95
primeiro (Howell, 2003) sobre o poder de decreto do presidente norte-americano e o
controle exercido por todo Poder Judiciário federal daquele país
67
. Os dados levantados
nestes trabalhos sobre a revisão judicial de executive orders
68
são bastante claros em
apontar a acentuada tendência à deferência judicial frente aos decretos editados pelo
presidente norte-americano
69
. Do total de 86 casos em que o Judiciário analisou
decretos, no período compreendido entre 1942 e 1996, apenas 14 (16,1%) foram
julgados, integral ou parcialmente, em contrariedade ao presidente, sendo os 72 (83,9%)
restantes totalmente favoráveis a ele. Como se verá no próximo capítulo, estes
percentuais são muito semelhantes àqueles existentes no Brasil, mesmo que por razões
institucionais os dados brutos apresentem variação. Ainda como afirma a teoria, o
exame da realidade norte-americana atesta que estes poucos casos de insucesso do
Executivo junto às cortes tenderam a se verificar especialmente quando estas se
67
O estudo é especialmente interessante porque o autor não se atém apenas ao papel da Suprema Corte,
mas estende o objeto de análise ao examinar o controle exercido por todo Poder Judiciário federal norte-
americano sobre as
executive orders. Este certamente é um indicador melhor do controle de
constitucionalidade exercido sobre o poder de decreto do presidente norte-americano, e praticamente
sobre o
judicial review de qualquer legislação que se queira analisar naquele país. Isto porque, como já foi
apresentado, a Suprema Corte apresenta ampla discricionariedade quanto ao controle de sua agenda,
somente julgando o que deseja de todos os processos que chegam até ela pelo sistema recursal. Desta
maneira, ao examinar os posicionamentos de todo Poder Judiciário federal (que possui sempre efeito
erga
omnes
, isto é, universal ao decidir), não restam olvidados os casos em que, ao não tomar uma decisão, a
Suprema Corte anui, ainda que não explicitamente, com o posicionamento tomado nas instâncias
inferiores do Poder Judiciário federal daquele país. Neste sentido, ao considerar apenas os dados relativos
ao controle exercido pelo mais alto tribunal do país, estar-se-ia omitindo situações importantes nas quais
há um posicionamento judicial com respeito a determinado tema, ainda que este não tenha sido tomado
pela Suprema Corte, mas cujos efeitos da decisão são idênticos àqueles contextos em que esta se
pronuncia sobre determinado tema.
68
Apesar de não previstas constitucional ou legalmente, as executive orders, até recentemente ignoradas
na análise do sistema político norte-americano, podem ser entendidas como decretos inicialmente
voltados à execução de leis, dirigindo-se aos agentes do governo – burocracia em especial – para que
estes implementem as diretrizes políticas determinadas na legislação. Elas podem ser consideradas
instrumentos de ação unilateral do Poder Executivo em que este goza de imenso raio de
discricionariedade, dado que, por decisão da própria Suprema Corte, o presidente não precisa fazer
menção a qual lei está regulando quando edita um destes decretos. Áreas altamente sensíveis da política
norte-americana foram iniciadas desta maneira, como legislação ambiental, fim da segregação nas forças
armadas, além da recente tônica no combate ao terrorismo, não contando, portanto, com o concurso do
Congresso para que fossem adotadas (Mayer, 2001; Howell, 2003).
69
Na realidade, mesmo que se considere apenas a Suprema Corte, a mesma tendência ao favorecimento
do Poder Executivo se verifica, se estendendo inclusive a diversas searas que não exclusivamente aos
decretos executivos. É pacífica a posição da literatura de que o presidente daquele país é o principal
favorecido com os julgamentos da corte. Estudos que tomam com base o papel do
Solicitor General –
espécie de representante, junto ao tribunal, dos interesses do governo federal, mas não necessariamente
adstrito aos interesses do presidente – indicam ampla margem de sucesso deste em relação aos demais
requerentes que se colocam ante o tribunal (McGuire, 1998; Graham, 2002). O mesmo se verifica em
trabalhos que afirmam ser a Suprema Corte bastante útil ao Presidente daquele país quando este tem de
superar obstáculos decorrentes da natureza fragmentada do sistema político daquele país (Whittington,
2005), não sendo diferentes os estudos que indicam haver apoio expresso do tribunal à expansão dos
poderes presidenciais (Yates & Whitford, 1998)