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Estamos a chamar a atenção para um dos aspectos que transformaram o
pensamento no século XVI e impregnou “a forma de ver o mundo, distinguindo fé de
razão, Igreja de Estado, privado de público”, que Paiva (2004) denomina de
pensamento mercantil.
Para ilustrarmos essa idéia, temos a própria denominação da Ordem:
Companhia de Jesus, que como anteriormente mencionado não se deve ao passado
de combatente de seu idealizador, mas segundo Costa (2005), seria uma alusão às
empresas privadas criadas para a exploração – comércio e colonização –
(Companhias das Índias Ocidentais, do Levante, Plymouth, etc.).
24
A difusão de novas idéias no século XVI elucida e “salienta o espírito da
época” que era o “mercantil”. Nesse sentido a Companhia de Jesus também deveria
pensar e agir “mercantilmente.”
25
O mercantil, para Paiva (p.35), “qualifica a sociedade moderna, moldando a
ação humana nos seus mais diversos tipos”, e as “relações sociais” serão “pautadas
sobre compra e venda. [...] Até em termos de espiritualidade, usou-se com
frequência da expressão, traduzindo ela o entendimento que de seu ofício tinha o
pregador e tinha o seu ouvinte.” E, para destacar a assimilação dessa mentalidade
pelos jesuítas, referimos a uma carta de Nóbrega aos moradores de São Vicente
(1557), e uma de Antônio Blasquez (1564), onde se destacam terminologias
mercantis, que estão grifadas.
Quem vos detém que não dais fruto digno de se apresentar na mesa do Rei
Celestial? Estas são as fazendas principais que haveis de fazer no Brasil;
este é o trato que deveis de ter com os cidadãos da cidade de Jerusalém
celestial, [...] o trato bendito não é de açúcar corruptível mas de graça, mais
saborosa que favo de mel. [...] Quão poucos mercadores da vida eterna se
acham? Se os mercadores de pedras preciosas topassem contigo,
venderiam tudo por te mercar e em te tratar; trato sem perigo, porque o
piloto, que governa, não pode errar [...] trato de tanto ganho, no qual não
se ganha um por cento, e sobretudo vida eterna em contrapeso [...] trato
que neste mundo enriquece de graça, e no outro de glória [...] trato sem
desassossego, antes quanto mais se trata, quanto mais de quietação se
ganha [...] trato onde nunca se perdeu ninguém, e todos possuem suas
riquezas em paz [...] trato sem perigos, mas antes ele livra de perigos! trato
onde onzenar é merecer, e não pecar [...] trato,finalmente , com o qual se
afermosenta a cidade de Deus celestial de almas que louvam a seu Senhor,
e a terra dos desterrados filhos de Adão, recebe por retorno mercadorias
espirituais de graça, de virtudes, de consolações (NÓBREGA, 1980, p.
167)
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O termo “Companhia” também servia no contexto do século XVI, para designar, de forma genérica, uma
associação piedosa que proliferava na Itália, como a “Companhia do Amor Divino”.
25
Cf. Paiva (s.d., p.34), em apontamentos sobre os vinte e cinco anos da publicação de sua obra “Colonização e
Catequese”. [material não impresso]