Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: MESTRADO
Área de Concentração: Aprendizagem e Ação Docente
PRODUÇÃO DE HISTÓRIAS EM QUADRINHOS EM AMBIENTES
INFORMATIZADOS COM ALUNOS EM PROCESSO DE
ALFABETIZAÇÃO
MARIA ANTONIA LAMBERTI
MARINGÁ
2008
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: MESTRADO
Área de Concentração: Aprendizagem e Ação Docente
PRODUÇÃO DE HISTÓRIAS EM QUADRINHOS EM AMBIENTES
INFORMATIZADOS COM ALUNOS EM PROCESSO DE
ALFABETIZAÇÃO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós Graduação em Educação, da Universidade
Estadual de Maringá, para obtenção do título de Mestre em Educação. Área de
concentração: Aprendizagem e Ação Docente. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Teresa Kazuko
Teruya.
MARINGÁ
2008
2
ads:
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
(Biblioteca Central - UEM, Maringá – PR., Brasil)
Lamberti, Maria Antonia
L223p Produção de histórias em quadrinhos em ambientes
informatizados com alunos em processo de
alfabetização / Maria Antonia Lamberti. -- Maringá :
[s.n.], 2008.
146 f. : il. color.
Orientadora : Profª. Drª. Teresa Kazuko Teruya.
Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de
Maringá. Programa de Pós-graduação em Educação, 2008.
1. Produção de textos. 2. Alfabetização. 3.
Histórias em quadrinhos - Computador. 4. Professores
- Formação. 5. Mediação docente. 6. Crianças -
Produção de textos. I. Universidade Estadual de
Maringá. Programa de Pós-graduação em Educação. II.
Título.
CDD 21.ed. 372.62
3
MARIA ANTONIA LAMBERTI
PRODUÇÃO DE HISTÓRIAS EM QUADRINHOS EM AMBIENTES
INFORMATIZADOS COM ALUNOS EM PROCESSO DE
ALFABETIZAÇÃO
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________
Profa. Dra. Teresa Kasuko Teruya (Orientadora) – UEM – Maringá
____________________________________________
Profa. Dra. Marieta Nicolau - USP – São Paulo
_____________________________________________
Profa. Dra. Nerli Nonato Ribeiro Mori – UEM – Maringá
UEM
Maringá, março de 2008.
4
Dedico este trabalho
Aos meus filhos Matheus, Mariela e Lucas, companheiros de todas as horas, que souberam
entender minhas ausências e minhas reclusões para que esse trabalho progredisse, minha
força nesta e em todas as caminhadas, pelas palavras de encorajamento; por sempre
acreditarem em mim e para que saibam que foi por eles que cheguei até aqui.
5
Agradecimentos
Agradeço em primeiro lugar a Deus por todos os dias vividos, por tudo que sou graças à
Sua bondade.
Aos meus filhos, pelo amor que sempre me dedicaram, pelo apoio em todas as horas,
pelos sorrisos infantis, pelos choros nas quedas, pela fala adolescente, pelo crescer a
meu lado e pelo apoio que recebi até nos silêncios.
Aos meus pais que, pelo exemplo e retidão, me mostraram os verdadeiros valores da
vida.
Às minhas irmãs e sobrinhos por todo carinho e dedicação.
À professora Dra. Anair Altoé, que primeiro me incentivou e vibrou comigo.
À Direção e equipe pedagógica do Colégio Santo Inácio, minha segunda casa, que
proporcionou a realização deste. Em particular, à Giovana, pela ajuda substancial.
Aos meus queridos alunos que me fazem crescer e aprender sempre mais.
Aos meus amigos que, mais do que nunca, me levantaram e caminharam comigo.
À Maria Sebastiana Lamberti Ziober e Sara Cristina Barreto Maia pelos comentários
valiosos na correção ortográfica.
À professora Dra. Teresa K. Teruya, pela amizade e carinho. Pela orientação firme,
segura e, principalmente, por nunca ter desistido de mim.
À banca de qualificação, Prof. Dra. Nerli Nonato Ribeiro Mori, Prof. Dra. Regina Lúcia
Mesti e Prof. Dra. Marieta Nicolau, que contribuíram com seus questionamentos e
sugestões para a construção/desconstrução da dissertação.
6
Agradeço a todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização e
finalização de mais essa etapa. Aos que se fizeram presença, em forma de incentivo e
apoio. Aos que me fizeram crescer e superar barreiras, e aos que estiveram sempre junto
comigo, mesmo estando distantes.
7
“O maior desafio é a busca, e, para começar, a grande força é a vontade. Não basta viver, é
preciso ousar!”
(Maria Augusta Cristo de Gouvêa)
8
LAMBERTI, Maria Antonia. PRODUÇÃO DE HISTÓRIAS EM QUADRINHOS EM
AMBIENTES INFORMATIZADOS COM ALUNOS EM PROCESSO DE
ALFABETIZAÇÃO. 146 f. Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade
Estadual de Maringá. Orientadora: Teresa Kasuko Teruya. Maringá, 2008.
Resumo
Esta dissertação trata da produção de textos com crianças no processo inicial de
alfabetização. Tem o objetivo de analisar as histórias produzidas pelos escolares entre 6
e 7 anos em ambiente informatizado, a fim de verificar se um software de histórias em
quadrinhos pode contribuir para ampliar o vocabulário na produção textual durante a
alfabetização. No ambiente escolar, constatei que os textos dos alunos são escritos com
frases curtas e predomina o verbo ser na maioria das construções frasais. O problema
dessa pesquisa se expressa em duas questões: 1) Como um software de Histórias em
Quadrinhos pode ser utilizado na produção de texto de forma a ampliar o vocabulário e
facilitar a transposição do pensamento para a escrita? 2) O que a criação de Histórias em
Quadrinhos indica ou revela na escrita das crianças? Para responder essas questões,
realizei um estudo de caso com alunos em fase de alfabetização em um ambiente
informatizado. Optei por uma abordagem histórica sobre os métodos e teorias da
alfabetização no Brasil analisando as transformações ocorridas no final dos anos 80 do
século XX, que modificaram as concepções de ensino e de aprendizagem na educação
escolar e sobre as Histórias em Quadrinhos. Para analisar a aquisição da linguagem
escrita nas histórias produzidas no computador, recorri aos pesquisadores da lingüística
e das Histórias em quadrinhos. Os dados obtidos indicam que a mediação docente nessa
fase da vida escolar é fundamental para elevar o nível de letramento e a produção de
textos. A criação das Histórias em Quadrinhos proporcionou aumento de vocabulário
dos alunos nas frases explicativas sobre os detalhes da narrativa de seus quadrinhos.
Diante disso, defendo a contribuição significativa desse encaminhamento na formação
de professores alfabetizadores para trabalhar com a produção textual na fase de
aquisição do código escrito.
Palavras-Chave: produção de textos, mediação docente, crianças, alfabetização.
Histórias em quadrinhos no computador e formação de professores.
9
LAMBERTI, Maria Antonia. COMIC STRIP PRODUCTION IN ENVIROMENTS
WITH COMPUTERS WITH STUDENTS IN PROCESS OF LITERACY. 146 p.
Dissertation (Mastership in Education) – State University of Maringá. Guide: Teresa
Kasuko Teruya. Maringá, 2008.
ABSTRACT
This dissertation is about the production of texts with children in the beginning
of the process of literacy and aims to analyze the histories produced by children
between 6 and 7 years old, in a computerized environment, to verify whether or not a
Comic Strip software can contribute to broaden the children’s vocabulary during the
textual production of the literacy. I could realize in the school atmosphere, that the
student´s texts are written mainly using short sentences and the verb to be is also present
most of the phrases constructions. The matter of that research can be expressed by two
questions: 1) How a Comic Strip software can be used in text production in a way to
amplify the vocabulary and make it easier the overpass of thinking to the written work?
2) What does the creation of Comic Strips can indicate or reveal in the children’s
writing? To answer those questions I executed a case study with students during the
process of literacy in a computerized environment. I’ve chosen a historic approach
about the methods and theories of literacy in Brazil, analyzing the transformations
occured during the late 80’s of 20
th
century, that had modified the concept of teaching
and learning pertaining to school education and about Comic Strips. To analyze the
acquisition of written language in the histories produced at computer, I appealed to the
linguistic researchers and Comic Strips. The gotten data indicated that teaching
mediation in this phase of the pertaining to school life is vital to raise the level of
lettering and text production. The creation of Comic Strips provided increase in the
vocabulary of the students concerning the explaining phrases about the details of the
narrative of its proper strips. Ahead of this, I am in favor of the significant contribution
of this guiding in the formation of teachers specialized in literacy to work with textual
production during the phase acquisition of the written code.
Key words: texts production, teaching mediation, children, literacy. Comic Strips in the
computer, formation of professors.
10
Lista de figuras Página
Figura 1 67
Figura 2 74
Figura 3 77
Figura 4 78
Figura 5 85
Figura 6 90
Figura 7 92
Figura 8 95
Figura 9 98
Figura 10 101
Figura 11 102
Figura 12 105
Figura 13 106
Figura 14 109
Figura 15 111
Figura 16 114
Figura 17 116
Figura 18 118
Figura 19 119
Figura 20 121
Figura 21 122
Figura 22 125
11
Lista de abreviaturas e siglas
HQs Histórias em Quadrinhos
IDEB Índice de desenvolvimento da Educação Básica
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
MCM Meios de Comunicação de Massa
MEC Ministério da Educação
PCNs Parâmetros Curriculares Nacionais
SE/SP Secretaria de Educação de São Paulo
12
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .................................................................................. 13
2. OS CAMINHOS DA ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL....................
2.1. Letramento e alfabetização................................................................
2.2. Para além da escola dualista............................................................
17
27
33
3. BREVE HISTÓRICO DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS.........
3.1. Os quadrinhos e a tecnologia.............................................................
39
53
4. ENCAMINHAMENTO METODOLÓGICO......................................
4.1. O ambiente empírico..........................................................................
4.1.1. A organização didático-pedagógica................................................
4.1.2. A estrutura física.............................................................................
4.1.3. O corpo docente..............................................................................
4.1.4. O corpo discente..............................................................................
4.2. Os sujeitos da pesquisa......................................................................
4.3. Descrição das atividades com as crianças no laboratório de
informática.......................................................................................
56
58
59
59
60
61
61
64
5. ANÁLISE DO TRABALHO COM HISTÓRIAS EM
QUADRINHOS .................................................................................
71
6. CONSIDERAÇÕES ............................................................................. 128
7. REFERÊNCIAS ................................................................................... 133
8. ANEXO................................................................................................. 137
13
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa tem como objeto de investigação a produção de textos das
crianças no processo inicial de alfabetização. O objetivo é analisar as histórias
produzidas pelas crianças de 6 a 7 anos em ambiente informatizado, a fim de verificar se
um software de histórias em quadrinhos pode contribuir para ampliar o vocabulário na
produção.
Com esse objetivo, procuro responder a duas questões: 1) Como um software de
Histórias em Quadrinhos pode ser utilizado na produção de textos de forma a ampliar o
vocabulário e facilitar a transposição do pensamento para a escrita? 2) O que a criação
de Histórias em Quadrinhos indica ou revela na escrita das crianças?
Para responder a essas questões, realizei um estudo de caso com alunos em fase
de alfabetização, em um ambiente equipado com computadores e percorri os caminhos
para compreender o processo de aquisição do código escrito pelos alunos que estão na
primeira série do Ensino Fundamental. Com base nas publicações sobre alfabetização e
Histórias em Quadrinhos, em uma perspectiva histórica, conheci os estudos
realizados para me aprofundar sobre a literatura relacionada ao domínio da leitura e da
linguagem escrita. Nesse sentido, as pesquisas de Mortatti (1997, 1999), Smolka (1989),
Soares (2003, 2004, 2005), sobre alfabetização e as pesquisas de Rama (2004), Eisner
(2001) e McCloud (2005, 2006) sobre histórias em quadrinhos, trouxeram contribuições
relevantes para minha análise.
Trabalho com crianças em fase de alfabetização desde 1988. Esta experiência
na sala de aula e a convivência no ambiente escolar permitiram identificar tanto a
dificuldade quanto os avanços dos alunos na produção de textos. Como exemplo, após
quatro meses de trabalho com alunos da primeira série do Ensino Fundamental,
desenvolvendo atividades de escrita espontânea, tentativas de escrita a partir de histórias
ou desenhos, formação de sílabas, palavras e frases, exercícios como caça-palavras,
palavras cruzadas, ordenação de sílabas, auto-ditado, acompanhados de leitura de
pequenos textos e livros de literatura infantil, observei que os alunos, neste ambiente,
se encontram prontos para elaborar textos e transmitir suas idéias para a escrita.
As tentativas de escritas e produções de textos aconteciam, mas, muitas vezes, o
resultado era frustrante. Nestas atividades, percebia-se que algumas crianças não
conseguiam organizar seus pensamentos e escrever histórias que liam ou ouviam, sobre
seu dia-a-dia, ou acontecimentos da atualidade com a riqueza de detalhes que estava
presente na oralidade. Na pesquisa realizada por Mori (1994), com crianças repetentes,
sua preocupação era investigar “o chamado fracasso escolar” (p.9), porém, também
ficou constatado que as crianças, mesmo sabendo escrever, limitavam-se ao uso do
verbo ser e produziam somente frases curtas. Qual seria a causa desta dificuldade?
As experiências e pesquisas sobre alfabetização mostram que recursos como
Histórias em Quadrinhos são pouco explorados, mas esse pode oferecer várias
possibilidades de aprendizagem, porque os desenhos com cenários e personagens
estimulam a imaginação e a criação textual. De acordo com Santos (2003), o emprego
de Histórias em Quadrinhos pode “despertar o interesse e criar o hábito da leitura
sistemática, conscientizar, fomentar atitudes críticas, desenvolver a aptidão artística e a
criatividade, seja em estudantes ou em participantes de movimentos populares” (p.11).
Esse fato foi observado no ambiente de sala de aula, onde as crianças
manifestavam o interesse em manusear os gibis. Diante disso, foi realizada uma coleta
de gibis e organizada uma ‘gibiteca’ que ganhou um espaço de destaque na escola. Os
alunos, entusiasmados com os empréstimos, passaram a trocar gibis entre eles. Poderia
estar aí um caminho para a elaboração de textos.
Em uma das visitas ao Laboratório de Informática, disse à funcionária (técnica
em informática) que atendia ali, sobre o interesse daquela turma por gibis. Nesta
ocasião, fui informada que o colégio havia adquirido um software de histórias em
quadrinhos. Mas este software não era utilizado pelos professores porque ainda não
percebiam o potencial pedagógico deste programa. Na opinião deles, este recurso
vinha com desenhos e cenários prontos, por isso, não contribuía para desenvolver, o que
entendem por criatividade e, provavelmente, não contribuiria na produção textual dos
alunos.
Este software contém os personagens da Turma da Mônica de Maurício de
Sousa em várias posições, várias expressões corporais e fisionômicas, recursos para
aumentar diminuir o tamanho das figuras, como também uma variedade de cenários.
Havia vários modelos de balões, opções de objetos para enriquecer os cenários e
algumas onomatopéias. Constatei que seria uma ótima ferramenta para elaborar
histórias a partir dos personagens e trabalhar as produções de textos com os alunos em
fase de alfabetização. Comecei naquele momento a produzir uma história, utilizando
todos os recursos disponíveis e, rapidamente, construí uma seqüência de quadrinhos.
Percebi que o programa é acessível às crianças, e poderia ser utilizado para ativar a
imaginação na produção textual. As ferramentas como a caixa de texto, com tamanho e
14
tipo da fonte, a cor da letra e a possibilidade de inserir o texto dentro dos balões nos
vários cenários disponibilizados, permitem a construção de ambientes em que
acontecem as histórias em quadrinhos de forma prazerosa.
Diante disso, elaborei um roteiro de atividades e encaminhei uma turma de
primeira série ao laboratório de informática para realizar uma intervenção pedagógica e
analisar os resultados.
Os alunos produziam suas histórias com o entusiasmo infantil característico
desta idade, procurei proporcionar às crianças situações reais de leitura e escrita. Era um
trabalho que os divertia muito, e o dia do trabalho no Laboratório de Informática era
ansiosamente esperado.
Após dezesseis encontros no Laboratório de Informática com atividades de
produção de textos, convidamos os pais para conhecerem as histórias criadas pelos
alunos, ao mesmo tempo, pedi para eles também criarem uma junto com os filhos.
Em seguida, coletei os dados das atividades realizadas pelas crianças e fiz uma
análise com base nas pesquisas sobre Histórias em Quadrinhos e alfabetização.
Assim, essa dissertação está organizada em quatro capítulos. No primeiro
capítulo, faço um breve histórico da alfabetização no Brasil, e em seguida, trago a
alfabetização para a realidade atual: o letramento e a necessidade de informar a função
social da escrita na sociedade do conhecimento e discuto, de maneira breve, a escola
dualista no Brasil.
No segundo capítulo, trato das produções bibliográficas sobre as Histórias em
Quadrinhos. Esses estudos revelam que no início do século XX, houve proibições por
parte da Igreja e das escolas a esse gênero de narrativa, por acreditarem que o seu
conteúdo traria prejuízos morais e intelectuais, porque causaria desvios de
personalidade ao incitar a violência entre os leitores. Mas as pesquisas posteriores
apontaram uma nova visão sobre esse tipo de leitura que havia conquistado o público
infantil, juvenil e adulto. Depois da Segunda Guerra Mundial, viram nas Histórias em
Quadrinhos as possibilidades de produzir campanhas esclarecedoras sobre doenças,
epidemias, vacinas; manuais de instruções para máquinas e aparelhos elétricos e
eletrônicos; biografias de heróis históricos e conteúdos escolares. Apresento também os
recursos para a elaboração das Histórias em Quadrinhos utilizados pelos autores e
criadores, tais como: os quadros em que aparecem os personagens, a forma de inserir
diálogos nos balõezinhos, a sonorização dos quadrinhos como as onomatopéias e a
passagem do tempo em uma história.
15
No terceiro capítulo, apresento o ambiente empírico onde foram realizadas as
atividades no laboratório de informática, os alunos da primeira série do ensino
fundamental, sujeitos da pesquisa e os procedimentos metodológicos para o
desenvolvimento do trabalho de campo.
No quarto capítulo, analiso a produção das Histórias em Quadrinhos realizadas
no laboratório de informática e os textos produzidos pelas crianças para verificar como
ocorre o processo de criação textual na alfabetização, utilizando o software da Turma da
Mônica. As histórias produzidas no laboratório de informática, evidenciam que nesse
ambiente os alunos revelam o conhecimento que adquiriram ao ler os gibis da Mônica,
Cascão, Cebolinha, Magali e utilizam-se de recursos alfabéticos, com hipóteses que eles
formularam para escrever; relatando detalhes e argumentos para dar sentido ao texto
elaborado após a produção das histórias.
16
1. OS CAMINHOS DA ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL
Mortatti (1999) pesquisou durante seis anos, por meio de documentos e
entrevistas, os caminhos percorridos pela alfabetização no Brasil desde o final do século
XIX até meados de 1994. Sua pesquisa analisa o posicionamento de Antonio da Silva
Jardim em defesa da Cartilha Maternal ou arte da leitura que seguia o Método João de
Deus. Essa defesa realizada em julho de 1882, incluía uma crítica severa sobre a
metodologia da soletração usada até então no Brasil e anunciava a nova metodologia
como sendo “uma educação útil, prática e racional e aplica aos estudos dos métodos de
ensino o princípio de ‘concertar melhorando’”
1
(p.43). Enfatiza a melhora do presente,
valorizando o passado como preparador que foi para o tempo atual [deles] e diz que
deve ser melhorado e não destruído. Mortatti apresenta Antonio da Silva Jardim como
um educador preocupado que acredita na importância de leitura e espera que, dessa
forma, a instrução pública atinja a todos por meio da nacionalização do sistema
educacional e de livros para a escola.
Ao falar em defesa da Cartilha Maternal, Silva Jardim, segundo Mortatti (1999),
cita-a como revolucionária, original e enfatiza que nela vêem-se os valores das letras,
descortinando uma nova forma de ensinar/aprender: a palavração. Mostra que o início
do método é com palavras fáceis para difíceis, simples para as compostas e cita uma
frase usada para convencer os educadores da época (e que foi muito usada também
pelos defensores das pesquisas de Emília Ferreiro quando estas começaram a ser
publicadas no Brasil em 1980). Outros tempos, outro contexto, mas o discurso era
semelhante:
A natureza, meus senhores, só se vence pelo aperfeiçoamento. Como
aprendemos a falar? falando palavras; como aprendemos a lêr? é claro que
lendo essas mesmas palavras. A palavração, pois, é o único processo racional;
porque não se ensina o alphabeto todo e sim por partes; porque não
arbitrariamente e sim partindo das vogaes, sons elementares e geraes,
communs, para as invogaes, sons secundários e especiaes, e ainda nestas, das
mais approximadas d’aquellas para as mais affastadas, n’uma complicação
crescente e generalidade decrescente, porque finalmente torna explícito que
para lêr não são mais necessários nomes de lettras e sim seus valores, por isso
que estes são falados, que aquelles são sua abstração convencional
2
(Silva
Jardim apud MORTATTI, 1999 p.49).
1
A ortografia é fiel ao uso da época.
2
A grafia segue e respeita o texto original conforme transcrito no livro publicado por Mortatti (1999)
17
Esse período (1882) mostra uma acentuada efervescência de métodos para se
ensinar a ler e escrever
3
. Um dos métodos descritos assemelha-se em sua prática com o
que fazemos hoje em salas de alfabetização. É o método de Francisco Pedro do Canto
em que ele expunha o alfabeto maiúsculo e minúsculo de imprensa e maiúsculo e
minúsculo manuscrito para o aluno identificar as várias formas das letras. A seqüência
do seu método distancia-se da prática atual, porque ele pedia para lerem a família
silábica e escreviam palavras formadas com estas e assim era lido; ba-be-bi-bo-bu e
depois o beba, boba etc.
As cartilhas e livros de leitura foram editados; alguns se popularizavam mais e
outros menos. Os que conquistavam as autoridades educacionais da época, ganhavam o
incentivo para publicá-las. É o caso da Cartilha Nacional publicada, segundo Mortatti,
provavelmente no início de 1880, em que o autor Hilário Ribeiro a descreve como uma
cartilha que ensina o valor fônico das letras e justifica “levemos desde logo o alumno a
conhecer os valores phonicos das lettras, porque é com o valor que de ler e não com
o nome dellas” (Ribeiro apud MORTATTI, 1999, p.54). Condena-se o método da
declamação (soletração), taxando-o como “absurdo e que martiriza as crianças”. Ao
citar o método da palavração, diz que ainda não encontrara vantagem na sua aplicação e
sugere o método fônico e fonotípico, apesar de não ter colhido os resultados esperados.
Apresenta o método que defende (silábico), reafirma que não se deve soletrar (be+a=ba)
e sim falar o conjunto das sílabas.
Outra cartilha do início da década de 1880, escrita por Thomaz Paulo do Bom
Sucesso Galhardo, vem reforçar o método da silabação e seu autor critica
veementemente a soletração e a descreve como tortura e martírio das crianças. Lastima
também, que algumas escolas demorem tanto para perceber as mudanças ocorridas na
Educação e por isso mesmo continuem com o método da soletração sem acompanhar “o
progresso do ensino” (MORTATTI, 1999, p.55).
Em 1892, o momento era de mudanças pela Proclamação da República e
concomitante a essas mudanças, tardiamente, Felisberto de Carvalho publica o Primeiro
Livro de Leitura, como uma derradeira defesa ao método da silabação, porém, nesta
época, o método analítico começava a ganhar espaço e ia se tornando oficial em São
Paulo. A novidade que se apresenta no Primeiro Livro de Leitura é a defesa do “método
3
Observa-se que nesse período, a ênfase era para a leitura. A escrita visava cópia do traçado correto das
letras (caligrafia)
18
por articulação ou emissão de sons” e que, pedagogicamente, não poderia se isolar
leitura, escrita e ortografia (MORTATTI, 1999).
No dizer de professores da época, conforme Mortatti (1997, 1999), o método
analítico era um método difícil para as crianças, porque partia de sentenças, depois ia
para as palavras, sílabas e, por fim, as letras. Ou seja, partia do conjunto para depois ir
às partes. Na defesa das autoridades da época, ouvia-se muito que era um método que
privilegiava todas as faculdades. O divulgador do método analítico para o ensino da
leitura foi o professor Arnaldo de Oliveira Barreto, que ocupou cargos na área
educacional (na década de 1890), produziu e divulgou materiais e novas idéias sobre a
leitura.
O método analítico para o ensino da leitura ganhou espaços e logo se iniciou um
processo de reforma na Escola Normal, primeiramente, na capital do estado de São
Paulo, e pretendia-se que esse novo modelo servisse também para todo o país. Criou-se,
na década de 1890, uma Escola Modelo na cidade de São Paulo. Nas décadas seguintes,
esse modelo de escola alcançou o interior e a divulgação estendeu-se também a outros
estados do Brasil.
O método analítico seguia os modelos dos norte-americanos, e, como foi dito,
partia do todo para as partes. Este método foi adotado pelas administrações
educacionais e passou a ser oficialmente dos alfabetizadores que atuavam na educação
escolar. Mortatti (1999) investiga sobre a reação de professores da época, que eram
contrários a essa imposição. Alguns achavam que era mais difícil para as crianças,
outros, por se sentirem mais seguros com os antigos métodos, tentavam, escondidos,
trabalhar da forma que dominavam melhor, mas, como era obrigado, procuraram
trabalhar com as cartilhas que continham o método analítico (p.83).
Nesta época, surgem vários escritores de livros didáticos por causa do aumento
do número de alunos e da consolidação do mercado editorial em que aparecem livros de
brasileiros para as escolas daqui. Várias cartilhas analíticas foram lançadas no universo
escolar. Algumas foram descartadas do cenário educacional, outras tiveram suas edições
publicadas até 1970, 1974. Entre os livros, citarei alguns autores e títulos das cartilhas
que foram publicadas pela primeira vez nesta época: Luiz Cardoso Franco, A arte da
leitura (1902), Arnaldo de Oliveira Barreto, Cartilha das mães (Provavelmente
impressa nos últimos anos do século XIX ou no início do século XX); Arnaldo de
Oliveira Barreto, Cartilha Analítica (escrita em meados de 1910 e, segundo Mortatti,
19
2000, p. 93, no ano de 1967 foi publicada a 74. edição); Ramon Roca Dordal, Cartilha
Moderna (Publicada pela primeira vez em 1902);
Theodoro Jeronymo de Moraes publicou Meu livro: Leitura Analytica no ano de
1909. Essa cartilha foi indicada para ser adotada nas escolas públicas de São Paulo. Em
defesa de sua obra, ele apresenta os motivos que embasam sua escolha e porque refuta
os métodos sintéticos para alfabetização. O aluno, com essa cartilha, torna-se
“collaborador, creador, interlocutor e observador, trazendo para a escola seu
‘apprendizado empírico”, adquirido anteriormente pela vista e ouvido, a partir do
interesse”. Ao professor, cabe o papel de ‘despertador de idéas’ e de “adaptação integral
às necessidades psycologicas do educando”. Sua tarefa inicial em relação à leitura
consiste, portanto, em sistematizar, disciplinar essa “linguagem toda espontanea” que o
aluno traz para a escola, e adestrá-lo na aquisição de pensamentos, a fim de lhe dar o
hábito da leitura” (Moraes apud MORTATTI, 1999, p.99-100).
Carlos Alberto Gomes Cardim publicou Cartilha infantil, provavelmente escrita
no final da década de 1910. Francisco Mendes Vianna publicou Cartilha (Leituras
Infantis) e Primeiros Passos (leituras infantis), escrita em 1910 (aproximadamente);
Mariano de Oliveira publicou Nova cartilha analytico-syntetica e Cartilha ensino
rápido da leitura, em 1915; Altina Rodrigues de Albuquerque Freitas publicou Cartilha
Primeiro Livro em 1920; Antonio Firmino de Proença publicou Cartilha Proença,
escrita provavelmente em meados da década de 1920; Benedito M. Tolosa publicou
Cartilha de alfabetização no ano de 1923.
Nas décadas seguintes, houve várias polêmicas em torno de autores e cartilhas.
Os embates evidenciavam as disputas entre os mais modernos e modernos. Por volta de
1910, surgem as primeiras idéias da Escola Nova e estão relacionadas às “descobertas
da psico-pedagogia que invertem o papel de professores e alunos. O ensino tende a
individualizar-se, adaptando-se métodos e programas a cada tipo de aluno”. A Escola
Nova torna-se a “nova bússola da educação” (MORTATTI, 1999, p. 130).
A nova tendência educacional que emergia, passa a combater o método adotado
pela escola tradicional ou a velha escola. uma forte divulgação do novo ou do
moderno. A Escola Nova foi proposta por educadores como Lourenço Filho, Fernando
de Azevedo e Anísio Teixeira. Eles eram os renovadores e inovadores que publicaram
“O manifesto dos pioneiros da Escola Nova” em 1932, com a finalidade de integrar e
generalizar as concepções de ensino para atender uma sociedade urbana e industrial.
Assim:
20
Os novos fins passam a demandar soluções voltadas para a função
socializadora e adaptadora da alfabetização no âmbito da educação popular,
a ser realizada de maneira rápida, econômica e eficaz, a fim de integrar o
elemento estrangeiro, fixar o homem no campo e nacionalizar a educação e a
cultura, ou seja, visando a uma educação renovada, centrada na psicologia
aplicada à organização escolar e adequada ao projeto político de
planificação e racionalização em todos os setores da sociedade brasileira
(MORTATTI, 1999, p.144)
Neste momento um enfraquecimento dos ideais (se comparado com o
momento anterior em que era forte a discussão em defesa desse ou daquele método) ao
mesmo tempo em que se observa a influência do pensamento de Lourenço Filho que
contava com grande prestígio internacional.
Segundo Monarcha (1997), Lourenço Filho é notoriamente o educador que atuou
decisivamente nos “processos culturais renovadores e do sentido moderno da educação
brasileira, em uma época de mudanças sociais aceleradas.” (p.11). Publicou vários
livros e organizou, por ocasião do Centenário do Ensino Primário no Brasil, projeto
editorial, com várias traduções de títulos estrangeiros e, juntamente com Anísio
Teixeira, organizou o Instituto de Educação, atuando ali não como diretor, mas
também assumindo a cátedra de Psicologia Educacional.
Por volta de 1930, muitas cartilhas do século anterior ainda eram utilizadas e
adotadas nas escolas. Havia afirmações de que o método analítico ainda era o melhor,
mas o que fica em evidência é o respeito pela maturidade da criança e em nome disso,
diz-se que se pode usar o método analítico-sintético e ainda assim conseguir bons
resultados na alfabetização.
É nesse cenário que surge, em 1934, a edição do Teste ABC de Lourenço Filho e
que por muito tempo norteou o início do processo de alfabetização no Brasil. Trata-se
de testes para medir o nível de maturidade da criança. Estes testes são descritos como
fáceis de serem aplicados e destinam-se a diagnosticar o perfil dos alunos de modo a
garantir que sejam bem assistidos na escola. Estes testes visavam observar a
coordenação viso-motora, resistência à inversão na cópia de figuras, memória visual,
coordenação auditivo-motora, capacidade de pronunciar palavras e duração do som,
resistência à ecolalia (repetir automaticamente sons ou palavras ouvidas), memória
auditiva, índice de fatigabilidade, índice de atenção dirigida, vocabulário e compreensão
geral (MORTATTI, 1997).
Na tentativa de se obter uma boa aceitação das suas hipóteses, Lourenço Filho
observa em seu livro que são testes fáceis de aplicar, o material a ser utilizado é fácil de
21
adquirir (ou o professor pode improvisá-los) e são eficientes. Os primeiros resultados da
aplicação destes testes são publicados e, junto a essa publicação, são conferidos elogios
ao teste, o que serve de propaganda e a sua divulgação vai se propagando até o ponto de
se tornar moda na época (MORTATTI, 1997 e 1999).
Esses testes conseguem sobreviver por mais de trinta e cinco anos em sucessivas
edições. Em algumas escolas foram usados (com adaptações e modificações) no final da
década de 1980, quando da publicação das pesquisas de Emília Ferreiro, como forma de
classificar os alunos em pré-silábicos, silábico-alfabéticos e alfabéticos (MORTATTI,
1999 p.167).
Neste terceiro momento da alfabetização no Brasil, Mortatti apresenta as
cartilhas produzidas neste período. Após a publicação dos Testes ABC, Lourenço Filho
publicou a Cartilha do Povo em 1928 e Upa, cavalinho em janeiro de 1957; Benedita
Stahl Sodré publicou Cartilha Sodré em 1940 (Essa cartilha foi remodelada
posteriormente pela filha da autora: Isis Sodré Vergamini); Branca Alves de Lima
publicou Caminho Suave em 1948. Ainda hoje essa cartilha é adotada por alguns
professores alfabetizadores. Mortatti (1999) observa que muitas edições publicadas não
constavam o nome do autor.
Mortatti (1997 e 1999) observa também que, ao contrário dos momentos
anteriores, fica fácil localizar o início e o fim, neste terceiro momento, o início não é
bem focado, em meados da década de 1920 e o final também não se apresenta claro,
relacionando-se com a lei 5692/71 e a elaboração dos Guias Curriculares para o ensino
das matérias do núcleo comum. O que se segue depois disso, é uma tendência eclética
na alfabetização; ou seja, as cartilhas baseadas no método misto continuam fazendo
sucesso, e há a permanência daquelas que optaram pelo método sintético ou analítico.
O destaque desse momento é realmente a pesquisa de Lourenço Filho que
ganhou prestígio internacional e foi um marco por não defender nem um nem outro
método, sendo reconhecido como o primeiro brasileiro a realizar uma pesquisa com o
rigor científico do trabalho de investigação sobre um determinado campo da educação.
A introdução do Ciclo Básico é apresentada por Mortatti (1999) como sendo o
quarto momento da alfabetização como objeto de estudo. Começa a aparecer no cenário
educacional no final da década de 1970, e o objetivo central é descobrir como o aluno
aprende. Questiona-se, nesse momento, por que para uns a aprendizagem flui facilmente
e para outros é tão difícil aprender.
22
Essa também é uma preocupação de Kramer (2001) que se inseriu em uma
escola pública em 1985, para verificar porque alguns aprendem e outros não, qual a
diferença na postura dos professores que conseguem sucesso em classes de
alfabetização.
Smolka (1989) também apresenta indagações que lhe ocorreram nesta época: “O
que se sabe das crianças, como constroem seu conhecimento, como vêem e percebem o
mundo à sua volta, qual o papel do adulto e da escola no processo de aprendizagem
delas?” (p.23).
É justamente no final dessa década (1980) que aparecem publicadas pela
primeira vez as pesquisas de Emília Ferreiro com colaboração de Ana Teberosky, que
não sendo método, nem técnica de ensino, vêm ajudar a entender o processo de
aprendizagem, por mostrar “a escrita como representação da linguagem e não como um
código de transcrição gráfica de unidades sonoras” (MORTATTI, 1999, p.252).
As autoridades educacionais prevêem mudanças, não somente de técnicas e
métodos, e antecipam que não receitas porque estas não dão garantias de bons
resultados. O momento sócio-político-educacional coincide com a busca de respostas
didático-pedagógicas e “encontra sua síntese no discurso sobre ´revolução conceitual`,
representada pelo postulado da construção do conhecimento lingüístico pela criança, em
decorrência do que, o eixo da discussão é deslocado para o processo de aprendizagem
do sujeito cognoscente e ativo, em detrimento dos métodos de alfabetização e da
relevância do papel da escola e do professor nesse processo” (MORTATTI, 1999,
p.253-254).
A cartilha continua sendo adotada, assim como os métodos tradicionais, nas
escolas da rede pública de São Paulo, de forma disfarçada ou não, embora, o discurso
torna-se cada vez mais enfático, procurando mostrar os estudos e a contribuição de
pesquisas nas diversas áreas que envolvem o conhecimento. As cartilhas são produzidas
e publicadas no início da década de 1980, mas a ênfase agora aparece como nova
proposta metodológica denominada de construtivistas ou sócioconstrutivistas ou ainda
como construtivistas-interacionistas.
Nesta perspectiva, todo tipo de material impresso, como livro de literatura,
receitas culinárias ou médicas, convites, trechos de jornais, bulas de remédio, contas de
água e luz, frases retiradas de painéis ou outdoors, enfim, todo material escrito que faça
parte do cotidiano dos alunos pode substituir a cartilha que era utilizada no processo de
23
alfabetização e que direcionava o processo de ensino e de aprendizagem na educação
escolar até então.
O início do Ciclo Básico coincide com o final da década de 1970. Nesta época
aumentava o debate sobre a repetência e evasão escolar, associados a uma nova visão de
educação que considera a escola como um espaço de reprodução da sociedade
capitalista, excludente e discriminatória. O fracasso escolar passou a ser tema de
discussão em congressos e seminários. Os debates sobre o problema da escola
questionavam a “educação compensatória”, baseada nos ideais da classe dominante que
marginaliza e neutraliza os diferentes e as diferenças.
Nesse momento, reivindicava-se uma educação escolar com o dever de corrigir
os desvios, as deficiências, e assegurar que a educação seja resistente ao que a classe
dominante impõe, para contribuir com a emancipação e superação da injustiça social
contra a classe popular.
Se por um lado, no campo político, há um encaminhamento para a concretização
da democracia, por outro, no campo educacional, o país continuava a enfrentar sérios
problemas na educação. A desvalorização do professor, a contradição entre qualidade e
quantidade, conteúdo e forma, aliados à carência cultural, social e dificuldades de
aprendizagem continuaram a crescer entre os alunos. Kramer (2001) concorda com as
dificuldades da escola nesse período e afirma que:
[...] desde a crítica da função da escola na sociedade de classes, passando pelo
reconhecimento de suas possibilidades reais, dado seu caráter contraditório e
emancipatório, até a identificação das raízes e mecanismos desse fracasso na
realidade brasileira, o fato é que conhecemos muito dos pontos de
estrangulamento da ação escolar em geral e da prática pedagógica em
particular. Dentre os fatores determinantes da baixa qualidade de ensino (e,
portanto de sua não-democratização), dois que interessam especialmente
[...]: a precária formação dos professores e a organização do trabalho escolar
(p.73).
Os ideais da Escola Nova aplicados com sucesso em poucas escolas, não
seguiram a mesma linha nas escolas públicas. Mortatti (1999), citando Palma Filho, diz
que houve uma desestabilização da confiança nos métodos tradicionais, métodos estes
que os professores dominavam, mas que, por serem tão criticados, foram abandonados e
a conseqüência foi um “relaxamento da disciplina de trabalho, o aligeiramento e
empobrecimento do conteúdo do ensino das camadas populares” (p.261).
O Ciclo Básico iniciou como forte esperança para solucionar o problema de
repetência, principalmente entre a primeira e segunda série. Compreendia um ciclo de
24
dois anos de alfabetização em que os alunos seriam remanejados ao mesmo tempo que
teriam acompanhamento nos estudos para sanar e/ou diminuir as dificuldades. Havia,
porém, uma lacuna no referencial teórico que se preencheu com as pesquisas de Emília
Ferreiro
Essa nova teoria busca explicar, de uma perspectiva psicolingüística pioneira,
resultante do entrecruzamento de dois marcos conceituais a teoria da
linguagem de N. Chomsky e a teoria da inteligência de J. Piaget - , a aquisição
da língua escrita pela criança como um processo psicogenético que se inicia
antes da escolarização e que “segue uma linha de evolução surpreendentemente
regular, através de diversos meios culturais, de diversas situações educativas e
de diversas línguas” (Ferreiro, 1985, p.19), numa relação direta entre
ontogênese e filogênese (MORTATTI, 1999, p. 264).
As pesquisas, com base na teoria piagetiana, defendem que a aprendizagem
depende de processos internos e individuais, não havendo predominância da leitura ou
da escrita, mas das duas concomitantemente. O aprendiz constrói seu conhecimento
interagindo com o objeto de conhecimento. A aprendizagem dessa forma é conceitual e
não técnica adquirida, ou seja, abandona-se a idéia de que o método gera a alfabetização
e o professor é o único autorizado a transmitir o saber.
Para que o professor dos anos 80 pudesse conhecer a proposta teórica que
embasa o Ciclo Básico e se convencer de sua eficácia, foram desenvolvidas diversas
ações no sentido de colocá-lo a par das mudanças implantadas e assim capacitá-lo, entre
elas: cursos de aperfeiçoamento, distribuição de textos e livros e palestras, destinadas
especialmente aos professores das classes de alfabetização. Ocorre que, sendo cursos
relâmpagos, não tempo para aprofundar-se e, segundo Kramer (2001), a
“compreensão distorcida da proposta que gera prejuízos porque nem o professor
continua alfabetizando (por exemplo) como sabia, nem incorpora as novas estratégias
ou linhas sugeridas” (p.79). Sobre isso, concorda Soares (2003) quando ela afirma que
as alfabetizadoras que usavam algum método no seu trabalho eram vistas como
retrógradas. Os métodos foram considerados ultrapassados e, sem conhecimento e
segurança das novas propostas, ficaram sem saber como trabalhar para ensinar a ler e a
escrever. Afirma ainda que na verdade, estavam “ensinando aquilo que é preciso
ensinar: codificar e decodificar. As alfabetizadoras podem até estar ensinando pelos
caminhos inadequados, mas isso precisa ser feito” (p. 2). Podemos facilmente
comprovar, se tomarmos por base os dados do Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica (IDEB) que mostram um alto índice de crianças que ao final das séries iniciais
não sabem ler e escrever.
25
No final da década de 1980, segundo o documento apresentado por Mortatti
(1999), a perspectiva construtivista especialmente a chamada teoria de Emília Ferreiro e
Ana Teberosky, conquista o universo escolar.
Porém, passados mais de dez anos da discussão entre construtivismo e socio-
interacionismo, a alfabetização segue eclética. MORTATTI (1999), ao citar Hernandes,
chama a atenção para o que ocorre nos dias atuais: “Na maioria das escolas, a
apropriação do pensamento construtivista limita-se à incorporação de algumas
atividades pedagógicas que, apesar de uma nova roupagem, explicitam a retomada de
práticas de características escolanovistas e tradicionais” (MORTATTI, 1999, p. 281).
Hoje, treze anos após o término do livro de Mortatti, observa-se que pouco se
avançou na alfabetização no Brasil. Discussões sobre o tradicional, o novo, o moderno,
ainda estão presentes nas palestras e nos estudos de pesquisadores. Mortatti (1999)
deixava uma idéia para a melhoria desse processo:
No entanto, na configuração do processo de mudança possível, algumas
questões centrais ainda permanecem pendentes. Dentre elas, a que ocupa
professores e intelectuais brasileiros desde, pelo menos, o final do século XIX:
a busca do todo, onde se encontra o sentido do que se e se escreve, onde se
encontra o sentido do ensino-aprendizagem da leitura e escrita na fase inicial
de escolarização de crianças (p.288).
E é sobre o sentido da leitura e da escrita que avançam as discussões atualmente,
o chamado letramento e é sobre isso que tratarei a seguir.
26
1.1. Letramento e alfabetização.
A escola hoje não tem clareza dos procedimentos metodológicos de
alfabetização. Hoje, percebe-se uma total falta de direção. No final da década de 1980,
esperava-se que o professor conhecesse as pesquisas sobre apropriação do
conhecimento e de posse desse saber, criasse projetos e, com autonomia, trabalhasse
para promover a aprendizagem dos seus alunos (Soares, 2003). Mas, ao mesmo tempo,
procura-se dar ênfase nas contribuições que as crianças trazem, mas, na prática de
ensino, é preciso seguir um programa, que nem sempre proporciona espaço para
trabalhar as diferenças culturais dos alunos. Nesse sentido, Soares (2003) afirma que
antes, “havia um método, mas não uma teoria. Hoje acontece o contrário: todos têm
uma bela teoria construtivista da alfabetização, mas não têm método. (...) É preciso ter
as duas coisas: um método fundamentado numa teoria e uma teoria que produza um
método”(p.3)
No início do século XX, havia um método para alfabetizar, fosse um ou outro, o
professor o dominava e, orientado por um manual detalhado que acompanhava a
cartilha, informava como deveria fazer para ocorrer a aprendizagem nos alunos.
(SOARES, 2003). Mas, segundo as pesquisas, o professor trabalhava com livro
didático, muitas vezes desprovido de sentido para a criança que ingressava na escola,
era também “alheio ao funcionamento da língua, contrastando violentamente com as
condições de leitura e escrita das sociedades letradas e da indústria cultural”
(SMOLKA, 1989, p.17).
Hoje vemos nas escolas particulares, principalmente, uma adesão aos sistemas
apostilados que, mudando a roupagem, é o mesmo livro didático, porém atualizado e
modernizado. As escolas públicas recebem livros didáticos do governo e o que deveria
ser um suporte para o processo ensino-aprendizagem, acaba tornando-se um roteiro a se
seguido. Mas não há método, nem estratégia.
O que é um método de alfabetização? Para Magda Soares, o método é:
a soma de ações baseadas em um conjunto coerente de princípios ou de
hipóteses psicológicas, lingüísticas, pedagógicas, que respondem a objetivos
determinados. Um método de alfabetização, será, pois, o resultado da
determinação dos objetivos a atingir (que conceitos, habilidades, atitudes
27
caracterizarão a pessoa alfabetizada?) da opção por certos paradigmas
conceituais (psicológico, lingüístico, pedagógico), da definição, enfim, de
ações, procedimentos, técnicas compatíveis com os objetivos visados e as
opções teóricas assumidas. (SOARES, 2005, p. 93)
Até a década de 80, do século passado, o processo de alfabetização baseava-se
nos métodos tradicionais (silábico, fônico, global). Com a divulgação das pesquisas de
Emília Ferreiro e Ana Teberosky, no início dos anos 80, com a “Psicogênese da língua
escrita”, o paradigma mudou e o velho passou a ser rejeitado (NASCIMENTO, 2002).
A concepção do “processo de aquisição da língua escrita” sofreu alterações, ou seja:
a criança de aprendiz dependente de estímulos externos para produzir respostas
que reforçadas, conduziriam à aquisição da língua escrita - concepção básica
dos métodos tradicionais de alfabetização passa a sujeito ativo capaz de
construir o conhecimento da língua escrita, que caracterizariam a criança
pronta ou madura para ser alfabetizada pressuposto dos métodos tradicionais
de alfabetização são negados por uma visão interacionista que rejeita uma
ordem hierárquica de habilidades, afirmando que a aprendizagem se por
uma progressiva construção de estruturas cognitivas, na relação da criança com
o objeto língua escrita, as dificuldades da criança no processo de aprendizagem
da língua escrita consideradas ‘deficiências’ ou ‘disfunções’, na perspectiva
dos métodos tradicionais passam a ser vistas como ‘erros construtivos’,
resultado de constantes reestruturações, no processo de construção da língua
escrita (SOARES, 2005, p.89).
Nesta proposta, significa dizer que o erro não é mais uma deficiência e sim um
processo para se construir um conhecimento. O professor alfabetizador precisa verificar
porque a criança escreveu daquele jeito, quais as hipóteses feitas por ela para escrever
daquela forma e, em parceria com o aluno, fazer as reestruturações necessárias para que
ele escreva corretamente, conforme o padrão da norma culta. Essas pesquisas
permitiram conhecer os passos da criança e sua interação com a escrita. Acontece a
descoberta pelo aluno que está sendo alfabetizado, que na língua portuguesa e em outras
que se usa um alfabeto fonético, acontece o registro do som das palavras e não
propriamente ao que elas se referem. A criança escreve ‘mesa’ sem utilizar desenhos
para representar o que ela quer dizer. É a fase silábica, que ela percebe primeiro o
som da sílaba, depois apropria-se do som do fonema e passa a ser alfabética (SOARES,
2003; CAGLIARI, 2002).
Na época que foram publicadas e divulgadas as pesquisas de Emília Ferreiro e
Ana Teberosky, no final dos anos 80, várias concepções foram interpretadas
erroneamente e algumas orientações pedagógicas equivocadas determinavam que não
mais poderia corrigir o erro das crianças.
28
Smolka (1989) levanta indagações a esse respeito, baseada nos discursos
anônimos da época, que, realizados a partir de estudos rápidos e sem as interpretações
corretas das pesquisas realizadas por Emília Ferreiro, acabam por analisar de maneira
errônea esses resultados. Questiona o que realmente está em jogo quando o que se ouve
é partir da experiência da criança e dar a palavra a ela” (p.18); de se levar em conta a
variação de dialetos, aceitar os erros que a criança produz quando está iniciando o
processo de escrita; fala-se da necessidade de se conhecer os processos de aprendizagem
e entender como a criança aprende (SANTOS, 2005). Evidentemente, tudo isso deve ser
levado em conta, mas a falta de base teórica da construção do conhecimento faz emergir
o espontaneísmo no processo de alfabetização. Este é um dos fatores que está nos
índices do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) divulgados
na mídia, sobre o mau desempenho da leitura dos estudantes no Brasil.
Aqui surge um contraponto: os estudos de Ferreiro e Teberosky (1991)
defendem que cada criança tem seu ritmo próprio, que deve permitir a elas o tempo
necessário para escrever, rever, desconstruir e construir novamente, rever as hipóteses
que formulou, experimentar e fazer de novo sem tempo determinado para que domine a
habilidade e demonstre o progresso obtido no processo de construção da escrita; e isso
não pode ser feito em tempo prefixado e em nível pré-estabelecido.
Na educação formal, segundo Soares (2005, p.90), cabe à escola definir os
conteúdos, priorizar aspectos culturais (o que exclui ou prioriza), fixar “a duração do
tempo em que deve ocorrer cada um desses conteúdos selecionados (o bimestre, o
semestre, o ano letivo, a série, o grau de ensino”. E finalmente, avaliar se houve ou não
apropriação desses conteúdos e desses conhecimentos, não sob o aspecto do aprendiz,
mas “em função de determinados resultados que devem ser obtidos em grau
considerado aceitável, no fim de um período de tempo prefixado” (Idem, p.91). Mas,
com os estudos e pesquisas, nos perguntamos: o sujeito considerado alfabetizado deve
demonstrar quais habilidades? O que é um analfabeto? Como pode um sujeito
considerado analfabeto ser letrado? E todo o alfabetizado é letrado? As pesquisas
apontam que um indivíduo pode ser alfabetizado e não ser letrado, como também este
pode ser letrado e analfabeto. Para entendermos melhor este aspecto, a seguir, faremos
um breve esclarecimento sobre um e outro.
Letramento é um termo citado em livros, palestras e artigos produzidos a partir
da década de 90, do século passado, para caracterizar o indivíduo que conhece a função
da leitura e da escrita mesmo que não saiba necessariamente codificar e decodificar um
29
texto escrito. Por exemplo: o analfabeto pode ser um letrado quando ouve uma pessoa
alfabetizada ler uma notícia e consegue entendê-la, dita uma mensagem para que um
outro a escreva, sabe entender e interpretar uma notícia veiculada na televisão ou no
rádio (LEMOS, 2002). Assim também, uma pessoa:
[...] pode ser alfabetizada e não ser letrada: sabe ler e escrever, mas não cultiva
nem exerce práticas de leitura e escrita, não lê livros, jornais, revistas, ou não é
capaz de interpretar um texto lido: tem dificuldades para escrever uma carta,
até um telegrama – é alfabetizada, mas não é letrada (SOARES, 2002, p.47).
As pesquisas sobre alfabetização e letramento têm apontado um alto índice de
analfabetos no Brasil. É um dos problemas mais discutidos juntamente com a
dificuldade de a escola no nosso país cumprir sua missão na função de inserir a criança
no mundo das letras. Além da discutida alfabetização, tornou-se comum,
recentemente o emprego do vocábulo letramento (PERES, 2005).
Segundo Casemiro (2005), foi em meados da década de 80 que o termo
letramento começou a ser usado em debates e pesquisas. Para entender o sentido desse
vocábulo, a autora nos reporta à idéia de que o leitor que apenas decodifica as palavras,
sem dar sentido ao que está escrito, terá muitas dificuldades no mundo do trabalho em
uma sociedade tecnológica, pois “o impacto da escrita é de longo alcance, o letramento
acaba por estar presente também na oralidade” (p.53). Se um analfabeto compreende a
escrita como a base da comunicação vai valorizar a função e o uso da escrita na
sociedade e pode se “sair melhor do que o decodificador alienado desses recursos”
(p.52).
reconhecer a letra e decodificar um texto não é suficiente na sociedade atual.
Para Soares (2003), o termo alfabetização sempre foi entendido como aprendizagem do
sistema de escrita, mas ele vai muito além. É necessário oferecer condições para o aluno
criar o hábito de procurar livros, jornais, freqüentar revistarias e livrarias, para assim
apropriar-se do sistema de escrita. Porém, o início do processo de alfabetização, o
aprendizado das letras, sons, grafemas e fonemas devem ser acompanhados de
manuseio com materiais escritos diversos, e não como era dito pelos professores que
usavam a cartilha: primeiro você conhece todas as letras, aprende a ler e a escrever e
depois pode ler todos aqueles livros ali. O conhecimento do processo de escrita deve
seguir junto com o letramento.
30
Segundo Perfeito (2005), o termo letramento origina-se do inglês literacy e
pode ser considerado sob três aspectos como:
aquisição da leitura e da escrita enquanto código (alfabetização tradicional
neste sentido)
a relação dos usos da leitura e da escrita, como o avanço da civilização e
do progresso tecnológico;
o aprendizado como produto, de atividades mentais do indivíduo. E, nessa
perspectiva, concebendo o indivíduo como fundamentalmente responsável
pela aquisição da escrita, desconsiderando os contextos socioculturais do
processo de ensino-aprendizagem (PERFEITO, 2005, p.11e12).
Alfabetizado é a pessoa que decodifica letras e símbolos, é aquele que é capaz de
atribuir valores às letras, aos textos e que tendo internalizado o processo de aquisição da
leitura e escrita, interpreta o que leu, coloca sua história e experiências vividas para
compreender a mensagem do autor e resgatar o teor da mensagem escrita.
Letrado é aquele que, mesmo sem conhecer as unidades escritas da língua,
consegue atribuir significados ao que ouve em mensagens divulgadas e que, mesmo
analfabeto, é capaz de fazer compras, reconhecer produtos pelos rótulos, identificar
cédulas, placas de propagandas ou de transportes coletivos, ver horas e viver em uma
sociedade escrita, tecnológica e, não necessariamente, na escola, mas em qualquer
ambiente (família, igreja, clube e associações de bairros, sindicatos, etc) que tenha um
texto escrito ou mensagens transmitidas pelo rádio, televisão ou qualquer outro meio
eletrônico, torna-se compreensível para ele (KLEIMAN, 2002).
Para exemplificar pessoas que são alfabetizadas e não são letradas, Soares
(2003) explica que, no Brasil, as pessoas não lêem, não colocam em prática o que
aprenderam em situações corriqueiras, não são capazes de preencher um requerimento
ou um cheque. Aponta, ainda, esta falha na alfabetização, porque os indivíduos
aprendem as letras, o código alfabético, mas depois não sabem usar. A autora cita o
exemplo do uso de um forno microondas. O indivíduo pode saber perfeitamente para
que serve cada botão, mas não sabe usá-lo. Outro exemplo pode ser visto no filme
Central do Brasil, em que pessoas analfabetas ditam cartas para a personagem de
Fernanda Montenegro escrever. Esses analfabetos do filme conhecem a estrutura de
uma carta, sabem para que serve, porém não sabem escrever. Esses personagens que
ditam as cartas, são letrados, porém, analfabetos.
Para o processo de letramento e alfabetização, é preciso entender
fundamentalmente que um não existe sem o outro, são indissociáveis, não entre eles,
hierarquia nem cronologia. Pode-se letrar antes de alfabetizar ou vice-versa.
31
Paralelamente, ao ensinar a leitura e a escrita no processo de alfabetização, deve-se
também permitir que o alfabetizando tenha contato com materiais impressos, com textos
que tenham significado e que façam parte do universo infantil, da sua vivência e não
usar frases, como nas cartilhas, que estavam longe do contexto social e cotidiano dos
alunos (SOARES, 2003).
O grande desafio hoje é “que todos, crianças e adultos, aprendam a ler e a
escrever (ainda um problema, sem dúvida), que aprendam a fazer uso adequado da
leitura e da escrita nas práticas sociais que envolvem estas atividades” (SOARES, 2005,
p.52). Esta também era a idéia que Paulo Freire, (2003) defendia: o processo de
alfabetização como um canal para refletir a política, as práticas sociais, a posição do
homem no mundo e não somente como aquisição de uma técnica mecânica de
codificação/decodificação de letras e símbolos usados na nossa sociedade.
Entendo que a escola tem a função social de ensinar para que serve a escrita e
não somente como se escreve. Hoje, a escrita não é mais o único meio de comunicação
e sim, mais um meio de comunicação. A escrita, desde a antiguidade, surgiu para
satisfazer uma necessidade do homem; por isso ela é uma produção social, porém não
de acesso a todos os homens (GUIMARÃES, 2001). Até o século XIX, poucas pessoas
tinham domínio da escrita. Era uma atividade somente daqueles que realizavam algum
trabalho com ela.
no cotidiano das pessoas, inúmeras situações que exigiam a escrita, passaram a
ser resolvidas pelo uso de outros meios, tão ou mais eficazes: o telefone, a
televisão, o fax, etc. interações verbais que, em outros momentos, poderiam
se realizar pelo recurso da escrita, hoje são, com mais economia e eficiência,
realizados por outros meios [...] que comungam imagem e texto, podendo
resultar numa forma muito mais qualificada de linguagem (KLEIN, 2002,
p.106-107).
Faz-se necessário que a escola aponte a função da escrita, aliada ao ensino de
codificar e decodificar letras e símbolos. Que mostre os vários tipos de textos e
mensagens (receitas, bulas, poesia, literatura infantil, classificados de jornais, bilhetes
etc) e trabalhe com os alunos além de livros didáticos e apostilas.
Seria esta uma forma de trabalhar com materiais acessíveis e oferecer condições
para que as crianças oriundas de classes e culturas diferentes tenham acesso à língua e
sua função na sociedade.
32
1.2. Para além da escola dualista
As pesquisas sobre a educação escolar no Brasil indicam que ainda persiste a
escola dualista: uma escola para a classe dominante e outra para a classe dos
dominados. Kramer (2001) diz que a “a escola como instrumento de reprodução e
manutenção das desigualdades sociais, afundando na nossa desesperança de que por
meio da educação, nada poderia ser transformado, mas apenas preservado” (p.96).
Seria utopia pensar que a Escola particular é um paraíso onde tudo funciona bem
e a Escola pública é cheia de problemas. Na verdade, os desafios e as dificuldades que a
escola enfrenta podem ser diferentes, mas não deixam de existir nem em uma nem em
outra.
A escola privada sofre com pressões que os pais exercem para retirar os filhos e
diminuir os lucros dela; enfrenta problemas também, porém, de outra ordem. os
professores dispõem de materiais, máquinas e equipamentos modernos, seus salários
são um pouco superiores aos dos seus colegas da escola pública, o espaço físico é
planejado, a classe a ser atendida faz parte de uma parcela da sociedade com maiores
recursos e acesso à cultura, as crianças vêm para a escola alimentadas (nem sempre bem
nutridas, mas saciadas).
Mas na escola particular, “a ‘evasão’(um problema,sem dúvida, mais evidente na
escola pública) é substituída pela ‘mudança de escola’, devido à insistência dos pais;
e/ou a ‘incapacidade’ ou as dificuldades das crianças são corrigidas ou trabalhadas por
‘profissionais competentes’, num sistema paralelo e de apoio à escola, graças às
possibilidades financeiras das famílias” (SMOLKA,1989, p. 16).
Dessa forma, o aluno que entra no Ensino Fundamental (de 8 anos antigos, ou 9
anos agora, conforme a alteração feita pela Deliberação Federal 11274 de
000006/02/2006) não é uma ‘folha em branco’, ela já teve acesso a materiais impressos,
livros, e situações em que a leitura e escrita aconteciam. Weisz (2002) também aponta
esta discrepância entre o aluno da escola pública e o aluno da escola particular. Para esta
autora, as crianças da escola particular m mais oportunidades de conviver com a
linguagem escrita porque, no seu ambiente, vêem mais pessoas usando a escrita, seja
lendo ou transcrevendo. as crianças da escola pública, embora tenham contato com a
linguagem escrita, esta prática não faz parte habitualmente da sua vivência de do dia-a-
33
dia no seu grupo social. Dessa forma, iniciam sua escolarização com desvantagem em
relação às crianças da escola particular.
Cagliari (1992) aponta esta observação e nos diz que:
Uma criança que viu desde cedo sua casa cheia de livros, jornais, revistas, que
ouviu histórias, que viu as pessoas gastando muito tempo lendo e escrevendo,
que desde cedo brincou com lápis, papel, borracha e tinta, quando entra na
escola encontra uma continuação de seu modo de vida e acha muito natural e
lógico o que nela se faz. Uma criança que nunca viu um livro em sua casa,
nunca viu seus pais lendo jornais ou revistas, que muito raramente viu alguém
escrevendo, que jamais teve lápis e papel para brincar, ao entrar para a escola
sabe que vai encontrar essas coisas lá, mas sua atitude em relação a isso é bem
diferente da criança citada no parágrafo anterior. E a maneira como a escola
trata da sua adaptação pode lhe trazer apreensões profundas, até mesmo
desilusões (CALIGARI, 1992, p.21-22).
Soares (2005) analisa também as diferenças culturais, sócio-econômicas e
regionais da população, apontando repercussões diferentes na alfabetização conforme a
região ou camada da sociedade:
O processo de alfabetização não ocorre da mesma maneira em diferentes
regiões do país, porque a distância entre cada dialeto geográfico e a língua
escrita não é a mesma (sobretudo no que se refere à correspondência entre o
sistema fonológico e o sistema ortográfico) esta seria uma das (poucas)
razões para a existência de cartilhas regionais. Outro exemplo, sem dúvida
mais grave para a realidade brasileira do que o exemplo anterior: a natureza do
processo de alfabetização de crianças das classes favorecidas, que convivem
com falantes de um dialeto oral mais próximo da língua escrita (a chamada
“norma padrão culta”) e que têm oportunidade de contato com material escrito
(por intermédio, por exemplo, de leituras que lhes são feitas por adultos) é
muito diferente da natureza do processo de alfabetização de crianças das
classes populares, que dominam um dialeto em geral distante da língua escrita
e têm pouco ou nenhum acesso a material escrito (p.20).
A criança que convive com a leitura e escrita no seu ambiente cotidiano,
ingressa na escola, para oficializar o conhecimento que adquiriu em suas relações
familiares e sociais, sem grandes dificuldades. No entanto encontra uma instituição com
desafios a enfrentar, metas a cumprir e satisfações a dar (para pais, Núcleos Regionais
de Educação, psicólogos, psicopedagogos, fonoaudiólogos, terapeutas, neurologistas,
equipe diretiva, orientadoras, coordenadoras) e as dificuldades destes alunos na
aprendizagem, são reais. Não tanto no que diz respeito à aprendizagem, mas na
adaptação ao novo sistema de aprendizagem. “Em suma, falhando na sua tarefa
pedagógica, a escola passa a apontar cada vez mais uma série de ‘patologias nas
crianças’” (SMOLKA, 1989, p.17). Não conseguindo dar conta do seu papel de ensinar,
a escola aponta fatores que passam a ser a causa do fracasso escolar, como dislexia,
34
discalculia, disgrafia, disortografia,etc, omitindo-se na sua função básica de ensinar, de
melhorar a aprendizagem e buscar recursos ou aproveitar os conteúdos que a criança
traz em sua bagagem cultural e vivencial, opta por denunciar patologias que justificam o
insucesso, rotulando e, algumas vezes, marginalizando algumas
crianças.Evidentemente, em alguns casos, as patologias são reais, mas em outros, são do
modismos da época (hiperatividade, déficit de atenção, transtorno bipolar, síndrome do
pânico, disgrafia, dislexia, discalculia)
4
e tantos outros argumentos que se usam, hoje,
para rotular os casos de dificuldade ou, para disfarçar a falta de limites e a boa educação
como também as falhas pedagógicas das escolas e dos professores.
Independente da classe social, da facilidade ou não de observar pessoas lendo ou
escrevendo, o certo é que há muitas dificuldades a serem vencidas pelas crianças em
fase de alfabetização. Mas, o que é alfabetização?
Segundo Soares (2005), há diferença entre aquisição da língua oral e escrita do
desenvolvimento da língua oral e escrita. A aquisição e o desenvolvimento não podem
ser designados como alfabetização. O desenvolvimento da língua é um processo que
não cessa, mas a aquisição acontece no período de alfabetização. Assim:
o termo alfabetização não ultrapassa o significado de “levar à aquisição do
alfabeto”, ou seja, ensinar o código da língua escrita, ensinar as habilidades de
ler e escrever; pedagogicamente, atribuir um significado muito amplo ao
processo de alfabetização seria negar-lhe a especificidade, com reflexos
indesejáveis na caracterização de sua natureza, na configuração das
habilidades básicas de leitura e escrita, na definição da competência em
alfabetizar. [...] em seu sentido próprio, específico: processo de aquisição do
código escrito, das habilidades de leitura e escrita. [...] alfabetizar significa
adquirir habilidade de codificar a língua oral em língua escrita (escrever) e de
decodificar a língua escrita em língua oral (ler). A alfabetização seria um
processo de representação de fonemas em grafemas (escrever) e de grafemas
em fonemas (ler) (SOARES, 2005, p.15) (grifos da autora).
Portanto, percebe-se que na fase de alfabetização, a criança possui um vasto
vocabulário adquirido no convívio familiar e social que se tranformará em códigos
escritos que recebem o nome de fonemas e grafemas.
Há professores-alfabetizadores, que se esquecem de que nesta fase de
alfabetização, a criança ainda precisa brincar e, ao se esquecerem deste detalhe, impõem
um ritmo forçado de aprendizagem, quando seria melhor oferecer atividades lúdicas,
prazerosas, brincadeiras e maneiras de aprender sem ser com lápis, caderno, borracha;
4
Ver no anexo 1 , uma breve descrição das patologias, já que não é esse o foco dessa pesquisa.
35
ou seja, oferecer jogos, atividades com o computador que estimulariam a criança a
pensar, a tentar sem receio de errar (CAGLIARI, 1992).
Diferente do adulto que tem o domínio do alfabeto, que sabe ler e escrever,
para uma criança de 6-7 anos, desenvolver a habilidade da escrita é um processo
complexo. Lembrando-se de que é mais complicado ainda para um adulto analfabeto
aprender a ler e escrever.
A criança quando entra na escola, sabe fazer uma leitura das coisas à sua volta.
Ela lê placas e desenhos, lê nomes de lojas, propagandas e rótulos; mas ler as letras da
maneira como a escola ensina é uma tarefa difícil para ela. Para começar, tudo à sua
volta está escrito com letra de forma, mas na escola ela precisa aprender também a letra
cursiva. Outro ponto é a linguagem oral das palavras que se diferencia da escrita. A
escola fala de uma outra forma que soa artificial aos ouvidos. Soares (2005) salienta a
diferença entre uma e outra:
a língua escrita não é, de forma alguma, um registro fiel dos fonemas da língua
oral, também especificidade morfológica, sintática e semântica da língua
escrita: não se escreve como se fala, mesmo quando se fala em situações
formais; não se fala como se escreve, mesmo quando se escreve em contextos
informais (p. 17).
Esse aspecto pode ser observado em um ditado, em que as palavras são quase
silabadas para que a criança perceba-as, é uma forma que se distancia da linguagem
oral, seja na norma padrão, culta ou não. Ninguém conversa silabando ou dando pausas
entre uma palavra e outra.
A escola também oferece poucas oportunidades para a criança ler; e a leitura
para Cagliari é “toda manifestação lingüística que uma pessoa realiza para recuperar um
pensamento formulado por outra e colocado em forma de escrita” (1992, p.155). A
escola deveria ser um lugar de excelência para propiciar o aprendizado da linguagem
escrita e da decodificação desta em leitura, mas poucas são as oportunidades oferecidas
para que isso ocorra. Além de oportunizar de maneira breve a leitura,
[...] as atenções se concentram na escrita como uma complicada habilidade
motora a ser desenvolvida, e as preocupações se encontram voltadas para os
‘pré-requisitos da alfabetização’, (...) além disso, em salas desnudas e super
populosas, a imposição do silêncio, da imobilidade, da esterilidade e da
estagnação acaba sendo uma ‘opção’ a que o professor recorre para poder
sobreviver (SMOLKA, 1989, p. 17).
36
Há professores que cobram uma leitura em voz alta, sem o aluno estar preparado
para esta atividade. Se um professor-alfabetizador tivesse noção do esforço que uma
criança faz para ler em voz alta, já que ela precisa ajustar sua fala à leitura, permitiria ao
aluno ler várias vezes em voz baixa (a leitura silenciosa) antes de pedir a leitura em voz
alta. O que é pior, para uma platéia que também está em processo de alfabetização e,
muitas vezes, ridiculariza a leitura do colega por causa dos erros cometidos. Esta
exposição vexatória pode causar traumas e vergonhas de se ler em público.
Ocorre que a leitura em voz alta requer um “amadurecimento das habilidades
lingüísticas” (CAGLIARI, 1992, p. 161) e em particular que o aluno expresse com sua
voz o pensamento de um outro e, dessa forma, a leitura é ouvida como a representação
de um ator, a declamação de um poeta que coloca ali suas expressões e deve ser
interpretada pelo leitor.
Para falar, começamos com uma organização neurolingüística de um
pensamento. No caso da leitura, a pessoa processa uma programação
neurolingüística para dizer coisas que não pensou, num longo tempo, a partir
das referências que a interpretação dos sinais de escrita lhe proporciona. Esta
falta de controle sobre uma extensão relativamente grande do pensamento leva
facilmente à produção de uma fala mais vagarosa, podendo, se mal controlada,
produzir uma realização fonética silabada, sem o ritmo, a entonação e outras
características próprias da fala espontânea. (CAGLIARI, 1992, p. 162)
A ênfase maior na escola é para a escrita, mas na vida cotidiana se mais do
que se escreve. No processo de alfabetização, a leitura e a escrita seguem juntas; uma
depende da outra.
Aprender a ler e a escrever, para a escola, parece apenas significar aquisição de
um ‘instrumento’ para a futura aquisição de conhecimentos; a escola
desconhece a alfabetização como forma de pensamento, processo de
construção do saber e meio de conquista de poder político (SOARES, 2005,
p.22).
Nessa perspectiva, Goulart (2005) diz que a língua escrita é ensinada como um
jogo de “codificação de sons em letras (escrita) e decodificação de letras em sons
(leitura)” (p. 53). Dessa forma, a escola esconde ou camufla a história de vida das
pessoas, sua vivência, seus valores e também não aponta o uso e função da escrita.
Encontramos este mesmo pensamento em Smolka (1989), quando ela afirma que
a “leitura é atividade social cuja funcionalidade se evidencia e se propaga cada vez
mais, mas que, contraditoriamente, uma grande parcela da população não aprende seu
37
funcionamento porque a escola, como lugar de ensino, acaba sendo extremamente
seletiva” (p.15).
Dessa forma, procurei proporcionar às crianças situações reais de escrita e
oferecer as histórias em quadrinhos como estratégia para elaboração de textos.
A seguir, apresentarei um breve histórico sobre as Histórias em Quadrinhos,
porque nesse momento é relevante conhecer a origem e evolução da História em
Quadrinhos em sua representação da realidade, as proibições que aconteceram, o
preconceito que as acompanharam e acompanham, a influência dessas nas crianças e
nas escolas, e também as normas convencionadas para ler e criar uma história em
quadrinhos.
A partir daqui, usarei HQs para designar Histórias em Quadrinhos, porque é
assim que os pesquisadores e estudiosos dessa área utilizam em seus trabalhos.
38
2. BREVE HISTÓRICO DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS
Guimarães (2003) investiga a relação texto e imagem e nos diz que desde os
primórdios da humanidade, o homem se comunica, por meio de gestos ou linguagem
oral. Não registro de que o homem primitivo de 250 mil anos atrás se comunicasse
pela fala, mas certamente possuía as estruturas fisiológicas preparadas para esse fim.
Também não há provas de que falassem frases com estrutura gramatical para estabelecer
um diálogo com seus semelhantes, mas, certamente, de um jeito ou de outro,
encontraram formas de se comunicarem.
A comunicação é inerente ao ser humano. Uma das formas utilizadas pelo
homem para se comunicar foi o desenho. As pinturas rupestres encontradas em cavernas
datam de cerca de 40 mil anos foram feitas em rochas, superfícies planas ou nas paredes
das cavernas, com tintas e resinas. Estes desenhos representam objetos, animais e
figuras humanas, “um aspecto da realidade que se tentou representar foi o das figuras
inertes (...) classificados como retratos” (GUIMARÃES, 2003, p.6)
Para representar fatos ou acontecimentos vividos, o homem primitivo fez nas
pedras a composição de cenas em um único quadro. Esta tentativa pode ser observada
em uma cena de caça, cujas figuras parecem descrever um acontecimento, ao contrário
da representação descrita anteriormente, cuja função era de descrever a figura.
Para descrever o que se supõe uma seqüência de um movimento, usava-se as
imagens seqüenciadas, uma ao lado da outra. Essa maneira de registrar os
acontecimentos está presente em painéis do antigo Egito, em que se pode ver as fases da
plantação, colheita e armazenagem da produção.
Segundo Guimarães (2003), o primeiro elemento próprio das HQs, é o desenho
com a função narrativa e sua tentativa de representar um movimento. O segundo
elemento é a seqüência de imagens que tem por finalidade representar a ação que
acontece em um espaço temporal maior. Assim, surgiram as HQs sem textos escritos,
que se utilizava somente de desenhos para narrar acontecimentos. No início, os textos
nas HQs, apareciam discretamente, mais como uma explicação para acrescentar
informações do que propriamente um diálogo ou uma narração da história. Como
exemplo disso, é a seqüência de quadros da Paixão de Cristo. O texto aparece no título
dos quadros, mas não descrição ou narração do acontecimento. O que se pode dizer
que é uma história feita em quadros e não uma HQs.
39
As HQs começaram a aparecer com mais intensidade aproximadamente 100
anos, ao mesmo tempo em que o cinema começa a se projetar como entretenimento
produzido pela indústria cultural (SILVA, 2004). Atualmente, as HQs fazem parte da
nossa cultura e podem ser consideradas uma expressão cultural e artística que ganhou
opulência e ostentação com o passar dos anos.
Mas não foi sempre assim. Segundo Quella-Guyot (1994) e Rama (2004), as
HQs passaram por períodos tão críticos que muitas editoras que publicavam esse
gênero, fecharam as portas ou tiveram grandes prejuízos. Seja pelos desenhos que
muitas vezes explicavam as histórias e complementavam a idéia que o autor queria
transmitir, seja pela linguagem de fácil assimilação para o grande público, o fato é que
as HQs popularizaram-se entre jovens e adolescentes e causou preocupação, segundo os
dois autores, aos pais, educadores e religiosos.
O crescente aumento das tiragens de revistas que continham as HQs, fizeram
surgir críticas acirradas “das camadas ditas pensantes da sociedade” (Rama, 2004, p.16).
Houve campanhas de difamação contra elas e tudo de ruim que acontecia era culpa da
HQs. Diziam os críticos, que a leitura destas, tornava o jovem preguiçoso, sem
vocabulário e que elas afastavam a juventude do mundo dos livros e de assuntos sérios.
Todo fracasso escolar que ocorria, era culpa delas. Diziam ainda que havia “o
embotamento do raciocínio lógico, a dificuldade para apreensão de idéias abstratas e o
mergulho em um ambiente imaginativo prejudicial ao relacionamento social e afetivo de
seus leitores” (RAMA, 2004, p.16). Ou seja, as HQs passaram a ser inimigas processo
de ensino e de aprendizagem.
Quella-Guyot (1994, p.19) aponta a campanha de difamação contra as HQs,
citando um artigo publicado e traduzido de uma revista dos Estados Unidos, intitulado
Psicopatologia das Histórias em Quadrinhos, de G. Legman, em 1949. Esse artigo
argumenta que a geração dos anos 40 não aprendeu a ler e não vai aprender; e muito
menos a decodificar propagandas. Afirma que a linguagem impressa estava perto de
desaparecer e culpava o rádio, o cinema e as Histórias em Quadrinhos, por isso,
salientava que estes cumpriam as necessidades recreativas da geração que não mais
procurava livros para se ocupar durante o tempo livre.
Nessa época, era grande a luta de professores, pais e padres contra as HQs,
porque traziam narrativas com temas que misturavam crimes, violência, sexo e
delinqüência. A campanha contra as HQs ganhou uma força especial, segundo Quella-
Guyot (1994), quando o psiquiatra F. Wertham publicou, em 1954, seu livro Seduction
40
of the innocent (Sedução de um inocente). Nesse livro, o citado psiquiatra afirma que os
leitores procuram imitar as personagens e “se transformam em perigosos malfeitores,
assassinos e tarados sexuais” (QUELLA-GUYOT, 1994, p.20).
Como conseqüência, os “bons” quadrinhos recebiam um selo da C.C.A. (Comics
Code Authority) para que pudessem ser publicados e comercializados. Mas, não foi
nos Estados Unidos que a propaganda contra os quadrinhos existiu. Na França, foi
proibida a leitura e utilização dos quadrinhos nas escolas. Porém, na França, existia
também um peso contra o americanismo, que, antes da Segunda Guerra Mundial,
alguns jornais traduziam e publicavam as tiras de quadrinhos americanos.
Em 16 de julho de 1949, foi aprovada uma lei que regulamenta algumas normas
para as publicações das Histórias em Quadrinhos. O primeiro artigo dessas normas,
dizia que “Ficam sujeitas às prescrições desta lei todas as publicações, periódicas ou
não, que, pelo seu caráter, sua apresentação ou seu objeto, pareçam destinar-se
principalmente às crianças e aos adolescentes.” (QUELLA-GUYOT, 1994, p.21)
No artigo dessa lei, foi estabelecido que as publicações não devem “conter
ilustrações, relatos, rubricas nem inserções que apresentem sob uma ótica favorável o
banditismo, a mentira, o roubo, a preguiça, a lassidão, o ódio, o desrespeito, bem como
todos os atos qualificados como crime ou delitos ou que possam vir a desmoralizar a
infância ou a juventude, ou que inspirem ou revelem preconceitos étnicos” (Ibidem).
Dessa forma, Quella-Guyot (1994) aponta as três proibições: proibido para
menores de dezoito anos (primeira), proibido expor (segunda) e fazer publicidade
(terceira). As críticas contra as Histórias em Quadrinhos, as proibições e o encalhe de
publicações, fizeram com que os editores se tornassem tão rígidos que se auto-
censuravam, tornando a censura mais rígida ainda do que era na verdade. O que de bom
ficou dessa época de críticas, campanhas difamatórias e proibições, é, segundo o autor,
as imagens astuciosas e criativas que os autores encontraram para burlar as proibições e
se divertirem ao mesmo tempo. Inventaram os balões que, ao invés de conter palavras
de baixo calão e poder transmitir cólera e raiva nos diálogos que criavam entre as
personagens, usavam uma combinação de caracteres gráficos em que se podiam ver
caveiras, bombas, facas e outras figuras como forma de expressar o sentimento
contestado sem correr o risco de ver seu trabalho proibido ou censurado.
Essas barreiras e preconceitos começaram a cair na Europa e depois se espalhou
para outras partes do mundo porque se entendeu que
41
grande parte da resistência que existia em relação a elas, principalmente por
parte dos pais e educadores, era desprovida de fundamentos, sustentada muito
mais em afirmações preconceituosas em relação a um meio sobre o qual, na
realidade, se tinha muito pouco conhecimento (RAMA, 2004, p.17).
Graças a essa nova visão das HQs, foram publicadas histórias de vultos famosos
que participaram de algumas batalhas ou foram responsáveis por grandes conquistas na
história do país, eventos históricos e quadrinhos religiosos e de fundo moral e também
uma aproximação dos quadrinhos com obras literárias. Várias publicações sobre valores
morais da Igreja Católica, biografias de santos e personagens bíblicos puderam ser
publicadas (MOYA, 1996).
Não tardou para usarem os quadrinhos como fonte de propagandas ideológicas e
políticas. Hoje, segundo Rama, (2004) o mercado oferece inúmeras publicações de
Histórias em Quadrinhos para campanhas de esclarecimento à população sobre
epidemias, doenças transmissíveis, combate à dengue, cólera, cuidados e preservação do
meio ambiente e uso correto dos recursos naturais. São conhecidos também, fartos
materiais de campanhas educativas do trânsito, apoio técnico para bem utilizar
equipamentos e treinamento de pessoal para atividades especializadas.
Sendo os quadrinhos considerados uma linguagem universal, que os desenhos
falam por si só, auxiliam no entendimento da história sem necessariamente entender a
língua vernácula utilizada (RAMA, 2004). Dessa forma, uma história produzida no
Canadá, por exemplo, poderá ser entendida por um brasileiro ou um chinês, sem que,
obrigatoriamente este saiba ler no idioma em que ela foi escrita.
Os estudos de alguns pesquisadores da área educacional, mostram que os
quadrinhos têm grande aceitação entre crianças e jovens. Por exemplo: Azis Abrahão
citado por Santos (2003) em sua pesquisa sobre a utilização das HQs em sala de aula,
diz que a aprendizagem com as histórias em quadrinhos não alcança o objetivo
proposto pelo professor como finalidade instrutiva, como também pode ser usada para
apresentar diversos assuntos. Afirma que preenche uma finalidade educativa que
produz um desenvolvimento mental e também desenvolve o interesse pela leitura.
As páginas coloridas e texto acessível facilitam a leitura, considera Azis Abrão
em Santos (2003), fazem das HQs uma importante aliada pedagógica em todas as
disciplinas escolares. Essa facilidade de comunicação é explicada por Rama (2004)
como sendo um gênero que vai ao “encontro das necessidades do ser humano, na
medida em que utilizam fartamente um elemento de comunicação que esteve presente
42
na história da humanidade desde os primórdios: a imagem gráfica” (p.8). Como são bem
aceitos, os quadrinhos podem ser utilizados por professores, seja com histórias
prontas para explicar a matéria ou como um reforço da aprendizagem. Também podem
ser aproveitadas como um meio de observar a aprendizagem dos alunos; ou seja, o
professor pode pedir que os alunos criem uma história em quadrinhos sobre um
conteúdo explicado, pois as crianças, segundo Rama (2004) transmitem seus
pensamentos, interpretações de histórias e sua percepção de mundo por meio do
desenho.
Os professores podem organizar uma coletânea de gibis a serem trabalhados
multidisciplinarmente. Várias atividades poderão surgir a partir dessa coletânea e da
posterior criação de uma gibiteca. Todo e qualquer gibi deve ser analisado, comentado e
classificado. Na visão de Rama (2004) e Calazans (2004), que pesquisam sobre a
utilização das HQs em sala de aula, a produção de HQs pode contribuir para criar o
hábito de leitura e este hábito poderá ser estendido para leitura de livros científicos ou
de literatura, revistas informativas, jornais e outras mídias.
Os quadrinhos que contam histórias de super-heróis, tão bem recebidos pelas
crianças e adolescentes, podem servir de fontes de pesquisas de teorias científicas
porque, por tratarem de assuntos relacionados à química, física, metamorfoses e
experiências, incitam a curiosidade. Mas independente de pesquisas científicas,
qualquer história possibilita a produção de trabalhos de interpretação e análise de textos
(GUIMARÃES, 2003).
Um bom exemplo, citado por Calazans (2004), é trabalhar a norma culta da
nossa língua a partir da fala caipiresca de Chico Bento, da Turma da Mônica, de
Maurício de Sousa, ou ainda um questionamento das características marcantes dos
outros personagens da Turma, lembrando também a falta de pai e mãe e de núcleo
familiar que nem é citado nas histórias do Pato Donald e do Tio Patinhas, de Walt
Disney. São aspectos que poderão ser analisados, pelo professor e alunos, criticamente,
seja psicológica ou socialmente, questionando valores, crenças, relações familiares,
preconceitos, estereótipos que aparecem subliminarmente nos quadrinhos.
Recomenda-se ao professor, não perder de vista que a imagem em uma história
em quadrinhos, é percebida primeiro e depois que se percebe o texto. Para não provocar
o desinteresse pela leitura, o texto deve ser ágil e dinâmico, com poucas explicações,
que essas, podem ser fornecidas pelas ilustrações. Ao utilizar as histórias em quadrinhos
na sala de aula, para simples divertimento ou para reforçar um conteúdo, o primeiro
43
passo é esclarecer aos alunos, os aspectos que são naturais para os adultos e que não são
necessariamente, tão simples assim para as crianças. Explicar, por exemplo, os balões
mais comuns; a parte que cabe ao narrador da história; a maneira correta de ler (que
segue a mesma norma estabelecida para leitura de textos. Se a atividade for para
construir uma HQs, deve-se informar aos alunos os recursos utilizados pelos produtores
e criadores, porque, apesar dos alunos lerem histórias em quadrinhos, nem sempre
percebem que a mudança de um quadro para outro, suscita a imaginação do leitor.
Quella-Guyot (1994, p.38) diz que “o leitor vida ao que falta, ao que não aparece” e
o aluno deve saber disso para criar as suas HQs.
Para se ler os textos das HQs, tem que ter um certo domínio da codificação e
decodificação de grafemas, letras, sílabas, assim como saber ler desenhos e imagens.
Mas como se aprende a ler? Em primeiro lugar, aprender a ler, apesar de ser vinculado
ao conceito de alfabetização, é um conceito mais amplo e abrangente do que apenas
reconhecer letras, sílabas e decodificar sinais gráficos. Segundo Eisner (2001, p. 8), ler
palavras é uma das atividades humanas que abrange a “decodificação de símbolos, a
integração e a organização de informações”, ou seja, implica uma interpretação
subjetiva do sujeito sobre os signos e símbolos.
Para Jolibert (1994, p.15), ler é “atribuir diretamente um sentido a algo escrito; é
questionar algo escrito [...]”. Ou seja, ler é entender o significado do que está registrado,
compreender o que o autor quis dizer e trazer as informações para um confronto com
sua vivência, seus saberes e seus valores adquiridos. Na leitura, não intermediários.
O leitor busca no texto as informações que necessita, e um mesmo texto pode ter
significados diferentes para cada leitor, dependendo do seu objetivo ao ler, e cada um
que lê faz as indagações para interpretar o texto, construir o sentido desse e não somente
decifrá-lo.
Para se interpretar e decifrar um texto escrito, de acordo com Jolibert (1994, p.
142), a análise passa por “sete níveis de conceitos lingüísticos”, que vão e vem para se
concretizar.
1) Passa pela noção geral do texto e não somente de uma única palavra ou de um
conjunto de palavras.
2) Identificação do sujeito para quem esse texto foi produzido e por quem, e os
objetivos que o autor tinha em mente ao escrevê-lo.
3) Reconhecimento do tipo do texto, se é poema, carta, cartaz, receita, bula, se é ou não
informativo, se é regra de jogos ou lista para construções.
44
4) A interpretação e decifração do texto, passa também pela análise da superestrutura,
que, segundo Jolibert (1994), é organização espacial, esquema narrativo e a dinâmica
interna, ou seja, como é o desenvolvimento desse texto.
4) O nível conceitual, se esse texto é conto, lenda, novela ou romance.
5) A verificação da pessoa, tempo e lugar, “os campos semânticos e a pontuação do
texto” (p. 143).
6) A lingüística da frase engloba vocabulário, ortografia, sintaxe e a pontuação das
frases.
7) As palavras que constituem o texto; grafemas, se estão no singular ou plural, no
masculino ou feminino, as pessoas e tempos verbais.
Vê-se que ler um texto, para Jolibert, vai muito além de ler palavras e
decodificá-las. É preciso que o professor acostume-se a fazer estes questionamentos
para treinar seus alunos a fazê-lo também.
Para Aguiar (2001), neste período da vida acadêmica que uma pessoa “está
aprendendo a simbolizar ou significar o mundo a partir da conquista dos códigos da
leitura e escrita” (p.59). É na alfabetização que se desenvolve a habilidade de
decodificar letras em sons. A partir daí, várias descobertas são possíveis, pois no
período da alfabetização, a criança começa a descobrir o mundo em sua volta,
simbolicamente ou não, e essas descobertas favorecem outras.
O ato de ler deve ser esclarecido para as crianças que vai muito além de
decodificar letras em sons. Existe uma função social e cultural mais abrangente
(KRAMER, 2001). Aprende-se a ler, não somente para avançar para a série seguinte,
nem para conseguir um emprego melhor no mercado de trabalho. É evidente que a
leitura também é para isso, mas não para isso. Aprende-se a ler para ter mais um
meio de se comunicar, de entender o mundo e estar inserido nas transformações
culturais e sociais da sociedade.
Vivemos em uma sociedade tecnológica que requer um novo perfil de
trabalhadores. São indivíduos que “não apenas dominem a tecnologia do ler e do
escrever, mas também que saibam fazer uso dela, incorporando-a a seu viver,
transformando assim seu ‘estado’ ou ‘condição,’ como conseqüência o domínio desta
tecnologia” (SOARES, 2005, p.7).
Atualmente, não é mais possível tratar as práticas de ensino sem pensar nas
mensagens midiáticas que circulam nos diferentes meios de comunicação. São
os novos mediadores tecnológicos que descentralizam o campo da produção
45
do conhecimento e da informação, mas que exercem grande poder e influência
no comportamento cognitivo e nos hábitos sociais, culturais e políticos.
(TERUYA, 2006, p.94).
Na escola, segundo Teruya (2006), pode ser desenvolvida também a leitura
midiática. Ou seja, os profissionais da educação devem trabalhar utilizando os recursos
midiáticos como aliados à sua prática pedagógica, seja para produzir textos, pesquisar
documentos e reportagens, como também ter acesso a mapas, obras de artes e utilizar os
inúmeros softwares educativos e pedagógicos que estão disponíveis no mercado.
No mundo repleto de tecnologias de mídia, “Saber ensinar a olhar e ler as
imagens, saber usar as modernas tecnologias no ensino, é um passo importante para se
transformar a educação e se atingir nas palavras de Heloísa Dupas Penteado uma
pedagogia da comunicação” (SILVA, 2004, p.112). A leitura é também uma
decodificação de mapas, imagens, obras de arte, notas musicais, figuras, projetos,
gráficos,. ou seja, a leitura de mundo é uma atividade mental em sentido amplo, que
engloba a percepção, a intuição, o conhecimento cultural, a sensibilidade, o sentimento
e a razão.
[...] a criança no mundo contemporâneo, é constantemente desafiada a fazer a
leitura das linguagens imagéticas. O universo infantil é invadido pelos meios
de Comunicação de Massa (MCM), o que significa um deslocamento dos
textos escritos para outros que privilegiam os aspectos visuais e sonoros, ou
combinam esses elementos com formas verbais (SILVA, 2004, p. 109).
Assim, para se ler as HQs, é preciso, em primeiro lugar, ser alfabetizado para
decodificar as palavras em fonemas e grafemas, sílabas, palavras e frases e depois para
entender o simbolismo, o significado e o significante de cada recurso empregado na
construção de uma história, é necessário uma combinação das experiências vividas,
lidas e ouvidas, que possam ser identificadas nos temas abordados e desenvolvidos nas
HQs. É uma alfabetização não de códigos lingüísticos, mas também de símbolos e
imagens que fazem da leitura de mundo que se vive, instrumentos para o crescimento e
desenvolvimento intelectual, mental e emocional para o alfabetizando, isto porque “a
leitura da revista em quadrinhos é um ato de percepção estética e de esforço intelectual”
(EISNER, 2001, p.8).
Segundo Eisner (2001), as Histórias em Quadrinhos exigem que os desenhos
exerçam uma interação entre o autor e o leitor, já que o primeiro está evocando imagens
46
guardadas na mente dos dois. Como o desenho é uma imagem fixa e sem palavras, ela
deve transmitir ao leitor o que a descrição de um texto escrito faria.
Nesse sentido, os produtores de texto, segundo Quella-Guyot (1994), procuram
dar a “ilusão de vitalidade, sonorizar e dinamizar estas imagens.” (p.26) para se ‘ler’
sons e imagens, os autores contemporâneos partiram de ideogramas existentes e
criaram outros, porque era preciso representar também os sons da vida, sons do
ambiente em que se passava a história, procurando transmitir de forma mais real
possível, com totalidade a realidade visual e sonora que existe nos ambientes.
Nessa perspectiva, os ideogramas diferem dos pictogramas porque são desenhos
simbólicos, enquanto os pictogramas têm sua semelhança entre símbolo e significado,
os ideogramas têm significado quando inseridos a outros signos que se apresentam
juntos. Quella-Guyot (1994,) elucida bem com o exemplo da lâmpada, em que
dependendo do contexto, pode ter um ou outro significado: pode representar uma forma
de iluminar um ambiente ou uma grande idéia quando colocada acima da cabeça de
algum personagem. Assim, os ideogramas são códigos, porém não são fixos, variam
conforme a conotação dada na história.
Eisner (1994) percebe que para esse recurso ser utilizado (do desenho
representar por si ou quando o objeto é uma coisa, mas com outro significado)
quando diz que as Histórias em Quadrinhos “apresentam uma sobreposição de palavra e
imagem, e, assim, é preciso que o leitor exerça suas habilidades interpretativas visuais e
verbais (p.8)”. Dessa forma, perceber o contexto e interpretar de acordo com o texto e a
imagem.
A imagem é representativa para a criança. É a primeira forma de comunicação
não verbal utilizada por ela, seja no contexto familiar ou escolar. O desenho contribui
para o futuro desenvolvimento da criança, porque, segundo Silva (2004), trabalha com
as fantasias e a linguagem interior da criança. Quando a criança e observa um
desenho, as estruturas mentais são ativadas e, estas estão relacionadas à criatividade,
emoções e sensações, daí sua contribuição, pois o repertório verbal da criança entre 6 e
7 anos, ainda é pequeno, e as imagens, mesmo que não consiga dar nomes, muitas vezes
são carregadas de significados. Isso facilita a elaboração de emoções e sensações, ainda
que não percebidas, são sentidas e traduzidas em palavras escritas.
Quando o autor cria uma história em que não utiliza texto, as imagens devem
representar uma expressão corporal capaz de levar o leitor a identificá-las com uma
série de ações contendo uma narrativa. Os desenhos têm a tarefa de expressar uma
47
experiência comum que é familiar ao leitor. Afinal o desenho sem texto era uma
forma expressão dos povos primitivos como um meio de comunicação desde a época
das cavernas, por isso requer do leitor uma interpretação mais refinada para captar os
sentimentos mais profundos do criador da história (EISNER, 2001)
Como demonstra Eisner (2001), quando a imagem apresentada nas HQs aparece
em close, ou a figura em plano médio, ou quando é desenhada da cintura para cima
ou a figura inteira, é o recurso utilizado pelos autores quando querem deixar algum
detalhe em evidência, como por exemplo, traços da fisionomia ou algum objeto que
deve ser observado pelo leitor para a compreensão da cena/história. Quando uma figura
aparece em close, espera-se que o leitor ‘leia’ o que não está aparecendo, ou seja, o
resto do corpo do personagem. A figura de um corpo desenhado da cintura para cima é
normalmente usada para que o leitor tenha noção do porte corporal do personagem,
estabelecendo um segmento mental ao que não aparece na imagem.
Outro recurso utilizado para ler e produzir uma HQs com ou sem texto, e que
precisa ser dito, é o quadro e o requadro do quadrinho. Além de emoldurar, serve
também para representar uma linguagem não verbal. Assim, Eisner (2001), nos
apresenta alguns tipos, comumente usados nas HQs:
O requadro quadrado ou retangular com traço reto quer nos informar que o que
se passa ali, está no tempo presente; ao passo que quando o retângulo é sinuoso ou
ondulado, quer representar um fato acontecido no passado; um hieróglifo é usado para
representar pensamento e também, dependendo do contexto, caracterizar emoções. E
podemos ainda ver histórias onde não são utilizados requadros. Esse recurso é utilizado
para representar o espaço ilimitado, e o leitor completa a cena imaginando o que não
está sendo mostrado.
Quella-Guyot (1994) nomeia de plano panorâmico e plano conjunto em que as
personagens aparecem em tamanho menor e são utilizados para dimensionar os espaços
e descrever ambientes. O plano médio, seja no formato americano (mostrado da parte
superior da coxa até a cabeça) ou plano italiano (se apresenta com cortes na altura do
joelho para cima) ou planos aproximados (da cintura para cima), servem para o autor
destacar algum fator que será importante na narrativa. Quando ele coloca “em relevo as
expressões do rosto nos faz participar de perto de certas cenas de ação” (p. 41)
Silva (2004) explica que nas cenas cinematográficas, os closes são usados para
detalhamento de fisionomia; os planos médios mostram o personagem da cintura para
cima e servem para destacar a expressão facial. O que para Eisner (2001) é plano
48
inteiro, para Silva (2004), é plano de conjunto, quando mostra os personagens por
inteiro e são utilizados para reforçar “a ênfase que se deseja dar às personagens e ao
contexto” (p.99).
Nas HQs, aparecem requadros com o traçado denteado quando se quer transmitir
uma forte tensão, um momento angustiante em que a emoção tem carga explosiva. Para
reforçar o comprimento de um objeto são usados retângulos compridos e, para
representar a força, ameaça ou deixar uma “ação desenfreada”, Eisner (2001) nos fala
de personagens rompendo “os limites do quadrinho”. Muitos outros modos de requadros
são apresentados, porém estes são os que nos auxiliarão na análise das histórias criadas
pelas crianças, a ser vista no próximo capítulo.
Seguindo a exposição dos recursos utilizados em Histórias e Quadrinhos, falarei
das Onomatopéias. Para Rama (2004), “Onomatopéias são signos convencionais que
representam ou imitam um som por meio de caracteres alfabéticos”. (p.62)
Para Quella-Guyot (1994, p.85), o uso das onomatopéias em Histórias em
Quadrinhos é o meio pelo qual os autores “se esforçam por instaurar uma
‘figurabilidade do sonoro’, de forma que o visto seja igualmente ‘ouvido’”. Variações
como a espessura da letra a ser colada na onomatopéia, a aparência desta (sinuosa,
tremida, retalhada) traduzem emoções, sentimentos como: medo, raiva, explosões, e
também o valor cronológico vinculado com a repetição da letra (ou do caractere gráfico)
ou o comprimento desta.
Segundo Rama (2004), a onomatopéia aparece próxima do lugar que acontece o
som, e pode se apresentar dentro ou fora dos balões. variações destas onomatopéias
dependendo da preferência de cada autor. As onomatopéias, em sua maioria, provém do
inglês e, embora autores optem por adaptá-las ao português, podemos encontrá-las
como foram criadas originalmente.
D’Oliveira (2004) diz que as onomatopéias preenchem totalmente um ou dois
quadros em algumas histórias. Para ela, “na onomatopéia, o verbal rompe a barreira que
o separa da imagem e torna-se, ele mesmo, uma outra imagem, não mais somente
aquela dada pelo significante, a marca da tinta, mas uma imagem que, digamos, se
presentifica através do desenho, se transforma em outro personagem” (p.89).
Os balões também representam uma outra forma de comunicação dentro das
HQs. Para Rama (2004), o balão é a complementação da imagem e da palavra e vice-
versa. Quella-Guyot (1994) parte do princípio que “o balão é de longe o elemento mais
49
codificado da HQ. Os autores despejaram nela um tesouro de inventividade, de modo
que essa criação, puramente convencional, se integra até aos desenhos realistas” (p.11).
Eisner (2001) aponta que o leitor dramatiza o que está escrito dentro dos balões
na mente e para evitar que se faça uma leitura superficial, é preciso dar ênfase ao
diálogo usando o negrito. Orienta, também, evitar três ou quatro balões em uma mesma
figura, assim como interromper frases de um personagem, passando para um outro
quadrinho, pois interrompe o fio do raciocínio.
O desenho e o texto devem se completar. Após o surgimento da primeira
História em Quadrinhos com balões, no final do século XIX, o balão começou a
aparecer nos quadrinhos e tornou-se marca característica.
Sendo uma convenção, o código auditivo transmitido pelo balão passa
geralmente despercebido ao leitor, a menos que um comentário textual chame a
atenção ou que participe ativamente da narrativa, transformando-se em
metalinguagem (RAMA, 2004, p.59).
McCloud (2005, p. 134) cita os balões como recurso que os autores utilizam para
“representar o som num meio estritamente visual [...] os autores inventam formas
variadas e também símbolos dentro dos balões para capturar a essência do som”.
Rama (2004, p.57) identifica várias formas de balões resultantes de convenções
dos autores das Histórias em Quadrinhos, a saber:
a) Balões com linhas tracejadas: são usados quando os personagens estão falando num
sussurro, em voz baixa, um cochicho, para não ser ouvido por outras pessoas.
b) Balões com traço contínuo, cheio, indicam uma conversação normal entre os
personagens.
50
c) Balões em forma de nuvem e a seta indicativa para o personagem aparece em forma
de bolhas, indicam o pensamento deste, ou seja, uma frase não pronunciada.
d) Balões com traços em zigue-zague: são usados para representar um grito, ou o som
que sai de um telefone ou aparelho eletrônico.
e) Quando uma seta (ou rabicho) não aparece no quadrinho, indica que quem está
falando está fora da cena.
f) Um balão ligado a outro balão no mesmo quadrinho: indica, segundo Rama as
“pausas que um personagem faz em uma conversação, nelas se intercalando os
balões do seu interlocutor.” (p. 59)
g) Um único balão em que aparecem várias setas (ou rabichos) indica muitos
personagens falando (ou pensando) a mesma coisa ao mesmo tempo.
Quella-Guyot (1994, p. 12) descreve os tipos de balões como uma mensagem
icônica que não podem ser ignoradas. Esclarece-nos que, quando um balão marca um
51
discurso direto, é usado um contorno contínuo ou um leve zigue-zague; quando o
discurso entre os personagens é feito em voz baixa, o contorno do balão é tracejado.
Quando o autor de uma História em Quadrinho quer representar medo, emoção
utiliza um balão com o contorno tremido. Quando quer mostrar cólera, um som vindo
de rádio, televisão ou telefone faz uso de balões recortados ou denteados.
Segundo Quella-Guyot, o balão fica nebuloso “passando a ter um apêndice
formado por pequenas bolhas quando exprime a vida interior (pensamentos,
lembranças, sonhos). “Deve-se observar ainda o uso particular de contornos
metafóricos: estalactites que exprimem o frio ou florzinhas que sugerem uma linguagem
florida e melosa.” (p.12) é comum observar isso em histórias cujo conteúdo seja
romântico, ou para demonstrar a fala meiga e suave de algum personagem.
Com o passar do tempo, os balões passaram a ser não somente um cercado para
a fala, mas também uma forma de comunicar a característica do som na narrativa.
Algumas formas e traços dos balões são conhecidos por serem convencionais, porém é
importante observar que eles carregam consigo o estilo do autor e também a
personalidade da personagem (EISNER 2001).
Para a leitura do balão em Histórias em Quadrinhos, segue-se a convenção dos
textos escritos, ou seja, da esquerda para a direita, de cima para baixo e devem ser lidos
na seqüência determinada para saber quem fala primeiro e assim entender e captar a
idéia do autor e perceber a passagem do tempo e a continuidade da ação.
Com respeito à passagem do tempo, é interessante observar que antigamente o
homem se orientava pelo sol, e suas atividades seguiam o curso natural dos dias/noites,
estações do ano e suas mudanças climáticas. Com a invenção do relógio, este tempo
passou a ser marcado mecanicamente. Eisner (2001) faz alusão à passagem do tempo,
explicando que:
O som é medido auditivamente em relação à distância que se encontra de nós.
O espaço, na maioria das vezes, é medido e percebido visualmente. O tempo é
mais ilusório: nós o medimos e percebemos através da lembrança da
experiência (...) A medição do tempo não tem um enorme impacto
psicológico como também nos permite lidar com a prática concreta do viver
(EISNER, 2001, p.25).
Conforme assegura o autor, a passagem do tempo é ilusória e relativa à
expectativa que temos e formamos na realização de atividades ou na espera de algum
acontecimento. Quanto mais queremos que o tempo passe depressa, mais ele se arrasta e
quando queremos que este mesmo tempo ande devagar para podermos aproveitar o
momento, ele se esvai rapidamente. Em Histórias em Quadrinhos, para marcar esta
52
passagem de tempo são utilizados vários elementos. Os próprios quadrinhos e os balões
têm uma importância muito grande, pois auxiliam para que o autor apresente o tempo
passando e esta passagem seja percebida pelo leitor. Eisner (2001) novamente nos
informa que “os balões, outro dispositivo de contenção usado para encerrar a
representação da fala e do som, também são úteis no delineamento do tempo” (p.28).
Os autores de Histórias em Quadrinhos encontraram formas de marcar o tempo
ou sinalizar que ele está passando não com frase do tipo: Mais tarde..., Enquanto
isso..., Dias depois..., como também usando recursos gráficos conhecidos e vividos no
cotidiano dos leitores. Assim, os autores utilizam-se de elementos que sejam capazes de
dar ao leitor a idéia do tempo transcorrido entre uma cena e outra entre uma seqüência e
outra, valendo-se de um torneira pingando, um semáforo que muda do vermelho para o
verde, o toque do telefone, o riscar de um fósforos e até mesmo o relógio que marca um
horário em um quadro e um horário mais adiantado no quadro seguinte.
É necessário também fazermos a diferenciação entre tempo e timing, explicando
que o primeiro aparece nas HQs como uma movimentação simples, cujo resultado pode
ser observado de imediato enquanto que o timing se mostra como um resultado que é
prolongado e assim salientar a emoção. (EISNER, 2001)
McCloud (2005) diz que fomos acostumados a ver as cenas nas Histórias em
Quadrinhos como um momento único, isso por causa da arte fotográfica. Mas nas
histórias em Quadrinhos, não se pode ver uma cena como um instante por causa das
ações que existem ali. “O quadro age como um tipo indicador geral de que o tempo ou o
espaço está sendo dividido. A duração do tempo e as dimensões do espaço são definidas
mais pelo conteúdo do quadro do que pelo quadro em si” (p.99).
2.1. Os quadrinhos e a tecnologia
Com o advento do computador, os quadrinhistas, acostumados a produzir suas
histórias com as ferramentas que dominavam (prancheta, grafite, nankin, pincel, lápis de
cor, tinta), segundo McCloud (2006), produziam com “aquilo que vê” (p. 139) viram
nele uma possibilidade para facilitar seu trabalho. Outros, porém, habituados a
realizarem seu desenho do modo tradicional e artesanal, viram-se obsoletos e
ultrapassados e mais, começaram a se perturbar com a rapidez das inovações
tecnológicas.
53
Para as crianças e jovens, o computador passou a ser uma ferramenta com
programas e recursos variados que possibilita satisfazer sua curiosidade, pois se
aventuram neles, descobrem novas saídas, inventam novas utilidades para os recursos
que existem nos programas. “Para elas, o computador é um ambiente a explorar, uma
extensão dos seus impulsos...” (McCLOUD, 2006, p.144)
Para as crianças e jovens é fácil explorar novos caminhos em um programa de
computador, porque isso tudo faz parte do cotidiano deles, o mesmo não acontece com
os adultos, principalmente os idosos (COSCARELLI, 2005). Os artistas veteranos
deixam de experimentar as novidades da tecnologia por não terem sido acostumados a
se aventurarem; para eles, no início dos trabalhos com o computador, era necessário
realizar seus trabalhos sem grandes transformações. Em vista disso, muitos recursos
deixaram de ser conhecidos, novas formas de apresentação gráficaforam descobertas
algum tempo depois, quando perceberam o potencial que existe em um programa de
computador.
O que se espera hoje da nova geração de artistas das Histórias em Quadrinhos é
que se tenham criatividade para transformar suas histórias, que não é mais necessário
questionar se um dado recurso do software funciona e sim qual o efeito? É interessante?
Como fazer uso dele?
A nova ordem, posta na sociedade, é a difusão digital por meio da internet. Gibis
e tiras de Histórias em Quadrinhos circulam on line, e um usuário ligado à rede pode ter
acesso a eles, interagir com as histórias e com os próprios criadores.
Segundo McCloud (2006), ainda uma vasta legião de fãs que prefere o gibi
impresso. Muitas são as razões apontadas por ele para justificar esta preferência, desde a
facilidade em transportar um exemplar e manuseá-lo (e até uma criança consegue esse
feito), até com a satisfação visual pela imagem melhor definida do que aquela que é
vista na tela de um computador. Acrescenta ainda que para se ler um gibi on line, em
primeiro lugar é preciso saber dominar o computador para depois ler a história
disponibilizada pela internet.
Contudo, a melhoria da definição de imagens, a queda de preços dos PCs, os
modelos portáteis que surgem a cada dia, a velocidade de acesso à rede internet,
contribuem para derrubar a resistência desse grupo que prefere a mídia escrita à digital,
e assegura que não haverá “superação da arte pela tecnologia...mas, simplesmente na
superação de uma tecnologia por outra” (McCLOUD, 2006, p. 177).
54
Se observarmos que crianças e adultos continuam adquirindo gibis em bancas de
revistas, ao mesmo tempo que procuram esse gênero na internet para leitura on line,
comprova-se a idéia de McCloud citada acima.
Kramer (2001) defende que a escola deve entender a escrita como uma forma de
alargar as possibilidades de compreensão da linguagem, colocando as crianças em
contato com situações reais de escrita porque assim facilitaria o processo de elaboração
da escrita e da leitura.
Busquei, nessas atividades, descobrir qual a dificuldade que mais se apresentava
quando eles iam criar o texto: falta de vocabulário, dificuldade de transpor para a escrita
seus pensamentos, descrever cenários, diálogos, criar ações e finalizar sua história. O
que mais se acentuava nessas produções?
Com base nas atividades realizadas com as crianças, foi possível constatar que a
maior dificuldade que se apresentou foi o vocabulário, que ainda se mostrava restrito e
tímido, mas que por meio das produções das HQs, esse aspecto obteve uma visível
melhora.
O encaminhamento das atividades realizadas pelas crianças para análise nessa
dissertação é apresentado a seguir:
55
3. ENCAMINHAMENTO METODOLÓGICO:
Para esta investigação, foram realizadas observações e análises das produções de
textos de Histórias em Quadrinhos, com o uso do computador, de 26 alunos que
freqüentam a série do Ensino Fundamental em um colégio da Rede Particular de
Ensino localizado em um bairro central da cidade de Maringá-PR. São crianças entre 6 e
7 anos que participaram das atividades de produção de histórias em quadrinhos que
foram tomadas como objeto de estudo em minha pesquisa empírica. Para realizar as
observações e análises dos textos, todos os pais ou responsáveis assinaram o termo de
consentimento para que as crianças participassem das atividades de produção de HQs e
de textos que fazem parte desse estudo. Os dados foram coletados no ambiente de sala
de aula com computadores, adotando os seguintes procedimentos:
1Apresentação o software da Turma da Mônica da editora FTD e os seus recursos;
2Solicitação a criação de ambientes para os personagens;
3Composição dos ambientes e os personagens com detalhes na decoração e no vestuário
das personagens;
4Produção de uma seqüência de quadrinhos com coerência, porém, sem a utilização de
balõezinhos;
5Apresentação das formas estabelecidas para a utilização dos balõezinhos e
onomatopéias utilizadas nas HQs;
6Introdução de onomatopéias e balõezinhos nos quadrinhos já criados;
7Elaboração livre de histórias com coerência e seqüência lógica por meio dos recursos
disponíveis no software;
8Apresentação da produção elaborada por eles à equipe pedagógica do colégio e
posteriormente aos pais ou responsáveis pelas crianças.
Nesta investigação optei por um Estudo de Caso para responder aos objetivos
propostos, pois esta abordagem metodológica “consiste no estudo profundo e exaustivo
de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu amplo e detalhado conhecimento”
(GIL, 2002, p.54).
O desenvolvimento do trabalho de pesquisa foi apoiado nas observações e
análises dos dados apresentados pelos alunos, sujeitos da pesquisa empírica, em um
ambiente informatizado, dentro de uma sua rotina escolar, que de acordo com Bogdan e
Biklen (1999), “um ambiente bom para estudar é aquele que um mesmo grupo de
pessoas utiliza repetidamente” (p. 91). Evitei alterar a rotina da turma a ser observada
em uma sala de aula, pois a atuação do investigador, não pode significar uma presença
56
intrusiva, mas que nesse caso,já havia uma convivência de 6 meses, tempo suficiente
para conhecer o dia-a-dia dos alunos.
Para iniciar o trabalho de intervenção pedagógica com uma turma desérie, foi
enviado um termo de consentimento aos pais dos alunos para que autorizassem a
participação destes no projeto de pesquisa. Com o termo de consentimento em mãos,
encaminhei os alunos ao Laboratório de Informática da instituição.
No primeiro dia, foi apresentado o software da Turma da Mônica da Editora
FTD às crianças e, em seguida, foram transmitidas as informações e explicações básicas
de sua utilização. Os alunos, sob minha orientação, conheceram, nesse primeiro dia de
trabalho, os personagens e os cenários disponíveis. Constatei uma grande satisfação
deles na interação com o software, à medida que atuavam sobre e com os personagens,
das diferentes situações de postura e de expressões corporais e também dos diferentes
cenários em que as histórias poderiam ser produzidas.
Alguns alunos começaram a dialogar com os personagens; criaram vozes para
eles e oralmente fizeram histórias para o quadrinho que estava à sua frente. Nesta fase
do trabalho, algumas crianças (meninos principalmente) imitavam sons, como por
exemplo: o coelhinho da Mônica acertando em um dos amiguinhos (poim, tuf, pow) ou
barulho de louças quebrando (crás, plact) ou ainda tombos e quedas (plaft, plum), ou
seja, oralmente já se utilizavam das onomatopéias.
Nas semanas seguintes, foram apresentados os balõezinhos disponíveis no
software, as onomatopéias, acessórios para decoração de interiores, plantas, animais,
alimentos, elementos da natureza (rios, lagos) parques, estabelecimentos comerciais etc.
Nestes dias, eles navegaram por esse programa (já citado anteriormente) no Laboratório
de Informática, e, na sala de aula, foi intensificado o trabalho com gibis para que se
familiarizassem com a linguagem, os quadros, as linhas dos quadrinhos e a dinâmica
das histórias em quadrinhos.
Os balõezinhos e as onomatopéias despertaram maior interesse e sempre que
encontravam um desses itens nos gibis ou em outros materiais (livros de literatura
infantil, textos impressos, jornais ou revistas) mostravam e comentavam sobre a
utilização. Alguns alunos chegavam mesmo a questionar a forma utilizada e sugeriam
outras maneiras que poderiam ter sido apresentados nos livros ou textos que estavam em
estudo.
57
Os alunos pesquisaram sobre onomatopéias e balõezinhos, trouxeram recortes e
vários cartazes foram confeccionados com as figuras, ressaltando quando e como
deveriam ser usados estes recursos.
Nas semanas que se seguiram, a atividade sugerida foi que criassem uma história
em quadrinhos sem diálogos, sem uso de narrativas ou onomatopéias para que
pudéssemos observar a seqüência lógica e a coerência entre os quadros.
O computador facilitou muito esta produção, porque, se o aluno não gostasse do
resultado final, era mais fácil corrigir ou transferir o quadro com um simples comando
de edição (FERREIRO, 2001).
3.1. O ambiente empírico
O colégio onde foi realizada a coleta dos dados empíricos situa-se em um bairro
central da cidade de Maringá. Trata-se de um colégio mantido por uma Congregação
religiosa da Europa onde são realizados eventos de difusão de valores religiosos e
morais. Além destes, são organizadas as festividades populares comemoradas com a
participação de toda comunidade escolar, desde os alunos da Educação Infantil até os
adolescentes do Ensino Médio. Estas comemorações transcorrem em um clima familiar
e, normalmente, conta com a presença de pais e familiares dos alunos.
É um colégio que foi fundado em 1957 e já tem muita tradição na cidade. Nele
são organizados eventos culturais e desportivos, destacando-se a Bienal do
Conhecimento que tem por objetivo “Resgate cultural; estimular a convivência social e
a prática da solidariedade; desenvolver o espírito de competição como atitude positiva;
desenvolver a imaginação criadora, vivenciando-se ao mesmo tempo o valor da
liberdade de escolha exercida com responsabilidade.”
5
Na Bienal, são realizados trabalhos de pesquisas multidisciplinares sobre o tema
escolhido. Neste evento, acontecem mostras artísticas como danças, peças teatrais e
também trabalhos de coletas de alimentos e materiais recicláveis e campanhas
filantrópicas.
Na ocasião da realização da Bienal, são convidados ex-alunos e ex-professores
do colégio para participarem testemunhando sobre os valores recebidos ali e dos
benefícios da instrução recebida para sua vida profissional.
5
Estes objetivos foram retirados do Manual da Família, entregue às famílias que efetivam a matrícula dos
filhos no colégio.
58
3.1.1. A organização didático-pedagógica
O serviço de orientação pedagógica e educacional conta com sete orientadoras, a
saber: duas para a Educação Infantil, duas para os primeiros anos, e primeiras e
segundas séries e uma para as terceiras e quartas séries do Ensino Fundamental I; uma
para o Ensino Fundamental II – quinta à oitava séries - e uma para os três anos do
Ensino Médio, uma psicóloga e uma psicopedagoga. O corpo de orientação atende e
orienta professores e alunos durante o período letivo.
São oferecidas aulas de Xadrez, Ginástica Geral, Futsal, Voley, Handbal,Coral,
Teatro, aulas de pintura, sempre no contra turno. Vale frisar que durante o período
normal de aula, os alunos das séries iniciais de Educação Infantil e do Ensino
Fundamental I, também recebem aulas de Inglês, Educação Física, Música e Xadrez.
O colégio conta também com Serviço de Orientação religiosa formado pelas
irmãs da congregação, professores de ensino religioso e alunos que espontaneamente
participam das reuniões, grupo de jovens e campanhas filantrópicas promovidas pelo
grupo. A organização didático-pedagógica é orientada pelo sistema apostilado desde a
Educação Infantil ao Ensino Médio.
3.1.2. A estrutura física
É um colégio amplo, moderno e bem equipado com recursos midiáticos. Conta
com 26 salas de aula, 4 salas para a Orientação pedagógica, uma para a diretoria, uma
para a secretaria e uma biblioteca com um terminal de computador para facilitar as
pesquisas feitas na internet. Conta ainda com um laboratório de física e química para
realizar experiências práticas; um laboratório de biologia para observar vários
espécimes para estudos e um laboratório de informática com 40 computadores de última
geração. Neste laboratório, são agendadas aulas pelos professores para complementar
um conteúdo estudado em sala de aula ou para iniciar algum assunto do programa
escolar.
Independente do acompanhamento do professor, o aluno pode marcar horários
para sua pesquisa e nesses momentos recebe o suporte pedagógico de dois profissionais
que atuam como técnicos em informática e também são professores de outras
disciplinas no colégio, o que facilita o atendimento e o entrosamento com os alunos.
59
Entre estes, é necessário citar a professora Estela
6
, que é responsável pelo Laboratório e
teve uma importância fundamental na realização deste trabalho, seja orientando e
auxiliando os alunos, como também sugerindo recursos para o aprimoramento das
histórias.
O colégio possui um parque infantil com brinquedos coloridos e modernos, duas
quadras esportivas cobertas e um ginásio de esportes para as aulas de Educação Física e
campeonatos esportivos internos (Olimpíadas Escolares).
No colégio existe uma sala onde é possível fazer cópias xérox e uma cozinha
onde é feita a grande maioria dos lanches comercializados na cantina.
No setor administrativo, nove pessoas (excluindo a direção), sendo dois
funcionários para o serviço de contabilidade, três secretárias, uma recepcionista, duas
bibliotecárias e um rapaz que atende no xérox.
3.1.3. O corpo docente
O corpo docente do colégio é composto por cinqüenta e sete professores, sendo:
oito da Educação Infantil, dezessete do Ensino Fundamental I, trinta e dois do Ensino
Fundamental II e Ensino Médio; todos com ensino superior, onze destes professores têm
especialização em sua área de atuação, uma professora com o mestrado em curso e uma
professora, que atua na orientação, com o doutorado em andamento. O corpo docente do
colégio é composto por professores que está muito tempo no magistério e
especificamente como professores deste colégio, todos fazem parte da história do
colégio.
Dos 57 professores, 35 fizeram parte do corpo discente e agora é parte do corpo
docente. Sua dedicação à educação, ao magistério, à filosofia, aos valores e aos eventos
que o colégio realiza é digna de ser citada aqui. Se acontece algum evento que necessita
de professores voluntários para a organização e encaminhamento das atividades, sempre
é possível contar com um número maior do que o esperado, porque o professor sente-se
motivado para colaborar.
6
Nome fictício para preservar a identidade.
60
3.1.4. O corpo discente
O corpo discente é composto por mil duzentos e quarenta e cinco alunos, de
classe social média e média-alta, cujos pais são proprietários de seus negócio ou
assalariados, mas com nível financeiro que possibilita pagar as mensalidades do colégio.
Estão matriculados regularmente na Educação Infantil, (cento e quarenta alunos)
compreendendo turmas de Infantil 2 até o Infantil 5
7
, primeiro ano (do ensino
fundamental de nove anos), primeira a quarta séries do Ensino Fundamental de 8 anos,
(trezentos e setenta e nove alunos) quinta a oitava séries (quatrocentos e vinte e um) e
três anos do ensino médio (duzentos e cinqüenta).
3.2. Os sujeitos da pesquisa
Abílio 6 anos
Arthur 6 anos
Bárbara 6 anos
Bernardo 6 anos
Elaine 6 anos
Fábio 6 anos
Gilberto 7 anos
Gisele 7 anos
Gustavo 6 anos
Inês Rosana 6 anos
Ingrid 6 anos
Isabel 6 anos
James 6 anos
Leila 6 anos
Leopoldo 7 anos
Lucas 7 anos
7
Na nomenclatura das turmas adotadas neste colégio para a Educação Infantil, o número que acompanha
o título da série diz respeito à idade dos alunos que podem ser matriculados na série. Assim sendo,
Infantil 2 recebe alunos de dois anos, Infantil 3, alunos de três anos, etc.
Os alunos de 6 anos agora pertencem ao Ensino Fundamental, conforme alteração da Lei 9394/96 feita
pela Lei Federal nº 11274 de 06/02/2006, e fazem parte do primeiro ano.
61
Luíza 7 anos
Marcella 6 anos
Mirian 7 anos
Murillo 7 anos
Najla 6 anos
Nayara 6 anos
Rita 7 anos
Roberto 6 anos
Tânia 6 anos
Os sujeitos da pesquisa fazem parte de uma turma de primeira série do ensino
fundamental, período vespertino, que compreendia vinte e seis alunos, sendo onze
meninos e quinze meninas com idade de seis a sete anos. Desses alunos, vinte e dois
estudavam no colégio desde a Educação Infantil e quatro ingressaram no ano em que foi
realizada a pesquisa.
Nas primeiras sondagens feitas no início do ano, percebeu-se que quatro desses
alunos não conheciam as letras ou os sons delas. Não conseguiam escrever palavras
simples nem pequenos textos. Era visível o grau de ansiedade dos pais e das próprias
crianças em relação à primeira série.
Essa turma mostrava-se agitada, com muita conversa paralela, um alto nível de
competição entre eles, destacadamente entre as meninas. Era comum brigas entre elas,
pois o grupo era dividido em dois subgrupos, com meninas de personalidade forte e que
exerciam liderança em ambos os lados.
Com os meninos era mais tranqüilo, porém um aluno se destacava
negativamente por não aceitar regras, não cumpri-las e sempre testando seus limites e o
das professoras. Sempre que se sentia frustrado ou contrariado, partia para agressão oral
com as professoras e agressão física com os colegas. Manifestava muita inteligência,
aprendia rapidamente as matérias novas e apresentava um vocabulário melhor elaborado
em relação aos demais. Sempre tinha argumentos para justificar suas atitudes e ao
mesmo tempo em que pedia desculpas por algum erro cometido, irritava-se ao ser
chamado atenção por algum ato de desrespeito a algum colega ou professora.
De um modo geral, a turma desenvolvia-se bem no processo de aprendizagem.
Demonstrava facilidade em aprender, os alunos eram curiosos e ávidos por novidades.
62
Algumas características particulares de determinados alunos convém destacar aqui,
porque de certa forma, sobressaíram nas observações que realizei na turma, seja por
dificuldade que apresentaram no início do processo, ou por sua personalidade ou por
traços da vida familiar que refletiam na aprendizagem.
A aluna, Najla
8
(seis anos) apresentava-se tímida e insegura, de poucas amigas,
parecia que preferia ficar sozinha a ter que escolher entre um grupo ou outro. Não
acreditava que já sabia e ocorria muitas trocas de fonemas na escrita.
Gilberto (sete anos) tinha mais dificuldade de aprender em relação aos demais
alunos de sua turma, era muito emotivo, queixava-se de dores de estômago (sintoma
agravado quando pressionado para acompanhar o ritmo da turma), mostrava-se muito
dependente da mãe e da irmã que o protegiam em excesso.
Bárbara (6 anos) apresentava a sonorização muito forte na escrita, e, apesar de
ser esforçada e dedicada, sempre escrevia exatamente como se fala, e isso prejudicava
as suas tentativas de escrita e suas produções textuais quando lidas pelos colegas que
não conseguiam entender o que estava escrito e o que ela queria dizer.
Fábio (6 anos) é o menino que desafiava as ordens e normas do colégio. Com
idade de seis anos, seu tamanho correspondia ao de um adolescente de treze ou quatorze
anos. Freqüentemente envolvia-se em brigas com os colegas e sempre os machucava,
visto ser bem maior e mais forte que os demais da turma. Sua capacidade em escrever
textos surpreendia pelo desfecho que inventava com criatividade e originalidade.
Tânia (6 anos) conhecia pouco as letras e os sons. Não via significado na leitura
e na escrita. Depois que o pai, que morava em São Paulo, atendeu a minha solicitação
de escrever, enviar cartões e livros para que ela sentisse vontade de decodificar
palavras, houve um avanço em seu desempenho e começou a responder as
correspondências, manifestando maior interesse pela leitura e escrita.
Roberto (6 anos) é um garoto que veio também com pouca noção da leitura e
escrita. Preocupava-se muito em agradar as pessoas, era esforçado e dedicado, porém,
recebia pouco (ou nenhum) apoio familiar e constantemente falhava e não apresentava
as tarefas solicitadas. Faltava em muitas ocasiões porque a mãe ia ao clube e não o
levava ao colégio. Desenvolveu-se no final do terceiro bimestre porque se motivou com
o trabalho desenvolvido de criação de histórias em quadrinhos.
Gisele (sete anos) sofria muito com a separação dos pais, mostrava-se
inconformada pelo fato da irmã morar com o pai. Queixava-se com freqüência da
8
Os nomes apresentados aqui são fictícios para preservar a identidades dos alunos pesquisados.
63
saudade que sentia e entregava-se em devaneios quando um feriado se aproximava,
imaginando o encontro com a irmã. Sofria também, porque sua mãe estava fazendo
faculdade e era uma vizinha que a levava ao colégio e esta que participava das reuniões
e convocações do colégio. Sentia-se rejeitada pelo pai que estava em outra cidade e pela
mãe, que embora morando na mesma casa, era ausente e relapsa em relação a ela.
Mírian (sete anos) apresentava dificuldades na escrita, ora omitindo letras, ora
aglutinando-as, com pouca noção da palavra. Alfabetizou-se ao final do terceiro
bimestre, mas a sua defasagem em relação aos demais se acentuou pela demora em seu
processo de aprendizagem.
Abílio (seis anos) veio da região do Rio de Janeiro e sua pronúncia carioca o
confundia, acrescentava s e r em demasia o que tornava até pitoresca sua escrita.
Bernardo (seis anos) era o menorzinho da turma, mas era valente! Enfrentava
sem medo as ameaças dos amigos maiores, como também os desafios propostos. Em
pouco tempo desenvolveu sua leitura e escrita, produzia textos com criatividade e sua
conversa em sala com os amigos não o prejudicava, porque se mostrava esperto e rápido
para copiar as atividades e resolvê-las.
Os demais alunos desenvolviam-se dentro da normalidade esperada.
Acompanhavam o processo de aprendizagem, participavam das atividades propostas e
prontamente realizavam os exercícios e tarefas solicitadas.
Uma vez por semana, esses alunos eram levados ao laboratório de informática e
ali desenvolviam atividades que visavam a reforçar o conteúdo ministrado ou
preparação para a introdução de novos conteúdos.
3.3. Descrição das atividades com as crianças no laboratório de informática
Para iniciar as atividades no laboratório, foi apresentado o software da FTD
Turma da Mônica e seus recursos disponíveis, os personagens, o ambiente físico que
poderia acontecer as histórias, objetos e paisagens para complementar o cenário. Os
alunos conheceram as ferramentas disponíveis com risos e gargalhadas diante de várias
expressões dos desenhos da turma da Mônica e fizeram comentários de satisfação diante
das descobertas que alimentavam a curiosidade em conhecer e avançar no ambiente do
software. Nesse dia, limitei a esclarecer as dúvidas sobre os recursos do programa. (Ver
anexo 2)
64
Após as apresentações e esclarecimentos, saímos do laboratório, com o protesto
dos alunos. Na semana seguinte (segundo encontro), foi solicitado que eles criassem um
ambiente físico onde transcorreria a história. Alguns alunos preferiram criar ambientes
que apareciam primeiro no software, sem se preocupar em avançar e descobrir outros
cenários possíveis para criar a história.
Abílio chamou a atenção dos colegas que se sentavam ao seu lado pela surpresa
ao descobrir no cenário, uma caverna. Como se estivesse falando com o computador,
começou a criar situações e imaginar fatos para os personagens e rapidamente quatro ou
cinco colegas saíram do lugar para acompanhar sua história oral. Em poucos minutos, a
maioria da turma estava com esse cenário na tela.
As meninas logo encontraram cenários de cômodos de uma casa. Ao explorar o
software, descobriram objetos de decoração, mobílias. Criaram cenas em escadarias, nos
quartos, salas e quintal. Os meninos, por sua vez, se preocupavam com lagos, florestas e
cavernas.
Este detalhe chamou a atenção por perceber que entre crianças do século XXI
ainda está enraizada a idéia de que meninas cuidam da casa e dos afazeres domésticos,
enquanto os meninos saem em busca de subsistência para prover a família.
Algumas crianças optaram por criar ambientes em ruas e praças, usaram lojas de
flores, sorveterias, frutarias e boutiques.
Bastou um aluno descobrir a cena do parque de diversão e muitos desistiram do
cenário que estavam criando para também criarem neste cenário. Embora o cenário
fosse o mesmo, os ambientes se diferenciavam pelos personagens colocados aí. Os
meninos optaram pelos personagens masculinos. Cascão e Cebolinha eram os mais
apreciados; enquanto que as meninas preferiam a Mônica, Magali, o Sansão e o
Mingau.
No terceiro encontro, pedi que escolhessem um cenário e explorassem objetos
para o enriquecimento da história. Sugeri que experimentassem novas posições e
vestimentas para os personagens a fim de produzir a história. Observei que neste dia, o
trabalho ocorreu de maneira monótona. Era como se eles estivessem repetindo a aula
anterior e como conheciam as opções, perderam o interesse. Ouvi crianças
reclamando que queriam fazer outra história, já que tinham feito aquilo.
No quarto encontro de atividades no Laboratório, o comando foi criar uma
história, ambientação, personagens, seqüência entre os quadrinhos, porém sem diálogo.
Um fato interessante que ficou registrado neste dia,ouvi de um aluno, Maurício, que
65
conversava com o computador e criava diálogos entre pedras, flores e árvores que ia
colocando no seu cenário, ele fez o mesmo que Abílio na aula anterior. Imitava os sons
do vento e da água, e criou uma história oralmente muito divertida sem colocar nenhum
personagem.
Um outro aluno, Guilherme, optou pelo cenário de um campo de futebol,
colocou várias vezes o mesmo personagem em posições diferentes no campo, como se
todo o time fosse um “exército de clones”. Narrava o jogo e, conforme dava vida à sua
narrativa, trocava os jogadores de posição. A seqüência de uma cena, que era o
comando inicial, não foi cumprida por ele, que usou um quadro e movimentava os
jogadores ao invés de repetir os cenários e colocar os personagens para dar sentido de
movimento à sua história.
Dois alunos demoraram mais do que os outros para criar a seqüência de suas
histórias, porque usavam um cenário para o primeiro quadro e outro cenário diferente
do primeiro, para o segundo quadro.
O primeiro aluno começou a história no banheiro com um personagem tomando
um banho na banheira, mas não deu seqüência a este quadro, pois, em seguida, ele
mostrava outro personagem brincando no quintal e o terceiro quadro mostrava um
corredor com várias portas e janelas, como se fosse um hotel, sem uma relação entre os
quadros. Apesar das incoerências entre os quadrinhos, este aluno conseguia explicar a
sua história oralmente: ‘Depois que tomou banho, foi brincar no quintal e saiu para ir ao
hotel chamar um amigo.’
O segundo aluno colocou no primeiro quadro a Mônica e a Magali no jardim.
no segundo quadro, havia um parque de diversões com outros personagens, sem seguir
uma seqüência em relação ao primeiro quadro, como fora solicitado nesta atividade.
Dessa forma, a história deles ficava limitada a um quadro, ou seja, cada quadro era uma
história. Nestes casos, fiz uma intervenção para mostrar a ausência de informação nos
quadros e a necessidade de redigir um texto para o leitor entender idéia. Solicitei a estes
alunos que escolhessem qual dos quadros eles queriam manter, excluir os quadros não
utilizados e dar continuidade a história .
No quinto encontro, na semana seguinte, intensifiquei o empréstimo de gibis
para dar noção a eles de como era uma história. Mostrei em várias oportunidades que
tinha muitas histórias que se passavam toda em um único cenário e, que, apesar do leitor
entrar com sua imaginação, tinha que ter um mínimo de coerência entre os quadros para
que a história tivesse sentido.
66
Em sala de aula, fizemos um trabalho de pesquisa de balõezinhos e
onomatopéias em gibis. Criamos cartazes explicativos e ilustrados, e as crianças
puderam perceber que era uma convenção social o uso de determinados modelos de
balões.
No sexto encontro, o comando da atividade era conhecer os tipos de balõezinhos
que o software apresentava. Foi pedido que eles inserissem os balões nos cenários
criados na aula anterior de acordo com o que havia sido estudado em sala. Logo, alguns
alunos iniciaram a produção de textos usando os balões.
O que se via nesse primeiro momento eram diálogos com pouca criatividade,
balões enormes para frases curtíssimas, isso sem contar as inúmeras vezes que tinham
que começar de novo, porque não ficavam satisfeitos com o resultado.
Ao pedir para que os alunos observassem as onomatopéias disponíveis, foi um
entusiasmo geral. Utilizaram as letras que imitavam louças quebrando, e os meninos da
Turma da Mônica levando coelhadas do Sansão ou socos da Mônica. Incrível como as
crianças sonorizaram este momento, emitindo elas próprias o som que inseriam na
história, por exemplo: cras, puf, pow etc.
Na figura 1, estão as onomatopéias disponíveis para a criação das histórias:
Figura 1
67
Ficamos quatro encontros nesse trabalho, e deixei que explorassem o software
para conhecer os recursos existentes de aumentar ou diminuir o tamanho dos balões,
mudar a fonte ou a cor da letra, mudar a posição do balão para ficar mais próximo do
personagem que estava falando.
Foi possível observar um aluno ajudando outro e às vezes eles andavam pela sala
para atender o colega em dificuldade, quando este não conseguia realizar determinada
ação na história.
Estes momentos de cooperação aconteciam freqüentemente. Eu mesma tive
dificuldade quando um aluno solicitou minha ajuda para colocar um bolo em um
balãozinho, representando o pensamento da Magali na frente de uma padaria. Depois de
algumas tentativas sem sucesso, sugeri que ele colocasse o bolo em cima da cabeça
dela, sem o balão, porque não conseguia inserir o bolo dentro do balão. Neste momento,
um aluno, Gustavo, levantou-se e veio nos ajudar, e, tanto tentou, que conseguiu colocar
o bolo como pretendia o autor da história.
Quando um aluno chamava para mostrar o que havia criado, eu questionava o
diálogo e sugeria que olhasse o cenário, os objetos que ali estavam para ampliar o texto.
Sem que soubessem a fundo sobre o significado dos traços e linhas separando um
quadro do outro, a historinha deles seguia a lógica de deixar algumas coisas
acontecerem pela imaginação do leitor.
Os seis encontros seguintes serviram para aprimorar e embelezar a história
criada por eles, mostrando as palavras que haviam escrito errado, sem fazer uma
correção sistemática, que nosso objetivo era que eles criassem um bom texto. O texto
deles era questionado, mas não era exigida a correção de palavra errada para adequar à
escrita da norma padrão.
A turma teve dificuldade para salvar as histórias porque o programa não aceita
acentos, cedilhas e til. Alguns alunos salvaram a história com acentuação, mas esse
título ficou desconfigurado, foi preciso a intervenção da professora Estela na semana
seguinte para recuperar o que havíamos feito. Outros salvaram e não se preocuparam
em criar uma pasta para salvar o que fizeram e, em um laboratório de informática, com
trabalhos de vários alunos, ficou difícil localizar as histórias. Teve aluno que fechou o
programa e a história sem salvar. Para alguns alunos, o jeito foi construir a história
novamente. Alguns ficavam chorosos, que estava se aproximando da data combinada
para mostrar aos pais as histórias que eles criaram. Eles temiam não conseguir fazer
outra a tempo. Nesses casos, a criança ficava mais tempo no laboratório com a
68
professora Estela, e os demais alunos retornavam à sala de aula comigo e fazíamos uma
avaliação do trabalho desenvolvido naquele dia.
Nas avaliações orais sobre a criação das histórias no computador, ficou evidente
que a euforia das crianças e também aumentou o interesse pela leitura tanto de gibis
como dos livros de literatura infantil. O vocabulário usado nas histórias feitas no
computador e nos textos que produziam em sala de aula ampliou, era possível ler
histórias ou textos com mais conteúdo e mais informações. O desenho deles também se
modificou, havia mais detalhes nos personagens e nos cenários.
Antes de mostrar as histórias aos pais, a aluna Tânia precisou voltar para São
Paulo. No dia da despedida dela, houve muita tristeza e choro. Remediamos um pouco
essa tristeza, presenteando-a com um CD em que estava gravada a versão final da sua
história para que ela levasse como lembrança. A avó se emocionou também e agradeceu
muito, porque o progresso dela na primeira série foi surpreendente.
Enviamos convites aos pais para que comparecessem ao laboratório para ver o
trabalho dos filhos. Planejamos cuidadosamente os detalhes, a recepção aos pais, o
encaminhamento ao laboratório, as explicações da professora para o desenvolvimento
dos trabalhos e as orientações dos filhos sobre os recursos do programa para a criação
das histórias. Na véspera do dia marcado ( vigésimo encontro), ficamos por várias horas
no laboratório para conferir as histórias e observar se todas estavam ali.
No dia marcado, contamos com a presença de todos os pais das crianças. Uma
mãe se atrasou, mas o filho tinha tanta certeza do comparecimento dela que ficou
guardando o lugar para ela e, tranqüilamente, ficou repassando sua história até que ela
chegasse.
Além dos pais convidados, a minha orientadora desse projeto, a professora Drª
Teresa Kazuko Teruya, também esteve presente, assim como a equipe pedagógica e a
diretora do colégio. Por mais ou menos duas horas, os pais viram as histórias dos filhos
e, em seguida, construíram uma história com eles, com base nas explicações que os
filhos forneciam sobre os recursos do software. Pôde-se observar neste momento que
eram os filhos quem sugeriam cenários e conteúdos das histórias e, mais uma vez, os
pais foram espectadores das performances dos filhos, somente dando alguma sugestão
nos cenários ou nos textos.
O mais interessante neste trabalho de produção de histórias em quadrinhos é que,
embora os personagens sejam conhecidos e suas características físicas, sociais e
psicológicas largamente difundidas e discutidas, os alunos não se prenderam em textos
69
prontos. Eles criaram sua própria história e utilizaram expressões conhecidas,
rivalidades e ‘agressões’ que caracterizam as histórias da Turma da Mônica. Não
construíram um texto baseado em algum outro texto conhecido ou lido. Percebi nos
textos um aumento significativo de vocabulário e de informações oferecidas a partir dos
cenários e personagens dos desenhos escolhidos.
A seguir, será analisada a produção das histórias realizadas pelas crianças.
Para realizar um estudo de caso, estabeleci como critérios de análise das
histórias produzidas pelas crianças,a utilização dos seguintes recursos:
* quadro e requadro,
* passagem do tempo,
* onomatopéias,
* balões,
* cenários e plano dos personagens,
* texto das história em quadrinhos,
* texto produzido no caderno.
Para a análise do texto produzido no caderno, observei:
* coesão,
* seqüência lógica,
* utilização de letras maiúsculas para nomes próprios e início de frases,
* vocabulário,
* pontuação,
* grafia das palavras
* utilização de parágrafos ,
* utilização de travessões nos diálogos.
70
4. ANÁLISE DO TRABALHO COM HISTÓRIAS EM QUADRINHOS
Muito se tem comentado e discutido sobre o índice alarmante de analfabetos ou
semi-analfabetos do Brasil. É a priori um dos problemas mais discutidos juntamente
com a dificuldade da escola no nosso país de cumprir sua missão de introduzir a criança
no mundo das letras, principalmente aqueles que são excluídos da sociedade e da escola,
e atualmente, também excluídos da era digital, ou dizendo de outra forma, aqueles que
não têm acesso e por isso não são excluídos, são simplesmente colocados à margem do
processo educativo e da alfabetização digital (COSCARELLI, 2005).
A sociedade mudou e espera-se que essa mesma mudança altere os métodos de
ensino na educação escolar. Não tem mais sentido ensinar a ler com unidades mínimas
da língua (ba-be-bi-bo-bu) sem significado nenhum para o aprendiz. Apresentar textos
fora da vivência do educando que se tornam enfadonhos e cansativos, e obrigados que
eram (nos tempos da cartilha) de repetir sílabas e palavras as quais não são possíveis de
atribuir ligação com o que se quer dizer ou escrever.
A sociedade pede e os alunos almejam aprender o que realmente é necessário e o
que usarão na vida. O professor deve mudar sua postura para atender esse desejo;
oferecer textos que proporcionem prazer em ler, para que, este momento crucial na vida
dos educandos, quando eles ingressam no mundo da alfabetização, tenha sentido e que
de fato os faça entrar em contato com o mundo fora dos portões da escola, criando
ambientes favoráveis para trabalhar os usos e funções da escrita (CITELLI, 2003)
Em outras palavras, a sociedade quer indivíduos alfabetizados e letrados e
aprender a ler e escrever com significados, é o ponto de partida.
Apesar de caminharem juntos na aprendizagem, a aquisição de escrita e o
domínio da leitura, acontecem em momentos diferentes um do outro. Comentarei a
leitura e a escrita antes de iniciar a análise das histórias e das produções textuais dos
alunos.
4.1- Leitura e escrita
Cagliari (2007) aponta o segredo da alfabetização: a leitura. Para ele, não é
necessário que se saiba escrever, é preciso tão somente saber ler. Nessa perspectiva, os
sistemas de escrita foram criados justamente para se permitir que se lesse. Assim, “a
71
verdadeira chave da decifração do nosso sistema de escrita, a que permite entrar no
segredo que a escrita guarda, é o fato de a escrita permitir a leitura” (p.71). Para ele, ler
é muito mais importante do que escrever.
Neste aspecto, Klein (2002) concorda com Cagliari, ao apontar que a escrita
surgiu para responder a uma necessidade do homem, por isso é tida como prática social,
porém não é uma necessidade de todos os homens, não é uma necessidade universal. A
autora analisa que outras formas de comunicação podem substituir a linguagem escrita,
e cita o telefone, a televisão e o fax. Também aponta que para se ter conhecimento de
uma notícia, a forma impressa é uma opção, mas não mais a única possibilidade.
Por isso é de fundamental importância que se ensine a ler, porque toda a vida
escolar, profissional, social do ser humano depende da leitura e não é somente uma
prática da disciplina de Língua Portuguesa (Zilberman, 1993). Com a concorrência dos
Meios de Comunicação de Massa (MCM), tornou-se primordial o ensino da leitura,
porque é do conhecimento de todos, que outras práticas visuais podem substituir a
escrita, mas não a leitura. A leitura funciona como uma porta de entrada ao universo do
conhecimento (Ibidem).
Ferreiro (2003) aponta a leitura como principal forma de se obter informações a
partir de textos escritos, e Zilberman (1993) reforça dizendo que:
“A posse de um código escrito determina a ruptura com uma situação de
inferioridade, por não ter o indivíduo, antes de ser alfabetizado, instrumentos
intelectuais para questionar valores que, na expectativa do grupo no poder,
teria de incorporar passivamente” (p.16)
A leitura funciona como um vínculo entre o sujeito e a realidade, possibilita a
convivência com o mundo exterior, e, ao decifrar, interpretar e interagir com um texto
escrito, o leitor fica de posse dessa experiência, acrescenta conhecimentos e conteúdos à
sua vivência.
A escrita é uma produção social e sofreu muitas transformações durante a
história da humanidade. A forma de escrita mais antiga, conforme disse
anteriormente, é a pictográfica, que permitia apenas a representação dos objetos que era
possível desenhar.
A fonetização da escrita, segundo Weiz (1985), seguiu em direção das escritas
silábicas, e então a escrita começou a representar a sonoridade das palavras. É a fase
inicial do processo de alfabetização, em que a criança acredita que a escrita é uma outra
72
forma de desenhar. Ela ainda não tem noção de que a escrita representa a palavra e não
o objeto a que se refere. Conforme avança no processo de alfabetização, ela elabora
hipóteses que acabam por serem sobrepostas por outras. Começa a diferenciar letra de
sílaba e formula aqui a hipótese silábica, que, segundo Weisz (1985), é falsa, mas
necessária para progredir na alfabetização.
Cabe ao professor e à escola facilitarem o caminho que o aluno percorre,
oferecendo materiais impressos, cartazes de propagandas e informativos de modo geral,
atividades variadas que possibilitem a leitura e que sejam fontes de consultas quando o
aluno for realizar suas tentativas de escrita.“É o contato com a cultura escrita desde a
educação infantil que vai possibilitar um conjunto de representações mentais sobre a
escrita e sobre o funcionamento da linguagem em geral” (FRADE, 2007, p.85).
A escola como uma instituição de acesso ao conhecimento científico, deve
desenvolver atividades que integrem a leitura e a escrita, proporcionar a participação da
comunidade educativa em debates e discussões sobre os benefícios da cultura escrita, e
não se posicionar unicamente como instrumento de decifração de códigos,
interpretações de textos (tão somente).
A seguir, as histórias produzidas pelas crianças:
73
Figura 2
HQs Marcella
(Essa água deve estar deliciosa.
Que água mais gelada.
Por que o Cebolinha está rindo?)
O que se percebe na escrita espontânea da aluna é que ainda está muito forte a
sonorização. Essa aluna escreve do jeito que pronuncia as palavras. Demonstra total
74
liberdade para se expressar. Sua escrita da palavra essa (esa) e deve (dve) demonstram
essa oralidade, já que a letra d, por si mesma, aparece como de, e na palavra essa, o som
se parece como o ‘sa’ de sapo, por exemplo. De acordo com as pesquisas de Emília
Ferreiro (1991), essa aluna encontra-se no nível alfabético em que “compreende que
cada um dos caracteres da escrita corresponde a valores sonoros menores que a sílaba, e
que realiza sistematicamente uma análise sonora dos fonemas das palavras que vai
escrever.” (p.213)
Na palavra estar reduziu a forma para ‘ta’ e escreveu-a como normalmente
falamos em conversas informais; e a palavra deliciosa (delisiosa) indica que ainda não
tem claro o som do c e do s, que, por exemplo, na palavra sino, o som apresentado se
iguala ao ci de deliciosa.
O que se apresenta daqui para frente na sua produção textual são problemas
relacionados à ortografia, que, sabe-se, somente serão sanados ao longo de seus
exercícios e investigações escolares. Se observarmos a forma como ela escreveu as
palavras mais (masi) e está (seta), podemos perceber que a aluna tem noção do s,
porém, como seu processo de aprendizagem está em andamento, não consegue
identificar que o s aparece no final de sílaba, porque para ela, nesse estágio do processo,
não é concebível uma letra sem vogal. Nesse momento, é imprescindível a presença de
um adulto letrado ou um aluno que esteja mais avançado no processo, para mostrar-lhe
que é possível sim, encontrarmos palavras com s, r, m, n em final de sílaba e não
acompanhado de vogal.
Segundo Mayrink-Sabinson (2002), o adulto letrado interfere na produção
escrita do aprendiz como um “informante da escrita” e “o elemento não letrado como
aquele que, a partir da informação recebida, vai construir sozinho, dependendo apenas
do seu sistema assimilatório já construído, um conhecimento sobre a escrita” (p. 11).
Outra palavra que nos chama a atenção e confere com a afirmação de que a
aluna escreve de acordo com a sonorização, é a palavra rindo, que no segundo
quadrinho está escrito rino, forma comumente usada pelas crianças que reduzem os
gerúndios, omitindo o d. Segundo Cagliari (1992, 2002), a criança que comete este tipo
de ‘erro’, o faz porque transfere para “o domínio da escrita algo que reflete sua
percepção de fala” (p.30).
Embora não haja seqüência nos quadrinhos da sua história, visto que ela inicia
com uma cena ao ar livre, no jardim da casa, na piscina e o quadrinho seguinte é em um
ambiente da cozinha no interior da casa, serve para analisarmos a produção escrita, o
75
que seria difícil entender o caminho que esta aluna está percorrendo, quais hipóteses ela
constrói para realizar sua escrita, se a produção fosse feita com textos e palavras
trabalhadas, como era feito pelos alunos na época da cartilha.
Um aspecto da composição da história, é o fator tempo citado por McCloud
(2005) “O quadro age como um tipo indicador geral de que o tempo ou o espaço está
sendo dividido. A duração do tempo e as dimensões do espaço são definidas mais pelo
conteúdo do quadro do que pelo quadro em si.” (p.99). Esse fato é comprovado pelo
personagem Cebolinha que faz uma estimativa sobre a temperatura da água no início do
quadrinho e em seguida aparece fora da piscina reclamando que a água estava fria.
Observa-se nesse balão o que Eisner (2001) nos aponta, e que foi citado nesse
trabalho, é que o autor utiliza-se do traço dos quadrinhos para comunicar também o som
da fala. Ao escolher um balão ondulado, a aluna quis passar a impressão de alguém
tremendo de frio, e conseguiu!
A seguir, veremos o texto criado pela aluna após a criação de sua história em
quadrinhos.
A aluna Marcella produziu seu texto a partir da HQs que criou, mas omitiu
parágrafos e travessões. Utilizou-se de sinais de pontuação adequados para o contexto
que escreveu, porém, ao escrever sem parágrafos, ficou a impressão de ser uma frase só,
o que torna difícil a compreensão em uma única leitura.
76
Observa-se também erros ortográficos e aglutinações de palavras.
No texto, escrito após a criação de HQs, observa-se que a aluna não escreveu
como nos quadrinhos. superou, em parte, a sonorização, pois não omitiu tantas letras
e procurou escrever a palavra correta. Alguns erros ainda aparecem e devem ainda ser
trabalhados: mais (quando quis escrever mas), dice (para disse), comesou (para
começou), arir (para a rir) michamou (para me chamou ou chamou-me), poriso (para
por isso), o uso do m antes de p e b (na palavra então que ela escreveu emtão) e pecina
para piscina.
Com a criação do texto, Marcella esclarece fatos que foram omitidos na sua
HQs, no caso, quando a Mônica convida o Cebolinha para tomar chá e a explicação da
autora do porquê do Cebolinha estar rindo. Percebe-se também uma melhora no
vocabulário.
Figura 3
HQs Najla
77
Cebolinha (pensando) __Cadê a Mônica?
Mônica __ Fique quietinho.
Cascão __ ‘Ta bom, Mônica.
Cebolinha __ Cadê a Mônica?
Magali __Que gostoso. (segurando a melancia)
Mônica __ Eu vou matar vocês.
Cascão __ Mônica, Por favor! Mônica!
Cebolinha __ Não, Mônica!
Magali __ AAAAAH! Mônica!!!
Cebolinha __Mônica, você vai me pagar! Mônica.
Cascão __ Mônica, não faz isso!
Magali __ Mônica, não né que você vai fazer isso?
Figura 4
78
79
HQs Isabel
O que se observa nestas produções são as trocas de fonemas e algumas
aglutinações. Vale destacar que a aluna Najla, autora da primeira história, não tem
pronúncia errada, assim como a autora da segunda história, Isabel. Elas não fazem as
trocas na oralidade como fizeram na escrita. Baseada nas afirmações de Cagliari (1992),
creio que essas trocas ocorreram porque a primeira aluna, Najla, é tímida vale
identificar este perfil da sua personalidade – e sussurrou as palavras para escrever.
Quando isso ocorre é comum, segundo o autor, acontecer estas trocas porque “o
sussurro é um tipo de fonação diferente da produção de sons surdos e sonoros. Por sua
própria natureza, um som sussurrado é mais semelhante a um som surdo do que a um
som sonoro” (CAGLIARI, 1992, p. 63). Sendo muito envergonhada, a aluna quis se
preservar, garantindo que ninguém a escutaria dizer as palavras que queria escrever,
então, falou-as baixinho e confundiu os sons. Apesar de Isabel não ser tímida como
Najla, pode ter ocorrido o mesmo fato com ela.
Outro erro é a aglutinação de palavras na história de Najla. Aqui, a aluna
soletrou as palavras para escrever e ao fazer esta soletração, não conseguiu identificar as
separações porque ainda não domina totalmente o sistema de escrita, ou, dizendo em
outras palavras, a criança não conhece ainda a forma ortográfica de todas as palavras e,
isso ocasiona a escrita errada, fora dos padrões de algumas palavras.
Se observarmos a seqüência e a coesão da construção da história de Najla,
verificaremos que, embora, pobre de conteúdo lingüístico, ou seja, o diálogo foi pouco
enriquecido com complementos explicativos, como por exemplo: Por que a Mônica está
80
tão brava com o Cebolinha? O que a turma está fazendo reunida naquela sala? Por que o
Cebolinha aparece por duas vezes querendo saber da Mônica? (Sendo que ela aparece
no primeiro quadro, próxima da janela. E o Cebolinha não a viu???). Essas e outras
questões não são respondidas na história, porém, partindo do princípio que a Turma da
Mônica é bem conhecida e as características dos personagens são bem divulgadas,
entende-se que o Cebolinha provocou a Mônica ou escondeu o Sansão, o coelhinho
dela, o que justificaria a preocupação dele em saber onde ela está, como também a
bronca da Mônica. Nesse caso, a aluna apropriou-se de um contexto conhecido para
não ter que dar muitas explicações sobre as causas da briga entre as personagens.
Como as alunas Najla e Isabel ainda não têm formada a idéia de que o leitor não
sabe e não pode saber o que se passa na cabeça do autor, e por isso, é necessário
fornecer explicações acerca dos fatos que ocorrem no texto, omitiram informações
relevantes para o entendimento das suas histórias. Nota-se que, na história de Najla, o
ambiente é o mesmo nos quatro quadros, com os objetos de decoração iguais em todos
eles. Não acréscimo ou sumiço de personagens. A aluna respeitou o requadro dos
quadrinhos e colocou os objetos e personagens dentro deles.
No terceiro e quarto quadrinho, a Mônica e a Magali permanecem na mesma
posição (somente a Mônica que aparece um pouco mais à frente no cenário), o que
caracteriza um bom domínio das ferramentas do programa, pois usou o recurso de
copiar e colar para assim não perder de vista o ambiente criado por ela.
Isabel criou sua história em cenários variados que na verdade não mostram
ligação de um com outro. Os personagens do primeiro quadro não se repetem no
segundo; e o ambiente criado por ela é diferente em toda sua história.
Nas historinhas a Magali aparece como comilona insaciável, a aluna Najla quis
realçar esta característica e colocou uma melancia na mão dela no primeiro quadro e, no
último, utilizou figuras de doces, bolo e pirulito para enfatizar essa característica. Pode-
se entender que, mesmo pedindo para parar com a briga, a Magali também pensava em
terminar logo a desavença para poder saborear as guloseimas.
Em seguida, o texto feito por Najla:
81
Observa-se no texto escrito, que Najla limitou-se a copiar sua história,
modificando a forma de diálogos, que, na sua HQs, aparecem no balãozinho e no texto,
a aluna utiliza-se de troca de linhas para apresentar a conversa entre os personagens,
porém, não o fez para todos os diálogos.
Vê-se também, os mesmo erros de fonemas e erros ortográficos, alguns escritos
da mesma forma na sua HQs e no seu texto. Houve a preocupação de atribuir um título
à sua produção.
E a seguir, o texto da aluna Isabel:
82
83
A produção textual de Isabel é longa e com vários erros de ortografia, troca de
fonemas e palavras em que se percebe a sonorização, porém, se deixar de lado a análise
dos erros, vê-se um texto coerente, com seqüência lógica e um bom uso do vocabulário.
A aluna Isabel conseguiu transferir seus pensamentos para a escrita e empregou
corretamente os travessões para indicar os diálogos dos personagens. Atribuiu um título
ao texto, porém sem muita coesão com o restante da história.
84
O texto dela explica vários pontos que ficaram sem entendimento na sua HQs e
apesar de pular linha na troca de assunto, ficou clara a idéia que passou pela cabeça ao
fazer sua história.
A próxima história é do aluno James. Ele conseguiu fazer uma seqüência e dar
movimento à sua história. Veja:
Figura 5
85
86
87
HQs James
Esta é uma das histórias criadas pelos alunos em que se pode perceber
seqüência, coesão e criatividade pelo desfecho inesperado. O primeiro quadrinho sugere
que a Mônica está pensando em empurrar o Cascão e o Cebolinha na piscina, observada
pelo Anjinho que de forma onisciente sabe o que a Mônica pretende. A partir do
segundo quadrinho, uma seqüência que nada tem a ver com o primeiro, porém, liga-
se com todo o resto da história. É a tradicional e conhecida fórmula idealizada pelo
criador da Turma da Mônica, Maurício de Sousa, uma perseguição em que Cebolinha é
o perseguido.
Para dar início à perseguição, o aluno colocou um corredor, e na próxima cena é
ao ar livre. Aqui o aluno fez o que Quella-Guyot (1994) diz quando a seqüência é
cortada, ou justificando que, em uma história em quadrinho, muitas informações são
omitidas, deixando detalhes para o leitor imaginar É observável também a ausência de
explicações ou detalhes entre as cenas que serviriam para dar noção da correria dos
amigos. Também aqui, o aluno usou a imaginação do leitor para dar seqüência às cenas
que foram omitidas.
No sexto quadrinho, um outro ambiente e um novo personagem aparecem.
Cebolinha recorre a um adulto para se livrar da perseguição e, confiante no auxílio
desse, mostra-se sorridente, com ar de vitorioso. O destoante nessa parte da história é a
fisionomia da Mônica, no penúltimo quadrinho, que aparece sorridente quando deveria
estar com uma fisionomia séria, já que está levando uma bronca do Louco.
88
A história termina com um final bem diferente dos apresentados nos gibis. Vê-se
a Mônica sozinha na sala de sua casa, constatando que levou a pior, quando nas
histórias, na grande maioria das vezes, o final é o Cebolinha com o olho roxo por ter
apanhado dela.
Observa-se na produção textual do aluno a escrita de algumas palavras de forma
oralizada e não ortográfica. ‘Qui coitados’ quando o certo seria ‘Coitadossomente. ‘Mi
livrei dela’ Livrei-me dela, ‘Eu ti achei’, Eu te achei, ou Achei você ‘Aleluia til’ Aleluia
tio.
Outro aspecto é a falta de pontuação nos diálogos, como também a ausência da
letra maiúscula para nomes de pessoas e início de frase.
O professor, ao se deparar com uma escrita do tipo da que esse aluno faz, deve
lembrar-se de que a nossa língua utiliza-se de um
“sistema de escrita baseado no significante, ou seja, um sistema alfabético que
dito de forma simplificada pela representação dos sons de uma palavra,
permite-nos chegar ao seu significado. No entanto a relação entre as letras e os
sons da fala não é simples, porque a escrita não funciona como um espelho da
fala.” (ROMUALDO, 2005, p. 101)
O que era considerado errado na prática educativa de antes, agora, passa a ser
visto como indicador do processo de aprendizagem que a criança está se apropriando
para transmitir suas idéias e vivências.
E agora, o texto criado pelo aluno James:
89
Nesse texto, o aluno James preocupou-se em descrever as conversas entre os
personagens e não acrescentou dados novos à sua história. Alguns erros persistem no
seu texto, notadamente as trocas que ele faz com o l e u.
O que chama a atenção, no texto produzido por James, é que ele diz que a
Mônica levou o Cebolinha para a cidade e, na sua HQs, a impressão que se tem é que o
Cebolinha correu para fugir da Mônica e acabou chegando na cidade.
Outro aspecto é que o aluno procurou escrever os nomes dos personagens e as
palavras em início de frases com letras maiúsculas, o que não ocorreu na sua produção
de HQs.
Figura 6
90
HQs Bárbara
Cagliari (1992) explica que no processo de alfabetização, um aluno não precisa
aprender a gramática para começar a escrever, pois ele ainda não conhece a forma
ortográfica das palavras, apenas teve contato com o alfabeto. Se não permitir que essa
criança escreva porque não tem essa noção, ou se ensinar primeiro a forma ortográfica
para depois permitir que ela escreva, pode provocar um bloqueio mental e na seqüência
da sua vida escolar, se sentirá impedida de escrever o que gostaria, ou o que tem
vontade. É o que teria acontecido se apontasse todos os erros que a aluna cometeu na
criação de sua historinha. Alguns, é claro, podem ser considerados como erros de
digitação, outros de ortografia, mas, neste momento do seu processo de aprendizagem, é
conveniente não nos fixarmos na escrita correta, porque um texto bem elaborado não é
somente o texto sem erros.
No momento oportuno, o professor deverá trabalhar ortografia, necessária ao
processo de aprendizagem do aspecto formal da língua na produção textual. Mas antes,
é melhor a criança produzir seus textos sem essa preocupação porque “o controle
ortográfico destrói o estímulo que a produção de um texto desperta na criança”
(CAGLIARI, 1992, p. 125).
No último quadrinho de sua história, a aluna apresenta o seguinte pensamento do
Cebolinha: ‘depoiz di uma corida vo megulia para discanssa’ (Depois de uma corrida,
vou mergulhar para descansar.) Além da presença forte da sonorização para a escrita,
pode-se observar que na palavra descansar, a aluna usa o dis, e ss no lugar de s. Isso
91
ocorre porque faz a hipercorreção. Não tendo ainda se apropriado do lh, usa o li em
mergulhar. Omite também a vogal u no final da palavra vou e, tendo observado a grafia
de nariz, giz, feliz, usa o z no final da palavra depois, usando a mesma regra para a
palavra que tem o mesmo som.
Figura 7
HQs Murillo
92
Nessa história, Murillo não conseguiu atribuir uma seqüência aos fatos
ocorridos. A personagem Mônica aparece no primeiro quadro perseguindo o
Cebolinha e, no quadro seguinte, este aparece com o olho machucado e, no terceiro e
quarto quadrinhos, é que aparece uma cena que justificaria a perseguição da Mônica.
Os primeiros quadros dessa história aparecem sem cenário, os personagens são
apresentados em um fundo branco, o aluno não se preocupou em estabelecer um
diálogo. Por isso, fiquei com a impressão de que estava apenas experimentando os
recursos disponíveis no software.
Quando se cria uma história em que não se utiliza texto, as expressões corporais
das imagens devem traduzir a narrativa. Elas devem exprimir uma experiência comum,
algo familiarizado pelo leitor. Por ser uma técnica primitiva existente desde a época
das cavernas, quando se fazia desenho sem texto nas paredes, requer uma interpretação
mais refinada para captar os sentimentos mais profundos do criador da história
(EISNER, 2001). O aluno, neste caso, usou as briguinhas, tão representadas em todas as
Histórias da turma da Mônica, porém, não se preocupou em apresentar os fatores que
levaram a essa perseguição. Nas imagens utilizadas por ele, as expressões fisionômicas
dos personagens mostram o estado emocional, entretanto, perdeu-se o foco da narrativa
por não ter conseguido dar seqüência ao pensamento.
No oitavo quadrinho, a cena não tem coerência com o início da história. O texto
aparece nos quadrinhos nove e dez. No balãozinho em que se a fala da
personagem Mônica, o aluno utilizou-se do balão com traçado denteado que representa
grito ou som saído de um aparelho eletrônico (EISNER, 2001). O traço desse quadrinho
aparece em forma denteada e representa uma um momento angustiante ou a emoção
explosiva, como a raiva.
93
Ao inserir um balão de fala para o Bidu (cachorrinho), o aluno Murillo utilizou-
se de um elemento muito presente nas fábulas, e, que neste caso, explorado por
Maurício de Sousa nas suas histórias, é o fato de animais falarem, pensarem e se
comportarem como seres humanos.
Houve na antiguidade uma literatura de cunho satírico, contra a opressão
reinante, para condenar usos, costumes e mesmo personagens. Para não serem
atingidos, os autores usavam aves e animais como personagens de suas críticas
e hoje desaparecidos tais personagens, usos ou costumes permanece a
literatura em sua forma pitoresca, como leitura de ficção apropriada à infância.
(SALEM, 1970, p.129)
Nas brincadeiras das crianças, esse aspecto é utilizado inserindo fala aos
homenzinhos ou bonecas como se eles tivessem vida, vontade e idéias próprias. Nos
textos produzidos por elas, observei-os inserindo fala aos animais que dialogam com os
outros personagens da história.
Murillo acrescentou fatos relevantes no seu texto que servem para esclarecer sua
criação de HQs. Em primeiro lugar, ele justificou os machucados do Cebolinha no
segundo quadrinho, ao escrever que a Mônica o acertou com o ursinho (aqui o aluno
confundiu-se, pois o bichinho de pelúcia da Mônica é um coelho e não um ursinho).
94
No parágrafo seguinte, um novo erro, desta vez de palavra, porque o que se é
Nenhum dia e o certo seria: No outro dia. Aqui o aluno utilizou onomatopéias para
representar a coelhada que o Cebolinha levou.
Um fato que chamou a atenção é que nos quadrinhos feitos por Murillo, não se
entendia que o Cascão havia engolido o coelhinho; pois, em um quadro, aparece a
Mônica atirando o coelhinho e, no quadro seguinte, aparece o Cascão chorando e a
onomatopéia Clonc, sem qualquer texto ou figura que mostrasse a trajetória do
coelhinho indo para a boca dele. Esse fato é explicado no texto do Murillo, e representa
um acidente, pois a Mônica chamou o Cascão e, no que ele virou, por estar chorando de
boca aberta, engoliu o coelhinho. Aqui comprova que texto e imagem se completam e,
como faltou o texto, não se podia chegar a essa conclusão pelos quadrinhos.
entendi essa parte, porque o texto criado posteriormente, permitiu esse entendimento.
Outro exemplo é o sétimo e o oitavo quadrinhos que não nos deixam perceber,
só pelos desenhos, que o Cebolinha havia tirado o doce da Mônica, razão da sua bronca
no penúltimo quadrinho.
Acredito que se o aluno tivesse inserido balõezinhos com essas idéias na sua
HQs, teria ficado mais claro o entendimento.
Observa-se também que ele escreveu algumas palavras com ortografia incorreta
e em outras, a escrita está subjugada à sonorização.
Figura 8
95
HQs Gisele
Nesta seqüência de história, a aluna quis dar noção de caminhada e do tempo
passando. Optou por trocar os cenários. Iniciou no banheiro e, em seguida, escolheu
ambientes ao ar livre, bem diferentes um do outro para deixar a idéia que o parque era
realmente muito longe. Quando o Cebolinha chega ao parque, ela terminou sua história.
Observe que os brinquedos do parque estão desproporcionais ao tamanho do
Cebolinha. Olhando pela primeira vez, tem-se a impressão de tratar de miniaturas de
brinquedos. O carrossel, o castelinho e os demais brinquedos estão menores que o
Cebolinha. Embora a aluna contemple sua história com coerência e seqüência, perdeu
um pouco o valor pela falha de não saber ou ter se esquecido de aumentar o cenário do
parque para não ficar a impressão de miniaturas.
A aluna utilizou-se do chamado plano médio para a descrição dos cenários,
porque queria dar a noção do caminho percorrido pela personagem. A maneira
encontrada por ela para descrever o caminho é explicada por vários autores e
pesquisadores de Histórias e Quadrinhos, variando a nomenclatura, Quella-Guyot,
(1994) chama de plano médio, Eisner (2001) chama de perspectivas, Rama (2004)
96
nomeia de plano geral, primeiro plano, plano de detalhe ou plano americano,
(dependendo da utilização), mas ficou clara a mensagem que ela quis transmitir.
Assim, conforme Quella-Guyot (1994, p. 40) explica a importância dos planos
usados nas Histórias em Quadrinhos: “Nosso olho, câmara sem filme, mas não sem
memória, recompõe o mundo em campos de visão (em outras palavras, em
“enquadramentos”) que nos habituamos a rotular a partir de uma escala de planos.”
Assim, estabelecer planos mais próximos ou mais distanciados, é o que define o objeto
que desejamos dar ênfase, porém, estes planos de imagens sofrem efeitos diferentes na
leitura conforme o contexto e os indicativos acrescentados a eles.
A passagem do tempo e o ritmo desta história são marcados pela seqüência da
caminhada em ambientes diferentes e a posição do Cebolinha nos quadrinhos, no canto
esquerdo, no segundo quadrinho, e, depois, próximo ao canto direito, perto da linha
limítrofe do quadro.
Na sua produção textual, Gisele focalizou o tempo e a ação praticada pelo
Cebolinha antes dele começar sua caminhada. No balãozinho do primeiro quadro, a
aluna escreveu um pensamento do Cebolinha sem as trocas que esse personagem faz,
porém, no seu texto, ela repete as palavras dele, agora, da maneira que aparece a fala
dele no gibis, ou seja, trocando o r pelo l.
Ao repetir três vezes a palavra andou, a aluna quis representar uma longa
caminhada, como já comentada na análise da sua HQs.
97
Faltou esclarecimento à cerca do último diálogo: Até que enfim chegamos
(Quem, se na figura aparece só o Cebolinha?). Aqui, fica a impressão que o personagem
está interagindo-se com o leitor e comunica que o leitor chegou com ele ao destino e;
como se outra pessoa estivesse tecendo elogios: Você foi bom nisso. Mas, na sua HQs,
ele diz, se auto elogiando: Eu sou bom nisso.
Figura 9
98
Esta história serve para ilustrar sobre a leitura de uma HQs que deve seguir o
padrão da cultura ocidental, ou seja, da esquerda para a direita e de cima para baixo. “O
leitor na cultura ocidental é treinado para ler cada página independentemente [...] A
disposição de quadrinhos na página parte desse pressuposto.” (EISNER, 2001, p. 41)
A aluna, no primeiro quadro, escreve um diálogo entre a Magali e a Mônica, no
entanto, sem ter o conhecimento da forma padrão para a leitura, coloca o primeiro balão
próximo à Magali, que seria resposta ao comentário que a Mônica faz. Assim, lemos
primeiro a resposta e depois o início do diálogo.
Rama (2004) afirma que a leitura procede como nos textos escritos, seja na
linguagem escrita como nos desenhos dos quadrinhos:
...em relação à disposição dos personagens e suas respectivas falas. Ou seja,
acontecimentos que ocorrem antes na seqüência temporal ainda que o
intervalo entre os atos representados seja apenas de alguns segundos são
apresentados sempre à esquerda do quadrinho (RAMA, 2004, p.33).
Essa norma convencional deve ser passada aos alunos para que, ao elaborarem
histórias e produzirem textos, não recaiam neste erro, possibilitando assim um bom
entendimento do seu pensamento e da idéia que se quis transmitir.
99
Embora a aluna tenha repetido por várias vezes o pronome ele: (Depois elas
levaram ele para passear e ele chorou (...) ele não parava de chorar (...) compraram
uma chupeta para ele (...) compraram roupas para ele (...) observa-se que a aluna
adquiriu noção de parágrafos e descreveu a primeira parte da sua história sem incluir os
diálogos dos balõezinhos no seu texto. Ela acrescenta informações que não se pode
perceber na sua HQs (que o primo chorou, que compraram chupeta, que foram ao
Shopping e que deram o primo para alguém).
Inês Rosana escreve com lógica e coerência, situando o espaço e o tempo na sua
narrativa. Optou por deixar de fora, no seu texto, a outra parte da sua história que
continuava o banho de piscina do Cebolinha e a fuga dele para uma caverna, seguido
pelo Anjinho. No penúltimo quadrinho, o balãozinho com a fala do Anjinho, mostra que
ele já estava cansado de proteger o Cebolinha, e no último quadro, este diz que só estava
brincando. Esses fatos ficaram sem explicação na sua HQs e no seu texto.
Faltou para Inês Rosana uma releitura do texto que criou, porque certamente
teria percebido palavras que escreveu errado por falta de atenção, como é o caso da
palavra menininho no título, que ela erradamente escreveu meninho
100
Figura 10
Nesta historinha, a aluna optou por fazê-la sem texto, mas é perfeitamente
entendida, embora a seqüência não apresente coerência entre si, e a evolução se perceba
somente pela troca de cenários.
Rama (2004) nos diz que
as histórias em quadrinhos constituem um sistema narrativo composto por dois
códigos que atuam em constante interação: o visual e o verbal. Cada um desses
ocupa, dentro dos quadrinhos, um papel especial, reforçando um ao outro e
garantindo que a mensagem seja entendida em plenitude (RAMA, 2004, p.31)
Assim sendo, embora o objetivo do trabalho seja analisar a criação de texto
escrito, está implícito nos quadrinhos um texto não verbal que permite identificar uma
narrativa clara das ações dos personagens visualizados na fisionomia alegre da Mônica e
do Cebolinha. Talvez, este fato se deva ao amplo conhecimento da idéia central das
HQs de Maurício de Sousa.
Percebe-se que Rita, que não apresenta falta de coerência e seqüência em sua
narração oral, perdeu-se nesta produção e este fato pode ser atribuído pela pouca
experiência que tem com o computador e com as ferramentas para trabalhar com as
HQs, visto que não uma seqüência entre os quadros: inicia no campo, aparece a
101
cidade, volta ao campo e depois é retratado um lago com o Cebolinha de sunga, pulando
no rio.
Rita adoeceu nos últimos dias de aula e não freqüentou o colégio nos dias que
encerramos o trabalho com a produção textual. Por isso, não consta aqui o seu texto.
Figura 11
102
Nesta seqüência, Tânia utiliza-se de outras personagens da Turma, fugindo das
histórias dos demais alunos, que sempre retratavam os personagens mais conhecidas:
Mônica, Magali, Cebolinha e Cascão. Embora a Mônica apareça no segundo quadro,
não está em evidência na história. Aparece somente para nos dar a noção de que se trata
da sua família.
A aluna Tânia procurou criar a sua história utilizando outro cão, outro cenário e
um tema bem diferente dos demais colegas.
A aluna contou com a imaginação do leitor para dar continuidade à sua narrativa
e os quadrinhos servem para demonstrar a passagem do tempo. Na cena em que Mônica
aparece, retrata bem uma cena familiar, pois ela aparece em um balanço, roupas no
varal, uma bicicleta encostada no muro, o tanque, enfim, uma cena de quintal bem
retratada que nos evoca memórias e que os autores utilizam, com a convicção que é do
conhecimento dos leitores.
As Histórias em Quadrinhos exigem que a imagem exerça uma interação entre o
autor e o leitor, que o primeiro estará evocando imagens que estão guardadas na
mente dos dois (autor e leitor). Como a imagem é fixa e sem palavras, ela deve
transmitir ao leitor o que a descrição de um texto escrito faria (EISNER, 2001).
No balãozinho de pensamento, o texto ali contido mostra que a aluna transferiu
para a escrita o modo como fala, por exemplo: “O que o papai ta procurano?”, ou seja,
o ‘ta’, é a forma reduzida de está eprocurano’, que retrata a fala das crianças omitindo
o d em gerúndios.
O monólogo do pai da Mônica, no último quadro, também apresenta a
sonorização transferida para escrita quando a aluna escreve ‘dezistir’ e ‘tezoro’.
Segundo Cagliari (1992), o s intervocálico apresenta o som de z, porém, em algumas
palavras, como fazer, não é o s que aparece e sim o z. A aluna optou por representar o
som com a letra z “uma escolha errada, mas perfeitamente de acordo com as
possibilidades de uso do sistema de escrita” (p. 138).
É o próprio Cagliari que nos pede para não corrigir demais os alunos nesta fase
em que estão iniciando suas produções textuais. Deve-se sim, estimular a auto-correção
para que ela possa pensar e refletir sua escrita. Se, ao contrário, tentarmos facilitar
demais, corrigir, não haverá o desafio que leva à reflexão.
Nesta história, também é possível observar o cão com características humanas
como nas fábulas. Ele parece querer dizer Ou, vem encrenca’. Uma outra
103
interpretação pode ser dada: a aluna quis representar o latido do cão, porém, um latido
mais grave, rouco e optou por colocar ou ou em vez de au au.
Tânia voltou para São Paulo antes de terminarmos os trabalhos com História em
Quadrinhos. Apresentei sua história ao aluno Fábio que produziu o seguinte texto a
partir da história de Tânia:
Transcrição do texto criado por Fábio, sem correções.
O pai da mônica estava porão procurando um mapa e que susto ele tomou
com um rato mas ele quase teve um troso de felizidade quando viu o mapa e
o monicão que estava procurando o mapa também não gostou e ficou muito
bravo! E começou a falar:
Ou au au au ou...
O pai da mônica feliz foi procurar o tesouro e o esperto do monicão foi junto
chegando o pai da mônica não achou e sabem porque ele não achou?
Porque o mapa era para achar um osso e não um tesouro.
Comprovando o que havia descrito sobre esse aluno, Fábio criou um texto
baseado nos quadrinhos da Tânia e deu um encaminhamento bem diferente do que se
poderia imaginar.
O aluno criou uma nova história no seu texto que só utilizou os personagens, e
completou-a com sua criatividade.
O texto se apresenta com somente três parágrafos, mas o vocabulário é claro e
sem repetições, as idéias são coerentes e embora não tenha sido ele o criador da HQs,
contribuiu de maneira significante para o trabalho.
104
Figura12
Esta historinha apresenta um conteúdo pobre de escrita, porém, o aluno Fábio
conseguiu transmitir sua idéia com seqüência entre os fatos, faltando, entretanto a
continuação do cenário nos dois últimos quadrinhos. Ele destaca nesta história o uso de
onomatopéias e optou por inserir em duas formas: uma solta, sem o balão, no lugar de
um quadradinho, significando o tombo do Cebolinha sobre a Mônica e outra dentro do
balão, representando um cansaço pela corrida para fugir da amiga, que interage com a
cena, complementando-a. As duas onomatopéias estão bem inseridas no contexto da
história e tornam mais dinâmica e divertida a leitura. As onomatopéias surgiram para
representar sons do ambiente por meio de caracteres alfabéticos. São utilizadas nas
histórias em quadrinhos e também em outros textos literários. No caso específico das
105
histórias em quadrinhos, elas assumem um “papel importante na linguagem, papel esse
que aumentou consideravelmente nas últimas décadas, impondo um ritmo fremente às
narrativas de ação e participando graficamente na diagramação das páginas” (RAMA,
2004, p. 63).
E é exatamente isso que constatamos nestes três quadrinhos produzidos pelo
aluno: as onomatopéias criam um clima de ação à seqüência, fugindo do marasmo das
cenas de correria e fugas do Cebolinha; e nas palavras de Quella-Guyot (1994, p. 87)
“constituem a sonoplastia (a trilha sonora) das histórias em quadrinhos...”
Fábio optou por escrever o texto de Tânia e não o seu próprio, por isso, não
consta aqui o texto da sua HQs.
Figura 13
106
Acrescentei esta história na análise por causa da fisionomia dos personagens que
bem representam os estados de humor condizente com o que a aluna Nayara tentou
retratar na cena. Vê-se, no primeiro quadro, a Magali comprando um picolé e, no
quadrinho seguinte, dando continuidade à ação, passa a língua nos lábios, significando
que estava com vontade de consumir logo o picolé. Neste mesmo quadro, a presença da
Mônica, com a expressão facial de aborrecida e mandona é complementada pelo traço
do balão, que como já foi dito, representa um estado de explosão ou raiva. Podemos ver,
neste quadro, também o Cebolinha que aproveita da discussão das meninas, pega o
coelhinho da Mônica para fazer alguma traquinagem com ele.
Na seqüência, a Magali devorou o picolé, e a Mônica é retratada com mais
raiva do que no quadrinho anterior. O Cebolinha inicia a gritaria por imaginar o
que espera por ele. No quadro seguinte, a Magali não mais aparece, assim como o
coelhinho da Mônica, mas o Cebolinha pede para não apanhar, e a Mônica, como que
desconhecendo a peraltice do amigo, termina perguntando ‘O que, Cebolinha?’
Nayara destacou em sua historinha a expressão facial e corporal dos
personagens, tão bem manipulada por ela, confirmando o que foi explicado por Quella-
Guyot (1994, p. 68) “a imagem se encarrega de detalhes picantes que o texto não
revela”. Assim, ao optar pela fisionomia carrancuda ou raivosa, ou ainda alegre e
descompromissada, Nayara fez interagir imagem e texto, num complemento que
desobrigou o uso de palavras para transmitir o humor dos personagens.
107
O corpo humano, [...] a codificação dos seus gestos de origem emocional e das
suas posturas expressivas, são acumulados e armazenados na memória,
formando um vocabulário não verbal de gestos [...] é óbvio que, quando uma
imagem é habilidosamente retratada, ao ser apresentada ela consegue deflagrar
uma lembrança que evoca o reconhecimento e os efeitos colaterais sobre a
emoção. Trata-se aqui, obviamente, da memória comum da experiência
(EISNER, 2001 p. 100).
A personagem Mônica é apresentada, nas histórias da Turma, como uma criança
mandona, explosiva e sempre próxima de transbordar sua raiva. A aluna Nayara usou
sua memória de leitora para retratar a Mônica nesta seqüência, uma maneira de
confirmar a personalidade da personagem, atestada nas histórias em quadrinhos
divulgadas para o público que conhecem, de longa data, as características do
temperamento da Mônica. Sua história ficou próxima das histórias produzidas por
Maurício de Sousa, o criador da Turma da Mônica.
Nayara escreveu um texto que se destaca os diálogos, representado pelos
travessões e com pontuação correta, utilizando inclusive reticências, fato pouco comum
para crianças nesta fase do processo de alfabetização.
108
Complementou seu texto com narrativa e acrescentou falas que não apareceram
em sua HQs. Percebe-se poucos erros de ortografia, sem, no entanto, utilizar de palavras
que estão além do vocabulário infantil. Colocou o título dando noção do final da história
que a Mônica, não podendo bater na Magali, resolve descarregar sua ira no Cebolinha.
Figura 14
109
HQs Bernardo
Nesta história, percebemos na escrita o mesmo ‘erro’ das outras histórias
analisadas, ou seja, a sonorização, a falta de pontuação e a ausência de letras maiúsculas
no início da frase. Utilizo esta história junto com as outras analisadas por causa do
último quadro. O aluno quis retratar o momento da correria do Cebolinha fugindo da
Mônica, e o Cascão, que estava chegando, acabou entrando na fuga sem saber o que
estava acontecendo. O aluno Bernardo representou o Cascão em várias posições, com
diferentes expressões faciais, inclusive com uma bola, para dar o aspecto de movimento
e ação à cena. Colocou o Cebolinha em primeiro plano junto com a Mônica segurando o
coelhinho em uma posição que indica movimentos circulares do coelho, para dar
sentido à narrativa, justificando a causa de toda aquela confusão.
110
A compreensão de uma imagem requer uma comunidade de experiência.
Portanto, para que sua mensagem seja compreendida, o artista seqüencial
deverá ter uma compreensão da experiência de vida do leitor. É preciso que se
desenvolva uma interação, porque o artista está evocando imagens
armazenadas nas mentes de ambas as partes. (EISNER, 2001, p.13).
Ao representar a confusão da perseguição, o aluno conseguiu que o leitor
entendesse o significado que ele quis dar à cena. Embora esta história apresente pouco
texto escrito, as figuras falam por si. Isso reforça a seguinte afirmação de Eisner (2001):
“é possível contar uma história apenas através de imagens, sem ajuda de palavras [...] é
uma tentativa de explorar a imagem a serviço da expressão e da narrativa.” (p.16).
A imagem complementa o diálogo sem que a história se torne incompleta. No
caso desta história, as expressões faciais e corporais dos personagens, falam por si só. O
mesmo fato pode ser observado na HQs de Abílio que também representa a fuga do
Cascão e do Cebolinha em um quadrinho dando noção de movimento e ação.
Figura 15
111
HQs Abílio
A seguir o texto produzido por Bernardo:
O texto de Bernardo apresenta-se como uma explicação do último quadro. É um
texto pobre de conteúdo e sem erros de grafia. Nota-se somente a palavra reflexo que
está fora de contexto. Pode ser que ele queria dizer que o Cascão correu tanto que
chegou a fazer flexões, ou agiu por reflexo para fugir das coelhadas impostas pela
Mônica.
112
O único sinal de pontuação é o ponto final. As frases são curtas, ainda naquela
fase de um só verbo, porém, é visto que o aluno consegue transcrever seus pensamentos
e transformar em texto uma história que criou com poucos diálogos e informações para
o entendimento.
E agora o texto criado por Abílio:
No seu texto, Abílio pouco esclarece sobre sua HQs. Tem-se a impressão de que
ele está escrevendo sobre outra história, com exceção do skate, não nenhum outro
fator que caracteriza que o texto produzido por ele é da HQs, assim mesmo, na história
ele colocou o Cascão no skate e no texto ele atribui o brinquedo ao Cebolinha.
Aparece ainda a Magali no seu texto e não aparece na HQs, que inicia com uma
perseguição da Mônica aos meninos, e esse fato não é citado no seu texto.
113
Figura 16
114
HQs Leila
115
A produção textual de Leila apresenta-se com início, meio e fim, utilizando os
sinais de pontuação, parágrafo e letra maiúscula onde são necessários.
A aluna utilizou-se do termo ‘Enquanto isso’ para expressar um fato que
acontecia simultaneamente à outra ação na história. Provavelmente, se tivesse tido mais
tempo com o trabalho de HQs, a aluna teria dado seqüência à cena do Cebolinha e da
irmãzinha dele de forma que a primeira parte se completasse com a parte do Cascão
indo ao circo.
Figura 17
116
HQs de Ingrid
Ingrid utilizou-se da sua produção de HQs e criou um texto bem escrito e
coerente que complementa realmente as lacunas que ocorreram na sua história, com
fatos aparentemente sem ligação .
Empregou a pontuação adequada, fez uso de parágrafos e travessões nos
diálogos.
Para fazer a ligação entre os fatos descritos, serviu-se de palavras como: mais
tarde e depois. Seu vocabulário é adequado para a história criada e observa-se poucos
erros na escrita.
117
Figura 18
HQs de Elaine
Percebe-se que Elaine usou somente um quadrinho para sua história, copiado da
HQs de Marcella, ou vice-versa, até a fala do balãozinho de uma e outra contém as
mesmas palavras. Como as duas meninas são amigas e estão sempre perto uma da outra,
creio que resolveram fazer uma história em dupla. Marcella acrescentou um quadrinho
antes da cena da cozinha e Elaine ficou só com este.
Seu texto é simples, pobre de conteúdo e nele aparecem fatos que não estão
apresentados na sua HQs, mas que aparecem na história de Marcella, que tive a
impressão de que se tratava de um trabalho feito em dupla.
118
Figura 19
119
HQs de Mirian
Aqui, mais um exemplo de texto de uma única frase. Mirian escreveu-o sem
parágrafos, comentando sobre tudo o que apresentava sua HQs, mais como uma
descrição desta do que propriamente um texto a partir dela.
O título aparece no final do texto, uma prática comum para crianças em fase de
alfabetização, que primeiro escreve a história e depois atribui um título.
120
Figura 20
HQs de Gislene
121
Gislene fez como os autores das últimas histórias analisadas: fez uma descrição
de sua HQs procurando explicar o que estava se passando na cabeça de cada um dos
personagens.
Criou um suspense no final, sem explicar por que a Mônica foi parar em uma
caverna o que aconteceu depois do último quadrinho. Porém, se atentarmos para o fato
que o texto foi criado por uma aluna em processo de alfabetização, que usou de acordo
com as normas a pontuação, parágrafos e travessões, diria que é bom o resultado final.
Figura 21
122
123
HQs de Gustavo
Na sua produção, Gustavo inverte os fatos não escrevendo como eles aparecem
em sua HQs, visto que a primeira cena da sua história é justamente o que aparece no
último parágrafo do seu texto.
Utiliza-se de fatos da atualidade para o desenvolvimento do seu texto, como por
exemplo, clone, e salienta que o clone da Mônica, embora não se entenda isso na sua
história, é mais amável que a Mônica verdadeira.
Usou de forma correta a pontuação, e os diálogos aparecem com travessões ,
ainda que em alguns, ele tenha esquecido de iniciar a frase com letra maiúscula.
É possível observar também, palavras escritas com a ortografia errada, o que não
prejudica o entendimento da história.
Gustavo foi um dos poucos alunos que utilizou a letra maiúscula nos balões da
sua história, demonstrando uma certa familiaridade com gibis, pois é assim que as letras
são usadas nas revistinhas. Antes dele, observamos este detalhe nas histórias de Gislene,
Ingrid, Abílio (somente em um balão), Inês Rosana e Marcella. Também, foi o único
que inseriu um título na sua HQs, que não é propriamente o título da história e sim os
personagens que aparecem nela.
124
Figura 22
HQs de Leopoldo
125
Leopoldo usou pouco diálogo na sua história, optando por fazê-la quase como
um monólogo e que os pensamentos da Mônica são apresentados ao leitor fora da forma
convencionada pelos autores das HQs, ou seja, dentro do balão de fala e não do balão de
pensamento.
Na sua HQs, o primeiro quadro não tem ligação com a parte final, pois o
Cebolinha e o Louco aparecem na primeira cena e não são representados nos próximos.
Mônica aparece em um parque de miniaturas, o que pode ter sido feito de forma
proposital, ou serve como indicativo para mostrar que Leopoldo não tem muita
126
afinidade com o software e não soube aumentar o cenário ou diminuir o tamanho da
Mônica.
Outro aspecto que chama a atenção é que o seu texto escrito não
ligação entre uma frase e outra, ou seja, ele escreveu sobre os quadros separadamente,
com frases curtas e com repetição de palavras. Está ainda utilizando o ‘Era uma vez’ e
sempre escreve fim no final das suas frases como um reforço para indicar que realmente
parou ali, sem possibilidades de retornar e continuar a idéia.
Observei também falta de vocabulário e idéias para o desenvolvimento
do seu texto.
Surpreendeu-me ler a produção textual dele, visto que é um aluno com
um bom desempenho na sala de aula, participativo e com bom vocabulário em sua
oralidade. Percebi que ele estava pouco à vontade na realização deste trabalho porque
não dominava bem o computador e sempre solicitava ajuda para usar os recursos do
software.
127
CONSIDERAÇÕES
Como professora alfabetizadora, sempre procurei conciliar a teoria das propostas
pedagógicas com a prática em sala de aula, e criar situações em que pudesse
acompanhar o desenvolvimento dos alunos, suas conquistas e seu crescimento. Porém,
não conseguia entender todas as teorias. Em um dado momento não se podia mais
alfabetizar com cartilha, por quê? Eu não conseguia ver ligação entre uma teoria e outra.
Por isso que o primeiro passo para realizar essa investigação foi estudar a história da
educação e dos métodos de alfabetização, iniciando com a história da infância e da
família na sociedade do passado e na atual, averiguando também a instituição escolar
como o local de acesso ao conhecimento sistematizado.
Com base na história da educação, conheci a trajetória da alfabetização e os
pesquisadores preocupados com a melhoria na prática pedagógica, mas que nem sempre
viram seus ideais levados a sério.
Por outro lado, ficou evidente que as pesquisas de Emília Ferreiro e Ana
Teberosky trouxeram novas propostas educacionais baseadas no construtivismo
piagetiano apontando para necessidade de mudar as concepções de aprendizagem na
educação escolar. Essas pesquisas contribuíram para a elaboração de documentos
oficiais do Ministério da Educação (MEC), como por exemplo: os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs). Essas novas recomendações na forma de ensinar,
provocaram muita polêmica no ambiente escolar entre os professores que deveriam
cumprir as fases da aquisição da escrita, de acordo com as pesquisas apresentadas por
Emília Ferreiro.
Teve início a uma corrida para preparar e capacitar os professores,
principalmente das séries iniciais, para que esses colocassem em prática as propostas
descritas nas pesquisas. Os professores que trabalhavam com o método fônico tiveram
que mudar sua maneira de ensinar e isso desencadeou um clima de descontentamento
em relação ao trabalho docente: o professor não ensinava do jeito que sabia para não ser
chamado de tradicional e não ensinava nos moldes das pesquisas porque não se sentia
seguro para fazê-lo.
Os professores das séries iniciais do Ensino Fundamental, independente se a
instituição em que atuam é pública ou privada, sempre vão em busca de soluções para
resolver este ou aquele problema que surge no seu dia a dia. No caso específico da
128
alfabetização, além de todo trabalho que se faz necessário para que um aluno leia e
escreva, os professores enfrentam também, na atualidade, a falta de interesse que muitos
alunos demonstram. São observações visíveis no ensino fundamental e mais ainda nas
séries finais. As crianças chegam à escola com informações de várias fontes midiáticas
recebidas de forma prazerosa, mas isso não quer dizer que elas tem o conhecimento,
porque este é adquirido em situações propícias, planejadas, com objetivos claros e
bem definidos.
O professor precisa motivar muito mais seus alunos uma vez que a mídia de
massa entretém as crianças, os jovens e os adultos, com programação dinâmica e
exibida de forma prazerosa. Ao professor, cabe a tarefa de despertar nos seus alunos o
interesse, o gosto pelos estudos e pela leitura.
Percebi que se trouxesse para a sala de aula um pouco das situações cotidianas,
poderia motivar meus alunos aos conteúdos escolares. Era preciso mostrar para as
crianças a importância da leitura e do conhecimento na sociedade atual e, também, criar
situações em que eles sentissem necessidade de ler. Investiguei os desenhos animados
preferidos, coleções de figurinhas, programas de televisão mais assistidos, passeios que
mais proporcionavam alegria e cheguei às leituras preferidas. Foi quase unânime a
preferência pelos gibis. Era a leitura preferida por eles, as que mais procuravam nas
horas de folga ou de lazer. Com base nas leituras sobre Histórias em Quadrinhos,
procurei trazer para os alunos uma leitura agradável e condizente à sua idade. O
objetivo foi proporcionar um ambiente de criação favorável ao hábito da leitura. Esse
trabalho no laboratório de informática, utilizando o software da Turma da Mônica
mostrou-se interessante para desenvolver a leitura e a escrita com alunos na fase de
alfabetização.
Evidentemente, essa não é uma técnica mágica que resolve todos os problemas
da alfabetização. Seria ingenuidade acreditar que um trabalho no laboratório de
informática, levaria todos os alunos a se desenvolverem no processo de aprendizagem e
a partir dali nunca mais teriam dificuldades em ler ou produzir textos. Porém, como
ponto positivo, tinha o fato de que os alunos gostam do computador e com isso, a
motivação já estava garantida.
Periodicamente eu os encaminhava ao laboratório, mas trabalhava somente os
conteúdos explicados para um reforço do aprendizado. Penso que com essa prática
colaborava com a formação deles e favorecia a familiaridade com a informática.
129
Com o trabalho de produção de histórias em quadrinhos usando o computador
constatei um melhor desempenho na produção de textos, mas a intervenção do professor
foi fundamental para assegurar um clima de cooperação afetiva e não só cognitiva. Essa
cooperação por parte dos colegas que auxiliavam uns aos outros, ensinando o que o
colega não sabia, contribuiu significativamente, tanto no aprendizado dos conteúdos
quanto no relacionamento entre os alunos.
Como os personagens do software eram da Turma da Mônica, conhecidos pelas
crianças, a produção textual não fluía como eu esperava. Nas criações de histórias, os
alunos reproduziam as perseguições e correrias da Mônica atrás do Cebolinha, quase
sem texto e sem explicações do motivo do corre corre.
No decorrer do trabalho, por meio de leituras e reflexões, foi possível construir
um outro olhar referente a estas questões, o que não ocorreu sem o desafio de superar
muita angústia dentre outros desconfortos.
Por isso que, um pouco desanimada, percebi que a criação das histórias em
quadrinhos não oferecia subsídios para que a produção textual melhorasse. Porém, com
a criação deles, pude analisar e conhecer os caminhos que eles percorreram para utilizar
o código escrito.
Os desafios referentes à leitura e à escrita levam a uma série de
questionamentos. Mas o trabalho de medição docente com situações reais favoreceu a
construção de textos e a realização de leituras significativas, porque a produção de
histórias em quadrinhos incentiva a criança a construir textos, mobilizando a
escreverem e descreverem situações expostas nos quadrinhos. Um aluno em fase inicial
de alfabetização, escreve somente com o verbo ser e estar, e era preciso mudar essa
forma de se comunicar. Nesse trabalho, foi necessário um constante ir e vir, para
analisar as teorias e comparar com a prática.
No decorrer da investigação, as leituras e as reflexões contribuíram para analisar
os dados, superar o desconforto e a intervenção realizou-se com base no constante
diálogo com os autores e pesquisadores. Pude entender as dificuldades dos alunos na
escrita, ajudá-los na desconstrução de suas hipóteses para formular outras.
Os erros que eles cometeram nas suas produções curtas ou longas, são os
mesmo. Percebi que, o tamanho de um texto nessa fase de alfabetização é irrelevante.
Um texto curto pode ter mais conteúdo que um texto longo, que muitas vezes, é longo
por ter muita repetição de fatos ou palavras que a criança acrescenta na sua produção.
130
Era preciso avançar e oferecer oportunidades para a construção de novos textos.
Por isso optei por levá-los novamente ao laboratório depois que as histórias em
quadrinhos estavam prontas, para que construíssem seus textos com base no que
criaram com o computador. Leram as histórias que produziram e escreveram um texto
no caderno. Dessa forma as produções textuais tiveram outro significado e fluiu com
maior facilidade. Foi possível observar o aluno escrevendo com segurança, com
imaginação, criatividade e sem medo de testar suas hipóteses na escrita, sem medo de
errar.
Observei que ao produzir os quadrinhos da Turma da Mônica no computador, as
brigas entre os personagens, próprias das Histórias da Turma da Mônica, estiveram
presentes nas criações, porém esse fato ficou menos evidente na produção do texto.
Além das leituras sobre alfabetização, outras leituras foram necessárias para
compreender o histórico das Histórias em Quadrinhos e suas convenções que dão
uniformidade a esse estilo de narrativa. São recursos como quadro, requadros, passagem
do tempo, balões e onomatopéias, que nem sempre é valorizado nas leituras de gibis,
porque se tornou parte do texto e do desenho. Não se pára para pensar na sua função
dentro das histórias em quadrinhos, por isso tornou-se elemento de análise na criação
dos alunos.
Outro fator que destaco nesse trabalho, embora não o tenha utilizado com essa
turma, é o trabalho de criação de histórias em quadrinhos para reforçar o aprendizado de
outras disciplinas como História, Geografia, Ciências, Ensino religioso e tantas outras
que dependem da criatividade do professor.
Cabe aos professores alfabetizadores não perderem de vista a sua função de
construir argumentos que possibilitem uma postura crítico-reflexiva. As questões que
permeiam a escola não se esgotam, uma vez que elas estão sempre em processo de
reformulação, pois o saber está em constante transformação.
Com essa investigação, pretendi oferecer uma pequena contribuição à pesquisa
educacional e aos professores alfabetizadores. As atividades de criação de histórias em
quadrinhos desenvolvidas com alunos em fase de alfabetização são sugestões que deram
certo no meu trabalho docente, mas podem ser melhoradas em todos os aspectos. Outras
pesquisas podem complementar ou aprofundar com novos resultados. Ainda muito
que ser feito para melhorar o desempenho escolar na educação básica no Brasil. É
preciso dar continuidade às transformações que se fazem necessárias no interior de
131
nossas escolas, oferecendo as condições materiais e formação pedagógica para
aperfeiçoar a prática docente.
132
REFERÊNCIAS
AGUIAR, Vera Teixeira de (org). Era uma vez na escola. Formando educadores para
formar leitores. Belo Horizonte: Formato, 2001.
BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação Qualitativa em Educação. Porto: Porto
Editora, 1999.
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e Lingüística. São Paulo: Scipione, 1992.
CAGLIARI, Luiz Carlos. A respeito de alguns fatos do ensino da aprendizagem da
leitura e da escrita pelas crianças na alfabetização. In ROJO, Roxane (org).
Alfabetização e letramento. Campinas: Mercado de Letras, 2002.
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização o duelo dos métodos. In SILVA, Ezequiel
Theodoro (org). Alfabetização no Brasil Questões e provocações da atualidade.
Campinas: Autores Associados, 2007.
CALAZANS, Flávio. História em Quadrinhos na sala de aula. São Paulo: Paulus,
2004.
CASEMIRO, Sinclair Pozza. Concepções de escrita. In SANTOS, Annie Rose dos;
RITTER, Lílian Cristina Buzato (org.). Alfabetização e Linguagem. EAD 17.
Maringá: Eduem,, 2005.
CITELLI, Beatriz. Produção e leitura de textos no Ensino Fundamental. São Paulo:
Cortez, 2003.
CHIAPPINI, Lígia. A circulação dos textos na Escola – 2. In CITELLI, Adilson. Outras
linguagens na escola. São Paulo: Cortez, 2004.
COSCARELLI, Carla Viana; RIBEIRO, Ana Elisa (orgs). Letramento digital
Aspectos sociais e possibilidades pedagógicas. Belo Horizonte: Ceale; Autêntica.2005.
D´OLIVEIRA, Gêisa Fernandes. Cultura em quadrinhos: reflexões sobre as Histórias
em Quadrinhos na perspectiva dos Estudos Culturais. Disponível em:
www.publique.rdc.puc.rio.br/revistaalceu/media/alceu_n8_d’oliveira.pdf.Acesso em
13/05/2007.
EISNER, Will. Quadrinhos e a arte seqüencial. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo: Cortez, 1987.
FERREIRO, Emília; TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1991.
133
FERREIRO, Emília. Aprenda com eles e ensine melhor. Revista Nova Escola. Ano
XVI. No. 143. junho/julho 2001. p. 13-15.
FERREIRO, Emília. Com todas as letras. São Paulo: Cortez, 2003.
FRADE, Isabel Cristina Alves da Silva. Alfabetização na escola de nove anos
Desafios e rumos . In SILVA, Ezequiel Theodoro (org). Alfabetização no Brasil
questões e provocações da atualidade..Campinas: Editores Associados, 2007.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: três artigos que se completam. São Paulo:
Cortez, 2003.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Editora Atlas,
2002.
GOULART, Cecília. Letramento e novas tecnologias: questões para a prática
pedagógica. In COSCARELLI, Carlos Viana; RIBEIRO, Ana Elisa (orgs). Letramento
digital Aspectos sociais e possibilidades pedagógicas. Belo Horizonte: Ceale;
Autêntica. 2005.
GUIMARÃES, Edgard. Integração do texto/Imagem na História em quadrinhos.
XXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Belo Horizonte, 2003.
Disponível em http//bdtd.ibict.br/bdtd/busca/resultsimples.jsp. Acesso em 24/04/2006.
GUIMARÃES, Edgard. História em Quadrinhos como instrumento educacional. XXIV
Congresso Brasileiro de Comunicação. Campo Grande, MS, setembro 2001. Disponível
em http//bdtd.ibict.br/bdtd/busca/resultsimples.jsp. Acesso em 24/04/2006.
JOLIBERT, Josette. Formando crianças leitoras. Porto Alegre: ArtMed, 1994.
KLEIMAN, Ângela. Ação e mudança na sala de aula: uma pesquisa sobre letramento e
interação. In ROJO, Roxane. (org). Alfabetização e letramento. Campinas: Mercado de
Letras, 2002.
KLEIN, Lígia Regina. Alfabetização: Quem tem medo de ensinar? Campo Grande:
Cortez/UFMS, 2002.
KRAMER, Sonia. Alfabetização, leitura e escrita. Formação de professores em curso.
São Paulo: Ática, 2001.
LEMOS, Cláudia T. G. Sobre a aquisição da escrita. In ROJO, Roxane. (org).
Alfabetização e letramento. Campinas: Mercado de Letras, 2002.
MAYRINK-SABINSON, Maria Laura T. Reflexões sobre o processo de aquisição da
escrita. In ROJO, Roxane (org.). Alfabetização e letramento. Campinas: Mercado de
Letras, 2002.
McCLOUD, Scott. Desvendando os quadrinhos. São Paulo: M.Books do Brasil Editora
Ltda, 2005.
McCLOUD, Scott. Reinventando os quadrinhos. São Paulo: M.Books do Brasil Editora
Ltda., 2006.
134
MONARCHA, Carlos. (org). Lourenço Filho Outros aspectos, mesma obra.
Campinas: Unesp; Mercado das Letras, 1997.
MORI, Nerli Nonato Ribeiro. Uma experiência de alfabetização com repetentes. Porto
Alegre: Kuarup, 1994.
MORTATTI, Maria do Rosário Testes ABC e a fundação de uma tradição:
alfabetização sobre medida. In MONARCHA, Carlos (org). Lourenço Filho Outros
aspectos, mesma obra. Campinas: UNESP; Mercado das Letras, 1997.
MORTATTI, Maria do Rosário Longo. Os sentidos da alfabetização. São Paulo:
UNESP, 1999.
MOYA, Álvaro. História da história em quadrinhos. São Paulo: Brasiliense, 1996.
NASCIMENTO, Milton do. A alfabetização como objeto de estudo: uma perspectiva
processual. In ROJO, Roxane. (org) Alfabetização e letramento. Mercado de Letras,
Campinas, 2002
PERES, Aparecida de Fátima. Panorama histórico da linguagem e da escrita: da
concepção mecanicista à sociointeracionista. In SANTOS, Annie Rose dos; RITTER,
Lílian Cristina Buzato (org.). Alfabetização e Linguagem. EAD 17. Maringá: Eduem,
2005.
PERFEITO, Alba Maria. Letramento e aquisição da escrita. In SANTOS, Annie Rose
dos; RITTER, Lílian Cristina Buzato (org). Alfabetização e Linguagem. EAD 17.
Maringá: Eduem, 2005.
QUELLA-GUYOT, Didier. A história em quadrinhos. São Paulo: Loyola, 1994.
RAMA, Ângela; VERGUEIRO, Waldomiro; BARBOSA, Alexandre; VILELA Túlio.
Como usar as histórias em quadrinhos na escola. São Paulo: Contexto, 2004.
ROJO, Roxane Helena Rodrigues. O letramento na ontogênese: uma perspectiva
socioconstrutivista. In ROJO, Roxane. (org). Alfabetização e letramento. Campinas:
Mercado de Letras, 2002.
ROMUALDO, Edson Carlos. Elementos da fonologia, fonética e algumas questões
relacionadas à alfabetização. In: SANTOS, Annie Rose dos; RITTER, Lílian Cristina
Buzato (org) Alfabetização e linguagem. EAD nº17. Maringá: Eduem, 2005.
SALEM, Nazira. História da literatura infantil. São Paulo: Mestre Jou, 1970.
SANTOS, Annie Rose dos: CECÍLIO, Sandra Regina . Teorias de aprendizagem da
língua escrita. In SANTOS, Annie Rose dos; RITTER, Lílian Cristina Buzato (org).
Alfabetização e Linguagem. EAD nº 17. Maringá: Eduem, 2005.
SANTOS, Roberto Elísio dos. A história em quadrinhos na sala de aula. XXVI
Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação BH/Mg. 6 de setembro 2003.
Disponível em http//bdtd.ibict.br/bdtd/busca/resultsimples.jsp. Acesso em 24/04/2006.
135
SILVA, Salete Therezinha de Almeida. Desenho animado e educação. In CITELLY,
Adilson. Outras linguagens na escola. São Paulo: Cortez Editora, 2004.
SILVA, Salete Therezinha de Almeida. A linguagem cinematográfica na escola: uma
leitura d’O Rei Leão. In CITELLY, Adilson. Outras linguagens na escola. São Paulo:
Cortez, 2004.
SMOLKA, Ana Luíza Bustamante. A criança na fase inicial da escrita A
alfabetização como processo discursivo. Campinas: Editora da Unicamp, 1989.
SOARES, Magda. O que é letramento? Diário na Escola Santo André, 2003.
Disponível em: www.redenoarsa.com.br Acesso em 05/10/2007.
SOARES, Magda. A reinvenção da alfabetização. In Revista Presença Pedagógica.
Julho/Agosto 2003. Disponível em: www.meb.org.br. Acesso em 05/10/2007.
SOARES, Magda. Alfabetização e letramento. São Paulo: Contexto, 2005.
TEBEROSKY, Ana; COLOMER, Teresa. Aprender a ler e a escrever. Uma proposta
construtivista. Porto Alegre: ArtMed, 2003.
TERUYA, Teresa Kazuko. Trabalho e educação na era midiática. Maringá: Eduem,
2006.
VYGOTSKY, Lev Semenovich. Formação Social da mente: o desenvolvimento dos
processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
VYGOTSKY, L. Pensamento e linguagem.. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
WEISZ, Telma. Como se aprende a ler e a escrever ou prontidão um problema mal
colocado. In: São Paulo, Secretaria da Educação. Coordenadoria de Estudos e normas
Pedagógicas. Revendo a proposta de alfabetização. São Pulo: SE/CENP, 1985.
WEISZ, Telma; SANCHES, Ana. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. São
Paulo: Ática, 2002.
ZILBERMAN, Regina. A leitura na Escola. In: ZILBERMAN, Regina (org). Leitura
em crise na Escola – As alternativas do professor. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1993
136
Anexo 1
Dislexia: Apresenta-se como distúrbio na leitura e traz consigo problemas na escrita,
fator observável no início do processo de alfabetização. Apontada pelos estudiosos
como hereditária, visto que sempre há algum membro da família que também apresenta
esse distúrbio. A criança com dislexia possui inteligência dentro dos padrões de
normalidade.O distúrbio em questão manifesta-se como dificuldades que envolvem a
percepção, memória e análise visual e a área cerebral, responsável por essas funções, a
região do lobo occipital e parietal, aparece com comprometimento.
O disléxico demora a falar, tem dificuldades em lembrar seqüências (dias da semana,
letras do alfabeto, meses do ano) soletra com dificuldades, pula linha na leitura entre
outros sintomas. Geralmente são crianças com baixa auto-estima, inseguras e mostram-
se medrosas por errar e pelo fracasso.
Disgrafia: Não está ligada a nenhum comprometimento intelectual. É a chamada letra
feia. A criança com disgrafia apresenta lentidão para escrever, ora amontoando letras
para tentar esconder possíveis erros ortográficos, ora omite letras. A criança disgráfica
tem dificuldades em recordar a grafia da letra e quando escreve, apresenta traços
irregulares, fracos ou demasiadamente forte, pequena ou grande demais, alongada ou
comprida. Não tem uniformidade.
Disortografia: No início da fase de alfabetização, é comum as crianças trocarem letras,
sílabas e palavras (vaca por faca; pote por pode, etc). Se essas trocas persistirem após a
segunda série do Ensino Fundamental, pode tratar-se de disortografia; porém, sempre é
aconselhável um estudo detalhado do caso para não rotular ou confundir com problemas
auditivos.
Discalculia: É um distúrbio que impede a criança de compreender os processos
matemáticos. É pois, um problema relacionado à contagem, compreensão de números,
seriação e seqüência numérica, compreensão dos sinais matemáticos e dificuldades em
estabelecer correspondência número/quantidade.
Transtorno Bipolar do Humor: Apresenta-se por períodos de intensa depressão
seguidos de grande euforia. Observa-se atitudes de tristeza e desânimo seguidas por um
período de muita agitação em que realiza muitas atividades ao mesmo tempo e a pessoa
fala muito, mais que o normal. Pode acometer adultos, jovens e crianças. O Transtorno
Bipolar do Humor era conhecido como Psicose Maníaco-depressivo.
Síndrome do pânico: Ocorre uma crise súbita de medo, sem motivo aparente e sem
fatores desencadeantes. A pessoa passa por momentos angustiantes de medo e com a
sensação de que algo terrível está para acontecer. Quando isso acontece, são ativados os
mecanismos de fuga no organismo e a pessoa sente palpitação, tontura, dificuldade para
respirar, boca seca, calafrios ou sudorese, vertigens, etc.
Longe ser frescura, atitudes para chamar a atenção ou fraqueza, a síndrome do pânico é
real e deve ser tratada por psicólogos e psiquiatras.
Déficit de atenção: É reconhecida pela dificuldade de concentração. A criança que
apresenta Déficit de Atenção demora para atingir o estado de alerta necessário para
entender uma situação, uma explicação ou realizar atividades propostas por professores
ou outros agentes e esse estado de alerta, quando atingido, demora um curto período de
137
tempo. Ou seja, é uma dificuldade para compreender e assimilar o fator central de um
estímulo.
É conhecida e rotulada por professores mais desavisados e equipes pedagógicas como a
criança que vive no mundo da lua ou crianças que têm a cabeça nas nuvens.
Hiperatividade: É caracterizada por crianças ou jovens que apresentam atividades
psicomotoras excessiva, são impulsivos, falam sem parar, não conseguem esperar sua
vez, interrompem a fala dos outros e atropelam tudo e todos.
Fontes:
www.abcdasaude.com.br/artigos
Dra. Ana Luiza Galvão
Dr. Cláudio Moojen Abuchaim
www.dislexia.com.br
Marina S. Rodrigues Almeida
www.abcdasaude.com.br/artigo.phd?420
Dra. Ana Luiza Galvão
Dr. Cláudio Moojen Abuchaim
Acesso em 7/07/2007
138
ANEXO 2.
O AMBIENTE DA TURMA DA MÔNICA,
Tela principal.
Na barra vertical do canto superior esquerdo da tela do programa estão os ícones
que são os recursos disponíveis para a criação das histórias.
O primeiro ícone refere-se aos cenários. O criador pode escolher o cenário que
acontecerá sua história: quintal, parque, praça, jardim, quarto, banheiro, sala,
cozinha, rio, lago, montanha, caverna e fatores climáticos: sol, nuvem, chuva,
chuva com raio e lua.
139
O segundo ícone é uma opção para a cor do fundo do requadro.
No terceiro ícone, encontramos os personagens que podem ser escolhidas para a
construção da história. A Mônica aparece em 50 posições diferentes, igualmente
o Cascão, Cebolinha e Magali. A seguir temos a opção para a escolha de outras
personagens da Turma: Anjinho, Bidu, Sansão, Du Contra, Franjinha, Louco,
Maria Cebolinha, Marina e Hirro.
140
141
142
No quarto ícone, encontramos objetos para decoração do cenário. Pode-se ver,
neste espaço, 41 bichos, 30 brinquedos, 14 representações de doces e salgados,
desenhos que complementam o ambiente exterior (lata de lixo, placas, janelas,
hidrante, pedras, caixa de correio, orelhão, carro, semáforo, skate, cesta de
piquenique, pneu) totalizando 20 itens. Ainda neste ícone, ferramentas como
pregos, martelos, lanternas, serrotes, opções de frutas e legumes, além de outros
objetos para decoração do interior de uma casa ou cômodo como: mesa, sofá,
quadro, estante, ventilador, cadeiras, vasos, relógios, porta-retratos, bancos,
lustre, baú e outros. Outra opção é o desenho de louças, livros, onomatopéias
(com 12 opções), figuras de plantas, roupas, calçados e acessórios. E na opção
‘outros’, vemos os nomes dos personagens em letras coloridas como na
apresentação das histórias nos gibis. Também são disponibilizadas figuras que
imitam desenhos e rabiscos em muros e paredes (comuns para o Cebolinha
provocar a Mônica)
143
144
O quinto ícone traz os tipos de balões para compor a história. São apresentados
com o fundo branco, amarelo, azul, rosa e verde, 10 modelos para cada cor.
145
O sexto ícone é a caixa de texto que oferece 169 tipos de fontes para a escrita,
porém, 153 estão disponibilizados. É oferecida opção para mudar a fonte
(negrito, negrito e itálico, itálico e normal) como também o tamanho para usar as
letras que variam de tamanho 8 ao tamanho 72 e a opção para escolher um outro
tamanho. Nesta caixa de texto, podemos ver também o efeito que se pode usar
nas letras e ainda 16 opções de cores para a fonte escolhida.
O sétimo ícone é a opção que o programa disponibiliza para imprimir a história.
As funções do ícone na barra inferior da tela inicial, do canto inferior esquerdo
para o direito:
primeiro ícone, a porta entreaberta é opção para salvar e sair do programa,
figura do sol serve para reordenar a posição dos objetos ou personagens
selecionados,
figura do elefante funciona para aumentar os objetos ou personagens,
figura do ratinho funciona para diminuir, inverso do elefante,
figura de dois cachorros é utilizada para inverter a posição dos personagens;
figura da borracha é utilizada para apagar desenho, cenário ou texto,
seta verde retorna à página anterior,
seta azul avançar para a página seguinte.
A parte central da tela é apresentada com seis quadrinhos em branco com o
requadro azul que é o local da criação da história.
146
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo