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dando alta prioridade aos vários sectores sociais. (Discurso do Presidente de
Angola na CMA, Roma, 1996)
Contudo, essa paz duradoura não chegou e Angola continuou submersa num
conflito que se agravava a cada dia, adiando assim a esperança para milhões de
angolanos, razão pela qual a segurança alimentar só apareceria na agenda depois da
chegada da paz. Naturalmente podemos questionar a profundidade da afirmação, dado
que este tipo de reuniões coaduna-se, na maior parte dos casos, com a leitura de
discursos circunstanciais de aprovação e consentimento com as decisões tomadas. No
entanto, se levarmos em linha de conta o elevado peso político do presidente angolano,
tanto no plano nacional como regional africano, tal manifestação não pode ser
considerada de todo irrelevante enquanto pontuação da agenda angolana. Além disso, a
CMA de 1996 constituiu um marco político muito importante na agenda internacional
da segurança alimentar, pois pela primeira vez foi assumida pelos governos uma meta
quantitativa em termos de redução da fome no mundo. A importância da CMA de 1996
como marco político internacional impõe que façamos um breve comentário a respeito.
Nessa reunião os representantes de 185 países mais a Comunidade Européia
assumiram “o objectivo imediato de reduzir o número de pessoas desnutridas pela
metade dos seus níveis actuais [1990-92] o mais tardar até ao ano 2015”. Além disso, os
governos comprometeram-se a seguir um conjunto de recomendações que constaram da
conhecida “Declaração de Roma” e do seu correspondente “Plano de Acção”, assinados
no final da reunião
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. No entanto, tais recomendações foram objeto de algumas críticas
subseqüentes, particularmente pela sociedade civil, que as considerou demasiado
ambíguas, o que tornaria difícil o acompanhamento da sua execução. Porém, duas
excepções a essa ambiguidade devem ser sublinhadas do ponto de vista do
comprometimento político subjacente a esta conferência: por um lado, o objectivo da
redução pela metade do numero de pessoas subnutridas referido anteriormente vinculou
os países a uma meta quantitativamente mensurável; por outro, o comprometimento
com a formulação de políticas de segurança alimentar (detalhada nos compromissos 2 e
3), responsabiliza os governos com a definição de instrumentos próprios, tais sejam
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Sete compromissos constam do Plano de Acção, cada um deles acompanhado de objetivos e ações a
pôr em prática: 1) Garantiremos um ambiente político, social e econômico propício, destinado a criar as
melhores condições para erradicar a pobreza e para uma paz duradoura, baseada numa plena e igualitária
participação de homens e mulheres, que favoreça ao máximo a realização de uma segurança alimentar ao
alcance de todos; 2) Implementaremos políticas que tenham como objetivo erradicar a pobreza e a
desigualdade, melhorar o acesso físico e econômico de todos, e a todo momento, a alimentos suficientes,
nutricionalmente adequados e seguros, assim como à sua utilização eficiente; 3) Prosseguiremos políticas
e práticas participativas e sustentáveis de desenvolvimento alimentar, agrícola, de pesca, florestal e rural,
em zonas de alto e baixo potencial produtivo, as quais são fundamentais para assegurar uma adequada e
segura provisão de alimentos a nível familiar, nacional, regional e global, assim como para combater as
pragas, a seca e a desertificação, considerando o caráter multifuncional da agricultura; 4) Esforçar-nos-
emos em assegurar que os alimentos e as políticas comerciais agrárias e comerciais em geral contribuam a
fomentar uma segurança alimentar para todos, através de um sistema comercial mundial justo e orientado
ao mercado; 5) Empenhar-nos-emos a prevenir e a estar preparados a enfrentar as catástrofes naturais e
emergências de origem humana, bem como a fazer face ás necessidades provisórias e urgentes de
alimentos de maneira a que encorajem a recuperação, reabilitação, desenvolvimento e capacidade de
satisfazer as necessidades futuras; 6) Promoveremos a distribuição e a utilização de investimentos
públicos e privados para fazer progredir os recursos humanos, os sistemas alimentares, agrícolas,
piscícolas e florestais duradouros e o desenvolvimento rural em áreas de alto e baixo potencial; 7)
Executaremos, monitoraremos e daremos prosseguimento a este plano de ação, a todos os níveis, em
cooperação com a comunidade internacional (PLANO DE ACÇÃO…, 1996).