Download PDF
ads:
1
SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
Caetano da Providência Santos Diniz
RELACIONAMENTOS HUMANOS MEDIADOS PELO COMPUTADOR:
as experiências de internautas cadastrados no site de
comunidades UOL K
Belém - Pará
Setembro-2008
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
Caetano da Providência Santos Diniz
RELACIONAMENTOS HUMANOS MEDIADOS PELO COMPUTADOR:
as experiências de internautas cadastrados no site de
comunidades UOL K
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Psicologia como um dos
requisitos para obtenção do Título de Mestre,
realizada sob a orientação do Prof. Dr. André
Maurício Lima Barretto.
Belém - Pará
Setembro - 2008
ads:
3
COMISSÃO EXAMINADORA
Prof. Dr. André Maurício Lima Barretto
Universidade Federal do Pará
Orientador
Membro
Prof. Dra. Ana Maria Nicolaci-da-Costa
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Membro
Prof. Dra. Rosely Risuenho Viana
Universidade Federal do Pará
Suplente
Prof. Dr. Janari da Silva Pedroso
Universidade Federal do Pará
Apresentada em 2 de setembro de 2008.
Resultado: Aprovada
Belém-Pará
4
Ao amado Jesus, Bom Deus, e a sua Mãe, A
Virgem Santíssima, cujas graças abundantes
são a fonte de toda ciência e conhecimento.
Diniz, Caetano da Providência Santos
Relacionamentos humanos mediados pelo computador: as
experiências de internautas cadastrados no site de
comunidade UOL K/ Caetano da Providência Santos Diniz;
orientador: André Maurício Lima Barretto. – Belém, 2008.
127f.
Dissertação - (Mestrado) - Universidade Federal do Pará, Belém,
2008.
1. Internet. Aspectos psicológicos 2. Internautas I. Título.
5
AGRADECIMENTOS
A Deus, começo e fim de todas as coisas, pai amoroso cuja imensa ternura e bondade
nos encaminham para a felicidade e a auto-realização.
A minha e Donina Ursulina Santos Diniz por lutar por nós e nos educar, sendo pai e
mãe, serei sempre grato pelo amor e pelos sacrifícios feitos a fim de que nós
pudéssemos alcançar nossas vitórias.
Ao meu pai José Erundino Diniz (in memorian) por ter se preocupado desde cedo com a
educação de seus filhos e pelo amor que nos dispensou apesar do pouco tempo de
convivência.
A minha amada avó Ursulina Maria dos Santos (in memorian), exemplo de ser humano,
fé, perseverança e amor, cujas lembranças irão me seguir até ficar velhinho também.
À Universidade Federal do Pará pela oportunidade de fazer meu mestrado nesta
instituição à qual sempre estive ligado seja como aluno do Núcleo pedagógico
Integrado (NPI) na educação básica, seja na graduação de psicologia entre os anos de
1996 e 2002.
Ao meu orientador Prof. Dr. André Barretto por acreditar neste trabalho e me estimular
para que ele chegasse a termo.
Ao Prof. Dr. Janari Pedroso, suplente da minha banca que sempre contribuiu com boas
sugestões para a elaboração do trabalho.
Aos professores do curso que contribuíram, cada um de uma forma diferente, para a
pesquisa.
6
Ao secretário do programa, Decionei Reis de Oliveira (o Ney), pela solicitude, e atenção
dispensados durante todo o meu percurso.
Às pessoas entrevistadas que dispensaram um pouco de seu tempo para fazer parte da
pesquisa.
7
“Seja qual for o seu sonho comece. Ousadia tem genialidade, poder e magia”.
Goethe
8
RESUMO
DINIZ, Caetano da Providência Santos. Relacionamentos humanos mediados pelo
computador: as experiências de internautas cadastrados no site de comunidades UOL
K. Belém, 2008, 127f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Universidade Federal do
Pará, Belém, 2008.
Os sites de comunidades têm atraído grande número de pessoas. Elas passam a se
relacionar à distância, utilizando para isso recursos como envio de recados e
mensagens e trocam informações sobre si através da auto-descrição (perfil) e do uso
de imagens, ambos abertos ao público. A experiência de possuir uma página pessoal
neste tipo de ambiente e se relacionar com pessoas através dela se constitui o objeto
desta pesquisa a qual foi realizada com base na metodologia qualitativa. Foram
entrevistados 16 usuários da rede de relacionamentos UOL K, pertencente ao UOL
(Universo OnLine), considerado o principal portal de conteúdo e provedor pago de
acesso à Internet do Brasil. A análise dos resultados destacou os seguintes aspectos: o
site possibilita tanto fazer novos contatos quanto manter contatos feitos anteriormente,
uma tendência a fazer novos contatos, a língua escrita é utilizada tanto para se
comunicar como para refletir acerca de si mesmo, o anonimato é favorecido pela
comunicação à distância e causa receio de se decepcionar com o outro, as
experiências são vistas como reais mesmo ocorrendo num ambiente virtual, “estar
onlinepode ser prazeroso e não significa desprender-se do mundo offline, a afiliação
às comunidades é freqüente e tem como base objetivos comuns, o uso da foto é,
graças aos recursos do site, um elo entre a comunicação sincrônica (bate-papo) e a
comunicação assincrônica (UOL K), há uma ênfase na sexualidade e, por fim, os
usuários se em na necessidade constante de rever e relativizar conceitos como
próximo e distante, público e privado, estar ou não online. Conclui-se que, mesmo não
tendo o hábito de marcar encontros face a face, os usuários são capazes de se
relacionar virtualmente de forma genuína, trocar afetos, formar vínculos e manter uma
vida online na qual o comunicar-se encontra seu sentido em si mesmo, podendo não
haver outro objetivo a não ser o de estar em contato.
Palavras-chave: Relacionamento. Internet. Interação. Experiência. Site. Comunidade.
9
ABSTRACT
DINIZ, Caetano da Providência Santos. Human Relationships mediated by the
computer: The experiences of internet users who are registered at UOL K community
web sites.Belém, 2008 127f. Dissertation (Master’s degree in psychology) Federal
University of Pará, Belém, 2008.
The community web sites have attracted a great number of people. They relate in
distance to each other using resources such as the sending of mails and messages.
These people also change information among themselves through the auto-description
(profile) and the use of images, both free to the internet users public. The experience of
having a personal web page in this kind of environment and the opportunity of relating
with people through that result on the objective of this research which has been realized
based on a qualitative methodology .There have been interviewed 16 internet users of
UOL K network that belongs to UOL (online universe) that is considered the main
vestibule of content and an access paid-supplier of internet in Brazil as well. The results
analysis has pointed the following features: The web site makes possible the
establishment of new contacts as well as the maintenance of old contacts. There is a
trend to make new contacts. The written language is used such for communication as for
a reflection about yourself. The anonymity is favored by the distant communication but it
causes distrust of disappointing someone. The exercises are seen as real even they
happen in a virtual atmosphere. “Being online” can be pleasant but it does not mean that
we have to come off from the offline world. The communities’ membership is frequent
and it is based on its common objectives. Thanks to the web sites tools, the use of photo
is a link between the synchronous communication (chat) and the asynchronous
communication (UOL K).There is an emphasis given to the sexuality and, consequently,
the internet users find themselves needed to see and relativize their concepts like close
and far, public and private, offline and online.It´s concluded that, even the users don’t
use to set face - to –face dates, they are able to relate virtually to each other as a real
situation, change affection, state links and keep an online life which communication finds
its own way that maybe there will be not another goal except being online.
Key-words: Relationship.Internet.Interaction.Experience.Site.Community.
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
ILUSTRAÇÃO 1: Alguns exemplos de emoticons 27
ILUSTRAÇÃO 2: Sala de Bate-papo do UOL 29
ILUSTRAÇÃO 3: Janela de conversa do MSN 30
ILUSTRAÇÃO 4: Perfil no Orkut 62
ILUSTRAÇÃO 5: Exemplo de página inicial do site Universo OnLine (UOL) 64
ILUSTRAÇÃO 6: Página de acesso ao UOL K 66
ILUSTRAÇÃO 7: Exemplo de perfil no UOL K 67
ILUSTRAÇÃO 8: Exemplo de foto na sala de bate-papo do UOL 68
ILUSTRAÇÃO 9: Página de acesso ao UOL XXX 69
ILUSTRAÇÃO 10: Exemplo de perfil no UOL XXX 71
ILUSTRAÇÃO 11: Exemplos de imagens fake presentes nos perfis 89
ILUSTRAÇÃO 12: Exemplo de mensagem enviada através do site 97
11
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 13
2 ASPECTOS RELEVANTES ACERCA DA RELAÇÃO ENTRE HUMANOS E
COMPUTADORES
2.1. A RECIPROCIDADE NA RELAÇÃO ENTRE HUMANOS E
COMPUTADORES 17
2.2. A INTERNET 20
2.3. A COMUNICAÇÃO MEDIADA PELO COMPUTADOR 24
2.4. OS IMPACTOS SUBJETIVOS DO USO DA INTERNET 32
3 RELACIONAMENTOS HUMANOS MEDIADOS PELO COMPUTADOR
3.1. A SOCIABILIDADE NA REDE 36
3.2. O ANONIMATO 41
3.3. DIVERSOS OLHARES ACERCA DO USO DA INTERNET 44
3.4. AS COMUNIDADES VIRTUAIS 56
4 O UOL K
4.1. O ORKUT 61
4.2. O UOL 64
4.3. O UOL K 66
4.4. O UOL XXX 69
5 O OBJETIVO 72
12
6 O MÉTODO
6.1. CONSIDERAÇÕES SOBRE A PESQUISA QUALITATIVA 74
6.2. OS ENTREVISTADOS 75
6.3. A PRESERVAÇÃO DO ANONIMATO 76
6.4. A APROXIMAÇÃO AOS ENTREVISTADOS 76
6.5. A PESQUISA-PILOTO 77
6.6. O ROTEIRO MÍNIMO 78
6.7. ENTREVISTAS PELO MSN 81
6.8. O MÉTODO DE EXPLICITAÇÃO DO DISCURSO SUBJACENTE (MEDS) 82
6.9. A DISCUSSÃO 83
7 OS RESULTADOS
7.1. OS ENTREVISTADOS 85
7.2. TEMPO DE UTILIZAÇÃO DA INTERNET E DO UOL K 87
7.3. TOMANDO CONHECIMENTO DO UOL K 87
7.4. SOBRE A DECISÃO DE FAZER CONTATOS ATRAVÉS DA INTERNET
E DO UOL K 87
7.5. BUSCANDO PESSOAS NO UOL K 91
7.6. SOBRE A DECISÃO DE IR CONHECER OS CONTATOS
PESSOALMENTE 92
7.7. DIVERSOS USOS DO UOL K 94
7.8. A PARTICIPAÇÃO EM COMUNIDADES 95
7.9. FATOS MARCANTES RELACIONADOS AO SITE 96
7.10. PONTOS POSITIVOS E PONTOS NEGATIVOS DE FAZER
CONTATOS ATRAVÉS DA INTERNET E DO UOL K 98
7.11. COMPARANDO O UOL K E O ORKUT 101
13
7.12. SE FAZ USO DO UOL XXX 102
7.13. COMBINAÇÃO DE USO DO UOL K E OUTROS PROGRAMAS 103
7.14. AVALIAÇÃO DOS CONTATOS FEITOS ATÉ ENTÃO 103
8 A DISCUSSÃO
8.1. FAZENDO CONTATOS PELA INTERNET 105
8.2. CONHECENDO NOVAS PESSOAS DEVIDO À AUTO-EXPOSIÇÃO 106
8.3. A ÊNFASE NA LÍNGUA ESCRITA 107
8.4. O ANONIMATO 108
8.5. CONCEPÇÕES DE REAL E DE VIRTUAL 109
8.6. “ESTAR ONLINE”: A COMUNICAÇÃO COMO META 110
8.7. CONVIVENDO EM COMUNIDADES 112
8.8. A FOTO COMO ELO ENTRE O SINCRÔNICO
E O ASSINCRÔNICO 113
8.9. A ÊNFASE NA SEXUALIDADE 114
8.10. A RELATIVIZAÇÃO CONSTANTE DAS EXPERIÊNCIAS 115
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS 117
10 REFERÊNCIAS 121
14
1 INTRODUÇÃO
A psicologia, uma vez voltada às implicações humanas das transformações
tecnológicas, preocupa-se em entender os fenômenos que afetam diretamente a vida
social assim como procura investigar os processos subjetivos a eles relacionados.
O surgimento da Internet e a sua popularização têm se constituído um dos mais
significativos fenômenos culturais da atualidade, pois tem afetado direta e indiretamente
a vida social, tornando-se no decorrer dos anos um espaço particularmente importante
para as relações humanas.
Suas ferramentas aumentaram os contatos entre as pessoas, tanto as que estão
próximas quanto as que estão distantes, possibilitando interações dificilmente
imagináveis antes do seu advento.
Em tempos de acelerado avanço tecnológico, cada vez mais as relações entre
psicologia e informática têm suscitado o interesse de pesquisadores que procuram
construir conhecimentos na área.
Todos sentimos diariamente os efeitos das novas tecnologias e muito se tem
falado das transformações que vêm ocorrendo em diversas áreas, economia,
educação, trabalho, saúde, relacionamentos entre outros. No que se refere a estes
últimos, Second Life, Orkut, MSN, blogs, chats, são alguns dos termos que fazem parte
do cotidiano de milhões de pessoas em diversas partes do mundo, as quais têm
utilizado estas ferramentas para incrementar, iniciar e manter contatos.
Este trabalho constitui-se num dos esforços de se produzir conhecimentos
acerca das implicações que as novas tecnologias informáticas têm para os
relacionamentos humanos. Ele está inserido numa área que tem se proposto discutir
diversos aspectos da temática, como as transformações subjetivas geradas pela
influência destas tecnologias, o surgimento das comunidades virtuais, as características
15
da vida em comunidade offline em tempos de Internet, os relacionamentos humanos (a
partir de variados focos) mediados pela rede, entre outros.
Entre os autores aqui destacados estão Wellman (1999, 2003, 2004), Rheingold
(1996), Bauman (1999, 2001, 2004), Castells (2004, 2006) e Nicolaci-da-Costa (1998,
2002, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b, 2005c, 2007), tendo sido dada atenção especial
aos trabalhos desta última cujo grupo de pesquisas da PUC-Rio de Janeiro têm
contribuído com diversas produções para os estudos da área.
De fato, a psicologia precisa acompanhar as mudanças culturais geradas pelo
avanço tecnológico, concentrando-se tanto nos aspectos subjetivos quanto nos sociais,
os quais, aliás, longe de se excluírem, estão intimamente ligados. No que se refere aos
relacionamentos, importa não apenas constatar as influências sofridas, mas descrever e
refletir acerca das mesmas, discutindo as experiências dos usuários das ferramentas
que possibilitam a Comunicação Mediada pelo Computador.
De acordo com Zacharias (2005, p. 231):
Acredito que nós, os psicólogos, precisamos compreender as relações dessa
nova tecnologia com a interação humana e desenvolver procedimentos
utilizando o instrumental da informática com serenidade, crítica e equilíbrio,
nem pendendo para o fascínio leviano e nem para a negação retrógrada.
A criação de comunidades é uma das características mais marcantes deste tipo
de interação. Elas dinamizam as relações na rede, dando novos contornos à
sociabilidade aí ocorrida. Com o intuito de descrever as experiências dos usuários
destes tipos de ambientes e refletir acerca dos significados a elas atribuídos, este
trabalho se concentrou na rede de relacionamentos do UOL.
O UOL tem como característica ser o maior provedor de conteúdo do país, além
de contar com o maior número de salas de bate-papo da América Latina. Ele oferece
aos usuários da sua rede a possibilidade de integrá-la (usando a foto do perfil) a estas
salas, possibilitando o compartilhamento de dois ambientes distintos, o de comunicação
sincrônica (bate-papo), que ocorre em tempo real, e o de comunicação assincrônica
(UOL K), que ocorre sem que haja a necessidade de ambos os interlocutores estarem
conectados ao mesmo tempo.
16
Esta possibilidade foi considerada particularmente interessante pelo pesquisador,
por ser uma inovação, e se constituiu no motivo para a escolha do site. Se
anteriormente o email representou a principal forma de comunicação pela rede, esta
ocorria assincronicamente, sem a formação de comunidades. Os chats também
alcançaram grande popularidade e se baseiam na interação em tempo real, mas sem a
formação de comunidades necessariamente. Com o UOL K, foi possível integrar os dois
ambientes, sincrônico e assincrônico, através do uso da foto do perfil que funciona
como link entre a sala de bate-papo e a página pessoal do usuário.
Neste trabalho, o primeiro capítulo trata da relação entre o ser humano e o
computador. São discutidos vários aspectos acerca dessa relação como a
complementação que existe entre o ser humano e a máquina. Eles estão implicados e
sofrem influências recíprocas quando ocorre a interação. Discute-se brevemente a
expansão da Internet e a noção de ciberespaço para logo em seguida refletir-se acerca
da Comunicação Mediada pelo Computador, incluindo uma reflexão acerca dos chats
enquanto um espaço dedicado à interação sincrônica bastante apreciada por muitos
internautas. Para encerrar o capítulo, argumenta-se acerca dos impactos subjetivos da
rede, abordando autores que percebem mudanças íntimas nos seus usuários.
O segundo capítulo trata dos relacionamentos que ocorrem mediados pela
Internet. Ele inicia com a noção de sociabilidade para depois estendê-la à de
sociabilidade virtual, aludindo às suas características, seus tipos e suas nuances, sendo
o anonimato tratado em seguida, evidenciando suas implicações para uma
comunicação que é feita à distância. Na continuidade, a discussão gira em torno dos
diversos olhares acerca do uso da Internet. Nesta seção, autores com opiniões
diferentes são contrapostos, buscando-se explorar as várias maneiras de se enxergar a
mesma realidade. Em seguida, a discussão se concentra na noção de comunidade
virtual a qual é de fundamental importância para este trabalho já que uma das principais
características da nova tendência em sites deste tipo é a formação de comunidades.
O terceiro capítulo é dedicado à apresentação do UOL K através da descrição de
sua origem, organização, funcionamento entre outros. Nele são feitas diversas
considerações sobre o Orkut por ser este o formato mais popular dos sites de
comunidades, tendo servido, inclusive de base para a criação do UOL K. O objetivo do
17
capítulo é fazer com que o leitor conheça o site e seja capaz de visualizar o ambiente
no qual se dão as interações aqui relatadas, ou seja, o locus onde ocorrem as
experiências analisadas neste trabalho. Ele está dividido em quatro seções: o Orkut, o
UOL, na qual se faz a apresentação do site que hospeda o UOL K, o UOL K
propriamente dito e o UOL XXX, uma parte dele voltada para conteúdos eróticos.
Depois da revisão da literatura seguem respectivamente o objetivo e o método,
no qual estão expostos os procedimentos realizados durante a fase das entrevistas,
assim como a apresentação do Método de Explicitação do Discurso Subjacente
(MEDS), elaborado por Nicolaci-da-Costa (2004; 2004b; 2007), o qual serviu de base
para produzir os resultados e sua conseqüente análise. Por fim, seguem os resultados
e a discussão, respectivamente os capítulos seis e sete e, na seqüência, as
considerações finais e as referências.
18
2 ASPECTOS RELEVANTES ACERCA DA RELAÇÃO ENTRE
HUMANOS E COMPUTADORES
2.1. A RECIPROCIDADE NA RELAÇÃO ENTRE HUMANOS E COMPUTADORES
A informática tem estado cada vez mais presente nas vidas das pessoas. No
cotidiano, deparamo-nos repetidas vezes com situações em que precisamos interagir
com essa tecnologia. Para ilustrar, imaginemos que um homem sai de sua casa para o
trabalho. Ele se dirige à empresa guiando seu moderno carro cujo painel eletrônico
transmite algo de futurista. Ele não trabalha diretamente com o computador, mas senta
algumas horas diante dele a fim de enviar e-mails e acessar sites de seu interesse. Na
hora do almoço, dirige-se ao banco para efetuar um depósito e é orientado a fazê-lo no
caixa eletrônico. No retorno, atende seu celular de chip que, além de fotografar e
acessar a Internet, possui um menu que muito se assemelha a um programa de
personal computer (pc). À noite, em casa, assiste ao jornal pela televisão que transmite
informações sobre as condições climáticas do dia seguinte as quais foram repassadas
pelos satélites do instituto meteorológico. No cotidiano deste homem estão presentes
várias situações de interação com o computador, de forma direta ou indireta, algumas
das quais ocorrem sem que ele perceba.
No caso daqueles que lidam diretamente com esta máquina a relação se torna
ainda mais marcante, particularmente quando a comunicação se através dela, a
chamada Comunicação Mediada pelo Computador (CMC), pois é possível observar
dois tipos de interação entre humanos e computadores, aquela na qual a pessoa
trabalha com a máquina e aquela na qual ela usa a quina para se comunicar com
outras pessoas através de uma rede na qual ambas estão interligadas.
De acordo com Castells (2006, p. 414): “O surgimento de um novo sistema de
comunicação caracterizado pelo seu alcance global, integração de todos os meios de
19
comunicação e interatividade potencial está mudando e mudará para sempre nossa
cultura”. A apropriação da tecnologia por parte das pessoas não deve ser vista,
portanto, apenas como uma parafernália que se utiliza a fim de se conseguir um fim,
mas como algo que se incorpora as suas vidas. Em outras palavras, o homem faz parte
daquilo que ele cria, sujeito e objeto estão inter-relacionados, tornando-se um
continuum. Carvalho afirma que o objeto “carrega em si algo do ser que o criou” (2000,
p. 129).
Segundo Sayeg (2000) a relação entre o ser humano e o computador pode ser
entendida em termos de um sistema de acoplamento, o que sugere que entre eles
uma ligação íntima, na qual a construção de uma máquina é feita pensando-se na ação
da pessoa, não se tratando de um sistema fechado, mas de um sistema que é completo
a partir da interação com o usuário. A autora afirma (2000, p. 174):
[...] o ser humano, ao usar o computador, forma uma máquina, um único
sistema para determinado nível de análise. Lembremos que o conceito de
máquina em cibernética é um conceito formal, não tem necessariamente a ver
com um aparato físico específico. Assim, um conceito importante na cibernética
é o de 'acoplamento'. A partir do conceito de 'máquina formal', focaliza-se o
sistema. O ser humano, em interação com um computador, é descrito como
parte de um sistema de acoplamento.
Uma máquina, assim, pode ser composta de diversas unidades as quais são
acopladas umas às outras para possibilitar um funcionamento eficiente do sistema cujo
último acoplamento é o ser humano. Sua inteligência, sua visão, suas mãos e seu
corpo são constituintes da díade homem-computador.
A ação do usuário é essencial para que a máquina consiga alcançar os seus
objetivos, qual seja, realizar as tarefas para as quais foi programada. O fornecimento de
dados, as respostas emitidas pela máquina através de mensagens pré-elaboradas, os
tempos de espera, a atitude atenta do usuário, entre outros, são eventos que requerem
tanto a participação ativa do usuário quanto a capacidade da máquina para operar. O
ser humano está implicado na máquina e a máquina está implicada no ser humano.
Um exemplo de que o ser humano está implicado na máquina seria a idéia de
que os computadores devem reproduzir os processos cognitivos humanos. O
processamento de dados pelo computador ao mesmo tempo em que estaria inspirado
20
no funcionamento do cérebro o potencializaria, superaria sua capacidade sendo capaz
de fazer cálculos muito superiores àqueles que o ser humano seria capaz de fazer.
um exemplo de que a máquina está implicada no ser humano seria a interface do
monitor a qual expressa a necessidade da máquina traduzir a sua linguagem binária em
signos que o ser humano seja capaz de entender. De fato, enquanto estou digitando,
estou vendo palavras que fazem sentido para mim, mas que a linguagem de
programação entende apenas como um conjunto de códigos que devem ser traduzidos
e organizados de maneira que se tornem compreensíveis.
Esta interação entre humanos e computadores leva a refletir que as influências
não são unilaterais, não é apenas o ser humano que molda a tecnologia, ele é também
moldado por ela. Ele tem a capacidade de criar, mas uma vez criado seu objeto passa a
influenciá-lo. O ser humano sofre modificações advindas das características dos bens
que ele produziu. Ao comentar Deleuze e Gatarri, Carvalho (2000, p. 126) escreve:
“Assim, sujeitos e objetos emergem simultaneamente, em uma causalidade recíproca”.
Esta noção contradiz a idéia de que o ser humano é senhor de sua técnica, visto
como separado dela e fazendo dos instrumentos inventados apenas meios para se
relacionar com a natureza, modificando-a a fim de satisfazer suas necessidades. Esta
seria, segundo Carvalho (2000, p. 121-122), uma concepção instrumentalista de
técnica:
[...] apenas um conjunto de meios neutros que os indivíduos precisam dominar
para se colocarem numa linha de progresso e evolução da humanidade. Ao nos
voltarmos para esse campo, o que encontramos de imediato são indivíduos que
querem dominar o computador, que se sentem poderosos quando sabem utilizá-
lo ou que, em sentido oposto, sentem-se diminuídos e humilhados por não
terem tal domínio.
Mas esta concepção instrumentalista diferencia-se de outra, a ontogenética, que
a relação entre o homem e a máquina de forma dialógica, recíproca. Nesta
concepção, o homem interfere em seu meio com a técnica e sofre as influências desta
mesma intervenção.
Ele modifica o meio e é por ele modificado, e mais, a técnica, pelo fato de ser
produto da história do próprio homem, é parte dele e traz em si as suas marcas; a
21
técnica passa a fazer parte de seus processos de subjetivação. De acordo com
Carvalho (2000, p. 131):
A concepção ontogenética sobre a relação homem-técnica (...) oferece-nos
instrumentos para pensar a interação dos humanos com os computadores em
uma perspectiva que não reduz a questão a um domínio de uma das partes
pela outra.
Uma visão da interação entre o ser humano e o computador que leve em conta a
reciprocidade da relação entre sujeito e objeto torna-se importante na hora de analisar
as transformações que o avanço da informática têm provocado tanto nas relações entre
as pessoas quanto nos seus processos de subjetivação, sendo que a Internet
representa um dos ícones deste avanço tecnológico.
2.2. A INTERNET
A Internet é um fenômeno do nosso tempo, uma invenção que faz parte da
vida de milhões de pessoas e com a qual as novas gerações estão crescendo. Ela não
é uma única rede, mas um vasto conjunto de redes cuja comunicação é possível devido
à linguagem comum dos protocolos TCP/IP (Transmission Control Protocol/Inter-net-
work Protocol).
Seu surgimento remonta à criação da ARPA (Advanced Research Projects
Agency), a Agência de Projetos de Pesquisa Avançada fundada pelo Departamento de
Defesa dos EUA em 1958, que criou a IPTO (Information Processing Tecnhiques
Office), Divisão de Técnicas de Processamento de Informação, em 1962, para
investigar a informática interativa e criar uma rede de comunicações flexível e
descentralizada capaz de sobreviver a um ataque nuclear (MATTAR NETO, 2005). De
acordo com Ferrari (2005, p. 257):
[...] o departamento de defesa daquele país (EUA) descentralizou os centros
de informações militares, de forma que a destruição de um deles não
implicasse na perda de dados e capacidade de seu processamento. Para isso,
seria necessário interligar seus centros de computação.
22
A história da Internet nos mostra que a sua criação se deveu às necessidades
militares de descentralização de dados, o que poderia ser muito útil nos tempos de
guerra, quando os centros de informação tornavam-se alvo do inimigo (WALTHER,
1996). Segundo Rheingold (1996, p. 19): “As redes alargadas de CMC espalhadas
pelos cinco continentes e que ligam milhares de pequenas redes são um efeito colateral
da investigação militar americana”.
Sua popularização ocorreu na década de 90, particularmente a partir de 1995.
Neste ano, a NSFNET (rede administrada pela National Science Foundation), que em
1988 havia se fundido com a ARPANET, encerrou suas atividades.
A privatização fora facilitada pela NSF ao proporcionar à IBM (International
Business Machines) o oferecimento de serviços de caráter filantrópico, o qual não
resistiria mais tarde à pressão do comércio.
Anos depois da sua criação o quadro é diferente. Os objetivos militares cederam
espaço às relações interpessoais, aos negócios, à comercialização, à pesquisa etc.
Segundo o site oficial das Nações Unidas acerca do Desenvolvimento do Milênio
(Millenium Development Goals Indicators), em 1990 havia cerca de 2.000.000 de
usuários da Internet nos EUA.
No Brasil, segundo Bogo (2000), os acessos foram possibilitados pela Rede
Nacional de Pesquisa (RNP), numa operação acadêmica subordinada ao Ministério de
Ciência e Tecnologia. De acordo com dados do Comitê Gestor da Internet
1
(CGI) no
país, em 2004 o número de usuários girava em torno de 22.000.000. Segundo o site do
CGI, dados de uma pesquisa acerca do Uso da Tecnologia da Telecomunicação e
Informação no Brasil (UTI), referente a julho/agosto de 2006, revelam que 19,63% dos
domicílios brasileiros têm computador e 14,49% possuem acesso à Internet.
A pesquisa afirma que 45,65% dos brasileiros já utilizaram um computador,
sendo que, dentre estes, 51,15% o fazem diariamente
2
. Com relação ao acesso à
1
Criado em 1995, o Comitê Gestor da Internet no Brasil é responsável pela coordenação e integração de todas as
iniciativas de serviços de Internet no país, promovendo a qualidade técnica, a inovação, a coleta e a disseminação de
informações. Sua composição inclui membros do governo, do setor empresarial, do terceiro setor e da comunidade
acadêmica.
2
Percentual sobre o total da base de entrevistados que utilizaram o computador nos últimos 3 meses.
23
Internet, 33,32% dos entrevistados já a teriam acessado, sendo que, destes, 46,01% o
fazem diária e individualmente
3
.
De acordo com o site do Ibope (julho de 2007) os internautas brasileiros
quebraram novo recorde no uso da web. O Brasil é o país de maior tempo médio de
navegação doméstica, com 23h30min mensais, seguido pelos EUA, Japão, Alemanha e
Austrália. Dados mais recentes do mesmo site (março de 2008) indicam que o número
de internautas residenciais ativos em março de 2008 atingiu 22,7 milhões de usuários,
40% mais do que em março de 2007. Também continuamos a ser o país com maior
tempo médio mensal de navegação residencial por internauta entre os 10 países
monitorados pela Nielsen//NetRatings, com 23h51min, 1 hora e 27 minutos mensais.
Sua presença tem se afirmado como um importante instrumento nas mais
variadas áreas da atividade humana: lazer, trabalho, saúde, educação, entretenimento,
relacionamentos entre outros. Segundo Zacharias (2005, p. 11):
As últimas décadas do século XX presenciaram a popularização dos
computadores pessoais e a difusão da internet. Ambos esses processos de
difusão levaram à penetração dos computadores no cotidiano de milhões de
pessoas ao redor do mundo, primeiramente como instrumento de trabalho e,
posteriormente, como um meio de comunicação à distância e como um novo
espaço de vida.
Este espaço de vida consiste no ambiente virtual criado pela tecnologia
informática e recebe o nome de ciberespaço. Willian Gibson utiliza este termo em seu
romance Neuromancer, de 1984, para denominar um terreno imersivo limítrofe entre o
real e o virtual, um espaço habitável de arquitetura flexível (ARAÚJO, 2005).
As redes telemáticas (associação entre telecomunicação e a informática)
transpõem as noções tradicionais de espaço as quais se referem ao ambiente físico,
territorializado e, portanto, limitado, no qual se locomovem os corpos. O ciberespaço
não é um território, ele, ao contrário, atravessa-os, diluindo as barreiras.
3
Percentual sobre o total da base de entrevistados que a acessaram nos últimos 3 meses.
24
Segundo Ramalho (2005, p. 82):
No final do século XX, com o advento da Internet, surge um novo espaço: o
ciberespaço. Muitos usuários da Internet perceberam que os relacionamentos
não estavam mais restritos aos espaços do mundo’real’. Em outras palavras,
os internautas notaram que por meio da rede podiam estabelecer diversos
tipos de relacionamentos online.
De acordo com Silva (2005, p. 3):
O ciberespaço constitui-se como um novo espaço de sociabilidade apesar de
não presencial com impacto nas esferas cultural e social. O ciberespaço,
sendo um espaço sócio-virtual baseado em técnicas informacionais em rede
– como espaço social que é, permite a interação social.
Segundo esta autora, o ciberespaço tem características próprias de
comunidades e criam nele redes sociais, estruturando uma “matriz de laços múltiplos”
baseada na comunicação. Nele estariam reunidos três aspectos que constituiriam uma
cibercultura: informação, comunicação e tecnologia.
Trata-se de espaços novos de convivência, freqüentados mais ou menos
regularmente, nos quais as pessoas desenvolvem relações, algumas das quais,
inclusive, acontecem somente nestes espaços. De acordo com autores como Castells
(2006), Wellman e Boase (2004), Nicolaci-da-Costa (1998) e Rheingold (1996)
apresentam-se neste espaço diversas formas de solidariedade e de vida comunitária.
É um espaço imersivo, ou seja, trata-se de um ambiente que envolve seus
usuários, fazendo com que eles se sintam compartilhando um espaço diferente daquele
de suas vidas offline (ARAÚJO, 2005). Wertheim (2001, p. 165), partindo de sua
experiência pessoal, escreve em seu livro “Uma história do espaço”:
Um espaço até agora o existente, a cada ano esse novo domínio digital
desempenha um papel maior na vida de um número crescente de pessoas.
Como muitos cidadãos da Internet”, tenho agora correspondentes por e-mail
no mundo todo. Pessoas com quem é difícil entrar em contato pessoal estão
muitas vezes prontamente disponíveis on-line, sobretudo se trabalham na área
acadêmica.
25
A utilização desta tecnologia tem causado alterações das formas de ser, pensar
e agir nos seus usuários. Como visto anteriormente, o ser humano não está separado
de sua invenção e recebe seus impactos em diversas áreas. No caso da Internet, pode-
se observar estes impactos na modernização da sociedade, nas alterações dos
costumes, nas formas de se relacionar e nos seus processos de subjetivação. Antes,
porém, da análise das transformações subjetivas mobilizadas pela rede, convém
discutir alguns aspectos da CMC.
2.3. A COMUNICAÇÃO MEDIADA PELO COMPUTADOR
Segundo Castells (2006), o início da CMC se deu nos EUA, entre os ambientes
acadêmicos, no começo dos anos 90. Desde então, o computador tornou-se um meio
de comunicação poderoso na atualidade. Ele possibilitou a interligação de pontos
distantes do planeta a um custo menor e a uma velocidade maior, facilitando negócios e
relacionamentos.
Segundo Lévy (1999, p. 32): “As tecnologias digitais surgiram, então, como uma
infra-estrutura do ciberespaço, novo espaço de comunicação, de sociabilidade, de
organização e de transação, mas também, novo mercado da informação e do
conhecimento”. Para Marcelo (2001, p. 31): “A Internet é, na sua essência, um meio de
comunicação”. Ela pode ser usada para diversos fins: relacionamentos, negócios,
pesquisa etc.
Entre as novidades está o fato do computador, através da rede, possibilitar a
comunicação de “muitos para muitos”. Nas salas de bate papo, por exemplo, um
contínuo fluxo de pessoas virtualmente presentes. Mas o estreitamento dos laços torna
possível a dispensa de uma maior atenção a determinados usuários. também os
emails que podem chegar a diversos usuários simultaneamente através de listas
pessoais. No telefone, ao contrário, os contatos começam de um-para-um”
4
. Nele o
contato está previamente definido, enquanto que na Internet apresentam-se diversas
4
Com exceção para as teleconferências as quais consistem da participação de diversos usuários numa
mesma ligação telefônica. Este tipo de interação, entretanto, vem sendo pouco utilizada.
26
opções, o usuário pode encontrar espaços públicos para iniciar novos contatos como,
por exemplo, os chats. De acordo com Nicolaci-da-Costa (2005c, p. 53-54):
[...] Essa possibilidade imediatamente levou estranhos a identificarem
afinidades comuns e, conseqüentemente, a estabelecerem relacionamentos
virtuais nos quais essas afinidades eram exploradas a médio ou longo prazo.
Para tanto, as comunicações rapidamente migravam do ambiente "muitos-
muitos" para ambientes "um-um" (como os ambientes privados das salas de
bate-papo, ou das trocas de mensagem do ICQ, Messenger e outros
programas semelhantes).
Trata-se de uma comunicação à distância que possui peculiaridades. Ela pode
ser sincrônica ou assincrônica. A sincrônica ocorre quando os interlocutores estão
conectados ao mesmo tempo, real time, como no MSN ou nos chats. Na assincrônica,
apenas um está conectado e aguarda a resposta do outro, como nos emails, nas
comunidades dos sites de relacionamentos ou nos fóruns de discussão, os
newsgroups.
Com o avanço da nova tecnologia, atualmente dispõe-se de recursos multi-mídia
como texto, som e imagem, mas, tradicional e comumente, a CMC está baseada na
escrita. Este tipo de comunicação talvez nunca fora tão valorizado antes do advento da
Internet, daí a necessidade de conseguir se expressar utilizando basicamente a língua
escrita em vez da fala.
Nesta ênfase na comunicação escrita observa-se a criação de uma linguagem
particular (NICOLACI-DA-COSTA, 1998), sendo que algumas de suas formas têm
penetrado no cotidiano. De acordo com Nicolaci-da-Costa (2002, p. 199):
O advento dos computadores pessoais e, principalmente, da internet fez com
que novos significados fossem atribuídos a antigos vocábulos e enxurradas de
novos termos e expressões como, por exemplo, www, rede, ciberespaço,
realidade virtual, tempo real, e-mail, listas de discussão, navegadores,
mecanismos de busca, hats, spam, windows, menus, deletar, formatar,
configurar e uma infinidade de outros — invadissem o linguajar contemporâneo
em ritmo extremamente acelerado.
27
Pode-se dizer que uma das peculiaridades da CMC é a criatividade no uso da
linguagem. De fato, a escrita pode ser mais ambivalente e por isso requer uma certa
habilidade da parte do escritor para se fazer entendido. Como afirma Zacharias (2005,
p. 10):
Quando dispomos apenas de um texto escrito, é mais difícil percebermos qual
emoção está sendo expressa pelo seu remetente. Se não dispomos de dados
suficientes, na própria escrita, que nos dêem indicações a respeito, é possível
que interpretemos a frase emprestando-lhe um “tom de voz” que desejarmos,
ou escolhermos, o que não necessariamente corresponde à intenção do
redator. A mesma frase pode ser “dita” (ou “lida”) de forma agressiva, amorosa,
desesperada, cínica, etc.
Segundo Marcelo (2001, p. 99-100):
Curiosamente, os utilizadores das novas tecnologias facilmente contornaram
este obstáculo, ao inventarem formas inovadoras e alternativas de exprimirem
as suas emoções [...]. Para além de utilizarem os smileys ou emoticons, os
utilizadores das novas tecnologias utilizam uma outra forma de expressarem os
seus sentimentos, que consiste em adicionar um comentário entre estes sinais
. Por exemplo: <Suspiro> Acabei de me esquivar a uma reunião <semblante
desanuviado>. Enfim, os utilizadores dos novos media inventam” formas de
contornar as aparentes deficiências que encontram na comunicação mediada
pelo computador, inaugurando novas formas de comunicar.
A criatividade entra em cena quando surgem formas diversas de expressar idéias
e sentimentos. Segundo Silva (2005) assiste-se a inúmeras maneiras de se comunicar
ao outro nosso tom de voz, expressão facial, ritmo. Os emoticons ou smileys, por
exemplo, costumam ser usados para expressar emoções nem sempre tão fáceis de
serem expressas por meio de palavras escritas, assim como para transmitir expressões
faciais que não podem ser percebidas pelo interlocutor.
28
Ilustração 1: Alguns exemplos de emoticons:
Uma de suas vantagens, além de facilitar a auto-expressão, é a rapidez. Falar é
mais rápido do que escrever, por isso são comuns as abreviaturas: vc (você), blz
(beleza), abc (abraço), tdb (tudo bem ou tudo de bom), bj (beijo), t+ (até mais) e assim
por diante, com o objetivo de agilizar a escrita. Estes recursos são bastante utilizados
em conversas online e constituem parte do conjunto de expressões que um usuário
freqüente precisa aprender para facilitar sua comunicação. Os chats são alguns dos
espaços de conversas online mais utlizados. Segundo Maiorino (2002, p. 29), eles são
“espaços construídos a partir da Internet, com o objetivo de reunir usuários em torno de
assuntos de comum interesse”.
As salas de bate-papo constituem espaços de interação entre usuários nos quais
a circulação é contínua. As pessoas entram e saem em busca de interações de todo
tipo: amigáveis, amorosas, sexuais, comerciais. Mas as salas são, sobretudo, espaços
de interação cujo objetivo central é a conversação, realizada através da escrita.
As salas oferecem variadas modalidades” de interação: em “sala aberta” onde
todos vêem o que todos (que também estejam em sala aberta) estão conversando; o
“reservado” no qual você vê o que se passa na sala aberta, porém somente a pessoa
convidada por você o que você escreve (e vice-versa, caso você também tenha sido
por ela convidado), e a possibilidade de optar por receber apenas mensagem de um só
usuário, não se dando conta, portanto, do que se passa na sala aberta.
;)
= piscada
=D
= alegria
:(
= tristeza
= alegria = tristeza = espanto
29
De acordo com Maiorino (2005, p. 42):
Os chats atualmente são salões de entretenimento e ponto de encontro on-line
povoados por diferentes comunidades virtuais. São salas habitadas e
experienciadas por seres humanos; nesses ‘não espaços o homem
contemporâneo constrói um modo de fazer sociedade, de se apaixonar, de se
relacionar e de trocar conhecimento.
As salas de bate-papo, assim, constituem-se um novo espaço para o travamento
de relações humanas, um espaço de circulação de pessoas que estão interessadas em
estabelecer conversações e/ ou contatos cujos objetivos podem ser desde um simples
passatempo até um relacionamento no estilo “algo sério”.
Para citar um exemplo deste tipo de interação podemos considerar as salas de
bate-papo do site Universo OnLine (UOL). No UOL, como ocorre de maneira geral em
outros sites, as salas de bate-papo estão divididas em grupos
5
, tais como “Cidades e
Regiões”, “Encontros”, “Por Idade” etc. Estes subdividem-se em subgrupos e estes, por
sua vez, em salas nas quais ocorrem as interações.
A título de ilustração, no grupo “Cidades e Regiões”, o subgrupo Pará, quando da
elaboração deste trabalho, as salas estão divididas por cidades da seguinte forma: 13
salas direcionadas à cidade de Belém, 3 à cidade de Marabá e 1 à cidade de Tucuruí.
Cada uma delas comporta ao máximo 30 usuários não assinantes, de forma que é
possível a entrada de assinantes mesmo que este número tenha extrapolado, sendo
que para adentrar as salas é necessário um nick (apelido) e que se digite num campo
algumas letras apresentadas pelo site número como medida de segurança. Se o
usuário, assinante ou não, tiver perfil cadastrado na página de relacionamentos do
UOL, o chamado UOLK, ele pode adentrar com uma foto, além do nick.
É possível encontrar, somando-se todas as salas de um subgrupo, cerca de 200
usuários conectados. De acordo com informações do próprio site neste exato momento
(às 17:45h do dia 27/05/2007), de acordo com o UOL (link “Bate-papo”), estão
conectados 39.476 usuários no total dos 8 grupos de salas do site.
5
Existem neste site, no link Bate-papo, 8 grupos de salas, os quais: “Por idade”, “Cidades e Regiões”,
“Tema Livre”, “Variados”, “Encontros”, “Sexo”, “Imagens eróticas” e “Outras Imagens”.
30
Segundo Nicolaci-da-Costa (1998, p. 229), os chats são:
’salas’ de todos os tipos e para todos os gostos, ou seja, o bate-papo pode rolar
sobre praticamente tudo: de música popular ou erudita e cinema a receitas
culinárias, da simples azaração ao sadomasoquismo, de como manter o corpo
em forma a body-piercing.
Ilustração 2: Sala de Bate-papo do UOL.
Como visto acima, nos chats as interações se dão de forma sincrônica, ou seja,
estando ambos os usuários online. Comumente o usados para dialogar com pessoas
que você não conhece, de maneira que, no caso daqueles que se conhecem
31
(pessoalmente ou virtualmente apenas) e querem ter uma conversa sincrônica,
costuma-se optar por programas como o MSN
6
.
A partir dos chats é possível fazer novos contatos. As pessoas podem teclar
(conversar com o auxílio do teclado) com quem quer que seja, havendo a possibilidade
de conhecer pessoas novas, diferentemente do que ocorre em programas como o MSN
ou o Yahoo Messenger, nos quais são criadas listas de amigos os quais são
adicionados (incluídos) de contatos conforme a vontade dos usuários.
Ilustração 3: Janela de conversa do MSN.
6
Messenger ou apenas MSN, é um programa de mensagens instantâneas criado pela Microsoft
Corporation. O programa permite que um usuário da Internet se comunique com outro que tenha o
mesmo programa em tempo real, podendo ter uma lista de amigos "virtuais" e acompanhar quando eles
entram e saem da rede.
32
Pode-se ver os chats como espaços públicos nos quais é possível manter uma
identidade privada, espaços virtuais que têm se constituído uma forma de estar em
contato anteriormente inexistente, tendo sido possibilitada pelo avanço da tecnologia
informática.
Quando alguém entra num chat, está ciente de que pode encontrar um grupo de
pessoas conectadas entre si através dos recursos da Internet, pessoas que muito
provavelmente ele não conhece pessoalmente ou pelo menos não sabe que conhece
devido à possibilidade do anonimato. Ele sabe que ali diversas possibilidades, pode
se envolver numa conversa empolgante que leve a contatos posteriores possibilitados
pela troca de números de telefones ou de endereços eletrônicos para programas de
conversas online ou mesmo troca de endereços de páginas pessoais (profiles)
presentes em sites de comunidades. Por outro lado, os contatos podem resultar numa
breve conversa, seguida de outras breves conversas com um grande número de
pessoas, de forma que os chats podem ser utilizados seja como um passatempo, seja
como um divertimento, seja como uma forma de conhecer novas pessoas.
De maneira geral, pode-se dizer que o caráter pessoal da CMC vem se
afirmando ao longo do tempo. Não obstante possa servir para diversos fins, a
popularização desta tecnologia se deve basicamente ao incremento das relações
interpessoais, à criação de novos laços e à facilitação dos contatos à distância.
Segundo Dias e De Lataille (2004, p. 188):
A princípio, as pesquisas a respeito da comunicação mediada por computador
consideravam a rede como um instrumento capaz de transmitir basicamente
informações impessoais. Atualmente, essa visão mudou. A rede é vista como
um instrumento importante e poderoso de comunicação interpessoal.
Mas, segundo Castells (2006, p. 442): “A comunicação mediada pela Internet é
um fenômeno social recente demais para que a pesquisa acadêmica tenha tido a
oportunidade de chegar a conclusões sólidas sobre seu significado social”. A Internet,
se comparada com outros meios de comunicação de massa, é uma invenção nova, e
sua propagação acelerada requer que se desenvolvam estudos capazes de analisar os
significados que ela tem nas vidas daqueles que a utilizam, de forma que a psicologia
33
se vê atualmente na necessidade de investigar os impactos subjetivos do uso da
Internet. Segundo Spink (2004, p. 58):
[...] a mídia não é apenas um meio poderoso de criar e fazer circular conteúdos
simbólicos, mas possui um poder transformador ainda pouco estudado e,
talvez, ainda subestimado de reestruturação dos espaços de interação
propiciando novas configurações aos esforços de produção de sentidos.
2.4. OS IMPACTOS SUBJETIVOS DO USO DA INTERNET
O advento da Internet provocou muitas mudanças no cotidiano da vida social.
Como exemplo pode-se citar a comunicação escrita. O costume de escrever cartas tem
agora uma forma alternativa que são os emails. Algo que chama atenção, porém, não é
tanto a diferença entre fazer uso da carta ou do email para se comunicar com alguém
que está longe e sim o costume de escrever em si.
A rapidez e a praticidade da CMC levou as pessoas a usarem freqüentemente a
escrita a fim de se comunicar. Ela tem se estendido não apenas à troca de informações
com um interlocutor tal como acontece nos chats ou nos sites de relacionamento, mas
também à auto-exposição, à escrita acerca de si mesmo como ocorre nos blogs,
espécies de diários ao mesmo tempo íntimos e públicos (PRANGE, 2007).
Entretanto, as transformações não afetariam apenas as formas de fazer, mas
também as formas de ser, o que implica numa transformação subjetiva. Para Carvalho
(2000, p. 131): “Essa interação entre humanos e computadores resulta em uma
produção de subjetividade, que é multiplicidade por excelência, emerge como indivíduo
e como coletivo, expressa-se no humano e na máquina”. De acordo com Nicolaci-da-
Costa (2002, p.193), há uma estreita relação entre tecnologia e subjetivação:
[...] embora seja fácil detectar que novas tecnologias têm o poder de alterar
nossos hábitos e nossas formas de agir, é bem mais difícil registrar que
algumas tecnologias também podem alterar radicalmente nossos modos de ser
(como pensamos, como percebemos e organizamos o mundo externo e interno,
como nos relacionamos com os outros e com nós mesmos, como sentimos,
etc).
34
A relação entre tecnologia e subjetivação fica evidente quando se leva em conta
que a tecnologia é uma produção humana, um bem cultural que promove o
desenvolvimento e cujo avanço está acompanhado de alterações sociais que se
refletem nas formas de ser das pessoas.
A cultura está diretamente relacionada à tecnologia. Quando esta muda, a
cultura sofre sua influência. E um dos principais aspectos desta influência é a
comunicação. As formas como nos comunicamos dizem respeito não apenas ao modo
como nos relacionamos, mas também a nossa forma de ser. Aliás, nossos
relacionamentos costumam ser baseados em nossas próprias formas de ver as coisas,
de sentir, de avaliar a nós mesmos, aos outros e às situações.
Em outras palavras, tecnologia e cultura estão numa estreita relação e as
transformações que aí ocorrem refletem-se tanto nas nossas formas de comunicar
quanto nas nossas formas de ser. Para Castells (2006, p. 459): “Culturas consistem em
processos de comunicação”. Para ele (2006, p. 414), as próprias culturas, isto é,
nossos sistemas de crenças e códigos historicamente produzidos são transformados de
maneira fundamental pelo novo sistema tecnológico e o serão ainda mais com o passar
do tempo” (CASTELLS, 2006, p. 414). Em uma reflexão semelhante, Ibáñez (1994)
analisa as implicações da informática para o pensar humano. Segundo o autor
(IBÁÑEZ, 1994, p. 48):
Los processos cognitivos se modifican a medida que cambian las tecnologías
de la inteligencia, nuestra forma de pensar es inseparable de esas tecnologias,
pero estas tecnologias definen tan profundamente lo que somos que resulta
difícil que podamos calibrar lo que les debe nuestra forma de ser.
Esse autor fala do surgimento de três tecnologias que modificaram o
pensamento no decorrer da história, sendo 1) a invenção da escrita e seus impactos na
memória e no raciocínio, 2) a imprensa que trouxe a necessidade de sistematizar a
informação, representando-a de forma objetiva e transmitindo, em massa, as ideologias
daqueles que detinham este meio de comunicação, e 3) a tecnologia informática.
35
Segundo Ibáñez (1994, p. 48):
La tercera gran tecnologia de la inteligência apenas empezado a modificar
el pensamiento, pero sus consecuencias se vislumbran impresionantes. Se
trata, por supuesto, de la microfinformática, y más precisamente de los
microcomputadores personales.
O avanço tecnológico tem como um de seus resultados, portanto,
transformações nas culturas e nos processos de subjetivação, nas formas como
significamos as coisas e a nós mesmos. De acordo com Nicolaci-da-Costa (2005a,
2005b), os impactos da Internet podem ser divididos em dois tipos, 1) os impactos
diretos e 2) os impactos indiretos.
Os impactos diretos se referem a dois tipos de interação, aquela na qual os
usuários interagem com a rede de computadores e aquela na qual eles interagem
através da rede.
Os impactos indiretos se referem tanto àqueles que interagem na rede quanto
sobre aqueles que jamais a utilizaram, e aqui estão incluídos os efeitos da Internet no
mercado de trabalho, na circulação do capital, no exercício da cidadania etc.
Uma organização subjetiva é invisível aos olhos e apenas perceptível pelas suas
expressões, nas palavras e nos comportamentos. Assim, pode-se observar nos
comportamentos de usuários aspectos típicos da lógica da rede, a qual se caracteriza
pela agilidade, pela alternativa (infinidade de caminhos a seguir através dos links),
expertise jovem, relativização, uso de uma linguagem peculiar, etc (NICOLACI-DA-
COSTA, 2005a, 2005b).
Ao tratar da facilidade com que as pessoas falam de si mesmas nos chats por
estarem protegidas pelo anonimato, Nicolaci-da-Costa (1998, p. 223) escreve: “Ao nos
revelarmos para o outro, estamos, também, nos revelando para nós mesmos. E, ao
observarmos, nesse outro, as reações àquilo que revelamos ser, somos informados do
quanto vale aquilo que somos”.
Dias e De La Taille, (2004, p. 191), por sua vez, afirmam: “As salas de bate-papo
trouxeram às vidas de muitas pessoas uma nova possibilidade de se relacionar com os
outros e, de certa forma, consigo mesmas”. A expressão de si mesmo talvez seja um
36
dos pontos marcantes das influências da informática sobre o íntimo. A Internet oferece
diversas ferramentas que possibilitam ao usuário deparar-se consigo mesmo, olhar-se
através de vários ângulos, falar de si mesmo.
A auto-expressão pode ser encontrada na rede de diversas formas, nos blogs,
nos chats, nos sites de cadastro para encontros amorosos, nos sites de comunidades,
os quais contém perfis com fotos, auto-descrição, vídeos, comunidades etc.
Nestes recursos sempre espaços para o feedback, para depoimentos acerca
do interlocutor ou do dono do perfil, de forma que seria razoável pensar que a Internet
oferece tanto a possibilidade para a expressão de si quanto a possibilidade de
construção de si. Afinal, é na interação com o outro que nos construímos. É na
interação que nos tornamos o que somos. O ser humano é um ser construído
socialmente.
37
3 RELACIONAMENTOS HUMANOS MEDIADOS PELO COMPUTADOR
3.1. A SOCIABILIDADE NA REDE
As relações humanas se estabelecem formando redes, entrelaçamentos que
possuem pontos de contato, os indivíduos, ligados uns aos outros, formando grupos
que podem ser mais ou menos excludentes, de acordo com os tipos de laços que os
unem, fortes (familiares, amigos íntimos, cônjuges) ou fracos (colegas de trabalho,
conhecidos).
Relacionamo-nos em redes cuja criação se em termos tanto de afinidades
quanto de objetivos comuns. O grupo familiar se caracteriza pela consangüinidade, pela
intimidade, pela convivência ao longo dos anos, por uma evidente semelhança física
entre seus membros. Os grupos de amigos também costumam ser formados com base
em identificações, num compartilhamento de interesses, jogos, atitudes, entre outros, os
quais fundamentam o desejo e a necessidade de estar junto.
Nos casos em que o fator principal não são as afinidades, como por exemplo, um
grupo de trabalho, a ligação entre eles está baseada nos objetivos comuns, na
necessidade de desempenhar tarefas que levem à meta traçada, ainda que seja
comum a criação de laços por afinidades. Segundo Silva (2005), o fenômeno da
atração interpessoal inclui a proximidade física, o estado afetivo, a semelhança de
atitudes, a reciprocidade, a ajuda entre outros. Num caso e no outro as relações entre
as pessoas constituem redes nas quais elas transitam, delimitando os espaços e os
tempos de interação. As redes sociais são formadas e nelas se exercita a sociabilidade.
Marcelo (2001, p. 39), citando Baechler, afirma que sociabilidade se refere à:
“capacidade humana de estabelecer redes através das quais as unidades de
actividades, individuais ou colectivas, fazem circular as formações que exprimem os
seus interesses, gostos, paixões, opiniões [...]”.
38
A forma mais tradicional de sociabilidade é a interação face-a-face, aquela na
qual estamos frente a frente, compartilhando o tempo e o espaço, olhando nos olhos do
interlocutor e sendo vistos por ele. Neste tipo de interação os sinais de que estamos
sendo entendidos são perceptíveis através da voz, do seu tom, dos gestos e das
posturas do interlocutor, enfim, os feedbacks necessários para que a comunicação
prossiga estão plenamente disponíveis.
Com a tecnologia, as interações passaram a ser também mediadas por
invenções como a imprensa, a televisão, o telefone e o computador. No que diz respeito
ao uso da tecnologia, Thompson (apud MARCELO, 2001) as diferencia em interação
quase-mediada e interação mediada, além da já citada face-a-face.
A interação face-a-face prescinde do uso de tecnologia (a não ser a própria
linguagem). A interação quase-mediada seria aquela na qual o feedback não está
disponível no momento da comunicação, ou seja, emissor e receptor estão separados
no tempo e no espaço. Não se tem idéia, no momento, das repercussões da mensagem
devido à unilateralidade da transmissão. É o caso da imprensa escrita e da televisão.
A interação mediada, por sua vez, permite o feedback, ou seja, a ida e a volta, as
mensagens são emitidas em tempo real. É o caso do telefone e da Internet. Por causa
dos feedbacks ela se assemelha à interação face-a-face, mas dela se diferencia pelo
uso do aparato tecnológico
7
.
É difícil hoje falar em interação mediada sem levar em conta a tecnologia. As
pessoas têm encontrado nos recursos tecnológicos uma forma de estar mais em
contato. O telefone é um dos principais meios capazes de diminuir as distâncias e isto
se intensificou mais ainda com o advento da telefonia móvel.
8
Com os celulares ficou
mais fácil encontrar as pessoas, marcar encontros, ter maior privacidade no uso do
telefone.
Atualmente, a sociabilidade tem alcançado especial destaque com o advento da
Internet. Manter contato, conhecer pessoas, procurar antigos amigos, trocar
mensagens, são atividades comuns entre os usuários da rede. Nesta, navegar é
7
Esta afirmação, entretanto, é relativa se pensarmos que a comunicação face-a-face também é mediada,
pois utilizamos uma tecnologia que é a linguagem.
8
Ao leitor interessado sugiro a leitura do artigo “Impactos psicológicos do uso dos celulares: uma
pesquisa exploratória com jovens brasileiros”, de Nicolaci-da-Costa (2004b).
39
preciso e exercitar a sociabilidade também. Para isto, as redes telemáticas têm
representado as novas formas das pessoas entrarem em contato, transmitir informação
e conhecimento e interagir. De acordo com Marcelo (2001, p. 65): “As redes telemáticas
operam, assim, modificações profundas no nosso quotidiano, que se traduzem em
novas formas de interacção, novas formas de sociabilidade.”
Antes do advento da Internet as pessoas tendiam a buscar novos contatos
através de redes de amigos ou em lugares como praças, bares, clubes e shoppings. A
Internet ofereceu um espaço tanto para fazer novos contatos quanto para conservar os
que existem, coisa que não acontecia com o telefone, o qual era utilizado para
manter contato com pessoas já conhecidas
9
. Para Nicolaci-da-Costa (2005c, p. 5):
A criação desses ambientes de encontro coletivo foi o que realmente subverteu
todos os parâmetros então vigentes de comunicação à distância, pois
inaugurou uma era em que os contatos interpessoais podiam ser travados
virtualmente (geralmente por escrito). Enquanto que antes (na era do telefone)
as interações virtuais eram restritas a uma rede de conhecimentos “reais” (ou
seja, travados no mundo físico), o escopo das interações virtuais na Internet foi
ampliado dramaticamente.
France (2002) no seu artigo “Love at first site”, chama atenção para o caso dos
relacionamentos amorosos. Para ela, o namoro pela Internet está decolando, está muito
mais fácil se aproximar de alguém e flertar. A rede ofereceria uma certa segurança na
hora de encerrar um contato desagradável e, se precisar fazer uma nova tentativa,
basta conectar-se. Em outras palavras, a rede tem favorecido a formação de novos
contatos. Segundo Saraiva e Cabral (2001, s/p):
Conhecer pessoas pela Internet é mais que um fato nos dias de hoje, virou
hábito e hobby entre muitos jovens e adultos. Através de programas como o
ICQ (em inglês I seek you, e que em português quer dizer ‘Eu te procuro’) ou o
Yahoo Pager criados exclusivamente para unir pessoas de todo o mundo
através de chats – conversas desenvolvidas através do teclado, em tempo real,
também através de sites ou servidores próprios são elaboradas todas as
facilidades para criar um ambiente descontraído e propício para conhecer
pessoas através de bancos de dados com informações pessoais dos usuários.
9
Deve-se notar, porém, a existência daqueles chats de voz que funcionam via telefone e constituem-se
de salas de conversação nas quais as pessoas podem travar novos contatos e criar comunidades.
40
Para os autores: Although the Internet is often used to contact existing
relationships. It also has the potencial to create new relationships”.
10
(BOASE e
WELLMAN, 2004, p. 8). Isto significa que não é preciso utilizar o contato face-a-face
como forma básica de fazer amigos. A sociabilidade prescinde do contato físico ou do
compartilhamento dos mesmos tempo e espaço para acontecer. Ela pode ser virtual,
como se observa nas trocas de emails, nos chats, nos blogs, nos sites de comunidades,
enfim, numa série de alternativas que a telemática oferece para quem opta pela rede
como um meio de comunicação.
Estes recursos são povoados de pessoas que se dispõem a interagir com quem
não está ao seu lado naquele exato momento ou mesmo com quem não está online
pois, como visto no capítulo anterior, a CMC pode ser sincrônica ou assincrônica.
Nenhuma outra tecnologia da sociedade contemporânea tem influenciado tanto
os relacionamentos como a informática, e mais especificamente a Internet. Não é de
hoje que a tecnologia afeta os relacionamentos, mas a Internet ofereceu a criação de
um espaço próprio no qual eles receberam uma atenção particular.
O uso do email, dos sites de comunidades e dos softwares de conversação,
ampliaram as possibilidades de entrar em contato, dando maior rapidez e diminuindo os
custos. Segundo Boase e Wellman (2004, p. 15): “Internet use allows people to
maintain networks that are physically distant, as it allows quick and cheap distant
communication”
11
.
Desta vez, tanto as relações de trabalho como as relações pessoais foram
facilitadas, sendo que, no caso das pessoais, a ênfase não está mais apenas em se
comunicar com alguém que você conhece, mas também em travar novos contatos. É
por isso que faz sentido afirmar que a Internet ofereceu um espaço próprio para os
relacionamentos. Um espaço para o qual as pessoas vão com o objetivo de entrar em
contato com conhecidos e não conhecidos, no qual não objetivo maior que o de
fazer contato”.
10
“Embora a internet seja, muitas vezes, utilizada para manter contato com relacionamentos existentes,
ela também tem o potencial de gerar novos contatos”.
11
O uso da internet permite às pessoas manterem contato com suas cadeias de relacionamento, que
estão fisicamente distantes como também, possibilita uma comunicação à distancia rápida e barata”.
41
Como visto no capítulo anterior, quando da sua criação a rede de computadores
não buscava a transmissão de mensagens pessoais, mas o caráter pessoal ou
interpessoal da CMC foi se afirmando e se disseminando, constituindo-se hoje um dos
principais motivos de acesso à rede. Segundo Rheingold (1996, p. 20): “O objetivo da
rede era a transmissão de dados informáticos, e não de mensagens pessoais mas
rapidamente se percebeu que ela também servia perfeitamente para a transmissão de
palavras”.
A pesquisa realizada em 2006 pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil acerca
da CMC revelou que do total dos entrevistados que acessaram a Internet nos últimos
três meses, 78,18% o fizeram com o objetivo de se comunicar, sendo que dentre as
atividades mais comuns estão, em primeiro, o hábito de receber e enviar e-mails, em
segundo, enviar mensagens instantâneas e, em terceiro, participar de sites de
relacionamentos e comunidades tais como o Orkut e o UOL K.
Rheingold (1996) reflete acerca das características da vida online, das reuniões
de pessoas que utilizam o computador como uma forma de estar em contato, de se
comunicar. Ele afirma que se trata de pessoas que não objetivam fazer negócios ou
estudar e sim estar em contato umas com as outras. Elas se dispõem a dedicar
algumas horas do seu dia e, em alguns casos, muitas horas, para se comunicar com
quem está longe ou mesmo perto e assim saber de suas vidas, compartilhar suas
experiências, pedir conselhos, solicitar ajuda para resolver problemas, entre outros.
São diversas as alternativas para se relacionar: os chats presentes em sites
como UOL e Terra, os canais de conversação como o Internet Relay Chat (IRC), os
softwares como o MSN (que possibilita a criação de listas de contatos nas quais são
incluídos aqueles que o usuário desejar), os sites de relacionamento, os blogs, os sites
de cadastro, os newsgroups, os emails etc.
Os chats
12
(bate-papo), por exemplo, reúnem características interessantes como
o fato de estarem hospedados em grandes sites, o que facilita o acesso que não
precisam ser instalados no pc (personal computer) como acontece com o IRC. Por
serem abertos (ao contrário do MSN) eles oferecem um espaço para fazer novos
12
O termo chat também pode ser aplicado ao IRC e aos mensageiros instantâneos (ex. MSN), mas é
mais freqüentemente utilizado ao se referir aos serviços de conversação oferecidos pelos sites.
42
contatos. Por serem exemplos significativos de espaços de interação, merecem
reflexões mais detalhadas as quais serão feitas mais adiante.
3.2. O ANONIMATO
Uma das características da comunicação à distância é a possibilidade do
anonimato. Ele ocorre nos emails, nos chats, nas comunidades virtuais, nos sites de
cadastro para novos relacionamentos etc. A distância, o uso do apelido, a liberdade
para a construção de perfis e a utilização de imagens são aspectos que favorecem a
manutenção do sigilo acerca de si e da vida pessoal.
O anonimato abre diversas possibilidades. Num encontro offline, ou seja, fora do
ambiente virtual, as impressões físicas precedem as comportamentais, alguns
comportamentos, aliás, podem até estar “refletidos” no físico. Tradicionalmente,
conhecemos a pessoa fisicamente, observamos seus traços, modos, vestimentas, tom
de voz, gestos, formas de olhar, entre outros, e concomitantemente percebemos suas
características psicológicas, traços de personalidade, temperamento, preferências etc.
Sendo que a quantidade e a qualidade da interação facilitam um “conhecimento maior”
do outro, através da “convivência”.
Na comunicação à distância entre pessoas que não se conhecem face-a-face, o
movimento é diferente. Os aspectos psicológicos costumam ser primeiramente
apresentados e, se for o caso, posteriormente passa-se ao contato face-a-face de
forma que quando este acontece as pessoas, de certa forma, já se conhecem.
Vale observar que os recursos disponíveis hoje já permitem a troca de imagens
tanto de foto quanto de câmeras (webcam), o que possibilita o conhecimento do físico
do outro, mas isso pode ser visto como algo extremamente diferente da experiência
proporcionada pelo contato face-a-face.
Além da questão das impressões físicas, o anonimato possui outras implicações,
como o sentimento de liberdade com relação à auto-expressão. Longe dos olhos do
outro, pode-se mostrar nuances que não se mostraria de outra forma. De maneira
43
particular para algumas pessoas que se consideram tímidas ou retraídas isto significa
uma maior liberdade para agir, para falar ou para mostrar-se como se é.
De acordo com Nicolaci-da-Costa (1998, p. 229) no “mundo ‘virtual’, onde
podemos ser anônimos e nos locomover de um lado para o outro, com facilidade e
rapidez, em busca daqueles com quem possamos entrar em sintonia, tudo se torna
mais fácil”. Anônimos podem se sentir mais livres para agir de forma genuína sem se
preocupar tanto com o que os outros vão pensar. Se ocorrer um constrangimento
sempre haverá como fechar uma janela ou excluir um contato.
Mas assim como o anonimato pode ser favorável a demonstrações mais
autênticas de si, ele pode ser útil na hora de forjar uma outra imagem. Ele facilita a
forma da auto-apresentação. O usuário tem a possibilidade de decidir que imagem de si
ele quer que o outro construa. Ele tem um poder maior acerca das impressões do
interlocutor, tanto no que se refere aos aspectos físicos quanto aos aspectos
psicológicos.
Alguém pode revelar apenas uma parte do seu corpo através de uma imagem,
ou expor imagens que não são suas. As reações contam com um tempo para respirar,
escolher as palavras e tentar mais facilmente dissimular emoções que talvez não
passassem despercebidas num contato face-a-face. As emoções são mais susceptíveis
de serem controladas quando a comunicação tem por base apenas a escrita.
Segundo Walther (1996), os emissores de mensagem selecionam e expressam
comportamentos comunicativos avaliados como mais desejáveis para conseguir metas
sociais. Por sua vez, os receptores de mensagens tendem a idealizar imagens de seus
emissores. Ainda segundo este autor, este processo seria ainda mais intenso no caso
da comunicação assincrônica, pois os usuários, além de estarem livres da pressão do
encontro face-a-face estão livres da pressão da comunicação em tempo real.
A comunicação ocorrida no ambiente virtual permite ainda a vivência de papéis
no sentido de atuar, revestir-se de uma atitude, de modos, de comportamentos que não
são comuns à pessoa. De acordo com Dias e De La Taille (2004, p. 191): “A proteção
do anonimato oferecida por este tipo de comunicação permite ainda a experimentação
de papéis e a realização ‘virtual’ de fantasias que não seriam admissíveis ou possíveis
para a maioria das pessoas na vida real [...].
44
Um arquiteto pode agir como uma colegial, uma idosa como um jovem escoteiro,
um adolescente como um homem de 40 anos. Envolvido pelo ambiente virtual, o
internauta pode dar asas à imaginação, criar personagens que lhe pareçam
interessantes e vivenciá-los de tal forma que para quem está do outro lado pareça
autêntico. Segundo Martins (2002, p.110):
Se entro em um “Chat” (bate-papo) tanto faz a identidade que assumo. Posso
falar com pessoas de qualquer parte do mundo, entrar como mulher ou
homem, como jovem ou idoso, hétero ou homossexual, procurando relações
afetivas ou relações de qualquer índole.
Segundo Sayeg (2000, p. 147): “A CMC cria um ‘estado’ virtual onde uma pessoa
pode agir em um novo papel através da criação de apelidos que podem alterar
características físicas como gênero, idade, raça e outras”. Isto não quer dizer que todas
as pessoas que acessam os chats desenvolvam papéis. É verdade que um apelido
pode ser comparado a uma máscara através do qual os usuários possam se revestir de
qualquer personagem, mas ainda que seja interessante comparar uma sala de chat a
um baile de máscara onde se pode encontrar super-homens, batmans, piratas,
princesas e fadas, não é verdade que todas as pessoas optem por ser outras pessoas
enquanto interagem.
De acordo com Sayeg (2000), trabalhos como os de Young e Griffiths têm
apontado para a relação entre a necessidade de forjar papéis e o uso compulsivo da
Internet. De acordo com a autora (SAYEG, 2000, p. 153), trabalhos como estes revelam
que os usuários compulsivos buscam uma vida paralela que geralmente está em
desacordo com sua realidade:
[...] A fantasia e a falta de inibição comandam os relacionamentos virtuais: os
internautas chegam a criar alteregos total ou parcialmente fictícios, que eles
percebem como mais interessantes do que a própria imagem que têm de si
mesmos. Onde em geral o alterego é um paradoxo do sujeito na vida real.
É importante observar, entretanto, que apesar da distância e do anonimato
estarem provavelmente relacionados à possibilidade de se usar um nick, algumas
45
pessoas os utilizam simplesmente por um costume ou por não quererem ser
identificadas, sem que haja uma necessidade de exercer uma fantasia incapaz de ser
realizada no mundo offline.
Mesmo quando anonimato na relação, pode-se, portanto, optar por fazer-se
conhecer como se é, ou seja, fornecendo informações verídicas, ou optar por criar um
personagem. Numa relação na qual não se optou pelo anonimato é menos provável a
apresentação de uma imagem que o seja a sua própria. Por outro lado, o uso
basicamente da língua escrita (concomitantemente ou não à exibição de imagem por
câmera) e principalmente a distância, talvez favoreçam uma exposição mais livre de si.
Como no telefone, pode-se falar de coisas que não se falaria face-a-face, ou não
sem uma maior dificuldade. A distância parece diminuir a pressão exercida pela
presença do outro e o recurso tecnológico literalmente media o contato.
3.3. DIVERSOS OLHARES ACERCA DO USO DA INTERNET
O advento da Internet provocou um receio de que seu usuário estivesse correndo
algum tipo de risco pessoal ou de perda da vida em comunidade. Ela seria a causa do
isolamento social, da desvalorização do contato face-a-face, o que empobreceria os
relacionamentos.
Segundo Bauman (2004), haveria nos relacionamentos virtuais uma facilidade
para o “desengajamento” e o “rompimento (a qualquer hora)”. E esta fragilidade afetaria
negativamente os relacionamentos offline. As pessoas tenderiam a se afastar, seus
relacionamentos ficariam mais frágeis. Para Wellman (2004), entretanto, a Internet é
uma tecnologia e não é de hoje que a tecnologia faz justamente o contrário, aproxima
pessoas que estão distantes. antes da Internet, o telefone, o carro e o avião
reduziram distâncias.
A comunicação a baixo custo proporcionada pela Internet assim como sua
disseminação em massa contribuíram para esta aproximação. Conectar-se algumas
horas num software de conversação é mais barato que uma ligação internacional e
mais ainda que uma passagem aérea.
46
Mas, para Wellman (2004), o email, um dos serviços mais utilizados
principalmente no início da popularização da rede, teve como um dos motivos principais
de seu sucesso a possibilidade de se comunicar com alguém de maneira assincrônica,
sem a necessidade de que ambos, emissor e receptor, estejam online. Ao relacionar o
uso do email às relações interpessoais offline, Boase e Wellman (2004, p. 8) escrevem:
The sender can send an email at many time, and the receiver can read and
respond to the email at a time that is convenient. This is in contrast to meetings
that are arranged by telephone, where the caller very often interrupts the
activity of the person on the other end of the line
13
.
O uso do email (e sua facilidade para trocar materiais, arquivos, músicas e
imagens) é um bom exemplo deste tipo de comunicação, assim como as comunidades
virtuais proporcionadas por sites de relacionamento, nos quais os recados são deixados
pelo emissor e respondidos conforme a disponibilidade do receptor.Para Wellman
(2004), esta alternativa favorece as relações entre pessoas que moram longe como, por
exemplo, num outro continente, mantendo e fortalecendo os laços, assim como as
relações que ocorrem entre pessoas que moram próximas mas que nem sempre podem
se ver ou que precisam se comunicar com freqüência.
Ele afirma que estamos vivendo num mundo não globalizado como também
“glocalizado”. A manutenção de relacionamentos tanto locais quanto à distância é um
fenômeno que Boase e Wellman (2004) comentam, chamado “glocalização”, e significa
que, mesmo localmente, estamos, cada um, interligados em redes de contatos, nem
sempre compartilhando as mesmas relações. Trata-se do networked individualism ou
individualismo em rede, expressão criada por Wellman (2004).
13
“O remetente pode enviar e-mails a qualquer momento e o destinatário poderá ler e responder o
mesmo e-mail no horário que lhe for mais conveniente. Isso representa um contraste com relação a
reuniões que são marcadas por telefone, na qual a pessoa que liga, muitas vezes, interrompe a atividade
de outra que está do outro lado da linha.”
47
Ao comentá-la Castells (2004, p. 158-159) escreve:
Após a transição desde o predomínio das relações primárias (personificadas
na família e na comunidade) até ao predomínio das relações secundárias
(personificadas na associação), o novo padrão dominante parece estar
constituído em torno do que poderíamos denominar relações terciárias, ou o
que Wellman chama <comunidades personalizadas>, personificadas em redes
centradas no eu. Isto representa a privatização da sociabilidade.
Esta seria uma das características da sociedade atual. Muitas pessoas não se
relacionam apenas num grande grupo no qual a maior parte se conhece, freqüenta-se,
compartilha lugares e interesses comuns. Em vez disso, cada pessoa possui sua rede
própria de amigos e cada uma se torna um nó, um ponto no qual é possível travar
contatos.
Este fenômeno pode ser bem entendido quando se toma como exemplo as
comunidades formadas pelos dois sites citados anteriormente, o Orkut e o UOL K, os
quais possibilitam que os visitantes adicionem a seu grupo um amigo novo e ao fazê-lo
têm acesso aos amigos desse seu amigo, havendo ainda a possibilidade de formar
comunidades ou agregar-se a elas.
Segundo Boase e Wellman (2004, p. 12-13): While many relationships are often
formed with people who have mutual friends, the Internet also affords the formation of
relationships between those who do not share common personal relationships”
14
. De
fato, nos sites de comunidades, costuma-se adicionar à própria página tanto contatos
conhecidos no “mundo offlinequanto contatos encontrados nas páginas de amigos ou
nos resultados de buscas por amigos.
Para Wellman (2004), este “exercício de sociabilidade”, longe de afastar as
pessoas, pelo fato de não ser físico, de não haver o contato face-a-face, acaba
contribuindo para a manutenção dos laços. O envio de um email facilita a localização da
pessoa, o arranjo de horários e do ponto de encontro. Segundo ele: “Online
14
“Enquanto que alguns relacionamentos são formados por pessoas, as quais têm os mesmos amigos, a
internet permite a formação de relacionamentos entre aqueles que não possuem os mesmos contatos
pessoais em comum.”
48
communication email, instant messaging, chat rooms, etc does not replace more
traditional offline forms of contact – face-to-face and telepfone”
15
. Em vez disso: “People
who frequently use the internet to contact others also tend to be in frequent contact with
people in other ways”
16
(WELLMAN, 2004, p. 4). Na mesma página, o autor afirma que
a Internet não é um mundo à parte: “[...] The internet is not a world apart”
17
. Ela faria
parte do cotidiano de muitas pessoas, mais diretamente daquelas que a utilizam.
Sendo um fenômeno nascido durante a globalização, a Internet é facilmente
associada à “aldeia global”, conforme expressão utilizada pelo sociólogo Marshall
McLuhan. Ela não aproximaria somente continentes, ela aproximaria vizinhos também.
Segundo as conclusões de um estudo realizado por Hampton e Wellman (2003), numa
comunidade denominada Netville, próxima a Toronto, EUA, especialmente equipada
com Internet de alta velocidade, o uso deste serviço possibilitou aos vizinhos conseguir
ajuda para resolver problemas domésticos tais como conseguir um encanador ou uma
babá e aumentou, além da quantidade de visitas, a quantidade de nomes de vizinhos
memorizados.
Este tipo de constatação levou os autores a concluir que a CMC tem como
diferencial em relação ao telefone, ao carro e ao avião, não a facilidade de unir
lugares distantes, mas também a de conectar pessoas, estejam elas geograficamente
próximas ou não. No caso de Netville, alguém poderia afirmar que a aproximação entre
os vizinhos poderia ter ocorrido independentemente da CMC já que o telefone pode ser
um instrumento muito útil. Mas a CMC conta com um importante diferencial: no telefone
a comunicação é de “um para um”, na Internet é de “muitos para muitos”, várias
pessoas podem mandar as mesmas mensagens para várias pessoas. Seria como um
outro nível de relacionamentos.
15
“A comunicação online email, mensagem instantânea, salas de bate-papo, etc não substitui as
formas mais tradicionais de contato offline, o face a face e o telefone”.
16
“Pessoas que freqüentemente usam a Internet para contactar as outras tendem a estar freqüentemente
em contacto com pessoas de outras formas”.
17
“A internet não é um mundo à parte”.
49
Segundo Rheingold (1996, p. 26):
A tecnologia CMC confere uma nova capacidade de comunicação multilateral,
de <muitos para muitos>. No entanto, a concretização futura desta capacidade
está nas nossas mãos porque somos os primeiros a experimentá-la; o seu
futuro depende do nosso sucesso ou insucesso em aplicá-la. Aqueles de nós
que travaram conhecimento por intermédio da tecnologia CMC encontram-se
perante um desafio de construírem em conjunto algo semelhante a uma
comunidade.
A partir destes autores, a idéia de que a rede aproximaria as pessoas que estão
distantes e afastaria as que estão próximas seria, portanto, questionável. Se é verdade
que a Internet têm contribuído para a dispersão das pessoas seria razoável pensar que
isto estaria diretamente relacionada a outras tecnologias anteriores à própria Internet,
não sendo esta dispersão pelo espaço uma especificidade da Internet, mas uma
tendência mundial da sociedade contemporânea.
Desde a revolução industrial o aumento do trânsito de massa e dos sistemas de
comunicação têm afetado os relacionamentos sociais, especialmente nos grandes
centros. O individualismo em rede seria a base desta mudança e significaria a formação
de redes tanto locais quanto à distância, uma numerosa quantidade de laços fracos,
uma menor de laços fortes e uma tendência tanto para criar quanto para abandonar
relacionamentos. Este último aspecto, a curta duração dos relacionamentos, seria ele
mesmo um dos argumentos contra a idéia de que o uso da Internet enfraqueceria as
relações humanas, pois a mudança de ambiente ocasionada pela mobilidade de
empregos, por exemplo, seria um dos aspectos relacionados a este fenômeno o qual
acontecia antes do seu advento (WELLMAN, 2004).
O fato é que, relacionado ou não ao advento da Internet, se os relacionamentos
na atualidade estão sofrendo alterações, estas seriam no sentido de uma grande
quantidade de laços fracos em forma de individualismo em rede ao lado da existência
dos laços fortes. O que não se pode deixar de atentar é para o fato de que esta
alteração não deve ser olhada de forma isolada e sim dentro de um contexto. Ela faria
parte do que se convencionou chamar modernidade tardia.
A modernidade tardia ou pós-modernidade refere-se ao tempo que estamos
vivendo hoje, o qual se seguiu à chamada modernidade iniciada no começo do século
50
XV ou no início do século XVI, cujas características, segundo Martins (2002), teriam
sido a ênfase no racionalismo, que visava explicar os fenômenos com base na razão e
opondo-se ao predomínio da fé, característico do período medieval; o universalismo,
que encarava as verdades científicas como possuindo um estatuto válido em qualquer
lugar; e a centralidade do sujeito, enquanto um ser que possui uma identidade
integrada e coerente cujas características marcantes seriam a igualdade e a liberdade.
De acordo com Nicolaci-da-Costa (2004a), foram também suas características: a
ordem, o progresso, a verdade, a objetividade, a emancipação universal, os sistemas
únicos de leitura da realidade, as grandes narrativas, os fundamentos definitivos de
explicação, as fronteiras, as barreiras, o longo prazo, a hierarquia, as instituições
sólidas, o poder central e as claras distinções entre público e privado.
Numa linguagem metafórica, na modernidade as coisas estariam mais
amarradas, postas nos seus lugares, ordenadas por uma racionalidade sem a qual o
avanço científico teria se tornado inviável. As coisas precisariam estar bem dispostas,
bem definidas, pois a objetividade é necessária à organização do trabalho, à produção
em série, à circulação de bens. Segundo Bauman (2001, p. 132):
[...] Essa foi a era do hardware, a época das máquinas pesadas e cada vez
mais desajeitadas, dos muros de fábricas cada vez mais longos guardando
fábricas cada vez maiores que ingerem equipes cada vez maiores, das
poderosas locomotivas e dos gigantescos transatlânticos.
Por outro lado, a coisa sólida, pesada, tem cedido espaço para a liquidez da
modernidade tardia. Segundo Nicolaci-da-Costa (2004a; 2005a), seriam suas
características a globalização, as comunicações eletrônicas, a mobilidade, a
flexibilidade, a fluidez, a relativização, os pequenos relatos, a fragmentação, as rupturas
de fronteiras e barreiras, as fusões, o curto prazo, o imediatismo, a descentralização e a
extraterritorialidade do poder, a imprevisibilidade e o consumo.
O software pode fluir, rompendo barreiras e relativizando o absoluto. É a
metáfora do quido. Como exemplo, podemos citar os relacionamentos. tempos
atrás, o casamento era considerado uma das instituições mais sólidas da sociedade.
Sua constância, sua perenidade eram muito mais valorizadas. O “até que a morte nos
separe” do casamento religioso decretava a obrigação dos cônjuges estarem sempre
51
juntos, “na saúde e na doença, na alegria e na tristeza”, de forma que o acontecimento
do divórcio era um escândalo. Hoje, não se poderia dizer que o divórcio seja visto com
bons olhos, pois as instituições sociais levam tempo para mudar, mas não causa tanto
espanto como antes. Da mesma forma, são comuns as uniões que não estão de “papel
passado” e mesmo nas que estão é comum que o casamento tenha ocorrido apenas no
civil, de cujo cerimonial não faz parte o “até que a morte...”. Bauman (2001, p. 187)
afirma: “[...] Compromissos do tipo ‘até que a morte nos separe’ se transformam em
contratos do tipo’enquanto durar a satisfação’”.
Pode-se fazer aqui um paralelo com o pensamento de Bauman (2001) quando
ele cita como uma das características da modernidade tardia o consumismo exagerado.
Para o nosso capitalismo, tudo que possa se tornar uma mercadoria em potencial deve
ser aproveitado. Acontece que, segundo este autor, uma das características da lógica
do consumismo é a efemeridade dos produtos, a qual levaria a uma busca constante de
satisfação, adquirindo o descartável uma importância fundamental para que se obtenha
lucro. E os relacionamentos humanos não fugiriam a esta lógica. Eles, na modernidade
tardia, estariam sofrendo mudanças profundas cuja característica principal é a mesma
idéia de fluidez, ou seja, de algo que não se pode reter tão facilmente, sendo que o
casamento que estamos discutindo também está incluído nisso. Bauman afirma (2001,
p. 187-188):
Em outras palavras, laços e parcerias tendem a ser vistos e tratados como
coisas destinadas a serem consumidas, e não produzidas, estão sujeitas aos
mesmos critérios de avaliação de todos os objetos de consumo. No mercado
de consumo, os produtos duráveis são em geral oferecidos por um “período de
teste”; a devolução do dinheiro é prometida se o comprador estiver menos que
totalmente satisfeito. Se o participante numa parceria é “concebido” em tais
termos, então não é mais tarefa para ambos os parceiros “fazer com que a
relação funcione”, “na riqueza e na pobreza”, na saúde e na doença, trabalhar
a favor nos bons e maus momentos, repensar, se necessário, as próprias
preferências, conceder e fazer sacrifícios em favor de uma união duradoura
[...]. Não qualquer razão para ficar com um produto inferior ou envelhecido
em vez de procurar outro “novo e aperfeiçoado” nas lojas.
52
Da mesma forma, Giddens (1993, p.152), ao refletir sobre os relacionamentos na
atualidade, afirma:
Para criar um compromisso e desenvolver uma história compartilhada, uma
pessoa deve se dar à outra. Ou seja, deve proporcionar, por palavras e atos,
algum tipo de garantia à outra de que o relacionamento pode ser mantido por
um período indefinido. Mas um relacionamento nos dias de hoje não é, como
foi um dia o casamento, uma condição natural” cuja durabilidade pode ser
assumida como certa, exceto em algumas circunstâncias extremas.
Esta idéia de efemeridade das relações se associa à de velocidade, à rapidez,
pois “tempo é dinheiro” no capitalismo. Assim, os interesses precisam ser satisfeitos
com o mínimo de demora possível, pois a espera pode significar perder tempo, ter
prejuízo. E a espera também pode ser desconfortável. A rapidez do trem bala e do
email é encontrada também nas práticas sociais caracterizadas pelo imediatismo, o
mesmo que está presente nas propagandas publicitárias que prometem prazer
garantido. Nas palavras de Silva (2006a, p. 25):
O mundo pós-moderno forja tecnologias do afeto e domina os sujeitos pela
adesão, pelo consentimento, numa espécie de contrato, revogável a qualquer
momento, de assimilação consentida de valores e de práticas sociais
efêmeras. O preço da adesão é o prazer imediato.
Entretanto, a análise das transformações próprias da modernidade tardia não
pode ser feita sem levar em conta os fatores econômicos que constituem a base de
qualquer sociedade, ou seja, o modo de produção. Os grandes momentos da história
das sociedades estiveram ligados diretamente ao modo de produção da época, o
escravismo, o feudalismo e o capitalismo. Da mesma forma, não se poderia negar que
economia e tecnologia andam juntas, de maneira que as transformações econômicas
estão diretamente relacionadas ao avanço tecnológico. Poder-se-ia, portanto, relacionar
a dispersão no espaço, o individualismo em rede e os laços fracos com o avanço
tecnológico, enquanto tendências gerais dos relacionamentos na atualidade.
A polêmica se coloca, porém, quando tais fenômenos são atribuídos ao advento
da Internet. Segundo Jungblut (2004, p. 15): O ciberespaço formado pela rede mundial
53
de computadores (Internet) tem sido apoiado por muitos como um lugar’ onde
tendências sociais próprias da tardo-modernidade se potencializam ao máximo”. Para
Bauman (2004, p. 13):
Diferentemente dos “relacionamentos reais”, é cil entrar e sair dos
“relacionamentos virtuais”. Em comparação com a “coisa autêntica”, pesada,
lenta e confusa, eles parecem inteligentes e limpos, fáceis de usar,
compreender e manusear. [...]. Sempre se pode apertar a tecla de deletar.
Autores como Castells (2004; 2006) e Nicolaci-da-Costa (1998) discordam desta
visão. Segundo Castells (2006, p. 445): “[...] a Internet pode contribuir para a expansão
dos vínculos sociais numa sociedade que parece estar passando por uma rápida
individualização e uma ruptura cívica”. E Nicolaci-da-Costa (1998, p. 215):
Esta é certamente uma nova forma de aprofundar e manter amizades. Mas é
uma forma que integra a realidade virtual, responsável pela sensação de
proximidade apesar da distância, àquilo que é por nós vivido como a realidade
“real”, ou seja, aquela em que sempre vivemos e na qual nos
relacionávamos e ainda provavelmente voltaremos a nos relacionar, com
nossos amigos reais e/ou familiares que agora estão distantes.
Em seu artigo “Sociabilidade virtual: separando o joio do trigo”, Nicolaci-da-Costa
(2005c) questiona a comparação feita por Bauman (2004) que atribui aos
relacionamentos anteriores à Internet “solidez” e “profundidade” enquanto que os atuais
seriam frágeis e superficiais. Da mesma forma, ela questiona os relacionamentos reais
como sendo necessariamente “fortes” e os virtuais como sendo necessariamente
“fracos”.
O questionamento é semelhante àquele feito acima por Wellman e Boase (2004):
se está havendo uma fragilidade nos relacionamentos atuais isso não estava
acontecendo antes da Internet? e até que ponto, na nossa modernidade tardia, os
relacionamentos reais eram realmente fortes?
Eles vêem a Internet como um instrumento que pode contribuir para a formação
de laços entre as pessoas, em vez de afastá-las. A Internet ultrapassaria as barreiras
geográficas de maneira muito mais dinâmica que a simples postagem de uma carta
54
pelos correios, e por um custo muito menor do que o de uma chamada telefônica
internacional.
Eles não negam que na modernidade tardia os laços humanos estejam mudando
e que fenômenos tais como a dispersão pelo espaço estejam ocorrendo. Anos atrás as
pessoas costumavam manter maior proximidade, transitando e estabelecendo-se nos
arredores daqueles com os quais possuíam laços fortes. Atualmente, isto tem tido
menos importância, sendo que os autores relacionam tal mudança aos meios de
transporte de massa e aos meios de comunicação de massa, os quais já existiam antes
da Internet. Eles escrevem: Well before the advent of the Internet, a largue portion of
many people’s personal relationships were geograpfically dispersed, relying on a
mixture of telephone and intermittent face-to-face contact”
18
(BOASE e WELLMAN,
2004, p. 4).
E Rheingold (1996), de forma semelhante, defende o ciberespaço como um lugar
favorável à formação de laços humanos, assim como a sua manutenção, no caso
daqueles que já possuem laços entre si pelo fato de já se conhecerem fora do ambiente
virtual. Segundo o autor, o ciberespaço constitui “o espaço conceptual onde se
manifestam palavras, relações humanas, dados, riqueza e poder dos utilizadores da
tecnologia de CMC” (RHEINGOLD, 1996, p. 18). Tal como na pesquisa de Hampton e
Wellman (2003), acima citada, na qual constatou-se em Netville um incremento na
sociabilidade entre os vizinhos, ele enfatiza o potencial socializador da rede, chamando
a atenção para a questão da solidariedade.
Narrando diversos exemplos nos quais os indivíduos utilizaram a Internet para
resolver problemas pessoais ou coletivos, ele narra como eles mobilizaram, através da
rede, recursos capazes de apoiá-los em situação difíceis. Segundo o autor: “A
capacidade de partilha de conhecimentos de um grande grupo de pessoas motivadas
para se entreajudarem, cujas disparidades espácio-temporais são pulverizadas pelas
CMC, pode atingir níveis consideráveis” (RHEINGOLD, 1996, p. 76).
Hampton e Wellman (2003) acreditam ainda que o uso freqüente da rede não
está relacionado à solidão ou isolamento social. Para eles, essas novas formas apenas
18
Bem antes do advento da Internet uma grande parte dos relacionamentos pessoais estavam
geograficamente dispersos, havendo uma mistura de contatos por telefone e face-a-face”.
55
aumentam e diversificam as possibilidades de interação social. A CMC não eliminaria o
hábito de usar o telefone para fazer contato nem reduziria os encontros face-a-face.
Para eles, é importante ver a Internet como uma tecnologia que faz parte do dia-dia das
pessoas, em vez de criar a idéia de que se trata de um mundo paralelo que as
consome, estando sempre em oposição às suas “vidas reais”. Eles partem do princípio
de que comunicação gera comunicação.
Tais concepções questionam aqueles que acreditam que a Internet altera
radicalmente as vidas pessoas que a utilizam. Boase e Wellman (2004) apresentam
uma visão alternativa às expectativas daqueles que a vêem enquanto um instrumento
capaz de mudar radicalmente as vidas dos usuários. Após analisar diversos estudos
sobre os impactos da CMC nas relações interpessoais dos usuários, eles chegaram à
seguinte conclusão:
Findings from these studies all indicate that Internet use does not detract from
amounts of contact with people offline. Given the consistency of these findings,
we conclude that people have not radically altered their lives because of the
Internet
19
(BOASE e WELLMAN, 2004, p. 6).
Nicolaci (2002, p. 200) chama atenção para a ocorrência de transformações
subjetivas mais profundas:
[...] Muitos vêem os novos desenvolvimentos tecnológicos como semelhantes a
tantos outros que presenciamos ao longo do século XX. Não crêem, portanto,
que as novas tecnologias venham a ter conseqüências mais radicais do que
aquelas que já fazem parte do nosso dia-a-dia.
Creio haver argumentado exaustivamente que eles estão enganados.
Necessitam de alguma distância que lhes forneça uma visão de conjunto para
poder perceber que, diferentemente do que aconteceu com a Internet, mesmo
as tecnologias de maior penetração no século XX (como o automóvel, o rádio,
a televisão, os aviões, o cinema) não tiveram o poder de criar um espaço de
vida no qual se desenrolam as mais variadas interações e dramas humanos.
Tanto Nicolaci-da-Costa (1998) quanto Boase e Wellman (2004) discordam que a
rede por si mesma traga prejuízos ao usuário ou à convivência. Este posicionamento
19
“Todos os achados destes estudos indicam que o uso da Internet não diminui a quantidade de contatos
entre as pessoas quando estas estão offline. Dada a consistência destes achados nós concluímos que as
pessoas não alteraram radicalmente suas vidas por causa da Internet”.
56
esvazia a idéia de que usuários freqüentes da Internet são pessoas viciadas, que
preferem se isolar no quarto e vivenciar papéis irreais a ter que sair e encarar às
frustrações da realidade.
Os estudos indicam que a tendência daqueles que optam por conhecer
pessoalmente os contatos tendem a integrá-los ao seu grupo de amigos offline caso
tenham sido criados laços afetivos. Segundo Boase e Wellman (2004): “Research has
shown that only a small minority users actually meet new people online. When this does
happen, these online relationships tend to expand to include offline contact”
20
.
Por outro lado, nos casos em que os relacionamentos permanecem online é mais
comum a dispersão das partes. Segundo os autores: While the Internet does create a
new venue through which people may form new relationships, this venue represents
only one aspect of the internet’s role in personal relationships for a majority of this
users”
21
(BOASE e WELLMAN, 2004, p. 9).
A partir de toda esta discussão, portanto, pode-se dizer que dizer que a
influência exercida pela Internet sobre a vida da pessoa dependerá mais do uso que se
fará desta ferramenta do que dela em si. Segundo Nicolaci-da-Costa (1998, p. 235):
Esta é certamente uma nova forma de aprofundar e manter amizades. Mas é
uma forma que integra a realidade virtual, responsável pela sensação de
proximidade apesar da distância, àquilo que é por nós vivido como a realidade
“real”, ou seja, aquela em que sempre vivemos e na qual nos
relacionávamos e ainda provavelmente voltaremos a nos relacionar, com
nossos amigos reais e/ou familiares que agora estão distantes.
20
“Pesquisas têm revelado que apenas uma pequena minoria de usuários de fato atualmente conhecem
novas pessoas online. Quando isso acontece, esses relacionamentos online tendem a se expandir para
incluir o contato offline”.
21
“Enquanto a internet criar um novo espaço por meio do qual as pessoas podem formar novos
relacionamentos, este espaço representa apenas um aspecto do papel da Internet nos relacionamentos
pessoais para a maioria destes usuários” (tradução do autor).
57
E, mais adiante (NICOLACI-DA-COSTA, 1998, p. 215):
A principal lição a ser tirada de tudo isso é a de que, se a nova tecnologia de
telecomunicações pode gerar problemas novos, também pode gerar soluções
novas para problemas antigos. Tudo depende de como nós vamos usá-la. E
isso, por sua vez, depende do quanto de equilíbrio conseguimos manter e do
quanto conseguimos domar nossas primeiras reações à nova tecnologia,
sejam elas de horror ou de enlevo.
3.4. AS COMUNIDADES VIRTUAIS
Uma comunidade no seu sentido tradicional constitui-se de um grupo de pessoas
que compartilham o mesmo espaço e o mesmo tempo, que estão em interação, que
possuem laços comuns entre seus membros. Estes convivem e compartilham
intimidade, sendo o sentimento de familiaridade capaz de ser exclusivista.
Partilha-se o sentimento de pertença ao grupo e o sentimento de que se possui
uma identidade comum, além da necessidade de permanência ao longo do tempo, ou
seja, seus membros encontram na comunidade alguma segurança no sentido de que os
laços ali existentes não se desfarão facilmente. Numa comunidade também costuma
haver um objetivo comum assim como formas particulares de linguagem, muitas vezes
entendida apenas pelos membros dessa comunidade.
A chamada comunidade virtual pode ser contrastada com a noção tradicional de
comunidade primeiramente a partir da própria idéia de virtual. Segundo Lévy (1996),
virtual vem do latim virtualise significa força, potência. Remete a algo que pode ser,
mas ainda não é. Trata-se, portanto, de uma possibilidade.
Ao se contrastar com as comunidades tradicionais, pode-se dizer que estas não
são virtuais porque ocorrem no mesmo espaço e ao mesmo tempo, dispensando a
utilização de recursos tecnológicos como o computador. Elas não são uma
possibilidade, elas são comunidades de fato. A partir desta visão, as comunidades
virtuais teriam a característica de serem comunidades apenas potencialmente.
Acontece, porém, que as pessoas que fazem parte dessas comunidades são pessoas
reais que mantêm relações reais. De acordo com Rheingold (1996), as pessoas contam
58
anedotas, distraem-se, obtém apoio emocional, apaixonam-se, fazem amigos, jogam e
namoram, além de haver também “muita conversa fiada”. Segundo Rheingold (1996, p.
16), estas vivências não se diferem tanto da vivência offline, apesar da distância física:
As pessoas das comunidades virtuais fazem tudo o que as pessoas na vida
real fazem, mas estão desprendidas de seus corpos. Claro que não se pode
nem beijar nem esmurrar o nariz a ninguém, embora muito possa acontecer
dentro desses limites. Milhões de pessoas sentem-se atraídas, mesmo
viciadas, pelas comunidades unidas por computador.
Na definição deste autor, as comunidades virtuais são agregações sociais que
surgem na Internet por um tempo determinado. Nestas agregações ocorrem discussões
públicas a partir de interações que apresentam suficiente emoção e formam teias reais
de relações sociais (RHEINGOLD, 1996). De acordo com Marcelo (2001, p. 92):
Por intermédio destas novas tecnologias, os processos comunicativos
articulam-se e dão visibilidade ao funcionamento das novas formas de
sociabilidade. A exemplo das comunidades tradicionais, nas comunidades
virtuais os indivíduos interagem, com a finalidade de fazerem quase tudo o que
fazem directamente. A única diferença, óbvia, é que a interacção nas
comunidades virtuais se faz, exclusivamente, por mediação do computador.
Comunica-se com aqueles que partilham as mesmas afinidades, os mesmos
gostos, os mesmos interesses, com a única finalidade de interagir com eles.
Segundo Silveira (2004, p. 47):
Eles a usam (a comunidade virtual) para a formação de novas relações de
amizade e amorosas e para se integrarem a tribos” eletrônicas que funcionam
como as turmas ou ‘panelinhas’ da vida real. Essas relações tanto podem
manter-se apenas online como ser um trampolim para relacionamentos “reais”
face a face.
O virtual pode ser entendido, portanto, de forma relativa, pois as comunidades
cuja existência se torna possível através dos recursos da informática são virtuais no
sentido de que são mediadas por esta tecnologia, mas são reais no sentido de que são
constituídas por pessoas reais cujas experiências são tão reais quanto as experiências
daquelas que compartilham o mesmo tempo e o mesmo espaço.
59
Estas comunidades são uma das alternativas para se relacionar no ciberespaço.
A tendência a formar comunidades, tal como as conhecemos hoje, ou seja, tal como se
apresentam nos sites de comunidades, surgiu depois que o uso dos chats tinha se
difundido, assim como os sites de cadastro e os softwares de conversação como o IRC.
Quando as pessoas transitam pelas salas de chats, por exemplo, elas passam o tempo
em conversações, mas nem sempre chegam a formar grupos. As comunidades
incrementaram as relações mediadas pelo computador, formando um novo conceito de
sociabilidade virtual. Segundo Araújo (2005, p. 219):
Com a rede surgiu um instrumento capaz de formar conhecimento colaborativo
e de entrelaçar subjetividades em comunidades, aglutinando pessoas de
diferentes formações culturais, filosóficas e religiosas numa comunicação que
prescinde da presença física para o estabelecimento como grupo.
Segundo Rheingold (1996, p. 44):
Como é que fazemos amigos? Na comunidade tradicional procuramos entre o
círculo de vizinhos, os colegas de profissão e entre os conhecidos de
conhecidos, de modo a encontrarmos quem partilhe os mesmos valores e
interesses. Depois trocamos informação sobre cada um, discutimos os
interesses comuns e por vezes tornamo-nos amigos. Numa comunidade virtual
podemos ir diretamente ao lugar onde os assuntos preferidos são discutidos e
ficar a conhecer alguém que partilhe dos mesmos gostos ou use as palavras
de uma maneira atraente [...]. As hipóteses de fazer amigos são aumentadas
várias ordens de grandeza relativamente aos antigos métodos de encontrar um
grupo de referência.
Elas em geral agrupam pessoas que compartilham interesses comuns que
norteiam a decisão de se afiliar a uma rede (WELLMAN e GULIA, 1999), e servem para
troca de experiências, discussão de temas ou simplesmente para o envio e recebimento
de mensagens.
A idéia não é tão recente quanto parece. Como dito acima, atualmente existem
diversos sites de relacionamentos que oferecem a criação de comunidades, mas estas
são de certa forma uma versão moderna do que já existia antes. Os fóruns de
discussão (newsgroups), logo no início da difusão da rede, acabavam formando
comunidades, aproximando pessoas que passavam a acessá-los com freqüência.
60
Rheingold relata ter se filiado, em 1985, a uma comunidade chamada WELL (Whole
Earth ‘Lectronic Link). Ele escreve (1996, p. 13):
[...] a WELL é um sistema de teleconferência por computador que permite aos
utentes espalhados pelo globo a participação em conversas públicas e a troca
de correspondência privada via correio eletrônico. A princípio pareceu-me fria a
idéia de uma comunidade apenas acessível através de um écran de
computador, mas depressa constatei a emoção que o correio eletrônico e as
teleconferências podem causar, tendo-me, inclusivamente, deixado contagiar.
Interesso-me pelas pessoas que vim a conhecer desse modo, e interesso-me
profundamente pelo futuro do meio que nos permite reunir.
Na experiência de Rheingold (1996) a freqüente troca de mensagens entre as
mesmas pessoas através do mesmo canal fez surgir o sentimento de comunidade, de
pertencimento a um mesmo grupo no qual os membros compartilhavam suas vidas e
forneciam informações acerca de assuntos de interesses pessoais. O entrosamento
chegou a tal ponto que em algumas dessas comunidades eles formaram o hábito de se
encontrar regularmente para confraternizar, sendo que o autor teria participado desse
tipo de reuniões em outros países além dos EUA, como a França e o Japão. Castells
(2006, p. 442-443), ao comentar a experiência de Rheingold, afirma:
[...] ele propôs a idéia de que as comunidades criadas on-line poderiam
transformar-se, como no próprio caso dele, em reuniões sicas, festas
amistosas e apoio material para os membros da comunidade virtual. Em geral
entende-se que comunidade virtual, segundo a argumentação de Rheingold, é
uma rede eletrônica autodefinida de comunicações interativas e organizadas
ao redor de interesses ou fins em comum, embora às vezes a comunicação se
torne a própria meta.
Segundo Marcelo (2001, p. 95):
Existem inúmeros exemplos de comunidades virtuais, cujos membros residem
na mesma cidade o que lhes permite o estabelecimento de relações face a
face, reunindo-se fora da rede, em locais que consagraram como ponto de
encontro.
61
Existem, portanto, vários tipos de formação de comunidades virtuais. Aquelas
nas quais nenhum membro se conhece, aquelas nas quais os membros se conhecem
fora da Internet e resolvem criar uma comunidade (ex. turma da escola) e aquelas nas
quais existem pessoas que se conhecem e pessoas que não se conhecem. A idéia
sofisticou-se após o surgimento do Orkut, em 2004, uma nova plataforma de
sociabilidade, conforme o próximo capítulo.
62
4 O ORKUT E O UOL K
4.1. O ORKUT
O Orkut é uma rede social filiada ao Google, cujo nome foi inspirado no projetista
chefe, o turco Orkut Büyükkokten. Ele se assemelha a um quadro de recados, sendo o
envio e o recebimento destes a base da utilização desse programa, além da
possibilidade de criar depoimentos acerca do dono do perfil. A comunicação é, portanto,
assincrônica, o que se assemelha ao email
22
.
Os usuários montam perfis que incluem dados pessoais e álbum de fotos, além
de vídeos de sua preferência, uma lista de amigos e uma lista de comunidades (grupos
de amigos que compartilham interesses semelhantes). Os recados estão sempre
visíveis, acessíveis a todos os que acessarem a página do usuário, mas este pode
apagá-los, seja os recebidos seja os enviados.
O Orkut teve no Brasil mais popularidade do que no seu próprio país de origem,
os EUA. As estatísticas revelam que os usuários somam apenas 11,12%, enquanto
que no Brasil, até dezembro de 2006, eles já somavam 64, 91% do total (HARMANN e
SOUZA, 2006). E de acordo com o site “superorkut.com”, dados mais recentes
revelaram que aproximadamente 73,2% dos usuários do sistema são brasileiros, quase
oito milhões e meio de usuários.
22
Vale lembrar que Wellman (2004) atribuiu à comunicação assincrônica um dos motivos principais do
sucesso do email. O receptor não precisa ser chamado para ver as mensagens, ele o faz a hora que lhe
for mais conveniente.
63
Ilustração 4: Perfil no Orkut.
De acordo com Dornelles (2005, p. 164), o Orkut representa um passo
importante para uma nova forma de sociabilidade que redimensiona a questão do
tempo e do espaço dos relacionamentos:
Ele pode ser considerado como um marco no início de um tipo de sociabilidade
desvinculada das dimensões de tempo e de espaço para encontro social. O
resultado é a geração de uma diversidade ampla de subjetividades colocadas
em contato, o que significa a possibilidade de contato entre indivíduos de
diferentes referenciais simbólicos e possuindo diversos estilos de vida.
64
Para o autor, existem três formas de sociabilidade: 1) a mais tradicional, ocorrida
no cotidiano do indivíduo, envolvendo escola, família, trabalho entre outros, 2) aquela
ocorrida por intermédio da Internet, porém de forma sincrônica como nos chats e 3) a
que ocorre de maneira assincrônica, representada por sites de comunidades como o
Orkut.
O que justificaria esta nova forma de sociabilidade desvinculada do tempo e do
espaço seria o fato de que se trata de uma comunidade na qual as pessoas interagem,
trocam experiências, possuem mútuas identificações. No caso dos chats, como foi visto,
não se chega no geral a formar comunidades, e mesmo que o fosse, seria de forma
sincrônica, ou seja, por mais que não estivesse atrelada ao espaço, por ser à distância,
estaria atrelada ao tempo, pois os interlocutores deveriam estar online ao mesmo tempo
para que a comunicação fosse possível. O que torna o Orkut tão atraente, segundo
Nogueira (2004), além da aquisição de novas amizades, é talvez o estreitamento do
convívio, mesmo que de uma maneira virtual, com pessoas já conhecidas.
O hábito de encontrar pessoas através deste site é também relatado por muitos
usuários, tal como afirma um entrevistado em matéria publicada por Nogueira (2004, p.
83) numa revista de grande circulação no Brasil: “O Orkut é quase um buscador como o
Goolge, direcionado para encontrar velhos amigos e parentes. Existem pessoas que
criaram comunidades para agregar familiares pelo mundo”.
O fato de ter sido um marco se refere também ao fato de que, apesar de
existirem canais destinados a este fim, eles eram, segundo Dornelles (2005), dispersos
e intermediavam redes de sociabilidade de forma isolada. De fato, depois do Orkut,
surgiram outros sites semelhantes como o Beltrano e o Gazzag, além de programas
semelhantes pertencentes a sites muito populares no país como a comunidade do
Terra e do UOL.
65
4.1. O UOL
O UOL K, site objeto deste trabalho, segue basicamente o mesmo estilo do
Orkut, mas ao contrário deste, ele faz parte de um site de conteúdos, o UOL. O UOL
(Universo OnLine) é o principal portal de conteúdo e provedor pago de acesso à
Internet do país. É considerado o mais extenso conteúdo em língua portuguesa do
mundo e oferece serviços, entretenimento e notícias, somando mais de 7 milhões de
páginas.
Ilustração 5: Exemplo de página inicial do site Universo OnLine (UOL).
66
Segundo Maiorino (2002) que desenvolveu uma pesquisa de mestrado sobre os
contratos intersubjetivos em chats de sexo no UOL:
O UOL é um dos maiores portais, sendo um ambiente significativo e muito
visado pelo público brasileiro e um modelo de Chat para muitos outros
provedores nacionais, que pioneiro em oferecer novos recursos
multimidiáticos em seus ambientes (MAIORINO, 2002, p. 10).
Criado em abril de 1996, ele provê acesso em mais de 3.000 localidades
brasileiras e oferece também inúmeros locais de conexão em mais de 14 mil cidades no
exterior. Seu número de assinantes está em torno de 1,5 milhão e estende-se como
portal e provedor na Argentina. Sua popularidade está refletida no fato de que de cada
10 pessoas que acessam a Internet no Brasil, 6 visitam as páginas do UOL.
O site possui extenso conteúdo, o qual inclui: UOL Jornais, UOL Revistas, UOL
Esportes, TV UOL, UOL Biblioteca etc, além do Bate-papo UOL, tido como o principal
ponto de encontro da Internet brasileira, por oferecer 3.000 salas de bate-papo online e
permitir que 150 mil participantes conversem simultaneamente. Os assinantes do UOL
podem abrir suas próprias salas, com capacidade para receber até 50 convidados,
sendo que os não assinantes podem ter acesso às salas até o limite máximo de 30
usuários.
O bate-papo tem programações especiais como quando a conversa gira em
torno de algum convidado como celebridades, artistas etc, tendo sido o pioneiro no
serviço de conversa com vídeo, o “Videopapo”. Ele se insere na proposta do site de
oferecer um espaço para os relacionamentos e substituiu os “Amigos Virtuais”, um
cadastro mais simples, no qual os usuários faziam buscas por perfis desejados e
passavam a ter contato com os donos dos perfis através de seu próprio e-mail,
fornecido ao site. Os resultados das buscas consistiam na confrontação dos dados,
feita automaticamente, a qual selecionava apenas os perfis que possuíam aspectos
semelhantes aos previamente selecionados pelo usuário autor da busca.
67
4.3. O UOL K
O UOL K é a rede de relacionamentos do site Universo OnLine (UOL). Ele foi
criado em 2005 e foi batizado de UOLkut, numa clara alusão ao Orkut, criado no ano
anterior. A idéia era ser um sistema semelhante, porém de origem nacional. Assim
como o Orkut, é dedicado aos relacionamentos, tendo como base a comunicação
assincrônica.
Suas ferramentas oferecem ao usuário a criação de um perfil no estilo página
pessoal, podendo ser utilizado como blog, fotolog e álbum de fotos e possibilitando
acesso a usuários que não sejam cadastrados no site, o que faz com que ele possa ser
usado como página pessoal. Trata-se de uma comunidade virtual cuja política de
privacidade permite, por exemplo, a visualização de alguns membros apenas pelo autor
do perfil, conforme sua conveniência, assim como a publicação dos recados deixados
só é feita após sua autorização.
Ilustração 6: Página de acesso ao UOLK.
68
O UOL K, por sua vez, pode ser encontrado no endereço eletrônico
www.uol.com.br/uolk. Ele é completamente gratuito, bastando para a inscrição que a
pessoa tenha um email válido. Ele oferece a possibilidade de interação com o usuário
através da manipulação de ferramentas, alterando o perfil, decorando-o com cores,
ocultando contatos, divulgando ou não informações entre outros.
Semelhante ao Orkut, o UOL K possui espaços para os amigos e para as
comunidades de amigos. A comunicação se dá por meio de mensagens e recados,
sendo as primeiras reservadas e os segundos públicos, após a possibilidade do dono
do perfil selecionar os recados que poderão ser visualizados pelos visitantes.
Ilustração 7: Exemplo de perfil no UOL K.
69
No perfil, à esquerda, é possível perceber a foto e a lista de opções que incluem,
dentre outros, o álbum de fotos, o perfil e o gerenciamento de recados e depoimentos.
O usuário tem a opção de primeiramente ler os recados e depoimentos recebidos e
exibi-los depois de aprovados. No centro, vê-se a frase pessoal do usuário, o link da
página (utilizado para ler informações básicas sobre o usuário, escrever recados e
enviar mensagens e cartões). Na parte inferior estão os espaços para recebimento de
recados e cartões. À direita, é possível notar os espaços para os amigos e, logo abaixo,
para as comunidades.
Uma característica importante é sua integração com as demais ferramentas do
site, particularmente o bate-papo. Quem tem UOL K pode, por exemplo, ao adentrar
uma das salas do bate-papo, optar por ter sua foto do perfil do UOL K junto ao seu nick
(apelido), sendo que a foto também funciona como um atalho pra sua página,
facilitando a interação e a navegação.
Ilustração 8: Exemplo de foto na sala de bate-papo do UOL.
70
4.4. O UOL XXX
Associado ao UOL K está o UOL XXX que possui a mesma estrutura, com a
diferença de possuir conteúdo erótico com permissão para a publicação de fotos
sensuais, sendo que os amigos do UOL XXX permanecem ocultos no UOL K a fim de
que sejam preservadas as identidades dos mesmos.
Ilustração 9: Página de acesso ao UOL XXX.
71
De acordo com uma propaganda do UOL, o UOL K oferece as seguintes
vantagens: proteção à privacidade, mais fácil de paquerar e ser paquerado, cadastro
fácil e rápido, integra blog, fotoblog e álbum de fotos, encontro de amigos, parentes e
paquera. Entretanto, um dos diferenciais do site é certamente a possibilidade de usar
uma foto junto ao apelido no bate-papo. De acordo com informações do próprio site:
Ao entrar no Bate-papo UOL, o internauta informa seu apelido e decide se
gostaria de aparecer com foto. O processo é simples e rápido, pois aproveita a
imagem que o usuário mantém em sua página pessoal do UOL K. As
vantagens não param por. A foto funciona como atalho para a página
pessoal do internauta no UOL K. Basta um clique e pronto. Quem prefere o
anonimato pode ficar tranqüilo. Basta selecionar a opção sem foto e sua
privacidade estará garantida.
Na sua estrutura é perceptível uma preocupação com a a privacidade do usuário.
Isso se mostra, por exemplo, na possibilidade de publicar os recados depois de lê-
los, assim como na ocultação de contatos do UOL XXX na página pessoal. Segundo o
site:
O UOL K é uma comunidade virtual que oferece proteção à privacidade [...]. No
UOL K, ninguém é assombrado por velhas relações amorosas, de amizade ou
profissionais. O internauta, quando monta seu perfil no UOL K, só mostra o que
quer e a quem quer, pois é possível manter em segredo alguns contatos da
rede de amigos. O relacionamento com uma ex-paixão, por exemplo, pode
ficar visível apenas para os pares e ninguém mais.
Este seria, junto ao uso da foto no bate-papo, um dos seus diferenciais com
relação a outros sites do tipo, ou seja, a preocupação com o a preservação da
identidade através da ocultação de amigos.
72
Ilustração 10: Exemplo de perfil no UOL XXX.
73
5 O OBJETIVO
O objetivo deste trabalho surgiu do desejo de investigar o recente fenômeno das
redes de relacionamentos que têm alcançado cada vez mais popularidade entre os
internautas. Estas redes têm se constituído em espaços de relacionamentos a partir de
uma nova proposta, a terceira forma de sociabilidade (DORNELES, 2005), uma
sociabilidade na qual não é preciso estar em contato direto com o interlocutor e, no
entanto, é possível nutrir o relacionamento através dos recursos oferecidos pela
comunicação assincrônica.
De fato, as formas de sociabilidade têm se modificado no tempo a partir da
influência da tecnologia. não é mais preciso estar face a face com a pessoa para
travar novos contatos ou simplesmente se relacionar com ela. Com o surgimento da
Internet, além de já não ser preciso estar face a face com o interlocutor (pois a
interação pode ocorrer através de um programa de bate-papo), torna-se mesmo
desnecessário que ambos estejam online ao mesmo tempo. É verdade que o email
possibilitava este tipo de interação mas, com o surgimento dos sites de comunidades, a
sociabilidade em rede se expandiu vertiginosamente, dando novas nuances aos
relacionamentos ali ocorridos, como a potencialização da vivência em grupo, a auto-
exposição, a exposição da vida privada, a criação de novos laços entre outros.
Com o intuito de entender melhor como se este fenômeno e quais as suas
implicações para as relações humanas, optou-se pela rede de relacionamentos do
UOL, o UOL K. A escolha do site se baseou no fato deste apresentar um recurso
diferenciado, ou seja, a integração entre a comunicação assincrônica (o próprio UOL K)
e a comunicação sincrônica (as salas de bate-papo), cujo objetivo seria dinamizar as
interações reunindo as duas possibilidades de comunicação.
74
Ao refletir sobre a questão, tornou-se interessante perguntar: que tipos de
experiências os usuários cadastrados no site têm tido? como eles significam tais
experiências?
O objetivo deste trabalho, portanto, foi, por um lado, descrever as
experiências dos usuários que se relacionam através do UOL K e, por outro,
construir um entendimento acerca dos significados que eles atribuem a tais
experiências.
Com este intuito, o pesquisador buscou oferecer aos participantes um espaço
através das entrevistas para que eles expusessem seus pontos de vista, seus relatos
de fatos ocorridos com seus contatos, seus sentimentos, impressões e avaliações
acerca da sua experiência enquanto usuários de um site de comunidades com as
peculiaridades do UOL K.
75
6 O MÉTODO
6.1. CONSIDERAÇÕES SOBRE A PESQUISA QUALITATIVA
A metodologia da pesquisa qualitativa tem como característica marcante a
ênfase na experiência dos entrevistados, nos seus pontos de vista, nas suas formas de
ver e relatar os fatos, o que pareceu muito adequado ao objeto de estudo deste
trabalho. De acordo com Neves (1996, p. 1) a pesquisa qualitativa: “[...] não busca
enumerar ou medir eventos e, geralmente, não emprega instrumental estatístico para
análise de dados. Seu foco de pesquisa é amplo e parte de uma perspectiva
diferenciada da adotada pelos métodos quantitativos”.
Esta metodologia não pretende alcançar resultados capazes de descrever, em
termos de regularidade, certas maneiras de agir, e nem formalizar padrões predizíveis
de comportamento. Em vez disso, ela busca oferecer ao pesquisador instrumentos que
o auxiliem a reunir informações fornecidas pelos participantes a fim de tratá-las e
analisá-las. Com o objetivo de construir um entendimento acerca dos pontos de vista e
experiências relatadas, busca-se refletir acerca das significações que os próprios
entrevistados atribuem a tais experiências.
O pesquisador não opta simplesmente por tecer explicações acerca do material
que conseguiu reunir, ignorando as explicações dadas pelos próprios entrevistados. Em
vez disso, procura entender as formas dos próprios entrevistados entenderem a
questão e, a partir disso, reflete acerca do fenômeno estudado, oferecendo uma
compreensão científica de seu objeto de estudo. Neste sentido, segundo Neves (1996,
p. 1): “[...]. Nas pesquisas qualitativas, é freqüente que o pesquisador procure entender
os fenômenos, segundo a perspectiva dos participantes da situação estudada e, a partir
daí, situe sua interpretação dos fenômenos estudados”.
76
É preciso uma capacidade crítica para se perceber as nuances que se
apresentam, os vários matizes de um mesmo aspecto, assim como as entrelinhas do
que está sendo dito. Não se pode querer, entretanto, que o entrevistado exponha suas
experiências e pontos de vista se não houver um clima de confiança capaz de fazê-lo
se sentir à vontade para se expressar. E este clima deve ser facilitado pelo
pesquisador. Como afirma Geertz (1997, p. 106):
Possuir e desenvolver capacidades normais para estas atividades é,
obviamente, essencial, se temos esperança de conseguir que as pessoas
tolerem nossa intrusão em suas vidas ou de que nos aceitem como seres com
quem vale a pena conversar.
6.2. OS ENTREVISTADOS
Na seleção dos participantes houve dois critérios: ter no mínimo 18 anos e
utilizar o UOL K pelo menos dois meses. Julgou-se que a partir dos 18 o
entrevistado tem maior responsabilidade sobre suas afirmações. A idade também foi
posta como critério devido a questões éticas tais como, por exemplo, a reflexão acerca
da própria intimidade ou a necessidade de tocar em pontos relacionados à sexualidade,
principalmente quando se tratava do UOL XXX que era um dos itens do roteiro mínimo.
O tempo de utilização de no mínimo 2 meses justifica-se pela idéia de que seria um
tempo razoável para que o usuário tivesse algumas experiências no site ou pelo
menos já tivesse formado algumas impressões sobre o ele.
Não se estipulou previamente um número exato de pessoas a entrevistar, pois
em pesquisa qualitativa a amostra não deve ser limitada de antemão, tal como
acontece na pesquisa quantitativa. Em vez disso, deve-se considerar o “ponto de
saturação” o qual consiste no momento em que o pesquisador percebe que a inclusão
de novos entrevistados não contribui mais de forma significativa às respostas já obtidas,
passando a haver uma repetição das mesmas (Bertaux, citado por Seidman, 1998).
Nesta pesquisa foram entrevistados ao todo 23 usuários, sendo 7 durante a
pesquisa-piloto e 16 durante a fase de entrevistas propriamente dita.
77
6.3. A PRESERVAÇÃO DO ANONIMATO
Em pesquisa científica preza-se pela preservação da identidade dos
participantes seja substituindo seus nomes por pseudônimos seja excluindo
informações que, mesmo com pseudônimos, seriam capazes de identificá-los. Nesta
pesquisa necessitou-se apenas substituir os nomes, sendo possível revelar dados
pessoais relacionados à idade, ocupação e estado de origem.
6.4. A APROXIMAÇÃO AOS ENTREVISTADOS
Para poder selecionar os usuários que participariam da pesquisa foi necessária a
criação de uma página no UOL K. Uma vez criada a página, fez-se diversas buscas no
site seja utilizando o seu buscador seja passeando pelos perfis. As buscas resultavam
em convites aos usuários para participar da pesquisa. Os convites consistiam em um
pequeno texto que continha informações gerais e sempre terminavam com o endereço
de email do pesquisador para contato, conforme modelo abaixo:
Aceito o convite e tendo sido adicionado ao MSN do usuário, aguardava-se o
momento de encontrá-lo online para proceder à entrevista. Quando isto acontecia,
Olá, meu nome é Caetano Diniz, eu sou psicólogo e
estou realizando uma pesquisa sobre relacionamentos
humanos na Internet. Trata-se de minha pesquisa de
mestrado em psicologia e meu objetivo é saber como
estão sendo as experiências dos usuários do UOL K no
que se refere a se relacionar através deste site. Caso
você esteja interessado em participar podemos conversar
sobre o assunto através do MSN, o meu é XXXXXXX,
você pode me add, agradeço desde já sua colaboração.
78
inicialmente o pesquisador fornecia mais detalhes e tirava as dúvidas do usuário acerca
da pesquisa.
Após o consentimento do usuário em participar era-lhe solicitado um
consentimento formal, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o qual
era enviado por email ou através do próprio MSN. Este podia ser enviado no início,
durante ou ao término das entrevistas.
O pesquisador sempre solicitava aos usuários que, após ler e preencher o termo,
reenviassem-no, pois um termo preenchido e que tivesse sido originado da própria
caixa de emails da pessoa serviria como comprovação de que ela concordara em
participar da pesquisa.
6.5. A PESQUISA-PILOTO
As primeiras entrevistas serviram como piloto para a elaboração do roteiro
mínimo a ser utilizado posteriormente. No total foram feitas 7 entrevistas-piloto.
Elaborou-se um roteiro para orientá-las o qual foi sendo aperfeiçoado no seu decorrer.
Assim, possibilitou-se testar as perguntas, observando se elas estavam sendo bem
compreendidas pelo usuário, retirar algumas e acrescentar outras conforme se percebia
os aspectos mais recorrentes e importantes a serem tratados. Além destes benefícios,
percebeu-se que o valor da pesquisa-piloto está principalmente no fato de que não é o
pesquisador que decide sozinho o que perguntar, ele parte do próprio campo que
deseja pesquisar e busca informações para elaborar um instrumento que o auxilie a
construir um conhecimento genuíno acerca da sua investigação.
79
6.6. O ROTEIRO-MÍNIMO
O roteiro-mínimo é assim chamado por não pretender ser um instrumento pronto
e acabado, inflexível, que não permita ao entrevistador enfatizar um ou outro ponto,
aprofundar questões, inverter a ordem dos tópicos entre outros.
As perguntas não estão previamente formuladas, o que permite ao entrevistador
reelaborá-las a cada nova entrevista, tornando o clima mais natural. Segundo Nicolaci-
da-Costa, Leitão e Romão-Dias (2004), o roteiro deve conter itens abertos que
funcionem como lembretes para o entrevistador. Para as autoras, estes itens: “[...]
Lembram-no de, durante a entrevista, fazer perguntas sobre os tópicos do roteiro sem
que estas perguntas sejam lidas e, em conseqüência, soem formais e artificiais para os
entrevistados” (NICOLACI-DA-COSTA, FARIA e LEITÃO, 2004, p. 5).
No caso das entrevistas online as perguntas são reescritas a cada entrevista,
devendo-se, porém, tomar-se o cuidado de abordar todos os tópicos do roteiro em cada
uma delas a fim de que não se comprometa a qualidade da análise dos resultados na
qual, conforme se verá adiante, precisa-se comparar as entrevistas entre si. Estando
finalizada a fase das entrevistas-piloto, elaborou-se o seguinte roteiro-mínimo:
ROTEIRO MÍNIMO
1. Dados de identificação:
Nome:
Idade:
Sexo
Estado de origem:
Escolaridade:
Ocupação:
80
TÓPICOS E ITENS
2. Tempo de utilização da Internet e do K
Há quanto tempo acessa a Internet.
Há quanto tempo acessa o UOL K.
Freqüência de acesso à Internet.
Freqüência de acesso ao UOL K.
3. Tomando conhecimento do UOL K
Como ouviu falar do UOL K pela primeira vez.
O que ouviu falar sobre o UOL K.
Expectativas surgidas acerca do serviço.
4. Sobre a decisão de fazer contatos através da Internet e do UOL K
A respeito da opção em buscar pessoas pela Internet.
A respeito da opção pelo UOL K (era essa sua intenção ao entrar no UOLK?).
Utilização de outros programas na Internet (como, IRC, Orkut etc).
Formas de buscar pessoas em outros meios de comunicação de massa (ex.
rádio, chat de voz, revistas etc).
Formas de buscar pessoas sem a utilização da Internet (praças, bares etc).
5. Buscando pessoas no UOL K
Formas pelas quais faz novos contatos nos sites (respondendo aos convites de
outros usuários, utilizando o serviço de busca, buscando pessoas utilizando a
rede de amigos dos contatos presentes em sua página, buscando pessoas
através da participação em comunidades etc).
Critérios de seleção de pessoas ao fazer uma busca no site (sexo, cor, idade,
local de moradia, orientação sexual etc).
Tipos de relacionamentos buscados (amizade, sexo, namoro, casamento etc).
6. Sobre a decisão de ir conhecer os contatos pessoalmente
Opção de ficar apenas no virtual.
Desejo de partir para o contato face a face.
Motivos para se optar pelo face a face.
Motivos de se optar por ficar apenas no virtual.
81
7. Diversos usos do UOL K
Manter contato com pessoas já conhecidas.
Buscar pessoas que há tempos não se vê.
8. A participação em comunidades
Se faz parte de alguma comunidade.
Pesquisar comunidades de seu interesse etc.
Significado de fazer parte de uma comunidade.
9. Fatos marcantes relacionados ao site
Fatos marcantes vivenciados no ambiente do UOL K.
Fatos marcantes vivenciados face a face a partir de contatos iniciados no UOL K.
10. Pontos positivos e pontos negativos de fazer contatos através da
Internet e do UOL K
Comparação com os contatos ocorridos face a face.
Pontos positivos e pontos negativos de se utilizar o ambiente virtual para
conhecer pessoas.
11. Comparando UOL K e o Orkut
Se utiliza o Orkut.
Semelhanças entre UOL K e Orkut.
Diferenças entre UOL K e Orkut.
Que usos faz do Orkut e que usos faz do UOL K (exemplo: no Orkut estão
pessoas que conheço pessoalmente e no UOL K a maioria das pessoas não
conheço pessoalmente).
12. Se faz uso do UOL XXX
13. Combinação de uso do UOL K e outros programas
Adição no UOL K de contatos iniciados no bate-papo do UOL.
Adição no MSN de contatos iniciados no UOL K.
14. Avaliação dos contatos feitos até então
Como avalia os contatos realizados até o momento.
Está satisfeito com a utilização do UOL K.
82
6.7. ENTREVISTAS PELO MSN
Todas as entrevistas foram realizadas pelo MSN. A utilização de programas
deste tipo para fazer entrevistas tem sido cada vez mais comum entre os
pesquisadores, como nos trabalhos de Ramalho (2005), Rodrigues (2006), Silva
(2006b) e Di Luccio e Nicolaci-da-Costa (2007).
Esta ferramenta tem algumas vantagens: possibilita o acesso às pessoas que
moram longe do entrevistador, deixa o entrevistado à vontade no conforto da sua casa
e sem a pressão exercida pelo contato face a face, colabora para a manutenção do
anonimato e facilita o registro das respostas, pois é possível através de recursos do
programa gravar as conversas no computador, o que poupa o entrevistador da
transcrição das mesmas.
As desvantagens consistem na dificuldade em perceber claramente as reações
dos entrevistados, os feedbacks assim são conseguidos basicamente através da ngua
escrita que na Internet sofre várias mudanças como o uso de emoticons, abreviaturas,
termos peculiares entre outros, sendo que o entrevistador, a fim de se aproximar dos
entrevistados e facilitar a interação, também utilizou esta linguagem. De acordo com
Nicolaci-da-Costa, Leitão e Romão Dias (2004, p. 6) as entrevistas online:
[...] devem também levar em conta a familiaridade que o pesquisador e os
participantes têm com o instrumento adotado (ICQ, Messenger, chats, etc.).
Tanto o entrevistado quanto o entrevistador têm que estar à vontade com a
mediação tecnológica escolhida. O entrevistador deve também ter consciência
das especificidades deste tipo de entrevista.
Outra dificuldade é a dispersão, pois é muito comum o entrevistado se distrair
com outras páginas na rede ou com o que estiver se passando no local onde está. A
atenção, assim, não é exclusiva para a pesquisa como poderia ocorrer no contato face
a face, de forma que as respostas podem demorar a chegar e poderá ser necessário
marcar outro(s) dia(s) para continuar a entrevista. Deve-se notar, aliás, que nenhuma
delas foi completada em um único dia, tendo sido necessários em média 3 encontros
para encerrá-las.
83
Percebeu-se que é importantíssima a criação de um vínculo positivo com o
usuário, pois cada vez que isto acontecia ele demonstrava estar mais à vontade com a
situação, passava a escrever mais, a descontrair. Quanto mais confiança ele sentia no
entrevistador mais ele se permitia falar das suas experiências. A empatia, ainda, passa
a ter um valor especial assim como o esforço de não lançar mão de julgamentos de
valores sejam eles quais forem é fundamental para que se estabeleça um clima de
confiança.
6.8. O MÉTODO DE EXPLICITAÇÃO DO DISCURSO SUBJACENTE (MEDS)
A pesquisa foi realizada com base no Método de Explicitação do Discurso
Subjacente, o MEDS, elaborado por Nicolaci-da-Costa (1998; 2004; 2004b; 2007).
Trata-se de um método de pesquisa qualitativa que objetiva tornar claro aspectos dos
discursos dos entrevistados que estão subentendidos. Muitas vezes, durante uma
conversa, eles nos o informações que não são ditas explicitamente, mas podem ser
detectadas através da análise, a qual acaba revelando aspectos importantes para
compreender seus posicionamentos acerca de determinado assunto, fazendo com que
o pesquisador obtenha um entendimento mais completo de sua experiência.
Nesta análise também podem ser discutidos os significados de certos termos ou
expressões usados pelos entrevistados. Estes significados podem contribuir para o
entendimento do discurso. Por exemplo, algum entrevistado poderia escrever; “minhas
amizades na rede são reais”. O termo real seria, então, analisado, levando-se em conta
sua noção do que seja o real num contexto virtual.
O MEDS parte do pressuposto de que o ser humano é um ser construído
socialmente, sendo o discurso uma peça fundamental nesta construção. Ele é
entendido tanto como uma forma de se construir subjetividades em consonância com
os valores do grupo social no qual se vive quanto como uma forma de se revelar estes
valores (NICOLACI-DA-COSTA, 2007). Desta forma, o método se concentra nos
discursos, procurando construir a partir dele um entendimento do objeto de estudo.
84
Originalmente elaborado na experiência clínica, ele tem sido utilizado na
investigação de mudanças psicológicas relacionadas a transformações sociais,
inclusive as de cunho tecnológico, como no caso da Internet (NICOLACI-DA-COSTA,
1998).
Sendo um dos métodos da pesquisa qualitativa, o MEDS tem como objetivo
central compreender as experiências dos entrevistados. Segundo Nicolaci-da-Costa,
Leitão e Romão-Dias (2004, p. 2), ele visa “[...] a identificação, descrição e análise
destas experiências e dos significados a elas atribuídos, de forma livre e espontânea,
pelos participantes da pesquisa.” O método, portanto, se preocupa com os modos de
cada um ver o mundo, entender suas experiências e elaborar explicações acerca delas.
Ele tem em comum com os demais métodos qualitativos a abertura, a
investigação aprofundada em contexto, as amostras pequenas e a flexibilidade de
procedimentos e técnicas, e também é considerado uma espécie de análise do discurso
por trabalhar de maneira explícita com o material discursivo, o que justifica a idéia,
discutida acima, de que se o discurso constrói ele também revela e como tal deve ser
analisado tendo como base um procedimento adequado de análise.
6.9. A DISCUSSÃO
Assim como na fase de entrevistas, a fase de análise seguiu a proposta do
MEDS, a qual está dividida em duas etapas: a interparticipantes e a intraparticipantes.
Na primeira, a fim de obter uma visão panorâmica, foram analisadas as respostas de
cada um dos entrevistados a cada um dos tópicos do roteiro mínimo. Por este motivo foi
necessário que o entrevistador não deixasse de abordar durante as entrevistas todos os
tópicos sob pena de, neste momento, não poder comparar as respostas de cada
entrevistado. A visão panorâmica obtida aqui apontou as tendências centrais, ou
seja, as recorrências, chamando a atenção para a importância das mesmas nos vários
discursos.
Na segunda etapa, as respostas de cada entrevistado foram analisadas
individualmente, obtendo-se uma noção de conjunto cujo objetivo era possibilitar a
percepção de conflitos, contradições, inconsistências não percebidas pelo entrevistado.
85
Uma vez concluída, fez-se uma nova análise interparticipantes a fim de detectar tanto o
dito quanto o não dito. Para isto, este movimento inter-intra-inter foi de grande
importância. De acordo com Nicolaci-da-Costa, Leitão e Romão-Dias (NICOLACI-DA-
COSTA, 2004, p. 8):
Este vai-e-vem (que pode ser repetido quantas vezes for necessário) permite
que o material coletado seja dominado a fundo e torna possível detectar, além
de vários não ditos (pois o que não é verbalizado em uma resposta pode ser
claramente sugerido em outra), os pormenores de sentimentos, conflitos
internos e porquês que a pesquisa se propõe a revelar.
Após o referido tratamento dado às respostas, pôde-se organizar os resultados e
proceder à discussão dos mesmos. Vale ressaltar, por fim, que as afirmações feitas
pelos entrevistados foram mantidas tal como foram escritas no MSN, sem que fossem
alteradas suas expressões, erros ortográficos, indecisões, equívocos entre outros, com
o objetivo de ser o mais fiel possível às informações coletadas.
86
7 OS RESULTADOS
Os itens nos quais estão divididos os resultados seguem a mesma ordem na
qual estão dispostos os tópicos do roteiro mínimo.
7.1. OS ENTREVISTADOS
Foram entrevistados 16 usuários, com faixa etária entre 18 e 53 anos, sendo a
média 36 anos. Foram seis homens e dez mulheres, não havendo nenhuma restrição
com relação ao sexo do entrevistado, de forma que este número de homens e mulheres
se deu aleatoriamente no decorrer da pesquisa. Com relação ao grau de instrução 4
possuíam nível superior e 12 possuíam nível médio. Na tabela abaixo estão
discriminados todos os entrevistados com seu pseudônimo, idade, ocupação, estado de
origem e o tempo de uso do site:
Nome
Idade
Ocupação
Estado de
origem
Tempo de
uso do
UOL K
Ágata
18
agente
administrativa
Acre
2 meses
Amélia
19
estudante
Rio Grande do
Norte
7 meses
Aldo
20
estudante
Ceará
9 meses
87
Alan
23
assistente
administrativo
São Paulo
6 meses
Álvaro
23
analista de
sistemas
Pará
3 anos
Antônio
26
auxiliar
administrativo
Mato Grosso
2 anos
Ana
35
biblioteconomista
Bahia
1 ano
Andreza
38
autônoma
São Paulo
6 meses
Andréa
40
produtora musical
São Paulo
1 ano
Aline
40
técnica em
atividades
jurídicas
Rio de Janeiro
2 anos
Alfredo
41
desempregado
Rio de Janeiro
3 meses
Ângela
49
administradora
São Paulo
2 anos
Amanda
50
auxiliar de
enfermagem
Paraná
1 ano e dez
meses
Adriana
51
costureira
São Paulo
2 meses
Almir
52
telefonista
São Paulo
1 ano
Antônia
53
técnica em
contabilidade
São Paulo
2 meses
88
7.2. TEMPO DE UTILIZAÇÃO DA INTERNET E DO UOL K
Quando perguntados acerca do tempo em que são usuários da Internet as
respostas variaram de 9 meses a 8 anos, sendo 5 horas a média de tempo em que eles
permanecem conectados diariamente, conforme 12 dos 16 entrevistados. Com relação
ao tempo em que os usuários acessam o UOL K, este varia de 2 meses a 3 anos e as
respostas sobre a freqüência são bastante variadas, podendo ir de uma freqüência
quase nula ao acesso diário de até 8 horas, sendo comum o acesso com duração
média de 2 horas por dia em 2 ou 3 dias por semana.
7.3. TOMANDO CONHECIMENTO DO UOL K
Dos 16 entrevistados, 12 tomaram conhecimento da existência do UOL K no
próprio site, seja ao acessar a página principal do UOL, seja ao acessar o bate-papo do
mesmo. Os outros 4 entrevistados relataram terem sido informados através de
terceiros. Suas expectativas estavam relacionadas a encontrar um site de comunidades
nos moldes dos conhecidos por eles. Também esperavam fazer novos contatos e
poder tornar o bate-papo mais interessante ao utilizar a foto nas salas.
7.4. SOBRE A DECISÃO DE FAZER CONTATOS ATRAVÉS DA INTERNET E DO UOL
K
As respostas dos entrevistados apresentaram posições mais otimistas ou menos
otimistas acerca da possibilidade de fazer contatos através da rede e do site. Segundo
Alan (23 anos, agente administrativo), conhecer alguém pela rede é “[...] mais prático e
mais perigoso ao passo que encontramos com facilidade amigos e namoros, não
sabemos na verdade quem esta do outro lado”. Para Aldo (20 anos, estudante): “Kra as
vezes é legal. mais em outras é furada [...] por não saber quem a pessoa é.” Assim
como Alan e Aldo, Alfredo (41 anos, desempregado) tem opinião semelhante: “[...] é um
89
caminho oculto você não sabe o que pode vir a encontrar pois nós não sabemos o que
está do outro lado do computador.”
O não saber quem é o outro, entretanto, pode ser vantajoso para os tímidos.
Segundo Andréa (40 anos, produtora musical):
A: pessoas tímidas têm medo de ficar frente a frente com as pessoas
então a net é bem mais fácil
eu sinto até que as pessoas se expõem mais
Pesquisador: isso seria devido ao anonimato?
A: isso.
É muito mais fácil usar um nome fictício falar um monte e depois desaparecer
sabe uma coisa que acho engraçado no uolk?
P: sim?
A: isso é sigiloso né?
P: sim, é
A: é assim
tem gente que não tem coragem de mostrar o próprio rosto
aí procura umas imagens lindas na net e poe como se fosse a pessoa
aí entram na sala de chat com essas fotos
e ainda tem gente que cria fantasias com essas imagens... outro dia vi um
cara na sala dizendo assim
meu deus marquei com a Malu Mader e quando encontrei a mulher era a
Regina Casé.
A entrevistada entende que a rede acaba servindo de escudo atrás do qual
algumas pessoas se escondem não mostrando quem são. Para Amélia (19 anos,
estudante), o anonimato ofereceria maior facilidade àqueles que não gostariam de ser
identificados ao falar de si. Ao ser perguntada se pensava ser possível conhecer
pessoas através da Internet ela respondeu: “[...] acho q sim, pois tem pessoas muito
sinceras que naum as conhecem justamente para poder desabafar.
Neste sentido Álvaro (23 anos, analista de sistemas) destaca a escrita como um
aspecto que facilita a auto-expressão numa situação em que as pessoas não estão
frente a frente e/ou não se conhecem. Para ele, apoiando-se exclusivamente na escrita
a pessoa “tem coragem de falar sobre seus desejos”.
Este anonimato também facilitaria na hora de forjar uma imagem de si. Para
Andreza (38 anos, autônoma): “[...] na net todos somos perfeitos e lindos... por isso qdo
90
me perguntam costumo dizer q sou baixa, gorda, feia e pobre... perco muitos
admiradores depois disso... RS”. Um fato a isto relacionado é a existência do perfil fake
(falso). O fake possui dados fictícios sobre o usuário, suas imagens e características
não correspondem à realidade. No UOL K este tipo de perfil é muito comum. Usa-se
imagens de paisagens, bocas e olhos desenhados, perfis mutlicoloridos entre outros.
Ilustração 11: Exemplos de imagens fake presentes nos perfis:
Mas aqueles que defendem os perfis fake e justificam sua escolha, como
Ágata (18 anos, agente administrativa): “[...] não quero que qualquer pessoa entre e
olhe tudo sobre mim sem nem ao menos me conhecer [...] Acho que tem muita gente
que faz isso no orkut, não gosto de me expor de maneira nenhuma. Acho muito fútil
colocar fotos e deixar recados para que todos vejam.”
A questão da imagem é um aspecto importante neste tipo de site em geral e no
UOL K em particular, devido à possibilidade de ingressar nas salas de bate-papo com
uma foto. O uso da foto no perfil UOL K tende a ser visto, assim, como algo que pode
tornar a interação no bate-papo mais interessante. Alguns entrevistados, como Andreza
(38 anos, autônoma) e Aline (40 anos, técnica em atividades jurídicas), afirmaram ter
criado o perfil no site unicamente para poder usá-la no bate-papo.
91
Para Álvaro, a foto é mais interessante quando o assunto é sexo:
Quando se procura sexo, utilizando uma imagem as outras
pessoas se interessam mais. Sem a utilização da foto, tem todo
um processo de auto descrição física, de imediato algumas
pessoas aceitam essas descrições e outras n aceitam quando se
usa a foto, a outra pessoa jah tah vendo o q é realmente quem
esta tc com ela nos sites de bate papo (uol) as pessoas exigem
um padrão de beleza
E acrescenta: quando mais se vê com quem está conversando, mas se torna
interessante a vontade de conhecer encontrar”. Algumas vezes estas imagens são
apenas “pedaços”, ou seja, revelam apenas partes do corpo da pessoa, olhos, bocas,
pernas, região genital entre outros. Ao ser perguntado sobre a razão de se usar
“pedaços” do corpo, ele responde: “[...] despertar a curiosidade do resto mas no bate
papo uma grande maioria quer beleza facial se tiver um corpo lindo e um rosto feio n
rola em muitos casos.”
Ainda com relação à decisão de fazer contatos pela Internet, não obstante as
desvantagens do anonimato (não saber quem é a pessoa do outro lado, os perfis fake
entre outros) os que destacam os aspectos positivos, como Ângela (49 anos,
administradora): “É fantástico..... o contato instantâneo com pessoas em lugares
distantes.... diferentes..... coisa que seria totalmente impossível imaginar em encontros
pelas ruas..... lugares.... etc”. Entretanto, no que se refere especificamente ao UOL K, a
entrevistada afirma ter o objetivo de fazer novos contatos: “eu naum faço uso do uolk
pra conhecer pessoas novas... pra mim ele serve pra add pessoas que eu jah
conheço..... mas naum deixa de ser mais uma ferramenta pra que pessoas c
encontrem..... o que no dia a dia seria impossível um contato”.
92
7.5. BUSCANDO PESSOAS NO UOLK
Com relação às formas de fazer contatos através da Internet a totalidade dos
entrevistados afirmou utilizar outros meios além do UOL K. Entre os recursos os mais
citados estão o Orkut (além de outros sites de comunidades como Beltrano, Disponível,
Gazzag, Orkut, Par Perfeito, Yahoo e Terra) e os bate-papos (em suas variadas formas:
bate-papo do UOL, bate-papo de outros sites, ICQ e IRC). Nestes lugares é possível
fazer contatos os quais podem ser adicionados ao MSN a fim de serem mantidos.
Questionados acerca do hábito de fazer buscas por contatos no próprio UOL K, 7
dos 16 entrevistados responderam positivamente. As formas utilizadas para isso são
basicamente as visitas nos perfis de usuários que estão ou não incluídos nas listas de
seus contatos e as buscas eletrônicas, quando se digita nomes nos campos
apropriados e se obtém uma lista de perfis. Com relação a este aspecto, há um dado
interessante: o hábito de “inchar” a página de contatos com os quais raramente ou
nunca se mantém contato. Segundo Aline, alguns usuários têm o hábito de convidar
apenas para “encher” seu perfil de contatos, dando a impressão de popularidade, o que
ela reprova: “acho irritante essa mania de “perfil lotado”. Diga-me, qual a finalidade de
adicionar quem não conhece e continuará sem conhecer? Uma grande bobagem!
Adicionar [...] status de “perfil lotado [...] gente q vive as voltas de um monte de gente,
mas, na verdade não se contenta nem se satisfaz com nada e ninguém”.
Ângela tem opinião semelhante: “Acho q fazem uma busca e tentam q a gente
add.... percebo as vezes que eh soh rpa fazer número no uolk deles... [...] eh o que me
parece. Algumas pessoas preferem ter um número de “amigos” add... eu prefiro
pessoas improtantes rpa mim...”.
Os 9 entrevistados que responderam negativamente afirmaram que seus
contatos em geral são resultados de convites de outros contatos, ou seja, alguém os
convida e eles aceitam. Quando isto acontece é necessário, segundo Ângela, antes de
aceitar o convite dar uma olhada no perfil de quem convidou e constatar se eles
possuem amigos em comum, o que seria uma boa referência da pessoa. Além deste,
haveria outros critérios para a aceitação como a necessidade de perceber sinceridade
no outro ou a ausência de insinuações sexuais no convite.
93
Entre os objetivos de se cadastrar no site estão: exclusivamente amizade,
amizade com possibilidade de envolvimento amoroso e namoro, sendo que 5 dos
entrevistados não conseguiram definir o que buscavam. Com relação ao envolvimento
amoroso, Andreza escreve: “Não busco especificamente isso... mas se um dia eu
encontrasse o hoemem da minha vida por lá... putz... sabe que seria uma boa?? Rs”.
A utilização de outras tecnologias além da Internet para conhecer novas pessoas
não é um hábito entre os entrevistados. Apenas Alan e Álvaro já utilizaram os chats de
voz através do telefone. Nenhum dos outros entrevistados afirmou ter utilizado
alguma vez outros meios como programas de rádio ou revista. com relação a outros
meios que dispensam o uso de alguma tecnologia apenas 6 entrevistados admitiram
ter saído de casa com o objetivo exclusivo de conhecer novas pessoas em lugares
como bares, clubes e boates. Outros consideram que o importante é estar aberto aos
relacionamentos, pois o encontro poderia ocorrer espontaneamente estando nestes
lugares.
7.6. SOBRE A DECISÃO DE IR CONHECER OS CONTATOS PESSOALMENTE
Os contatos online podem ser prazerosos e gratificantes para os usuários.
Mesmo quando não se conhecem face a face sua relação pode ser carregada de
emoções e troca de afeto. Este foi um aspecto que apareceu com bastante freqüência
nos relatos, alcançando maior destaque com relação a outros. Segundo Adriana (51
anos, costureira):
[...] tds que estão em minha pagina foi através de outras pessoas!
não conheço ninguém nem imagino como são! mas a gente vai
gostando das pessoas como se conhecesse a tempo! sentimos o
que elas estão precisando naquele dia que nos passa uma
mensagem... são pessoas carinhosas, não sei se verdadeiras
mais faz um bem danado em nossa vida! Um bom dia as vezes
pode trans formar seu dia.
94
Segundo Alan: “Em dado momento de uma relação virtual você sente a
curiosidade de ver ou sentir a pessoa ao teu lado e o contato da telinha é muito frio”. O
desejo de ficar no virtual pode ser visto como a tentativa de criar um mundo pessoal no
qual os desejos seriam realizados, onde os ideais são vividos sem que se precise
contrapô-los às contradições do cotidiano. De acordo com Andreza: “pra quem gosta de
sonhar é melhor ficar no virtual [...] é onde realiza sonhos..... onde coloca em prática
fantasias que não realiza.”
Mais comum, porém, é a idéia de que a Internet representa a possibilidade de
conhecer pessoas, culturas e lugares diferentes sem sair de casa. Ela representa assim
inúmeras possibilidades e alimenta a curiosidade pelo desconhecido, abrindo espaços
para experiências nunca vividas. Um exemplo é a facilidade que pessoas de diferentes
orientações sexuais, classes econômicas e religiões têm de se aproximarem umas das
outras, quando na vida fora da Internet as chances para que isso acontecessem seriam
bem menores. Ricos e pobres, heterossexuais e homossexuais, cultos e incultos,
jovens e velhos, crentes e ateus, todos têm maior probabilidade de se encontrarem por
este meio. Para Aline: “acho dez a oportunidade de conhecer gente de outras regiões...
culturas... mesmo que virtualmente, por isso gosto de interagir mesmo! Aliás, essa,
para mim, a magia da net! Poxa, usar essa possibilidade incrível de se conhecer gente
para “status de perfil lotado”. Fala sério... RS”.
Aline vai mais fundo e analisa o fato de que estar no virtual é uma forma de
relativizar a presença. Para aqueles que preferem não sair do virtual, mesmo sendo
uma forma de se preservar, acaba sendo, segundo ela, um “estar não estando”, pois
faltaria a comprovação do “real”. Ela sente sempre a necessidade do toque, da pele, do
olhar sem barreiras: “[...] é talvez o virtual seja uma forma de estar não estando o é
preciso “mostrar a cara”, vc como existe perfil fake, criam um personagem”. Ana (35
anos, biblioteconomia) chega a ser mais radical: “Não vejo nada de vantagem no virtual,
jas tive relacionamento assim, presta naum, rs”.
Pelo que se observou, entretanto, há um aspecto importante com relação à
decisão de ter um encontro face a face: a distância geográfica. Na maioria das vezes a
distância inviabiliza o encontro. Para Álvaro: “prefiro ficar no virtual [...] é uma falta de
interesse jah q a grande maioria é de fora do estado.”
95
Outro fator é o tipo de relacionamento. Se for apenas amizade não tem problema
de ficar no virtual, mas se houver um envolvimento amoroso, o encontro é
imprescindível. Esta opinião é compartilhada por diversos entrevistados. O termo real é
em geral tido como sinônimo de face a face e as experiências vividas no ambiente do
site por mais autênticas que sejam recebem o nome de “virtuais” pela ausência de
contato físico. Segundo Andréa (40 anos, produtora musical):
[...] são amigos virtuais que gosto muito mas nunca vão ser iguais
as reais pq valorizo muito o olho no olho, o abraço o sorriso e isso
a gente tem pessoalmente [...] isso enquanto não
pessoalmente será virtual, gosto, converso, brinco, ajudo, choro
junto, mas nunca vai ser igual.
Note-se ainda que no caso se “simples amizade” o haveria problema de ficar
apenas no virtual, mas no caso de envolvimento amoroso, o encontro face a face é
importante, de forma que o namoro virtual não é bem visto.
7.7. DIVERSOS USOS DO UOL K
As experiências dos entrevistados com relação aos usos que fazem do site são
diversas. Enquanto alguns só possuem contatos desconhecidos, ou seja, nunca vistos
face a face, outros possuem contatos originados fora da Internet, contatos estes que
podem ser de amigos da faculdade, como é o caso de Álvaro que foi incentivado a criar
um perfil pelos colegas de turma, ou de membros da família, como é o caso de Alfredo
(41 anos, desempregado) e Adriana que possuem entre seus contatos seus próprios
filhos.
Foram 7 os entrevistados que relataram possuir entre os contatos do UOL K
pessoas conhecidas face a face. Em alguns casos estes contatos já eram conhecidos
antes do UOL K. Apenas 3 afirmaram ter tido contato face a face com pessoas que eles
conheceram no site.
96
Apesar da diversidade das experiências dos usuários observa-se algumas
tendências como a de adicionar pessoas desconhecidas no perfil. As respostas revelam
o hábito de manter online os relacionamentos ali iniciados. Ao contrário do que
acontece com o Orkut, citado por 12 dos 16 entrevistados, os contatos do UOL K
tendem a se constituir de pessoas não conhecidas face a face. Adriana relata ter
cometido “orkuticídio” (deletar o orkut) justamente por se sentir muito exposta com
relação às pessoas conhecidas. Na sua opinião o UOL K contém mais pessoas que não
se conhecem pessoalmente: “[...] muitos parentes tinham sua pagina (do Orkut) tira um
pouco sua privacidade! então resolvi fechar!!” Nas palavras de Andréa: “tenho orkut
mas tem gente que conheço na vida real amigos e familiares...”. Para Amanda (50
anos, auxiliar de enfermagem): “Lá (no Orkut) meu amigo conheço quase todos os
meus contatos mesmo pq já é, amigos e, parentes”.
Verificou-se ainda que os entrevistados não possuem o hábito de buscar no UOL
K pessoas que já são conhecidas fora da rede e que tempos não se vê. Da mesma
forma, não possuem o hábito de buscar no site pessoas com as quais mantém
freqüente contato fora da rede.
7.8. A PARTICIPAÇÃO EM COMUNIDADES
Dos 16 entrevistados, 13 fazem parte de comunidades. Um aspecto importante
na hora de se filiar a uma seria a identificação com o tema. Dentre os citados estão:
literatura, comida, time de futebol, série de tv, livros, signo, música e auto-valorização. A
decisão de participar pode ser vista como uma forma de se fazer conhecer pelos outros
usuários, pois a escolha do tema diria algo a respeito de si.
As ginas pessoais deste tipo de site exibem um perfil que consiste numa rie
de informações acerca do seu dono: nome, idade, sexo, estado de origem, orientação
sexual entre outros, além da possibilidade de expor uma foto a ser visualizada por
quem o acessa. Esta é a principal fonte de informações pessoais (além do álbum de
fotos), mas a participação em comunidades funcionaria como complemento na hora de
saber quem seria o dono da página, pois a escolha do tema estaria relacionada à
necessidade de haver uma identificação na hora de se afiliar. Segundo Ângela: “A: eu
97
acho que sim....através das comunidades....podemos ter uma idéia sobre a pessoa....do
que gosta......a que cosias de identifica.....trabalho....lazer...preferêncas...experiências
de vida....etc.etc”.
Diversos entrevistados relataram que precisam ter algo em comum com a
comunidade. Ao tratar deste tópico, Antônia afirma que se afilia: “...quando recebo
convite e quando vejo alguma coisa que parece comigo”, sendo que o título da
comunidade importa na hora da aceitação.
Um outro aspecto que parece estar relacionado à afiliação a uma comunidade é
a possibilidade de se auto-expressar. Os usuários afirmam que a participação permite
entrar em discussões ou fóruns para expressar opiniões acerca de algum pico
(assunto) apresentado por um de seus membros. Além disso, a participação nas
discussões é vista como uma das formas de interagir com os outros usuários, além do
envio e recebimento de recados e de mensagens.
7.9. FATOS MARCANTES RELACIONADOS AO SITE
Sete entrevistados relataram não ter havido fatos marcantes relacionados ao seu
cadastro. Os que destacaram alguma experiência referem-se a fatos muito diversos
entre si. Por exemplo, Andréa chama atenção para a obtenção de apoio emocional: “[...]
as vezes estou meia pra baixo com algum problema e derrepente acho o uolk e tem
uma mensagem bonita de carinho e que se encaixa perfeitamente com o momento que
estou vivendo.” Segundo a entrevistada, o envio e o recebimento de mensagens fazem
com que as pessoas se sintam bem. Neste sentido, Antônia (53 anos, técnica em
contabilidade) afirma: “gosto de ler as mensagens deixadas [...] ainda mais quando são
palavras maravilhosas [...] recebo uma mais bonita que a outra, são palavras que as
vezes elevam nosso espírito”.
98
Ilustração 12: Exemplo de mensagem enviada através do site.
Antônio (26 anos, auxiliar administrativo) lembra de uma garota que conheceu no
UOL K com quem teve intensas experiências sexuais. Ângela recorda, bem humorada,
uma briga que presenciou na qual duas mulheres se afrontavam por causa de um
homem através de recados agressivos. Ana (35 anos, biblioteconomista) não se
esqueceu de um rapaz que conheceu havia anos apenas no site pelo qual sentia forte
atração e que coincidentemente, num dos dias da nossa entrevista, afirmou ter
finalmente acabado de marcar o esperado encontro. Álvaro lamenta, por sua vez, o
término de seu atual relacionamento devido a uma traição que descobrira: seu ex-
namorado o tinha traído com alguém que conhecera no UOL K, enquanto Amélia (19
anos, estudante) lembra de uma usuária que costumava lhe enviar músicas e textos
que a emocionavam muito.
99
Amanda destaca as amizades virtuais. Ao comentar os “amigos fantasmas”
(contatos que nunca se manifestam, não enviam recados nem respondem os enviados),
escreve:
Olha teve uma vez, que eu quis sair!! Por causa dos amigos
fantasma que querem ficar com sua página cheia e não da
atenção pra ninguém daí coloquei uma frase me despedindo,
teve amigas que me disseram olha por favor não saia, fique nem
se for pra passar de vez em quando precisamos de você aqui!!!
Fui comovida pq ai tive certeza que tenho amigos de verdade que
sente minha falta por isso fiquei.
Sobre as relações afetivas que podem ocorrer no site, Adriana dá um bom
exemplo ao se despedir da pesquisa, quando soube que nossa entrevista tinha
terminado: acredita que até me emocionei!! isso é carência afetiva!!! quando a gente
acostuma com a pessoa é o que acontece no uolk!! a pessoa parece ser seu parente, é
onde vc se apega!!!”
7.10. PONTOS POSITIVOS E PONTOS NEGATIVOS DE FAZER CONTATOS
ATRAVÉS DA INTERNET E DO UOL K
Os entrevistados destacaram pontos positivos e pontos negativos acerca de
conhecer pessoas com relação à rede de maneira geral e ao UOL K de maneira
particular. Dentre os pontos positivos estão a possibilidade de conhecer pessoas novas
devido a grande quantidade de pessoas online que podem estar em diferentes lugares
do mundo. Haveria também uma praticidade na busca de pessoas que não exigiria, por
exemplo, ter que sair de casa, e uma rapidez em fazer contatos. Para Andréa: “o bom
da net é a velocidade vc escreve imediatamente a pessoa L~e, as cartas tinham um
porem demoravam muito as vezes a pessoas envia e até chegar a pessoa as vezes
se arrependia do que tinha escrito”. Na opinião de Ângela: “no virtual.....encontrar
pessoas que jamais teríamos a chance de "conhecer"..pela distância.....nível
100
social....rpeferências.etc...torna-se mais fácil manter esse contato..tb fácil....basta ligar o
pc....”.
A rede possibilitaria conhecer primeiramente a pessoa através do diálogo e das
imagens e prever a ocorrência de uma possível química antes de decidir ir para o face a
face. Esta possibilidade nunca fora tão propícia antes da Internet na qual pode-se ter
contato com imagens de foto, câmeras, ouvir a voz, conversar pela escrita entre outros.
Tudo isto significaria um risco menor na hora de partir para o face a face. Mesmo a
distância, segundo Álvaro, pode ser um ponto positivo, pois “sem vc esta vendo a
pessoa ao vivo, vc n sente vergonha em falar, expressar o que esta sentindo”.
Os pontos negativos referem-se ao risco de se decepcionar na hora do encontro.
Para Amanda o problema está no fato da pessoa não ser aquilo que apresenta”.
Conforme Alfredo: embora as fotos estejam ali pode não ser a pessoa que ali se
identifica”. Segundo Antônio: “pela net vc pode ser qm vc quiser e omitir muita coisa”.
Outro ponto é a distância. Quatro entrevistados ressaltaram o fato de que é
importante o “olho no olho”, ele tornaria o encontro mais autêntico. Segundo Amanda
(50 anos, auxiliar de enfermagem): “[...] Pq face a face pra ver olhando dentro dos
olhos da pessoa pq dá pra identificar se está falando a verdade ou não!!”
A rede facilitaria também a traição, pois há um grande número de pessoas
conectadas com as quais poderia haver um envolvimento amoroso, sem falar que
manter conversas eróticas online para algumas pessoas não deixa de ser uma traição
que o sexo virtual, se não é o sexo em que os corpos se tocam, pode ser uma
simulação de tudo que possa acontecer no corpo a corpo. Ângela, que busca um
relacionamento amoroso, refere-se a este risco:
naum.....rs..uma pessoa da net....será sempre um viciado na
net...ae mra o perigo numa relação....rs [...] veja a quantidade
de pessoas....homens e mulheres que acessam a net durante o
dia d seu local de trabalho casados..casadas....que passam a
maior parte do dia em chats.... isso naum eh legal...por isso
eudisse...naum eh confiável..rs [...] o fato da net facilitar contato
entre as pessoas.....tb nos traz a insegurança, claro que
sim.....haja visto a quantidade de pessoas
casadas...."cançando"...rsrs caçando, nao precisa mais pular a
cerca, pelo menos não naquela hora e sim no dia seguinte... eh a
101
facilidade a disponibilidade que acaba atrapalhando.rsrs [...] pois
eh.hj naum c pula mais a cerca..só liga pc....rs.
No que se refere ao UOL K mais especificamente, destaca-se como positiva a
possibilidade de usar a foto no bate-papo do UOL. Este é um aspecto central
encontrado em muitas respostas. Andreza chega a afirmar: “[...] fiz esse uolk apenas
para poder colocar as fotos no uol... não entro lá faz tempo”. O usuário, ao acessar sua
página no UOL K, tem a opção de, a partir dela, adentrar as salas de bate-papo do
UOL. No momento de adentrar uma sala, ele pode escolher fazê-lo tendo seu apelido
(nick) acompanhado de sua foto que está presente em seu perfil do UOL K. Esta foto
funciona, ainda, como um link para o acesso ao mesmo de forma que qualquer membro
da sala de bate-papo, ao clicar sobre a foto, pode ter acesso à página do usuário.
Este fato é encarado como um atrativo pelos entrevistados e em alguns casos é
a justificativa para resolver fazer um cadastro no site. Ângela chega a usar a expressão
“kit UOL”, pois evita que a pessoa ainda tenha que fazer uma descrição de si mesma na
hora do bate-papo; basta o interlocutor clicar na foto e se abre a página com seus
dados. Ela afirma: “[...] soh fiz (o cadastro) porque facilita tc nas salas....evita da gente
ficar respondendo muitas perguntas.....tipo .kitUOL...rs”.
uma estreita relação entre o UOL K e o bate-papo do site. Esta relação pode
ser de várias formas. Pode-se clicar na foto do perfil e ir direto para a sala de bate-
papo, pode-se clicar na foto do bate-papo e ir direto para o perfil, pode-se formar
grupos de bate-papo que também sejam cadastrados no UOL K, e daí por diante. Esta
relação agrada principalmente aquelas pessoas que costumam freqüentar
assiduamente as salas. Este costume, entretanto, na opinião de Aline, pode ser
excludente. Na sua opinião, a proximidade de algumas pessoas que formam grupos de
conversação no bate-papo acaba excluindo outras pessoas que não fazem parte deste
grupo: “[...] o uolK acho q fica muito limitado a quem usa o chat da UOL e como perdi a
paciência com sala de bate papo...não consegui interagir limoitado ao bate-papo? de
que forma? tenho a imprensão q a rede de amigos é a mesma das salas são amigos
quem frequenta as salas”.
102
7.11. COMPARANDO O UOL K E O ORKUT
Devido à grande semelhança entre o Orkut e o UOL K e pelo fato de o UOL K ter
apresentado a proposta de ser a versão brasileira e inovadora do Orkut, torna-se
inevitável a comparação entre os dois sites. Ao compará-los percebe-se uma certa
ênfase em aspectos técnicos os quais ora revelam vantagens para o UOL K ora
revelam vantagens para o Orkut. Este é considerado graficamente mais atraente, seu
visual é mais apreciado. Há a opção de escrever, por exemplo, com letras coloridas, de
acrescentar vídeos nos recados, de optar por enviar cartões de outros sites para os
amigos. O UOL K apresentaria alguns obstáculos como o envio de recados que só é
possível após digitar letras e números em campos para confirmação. Por outro lado, ele
ofereceria maior facilidade para adicionar fotos além de avisar por meio de e-mail
quando uma comunidade recebe um novo membro.
Outro diferencial seria uma certa ênfase na sexualidade no UOL K, ou melhor,
uma maior tolerância com relação à expressão do desejo sexual, representada pela
existência do UOL XXX. No Orkut, a questão sexual existe, mas restrições impostas
pelo site, como a proibição de postar fotos eróticas, ainda que muitos usuários burlem
esta norma. Para Álvaro: “[...] mas uma diferença bem grande entre os dois, é que hoje
no orkut n se pode ter fotos picantes pq eles tiram do ar, mas no geral vc conhece
outras pessoas, conversa namora [...]”.
Esta ênfase na sexualidade veio também em forma de queixa, particularmente
por parte das mulheres. Segundo elas, constantes investidas por parte dos homens,
o que chega a ser incômodo. Nas palavras de Adriana:
[...] net e uol xxx eu acho que devia ser proibido, essas pessoas
se mostrando o tempo inteiro. Tem pessoas que não põe foto e
coloca a foto de uma pimenta, eu muito curiosa cliquei em cima da
foto, quase cai de costas. não pensei que fosse o que vi!!! Rsrsr
rsrsrsrrscuriosa né!!! [...] no orkut rola recadinhos e mensagens,
nada de putaria como no msn e tb no uolk amigos e familiares,
pagina feita pra família mesmo!!! comecei a achar as putarias
agora no uolk.
103
Uma outra diferença está na quantidade de perfis fake. Parece que no UOL K
muito mais deste tipo de perfil do que no Orkut. Esta característica retiraria um pouco
da veracidade das páginas, pois imagens e textos que não correspondem ao usuário
podem denotar um desejo de querer se esconder, de não querer estabelecer relações
autênticas. Segundo Ana: “[...] acho estranho, sem vida, naso é como o orkut e as
pessoas parecem q não existem [...] parece q. muitos perfis são criados.”
Não obstante estas e outras diferenças de um modo geral os dois sites são muito
parecidos no sentido de que têm o mesmo modelo de comunidades. Possuem
ferramentas destinadas às mesmas funções de receber e enviar recados e mensagens,
expor imagens, Nas palavras de Ágata: “tem o mesmo serviço: perfil, álbum de fotos,
comunidades”.
7.12. SE FAZ USO DO UOL XXX
Questionados acerca do uso do UOL XXX, 14 dos 16 entrevistados responderam
que não o fazem. As mulheres, particularmente, registraram seu desagrado devido às
freqüentes investidas sexuais dos homens e criticaram o UOL XXX por seu caráter
explicitamente sexual. Segundo elas não eram estes seus objetivos ao fazer contatos.
De maneira geral, o UOL XXX não parece ser uma preferência dos entrevistados,
dando a impressão de que a questão sexual está em segundo plano. Entre os homens
percebe-se uma certa indiferença por esta parte do site enquanto entre as mulheres
percebe-se uma repulsa. Um exemplo da liberalidade com relação ao tema é a
afirmação de Aldo que conheceu o UOL K através de um primo: “eu tinha dito a ele (ao
primo) q iria colocar fotos pelado no orkut ai ele disse q não podia mas no uolk podia ai
eu fiz um pra mim”.
104
7.13. COMBINAÇÃO DE USO DO UOL K E OUTROS PROGRAMAS
A adição no UOL K de contatos iniciados no bate-papo foi afirmada por 7 dos 16
entrevistados. Três deles afirmaram não freqüentar as salas de bate-papo. Esta alta
freqüência confirma a íntima relação entre o site e as salas de bate-papo. Onze
entrevistados afirmaram ter adicionado no MSN contatos iniciados no UOL K. Ao
fazer isso, seus objetivos eram prolongar o contato através da interação em tempo real.
No geral não parece haver resistências quanto a isso, mas alguns são mais criteriosos.
Seria preciso conhecer as pessoas para poder adicioná-las no MSN.
Para Andréa a interação em tempo real oferecida pelo bate-papo é mais
favorável à obtenção deste conhecimento, e o UOL K, por ser um site de
relacionamentos baseado na comunicação assincrônica, não oferece isso: “[...] pq só
adiciono no msn pessoas que realmente merecem minha confiança e no uolk não
converso com as pessoas não sei quem são na sala é mais fácil saber quem é quem”.
Nesta afirmação de Andréa fica claro a necessidade que alguns usuários têm de manter
um contato dinâmico com o interlocutor e a troca instantânea de mensagens permitida
pelas salas e pelo MSN é bem-vinda.
7.14. AVALIAÇÃO DOS CONTATOS FEITOS ATÉ ENTÃO
Dos entrevistados, 9 apresentaram em suas respostas conteúdos que
demonstram uma avaliação positiva dos contatos realizados. Os termos mais
freqüentes foram: “bom”, “muito bom”, “legale “muito legal”. Alan e Álvaro ressentem-
se do fato de boa parte de seus contatos morarem em outros estados. Adriana chama
atenção para as trocas afetivas que ocorrem através do envio e recebimento de
recados, cartões e mensagens e que fazem bem à pessoa. Antônio ressalta que apesar
de haver ótimos contatos no UOL K o fato de serem virtuais os torna insatisfatórios:
“Antônio: creio q tem q ter aquele afeto, calor humano... rola aquela química... coisas do
tipo”.
105
Observa-se que enquanto alguns desenvolvem uma intensa atividade no site,
freqüentando diariamente e mantendo intensas relações com seus contatos,
caracterizadas pela troca afetiva e apoio mútuo, outros fazem apenas contatos
superficiais dando a impressão de “estar por estar” no site.
Dois entrevistados não avaliaram positivamente os contatos. Usaram expressões
como “eu não gostei”, sem valor”, e atribuíram isto aos perfis fake, à superficialidade
dos contatos e à falta de relações mais estreitas com seus contatos. Alan destaca a
dificuldade em passar para o face a face: “[os contatos] são ruins de se ter algo fora de
[...] afinal eu quero conhecer meus amigos mas ao passo que eu vou muitos andam
na contra-mão aos meus pensamentos [...] tipo relacionamento virtual e eu sou mais
que isso entende?”.
Um ponto que chamou a atenção neste quesito foi a abstinência de 5
entrevistados por não se sentirem em condições para avaliar suas experiências, o que
sugere o terem interação suficiente com seus contatos. Esta falta de conhecimento
lembra a crítica de alguns entrevistados acerca de usuários que estão no site mas não
interagem, dando a impressão de que é suficiente estar cadastrado; talvez
simplesmente para poder usar a foto no bate-papo, talvez por apenas terem respondido
à publicidade do UOL, talvez por manterem perfis fake, talvez por sentirem satisfação
com o “status de perfil lotado” ou por qualquer outro motivo.
À pergunta mais direta: “Você se sente satisfeito com os contatos feitos até
então?” dez entrevistados responderam positivamente, cinco responderam
negativamente e um se absteve.
106
8 A
DISCUSSÃO
8.1. FAZENDO CONTATOS PELA INTERNET
A experiência de se cadastrar em um site de relacionamentos guarda muitas
nuances. De maneira geral são contatos que se estabelecem à distância, que se
baseiam na língua escrita, que são assincrônicos, que exigem a exposição pública. De
uma maneira mais específica são experiências individuais e como tal únicas,
irrepetíveis, sendo que os olhares sobre o mesmo objeto podem divergir.
No UOL K, assim como em outros sites de relacionamento, a comunicação tem
como base a escrita e é através dela que os usuários se dão a conhecer e conhecem o
outro, podendo ainda contar com o uso de imagens para transmitir informações acerca
de si. De acordo com os relatos obtidos, é possível perceber que o site tem duas
funções básicas para seus usuários: conhecer pessoas novas e se comunicar com
pessoas contactadas fora do site.
Os entrevistados costumam “conhecer” novas pessoas, travar novos contatos
baseando-se apenas nas trocas ocorridas no ambiente virtual através de recados,
mensagens, cartões entre outros. Outros o utilizam para manter contatos iniciados de
outra forma, sendo freqüentemente originados no bate-papo do próprio UOL, apesar de
terem havido relatos de pessoas que incluíram em sua página amigos da escola e
parentes.
107
8.2. CONHECENDO NOVAS PESSOAS DEVIDO À AUTO-EXPOSIÇÃO
Apesar da possibilidade de travar relações com pessoas conhecidas, observa-
se uma tendência maior em conhecer novas pessoas. Este tipo de site pode ser
comparado a um quadro de recados (DORNELES, 2005). Quem se cadastra precisa
estar disposto a se expor, a divulgar informações pessoais e a publicar de uma certa
forma seus relacionamentos. Através do envio e recebimento de recados, mensagens,
cartões entre outros, através da lista de amigos e da lista de comunidades, através
da(s) foto(s), o usuário sabe que pode estar sendo observado por milhões de pessoas.
Esta é uma das características deste tipo de site, a invasão do público pelo
privado, contrariamente ao panóptico de Bentham no qual o privado era invadido pelo
público. Bauman (1999; 2001) analisa a questão a partir de um olhar sociológico. Para
ele (BAUMAN, 2001, p. 49) trata-se de um fenômeno da pós-modernidade: “Não é mais
verdade que o ‘público’ tente colonizar o ‘privado’. O que se é o contrário: é o
privado que coloniza o espaço público [...] o espaço público é onde se faz a confissão
dos segredos e intimidades privadas.”
Os recados são expostos de forma que qualquer um pode olhar. A comunicação
se aos olhos dos outros. Não é apropriada para a privacidade e o interessante
parece estar justamente em ver os outros se comunicando, assim como em ser visto.
Essa auto-exposição, essa revelação de dados pessoais, de certos aspectos da
intimidade, de relacionamentos mais ou menos intensos, inevitavelmente, acaba
levando, no UOL K, a novos contatos.
Conhecer novas pessoas tem sido uma das características da Internet enquanto
um meio de comunicação de massa. Ela tem proporcionado um espaço para aumentar
o grupo de pessoas com as quais o usuário pode se relacionar (FRANCE, 2002;
SARAIVA e CABRAL, 2001). Seguidamente, emails, chats e sites de comunidades têm
diversificado as formas de fazer contatos pela rede, cada um a sua maneira. Os emails
costumam aproximar pessoas conhecidas, os chats costumam favorecer novos
contatos e os sites de comunidades, além de favorecer novos contatos, costumam
mantê-los pois a relação não se extingue ao desligar o computador: caso seja da
vontade dos usuários, ela pode se manter através da página pessoal,
108
assincronicamente, bastando para isso enviar o endereço para o interlocutor e aguardar
até a próxima conexão.
Novos contatos iniciados pela rede têm a característica de inverter as coisas.
Tradicionalmente o contato face a face precede o conhecimento da personalidade ou
do “jeito” da pessoa. Na rede, como escreveu uma entrevistada, “a química é sempre
pelo papo” (Aline, 40 anos, técnica em atividades judiciárias).
Deve-se notar que o objetivo de fazer novos contatos pode não ser explícito, mas
está subentendido na própria decisão de se cadastrar no site. Ter uma página neste
ambiente expõe a pessoa a diversos olhares, pois a rede é um lugar de trânsito intenso.
Por mais que não se admita expressamente que se tenha o objetivo de fazer contatos
novos isto fica subentendido devido à própria natureza do site. Como afirmou Ângela
(49 anos, administradora): “[...] eu disse naum faço uso do uolk pra conhecer pessoas
novas... pra mim ele serve pra add pessoas que eu jah conheço..... mas naum deixa de
ser mais uma ferramenta pra que pessoas c encontrem...”.
Um aspecto que indica a tendência para se travar novos contatos no UOL K é o
fato de que a maioria dos contatos lá realizados são de pessoas não conhecidas
pessoalmente. Diferentemente do que ocorre no Orkut, no qual é muito freqüente
adicionar parentes e amigos. No UOL K, ao contrário, foi muito comum a frase: “não
conheço ninguém lá”, e , ao se comparar com o Orkut: “lá (no Orkut) estão pessoas que
conheço, parentes e amigos”.
Outro aspecto a ser considerado é a possibilidade de integrar o perfil às salas de
bate-papo. Esta conexão provavelmente favoreceria novos encontros pelo fato das
salas serem espaços de trânsito contínuo de internautas.
8.3. A ÊNFASE NA LÍNGUA ESCRITA
A ngua escrita assume um papel central na interação. Expressões
ambivalentes, emoticons, gifs (animações) abreviaturas, termos próprios das conversas
online entre outros, vão influenciar os rumos da interação (MARCELO, 2001;
NICOLACI-DA-COSTA, 1998; ZACHARIAS, 2005; SILVA, 2005). Os entrevistados
109
tendem a ver a escrita como uma facilitadora das relações pela rede. Ela deixaria as
pessoas mais à vontade para falar de si e para se expor.
Neste falar de si, ou melhor, escrever sobre si, está incluído um processo de
subjetivação que se baseia na construção pessoal através da reflexão, da organização
de idéias acerca do que se é, de gostos e preferências, de visões do mundo, de ser ou
não ser. Neste exercício, a escrita para o outro acaba sendo também uma escrita para
si mesmo, nem tanto para se conhecer ou para se compreender, mas para se construir.
Na comunicação assincrônica, que é o caso do UOL K, a pessoa tem ainda mais
tempo do que na sincrônica ou no contato face a face para selecionar o que transmitir,
e isto é visto positivamente pelos entrevistados (WALTHER, 1996), além de simplificar e
agilizar a comunicação: “[...] pra ganhar tempo e tb preguiça, eu por exemplo teclo
devagar e muito mal, abreviar ajuda” (Andréa, 40 anos, produtora musical).
8.4. O ANONIMATO
A ênfase na escrita, por outro lado, pode favorecer o anonimato. A pessoa pode
forjar uma imagem de si que considere mais atraente ao interlocutor (WALTHER, 1996;
MARTINS, 2002), o que tende a não ser visto “com bons olhos” pelos usuários.
Entretanto, observe-se que este seria um risco não da escrita em si, mas da
comunicação à distância que favorece o anonimato.
bastante preocupação com o anonimato, sendo interessante notar que
nenhum dos entrevistados assumiu utilizá-lo para forjar uma imagem irreal de si, de
forma que esta preocupação está sempre voltada para o outro. Chama atenção o receio
de se decepcionar, o que leva à pergunta: se, conforme os resultados, não há o
costume de partir para o face a face seja por morarem longe seja por não haver
intenção de conhecer pessoalmente, por que então este cuidado?
Trata-se de uma contradição que se observa nas entrelinhas que nenhum dos
entrevistados tocou no assunto. E esta contradição aponta para a visão de que a “vida
onlinenão está desprendida da “vida offline”. A internet não deve ser vista como um
mundo à parte (WELLMAN, 2004).
110
Os entrevistados vivem suas relações na rede como sendo reais; eles não
consideram que o fato de estarem utilizando a tecnologia informática para se comunicar
significa que seus contatos serão fictícios; assim, mesmo online, eles se preocupam
com a decepção, pois a decepção que o anonimato ajudaria a causar se fossem
encontrar pessoalmente, também poderia ocorrer no próprio ambiente da rede, e seria
real como seus relacionamentos na rede são reais. Como afirmou Amanda (50 anos,
auxiliar de enfermagem): “[...] é que quando a pessoa não é aquilo que aparenta; fica
todo enrolado ai se percebe automaticamente!”.
8.5. CONCEPÇÕES DE REAL E DE VIRTUAL
Ainda que eles considerem suas experiências profundamente reais, costumam
usar os termos “virtual” e “real” para designar os mundos online e offline. Assim, é
chamado de virtual o que acontece na rede e é chamado de real o que acontece fora
dela. Estas expressões são usadas mesmo que não se perceba o virtual como ficção e
sim como uma experiência verídica. O estatuto de real, porém, é atribuído ao toque, ao
olho no olho, ou seja, ao offline.
Neste sentido, é interessante a distinção feita entre amizade e namoro com
relação ao virtual. A amizade é vista como algo perfeitamente possível, e algumas são
vividas intensamente, mas o namoro seria inviável por este meio. O contato físico
justificaria essa posição. Os usuários acabam se reportando ao mundo offline devido ao
fato de que, nele, o namoro inclui o contato físico de uma maneira muito mais intensa
do que a amizade. Segundo Andréa: ”Namoro nunca tive, mas grandes e eternas
amizades”.
111
8.6. “ESTAR ONLINE”: A COMUNICAÇÃO COMO META
As experiências dos usuários giram em torno do estar online”, entendido
enquanto a disposição de possuir um perfil cadastrado e de, mesmo não estando
conectado, estar disponível para o contato. A partir dos sites de comunidades, a noção
de estar online pôde ser relativizada pois, mesmo não estando conectada, a pessoa está
no ambiente virtual, ela tem um lugar lá, a sua página pessoal.
No tempo em que o email era a principal forma de comunicação assincrônica isto
não acontecia, a pessoa, ao encerrar a conexão, ausentava-se da rede, com os chats
acontecia o mesmo, mas com o advento deste tipo de site a pessoa, através de sua
página pessoal, põe-se à disposição e dá-se a conhecer sem estar conectada. De uma
certa forma, portanto, ela continua se relacionando. E quando acessa a sua página e
envia seus recados, ela está se relacionando com as pessoas ainda que estas não
estejam conectadas naquele momento.
Estar online pode ser vivido radicalmente por algumas pessoas. Há, por
exemplo, pessoas que estão conectadas 24 horas por dia ao MSN, ainda que não
estejam na frente do computador todo esse tempo. Outras interconectam MSN e celular
para receber mensagens.
Parece ser preciso estar em contato. Comunicar-se é preciso. Ainda que as
trocas ocorridas nestes sites estejam em geral baseadas nas identificações mútuas, nos
interesses comuns, na formação de laços afetivos, a comunicação pode se tornar a
própria meta”, conforme Castells (2006).
Rheingold (1996), da mesma forma, afirma que na vida online as pessoas
utilizam o computador como uma forma de estar em contato, de se comunicar. Para ele,
algumas pessoas não objetivam fazer negócios ou estudar e sim estar em contato umas
com as outras, dedicando algumas horas do seu dia e, em alguns casos, muitas horas,
para se comunicar com quem está longe ou mesmo perto e assim saber de suas vidas,
compartilhar suas experiências, pedir conselhos, solicitar ajuda para resolver problemas,
entre outros.
112
Tem-se, muitas vezes, a impressão de que não nenhuma necessidade de
enviar recados, mas envia-se pela simples necessidade de se comunicar num verdadeiro
exercício de sociabilidade.
No UOL K aqueles usuários que possuem em suas páginas várias centenas
de amigos, boa parte dos quais eles jamais contactam. É o que Aline, num tom
aborrecido, chama de status de perfil lotado”. Ter o perfil lotado de amigos pode dar a
impressão de que o dono é uma pessoa popular, querida, requisitada, e por mais que não
seja essa sua realidade, é esta a imagem que a pessoa que acessar o perfil terá.
Segundo a entrevistada, isto causa a sensação de que o usuário “está não estando”. Esta
expressão é particularmente interessante, pois indica que este tipo de usuário não se
comunica com freqüência, não “dá sinal de vida”, passando a idéia de que o mais
importante é a quantidade de contatos do que a qualidade.
Semelhante a ele é o fake, o qual inventa totalmente uma página (perfil e
imagens), o que já daria a impressão de que não está disposto a se relacionar
abertamente com as pessoas do site. A mentira sugerida pelos perfis fake não é bem-
vinda, pois as experiências online podem ser intensas e genuínas, conforme os
entrevistados.
É possível fazer trocas afetivas significativas, criar laços, dar e receber apoio
emocional. Como no caso de Adriana (51 anos, costureira) que afirma estar apaixonada
por um usuário do UOL K e estar sofrendo com sua indiferença: “[...] eu mesmo estou
apaixonada por uma pessoa que estou conversando a algum tempo [...] mando
mensagens na página dele, mas ele não responde!”.
As experiências afetivas são em geral alimentadas através do envio e
recebimento de recados, mensagens e cartões. Observa-se nestes uma intensa
demonstração de afeto que resulta na “elevação da auto-estima”, no sentimento de bem-
estar e de ser querido. Como escreve Perez (2007, p. 20):
O espaço virtual tem o poder de aproximar pessoas, apesar de se encontrarem
geograficamente distantes. Essa aproximação parece legitimada a partir da
troca de conversas, nas quais os internautas expõem afinidades, trocam
elogios, sonham com o par ideal, fantasiam, intermediam sexo, suspiram ao
pensar na idealização construída e ainda obtém disso uma atividade
considerada prazerosa e de lazer.
113
Parece ser prazeroso estar online. Manter uma convivência com pessoas que
costumam estar longe, como é a tendência observada no UOL K, revela uma disposição
de habitar estes espaços virtuais e vivenciá-los e se relacionar neles com quem é
“conhecido” apenas de uma certa forma.
Segundo Ramalho (2005, p. 84), citando Gonçalves:
[...] os usuários da Internet podem usar o ciberespaço de duas formas. A
primeira delas é a utilização do ciberespaço como um meio de estabelecer
relacionamentos “reais”. Em outras palavras, o objetivo é do usuário é
conhecer alguém na Internet para, posteriormente, ter um encontro face-a-face
com ele. a segunda seria utilizar o ciberespaço como um espaço no qual os
relacionamentos se iniciariam e se manteriam. Neste caso o usuário não teria
nenhum objetivo de tornar tais relacionamentos “reais”.
8.7. CONVIVENDO EM COMUNIDADES
Bauman (2001), analisando a questão das comunidades na atualidade, entende-
as como uma reação ao individualismo do capitalismo selvagem. Ele afirma: “Em termos
sociológicos, o comunitarismo é uma reação esperável à acelerada ‘liquefação’ da vida
moderna” (BAUMAN, 2001, p. 195).
Autores trataram da questão das comunidades nos sites, como Rheingold
(1996); Marcelo (2001) e Silva (2005), e as experiências relatadas pelos entrevistados
confirmam o costume de se afiliar a elas. Os resultados obtidos demonstram esta
tendência em 13 dos 16 entrevistados. Elas são uma forma de se reunir ao redor de um
tema de interesse, de alguma característica comum (WELLMAN e GULIA, 1999).
Conforme Araújo (2005), os membros prescindem da presença física para se estabelecer
como grupo.
Os relatos confirmam também a necessidade de se identificar com o tema da
comunidade, sendo o título um detalhe importante. Ocorre ainda que o usuário se
identifica com a comunidade, filia-se e acaba sendo identificado pelos outros usuários
que acessam seu perfil, pois o pertencimento a um determinado grupo demonstraria algo
da personalidade da pessoa. Mas a oportunidade de dispor de um espaço para se
114
expressar parece ser vista com especial importância. Nas comunidades é possível
expressar opiniões sobre temas propostos pelos membros, os chamados tópicos, criando
uma lista de discussões ou fóruns, a qual alimenta a vida comunitária.
Segundo Dorneles (2005) os sites de comunidades constituem a terceira forma
de sociabilidade, depois da mais tradicional, ocorrida face a face e da que ocorre através
da rede em tempo real. Com o surgimento da Internet a base dos contatos eram os
emails, os quais são uma forma de comunicação assincrônica e particular. Depois vieram
os chats que são uma forma de comunicação sincrônica que pode ser pública ou
particular e, mais recentemente, surgiram os sites de comunidades que são assincrônicos
e públicos. Segundo Dorneles (2005), a novidade destes últimos com relação aos emails,
além de terem um caráter público, é justamente a formação de comunidades.
8.8. A FOTO COMO ELO ENTRE O SINCRÔNICO E O ASSINCRÔNICO
Um dos diferenciais do UOL K é a possibilidade de misturar as comunicações
sincrônica (chat) e assincrônica (do site de relacionamentos). Isto acontece devido à
ligação entre o site e as salas de bate-papo do UOL. Como visto anteriormente, caso o
usuário opte por adentrar as salas de bate-papo com sua foto da página pessoal, esta
foto estará disposta como um link que, uma vez clicado, direciona para sua página,
possibilitando ao seu interlocutor acessar as informações do seu perfil. É o que a
entrevistada Ângela chama de “kit-UOL”.
Segundo se percebeu, o uso da foto é interessante por dinamizar a interação
ocorrida no bate-papo. Ela já é por si uma novidade, pois possibilita ao interlocutor ter
logo uma idéia de como é o outro fisicamente, sem ter que passar para o passo seguinte,
o MSN, para ter acesso a uma imagem da pessoa. Como afirmou Álvaro (23 anos,
analista de sistemas): “[...] sem a utilização da foto, tem todo um processo de auto-
descrição física, de imediato algumas pessoas aceitam essas descrições e outras n
aceitam, quando se usa a foto, a outra pessoa jah tah vendo o q é realmente quem esta
tc com ela”.
115
Com o “kit-UOL” os usuários ficam consultando a página do interlocutor da sala,
verificando seus dados, perfil, imagens etc. Eles podem transitar entre os dois ambientes,
assim como fazer perguntas acerca das informações encontradas na consulta. O acesso
à página facilita também a preservação do novo contato, pois ele pode adicioná-lo ao seu
perfil e esperar que o outro o aceite, caso deseje prolongar o contato iniciado na sala.
Esta possibilidade, inclusive, pode funcionar como mais um atrativo para passar da sala
de bate-papo ao MSN, o que também aumenta a probabilidade de haver um novo contato
futuramente.
8.9. A ÊNFASE NA SEXUALIDADE
De acordo com várias entrevistadas são muito comuns as investidas sexuais por
parte dos homens. Elas em geral relatavam se sentir incomodadas diante de usuários
que demonstravam estar apenas interessados em sexo enquanto elas não estavam.
Tentando entender este aspecto, não é difícil lembrar do UOL XXX, a parte do site
voltada ao erotismo na qual encontra-se um apelo sexual explícito. Contrariamente ao
Orkut, que nos álbuns de fotos possui a opção comunique abuso” referente a este tipo
de conteúdo, nesta parte do UOL K praticamente não restrições quanto ao conteúdo
erótico de textos e imagens, o que o torna um diferencial com relação a outros sites do
tipo.
A pergunta que se faz, portanto, é: estaria o UOL XXX relacionado a estas
freqüentes investidas sexuais relatadas pelas entrevistadas no sentido de que a sua
existência seria uma espécie de estímulo para os homens tratarem mais
freqüentemente do sexo nos contatos?
Seja como for, um aspecto chama a atenção. Ao analisar mais detidamente a
questão percebe-se que as usuárias que destacaram este incômodo são em geral
assíduas freqüentadoras do UOL K. Esta constatação leva a pensar que o incômodo
não é tal ao ponto das usuárias resolverem cometer UOL Kcídio
23
. Mesmo
23
UOL Kcídio é o nome dado ao ato de apagar o próprio UOL K, dando fim às relações de amizade e
paquera. No site, quando algum usuário comete UOL Kcídio, em lugar de seu perfil encontramos o
seguinte conteúdo:
116
incomodadas, elas permanecem freqüentando, podendo-se questionar: ser
freqüentemente cantada seria para elas algo totalmente indesejável? Aque ponto a
situação realmente incomoda? Sustentar esta situação não seria uma forma de se
sentir sexualmente desejada?
Vale lembrar, entretanto, que uma resposta afirmativa a estas perguntas não
significa que as usuárias estejam dispostas a marcar encontros sexuais offline, pois,
conforme já foi discutido, a maioria dos usuários restringe suas interações ao site,
sendo interessante para eles “estar online”. Viver esta situação para elas faria parte
deste “estar”. Mesmo que a passagem para o offline fosse improvável em muitos casos,
haveria uma espécie de gratificação em “sofrer” freqüentes investidas. Ainda que o
discurso explícito aponte para uma reprovação desta atitude masculina, a ão aponta
para uma persistência que parece ignorar tal atitude. Talvez haja outros fatores que
compensem esta situação, como as trocas afetivas, as outras amizades entre outros, o
que as impediria de encerrar suas participações no site, se assim for, isto sugere que a
ênfase na sexualidade seja algo ao mesmo tempo incômodo e suportável.
8.10. A RELATIVIZAÇÃO CONSTANTE DAS EXPERIÊNCIAS
O usuário do UOL K está a todo momento tendo a necessidade de relativizar
alguns aspectos de suas experiências. Nem tudo está delimitado, definido. Estar longe
é ao mesmo tempo estar perto pois a rede permitiu aproximar pessoas dos mais
variados lugares do planeta. Para enviar uma mensagem a alguém o precisa mais
esperar semanas até que ela chegue ao destinatário, um recado pode estar na página
do usuário em apenas alguns segundos. Alguns usuários se referiram à “maravilhosa”
“O dono desta página saiu do UOL K. Você conhece ele? Chame-o de volta agora!
Estamos sentindo muita falta dele. Não só nós, mas todos os amigos, paqueras e fãs.
O UOL Adverte:
Cometer UOL Kcídio é extremamente PREJUDICIAL às relações sociais.
117
possibilidade de entrar em contato com várias culturas, conhecer pessoas diferentes de
realidades diferentes.
Estar online significa estar conectado em tempo real ou simplesmente estar
cadastrado, disponível para visitas e recebimento de comunicações. Estar online,
portanto, significa também estar disponível para o contato através de sua página
pessoal.
O privado se torna público, pois as pessoas estão a todo momento revelando
fatos, sentimentos e pensamentos íntimos os quais são observados por quem quiser.
O real é virtual e o virtual é real. Os usuários tendem a se referir ao real como
sendo o mundo offline, porém a todo momento deixam claro que o que vivenciam no
virtual é também real.
O usuário pode ir e vir entre espaços sincrônicos (bate-papo) e assincrônicos
(UOL K) através do recurso oferecido pelo uso da foto enquanto um link. E ainda, se
por um lado a rede oferece diversas possibilidades para aqueles que desejam encontrar
alguém para se envolver amorosamente devido ao grande número de pessoas
conectadas, por outro esta imensa diversidade pode ser uma faca de dois gumes: o
grande número de opções poderia facilitar que o pretenso parceiro desenvolvesse
novos interesses. Nas palavras de Ângela: “[...] o fato da net facilitar contato entre as
pessoas.....tb nos traz a insegurança [...] nao precisa mais pular a cerca, pelo menos
não naquela hora e sim no dia seguinte...eh a facilidade a disponibilidade que acaba
atrapalhando.rsrs”.
Enfim, a relativização das experiências dos usuários indica que manter relações
online significa que, além de ter que lidar com a diversidade, o usuário precisa aprender
que nem tudo está devidamente separado, definido ou guardado em suas respectivas
gavetas. Em vez disso, o imprevisto, o contraditório, o sim e o não convivendo
pacificamente sem que se precise fazer uma ruptura. Nas palavras de Perez (2007, p.
22): “[...] a experiência de encontros virtuais possui um caráter difuso, uma vez que abre
margens para controvérsias e polêmicas”.
118
9 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As experiências dos usuários do UOL K são variadas, ainda que em alguns
momentos sejam semelhantes, dando a impressão de que pontos em comum que
caracterizam a vivência online neste tipo de site. Atualmente, e com o surgimento do
Orkut, uma crescente popularização destes ambientes virtuais, atraindo milhões de
pessoas em todo o mundo. Mas não é suficiente identificar esta tendência ou
desenvolver críticas acerca dos significados que ela possui em suas relações com o
momento histórico que estamos vivendo, o da pós-modernidade. É preciso descrevê-la.
se sabe que um número cada vez maior de pessoas tem se cadastrado nestes
ambientes, mas como estão sendo estas experiências? O que os usuários têm a “dizer”
sobre elas?
Foi este o objetivo que norteou o trabalho, ou seja, descrever e refletir acerca da
experiência de se cadastrar num site de relacionamentos para se relacionar, baseando-
se nos relatos dos próprios usuários.
Os aspectos mais importantes destacados pela análise dos resultados
demonstram que o site possibilita tanto fazer novos contatos quanto manter contatos
feitos anteriormente, uma maior tendência a fazer novos contatos, a língua escrita é
utilizada tanto para se comunicar como para refletir acerca de si mesmo, o anonimato é
favorecido pela comunicação à distância e causa receio de se decepcionar com o outro,
as experiências são vistas como reais mesmo ocorrendo num ambiente virtual, “estar
onlinepode ser prazeroso e não significa desprender-se do mundo offline, a afiliação
às comunidades é freqüente e tem como base objetivos comuns, o uso da foto é,
graças aos recursos do site, um elo entre a comunicação sincrônica (bate-papo) e a
comunicação assincrônica (UOL K), uma ênfase na sexualidade e os usuários se
vêem na necessidade constante de rever e relativizar conceitos como próximo e
119
distante, público e privado, estar ou não online etc. Se for possível, entretanto, destacar
dentre estes alguns pontos, estes seriam três:
1. A tendência a fazer novos contatos, particularmente no que se refere à auto-
exposição: ter uma página neste site possibilita estar à disposição de olhos
desconhecidos (ou conhecidos). A pessoa se deixa conhecer mesmo quando
não está online, seus dados estão à mostra e isto pode freqüentemente resultar
em novos contatos;
2. A integração entre as comunicações sincrônica e assincrônica através da
foto, a qual põe lado a lado dois tipos diferentes de interação através da rede,
possibilitando dinamizar a experiência de conhecer novas pessoas; um contato
que é iniciado numa sala de bate-papo pode ser incrementada pela visita à
página do interlocutor, o que favorece a obtenção de mais informações sobre ele
sem que se necessite fazer uso de outros programas sincrônicos como o MSN; a
página, aliás, pode se tornar uma forma de manter o vínculo após a conversa no
bate-papo caso os interlocutores adicionem os endereços;
3. E, principalmente, o prazer de “estar online: não tendo o hábito de marcar
encontros face a face, os usuários são capazes de se relacionar virtualmente de
forma genuína, trocar afetos, formar vínculos e manter relações online nas quais
o comunicar-se encontra seu sentido em si mesmo, podendo não haver outro
objetivo a não ser o de manter contato. Na expressão usada por Castells (2006,
p. 443), a comunicação se torna “a própria meta”. É prazeroso se comunicar por
se comunicar, mandar recados sem que haja uma necessidade maior do que a
própria necessidade de se comunicar. Trata-se de uma espécie de exercício da
sociabilidade. Relacionar-se é preciso, mesmo que seja apenas para deixar um
recado de “bom final de semana”, ou uma mensagem bonita, ou um simples
“olá”.
120
Para se chegar aos resultados tendo como base a metodologia da pesquisa
qualitativa, foi importante a utilização do Método de Explicitação do Discurso
Subjacente (1998; 2004a; 2004c; 2007) como uma alternativa para a compreensão do
discurso dos entrevistados. O movimento de ida e volta da análise interparticipantes
para a análise intraparticipantes e depois novamente para a interparticipantes,
possibilitou uma maior clareza dos dados, assim como a identificação de conteúdos não
explicitamente expostos pelos entrevistados, mas que constituíam aspectos importantes
para se compreender os significados de suas experiências.
Algumas vezes, estes conteúdos se referem a certos posicionamentos do
usuário os quais estão relacionados a fatores que ele mesmo não percebe, como no
caso daqueles que afirmaram não ter o objetivo de conhecer novas pessoas,
desprezando o fato de que a auto-exposição natural destes sites tende,
inevitavelmente, à formação de contatos com pessoas desconhecidas; ou o caso das
usuárias que reclamavam do constante apelo sexual o qual, entretanto, não as impedia
de ser freqüentadoras assíduas do UOL K; ou, ainda, o fato de alguns usuários
afirmarem não ter o objetivo de partir para o encontro face a face, sem, no entanto,
deixarem de demonstrar preocupação com uma possível decepção causada pelo
anonimato.
No decorrer das entrevistas pôde-se perceber a necessidade de criar um vínculo
com a pessoa. Ela precisa sentir que vale a pena compartilhar algo de suas
experiências. Para ser um interlocutor do entrevistado é preciso criar um clima de
confiança. Mais de uma vez, por exemplo, houve dificuldade em conseguir a permissão
formal para participar da pesquisa. O entrevistado resistia em receber o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Ele talvez tivesse receio de ser vítima de
algum golpe como tantos que acontecem pela Internet. Mesmo informado da ética em
pesquisa, do sigilo e da seriedade da mesma, ele demonstrava muita indisposição. Mas
nas vezes em que o TCLE era solicitado após algum tempo de conversa descontraída
cujo objetivo era formar um vínculo positivo sempre o entrevistado concordava sem
demonstrar desconfiança nem oferecer resistência.
Por fim, vale ressaltar duas coisas:
121
Primeiramente, os resultados aqui discutidos não pretendem ser universais. Em
vez disso, eles propõem uma forma de compreender um fenômeno atual de grande
complexidade, motivo pelo qual é necessário entender melhor suas implicações para a
vida em sociedade, particularmente para as vidas daqueles que estão em contato direto
com as transformações geradas pelo uso da Internet. Em segundo lugar, assim como
os resultados não pretendem ser universais, eles não pretendem ser conclusivos, o que
implica na necessidade de se fazer mais estudos sobre o assunto, enriquecendo as
contribuições dadas pela pesquisa acerca da relação entre a tecnologia informática e os
relacionamentos humanos.
122
10 REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Yara Rondon Guasque. Telepresença: interação e interfaces. São Paulo:
EDUC,/Fapesp, 2005.
BAUMAN, Zygmunt. Globalização. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.
_________________. Modernidade líqüida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
_________________. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 2004.
BOGO, Kellen Cristina (2000). A história da Internet: como tudo começou.
Disponível em: www.kplus.cosmo.com.br. Acesso em: 12 nov. 2006.
CARVALHO, Paulo rgio de. Interação entre humanos e computadores: uma
introdução. São Paulo: EDUC, 2000.
CASTELLS, Manuel. A galáxia Internet: reflexões sobre Internet, negócios e
sociedade. Lisboa, 2004.
__________________. A sociedade em rede. 9 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006.
COMITÊ GESTOR DA INTERNET NO BRASIL. Indicadores. Disponível em:
www.cg.org.br. Acesso em: 17 nov. 2006.
123
DIAS, Ana Cristina Garcia e DE LA TAILLE, Yves. As salas de bate papo na Internet
são um novo espaço para o compartilhamento da intimidade?. In: MALUF, Maria
Regina. Psicologia educacional: questões contemporâneas. São Paulo: Casa do
Psicólogo, 2004. p. 187-219.
DORNELLES, Jonatas. O Orkut e a terceira forma de sociabilidade. Ciências sociais
Unisinos, Rio Grande do Sul, 41(3), p.163-171, set/dez 2005. Disponível em:
http://www.megabaitche.hpg.ig.com.br/orkut.htm. Acesso em: 22 mar. 2007.
FERRARI, Antônio Martins. Telecomunicações: evolução e revolução, 9 ed. São
Paulo: Érica, 2005.
FRANCE, Louise. Love at first site. Observer Magazine, 30 jun 2002. Disponível em:
http://observer.guardian.co.uk/magazine/story/0,,746525,00.html. Acesso em: 5 jun.
2007.
GEERTZ, Clifford. O saber local: novos ensaios em antropologia interpretativa.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.
GIDDENS, Anthony. A transformação da intimidade: sexualidade, amor e erotismo
nas sociedades modernas. São Paulo: Unesp, 1993.
HAMPTON, K. e WELLMAN, B. Neighboring in Netville: how the internet supports
community and social capital in a wired suburb. City and Community, 2003. Disponível:
http://www.chass.toronto.edu/~wellman/publications/neighboring/neighboring_netville.pd
f. Acesso em: 20 set. 2007.
HARMANN, Fernanda Passarelli e SOUZA, Solange Jobim. Os jovens e o Orkut:
considerações sobre a criação de jogos de linguagem e de indentidade em rede. In:
NICOLACI-DA COSTA, Ana Maria (org.). Cabeças digitais: o cotidiano na era da
informação. Rio de janeiro: Ed. PUC-Rio, São Paulo, Loyola, 2006. p. 107-130.
IBÁÑEZ, Tomas. La construccion del conocimiento desde uma perspectiva
socioconstruccionista. In: MONTERO, Marilza (coord.). Conocimiento, realidad e
ideologia, fasc. 6, AVEPSO, Caracas, 1994, p. 39-48.
IBOPE. Internautas brasileiros quebram novo recorde no uso da rede, ago.
2007.Disponível:http://www.ibope.com.br
. Acesso em: 25 ago. 2007.
124
IBOPE. Internet brasileira atinge novos e maiores patamares em março. 25 abr.
2008. Disponível em http://www.ibope.com.br. Acesso em: 17 mai. 2008.
JUNGBLUT, Airton Luiz. Exercícios identitários no ciberespaço brasileiro: o caso
dos chats evangélicos. In: DUARTE, M. B. B. e MEDEIROS, J. L. (orgs.). Mosaico de
identidades. Curitiba: Juruá, 2004. p. 15-30.
LÉVY, Pierre. O que é o virtual? São Paulo: Editora 34, 1996.
_________________. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999.
LUCCIO, Flavia Di e NICOLACI-DA-COSTA, Ana Maria. Escritores de blogs: interagindo
com os leitores ou apenas ouvindo ecos?. Psicologia: ciência e pesquisa, Brasília, v.
27, dez. 2007, p. 664-679. Disponível: http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo. Acesso em: 24
fev. 2008.
MAIORINO, Fabiana Tavolaro. Análise do contrato intersubjetivo em chats de
encontros e sexo. 2002. 112f. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Semiótica) -
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2002.
_________________________. A subjetividade na era dos chats. In ZACHARIAS,
Juliana (org.). Psicologia e informática: desenvolvimentos e progressos. São Paulo:
Casa do psicólogo, 2005. p. 41-60.
MARCELO, Ana Sofia. Internet e novas formas de sociabilidade, 2001. Disponível
em: bocc.ubi.pt/pag/marcelo-ana-sofia-internet-sociabilidade.pdf. Acesso em: 26 jan. de
2008.
MARTINS, João Batista (org.). Temas em análise em análise institucional e em
construcionismo social. Curitiba: Fundação Araucária, 2002.
MATTAR NETO, João Augusto. Metodologia científica na era da informática. 2 ed.
São Paulo: Saraiva, 2005.
MILLENIUM DEVELOPMENT GOALS INDICATORS. Disponível em:
http://mdgs.un.org/unsd/mdg/. Acesso em: 17 nov. 2006.
125
NEVES, José Luis. Pesquisa qualitativa: características, usos e possibilidades.
Caderno de pesquisas em administração, São Paulo, vol. 1, n. 3, p.1-5, sem.,
1996.
NICOLACI-DA-COSTA, Ana Maria, LEITÃO, Carla Faria; ROMÃO-DIAS, Daniela.
Como conhecer usuários através do Método de Explicitação do Discurso
Subjacente (MEDS). In: VI Simpósio Brasileiro sobre Fatores Humanos em Sistemas
Computacionais, IHC, 2004, Curitiba. Disponível em:
www.decom.ufop.br/prof/elton/CIC361/meds.pdf. Acesso em: 11 set. 2007.
NICOLACI-DA-COSTA, Ana Maria. Na malha da rede: os impactos íntimos da Internet.
Rio de Janeiro: Campus, 1998.
____________________________. Revoluções tecnológicas e transformações
subjetivas. Psicologia: teoria e pesquisa. Brasília, v. 18, n. 2, 2002. Disponível:
http://www.scielo.br. Acesso em: 16 mar. 2006.
___________________________. A passagem interna da modernidade para a pós-
modernidade. Psicologia: ciência e pesquisa, Brasília, v. 24, no.1, p.82-93, 2004a.
Disponível em: http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo. Acesso em: 16 jan. 2008.
___________________________. Impactos psicológicos do uso de celulares: uma
pesquisa exploratória com jovens brasileiros. Psicologia: teoria e pesquisa, v. 20, n. 2,
pp. 165-174, mai/ago 2004b. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo. Acesso em 23
abr. 2006.
___________________________. Internet e subjetividade: a emergência de uma nova
“configuração psíquica”. In Psicologia e informática: desenvolvimentos e progressos.
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2005a.
___________________________. Primeiros contornos de uma nova "configuração
psíquica". Caderno CEDES, Campinas, v. 25,n. 65, 2005b. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo. Acesso em: 30 mar. 2006.
____________________________. Sociabilidade virtual: separando o joio do trigo.
Psicologia Social. Porto Alegre, v. 17, n. 2, 2005c. Disponível em:
http://www.scielo.br/sciel. Acesso em: 26 abr. 2006.
126
NICOLA-DA-COSTA, Ana Maria. O campo da pesquisa qualitativa e o Método de
Explicitação do Discurso Subjacente (MEDS). Psicologia: reflexão e crítica, Porto
Alegre, v. 20, n. 1, p. 65-73, 2007. Disponível: http://www.scielo.br/scielo. Acesso em:
16 fev. 2008.
NOGUEIRA, Marcos. Orkut: como entender esse fenômeno? Super interessante, São
Paulo, p. 80-87, set. 2004.
PEREZ, Sílvia Raquel Santos de Morais. Te “vejo” na Internet! Reflexões sobre os laços
humanos na contemporaneidade. Revista Técnica IPEP, São Paulo, v. 7, n. 1, p. 17-
24, jan/jun, 2007. Disponível em:
http://www.ipep.edu.br/portal/publicacoes/revista/rev07_01/art2_tevejo.pdf. Acesso em:
25 set. 2007.
PRADO, Oliver Zancul e HONORATO, Eduardo. Alguns usos patológicos do
computador: o uso patológico de Internet. In SAYEG, Elisa (org.). Psicologia e
informática: interfaces e desafios. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000. p. 141-161.
PRANGE, A. P. L. Da literatura aos blogs: um passeio pelo território da escrita de si.
Psicologia: ciência e profissão, Brasília, v.27, n.4, dez. 2007. Disponível em:
http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo. Acesso em: 21 mar. 2008.
RAMALHO, Erika Falcão. Par perfeito: um novo espaço virtual para a procura de
parceiros amorosos. 2005. 104f. Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica) -
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2005. Disponível em:
http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br. Acesso em: 21 mai. 2007.
RHEINGOLD, Howard. A comunidade virtual. Lisboa: Gradiva, 1996.
RODRIGUES, Sandra. Interações no Ciberespaço: traços de um imaginário. 2006.
Disponível em: http://www.2020online.com.br/sandra/artigos.html. Acesso em 8 set.
2007.
SARAIVA, Luana Negrelly e CABRAL, Adilson. A Internet que nos protege.
Ciberlegenda, n. 4, 2001. Disponível em: http://www.uff.br/mestcii/adilson1.htm. Acesso
em 12 jan. 2007.
127
SAYEG, Elisa. Psicologia e informática. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.
SEIDMAN, I. Interviewing as qualitative research: a guide for researchers in
education and the social sciences, 2 ed. New York: Teachers College Press, 1998.
SILVA, Adelina. Mundos reais, mundos virtuais: os jovens nas salas de chat. Textos de
la CiberSociedad, n. 6. fev. 2005. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/silva-
adelina-mundos-reais-mundos-virtuais.pdf. Acesso em 23 mai. 2007.
SILVA, Juremir Machado. As tecnologias do imaginário. 2 ed. Porto Alegre: Sulina,
2006a.
SILVA, Cristiane Moreira da. Intimidade on line: outras faces do diário íntimo na
Contemporaneidade, IFCH/UFF, Rio de Janeiro, 2006b. Disponível em:
www.slab.uff.br/dissertacoes/2006/Cristiane_Moreira.pdf. Acesso em 25 jan. 2008.
SILVEIRA, Marcelo D. Prates da. Efeitos da globalização e da sociedade em rede via
Internet na formação de identidades contemporâneas. Psicologia: ciência e profissão,
Brasília, v. 24, n.4, p. 42-45, dez. 2004. Disponível em: http://pepsic.bvs-
psi.org.br/scielo. Acesso 26 set. 2007.
SPINK, Mary Jane. Práticas discursivas e produção de sentidos no cotidiano:
aproximações teóricas e metodológicas. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2004.
TURATO, Egberto Ribeiro. Tratado da metodologia da pesquisa clínico-qualitativa.
Petrópolis/Rio de Janeiro: Vozes, 2003.
WALTHER, J. B. Compute mediated communication: impessoal, interpessoal, and
hyperpersonal interaction. Communication Research, 23, 1996. Disponível em:
http://campus.emp.paed.uni-
muenchen.de/sw_vhb/edid/content/data/ressourcen/literature/walther1996.html. Acesso
em: 5 jun. 2007.
WELLMAN, Barry e GULIA, Milena. Net surfers don’t ride alone: virtual communities
as communities, 1999 Disponível em:
http://www.chass.utoronto.ca/~wellman/publications/netsurfers/netsurfers.pdf. Acesso
em: 14 set. 2007.
128
WELLMAN, Barry. Connecting community: on-and offline, 2004. Disponível em:
http://www.chass.utoronto.ca/~wellman/publications/index.html. Acesso em 14 set.
2007.
WELLMAN, Barry e BOASE, Jeffrey. Personal relationships: on and off the Internet.
Jul 2004. Disponível em: http://citeseer.ist.psu.edu/695110.html. Acesso em: 26 set.
2007.
WERTHEIM, Margaret. Uma história do espaço: de Dante à Internet. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2001.
ZACHARIAS, Juliana. Serviços de orientação psicológica mediados por computador
desenvolvidos pelo NPPI Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática da PUC-
SP. In ZACHARIAS, Juliana (org.). Psicologia e informática: desenvolvimentos e
progressos. São Paulo: Casa do psicólogo, 2005. p. 91-132.
ZACHARIAS, José Jorge M. O processo de construção de questionários on-line para
pré-seleção de profissionais: utilização, praticidade e limites de questionários on-line. In
ZACHARIAS, Juliana (org.). Psicologia e informática: desenvolvimentos e progressos.
São Paulo: Casa do psicólogo, 2005. p. 225-243.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo