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Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Centro Biomédico
Faculdade de Enfermagem
Márcia Fontes Peixoto Azeredo
Repercussões da violência sob a gestação percebida pelas
gestantes com Síndromes Hipertensivas.
Rio de Janeiro
2009
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Márcia Fontes Peixoto Azeredo
Repercussões da violência sob a gestação percebida pelas gestantes com
Síndromes Hipertensivas
Dissertação apresentada, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre, ao
Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem, da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro. Área de concentração:
Enfermagem, Saúde e Sociedade
Orientadora: Profª. Drª. Lucia Helena Garcia Penna
Rio de Janeiro
2009
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CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/CBB
Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou
parcial desta dissertação.
________________________________ _________________________
Assinatura Data
A993 Azeredo, Márcia Fontes Peixoto.
Repercussões da violência sob a gestação percebida pelas
gestantes com síndromes hipertensivas / Márcia Fontes Peixoto
Azeredo. - 2009.
94 f.
Orientadora: Lucia Helena Garcia Penna.
Dissertação (mestrado) Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Faculdade de Enfermagem.
1. Gravidez. 2. Violência contra a mulher. 3. Hipertensão. 4.
Enfermagem na saúde e higiene da mulher I. Penna, Lucia Helena
Garcia. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Faculdade de
Enfermagem. III. Título.
CDU
614.253.5
14
Márcia Fontes Peixoto Azeredo
Repercussões da violência sob a gestação percebida pelas gestantes com
Síndromes Hipertensivas
Dissertação apresentada, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre,
ao Programa de Pós-Graduação da
Faculdade de Enfermagem da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro. Área de
concentração: Enfermagem, Saúde e
Sociedade.
Aprovado em 11 de março de 2009
Banca Examinadora:
____________________________________________________________
Profª. Drª. Lucia Helena Garcia Penna (Orientadora)
Faculdade de Enfermagem da UERJ
____________________________________________________________
Profª. Drª. Ana Beatriz Queiroz
Escola de Enfermagem Anna Nery
____________________________________________________________
Profª. Drª. Jane Márcia Progianti
Faculdade de Enfermagem da UERJ
_____________________________________________________
Profª. Drª. Maria Aparecida de Vasconcellos Moura
Escola de Enfermagem Anna Nery
_____________________________________________________
Profª. Drª. Adriana Lenho de Figueiredo Pereira
Faculdade de Enfermagem da UERJ
Rio de Janeiro
2009
15
DEDICATÓRIA
Ao meu querido marido Jairo e nossos filhos Felipe e Tiago,
obrigada pelo apoio, incentivo e dedicação
em todos os momentos.
16
AGRADECIMENTOS
A Deus por me iluminar e pela oportunidade de ter realizado mais este
trabalho, ter alcançado meus objetivos e poder estar desenvolvendo a difícil tarefa
de ouvir, respeitar e cuidar do outro.
À minha família, em especial ao meu marido Jairo. Obrigada pela paciência,
carinho e compreensão nos momentos em que estive ausente do convívio e, pela
força que fizeram com que eu chegasse até aqui.
À Profª. Drª Lucia Helena Garcia Penna, minha orientadora, obrigada pelo
aprendizado, a paciência, a compreensão, a amizade e a dedicação durante a
realização deste trabalho.
Ao meu pai Mudesto (in memória) e meu irmão Paulo Cesar (in memória)
por todo apoio e incentivo durante as várias etapas de minha vida.
À minha mãe Dalva, minha sogra Cenira e irmã Ana Maria, obrigada pelas
fervorosas preces e o apoio imprescindível para continuar a caminhar.
À chefe e amiga Abilene Gouvêa pelo incentivo e apoio constante, sua
amizade e sua dedicação em todos os momentos.
Aos todos os colegas do mestrado e especialmente ao André pelo apoio,
amizade e solidariedade nos momentos difíceis.
Aos enfermeiros Helder, Thais, Ana Lucia, Regina e Lidiane obrigada pelo
apoio e incentivos no trabalho e momentos difíceis.
Às amigas Vilma, Luzia e Andréa, pelo ombro amigo, apoio no trabalho e
incentivo diário.
Às enfermeiras da maternidade do HUAP e HUPE, obrigada por sua
atenção e acolhimento contribuindo de forma efetiva na construção deste trabalho.
17
Às mulheres que confiaram em mim e falaram de suas vidas à procura de
apoio e conforto, muito obrigado. Vocês me incentivaram e fizeram com que eu
aprofundasse meus conhecimentos na temática da violência.
18
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria.
Milton Nascimento e Fernando Brant
19
RESUMO
AZEREDO, Marcia Fontes Peixoto. Repercussões da violência sob a gestação
percebida pelas gestantes com síndromes hipertensivas. 2008. 94f. Dissertação
(Mestrado em Enfermagem) - Faculdade de Enfermagem, Universidade do Estado
do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009.
Este estudo tem como objeto a perspectiva de gestantes com ndromes
hipertensivas sobre as repercussões da violência vivida na gestação. A violência é um
problema muito complexo em virtude de sua multicausalidade, assim como, pelo seu
impacto na saúde das populações. Representa ameaça de vida, produz enfermidades e
pode provocar até a morte. Várias são as conseqüências da violência para a saúde da
mulher, particularmente no processo gestacional e no desenvolvimento do concepto. O
estudo fundamenta-se em conhecer o fenômeno a partir da perspectiva da gestante. Possui
como objetivos: descrever a definição da violência contra a mulher na perspectiva da
gestante com Síndrome Hipertensiva; discutir os tipos de violência vivenciados por
gestantes com diagnóstico de Síndrome Hipertensiva; e analisar as repercussões da
violência vivida sobre a gestação na perspectiva da gestante com ndrome Hipertensiva
que a vivenciou. Em decorrência do grau de complexidade e subjetividade do objeto optou-
se por uma pesquisa descritiva na abordagem qualitativa, pois esta busca entender um
fenômeno específico em profundidade, tendo como fonte primária os discursos dos sujeitos,
ou seja, gestantes de risco internadas em maternidades de referência com diagnóstico de
Síndromes Hipertensivas e que vivenciaram a violência. Os cenários da pesquisa foram
duas maternidades referência para gestação de alto risco, inseridas em dois hospitais
universitários da cidade do Rio de Janeiro, sendo investigadas 18 gestantes. A investigação
ocorreu no período de abril e maio de 2008. Como técnica de coleta foi realizada entrevista
semi-estruturada associada a um questionário de caracterização social dos sujeitos da
pesquisa. No aprofundamento dos dados utilizamos a técnica de análise de conteúdo de
Bardin, onde emergiram dos depoimentos duas categorias: A violência na perspectiva da
gestante com ndrome Hipertensiva - um olhar de quem a vivenciou; e Violências
vivenciadas por gestantes com síndromes hipertensivas e suas repercussões. Na primeira,
verificamos que 14 gestantes definem a violência contra a mulher como violação dos direitos
humanos e como algo inerente ao contexto familiar; e 04 apresentaram dificuldades em
explicar. Na segunda, constatamos que todas as gestantes relatam vivenciar a violência
intrafamiliar e algumas, também, a violência comunitária. Das 18 gestantes entrevistadas, 16
fizeram relação da violência vivida com a internação em decorrência da hipertensão arterial.
As relações foram expressas através das repercussões da violência vivida na gestação
sobre o seu organismo, destacadas como repercussões: emocionais, físicas e sociais. O
estudo permitiu conhecer a realidade e aspectos valiosos do contexto dessas gestantes,
principalmente, demonstrando a partir das próprias vítimas, a importância de refletir sobre as
possíveis causas não fisiológica, tais como a violência, que podem agravar ou mesmo
desencadear uma hipertensão arterial. Permitiu também, compreender e visualizar a
violência vivenciada pela gestante nos seus diversos contextos: família, trabalho,
comunidade onde reside e na instituição hospitalar a que recorre. Consideramos ser
relevante despertar para todo o contexto histórico-social que cerca uma gestante,
particularmente a que possui uma morbidade associada. E também, oferecer um cuidar
integral, que valorize a perspectiva do gênero, focado mais na contextualização do processo
saúde doença e na humanização, logo, minimizando a medicalização.
Palavras-chave: Gestação. Violência contra a Mulher; Síndrome hipertensiva.
Enfermagem.
20
ABSTRACT
This study has as object the pregnant perspective with hypertensive syndromes
about the violence repercussions experiences in the pregnancy. The violence is a
very complex problem in view of its multi causality, as well as, by its impact in the
population´s health. It represents life threatening, produces illnesses and can
provoke including the death. Several are the violence consequences for the woman´
s health, particularly in the gestational process and in the being development. The
study bases on knowing the phenomenon from the pregnant perspective. It has as
objectives: describe the violence definition against the woman in the pregnant´ s
point of view with Hypertensive Syndrome; discuss the types of violence experiences
by pregnant women with diagnosis of Hypertensive Syndrome; and analyze the
violence repercussions experienced about the pregnancy in the pregnant women´ s
point of view with Hypertensive Syndrome that experienced it. In view of the object
complexity and subjectivity grade it decided for a descriptive research in the
qualitative approach, once this aims at understanding an specific phenomenon in
depth, having as primary source the subjects´ discourses, in other words, risk
pregnant women interned in qualified maternity hospital with diagnosis of
Hypertensive Syndromes and who experienced the violence. The research
scenarios were two qualified maternity hospitals for high risk pregnancy, inserted in
two university hospitals of the Rio de Janeiro city, being investigated 18 pregnant
women. The investigation occurred in the period of April and May of 2008. As
collection technique it was realized semi-structured interview linked to a
questionnaire of social characterization of the research subjects. For the data
deepening we utilized the content analysis of Bardin, where emerged from the
depositions two categories: The violence in the pregnant women´ perspective with
Hypertensive Syndrome a look from who experienced it; and Violence experienced
by pregnant women with hypertensive syndromes and theirs repercussions. In the
first we verified that 14 pregnant women define the violence against the woman as
violation of the human rights and as something inherent to the familiar context and
four presented difficulties in explaining such question .In the second, we verified that
all the pregnant women relate that experience the intra familiar violence and any
women, the community violence. Of the 18 pregnant women interviewed, 16 linked
the violence experienced to the internment as result of the arterial hypertension. The
relations were expressed through the violence repercussions experienced in the
pregnancy about her organism, detached as emotional repercussions:: emotional,
physical and social. The study allowed to know the reality and value context aspects
of these pregnant women, mainly showing from the own victims, the importance of
reflecting about the possible no physiological causes, such the violence, that can
aggravate or even give rise to an arterial hypertension. It also allowed, understand
and visualize the violence experienced by the pregnant in its several contexts: family,
work, community where lives and in the hospital institution to one that recurs. We
considerer be relevant arise to all historical-social context that envelop a pregnant,
particularly the one that has a morbidity associated. And also, offer an integral care,
that value the gender perspective, focused more in the health-disease process and in
the humanization, therefore, minimizing the medical aid.
Keywords: Pregnancy. Violence against the Woman, Hypertensive Syndrome,
Nursing
21
SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS ....................................................................
11
1
APRESENTAÇÃO DA TEMÁTICA ...........................................................
21
1.1
Violência contra a mulher.........................................................................
21
1.2
Vivendo a Gestação de risco e a violência.............................................
28
2
METODOLOGIA ........................................................................................
36
3
RESULTADOS E ANÁLISES.....................................................................
44
3.1
A violência na perspectiva da gestante com Síndrome Hipertensiva:
um olhar de quem a vivenciou.................................................................
44
3.1.1
Dificuldade em explicar a violência.............................................................
44
3.1.2
A violência como violação dos direitos humanos........................................
45
3.1.3
A violência como algo inerente ao contexto familiar...................................
49
3.2
Violências vivenciadas por gestantes com síndromes hipertensivas
e suas repercussões.................................................................................
51
3.2.1
Violência vivenciada na gestação: uma experiência do cotidiano
familiar.........................................................................................................
51
3.2.2
Violência vivenciada na gestação: uma experiência do cotidiano
comunitário..................................................................................................
59
3.2.3
Repercussão da violência: uma perspectiva da gestante ..........................
68
4
CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES .................................
77
REFERÊNCIAS...........................................................................................
81
APÊNDICE A Termo de autorização para coleta de dados ....................
87
APÊNDICE B Termo de consentimento livre e esclarecido ....................
88
APÊNDICE C Instrumento para caracterização do sujeito......................
89
APÊNDICE D Roteiro para entrevista semi-estruturada..........................
90
APÊNDICE E Quadro de Categorização das entrevistas........................
91
ANEXO A Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa..........................
93
ANEXO B Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa..........................
94
22
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente estudo tem como objeto a perspectiva de gestantes com
síndromes hipertensivas sobre as repercussões da violência vivida na gestação.
O interesse pelo mesmo surge a partir de minha prática como enfermeira
obstétrica no setor de uma maternidade de referência para gravidez de risco, ou
seja, gestantes com alguma morbidade associada, principalmente as com
Síndromes Hipertensivas.
Ao acolher as gestantes durante a internação verificava, através de
expressões verbais e não verbais que algumas possuíam histórias que traziam à
tona ansiedade, estresse, tensão e sofrimentos que acarretavam agravos ao seu
quadro clínico-obstétrico. Percebia claramente, que algumas gestantes faziam
relação do seu quadro hipertensivo com seu contexto social, considerando-o como
fator de origem ou de alteração de sua pressão arterial.
Ao serem questionadas sobre o que as levou a estarem com a pressão alta,
com necessidade de internação, muitas relataram problemas particulares que no
decorrer da conversa foram sendo colocados, como: dificuldades econômicas, o
relacionamento com o chefe no trabalho, as preocupações diversas com os filhos,
desentendimentos com familiares e com o companheiro, e também a ocorrência de
situações de violência (doméstica, intrafamiliar, de gênero, institucional, social). Tal
fato propiciava o surgimento de agravos para a gravidez, tendo por conseqüência a
necessidade de internação.
A internação, por sua vez, ao promover o afastamento de seu contexto social,
de seus entes queridos, do seu emprego por longo período, a própria perda de sua
autonomia e privacidade no interior da instituição de saúde, na maioria dos casos
gerava novas preocupações e ansiedades dificultando a normalização da pressão
arterial. Essas situações as mobilizavam e muitas mulheres demonstravam,
inclusive, preocupação com a possibilidade de que estas facilitassem alteração do
seu quadro fisiopatológico, comprometendo física ou emocionalmente sua saúde e
conseqüentemente, sua gestação.
Intrigada com tais situações despertei acerca da violência na gestação,
buscando entender sua influência na saúde dessa mulher e do seu filho,
particularmente, sobre o estado obstétrico e perinatal. Questionava-me
principalmente, sobre a dimensão das situações não clínico-obstétricas pouco
23
valorizadas durante o cuidar destas gestantes e a relação destas com o processo de
saúde-doença da mulher. As condições de conflitos, as situações de violência
poderiam afetar essas mulheres grávidas? De que forma? Será que essas gestantes
relacionam ou não a vivência da violência na gestação e o desenvolvimento de um
risco obstétrico, como os das Síndromes Hipertensivas? Minhas inquietações
embasavam-se na busca por melhores êxitos junto a essa clientela, no sentido de
apontar um cuidado mais integral por toda a equipe profissional.
É notório o fato de que a violência é um problema muito complexo em virtude
da sua multicausalidade, assim como o seu impacto na saúde das populações,
representando ameaça de vida, produzindo enfermidades e podendo provocar até a
morte.
Várias o as conseqüências da violência para a saúde da mulher,
particularmente, para o processo gestacional e o desenvolvimento do concepto.
Dentre elas se destacam: o adiamento do início do pré-natal, a diminuição dos
números de consulta, o ganho de peso insuficiente durante a gestação, abortos
espontâneos e/ou induzidos, complicações clínico-obstétricas, partos prematuros,
baixo peso ao nascer, riscos de infecções genitais e do trato urinário e a morte da
gestante ou do concepto. Além desses, há também alguns efeitos emocionais
como: a depressão, angústia, baixa-estima, isolamento social, insegurança,
distúrbios do sono, presença de dores abdominais recorrentes, lombalgias crônicas,
cefaléias, contusões localizadas, tentativas e idéias de suicídios, uso abusivo do
álcool, drogas e cigarro (PARKER et al., 1994; VALDEZ-SANTIAGO; SANÍN-
AGUIRRE, 1996; HEISE et al., 2002; BRASIL, 2004; BRASIL, 2005a).
Em estudo com 800 puérperas que deram à luz em maternidades públicas do
Rio de Janeiro, chama-se a atenção para a grande parcela de mulheres que havia
convivido com algum tipo de violência em seus lares durante a gravidez. Estima-se
que 58.000 mulheres atendidas nas maternidades públicas da cidade conviviam com
algum tipo de violência e que, dentre estas, 38.000 participavam de situações graves
(MORAES; REICHENHEIM, 2002).
Somados a esses transtornos vinculados à saúde da mulher, os
diretamente relacionados com a saúde do feto, onde podem ser devastadoras as
conseqüências, como: o baixo peso de nascimento (PARKER et al., 1994; VALDEZ-
SANTIAGO; SANÍN-AGUIRRE, 1996), aborto espontâneo, descolamento prematuro
de placenta, hemorragias intracranianas com conseqüente morte fetal,
24
prematuridade (GOODWIN; BREEN, 1990; BERENSON et al., 1994), restrição de
crescimento intra-uterino, ruptura uterina, nati e neomortalidade, doença hipertensiva
específica da gravidez (JANSSEN et al., 2003; MENEZES et al., 2003) e
corioamnionite (BERENSON et al., 1994; CUNNINGHAM et al., 1997).
Assim, ao vivenciarem a violência, muitas mulheres, além dos sinais visíveis
de depressão, ansiedade, medo, traumas, isolamento, podem também desenvolver
sinais clínicos de patologias sérias, como: alterações da pressão arterial, do nível de
glicose, hormonais, alterações na coagulação, dentre outros. Tais alterações,
quando associadas à gravidez, podem desencadear um quadro mais sério que nem
sempre somente a terapia farmacológica resolve. a necessidade de diagnosticar
e tratar a causa não - clínica, como no caso da violência, a qual pode agir trazendo
conseqüências sobre todo o organismo, gerando complicações emocionais e
psicológicas.
Ao consideramos o indivíduo como um ser integral, é necessário minimizar
tais conflitos e valorizar a interferência destes sobre a saúde, em especial da
população feminina. É de conhecimento de todos que ansiedades e estresses
constituem um dos principais fatores de risco para desenvolverem doenças
cardiovasculares que por sua vez, são a primeira causa de morte no Brasil, em
mulheres no período reprodutivo, cerca de 30% (BRASIL, 2004).
Infelizmente, os atos violentos têm estado presentes nas relações entre
homens e mulheres. Tal fato, possivelmente, decorre do contexto sócio-histórico-
cultural e econômico do papel da mulher e do homem na sociedade. Ressalto,
entretanto, que alguns níveis de violência à mulher o exercitados com legitimação
social, cujas margens de aceitabilidade são mutáveis no tempo. Ao refletirmos sobre
o fenômeno da violência é necessário destacar que sua existência é o próprio
desrespeito à Declaração Universal dos Direitos Humanos (BARSTED; HERMANN,
2001).
A violência vivenciada pela mulher no seu cotidiano se caracteriza pelo
desrespeito aos direitos humanos, reprodutivos e sexuais e pode ser definida como
todo ato baseado no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual e
psicológico à mulher, tanto na esfera pública ou privada, como recomendada na
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a
Mulher de Belém do Pará (Organizações das Nações Unidas - ONU, 1999).
25
Geralmente, tem sua origem nas questões de gênero e nas desigualdades, que
influenciam diretamente a relação de homens e mulheres, atribuindo ao homem o
exercício de controle e poder sobre a mulher, e a esta uma postura de
subalternidade. Essa relação de poder ocorre também no mundo privado, tornando-
a invisível, se não for denunciada.
No mundo privado, ou seja, no ambiente familiar, numa perspectiva sócio-
histórica e de gênero, a mulher é um dos grupos populacionais mais vulneráveis à
violência nesse cenário, assim como as crianças, adolescentes, idosos e portadores
de necessidades especiais.
Para um melhor entendimento, destaco que a violência contra a mulher é
denominada de violência doméstica quando cometida por qualquer membro da
família ou outra pessoa sem função de parentesco, que conviva no espaço
doméstico. E, violência intrafamiliar é toda ação ou omissão que prejudique a
integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito ao pleno desenvolvimento de
outro membro da família. Pode ser acometida dentro ou fora de casa por algum
membro da família (BRASIL, 2001).
Pesquisa realizada sobre violência contra a mulher no ambiente doméstico,
pela Sociedade Mundial de Vitimologia (IPAS BRASIL, 2007) demonstrou que numa
população de 138 mil mulheres de 54 países, 23% das mulheres brasileiras estão
sujeitas à violência doméstica, e que a cada quatro minutos, uma mulher é agredida
em seu próprio lar por uma pessoa com quem mantém relação de afeto. Constata-se
que dos incidentes que acontecem dentro de casa, em 70% o agressor é o próprio
marido ou companheiro e mais de 40% das violências resultam em lesões corporais
graves decorrentes de socos, tapas, chutes, amarramentos, queimaduras,
espancamentos e estrangulamentos.
Infelizmente, durante meu processo de formação e mesmo durante o
quotidiano de minha prática profissional junto à equipe de saúde de uma
maternidade - referência para gestação de risco, não observei qualquer atitude de
valorização em considerar a relação do quadro de morbidade da gestante com
outros fatores psico-sociais, como por exemplo, o fenômeno da violência.
Geralmente, limita-se a análise da morbidade por meio dos mecanismos
fisiopatológicos da doença. Acredito que tal fato seja decorrente de um modelo
assistencial ainda calcado nos princípios biomédicos e por ser a violência, um tema
recente no setor da saúde, ainda não discutido de forma mais ampliada nos
26
currículos da área da saúde e nem valorizada como agente de morbidade e sim,
como caso de polícia.
Classificar a gestação como de risco ou não de risco, nos remete a definição
do que vem a ser risco. Para nós o risco é a probabilidade de um determinado fator
causar danos a uma gestação. E, o fator de risco, no caso da gestação são as
condições existentes no contexto da mulher de agravar sua gestação. Deste modo,
estamos de acordo que a gestação de risco é aquela onde a vida ou saúde da mãe
e/ou do feto e/ou do recém-nascido têm maiores chances de serem atingidas que as
da média da população considerada, como explica Caldeyro-Barcia (BRASIL, 2000).
Compreendemos neste estudo que a violência se constitui em fator de risco
porque desencadeia condições que agravam ao estado da gestante, em particular
as com síndromes hipertensivas que atualmente são responsáveis pelos maiores
índices de morbimortalidade materna e fetal (BRASIL, 2004).
Torna-se, a cada dia, mais claro para nós que a violência contra a mulher é
um importante e complexo problema de saúde pública. Dessa forma, é de
fundamental importância que haja a revisão dos fatores causais das gestações de
risco. Para isso, é necessário rever também, a formação do profissional de saúde,
em especial do enfermeiro, para que este possa adquirir competências durante a
graduação, no sentido de identificar e propor soluções para cada caso. A inserção
da temática ainda no processo de formação permite a reflexão e revisão de seus
preconceitos, atentando que esta é uma situação que pode ocorrer com qualquer
pessoa; assim como para possíveis situações que possam contribuir para promover
a violência ou mascarar o seu diagnóstico (PENNA, 2005).
A possibilidade de tornar mais visível a violência é importante forma de
enfrentamento da mesma. O profissional de saúde, principalmente o enfermeiro
instrumentalizado, poderá identificar a mulher que está sendo acometida ou
exercendo algum tipo de violência e perceber o prejuízo que tal comportamento traz
à sua saúde. E, no período gestacional não é diferente, principalmente por ser um
dos períodos em que a mulher fica mais suscetível às reações emocionais e sociais
decorrentes da mudança de seu papel social como mulher.
Estudos como os de Schraiber; D‟Oliveira (1999) e Mcfarlane et al. (1992)
mostram que a prevalência da violência na gestação tende a ser ainda maior que os
índices encontrados para violências físicas e sexuais em populações não - grávidas,
levando alguns autores à conclusão de que a gravidez representa um risco para
27
uma violência maior. Eles confirmam que as altas prevalências de violência na
gestação não se estendem para além do abuso físico, incluem a esfera sexual,
psicológica e social.
Dados do Ministério da Saúde informam que as mulheres em idade
reprodutiva, ou seja, de 10 a 49 anos, o 58.404.409, e representam 65% de um
total da população feminina de 73.837.876 (BRASIL, 2004). Desse total, não
diferente do panorama mundial, a maioria vivencia a violência durante sua vida e
geralmente, muito antes dos 10 anos de idade, já são vítimas da violência doméstica
ou intrafamiliar.
Ao iniciar a vida profissional, sua realidade é um ganho salarial menor que o
do homem, apesar de desempenharem papéis iguais. Concentram-se em profissões
mais desvalorizadas; o seu acesso a espaços de decisão no mundo político e
econômico é menor, enfrentando ainda maiores dificuldades de luta a favor de seus
direitos.
Tais mulheres enfrentam ainda jornadas de trabalho maiores, muitas vezes
duplas ou triplas; com uma maior sobrecarga de responsabilidade, como se observa
a condição de algumas mulheres que chefiam famílias. Fazem parte de sua vida o
sedentarismo; a alimentação; o tabagismo; a competitividade; o assédio moral e
sexual no mundo do trabalho; além de não conseguirem acesso a serviços de saúde
e políticas sociais para elas e seus familiares. Além disso, associa-se a condição
cultural às situações de desigualdade social, como: classe social, etnia, raça, idade e
orientação sexual. Estas situações comprometem a saúde tanto física como mental
e social de muitas mulheres, limitando o seu desenvolvimento e gerando a doença.
Deve-se considerar que a maternidade é um dos atributos que a sociedade
impõe à mulher como de sua responsabilidade e que esta por si só, pode em alguns
casos tornar-se mais um problema. Trata-se de um novo ser, totalmente dependente
e que muitas vezes não foi desejado e planejado, podendo em alguns casos ser
fruto de uma violência ou de uma desinformação.
Essas situações latentes de violência são de difícil visibilidade e diagnóstico,
pois a mulher tem medo de denunciar o agressor e vive sob regime de ameaças. E,
é nestes casos, que algumas gravidezes têm início, pois a mulher é forçada a
praticar relações sexuais e muitas vezes proibida de utilizar um contraceptivo. São
situações que perduram por anos gerando processos de morbidade, e que devem
ser considerados como um risco para a hipertensão arterial.
28
Ao debruçarmos sobre os indicadores de saúde feminina verificamos que, no
Brasil, as principais causas de morte da população feminina o as doenças
cardiovasculares, destacando-se o infarto agudo do miocárdio e o acidente vascular
cerebral; as neoplasias, doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas, com
destaque para a hipertensão arterial e os diabetes; e as causas externas. E em
relação as gestantes, a primeira causa da mortalidade materna é a hipertensão
arterial seguida de hemorragias e infecção, ou seja, todas consideradas evitáveis
(BRASIL, 2004).
As Síndromes Hipertensivas são situações clínicas freqüentes durante a
gestação. Encontra-se entre as principais causas de óbitos ligados à gravidez, ao
parto e ao puerpério, sendo sua taxa a mais elevada, 29,8%, seguida da
hemorragia, 18,5%, das complicações do puerpério, 15,4%, e dos abortos, 11,6%.
(BRASIL, 2007a; BOTELHO, 2007; BERQUÓ et al, 1995). E sua ocorrência é um
dos fatores que aumenta a morbimortalidade materna, a prematuridade e a
mortalidade perinatal, na maioria das vezes devido à necessidade de se interromper
a gestação para não levar à mortalidade materna.
Considerando que a elevação da pressão arterial, assim como todo processo
que envolve a saúde e a doença, o se limita ao aspecto clínico, e que para sua
compreensão é necessário inseri-la em um contexto muito mais amplo, o qual deve
considerar a experiência cotidiana e a subjetividade como componentes
fundamentais; entendemos que não são apenas as condições biológicas que devem
ser valorizadas no cuidar.
Analisando a forma de assistência recebida pela mulher nos diversos setores
da saúde, pode-se verificar que a mesma resulta em resolver as causas dos
problemas através da medicalização. E nem todas as causas tem fundamentação no
biológico, podendo ter sua origem no social, o qual pode atingir o psicológico, e que
por conseqüência interfere no organismo (biológico).
Dentre as causas sociais, podem-se destacar os conflitos e violência
vivenciados nas diversas formas de relações (conjugal, trabalhista, na comunidade e
mesmo nas instituições) como sendo um dos fatores a desenvolver patologias como
a hipertensão arterial, as quais podem gerar complicações de maior relevância
durante o período gravídico-puerperal podendo ser importante fator de
morbimortalidade materna e fetal (VIEIRA, 2003).
29
A ocorrência dessas complicações pode ser precipitada por mudanças
internas, como: crises normais do desenvolvimento, no caso a própria gestação;
doenças ou traumas; ou externas como: perda ou ameaça de perda de uma fonte de
segurança e satisfação; acúmulo de tensões que ameaçam romper o equilíbrio
funcional dos mecanismos adaptativos do ego, que podem ser causados pela
relação de violência diária gerando a insegurança, a ansiedade e o estresse,
desenvolvendo um processo patológico (MALDONADO, 1997).
Diante de tais considerações, emergiram de nossas reflexões as seguintes
questões norteadoras:
Como a gestante com Síndrome Hipertensiva define a violência contra
a mulher?
Quais os tipos de violência vivenciados pelas gestantes internadas com
Síndrome Hipertensiva durante a gestação atual?
Quais as repercussões da violência vivida por gestantes com Síndrome
Hipertensiva a partir de sua própria perspectiva?
A valorização pelo entendimento das gestantes com Síndrome Hipertensiva
acerca da violência vivida e a repercussão desta sobre seu estado de saúde é
fundamentada no fato de acreditarmos que a mulher percebe haver tal relação.
Entretanto, tais observações não são apontadas nas anamneses realizadas por
profissionais de saúde, por geralmente o haver espaço de escuta nos
atendimentos e serviços clínico-obstétricos.
Diante destas questões traçamos os seguintes objetivos:
Descrever a definição da violência contra a mulher na perspectiva da
gestante com Síndrome Hipertensiva.
Discutir os tipos de violência vivenciados por gestantes com
diagnóstico de Síndrome Hipertensiva.
Analisar as repercussões da violência sobre a gestação na perspectiva
da gestante com Síndrome Hipertensiva que a vivenciou.
Considerando que o período gestacional consiste ainda num dos únicos
momentos que a mulher brasileira procura atendimento de saúde, entendemos que
pesquisar a relação estabelecida pelas próprias gestantes de risco sobre a vivência
da violência e sua repercussão sobre a gestação poderá contribuir como subsídios
às futuras pesquisas e também na construção de estratégias que auxiliarão na
30
minimização de tais fenômenos negativos à saúde da população feminina,
particularmente no período gestacional. Acreditamos que as pesquisas que
valorizam a realidade e a vivência da clientela, dando voz à mulher para relatar o
que se passa com ela e o que ela precisa enquanto usuária de um serviço, muito
contribui na reflexão e construção dessas estratégias.
Mediante as conseqüências que a violência pode causar a mulher e ao feto e
a partir das estatísticas de morte materna, principalmente no que diz respeito às
omissões, tratamento incorreto, cabe aqui ressaltar a importância desse estudo para
que possamos estar atentos a qualquer tipo de fator que possa trazer complicações
durante o período gestacional.
A identificação de sinais ou mesmo o relato da gestante mediante a
preocupação do profissional, se esta vivencia ou não violência, é mais uma forma de
estarmos prevenindo agravos, cuidando dessa gestação e dessa mulher, para que
não seja um fator a mais de morbimortalidade para a mãe e o feto.
Consideramos que este trabalho permitirá o despertar de profissionais para
ampliarem a visão sobre sua prática e formas de cuidar, visualizando a violência
como um fator de risco para várias patologias originárias de um processo de trauma
psicológico ou social assim como valorizar a assistência multiprofissional de modo a
desenvolver estratégias para o cuidar dessa gestante. Nesse sentido o enfermeiro
de forma especial, deve enfatizar a assistência voltada para uma mulher inserida no
seu contexto familiar e sociocultural, não limitada apenas ao modelo assistencial
existente, fragmentado e curativo. Acrescente-se que este profissional também
deverá estar apto para desenvolver o olhar de sua equipe para uma escuta mais
apurada e sem preconceito dos relatos das gestantes e trabalhos educativos com a
família desta, no decorrer da gravidez.
Dessa forma, o desenvolvimento da presente pesquisa, que está inserida no
Grupo de Estudos sobre Violência e Saúde da Mulher do Núcleo de Estudos e
Pesquisas de Enfermagem, Mulher, Saúde e Sociedade NEPEN contribuirá para o
aprofundamento da temática da violência contra a mulher, particularmente, nas
relações de cuidado da enfermeira obstétrica junto à mulher grávida que vivencia
violência durante o período gestacional.
A temática dessa pesquisa envolve duas seções, as quais serão abordadas
de forma a situar o leitor. São elas: a violência contra a mulher e vivendo a gestação
de risco e a violência. Iniciei com a definição da violência contra a mulher, seus
31
tipos, classificações, dentre outros. E, na segunda seção evidenciamos as
conseqüências da violência para a mãe e para o feto, a saúde reprodutiva, os
principais dados de mortalidade e a síndrome hipertensiva, que é um dos principais
fatores de risco maternos.
32
1 APRESENTAÇÃO DA TEMÁTICA
1.1 A Violência Contra a Mulher
Segundo o Relatório Mundial sobre Violência e Saúde desenvolvido pela
Organização Mundial de Saúde OMS (KRUG et al, 2002), a violência é definida
como o uso da força física ou do poder real, ou em ameaça contra si próprio, contra
outra pessoa, ou ainda contra um grupo ou comunidade que resulte ou tenha
qualquer possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de
desenvolvimento ou privação.
A violência pode ser expressa de forma visível (terrorismo, guerras, rebeliões,
tumultos civis) e invisível (nos lares, locais de trabalho, instituições e outros). Não
tem raízes biológicas, mas afeta diretamente o indivíduo, constituindo-se atualmente
num grave problema de saúde pública. É um complexo e dinâmico fenômeno
psicossocial, sendo criado e desenvolvido na vida em sociedade (KRUG et al, 2002;
MINAYO, 2003).
No Brasil constitui-se na segunda causa de morte perdendo apenas para as
doenças cardiovasculares. Os acidentes de trânsito e a crescente freqüência dos
homicídios foram os responsáveis pela maior magnitude e impacto desse grupo de
mortes em relação às outras causas. A violência vem constituindo-se em uma das
principais causas de morbimortalidade em todo o mundo, apresentando diversas
facetas que afetam, de modo diferenciado, a população. Dentre estas, a violência
contra a mulher que nos últimos anos vem sendo especialmente mais abordada
(PENNA, 2005).
Distinguimos, também, os tipos de violência a partir do local da ocorrência e
do agressor: violência no âmbito doméstico (violência doméstica), violência praticada
por familiares (violência intrafamiliar), as violências praticadas pelo fato de serem
mulheres (violência de gênero), o assédio moral (violência no trabalho) e também a
violência no serviço público e privado (violência institucional) (BRASIL, 2001).
A Violência Doméstica é geralmente aquela cometida por pessoas íntimas,
envolvendo também filhos, pais, sogros e outros parentes ou pessoas que vivam na
mesma casa. É considerada uma prática de tradição nos relacionamentos conjugais
e, geralmente, é confundida com a Violência Intrafamiliar (SCHRAIBER;
D‟OLIVEIRA, 1999; BRASIL, 2002a; KRUG et al 2002; HEISE, 2002).
33
Conceitua-se a Violência Intrafamiliar como toda ação ou omissão que
prejudique o bem-estar, a integridade física, a psicológica ou a liberdade e o direito
ao pleno desenvolvimento de outro membro da família. Pode ser cometida dentro ou
fora de casa por algum membro da família, incluindo pessoas que passam a assumir
função de parentesco, ainda que sem laços de consangüinidade, e em relação de
poder à outra. E, esta não se refere apenas ao espaço físico onde ocorre a violência,
mas também às relações em que se constrói e efetua (BRASIL, 2002a).
Distingue-se violência doméstica de violência intrafamiliar por incluir outros
membros do grupo, sem função de parentesco, que convivam no espaço doméstico.
Incluem-se nesse grupo, empregadas ou empregados, pessoas que convivem
esporadicamente, agregados.
Define-se violência contra a mulher qualquer ato ou força física ou verbal,
coerção ou privação que atente contra a vida, dirigido a uma mulher, adolescente ou
menina, que cause dano físico ou psicológico, humilhação ou privação arbitrária da
liberdade e que perpetue a subordinação feminina. Pode se manifestar de várias
formas, como: física, sexual, psicológica, moral e patrimonial; e ser acometida por
parceiros íntimos e/ou familiares, ou pessoas conhecidas ou não, através do
estupro, do abuso sexual de meninas, do assédio sexual e moral no local de
trabalho, da violência contra a homossexualidade, do tráfico de mulheres, do turismo
sexual, da violência étnica e racial, da violência cometida pelo Estado, por ação ou
omissão, da mutilação genital feminina, da violência e dos assassinatos ligados ao
dote, do estupro em massa nas guerras e conflitos armados (BRASIL, 2001).
A Violência Contra a Mulher diz respeito a sofrimentos e agressões dirigidos,
especificamente, às mulheres, pelo fato de serem mulheres, podendo ser
classificada também como Violência de Gênero. Isto significa a diferença de status
social da condição feminina, diferença esta que faz certas situações de violência
experimentadas pelas mulheres, parecerem experiências de vida usuais,
especialmente a violência que se por agressores conhecidos, próximos e de
relacionamento íntimo (SCHRAIBER; D„OLIVEIRA, 1999).
Encontramos também violência nos ambientes de trabalho, onde geralmente
em função das relações de poder (gênero) desiguais entre funcionária e
chefia/patrão a ocorrência de assédio moral. O assédio moral é considerado pelo
Ministério do Trabalho e Emprego como toda e qualquer conduta que caracteriza
comportamento abusivo, de forma freqüente e intencional, através de atitudes,
34
gestos, palavras ou escritos, que possam ferir a integridade física ou psíquica de
uma pessoa, vindo a pôr em risco o seu emprego ou degradando o seu ambiente de
trabalho (BRASIL, 2007b).
A capacidade da gestante, que desempenha o trabalho no ambiente público,
de se rebelar contra a vivência do assédio moral é limitada, vai depender do seu
perfil psicológico e da sua condição social. Ao se sujeitar às diversas humilhações, a
gestante possivelmente poderá adoecer psicológica ou fisicamente, refletindo numa
diminuição no desempenho do seu trabalho e na motivação em desempenhá-lo.
Também encontramos reflexo das relações de gênero desiguais nas instituições de
saúde, particularmente ao debruçarmos sobre as questões referentes à saúde
reprodutiva. A violência institucional é aquela acometida por instituições prestadoras
de serviço público, e é perpetrada por agentes que deveriam proteger as mulheres
da violência, prestando uma assistência humanizada, preventiva e reparadora
(AGENDE, 2005).
As instituições de saúde são locais que deveriam acolher a gestante de forma
humanizada, ouvindo suas queixas e resolvendo da melhor forma. Nem sempre isto
acontece, muitas vezes são situações de constrangimento e despersonalização
dessa mulher, sendo locais de produção e reprodução de situações de violências,
como: a falta de recursos materiais, a falta de recursos humanos qualificados na
assistência, a falta de vagas, com a peregrinação da mulher, a medicalização do
corpo feminino, dentre outros. Essa violência atinge os direitos de saúde e
reprodutivos da mulher.
Podemos perceber que as classificações e, conseqüentemente, os conceitos
de Violência Contra a Mulher, muitas vezes, se entrelaçam. Sendo que as relações
conjugais representam o ponto principal das grandes queixas em torno da violência
doméstica, seguindo com a violência contra crianças. E, sendo responsáveis pela
maior parte das transformações sociais e das iniciativas, públicas e privadas, nesse
campo.
A violência contra a mulher traz as mais diversas conseqüências, que podem
ser: múltiplas, variadas, alarmantes, mortais e não mortais. Heise (2002) demonstra
que, em diversos países, as conseqüências do estupro e da violência doméstica e
sexual são maiores que as conseqüências de todos os tipos de câncer, e pouco
menores que os efeitos das doenças cardiovasculares. A autora inclui nas
conseqüências não mortais, desde lesões permanentes, problemas crônicos, tais
35
como dor de cabeça, dor abdominal, infecções vaginais, distúrbios diversos, como
insônia, falta de apetite, doenças com efeitos retardados, porém contínuos, como
hipertensão, artrite e doenças cardíacas, até drogas, dentre outros.
Além desses transtornos na saúde da mulher verifica-se que nas economias
mais desenvolvidas, 19% dos anos de vida perdidos por morte ou incapacitação
física, por mulheres entre 15 a 44 anos, resultam da violência de gênero (SUAREZ
et al, 1999). Além de que as mulheres se tornam mais dependentes
economicamente do parceiro, dificultando sua saída desse tipo de relação; e quando
trabalham o índice de absenteísmo é elevado, acarretando um custo para o
empregador; com baixa produtividade; alto custo com processos judiciais e medidas
de proteção e usam o sistema de saúde por um tempo maior.
A saúde reprodutiva é definida, pela Conferência Internacional sobre
População e Desenvolvimento (BARSTED, 1996), como um estado geral de bem-
estar físico, mental e social, e não a mera ausência de doenças ou dores, em todos
os aspectos relacionados com o sistema reprodutivo e suas funções e processos.
São várias as conseqüências da violência na saúde reprodutiva, sendo a gravidez
indesejada e as doenças sexualmente transmissíveis (DST) as de maior dificuldade
das mulheres de se protegerem. Temos também, a multiparidade com curto intervalo
intergestacional, o aborto espontâneo ou sem segurança, o início tardio do pré-natal,
dieta desequilibrada, a depressão pós-parto, dificuldades no aleitamento materno e
outras complicações.
Infelizmente, a violência vem ocorrendo diariamente, fazendo parte das
relações humanas, o que não deveria acontecer. Ela é considerada como sendo
complexa, pois atinge o biopsicossocial do ser humano. Ocorre tanto no espaço
público quanto no particular, fazendo parte de toda a sociedade, dos mais pobres
aos mais ricos. Ela ocorre quando se utiliza a força, seja da forma física, psicológica
ou verbal, para alcançar determinado objetivo.
Diante dessas conseqüências e de vários esforços para entender o porquê da
violência, a Organização Mundial de Saúde elaborou o Relatório Mundial sobre
Violência e Saúde (KRUG et al, 2002) e propôs um modelo ecológico para facilitar o
melhor entendimento dos fatores que propiciam a violência, dividindo-os em vários
níveis.
Primeiro nível - Fatores Individuais São os fatores biológicos e
pessoais que cada pessoa possui, concentrando-se nas características
36
que aumentam a possibilidade do indivíduo ser a vítima ou o
perpetrador da violência, como: rendimento escolar, o uso de drogas
lícitas e não - lícitas, poder econômico, dentre outros.
Segundo nível - Fatores relacionais Está vinculado às interações
sociais, como: os relacionamentos mais próximos dos companheiros,
dos colegas, dos parceiros íntimos, dos membros de família; e a
influência sobre o indivíduo.
Terceiro nível Fatores comunitários Sendo nomeados os locais de
trabalho, a escola e a vizinhança, tendo os problemas de desemprego,
o tráfico de armas e de drogas e, o isolamento social em que vivem
determinadas famílias.
Quarto nível - Fatores sociais - é mais amplo, e inclui as normas
culturais; as atitudes que consideram a opção pelo suicídio como um
direito individual; normas que dão prioridades aos pais sobre a criança;
normas que afirmam o domínio do homem sobre a mulher, que validam
o uso da força pela polícia contra os cidadãos e as que apóiam os
conflitos políticos. Podendo incluir numa visão mais ampla as políticas
de saúde, educacionais, econômicas e sociais.
Os atos violentos mais comuns contra a mulher podem ser classificados de
acordo com sua natureza: físico, quando uma pessoa, que está em relação de poder
em relação à outra, causa ou tenta causar danos físicos não acidentais;
psicológico quando toda ação ou omissão que causa ou visa a causar dano à auto-
estima, à identidade ou ao desenvolvimento da pessoa; sexual quando uma pessoa
em relação de poder e por meio de força física, coerção ou intimidação psicológica,
obriga uma outra ao ato sexual contra a sua vontade. E, o social que ocorre nas
relações sociais de gênero, como a posição da mulher no mercado de trabalho e na
sociedade (BRASIL, 2002a).
Como exemplos de atos de violência física: os empurrões, atirar objetos,
sacudir, esbofetear, bater, espancar, contusões, estrangular, chutar, torcer os
braços, queimar, perfurar, mutilar, torturar, usar armas brancas ou de fogo. Os
psicológicos o: intimidar com ameaças, diminuir, fazer a pessoa sentir-se mal
consigo mesma, xingar, fazer a pessoa pensar que está louca, provocar confusão
mental, fazer a pessoa se sentir culpada; humilhar, coagir, cercear, controlar os
movimentos e perseguir; usar os filhos para fazer chantagem; isolar a vítima de
37
amigos e parentes, além de controlar, reter, tirar o dinheiro da vítima. Os sexuais
são: forçar as relações sexuais quando a pessoa não quer, quando está dormindo
ou doente; forçar a prática de atos que causam desconforto ou repulsa; obrigar a
mulher a olhar imagens pornográficas, quando ela não deseja; obrigar a tima a
fazer sexo com outras pessoas. Além destes, temos os sociais o qual a mulher
recebe menor salário que o homem, mesmo desempenhando a mesma atividade,
discriminar por atributos de gênero ou por aparência, assediar sexualmente, exigir
atestado de laqueadura ou negativo de gravidez para emprego, e promover e
explorar a prostituição e o turismo sexual de meninas e de adultas (BRASIL, 2005a;
GOMES, 2005).
Como conseqüência dessa violência seja física, psicológica, sexual, gênero e
social; temos como sinais e sintomas as contusões, hematomas generalizados,
inflamações, fraturas, queimaduras, gravidezes indesejadas, DST/AIDS, estado de
choque, crise do pânico, medo, confusão, fobias, insônias, pesadelos, auto-
reprovação, insegurança, culpa, baixa auto-estima, comportamento autodestrutivo
como uso de drogas e álcool, depressão, isolamento por medo, dentre outros
(BRASIL, 2004).
Em São Paulo, estudo em um serviço de atenção primária mostrou que 57%
das mulheres atendidas relataram algum episódio de violência na vida
(SCHRAIBER; D‟OLIVEIRA, 1999). Como previamente mencionado, a violência que
mais acomete a mulher é a de gênero, no qual se baseiam no que a sociedade
determina, e culturalmente aprendidas. A mulher é educada para casar e ter filhos,
sendo a principal função a sexualidade e a procriação. Suarez et al (1999), afirma
que essas representações são legitimadas pela visão essencialista de que mulheres
são mães por natureza, e que são responsáveis pela estrutura familiar.
A família é a primeira sociedade que o indivíduo faz parte e podemos chamá-
la de micro sociedade em tamanho, mas uma macro-sociedade na importância que
estabelece no desenvolvimento do indivíduo, onde aprenderemos valores,
costumes, crenças que irão formar a personalidade e a parte emocional das
pessoas. É através do relacionamento de afeto que a dinâmica e a organização da
família ocorre, com suas diferenças de poder entre os sexos e no contexto afetivo.
Essa dinâmica no relacionamento entre os membros da família, se não houver a
compreensão e a tolerância, poderá tornar-se violenta. E, com o tempo essa
violência poderá ser repetitiva e tornar-se progressivamente mais grave.
38
O impacto da violência repercute seriamente na saúde das mulheres e
conseqüentemente, na sua qualidade de vida. Desencadeia prejuízos na saúde
reprodutiva da mulher acarretando gestações de risco e mesmo gravidezes não -
planejadas (SCHRAIBER et al., 2005).
A violência contra a mulher e suas conseqüências muitas vezes são invisíveis
para o serviço de saúde e essas mulheres acabam sendo rotuladas como
poliqueixosas, somatizadoras ou portadoras de distúrbios neuro-vegetativos. Os
processos patológicos que surgem associados à violência e ao sofrimento
psicoemocional, se não forem abordados de forma integrada, resultam em casos de
difícil solução (SCHRAIBER; D‟OLIVEIRA, 2003).
A gravidez em algumas situações é tida como fator de risco para a violência
doméstica, podendo esta ter início depois da gestação ou alterar o padrão quanto à
freqüência e gravidade neste período (MENEZES et al, 2003). Portanto, a violência é
considerada fator desencadeante dos fatores de risco, assim como: as condições
sócio-econômicas, a idade, a nutricional, dentro outros, que poderão ser a causa do
agravamento ou surgimento de uma patologia na gestação.
Assim, torna-se oportuno refletir que a violência é um dos possíveis fatores de
risco gestacional. É possível suspeitar que a violência possa ser uma causa do
agravamento ou surgimento de um de risco ou um dano à saúde da gestante.
No modelo biomédico de assistência, como ainda não uma valorização da
violência como um fator de riscos para complicações do estado de saúde, muitos
profissionais não conseguem percebê-la como tal e diagnosticá-la. A terapêutica do
risco gestacional é geralmente restrita às causas fisiopatológicas e ou clínico-
obstétricas. Tal conduta, muitas vezes, o consegue evitar uma complicação e ou
mesmo tratá-la com êxito.
Na implementação das atividades de assistência à gestante, é necessário
identificar os fatores de riscos a que cada uma está exposta. Isso permitirá a
orientação e os encaminhamentos adequados em cada momento da gravidez. É
indispensável que esta avaliação do risco seja permanente, ou seja, aconteça em
todo acompanhamento gestacional.
39
1.2 Vivendo a Gestação de risco e a violência
No Brasil, em função das diferenças sociais, culturais, econômicas e políticas
existentes em suas regiões percebemos uma diversificação de situações e fatores
que podem proporcionar algum risco gestacional, tais como: características
individuais e condições sócio-demográficas desfavoráveis; história reprodutiva
anterior à gestação atual; doenças obstétricas na gestação atual; intercorrências
clínicas. Tais fatores devem ser avaliados durante o atendimento de pré-natal, sendo
a ausência deste acompanhamento um fator de risco para a mesma ou para o
concepto. Conforme preconizado pelo Ministério da saúde e apresentado mais
detalhadamente no quadro abaixo (BRASIL, 2005b):
QUADRO 1 Fatores de Risco para a Gravidez
40
Como já definimos o risco gestacional é uma probabilidade de causar agravos
à gestação. E os fatores que desencadeiam esse risco podem estar presentes em
todo o período gestacional, ou parte dele. fatores que atuam de forma isolada e
outros que quando associados podem ocasionar uma gestação de risco. A violência
se caracteriza como um fator de risco que tanto pode agravar a gestação
isoladamente ou associada a outros fatores.
Ao analisarmos os fatores que levam ao risco na gestação, é possível verificar
que no primeiro grupo indicado pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2005b), onde são
apontadas as características individuais e condições sócio-demográficas
desfavoráveis, o destaque para a violência como um fator de risco para a
gravidez.
Cabe destacar que o próprio Ministério da Saúde (BRASIL, 2005b) afirma que
a gestação consiste num período de grandes transformações psíquicas, de que
decorre importante transição existencial, favorecendo o surgimento de conflitos
internos e externos. Conseqüentemente, no acompanhamento gestacional deve-se
acrescentar a necessidade de associar a história clínica com a vida pessoal, seus
sentimentos, desejos e suas ansiedades, ou seja, uma avaliação integral da saúde
da mulher em todo seu contexto social, histórico e político.
Assim, ao discutir gestação de risco é necessário compreender o processo
saúde-doença para além das suas causas, devendo-se incluir a relação entre sujeito
e contexto social como determinante das condições gerais de saúde.
No contexto social coexistem diferentes fatores psicossociais que atuam
como estímulos nocivos: a dificuldade de inserção no mercado de trabalho, o risco
iminente de desemprego, as precárias condições de vida, a violência no interior das
relações familiares, a gravidez indesejada; ocasiona a desagregação dos laços
sociais, a dificuldade de constituir vínculos, assim como a inserção ao pré-natal.
Quanto mais os vínculos se desfazem, maior a probabilidade de interferência sobre
a saúde dessa mulher, particularmente a saúde reprodutiva, ocasionando
adoecimento e sofrimento (SCHRAIBER; D‟OLIVEIRA, 2003).
A saúde da mulher abrange vários aspectos relativos a enfermidades,
doença, bem-estar, assim como as atividades de prevenção, assistência e cura. A
saúde é determinada por vários fatores, como: biológicos, reprodutivos, condições
de trabalho, nutrição, estresse, conflitos, violência, entre outros.
41
Graham; Campbell, (1998) definem a saúde reprodutiva como o conjunto de
métodos, técnicas e serviços que contribuam para a saúde e o bem-estar
reprodutivo mediante a prevenção e solução dos problemas de saúde reprodutiva.
Incluindo também a saúde sexual que tem como objetivo a melhoria da vida e das
relações pessoais, e não somente o aconselhamento e a atenção referentes à
reprodução e às doenças sexualmente transmissíveis.
Os serviços de saúde quando não organizados para atender a mulher
considerando seus direitos, particularmente os reprodutivos, indicam que há violação
de seus direitos. Quando os direitos não são respeitados, podem apresentar-se e
expressar-se no desenvolvimento de patologias que interferem direta e
indiretamente na mulher. E se esta estiver grávida, poderá atingir sua saúde e a de
seu feto, representando também, um dos componentes influenciadores dos índices
de mortalidade materna, que se caracteriza por ser um indicador para avaliar as
condições de saúde de uma população.
Durante a sua vida, a mulher esta suscetível a várias doenças, dentre elas a
hipertensão. De acordo com os dados do Ministério da Saúde, no ano de 2005, para
100.000 nascidos vivos, 74,5 foram a óbitos maternos, sendo todas as causas
evitáveis, como: hipertensão arterial, hemorragias, infecção puerperal e aborto
(BRASIL, 2007a).
O aparecimento ou agravamento da hipertensão arterial pode estar ou não
vinculado ao período gestacional. Laurenti et al (2004) em estudo realizado com
uma população estimada em 7332 mortes de mulheres, no primeiro semestre de
2002, sobre a mortalidade materna nas capitais brasileiras, apontou que 67,1% das
mortes maternas foram decorrentes de causas obstétricas diretas, predominando os
transtornos hipertensivos, com quase 25%, praticamente a mesma proporção
correspondente às causas obstétricas indiretas. Somente a doença hipertensiva
específica da gravidez (pré-eclampsia e eclampsia) totalizou 37% de todas as
mortes obstétricas diretas.
Portanto, a gravidez de risco, principalmente vinculada à hipertensão arterial é
considerada gravidez que necessita de um acompanhamento integral. O profissional
de saúde tem que estar sensível à escuta, sem discriminação ou constrangimento
sobre o contexto vivido da mulher.
A gestante que se descobre de risco, geralmente apresenta emoções que
geram ansiedade, medo, angustia e auma sensação de incompetência em gerar
42
um filho sem problemas. Essa situação quando vinculada a um contexto social que
reforça esses sentimentos, como no caso de mulheres que vivenciam a violência,
torna tais repercussões mais significativas, interferindo no desenvolvimento da
gestação, gerando ou descompensando patologias pré-existentes.
Estudos sobre violência à gestante têm pouco mais de vinte anos e, embora a
pesquisa na área esteja crescendo, existem várias lacunas a serem investigadas,
como: fatores de risco, conseqüências e prevalência do tipo de violência (JASINSKI,
2004).
Menezes et al. (2003), em um estudo, na cidade de Recife (Brasil), com 420
mulheres que tiveram o parto assistido em maternidade terciária, com feto acima de
500 gramas, demonstraram que a prevalência de violência física é de 13% antes da
gestação e 7,4% durante a gravidez, sendo as formas de agressão mais freqüente o
empurrão, tapa e manchas roxas. Em relação ao padrão da violência, 43,6% das
mulheres afirmaram ter cessado; 27,3% diminuído; 18,2% informam ter permanecido
inalterado e 10,9% tendo aumentado durante a gravidez.
Outros estudos apontam para prevalência de violência entre parceiros íntimos
durante a gestação que variam de 1% a 32% (CUNNINGHAM et al., 1997;
MORAES; REICHENHEIM, 2002; JANSSEN et al. 2003). Essa variação entre alguns
estudos, pode ter ocorrido pelo uso de definições diferenciadas de violência, das
características das amostras estudadas e do método de coleta de dados utilizados
(JASINSKI, 2004).
As pesquisas sobre a violência na gravidez vêm demonstrando que a
gestação não parece impedir que a mulher seja tima de violência e muitas
mulheres relatam mudanças no padrão e na freqüência do abuso neste período. A
exacerbação do estresse familiar durante a gravidez pode precipitar o primeiro ato
violento, intensificando ou amenizando a violência pré-existente.
Verificamos que alguns pesquisadores têm se dedicado ao estudo das
conseqüências da violência intrafamiliar para a saúde materno-infantil, sejam
fisicamente ou psicologicamente. E o que se constata da relação da violência com a
saúde da mulher é que esta apresenta: o isolamento social, a insegurança, a
depressão, os distúrbios do sono, a baixa auto-estima, a presença de dores
abdominais recorrentes, lombalgias crônicas, cefaléia, contusões localizadas e
distúrbios psicossomáticos (VALDEZ-SANTIAGO; SANÍN-AGUIRRE, 1996; KRUG et
al, 2002).
43
Além desses estudos, Schraiber; D‟Oliveira (2003), apontam para a
associação entre disfunção familiar, incluindo abuso físico da gestante por seu
companheiro, e ausência de cuidados pré-natais. E Dietz et al. (1997) ressaltam
que mulheres que vivenciam violência apresentam características similares àquelas
que procuram pela assistência pré-natal após o terceiro trimestre de gestação,
como: são jovens, de baixa renda, baixo nível de escolaridade, e freqüentemente
têm a gravidez indesejada, passando a ser um grande problema vivenciado pela
mulher.
Outras repercussões ocorrem nas gestantes através de sofrimentos que
muitas vezes se tornam crônicos como, o relato de dor no baixo ventre, na região
pélvica e de cefaléia, devido aos medos, ansiedades, pesadelos; que se apresentam
como desmaio, tonturas, insônia, sangramentos vaginais, DST, Infecção do trato
urinário, abortamento do bebê e baixo peso do recém-nascido (SCHRAIBER et al,
2005).
A gravidez indesejada que muitas vezes é resultado de uma violência
perpetrada pelo parceiro íntimo, em não permitir o uso de métodos
anticoncepcionais, principalmente a camisinha, é caracterizada como violência de
gênero. Ela afeta o bem-estar das mulheres, das crianças e das famílias. De fato,
alguns especialistas em saúde acreditam que a gravidez indesejada e levada a
termo possui maior probabilidade de apresentar complicações. Schraiber; D‟Oliveira
(2003), afirmam que mulheres com gravidez indesejada podem estar sujeitas a mais
maus-tratos físicos por seus parceiros durante a gravidez.
Algumas mulheres possuem dificuldades em escolher um método
contraceptivo, seja pela dificuldade em estabelecer um diálogo com o companheiro,
ou pelo fato de determinados métodos contraceptivos serem contra-indicados à sua
condição de saúde, ou por ter que usar algum método sem que o parceiro tenha
conhecimento. Isto ocorre principalmente em mulheres que vivem sob a ameaça por
parte de seus parceiros íntimos, sendo um fator de risco para a gravidez indesejada
e até para doenças sexualmente transmissíveis.
Cunningham et al., (1997) e Moraes; Reichenheim, (2002) apontam que
fatores como: os hábitos de vida do casal, as características demográficas e
reprodutivas da gestante, a presença de problemas psicológicos, a falta de rede
social de apoio, o tabagismo, o mau uso do álcool e de substâncias ilícitas causam
vários prejuízos à saúde da gestante e do feto, como doença hipertensiva espefica
44
da gravidez, deslocamento prematuro de placenta, amniorrexe prematura,
sofrimento fetal, dentre outros. Esses fatores podem ser considerados como de risco
para a violência familiar, e por outro lado a violência familiar pode ser um fator de
propensão a esses fatores (MCFARLANE et al.1996; GELLES, 1997).
Além de pesquisarmos a violência na gestação, optamos por relacioná-las as
Sindromes Hipertensivas agravadas ou surgidas na gravidez por apresentar-se
diretamente relacionada a diversos fatores sócio-emocionais, caracterizando-se
também como um problema de saúde de grande complexidade, e por serem umas
das maiores causas de mortalidade materna.
Com base no Manual do Ministério da Saúde podemos resumir a classificação
clínica das Síndromes Hipertensivas na gravidez em quatro grupos (BRASIL, 2000):
a) Hipertensão gestacional (HG) é quando aparece a hipertensão arterial,
decorrente da gravidez, após a 20ª semana, com ausência da proteinúria em
mulheres previamente normotensas, com pressão diastólica ≥90 mmHg e com
aumento acima de 15mmHg do valor conhecido previamente. Pode evoluir
clinicamente para a pré-eclâmpsia, quando a hipertensão associa-se à proteinúria; e
para a hipertensão latente ou transitória, principalmente em multíparas.
b) Hipertensão crônica (HC)- é a presença de hipertensão persistente anterior à
gravidez ou à 20
a
semana de gestação, e que se mantém após o puerpério;
c) Hipertensão arterial não classificadas (HAñC)- refere-se ao aparecimento da
hipertensão após 20 semanas de gestação, sem dados conclusivos para classificar
a hipertensão, como a primeira consulta de pré-natal iniciada após a 20ª semana, ou
a idade gestacional duvidosa ou ignorada, mas clinicamente superior a 20 semanas
e história clínica inconclusiva para o diagnóstico de hipertensão arterial crônica;
d) Eclâmpsia é a presença de convulsões tônico-crônicas generalizadas em
mulher com quaisquer dos quadros hipertensivos descritos, não causadas por
epilepsia ou qualquer outra patologia convulsiva, e que pode ocorrer na gravidez,
parto ou até dez dias de puerpério.
Cabe destacar que em nosso trabalho estudaremos as gestantes com
diagnóstico de Síndromes Hipertensivas na gravidez classificadas em um dos três
primeiros grupos, em virtude da gravidade clínica presente no ultimo grupo.
Apesar da sua importância em saúde pública, a etiologia hipertensão que se
manifesta na gestação permanece desconhecida. Acredita-se haver combinação de
fatores genéticos, imunológicos e ambientais (PERAÇOLI; PARPINELLI, 2005).
45
No que diz respeito ao fator ambiental temos a vivencia da violência, a qual
gera sentimentos como o estresse, a ansiedade, o medo, a angustia, que são
fatores de risco importante no desenvolvimento de doenças psicossomáticas, como
a hipertensão arterial, coronariopatias, úlceras gastroduodenais, infecções
respiratórias por diminuir as defesas imunológicas, dermatológicas, dentre outras
(LIPP; Romano, 1987).
Howard; Lewis (1984) descobriram a existência de uma relação íntima entre
as emoções e a hipertensão, ou seja, a pressão sanguínea elevada. Estas emoções
que muitas vezes, durante a vivência de situações de violência, irão representar um
risco maior para a realização do processo vital humano: ameaça a vida, altera a
saúde, produz enfermidade e provoca a morte como realidade ou como
possibilidade próxima.
Ao engravidar, a mulher além das modificações fisiológicas adaptativas ao
processo gestacional, também vivencia modificações nas relações interpessoais e
sociais de seu cotidiano, principalmente em decorrência de seu novo papel social,
transformando sua condição de filha para ser mãe.
Vieira (2003) ressalta que fatores como: o componente emocional da mulher
grávida, os fatores psíquicos preexistentes e atuais, componentes específicos da
gravidez, o contexto social, a vivência do casal, o papel que o companheiro
desempenha e a própria família, com suas reações manifestadas através de
sentimentos de exclusão, ressentimento, agressividade, culpa entre outros
influenciam diretamente na gravidez e podem levá-la ao risco.
Nessas emoções intensas, a vivência da violência e as tensões da vida
moderna podem ocasionar uma elevação da pressão arterial e até produzir
hipertensão. Isso ocorre principalmente nos indivíduos que têm dificuldades de dar
vazão aos seus sentimentos negativos, como raiva, frustrações amorosas e no
campo profissional, os quais podem gerar medo, preocupação, estresse e ansiedade
- fontes adicionais de sobrecarga cardíaca e que estão presentes principalmente,
nas gestantes de risco.
Para Vieira (2003) o diagnóstico da hipertensão encontra-se freqüentemente
associado com a presença de um fator traumático, sendo difícil precisar a sua
origem e o tempo de sua instalação no indivíduo, assim como prever com exatidão a
probabilidade de sua ocorrência. A prevalência da hipertensão apresenta
significativa variação em relação a fatores socioculturais tais como a situação
46
socioeconômica, desigualdade social e acesso aos cuidados com a saúde. Desta
forma, observa-se o agravamento no quadro das doenças crônico-degenerativas,
especialmente quando se refere à população de baixa renda, onde as perspectivas
tornam-se pouco promissoras para a sua solução.
Logo, cabe ao profissional de saúde despertar para as diversas nuances
presentes no processo saúde-doença, tornando o atendimento mais global e
satisfatório para a saúde física e emocional da gestante.
As gestantes que vivenciam um contexto social estressante necessitam de
uma atenção mais direcionada à minimização desses problemas, prevenindo
inclusive o surgimento de morbidades, como a doença hipertensiva. Diante desse
quadro, percebemos que a gestante precisa de apoio, de uma escuta sensível, de
acolhimento por parte da família e dos profissionais de saúde que a acompanham no
período gestacional e puerperal.
É necessário, numa perspectiva do cuidar integral avaliar se o estado
hipertensivo gestacional é somente associado aos problemas biológicos ou se os
mesmos apresentam-se associados às situações que ocasionam estresses,
ansiedades como as situações de violência.
47
2 METODOLOGIA
No sentido de aprofundar acerca das repercussões da violência sob a
gestação percebida pelas gestantes com Síndromes Hipertensivas optou-se por uma
pesquisa descritiva de abordagem qualitativa, pois é aquela que busca entender um
fenômeno específico em profundidade, tendo como fonte primária os discursos dos
sujeitos, ou seja, gestantes de risco internadas em maternidades de referência com
diagnóstico de Síndromes Hipertensivas.
A pesquisa descritiva tem como objetivo primordial a descrição das
características de determinadas populações ou fenômenos utilizando técnicas
padronizadas de coleta de dados, tais como o questionário e a observação
sistemática (GIL, 2002).
A metodologia qualitativa tem a capacidade de envolver o significado e a
intencionalidade como inerentes aos atos, às relações, e às estruturas sociais,
sendo essas últimas tomadas tanto no seu advento quanto à sua transformação,
com construções humanas significativas. Ela tem como objetivo a compreensão dos
valores culturais e as representações de um determinado grupo sobre temas
específicos ligados à natureza do social, às relações entre indivíduo e sociedade,
entre ação, estrutura e significados (MINAYO, 2000).
A necessidade de trabalhar com uma abordagem de natureza qualitativa
surgiram da complexidade e subjetividade presente na temática da pesquisa. Esta
modalidade de investigação preocupa-se com questões que não podem ser
relativizadas através de variáveis. uma especial atenção à qualidade, aos
elementos que sejam significativos para o investigador, que irá à busca de valores
subjetivos camuflados nos atos da humanidade, tentando compreender as ações e
reações do mundo humano, suas crenças, atitudes e posturas.
O método qualitativo parte do fundamento de que uma relação dinâmica
entre o mundo real e o sujeito, uma interligação entre o sujeito e o objeto, um vínculo
inseparável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. O conhecimento não
se reduz a um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa, o sujeito
observador é parte do processo de conhecimento e é capaz de interpretar os
fenômenos, atribuindo-lhes um significado (CHIZZOTTI, 2001).
O objeto não é um dado novo neutro, isolado, está possuído de significados e
relações construídas pelos sujeitos em suas ações. Assim, entendemos que ao
48
estudar as gestantes internadas em função da hipertensão arterial na gestação e
que vivenciaram violência é necessário conhecer parte de sua história, seus
problemas, suas crença e valores, sendo necessário uma abordagem qualitativa.
Escolhemos como cenário, duas maternidades de referência para gestação
de risco inseridos em hospitais universitários de grande porte, ambos localizados no
Estado do Rio de Janeiro. Essa escolha ocorreu pelos seguintes motivos: em função
da multisetorialidade e multidisciplinaridade dos dois hospitais; e pelo fato de serem
hospitais de ensino e pesquisa, onde a partir de uma perspectiva educacional (de
formação profissional) estes desenvolvem ou devem desenvolver a busca por uma
anamnese mais aprofundada e ampliada (o contexto que envolve a situação de
morbidade).
Uma das maternidades caracteriza-se por ser um cleo perinatal de
assistência, inserido na estrutura administrativa de um Hospital Universitário
Estadual do Rio de Janeiro Hospital Universitário Pedro Ernesto, vinculado a
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (HUPE/UERJ), tendo como missão ser
referência para o atendimento de saúde às gestantes que demandem cuidados
terciários e para a formação de profissionais e a produção de conhecimento na área
de saúde perinatal.
A referida unidade é composta por 18 leitos para gestantes de risco, mas
somente 10 estão autorizados a internar; e 04 leitos de Unidade Intermediária, para
assistência às gestantes de alto risco descompensadas. Para o desenvolvimento do
estudo entrevistamos somente as gestantes com Síndromes Hipertensivas que não
se encontravam na Unidade Intermediária, visto que as mesmas inspiravam maiores
cuidados, monitorizadas e sem um espaço privativo para o desenvolvimento da
entrevista.
Outra unidade selecionada foi uma maternidade vinculada ao Hospital
Universitário Antônio Pedro, vinculado a Universidade Federal Fluminense
(HUAP/UFF) a qual possui uma enfermaria de gestantes de risco com 06 leitos. Tal
unidade, assim como a anterior, caracteriza-se em ser um serviço de referência para
atendimento as gestantes de risco para o Estado do Rio de Janeiro.
O projeto do estudo foi encaminhado aos Comitês de Ética e Pesquisa
de cada unidade hospitalar, tendo sido avaliado por ambos. A aprovação foi
concedida em uma unidade hospitalar em 14 de dezembro de 2007 com o
49
protocolo 1957-CEP (Anexo A), e na outra unidade em 15 de fevereiro de
2008, recebendo o nº. 010/08 de protocolo de pesquisa (Anexo B).
As gestantes foram entrevistadas após terem sido informadas sobre as
peculiaridades da pesquisa e seus direitos; e autorizando sua participação a
partir da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice
B), conforme legislação vigente na Resolução 196/96 que dispõe acerca das
diretrizes da pesquisa com seres humanos (BRASIL, 1996).
Os sujeitos deste estudo foram 18 gestantes internadas em maternidades de
referência para risco obstétrico e/ou clínico que apresentavam nos seus prontuários
o diagnóstico de Síndrome Hipertensiva, tendo sido 09 (nove) gestantes em cada
unidade hospitalar. Na seleção dos sujeitos do estudo desenvolvemos algumas
etapas de aproximação junto às gestantes. Primeiramente estabelecemos como
critério de inclusão possuir o diagnóstico de algum tipo de hipertensão arterial, o que
foi identificado pela investigação dos registros nos prontuários das unidades.
Num segundo momento, ao aproximarmos das gestantes internadas com
algum tipo de hipertensão arterial, apresentei-me como enfermeira obstétrica e
pesquisadora buscando iniciar uma interação pessoal.
Assim, no primeiro contato estabelecemos o diálogo com a gestante
procurando saber a causa de sua internação; como ocorreu o processo gestacional;
a existência de outros filhos; sua condição profissional/ocupação; o conhecimento do
seu cotidiano intrafamiliar e social; a existência de algum conflito que significasse
violência. Expliquei que como enfermeira e ao cuidar de algumas gestantes estas
relatavam a violência, e a partir daí interessei-me pelo tema. Como pesquisadora
queria entender melhor o cotidiano delas e se a violência fazia parte de seu
contexto. Com essa abordagem, obtive um melhor êxito na aceitação da
participação e na coleta dos depoimentos. Após a confirmação da vivencia da
violência, explicava-lhes os objetivos da pesquisa e perguntava se gostaria de
participar da mesma respondendo algumas perguntas. Ao concordarem em
participar a entrevista era realizada num espaço reservado, na própria unidade.
Cabe ressaltar que realizamos um teste piloto objetivando adequar o
roteiro da entrevista e a abordagem às gestantes. Foram realizadas seis
entrevistas pilotos, três em cada unidade hospitalar. Tais entrevistas não
foram incluídas na análise final dos dados, sendo somente importantes na
adequação do instrumento de coleta de dados.
50
No cenário da Maternidade do Hospital Universitário Pedro Ernesto - UERJ,
as entrevistas foram realizadas nos meses de abril e maio de 2008. Neste
registramos um total de 22 (vinte e duas) gestantes hipertensas. Desse total, 08
(oito) encontravam-se na unidade intermediaria que acabaram realizando cesárea;
02 (duas) não desejaram participar; 03 (três) afirmaram não vivenciar violência no
período gestacional e 09 (nove) afirmaram vivenciar a violência na gestação.
Na Maternidade do Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP/UFF), a
coleta de dados também ocorreu nos meses de abril e maio de 2008. Nesta
registramos um total de 17 (dezessete) gestantes hipertensas, onde 04 (quatro)
encontravam-se com quadro clínico complexo, impossibilitadas de serem
entrevistadas, 02 (duas) não desejaram participar; 02 (duas) afirmaram não vivenciar
violência na gestação e 09 (nove) afirmaram vivenciar a violência.
O quantitativo de entrevistas foi estabelecido pela recorrência dos
depoimentos das gestantes, o que caracterizava o fenômeno de saturação. O
fechamento amostral por saturação teórica é operacionalmente definido como a
suspensão de inclusão de novos participantes quando os dados obtidos passam a
apresentar, na avaliação do pesquisador, certa redundância ou repetição, não sendo
considerado relevante persistir na coleta de dados (FONTANELLA, RICAS,
TURATO, 2008).
Cabe destacar que, considerando a complexidade da temática e própria
dificuldade da maioria das mulheres em admitir a vivência de violência, entendemos
ter depoimentos representativos da realidade das gestantes que vivenciaram
violência na gestação e que percebiam a repercussão desta na sua saúde.
Num terceiro momento, iniciamos a entrevista propriamente dita. Para a
coleta de dados utilizamos um instrumento contendo perguntas direcionadas
ao preenchimento da caracterização das gestantes em relação ao perfil social
(Apêndice C) e um roteiro com três perguntas guias, relacionadas à temática
da violência na gestação (Apêndice D).
Todas as entrevistas foram desenvolvidas individualmente, em sala
exclusiva, com privacidade para que estas pudessem relatar os fatos. As
mesmas foram gravadas em fita magnética e transcritas posteriormente na
íntegra.
Foi garantida a cada participante, total liberdade para o esclarecimento
de dúvidas que tivessem durante o estudo, oportunidade para eventual recusa
51
em responder à(s) questão (ões) e a desistência da participação na pesquisa,
sem qualquer tipo de penalização.
Ao final das entrevistas foi feita uma cuidadosa escuta e transcrição das
mesmas, com posterior organização do material a ser analisado. Em seguida,
realizamos a análise qualitativa dos dados utilizando a técnica de Bardin (2004)
que utiliza a análise de conteúdo, definindo-a como um conjunto de técnicas
de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e
objetivos de descrição de conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativas
ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de
produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens.
Diversas leituras flutuantes e analíticas dos depoimentos foram realizadas
objetivando identificar as unidades de registros no texto; a construção das unidades
de significação correspondeu à etapa seguinte, realizada a partir da associação com
um tema comum das unidades de registros; e posteriormente tratamos de agrupá-
las definindo as categorias temáticas oriundas dos depoimentos (Apêndice E).
A partir da análise dos depoimentos, emergiram duas categorias:
A violência na perspectiva da gestante com Síndrome Hipertensiva:
um olhar de quem a vivenciou.
Violências vivenciadas por gestantes com síndromes hipertensivas e
suas repercussões
Com o intuito de favorecer uma melhor compreensão dos resultados obtidos,
consideramos relevante apresentar a caracterização social das 18 gestantes
entrevistadas, destacando a unidade hospitalar onde cada uma delas se encontrava
internada, o diagnóstico clínico-obstétrico da síndrome hipertensiva, sua idade, a
idade gestacional que se encontrava no momento da entrevista, número de
gestações, cor, escolaridade, estado civil e ocupação profissional.
A referida caracterização social dessas 18 mulheres foi distribuída no quadro
de caracterização dos sujeitos, o qual será mostrado na página seguinte.
52
QUADRO 2 Caracterização dos Sujeitos
Ao analisarmos as características sociais das gestantes em relação à sua
faixa etária e o tipo da Síndrome Hipertensiva verificamos que 15 gestantes
encontram-se entre a faixa etária de 20 a 29 anos, sendo que 07 delas possuíam o
diagnóstico de Hipertensão Arterial não Classificada (HAñC), 05 gestantes tinham
Ent
Unidade
Hospitalar
Diagnó
stico*
Idade
Idade da
gestação
Números de
gestação
Cor
Escolaridade
Estado
Civil
Profissão
1
HUAP/UFF
HAñC
26 a
28 sem
G 2 / P 1 / A 0
Branca
Fund.
Incompleto
Viúva
Faxineira-
Diarista
2
HUAP/UFF
HAñC
32 a
34 sem
G 2 / P 0 / A 1
Parda
Médio
incompleto
Solteira
Manicure
3
HUAP/UFF
HAñC
23 a
40 sem
G 2 / P 0 / A 1
Parda
Médio completo
Solteira
Do lar
4
HUAP/UFF
HG
23 a
40 sem
G 2 / P 0 / A 1
Branca
Médio
incompleto
Solteira
Do lar
5
HUAP/UFF
HG
25 a
30 sem
G 1 / P 0 / A 0
Branca
Superior
completo
Casada
Assistente
Social
6
HUAP/UFF
HAñC
21 a
33 sem
G 2 / P 1 / A 0
Preta
Fund.
Completo
Solteira
Do lar
7
HUAP/UFF
HAñC
20 a
35 sem
G 1 / P 0 / A 0
Branca
Fund.
Completo
Solteira
Cabeleireira
8
HUAP/UFF
HAñC
24 a
34 sem
G 3 / P 2 / A 0
Preta
Fund.
Incompleto
Casada
Do lar
9
HUAP/UFF
HC
29 a
26 sem
G 2 / P 1 / A 0
Parda
Fund.
Incompleto
Solteira
Do lar
10
HUPE/UERJ
HG
20 a
30 sem
G 1 / P 0 / A 0
Preta
Fund.
Incompleto
Solteira
Atendente
11
HUPE/UERJ
HG
28 a
30 sem
G 8 / P 6 / A 1
Preta
Fund.
Incompleto
Casada
Emp.
Doméstica
12
HUPE/UERJ
HC
33 a
36 sem
G 4 / P 3 / A 0
Preta
Fund.
Completo
Solteira
Emp.
Doméstica
13
HUPE/UERJ
HC
31 a
37 sem
G 3 / P 2 / A 0
Parda
Fund.
Incompleto
Solteira
Do lar
14
HUPE/UERJ
HC
26 a
27 sem
G 2 / P 1 / A 0
Parda
Fund.
Completo
Casada
Do lar
15
HUPE/UERJ
HAñC
29 a
32 sem
G 3 / P 2 / A 0
Preta
Fund.
Completo
Casada
Do lar
16
HUPE/UERJ
HG
22 a
34 sem
G 5 / P 3 / A 1
Preta
Fund.
Incompleto
Solteira
Do lar
17
HUPE/UERJ
HC
27 a
35 sem
G 4 / P 3 / A 0
Preta
Fund.
Incompleto
Solteira
Do lar
18
HUPE/UERJ
HAñC
25 a
23 sem
G 2 / P 1 / A 0
Preta
Fund.
Incompleto
Casada
Do lar
* HC = Hipertensão Crônica; HG = Hipertensão Gestacional; HAñC = Hipertensão Arterial não
Classificada
53
Hipertensão Gestacional (HG) e 03 apresentavam Hipertensão Crônica (HC).
Apenas 03 gestantes encontravam-se na faixa etária de 30 a 39 anos. Nesta faixa,
01 gestante apresentava diagnóstico para HAñC, 02 para HC e nenhuma para HG.
Em relação à idade gestacional por ocasião da entrevista, verificamos que 07
gestantes se encontravam com a idade gestacional variando entre 23 a 31 semanas
e 11 gestantes entre 32 a 40 semanas, ou seja, são gestantes que descreveram
sobre a vivencia da violência tendo mais de dois trimestres de gestação, e todas
declararam estar realizando o pré-natal. Quanto à paridade destacamos que
somente 03 gestantes encontravam-se na primeira gestação. Tal dado nos permite
afirmar que são mulheres que iniciaram a maternidade precocemente, possuindo na
maioria mais de um filho.
No que diz respeito à caracterização das gestantes segundo a cor auto
identificada verificamos que 14 das gestantes se diziam pretas e pardas, ou seja,
não eram brancas, e 04 se diziam brancas. Ao relacionarmos o tipo de Síndrome
Hipertensiva com a cor, constatamos que das 14 gestantes que se diziam não
brancas, 06 possuíam o diagnóstico de HAñC, 05 tinham HC e 03 apresentavam
HG.
Ao relacionarmos a cor com os diagnósticos encontrados nas gestantes
entrevistadas, percebemos a prevalência da hipertensão arterial mais comum nas
gestantes não brancas. Contudo, nos chama a atenção o fato de identificarmos que
dentre essas 14 gestantes não brancas, 05 tinham HC, ou seja, apresentavam a
hipertensão arterial confirmada como anterior à gestação. O que nos permite refletir
que 09 gestantes apresentaram agravamento da mesma ou desenvolveram pela
primeira vez os sinais e sintomas da patologia nessa gestação.
Outro ponto importante destacado no perfil social das gestantes entrevistadas
foi à escolaridade e a ocupação profissional exercida, onde constatamos que 09 das
gestantes possuem o nível fundamental incompleto, 05 gestantes o nível
fundamental completo, 02 gestantes o nível médio incompleto, 01 gestantes o nível
médio completo e 01 gestante o nível superior completo. Em relação às ocupações
profissionais, verificamos que 15 delas afirmam serem “Do lar” e 03 exercem
atividades remuneradas fora do lar. As ocupações profissionais exercidas pelas
gestantes são: Faxineira-diarista (01 gestante) e Empregada doméstica (02
gestantes). Destaca-se ainda que das 15 gestantes que afirmaram não exercerem
54
ocupação remunerada, 04 possuem uma formação profissional, tais como:
Manicure, Recepcionista, Cabeleireira e Assistente Social.
Ao buscarmos entender as condições da relação conjugal e relações sociais
próximas questionamos sobre as condições da convivência marital e verificarmos
que 11 gestantes consideram viver um relacionamento estável (casadas e/ou união
consensual), e 07 gestantes disseram viver um relacionamento não estável. No
passado, o casamento ou a união consensual caracterizava a idéia que as mulheres
teriam certa segurança, status e uma visibilidade social por estarem ao lado de um
homem, seja companheiro, marido ou até o concubinato.
Constatamos através dos depoimentos que 09 gestantes afirmaram que, em
sua realidade, o chefe da família é o companheiro, 06 apontaram os pais e 03
gestantes afirmaram que eram elas próprias. Apesar de algumas transformações na
estrutura familiar, ainda faz parte da cultura da sociedade brasileira o modelo de
mulher mantida por um homem, sempre necessitada de proteção masculina, seja do
pai ou do marido.
Isto fica evidente nos resultados encontrados ao investigarmos sobre o
planejamento da gravidez atual. Encontramos que das 18 gestações, somente 02
gestantes afirmaram ter planejado a gestação e 16 delas não foram planejadas.
Geralmente, os motivos do não planejamento, segundo as mesmas, são decorrentes
de: descuido, descaso, falta de dinheiro para compra de preservativos, o não uso da
camisinha pelo companheiro, que tinha como desculpa, o não gostar ou não querer
ou não aceitar. Geralmente as mulheres vêem na gravidez não planejada a
conseqüência de uma relação desigual junto ao companheiro, no que diz respeito à
saúde reprodutiva e sexual do casal.
Em nosso estudo, as gestantes declararam que a gravidez foi rejeitada pelo
companheiro em 12 das entrevistadas, rejeitada por ambos em 04 e somente nas 02
gestações que foram planejadas, houve a aceitação das mesmas pelo casal. Essa
realidade aponta os possíveis conflitos vivenciados pela mulher ao engravidar e que
possivelmente geraram violência, podendo ter repercutido sobre a saúde da mulher
e no desenvolvimento do feto.
55
3 RESULTADOS E ANÁLISES
3.1 A violência na perspectiva da gestante com Síndrome Hipertensiva: um
olhar de quem a vivenciou.
Ao buscarmos conhecer os tipos de violência vivenciados pelas 18 (dezoito)
gestantes que se encontravam internadas na maternidade, com diagnóstico de uma
Síndrome Hipertensiva, percebeu-se primeiramente a necessidade de compreender
o entendimento acerca do fenômeno da violência pela gestante que a vivenciou e,
assim analisar a dimensão da violência vivida a partir de suas falas.
Ao questioná-las sobre o que entendiam por violência, constatamos que 04
gestantes (04 UR) demonstraram não saber explicá-la. As 14 (quatorze) demais
afirmaram entendê-la como violação dos direitos (30UR) podendo acontecer em
qualquer cenário, público ou privado. Também, afirmaram entendê-la como aquela
que acontece no contexto familiar (25 UR), ou seja, violência com parceiros íntimos,
pais e filhos.
3.1.1 Dificuldade em explicar a violência
Apesar da maioria demonstrar conhecer sobre a temática da violência,
algumas gestantes tiveram dificuldades em explicá-la, dizendo não saber defini-la.
Possivelmente, isto é decorrente da complexidade, multicausalidade e naturalização
do fenômeno (condições sociais, culturais, políticas e outras), onde a própria
situação em que vivem essas mulheres é cenário cotidiano da violência
(SCHRAIBER et al, 2005; PENNA, 2005).
“(Silêncio) Não... Sei lá” (ENTREVISTA nº 1).
“(Silêncio)... Não sei nem dizer o que é violência” (ENTREVISTA nº 6).
“Violência... Ah. (abaixou a cabeça) eu não sei te falar. Violência acho que é
violência mesmo. Sei lá” (ENTREVISTA nº 9).
Schraiber et al (2005) apontam como barreiras na verbalização da violência, o
sentimento de medo, de culpa, de vergonha e humilhação, o temor pela sua
segurança e de seus filhos, as más experiências no passado ao relatar sua situação
de violência, a falta de controle sobre o que acontece na sua vida, a esperança de
56
que o agressor mude seu comportamento, a não valorização das suas lesões e do
seu problema, a proteção do companheiro por dependência econômica ou afetiva, o
medo de perder os filhos, quando o agressor a acompanha ao serviço
permanecendo ao lado da mesma no momento em que esta se encontra sob os
cuidados do profissionais e quando tais profissionais desvalorizam a situação por
desconhecimento ou preconceito.
Em muitas situações, as dificuldades apresentadas na verbalização sobre a
violência por algumas das gestantes entrevistadas puderam ser confirmadas através
de outras expressões corporais, como gestos e emoções, o silêncio, o choro, o
desviar do olhar. Essas expressões (comportamentos, atitudes e sinais)
manifestadas por elas, muitas vezes inconscientes denotam solicitação de ajuda, de
compreensão, de socorro para aquela situação em que elas não sabem como
resolver. Para Ferreira (2006), expressão é considerada ato de exprimir-se e,
também enunciação do pensamento por gestos e palavras escritas ou faladas.
Em função das dificuldades de se falar sobre a temática, os profissionais de
saúde devem desenvolver um olhar mais atento para mulheres que apresentam
sinais de vivência da violência. A visão do profissional sobre a cliente, para efeito de
diagnóstico, tem que ser integral, valorizando as expressões corporais e emocionais
das gestantes as quais o expressas por: ansiedade, nervosismo, tristeza, medo e
culpa; tais sinais possibilitam constatar indícios de vivencia de situações de violência
(MEDINA, 2007).
3.1.2 A violência como violação dos direitos humanos
Em relação à compreensão das gestantes acerca da violência como violação
dos direitos, verificamos que tal entendimento tem base naquilo que é feito contra o
desejo do indivíduo, ou seja, através de situações que lhe são impostas social e
culturalmente. Elas percebem como sendo algo que faz mal para o outro, que não
deve acontecer a ninguém, que vai contra o outro a discriminação, o preconceito,
atos de covardia, constrangimentos, crimes, violências sociais, situações complexas,
porém presente em seu cotidiano. Ao analisarmos essas visões percebemos que
elas expressam situações vividas por elas e por pessoas próximas a elas, e que em
geral, a violência atinge a todos, sem distinguir sexo, raça, posição social.
57
A violência hoje em dia está em tudo quanto é lugar, é uma coisa muito ruim. As
pessoas têm que ter mais consciência e não querer (ENTREVISTA nº 3).
“Violência é aquilo que fere a pessoa, que vai contra princípios básicos”
(ENTREVISTA nº 7).
“É ver pessoas morrerem de forma tão cruel. Não sei se merecem ou não. Mas não
quero aquilo pra nenhum inimigo meu” (ENTREVISTA nº 14).
Em seus relatos, percebemos também uma visão crítica, uma posição
contrária à ocorrência do fenômeno - de que as pessoas não devem querer mais
conviver com a violência, que não deve acontecer com ninguém, que faz mal para o
outro. As gestantes percebem a violência como algo comum, que fere e machuca a
todos, mas que não deveria continuar existindo na família e nem na sociedade.
Vários estudos enfocam o crescimento da violência externa (na sociedade) e
interna (na família). No Brasil, na década de 90, mais de um milhão de pessoas
morreram por violências e acidentes, sendo que 400 mil faleceram por homicídios.
Os homens são as maiores vitimas das violências externas e as mulheres, crianças,
idosos e pessoas com necessidades especiais são das violências internas, ou seja,
inerentes à família (SOUZA; LIMA 2007; MINAYO 2003; KRUG et al 2002).
A violência vem aumentando no nosso cotidiano, atingindo qualquer indivíduo
independente de idade, sexo, de sua condição social, e vem se alastrando dentro da
sociedade, correndo o risco de se banalizar. Tal banalização é decorrente da
violência que não tem faces e limites, e, pela sensação de impotência na solução
do problema, pois não sabemos quem estaria pronto para praticá-la, em quais
circunstâncias, quem se desejaria atingir e quais as razões, se é que temos razão
para justificar uma violência.
O Relatório Mundial sobre Violência e Saúde da OMS (KRUG et al, 2002)
define como principais fatores sociais que criam as tensões entre pessoas, grupos
ou países as seguintes normas: as culturais que apóiam a violência; as que dão
prioridade aos direitos dos pais sobre o bem-estar da criança; as que reafirmam o
domínio masculino sobre as mulheres e crianças; as que validam o uso abusivo da
força pela polícia contra os cidadãos e as que apóiam os conflitos políticos. Nesses
fatores incluímos também as políticas de saúde, econômicas, educacionais e sociais
que mantém as desigualdades econômicas e sociais entre os grupos na sociedade
em altos níveis.
58
Essas tensões e normas sociais geram desigualdades, conflitos que nada
mais são do que a violência atingindo tanto o cotidiano da família quanto a
sociedade (instituições educacionais, nas relações de trabalho, no setor saúde e na
segurança pública). Tais situações são visíveis no contexto familiar das gestantes,
sendo demonstradas pelas dificuldades socioeconômicas em se manter e criar um
filho, no direito de ir e vir, nos fechamentos de instituições educacionais, comerciais,
hospitalares por questões de segurança, pelo enfrentamento entre polícia e bandido,
na deficiência de transporte coletivo e nas dificuldades de se conseguir atendimento
e assistência na saúde para ela e família.
“É colocar filho no mundo e não poder criar, dar uma vida digna” (ENTREVISTA
8).
“É a violência onde a gente vive. Foi assim, teve uma guerra e eles fecharam
tudo. Está tudo fechado colégio, comércio, supermercado. Não abre nada. Isso é
violência”(ENTREVISTA nº18).
Observamos nas falas das gestantes que estas percebem o quanto o
individuo vem sendo destituído de seus direitos, e que a violência estrutural
1
está
presente tanto na comunidade quanto na família, através da miséria, má-distribuição
de renda, falta de saneamento básico, desemprego, ausência de lazer, falta de
assistência na educação e saúde, dentre outros. Esses problemas se alastraram por
várias décadas atingindo vários setores da sociedade, tornando-se uma questão
complexa e de difícil resolubilidade, por falta de políticas públicas sérias, na
educação, saúde, segurança, família, e não-inclusão dos direitos assegurados à
pessoa como cidadã.
Dentre esses setores, podemos destacar o relacionado à saúde, que tem
importante papel no enfrentamento e na prevenção da violência, mas que para isso,
precisa modificar a estrutura de formação desses profissionais. Há ainda nesse setor
a necessidade de rever sua estrutura de atendimento, investir na capacitação e
sensibilização dos profissionais, pois encontramos lacunas no preparo de como lidar
com as situações de violência (PENNA, 2005).
1
“É aquela que oferece um marco à violência do comportamento e se aplica tanto às estruturas organizadas e
institucionalizadas da família como aos sistemas econômicos, culturais e políticos que conduzem à opressão de
grupos, classes, nações e indivíduos, aos quais são negadas conquistas da sociedade, tornando-os mais
vulneráveis que outros ao sofrimento e à morte”. (MINAYO, 1994)
59
Sabemos que os profissionais formados, em sua maioria, enfrentam
dificuldades em lidar com as reais necessidades da população que utilizam o
Sistema Único de Saúde. É necessário capacitar permanentemente os profissionais
em serviço. Geralmente, o profissional, ano após ano exerce suas práticas sem um
conhecimento prévio ou mesmo uma sensibilização sobre o tema, o que permite não
atentar para diversas situações de prevenção, diagnóstico e tratamento, como no
caso particular da violência contra a mulher.
A mudança de visão do profissional é importante para a clientela, como para o
serviço de saúde, que deixa de ser curativo, para ser preventivo, detectando casos
de violência antes que estes se tornem crônicos ou que até levem ao óbito.
Principalmente na violência contra a mulher, criança, idosos, pessoas com
necessidades especiais, pois a abordagem passa a incluir aspectos psicossociais,
tanto em relação ao impacto sobre as vítimas, quanto aos fatores que caracterizam
os agressores e o ambiente, seja na família ou na sociedade.
Verificamos também, que a violência para as gestantes é apontada quando
ocorre um atentado à vida, porém sem motivo aparente ou aceitável, o qual é
considerado crime. Isso nos faz pensar em qual seria o motivo que justificasse a
morte de alguém. Quais valores sociais e culturais estariam envolvidos nessa
relação? Será que o cotidiano da violência vem mudando a condição para que
alguém seja morto? Esse tipo de julgamento moral realizado é uma visão que
atualmente a sociedade vem apresentando no que diz respeito aos atos violentos. E
dependendo do contexto e da cultura em que ocorre, diferença de valores
podendo ser aceito ou não.
“É quando alguém mata alguém por nada” (ENTREVISTA nº 4).
No Brasil, a violência social ocorre a partir de eventos letais e não letais,
apresentando uma magnitude e intensidades sem precedentes, maiores até do que
as observadas em países em situação de guerra. O ano de 2003 teve as taxas mais
elevadas de morte por causas externas (acidentes e violências) 28,9 e 19,0 por 100
mil habitantes O crime, em todas as culturas, nunca foi visto com tolerância pela
sociedade, uma vez que fere, principalmente, a moral. A violência afeta a população
60
de modo desigual, gerando riscos diferenciados em função de gênero, raça, idade e
espaço social (SOUZA; LIMA, 2007).
3.1.3 A violência como algo inerente ao contexto familiar
Além de considerar a violência como violação dos direitos, as gestantes
também apontaram a violência vivida em seu cotidiano familiar. São situações de
violência surgida das desavenças, violências físicas, violências contra a mulher,
contra a criança, e a violência psicológica, caracterizada principalmente pelo uso de
palavras agressivas, que machucam, ferem, humilham, ofendem, e que afeta o
emocional e o psicológico das pessoas envolvidas.
“Violência é usar palavras que machucam. Você não precisa agredir a pessoa pra
ser violenta... Geralmente as pessoas não estão preparadas para lidar com certas
situações e acabam que com algumas palavras ela é violenta” (ENTREVISTA nº 7).
“Violência é quando o homem bate na mulher, fala palavras agressivas, xingar,
essas coisas” (ENTREVISTA nº 10).
A violência contra a mulher e contra a criança, geralmente acontece no
ambiente doméstico, podendo ser acometida na forma psicológica, física e ou
sexual; e o perpetrador é na maioria o seu companheiro. Segundo a Pesquisa
Nacional por Amostra Domiciliar realizada no ano de 1988 (IBGE, 1989), 55% das
mulheres vítimas de agressão na Região Sudeste do Brasil haviam sido vitimizadas
em seus próprios lares, sendo que, em 62,2% dos casos os agressores foram seus
parentes ou companheiros. No caso das crianças e adolescentes a proporção é
ainda maior. Segundo a pesquisa, 80% das agressões físicas foram perpetradas por
esses agressores.
A violência no interior da família tem raízes na tradição patriarcal. Ela é aceita
pela sociedade, que promove a vulnerabilidade feminina aos abusos masculinos,
sendo estruturada na desigualdade entre o nero onde o homem exerce poder e
controle da mulher usando a força.
um século, na sociedade brasileira, as diferenças entre homens e
mulheres eram bem marcadas por atitudes e comportamentos, de ambos os sexos.
A educação era baseada nos papéis representados pelos sexos; aos meninos se
ensinava que fossem obedientes, respeitosos, honestos e trabalhadores, e as
meninas que fossem submissas, delicadas, puras, com capacidade de doação e de
61
dedicação às prendas domésticas e às habilidades manuais. Esses papéis, impostos
e reproduzidos durante anos, levaram o homem ao domínio e a mulher à submissão,
gerando a desigualdade dos direitos na família, sendo vigiados e reforçados por uma
sociedade controladora (BIASOLI-ALVES, 2002; FALEIROS 2007).
Na visão das depoentes de que a violência é algo inerente ao contexto
familiar, o tipo de violência mais apontado como de maior gravidade é aquela que
afeta psicologicamente a mulher, principalmente nas manifestações por agressões
verbais e insultos.
“Acho que a física é até amena, pois dói ali na hora e depois passa. Mas a
psicológica a gente fica remoendo, vivendo sentimentos ruins” (ENTREVISTA nº 5).
É um tipo de violência que não deixa marcas externas, mas que acarreta
inquestionáveis estragos na estrutura psicológica, assim como no desenvolvimento
da personalidade e na construção e ou manutenção de sua identidade como cidadã.
Além da psicológica, as gestantes identificaram a violência física no contexto
familiar. Esta, geralmente vem associada à violência psicológica e verbal, e se
caracterizara basicamente pelo ato de bater, ferir fisicamente.
“Eu mesmo, o pai dos meus dois filhos batia em mim. Isso é uma violência”
(ENTREVISTA nº 13).
Para Schraiber et al (2005) a violência física é qualquer ato que agrida
deixando marcas como hematomas, arranhões, cortes, manchas e fraturas; quebras
de objetos, utensílios e móveis; rasgo de roupas; esconderijo ou rasgo de pertences
e documentos; aprisionamento da mulher em casa, ameaças com faca, tentativa de
asfixia e homicídios.
Cabe ressaltar que outros atos comuns de agressões físicas presentes no
dia a - dia dessas mulheres, tais como: rasgar roupas, documentos, quebrar
utensílios, dentre outras. Violências que tentam destruir pilares concretos da mulher
(seu corpo, seus objetos de referencia, sua identidade)
O conhecimento do que as gestantes entendem sobre violência é de grande
relevância como ferramenta para subsidiar a análise da visão que as mesmas têm
do problema que as cerca. Verificamos que seu entendimento está diretamente
relacionado com a violência que vivencia, pelas imposições sócio-culturais
62
determinadas ao gênero feminino, seja no público ou no privado, onde suas
experiências de vida retratam violações de direitos. Também verificamos em seus
depoimentos que compreendem a violência, a partir das diversas conquistas e
políticas públicas direcionadas ao enfrentamento da violência, em especial à
violência contra a mulher, e pela própria mídia.
3.2 Violências vivenciadas por gestantes com síndromes hipertensivas e suas
repercussões
Ao analisarmos os depoimentos das 18 gestantes com diagnóstico de
Síndromes Hipertensivas (SH) em relação aos tipos e/ou manifestações de violência
vividos na gestação e suas repercussões constatou-se que todas as gestantes
afirmaram vivenciar a violência no contexto intrafamiliar (280 UR) e 13 delas (85 UR)
também apontaram vivenciar no contexto comunitário.
3.2.1 Violência vivenciada na gestação: uma experiência do cotidiano familiar
O fato das 18 gestantes entrevistadas relatarem vivenciar situações de
violência intrafamiliar (280 UR) não nos surpreende. Infelizmente, a gestação não
caracteriza uma proteção à violência. vários estudos que nos mostram essa
realidade como os de Moraes; Reichenheim (2002), que obtiveram uma prevalência
bastante alta (63,4%) de violência por parceiro íntimo na gestação entre usuárias de
três maternidades públicas do Rio de Janeiro e o de Castro; Ruíz (2004) que
constataram taxa de 32,1% para qualquer forma de violência na gestação entre
usuárias gestantes, no Estado do México.
As gestantes entrevistadas, não diferem em seus fatores predisponentes para
a violência, da maioria da população mundial. Basicamente, temos como fatores
predisponentes para a prevalência da violência familiar o perfil social - baixa
escolaridade, serem mulheres do lar, dependente financeiramente do parceiro e da
família, multíparas e terem ficado grávidas sem planejamento, conforme verificamos
no Relatório Mundial sobre Violência e Saúde da Organização Mundial de Saúde -
OMS (KRUG et al,2002).
As características das gestantes do estudo fortalecem a análise do papel da
mulher na sociedade a partir da categoria de gênero, explicitado principalmente nos
63
distintos papéis sociais atribuídos aos sexos, onde os homens são direcionados para
a esfera pública e as mulheres à esfera privada. Constatamos a predominância
destas gestantes no papel da mulher no lar, ou seja, é responsável pela casa, pelo
cuidado com os filhos e no atendimento às necessidades da relação conjugal. Além
disto, ao exercerem alguma atividade, todas desenvolvem profissões ditas
socialmente como femininas, de menor status e menores remunerações. Tais
condições sociais favorecem ainda mais a posição de submissão no interior do
contexto familiar por parte da mulher.
Dentre as manifestações mais comuns de violência no âmbito familiar,
observamos que a física e a psicológica foram as mais vividas, sendo esta última a
mais prevalente e perpretada tanto pelo companheiro (222 UR) como pelos
familiares (58 UR).
“Minha mãe ficou com muita raiva, quando soube da gravidez. Parece até que a
culpa é minha. Achei que ela poderiam falar comigo de outra forma, me chamou
de irresponsável, me xingou e disse que eu iria me virar para cuidar do bebê. Foi
muito ruim” (ENTREVISTA nº 10).
“Eu e meu companheiro sempre discutíamos, ele me ofendia e quando eu ia ofender
ele, ele acabava me agredindo com tapa” (Entrevista nº 16).
Em relação à violência física vivenciada encontramos que das 18 gestantes,
05 (17 UR) relataram terem sofrido agressões, tapas, socos, empurrões, durante o
período gestacional, pelo companheiro. E, 01 gestante (3UR) afirmou ter vivenciado
violência física pelos familiares.
“Meu companheiro me batia muito” (ENTREVISTA nº 1).
“Minha mãe me empurrou, quase que rolei da escada. O susto que levei, me fez
passar mal” (ENTREVISTA nº 5).
Em pesquisa realizada em São Paulo encontrou-se que 27,3% de mulheres
de 15 a 49 anos relataram violência física cometida por parceiros íntimos ou ex-
parceiros, em episódio ocorrido pelo menos uma vez na vida. E, 22,1% disseram ter
sofrido essa forma de agressão por qualquer outra pessoa, familiares, conhecidos
ou não (SCHRAIBER et al., 2002).
A vivência da violência num relacionamento conflituoso geralmente extrapola,
podendo chegar às tensões mais graves como a violência física. Essa situação
ocorre como um ciclo, conhecido como ciclo da violência, o qual é composto de três
fases. A primeira é a construção da tensão, com incidentes menores, como
64
agressões verbais, ciúmes, ameaças, destruição de objetos. A segunda é marcada
por agressões agudas, as tensões atingem seu ponto máximo e ocorrem os ataques
mais graves. E, a terceira fase, é marcada pela fase da lua-de-mel, quando o
agressor mostra remorso e medo de perder a companheira. É nesta fase que a
mulher alimenta suas esperanças de que a situação irá melhorar e que o
companheiro irá mudar de comportamento, o que não acontece (KRUG et al, 2002).
“Até então, ele me xingava, mas desta vez ele me deu um soco na boca, puxou
meus cabelos e deu um chute na minha barriga, bem aqui ó (mostrou a região
epigástrica) foi no carnaval e eu já estava grávida, vê”(ENTREVISTA N º15).
A gestante tem consciência da vivência da violência, mas a encara como
situação não tão grave, banalizando-a e dificultando o seu enfrentamento. Essa
atitude é vista como uma negação, medo do agressor, vergonha, culpa e, com isso,
alegam que a sua situação não é tão ruim e que existem pessoas em piores
condições do que ela.
“Tem sempre alguém pior que eu, que está precisando de uma ajuda
maior”(ENTREVISTA nº 2).
A negação, geralmente é vista como um mecanismo de defesa que ajuda a
reduzir a ansiedade e torna a situação ameaçadora mais tolerável. Por outro lado,
ela dificulta o reconhecimento do problema e conseqüentemente, a busca de
solução para que a situação fique resolvida. Este pensamento é reforçado pela
sociedade com sua cultura machista acrescida pela baixa auto-estima da mulher
(VENGUER et al,1998).
Consideramos ainda que a dificuldade em visualizar a sua vivência acerca da
violência como algo ruim, está diretamente relacionada ao fato desta não dispor
ainda de condições emocionais, financeiras e sociais para romper barreiras tais
como: sair dessa situação; a quem pedir apoio; a própria gravidez; a importância do
casamento na sua vida, a preocupação em manter a si e seus filhos, a esperança de
que algum dia o marido mude; a sensação de fracasso no casamento; o isolamento
social e a dificuldade de recomeçar.
Outra violência no contexto familiar apontada por todas as gestantes foi a
violência psicológica. No que diz respeito ao agente agressor estas destacaram
65
como principal, o companheiro (205 UR), seguido dos familiares (55 UR) destacados
por 10 gestantes.
Observamos que as gestantes revelaram como violência psicológica a
utilização de palavras rudes, modo e forma de falar ocorrido durante as discussões,
ou até na ausência de diálogo, ou seja, quando a estratégia do silêncio era utilizada
para machucar ou agredir. É comum o agressor verbal, ao perceber que quando um
comentário ou argumento é esperado para o momento, ele se cala, emudece e,
evidentemente, esse silêncio machuca mais do que se tivesse falado alguma coisa.
“Ele é muito calado, muito fechado. Quando discutia, falava meia dúzia de palavras,
me ofendia e ficava calado. Essa atitude dele doía muito, quem gosta de ter um
relacionamento assim, fica difícil, machuca”(ENTREVISTA nº 3).
Outros pesquisadores também constataram como forma de violência em
maior escala, a violência psicológica. Schraiber et al (2002) em estudo com 322
mulheres em São Paulo, onde lhes foi perguntado se em algum momento de sua
vida havia tido a ocorrência de maus tratos, humilhação e agressão, 179 disseram
que sofreram, sendo que 65 apontaram o companheiro como o perpetrador e com
igual número para familiares.
As gestantes também apontaram a vivencia da violência psicológica, no
interior da família, perpetrada por familiares, principalmente pela mãe e pai.
Geralmente, estas são associadas ao recebimento da notícia da gravidez e, com
isso, fica evidente a dependência financeira, dependência para ficar com os netos
para que possa trabalhar, e amesmo a dependência emocional da gestante. Para
as gestantes entrevistadas, o fato da família não apoiar no processo gestacional se
caracteriza também como uma violência, interferindo em sua auto-estima.
“Fui falar com minha mãe e meu padrasto para eles me ajudarem, e eles disseram
que o dinheiro é deles, que eu é que tenho que me virar. Isso é humilhante”
(ENTREVISTA nº 8).
“Minha mãe. que toda hora ela joga na minha cara, que era eu que tinha que
sustentá-la e como não bastasse, ainda arrumei outra boca para ela sustentar”
(ENTREVISTA nº 9).
A falta de apoio, muitas vezes, tem suas raízes nos problemas econômicos e
sociais em que a família está inserida. Entretanto, esta não tem sido mencionada
nas diretrizes e programas propostos pela política social brasileira, pela falta de
políticas de erradicação da pobreza e da exclusão a que está submetida. Giordani,
66
(2006), ratifica que esta pobreza e exclusão da família refletem nas relações entre
os indivíduos que fazem parte da família, principalmente nas relações marido e
mulher, mãe e filho, pai e filho.
“No início foi uma grande surpresa. Eu sou filha única, acho que eles sonhavam com
uma outra vida pra mim. Discutimos muito” (ENTREVISTA nº 7).
“O que minha mãe ganha mal pros gastos dela, fica difícil me ajudar”
(ENTREVISTA nº 9).
Algumas vezes a violência entre os familiares mais próximos pode
desencadear a violência entre o casal. Como o que ocorreu em dois casos deste
estudo em que a violência entre filho e mãe e entre filha e avó levavam à violência
conjugal. E, em outras situações, a violência conjugal do pai e da mãe desencadeia
a violência entre a mãe e os filhos.
“Eu gosto dela [sogra] e dele [meu companheiro], e eles ficam discutindo à toa e
depois sobra pra mim” (ENTREVISTA nº 2).
“Minha mãe queria que eu parasse de falar com meu pai. Como não parei, ela
começou a dizer que eu era safada que nem ele, que eu apoiava as safadezas dele,
que eu era igual a ele. foi uma confusão, ela [a mãe] me xingou, gritou, me
empurrou da escada” (ENTREVISTA nº 5).
“Quando eu vou me meter eles param, eles se voltam contra mim e começam a
discutir comigo” (ENTREVISTA nº 8).
Em relação às características das manifestações mais comuns de violência
psicológica perpetrada pelos companheiros, onde muitas delas são vivenciadas
concomitantemente com outras, encontramos gestantes que destacaram: falta de
apoio financeiro e emocional; rejeição das mulheres após engravidarem; vivência da
traição no relacionamento pelo companheiro; rejeição do sexo do bebê pelo
companheiro; paternidade não assumida e solicitação de abortos feita pelos
companheiros (Apêndice F).
Uma das motivações da violência psicológica/emocional vivida pelas
gestantes no interior da família, apontadas pelas gestantes, está diretamente
relacionada ao não planejamento da gravidez ou mesmo a não negociação da saúde
sexual e reprodutiva entre o casal, sendo o grande desencadeador de uma série de
violências relatadas pela gestante.
“Não, o meu companheiro disse que camisinha incomoda. Como eu não usava outra
forma de impedir a gravidez, engravidei e não queria. Nem eu e nem ele”
(ENTREVISTA nº 12).
67
“Não. Não foi planejado, ele quer que eu aborte. Mas foi responsabilidade minha,
não usava nada para impedir a gravidez. Camisinha ele não queria usar porque não
gostava, deu no que deu” (ENTREVISTA nº 15).
Na análise dos depoimentos das gestantes, pudemos observar a íntima
relação entre a paternidade não assumida e a violência vivida na gestação. Esta
desencadeia posturas irresponsáveis do companheiro como: a falta de apoio
emocional e financeiro, promovendo a violência psicológica caracterizada pelas
gestantes na ausência do parceiro (não telefonam, não visitam e nem se preocupam
com seu estado e, principalmente, com o filho que estão gerando), assim como
ocorre em relação aos seus pais.
A falta de apoio financeiro é um dos principais problemas relatado por elas -
ou porque o companheiro não queria ajudar, ou porque estava desempregado, ou
porque vivia de biscate e o que ganhava mal dava para ele, ou porque gastava tudo
em bebida.
Segundo a OMS (KRUG et al, 2002), a gravidez não planejada pode ser um
desencadeador da violência ou conseqüência da mesma, ameaçando a saúde
reprodutiva da mulher e, dentre essas violências destaca-se a paternidade não
assumida.
“Sozinha com três filhos pra criar, grávida de um quarto, que não sei nem como vai
ser” (ENTREVISTA nº 13).
“Agora percebo que ele só queria era curtir. Estou internada e ele nem apareceu, pra
saber de mim e do bebê” (ENTREVISTA nº 7).
Torna-se essencial, como profissionais de saúde, localizarmos a relação de
gênero nas questões reprodutivas, onde tradicionalmente, o homem é estimulado a
se manter alheios às questões da reprodução e da paternidade. Infelizmente, os
serviços de saúde ainda não estão preparados para incorporar o homem nas
questões da saúde sexual e reprodutiva - anticoncepção, gravidez, aborto, filhos,
pois tais questões são tidas como “coisas de mulher”.
“Os homens, como esse que me fez um filho, só se aproximam das mulheres pra
fazer filho, depois largam e vão embora como se nada tivesse acontecido”
(ENTREVISTA nº 13).
“Ele não oferece ajuda financeira, nem se preocupa comigo nem com o neném,
essas coisas” (ENTREVISTA nº 3).
68
“Sim, meu marido trabalha, mas não ajuda. Como vou arrumar dinheiro pra comer?”
(ENTREVISTA nº 11).
Os estresses psicológicos agravam-se à medida que as dificuldades
econômicas se estabelecem com a gestação. Associado a paternidade não
assumida há também as dificuldades em conseguir manter o emprego. A gestação
dificulta o acesso ao novo emprego ou a manutenção do mesmo, após o período
gestacional. E essa dificuldade torna-se maior quando a gestante desenvolve um
agravo, como a hipertensão arterial.
Também foi destacado, pelas gestantes entrevistadas em seus relatos, o
alcoolismo como sendo um desencadeador da falta de apoio financeiro e um dos
indicadores de risco para a violência contra a mulher.
“Por que o pouco dinheiro que nós temos vai todo pra bebida, e eu é que tenho que
me virar” (ENTREVISTA nº 8).
As mulheres que vivem com homens que bebem correm maiores risco de
sofrer violência por parte de seus parceiros. O alcoolismo pode causar vários
transtornos para o indivíduo, nos grupos familiares, no trabalho, bem como na sua
saúde física e mental, podendo levar a homicídios e suicídios. Podem desencadear
vários conflitos, como: violência, problemas no trabalho, perda de reputação, perda
de oportunidades educacionais e profissionais, dificuldades financeiras, entre outros.
Na família, os distúrbios de conduta do alcoolizado, são capazes de gerar
sentimentos, como: ansiedade, vergonha, raiva, dentre outros; que por sua vez
levam a culpa e negação, levando ao isolamento social, bem como ambiente familiar
de constantes brigas e ressentimentos, interferindo principalmente na relação
conjugal. (KRUG et al, 2002; CALHEIROS, 2007)
Outro tipo de violência psicológica encontrada nas análises das falas das
gestantes foi a experiência de rejeição pelo companheiro, ao informarem a notícia de
que estava grávida. Observamos que unanimemente, os parceiros se afastam,
deixando de comparecer em casa, de telefonar e até mesmo de visitarem-na no
hospital, demonstrando claramente a não aceitação da violência, o desprezo e o
abandono por parte deles.
.
“Meu companheiro, me largou assim que soube que estava grávida. Disse que não
queria mais filho e me deixou” (ENTREVISTA nº 6).
69
“(...) e quando a gravidez aparece, o cara te trata como se você estivesse com uma
doença contagiosa” (ENTREVISTA nº 9).
Além da rejeição pelo fato de estarem grávidas, algumas destacaram também
a rejeição do sexo do bebê. O companheiro ao saber que a criança era do sexo
feminino, através do exame de ultra-sonografia, rejeitou-a. Isso caracteriza a
violência de gênero onde antes mesmo de nascer se estabelece uma depreciação
do ser pelo sexo que este possui. Tal comportamento retrata uma determinação
histórico-social que se imputa a cada sexo de seu status social”, onde ser homem é
possuir maior status, poderes, possibilidades.
“Ao saber da gravidez, senti que ele não gostou. Começou a se afastar e não me
ligava. Quando soube que seria uma menina, ficou mudo, teve uma reação fria,
estranha. Até hoje não me ligou e nem me procurou” (ENTREVISTA nº 3).
Podemos perceber que neste caso não a mãe vivenciou uma violência
psicológica, mas também o bebê, ainda no útero materno vivencia o sentimento
de rejeição. E é possível que, essa rejeição paterna possa ser expressa de outras
formas quando essa criança nascer.
A rejeição é um dos piores sentimentos que o ser humano pode
experimentar. Essa rejeição é vivida pela mulher e pelo bebê. Ela desenvolve e
acentua sentimentos negativos e os transtornos emocionais e psicológicos, tanto
para mãe quanto para o bebê, atrapalhando o seu desenvolvimento emocional e
físico. Rejeitar significa não reconhecer e não desejar a mulher como companheira
e o bebê como filho. A aceitação é definida basicamente pelo nível de afeto
expressado e o ser humano precisa de afeto para ser equilibrado durante toda a vida
(FERREIRA, 2006).
Outra situação que emergiu como sendo uma violência perpetrada pelo
parceiro, foi a traição conjugal.
“Bem nesse momento agora mesmo estou passando por momentos de traição.
Cheguei do trabalho e encontrei ele com outra mulher. Discuti com ela [a amante] a
mulher ficou com raiva e partiu pra cima de mim, me empurrando”(ENTREVISTA
1).
“A gente tinha se separado por que ele arrumou outra, entendeu?”(ENTREVISTA nº
3).
70
Culturalmente, o homem considera compreensível, perdoável e até natural
suas possíveis traições e infidelidades. É comum ele não reconhecer como
infidelidade os relacionamentos ocasionais e „puramente físicos‟.
Durante o período de gravidez, em função das modificações corporais, das
imputações religiosas e do apelo social dos padrões estéticos, algumas mulheres
sentem-se sexualmente incapazes. Por sua vez, o homem quando não consegue
desassociar maternidade da sexualidade, se percebe “respeitando sexualmente” a
mulher durante o período gestacional procurando ligações extraconjugais durante a
gravidez (MALDONADO, 1997).
Diante dos depoimentos onde a violência por parceiros íntimos e ou familiares
é comumente encontrada, também verificamos que as gestantes entrevistadas
possuem dificuldade em denunciar, seja por terem esperança de que eles mudem,
pela dependência financeira e emocional, ou por vergonha da família e da própria
instituição policial.
“Eu não tenho coragem de fazer nada contra ele, por que gosto muito dele”
(ENTREVISTA nº 1).
Schraiber et al (2005), nos relata que são vários os motivos para a mulher não
denunciar, além dos citados, temos os registros policiais que são feitos de uma
única ocorrência. E, há mulheres que sofreram agressões durante muitos anos, e ao
denunciar, tem que relatar a ultima agressão como uma tapa, soco ou ameaça,
sendo todos crimes de “baixo potencial ofensivo”. E, as agressões verbais
continuadas, as ameaças, suspeitas de adultério ou recusa de contribuição
financeira, são queixas raramente ouvidas e acabam sendo desqualificadas em seu
agravo, fazendo com que muitas mulheres não recorram à denúncia.
3.2.2 Violência vivenciada na gestação: uma experiência do cotidiano comunitário
Conforme já mencionamos, 13 gestantes (85 UR) destacam também vivenciar
a violência no contexto comunitário. Desse total, 04 gestantes (32 UR) registraram
terem vivenciado no cenário urbano e institucional hospitalar; 03 gestantes (13 UR)
somente no institucional hospitalar; 03 gestantes (14 UR) no urbano e 03 (26 UR)
gestantes no trabalho.
71
Segundo o relatório da OMS (KRUG et al, 2002), define-se a violência
comunitária como aquela que ocorre no ambiente social em geral, entre conhecidos
e desconhecidos. Temos como expressões desse tipo de violência: a juvenil,
agressões físicas, estupros, ataques sexuais e inclusive a violência institucional que
ocorre, por exemplo, em escolas, locais de trabalho, instituições de saúde, prisões e
asilos.
“Fui parar no hospital. Cheguei às 5 horas da manhã, com pressão 15X11, fizeram
uma medicação e me mandaram embora, não deram importância. Você mora longe,
mandam você pra casa, você depende do carro do vizinho, ficar andando de pra
cá, não tenho condições de pegar táxi, e se eu o procurasse o pré-natal como
seria? Teria perdido meu neném, pois nem fizeram um exame” (ENTREVISTA nº 4).
“Meu patrão me trata como se eu fosse um lixo (chorou)” (ENTREVISTA nº 12).
“Meu marido foi assaltado e quando entregou a carteira, um dos bandidos foi ver
seu documento e tinha sua carteira de policial, na mesma hora ele mandou o outro
matar ele por que era policial (chorou). Ele se atracou com o bandido, pois viu que ia
morrer de qualquer maneira, e levou três tiros. Um no joelho, outro na clavícula e
outro no braço” (ENTREVISTA nº 14).
A violência comunitária é muito abrangente e envolve vários aspectos desde o
individual até o coletivo e geralmente se caracteriza por desrespeito às normas de
relacionamento entre os indivíduos de uma sociedade com o uso do poder para se
obter benefícios próprios ou de um determinado grupo. A violência no contexto
comunitário, que atinge a área urbana, se faz presente nos bairros ou comunidades,
tornando-se um estado de perigo iminente. Perigo este presente em toda a parte,
em todo o Estado, atingindo a população independente de sua classe social.
As estatísticas do Ministério da Saúde (BRASIL, 2002b) mostram que as
mortes por acidentes e violências, na década de 80, passaram a responder pela
segunda causa de mortalidade no quadro geral, sendo um dos mais graves
problemas de saúde pública a ser enfrentado. Essas mortes representam cerca de
15% dos óbitos registrados no País, perdendo apenas para as doenças do aparelho
circulatório. em 1996 e 1997, os acidentes e violências foram responsáveis por
aproximadamente 120 mil mortes anuais, tendo uma concentração maior nas áreas
urbanas, acumulando cerca de 75% do total das mortes por causas violentas.
As gestantes relataram como forma de vivência da violência urbana, o que
elas presenciam na comunidade no seu dia a - dia, como: discussões e
xingamentos entre vizinhos, conflitos entre bandidos e policiais; conflitos e ameaças
vindas de bandidos, milícias e da polícia; fechamento de escolas, comércios e até
72
posto de saúde, devido aos tiroteios; acidentes de carro; torturas entre bandidos
sendo presenciadas pela comunidade; assalto à mão armada e familiares envolvidos
com o tráfico. Diante de tais situações, constatamos ser a violência resultante do
desrespeito às leis de convivências de uma sociedade, além de desrespeito ao
direito humano e constitucional em relação à segurança que deveria ser
estabelecido tanto pelos indivíduos, quanto pelo Estado.
Mas agora ele não esta nem indo pra escola, por que lá onde a gente vive teve uma
guerra e eles fecharam tudo. Está tudo fechado: colégio, comércio, supermercado.
Não abre nada. (...) Atrapalha os estudantes. pensou quem esta fazendo a
série, a 8ª série perde muita matéria e depois não tem como concorrer com as
outras crianças que estão estudando direito” (ENTREVISTA nº 18).
“Fico preocupada com meu filho maior, não quero ele envolvido com coisas erradas”
(ENTREVISTA nº 15).
A violência urbana é qualquer ação que atinge as leis, a ordem pública e as
pessoas. (SOUZA; LIMA, 2007) É um mal que atinge as comunidades que vivem
nos centros urbanos, e interfere diretamente na rotina dos indivíduos, ocasionando
transtornos como a perda da liberdade, a pouca oferta de empregos e a deterioração
do serviço público.
Em 2003, 51.043 brasileiros foram assassinados, sendo 140 mortes por dia.
No mesmo ano ocorreram 33.619 óbitos por ações violentas no trânsito, sendo a
taxa de violência, acometida neste ano, por sexo de 52,8/100 mil habitantes para
homens em relação a 4,3/100 mil mulheres, sendo 12,3 vezes maior no homem
(SOUZA; LIMA, 2007). Assim, verificamos que mais homens morrem em
conseqüência da violência urbana enquanto as mulheres adoecem pelos efeitos das
perdas de filhos, companheiros, irmãos e amigos.
A violência urbana, como fator de risco, acentua diferenças socioeconômicas
e demográficas das regiões, como por exemplo: desigualdades de renda, diminuição
nos indicadores de desenvolvimento humano, de escolaridade, de condição de vida,
na concentração demográfica, na heterogeneidade, e ocasiona isolamento pelo
pouco vínculo social, trazendo como conseqüência, vizinhos que não se relacionam
com a comunidade, o tráfico de drogas, altos índices de desemprego, jovens ociosos
sem atividade e educação, dentre outros.
Em nossa sociedade, é visível a fragilidade das instituições e as profundas
desigualdades que levam a violência no cotidiano das grandes cidades. Infelizmente,
73
ela admite passivamente a violência dos agentes do Estado contra as pessoas mais
pobres, tanto quanto ocorre com o descompromisso dos indivíduos em relação às
regras de convívio.
Esse tipo de violência dificulta o desenvolvimento e o crescimento intelectual,
econômico e cultural do individuo e conseqüentemente da comunidade; tornando,
principalmente, os jovens e desempregados, vítimas ceis do tráfico. Para as
gestantes torna-se estressante viver numa comunidade que é carente das
necessidades básicas e, ainda presenciar a dor, a morte de outras pessoas.
“Fins de semana nós sempre nos reunimos e fazemos um churrasquinho, eu e
minhas amigas. E, quantas vezes nós estamos assando um carninha, tomando uma
cerveja e a bandidagem passa arrastando um que parece estar mais morto que vivo,
isso quando não batem nos caras até morrer, na nossa frente. E, ainda ameaçam
mandando a gente entrar se não vai acontecer a mesma coisa com a gente. Eles
dizem que quem vê demais, acaba assim. É muito duro morar onde eu moro”
(ENTREVISTA nº 17).
O Relatório Mundial sobre Violência e Saúde da OMS (KRUG et al, 2002) nos
informa que, com um aumento descompassado das diferenças sociais entre ricos e
pobres, poderá haver um aumento da violência social, interferindo sobre os diversos
setores da sociedade, como educação, saúde e segurança.
O Estado, que é a lei, infelizmente é o primeiro a omitir-se, cometendo
inúmeras violências contra a sociedade; seja de forma indireta, direta e
representacional ou moral.
A indireta é aquela em que o Estado não propicia a devida infra-estrutura
urbana de serviços necessários para se ter uma qualidade de vida, como
saneamento sico, sistema viário, energia elétrica e iluminação pública, transporte,
lazer, educação, creches, equipamentos culturais, segurança pública e acesso à
justiça. A forma direta é aquela em que representantes de instituições públicas
perpetram a violência de forma ilegítima ou ilegal, e, através do enfrentamento da
violência, toma medidas pouco eficientes, fortalecendo a idéia de sua incapacidade
própria e de suas instituições em resolver o problema, aumentando a sensação de
insegurança e medo por parte da sociedade, incidindo nas questões de saúde e
doença da população. E, a forma representacional e moral, é aquela que através de
práticas de corrupção de funcionários estatais, cometem-se ilegalidades de ações
públicas e a impunidade dessas ações.
74
Todos os indivíduos de uma sociedade, em particular a mulher gestante,
necessitam dos serviços básicos para se ter qualidade de vida e poder gerar e criar
os filhos. Estas, além dos serviços de saúde de qualidade, precisam de escolas em
tempo integral que ajudem na formação intelectual, social e cultural de seus filhos e
creches que fiquem com suas crianças em idades menores, para que possam
ingressar no mercado de trabalho se tornando financeiramente independentes.
Atualmente, o que percebemos é a ausência do Estado em diversas áreas,
com a sensação do domínio do crime organizado ditando normas e leis, no aumento
da existência de comunidade carente desses serviços, o qual interfere diretamente
na rotina e na saúde da população, que se encontra assustada, amedrontada e cada
vez mais presa aos domicílios.
“Ah, tem tudo a ver, é um susto que leva, se está na rua tem que voltar rápido pra
casa, correndo por que está acontecendo alguma coisa diferente. Mexe muito. Fico
o tempo todo sobressaltada, principalmente quando vou levar meu filho à escola.
Isso quando não fecham o comércio, as escolas, os postos de saúde e ficamos sem
nenhuma assistência” (ENTREVISTA nº 18).
Entendemos ser preciso trabalhar para obter resultados contra a exclusão
social, o crime organizado e o quadro institucional e cultural em que a criminalização
do uso de drogas se insere no Brasil para pensarmos no alcance da saúde da
população. O desemprego, a desestruturação familiar, a frustração de não alcançar
padrões sociais de um mundo de consumo, contribuem para a delinqüência e a
violência, nos grandes centros urbanos, adoecendo a população que nele vive
(SOUZA; LIMA, 2007).
Outra forma de violência mencionada foi a institucional hospitalar, apontada
principalmente nos serviços de saúde a que elas recorreram. Geralmente foram
vividas durante o atendimento no pré-natal e na assistência de urgência prestada
nos hospitais, ao dar entrada com a pressão arterial elevada.
Conforme a Ações em Gênero Cidadania e Desenvolvimento (AGENDE,
2005), a violência institucional é definida como a praticada nas instituições
prestadoras de serviços públicos, como hospitais, postos de saúde, escolas,
delegacias, judiciário. É perpetrada por agentes que deveriam proteger as mulheres
vítimas de violência, garantindo-lhes uma atenção humanizada, preventiva e
também reparadora de danos e não, causadora de humilhações, aborrecimentos,
estresses e desconforto tanto para a mulher quanto para seu bebê que se encontra
75
no seu ventre, gerando estresses, frustrações e uma sensação de incompetência,
reforçando na gestante a sua baixa auto-estima e culpa.
Nas instituições de saúde, a principal forma de violência apontada foi
referente às condutas dos profissionais de saúde. As gestantes demonstraram
sentirem emocionalmente afetadas com o atendimento, com orientações e condutas
precárias; o descuido do profissional durante o cuidar, a não solução para os
problemas e o preconceito em relação ao contexto biopsicosocial. Durante o
atendimento, as gestantes perceberam a qualidade da assistência que lhe é
oferecida e a forma como é tratada.
È possível entender que tal fato tem relevância para as gestantes visto a
situação de estresse e insegurança gerada pelo processo gestacional. Elas referem
uma carga emocional grande em função da gravidez que não é bem recebida em
seu meio; associada a própria sensibilidade do processo gestacional e também
possuem, expectativas de serem atendidas de forma acolhedora.
“Fui procurar o serviço de emergência por que não estava me sentindo bem, e fui
maltratada. Me deram um remédio para a pressão que estava alta, e disseram para
procurar o local onde fazia o pré-natal, para ser acompanhada pelo profissional.
Nem reavaliaram minha pressão. sei que quando cheguei no pré-natal, minha
pressão estava muito mais alta e o profissional me internou” (ENTREVISTA nº 8).
Também foi apontada a violência institucional a partir das condições
estruturais, como a gestão e organização da assistência e o ambiente de
atendimento do serviço. As gestantes indicaram: falta de leito, peregrinação por falta
de recursos humanos e tecnológicos para atendimento da gravidez de risco e falta
de transporte para levá-las a outra instituição que tivesse condições de atendê-las,
correndo diversos riscos.
Poxa, eu o tenho carro, nem dinheiro para pagar táxi, custava terem me atendido
e se fosse o caso me transferir para um hospital, que não fui atendida e fiquei
passando mal” (ENTREVISTA nº 6).
A violência institucional torna-se também mais grave, pois acaba interferindo
nas expectativas de soluções para os problemas das mulheres. As gestantes que
vivenciam a gravidez não planejada, algumas inclusive rejeitadas no seu contexto
familiar, ao procurar a Instituição, que tem como objetivo prestar uma assistência
humanizada e acolhedora, buscando minimizar seu sofrimento ou mesmo encontrar
76
um melhor encaminhamento para seus problemas e, quando não encontram esse
espaço, acabam agravando o estresse vivido.
O Ministério da Saúde (BRASIL, 2005b) relata que um atendimento tem que
ter duas características essenciais: a humanização e a qualidade. O profissional tem
o dever de acolher a mulher e sua gravidez com dignidade, tratando-os como
indivíduos e não objeto. Humanizar o atendimento é valorizar a gestante como
indivíduo, identificando suas necessidades. Além de prover os recursos humanos e
materiais necessários para um bom atendimento, organizar suas rotinas de forma
que as intercorrências também façam parte dessa rotina, estabelecer relações
baseadas na ética, garantido a privacidade e autonomia da gestante e compartilhar
com elas condutas e decisões a serem tomadas em sua vida, caso contrário,
cometeremos um ato de violência impondo o poder do “saber” do profissional.
“Mas a estrutura está precária, está super lotada. Eu fiquei na cadeira por que ainda
estava grávida ao lado de uma menina sentada no chão, quase que vomitei em cima
dela, fui reclamar e me disseram que estava lotado e não tinha mais maca. A
menina foi pro chão, por que ela tinha tido o parto e pra me dar a cadeira. Me
senti mais mal do que já estava” (ENTREVISTA nº 5).
“E, muito antes de conhecer ele, o profissional disse que se eu quisesse engravidar,
teria que fazer um tratamento, que não engravidaria à toa. Ele disse que eu tinha o
útero infantil, e que teria que fazer um tratamento para amadurecer o útero. E
acabou que acreditei nele, não me preveni e engravidei”(ENTREVISTA nº 3).
Acolher é recepcionar a gestante, ouvindo suas queixas, suas necessidades e
se responsabilizando pelos cuidados que cabem naquele momento, garantindo-lhe
uma atenção e solução, seja na unidade ou em articulação com outros serviços de
saúde, isso fará com que ela se sinta importante e valorizada, criando um vínculo
com o profissional, ao mesmo tempo que facilita e torna a relação fortalecida, dando
segurança para que a gestante possa falar de suas intimidades, seus medos, seus
conflitos. O Ministério da Saúde (BRASIL, 2005b) nos coloca que o acolhimento não
é um local, um espaço, e sim ações que mudem a relação profissional e cliente,
devendo ocorrer em todos os momentos da assistência, seja ela preventiva,
assistencial ou curativa. Uma relação profissional sem vínculos gera insegurança e
falta de confiança da cliente, dificultando o diagnóstico e o tratamento.
“Não e não conto nada. Eles não vão resolver nada mesmo. O problema é meu, se
eu não consigo resolver, como eles vão?” (ENTREVISTA nº 15).
77
Mesmo não havendo a verbalização da violência, seja física e/ou psicológica
e/ou sexual, pela gestante é possível ao profissional de saúde sensível e capacitado
em cuidar de vítimas de violência perceber as suas alterações físicas, seus
comportamentos, sentimentos e detectar suas alterações de humor que podem ser
expressas através de sinais, levando à suposição de situações de violência
vivenciadas pelas mulheres. Medina (2007) relata que através da avaliação das
suas alterações físicas, comportamentais, emocionais é possível detectar as
alterações de humor expressas através de sinais, levando à suposição de situações
de violência vivenciadas pelas mulheres.
Outra violência que emergiu nas falas das gestantes foi a vivenciada no
trabalho. Verificamos que 03 gestantes (20 UR) apontaram a vivência no trabalho a
partir de discussão, substituições em função da gravidez, falta de infra-estrutura,
relacionamento difícil com patrão, e principalmente violação dos direitos trabalhistas.
Todas essas violências afetaram a gestante na forma psicológica, com a utilização
de agressões verbais, não obtendo relatos de violência física e sexual. Observou
claramente a desigualdade de gênero, resultando num relacionamento de poder
exercido sobre as gestantes enquanto funcionárias.
“Não tenho culpa de ter ficado grávida e muito menos de estar com a pressão alta e
não poder fazer o serviço mais pesado. Meu patrão vive me humilhando e
reclamando. Eu não tenho vontade de ir trabalhar. pensou trabalhar nessa
situação, tendo sido substituída, é muito chato” (ENTREVISTA nº 12).
A relação de poder estabelecida entre o patrão e funcionário é geralmente
acentuada quando esse empregado é uma mulher. A discriminação sexual e social
na esfera do trabalho ocorre pela dominação histórico-social do masculino nas
relações profissionais, caracterizada pela desvalorização de profissões destinadas
ao público feminino. Estas questões nos mostram como a mulher vivencia a
violência no contexto do trabalho público, principalmente quando esta se encontra
gestante, com alguma patologia associada (por exemplo a hipertensão), e com
restrições médicas a desenvolver determinados trabalhos.
Além dessas condições no ambiente público, temos o fato da gestante ter de
atender as condições também do ambiente doméstico, necessitando desenvolver a
dupla jornada de trabalho com o cuidar da família, das obrigações junto ao parceiro
e o trabalho assalariado.
78
A inserção da mulher no mercado de trabalho não diminuiu sua
responsabilidade social quanto ao trabalho doméstico. Esta continua com o papel de
cuidadora do lar e o papel no ambiente público. Por ser pouco valorizado, é visto
como um complemento da renda familiar, independente do valor de sua
remuneração, mantendo-se socialmente o orçamento familiar como do homem, que
justifica sua ausência nos trabalhos domésticos.
Como gestante, essa mulher passa a desempenhar mais um papel na
sociedade, a de reprodutora. Então, podemos afirmar que a gestante não
desempenha uma dupla jornada, e sim uma tripla jornada - reprodutora, cuidadora e
“complementadora” da renda familiar. E infelizmente, nesses três segmentos, ela
vivencia a violência.
“Pedi pro banana do meu marido ir buscar o dinheiro e levar a carteira pra me
poupar do aborrecimento com meu patrão, mais ele diz que o problema é meu e eu
é que tenho que resolver. (chorou de soluçar)” ( ENTREVISTA nº 13).
As gestantes apontaram como violência no trabalho, os conflitos enfrentados
com o patrão como: o assédio moral e o estresse ao perceber que seus benefícios
não foram pagos por esse empregador.
“Fui resolver minha licença, e descobri que minha patroa o pagou o meu INSS.
Pra mim foi como uma rasteira que levei. Mesmo que ela pague, até o INSS liberar
vai demorar e pensou se tiver que brigar na justiça, é que estou perdida”
(ENTREVISTA Nº 11).
“Ele vai assinar a carteira quando eu voltar, por que com a gravidez, ele não quis
assinar” (ENTREVISTA nº 10).
Claramente, observa-se que as gestantes não conhecem seus direitos
trabalhistas, o que favorece a ocorrência da violência silenciosa nas relações, entre
empregador e empregada. O empregador que não respeita os direitos da
empregada, não cumprindo com o seu dever, poderá ocasionar futuros problemas
de ilicitude jurídica à previdência e conseqüências á saúde da mulher, tanto atuais
como futuras.
79
3.2.3 Repercussão da violência: uma perspectiva da gestante
Ao analisar as repercussões apontadas pelas gestantes decorrentes da
vivência da violência na gestação e sua relação com o agravamento de sua saúde,
observamos que durante suas declarações, 16 gestantes (172 UR) afirmaram
perceber haver alguma relação da violência vivida nesta gestação e seu estado de
saúde e 02 gestantes (02 UR) não souberam dizer se existe tal relação.
Das 02 gestantes que afirmam não saberem da existência de alguma relação
entre a violência vivida e a sua saúde atual, ambas relataram a vivência da violência
urbana no local onde residem e afirmaram que a violência interfere em suas vidas,
mas não sabem afirmar se isso interferiu no agravamento ou surgimento da
síndrome hipertensiva.
“Não sei, se alguma coisa a ver com minha pressão alta. Quando começa o
tiroteio a gente fica tremendo, com medo, nervosa, tenta se proteger junto com os
filhos, que ficam desesperados, choram muito. Sinto que o coração acelera, às
vezes tenho dor de cabeça quando dura a tarde toda” (ENTREVISTA nº 13).
“Não, não sei te dizer” (ENTREVISTA nº 17).
É difícil para algumas mulheres assumir que vive uma situação de violência,
principalmente, para aqueles tipos de violência que não atingem somente a elas,
como é o caso da violência urbana. Possivelmente, por ser uma violência
atualmente presente mais freqüentemente na mídia, e que ocorre em geral na
sociedade, elas não conseguiram perceber a relação da violência com a sua
situação de saúde.
Além disto, para determinadas gestantes que vivem em um relacionamento
violento freqüente e repetitivo, isso pode fazer com que a sua área cognitiva esteja
afetada, bem como, o seu emocional e o seu comportamento. Essa circunstância
ocasiona, como conseqüência, o abalo na auto-estima, favorecendo um círculo
vicioso de isolamento, depressão, que interfere em sua capacidade de interagir com
o mundo que a circunda.
Segundo Oliveira (2007), isto ocorre porque a mente apresenta dificuldades
para se concentrar, diminuindo o poder de observação da gestante. A reatividade
80
deixa de ser tão eficiente, a objetividade e os poderes críticos são reduzidos,
tornando o pensamento confuso e irracional.
Logo é notório, que a violência afeta o emocional, a individualidade, a
dignidade e os direitos dessas mulheres, em especial, das gestantes. E diversas são
as conseqüências sobre a saúde, no social e na sua própria condição de cidadã.
Diante das circunstâncias e da dificuldade em apontar as repercussões da
violência sobre sua vida, torna-se singular e de extrema relevância, analisar quando
essas gestantes apontam tais repercussões e estabelecem algumas relações da
violência vivida durante o período gestacional com sua condição de saúde, em
especial, ao agravamento ou surgimento da SH.
Acho que interfere sim, porque essa gravidez está sendo complicada”
(ENTREVISTA nº 1).
“Eu vejo claramente essa relação”(ENTREVISTA nº 5).
“Sim, tem relação, pois foi após a discussão fiquei muito nervosa e me senti mal”
(Entrevista nº 9).
Acho não tenho certeza. Eu não tenho vontade de ir trabalhar (ENTREVISTA
12).
Considerando que relacionar representa o ato de vincular, ligar, fazer a
correspondência entre elementos de dois conjuntos
2
verificamos que as 16
gestantes relacionaram as violências vividas com o seu quadro gestacional, seja
pelo agravamento ou surgimento da SH, mas também com outras intercorrências.
Cabe ressaltar que algumas gestantes apontaram essa relação, associando com
mais de um tipo de violência.
A gravidez é considerada um período de transição, transformações e
adaptações a uma nova condição de vida caracterizada por mudanças metabólicas
complexas. Um estado temporário de equilíbrio instável devido às grandes
perspectivas de mudanças envolvidas nos aspectos sociais, psicológicos e
biológicos, como por exemplo: a necessidade de novas adaptações, reajustamentos
interpessoais e intrapsíquicos, além de mudança de identidade. Nesse sentido, os
fatores socioeconômicos são fundamentais, novas preocupações surgem,
principalmente com o futuro do próprio bebê (MALDONADO, 1997).
2
Ferreira (2006)
81
Dessa forma, nesse período, as gestantes se tornam mais susceptíveis e
vulneráveis às conseqüências físicas e mentais geradas pela violência. Isto provoca
efeitos psicofisiológicos sobre esse organismo, através da liberação de adrenalina e
noradrenalina das supra-renais na corrente sanguínea, causando distúrbios cardio-
vasculares, como moléstias do coração e derrames; problemas renais decorrentes
da hipertensão arterial, oscilações nos níveis de açúcar no sangue, agravando o
diabetes e a hipoglicemia. Esses efeitos emocionais reduzem a capacidade de
relaxamento do tônus muscular, de se sentir bem, de se desligar das preocupações
e ansiedades, tornando o quadro crônico e com efeitos mais acentuados (OLIVEIRA,
2007).
“Isso tudo [passar mal] começou, depois que ele soube da gravidez. Ele não me
procurou mais, e quando eu o procurava me destratava. Não me ajudou em nada,
nem para comprar uma roupinha para o bebê, e disse que eu devia ter me cuidado
para evitar isso” (ENTREVISTA nº 3).
“Sim faço relação. Porque se quando eu fosse dar entrada na minha licença não
tivesse dado esse problema eu não tinha me aborrecido, fiquei nervosa, estressada.
Me aborreci no INSS e com minha patroa, com isso minha pressão subiu. Agora
estou preocupada, ansiosa, como vou resolver isso e como vou comprar comida
nesse período sem minha pensão(ENTREVISTA nº 11).
A ciência vem comprovando o quanto é difícil e prejudicial viver sob tensão,
resultantes de situações estressantes, como a violência. O organismo libera elevada
taxa de hormônios no sangue, alterando o funcionamento dos órgãos e resultando
em uma série de manifestações fisiológicas, sendo mais acentuado no organismo da
gestante que está passando por alterações hormonais e mudanças em função da
própria gravidez.
“Porque a gente fica sensível, carente. E, a gente quando chega em casa encontra o
marido com outra na nossa cama,não sei nem definir o que senti, humilhação,
desprezo, raiva” (ENTREVISTA nº 1).
“Mas é aquela atenção que agente quer, e em vez disso, o cara sabe xingar”
(ENTREVISTA nº 3).
Essas tensões fazem com que aflorem sentimentos de rejeição, culpa ou
hostilidade, resultando em mudanças físicas, psicológicas e químicas. Nas relações
conjugais de estrutura frágil, a gravidez pode, pela própria condição, tanto levar
aos maiores níveis de integração e aprofundamento no relacionamento do casal,
como favorecer ao rompimento, sendo esta ultima o mais provável de acontecer. À
82
medida que isso aconteça, os conflitos, estresses se intensificam desencadeando
uma série de alterações, sentimentos e emoções desconfortantes e desfavoráveis
tanto para a mãe quanto para o bebê (LIPP, ROMANO, 1987; BOADELLA, 1992).
Esses sentimentos e emoções têm uma relação íntima com a hipertensão.
Elas fazem com que o sangue exerça uma maior força contra as paredes das
artérias. O coração apresenta tendência ao aumento de seus batimentos, com
prejuízo de suas funções. Na maioria dos casos de hipertensão, a causa de
desencadeamento não é orgânica e sim psicológica (HOWARD, LEWIS, 1984).
Para as mulheres entrevistadas, o fato de terem ficado grávidas desencadeou
ou intensificou a vivência da violência, tanto por parte do companheiro, como dos
familiares e ou chefe no trabalho.
“Depois que falei da gravidez ele mudou. Quando tento pedir uma ajuda de dinheiro,
nós sempre acabamos discutindo, e fico logo com dor de cabeça. Outro dia fui parar
no Hospital, minha pressão estava 16 X 10, fizeram uma medicação, fiquei em
observação por um tempo, e fui liberada” (ENTREVISTA nº 8).
Depois que engravidei o meu patrão passou a pegar no meu , dizendo que meu
trabalho não era o mesmo, reclama de tudo. Não consigo ter paz pra trabalhar, acho
que ele tem medo de eu pegar licença e me pertuba pra eu não agüentar mais e
pedir demissão ( voz embargada) (ENTREVISTA nº 12).
Logo, a instabilidade emocional comum ao período gestacional tende a
potencializar-se em virtude dos transtornos e agravos decorrentes de situações de
violência. E, conseqüentemente, tornam-se gestações com maior propensão à
gravidade
“O meu sentimento é mágoa. Enquanto eu não estava grávida ele era maravilhoso
comigo. No dia em que eu falei que estava grávida ele mudou. Virou outra pessoa.
Ele me disse que me repudiava por eu ter engravidado. Simplesmente não quis
saber de nada” (ENTREVISTA nº 7).
“Eu sinto é tristeza, desprezo, vergonha e humilhação. Não precisava passar pelo
que estou passando, dependendo de meus pais. É uma mágoa muito grande. Sinto
que isso me faz mal” (ENTREVISTA Nº 16).
As gestantes identificaram as repercussões da violência a partir dos
sentimentos e emoções negativos vividos, que em sua percepção, resultaram em
reações fisiopatológicas expressas em sintomas e sinais. Para elas, tais situações
83
geraram preocupação e levaram-nas a procurar assistência hospitalar, onde foram
internadas em virtude da hipertensão arterial.
Estas ao relacionarem o surgimento ou o agravamento da hipertensão
arterial, fizeram tanto com a ocorrência da violência psicológica, como a da física, ou
mesmo da social, seja no contexto intrafamiliar, comunitário, no trabalho ou mesmo
na instituição de saúde.
“Ah, com certeza porque eu não estava assim antes. Foi depois do dia 26, que eu
tive essa briga, que eu comecei a ter dor de cabeça, minha perna inchar, antes eu
não estava assim, eu nunca fui hipertensa, até meu cartão do pré-natal está relatado
que na ultima consulta minha pressão era 11X6. Foi por aborrecimento. eu tive um
problema com minha mãe, uma briga bem séria” (ENTREVISTA nº 5).
“Sim, tem relação. Fui procurar o serviço de emergência por que não estava me
sentindo bem, e fui maltratada. Me deram um remédio para a pressão que estava
alta, e disseram para procurar o local onde fazia o pré-natal, para ser acompanhada
pelo profissional. Nem reavaliaram minha pressão. sei que quando cheguei no
pré-natal, minha pressão estava muito mais alta e o profissional me internou, podia
ter perdido meu filho”(ENTREVISTA nº 6).
As repercussões de caráter afetivo (emocional) destacadas pelos sentimentos
e emoções negativos vividos, foram denominadas de Repercussões Emocionais.
Dentre elas temos: decepção, desilusão, raiva, preocupação, medo, vergonha,
sofrimento, insegurança, tristeza, desprezo, mágoa, desespero, irritação,
arrependimento, nervoso, solidão, o medo de um parto prematuro; as preocupações
com os riscos de sua saúde e do seu bebê.
“Bom, depois dessa situação [discussão e abandono] eu passei a ter insegurança, a
ficar com medo de acontecer alguma coisa comigo, com meu filho” (ENTREVISTA
Nº 9).
“Eu depois que vi meu marido bem [o marido levou três tiros], não sei se é relaxar a
palavra, você me entende. É como eu tivesse deixado vir a tona todo o sentimento
que controlei esse tempo todo, como medo, insegurança, preocupação, desespero,
angustia...” (ENTREVISTA nº 14).
“Eu me senti violentada, humilhada, triste e desprezada, [no hospital durante sua
internação]” (ENTREVISTA Nº18).
Os sofrimentos na esfera mental tendem a serem transformados em
ansiedades, depressões ou toda sorte de quadros mórbidos. Cabe destacar o
momento ímpar do período gestacional, onde tais repercussões, reações e os
próprios sentimentos vividos pela violência (de gênero), encontram-se entrelaçados
84
com o momento de transição da própria identidade dessa mulher, da definição de
papéis (da condição de filha para a de mãe) e de seu amadurecimento.
Nesse sentido, Oliveira (2007) e Schraiber et al (2003) ressaltam que os
profissionais médicos (de saúde) não devam somente associar tais sofrimentos à
esfera dos transtornos mentais e sim pensar na causa principal, ou seja, uma
possível situação de violência.
Além das repercussões emocionais, as gestantes apontaram sinais e
sintomas físicos como indicadores da busca por assistência hospitalar, os quais
denominamos Repercussões Físicas. Dentre tais as repercussões relacionadas com
a síndrome hipertensiva na perspectiva das gestantes destacaram-se: mal - estar,
dores de cabeça, dores na nuca, aperto no peito, náuseas, edemas de membros
inferiores, cólicas, lesões físicas, sangramentos, a diminuição do liquido amniótico,
alterações da glicose e da pressão arterial.
“Eu nunca fiquei internada na outra gravidez. Nasceu no tempo certinho, tudo
certinho. E nessa gravidez eu vim parar aqui com minha pressão alta, com uma dor
na nuca, aperto no peito. Quase que o neném nasce antes do tempo, depois do
empurrão que levei e pela dificuldade em baixar a pressão, até sangramento eu tive”
(ENTREVISTA nº 1).
“Após as discussões que tinha com minha mãe e padrasto minha glicose ficava
alterada, pois sou diabética, e dessa vez foi a minha pressão. Por isso que estou
internada e meu bebê correndo risco” (Entrevista nº 8).
“Eu acho que foi por causa disso que eu perdi líquido. Ele me deu um soco aqui
(mostrou a região epigástrica). Claro, se acha que essas dores que sinto são o que?
É conseqüência do chute que aquele animal me deu. Depois disso vivo sentindo
cólicas e tomando dipirona” (Entrevista nº15).
As repercussões para a saúde não se limitam a distúrbios ou sintomas que
ocorrem por ocasião da violência. A mulher procura o serviço de saúde em busca de
solução para problemas que podem ser decorrentes da violência, classificados de
agudos, ou seja, distúrbios ou sintomas que ocorrem por ocasião da violência
(lesões traumáticas, hematomas, lesões musculares e fraturas); ou crônicos,
surgidos lentamente, pouco expressivos, em decorrência de sucessivas situações da
violência e de suas conseqüências como sofrimentos de longa duração, infecções
urinárias de repetição, infecções sexualmente transmissíveis que podem ocasionar
as inflamações pélvicas crônicas, além do sofrimento mental crônico, que leva à
perda da habilidade de lidar emocionalmente com outras situações difíceis,
85
causando depressão, ansiedade e pensamentos ou tentativas de suicídios
(SCHRAIBER et al,2005; KRUG et al,2002)
As repercussões da violência sobre a saúde da mulher ocorrem em todo o
seu ciclo de vida, inclusive no período reprodutivo. Neste período, é comum verificar
como conseqüência da violência, queixa de sangramento vaginal, dor pélvica, dor
em baixo ventre, abortos, recém nascido de baixo peso, ansiedade, depressão, além
do início do pré-natal tardio, dificultando a identificação de comportamentos de risco,
uso de medicamentos proscritos e de patologias pregressas ou correlatas à
gravidez, como a própria hipertensão arterial, acarretando um possível aumento de
complicações maternas e fetais (STEWART; CECUTTI, 1993; MCFARLANE et al.,
1996; SCHRAIBER; D‟OLIVEIRA 2003; NOGUEIRA, 2006).
Algumas gestantes apontaram repercussões da violência sobre seu cotidiano
pessoal e social e que foram relacionadas com surgimento ou agravamento da
síndrome hipertensiva vivida por elas, tais como: o isolamento por vergonha;
ansiedade gerada pela necessidade de internação que a afasta de suas atividades e
do cuidar dos seus filhos, de sua casa; preocupações, mas também, o isolamento,
pois algumas não recebem visitas quando internadas.
“Não procurei [o hospital]. Não quis sair para ir ao hospital. É que sangrou muito a
boca. Tinha vergonha que alguém de onde eu moro me visse assim. Mas tomei um
remédio para a dor” (ENTREVISTA Nº15).
“Eu não falo muito, mais fico pensando nelas, como será que elas estão, será que
esta comendo, fazendo o dever, se cuidando. Fico preocupada, quando começo a
lembrar, eu passo muito mal, isso me faz muito mal” (ENTREVISTA nº 14).
A violência ao ser vivenciada promove insegurança à vítima, além de
depressão, distúrbios do sono, isolamento social progressivo, intimidação, baixa
auto-estima e distúrbios psicossomáticos (MARTIN et al., 1996; GELLES, 1997;
DANIELS, 2005). Outros problemas são apresentados como os custos da
assistência de saúde. o mulheres que apresentam maior propensão a utilizar os
serviços de saúde e serem atendidas nos serviços de emergências, demandando,
por vezes, um atendimento multiprofissional e de alta complexidade. Ao vivenciarem
atos de violência freqüentemente e progressivamente mais graves, tornan-se
vulneráveis a morbimortalidade materna e fetal (COKER et al., 2004; JONES et al.,
2006; RIVARA et al., 2007).
86
Verificamos, ao analisar repercussões apontadas pelas gestantes e sua
relação, estabelecida pelas mesmas, com a violência, no agravamento e surgimento
da síndrome hipertensiva, que se faz mister a importância de identificar outras
possíveis causas, não biológicas para o advindo de patologias como a síndrome
hipertensiva. E que a violência, em particular a que é voltada contra a mulher, pode
representar um dos fatores motivadores ou agravantes de riscos à saúde.
Infelizmente, é comum nas patologias clássicas como a hipertensão arterial
conhecer sua relação com outros problemas que não orgânicos, entretanto, pouco
se valoriza além da intervenção bioquímica no cuidar de pessoas com essa
patologia.
Resultados obtidos por Silva, Aquino (2008), numa pesquisa com mulheres
vítimas de violência atendidas em uma unidade de urgência e emergência,
mostraram que a mulher percebe os efeitos da violência sobre a sua saúde, mas o
problema continua invisível para os profissionais de saúde, não havendo nenhum
registro em prontuário acerca do que ocorreu com a mulher e que o atendimento se
resume ao tratamento das marcas deixadas no corpo especialmente para as vítimas
de traumas, demonstrando que a violência somente é considerada para efeito de
cuidados quando pode ser exteriorizada.
Os profissionais de saúde são formados e se tornam competentes para lidar
com diagnósticos de quadros mórbidos delimitados, tendo como conduta a
intervenção curativa, que é a intervenção médica tradicional, de tratar as
enfermidades do que em ações de caráter preventivo e de promoção da saúde
(SCHRAIBER et al, 2005; PENNA, 2005)
Para prestarmos um cuidado integralizado e interdisciplinarizado, precisamos
acolher de forma humanizada essas gestantes, com olhar diferenciado a cada uma,
valorizando suas queixas físicas, psicológicas e o seu contexto social, para
identificar a verdadeira causa do problema, dando opções para que ela possa sair
dessa realidade.
Apesar do SUS ter como objetivo a integralidade
3
da assistência, e com isso
resolver a dicotomia entre a assistência preventiva e curativa, constatamos que
muitos profissionais, particularmente os apontados pelas gestantes, e que trabalham
nas emergências e no serviço de pré-natal, não ofereceram um atendimento
3
A integralidade envolve três grandes conjuntos, as práticas dos profissionais de saúde, a organização dos
serviços e às respostas aos problemas de saúde (MATTOS, 2004).
87
resolutivo. Parecem não estarem preparados para desenvolverem uma assistência
integral e humanizada, voltando-se mais para os aspectos curativos, e os sinais e
sintomas visíveis no momento.
Conforme Boff (2000) afirma “o cuidado é a dedicação a alguém, é dispor a
participar de suas buscas, de seus sofrimentos e de seus sucessos, enfim de sua
vida. Cuidado é zelar, dar atenção e ter bom trato”.
88
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES
Acreditamos que este estudo alcançou os objetivos propostos de identificar os
tipos de violência que as gestantes portadoras de SH vivenciam e também as
relações estabelecidas pelas mesmas a partir das repercussões da violência vivida
sobre sua condição de saúde, ou seja, o agravamento ou surgimento da hipertensão
arterial.
Conhecer a realidade das gestantes que são portadoras da SH e que
vivenciam a violência na gestação foi de grande importância, pois revelou aspectos
valiosos, apontados pelas próprias gestantes, na identificação das causas não
fisiológica que podem estar desencadeando a hipertensão arterial. Além do mais,
permitiu a visualização da violência vivenciada pela gestante, nos seus diversos
contextos: família, trabalho, comunidade que vive e também na instituição hospitalar
a que recorre; e o muito que se tem que fazer para melhorar essa realidade.
Foi difícil para essas gestantes relataram esse cotidiano de violência,
observamos isso não através de suas falas, mas também na expressão corporal
e de seus sentimentos. Mas, ao mesmo tempo percebemos que ao conseguirem
expressar sobre a situação que passavam, ficavam com um semblante de alívio, e
muitas afirmaram ter sido positivo falar sobre o assunto.
Analisando o perfil sócio-cultural dessas gestantes, encontramos as seguintes
características: mulheres de faixa etária jovem, entre 20 a 29 anos; com baixa
escolaridade; do lar; com idade gestacional acima de 20 semanas; a maioria
multípara; a maioria dessas gravidezes não foi planejada e são rejeitadas pelo
companheiro, estão inseridas num relacionamento conjugal conflituoso e inseguro e,
sendo rejeitada pelo companheiro. Percebemos que elas apresentam fatores de
vulnerabilidade tanto para a hipertensão arterial como para a vivência da violência
em vários contextos e de diferentes tipos, principalmente na violação dos seus
direitos como cidadãs, como conseqüência das desigualdades sociais e estruturais
enfrentadas no contexto intrafamiliar e no contexto comunitário.
Ao valorizarmos o perfil sócio-cultural das gestantes com seu contexto social
(modelo ecológico) verificamos que o mesmo é predisponente para a ocorrência da
violência, assim como, um possível fator de risco para a hipertensão arterial, o que
nos leva a despertar para a importância da integralidade da assistência, e em
decorrência disto, para a necessidade de ampliar a visão de todo processo de
89
saúde-doença. Cabe ressaltar que a Síndrome Hipertensiva na gestação é a
primeira causa da mortalidade materna em nosso país, devendo ser reavaliado os
mecanismos de sua identificação, agravamento e tratamento. E que a violência está
presente na vida da maioria das mulheres em todo o seu ciclo vital.
Outro ponto importante foi o que as gestantes definiram como violência contra
a mulher - uma violação dos direitos e a violência familiar. Com isso, podemos
verificar que as mulheres possuem a consciência do que seja a violência contra ela.
Seu entendimento é basicamente fruto do que vivem em seu cotidiano, na relação e
convívio com o companheiro e a família; no trabalho, na comunidade onde mora e
nas instituições hospitalares que lhe deviam prestar uma assistência humanizada e
digna.
O tipo de violência vivenciado pelas gestantes hipertensas e apontado pela
maioria foi psicológico. É uma violência comum que ocorre no cotidiano, pouco
visível, sendo muito difícil de ser detectada e percebida, mas que essas gestantes o
percebem. Um dado interessante é que todas vivenciam a violência psicológica com
o companheiro e grande parte dessa violência estava vinculada ao fato do
surgimento da gestação não planejada. Tal dado nos faz pensar sobre os programas
assistenciais de planejamento familiar, das ações sobre a saúde reprodutiva, não
da mulher, mas principalmente do casal.
Como foi definida pelas próprias gestantes, a violência começa na violação
dos direitos na família, com a falta de uma conscientização do companheiro por
ocasião da divisão das tarefas domésticas, assim como pela não inclusão deste na
responsabilidade do planejamento dos filhos, na escolha e utilização de um método
contraceptivo que favoreça a ambos. No campo do trabalho, esta pode ser
combatida pelo cumprimento de leis que favoreçam a mulher gestante no
desempenho de seu trabalho, não somente o empregador. Nas instituições
hospitalares que seja colocado em prática o objetivo do Sistema Único de Saúde e
da própria Política de Assistência Integral á Saúde da Mulher, qual seja,
proporcionar uma assistência acolhedora, humanizada e integral. E, acrescente-se,
na comunidade em que vivem é necessário que os órgãos governamentais priorizem
políticas de segurança, dando condições de “ir e vir” sem colocar em risco a vida.
Destacamos ainda, as repercussões e a relação identificada pelas gestantes
da vivencia a violência e o surgimento ou aumento da pressão arterial, em diversos
contextos: familiar, tanto com o companheiro quanto com os pais; comunitário,
90
através do trabalho, com situações de assédio moral e urbana com violência no
trânsito e a violência vivida com a impunidade de bandidos e os conflitos destes com
policiais; e nas instituições hospitalares, nas relações com o profissional e a
peregrinação nos serviços.
Durante a coleta de dados ao caracterizarmos essas gestantes, tivemos
dificuldades em obter algumas informações nos prontuários, pois estes possuíam
lacunas nas anamneses, principalmente quanto aos dados de identificação, de
fatores como: socioeconômicos; etnia, grau de escolaridade; profissão, estado
civil/união; número de filhos e se havia uma sobrecarga de trabalho doméstico; a
renda familiar; condição de moradia, saneamento básico, informações sobre sua
saúde reprodutiva e sexual. Isso nos permite constatar que ainda nos deparamos
com uma desvalorização desse contexto para conclusão do diagnóstico e
principalmente, na investigação das causas sociais que podem desencadear
diagnósticos fisiopatológicos.
É necessário haver uma modificação no modelo de assistência e de formação
dos profissionais, que este ainda possui resquícios do modelo biomédico,
centrado na cura da sintomatologia e não na prevenção das causas que
desencadeiam essa sintomatologia.
Diante do contexto social e familiar das gestantes que vivenciam violência e
que apresentam a SH, o profissional de saúde tem várias e importantes funções a
serem desenvolvidas diretamente com as próprias gestantes, mas também com seu
parceiro e família, e também com a equipe onde trabalha.
Destaca-se como ponto importante na minimização das lacunas de
valorização da cliente como um todo, o investimento na formação dos profissionais
de saúde, para que estes não sejam somente centrados no modelo biomédico, ou
seja, que seu olhar não seja focado apenas sobre a patologia que a gestante
apresente e sim em todo o processo gestacional e no contexto em que está inserido.
O profissional de saúde tem papel importante em diversas ações a serem
desempenhadas na prevenção da violência intrafamiliar e suas conseqüências.
Desde o acolhimento dessa gestante no serviço de saúde, onde se sinta valorizada
e tenha confiança no serviço, até na formação de grupos educativos, no atendimento
individualizado e multiprofissional com as gestantes, nas visitas domiciliares, na
produção de material educativo explicativo de situações de risco para a violência, e
nas orientações sobre as diversas formas de saída desse contexto. Com isto,
91
promoverão a saúde da gestante e bem - estar do concepto, assim como, as ações
assistências para melhorar seu quadro, neste caso a hipertensão na gravidez.
Deve-se focar, principalmente, a atuação desse profissional no campo da
saúde reprodutiva, o qual tem que desempenhar papel diferenciado desde a pré-
adolescência, com instruções e orientações, destacando o papel e a
responsabilidade do homem numa gravidez não planejada e suas conseqüências.
A enfermeira obstétrica assim como os obstetras tem um campo de atuação
muito grande, no planejamento familiar, no pré-natal, no parto e puerpério.
Praticamente são estes profissionais que acompanham essa mulher por mais de um
ano, durante o desenvolvimento e após a gestação, período em que tem
possibilidades de conversar, analisar e trabalhar o contexto de vida dessa gestante,
além do companheiro e família.
Outro ponto importante a ser considerado é capacitar e sensibilizar toda a
equipe de saúde, para que a gestante seja atendida a partir de um olhar
diferenciado. Destacamos também a necessidade de um respaldo institucional e
psicológico para a equipe, no atendimento ás mulheres que vivenciam a violência,
prevenindo dificuldades que muitas vezes podem surgir a partir desse atendimento.
Para que essas ações sejam eficientes, principalmente no contexto da
violência, o trabalho tem que ser desempenhado por uma equipe multiprofissional e
interdisciplinar, a fim de que o problema tenha uma compreensão abrangente e
intervenções sejam efetivas.
É de grande importância que haja um incentivo para que o profissional de
saúde desenvolva pesquisas no campo da violência, principalmente, naquelas que
revelem o máximo de conhecimento básico a respeito de todos os aspectos da
violência contra a mulher e especial a mulher gestante, sua magnitude,
características e conseqüências. E, com isso atuar nas formulações de políticas
públicas para promover, prevenir e assistir de forma integrada a gestante que
vivencia a violência.
92
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SCHRAIBER, L.B.; et al. A Violência contra a mulher: estudo em uma unidade de
atenção primária à saúde. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 36, n. 4, p. 470-
477, 2002.
SCHRAIBER, L.B.; et al. Violência contra a mulher: estudo em uma unidade de
atenção primária à saúde. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v.36, n.4, ago. 2003.
SCHRAIBER, L.B.; D´OLIVEIRA, A.F.P.L. O que devem saber os profissionais de
saúde para promover os direitos e a saúde das mulheres em situação de violência
doméstica. 2.ed. Faculdade de Medicina USP, São Paulo, 2003.
SCHRAIBER, L.B; et al. Violência dói e não é direito: a violência contra a mulher, a
saúde e os direitos humanos. São Paulo: Editora UNESP, 2005.
SILVA I. V.; AQUINO E.M. Padrão de distúrbios psíquicos menores em
mulheres vítimas de violência atendidas em uma unidade de urgência e emergência
Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 24, n. 9, p. 2103-2114, set, 2008.
97
SOUZA, ER; LIMA, MLC. Panorama da violência urbana no Brasil e suas capitais.
Ciência & Saúde Coletiva, [s.l.], v.n. 2007.
STEWART, D.; CECUTTI, A. Physical abuse in pregnancy. Canadian Medical
Association Journal, v. 149, p.1257-1263. 1993.
SUÁREZ,M.; MACHADO,L.Z.; BANCEIRA,L.M. Violência, Sexualidade e Saúde
Reprodutiva. In: GALVÃO, L.; DÍAZ, J., e Org. Saúde Sexual e Reprodutiva no
Brasil. São Paulo: Hucitec; Population Council, 1999.
VALDEZ-SANTIAGO, R.;
SANÍN-AGUIRRE, L. H. La violencia doméstica durante el
embarazo y su relación con el peso al nacer. Salud Pública de México, México, v.38, p.352-
362. 1996.
VENGUER, T. et al. Violência doméstica: um marco conceptual para la capacitación Del
personal de salud. México: IMIFAP/Population Council,1998.
VIEIRA, V.A., Hipertensão Arterial Aspectos Éticos em Pesquisas Envolvendo Seres
Humanos: Implicações para a área de saúde. Rev. Bras. Saúde Materno Infantil,
Recife, v. 3, 2003.
98
APÊNDICE A - Termo de Autorização para Coleta de Dados
TERMO DE AUTORIZAÇÃO
Ilmº Sr. Diretor (a)
Ilmª Srª Chefe de Enfermagem
Venho pelo presente, apresentar o meu Projeto de Pesquisa do Mestrado,
intitulado, provisoriamente, VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: VIVÊNCIA DE
MULHERES COM DOENÇA HIPERTENSIVA GESTACIONAL”, e solicitar a V. Sa.
o desenvolvimento de tal proposta nesta unidade de saúde, e a divulgação e
publicação dos dados. A referida pesquisa tem como objetivos: Discutir os tipos de
violência vivenciados por gestantes com diagnóstico de Síndrome Hipertensiva na
Gravidez, e analisar as relações estabelecidas pela gestante com diagnóstico de
Síndrome Hipertensiva na Gravidez e a vivencia da violência durante a sua
gestação.
Para o desenvolvimento do projeto será realizada uma entrevista semi
estruturada com as gestantes com diagnóstico de Síndromes Hipertensivas na
Gestação e que vivenciam a violência, atendendo os critérios científicos
estabelecidos pela Lei 196/96 do CNS. (Em anexo Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido). Todo o material da pesquisa estará à disposição desta unidade,
sendo inclusive doado ao Centro de Memória da Faculdade de Enfermagem da
UERJ.
Certa de contar com sua colaboração, desde agradeço e coloco-me
à disposição para qualquer dúvida e esclarecimentos.
Rio de Janeiro, __ de ________ 2007.
__________________________
Márcia Fontes Peixoto Azeredo
Pesquisadora
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CENTRO BIOMÉDICO
FACULDADE DE ENFERMAGEM
99
APÊNDICE B Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Solicito sua participação nesta pesquisa intitulada VIOLÊNCIA CONTRA A
MULHER: VIVÊNCIA DE MULHERES COM DOENÇA HIPERTENSIVA
GESTACIONAL, cujos objetivos são: Discutir os tipos de violência vivenciados por
gestantes com diagnóstico de Síndrome Hipertensiva na Gravidez, e analisar as
relações estabelecidas pela gestante com diagnóstico de Síndrome Hipertensiva na
Gravidez e a vivencia da violência durante a sua gestação.
As suas respostas serão tratadas de forma anônima e confidencial, seu nome
será mantido em sigilo, sendo usado outra forma de identificação. As informações
prestadas serão utilizadas apenas nesta pesquisa e a divulgação dos resultados
ocorrerá em eventos ou publicações científicas. Sua participação não inclui qualquer
custo de compensação financeira, é voluntária, quer dizer, você tem o direito de não
participar, responder qualquer pergunta ou de se retirar do estudo, a qualquer
momento, sem que isso represente qualquer prejuízo ao seu atendimento ou em sua
relação com a instituição onde a pesquisa está sendo realizada. A pesquisa se
conduzida pela técnica de entrevista, que serão gravadas em MP4, transcritas na
íntegra, e sua participação consistirá em responder as perguntas realizadas.
Você terá uma cópia deste termo, que contém números de telefone e
e-mail do pesquisador. Com eles poderá a qualquer momento esclarecer suas
dúvidas a respeito da pesquisa e/ou de sua participação.
Assinatura: _________________________________ Rio de Janeiro, ___/___/___
Márcia Fontes Peixoto Azeredo. (Mestranda da Faculdade de Enfermagem da
UERJ). Tel 92325288 /25876552 (trab) E-mail: [email protected].
Lúcia Helena Garcia Penna (Orientadora)
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CENTRO BIOMÉDICO
FACULDADE DE ENFERMAGEM
100
APÊNDICE C INSTRUMENTO PARA CARACTERIZAÇÃO DO SUJEITO.
1) Município de origem: ______________________________________
2) Idade: ___________
3) V/S já freqüentou ou freqüenta a escola? Qual foi a última série que V/S
completou?
a) Não estuda ou estudou
b) Nível Fundamental completo
c) Nível Fundamental incompleto
d) Nível Médio completo
e) Nível Médio incompleto
f) Terceiro grau completo
g) Terceiro grau incompleto
4) Qual a sua cor?
a) Branca
b) Parda
c) Preta
d) Amarela
e) Indígena
f) NSR
5) Estado Civil:
Solteira ( ) Separada ( )
Casada ( ) Viúva ( ) com companheiro ( )
6)Profissão/ Ocupação: _________________________________________
7) Quem é o chefe de família em sua casa, assumindo as responsabilidades?
Você ( ) seu companheiro ( ) outros ( )
16)Idade gestacional__________________
17) Gesta: _____ Para: _____ Aborto____
18) V/S faz pré-natal?
( ) Sim
( ) Não
101
APÊNDICE D ROTEIRO DA ENTREVISTA SEMI ESTRUTURADA
1. O que você entende por violência contra a mulher?
2. Durante esta gestação você vivenciou violência. Poderia estar relatando como
foi essa situação?
3. Você perceber a relação entre essa violência vivida e o seu estado de saúde
atual?
102
APÊNDICE E QUADRO DE CATEGORIZAÇÃO DAS ENTREVISTAS
CATEGORIA
SUBCATEGORIA
UNIDADE DE SIGNIFICAÇÃO
1ª Categoria: A
violência na
perspectiva da
gestante com síndrome
hipertensiva um olhar
de quem a vivenciou
NE= 18 / UR = 59
VIOLAÇÃO DOS DIREITOS
NE= 11 / UR = 30
Algo que faz mal para o outro, que não deve acontecer a ninguém, que vai contra o outro, o
preconceito, um ato de covardia, crime, violência social, algo complexo, do cotidiano
VIOLÊNCIA FAMILIAR
NE= 10 / UR = 25
Desavença, bater em outras pessoas, contra a mulher, contra a criança, física e a violência
psicológica (agressores verbais como palavras que machucam, ferem, humilham, ofendem, e
que afeta o emocional e o psicológico)
NÃO SABE EXPLICAR
NE= 04 / UR = 04
CATEGORIA
SUB-
CATEGORIA *
LOCAL /
AGRESSOR*
TIPO DE
VIOLÊNCIA
VIVENCIADA *
UNIDADE DE SIGNIFICAÇÃO
2ª categoria:
gestantes com
síndromes
hipertensiva-
descrevendo a
violência
vivenciada.
NE=18 / UR=365
A violência
vivenciada no
contexto familiar
NE=18 /
UR=280
Familiares
NE=10 / UR=58
Psicológica
NE=10 /UR=55
Conflito entre mãe e filha / entre pai e filha. Falta de apoio
Física NE = 01 /
UR=03
Empurrões e tapas.
Companheiro
NE=18 /
UR=222
Física NE= 05 /
UR=17
Soco, chute, tapas e empurrões,
Psicológica
NE=18 /
UR=205
Grosso com palavras; Doía certa palavra; Discussão, Ameaças. Rejeição da mulher;
Paternidade não assumida; Solicitação de aborto; Rejeição do sexo da criança; Falta de apoio
emocional; Falta de apoio financeiro para: Alimentação, medicação, Dinheiro Exame pré-natal;
Marido desempregado, gastando com bebida. Traição.
A violência
vivenciada no
contexto
comunitário
NE=13
UR=85
Trabalho
NE=03 / UR=26
Psicológica
Assédio moral, discusão; psicológica; Subsitituição; Falta de infraestrutura
Relacionamento com patrão; Violação dos direitos trabalhistas.
Urbana
NE=03 / UR=14
Psicológica
Xingamentos; discusões; Psicológica; Ameaças; Fechamento do comercio, escolas; Tremores
em relação aos conflitos entre bandidos
Institucional
NE=03 / UR=13
Psicológica
Psicológica; Preconceito em relação a doença; Falta ou má orientação; Atendimento precário;
Desprezo, humilhação; Morar longe sem transporte; Falta de vaga.
Institucional e
Urbana
NE=04 /UR=32
Psicológica
Fechamento do comercio, escolas; Susto com acidente próximo ao trabalho; Tremores em
relação aos conflitos entre bandidos
* Destacamos que algumas entrevistadas vivenciaram a violência com mais de um tipo de agressor e de violência
Continuação
103
CATEGORIA
SUBCATEGORIA
LOCAL /
AGRESSOR
TIPO DE
REPERCUSSÕE
S
UNIDADE DE SIGNIFICAÇÃO
3ª CATEGORIA:
A síndrome
hipertensiva
gestacional como
repercussão da
violência: uma
perspectiva da
gestante.
NE=16
UR=172
Contexto Familiar
NE=16 / UR=126
Familiares
NE=05
UR=33
EMOCIONAIS
NE=06 / UR=28
Preocupação, ansiedade, nervosismo, medo, insegurança ansiedade,
preocupação com a gestação e o filhos em casa
BIOLÓGICA
NE=02 / UR=02
Aumento da pressão arterial. Mal estar, cefaléia, descompensação da
glicose (diabetes) risco de morte para o bebê.
Social
NE=03 / UR=03
Internação e afastamento dos filhos
Companheiro
NE=11 / UR=93
EMOCIONAIS
NE=10 / UR=83
Desilusão, decepção, rejeição, raiva, irritabilidade Carência afetiva
saudade, falta de atenção, sensível. Insegurança, desconfiança,
sofrimento, magoa, desespero, tristeza.
BIOLÓGICA
NE=02 / UR=09
Sangramento; risco de parto prematuro; aumento da pressão arterial Perda
de liquido Mal 1estar, cefaléia
Social
NE=01 / UR=01
Isolamento
Contexto
Comunitario
NE=09 / UR=46
Trabalho
NE=03 / UR=13
EMOCIONAIS
NE=03 / UR=06
Preocupação, irritação, aborrecimento, injustiça, tristeza. Nervosa sem
beneficio, preocupada com sustento dos filhos, ansiosa, estresse com
aborrecimento no trabalho
BIOLÓGICA
NE=03 / UR=03
Aumento da pressão arterial; cefaléia e mal estar
Urbana
NE=03 / UR=17
EMOCIONAIS
NE=03 / UR=11
Preocupação com a violência urbana, medo,insegurança em relação a
violência urbana Preocupação com filhos e com a saúde do marido
BIOLÓGICA
NE=03 / UR=03
Aumento da pressão arterial.
Social NE=03 /
R=03
Não poder levar o filho para a escola, não sair de casa,
Institucional
NE=03 / UR=16
EMOCIONAIS
NE=03 / UR=10
Sentimentos em relação a hospitalização, medo, raiva, desprezo,
preconceito, humilhação, tristeza, vergonha
BIOLÓGICA
NE=03 / UR=03
Aumento da pressão arterial
Não Sabe
NE=02 / UR=02
Conclusão.
ANEXO A Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa
ANEXO B Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa
Livros Grátis
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