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si próprio daquilo que as circunstâncias e o seu próprio progresso lhe acrescentaram ou
mudaram no seu estado primitivo” (Rousseau, 1999. p.15).
Nota-se, que no segundo Discurso Rousseau estabelece uma analogia: a
“evolução” da espécie humana por um lado, mas certa “involução” por outro, nas
gerações que estariam nascendo por conta da corrupção de seus costumes, ou seja, seria
como se o ser humano reproduzisse, em sua história de vida, a trajetória traçada pela
espécie, e para o filósofo, essa história é de degeneração. Para tanto, Rousseau quer
buscar suposições acerca de uma natureza primeira, cujo valor, seja sempre positivo.
Para Bènichou (1979. p.6), Rousseau quer dar ao estado de natureza uma imagem
oposta ao estado de sociedade, onde não transpareça nada que anuncie o presente. Dessa
forma, ele marca duas etapas sucessivas, dois sinais contrários: seja um positivo, para a
primeira natureza e outro negativo, para a segunda, artificialmente construída.
Para os pensadores Grotius e Punfendorf
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, a concepção de natureza teria um
significado histórico. Enquanto eles consideraram o homem primitivo como um ser
racional e social, Rousseau atrelou a maior relevância à compreensão da condição
humana, pois entendia o estado de natureza como um simples ponto de partida, um
estado no qual o homem possuía virtudes como a liberdade
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e agia como um ser sem
vícios, sem noção de bondade ou maldade, sem atributos morais e intelectuais.
Em Rousseau, o homem, ao nascer, jamais seria originalmente mau, e por não
conhecer o que seria propriamente o mal, ele viria ao mundo com uma bondade
originária. Ainda para o pensador genebrino, é o próprio homem que concede o seu
estado de abandono, isto é, sem a intervenção humana, oferecendo tudo que ele precisa
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“Grotuis e Punfendorf tinham destruído a idéia tradicional de uma criação do estado social por Deus e
difundiram as idéias de uma evolução natural do homem e das sociedades, de sua organização progressiva
da barbárie para a civilização. Desses filósofos juristas, teóricos do direito natural, Rousseau toma, aliás,
mais o seu método do que suas idéias, e, pelo contrário, em relação a um bom número das quais, pelo
contrário em relação a tais linhas de pensamento é que proclamará seu desacordo”. Discurso sobre a
origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. 1988. Coleção Novos Pensadores. P.7.
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“A noção de liberdade é central para o pensamento social e político de Rousseau. No Discurso sobre a
origem da desigualdade, Rousseau afirma que os seres humanos têm uma capacidade, que os distingue
dos animais, de frear seus impulsos imediatos ou de iniciar uma ação deliberada, não impulsiva, em
atenção ao bem futuro: o homem tem alguma participação em suas próprias operações, em seu caráter
como agente livre” (Dent, N.J.H. 1996. p. 156).