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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FFCLRP - DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
Representações de professores
do ensino fundamental sobre o aluno
Eliana Aparecida de Souza Luciano
Dissertação apresentada à Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP, como parte
das exigências para a obtenção do título de Mestre em
Ciências, Área: Psicologia.
RIBEIRÃO PRETO - SP
2006
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FFCLRP - DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
Representações de professores do ensino fundamental sobre o aluno
Eliana Aparecida de Souza Luciano
Prof. Dr. Antônio dos Santos Andrade
Dissertação apresentada à Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras de Ribeirão Preto da USP, como parte das exigências
para a obtenção do título de Mestre em Ciências, Área:
Psicologia.
RIBEIRÃO PRETO - SP
2006
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FICHA CATALOGRÁFICA
Luciano, Eliana Aparecida de Souza
Representações de professores do ensino fundamental
sobre o aluno. Ribeirão Preto, 2006.
171 p.: il; 30cm
Dissertação, apresentada
à Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de Ribeirão Preto/ USP – Departamento de
Psicologia e Educação.
Orientador: Andrade, Antônio dos Santos.
1. Representações de Professores. 2. Aluno 3. Ensino
Fundamental.
DEDICATÓRIA
A todas as vítimas do insucesso escolar, na expectativa de que suas vozes ecoem e sua
inteligência reconhecida, voe livre...
À minha professora da segunda série primária: Vera Lúcia Uchôa, por também ouvir
seu coração e me ajudar nas primeiras dificuldades de aprendizagem.
Ao meu único irmão, Sebastião, cuja inteligência não se encontra aprisionada...
AGRADECIMENTO ESPECIAL
Ao meu orientador, Toninho
Que além de me “orientar” no sentido acadêmico da palavra, soube também
me “orientar” no sentido das vivências humanas.
Que viu por trás da aluna a possibilidade de discípula.
Respeitou no germe de discípula as diferenças.
Enxergou além da “mulher- discente”, “a mulher-mãe” e, me acolheu num momento
muito importante de minha vida: o da maternidade.
Obrigada!!!
AGRADECIMENTOS (Também Especiais)
Às professoras Dra. Sylvia Domingos Barrera e Rita de Cássia Pereira Lima, cuja
participação no exame de Qualificação me possibilitou novas reflexões que muito
contribuíram para este estudo.
Aos colegas do Grupo de Estudos e Pesquisas Institucionais e Sociodrama
Educacional (GEPISEd) com quem com pude aprender e compartilhar experiências, em
especial a Patrícia Carraro, pela tutoria.
Às professoras participantes da pesquisa por me confiarem suas angústias e opiniões.
Ao pediatra e amigo Marcelo Rossi, por me acompanhar no momento mais delicado
deste trabalho, sem a sua atenção e dedicação cuidadosa “este parto seria de muitos riscos”.
Ao meu marido, Renato, fonte inesgotável de compreensão e apoio, com quem posso
vivenciar da maneira mais intensa possível o significado da palavra AMOR.
A minha filha, Ana Clara, concebida durante o processo de Mestrado e que tem me
ajudado a rever as minhas prioridades e valores.
A todos os meus familiares, especialmente meu pai e minha mãe, cuja presença foi
imprescindível para a conclusão deste trabalho. Ao Silas e a Susan por ter “emprestado a
avó” e as minhas irmãs, “ tias babonas”, pela compreensão da ausência da sobrinha... Aos
meus sogros, por todo o cuidado a mim dispensado e pelo suporte constante.
Aos meus alunos com quem vivencio e ressignifico diariamente o lugar de
“aprendensinante”.
À Adriana Tannús pelo acolhimento e escuta sensível.
A todos que contribuíram direta e indiretamente para a conclusão desta pesquisa.
A Deus, autor e sustentador de minha fé, pela possibilidade de viver tão intensamente
e encontrar em meu caminho pessoas tão prestativas.
LUCIANO, E. A. S. Representações de professores do ensino fundamental sobre o aluno.
2006. 171p. Dissertação de Mestrado – Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão
Preto. Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2006.
RESUMO
Nas últimas décadas, várias pesquisas educacionais foram desenvolvidas para verificar os
determinantes do insucesso escolar e elucidar questões referentes ao ensino básico.
Acreditamos que a sala de aula, por meio da relação professor-aluno, é um ambiente de
manifestação de crenças que podem influenciar no desempenho discente. Sendo assim, este
estudo teve por objetivo investigar as representações de professores do ensino fundamental (1
a
a 8
a
série) sobre o aluno. Os participantes desse estudo foram 15 professoras de uma escola
pública estadual da cidade de Ribeirão Preto - SP. A investigação se deu por meio da
observação participante e de entrevistas individuais semi-estruturadas com as professoras. As
entrevistas aconteceram em duas etapas: 1
º
etapa: investigação sobre a trajetória profissional e
a formação acadêmica; 2
o
etapa: percepções e crenças sobre o aluno. Os dados, depois de
transcritos literalmente, foram submetidos, num primeiro momento, à Análise de Conteúdo,
tomando como referência os pressupostos teóricos da pesquisa qualitativa e organizados em
três fases: pré - análise; a exploração do material e o tratamento dos resultados obtidos por
meio da inferência e da interpretação. Os resultados evidenciaram que a maioria das
professoras não se reconhece no sucesso e tampouco no fracasso de seus alunos. Dessa forma,
se desvinculam de sua responsabilidade frente ao aprendizado deixando o aluno à deriva.
Acreditam que o bom aluno é fruto de um bom suporte familiar e de atributos pessoais como
ser "limpinho", "esforçado", "inteligente", "estudioso", "atencioso", "quietinho",
"responsável", "interessado", "bem comportado", "dedicado", "otimista". Por outro lado, "o
aluno com dificuldades de aprendizagem" é descrito com características opostas aos do "bom
aluno". Ele aparece na fala da maioria das professoras como o aluno "indisciplinado",
"insuportável", "desatento", com "baixa auto-estima", "preguiçoso", "briguento", "rebelde",
"desinteressado", "inquieto", "que não teve suporte familiar", "que não sabe ler e escrever",
"que apresenta problemas neurológicos ou psicológicos". Os dados encontrados confirmam a
literatura consultada. Estudos apontam que as famílias, geralmente, não podem oferecer aos
seus filhos este suporte familiar como esperado pelas professoras. Algumas professoras
percebem que as dificuldades de aprendizagem fazem parte de um contexto mais amplo no
qual o aluno está inserido e se esforçam para buscar alternativas de intervenção. Denunciam a
ineficácia das políticas educacionais vigentes que são criadas sem levar em consideração os
seus principais agentes efetivos e a sua prática em sala de aula. Reconhecem o aluno de hoje
como vítima do sistema educacional que cria e reformula teorias sem conseguir alcançar o seu
cliente principal - o aluno - e atender às suas necessidades mais prementes.
Palavras - chave: Representações de Professores. Aluno. Ensino Fundamental
LUCIANO, E. A. S. Representations of Public Basic Education Teachers about the
Student. 2006. 171p. Master´s Dissertation - “Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de
Ribeirão Preto”. Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2006.
ABSTRACT
In the last decades, several educational researches were developed in order to verify the
determinants of school failure and to clarify questions related to basic education. We believe
that the classroom, through the teacher/student relationship, is an evironment for disclosure of
beliefs that may influence the teaching performance. Therefore, the aim of this study was to
investigate the representations of basic education teachers (1st to 8th grade) about the student.
The participants of this study were 15 female teachers of a public state school of the city of
Ribeirão Preto-SP. The investigation was made through the participant observation and
individual semi-structured interviews with the teachers. The interviews happened in two
stages: 1
st
stage: investigation about the professional trajectory and graduation; 2
nd
stage:
perceptions and beliefs about the student. The data, which were taped and literally
transcribed, were submitted, in the first instance, to content analysis and taking as reference
the theoretical presuppositions of the qualitative research and organized in three phases: pre-
analysis; exploration of the material and the results' treatment by means of inference and
interpretation. Results revealed that most of the teachers don't recognize themselves neither in
the success nor in the failure of their students. Thus, they detach themselves from their
responsibility related to the learning process, leaving the student adrift. They believe that the
good student is fruit of a good familiar support and of personal attributes like be "tidy",
"diligent", "smart", "studious", "attentive", "quiet", "responsible", "interested", "well-
behaved", "dedicated", "optimist". On the other hand, "the student with learning difficulties"
is described with characteristics opposite to the "good student’s". He appears in the talk of
most teachers as the "undisciplined", "unbearable", "inattentive student”, with "low self-
steem", "lazy", "quarrelsome", "rebellious", "disinterested", "anxious", "who did not have
familiar support", "unable to read and write", "that has neurological and psychological
troubles". The data obtained confirm the literature consulted. Some studies point out that
families, generally, cannot offer to their children this familiar support as expected by the
teachers. Some teachers perceive that the learning difficulties are part of a broader context
into which the student is inserted and endeavor themselves seeking after intervention
alternatives. They denounce the inefficacy of the existing educational policies that are created
without considering their main real agents and their practice in the classroom. They recognize
today’s student as a victim of the educational system that creates and reformulates theories
without reaching its main client - the student - and looking after his most pressing
necessities.
Key words: Representations of Teachers. Student. Basic Education
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 -
Caracterização dos Participantes da Pesquisa ........................................
62
Quadro 2 -
Normas de Pretti (1993) - para transcrição literal e análise de dados de
entrevistas ...............................................................................................
67
Quadro 3 -
Síntese do Tema: “Minhas Experiências Profissionais” ........................
79
Quadro 4 -
Síntese do Tema: “A Escola onde Trabalho” .........................................
86
Quadro 5 -
Síntese do Tema: “Meus Planos Profissionais” .....................................
.
92
Quadro 6 -
Síntese do Tema: “O bom aluno” ..........................................................
.
97
Quadro 7 -
Síntese do Tema: “O aluno com dificuldade de aprendizagem” ...........
.
106
Quadro 8 -
Síntese do Tema: “Os alunos de minha turma” .....................................
.
127
Quadro 9 -
Síntese do Tema: “O aluno de hoje” ...................................................
134
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO.........................................................................................................................................21
1. INTRODUÇÃO..................................................................................................................................23
1.1. REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: BREVE HISTÓRICO ...................................................................26
1.2. A INVESTIGAÇÃO SOBRE REPRESENTAÇÕES NA EDUCAÇÃO...........................................31
1.3. A PESQUISA SOBRE O PENSAMENTO DO PROFESSOR: SUAS CRENÇAS,
EXPECTATIVAS E REPRESENTAÇÕES.......................................................................................36
1.4. A PESQUISA SOBRE O "ALUNO" E "DESEMPENHO" ...............................................................42
1.5. AS CONTRIBUIÇÕES DO GRUPO DE ESTUDOS E PESQUISAS INSTITUCIONAIS
E SOCIODRAMA EDUCACIONAL (GEPISEd)..............................................................................49
2. OBJETIVOS.......................................................................................................................................55
2.1. OBJETIVO GERAL ...........................................................................................................................57
2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS..............................................................................................................57
3. METODOLOGIA..............................................................................................................................59
3.1. PARTICIPANTES..............................................................................................................................61
3.2. LOCAL ...............................................................................................................................................63
3.3. PROCEDIMENTOS PARA COLETA DE DADOS..........................................................................65
3.4. PROCEDIMENTOS PARA A ANÁLISE DOS DADOS................................................................67
3.5. ASPECTOS ÉTICOS..........................................................................................................................68
4. RESULTADOS...................................................................................................................................71
4.1. CONTEXTUALIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS..............................................................................73
4.1.1. Entrevista com Mara .......................................................................................................................74
4.2. OS RESULTADOS OBTIDOS POR MEIO DA ANÁLISE DE CONTEÚDO DAS
ENTREVISTAS..................................................................................................................................76
4.2.1. Trajetória Profissional.....................................................................................................................76
4.2.1.1. Minha Formação Acadêmica ............................................................................................................76
4.2.1.2. Minha Trajetória Profissional............................................................................................................79
4.2.1.2.1.
Necessidade de dedicação à profissão..............................................................................................80
4.2.1.2.2.
A diversidade da experiência em sala de aula..................................................................................81
4.2.1.2.3. A diversidade da experiência com cargos administrativos...............................................................83
4.2.1.2.4. A diversidade da experiência como fonte de constante aprendizado...............................................84
4.2.1.2.a. Síntese das categorias do tema: “Minhas Experiências Profissionais”..........................................85
4.2.1.3. A Escola onde Trabalho....................................................................................................................86
4.2.1.3.1. Escola boa, bem localizada, com bons funcionários, boa clientela e bons
relacionamentos................................................................................................................................87
4.2.1.3.2. Escola grande e sem recursos.........................................................................................................88
4.2.1.3.3. Professores sem união, ética e coleguismo ......................................................................................90
4.2.1.3.4. Professores desrespeitados na escola ...............................................................................................90
4.2.1.3.a. Síntese das categorias do tema: “A Escola onde trabalho”............................................................91
4.2.1.4. Meus planos profissionais.................................................................................................................92
4.2.1.4.1. Planos para depois da aposentadoria que se referem ao ensino .......................................................92
4.2.1.4.2. Planos para depois da aposentadoria que se referem à outra área....................................................93
4.2.1.4.3.
Planos de carreira não relacionados à aposentadoria .......................................................................94
4.2.1.4.a. Síntese das categorias do tema: “Meus Planos Profissionais”.......................................................96
4.2.2. O Aluno.............................................................................................................................................96
4.2.2.1. O Bom Aluno....................................................................................................................................97
4.2.2.1.1.
O bom aluno é: limpinho, arrumadinho, esforçado, inteligente, estudioso, atencioso,
responsável, organizado, disciplinado, participativo, questionador, observador,
criterioso, com boa memória, interessado, interessante, quietinho, prestativo, dedicado,
otimista, acredita em si mesmo, tem opinião própria.......................................................................97
4.2.2.1.2.
O bom aluno tem suporte familiar................................................................................................. 100
4.2.2.1.3. O bom aluno é tudo o que o professor e o grupo desejam .............................................................102
4.2.2.1.4.
O bom aluno tem bons colegas e um bom relacionamento com todas as pessoas .........................102
4.2.2.1.5.
O bom aluno nem sempre corresponde ao rótulo...........................................................................103
4.2.2.1.a. Síntese das categorias do tema: “O bom aluno”...........................................................................104
4.2.2.2. O aluno com dificuldade de aprendizagem.....................................................................................106
4.2.2.2.1.
O aluno com dificuldade de aprendizagem é: indisciplinado, insuportável,
desatento, disperso, preguiçoso, briguento, rebelde, desinteressado, inquieto,
lento, limitado, imaturo, tem baixa auto-estima, pouco raciocínio e dificuldades
de entrosamento com os colegas....................................................................................................107
4.2.2.2.2.
O aluno com dificuldade de aprendizagem tem problemas psicológicos e/ou
neurológicos e necessita de acompanhamento especializado.........................................................109
4.2.2.2.3.
Ao aluno com dificuldade de aprendizagem falta suporte familiar................................................111
4.2.2.2.4.
Ao aluno com dificuldade de aprendizagem faltam bases anteriores; traz consigo
traumas e decepções escolares .......................................................................................................113
4.2.2.2.5.
A ineficiência das estratégias das políticas vigentes para lidar com o aluno
com dificuldades de aprendizagem ................................................................................................114
4.2.2.2.6.
O despreparo confesso das professoras para lidar com o aluno com dificuldade
de aprendizagem.............................................................................................................................116
4.2.2.2.7.
As estratégias das professoras como tentativas para lidar com o aluno
com dificuldade de aprendizagem..................................................................................................118
4.2.2.2.8.
As alternativas sugeridas pelas professoras para lidar com o aluno com
dificuldade de aprendizagem..........................................................................................................122
4.2.2.2.a. Síntese das categorias do tema: “O Aluno com dificuldade de Aprendizagem”...........................125
4.2.2.3. Os alunos de minha turma...............................................................................................................127
4.2.2.3.1.
Os alunos de minha turma são bons...............................................................................................127
4.2.2.3.2.
A minha turma é constituída de bons alunos, em sua maioria ........................................................129
4.2.2.3.3.
A minha turma é constituída de alunos difíceis, em sua maioria...................................................130
4.2.2.3.4.
A minha turma é heterogênea: tem bons alunos e alunos que apresentam dificuldades................131
4.2.2.3.a. Síntese das categorias do tema: "Os alunos de minha turma”......................................................132
4.2.2.4. O aluno de hoje ...............................................................................................................................133
4.2.2.4.1.
O aluno de hoje é: “afetivo”, “interessado”, “esperto”, “bom aluno”, “investigativo”,
“curioso”, “bem informado”, “questionador”, “independente”, “esperançoso”,
“responsável” e “amoroso” ............................................................................................................134
4.2.2.4.2.
O aluno de hoje é: “fruto das mudanças sociais”, “violento”, “indisciplinado”,
“inquieto”, “falante”, “desinteressado”, “briguento”, “perdido”, “desvinculado”,
“sem compromisso”, “imaturo”, “sem concentração”, “sem limites” ...........................................136
4.2.2.4.3.
O aluno de hoje e a suas carências familiares .............................................................................140
4.2.2.4.4.
O aluno de hoje e o aluno de ontem..............................................................................................141
4.2.2.4.a. Síntese das categorias do tema: "O aluno de hoje”..............................................................143
5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS.................................................................................................145
6. CONCLUSÃO E IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS................................................................155
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................................................................159
APÊNDICES
APÊNDICE A...........................................................................................................................................170
APÊNDICE B ...........................................................................................................................................171
21
APRESENTAÇÃO
O interesse pelas questões que dizem respeito à Educação e ao Ensino faz parte de
minha trajetória profissional. Como psicóloga, professora e psicopedagoga tenho lidado
constantemente com aspectos do cotidiano escolar que me provocam muitas indagações.
Algo, em particular, me incitou à pesquisa: os alunos considerados bons, que se destacavam
em meio aos colegas de classe devido ao bom desempenho acadêmico, citados pelos
professores como "modelo" para os demais, pareciam ser os menos ativos e autônomos na
relação de ensino-aprendizagem. Por outro lado, os alunos "medíocres" em relação a estes,
demonstravam maior autonomia e espontaneidade, que por vezes, eram entendidas pelos
profissionais da educação de meu círculo vivencial como "desorganização corporal",
"dificuldade de compreender regras", "inadequação ao espaço coletivo", "problema
emocional", entre outros predicados.
Estas inquietações me levaram a procurar o grupo de pesquisa em Sociodrama
Educacional que, por meio da pesquisa-ação em Psicologia Educacional, se propõe ao estudo
das relações humanas nestes contextos (informação verbal)
1
.
Ao ler a tese de doutorado de Andrade (1986) e os trabalhos posteriores desenvolvidos
por ele e seus auxiliares de pesquisa - Andrade (1995, 1998, 1999a, 1999b, 2000, 2001a,
2001b), Andrade e Nunes (1991), Andrade, Tositto et al.(1996), Borsato e Andrade (2000) -
com grupos de alunos e professores pude encontrar subsídios para a questão que tanto me
incomodava frente à prática docente: a representação de " bom aluno" evidenciada pelos
professores.
1
Explicação fornecida por Antônio dos Santos de Andrade, em reunião com o grupo de pesquisa, em Ribeirão
Preto (FFCLRP-USP), março 2002.
22
Andrade (1986) demonstrou em seu estudo que o modelo de “bom aluno” estava a
serviço da “reafirmação da autoridade do professor” e da manutenção de uma “relação
vertical e dependente” enquanto que o “aluno problema” era selecionado para as salas
especiais por critérios arbitrários e pouco plausíveis (ANDRADE; NUNES, 1998). Podemos
perceber a partir de Andrade (1986) que tanto o papel de “bom” como “mau” aluno parece
desconfortável, visto que, aos bons alunos era relegado um lugar de obediência cega e
dependente.
Sabemos que as crenças e percepções dos professores acerca de seus alunos podem
interferir no processo de aprendizagem facilitando-o ou dificultando-o. Conhecer estas
representações pode ser um caminho para se chegar, futuramente, a intervenções facilitadoras
de mudanças de atitudes na relação professor-aluno.
Frente a isto, buscamos no 1
o
capítulo do presente trabalho, introduzir ao levantamento
da literatura com um breve histórico do conceito de Representações Sociais e a difusão destas
nos estudos de âmbito educacional. Apresentamos também, pesquisas que dizem respeito ao
pensamento do professor, ao aluno e ao seu desempenho. Ainda neste capítulo, destacamos as
contribuições do Grupo de Estudos e Pesquisas Institucionais e Sociodrama Educacional
(GEPISEd) para o sucesso escolar.
No segundo capítulo, apresentamos os Objetivos da Pesquisa, para em seguida, no
terceiro, descrevermos a Metodologia adotada.
O quarto capítulo refere-se aos Resultados encontrados neste estudo, a partir da
Análise dos dados. No quinto capítulo discutimos estes Resultados e finalmente, no sexto
capítulo fazemos reflexões em busca de algumas conclusões e apontamentos de implicações
educacionais deste estudo.
1 INTRODUÇÃO
25
Nas últimas décadas, várias pesquisas educacionais foram desenvolvidas para verificar
os determinantes do sucesso/insucesso escolar e elucidar questões referentes ao ensino básico.
Numa análise dos 78 (setenta e oito) números da revista Cadernos de Pesquisa editados entre
1971 e 1991, Silva e Davis (1992) observaram que os temas referentes a professores, fracasso
escolar e características das crianças das classes populares foram os mais freqüentes, com um
aumento significativo na década de 80.
Mais recentemente, Angelucci et al. (2004) elaboraram um estudo sobre o fracasso
escolar na rede pública de ensino fundamental, partindo de uma retrospectiva histórica da
pesquisa educacional no Brasil. As autoras analisaram teses e dissertações defendidas entre
1991 e 2002 na Faculdade de Educação e no Instituto de Psicologia da Universidade de São
Paulo. Encontraram 71 (setenta e uma) obras, dentre as quais analisaram 13 (treze) em maior
profundidade. Estas obras analisadas revelaram vertentes nas quais o fracasso escolar era
compreendido como problema psíquico, problema meramente técnico, questão institucional
ou como questão fundamentalmente política. Foi possível averiguar o predomínio de
concepções psicologizantes e tecnicistas em algumas teses, a coexistência de concepções
inconciliáveis em outras, resultando num discurso fraturado e, ainda, trabalhos que avançaram
a pesquisa crítica do fracasso escolar, inserindo-o nas relações de poder existentes numa
sociedade de classes.
Se a pesquisa sobre o fracasso escolar cresceu ultimamente não foi diferente com as
pesquisas sobre a figura do professor.
Carvalho (2002) analisou esta questão na produção científica brasileira em resumos
publicados nos anais da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) na década
de 80 e no ano de 2001. Os resultados evidenciaram um aumento extraordinário de trabalhos
sobre o professor, sendo que na década de 1980 o número de trabalhos publicados em
26
reuniões anuais da SBPC foi de 36 (trinta e seis) e, em apenas uma reunião realizada em 2001
esse número foi de 310 (trezentos e dez) trabalhos.
Quanto à pesquisa em Representações Sociais, a IV Jornada Internacional e II
Conferência Brasileira sobre este tema registraram, em 2005, pelo menos 269 (duzentos e
sessenta e nove) trabalhos em grupos de discussão e 180 (cento e oitenta) pôsteres, com maior
concentração de estudos na área de Saúde e Educação, evidenciando o crescente avanço da
Teoria das Representações Sociais (TRS).
Apresentaremos, a seguir, um breve histórico desta teoria por entendermos a
importância de sua contribuição no meio científico brasileiro.
1.1. REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: BREVE HISTÓRICO
A Teoria das Representações Sociais (TRS) tem sido amplamente estudada e utilizada
em pesquisas internacionais como pode ser visto em Abric (2001), Banchs (2002), Bonardi e
Roussiau (1999), Breakwell e Canter (1993), Doise e Palmonari (1986), Guimelli (1994),
Jodelet (1993), Purkhardt (1993), e também em trabalhos nacionais, conforme apresentado
por Lane (1993), Spink (1993) e Sá (1998).
Esta Teoria foi elaborada por Serge Moscovici (1961, 1978) no âmbito da Psicologia
Social e tem se constituído num campo de investigação profícuo devido ao seu pluralismo
metodológico.
Alguns autores, como Abranches (2000), Nóbrega (2001), Pereira e Soares (2003),
Rangel (1997), Sá (1993), ao introduzirem o conceito de "Representações Sociais", fazem o
resgate histórico do termo que lhe deu origem, qual seja, o conceito de "representação
coletiva" do sociólogo francês Durkheim, apresentado e discutido por Moscovici (1961) em
seu primeiro trabalho acerca desta teoria, La psychanalyse, son image et son public. O
27
objetivo de Moscovici (1961) foi estudar como a psicanálise era transformada em
conhecimento do senso comum. Para tanto buscou amostras na população investigando seis
grupos da sociedade parisiense da época: população representativa, população "classe média",
população liberal, população operária, população estudantil e população de alunos de Escola
Técnicas, sendo ao todo 2.265 (dois mil, duzentos e sessenta e cinco) sujeitos interrogados.
Foi usado como instrumento um caderno-questionário que combinava a entrevista com
questionário como técnica de investigação. Para cada grupo, foram preparadas questões
diferentes havendo apenas 14 (catorze) questões comuns a todos eles. Concomitantemente, foi
realizada a análise de conteúdo de artigos referentes à Psicanálise. Dessa forma, Moscovici
(1961) pôde descrever em seu trabalho os processos psicossociológicos subjacentes naqueles
grupos e a forma como a imprensa francesa dos anos cinqüenta contribuía para essa
transformação por meio da difusão de opiniões sobre a psicanálise.
Moscovici (2001, 2003) encontra, em Durkheim, a representação como conceito que
designa classes de formas mentais, de opiniões e de saberes, mantendo certa constância e
objetividade, já que é partilhada e reproduzida de modo coletivo. Isto é o que lhe dá o poder
de penetrar em cada indivíduo e de se impor. Entretanto, conclui que a maior parte das
explicações de Durkheim se relaciona às sociedades ditas primitivas e não às sociedades
modernas.
Buscamos na obra clássica de Moscovici, "La psychanalyse, son image et son public"
(1976), publicada no Brasil sob o nome de “A Representação Social da Psicanálise” (1978),
uma das definições dada pelo autor às Representações Sociais
[...] uma representação social é a organização de imagens, linguagem, por que ela
realça e simboliza atos e situações [...] ela é apreendida a título de reflexo, na
consciência individual ou coletiva, de um objeto, de um feixe de idéias que lhe são
exteriores [...] a representação social é uma modalidade de conhecimento particular
que tem por função a elaboração de comportamentos e a comunicação entre
indivíduos (MOSCOVICI, 1978, p.25-26).
28
Jesuíno (2001) nos esclarece que, na América Latina, o Brasil assumiu uma posição de
liderança na assimilação e difusão desta teoria, estendendo-se de áreas como saúde e
educação até a temática do meio ambiente, com crescentes publicações científicas na área.
Sá (1998) nos informa que Robert Farr é considerado o principal divulgador das
proposições de Moscovici na comunidade científica de língua inglesa e Denise Jodelet é,
reconhecidamente, a principal colaboradora e continuadora do trabalho deste teórico na
França, sendo também a principal participante do programa de cooperação entre a Europa e a
América Latina neste campo de estudos e a quem os cientistas brasileiros devem as primeiras
notícias acerca das Representações Sociais. Vários estudos brasileiros trazem, de alguma
forma, a marca de um contato anterior com a obra de Jodelet. É desta autora uma definição
bastante difundida no Brasil que considera as Representações Sociais como "uma forma de
conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que contribui
para a construção de uma realidade comum a um conjunto social" (JODELET, 2001, p.22) .
Em 1990 foi proposto pela primeira vez, no Brasil, o grupo de Trabalho sobre
Representações Sociais
23
(GT 16) pelo professor Edson de Souza Filho, como parte do III
Simpósio da Associação Nacional de Pesquisa e Pós Graduação em Psicologia (ANPPEP) que
se realizou em Águas de São Pedro, São Paulo. O objetivo era aprofundar a discussão dos
aspectos teóricos e metodológicos da Teoria das Representações Sociais, possibilitando um
maior intercâmbio entre pesquisadores de diferentes instituições de modo a explicitar
conceitos, clarear definições e estabelecer articulações com outros conhecimentos produzidos
tanto em Psicologia quanto em outras áreas de conhecimento. Intensificaram-se também os
intercâmbios internacionais com a vinda ao Brasil de diversos pesquisadores da área (Denise
Jodelet, Serge Moscovici, Jean-Claude Abric, Robert Farr, entre outros) a partir de um esforço
2
Informações encontradas em http://www.anpepp.or.br/xSimposio/Representa%C3%A7%C3%A7%C3%B5es%20sociais.doc,
acesso em 28.10.2004.
29
conjunto entre os pesquisadores de diferentes instituições brasileiras participantes do GT da
ANPEPP. O grupo vem realizando, ao longo de sua existência até o momento, diversas
atividades que incluem publicações conjuntas, intercâmbio para promoção de cursos e eventos
científicos em diferentes universidades brasileiras e estrangeiras, participação em bancas de
mestrado e doutorado, além de parcerias em torno de programas institucionais de pesquisas.
Uma outra contribuição para os estudos das Representações Sociais é oferecida por
Minayo (1998) em seu trabalho sobre a pesquisa qualitativa na área de Saúde. A autora refere-
se ao termo “Representações Sociais”, diferenciando-o da Teoria das Representações Sociais
de Serge Moscovici (1961) e faz o resgate histórico deste conceito buscando-o primeiro em
Durkheim e seus seguidores: Weber e a escola fenomenológica representada por Schutz;
Marx e em marxistas como Lukács e Gramsci. Em Durkheim o termo é "usado no mesmo
sentido que Representações Coletivas" (grifo da autora) e "se refere a categorias de
pensamento através das quais determinada sociedade elabora e expressa sua realidade".
(MINAYO, 1998, p. 159).
Nesta concepção, as representações não são necessariamente conscientes e todas
respondem a condições dadas à existência humana. Já em Weber, a ação humana é
considerada significativa e digna de investigação. As Representações são chamadas por este
teórico de "idéias" e consideradas como "juízo de valor que os indivíduos dotados de vontade
possuem" (MINAYO, 1998, p.161). Ele busca compreender as Representações na relação
com a estrutura sócio-econômica e política.
Minayo (1998, p.163), destaca que tanto Weber quanto Durkheim "nos remetem à
importância de compreensão das idéias e de sua eficácia na configuração da sociedade
apelando ao estudo empírico do desenvolvimento histórico". Alfred Schutz, representante da
corrente fenomenológica, usa o termo "senso comum" para se referir às Representações
Sociais. Sua preocupação teórica está em compreender a cotidianidade e os pressupostos de
30
suas estruturas significativas, pois vê o dia-a-dia como algo passível de ser captado e
interpretado.
A terceira corrente, apresentada por Minayo (1998), para a compreensão das
Representações Sociais é a que surge da dialética marxista. A autora nos diz que Marx, na
obra “Ideologia Alemã”, discute sua teoria sobre as Representações Sociais e recorre ao termo
"consciência" como categoria-chave para tratar do campo das idéias. A consciência, em Marx,
se manifesta através da linguagem. "Para ele, as representações, as idéias e os pensamentos
são o conteúdo da consciência que por sua vez é determinada pela base material" (MINAYO,
1998, p. 166). O princípio básico do "pensamento" e da "consciência" é determinado pelo
modo de vida dos indivíduos que condiciona o modo de produção da vida material. As
Representações Sociais também foram estudadas a partir de Marx, por Gramsci e Lukács.
Gramsci aborda este tema quando trata do "senso comum" e do "bom senso" e Lukács o
aprofunda quando se refere à noção de "visão de mundo". A autora apresenta a contribuição
de Gramsci sobre as Representações Sociais em três aspectos que considera importante:
[...] primeiramente, chama atenção para o caráter de conformismo de que elas são
reveladoras e para o caráter de abrangência deste conformismo de acordo com os
diferentes grupos sociais, [...] cada grupo social tem seu próprio conformismo e
ilusão [...] em segundo lugar, alerta para os aspectos dinâmicos geradores de
mudanças que coexistem com o conservadorismo no senso comum; [...] em terceiro
lugar, analisa a composição mais abrangente das diferentes concepções de mundo -
das representações sociais - de qualquer grupo social e de determinada época
histórica. (MINAYO, 1998, p.169).
Minayo (1998) esclarece que, para Lukács, a "visão de mundo" é o conjunto de
aspirações, sentimentos e idéias que reúne os membros de um grupo em oposição às de outros
grupos. "Segundo ele, a visão de mundo não é um dado empírico imediato, mas um
instrumento conceitual de trabalho, indispensável para se compreender as expressões
imediatas do pensamento dos indivíduos." (MINAYO, 1998, p.170)
31
Para estes autores apresentados por Minayo (1998), é no plano individual que as
representações sociais se expressam. A partir deles, a referida autora define as Representações
Sociais
[...] enquanto senso comum, idéias, imagens, concepções e visão de mundo que os
atores sociais possuem sobre a realidade [...] se manifestam em condutas e chegam a
ser institucionalizadas, portanto, podem e devem ser analisadas a partir da
compreensão das estruturas e dos comportamentos sociais. Sua medição privilegiada
porém é a linguagem do senso comum (grifo da autora), tomada como forma de
conhecimento e de interação social [...] "as Representações Sociais (grifo da autora)
possuem núcleos positivos de transformação e de resistência na forma de conceber a
realidade. Portanto, devem ser analisadas criticamente, uma vez que correspondem
às situações reais da vida." (MINAYO, 1998, p.173).
Temos em Penin (1995), uma outra vertente nos estudos das Representações Sociais.
Em seu trabalho sobre a construção do conhecimento do professor sobre o ensino, a autora
ressalta a importância das Representações como objeto de estudo, pois são elas que fazem a
mediação para o verdadeiro conhecimento. Reconhece a grande contribuição de Moscovici
que aponta para o "necessário aprofundamento do estudo das Representações Sociais", mas
considera insuficiente a análise destas para o "desvelamento do sujeito". Então, busca estudá-
las a partir do pressuposto filosófico de Lefèbvre, entendendo assim a Representação como
"[...] algo formado na imbricação entre as representações chamadas ‘sociais’ e aquelas
provenientes da vivência pessoal dos indivíduos" (PENIN, 1995, p. 9)
1.2. A INVESTIGAÇÃO SOBRE REPRESENTAÇÕES NA EDUCAÇÃO
A área educacional tem sido entendida como um campo privilegiado para o estudo das
Representações Sociais, visto que recebe influências de diferentes grupos com discursos
também distintos, como vemos em Carvalho (2001), Gilly (2001), Lins e Santiago (2001),
Madeira (2001), Mollo (1986) e Sousa (2002).
32
A noção de Representação Social para a compreensão de fatos educacionais, segundo
Gilly (2001, p. 321), "orienta a atenção sobre o papel de conjuntos organizados de
significações sociais no processo educativo". Este autor revela que dispunha, na França,
somente de alguns trabalhos de análises sociológicas, psicossociológicas e históricas nas quais
era possível visualizar as contradições inerentes aos sistemas de representações, dentro do
contexto escolar. Entre estes trabalhos está o de Mollo (1986) com as Representações Sociais
ocupando um lugar central.
Em sua obra “La sélection implicite à l’école”, Mollo (1986) trabalhou com
documentos franceses relacionados ao ensino obrigatório, voltando-se para o modo como as
informações oficiais, sobre o ensino, eram veiculadas entre pais, alunos e professores.
Analisou as reformas de ensino básico que ocorreram na França, com o objetivo de acabar ou
evitar a seleção de alunos na escola. Sua pesquisa de campo foi desenvolvida no ano escolar
1976-1977. A autora comenta que a administração do ensino em Paris apresentava um aspecto
particular. As decisões relacionadas à entrada na 6ª série
34
(equivalente à passagem do antigo
primário ao ginásio, o que nos faz supor que as crianças tinham, em média, entre 10 e 11
anos) eram tomadas localmente por uma comissão presidida por um inspetor departamental
4
.
5
As informações eram coletadas e redistribuídas por um poder centralizador, que era o
computador. Toda estratégia de setorização, importante em Paris, passava pelo computador.
Este operava a repartição das crianças em diferentes estabelecimentos do setor, a partir de
dados recolhidos nas escolas primárias e transmitidos à Comissão através de relatórios. A
entrada do computador nos circuitos de informação e de decisão mostrava algumas
3
Informações recebidas por email em 29.10.2004, a partir de aula proferida no Mestrado em Educação do Centro Universitário
Moura Lacerda, (CUML) em Ribeirão Preto, S.P., pela professora Rita de Cássia Pereira Lima sobre a obra de Mollo. (1986).
4
Até os anos 60, na França, as crianças tinham que fazer um exame para obter ingresso à 6ª série. Até essa época, o exame
tinha o objetivo de limitar o acesso ao ensino geral, longo. Em 1967, houve uma medida onde a escolaridade obrigatória
deveria se estender até os 16 anos. Essa medida suprimiu o exame para a entrada na 6ª série. A partir desta data, várias
reformas foram aparecendo com o objetivo de apagar dos textos oficiais a idéia de uma seleção precoce das crianças.
Portanto, no discurso oficial não deveria haver seleção e todos deveriam ter os mesmos direitos.
33
manipulações de informação. Ele era considerado, por professores, alunos e pais, como tendo
um poder incontestável que acabava por encobrir os lugares, os critérios e as pessoas que, em
diversos níveis, intervinham na trajetória escolar de uma criança.
Mollo (1986) considerou o estudo das representações importante nessa área porque ele
possibilitava misturar os diferentes tipos de discursos. O estudo das representações permitia
observar como cada um articulava, nas suas relações interindividuais, seus próprios valores e
ideologias.
Para o desenvolvimento de seu trabalho, Mollo (1986) escolheu duas escolas primárias
inseridas em bairros diferentes de Paris, com populações e equipamentos escolares
contrastados. Uma delas recebia crianças de um meio sócio-econômico uniformemente baixo
e a outra escola situava-se na fronteira de duas zonas distintas: uma zona burguesa, meio
aristocrática, e uma zona popular, mas não miserável. Depois da análise dos documentos
oficiais iniciou-se a pesquisa nas escolas. Ela tomou como referência duas salas de aula em
cada escola, com 25 (vinte e cinco) alunos cada uma. A amostra total incluía 104 (cento e
quatro) pessoas: 100 (cem) alunos e 4 (quatro) professores. No decorrer da pesquisa, tentou
analisar os processos que unem, num indivíduo, as representações, os discursos e as práticas.
A autora propõe que essas três dimensões se articulam de formas diferentes e levam a
situações também diferentes de acordo com a distância de cada um em relação à cultura
escolar. O trabalho foi centralizado nos diversos níveis de possibilidade de se ter ou não
acesso à informação. É esse acesso à informação que vai permitir o uso da escola como um
serviço útil à promoção pessoal, ao invés de levar o aluno a um processo de segregação pela
própria escola. A autora constatou que, apesar da seleção ter desaparecido do discurso do
legislador e das intenções explícitas das reformas escolares, algumas barreiras inesperadas
continuaram a ser colocadas. Em 1975, uma porcentagem das crianças não se encontrava na
6ª série normal. Uma parte ia para a 6ª série normal e a outra parte para a educação especial.
34
Mesmo não havendo a barreira do exame, uma parte das crianças era recusada na 6ª série
normal. A autora afirma que existia uma passagem da seleção para a clandestinidade, visto
que uma seleção manifesta e explícita pela lei passou a ser recusada. A pesquisa da autora
voltou-se para o implícito, para o “não-dito”.
Mollo (1986) também analisou as representações dos professores, relacionadas aos
julgamentos que eles faziam dos alunos. Através de uma “galeria de retratos” apresentada aos
professores, estes expressavam o que a autora denominou “constelações de representações”,
que se manifestaram através de duas dimensões principais: o “bom aluno” e o “mau aluno”.
Cada um dos quatro professores articulou de maneira pessoal quatro categorias de
argumentos: dons, aptidões e resultados escolares da criança, o caráter da criança e o meio
familiar. Entre os quatro professores apareceram referências às causas do fracasso escolar
como sócio-culturais, exteriores à escola. Apenas uma das professoras se envolvia e se
engajava para auxiliar o aluno que apresentava dificuldades no aprendizado. Houve uma
valorização do caráter e a aptidão da criança que se explicavam pela origem familiar. No
discurso de um dos professores, os 5 (cinco) melhores alunos eram todos determinados pelo
grupo social ao qual pertenciam. As representações do bom aluno e do mau aluno estavam,
para este professor, em relação de oposição, como por exemplo: participação versus não
participação; confiável versus não confiável; maduro versus imaturo; tem amigos versus tem
inimigos. A exceção era a noção de inteligência, que estava presente somente para o bom
aluno.
No Brasil, os estudos desenvolvidos sob o enfoque teórico das Representações Sociais
no campo educacional tiveram seu início em meados de 1980. Desde lá, têm crescido e
buscado consolidação no meio científico, como nos mostra Carvalho (2001), Madeira (2001),
e Sousa (2002).
35
Madeira (2001) apresentou algumas reflexões sobre a aplicação da Teoria das
Representações Sociais ao estudo de questões educacionais. Durante mais de 20 (vinte) anos,
a autora trabalhou no Nordeste brasileiro, centrando seus estudos nas representações de
educação e escola para analfabetos adultos, migrantes, trabalhadores rurais e meninos de rua.
A partir de seus trabalhos, conclui que a aplicação da Teoria das Representações Sociais ao
campo da educação
[...] permite apreender o sentido de um objeto em articulação a outros tantos que se
lhe associam em diferentes níveis; possibilita superar o reducionismo de análises
que desrealizam o objeto ao isolá-lo e decompô-lo; viabiliza ultrapassar uma
pseudocientificidade que enrijece análises e proposições. (MADEIRA, 2001, p. 127)
Carvalho (2001, p. 443) esclarece que optar pelas Representações Sociais, como
categoria de análise em questões educacionais, implica em "[...] adotar uma postura
relacional, considerando indivíduo e sociedade como totalidades, num movimento contínuo
de relações mutuamente constitutivas".
Sousa (2002) fez um levantamento, junto ao programa de estudos de pós-graduação
em Educação, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e junto à Fundação
Carlos Chagas, para descrever a trajetória metodológica que o estudo das Representações
Sociais em educação vem traçando e mostrar o processo de apropriação desta teoria pelos
pesquisadores da área educacional. Neste levantamento, identificou 37 (trinta e sete)
pesquisas de mestrado e doutorado que foram realizadas desde 1983 até o ano de 2002. Os
trabalhos encontrados foram organizados em categorias de: análise crítica da ideologia das
Representações Sociais em contextos educacionais; análise das Representações Sociais em
situação de exclusão ou construídas a partir de experiências traumáticas; análise das
Representações Sociais como subsídio para diagnóstico de sistemas e programas
educacionais; análise das Representações Sociais produzidas e propagadas pela mídia e
"análise da possibilidade de desconstruir ou reconstruir representações sociais" (SOUSA,
2002, p.287). Em seu trabalho, conclui que a consolidação desta área de pesquisa exige ainda
36
muitos estudos teóricos e empíricos, bem como, análises críticas, construções teóricas e
metodológicas diversas a serem desenvolvidas pelos pesquisadores que se propõe a trabalhar
dentro deste referencial.
Trabalhos como os de Lima (2001, 2002, 2003, 2004, 2005) evidenciam uma
ampliação da pesquisa sobre Representações Sociais no contexto escolar, voltada para as
representações de saúde nos discursos de alunos, funcionários e professores.
Apresentaremos a seguir um recorte sobre as pesquisas que têm sido desenvolvidas
acerca de professores, suas crenças e representações, visto que, a nossa proposta é investigar
o pensamento deste sobre o aluno.
1.3. A PESQUISA SOBRE O PENSAMENTO DO PROFESSOR: SUAS CRENÇAS,
EXPECTATIVAS E REPRESENTAÇÕES.
A sala de aula se apresenta como um cenário propício para a manifestação de crenças,
valores e percepções, interiorizadas e objetivadas tanto pelos professores quanto pelos alunos.
Estas representações parecem contribuir para o bom ou mau desempenho escolar,
desencadeando o fracasso escolar.
Sobre as expectativas do professor e o desenvolvimento intelectual do aluno, Robert
Rosenthal e Lenore Jacobson (1981) em seu trabalho “Pigmalião na Sala de Aula” suscitaram
grandes controvérsias nos meios educacionais. Para os autores, o efeito de Pigmalião faz
com que as expectativas funcionem como “profecias auto-realizadoras” que levam as
pessoas a se transformarem naquilo que delas se espera. Segundo os autores, quatro fatores
mediariam a expectativa do professor e o desempenho do aluno: clima, feedback, input e
output. Para os alunos dos quais se esperam mais, os professores criam um clima mais
caloroso e fornecem mais informações a respeito do seu desempenho (feedback). Os
37
professores lhes dão mais matéria difícil (input) e os encorajam a perguntar e responder
(output).
Ainda sobre expectativas, Rasche e Kude (1986) abordaram, numa pesquisa
bibliográfica, a evolução destes estudos nos Estados Unidos e Brasil após quinze anos da
publicação de Pigmalião na sala de aula. As autoras constataram que no Brasil, até àquele
momento, os estudos enfatizavam principalmente a relação existente entre fracasso escolar e
expectativas do professor.
Temos como exemplo de pesquisas deste período, o trabalho de Barreto publicado em
1981, que relata o estudo realizado em 1976 com 160 (cento e sessenta) professoras da capital
do Estado de São Paulo, no qual se pede a elas que descrevam o que seria o aluno ideal ou o
mau aluno do 1º ano da escola de 1° grau. Dentre alguns dos resultados, destacamos aquele
que diz respeito às características físicas, sociais e econômicas dos alunos, bem como a sua
relação com o ensino. O aluno ideal foi preferentemente descrito como uma criança de pele,
cabelo e olhos claros, enquanto o mau aluno tendia a ter pele branca, mas cabelos e olhos
escuros e podia também ser negro. A boa aparência, a limpeza e o vestuário em ordem foram
atributos “externos” associados ao aluno ideal, enquanto a aparência lamentável, a sujeira, a
inadequação do vestuário ou a falta de roupa retratavam o mau aluno. No que diz respeito ao
ensino propriamente dito, o aluno ideal foi tido como aquele que participava ativamente da
aula e o fazia disciplinadamente. O mesmo não foi dito sobre o mau aluno. Este foi descrito
como indisciplinado, desobediente, que não sabe acatar ordens e só faz o que quer,
atrapalhando o andamento da aula; é agressivo com os colegas e professora, desacatando e
afrontando a autoridade desta na classe. O perfil do bom aluno apareceu como sendo de nível
sócio-econômico médio e o mau aluno como pertencendo às camadas de baixo status social e
econômico. Foram encontrados resultados semelhantes por Penin (1989).
38
Sipavicius (1987) reuniu em um livro as pesquisas mais relevantes, do seu ponto de
vista, para o problema do rendimento escolar e as agrupou, separando as que diziam respeito
ao aluno, à sua família e à escola; as que se referiam às atitudes e expectativas do professor
sobre o rendimento escolar; as que diziam respeito à atuação do professor na sala de aula e
algumas pesquisas sobre avaliação educacional. Concluiu que os resultados destas pesquisas
nem sempre eram coerentes e, às vezes, chegavam a ser contraditórios. Entre as constatações
encontradas em sua análise, destacamos as que dizem respeito às expectativas do professor
sobre a aprendizagem do aluno.
As expectativas dos professores influenciam o rendimento dos alunos através de
comportamentos como:
-exigir melhores trabalhos de alunos para os quais há altas expectativas;
-premiar mais o comportamento dessas crianças;
-aceitar trabalhos mal-feitos, sem maiores exigências, dos alunos sobre os quais se
tem baixas expectativas;
-menor freqüência de reforçamento para tarefas bem cumpridas por alunos sobre os
quais se tem baixas expectativas. (SIPAVICIUS,1987, p.70)
Mantovanini (1999) realizou um diagnóstico psicopedagógico com alunos da 3
a
série
do ensino fundamental, em uma escola pública, com o objetivo de discutir a compreensão do
professor a respeito daquilo que denominava “dificuldade de aprendizagem” e “aluno
problema”. O trabalho de campo envolveu a avaliação psicopedagógica de alunos “bem
sucedidos” e de alunos portadores de “distúrbios de aprendizagem”, segundo a indicação de
seus professores. Foi solicitado aos professores que apenas expressassem por escrito os
critérios utilizados para classificação dos alunos. A pesquisadora verificou o desenvolvimento
do raciocínio operatório das crianças e o desenvolvimento intelectual, apoiada em trabalhos
de teóricos da Psicologia Genética e do Desenvolvimento Humano. Do ponto de vista
cognitivo, não foram constatadas “diferenças significativas” entre as crianças dos dois grupos.
Porém, percebeu-se uma diferença marcante quanto à maneira das crianças comportarem-se
perante os desafios propostos no processo diagnóstico
39
Alunos problema partem do princípio que são incapazes, que não sabem nada, não
ousam, não tentam, desistem. Rendem-se à condição de aluno problema e assumem
integralmente o julgamento dos seus professores a respeito do seu desempenho e
suas atitudes em classe, reforçando a visão docente sobre suas minguadas condições
escolares. Mesmo quando não possuem nenhum grau de comprometimento
cognitivo, demonstram uma relação muito ruim e deteriorada com o ato de aprender,
manifestada geralmente por uma atitude de pouco caso e ojeriza à tudo que se refere
à aprendizagem escolar. (MANTOVANINI, 1999, p. 154)
O critério mais importante, segundo Mantovanini (1999), que levou os professores a
classificarem seus alunos no grupo de rendimento insatisfatório, referia-se às atitudes do
aluno em classe. Em seguida, destacam-se os problemas de ordem emocional e física, e por
último, surgia o nível de produção escolar. O bom aluno, para estes professores
[...] deve ser interessado, porém autônomo, independente e disciplinado. Não lhe
causando transtornos [...] Já os alunos com problemas de aprendizagem têm posturas
que desagradam aos professores: são apáticos ou agitados, não resolvem sozinhos as
tarefas propostas, são lentos, ficam num canto isolados, não participam da aula,
demonstram dependência e desinteresse. (MANTOVANINI, 1999, p.155)
Como também Sipavicius (1987), Mantovanini (1999, p.155) assinala, que “há um
imenso desencontro de expectativas entre professores e alunos-problema ou um encontro
perfeito entre a profecia e a realização”.
Carvalho (1983) se propôs a analisar as representações de professoras da 1
ª
série do 1
º
grau de escolas públicas estaduais da periferia de João Pessoa (Paraíba). Seu objetivo foi o de
captar, através de entrevistas e análises das mesmas, as representações das professoras sobre
si, sua profissão e seus alunos. Os resultados das análises revelaram que os problemas das
professoras não se restringiam apenas à remuneração, infra-estrutura precária das escolas ou
as suas condições de funcionamento. Ainda que esses temas estivessem presentes em suas
representações, as insatisfações reveladas faziam parte de uma trama mais complexa que
envolvia a representação que possuíam sobre si mesmas. Assim como seus alunos,
encontravam-se numa situação de baixa renda devido ao salário que recebiam e a origem
familiar. No entanto, rejeitavam essa condição negando essas semelhanças.
40
Andrade (1999a) trabalhou com um grupo de 6 (seis) professoras do ensino
fundamental proporcionando, por meio da abordagem do Psicodrama, reflexões sobre a
prática profissional e a relação professor-aluno. Foram realizados 9 (nove) encontros, ao fim
dos quais, o autor constatou "o valor do procedimento utilizado na modificação das crenças,
concepções e atitudes das professoras sobre a relação que cotidianamente estabelecem com
seus alunos, particularmente com aqueles que consideram como 'problema' " (ANDRADE,
1999a, p. 64).
Bardelli (1986) elaborou uma pesquisa numa escola estadual de periferia, com o
objetivo de realizar aperfeiçoamentos metodológicos a partir do Estudo Preliminar de sua
dissertação e conhecer como as professoras de 1
ª
, 2
ª
, 3
ª
e 4
ª
séries do 1
º
grau descreviam as
características do “mau desempenho escolar” de seus alunos. Buscou também identificar as
semelhanças ou diferenças entre as causas atribuídas por professoras e alunos ao desempenho
escolar dos participantes da amostra. Os resultados mostraram que tanto o grupo de
professoras como o de alunos responsabilizou, em primeiro lugar, o aluno pela má qualidade
do desempenho escolar. Os alunos que, segundo as professoras, apresentavam “mau
desempenho escolar” foram indicados por possuírem “dificuldades centradas na dimensão
cognitiva e da personalidade” e, segundo elas,
[...] tinham problemas para raciocinar, assimilar, não retinham a matéria, eram
lentos, fracos, tinham problemas psicomotores, e tinham retardo mental. Estas são
crianças percebidas pelas professoras como inibidas, briguentas, mentirosas,
insatisfeitas, vaidosas, sem iniciativa, precisando de ajuda para se desenvolverem e
tendo dificuldades para se relacionarem. Foram vistas ainda como crianças que
tinham pouca saúde, pouca higiene e faltavam muito às aulas. (BARDELLI, 1986, p.
71-72)
Souza (1991) descreve um estudo etnográfico que realizou, durante o ano de 1990, em
uma escola da cidade de São Paulo. Esta escola atendia uma clientela composta por crianças
41
de famílias de baixa renda, em um bairro no qual a autora já havia trabalhado num estudo
anterior, ao qual denomina no corpo de seu texto de Primeira Pesquisa
5
.
6
Inicialmente Souza (1991) estava interessada em recuperar o “sucesso” enquanto parte
integrante da vida na escola. Seu objetivo inicial era investigar quem eram os alunos
aprovados nas escolas públicas de periferia e como eram os seus primeiros contatos com a
escola. Chamou a sua atenção
[...] a ausência de referência a esse segmento do corpo discente, tanto na literatura
quanto nas discussões desenvolvidas na escola. Os pesquisadores, professores e
técnicos parecem direcionar preferencialmente sua atenção aos chamados ‘alunos
problema’ (SOUZA, 1991, p.66).
Para entender os mecanismos envolvidos na produção do “sucesso escolar”, Souza
(1991) observou duas classes consideradas “fortes”, cujas professoras eram consideradas pela
instituição como boas profissionais e que conseguiam aprovar a maioria de seus alunos. Ao
final do primeiro semestre, solicitou-se a uma das professoras uma avaliação geral dos seus
alunos. O conjunto dos pareceres ofereceu pistas sobre sua representação das crianças e de
suas famílias. Os alunos dessa classe “forte”, ou seja, “os bons alunos”, foram descritos como
crianças irrequietas, falantes, ativas e participantes em sala de aula. Ao final, entre as
considerações destacadas como as mais importantes estava a questão dos “bons alunos”, que
requer outros estudos para que possa ser mais bem compreendida.
Patto (1990) verificou que a literatura sobre o fracasso escolar continuava registrando,
nos anos 80, a mesma afirmação dos meados da década de 70: "[...] o professor idealiza, mas
não encontra um aluno ‘sadio, bem alimentado, com uma família organizada e atenta aos seus
problemas pessoais e com prontidão para aprender’" (PATTO, 1990, p.122). Anteriormente,
a referida autora já havia proposto que, por meio de uma outra abordagem de pesquisa, que
não a experimental, se procurasse verificar entre outras coisas "[...] se o professor tende a agir,
em sala de aula, tendo em mente um aluno ideal" (PATTO, 1988, p.77).
5 Tese de Livre Docência de Maria Helena Souza Patto (“A produção do fracasso escolar”)
42
Abranches (2000) investigou as Representações Sociais de professoras da primeira
série do Ensino Fundamental, da Prefeitura da Cidade do Recife, sobre a relação do sucesso e
do fracasso escolar. Utilizou, como procedimento metodológico, a entrevista e a aplicação de
questionário, bem como a análise de conteúdo para compreender os dados. Os resultados
demonstraram que as professoras constroem e estruturam suas Representações Sociais a partir
de categorias denominadas de: significação do sucesso e do fracasso escolar, explicação do
sucesso e do fracasso escolar e competências para o sucesso escolar, numa relação lógica e
dinâmica de oposição.
No próximo item, apresentaremos os estudos que se centraram no aluno, por
entendermos a relevância destes para a nossa pesquisa.
1.4. A PESQUISA SOBRE O ALUNO E O DESEMPENHO
Numa revisão da literatura a respeito da representação de "aluno" e "desempenho"
pelo professor, encontramos estudos que versam sobre esta questão sob diferentes pontos de
vista. Há trabalhos que apresentam este tema sob a nomenclatura de “sucesso escolar”,
“rendimento escolar”, “desempenho de alunos” e “avaliação de desempenho”, e que foram
desenvolvidos dentro do aporte teórico de pesquisa quantitativa. Autores como Barroso,
Mello e Faria (1976), Camargo (1977), Lewin (1980), Silva (1980) e Ropke (1981)
denunciam em seus estudos um enfoque de sucesso escolar centrado nas características
individuais dos alunos, na chamada “ética do esforço pessoal” e associado ao nível sócio-
econômico.
A partir de 1990, várias pesquisas surgiram com o objetivo de avaliar as atribuições
causais de professores e/ou alunos em relação ao desempenho acadêmico.
(BORUCHOVITCH, 2001; GAMA; JESUS, 1994; JACOB 2001; MALUF; BARDELLI,
43
1991; NEVES; ALMEIDA, 1996; PARO, 1992; PEREIRA; ROSSI; ARAÚJO, 2001;
TOREZAN, 1994). Destes, os estudos de Gama e Jesus (1994); Maluf e Bardelli (1991);
Neves e Almeida (1996), Paro (1992), Pereira; Rossi e Araújo (2001) e Torezan (1994)
obtiveram como resultados que os professores atribuíam, primeiramente, o mau desempenho
aos alunos e suas famílias, eximindo-se de qualquer responsabilidade. A pobreza, desnutrição
e carência cultural também apareceram como fatores importantes na explicação do fracasso
escolar.
Passaremos agora a discorrer sobre os estudos desenvolvidos dentro do aporte teórico
da pesquisa qualitativa que é o referencial escolhido para este trabalho.
Andrade (1986), em sua tese de doutorado, fez um estudo etnográfico com um grupo
de alunos repetentes da 1
a
série do 1
o
grau de uma escola pública, visando, através de
entrevistas e observações participantes, conhecer o contexto social e familiar dos alunos, seu
potencial cognitivo e a dinâmica intra-escolar na qual estavam inseridos.
Ao final da tese, o autor fez uma contextualização econômico-sócio- cultural de uma
amostra dos alunos repetentes estudados; um levantamento do potencial cognitivo destes
alunos a partir do conceito de “zona de desenvolvimento proximal” de Lev Seminovich
Vygotsky e uma descrição do cotidiano da escola, na qual focalizou as salas dos alunos
repetentes e a classe especial (ANDRADE, 1986, 1999b e 2000).
Em seu estudo, Andrade (1986) observou, entre os professores, que o modelo de bom
aluno era aquele que obedecia cegamente aos rituais e rotinas e se portava com ordem e
disciplina.
O que se observa a todo momento, por parte dos alunos que mais se aproximam do
modelo do bom aluno, conforme as declarações dos professores, é uma constante
reafirmação da autoridade do professor, da relação vertical e dependente que
estabelecem com eles, da importância da ordem e da disciplina. Tais alunos são
rotulados como “bonzinhos”, como obedientes, disciplinados e citados como
exemplo para os colegas. (ANDRADE, 1986, p.154).
44
Nunes e Andrade (1998) atingiram resultados satisfatórios com uma turma de 1
a
série
do ensino fundamental, que era considerada classe especial de uma escola pública, a partir da
ação do supervisor escolar junto ao professor da turma. Ao final do ano, 53,8% (cinqüenta
três vírgula oito por cento) dos alunos foram aprovados. A coleta de dados foi realizada
dentro da abordagem qualitativa e etnográfica, explorando o cotidiano da escola. O objetivo
foi alcançado através da “melhoria da relação professor-aluno; desestímulo da rotulação de
alunos que não apresentavam rendimento satisfatório; promoção do planejamento pedagógico
em grupo e valorização da relação professor–supervisor". (NUNES; ANDRADE, 1998,
p.182). A partir dos dados levantados, os autores perceberam, entre outras coisas, a falta de
critérios que muitas vezes regia a formação de classes especiais e concluíram que “quando a
escola tem em seu projeto pedagógico uma redefinição de papéis dos profissionais que lá
atuam é possível elaborar propostas conjuntas em busca da melhoria da qualidade de ensino”.
(NUNES; ANDRADE, 1998, p.186).
Guimarães (1996) investigou a concepção que professores e alunos de uma escola de
ensino fundamental possuíam sobre "o bom aluno", buscando identificar quais os aspectos
semelhantes e diferentes nesta concepção, afim de verificar se eles estavam de acordo com o
projeto da escola. Para isso, entrevistou 146 (cento e quarenta e seis) alunos de segunda à
oitava série, 13 (treze) professores da alfabetização à quarta série e 10 (dez) professores de
quinta à oitava série. Verificou que, para os professores, a concepção de bom aluno estava
voltada para a autonomia, para o aluno crítico, consciente, capaz de resolver problemas. Para
os alunos, predominou a valorização dos aspectos de submissão e ordem.
Penin (1989) publicou um estudo, de tipo exploratório, realizado entre 1983 e 1988, no
qual descreveu as condições concretas da vida cotidiana em quatro escolas públicas do 1
o
grau, na cidade de São Paulo. Concluiu que a escola refletia em seu cotidiano os seus aspectos
hegemônicos e as suas contradições; a burocracia, presente no cotidiano escolar, não impedia
45
que a força das práticas cotidianas também se apresentasse como um espaço de resistência; as
práticas cotidianas não somente revelavam a história, mas antecipavam alguns
acontecimentos. Constatou que o aluno pobre estava descartado por não possuir
características "desejáveis" pelas professoras: "ser fluente verbalmente", "ter higiene", "ser
assíduo", "ser sociável" e, sobretudo, "não ter problema econômico sério". A única
característica do aluno pobre desejada pelas professoras era a "obediência".
Penin (1992) discorreu sobre as condições objetivas e subjetivas do fracasso escolar,
partindo do princípio de que as condições objetivas devem ser enfrentadas com ações mais
explicitamente políticas e as subjetivas com atuações de visibilidade mais pedagógicas. Entre
as condições objetivas do fracasso escolar destacou a falta de verbas para a educação, como a
central e geradora de muitas outras. Referiu-se às condições subjetivas como aquelas vividas
pelos sujeitos no interior de uma escola, especialmente os diretores, os coordenadores e os
professores. Considerou que
[...] todos eles, e de modo especial os professores, necessitam trazer à tona as
representações que mantêm sobre os aspectos e os componentes do processo
educativo, incluindo o conhecimento das representações dos alunos e de seus pais
sobre tal processo. Somente essa análise poderá identificar quais concepções e ações
docentes estão interferindo no desempenho dos alunos, sem esquecer a influência da
organização escolar orientada por essas concepções. (PENIN, 1992, p.7).
Siqueira (2000) pesquisou as representações sobre o desempenho escolar dos alunos
em um grupo de professores de 1
ª
série do ensino fundamental da rede pública de Porto Velho
– Rondônia. Seu objetivo principal era o de ampliar o conhecimento sobre estes professores.
Lançou mão do questionário como técnica para obtenção dos dados. Fez uma análise
quantitativa das questões relacionadas à caracterização dos sujeitos da pesquisa e uma análise
do tipo qualitativa quanto às outras questões para identificar os seus conteúdos semânticos. A
autora percebeu que
[...] quando solicitados a explicar o bom e o mau desempenho escolar de seus
alunos, os professores apresentaram idéias relativas à cognição, ao comportamento e
ao domínio de conteúdos, enquanto, características individuais desejáveis, presentes
46
no aluno de melhor desempenho e ausentes enquanto características do aluno com
dificuldades (SIQUEIRA, 2000, p.95).
Quanto ao desempenho escolar, os professores do referido estudo tomaram como
relevantes as características individuais do aluno e a estrutura familiar e explicaram as causas
do melhor desempenho de uma maneira simplista, atribuindo grande responsabilidade ao
aluno pelo seu aprendizado. Dado também presente na pesquisa de Rangel (1997) que
destacou sobretudo a associação entre ‘mérito’ e ‘esforço pessoal’ do ‘bom aluno’ com
acesso ao trabalho, acesso ao ensino superior e sucesso na vida. A autora também constatou
que, no campo de representação, a imagem real ou ideal do ‘bom’ aluno se apresentava na
expressão dos próprios alunos como “disciplinado”, ”estudioso”, “comportado”; na expressão
dos pais como “esforçado”, “dedicado”, “responsável”, “estudioso”; e na dos funcionários
como “amigo”, “educado”, “respeitador”. Observou que as imagens do bom aluno, expressas
em sua pesquisa, aproximaram-se de características observadas em outros estudos, como a do
‘aluno desejável’ e do ‘indesejável’, investigados por Penin (1989), e do ‘bom’ ou ‘mau’
aluno e suas famílias, vistos pela professora de 1
o
grau, investigados por Barreto (1981).
Hollanda (2001) desenvolveu uma pesquisa na qual teve como objetivo identificar as
representações sociais do bom aluno, segundo estudantes da 1
a
série do ensino público de
Fortaleza, e analisar a evolução destas representações ao longo do primeiro semestre escolar.
A autora procurou investigar se havia alguma mudança nas representações sociais do bom
aluno, na medida em que o estudante passava a se familiarizar mais com o contexto da escola.
Foram utilizadas fotos individuais de cada aluno pertencentes à turma de 1
a
série investigada.
Num primeiro momento, solicitava-se aos participantes que definissem as características do
bom aluno. Em seguida, apresentavam-se a cada um as fotos individuais de seus colegas e
pedia-se que classificasse aqueles considerados melhores alunos do que ele, os piores e os
mais ou menos como ele, perguntando-lhe também por que achava que aqueles alunos eram
melhores, piores ou parecidos com ele. Os resultados sugeriram que as representações sociais
47
apresentadas pelos alunos da 1
a
série estavam mais vinculadas aos comportamentos
desempenhados pelos alunos em sala de aula do que as capacidades e habilidades para o
processo de alfabetização. O bom aluno foi descrito como aquele que "fica quieto", “fica
comportado'', "não briga", "obedece a ‘tia’", entre outras características similares. A autora
chama a atenção para o fato de que como as representações são construídas a partir de
interações sociais, é necessário indagar "até que ponto a relação pedagógica vivenciada na
escola pública contribui para a formação de sujeitos políticos, críticos e criativos ou apenas
reforça atitudes passivas, domesticadas e submissas frente ao modelo de autoridade escolar"
(HOLLANDA, 2001, p. 460).
Franco (2002), numa pesquisa realizada com 675 (seiscentos e setenta e cinco) jovens
de ambos os sexos, entre 15 (quinze) e 19 (dezenove) anos de idade, alunos de escolas
estaduais do município de São Paulo, buscou caracterizar e captar as representações sociais
sobre a escola, a situação ocupacional e profissional, o prosseguimento dos estudos e as
expectativas ante o futuro. O instrumento utilizado para a coleta dos dados foi o que
denominou de "questionário reflexivo", com o qual, por meio de questões "abertas", colocava-
se ao participante uma série de desafios, ante os quais ele deveria expressar suas opiniões
pessoais. Utilizou-se da análise de conteúdo para a leitura das respostas abertas. As
Representações encontradas sobre o futuro em 60% (sessenta porcento) "dos pesquisados foi a
de que acreditavam que estavam preparados para ele ou que o futuro seria melhor que o
presente. Porém, apenas 11,1% (onze vírgula um porcento) dos alunos enxergavam o futuro
com uma profissão definida e provavelmente acessível. Uma porcentagem significativa
(20,6% - vinte vírgula seis porcento) disse que via o futuro com muitas dificuldades e alguns
(12% - doze porcento) expressaram uma evidente apreensão e afirmaram que não viam nada:
"o futuro é amanhã e mais nada", "só penso no presente", "(amanhã) posso estar morto"
(FRANCO 2002, p.199).
48
Sobre os tipos de conhecimentos que são importantes para "vencer na vida", 49,6%
(quarenta e nove vírgula seis porcento) indicaram "aspectos relativos a elementos afetivo-
emocionais ou místicos como 'respeito', 'amor', 'dignidade', religião', 'crença em Deus', 'ajuda
de Jesus'..." (FRANCO 2002, p.199).
Sobre a escola 64,7% (sessenta e quatro vírgula sete porcento) afirmaram que a
freqüentavam "'para ser alguém na vida', 'para ter um futuro melhor', (grifo da autora) em
geral vinculado ao mercado de trabalho" (FRANCO 2002, p.200).
Na Argentina, Castorina e Kaplan (1997) desenvolveram uma pesquisa na qual
investigaram as representações sociais dos professores do ensino básico sobre a inteligência
dos alunos. A partir da hipótese de que os juízos dos professores sobre seus alunos estavam
associados à origem social destes, aplicaram entrevistas em profundidade com os professores
e analisaram os efeitos do senso comum inatista e ambientalista a respeito da inteligência,
bem como o reflexo dessas concepções sobre a avaliação escolar. Os professores
interpretavam o conceito de inteligência a partir de sua prática docente, o que os autores
denominaram como "a inteligência escolarizada". Os professores identificavam o aluno
inteligente como sinônimo do "bom aluno", "disciplinado", "obediente", "comunicativo".
Outros sinônimos aparecerem acompanhados de seus opostos denunciando as dicotomias
sociais, como exemplos de inteligente surgiram: "interessado", "comunicativo", "criativo".
Em oposição encontraram: "mal alimentado, de família não constituída, vem sem almoçar"
(CASTORINA; KAPLAN, 1997, p. 189). Os autores concluíram que, nos discursos já
naturalizados sobre a inteligência ou no senso comum dos professores, permaneciam ocultas
as relações entre as taxionomias escolares e as divisões objetivas do mundo social.
Na revisão de literatura, até aqui apresentada, pudemos constatar o crescente número
de pesquisas sobre temas relacionados à educação, aos professores, aos alunos e ao
desempenho escolar, o que, inevitavelmente, contribuiu para sucessivas reformas
49
educacionais e para constantes medidas técnico-administrativas tomadas pelos órgãos oficiais
durante os últimos anos. No entanto, como bem já assinalou Penin (1992, p.5), há "uma
grande distância entre leis, proposições e ações efetivas".
Apresentaremos a seguir o Grupo de Estudos e Pesquisas Institucionais e Sociodrama
Educacional (GEPISEd), que surgiu nesse contexto, com o intuito de contribuir para a
viabilização do sucesso escolar e para uma melhor compreensão das relações humanas nos
meios educacionais.
1.5. AS CONTRIBUIÇÕES DO GRUPO DE ESTUDOS E PESQUISAS INSTITUCIONAIS
E SOCIODRAMA EDUCACIONAL (GEPISEd)
Andrade (1986), desde o seu trabalho de doutorado, no qual realizou um estudo
etnográfico em uma escola de ensino fundamental, vem buscando o aperfeiçoamento de
atuações junto à instituição escolar de maneira a favorecer uma melhoria na relação professor-
aluno, bem como promover a criatividade no âmbito da escola. Essa busca foi pontuada com
trabalhos de diferentes agentes do processo educacional e culminou, no ano de 1995, com a
formação do atualmente denominado Grupo de Estudos e Pesquisas Institucionais e
Sociodrama Educacional (GEPISEd)
67
, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. O GEPISEd, buscando contribuir para o
sucesso escolar, vem desenvolvendo trabalhos dentro de uma linha de pesquisa-ação em
Psicologia Escolar Institucional que se propõe ao estudo das relações humanas nestes
contextos. Utiliza-se, também, de estratégias de pesquisa qualitativa, de cunho
sociopsicodramático e atua em 4 áreas distintas. São elas: (1) a linha de pesquisa
institucional (ANDRADE, 1980; NUNES; ANDRADE, 1998; SADE; ANDRADE, 2000;
76
Acessível no Diretório de Grupos da Plataforma Lattes e no sítio: http://gepsed.ffclrp.usp.br/
50
TEOTÔNIO; ANDRADE 2000); (2) a linha de pesquisa com pais (CHECHIA; ANDRADE,
2002; RIBEIRO; ANDRADE, 2004); (3) a linha de pesquisa com alunos (ALVES;
ANDRADE, 1996; ANDRADE (1996, 1999, 2001); ANDRADE e Col. 1996; BERETTA;
ANDRADE, 2001; COLARES; ANDRADE, 2004; RODRIGUES, 2003) e (4) a linha de
pesquisa sobre o pensamento do professor (ANDRADE (1999, 2000); BORSATO;
ANDRADE, 2000; CARRARO; ANDRADE, 2002; NUNES; ANDRADE, 1996; PEREIRA,
2003; SILVA; ANDRADE, 2002; VERÍSSIMO; ANDRADE, 2001). Dentro desta última
linha de pesquisa, destacamos os trabalhos de Veríssimo e Andrade (2001), Carraro (2002),
Silva (2002), Pereira (2003) e Garde (2003) por considerá-los relevantes para este estudo,
como também os trabalhos de Chechia (2002) e Ribeiro (2004) da linha de pesquisa com pais,
os quais apresentamos a seguir.
Chechia (2002) desenvolveu um estudo numa escola pública com 32 (trinta e dois)
pais, sendo 16 (dezesseis) pais de alunos com sucesso escolar e 16 (dezesseis) pais de alunos
com insucesso. Seu objetivo foi conhecer as percepções desses pais sobre a escola, sobre o
desempenho escolar e sobre o seu próprio envolvimento no cotidiano escolar dos filhos. Em
seus resultados constatou, que a maioria dos pais de alunos com sucesso considerava a escola
boa, sendo que seus filhos tiveram bom desempenho desde o início de sua vida escolar. Já os
pais de alunos com insucesso demonstraram uma percepção negativa da escola, a partir das
experiências vividas pelos filhos, pois estes apresentaram dificuldades no rendimento desde o
início de sua vida escolar. Tanto os pais de alunos com sucesso como os de alunos com
insucesso acreditavam que a família deveria valorizar a escola e esta deveria rever seus
valores em relação ao aluno e sua família. Também atribuíam a responsabilidade do
desempenho escolar ao próprio filho, ao professor e a si mesmos. Os pais de alunos com
sucesso acreditavam que o envolvimento deles no cotidiano escolar dos filhos aumentava as
possibilidades de um bom rendimento nos estudos. Já os pais de aluno com insucesso
51
demonstravam um esforço em ajudá-los, ainda que sem muito preparo, a fim de que esta
situação de baixo rendimento fosse revertida.
Ribeiro (2004) investigou as representações e vivências de pais de alunos sobre a
escola pública na qual os filhos estudavam e constatou que estes pais procuravam
corresponder às expectativas da escola sobre a sua participação na vida escolar dos filhos. No
entanto, encontravam dificuldades para cumprir o que a escola esperava deles, aumentando
ainda mais o distanciamento entre o conhecimento formal e a realidade dessas famílias que,
em sua maioria, eram provenientes de meios desfavorecidos social e economicamente. A
relação família–escola demonstrou-se assimétrica sendo que a escola parecia sutilmente
exercer mecanismos de exclusão para com estes alunos. Um outro aspecto importante no
trabalho de Ribeiro (2004) refere-se as entrevistas em grupo focal que tinham caráter
investigativo, mas o uso de recursos e estratégias sociodramáticas possibilitou que o grupo
focal se tornasse de intervenção.
Garde (2003) desenvolveu um estudo no qual teve por objetivo investigar as
representações de professores do ensino médio da rede pública sobre a criatividade e como a
entendem no ensino. A investigação se deu com 12 docentes por meio de entrevista semi-
estruturada. Os dados foram analisados a partir da metodologia de análise qualitativa à luz do
referencial teórico psicanalítico, rogeriano, cognitivista e moreniano. Foram encontradas
representações de criatividade que enfatizavam a valorização do conhecimento, da
sensibilidade e do esforço para recriar algo e construir novos sentidos. Já no ensino, a
criatividade é mencionada como um processo de reflexão e sensibilidade por parte do
professor, que deve buscar na realidade de seus alunos as condições necessárias para trabalhar
o conteúdo da disciplina que leciona, bem como instigar o aluno para que este seja um agente
de mudança. Os professores também reconhecem a necessidade de aprimoramento
profissional para que possam desenvolver um trabalho criativo e dizem repensar sua
52
metodologia de ensino por meio do debate, da discussão de textos e do diálogo com seus
alunos.
Silva (2002) investigou o sentido e o significado da participação do professor em
grupos reflexivos e como essa participação incidia sobre as representações e crenças que
demonstravam, referentes ao seu papel e sua identidade profissional. Buscou também, durante
grupos reflexivos com professores, identificar as resistências e as dificuldades apresentadas na
superação de representações anteriores. Os resultados demonstraram que a compreensão das
práticas pedagógicas pressupõe sínteses das contradições vivenciadas no contexto
educacional. A ação reflexiva em grupo pôde levar os professores a repensarem suas práticas
enquanto agentes educativos e formadores, buscando assim a transformação das mesmas.
Pereira (2003) investigou as representações sociais de professores do ciclo-II do
ensino fundamental (5
a
a 8
a
séries) de uma escola pública buscando compreender a prática
docente, a relação com os alunos, as dificuldades e as percepções sobre a passagem do ciclo I
para o ciclo II (passagem para a 5
a
série). Realizou entrevistas semi-estruturadas de
profundidade e encontros grupais com técnicas sociopsicodramáticas. Os dados foram
submetidos à análise de conteúdo e mostraram que os professores têm encontrado
dificuldades para exercer o seu papel, seja por fatores intra ou extra-escolares. As inovações
introduzidas na escola, sem um preparo prévio dos docentes, afetaram o seu fazer pedagógico
e suas relações com os alunos que por sua vez, experimentaram dificuldades de adaptação na
passagem entre os ciclos.
Veríssimo e Andrade (2001) buscaram identificar as representações de professores de
1ª a 4ª série do Ensino Fundamental, sobre a motivação dos alunos e o papel do erro na
aprendizagem por meio de um questionário de crenças (Q.C.P), entrevistas semi–estruturadas
para contextualização e entrevistas temáticas. Os resultados demonstraram que a concepção
de motivação distanciava-se da perspectiva construtivista à medida que se propunha
53
extrínseca à tarefa do aluno. Em relação ao "erro" os conceitos construtivistas estavam
presentes ainda que sem uma apropriação aprofundada.
Carraro (2002) se propôs a investigar as crenças e representações dos professores do
ensino fundamental a respeito do construtivismo, dos parâmetros curriculares nacionais e das
inovações pedagógicas decorrentes da nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB). Para alcançar
seus objetivos realizou entrevistas de profundidade, semi-estruturadas, com 40 (quarenta)
professores do ensino fundamental, em duas escolas públicas no interior de São Paulo e
submeteu os dados à Análise de Conteúdo. É importante destacar que o trabalho de Carraro
(2002) teve uma inovação metodológica na forma de se fazer entrevistas, e será melhor
descrita no item 3.3 da Metodologia do presente estudo. Os resultados revelaram que a
maioria dos professores acreditava que as mudanças no cotidiano escolar são necessárias e
importantes, mas não concordavam com o modo como elas são implantadas e conduzidas. Os
professores demonstraram ter uma noção equivocada e imprecisa sobre o construtivismo e
uma noção superficial sobre os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Sentiam-se
obrigados a inseri-los no seu planejamento de aula, embora não compreendessem que os
PCNs pressupunham uma perspectiva construtivista do ensino. Sentiam-se despreparados e
desrespeitados pelas políticas educacionais alegando que estas eram impostas e que tinham
que assimilá-las rapidamente. Sentiam falta de estudos, orientações e apoio da escola para
melhor compreender as inovações pedagógicas, porém acreditavam que se as mudanças no
ensino fossem bem trabalhadas trariam bons resultados.
Neste contexto de inovações pedagógicas consideramos que os professores são os
principais executores das propostas de mudanças educacionais. O presente estudo, que se
localiza dentro do GEPISEd na linha de pesquisa o "pensamento do professor", buscou
investigar as representações dos professores sobre o "aluno", objetivo esse que detalharemos
no capítulo a seguir.
54
2. OBJETIVOS
57
2.1. OBJETIVO GERAL
Investigar as representações de professores do ensino fundamental sobre o "aluno"
situando-as no contexto de suas trajetórias profissionais.
2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS
1º. Contextualizar a “Trajetória Profissional” de uma amostra de professores do ensino
fundamental a partir da investigação dos fatores: “formação acadêmica”, “experiências
profissionais”, “a escola onde trabalha” e “planos profissionais”.
2º. Investigar as representações de professores do ensino fundamental sobre “o bom
aluno”.
3º. Investigar as representações de professores do ensino fundamental sobre “o aluno com
dificuldade de aprendizagem”.
4º. Investigar como os professores do ensino fundamental percebem “o aluno de hoje”, a
partir dos “alunos de sua turma”, em contraposição aos alunos do início de suas
carreiras.
58
3. METODOLOGIA
61
A metodologia qualitativa, conforme descrita por Bogdan e Biklen (1994), foi a
escolhida para atender aos objetivos deste estudo por ser uma abordagem metodológica de
caráter descritivo que visa mais o processo do que os resultados ou os produtos, permitindo
estabelecer uma compreensão mais esclarecedora do objeto de estudo e "investigar os
fenômenos em toda a sua complexidade e em contexto natural" (BOGDAN; BIKLEN, 1994,
p. 16).
Tal metodologia considera o ambiente natural como a fonte direta de dados e o
investigador como o instrumento principal de investigação, ou seja, que as ações podem ser
melhor compreendidas quando são observadas no seu ambiente habitual de ocorrência.
"Divorciar o ato, a palavra ou o gesto do seu contexto é perder de vista o seu significado".
(BOGDAN; BIKLEN, 1994, p.48).
A estratégia adotada foi a entrevista em profundidade, em forma de cartões temáticos,
a qual está descrita com maiores detalhes no item 3.3. abaixo, além do diário de campo, no
qual se deu um registro sistemático de tudo o que foi observado. A partir das entrevistas
foram obtidos dados referentes aos valores, às atitudes e às opiniões dos sujeitos
entrevistados.
3.1. PARTICIPANTES
Os participantes deste estudo foram 15 (quinze) professoras do ensino fundamental de
uma escola pública da cidade de Ribeirão Preto-SP, descritas no quadro 1, a partir de dados
obtidos durante entrevistas com as mesmas.
62
Nomes das
Profª *
Formação
Acadêmica
Série e/ou
Disciplina
Nível de Ensino Tipo de
Contrato
de trabalho
Regime de Trabalho Tempo
de
carreira
1. Mara
Magistério 4ª série Ensino
Fundamental
Efetivo Período integral –
Estado
30 anos
2. Lia
Magistério/
Pedagogia
1ª série Ensino
Fundamental
Efetivo ½ período - Estado e ½
período - Prefeitura
21 anos
3. Lane
Magistério/
Pedagogia
1ª série Ensino
Fundamental
Efetivo ½ período- Estado 15 anos
4. Vanda
Magistério/
Pedagogia
1ª série Ensino
Fundamental
Efetivo Período integral –
Estado
23 anos
5. Ada
Magistério/
Pedagogia
1ª série Ensino
Fundamental
A.C.T ** ACT; ½ período -
Estado
19 anos
6. Bete
Magistério
Artes
Plásticas
4ª série Ensino
Fundamental
Efetivo ½ período - Estado e
½ período - Prefeitura
29 anos
7. Clara
Magistério/
Pedagogia
3ª série Ensino
Fundamental
Efetivo Período integral -
Estado
23 anos
8. Marta
Contabilidade
/ Pedagogia
3ª série Ensino
Fundamental
A.C.T ½ período - Estado e
½ período - Prefeitura
17 anos
9. Néia
Magistério/
Biologia
3ª série Ensino
Fundamental
Efetivo ½ período - Estado e
½ período - Prefeitura
19 anos
10. Mila
Magistério/
Pedagogia
Incompleto
4ª série Ensino
Fundamental
A.C.T ACT - Período integral
- Estado
19 anos
11. Ana
Letras Português/
Inglês
Ensino
Fundamental/
Médio e E.J.A.***
Efetivo ½ período - Estado e
½ período- Particular
10 anos
12. Nívea
Magistério
Ciências
Biológicas
Ciências
Ensino
Fundamental
Efetivo ½ período - Estado e
½ período - Prefeitura
29 anos
13. Rute
Biomedicina Ciências/
Biologia
Ensino
Fundamental
e E.J.A
Efetivo ½ período – Estado e
½ período - Particular
15 anos
14. Taís
Educação
Artística
Educação
Artística
Ensino
Fundamental
A.C.T. ACT - período Integral
- Estado
21 anos
15. Sara
Letras Português/
Inglês
Ensino
Fundamental
e Médio
Efetivo Período Integral-
Estado
17 anos
Quadro 1 - Caracterização dos Participantes da Pesquisa
* Nomes fictícios
** Admitido em Caráter Temporário.
*** Educação de Jovens e Adultos, antigo Supletivo.
As entrevistas com as professoras se deram na escola onde trabalham, no Horário de
Trabalho Pedagógico em Conjunto (H.T.P.C), das 12h00min às 13h00min, nas segundas e
terças-feiras no período de abril a outubro de 2003.
63
No início do ano letivo de 2003, fizemos uma reunião com a coordenação da escola
estudada, na qual apresentamos o trabalho do GEPISEd e nos propusemos a uma investigação
com posterior intervenção junto ao grupo de professores daquela instituição. Após a aceitação
da proposta pela coordenação, passamos a apresentação do GEPISEd aos professores em uma
reunião de H.T.P.C., na qual todos os presentes foram convidados a participar deste estudo.
Os professores interessados, 17 (dezessete) naquele momento, assinaram seus nomes numa
lista indicando a série na qual lecionavam. Dos 17 (dezessete) professores candidatos
inicialmente, 15 (catorze) foram entrevistados. Os demais se afastaram do cargo, neste
período, não podendo participar da pesquisa.
3.2. LOCAL
O local no qual o estudo se deu foi a Escola Estadual de ensino de 1° e 2° graus onde
as professoras lecionavam. As informações sobre a escola foram obtidas por meio de uma
entrevista com o vice-diretor da época.
A Escola foi fundada em fevereiro de 1975 e atendia, no momento da pesquisa, uma
clientela de 2.168 (dois mil, cento e sessenta e oito) alunos.
Estava localizada em um bairro popular residencial de Ribeirão Preto, próxima a duas
grandes avenidas que ligavam o bairro ao centro e davam acesso a outros bairros e a uma das
saídas da cidade. Havia um Posto Policial nas imediações da escola e variedade de comércios,
principalmente nas avenidas.
Atendia alunos do 1
o
e 2
o
ciclo do Ensino Fundamental nos períodos matutino
(07h00min às 12h00min) e vespertino (13h00min às 17h50min) e alunos da Educação de
Jovens e Adultos (EJA) no período noturno (19h00min às 22h35min). Havia uma grande
procura por matrícula nesta escola apesar de existir em suas proximidades mais 2 (duas)
64
escolas estaduais e 2 (duas) escolas municipais. O vice-diretor informou que buscavam
atender toda a população que procurava a escola, fosse do próprio bairro ou de adjacentes.
A Escola funcionava com 154 (cento e cinqüenta e quatro) funcionários ao todo, sendo
120 (cento e vinte) professores dos quais 14 (catorze) eram eventuais (ACTs), 1 (um) diretor,
2 (dois) vice-diretores e 2 (dois) coordenadores pedagógicos. Os demais funcionários
ocupavam cargos de auxiliares de serviço, inspetores de alunos, merendeiras, auxiliares de
escritório e secretários. Os professores possuíam formação acadêmica com Licenciatura
Plena, com exceção dos eventuais (ACTs), e eram do sexo feminino em sua maioria,
principalmente no Ensino Fundamental.
O número de alunos repetentes no Ensino Fundamental era baixo devido a Progressão
Continuada, sendo que no EJA já não se dava dessa forma, chegando a 14% (catorze
porcento) de retenção. A freqüência de alunos era boa, chegando a 75% (setenta e cinco
porcento), com poucas desistências.
O prédio da escola possuía 5 (cinco) blocos com 20 (vinte) salas de aulas ao todo e 1
(uma) pequena sala de professores. Havia também 2 (duas) salas de diretoria, com 1 (uma)
sala de espera e, contíguo a este espaço funcionava a Secretaria. Não possuía laboratórios,
sala de computação ou biblioteca. Havia um pequeno espaço com livros amontoados, fora de
estantes, embolorando devido à umidade e à poeira, não consultados pelos professores e
alunos, ao qual o vice-diretor chamava de "biblioteca em funcionamento precário”. A
professora mais antiga da escola relatou com certa indignação que em uma gestão anterior, a
diretora da época desativou a biblioteca e a transformou em sala de aula. Desde então, devido
a fatores de ordem burocrática não conseguiram mais reaver o espaço que era destinado para
este fim, ficando os livros amontoados num canto, próximo ao refeitório.
O espaço externo da Escola constituía-se de 1 (um) pátio grande, 1 (uma) quadra não
coberta e 2 (dois) estacionamentos para carros de funcionários.
65
Os estacionamentos eram arborizados, assim como as imediações da escola. Esta fazia
limites com dois terrenos baldios que ficavam em frente às duas avenidas mais movimentadas
do bairro.
3.3. PROCEDIMENTOS PARA A COLETA DE DADOS
A investigação aconteceu por meio de entrevistas individuais em profundidade que
foram gravadas e depois transcritas literalmente. As entrevistas aconteceram em duas sessões,
em dias diferentes, com duração aproximada de uma hora cada. Antes da primeira sessão era
apresentado ao entrevistado os "Esclarecimentos aos Participantes da Pesquisa" e o "Termo de
Consentimento Livre Esclarecido" (APÊNDICES A e B). A primeira sessão teve como foco
a “Trajetória Profissional” das professoras. Buscou-se também, neste primeiro momento, o
estabelecimento de um vínculo facilitador entre entrevistador e entrevistado. Na segunda
sessão se deu a investigação das representações tendo como foco “O Aluno”.
A estratégia de entrevista adotada, já utilizada por outros pesquisadores do GEPISEd
como Carraro (2002), Figueiredo (2004), Garde (2003) e Silva (2002), se encontra melhor
descrita em Carraro (2002) e se configura como uma estratégia quase projetiva que tem como
objetivo favorecer manifestações verbais mais profundas dos professores, a fim de apreender
as suas representações acerca do tema apresentado.
Foram investigados 4 (quatro) temas em cada sessão. Cada tema foi abordado em 3
(três) etapas. Os temas da primeira sessão foram: “Minha Formação Acadêmica”, “Minhas
Experiências Profissionais”, “A Escola Onde Trabalho” e “Meus Planos Profissionais”. Os da
segunda sessão foram: “Os alunos de minha turma”, “O aluno com dificuldade de
aprendizagem”, “O Bom Aluno” e “O Aluno de Hoje”.
66
Em cada sessão, utilizaram-se 4 (quatro) cartões constando, respectivamente em cada
um, os temas a serem investigados. Os quatro cartões, referentes a cada uma das sessões,
foram colocados sobre a mesa. Solicitou-se ao entrevistado que escolhesse o tema pelo qual
gostaria de iniciar a entrevista. Os 3 (três) cartões restantes foram guardados para serem
usados em seguida ao primeiro que foi escolhido.
Na primeira etapa, conforme já detalhado em Carraro (2002), perguntou-se ao
entrevistado o que lhe vinha à mente enquanto lia o tema escrito no cartão, quais
pensamentos, idéias e sentimentos lhe ocorriam. Então, sugeriu-se que o entrevistado se
dedicasse a pensar sobre o tema, em silêncio, pelo tempo que desejasse.
Na segunda etapa, ofereceu-se ao entrevistado uma folha de papel pautado, com o
tema escolhido escrito na parte superior, solicitando-lhe que escrevesse as palavras ou
expressões que lhe vieram à mente enquanto pensava sobre o tema escolhido na primeira
etapa.
A terceira e última etapa representa a fase da entrevista propriamente dita e é nesta que
se aprofunda a investigação muito além das palavras e expressões registradas. Informou-se ao
entrevistado que o gravador seria ligado e solicitou-se-lhe que explicasse, um a um, os
sentidos de todas as palavras ou expressões escritas na etapa anterior. Para iniciar, perguntou-
se ao entrevistado: "o que lhe fez lembrar esta palavra ou expressão quando você a escreveu?"
Procedeu-se desta forma para cada uma das palavras ou expressões anotadas na folha de papel
pautado. À medida que o entrevistado explicava, exploraram-se os assuntos, com intervenção
de esclarecimentos quando estes se fizeram necessários.
67
3.4. PROCEDIMENTO PARA A ANÁLISE DOS DADOS
As entrevistas foram transcritas segundo as normas de Pretti (1993), conforme os
critérios apresentados no quadro 2, a seguir:
OCORRÊNCIAS SINAIS EXEMPLIFICAÇÃO*
Incompreensão de palavras ou Segmentos
( )
do nível de renda ... ( ) nível de renda nominal ...
Hipótese do que se ouviu (hipótese) (estou) meio preocupado (com o gravador)
Truncamento (havendo homografia, usa-se
acento indicativo da tônica e/ou timbre)
/
e come/ e reinicia
Entonação enfática Maiúscula Porque as pessoas TÊM moeda
Prolongamento de vogal e consoante
(como s, r)
:: podendo
aumentar para
:::: ou mais
ao emprestarem os ... éh::: ... o dinheiro
Silabação
-
Por motivo de tran-sa-ção
Interrogação
?
E o Banco ... Central ... certo?
Qualquer pausa
...
São três motivos ... ou três razões ... que faziam
com que se retenha moeda ... existe uma ...
retenção
Comentários descritivos do transcritor ((minúscula)) ((tossiu))
Comentários que quebram a seqüência
temática da exposição; desvio temático
-- --
... a demanda de moeda – vamos dar essa notação
– demanda de moeda por motivo
Superposição, simulação de vozes Ligando
As linhas
A. na casa da sua irmã
B. Sexta-feira?
A. fizeram lá ....
B. Cozinharam lá?
Indicação de que a fala foi tomada ou
interrompida em determinado ponto. Não
no seu início, por exemplo.
(...)
(...) nós vimos que existem ...
Citações literais ou leituras de textos,
durante a gravação.
“ ”
Pedro Lima ... ah escreve na ocasião ... “O cinema
falado em língua estrangeira não precisa de
nenhuma baRReira entre nós” ...
Quadro 2 – Normas de Pretti (1993) - para transcrição literal e análise de dados de entrevistas.
* exemplos retirados dos inquéritos NURC/ SP n
o
338 EF e 331 D
2
.
Observações:
1. Iniciais maiúsculas: só para nomes próprios ou para siglas (USP eTc.)
2. Fáticos: ah, éh, eh, ahn, ehn, uhn, tá
(não por está: tá? Você está brava ?)
3. Nomes de obras ou nomes comuns estrangeiros são grifados.
4. Números: por extenso.
5. Não se indica o ponto de exclamação (frase exclamativa)
6. Não se anota o cadenciamento da frase.
7. Podem-se combinar sinais. Por exemplo: oh:::... (alongamento e pausa)
8. Não se utilizam sinais de pausa, típicos da língua escrita, como ponto final; ponto-e-vírgula; dois pontos,
vírgula. As reticências marcam qualquer tipo de pausa.
68
Após a transcrição literal, os dados foram submetidos à Análise de Conteúdo a partir
do referencial de Bardin (1977) e de Minayo (1998), sendo que, este último, apresenta, amplia
e discute a proposta de Bardin (1977). Dentre as técnicas propostas por Bardin (1977) se
privilegiou a Análise Temática na qual se buscou encontrar núcleos de sentido nos enunciados
da fala e os seus significados. A Análise Temática desdobrou-se em 3 (três) fases: a pré-
análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados obtidos e interpretação.
Na pré-análise, determinamos, entre outras coisas, a unidade de registro sob a forma
de palavra-chave ou frase; a unidade de contexto e os conceitos teóricos mais gerais que
orientaram a análise. Procedemos também, na pré-análise, à leitura flutuante dos dados de
maneira a construir um corpus que atendesse aos critérios de exaustividade,
representatividade, homogeneidade e pertinência.
Na exploração do material se deu a codificação dos dados com a organização de
categorias e subcategorias analíticas e empíricas. As categorias analíticas foram construídas a
partir da revisão bibliográfica e as categorias empíricas surgiram após as várias releituras das
entrevistas emergindo espontaneamente dos conteúdos das falas dos participantes da pesquisa.
No tratamento dos resultados obtidos e interpretação buscamos compreender as
categorias e subcategorias temáticas situando-as no contexto em que foram produzidas pelas
entrevistadas e estabelecendo possíveis relações com a literatura científica sobre o assunto.
3.5. ASPECTOS ÉTICOS
Neste estudo, procuramos atender às exigências éticas e científicas fundamentais da
Resolução nº 196 de 10 de outubro de 1996 que trata sobre declarações e diretrizes de
pesquisas envolvendo seres humanos. Esta Resolução incorpora os quatro referenciais básicos
da bioética: 1) autonomia, 2) não maleficência, 3) beneficência e 4) beneficência e justiça.
69
Seu objetivo é assegurar os direitos e deveres que dizem respeito à comunidade científica, aos
sujeitos da pesquisa e ao Estado. Para isso, assumimos o compromisso de desenvolver o
estudo a partir do consentimento livre e esclarecido dos indivíduos participantes; assegurar a
confidencialidade e a privacidade nos instrumentos de coleta de dados utilizados; garantir a
não utilização das informações colhidas em prejuízo destas pessoas e/ ou da sociedade; zelar
pela proteção da imagem e a não estigmatização dos envolvidos e assegurar os benefícios
resultantes deste estudo aos sujeitos desta pesquisa, em termos de retorno educacional e
acesso aos seus resultados. Este nosso compromisso foi registrado nos documentos
“Esclarecimentos aos Participantes da Pesquisa” e “Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido” (APÊNDICES A e B) e apresentado ao Comitê de Ética da Faculdade de
Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto, juntamente com o Projeto de Pesquisa. Após
sugestões e adequações necessárias, o Projeto e os documentos foram aprovados pelo referido
Comitê, segundo o parecer da 27ª reunião ordinária, realizada no dia 30/04/2003. Os
documentos aprovados foram apresentados aos professores antes do início da pesquisa para
informá-los de nosso compromisso. Os professores, que concordaram em participar do estudo,
assinaram a documentação em duas vias, sendo que uma cópia ficou em seu poder e a outra
foi entregue à pesquisadora.
70
4. RESULTADOS
73
Neste tópico, apresentamos e exemplificamos o contexto no qual se deram as
entrevistas com as professoras, para em seguida, descrevermos seus resultados.
4.1. CONTEXTUALIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS
Em março de 2003, demos início às entrevistas com as professoras no horário
reservado para H.T.P.C., conforme já descrito anteriormente no capítulo 3
(METODOLOGIA).
No começo do trabalho, era comum a interrupção da entrevista por professoras que
entravam na sala para pegar algum material, funcionários que trabalhavam na escola e
precisavam de alguma informação e até mesmo alunos que chegavam mais cedo para a aula.
À medida que o encontro da pesquisadora com as professoras se tornou parte do cenário da
escola, as interrupções diminuíram significativamente e este horário passou a ser respeitado.
Vez ou outra, durante a coleta de dados, a entrevista se estendia por mais de uma hora e era
mesclada com a conversa da criançada no pátio se preparando para o início da aula. Algumas
vezes, não era possível concluir as etapas propostas para a sessão, visto que a maioria das
participantes precisava se deslocar para outras escolas nas quais trabalhava num segundo
período.
Houveram ocasiões em que a entrevista não pôde ser realizada porque ao chegar à
escola a pesquisadora era avisada de que as professoras tinham sido dispensadas do H.T.P.C
daquele dia, por terem muitas horas de trabalho acumuladas em atividades extra–classe.
Em outras vezes, a entrevista não ocorreu porque “havia um tema muito importante
para ser discutido por todas na pauta do H.T.P.C”, segundo explicação da coordenadora, a
qual pediu desculpas e, nestes dias, não liberou nenhuma professora para ser entrevistada.
74
Geralmente, na primeira sessão as professoras estiveram mais inibidas e falaram
pouco. Já na segunda sessão, a maioria delas se permitiu falar mais e até mesmo fazer queixas
e críticas. Algumas, após a pesquisadora desligar o gravador, fizeram desabafos pessoais
buscando, se não cumplicidade, pelo menos um ouvido atento.
Relataremos a seguir, a caráter de exemplo, o contexto das 2 (duas) sessões com a
primeira professora entrevistada.
4.1.1. Entrevista com Mara
Mara foi a primeira professora entrevistada. Foi indicada, aleatoriamente, pela
coordenação para iniciar a entrevista. Isto se deu quando a pesquisadora chegou à sala do
H.T.P.C. e não conseguiu conversar com as professoras que haviam dado o nome para a
pesquisa. A coordenadora já havia iniciado sua fala e comunicava, rapidamente, tópicos da
pauta do dia que precisavam ser resolvidos em conjunto. Às vezes, algumas professoras
conversavam em paralelo. Em resposta, a coordenadora dava um altíssimo PSIU! e
continuava com a sua pauta de reunião. A conversa paralela cessava por alguns instantes.
Percebendo que a pauta e os recados da coordenação iam longe, a pesquisadora interrompeu a
oratória, e em particular, pediu à coordenação para liberar uma professora para a entrevista,
pois temia demorar um pouco mais e prejudicá-las no retorno ao trabalho à tarde.
Rapidamente a coordenadora olhou a lista com os nomes e apontou: "Mara, você. Pode sair
com a psicóloga para a entrevista". De pronto foi atendida e assim, Mara foi a primeira da
lista.
Na primeira sessão, demonstrou-se um pouco saudosista, pois se aposentaria ainda
naquele ano. Fez uma retrospectiva e falou com certa amargura dos sonhos não realizados e
da opção que fez pela vida familiar em detrimento do trabalho. Parecia arrepender-se, visto
75
que se separou do marido. É como se não tivesse valido a pena não ter investido na carreira.
Ao final da primeira sessão, pediu para que eu ligasse na escola antes de ir para a segunda
sessão, pois estava com a mãe doente e possivelmente faltaria no dia em que combinamos.
Na segunda sessão, Mara parecia aturdida, confusa. Justificou que estava pensando na
enfermidade da mãe e em sua internação. No momento de olhar para o cartão escolhido e
escrever sobre o que o tema lhe evocava, disse que não estava conseguindo concentrar-se.
Estava com a "cabeça lá longe", no hospital, na mãe. Ofereci-lhe a possibilidade de
interrompermos a sessão, mas ela quis continuar e ao final falou, num desabafo, sobre o que
tem enfrentado com a enfermidade da mãe.
Quando falou sobre "os alunos de sua turma" a professora citou o que chama de
"jeitinho brasileiro" para conseguir auxiliar os que têm mais dificuldades: coloca-os em
grupo; os que têm facilidade auxiliam os que têm mais dificuldades e percebe que estes
progridem pois, muitas vezes, "entendem mais um colega falando do que o professor
explicando". Informo-lhe, ao final da sessão, que um pesquisador russo de nome Vygotsky,
havia descoberto no século passado que as crianças poderiam, de fato, consolidar seu
aprendizado a partir da intervenção do professor e de colegas que sabiam mais que eles. Ela se
animou e relatou outras experiências em sala, de trabalhos em grupo, nos quais os alunos com
dificuldades obtêm êxito. Quando terminamos, parecia aliviada e disse que não só os alunos
precisavam de um atendimento especializado, mas os professores também necessitavam, e,
muito mais, de um apoio psicológico, psicopedagógico. Enfim, algum trabalho que os
ajudasse na reflexão de seu fazer profissional diário.
76
4.2. OS RESULTADOS OBTIDOS POR MEIO DA ANÁLISE DE CONTEÚDO DAS
ENTREVISTAS
Passaremos a seguir, à descrição dos resultados das entrevistas, obtidos por meio da
Análise de Conteúdo. Num primeiro momento, abordaremos o foco explorado na 1ª sessão:
"Trajetória Profissional", com seus temas e categorias. Em seguida, faremos o mesmo com o
foco "O Aluno", trabalhado na segunda sessão.
4.2.1. Trajetória Profissional
Na primeira sessão da entrevista exploramos o foco "Trajetória Profissional" que teve
por objetivo contextualizar a formação, a atuação e as aspirações das participantes da
pesquisa. Serão apresentadas, neste item, as categorias geradas a partir de 4 (quatro) temas:
"Minha Formação Acadêmica", "Minha Trajetória Profissional", "A Escola onde trabalho" e
"Meus Planos Profissionais". Ao final da descrição destes dados, faremos uma síntese do que
foi percebido.
4.2.1.1. Minha Formação Acadêmica
Para comentar os conteúdos que emergiram nesta categoria recorremos ao Quadro 1,
apresentado no item 3.1 da Metodologia (pág.48), que traz sinteticamente a caracterização das
professoras participantes da pesquisa.
Das 15 (quinze) professoras entrevistadas, apenas 2 (duas), Mara e Mila, não
possuíam a formação acadêmica com o 3º grau, sendo que uma delas já havia iniciado a
faculdade de Pedagogia enquanto a outra, prestes a se aposentar, lamentava-se por não ter
77
investido mais em sua carreira profissional. O fato “de ter colocado a família em primeiro
plano” é apontado por Mara, como o motivo que a impossibilitou de continuar seus estudos.
Esta queixa apareceu várias vezes enquanto falava sobre sua "formação acadêmica" e foi
recorrente em outros temas da entrevista.
Das 13 (treze) professoras que fizeram faculdade, somente 1 (uma), Rute, fez um
curso que não era Licenciatura (Biomedicina), o que a levou a buscar uma complementação
pedagógica. Esta professora entrou no Magistério como segunda opção de trabalho, por ter
dificuldades em permanecer atuando em sua área de formação inicial.
essa empresa que a gente tinha passou por várias situações... daí eu recomecei a
minha vida com essa outra formação acadêmica que eu tinha que era de professora
tal... não era nem de professora... eu não sou professora formada como professora...
eu sou biomédica minha área seria mais de pesquisa então como com essa
formação acadêmica eu tive também uma formação pra ser professora uma
licenciatura eu comecei a querer mudar minha vida... eu não queria mais daquela
maneira então eu fui procurando outras coisas né? e fui encontrar essa profissão...
depois é claro que eu tive que percorrer um outro caminho... me especializar... de
acabar de concluir essa minha formação pra ter uma licenciatura plena em
Biologia... que é a minha área... (Rute).
Mais 3 (três) professoras declararam que o Magistério não foi a sua primeira opção
profissional. Uma delas (Bete) se tornou professora porque as mulheres de sua época já eram
condicionadas para esta profissão. Outra professora deste trio (Sara) gostaria de ter estudado
Psicologia, mas a sua realidade econômica e social não lhe permitiu. Então, cursou Letras por
gostar também de Literatura. Uma vez professora, pretende se aprimorar em sua profissão e
fazer Mestrado, pois o seu objetivo é lecionar no 3º grau.
a minha formação acadêmica... eu... eu... me formei não exatamente naquilo que eu
queria por questões financeiras (...) foi minha segunda opção (...) eu tento ser mais
justa e mais profissional possível (...) eu gostaria de ter sido psicóloga e acho que
eu teria sido boa mas não pude por que eu não tinha como só estudar e... foi
complicando... como eu gosto muito de ler eu optei por Literatura... né? e... e...
pretendo fazer pós graduação em Literatura(...) por que eu acho que eu posso tá
contribuindo assim... dando aula mesmo pra professores... pra tá melhorando...
sabe? (Sara)
A terceira professora deste grupo disse que caiu na rede (de ensino) por necessidade
(Nívea). Já no final da carreira, ainda não sabe se gosta ou não do que faz. Dedicou-se à
profissão, superou dificuldades e acredita que se tornou uma boa profissional, consciente e
78
capacitada. Esta professora foi a única do grupo das participantes que considerou a sua
formação acadêmica ruim, pois não a capacitou para lidar com a sala de aula. Por isso, ela foi
em busca de outros cursos que, em sua maioria, contribuíram para a sua prática e crescimento
profissional, tornando-a uma professora mais competente, respeitável e analítica.
olha... eu... na época da minha formação... eu... fui muito MAL formada né porque
eu fiz curso trabalhando e quando eu acordei eu era professora... morta de fome
então eu tinha que trabalhar... então primeiro quando você entra em uma sala de
aula você percebe que não sabe NADA absolutamente NADA (...) eu não amo dar
aula... eu tenho o maior respeito por isso pelos meus alunos por que eu tenho
CONSciência de que eu não nasci para ENSInar eu não tenho certeza... eu não tive
outra opÇÃO pra faZER (...) fiz muitos cursos na USP em São Paulo... sempre
buscando então SEMPRE crescendo...amadurecendo pra trabalhar...então...na hora
de aplicar tudo isso não dá para você aplicar mas você se torna um profissional
competente eu acho um profissional respeitável um profissional que se faz respeitar
e... até analítico porque você analisa as situações (Nívea)
As demais professoras (catorze) afirmam que tiveram uma ótima formação acadêmica
e que esta é progressiva e contínua com cursos de aperfeiçoamento.
A partir desta caracterização, pôde-se perceber que a maioria das professoras estavam
procurando se adequar à proposta da Lei de Diretrizes de Bases (L.D.B) que visa a formação
em curso superior para o exercício da profissão. Uma das professoras que interrompeu os
estudos (Mara) encontrou dificuldades em conciliar a demanda da vida profissional com a
vida familiar. Uma das professoras que, em sua época de formação não teve outra opção a não
ser o Magistério (Bete), fez faculdade de Artes posteriormente. A professora biomédica (Rute)
relatou que buscou aperfeiçoamento para conseguir lecionar em uma área distinta da área de
sua formação e informou que conseguiu integrar sua experiência e curiosidade em
laboratórios com a sua atuação em sala de aula. A professora que desejava ser psicóloga,
(Sara) buscava trabalhar a afetividade com seus alunos e compreendê-los. A professora que se
queixou de sua "má formação" (Nívea) afirmou que sofreu muito, num primeiro momento,
frente ao desafio de transmitir algo que desconhecia ao seu grupo de alunos de 8
a
série. Isto a
levou a buscar aprimoramento. Reconheceu crescimento e enriquecimento pessoal nesta
busca. Fez muitos cursos. Alguns apenas pelo diploma, muitos outros pelo enriquecimento
79
que proporcionariam à sua atuação profissional, pois a tornou uma profissional mais
competente, respeitável e analítica.
Diante destes dados, percebemos que nem todas as professoras estão no Magistério
por escolha ou afinidade com a área de ensino. Porém, todas afirmam que atuam da melhor
maneira possível, buscando cursos de aprimoramento e integração entre as experiências
anteriores e os desafios atuais da sala de aula. No entanto, sabemos que os “muitos cursos de
aperfeiçoamento” aos quais as professoras se referem, são obrigatórios como parte do
programa de formação de professores do Governo do Estado. Do grupo das 15 (quinze)
professoras, apenas 2 (duas) (Ana e Taís) afirmaram considerar tão importante a formação
contínua que investem em cursos de aprimoramento, até mesmo pagando-os do próprio bolso.
4.2.1.2. Minha Trajetória Profissional
A partir do Quadro 1 (página 48), pudemos constatar que todas as professoras
participantes da pesquisa estavam há mais de uma década trabalhando na área da Educação,
sendo que 7 (sete) das 15 (quinze) entrevistadas atuavam há mais de 20 (vinte) anos e 3 (três)
(Mara, Nívea, Bete) estavam para se aposentar.
Neste tema, “Minhas Experiências Profissionais”, surgiram 4 (quatro) categorias que
esquematizamos no Quadro 3, a seguir, expandindo-as posteriormente com exemplos de falas
das professoras.
Categorias de Experiências
Profissionais
4.2.1.2.1. Necessidade de dedicação à profissão Lane, Lia, Clara, Vanda, Sara, Marta, Nívea (7)
4.2.1.2.2. A diversidade da experiência em sala de aula Mara, Lane, Ilda, Marta, Néia, Sara, Ana, Bete, Rute
(9)
4.2.1.2.3. A diversidade da experiência com cargos
administrativos
Lane, Marta, Mara, Vanda, Clara, Ilda, Mila (7)
4.2.1.2.4. A diversidade da experiência e constante
aprendizado
Ilda, Sara, Clara, Taís, Vanda, Mila (6)
Quadro 3 - Síntese do Tema: “Minhas Experiências Profissionais”
80
4.2.1.2.1. Necessidade de dedicação à profissão
Nesta categoria, 7 (sete) professoras destacaram a importância da dedicação ao ensino. Uma
delas entendia que, uma vez que prestou e passou no concurso para esta profissão, deveria ter o
máximo de dedicação no exercício da mesma.
a dedicação (...) já que eu tô aqui dando aula... eu tenho que ter dedicação... (...) já
que eu fui fazer concurso e passei então eu tenho que me dedicar ao máximo pro
meu trabalho né? (Lane)
Outra professora declarou que a sua dedicação é sinônimo de amor.
às vezes a minha filha comenta comigo ‘mãe você está com mais pique do que
eu...’(.,.) tá quase na hora de trabalhar ela fala 'nossa que pique você tem'... eu falo
é dedicação né? é pra quem gosta... se eu não gostasse eu não tinha esse ânimo
todo não é verdade?... ... dedicação... ... (...) amor à profissão... acho que é a mesma
coisa que dedicação (Lia)
Nesta direção, mais duas professoras afirmaram “gostar da profissão” e informaram
isto com falas do tipo “não conseguiria ser outra coisa”; “nasci para isso”. Uma delas
ressaltou que a sua experiência nesta área é de constante aprendizado.
é uma coisa que vem dentro de mim esse GOSTAR do que eu faço... entendeu?(...)
eu NÃO SEI ser outra COISA... EU... NÃO... SEI... SER... OUTRA... COISA...
MESMO... saBE? (Clara)
a experiência tem sido essa sabe? de sempre ESTAR APRENDENDO... por que o
que eu ouço o que eu falo de cabeça erguida é isso...eu ainda estou aprendendo... eu
gosto de dar aula... eu nasci pra isso....(Vanda)
Duas professoras entendiam que a profissão possibilitava-lhes mudanças e afirmavam
ter melhorado suas atitudes no decorrer dos anos.
bem eu nem sempre fui como eu sou hoje né? eu... eu... eu já fui uma professora
bastante autoritária quando eu era bem jovem (...) ao longo dos anos eu fui... --eu
sempre tento ser uma pessoa melhor né? (Sara)
então eu acho que cada ano que passa a gente vai melhorando... vai sabendo por
onde você não deve ir mais... sabe? (Marta)
Na fala da última professora deste grupo percebemos a dedicação como sinônimo de
busca. Ela declara que busca se aprimorar por ser responsável e respeitar o aluno. Na
verdade, quer se livrar da profissão, pois a sua área é música. Sente-se uma profissional
jogada no Estado.
81
sempre buscando então SEMPRE crescendo... amadurecendo pra trabalhar (...) eu
sempre quis sair nunca pude sair... porque eu acho que a minha área é música a
minha área é outra eu não nasci para ficar/ a minha a letra dança na lousa sabe? é
uma letra de médico então eu faço caligrafia eu quase ME MATO pra me aprimorar
neste quadro... então eu tenho MUITO respeito pelo meu aluno eu acho que eu sou
MUITO responsável mais isso essa coisa de dar aula ela me traz insegurança ela
me traz angústia me traz muito sofrimento por que eu quero me LIvrar disso... isso
uma coisa particular minha de um profissional que está JOGAdo no Estado sabe lá
quanto tem disso... (Nívea)
4.2.1.2.2. A diversidade da experiência em sala de aula
Nesta categoria, 9 (nove) professoras mencionaram, a partir de suas diversas
experiências de ensino, a preferência pelo trabalho com crianças e adolescentes e/ou jovens e
adultos. Duas professoras deste grupo citam as suas experiências de trabalho com 1ª a 4ª série
(Ensino Fundamental). Uma delas salientou que é muito difícil permanecer com a mesma
série de um ano para outro.
trabalhei com todas as séries da primeira até a quarta... difícil pegar de um ano
pro outro pegar a mesma série... (Mara)
comecei como ACT né? a gente começa que nem os outros professores que tem aí
ACT depois tem concurso passei fui pra São Paulo e voltei (...) dois anos ((como
professora de 1
ª
série))... mas já dei aula pra primeira série outros anos... (Lane)
Mais duas professoras de 1ª a 4ª série (Ensino Fundamental), destacaram a
importância que tem para elas o trabalho com o aluno em sala, preferindo-o a cargos
administrativos.
tá dentro da sala de aula pra mim é fundamental... eu já tive oportunidade de
prestar concurso de supervisão de direção mas eu não fui por que a minha vida é a
sala de aula é o contato com o aluno... então eu escolhi essa profissão realizando
um sonho mesmo (Ilda)
então esse ano eu vim pra terceira série (...) parece que eu acabo me satisfazendo
em estar com a criança... com o aluno de perto... então eu voltei pra sala de aula...
((antes estava como supervisora)) então eu pensei em pegar primeira segunda série
mas eu não consegui na atribuição pegar... escola de primeira e de segunda era
muito retirada... longe... (Marta)
Outra professora afirmou que ama o trabalho com alunos de pré-escola (atual
Educação Infantil) como também o trabalho com adolescentes (Ensino Fundamental – 5ª a 8ª
série) pela possibilidade de aprender com as experiências deles.
82
(...) por que eu sempre gostei de lidar com crianças... trabalhei na pré escola dois
anos... amava o que eu fazia... amava... adorava trabalhar com aqueles alunos de
quatro cinco até seis anos... me dava bem com eles... como eu gosto também de
trabalhar até a faixa etária... gosto muito de trabalhar que eu já lecionei de quinta a
oitava que eu gosto de mexer nessa faixa de adolescente... de ter convivência com
eles... de ter a experiência que eles tem... de aprender com eles... por que você
aprende muito com eles... (Néia)
Na fala a seguir, a professora mencionou a sua dificuldade em trabalhar com alunos de
5ª a 8ª série do Ensino Fundamental e a facilidade e preferência pelo trabalho com alunos do
colegial (Ensino Médio).
eu tenho problemas às vezes igual eu te falei com criança por que eles misturam as
coisas... às vezes eles acham que esta abertura que eu dou é pra fazer bagunça... aí
eu tenho que retroceder... então isso é uma faca de dois gumes e funciona muito no
colegial... o colegial é um sucesso... você... você... abre espaço... isso funciona que é
uma beleza... o retorno é muito bom... com crianças o retorno não é tão bom... então
de quinta a oitava eu tenho problema (Sara)
A fala da professora seguinte evidencia a sua experiência com alunos do colegial
(Ensino Médio), primeiro grau (Ensino Fundamental) e Supletivo (E.J.A.), destacando que
gosta mais de trabalhar com os alunos deste último (E.J.A).
logo de cara eu peguei todos os terceiros colegiais... tanto de Português como de
Inglês (...) quando eu peguei o terceiro colegial nenhum professor gostava dessa
sala... eu acho que por isso que eu só peguei o terceiro colegial... não tive nenhum
problema com esse alunos... desenvolvi um trabalho ótimo com eles... inclusive
produção de texto... trabalhei muito com/ pra Vestibular... fui atrás da UNICAMP,
VUNESP, UFSCAR... inclusive eu sou fiscal deles hoje (...) ... logo de início era com
o segundo grau depois eu comecei a dar aula pro primeiro grau... que era no
período da tarde também nessa escola (...) e o Supletivo também é uma das salas
que eu mais gosto de trabalhar (Ana)
Mais uma professora também deu um destaque especial à experiência de ensino com
adultos considerando-a gratificante.
a maior parte da minha experiência profissional... é... foi feita com adultos... na
alfabetização de adultos... por que eu trabalhei no Centro de Educação Supletiva
por dez anos... trabalhei também na Prefeitura com alfabetização de adultos e no
Senac... com o programa do Instituto Paulo Freire... e pra mim isso aí foi uma
realização muito grande pra mim por que trabalhar com adulto analfabeto é assim
uma experiência muito mais gratificante do que trabalhar com... com criança... eu
acho que o adulto é assim ele necessita e valoriza muito mais... (Bete
)
A última professora deste grupo revela a sua frustração com os seus alunos jovens (5ª
a 8ª série do Ensino Fundamental) chegando a irritar-se pela falta de entendimento, da parte
deles, da importância de um professor.
83
alguma vezes a gente tem algumas frustrações em determinadas aulas... em
determinados momentos com aquela atitude de alguns jovens que podem te irritar...
aquela falta assim de entendimento da parte deles da importância de um
profissional... de um professor ali na frente... então algumas vezes realmente a gente
se frustra né?... acha que não consegui transmitir o que você queria o objetivo não
foi é... não foi atingido... só que eu sempre saio quando acontece alguma coisa
desse tipo (Rute)
4.2.1.2.3. A diversidade da experiência com cargos administrativos
Temos nesta categoria 7 (sete) professoras que se referiram a cargos administrativos
em suas experiências profissionais, seja por desejá-los, por repudiá-los ou por já terem
trabalhado nestes cargos anteriormente.
Três professoras deste grupo, já trabalharam em cargos administrativos e, no momento
da pesquisa, estavam em sala de aula. Uma das professoras percebeu, na experiência
administrativa, a possibilidade de ajudar a escola e o professor. Outra delas descobriu, a
partir desta experiência, que queria ser professora.
eu também estive na direção ((de escola)) ... (Lane)
eu tava na coordenação o ano passado... então a gente tando na coordenação você
começa a ver um outro tipo de trabalho e vê a escola no geral... o problema do
aluno no geral... então você quer passar toda aquela experiência pra ajudar a
escola a caminhar... ajudar o professor... então é uma experiência nova... já fui num
outro ano também... há 8 anos atrás também já fui coordenadora e voltei o ano
passado... (Marta)
... e por aqui também já fui coordenadora... fui um ano coordenadora (...) porque eu
tinha feito uma opção para trabalhar no administrativo então eu fui secretária de
escola... então... não achava que era bom ser professora... aí... de repente assim...
eu vi que não era aquilo que eu queria... quero ser professora realmente... prestei
concurso passei e fui... (Mara)
Já outras 4 (quatro) professoras declararam não ter ambições administrativas e nem
pretensão a outro cargo a não ser o de professora, pois gostavam de dar aulas.
eu gosto de dar aula... eu nunca pretendi ser diretora de escola... algum cargo além
de ser professora... gosto de dar aula... nunca eu... eu estudei... eu acabei uma
faculdade agora o ano passado... mas eu não pretendo ser mais do que professora...
mais assim no sentido de ser diretora... coordenadora... ... eu gosto de dar aula...
(Vanda)
é como eu te falei... eu tenho assim uma característica que eu acho dentro da
profissão... eu nunca tive ambições administrativas... você entendeu? nunca... eu
sempre... eu acho... que o meu estar na profissão é com a criança... é estar com
aluno... eu não me vejo por exemplo na parte administrativa nunca... eu nunca me
vi... (Clara)
84
depois eu fiz o curso na Faculdade de Pedagogia né?... não com o intuito de ter a
direção... a supervisão de escola... não... (Ilda)
então eu acho que eu prefiro trabalhar mesmo com a criança do que com os
adultos... então... não tenho planos assim pra uma administração... uma
coordenação...
(Mila)
4.2.1.2.4. A diversidade da experiência e o constante aprendizado
Nesta categoria 6 (seis) professoras falaram de sua experiência profissional como
fonte de constante aprendizado, seja por meio do relacionamento com os alunos, seja por
meio de estudos ou mesmo pela diversidade das escolas pelas quais passaram.
Das 6 (seis) professoras, 3 (três) ressaltaram o aprendizado a partir de trocas
enriquecedoras com os alunos nas experiências de sala de aula.
agora... as experiências em sala de aula essas sempre me acrescentam alguma
coisa... por que eu tô pra ensinar e tô também pra aprender... eu costumo dizer que
eu ensino e que eu aprendo... né? então eu ensino passando os conteúdos... vendo
como o aluno tá acompanhando como ele tá aprendendo... e eu aprendo na hora
que o aluno me ensina alguma coisa não é aquela coisa aí só por que eu sou
formada que eu não sou capaz de aprender com uma criança... por que criança ela
ensina muito a gente né? (Ilda)
então eu acho que eu consigo muito muito... muito mesmo assim com essa mudança
de atitude que eu tive em relação às crianças aos adolescentes eu acho que eu
consegui muito mais... então eu me sinto muiTÍssimo realizada no aspecto de que eu
consigo mostrar isso pra eles... (Sara)
é... como eu te falei... qualquer campo profissional você tem o pró e o contra mas no
meu modo de ver minhas experiências são sempre gratificantes (...) em TOdas as
profissões a gente experimenta frustrações... mas eu acho que a maioria das minhas
experiências são gratificantes... mesmo que as trocas não sejam sempre cem por
cento... né?... são enriquecedoras... (Clara)
Uma outra professora deste grupo considerava sua experiência profissional
maravilhosa por ter feito muitos cursos e conseguido aplicá-los com os alunos.
eu tenho sorte por que todo o curso que eu fiz mais tem me ajudado assim cem por
cento na escola (...) então tudo o que eu aprendi nesses vinte e um anos foi através
de cursos e que tem me ajudado muito nas escolas... tudo o que eu aprendi em
cursos eu apliquei pros meus alunos (...) a experiência profissional que se a gente
não tivesse esses cursos não teria essa experiência maravilhosa... maravilhosa...
muito maravilhosa MESMO... (Taís).
85
Havia neste grupo uma professora que, apesar dos 23 anos de experiência, estava
recém formada em Pedagogia. Ela afirmava estar sempre inovando, aprendendo e via na
experiência de sala de aula, uma fonte de realização pessoal.
eu gosto de dar aula... então pra mim... depois de 23 anos dando aula e gostando ...
é uma realização pessoal né? então eu fico feliz (...) eu tenho aprendido (...) todo o
ano eu estou inovando... estou mudando... agora que eu acabei a faculdade...
(Vanda)
A última professora deste grupo passou por diferentes escolas, por ser A.C.T., e
procurou aproveitar essa diversidade de experiências considerando-as bem válidas.
a gente tá sempre passando por escolas diferentes... vendo... pessoas diferentes...
costumes diferentes... então a gente procura... ver as coisas boas ... aproveitar... e
as ruins... não cometer o erro... então a gente está sempre observando... tá sempre
olhando por onde passamos e... eu acho que é bem válido... (Mila)
4.2.1.2.a. Síntese das categorias do tema: “Minhas Experiências Profissionais"
Pudemos perceber, neste conjunto de categorias, que todas as professoras participantes
da pesquisa estavam há mais de uma década atuando na Educação, sendo que 7 (sete) das 15
(quinze) entrevistadas atuavam há mais de 20 (vinte) anos e 3 (três) estavam para se
aposentar.
Um grupo de 7 (sete) professoras destacou a importância de dedicação ao ensino
como sinônimo de amor, forma de respeitar o aluno e fazer jus à escolha da carreira, que se
manifestou em expressões como “busca por aprimoramento”, “gostar da profissão”, “não
saber fazer outra coisa”, “nascer para isso”.
A maioria das professoras (nove) mencionou, a partir de suas diversas experiências de
ensino, a preferência pelo trabalho com crianças e adolescentes e/ou jovens e adultos,
destacando a constante mudança de série de um ano para outro e a importância de estar em
sala de aula, em contato direto com o aluno. As professoras, que trabalham ou já trabalharam
com a educação e/ou alfabetização de jovens e adultos, exaltam esta experiência em
detrimento das outras. Uma única professora deste grupo denuncia a falta de respeito dos
86
alunos e assume irritar-se com tal atitude. Sai da sala de aula nessas ocasiões, para evitar um
confronto.
Em relação aos cargos administrativos, 7 (sete) professoras se referiram a eles em
suas experiências profissionais. Desse grupo, 3 (três) professoras já trabalharam na direção
ou supervisão escolar e, umas dessas professoras, vislumbrou com esta experiência a
possibilidade de ajudar a escola e o professor em sua prática. Outra deste grupo descobriu
que gostaria de ser professora a partir de sua experiência com os cargos administrativos.
Outras 4 (quatro), afirmaram categoricamente não desejar estes cargos, já que têm a certeza
absoluta de que gostam de dar aulas.
As diversas experiências profissionais foram entendidas por 6 (seis) professoras como
forma de constante aprendizado e realização pessoal por serem bem válidas e
enriquecedoras.
4.2.1.3. A Escola onde Trabalho
Neste tema, a escola apareceu na fala das professoras como um bom lugar para se
trabalhar, porém inspiradora de sentimentos antagônicos. Possui poucos recursos financeiros,
está bem localizada, com boa clientela de alunos e com bons funcionários. Também surgiu
neste tema referência ao relacionamento dos professores entre si e as atitudes da direção da
escola, dos funcionários e dos alunos para com os professores. Apresentamos a seguir, o
Quadro 4 com as categorias que surgiram neste tema e as comentamos, logo após, com
exemplos retirados da própria fala das participantes da pesquisa.
Categorias de Opiniões Acerca do Local de Trabalho Profissionais
4.2.1.3.1. Escola boa, bem localizada, com bons funcionários, boa
clientela e bons relacionamentos
Lane, Bete, Mara, Ilda, Lia, Clara,
Vanda, Nívea, Rute (9)
4.2.1.3.2. Escola grande e sem recursos Vanda, Marta, Néia, Sara (4)
4.2.1.3.3.Professores sem união, ética e coleguismo Taís, Mila, Néia (3)
4.2.1.3.4. Professores desrespeitados na escola Mila, Ana (2)
Quadro 4. Síntese do Tema: “A Escola onde Trabalho”
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4.2.1.3.1. Escola boa, bem localizada, com bons funcionários, boa clientela e bons
relacionamentos
Surgiu na fala de 9 (nove) professoras pelo menos uma das referências acima sobre a
escola.
Apenas uma professora disse achar tudo "ótimo", desde a localização da escola até o
atendimento dos funcionários, contemplando em sua fala todos os itens desta categoria.
a escola ela... ela... ela é boa certo? (...) os alunos tem gente que fica reclamando
dos alunos por aí... não... a gente recebe alunos bons... tem alunos que têm
dificuldades mas recebemos uma clientela boa... bairro... a escola está localizada
num bairro bom... não está muito afastado nem muito longe é um bairro bom
adequado... as pessoas que... os funcionários são ótimos funcionários o que a gente
precisa da escola os funcionários vem na porta... quando a gente precisa eles
atendem a gente pelo menos no meu caso... e nunca deixaram que... / os inspetores a
secretaria a direção tudo os próprios colegas os nossos professores eles são ótimos
viu? (Lane)
Sua percepção do corpo docente e discente foi endossada por mais 4 (quatro) colegas e
uma das professoras falou dos bons relacionamentos usando os termos integração, amizade,
cumplicidade e troca.
(...) esta integração é importantíssima... tanto no relacionamento que a gente tem
com direção com os colegas e com os alunos também... eu acho que a gente tem que
ter assim um estreitamento muito grande de amiZADE de cumpliCIDADE.. de...
TROca... (Bete)
(...). eu gosto de trabalhar... gosto de dar aula... gosto das minhas colegas... então
me sinto bem no meio delas sou uma pessoa que me comunico bem... brinco
bastante... tal... eu gosto deste ambiente de trabalho... (Mara).
eu cheguei e encontrei amigos que me acolheram... a diretora eu já conhecia...
antes de vir pra cá por que eu já trabalhei com ela em outra escola... então eu fui
assim MUITO bem recebida... né? por todos os professores.,.(...) me dou bem com
todo mundo... não sou uma pessoa que tem atrito com outras pessoas não sou
assim... e SEMPRE fui muito valorizada... como pessoa e como profissional aqui
dentro... eu falo que eu tô num paraíso eu gosto muito daqui. (Ilda)
(...) gosto de todo o corpo docente do pessoal todo dos alunos... nunca tive
problema tal... então assim eu sou apaixonada pela escola (...) é amor antigo eu fui
muito bem recebida aqui sabe... são todas... mas essa daqui foi mais... muitas
pessoas falam da escola mas eu adoro aqui é questão mesmo de um relacionamento
eu acho (...) e eu pretendo aposentar aqui nessa escola sabe? gostaria... se der certo
eu vou aposentar aqui... (Lia)
88
Se esta última professora (Lia) se declarou apaixonada pela escola, a fala da
professora a seguir revela que considerou o seu compromisso com esta instituição como um
casamento, pois ama a escola e se sente parte dela.
eu estou aqui há dezessete anos (...) então a gente passa assim a fazer um
casamento mesmo com a escola né? (...) é uma escolha minha estar aqui por que
eu me sinto COMPROMETIDA com a escola (...) eu acho que eu faço parte do
patrimônio histórico da escola entendeu? (...) então eu sou meio suspeita... pra falar
da escola onde eu trabalho por que faz parte já da minha vida... né? ... se confunde
com a minha história... (...) eu me sinto responsável por ela... você entendeu? (...)
sempre dei a cara a bater... depois eu refletia e falava... por que né? por que eu faço
isso?... agora eu estou pensando eu acho que é por que eu amo a escola... acho que
eu gosto da escola... dezessete anos... a história dela se confunde com a minha vida
né?... com a minha história né?... (Clara)
Na fala a seguir a professora elogiou a direção da escola por propiciar liberdade de
trabalho para os professores, motivo pelo qual ela permaneceu na escola.
eu fico aqui por que eu tenho liberdade e eu acho que isso é importante (...) eu
trabalho direitinho do jeito que eu acho melhor... o método que eu quero... então
ISSO é muito importante... por que o professor tem que se sentir livre pra trabalhar
da maneira como ele acha melhor... por que ele que conhece a classe... então ele
sabe como ele vai trabalhar... então essa parte eu acho ótima (...) as diretoras que
passaram por aqui... a diretora é ótima... eu gosto muito dela... (Vanda)
Outra professora também colocou que a direção da escola é boa e os professores, por
mais incompetentes que se sintam, são unidos.
(...) muita amizade... as pessoas se gostam na escola agora sabe? têm os blocos lá...
mas você chega você chega cantarolando você é dona da sua escola por mais
incompetente que a gente se sente dentro de muita coisa a gente se gosta a gente se
une... é uma turma boa... uma direção boa... não tenho uma reclamação esse ano...
eu tô feliz... uma professora feliz que são melhorias... (Nívea)
Na fala da última professora deste grupo, apareceu o carinho pela instituição como um
todo e a escola, em seu ponto de vista, como transformadora de vidas.
(...) você sente carinho pelo todo... como uma escola pode transformar vidas... como
é você pode ter esse contato com os alunos de uma maneira mais -- aquele aluno
mais quieto... aquele aluno mais agitado... como você pode transmitir carinho...
quantas vezes você sente percebe a carência... então isso é um contato que professor
aluno tem que muitas vezes nem em casa os pais conseguem ter né? não sei né? hoje
em dia assim essa famílias estão meio conturbadas e a gente consegue ter uma
relação de carinho com esses aluno né? (Rute)
89
4.2.1.3.2. Escola grande e sem recursos
Nesta categoria, 4 (quatro) professoras consideraram a estrutura física da escola
grande, o que possibilitava o atendimento de uma ampla clientela. Porém, faltavam
investimentos para que se tivessem mais recursos e se aprimorasse o ensino. O uso do espaço
por alunos de diferentes faixas etárias foi considerado problemático por uma professora que
não conseguia manter a organização de sua sala de aula.
é uma escola problemática... ela é muito grande tem de primeira a Supletivo...
então... essa relação de crianças pequenas com as crianças grandes... causa
problema na sala de aula que não é bem arrumada e eu sou bem organizada... (...)
material que a gente não tem... falta de dinheiro (...) então tudo isso prejudica o
trabalho da gente... mas eu continuo aqui e vou ficando até me aposentar ((risos))
(Vanda)
Apesar de possuir uma boa estrutura o espaço físico da escola não é adequado para
atender as necessidades de professores e alunos, como denunciam as falas a seguir.
(...) .quando eu vim pra essa escola... eu já prestei atenção na estrutura dela (...)
ela é uma escola que além de atender as crianças de primeira a quarta atende as
de quinta a oitava (...) é uma estrutura BOA... né? mas ainda não deu pra adequar
as necessidades nossas... ás crianças que a gente tem e ao que precisa trabalhar...
então a gente não tem uma sala de vídeo... a gente não tem uma quadra específica...
um local coberto... né...
(Marta)
eu trabalho numa escola grande... já trabalhei em VÁrias escolas... estou
acostumada a ter entretenimento... ter diálogo... ter acesso a muitos materiais...
aqui eu não tenho...tá?... (Néia)
Na fala a seguir, a professora mencionou a sua dificuldade em trabalhar com alunos de
5ª a 8ª série do Ensino Fundamental e a facilidade e preferência pelo trabalho com alunos do
colegial (Ensino Médio).
eu tenho problemas às vezes igual eu te falei com criança por que eles misturam as
coisas...às vezes eles acham que esta abertura que eu dou é pra fazer bagunça...aí
eu tenho que retroceder...então isso é uma faca de dois gumes e funciona muito no
colegial...o colegial é um sucesso...você...você... abre espaço...isso funciona que é
uma beleza...o retorno é muito bom...com crianças o retorno não é tão bom ...então
de quinta a oitava eu tenho problema (Sara)
90
4.2.1.3.3. Professores sem união, ética e coleguismo
A dificuldade no trabalho devido a falta de união, de coleguismo e de ética é
mencionada por 3 (três) professoras. Isto impossibilita a troca de experiências ficando cada
um por si, como evidenciam as falas a seguir.
eu acho que falta muita união nessa escola... (...) .eu sou de Educação Artística PEB
II... trabalho com PEB I... então há uma distância entra a gente... sempre houve... e
agora com a gente trabalhando com a classe é pior ainda... eu acho assim que tem
classe que o professor é a classe dele... ele não divide com ninguém... que é dele...
as crianças são dele... e a gente às vezes tá ali...você se sente às vezes uma intrusa
ali... tá? (...) nós somos educadoras... não importa o grau que você está... nossa
função e objetivo é um só (...) o coleguismo... olha como que é difícil... eles têm
muita panelinha... sabe? eles são individualistas... é... eu acho que não é só aqui
né? mas como eu trabalho aqui eu tô falando daqui... (Taís)
sabe... por mais que se fale assim... nessa profissão nossa de educação
principalmente na rede estadual... ela... falta muita ética profissional... (...) a gente
tem que acabar engolindo e procurando não fazer igual... (...) (Mila)
eu me sinto aqui assim... cada professor pra si e Deus pra todos... num tem aquela
troca de experiência... aquilo 'ó hoje eu vou dar tal matéria... você preparou alguma
coisa? eu preparei isso' e trocar... não... cada um dá a sua aula... você não sabe se
o professor tá equivalente na matéria do mês... dentro do bimestre ou do semestre...
e vai assim por diante... cada um pra si e Deus pra todos... acho muito difícil
trabalhar assim... (Néia)
4.2.1.3.5.
Professores desrespeitados na escola
Duas professoras denunciaram que a escola tem muitas falhas e em vários setores.
Sentiam-se desrespeitadas pela direção da escola, funcionários e alunos.
tem falha na secretaria... falha na diretoria... tem falha com os professores... sabe?
mas é o que eu digo... às vezes você não concorda com aquilo que o colega está
dizendo... mas é preferível você aceitar aquilo... aceitar e... por que senão a coisa
vira uma guerra do tamanho de um bonde... sabe então? para que não haja a
inimizade... para que não fiquem te olhando torto... você tem que... balancear a
coisa... de vez em quando você dá uma opinião (...) mas... começou muito conflito eu
já... eu pelo menos já não... eu prefiro assim viver bem com todo mundo... tratar
bem respeitar... respeitar a maneira de ser... mas a escola estadual tem muito isso...
apesar de tudo isso é um ambiente bom... ainda existem escolas que tem um
ambiente mais carregado... (Mila)
a respeito da direção da escola, às vezes deixa a desejar, né?... devido a
legislação... que nós temos... às vezes você leva um determinado problema pra/
direção da escola... que é uma coisa grave e você vê que a pessoa tipo assim... acha
que você ta aliiiiii... você ta dentro da sala de aula você tem que resolver (...) é o
91
primeiro ano que eu estou sentindo UMA GRANDE dificuldade mesmo...
começando pela direção... né? e às vezes você se sente até mal de pedir um apoio
por que são coisas graves... e a respeito de funcionários que tipo assim... o
professor ele é tratado como um qualquer dentro da escola... às vezes... o aluno tem
mais direito do que o próprio professor... o aluno não sabe os deveres dele... só
sabe os direitos... e às vezes o próprio funcionário da escola... vamos supor... da
secretaria chama a atenção de professor... às vezes o inspetor... chama a atenção...
na frente de um aluno... então eu acho que tem uma hierarquia aí muita errada...
cada um eu acho que tem que tomar conta do seu devido lugar... né ... (Ana)
4.2.1.3.a. Síntese das categorias do tema: “A Escola onde trabalho”
Pudemos perceber, no conjunto de categorias apresentadas, que a escola foi
considerada, pela maioria das professoras 9 (nove), como um bom lugar para se trabalhar, no
qual há a possibilidade de integração e bons relacionamentos tanto com a direção como com
funcionários, colegas e alunos. Porém, para outras 3 (três) professoras este era um local onde
imperava a falta de coleguismo, união e ética nos relacionamentos profissionais. Uma destas
professoras também afirmou que havia falhas em vários setores e falta de respeito nos
relacionamentos, o que também apareceu na fala de mais duas colegas. Três professoras
ressaltaram que, apesar da escola ter uma boa estrutura física, faltavam recursos para adequar
o espaço e atender melhor aos alunos. Uma outra professora via a escola como uma
instituição desorganizada e sem objetivos.
Um exemplo disto é a professora que falou dos bons relacionamentos usando os
termos "integração" "amizade", "cumplicidade" e "troca" e concluiu que "é isto que nos faz
sentir bem". Outra professora colocou que por mais incompetentes que se sintam, são unidos
e está feliz nesta escola. Houve ainda, duas professoras apaixonadas pela instituição, sendo
que uma delas afirmou que tem para com a escola, um compromisso como o de casamento e,
apesar das dificuldades vividas, não desejava o divórcio. Uma outra professora ressaltou a
instituição como um todo como transformadora de vidas.
92
Percebeu-se, neste tema, uma descrição um tanto que idealizada do ambiente de
trabalho. Talvez isto tenha se dado pelo fato deste ser o primeiro tema escolhido para ser
tratado pela maioria das professoras, na primeira sessão, na qual ainda não se tinha um
vínculo estabelecido com a pesquisadora para expor os possíveis problemas da instituição. A
escola é considerada um bom lugar em comparação com outras do ensino público que estão
em piores condições de administração.
4.2.1.4. Meus planos profissionais
Ao tratar deste tema, as professoras falaram de seus planos profissionais, relacionados
à aposentadoria e seus planos pessoais, fora da carreira. O quadro 5, a seguir ilustra as
categorias que surgiram neste tema e as falas das professoras as confirmam e elucidam.
Categorias de Planos Profissionais Profissionais
4.2.1.4.1. Planos para depois da aposentadoria que se referem
ao ensino
Mara, Nívea (2)
4.2.1.4.2. Planos para depois da aposentadoria que se referem à
outra área.
Mara, Nívea, Lia, Bete (4)
4.2.1.4.3. Planos não relacionados a aposentadoria Rute, Marta, Mila, Ana, Vanda, Clara,
Lane, Sara, Taís, Ilda, Néia (11)
Quadro 5 - Síntese do Tema: “Meus Planos Profissionais”
4.2.1.4.1. Planos para depois da aposentadoria que se referem ao ensino
Duas professoras fazem planos referentes ao ensino para depois da aposentadoria.
Interessante observar que, na época da pesquisa, ambas já estavam bem próximas de se
aposentar. Uma delas afirmava que como adorava dar aulas, gostaria de continuar ainda que
como voluntária, talvez numa creche. Queria evitar ficar em casa sofrendo a perda do
trabalho. Destacou a importância de aposentar-se para ceder seu lugar a outra pessoa.
93
(...) ... quero servir esse período que eu ficar porque eu também tenho que dar
oportunidade para outros também que vem vindo (...) então... é trabalhar... ajudar
alguém (...) trabalhar de voluntária em alguma creche em algum lugar que precisar
eu... vou trabalhar... quero continuar dando minhas aulas... não quero parar...
quero alfabetizar porque eu ADORO alfabetizar... (...) então de voluntária é um
tempo menor então para não sofrer muito e também pra continuar pra não ficar
muito em casa sofrendo a perda do serviço (Mara)
A outra professora passou num concurso para lecionar em escolas da Prefeitura e
disse que só o fará pelo dinheiro. Confessa que gostaria muito de se afastar de escola para
verificar se de fato gosta deste ambiente, um teste apenas, mas que sempre teve a curiosidade
de fazê-lo.
... depois da minha aposentadoria eu passei em segundo lugar na prefeitura não sei
se pro meu azar ou sorte esse pessoal do mestrado me deu uma passada na frente e
a prefeitura tá aí pra me chamar sabe? eu tô feliz pelo trabalho pelo dinheiro não
pela escola em si porque eu queria fazer outra coisa sim eu sinto essa necessidade
de mudar para ver se eu gosto de escola ou não eu queria esse teste sabe? isso
sempre passou pela minha cabeça e viver como sempre a gente já vive né? eu acho
que eu aprendi a viver no meu dia-a-dia feliz e... eu passeio vou à shows tenho
meus valores né? então eu tô bem... (Nívea)
4.2.1.4.2. Planos para depois da aposentadoria que se referem à outra área:
Quatro professoras comentaram sobre os seus planos pós-aposentadoria.
Uma delas deseja voltar a estudar para realizar um sonho antigo: o de cursar
Psicologia e Psicopedagogia. Mas, ressalta que é apenas por satisfação pessoal e não para
trabalhar.
(...) começar a estudar de novo prestar o vestibular quem sabe... espero que sim
porque eu tenho MUITA.... muita vontade... é o meu sonho (....) então eu tenho
MUITA vontade... tenho vontade de estudar... então eu gosto me interesso por tudo
que é de psicologia... me interesso e era a minha vontade... de ser Psicopedagogia
né?... não tinha o sonho de abrir um consultório não era isso que eu queria que eu
tinha... meu sonho era mais humilde ainda era mais restrito eu pensava ah eu vou
fazer isso depois mesmo... então mais pra ajudar realmente... para satisfazer o meu
ego ((ri)) (Mara)
Outra professora também relatou desejar, ao aposentar-se, realizar a sua grande
frustração: estudar acordeão.
olha eu... eu... que-ro ten-tar realizar a minha grande frustração porque eu vou
estudar música... eu sou apaixonada por música (...) eu tocava violão eu tocava
acordeão eu tocava flauta eu toquei piano mais tudo assim nunca deu... eu nunca
tive chance de desenvolver... então agora eu vou mesmo não vai ser recente ainda
não porque isso daqui depende do financeiro e quando eu pegar vai ser pra valer
(Nívea)
94
A professora seguinte demonstrou o desejo de, após aposentar-se, trabalhar como
voluntária numa associação que cuida de pessoas com câncer.
plano profissional é aposentar e se amanhã ou depois tiver condições voltar a
trabalhar... é... num digo na mesma área de escola... mas assim de trabalho
voluntário... ajudar as pessoas que necessitam... (...) é uma associação de pessoas
com câncer né? (...) tem muita criança também...muita criança... eu já dou uma
ajuda assim há algum tempo por mês né? você adota uma pessoa entendeu? então
você ajuda conforme você pode... é dinheiro... é... mercadorias... assim o que você
puder... (Lia)
A última professora deste grupo sonha em ter mais tempo, após a aposentadoria, para
dedicar-se à leitura e aos estudos.
é... no final da carreira a gente já... assim não tem tantos planos como a gente tinha
quando começou... mas eu acho que... o pouco que estou aqui eu tenho que dar
continuidade para esses planos... não tenho que... por que eu vou aposentar daqui
um ano dois anos eu não tenho que... parar aqui... então eu acho que... até depois
de aposentada também eu não tenho que parar... não é por que eu cumpri o meu
tempo de serviço que eu vou estagnar... (...) olha... é... eu trabalho no estado e na
Prefeitura... então é muito corrido... a gente não tem assim um tempo pra ler mais...
pra estudar mais... então é gozado ((ri)) que eu queria ter esse tempo trabalhando
mas a gente não consegue... tudo né? mas é isso aí ((risadas)) mas é ter um tempo
pra gente... ( Bete)
4.2.1.4.3. Planos de carreira não relacionados à aposentadoria
Todas as professoras desta categoria (onze) declararam o desejo de continuar
investindo na carreira profissional do Magistério. Oito destas ressaltaram o desejo de estudar
para se aperfeiçoarem em suas áreas de atuação, como exemplificam as falas a seguir.
trazer novos conhecimentos... aperfeiçoar tudo que você vai em busca de curso de
aperfeiçoamento... eu faço curso de aperfeiçoamento... eu acho que isso é muito
importante essa reciclagem né? que a gente tem (...) aperfeiçoar pra dar aulas mais
bem elaboradas ter um tempo maior pra isso e ter um bom relacionamento com todo
mundo dentro de uma escola e todo lugar que eu for trabalhar... em todos os
lugares né? ter um bom relacionamento... (Rute)
nos meus planos profissionais é sempre de crescer na educação de querer tá
fazendo o melhor possível... profissionalmente você quer tá procurando um emprego
melhor tá num grau de estudo melhor... (Marta)
meus planos profissionais é me atualizar cada vez mais para não ficar pra trás
né?... então as propostas que vão surgindo... procurar estudar essa propostas... me
atualizar... procurar pôr em prática pra não ficar na defasagem... e com isso
melhorar cada vez mais por que a minha intenção é... ser professora por que eu
gosto muito de lidar com a criança... (Mila)
95
eu tenho paciência... eu gosto do que eu faço... eu gosto de trabalhar com o
público... com o aluno... então é por isso que eu invisto em minha carreira... então
eu to sempre fazendo aperfeiçoamento... sempre estou fazendo cursos... todos os
cursos que aparece... sempre que eu tenho oportunidade de fazer.... principalmente
se for em período de férias ou eu tento arrumar um período pra fazer esse curso
MESMO sendo de sábado eu faço...pra sempre tá me aperfeiçoando... e tentar
melhorar né? pra conseguir entender o próprio aluno né? (Ana)
bom... meus planos profissionais... eu pretendo continuar estudando... né? agora em
agosto já começa a fazer uma espécie de Mestrado... né? a gente não sabe direito
ainda.... mas eu vou... já fui consultada... né? vou continuar com a UNESP... eu
quero fazer isso daí... e quantos cursos vierem eu quero fazer... não quero parar de
estudar não... é... eu gostaria muito de aperfeiçoar o meu trabalho com a primeira
série... daqui pra frente eu gostaria de pegar só primeira... se for possível... e
aperfeiçoando... trabalhando... trabalhando pra ver o que de melhor eu posso fazer
pra eles né? eu gostaria de continuar com a primeira série... (Vanda)
... os meus planos profissionais estão sempre ligados a área pedagógica... eu acho
assim que eu careço... estou carecendo de aperfeiçoamento... de fazer novos
cursos... eu acho que eu preciso me organizar pra fazer uma Psicopedagogia... ou
uma pós... um aperfeiçoamento... na área da educação... (...) meus planos são
ligados a sala de aula... a ensinar... ou ao aprender... não sei... (Clara)
meus planos pro futuro né? assim vamos supor assim os alunos vou dedicar o
máximo com os meus alunos no futuro entendeu? cada ano que passa eles serem
melhor do que os que eu estou recebendo (...) ... continuar estudando eu quero ver
se pro ano que vem eu faço pós graduação... depois mestrado e depois doutorado...
continuar estudando... esses são meus planos profissionais tá? (Lane)
o que eu tinha colocado pra você é fazer a pós graduação... isso eu não descartei
(Sara)
Outra professora fazia planos de passar num concurso para ser efetivada e, também,
levar seus alunos a conhecerem o que a cidade oferece em termos culturais.
meus planos... passar no concurso (...) atingir meus objetivos levando o meu aluno a
conhecer um pouco do que tem de bom em nossa cidade... é... tem alunos... que ele
pode por exemplo visitar o Museu do Café... tem criança que nem sabe o que é isso
o que tem lá dentro (...) eu acho que esse é um ponto principal da criança conhecer
um pouco o que tem na nossa cidade... e outro é realmente conhecer o Teatro Dom
Pedro e... assistir a Orquestra Sinfônica lá que eu tenho a maior paixão... esses são
meus dois objetivos principais... meus planos que eu espero conseguir... (Taís)
Duas últimas professoras deste grupo desejavam continuar o trabalho com alunos,
sendo que, uma delas almejava se aposentar nesta profissão.
me aposentar nessa profissão por que eu espero nunca ter que abandonar isso
aqui... que é... o magistério como eu te falei é a minha vida... eu fora da sala de
aula... me falta o ar... eu costumo dizer isso... (Ilda)
... eu gosto de fazer... lidar com o aluno e tô no dia a dia por enquanto... não tenho
planos futuros não... por enquanto ainda não... (Néia)
A fala a seguir revela o desejo da professora de ter mais tempo para a família e para o
preparo das aulas.
96
sabe aquele negócio que fala assim trabalhar menos ter mais tempo pra ficar em
casa... pra família tá?... eu acho que a gente trabalha demais... então eu queria um
tempo e um espaço maior né? pra poder ficar mais perto dos meus filhos... não
trabalhar tanto... mas quando trabalhar é... esse tempo que você dedicar a
trabalhar você ter um tempo assim pra preparar melhor as aulas né? então ter um
tempo maior... a única maneira de dividir esse tempo é diminuir o número de
aulas... ganhar bem.
... ganhar bem diminuir o número de aulas par poder ficar mais tempo com os
filhos mas também ter esse tempo disponível pra você preparar melhor o que você
vai passar (Rute)
4.2.1.4.a. Síntese das categorias do tema: “Meus Planos Profissionais”
Nesta classe de categorias, pudemos perceber que estava nos planos da maioria das
professoras, continuar trabalhando. Mesmo aquelas que estavam prestes a se aposentar
desejavam continuar a trabalhar, ainda que como voluntárias.
A maioria das professoras também desejava continuar os estudos como forma de
aprimoramento, sendo que, uma delas reconhecia que isto deveria acontecer ainda enquanto
lecionam, mas não há tempo.
Há ainda, um grupo de professoras que desejam realizar sonhos e planos do início da
carreira como, por exemplo, ter aulas de música, fazer faculdade de Psicologia. Outras
desejavam realizar o que não conseguiram enquanto professoras, como por exemplo, ter mais
tempo para cuidar de si mesmas e investir mais tempo em leituras.
4.2.2. O Aluno
Na 2
a
sessão da entrevista, as professoras falaram sobre seus alunos. Trouxeram à tona
suas representações sobre o aluno ideal e as suas dificuldades para lidar com o aluno que tem
problemas de aprendizagem. Discorreram sobre os alunos de suas turmas e o aluno de hoje
em comparação com o de antigamente, do início de suas carreiras, como veremos a seguir.
97
4.2.2.1. O Bom Aluno
Encontramos, após a análise de conteúdo das falas das professoras, “o bom aluno"
como aquele que apresenta bons atributos pessoais e familiares, possui bons relacionamentos,
é tudo o que o professor e o grupo desejam, mas nem sempre corresponde ao rótulo de bom.
Apresentamos a seguir, o Quadro 6 com as cinco categorias encontradas, sendo que a
primeira delas é uma composição das várias representações manifestas no discurso das
professoras. Após a apresentação sintética, ampliamos as categorias com comentários e
recortes das falas que as exemplificam e as elucidam.
Categorias de representações do “bom aluno” Profissionais
4.2.2.1.1. O bom aluno é: “limpinho, arrumadinho, esforçado,
inteligente, estudioso, atencioso, responsável,
organizado, disciplinado, participativo, questionador,
observador, criterioso, com boa memória, interessado,
interessante, quietinho, prestativo, dedicado, otimista,
acredita em si mesmo, tem opinião própria”.
Mara, Lane, Lia, Nívea, Ilda, Rute, Taís,
Ana, Sara, Néia, Marta, Vanda, Bete,
Mila (14)
4.2.2.1.2. O bom aluno “tem suporte familiar”. Rute, Néia, Marta, Mara, Lane, Bete (6)
4.2.2.1.3. O bom aluno “é tudo o que o professor e o grupo
desejam”.
Taís, Nívea, Lia, Ilda (4)
4.2.2.1.4. O bom aluno “tem bons colegas e um bom
relacionamento com todas as pessoas”.
Lia, Lane (2)
4.2.2.1.5. O bom aluno nem sempre corresponde ao rótulo. Rute, Vanda, Sara, Mara, Clara (5)
Quadro 6 - Síntese do Tema: “O bom aluno”
4.2.2.1.1. O bom aluno é: “limpinho, arrumadinho, esforçado, inteligente, estudioso,
atencioso, responsável, organizado, disciplinado, participativo, questionador,
observador, criterioso, com boa memória, interessado, interessante, quietinho,
prestativo, dedicado, otimista, acredita em si mesmo, tem opinião própria”.
As características enumeradas acima marcaram, pelo menos uma delas, os discursos
de catorze das quinze professoras quando falaram sobre o "bom aluno".
98
Aparece na fala de uma professora, junto com os adjetivos atencioso e estudioso, a
questão da aparência física como um fator que dará ao aluno o adjetivo de bom. Ela afirma
que o aluno bem cuidado, bem arrumado vai se destacar entre os demais.
o aluno bem cuidADO vai se destacar ou a criança que está mais bem arrumada
vai se destACAR do outro que está mal arrumado né? então se tem que fazer
alguma coisa quem é que é eleito? aquele que está todo arrumadinho e nem sempre
às vezes é o melhor para fazer as coisas... tá?(...) eu acredito mais assim no aluno...
no aluno estudiOSO... no aluno atenciOSO... o aluno bem cuidADO... (Mara)
Outra professora também se refere à limpeza e ao cuidado com os materiais escolares
como características do “bom aluno”:
a carteira limpinha... o caderno... tem uns cadernos ótimo (...) não faz num (...) o
caderno dele... até o comportamento dele... a lição tudo tudo tudo... a carteira dele
é ótimo fica bom em tudo... (Lane)
Mais duas professoras mencionam a questão da atenção, junto com a participação em
sala de aula, como qualidades do bom aluno.
(...) aquele aluno atencioso... dedicado... estudioso né?... presta atenção na matéria
que você está dando... o aluno que faz pergunta que participa da aula... eu acho que
o bom aluno é isso... né? (Lia)
aquele que participa que é atento... (Nívea)
Uma terceira professora entende que a participação do aluno em aula, lendo,
interpretando e expressando a sua própria opinião a partir do que guardou de informações, é
importante em sua formação como cidadão.
só que o bom aluno pra mim é aquele que ele lê e interpreta e tem a sua opinião
pessoal (...) participa da aula... mesmo com a dificuldade... por que você vai
sanando as dificuldades... principalmente aquele que expressa as suas opiniões
pessoais... por que aí eu vou ver que eu estou formando um cidadão... e não um
simples... um simples... como que eu vou falar... ... um simples... copista um aluno
copista que só repete aquilo que você fala (...) então é um aluno que tem muita
informação... e é um aluno que ele adquire a informação e guarda... ele armazena...
então ESSE é o BOM aluno... né? ... que ele guardou... que ele manteve aquela
informação... (Ilda)
Outras sete professoras consideram que o “bom aluno” é interessado e interessante,
vem pra escola com o intuito de aprender, portanto, apresenta resultados e acaba
enriquecendo a aula por que cobra do professor. Seu interesse pelos estudos o torna
responsável, prestativo, observador, criterioso, concentrado, aplicado, organizado,
99
disciplinado, questionador, participativo e uma pessoa inteligente por que pensa no futuro. A
última professora deste grupo, destaca que este aluno interessado caminha sozinho e tem o
professor apenas como mediador de sua aprendizagem
eu considero bom aluno aquele aluno que ele é responsável em primeiro lugar... ele
tem um... ele tem aquele interesse... pelo menos procura entender o que está sendo
colocado... ele é responsável com as atividades... ele é responsável com as tarefas
(...) o bom aluno é aquele que é aplicado... ele vem interessado... (Rute)
(...) o bom aluno ele é TUDO... ele é interessante e ele CHAma a atenção também
da classe... não é só o mal aluno que chama a atenção... o bom aluno também
chama. (Taís)
você vê que o aluno vem pra sala de aula com o intuito de aprender... vem com o
material tudo organizado... então a hora que o professor entra na sala de aula ele
já começa a tirar o material e já começa a abrir pra mostrar as tarefas... não
precisa nem perguntar... é um aluno que já é disciplinado... já é organizado (...) e
ele é muito questionador... você explica... e eu pergunto assim 'tem alguma dúvida?'
ele levanta a mão e fala 'ó... eu não entendi aquilo ali... pode explicar novamente?'
(...) e eu gosto de trabalhar com sala assim... eles podem até conversar... mas desde
que participe (...) então pra mim esse é o bom aluno... (Ana)
(...) o bom aluno é aquele que depois que você dá a sua aula você vê o resultado... e
qual é este aluno que apresenta resultado? é o aluno que tem interesse (...) primeiro
ele se interessa pela aula né? e... o disciplinado que eu coloquei aqui não é aquele
cara que fica parado na carteira mas aquele que sabe falar e ouvir na hora certa...
né? aquele que você consegue fazer ele participar sem atrapalhar a sala... aquele
que quando não entende pergunta... te dá oportunidade de você enriquecer a sua
aula... vai tá colocando coisas que às vezes passou desapercebido e que é do
interesse deles né... é... ele é participante... ele faz e ele te cobra também (...) ele
chega e começa a te cobrar então você acaba você vai enriquecendo a sua aula
por causa do bom aluno... (Sara)
interessado é aquele aluno que vem com o compromisso (...) por que esse é o aluno
inteligente... se ele chegou em casa e a mãe cobrou... ele não entendeu ele vem no
outro dia me procurar... então ele é inteligente... por que ele sabe que o futuro dele
tá lá adiante... se ele não tiver o estudo hoje... nem pra ser um lixeiro ele vai ter...
por que até a quarta. ele tem que ter... se ele não tiver a inteligência e o interesse
de aprender... num concurso por que tem que ter concurso ele não vai entrar...
entendeu? (Néia)
é prestativo demais... quer sempre prestar um serviço ajudar um colega que não
sabe... ajudar a professora... (...) é observador demais... observa tudo... é
criterioso... ele se concentra com mais facilidade... por que ele é interessado...
(Marta)
o bom aluno pra mim é aquele que questiona né? (...) então quando eles colocam
uma coisa pra mim que eu não havia pensado... eu acho que eles estão evoluindo...
tá indo além do que eu estou mostrando né... então... pra mim... o bom aluno é esse
questionador... (...) eu coloquei aqui 'caminha sozinho' não sozinho... sozinho... ele
precisa claro do professor por que o professor é o mediador ali da aprendizagem
dele... mas o professor é o MEDIADOR... ele não necessita do professor do lado
dele o tempo inteiro... o professor dá um incentivo e ele vai... ele caminha...
(Vanda)
100
Uma professora descreve esse bom aluno como um otimista e que acredita em si.
o bom ((aluno)) acredita nele... sabe que ele é capaz que ele pode que ele consegue
então (...) ele é um otimista... ele consegue ele pode ter inúmeras dificuldades que
ele corre atrás pra conseguir porque ele sabe que uma hora ele vai conseguir...
(Bete).
A fala de uma outra professora caracteriza “o bom aluno” como o quietinho, mas no
sentido daquele aluno calado, que não dá trabalho e acaba se prejudicando, pois tem
dificuldades específicas e acaba não sendo percebido em sala de aula.
(...) tem também aquele bom o bom que é quietinho... que é um coitado né? que não
faz nada que não sabe escreVER você não chega nem até a carteira dele porque não
dá tempo e quando você olha lá o cara tem – (...) -- vamos imaginar descobri que
tem um bonzinho quietinho que não sabe nem escrever ficou lá morto ... quietinho...
nulo né? você tem milhares desses... às vezes aluno que você precisava ter olhado
ele né? (Nívea)
Por último, destacamos a fala de uma professora que compartilha das representações
das demais colegas e deixa subentendido que o “bom aluno” estuda por satisfação, mas
raramente se depara com esse tipo de aluno, o que a faz considerar que não existe o aluno de
seus sonhos.
não existe o aluno de meus sonhos (...) então o que você pode chamar de bom
aluno?... que é coisa rara... você encontrar um que você vê que tá fazendo aquilo
por satisfação (...) é tudo por obrigação... (Mila)
4.2.2.1.2. O bom aluno tem suporte familiar
O suporte familiar aparece na fala de seis professoras como requisito importante para
que o aluno seja “bom”.
Nas três falas a seguir, as professoras destacam a cobrança dentro de casa como
motivo para que o aluno seja responsável com os estudos.
ele é responsável com as tarefas aquele aluno que dá a entender que ele tem uma
cobrança por trás dele ou muitos eu acho que é do próprio aluno né?... mas a
grande maioria eu acho que dos bons alunos vem de uma cobrança dentro de casa...
(Rute)
aquele aluno que chegou em casa... a mãe cobra matéria se não tiver no outro dia
tá aqui... 'professora por que fulano não fez?(...) hoje ele não levou matéria ele sabe
que ele chegou em casa ele não fez a matéria a mãe vai cobrar ...TIRA a televisão...
101
TIRA o vídeo game... TIRA a bola... a brincadeira na rua... mas ele tem que levar a
matéria e explicar se entendeu se não entendeu vem o bilhete no outro dia que é pra
mim explicar... então esse é que eu julgo o aluno inteligente e interessado... (Néia)
ele quer prestar contas em casa... ele é preocupado por que a mãe quer ver o
caderno... ele é preocupado por que ele tem que mostrar o caderno em dia... ele
quer as notas no caderno... ele quer as notas boas no boletim... ele cobra da
gente(...) o aluno que tem interesse já vem da família... a família cobra de lá ele já é
uma criança que tem uma boa disciplina... foi bem educado... tem uma formação
diferente... então ele quer... dá a paga pros pais diferentes... então ele passa a fazer
as coisas diferentes por que a família tá vendo... tem sempre alguém de modelo pra
ele... tem sempre alguém que ele tem que mostrar o serviço dele... porque ele sabe
que alguém tá cobrando dele... (Marta)
Em uma outra fala, é ressaltada a importância da boa alimentação e do afeto
apresentado como o beijinho de mamãe, para que a criança se destaque e seja atenciosa em
sala de aula.
(...) que se desTACA destaca porque? às vezes ele tem ajuda em casa o que não
acontece com outro... né? então ele é mais atencioso também porque ele está mais
alimentado ele saiu de casa e ele teve beijinho da mamãe ele teve uma porção de
coisas que o outro não teve ele teve café da manhã e às vezes o outro não (...)
quantas crianças que fala ‘professora eu estou com fome’ então como uma criança
dessas vai ficar ali atenciosa na lousa? né? (Mara)
Em uma outra fala, o suporte familiar aparece como a educação que vem de berço.
é ter um bom nível de educação que a gente diz seria o berço mesmo né? ele é
aquele aluno mais educado né? ele sabe o lugar mais de aluno e tem aquele respeito
pela gente... eu acho que esse é o bom aluno... (Rute)
Uma professora considera a participação familiar importante na organização dos
cadernos e aponta que os alunos são inquietos devido à falta de conforto da família, entendido
por ela como afeto e carinho.
tem uns cadernos ótimo aí... mas depende muito da família... a família que está no
meio... né?(...) são bons... não vou falar não... são bons... sabe ler sabe tudo mas
são inquietos... briga... perturba o outro... perturba o colega... (...) de manhã eles
ficam na escola e à tarde vão pra creche... então quer dizer... é o que eu estou te
falando... fica pouco tempo com a família... e às vezes vamos supor chega em casa...
a mãe chega oito... nove horas da noite... aí qual que é... o que vai dar esse conforto
pra ele... nada... então a família é muito importante hoje... (Lane)
A fala da última professora desse grupo mostra a importância da família na
transmissão de princípios e valores à criança.
(...) ele tem principalmente princípios de valores que a família dá (...) e a família
geralmente dá rumos que ele só vem completar aqui na escola (...) o que é bom (...)
ele já tem um respaldo né familiar que facilita muito pra gente... (Bete)
102
4.2.2.1.3. O bom aluno é tudo o que o professor e o grupo desejam
Quatro professoras apontam o bom aluno como aquele desejável pelo professor e pelo
grupo, pois faz tudo o que se pede como exemplificam as falas a seguir.
por que todos querem ele... no grupo 'ah tem que ser aquela menina... ah por que
ela sabe tudo...' então eu acho que o aluno bom... a gente não tem que se preocupar
com ele... por que ele já é... ele é TUDO... ele não precisa da gente... tudo o que a
gente pede ele faz... ele... eu acho que o aluno bom ele já é TUDO na classe... (Taís)
aquele bom aluno que você consegue o aprendizado total... consegue fazer tudo que
você pede (...) porque dentro de uma sala de aula de quarenta e sete a gente acha
uns quatro, cinco desses que a gente fala que são ricos né... é uma delícia você dar
aula para esse tipo de aluno ele sabe tudo ele prepara tudo... ele é tudo que você
quer que você deseja... que vai ele faz tudo que você manda... ele só tira dez...
(Nívea)
é aquele aluninho que tudo que você precisa dele... não só o professor e o aluno
bom tanto como os coleguinhas... tudo que você pede ele está pronto pra fazer
ajudar... (Lia)
o bom aluno é aquele que atende as minhas expectativas... (Ilda)
4.2.2.1.4. O bom aluno tem bons colegas e um bom relacionamento com todas as pessoas
Duas professoras apontam à questão do bom relacionamento, sendo que uma delas
destaca em sua fala que não basta ser bom aluno, é necessário se relacionar bem com as
pessoas.
o bom aluno é aquele que tem um bom relacionamento com a classe né? se
relaciona com os coleguinhas de uma maneira natural (...) um bom relacionamento
com os colegas e com o professor (...) por que eu penso assim pra você ter um bom
relacionamento com qualquer pessoa... pra você ser uma boa pessoa você tem que
ter um bom relacionamento primeiro... porque às vezes você não é uma boa aluna...
não digo assim uma excelente aluna mas você não tem um bom relacio/ você é uma
excelente aluna mas se você não tem um bom relacionamento você deixa de ser... é
ou não é verdade? (...) eu acho que faz parte não é mesmo... não é só aquele aluno
que sabe ler e escrever que é o bom aluno... sim... faz parte também mas... acho que
em primeiro lugar tem que ter um bom relacionamento com todos né?... (Lia)
o bom aluno tem bons colegas... não briga... (Lane)
103
4.2.2.1.5. O bom aluno nem sempre corresponde ao rótulo.
A fala de cinco professoras descreve o bom aluno a partir da negação, ou seja, do que
ele “não é”, numa tentativa de superar os rótulos que caracterizam o aluno “bom”. Uma delas
aponta que não basta ser inteligente, pois muitos alunos com facilidade de aprender
atrapalham a aula.
eu tenho caso de aluno que você percebe que ele tem uma facilidade de aprender
mas ele não pode ser enquadrado como bom aluno por que é aquele aluno que
atrapalha (...) ele complica a sala... a aula... ele te complica na sala de aula por que
ele... ele entende o negócio mas ele deixa... ele brinca demais e atrapalha os
outros... eu acho que o bom aluno não é aquele aluno que é inteligente... não acho
que é isso não... (Rute)
A segunda professora afirma que um caderno organizado não mostra que o aluno é
bom, portanto não se prende nisso e se preocupa com o aluno muito quieto, pois não sabe se
está aprendendo.
mas... isso um caderno organizado não mostra que o aluno é bom... e o professor se
prende muito nisso... no caderno bonitinho... e às vezes o aluno não faz ele tá só
copiando... ele só tá repetindo (..) o aluno muito quieto.. eu fico preocupada... por
que eu falo 'o que será que ele está pensando?' eu não gosto de classe quieta não...
a minha classe... nunca foi muito quieta não... eles andam bastante... eles
conversam... (Vanda)
Pensamento semelhante parece demonstrar a terceira professora quando afirma que:
o bom aluno não é aquele que fica sentado ouvindo... o bom aluno é aquele que
depois que você dá a sua aula você vê o resultado... (Sara)
A fala de uma outra professora parece ir à mesma direção do pensamento das
anteriores quando ressalta que:
todos os alunos têm o seu lado bom... né? eles tem as suas qualidades... um... é
diferente do OUTRO ... então um é bom numa coisa outro é bom em outra então eu
tava comentando agora até de um aluno que ele é super caprichoso mais na hora de
fazer os deveres ele não faz ele quer só desenhar só... ( Mara)
Por último, uma professora que, num primeiro momento, parece se aproximar das
falas das demais quando afirma que todos os alunos são bons, rompe com esta lógica ao
questionar o conceito de bom colocado pelo sistema avaliativo educacional. Compreende que
este conceito é um rótulo imposto ao qual o aluno tenta corresponder. O bom aluno então,
104
seria aquele que se supera, vai além, desafia a professora, pois não só trabalha, mas
trabalho.
eu acho que o conceito de BOM vem dessa coisa preconceituosa de você avaliar... o
ser... né?... eu acho meio preconceituoso isso né?... e é dicotômico no sentido
assim... são dois lados... o que é BOM para o sistema... o que o sistema acha que é
BOM... que atinge as metas que ele exige... e o que é BOM... pra mim professor (...)
... esse termo pra mim é complicado por que cada um é cada um (...) PARA a
sociedade o bom é o perfeito o bonito o belo e isso não existe... assim não dá pra
estabelecer esse padrão... então PRA MIM o BOM vem desse sistema de avaliação
(...) então pra mim o bom aluno é aquele que se supera... você passa a ter um
vínculo com ele e você vê ali o sujeito... o educando no caso... passa a se SUPErar...
ele passa a não querer mais ter aquele comportamento... a mudar a REFLETIR
sobre o seu comportamento... então é um bom aluno... ele é desafiador para si e
para o professor... né?... então pra mim todos têm esse bom (...) bom aluno pra mim
é aquele que é desafiador... que você acha alguma coisa nele... te dá trabalho e ele
trabalha... e não trabalha e aí ele te dá trabalho e você procura trabalho entendeu?
(...) todos são bons... e todos têm problema (...) mas você continua rotulando... o
bom... o médio e o fraco... o sistema é rotulador... (Clara)
4.2.2.1.a. Síntese das categorias do tema: “o bom aluno”
Pudemos constatar nesta classe de categorias que, para estas professoras, ser "bom
aluno" depende de bons atributos pessoais e familiares. O “bom aluno” é descrito por catorze
das quinze participantes da pesquisa com, pelo menos, vinte e dois adjetivos que o
caracterizam como tal: limpinho, arrumadinho, esforçado, inteligente, estudioso, atencioso,
responsável, organizado, disciplinado, participativo, questionador, observador, criterioso,
com boa memória, interessado, interessante, quietinho, prestativo, dedicado, otimista,
acredita em si mesmo, tem opinião própria.
O suporte familiar aparece na fala de seis professoras como requisito importante para
que o aluno seja “bom” e é representado como a cobrança dentro de casa, a boa alimentação,
o afeto, a educação que vem de berço, a transmissão de princípios e valores à criança. Este
apoio da família contribui do ponto de vista das professoras, para que o aluno se torne
responsável com os estudos e organizado com o material escolar, se destaque e seja
atencioso em sala de aula.
105
Emerge na fala de quatro professoras “o bom aluno” como aquele desejável pelo
professor e pelo grupo de colegas, pois faz tudo o que se pede.
Ter bons colegas e um bom relacionamento com as pessoas, surge na fala de duas
professoras como características importantes do bom aluno.
Cinco professoras denotam em suas falas uma tentativa de enxergar o bom aluno além
das imagens idealizadas quando afirmam que este aluno nem sempre é o quietinho,
organizado e inteligente. Consideram que todos os alunos tem o seu lado bom, o que equivale
a dizer que todos são bons a seu modo. Estas falas parecem denotar um viés da "teoria das
inteligências múltiplas". No entanto, apenas uma das cinco professoras parece conseguir
romper com a representação de aluno ideal. Esta professora questiona o conceito de bom
colocado pelo sistema avaliativo educacional, considerando-o dicotômico, preconceituoso e
rotulador. O bom aluno em sua concepção é aquele que consegue romper com o rótulo e se
superar, gerando assim, desafios para o professor.
Em nenhum momento, nesta categoria, aparece a possibilidade de que ser “bom
aluno” tenha alguma relação com a postura do professor ou com a escola. O sucesso escolar,
do ponto de vista dessas professoras, parece depender única e exclusivamente do próprio
aluno e dos recursos de seu meio familiar.
106
4.2.2.2. O aluno com dificuldade de aprendizagem
Num primeiro momento, o aluno com dificuldade de aprendizagem apareceu na fala
das professoras como o oposto do "bom aluno": “indisciplinado, insuportável, desatento, com
baixa auto-estima, preguiçoso, briguento, rebelde, desinteressado, inquieto e sem suporte
familiar”. Algumas professoras, no entanto, conseguiram identificar a necessidade de atenção
diferenciada e especializada para este aluno, como veremos a seguir, no Quadro 7:
Categorias de representações do “aluno com dificuldade de
aprendizagem.
Profissionais
4.2.2.2.1. O aluno com dificuldade de aprendizagem é:
“indisciplinado, insuportável, desatento, disperso,
preguiçoso, briguento, rebelde, desinteressado, inquieto,
lento, limitado, imaturo, tem baixa auto-estima, pouco
raciocínio e dificuldades de entrosamento com os colegas”
Rute, Sara, Lane, Lia, Mila, Ilda, Bete,
Taís, Néia (8)
4.2.2.2.2. O aluno com dificuldade de aprendizagem tem problemas
psicológicos e/ou neurológicos e necessita de
acompanhamento especializado.
Néia, Rute, Nívea, Lia, Marta , Mara,
Clara (7)
4.2.2.2.3. Ao aluno com dificuldade de aprendizagem falta suporte
familiar.
Rute, Lane, Lia, Ana, Vanda, Marta,
Sara, Clara (8)
4.2.2.2.4. Ao aluno com dificuldade de aprendizagem faltam bases
anteriores; traz consigo traumas e decepções escolares.
Bete, Rute, Lane, Lia, Ana, Mara,
Clara,Sara (8)
4.2.2.2.5. A ineficiência das estratégias das políticas vigentes para
lidar com o aluno com dificuldade de aprendizagem.
Nívea, Sara, Vanda, Mara, Ana, Clara
(6)
4.2.2.2.6. O despreparo confesso das professoras para lidar com os
alunos com dificuldade de aprendizagem.
Clara, Marta, Ana, Sara, Nívea (5)
4.2.2.2.7. As estratégias das professoras como tentativas para lidar
com o aluno com dificuldade de aprendizagem
Ilda,Marta,Taís,
Clara,Mara,Ana,Sara,Mila,
Nívea,Rute, Bete, Vanda (12)
4.2.2.2.8. As alternativas sugeridas pelas professoras para lidar com o
aluno com dificuldade de aprendizagem.
Mara, Marta, Nívea, Ana, Sara,
Marta,Clara (7)
Quadro 7- Síntese do Tema: “O aluno com dificuldade de aprendizagem”
107
4.2.2.2.1. O aluno com dificuldade de aprendizagem é: indisciplinado, insuportável,
desatento, disperso, preguiçoso, briguento, rebelde, desinteressado, inquieto, lento,
limitado, imaturo, tem baixa auto-estima, pouco raciocínio e dificuldades de
entrosamento com os colegas
Em algum momento, no relato de oito professoras, apareceu "o aluno com dificuldade
de aprendizagem" com as características acima acrescidas de alguma justificativa, como
podemos verificar abaixo.
Uma professora relacionou "dificuldade de aprendizagem" com indisciplina.
Explicou que há dois tipos de alunos indisciplinados: o que tem facilidade em
aprender e o que é “fraquinho”, ou seja, o que já vem com dificuldades dos anos anteriores.
A este último relacionou também, como conseqüência das dificuldades, a baixa auto-estima.
a maioria das vezes o aluno com dificuldades de aprendizagem está relacionado
com indisciplina também... entendeu? por que o aluno que não consegue aprender
ele quer se destacar na sala de aula de uma outra maneira... então ele causa essa
indisciplina... você pode pegar os alunos mais é... tem dois lados né? ou ele é muito
esperto ele sabe muito ele tem facilidade de aprender e atrapalha ou é aquele que
realmente não tem --tem uma formação muito fraquinha e aí que que acontece? ele
tem um jeito de se superar perante os colegas aí ele é aquele aluno indisciplinado
que está querendo sempre se mostrar e tem problema de baixa estima né? aquele
aluno que é... acha que ele não vai conseguir... (Rute)
Na fala a seguir, uma outra professora considerou que “o aluno com dificuldade de
aprendizagem” também apresenta dificuldades de entrosamento com o grupo tornando-se um
problema na classe, pois ou quer aparecer ou se anula ficando quietinho. A professora acaba
por ser grosseira e, como conseqüência, afeta a auto-estima dos alunos.
eu vejo os alunos que têm dificuldade de aprendizagem eles têm dificuldade de
entrosamento com o grupo... ou eles se tornam um grande problema para a classe
por que ele quer aparecer de outras formas já que ele não consegue aprender ou ele
se anula... então ele fica muito quietinho e ele desaparece da turma ou então... o
aluno fica perdido mas o professor fica mais ainda (...) ah outra coisa outro
problema é de auto estima... a gente acaba às vezes sendo grosseiro com eles...
(Sara)
108
Na linha de pensamento da professora anterior, apareceu também a fala da professora
de 1
ª
série alegando que o aluno que não sabe escrever atrapalha o andamento da aula por que
não fica quieto, briga e é desinteressado. Por um momento, esta professora fez um
movimento de procurar outra justificativa e apresentou o fato de que os alunos que não
fizeram pré-escola tinham mais dificuldades. Logo, voltou atrás dando um exemplo de um
aluno que fez pré-escola e se encontrava nas condições acima descritas. Então, concluiu que
"era preguiça mesmo”.
o aluno que não sabe escrever é o aluno que fica cutucando... brigando... né? ele
fica desassossegado não dá meio... ele cutuca cutuca cutuca cutuca até... ficar a
gente nervosa... e os colegas... então quer dizer (...) ele conversa... quer dizer ele
não está se interessando... não sabe nada.. (...) é onde ele conversa... ele briga... ele
não se interessa por nada... né? e tem dificuldade.. (...) fica com preguiça... ele
cutuca... ele joga lápis... vai no lixinho apontar toda hora o lápis por que? por que
ele não tem interesse... eles não tão sabendo desenvolver nada... o aluno que tem
pré... então quer dizer já ajuda a gente... ajuda o professor... ele também não tem
interesse por nada... ele vem ... já chega... já deita... acontece que eu tenho um
aluno assim que chega pega e já deita mas esse aluno tem pré é preguiça mesmo...
quer dizer ele não tem interesse... (Lane)
Mais duas professoras apontaram o desinteresse, a dispersão e a preguiça como
características do “aluno com dificuldades de aprendizagem”.
dispersos... é a falta de interesse que eles estão vindo assim tendo... essa coisa de tá
tudo pronto... você tem/não sei mistura aí a preguiça por que...você dá alguma
coisa que ele tenha que pensar descobrir eles já se negam a fazer... (Mila)
a dificuldade não é problema o desinteresse sim... (Ilda)
Uma professora reconheceu que a baixa auto-estima vinha da maneira como este
aluno fora tratado nos anos anteriores e o professor que o recebeu precisava reverter esta
situação.
nas minhas classes a gente nota que esse aluno ele vem assim com baixa auto
estima baiXÍssima ele não acredita nele não acredita que ele é capaz... ele não
acredita no potencial dele e então eu acho que cabe à gente reverter esta situação
porque sem essa cumplicidade de ele acreditar em você e você acreditar nele... eu
acho que não acontece nada se não tiver essa cumplicidade... precisa ter (...)
porque como eu leciono pra quarta série ele já veio... na primeira na segunda
joGAdo jogado jogado então quando chega na quarta ele... ele tem todas as...
convicções já que ele não é nada que ele não é capaz de nada... (Bete)
Houve aquela professora que considerava “o aluno com dificuldade de aprendizagem”
insuportável, mas procurava estratégias para ajudá-lo.
109
é daqueles assim... que você não suporta... você coloca eles pra fora e daí no outro
dia eles fazem a bagunça você fala assim 'vamos agir diferente com ele hoje?' você
vai -- igual hoje né? eu hoje não vou colocar aquele menino pra fora... eu vou
chamar ele primeiro na frente... ele vai começar a minha aula... e você sabe que deu
resultado... (Taís)
Por último, apresentamos a fala de uma professora que, num pequeno trecho de seu
discurso, descreve “o aluno com dificuldade de aprendizagem” como alguém lento, sem
capacidade de raciocinar e interpretar, imaturo e limitado.
O aluno com dificuldade de aprendizagem é aquele aluno lento... você pode chegar
sentar ao lado dele conversar explicar... não entra na cabecinha dele... ele não tem
a capacidade de raciocinar e nem interpretar e... com pouco raciocínio às vezes o
pensamento dele está imaturo e ele não consegue chegar no limite dele... (Néia)
4.2.2.2.2. O aluno com dificuldade de aprendizagem tem problemas psicológicos e/ou
neurológicos e necessita de acompanhamento especializado.
Sete professoras identificam no “aluno com dificuldade de aprendizagem” algumas
necessidades especiais que requerem um acompanhamento com profissionais como
fonoaudiólogo, psicólogo e psicopedagogo. A fala de uma professora demonstrou que as
trocas de letras apresentadas por alguns de seus alunos estavam relacionadas à dificuldade na
fala, por isso faziam acompanhamento fonoaudiológico.
a dificuldade é mais na troca de letras... nas palavras... m, p e b... às vezes é m eles
colocam n... principalmente nas sílabas complexas eles têm muitas dificuldades de
falar... esses alunos (...) inclusive fazem Fono... (Néia)
Uma das professoras destacou que havia casos em que o aluno precisava de ajuda
especializada, mas os pais não percebiam e o professor também não fazia nenhum
encaminhamento.
pode ter problemas psicológicos ter problema neurológico... então isso acontece
né?... a gente sabe que acontece... então o aluno tem esse tipo de dificuldade e... eu
acho que por ele apresentar essa dificuldade de aprender (...) é... eu acho que tem
os casos né que eu falei os pais num percebem isso... o professor não encaminha e
existe os caso de problemas neurológicos precisa de um acompanhamento né?
problemas psicológicos né? vai saber? tem tantas situações né? e se não tiver um
encaminhamento aí fica difícil pro professor por que a gente não tem formação pra
isso... né pra acompanhar casos mais específicos de algum tipo de doenças de
alguma coisa... precisa de um acompanhamento... (Rute)
110
Já uma outra professora deixou claro que, o máximo que podia fazer frente aos
problemas de aprendizagem, era falar com a coordenadora pedagógica para que esta
conversasse com a mãe do aluno e a orientasse a procurar uma psicóloga.
tem todo o tipo de problema por isso o quê que é problema de dificuldade de
aprendizagem? lá nós temos um problema neurológico... e.. é... delicado né? (...) o
quê que é uma dificuldade de aprendizagem? não saber lê... não saber escrever...
não é? por quê aquele aluno que tem um problema psíquico que tem alguma coisa o
máximo que eu posso falar é pra minha coordenadora 'olha aquele menino tem uns
problemas aí que eu não sei detectar né? mas eu desconfio né?... manda a mãe dele
vir aí... fala pra mãe levar ele na psicóloga’...
( Nívea )
Uma professora afirmou que a dificuldade de aprendizagem de seus alunos era
problema emocional. Os pais, quando chamados na escola, não compareciam e o
encaminhamento para psicóloga ainda não havia dado resultado.
tenho alguns aluninhos com muita dificuldade de aprendizagem mas é tudo
problema emocional né?... social também não sei que... muitas vezes você chama
pai e mãe e não comparece... sabe?... alguns desses aluninhos nós já encaminhamos
pra psicóloga né?... té agora a gente não viu resultado não... ainda não deu
resultado mas a gente tá fazendo de tudo é... comunicando os pais pra ver o que
podemos fazer pra ajudá-los... né? (Lia)
Outra professora entendia que, na maioria dos casos de “dificuldade de
aprendizagem”, estavam envolvidos problemas psicológicos ligados à família e que vinham
desde o ventre. Os descreveu como a insegurança passada pelos pais aos filhos devido à
estrutura econômica. Afirmou que o profissional maior para solucionar este problema seria a
própria família. Em seguida, pareceu perceber que só isto não seria suficiente e mencionou
que um psicólogo na escola poderia ajudar muito.
na maioria dos casos (...) são fatores psicológicos... está envolvendo o afetivo (...)
está envolvendo o fator psicológico e ele está muito ligado à família... sabe?...
aquela criança que desde o ventre foi mal gerada... foi gerada já com problema
sabe?... passou para o filho... acho que vai ficando... sabe?... os pais já passam para
o filho esta insegurança... já vem com esta insegurança de casa por estrutura
familiar que não tem... estrutura econômica... que não tem... geralmente... as
crianças que sobram para nós com esta defasagem de aprendizagem são essas (...)
tem outras que já nascem talvez com um probleminha mesmo de QI... que a gente
sabe que tem na nossa escola... que a criança no caso já é especial... (...) então ela
precisa de um profissional para estar ajudando... precisa da família que o
profissional maior seria a família... (...) tanto que a gente sabe que se o psicólogo
estivesse na escola faria muito... (Marta)
111
A professora a seguir, ressaltou tanto a importância de um trabalho diferenciado com
as crianças que têm dificuldades, quanto à importância de se conversar com as famílias para
que participem deste tipo de encaminhamento, pois as crianças que tiveram acompanhamento
mudaram realmente.
(...) que precisa trabalhar diferenciado... ah... haveria a necessidade eu acho que
com essas crianças haveria necessidade de uma psicóloga ou psicopedagogos na
escola pra trabalhar mais de perto com essas crianças porque todas as crianças que
têm dificuldades também têm problemas têm um/está trazendo aqueles problemas
para escola então precisa trabalhar com eles tem que chamar a família conversar
porque aqueles que estão com acompanhaMENTO você vê que eles estão
melhorando... agora aqueles que não têm acompanhamento é muito difícil MESMO
você trabalhar com eles (...) todas as crianças que têm acompanhamento eles
mudaram REALMENTE... (Mara)
A última professora deste grupo reconheceu a necessidade de um acompanhamento
com profissionais especializados, pois o aluno não acompanhado está na contravenção das
regras correndo sérios riscos de cair na marginalização social.
... então... o que a escola teria que ter? (...) aquela criança que não aprende ela
exige o cuidado de OUTROS profissionais... (Clara)
eu... pra mim... o investimento seria paramentar a escola de profissionais... eu vou
te fazer uma pergunta ‘você conhece a psicóloga que dá assistência no Estado ?...
não existe... se for lá na Delegacia e falar ‘ó eu queria conversar com a psicóloga
da rede estadual... não existe... aí eles contratam psicóloga lá na FEBEM... mas só
que educar a trajetória do menino com dificuldades de aprendizagem começa na
escola... e muitas/ não que todas às vezes... mas algumas vezes vai parar na
marginalidade... olha se ele não aprende e não é aproveitado de outras maneiras...
o que ele vai fazer? Ele está na contravenção da regra... não é?... então não adianta
querer que... o professor pode resolver... não estou dizendo que NÂO podemos... eu
acho que a gente pode e deve... só que muitas vezes você esgota TODOS os seus
recursos... aí você chega na coordenadora e fala ‘olha eu gostaria... eu acho... que
precisaria ser avaliado... pra eu saber como que eu posso trabalhar com ele’...
‘ah... manda não sei pra onde... não pra onde...’ e o menino passa os quatro
primeiros anos na escola e nunca foi avaliado... você entendeu?... (Clara)
4.2.2.2.3. Ao aluno com dificuldade de aprendizagem falta suporte familiar
Na fala de 8 (oito) professoras apareceu “o aluno com dificuldade de aprendizagem”
como aquele sem suporte familiar. Três professoras denunciaram a falta de acompanhamento,
interesse, ajuda e incentivo da família.
112
eu acredito que esse aluno com dificuldade de aprendizagem (...) ... faltou também o
acompanhamento dele pela família né? por que não observaram essa dificuldade...
ou não encaminharam pra tentar resolver ... (Rute)
se a família ajudasse ia bem mas têm família que não ajuda chega tudo pela
escola... né? então quer dizer a gente desdobra mas o serviço e... ele vai ficando um
pouco pra trás... né? (...) tudo isso que eu tô te falando é a família... né? tem que
trazer de casa as boas qualidades por que aí ajuda a gente na sala de aula (...) tem
família que ajuda mas tem família que não se interessa por nada... joga aqui na
escola e a gente que tem que fazer a parte dela... tá?... é isso aí... (Lane)
por que esses aluninhos na época assim de reunião que se chama aquele dia que
todos os pais devem comparecer na escola esses pais nunca comparecem... então
você tem que fazer uma notificação à parte pra que eles venham até a escola... são
alunos que você faz um trabalho -- eu fiz um trabalho diferenciado... mesmo assim
eles têm muita dificuldade por que eles não têm o incentivo em casa sabe?... então
são alunos que eu coloquei no reforço... só que até agora não tive resultado ainda
desses aluninhos sabe?... (Lia)
Uma outra professora afirmou que a mãe do “aluno com dificuldade de aprendizagem”
só ia à escola para reclamar, mas não procurava meios de ajudar o filho.
por que ele não sabe... e a mãe muito menos... ou se não a mãe só vem aqui e
reclama... ponto final e não tenta solucionar o problema... se ela vê que na escola
não está resolvendo muda de escola se não resolver PAGA uma pessoa ou ela
mesmo estuda com o filho... se ela não tem estudo o que ela tem que fazer? paga
uma pessoa uma estagiária alguma coisa que não seja muito caro ou pede uma
indicação entendeu? por que tem lugar que não precisa pagar e que ensina...
voluntários... pra ajudar o aluno... só que não... deixa... por quê? pra não dá
trabalho... (Ana)
Na fala de duas professoras apareceram as questões dos pais separados e da família
desajustada como causadores do problema de aprendizagem.
a DIFIculdade de APRENDIZAGEM mesmo eu vejo assim... que a família...
geralmente... ele tem problemas familiares... assim pais separados... família
desajustada e isso contribui por que ele fica... eu acho que ele fica meio perdido
né... o pai brigando com a mãe... a mãe separada... em casa não tem incentivo de
nada... a criança vem pra escola meio jogada... a família não cuida... quando chega
em casa não incentiva a criança a estudar não tem um ambiente bom em casa...
então isso reflete na escola também... (Vanda)
É claro, a criança vem de casa já com sua aprendizagem comprometida, né?...
aquele que é problema para nós... já trás de casa uma gama de problemas que a
gente já vê no início... sabe?... acho que até o professor que está no prezinho já
percebe.. problemas de separação de pais... vai comprometendo a criança...
(Marta)
A fala a seguir demonstra que a professora acreditava que o fato da família do aluno
não valorizar a escola o afetava em sua aprendizagem.
113
eu acho que as famílias também não estão valorizando a escola e não estão
conseguindo colocar isso pras crianças... que o que ela não aprender aqui -- que ele
é o traba/ que o trabalho dele é estudar né? e se ele não tiver responsabilidade
depois ele vai ter problema no futuro (Sara)
A última professora deste grupo declarou que, nem a família e nem a escola
conseguiam resolver o problema do aluno com dificuldade, pois este é um problema social.
NEM família... por que falam ‘ah... chama a família... a família leva... a gente
encaminha...’ a família não leva... não toma providência e NEM A escola... então é
um problema social... isso aqui é um problema social... sempre vai existir... ele é um
coitado... (Clara)
4.2.2.2.4. Ao aluno com dificuldade de aprendizagem faltam bases anteriores; traz consigo
traumas e decepções escolares.
O aluno com dificuldade de aprendizagem apareceu na fala de 8 (oito) professoras
como sem bases anteriores, pois vem jogado de um ano para outro, com má formação por
serem largados num canto, sem a atenção devida às suas demandas. As duas professoras a
seguir afirmaram que é difícil reverter esta situação e a tendência é a de que o aluno fique
desatento e vá piorando.
... por que como eu leciono pra quarta série ele já veio... na primeira na segunda
joGAdo jogado jogado então quando chega na quarta ele... ele tem todas as...
convicções já... que ele não é nada que ele não é capaz de nada... então pra gente
reverter isso é difícil... (Bete)
... eu acho que o aluno com dificuldade de aprendizagem... nós temos aquele caso
dos alunos é... que eles vêm com uma base fraca... então ele teve uma má formação
mesmo... então faz com que esse aluno fique desatento e aí e vai só piorando (...)
(Rute)
As falas das 3 (três) professoras abaixo denunciam a dificuldade já na alfabetização e
que vai se arrastando pelos anos seguintes. A professora de 1
ª
série considerava a pré-escola
como a base para um bom aprendizado.
ele é... às vezes o aluno com dificuldade é que ele não vem... vem sem pré... que nem
eu tenho aluno que não tem pré... então tá/tô/tem/eu tô tendo dificuldade... quer
dizer o aluno que tem pré facilita ajuda... né... ajuda... pra mim tanto faz como ter
pré ou não ter... mas assim tem aluno que tem pré que já vai na frente... outros que
não tem pré a gente precisa pegar na mão... precisa pegar... dar mais atenção... né?
(Lane)
114
é um trabalho assim... alfabetização... esse trabalho que eu faço não é o conteúdo
da terceira série... sabe? é a parte que eu faço é alfabetização que eles não estão
alfabetizados... então o trabalho diferenciado que eu faço é esse né?... trabalho
diferente da classe (...) por que tem que trabalhar por que amanhã ou depois chega
na quarta série... se o professor não tiver consciência de fazer um trabalho
separado vai tocando e este aluno vai seguindo pra outra série sem saber nada
entendeu? então eu tô tentando alfabetizá-los... (Lia)
olha... aquele aluno mal alfabetizado é aquele aluno que vem de 1a da quarta
série... que automaticamente o governo... não quer que retenha o aluno por que dá
custo (...) por que hoje eu tenho aluno na oitava série que não sabe escrever e que
não sabe ler (...) ele tem dezessete anos... (...) por que esse aluno vai pra quinta
série aí que enrola... vai embolando... vai enrolando aí que fica difícil pra esse
aluno aprender por que já vai ficar com vergonha por que ele vai tá um pouquinho
mais velho... e... se ele se manifestar ele vai ser motivo de chacota dentro da sala
então como é que ele fica? quietinho... fica na dele e vai passando com a barriga...
aí quando chega na oitava série ele não quer saber mais de estudar... dá dor de
cabeça dá dor de barriga dá de tudo por quê? por que ele não sabe... (Ana)
Uma professora deixou implícito que acolhia este aluno permitindo-lhe que fizesse
perguntas sem ter medo.
(...) e ele pode perguntar sem ter medo porque eles já trazem muitos traumas ...
muitas decepções às vezes muito são largados num canto (...) (Mara)
As falas das duas últimas professoras desse grupo revelam que o problema da
defasagem acompanha estes alunos até o colegial, pois as medidas tomadas são paliativas.
(...) haja visto que hoje em dia você vê... chega uma avalanche de meninos que não
aprenderam... lá no colegial e não aprenderam... mas por quê?... todas as medidas
que são tomadas nesse sentido são paliativas... por que ninguém quer... investir
né?... por que se você for investir... é complicado... então esse menino é aquele
assim que pedagogicamente ele não corresponde... e por outro lado não é
trabalhado e nem aproveitado de outras formas... (Clara)
o aluno fica perdido mas o professor fica mais ainda... quando ele chega é... por
que quando ele chega na quinta série e ele tem defasagem muito grande... (...)
quando você pega lá no colegial a pessoa já está com uma defasagem muito grande
e você não consegue repor... (Sara)
4.2.2.2.5. A ineficiência das estratégias das políticas vigentes para lidar com o aluno com
dificuldades de aprendizagem
Um grupo de 6 (seis) professoras afirmou que as estratégias adotadas para lidar com as
dificuldades de aprendizagem, decorrentes das políticas educacionais vigentes, são ineficazes.
115
Duas destas declararam, veementemente, que a recuperação de conteúdos e as aulas
de reforço propostas pelo Estado, são uma farsa.
dificuldade de aprendizagem é muito complicado que tipo que é... e na minha
matéria que vai mal? que jeito que você pensa que eu vou recuperar um aluno que
não entendeu nada da minha matéria que faltou que tava doente? eu tenho que
tocar o bonde pra frente minha filha... eu não vou dar aula de novo pra aquele
MOLEque por que com Quarenta e sete JAMAIS então a recuperação ela é
MENTIrosa... ela sempre foi mentirosa (...) a escola pública ela não resolve os
problemas de dificuldades mesmo como a Prefeitura tem essas salas e no Estado
eles continuam por aí... não tem sala... quem vai resolver este problema? (Nívea)
essa aula de reforço que existe na escola não funciona... é uma farsa uma
ENGANAÇÃO... eu não mando aluno pra reforço... eu acho um ABSURDO...
ninguém pode ficar cinco horas na escola e depois ficar mais uma pra ter reforço...
outra coisa este aluno precisa de uma atenção especial e não de uma enganação...
(Sara)
Outras duas professoras também consideraram que a aulas de reforço e de
recuperação não resolviam as dificuldades do aluno, pois ele é deixado de lado. Uma delas
acreditava que, para que essas medidas se tornassem eficazes, o aluno deveria ter
acompanhamento individual, em paralelo.
mas é... eu acho que aqui... a escola não tem oferecido muita coisa pra essas
crianças com dificuldades de aprendizagem... há uma falta de incentivo da escola...
'ah aquele lá não aprende'... já deixa ele de lado... então quer dizer o próprio
professor... a própria escola... vai deixando o aluno de lado... então a escola se
prepara não tão bem... mas se prepara um pouco... pros alunos que vão aprender...
agora o aluno que não vai aprender a escola não oferece nada... por mais que se
fale que tem aula de recuperação... aula de reforço... aula disso e daquilo outro....
nada disso tem resolvido o problema da dificuldade de aprendizagem.... por que o
aluno ficar uma hora a mais aqui na escola não resolve nada se ele não tem um
material... se ele não tem um professor que entenda a dificuldade dele... (...)
(Vanda)
(...) então acho essa aprendizagem continuada tudo muito bom porque de primeiro
a criança ficava parada na primeira série... hoje em dia não... vai embora... vai
andando... vai caminhando mais só se não tiver acompanhamento não viram
nada... acho que precisava de acompanhamento para produzir porque precisa ser
trabalhada essas crianças... (Mara)
A fala da próxima professora denuncia a aprovação automática como a lei do mínimo
esforço para o aluno e de interesse do governo, por que quanto mais burro melhor.
(...) então acho que se o governo se preocupasse um pouquinho mais... esquecesse
esse negócio de aprovação automática... o aluno ele teria mais interesse... ele se
esforçaria... pra aprender... como ele já sabe que tá assim bem aberto pra
sociedade que ele não quer/ quanto mais burro pra ele melhor... e uma... menos
gasto pro governo pra ele poder desviar pra outros setores... (Ana)
116
A última professora deste grupo, afirmou que não existe um projeto sério para atender
ao aluno com dificuldade de aprendizagem. Declarou que era completamente contra a sala de
reforço e que estas medidas são paliativas, pois não resolvem o problema.
... normalmente esse aluno vai ter sempre problema... por que não tem... não existe
um PROjeto sério... ‘olha professores... vamos sentar... professores’... por que
todos os projetos criados pros alunos com dificuldades vem lá da Secretaria
pronto... essa sala de reforço? eu sou completamente contra... eu acho um
ABSURDO você pegar uma criança das sete ao meio–dia... ela ficou com o
professor... daí ela sai e fica do meio–dia à uma sem comer... sem nada... num
reforço... você acha que isso rende frutos?... no MEU entenDER... é o menino com
dificuldades que foi jogado aqui numa medida paliativa pro governo falar na
televisão que ele tem o projeto de reforço... que todas as crianças freqüentam o
projeto de reforço... mas não resolve... por que teria que ter um projeto SÉRIO...
esse aluno com dificuldade de aprendizagem... ele tem outros fatores que criam essa
dificuldade... (...) (Clara)
4.2.2.2.6. O despreparo confesso das professoras para lidar com os alunos com dificuldades
de aprendizagem
Das 15 (quinze) professoras entrevistadas, 5 (cinco) reconheceram que se encontravam
despreparadas para lidar com as diferentes dificuldades de aprendizagem. Uma delas afirmou
que o aluno que apresentava tais dificuldades era um desafio, pois extrapolava o saber do
professor que, às vezes, por ignorância, acabava rotulando-o. Sem orientação ou ajuda,
considerava que a sua tentativa de ajudar o aluno era como um pinguinho de água num
incêndio da floresta.
... sozinha... até onde eu sei ajudá-lo? então é um desafio pra o professor... por que
às vezes a gente até acaba... rotulando ou ‘ai não vai aprender... não sabe... ’por
ignorância... pela própria ignorância do professor (...) o que eu faço por ele?...
quem me orienta?... o que ele tem e de onde eu posso partir para ajudá-lo? (...) aí
entra aquilo que extrapola o seu saber profissional... eu não posso falar todo às
vezes que alguém peça ‘ah faça um relatório do aluno’ eu acho super complicado...
eu posso falar pra você assim ‘olha ele não sabe fazer o a-e-i-o-u’ em termos bem/
‘ele não sabe escrever o nome dele’... mas eu não posso dizer ‘ah ele tem
problema’... quem sou eu? (...) então o que foi o meu trabalho com aquele aluno?...
foi um pingo... num incêndio da floresta... é um pinguinho de água... (Clara)
117
Outra professora percebia as dificuldades dos alunos, tinha visão dos problemas, mas
confessou que lavava as mãos, pois com o monte de alunos na sala de aula e sem um
profissional auxiliando-a, seria impossível resolvê-los.
é impossível o professor falar que não vê... porque a gente vê como um espelho
aonde está as causas, só que a gente não consegue detectar aquele mal para ajudar
a trabalhar em cima...(...) mas nós temos este monte de alunos na sala de aula... um
monte de problemas para resolver... como que nós podemos fazer um trabalho
sabendo, mais específico... nós não damos conta. eu, como professora, lavo minhas
mãos... eu faço o que está no meu alcance... eu vejo, posso estar vendo de perto,
tenho visão, mas tem coisa que não está no nosso alcance... poderia se resolver
problemas, muito mais... poderiam se resolver situações... mas alguém estar
ajudando... a gente não tem este profissional ajudando desta forma... (Marta)
A fala da professora seguinte corrobora a afirmação anterior quando declara que o
professor dá mais atenção para os que sabem e deixa de lado os alunos com dificuldades.
... aquele aluno que vem com dificuldade tem professor que não tem a paciência de
perder com aquele aluno... então o que que ele faz? ele dá mais atenção pra aqueles
que sabem e os que não sabem ele deixa de lado (Ana)
As duas últimas falas vêm de encontro às duas falas anteriores (Ana, Marta). Nelas, as
professoras das disciplinas de Português e Ciências, afirmaram que não poderiam parar a
aula para dar uma atenção especial ao aluno com dificuldade de aprendizagem. A professora
de Ciências afirmou que, em sua aula, não há momento nenhum para discutir as dificuldades
e não dá pra repetir toda a matéria, pois como professora PII, escorrega de uma classe para
outra tão rápido que parece água.
... a gente não sabe como resolver a nossa -- você vai dar aula de Português pra ele
por exemplo que é a minha área... às vezes ele tem problema tão grave lá da frente
que eu não sei o que fazer por que eu não posso parar é... a minha aula toda pra
ficar pra dar uma atenção especial pra ele... daí... sabe assim? então é muito
complicado... (Sara)
você precisava também depois separar na tua pesquisa o PI... o professor PI do
professor P II por que nós vazamos de... eu falo vazar um termo que a gente
escorrega de uma classe pra outra tão rápido parece água... vai daí a pouco já
sumiu de novo então... pra mim esse aluno que tem essa dificuldade de
aprendizagem se é que eu notei tá? se é que eu notei ele continua com ela (...) eu
não dou conta disso não... de jeito nenhum (...) na minha sala não tem momento
neNHUM pra discutir as dificuldades de Ciências não dá pra repetir toda a matéria
(...) como é que você vai avaliar esse aluno?... ah fazendo de conta... eu faço de
conta... eu não dou... a classe é de quarenta e sete... uma classe extremamente
pesada... e... como é que eu vou dar aula... atenção só pra ele... (Nívea)
118
4.2.2.2.7. As estratégias das professoras como tentativas para lidar com o aluno com
dificuldade de aprendizagem
Do grupo das (15) professoras participantes da pesquisa, 12 (doze) revelaram buscar
novos meios para auxiliar o aluno com dificuldade de aprendizagem. Suas estratégias vão
desde o visto no caderno até a busca por metodologias diferenciadas, conforme demonstram
as falas a seguir.
Duas professoras afirmaram a importância de se experimentar novos métodos de
ensino para atrair a atenção do aluno e despertar o seu interesse para aula. Ambas citaram as
estratégias que utilizavam como tentativas para auxiliar na aprendizagem. Uma das
professoras garantiu que, se o aluno não tiver uma dificuldade mais específica, como um
distúrbio mental, ele terá o interesse despertado e a dificuldade vai acabar. A outra faz uso
também desses recursos quando está muito ansiosa e sem forças para lidar com a situação.
... então o aluno com dificuldade eu vou ter que fazer... eu vou ter que arrumar
METOdologias diferentes pra sanar essa dificuldade desse aluno... a primeira coisa
que eu tenho que fazer é trazer ele pra dentro da sala... pro convívio da sala... se
interessar pela escola... se interessar por aquilo que eu tô passando... a partir do
momento que eu chego... que eu desperto o interesso dele... a maior parte das
dificuldades que tava lá... aluno com dificuldade... vai... vai... acabar... entendeu?
(...) se não deu certo de uma forma você vai de outra... você usa outros livros...
outros tipos de textos... se não gosta de texto você parte pra poesia... você parte
para música... que aí você vai despertando o interesse dele (...) a não ser que...
como eu falei seria aquele aluno que tem um... um... não sei nem como eu vou
falar... um distúrbio mental... ou alguma coisa do tipo que aí esse aluno vai ter a
dificuldade... vai ter o limite dele pra tudo né? ... agora a dificuldade em si que a
gente ‘nossa aquele aluno tem uma dificuldade tremenda’ você tem que despertar o
interesse dele... falei?... (Ilda)
... então o que fazer pra levar o aluno a concentrar?... então aí é que tá a nossa
didática... a gente vai criar dinâmicas diferentes... novas estratégias... aula bem
descontraída...né? mecanismos que vai ajudar a criança a se concentrar... e a
gente percebe que mesmo a gente criando esses momentos bons... prazerosos pra
criança... você percebe que ainda fica muito aluno sem concentração (...) mas a
gente encontra mecanismos de ajudar sempre (...) então você tem que mudar...
brinco um pouco... descontraio... ‘vamos cantar uma música... quem vai cantar uma
música lá na frente’ pra quebrar entendeu? quebrando aquele clima... senão você
passa a aula inteira brigando... eu percebo que o dia que eu não estou bem assim eu
não estou bem em casa... com problema... que eu venho e encontro um clima assim
que eu estou sem forças pra lidar com a situação... aí eu fico mais ansiosa ainda...
aí eu faço qualquer negócio... eu dou muita dobradura... dobradura quebra muito
isso... então eles começam a aprender com o papel a dobrar... então quebra aquele
clima com a dobradura... ou uma aula de leitura... eu pego um livrinho de história
(Marta)
119
A fala seguinte revela a estratégia de uma aula diferente para prender a atenção dos
alunos indisciplinados. A professora de Educação Artística deu atenção aos alunos mais
terríveis colocando-os para participar e reconheceu que naquele dia deu certo. Afirmou que é
necessário muito amor para conseguir trabalhar com estes alunos.
(...) uma segunda série.. a segunda C... eu não lembro o nome da professora... só
tem dois alunos bons... o resto é tudo indisciplinado... eu falei eu vou começar por
aquele que é mais teRRÍvel... se você vê o silêncio que a classe fez... TOdos
participaram sabe?... era uma atividade diferente... eu trouxe instrumentos da outra
escola... então você se sente assim... realizada né?... nossa hoje eu consegui fazer
isso... peguei aqueles mais TRIStes primeiro coloquei na frente... e falei 'não vai
sair nada’ ai meu Deus pôr pra fora dá um trabalho depois eles reclamam né?...
tenho que fazer alguma coisa hoje pra conseguir... e a aula passou rápido... menina
eu não vi a hora passar hoje... que eu parti daqueles alunos que davam maior
problema pra mim... esses não vão me dar dor de cabeça hoje... porque a hora que
eles estiverem dando trabalho vou falar pra eles tocarem o instrumento mais forte...
quanto mais alto ele tocar o instrumento... mais ele vai perceber que com bagunça
ele não vai ouvir... tá?... então deu certo hoje... então eu acho que eu... sei lá... a
gente procura um meio -- pode ser que amanhã não dê certo na outra classe... mas
hoje deu certo... aqueles alunos que eu achei que ia dar trabalho que eles iam
atormentar... não iam deixar eu dar a minha aula... eu parti dessa turminha mais
terrível... foram os primeiros... ... se você não tiver um amor por aquilo que você
faz... e amor por eles também ne´? então... eu acho que eu estou conseguindo...
graças a Deus né?... (Taís)
Esta outra professora passava lição diferenciada e estimulava a participação dos
colegas para ajudar os alunos que tinham mais dificuldades. Acreditava que os alunos não se
sentiam diferentes por que já estavam acostumados com estas trocas. Pom, como a
professora anterior, reconhecia que este trabalho é de cada dia, tem dia que dá certo, tem dia
que não dá...
por que todos os dias eu peço os cadernos daqueles que têm assim dificuldades eles
põem na minha mesa por que eu passo a lição diferenciada... e nem assim eu sinto
que eles se sentem diferentes entre a turma por que a turma já se inteirou... eles já
se inteiraram que o trabalho é assim... ‘agora vai pôr o caderno?’... ‘ai não... agora
não... pede pro fulano lá que agora ele vai te ensinar... ’... então eles já
acostumaram com essas trocas assim... e não que seja um trabalho fácil porque é
complicado a gente estabelecer isso... é no dia a dia né?... que se estabelece essa
troca com a sua turma... às vezes dá certo... às vezes não dá... às vezes você se
sente... tem dia que eu estou satisfeita... tem dia que eu tô frustrada... (Clara)
A professora seguinte, como a professora anterior, recorria aos alunos com facilidade
no aprendizado para auxiliarem os colegas de sala que possuíam dificuldades, visto que
falavam a mesma língua, logo, se entendiam. Considerava esta estratégia como um jeitinho
brasileiro que dava certo.
120
então peço muita ajuda dos próprios colegas "a turma de cá ajuda a turma de lá
vem cá essa turma de cá vem do lado de cá"... eu gosto muito de pedir para outra
criança ajudar... eu acho que é muito importante porque eles falam a mesma
língua... então você pedindo pra outra criança ajudar ele tem aquela dificuldade
(...) então essas crianças tendo às vezes uma outra criança que sabe um pouquinho
mais que ele às vezes até muito pouquinho a outra também vai se esforçar (...) na
lousa e eu mando sempre em dupla... um que aprendeu um pouquinho mais com
aquele que não conseguiu... então vamos juntos vamos trabalhar... fala alto pro
coleguinha ouvir então eu mando às vezes continha principalmente de dupla na
lousa pra eles poderem aprender... entender aquilo que não entendeu para fazer a
continha para entender... então eu acho que é o jeitinho que meio brasileiro (ri)
mais que dá/ quer dizer eles se ajudam e aprende novamente porque tem ensinado o
colega e fixando aquilo que ele já aprendeu né? (Mara)
Na próxima fala podemos perceber que a estratégia utilizada era o incentivo à
participação e o esclarecimento de dúvidas.
(...) desde o início quando eu comecei a dar aula... eu comecei a trabalhar com eles
desse jeito por que às vezes ninguém levantava a mão (...) foi onde no primeiro dia
eu apaguei toda a tarefa “ah... eu tô copiando” ... não... importa eu passo de
novo... apaguei tudo e comecei a explicar... aí eu comecei... fulano entendeu?
comecei um por um... foi assim que eles começaram a participar... foi super
interessante... daí depois eu passei o exercício... (Ana)
Uma outra forma de incentivo é demonstrada na fala a seguir. Porém, a professora
reconhecia que não era uma estratégia eficaz com o aluno indisciplinado ou com defasagem.
eu tenho o hábito de pôr bilhete tipo assim que ele melhorou pra tentar ajudar...
algum caso você percebe que -- quando o aluno tem bom comportamento dá pra
fazer isso... aí mesmo que tá ruim você escreve e você vê que ele se esforça pra tá te
mostrando... às vezes... mas quando o aluno é indisciplinado e o problema é de
defasagem aí num... aí realmente a gente não tem como ajudar... ele vai sendo
empurrado e chega no colegial sem saber nada... (Sara)
Uma das professoras citou um projeto de ética da boa convivência que estava
desenvolvendo com a sua turma por meio de histórias em quadrinhos.
eu tô fazendo um projeto... nós trabalhamos... estamos trabalhando ainda com o
Projeto Ética... com as crianças... através de histórias... nós transformamos tudo
assim em história em quadrinhos pra eles lerem... hã... eles formando frases... eles
montando alguma historinha... isso tudo assim.... girando em torno da ética da boa
convivência... sabe? nós estamos trabalhando isso pra tentar melhorar... que faz
parte... é um dos projetos da quarta série... e nós estamos trabalhando com isso...
(Mila)
A professora a seguir deu alguns exemplos de estratégias que utilizava com os alunos.
Quando não sabiam ler, jogava a culpa na professora de Português e fazia leitura em voz alta
com a turma toda para que o aluno não se sentisse rejeitado. Em outra escola na qual
trabalhava havia o Programa de Alfabetização de Crianças para o qual encaminhou dois
121
alunos de quinta série que não sabiam escrever. Em sala de aula, os acolhia e dava visto no
caderno. Esta professora, já bem perto de aposentar-se, relatou também que aprendeu a
enfrentar diferentes tipos de problemas com alunos e só dava nota baixa para castigar os
malandros, quanto aos fracos, procurava estimulá-los em sua auto-estima.
agora... detectar dificuldade por exemplo de aprendizagem em Ciências? eu jogo na
professora de Português por que não sabe ler... então o quê que eu faço? eu leio
alto com a turma toda... né? pra ele não se sentir rejeiTADO... (Nívea)
... então eles vão pro PAC e quando eles estão em sala de aula eles não fazem nada
a não ser a gente acolher... então você dá um vistozinho no caderno... você manda
ele aqui pra frente... então falando de lá... a experiência de lá... dificuldade de
aprendizagem das mais dificultosas tem dois alunos lá que eu descobri que eles não
sabem escrever na quinta série... eu descobri né? tá na quinta... são alunos que
estão lá no tal do PAC (...) é uma sala... PAC... deixa eu ver se eu lembro... é
Projeto de Alfabetização de Crianças eu não sei se é com deficiência mas a sala
está com crianças com deficiência (...) (Nívea)
até aqueles BRAvos eu enfrento vigê eu vou em cima supletivo... pode ser drogado
filho de drogado pode ser tudo eu tenho... eu sô... por exemplo eu sou brava mas eu
ca.. to ele eu sei até onde o meu limite vai né? tem aluno que tá aí todo esfarraPAdo
né com TODAS as carências possíveis né? o é pai traficante que ele tá com o
olhinho assim de droga já o que você vai fazer com um aluno desses? vai querer o
quê dele? brigar? então antes você brigava você não entendia que ele não vai
aprender nunca que não é assim... então hoje ele fica na aula amanhã ele aprende
ele se enriquece num... não ponho nem vermelho em prova mais eu ponho
recuperação sabe esse negócio de I (conceito Insatisfeito) isso pra mim já acabou
não- tô- dan-do já adotei já uns cinco anos pra cá dô um vermelho assim pra
CAStigar os malandros mas os FRAcos e esses perturbados aí da vida esses que tem
problema grave nem dô I eu dô P (parcialmente satisfatório) pra estimula....é a
auto-estima sabe e você tem que ter e outra agora quem que te ensina isso? então é
a vida né? (Nívea)
Na fala seguinte, a professora se beneficiava de sua facilidade para esquecer situações
difíceis, como forma de lidar com os aborrecimentos em sala de aula gerados pelos alunos
indisciplinados. Acreditava que cada um tem o seu tempo e procurava despertar a
curiosidade de seus alunos para o conhecimento.
eu tenho uma... uma facilidade muito grande em esquecer essas situações e achar
que isso vai ser resolvido com o tempo que cada um tem o seu tempo né? que
quando você passa por um aborrecimento na sala de aula causado por algum aluno
indisciplinado... algum aluno que falta aquela... não sei... falta aquele click pra
aquele aluno aprender que que é realmente o professor aí eu passo... por que eu
saio de uma sala e entro na outra então eu não posso ficar levando pra outra sala o
que aconteceu então eu sempre tenho esperança que aquilo vai melhorar que aquilo
vai... que você vai conseguir melhorar... (...). da mesma maneira que eu fui
despertada por professores... eu tento passar isso pros alunos... eu tento despertar
essa curiosidade e essa vontade também de ter esse contato e querer descobrir e
fazer mais ciência... a ciência mesmo de conhecer... de ir em busca de
conhecimento... (Rute)
122
Uma outra professora destacou que o aluno com dificuldade de aprendizagem chegava
desnorteado e necessitava de carinho, dedicação, apoio e direção. Na base do ferro e fogo
não se consegue nada. Ressaltou a importância de dar apoio a esses alunos, colocá-los nos
ombros para que enxergassem adiante.
precisa acreditar em você e você acreditar nele e isso só na base de carinho... na
base do ferro e fogo a gente não consegue nada... principalmente nos dias de hoje
não consegue mesmo... então a gente tem que levar pelo lado afetivo pelo lado
carinhoso aí a gente consegue muita coisa... então é preciso essa dedicação... é
preciso dar esse apoio pra eles... é preciso dar essa direção pra eles... porque eles
chegam pra gente... esse aluno com dificuldade de aprendizagem... eles chegam pra
gente completamente desnorteado...(...) e a gente reverte com bastante dificuldade
mas quando a gente usa dessa cumplicidade desse carinho dessa troca e... é... tem
uma... fala que eu acho muito bonita que é... 'se eu vi mais longe é foi porque eu me
pus em ombros de gigante'... e a gente de fato... às vezes precisa colocar eles no
ombro pra que eles enxerguem lá... então é isso aí... (Bete)
A última fala desta categoria revela uma professora que busca se preparar de
diferentes formas para lidar com as dificuldades do aluno, porém sem êxito. Ela levantou
algumas hipóteses sobre as causas do problema e diz não acreditar que uma criança não
tenha vontade de aprender.
mas eu me vejo às vezes olha por mais que eu estude... que eu procure ler... que eu
procure os colegas... acabei de fazer uma faculdade agora eu ainda me sinto...
incapaz de ajudar muitos alunos... não sei se é por falta de preparo meu ou se
porque as coisas fogem da minha área... o problema não é só comigo... mas eu acho
que tem um pouco de incapacidade do professor também... falta de preparo... talvez
não por tanta culpa dele... mas por que o sistema também não nos ajuda... não
oferece material... não oferece cursos... então eu acho que entra um pouco nisso
daí... então é família... é escola... o professor... todos eles colaboram por que a
gente fala 'a criança não tem vontade' eu não consigo acreditar numa criança que
não tenha vontade de aprender... nem que seja pra ela ler o gibizinho dela... pra ela
brincar lá na rua... ela não quer se sentir burra... incapaz no meio dos outros
colegas... então... eu não consigo imaginar uma criança que não queira... aprender
porque tem algum problema e... a gente não se sente muito capaz de lidar com eles
às vezes né?... (Vanda)
4.2.2.2.8. As alternativas sugeridas pelas professoras para lidar com o aluno com dificuldade
de aprendizagem
Nesta categoria, 6 (seis) professoras falaram sobre o que acreditam que possam
auxiliá-las e aos alunos em suas dificuldades de aprendizagem. Duas (Mara, Marta)
123
mencionam as classes superlotadas e a necessidade de um profissional na escola, psicólogo ou
psicopedagogo, para lidar com as crianças e as suas famílias.
só sala de aula... olha para você ver tem quarenta alunos como você vai trabalhar
a parte mesmo com essas crianças?... tinha que ser individual essas crianças que
não sabe que tenho dez na classe que precisa disso que precisa ser trabalhada à
parte... tudo... então tem hora que você morre de pena deles você também tem que
dar atenção pros outros trinta como é que você faz né? então se tivesse uma
psicóloga uma psicopedagoga na classe... na classe não na escola né? que pudesse
atender chamar o pai conversar com o pai porque às vezes é muito pouco e que
poderia ser resolvido... (Mara)
só que é o problema das classes superlotadas... que a gente tem... entendeu? mas de
repente o tempo... acaba não dando tempo de você ajudar este lado da criança... tá
observando onde está o problema... onde está a causa... a gente não consegue
muitas vezes na sala de aula ver a fundo... é onde precisa do profissional... né? a
gente precisa do pedagogo... precisa do psicopedagogo pra tá trabalhando mais
particular com essa criança... a família tá mais de perto pra tá ajudando em casa...
aí precisa do reforço... ela precisa da recuperação em paralelo... ela precisa de um
trabalhinho a parte (Marta)
Na fala seguinte, a professora apontou a importância dos profissionais mais novos que
estão chegando ao ensino, aprenderem com os antigos. Destacou também a necessidade de se
ter um psicólogo para o professor e não, necessariamente, para o aluno.
muita... muito conhecimento que você vai ajuntando escutando percebendo em sala
e esses professor que tão vindo precisava escutar tudo isso saber já né? que eles
tão... você vê eles vão passar pra aprender precisava de muita orientação...
psicólogo para professor eu nem acho que precisava de psicólogo para aluno ((ri))
nossa... quanto precisava a gente eu vejo muito isso... muito.... (Nívea)
Uma professora sugeriu que os alunos com dificuldades de alfabetização recebessem
atendimento especializado e em separado.
... eu acho que a partir do momento que você percebe que dentro de uma sala de
aula tem um aluno que ele tem MAIS dificuldade... o que você poderia fazer?
separar esses alunos já no segundo semestre... já no segundo bimestre separar esses
alunos... no meu ponto de vista colocaria numa sala com poucos alunos e colocaria
um professor ESPECÍfico pra alfabetizar esses alunos... no meu ponto de vista seria
assim (Ana)
Outra professora acreditava que, se trabalhassem com os alunos desde as séries iniciais
com menos autoritarismo, eles poderiam ser mais participantes e menos copistas. Mencionou
também o fato das classes superlotadas dificultarem o trabalho dos professores.
então eu acho que talvez que o ideal fosse a gente começar a mudar desde o
começo... o que a gente tem hoje são alunos assim copistas... é outra falha da
educação... por que o certo é a gente... se a gente não -- se o professor não for tão
124
autoritário na base... se ele ensinar o aluno a falar na hora certa e a ouvir...então a
gente vai ter um aluno participante que não é copista e que você vai estar assim...
suprindo as deficiências dele... como eles pegam professor autoritário na base e a
gente tem experiência hoRRÍvel de ver isso assim ... você está sentado ali você está
ouvindo né? a criança sendo oprimida... aí quando você vai dar esta abertura pra
ele ele entende que é bagunça... e aí o problema já foi causado lá na frente e você
não consegue suprir então... mas eu eu acho assim pela minha experiência a minha
mudança de comportamemto só tem feito com que eu melhorasse e... e... tivesse um
retorno... mas... não é fácil... com classe superlotada é quase impossível... (Sara)
A professora a seguir, acreditava que o eixo da aprendizagem estava na orientação à
família para que pudesse acompanhar a criança em suas tarefas escolares.
não sei se estou pensando longe demais... mas a família tinha que ter um programa,
sabe?... a gente faz tanto programa na área social com a família: de estar ajudando
a família na higiene pessoal, como cuidar da criança e não se ensina como educar a
criança... tarefas escolares... como ajudar a criança a ler e a escrever... porque às
vezes ela não aprende com o professor, mas ela pode aprender com a mãe... se a
escola chegar junto com a mãe... mostra uma atividade que ela pode estar fazendo
junto... está aí o eixo da aprendizagem... (Marta)
Na última fala desta categoria, a professora sugeriu que os profissionais da educação
consultassem os professores que lidam diariamente com os alunos, antes de tomarem atitudes.
Ela considerava que os projetos não alcançavam efetivamente o aluno que é fruto de um
descaso social, vítima do vai e vem das teorias e mudanças.
(...) eu acho que as pessoas responsáveis pela educação deveriam ouvir a gente... os
profissionais que lidam com o problema todo dia para tomarem atitudes... e
preparem um projeto... por que esse projeto vem lá da cabeça deles ‘vamos
pôr
esses meninos num reforço... a gente contrata um outro professor que também não
sabe o que fazer e que vai ficar uma horinha... duas... três com aqueles alunos na
semana...’ não que não se tenha recursos... tem-se recursos sim... tem-se muitas
formas diversificadas de trabalhar... mas não vai resolver em profundidade o
problema dele... (Clara)
então o sistema... o próprio sistema ele fala assim ‘nós vamos ajudar o aluno com
dificuldades’... mas se você não resguardar... e não paramentar o professor... você
pode criar MILHÕES de projetos... você não vai ajudar esse aluno... por quê?
porque o professor SABE que aquela criança é um desafio (...) então eu pus aqui é
um descaso familiar um descaso escoLAR é um descaso social... É UM DESCASO
SOCIAL... por que seria até um problema... é um problema social... por que quem
teria que investir nisso?... é o governo no sentido não de/ não gosto de falar
governo... mas assim as pessoas responsáveis pela educação (...) (Clara)
eu... pra mim... o investimento seria paramentar a escola de profissionais (...)
(...) eu estou no Magistério há 23 anos... a gente discute isso... eles fazem teorias...
eles reformam teorias... v-o-l-t-a-m no professor... ‘ah... então agora nós vamos
formar o professor... vamos dar uma ótima formação... todos terão que ter nível
universitário’ aí o professor volta pra sala de aula... mas o menino tá lá... e não é só
aquele professor com boa formação que vai resolver o problema dele... não é?...
então esse aluno com dificuldade ele é um coitado... ele é fruto desse vai e vem aí
que às vezes eu penso que não tem solução (Clara)
125
4.2.2.2.a. Síntese das categorias do tema: “O Aluno com dificuldade de Aprendizagem”
Neste conjunto de categorias, pudemos perceber que "o aluno com dificuldade de
aprendizagem" é descrito com características opostas às do "bom aluno". Assim, ele apareceu
na fala de 8 (oito) professoras como o aluno indisciplinado, insuportável, desatento, com
baixa auto-estima, preguiçoso, briguento, rebelde, desinteressado, inquieto e sem suporte
familiar.
Sete professoras viam este aluno como portador de possíveis problemas neurológicos
e/ou psicológicos. Consideravam importante um acompanhamento especializado, tanto para
ele como para a sua família, pois não possuíam formação específica para tal. A progressão
continuada, do ponto de vista de algumas professoras, contribuía para que os problemas se
arrastassem ano após ano.
Este aluno apareceu na fala de 8 (oito) professoras como sem suporte familiar. O
suporte familiar seria caracterizado: por boa alimentação, afeto, orientação, transmissão de
valores e princípios. Estas profissionais denunciaram também, a falta de acompanhamento,
interesse, ajuda e incentivo dos pais.
Mais da metade do grupo das participantes da pesquisa, (oito) acreditava que faltavam
bases anteriores ao aluno com dificuldade de aprendizagem e que estes traziam consigo
traumas e decepções escolares que se avolumavam a cada ano. Frente a isso, uma dessas
professoras deixou implícito que acolhia o aluno, permitindo-lhe que fizesse perguntas sem
receio. Isto nos fez pensar que, provavelmente, em experiências anteriores, este aluno era
repreendido por fazer questionamentos aos professores.
Um grupo de 6 (seis) professoras afirmou que as estratégias adotadas pelo sistema
educacional vigente – recuperação paralela, aula de reforço e progressão automática – não
eram efetivas para sanar as dificuldades de aprendizagem.
126
O despreparo para auxiliar os alunos que apresentavam dificuldades no aprendizado
foi mencionado por 5 (cinco) professoras. Estas afirmavam precisar de ajuda, pois, intervir
junto a estas dificuldades era um desafio que extrapolava o seu conhecimento e era agravado
pelas salas de aula superlotadas. Várias estratégias foram adotadas como tentativas para lidar
com o problema. Doze professoras experimentavam novas metodologias em sua prática diária
para atrair o interesse do aluno a fim de incentivá-lo à participação e a valorizá-lo em suas
tentativas de aprendizado. Uma professora destacou que o aluno com dificuldade de
aprendizagem chegava desnorteado e necessitava de carinho, dedicação, apoio e direção.
Ressaltou a importância de dar-lhe apoio e colocá-lo nos ombros para que enxergassem
adiante.
Foram sugeridas alternativas, para lidar com o aluno que apresentava dificuldade de
aprendizagem, por 6 (seis) professoras. Entre estas alternativas se encontravam a contratação
de um psicólogo ou psicopedagogo para a escola, a fim de acompanhar as crianças e suas
famílias, que deveriam ser orientadas no acompanhamento das tarefas escolares. O
profissional psicólogo também apareceu como sugestão para atender ao professorado e não,
necessariamente apenas aos alunos.
Houve ainda uma sugestão misturada com um desabafo. Nela, a professora denunciou
o descaso social para com o aluno, vítima das mudanças de teorias dentro da educação.
Acreditava que, se os professores fossem ouvidos e consultados antes das tomadas de atitudes
que geram as reformas na educação, a chance de que estas medidas fossem efetivas e
beneficiassem os alunos seria maior.
127
4.2.2.3. Os alunos de minha turma
As professoras reconheciam que tinham bons alunos e que alguns destes precisavam
mais de ajuda. Algumas polarizavam descrevendo-os só com adjetivos positivos. Outras
percebiam a heterogeneidade da classe e afirmavam que apenas uma pequena parte
apresentava dificuldades. Já outras professoras, consideravam que os bons alunos constituíam
a exceção. Ainda houve professoras que descreveram a sala de aula em sua heterogeneidade,
com suas facilidades e dificuldades cotidianas, conforme podemos conferir no quadro 8 e nas
falas que o ilustram.
Categorias de opiniões acerca dos “alunos da minha turma” Profissionais
4.2.2.3.1. Os alunos de minha turma são bons Mara, Bete, Ilda, Taís, Nívea (5)
4.2.2.3.2. A minha turma é constituída de bons alunos, em sua
maioria
Lane, Clara, Ana (3)
4.2.2.3.3. A minha turma é constituída de alunos difíceis, em sua
maioria
Rute, Néia, Mila (3)
4.2.2.3.4. A minha turma é heterogênea: tem bons alunos e
alunos que apresentam dificuldades
Bete, Marta, Vanda, Lia, Sara (5)
Quadro 8 - Síntese do Tema: “Os alunos de minha turma”
4.2.2.3.1.
Os alunos de minha turma são bons
Um grupo de 5 (cinco) professoras polariza, em suas falas, os alunos de sua turma só
percebendo-os com boas qualidades. Uma das professoras, que se aposentou durante o tempo
em que a pesquisadora fazia a coleta de dados na escola, falava com muita ternura de sua
última turma, descrevendo-os como amáveis, amorosos, obedientes, participativos e
agradáveis. Mesmo os alunos que vieram com defasagem estavam se desenvolvendo bem,
que contribuiu para que essa turma fosse motivo de muita alegria.
então os alunos da minha turma eles são muito amáveis... essa turma aí parece que
é especial veio para fechar o meu círculo mesmo né... então eles são amorOSOS...
eles... você pode conversar com eles que eles são atenciosos eles não desobedecem
não respondem eu não tenho UM aluno que você pode falar assim 'esse aluno
responde esse aluno/ é uma classe que é um doce... (...) tem alunos que estão com
128
defasagem mas mesmo assim tá indo... vai devagarzinho mais tá indo... até uma que
deu problema primeira segunda série tá uma gracinha tá fazend/ formando frases
forma palavras então tá muito BEM está bem meSMO... então é uma classe que tá
me dando MUUUUITA alegria demais da conta (...) então é uma classe muito boa
para mim eu acho que foi uma das melhores classes que eu peguei... (Mara)
Outra professora descrevia os alunos de sua turma como interessados, curiosos,
investigadores, verdadeiros, honestos e amorosos. Esta última característica ela suspeitava
que fosse um reflexo de sua atitude para com eles, pois também era muito amorosa.
então... os alunos da minha turma são assim muito interessados em tudo... eles têm
uma curiosidade muito grande... eles são também muito investigadores... eles
gostam de ir atrás... de procurar... saber... e... é... também uma característica
interessante deles é que são muito verdadeiros...
eles... quando você conversa com
eles... eles assumem aquilo que fazem
(...) então eu acho isso um aspecto muito
positivo no caráter deles... sim... então a maioria da minha turma tem essa
característica de ser verdadeiro de ser honestos com eles mesmos
(...) e eles são
muito amorosos também... eu não sei se é por que eu também sou... então eu sinto
que eles são muito amorosos... e muito carinhosos comigo... eles também são muito
festeiros... adoram fazer uma festa... (Bete)
Nesta direção, uma outra professora informou que, atualmente, a sua turma estava
muito boa. Ocorreram mudanças de comportamento perceptíveis aos olhos de todos.
Acreditava que isto era fruto de seu tratamento respeitoso para com eles.
... houve uma mudança como eu comentei com você ontem... era uma classe uma
classe assim muito difícil... que eu tinha comentado com você... e... houve essa
mudança... então eles estão mais atentos... eles estão mais interessados...
participam bastante da aula... coisas que pelas informações que eu obtive... que
chegaram e me contaram (...) é que houve assim uma mudança muito grande desses
alunos.... em nível de comportamento... em aprendizagem... em todos os sentidos (...)
... assim visível aos olhos de todos até chegam e comentam ‘o que você fez?’ não
fiz nada... tratei com respeito... né? ... então houve assim essa mudança muito
grande...(Ilda)
Uma professora afirmava que amava seus alunos, mesmo os mais indisciplinados.
olha... eu amo todos os meus alunos... desde aquele mais indisciplinado... porque é
tão interessante né? os aluno da minha turma... a gente... como eu tenho muitos
alunos... muita classe... o pessoal guarda o nome daqueles que são indisciplinados...
(Taís)
A última fala deste grupo é de uma professora que considerava seus alunos bons por
que a agüentavam. Fez uma reflexão sobre suas aulas e chegou a conclusão de que não eram
interessantes, por mais que ela se esforçasse, o que a levava a mais reflexões: “será que estou
passando o meu recado”?
129
esta turma que eu tô... são bons... sabe? não tem grandes problemas... me agüentam
porque eu acho que cinqüenta e quatro aulas e uma professora já com quase trinta
anos ((de Magistério)) você viu a minha voz? e aí você pega uma doencinha
NOSSA.... você com quarenta e sete alunos eu acho que já não tem produção... eu
fico preocupada com essa coisa já de produzir... o quê produzir... eu acho que eles
me agüentam mesmo sabe? professora que fala baixo né?... não tem livro... meus
livros sumiram todos... então não tem nenhum colorido então tudo é na lousa e
falado né?... então... por MAIS que você invente e tente mostrar a matéria pra ele vê
algum significado naquilo que você está ensinando... ai.... eu fico perdida sabe?
será que eu estou passando meu recado?
(Nívea)
4.2.2.3.2. A minha turma é constituída de bons alunos, em sua maioria
Três professoras consideravam a maioria de seus alunos bons. A primeira deste grupo
tinha apenas uns oito ou seis que davam trabalho, e cujas famílias não colaboravam com a
escola.
então tá... tem bons alunos né? tem os ótimos alunos na sala de aula... são bons que
dá gosto de...... de trabalhar mas tem --não é muito não... são uns oito ou seis
alunos que tão dando trabalho o resto são tudo bons alunos e a família também...
tem família que ajuda mas tem família que não se interessa por nada... joga aqui na
escola e a gente que tem que fazer a parte dela... tá... é isso aí... (Lane)
A professora seguinte, tinha em sua turma uns dois ou três alunos com problemas
seríssimos, mas que eram acolhidos pelos demais colegas. A turma veio bem preparada e
tinha uma integração muito boa.
então no geral a turma é muito jóia... eles são crianças riquíssimas... eles vieram
assim bem preparados... eles têm uma integração entre eles muito boa...eles aceitam
muito bem essas crianças que tem/ até tem assim uns dois três com problemas
SERÍSSIMOS de comportamento... sabe? ... e eles procuram se ajeitar né? ...
(Clara)
A fala da última professora deste grupo difere das demais por ser PEB II. Esta
professora tinha várias turmas de Inglês e Português e que eram constituídas de bons alunos,
em sua maioria. Havia apenas uma turma de oitava série que ela descrevia como a mais
difícil, com alunos sem nenhum respaldo da família.
olha eu não posso falar de modo geral por que eu tenho bons alunos... eu tenho
assim pais que freqüentam é aquele caso que eu te disse... os pais dos bons alunos
sempre são presentes... agora aqueles pais que precisariam participar nunca estão
presentes... então... eu vou pegar mais uma sala que eu acho que é a mais
importante por que é a que dá mais trabalho... eu tenho uma oitava série aqui que é
a oitaca C... ausência da família é TOTALMENTE.. (...) então você vê que a sala de
130
aula não tem nenhuma perspectiva... é o caso de um menino aí... não sabe nem
escrever... nem ler... eu fico morrendo de... então quer dizer que quem não sabe
fazer isso o que que tem que fazer? bagunça na sala de aula... por que fazendo
bagunça extrapola e passa desapercebido... como eu dou aula de Português e Inglês
foi fácil pra perceber... por que ele fazia isso... porque falta de conhecimento é
aquele caso vem desde o primário empurrado... a maioria escreve muito errado...
tem dificuldade (...)
(Ana)
4.2.2.3.3. A minha turma é constituída de alunos difíceis, em sua maioria
Três professoras encontravam mais alunos difíceis do que bons alunos em suas
turmas. A professora PEB II, que lecionava também no EJA, falou de seus alunos do Ensino
Fundamental. As turmas, em sua maioria, eram constituídas por alunos desinteressados,
perdidos, sem valores, desrespeitosos e sem limites. Poucos, segundo a professora, não se
encaixavam nesta descrição.
é só do ensino fundamental né? que eu vou falar aqui 'os alunos da minha turma' é...
continuo colocando que eles são muito desinteressados né? então são perdidos é...
não tem noção do que eles querem... é existe uma falta de valores muito grande
muito marcante em cada um é... quando eles se juntam então... fica assim uma falta
de respeito muito grande um pelo outro... com os professores... com a direção... com
os funcionários... e... você percebe que eles não têm limites... têm muita dificuldade
dos pais de por limites... e eles não têm regras pra eles tudo vale... são poucos os
que não se encaixam nessa discrição aqui né... agora desses poucos a gente tira a
vontade assim de... melhorar as coisas né? (...) tem ainda os que são interessados
(...) e tem alunos que são mais responsáveis eu acho porque têm cobrança em
casa... né? e conseguem se sobressair... (Rute)
Uma professora descrevia seus alunos como ansiosos, dependentes, com vários
problemas familiares e de socialização. Apesar de a turma ser difícil afirmava gostar muito
deles.
é uma turma difícil... mas mesmo assim eu gosto deles... mesmo assim eu gosto
deles... procuro ajudar... são muito ansiosos... ansiosos e dependentes... com vários
problemas familiares...(...) eles são alunos que não gostam de sentar no lugar e
ficar quieto... sempre é irrequieto... tão sempre de pé... tão sempre cutucando o
colega pra poder ter BRIGA... um cutuca o outro... porque ele falou isso BATE
nele... porque ele falou aquilo BATE nele... então esse é o problema... irrequieto
deles é a convivência... é a SOCIALIZAÇÃO... que eles ainda não aprenderam...
(Néia)
A terceira professora estava com uma turma de alunos que considerava sem interesse,
dispersos e preguiçosos. Relatou um episódio de desavença em sala de aula que a assustou
muito. O aluno que se sentiu ofendido reagiu com tamanha violência que não foram
131
suficientes as tentativas de contenção da professora e demais funcionários, sendo necessário
acionar a polícia.
dispersos é a falta de interesse que eles estão vindo assim tendo... essa coisa de tá
tudo pronto... você tem/não sei mistura aí a preguiça porque... você dá alguma
coisa que ele tenha que pensar descobrir eles já se negam a fazer (...) a
semana
passada saiu uma briga muito feia na minha sala... justamente por causa disso... o
aluno foi passar uma bolinha de gude pro outro... e o terceiro viu... quis tirar a
bolinha do menino pra entregar pra mim... pra falar que... ele estava com a bolinha
de gude... o outro não deixou eles se atracaram dentro da sala... deu o que fazer pra
eu separar... quando... eu separei que eu tirei o aluno fora da sala... ele pegou um
galho de uma árvore... enorme... grosso e... voltou pra sala para bater com o galho
no menino... olha foi terrível pra segurar... pra tirar... precisei chamar a polícia... a
polícia veio... e... aí chamamos a mãe do menino... porque foi uma violência... sabe?
tava eu... a vice-diretora... a outra professora... segurando o moleque... e o rapaz
da secretaria ainda veio ajudar a gente... e tirou o menino de lá... porque foi... eu
nunca tinha visto dessa maneira... eu fiquei... eu fiquei espantada... olha... a que
ponto que tá a violência... tá entendendo
? (Mila)
4.2.2.3.4.
A minha turma é heterogênea: tem bons alunos e alunos que apresentam
dificuldades
Cinco professoras identificaram em suas turmas alunos com facilidades e dificuldades
para aprender. Parte dos alunos da professora a seguir, estava repetindo a 4ª série e
apresentava muitas dificuldades que, nem o reforço escolar, nem a professora estavam
conseguindo resolver.
e eu tenho aqui na classe assim... é uma classe que uma parte é muito boa e outra
tem muita dificuldade... eles são esses que têm muita dificuldade são alunos que
vieram que são repetentes que fazem a quarta série pela segunda vez... então eles
assim parecem que não conseguiram sanar essa dificuldade sei lá... e eu também
não estou conseguindo administrar isso muito bem não... porque de fato eles têm
muita dificuldade de aprendizagem... estão no reforço têm apresentado melhoras
mas pequenas... (Bete)
A professora a seguir percebia em seus alunos características que se apresentavam ora
como boas, ora como ruins.
falantes por que falam demais quem somos nós pra impedir isso né? (...) eles são
bons até é uma classe que é eu não vou dizer que é ruim (...) por serem falantes...
eles já vem com a rixa um do outro... eles estudaram muito juntos desde o primeiro
ano... então tem aquela implicância... (...) então... na maioria na sala... eles são
espertos demais... só que... às vezes... a briga deles faz a tarefa ficar atrasada... são
sossegados até escrever... mas no censo crítico deles... eles são ótimos... ótimos...
ótimos... você vai montar um texto coletivo na lousa... todo mundo ajuda montar (...)
132
a gente encontrou esta classe... alunos ótimos... dá para levar até a disciplina deles
(...) mas fica muita coisa a desejar... porque eles não foram trabalhados (...) têm
dificuldades de ortografia... de estar escrevendo por si só... (Marta)
As falas das duas professoras que lecionavam na 1ª série demonstra que reconheciam a
heterogeneidade e procuravam trabalhá-la. Uma das professoras, inclusive, tinha em sua
turma alunos com necessidades educativas especiais.
... eu tenho aluno que lê e não escreve muito bem... tenho aluno que escreve e tem
dificuldade de leitura... então... é um trabalho difícil né? por que a classe é bem
heterogênea... eu tenho alunos com problemas... alunos especiais né? até nem são
meus alunos... uns as outras professoras não davam conta deles pediram pra eu
ficar com eles e não achei ruim... (Vanda)
... tem alunos com muita dificuldade de aprendizagem por que não existe um classe
homogênea né? por que mesmo que você comece com uma classe homogênea ela se
torna heterogênea por que tem aquele que desenvolve assimila rapidamente e
aquele que demora mais né?... agora a minha turma é uma turma muito boa...
quando eu estou explicando a matéria eu peço... eu não preciso ficar gritando com
aluno... não preciso... sabe? então eles respeitam muito... é uma turminha muito boa
eu gosto muito deles (Lia)
Já a professora PEB II via na heterogeneidade das turmas um empecilho a mais para o
seu trabalho. Chegou a sugerir na escola que se buscassem reunir os alunos com o mesmo tipo
de dificuldade defendendo a idéia de que isto não era discriminação e sim, uma maneira de
ajudar a resolver o problema.
as turmas são muito diferentes... os alunos são diferentes dentro de uma mesma
turma eu cheguei a comentar com você... nem sala aqui que a gente está que é a
sétima série a gente tem quatro tipos de alunos dentro de uma turma... e isso é o que
diferencia o trabalho... a gente chega até pedir às vezes pra direção no começo do
ano separar... eles falam que não podem discriminar... eu acho que discriminar é
você não dar oportunidade... porque se você separa os alunos eles falam que é
discriminação... mas eu acho que se você separa você resolve o problema de cada
um... e depois no futuro você junta tudo outra vez... (Sara)
4.2.2.3.a. Síntese das categorias do tema: "Os alunos de minha turma"
Neste tema, pudemos perceber que as professoras se dividiam entre aquelas que
descreviam a sua turma de alunos só com características boas e aquelas que reconheciam que
tinham alunos com facilidades e outros com dificuldades de aprendizagem. No grupo de
professoras que percebeu a heterogeneidade da classe temos as que declaravam ser a turma
133
composta em sua maioria por bons alunos e as que percebiam isto como a exceção. Os alunos
difíceis foram descritos como desinteressados, dispersos, preguiçosos, violentos, carentes,
sem valores e apoio familiares, dependentes, desrespeitosos e com dificuldades de
socialização. Estes adjetivos também surgiram no tema “o aluno com dificuldade de
aprendizagem”. É curioso observar que a maioria das professoras que descreveram os alunos
apenas com características boas estava próxima de aposentar-se. Uma destas professoras fala
com muita ternura de sua última turma, descrevendo seus alunos atuais como amáveis,
amorosos, obedientes, participativos, agradáveis, a melhor turma que já teve durante todo o
seu tempo de Magistério e que lhe trouxe muita alegria. Porém, reconhece que há um grupo
com defasagem e parece amenizar o fato enxergando o pequeno progresso que eles fazem e
afirmando que estão acompanhando a classe, na medida de suas capacidades. Provavelmente,
por estar em fim de carreira, parece nostálgica e mais receptiva aos alunos como se quisesse
encerrar bem e aproveitar ao máximo o seu último ano no ensino.
4.2.2.4. O aluno de hoje
Este tema trouxe às professoras lembranças dos alunos do início de suas carreiras e de
outros anos, como também de outras turmas e de outras escolas, comparativamente aos alunos
de hoje. Descreveram “o aluno de hoje” com várias características que adjetivaram “o bom
aluno” e o “aluno com dificuldade de aprendizagem” conforme podemos constatar no Quadro
9 e nas falas a seguir.
134
Categorias de características atribuídas ao Aluno de Hoje
Profissionais
4.2.2.4.1. O aluno de hoje é: “afetivo”, “interessado”, “esperto”, “bom aluno”,
“investigativo”, “curioso”, “bem informado”, “questionador”,
“independente”, “esperançoso”, “responsável” e “amoroso”.
Bete, Taís, Mara, Lia, Vanda (5)
4.2.2.4.2. O aluno de hoje é: “fruto das mudanças sociais”, “violento”,
“indisciplinado” “inquieto”, “falante”, “desinteressado”, “briguento”,
“perdido”, “desvinculado”,“sem compromisso”, “imaturo”, “sem
concentração”, “sem limites”
Clara, Sara, Nívea, Rute, Ana,
Mara, Marta, Vanda, Lane, Ilda,
Néia (11)
4.2.2.4.3. O aluno de hoje e suas carências familiares
Sara, Ilda, Marta, Ana, Mila (5)
4.2.2.4.4. O aluno de hoje e o aluno de ontem
Vanda, Mila, Marta, Lia, Lane,
Ilda, Néia, Sara (8)
Quadro 9 – Síntese do Tema: “O Aluno de Hoje”.
4.2.2.4.1. O aluno de hoje é: “afetivo”, “interessado”, “esperto”, “bom aluno”,
“investigativo”, “curioso”, “bem informado”, “questionador”,
“independente”, “esperançoso”, “responsável” e “amoroso”.
Para 5 (cinco) professoras, o aluno de hoje foi descrito com uma ou mais das
características citadas acima. Uma professora percebia "o aluno de hoje" como mais curioso,
mais investigativo, muito afetivo, muito carinhoso e com muita esperança também.
bom...eu vejo o aluno de hoje muito mais curioso...muito mais investigativo...ele
está sempre buscando...é...pela época que a gente vive...a quantidade de
informações que eles recebem então eu acho que isso é que contribui para eles
serem assim...e acho que eles são muito afetivos também...pelo menos os que eu
convivo eles são muito afetivos...são muito carinhosos...são...eles se doam
muito..e...eu vejo assim que a criançada de hoje eles tem muita esperança também
(Bete)
A professora de Educação Artística relatou que os alunos se preocupavam quando ela
faltava à aula e manifestavam amor e carinho beijando-a.
os alunos de hoje assim na minha área...eles sentem muito quando eu falto...quando
eu falto, eles falam assim 'por que você faltou? você estava doente?' a primeira
coisa 'você tava doente?(...) antes eles não sentiam a falta da gente...eles até
gostavam por que eles ficavam no pátio...podiam correr...brincar...sabe?...hoje eles
tem parece que mais amor na gente sabe?...tem aluno que me beija tanto tanto...
tanto (...) parece que eles tem um carinho com a gente sabe? ...eu percebo mais esse
amor com a gente...parece que eles tem mais...ou é comigo né?...acho que eles
gostam muito de mim...pelo menos percebem a minha falta...o dia que eu não
venho...pra eles é uma falta né?... ( Taís )
135
Três (3) professoras deste grupo afirmaram, a partir de suas experiências anteriores,
que "o aluno de hoje” é mais independente, esperto e mais curioso. Uma delas acreditava que
a televisão proporciona uma maior bagagem para o aluno auxiliando-o em seu processo de
assimilação de conteúdos.
(...) então... o aluno de hoje eles são mais espertos... não resta dúvida porque o que
eles trazem de bagagem em matéria de televiSÃO televisão passa muita coisa então
eles vem/entra em contato com revistas... com MÚSIcas então eles têm MUITO mais
bagagem são mais espERTOS mesmo aqueles que ...que estão um pouco mais
defasados na aprendizAGEM eles já conseguem ler por causa dos 'outdoor'... né?
então das figuras que eles vêem né.... então.... então a gente vai trabalhando com
eles e eles conseguem assimilar um pouquinho mais né... então acho que
assimilação deles é mais fácil do que antigamente porque já tenho trinta anos de
serviço então trinta anos atrás já trabalhei com esse/ de alfabetizar...eu sei né?
(Mara)
(...) na minha opinião o aluno de hoje...ele é um aluno mais...além de ser esperto ele
é mais curioso...do que os de antigamente...né?...muitas vezes você tá dando uma
aula...você tem que parar por que ele pergunta você explica e muitas vezes a aula
acaba sendo... aquele...aquele plano de aula que você fez pra aquele dia num...você
num...aquele conteúdo que você fez pra aquele dia já não dá tempo...devido às
perguntas desses aluninhos mais curiosos que você tem que explicar...então eu acho
que é isso (Lia)
eu acho que eles são mais independentes...mesmo na primeira série eu já percebo
isso (...)...a 23 anos que eu dou aula...então a gente percebe a diferença ano por
ano...e hoje o aluno eu acho que ele está assim...muito...ele questiona muito...ele
não aceita qualquer coisa não...(Vanda)
Na fala a seguir a professora ressalta que "o aluno de hoje" busca coisa melhor,
espera muito da vida, da escola e está mais amadurecido por que é mais sofrido. Tem
muita responsabilidade e pouco tempo para brincar.
ele espera muito...espera da gente espera da vida espera da escola...então a gente
nota que ...eles tem...que isso pra eles faz parte deles...essa busca de coisa
melhor(...) e eu acho que as crianças hoje também elas estão mais
amadurecidas...elas são mais sofridas também...eu não sei se pela condição de ficar
sozinha em casa de todo mundo tá trabalhando e de não ter muito tempo de ...mas a
criança de antigamente assim da minha época...eu não sei parece que era mais
brincar... brincar...não tinha tanta responsabilidade que tem hoje... e essas crianças
também assim são muito cobradas hoje...é curso disso é não sei o quê daquilo...não
tem muito tempo pra ser criança realmente... (Bete)
136
4.2.2.4.2. O aluno de hoje é: “fruto das mudanças sociais”, “violento”, “indisciplinado”,
“inquieto”, “falante”, “desinteressado”, “briguento”, “perdido”,
“desvinculado”, “sem compromisso”, “imaturo”, “sem concentração”, “sem
limites”
Nesta categoria, um grupo de 11 (onze) professoras descreveu “o aluno de hoje”, com
pelo menos, uma das características acima.
No primeiro recorte de fala, que apresentamos a seguir, a professora descreveu o aluno
de hoje como fruto das mudanças sociais e, considerou que, como estamos passando por um
período de desestrutura, a característica deste aluno “é de dificuldade”. É com adjetivos que
elucidam estas dificuldades que ele é descrito pelas demais professoras do grupo.
a sociedade está diferente...ele é fruto dessas mudanças...então quer dizer...eu não
posso falar ‘ah o meu aluno de 20 anos atrás era assim’...ele era por que ele era
fruto daquela época...então a sociedade de hoje...ela é conflitante...ela é...nós
estamos passando por um momento de desestrutura...em todos os
níveis...né?...ético...social...econômico...então quem é o meu aluno de hoje...é fruto
disso aí...eu acho...então a CARACTERÍSTICA dele é de dificuldades... (Clara)
Uma das representantes deste grupo mencionou a questão da violência que se
manifestava por meio da agressividade entre colegas e para com o professor, sendo que, ela
própria havia sido ameaçada de levar uma cadeirada.
a gente tem problema de agressividade dentro da sala de aula...eles se BAtem você
tem que separar....aqui que a idade é menor né? eu trabalho em duas escolas...na
minha outra escola é colegial...aqui eles são até a oitava...então eu tenho -- eles se
batem ...quando eu dava aula o ano passado na quinta série... você tem que separar
brigas...eles não são generosos...eles não sabem emprestar...eles jogam...eles...aí
acerta...tem agressão...sabe...é isso que eu falei...não sabem assim dividir...às vezes
você fala assim ...vamos fazer um grupo...vamos trabalhar em grupo...eles não
sabem trabalhar em grupo...eles não sabem dividir a informação...não só
informação...eles não sabem emprestar...(Sara)
esse ano eu recebi uma ameaça de levar até uma cadeirada...é porque eu coloquei -
- eu avisei antes assim que eu não ia permitir que colasse e que se alguém colasse
eu não ia corrigir a prova quando eles colaram descaradamente e nem nem
disfarçaram né?... quando o menino me entregou a prova eu só ...eu só escrevi
assim "COlou" e não disse nada...ele viu eu escrevendo ...voltou e aí ele ficou muito
bravo e ameaçou me dar uma cadeirada né?...então veja bem...é uma agressividade
que é assim ...ou você deixa a pessoa fazer o que ela quer ou... então ela se volta --
isso você sente em todas as séries assim...desde a quinta série até o terceiro
colegial...e tá piorando...a agressividade está piorando..... (Sara).
137
Na fala a seguir, a professora denunciou que havia bandidos dentro da escola
aliciando alunos. Afirmou que os alunos eram corrompidos dentro da própria escola e
desrespeitados na questão educacional.
por que antes você não tinha bandido dentro da escola...agora você vê as pessoas
que são de família que tem uma educação...eles morrem de medo desses bandidos
que tem dentro da escola (...) você vê meninos MARAvilhosos que você conheceu na
quinta série que quando chega lá no colegial já são drogados... e você sabe que ele
aprendeu a usar drogas dentro da escola...e você SAbe quem passa droga pra ele e
não pode fazer nada (...) ...então você vê como que eles são desrespeitados...então
eles são corrompidos dentro da própria escola...também são desrespeitados na
questão educacional né? que ele tá querendo aprender e o outro tá fazendo
bagunça... (Sara)
A denúncia anterior corrobora com a afirmativa a seguir, na qual “o aluno de hoje” é
percebido como indisciplinado e violento, envolvido com guerras e gangues, perdido e
desvinculado da escola. A professora entendia que os conteúdos escolares não tinham
significado na vida deste aluno. Percebia também, que não se encontrava preparada para lidar
com esta realidade.
(...)porque a turma da tarde e os alunos normais que você encontra por aí hoje
como por exemplo eu dou aula no Semei (?) também eles não têm NADA... NADA...
só guerra as GANgues BRIgas e o que você vai ensinar para esses alunos? então
por isso a maior dificuldade ainda a maior indisciplina você tem em sala de aula
porque vai ensinar O QUÊ? esses aqui talvez consigam (...) essa turminha mais
nova da parte da manhã QUErer fazer que aquilo seja importante... seus conteúdos
o que você passa pra eles as mensagens... e este aqui então? eu acho que é aluno
de hoje... completamente perdido DESVINCULADO desvinculado da escola... a
escola não tem nada a ver com ele... a escola não tem nada a ver com este
MOLEque que a gente está querendo ensinar que a gente tá querendo passar... o
MUNdo dele é outro eu também não sei trabalhar esse aluno de hoje de jeito
nenhum que que eu vou fazer? eu estou preparada para dar aula né? na verdade...
aí você acolhe né? porque eu já estou assim eu já não estou tão preocupada com
conteúdos essa coisa... mas o que você vai fazer em aula com tantos alunos? então
você tem que passar um conteúdo... passar uma mensagem passar uma matéria... aí
eles ficam tudo perdido tudo JOgado por que aquilo tá no caderno deles num sabe
pra quê que é aquilo... (Nívea)
Apareceu em mais 3 (três) falas “o aluno de hoje” como perdido, sem objetivo ou meta
a atingir e sem perspectiva para o futuro.
(...) ...se eu colocar o aluno de hoje...se eu colocar a maioria...eu acredito assim que
a grande maioria é muito desinteressada tá?...eles não tem noção do que falta pra
eles...da importância de conhecer de aprender ...pra eles eles parecem que estão
meio perdidos sabe? não se encontraram ...ou aquela...parece que perde...não
sei...a fase ...pelo menos os alunos que eu trabalho assim de oitava série...parece
que eles estão assim tudo meio perdido... (Rute)
138
então ele chega aqui na escola...ele sabe que ele tem que vir aqui mas ele não tem
um objetivo assim ... não tem uma meta pra atingir então ele fica perdido na sala de
aula dá todos os problemas assim pra gente...de respeito...de falta de solidariedade
de falta de generosidade... e.... quando você tenta passar pra ele...que o objetivo da
escola não é ...assim...somente (...) a criança e o adolescente estão perdidos...(...)
então eu acho que o maior problema...assim...do...não da criança mas do
adolescente...a criança ela ainda não tem perspectiva assim como o adolescente...só
que -- a criança ainda não tem essa consciência...quando eles chegam no colegial é
que começam a se conscientizar mas aí o tempo já passou e eles se
perderam...(Sara)
a falta de perspectiva eu acho que ele não pensa no dia de amanhã...ele não pensa
em ser alguém no dia de amanhã...ele e essa vidinha que ele tá levando ele acha que
tá ótimo...ele não pensa que ele vai escutar as pessoas lá fora...não é o diploma dele
que é importante...é o conhecimento...só que eu já tentei explicar para eles o que é
importante lá fora é o conhecimento não é o canudinho...diploma...se você tiver
capacidade você tem prioridade no emprego lá fora...(Ana)
Apareceu, na fala de uma professora, “o aluno de hoje”, como muito violento, devido a
televisão.
(...) só o que a gente sente assim a pena é que eles são muito violentos mesmo na
brincadeira deles talvez porque vê a convivência em casa TALVEZ NÃO é uma
convivência que eles vêem em casa e nós aqui/ é uma escola de periferia né? então
eles vêem muito muita droga muita/eles trazem essas coisas pra casa pra escola
tudo isso que eles vêem na televisão os desenhos que essa/ esses desenhos
violentos... então chega aqui e eles querem dar chutes fazer a mesma coisa então
eles são muito violentos demais da conta né?... nas brincadeiras"(...) (Mara)
A fala seguinte adjetiva o aluno como violento, indisciplinado, criança explosiva ao
qual o professor precisa ajudar.
(...)...é uma criança explosiva...um olhou pra ele...já ta batendo...é violento...então a
indisciplina vai envolver todos esses fatores...e vira briga... tá na hora do recreio
vêm brigado pra sala de aula e vê brigando na fila(...)...as crianças estão partindo
pra violência...pra porrada...bateu levou...toma lá dá cá....então eles não toleram
nada...então a gente tem que trabalhar muito este lado do respeito...aí nosso papel
de repente...você quer trabalhar um conteúdo você tem que deixar o conteúdo de
lado...você tem que trabalhar outras coisas e tentar ajudar(...) (Marta)
Nas 3 (três) falas a seguir, o aluno é descrito como inquieto, falante, briguento,
irrequieto, sem concentração. Uma das professoras acreditava que isto se dava pelo suplício
de ter que ficar 5 (cinco) horas na escola, sem alternativas.
eles ficam irrequietos por que a sala de aula não está oferecendo o que eles
precisam....eles tem em casa televisão ...vídeo game...que movimentam tudo...e aqui
139
eles tem o professor e a lousa...então fica difícil né... então o aluno ele se torna
irrequieto porque o professor e a escola não está acompanhando o que ele vê lá
fora...então ele chega na escola...pra ele ficar sentado cinco horas aqui...é um
suplício...então ele não fica quieto...aí ele brinca...ele briga...ele bate no colega...ele
quer mexer nas coisas mas é por isso...por que ele não tem alternativas e acaba
fazendo isso... (Vanda)
o aluno de hoje ele é inquieto...ele tá fazendo a lição mas ele fica conversando
entendeu? (...) tá conversando e tá brigando ao mesmo tempo...ao mesmo tempo...e
aborrece a gente na sala de aula você entendeu? então quer dizer...os meus alunos
eles estão bons mas e fica falando e já briga com os outros então é isso que é o
aluno de hoje... (Lane)
no que diz respeito a concentração que é a problemática nossa né? que a gente quer
que o aluno se concentre...nas atividades...por que você tem sempre um
programinha pra cumprir... pra dar e de repente você fica preocupada que não vai
atingir aquele programa que você tem que cumprir...então a gente percebe assim se
o aluno não se concentra na atividade ...a gente não vai conseguir nada
dele...(Marta)
Nas próximas 3 (três) falas, o aluno é percebido como aquele que conhece seus
direitos, mas se esquece dos deveres, é sem limites, sem compromisso, desinteressado e que
vai à escola só para passear.
eu vejo assim...que o aluno de hoje...ele conhece muito bem todos os seu direitos e
ele esquece dos seus deveres...tá?...é aquele aluno que ele acha que ele pode fazer
tudo...e não tem que cumprir NADA...né? aí vem aquele aluno sem limite (Ilda)
o aluno de hoje ... não pensa em compromisso...eles tem na mente na cabeça que o
aluno por causa da... ...ah me fugiu a palavra...progressão continuada...o aluno só
continua após o outro ano aprender...então de 1ª..2ª..3ª...série até a 4ª série...mesmo
com nota vermelha eles vão pra 4ª série...por que eles vão ...reter mesmo é na 4ª
série...então eles não tem muito compromisso(...).por que compromisso mesmo eles
vão ter na 4a e 8a série...por que 5ª 6ª e 7ª passa...vai passando mesmo com nota
vermelha...quando chega na 8ª aí é que a coisa vai pegar e eles já tão adulto mais
maduro aí é que vai entender o que eles perderam... e desde o começo... (Néia)
ó...no meu entender o aluno de hoje...ele não tá preocupado em aprender alguma
coisa ele vem na escola pra passear... ...é isso que eu quero dizer 'ausência'...ele
não tem um pingo de interesse por mais que você se esforce...(Ana)
Na última fala desta categoria, a professora revelou que o aluno era carente de adultos
para orientá-lo. Fazia as tarefas sem acompanhamento, assistia à televisão sem alguém para
policiar, se encontrava sem rumo, confundindo-se em sala e chamando, muitas vezes, a
professora de tia, avó e mãe.
(...) também são muito carentes porque não tem a mãe ali durante o dia... muitos
fazem tarefas sozinho senão nem chegam a fazer os deveres de casa porque não tem
ajuda da mãe 'só vou tê professora no final de semana a minha mãe'... então ainda
140
ontem eu comentei com a minha irmã eu acho tão bonitinho porque tem hora que
eles ficam assim "ô vó...ô tia...ô pro/ ô mãe" então eles começam porque "(...) eu
acho que é tanta gente que toma conta deles que a última palavra que eles falam às
vezes é professora e então eles falam 'ô vó ô tia ô mãe ô Pro/ ô professora né?
então eu acho tão bonitinho (ri) então acho que isso aí vem muito de uma carência
deles e mesmo essa violência muito né? é da carência falta de alg/ou de alguém
para mostrar para eles o que é certo o que é errado o desenho certo para assistir o
desenho e/que não podem assistir... de ter alguém ali para policIAR mesmo porque
tem criança que precisa se policiado então precisa mostrar para eles o que é certo e
o que é errado porque eles perdem a noção o rumo das coisas eu acho que é isso
que é o aluno de hoje...é por aí...(Mara)
4.2.2.4.3. O aluno de hoje e suas carências familiares
Destacamos nesta categoria a fala de 5 (cinco) professoras que discorreram sobre “o
aluno de hoje” denunciando o tipo de relacionamento que a família deste aluno mantém com
ele e com a escola conforme podemos conferir nos recortes de falas a seguir.
Uma professora declarou que a criança está chegando à escola sem saber o que veio
fazer, pois a família não participa informando-a. Os pais não tinham perspectiva de uma vida
melhor, portanto, não conseguiam oferecê-la aos filhos. A professora demonstrou o desejo de
que a família se aliasse à escola para que pudessem fazer reivindicações junto ao governo.
a família não participa da vida da criança.. na verdade a criança está chegando
para a escola é...sem saber o que que ele vem fazer aqui por nem o pai tem
perspectiva de uma vida melhor e ele não está conseguindo passar isso pra ela (...)
os pais ainda não acordaram pra esta questão pra cobrar do governo...eu acho que
a escola só vai melhorar quando...os pais acordarem e começarem a cobrar a do
governo...enquanto eles achar que a escola é culpada...por que a gente não tem
força pra tá lutando sozinha...solução tem...a gente poderia tá melhorando...(Sara)
A indisciplina é apontada como conseqüência da desestruturação familiar.
...falta muito da família...a gente observa isso... que os alunos que mais te dão
problemas em disciplina...são os alunos que não tem uma estrutura familiar bem
constituída...bem montada...né?(...)(Ilda)
Os pais se ofendem quando chamados pelo professor e o culpam pela indisciplina do
filho.
...então assim...é arriscado os pais virem e ainda dá bronca na gente...acha que é o
professor que não consegue disciplina... a gente leva aqueles riscos que eu te falei
que a gente tem sabe?...você quer defender a causa de um...você quer chamar o
pai...você chama e você vê que não foi uma boa chamar a mãe...sabe...você
encontra com uma mãe malcriada mal educada...é complicado... (Marta)
141
O aluno não tem respaldo da família, seus pais não demonstram interesse por sua vida
escolar e pelo seu aprendizado, então extravasa na escola para chamar a atenção
não tem respaldo da família...que você entra em... ... ... contato com a família é
como se você estivesse passando um resultado qualquer...por que os pais não tem
interesse não participam não vem na escola uma boa parte...geralmente só vem os
pais dos bons alunos...os que precisam mesmo não aparecem...só que querem saber
se tirou nota...se tirou nota tudo bem... aí se não tirou ele vem no final do ano pra
bater boca entendeu?... ele não quer saber se o filho dele está aprendendo
conteúdo...então eu acho que nos dias de hoje é o que está faltando pro aluno...
acho que um pouco de interesse do PAI pra modificar o aluno... o aluno vê que o
pai não tem motivação... o pai não motiva ele...então se o pai não tem interesse em
ver um caderno do aluno quando chega em casa em perguntar como foi o dia dele
na escola...o que ele fez o que ele deixou de fazer então quer dizer que o pai não
está mostrando interesse pela educação escolar do filho...aí o que ele faz? ele vem
pra escola e extravasa aqui por quê? Ele não tá chamando a atenção em casa então
ele tem que chamar a atenção do professor na sala de aula... (Ana)
Os pais confundem o papel da escola e das professoras tratando-as como babá. As
professoras confundem seu papel se envolvendo nos assuntos das famílias e deixam de lado a
sua função de educar, transmitir conhecimentos e mostrar limites.
olha eu acho assim que o fundamental é a família...sabe? porque a família não tá
ajudando não... a gente tem que ter a cooperação mas infelizmente os pais acham
que nós somos babás (...)o PROFESSOR...vamos mudar um pouco...ele deixou de
ser aquele profissional pra ser às vezes babá...entendeu?...então ele se envolve
muito no assunto da família o que que tá acontecendo...e vai daqui e pesquisa de
lá...não que isso não tenha que acontecer...mas o professor está resolvendo muitos
assuntos...e deixando às vezes de exercer a sua função que...é a de passar
conhecimentos que eu costumo dizer que o professor ele é um educador...educar...é
mostrar limites...é mostrar...o que é certo...o que é errado
... (Mila)
4.2.2.4.4. O aluno de hoje e o aluno de ontem
Ao falar sobre o aluno de hoje, 8 (oito) professoras se remeteram aos alunos que já
tiveram em outros tempos. A maioria dessas professoras (seis), destacou a questão da
obediência e respeito ao professor que era considerado antigamente como uma autoridade,
um juiz, um santo. Os alunos não questionavam, eram quietinhos, bem comportados, o que o
professor falava era lei. Se desrespeitasse o professor era punido na escola e em casa.
142
antigamente a gente chegava na sala de aula...a tua palavra era aquela...né? o que
você falava era lei...e hoje não...eles questionam....se eles não gostam...e eu gosto
de aluno assim...até prefiro...né? claro que com toda a educação e tudo o mais (...)
mais a criança mudou na minha época a gente não questionava nem pai nem
mãe...né? era ...professor era um santo pra gente...hoje não... (Vanda)
ah...os de antigamente era assim...eles te obedeciam mais...sabe?...mesmo por que
durante 10 anos da minha carreira eu trabalhei numa comunidade japonesa...e...os
japoneses eles respeitam muito o professor...né...é uma autoridade...pra eles...é
como se fosse um juiz uma coisa/ então ...eles já vinham de casa...sabe?...com
aquele respeito...e eles te obedeciam...né?. (Mila)
tem muita diferença sim...principalmente porque eu trabalhei em fazenda...gente as
crianças assim...brigavam também (...)...mas ...eles tinham respeito pelo
professor...o professor em sala de aula...era aquela pessoa que estava ali
onipresente...se você dava uma bronca ‘nossa a professora ta brava’...ficavam
quietos e obedeciam...hoje não tem aluno que você fala...não adianta...vem de casa
assim...e parece que um passa a doençinha pro outro... um faz igual o outro
também...então você tem que mudar...(Marta)
eu já dei aula pra todo tipo de aluno...todo tipo de aluno...porque a gente quando
era substituta a gente anda muito né? eu já passei por várias escolas né?...eu não
fiquei só numa escola... eu já andei em mais de dez escolas... né? ... e na fazenda
também...eu já dei aula em fazenda...então...em fazenda é completamente diferente...
são aquelas criancinhas assim mais...mais quietinhas né? que tá realmente ali
querendo aprender alguma coisa por que não tem muito recurso né?(Lia)
não é que nem o aluno de antigamente que fazia a lição ficava quieto...numa tinha --
falante...tá fazendo tá falando...tá brigando...entendeu?(Lane)
então na época que eu estudava que eu sou bem mais velha que você ... na época
que eu estudava NOSSA SENHORA ai se você falasse alguma coisa pra professora
ou que você não respondesse pra professora...você tinha as punições... você tinha
em casa uma punição maior ainda...hoje não...(Ilda)
Uma das oito professoras se lembra que antigamente o aluno se esforçava para
aprender e conseguir os pontos necessários na prova a fim de fechar o bimestre com os
antigos 12 pontos. Hoje, com a substituição dos valores numéricos pelo Satisfatório (S),
Excelente (EX) e Insatisfatório (I), o aluno pouco se importa se aprendeu ou não.
...por que o aluno antigamente a gente tinha aquela prova ...um tipo de provão em
setembro...em setembro como o Saresp...que é no final do ano em novembro por
aí...então em setembro o aluno antigamente tinha que fechar fazer 12 pontos pra
fechar a nota...agora não existe mais...o aluno ficava assim 'ah...será que eu fechei
professora? eu tirei nota? eu fechei?' agora não... tanto faz aqui o Satisfatório...o
EX que é excelente e o Insatisfatório...então eles só querem saber...'o que eu tirei?
nota vermelha ou azul? ...se falar que é azul eles não querem saber se aprenderam
ou não...tirou azul tirou...às vezes pela habilidade do aluno... pelo compromisso ou
pelo desenvolvimento oral...o professor acaba dando nota...mesmo que não consta
na escrita...(Néia)
143
Na fala da última professora deste grupo, há certa nostalgia ao lembrar-se do que
conseguia com os alunos há alguns anos atrás. Ela e a professora de História trabalhavam em
grupos a discussão de textos sobre os quais os alunos expunham suas opiniões. O aluno
aprendia a ouvir, a argumentar e a defender as suas idéias. Isto se refletia em sua postura
diante da direção da escola, para a qual fazia reivindicações. Hoje, há uma lacuna, não se
consegue fazer mais isso e o aluno atualmente não consegue se sair bem nem em uma
entrevista de emprego.
eu me lembro que há uns sete oito anos atrás (...)nós terminávamos a oitava série
por que nós pegávamos eles da quinta e ia até a oitava...a gente conseguia ensinar o
aluno a ouvir...a gente levava temas e textos pra serem lidos e depois discutidos e
nós formávamos os grupos...eu fazia esse trabalho junto com a professora de
História...nós formávamos grupos e a gente conseguia fazer um grupo ouvir o que
outro estava dizendo e fazia com que um grupo retrucasse o que o outro estava
falando... e depois... e hoje em dia você não consegue mais fazer isso ...por que
quando você forma um grupo...um grupo não ouve mais a resposta que o outro deu
então...por que o debate é o que enriquece...a troca de experiências ...e hoje...essa
falha essa lacuna....e essa lacuna tem um peso enorme... porque a gente tá vendo
que ele...quando ele vai procurar emprego ele não se dá bem na entrevista porque
ele não aprendeu a defender as idéias dele... e isso era uma coisa...a gente criava --
nós saíamos da --eu me lembro que nós saíamos da sala depois disso e nós
falávamos assim ' nós estamos formando cidadãos' ...eles conseguiam
defender...eles iam na direção brigar pelas coisas que eles acreditavam... pedir pra
ter festa pedir pra sabe?... hoje não hoje você não consegue isso porque ele não
sabe reivindicar os direitos dele...ele não consegue porque ele não consegue
ouvir...enquanto o aluno não aprender a ouvir ele não vai conseguir falar e nem se
expressar... (Sara)
4.2.2.4. a. Síntese das categorias do tema: "O aluno de hoje"
No conjunto das categorias que emergiram neste tema, pudemos perceber que, a
maioria das professoras (onze), descreveu o aluno com características coincidentes ou muito
próximas das que adjetivaram “o aluno com dificuldade de aprendizagem”, destacando que
este é um problema social.
Um grupo de cinco professoras reconhecia em suas falas “o aluno de hoje” com
qualidades positivas, próximas das que apareceram no tema: “o bom aluno”.
144
Quanto à família desses alunos, cinco professoras as descreveram como núcleos com
pouco envolvimento na vida escolar do filho e, quando se envolvia, era para criticar o
professor e culpá-lo. O fato do aluno não pertencer a uma família bem constituída foi
apontado por uma professora como a causa de indisciplina. A família confundia o papel das
professores, considerando-as “babás” de seus filhos. Estes acabavam por envolver-se nas
questões familiares dos alunos assumindo a confusão de papéis.
“O aluno de hoje” apareceu, comparativamente ao aluno de antigamente, na fala de
oito professoras que se lembravam de como o professor era respeitado e obedecido. Este
aluno do passado era mais comprometido com o aprendizado e conseguia expor as suas
opiniões e idéias.
5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
147
Pudemos perceber nos dados que emergiram da análise de conteúdo que a
representação das dificuldades de aprendizagem foi muito marcante no discurso das
professoras participantes desta pesquisa. Esta representação surgiu não só no tema a ela
destinado: “o aluno com dificuldade de aprendizagem”, mas também fortemente no tema: “o
aluno de hoje”. Ambos apareceram quase que como sinônimos. É interessante destacar, para
melhor compreensão destes dados, o contexto no qual eles foram gerados.
A escola onde a pesquisa se deu, tem uma história pontuada de buscas por
atendimentos a seus “alunos-problema”. Devido a sua localização, bem próxima a uma
universidade, constantemente se abre para receber profissionais e estagiários que atuam junto
ao seu corpo discente. A idéia de que o problema está no aluno é tão presente que, a anuência
da coordenadora para a pesquisa com os professores só foi conseguida a partir do momento
que nos comprometemos com o atendimento dos alunos que apresentavam dificuldades de
aprendizagem. Isto só foi possível devido à parceria junto ao Programa de Estágio em
Psicologia Escolar, da instituição na qual a pesquisadora estava vinculada como aluna de pós-
graduação. Após a coleta de dados, a pesquisadora se propôs voluntariamente, a realização de
encontros quinzenais em grupo reflexivo, na escola, com os professores interessados até o
limite de 12 (doze) participantes. Paralelamente, os estagiários de Psicologia Escolar
organizavam o atendimento dos grupos de alunos com dificuldade de aprendizagem. Dos 75
(setenta e cinco) profissionais convidados, 8 (oito) professoras aderiram à proposta.
Aconteceram 3 (três) encontros não consecutivos com as professoras. Ao final do terceiro
encontro o grupo encerrou-se devido à coincidência com várias atividades extra-classe que,
segundo a coordenadora, exigia a participação das mesmas. Estas atividades estavam no
calendário escolar e, se caracterizavam em sua maioria, por organização de datas
comemorativas. Já no grupo de alunos, a demanda por atendimento era crescente. As
148
professoras buscavam soluções para os seus alunos com dificuldades de aprendizagem, numa
tentativa de aproximá-los do ideal de bom aluno.
Os dados de nossa pesquisa evidenciaram que, a concepção das professoras do ensino
fundamental sobre o bom aluno, estava relacionada às características pessoais deste, tais
como: “limpinho”, “arrumadinho”, “esforçado”, “inteligente”, “estudioso”, “atencioso”,
“responsável”, “organizado”, “disciplinado”, “participativo”, “questionador”, “observador”,
“criterioso”, “com boa memória”, “interessado”, “interessante”, “quietinho”, “prestativo”,
“dedicado”, “otimista”, “acredita em si mesmo” e “tem opinião própria”. O bom aluno
também era apresentado como aquele que tinha um bom suporte familiar. Por outro lado, “o
aluno com dificuldade de aprendizagem” foi descrito com características opostas às do "bom
aluno". Ele apareceu na fala da maioria das professoras como o aluno "indisciplinado",
"insuportável", "desatento", “disperso”, "preguiçoso", "briguento", "rebelde",
"desinteressado", "inquieto", “lento”, “limitado”, “imaturo”, “tem baixa auto-estima”, “pouco
raciocínio” e “dificuldades de entrosamento com os colegas”. As professoras também
percebiam que este aluno apresentava possíveis “problemas neurológicos ou psicológicos” e
não dispunha de um “suporte familiar” adequado. Dados semelhantes sobre este tema, foram
encontrados na literatura científica.
Em Andrade (1986), o bom aluno aparecia na concepção das professoras como aquele
que obedecia cegamente aos rituais e rotinas e se portava com ordem e disciplina, o que
poderíamos afirmar que equivale ao aluno "bem comportado" da fala das professoras de nossa
pesquisa.
Na pesquisa de Bardelli (1986), as professoras responsabilizaram, em primeiro lugar, o
aluno pela má qualidade do desempenho escolar. Os alunos que apresentavam “mau
desempenho” foram indicados pelas professoras por possuírem “dificuldades centradas na
dimensão cognitiva e da personalidade” e eram percebidos por elas como inibidos, briguentos,
149
mentirosos, insatisfeitos, vaidosos, sem iniciativa, precisando de ajuda para se desenvolver e
com dificuldades de relacionamento. Estes alunos foram considerados ainda, como crianças
que tinham pouca saúde, pouca higiene e faltavam muito às aulas. Aparecem características
semelhantes a estas, na concepção das professoras de nossa pesquisa sobre "o aluno com
dificuldades de aprendizagem". São elas: "briguento" que também se relaciona com o
"indisciplinado" e "insuportável". O "sem iniciativa" em Bardelli (1986), parece relacionar-se
ao que apareceu na fala das professoras de nossa pesquisa como o "preguiçoso" e
"desinteressado". Os problemas de dimensão cognitiva e de personalidade que aparecem na
pesquisa de Bardelli (1986) em nosso estudo são concebidos, pelas professoras, como "que
apresenta problemas neurológicos ou psicológicos".
Na França, os professores investigados por Mollo (1986), faziam referências às causas
do fracasso escolar como sócio-culturais e exteriores à escola. O caráter e a aptidão da criança
foram valorizados e explicados pela origem familiar. Apenas uma das professoras desta
pesquisa se envolvia e se engajava para auxiliar o aluno que apresentava dificuldades no
aprendizado. Para um outro professor, as representações do bom aluno e do mau aluno
estavam em relação de oposição, como por exemplo: participação versus não participação;
confiável versus não confiável; maduro versus imaturo; tem amigos versus têm inimigos.
Em nossa pesquisa, também é evidente a relação de oposição entre "o bom aluno" e o
"aluno com dificuldades de aprendizagem". Das professoras investigadas, apenas uma delas
fez uma alusão remota à possibilidade do desempenho dos alunos relacionar-se ao seu modo
de dar aulas. Esta professora afirmou que os alunos são bons porque a agüentam, visto que,
ela tinha trinta anos de Magistério, uma voz rouca e poucos recursos visuais, o que fazia suas
aulas pouco interessantes. Ainda que, brevemente refletisse sobre sua prática, a professora
colocava sobre seus alunos novamente o mérito pelo sucesso e a responsabilidade pelo
fracasso. "São bons porque apesar de tudo me agüentam e agüentam minhas aulas". O mérito
150
era deles por agüentá-la. Quanto ao mérito dela parece ser o de se perguntar: "será que estou
passando o meu recado?”. As demais professoras investigadas, em nenhum momento
atribuem o desempenho de seus alunos a relação ensino-aprendizagem ou professor-aluno.
Isto parece denunciar que as professoras se eximem da responsabilidade pelo aprendizado de
seus alunos. Assumir que o sucesso está também imbricado na trama da relação professor-
aluno-família implicaria, também, em tornar-se responsável pelo insucesso. Se ele tem
sucesso, o mérito é pessoal e familiar, logo o insucesso também será de total responsabilidade
dele e da família.
Penin (1989) constatou em um estudo no qual descreveu as condições concretas da
vida cotidiana em quatro escolas públicas do 1
o
grau, na cidade de São Paulo, que o aluno
possuidor de características "desejáveis" pelas professoras era o que tinha higiene, era
assíduo, sociável, fluente verbalmente, obediente e não tinha problema econômico sério. O
aluno pobre era excluído desta concepção, se enquadrando, quando muito, na característica
"obediência".
Na Argentina, Castorina e Kaplan (1997) descobriram em seu estudo que os
professores identificavam o aluno inteligente como sinônimo do "bom aluno": "disciplinado",
"obediente", "comunicativo". Outros sinônimos aparecerem acompanhados de seus opostos
denunciando as dicotomias sociais, como por exemplo: inteligente: "interessado",
"comunicativo", "criativo". Seus opostos: "mal alimentado, de família não constituída, vem
sem almoçar" (CASTORINA; KAPLAN, 1997: 189)
Apareceu em nossa pesquisa o "bom aluno" como aquele desejável pelo professor e
grupo, o que corrobora a pesquisa de Penin (1989). O aluno "limpinho", "arrumadinho", que
aparece na fala dos professores de nossa pesquisa é correspondente ao "com higiene" na
pesquisa de Penin; o aluno que "tem bons relacionamentos" é correspondente ao "sociável"; o
aluno "esforçado", "responsável" é correspondente ao "assíduo" "inteligente"; o aluno
151
"atencioso", "quietinho" e "bem comportado", "que cumpre os seus deveres", "faz tudo o que
o que o professor manda" é correspondente ao aluno "obediente" da pesquisa de Penin (1989).
Para as características "fluente verbalmente" e que "não tinha problema econômico sério" não
encontramos correspondentes. Pelo contrário, as professoras de nossa pesquisa definem o
suporte familiar como boa alimentação, afeto, educação "de berço", cuidado com os materiais
escolares e a transmissão de princípios e valores. A "boa alimentação" aqui é explicada pela
professora como tomar o "café da manhã antes de vir para a escola", o afeto é descrito como
ter "beijinho da mamãe", a educação de berço e a transmissão de princípios e valores. Isto se
aproxima mais da pesquisa de Castorina e Kaplan (1997), na qual os professores apontaram
nos alunos com mau desempenho escolar situações de família não constituída, vir para a
escola sem almoçar e mal alimentado.
Temos na pesquisa de Chechia (2002) alguns elementos para pensarmos a questão do
suporte familiar.
Chechia (2002) constatou, em seu estudo sobre pais de alunos com sucesso e insucesso
escolar, que as mães de alunos com insucesso, ao contrário do que se imaginava,
assessoravam os filhos em suas tarefas. Porém, revelavam que precisavam ser mais bem
orientadas para que pudessem auxiliar melhor os filhos. A autora também verificou em sua
pesquisa que as mães, que trabalhavam fora ou possuíam baixa ou nenhuma escolaridade, não
eram alheias às dificuldades dos filhos e os apoiavam a seu modo. Os pais dos alunos com
insucesso tinham consciência das dificuldades dos filhos, mas não dispunham de elementos
ou dados para compreendê-las, mesmo porque tinham outros filhos com sucesso na escola. Os
dois grupos de pais de sua pesquisa reconhecem que o professor influencia no rendimento
escolar do filho. Os pais de aluno com sucesso atribuíam o êxito à criança, ao professor e a si
mesmos. Já os pais de alunos com insucesso responsabilizavam a escola e a professora. Estes
152
pais reconheciam também que a falta de limites e o excesso de mimos para com os filhos,
poderiam prejudicá-los em seu desempenho escolar.
Ribeiro (2004) também verificou em sua pesquisa sobre a relação família-escola que
os pais valorizavam o acompanhamento escolar dos filhos. Porém, muitos deles encontravam
dificuldades para auxiliar os filhos em suas tarefas. Isto se dava pelas muitas ocupações com a
sobrevivência, como também pelo fato de terem pouco acesso à escola. Para corresponder às
expectativas da escola, uma saída encontrada pelos pais, era ameaçar os filhos com punições.
A cobrança da escola sobre a família, evidenciada nos resultados da pesquisa de Ribeiro
(2004), nos faz pensar que era uma tentativa para se conseguir “bons alunos”.
Encontramos, também, nos estudos de Mantovanini (1999); Rangel (1997) e Siqueira
(2000) resultados que corroboram os encontrados em nossa pesquisa.
Mantovanini (1999) identificou, nos critérios que levavam os professores a definirem
o "bom aluno", características como ser interessado, autônomo, independente e disciplinado e
que não causasse transtorno. Os alunos com problemas de aprendizagem eram definidos como
apáticos ou agitados, que não resolviam as tarefas propostas sozinhos, lentos, não
participativos, dependentes e desinteressados.
No estudo de Siqueira (2000), as professoras tomaram como relevantes as
características individuais do aluno e a estrutura familiar para explicar as causas do melhor
desempenho de seus alunos. Atribuíram ao aluno a responsabilidade pelo seu aprendizado.
Dado também presente na pesquisa de Rangel (1997) que destacou, sobretudo, a associação
entre ‘mérito’ e ‘esforço pessoal’ do ‘bom aluno’ com acesso ao trabalho, acesso ao ensino
superior e sucesso na vida. Rangel também constatou que, no campo de representação, a
imagem real ou ideal do ‘bom’ aluno se apresentava na expressão dos próprios alunos como
“disciplinado”, ”estudioso”, “comportado”; na expressão dos pais como “esforçado”,
153
“dedicado”, “responsável”, “estudioso”; e na dos funcionários como “amigo”, “educado”,
“respeitador”.
Alguns resultados da presente pesquisa, poderiam ser interpretados como um pedido
de socorro de pelo menos 1/3 do grupo das professoras investigadas, quando confessam o seu
despreparo para lidar com o aluno que apresenta dificuldades. As professoras conseguem
perceber que possuem poucos recursos para intervir junto a seus alunos de maneira adequada.
Necessitam de ajuda especializada para orientar os pais e a escola. As crianças com reais
problemas neurológicos ou psicológicos precisam ser atendidas. Ainda que estes pedidos
pareçam, por um momento, "medicalizar" ou "psicologizar" as dificuldades de aprendizagem,
nos trazem esperança, na medida em que denunciam uma percepção das professoras de que,
de fato, algo não vai bem e que estão tentando, em sala de aula, com seus poucos recursos,
remediar a situação. Porém, sentem-se impotentes diante de tantos desafios. Uma delas
mencionou o fato de se preparar e, tentar de várias formas, auxiliar o aluno, mas sem êxito.
Em meio a tantas dificuldades e desafios do ensino público, uma das professoras afirma que
precisamos reverter este processo. Parece se imbuir de esperança quando resgata uma citação
que leu em algum lugar e a usa para exemplificar o que acredita que devam fazer em relação
aos alunos: "para ver mais longe subi em ombros de gigantes". Ela sai do lugar de impotência
para se colocar no lugar de "gigante" sobre cujos ombros os alunos poderão ser levados a
olharem para frente, olharem adiante, seguirem em frente.
154
6.
CONCLUSÕES E IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS
157
Neste estudo, tivemos como objetivo principal, investigar as representações de
professores do ensino fundamental sobre o "aluno", situando-as no contexto de suas trajetórias
profissionais. O início da carreira profissional, da maioria das professoras, se deu num
contexto de crescentes pesquisas sobre a educação e se efetivou num cenário de mudanças e
inovações pedagógicas. As professoras denunciaram a ineficácia destas medidas para lidar
com as dificuldades do aluno, considerando-as paliativas. Contudo, buscavam adequar-se,
pelo menos, à exigência de curso de nível superior para permanecer lecionando. Desejavam
continuar os investimentos em sua formação profissional e se aposentar nesta área.
Quanto às representações sobre o aluno, encontramos, na maioria das falas das
professoras, um discurso que ainda destaca a meritocracia e os atributos físicos, pessoais e
familiares como causa principal de sucesso. Tanto o bom aluno quanto o aluno com
dificuldades corrobora estudos anteriores na forma como são percebidos pelas professoras. As
dificuldades de aprendizagem também são percebidas como oriundas do aluno e de sua
família e, em alguns apontamentos, do sistema educacional. O aluno de hoje, com o qual as
professoras lidam diariamente em suas turmas, foi descrito pela maioria delas com
características semelhantes às do aluno com dificuldades de aprendizagem. A representação
de aluno predominante neste grupo de professoras é, de fato, a do aluno-problema, difícil,
sem apoio familiar, perdido, sem objetivos, vítima do sistema, aliciado por traficantes,
educado pela televisão, indisciplinado, violento, desrespeitoso, enfim, com tantos adjetivos
negativos que parece uma denúncia do despreparo para lidar com ele, ainda que só admitido
por poucas professoras. Diante desta percepção da realidade, as estratégias utilizadas em sala
de aula pelas professoras parecem tão ineficazes quanto as impostas pelo sistema educacional
vigente. A solução apontada por elas se encontra novamente fora de si mesmas e de suas
práticas pedagógicas. Psicólogos, psicopedagogos, profissionais especializados devem ser
contratados para orientarem os pais e atenderem os alunos. A família deve participar mais, e
158
assim, parecem se eximir da responsabilidade de atuarem junto, como parte deste processo.
Este discurso das professoras parece esconder a frustração e o seu descontentamento com uma
profissão que vem sendo desvalorizada no decorrer dos anos.
Os dados da pesquisa apontam para algumas implicações educacionais.
O professor precisa ter garantido espaços para reflexão sobre a sua prática pedagógica,
nos quais tenha a possibilidade de trocar experiências com outros colegas e se sentir
acolhido. Os cursos de aperfeiçoamento, possivelmente, serão mais efetivos se os
professores tiverem a oportunidade de relacioná-los com o seu fazer diário.
Os professores precisam ser respeitados e consultados antes da adoção de medidas e
inovações pedagógicas, visto que são os principais agentes efetivos destas junto ao
aluno.
A escola, como instituição, precisa voltar-se para o seu objetivo primeiro: o aluno.
Neste sentido, é necessário que o professor resgate o seu papel profissional, que tem se
confundido com o papel da família.
A prática docente deve ser sempre o foco de qualquer proposta de intervenção que
busque a melhoria das condições de ensino e aprendizagem, uma vez que as
representações e as atitudes que delas decorrem, continuam bastante conservadoras, a
despeito da imensa quantidade de cursos, teorias progressistas e inovadoras a que vem
sendo submetidos os professores do Ensino Fundamental, nos anos recentes. Esta
situação pode estar indicando que, mais que formação continuada, é preciso
transformar as práticas efetivas, com medidas que sejam gestadas e consolidadas no
próprio cotidiano escolar.
Novas pesquisas precisam ser realizadas, buscando esclarecer ainda mais as
representações dos professores sobre o aluno, que no presente estudo, confirmando
estudos anteriores, revelou grande complexidade e diversidade.
159
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1
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a 4
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_______________
De acordo com:
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: informação e documentação: elaboração.
Rio de Janeiro, 2002.
170
APÊNDICE A
ESCLARECIMENTOS AOS SUJEITOS DA PESQUISA
1 - Nome da Pesquisa: "Representações de professores do ensino fundamental sobre
o aluno".
2 - Pesquisadora responsável: Ana Aparecida de Souza Luciano.
3 - Orientador Responsável: Antônio dos Santos Andrade.
4 - Instituição: Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade de Filosofia
Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP).
5 - Descrição das informações que deverão ser, obrigatoriamente, prestadas aos
sujeitos da pesquisa:
“Caro professor (a), você está sendo convidado (a) para participar de um estudo, que
pretende através de entrevistas conhecer as suas percepções e crenças sobre o aluno e seu
desempenho escolar. As entrevistas serão gravadas com a sua anuência e utilizadas somente
para estudo nesta pesquisa de forma a não identificar-lhe. Seu nome não será divulgado, no
caso de publicação ou exposição do referido trabalho. Não há previsão de desconfortos e
riscos para esta modalidade de estudo, no entanto, você poderá se retirar da atividade a
qualquer momento, sem prejuízo da mesma”.
Local,____________ de ______________ de ______
________________________________________
Pesquisadora: Ana Aparecida de Souza Luciano
171
APÊNDICE B
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu,__________________________________________________________abaixo assinado,
tendo sido esclarecido sobre todas as condições que constam do documento "Esclarecimentos aos
Sujeitos da Pesquisa", de que trata o projeto intitulado : “Representações de professores do ensino
fundamental sobre o "aluno", que tem como pesquisadora responsável a Sra. Ana Aparecida de
Souza Luciano, declaro que tenho pleno conhecimento dos direitos e das condições que me foram
asseguradas, relacionadas a seguir:
1 - A garantia de receber esclarecimentos a qualquer etapa do trabalho, dos riscos e benefícios
que a técnica poderá trazer.
2 - A liberdade de retirar meu consentimento a qualquer momento sem que isso traga prejuízo
à continuidade do trabalho.
3 - A segurança de que não serei identificado e que será mantido o caráter confidencial de
informação relacionada com a minha privacidade.
4 - O compromisso de que me será prestada informação atualizada durante o estudo.
Declaro ainda que concordo inteiramente com as condições que me foram apresentadas e que
aceito, voluntariamente, a participar deste projeto, não tendo sofrido nenhuma forma de pressão para
isso.
Local, _____________________, de _______________________ de _______
_________________________________________
Assinatura
Eu Ana Aparecida de Souza Luciano, como pesquisadora responsável, declaro que estarei respeitando
todos os termos supra mencionados. Por ser verdade firmo.
Local, ___________________, de _______________________ de _________
___________________________________
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