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perdendo a guerra. Os mouros coroaram o filho do rei morto, de apenas três anos, e
perderam as batalhas seguintes, nas quais os cristãos tinham o apoio do soldado
misterioso
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A festa era realizada em 13 de maio, em comemoração à Lei Áurea, mas,
depois, foi colocada em outra data, na tentativa de angariar mais adeptos; no
entanto, a entrada dos cultos evangélicos tem roubado simpatizantes do festejo,
devido à falta de visão cultural dessas entidades do valor da comemoração para
além da fé, o que tem reduzido em muito a participação dos moradores.
A seguir, traremos um esboço das manifestações culturais mais autênticas do
Amapá, que são o Batuque e o Marabaixo, revelando suas origens, seus encantos e
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Para entender melhor a encenação, é preciso saber um pouco mais sobre a interessante história
que deu origem à festividade. Desde a conquista das terras africanas, os lusitanos tentaram obrigar
os muçulmanos a se tornarem cristãos e aceitarem a fé em Cristo e o batismo de sua religião. Esse
fato provocou a reação dos seguidores de Maomé, que declararam guerra aos cristãos, estes
liderados, na época, pelos capitães Atalaia, Jorge e Tiago. Durante dias, ocorreram batalhas
acirradas, com grande vantagem para os lusitanos, que resistiam aos constantes ataques dos
mouros. Estes, chefiados pelo Rei Caldeira, armaram uma cilada, que consistia em entregar, aos
capitães cristãos, presentes em forma de iguarias. Os cristãos receberam os presentes e
desconfiaram que pudessem estar envenenados. Assim, jogaram uma parte da comida para os
animais na granja dos mouros, e guardaram a outra, objetivando preparar um contra-ataque. Sem
nada saber, os mouros confiaram na vitória e, à noite, deram um baile de máscaras, estendendo o
convite aos cristãos que quisessem passar para o seu lado, sem que pudessem ser reconhecidos
pelos seus superiores. Os cristãos compareceram mascarados à festa, levando a parte da comida
que haviam recebido como presente dos mouros e a distribuíram aos seus inimigos. Quando
amanheceu o dia, muitos soldados mouros jaziam mortos por haverem comido o presente dos
cristãos e, entre eles, estava o Rei Caldeira. Seu filho, denominado Menino Caldeirinha, assumiu o
trono. Na manhã do outro dia, os cristãos aproveitaram o desespero e a desorganização de seus
inimigos para atacá-los. Movidos pela fé, iniciaram uma luta sem precedentes, só amenizada por volta
do meio-dia, quando os mouros, aproveitando o descanso dos cristãos, mandaram um vigia – o Bobo
Velho – para tentar persuadir seus conterrâneos que haviam se convertido ao Cristianismo a
retornarem para seu lado. Além disso, o Bobo Velho poderia espionar o estado em que se encontrava
a força dos seus inimigos. Quando ele chegou perto dos cristãos, esses o apedrejaram. No fim da
tarde, antes de iniciar a batalha, os cristãos mandaram o Atalaia espionar os mouros. Atalaia
arrebatou a bandeira do acampamento mouro, mas foi descoberto pelos inimigos que o feriram.
Mesmo ferido de morte, o Atalaia conseguiu chegar próximo de seu acampamento, e lá atirou a
bandeira a seus companheiros, dando gritos de alerta. Em represália, os mouros decapitaram-no,
espetaram sua cabeça em uma vara, e colocaram-na junto ao muro do acampamento cristão, para
que estes ficassem com medo. Ainda com planos para vencer os cristãos, o rei Caldeirinha mandou
que seus soldados fizessem uma passeata ao redor do acampamento, a fim de raptar as crianças
cristãs, que, curiosas, foram facilmente apanhadas. Depois do êxito do plano, elas foram vendidas e o
dinheiro arrecadado serviu para comprar armas e munição. Quando os cristãos souberam do roubo
de suas crianças, iniciaram uma violenta batalha carregada de grande heroísmo e fé. O rei
Caldeirinha ainda propôs a troca do corpo de Atalaia pela bandeira moura em poder dos cristãos.
Estes aceitaram a troca, mas receberam o corpo e não entregaram a bandeira. A batalha recomeçou
com essa atitude e, ao entardecer, os cristãos pediram a Deus que prolongasse o dia, a fim de que
pudessem vencer tão desesperada luta. Assim, parecia que o dia estava se prolongando e os cristãos
foram vencendo as batalhas que se sucediam, até que o jovem rei Caldeirinha foi aprisionado,
enquanto seus soldados fugiam. Mortos muitos infiéis mouros, os cristãos rejubilaram-se pela vitória,
agradecendo a Deus e, em passeata, levaram o rei mouro vencido. À noite, depois de tudo,
organizaram um baile chamado “Vomo nê”, que vem simbolizar a vitória alcançada por eles (BRASIL,
2009a).