subsistência.
Merece destaque o fato de que a atual Costa Verde do Rio de Janeiro, antes da
abertura da BR-101 e de sua transformação em uma das mecas do turismo, era um
dos maiores pólos pesqueiros de pesca artesanal nacional e a área com a maior
produção de banana e amendoim do Estado do Rio de Janeiro (LIMONAD, 1996).
b) Programa Nacional de Municipalização do Turismo - PNMT
O “Programa Nacional de Municipalização do Turismo” foi desenvolvido e
coordenado pela EMBRATUR com o intuito de apoiar as funções gerenciais de
planejamento, tomada de decisão e controle operacional de Órgãos da
65
Administração Pública Direta ou Indireta. Este Programa também deveria atuar
diretamente no incentivo à prática da atividade ecoturística, uma vez que estava
prevista a injeção de recursos da OMT, por intermédio do Banco do Brasil,
destinados ao financiamento de empreendimentos privados direcionados para o
desenvolvimento e implementação de atividades de ecoturismo.
De acordo com a EMBRATUR (2002), os objetivos deste programa seriam
(os grifos são nossos):
1. fomentar o desenvolvimento turístico sustentável dos municípios, com base na
sustentabilidade econômica, social, ambiental, cultural e política;
2. conscientizar e sensibilizar a sociedade para a importância do turismo como
instrumento de crescimento econômico, geração de empregos, melhoria da
qualidade de vida da população e preservação de seu patrimônio natural e cultural;
3. descentralizar as ações de planejamento, coordenação, execução, acompanhamento e
avaliação, e motivar os segmentos organizados do município a participar da formulação
e da co-gestão do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Turismo Municipal;
4. disponibilizar aos municípios brasileiros com potencial turístico condições técnicas,
organizacionais e gerenciais para o desenvolvimento da atividade turística;
5. estimular o fortalecimento das relações dos diferentes níveis do poder público
com a iniciativa privada, visando ao estabelecimento de parcerias para discutir os
problemas e buscar soluções em benefício da comunidade.
Como visto no capítulo anterior, a problemática da sustentabilidade é
controversa, bem como a preservação do patrimônio natural e cultural. Os itens 3) e
4) de certa forma procuram legitimar o programa ao nível das prefeituras com a
cooptação dos prefeitos ao acenar-lhes com a possibilidade de “formulação e co-
gestão do Plano de Desenvolvimento Sustentável do Turismo Municipal” (item 3).
Trata-se de fato, conforme fica explícito nos itens 2) e 5) de criar bases para o
crescimento e expansão da atividade turística e não, necessariamente, de propiciar
o desenvolvimento local. No caso da Costa do Sauípe, foi fartamente noticiado
pelos órgãos da imprensa que os funcionários deveriam ser qualificados e versados
em um ou dois idiomas estrangeiros, o que fez com que em sua maioria fossem
recrutados em Salvador, capital da Bahia.
O primeiro passo para a implantação do PNMT era a inscrição dos
municípios no Programa. Neste sentido, fazia-se necessário elaborar um Relatório
de Informações Turísticas do município em pauta, que deveria ser submetido à
análise e à avaliação da Embratur em relação ao potencial turístico do local. Uma
vez aprovados, os municípios deveriam, em um ato subseqüente, criar o Conselho
Municipal de Turismo; elaborar o Plano Municipal de Turismo e criar o Fundo
66
Municipal de Turismo.
A inscrição no Programa, por si só, garantia ao município a possibilidade de
obter o financiamento de projetos através de empréstimos da FINEP
(Financiadora
de Estudos e Projetos), SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas
Empresas) e do Banco do Brasil. Além disso, o SEBRAE apoiaria o
desenvolvimento da atividade turística através da oferta de cursos de capacitação
profissional (ALMEIDA & CACCIA-BRAVA, 1997).
Caso o município desejasse implementar um “Plano Municipal de
Ecoturismo”, o prefeito deveria determinar a área da administração que ficaria
responsável, além de se preocupar em fornecer o respaldo técnico necessário com
relação ao meio ambiente. Deveriam ser definidas, neste sentido: as áreas de
visitação; o perfil da clientela turística; o objetivo das atividades e viagens
oferecidas; a infraestrutura do entorno; a capacitação profissional dos agentes de
turismo voltados para o atendimento da clientela.
Além disso, segundo Almeida e Caccia-Bava (1997), deve haver uma
preocupação em planejar a divulgação de acordo com as condições do local, com o
intuito de não gerar impactos negativos para o próprio município e para o meio
ambiente - pois caso o município não consiga atender a todos que venham a
procurá-lo, pode perder a garantia de retorno de muitos turistas.
No caso de práticas ligadas ao ecoturismo, o diferencial é uma maior
preocupação com relação às restrições de visitação a locais de preservação do
ambiente natural e cultural.
Em nível nacional, a Coordenação Geral do PNMT é exercida pela
EMBRATUR e pelas instituições parceiras. Nos estados, representantes da unidade
gestora da política de turismo e das instituições parceiras estaduais compõem os
Comitês Estaduais do PNMT. Já nos municípios, existem os Conselhos Municipais
de Turismo, com a responsabilidade de iniciarem e coordenarem o processo de
elaboração do “Plano de Desenvolvimento Sustentável do Turismo”.
Segundo a EMBRATUR (2002), o PNMT, ao seguir a tendência de
descentralização de informações e delegação de funções, teria desenvolvido este
projeto de gestão que se propunha a um planejamento participativo em todo o país.
67
Todavia, muitas vezes as propostas de planejamento participativo consistem em um
meio eficaz de controle social e legitimação de ações governamentais, à medida
que um dos mais fortes ingredientes destas propostas, principalmente quando
vindas de “cima para baixo”, é o próprio planejamento da participação no
planejamento – em que já estão definidos a priori os parâmetros estratégicos da
ação, cabendo aos grupos sociais envolvidos participarem para definir os passos
táticos, sem que os objetivos e os meios sequer sejam postos em discussão
(LIMONAD, 1984).
Torna-se patente, através de tais medidas, que a possibilidade de colocar os
municípios no mapa turístico nacional converteu-se, em certa medida, em mais um
meio de captação de verbas para as prefeituras municipais, uma vez que, em
virtude da Reforma Tributária de 1966, as prefeituras, até esta data, contavam com
um número reduzido de fontes de renda. A possibilidade de geração de atividades
ligadas a serviços, por sua vez, poderia em última análise contribuir para aumentar
a receita municipal direta e indiretamente. Se por um lado, houve um
desenvolvimento da promoção do turismo em áreas e municípios quase
desconhecidos – como Sete Lagoas e Ouro Branco em Minas Gerais, Três Rios e
Paraíba do Sul no Rio de Janeiro, onde os pontos turísticos são reduzidos e a
atividade turística secundária em relação a outras atividades dos municípios em
pauta – por outro, não houve geração de empregos, nem de uma infra-estrutura
turística, apesar de muitos destes municípios contarem agora com um Conselho
Municipal de Turismo.
Pode-se concluir ainda que de maneira provisória muitas destas ações
contribuíram não necessariamente para incrementar o desenvolvimento local e
gerar empregos, notadamente nos municípios de pequeno e médio porte, mas para
servir de uma fonte extra de recursos para fortalecer as deficitárias receitas
municipais. Muitos destes municípios constroem um quiosque de informações
turísticas em que são distribuídos folhetos informativos, sem, no entanto,
oferecerem de fato uma infra-estrutura para a realização de atividades.
68
4.2. O ECOTURISMO NO BRASIL
As problemáticas ambiental e da sustentabilidade, conforme abordado no
capítulo anterior, tendem a ser inseridas nas propostas de ecoturismo mais como
um artifício para a promoção da atividade do que enquanto uma proposta de
defesa, preservação e/ou conservação ambiental. Merece destaque também o fato
das atividades de ecoturismo abarcarem, como visto, um amplo leque de
atividades. Tratar-se-á, a seguir, da prática de ecoturismo no Brasil, com o intuito
de procurar situá-la na discussão precedente, considerando o abordado no item
anterior, onde foi visto que os programas governamentais existentes até o início de
2003, apesar de pleitearem o desenvolvimento sustentável, mostram claramente a
que vieram.
Conforme visto no Capítulo 2, o conceito de ecoturismo como uma forma de
turismo com viagens especializadas ligadas à natureza foi introduzido no Brasil no
final dos anos 80, seguindo a tendência internacional. O termo “ecoturismo” surgiu
oficialmente em 1985, mas apenas em 1987 foi criada a Comissão Técnica
Nacional, constituída pelo IBAMA e a EMBRATUR, com vistas a ordenar e
regulamentar as atividades neste campo (HILSDORF, 2003).
A EMBRATUR autorizou os primeiros cursos de guias de ecoturismo em
1989. No entanto, foi somente após a Eco 92
21
, que o termo ecoturismo começou a
ser divulgado e promoveu um crescimento no número de destinos e agências que
desejassem atrair turistas para tal atividade.
A EMBRATUR (2002) estima que mais de meio milhão de pessoas
pratiquem o ecoturismo no Brasil, empregando cerca de trinta mil pessoas, através
de, no mínimo, cinco mil empresas e instituições privadas.
A ECOBRASIL (2000), organização que participa de vários projetos de
ecoturismo no Brasil desde 1996, aponta dois mercados distintos de ecoturismo: o
nacional e o internacional, sendo o primeiro bem maior em número de turistas que o
segundo. Segundo essa organização, existem centenas de agências brasileiras que
promovem ecoturismo, cujos clientes possuem o seguinte perfil: jovem, solteiro,
21
Eco 92: Earth Global Summit realizado em 1992 no Rio de Janeiro, Brasil.
69
com médio poder de compra, com viagens programadas em feriados prolongados e
férias, estando muitas vezes em grupos. Destaca ainda a procura pela Mata
Atlântica, como um dos destinos mais populares.
Dentre os principais destinos ecoturísticos, a EMBRATUR (2002) destaca:
Bonito (MS), Chapada Diamantina (BA), Chapada dos Guimarães (MT), Chapada
dos Veadeiros (GO), região de Manaus (AM), Fernando de Noronha (PE), Lagamar
(SP), litoral sul da Bahia, Pantanal (MS/MT), Serra Gaúcha (RS), Serra do Mar
(SP), Vale do Ribeira (SP) e diversas regiões do litoral nordestino. Esses destinos
abarcam todos os biomas nacionais, que são constituídos pelas regiões da Floresta
Amazônica, da Mata Atlântica, do Cerrado, do Pantanal, da Caatinga e ainda 8.500
quilômetros de litoral.
Esse órgão afirma ainda que apenas 2,2% das áreas naturais encontram-se
legalmente protegidas, sendo indevida a maneira como são explorados os recursos
oferecidos por estas áreas, sem que haja de fato uma preocupação e um controle
ambiental efetivos.
As áreas naturais são legalmente protegidas através da criação de Parques
Nacionais e Unidades de Conservação (UCs), que atendem à demanda
ecoturística. Além destes, em 1993, foi criado um “mecanismo de Reservas
Particulares de Proteção à Natureza (RPPN), pelo Ministério do Meio Ambiente e
da Amazônia Legal, e IBAMA, segundo o qual proprietários podem oferecer à
conservação seus terrenos, recebendo em troca incentivos fiscais e tratamento
prioritário em projetos de desenvolvimento sustentável” (LINDBERG & HAWKINS,
1995, p. 27).
De acordo com a EMBRATUR (2002), os 2,2% de áreas naturais protegidas
legalmente constituem em sua grande maioria Unidades de Conservação (UCs). O
conceito de Unidades de Conservação estaria fundamentado originalmente na idéia
de “áreas naturais protegidas, ou seja, áreas intocadas e intocáveis, criadas
inicialmente para contemplação”, com base no Parque Nacional de Yellowstone nos
Estados Unidos. No entanto, na atualidade, ainda segundo este órgão
[...] o grau de importância sobre a existência das UCs, extrapola a
questão de beleza cênica a ser preservada; a proteção dos
ecossistemas, da fauna e da flora de uma área natural, são encarados
até mesmo como necessidade vital à nossa sobrevivência nesse planeta.
70
Neste sentido, a EMBRATUR incorpora a idéia de preservação ambiental
enquanto “capital natural” a ser preservado para as gerações futuras.
Com o crescimento da prática de ecoturismo no país, a EMBRATUR tem
valorizado a atividade mediante publicações, como o documento chamado
“Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo”, lançado em 1995, e também
através da criação de programas e projetos, tais como o “Programa Nacional de
Ecoturismo” e o “Programa Nacional de Desenvolvimento de Pólos Ecoturísticos”
(PNDPE), este último, com o apoio da TAM e do IEB
22
, os quais serão tratados a
seguir.
Em 1994, durante o governo do Presidente Itamar Franco, a EMBRATUR
lançou o documento “Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo” que
propunha: uma regulamentação da atividade através de uma ação articulada das
três esferas de poder com um intercâmbio de dados, informações e experiências
entre o setor público e privado; além da formação de recursos humanos, controle
de qualidade, implantação de infra-estrutura e “incentivo à participação comunitária,
para que as populações envolvidas percebam no ecoturismo uma alternativa
econômica viável”.
O “Programa Nacional de Ecoturismo”, por sua vez foi um resultado da ação
conjunta entre a EMBRATUR e o Ministério do Meio Ambiente, Recursos Hídricos e
Amazônia Legal, através da Secretaria de Coordenação da Amazônia e do IBAMA.
A finalidade deste programa era implementar as diretrizes traçadas para uma
Política Nacional de Ecoturismo.
De acordo com a EMBRATUR (2002), os objetivos principais do programa,
baseados nos pontos mais importantes do documento “Diretrizes para uma Política
Nacional de Ecoturismo”, seriam: buscar “compatibilizar as atividades de
ecoturismo com a conservação de áreas naturais”; bem como, em consonância
com o anterior, manter-se a articulação entre as três esferas de poder e outros
parâmetros; e, além disso, é introduzida a proposta de “promover o aproveitamento
do ecoturismo como veículo de educação ambiental”.
22
O Instituto de Ecoturismo do Brasil (IEB), desde novembro de 1995, é uma entidade nacional dos
profissionais que atuam na atividade ecoturística.
71
O “Programa Nacional de Ecoturismo”, lançado em 1995, segundo a
EMBRATUR (2002), iniciou sua atuação com a formação de um Grupo Técnico de
Coordenação - GTC-Amazônia, que foi responsável pela implantação de um
projeto-piloto na Região da Amazônia Legal, compreendida pelos estados de
Amazonas, Acre, Amapá, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins, Maranhão e Mato
Grosso, onde foram definidos nove pólos de ecoturismo, um em cada estado, a
serem implementados através de um programa de financiamento do Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID), especialmente constituído para este fim:
o Programa para o Desenvolvimento do Ecoturismo na Amazônia Legal
(PROECOTUR).
Além disso, como resultado deste programa, a EMBRATUR (2002)
apresentou a qualificação de cerca de duas mil pessoas para o planejamento e
gestão de empreendimentos ecoturísticos e o lançamento do "Manual Indígena de
Ecoturismo", realizado pelo GTC-Amazônia e Ministério do Meio
Ambiente/Secretaria de Coordenação da Amazônia. Este documento propunha
princípios e procedimentos para uma visitação ordenada em terras indígenas e
resultou do trabalho de índios, antropólogos, indigenistas e especialistas em
ecoturismo.
Outras regiões do país também receberam apoio para o desenvolvimento de
projetos ecoturísticos específicos, com destaque para: a Agenda de Ecoturismo do
Vale do Ribeira, implementado pela Fundação Florestal do Estado de São Paulo; o
Pólo Ecoturístico do Sertão Central do Ceará, implementado pela Secretaria do
Turismo do Estado do Ceará; a capacitação de técnicos do Parque Nacional da
Serra da Capivara, executado pela Fundação Museu do Homem Americano; e o
Pólo Ecoturístico do Lagamar, implementado pela Fundação SOS-Mata Atlântica. É
interessante notar que, nestes casos, com exceção de Lagamar, as iniciativas
concentraram-se em áreas caracterizadas pela pobreza e falta de dinamismo
econômico.
Em 1996, associado ao “Programa Nacional de Ecoturismo” temos a
implantação do “Programa Nacional de Desenvolvimento de Pólos Ecoturísticos”
(PNDPE), voltado para a identificação das localidades brasileiras onde ocorre o
ecoturismo. Este programa começou a ser implantado e administrado pelo IBAMA,
abrangendo todo o território nacional.
72
De acordo com Costa (2002, p. 33), este programa promoveu o
levantamento das características, potencialidades e das condições de infra-
estrutura em locais onde o ecoturismo se mostrava como nova alternativa de
desenvolvimento. Este programa identificou noventa e seis pólos ecoturísticos
conforme a Tabela 4.2.3a, que pode ser acompanhada pelo Mapa 4.2.3
apresentado em seguida.
Tabela 4.2.3 a – Pólos de Desenvolvimento do Ecoturismo no Brasil -2001
23
NORTE
Roraima RR 1 Turístico Norte de Roraima
Amapá AP 1 Amapá
Amazonas AM 1 Amazonas
Pará PA 1 Tapajós
Acre AC 1 Vale do Acre
Rondônia RO 1 Vale Guaporé
Tocantins TO 1 Ecoturístico do Cantão
CENTRO-OESTE
MS 1 Pantanal Sul Mato Grosso do Sul
MS 2 Serra Bodoquena
GO 1 Chapada dos Veadeiros
GO 2 Pirinópolis
Goiás
GO 3 Parque das Emas
MT 1 Pantanal Norte
MT 2 Chapada dos Guimarães
Mato Grosso
MT 3 Amazônia Matogrossense
SUL
PR 1 Paranguá/Graciosa
PR 2 Campos Gerais
Paraná
PR 3 Costa Oeste
SC 1 Alto Vale do Itajaí
SC 2 Ilha de Santa Catarina
Santa Catarina
SC 3 Planalto Serrano
RS 1 Serra Gaúcha Rio Grande do Sul
RS 2 Região Central
SUDESTE
MG 1 Grutas Serras e Diamantes
MG 2 Zona da Mata
MG 3 Circuito do Ouro
MG 4 Terras Altas da Mantiqueira
MG 5 Canastra
Minas Gerais
MG 6 Caminhos do Cerrado
ES 1 Itaúnas
ES 2 Delta do Rio doce
ES 3 Passos de Anchieta
ES 4 Serras Capixabas
Espírito Santo
ES 5 Serra do Caparão
RJ 1 Costa Verde
RJ 2 Região de Itatiaia
RJ 3 Rio/Niterói
RJ 4 Região Serrana
RJ 5 Região dos Lagos
RJ 6 Costa Doce
Rio de Janeiro
RJ 7 Vale do Paraíba
23
Outros pólos existem, porém ainda não foram catalogados.
73
SP 1 Alto Paranapanema
SP 2 Serras Paulistas
SP 3 Região das Cuestas
SP 4 Vale do Ribeira do Iguape
SP 5 Vale do Paraíba do Sul
SP 6 Mantiqueira
SP 7 Litoral Paulista
São Paulo
SP 8 Grandes Lagos
NORDESTE
MA 1 Reentrâncias Maranhenses
MA 2 Patrimônio Histórico-Cultural
MA 3 Lençóis Maranhenses
MA 4 Delta do Paraíba Maranhense
Maranhão
MA 5 Chapadas
PI 1 Parque Nacional da Serra da Capivara
PI 2 Parque Nacional Sete Cidades
Piauí
PI 3 Delta do Parnaíba
CE 1 Vale Monumental do Ceará
CE 2 Serra do Baturité
CE 3 Cariri
CE 4 Ibiapaba
CE 5 Litoral Oeste Cearense
Ceará
CE 6 Litoral Leste Cearense
RN 1 Litoral Leste Portiguar
RN 2 Litoral Norte Portiguar
RN 3 Serras do Sul
RN 4 Cabugi
RN 5 Seridó
Rio Grande do Norte
RN 6 Serras do Sudoeste
PB 1 João Pessoa
PB 2 Litoral Norte Paraibano
PB 3 Serra da Borborema
Paraíba
PB 4 Sertão Paraibano
PE 1 Fernando de Noronha
PE 2 Litoral Norte Pernambuco
PE 3 Litoral Sul Pernambuco
PE 4 Buique
PE 5 São Benedito do Sul
PE 6 Afogados da Ingazeira
Pernambuco
PE 7 Bacia do São Francisco
AL 1 Litoral Norte Alagoano
AL 2 Zona da Mata Alagoana
AL 3 Sertão Alagoano
Alagoas
AL 4 Baixo São Francisco
SE 1 Sertão Sergipano de São Francisco
SE 2 Própria
SE 3 Cotinguiba
SE 4 Agreste de Itabaiana
Sergipe
SE 5 Litoral Sul Sergipano
BA 1 Chapada Diamantina
BA 2 Costa dos Coqueiros
BA 3 Baía de Todos os Santos
BA 4 Costa do Dendê
BA 5 Costa do Cacau
BA 6 Costa do Descobrimento
Bahia
BA 7 Costa das Baleias
Fonte: COSTA, Patrícia C. Ecoturismo. São Paulo: Editora ALEPH, 2002 (Coleção ABC do Turismo),
p. 34-37.
74
75
RIO GRANDE DO SUL
SANTA CATARINA
PARANÁ
MATO GROSSO
DO SUL
SÃO PAULO
RIO DE JANEIRO
ESPÍRITO SANTO
MINAS GERAIS
BAHIA
SERGIPE
ALAGOAS
PERNAMBUCO
RIO GRANDE
DO NORTE
CEARÁ
MARANHÃO
PARÁ
AMAPÁ
RORAIMA
AMAZONAS
ACRE
RONDÔNIA
MATO GROSSO
TOCANTINS
GOIÁS
SE 1
SE 2
A
L 1
PE 1
RN 1
RN 2
CE 1
CE 2
CE 3
CE 4
CE 5
PI 3
PI 2
PI 1
MA 5
MA 4
MA 3
MA 2
MA 1
AP 1
RR 1
AM 1
AC 1
TO 1
MT 1
MS 1
MS 2
SC 3
RS 2
RS 1
SC 2
SC 1
PA 2
PA 1
PA 3
SP 2
SP 1
SP 3
SP 4
SP 5
RJ 1
RJ 2
RJ 3
RJ 4
RJ 5
RJ 6
ES 1
ES 2
MG 1
ES 3
ES 4
ES 5
MG 2
MG 3
MG 4
MG 5
MG 6
BA 1
BA 2
BA 3
BA 4
BA 5
BA 6
BA 7
RJ 7
SP 6
SP 7
SP 8
GO 2
GO 1
GO 3
MT 2
MT 3
RO 1
PA 1
CE 6
RN 3
RN 4
RN 5
RN 6
PB 1
PB 2
PB 3
PB 4
PE 2
PE 3
PE 4
PE 5
PE 6
PE 7
AL 2
AL 3
AL 4
SE 3
SE 4
SE 5
PIAUÍ
PARAÍBA
AMAZÔNIA
CAATINGA
CERRADO
MATA ATLÂNTICA
PANTANAL
CAMPOS SULINOS
ZONA COSTEIRA
BIOMAS
AMANIA / CAATINGA
AMAZÔNIA / CERRADO
CERRADO / CAATINGA
ÁREAS DE TRANSIÇÃO
Fonte: Revista Viagem. .
São Paulo: Editora Abril, Edição 80-A, junho de 2002, p. 6.
Desenho: Maria Augusta Alves Cabral de Lacerda.
O Mapa do Ecoturismo - Os 96 pólos recenseados em todo o Brasil
O Mapa do Ecoturismo
Os 96 pólos recenseados em todo o Brasil
A tabela 4.2.3b mostra a distribuição dos noventa e seis pólos ecoturísticos
definidos pelo PNDPE, por região do país.
Tabela 4.2.3b – Distribuição regional dos pólos de ecoturismo
Região Pólos de ecoturismo
N°s absolutos N°s relativos (%)
Norte 7 7,3
Nordeste 47 49
Centro-Oeste 8 8,3
Sudeste 26 27,1
Sul 8 8,3
Brasil 96 100
Elaborada por ARAUJO, C.V.F., com base nos dados de COSTA, 2002.
A análise das tabelas e do mapa apresentados aponta claramente para uma
concentração destes pólos na Região Nordeste, com quase 50% em relação ao
total de pólos de todo o país, seguida pela Região Sudeste, com 27,1%, e todo o
litoral brasileiro, distribuídos de Norte ao Sul do país. Pode-se destacar a escassez
de pólos na Região Norte e Centro-Oeste do país, que juntas concentram mais de
50% da área do território nacional.
Há que se ressaltar os inúmeros investimentos realizados nestas
localidades, tal como visto anteriormente, por parte de governos e da iniciativa
privada, em obras de infra-estrutura necessária à recepção de turistas, em
programas de capacitação profissional, na adequação da legislação, na
implementação de material de divulgação, na promoção de reformas e construções
de aeroportos e no crescimento de redes de hotéis e de serviços ligados ao
turismo. Esses investimentos foram feitos especialmente na Região Nordeste, como
visto ao se tratar do PNMT, com investimentos da ordem de US$ 8 bilhões em
obras de infra-estrutura básica, justificando a expressividade da prática de
ecoturismo nesta região.
As regiões Norte e Centro-Oeste, apesar de concentrarem mais de 50% do
território nacional, respondem por uma participação ao redor de 15% nos pólos de
ecoturismo existentes. Ao se analisar estas duas regiões à luz dos tipos de oferta
ecoturística de caráter representativo em termos mundiais, propostos por Bozzano
(apud COSTA, 2002, p. 41-42), na Tabela 4.2.3c, fica patente o potencial
inexplorado em termos do ecoturismo nestas duas regiões.
76
Tabela 4.2.3c – Caracterização da Oferta Ecoturística por Ecotemas
ECOTEMAS AMBIENTES SIGNIFICAÇÃO
Paisagem e ecossistemas de
montanha, glaciares, vulcanismo.
Áreas de montanha, vulcões,
altiplanos.
Valorização paisagística,
conhecimentos de fenômenos
geológicos e formas de vida.
Biodiversidade, ecossistemas,
fauna e flora.
Áreas de selva, bosques,
manguezais, alagados e uma
gama variada de ecossistemas.
Interpretação de interrelações e
processos dos ecossistemas,
espécies de flora e fauna
relevantes.
Espeleologia. Cavernas, grutas. Formações geológicas, elementos
singulares, usos antrópicos, traços
culturais, biota.
Biota e paisagens marinhas,
avifauna, flora e geologia.
Zonas marinho-costeiras. Caracterização de paisagens,
formações geológicas e biota
associada.
Insularidade, geomorfologia,
fragilidade, adaptação.
Ambientes insulares,
arquipélagos.
Caráter de isolamento, análise de
processos de evolução e
diferenciação de unicidade e
endemismo de espécies,
intervenção antrópica.
Manejo da água, hidrologia,
conservação de nascentes.
Áreas lacustres, quedas d´água e
rotas fluviais.
Contemplação da paisagem,
valores de produção, uso e
conservação dos recursos
hídricos. Obras humanas e usos.
Termalismo. Fontes termais, balneários,
mananciais e águas minerais.
Propriedades medicinais e de
recuperação na natureza.
Interesse por lugares e práticas
tradicionais, banhos rituais.
Interação entorno cultural-
ambiente natural.
Áreas culturais históricas, centros
e monumentos, zonas
arqueológicas, entornos naturais
e urbanos.
Valores testemunhais,
singularidade e diferenciação
histórico-cultural relevante,
ecologia humana.
Etnografia, integração
ecocultural.
Territórios indígenas,
comunidades tradicionais,
assentamentos.
Identidade cultural, adaptação ao
meio, entornos naturais
modificados por práticas
tradicionais, convivência cultural.
Agronaturalismo. Espaços rurais, paisagem cultural
ou adaptada.
Produção sustentável, cultivos
agroecológicos, processos de
recuperação de solos,
reflorestamento,
agroreflorestamento.
Fonte: COSTA, Patrícia C. Ecoturismo. São Paulo: Editora ALEPH, 2002 (Coleção ABC do Turismo),
p. 41-42.
Esta tabela mostra a grande variedade de ofertas ecoturísticas em razão
das particularidades dos ecossistemas e dos recursos das áreas visitadas. Ao se
observar os ecotemas abordados, pode-se inferir que o Brasil se encaixa em todos
77
eles, já que pode oferecer praticamente todos os ambientes correspondentes, fato
que comprova a potencialidade do país para a prática ecoturística.
No entanto, como visto nos capítulos anteriores, a implementação das
atividades relativas ao ecoturismo requer inúmeros cuidados, pois o limite entre a
atividade converter-se de prática educativa e de conservação em prática predatória
é muito tênue, como é o caso da visitação das dunas de Natal (Rio Grande do
Norte) ou da deterioração de manguezais e de cobertura vegetal superficial em
ecossistemas frágeis como as dunas da Ilha de Santa Catarina. E para não ficar
apenas no Brasil, tem-se as escaladas e caminhadas com sapatos de gelo com
pregos nas geleiras da Patagônia Argentina, da contaminação ambiental dos lagos
andinos em virtude das excursões lacustres, entre outros.
Parece que o “gozo” da natureza, ainda que contido sob determinados
parâmetros, não deixa de implicar em um certo grau de degradação ambiental. A
questão que se coloca é como implementar tais atividades, que não deixarão de
existir, uma vez que há uma clientela para isso, de uma forma em que se
minimizem os impactos ambientais e se propicie o desenvolvimento local.
78
5. À GUISA DE CONCLUSÃO -
ECOTURISMO ENTRE O IDEAL E O REAL
Tornou-se patente, ao longo deste trabalho, que há uma ampla distância
entre as proposições oficiais relativas à prática do ecoturismo e seu
desenvolvimento enquanto uma atividade passível de contribuir para a conservação
ambiental e cultural e a geração de empregos.
Em primeiro lugar, a concentração das atividades de ecoturismo, conforme
visto no Capítulo 4, ocorre em áreas de ocupação mais antiga e/ou mais
urbanizadas do país, o que vai ao encontro de uma das principais características do
turismo de massa, enquanto um fenômeno característico da modernidade, ligado
intrinsecamente ao capitalismo industrial e ao processo de urbanização
conseqüente deste, conforme abordado no Capítulo 2.
Em segundo lugar, parece que a prática do turismo e, por conseguinte, do
ecoturismo converteram-se em uma necessidade social, a partir da massificação
destas atividades, produto da sociedade capitalista que transforma até mesmo o
tempo livre do trabalhador em tempo de consumo. Haja vista o surgimento do
turista virtual, segundo Lash & Urry (1998).
E, finalmente, conforme visto no Capítulo 2, o desenvolvimento da atividade
em si acaba por acirrar o que se poderia chamar de consumo dos lugares e
localizações – o ponto culminante de uma localidade, os acidentes geográficos
incomuns (como geleiras, canyons ou chapadas).
A abrangência das definições de turismo e ecoturismo, de acordo com o que
foi visto nos Capítulos 2 e 4, permite entender que todo e qualquer deslocamento
79
não remunerado, tais como visita a familiares residentes em outra localidade, visita
a instituições de ensino e pesquisa para coleta de dados, levantamentos de dados
para fins científicos, viagem para assistir cerimônias de casamento ou funerais,
entre outros, poderiam ser classificados como atividades de turismo e, dependendo
da abordagem, poderiam inclusive ser vistos como atividades de ecoturismo. A
generalidade desta definição, por si só, aponta para a necessidade de buscarmos
uma definição mais precisa.
De fato, transita-se entre o ideal, proposto pelas formulações oficiais e dos
organismos ligados à atividade com fins mercadológicos, e o real da execução e
realização das práticas, em que a excursão lacustre é muitas vezes viabilizada por
um barco com motor a diesel, em que os sons e ruídos produzidos chegam
inclusive a afetar a “vida natural” que se pretende observar, sem falar na poluição
gerada pelo próprio barco.
Por outra parte, há também uma idealização em termos da geração de
empregos e desenvolvimento local, como visto no capítulo anterior, à medida que a
implementação destas atividades, ao menos da forma com que vem sendo
conduzida, tem contribuído mais para as receitas municipais deficitárias do que
para a melhoria das condições de vida das populações envolvidas, através da
geração de empregos. O que se pode perceber é a multiplicação, no caso
principalmente do Nordeste, de guias turísticos menores de idade, com um salário
irrisório, ao invés da formação de pessoal qualificado voltado para a implementação
da atividade.
Não se pode esquecer, conforme dissertado no Capítulo 2, do fato de que o
turismo e o ecoturismo são práticas que envolvem uma mobilidade geográfica e
pressupõem um consumo por parte de seus praticantes, o que não deixa de
proporcionar lucro aos que os promovem, suportam ou implementam.
Ficou claro que, através do processo de turistificação dos lugares
(FRATUCCI, 2000) ou de (re)criação do espaço (MARTINS, 2001), ocorre a
introdução de novos usos e valores sociais e espaciais no ambiente, o que pode
promover o fim de manifestações culturais locais. No entanto, acredita-se que isto é
inevitável e faz parte do próprio processo de globalização e do progresso técnico-
científico a que todos estamos sujeitos. Portanto, não se pode imaginar que a
prática ecoturística não interfira no ambiente em que se desenvolver.
80
Diversos debates existem acerca do que vem a ser um ambiente natural.
Neste sentido, não se acredita que exista um ambiente natural intocado pelo
homem, especialmente porque nos dias atuais discute-se, por exemplo, a
responsabilidade das mudanças climáticas que vêm ocorrendo em todo o planeta.
Se comprovada a interferência humana neste caso, como pode-se dizer que existe,
no globo terrestre, algum local intocado, já que as mudanças climáticas são
capazes de afetar a tudo e a todos? Sendo assim, prefere-se considerar que o
ecoturismo é uma atividade ligada basicamente a um ambiente em que se tenha
contato com animais, plantas, cursos d’água e tudo que venha a se relacionar à
natureza, mesmo que possua alguma interferência humana evidente, porém
reduzida.
Observa-se que, pelo fato do ecoturismo estar sempre relacionado ao
ambiente natural, como uma forma de usufruí-lo sem degradá-lo, muitas empresas
promotoras de viagens usam o termo ecoturismo para atrair seus clientes e, no
entanto, promovem atividades que degradam a natureza, sem se preocuparem com
os riscos ambientais que possam vir a causar. Há, portanto, uma preocupação
econômica que suplanta a preocupação ambiental.
Todavia, não parece plausível descartar a atividade de ecoturismo enquanto
um meio de contribuir para o desenvolvimento local e para a preservação
ambiental. Caberiam, contudo, algumas mudanças e delimitações em certas
conceituações e práticas, que permitam um melhor direcionamento e controle desta
atividade.
A idéia de participação no processo de formulação e elaboração de uma
política local de turismo/ecoturismo deveria partir de proposições e do engajamento
dos grupos sociais atingidos e/ou envolvidos e não de “cima para baixo”, como
usualmente é feito. Neste sentido, o Conselho Municipal de Turismo poderia
converter-se em um fórum dos trabalhadores e de empresas envolvidas no
desenvolvimento do turismo em uma dada localidade. Pois, como já afirmado antes,
a população só toma como seu patrimônio aquilo em que tiver participação ativa,
direta. Portanto, a participação social no processo de instalação e desenvolvimento
da atividade ecoturística é imprescindível.
Neste sentido, parece que Acselrad e Leroy (1999, p. 47) apontam a direção
a ser seguida ao chamar a atenção para o fato de que, “frente à concentração de
81
poder sobre os recursos naturais e o meio ambiente”, deve-se construir “um
caminho que considere a diversidade”, de modo a permitir a afirmação “de
diferentes formas culturais de relação com a natureza, diferentes estratégias e
propostas para o futuro”.
Seguindo essa linha de raciocínio, tem-se que à medida que se define um
território como espaço de realização da sociedade, de acordo com a identificação
de suas potencialidades, com o reconhecimento das habilidades e experiência
histórica que acumularam, os sujeitos sociais acabam se firmando enquanto
cidadãos.
Neste contexto, parece que apenas uma luta democrática, onde todos sejam
agentes com possibilidade de influência, onde o meio ambiente apareça primeiro
como um bem público, subordinando sua exploração e a dos recursos naturais às
necessidades básicas da população, ou seja, apenas uma luta por justiça social
pode apontar para um “Brasil Sustentável e Democrático” (ACSELRAD & LEROY,
1999, p. 51).
Bonduki (1996, p. 29), por sua vez, chama a atenção para o fato de que na
área urbanizada do Brasil, há uma população cuja realidade sócio-ambiental está
marcada pela exclusão, pela falta de informação, de educação sanitária e
ambiental. Esse quadro ambiental de degradação, decorrente da urbanização
acelerada, das atividades econômicas desenvolvidas no espaço, dos processos de
conurbação e da tecnologia utilizada pelas indústrias, advém de um
desenvolvimento pautado no uso predatório dos recursos naturais. Parece, enfim,
que a prática do ecoturismo não pode estar descolada nem das questões relativas
à justiça ambiental, como visto no Capítulo 3, nem das questões relativas à justiça
social.
82
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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86
7. ANEXOS
ANEXO I – Principais Modalidades e Destinos Turísticos – EMBRATUR
(2002)
Principais modalidades
-Ar
Pára-quedismo, Sky-surf, Base jump, Asa-delta, Parapente - infla e decola, Balonismo,
Ultraleve
-Terra
Espeleologia - exploração de cavernas, Excursionismo, caminhadas, trekking e hikking,
Rallies - classe turismo, Bung jump, Rope swing - pêndulo c/ corda, Cavalgada, Orientação -
caminhada, corrida, Canionismo - rapel, tirolesa, Montanhismo - escalada, caminhada,
Ciclismo, Montain bike – cicloturismo, Off-road - fora-de-estrada, Arborismo, Motocross,
Sand board - prancha na areia.
-Água
Caiaque, Surfe, Mergulho, Vela, Acqua-rider, Bóia-cross, Rafting, Outrigger - canoa
havaiana, Canoa, Windsurf, Morey-bug - body boarding.
Destinos Turísticos
-Sul
Parque Estadual Morumbi, Pau Oco, Gracioso, toda a AEIT
Campos Gerais-PR
Costa Oeste do Paraná
Represa Ribeirão Claro-PR
Guaraqueçaba, Ilha do Mel, Antonina, litoral-PR
Bombinhas-SC
Florianópolis-SC
Serra Gaúcha
Campanha Gaúcha
-Centro-Oeste
87
Buraco das Araras-GO
Pirinópolis-GO
Itiquira-GO
Bonito-MS
Jalapão
-Nordeste
Natal-RN
Xingó
Lençóis-BA
Ilhéus
Morro de São Paulo
Delta do Parnaíba-PI
-Norte
Manaus
Barcelos
Transamazônica
Serra do Navio
-Sudeste
Parati-RJ
Ilha Grande Ouro Preto
Carmo do Rio Claro
Araxá
Estrada Real
Serra do Espinhaço
Terras Altas da Mantiqueira
Diamantina
RPPN Caraça
Circuito das Águas-MG
Ibitipoca
Serra do Lenheiro-MG - São José/Carrancas
Brotas-SP
Juréia (Peruíbe)-SP
Bertioga-SP
Ubatuba-SP
Faixa litorânea - Juréia, Superágua
Ilha Bela-SP
São Sebastião-SP
Santos-SP
Vale do Contestado
Parque Estadual da Serra do Mar-SP
Parque Estadual da Serra da Cantareira-SP
Parque Estadual Ilha do Cardoso-SP
Parque Estadual Intervales/Petar-SP
Cabo Frio-RJ
Angra dos Reis-RJ
88
ANEXO II – Declaração de Ecoturismo de Quebec
24
Como parte do Ano Internacional do Ecoturismo, declarado pelas Nações Unidas, e sob a
égide do Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas e da Organização Mundial do
Turismo (WTO), mais de mil integrantes dos setores público e privado e de organizações
não-governamentais provenientes de mais de 132 países participaram da Cúpula de
Especialistas em Ecoturismo em Quebec, no Canadá. O evento aconteceu de 19 a 22 de
maio de 2002 e teve como organizadores a Tourisme Quebéc e a Comissão Canadense de
Turismo.
A série de 18 reuniões preparatórias realizadas em 2001 e 2002, que culminou com este
encontro em Quebec, teve a participação de 3 mil representantes de governos nacionais e
locais (incluindo técnicos de turismo e de meio ambiente), de agências de turismo, de
organizações não-governamentais, de empresas de consultoria, de universidades e de
comunidades locais e indígenas.
Este documento considera o processo preparatório, assim como as discussões realizadas
durante a Cúpula. Embora seja o resultado de uma discussão de múltiplas partes
interessadas, este não é um relatório oficial. A sua principal utilidade é registrar uma agenda
preliminar e estabelecer uma série de recomendações para o crescimento das atividades de
ecoturismo implementadas sob o contexto do desenvolvimento sustentável.
Para os propósitos deste ano internacional e conscientes da variedade de interpretações
conferidas ao termo “ecoturismo” ao redor do mundo, as organizações comissionadas pelas
Nações Unidas para levar adiante as atividades internacionais durante este ano
concordaram que:
Ecoturismo inclui todas as formas de turismo com base na natureza em que a motivação
principal dos turistas seja a observação ou apreciação da natureza, bem como das culturas
tradicionais que prevalecem em áreas naturais. Ele inclui uma experiência de
interpretação/aprendizado.Ele é geralmente, porém não exclusivamente, organizado para
viajantes independentes e grupos pequenos, por empresas especializadas e pequenas, de
propriedade local. Operadores estrangeiros de tamanhos variados também organizam,
operam e/ou comercializam passeios ecoturísticos, geralmente para pequenos grupos.
Ele minimiza impactos negativos sobre o ambiente natural e sócio-cultural.
Ele auxilia na proteção de áreas naturais por gerar benefícios econômicos para as
comunidades anfitriãs, organizações e autoridades locais, controlando áreas naturais com
propósitos de conservação, promovendo oportunidades alternativas de emprego e renda
para comunidades locais, aumentando a consciência acerca dos recursos naturais e
culturais entre habitantes locais e turistas.A Conferência de Desenvolvimento Sustentável
Rio+10 acontece em Johanesburgo, África do Sul, em agosto/setembro, como o espaço de
discussão e de estabelecimento de políticas internacionais para o setor para os próximos 10
anos. Enfatizou-se que o turismo deve ser mundialmente visto como prioridade por sua
potencial contribuição para a erradicação da pobreza e conservação dos ecossistemas
ameaçados. Assim, os integrantes da Cúpula solicitam que as Nações Unidas, suas
organizações e os representantes dos governos, que estiveram em Quebec, disseminem
esta Declaração e os demais resultados deste evento durante a Rio+10.
Os participantes, cientes da limitação deste processo consultivo para incorporar sugestões e
contribuições de uma grande variedade de interessados, particularmente de organizações
não-governamentais e de comunidades indígenas e locais:
24
Documento revisto e aprovado pelo Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas e pela
Organização Mundial do Turismo em 10/06/2002 e traduzido pelo Programa de Turismo e Meio
Ambiente do WWF-Brasil. Disponível em: <Hhttp://www.superagui.net/cartaquebec2002.docH>.
Acesso em: Ago. 2002.
89
reconhecem que o ecoturismo compreende em si os princípios do turismo sustentável
considerando seus impactos econômico, social e ambiental. Ele também traz consigo os
seguintes pontos:
contribui para a conservação das heranças naturais e culturais em seu
planejamento, desenvolvimento e operações, inclui as comunidades locais e
indígenas e contribui para seu bem-estar;
interpreta as heranças naturais e culturais para seus visitantes;
funciona de forma ideal para indivíduos e pequenos grupos organizados;
reconhecem que o turismo tem significantes e complexas implicações sociais,
econômicas e ambientais que podem trazer benefícios e custos para o meio ambiente e
para as comunidades;
levam em consideração o crescente interesse das pessoas em visitar áreas naturais;
reconhecem que o ecoturismo tem tido papel primordial na introdução de práticas
sustentáveis ao setor do turismo;
enfatizam que o ecoturismo deve contribuir para que a indústria do turismo seja mais
sustentável, elevando os benefícios econômicos para as comunidades anfitriãs,
contribuindo ativamente para a conservação dos recursos naturais e integridade cultural
das comunidades e conscientizando os turistas a respeito da importância das heranças
naturais e humanas;
reconhecem a diversidade cultural associada às áreas naturais, especialmente por
causa da presença histórica das comunidades locais responsável pela manutenção dos
conhecimentos tradicionais, usos e práticas sustentáveis trazidas ao longo dos séculos;
reiteram que os fundos mundiais para a conservação e manutenção de áreas ricas
culturalmente e em biodiversidade têm sido inadequados;
reconhecem que o turismo sustentável pode ser uma importante fonte de receita para
as áreas protegidas;
enfatizam que muitas destas áreas são habitadas por populações rurais pobres que,
com freqüência, carecem de sistemas de saúde, educação, comunicação e de outras
infra-estruturas necessárias para um desenvolvimento adequado;
afirmam que diferentes formas de turismo, especialmente o ecoturismo, são valiosas
oportunidades econômicas para as populações locais e, se realizadas de forma
sustentável, podem contribuir de forma intensa para a conservação;
reforçam que, quando mal planejada e desenvolvida, a atividade do turismo em áreas
naturais e rurais contribui para o aumento da pobreza, deterioração das paisagens,
erosão das culturas tradicionais, redução da qualidade e quantidade de água e constitui
uma ameaça para a vida selvagem e biodiversidade;
lembram que o ecoturismo deve reconhecer e respeitar os direitos à terra dos indígenas
e das comunidades locais, incluindo suas áreas protegidas e sagradas;
afirmam que, para a obtenção de reais benefícios sociais, econômicos e ambientais e
para a prevenção de impactos negativos, é necessário que o ecoturismo e demais
atividades turísticas tenham mecanismos participativos de planejamento permitindo que
as populações locais e indígenas definam o uso de suas áreas e optem, se julgarem
necessário, pela não adoção da prática;
reconhecem a necessidade de se combater preconceitos de raça, sexo ou outras
circunstâncias pessoais entre as pessoas com respeito ao seu envolvimento com o
turismo como consumidoras ou fornecedoras/prestadoras de serviços;
atribuem aos visitantes a responsabilidade de promover a sustentabilidade do destino e
do meio ambiente em geral por meio da escolha de seus passeios e atividades e por
90
meio de seus comportamentos;
Com base nestas informações, os participantes da Cúpula de Quebec produziram uma série
de recomendações para governos, setor privado, organizações não-governamentais,
associações de base comunitária, instituições de ensino e pesquisa, agências financiadoras
e de auxílio ao desenvolvimento e comunidades indígenas e locais, presentes abaixo.
A. Aos governos nacionais, regionais e locais
1. formular políticas e estratégias de desenvolvimento nacional, regional e local que sejam
compatíveis com os objetivos do desenvolvimento sustentável. É importante que isto seja
conduzido por meio de um amplo processo de consulta àqueles que se envolverão ou que
serão afetados pelas atividades de ecoturismo. Se possível, deve-se ampliar os princípios
do ecoturismo às demais atividades do setor de turismo;
2. em conjunto com as comunidades locais, setor privado, ONGs e todas as partes
interessadas, garantir a proteção da natureza, das culturas locais e especialmente do
conhecimento tradicional, dos recursos genéticos, direito à terra e à água;
3. garantir o envolvimento e a participação apropriada de cada instituição pública em nível
local, regional e nacional, incluindo o estabelecimento de grupos de trabalho inter-
ministeriais, quando necessário. Além disso, são necessários orçamentos adequados e
legislações apropriadas que permitam a implementação dos objetivos e metas
estabelecidos pelas partes interessadas;4. incluir, em níveis nacional, local e regional, em
seu plano de ação, mecanismos regulatórios e de monitoramento, além de indicadores de
sustentabilidade aceitos pelas partes interessadas e estudos de impacto ambiental para
prevenir ou minimizar a ocorrência de impactos negativos nas comunidades ou no meio
ambiente. Os resultados dos monitoramentos devem estar à disposição do público, já que
estas informações permitirão que os turistas escolham operadores que adotam princípios do
ecoturismo;
5. desenvolver mecanismos de avaliação dos custos ambientais em todos os aspectos do
produto de turismo, incluindo o transporte internacional;
6. desenvolver a capacidade de implementação de mecanismos de gestão do crescimento,
como zoneamento, e de uso participatório do solo tanto em áreas protegidas como em seus
entornos e em outras zonas de desenvolvimento do ecoturismo;
7. utilizar manuais de utilidade e eficiência consagradas para servir de base para processos
de certificação, adoção de selos verdes e outras iniciativas voluntárias promovidas em nome
da sustentabilidade do ecoturismo. É necessário encorajar os operadores a se unir a tais
iniciativas e promover o seu reconhecimento por parte dos consumidores. Os sistemas de
certificação da atividade, no entanto, devem sempre seguir critérios regionais, promover
capacitações e fornecer apoio financeiro de forma a se tornarem acessíveis também aos
pequenos e médios operadores. Uma série de critérios e métodos é necessária para que
estes esquemas atinjam seu objetivo;
8. garantir o acesso ao desenvolvimento dos recursos técnicos, financeiros e humanos para
micro, pequenas e médias operadoras, que são a base do ecoturismo, de forma a lhes
garantir o estabelecimento, crescimento e desenvolvimento de uma maneira sustentável;
9. definir políticas apropriadas, planos de manejo e programas interpretativos para
visitantes. Estabelecer mecanismos de identificação de fundos adequados para a gestão de
áreas protegidas com acelerado crescimento de visitantes e proteção de ecossistemas
vulneráveis. Estes planos devem incluir normas claras, estratégias de manejo direto e
indireto e regras para uso de recursos de forma a garantir o monitoramento dos impactos
sociais e ambientais para todos os empreendimentos de ecoturismo na área;
10. incluir as micro, pequenas e médias operadoras de ecoturismo, assim como aquelas de
base comunitária, na estratégia promocional e programas desenvolvidos pelas empresas
nacionais de turismo, tanto no mercado nacional como internacional;
91
11. desenvolver redes regionais para a promoção e marketing de produtos de ecoturismo
em nível nacional e internacional;
12. criar incentivos para que os operadores de turismo tornem suas atividades mais
ambiental, social e culturalmente responsáveis;
13. garantir que alguns princípios ambientais e sanitários básicos sejam definidos e
adotados para todos os empreendimentos de ecoturismo, mesmo para aqueles conduzidos
em parques nacionais e áreas rurais. Isto deve incluir aspectos como a escolha de locais,
planejamento, tratamento de lixo, proteção de córregos e riachos, entre outras coisas. Deve-
se garantir ainda que as estratégias de desenvolvimento do ecoturismo sejam conduzidas
sob uma forma que preveja investimentos em infra-estrutura sustentável e em capacitação
das comunidades para que elas monitorem estes aspectos;
14. investir ou dar apoio a instituições que investem em programas de pesquisa em
ecoturismo e turismo sustentável. Instituir estudos e pesquisas que levantem dados sobre
fauna e flora, com atenção especial para espécies ameaçadas, como parte de um programa
de levantamento de impactos para as atividades de ecoturismo;
15. apoiar o desenvolvimento de princípios internacionais, manuais e códigos de ética para
o turismo sustentável fortalecendo as políticas nacionais e internacionais que utilizam o
conceito de desenvolvimento sustentável na atividade;
16. considerar como uma opção o remanejamento de áreas públicas de produção intensiva
para a atividade do turismo combinada à conservação, quando esta mudança puder trazer
benefícios sociais, econômicos e ambientais para as comunidades em questão;
17. promover e desenvolver programas educacionais para crianças e adolescentes para
aumentar a consciência a respeito da importância da conservação da natureza e do uso
sustentável, das culturas locais e indígenas e da sua relação com o ecoturismo;
18. promover a colaboração entre operadores de turismo, demais prestadores de serviços e
ONGs para permitir a educação de turistas e influenciar seu comportamento nos destinos,
especialmente em países em desenvolvimento;
18. incorporar os princípios de transporte sustentável no planejamento e implementação do
turismo e promover locomoções de baixo impacto sempre que possível;
B. Ao Setor Privado
19. planejar, desenvolver e conduzir seus empreendimentos minimizando impactos e
contribuindo para a conservação de ecossistemas sensíveis, do meio ambiente em geral, e
levando benefícios às comunidades indígenas e locais;
20. ter em mente que, para ser sustentável, um empreendimento de ecoturismo precisa ser
rentável às partes envolvidas, incluindo proprietários, investidores, gerentes e empregados,
assim como às comunidades e às organizações de conservação presentes na área onde a
atividade é desenvolvida;
21. garantir que a utilização de materiais, planejamento e operações incorporem os
princípios da sustentabilidade, como conservação da água, energia e materiais;
22. adotar formas confiáveis de regulação voluntária, como selos verdes, de forma a
demonstrar aos seus potenciais clientes o seu real compromisso com os princípios da
sustentabilidade;
23. cooperar com organizações governamentais e não-governamentais que trabalham com
conservação de áreas protegidas e de biodiversidade, assegurando que suas práticas de
ecoturismo sejam realizadas de acordo com planos de gestão e outras regulações para
estas regiões. Desta forma, fica evidente que se preocupam em minimizar quaisquer
impactos negativos garantindo a qualidade das experiências de turismo e contribuindo
financeiramente para a conservação dos recursos naturais;
24. aumentar o uso de materiais, produtos, logística e recursos humanos locais em suas
92
operações, de forma a manter a autenticidade da atividade de ecoturismo e ampliar os
benefícios financeiros ao destino. Para que isso seja possível, é necessário também que se
invista no treinamento e na capacitação da mão-de-obra local;
25. trabalhar ativamente com lideranças indígenas para garantir que suas comunidades e
culturas sejam tratadas com respeito e que seu quadro de funcionários e clientes seja bem
informado a respeito das áreas indígenas, de seus costumes e história;
26. garantir que a cadeia de produtos e serviços que compõem a operação de ecoturismo
seja sustentável e compatível com o nível de sustentabilidade exigido ou esperado pelo
consumidor;
27. trabalhar ativamente com lideranças indígenas e com comunidades locais para garantir
que elas sejam tratadas com respeito e que os turistas tenham informações a respeito
delas;
28. promover entre seus clientes, os turistas, uma forma consciente de comportamento,
dando-lhes a oportunidade de participar de experiências de educação ambiental e de
conviver com pessoas de outras culturas. Além disso, contribuições voluntárias às
comunidades locais e às atividades de conservação realizadas na região devem ser
encorajadas;
29. gerar um nível de consciência entre funcionários por meio de aulas de educação
ambiental e dar suporte ao trabalho que eles e suas famílias realizam em nome da
conservação, de desenvolvimento econômico da comunidade e na redução da pobreza;
30. diversificar suas ofertas, desenvolvendo um leque de atividades turísticas e estendendo
suas visitas a locais diversos, de forma a disseminar o potencial de ecoturismo destas
regiões e evitar que um determinado local seja superexplorado e sua sustentabilidade
colocada em perigo. Para tanto, as operadoras devem respeitar e contribuir para o
estabelecimento de limites de visitas de cada local;
31. criar e desenvolver mecanismos de arrecadação de fundos para a manutenção de
associações e cooperativas que podem fornecer treinamento e divulgação e desenvolver
produtos e pesquisas;
32. formular e implementar políticas para sustentabilidade com uma visão para aplicá-las
em cada parte da operação do turismo;
C. Às organizações não-governamentais, associações de base comunitária e
instituições de ensino e pesquisa
33. fornecer apoio técnico, financeiro, educacional, capacitação e demais suportes aos
destinos de ecoturismo, às suas organizações comunitárias, pequenos negócios e
autoridades locais de forma a garantir a aplicação de políticas apropriadas, o
desenvolvimento de planos de gestão e os mecanismos de monitoramento compatíveis com
a sustentabilidade;
34. monitorar e conduzir estudos do impacto das atividades de ecoturismo nos
ecossistemas, na biodiversidade e nas culturas indígenas locais;
35. cooperar com as organizações públicas e privadas garantindo que os dados e
informações gerados com os estudos sejam utilizados na tomada de decisões durante o
processo de desenvolvimento e gestão do ecoturismo;
36. cooperar com as instituições de pesquisa de forma a se encontrar as soluções mais
práticas e adequadas para as questões relacionadas ao desenvolvimento do ecoturismo;
D. Às instituições internacionais de financiamento e agências de assistência ao
desenvolvimento
39. planejar e acompanhar a implementação de políticas nacionais e locais de
93
desenvolvimento do ecoturismo e a avaliação de sua relação com a conservação,
desenvolvimento socioeconômico, direitos humanos, redução da pobreza e outras questões
ligadas ao desenvolvimento sustentável, além de intensificar a transferência destes
conhecimentos para outros países. Uma atenção especial deve ser dada aos países em
desenvolvimento e às ilhas e aos países montanhosos, já que 2002 foi estabelecido como o
“Ano Internacional das Montanhas” pelas Nações Unidas;
40. promover capacitações em organizações locais, regionais e nacionais para a formulação
e aplicação de políticas e planos de ecoturismo baseados em padrões internacionais
consagrados;
41. desenvolver padrões mundiais e mecanismos para sistemas de certificação do
ecoturismo que considerem empreendimentos de pequeno e médio portes e a eles facilite o
seu acesso;
42. incorporar o diálogo entre as diversas partes interessadas nas políticas, manuais e
projetos em níveis global, regional e nacional para a troca de experiências entre os países e
setores envolvidos no ecoturismo;
43. fortalecer seus esforços em identificar os fatores que determinam o sucesso e fracasso
das atividades de ecoturismo ao redor do mundo, de forma a transferir estas experiências e
melhores práticas para outras nações por meio de publicações, missões de campo,
seminários e projetos de assistência técnica. O Programa de Meio Ambiente das Nações
Unidas (UNEP) e a Organização Mundial do Turismo (WTO) devem continuar este diálogo,
promovendo, por exemplo, avaliações periódicas do ecoturismo em encontros internacionais
e regionais;
44. adaptar, sempre que necessário, suas formas de financiamento e empréstimo às micro,
pequenas e médias operadoras de ecoturismo, que são a base da atividade, de forma a
garantir sua sustentabilidade econômica a longo prazo;
45. desenvolver a capacidade dos recursos humanos internos para lidar com o turismo
sustentável e com o ecoturismo como uma atividade de desenvolvimento em si só e garantir
que o conhecimento interno, a pesquisa e a documentação permitam que o ecoturismo seja
visto como uma ferramenta de desenvolvimento sustentável;
46. desenvolver mecanismos financeiros para o treinamento e capacitação das
comunidades indígenas e locais, permitindo que elas participem do desenvolvimento do
ecoturismo;
E. Às comunidades locais e indígenas
Além das referências à comunidades locais e indígenas, feitas nos parágrafos anteriores
desta Declaração, os participantes fizeram estas recomendações a estes grupos:
47. como parte de uma visão de desenvolvimento para a comunidade, definir e implementar
estratégias para um aumento de benefícios para a localidade, incluindo o acesso à
informação, o desenvolvimento humano, físico, financeiro e social, que venham com o
crescimento da prática do ecoturismo;
48. fortalecer, estimular e encorajar a habilidade da comunidade em manter e utilizar
conhecimentos tradicionais que sejam relevantes para a atividade do ecoturismo, como o
artesanato, a agricultura, o folclore, a culinária e demais atividades que utilizam os recursos
locais de forma sustentável;
F. À Conferência de Desenvolvimento Sustentável Rio+10
49. reconhecer a necessidade de se aplicar os princípios de desenvolvimento sustentável
ao turismo e o importante papel do ecoturismo na geração de benefícios econômicos,
sociais e ambientais;
50. integrar o turismo, incluindo o ecoturismo, nos resultados do evento.
Quebec, 22 de maio de 2002.
94
ANEXO III – Carta do Turismo Sustentável do ICOMOS de 1997
25
A Carta de Turismo Sustentável do ICOMOS estabelece as diretrizes para a
promoção da atividade ecoturística, que são:
1. Devemos usar os recursos de forma sustentável. A conservação e o uso
sustentável dos recursos – natural, social e cultural – é crucial e propícia a negócios a longo
prazo.
2. Reduzir o excesso de consumo e gasto: isto evitaria os custos, a longo prazo, de
restauração do meio ambiente danificado e contribuiria para a melhora da qualidade do
turismo.
3. Manter e promover a diversidade natural, social e cultural é essencial para o
turismo sustentável de longo prazo.
4. Integrar o turismo ao planejamento: o desenvolvimento do turismo dever ser
integrado ao planejamento nacional e local, estrategicamente e sem causar impacto
ambiental, o que torna viável a longo prazo o turismo.
5. Sustentar o desenvolvimento de economias locais: o turismo comporta um vasto
percentual de atividades econômicas locais e leva em consideração custos ambientais e
valores que protegem aquelas economias e evita danos ambientais.
6. Envolver as comunidades locais no processo de turistificação: o pleno
envolvimento de comunidades locais no setor do turismo não apenas as beneficia mas
beneficia também ao ambiente em geral e aprimora a qualidade da experiência do turismo.
7. Consultar constantemente os investidores e o público: as consultas tanto à
indústria do turismo quanto às comunidades locais, organizações e instituições são
essenciais para um trabalho de equipe e para resolver possíveis conflitos potenciais de
interesse.
8. Treinar a equipe de trabalho: a equipe de treinamento que integra o turismo
sustentável deve recrutar empregados de todos os níveis com diferentes práticas de
trabalho, para que haja a melhora da qualidade do produto do turismo.
9. Promover o marketing turístico responsável: o marketing que provê os turistas de
informação completa e responsável, aumenta o respeito pelos lugares de destinação
(ambientes natural, social e cultural) e pela satisfação do freguês.
10. Promover pesquisas na área: a pesquisa contínua deste setor e o seu
monitoramento usando uma coleção e análise de dados (registros) são essências para
auxiliar na solução de problemas e trazer benefícios aos lugares onde estão presentes, à
indústria turística e aos turistas.
25
Extraída de MARTINS (2001, p. 19-20).
95
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