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A identidade étnica está ancorada na idéia de descendência comum em que “os atores
a utilizam para categorizar a si próprios e a outros, no propósito de uma interação” (Barth,
1998, p. 213).
É um pouquinho de dedicação de cada um de nós para relembrar e fazer a nossa
história, como disse e volto a dizer, como é que nós contaríamos a nossa história no
futuro se nós não conhecemos o nosso passado? Se nós não sabemos da onde
viemos, quem somos, a quem pertencemos? O meu desejo nesses Encontros da
Família, na Festa da Família Valer, é para que cada um de nós aqui possamos
refletir a importância desse momento, ou que diriam os nossos pais se estivessem
aqui, os nossos avós? Isso... eu gostaria que cada um pensasse, nesse momento se
estamos aqui é porque antes de nós existirmos, alguém, e alguém que também teve
esse sobrenome que nós temos, alguém que tem essa origem que nós temos... Então
é necessário para a nossa história, para a história da nossa família, para os que
vierem depois de nós, nós podermos conservar, nós mantermos vivo dentro de nós a
nossa origem, a nossa história, em nenhum momento duvidarmos quem somos,
muito pelo contrário, que sintamos orgulho, que a gente possa se sentir orgulhosos
de sermos e pertencermos a família Valer. Essa família Valer tem uma história em
Nova Bréscia, que tem uma história por todo esse Estado, por todos os recantos,
que tem uma história da origem italiana aqui no Brasil (Noeli – organizadora da
Festa da Família Valer – 53 anos)
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Os imigrantes italianos chegaram ao Brasil por volta de 1875 cujo processo migratório é fruto de processos
mais amplos e concomitantes: o nacional e o internacional. Com origem em um projeto do capitalismo europeu
de expansão, as metas do governo brasileiro, no que diz respeito às levas que vêm para o sul, visavam à
ocupação de áreas com baixa densidade e uma efetiva delimitação de fronteiras, mas que, no seu interior, inclui
objetivos implícitos tais como o branqueamento e recatolização dos estados meridionais brasileiros (PEREIRA
apud ZANINI, 2006, p. 11).
O quadro abaixo, retirado de um site especializado em processos de aquisição de dupla cidadania, mostra uma
perspectiva sobre a imigração italiana no RS. Os quadros na página seguinte buscam sistematizar como se
posicionaram geograficamente os italianos imigrantes e as datas de entrada das levas de imigração:
A presença dos imigrantes italianos e de parte de seus descendentes passa por momentos históricos significativos
na afirmação de sua condição étnica. Ao aqui chegarem, se depararam com uma conjunção significativa de
etnias, cujas diferenças denotavam a existência de outros mundos possíveis ignorados por aqueles que deixaram
um único mundo visto, até então, como absoluto. Outro aspecto relevante é que não se pode afirmar a existência
de um modelo de etnicidade italiana, uma vez que a vinda dos imigrantes – expulsos pela miséria e atraídos pelo
sonho da terra (Maestri, 1998, p. 5) – abarcava diferentes regiões da Itália recentemente unificada. Isso remete à
compreensão de que o processo de unificação dos pequenos estados sob o domínio de potências estrangeiras
resultaria no Estado-nação italiano e que a formação de um único povo seria desenvolvida em um lento processo.
No sul do Brasil, essa diferença é reconhecida por meio dos dialetos, de alguns costumes e hábitos específicos e
pela origem anunciada: italiano da Lombardi, do Vêneto e do Tirol. Esse aspecto implica em uma identidade
étnica marcada pela origem reconhecida com supremacia pela memória de seus descendentes, seguida das
relações de consangüinidade e parentesco. Ou seja, os descendentes reconhecem-se e são reconhecidos com uma
origem distinta do restante da sociedade brasileira pluralista e reivindicam tal condição. Do mesmo modo,
trazem dentro desse grupo mais amplo diferenças pontuais que os colocam em grupos mais reduzidos, cujas
fronteiras são expressas em organizações sociais diferenciadas, bem como em dialetos e hábitos distintos.
Não obstante, a presença dos ítalo-brasileiros é marcada por experiências singulares que Zanini aponta os “eixos
narrativos pelos quais a identidade étnica era invocada: a travessia, a colonização, o período do Estado Novo e os
últimos anos, quando se introduziu uma nova discursividade positivada acerca da italianidade” (Zanini, 2006, p.
3 – ABA Goiânia).
Com o intuito de retomar as motivações dos ítalo-brasileiros para a realização das Festas de Família, vale rever
que as comemorações sobre um século de colonização italiana no Rio Grande do Sul trazem à tona, aos
descendentes que estavam em situação de favorecimento nas escalas social e econômica, o desejo de visibilidade
às suas origens distintivas no âmbito da sociedade nacional. Nessa direção foi feita uma série de investimentos
pelos descendentes, bem como de instituições italianas, que contribuíram significativamente para a revivificação
e valorização da cultura italiana. Esse movimento trouxe a positivação do imigrante italiano de modo, inclusive,
a atribuir-lhe exclusivamente o desenvolvimento e crescimento do Estado do Rio Grande do Sul.