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MARIBEL PELAEZ DÓRO
Satisfação com a Qualidade de Vida dos Sobreviventes
Adultos de Longa Data de Pós-Transplante de Medula
Óssea Alogênico em Comparação com um Grupo Controle
Tese apresentada ao Curso de Pós-graduação em
Medicina Interna, do Setor de Ciências e Saúde da
Universidade Federal do Paraná, como requisito
parcial à obtenção do grau acadêmico de Doutora.
Orientador: Prof. Dr. José Zanis Neto
Co-Orientadora: Prof
a
. Dra. Eliane Cesário
CURITIBA
2008
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DEDICATÓRIA
Gostaria de não ter que restringir a dedicatória deste trabalho a uma única
pessoa. Assim, dedico:
Ao meu pai (in memorium) que soube semear lindos e profícuos frutos através
do seu respeito e amor à palavra, a justiça, aos livros, a natureza e aos animais.
A minha mãezinha querida que do seu jeito nos cuidou, acarinhou e hoje nos
seus 83 anos ainda zela e prima pela família.
E por fim, dedico este trabalho especialmente à razão maior da minha vida e ao
prazer da minha existência que está entrelaçado no meu amado marido e nos
nossos desejados filhos, Marcelo e Priscila.
ii
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AGRADECIMENTOS
Ao Hospital de Clínicas de Curitiba da Universidade Federal do Paraná HC-
UFPR, que, ao autorizar o projeto de pesquisa e acolher-me para sua concretização,
viabilizou este estudo.
Participar deste estudo foi muito gratificante, pela constatação científica de que
a qualidade de vida e a satisfação dos SOBREVIVENTES são favoráveis. Mas,
principalmente pela oportunidade e confiança que os sobreviventes, depositaram ao
compartilhar a riqueza das suas experiências e a grande lição de vida que
passaram. Agradeço de coração as reflexões saudáveis que propiciaram.
Um agradecimento muito especial ao meu orientador Prof. Dr. José Zanis
Neto pelo envolvimento e empenho constante e por não ter desistido, nos meus
momentos de frustração. Agradeço-lhe pela realização deste nosso trabalho.
Ao Dr. Ricardo Pasquini agradeço pela oportunidade de conviver diariamente
com a expressão do seu saber, com sua postura ética, humana e do grande
empreendedor que é.
Além disso, sua objetividade e conhecimento produzem discernimento e
clareza de idéias nesta que lhe admira e o tem como um mentor.
A Dra. Dra. Eliane Cesário e Dra. Denise Carvalho pela participação ativa e
integral na análise estatística dos resultados deste estudo. Mas, principalmente pelo
carinho, disponibilidade e questionamentos constantes e interessantes que com
certeza qualificaram este trabalho.
A Professora, Doutora, Psicóloga, e minha grande amiga Tânia Baibich-Faria
agradeço-lhe pelo seu carinho especial, reconhecimento e acolhimento para tudo e
para qualquer hora destes 26 anos de amizade. És capaz de alçar o belo, mesmo
nas paisagens estéreis e nas mentes estagnadas.
iii
A Dra. Vaneuza Araújo Moreira Funke que apesar dos inúmeros
compromissos contribuiu com seu conhecimento ao clarificar os critérios de definição
de condicionamentos com doses mieloablativas e não-mieloablativas. Além disso,
atualizou o banco de dados com as classificações dos SOBREVIVENTES que
desenvolveram a doença do enxerto contra o hospedeiro – DECH. Tornando
possível a inclusão na avaliação do efeito colateral do DECH na qualidade de vida
dos SOBREVIVENTES da nossa amostra.
Ao Dr. Marco Antonio Bitencourt que diante das minhas incertezas,
desconhecimentos e dificuldades, sempre disponibiliza sua atenção e oferece ajuda
com respeito e competência. Além disso, pelas inúmeras opiniões sobre o projeto,
sobre as condições clínicas dos sobreviventes e a avaliação do Karnofsky.
Ao Dr. Carlos Roberto de Medeiros que quando possível me dá o prazer de
participar de discussões profícuas que me trazem conhecimento e reflexões sobre a
dialética do nosso fazer, pensar e sentir diário.
A Dra. Carmem Maria Sales Bonfim por acreditar, investir e incentivar a
interação dos conhecimentos da medicina com os saberes da psicologia. Mas
principalmente por sua amorosidade e respeito demonstrados no convívio diário.
Dr. Paulo Tadeu Almeida que diante da solicitação, viabilizou os tramites
logísticos para que a pesquisa do grupo controle se efetuasse no HemoBanco de
Sangue de sua responsabilidade.
Ao meu marido e filhos que foram privados de inúmeros passeios e
entretenimentos em decorrência da minha dedicação contínua no desenvolvimento
deste trabalho. Além de aceitarem e respeitarem este compromisso, demonstraram
apoio logístico e afetivo para que eu pudesse alçar este sonho.
Quero registrar minha dívida enorme com minha irmã e psicóloga clínica e
hospitalar Julita Maria Pelaez. Pois, sua disponibilidade afetiva e de
iv
responsabilidade científica fez com que participasse no trabalho logístico da
digitação dos resultados (de forma duplicada e independente da pesquisadora).
A Marina Pelaez Evaristo de Souza a minha irmãzinha querida que com seu
conhecimento, perspicácia, sensibilidade e inteligência refletia, aquecia e enriquecia
minha aprendizagem.
A Neide Pelaez de Campos minha outra irmã especial que insiste em cuidar
de todos sem exceção como se fosse a nossa mãezinha. Muito obrigada pelo seu
carinho, torcida e disponibilidade incondicional para comigo.
Não seria possível este trabalho sem a ajuda de muitas pessoas, entre estas,
estão as Assistentes Sociais, Marlene Dias de Araújo Oliveira que prontamente
colaborou e forneceu os registros do Banco de Dados do STMO do Serviço Social,
para que os SOBREVIVENTES do estudo fossem classificados conforme as
condições sócio-econômicas. Também sou muito grata em relação a Ielza Maria
kafka, sua disponibilidade, responsabilidade e atenção foram fundamentais. Só
assim, foi possível ampliar o número de sujeitos da pesquisa, uma vez que,
localizava os endereços e número de telefones, e-mails, viabilizando o acesso aos
SOBREVIVENTES que se encontravam fora da rotina ambulatórial.
A Regina Consuelo Sperandio pelo desejo, reflexões e apoio afetivo para que
este trabalho pudesse se realizar.
A Heliz Regina das Neves que forneceu as informações do banco de dados,
sem o qual não seria possível a definição da amostra deste estudo.
A todos os colegas de trabalho que disponibilizam suas especialidades e
trabalhos técnicos na agilização das funções da prática diária. Além da paciência e
compreensão pela minha presença parcial devido aos compromissos assumidos
com o desenvolvimento do doutorado. Enfim, a todos que opinaram sobre este
trabalho e facilitaram sua execução, meu muito obrigada.
v
EPIGRAFE
Pouco conhecimento faz que as criaturas se sintam orgulhosas.
Muito conhecimento, que se sintam humildes.
É assim que as espigas sem grãos erguem desdenhosamente a cabeça para o
céu,
enquanto que as cheias abaixam para a terra, sua mãe.
Leonardo da Vinci
vi
SUMÁRIO
LISTA DE TABELAS
..................................................................................... X
LISTA DE ABREVIATURAS
........................................................................ XIII
RESUMO
........................................................................................................... XV
ABSTRACT
...................................................................................................... XVI
1 INTRODUÇÃO
............................................................................................. 1
1.1 OBJETIVOS ................................................................................................... 4
1.1.1 Objetivo Geral ............................................................................................. 4
1.1.2 Objetivos Específicos .................................................................................. 4
2 REVISÃO DA LITERATURA
.................................................................... 5
2.1 QUALIDADE DE VIDA ................................................................................... 5
2.1.1 Fundamentação Histórica do Estudo sobre Qualidade de Vida .................. 5
2.1.2 Qualidade de Vida e seus Múltiplos Conceitos ........................................... 11
2.1.3 Construção Metodológica para Avaliação de Qualidade de Vida ................ 20
2.1.4 Instrumentos ................................................................................................ 26
2.1.5 Descrição das Escalas da Pesquisa ........................................................... 30
2.1.6 Facit-Fadigue .............................................................................................. 31
2.1.7 WHOQOL .................................................................................................... 32
2.1.8 Escalas de Beck .......................................................................................... 35
2.1.8.1 BDI – Inventário de Depressão ................................................................ 35
2.1.8.2 BAI – Inventário de Ansiedade ................................................................. 36
2.1.9 Karnofsky .................................................................................................... 37
2.2 TRANSPLANTE DE CÉLULAS-TRONCO HEMATOPOÉTICA -TCTH .......... 40
2.2.1 Mitologia e História sobre Transplantes ...................................................... 40
2.2.2 História sobre o TCTH ................................................................................. 43
2.2.3 Conceito e Peculiaridades ........................................................................... 48
2.2.4 Descrição Geral dos TCTH do STMO da UFPR-HC ................................... 50
2.2.4.1 Tipo de Transplante.................................................................................. 50
2.2.4.2 Fonte das Células-Tronco Hematopoéticas ............................................. 51
2.3 TCTH E AS RELAÇÕES DE CONHECIMENTO COM A QV ........................ 52
2.3.1 QV um Termômetro Pessoal Aquecido na Experiência do TCTH ............... 52
2.3.2 Interferência da Subjetividade na QV dos Sobreviventes do TCTH ............ 53
2.3.3 Influência da Fadiga na QV dos Sobreviventes do TCTH ........................... 62
2.3.4 A Interferência do TCTH nas Funções Cognitivas ...................................... 67
2.3.5 TCTH e as Relações de Conhecimento com a QV ..................................... 70
2.4 SEXUALIDADE .............................................................................................. 81
2.4.1 Sexualidade no Contexto do Adoecimento .................................................. 81
2.4.2 Conceitos da Sexualidade, Sexo e Disfunção Sexual ................................. 81
vii
2.4.3 Interferência do TCTH na Satisfação da Vida Sexual ................................. 84
2.4.4 A Sexualidade em Relação ao TCTH .......................................................... 87
2.4.5 Reconstrução: Uma Possibilidade do Despertar do Desejo ........................ 96
2.4.6 Abordagem Intervencionista no Resgate da Sexualidade ........................... 100
3 CASUÍSTICA E METODOLOGIA.....................................................
102
3.1 CASUÍSTICA .................................................................................................. 102
3.1.1 Critérios de Inclusão .................................................................................... 102
3.2 MATERIAL ..................................................................................................... 103
3.3 PROCEDIMENTOS ........................................................................................ 103
3.3.1 Método de Aplicação de Questionários e Entrevistas ................................. 103
3.3.1.1 Grupo de Sobreviventes ........................................................................... 103
3.3.1.2 Grupo Controle ......................................................................................... 104
3.4 TRATAMENTO DAS VARIÁVEIS .................................................................. 105
3.4.1 Dados Demográficos .................................................................................. 105
3.4.2 Características Clínicas ............................................................................... 106
3.4.2.1 Diagnóstico ............................................................................................... 106
3.4.3 Qualidade de Vida Global ............................................................................ 106
3.5 ANÁLISE ESTATÌSTICA ................................................................................ 107
4 RESULTADOS
............................................................................................. 110
4.1 DESCRIÇÃO DO ESTUDO VIGENTE DO TMO DO STMO DA UFPR-HC ... 110
4.1.1 Seleção do Grupo de Sobreviventes ........................................................... 110
4.2 DESCRIÇÃO DA POPULAÇÃO DO ESTUDO ............................................... 110
4.2.1 Dados Demográficos ................................................................................... 110
4.2.2 Tempo de Pós-TMO Alogênico ................................................................... 112
4.2.3 Tempo Entre o Diagnóstico e a Realização do Transplante 112
4.2.4 Idade dos Sobreviventes no Momento do Transplante 113
4.3 CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS DA DOENÇA .............................................. 113
4.3.1 Diagnóstico ................................................................................................... 113
4.3.2 Processo do Tratamento e suas Implicações ............................................... 114
4.3.2.1 Karnofsky Pré e Pós-Transplante .............................................................. 114
4.3.2.2 Pega, DECH, Condicionamento, Re-Transplante e Infusão de Linfócitos 114
4.3.2.3 Tipo de Transplante................................................................................... 116
4.4 REGIME DE CONDICIONAMENTO ............................................................... 116
4.5 OCORRÊNCIA DE ÓBITOS ............................................................................ 117
4.6 QUALIDADE DE VIDA .................................................................................... 118
4.6.1 Significado de Qualidade de Vida ................................................................ 118
4.6.2 Nível de Satisfação em Relação à Qualidade de Vida ................................. 119
4.6.3 A Idade dos Sobreviventes no Momento do TMO e a Relação com a QV ... 121
4.6.4 Diagnóstico e a Relação com a QV .............................................................. 121
4.6.5 Fadiga ......................................................................................................... 122
4.6.5.1 Definição Subjetiva.....................................................................................122
4.6.5.2 Frequência de Queixas e a Percepção de Saúde......................................122
4.6.6 A Condição de Provedor e sua Relação com o Estado Civil ........................ 123
4.7 ANÁLISE UNIVARIADA E MULTIVARIADA DOS SOBREVIVENTES ............ 123
4.7.1 Características Clínicas da Sexualidade ...................................................... 126
4.7.2 Análise Univariada e Multivariada dos Homens Sobreviventes .................... 126
4.7.3 Características Sexuais do Grupo Masculino ............................................... 128
4.7.4 Análise Univariada e Multivariada das Mulheres Sobreviventes .................. 128
viii
4.7.5 Características Sexuais do Grupo Feminino ................................................ 129
4.8 ANÁLISE UNIVARIADA E MULTIVARIADA DOS CONTROLES.....................131
4.8.1 Transtorno de Humor ................................................................................... 131
4.9 ANÁLISE MULTIVARIADA DOS SOBREVIVENTES E DO CONTROLE ....... 133
4.9.1 Transtorno de Humor ................................................................................... 133
4.9.2 Análise Descritiva dos Sobreviventes e do Controle .................................... 135
5 DISCUSSÃO
.................................................................................................. 136
5.1 DISTRIBUIÇÃO DEMOGRÁFICA ................................................................... 136
5.1.1 Coleta de Dados ........................................................................................... 136
5.1.2 Grupo Controle ............................................................................................. 137
5.1.3 Idade ............................................................................................................ 138
5.1.4 Escolaridade ................................................................................................. 142
5.1.5 Provedor ....................................................................................................... 143
5.1.6 Espiritualidade .............................................................................................. 145
5.2 ASPECTOS CLÍNICOS ................................................................................... 145
5.2.1 Diagnóstico .................................................................................................. 145
5.2.2 Anemia de Fanconi ...................................................................................... 146
5.2.3 Pega ............................................................................................................. 146
5.2.4 DECH ........................................................................................................... 147
5.2.5 Re-TMO ........................................................................................................ 151
5.2.6 ÓBITO .......................................................................................................... 151
5.2.7 Ansiedade e Depressão ............................................................................... 152
5.2.8 Fadiga .......................................................................................................... 154
5.2.9 Sexualidade .................................................................................................. 156
5.3 SUBJETIVIDADE ............................................................................................ 157
5.3.1 A Interferência Subjetiva da Percepção ....................................................... 157
5.3.2 Qualidade de Vida ........................................................................................ 159
5.3.3 Corpo Simbólico ........................................................................................... 161
5.3.4 Percepção .................................................................................................... 163
5.3.5 Resiliência .................................................................................................... 168
6 CONCLUSÃO
................................................................................................ 171
7 SUGESTÕES
................................................................................................. 174
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 175
ANEXOS
............................................................................................................. 192
ix
LISTA DE TABELAS
TABELA 1: DISTRIBUIÇÃO DOS PACIENTES DE ACORDO COM O TIPO DE
TRANSPLANTE DAS CÉLULAS TRONCO-HEMATOPOÉTICAS...................................... 50
TABELA 2: DISTRIBUIÇÃO GERAL DA FONTE DAS CÉLULAS TRONCO-
HEMATOPOÉTICAS............................................................................................................ 51
TABELA 3: DISTRIBUIÇÃO DA AMOSTRA POPULACIONAL E DO GRUPO DE
PACIENTES DO ESTUDO....................................................................................... 110
TABELA 4: CARACTERÍSTICAS DEMOGRÁFICAS DA POPULAÇÃO DO
ESTUDO............................................................................................................................. 111
TABELA 5: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES QUANTO AO TEMPO DE
PÓS-TMO ALOGÊNICO..................................................................................................... 112
TABELA 6: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES QUANTO AO TEMPO
ENTRE O DIAGNÓSTICO E A REALIZAÇÃO DO TRANSPLANTE.................................. 112
TABELA 7: DISTRIBUIÇÃO DA IDADE DOS SOBREVIVENTES EM RELAÇÃO
AO PERÍODO EM QUE SE SUBMETERAM AO TRANSPLANTE......................................113
TABELA 8: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES DE ACORDO
COM A CLASSIFICAÇÃO DIAGNÓSTICA...........................................................................113
TABELA 9: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES DE ACORDO COM O
PROCESSO DO TRATAMENTO EXPRESSO NOS VALORES DE KARNOFSKY
PRÉ E PÓS-TRANSPLANTE...............................................................................................114
TABELA 10: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES DE ACORDO COM
PEGA, DECH-a, DECH-c, CONDICIONAMENTO E INFUSÃO DE LINFÓCITOS..............115
TABELA 11: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES DE ACORDO COM O TIPO DE
DE TRANSPLANTE E A FONTE DAS CÉLULAS-TRONCO...............................................116
TABELA 12: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES E DO CONTROLE
DE ACORDO COM O SIGNIFICADO INDIVIDUAL DE QV.................................................118
TABELA 13: DISTRIBUIÇÃO DOS GRUPOS DE ACORDO COM A SATISFAÇÃO
EM RELAÇÃO À QUALIDADE DE VIDA GLOBAL..............................................................119
TABELA 14: DISTRIBUIÇÃO DOS GRUPOS DE ACORDO COM OS DOMÍNIOS
DA QUALIDADE DE VIDA GLOBAL....................................................................................120
TABELA 15: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA, MEDIANA E MÉDIA (DP)
DOS GRUPOS DE ACORDO COM OS DOMÍNIOS DA QV GLOBAL................................121
TABELA 16: DISTRIBUIÇÃO DA IDADE DOS SOBREVIVENTES EM RELAÇÃO
AO PERÍODO EM QUE SE SUBMETERAM AO TRANSPLANTE E A QV.........................121
x
TABELA 17: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES DE ACORDO COM
A CLASSIFICAÇÃO DIAGNÓSTICA E SUA RELAÇÃO COM A QV................................121
TABELA 18: DISTRIBUIÇÃO DA ASSOCIAÇÃO SUBJETIVA REALIZADA
PELOS GRUPOS PARA DEFINIR FADIGA.......................................................................122
TABELA 19: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DE QUEIXAS EM RELAÇÃO
À FADIGA E DA PERCEPÇÃO DE SAÚDE........................................................................123
TABELA 20: DISTRIBUIÇÃO REPRESENTATIVA DOS PROVEDORES E SUA
PORCENTAGEM EM RELAÇÃO AO ESTADO CIVIL NOS DOIS GRUPOS......................123
TABELA 21: DISTRIBUIÇÃO DAS VARIÁVEIS DE INTERFERÊNCIA NOS
VALORES BRUTOS, AJUSTADOS DAS RAZÕES DE CHANCE, INDICES
DE CONFIANÇA E OS VALORES DE p BRUTO E AJUSTADO EM RELAÇÃO
AOS SOBREVIVENTES CONFORME A ANÁLISE MULTIVARIADA.................................124
TABELA 22: DISTRIBUIÇÃO COMPARATIVA DA POPULAÇÃO DOS
SOBREVIVENTES EM RELAÇÃO A VARIÁVEL DE ANSIEDADE E OS
GÊNEROS............................................................................................................................125
TABELA 23: DISTRIBUIÇÃO COMPARATIVA DO GÊNERO DO GRUPO DOS
SOBREVIVENTES EM RELAÇÃO À DEPRESSÃO............................................................125
TABELA 24: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DE ALTERAÇÃO SEXUAL
PARA A AMOSTRA TOTAL DO GRUPO DE SOBREVIVENTES......................................126
TABELA 25: DISTRIBUIÇÃO REPRESENTATIVA DAS VARIÁVEIS DE
INTERFERÊNCIA NA QVG E SUAS RAZÕES DE CHANCES, OS INDÍCES
DE CONFIANÇA E VALORES DE p BRUTOS E AJUSTADOS EM RELAÇÃO
AOS HOMENS SOBREVIVENTES DE ACORDO COM O MODELO DA
ANÁLISE UNIVARIADA E MULTIVARIADA.......................................................................127
TABELA 26: DISTRIBUIÇÃO DE DISFUNÇÕES SEXUAIS MASCULINAS NO
GRUPO DE SOBREVIVENTES ........................................................................................128
TABELA 27: DISTRIBUIÇÃO DAS VARIÁVEIS DE INTERFERÊNCIA NA QVG
E SUAS RAZÕES DE CHANCES, OS INDÍCES DE CONFIANÇA E VALORES
DE p BRUTOS E AJUSTADOS EM RELAÇÃO ÀS MULHERES SOBREVIVENTES
DE ACORDO COM O MODELO DA ANÁLISE UNIVARIADA E MULTIVARIADA.............129
TABELA 28: DISTRIBUIÇÃO DE DISFUNÇÕES SEXUAIS FEMININAS NO
GRUPO DE SOBREVIVENTES...........................................................................................130
TABELA 29: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DA DEPRESSÃO NO
GRUPO CONTROLE............................................................................................................131
TABELA 30: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DA ANSIEDADE NO
GRUPO CONTROLE...........................................................................................................131
TABELA 31: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DA DEPRESSÃO E
ANSIEDADE NO GRUPO CONTROLE................................................................................131
xi
TABELA 32: DISTRIBUIÇÃO COMPARATIVA DA POPULAÇÃO DO GRUPO
CONTROLE EM RELAÇÃO À ANSIEDADE.......................................................................132
TABELA 33: DISTRIBUIÇÃO COMPARATIVA DA POPULAÇÃO DO GRUPO
CONTROLE EM RELAÇÃO À DEPRESSÃO.......................................................................132
TABELA 34: DISTRIBUIÇÃO DAS VARIÁVEIS DE INTERFERÊNCIA NA QVG
E SUAS RAZÕES DE CHANCES, OS INDÍCES DE CONFIANÇA E VALORES
DE p BRUTOS E AJUSTADOS EM RELAÇÃO AO GRUPO CONTROLE
CONFORME A ANÁLISE UNIVARIADA E MULTIVARIADA..............................................133
TABELA 35: DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO FEMININA DOS DOIS GRUPOS
EM RELAÇÃO À DEPRESSÃO E ANSIEDADE..................................................................134
TABELA 36: DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO MASCULINA DOS DOIS GRUPOS
EM RELAÇÃO À DEPRESSÃO E ANSIEDADE.................................................................134
TABELA 37: DISTRIBUIÇÃO DAS VARIÁVEIS DE INTERFERÊNCIA NA QVG
E SUAS RAZÕES DE CHANCES, OS INDÍCES DE CONFIANÇA E VALORES
DE p BRUTOS E AJUSTADOS EM RELAÇÃO AO GRUPO DE SOBREVIVENTES
CONFORME A ANÁLISE UNIVARIADA E MULTIVARIADA..............................................135
xii
LISTA DE ABREVIATURAS
AAS - Anemia Aplásica Severa
AF - Anemia de Fanconi
BAI - Beck Anxiety Inventory
BDI - Beck Depression Inventory
BUS - Busulfan
CA - Caso (amostra do grupo de SOBREVIVENTES).
CCT - Center for Cognitive Therapy
CFA - Ciclofosfamida
CO - Controle
CORE - Center on Outcomes, Research and Education
DECH-a - Doença do Enxerto Contra o Hospedeiro - aguda
DECH-c - Doença do Enxerto Contra o Hospedeiro – crônica
FACIT-F - Functional Assessment of Chronic Illness Therapy-Fatigue
FDA - Food and Drug Administration
FSH - Follicle Stimulating Hormone
HPN - Hemoglobinúria Paroxística Noturna
HC-UFPR - Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBMTR - Registro Internacional de Transplante de Medula Óssea
IEN - Indicadores Econômicos Nacional
LH - Linfoma de Hodgkin
LH - Hormônio Luteinizante
LMC - Leucemia Mielóide Crônica
LLA - Leucemia Linfóide Aguda
LMA - Leucemia Mielóide Aguda
SMD - Síndrome Mielodisplásica
NSE - Nível Sócio-Econômico
OMS - Organização Mundial de Saúde.
QLI - Quality of Life Index
QV - Qualidade de Vida
QVG - Qualidade de Vida Global
xiii
QVRS - Qualidade de Vida em relação a saúde
KPSS - Karnofsky Performance Status Scale
SNC - Sistema Nervoso Central
STMO - Serviço de Transplante de Medula Óssea
TBI - Irradiação corporal total
TCTH - Transplante de Células-Tronco Hematopoéticas
TMO - Transplante de Medula Óssea
WA - Wiscott Aldrich
WHOQOL - World Health Organization Quality of Life
xiv
Pelaez Dóro, M. (2008). Qualidade de Vida dos Sobreviventes de Longa Data de
Transplante de Medula Óssea Alogênico. UFPR Curitiba.
RESUMO
Desenho do Estudo: Transversal
Palavras Chave: Qualidade de Vida-QV, Transplante de Medula Óssea-TMO
Sobreviventes de Longa Data.
Introdução: O transplante de medula óssea ainda é uma intervenção de alto custo
(econômico, social, familiar, emocional). Sendo assim, o tratamento tem que trazer
resultados favoráveis e não apenas a manutenção da vida em si, mas, sim a
aquisição de uma condição de vida com qualidade digna de ser vivida. Objetivo:
avaliar a qualidade de vida dos pacientes que sobreviveram pelo menos dez anos de
pós-TMO alogênico. Sujeitos: Foram elegíveis pacientes com 18 anos ou mais que
se submeteram ao TMO alogênico para hemopatias malignas e não malignas. A
amostra constitui-se de 214 pacientes adultos do Hospital de Clínicas. Estes
pacientes foram avaliados e comparados com um grupo controle (n: 264). Métodos
e Material: O desenvolvimento do protocolo de estudo aconteceu no Serviço de
Transplante de Medula Óssea da Universidade Federal do Paraná, em Curitiba. A
avaliação do grupo controle ocorreu num Banco de Sangue, no HemoBanco, com
doadores voluntários de sangue. O protocolo consiste em cinco partes: dados
demográficos, FACIT-Fatigue, WHOQOL, Escala de Beck para depressão e
ansiedade e a Escala de Karnofsky. Todos os dados foram coletados após a
aceitação do termo de consentimento. A avaliação estatística foi multivariada
retrospectiva, realizada através do programa Stata, na versão 8.0, e do teste Qui
2
de
Pearson, com o valor do p0.05. Resultados: No grupo dos sobreviventes, 53.7%
estão muito satisfeitos e no controle, 54.2%, ou seja, não existe diferença entre os
grupos na questão da satisfação em relação a QV. Porém, os fatores de riscos nos
sobreviventes para a satisfação da QV foram: ansiedade, escolaridade baixa, ser
provedor, ejaculação precoce, perda da libido, idade avançada, não ter parceiro fixo,
e não ser da raça branca. Apesar de inúmeras situações clínicas adversas, os
resultados mostram que a aquisição da QV equipara-se aos parâmetros da
normalidade e até mesmo, supera em alguns domínios, tais como, os sobreviventes
desenvolvem mais trabalhos com funções intelectuais e apresentam menos
sintomas de depressão (14%) que o grupo controle (20%).
Conclusão: Apesar de todas as comorbidades e seqüelas decorrentes da
doença e do tratamento o grupo de sobreviventes conquistou uma condição de QV
semelhante àquele que é considerado como um representante da população normal.
Todos os grupos e subgrupos apresentam o transtorno de humor como um fator de
risco para o bem-estar. Esse achado mostra que o subjetivo não pode ser excluído
do olhar de análise do clínico e/ou do pesquisador. Os resultados desse estudo
poderão influenciar nas estratégias de manejos ajudando os sobreviventes a
enfrentarem as dificuldades encontradas. A DECH-a é considerada como fator de
proteção nos sobreviventes de longa data de pós-TMO. Pela razão de ser percebida
como parte complementar do tratamento, diminuindo os riscos de recaída da
doença, devido o efeito do enxerto contra as células leucêmicas. Enfim, este
trabalho deixa lacunas para serem preenchidas, mas trouxe a descoberta de um
processo de ajustamento perceptivo por parte dos sobreviventes, que possibilita uma
outra realidade do real. Porém, isto não é uma revelação da verdade, mas, uma
aproximação conforme o viés dos sujeitos da pesquisa. Pois, não podemos habitar o
mundo dos sobreviventes, apenas nos aproximar.
xv
xvi
Pelaez Dóro, M. (2008). Quality of life in long-term survivors of allogeneic bone
marrow transplantation. UFPR Curitiba
ABSTRACT
Study Design: Transversal
Key Words: Quality of Life, Bone Marrow Transplantation - BMT, Long-term
Survivors
Background: Bone marrow transplantation is still a high cost intervention
(economically, socially, emotionally and in terms of the toll it takes on the family).
Being as such, the treatment needs to offer favorable results that go beyond just
keeping the patient alive, there has to be quality of life, a life that is worth being lived.
Objective: To evaluate the quality of life in patients that have survived at least 10
years after allogeneic bone marrow transplantation. Subjects: Patients 18 years or
older who underwent allogeneic BMT for malignant and non-malignant hemopathies
were eligible for the study. The sample was made up of 214 adult patients from
Hospital de Clínicas (from the Federal University of Paraná). These patients were
evaluated and compared with a control group (n: 264). Methods and Materials: For
patients, the self-survey report was filled out at the Bone Marrow Transplant Unit of
the University Hospital. The control group was evaluated at the Blood Bank
(HemoBanco), with volunteer blood donors. The self-report survey consisted of five
parts: demographic data, FACIT-Fatigue, WHOQOL, Beck Anxiety Inventory and
Beck Depression Inventory and the Karnofsky Performance Status Scale. All data
was collected after informed consent had been obtained. The statistical analysis was
multivariate retrospective, using the Stata program, version 8.0 and the Chi Pearson
Test with a value of p0.05. Results: In the group of survivors, 53.7% were very
satisfied while in the control group, 54.2%; in other words, there is no difference
between the groups regarding the issue of satisfaction in relation to Quality of Life.
However, the risk factors among survivors for Quality of Life satisfaction were:
anxiety, low level of education, being a provider, early ejaculation, loss of libido,
advanced age, not having a fixed partner, and not being Caucasian. Despite the
numerous adverse clinical situations, the results show that the acquisition of Quality
of Life matches the parameters of normality and even surpasses it in some areas,
such as, that survivors cultivate more work using intellectual functions and present
fewer symptoms of depression than the control group. Conclusion: Despite all of the
co morbidities and sequelae resulting from the disease and the treatment, the group
of survivors achieved a quality of life similar to that considered representative of the
normal population. All of the groups and subgroups present mood disorders as a risk
factor to well-being. This finding shows that subjective considerations cannot be
omitted from the analysis made by the doctor and/or researcher. The results of this
study can influence the management strategies to assist patients in coping with the
difficulties encountered. The a-GVHD is considered a protection factor among long-
term survivors of post-BMT. Because it is considered a complementary part of the
treatment, it leads to a decrease in the risk of relapse, due to the effect of
transplanting against the leukemic cells. In conclusion, this work leaves some gaps to
be filled, but it also reveals the discovery of a perceptive adjustment process on the
part of survivors, which offers another possible reality for them. However, this is not
actually a revelation, but rather an approximation according to the bias of the
subjects of the study. However we cannot inhabit the world of the survivors, we can
only get close to it.
1
1 INTRODUÇÃO
“Não é digno de saborear o mel,
aquele que se afasta da colméia
com medo das picadelas das abelhas.”
Shakespeare
O transplante de medula óssea é uma intervenção que exige um alto custo,
não apenas no aspecto econômico, mas também, no campo biopsicossocial.
Apesar da evolução tecnológica e científica os indicadores objetivos utilizados
para mensurar os resultados das intervenções clínicas são insuficientes. Por isso, a
inserção da avaliação de marcadores subjetivos também se faz necessária, perante
a responsabilidade ética para com os sobreviventes de longa data.
Aqueles que ultrapassam as barreiras das comorbidades e da mortalidade
durante o processo inicial e de médio prazo, terão que percorrer outro caminho
envolto em inúmeras imprevisibilidades.
Existem muitos estudos que demonstram os resultados a curto e médio prazo
dos sobreviventes que se submeteram ao transplante de células tronco
hematopoéticas. Porém, as informações são esparsas quando se trata de investigar
a qualidade de vida em relação à saúde dos sobreviventes de longa data.
Mesmo assim, sabe-se que é maior a probabilidade da manifestação de
neoplasias secundárias, endocrinopatias, falha nos órgãos reprodutivos, seqüelas
psicossociais, fadiga crônica, osteoporose, necrose óssea, além de outras
conseqüências.
De um modo geral, as experiências vividas deixam marcas que servem de
basal para aquisição de novos conhecimentos e posicionamentos. Compreendendo-
se conhecimento como as associações que interagem entre as novas percepções e
os conteúdos já existentes, ou seja, é o resultado de uma composição integrativa do
desconhecido com o conhecido. E este saber serve de patamar e pressuposto no
processo valorativo da vivência. Pois, ninguém passa por uma experiência de
doença e transplante totalmente ileso. Algo acontece e influencia a percepção
processual dos pensamentos e sentimentos, ou seja, a percepção é uma ferramenta
transformadora da interpretação e assimilação dos fenômenos.
2
Para Merleau-Ponty (1999) a fenomenologia
1
é o estudo das essências, e
todos os problemas, segundo ela, resumem-se em definir essências: a essência da
percepção, a essência da consciência.
Desse modo, ter consciência dos problemas por si só, é um gerador de
sofrimento, mas ao mesmo tempo, pode ser produtor de um efeito paradoxal e
controverso que faz com que o indivíduo se sinta mais vivo, apesar da morbidade.
Aparentemente eles constroem um referencial peculiar porque sentem que
estão recebendo mais do que esperavam. Exemplificando através do seguinte
comentário: “Estou vivendo horas extras, era para eu estar morta”; “Achei que não
viveria muito e hoje sei que além de ter sobrevivido, eu dei vida. Recebi vida e dei
vida. O que mais eu posso querer?!”. — Isso foi dito por uma sobrevivente que gerou
um filho no pós-transplante.
Na América Latina, o Brasil foi pioneiro neste campo científico, sendo que o
primeiro transplante ocorreu em 1979, no Hospital de Clínicas da Universidade
Federal do Paraná.
De lá para cá entre acertos e desacertos o número de sobreviventes que
realizaram transplante de células tronco hematopoéticas aumentou
consideravelmente. Por isto, a importância de avaliar a qualidade de vida e suas
variáveis.
Sendo assim, o que será que acontece nesta ampliação temporal da duração
da vida? Uma qualificação ou o que se conquista é apenas um quadro de
decomposição biopsicossocial?
O que se sabe é que com o advento dos transplantes, viabilizou-se um
aumento expressivo da sobrevida. Porém, qualidade de vida não se trata apenas de
obter longevidade para o sobrevivente. Então, será possível uma qualidade de vida
após uma doença que ameace a vida e que requeira um TCTH como intervenção
clínica?
Sim, se considerarmos que toda e qualquer crise desencadeia um perigo real e/ou
imaginário, mas também uma oportunidade de mudanças. Pois, as perdas
coexistem com os ganhos, não só pela vivência das dificuldades, mas também, pelo
1
Fenomenologia deriva da palavra grega phainómenon que significa aquilo que mostra, está visível, e logos significa
estudo. Deste modo, a etimologia diz que fenomenologia é o estudo daquilo que se mostra. Ferreira, (1986).
3
seu enfrentamento e principalmente pela superação do mesmo. Além disso, a
deficiência é aquilo que você faz dela.
Segundo Belasco & Sesso (2006) entre 1990 e 2002 as teses sobre qualidade
de vida alcançaram o número de 9.635, de acordo com o Instituto Brasileiro de
Informação em Ciências e Tecnologia.
Contudo, ainda hoje não há registro de nenhuma tese no Brasil sobre
qualidade de vida relacionada à saúde dos pacientes adultos que se submeteram ao
transplante de medula óssea e que são sobreviventes há mais de uma década.
Sendo assim, temos o dever de pensar em qualidade de vida, mesmo quando
o que está em questão é: adoecimento, tratamento prolongado, efeitos secundários
da doença e da intervenção clínica. Pois, a qualidade de vida pode coexistir com o
adoecimento, desde que o foco do olhar esteja no cuidado com a saúde e não
apenas na doença em si. Lembrando que para a OMS, saúde é um bem-estar global
e não meramente a ausência de doença.
Por isso, qualidade de vida pode ser compreendida como o termômetro de
cada um, ou seja, o que é muito bom para um pode ser considerado apenas bom ou
até mesmo ruim para outro. Isto porque depende do olhar interpretativo e valorativo
que se tem dos fatos.
O objetivo deste estudo é realizar a avaliação da qualidade de vida dos
sobreviventes adultos que se submeteram ao transplante de medula óssea há mais
de dez anos. O protocolo proposto inclui mais de um instrumento de avaliação da
qualidade de vida e outras escalas que mensuram aspectos multifatoriais
correlacionados e que podem interferir no bem-estar global do indivíduo. Os
questionários são auto-aplicativos porque assim se contempla as respostas
conforme a perspectiva do sobrevivente. O pesquisador tem um outro referencial
perceptivo, já que, a percepção é um processo que depende de uma química
interacional resultante do quimerismo complementar do binômio da subjetividade e da
objetividade.
Quanto à organização desse estudo, inicialmente apresenta uma revisão
bibliográfica sobre qualidade de vida, transplante de células-tronco hematopoéticas
e sexualidade. Em seguida, discorre sobre a metodologia da pesquisa em si.
Posteriormente, aborda os resultados que são discutidos na seção subseqüente.
Para finalizar, apresentam-se as conclusões e sugestões. Espera-se que esses
conhecimentos contribuam para o aprimoramento dos serviços oferecidos aos
4
sobreviventes do Serviço de Transplante de Medula Óssea. Afinal, os resultados
poderão ser utilizados como parâmetros clínicos no âmbito da administração dos
recursos (humano, econômico, científico) escassos no Sistema de Saúde do Brasil.
1.1 OBJETIVOS
1.1 1 Objetivo Geral
O objetivo deste estudo é avaliar a qualidade de vida (QV) de sobreviventes
adultos que se submeteram ao transplante de medula óssea há dez anos ou mais,
realizado pelo Serviço de Transplante de Medula Óssea do Hospital de Clinicas da
Universidade Federal do Paraná (STMO-HCUFPR).
1.1.2 Objetivos Específicos
1- Verificar se os sobreviventes com 10 anos ou mais de pós-transplante
apresentam queixas em relação à condição de saúde atual, da sexualidade
e de transtorno de humor: depressão e ansiedade;
2- Identificar possíveis fatores de risco e de proteção na QV;
3- Comparar a QV dos sobreviventes com um grupo controle representativo da
população normal.
5
2 REVISÃO DA LITERATURA
“Todos os dias devíamos ouvir um pouco de música,
ler uma boa poesia, ver um quadro bonito e, se possível,
dizer algumas palavras sensatas.
Goethe
2.1 QUALIDADE DE VIDA
2.1.1 Fundamentação Histórica do Estudo sobre Qualidade de Vida-
Existe uma citação no Nichomachean Ethics, de autoria do Aristóteles (384-322
AC), que diz: “Tanto a multidão como o indivíduo concebe uma ‘vida boa’ ou ‘estar
indo bem’ como a mesma coisa que ser feliz”. Ele também declara que, às vezes, o
que é bom para um não o é para o outro; e que, dependendo da situação, o que era
bom pode deixar de ser bom. Ademais, aquilo que falta pode ser o que se deseja
para se sentir feliz, por exemplo: se um indivíduo está doente, ele vai desejar saúde,
enquanto aquele que foi a falência vai almejar riqueza. Este registro milenar pode
ser considerado como uma das primeiras definições de qualidade de vida (FAYERS
e MACHIN, 2001).
A palavra grega
ε ν δ α ι μ ο ν ι α
usada por Aristóteles normalmente é
traduzida como felicidade, embora Harris Rackham, em 1926 a tenha traduzido
como bem-estar em relação ao sentir, agir e pensar. Na modernidade, essas
expressões estão asseguradas no que se compreende como qualidade de vida
(citado por FAYERS e MACHIN, 2001).
Naturalmente que a concepção de QV na Antigüidade não tinha a mesma
dimensão que passou a ter a partir do século XX. Belasco e Sesso, em 1920,
mencionam que no livro de economia de Pigou, esse fez uma correlação de QV com
o apoio governamental para a população de baixa renda e analisou a interferência
deste suporte econômico nas pessoas e nas finanças nacionais. A mensuração da
QV está diretamente relacionada com os seguintes indicadores: recursos financeiros
disponíveis, qualidade dos empregos, moradias, serviços de saúde, infra-estrutura
social, recursos humanos, segurança na comunidade e participação comunitária.
Nesse contexto, a QV é comparada com o padrão de vida, porque esse é
medido pela qualidade e quantidade de posses e serviços disponíveis para as
pessoas. Qualificar a vida de acordo com o acesso às possibilidades de usufruir
6
bens materiais, confere-se duas perspectivas nas pesquisas de QV. A primeira
refere-se aos indicadores sociais que são considerados pela valoração da elite em
relação às necessidades das pessoas. A segunda diz respeito às pesquisas que
investigam o que as pessoas querem para melhorar as suas vidas.
Assim, pode se dizer que QV é um interjogo entre os aspectos do social, da
saúde, da economia e das condições do meio ambiente, sendo os que interferem no
desenvolvimento psicossocial.
Conforme relatos de Park (2002), antes da Segunda Guerra Mundial havia três
idéias dominantes em relação à QV: política democrática, economia e ética.
Acreditava-se que a existência de um governo democrático perfeito resultaria numa
condição de vida favorável, uma vez que, com uma economia próspera, se
conseguiria bem-estar. Conseqüentemente isso produziria uma moral de valor para
o indivíduo e o contexto social.
Em 1948, quando a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu o termo
“saúde”, incluiu três dimensões: físico, mental e social. Tal inclusão teve uma
influência positiva para o andamento dos estudos sobre QV.
No período Pós-guerra, as medidas econômicas foram substituídas pelas
medidas sociais, pois, junto com salários satisfatórios e riquezas, as cidades
simultaneamente eram constituídas também pela poluição, expectativas de vida,
marginalidade, tráficos, entre outras conseqüências. Sendo assim, o foco nas
condições econômicas não necessariamente era indicativo de QV alta.
Em 1964, o presidente dos Estados Unidos, Lyndon Johnson usou a expressão
QV ao declarar que os objetivos não poderiam ser medidos através do balanço dos
bancos. Eles só poderiam ser medidos através da condição de vida que
proporcionariam às pessoas. Sugerindo, que não importa somente o que se tem,
mas o que se faz com o que se tem.
Na década de 1970, verificou-se que o crescimento e o desenvolvimento do
país não melhorariam a QV das pessoas de baixa renda. Desse modo, os esforços
se voltaram para as necessidades básicas, tais como: alimentação, vestuário,
moradia, saúde, educação, seguro social, condições de emprego e autonomia;
aspectos considerados fundamentais para que o indivíduo conquistasse a sua
dignidade.
O desenvolvimento científico e tecnológico da medicina, por sua vez, acelerou
os avanços nas intervenções, criando novas perspectivas nos tratamentos, mas
7
também gerando conseqüências indignas de serem vividas. Desse modo, a QV está
relacionada ao movimento dentro das ciências humanas e biológicas que engloba
fenômenos que vão além dos sintomas, da diminuição da mortalidade ou do
aumento de expectativa de vida (FLECK, 1999b).
Essa atenção mobilizou e viabilizou o investimento na qualificação do
atendimento ao sobrevivente (ZEBRACK, 2000).
Na oncologia, a avaliação centrou-se na escolha de tratamentos, no manejo da
dor e nas conseqüências clínicas. Após o diagnóstico, o procedimento incluía o
cuidado com a interação dos profissionais da saúde, a comunicação sobre
tratamentos alternativos, conforto e competência da equipe. Buscava-se um
atendimento que possibilitasse a dignidade do sobrevivente, independentemente do
estágio da doença.
Mayer e colaboradores (1978) apresentaram estudos sobre reabilitação com o
foco sobre a QV dos sobreviventes, pois a população dos sobreviventes com maior
tempo de sobrevida aumentava substancialmente. Assim, começaram a questionar
sobre as condições do funcionamento físico, da capacidade de manter os papéis e
as funções que desempenhavam na família, na comunidade e na sociedade. Nos
anos subseqüentes um novo conceito de bem-estar foi constituído, e esta
concepção incluía felicidade e satisfação em relação à vida. A subjetividade passou
a ser considerada e tornou-se o ponto central da mensuração da QV. Além disso,
transformou-se em um movimento mundial.
Já na década de 1980, ocorreu um aumento das pesquisas sobre aspectos
psicossociais. Desse modo, foram tomadas medidas para avaliar a ‘percepção dos
sobreviventes’ em relação a outros aspectos além do orgânico e também para
verificar a qualidade dos serviços hospitalares e dos alimentos ofertados nas
instituições de saúde.
A Food and Drug Administration (FDA) em 1985, influenciou na consideração
da avaliação de QV declarando que, para um novo reagente anticâncer ser
aprovado, este deveria incluir na sua composição um ou mais elementos que
contribuíssem na condição favorável de vida do futuro usuário. Assim, o bem-estar
depois do tratamento passou a ser um dos principais critérios pelos quais as novas
drogas anticâncer são julgadas e avaliadas pela FDA. Por exemplo: um novo
quimioterápico é aprovado desde que apresente uma redução nas reações
secundárias (CELLA, 1988; ROWLAND, 1997; SLOAN, 1998).
8
Com esses conhecimentos foi possível desenvolver planejamentos de
atendimentos preventivos e planos de tratamento. Os estudos subseqüentes
tomaram como foco de investigação os problemas de morbidades psicossociais e
angústia e sua interferência na QV.
No início dos anos 90, o paradigma do manejo do estresse foi relacionado com
a neoplasia, ou seja, se estabelecia uma conexão com a doença e o aparecimento
de eventos negativos (ROWLAND, 1990).
Por meio das pesquisas foi possível interligar as implicações físicas,
emocionais, sexuais, econômicas e vocacionais e relacioná-las com o diagnóstico e
as comorbidades do tratamento. Assim, gradativamente desenvolveram-se planos
de atendimentos preventivos e paliativos com o intuito de proporcionar um bem-
estar.
Em meados da década de 1990 o termo QV apareceu para substituir a
nomenclatura anterior – ‘adaptação, funcionamento e ajustamento psicossocial’ –
utilizada nos estudos que abordavam a saúde e o bem-estar dos sobreviventes. E a
mensuração da QV tornou-se uma medida dos resultados dos serviços de
tratamentos de saúde e ensaios clínicos de doenças crônicas. Simultaneamente
aconteceram mudanças econômicas que exigiam como parte do tratamento, a
avaliação do custo efetivo e da qualidade do cuidado.
Em 1990 e 1995, o National Institutes of Health and National Cancer Institute
enfatizou os trabalhos que discutiam o experimento clínico e o seu progresso
relacionado com a integração de QV. Além disso, grupos de experimento clínico nos
Estados Unidos, Canadá e Europa adotaram declarações no plano de ação que
encorajavam o uso da avaliação de qualidade nos protocolos de pesquisa
(ROWLAND, 1997).
A explosão do interesse na qualidade dos atendimentos e na satisfação do
sobrevivente decorreu, em primeiro lugar, da necessidade de controlar os custos
com os cuidados na saúde, isto é, avaliação do custo/benefício, em segundo, para
melhorar o padrão do atendimento pelo benefício ofertado ao sobrevivente em si.
(ROWLAND, 1997).
Nos anos de 1990, o padrão econômico, a capacidade, a satisfação pessoal
social foram todos incluídos na mensuração da QV, isto é, introduziu-se a avaliação
multidimensional.
9
Atualmente as pesquisas variam, algumas comparam QV em grupos de
sobreviventes com câncer e em indivíduos normais, outras pesquisas incluem tipos
generalizados ou específicos de câncer (ROWLAND, 1997).
Com o avanço das pesquisas observa-se que houve uma mudança de atitude
na área do transplante de células-tronco hematopoéticas-TCTH, por parte das
autoridades em saúde. No início, o sucesso centrava-se na obtenção de um número
de sobreviventes significativo, atualmente isso não é suficiente. Deseja-se aumentar
os sobreviventes, mas em condições favoráveis e que possam ser reintegrados na
sociedade (NEITZERT, 1998).
De um modo geral, há concordância entre os pesquisadores em relação ao
impacto psicossocial e aos efeitos colaterais aflitivos decorrentes da toxicidade do
condicionamento.
Nas investigações dos tratamentos e da evolução das doenças
hematopoéticas, é necessário avaliar o impacto das intervenções sobre a
quantidade e a QV. De acordo com Cella (1998b) é fácil avaliar e medir a quantidade
de vida, mas não é fácil mensurar a qualidade. O tempo de sobrevida tem sido um
marcador de tratamento efetivo. No entanto, é preciso também avaliar a perspectiva
e a valoração que o sobrevivente dá para este resultado. Qualidade de vida difere
das mensurações de toxidade uma vez que incorpora mais aspectos funcionais, tais
como: humor, afeto, bem-estar social.
A alta competitividade na área de saúde fez com que as organizações
envolvidas utilizassem as informações sobre a satisfação do sobrevivente como
medida hospitalar e para a avaliação da performance do médico. Desse modo,
medidas de satisfação foram usadas como instrumentos para a escolha de planos
de saúde e para serviços específicos.
Apesar de seu início ter se estabelecido em bases econômicas, hoje o
sobrevivente pode usufruir um atendimento que visa o seu bem-estar geral. O seu
“ser” está menos fragmentado, a dicotomia ficou para demarcar a história dos
nossos antepassados, e a preocupação e a ocupação voltaram-se para aspectos
que amenizam ou propiciam uma QV para aquele que está perdendo com o seu
adoecimento.
Nos dias atuais, a mensuração da QV deve ser considerada como um dos
componentes do cuidado que se deve ter em relação ao sobrevivente que se
submete ao transplante. Avaliar o bem-estar implica quantificar e qualificar como
10
estão os funcionamentos físico, emocional, social, pessoal e familiar do
sobrevivente. No entanto, QV ainda é um conceito de difícil operacionalização, em
função da insuficiência teórica da sua construção, da ambigüidade de definição, da
falha de normas populacionais e das flutuações nas tarefas de populações.
Nos últimos anos houve um aumento significativo de interesse sobre QV nos
sobreviventes com câncer. Devido à toxidade inerente aos tratamentos propostos
pela oncologia, esta se obrigou a avaliar as condições de vida daqueles que
sobreviveram apesar da morbidade da doença e das intervenções clínicas e
cirúrgicas aplicadas, já que, muitas vezes, na busca de acrescentar “anos a vida” era
deixada de lado à necessidade de acrescentar ‘vida aos anos’ (WARR e FELD,
1996).
É de consenso dos profissionais da área de saúde que, na escolha do melhor
tratamento possível, é preciso considerar a QV. Dentre as opções, existem alguns
tratamentos que podem resultar em apenas uma diferença mínima de sobrevida,
mas com redução significativa dos efeitos colaterais ou com diminuição do impacto
nas funções sexuais e psicossociais. A outra possibilidade de escolha enquadra-se
no grupo daqueles novos tratamentos, particularmente os que promovem um avanço
significativo de sobreviventes à custa de alta toxidade, e nestes sobreviventes
também é fundamental avaliar as condições gerais de saúde (NEITZERT, 1998).
Nos ensaios clínicos randomizados de avaliação, existiam dois critérios a
serem considerados: a) eficácia: modificação da doença pelo efeito da droga; b)
segurança: reação adversa às drogas. Porém, acrescentou-se a avaliação de bem-
estar como uma terceira dimensão a ser investigada. Assim, nos últimos anos, o
conceito de QV com conseqüências saudáveis vem sendo incluído nos argumentos
de avaliação para o bem-estar físico e psicológico. Conseqüentemente, na escolha e
na definição do plano de atendimento médico, levam-se em conta a eficácia da
droga medicamentosa, a segurança em relação aos efeitos colaterais e a satisfação
em relação à vida (SCHULMAN, 1997).
Nos anos mais recentes, estão inclusos nas investigações do bem-estar global
os resultados positivos e os benefícios conquistados e não apenas os prejuízos
ocorridos nos sobreviventes da clínica da hemato-oncologia. Apesar de ainda ser
uma experiência dolorosa, o que se pensa é que a dor talvez não seja possível
evitar, mas a forma de enfrentamento pode diminuir o sofrimento, e isso está
relacionado à capacidade de resiliência de cada um, ou seja, está associado com a
11
habilidade e os recursos pessoais que o indivíduo apresenta nas circunstâncias em
que necessite suplantar os problemas e conquistar uma condição de vida favorável.
Compreende-se por resiliência os comportamentos de enfrentamento,
capacidade de superação das crises, manejo eficaz das dificuldades e alto limiar de
frustração.
Qualidade de vida tornou-se um assunto que é facilmente encontrado na
linguagem coloquial. E nesse termo se inclui tudo, o clima, as finanças, a
disponibilidade de alimentos, a moradia, o bem-estar físico, emocional e social.
Nas publicações, em geral, esses aspectos são mencionados. Em um artigo
sobre o manejo federal em relação às emergências, é relatado que para um plano
de ataque nuclear é necessário discutir as predições positivas e negativas sobre a
QV depois de uma Terceira Guerra Mundial (SKEEL, 1998).
A revista Quality of Life Research que trata com especificidade da QV relata
que após uma análise dos registros. do Centro Cochrane (1998) constataram que
apenas 4% dos ensaios do ano anterior utilizaram a variável QV (BELASCO e
SESSO, 2006).
Também realizaram uma revisão sobre o uso de questionários para mensurar a
qualidade de vida em relação à saúde (QVRS). Verificaram que, em 1973, com a
busca no site da Medline, o termo QV foi encontrado apenas em cinco artigos. Após
cinco anos, a busca fornecia 1.252 menções. Porém, em 1998 o aumento foi
significativo, passou para 16.256 citações; em 2003 o número cresceu para 53.588 e
em 2005 chegou a aproximadamente 69 mil referências (National Library of
Medicine, 2005).
2.1.2 Qualidade de Vida e seus Múltiplos Conceitos
Qualidade de vida é um conceito multidimensional (polissêmico) e, por isto,
propicia uma grande diversidade de definições. Desse modo, é indispensável
identificar em que sentido está sendo empregada, pois as informações básicas que
suas definições fornecem servem para determinar os objetivos no atendimento e
também indicam quais as expectativas viáveis em relação ao bem-estar na sua
totalidade.
12
Ao buscar a definição da palavra “qualidade”, encontram-se alguns sentidos,
tais como: nobreza, casta, espécie, característico de algo, modo de ser, uma
posição elevada, distinto, essência, disposição moral, delito com agravante, entre
outros (BUENO, 1985).
Sendo assim, ao falar de QV não se deve confundir cultura e conforto com
bem-estar garantido, como era feito no século XIX, quando se consideravam as
acepções “posição elevada” e “cultura refinada” para definir se havia qualidade ou
não.
Já para Franz Boas (citado por BUENO, 1985), QV tem como ponto de partida
alguns dos significados do vocábulo ‘qualidade’, ou seja, ‘modo de ser’,
‘característico’ e ‘distinto’.
Essa parece ser uma concepção adequada de QV, uma vez que compreende a
multidimensionalidade, a subjetividade e a possibilidade de inclusão de posições
diferenciadas e com qualidade positiva ou negativa. Enfim, faz considerações
democráticas, sistêmicas, abrangentes, mediadoras e relativistas. Além disso, QV é
um tema tão visado atualmente e tão diversificado que não é possível concentrar a
totalidade de seu significado em uma única definição.
Segundo Cella, (1998b) uma das maiores dificuldades para definir QV é
entender e interpretar os julgamentos realizados por sobreviventes, familiares e
equipe médica. Assim, ocorreu a ênfase histórica na avaliação de indicadores
objetivos, como o resultado do tratamento. Observou-se, no entanto, que dadas às
diferenças individuais, as pessoas reagem diferentemente em uma mesma
circunstância objetiva. Desse modo, a solução foi construir uma avaliação que
considerasse a experiência subjetiva do sobrevivente. Por exemplo: um adolescente
antes saudável, ao ficar acamado devido ao transplante, poderá sofrer um impacto
muito superior do que alguém com mais idade cuja doença conduza-o ao leito,
periodicamente.
É quase impossível mencionar todos os atributos que se encontram numa
conceituação de QV. A título de ilustração alguns fenômenos serão mencionados,
entre eles: habilidade, adaptação, apreciação, necessidades básicas, pertences,
controle de demandas e responsabilidades, humor, lazer, entretenimentos,
felicidade, liberdade, esperança, melhoramentos, integridade, dignidade,
conhecimentos, oportunidades, possibilidades políticas e econômicas, moradia,
13
domínio físico, psicológico, social, religioso, segurança, auto-estima, privacidade,
discernimento, condições de trabalho, status, desejos, bem-estar, e outros.
De acordo com a OMS, a qualidade de vida é a percepção do indivíduo de sua
posição na vida, no contexto da cultura e sistemas de valores nos quais ele vive e
em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações (FLECK,
1999b; BELASCO e SESSO, 2006).
Estão inclusas nessa definição de QV seis variáveis fundamentais: saúde
física, estado psicológico, níveis de independência, relacionamento social,
características ambientais e padrão espiritual.
No campo da saúde, existem duas tendências conceituais. Na primeira, a QV
refere-se ao genérico e baseia-se em estudos sociológicos; a segunda, diz respeito
à denominação Qualidade de Vida Relacionada à Saúde (QVRS) ou na terminologia
inglesa Health-Related Quality of Life (HRQO). Ao limitar o estudo no campo da
saúde, a QV ganha um significado específico. Concentra-se nos aspectos clínicos
relacionados à condição de vida nas disfunções. Refere-se à condição médica, ao
tratamento e ao seu impacto no bem-estar físico, psicológico, social (BELASCO e
SESSO, 2006). Para esses mesmos autores (2006) a introdução da QV na área da
saúde é decorrente de três influências: 1. o avanço tecnológico que viabilizou
sobreviventes de longa data; 2. alteração no panorama epidemiológico das
enfermidades, sendo que as doenças crônicas passaram a ser o perfil
preponderante; 3. mudança de perspectiva, o ser humano não é mais visto
unicamente como um organismo biológico, mas também como um agente social.
Também existe uma preocupação em não produzir distorções conceituais, uma
vez que é fácil dar ênfase na capacidade funcional pela condição saudável. Porém,
o bem-estar vai além da performance produtiva, ou seja, é multidimensional.
A qualidade de vida não tem uma definição padrão ouro porque, em parte,
depende da perspectiva da análise econômica, antropológica, demográfica, bioética,
ambiental e de saúde pública. Porém, não depende somente desta visão coletiva,
mas também da percepção subjetiva. A condição do corpo, o bem-estar emocional,
a reinserção social, são parâmetros importantes para se falar em QV.
A OMS preconiza que existem quatro níveis de valorização dos problemas de
saúde, os quais são: a) a patologia observada no mundo micro (molécula, bactéria);
b) deficiência; c) incapacidade ou limitação do indivíduo para desenvolver
14
habilidades sociais e familiares normais; d) desvalorização que se manifesta em um
nível relacional, afetando o indivíduo como ser social (BELASCO e SESSO, 2006).
Esse último aspecto está diretamente relacionado com o bem-estar, pois se o
indivíduo se percebe como diferente ou aquém das próprias expectativas, sua ação
e reação serão uma manifestação desta imagem internalizada. Conseqüentemente,
ele pode agir como um ser deficiente, sem ter uma deficiência objetiva.
A título de ilustração apresenta-se um conto “Debate por um alojamento” do
repertório de OSHO (1974).
Em alguns templos Zens japoneses, existe uma antiga tradição: se um monge errante
conseguir vencer um dos monges residentes num debate sobre budismo, poderá pernoitar no
templo. Sobrevivente contrário terá que ir embora. Havia um templo assim no norte do Japão
dirigido por dois irmãos.
Uma noite, um monge errante foi pedir alojamento a eles. O irmão mais velho estava muito
cansado, pois havia estudado muitas horas; assim, pediu ao mais novo que fosse debater.
Este tinha apenas um olho, mas isto não o impedia de debater.
O irmão mais velho sugeriu para o mais novo que fizesse uma proposta, ao monge errante, de
um diálogo silencioso. Pouco depois, o viajante voltou e disse ao irmão mais velho: “Que
homem maravilhoso é seu irmão. Venceu brilhantemente o debate. Assim, devo ir-me embora.
Boa noite”. Antes de partir, disse o ancião, “por favor conte-me como foi o diálogo”.
Bem, disse o viajante, primeiramente, ergui um dedo simbolizando Buda. Seu irmão levantou
os dois dedos simbolizando Buda e seus ensinamentos.
Então, ergui três dedos para representar Buda, seus ensinamentos e seus discípulos. Daí, seu
inteligente irmão sacudiu o punho cerrado em minha frente, indicando que todos os três vêm
de uma única realização. Com isso, o viajante se foi.
Pouco depois, veio o irmão mais novo parecendo aborrecido. “Soube que você venceu o
debate”, falou o mais velho.
“Que nada!”, disse o mais novo, “esse viajante é um homem rude”. “É?”, disse o mais velho,
“Conte-me qual foi o tema do debate”.
“Ora!”, exclamou o mais novo, “no momento em que ele me viu, levantou um dedo insultando-
me, indicando que tenho apenas um olho”.
Mas por ser ele um estranho, achei que deveria ser polido. Ergui dois dedos congratulando-o
por ter dois olhos. Nisto, o miserável mal-educado levantou três dedos para mostrar que nós
dois juntos tínhamos três olhos. “Então, fiquei louco e ameacei lhe dar um soco no nariz –
assim, ele se foi”. O irmão mais velho riu.
Esse simples relato mostra a importância e os efeitos que a subjetividade pode
imputar no comportamento. O sentido, o significado e o julgamento que se faz
podem ter um peso maior do que a condição real e as circunstâncias da vida.
Campbell, Converse e Rodgers (1976) dizem que QV é a percepção pessoal e
por isso é o sobrevivente quem deve dizer como se sente em relação a sua saúde e
ou sobre aspectos não-clínicos da sua vida. Afirmam ainda que, a expressão QV
apresenta sinônimos como: funcionamento social e condições de saúde. Além disso,
a própria definição muitas vezes não é apresentada nos artigos que a utilizam ou
que propõem algum instrumento para a sua avaliação. Outra característica que
15
dificulta a operacionalização é o fato de que a QV relaciona-se com saúde. Ocorre,
porém, que a saúde e o estado subjetivo de saúde são conceitos afins e estão
centrados na avaliação subjetiva do sobrevivente e ligados ao impacto do estado de
saúde sobre a capacidade de o indivíduo viver plenamente.
Cohen, Mount e MacDonald (1996) entendem que as pessoas que tratam sua
doença dizem que saúde vai além de um bem-estar físico, mental/emocional e
espiritual, pois incluem uma sensação de integridade pessoal e completude. É do
consenso geral que QVRS é um conceito multidimensional que abrange variáveis
como patologia (sintomas), condição funcional (limitações biopsicossociais),
percepções gerais de saúde e do bem-estar psicológico.
Qualidade de Vida é um desses temas que de tão amplo, qualquer opinião
emitida a respeito está correta. Damineli (2000) refere que as concepções dão conta
de parte da verdade, mas nenhuma é tão abrangente que dê conta do todo. Tal fato
justifica a diversidade conceitual apresentada pela literatura pertinente, descritas
conforme a compreensão de diferentes pesquisadores.
Qualidade de Vida é uma experiência multidimensional e subjetiva que engloba
uma análise sucinta de atributos positivos e negativos (como saúde e doença) que
caracterizam a vida individual (PADILLA, GRANT e FERRELL, 2006).
Ferrans (1990) definiu como um constructo que circunda aspectos da saúde,
do funcionamento socioeconômico, psicológico, emocional, espiritual e familiar.
Como já dito, anteriormente, QV tem sido conceituada de inúmeras formas, em
relação aos cuidados da saúde. Nesse contexto, Ferrans (citado por VARRICCHIO,
2006) identificou cinco principais tópicos para se ter um bem-estar global.
O primeiro é: Normalidade da vida, ou seja, envolve a habilidade individual de
conduzir a vida dentro da normalidade. Compreende-se normalidade não como
adequação alienada do coletivo, mas como participante ativo nas escolhas e nos
posicionamentos perante o próprio viver. Diante do adoecimento, grande parte desta
autonomia é delegada aos cuidadores.
O segundo é: Utilização da vida social, ou seja, quando o indivíduo consegue
desempenhar os papéis sociais sente-se muito melhor.
O terceiro é: Realização dos objetivos de vida, diz que é fundamental ter uma
congruência entre o desejo e a realização.
16
O quarto refere-se à Felicidade/Afetos, o qual é o equilíbrio entre os estados
afetivos positivos e negativos. Quanto mais feliz o indivíduo se sente, maior é a
percepção favorável de bem-estar e vice-versa.
Finalmente, o quinto tópico que trata da Satisfação pessoal com a vida, diz
respeito à avaliação cognitiva das experiências de vida, baseada na comparação
entre os desejos e as atuais condições de vida.
Enfim, para que uma avaliação da QV retrate a realidade conforme é percebida
pelo próprio indivíduo da pesquisa, é preciso lembrar a importância da subjetividade
e não apenas dos fatos reais sucedidos. Afinal, os resultados das mensurações são
mais confiáveis quando o próprio sobrevivente responde, pois a perspectiva
individual é o que realmente conta e não o olhar de uma terceira pessoa. Quando a
análise toma como base as informações obtidas mediante a avaliação de um
profissional da área de saúde e ou do cuidador direto do sobrevivente, mas não dele
próprio, segundo Molzahn, Northcott e Dossetor (1997) ocorrem discrepâncias nos
resultados.
A literatura apresenta várias definições sobre QV ressaltando a importância do
fenômeno da subjetividade na construção conceitual. Tais como: Ferrans e Powers
(1985) definem QV como uma sensação de bem-estar pessoal que tem um tronco
de satisfação ou insatisfação nas áreas da vida que são importantes para a pessoa
em si. Cella e Cherin (1988) definem de forma semelhante. Para eles QV é a
avaliação de satisfação pessoal com o nível de funcionamento atual comparado com
o que a pessoa percebe como possível ou ideal. Belec (1992) define como um grau
de satisfação com as circunstâncias da vida presente e conforme a percepção
individual. É a percepção e o julgamento peculiar que cada qual tem em relação à
própria existência e experiências vividas, ou seja, a QV assume significado
individual.
Conforme Bush e colaboradores (1995) é a composição dos fenômenos físicos,
emocionais e econômicos. Sendo que estas considerações são freqüentemente
dominadas pelas seqüelas físicas de uma doença. Ainda, Andrykowski e
colaboradores (1995b) a definem como um constructo multidimensional e
corporativo que considera as informações individuais dos sintomas físicos, da
percepção de saúde geral e dos aspectos físico, emocional, ocupacional e do
funcionamento interpessoal.
17
Na compreensão de Molassiotis e colaboradores (1996) é um conceito que se
refere à própria percepção sobre o grau de satisfação e habilidade para o
desempenho da vida. Porém, em 1999, esses autores apresentam um novo conceito
como um grau de ajustamento dos domínios físico, psicológico e social associado ao
impacto da doença e do tratamento.
De acordo com Gaston e Foxall (1996), é como um grau de satisfação em
relação as atuais circunstâncias de vida, conforme a própria percepção. Por isso
acredita-se que o bem-estar é influenciado pelo passado, presente e futuro. Já para
Long e colaboradores (1996) é como um portão que existe entre a condição pessoal
atual e o padrão ideal.
Segundo Zebrack (2000), é uma chave para o constructo psicossocial nas
pesquisas oncológicas. Epstein e colaboradores (2001) definem QV como um
estado de bem-estar no qual o indivíduo está apto para desempenhar as atividades
diárias relativas às funções físicas, psicológicas e sociais, bem como estar satisfeito
com a função e o controle da doença e dos sintomas relativos à doença.
Chauhan, Eppard e Perroti (2004) comentam que o termo não é simplesmente
uma chamada para a área de investigação científica, pois também se define pela
interação com os aspectos físicos, emocionais, intelectuais e espirituais.
Esses são alguns dos inúmeros conceitos elaborados em relação à QV, e, de
um modo geral, eles não são divergentes, há um consenso sobre a influência da
“subjetividade” na auto-avaliação do próprio bem-estar. Também há uma afinidade
em relação à idéia de uma interferência de vários fenômenos, isto é, o caráter
“multidimensional” desta composição. Ademais, é notável a inclusão de “aspectos
positivos e negativos” (doença/saúde, felicidade/satisfação).
Relembra-se a definição dada pela OMS, que contempla a necessidade dessas
variáveis, isto é, multidimensionalidade de caracteres, a consideração de
autopercepção e de elementos positivos e negativos justapostos neste bem-estar.
Então, apesar dos conceitos serem elaborados de forma diferente, seus significados
não necessariamente são contraditórios.
Em 1987 89% dos médicos do Eastern Cooperative Oncology Group disseram
que se sentiam muito satisfeitos quando melhoravam a QV dos sobreviventes.
De acordo com Skeel (1998), é importante diferenciar “esperança de
expectativas” porque são conceitos que carregam uma percepção subjetiva que dá
uma conotação positiva ou negativa em relação aos resultados obtidos. Assim, o
18
sobrevivente pode sentir uma satisfação pela QV conquistada se a expectativa for
reduzida ou se houver uma melhoria no bem-estar emocional, no status funcional, e
isso equivale às expectativas e não à esperança propriamente dita.
Ainda, esse mesmo pesquisador acredita que o conceito de QV inclui fatores
multidimensionais, sendo os principais: a) sintomas físicos da doença e do
tratamento; b) capacidade funcional (habilidade e energia) para a rotina diária,
interação social, atividade intelectual, reações emocionais, ajustamentos e
independência econômica; c) autopercepção do bem-estar.
Os sintomas físicos da doença e dos efeitos colaterais do tratamento podem
incluir: dor, náusea, vômitos, alopecia, fadiga, anorexia. Além de interferirem no
bem-estar global, também podem influenciar na capacidade operacional (mobilidade,
habilidade de autocuidado) e nas rotinas diárias.
Os sintomas psicológicos incluem ansiedade, depressão, desajustamento em
relação à doença e ao tratamento e insatisfação com os cuidados.
Os sintomas sociais podem incluir dificuldades nas relações familiares, sociais
e profissionais. Pode haver outras variáveis que também interferem na satisfação da
condição de vida em relação à saúde, tais como: vida sexual, imagem corporal e
espiritualidade. A subjetividade e a multidimensionalidade dão a intensidade para a
QVRS.
Alguns estudos investigam as doenças, os tratamentos, a mortalidade e a
morbidade. Após a submissão ao processo da intervenção é preciso ampliar a
avaliação e incluir aspectos que estejam implicados com a condição de saúde e o
bem-estar dos sobreviventes. Até porque a OMS define saúde como um estado de
bem-estar físico, mental e social e não meramente a ausência de doença. (FLECK,
1999b).
Diante disso, para contemplar tal conceito é preciso considerar outros aspectos
além da doença em si, por exemplo: físico, social, psicológico. Tal raciocínio conduz
para uma visão integradora do ser humano, isto é, vai além do físico. Existe uma
multidimensionalidade de variáveis que interferem na subjetividade perceptiva de
cada um.
Desse modo, QV pode ser definida como um bem-estar subjetivo. O
reconhecimento da subjetividade inclusa neste conceito é a chave para
compreender esta construção. Isto porque a QV é uma expressão que considera as
expectativas, as esperanças e o fato em si que está sendo vivenciado.
19
Frankl (1963) diz que QV é a percepção de algo essencial que tem
interferência naquilo que se acredita, ama, cria e no que se deixa como legado.
Ainda nesse mesmo estudo, menciona outra definição, a qual demarca que QV é o
grau que a pessoa dá para possibilidades importantes da sua vida. Compreendendo-
se “possibilidades” como resultados de oportunidades e limitações que ocorrem e
que interferem no pessoal e no meio ambiente do seu contexto.
Para ter o que se considera uma boa saúde, é importante poder ser, pertencer
e estar. Sendo que, na fenomenologia do ser, estão inclusos três domínios: físico,
psicológico e espiritual. O bem-estar da saúde física engloba higiene, nutrição,
exercício, vestuário, aparência. No aspecto do bem-estar psicológico incluem-se a
saúde emocional, as funções cognitivas preservadas, os sentimentos e
pensamentos, as avaliações em relação a si mesmo e ao autocontrole.
Quanto ao bem-estar espiritual, consideram-se os valores pessoais, padrões e
condutas. A crença religiosa não necessariamente deve estar vinculada a
organizações religiosas, pois a razão maior é o anseio espiritual inerente ao homem
e não necessariamente às convenções determinadas pelos dogmas religiosos.
Os itens mencionados acima estão relacionados com a necessidade de “ser”.
Mas não é possível apenas ser, também é necessário pertencer. Assim, quanto à
área da pertença, inclui-se a adaptação pessoal com o seu meio ambiente. Também
tem três domínios, ou seja, as pertenças físicas, sociais e comunitárias.
“Pertença física” é o que está relacionado ao meio ambiente: casa, vizinhança,
escola, comunidade. “Pertença social” está vinculada à sensação de intimidade e à
aceitação dos outros, família, amigos, sócios. Por último, a “pertença na
comunidade” compreende ter salários adequados, serviços sociais e de saúde,
emprego, recreação educacional, entre outros benefícios.
Como foi dito anteriormente, para ter uma boa saúde é preciso ser, pertencer e
estar. Assim, quanto ao terceiro tópico, isto é, “estar” e tornar-se, tratam-se das
conquistas dos objetivos pessoais, esperanças e desejos. Desse modo, engloba as
atividades do dia-a-dia, tais como: tarefas do lar, da escola, cuidados com a saúde e
o social. Também inclui atividades de lazer (relaxamento, jogos, caminhadas, visitas
familiares, férias, feriados). Esse fenômeno faz com que as pessoas fiquem
atualizadas e habilitadas nos novos conhecimentos.
Enfim, é da responsabilidade do profissional reconhecer os vários domínios do
bem-estar, incorporar a multidisciplinariedade e estabelecer objetivos de cuidados
20
aos sobreviventes, redefinir a QV e avaliar o sucesso das medidas de melhoramento
e modificar os planejamentos sempre que possível e necessário para melhorar a
qualidade de vida.
Desta forma o conceito de QV é controverso e complexo, em função da
diversidade e subjetividade imposta na elaboração da definição. A lacuna conceitual
deve-se às diferentes perspectivas e à multiplicidade de variáveis existentes na
escolha final.
No entanto, existe um consenso de que determinados domínios devem estar
presentes na avaliação (funcionamentos:físico, psicológico, social, espiritual). (KING
e HINDS, 2003).
A mensuração de QV é potencialmente útil na comparação de tratamentos
alternativos, na identificação de doentes com dificuldades particulares e na
adequação das expectativas em relação à intervenção clínica que o sobrevivente
experimentará.
Segundo estudo realizado por um grupo de pesquisadores de diferentes
culturas, sob o comando da OMS, não há um acordo em relação ao conceito de QV.
Porém, existe um consenso da presença de três elementos fundamentais, que são:
subjetividade, multidimensionalidade e presença de dimensões positivas – por
exemplo: mobilidade, capacidade de execução de tarefas – e negativas –
exemplificando, dor, fadiga.
Em síntese, pode-se dizer que há diferenças entre as definições de QV para
diferentes autores em relação ao conceito apresentado pela OMS. Contudo, a
subjetividade e a multidimensionalidade tendem a ser pontos defendidos pela
maioria (PADILLA, 1985; BULLINGER, ANDERSON e CELLA, 1993).
2.1.3 Construção Metodológica para Avaliação de Qualidade de Vida
A avaliação de QV tem se tornado uma prática constante na rotina clínica.
Zebrack (2000) relata que existem mais de duzentos instrumentos de QV que são
teoricamente utilizáveis. Porém, não se tem certeza de que eles realmente
mensuram o real impacto do adoecimento e do tratamento na vida dos
sobreviventes. Por isto a necessidade de elaborar um protocolo que inclua escalas
multidimensionais e propicie espaço para que ocorram comentários. Assim, além da
21
avaliação quantitativa se obtém informações espontâneas, de caráter qualitativo, em
relação ao significado perceptivo de cada um.
Membros da organização Oncology Nursing Society, em 2000 identificaram a
variável QV como a segunda prioridade mais importante para ser investigada nas
pesquisas (citado por VARRIACHIO, 2006).
Posteriormente, foi determinado pela Society’s Research que a principal
prioridade para investigação, para o período de 2005 a 2008, é e deverá ser a
abordagem sobre a QV apesar das divergências conceituais que dificultam a sua
implantação (BERGER et al, 2005). Há consenso entre os pesquisadores que a
avaliação deve ter uma abordagem multidimensional, tendo como foco as seguintes
dimensões: física, psicológica, funcional e social.
Outros pesquisadores acreditam que os aspectos religiosos devem estar
inclusos como componentes da QV, devido à relevância que existe para o bem-estar
global. Compreendendo-se bem-estar espiritual como a satisfação que a pessoa tem
em relação a Deus e a percepção de um sentido de vida (ZEBRACK, 2000).
A metodologia deve contemplar a multidimensionalidade e a subjetividade
devido à interferência que causam nos resultados da mensuração da QV. Isto
porque cada indivíduo tem a sua própria maneira de interpretar e valorar as suas
experiências.
Conforme Zebrack (2000), o estudo da QV é muito polêmico, pois não há uma
definição aceita por todos. As decisões variam conforme a conceituação, o tamanho
da amostra e sua divergência, os exames psicométricos e protocolos. E estes são
inúmeros em termos de possibilidades; alguns descrevem estudos com grupo
controle da população, outros não e assim por diante.
Todas essas diferenças, na verdade, mostram a necessidade de levar-se em
consideração não apenas a avaliação objetiva – isto é, as demandas de bens
materiais, status social e ao bem-estar físico –, mas também os aspectos subjetivos,
que estão diretamente relacionados à percepção peculiar de cada um. A satisfação
que se tem em geral é moldada pela tonalidade afetiva. Segundo Goethe a alegria
não está nas coisas. Está em nós.
Conseqüentemente a mensuração da QV deriva da vida em geral, que é
composta por áreas específicas (família, amigos, trabalho, comunidade, saúde,
educação, bem-estar físico, social, psicológico e espiritual).
22
Segundo Fleck e colaboradores (1999b) a QVRS e os estados subjetivos de
saúde são conceitos afins. Estão diretamente relacionados à percepção do
sobrevivente. Contudo, também tem importância o impacto da condição de saúde
sobre a capacidade de o indivíduo viver satisfatoriamente.
Ao incluir aspectos objetivos e subjetivos, por exemplo: andar e sentir-se feliz,
respectivamente, ampliam-se as possibilidades de clarificar o processo de análise da
QV, para que o estudo colete e mensure dados que informem sobre o que realmente
se quer medir.
Dentro deste contexto, Ferrans e Powers (1985) desenvolveram um índice
referencial como medida de QV, ou seja, elaboraram o Quality of Life Index (QLI),
visando ter um marcador que mensurasse o bem-estar em relação à satisfação
pessoal com a própria vida, isto é, conforme os valores pessoais.
O objetivo da construção do QLI foi organizar um instrumento para a sociedade
que compilasse vários aspectos subjetivos e objetivos da QV e que pudesse ser
usado como um indicador de satisfação.
Foram incluídas as seguintes dimensões: social, saúde, meio ambiente e
economia da sociedade. Este índice pode ser aplicado para medir aquilo que tem
uma influência nos indivíduos e também pode contribuir para os debates sobre como
melhorar as condições de vida de uma determinada sociedade.
A seguir serão mencionados alguns dos itens que foram inclusos na dimensão
social: benefícios de assistência social e estar na lista de espera para casas
populares. Na dimensão da saúde: níveis de suicídios e crianças pré-maturas. Na
dimensão econômica: número de desempregos, de pessoas empregadas e
falências. Na dimensão do meio ambiente: qualidade do ar (poluição) e
derramamentos de óleos.
Aparentemente, a preocupação excessiva de mensurar aquilo que se propõe
acaba produzindo uma diversidade de infindáveis propostas conceituais e de
instrumentos. Nos sobreviventes, a mensuração é tão ampla que acaba perdendo o
foco da satisfação e do bem-estar de uma boa vida.
Por isso, segundo Belasco e Sesso (2006) deve-se distinguir primeiramente os
aspectos materiais e imateriais. Entende-se que necessidades básicas, como
habitação, luz, infra-estrutura; interferem e exercem uma influência nos fenômenos
imateriais, tais como: bem-estar, cultura, valores familiares.
23
Outra distinção importante está constituída pelas questões do indivíduo
(posição econômica, pessoal e familiar) e do coletivo (serviços básicos e públicos).
Por último, devem-se distinguir os elementos objetivos (natureza quantitativa) e
os subjetivos (percepção individual sobre o bem-estar), que oscilam de indivíduo
para indivíduo, conforme o referencial do estrato social.
A consideração da subjetividade é crucial, uma vez que esta interfere na
qualidade interpretativa que se dá para a gravidade do diagnóstico clínico ou dos
fatores de risco como a mortalidade (BELASCO e SESSO, 2006).
Ao mensurar QV, as variáveis mencionadas acima devem ser estudadas para
que se tenha uma visão integrativa do binômio saúde/doença.
Alguns autores como Diniz e Levensteinas (2006) sugerem a inclusão da
oportunidade de saúde, duração da vida e dos fenômenos da morte.
Na revisão realizada por Belasco e Sesso (2006) encontram-se outras
sugestões de inclusão. Os autores acreditam que é necessário avaliar componentes
pessoais e sociais que interferem no processo da patologia e da QVRS, nos
períodos hospitalar e pós-alta. Todavia, deve-se evitar a ênfase no funcionalismo e
diferenciar QV do fenômeno saúde.
Saúde não significa meramente ausência de doença e a QV depende como já
dito, da percepção subjetiva. Existe uma interferência significativa do lugar de
importância que a doença tem e de como o sobrevivente sente e analisa o que tem.
Segundo Hilderley (2001), apesar de existirem muitas sugestões em relação às
áreas que devem estar inclusas num instrumento de avaliação da QV, é mais
comum encontrar os seguintes tópicos nas escalas: físico, psicológico, social e
espiritual.
Em relação à dimensão física, inclui-se a capacidade de mobilidade. Isto
porque, freqüentemente ocorrem efeitos secundários ao tratamento, dor, fadiga,
fraqueza, perda do apetite, alterações nas funções renais e de intestino, o que pode
desencadear um prejuízo na autonomia física, conseqüentemente no bem-estar
global.
A dimensão psicológica considera as atividades de lazer, satisfação, metas e
controle da própria vida. Contudo, esses aspectos podem fragilizar-se diante do
adoecimento, com isto aumentam as probabilidades de manifestar-se algum
transtorno de humor. Às vezes pode haver a expressividade da depressão ou da
ansiedade, fato este que também pode interferir na condição geral do sobrevivente.
24
Em relação à dimensão social, constata-se uma ruptura já no início da
intervenção, pois envolvem preocupações financeiras, papéis e relacionamentos que
precisam ser remanejados, responsabilidades assumidas com a família, afetividade
e sexualidade.
Quanto à dimensão espiritual, esta área vai além da religião em si. O
adoecimento e o sofrimento fazem parte dos propósitos naturais da vida física e
psíquica. Diante do diagnóstico e tratamento, é comum deparar-se com dúvidas e
conflitos em relação às crenças anteriores. Mas o contrário também pode acontecer,
isto é, haver o fortalecimento da fé.
Tanto a doença quanto o tratamento podem dificultar a manutenção do bem-
estar do sobrevivente. Desse modo, é fundamental considerar a QV nas decisões,
nos cuidados e na avaliação dos resultados, pois os sobreviventes podem se
deparar com uma realidade diferente das expectativas iniciais.
A QV deveria ser incluída num protocolo de análise da satisfação do
sobrevivente, independentemente se a equipe tem expectativas favoráveis ou não.
Qualidade de vida é um conceito que define uma sensação de bem-estar
individual. Isso deve ser considerado em qualquer indivíduo, tanto naquele que tem
possibilidade de uma longa sobrevida como em quem recebe cuidados paliativos e
nos que estão no leito da morte.
A indicação de uma avaliação que considere a característica multidimensional
deve-se ao fato de que o homem é uma estrutura sistêmica. A tendência do
profissional da área de saúde é dissecar, estudar em partes, até por uma questão de
especialização. Porém, o processo interno da doença está inter-relacionado com o
doente em si. Desse modo, a sensação da dor não afeta apenas a condição física,
pois a alteração do humor produz um decréscimo na QV.
Para Jung (1991), a percepção originária dos objetos provém só parcialmente
do comportamento objetivo das coisas. Em sua maior parte, essas percepções
advém de fatos intrapsíquicos, os quais têm relação com as coisas apenas mediante
a projeção. É praticamente impossível imaginar como as experiências, no mais
amplo sentido das palavras, bem como o psíquico de um modo geral, poderiam
provir exclusivamente de algo externo.
Esse fato traz o aspecto da singularidade do ser e não da coletividade, pois,
segundo Balieiro (1999), o indivíduo pode perceber com mais facilidade uma
determinada característica do objeto cuja representação latente interna já existia,
25
dentro dos seus esquemas perceptivos. Cada indivíduo tem o seu processamento
mental e afetivo que produz pensamentos, sentimentos e ações relacionados com a
experiência vivida. Existe uma tendência a projetar no objeto visto algumas
características pertencentes à imagem interna elaborada anteriormente.
Exemplificando: o garimpeiro na busca do diamante pode, num primeiro momento,
imaginar que a pedra que encontrou é de valor. Não porque não diferencia, mas
porque a sua percepção está voltada para este reconhecimento. Sendo assim, a
reação pode ser o resultado dos fatos em si e da capacidade pessoal de perceber,
entender e apreender.
É esperado que, imediatamente após o TCTH, ocorra uma queda no bem-
estar. Contudo, alguns podem, já neste início, resgatar uma condição mais favorável
de saúde. O resultado é imprevisível, e desse modo a realização da avaliação é
indicada para se obterem os parâmetros basais e correlacioná-los com os resultados
no seguimento do processo.
Quando se avalia a QV, o ideal é a aplicação de instrumentos de avaliação do
tipo multidimensional. Porém, não é preciso sobrecarregar o sobrevivente com uma
investigação extensa. Deve-se escolher as dimensões que coletem informações que
sejam pertinentes ao sobrevivente ou ao grupo que se estuda.
A percepção da QV é dinâmica, isto é, ela pode apresentar diferentes
interpretações conforme o momento peculiar do sobrevivente, dos estádios da
doença e da evolução do tratamento. Exemplificando: um sobrevivente, antes de
adoecer, era um amante da natureza e de esportes radicais. Com o adoecimento e
as limitações extensas, um dia ele comentou que se sentia feliz nos dias em que
conseguia manter uma conversa sem ter falta de ar; anteriormente, só se sentia
satisfeito se ganhasse o primeiro lugar nas competições.
Os sobreviventes podem mudar a própria definição de QV durante o curso da
doença e do tratamento. Porém, de um modo geral o enfermo deseja ter uma vida
com autonomia e controle das dificuldades inerentes ao seu cotidiano.
Na saúde pública e Medicina, o conceito de QV está relacionado à saúde e
refere-se ao componente biopsicossocial percebido por uma pessoa e (ou) um grupo
em determinado tempo.
A avaliação possibilita comparar as alterações provocadas pelos efeitos da
doença crônica, incapacidades, limitações e transtornos mentais. Enfim, amplia a
compreensão da interferência da enfermidade na rotina de vida.
26
Por mais que ocorra uma variedade de aspectos da QV, o que se sabe é que o
tratamento e o diagnóstico de prognóstico reservado causam um impacto
significativo. As mensurações ajudam na avaliação dos custos e benefícios das
intervenções.
Além disso, a avaliação da QV pode ser aplicada em diferentes culturas e
populações. Desse modo, é possível coletar informações e identificar diferentes
subgrupos com déficits em determinadas áreas, servindo de ponto de apoio para as
intervenções terapêuticas necessárias.
2.1.4 Instrumentos
Muitos estudos estão diretamente relacionados aos protocolos de pesquisa,
isso provocou um aumento significativo de escalas que mensuram a QV,
independente dos diferentes tipos de sobreviventes, doenças e população.
Quando um grupo de cientistas sociais avaliou a população geral sobre QV,
eles concluíram que alguns domínios devem ser inclusos, os quais são: a) bem-estar
físico subentendendo segurança pessoal e de saúde; b) relacionamento com outras
pessoas; c) atividades cívicas, comunitárias e sociais; d) desenvolvimento e
realização pessoal; e) lazer. Então perceberam a necessidade de instrumentos
específicos para que fossem usados conforme a amostra de estudo. As escalas não
podem ser aplicadas aleatoriamente, pois podem trazer resultados irreais (SKEEL,
1998).
Contudo, os estudos esbarraram na questão metodológica, uma vez que, para
decidir o método que se utilizará, primeiro é preciso ter uma posição sobre aquilo
que se pretende mensurar.
Em relação aos instrumentos de medida de QV, estes tiveram a sua inserção
na década de 1970; caracterizam-se por questionários de auto-aplicação ou
entrevistas dirigidas, que avaliam sentimentos, atitudes e a autovalorização.
Esses instrumentos são subdivididos em genéricos (multidimensionais) ou
específicos (unidimensionais). Aqueles viabilizam uma análise geral, por isso,
podem ser aplicados na população geral, possibilitando uma referência como grupo
controle. Já as escalas específicas ficam restritas, isto é, investigam informações
27
próprias do foco de atenção; por exemplo, uma determinada doença, tratamento,
sintoma, limitação e causalidade.
Para amenizar as críticas em relação à falta de uma definição padrão ouro, e
conseguir estabelecer uma metodologia que seja coerente com o procedimento
científico, a elaboração dos instrumentos de medida da QV, seguiu-se o modelo da
avaliação psicométrica tendo por base a capacidade dos indivíduos em discernir
estímulos de diferentes intensidades (BELASCO e SESSO, 2006).
Algumas propriedades também estão inclusas na metodologia da elaboração
dos instrumentos que mensuram QV, tais como: 1. confiabilidade: se tem
consistência interna, isto é, o instrumento é capaz de mostrar que sobreviventes
estáveis apresentam resultados semelhantes em inúmeras reaplicações; 2.
reprodutibilidade; 3. validade: é a avaliação de modo transversal e longitudinal;
seguido do conteúdo; do constructo e por último, mas não menos importante, do
critério.
Por meio da avaliação psicométrica da QV é possível obter informações que
auxiliam na escolha de tratamentos, na manutenção de diferentes programas no
sistema de saúde e na efetividade das intervenções sanitárias (BELASCO e SESSO,
2006).
A inclusão do grupo controle deve-se ao desejo de obter uma referência da
população normal, que seja representativa da população geral e que viabilize uma
confiabilidade na interpretação das pontuações do questionário, evitando, assim,
possíveis desvios na valoração dos resultados encontrados. De acordo com Belasco
e Sesso (2006), o grupo controle serve como uma referência que auxilia na
elaboração dos objetivos terapêuticos.
A realização de um estudo sobre QVRS deve visar a aplicação na prática
clínica, uma vez que seus resultados potencialmente apontam para os aspectos
fortes e vulneráveis das intervenções de alta comorbidade e mortalidade. Assim,
esses achados devem ser considerados nos projetos de políticas públicas de saúde.
Contudo, no Brasil, as políticas públicas de saúde pouco contemplam as
questões referentes à QV da população, apesar do Programa de Reforma Sanitária,
definido na VIII Conferência Nacional de Saúde, considerar a saúde como resultado
de reais condições de vida, incluindo renda, trabalho, educação, habitação,
transporte, alimentação e condicionantes da QV (BELASCO e SESSO, 2006).
28
Na avaliação do bem-estar existe um elemento que dificulta a compreensão
avaliativa: o fato de o ser humano ser capaz de modificar seus valores pessoais.
Desse modo, o que é bom pode deixar de sê-lo e vice-versa. A subjetividade é um
denominador comum de críticas quanto à mensuração de QV; é ao mesmo tempo,
um fator fundamental que pode fazer a diferença entre se sentir bem ou apresentar a
percepção de um mal-estar geral, ou seja, além do fato em si, existe a interferência
específica do referencial subjetivo de como o fato é percebido.
Para evitar a elaboração de protocolos com lacunas metodológicas, o ideal é
optar por uma avaliação conjunta, isto é, mensurar a QV e outras variáveis que
sejam indicadores objetivos e interdependentes no bem-estar do indivíduo, como,
por exemplo, fadiga, depressão, ansiedade e sexualidade.
Existem muitas controvérsias em relação à fidedignidade da mensuração de
QV, devido à questão cultural. No entanto, Bullinger (1994) defende a idéia da
existência de uma similitude universal de QV. Para ele QV é um universo cultural,
independentemente da nação, cultura ou época, é importante que as pessoas se
sintam bem psicologicamente, possuam boas condições físicas e sintam-se
socialmente integradas e funcionalmente competentes.
O termo QV não é simplesmente uma chamada para a área de investigação
científica, visto que ela também se define pela interação com os aspectos físico,
emocional, intelectual e espiritual (CHAUHAN, EPPARD e PERROTI, 2004).
Nessa perspectiva, a pesquisa sobre QV representa variedades metodológicas,
conceituais e da subjetividade, e seu conhecimento é fundamental, pois a sua
compreensão viabiliza atender o sobrevivente na perspectiva dele, como
sobrevivente, e não a partir da percepção do profissional.
Apesar de ser necessária a consideração da subjetividade e da inclusão de
variáveis diferentes, também é preciso uma padronização, uma mensuração que dê
valores numéricos para que não se perca o seu caráter científico e seja possível a
interpretação, mesmo na existência dos impasses da ordem do emocional. Enfim,
deve-se desenvolver uma avaliação que seja fecunda pela integração do teórico e
do relacionamento, ou seja, abordar a questão sob diversos aspectos.
Conforme Cella (1988b), para assegurar uma avaliação ampla e obter
validação das informações, é indicado que se utilizem medidas que são niveladas
pelos sobreviventes (self report), mas, também, deve-se aplicar instrumentos que
29
são mensurados pelos profissionais. Ainda de acordo com esse pesquisador, na
definição de QV observa-se um ponto de vista fluido, multidimensional e subjetivo.
Por isso, a mensuração deve incluir a perspectiva do sobrevivente, ser sensível
às alterações, ser breve e considerar os aspectos culturais e a qualidade de
tradução. Uma vez que não existe um padrão ouro em relação às escalas, o
pesquisador deve estar sempre em estado de alerta quanto às características
positivas e negativas desses instrumentos.
Em decorrência disso, Cella (1988b) propõe normas para mensurar a QV, as
quais são: a) evitar o uso do termo QV, quando o estudo considerar apenas uma
dimensão de avaliação, por exemplo: dor, humor; b) selecionar uma medida que
esteja de acordo com as características da população que será estudada, c)
acrescentar uma escala com itens relevantes e específicos; d) combinar escalas de
auto-aplicação com medidas de observação, para obter uma informação
complementar; e) simplificar as técnicas de mensuração; f) enquadrar o
funcionamento específico dentro de um tempo e de um questionário curto; g)
assegurar que a avaliação seja possível considerando o tempo que será requisitado
e o lugar em que o sobrevivente permanecerá; h) permitir que o sobrevivente
complete o questionário fora do espaço clínico, se desejar; i) prestar atenção no
tempo de administração.
Como já foi citado, QV geralmente reconhece a inclusão de quatro amplas
dimensões: a) bem-estar físico que inclui a condição física atual do sobrevivente, ou
seja, a experiência e sintomas da doença, tratamento e seus sintomas colaterais; b)
bem-estar funcional, relacionado com as habilidades de responsabilidade para as
atividades básicas da rotina de vida; c) bem-estar mental e emocional, este se refere
à tristeza, mas, também, ao bem-estar positivo ou de uma vida satisfatória; d) bem-
estar social, incluindo atividades com o suporte da família e dos amigos.
Por último, o instrumento deve apresentar uma linguagem e formato atraente
para o sobrevivente. O instrumento não deve causar desassossego emocional ou
impor um esforço demasiado. Além de ser confiável cientificamente e de fácil
administração.
30
2.1.5 Descrição das Escalas da Pesquisa
O aumento dos experimentos clínicos de avaliação dos agentes
quimioterápicos dentro do tratamento de câncer gerou a necessidade de criar
instrumentos de quantificação da condição dos sobreviventes relativos ao grau de
independência, no manejo das atividades normais e na autonomia. O protocolo
dessa tese considerou esta especificidade, fato esse que, o leitor poderá constatar
na descrição dos instrumentos a seguir.
2.1.6 FACIT-Fatigue
A escala para Avaliação Funcional de Fadiga em Terapia para Doenças
Crônica, mais conhecida pela sigla inglesa FACIT (Functional Assessment of
Chronic llness Therapy-Fatigue), está na 4
a
versão.
Inicialmente foi desenvolvida e validada uma escala geral denominada Escala
de Avaliação Funcional para Terapia de Câncer-Versão Geral, FACT-G. Na
seqüência das pesquisas acrescentaram na FACT-G itens específicos de
determinadas doenças crônicas e tratamentos obtendo assim outras escalas, como
por exemplo: FACT-BMT: para sobreviventes submetidos ao transplante de medula
óssea e a FACT-F: para indivíduos com fadiga. Tais escalas foram agrupadas no
sistema de avaliação de doenças crônicas (CELLA et al., 1997 a).
Este sistema de avaliação teve seu início em 1987 no Centro de
Acompanhamento de Pesquisa e Ensino (Center on Outcomes, Research and
Education - CORE),em Chicago, Illinois, USA.
A FACIT-Fatigue é uma escala multidimensional de QV, composta de 40 itens.
Treze itens investigam as preocupações pertinentes à fadiga. Contém ainda, a
mensuração do desempenho de mais quatro dimensões: bem-estar físico, bem-estar
funcional e bem-estar social e familiar, cada dimensão composta de 7 itens. E por
fim o bem-estar emocional com 6 itens, os quais devem ser preenchidos pelo
sobrevivente.
31
A partir das dimensões avaliadas obtém-se um panorama do funcionamento do
cotidiano do sobrevivente conforme a percepção e valores do mesmo, frente à
doença crônica e o seu subseqüente tratamento.
De acordo com Cella e colaboradores (1988 ab) esta avaliação é constituída
respeitando componentes universais do conceito de QV, os quais são: subjetividade,
multidimensionalidade, elementos positivos e negativos. Levando em consideração
esta informação, pode se dizer que a avaliação funcional fornece uma expressão da
QV.
Quando se opta pelo critério de multidimensionalidade, isto significa uma
verificação ampla do desempenho do sobrevivente. Pois, mensuram aspectos do
bem-estar físico, emocional, social, familiar e funcional. (CELLA et al., 1988, 1993,
1995a, 1997 a; 1998a; AARONSON, 1993; KORNBLITH et al., 1994; ROWLAND,
1997; MCQUELLON et al., 1997, MCQUELLON e RAMBO, 1998).
Para a tradução atual foi utilizado o “back translation”, primeiramente foi
traduzido para o português e posteriormente para o inglês. Em seguida, o original foi
comparado com a tradução e obteve-se a equivalência semântica. A sua
mensuração considera a experiência clínica, mas também, as declarações
subjetivas do sobrevivente (CELLA et al., 1988, 1993, 1995 a, 1997 a; 2002 ab;
WINNIE, 2003; CELLA, 2004; BRUCKER et al. 2005).
Cada uma dessas medidas está escalonada com escore baixo significando QV
pobre e alto escore indica QV elevada. Para o escalonamento usa-se uma
transformação linear simples de zero a cem (CELLA et al., 2003).
A FACIT-Fatigue demonstrou propriedades psicométricas favoráveis
(coeficientes correlacionais válidos, consistência interna, altos níveis de
escalonamento de sucesso e fidedignidade) na aplicação clínica entre os indivíduos
com doença e sem doença. Também verificaram que a utilização da internet, assim
como do telefone são possíveis, para a coleta de dados. Pois, estas alternativas
mostraram boa congruência com o escore original.
32
2.1.7 WHOQOL
Escala abreviada de Qualidade de Vida da Organização Mundial de Saúde -
World Health Organization Quality of Life, é um instrumento de auto-avaliação, auto-
explicativo, composto de 26 itens (forma reduzida). Sendo que dois itens referem-se
à temática geral: QV e saúde. Enquanto que os outros 24 itens fazem parte das
perguntas que estão distribuídas em quatro domínios: físico, psicológico, relações
sociais e meio ambiente.
. O objetivo visa mensurar a percepção subjetiva do respondente sobre a QV.
A própria OMS estabeleceu a redução de itens para os 26 atuais na forma
reduzida, devido à necessidade de proporcionar uma escala que não tomasse tanto
tempo de aplicação. Apesar disto, foram mantidos os quatro domínios.
Para a configuração da WHOQOL na forma reduzida, foram retiradas várias
perguntas, mas, mantiveram pelo menos uma representante de cada domínio e
também tiveram o cuidado de manter a relação conceitual do domínio. Foram
extintos o domínio do nível de independência e o relacionado com aspectos
espirituais, religiosos e crenças pessoais.
Apesar da retirada destes dois domínios, isto não significa que não sejam
considerados importantes. Pois, é reconhecido que alguns aspectos como o
psicológico e a espiritualidade têm interferência no campo do material.
Em razão desta compreensão, na 101ª sessão da Assembléia Mundial de
Saúde foi proposta uma modificação do conceito de saúde pela OMS para um
estado dinâmico de completo bem-estar físico, mental, espiritual e social e não
meramente a ausência de doença (WHO 1998; FLECK, 2000b).
No primeiro domínio – Físico, estão os seguintes aspectos: dor, desconforto,
fadiga, energia, capacidade de trabalho, atividades da vida diária, sono,
dependência de medicação ou de tratamento.
O segundo domínio – Psicológico, é composto pelos seguintes itens:
sentimentos positivos e negativos, auto-estima, imagem corporal e aparência,
pensar, aprender, memória e concentração, espiritualidade e crenças pessoais.
No terceiro domínio - Relações Sociais estão as seguintes facetas: relações
pessoais, apoio social, atividade sexual.
33
No quarto domínio - Meio Ambiente estão os seguintes componentes:
segurança física e proteção, ambiente no lar, recursos financeiros, cuidados de
saúde e sociais: disponibilidade e qualidade, oportunidades de adquirir novas
informações e habilidades, de participação em recreação e lazer, transporte,
ambiente físico (FLECK, 2000b).
Para a elaboração do questionário WHOQOL-100, os autores realizaram uma
seleção dos itens, considerando aspectos conceituais e psicométricos.
No âmbito conceitual preservaram o caráter abrangente do WHOQOL e no
âmbito da psicometria foram escolhidas as perguntas que apresentavam uma
correlação maior com o escore total do WHOQOL-100. Todas as respostas são
distribuídas por escalas com pontuações (tipo Likert) que varia de um a cinco.
Conforme o tipo do conteúdo da pergunta se estabelece uma investigação sobre a
intensidade, capacidade e/ou freqüência do comportamento a ser avaliado (FLECK,
2000b; MORENO et al., 2006).
Os especialistas desse estudo da OMS analisaram as questões para investigar
se elas representavam conceitualmente o domínio de onde as facetas originaram.
Este instrumento foi aplicado diversas vezes e em centros e grupos de pessoas
diferentes com o intuito de investigar as características psicométricas. Na validação
da versão em português, os resultados foram satisfatórios, uma vez que,
apresentaram consistência interna, validade discriminante, de critério, concorrente e
fidedignidade teste-reteste (FLECK, 2000b).
Na validação deste instrumento foram utilizados como escalas de avaliação
indireta de validade concorrente o Inventário de Beck para depressão e a Escala de
Beck de desesperança.
O grupo do Fleck e colaboradores (2000a) foi quem realizou um estudo com o
instrumento WHOQOL na população brasileira para validação.
A versão em português do WHOQOL-100 foi desenvolvida no Departamento de
Psiquiatria e Medicina Legal da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Fleck
et al., 1999b).
Para a validação da versão em português do WHOQOL - Bref, consideraram as
mesmas normas que foram utilizadas na validação do WHOQOL - 100 no Brasil e
nos demais centros de pesquisas (Fleck et al., 1999b).
34
A forma reduzida da WHOQOL foi aplicada em 300 indivíduos na cidade de
Porto Alegre - RS, sendo 250 sobreviventes de múltiplas clínicas (125 do
ambulatório e 125 internados) e 50 voluntários que constituíram o grupo controle.
Além da tradução e retrotradução, durante o período da elaboração das
questões, havia aplicações e discussões com os sobreviventes, profissionais de
saúde e pessoas em geral, com o intuito de obter comentários e sugestões que
demonstrassem a aceitação e compreensão das questões do instrumento avaliado.
O instrumento demonstrou consistência interna, validade discriminante, de
critério e simultânea. Assim como, também mostrou bom desempenho em relação à
estabilidade e fidedignidade teste-reteste (
Fleck, 2000a).
Também há uma concordância substancial, quase perfeita, quando se investiga
a estabilidade e os coeficientes de correlação intraclasse. Concluíram que o
WHOQOL tem um bom desempenho psicométrico e pode ser indicado para estudos
de QV no Brasil. Além disso, tem uma perspectiva transcultural para uso
internacional, já que na elaboração de base, foram incluídos vários países e
diferentes culturas. (
Fleck, 2000a).
A amostra do estudo original para a viabilização da validação incluiu 11275
indivíduos provenientes de diferentes centros. Apesar da amostra brasileira se
restringir a 300 indivíduos, as características psicométricas do WHOQOL na versão
brasileira são condizentes à amostra do grupo de QV da OMS.
Este é um questionário que por ser auto-aplicativo, quando o indivíduo
responde, fornecendo informações da própria percepção em relação aos aspectos
positivos e negativos, aos fenômenos da saúde global e às variáveis que tem
interferência na QV. Além disso, esse instrumento está direcionado a avaliar a QV
das pessoas em geral e não especificamente a QV relacionada à saúde.
A definição do Grupo WHOQOL reflete a natureza subjetiva da avaliação que está imersa no
contexto cultural, social e de meio ambiente. O que está em questão não é a natureza objetiva
do meio ambiente, do estado funcional ou do estado psicológico, ou ainda como o profissional
de saúde ou um familiar avalia essas dimensões: é a percepção do respondente/sobrevivente
que está sendo avaliada” (FLECK, 2000b).
Enfim, a WHOQOL é uma composição multidimensional, sendo assim, é
preciso avaliar cada dimensão para que os resultados sejam discriminados. Obtendo
mais informações sobre cada domínio e deste modo, conhecendo o que realmente
está afetado e não se restringindo a um resultado final que diga sinteticamente que a
35
QV é boa ou ruim. E isto é possível porque o instrumento WHOQOL viabiliza a
avaliação de cada área e ao mesmo tempo fornece uma interpretação do escore
total também.
2.1.8 Escala de Beck
O BDI - Inventário de Depressão do Beck (Beck Depression Inventory) e o BAI-
Inventário de Ansiedade do Beck (Beck Anxiety Inventory). Ambas foram
desenvolvidas por Beck e seus colaboradores no Center for Cognitive Therapy
(CCT) da Universidade de Pennsylvania, na Philadelphia, nos Estados Unidos. Estas
escalas são indicadas para pessoas com 17 até 80 anos de idade. A sua aplicação é
extensa, podendo ser usada com sobreviventes psiquiátricos ou não e na população
em geral.
A escolha do uso das escalas depende do que se objetiva mensurar.
Entretanto a aplicação das duas escalas, depressão e ansiedade, enriquecem a
compreensão clínica e conseqüentemente viabilizam melhores subsídios para a sua
interpretação e intervenção terapêutica.
Para a versão em português, um grupo de peritos foi convidado para serem
juízes da elaboração consensual, para que esta representasse equivalência
conceitual e semântica com as versões em inglês, enquanto que a tradutora
assegurou a equivalência idiomática das expressões usadas.
Na seqüência, 32 indivíduos bilíngües da população geral, testaram a
equivalência lingüística das duas versões, (inglês-português), através do teste e
reteste. Os dados demonstraram resultados satisfatórios (CUNHA, 2001).
A amostra para o estudo com a versão em português foi composta por três
grandes grupos, sendo: sobreviventes psiquiátricos (n =1388), sobreviventes de
clínica médica (n= 531) e grupos da população geral brasileira (n= 2476), totalizando
4.395 indivíduos.
36
2.1.8.1 BDI - Inventário de Depressão
É uma medida da intensidade da depressão, elaborada no ano de 1979 por
Beck, amplamente usada tanto na área clínica como na pesquisa e com a população
em geral. Na elaboração da escala foram consideradas as observações clínicas,
relatos, atitudes e sintomas mais freqüentes entre as pessoas com vários tipos de
transtorno depressivo.
É um instrumento de avaliação de auto-relato, com 21 itens, cada um com
quatro alternativas. Sendo que o grau mais alto significa maior comprometimento,
isto é, um quadro depressivo grave. Esta graduação apresenta um escore de 0 a 3.
Os itens do BDI se referem a: tristeza, pessimismo, sentimento de fracasso,
insatisfação, culpa, punição, auto-aversão, auto-acusação, idéias suicidas, choro,
irritabilidade, retraimento social, indecisão, mudança na auto-imagem, dificuldade de
trabalhar, insônia, fadiga, perda de apetite, alteração de peso, preocupações
somáticas e perda da libido. Na versão em português, esta apresentação é
semelhante.
Com as respostas de inclusão ou exclusão destes itens, é possível obter o
padrão sintomático do respondente, ou seja, o foco das queixas está centrado na
dimensão somática, cognitivo-afetivo ou de desempenho.
A classificação do manual mostra que para a avaliação da depressão,
considera-se a pontuação de 0-11 para a presença de intensidade mínima de
transtorno depressivo; 12-19 com grau leve; 20-35 com manifestação moderada e
de 36-63 com uma condição depressiva grave. O escore total é o resultado da soma
dos escores individuais dos itens apresentados. Com o resultado é possível a
classificação de níveis de intensidade da depressão. Na versão brasileira foram
desenvolvidos outros estudos, sendo que alguns ampliaram a faixa etária e incluíram
indivíduos com 12 a 17 anos e de terceira idade também (CUNHA, 2001).
37
2.1.8.2 BAI - Inventário de Ansiedade
O BAI foi criado em 1988, também por Beck e seus colaboradores. Foi
elaborada com base em vários instrumentos de auto-relato e que eram usados no
CCT quando se desejava mensurar aspectos da ansiedade.
Esta escala tem ampla utilização, uma vez que, é consistente e a demanda é
alta. Geralmente a ansiedade é uma emoção sintomática comum entre os seres
humanos.
O nível de correlação estimado varia conforme as escalas de aplicação,
exemplificando: a comparação com as escalas de Hamilton. Porém, existe uma
tendência a apresentarem uma relação substancial entre ansiedade e depressão.
O BAI foi construído para medir sintomas de ansiedade, que são
compartilhados de forma mínima com os de depressão” (CUNHA, 2001).
A versão em português foi usada com sobreviventes psiquiátricos ou não e na
população geral. Os dados sobre fidedignidade e validade são amplamente
satisfatórios.
É uma escala de auto-relato que mede a intensidade de sintomas de
ansiedade. Com 21 itens que devem ser avaliados pelo indivíduo com referência a si
mesmo, numa escala de 4 pontos, com escore de 0 a 3. Ele representa os níveis de
gravidade crescente de cada sintoma.
A classificação do manual mostra que para a avaliação da ansiedade,
considera-se a pontuação de 0-10 para a presença mínima de um transtorno de
ansiedade; 11-19 com intensidade leve; 20-30 com manifestação moderada e de 31-
63 com uma condição ansiógena grave (CUNHA, 2001).
O escore total é a soma dos escores individuais dos itens apresentados. Com o
resultado é possível a classificação de níveis de intensidade da ansiedade.
2.1.9 Karnofsky
A Escala de Desempenho de Karnofsky - KPSS (Karnofsky Performance Status
Scale) foi elaborada para medir o nível de atividade do sobrevivente e sua
necessidade de cuidados médicos. É uma medida geral que mostra o padrão de
independência do sobrevivente (YATES, 1980).
38
Foram descritas em 1948 por Karnofsky e Burchenal (1980) como uma escala
numérica e na seqüência, tornou-se conhecida como Escala de Desempenho de
Karnofsky. Trata-se de uma escala unidimensional na qual o médico preenche sua
avaliação relativa ao desempenho físico do sobrevivente, em uma escala de 0 a 100.
Indicada para sobreviventes com idade igual ou superior a 16 anos de idade.
Este instrumento é de uso comum nas avaliações de QV em sobreviventes
com câncer que participam de experimentos clínicos. A mesma mede o desempenho
do sobrevivente na participação de atividades físicas, cujo critério é unidimensional.
A escala é composta por pontos. O índice de alta atividade vale cem pontos
enquanto que o zero representa morte
A Escala de Desempenho de Karnofsky apresenta algumas vantagens: a) é
familiar para muitos clínicos; b) muitos investigadores a escolhem, de modo que
informações normativas estejam disponíveis e comparações cruzadas em estudos
sejam possíveis; c) faz parte do protocolo de avaliação do Registro Internacional de
Transplante de Medula Óssea – IBMTR.
O Serviço de Transplante de Medula Óssea do Hospital de Clínicas realiza
rotineiramente a avaliação do desempenho físico por meio dessa escala, uma vez
que, está vinculado ao IBMTR. Existem algumas desvantagens, as quais são: a) é
uma medida de uma única dimensão da QV (desempenho físico); b) é um escore
determinado pelo médico, não refletindo a percepção do sobrevivente sobre a QV
(PADILLA, 1985).
O escore baixo na Escala de Desempenho de Karnofsky foi fortemente
associado com morte dentro de um período curto de tempo. Conforme Yates et al
(1980) do seu estudo apenas um individuo sobreviveu mais do que seis meses,
entre aqueles que tinham menos que 50 de índice. Quando se observa uma
associação entre respostas positivas no tratamento e o aumento no escore, isso
pode ser considerado como uma medida objetiva de eficácia da intervenção.
Em relação à exatidão do escore como preditor da morte, a Escala de
Desempenho de Karnofsky mostra que um escore alto nem sempre significa uma
garantia de longa sobrevivência, pois o sobrevivente pode deteriorar com
subseqüente morte em poucos meses, apresentando queda rápida no escore. O
resultado tem considerável validade como indicador global da condição funcional do
sobrevivente com câncer e de outras doenças crônicas, mas não como um
sinalizador específico da morte (YATES et al., 1980).
39
A confiabilidade e a validade desta escala foram analisadas por dois caminhos.
Comparou-se o desempenho dos sobreviventes em casa e na clínica por uma
enfermeira e uma assistente social. Os resultados mostraram que é possível obter
uma avaliação do status do sobrevivente, por meio de vários profissionais.
A validação da Escala de Desempenho de Karnofsky ocorreu pela verificação
de forte correlação dos resultados com algumas variações relacionadas ao
funcionamento físico. Esta escala evidencia validade, confiabilidade e simplicidade.
Assim, é útil como critério clínico para avaliar sobreviventes com câncer e também
para outras doenças crônicas com resultados fatais (YATES et al., 1980).
Apesar de limitar a avaliação no campo do físico, é um instrumento que tem o
seu valor porque é objetivo e dá um parâmetro palpável da presença ou não de
sinais da doença. Enquanto que a QV é o resultado de uma percepção subjetiva.
Assim, é possível ter informações objetivas e subjetivas, conseqüentemente,
podendo discriminar a interferência do psiquismo na condição real de saúde e vice e
versa.
Os instrumentos escolhidos para o protocolo desse trabalho têm uma boa
aceitação no meio nacional e internacional em decorrência de demonstrarem clareza
de formulação das questões, adequação e suficiência das opções de respostas,
instruções de fácil compreensão, coerência seqüencial nas transições das
dimensões temáticas, ou seja, de cada área abordada na investigação e do registro
da subjetividade do indivíduo. Os instrumentos são auto-aplicativos.
Para a elaboração do protocolo levou-se em consideração o registro na
literatura de trabalhos anteriores, em outras populações e com resultados fidedignos
(CELLA et al 1995; MCQUELLON, 1997, 1998; ROWLAND, 1997; STEWART, IN
WHEDON 1997; WINSTEAD, 1997; SLOAN et al., 1998; KOPP et al., 2005;
JACOBS et al., 2007).
Como visto, este capítulo transitou pelo caminho histórico da inserção do tópico
de QV, em seguida, trouxe a polêmica composição conceitual, a construção
metodológica e finalizou com uma descrição do material utilizado no estudo vigente.
Percebe-se que a pesquisa sobre QV representa variedades metodológicas,
conceituais e de subjetividade. Entretanto, seu conhecimento é fundamental, pois a
sua compreensão viabiliza atender o sobrevivente conforme a perspectiva dos
sobreviventes e não apenas pela ótica do pesquisador e ou do clínico que o
acompanha.
40
2.2 TRANSPLANTE DE CÉLULAS-TRONCO HEMATOPOÉTICAS
Esperança é uma das virtudes mais precoces e indispensáveis.
Se a vida tem que ser suportada,
a esperança deve permanecer nas situações
em que a confiança está ferida e a fé prejudicada.
Erik Erikson
2.2.1 Mitologia e História sobre Transplantes
O transplante ainda hoje é considerado como um tratamento de custo
biopsicossocial alto, uma vez que ocorrem comorbidades secundárias, seqüelas e
mortes. É uma intervenção que envolve não só o sobrevivente, mas também o
doador, a família e a sociedade. Porém, apesar dos riscos e comprometimentos, por
meio dele é possível obter a cura e construir uma nova vida com qualidade e
dignidade.
Mas qual a base histórica desta intervenção tão complexa?
A idéia de substituir um órgão doente por um saudável de outra pessoa viva ou
morta é com certeza um dos eventos marcantes do século XX. Porém, esta
impressionante aventura é o resultado de inúmeras pesquisas coordenadas por
naturalistas, fisiologistas, cirurgiões e biologistas com diferentes enfoques.
Nas civilizações antigas, o homem já imaginava realizar alterações funcionais e
estruturais do corpo humano. Esse fato pode ser constatado por meio das imagens
mitológicas de deuses, demônios, centauros que trazem uma junção de corpos de
diferentes animais, tal como a sereia. Contudo, isso faz parte do mundo imaginário.
Essa mitologia híbrida tem saído, porém, do mundo fantástico e adentrado nas
tentativas reais.
A mitologia
2
e as lendas também consideravam a idéia do transplante como se
percebe no seguinte relato: Zeus, certa ocasião costura a criança Dionisio dentro da
coxa de Semela, para permanecer ali, até o tempo de ele nascer (KUSS e
BOURGET, 1992). Esse é o prenúncio do transplante embrionário; mas apenas hoje
se conhece a capacidade de adaptação do enxerto no receptor. Outro exemplo do
2
Mythos: narrativa de significação simbólica, geralmente ligada à cosmologia, e referente a deuses que encarnam as forças da
natureza e (ou) dos aspectos da condição humana.
41
conceito de enxerto aparece na história mitológica que menciona o combate de Zeus
e o gigante Typhon. A mitologia narra que o gigante quase o destruiu com os cortes
dos tendões das mãos e dos pés. Hermes, deus da saúde, encontra os tendões
escondidos na pele do urso, assim, coloca-os de volta no lugar. O deus do Olímpio
então recuperou o seu poder e arremessou o gigante para baixo da colina Etna.
Nesta lenda, fica explícito o resultado favorável de um enxerto (KUSS e BOURGET,
1992).
Outro exemplo registrado é o de San Pietro. Ele foi ao cemitério e trouxe uma
perna de um homem morto e em seguida cortou a perna de um doente. Na
seqüência, enxertou a perna do morto naquele sobrevivente e cuidadosamente
ungiu e esfregou. Quando o doente acordou não sentiu dor, tocou e viu sua perna
sem os sinais de doença; pensou não ser ele mesmo, que tinha se tornado outra
pessoa. Quando finalmente recupera a sua consciência, sai da cama e conta para
todo mundo o que havia acontecido com ele enquanto dormia e como foi curado.
Conseqüentemente este fato “milagroso” criou um movimento intenso na
comunidade cristã (KUSS e BOURGET, 1992).
A mitologia e as lendas gradativamente foram abrindo espaço para as
tentativas reais. Iniciam-se, então, os experimentos no mundo vegetal.
Até o século XII a técnica da aplicação de enxerto foi referenciada pela palavra
greif, derivada da Grécia. No século XVI, este termo foi substituído para enxerto
graft, definido como crescimento de um fragmento inserido dentro de outra planta.
Na época, para entender o processo do enxerto, eles se basearam na observação
da natureza. Os cientistas pesquisavam porque tinham um objetivo bem prático.
Eles queriam obter um aumento quantitativo e qualitativo da produção de frutas
e flores (KUSS e BOURGET, 1992).
Nos experimentos empíricos do percurso da história dos enxertos com plantas
faziam aplicações por meio de vários métodos para assegurar a junção das
superfícies das plantas. Usavam plantas da mesma espécie ou família. Por exemplo:
cereja x cereja silvestre; marmelo e pêra.
Apesar de todos os cuidados, aconteciam rejeições precoces e tardias. Mas
também ocorriam simbioses entre plantas de espécies diferentes, resultando na
‘quimera’, ou seja, no desenvolvimento de um ‘universo imunológico’ diferenciado,
como ocorreu em Florença no ano de 1644 por meio da quimera da fruta laranja-
limão.
42
No século XVIII, houve um encaminhamento das pesquisas científicas e dos
princípios do enxerto em direção ao mundo animal.
Em 1744, o cientista Trembley divulgou o primeiro experimento de transplante
em animais. Ele observou hidras de água doce que pertenciam à família de zoófilo e
percebeu que duas porções de pólipos, ao se tocarem, espontaneamente se uniam.
Anteriormente, havia constatado este fenômeno nas plantas. Entretanto, verificou
que as hidras de cores diferentes foram ‘incompatíveis’. Wetzel utilizou este
conhecimento e mais tarde diferenciou os enxertos em compatíveis e incompatíveis.
(KUSS e BOURGET, 1992).
Bonnet simultaneamente confirma esses achados, mediante a experiência
realizada com minhocas. Por intermédio de suturas cirúrgicas obteve dois ou três
vermes que se regeneraram como acontecia com o broto que nascia de uma
ramificação.
O fisiologista e naturalista Duhamel du Monceau em 1746, conduziu pesquisas
tanto no campo da botânica como na zoologia. Ele foi o primeiro cientista que inseriu
o termo ‘enxerto animal’. Mais tarde, em 1749, realizou com sucesso o transplante
de esporas de aves. Retirava a espora e transplantava no lugar da crista do mesmo
galo ou de outro. A espora foi selecionada como doador, por ter um grande potencial
regenerativo, devido ao abastecimento sangüíneo (KUSS e BOURGET, 1992).
Posteriormente, Boronio (1759-1811), também escolheu a crista de galo para
implantar nas asas de um canário e no rabo de um gato.
Hunter, pai da cirurgia britânica científica, em 1767 implantou dentes de
cadáveres humanos em receptor humano. O resultado foi considerado de sucesso.
No século XIX muitas formas de enxertos foram experimentadas, com vários
tipos de tecidos e com toda espécie disponível de animais. Magendie (1782-1855) e
Bernard (1813-1879) foram dois pesquisadores de grande importância para a ciência
do transplante, por terem estudado a fisiologia e as possíveis implicações
terapêuticas (KUSS e BOURGET, 1992).
Entre fracassos e acertos parciais, os experimentos foram avançando. Assim,
em 1869, Reverdin realizou o primeiro enxerto de pele com bom resultado, no ser
humano. Ele escolheu a epiderme, porque havia observado que nas situações de
traumas, úlceras, feridas e queimaduras, a pele cicatrizava a partir das
extremidades.
43
Houve um entusiasmo entre os cirurgiões da Europa e dos EUA, assim, faziam
todo tipo de enxerto, inclusive neles próprios. Não havia conhecimento sobre o
transplante autogênico e o alogênico. Desse modo, a mortalidade era alta e, muitas
vezes, a responsável por este resultado nefasto era a infecção. Mesmo assim, as
pesquisas avançavam e, no final do século XIX, o desenvolvimento dos enxertos de
pele viabilizou as cirurgias plásticas e de reconstituição. Esse investimento trouxe
conhecimentos importantes sobre os mecanismos da imunogenética e sobre o
controle dos enxertos em geral.
O transplante de córnea foi tentado por Reisneger (1877) e por Power (1878),
realizadas com córneas removidas de defuntos. Outras aplicações foram indicadas
para realizar transplantes com ‘falsos enxertos’, isto é, de cadáveres (KUSS e
BOURGET, 1992).
No campo dos “enxertos verdadeiros”, incluíam as transfusões de sangue de
células sangüíneas vermelhas, que continuavam vivas no plasma daquele que
recebia.
2.2.2 História Sobre o Transplante de Células-Tronco Hematopoéticas
O conhecimento sobre a função da medula óssea tem menos de dois séculos e
a exploração científica em relação aos transplantes tem seu percurso na última
metade do século XX, aproximadamente, pois as tentativas para o uso terapêutico
da medula iniciaram-se em 1939 (OSGOOD, RIDDLE e MATHEWS, 1939;
MORRISON e SAMWICK, 1940).
O contexto da Segunda Guerra Mundial trouxe muita dor e atrocidades, mas,
também, possibilitou inúmeros experimentos que auxiliaram no avanço do
conhecimento científico. Todo o horror da guerra, o caos da crise propiciou
aprendizagens positivas, apesar do sofrimento instalado na época.
A imagem da guerra pode servir de analogia para a situação particular de cada
sobrevivente que se submete ao transplante: começa igualmente com um grande
susto, vem o caos, as conseqüências sofridas e finalmente a morte ou o
renascimento com o aproveitamento de tudo que esta vivência permite.
Pensando nos acontecimentos globais ou específicos, constata-se que os
ganhos conquistados são provenientes de muita persistência, apesar da presença
44
de uma série de fracassos. Em 1949, ainda ocorriam falhas na tentativa de
restabelecer a função medular mediante a infusão intravenosa das células
sangüíneas.
Contudo, apresentavam sucesso na experiência com animais que recebiam
radiação. Verificaram que, apesar da radiação, houve efeitos de proteção em
relação ao baço e isto possibilitou a sobrevivência dos camundongos do estudo.
Observaram efeitos similares de proteção na infusão de células da medula óssea
(JACOBSON et al., 1949).
Em 1954 os resultados de sobrevida de camundongo perduraram até pouco
mais de 100 dias. A diferença neste sobrevivente foi à infusão de células singênicas,
ou seja, foi considerada a compatibilidade dos grupos de doadores, resultando na
maior tolerância e aceitação do enxerto. Mas apenas em 1956 conseguiram
confirmar que, após a radiação e infusão de células-tronco do doador, estas
proliferavam no sobrevivente (THOMAS, 2004).
Essa descoberta foi um marco importante, uma vez que, a partir deste ponto,
iniciou-se o uso do transplante de medula óssea com o objetivo de melhorar as
condições de aplasias medulares, leucemias e outras doenças.
Assim, em 1957 os estudos não se limitavam mais aos animais de outras
espécies. Seis sobreviventes foram tratados com radiação e infusão intravenosa de
medula de um doador normal. Em 1970 já havia o registro de duzentas tentativas de
transplantes, mas todos foram sem sucesso prolongado. Nesse período também
aconteceram os primeiros transplantes do tipo autólogo (THOMAS, 2004).
Devido às dificuldades encontradas e os resultados infrutíferos entre os
humanos, muitos pesquisadores retomaram as pesquisas com animais. No curso
dos estudos descreveram uma síndrome, denomina em inglês como Syndrome of
Runt Disease. Esta acontecia naqueles que recebiam células alogênicas e sua
manifestação era similar a uma doença secundária. Porém, quando as células eram
provenientes de doador singênico, não ocorria esta reação (THOMAS, 2004).
Esses acontecimentos demonstraram a existência de uma reação do enxerto
contra o hospedeiro. No entanto, primeiro é preciso haver uma pega medular, para
posteriormente ocorrer o desenvolvimento da reação sindrômica.
A severidade e incidência da doença foram determinadas pelos antígenos
diferentes entre doador e receptor. Por isso, o conhecimento dos antígenos Human
Leukocyte Antigens (HLAs) é essencial neste procedimento.
45
Além disso, avanços nos conhecimentos complementares (melhorias nas
transfusões, tratamentos mais efetivos das infecções, compreensão da importância
dos antígenos) contribuíram para a ampliação das pesquisas.
Em 1977 um grupo de Seattle apresentou os progressos obtidos em 100
sobreviventes com leucemia que se submeteram ao transplante alogênico, desses
13 tornaram-se sobreviventes de longa data. Em 1979, foi descrito que
sobreviventes na primeira remissão tinham resultados superiores e
aproximadamente 50% sobreviveram por longo período.
Na seqüência descobriram que, por vezes, a manifestação dos componentes
linfócitos no enxerto medular resulta num benefício para o sobrevivente. Isto porque,
os linfócitos podem apresentar uma reação de ataque em relação às células
malignas do sobrevivente, pois a função da defesa imunológica existente no enxerto
está intacta. Conseqüentemente, este ataque possibilita a erradicação destas
células indesejáveis. Sendo assim, quanto mais severa a doença do enxerto contra
o hospedeiro – DECH, menor a probabilidade de recaída da leucemia. Para explicar
esta manifestação, isto é, a possibilidade de elementos linfóides no enxerto e sua
reação salutar no sobrevivente, Mathé em 1959 cunhou o termo “imunoterapia
adotada” (THOMAS, 2004).
Ainda em 1979, ocorreu o primeiro transplante de medula com doador não
aparentado, num sobrevivente com leucemia. Essa experiência motivou a
constituição do National Marrow Donor Program.
Nesse mesmo ano, no Brasil, o Hospital de Clínicas de Curitiba-Paraná tornou-
se o pioneiro em transplante de medula óssea, tendo como mentores e
organizadores os pesquisadores Ricardo Pasquini e Eurípedes Ferreira ao
realizarem o primeiro transplante de medula óssea em um paciente com diagnóstico
de Anemia Aplásica.
Os transplantes subseqüentes apresentaram resultados significativos. A partir
dos anos de1980 novos tipos de fontes de células-tronco hematopoéticas para a
infusão foram conquistados. Assim, os transplantes de cordão umbilical e do sangue
periférico já compunham uma parte da rotina. Devido à diversificação da fonte
celular, os transplantes passaram a ser inclusos na terminologia Transplante de
Células-Tronco Hematopoéticas, por ser abrangente.
46
Ainda nessa década foram implantados os regimes não mieloablativos, ou seja,
o sobrevivente recebe um condicionamento de menor impacto em relação à
toxicidade, durante o processo do transplante.
Também nesse período, em 1981, se realizou o primeiro transplante em uma
criança com diagnóstico de mucopolissacaridose. É uma doença autossômica
recessiva causada por uma deficiência enzimática, conhecida como Síndrome de
Hurler (GUTIÉRREZ-SOLANA, 2006).
Na década de 1990, as tentativas de transplante em crianças com doenças
decorrentes de erros congênitos do metabolismo começaram a demonstrar alguma
eficácia com a substituição enzimática. Essas doenças são progressivas e muitas
afetam o sistema nervoso central. Além disso, um mesmo defeito enzimático pode
manifestar-se em idades distintas e também pode expressar uma atividade
enzimática residual diferente (GUTIÉRREZ-SOLANA, 2006).
Em 1998, o Serviço de Transplante de Medula Óssea do Hospital de Clínicas
de Curitiba-Paraná completou a realização de mil transplantes. Sendo que, desses,
aproximadamente 60% são sobreviventes. Até Junho de 2007, esse serviço tem
registrado em seu banco de dados 1.803 transplantes realizados.
Uma vez que o Serviço de Transplante de Medula Óssea do Hospital de
Clínicas de Curitiba pertence a uma instituição pública que enfrenta as dificuldades
inerentes a entidades com essa característica, há uma fila de espera para a
realização do transplante de células-tronco hematopoéticas, com cerca de 130
sobreviventes. Calculando uma média de trinta dias de hospitalização, subentende-
se que a espera pode estender-se para aproximadamente três anos, em relação aos
sobreviventes com hemopatias malignas. Devido à demanda reprimida, isto é, a
sobrecarga de candidatos ao transplante, muitas vezes, ao internar-se, o
sobrevivente está na segunda ou terceira remissão, diminuindo o percentual de
sucesso.
É de extrema importância o rápido atendimento dos pacientes com diagnóstico
de Anemia Aplásica e de Fanconi, por serem doenças que geralmente causam
síndromes hemorrágicas e (ou) infecções. A demora no atendimento desses
pacientes pode determinar uma queda no funcionamento diário ou mesmo à morte.
A recaída e a sobrevida tardia para transplante de células-tronco
hematopoéticas dependem de alguns fatores, tais como: tipo da doença e de
transplante, sua maior ou menor comorbidade, compatibilidade, idade e sexo.
47
Apesar de todas as dificuldades pertinentes ao cenário de um hospital público,
o Serviço de Transplante de Medula Óssea do Hospital de Clínicas da Universidade
Federal do Paraná conquistou um lugar de respeito científico, não só pela conduta
ética, mas também pela produção de conhecimentos científicos e resultados de
sucesso em muitas das inúmeras intervenções aplicadas.
Atualmente, estão sendo realizados transplantes em crianças que são
diagnosticadas com doenças metabólicas, com imunodeficiências e anemia de
Fanconi. Os resultados são promissores e a amostra é maior em termos da América
Latina.
O STMO-HC-UFPR não se limita a estas doenças, atividades e profissionais. A
equipe é multidisciplinar e interage não só no campo da assistência, mas também no
ensino e pesquisa.
Hoje no Brasil existem vários centros de transplantes que estão distribuídos em
estados estratégicos, tais como: Paraná, São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do
Sul, Pernambuco, Bahia, entre outros.
Mundialmente acontecem de 30 a 40 mil transplantes de células-tronco
hematopoéticas. Não só o número de transplantes aumentou por ano, mas também
seus resultados de cura têm apresentado um acréscimo de 10% por década.
(WINNIE et al., 2003).
Esses resultados decorrem de conquistas tecnológicas e científicas, dentre as
quais podem ser citadas: avanços de conhecimentos sobre compatibilidade do
doador e receptor; refinamento na preparação do enxerto de células-tronco; regimes
de condicionamentos seguros; novas tecnologias no banco de sangue; regimes de
imunossupressão mais efetivos; novas drogas, entre outras conquistas.
O número atual de sobreviventes possibilita uma análise estatística confiável e
a comparação com grupo controle tem qualificado os resultados e contribuído para
que os profissionais da área de saúde ampliem os conhecimentos.
Conseqüentemente estão aptos a dar sugestões sobre a melhor intervenção para
cada doente e não apenas para cada doença.
Esses achados suscitam um comportamento reflexivo na condução de novos
estudos para melhor discernir quando indicar o transplante de células-tronco
hematopoéticas, apesar das conquistas obtidas, pois o transplante em si pode se
converter em um marco referencial na vida do indivíduo.
2.2.3 Conceito e Peculiaridades
48
O transplante de células-tronco hematopoéticas é um processo altamente
adverso que necessita de procedimentos técnicos avançados, conhecimentos
científicos e sensibilidade no manejo clínico. Stelmatchuck e colaboradores (2004)
definem transplante de células-tronco hematopoéticas como:
O transplante de células-tronco hematopoéticas é a infusão intravenosa de células
progenitoras hematopoéticas, destinadas a restabelecer a função medular e imune em
pacientes com uma série de desordens malignas e não-malignas, herdadas ou adquiridas. O
objetivo do transplante é substituir as células-tronco da medula óssea doente ou destruída por
células-tronco normais de um doador administradas no paciente (receptor) após o tratamento
com altas doses de quimioterapia e às vezes radiação, dependendo do tipo de
condicionamento escolhido.
Antes da infusão de células-tronco, as células são destruídas pela ação do
regime de condicionamento, o qual geralmente é uma composição processual de
quimioterapia e radioterapia. As células sangüíneas enxertadas substituirão as
células originais e proliferarão no centro esponjoso dos ossos.
Transplante alogênico é uma infusão de células-tronco hematopoéticas que
envolve duas pessoas. O receptor, aquele que recebe e o doador, aquele que doa
células-tronco. Pode haver como fonte, as células sanguíneas da medula ou do
cordão umbilical ou placenta ou, ainda, sangue periférico. No paciente do
transplante autólogo, as células sangüíneas são do próprio paciente, ou seja, ele é
doador dele mesmo.
Contudo, os resultados mostram ainda que nem sempre a cura vem
acompanhada de um resgate da saúde. Algumas das possíveis comorbidades são:
infecções, toxicidade em órgãos e tecidos normais, recaídas e a grande
probabilidade de desenvolver neoplasia secundária anos mais tarde.
Além disso, com o transplante alogênico aparentado ou não-aparentado, após
a sua pega pode ocorrer uma rejeição em relação ao enxerto infundido. Esse
fenômeno recebe a denominação de Doença do Enxerto contra o Hospedeiro –
DECH.
Essa doença é o resultado de um desequilíbrio imunológico que pode ter uma
manifestação aguda ou crônica. Quando ocorre a doença do enxerto crônica,
dependendo do grau de complicação recebe a classificação de limitada ou extensa.
49
Mas, se for considerada a severidade, pode ser categorizada como leve,
moderada ou severa. No paciente da DECH- agudo é classificada como grau I até o
grau IV.
Quando a DECH é do tipo limitado significa que a pele está envolvida e (ou) há
disfunção hepática também. Se a manifestação for classificada como extensa, então
a pele tem um prejuízo generalizado, o fígado pode apresentar cirrose e há
alteração nos olhos e glândulas salivares (oral, mucosa, labial).
Quando a DECH registra severidade leve, isto significa que não interfere
substancialmente no funcional. Verificam-se apenas alguns sintomas ou sinais do
DECH-c. Mas, se for classificada como moderada, há interferência no funcional e é
preciso usar a primeira linha sistêmica de terapêutica. No paciente com
manifestação severa, há uma limitação substancial e a indicação é a segunda linha
sistêmica de terapêutica.
O transplante de células-tronco hematopoéticas é curativo para um grande
número de hemopatias malignas, falhas da função medular e uma variedade de
síndromes imunodeficientes.
Cada doença é definida como uma entidade específica conforme a sua
morfologia, clínica e características biológicas. A citogenética, imunofenotipagem e a
genética molecular têm um papel importante na elaboração diagnóstica.
Algumas seqüelas psicológicas também podem se apresentar, em decorrência
da ameaça real e simbólica da possibilidade da morte e da comorbidade no
processo do transplante.
A interferência antecede a concretização do transplante, em função dos
precursores do tratamento, da alteração na rotina de trabalho, na escola e no lar. Os
papéis familiares, sociais e profissionais também sofrem mudanças; além das
possíveis dificuldades financeiras e o aumento dos níveis de ansiedade, transtornos
de humor, fadiga e labilidade emocional.
Para finalizar, é interessante comentar que o relato da mitologia e da história
dos enxertos para transplantes teve como objetivo demonstrar que o desejo, os
estudos e experimentos dos séculos passados serviram de base para os
pesquisadores contemporâneos.
Se os precursores tivessem desistido diante dos desconhecimentos, das
dificuldades, da mortalidade, hoje milhares de pessoas não teriam se beneficiado
50
com a intervenção decorrente dos diversos tipos de transplantes realizados no
campo da Medicina.
Eles acreditaram, persistiram e estudaram com afinco e seriedade científica.
Assim, entre os ensaios e erros, possibilitaram o conhecimento necessário, para
neste século termos o transplante como uma das principais aventuras científicas de
sucesso. Assim, neste cenário promissor, hoje também se faz história por meio do
transplante de células-tronco hematopoéticas e das novas descobertas sobre os
genomas.
2.2.4 Descrição Geral dos TCTH do STMO da UFPR-HC
2.2.4.1 Tipo de Transplante
O Serviço de Transplante de Medula Óssea do Hospital de Clínicas de Curitiba
vem realizando transplante de células tronco-hematopoéticas, desde outubro de
1979. De acordo com informações do banco de dados do STMO-HC, foram
registrados 1803 transplantes, até junho de 2007. A Tabela abaixo demonstra uma
distribuição representativa conforme o tipo de transplante. Realizaram 1528
(84,74%) transplantes alogênicos, distribuídos entre aparentado, singênico e não-
aparentado.
TABELA 1: DISTRIBUIÇÃO DOS PACIENTES DE ACORDO COM O TIPO DE
TRANSPLANTE DE CÉLULA-TRONCO HEMATOPOÉTICA
Ti
p
o de Trans
p
lante N %
A
lo
g
ênico
parentado 1240 68,8
Sin
g
ênico 12 0,7
Não aparentado 276 15,3
Total 1528 84,74
A
utólo
g
o 127 7,0
Retransplante 148 8,2
Total 1803 100
FONTE: Banco de Dados do STMO-HC-UFPR
51
2.2.4.2. Fonte das Células-Tronco Hematopoéticas
A Tabela 2 apresenta a distribuição dos pacientes de acordo com a fonte das
células-tronco hematopoéticas. Os resultados mostram que 1536 (85,2%) dos
transplantes tiveram como fonte celular a medula óssea.
TABELA 2: DISTRIBUIÇÃO GERAL DA FONTE DAS CÉLULAS-TRONCO HEMATOPOÉTICAS
Fonte N %
Medula óssea 1536 85,2
Cordão umbilical 152 8,4
Sangue periférico 112 6,2
Medula óssea mais san
g
ue periférico 03 0,2
Total 1803 100
FONTE: Banco de Dados do STMO-HC-UFPR
Enfim, com a intervenção do transplante, abre-se uma possibilidade de cura
para sobreviventes com leucemia, linfomas, anemia aplásica severa, doenças
metabólicas entre outras enfermidades. Contudo, os riscos estão presentes, mas os
ganhos também. Tema desenvolvido no tópico a seguir: Transplante de Células-
Tronco Hematopoéticas e as Relações de Conhecimento com a Qualidade de Vida.
52
2.3 TRANSPLANTE DE CÉLULAS-TRONCO HEMATOPOÉTICAS E AS
RELAÇÕES DE CONHECIMENTO COM A QUALIDADE DE VIDA
“Assim como não é apropriado curar os olhos
sem a cabeça, nem a cabeça sem o corpo,
também é inapropriado curar o corpo sem curar a alma”.
Sócrates
2.3.1 QV um Termômetro Pessoal na Experiência do TCTH
Este capítulo recolhe algumas informações sobre a interferência do transplante
na qualidade de vida e nas variáveis afins.
O intuito é mostrar quão específico é este processo e demarcar as perdas e os
ganhos significativos que sucessivamente acontecem durante o percurso vivenciado
pelo doente até a sua transformação em sobrevivente de longa data.
O transplante é um desafio e um divisor de águas, que delimita um antes e um
depois. Porém, e com o passar dos anos, o que se soma? São apenas anos ou vida
com qualidade e dignidade?
Tendo presente essa questão, a proposta deste estudo é investigar o valor dos
resultados desta intervenção depois de um longo tempo.
Qualidade de vida é um termo muito usado, principalmente quando o que está
em jogo é: saúde, economia, capacidades e meio ambiente. No entanto, o conceito
está diretamente relacionado com o indivíduo, pois cada um tem a sua própria
interpretação e percepção. Sendo assim, dependendo de quem fala, a QV pode ser
harmonia na família, saúde, emprego, amigos ou conseguir ter a casa e o carro dos
sonhos. Conforme os desejos, as expectativas, os objetivos, as necessidades e as
preocupações a QV recebe uma definição.
O conceito elaborado pela OMS abrange áreas como: saúde, estado
psicológico, nível de independência, relacionamento social e o meio ambiente em
que está inserido.
Mas o que e como falar de qualidade de vida quando o indivíduo recebeu um
diagnóstico de alguma neoplasia? E que, além disso, se submeteu a um transplante
de células-tronco hematopoéticas?
Provavelmente, nesse contexto a qualidade de vida é ameaçada. Mesmo que
seja em graus diferentes, sempre existe uma ameaça. Por isso, o momento fica
permeado pelas incertezas.
53
Na atualidade, a busca de condições favoráveis para a evolução de uma boa
QV tem sido um dos objetivos principais no planejamento de um protocolo clínico. A
importância é maior ainda quando o transplante passa a ter uma possibilidade de
cura e de sobrevivência longa.
2.3.2 Interferência da Subjetividade na QV dos Sobreviventes do TCTH
Em relação à QV e ao adoecimento, sabe-se que os recursos pessoais do
sobrevivente têm interferência no enfrentamento da doença e do tratamento. Pois,
se tiver condição favorável, como: satisfação nos relacionamentos interpessoais,
estabilidade emocional, condições financeiras e sociais convenientes, isto propicia a
superação do quadro ou do resgate das condições de saúde que existiam antes do
aparecimento da doença. Porém, esta é uma tarefa árdua, contínua e nem sempre
bem-sucedida.
No entanto, não apenas as condições externas precisam ser averiguadas, mas
também as características que envolvem emoções, sentimentos e pensamentos,
pois são variáveis que possibilitam uma baixa na defesa imunológica, como
acontece nos transtornos de humor, por exemplo.
Maruta e colaboradores (2000) investigaram mais de mil sobreviventes e
concluíram que aqueles que manifestavam um estilo de vida mais pessimista, em
geral, evoluíram para a morte, enquanto os otimistas apresentaram um aumento na
sobrevida. Porém não lhes foi possível definir os reais motivos que fazem do
pessimismo um fator de risco para o óbito precoce.
Quiçá esteja relacionado com o fato de que os sobreviventes otimistas
apresentam uma atitude mais ativa em relação aos cuidados clínicos. Procuram
ajuda médica e demonstram uma tendência menor aos sentimentos de culpa e aos
pensamentos derrotistas.
Outro trabalho que corrobora com a opinião de Maruta e colaboradores (2000)
é o de Wenzel et al, (2002). Eles avaliaram a QV dos sobreviventes e verificaram
que aqueles que vivenciavam um bem-estar espiritual apresentaram atitudes
positivas associadas com o crescimento pessoal e a saúde mental. Já a
negatividade estava vinculada a um declínio da condição de saúde.
54
Os sobreviventes que tinham uma postura de hesitação e que não
demonstravam um enfrentamento da doença sentiam mais medo da evolução
diagnóstica e de recaídas.
Neste estudo também foi possível observar que os fatores de resiliência
contribuem positivamente para a conquista do bem-estar global.
Existem alguns fatores que interferem na conquista da longevidade e na QV
dos sobreviventes no pós-transplante, sendo: a) o estádio da enfermidade, a
severidade e agressividade da doença de acordo com a patologia e a evolução; b)
as condições dos sintomas físicos desde a falta de apetite, de energia, fadiga, dor,
diarréia, perda do cabelo, constipação, entre outras e de humor como irritabilidade,
preocupação e nervosismo.
Os sobreviventes com diagnósticos de neoplasias ou após tratamentos
agressivos têm consciência de um futuro incerto, com um potencial significativo de
problemas e receios. Assim, as intervenções terapêuticas de cuidados devem ser
realizadas simultaneamente com o processo do transplante, pois, pelo
restabelecimento das funções, alívio dos sintomas, inclusão de orientações e
atendimentos psicológico, social, ocupacional é possível contribuir para a melhoria
da QV.
Segundo Wingard (1998), algumas intervenções são indicadas para ampliar o
ajustamento psicossocial, entre elas: avaliar o estilo de enfrentamento do
sobrevivente, encorajar uma participação ativa no tratamento, amenizar a ansiedade
nas situações de crise ou de emergência mediante o suporte de apoio.
O ajustamento psicossocial é um fator de proteção para resultados promissores
em relação ao resgate do bem-estar global.
A inclusão de estudos sobre QV pode servir como caminho para avaliar as
conseqüências do transplante de células-tronco hematopoéticas.
A seguir serão descritas algumas pesquisas sobre os efeitos do TMO, algumas
das informações se compatibilizam e outras não. Assim, é possível demonstrar que
além dos resultados mensuráveis e visíveis existe a interpretação singular daquele
que experimenta os efeitos do processo do transplante.
Helder e colaboradores (2004) estudaram 22 jovens adultos que realizaram o
transplante na infância. No momento do estudo, todos tinham pelo menos 14 anos
de pós-transplante. O objetivo do trabalho foi avaliar a QV. Para tal, usaram os
instrumentos na forma reduzida Health Survey e o Functional Assessment of Cancer
55
Therapy-Bone Marrow Transplant Scale (FACT-BMT) (MASTROPIETRO et al.,
2007).
Em relação à QV, constataram que os sobreviventes estão dentro da média
normal de funcionamento, embora haja alguns prejuízos na questão de trabalho. Por
outro lado, emocionalmente estão muito bem, sem queixas significativas.
Concluíram que a idade em que o sobrevivente se submete ao transplante e a
radiação não são fatores de interferência negativa para a obtenção da QV.
Em outro estudo, Kopp e colaboradores (2005) avaliaram 34 sobreviventes que
fizeram transplante de células-tronco hematopoéticas, devido à neoplasia maligna,
há pelo menos cinco anos e compararam com um grupo controle (n=68), com
características demográficas semelhantes. Constataram baixa QV nos sobreviventes
em decorrência do funcionamento físico, social e econômico. Apesar disso, em
termos gerais os sobreviventes declararam que estão satisfeitos.
Com o objetivo de avaliar a QV, o nível de auto-estima e as preocupações
gerais, Langeveld e colaboradores (2004) analisaram 400 adultos que fizeram
transplante durante a infância, há 16 anos. Após a análise dos sobreviventes
compararam com um grupo controle (n=560), composto pela população geral sem
doença. Os resultados não mostraram diferença significativa entre o escore dos
sobreviventes e do grupo controle quando investigaram a variável auto-estima.
Porém, as mulheres manifestaram mais queixas sobre a doença em si do que os
homens.
Em geral, os sobreviventes se preocupavam menos do que o grupo controle,
quando a temática era a própria imagem e a morte. Mas se angustiavam muito com
os problemas da fertilidade, da aquisição de emprego e da aposentadoria, pois esta
nem sempre está assegurada pelas instituições governamentais.
Aparentemente, para as mulheres os efeitos colaterais tardios, problemas de
saúde e a perda da auto-estima são fenômenos que sugerem um prognóstico ruim
de QV. Além disso, foi significativa a preocupação dos sobreviventes em relação ao
tempo que eles têm de pós-transplante e ao desemprego.
Díez-Campelo e colaboradores (2004) investigaram 47 sobreviventes que se
submeteram ao transplante alogênico com um condicionamento de intensidade
reduzida e compararam com um grupo similar de sobreviventes, mas que fizeram
transplante do tipo autólogo.
56
Após um ano de transplante apresentaram condições muito favoráveis, sem
fraqueza e sem fadiga. Esse resultado satisfatório não é o comum para esse
período, entre os sobreviventes do transplante alogênico de células-tronco
hematopoéticas.
Esse mesmo grupo manifestou queixas de depressão, mas, quando
comparado com o grupo de autólogo, não foi significativo. Contudo, 45,2% dos
sobreviventes do grupo alogênico apresentaram ansiedade.
Apesar dos vários estudos sobre QV pós-transplante, os achados não
viabilizam uma definição conclusiva. Ocorre que há autores como Chao e col.
(1992), Bush et al, (1995), Hjermstad et al (1999), Kiss et al (2002), Worel, et al
(2002) e seus respectivos colaboradores em seus estudos apresentam resultados
que mostram boa recuperação física e funcional depois do transplante de células-
tronco. Por outro lado Baker et al (1999), Andrykowski (2005), Syrjala et al (2005),
Edman et al (2001), De Souza et al (2002) e colaboradores descrevem importantes
prejuízos, tais como: fadiga, disfunção psicológica, cognitiva e sexual.
Contudo, existem opiniões semelhantes quanto ao impacto negativo da DECH-
crônica e quanto ao fato de o transplante alogênico ser mais comprometedor do que
o transplante autólogo.
Syrjala e colaboradores (2005) avaliaram 137 adultos que se submeteram ao
transplante de medula óssea e compararam com um grupo controle com
características demográficas similares. Após 10 anos de transplante, os
sobreviventes apresentaram diferenças significativas para pior, em relação a:
fraqueza, cataratas, hepatite, problemas sexuais, restrição social, uso de
psicotrópicos, queixas de memória e atenção. Além disso, precisaram de mais
cuidado médico que o grupo controle. No entanto, não manifestaram diferenças
significativas quando foram comparados em relação ao aparecimento de
osteoporose, satisfação no relacionamento conjugal, condição de emprego, divórcio
e saúde psicológica.
Ness e colaboradores (2005) realizaram um estudo multicêntrico, por meio da
análise de 235 sobreviventes com algum diagnóstico de hemopatia maligna, e todos
tinham menos de 21 anos na época do TMO. Após dois anos da intervenção
concluíram que se submeter ao transplante em idade jovem interfere negativamente
no desempenho da rotina diária e nos relacionamentos interpessoais.
57
Deeg e colaboradores (1998) avaliaram 212 sobreviventes com AAS foram
acompanhados de 2 a 26 anos (média de 12 anos) após o transplante de medula
óssea alogênico. O grupo de sobreviventes tinha uma idade média de 32 anos. Os
resultados mostraram que 19% deles experimentaram depressão e precisaram de
psicoterapia ou tentaram suicídio.
Com dois anos pós-transplante 83% retornaram à escola e ao trabalho. Com
20 anos pós-transplante houve um aumento para 90%. A probabilidade de melhorias
tende a aumentar se não ocorrer a DECH-c. Metade dos sobreviventes está apta a
ter filhos, considera a QV muito boa e relata apenas sintomas leves.
Com 20 anos pós-transplante a probabilidade de engravidar foi de 47%,
enquanto para o homem a possibilidade de ser pai foi de 50% (variando de 29% se
teve DECH aguda ou crônica e 62%, caso não tenha ocorrido).
Dos sobreviventes que não desenvolveram DECH-c e que tinham menos de 18
anos de transplante, 95% retornaram para a escola ou trabalho. No sobrevivente da
ocorrência da DECH-c, a porcentagem caiu para 91%.
Dos sobreviventes que não desenvolveram DECH-c e que tinham 18 anos ou
mais de transplante, 86% retornaram para a escola ou trabalho. No sobrevivente da
ocorrência do DECH-c, a porcentagem caiu para 77%.
Existem complicações pós-transplante, tais como a síndrome do olho seco e o
ressecamento da pele. Essas queixas são freqüentes entre os sobreviventes que
tiveram DECH. Aquele que é acometido pela síndrome do olho seco pode
apresentar olhos vermelhos, irritados, dor, sensibilidade à luz e desconforto após
períodos de concentração.
Hayden (2004) selecionou uma amostra com 75 sobreviventes adultos que
haviam se submetidos ao transplante alogênico e singênico para LMC. Destes, 51
viveram de 3 a 18 anos, com uma média de seguimento de 8 anos.
Esses mesmos autores realizaram uma pesquisa sobre QV e constataram que
a função cognitiva estava significativamente mais baixa que a população normal. A
dispnéia e as dificuldades financeiras eram maiores no grupo de sobreviventes.
Não encontraram diferenças nos domínios físico, emocional e social. Mas
verificaram uma insatisfação no funcionamento sexual em 1/3 dos sobreviventes,
embora estes tenham assegurado que possuem uma boa qualidade de vida.
A minoria apresenta dificuldades com a reintegração na profissão, e estes
sobreviventes expressam problemas financeiros.
58
Esses pesquisadores mostram a necessidade de avaliar e intervir mais
profundamente no cuidado com os fenômenos da sexualidade e do prejuízo
cognitivo, pois perceberam que 38% dos sobreviventes apresentam um decréscimo
na atividade sexual. A infertilidade estava presente em 59%, mas 26% não sabiam
afirmar a real condição e 7% confirmaram não ter dificuldades nesta área. O restante
não respondeu a esta questão.
Em decorrência da infertilidade, quase a metade dos sobreviventes (48%) disse
não se importar. No entanto, 15% deles sentiam-se muito incomodados e 37% mais
ou menos. Ainda nesse grupo verificou-se que 15% buscavam alternativas para
suprir a infertilidade, por exemplo, realizando a adoção e (ou) o uso da assistência
de técnicas reprodutivas.
Após um ano de transplante foram comparados com a população normal e
observaram-se diferenças significativas. Os sobreviventes manifestaram queixas em
relação ao bem-estar global. Entretanto, com três anos de transplante 90% dos
sobreviventes declararam que a QV era boa a excelente.
Com mais de três anos, já não apresentavam diferenças ao serem comparados
com o grupo controle, na maioria dos domínios.
O impacto do transplante na função sexual é um achado comum nas pesquisas
de qualidade de vida (BAKER et al., 1994; PRIETO et al., 1996; ZITTOUN et al.,
1997; SARTK, 2007; BAILLARGEON, 2007).
Hayden e colaboradores (2004) mostraram que os sobreviventes que se
submeteram ao transplante com menos de 35 anos de idade têm a mesma atividade
sexual ou até mesmo ocorre certa superioridade quando são comparados com o
grupo de mais idade.
Outros trabalhos que corroboram com a opinião de Hayden e seus
colaboradores foi o estudo de Wingard e colaboradores (1992). Esses detectaram
que os sobreviventes ao realizarem a intervenção em idade jovem manifestaram
mais satisfação sexual após o transplante, diferentes daqueles que o fizeram com
idade mais avançada.
Ainda, em 1995 Andrykowski e colaboradores perguntaram para 172
sobreviventes adultos que tinham uma média de quatro anos de transplante, se eles
tinham retornado a vida normal, 48% responderam afirmativamente.
Duell e colaboradores (1997) avaliaram 477 adultos de 43 centros europeus,
com pelo menos cinco anos de transplante, em decorrência de doenças
59
hematológicas. Constataram que 93% apresentavam boa saúde e 89% retornaram
para as atividades normais em tempo integral. O escore da avaliação da escala do
Karnofsky mostrava que quase 80%, deles, necessitavam algum esforço para
realizar as atividades normais. 89% retornaram ao trabalho e ao estudo. Os fatores
que contribuíram para o afastamento das atividades e (ou) em alguns casos a morte
foram: idade, sexo, DECH, ocorrência de uma neoplasia secundária, recaída da
leucemia, alterações neuropsicológicas, depressão e leucoencefalopatia.
As crianças se engajam nas atividades, por tempo integral, antes do que os
homens e estes, por sua vez, antecedem as mulheres.
Os sobreviventes que se submeteram ao transplante alogênico e que
desenvolveram DECH-c manifestaram, durante muitos anos, prejuízos no
desempenho de vários aspectos do cotidiano e conseqüentemente na QV.
Em decorrência dessa vivência, o sobrevivente passa por períodos de
transtornos de humor (depressão e ansiedade) com depreciação psicossocial,
fadiga, dor, interação familiar com alterações na performance sexual, social e física.
Muitas vezes, os sobreviventes sentem uma sobrecarga com a presença da DECH-
crônica; é como se tivessem apenas trocado de doença, pois continuam tendo as
limitações e os percalços do adoecimento e da iminência da morte. Por isso, a
presença da depressão na manifestação da DECH compromete e muito o
desenrolar deste quadro clínico.
Ainda são desconhecidas as razões da baixa qualidade do enfrentamento das
morbidades. As hipóteses recaem sobre a interferência da DECH-c, depreciação,
fadiga, depressão ou dificuldades neurológicas. Provavelmente, seja decorrente
desta interação multifacetada.
A DECH-c extensiva é um importante preditor para uma qualidade ruim, uma
vez que tem limites provenientes das comorbidades complementares da doença do
enxerto. Exemplificando, ocorrem desajustes emocionais, fadiga, redução na
habilidade física e comprometimento funcional de órgãos fundamentais,
exemplificando, pulmão, fígado.
Wingard e colaboradores, em 1991 verificaram que após o transplante a perda
de emprego foi maior no gênero feminino, com a presença de DECH e com nível
socioeconômico mais baixo.
Constataram que os sobreviventes que realizam o transplante em tenra idade
(crianças) e na puberdade, apresentaram problemas específicos desse período.
60
Exemplificando, a falha ovariana induziu ao uso de hormônio para que ocorresse o
amadurecimento esperado na adolescência. Nos meninos, a falha testicular se
limitava à aspermia e à produção de testosterona, mas este prejuízo foi reversível.
Além disso, a radiação de crânio pode resultar em déficit cognitivo mais nas meninas
do que nos meninos (SANDERS et al., 1983, 1986; SKLAR et al, 1984, CHRISTIE,
1994).
Alguns sobreviventes com mais de cinco anos de transplante desenvolveram
DECH com seqüelas, recaída da doença primária ou o aparecimento de outra
malignidade e disfunções de outros órgãos que causou um decréscimo na QV e na
função social (DUELL et al., 1997).
Oliveira e colaboradores (2005) investigaram as implicações na QV e na
readaptação psicológica de 17 sobreviventes. A avaliação ocorreu em três etapas
(pré-transplante, na alta da enfermaria e um ano após a realização do transplante).
Os sobreviventes com um ano pós-transplante apresentaram melhorias na
capacidade funcional e na redução dos sintomas de psicomorbidade.
Os níveis de ansiedade e depressão têm se manifestado acima de 40% nos
pacientes do pré-transplante. Mas, no primeiro ano após a intervenção, a presença
da fadiga sofreu um declínio, provavelmente, porque o suporte psicológico oferecido
aos sobreviventes foi adequado.
Os sobreviventes que realizaram autotransplante estavam com a doença mais
avançada e devido a isso precisaram um regime de condicionamento agressivo, isto
é, de maior toxidade.
A radioterapia necessária em alguns sobreviventes no processo do transplante
pode apresentar como efeito secundário a xerostomia (carne extra da gengiva ou
sem saliva), ou seja, a boca apresenta uma secura, o paladar e o olfato ficam
alterados. Podem ocorrer infecções e cáries dentárias e este quadro sintomático é
um componente adverso para a qualidade de vida (BRUCE, 2004).
Para Glaus e colaboradores (1996), 59% dos sobreviventes apresentam
queixas médicas; 29% manifestam fraqueza e diminuição do desempenho físico;
12% mal-estar, desmotivação, dificuldades de concentração e diminuição da
habilidade de resolução de problemas.
Prieto e colaboradores (1996) analisaram 117 sobreviventes que realizaram
transplante do tipo alogênico e autólogo, com um tempo médio de quatro a sete
61
meses de pós-transplante. Observaram um desempenho aquém do esperado em
relação à habilidade física, trabalho e vida sexual.
Os sobreviventes que demandaram tratamento psiquiátrico foram significativos
(22%), quando comparado com a incidência na população geral (9%) (FANN et al.,
2007).
Fife e colaboradores (2000) realizaram um estudo longitudinal para investigar a
condição adaptativa, isto é, o grau de angústia dos doentes que se submetem ao
transplante do tipo autólogo e alogênico. Avaliaram 101 sobreviventes no pré-
transplante e várias outras vezes, até completar um ano. Observaram que dois
momentos do processo são muito aflitivos para eles: a admissão hospitalar e antes
da infusão medular. A ansiedade e a depressão reduzem aproximadamente uma
semana após o transplante, apesar de os sintomas físicos aumentarem durante esse
período. Depois do terceiro mês até um ano, a tendência é que a manifestação
aflitiva amenize.
Os fatores de risco associados à presença da angústia no pós-transplante
foram: aflição exacerbada no pré-transplante, presença precária de um padrão de
controle pessoal, dificuldade de compreensão e sintomatologia intensificada. Por
isso, é fundamental que seja avaliado o bem-estar psicossocial do sobrevivente
antes do transplante.
Outro trabalho que mostra resultados similares é o de Siston e colaboradores
(2001). Eles pesquisaram sobre o ajustamento social em relação à doença, ao
humor e às respostas de estresse nos sobreviventes e de seus cuidadores, antes da
admissão para o transplante em si. Observaram que os doentes que apresentaram
níveis clínicos de desajustamento no pré-transplante, posteriormente também
demonstraram precariedade no enfrentamento.
Manifestaram sintomas de esquiva, isto é, negação dos problemas e
dificuldade para tomar decisões eficazes em relação ao autocuidado.
Enfim, os serviços de transplantes podem se beneficiar com as informações
obtidas inicialmente na avaliação psicossocial, pois este conhecimento mostra
elementos preditores da psicodinâmica do sobrevivente e do seu acompanhante.
Assim, também é possível prever o impacto psicossocial que o transplante pode
causar nos sobreviventes.
A forma de os sobreviventes responderem e manifestarem as opiniões
pessoais denota a inclusão e justaposição de aspectos positivos e negativos. É
62
perceptível para o leitor que apesar da presença de seqüelas e dificuldades, de um
modo geral, os sobreviventes mencionam que estão satisfeitos com a QV. Pois, a
interpretação dos fatos e o jeito de enfrentar as intercorrências da vida parecem ser
potencialmente fatores de influência de risco ou de proteção dependendo da
subjetividade daquele que experimenta.
2.3.3 Influência da Fadiga na QV dos Sobreviventes do TCTH
A fadiga é uma morbidade que interfere na atividade diária, diminui a
concentração, prejudica a qualidade do sono, produz uma fraqueza generalizada.
Além desse mal-estar global, também causa um prejuízo na dimensão social e
funcional.
Muitos trabalhos correlacionam a fadiga com doença, radioterapia e
quimioterapia. Porém, em comparação com a modalidade de tratamento de
transplante o número de pesquisas cai substancialmente.
Contudo, alguns estudos sobre fadiga no contexto do transplante serão
mencionados a seguir, com o intuito de demonstrar a importante interferência da
fadiga no resgate da normalização de uma rotina de vida (KALO et al., 2007).
De modo geral, com um ano pós-transplante parece que os sobreviventes
alcançam um status funcional aceitável (voltam a trabalhar e freqüentam a escola).
Entretanto, quando as avaliações são específicas e se aprofundam mais, constatam-
se prejuízos em alguns aspectos do físico, da sexualidade e da fadiga.
Hjermstad e colaboradores (2004) avaliaram a fadiga e as condições
psicológicas de 248 sobreviventes, destes 61 realizaram transplante do tipo
alogênico, devido à hemopatias malignas (leucemias e linfomas).
Os sobreviventes apresentaram mais fadiga que a população normal. Mas,
aqueles não demonstraram diferença significativa entre os grupos alogênico e
autólogo, ao compararem a presença de fadiga, ansiedade e depressão.
O nível de ansiedade diminuiu após oito meses de transplante e na seqüência
se manteve estável até o terceiro ano ou mais. Então, não houve diferença
estatística quando comparado ao grupo controle.
Em relação à QV, os sobreviventes reclamaram da interferência negativa do
tratamento nas funções cognitivas e no relacionamento social.
63
O nível físico e mental de fadiga é significativamente mais pronunciado nos
sobreviventes, quando comparado com o grupo controle. Observou-se que a fadiga
é um preditor para um decréscimo na performance neuropsicológica. Entretanto,
essa condição pode melhorar com o passar do tempo (HARDER et al., 2002).
Winnie e colaboradores (2003) avaliaram a fadiga e a QV de 157 sobreviventes
que se submeteram ao transplante devido à hemopatias malignas. Verificaram que
15% deles experimentaram altos níveis de fadiga. Aqueles que manifestaram mais
queixas foram os sobreviventes que se encontravam desempregados ou com baixos
salários, eram casados e faziam parte dos sobreviventes mais velhos da amostra.
Ao serem comparados com a população normal, constatou-se que os
sobreviventes apresentaram níveis mais altos de fadiga. Para esses pesquisadores,
a fadiga é um cansaço corporal excessivo, anormal, desproporcional e não
relacionado com atividade ou exercício. É importante demarcar que a exaustão é de
uma intensidade anormal, uma vez que a população normal também pode
apresentar fadiga.
Porém, eles não conseguiram concluir se os desempregados têm mais fadiga e
por isso não conseguem trabalhar e/ou manter o emprego ou se a insatisfação e a
desvalia da estima produzem a sensação de fadiga. Enfim, não determinaram o fator
causal da percepção de fadiga.
O que se sabe é que sendo casado, geralmente tem mais responsabilidades; é
ou tem a expectativa de ser o provedor ou pelo menos contribuir para a estabilidade
e segurança financeira e emocional.
Flechtner e Bottomley (2003) verificaram que existem quatro padrões de
comportamentos após o tratamento e recuperação da neoplasia. O primeiro ocorre
uma melhora das funções em geral, após dois a três anos e este resultado
satisfatório se mantém. O segundo, apresenta uma melhora inicial, mas deteriora
com dois a três anos e não atinge mais o estágio normal. No terceiro padrão, há
uma melhora e um retorno para o ritmo normal. Por fim, ocorre uma mistura de
padrões com um alto nível de fadiga.
Diferentes estudos mostram que mais ou menos 75% dos sobreviventes
apresentam fadiga durante ou após o tratamento.
Fadiga refere-se à sensação de mal-estar, cansaço, exaustão, ao sentir-se
doente. Além disso, é um termo que inclui outros caracteres, como esgotamento,
64
extenuação, distração, perturbação e abatimento (FLECHTNER e BOTTOMLEY,
2003; OLSON, 2007).
As pessoas saudáveis também sentem fadiga, mas, após uma boa noite de
sono, o mal-estar se dissipa. Nos sobreviventes após o transplante, mesmo depois
do repouso a fadiga permanece.
Nesses doentes, a fadiga está relacionada a um evento específico, isto é, à
doença, aos efeitos tardios da radioterapia e do tratamento em geral. É um
sentimento, um estado de cansaço que excede o normal e é experimentado como
um desprazer.
O contexto da fadiga também é amplo, pois pode encaminhar-se para um
transtorno depressivo.
A fadiga apresenta duas dimensões (subjetiva e objetiva). No primeiro caso,
depende de como o sobrevivente vive essa experiência, e nesse contexto são
consideradas as interferências físicas, emocionais e cognitivas. No segundo, está
relacionado com o operacional, isto é, se tem anemia, imunidade baixa, dificuldade
respiratória entre outras morbidades.
Ao estudar a influência da fadiga, o que se busca é a compreensão dos efeitos
secundários do tratamento e adequar estratégias para amenizar esses sintomas,
uma vez que o impacto da fadiga associa-se à redução de desempenho nas
atividades rotineiras. O sobrevivente sente-se extenuado e com uma sensação de
estar perdendo o controle de si e de partes da própria vida. Com isto se isola e
sente-se só.
The National Comprehensive Cancer Network (NCCN) define fadiga como uma
sensação persistente e subjetiva de cansaço decorrente do câncer ou do tratamento
que interfere no seu funcionamento rotineiro (MOCK, 2004).
A fadiga em relação ao câncer foi aceita como diagnóstico de acordo com
International Statistical Classification of Diseases 10
th
Revision - Clinical Modification.
Os critérios para tal diagnóstico são: fadiga significativa, baixa da energia, ou
aumento da necessidade de descanso, alteração no nível de atividade recente e
desproporcional. O impacto da fadiga se faz presente diariamente e até mesmo ao
amanhecer, e isso perdura por pelo menos nas duas semanas do último mês
(CELLA, 2001).
65
Segundo esses mesmos autores, a fadiga está presente em 70% daqueles que
receberam quimioterapia, radioterapia e transplante de células-tronco. Por vezes, a
dor não provoca tantas queixas como acontece em relação à fadiga.
A etiologia da fadiga é desconhecida, assim como também não se conhecem
os mecanismos patofisiológicos envolvidos. O que se sabe é que pertence a
múltiplas variáveis.
Esse fenômeno multifatorial pode ser causado pela própria malignidade, pelo
tratamento em si, anemia, fatores fisiológicos como a caquexia, altos níveis de
certas citoquinas como a interleucina 1 e 6, necrose tumoral (MOCK, 2004). Outras
possíveis causas complementares são: ansiedade, depressão, insônia, dor,
comorbidades, nível de atividades físicas e nutrição inadequada, anorexia, vômitos,
diarréias e perda da massa muscular.
Os sintomas desencadeiam o desenvolvimento de preocupações e angústia
que exacerbam o desconforto global e a condição funcional. Reduzindo a satisfação
da QV e interferindo na motivação para assumirem novos papéis sociais.
A fadiga é um dos principais sintomas relacionados a neoplasias e está
associada a quadros de alteração de humor. Contudo, pode ocorrer uma melhora no
humor e, mesmo assim, o sobrevivente manifestar uma piora da fadiga, pois a fadiga
e o humor podem se complementarem na expressão ou se apresentarem de modo
independente (VISSER e SMETS, 1998; LOGE et al., 2000).
A população normalmente apresenta mais fadiga com o aumento da idade e a
mulher manifesta mais queixas do que o homem.
O indivíduo sente uma queda na sua capacidade energética, com uma
sensação de fraqueza generalizada, dificuldade de atenção, de memória e perda do
interesse em atividades gerais. Mas, o impacto da fadiga no bem-estar depende da
intensidade, da interferência diária e da duração do sintoma.
A qualidade de vida retorna ao normal quando os níveis de fadiga são baixos.
Contudo, se os níveis forem altos, a fadiga permanece mesmo nos sobreviventes
com 6/7 anos. Os sobreviventes apresentam reclamações em relação aos limites na
capacidade física (20%) e manifestam queixas devido ao mal-estar emocional
(50%).
É uma rede da qual o sobrevivente, muitas vezes, não consegue se libertar,
pelo contrário tende a apresentar depressão, dor, insônia, perda de apetite e
emagrecimento. Porém, 40% conseguem suplantar a morbidade e dizem estarem
66
satisfeitos quanto à QV, com ou sem queixas de fadiga (FLECHTNER e
BOTTOMLEY, 2003).
Após um ano de transplante de medula óssea, Baker e colaboradores (1999)
detectaram algumas comorbidades que podem ser divididas em três áreas: físico,
psicológico e social.
No campo físico, encontraram queixas em relação à fadiga, aparência,
dificuldade no apetite.
No campo psicológico, verificaram que os sobreviventes apresentam medo em
relação ao futuro, experimentam uma sensação de perda do controle e referem
ansiedade e depressão.
No campo social, os sobreviventes demonstraram dificuldade de reintegrar-se
na sociedade. Acham difícil a formação ou participação em grupo, precisam de um
esforço para sair de casa e do meio familiar. Também expressam desconforto pela
percepção do estigma e pela dificuldade em arranjar emprego. Conseqüentemente
apresentam insatisfação em decorrência da condição financeira.
Segundo Hjermstad e colaboradores (2004), os sobreviventes que realizaram o
transplante há pelo menos três anos (3-5anos), do tipo alogênico e autólogo,
apresentaram queixas em relação à fadiga, saúde, capacidade funcional, ansiedade
e depressão.
A fadiga causa impacto no trabalho, no papel funcional, na rotina diária, na vida
social, na habilidade mental, na condição emocional, na sexualidade e no apetite.
Enfim, somos um sistema integrado e, como tal, provavelmente a fadiga tem
uma origem multifacetada, isto é, as variáveis se justapõem na dimensão
biopsicossocial. É uma cadeia interligada que pode gerar condições favoráveis ou
não, promovendo, assim, uma reação conjunta e singular.
Essas informações prospectivas são úteis para o conhecimento científico, mas
também para os procedimentos clínicos a serem inseridos no contexto de trabalho.
Por isso, todos estes dados precisam ser considerados no planejamento inicial do
transplante de células-tronco hematopoéticas.
A NCCN elaborou um instrumento de avaliação breve que fornece um guia
para investigar o nível de fadiga e a condição clínica para então definir a estratégia
de tratamento (MOCK et al., 2003).
Flechtner e Bottomley (2003) sugerem que a avaliação de fadiga deve ser feita
nas duas dimensões (subjetiva e objetiva). Sendo que na forma objetiva utilizam-se
67
definições mensuráveis (verificando a ação desenvolvida nas atividades diárias),
enquanto a subjetividade será posta por meio das respostas do próprio sobrevivente.
Entre outros instrumentos de avaliação, eles recomendam o uso do FACT-
Fatigue, uma vez que esta escala é auto-aplicativa, isto é, fornece a opinião peculiar
daquele que responde.
Atualmente os transplantes estão provocando menos mortalidade, mas ainda o
índice é alto e continua carregado de efeitos secundários no âmbito biopsicossocial.
A fadiga, por exemplo, é uma manifestação que interfere na rotina de vida de cada
um e de modo significativo. Por isto é premente que ocorram novos conhecimentos
para que sejam aplicados na conduta de cuidados.
2.3.4 A Interferência do TCTH nas Funções Cognitivas
Olin (2001) define função cognitiva como um conceito multidimensional que
descreve os domínios que resultam da performance cerebral saudável. Entre elas
estão as seguintes funções: atenção e concentração, rapidez de processamento das
informações, linguagem, função motora, habilidade viso-espacial, aprendizagem e
memória.
Um grupo de pesquisadores realizou um estudo multicêntrico, em que foram
incluídos 40 centros de transplantes com sobreviventes que se submeteram ao
transplante autólogo ou alogênico decorrentes de doenças malignas. O transplante
havia ocorrido em média há 7 anos (1 a 22 anos) pós-transplante (ANDRYKOWSKY
et al., 2005).
As entrevistas foram realizadas em 662 sobreviventes pelo telefone. Quando
comparados com o grupo controle saudável (n=158), constatou-se uma diferença
significativa: os sobreviventes apresentaram resultados inferiores em relação à
saúde global, funcionamento físico e social, fadiga, função cognitiva, ajustamento
psicossocial.
Jansen e colaboradores (2005) realizaram um estudo para investigar os
possíveis prejuízos cognitivos decorrentes da neurotoxicidade associada aos
agentes quimioterápicos.
Existem vários estudos mostrando que ocorre um prejuízo cognitivo com a
inserção do amplo uso dos agentes alquilantes. Acredita-se, porém, que quando o
68
sobrevivente recebe quimioterapia em doses padrões, ela não atravessa a barreira
sangüínea cerebral (LEZAK, 2004; SYRJALA et al., 2004; BEVANS, 2006).
Mas, muitas drogas quimioterápicas são potencialmente maléficas para as
funções cognitivas mediante outros mecanismos, a exemplo de ciclofosfamida (CFA)
e da metrotexate (MTX). A quimioterapia é um sistema de tratamento que causa
grande impacto na divisão das células tumorais, mas, infelizmente, também
prejudica as células normais.
Acima de 20% dos sobreviventes com menos de 10 anos de transplante de
medula óssea para LMC têm mencionado perda da memória (KISS et al., 2002).
Para o grupo de Hayden (2004), houve uma grande diferença quando
comparado à população normal. Os sobreviventes apresentaram queixas em relação
à lentidão de reação, diminuição na capacidade de concentração e atenção,
dificuldade para raciocinar e encontrar solução para os problemas.
A idade em relação ao período da realização do transplante não mostrou
correlação com o resultado negativo do desempenho cognitivo. Entretanto, Bush e
colaboradores (1995) encontraram essa associação em seu estudo.
O sistema nervoso é protegido pela barreira sangüínea cerebral contra a
entrada de agentes, solução de água ou hidrofílica. Porém, alguns agentes
quimioterápicos têm habilidade para atravessar esta barreira. Algumas dessas
drogas alquilantes podem causar danos na barreira e nos vasos sangüíneos,
rompendo-os. Por exemplo, o ciclofosfamida, que é um agente alquilante lipophilico,
quando administrado em altas doses, pode ocasionar borramento visual, confusão e
tontura; já o metrotexate é um antimetabólico de solução de água, com capacidade
de indução da neurotoxicidade, que, por sua vez, causa problemas de atenção e
memória.
Sabe-se que ocorrem disfunções cognitivas, mas muito pouco se sabe em
relação aos mecanismos potenciais que produzem estas alterações, é comumente
referido como chemo brain. Para compreender as complexas relações existentes
entre as funções cognitivas, faz-se necessário um entendimento maior sobre a
organização e a anatomia cerebral, isto é, as correlações neuroanatômicas
(JANSEN et al., 2005).
A projeção neuronal influencia o tálamo, o córtex cerebral e o sistema límbico
por meio das extensivas trocas. A atenção é um mecanismo cognitivo mental que
69
habilita a pessoa a absorver pensamentos ou ações relevantes e ao mesmo tempo
ignorar aquilo que lhe é irrelevante (GROBER, 2002).
Existem três tipos de atenção: seletiva, dirigida e a de manutenção e
sustentação. Mas é preciso certo estado de alerta, de interesse para que esta
função se processe.
A atenção seletiva é a habilidade de dar foco a certos assuntos ou estímulos e
de excluir outros por breves períodos de tempo.
A atenção dirigida é capaz de realizar atentamente duas ou mais tarefas de
forma simultânea.
A atenção de sustentação também se refere à concentração ou à vigilância
mantida por um período maior de tempo.
Os neurotransmissores como acetilcolina, serotonina, norepinephrine,
dopamina são necessários para facilitar a comunicação entre essas áreas e a
produção do estado de alerta e atenção.
A atenção é um bloco de base para a manifestação efetiva das outras funções
cognitivas. Ela também funciona como um medidor de integração que influencia
memória, percepção e linguagem. Por isso um déficit de atenção interfere nas
atividades diárias, no trabalho e no desempenho dos papéis sociais (JANSEN,
2005).
A aprendizagem é um processo que propicia a aquisição de novas
informações. A memória é a manutenção desta aprendizagem a ponto de ser
relembrada posteriormente. Memória é o resultado de uma aprendizagem que é
criada ou fixada pela repetição que amplia a habilidade de adquirir, armazenar e
usar novas informações. Ela é importante no processo de aprendizagem, para reter
informações que são exigidas nas tarefas diárias. Por isso, déficits têm um impacto
substancial na rotina de vida e no desempenho do trabalho (JANSEN, 2005).
Outro fator que pode contribuir para a ocorrência do déficit cognitivo é a
manifestação da anemia, decorrente do regime quimioterápico. Se houver uma
oxigenação reduzida, isto pode afetar a habilidade da atenção, da flexibilidade
mental, da concentração e da memorização.
Receptores de estrogênio existem em vários locais do cérebro, especialmente
nas regiões que envolvem as funções de atenção, memória e aprendizagem
relacionadas com o córtex cerebral, hipocampo e amigdala.
70
A terapia de reposição hormonal propicia uma interferência favorável nas
respostas cognitivas. Além disso, quando a menopausa está associada à
quimioterapia, o prejuízo cognitivo acontece rapidamente e nas situações em que a
menopausa é natural, a perda é gradativa (JANSEN, 2005).
Existem outros fatores que podem influenciar na expressão cognitiva, tais
como: deficiência nutricional, anormalidades metabólicas, medicamentos que podem
interferir no SNC, nível educacional e a capacidade intelectual. Observa-se que
estas últimas variáveis possuem força positiva.
Alguns transtornos psicológicos são freqüentes diante da vivência com o
adoecimento e os tratamentos correlatos. Assim, verifica-se que a presença de
níveis estressantes pode desencadear quadros de ansiedade e depressão.
Conseqüentemente, há uma redução do desempenho global, ou seja, funções como
atenção, concentração e memória ficam aquém do padrão normal (LEZAK et al.,
2004).
A fadiga é outro efeito secundário comum no pós-transplante e perdura por
muito tempo, conforme descrito anteriormente. Tanto a fadiga física como a mental
podem afetar o desempenho cognitivo.
Existem evidências que a quimioterapia induz prejuízos nas funções cognitivas,
mas não se sabe ao certo se mecanismos isolados ou uma multiplicidade deles são
responsáveis pelas alterações.
Este é um campo que requer maior desenvolvimento de pesquisas específicas,
com vistas a desvendar os fatores de risco que por sua vez viabilizarão a elaboração
de estratégias de atendimentos ou orientações que exerçam uma função protetora.
2.3.5 TCTH e as Relações de Conhecimento com a Qualidade de Vida
Conviver com uma doença de alta mortalidade e passar pelo tratamento em si
é uma experiência de vida que insere mudanças significativas no sobrevivente.
Quanto a isso, existem muitos estudos que demonstram resultados de curto e médio
prazo sobre aqueles que se submetem ao transplante de células-tronco
hematopoéticas. Mas as informações são insuficientes quando o foco é a
investigação da QV em relação à saúde dos sobreviventes de longa data. Contudo,
existem importantes trabalhos realizados e que serão expostos a seguir.
71
Bush e colaboradores em 1995 avaliaram 125 adultos que realizaram
transplante do tipo autólogo e alogênico, com um tempo médio de 10 anos e um
mês (6-18 anos).
Verificaram que 63,3% dos sobreviventes apresentaram dificuldade emocional,
42,7% manifestaram transtorno de sono, 38.9% queixaram-se de disfunção
cognitiva, 38,7% tinham medo de recaída ou morte, 32,3% demonstraram
inabilidade social, 55,9% registraram fadiga, 27% estão insatisfeitos com a própria
aparência, 96% reclamaram de não ter o suporte necessário, 26% disseram ter
problemas físicos que dificultam a satisfação e intimidade sexual e 28 a 36% estão
insatisfeitos com a vida sexual. Pois, não sentem interesse em fantasiar e (ou)
praticar a relação sexual. Além disso, ocorre uma desvalorização da própria imagem,
isto é, não se sentem atraentes.
Molassiotis e colaboradores (1995) investigaram 50 sobreviventes que se
submeteram ao transplante (autólogo ou alogênico), há 3 anos e meio. Dos
sobreviventes, 25% não retomaram a condição de trabalho e de estudo e 10%
manifestaram dificuldade em assumir as tarefas diárias.
Wingard, Curbow e Baker (1992) avaliaram 126 sobreviventes com 6 meses
até 12 anos e 5 meses de pós-transplante alogênico e autólogo. Detectaram que
22% encontravam-se insatisfeitos com a vida sexual e que isto estava associado à
questão hormonal em ambos os gêneros A insatisfação estava relacionada com
dificuldade de ereção, ejaculação, perda da libido e menopausa precoce.
A verdade é que complicações psicológicas podem acontecer em qualquer
época do transplante. Mas, inicialmente, a condição e os efeitos da doença e do
tratamento têm foco emergencial nos cuidados e nas queixas físicas.
Com dois a três anos tendem a recuperar-se emocionalmente da experiência
do transplante. Entretanto, alguns logo superam e outros permanecem no problema.
Não conseguem suplantar as dificuldades que podem ser originárias das
complicações físicas do transplante, tipo recaída, DECH com limitações e dor.
Porém, também podem decorrer da falha de suporte social, conflitos familiares,
perda da auto-estima e confiança, identificação com o ser doente, perda dos papéis
que desempenhava no pré-transplante. Enfim, existem vários fenômenos
psicossociais que exercem impacto negativo sobre a retomada da vida.
Bush e colaboradores (2000) do Fred Hutchinson Câncer Research Center
apresentam os resultados de uma pesquisa realizada com 415 sobreviventes com
72
mais de quatro anos de pós-transplante. Esses pesquisadores observaram melhoras
na QV, ainda que tenham registros de problemas isolados, como por exemplo, a
insatisfação sexual.
Os resultados da pesquisa realizada por Kiss, Abdolell e Jamal (2002)
constataram que entre os sobreviventes com LMC, após 10 anos de transplante
alogênico, apenas um faleceu com crise blástica e na época encontrava-se com 12
anos de pós-transplante.
As mais freqüentes complicações nesse grupo foram: DECH, osteoporose e
cataratas. Em relação à QV verificou-se baixa performance física quando comparado
com o grupo controle. Porém, no campo social se equiparavam e nos
relacionamentos interpessoais encontravam satisfação significativa.
Segundo Hendriks, Van-Beijsterveldt e Schouten (1998), os sobreviventes que
se submeteram ao transplante de células tronco há mais de quatro anos ainda
manifestam queixas em relação à fadiga, sexualidade, finanças e o retorno ao
trabalho.
Mehta e Wingard (2002) realizaram um estudo com mais de 798 sobreviventes
com mais de cinco anos pós-transplante. A amostra foi obtida por meio do European
Bone Marrow Transplantation Registry, sendo que 328 eram crianças. Verificaram
que, apesar de estarem aparentemente bem, os sobreviventes com 10 a 15 anos
pós-transplante tinham um risco maior de mortalidade que a população normal.
As causas relatadas foram: recaída da doença, nova neoplasia, especialmente
linfomas, DECH-c, infecção viral devido às transfusões.
A doença do enxerto contra o hospedeiro-crônico pode ter seu aparecimento
imediatamente após a pega ou em médio e longo prazo. Existem vários tipos de
comprometimentos da DECH, incluindo o progressivo que inicia como DECH-aguda
e que na seqüência pode desenvolver características crônicas.
Os sobreviventes com HLA não idênticos em relação aos doadores, ou com
mais de 20 anos e que realizaram transplante de sangue periférico, apresentam uma
predisposição maior para o desenvolvimento da DECH do que outros sobreviventes.
Vários órgãos podem sofrer prejuízos, tais como: pele, córnea, fígado, boca,
estômago, intestino, olhos, pulmão.
Geralmente os sobreviventes que recebem radioterapia apresentam problemas
de crescimento, gerando a necessidade posterior de tratamento hormonal.
73
Também verificaram que existe um alto risco de anormalidades dentárias no
pós-transplante, havendo uma redução da secreção salivar ainda após 4 anos de
transplante. O prejuízo nas glândulas salivares pode ser permanente, após a
radioterapia. Essa intervenção também pode causar síndrome de olho seco e
catarata secundária a radiação.
Gruber (2003) avaliou 163 sobreviventes, sendo que 85,3% da amostra eram
transplantes do tipo alogênico, os demais eram singênicos e autólogos.
Nesse estudo ele não observou diferença nos resultados dos sobreviventes
que fizeram transplante de medula óssea há dois anos ou até mais de 10 anos.
Porém, foi constatado que 24% consideravam indesejável a condição física atingida,
17,2% apresentaram queixas de dor, 14,1% manifestaram medo e estresse.
A reintegração profissional é muito importante para a auto-estima, mas 30,7%
não retornaram integralmente para o trabalho, devido a problemas com sono, dor,
depressão, envolvimento insatisfatório em relação ao parceiro, a família e aos
amigos. Apesar disso, apenas 9,8% se dispõem a aceitar a sugestão de
psicoterapia.
Schulz-Kindermann e colaboradores (2002) verificaram que os sobreviventes
que se submeteram ao transplante de medula óssea ou de sangue periférico, no
período da mucosite sentiram dor em nível moderado a severo, precisando do uso
da morfina para obter alívio. Porém, existem variáveis sociais, psicológicas além das
biomédicas. Esses pesquisadores constataram que por meio de avaliações do
humor (depressão, ansiedade) da presença do estresse crônico, do suporte social e
do manejo apresentado diante da dor, é possível detectar comportamentos que
indicarão maior vulnerabilidade em relação às reações precárias de enfrentamento
da dor na seqüência do tratamento.
A presença de ansiedade é um preditor de mau prognóstico, quanto às
respostas de superação. Da mesma forma, o sobrevivente que demonstra
constantemente aflição na sua história pessoal (rotina diária, trabalho) também é
indicativo de recursos psíquicos desfavoráveis na suplantação da dor e do
sofrimento. Em relação às variáveis biomédicas, incluem-se riscos nos seguintes
aspectos; tipo de transplante, radioterapia, idade e o gênero.
A aflição psicológica do sobrevivente está associada a muitos aspectos do
processo do transplante e também freqüentemente é relacionada com os resultados
insatisfatórios do tratamento em si.
74
Trask e colaboradores (2002) avaliaram um grupo de sobreviventes na
consulta inicial e então compararam os resultados de aflição, ansiedade e depressão
com outra avaliação que também foi realizada pelos mesmos profissionais da área
de saúde e que mediam as mesmas variáveis.
Verificaram que 50 e 51% dos sobreviventes responderam que sentiam níveis
de aflição e de ansiedade, mas apenas 20% mencionaram níveis de depressão. No
entanto, na análise das respostas do profissional em relação ao sobrevivente, houve
um registro de alto nível de aflição. Sendo que o profissional associa esta aflição
com a ansiedade enquanto o sobrevivente relaciona com algo além da ansiedade e
da depressão.
Desse modo, é pertinente a necessidade de usar instrumentos que sejam auto-
aplicativos, isto é, que a opinião e a percepção do sobrevivente sejam computadas.
Afinal, a perspectiva do olhar do profissional e do sobrevivente tende a ser diferente.
Além disso, é premente a compreensão e padronização dos significados daquilo que
se mensura. Na pesquisa acima mencionada, ocorreu a necessidade de clarificar o
significado de ansiedade, depressão e aflição.
As pesquisas biomédicas têm sido muito presentes no processo do TCTH,
assim como as investigações psicossociais, que também têm avançado e estão
sendo aplicadas.
Andrykowski (1994) menciona três áreas centrais de pesquisas em relação ao
transplante, as quais são: a) pré-transplante, no período da tomada de decisão; b)
no pós-transplante, incluindo neste tópico os resultados, as considerações em
relação ao manejo, enfrentamento, adaptação e QV; c) pesquisas em relação aos
doadores e as características da compatibilidade das células-tronco.
Em um estudo realizado mais tarde, Andrykowski e colaboradores (1995b)
avaliaram 200 adultos de cinco centros diferentes; 46% realizaram transplante de
medula óssea alogênico e 54% autólogo por razões de doenças neoplásicas.
Os resultados indicavam uma variabilidade no pós-transplante, havia déficit no
desempenho físico, nas funções sexuais e ocupacionais. Sendo que as queixas
mais comuns foram: baixa energia, dificuldade ocupacional, sono, relacionamento
sexual, fraqueza, fadiga e um terço da amostra constituiu-se com desempregados e
aposentados. Os sobreviventes de transplante alogênico apresentaram QV inferior
em relação àqueles que realizaram o tipo autólogo.
75
Os fatores de risco para os resultados de baixa QV foram: idade mais
avançada, nível educacional inferior e doenças de pior prognóstico. Contudo, com o
decorrer do tempo, isto é, com uma sobrevida mais longa, o bem-estar tende a
melhorar. Esses pesquisadores concluíram que a maioria dos sobreviventes
considera a QV normal. Eles acreditam que o bem-estar global está relacionado com
o status pré-mórbido.
Keogh e colaboradores (1998) investigaram o funcionamento psicossocial dos
sobreviventes e familiares no pré e pós-transplante alogênico e autólogo. Todos os
28 sobreviventes foram avaliados na primeira semana antes do transplante e três,
seis e doze meses após a intervenção médica: a análise baseou-se em dados
quantitativos e qualitativos.
Os resultados mostraram que no pré-transplante, 61% apresentam nível
moderado a severo de ansiedade e 14% nível moderado a severo de depressão. Já
os sobreviventes demonstraram melhorias nas condições físicas, psicológicas e
sociais.
A maioria dos familiares (88%) relatou angústia no pré e com 3 meses de pós-
transplante. Mas, com um ano esse quadro já havia amenizado. A questão é que
houve significativa correlação entre a presença da aflição nos familiares e o bem-
estar físico e psicológico do sobrevivente após o transplante imediato. Esse tipo de
estudo e análise possibilita qualificar a orientação para os sobreviventes e familiares
em relação à expectativa que podem ter no primeiro ano de transplante.
Broers e colaboradores (2000) pesquisaram as alterações que ocorrem na QV
e nos aspectos psicológicos no pós-transplante e associaram com as possíveis
variáveis que interferem nestes resultados. Para tal, selecionaram 125
sobreviventes, aqueles que fizeram transplante entre 1987 e 1992. As indagações
abordavam a QV, as limitações, a depressão, ansiedade e auto-estima.
Correlacionaram estas informações com as obtidas em um grupo controle
constituído com pessoas saudáveis.
A avaliação ocorreu em várias etapas, antes do transplante, 1, 6, 12, 36 meses
após a intervenção. Após três anos de transplante, verificaram que ¼ dos
sobreviventes continuavam com sérias limitações. Porém, quase 90% deles durante
todo o seguimento mencionaram que a QV estava num nível bom a excelente.
76
As alterações na QV estão relacionadas com os sintomas somáticos, a queda
na performance e as alterações nos aspectos psicológicos. Além disso, também são
dependentes das condições basais, isto é, do padrão de comportamento individual.
Desse modo, se após três anos os sobreviventes ainda necessitam de ajuda
biopsicossocial, é preciso incluir intervenções terapêuticas para diluir as faltas
existentes no campo físico e psicológico.
Gopcsa e colaboradores (2002) demonstraram a necessidade de usar múltiplas
técnicas e de avançar nos estudos sobre imunofenotipagem combinada para
melhorar a compreensão. Exemplificando, um sobrevivente masculino que tinha
inicialmente o diagnóstico de leucemia mielóide crônica-LMC, após cinco anos de
pós-transplante, desenvolveu um quadro de leucemia mielóide aguda-LMA. Apesar
de ser um estudo de caso, este relato mostra a importância desta análise.
Mas existem também outros relatos que mostram resultados favoráveis.
Goldman (1989) verificou que os sobreviventes com leucemia mielóide crônica-LMC
tratados em diferentes centros, com HLA-idêntico de doadores familiares, após
quatro anos de pós-transplante, 45 a 55% encontravam-se livres de doença. Os
maiores fatores determinantes para estes resultados foram o status da doença,
diagnóstico, idade do sobrevivente e a ocorrência da DECH.
Saleh e Brockopp (2001) avaliaram a QV de sobreviventes após uma média de
30 meses e obtiveram numa escala de 0-10, o escore de 6.4, ou seja, a QV foi
considerada boa. Esse grupo de sobreviventes não obteve melhor índice devido à
presença de várias queixas, tais como: falta de força física, atividades sexuais
insatisfatórias, medo da recaída e (ou) de desenvolver uma segunda neoplasia,
desemprego, aflição familiar e incerteza em relação ao futuro.
Por meio das avaliações da condição física, do funcionamento espiritual e
psicossocial no pré e pós-transplante, viabiliza-se um canal de identificação dos
problemas. Assim, é possível um atendimento preventivo.
Larsen e colaboradores (2003) analisaram a QV e os sintomas de aflição de
sobreviventes, no início do processo do transplante, em relação às doenças e ao
tratamento específico. Foram avaliados 51 sobreviventes, sendo que 92% relataram
cansaço, 67% ansiedade e 53% ambos os sintomas foram comuns. Porém, essas
queixas não foram consideradas como causa da aflição. Mas sim, a presença de
vômitos, redução da mobilidade e a febre estavam presentes quando havia a
expressão aflitiva.
77
Ao comparar com um grupo controle normal, os sobreviventes apresentaram
índices marcadamente mais baixos, na condição funcional e na QV, apesar de
estatisticamente não ter sido significativo. Obviamente que com o avanço da doença
os resultados sofriam um decréscimo maior.
Scott Baker (2004) avaliou 248 sobreviventes com doenças malignas (LMC),
que se submeteram ao transplante alogênico aparentado e não-aparentado e
autólogo. A média de idade de pós-transplante era de sete anos (2-27 anos) e foram
comparados com irmãos (n=317).
O objetivo do estudo foi analisar os efeitos clínicos tardios. Constataram que o
risco de apresentarem complicações endócrinas, gastrointestinais e no músculo
esquelético é maior nos sobreviventes do que no grupo controle. Porém, aqueles
que tiveram DECH manifestaram um alto risco de hipotiroidismo, osteoporose,
comprometimentos cardiopulmonar, neurosensório e neuromotor.
Dessa forma, 78% dos sobreviventes que não tiveram DECH mencionaram que
em relação à saúde global estavam muito satisfeitos ou satisfeitos, enquanto
aqueles que tiveram DECH registraram insatisfação em relação à saúde global;
precisam de assistência para as atividades rotineiras e de atendimento atual para os
cuidados da saúde.
A doença do enxerto contra o hospedeiro-DECH é uma ocorrência que pode
ocasionar efeitos tardios adversos e um empobrecimento da saúde global.
O seguimento de 20 anos mostrou que os sobreviventes de TCTH não-
aparentado têm um risco de aumentar em 16% a possibilidade de deparar-se com
uma subseqüente malignidade. Os incidentes de cataratas, hipotiroidismo,
malignidades secundárias (câncer de língua, de estômago, doença do intestino,
linfomas...) são comuns.
Em relação ao histórico da fertilidade e a realização da gestação, nesse grupo
ocorreram 14 gestações. O resultado mostrou que sete nascimentos foram normais,
uma criança nasceu morta, houve quatro abortos e os resultados de duas gestações
não foram registrados.
Apesar dessas ocorrências, foram registrados nesse mesmo grupo,
sobreviventes com problemas de fertilidade.
Quanto às limitações do funcionamento físico, 78,2% dos sobreviventes dizem
não apresentarem problemas desta ordem, ou seja, estão muito bem ou bem e
94,3% do grupo controle diz o mesmo. Sendo assim, a maioria dos sobreviventes
78
com diagnóstico de LMC, e que se submeteu ao transplante, está muito bem.
Apesar de não estar tão bem quanto o controle.
Chang e colaboradores (2004) avaliaram 114 sobreviventes no pré e um ano
após o transplante alogênico e autólogo e todos tinham doença maligna (LMC). No
Pré-transplante a presença de comportamentos de dependência de álcool, cigarro e
outras substâncias, além de transtorno de humor, não interferiram no pós-
transplante.
Desse modo, essas variáveis não devem ser motivos para a equipe de saúde
negar a realização da infusão. Mas, como foi visto anteriormente, existem outras
pesquisas que incluem o transtorno de humor como fator de risco.
Existem fatores que contribuem favoravelmente no resultado, como, por
exemplo, sobreviventes mais jovens (menos de 39 anos) e com doença estável no
período da admissão para o transplante.
Esses achados são correlatos às informações encontradas na pesquisa
realizada por Koh e colaboradores (2004). Eles estudaram algumas variáveis que
afetam as conseqüências do transplante alogênico nos sobreviventes que têm LMC.
Os resultados mostraram que, em sobreviventes jovens (30 anos ou menos), a
ausência de DECH, o uso de busulfan e ciclofosfamida é fator que está associado
com uma melhor sobrevida.
O transplante de medula óssea permanece como uma proposta plausível para
sobreviventes com doenças hematológicas malignas, jovens e na fase inicial da
doença, pois o prognóstico é favorável.
Bush e colaboradores (2005) mencionam a necessidade de documentar as
alterações que os sobreviventes experimentam no pós-transplante. Ao mesmo
tempo, chamam a atenção para a dificuldade logística encontrada na realização das
pesquisas prospectivas com suas inúmeras entrevistas e aplicações dos
questionários auto-avaliativos.
Assim, elaboraram um sistema on-line, para que os sobreviventes pudessem
acessar da própria casa e responder os instrumentos avaliativos. A aceitação foi
muito boa e os resultados foram satisfatórios.
Essa é uma realidade distante da população brasileira que freqüenta hospitais
públicos. Porém, a inclusão desse artigo nesta revisão se deve ao fato de ele
mostrar que esta dificuldade é um fator comum dos pesquisadores em geral. Mesmo
assim, é preciso buscar alternativas que auxiliem na captação do conhecimento
79
científico, para tal, torna-se necessário adaptar, qualificar e padronizar as coletas de
dados.
Lee e colaboradores (2005) investigaram os aspectos psicossociais e a
qualidade de vida em 80 adultos que realizaram o transplante autólogo e alogênico.
Constataram que 55% expressaram altos índices de ansiedade e depressão no pré-
transplante e 44% no pós-imediato (100 dias após). Além disso, aconteceram alguns
transtornos de estresse pós-trauma.
Concluíram que as condições ruins dos aspectos psicossociais do pré-
transplante são preditivos de uma possível manutenção deste quadro no pós-
transplante. Servem como marcadores de programas de intervenção.
Oyekunie e colaboradores (2006) examinaram 44 sobreviventes com idade
média de 28 anos (3-56 anos), todos com doenças malignas, que usaram
condicionamento mieloablativo (ciclofosfamida, busulfan e radioterapia) e se
submeteram ao transplante de medula óssea ou de sangue periférico. De todos os
sobreviventes, oito tiveram DECH-agudo e quatorze DECH-crônico. Devido às
complicações (infecções e recaídas) ocorreram 31 óbitos. Após pouco mais de dois
anos pós-transplante 13 sobreviventes encontravam-se vivos.
O estudo mostrou que quando o sobrevivente tem leucemia refratária, mas
apresenta menos de 20% de blastos e se o tempo de espera para o transplante for
menor ou igual a um ano, ele pode se beneficiar com o TMO alogênico.
Edman e colaboradores (2001) pesquisaram a QV em relação à saúde em 22
sobreviventes que fizeram o transplante há 2-4 anos. Constataram que existem
prejuízos no status funcional, na habilidade de enfrentamento e na condição
emocional (aflição). Resultados diferentes e melhores foram encontrados na
população normal.
As dificuldades na interação social, no sono e na aquisição do descanso são as
queixas mais freqüentes. Mais de 50% dos sobreviventes relataram problemas nos
olhos, boca seca, tosse freqüente, cansaço, ansiedade, dificuldades sexuais e
alteração no paladar.
Apesar desses sintomas 80% deles consideram a QV boa a excelente e a
maioria está em condições para retornar ao trabalho e (ou) a escola.
Existem aspectos salutares nos sobreviventes de longa data, mesmo naqueles
que passaram por intercorrências negativas. Com a vivência do susto do
diagnóstico, do tratamento em si, das comorbidades e da dor, parece que o olhar
80
perceptivo muda de foco e eles passam a valorizar mais as conquistas e não
enfatizam as perdas.
Essa mudança de atitude vem expressa pelo sentimento de gratidão,
fortalecimento e construção de laços afetivos, crescimento espiritual, pela
apreciação da vida e dos presentes que ela propicia. Talvez seja essa a razão de
muitos deles dizerem que o transplante tem o significado de renascimento.
Como resultado do processo do tratamento observa-se a alegria de viver horas
extras, quando tudo e todos estavam sinalizando o risco iminente da falência, pois
ao submeter-se ao transplante, assinou que consentia com a realização da
necropsia do seu corpo, caso ocorresse o próprio óbito.
Apesar de o transplante desencadear situações de riscos, dor e sofrimento, os
sobreviventes demonstram que ocorre uma superação, principalmente deles
próprios, e esta mudança reflete na QV.
Percebem que nessa modalidade de tratamento é preciso primeiro perder, para
ganhar mais adiante.
81
2.4 SEXUALIDADE
Bobo! Acha que abro minhas pétalas para que vejam?
Não faço isso para os outros,
é para eu mesma, porque gosto.
Minha alegria consiste em ser e desabrochar”
Yalom
2.4.1 Sexualidade no Contexto do Adoecimento
As doenças malignas, os tratamentos mais invasivos e agressivos como a
radioterapia, quimioterapia e o transplante de células-tronco hematopoéticas-TCTH
geram alguns períodos de alta toxidade com efeitos secundários e que por vezes
deixam seqüelas, dificultando o retorno para uma vida sexual satisfatória.
O aumento de sobreviventes se faz juntamente com benefícios e riscos, pois o
transplante é uma intervenção multimodal que envolve uma série de procedimentos
e etapas que podem interferir na qualidade da sobrevida.
No entanto, de um modo geral, os sobreviventes não falam espontaneamente
sobre as limitações e insatisfações sexuais. Tornam-se muitas vezes vítimas do
próprio silêncio, como se não fosse permitido comentar sobre esta falta, ou da
vontade de poder sentir de novo o despertar do desejo.
De acordo com Tierney (2003), os diagnósticos e tratamentos podem interferir
intensamente na sexualidade. Mas nem sempre esta queixa é imediata, uma vez
que outras questões emergenciais estão em jogo.
Entretanto, antes de adentrar na condição da vida sexual dos sobreviventes
que se submetem ao transplante, é preciso retomar os conceitos da sexualidade,
sexo e disfunção sexual.
2.4.2 Conceitos da Sexualidade, Sexo e Disfunção Sexual
A Organização Mundial de Saúde ao definir sexualidade sugere que existe um
jeito próprio de ser sexual, ou seja, a subjetividade está posta na expressão da
sexualidade. Além disso, o estágio de desenvolvimento e as regras da sociedade
exercem influência na expressão da sexualidade, visto que as normas culturais são
82
referências para considerações e classificações dos parâmetros de normalidade
(TIERNEY, 2004).
A satisfação da sexualidade depende de uma complexidade de elementos do
campo da fisiologia, psicologia e sociocultural.
A vivência da sexualidade viabiliza uma experiência integrada do corpo e das
manifestações das emoções. Geralmente a vida sexual acontece em parceria com o
outro, porém pode haver uma busca solitária. Mas em qualquer das situações requer
intimidade, toque e a capacidade de simbolização inerente ao ser humano. Só assim
é possível a expressão da sexualidade no intercurso da resposta sexual.
Por isso, as condições dos relacionamentos sociais, psicológicos e a auto-
imagem influenciam na identidade sexual. Porém, as insatisfações por motivo da
infertilidade, dispareunia, disfunção de ereção, ejaculação precoce ou tardia,
menopausa prematura, também contribuem negativamente.
Sexualidade, segundo Segal (1994), “é muito mais do que o intercurso sexual
e se expressa de diferentes maneiras. É a combinação de sentimentos, atitudes e
comportamentos que expressam o fato de ser homem ou mulher”.
Sexorefere-se somente à resposta fisiológica a um estímulo psíquico ou físico
que poderá ocorrer quando a pessoa estiver sozinha ou acompanhada. Envolve
principalmente o ato sexual com orgasmo e o conseqüente relaxamento de tensão,
que é o principal objetivo”.
Disfunções sexuais caracterizam-se por uma perturbação no desejo sexual e
alterações fisiopsicológicas que qualificam o ciclo de resposta sexual, causando
sofrimento acentuado e dificuldade interpessoal.
Uma resposta sexual desejada inclui no seu ciclo quatro fases: desejo,
excitação, orgasmo e resolução (DSM-IV TR, 2002). Entende-se por desejo sexual
como a necessidade e o interesse pelo sexo.
A excitação acontece diante de um estímulo (fantasias, lembranças, cheiros,
visões, sons, vivências) que produz um aumento da pulsação, da pressão arterial e
a respiração torna-se ofegante e simultaneamente acontece o aumento do fluxo
sangüíneo.
O orgasmo é um prazer intenso que conduz o controle para um descontrole,
propiciando ondas de prazer no corpo, na alma, no ser, momentaneamente em tudo
do todo.
83
É o clímax do prazer sexual, com liberação da tensão sexual e contração
rítmica dos músculos do períneo e órgãos reprodutores; no homem a ejaculação do
sêmen e na mulher contrações na parede do terço inferior da vagina (SEGAL, 1994).
A resolução é o resgate da normalização, isto é, os batimentos cardíacos, a
respiração, o fluxo sangüíneo na região genital e a excitação amenizam diante de
um bem-estar global.
Abdo e colaboradores (2004) realizaram um estudo com 1.219 mulheres
brasileiras com o intuito de investigar a prevalência de disfunções sexuais em
mulheres da comunidade. Este grupo tinha como critério de inclusão a idade mínima
de 18 anos. A média de idade foi de 35,6 anos e a média de relações sexuais foi de
2.8 por semana. Porém, 49% mencionaram pelo menos uma queixa em relação à
sexualidade. Em relação à falta de desejo 26,7% das mulheres reclamaram.
Também mencionaram dor durante a penetração, 23,1% e 21% referiram ausência
de orgasmo.
Esse estudo mostrou que ter mais de 40 anos e (ou) depressão são fatores de
risco para a manifestação da disfunção de orgasmo e da falta de libido. O nível
educacional baixo também é um indicador ruim, uma vez que aumenta a
possibilidade de perda da libido, dor e dificuldade para apresentar o orgasmo.
E as mulheres com mais de 25 anos apresentaram uma probabilidade menor
de manifestar dor no intercurso sexual. Por esse estudo, é possível perceber que a
sexualidade por si só é um fenômeno fascinante e, ao mesmo tempo, delicado. Daí
porque requer atenção dos profissionais, uma vez que a incidência de disfunções é
significativa mesmo na população geral e a sua presença causa um impacto
negativo nas suas vidas.
Então como é o processo da sexualidade para os sobreviventes que realizam o
TCTH?
Assim como a resposta sexual tem seu ciclo, o processo do transplante
também. Por isto, quando os sobreviventes retomam o sabor da sexualidade sentem
como sendo um resgate da vida normal, ou seja, não basta sobreviver é preciso
estar satisfeito com os resultados e ter uma vida digna. Mas isso nem sempre
acontece: assim, os sobreviventes e seus familiares necessitam saber que o estilo
de vida pode sofrer mudanças desagradáveis temporárias ou permanentes.
84
2.4.3 Interferência do TCTH na Satisfação da Vida Sexual
Com o advento do transplante verifica-se que no início deste processo é
comum que ocorra uma visão focal no tratamento da doença, na busca pela
sobrevivência. Dificilmente o sobrevivente e seu cônjuge trazem queixas ou
questionamentos em relação à sexualidade, porque são tomados por uma
expectativa maior que é o desejo da sobrevivência. Nesse início, a sexualidade não
é uma questão prioritária, conseqüentemente a abordagem depende da iniciativa do
profissional da área de saúde.
Avaliar o comportamento sexual e a satisfação no pós-transplante viabiliza uma
compreensão e uma adequação dos recursos para a diminuição do desconforto do
sobrevivente. No entanto, pela dificuldade do doente e (ou) do profissional em
abordar este assunto, o que se vê é uma escassez em relação a esta temática.
A questão é que a sexualidade é considerada como um assunto privado. Desse
modo, não é da prática comum que este tema seja introduzido, pela equipe e o
sobrevivente por sua vez, como já foi mencionado, dificilmente tece comentários.
No entanto, os ciclos de quimioterapias, radioterapias e o TCTH são
modalidades de tratamento que afetam as condições físicas, os ajustes
psicossociais e a imagem pessoal.
Mas não só as comorbidades decorrentes da doença e do transplante
interferem na satisfação da vida sexual. Segundo Segal (1994), a mídia e o sistema
capitalista fazem do indivíduo uma grande vítima em vários aspectos.
A representação coletiva se faz presente mediante o desejo de corresponder
ao desempenho sexual de um amante perfeito. Não há, portanto, espaço para a
masculinidade, feminilidade, sensualidade e sensibilidade se não estiver
correlacionado com um corpo jovem, belo e saudável.
É comum observar uma associação errônea entre desempenho sexual e
fertilidade. Como se a impossibilidade de gerar um filho significasse ser menos
mulher ou homem. A ignorância, a ansiedade, a baixa estima e as idéias pré-
concebidas interferem na libido e no desempenho sexual, por vezes, mais do que a
quantidade de testosterona, de andrógenos, de alterações vasculares na região
85
pélvica, da atrofia vaginal
3
, quer seja do tratamento em si, quer dos efeitos
secundários do mesmo.
Isso porque a sexualidade vai além do ato sexual em si, uma vez que envolve
sentimentos, emoções, comportamentos e atitudes que são demarcadas pela
expressão física peculiar de cada um.
Assim, não apenas o resultado e as seqüelas dos acontecimentos influenciam
na satisfação. O autoconceito – que é a imagem construída pela interpretação
subjetiva realizada pelo indivíduo, pelos outros e pela referência de valores
preconizados no contexto em que está inserido – também interfere na percepção do
bem-estar.
Contudo, esse conceito engloba aspectos da identidade e da imagem corporal.
Em relação à identidade, esta é influenciada pelos papéis, pelas posições e funções
que lhe cabem, e que lhe dão uma classificação por meio do rótulo. Exemplificando,
homem, mulher, executivo, lavrador, professor, aluno, entre outros.
A sexualidade está inserida neste autoconceito pela inclusão da referência
biopsicossocial e da imagem internalizada do próprio corpo.
Conseqüentemente, no adoecimento e no pós-transplante diante de seqüelas
físicas, dos efeitos secundários da menopausa ou da terapia de reposição hormonal
(TRH), o indivíduo pode sentir-se inseguro em relação ao desempenho sexual,
apresentar um efeito negativo no autoconceito e no amor próprio. E isso faz com que
ele fique prisioneiro da forma, do contorno visual do seu corpo e não na função do
mesmo, ou seja, não se permite expressar o desejo. A imagem do corpo é um perfil
conceitual complexo de fatos e percepções a respeito do corpo (SEGAL, 1994).
No sobrevivente a presença da doença do enxerto contra o hospedeiro crônica,
os sobreviventes sofrem mudanças na imagem corporal, pois a DECH-c de pele
pode alterar a cor da epiderme em função de hiper-hipopigmentação, vitiligo,
alopecia ou modificações da condição de saúde dos cabelos, aumento de peso,
dispareunia, disfunções na elasticidade e lubrificação vaginal, perda da libido, olhos
vermelhos, entre outros.
É comum o sobrevivente apresentar reações adversas a essas mudanças, tais
como: raiva, medo, culpas, ansiedade, tristeza, solidão e esquiva de situações
sociais. Enfim, emoções que expressam a frustração do acontecimento.
3
Atrofia Vaginal: ocorre em algumas mulheres quando a vagina não se lubrifica mesmo na fase de excitação, permanecendo
seca e rígida.
86
No pós-transplante imediato e em médio prazo, o sobrevivente se depara com
mudanças de papéis, com alterações físicas e fisiológicas que interferem no seu
bem-estar e na sua capacidade de desempenho.
O sistema de valores do sobrevivente, dos familiares e da sociedade em que
está inserido, tem a mesma importância que tinha, mas não a mesma
correspondência. Exemplificando: se for o provedor da família, neste estágio, por
vezes, não consegue sê-lo. Tem receio e se sente ameaçado de ser dispensado ou
de não superar a competição, pois seu valor é medido pela sua capacidade
produtiva.
Deste modo, há uma intensificação do sentimento de menos valia, uma vez
que a sociedade é capitalista. O indivíduo no sistema de produção torna-se um
produto de consumo. Todo esse processo de reinserção profissional e social
geralmente transcorre e se adapta conforme o tempo passa.
A maioria dos sobreviventes de longo prazo acomoda as perdas, incorpora
novos valores que contribuem positivamente no autoconceito e redefine sua posição
perante si, os outros e o meio em que vive, ou seja, este longo processo constitui-se
no ganho de uma nova perspectiva e no amadurecimento do ser. O foco não está no
que ele faz, mas no que ele é.
Porém, alguns sobreviventes não superam as perdas. Permanecem com as
mesmas expectativas e os mesmos valores, isto é, não investem em atitudes
compensatórias apesar de perceberem que aquilo que antes contribuía para sua
auto-imagem não existe mais. Conseqüentemente, ficam na insatisfação e não se
beneficiam das oportunidades de reinserção. Porque para ter novos ganhos é
necessário elaborar as perdas.
Essa ausência de aceitação inviabiliza a adaptação e dificulta o resgate dos
antigos papéis, causando uma interferência negativa na própria identidade, e esta,
por sua vez, na sexualidade.
Segundo Segal (1994) o efeito que uma incapacidade causa à imagem que a
pessoa tem de seu corpo, ao autoconceito e a sexualidade dependerá de muitos
fatores. Entre elas a extensão e o tipo de disfunção, a visibilidade da inabilidade, a
personalidade e o sistema de valores da pessoa e do quanto ela interioriza os
valores de sua cultura ou sociedade. Dependerá também, das características e
extensão da crise de identidade e dos recursos disponíveis para resolvê-la.
87
Entende-se, então, que além dos aspectos do cotidiano e das reflexões
peculiares de cada um, o sobrevivente depara-se com os comprometimentos e as
seqüelas do TCTH.
Apesar de não haver um número significativo de pesquisas sobre a
sexualidade nos sobreviventes de longa-data de transplante, a seguir serão
descritos alguns trabalhos pertinentes à temática da sexualidade em relação ao
processo do transplante.
2.4.4 A Sexualidade em Relação ao TCTH
Syrjala e colaboradores (1998) realizaram um estudo com sobreviventes que
se encontravam no período de um ano a três anos de pós-transplante alogênico.
Esse trabalho teve como objetivo verificar os preditores de transtornos sexuais.
Constataram que a ocorrência de dificuldade na satisfação sexual no período
que antecede o transplante é um fator de risco para o pós-transplante, para ambos
os sexos. Sendo que dos sobreviventes de longa data, 80% das mulheres e 29%
dos homens trouxeram queixas sexuais.
Existem alguns preditores para futuros problemas sexuais, tais como: idade
mais avançada, fragilidade psicológica, casamento com problemas e a prévia
insatisfação sexual.
Parece que para o homem, a idade e a condição de ser casado influenciam
mais do que o próprio processo de transplante. A falta de ereção e excitação são as
queixas mais comuns. Aparentemente, a ilusão do relacionamento garantido pela
sua condição estável produz uma acomodação e uma falta de investimento
emocional e sexual.
Já para a mulher, o que mais influencia é a falta de lubrificação vaginal e de
orgasmo. Em geral, a mulher demonstra menos interesse sexual do que o homem.
Alguns estudos apontam que as mulheres apresentam mais problemas do que
os homens. Porém, aquelas que iniciam a reposição hormonal com menos de um
ano pós-transplante demonstram menos dificuldades em relação às que não fazem
à terapia hormonal (SYRJALA e ABRAMS, 1997; SYRJALA et al., 1998; STEWART,
1999).
88
A reabilitação vai além do ato e da função sexual. Visa a uma reorganização do
impacto emocional da doença sobre a imagem corporal, a satisfação no
relacionamento e na capacidade reprodutiva (SCHOVER & LESLIE, 1988ab;
WILMOTH e FLAHERTY, 2006).
Existem fenômenos culturais que influenciam nas atitudes assumidas no pós-
transplante. Assim, o casal pode interromper totalmente a atividade sexual, devido
ao medo de contágio, o que é mais comum nas pessoas do meio rural.
As crenças prévias culturalmente inseridas constituem outra interferência.
Exemplificando: acreditar que está sendo punido por alguma atitude do passado que
considere culposa (amante, aborto, prostituição), ou quando a imagem associada ao
sexo é de impureza e pecado.
A freqüência de divórcios não aumenta com a ocorrência de quimioterapia,
radioterapia e de transplante se o casal tem um bom relacionamento. Mas se os
vínculos são instáveis no período que antecede o adoecimento, aumentarão as
probabilidades de rupturas e de disfunções sexuais no pós-transplante.
Porém, De Vita, Hellman e Rosenberg (2005) mencionam que, apesar de
poucos estudos em relação às crianças que se submetem ao transplante,
aparentemente na idade adulta, a freqüência de casamentos e de divórcios é alta.
Essas crianças quando adultos apresentam déficit cognitivo e transtorno gonadal.
Para o homem, a experiência de viver uma disfunção sexual representa a
perda da própria masculinidade. Mas quando ele não é o sobrevivente e sim a sua
mulher, em geral demonstra dificuldades em tornar-se o cuidador, não se sente
competente para tal papel ou assume um papel paternal/maternal e deixa de senti-la
como ‘objeto de desejo sexual.
Assim, as alterações no comportamento sexual decorrentes dos efeitos
secundários do transplante afetam não somente o sobrevivente, mas também
podem produzir uma percepção negativa no parceiro sexual em relação ao
sobrevivente.
Essas mudanças podem afetar o relacionamento, provocando distanciamento,
manifestações de raiva, preocupações com recaídas e com o futuro, aumento da
ansiedade e da depressão, com sensação de inadequação e diminuição do
autocontrole. Isto pode ser vivenciado por um dos parceiros ou por ambos.
89
No pós-transplante, algumas mulheres diante da possibilidade de gerar um filho
apresentam medo de que a gravidez produza uma alteração hormonal e que esta
provoque o reaparecimento da doença.
Nas pessoas mais jovens, a infertilidade pode causar angústia por muito
tempo, e isto interfere no desejo sexual, devido à influência do psicológico no
fisiológico e esse sobre aquele.
A dificuldade se estabelece também para os solteiros, pois inibe novos
relacionamentos e gera um dilema entre contar ou não que é um “transplantado”.
Mesmo depois de ter recuperado a aparência modificada pela morbidade do
tratamento, faz com que protele a atividade sexual.
Devido ao estigma popular de que ter câncer é estar contaminado, há uma
interferência negativa nos sentimentos da identificação com o ser atraente.
O ajuste psicológico depois do tratamento também depende dos riscos pré-
mórbidos, tais como: pessimismo em relação à vida, história prévia de humor e
desordens de ansiedade ou recursos precários em relação às finanças, ao suporte
social e à saúde global.
Molassiotis e colaboradores (1995) verificaram que o Hormônio Folículo
Estimulante-FSH e o hormônio luteinizante-LH estão aumentados após três anos de
transplante e isto sugere um hipogonadismo moderado. Quando compararam a
função psicossexual dos sobreviventes com indivíduos normais constataram que o
nível de disfunção sexual é superior naqueles.
Metade dos sobreviventes está insatisfeita com a vida sexual, e os principais
problemas são impotência e ereção (37,9%), perda da libido (37,9%) e a alteração
na imagem corporal (20,7%).
Ofman (1998) comenta que a ciência está num processo evolutivo que tem
produzido um número significativo de sobreviventes. Sendo que, após o tratamento
ativo, os sobreviventes se deparam com outro desafio, que é a retomada da rotina
de vida. Porém, em condições biopsicossociais vulneráveis.
Num primeiro momento, a atenção se volta para a possibilidade de manter-se
vivo. Após um longo tempo do transplante, a atenção amplia-se para outros fatores,
além do físico, tais como: papel profissional, social e sexual.
O condicionamento utilizado para a realização do transplante pode causar a
infertilidade. Mas, além disso, o estresse decorrente de fatores emocionais também
90
pode contribuir para um desequilíbrio hormonal. Instala-se uma ferida narcísica que
se expressa na depressão pela constatação de não poder ter descendentes.
Quando o sobrevivente tem um relacionamento estável, por vezes, é preciso
ajudar o parceiro a elaborar esta nova condição, isto é, aceitar a idéia de não poder
gerar filhos.
As pesquisas em geral focalizam a etiologia orgânica da disfunção sexual e
reprodutiva: de fato, muitas são as causas fisiológicas, mas não só, pois, as
respostas psicossociais (estigma da leucemia, alterações na imagem corporal, efeito
da doença no parceiro, família e trabalho) também estão envoltas na insatisfação
sexual.
No ambulatório, quando o sobrevivente é muito jovem ou mais velho, solteiro,
viúvo ou homossexual é mais difícil partir dele o questionamento sobre a
sexualidade. Mesmo aqueles que têm parceiros sexuais fixos evitam trazer tais
queixas. Por vezes, a idéia é que devem ser gratos por estarem vivos e as
reclamações passam a ter uma conotação de estarem sendo ingratos. Por essa
razão, quando o profissional de saúde aborda o assunto dá ao sobrevivente a
oportunidade de comentar a sua insatisfação.
A equipe pode clarificar sobre as possíveis dificuldades no campo da
sexualidade, dar explicações das prováveis causas da ocorrência e, ao mesmo
tempo, explicitar o problema e expor os recursos existentes para solucioná-lo ou
amenizar a dificuldade. A satisfação sexual geralmente é um dos elementos
considerados na avaliação da QV. A condição física prejudicada interfere na
satisfação e função da sexualidade e esta performance influencia negativamente na
qualidade de vida (LEE et al., 2002).
Esse grupo de estudiosos correlacionou os domínios: físico, psicológico, social
e espiritual com a sexualidade e a QV. A amostra constituiu-se de 38 sobreviventes
que se submeteram ao transplante e encontravam-se livres de doença.
Verificaram que 69,2% das mulheres apresentaram amenorréia; 53,8%
perderam o interesse sexual; 50% manifestaram ressecamento vaginal; 34,6%
expressaram a ocorrência de menopausa precoce; 30.8% estavam com dispareunia
e 23,1% tinham dificuldade para alcançar o orgasmo.
Em relação aos homens, constatou-se que 41,7% queixaram-se de impotência
e 16,7% declararam dificuldade de ejaculação.
91
A freqüência e a QV sexual decaíram após o transplante quanto foram
comparadas com o período que antecedeu a intervenção.
Claessens, Beerendonk e Schattenberg (2006), realizaram um estudo com 34
homens e 36 mulheres, com uma idade média de 43 e 45 anos. Os sobreviventes
foram investigados entre 1 ano e meio até 18 de intervenção. Foram avaliados nas
alterações da QV, da reprodução e da sexualidade.
Os sobreviventes demonstraram perda da energia (n=50), apresentaram
prejuízo na performance do trabalho (n=31), manifestaram dificuldade no
relacionamento sexual (n=41), ou seja, 59% dos sobreviventes avaliados estavam
insatisfeitos.
Quase 60% dos sobreviventes sentiram perdas em relação ao interesse por
sexo, pela atividade sexual e prazer no ato em si, sendo que a metade dos doentes
deste grupo tinha menos que cinqüenta anos.
Quanto às mulheres, 24 manifestaram queixas em relação às perdas na
qualidade sexual devido a sintomas de menopausa, 19 falaram do ressecamento
vaginal, isto é, 53% trouxeram queixas.
Nos homens a disfunção erétil ocorreu em 47% deles. A ausência ou a
ejaculação tardia ocorreu em 38%, sendo que 62% deles também estavam numa
faixa etária abaixo de 50 anos.
Essas alterações na sexualidade interferem negativamente na QV. Pois, um
quinto dos sobreviventes não estão satisfeitos em relação à esterilidade e a
menopausa precoce. Esses resultados corroboram com estudos publicados
anteriormente por Neizert (1998), Watson, et al (1999) e Tauchmanova, et al (2003)
e colaboradores.
No pós-transplante quando a mulher engravida, existe um risco maior de
complicações, tais como: aborto espontâneo, nascimento pré-termo com baixo peso
e a cesariana, que tem sido um procedimento freqüente. Porém, não há um aumento
de anormalidades congênitas e de crianças com malignidade. Sabendo-se que a
fertilidade pode ser restaurada, deve existir um cuidado contraceptivo. Alguns
sobreviventes optam pela adoção ou pela fertilização in vitro (SALOOJA, 2001).
Apesar de ser difícil, a recuperação gonadal espontânea é viável. É possível à
recuperação espontânea de fertilidade e da espermatogênese, após longa data, isto
é, 9/10 anos após o transplante (JACOB et al., 1998).
92
Se na época do transplante, aquele que se submete for uma criança ou púbere
isto poderá inibir o desenvolvimento normal do corpo interferindo na auto-estima e
na QV, devido à perda da função gonadal. Tendem a reagir com fuga das situações
de concorrência e ou competição na dimensão social, profissional e física.
Na fase adulta desses sobreviventes, 20% sentem-se desqualificados em
relação ao desempenho no trabalho e 34% apresentam um decréscimo na
capacidade intelectual.
A perda do emprego e a discriminação no trabalho, principalmente nas
mulheres sobreviventes, foram associadas às seqüelas do DECH-c. A fadiga
também causa prejuízos, mas é mais freqüente na primeira década de seguimento
do tratamento.
Quanto à satisfação na QV, 44% referem que houve um declínio. Assim como
no relacionamento social, mais de um quarto relatam que aconteceu uma mudança
para pior. Mas, em contrapartida, 33% mencionam que a vida familiar melhorou e
muito.
A função ovariana e testicular invariavelmente é afetada se o condicionamento
for alquilante em dose alta nos vários ciclos da quimioterapia e da radioterapia.
Porém, o grau e a duração da falha gonadal dependem da dose e da idade em que
recebeu o condicionamento (MEHTA e WINGARD, 2002).
Se a menina estiver no final da puberdade ou adolescência durante o período
do transplante, provavelmente desenvolverá falha ovariana devido ao aumento dos
níveis de hormônio luteinizante e hormônio folículo estimulante, com ou sem
acréscimo dos níveis do estrogênio. Conseqüentemente tais jovens poderão ter
osteoporose precocemente, fraturas ósseas, transtornos lipídicos e doença do
coração. A osteoporose está potencialmente associada ao uso de esteróide e
radioterapia.
Noventa por cento das mulheres com mais de 40 anos e que se submeteram a
um regime de quimioterapia altamente tóxico apresentam disfunção ovariana
provocando amenorréia temporária ou permanente. Mas isso também ocorre em
50% das sobreviventes jovens.
Apesar do suplemento de estrogênio ser o tratamento mais efetivo para reduzir
os danos da menopausa precoce, o uso prolongado pode causar efeitos adversos,
tais como: doenças ósseas e do coração.
93
Os meninos pré-púberes mantêm os níveis de testosterona normais (90%), isto
é, a fertilidade não se altera se eles forem submetidos ao transplante ainda crianças.
Contudo, se forem pós-púberes podem desenvolver deficiência de testosterona.
A infertilidade devido à disfunção gonadal decorre da terapêutica do
tratamento, mas muitos sobreviventes podem se beneficiar dos bancos de esperma.
Porém isso depende porque a própria doença aguda pode causar azoospermia
(ausência de produção do esperma).
Um estudo mostrou que 56,9% não produziam sêmen e mais de 20%
apresentavam ansiedade em relação à esterilidade e à falta de sêmen (GANZ e
BOWER, 2004).
Existem diferentes tipos de tratamentos que são recomendados conforme as
características dos distintos sobreviventes e dos estágios da doença.
A radioterapia, a presença da doença do enxerto e a esterilidade estão
associadas à disfunção sexual na mulher, mas no homem não o estão. A perda
excessiva da lubrificação vaginal aparece como a mais importante causa da
insatisfação sexual.
Por isso, alguns sobreviventes preferem não usar a terapêutica de reposição
hormonal e administram os sintomas da menopausa com medicações para
osteoporose, exercícios e o uso de lubrificantes.
Assim, existem benefícios e riscos em relação à terapia de reposição hormonal.
Este tratamento retira os sintomas associados à menopausa, mas tem efeitos
deletérios. Além disso, pode não qualificar o funcionamento sexual e a satisfação,
uma vez que a sexualidade se concretiza também pela subjetividade.
Isso porque a sexualidade sofre interferência da intervenção e de seu
comprometimento clínico, bem como também dos caracteres como, idade, cultura,
normas sociais, experiências prévias, insegurança em relação ao parceiro,
condições emocionais precárias do companheiro, dificuldade de comunicação,
papéis instáveis durante o tratamento e o status da recuperação e das alterações
fisiológicas.
Existem alguns fatores de risco que influenciam as respostas do ciclo sexual,
entre eles: imagem corporal alterada, ansiedade, depressão, auto-estima reduzida,
medo de recaída, estresse da rotina de vida e outras queixas em relação à
fertilidade e fatores psicossociais.
94
A alopecia em ambos os sexos tem um efeito negativo nos sobreviventes, pois
a alteração da imagem corporal modifica o sentimento de “ser desejável”.
Há uma relação direta entre níveis altos de aflição psicológica com a
diminuição da satisfação sexual e um aumento de rompimentos de relacionamentos
sexuais. Por isso, quando se encontra alto nível de angústia em homens no pré-
transplante, isto é considerado um preditor de insatisfação sexual no pós-
transplante.
Na disfunção erétil, é preciso investigar a história clínica, as condições médicas
atuais, os medicamentos de uso e a evolução endócrina, os níveis de testosterona, a
inervação autônoma, entre outros sintomas.
Muitos dos sintomas comuns na mulher estão associados à menopausa
precoce, tais como: sono interrompido decorrentes de suores e calorões, alterações
na elasticidade e lubrificação vaginal e amenorréia.
Freqüentemente ocorrem queixas em relação à diminuição da libido, disfunção
na ereção e ejaculação, menopausa prematura, alterações vaginais e dispareunia.
Essas insatisfações podem permanecer durante anos e isto tem uma repercussão
na QV dos sobreviventes transplantados.
No pós-transplante alogênico 52% das mulheres citam problemas na
lubrificação vaginal, 33% apresentam dispareunia, 46% encontram dificuldades em
relação ao orgasmo (SYRJALA et al., 1998).
No homem, a alteração das gônadas pode causar perda ou redução da
secreção de esteróides sexuais e a ausência ou resposta negativa das glândulas
pituitárias e hipotalamica. Se for a níveis elevados, este comprometimento poderá
causar uma falha gonadal (KLEIN e GODE, 1992).
Alterações nos níveis de testosterona podem resultar em diminuição da libido e
na disfunção erétil. Isto e mais a infertilidade estão associadas à hiperprolactinemia
(MOLASSIOTIS et al., 1995).
Agentes alquilantes que causam neuropatias periféricas e detrimento
neurovascular secundário da radioterapia também podem causar disfunção erétil.
Alterações nos níveis hormonais e danos neurovascular também podem
diminuir a satisfação na resposta do desejo e do orgasmo, prejudicando a
satisfação.
De acordo com Ganz e Bower (2004), existem quatro categorias de disfunção
sexual, que envolvem os aspectos do desejo, excitação, orgasmo e dor. Por isso,
95
sugerem um modelo de intervenção que inclui acolher, dar informações, sugestões
específicas e conduzir para uma terapêutica intensiva. Este esquema de trabalho
segue um roteiro que recebeu a denominação de Permission giving Limited
Information Specific Suggestions Intensive Therapy (PLISSIT).
Essa intervenção considera o fato de que a vivência sexual é um complemento
fundamental para o bom relacionamento do casal. Quando este elo está
desconectado, isto pode interferir na auto-estima, na energia e no entusiasmo para
as atividades da vida em geral.
Nos sobreviventes em que o relacionamento do casal é insatisfatório,
independentemente da doença ou do tratamento, a tendência é que com o
surgimento da enfermidade e suas conseqüências, estas sejam usadas como
justificativa para desistir do ato sexual.
Sendo assim, a interrupção não está diretamente relacionada às comorbidades
decorrentes do adoecimento e ou do tratamento, mas sim à construção simbólica
estabelecida no pré-transplante. Deste modo, a percepção, os sentimentos e a
experiência pessoal em relação à própria vida sexual interferem no desempenho da
sexualidade.
Os limites não são relativos apenas às condições da doença, mas também à
qualidade da realidade psíquica e emocional do indivíduo. A base pode ser o corpo,
mas a sexualidade está além do biológico (AMPARO, 2003).
Sendo assim, mesmo sem a intervenção do transplante, cada um tem seus
próprios limites e limitações em relação à vivência sexual. Por vezes, o impedimento
maior de uma experiência sexual satisfatória encontra-se dentro da própria pessoa,
em decorrência da forma como simboliza esta vivência, podendo manifestar-se
independentemente da condição clínica do momento.
Aquele que se encontra doente, muitas vezes, acredita que o questionamento
sobre a satisfação sexual soa como algo fora do contexto. Assim, é preciso
disponibilizar um espaço para que o constrangimento fique diluído e o sobrevivente
possa trazer suas dúvidas, queixas e reivindicações dos recursos existentes.
Há uma máxima de Aristóteles que diz: “O homem prudente não aspira ao
prazer, mas à ausência da dor”. Inicialmente os sobreviventes estão voltados a não
vivenciar o desprazer da dor, do sofrimento e do insucesso do transplante (FAYERS
e MACHIN, 2001; YALOM, 2005).
96
No entanto, os sobreviventes de média e longa data pós-transplante iniciam um
investimento em interesses que vão além do aspecto da condição física. Começam
a acreditar que podem ampliar suas metas, objetivos e sonhar com a possibilidade
de uma vida prazerosa e não apenas de sobrevivência, inicia-se, então, uma nova
construção e (ou) reconstruções do desejo.
2.4.5 Reconstrução: uma Possibilidade do Despertar do Desejo
Se há uma reconstrução, fica subentendido que anteriormente existia uma
construção. Quiçá constituída com matéria-prima que envolve uma sobreposição de
fenômenos, como, cultura, experiências anteriores, estrutura de personalidade,
valores autênticos, idade, gênero, estado civil, nível socioeconômico, condições de
saúde, qualidade de relacionamentos afetivos.
Sendo assim, a reconstrução da vida sexual realizada pelos sobreviventes de
longa data tem como base e recursos os antecedentes do pré e pós-transplante
imediato e de médio prazo.
Observa-se que, mesmo na vigência de algumas seqüelas e
comprometimentos decorrentes do processo do transplante, algo pode ser feito em
prol da melhoria desta condição.
Existem algumas atitudes que podem alicerçar a reconstrução da sexualidade,
tais como: a) ter um papel ativo na busca da própria felicidade; b) avaliar a escala
pessoal de valores; c) marcar um encontro consigo mesmo pelo autoconhecimento;
d) considerar a valoração individual; e) preservar a auto-estima; f) processar a
comunicação; g) solucionar ao máximo as comorbidades; h) expressar os desejos e
anseios sem receios.
Em relação ao papel ativo na busca da própria felicidade, por vezes, a
construção anterior é totalmente demolida, parte-se então do zero, no pós-
transplante. O sobrevivente refaz a sua vida sexual porque não aceita mais a
condição de manter uma relação só por conveniência ou por medo de enfrentar uma
separação. A superação da dor vivida na experiência do transplante lhe dá força
para enfrentar qualquer outra dificuldade. Assim, toma decisões para viver com
honestidade em relação a si mesmo. Enfim, e por fim, assume a responsabilidade
pela própria felicidade, não se aquieta no conformismo.
97
Mas na reconstrução também é possível aproveitar os pilares preexistentes
(valores e vínculos afetivos). Como exemplo, são os relacionamentos que
amadurecem, porque na possibilidade da perda, desvendam valores que estavam
esquecidos.
Há uma busca e uma preferência pelo que realmente tem valor, é preciso
estabelecer uma relação de troca saudável.
Uma história grega conta que no início o homem tinha o feminino e o masculino
juntos, internalizados. Os deuses com inveja separaram esta força interior, assim
iniciou-se a busca pela alma gêmea.
Este conto expressa a necessidade que temos de encontrar um parceiro de
vida. Quando existe um relacionamento afetivo de qualidade já estabelecido é difícil
que ocorra separação. Porém, quando a relação pré-mórbida é frágil, as
probabilidades de rompimento são significativas.
Mas, a sexualidade tem mais possibilidades de ser vivida com qualidade
quando há uma integração do afetivo com o sexual. Por isso a importância de o
profissional abordar terapeuticamente o casal e não apenas o sobrevivente.
Contudo, com ou sem a existência da cara-metade, deve-se trabalhar com o
feminino e o masculino interiorizado, uma vez que o ser humano, a despeito dos
deuses, continua com estas forças opostas internalizadas.
Assim, o profissional deve ser uma ferramenta útil para os sobreviventes
compreenderem a verdade de cada um. Apesar da interpretação da realidade ser
apenas uma parcela da verdade, mesmo assim, a conscientização da própria
vivência é esclarecedora e tem influência primordial na maneira de ver o cotidiano e
de apresentar-se para a vida.
Outro alicerce importante a ser visto é a questão da auto-estima, ou seja, qual
o valor que o indivíduo acredita possuir.
A natureza do homem necessita da estética por si só, pois esta alimenta a
alma. Schopenhauer diz que a beleza é uma carta de recomendação de quem a
possui (apud YALON, 2005).
Na Grécia Antiga já existia o culto ao corpo, a saúde e a busca da perfeição.
Atualmente, a sociedade valoriza a estética a qualquer preço, por vezes, a beleza
está acima da própria saúde. Naturalmente, para quem passa pela experiência da
morte iminente, este valor perde a sua intensidade. Porém, conforme se tem a ilusão
do distanciamento da morte, este valor vem em cobrança. Uma sobrevivente no
98
meio do processo do transplante questiona, “uma mulher como eu (referindo-se a
sua falta de atrativos) é capaz de atrair um homem bonito?”.
Quando a auto-estima está desqualificada então o indivíduo altera a opinião
que tem de si próprio conforme a expressão do outro. Fica à mercê da referência
coletiva e não pessoal, acreditando que para ter uma vida sexual ativa precisa ter
um “corpo sarado”, uma embalagem comestível. Assim, exclui-se antes mesmo de
sentir a concorrência. Esquece que uma cédula pode manter seu valor, mesmo
estando amassada.
Além disso, é fundamental o diálogo entre os parceiros para que encontrem o
melhor ajuste e sanem algumas dificuldades com soluções criativas. O profissional
pode auxiliar inserindo o cônjuge nas discussões dos problemas e sugerindo
propostas intervencionistas possíveis para aquele que se submete ao transplante.
É preciso estar atento se de fato houve uma comunicação, pois nem sempre a
certeza de ter falado ou do outro ter ouvido significa que realmente houve uma
escuta ou que a comunicação esperada tenha se processado. É bastante comum o
problema do mal-entendido, do dito pelo não dito e isto serve de base para
atividades circulares, estereotipadas e interpretativas, mas sem sintonia
(ZIMERMAN, 2000).
A comunicação é necessária para que o muro erguido com as seqüelas da
doença, do tratamento e das bases do relacionamento possa ser gradativamente
ultrapassado.
É óbvia a importância da resolução das comorbidades, de não negligenciar a
história clínica e as condições médicas devido aos efeitos secundários que podem
dificultar o prazer sexual em decorrência de uma serie de sintomas, como por
exemplo: dispaurenia, ressecamento vaginal, infertilidade, hiperprolactinemia
associada à perda da libido, imagem corporal alterada, menopausa precoce, entre
outros.
Os sobreviventes precisam ser orientados para que recebam tratamentos
específicos com reposição hormonal, modificações na dieta, antidepressivo, cremes
próprios, massagens e outras indicações coerentes com a especificidade da queixa.
A equipe deve ser composta ou realizar encaminhamentos para especialistas
correspondentes aos problemas apresentados. Conforme o sobrevivente deve
providenciar o agendamento com urologista, ginecologista, endocrinologista,
99
psicólogo, terapeuta ocupacional, nutricionista, fisioterapeuta, cardiologista e/ou
psiquiatra.
É muito importante que o sobrevivente tenha desejo de ter desejos e de ser
desejado. A ocorrência da perda do prazer e da falta de vontade de ter prazer é
prejudicial e interfere na reconstrução da sexualidade. É preciso que o indivíduo
queira reverter à situação.
Para Freud e demais seguidores de seu pensamento a sexualidade é uma
necessidade primária que contribui para satisfazer as exigências do organismo. Algo
similar a comer, beber e dormir. Essas necessidades, conceituadas como pulsões
encobertas por superestruturas culturais, estariam inscritas no cérebro e
encontrariam uma gratificação no prazer e na satisfação. E quando não satisfeitas
gerariam descontentamento.
Continuando, para que as pulsões se realizem, para que o indivíduo seja
impelido rumo à comida ou ao sexo, é preciso existir o prazer, como um reforço que
manifeste a expressão de suas necessidades (citado por FAYERS e MACHIN,
2001). Tem que ser reforço e não esforço, como os sobreviventes mencionam.
A proposta do título deste capítulo não foi por existir a resposta e a receita
certa para os sobreviventes, mas foi mobilizada pela pergunta: o que fazer, diante de
tantas queixas?
É premente a necessidade de abordar terapeuticamente este assunto nas
consultas, nas reuniões, nas aulas para sobreviventes e cuidadores, para que novas
construções se materializem, apesar das perdas, medos e defesas.
O profissional da área de saúde deve diagnosticar e intervir, conforme as
necessidades e os recursos disponíveis para cada sobrevivente (acupuntura,
massagem, psicoterapia, farmacologia, ginecologista, endocrinologista, yoga,
musicoterapia).
Se o sobrevivente vive aprisionado pelas próprias limitações artificiais por
desconhecer as suas reais potencialidades. Cabe ao especialista contribuir na
amplificação da percepção do sobrevivente, para que esse possa compreender não
só o que tem e conhece, mas também aprender a explorar o que tem e desconhece.
É no decorrer do seguimento da recuperação da saúde que questões
esquecidas voltam a ter importância, ou um lugar de reflexão, por exemplo,
sexualidade, lazer, profissão e projetos.
100
Os profissionais devem viabilizar condições clínicas para que eles encontrem
um atendimento que faça ressonância com suas necessidades terapêuticas.
A psicologia pode contribuir para o resgate da satisfação sexual do
sobrevivente mediante a elaboração dos afetos e desafetos que estão envoltos na
sexualidade em si. O que se almeja no atendimento e entendimento destes
sobreviventes é que apesar de, consigam vivenciar o movimento da flor, conforme o
que traz Schopenhauer (2005).
“A flor respondeu: — Bobo! Acha que abro minhas pétalas para que vejam?
Não faço isso para os outros, é para eu mesma, porque gosto. Minha alegria
consiste em ser e desabrochar” (YALOM, 2005).
2.4.6 Abordagem Intervencionista no Resgate da Sexualidade
Verifica-se uma disparidade muito grande entre a expectativa do pós e os
resultados obtidos, deste modo acentuam-se as dificuldades psicossociais
(ANDRYKOWSKI et al., 1995).
Por isso uma das intervenções no pré-transplante é prevenir o sobrevivente em
relação aos resultados, diminuindo a diferença entre a realidade esperada e o real.
Ao serem preparados para as disfunções sexuais podem acionar recursos para a
adaptação em relação a estas perdas e desenvolverem o basal de tolerância
mediante a vivência desse período como seqüência do tratamento e não como
resultado final.
Tratamentos alternativos para a resolução dos sintomas da menopausa podem
ser feitos com o uso de ervas, vitaminas, yoga, acupuntura, exercícios, modificações
na dieta, entre outros.
A depressão e a ansiedade podem diminuir o desejo sexual tanto no homem
como na mulher. O uso de antidepressivos pode ocorrer, apesar de alguns
medicamentos (antidepressivos, estimulantes, sedativos, anti-andrógenos, anti-
hipertensivos, anticolinérgicos, anti-histamínicos) também afetar o funcionamento
sexual.
A ansiedade interfere na libido e na reação, uma vez que o indivíduo não
consegue se concentrar nas sensações prazerosas, seus pensamentos ficam
direcionados na expectativa do que está por vir.
101
O atendimento psicológico deve estar inserido no processo do transplante para
auxiliar na qualidade não apenas da sexualidade, mas da vida, oportunizando um
espaço para o indivíduo elaborar sua nova condição de saúde.
Para ter satisfação na vida é preciso encontrar um sentido para a própria
existência, ir além do biológico e poder viver o que é possível, sem ficar na
expectativa do ideal e ou do completo.
Outra sugestão possível é a implantação de grupos terapêuticos de casais.
Estes podem ser acompanhados durante o processo de recuperação e no retorno da
vida normal. É fundamental que haja comunicação entre o casal para que busquem
a solução.
A avaliação das respostas fisiológicas, psicológicas, sociais, culturais amplia as
condições do profissional da área de saúde na condução de intervenções mais
efetivas. Porém, é fundamental relembrar que no interjogo da sexualidade muitos
fatores estão sobrepostos e este complexo quadro passa pelo filtro interpretativo do
sobrevivente, ou seja, para se obter um bom resultado é preciso considerar o fato de
que a função sexual pode viabilizar uma experiência sexual, mas não pode garantir
uma satisfação subjetiva da sexualidade vivida.
Por isso, deve-se discernir se o problema da insatisfação sexual encontra-se
na dimensão física ou no relacionamento pessoal ou em ambos, uma vez que o
planejamento de tratamento muda substancialmente.
As idéias preconcebidas de que o transplante detona qualquer possibilidade de
satisfação sexual não se sustentam, porque muitos sobreviventes só conseguem
uma melhoria na QV e uma vida sexual satisfatória no pós-TCTH.
As repercussões da intervenção do transplante no resgate da sexualidade são
complexas, sendo assim, é fundamental que o profissional da área de saúde leve
em consideração este tópico durante a abordagem avaliativa e intervencionista.
É premente que novos estudos se instaurem e se estabeleçam no campo da
sexualidade, visando ampliar os conhecimentos da função e satisfação sexual dos
adultos que se submeteram ao transplante.
102
3 CASUÍSTICA E METODOLOGIA
3.1 CASUÍSTICA
Participaram do estudo 478 indivíduos, de ambos os sexos, na faixa etária de
18 a 68 anos, sendo 214 sobreviventes e 264 indivíduos da população normal. O
grupo de sobreviventes representa uma amostra dos sobreviventes que se
submeteram ao TMO alogênico, realizado pelo STMO-HC-UFPR.
3.1.1 Critérios de Inclusão
Grupo de Sobreviventes
a) Diagnóstico de hemopatias benignas e malignas
b) Ambos os sexos
c) Idade igual ou superior a 18 anos
d) Com 10 anos ou mais de pós-transplante de medula óssea alogênico
e) Alfabetizados
f) Realizaram o transplante de medula óssea alogênico no STMO-HC-UFPR
g) O paciente se submeteu ao TMO no período anterior ao ano de 1997
h) Concordar e assinar o termo de consentimento livre e esclarecido (Anexo-1)
Grupo Controle
Os indivíduos do grupo controle foram recrutados em um único Banco de
Sangue de Curitiba que recebe doadores todas as regiões do Brasil,
independentemente do nível sócio-econômico ou cultural.
a) Livre de doenças crônicas e sem uso de medicação controlada
b) Ambos os sexos
c) Idade igual ou superior a 18 anos
d) Alfabetizados
e) Não realizaram consultas médicas para tratamento, apenas as de rotina
preventiva, nos últimos três meses
f) Ser doador voluntário de sangue
g) Concordar e assinar o termo de consentimento livre e esclarecido (Anexo 2)
103
3.2 MATERIAL
O protocolo psicométrico utilizado para avaliar a QV foi composto pelos
seguintes instrumentos de pesquisa:
a) Questionário Demográfico (Anexo-3 e 4)
b) FACIT-Fatigue
d) WHOQOL
e) BDI - Inventário de Depressão do Beck
f) BAI - Inventário de Ansiedade do Beck
g) Karnofsky - Escala Unidimensional de QV – KPSS
3.3.PROCEDIMENTOS
3.3.1 Método de Aplicação de Questionários e Entrevistas
3.3.1.1 Grupo de Sobreviventes
Através da equipe e do Banco de Dados do STMO-HC-UFPR, foi possível
obter uma compilação de informações clínicas necessárias para a seleção e
definição da amostra desta pesquisa.
Todos os indivíduos foram entrevistados pela mesma psicóloga e informados
sobre os objetivos da pesquisa e da confidencialidade dos dados.
Após a concordância e assinatura do termo de consentimento livre e
esclarecido, realizou-se a coleta de dados pessoais e clínicos. Essa acontecia
através do questionário demográfico, que fornecia informações sobre as variáveis
associadas com a QV, exemplificando, sexualidade, idade, gênero, estado civil, nível
educacional, nível sócio econômico, profissão, religião, etnia. Também abrange
informações clínicas adicionais, tais como, diagnóstico, regime de condicionamento,
tipo de transplante, tempo de pós-transplante, tempo de diagnóstico.
Posteriormente foram feitas as aplicações das escalas específicas da avaliação
da QV. Os instrumentos de avaliação foram respondidos conforme a ordem do
material mencionado acima.
104
Todas as escalas são de auto-aplicação, com exceção do Karnofsky que foi
administrada pelo médico. Esse verificava o status físico do sobrevivente e
quantificava conforme os níveis da escala de desempenho de Karnofsky e estes
valores numéricos foram transpostos para o protocolo de pesquisa.
Além das entrevistas realizadas no ambulatório do STMO-HC-UFPR, algumas
aconteceram através de e-mails e de telefonemas. Foi uma forma de suprir a
ausência ambulatorial destes sobreviventes de longa-data. Dentro da rotina de
acompanhamento pós-transplante há sobreviventes que só retornam ao ambulatório
para a consulta de seguimento de dois em dois anos. Outros devido à distância e a
impossibilidade econômica ou de compromissos assumidos não poderiam vir dentro
do prazo solicitado. Em decorrência destes fatos, a amostra deste estudo foi
composta pelos sobreviventes que preencheram os critérios de inclusão, conforme
descrito na metodologia.
Nas situações em que os questionários foram encaminhados por endereço
eletrônico foram debatidos, posteriormente, por telefone. Quando o contato foi
somente por telefone, a pesquisadora lia as questões e anotava a resposta dada
pelo sobrevivente. Durante todo este processo houve a preocupação para seguir
exatamente a mesma seqüência e procedimento que fora aplicado no ambulatório.
O agendamento ocorria antecipadamente, para não interferir na rotina do
respondente.
A digitação de todos os dados foi realizada de forma duplicada e independente
pela pesquisadora e por outra profissional da mesma área.
3.3.1.2. Grupo Controle
O procedimento da pesquisa em relação ao grupo controle foi semelhante ao
grupo de sobreviventes.
A amostra é composta de 264 indivíduos representantes da população normal,
recrutados num banco de sangue e são doadores voluntários de sangue.
Esses doadores voluntários foram para o Banco de Sangue, com o intuito de
ajudar algum familiar, amigo ou alguém do trabalho que estava necessitando. Por
vezes, simplesmente estavam imbuídos pela consciência social, assim, faziam com
a intenção de ajudar qualquer um que precisasse.
105
Eram avaliados pela equipe clínica do Banco de Sangue e quando habilitados
para a doação, estavam liberados para este estudo.
A avaliação do grupo controle se realizou no HemoBanco da cidade de
Curitiba. Após a explicação dos objetivos do trabalho, e da aceitação em participar
do estudo, os doadores voluntários foram convidados a responder o questionário
demográfico e preencher todos os questionários de auto-aplicação, conforme
mencionados acima.
O protocolo de pesquisa foi o mesmo utilizado com os sobreviventes exceto a
escala de Karnofsky, tendo em vista que tal escala é específica para a avaliação de
sobreviventes.
3.4 TRATAMENTO DAS VARIÁVEIS
3.4.1 Dados Demográficos
A amostra total foi estratificada quanto ao sexo, idade atual, estado civil, filhos,
escolaridade, etnia, nível socioeconômico, procedência, profissão, condição atual de
trabalho e religião. Todas essas variáveis numéricas foram transformadas em
categorias binárias, exceto a idade atual que foi dividida em três categorias. As
variáveis pertinentes ao grupo controle receberam o mesmo tratamento de
categorização binária.
Com relação à escolaridade considerou-se a quantidade de anos de estudo,
categorizados em dois grupos: 1) com até oito anos e 2) com mais de oito anos de
estudo. Foi usado como fonte de referência à classificaçaõ de acordo com o IBGE.
O nível socioeconômico compreende uma série de indicadores, tais como:
condições habitacionais e nutricionais, culturais, bens domésticos, entre outros. Para
o presente estudo, o nível socioeconômico foi classificado a partir das informações
obtidas junto ao Serviço Social do TMO que tem como referência os Indicadores
Econômicos Nacional (IEN) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístico (IBGE).
Dentre os treze indicadores para referência nacional, o indicador sobre a
aquisição de bens domésticos substitui a renda familiar (per capita). Dentro deste
contexto a classificação do nível socioeconômico para toda a amostra da pesquisa
foi dividida em duas categorias: classe média/alta e classe baixa.
106
Profissão, categorizada de acordo com o tipo de ocupação: intelectual e braçal.
Dentro da categoria intelectual estão: professores, engenheiros, advogados,
médicos, bancários, vendedores de seguros, autônomos, estudante. O trabalho
braçal incluiu: dona de casa (do lar), operadoras de máquinas, agricultores,
balconistas, motoristas, cabeleireira, pintores, pedreiros.
3.4.2 Características Clínicas
3.4.2.1 Diagnóstico
O diagnóstico dos sobreviventes foi dividido em duas categorias: hemopatias
malignas e benignas. As doenças consideradas dentro do grupo de malignas foram:
LMC-Leucemia Mielóide Crônica, LMA-Leucemia Mielóide Aguda, LLA- Leucemia
Linfóide Aguda, LH-Linfoma de Hodgkin e SMD-Síndrome Mielodisplásica.
As que compusseram o grupo das doenças benignas, foram: AAS-Anemia
Aplásica Severa, AF-Anemia de Fanconi, HPN-Hemoglobinúria Paroxística Noturna
e WA-Wiscott Aldric.
3.4.3 Qualidade de Vida Global
A análise quantitativa para obter o valor de QVG foi realizada a partir das
respostas de cada item que compõe os quatro domínios da escala WHOQOL (físico,
psicológico, relações sociais e meio ambiente). A transformação dos resultados
numéricos foi realizada através da somatória das respostas aplicada as equações
que a folha de respostas determina.
Os valores de cada domínio foram agrupados em variáveis binárias: satisfeito
e insatisfeito. Os resultados foram transferidos para planilha específica, para serem
analisados por meio de métodos estatísticos. Os quais foram apresentados sob a
forma de tabelas e tratados descritivamente.
107
3.5 ANÁLISE ESTATÍSTICA
Os dados coletados foram digitados em planilha eletrônica (Microsoft Excel®),
conferidos e exportados para o programa STATA 8.0 (STATA Corporation College
Station, EUA). Utilizou-se a estatística descritiva para apresentar os dados. As
diferentes características dos grupos foram expressas em porcentagens, medianas e
médias (±DP).
Para a análise inicial dos resultados fez-se a correção das respostas dos
respondentes conforme a metodologia descrita nos manuais dos instrumentos
utilizados (somatória transformação dos resultados brutos em números ponderados
e a classificação de acordo com o número de corte definido).
Adotou-se a análise univariada e multivariada para identificar os possíveis
fatores associados com a QV e as possíveis variáveis dependentes. O modelo de
regressão logística foi utilizado para avaliar as variáveis relacionadas com a variável
de desfecho: QV Global. Esta operação estatística foi realizada pelo próprio
programa e o teste Qui-Quadrado de Pearson.
O nível de significância estatística (ou probabilidade de significância) adotado
em todas as escalas foi de 95% (p 0,05) na análise dos fatores que influenciaram a
QV dos sobreviventes e controles.
No processo da análise optou-se por testar o modelo utilizando o recurso
stepwise backwards, ou seja, iniciou-se o modelo com todas as variáveis com
significância estatística com valor do p 0,20 e foram suprimidas as variáveis que no
decorrer da análise apresentaram valor de p > 0,05.
Em relação à análise dos resultados obtidos no instrumento FACT-Fatigue
realizou-se uma transformação linear simples de zero a cem, conforme apresentado
anteriormente na descrição das escalas.
As respostas foram categorizadas em número binário (0,1), ao proceder desta
forma perde-se o refinamento dos dados, pois, para o uso deste método, faz-se um
enquadramento numérico das respostas subjetivas.
O motivo desta categorização decorreu da necessidade de compilar os dados
para que os resultados fossem mais consistentes e representativos da condição real
dos sobreviventes e do grupo controle. O mesmo critério foi utilizado em ambos os
grupos.
108
Ficou definido que a presença do numeral zero significa um resultado
favorável, para o respondente. Enquanto que o numeral 1 refere-se ao resultado
desfavorável.
Deste modo, na transformação para binário ficou sim ou não. Por isto se a
pergunta for positiva (Durmo bem?) quanto maior a pontuação, melhor o resultado e
assim é classificado com zero.
Porém, se a pergunta é negativa (Sinto-me triste?) quanto menor a pontuação,
melhor o resultado e assim é classificado também como zero.
É importante registrar que as escalas FACIT-Fatigue e a WHOQOL
apresentam na folha de resposta equações que já fazem a transformação numérica
das respostas (escores) que são oriundas de perguntas negativas.
Nas escalas Beck, para depressão e ansiedade, os resultados são
categorizados em quatro níveis de intensidade (1 - mínimo; 2 - leve; 3 - moderado e
4- grave) conforme o número de corte determinado (BECK, 1993).
Para transformar as respostas em número binário, foi usado como referência
de corte a pergunta: A depressão tem uma intensidade mínima? Com isto a resposta
positiva foi categorizada como zero e para qualquer outra intensidade foi
considerado como valor um, isto é, os numerais 2, 3 e 4 tornaram-se 1.
Na seqüência, realizou-se a análise univariada para identificação dos fatores
que influenciavam os escores. Então foram definidas categorias que passaram pela
análise do teste Pearson Qui-Quadrado, com correção de Yates para amostras
relacionadas.
Foram selecionados os fatores da univariada com p 0,20 para a análise
multivariada por regressão logística, ou seja, na univariada a triagem foi feita pela
significância da probabilidade (valor do p). Em seguida os fatores relacionados à QV
e seus componentes foram identificados.
Como foram coletadas muitas variáveis (n= 10) utilizou-se para a avaliação das
regressões possíveis, no modelo inicial, o método de seleção Stepwise backwards
Enfim, para a análise de fatores foi utilizado o método de fatores principais
iterados, no programa STATA 8.0, com o intuito de atingir melhores estimativas nas
correlações e rotação, uma vez que, é próprio para avaliação univariada e
multivariada (RUMMEL, 1988).
109
Em decorrência deste objetivo todos os valores numéricos foram transformados
em categorias binárias. As variáveis: idade atual e idade em que se submeteram ao
transplante mantiveram três categorias.
110
4 RESULTADOS
4.1. DESCRIÇÃO DO ESTUDO VIGENTE DO TMO DO STMO DA UFPR-HC
4.1.1 Seleção do Grupo de Sobreviventes
Conforme os registros do banco de dados do STMO-HC-UFPR, 701 pacientes
tinham as características necessárias para serem inclusos no estudo. Porém destes,
389 tinham falecido. Dos 312 sobreviventes, 98 não foram avaliados por razões
logísticas. Sendo assim, a amostra de sobreviventes que constituíram o estudo foi
de 214. Distribuição apresentada na Tabela seguinte.
TABELA 3: DISTRIBUIÇAO DA AMOSTRA POPULACIONAL E DO GRUPO DE
PACIENTES REPRESENTANTES DO ESTUDO
Total Óbitos Vivos
A
valiados Não Avaliados
701 389 312 214 98
4.2 DESCRIÇÃO DA POPULAÇÃO DO ESTUDO
4.2.1 Dados Demográficos
A Tabela 4 apresenta as características da amostra do estudo quanto ao
número e ao percentual dos grupos, de acordo com sexo, idade no momento da
avaliação, estado civil, filhos, escolaridade, etnia, nível sócio econômico,
procedência, profissão, condição de trabalho e religião.
111
TABELA 4: CARACTERÍSTICAS DEMOGRÁFICAS DA POPULAÇÃO DO ESTUDO
Sobreviventes
(
n=214
)
Controle
(
n=264
)
Variáveis N % N %
p
Sexo
Feminino 75 35,0 138 52,3
Masculino 139 65,0 126 47,7 0,000
Idade
(
anos
)
18-25 49 22,9 90 34,1 0,03
26-35 68 31,8 69 26,1
> 36 97 45,3 105 39,8
Estado Civil
Casado 124 57,9 124 47,0
Solteiro 90 42,1 140 53,0 0,02
Filhos
Sim 76 35,5 139 52,7
Não 138 64,5 125 47,3 0,000
Escolaridade
A
té 8 anos 70 32,7 44 16,7
A
cima de 8 anos 144 67,3 220 83,3 0,00
Etnia
Branco 187 87,4 218 82,6
Outras 27 12,6 46 17,4 0,15
NSE
Média/alta 77 36,0 126 47,7 0,01
Baixa 137 64,0 138 52,3
Procedência
Sul/Sudeste 171 79,9 259 98,1
Outros 43 20,1 5 1,9 0,000
Profissão
Intelectual 125 58,4 150 56,8
Braçal 89 41,6 114 43,2 0,73
Condição
Empregado 178 83,2 150 87,9
Desempre
g
ado 36 16,8 114 43,2 0,000
Reli
g
ião
Católico 174 81,3 157 59,5
Outras 40 18,7 107 40,5 0,000
Teste: * qui-quadrado de Pearson
Conforme indica a Tabela 4, o grupo dos sobreviventes inclui 75 do gênero
feminino e 139 indivíduos do masculino. No grupo controle há 138 do gênero
feminino e 126 do masculino. As amostras são compostas por jovens, uma vez que,
mais da metade tem menos de 36 anos. Como os grupos não foram pareados, há
uma diferença entre eles no tocante à idade. Observa-se que 34,1% dos indivíduos
do grupo controle tem idade entre 18-25 anos
Com relação à escolaridade 67,3% dos sobreviventes e 83,3% do grupo
controle estudou mais de oito anos. É importante mencionar que muitos de ambos
os grupos ainda são estudantes e com idade cronológica coerente com o período da
escolarização atual.
112
Mais de 50% dos indivíduos que possuem uma função no mercado de trabalho
foram classificados como intelectuais e acima de 80% deles encontram-se
empregados, mas nem todos apresentam uma condição sócio-econômica favorável.
Dentre as demais características demográficas se observa ainda, nos dois
grupos, um predomínio da raça branca, católicos e procedentes da região sul e
sudeste.
4.2.2 Tempo de Pós-TMO Alogênico
Para efeito deste estudo o tempo de pós-TMO alogênico foi dividido em dois
grupos. O primeiro foi composto com os sobreviventes que tinham de 10 a 15 anos
de pós-transplante e o segundo com 16 anos ou mais. O tempo de pós-TMO
alogênico variou entre 10 e 23 anos e oito meses. A distribuição dos sobreviventes
quanto ao tempo de pós-transplante, categorizado, encontra-se na Tabela a seguir.
TABELA 5: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES QUANTO AO TEMPO DE PÓS-
TMO ALOGÊNICO
Tem
p
o N % Média
10 - 15 anos 168 78,5 11,1 ± 1,4
16 anos 46 21,5 17,1 ± 2,1
4.2.3 Tempo entre o Diagnostico e a Realização do Transplante
Entre os sobreviventes estudados 58,9% (126) submeteram-se ao transplante
no ínterim do primeiro ano após o diagnóstico. A média de tempo entre o diagnostico
e a realização do transplante foi de 5,2 ± 3,3 meses.
A porcentagem de sobreviventes que realizaram o transplante com um ano ou
mais de diagnostico foi de 41,1% (88) e a média de tempo foi de 16,9 ± 3,3 meses,
conforme mostra a Tabela 6.
TABELA 6: DISTRIBUICAO DOS SOBREVIVENTES QUANTO AO TEMPO ENTRE O
DIAGNOSTICO E A REALIZACAO DO TRANSPLANTE
Tem
p
o N % Média
0
12 meses 126 58,9 5,2 ± 3,3
13meses 88 41,1 16,9 ± 3,3
113
4.2.4 Idade dos Sobreviventes no Momento do Transplante
A Tabela 7 mostra que os sobreviventes que se submeteram ao transplante
com idade entre 0-20 anos foram 100 (46,7%) e os que se submeteram com 21 anos
ou mais foram 114 (53,3%). A idade média dos sobreviventes da primeira
categorização etária, no momento do transplante, foi de 12,8 ± 5,0 anos e a idade
média da segunda foi 30,4 ± 7,1 anos.
TABELA 7: DISTRIBUICAO DA IDADE DOS SOBREVIVENTES EM RELAÇÃO AO
PERÍODO EM QUE SE SUBMETERAM AO TRANSPLANTE
Idade N % Média
0
20 anos 100 46,7 12,8 ± 5,0
21anos 114 53,3 30,4 ± 7,1
4.3 CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS DA DOENÇA
4.3.1 Diagnóstico
Para a análise estatística o diagnóstico dos sobreviventes foi dividido em duas
categorias: hemopatias malignas e não-malignas. Distribuição apresentada na
Tabela abaixo.
TABELA 8: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES DE ACORDO COM A
CLASSIFICAÇÃO DIAGNOSTICA
Variáveis N
Hemo
p
atias Mali
g
nas
LMC - Leucemia Mielóide Crônica 67
LMA - Leucemia Mielóide A
g
uda 17
LLA - Leucemia Linfóide A
g
uda 5
LH
Linfoma de Hod
g
kin 1
SMD - Síndrome Mielodisplásica 1
Total 91
(
42.5%
)
Hemopatias não-mali
g
nas
A
AS -
A
nemia Aplásica Severa 101
A
F -
A
nemia de Fanconi 18
HPN - Hemo
g
lobinúria Paroxística Noturna 3
WA
Wiscott Aldrich 1
Total 123
(
57,5%
)
O percentual de sobreviventes com hemopatias não-malignas foi de 57,5%,
com um predomínio de Anemia Aplásica Severa. Também foram incluídos casos
com Anemia de Fanconi, Wiscott Aldrich e Hemoglobinúria Paroxistica Noturna.
114
Com relação às hemopatias malignas, foram incluídas: Leucemia Mielóide
Crônica, Leucemia Mielóide Aguda, Leucemia Linfóide Aguda, Linfoma de Hodgkin e
Síndrome Mielodisplasica. O percentual de sobreviventes com hemopatias malignas
foi de 42,5% Havendo uma concentração no diagnóstico de Leucemia Mielóide
Crônica.
4.3.2 Processo do Tratamento e suas Implicações
4.3.2.1 Karnofsky Pré e Pós-Transplante
A Tabela 9 apresenta a distribuição dos sobreviventes conforme o processo do
tratamento expresso nos valores de Karnofsky pré e pós-transplante.
A maioria dos sobreviventes (86,4%) apresentava níveis 80 ou mais no
Karnofsky no período do pré-transplante. Houve um aumento na freqüência dos
bons resultados após a intervenção (99,1%).
TABELA 9: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES DE ACORDO COM O PROCESSO
DO TRATAMENTO EXPRESSO NOS VALORES DE KARNOFSKY PRÉ E
PÓS-TRANSPLANTE (n = 214)
Karnofsk
y
N%
Pré
80 185 86,4
79 29 13,6
Pós
80 212 99,1
79 2 0,9
4.3.2.2 Pega, DECH, Condicionamento, Re-Transplante e Infusão de Linfócitos
Na Tabela 10 pode-se observar a ocorrência de alguns fatores relacionados
com o processo do tratamento e implicações. Observa-se que dois sobreviventes
tiveram problemas em relação à pega, sendo que, o primeiro, teve pega parcial, ou
seja, não aconteceu um aumento significativo e sustentável das plaquetas, apesar
do número dos neutrófilos ser normal, na seqüência houve a recuperação. O
segundo sobrevivente não apresentou pega no primeiro transplante, por isso, fez um
segundo, que resultou em pega completa.
115
A ocorrência da DECH-a esteve presente em 38 (17,8%) dos sobreviventes,
sendo que 34 manifestaram a doença do tipo I e II enquanto que a presença da
doença do tipo III e IV foi observada em apenas 4 sobreviventes.
Dos 72 (33,6%) sobreviventes que manifestaram a DECH-c 36 (16,8%) tiveram
uma expressão limitada da doença e o restante classificou-se como extenso.
Em relação à severidade 48 (22,4%) expressou um grau leve e 24 (11,2%)
apresentou um grau moderado a severo.
Quanto à toxicidade do condicionamento verifica-se que a grande maioria se
submeteu ao regime alquilante. Apenas 18 sobreviventes passaram por um segundo
transplante, desses, cinco eram mulheres. Com relação à infusão de linfócitos,
somente seis receberam.
TABELA 10: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES DE ACORDO COM PEGA, DECH-a
DECH-c, CONDICIONAMENTO E INFUSÃO DE LINFÓCITOS
Variáveis N %
Pe
g
a
Completa 212 99
Parcial
(
plaquetas
)
10,5
Não-Pe
g
a 1 0,5
DECH-a
A
usência 176 82,2
Presença 38 17,8
Tipo I / II 34 15,9
Tipo III / IV 4 1,9
DECH-c:
A
usência 142 66,4
Presença 72 33,6
Limitado 36 16,8
Extenso 36 16,8
DECH-c Severidade
Presença de 72 33,6
Grau Leve 48 22,4
Grau Moderado a Severo 24 11,2
Condicionamento
Mieloablativo 165 77,1
Não-Mieloablativo 49 22,9
Re-TMO
Submissão a um transplante 196 91,6
Submissão a dois transplantes 18 8,4
Infusão de Linfócitos
Sim 6 2,8
Não 208 97,2
116
4.3.2.3.Tipo de Transplante
A Tabela 11 apresenta a distribuição dos sobreviventes de acordo com o tipo
de transplante e a fonte das células-tronco.
TABELA 11: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES DE ACORDO COM O TIPO DE
DE TRANSPLANTE E A FONTE DAS CÉLULAS-TRONCO
Ti
p
o de Trans
p
lante Alo
g
ênico N
(
%
)
Ap
arentado 210
(
98,1%
)
Não-
A
parentado 4
(
1,9%
)
Doador Familiar
Irmão 207
(
98,5%
)
Mãe 1 (0,5%)
Pai 2
(
1%
)
Total 210
Retransplante 18
(
8,4%
)
Fonte das Células-Tronco 214
(
100%
)
É possível observar que a amostra dos sobreviventes é bastante homogênea.
Constata-se que a maioria dos sobreviventes (98,1%) teve doador aparentado.
Desses, 207 foram de irmãos, um da mãe e dois enxertos do pai. Os quatro
restantes foram do tipo não aparentado. Em 100% dos transplantes, a origem celular
foi à medula óssea.
4.4 REGIME DE CONDICIONAMENTO
Os protocolos de condicionamento variam conforme as características da
doença, das condições clínicas do sobrevivente do momento da internação, da idade
do sobrevivente e do doador, entre outras variáveis. Para este grupo de
sobreviventes foram utilizados regimes de condicionamentos com Bus + CFA, ou
somente CFA, ou TBI + CFA ou CFA + Timoglobulina ou fludarabina e bussulfan. A
dose do bussulfan variou entre 12 e 16 mg/kq. A ciclosfosfamida ficou entre 100-200
mg/kq. E para a aplicação da radioterapia a recomendação permaneceu entre 1000
e 1440 rads.
Quanto ao regime de condicionamento foram configurados dois tipos de
regime: mieloablativo (alta toxicidade) e não mieloablativo (toxicidade reduzida).
Onde se considerou mieloablativos aqueles que usaram radioterapia corporal total
1440 rads ou outras cargas e bussulfan 12 mg/kq ou mais. Os não-mieloablativos
117
foram os regimes que usaram fludara e bussulfan 8 mg/kq. Apenas os sobreviventes
que são submetidos ao regime não mieloablativo podem apresentar à recuperação
autóloga.
Na amostra desse estudo 165 sobreviventes receberam um regime de
condicionamento mieloablativo, ou seja, foi destruído todo o tecido hematológico e
49 não-mieloablativo.
4.5 OCORRÊNCIA DE ÓBITOS
Os sobreviventes que se submetem ao TMO apresentam uma probabilidade
maior de desenvolver outras neoplasias em decorrência da radiação, da
quimioterapia, imuno estimulação e da malignidade da doença de base. Nem
mesmo os sobreviventes de longa data estão livres dessa possibilidade. No nosso
estudo, ocorreram três óbitos (todos do gênero masculino).
O primeiro era agropecuarista, casado, tinha descendentes, estava com 35
anos de idade e 12,4 anos de pós-transplante. Sua doença de base era LMC, mas
na época da avaliação desta pesquisa apresentou um Karnofsky de nível 100, ou
seja, em relação à saúde e a QV estava satisfeito.
Na mensuração dos resultados das escalas de humor de depressão e
ansiedade do BECK, o sobrevivente manifestava depressão em nível leve e
ansiedade moderada. Apesar destes resultados, um ano após a aplicação do
protocolo deste estudo, recebemos a informação através de familiares que ele
suicidou-se, sem uma causa aparente. Porém, a história pré-mórbida dos
antecedentes familiares, apresenta alguns registros de suicídios: bisavô materno,
um tio e dois primos de primeiro grau.
O segundo sobrevivente, era médico/psicanalista, casado, tinha descendentes,
estava com 57 anos de idade e 11 anos de pós-transplante. Sua doença de base era
LMA, mas na época da avaliação desta pesquisa apresentou um Karnofsky de nível
100 e conforme sua perspectiva sentia-se bem em relação à saúde, QV e ao humor.
A causa morte foi a recaída da doença de base.
O terceiro sobrevivente, era mecânico, não tinha emprego fixo, estava em
processo de separação, tinha descendente, estava com 45 anos de idade e 11 anos
de pós-transplante. Sua doença de base era LMC, apresentou um Karnofsky de
118
nível 100 e conforme sua perspectiva sentia-se bem em relação a saúde e QV.
Porém, estava apresentando depressão e ansiedade moderada. Conforme seu
relato estava triste e ansioso devido a recente ruptura matrimonial. Na seqüência,
apresentou um câncer de esôfago, e durante o tratamento desenvolveu infecção
fúngica e fibrose pulmonar, o que motivou a sua morte.
4.6 QUALIDADE DE VIDA
4.6.1 Significado de Qualidade de Vida
Todos foram questionados em relação à opinião pessoal e o significado
individual do conceito “qualidade de vida”. A Tabela 12 apresenta a distribuição dos
sobreviventes e do controle de acordo com o significado de QV.
TABELA 12: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES E DO CONTROLE DE ACORDO
COM O SIGNIFICADO INDIVIDUAL DE QV
Sobreviventes
(
n=214
)
Controle
(
n=264
)
N%N%
Econômico
Sim 59 27,6 102 38,6
Não 155 72,4 162 61,4
Físico
Sim 3 1,4 38 14,4
Não 211 98,6 226 85,6
Emocional
Sim 131 61,2 105 39,8
Não 83 38,8 159 60,2
Social
Sim 16 7,5 32 12,1
Não 198 92,5 232 87,9
Saúde
Sim 99 45,3 120 45,5
Não 115 53,7 144 54,5
Funcional
Sim 43 20,1 65 24,6
Não 171 79,9 199 75,4
Familiar
Sim 43 20,1 36 13,6
Não 171 79,9 228 86,4
Espiritualidade
Sim 5 2,3 18 6,8
Não 209 97,7 246 93,2
A grande maioria do grupo de sobreviventes menciona que é um bem-estar
emocional (61,2%), ter saúde (45,3%), uma condição econômica favorável (27,6%),
119
estar em harmonia com a família e ter capacidade funcional dentro da normalidade
(20,1%).
Além de comentarem sobre a inclusão social, espiritual e a condição física,
mas em relação a estes componentes não apresentaram destaque.
Quanto ao grupo controle, verifica-se que para eles QV é ter saúde (45,5%),
estar bem emocionalmente (39,8%), ter uma condição econômica favorável (38,6%)
e uma capacidade funcional adequada com as necessidades cotidianas (24,6%).
Esse grupo confere importância similar para o bem-estar físico, familiar e
social.
4.6.2 Nível de Satisfação em Relação à Qualidade de Vida
A Tabela 13 apresenta a distribuição para toda amostra do estudo segundo a
satisfação com a qualidade de vida.
TABELA 13: DISTRIBUIÇÃO DOS GRUPOS DE ACORDO COM A SATISFAÇÂO EM
RELAÇÂO À QUALIDADE DE VIDA GLOBAL
Sobreviventes
(
n=214
)
Controle
(
n=264
)
Qualidade de Vida Global N % N %
Satisfeito 115 53,7 143 54,2
Insatisfeito 99 46,3 121 45,8
Pode-se evidenciar que entre os sobreviventes, 53,7% estão muito satisfeitos
em relação à qualidade de vida global. Resultado similar pode-se observar no grupo
controle (54,2%).
O bem-estar oriundo da percepção de QVG é composto com áreas de
domínios que englobam a condição física, psicológica, social e do meio ambiente,
distribuição apresentada, na Tabela 14, sob a forma de domínios.
120
TABELA 14: DISTRIBUIÇÃO DOS GRUPOS DE ACORDO COM OS DOMÍNIOS DA
QUALIDADE DE VIDA GLOBAL
Sobreviventes
(
n=214
)
Controle
(
n=264
)
N%N%
Domínio Físico
0-15 1 0,4
16-25 35 16,3 39 14,9
26-30 75 35,1 109 41,2
31-35 104 48,6 115 43,5
Domínio Psicoló
g
ico
0-15 3 1,5 5 1,9
16-25 126 58,9 180 68,1
26-30 85 39,6 79 30,0
Domínio Social
0-5 2 0,9 2 0,8
6-10 27 12,7 51 19,4
11-15 185 86,4 211 79,8
Domínio Ambiental
0-15 1 0,5 1 0,4
16-25 42 19,5 57 21,6
26-30 66 30,9 102 38,6
31-35 82 38,2 83 31,4
36-40 23 10,7 21 8
No domínio físico 48,6% dos sobreviventes apresentaram respostas
condizentes ao nível máximo de satisfação. Observam-se resultados similares no
grupo controle (43,5%).
No domínio psicológico 58,9% dos sobreviventes e 68,1% do grupo controle
manifesta satisfação. É importante observar que esta diferença ocorrida entre os
grupos, foi compensada pelos 39,6% dos sobreviventes que mencionam estarem
muito satisfeitos.
Com relação ao domínio social novamente os resultados foram compatíveis
com o nível máximo de satisfação, tanto para o grupo de sobreviventes (86,4%)
quanto para o controle (79,8%).
O domínio ambiental inclui o contexto em que o indivíduo está inserido, sua
rotina, as condições e recursos sociais e pessoais que disponibiliza. Entre os
sobreviventes, 38,2% referem estar muito satisfeitos. Em relação ao grupo controle
constata-se que 38,6% deles manifestam satisfação.
Na Tabela 15 verifica-se a distribuição das quatro áreas de domínio da QV,
com a média da somatória das pontuações mínima e máxima obtidas em cada grupo
e o nível da freqüência de resposta que mais ocorreu entre eles.
121
TABELA 15: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA, MEDIANA E MÉDIA (DP) DOS GRUPOS
DE ACORDO COM OS DOMINIOS DA QV GLOBAL
Domínios Min Max Fre
q
. Mediana Media
(
DP
)
Físico
Sobrevivente 17 35 30 30 29,7 ± 4,1
Controle 15 35 30 30 29,5 ± 3,9
Psicológico
Sobrevivente 9 30 26 24,5 24,1 ± 3,3
Controle 13 30 23 24 23,6 ± 3,2
Social
Sobrevivente 5 15 15 13 12,2 ± 2,2
Controle 5 15 12 12 12 ± 2
A
mbiental
Sobrevivente 13 40 31 30 29,5 ± 4,9
Controle 13 40 29 29 28,9 ± 4,8
As freqüências de respostas apresentadas registram resultados semelhantes,
ou seja, ambos os grupos mantiveram pontuações altas significando uma QV
satisfatória e/ou muito satisfatória. O score mais alto é sempre do grupo de
sobreviventes, apesar de não haver diferença na média e mediana dos scores.
4.6.3 A Idade dos Sobreviventes no Momento do TMO e a Relação com a QV
TABELA16: DISTRIBUICAO DA IDADE DOS SOBREVIVENTES EM RELAÇÃO AO
PERÍODO EM QUE SE SUBMETERAM AO TRANSPLANTE E A QV
QV Crian
ç
a/Adolescente
A
dulto
p
Satisfeito 84
(
84,0%
)
91
(
79,8%
)
ns
Insatisfeito 16
(
16,0%
)
23
(
20,2%
)
Total 100 114
NOTA: ns: não significativo
Os resultados mostram que a faixa etária do paciente que se submete ao
transplante não tem uma relação direta com a QV. Crianças, adolescentes e adultos
apresentam grau de satisfação similar.
4.6.4 Diagnóstico e a Relação com a QV
TABELA 17: DISTRIBUIÇÃO DOS SOBREVIVENTES DE ACORDO COM A CLASSIFICAÇÂO
DIAGNOSTICA E SUA RELAÇÃO COM A QV
QV Beni
g
na
(
n=123
)
Mali
g
na
(
91
)
p
Satisfeito 100
(
81,3%
)
75
(
82,4%
)
ns
Insatisfeito 23 (18,7%) 16 (17,6%)
NOTA: ns: não significativo
122
Após longa data de TMO, a doença de base não interfere na percepção do bem-
estar dos sobreviventes, uma vez que, a grande maioria está satisfeito com a QV
atual.
4.6.5 Fadiga
4.6.5.1 Definição Subjetiva
Na Tabela 18 encontra-se a distribuição da definição subjetiva de fadiga
associada aos fatores: físico, emocional e físico-emocional.
TABELA 18: DISTRIBUICAO DA ASSOCIAÇÃO SUBJETIVA REALIZADA PELOS GRUPOS
PARA DEFINIR FADIGA
Sobreviventes
(
n=214
)
Controle
(
n=264
)
p
Físico
Sim 70
(
32,7%
)
115
(
43,6%
)
0,015
Não 144
(
67,3%
)
149
(
56,4%
)
Emocional
Sim 66
(
30,8%
)
66
(
25,5
)
% ns
Não 148 (69,2%) 198 (74,5%)
Físico-Emocional
Sim 29
(
13,6%
)
48
(
18,6%
)
ns
Não 185
(
86,4%
)
216
(
81,8%
)
NOTA: ns: não significativo
Ao proceder a análise desses resultados não se constatou diferença
estatisticamente significativa entre os dois grupos no tocante a distribuição quanto à
associação da fadiga com o emocional e com o físico-emocional. Contudo, observa-
se que em relação ao físico há diferença significativa entre os dois grupos, sendo
maior no grupo controle (p=0,015).
4.6.5.2 Frequência de Queixas e a Percepção de Saúde
A Tabela 19 apresenta a distribuição dos grupos de acordo com a freqüência
de queixas em relação à fadiga e da percepção de saúde. A grande maioria de
ambos os grupos esta satisfeita com relação à saúde. Quanto à presença de
queixas de fadiga, constata-se que não há diferença significativa entre os grupos.
123
TABELA 19: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DE QUEIXAS EM RELAÇÃO À FADIGA
E DA PERCEPÇÃO DE SAÚDE
Sobreviventes
(
n=214
)
Controle
(
n=264
)
Variáveis N % N %
Fadi
g
a
Sem Queixas 185 86,4 220 83,3
Com Queixas 29 13,6 44 16,7
Saúde
Satisfeito 160 74,8 192 72,7
Insatisfeito 54 25,2 72 27,3
4.6.6 A Condição de Provedor e sua Relação com o Estado Civil
A amostra deste estudo registra uma porcentagem maior de casados no grupo
de sobreviventes. A Tabela 20 apresenta uma distribuição dos provedores e sua
porcentagem em relação ao estado civil em ambos os grupos.
TABELA 20: DISTRIBUIÇÃO REPRESENTATIVA DOS PROVEDORES E SUA
PORCENTAGEM EM RELAÇÃO AO ESTADO CIVIL NOS DOIS GRUPOS
Sobreviventes
(
n=124
)
Controle
(
n=136
)
N%N%
p
Provedores
Casados 90 72,6 93 68,4 ns
Solteiros 34 27,4 43 31,6
NOTA: ns: não significativo
Entre os casados há mais provedores no grupo de sobreviventes e entre os
solteiros a concentração de provedores está no grupo controle. Contudo, não existe
diferença significativa entre os grupos.
4.7 ANÁLISE UNIVARIADA E MULTIVARIADA DOS SOBREVIVENTES
Através da significância encontrada no valor de p 0,20 fez-se uma primeira
triagem das variáveis (analise univariada) e na seqüência fez-se a multivariada,
onde se considerou o valor de p 0,05. A partir da primeira análise as variáveis
selecionadas compuseram a analise multivariada.
Na análise univariada a QVG foi considerada como variável de desfecho, a
mesma constitui-se pela somatória das variáveis que estão inclusas nos domínios da
avaliação da QV.
124
As variáveis de destaque analisadas em relação a variável de desfecho foram:
ansiedade, depressão, provedor, perda da libido, escolaridade, DECH-a, condição
de trabalho, intelectual / braçal, tempo de pós-transplante, condicionamento, religião
e severidade da DECH-c.
Para realizar o procedimento stepwise backwards, no modelo geral, foi preciso
considerar o conjunto de variáveis obtidos na análise da univariada e em seguida
verificar as interferências que as mesmas causavam entre si.
Há uma distribuição das variáveis interrelacionadas e a interferência ocorrida
nos valores da razão de chance, índice de confiança e da probabilidade ajustada.
A Tabela 21 apresenta a distribuição das variáveis obtidas nas análises
univariada e na multivariada, respectivamente. Há uma distribuição das variáveis
interrelacionadas entre si e a interferência em relação aos valores brutos e
ajustados, da razão de chance, índice de confiança e da probabilidade.
TABELA 21: DISTRIBUIÇÃO DAS VARIÁVEIS DE INTERFERÊNCIA NOS VALORES
BRUTOS E AJUSTADOS DAS RAZÕES DE CHANCES, INDICES DE
CONFIANÇA E OS VALORES DE p BRUTO E AJUSTADO EM RELAÇÃO
AOS SOBREVIVENTES CONFORME A ANÁLISE UNIVARIADA E
MULTIVARIADA
RC IC 95%
P
Variáveis Bruto
Aj
ustado Bruto
Aj
ustado Bruto
Aj
ustado
A
nsiedade 7,4 7,4 3,2
16,9 3,3 - 16,5 0,000 0,000
Depressão 7,0 2,4 2,4
20,2 0,7-8,0 0,126 ns
Provedor 2,4 2,8 1,4
4,3 1,5-5,2 0,001 0,001
Perda da Libido 2,5 1,3 1,4
4,5 0,6-2,6 0,376 ns
Escolaridade 2,3 2,0 1,3
4,1 1,0-3,9 0,005 0,037
DECH-a 0,4 0,4 0,2
0,9 0,2-0,9 0,018 0,037
Condição de Trab. 2,1 1,2 1,0
4,3 0,5-3,1 0,605 ns
Intelectual/ Braçal 1,7 1,1 1,0
2,9 0,5-2,2 0,713 ns
Tempo Pós-TMO 1,8 2,0 0,9
3,6 0,9-4,4 0,088 ns
Condicionamento 0,6 0,7 0,3
1,1 0,3-1,5 0,389 ns
Religião 1,7 1,5 0,9
3,5 0,7-3,5 0,262 ns
DECH-c 0,5 0,8 0,2
1,3 .27-2,4 0,740 ns
NOTA: RC= Razão de Chance IC= Índice de Confiança p= Probabilidade ns: não significativo
Com o panorama composto pelo conjunto de variáveis em interações, avaliou-
se a maior ou menor importância das variáveis na modificação do desfecho.
Conforme a constatação dos valores estatísticos obtidos no valor do p, as
variáveis foram gradativamente retiradas desse conjunto. Por último restaram as
seguintes variáveis interferentes: a escolaridade, condição de provedor, DECH-
agudo, e a presença de transtorno de humor ansiógeno.
A manifestação de DECH-agudo, nessa análise, foi considerada como fator de
proteção. Enquanto que a presença da ansiedade, escolaridade baixa e a condição
125
de provedor foram interpretadas como fatores de complicação para ambos os
gêneros.
Na análise foi detectado que a variável depressão causa certo efeito na
variável da ansiedade, mas não chega a ser significativo. Existe uma relação da
depressão que interfere no valor explicativo da ansiedade. Porém, não o suficiente
para influenciar e explicar a QV.
A depressão é uma variável de confusão em relação à ansiedade, por isso, tem
influência indireta sobre a mesma através da justaposição. No entanto, não chega a
alterar o valor de p. 0,000 da variável ansiedade nos sobreviventes.
A distribuição dos sobreviventes em relação à ansiedade e aos gêneros
encontra-se na Tabela 22
TABELA 22: DISTRIBUIÇÃO COMPARATIVA DA POPULAÇÃO DOS SOBREVIVENTES
EM RELAÇÃO A VARIÁVEL DE ANSIEDADE E AOS GÊNEROS.
Gru
p
o de Sobreviventes
(
n=214
)
A
nsiedade Mulheres
(
N=75
)
%Homens
(
N=139
)
%
Sim 24 32 27 19,4
Não 51 68 112 80,6
Ser homem é fator de proteção em relação à manifestação da ansiedade, uma
vez que, as mulheres mostram maior propensão.
A Tabela 23 apresenta a distribuição dos sobreviventes em relação à
depressão.
TABELA 23: DISTRIBUIÇÃO COMPARATIVA DO GÊNERO DO GRUPO DOS
SOBREVIVENTES EM RELAÇÃO À DEPRESSÃO.
Gru
p
o de Sobreviventes
(
n=214
)
Depressão Mulheres
(
n=75
)
%Homens
(
N=139
)
%
Sim 10 13,3 19 13,6
Não 65 86,7 120 86,4
Não existe diferença estatisticamente significativa entre os homens e as
mulheres sobreviventes, quanto à manifestação da depressão.
126
4.7.1 Características Clínicas da Sexualidade
O condicionamento e por vezes a própria doença causam comorbidades que
interferem na atividade e satisfação sexual. Após o transplante, mesmo a longo
prazo é comum os sobreviventes manifestarem algumas dificuldades no campo da
sexualidade.
A Tabela 24 mostra a freqüência das queixas em relação à alteração sexual
sofrida.
TABELA 24: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DE ALTERAÇÃO SEXUAL PARA A
AMOSTRA TOTAL DO GRUPO DE SOBREVIVENTES
Mulheres
(
n=75
)
Homens
(
n=139
)
A
presentou Alteração N % N %
Sim 31 41,3 31 22,3
Não 20 26,7 73 52,5
Não se aplica * 24 32 35 25,2
NOTA: crianças, virgens no pré-TMO
Nessa tabela apesar de incluir as respostas de todos os sobreviventes, 59
delas não foram computadas, uma vez que, eles não podiam falar de alterações de
vida sexual entre o pré e o pós-TMO. Pois, eram crianças ou virgens no período que
antecedeu o transplante e outros ainda são virgens, em decorrência da idade ou por
opção de vida.
4.7.2 Análise Univariada e Multivariada dos Homens Sobreviventes
Ao investigar os sobreviventes masculinos através da avaliação univariada,
realizou-se a regressão logística com as variáveis que demonstraram significância.
Algumas apesar de não apresentarem valor significativo também ficaram para o
modelo da avaliação multivariada devido à probabilidade de interferência. Assim, as
variáveis inclusas foram: ansiedade, depressão, ejaculação precoce, perda da libido,
perda da fertilidade, provedor, DECH-a, escolaridade, condição de trabalho,
intelectual / braçal, idade do sobrevivente, condição de emprego, tempo de pós-
transplante, severidade da DECH-c, religião.
O conjunto das variáveis da univariada migrou para a avaliação multivariada
com o intuito de investigar o comportamento de cada variável quando em interação e
127
em relação ao desfecho. As variáveis de interferência, suas razões de chances, os
índices de confiança e os valores de p ajustados em relação aos homens
sobreviventes, conforme o modelo de análise univariada e multivariada está
demonstrado na Tabela 25.
TABELA 25: DISTRIBUIÇÃO REPRESENTATIVA DAS VARIÁVEIS DE INTERFERÊNCIA
NA QVG E SUAS RAZÕES DE CHANCES, OS INDICES DE CONFIANÇA E
VALORES DE p BRUTOS E AJUSTADOS EM RELAÇÃO AOS HOMENS
SOBREVIVENTES DE ACORDO COM O MODELO DA ANÁLISE UNIVARIADA
E MULTIVARIADA
RC IC 95%
P
Variáveis Bruto
Aj
ustado Bruto
Aj
ustado Bruto
Aj
ustado
A
nsiedade 15,6 15,1 3,8
63,7 3,8 - 60,9 0,000 0,000
Depressão 8,6 2,0 2,1
33,5 ,35 - 11,5 0,425 ns
E
j
ac. Precoce 16,4 11,5 1,8
144,9 1,2 - 09,7 0,000 0,033
Perda da Libido 3,8 2,7 1,6
8,9 1,0 - 7,2 0,001 0,049
Perda da Fertil 4,2 3,4 1,3
12,9 ,87 - 13,8 0,078 ns
Provedor 2,3 5,7 1,1
4,9 1,7 - 8,7 0,019 0,004
DECH-a 0,3 ,28 0,11
1,0 ,07 - 1,1 0,074 ns
Escolaridade 2,0 1,4 1,0
4,2 ,58 - 3,6 0,409 ns
Cond. Trabalho 2,4 1,9 0,9
6,6 ,49 - 7,5 0,343 ns
Idade Atual 1,4 2,4 0,9
2,2 1,2 - 4,7 0,090 0,015
Intelect / Braçal 1,7 ,68 0,8
3,4 .23 - 1,9 0,481 ns
Tempo pós TMO 1,8 1,5 0,7
4,2 ,44 - 5,4 0,464 ns
DECH-c 0,5 ,35 0,1
1,4 ,07 - 1,6 0,181 ns
Reli
g
ião 1,7 1,1 0,7
3,9 ,35 - 3,5 0,848 ns
NOTA: RC= Razão de Chance IC= Índice de Confiança p= Probabilidade ns: não significativo
O resultado desse processo de análise apresenta variáveis importantes para
explicação da QV dos sobreviventes masculinos: presença da ansiedade,
manifestação da ejaculação precoce, perda da libido, provedor e ter mais idade.
A idade mais avançada, ansiedade, dificuldades na sexualidade e ser provedor
são fatores que interferem negativamente na construção da QV.
O prejuízo no campo da sexualidade tem uma interferência direta na satisfação
da QV. Ter mais idade também é um fator desfavorável, ou seja, a maturidade
cronológica é percebida com ressalvas.
A depressão quando posta na análise geral em relação aos homens
sobreviventes, perde o significado em relação a QV. Mas, interfere na expressão da
ansiedade.
Enfim, os fatores de risco considerados na análise multivariada, em relação aos
homens sobreviventes, foram: ansiedade, ejaculação precoce, perda da libido, ser
provedor e ter mais idade.
128
4.7.3 Características Sexuais do Grupo Masculino
De um modo geral, os homens sobreviventes demonstram reservas ao
responder essa parte do protocolo.
TABELA 26: DISTRIBUIÇÃO DE DISFUNÇÕES SEXUAIS MASCULINAS NO GRUPO
DE SOBREVIVENTES
Homens
(
= 139
)
Disfunções N %
E
j
acula
ç
ão Precoce
Não 127 91
Sim 12 9,0
Ejaculação Tardia
Não 133 95,7
Sim 6 4,3
Disfunção Erétil
Não 134 96,4
Sim 5 3,6
Perda da libido
Não 104 74,8
Sim 35 25,2
Vida Sexual Ativa
Não 55 39,6
Sim 84 60,4
Satisfação da Sexualidade
Não 43 30,9
Sim 96 69,1
A perda da libido é um inibidor das atividades sexuais e sua presença demarca
um lugar de importância para esse grupo.
Em relação ao grupo masculino constata-se que 60,4% (n: 84) dos
sobreviventes relatam ter vida sexual ativa. Contudo, 69,1% (n: 96) estão satisfeitos
apesar de alguns não ter vida sexual ativa ou de conviver com disfunções e
dificuldades.
4.7.4 Análise Univariada e Multivariada das Mulheres Sobreviventes
Ao investigar as mulheres sobreviventes através da avaliação univariada
realizou-se a regressão logística com as variáveis que demonstraram significância.
Outras apesar de não apresentarem valor significativo também ficaram no modelo
para a avaliação multivariada devido à probabilidade de interferência. As quais
foram: ansiedade, depressão, escolaridade, parceiro fixo, provedor, dispareunia,
nível sócio econômico, diagnóstico benigno ou maligno, etnia, idade atual, estado
civil, retransplante, DECH-a.
129
A Tabela 27 apresenta as variáveis de interferência na QVG e suas razões de
chances, os índices de confiança e os valores de p brutos em relação às mulheres
sobreviventes, conforme o modelo de análise univariada.
Esse conjunto de variáveis posteriormente migrou para a avaliação
multivariada. Nessa análise de acordo com a constatação dos valores estatísticos
obtidos no valor de p, as variáveis eram gradativamente retiradas.
TABELA 27: DISTRIBUIÇÃO DAS VARIÁVEIS DE INTERFERÊNCIA NA QVG E SUAS
RAZÕES DE CHANCES, OS INDICES DE CONFIANÇA E OS VALORES, DE p
BRUTOS E AJUSTADOS EM RELAÇÃO ÀS MULHERES SOBREVIVENTES DE
ACORDO COM MODELO DA ANÁLISE UNIVARIADA E MULTIVARIADA
RC IC 95%
P
Variáveis Bruto Ajustado Bruto Ajustado Bruto Ajustado
A
nsiedade 3,8 6,6 1,2-11,3 1,7 - 25,5 0,011 0,007
Depressão 5,0 1,9 0,9-26,8 ,19 - 19,7 0,564 ns
Escolaridade 2,8 4,5 1,0-8,1 1,2 - 16,4 0,040 0,022
Parceiro Fixo 2,7 4,7 0,98-7,6 1,3 - 16,9 0,044 0,019
Provedor 2,6 4,0 1,0-7,0 1,2 - 13,6 0,045 0,025
Dispareunia 2,4 3,2 0,8-6,8 ,80 - 12,7 0,098 ns
NSE 2,4 1,3 0,9-6,5 ,36 - 5,0 0,637 ns
Dia
g
0,4 ,69 0,2-1,1 ,19 - 2,4 0,567 ns
Etnia 3,2 6,4 0,7-13,7 1,0 - 40,5 0,095 0,048
Idade Atual 0,6 ,95 0,4-1,1 ,35 - 2,5 0,934 ns
Estado Civil 2,0 1,4 0,8-5,2 ,12 - 17,9 0,755 ns
Re-TMO 0,2 ,05 0,022,3 0,00 - 0,7 0,177 0,025
DECH-a 0,5 ,53 0,1-1,5 ,12 - 2,3 0,408 ns
NOTA: RC= Razão de Chance IC= Índice de Confiança p= Probabilidade NS: não significativo
Após a avaliação univariada e multivariada restaram algumas variáveis
interferentes com valor de proteção e de risco em relação à QVG.
Os fatores de risco encontrados na análise multivariada em relação às
mulheres sobreviventes, foram: ansiedade, baixo nível de escolaridade, não ter
parceiro fixo, ser provedora, não ser da raça branca. Enquanto que o fator de
proteção encontrado foi à realização de um segundo transplante, lembrando aqui
que na nossa amostra apenas cinco mulheres (6,7%) se submeteram ao re-
transplante.
4.7.5.Características Sexuais do Grupo Feminino
Em relação às características sexuais do grupo feminino, existem algumas
comorbidades decorrentes do tratamento que podem interferir negativamente na
130
resolução e satisfação da vida sexual das mulheres. A Tabela 28 apresenta a
freqüência de ocorrência de algumas disfunções femininas.
TABELA 28: DISTRIBUIÇÃO DE DISFUNÇÕES SEXUAIS FEMININAS
NO GRUPO DE SOBREVIVENTES
Mulheres
(
n= 75
)
Disfunções N %
Sintomas de Meno
p
ausa
Não 45 60
Sim 30 40
Reposição Hormonal
Não 38 51
Sim 37 49
A
menorréia
Não 45 60
Sim 30 40
Ressecamento Va
g
inal
Não 52 69
Sim 23 31
Dispareunia
Não 50 67
Sim 25 33
Perda da libido
Não 36 48
Sim 39 52
Vida Sexual Ativa
Não 35 47
Sim 40 53
Satisfação da Sexualidade
Não 33 44
Sim 42 56
Apesar das comorbidades e seqüelas deixadas pelo processo do transplante
muitas mulheres não aderem à terapia de reposição hormonal devido aos efeitos
secundários decorrentes dessa proposta de tratamento.
Observa-se que existe uma porcentagem semelhante entre a atividade sexual
e a libido, a relação é diretamente proporcional. O mesmo acontece em relação à
satisfação da vida sexual, uma vez que, 56% (42) comentam que de um modo geral
estão satisfeitas. Por vezes, apresenta-se uma inversão de valores, uma vez que,
dizem que a satisfação se deve a decisão de evitar qualquer tipo de relacionamento
sexual.
Apesar do protocolo ser extenso, 100% dos sobreviventes da amostra
mencionou que foi muito bom e acham importante que os novos pacientes saibam
que apesar das dificuldades é possível alçar QV.
131
4.8 ANÁLISE UNIVARIADA E MULTIVARIADA DOS CONTROLES
4.8.1 Transtorno de Humor
Ao investigar o grupo controle verificou-se a interferência da variável depressão
em relação à QV. Esse grupo apresenta uma porcentagem maior para depressão do
que para ansiedade. Distribuição apresentada na Tabela 29.
TABELA 29: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DA DEPRESSÃO NO GRUPO
CONTROLE
Gru
p
o Controle
(
n=264
)
Depressão Freqüência %
Não 211 79,9
Sim 53 20,1
A porcentagem registrada em relação à depressão foi 20,1%, no grupo
controle. Na Tabela a seguir, constata-se a freqüência da ansiedade nessa mesma
população.
TABELA 30: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DA ANSIEDADE NO GRUPO
CONTROLE
Gru
p
o Controle
(
n=264
)
A
nsiedade Freqüência %
Não 219 83,0
Sim 45 17,0
Os indivíduos do grupo controle demonstram uma freqüência menor (17,0%)
para ansiedade do que para a depressão.
A Tabela 31 apresenta o cruzamento das variáveis do transtorno de humor no
grupo controle, demonstrando uma justaposição da depressão em relação à
ansiedade.
TABELA 31: DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DA DEPRESSÃO E ANSIEDADE
NO GRUPO CONTROLE
A
nsiedade
Não Sim Total
De
p
ressão
Não 193 18 211
Sim 26 27 53
Total 219 45 264
132
Observa-se que dos 53 indivíduos do grupo controle que apresentam
depressão, 27 também se queixam de ansiedade. Conferindo a justaposição dos
humores.
A Tabela 32 apresenta a distribuição comparativa dos gêneros do grupo
controle em relação à ansiedade.
TABELA 32: DISTRIBUIÇÃO COMPARATIVA DA POPULAÇÃO DO GRUPO CONTROLE
EM RELAÇÃO À ANSIEDADE
Gru
p
o Controle
(
n=264
)
A
nsiedade Mulheres % Homens %
p
Sim 34 24,6 11 8,7 0,0006
Não 104 75,4 115 91,3 ns
Total 138 100 126 100
NOTA: ns: não significativo
Observa-se uma diferença estatisticamente significativa entre as mulheres e os
homens no tocante a queixa de ansiedade (p=0,0006).
A Tabela 33 apresenta a distribuição comparativa dos gêneros do grupo
controle em relação à depressão.
TABELA 33: DISTRIBUIÇÃO COMPARATIVA DA POPULAÇÃO DO GRUPO CONTROLE
EM RELAÇÃO À DEPRESSÃO
Gru
p
o Controle
(
n=264
)
Depressão Mulheres % Homens %
p
Sim 36 26,1 17 13,5 0,011
Não 102 73,9 109 86,5
Total 138 100 126 100
NOTA: ns: não significativo
Constata-se que as mulheres desse grupo apresentam mais queixas
depressivas do que os homens, estabelecendo uma diferença estatisticamente
significativa (p = 0,011).
Ao investigar o grupo controle através da avaliação univariada realizou-se a
regressão logística com as variáveis que demonstraram significância. Outras apesar
de não apresentarem valor significativo também ficaram no modelo para a avaliação
multivariada devido à probabilidade de interferência. As quais foram: depressão,
ansiedade, etnia, trabalho braçal, nível sócio econômico, gênero e escolaridade.
133
Este conjunto de variáveis posteriormente migrou para a avaliação
multivariada. Nessa análise, as variáveis foram gradativamente retiradas, de acordo
com a constatação dos valores estatísticos obtidos no valor de p.
A Tabela 34 apresenta as variáveis de interferência, suas razões de chance, os
índices de confiança e os valores de p brutos e ajustados em relação ao grupo
controle, conforme o modelo de análise univariada e multivariada.
TABELA 34: DISTRIBUIÇÃO DAS VARIÁVEIS DE INTERFERÊNCIA NA QVG E SUAS
RAZÕES DE CHANCE, INDICES DE CONFIANÇA E OS VALORES DE p
E BRUTOS AJUSTADOS EM RELAÇÃO AO GRUPO CONTROLE DE
ACORDO COM A ANÁLISE UNIVARIADA E MULTIVARIADA
RC IC 95%
P
Variáveis Bruto Ajustado Bruto Ajustado Bruto Ajustado
De
p
ressão 8,2 8,0 3,0
22,3 3,0 - 20,8 0,000 0,000
A
nsiedade 3,4 1,2 1,3
9,0 ,38 - 3,9 0,717 ns
Etnia 3,3 3,1 1,3
8,7 1,1 - 8,5 0,009 0,028
Trab. Intelec/Bra 2,9 1,8 1,1
7,4 ,65 - 5,2 0,241 ns
NSE 2,4 1,2 0,9
6,5 ,38 - 4,2 0,681 ns
Gênero 0,4 ,41 0,1
1,1 ,13 - 1,2 0,111 ns
Escolaridade 2,1 1,0 0,8
5,9 ,30 - 3,4 0,952 ns
NOTA: RC= Razão de Chance IC= Índice de Confiança p= Probabilidade NS: não significativo
Como modelo final do grupo controle resultante da análise multivariada,
obteve-se as seguintes variáveis negativas interferentes: depressão e a etnia (não
ser branco). Sendo que essas variáveis são fatores de riscos para a QVG.
A presença da depressão e a questão racial têm uma interferência no bem-
estar, ou seja, os indivíduos do grupo controle acreditam que ser caucasiano é um
fator de proteção.
4.9 ANÁLISE MULTIVARIADA DOS SOBREVIVENTES E DOS CONTROLES
4.9.1 Transtorno de Humor
A Tabela 35 apresenta a distribuição das mulheres do grupo de sobreviventes e
do grupo controle em relação ao transtorno de humor. Observa-se diferença
estatisticamente significativa entre os grupos, com relação à depressão (p=0,031). O
mesmo não foi observado com relação à ansiedade.
134
TABELA 35: DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO FEMININA DOS DOIS GRUPOS EM
RELAÇÃO À DEPRESSÃO E ANSIEDADE
Sobrevivente
(
n=75
)
Controle
(
n= 138
)
N%N%
p
De
p
ressão
Sim 10 13,3 36 26,1 0,031
Não 65 86,7 102 73,9
A
nsiedade
Sim 24 32,0 34 24,6 ns
Não 51 68,0 104 75,4
NOTA: ns: não significativo
A Tabela 36 apresenta a distribuição da população masculina dos dois grupos
em relação à depressão e a ansiedade.
TABELA 36 DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO MASCULINA DOS DOIS GRUPOS EM
RELAÇÃO À DEPRESSÃO E ANSIEDADE
Sobrevivente
(
n=139
)
Controle
(
n= 126
)
N%N%
p
De
p
ressão
Sim 19 13,7 17 13,5 ns
Não 120 86,3 109 86,5
A
nsiedade
Sim 27 19,4 11 8,7 0,01
Não 112 80,6 115 91,3
NOTA: ns: não significativo
Verifica-se uma diferença estatisticamente significativa com relação à
ansiedade entre os grupos, sendo maior na população masculina do grupo de
sobreviventes (p=0,01).
A Tabela 37 apresenta essas variáveis de interferência, suas razões de
chances, índices de confiança e os valores de p. em relação aos grupos.
135
TABELA 37: DISTRIBUIÇÃO DAS VARIÁVEIS DE INTERFERÊNCIA NA QVG E SUAS
RAZÕES DE CHANCES, OS INDICES DE CONFIANÇA E OS VALORES DE p
BRUTOS E AJUSTADOS EM RELAÇÃO AO GRUPO DE SOBREVIVENTES E
AO GRUPO CONTROLE CONFORME A ANÁLISE UNIVARIADA E
E MULTIVARIADA
RC IC 95%
P
Variáveis Bruto
Ajustado
o
Bruto Ajustado Bruto
Ajustado
o
De
p
ressão 8,6 4,6 4,4-16,8 2,3-9,0 0,000 0,000
A
nsiedade 7,3 4,6 4,0-13,2 2,5-8,3 0,000 0,000
Intelec/Braçal 1,8 1,5 1,2-2,6 1,0-2,3 0.001 0,034
Cond/trabalho 1,8 1,3 1,0-3,0 .76-2,4 0,289 ns
Reli
g
ião 1,3 1,2 0,9-1,9 .78-1,8 0,383 ns
Etnia 1,4 1,3 0,8-2,3 .77-2,3 0,294 ns
NSE 1,3 1,0 0,9-1,9 .72-1,6 0,660 ns
Gênero 0,5 .72 0,4-0,8 .48-1,0 0,117 ns
Escolaridade 1,7 1,2 1,1-2,7 .73-2,0 0,445 ns
NOTA: RC= Razão de Chance IC= Índice de Confiança p= Probabilidade NS: não significativo
A presença de transtorno de humor (ansiedade e depressão) e da condição de
trabalho classificada como “braçal” são fatores de risco para a QV
independentemente de ter realizado o transplante ou não.
O envolvimento com um trabalho de categorização “intelectual” (dentista,
contador, engenheiro, psicólogo, médico, secretária, advogado, entre outras
profissões) é um fator de proteção em relação à QV.
4.9.2 Análise Descritiva do Grupo de Sobreviventes e do Controle
O modelo final descritivo do grupo de sobreviventes em comparação com o
grupo controle mostra as seguintes variáveis: religião, procedência, escolaridade,
gênero, filhos, nível sócio econômico, estado civil, satisfação sexual, idade,
ansiedade e depressão são fatores diferenciados entre si. Porém, apesar de ser
diferente, isso não desencadeou um viés tendencioso em relação à QVG. Sendo
assim, estas associações foram possíveis porque se verificou que apesar das
diferenças, não causaram tendências.
136
5 DISCUSSÃO
Não importa onde você parou...
em que momento da vida você cansou...
o que importa é que sempre
é possível e necessário recomeçar.
Carlos Drummond de Andrade
5.1 DISTRIBUIÇÃO DEMOGRÁFICA
5.1.1 Coleta de Dados
Uma das questões metodológicas que deve ser discutida trata-se da coleta de
dados deste estudo que utilizou entrevistas face a face (n=150) e o uso de
comunicações por telefone e e-mail (n=64).
Isto ocorreu devido alguns fatores logísticos que dificultavam a vinda dos
sobreviventes ao ambulatório. Mas também porque esta decisão tinha respaldo em
trabalhos que utilizaram esta alternativa de entrevista, (telefone e e-mail) e que
foram bem sucedidos. Conforme experiência registrada e confirmada por (BUSH, et
al., 2005).
Alguns pesquisadores realizaram um estudo multicêntrico, no qual, 662
sobreviventes foram entrevistados através do telefone. Concluíram que esta prática
é recomendada com os sobreviventes em que é a única forma possível de coleta de
dados. (ANDRYKOWSKI et al., 2005)
Optamos pelo uso do telefone e e-mail para as entrevistas sempre que não
tínhamos outra opção de contato num curto/médio prazo de tempo.
A aceitação foi muito boa, de todas as solicitações para a participação na
pesquisa, apenas dois contatos foram de certo modo infrutíferos. A primeira
sobrevivente justificou a recusa pela falta de tempo e a segunda colocou-se a
disposição para participar, mas, ao relembrar do seu passado se emocionava e
pedia para responder em outro momento. Mas, a mesma situação se repetia a cada
tentativa. Deste modo, foi acordado com a sobrevivente que ela poderia responder
quando se sentisse a vontade para tal. Porém, isto não aconteceu.
137
Como se observa a emoção é um impulso que produz uma ação no campo
externo e/ou interno, conseqüentemente desempenha um papel decisivo na atitude
dos indivíduos.
Apesar destas duas ocorrências, a participação em geral foi profícua. Afinal,
percebiam que cada história era importante. Podiam contribuir como testemunhas de
uma vivência específica e de longa data. Transmitindo um conhecimento que se
compõe de experiências peculiares, mas também, universais.
Para o pesquisador o fato de não ocorrer à entrevista face a face, reduz
sensivelmente a linguagem corporal, isto é, não é possível perceber as expressões
faciais e as alterações de postura. Mesmo assim, não desqualifica o resultado
porque a emoção se dá através de um mecanismo de retro-alimentação do corpo e
da mente. Então, o comportamento emocional também se apresenta através das
mudanças na entonação da voz, nas frases interrompidas e retomadas na
seqüência. No choro e no próprio conteúdo do discurso desenvolvido.
Enfim, este método se mostrou válido pelos resultados obtidos. Não houve
dificuldade para a aplicação dos instrumentos da avaliação. Muito pelo contrário, a
maioria demonstrou interesse em participar e queria acrescentar, com riqueza de
detalhes.
A atenção recebida, a oportunidade de passar a experiência vivida e quiçá
ajudar aqueles que estão iniciando este processo, talvez tenham sido motivos para
disponibilizarem o tempo e participarem tão prontamente.
5.1.2 Grupo Controle
Outra questão metodológica que deve ser discutida é a escolha do grupo
controle.
Queríamos um grupo que representasse a população “normal” para
correlacionar com o grupo de sobreviventes.
A amostra é composta de doadores de sangue (n=264) que foram recrutados
num banco de sangue e considerados representantes da população normal.
Mas, ao compreender normalidade como uma noção relativa dependente do
contexto sociocultural e também da época. Como algo comum, freqüente para um
determinado povo e período de tempo (SILLAMY, 1998).
138
E ao relembrar os critérios de inclusão, o participante do grupo controle tinha
que ser alfabetizado, não podia apresentar doenças crônicas, nem realizar
tratamento médico naquele período e estar sem uso de medicações controladas.
Então, não podem ser considerados representantes da média da população
geral, uma vez que, as exigências necessárias para serem aceitos como doadores,
produz uma classificação que sobressai à média populacional.
Mesmo assim, eles foram incluídos na amostra do grupo controle. Pois,
acreditou-se que ao preservar um parâmetro de correlação criterioso, propiciaria
maior valor aos resultados que demarcassem aquisições obtidas pelos
sobreviventes na análise comparativa da pesquisa.
5.1.3 Idade
Inicialmente a diferença de idade entre os grupos, foi motivo de preocupação,
mas, acabou qualificando os achados, uma vez que, o estudo demonstrou que não
existe diferença significativa entre os grupos quanto à satisfação de QV, mesmo com
todos os fatores de risco que o processo do TMO desencadeia e o fato do grupo
controle ter uma amostra que comporta mais indivíduos jovens sendo que ter menos
idade apresentou-se como fator de proteção em relação à QV.
Além disso, conforme foi dito anteriormente o grupo controle pode ser
configurado como uma amostra que se diferencia por estar acima do padrão normal
da população comum. Desse modo, a insignificância ocorrida na diferença
percentual da QV entre os grupos também demarca uma qualificação dos achados a
favor dos sobreviventes, já que, os critérios de comparação estabelecidos foram
seletivos.
De acordo com Chang e colaboradores (2004) os sobreviventes que se
submetem ao transplante alogênico em decorrência de doença maligna (LMC),
podem apresentar resultados favoráveis. Desde que, os doentes façam parte de
uma faixa etária jovem (menos de trinta e nove anos) e que a doença esteja estável
no período de admissão para o transplante.
Estes caracteres estão parcialmente presentes no nosso estudo. Se
considerarmos que a média de idade do grupo foi de 34,8 e os níveis do Karnofsky
no pré-transplante mostrou que a grande maioria dos sobreviventes (86,4%)
139
encontrava-se estável na admissão. Provavelmente, estas variáveis também
contribuíram para resultados favoráveis.
Andrykowski e colaboradores (1995) também corroboram com informações que
confirmam a importância da idade e do status pré-transplante. Através do estudo
que realizaram em cinco diferentes centros, com sobreviventes que se submeteram
ao TMO alogênico devido ao diagnóstico de hemopatias malignas.
Sendo que os fatores de risco para a insatisfação da QV foram: idade e
doenças mais avançadas e nível educacional inferior. Além do déficit no
desempenho físico, nas funções sexuais e ocupacionais.
Na nossa amostra, em relação aos sobreviventes também foi considerado
como fator de risco a idade avançada, nível educacional inferior e muitos dos
sobreviventes (41%) realizaram o transplante com mais de um ano de doença em
atividade. Porém, tomando como referência os níveis do Karnofsky, muitos doentes,
registraram um quadro estável da doença, ou seja, os resultados apresentam
semelhanças com outros estudos, naquilo que favorece ou desfavorece as
conquistas.
Koh e colaboradores (2004) concluem que o TMO permanece como uma
proposta plausível para sobreviventes com neoplasias e que sejam jovens e na fase
inicial da doença, pois, nesses sobreviventes o prognóstico é favorável.
Um total de 59% dos nossos sobreviventes realizou o TMO antes de finalizar
um ano de diagnóstico. Sendo que, 53% estavam com uma idade entre 0 e 20 anos
na época do TMO, ou seja, as condições para um bom prognóstico também
estiveram presentes no estudo vigente e realmente os resultados encontrados foram
favoráveis.
Wingard e colaboradores (1992) mencionam que ocorre uma maior satisfação
sexual no pós-transplante quando a intervenção é realizada em sobreviventes
jovens. Porém, a faixa etária do indivíduo avaliado é uma questão polêmica, uma
vez que a QV pode ser influenciada pelo olhar subjetivo de cada um e pela visão de
mundo independentemente da mudança cronológica.
Segundo Skeel e colaboradores (1998), realmente existem algumas
peculiaridades quando se correlaciona à expectativa e a faixa etária. Os jovens têm
expectativas diferentes das pessoas de mais idade, em relação aos sintomas que
podem afetar a QV. Além disso, constatou-se que os jovens toleram mais se houver
140
a probabilidade de aumentar a sobrevida. Enquanto que o objetivo maior para os
mais velhos é manter a QV.
Conforme as pesquisas de Fleck e colaboradores (2003) sobre QV num grupo
de brasileiros da terceira idade, esses diferem das outras faixas etárias apenas no
aspecto de darem menos valor as atividades laborais e mais importância para as
questões de saúde.
De acordo com Yellen e Cella (1995) as comorbidades clínicas são à base de
uma QV insatisfatória. Porém, quando as comorbidades são controladas, os
sobreviventes de mais idade apresentam resultados similares aos mais jovens, em
relação aos aspectos físicos e psicológicos.
No nosso grupo de sobreviventes temos pessoas de 18 a 64 anos, ou seja, a
expectativa de sobrevida longa é importante. Contudo, todos já viram que é possível
ter vida longa após o transplante, então isto, não é a prioridade diária, mas a QV
sim.
No controle a faixa etária varia de 18 a 68 anos, assim, o foco do olhar está na
conquista do bem-estar, quer seja porque acreditam que tem todo o tempo para
alçarem seus sonhos ou porque estão com mais idade e então almejam uma
condição favorável sem maiores privações. Sendo assim, todos desejam QV,
independentemente de serem transplantados ou não.
A idade avançada foi acusada como fator de risco da QV para os homens
sobreviventes do nosso estudo. Quiçá a presença de ejaculação precoce e perda da
libido contribuam para tal resultado. Estas variáveis podem estar correlacionadas
com o distanciamento da condição jovem e não apenas como efeito adverso do
tratamento.
Pois, independentemente do gênero ou do fato de ter se submetido ou não ao
transplante, ao correlacionar os indivíduos mais jovens (<36 anos) com os de mais
idade de cada grupo, observou-se que ter menos idade, viabiliza a aquisição de
maior satisfação.
Isto se reafirmou ao comparar os grupos entre si. O do controle constitui-se
com um número maior de jovens e eles demonstraram maior satisfação em relação
à vida sexual do que os sobreviventes. Porém, ao investigar somente os indivíduos
de mais idade, de ambos os grupos, constatou-se que aqueles que pertencem à
população normal apresentam maior satisfação sexual do que os sobreviventes, ou
141
seja, ter mais idade é um fator de risco, mas, os efeitos adversos do tratamento
também interferem na qualificação da vida sexual.
Os sobreviventes masculinos apresentam menos disfunções sexuais do que as
mulheres, aparentemente isto se deve ao fato do grupo masculino de um modo geral
se importar mais com a sexualidade do que o grupo feminino. Pois, para as
mulheres as queixas não se apresentaram como fator de risco em relação a QV,
enquanto que para os homens sim.
Segundo Leigh (1997), o significado que se dá para a QV pode variar,
dependendo do humor, tempo e os valores que estão embutidos na resposta.
Independente dos nossos resultados o processo de envelhecimento causa
algumas limitações mesmo em condições saudáveis. Pois, avançar para estágios
tardios da vida é um fator de risco para qualquer um.
Enfim, no estudo vigente constatou-se que o grupo controle tem um acentuado
número de jovens (18-25), diferente do grupo de sobreviventes que tem um número
maior centrado nos adultos de mais idade (26-35 anos). Sendo que, isto foi
considerado como fator de risco em relação à QV. Mesmo assim, mais da metade
dos sobreviventes consideram-se satisfeitos nas atuais condições de vida.
Além da idade, existem outros fatores que influenciam na forma de olhar e
perceber as vivências pessoais, como por exemplo, personalidade, cultura, valores,
expectativas, objetivos, estágios circunstanciais da vida, tais como, vestibular,
formatura, emprego, casamento, filhos, aposentadoria e outras crises normais do
próprio viver. Fatores esses constituintes da subjetividade que propicia uma visão
interpretativa peculiar em cada um.
Na crise o homem é obrigado a sair da acomodação e da zona de segurança,
pois ele precisa transformar a situação e buscar novas oportunidades, soluções e
alternativas para enfrentar os problemas da vida. Assim, em função da adversidade
o sobrevivente descobre suas reais capacidades; que, muitas vezes, nem sabia que
as possuía.
142
5.1.4 Escolaridade
Em relação à escolaridade 67% dos sobreviventes estudaram mais de oito
anos. Enquanto que no grupo controle 83%. Um dos motivos desta diferença talvez
se dê pelo fato de que alguns dos sobreviventes cujo diagnóstico era AAS, eram
filhos de agricultores, trabalhavam na roça e não existiam escolas nas proximidades.
Outro motivo pode ser o fato de que muitos estiveram em tratamento quando
ainda criança (n=45) ou adolescente (n=55). De um modo geral, esse período está
direcionado para a vida escolar. A conseqüência pode ter sido uma interrupção
prolongada do estudo, atrasando ou até mesmo interrompendo definitivamente o
processo acadêmico. Pois, com o avançar da idade observa-se a necessidade de
ser provedor, ou pelo menos de contribuir na receita familiar e não apenas na
despesa. Esta interpretação se respalda no fato de existirem mais casados (58%) e
provedores (57,9%) no grupo dos sobreviventes. Enquanto que no grupo controle
existe mais solteiros (44,3%) mais jovens e menos provedores (51,5%). Mas, entre
os solteiros, existem mais solteiros provedores no grupo controle. Quiçá esses
jovens têm outros interesses e necessidades.
Outro fator explicativo para a porcentagem mais baixa de anos de estudo pelos
sobreviventes, pode ser o fato de que nessa amostra a maioria pertence ao nível
sócio econômico menos favorecido (64%). Supostamente eles tiveram menos
condições da inserção ou permanência na vida acadêmica.
Mas, é interessante observar que ao comparar os grupos, 58,4% dos
sobreviventes realizam trabalhos que exigem uma função mais intelectual do que
braçal. Enquanto que no grupo controle são 56,8%. Apesar de haver uma diferença
ínfima, parece que de alguma forma os sobreviventes conseguem superar as
dificuldades e compensar com atitudes que amenizam as lacunas deixadas pelo
processo de doença e de tratamento.
Ness e colaboradores (2005) constataram que quando o sobrevivente se
submete ao transplante enquanto criança ou adolescente, isto interfere
negativamente no desempenho da rotina diária e nos relacionamentos interpessoais.
No estudo vigente, não se registrou diferença estatísticamente significante em
relação a QV, entre aqueles que se submeteram ao TMO enquanto criança e/ou
adolescente ou adulto.
143
Além disso, o fato de passarem por uma doença e uma intervenção clínica de
alta mortalidade, faz com que busquem trabalhos que exijam menos da força
corporal e que propiciem uma autonomia através do próprio negócio.
No estudo vigente a condição de trabalho braçal e a baixa escolaridade estão
relacionadas, e é uma composição de risco que desfavorece a QV.
5.1.5 Provedor
A condição de provedor e o aparecimento da ansiedade são variáveis de risco
para os sobreviventes, independentemente do gênero.
Ser provedor ao mesmo tempo em que representa uma reinserção profissional,
também significa um compromisso com a responsabilidade e o cuidado da própria
autonomia e de terceiros. Consequentemente é uma composição de deveres e
direitos. É preciso sentir-se apto e com uma perspectiva de manutenção dessa
condição de prover o sustento de si e dos seus. Quiçá isso também contribua para a
manifestação da ansiedade.
Além disso, as transformações ocorridas nos últimos anos nos processos de
trabalho são incentivadoras da competitividade e causadoras de expressões
ansiógenas. Pois, a pressão do sistema exige qualificações e superações para que o
indivíduo consiga uma condição que o designe como apto para a empregabilidade e
pertencente ao mundo corporativo (JACQUES, 2007).
No entanto, também é através do trabalho que se constrói a identidade social e
a independência financeira. Entre os sobreviventes casados 72,6% são provedores,
enquanto que no grupo controle são 68,4%.
No grupo das mulheres que se submeteram ao TMO, 31 delas são as únicas
provedoras da família. A responsabilidade assumida significa que há uma condição
favorável para o desempenho funcional, ou seja, a mulher tem autonomia para
gerenciar o próprio sustento e de outros. No entanto, foi detectado que para elas é
fator de risco não ter parceiro fixo. Provavelmente pelo desejo de construir e
compartilhar uma vida com um companheiro, por vínculo afetivo e não somente por
respaldo financeiro.
144
Segundo Cavalcanti (1987) na sociedade patriarcal a história da vida da mulher
está diretamente associada ao inferior, ao submisso e com isto atribuiu-se uma
identidade que se modifica conforme os interesses do contexto machista.
Cuschnir (1992) corrobora com este parecer ao comentar que na cultura
brasileira ser mulher significa: casar, ter filhos, ser fiel ao marido, ganhar menos
dinheiro que o homem, ser submissa, mas, ter uma profissão. Sendo que na
literatura muitas vezes é referendada como “segundo sexo”, (citação de Simone de
Beauvoir) no sentido de sexo frágil.
Apesar de a mulher ocupar lugares de muita importância no mundo
competitivo, ainda permanece algum resquício da desqualificação imposta pela
hegemonia da época e pelos conteúdos simbólicos ancestrais. Consequentemente,
ao mesmo tempo em que a mulher deseja a independência, ainda almeja ter um
companheiro de vida, é uma busca pela alma gêmea.
Além disso, vivemos num sistema capitalista que o consumidor é visto muito
mais como um produto de mercado e não tanto como produtor. Desse modo, estar
na concorrência é estar à mercê das oscilações daquele que tem poder de
negociação. Em sendo assim, ser provedor é um protótipo de liberdade e
escravidão, uma vez que, suscita uma miscelânea paradoxal de sentimentos e
emoções como segurança/insegurança, aquisições/dividas, liberdade/compromisso,
responsabilidade/vaidade entre outros.
Constatou-se que ser provedor modifica a condição dos sintomas da depressão
devido ao bem-estar pela conquista e da mudança na classificação do status. Diante
disso, pode apresentar sentimentos ambivalentes, sentir um alívio e ao mesmo
tempo uma expectativa pelo desempenho do compromisso.
De acordo com os estudos de Gruber e colaboradores (2003) com
sobreviventes que realizaram o transplante do tipo alogênico, verificou-se que 30,7%
não retornaram integralmente para o trabalho.
No nosso estudo 83% dos sobreviventes trabalham em funções que se dividem
entre atividades mais complexas e braçais. Desses trabalhadores 57,9% são
provedores.
Esses resultados são similares ao encontrados no grupo controle, ou seja,
após longa data de pós-transplante, essa intervenção não tem uma interferência
marcante na capacidade laboral. Porém, ao comparar os grupos entre si registrou-
se que é fator de risco a condição de ter uma função braçal no trabalho.
145
Provavelmente isto é decorrente da composição tendenciosa que a atividade braçal
estabelece com um status socioeconômico desfavorável e uma escolaridade aquém
da exigência de mercado.
Estar apto ao trabalho é fundamental, uma vez que se sabe que a reintegração
profissional é muito importante para a auto-estima, devido o reconhecimento social.
Pelos resultados conquistados, podemos dizer que os sobreviventes estão em
condições de entrar no mercado de trabalho e concorrer à altura como qualquer
pessoa normal que tenha as mesmas qualificações.
5.1.6 Espiritualidade
A ciência deu foco no mundo material e a espiritualidade ficou para o campo da
religião e da especulação filosófica. Porém, hoje já existem movimentos da ciência
para tentar compreender a dimensão e a interferência da espiritualidade.
No estudo vigente ao comparar os dois grupos, o item religião mostrou ser um
fenômeno que está presente nas pessoas em geral. Provavelmente porque as
crenças e a espiritualidade dependam da subjetividade e não somente da condição
de doença ou de tratamento.
O aparecimento de uma necessidade espiritual maior é comum nas situações
de ameaças reais ou imaginárias (SLOVACEK et al., 2005).
Os sobreviventes apresentam um discurso aonde mencionam o quão gratos
são: a Deus, a família e aos médicos pelas conquistas obtidas. Quiçá porque esses
recursos (espiritual, suporte familiar e clínico) amenizem a dor e o sofrimento e
promovam uma interferência positiva na QV.
5.2.ASPECTOS CLÍNICOS
5.2.1 Diagnóstico
No estudo vigente o fato de ter um diagnóstico de hemopatia maligna ou
benigna não demarcou uma diferença estatisticamente significante entre os grupos
em relação à QV.
146
Da amostra total, vivos e mortos, (n=701), registraram-se mais óbitos no
gênero masculino e mesmo assim têm mais homens vivos. Uma das razões de
termos um número superior em relação ao gênero masculino é que a incidência de
quadros leucêmicos é maior nos homens.
5.2.2 Anemia de Fanconi
A ocorrência de câncer nos sobreviventes com Anemia de Fanconi aumenta
cinqüenta vezes quando comparados com a população normal. Além disso, podem
apresentar riscos de comorbidades e mortalidades devido à severa falência da
medula óssea com imunodeficiência. Por isto a indicação da intervenção do TMO.
Através desta intervenção é possível conquistar um acontecimento somático.
Pois, as células-tronco após o transplante alcançam condições normais, ou seja,
sem clone citogenético anormal e o sobrevivente passa a apresentar contagens
sanguíneas normais. No entanto, apesar deste tratamento mobilizar melhorias na
medula óssea, não resolve todas as comorbidades relativas à doença em si.
Contudo, submeter-se ao transplante também significa correr riscos
significativos do próprio óbito, da ocorrência do DECH e do aumento da
probabilidade de desenvolverem futuros tumores sólidos.
Pesquisadores alemães registraram que o aparecimento de câncer é mais
precoce e se expressa mais frequentemente nos sobreviventes transplantados do
que nos não-transplantados. Por isto, a recomendação de exames ginecológicos é
alta. Porque é significativo o risco de câncer de vulva, cervix, vagina e anus.
No nosso estudo, nenhum dos nossos sobreviventes com Anemia de Fanconi
(n=18) recebeu diagnóstico de alguma neoplasia secundária, após dez anos de
transplante. Sendo assim, o transplante foi uma intervenção clínica muito favorável
para esse grupo de sobreviventes.
5.2.3 Pega
Quando correlacionamos o aspecto da pega das células tronco, observamos
que na nossa amostra (n=214), apenas dois sobreviventes tiveram problemas em
147
relação à pega. Podemos afirmar que os sobreviventes que não apresentam pega
completa, reduzem significativamente a possibilidade de uma sobrevida longa. Isto
se confirma ao avaliar as causas do óbito dos 389 sobreviventes que não
participaram do estudo. Pois, 25% apresentaram problemas quanto à pega e 49%
desenvolveram a DECH, causando comorbidades que contribuíram para o desfecho
do óbito.
Assim, a não pega ou pega parcial e a manifestação da DECH são fenômenos
que funcionam como filtros seletivos em relação à sobrevida longa.
5.2.4 DECH
A doença do enxerto contra o hospedeiro-DECH é uma conseqüência do
tratamento podendo causar efeitos adversos que conduzem para um
empobrecimento da saúde global e até mesmo ao óbito (FRASER et al., 2006; LEE
et al., 2006; WEISDORF, 2007).
Baker e colaboradores (2004) analisaram os efeitos clínicos tardio, (com
sobreviventes transplantados devido a doenças neoplásicas) e perceberam que
aqueles que tiveram DECH manifestaram um alto risco de hipotiroidismo,
osteoporose e cardiopulmonar, ou seja, a saúde global foi considerada insatisfatória.
Outra pesquisa importante neste sentido é a de Kol et al., (2004). Eles
constataram que alguns fatores associados resultam na melhor sobrevida, os quais
são: ser jovem (trinta anos ou menos), inexistência da manifestação da DECH, e
condicionamento com busulfan e ciclofosfamida.
Existem inúmeras pesquisas que mostram resultados semelhantes, ou seja, a
presença da DECH como um fator de risco para a QV. Mas, os trabalhos
encontrados muitas vezes, avaliam a causa morte e nesse sentido esta ocorrência é
uma das razões principais de mortalidade relacionada ao tratamento, isto é, é causa
adjuvante de óbito e nas ocasiões que sobrevivem isto ocorre com uma qualidade
ruim, quando a expressão da DECH crônica foi severa, extensa e grau III ou IV.
Assim, esse acontecimento desempenha uma ação filtradora em relação à sobrevida
e a QV.
Por esta razão, em geral, as pesquisas e análises quanto ao DECH abordam
as ocorrências que agravam as chances de sobrevida e de QV. Sem haver uma
148
investigação mimuciosa em relação à convivência com a DECH aguda, grau I e II,
leve e limitado.
No estudo vigente encontramos 38 (17,8%) sobreviventes com DECH-a. Sendo
que, desses 13 (34,2%) evoluíram para a DECH-c. Este resultado mostra o aspecto
preditivo e progressivo de DECH-a para o DECH-c. Além disso, observou-se que
dos 13 sobreviventes que tiveram DECH-a e DECH-c 12 apresentaram uma
evolução extensa e severa da doença. Essa progressão ocorrida da doença aguda
para a crônica também está descrita no trabalho de Funke e colaboradores (2006).
O efeito da DECH contra as células leucêmicas passou a ter uma importância
maior do que o condicionamento. Hoje não vigora mais o antigo preceito de que
more is better”, isto é, acreditava-se que os condicionamentos tinham que ser de
grande toxicidade.
Apesar da alta morbidade e mortalidade dessa realidade também existem
outras possibilidades, como constatamos nos achados da nossa pesquisa.
Encontramos um resultado inesperado e controverso no estudo vigente, uma
vez que, verificamos que a presença da DECH-a e do re-transplante são fatores de
proteção para os sobreviventes em relação à QV. Como interpretar este achado uma
vez que a literatura diz o contrário e a clínica do nosso serviço também mostra a
presença de prejuízos?
O DECH-c não aparece como fator de risco provavelmente porque após mais
de uma década de transplante, não é comum ter a doença em atividade, uma vez
que geralmente se tem um controle e não está na vigência de tantas medicações.
Dos nossos sobreviventes que desenvolveram DECH-a 66% (n=25) tinham
como diagnóstico uma doença maligna neoplásica, sendo que 23 desses
sobreviventes tinham algum tipo de leucemia. É provável que este seja um
motivador para a ocorrência da DECH ser interpretada pelos sobreviventes como
algo positivo e relevante para o resgate da saúde e maior garantia contra a recaída
da doença. No sentido do efeito do enxerto contra as células leucêmicas. Sendo
assim, apesar da DECH ser causadora de comorbidades e como tal é um problema,
a sua presença também pode ser compreendida, após longa data do TMO, como
parte da solução nos sobreviventes em que diminui a probabilidade do aparecimento
da recaída da doença primária. Mesmo que esta característica do enxerto versus
leucemia esteja relacionada com a presença direta da DECH-crônica e não aguda.
149
Parece que viver a experiência da DECH produz um paradoxo emocional, no
sentido dela ser bem-vinda ao mesmo tempo mal dita, pelo alto índice de
mortalidade. Porém, quando ela aparece, mas no final de um percurso ela
desaparece é como se demarcasse presença como parte complementar do
tratamento, no sobrevivente das LMC. Assim, essa passagem cria uma convicção
interna de proteção. Relembrando um dizer de Nietzsche: O que não mata, fortalece!
O fato de conhecer o efeito positivo do enxerto versus células leucêmicas
produz maior tranqüilidade em relação à expectativa favorável de melhores
resultados e menores riscos de ocorrer no futuro uma recaída da doença.
Além disso, quando se vivencia um adoecimento, perde-se a identidade de ser
saudável e de ter controle sobre o próprio corpo. Porque a doença passa a ter e ser
o lócus de controle interno, ou seja, o sobrevivente segue as diretrizes do percurso
da doença e não mais os compromissos que gostaria de ter marcado, ao invés
disso, ele é que fica marcado. Além disso, o fato de não se ter uma etiologia
específica da doença gera instabilidades emocionais devido à sensação que esse
desconhecimento causa.
Com o desenvolvimento da DECH também não se tem a certeza de um
controle. Porém, a causa está relacionada com uma rejeição produzida pelo
tratamento e não pela doença. Desse modo, a percepção que se tem é que o lócus
de controle é externo e isto desencadeia uma diferença perceptiva significativa
porque é como se o “mal” viesse de fora e não de dentro. Assim, o sobrevivente
resgata a crença de que suplantará as adversidades porque a DECH é um reforço
do tratamento, é uma oficialização de maior garantia da inexistência de recaída da
doença primária, que é um dos grandes fantasmas na vida dos sobreviventes.
Além disso, com o passar do tempo acontece um ajustamento das percepções
da normalidade para uma adaptação maior em se tratando das circunstâncias,
expectativas e mudança na consciência temporal. Nesse sentido, o maior desafio
não é o físico, mas sim, o emocional.
Esta interpretação propicia uma explicação para a aparente discrepância que
ocorre entre alguns fatos reais, as respostas e atitudes tomadas pelos sobreviventes
quando comentam sobre a própria condição de QV. Aparentemente, os efeitos dos
sintomas existentes com o passar do tempo perdem a intensidade.
Os resultados mostram que apesar de haver algumas seqüelas e
comorbidades, os sobreviventes, em geral, estão muito satisfeitos. Enquanto que as
150
pessoas do grupo controle de um modo geral são mais intolerantes e por isto
demonstram mais queixas e insatisfações no dia a dia.
De certo modo, as complicações e morbidade ocorridas na nossa amostra
foram irrelevantes enquanto seqüelas, uma vez que, ter a DECH-a apresentou-se
como fator de proteção.
A adversidade gera um desafio que com a superação produz vitalidade e
persistência. O esforço aplicado é compensado pela possibilidade de um recomeço.
Será que, o fato desses indivíduos terem sobrevivido a essa experiência
significa que são pessoas que desenvolveram um comportamento resiliente com
maior capacidade de superação? Parece que não sucumbir diante de tantas
adversidades propicia um sentimento de tolerância, gratidão e de maior
aproveitamento das oportunidades que a vida oferece.
Então, viver circunstâncias tão desesperadoras faz com que qualquer novo
enfrentamento que tenha que passar, fique insignificante para os parâmetros e
referências pessoais.
No mesmo processo em que sai vivo, acompanha alguns colegas durante o
tratamento que tem como desfecho final o óbito. Essa vivência de um passado tão
presente produz uma valorização de cada aquisição e uma força interna (resiliência)
para enfrentar qualquer situação.
Gerando uma crença de que se não existe total controle do processo da vida e
nem solução para a morte em si, então o que resta é viver os sabores e dissabores
da vida, mas, com uma busca naquilo que realmente faça uma diferença na
qualidade e no sentido da própria existência. Parafraseando Confúcio: “É melhor
acender uma vela que amaldiçoar a escuridão."
Ocorre uma construção de relativização dos valores, propiciando uma atitude
de condescendência e fornecimento de uma outra realidade do real.
Mas, para tal se estabelecer impera a demanda de um tempo e de uma
retomada retrospectiva dos valores que norteavam o viver, uma postura de
conscientização das experiências oriundas das perdas sofridas e o encontro
legitimado com o desejo de viver. Assim, a tolerância se faz presente para suplantar
as intempéries. Enquanto que a atitude de permuta de interpretação relativa em
relação aos fatos é capaz de viabilizar um ajuste de ação contemplativa e adaptativa
na dialética do ser, no contexto do ter.
151
Não há um projeto de mudança, mas, o novo material experimentado produz tal
fenômeno. Este novo prisma conjectura com uma universalidade que só a
subjetividade contém. A identidade individual se fortalece e as adversidades próprias
da vida não produzem mais o medo. Apesar do processo da doença, do tratamento
e de seus efeitos secundários levar o sobrevivente ao encontro com a morte.
Mas, parece que a condição de ser sobrevivente de longa data cria uma
apreciação e um desdobramento da sobrevivência. Aonde o panorama de fundo é
passado e a ação diária é o “presente” que está à espera de ser desembrulhado e
apreciado no intervalo do tempo e espaço que ainda se tem. Ou como dizem se não
é possível mudar os fatos. Se não há satisfação com o modo como a vida está se
apresentando. É preciso então investir na mudança interior do jeito de ver a vida.
5.2.5 Re-Transplante
O registro de um segundo transplante também foi um resultado inquietante,
uma vez que se apresentou como fator de proteção no grupo das mulheres. Apesar
do n ser ínfimo esse achado demarcou significância e mostrou a tendência e a força
dessa variável. Confirmando a importância do processo da transformação referencial
que se toma ao longo dos anos. Então, esse acontecimento também pode ser
explicado pela relativização temporal de valores, uma vez que, propicia a construção
de uma nova perspectiva ocular.
5.2.6 Óbito
Conforme os resultados da nossa pesquisa três sobreviventes faleceram
durante o percurso do estudo. Dois deles por motivos plausíveis dentro do contexto
(recaída da doença e câncer secundário) e o outro por razões não relacionadas com
a doença neoplásica ou os efeitos deletérios do tratamento. Mas, provavelmente
devido ao quadro de depressão endógena, uma vez que, vários familiares de
primeiro grau do sobrevivente em questão também se suicidaram.
152
Contudo, Deeg e colaboradores (1998) constataram que 19% de 212
sobreviventes adultos que se submeteram ao TMO-alogênico, após longa data
(média de 12 anos) apresentaram depressão ou tentaram suicídio.
Ao verificar o motivo dos óbitos do grupo maior, isto é, dos 701, as causas mais
freqüentes foram infecções de toda ordem (bacteriana, fúngica, viral, protozoária e
outras). Outro fator de relevância nas causas dos óbitos é a rejeição e a falha de
enxerto. Talvez este seja o motivo de só existir dois sobreviventes na nossa amostra
que passaram por problemas com a pega do enxerto. A maioria não superou esta
situação clínica e foi a óbito. Sendo assim, falha na pega e a DECH são
acontecimentos que envolvem riscos significativos para a sobrevida.
5.2.7 Ansiedade e Depressão
Com a confirmação diagnóstica e a decisão de realizar o TMO, entram em jogo
os recursos psíquicos, sociais e econômicos de cada um.
Observa-se que as atitudes tomadas inicialmente seguem um padrão
específico da personalidade, isto é, são pessoas que além do suporte familiar/social
e da crença num poder maior, eles enfrentam o desafio com uma participação ativa,
ou seja, tem uma parte que é da responsabilidade deles. É preciso “querer”
enfrentar, estar na linha de frente e assumir este compromisso com eles e por eles.
A dinâmica da personalidade dá um colorido ou sombreamento peculiar nas
atitudes, pensamentos e sentimentos expressos. Mas, também existem
comportamentos que são comuns, como a ansiedade e o medo do amanhã, devido
à condição de imprevisibilidade na singularidade das reações.
Após tantos anos de transplante, verifica-se a presença da ansiedade como
fator de risco para os sobreviventes. Porém, este componente ansiógeno também se
manifesta quando se compara os dois grupos. Mas, com predomínio nas mulheres
sobreviventes.
No grupo controle a depressão e a condição de não ser da raça branca
também foram fatores de risco. A aceitação ou rejeição da própria etnia tem
interferência na QV.
A sintomatologia que ocorre nos quadros depressivos ou de ansiedade muitas
vezes está emaranhada, tendendo a apresentar uma relação substancial entre
153
esses humores. Assim, a discriminação é factível de falhas devido à ambivalência
dos sintomas e também porque não é uma expressão matemática, mas sim,
subjetiva.
De acordo com Cunha (2001) a escala de avaliação de ansiedade foi elaborada
para mensurar os sintomas ansiógenos, mas que estes são de certo modo
compartilhados com os de depressão.
O estudo vigente mostrou que os sobreviventes apresentam mais ansiedade do
que depressão. Porém, a sintomatologia de alterações de humor por vezes se
justapõe. Assim, apesar de não ser significativa a presença da depressão; esta
interfere na expressão da ansiedade.
Deste modo, a interferência da depressão sobre a ansiedade vista neste
estudo se justifica pela integração confusional dos transtornos de humor. A própria
escala utilizada para avaliar a ansiedade, menciona a similaridade com alguns
sintomas da depressão.
Segundo Syrjala e colaboradores (1993) mesmo que os sintomas de depressão
não afetem diretamente a QV, o tratamento do transtorno pode ser um fator de
contribuição para o resgate da vida normal e do bem-estar.
Para muitos dos sobreviventes, a ansiedade não está relacionada com as
conseqüências do transplante. Pois, já se obteve um resultado e isto faz com que
eles não tenham mais a ansiedade de que tem que dar certo. Já deu!
Loberiza e colaboradores (2002) investigaram a associação entre síndrome
depressiva e os sobreviventes de longa data de pós-transplante. Os resultados
mostraram que 35% satisfizeram os critérios de depressão. Sendo que este grupo
apresentou três vezes mais o risco de morrer do que aqueles que não manifestaram
depressão. Para estes pesquisadores a síndrome de depressão está associada com
a diminuição de sobrevida, pelo menos no primeiro ano de infusão. A hipótese deles
é que a intervenção psicológica e/ou farmacológica pode aumentar a sobrevida e a
QV.
Isto é hipotético e como tal não pode ser firmada pelos estudos vigentes que a
depressão ou déficit psicológico contribuem diretamente para o aumento da
mortalidade ou se é um simples marcador da gravidade do processo das doenças
crônicas.
Contudo, Colon e colaboradores (1991) encontraram uma correlação direta
com a avaliação no período do pré-transplante. Para eles, os resultados da
154
mensuração basal indicaram depressão durante e após o transplante, encontraram
níveis significativos de óbitos nestes sobreviventes.
Mas, tanto os sintomas de depressão como os de ansiedade são freqüentes
em pelo menos 18% dos sobreviventes depois do transplante (SYRJALA, 1993;
SASAKI, 2000; BETSY et al., 2000; PERES 2006).
Parece que o indivíduo com humor depressivo não consegue perceber os
pontos favoráveis que coexistem no dia a dia. Afetando a QV e quiçá interferindo na
atitude pessoal em relação às intempéries da vida. Pois, os sobreviventes com
depressão mostraram-se com menos energia, vitalidade e desempenho mental.
Enfim, expressaram uma tendência deficitária perante a vida.
Depressão é uma condição freqüente entre os sobreviventes com neoplasias,
uma vez que, a evolução natural da doença normalmente é acompanhada de
intercorrências estressantes e ameaçadoras, retirando a confiança, segurança,
estabilidade e harmonia. A depressão pode ser considerada uma “reação normal”,
no sentido de ser esperada diante da rebeldia da doença e da proposta agressiva do
tratamento. Mas, no campo dos conhecimentos da semiótica a depressão não é
normal e interfere na QV, independentemente da condição de saúde, como foi
constatado no grupo controle, uma vez que, a depressão é o fator de risco dessa
população.
5.2.8 Fadiga
A fadiga é um sintoma muito comum entre os sobreviventes, além de interferir
na participação ativa, também causa stress e frustração, ou seja, tem uma influência
negativa no humor (GIELISSENN et al., 2007; KALO, 2007).
A presença de fadiga causa um impacto em vários aspectos da vida (atividades
diárias, senso de bem-estar, capacidade para relaxar, trabalhar, disponibilidade para
ficar com amigos e familiares e até em relação ao enfrentamento do tratamento).
Existem algumas possíveis causas para a permanência da fadiga, as quais
são: a doença em si, uma vez que ela consome os nutrientes do corpo, baixa
contagem sanguínea, quimioterapia, radioterapia, medicação imunoterapica,
problemas com o sono, com a nutrição, a redução de atividade física, diminuindo a
155
massa muscular, assim como, os problemas emocionais (ansiedade, depressão,
conflitos de relacionamento) também podem interferir no bem-estar do indivíduo.
Mas, em relação aos sobreviventes de longa-data de transplante, muitas
destas causas deixam de ocorrer, então a freqüência da fadiga deve-se a que, neste
período tão tardio?
Supostamente, devido às seqüelas decorrentes da própria doença e do
tratamento. Pois, ocorre um desgaste das reservas naturais do organismo. Além
disso, as condições emocionais podem propiciar motivações positivas e/ou
negativas e estas produzem um efeito maior ou menor na disposição interna.
Segundo Cella e colaboradores (2003) a fadiga é um dos sintomas mais
freqüentes nos sobreviventes com neoplasias. Sua etiologia é multifatorial porque
incluí efeitos adversos do tratamento, da doença, dor, alterações do sono, do humor
e das alterações fisiológicas e metabólicas.
Na amostra deste estudo verificou-se que 13,6% dos sobreviventes
apresentam fadiga. É preciso lembrar que para muitos a causa está associada aos
fatores emocionais e não somente aos componentes de ordem física, ou seja, o
bem-estar emocional propicia bem-estar físico. Enquanto que nos sobreviventes em
que a condição física é muito ruim, isto pode causar mal-estar emocional.
“Um funcionamento inadequado da psique pode causar tremendos prejuízos ao corpo, da
mesma forma que, inversamente, um sofrimento corporal pode afetar a psique; pois a psique e
o corpo não estão separados, mas são animados por uma mesma vida. Assim sendo, é rara a
doença corporal que não revele complicações psíquicas, mesmo quando não seja
psiquicamente causada”.
(JUNG, 1991)
É importante salientar que esse resultado pode ser considerado muito bom,
apesar da presença da fadiga nos sobreviventes, a porcentagem está aquém do
esperado.
156
5.2.9 Sexualidade
Os problemas sexuais podem gerar sérias dificuldades no relacionamento do
casal, principalmente quando o parceiro acredita que o fator causal de impedimento
dos encontros sexuais é o psicológico, a “má vontade” e não fatores biológicos
(decréscimo hormonal, seqüelas da DECH, dispareunia).
Na nossa amostra, uma sobrevivente separou-se do cônjuge porque ele a
agredia fisicamente. Pois, achava que a mesma não engravidava porque não
desejava ter um filho dele.
De fato, o desconhecimento, desconfiança, despreparo emocional, estrutura da
personalidade e comorbidades provenientes da experiência com o transplante
podem produzir fadiga, dificuldades psicológicas e de relacionamento, afetando o
desempenho e a libido do sobrevivente. A aparência física também tem um impacto
negativo na auto-imagem, gerando sentimentos de rejeição. Consequentemente,
pode haver um afastamento e um decréscimo na busca do parceiro e na ousadia
deste movimento.
Para as mulheres sobreviventes verificou-se que não ter parceiro fixo, um
companheiro de vida é um fator de risco em relação a QV. Mas também a etnia tem
uma influência na auto-estima, pois, não ser da raça branca foi percebido como algo
desfavorável para as mulheres e no grupo controle independentemente do gênero.
Os homens do grupo de sobreviventes apresentaram alguns fatores de risco,
entre estes a ansiedade, ejaculação precoce e perda da libido, causando uma
insatisfação em relação à vida sexual.
Ao comparar o grupo controle com o de sobreviventes verificou-se que aqueles
estão mais satisfeitos em relação à vida sexual. Os homens sobreviventes (60,4%)
têm uma vida sexual ativa apesar da perda da libido em 25,2% e da insatisfação
sexual em 30,9%, ou seja, ativa, mas com uma satisfação questionável.
Enquanto que as mulheres sobreviventes (53%) têm uma vida sexual ativa
apesar da perda da libido presente em 52% e da insatisfação sexual em 44%.
Mesmo assim, 56% dizem estar satisfeitas.
Os resultados em relação à sexualidade mostram a necessidade de implantar
e/ou ampliar os atendimentos especializados (ginecologia, endocrinologia,
fisioterapia, terapia ocupacional, psicologia) para intervenções preventivas e
157
orientações não só para o sobrevivente como também para o seu parceiro (a)
(BAILLARGEON, 2007; STARK, 2007).
5.3 SUBJETIVIDADE
5.3.1 A Interferência Subjetiva da Percepção
Apesar de este trabalho ter o foco nos sobreviventes de longa data, é
importante relembrar que eles precisam percorrer um trajeto que no início parece
intransponível.
Afinal são informados do diagnóstico de uma doença de alta comorbidade e
mortalidade. Na seqüência se submetem ao TMO e em seguida precisam aplacar as
complicações agudas ou crônicas desta intervenção. Após tudo isto e muito mais, ao
serem comparados com um grupo de indivíduos representantes da população geral,
constata-se que a grande maioria dos sobreviventes (53,7%) apresenta um
resultado satisfatório e similar ao padrão de qualidade conquistado pela população
sadia (54,2%). Sem dúvida este resultado é muito gratificante para todos que estão
envolvidos nesse processo, quer seja o sobrevivente, o familiar, a equipe de saúde e
a sociedade.
Através da avaliação descritiva dos domínios que estão inclusos na QV, é
possível verificar que ambos os grupos apresentam uma performance semelhante.
Esse resultado reafirma os achados do padrão de qualidade global encontrado no
grupo de sobreviventes.
A seguir os domínios serão especificados para que se compreendam as áreas
que servem de suporte basal para a aquisição do bem-estar dos indivíduos.
No domínio físico (dor, tratamento médico, disposição física, locomoção, sono,
capacidade de trabalho e manutenção da rotina) quase a metade de ambos os
grupos relataram muita satisfação.
No domínio psicológico (sentido de vida, satisfação pessoal e com aparência
física, sentimentos negativos) mais da metade de ambos os grupos registram
satisfação. Sendo que os sobreviventes estão mais satisfeitos.
Com relação ao domínio social (amigos, suporte social, vida sexual) novamente
os resultados foram compatíveis com o nível máximo de satisfação.
158
Quanto ao domínio ambiental (segurança, ambiente físico agradável, finanças,
lazer, acesso as informações, aos serviços de saúde, ao meio de transporte e
condições do local onde mora) observa-se uma freqüência maior de insatisfações.
Porém, mesmo assim, entre os sobreviventes 38,2% referem estar muito satisfeitos
e 31,4% do grupo controle também.
Enfim, constata-se que em todos os domínios os dois grupos apresentam
resultados similares, tanto nos aspectos positivos como nos negativos. Sendo assim,
podemos concluir que há uma superação por parte dos sobreviventes, uma vez que,
de certa forma, eles recomeçam do zero e chegam juntos.
Mas, ao mesmo tempo é intrigante esta similaridade de satisfação. Então como
conceber que é possível um sobrevivente ficar satisfeito apesar de tudo que viveu e
de seqüelas que ficaram?
Existe um mito chamado o Mito do Leito de Procusto, ou seja, aquele que
estica.
Procusto era um bandido que atacava os viajantes e os submetia a um suplício, empregando,
para isso, uma técnica perversa peculiar: ele os prendia a um leito de ferro e, se a sobrevivente
o viajante fosse mais curto que o leito, ele o esticava violentamente; se mais longo, cortava-lhe
os pés.
(DE MARCO, 2003).
Ao mencionar este mito tem-se a intenção e o desejo de utilizar esta imagem
para ampliar a compreensão de quem não realizou um transplante ou não passou
por uma doença grave.
Afinal, aquilo que foge da expectativa, da perspectiva imaginada e esperada
desperta uma reação imediata de incredibilidade. Semelhante ao Procusto, a todo
custo tal informação deve ser acomodada aos paradigmas que se acredita e ao leito
do conhecimento que se tem.
Não podemos entender os diferentes modos de sentir, perceber e de ter um
entendimento sobre QV se estivermos com a mente colada nos padrões cartesianos
ou idealizada num padrão ouro.
É difícil entender que nem tudo que é importante é prioritário, e nem tudo que é
necessário é indispensável. Supõe-se que os sobreviventes têm esta compreensão
e por isto aprendem a ter maior tolerância e valorizam cada conquista
consequentemente se sentem mais satisfeitos.
159
Componentes presentes na personalidade como a habilidade para ajustarem-
se as situações de estresse e a sua capacidade de enfrentamento nestas
ocorrências, pode ter um impacto na percepção da QV, uma vez que, isto pode
infringir na qualidade da expectativa do sobrevivente (SKEEL et al., 1998; BETSY et
al., 2000; PERES, 2006).
5.3.2 Qualidade de Vida
A avaliação da QV baseia-se em percepções subjetivas e objetivas. Por esta
razão, este estudo incluiu um protocolo de avaliação que pudesse fornecer
informações sobre a QV, mas também com especificadores que pudessem contribuir
com conhecimentos que abarcam o homem, tais como: físico, social, familiar,
emocional, cognitivo, fadiga, humor e funcional.
A proposta de avaliar a QV sempre suscita dúvidas, pois a mesma está envolta
na subjetividade e depende do termômetro de cada um.
O homem contém dentro de si infinitas possibilidades. Com isto é capaz de
recriar sempre, através da extração de si mesmo.
Então como propor uma mensuração de algo que aos olhos da lógica, não está
apta a ser mensurada?
A forma encontrada neste estudo foi selecionar um protocolo que contemplasse
a variável da subjetividade e que incluísse algumas das múltiplas dimensões do ser
humano. Mas também, que considerasse a perspectiva transcultural e que relevasse
aspectos positivos e negativos conforme a própria sugestão da OMS.
Na amostra deste estudo apesar de haver depoimentos que revelam algumas
dificuldades, limites e problemas com a saúde, a síntese dos pareceres foi
predominantemente positiva. Mas, com certeza a idéia não é homogênea, depende
de cada um e principalmente de como são dimensionados e qualificados os fatos em
si e as circunstâncias próprias do viver.
Sendo assim, não é possível discutir sobre este trabalho apenas com dados
estatísticos e conclusivos, ou num padrão estritamente acadêmico para que seja
aceito aos olhos daqueles que não compreendem que “Nihil est in intellectu, quod
non antea fuerit in sensu”. (“O intelecto só contém o que passou pelos sentidos”).
JUNG (1991). Para melhor compreender é interessante relembrar o posicionamento
de Cohen e colaboradores (1996) quando diz que se QV é um bem-estar subjetivo é
160
fundamental saber o que o respondente considera como QV e quais os fatores que
contribuem para o bem-estar. Pois, essa avaliação age como uma ação individual.
Por esta razão que o resultado fornece informações subjetivas da realidade objetiva,
uma vez que, o sobrevivente expressa a sua percepção em relação às experiências
vividas.
No nosso estudo verificamos que 53,7% dos sobreviventes consideram ter uma
QV global muito boa. Mesmo na convivência com algumas seqüelas, tais como, olho
seco, osteoporose, menopausa precoce, infertilidade, hepatite e necrose óssea.
Apesar das possíveis seqüelas e dificuldades inerentes ao transplante, é
indiscutível a possibilidade de acrescentarem valores que dignificam a própria
existência. Mostrando que o processo do adoecimento e do transplante em si pode
produzir um profundo impacto positivo na QV dos sobreviventes. (ANDRYKOWSKI
et al., 2005)
Na nossa pesquisa encontramos este registro na maioria dos sobreviventes.
Este resultado se deve ao fato de que a auto observação da QV não é estática, pode
variar devido à complexa integração de variáveis multifatoriais. Além disso, é preciso
considerar que a perspectiva, a maturidade advinda da experiência de vida
promovem a capacidade de superação.
Edman e colaboradores (2001) pesquisaram a QV e constataram que existem
prejuízos no status funcional, na habilidade de enfrentamento e na presença da
ansiedade. Apesar destes sintomas, 80% deles consideravam a QV boa a excelente.
Foi possível verificar através da análise conceitual de QV expressa pelos
grupos que eles dão importância para o bem-estar emocional. Mas, para a grande
maioria do grupo de sobreviventes a condição emocional é essencial, demarcando
uma diferença estatisticamente significante entre eles.
A questão econômica tem valor para os dois grupos, mas, o grupo controle
prioriza, estabelecendo uma diferença estatisticamente significante entre eles.
Quanto à interferência da variável do relacionamento familiar na QV, constata-
se que para o grupo de sobrevivente isso ocupa um lugar de maior importância do
que para o grupo controle, registrando uma diferença estatisticamente significante
entre eles.
Como se vê nos trabalhos publicados e no estudo vigente não é possível
simplesmente eliminar o efeito da subjetividade em nome de um resultado na
perspectiva positivista. A retirada da interferência do psicológico e da cultura é o
161
mesmo que destituir o homem da percepção pessoal e do manejo próprio que se
tem perante a condição de vida.
Apesar de existirem seqüelas e comprometimentos, é possível ter a percepção
de uma qualidade satisfatória em relação à vida porque isto depende muito mais da
significação e interpretação que o sobrevivente dá, do que o fato em si.
5.3.3.Corpo Simbólico
O corpo não pode ser abordado apenas com os pressupostos biológicos. É
preciso considerar a realidade psíquica como uma energia que interfere através dos
recursos cognitivos e emocionais, uma vez que, estes guiam as ações e reações.
Freitas (1992) menciona que o corpo é percebido como algo externo à psique.
Mas, numa análise mais específica, sabe-se que o corpo e a psique não podem ser
dissociados, uma vez que o corpo também é psique.
Deste modo, a divisão corpo mente é uma abstração, mas, que não se
sustenta ao longo do tempo transcorrido desde o transplante. Pois, o processo do
adoecimento e do tratamento produz uma consciência da dialética entre o pensar,
sentir e o agir.
Ao realizar o TMO, muitos sobreviventes vivem um “processo de identificação”
com a personalidade ou o gênero do doador em si. Em outras palavras, o que por
vezes acontece é que o sobrevivente apresenta esta contaminação imaginária, além
do medo da morte, da deterioração física e do descontrole mental. Ele pode
acreditar em alterações psíquicas e somáticas, pela crença de ser tomado pelos
caracteres do doador. Exemplificando, um sobrevivente recebeu células-tronco
hematopoética de uma mulher, mas, com isto, viveu um processo de intensa
angústia, porque acreditava que ao receber células “mariquinhas” perderia sua
virilidade.
Outro exemplo: o sobrevivente tinha uma personalidade pacífica e o doador era
considerado a ovelha negra na família. Aquele pensou que após a doação, também
seria rejeitado, uma vez que, assimilaria as características do doador.
“O corpo humano nunca é para o próprio homem puramente um corpo, livre de
representações psíquicas, ou seja, há um corpo real (matéria) e um corpo simbólico
(representado). Há uma distância, mas não uma cisão, entre o corpo tal como ele é
162
e o corpo representado, ou seja, o corpo como ele é para alguém” (DINIZ e
LEVENSTEINAS, 2006).
Ao adoecer e necessitar da realização do TMO gera-se uma dependência real
e simbólica. Realmente precisa da intervenção, de um centro médico específico, de
um doador e da aceitação deste, do cuidado logístico e afetivo da família e do
controle da própria doença.
Enfim, toda esta submissão significa não ser mais o “sujeito” da própria vida.
Perde-se a autonomia dos próprios desejos e necessidades, tem-se que confiar a
própria vida aos outros e aceitar as limitações.
Parafraseando Diniz e Levensteinas (2006) este acontecimento causa uma
experiência do processo de morrer do eu constituído. Pois, acontece muito mais do
que a iminente morte física, mas também a morte daquilo que um dia foi, da imagem
narcisica de ser saudável, “de ser um corpo fechado”, de ter um controle contínuo da
própria vida e ter autonomia de ir e vir conforme suas decisões independentemente
da vontade do outro.
Sendo assim, na submissão desse tratamento, é como se ai morresse o próprio
eu e como se fosse roubado de si mesmo, uma vez que, fica num certo sentido
subjugado a decisão da equipe médica.
Com esta morte simbólica, cria-se a necessidade e as fantasias de um
renascimento através do TMO.
Inicialmente o que se deseja é um eu idealizado, ou seja, imaginam a
possibilidade de adotar uma criança, de assumir uma posição religiosa exacerbada,
de ajudar uma população carente, entre outros projetos de caridade coletiva e
humanitária.
Na seqüência, com o decorrer dos anos, o que se vê é à constituição de um eu
equilibrado, isto é, seu padrão de personalidade permanece, mas, apresentam uma
atitude flexível e mais adequada às demandas internas e externas.
Assim, há uma reformulação de valores, com adequação das experiências,
resgate de uma condição de autonomia e de ser produtivo independentemente da
busca do poder pelo ter.
Já é reconhecido pela caminhada que percorreu e por ter chegado aonde
chegou, isto é, é um sobrevivente da dor e da morte iminente. Mas, que hoje, de um
modo geral, vive com satisfação as descobertas de um novo olhar que esta
experiência possibilitou.
163
Essa compreensão pode ser ilustrada com esse dizer popular: O sacrifício de
subir a montanha é compensado pela paisagem que descobrimos do alto.
Conforme os estudos de Diniz e Levensteinas (2006) a doença e o TMO
interrompem a vida em geral, uma vez que, causam uma separação da rotina diária,
dos familiares, residência, projetos de vida e da própria imagem corporal. A pessoa
não se reconhece mais como ser autônomo, mas se identifica com a representação
psíquica que a doença em si tem para ele. Também, pode se identificar com objetos,
exemplificando: “Me sentia uma alienígena durante o tempo que fiquei com o
cateter”. “Parece que eu era um ser artificial, me perdi de mim”, frase dita por uma
sobrevivente.
Conforme a compreensão de Damineli (2000) “é possível melhorar a QV e se
tornar mais feliz, apesar de carências comparativas nas condições materiais de sua
existência, buscando suas recompensas nos próprios conteúdos organizados de sua
consciência. Para isso é preciso estar aberto a um acúmulo de experiências,
desafios e aprendizagens que envolvem as relações do indivíduo consigo mesmo,
com outras pessoas e com o sistema de objetos e de outros seres vivos que cercam
seu espaço de vida cotidiano”.
Tem certas situações na vida que para uma auto-preservação é fundamental
mudar o foco, a perspectiva de análise, isto é, desconectar, despojar, sair para dar
conta da emoção. É uma espécie de regulação da energia mental e física.
É uma estratégia que possibilita saber a hora de entrar e de se retirar para
alçar uma compreensão sobre os fatos em si. Não é uma forma de fuga ou negação,
porque nesse comportamento inexiste eficácia. Enquanto que naquele, apesar de
ser uma difícil tarefa este transito de ótica pessoal, é necessário para que aconteça
a compreensão, adaptação e consequentemente a satisfação.
5.3.4 Percepção
Quando o indivíduo não passou por situações de morte iminente ou de
experiências com doenças de prognósticos reservados, é como se a consciência
real do valor da vida ficasse passiva..., adormecida..., anestesiada. É como se a
saúde lhe pertencesse independentemente dos seus cuidados. Pois, não precisa
164
preocupar-se com ela, ela está ali, “meio que de graça”, isto é, não requer esforço,
nem reforço.
Quando se é acometido de uma doença de alta morbidade e que depende de
uma intervenção de grande risco, como o TCTH, para resgatar a saúde, o indivíduo
amargamente descobre um outro saber, a saúde tem um preço, não é de graça.
Aliás, o preço é alto, exige muito empenho e vontade de vencer. Assim, o
simples/grande fato de ter saúde, de estar vivo, tem um outro sentido que é
traduzido no valor da vida.
Consequentemente os sobreviventes se permitem ter tempo para fazer o que
gostam, para ouvir música, visitar amigos, apreciar a natureza, enfim, degustar o
sabor de serem vencedores.
Perguntaram para Dalai Lama o que mais o surpreendia na humanidade e ele
respondeu: “é o Homem”. Porque ele perde a saúde para juntar dinheiro, depois
perde o dinheiro para recuperar a saúde. E por pensar ansiosamente no futuro,
esquece do presente de tal forma que acaba por não viver nem o presente nem o
futuro. E vive como se nunca fosse morrer e morre como se nunca tivesse vivido.
Com o diagnóstico, doença e o tratamento muitos sobreviventes despertam
para um novo sentido da própria existência. Manifestam uma nova perspectiva de
vida e de relacionamentos. Os fatores existenciais e psicológicos ganham peso
(respeito, dignidade, alegria e autonomia), por vezes, até suplantam a função física.
Na nossa amostra de sobreviventes, ao responderem sobre o significado do
transplante e de todo o seu percurso, predominantemente eles disseram que
significa uma nova vida, o próprio renascimento e que agora vivem mais fortalecidos
e com valores dignificados.
Sendo assim, não é confiável uma avaliação que tenha como base apenas os
instrumentos quantitativos. Pois, é preciso ouvir os significados simbólicos do que
está sendo pontuado.
Só assim, é possível avaliar a extensão da ascensão ou prejuízo funcional e a
interpretação compreendida pelo sobrevivente conforme seu sistema pessoal de
valores.
Quando os sobreviventes de longa data discursam livremente sobre as marcas
deixadas pela experiência vivida, trazem no seu depoimento o aparecimento de
benefícios através de mudanças de atitudes. Comentários como: gratidão pela vida,
afirmação da confiança, por se sentir capaz de manejar as intempéries recorrentes
165
de acontecimentos próprios da existência humana e uma ampliação do auto-
conhecimento.
Porém, tudo isto não significa que não exista dor, raiva, sentimentos de perda e
tristeza. Significa que apesar da queda, encontram forças para levantar e ir em
frente com dignidade.
Existem sobreviventes que não querem nem passar na frente do hospital. Mas,
também têm aqueles que se tornaram enfermeiros e médicos. O motivo para tal
atitude pode ter sido o mesmo, mas com certeza a significação é peculiar de cada
um.
É comum o medo de recaídas, as incertezas em relação ao futuro, os receios
de não ter atendimento adequado do sistema de saúde, naqueles que passam pela
experiência do adoecimento e do transplante. Mas, após, longa data muitos ficam
com a sensação de que antes de adoecer não souberam aproveitar a vida e nem
valorizá-la.
Na iminência da morte é comum haver um processo retrospectivo e de
reavaliação da própria identidade, do que realmente é prioritário, do sentido e
contribuição deixada. Assim, após este percurso o sobrevivente sai deste contexto
satisfeito e vitorioso porque venceu a batalha de todo o processo, mas,
principalmente porque superou a si próprio.
Enquanto que o indivíduo saudável almeja sempre muito mais porque está no
sistema em plena concorrência do consumo e deste modo, não consegue parar e
apreciar o que recebeu gratuitamente, isto é, a saúde. Situação esta, muito diferente
daquele que precisou um dia ser transplantado, para voltar a ser saudável.
A satisfação é maior quando o indivíduo apresenta uma expectativa de
resultados próxima do possível. Enquanto que, quando está num nível não atingível,
é certo que haverá desapontamento.
Ross e Van Willigen (1997) corroboram com este comentário e afirmam que as
pessoas ficam satisfeitas quando as condições são melhores que o esperado.
Porém, se esperam mais, a insatisfação ocorre.
Por intermédio do cruzamento comparativo dos resultados verifica-se a
importância do bem-estar emocional como fator de proteção para a preservação da
QV, independentemente de ser transplantado ou um indivíduo qualquer da
população normal.
166
Outro aspecto interessante é que o apoio social pode contribuir para respostas
mais adequadas, nas situações de estresse intenso. Isto porque aumenta o
engajamento e a motivação, gerando força interna (ZEBRACK, 2000).
Na nossa amostra foi constatado que muitos dos sobreviventes que realizaram
o transplante quando ainda crianças, não lembram do processo em si. Mas,
mencionaram que a mãe ficava junto e brincava. Através da lembrança dizem que o
ruim para eles eram os momentos em que a mãe se ausentava.
Segundo Rachel Naomi Remen, muitas coisas na vida não podem ser
explicadas, somente presenciadas.
Pode até haver limitações físicas ou do estado de saúde, mas, o fato de
aprender a tirar o melhor daquilo que se tem, resulta num aproveitamento por vezes,
superior daquele que objetivamente tem mais. É uma questão de otimização das
prioridades, de comportamento resiliente e de reavaliação daquilo que considera o
seu maior patrimônio.
O pensamento e o sentimento buscam uma forma correspondente. Sendo
assim, as ações são guiadas pela percepção. Conforme o que se espera, tendemos
a enxergar o que imaginamos ser. Deste modo, a QV é o resultado de um processo
perceptivo. Os pensamentos e emoções geram uma bioquímica interna de bem ou
mal-estar, isto é, depende da qualidade do que se sente.
Relembrando Sófocles, a sabedoria é a parte mais considerável da felicidade.
Não se ganha o sucesso, a saúde, a felicidade, o que cada um ganha são condições
para reconstruí-la ou a capacidade para criar oportunidades de reconciliação com a
própria vida.
Mesmo que os fatos, as seqüelas e perdas justifiquem uma resposta negativa,
uma insatisfação em relação à QV, é preciso levar em conta o aspecto psíquico da
enfermidade.
A psique não é somente um processo cerebral (orgânico e celular), tem algo
mais que viabiliza a sua manifestação. Vivenciamos a psique assim como o mundo
físico através de óculos internos (ROBERTSON, 1992).
A consciência é um processo individual, cada um vive e sente suas próprias
experiências de acordo com o que pensa da vida.
O resultado deste estudo deixa visível que não podemos reduzir o psíquico ao
físico.
167
Conforme se modificam as experiências e as interações interpretativas, a
perspectiva interior também muda. Na nossa amostra, ficou claramente demonstrado
que apesar do grupo controle teoricamente estar em melhores condições ou com
mais recursos para construírem uma posição satisfatória, os resultados mostraram
que a diferença com o grupo de sobreviventes não é contrastante. Ainda que,
objetivamente falando, na rotina prática de vida, faz diferença, ter ou não ter, uma
doença de prognóstico reservado e passar pelo processo do TMO e toda a sua
comorbidade.
Sendo assim, há algo a mais que demarca a distinção e não unicamente a
vivência dos fatos em si, mas sim, como é experimentado este ou aquele
conhecimento.
Enfim, os resultados demarcam que a satisfação em relação à QV está
significativamente presente em ambos os grupos. Sendo que, apesar de todas as
comorbidades e seqüelas decorrentes da doença e do tratamento o grupo de
sobreviventes conquistou uma condição de QV semelhante àquele que é
considerado como um representante da população normal.
Porém, em outra perspectiva todos os grupos e subgrupos apresentam o
transtorno de humor como um fator de risco para o bem-estar. Esse achado mostra
que o subjetivo não pode ser excluído do viés de análise do clínico e/ou do
pesquisador.
Tem coisas que precisam ser vividas, o intelecto só descreve. “Os próprios
alquimistas diziam: “Rumpite libros, ne corda vestra rumpantur” (Rasgai os livros
para que não rompam vossos corações). Mas, por outro lado insistiam justamente
no estudo dos livros. São as vivências e não os livros que nos aproximam da
compreensão” (JUNG, 1991b).
O mesmo processo ocorreu no desenvolvimento dessa pesquisa, deixou um
registro mnemônico vivo de cada história ouvida. Enquanto que, o estudo teórico,
apesar da sua importância, ocupa um lugar de fundamentação dos resultados e da
aplicação dos conhecimentos, mas não trouxe a intensidade do sabor vivido.
168
5.3.5 Resiliência
Ao receber o veredicto do diagnóstico e no início do processo de tratamento o
medo da morte e a expectativa da vida geram ansiedade e esta produz um
movimento que pode causar uma desistência de luta e/ou reacender o valor da vida.
Na seqüência o indivíduo passa a direcionar suas prioridades e interesses,
consequentemente reduz a voracidade insaciável do desejo de tudo e usufrui aquilo
que é possível. Além disso, inicia o enfrentamento dos riscos necessários
assumindo uma postura e interpretação reflexiva na ação diária.
Nesse caso, a emoção tem força consteladora e essa, por sua vez, delineia o
valor e o referencial em cada sobrevivente. Esses fenômenos são dinâmicos e estão
na concepção da QV e da resiliência.
Conforme a definição de Rutter “a resiliência é uma variação individual em
resposta ao risco”. YUNES & SZYMANSKI, (2002, p. 20).
É certo que as circunstâncias adversas, a alta comorbidade do tratamento e as
consequências têm influência sobre os sobreviventes. Ter ou não ter que se
submeter ao TMO faz diferença. Mas, também é certo que os sobreviventes são
responsáveis pelo sentido e valores que colocam nas experiências vividas. Para
exemplificar esta reflexão, a seguir serão relembrados alguns estudos.
No estudo de Kopp e colaboradores (2005) constataram baixa QV nos
sobreviventes em decorrência do funcionamento físico, social e econômico. Mesmo
assim, em termos gerais os sobreviventes declararam que estão satisfeitos.
Syrjala e colaboradores (2005) verificaram que os adultos que se submeteram
ao TMO e que foram comparados com um grupo controle com características
demográficas similares, após 10 anos de transplante, os sobreviventes
apresentaram diferenças significativas para pior, em relação a: fraqueza, cataratas,
hepatite, problemas sexuais, restrição social, uso de psicotrópicos, queixas de
memória e atenção. No entanto, não manifestaram diferenças significativas quando
foram comparados em relação a saúde psicológica.
Em outro estudo, Hayden (2004) através de pesquisas com sobreviventes pós-
TMO, verificaram uma insatisfação no funcionamento sexual em 1/3 dos
sobreviventes, embora estes tenham assegurado que possuem uma boa QV.
Na pesquisa desenvolvida por Edman e colaboradores (2001) observa-se que
mais de 50% dos sobreviventes relataram problemas nos olhos, boca seca, tosse
169
freqüente, cansaço, ansiedade, dificuldades sexuais e alteração no paladar. Apesar
desses sintomas 80% deles consideram a QV boa a excelente.
No estudo vigente pode-se evidenciar que entre os sobreviventes, 53,7% estão
muito satisfeitos em relação à qualidade de vida global. Resultado similar pode-se
observar no grupo controle (54,2%).
Os resultados mostram que apesar de haver algumas seqüelas e
comorbidades, os sobreviventes, em geral, estão muito satisfeitos. Enquanto que os
indivíduos do grupo controle de um modo geral são mais intolerantes e por isto
demonstram mais queixas e insatisfações no dia a dia.
Os resultados gerais registram a importância da tonalidade afetiva,
permeabilidade psíquica e da subjetividade. É possível ir muito mais longe do que
se pensa mesmo depois que achar que não pode mais.
Com o passar do tempo acontece um ajustamento das percepções da
normalidade para uma adaptação maior em se tratando das circunstâncias,
expectativas e mudança na consciência temporal. Nesse sentido, o maior desafio
para os sobreviventes não é o físico, mas sim, o emocional.
Esta interpretação propicia uma explicação para a aparente discrepância que
ocorre entre alguns fatos reais, as respostas e atitudes tomadas pelos sobreviventes
quando comentam sobre a própria condição de QV. Aparentemente, os efeitos dos
sintomas existentes com o passar do tempo perdem a intensidade.
Além disso, a experiência adversa do adoecimento e de todo o processo do
transplante contribui para a expressão do comportamento resiliente, ampliando a
capacidade de superação do problema e do fortalecimento individual. Então
podemos inferir que a firmeza mental, a maior tolerância aos limiares da frustração,
as mudanças da concepção de tempo e a flexibilidade psíquica decorrem “por causa
de” e não “apesar de” infortúnios da vida.
Segundo Paludo & Koller (2005, p. 2) “a resiliência se expressa frente à
presença de fatores de risco e não existirá resiliência sem o risco”. Sendo que, o
risco é visto por tais autoras como um fator que está vinculado diretamente ao
resultado que provoca, ou seja, a mesma variável pode apresentar resultados
diferentes dependendo do sujeito e dos momentos de vida de cada um. Outra
conclusão importante das autoras é que para que um fator de risco tenha influência
é preciso que o indivíduo esteja fragilizado ou vulnerável. PEREZ (2007).
170
Parece que não sucumbir diante de tantas adversidades propicia um
sentimento de tolerância, gratidão e de maior aproveitamento das oportunidades que
a vida oferece.
Os resultados encontrados demonstram que o processo do transplante não é o
melhor, mas é preciso apreender o melhor daquilo que se vive. Os sobreviventes no
meio dos inúmeros riscos, apresentaram atitudes de resiliência e com isto alçaram
uma transformação nos engramas emocionais, cuja consolidação se dá no
fortalecimento de si e na descoberta que o sentido da existência é o próprio viver.
Então, viver circunstâncias tão desesperadoras faz com que qualquer novo
enfrentamento se torne insignificante para os parâmetros e referências pessoais.
Pois, a elaboração das perdas possibilitou novos ganhos.
Afinal, a forma de os sobreviventes responderem e manifestarem as opiniões
pessoais denota a inclusão e justaposição de aspectos positivos e negativos. É
perceptível para o leitor que apesar da presença de seqüelas e dificuldades, de um
modo geral, os sobreviventes mencionam que estão satisfeitos com a QV. Pois, a
interpretação dos fatos e o jeito de enfrentar as intercorrências da vida parecem ser
potencialmente fatores de influência de risco ou de proteção dependendo da
subjetividade e do potencial de resiliência daquele que experimenta.
Para finalizar esta discussão podemos responder a questão central que
norteou este estudo. Após enfrentarem e vencerem o processo da enfermidade e do
transplante os sobreviventes estão satisfeitos com a QV. Porém, ousamos dizer que
os resultados mostram muito mais que satisfação em relação à QV. Os achados
registram que os sobreviventes são indivíduos com potencial favorável para o
desenvolvimento da resiliência, uma vez que, após longa data de TMO, fica visível
que foram além do enfrentamento e da satisfação da QV. Eles enfrentaram,
venceram e saíram fortalecidos pela transformação e aprimoramento do próprio ser.
171
6 CONCLUSÃO
Aonde está a saída?
Depende daonde você quer ir?
Alice no País das Maravilhas.
Para o fechamento deste estudo compilamos alguns resultados conclusivos
inquietantes e outros compatíveis com o esperado, os quais são:
A combinação dos resultados quantitativos e qualitativos, do estudo vigente
mostra que a satisfação com a qualidade de vida dos sobreviventes é tão boa
quanto dos indivíduos representantes da população normal. Compreendendo QV
como um processo perceptivo, constituído de fenômenos objetivos (capacidade
operacional e relacional) e subjetivos (composição perceptiva).
Apesar de inúmeras situações clínicas adversas, os resultados mostram que
a aquisição da QV equipara-se aos parâmetros da normalidade. Em relação a
variável depressão e fadiga os sobreviventes estão em melhores condições do que o
grupo controle. Sendo assim, a vida no pós-transplante de longa data não é apenas
uma reposição de energias perdidas ou desperdiçadas, mas é a superação do
próprio viver.
Para o homem sobrevivente a maturidade cronológica é percebida com
ressalvas. A ansiedade, ejaculação precoce e perda da libido também são
consideradas como fatores de risco para a QV. Essas comorbidades da doença e do
tratamento interferem na atividade e satisfação sexual.
Pode até haver limitações físicas ou do estado de saúde, mas, os
sobrevientes estão tão satisfeitos com a saúde quanto o grupo controle. Parece que
o fato de aprender a tirar o melhor daquilo que se tem, resulta num aproveitamento
por vezes, superior daquele que objetivamente tem mais. É uma questão de
otimização das prioridades, de comportamento resiliente e reavaliação dos
parâmetros e valores pessoais.
172
• A DECH-a é considerada, como fator de proteção nos sobreviventes de longa
data no pós-TMO, uma vez que é percebida como parte complementar do
tratamento. Além disso, com o passar do tempo os efeitos dos sintomas existentes
perdem a intensidade, devido à acomodação das vivências e do ajustamento das
percepções conforme um referencial próprio de normalidade.
A relativização de valores e o tempo passado possibilita perceber a
ocorrência do segundo transplante como uma recarga, como reforço do tratamento.
Assim, o re-transplante é visto como fator de proteção nas mulheres sobreviventes
de longa data, apesar da amostra ser reduzida.
Naturalmente que a reinserção social, profissional e a retomada da vida
dependem da evolução clínica. Mas, é fundamental o empenho pessoal no
enfrentamento das perdas e recolhimentos dos frutos oriundos deste plantio. Muitos
sobreviventes não sucumbem diante das adversidades, em decorrência da
construção da relativização de valores, sendo que isso propicia uma atitude de
condescendência e fornecimento de uma outra realidade do real.
Em relação a outros fatores de risco, (ser provedor, ter um trabalho braçal e
uma escolaridade num nível baixo e não ser da raça branca) observa-se uma
característica comum que apesar de serem fatores diferentes estão inclusos numa
mesma raiz de função sociocultural.
É premente o cuidado com o bem-estar emocional como fator de proteção
para a preservação da QV, independentemente de ser transplantado ou um
indivíduo qualquer da população normal. Todos os grupos e subgrupos apresentam
o transtorno de humor como um fator de risco para o bem-estar. Esse achado
mostra que o subjetivo não pode ser excluído do viés de análise do clínico e/ou do
pesquisador.
A Mulher sobrevivente resgata a autonomia, é provedora, mas em relação à
vida sexual apresenta dificuldades. Mesmo assim, almeja um parceiro fixo. Com isso
demarca-se o desejo da construção de vínculos afetivos e a necessidade de não se
sentir discriminada, quer seja pela questão racial ou por idéias pré-concebidas de
173
que se é mulher e transplantada tem menos valor. É fundamental desenvolver um
olhar para as questões da subjetividade, uma vez que, é a possibilidade de
encontrar a flor de lótus (crescimento pessoal, ajuste de percepção adaptativa,
sentido da própria existência, mudanças de valores e de perspectiva de vida) no
meio do árido panorama (perdas e sofrimentos).
Apesar da vivência dolorosa, os resultados a longo-prazo são favoráveis e a
experiência com as comorbidades e a morte iminente produz uma valorização da
própria existência e uma redefinição de valores e metas a serem atingidas. Deste
modo, a subjetividade interfere e demarca as diferenças qualitativas no julgamento
dos resultados. Muitas vezes o olhar interpretativo importa mais do que os fatos em
si. Assim, este estudo fornece informações subjetivas da realidade objetiva dos
sobreviventes de longa data do TMO.
Enfim, apesar desse trabalho deixar lacunas para serem preenchidas, trouxe a
descoberta de um processo de ajustamento perceptivo por parte dos sobreviventes,
que possibilita uma outra realidade do real. Porém, isto não é uma revelação da
verdade, mas, uma aproximação conforme o viés dos indivíduos da pesquisa. Pois,
não podemos viver a vida dos sobreviventes, apenas nos aproximar.
A realização deste estudo propiciou conhecimento científico. Mas, também
trouxe uma grande satisfação pela lição de vida e pela riqueza de experiências que
tive o prazer de escutar e compartilhar.
Finalizo com um agradecimento especial a todos os sobreVIVENTES.
174
7 SUGESTÕES
O pesquisador ao avaliar a QV dos sobreviventes deve evitar o erro de supor
que a sua perspectiva é a mesma que a do outro. Por vezes, pode até ser parecida,
mas de um modo geral, a forma de perceber e interpretar é muito diferente do
angulo interpretativo do sobrevivente, do familiar, do profissional da área de saúde
ou de pessoas da população normal. Sendo assim, é preciso estar consciente dessa
multiplicidade de lentes focais.
Apesar do cuidado na elaboração, definição e inclusão do protocolo de
avaliação deste estudo. É preciso considerar as limitações do mesmo e dos
instrumentos disponíveis no contexto do Brasil e das diferenças culturais.
De fato, novos estudos se abrem para suprirem lacunas deixadas,
exemplificando, avaliação neuropsicológica e desenvolvimento de novos protocolos
de pesquisa quanto a ocorrência da DECH e do re-transplante e a sua relação com
a percepção do sobrevivente no processo temporal dessas experiências.
Pouco se sabe sobre as condições da vida sexual no pré-transplante, este é
um campo que deverá ser mais explorado para que se diferenciem os efeitos
negativos provenientes da doença e os decorrentes do processo do transplante. Ter
consciência do problema é uma abertura para discussões e o primeiro passo para a
busca de soluções.
175
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WINNIE, K. W. et al. Fatigue and quality of life among Chinese patients with
hematologic malignancy after bone marrow transplantation. Cancer Nursing, v.26,
n.3, p.211-221, 2003.
WINSTEAD, F. P.; SCHULTZ, A. Psychometric Analysis of the Functional
Assessment of Cancer Therapy-General (FACT-G) Scale in a Rural Sample. Cancer,
v.79, n.12, p.2446-2452, 1997.
WOREL, N.; BIENER, D.; KALHS. Long-term outcome and quality of life of patients
who are alive and in complete remission more than two years after allogeneic and
191
syngeneic stem cell transplantation. Bone Marrow Transplant, v.30, p.619-626,
2002.
WORLD HEALTH ORGANIZATION-WHO. WHOQOL and spirituality, religiousness
and personal beliefs (SRPB). Report on WHO consultation. MNH/MAS/MHP/98.2
WHO, Genebra. 22.p. Observação: O código MNH/MAS/MHP refere-se ao setor de
origem do documento seguido pelo ano e número. 1998)
_____. WHOQOL. Rating scales. Geneva: WHO. (Draft 30.08.93), 1993a
_____ . WHOQOL. Study protocol. Geneva: WHO. (MNH/PSF/93.9), 1993b
YALOM, I. D. A cura de Schopenhauer. Rio de Janeiro: Editora Ediouro,2005.
YATES, J. W. et al. Evaluation of Patients with advanced cancer using the Karnofsky
Performance Status. American CA Society, v.45, n.8, 1980.
YELLEN, S. B.; CELLA, D. F. Someone to live for: social well-being, parent-hood
status, and decision-making in oncology. Journal Clinical Oncology, v.13, p.1255,
1995. In BERGER, A.; PORTENOY, R. K.; WEISSMAN, D. E. Principles and
practice of supportive oncology. Philadelphia: Lippincott-Raven Publishers, 1998
1- YUNES, M. A. M; SZYMANSKI, H. Resiliência: noção, conceitos afins e
considerações finais. In: TAVARES, J. Resiliência e Educação. São Paulo: Cortez
Editora, 2002. p.13 -42.
ZEBRACK, B. Cancer Survivors and quality of life: a critical review of the literature.
Oncology Nursing Forum, v.27, n.9, 2000.
ZIMERMAN, D. E. Fundamentos Básicos das Grupoterapias. 2 Edição. São
Paulo: Editora Artes Médicas, 2000.
ZITTOUN, R; SUCIU, S.; WATSON, M. Quality of life in patients with acute
myelogenous leukaemia in prolonged first complete remission after bone marrow
transplantation (allogeneic or autologous) or chemotherapy: a cross-sectional study
of the EORTC-GIMEMA AML 8A trial. Bone Marrow Transplant, v.20, p.307-315,
1997.
Disponível em:
http://www.cancersupportivecare.com
http://www.healthlibrary.stanford.edu
http://www.tmobr.com.br/oque.htm
www.ufrgs.br/psiq
WWW.facit.org (FACIT Multilingual Translations Project)
http://www.ibge.gov.br/
192
ANEXO 1: CARTA DE CONSENTIMENTO DO GRUPO DE PACIENTES
CONVITE À PARTICIPAÇÃO DE UM ESTUDO SOBRE
QUALIDADE DE VIDA
Estamos realizando um trabalho de pesquisa sobre como é que as pessoas acham
que está a sua vida na última semana. Para isto, gostaríamos de contar com a sua
colaboração durante alguns minutos para responder algumas perguntas.
Serão feitas várias perguntas sobre diferentes aspetos de sua vida: sua saúde física,
sua vida emocional, sua relação com amigos e familiares, seu trabalho, seu meio-
ambiente.
A realização das perguntas para que o senhor (a) responda acontecerão no
Ambulatório do Transplante de Medula Óssea do Hospital de Clínicas da
Universidade Federal do Paraná.
A psicóloga fará uma entrevista com o senhor (a), assim que a sua consulta médica
finalizar, isto é, tem uma consulta com o médico e em seguida com a psicóloga.
Gostaríamos de deixar claro que esta pesquisa é independente de seu tratamento e
em nada influenciará caso o (a) senhor (a) não estiver de acordo em participar.
Lembre-se que a sua participação é voluntária.
Asseguramos que todas as informações prestadas pelo senhor (a) são
sigilosas e serão utilizadas somente para esta pesquisa. A divulgação das
informações será anônima e em conjunto com as respostas de um grupo de
pessoas. Caso o senhor concorde, poderemos passar as informações obtidas a
partir desta pesquisa para o seu médico e isto poderá auxiliá-lo na compreensão de
seu caso.
Se você tiver alguma pergunta a fazer antes de decidir, sinta-se a vontade para fazê-
la.
Eu-------------------------------- li o texto acima e compreendi a natureza e o objetivo do
estudo do qual fui convidado a participar. Sei que sou livre para interromper minha
participação no estudo a qualquer momento sem justificar a minha decisão e sem
que esta decisão afete meu tratamento com o meu médico. Eu concordo
voluntariamente em participar deste estudo.
___________________________________________________________________
Nome do Entrevistado Assinatura
___________________________________________________________________
Nome da Testemunha Assinatura
__________________________________________________________________
Pesquisador: Maribel Pelaez Dóro Assinatura
Tel.(041)223-5078/cel:(041)9961-0044
CURITIBA___________________________________
193
ANEXO 2: CARTA DE CONSENTIMENTO DO GRUPO CONTROLE
CONVITE À PARTICIPAÇÃO DE UM ESTUDO SOBRE
QUALIDADE DE VIDA
Estamos realizando um trabalho de pesquisa sobre como é que as pessoas acham
que está a sua vida na última semana. Para isto, gostaríamos de contar com a sua
colaboração durante alguns minutos para responder algumas perguntas.
A divulgação das informações será anônima e em conjunto com as respostas de um
grupo de pessoas
Serão feitas várias perguntas sobre diferentes aspectos de sua vida: sua saúde
física, sua vida emocional, sua relação com amigos e familiares, seu trabalho, seu
meio-ambiente.
Asseguramos que todas as informações prestadas pelo senhor (a) são sigilosas e
serão utilizadas somente para esta pesquisa.
Se você tiver alguma pergunta a fazer antes de decidir, sinta-se a vontade para fazê-
la.
___________________________________________________________________
Nome do Entrevistado Assinatura
___________________________________________________________________
Nome Pesquisador Assinatura
CURITIBA___________________________________
194
ANEXO 3: QUESTIONÁRIO DE DADOS DEMOGRÁFICOS DOS PACIENTES
NÚMERO DA ENTREVISTA:...........DATA DA ENTREVISTA:...............DURAÇÃO:.....................
DATA DO DIAGNÓSTICO:..................................DIAGNÓSTICO...................................................
TEMPO ENTRE O DIAGNÓSTICO E A REALIZAÇÃO DO TRANSPLANTE:................................
DATA DO TRANSPLANTE DE MEDULA ÓSSEA:.........../............../........................
TEMPO DE PÓS-TRANSPLANTE:...........................................................................
TIPO DE TRANSPLANTE ALOGENICO APARENTADO:........................................
RG DO PACIENTE:...................................................................................................
NOME:.......................................................................................................................
IDADE:...............................................D.N:.................................................................
SEXO: 1
-MASC ( ) 2-FEM ( )
ESTADO CIVIL
1-SOLTEIRO (A) 4-DIVORCIADO (A)
2-CASADO (A) 5-SEPARADO (A)
3-VIVENDO COMO CASADO (A) 6-VIUVO (A)
FILHOS
: SIM ( ) NÃO ( ) QUANTOS ( ). ADOTIVOS (.......)
NÍVEL EDUCACIONAL
1-Analfabeto
2-Ensino Fundamental: Ate 4
a
serie ( ) Ate 8
a
serie ( )
3-Ensino Médio (II Grau) 4-Superior (III
Grau)
5-Pós-Graduação
PROCEDÊNCIA:
...................................................TELEFONE:.......................................
FAX:.....................................................E-MAIL:................................................................
CONDIÇÃO PROFISSIONAL ATUAL
PROFISSÃO:............................................................ESTUDANTE:..................................
DESEMPREGADO ( ) DESEMPREGADO E PROCURANDO EMPREGO ( )
DESEMPREGADO E NÃO ESTÁ PROCURANDO EMPREGO ( )
EMPREGADO MEIO EXPEDIENTE ( ) HORÁRIO INTEGRAL ( )
AUTÔNOMO ( ) LICENÇA DEVIDO A DOENÇA ( ) APOSENTADO ( )
PROVEDOR DA FAMÍLIA: SIM ( ) NÃO ( ) AMBOS ( )
IMPOSTO DE RENDA PAGA ( ) NÃO PAGA ( )
TEM CASA PRÓPRIA: SIM ( ) NÃO ( )
TEM CARRO PRÓPRIO ( ) SIM NÃO ( )
Quanto tempo depois do TMO, você começou a trabalhar (estudar) normalmente?......................
Em que você trabalhava antes do TMO?.........................................................................................
Em que você trabalha atualmente?..................................................................................................
195
A sua capacidade de trabalho após o TMO: Melhorou ( ) Piorou ( ) Nenhum dos dois ( )
Justifique:.........................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
A questão seguinte, responda com uma das seguintes afirmações abaixo, usando o número
correspondente.
(0) Nenhum pouco (1) Um pouco (2) Mais ou Menos (3) Muito (4) Muitíssimo.
Atualmente, a sua condição de saúde o impede de realizar os compromissos com:
TRABALHO ( ) ESTUDO ( ) FAMILIAR ( ) SOCIAL ( )
RELIGIOSO ( ) PESSOAL ( ) LAZER ( )
ETNIA:
BRANCO ( ) NEGRO ( ) AMARELO ( ) MULATO ( )
RELIGIÃO:
CATÓLICO ( ) LUTERANO ( ) JUDEU ( )
EVANGÉLICO ( ) ESPÍRITA ( ) OUTROS ( )
ÍNDICE DO KARNOFSKY: BASAL:............................ATUAL:.....................
COMPLICAÇÕES RELACIONADAS AO PROCEDIMENTO
DECH-C ( ) DECH-A ( ) PELE ( ) FÍGADO ( ) INTESTINO ( ) ESTOMAGO ( )
INFECÇÃO PULMONAR GRAVE ( ) BACTERIANA ( ) FÚNGICA ( ) VIRAL ( )
HEPATITE TIPO ( ) QUANDO.............................
NUMA ESCALA DE ZERO A DEZ, QUANTO VOCÊ TEM DE QUALIDADE DE VIDA, HOJE?
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
NUMA ESCALA DE ZERO A DEZ, QUANTO VOCÊ TEM DE FADIGA, HOJE?
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
NUMA ESCALA DE ZERO A DEZ, QUANTO VOCÊ ESTÁ SATISFEITO COM A SUA
CONDIÇÃO DE SAÚDE, HOJE?
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
196
O QUE É QUALIDADE DE VIDA, PARA VOCÊ?............................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
O QUE É FADIGA, PARA VOCÊ?...................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
O QUE VOCÊ SUGERE PARA A EQUIPE DO STMO? .................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
QUAL O CONSELHO, OU DICA QUE VOCÊ DARIA PARA AQUELE QUE REALIZARÁ O
TRANSPLANTE?.............................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
COMO VOCÊ REAGIU DIANTE DAS SITUAÇÕES E MOMENTOS DIFÍCEIS?............................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
QUAL O SIGNIFICADO DO TRANSPLANTE PARA VOCÊ?..........................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
APÓS O TRANSPLANTE HOUVE DIFERENÇA NA SUA CAPACIDADE DE:
ATENÇÃO ( ).................................................................................................................................
MEMÓRIA ( ).................................................................................................................................
RACIOCÍNIO ( ).............................................................................................................................
197
APÓS O TRANSPLANTE HOUVE ALTERAÇÃO NA SUA VIDA SEXUAL?
SIM ( ) NÃO ( ) CRIANÇA ( ) VIRGEM ( )
1. VOCÊ TEM PARCEIRO FIXO ( )
2. TEM VIDA SEXUAL ATIVA ( )
3. MATURAÇÃO SEXUAL TARDIA ( )
4. APRESENTA SINTOMAS DE MENOPAUSA PRECOCE ( )
5. FAZ TERAPIA DE REPOSIÇÃO HORMONAL ( )
6. O TRATAMENTO HORMONAL TEM EFEITOS SECUNDÁRIOS ( )
7. AMENORRÉIA ( )
8. FALTA DE LUBRIFICAÇÃO (RESSECAMENTO VAGINAL) ( )
9. DISPAREUNIA ( )
10. PERDA DA LIBIDO (DESEJO SEXUAL) ( )
11. PERDA DA FERTILIDADE ( ) Espermograma ( ) Azoospermia ( )
12. EJACULAÇÃO PRECOCE ( )
13. EJACULAÇÃO TARDIA ( )
14. DISFUNÇÃO ERÉCTIL ( )
15. ADOÇÃO PÓS-TMO ( )
16. SEPARAÇÃO PÓS-TRANSPLANTE ( )
17. FILHO PÓS-TMO ( )
198
ANEXO 4: QUESTIONÁRIO DE DADOS DEMOGRÁFICOS DOS PACIENTES
NÚMERO DA ENTREVISTA:...........DATA DA ENTREVISTA:...............DURAÇÃO:.....................
NOME:..............................................................................................................................................
IDADE:...............................................D.N:.......................................................................................
SEXO: 1
-MASC ( ) 2-FEM ( )
ESTADO CIVIL
1-SOLTEIRO (A) 4-DIVORCIADO (A)
2-CASADO (A) 5-SEPARADO (A)
3-VIVENDO COMO CASADO (A) 6-VIUVO (A)
FILHOS
: SIM ( ) NÃO ( ) QUANTOS ( ). ADOTIVOS (.......)
NÍVEL EDUCACIONAL
1-Analfabeto
2-Ensino Fundamental: Ate 4
a
serie ( ) Ate 8
a
serie ( )
3-Ensino Médio (II Grau) 4-Superior (III
Grau)
5-Pós-Graduação
PROCEDÊNCIA:
...................................................TELEFONE:.......................................
FAX:.....................................................E-MAIL:................................................................
CONDIÇÃO PROFISSIONAL ATUAL
PROFISSÃO:............................................................ESTUDANTE:..................................
DESEMPREGADO ( ) DESEMPREGADO E PROCURANDO EMPREGO ( )
DESEMPREGADO E NÃO ESTÁ PROCURANDO EMPREGO ( )
EMPREGADO MEIO EXPEDIENTE ( ) HORÁRIO INTEGRAL ( )
AUTÔNOMO ( ) LICENÇA DEVIDO A DOENÇA ( ) APOSENTADO ( )
PROVEDOR DA FAMÍLIA: SIM ( ) NÃO ( )
IMPOSTO DE RENDA PAGA ( ) NÃO PAGA ( )
TEM CASA PRÓPRIA: SIM ( ) NÃO ( )
TEM CARRO PRÓPRIO ( ) SIM NÃO ( )
ETNIA:
BRANCO ( ) NEGRO ( ) AMARELO ( ) MULATO ( )
RELIGIÃO: CATÓLICO ( ) LUTERANO ( ) JUDEU ( )
EVANGÉLICO ( ) ESPÍRITA ( ) OUTROS ( )
O QUE É QUALIDADE DE VIDA, PARA VOCÊ?............................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
199
O QUE É FADIGA, PARA VOCÊ?...................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.QUAL O MOTIVO DE VOCÊ TER SE TORNADO DOADOR (A) DE SANGUE?..........................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
VOCÊ E DOADOR (A) DE MEDULA ÓSSEA (CELULAS-TRONCO HEMATOPOÉ TICAS)?.......
SIM ( ) NÃO ( ) JUSTIFIQUE...................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
QUAL A SUA OPINIÃO SOBRE A APROVAÇÃO DAS PESQUISAS COM CELULAS-
TRONCO?........................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
VOCÊ PODERIA DIZER O QUE É UM TRANSPLANTE DE MEDULA
ÓSSEA?...........................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
.........................................................................................................................................................
Você tem alguma doença crônica? Sim ( ) Não ( )
Qual?................................................................................................................................................
Você usa algum remédio de forma regular atualmente? Sim ( ) Não ( )
Qual?................................................................................................................................................
Você consultou algum medico ou profissional de saúde no ultimo mês? (exceção para consultas de
prevenção) Sim ( ) Não ( )
Qual?................................................................................................................................................
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