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Centro Universitário Feevale
Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental
Mestrado em Qualidade Ambiental
Silvia Maria Machado Uszacki
A MELHOR TECNOLOGIA DISPONÍVEL COMO
MEDIDA PREVENTIVA NA ELEIÇÃO DO
MÉTODO DE DISPOSIÇÃO FINAL DE
RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS
Novo Hamburgo, 2009
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Centro Universitário Feevale
Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental
Mestrado em Qualidade Ambiental
Silvia Maria Machado Uszacki
A MELHOR TECNOLOGIA DISPONÍVEL COMO
MEDIDA PREVENTIVA NA ELEIÇÃO DO
MÉTODO DE DISPOSIÇÃO FINAL DE
RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Qualidade Ambiental
como requisito para a obtenção do título
de mestre em Qualidade Ambiental.
Orientador: Prof. Dr. Délton Winter de Carvalho
Novo Hamburgo, 2009
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III
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
Bibliotecária responsável: Rosângela Terezinha Silva – CRB 10/1591
Uszacki, Silvia Maria Machado
A melhor tecnologia disponível como medida preventiva na eleição
do método de disposição final de resíduos sólidos urbanos / Silvia Maria
Machado Uszacki. – 2009.
128 f. ; 30 cm.
Dissertação (Mestrado em Qualidade Ambiental) – Feevale, Novo
Hamburgo-RS, 2009.
Inclui bibliografia.
“Orientador: Prof. Dr. Délton Winter de Carvalho”.
1. Responsabilidade por danos ambientais. 2. Resíduos sólidos -
Urbanização. 3. Proteção ambiental - Tecnologia. I. Título.
CDU
IV
Centro Universitário Feevale
Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental
Mestrado em Qualidade Ambiental
Silvia Maria Machado Uszacki
A MELHOR TECNOLOGIA DISPONÍVEL COMO
MEDIDA PREVENTIVA NA ELEIÇÃO DO
MÉTODO DE DISPOSIÇÃO FINAL DE
RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS
Dissertação de mestrado aprovada pela banca examinadora em 14 de abril de 2009,
conferindo à autora o título de mestre em Qualidade Ambiental.
Componentes da Banca Examinadora:
Prof. Dr. Délton Winter de Carvalho (Orientador)
Centro Universitário Feevale
Prof. Dr. Marco Antônio Siqueira Rodrigues
Centro Universitário Feevale
Profa. Dra. Heline Sivini Ferreira
Pontifícia Universidade Católica do Paraná
V
Ao meu irmão, Julio,
como estímulo na sua caminhada pessoal e profissional.
VI
AGRADECIMENTOS
Nesta caminhada, contei com o apoio de pessoas que foram fundamentais para a
realização e conclusão deste trabalho e é chegada a hora de agradecer:
Ao Prof. Dr. Délton Winter de Carvalho, que, além de meu orientador, foi um grande
motivador na construção deste trabalho, dedicando tempo e paciência, proporcionando
enorme aprendizado.
A todos os professores e colegas do Mestrado, pertencentes às mais variadas áreas do
conhecimento, que muito contribuíram para o meu crescimento pessoal e acadêmico,
proporcionando uma imensa troca de conhecimentos e experiências transdisciplinares.
Aos Professores da Pontifícia Universidade Católica, Me. Orci Bretanha e Me.
Caroline Ruschel, que me recomendaram ao Mestrado, oportunizando a realização deste
projeto.
Aos meus pais, Julio e Elisabeth, os grandes responsáveis pela minha educação, por
todo amor e por todas as oportunidades de crescimento pessoal e profissional.
À minha grande família Machado (irmão, sobrinha, avós, tios, tias, primos, primas) e
à minha pequena família Uszacki, pela torcida e por me desculparem pela longa ausência. À
“minha” família Gómez-Sosa, por tanto carinho e cuidado.
Ao meu amado Rodrigo, pelo estímulo e que, com o seu grande amor, me ajudou a
manter o equilíbrio diante das dificuldades, das limitações e da minha grande ansiedade. Mais
do que ninguém, ele sabe o que significa chegar até aqui.
Aos meus queridos amigos, grandes companheiros, de perto e de longe, por sempre
torcerem, por apoiarem, por estimularem e por perdoarem o meu afastamento e ausência nos
últimos tempos.
VII
RESUMO
As constantes mutações sociais exigem evolução também dos mecanismos legais tendentes à
prevenção e correção dos riscos e danos ambientais, alcançando, dessa forma,
verdadeiramente, o sentido do instituto da responsabilidade ambiental. O dever de
preventividade objetiva contido no artigo 225 da Constituição Federal, aliado ao novo
conceito de ilícito civil trazido pelo artigo 187 do Código Civil de 2002, obriga a imposição
de medidas preventivas àqueles que desenvolvem atividades potencialmente danosas ao meio
ambiente. Também neste contexto estão as questões acerca dos métodos de disposição final
dos resíduos sólidos urbanos, cujos riscos ao meio ambiente, além de intoleráveis, são
desnecessários. Nesse sentido, esse trabalho tem como objetivo comprovar a capacidade
jurídica de imposição da melhor tecnologia disponível como medida preventiva na eleição do
método de disposição final de resíduos sólidos urbanos. Para tanto, foi realizada pesquisa
bibliográfica em obras de autores nacionais e internacionais, consulta a normatização sobre
responsabilidade civil e risco ambiental, direito de resíduos e melhor tecnologia disponível,
assim como foi realizada análise dos princípios de direito ambiental aplicáveis ao direito de
resíduos sólidos urbanos. Como resultado, temos que a imposição de medidas preventivas
deve ser proporcional ao possível risco ou dano, o que é feito através da aplicação do binômio
adequação/necessidade do princípio da proporcionalidade. Como exemplo de medida
preventiva ambiental temos a imposição de melhor tecnologia disponível na eleição do
método de disposição final de resíduos sólidos.
Palavras-chave: responsabilidade ambiental; prevenção; resíduos sólidos urbanos; métodos de
destinação final; melhor tecnologia disponível.
VIII
ABSTRACT
The constant social changes require development also in the legal mechanisms that tend for
the prevention and correction of risks and environmental damages, reaching thus, truly, the
meaning of the institute of environmental responsaility. The duty of objective prevention
contained in the article 225 of the Federal Constitution, coupled with the new concept of civil
illicit brought under the article 187 of the Civil Code of 2002, requires the imposition of
preventive measures for those activities which are potentially harmful to the environment.
Also in this context, are the questions about the methods of final disposal of urban solid
waste, whose risks to the environment, beyond intolerable, are unnecessary. In that matter,
this paper has as an objective to prove the legal capacity of the imposition of the best
available technology as preventive measure in the election of the method for final disposal for
urban solid waste. To achieve so, it was realized a bibliographic research on national and
international authors, a consult on the norms about civil responsability and environmental
risk, waste law and best available technology, just as was realized an analisys of the principles
of environmental law applicable to urban solid waste law. As a result, we have that the
imposition of preventive measures must be proportionate to the potential risk or damage,
which is done by applying the binominal appropriateness/necessity of the proportionality
principle. As an example of environmental preventive measure is the imposition of the best
available technology in the election of the method for final disposal for solid waste.
Keywords: environmental responsability; prevention; urban solid waste; methods of final
disposed; best available technology.
IX
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Normatizações federais aplicáveis aos resíduos sólidos urbanos...........................54
Quadro 2 - Normatizações estaduais sobre os resíduos sólidos urbanos..................................55
X
LISTA DE SIGLAS
ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas
ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária
CEMPRE – Compromisso Empresarial para Reciclagem
CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente
CONSEMA – Conselho Estadual do Meio Ambiente
FAMURS – Federação das Associações dos Municípios do Rio Grande do Sul
GIRSU – Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos Urbanos
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
Nº - Número
NBR – Norma brasileira
RSU – Resíduos Sólidos Urbanos
XI
SUMÁRIO
RESUMO...............................................................................................................................VII
ABSTRACT.......................................................................................................................... VIII
LISTA DE QUADROS.......................................................................................................... IX
LISTA DE SIGLAS.................................................................................................................X
1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................1
2 DIREITO AMBIENTAL NA SOCIEDADE DE RISCO ..................................................5
2.1 DA SOCIEDADE INDUSTRIAL À SOCIEDADE DE RISCO ....................................5
2.2 DO DIREITO DE DANOS AO DIREITO DE RISCOS ................................................8
2.2.1 Conceito e espécies dos danos ambientais .........................................................8
2.2.2 Conceito, classificação e características dos riscos ambientais .....................13
2.3 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE DIREITO AMBIENTAL APLICADOS À
GESTÃO DE RISCOS ECOLÓGICOS..............................................................................16
2.3.1 Princípio da prevenção (stricto sensu)..............................................................17
2.3.2 Princípio da precaução......................................................................................19
2.3.3 Princípio do poluidor-pagador e princípio da responsabilização.................21
2.3.4 Princípio da equidade intergeracional (ou solidariedade intergeracional) e
os direitos das futuras gerações.................................................................................23
2.3.5 Princípio do limite de tolerabilidade................................................................24
2.4 RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL............................................................26
2.4.1 Adoção da responsabilidade objetiva em matéria ambiental........................26
2.4.2 Variações da teoria do risco concreto e as excludentes de responsabilidade28
2.4.3 Pressupostos da responsabilidade civil ambiental..........................................30
2.4.4 Solidariedade passiva dos sujeitos responsáveis.............................................32
2.5 DANO AMBIENTAL FUTURO ..................................................................................35
2.5.1 Responsabilidade sem danos e os riscos ambientais configuradores do ilícito
ambiental.....................................................................................................................38
2.5.2 Princípio da proporcionalidade e medidas preventivas na gestão dos riscos
ambientais....................................................................................................................39
3 DIREITO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS ..........................................................42
3.1 JUSTIFICATIVAS PARA O TRATAMENTO JURÍDICO DIFERENCIADO DOS
RESÍDUOS..........................................................................................................................42
3.2 PRINCÍPIOS DE DIREITO AMBIENTAL E RESPONSABILIDADE CIVIL
APLICÁVEIS AO DIREITO DE RESÍDUOS ...................................................................45
3.2.1 Princípio da prevenção......................................................................................45
3.2.2 Princípio da precaução......................................................................................46
3.2.3 Princípio do poluidor-pagador.........................................................................47
3.3 CONTEXTUALIZAÇÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS NO DIREITO
BRASILEIRO......................................................................................................................50
3.3.1 Conceituação e aspectos normativos................................................................50
3.3.2 Classificação e características dos resíduos sólidos urbanos.........................56
3.3.3 O papel dos responsáveis: Administração Pública e os cidadãos..................58
3.3.4 Coleta seletiva de resíduos nos municípios brasileiros...................................60
XII
3.3.5 Programa de reciclagem: reutilização, reciclagem e tratamento de resíduos
......................................................................................................................................62
3.4 MÉTODOS DE DISPOSIÇÃO FINAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS E OS
RISCOS INERENTES A CADA TIPO...............................................................................65
3.4.1 Tratamento da fração orgânica por processos biológicos: compostagem e
digestão anaeróbia......................................................................................................66
3.4.2 Lançamento a céu aberto..................................................................................68
3.4.3 Aterro controlado ..............................................................................................69
3.4.4 Aterro sanitário..................................................................................................70
3.4.5 Tratamento térmico de resíduos.......................................................................73
4 GESTÃO DOS RISCOS NA DISPOSIÇÃO FINAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS
URBANOS...............................................................................................................................76
4.1 NÍVEIS DE GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS ..................................76
4.2 MELHOR TECNOLOGIA DISPONÍVEL COMO MEDIDA PREVENTIVA
AMBIENTAL......................................................................................................................82
4.2.1 Medida preventiva ambiental...........................................................................82
4.2.2 Diretiva 96/61, do Conselho da Comunidade Europeia: definição de
melhores técnicas disponíveis ....................................................................................84
4.2.3 Contextualização da melhor tecnologia disponível no direito brasileiro......87
4.2.4 Aporte jurídico para imposição da melhor tecnologia disponível como
medida preventiva ambiental ....................................................................................91
4.3 MELHOR TECNOLOGIA DISPONÍVEL COMO MEDIDA PREVENTIVA NA
ELEIÇÃO DO MÉTODO DE DISPOSIÇÃO FINAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS
URBANOS ..........................................................................................................................93
4.3.1 Eleição do método de disposição final de RSU................................................93
4.3.2 Aplicação da melhor tecnologia disponível na eleição do método de
disposição final de RSU..............................................................................................98
4.3.3 Aterro sanitário como melhor tecnologia disponível de disposição final de
RSU no Brasil............................................................................................................101
5 CONCLUSÕES..................................................................................................................105
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................109
1 INTRODUÇÃO
Nos últimos séculos, a sociedade passou por relevantes mutações estruturais, dentre
as quais o grande crescimento populacional, a evolução dos processos de produção, o
aumento do volume e dos tipos de resíduos e a consequente passagem da sociedade industrial
à sociedade de riscos (sociedade pós-industrial). Nesta, a sociedade passa a ter de lidar com os
riscos que ela mesma produz, cujos efeitos são “globais, imprevisíveis, incalculáveis,
invisíveis, transtemporais, transnacionais”.
1
No que diz respeito ao aumento do volume dos resíduos, tem-se como causas o
crescimento populacional e o consequente aumento dos aglomerados urbanos, aliados aos
avanços tecnológicos e produtivos e às mudanças nos padrões de consumo. Essas mudanças
se refletem também no meio ambiente e seus recursos naturais, que, por serem finitos, já não
suportam a exploração desenfreada do homem. Nessa esteira, já que toda atividade humana
produz resíduos e o aumento da produção nos coloca diante do aumento desses resíduos e
suas consequências indesejáveis (riscos e danos ambientais), o Direito Ambiental deve ser
instrumento de proteção e responsabilização ambiental.
Ocorre que, desafortunadamente, o ordenamento jurídico não está dotado do mesmo
dinamismo que as relações, estruturas, processos e mutações sociais. Em suma, os processos
de normatização não acompanham as (constantes novas) demandas trazidas por essa nova
sociedade. Quando as demandas são relativas ao meio ambiente, cujo equilíbrio é vital para a
preservação da própria espécie humana, esperar pela atualização das normatizações pode
trazer consequências danosas irreversíveis.
A produção de resíduos sólidos urbanos é inevitável numa sociedade cujos padrões
de consumo são altamente influenciados pelo avanço tecnológico. Durante muito tempo, os
resíduos foram desconsiderados, mas justamente pela formação social de um alto padrão de
consumo, em que os produtos são cada vez mais feitos de materiais descartáveis, a geração de
um número cada vez maior de resíduos tornou-se inevitável. Diante dessa realidade, a
sociedade se defronta com a questão da destinação final: “o que fazer com os resíduos que
produz o tempo todo, num planeta que possui limites para suportar toda a carga de lixo nele
1
ROCHA, Leonel Severo. Apresentação. In: CARVALHO, Délton Winter de. Dano ambiental futuro: a
responsabilização civil pelo risco ambiental. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008. p. XV.
2
despejada”.
2
A disposição irregular de resíduos sólidos urbanos pode trazer consequências
danosas desnecessárias ao meio ambiente.
O Brasil, apesar de possuir uma das legislações mais avançadas sobre
responsabilidade civil ambiental, não possui uma Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Aliás, nem ao menos possui legislação específica sobre resíduos sólidos. As poucas
normatizações brasileiras de resíduos se resumem a Resoluções do Conselho Nacional de
Meio Ambiente – CONAMA e normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas –
ABNT. Assim como ocorre com a legislação, o Brasil praticamente não possui pesquisas
jurídicas sobre o tema dos resíduos. Mais especificamente, e conseqüentemente, não possui
normas que determinem como deve ser o procedimento na eleição do método de disposição
final de resíduos sólidos.
A parca legislação ambiental, assim como as pouquíssimas pesquisas e estudos sobre
o assunto justificam, por razões teóricas e práticas, a realização da presente pesquisa, que tem
como objetivo principal demonstrar a capacidade jurídica de imposição da melhor tecnologia
disponível como medida preventiva na eleição do método de disposição final de resíduos
sólidos urbanos. Essa construção é feita a partir do dever de preventividade objetiva na
obrigação de proteção ambiental do artigo 225 da Constituição Federal, aliado ao novo
conceito de ilícito civil trazido pelo artigo 187 do Código Civil de 2002. A fim de especificar
a pesquisa, a mesma limita-se aos resíduos sólidos urbanos, pelas razões descritas nos
primeiros parágrafos desta introdução, que podem ser resumidas nas seguintes palavras:
qualidade ambiental no meio urbano.
Para tanto, foram pesquisadas doutrinas, diplomas legais e decisões técnicas
nacionais e internacionais sobre o instituto da responsabilidade civil ambiental e as novas
teorias do risco, sobre o direito de resíduos e seus métodos de destinação final, sobre as
medidas preventivas ambientais, assim como sobre a melhor tecnologia disponível. Além da
pesquisa bibliográfica, foram consultados e utilizados dados da Pesquisa Nacional de
Saneamento Básico, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE e dados da
Pesquisa Resíduos Sólidos, da Federação das Associações dos Municípios do Estado do Rio
Grande do Sul – FAMURS.
Especificamente, os objetivos são, ainda: descrever a evolução da sociedade, da
passagem industrial à sociedade de riscos, para demonstrar que essas constantes mutações
sociais exigem acompanhamento e evolução dos mecanismos legais de prevenção ambiental;
2
FRITSCH, Ivânea Elisabete. Resíduos sólidos: e seus aspectos jurídicos, legais e jurisprudenciais. Porto
Alegre: UE/Secretaria Municipal de Cultura, 2000. p. 17.
3
revisar o tema da responsabilidade civil ambiental, as teorias do risco e suas consequências
jurídicas, até chegar à conceituação de dano ambiental futuro; analisar especificamente a
normatização de resíduos sólidos urbanos e dos seus métodos de disposição final,
investigando a situação atual dessa discussão no Brasil e no Estado do Rio Grande do Sul;
demonstrar a inserção da melhor tecnologia disponível no direito brasileiro.
Assim, no segundo capítulo, são analisados o direito ambiental e o instituto da
responsabilidade civil ambiental na sociedade de risco, iniciando com a passagem da
sociedade industrial (de um direito de danos) para a sociedade pós-industrial (de um direito de
riscos). Em continuidade, são apresentados os princípios fundamentais de direito ambiental
aplicáveis à gestão dos riscos ambientais, cuja base se fundamenta no princípio da prevenção
lato sensu.. A existência e aplicação desses princípios explicam o atual funcionamento da
responsabilidade civil ambiental no direito brasileiro, cujo dever de preventividade objetiva
contido no artigo 225 da Constituição Federal, justifica a responsabilidade sem danos, tendo
em vista a possibilidade de dano ambiental futuro.
O terceiro capítulo trata especificamente do direito de resíduos. Após a exposição
das razões para um tratamento jurídico diferenciado dos resíduos, são elencados e explicados
os princípios de direito ambiental aplicáveis aos resíduos. Superada essa etapa geral, os
resíduos sólidos, especialmente os urbanos, são contextualizados no direito brasileiro e
também no Estado do Rio Grande do Sul. É a fase de conceituação, classificação, exposição
da normatização aplicável, identificação dos sujeitos responsáveis e das etapas de gestão. Por
fim, nesse segundo capítulo são analisados os métodos de disposição final de resíduos sólidos
urbanos e os riscos inerentes a cada tipo. São descritos, individualmente, os métodos de
disposição final e a disciplina legal de cada um, identificando os resíduos que se destinam a
cada método (fração orgânica e fração reciclável).
Por fim, no quarto capítulo, é investigada a gestão dos riscos na disposição final dos
resíduos sólidos urbanos. É avaliada a conceituação de medidas preventivas ambientais e a
capacidade de imposição dessas medidas como forma de proteção ao meio ambiente.
Escolhida a melhor tecnologia disponível como exemplo de aplicação dessas medidas, passa-
se a demonstrar a capacidade jurídica de imposição dessa medida preventiva ambiental na
eleição do método de disposição final de resíduos sólidos urbanos. Por derradeiro, discute-se
sobre qual a melhor tecnologia disponível de disposição final de RSU no Brasil, país em
desenvolvimento.
É nesse ponto do trabalho que se unem, se ligam os dois primeiros capítulos, já que,
aqui, é avaliada a possibilidade e efetividade da imposição de medida preventiva ambiental, a
4
fim de evitar a concretização de risco em dano. É a responsabilização preventiva, que se
antecede à ocorrência do dano/degradação ambiental, com o fim de gerir os riscos ambientais,
proporcionando verdadeira e efetiva proteção ao meio ambiente. Restaurando esse equilíbrio é
que se proporciona verdadeira qualidade ambiental.
2 DIREITO AMBIENTAL NA SOCIEDADE DE RISCO
2.1 DA SOCIEDADE INDUSTRIAL À SOCIEDADE DE RISCO
O ponto de partida para a compreensão da atual crise ambiental reside no paralelo
traçado entre a sociedade contemporânea (sociedade de risco ou pós-industrial) e a sociedade
industrial. Se a sociedade não é estática e está em constante evolução, o Direito, como
elemento de organização social, deve acompanhar essas mudanças. Nesse sentido, a
responsabilidade civil deve ser instrumento não apenas de reparação de danos, mas também
de gerenciamento de riscos.
3
Num primeiro momento histórico, ainda anterior à sociedade industrial, tem-se uma
sociedade pré-industrial (também conhecida como sociedade burguesa), fortemente
influenciada pelo direito canônico, após a queda e ruína do império romano. Após as
revoluções burguesas e a partir do jusracionalismo (direito natural), estabeleceu-se a culpa
como princípio geral da responsabilidade civil.
4
Assim posta, tendo como pressuposto a culpa,
a responsabilidade civil é denominada subjetiva e está condicionada à ocorrência de um dano
para sua configuração e dever de reparação pelo agente causador.
5
É com o advento da Revolução Industrial, no século XIX, e mais tarde no século XX,
com a Revolução Tecnológica, que as mais variadas situações fáticas passam a reclamar
adaptações e mudanças de modelo “ante à insuficiência do sistema subjetivista em fornecer
respostas adequadas e justas para o panorama então instalado”.
6
Referido panorama é
justamente o surgimento da chamada sociedade de massas, caracterizada pela impessoalidade
das relações (também as jurídicas), produção industrial e fornecimento de serviços através de
maquinários modernos, crescimento populacional e dos meios de transporte, com consequente
êxodo rural e urbanização etc.
Nesse cenário caótico, com o desenvolvimento do maquinismo, a proliferação dos
acidentes de trabalho, causados pela própria tecnologia utilizada nos processos de produção,
3
CARVALHO, Délton Winter de. Dano ambiental futuro: a responsabilização civil pelo risco ambiental. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 2008. p. 63.
4
NORONHA, Fernando. Desenvolvimentos contemporâneos da responsabilidade civil. Revista dos Tribunais,
São Paulo, v. 88, n. 761, p. 31-44, mar. 1999.
5
Ainda hoje essa é a regra geral da responsabilidade civil no direito brasileiro: responsabilidade subjetiva,
fundada na culpa, como preceitua o art. 186 do Código Civil Brasileiro.
6
VIANNA, José Ricardo Alvarez. Responsabilidade civil por danos ao meio ambiente: à luz do novo Código
Civil. Curitiba: Juruá, 2005. p. 81.
6
inúmeras eram as situações de exposição de pessoas aos riscos na assim chamada sociedade
industrial. Nas palavras de Beck: “a produção social de riqueza é acompanhada
sistematicamente pela produção de riscos”.
7
A prova da culpa pela vítima, tendo em vista o
momento histórico e a realidade social, principalmente a desigualdade econômica, era penosa,
e, em muitos casos, impossível de ser demonstrada. Dessa maneira, “evidenciou-se a
incompatibilidade da responsabilidade subjetiva, fundada na culpa, com o impulso
desenvolvimentista da sociedade”.
8
É nesse contexto histórico que, já na metade do século XIX, emerge a
responsabilidade civil objetiva, não mais baseada na culpa, mas no risco inerente às atividades
desenvolvidas pelos potenciais causadores de danos, como resposta às mutações sociais
decorrentes dos processos de industrialização e desenvolvimento tecnológico. A construção e
formalização desse novo modelo de responsabilização, baseado na Teoria do Risco, não foi
imediata nem trabalho isolado, mas ferrenha atividade de doutrinadores e da jurisprudência,
sendo recepcionada pelo legislador, que não poderia se furtar a empreender correções no
sistema legal.
9
Na responsabilidade objetiva, não se analisa o elemento subjetivo (culpa) do(s)
agente(s). Pouco importa se o causador do dano agiu ou não culposamente, dando ou não
causa ao evento danoso. É o exercício de atividade passível de produzir danos, ou seja,
atividade arriscada produtora de riscos, somada à relação de causa e efeito entre referida
atividade e a ocorrência de dano o elemento ensejador da responsabilidade civil objetiva.
Todo prejuízo deve ser reparado por quem o causou, independentemente desta ação (ou
omissão) ter sido voluntária. É essa a base da teoria do risco, caracterizadora da sociedade
industrial. Atente-se para o fato de que esses riscos são concretos, diagnosticáveis,
conhecidos.
10
Pela própria natureza das atividades industriais exercidas, a ocorrência de danos
é previsível.
A passagem dessa realidade social (sociedade industrial ou de massas) para a
realidade atual (sociedade de riscos ou pós-industrial) decorre também das mutações sociais e
do desenvolvimento industrial e tecnológico, assim como ocorreu com a passagem da
sociedade burguesa (responsabilidade subjetiva) para a sociedade industrial (responsabilidade
7
BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo: hacia una nueva modernidad. Barcelona: Paidós, 1998. p. 25. (Tradução
livre)
8
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p.
262
9
TEPEDINO, Gustavo. A evolução da responsabilidade civil no direito brasileiro e suas controvérsias na
atividade estatal. In: TEMAS de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 181
10
CARVALHO, 2008, p. 57.
7
objetiva). As exigências do mercado aumentaram, a produção tornou-se ainda mais acelerada,
“produzindo externalidades negativas com maior velocidade e em escala global”.
11
Dessa
realidade, identifica-se a passagem da teoria do risco concreto para a teoria do risco abstrato e
“a sociedade passa a ter de encarar e lidar com os riscos que ela mesma produz”
12
.
É no contexto dessa sociedade de riscos que está situada a atual crise ambiental
13
, em
que já não é possível a verificação concreta das consequências das decisões e a conceituação
dos riscos se distancia dos sentidos de controle e cognoscibilidade
14
antes auferidos. O
próprio processo de industrialização criou novos riscos, ou seja, tem-se agora riscos
socialmente criados, obrigando o legislador a repensar a noção de responsabilidade.
15
Esses
novos riscos sem possibilidade de delimitação espacial, temporal e social
16
se caracterizam
por serem imperceptíveis, invisíveis e imprevisíveis, ensejando a predominância da prevenção
lato sensu (prevenção stricto sensu e precaução) “como palavra de ordem para evitar a
concretização de danos futuros”.
17
Nas palavras de Carvalho:
Há de se considerar que os avanços científicos, o progresso da tecnologia e o
crescimento industrial desencadeiam uma imprevisibilidade das conseqüências
dessas atividades sobre o meio ambiente. Assim, aos riscos concretos (previsíveis)
da sociedade industrial são incorporados e acrescidos os riscos
invisíveis/imprevisíveis característicos da sociedade hodierna, exigindo a
resignificação da teoria do risco para fins de atribuição da responsabilidade civil.
18
Para que o Direito possa assimilar o risco, realizando sua investigação, avaliação e
gestão, é necessário dar-lhe sentido jurídico. Mais uma vez, a sociedade está diante de
mutações estruturais que exigem mudança também dos institutos jurídicos, a fim de dar
respaldo à nova realidade. Tais mudanças sociais desencadeadas pelos processos
tecnocientíficos massificados exigem que se tomem decisões judiciais sem a necessidade da
ocorrência de um dano, como ocorria na sociedade industrial. A complexidade dos riscos e as
11
STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no
direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 74.
12
CARVALHO, 2008, p. 59.
13
BECK, 1998, p. 25.
14
LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patrick de Araújo. Direito ambiental na sociedade de risco. 2. ed. rev.
atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 17.
15
LOUREIRO, João. Da sociedade técnica de massas à sociedade de risco: prevenção, precaução e tecnociência
– algumas questões juspubliscistas. Boletim da Faculdade de Direito: Studia Iuridica, Coimbra v. 61, 2000. p.
804.
16
Das teses de Ulrich Beck sobre os novos riscos ambientais.
17
CARVALHO, 2008, p. 60.
18
Ibidem. p. 61.
8
incertezas científicas atuais clamam por tomadas de decisões de caráter preventivo lato sensu,
tendentes a evitar suas possíveis e desconhecidas consequências futuras.
Na medida em que os riscos são consequências não desejadas decorrentes das
decisões tomadas no presente, necessário realizar uma distinção entre os sentidos de risco e
perigo. No primeiro, temos a ação e controle do agente, ou seja, é o agente quem cria e
desencadeia as situações de risco. Já no perigo, as conseqüências não desejadas são
provenientes do ambiente, não existe elemento de controle ou vontade. Os riscos são criados
pela própria sociedade, ao contrário dos perigos, que são eventos da natureza. O que ocorre é
que, na constatação de Luhmann
19
, o avanço da tecnologia e o grande controle do homem
sobre as condições da natureza aumentam a possibilidade da ocorrência dos riscos, e até
mesmo a transformação dos perigos em riscos propriamente ditos.
A diferença primordial entre a sociedade industrial e a sociedade de riscos reside na
comunicação dos riscos com o futuro. Enquanto na primeira a responsabilidade objetiva
funcionava como elemento de reparação de danos, na segunda, muito mais importante é a sua
atuação como instrumento de gerenciamento de riscos ambientais, antecipando-se à sua
ocorrência, agindo preventivamente. Da necessidade de acompanhamento das mudanças
estruturais na sociedade (de industrial para pós-industrial ou de riscos), de riscos concretos
(conhecidos) para riscos abstratos (invisíveis, imprevisíveis e imperceptíveis), a
responsabilidade civil objetiva passa a atuar não apenas como remédio aos danos causados,
mas também como forma de evitar, de prevenir a ocorrência desses danos.
2.2 DO DIREITO DE DANOS AO DIREITO DE RISCOS
2.2.1 Conceito e espécies dos danos ambientais
Para uma correta compreensão do que seja dano ambiental, é fundamental entender a
definição de dano no sentido amplo. Literalmente, “dano é estrago, deterioração,
19
LUHMANN, Niklas. Sociologia del riesgo. Guadalajara: Universidad Iberoamericana/Universidad de
Guadalajara, 1992. p. 70-71.
9
danificação”.
20
Dano dá idéia de lesão, agressão, ofensa, perda, depreciação, prejuízo. Para
Antunes:
O dano é prejuízo causado a alguém por um terceiro que se vê obrigado ao
ressarcimento. É juridicamente irrelevante o prejuízo que tenha por origem um ato
ou uma omissão imputável ao próprio prejudicado. A ação ou omissão de um
terceiro é essencial. Decorre daí que dano implica em alteração de uma situação
jurídica, material ou moral, cuja titularidade não possa ser atribuída àquele
que, voluntária ou involuntariamente, tenha dado origem à mencionada
alteração. Desnecessário dizer que, no conceito, somente se incluem as
alterações negativas, pois não há dano se as condições foram alteradas para
melhor. É a variação, moral ou material, negativa que deverá ser, na medida do
possível, mensurada de forma que se possa efetivar o ressarcimento. Posta nestes
termos, a questão parece simples. Contudo, é nesta aparente simplicidade que se
encontram as mais significativas dificuldades do Direito Ambiental.
21
(grifou-se)
As dificuldades de conceituação de dano ambiental ocorrem, principalmente, em
razão da legislação brasileira não ter elaborado uma noção técnico-jurídica de meio ambiente.
Sendo o próprio conceito de meio ambiente impreciso, sujeitando-se a ser compreendido de
acordo com análises fáticas, o mesmo ocorre quanto à elaboração de um conceito de dano
ambiental.
22
Diante das constantes evoluções e mudanças sociais, principalmente quanto à
temática ambiental, “a inexistência de uma legislação expressa do conceito de dano ambiental
favorece uma construção dinâmica de seu sentido na interação entre a doutrina e os
tribunais”,
23
resguardando o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e, por
consequência, a qualidade de vida.
Não obstante, a legislação brasileira conceitua expressamente as noções de
degradação e poluição, possibilitando ao legislador, a partir desses conceitos, a elaboração do
sentido de dano ambiental nos casos em que se configurarem. Nesse sentido, os incisos II e III
do artigo 3º da Lei nº 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente,
dispõem, respectivamente, que degradação da qualidade ambiental é “a alteração adversa das
características do meio ambiente”, enquanto poluição é:
a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou
indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b)
criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem
desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio
20
FERREIRA, Aurélio Buarque de Hollanda. Novo dicionário aurélio da língua portuguesa. 2. ed. rev. e ampl.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. p. 519.
21
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 7. ed. rev. ampl. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p.
239.
22
ANTUNES, Paulo de Bessa. Dano Ambiental: uma abordagem conceitual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002.
p. 246-247.
23
CARVALHO, 2008, p. 79.
10
ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais
estabelecidos.
Sendo o dano, em sentido geral, uma lesão ou ofensa a bem ou interesse
juridicamente protegido, e sendo o meio ambiente um desses bens, conjugando as definições
de degradação e poluição, tem-se que o dano ambiental é uma alteração adversa das
características do meio ambiente, ou seja, uma lesão ao bem ambiental. O principal fator para
indicar a aferição do dano ambiental está na ruptura do equilíbrio ecológico.
24
Não basta
apenas a prática de atos negativos ao meio ambiente, é necessário que esses atos importem no
desequilíbrio do panorama ambiental. “Para a ocorrência de dano ambiental será preciso um
abalo, um comprometimento, uma ofensa ao bem ambiental”.
25
A própria complexidade do bem ambienta,l aliada às incertezas científicas e ao
potencial ofensivo das atividades de risco e suas causas, ensejam a dificuldade na
conceituação e caracterização dos danos ambientais.
26
Referidos danos podem atingir de
forma direta, o meio ambiente (como o bem ambiental juridicamente protegido), repercutindo
como dano coletivo, atingindo interesses coletivos ou difusos, como também podem atingir,
de forma indireta ou reflexa, interesses individuais. É o que Milaré identifica como “dupla
face na danosidade ambiental”.
27
Outrossim, essa complexidade não atinge o meio ambiente
somente em seus aspectos individuais e coletivos, mas também seus aspectos natural,
artificial, cultural e do trabalho, e também suas dimensões de macro
28
e microbem
29
.
Pelo exposto, entende-se que o dano ambiental detém diversas dimensões jurídicas,
possibilitando uma classificação quanto aos interesses lesados (dano ambiental individual e
dano ambiental coletivo) e quanto à natureza do bem lesado (dano ambiental patrimonial e
dano ambiental extrapatrimonial), como passaremos a expor a seguir. Importante salientar que
essas dimensões não são excludentes uma em relação às outras. Um mesmo dano pode atingir
uma ou até mesmo todas as suas dimensões.
30
24
Este raciocínio está baseado no que reza o caput do artigo 225 da Constituição Federal: “Todos têm direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida [...]”. (grifou-se)
25
VIANNA, 2005, p. 130.
26
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 12. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:
Malheiros, 2001. p. 326.
27
MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco. 5. ed. ref. atual. e ampl. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2007. p. 811.
28
“Conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica que permite, abriga
e rege a vida em todas as suas formas”, nos termos do inciso I do artigo 3º da Lei nº 6.938/81.
29
Os recursos naturais: solo, água, ar, espécies da fauna e da flora, recursos genéticos, ecossistemas, processos
ecológicos, paisagens e bens de valores culturais.
30
CARVALHO, 2008, p. 82.
11
Danos ambientais individuais (ou pessoais ou reflexos) são aqueles que, ao atingirem
o meio ambiente, atingem também, indiretamente, interesses individuais (saúde, patrimônio,
bem-estar) ou lesam um ente público (bens públicos).
31
Tem-se como exemplos os problemas
de saúde causados por emissão de gases tóxicos, ou, ainda, a infertilidade do solo de um
terreno privado causada pela poluição do lençol freático. Referidos exemplos têm previsão no
parágrafo 1º do artigo 14 da Lei nº 6.938/81, ao determinar que há obrigação do poluidor em
reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros.
32
Esses danos geram direito de
ações individuais, independentemente da ação coletiva.
De outro lado, tem-se os danos ambientais coletivos (ou ecológicos ou propriamente
ditos), configurados como aqueles que lesam o meio ambiente em si, globalmente
considerado, sem necessidade de averiguação quanto aos danos pessoais. São danos que
atingem o meio ambiente enquanto bem comum de todos, atingindo, dessa forma, toda a
coletividade. Assim, os danos ambientais ecológicos afetam interesses coletivos stricto sensu
(coletividade determinada) ou interesses difusos (coletividade indeterminada), tendo como
características a transindividualidade e a indivisibilidade, nos termos dos incisos I e II do
parágrafo único do artigo 81 da Lei nº 8.078/90.
33
Tais danos geram direito à ação civil
pública
34
ou ação popular.
35
A seguir, chega-se à classificação dos danos ambientais quanto à natureza do(s)
bem(ns) lesado(s). Danos ambientais patrimoniais levam em consideração a conceituação
31
CARVALHO, 2008, p. 82.
32
“Art. 14: [...] parág. 1º: Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado,
independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a
terceiros, afetados por sua atividade”.
33
“Art. 81: [...]
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I – interesses ou direito difusos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza
indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II – interesses ou direito coletivos, assim entendidos, para efeitos deste Código, os transindividuais de
natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte
contrária por uma relação jurídica base;
[...]”.
34
Ação regulada pela Lei nº 7.347/85, que visa, explicitamente, proteger o meio ambiente, o consumidor e os
bens e interesses de valor artístico, estético, histórico, paisagístico e turístico, que são interesses difusos ou
coletivos. Seu artigo 5º determina quem pode ser autor de Ação Civil Pública. Mas é a Lei nº 6.938/81, em seu
artigo 1º, que faz constar a legitimidade do Ministério Público da União e dos Estados para propor ação civil
pública por danos causados ao meio ambiente. (MACHADO, 2001, p. 355-357.)
35
A ação popular está prevista no inciso LXXIII, do artigo 5º da Constituição Federal, que preconiza: “qualquer
cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise anular ato lesivo ao patrimônio público ou de
entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico
e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência”.
(grifou-se)
12
clássica de propriedade de bens.
36
O meio ambiente, em suas esferas macro ou micro, como
bem ambiental. Como microbem, seus elementos são de propriedade do titular; como
macrobem, bem de uso comum do povo, ou seja, de “propriedade” de todos. Para sua
configuração, as lesões atingem diretamente o meio ambiente, causando-lhe um menoscabo,
uma desvalorização, rompendo-se o equilíbrio ecológico, como já mencionado anteriormente.
Já os danos ambientais extrapatrimoniais (ou morais) estão fora da esfera
patrimonial. São danos que afetam o meio ambiente ou os indivíduos, ultrapassando os limites
materiais. Todos os prejuízos não patrimoniais ocasionados ao indivíduo ou à sociedade , em
razão de lesão ao meio ambiente, configuram-se como danos morais ambientais.
37
São
caracterizados por sentimentos negativos em vista de degradação ambiental, podendo ser
individuais
38
ou transindividuais. Esse último é evidenciado por um sentimento público de
comoção e perturbação à comunidade. A esse respeito, Carvalho:
Quando uma agressão ao patrimônio ambiental acarretar desvalorização imaterial do
meio ambiente ecologicamente equilibrado ou a perda da qualidade de vida das
presentes e futuras gerações, tem-se o dano ambiental extrapatrimonial coletivo ou
transindividual, decorrente do sentimento negativo sentido por uma coletividade em
razão da violação de valores imateriais coletivos.
39
Pela importância e complexidade do meio ambiente, o âmbito de sua proteção deve
ser o mais abrangente possível, sendo essa mais uma justificativa para o reconhecimento
jurídico do dano ambiental moral, em suas esferas individual
40
e coletiva
41
. Pode-se formar,
assim, o entendimento de que o dano ambiental é ofensa ou lesão ao meio ambiente,
rompendo o seu equilíbrio ecológico. Ainda, pode ser de caráter individual (atingindo
unitariamente o indivíduo) ou de caráter transindividual (coletivo). As repercussões do dano
ambiental alcançam tanto o meio ambiente natural quanto seus aspectos relativos à vida
humana.
36
LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2000. p. 101.
37
Ibidem.
38
A fundamentação legal.
39
CARVALHO, 2008, p. 85.
40
O fundamento legal para a reparação do dano ambiental moral individual está contido na Constituição Federal:
“Art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos seguintes termos: V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenização por dano material, moral ou à imagem. [...] X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a
honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação”.
41
Para a reparação do dano ambiental moral coletivo, o fundamento está na Lei nº 7.347/85: “Art. 1º: Regem-se
pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e
patrimoniais causados: I – ao meio ambiente; [...] IV – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo; [...]”
13
2.2.2 Conceito, classificação e características dos riscos ambientais
Em virtude do avanço tecnológico e científico, tem-se a passagem da sociedade
industrial (de massas) para a sociedade de riscos, caracterizada pelo surgimento de
tecnologias tão complexas que dificultam a identificação de suas possíveis consequências
nocivas. Essa evolução científica não foi acompanhada por uma compreensão segura dessas
consequências. Dessa forma, a incerteza científica é a marca das novas tecnologias da
sociedade contemporânea (pós-industrial). “A passagem de uma forma mecanicista para uma
formatação tecnologicamente potencializada”,
42
ao produzir mudanças sociais, produz
também mudanças no Direito Ambiental, tendentes a lidar com esses novos danos e riscos
ecológicos.
Dessa forma, é possível verificar, hoje, a existência de duas espécies de riscos: os
concretos e os abstratos. Os riscos concretos, característicos da sociedade industrial, são
calculáveis, passíveis de uma “análise de risco determinística”,
43
ou seja, uma análise segura
das causas e efeitos decorrentes do desenvolvimento de certa atividade. “Os riscos concretos
são, na verdade, consequências nocivas de uma determinada atividade ou técnica, cujo
conjunto de causalidades é provável e calculável pelo conhecimento científico vigente”.
44
Em
decorrência, tem-se que “o conceito de risco remete à probabilidade de ocorrência de danos
(efeitos indesejáveis)”.
45
A teoria do risco concreto, nesse modelo de sociedade, é fundamento para a
atribuição de responsabilidade independentemente de culpa do causador (responsabilidade
objetiva), mas condiciona a incidência da responsabilização à concretização do dano
(calculado anteriormente, por partir de um risco concreto, conhecido). Esse modelo apenas
exonera a vítima de provar a culpa do agente.
46
Ocorre que, superada a previsibilidade e segurança jurídica acerca dos possíveis
danos ambientais, a constante evolução tecnocientífica faz surgir novos riscos, os riscos
abstratos (ou invisíveis). Na sociedade de risco, o sentido de risco deve ser compreendido
como, nas palavras de De Giorgi, “uma forma de constituição de formas para a representação
42
CARVALHO, 2008, p. 66.
43
LUHMANN, 1992, p. 63.
44
CARVALHO, op. cit., p. 67.
45
SILVA, Carlos Celso do Amaral. Avaliação, comunicação e gerenciamento de riscos ambientais: perspectivas
dentro da realidade brasileira. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, v. 10, n. 39, jul./set. 2005. p. 50.
46
CARVALHO, Délton Winter de. Dano ambiental futuro: a responsabilização civil pelo risco ambiental.
Revista de Direito Ambiental, São Paulo, v. 12, n. 45, jan./mar. 2007a. p. 67.
14
do futuro e para produzir vínculos com o futuro”.
47
Esses novos riscos desencadeados pela
rapidez dos processos produtivos não possibilitam uma análise segura de suas consequências,
tendo como características a invisibilidade, a globalidade e a transtemporalidade.
48
A primeira característica dos riscos abstratos é a invisibilidade, que quer dizer que
fogem à percepção dos sentidos humanos, assim como não há conhecimento científico seguro
acerca de suas reais dimensões.
49
Esses riscos não revelam situações de excepcional
gravidade, consistindo num padrão de normalidade no presente. São efeitos cumulativos e
progressivos, como, por exemplo, contaminações por elementos tóxicos contidos nos
alimentos, que só serão sentidas após anos
50
, talvez de forma grave e irreversível. Enquanto
nos riscos concretos, a causalidade é conhecida, nos riscos abstratos as causas (e também os
efeitos) são complexas, indeterminadas. As dificuldades científicas são tão grandes que
permitem apenas um juízo de probabilidade/improbabilidade acerca das possíveis
consequências.
Por globalidade, deve-se entender que os riscos abstratos ultrapassam fronteiras
espaciais. Suas dimensões são planetárias. Referidos riscos atingem um número
indeterminado e indeterminável de sujeitos, ameaçando interesses coletivos e difusos. “Na era
da globalização (pós-industrialismo), tanto as conseqüências positivas quanto as negativas
desencadeiam efeitos de dimensões globais”.
51
Diferentemente dos riscos concretos da
sociedade industrial, cujos efeitos ficavam delimitados a determinados locais, os riscos atuais
ameaçam a sociedade mundial. São riscos globais no âmbito de seu alcance.
52
Exemplo típico
da globalidade dos riscos abstratos é o acidente nuclear de Chernobil.
Por último, identifica-se a transtemporalidade dos riscos abstratos, que significa que
não há limite temporal para as consequências dos danos ambientais. Dessa forma, os riscos
ambientais “são capazes de gerar uma comunicação jurídica acerca dos riscos (probabilidade
danos futuros)”.
53
A conscientização acerca da irreversibilidade dos danos ambientais e, dessa
maneira, da “possível destruição da vida na Terra”,
54
possibilita e exige do Direito uma
comunicação com o futuro. É preciso que as decisões tomadas no presente levem em
consideração as possíveis consequências às gerações futuras. Assim, “os riscos ambientais
47
DE GIORGI, Raffaele. Direito, democracia e risco: vínculos com o futuro. Porto Alegre: Safe, 1992. p. 193.
48
CARVALHO, 2008, p. 67.
49
CARVALHO, Délton Winter de. O direito e o gerenciamento dos riscos ambientais. Revista Gestão e
Desenvolvimento, Novo Hamburgo, v. 4, n. 1, jan. 2007b. p. 103.
50
STEIGLEDER, 2004, p. 75.
51
CARVALHO, 2008, p. 69.
52
STEIGLEDER, op. cit., p. 75.
53
CARVALHO, 2008, p. 69.
54
BECK, 1998, p. 27.
15
devem ser vislumbrados como um meio comunicativo para construir observações acerca do
futuro do ambiente”.
55
Superada a noção de riscos ambientais e os elementos de sua caracterização,
importante realizar a distinção entre risco e perigo
56
, para, a partir daí, construir uma
comunicação jurídica com o futuro antecipando-se à concretização de danos ambientais. O
risco concreto, conforme já mencionado, consiste nas consequências indesejadas decorrentes
das decisões tomadas anteriormente, havendo uma certa possibilidade de controle. Os riscos
levam em consideração as consequências futuras das decisões presentes. Assim, passados por
um processo de tomada de decisões, os possíveis danos são consequências da conduta do
agente.
Já o perigo está relacionado a consequências também indesejadas, mas decorrentes
do próprio ambiente, ou seja, independem da conduta humana. Exemplos de perigos são as
catástofres naturais e os fenômenos meteorológicos. Os perigos não possibilitam um controle
das consequências prejudiciais, ao contrário dos riscos, em que essa possibilidade de controle
é maior. Como já referido anteriormente, a intervenção do homem sobre as condições de vida,
cada vez mais, transformam situações de perigo em situações de risco, além de ocasionar o
surgimento de novos riscos.
Sendo o risco uma consequência indesejada de uma tomada de decisão pelo agente,
sua jurisdicização possibilita a sua comunicação com o futuro, através da aplicação de um
juízo de probabilidade/improbabilidade (modelos quantitativos de análise de riscos e modelos
qualitativos de estimativa de riscos
57
), e, dessa forma, se obtém um mecanismo de controle
dos danos ambientais presentes (aqueles cujos riscos de ocorrência são conhecidos e
determináveis) e futuros (aqueles cujos riscos, além de desconhecidos, não são
determináveis). Essa comunicação normativa é explicada pela prevenção lato sensu
(prevenção stricto sensu e precaução)
58
, instituto que será detalhado adiante no texto.
A formação da noção de risco tem como função permitir ao Direito, estruturalmente,
a produção de processos decisivos para investigar, avaliar e gerir os riscos ambientais, e, para
tanto, precisam se antecipar à ocorrência desses danos.
59
O fato é que a sociedade exige não
somente a aplicação da responsabilidade objetiva em matéria ambiental, sem a necessidade da
comprovação do agente quando da ocorrência de dano ambiental, mas impõe-se a necessidade
55
CARVALHO, 2008, p. 70.
56
Acerca da distinção entre risco e perigo: CARVALHO, 2007a, p. 67-68; LOUREIRO, 2000, p. 807-809.
57
SILVA, 2005, p. 51.
58
CARVALHO, 2008, p. 69-71.
59
CARVALHO, 2007a, p. 68.
16
de um sistema de responsabilização sem dano, agindo preventivamente, atuando como um
instituto de gestão de riscos ambientais.
2.3 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DE DIREITO AMBIENTAL APLICADOS À
GESTÃO DE RISCOS ECOLÓGICOS
Os princípios fundamentais de direito ambiental devem ser entendidos como as
primeiras estruturas, as proposições básicas que pautam o direito ambiental, cuja finalidade é
a proteção do meio ambiente.
60
Nesse sentido, os princípios são o ponto de partida, são “o
mandamento nuclear de um sistema”,
61
ou seja, não são apenas valores a serem seguidos,
dependentes de simples preferências pessoais; instituem, verdadeiramente, “o dever de adotar
comportamentos necessários à realização de um estado de coisas”.
62
Esse dever ocorre
independentemente da positivação destes princípios, ou seja, independentemente de estarem
expressamente previstos em textos legais, embora os princípios fundamentais de direito
ambiental, em sua maioria, encontrem previsão expressa nos diplomas legais, sendo
chamados, dessa forma, de princípios jurídicos positivados.
63
Os princípios jurídicos positivados não podem ser confundidos com as regras de
direito. As normas de direito são divididas em princípios e regras. Os princípios, como
explicado no parágrafo anterior, são normas gerais, mais abrangentes, que não estão
necessariamente expressas ou escritas nos textos jurídicos, e que se constituem no dever de
adoção de comportamentos tendentes à realização de um estado de coisas, que, no caso da
gestão de riscos ecológicos, é o “dever de preventividade objetiva”
64
de proteção do meio
ambiente. Regras devem estar sempre expressamente previstas nos diplomas jurídicos e são,
nas palavras de Ávila, “normas imediatamente descritivas [...], para cuja aplicação exigem a
avaliação da correspondência entre a construção conceitual da descrição normativa e a
construção conceitual dos fatos”.
65
(grifo do autor)
60
MILARÉ, 2007, p. 760-761.
61
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p.
922.
62
ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 5. ed. São Paulo:
Malheiros, 2006. p. 80.
63
MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Princípios fundamentais do direito ambiental. Revista de Direito Ambiental, São
Paulo, n. 2, 1996. p. 53.
64
CARVALHO, 2008, p. 71.
65
ÁVILA, op. cit., p. 80-81.
17
O instituto da responsabilidade civil ambiental como instrumento de decisão acerca
dos riscos ambientais (concretos e abstratos) funciona como forma de comunicação do
presente com o futuro. Para uma correta gestão dos riscos ambientais, a fim de evitar a sua
ocorrência em danos, é preciso que o Direito se utilize da noção normativa emanada da
prevenção lato sensu, como já citado anteriormente. É no pensamento acautelatório, prévio à
ocorrência de danos, que se funda a gestão dos riscos no direito ambiental. Para tanto,
necessária a análise dos princípios de direito ambiental aplicáveis à responsabilidade civil
ambiental.
Nos termos do caput e do parágrafo primeiro do artigo 225 da Constituição
Federal,
66
impõe-se uma normatividade de antecipação aos danos ambientais, ou seja, impõe-
se uma obrigação de prevenção, traduzida no dever de preventividade objetiva, descrito por
Carvalho. É justamente essa ênfase preventiva que possibilita a operacionalidade do Direito
para comunicar-se com o futuro.
Tendo em vista a existência de riscos (resultados indesejáveis) ao meio ambiente,
sendo calculáveis (riscos concretos) ou apenas passíveis de juízos de
probabilidade/improbabilidade (riscos abstratos), necessária a tutela preventiva do Direito a
fim de evitar a concretização desses riscos em danos. Para tanto, a prevenção ambiental se
desdobra em prevenção stricto sensu (ou propriamente dita) e precaução, além de emanar
outros princípios acautelatórios de direito ambiental, a seguir.
2.3.1 Princípio da prevenção (stricto sensu)
Conforme Antunes, o princípio da prevenção “aplica-se a impactos ambientais já
conhecidos e dos quais se possa, com segurança, estabelecer um conjunto de nexos de
causalidade que seja suficiente para a identificação dos impactos futuros prováveis”.
67
Portanto, o princípio da prevenção recai sobre os riscos concretos, cujo conhecimento
científico é capaz de determinar as causas e efeitos, ou seja, “se tem elementos seguros para
66
“Art. 225: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
67
ANTUNES, 2005, p. 35.
18
afirmar que uma determinada atividade é efetivamente perigosa”,
68
potencialmente causadora
de danos.
Nesses casos, o gerenciamento desses riscos ambientais pode ser feito baseado no
conhecimento científico acumulado sobre o meio ambiente. Exemplos de instrumentos para
gestão desses riscos são o licenciamento ambiental e as avaliações de impacto ambiental.
69
Assim demonstra Milaré:
Tome-se o caso, por exemplo, de indústria geradora de materiais particulados que
pretendia instalar-se em zona industrial já saturada, cujo projeto tenha exatamente o
condão de comprometer a capacidade de suporte da área. À evidência, em razão dos
riscos ou impactos já de antemão conhecidos, outra não pode ser a postura do órgão
de gestão ambiental que não a de – em obediência ao princípio da prevenção – negar
a pretendida licença.
70
O princípio da prevenção, assim como o da precaução, que será especificamente
analisado no próximo item, possibilita a mudança, a alteração no modus operandi da
informação da responsabilidade civil pelo dano ambiental, que, regra geral, ocorre após a sua
efetiva concretização. Pela incidência do princípio da prevenção, a responsabilização
ambiental depende tão somente da identificação da possibilidade concreta de ocorrência de
dano(s), sendo aplicada nesse momento anterior, já que supõe riscos conhecidos. Reconhecida
a possibilidade da concretização do risco em dano, impõe-se a adoção de medidas preventivas
a fim de evitar essa efetivação.
71
Milaré diz, ainda, que “os objetivos do direito ambiental são fundamentalmente
preventivos”,
72
na medida em que sua atenção está sempre voltada ao momento anterior à
concretização do dano, ao momento em que há simplesmente risco. De fato, isso ocorre
porque a degradação ambiental nem sempre é passível de reparação (como a extinção de uma
espécie, por exemplo), ainda que seja possível a sua compensação. E mesmo que a reparação
seja uma possibilidade, é uma atividade não apenas onerosa, mas também demorada.
Ora, se já existe conhecimento técnico-científico sobre as consequências nocivas de
determinadas atividades (riscos concretos), muito mais seguro evitar a sua concretização ou,
pelo menos, minimizar seus efeitos do que ter de lidar com toda a estrutura de sua reparação.
Reparação esta que, em muitos casos, já não é possível, dada a irreversibilidade de muitos
danos ambientais. A imposição de medidas preventivas justifica-se não somente pela
68
MILARÉ, 2007, p. 766.
69
ANTUNES, 2005, p. 36.
70
MILARÉ, op. cit., p. 766.
71
STEIGLEDER, 2004, p. 187-189.
72
MILARÉ, op. cit., p. 767.
19
possibilidade de ocorrência de danos ambientais, mas também pela comunicação do presente
com o futuro, já que existe a obrigação de proteger o meio ambiente não somente para as
gerações presentes, mas também para as futuras.
2.3.2 Princípio da precaução
A inovação trazida pelo princípio da precaução está no fato de que sua incidência se
dá nos casos de incerteza científica, em que as conseqüências futuras do exercício de certa
atividade ou do uso de determinado produto não são conhecidas ou não podem ser calculadas
e “haja indicações de que os possíveis efeitos sobre o ambiente, a saúde das pessoas ou dos
animais ou a proteção vegetal possam ser potencialmente perigosos e incompatíveis com o
nível de proteção escolhido”.
73
A precaução atua na esfera dos riscos abstratos, característicos
da nova realidade social, pós-industrial. Seu sentido normativo está contido no Princípio 15 da
Declaração do Rio de 1992:
Para proteger o meio ambiente, medidas de precaução devem ser largamente
aplicadas pelos Estados, segundo suas capacidades. Em caso de riscos de danos
graves e irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não deve servir de
pretexto para procrastinar a adoção de medidas visando a prevenir a degradação do
meio ambiente.
74
Na definição do supracitado Princípio 15, o princípio da precaução mostra-se como
instrumento de gestão dos riscos ambientais abstratos. Ao contrário de uma idéia de não-ação,
a precaução significa o uso de produtos e metodologias, para os quais o conhecimento
científico não é precisamente seguro, de forma controlada e com acompanhamento
transdisciplinar documentado. Aliás, é somente a partir desse estudo transdisciplinar que a
precaução é capaz de avaliar a probabilidade de materialização ou não dos riscos abstratos.
75
A falta de previsão técnica e normativa não pode ser entendida como autorização de exercício
de atividades para os quais o conhecimento científico não é seguro, não conhece suas
consequências.
73
MILARÉ, 2007, p. 767.
74
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Conferência das Nações Unidas sobre meio ambiente e
desenvolvimento. Rio de Janeiro: Organização das Nações Unidas, 1992. Disponível em:
<http://mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=188&idConteudo=576> Acesso em 07
dez. 2008.
75
CARVALHO, 2008, p. 73.
20
O risco será inaceitável quando a probabilidade de sua ocorrência e irreversibilidade
sejam determinantes ao ponto de justificar a proibição do desenvolvimento da atividade e suas
possíveis vantagens ou a imposição de medidas preventivas a fim de mitigar suas possíveis
conseqüências negativas indesejadas.
76
Exemplos recorrentes de sua aplicação são verificados
quando se discutem questões referentes ao aquecimento global, à engenharia genética, à
exposição a campos eletromagnéticos gerados por estações de radiobase, etc.
77
O principal
instrumento precaucional no direito brasileiro é o estudo prévio de impacto ambiental - EIA,
78
através do qual são levantados todos os riscos inerentes à certa atividade potencialmente
danosa, com o intuito de viabilizar informações para o licenciamento ambiental, que deverá
impor medidas preventivas e mitigadoras dos impactos ambientais.
79
Derani traduz o sentido mais profundo do princípio em questão ao referir que “o
princípio da precaução está ligado aos conceitos de afastamento de perigo e segurança das
gerações futuras, como também de sustentabilidade ambiental das atividades humanas”.
80
É a
proteção da existência humana e das demais espécies, seja através da proteção do meio
ambiente, seja através do asseguramento direto da integridade humana, o verdadeiro e último
sentido do princípio da precaução. Dessa forma, é preciso entendê-lo como pressuposto de
todo e qualquer processo decisório político que envolva a gestão de riscos.
81
No direito pátrio, o princípio da precaução foi implicitamente adotado pela
Constituição Federal, na preocupação do legislador em “controlar a produção, a
comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a
vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”.
82
Expressamente, a precaução foi normatizada
na ratificação da Convenção das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima.
83
Ainda, a Lei nº
9.605/1998
84
considera que a omissão na adoção de medidas de precaução é capaz de sujeitar
o infrator a reprimenda equivalente à do crime de poluição qualificado pelo resultado. A Lei
76
CARVALHO, 2008, p. 73.
77
MILARÉ, 2007, p. 768.
78
Previsto no artigo 9º, III, da Lei nº 6.938/1981, no artigo 225, parágrafo 1º, inciso IV, da Constituição Federal
e na Resolução nº 01/1986, do Conselho Nacional de Meio Ambiente - CONAMA.
79
STEIGLEDER, 2004, p. 188.
80
DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. São Paulo: Max Limonad, 1997. p. 167.
81
LEITE; AYALA, 2004, p. 66-67.
82
Art. 225, V, da Constituição Federal.
83
“Art. 3º, 3: As partes devem adotar medidas de precaução para prever, evitar ou minimizar as causas da
mudança do clima e mitigar seus efeitos negativos. Quando surgirem ameaças de danos sérios ou irreversíveis,
a falta de plena certeza científica não deve ser usada como razão para postergar essas medidas [...]”.
84
“Art. 54: [...] parágrafo 3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar,
quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental
grave ou irreversível.”
21
nº 11.105/2005 (Lei da Biossegurança) também faz menção ao princípio em suas exposições
preliminares.
85
2.3.3 Princípio do poluidor-pagador e princípio da responsabilização
A despeito da máxima de prevenção ambiental, importante lembrar que a
responsabilidade civil ambiental se aproxima também do princípio do poluidor-pagador. Ao
contrário da idéia aparente, não é somente uma questão de que quem polui deve arcar com a
reparação do dano ambiental, não é uma idéia meramente consequencial, de responsabilização
posterior à ocorrência do dano. Aliás, o princípio poluidor-pagador não é sinônimo nem deve
ser confundido com o princípio da responsabilização ou repressão, que são apenas “duas das
possibilidades de manifestação do princípio”.
86
Impõe-se à responsabilidade civil o dever de internalização das externalidades
ambientais negativas, ou seja, impõe-se às fontes poluidoras/degradadoras as obrigações de
incorporar aos seus processos produtivos, os custos com prevenção, controle e reparação dos
impactos ambientais, impedindo, dessa forma, a socialização dos riscos. Nessa esteira, adverte
Benjamim:
O princípio poluidor-pagador não é um princípio de compensação dos danos
causados pela poluição. Seu alcance é muito mais amplo, incluídos todos os custos
da proteção ambiental, ‘quaisquer que eles sejam’, abarcando, a nosso ver, os custos
de prevenção, de reparação e de repressão do dano ambiental, assim como aqueles
outros relacionados com a própria utilização dos recursos ambientais,
particularmente os naturais [...].
87
Assim, conforme os ensinamentos de Benjamim, é incorreto o entendimento de que
este princípio tem apenas uma natureza corretiva. O princípio não tem o sentido de uma
85
“Art. 1º, caput: Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o
cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o
armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de
organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço
científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a
observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente.” (grifou-se)
86
LEITE; AYALA, 2004, p. 99.
87
BENJAMIM, Antonio Herman de V. e. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. In:
BENJAMIM, Antonio Herman de V. e (Coord.). Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 231.
22
“licença para poluir”.
88
A primeira ótica a ser considerada é a do potencial poluidor como o
“primeiro pagador”: antes de poluir, ele é pagador. Pagador dos custos relativos às medidas
preventivas e precaucionais que se destinam a evitar a concretização dos riscos ambientais. O
objetivo principal de sua aplicação não é a reparação nem a repressão da ocorrência de danos,
que são apenas posteriores, mas sim a tomada de medidas preventivas para evitar que essas
consequências negativas aconteçam.
Para tornar efetiva a aplicação deste princípio, os pagamentos impostos aos
potenciais poluidores devem levar em consideração os custos de medidas de prevenção e
precaução de danos ao meio ambiente. A degradação ambiental não pode ser mais
interessante ao potencial poluidor do que a adoção de medidas preventivas. Os custos das
consequências dos danos ambientais, que ficariam a cargo da sociedade, são suportados pelos
sujeitos que desenvolvem atividades potencialmente danosas ao meio ambiente no próprio
processo de produção.
No direito brasileiro, o princípio poluidor-pagador foi incorporado pelo inciso VII do
artigo 4º da Lei nº 6.938/81
89
e pelos parágrafos 2º e 3º do artigo 225 da Constituição
Federal.
90
Muito embora essas previsões legais enfatizem apenas o caráter reparador e
repressor do princípio poluidor-pagador, deve-se enfatizar a sua vocação preventiva, não
vislumbrando, assim, uma autorização para poluir e arcar, posteriormente, com as
conseqüências desse dano.
91
O princípio da responsabilização existe porque, concretizada a ocorrência de um
dano, em virtude de falha dos instrumentos preventivos, o causador não pode simplesmente
sair impune. A prevenção (lato sensu) é a palavra de ordem e, por isso mesmo, o sistema de
prevenção das degradações deve ser o mais abrangente possível, impondo-se a
responsabilização de causadores de danos ambientais que venham a se concretizar.
88
LEITE; AYALA, 2004, p.96.
89
“Art 4º: A Política Nacional do Meio Ambiente visará: [...] IV – à imposição, ao poluidor e ao predador, da
obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados, e ao usuário, de contribuição pela utilização de
recursos ambientais com fins econômicos; [...].”
90
“Art. 225: [...] parág. 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente
degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei; parág. 3º
As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou
jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados;
[...].”
91
STEIGLEDER, 2004, p. 194.
23
2.3.4 Princípio da equidade intergeracional (ou solidariedade intergeracional) e os
direitos das futuras gerações
Sendo a responsabilidade civil ambiental, em sua ênfase preventiva, um mecanismo
de comunicação com o futuro, estabelecendo a gestão dos riscos ambientais abstratos (além
dos concretos), para os quais não há conhecimento científico seguro, necessário estabelecer
uma contextualização e conceituação do princípio da equidade intergeracional. Se há um
dever jurídico (e de ordem constitucional) de proteção ambiental para as presentes e futuras
gerações, necessário verificar como se dá essa comunicação.
A aplicação do princípio da eqüidade ou solidariedade intergeracional tem por
escopo assegurar a solidariedade da presente geração em relação às futuras, para que estas
também possam usufruir, de forma sustentável, dos bens ambientais. Há um caráter de
sucessividade neste princípio. Como solidariedade intergeracional estão traduzidos os
sentidos de vínculos solidários entre as presentes gerações e as gerações futuras.
92
As bases deste princípio são do direito internacional, podendo ser observada em
diversos diplomas internacionais.
93
Seu surgimento ocorreu a partir da Conferência das
Nações Unidas realizada em Estocolmo, em 1972, na perspectiva da preocupação global com
as futuras gerações. É justamente na estruturação das bases jurídicas, frente à necessidade de
implementação de “novos direitos”, mediante a formação de vínculos e controle do futuro
pelo direito ambiental, que reside a máxima da equidade intergeracional,
94
como forma de
solidariedade das presentes com as futuras gerações.
A constituição da equidade intergeracional revela a necessidade de formação de uma
“ética de alteridade intergeracional”
95
que reconheça que o homem não é apenas sujeito de
direitos em relação ao meio ambiente, tendo deveres e responsabilidades não somente no
presente, mas também em face do futuro. Para sua viabilização, o princípio da equidade
intergeracional é formado por três subprincípios: princípio da conservação das opções, que
significa que cada geração deve conservar a diversidade dos recursos naturais e culturais com
92
MILARÉ, 2007, p. 763.
93
O princípio da equidade intergeracional está inserido em diversos diplomas internacionais, tais como: Carta
das Nações Unidas, Preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, Convenção Internacional
sobre os Direitos Civis e Políticos, Convenção sobre a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio,
Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, Declaração para Eliminação de Discriminação
contra as Mulheres, Declaração sobre os Direitos da Criança, Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, Convenção sobre Diversidade Biológica, entre outros.
94
CARVALHO, 2008, p. 45.
95
LEITE; AYALA, 2004, p. 114.
24
a finalidade de não obstar restrição às opções disponíveis às futuras gerações; princípio da
conservação da qualidade, segundo o qual cada geração deve transmitir às próximas a
qualidade ambiental do planeta em condições equiparadas àquelas recebidas; e, por fim, o
princípio da conservação de acesso, segundo o qual “cada geração deveria prover seus
membros com direitos iguais de acesso ao legado das gerações passadas e conservar o acesso
para as futuras gerações”.
96
Normativamente, a equidade intergeracional está prevista constitucionalmente, no rol
dos princípios fundamentais de direito, no caput do artigo 225 da Constituição Federal, ao
estabelecer o meio ambiente como “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade
de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações.” (grifou-se)
No reconhecimento de que o homem é um ser finito com desejos infinitos, o
princípio da equidade ou solidariedade intergeracional traz a inovação no sentido de que as
futuras gerações não são somente interessadas na proteção ambiental, mas também são
sujeitos de direitos (e, consequentemente, o serão de deveres) no que tange ao patrimônio
ambiental. Dessa forma, incluídas as futuras gerações como titulares do direito à proteção do
meio ambiente, a comunicação com o futuro, através da imposição de medidas preventivas,
forma um sistema de solidariedade das presentes com as futuras gerações. Assim, a equidade
intergeracional mostra-se como um forte instrumento de gestão de riscos ambientais.
2.3.5 Princípio do limite de tolerabilidade
O princípio do limite de tolerabilidade consiste na linha tênue que diferencia os
impactos dos danos ambientais. Este princípio tem como função estabelecer o limite e a
diferenciação entre os impactos ambientais significativos (danos ambientais) e os impactos
ambientais irrelevantes (impactos ambientais propriamente ditos).
97
Os impactos ambientais
significativos se configuram em verdadeiros danos ambientais, quando concretizados; já os
impactos ambientais irrelevantes são meras alterações no meio ambiente, sem grandes
repercussões.
96
LEITE; AYALA, 2004, p. 118.
97
CARVALHO, 2008, p. 102.
25
Então, temos uma idéia de impacto ambiental lato sensu (impacto ambiental stricto
sensu e dano ambiental), que são as alterações ambientais de toda e qualquer natureza, mesmo
que não repercutam como consequências negativas que causem desequilíbrio ecológico.
Assim, o conceito de impacto ambiental é formulado pelo artigo 1º da Resolução nº 1/86 do
CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente:
Impacto ambiental é qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e
biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia
resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I – a saúde,
a segurança e o bem-estar da população; II – as atividades sociais e econômicas; III
– a biota; IV – as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V – a qualidade
dos recursos ambientais.
Essa subdivisão em impactos ambientais “stricto sensu” e danos ambientais é
operacionalizada pelo sistema jurídico porque nem toda alteração ambiental acarreta prejuízo
ou desequilíbrio ao meio ambiente. Se assim fosse, não admitiríamos a idéia de alteração
positiva, negando as possibilidades de mudanças inovadoras, que possam trazer benefícios ao
invés de conseqüências negativas.
98
Ainda, como bem ressalta Mirra:
Nem todo atentado ou agressão ao meio ambiente e seus elementos causa
necessariamente um prejuízo à qualidade ambiental. O próprio meio ambiente é
capaz de suportar pressões adversas; ele pode defender-se até um certo ponto, um
limite, além do qual ocorre a degradação.
99
Nesses termos, o limite de tolerabilidade “tem por escopo a ponderação e o equilíbrio
entre as atividades desenvolvimentistas do homem e a devida manutenção da qualidade do
patrimônio ambiental”.
100
Sem nem ao menos ser necessário entrar no mérito da questão de se
há ou não autorização para poluir (e é claro que não há), trata-se da utilização dos recursos
ambientais até o seu limite de tolerabilidade, ou seja, até o ponto em que não haja perda da
qualidade ambiental.
101
Nesse sentido, válida mais uma lição de Mirra:
A capacidade de absorção e reciclagem do meio ambiente de que se cogita aqui não
pode ser confundida com a capacidade de regeneração do meio ambiente. Aquela
primeira consiste na aptidão do meio atingido de digerir de certo modo
imediatamente e sem dano os rejeitos que lhe são submetidos, de resistir às
98
MACHADO, 2001, p. 325.
99
MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Ação civil pública e a reparação do dano ao meio ambiente. São Paulo: Juarez
de Oliveira, 2002. p. 100.
100
CARVALHO, 2008, p. 104.
101
LOUBET, Luciano Furtado. Delineamento do dano ambiental: o mito do dano por ato lícito. Revista de
Direito Ambiental, São Paulo, v. 10, n. 40, out./dez. 2005. p. 138.
26
perturbações impostas; a segunda representa a capacidade do meio ambiente de
recuperar-se quando é desequilibrado por alguma perturbação, supondo um prejuízo
já ocorrido, em que o limite de tolerabilidade foi ultrapassado.
102
Nessa linha de pensamento, a conclusão de Carvalho, para o qual o limite de
tolerabilidade é a “capacidade de assimilar imediatamente os impactos”
103
(que se configuram
em danos quando concretizados). Essa análise deve se dar de forma casoística, ou seja, na
avaliação caso a caso, de forma transdisciplinar. Esse entendimento pode ser retirado da
previsão normativa de poluição, contida no inciso III do artigo 3º da Lei nº 6.938/81, que é
amplo e não restringe o conceito de dano ambiental. Na análise do caso concreto, feita a
constatação do rompimento do equilíbrio ecológico, tem-se a incidência da responsabilização
civil ambiental, de forma preventiva, quando o dano ainda não se houver se configurado, ou
de forma reparadora/corretiva, quando o limite de tolerabilidade já foi ultrapassado.
2.4 RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL
2.4.1 Adoção da responsabilidade objetiva em matéria ambiental
Quando da explanação acerca da passagem da sociedade industrial para a sociedade
de riscos, discorreu-se brevemente sobre o instituto da responsabilidade civil ambiental,
frisando que a diferença da responsabilidade subjetiva para a responsabilidade objetiva reside
no elemento culpa, analisado no caso da primeira e posto de lado na última.
A responsabilidade civil subjetiva, em que é preciso provar a culpa do agente
causador para que se tenha direito à reparação do(s) dano(s) sofrido(s), ainda é a regra geral
de responsabilização, como disposto nos artigos 186 e 927 do Código Civil Brasileiro.
104
No
entanto, o direito ambiental é reconhecido como uma ciência autônoma, não estando obrigado
a seguir a referida regra, como não poderia fazê-lo, em virtude das particularidades da
natureza do bem ambiental. A responsabilidade civil ambiental, como destaca Arruda, “se
origina nas hostes do próprio Direito Ambiental, baseado em suas regras e seus princípios,
102
MIRRA, 2002, p. 104.
103
CARVALHO, 2008, p. 104.
104
“Art. 186: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito; Art. 927: Aquele que, por ato ilícito (arts,
186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”
27
com conceitos, categorias, pressupostos e funções específicas”, para exigir obrigações não
somente levando em consideração ações pretéritas, mas, também, “para exigir compromissos
para com o futuro”.
105
Tradicionalmente, o instituto da responsabilidade civil, sem adentrar no mérito da
responsabilidade ambiental, tem por escopo a obrigação de reparação de danos. Daí que dano
é pressuposto e elemento da responsabilidade civil. Assim concebida, se relaciona somente
com ações pretéritas, com consequências negativas, atuando apenas de forma reparatória e
repressora.
106
Em matéria ambiental, mesmo a simples objetivação do instituto não seria suficiente,
pois não se trata apenas de um direito de danos, mas de um direito de riscos. A razão da
adoção da responsabilidade objetiva em matéria ambiental nasceu justamente da necessidade
de proteção do meio ambiente e preservação dos recursos naturais, posto que o
desenvolvimento industrial, econômico e social, durante muito tempo, foi colocado em
primeiro plano, sem que houvesse uma preocupação com as consequências de tantas
atividades para o meio ambiente. Da constatação de que os recursos ambientais são finitos e
da irreversibilidade de certos danos ambientais, nasceu a responsabilidade objetiva ambiental.
como resposta à nova realidade observada.
A responsabilidade civil ambiental não possui caráter apenas reparatório como
resposta aos danos ambientais, mas tem também uma função acautelatória, preventiva, como
resposta aos riscos ambientais. O dever de proteção ambiental disposto no artigo 225 da
Constituição Federal, exprime a idéia da responsabilidade ambiental objetiva, recepcionando
o que foi consagrado com o advento da Lei nº 6.938/81, instituto através do qual começou-se
a dar adequado tratamento à matéria, fundamentando a responsabilidade no risco.
107
O artigo
14 da Lei nº 6.938/81, em seu parágrafo 1º, dispõe que “sem obstar a aplicação das
penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de
culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por
sua atividade. [...]”.
Esse risco referido no parágrafo 1º do artigo 14 da Lei nº 6.938/81, na estrutura
dogmática da responsabilidade civil é concreto, potencial. E nesse sentido há uma duplicidade
na função da responsabilidade civil, que não é apenas reparadora/repressiva, mas também
105
ARRUDA, Domingos Sávio de Barros. A categoria acautelatória da responsabilidade civil ambiental. Revista
de Direito Ambiental, São Paulo, v. 11, n. 42, abr./jun. 2006. p. 34.
106
Ibidem, p. 40-41.
107
MILARÉ, 2007, p. 896.
28
preventiva.
108
E é na sua função preventiva, de caráter pedagógico, que deve residir o seu
interesse primordial. É aí que a responsabilidade ambiental constrói uma comunicação com o
futuro: na imposição de medidas preventivas (obrigações de fazer e de não fazer), com o
intuito de evitar que os riscos ambientais se tornem verdadeiros danos.
A dogmática jurídica da responsabilidade civil ambiental ainda caminha no sentido
de formar um dever de preventividade lato sensu, englobando os deveres de prevenção stricto
sensu e de precaução. Ainda hoje, a responsabilidade ambiental baseia-se na incidência do
risco concreto, não trabalhando o risco abstrato. À frente, quando tratarmos do dano
ambiental futuro, ficará mais clara a necessidade de sua aferição.
2.4.2 Variações da teoria do risco concreto e as excludentes de responsabilidade
Não existem dúvidas quanto ao fundamento inicial de que a responsabilidade civil
ambiental abarca, em seu bojo, a teoria do risco concreto. Assim, todo aquele que exerce
atividade que cria risco de dano ao meio ambiente e a terceiro tem a obrigação de repará-lo (e
deve-se entender a idéia de reparação no seu sentido mais amplo, incluindo a aplicação de
medidas preventivas). Partindo dessa premissa, surgem na doutrina algumas modalidades
acerca desse risco concreto. Assim, cogita-se nas teorias de adoção do risco proveito, do risco
criado, do risco administrativo e, por fim, na teoria do risco integral.
Para Vianna, as primeiras modalidades de risco supramencionadas (proveito, criado e
administrativo) são equivalentes em seus efeitos. Ou seja, as três traduzem a ideia de
responsabilidade civil decorrente da atividade exercida pelo causador do dano (ou o potencial
causador do dano); é o exercício da atividade desenvolvida que gera a obrigação de
reparar/agir preventivamente. Dessa maneira, essas modalidades, que, em verdade, se
equiparam, não afastam a possibilidade de se invocar as excludentes do dever de
reparação/prevenção.
109
108
Para Paulo Affonso Leme Machado, “a Lei nº 7.347/85, embora dizendo ‘regem-se pelas disposições desta
Lei as ações de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente’ (art. 1º), deixa aberta a possibilidade
de ser observada a responsabilidade de prevenir ao ensejar a propositura da ação civil pública para o
‘cumprimento da obrigação de fazer ou não-fazer’. Assim, ‘o juiz determinará o cumprimento da prestação da
atividade devida, sob pena de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível (art. 11).”
(MACHADO, 2001, p. 330-331.)
109
VIANNA, 2005, p. 100-101.
29
Entretanto, para outros autores, essas três modalidades se diferenciam: a teoria do
risco proveito traduz dever de indenizar imposto àquele que desempenha atividade em seu
benefício, com o intuito de lucro; a teoria do risco criado traduz-se na assunção de possíveis
danos por aquele que executa certas atividades para obter um objetivo específico, ou seja, é o
próprio autor quem cria a possibilidade de causar danos; enfim, a teoria do risco
administrativo, nos termos do parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição Federal
110
, é a
aplicada à Administração Pública.
111
Como já mencionado anteriormente, o grande ponto da questão acerca das variações
do risco no direito ambiental reside na aceitação ou não das excludentes de responsabilidade.
Assim, essas modalidades de risco concreto podem ser condensadas em dois principais
entendimentos:
112
risco criado, condensando as três modalidades que admitem excludentes de
responsabilização, e risco integral, modalidade que não admite nenhuma forma de excludente
de responsabilidade.
Para a teoria do risco integral, a adoção da responsabilidade civil ambiental necessita
somente que se comprove a ocorrência do dano e relação de causa e efeito deste. “Para os
partidários dessa teoria, a simples existência da atividade já é reputada como condição para o
evento lesivo”, segundo Carvalho.
113
Mesmo que o dano seja involuntário, “responsabiliza-se
o agente por todo ato do qual fosse a causa material”, nas palavras de Steigleder.
114
Isso
porque o nexo de causalidade, ou seja, a relação de causa e efeito entre a atividade e o dano
não deve ser encarado como o liame entre o dano e a conduta do responsável, mas como o fio
de ligação entre o dano e a atividade desenvolvida, que se configura num conjunto de
atividades potencialmente causadoras de danos. Para Milaré, a teoria do risco integral
configura-se em: prescindibilidade de investigação de culpa, irrelevância da licitude da
atividade e inaplicabilidade de excludente.
115
Já a teoria do risco criado admite excludentes de responsabilidade, tendo em vista
que sujeita o agente à responsabilização por desenvolver, mesmo que licitamente, uma
atividade que implique em risco para o ambiente e terceiros, pois afastaria qualquer
110
“Art. 37: A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência e também, ao seguinte: [...] parág. 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado
prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a
terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável os casos de dolo ou culpa. [...]”.
111
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 2. ed. aum. e atual. São Paulo: Malheiros,
2001. p. 143-144.
112
CARVALHO, 2008, p. 117.
113
Ibidem.
114
STEIGLEDER, 2004, p. 198.
115
MILARÉ, 2007, p. 904-907.
30
subordinação do dever de reparação a um proveito obtido pelo agente.
116
Assim, se o prejuízo
causado ao meio ambiente não for causado diretamente pelo desenvolvimento dessa atividade,
não se configura a responsabilidade ambiental do agente.
As excludentes de responsabilidade, no Brasil, ficam restritas à força maior
117
e o
fato de terceiro.
118
A força maior consiste em evento natural, impossível de controle, mesmo
que haja a sua previsão. O fato de terceiro, literalmente, significa que o dano é ocasionado por
terceiro (que não guarda qualquer relação com a atividade), exclusivamente.
A Lei nº 6.938/8 manteve-se silente sobre qual das teorias do risco está filiada ao
direito ambiental. Mas como já restou demonstrado que a responsabilidade ambiental deve ser
o mais abrangente possível (inclusive, no seu caráter preventivo), nos termos do parágrafo 1º
do artigo 14 da citada Lei, parece evidente que é a do risco integral a teoria que deve ser
adotada. É a modalidade de risco defendida pela maioria dos autores, em virtude do
“reconhecimento da fragilidade dos recursos naturais e sua importância como bem da
vida”,
119
em que os riscos ambientais devem ser assumidos em sua totalidade, em sua
plenitude, em sua integralidade.
120
2.4.3 Pressupostos da responsabilidade civil ambiental
No sistema tradicional de responsabilidade civil ambiental, os pressupostos para a
sua configuração são o evento danoso e o nexo de causalidade entre esse dano e a atividade
desenvolvida pelo agente causador. Já a configuração da responsabilidade civil ambiental em
face do risco se aperfeiçoa com a presença de duas circunstâncias, a conduta e o nexo de
causalidade, que se diferenciam do sistema tradicional.
116
ATHIAS, Jorge Alex Nunes. Responsabilidade civil e meio ambiente: breve panorama do direito brasileiro.
In: BENJAMIM, Antonio Herman V. e. (Org.). Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1993. p. 243.
117
O caso de força maior é o fato que, mesmo em que haja previsão, não se pode controlar ou evitar, visto que é
uma força da natureza (uma força externa à atividade) muito mais forte que qualquer ação do homem.
Exemplo de força maior é o raio que atinge um depósito de resíduos. Diferentemente da força maior, embora
seja muito semelhante, o caso fortuito trata de situações que, apesar de não desejadas e programadas pelo
agente, ocorrem. São os riscos do desenvolvimento da atividade. Como exemplo, tem-se a quebra de
maquinário em estação de tratamento de efluentes. (SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 4. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1995. v. 1. p. 402.)
118
STEIGLEDER, 2004, p. 212.
119
VIANNA, 2005, p. 103.
120
Ibidem. p. 110.
31
A conduta, como pressuposto da responsabilidade ambiental também em sua função
acautelatória, pode ser definida como todo comportamento voluntário (ação ou omissão)
capaz de gerar condições concretas ou possibilidade de nocividade ao meio ambiente. Assim,
a conduta constitui inobservância do dever jurídico de objetividade preventiva (prudência e
zelo para com o meio ambiente), tornando o agente passível de responsabilização.
121
Quando
já configurado o dano, é este o elemento de obrigatoriedade do dever de responsabilização.
Mesmo afastada a investigação e discussão da culpa, a responsabilidade civil
ambiental objetiva prescinde do nexo de causalidade, ou seja, da relação de causa e efeito
entre a atividade e o risco ou dano dela advindo.
122
Este pressuposto se configura como o
“problema primordial”
123
dessa responsabilidade civil.
Para Pasqualotto, a teoria do risco, em verdade, desconsidera a relação de causa e
efeito entre uma determinada ação ou omissão e um determinado resultado, ou seja, a teoria
do risco desconsidera o nexo causal. O autor entende que o nexo de causalidade é fator
condicionante: não é uma relação de causa, mas sim condição imposta. Causa é fato gerador,
enquanto condição é circunstância propícia, e, “na responsabilidade objetiva quem põe a
circunstância assume o risco de produzir o resultado”.
124
Essa “condicionalidade danosa”,
125
como a conceitua Arruda, “é a circunstância fática decorrente de uma conduta humana
voluntária, configuradora de um risco intolerável ao meio ambiente”.
126
Nessa esteira, Steigleder entende que o ordenamento supõe que todo aquele que
desenvolve atividades gravadas com responsabilidade objetiva tem que fazer um juízo de
previsão das possíveis consequências pelo simples fato de desenvolvê-las, aceitando, dessa
forma, as consequências danosas que lhe são inerentes. O que ocorre é que a conduta do
agente não será investigada, pois a isso se substitui o risco.
127
Neste mesmo sentido, em razão da complexidade que envolve o bem ambiental,
cujos danos são produtos de várias causas concorrentes, simultâneas ou sucessivas, a idéia de
ampliação do nexo causal,
128
segundo Jonas. Assim, o simples desenvolvimento da atividade
potencialmente causadora de danos, ou seja, arriscada, é circunstância para o dano. E assim, a
121
ARRUDA, 2006, p. 60.
122
MILARÉ, 2007, p. 902-903.
123
GOMIS CATALÁ, Lucía. Responsabilidad por daños al medio ambiente. Pamplona: Arazandi, 1998. p. 160.
124
PASQUALOTTO, Adalberto. Responsabilidade civil por dano ambiental: considerações de ordem material e
processual. In: BENJAMIM, Antonio Herman V. e. (Org.). Dano ambiental: prevenção, reparação e
repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 454.
125
ARRUDA, op. cit., p. 61.
126
Ibidem.
127
STEIGLEDER, 2004, p. 196.
128
JONAS, Hans. El princípio de responsabilidad: ensayo de uma ética para la civilización tecnológica.
Barcelona: Herder, 1995. p. 31.
32
simples probabilidade de que essa atividade tenha causado ou possa causar dano é suficiente
para sua responsabilização, de forma preventiva ou reparadora.
Para que as incertezas científicas não se configurem em incertezas jurídicas, a
doutrina espanhola, por exemplo, possui a teoria das probabilidades, com graus de
suficiência de probabilidade, alta probabilidade ou probabilidade próxima da certeza. Assim,
a relação de causa e efeito (de condição e efeito, na verdade) é interpretada segundo uma idéia
de probabilidade, configurando-se quando for considerável ou determinística.
129
Podemos concluir, assim, que a avaliação do nexo de causalidade em matéria
ambiental deve passar por uma análise jurídica de probabilidade/improbabilidade de
determinada atividade ser ou não arriscada/causadora de danos. A realidade ambiental
apresentada, cujos riscos não são apenas os conhecidos, mas dotados de abstração, exige que
o Direito atue além dos seus juízos de certeza, estabelecendo, dessa maneira, juízos de
probabilidade/improbabilidade. Essa conclusão pode ser retirada, inclusive, do artigo 10 da
Convenção de Lugano, de 1993,
130
sobre o regime de responsabilidade civil por danos
resultantes de atividades potencialmente danosas ao meio ambiente, cuja orientação é a de que
a caracterização do nexo causal se dê através de sua verossimilhança, sempre que a atividade
avaliada for potencialmente perigosa e seja demonstrada a probabilidade de ter ocasionado o
dano ambiental.
131
2.4.4 Solidariedade passiva dos sujeitos responsáveis
A Lei nº 6.938/81, no inciso IV do artigo 3º, identifica como poluidor “a pessoa
física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por
atividade causadora de degradação ambiental”. Assim, todo aquele que se encontrar envolvido
com a conduta que enseja o risco ambiental ou ensejou o dano, é ou será obrigado, por força
da regra da solidariedade
132
, a responder pelas medidas preventivas a fim de evitar a
129
GOMIS CATALÁ, 1998, p. 164-165.
130
“Art. 10. Causalidade. Ao considerar as provas do vínculo causal entre o incidente e o dano ou, no contexto
da atividade perigosa conforme definida no art. 2º, §1º, subparágrafo d, entre a atividade e do dano, o tribunal
(judiciário) deverá levar na devida consideração o perigo acrescido de causar tal dano, inerente à atividade
perigosa.” (SOARES, Guido Fernando Silva. Direito internacional do meio ambiente: emergências,
obrigações e responsabilidades. São Paulo: Atlas, 2001. p. 830)
131
SOARES, op.cit. p. 830-831.
132
A solidariedade é orientação do artigo 942 do Código Civil, que tem a seguinte redação:
33
concretização do risco, ou quando já concretizado, a responder pelas medidas
reparadoras/indenizatórias.
O princípio da responsabilidade solidária traduz-se na máxima de que todos aqueles
que, de alguma forma, direta ou indireta, contribuem para a ocorrência de dano ambiental,
devem responder pela integralidade do dano. A questão da repartição da quota de
responsabilidade de cada agente é interna, entre os causadores, por meio do exercício do
direito de regresso, nos termos do artigo 934 do Código Civil,
133
daquele que respondeu por
todo o dano ou de forma excedente ao seu percentual de participação. Nesse ponto, verifica-se
uma espécie de responsabilidade subjetiva, permitindo apurar-se qual a parcela de culpa de
cada um dos agentes causadores do dano. Mas frise-se que aí é a responsabilização interna,
feita entre os co-responsáveis; não é a esfera da responsabilização ambiental propriamente
dita.
Pela característica de indivisibilidade do bem ambiental e ciente de que a maioria dos
danos ambientais tem multiplicidade de fontes e pluralidade de agentes, grande parte da
doutrina e da jurisprudência entende que a atribuição da responsabilidade pode e deve recair,
solidária e integralmente, sobre qualquer um daqueles que tenha contribuído, de alguma
forma, para a ocorrência do dano ambiental
134
, sob pena de frustração da finalidade de
proteção ambiental.
Por todo o exposto, pode-se dizer que as esferas da responsabilidade civil ambiental
são três. A primeira diz respeito ao(s) responvel(is) pela degradação, figura(s) principal(is),
cuja responsabilidade é objetiva e solidária, na forma como tem-se discorrido desde o início
deste trabalho, não sendo mais necessário tecer comentários a esse respeito. As segunda e
terceira esferas referem-se à Administração Pública e aos profissionais responsáveis pelos
estudos de impacto ambiental. Nessas duas últimas hipóteses, o regime de responsabilidade é
distinto daquele adotado em caso de responsabilidade do(s) agente(s) causador(es) do dano,
135
como se verá a seguir.
Como regra geral, a responsabilidade civil da Administração Pública pelos danos
causados a terceiros, incluindo-se aí o meio ambiente, é objetiva, conforme o disposto no
parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição Federal. Portanto, em se tratando de atos comissivos
“Art. 942: Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do
dano causado; e, se tiver mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação.
Parágrafo único: São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no
art. 932.” (grifou-se)
133
“Art. 934: Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem
pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz.”
134
CARVALHO, 2008, p. 108-112.
135
PASQUALOTTO, 1993, p. 451.
34
(ação), não há dificuldade em apurar sua responsabilidade. Quando as faltas são omissivas,
porém, a solução pode ser outra.
136
A omissão do Estado, ou a chamada falta do serviço, é configurada quando
verificada a ausência, o não funcionamento ou o funcionamento deficiente dos serviços
públicos. Há falha no exercício do poder de polícia, ou seja, há falha na fiscalização que deve
ser feita pelo Estado, permitindo-se o desrespeito ao regulamento pertinente, o que pode vir a
gerar o dano ambiental. Para estas situações, a doutrina brasileira se divide em três correntes:
“a primeira faz opção pela responsabilização solidária com direito de regresso; a segunda
afasta a solidariedade; e a terceira, menos expressiva, propõe a solidariedade apenas quando
se verificada culpa grave, ou, de omissão injustificável das autoridades”.
137
Os adeptos da primeira corrente, dentre eles, Milaré, entendem que o caput do artigo
225 da Constituição Federal, institui ao Poder Público o dever de defender o meio ambiente e
de preservá-lo para as presentes e futuras gerações; por esta razão é que o Estado também
pode (e deve) ser solidariamente responsável pelos danos causados ao meio ambiente, pois é
seu dever realizar fiscalização a fim de impedir que tais danos aconteçam
138
, já que a
legitimação passiva ambiental estende-se a todos que contribuíram, direta ou indiretamente,
para a ocorrência do dano, inclusive o ente estatal. Assim, reparado o dano, o Estado se valerá
do regresso contra o seu causador.
Em sentido contrário, Mirra sustenta que
acionar indiscriminadamente o Estado, em caráter solidário com terceiro degradador,
pela sua omissão em fiscalizar e impedir a ocorrência do dano ambiental,
significaria, no final das contas, transferir à própria vítima última da degradação – a
sociedade – a responsabilidade pela reparação do prejuízo, com todos os ônus daí
decorrentes, quando, na verdade, a regra deve ser a da individualização do
verdadeiro e principal responsável, evitando-se, com isso, indesejável socialização
dos encargos necessários à reparação de danos ambientais praticados por pessoas
físicas ou jurídicas determinadas.
139
Os adeptos dessa segunda corrente, como Fiorillo e Abelha, entendem que não se
pode adotar a atitude “simplista e irresponsável” de querer que o Poder Pública seja sempre o
136
PASQUALOTTO, 1993, p. 452.
137
CHAGAS, Galileu Marinho das. Omissão indireta e responsabilidade civil ambiental do Estado. Revista
Direito e Liberdade da Escola da Magistratura do Rio Grande do Norte, Mossoró, v. 1, n. 4. jul./dez. 2006. p.
167.
138
MILARÉ, 2007, p. 909.
139
MIRRA, 2002, p. 205.
35
responsável pela omissão causadora do dano ao meio ambiente,
140
pois, assim, é a própria
sociedade, que é a maior vítima dos danos ambientais, que arcará com essa responsabilização.
Por fim, há aqueles, como Mukai, que adotam uma espécie de “flexibilização entre
os dois extremos”,
141
ou seja, entre a primeira e a segunda correntes, em que a
responsabilidade da Administração é subjetiva, pois “somente a culpa grave, capaz de ser
caracterizada como causa do evento danoso, praticada por terceiro, empenha a
responsabilidade da Administração”,
142
verificando-se, assim, que tem que haver um dever
geral de cautela, mas que não se configura como um dever total de cautela.
143
A responsabilidade pessoal do profissional que trabalha a questão ambiental é
verificada pelo disposto no artigo 11 da Resolução nº 237/97, do CONAMA, que consignou
que os estudos de impacto ambiental devem ser realizados por profissionais legalmente
habilitados, sendo “responsáveis pelas informações apresentadas e estando sujeitos às sanções
administrativas, civis e penais”. A jurisprudência funda a responsabilidade dos profissionais
em ato ilícito, utilizando-se do disposto no artigo 951 do Código Civil,
144
que esclarece que os
mesmos são obrigados a indenizar os atos provenientes de sua impudência, negligência ou
imperícia. Assim, não pairam dúvidas quanto ao regime de responsabilidade civil dos
profissionais de estudos de impacto ambiental: subjetiva, baseada na culpa. Aquele que
responder objetivamente pelos danos ambientais tem direito de regresso quanto ao
profissional que agiu culposamente.
2.5 DANO AMBIENTAL FUTURO
Conforme já abordado anteriormente, a responsabilidade civil ambiental é objetiva,
consubstanciada na teoria do risco concreto, exigindo a ocorrência do dano ambiental para se
configurar, nos temos do parágrafo 1º do artigo 14 da Lei nº 6.938/81. Mas ao analisarmos a
passagem da sociedade industrial para a sociedade de risco (pós-industrial), identificamos que
140
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco; RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de direito ambiental e
legislação aplicável. São Paulo: Max Limonad, 1997. p. 129.
141
CHAGAS, 2006, p. 169.
142
MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998. p. 67.
143
PORFIRIO JUNIOR, Nelson de Freitas. Resonsabilidade do Estado em face do dano ambiental. São Paulo:
Malheiros, 2002. p. 70.
144
“Art. 951: O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que,
no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente,
agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho”.
36
os riscos ambientais, agora, são invisíveis, imperceptíveis aos sentidos humanos e globais,
atingindo um número indeterminável de pessoas. Por essa razão, o dever de preventividade
objetiva em relação ao meio ambiente assume um caráter precaucional frente às incertezas
científicas da atual realidade social.
O instituto da responsabilidade civil ambiental já não é mais somente um
instrumento de reparação de danos, mas também um elemento jurídico de gestão dos riscos
ambientais, com incidência anterior à efetivação de danos ambientais, impondo o
cumprimento de obrigações de fazer e não fazer (medidas preventivas lato sensu: prevenção
stricto sensu e precaução) ao agente.
145
É esse o contexto de identificação do dano ambiental
futuro.
Em matéria jurídico-ambiental, em virtude de sua transtemporalidade e
imprevisibilidade,
146
já não é suficiente utilizar-se da responsabilidade ambiental somente
como mecanismo de reparação de danos. Tampouco basta a imposição de medidas
preventivas somente quando for identificado um risco concreto, um risco conhecido. A
irreversibilidade e conseqüente irreparabilidade dos danos ambientais ensejam a necessidade
da institucionalização da prevenção e da precaução como pilares em matéria ambiental,
fundada na teoria dos risco abstrato, já esclarecido anteriormente. Para Carvalho:
são ínsitas à proteção jurídica do meio ambiente a investigação, a avaliação e a
gestão dos riscos ambientais gerados a partir de determinadas atividades,
minimizando a probabilidade de sua concretização em danos, bem como
oportunizando o dimensionamento das conseqüências futuras das degradações
ambientais já ocorridas.
147
É o disposto no artigo 225 da Constituição Federal a justificativa normativa da
identificação do dano ambiental futuro, ao prever o direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado tanto às presentes quanto às futuras gerações. Sendo o meio ambiente interesse
jurídico tutelado às futuras gerações, necessária a estruturação do Direito para tal, cujas
decisões tomadas no presente repercutirão no futuro. Assim, a proteção das futuras gerações
pelo direito ambiental pode ser efetivada através da noção de dano ambiental futuro, como
instrumento de investigação, avaliação e gestão dos riscos ambientais.
148
Sobre a necessidade de avaliação do dano futuro existe, inclusive, recomendação da
comissão constituída pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA, ao
145
CARVALHO, 2008, p. 120-121.
146
Ibidem. p. 120.
147
Ibidem. p. 124.
148
Ibidem.
37
estabelecer que “é necessário um novo regime de responsabilidade civil que estabeleça tanto
os danos previsíveis quanto os imprevisíveis, assim como os danos presentes e futuros
[...]”.
149
É justamente para a formação de um vínculo comunicacional com o futuro
(comunicação do risco) que se destina a noção de dano ambiental futuro, que é definido por
Carvalho como “a expectativa de dano de caráter individual ou transindividual ao meio
ambiente”,
150
e sua constatação é fundada em juízos de probabilidade/improbabilidade, ou
seja, a passagem de um direito de danos para um direito de risco. Nessa esteira, o autor
descreve duas espécies de danos ambientais futuros: os danos ambientais futuros
propriamente ditos ou “stricto sensu” e as conseqüências futuras de danos ambientais já
concretizadas.
151
Em ambas as espécies de dano ambiental futuro é observada a incerteza como o
elemento constituinte do processo de tomada de decisão no presente para comunicação com o
futuro. Por esta razão é que a avaliação dos riscos só é possível através de um juízo de
probabilidade/improbabilidade de sua concretização. A diferença entre as espécies está em
que, na primeira, deve ser construído um juízo de probabilidade acerca da concretização
futura de um dano ambiental, enquanto na segunda, o juízo é de probabilidade acerca da
progressão dos efeitos futuros de um dano já concretizado (atual).
152
Assim, o dano ambiental futuro é instrumento para cálculo de risco, sendo
necessário, para tanto, utilizar-se da transdisciplinaridade para realizar essa avaliação. Esse
juízo de probabilidade/improbabilidade, segundo Luhmann, é formado a partir da exclusão do
presente: avaliando-se o horizonte futuro através de lições do passado, formando, a partir daí,
uma percepção de concretização do risco em dano (mais ou menos provável ou
improvável).
153
A nova realidade social (sociedade pós-industrial ou de risco) exige do Direito um
instrumento para lidar com as incertezas científicas, que, como já mencionado anteriormente,
não podem se transformar em incertezas jurídicas. No contexto do surgimento de riscos
invisíveis e globais (riscos abstratos), justifica-se a descrição e jurisdicização do dano
ambiental futuro, como instrumento de assimilação desses novos riscos, realizada a aplicação
149
PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente apud CARVALHO, 2008. p. 125.
150
Ibidem, p. 127.
151
Ibidem. p. 129.
152
Ibidem.
153
LUHMANN, 1992, p. 86-92.
38
de uma ordem principiológica não apenas preventiva, mas também precaucional
(preventividade lato sensu).
2.5.1 Responsabilidade sem danos e os riscos ambientais configuradores do ilícito
ambiental
A responsabilização civil por dano ambiental futuro passa, necessariamente, pela
responsabilidade civil sem dano, desvinculada da concretização de um dano e da
comprovação de culpa para configuração do ilícito civil. Em matéria ambiental, a
responsabilidade civil sem dano se justifica pelo contido no artigo 225 da Constituição
Federal e no artigo 187 do Código Civil,
154
ou seja, a produção de riscos ambientais
intoleráveis, caso em que o ilícito estabelece “um custo social em decorrência direta de sua
transtemporalidade e sua dimensão difusa”.
155
Tradicionalmente, a noção de ilícito civil guarda relação com suas conseqüências
patrimoniais negativas, ocasionando o dever de reparação e/ou indenização. Contudo, essa
noção de ilicitude civil não responde às necessidades dos problemas ambientais da sociedade
de risco e, dessa forma, elabora-se uma noção mais ampla, superando a versão clássica de
vinculação a dano e culpabilidade,
156
nos termos do disposto no artigo 187 do Código Civil.
Assim, o conceito de ilicitude passa a incluir situações que vão além do dever de
reparar ou indenizar, bem como supera a idéia de dano e culpa como pressupostos.
Considerando o dever de preventividade objetiva do artigo 225 da Constituição Federal, a
produção de riscos intoleráveis (dano ambiental futuro) se configura como um ilícito
ambiental em razão dos seus custos sociais. O artigo 187 do Código Civil, aliado à teoria do
risco abstrato, estabelece que “a produção de riscos ambientais intoleráveis por determinada
atividade enseja a imposição de medidas preventivas ao agente que desenvolve a atividade
perigosa, sem a necessidade da concretização do dano ambiental”.
157
A imposição de medidas preventivas está prevista no artigo 3º da Lei nº 7.347/85, ao
estabelecer que a ação civil pública pode ter “por objeto a condenação em dinheiro ou o
154
“Art. 187: Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”
155
CARVALHO, 2008, p. 147.
156
Ibidem, p. 148.
157
Ibidem, p. 150.
39
cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.” Pode-se entender, então, o dano ambiental
futuro como todos aqueles riscos ambientais que, por sua intolerabilidade, são considerados
como ilícitos, justificando a imposição de medidas preventivas.
158
Para a imposição destas medidas preventivas, necessária a verificação da alta
probabilidade da concretização dos riscos em danos e a magnitude, ou seja, a gravidade e a
possibilidade de irreversibilidade desses riscos. Assim, para Carvalho:
Os riscos ilícitos serão aqueles cuja avaliação de sua probabilidade e magnitude lhe
conferir a condição de riscos intoleráveis, e, por isso, justifica-se a sua sujeição ao
cumprimento de medidas preventivas que sirvam para a minimização da sua
potencialidade ou mesmo de sua concretização.
159
Sendo o meio ambiente ecologicamente equilibrado direito fundamental das
presentes e das futuras gerações, a violação a esse interesse se configura em ilícito ambiental.
Nesse sentido, o direito deve lidar com os riscos ambientais, atribuindo-lhes um sentido de
licitude ou ilicitude, através da avaliação da probabilidade de sua ocorrência futura e da sua
magnitude, cujo grau máximo consiste na irreversibilidade dos danos potenciais.
Ainda, no que diz respeito à magnitude dos riscos ambientais, deve-se avaliar a
capacidade de tolerabilidade do meio ambiente frente aos riscos gerados por atividade
potencialmente danosa. Quando excedido o grau de tolerabilidade do meio ambiente,
configura-se o ilícito ambiental. Desses elementos, o direito faz uma equação que permite-lhe
verificar a licitude ou ilicitude dos riscos ambientais. Devem ser considerados ilícitos os
riscos cuja equação entre sua probabilidade de ocorrência futura e a magnitude de suas
consequências resultem na sua intolerabilidade social, o que justifica a imposição de medidas
preventivas para evitá-los.
160
2.5.2 Princípio da proporcionalidade e medidas preventivas na gestão dos riscos
ambientais
O princípio da proporcionalidade é o ponto orientador na imposição de medidas
preventivas como consequência jurídica da aferição de danos ambientais futuros (riscos
158
CARVALHO, 2008, p. 151.
159
Ibidem, p. 154.
160
Ibidem, p. 156-157.
40
ilícitos). As medidas preventivas (obrigações de fazer ou não fazer) impostas devem ser
proporcionais à proteção necessária e pretendida.
161
Quando se está diante de conflitos entre
direitos fundamentais, entra em ação o princípio da proporcionalidade, como forma de
solucionar o problema no caso concreto, através da ponderação entre os interesses envolvidos,
impondo-se medidas proporcionais à gravidade e à probabilidade de concretização do risco
ambiental.
A aplicação concreta do princípio da proporcionalidade depende da identificação de
uma relação de causalidade (de meio e fim) entre dois elementos, de sorte que se possa
proceder aos seus três exames fundamentais: 1. adequação, 2. necessidade e 3.
proporcionalidade em sentido estrito. Assim, temos que sem um meio, um fim concreto e uma
relação de causalidade entre eles não há aplicação do princípio da proporcionalidade. É o que
explica Ávila:
O exame de proporcionalidade aplica-se sempre que houver uma medida concreta
destinada a realizar uma finalidade. Nesse caso devem ser analisadas as
possibilidades de a medida levar à realização da finalidade (exame da adequação),
de a medida ser a menos restritiva aos direitos envolvidos entre aquelas que
poderiam ser utilizadas para atingir a finalidade (exame da necessidade) e de a
finalidade pública ser tão valorosa que justifique tamanha restrição (exame da
proporcionalidade em sentido estrito).
162
No caso do princípio da proporcionalidade aplicado à gestão dos riscos ambientais,
devem ser analisados qual o meio mais intenso, melhor e mais seguro que promova o fim de
proteção do meio ambiente (adequação), assim como deve-se optar pelo meio menos restritivo
aos direitos colateralmente afetados (necessidade). No que diz respeito à proporcionalidade
propriamente dita, ou em sentido estrito, a importância do bem que se quer proteger deve ser
tão grande que justifique essa restrição.
163
Ora, em se tratando do bem ambiental, o bem que
se quer proteger é o meio ambiente, bem maior, comum de todos, cujo equilíbrio é essencial à
sadia qualidade de vida e necessário e condição para a existência humana.
Para ponderação da licitude ou ilicitude das situações de risco, aplica-se o juízo de
probabilidade/improbabilidade de ocorrência de danos ambientais, risco/benefício,
reversibilidade/irreversibilidade dos danos. Dessa forma, o princípio da proporcionalidade
possibilita ao direito a assimilação jurídica dos riscos ambientais, ao atribuir critérios
valorativos para a identificação da licitude/ilicitude dos riscos ambientais.
161
CARVALHO, 2008, p. 157.
162
ÁVILA, 2006, p. 150.
163
Ibidem, p. 148-161.
41
Utilizado o princípio da proporcionalidade como instrumento de identificação dos
riscos ambientais ilícitos, impõe-se a aplicação de medidas preventivas (obrigações de fazer e
não fazer) a fim de evitar a concretização desses riscos em danos. Como exemplo dessas
medidas preventivas, temos a aplicação do princípio da correção na fonte (já utilizado nos
países da União Européia), que consiste na idéia de determinar quem deve, onde e quando se
devem desenvolver ações de proteção ao meio ambiente.
A correção na fonte consiste, assim, numa obrigatoriedade de pesquisa das causas de
poluição (sempre um estudo prévio), para eliminá-las ou, no mínimo, moderá-las a um nível
tolerável ao meio ambiente. É um dever de modificação da conduta do agente, obrigando-o a
tomar medidas preventivas necessárias a inibir, desde o início, a possibilidade de
concretização dos danos ambientais, e não medidas “de fim de linha”, como seria o
tratamento posterior dos resíduos gerados por determinada atividade.
164
Outro exemplo de medida preventiva é a imposição de melhor tecnologia disponível
no desenvolvimento de atividades potencialmente produtoras de riscos ao meio ambiente. A
melhor tecnologia disponível pode ser conceituada como a tecnologia mais eficaz e avançada
naquele caso concreto
165
, ou seja, não se trata da última tecnologia do mercado, mas sim
aquela que mais traz benefícios e diminui a incidência dos riscos ambientais para aquela
atividade. Na prática, trata-se de não permitir que certa atividade seja desenvolvida através de
tecnologia adequada, no caso de existir uma mais apropriada, que diminui a probabilidade de
concretização dos riscos ambientais.
164
ARAGÃO, Maria Alexandra de Sousa. Direito constitucional do ambiente da União Européia. In:
CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. (Org.). Direito constitucional ambiental
brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 45-46.
165
PARDO, José Esteve. Técnica, riesgo y derecho: tratamiento del riesgo tecnológico en el Derecho ambiental.
Barcelona: Ariel Derecho, 1999. p. 95.
3 DIREITO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS
3.1 JUSTIFICATIVAS PARA O TRATAMENTO JURÍDICO DIFERENCIADO DOS
RESÍDUOS
Na perspectiva jurídica e também na social, os resíduos sólidos urbanos trazem, sem
dúvidas, complexos conflitos. Para a população, nada é mais rotineiro do que os resíduos
sólidos, comumente denominados lixo. Quanto à destinação final destes, a grande maioria das
pessoas não tem conhecimento, muito menos interesse. A humanidade costuma se preocupar
apenas com aquilo que lhe causa problemas imediatos, diretos.
O avanço industrial e tecnológico, o grande aumento populacional e o estímulo ao
crescimento econômico geram aumento no consumo, o que aumenta a produção dos resíduos
sólidos, principalmente nos centros urbanos. Nessa esteira, nada é mais rotineiro para a
população do que a questão dos resíduos sólidos, e, dessa forma, torna-se urgente a busca de
soluções para essa problemática ambiental.
Importante destacar a necessidade de um tratamento jurídico específico para os
resíduos, levando em consideração as suas particularidades. Os resíduos não são substâncias
como quaisquer outras; têm potencialidades para ser substâncias nocivas e/ou também
lucrativas, úteis, fontes de materiais para diversos setores da indústria.
Como justificativas para o tratamento jurídico diferenciado dos resíduos, podemos
listar as seguintes razões: 1. o desinteresse inerte, ou seja, o desinteresse pelos resíduos; 2. os
altos custos de eliminação; 3. a complexidade da composição; 4. os riscos ambientais e
humanos; 5. os impactos ambientais; 6. a dificuldade de gestão; 7. a prioridade de
valorização; 8. a reciclagem. Muito provavelmente existem outras razões que justifiquem o
tratamento jurídico dos resíduos de forma específica, mas podemos condensá-las nestas acima
citadas.
1. Por definição, resíduos são o que restou de quaisquer substâncias, significam resto.
Por isso mesmo, são coisas destituídas de interesse para quem as produz. “São substâncias
cuja produção não foi o objetivo principal da atividade – extrativa, transformadora, comercial
ou de consumo – que os gerou e é por isso mesmo que o seu detentor quer desfazer-se
43
deles”,
166
como salienta Aragão. A natural falta de cuidado com os resíduos ocorre justamente
pela falta de interesse que se tem por eles, o que ocorre também na sua destinação final.
2. A correta eliminação de resíduos, de forma ecologicamente adequada, gera custos
muito altos. Esses pesados custos de eliminação fazem com que o detentor dos resíduos, na
maioria das vezes, recorra a formas de eliminação, senão ilegais, prejudiciais ao meio
ambiente.
167
Mais uma vez, verifica-se a importância da redução na produção de resíduos
(prevenção de resíduos), a fiscalização estatal e o incentivo fiscal para a correta destinação
dos resíduos sólidos.
3. A composição física dos resíduos guarda relação com as porcentagens dos
variados materiais que os constituem. Já a sua composição química está relacionada aos seus
componentes orgânicos.
168
Essa composição físico-química, muitas vezes, é desconhecida
daqueles que lidam com os resíduos. Isso ocorre pela dificuldade inerente a essa
determinação, que envolve muitos problemas estatísticos, geradores de custos. Essa correta
caracterização, que Aragão denomina de “composição enigmática”
169
dos resíduos é essencial
para determinar os tratamentos mais adequados à sua destinação final.
4. Os resíduos, sobretudo os perigosos, produzem riscos à saúde, à vida e ao
equilíbrio ecológico, tais como: risco de poluição de lençol freático (águas destinadas a
consumo), risco de proliferação de agentes patogênicos (causadores de doenças), risco de
explosões etc. Esses riscos chamam ainda mais atenção para a necessidade de uma correta
gestão e destinação final de resíduos.
5. Os resíduos podem originar os mais variados tipos de poluição e degradação,
“causando perturbações ambientais na hidrosfera, na atmosfera, na litosfera e na biosfera”.
170
Naturalmente, casualmente ou voluntariamente, os resíduos trazem impactos ambientais às
águas, ao ar e ao solo, assim como têm efeitos visuais e olfativos desagradáveis.
6. A adequada gestão e destinação de resíduos sólidos causam conflitos que, na
verdade, começam no momento de sua produção. Essas dificuldades decorrem da falta de
informação da população local e da falta de interesse das autoridades. A gestão e destinação
final de resíduos causam ainda mais problemas, afinal, é preciso determinar para onde,
quando e como esses resíduos deverão ser destinados, o que demanda análise e investigação
dos riscos gerados e dos possíveis danos ambientais.
166
ARAGÃO, Maria Alexandra de Sousa. O direito dos resíduos. Coimbra: Almedina, 2003. p. 8.
167
Ibidem.
168
NAIME, Roberto Harb. Gestão de resíduos sólidos: uma abordagem prática. Novo Hamburgo: Feevale, 2004.
p. 31.
169
ARAGÃO, op. cit, p. 8.
170
Ibidem, p. 9.
44
Para uma boa gestão e melhor destinação dos resíduos, não é possível definir
soluções de forma abstrata, ou seja, as alternativas empregadas devem levar em consideração
os casos concretos, as situações que devem ser resolvidas. Ainda, essas alternativas devem ser
analisadas segundo uma “perspectiva integrada”, considerando e ponderando todas as
incidências ambientais possíveis.
171
Para tanto, mais uma vez, verifica-se a necessidade de
atuação conjunta de várias ciências, destacado o caráter da transdisciplinaridade quando o
assunto são questões envolvendo o meio ambiente.
7. Nos dias atuais, eliminar resíduos pode significar o desperdício de recursos
escassos e que poderiam ser (re)aproveitados,
172
afinal, o que é resíduo para um agente pode
ser matéria-prima para outro. No que tange à valorização dos resíduos, tudo depende de torná-
la mais interessante e viável, social, ambiental e economicamente, do que simplesmente a
eliminação dos resíduos.
Para tanto, os encargos com a valorização devem ser menores do que aqueles da
eliminação, ou, ainda, a receita gerada pela valorização de resíduos deve ser maior do que os
seus encargos. Em qualquer situação, deve-se levar em consideração não somente o ganho
econômico, mas também a relevância social desta valorização. Como já mencionado no
parágrafo anterior, há recursos que já se tornaram escassos, tamanha e tão duradoura a
exploração sofrida, razão pela qual é necessário o seu aproveitamento.
8. Nas mais variadas formas, a valorização de resíduos torna-se “um negócio atraente
e em expansão”.
173
Como fonte de matérias-primas secundárias, como fonte energética, como
mais valia comercial utilizada em embalagens, rótulos e oferecimento de serviços etc, a
reciclagem ou reutilização de resíduos é atraente e viável econômica e socialmente falando.
São inúmeros exemplos, como as latinhas de alumínio, o vidro, o plástico, o papelão. O fato é
que o filão da reciclagem forma “verdadeiras cadeias produtivas assentadas na reutilização de
materiais”.
174
Em suma, os resíduos são coisas desinteressantes, caras, de composição
desconhecida para quem os manuseia, poluentes, perigosas, arriscadas, enfim, difíceis de
gerir. Em contrapartida, são também úteis e lucrativas. Essas características, tanto as
vantajosas quanto aquelas ruins, mostram a importância da correta gestão de resíduos,
respeitando as regras já existentes e aplicando, conjuntamente, princípios orientadores de
171
ARAGÃO, 2003, p. 33.
172
Ibidem. p. 10.
173
Ibidem.
174
NAIME, 2004, p. 33.
45
direito, que têm como função essencial “reforçar a lógica, a clareza e a coerência das
normas”,
175
justificando, assim, o porquê de um tratamento diferenciado dos resíduos sólidos.
3.2 PRINCÍPIOS DE DIREITO AMBIENTAL E RESPONSABILIDADE CIVIL
APLICÁVEIS AO DIREITO DE RESÍDUOS
Os princípios de direito ambiental e responsabilidade civil ambiental descritos no
capítulo anterior também são aplicáveis aos resíduos, como instrumento para sua
investigação, avaliação e gestão. Existem particularidades e especificidades nessa aplicação,
como veremos a seguir, mas o sentido é o mesmo.
Antes, importante relembrar a noção de norma jurídica, que engloba os princípios e
as regras. Os princípios são normas gerais, hierarquicamente superiores e mais abrangentes
que as regras, que se aplicam somente para aquelas situações para as quais foram editadas. Os
princípios são diretrizes normativas, que devem ser observadas na aplicação das normas
jurídicas. Ao contrário das regras, que são expressamente previstas, os princípios nem sempre
são expressos nas codificações.
3.2.1 Princípio da prevenção
O princípio da prevenção é traduzido na idéia de que medidas jurídicas devem ser
tomadas a fim de evitar a concretização de riscos em verdadeiros danos ambientais. No que
diz respeito ao direito de resíduos, o princípio da prevenção tem duas acepções: prevenção de
resíduos e prevenção de danos ambientais (causados pelos resíduos).
Aragão diferencia os âmbitos do princípio da prevenção em relação aos resíduos nas
seguintes palavras:
a) a prevenção de resíduos – uma actuação preventiva a priori, ou de ‘início de
linha’, baseada em normas que se aplicam anteriormente à existência de resíduos, e
cuja finalidade é evitar a sua produção; b) a prevenção de danos – uma actuação
preventiva mas a posteriori,
mais de ‘fim de linha’, baseada em normas que se
175
ARAGÃO, 2003, p. 10.
46
aplicam posteriormente ao surgimento dos resíduos e cuja finalidade é fomentar a
boa gestão dos resíduos, de forma compatível com o ambiente.
176
O princípio da prevenção deve ser entendido, quando aplicado aos resíduos, não só
como medida tendente a evitar a ocorrência de danos ambientais, mas também como medida
de prevenção de produção de resíduos (produção de riscos). Essas duas acepções do princípio
da prevenção aplicado ao direito de resíduos dão até uma ideia de “prevenção da prevenção”,
pois se a prevenção de danos é a tomada de medidas para evitar a ocorrência de danos
ambientais, a prevenção de resíduos ocorre ainda antes: evitando a produção de resíduos em
demasia, diminuindo-se a necessidade de tomadas de medidas preventivas de danos.
A minimização na geração de resíduos, aliás, é orientação das diretrizes
internacionais voltadas para a questão dos resíduos. A redução na geração de resíduos
(prevenção de resíduos) elimina ao máximo o desperdício de matérias-primas, diminui a
quantidade de produtos descartáveis e gera economia com os custos de operações e
eliminação destes resíduos.
177
Ora, quanto menor a produção de resíduos, menores os
problemas com a sua gestão e eliminação.
No direito brasileiro, apenas a primeira acepção da prevenção (de danos) encontra
previsão expressa, no artigo 225 da Constituição Federal. A segunda acepção do princípio
(prevenção de resíduos) pode ser deduzida do conteúdo do inciso V, do parágrafo 1º do
referido artigo, que determina que incumbe ao Poder Público “controlar a produção, a
comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a
vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”. Internacionalmente utilizada, a máxima dos 3R
(reduzir, reutilizar e reciclar)
178
, também tem como primeira referência a redução dos resíduos
já nos processos de produção.
3.2.2 Princípio da precaução
Também no setor dos resíduos, a regra é “in dubio pro ambiente”, ou seja, na dúvida
deve-se decidir a favor do ambiente. O princípio da precaução, também previsto no artigo 225
da Constituição Federal, traduz-se na idéia de que mesmo desconhecidos os riscos e
176
ARAGÃO, 2003. p. 12.
177
NAIME, 2004, p. 33.
178
Prevista no ordenamento jurídico no inciso V do artigo 2º da Resolução nº 307, do CONAMA.
47
conseqüências de determinadas atividades, deve-se agir de forma a evitar acontecimentos
danosos ao meio ambiente. Assim, mesmo não havendo conhecimento técnico-científico
suficiente para abranger as situações atuais, devem ser adotadas medidas antecipatórias, a fim
de controlar os possíveis riscos dessas atividades e evitar que se concretizem em danos.
Quanto aos resíduos sólidos, além da previsão do inciso V do artigo 225 da
Constituição Federal, que determina que incumbe ao Poder Público “controlar a produção, a
comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a
vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”, aplicável também o inciso IV do referido artigo,
que determina incumbe ao Poder Público “exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou
atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo
prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”.
Esses dois incisos conjugados demonstram a importância da aplicação do princípio
da precaução ao direito de resíduos, que podem ser substâncias arriscadas e perigosas,
conforme já mencionado anteriormente. O dever de preventividade objetiva contido no artigo
225 da Constituição Federal engloba também o princípio da precaução.
Numa instalação de central de destinação de resíduos sólidos, que pode ser
caracterizada como “atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio
ambiente”, necessário o estudo de impacto ambiental e fiscalização nas licenças de instalação
e operação, como medidas não apenas preventivas, mas também precaucionais. Ainda,
importante ressaltar que as medidas cautelares adotadas não devem ser definitivas, sendo
revistas assim que estiverem reunidas as provas científicas que faltavam.
179
3.2.3 Princípio do poluidor-pagador
A aplicação do princípio do poluidor-pagador relativamente a resíduos significa que
o responsável pela produção de resíduos deve suportar economicamente os custos sociais e
ambientais dos resíduos que produz.
180
Há, portanto, que se internalizar os custos ambientais
nas atividades de produção e consumo, o que não pode ser diferente nas atividades que
produzem resíduos. E, assim como ocorre com o princípio da prevenção, o princípio do
poluidor-pagador, quando aplicado aos resíduos, tem duas acepções.
179
ARAGÃO, 2003, p. 11.
180
Ibidem, p. 13.
48
A primeira acepção do princípio do poluidor-pagador aplicado aos resíduos refere-se
a determinados tipos de resíduos, “cujas características impõem ao gerador o dever de seu
gerenciamento”.
181
Esse gerenciamento de resíduos está regulado por Resoluções do
CONAMA. Assim, portos, aeroportos, terminais ferroviários e rodoviários e estabelecimentos
prestadores de serviços de saúde
182
, nos termos da Resolução nº 05/1993, do CONAMA, são
responsáveis pelo gerenciamento de seus resíduos sólidos, desde a geração até a disposição
final. Os resíduos da construção civil têm diretrizes, critérios e procedimentos para sua gestão,
estabelecidos pela Resolução nº 307/2002 (alterada pela Resolução nº 348/2004).
A segunda frente de aplicação do princípio poluidor-pagador aos resíduos é relativa
aos resíduos de produtos acabados após o uso pela sociedade, os resíduos de consumo.
183
Nessa aplicação, verifica-se o que se denomina responsabilidade pós-consumo, “imposta a
determinadas fontes geradoras, em virtude do fator de risco intrínseco ao produto”.
184
Nessas
situações, após a utilização do produto pelo consumidor, a responsabilidade pela destinação
final dos resíduos dessa utilização é reputada à sua fonte geradora.
Para Derani, ao longo do processo produtivo, são produzidos, além do produto a ser
comercializado, “externalidades negativas”, que são recebidas pela coletividade enquanto o
lucro é percebido pelo produtor. Ainda, segundo Derani, a aplicação do princípio poluidor-
pagador procura corrigir este custo direcionado à sociedade, impondo-se a sua internalização
no processo produtivo.
185
Na prática, a aplicação do princípio poluidor-pagador aos resíduos é implementar a
responsabilidade do fabricante pelo ciclo integral do produto, como já ocorre nos países da
Europa. A Alemanha é pioneira na adoção de medidas preventivas de gestão de resíduos, para
os quais editou a Lei de Economia de Ciclo Integral e Gestão de Resíduos, de 1994 (que
substituiu a Lei de Minimização e Eliminação de Resíduos, editada em 1986).
186
No Brasil, a tendência de responsabilização pelo ciclo integral do produto
(responsabilidade pós-consumo) não possui norma geral expressa, mas já é seguida,
infelizmente apenas em se tratando de determinados tipos de resíduos: agrotóxicos, pneus,
óleos lubrificantes e pilhas e baterias.
181
JURAS, Ilidia da Ascensão Garrido Martins; ARAÚJO, Suely Mara Vaz Guimarães de. Uma lei para a
Política Nacional de Resíduos Sólidos. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, v. 11, n. 43, jul./set., 2006. p.
123.
182
Especificamente aos resíduos dos serviços de saúde, o CONAMA editou, ainda, a Resolução nº 358/2005,
que manteve a responsabilidade do gerador pelo gerenciamento dos resíduos.
183
JURAS; ARAÚJO, op. cit., p. 123.
184
STEIGLEDER, 2004, p. 204.
185
DERANI, 1997, p. 158.
186
JURAS; ARAÚJO, op. cit., p. 125.
49
Para os agrotóxicos, foi editada a Lei nº 9.974/2000, que alterou a Lei nº 7.802/1989,
e introduziu o dever do usuário de devolver as embalagens vazias dos produtos no
estabelecimento em que foram adquiridas. Ainda, a responsabilidade pela destinação final
destas embalagens vazias, dos produtos apreendidos pela fiscalização e dos produtos
impróprios para utilização ou em desuso, é atribuída às empresas produtoras e
comercializadoras de agrotóxicos.
Em relação aos pneus, a Resolução nº 258/1999, do CONAMA, atribui às empresas
fabricantes e importadoras a coleta e destinação final, ambientalmente adequada, aos pneus
inservíveis. Os óleos lubrificantes são regulados pela Resolução nº 362/2005, do CONAMA,
que estabelece que todo óleo lubrificante usado ou contaminado deverá ser recolhido e
destinado adequadamente.
A Resolução nº 401/2008, do CONAMA (que revogou a Resolução nº 257/1999),
estabelece que as pilhas e baterias que contenham chumbo, cádmio, mercúrio e seus
compostos em suas composições, após o seu esgotamento energético, deverão ser entregues
pelos usuários aos estabelecimentos comercializadores ou à rede de assistência técnica
autorizada pelas indústrias produtoras, para repasse aos fabricantes ou importadores, para que
estes adotem os procedimentos de reutilização, reciclagem, tratamento ou disposição final
ambientalmente adequada.
No que diz respeito aos resíduos sólidos urbanos, a aplicação do princípio poluidor-
pagador, integrando as ideias de responsabilidade pós-consumo e de ciclo integral do produto,
é verificada nas taxas de resíduos previstas nos regulamentos municipais e também as taxas
cobradas pelos usuários de instalações de destinação e eliminação dos resíduos.
187
Aragão
entende que as taxas municipais de resíduos devem ser pagas por toda a população que recebe
os serviços de coleta e destinação desses resíduos (munícipes, estabelecimentos comerciais,
unidades industriais). Assim, essas tarifas “devem observar os princípios da adequação, do
equilíbrio econômico e financeiro, do utilizador/poluidor-pagador e respeitar a necessidade de
induzir, nos utentes, comportamento que se ajustem ao interesse público”.
188
Da forma como explicitado nos parágrafos anteriores, pode-se instituir um regime de
internalização dos custos com todo o ciclo dos resíduos. Quanto aos resíduos sólidos urbanos,
estes custos também podem ser internalizados, responsabilizando-se os munícipes, ou seja, os
usuários dos serviços (de coleta e destinação, por exemplo) relativos aos resíduos.
187
ARAGÃO, 2003, p. 13.
188
Ibidem, p. 13-14.
50
3.3 CONTEXTUALIZAÇÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS NO DIREITO
BRASILEIRO
3.3.1 Conceituação e aspectos normativos
Até o início da década de 1990, os resíduos sólidos eram denominados lixo,
simplesmente, com conceituação diversa da utilizada atualmente.
189
Essa definição pobre e
insuficiente, aliada à “falta de elegância” que era falar de resíduos, tornava o assunto pouco
interessante para a população (explicada, assim, a pobreza cultural na compreensão e
tratamento do tema) e para os órgãos públicos e, consequentemente, para os operadores de
direito. Como produzir resíduos é inerente ao ser humano e suas consequências,
inevitavelmente, foram sentidas (como não poderiam deixar de ser) surgiram opiniões,
estudos técnicos e organizações tratando do assunto, além da formação da consciência social
de que os recursos naturais não são ilimitados. Infelizmente, não ocorreu o mesmo com a
legislação, que muito pouco evoluiu no sentido de enfrentar a importante e inevitável questão
imposta ao ser humano acerca do que fazer com tantos resíduos produzidos “num planeta que
possui limites para suportar toda a carga de lixo nele despejada”.
190
Para Naime, a definição “lixo” pode ser utilizada para os resíduos quando
“misturados e sem possibilidade de reutilização e reciclagem”.
191
Ocorre que nem todo
resíduo é somente descartável. Como já demonstrado no item 3.1, há situações em que os
resíduos são valorizáveis, podendo ser utilizados, inclusive, como fonte de energia.
Gradativamente e, principalmente pelo aspecto da valorização econômica, formou-se uma
nova consciência acerca dos resíduos, graças à “uma visão mais técnica e mais abrangente”, e,
também, ao caráter de proteção ao meio ambiente (reforçado como direito constitucional
fundamental).
192
Essa nova “visão” sobre os resíduos deu margem a uma nova conceituação, levando
em conta tanto os seus aspectos negativos, como também os positivos, nem pensados
anteriormente. Essa nova conceituação foi tornada obrigatória, a nível nacional, pela
Resolução nº 005/93, do CONAMA, ao determinar a implementação de Gerenciamento de
189
FRITSCH, 2000, p. 27.
190
Ibidem. p. 17.
191
NAIME, 2004, p. 17.
192
FRITSCH, op. cit., p. 30.
51
Resíduos Sólidos. Através da NBR nº 10.004/1987 (revisada em 2004), emitida pela
Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT, foi dada uma definição técnica e legal
para os resíduos sólidos urbanos, recepcionada pela posterior Resolução nº 005/1993, do
CONAMA, que dispõe, no inciso I do seu artigo 1º:
Art. 1º: Para os efeitos desta Resolução definem-se: I) Resíduos Sólidos: conforme a
NBR nº 10004, da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT – “Resíduos
nos estados sólido e semi-sólido, que resultam de atividades da comunidade de
origem: industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços e de
varrição. Ficam incluídos nesta definição os lodos provenientes de sistemas de
tratamento de água, aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle de
poluição, bem como determinados líquidos cujas particularidades tornem inviável
seu lançamento na rede pública ou corpos d’água, ou exijam para isso soluções
técnica e economicamente inviáveis, em face à melhor tecnologia disponível.
(grifou-se)
Essa definição evidencia a diversidade e complexidade que envolvem os resíduos
sólidos. Fernandes ressalta a importância de que “sob o aspecto ambiental, é preciso
estabelecer como premissa o fato de que os resíduos são parte de uma ideia maior:
saneamento”.
193
Isso porque uma das atividades do saneamento ambiental básico é a gestão e
o gerenciamento integrado de resíduos sólidos urbanos (GIRSU), que devem ter por objetivo
principal propiciar o bem-estar físico, social e mental da comunidade.
194
Resíduos sólidos urbanos (RSU) são compreendidos como todos aqueles resíduos
produzidos “pelas inúmeras atividades desenvolvidas em áreas com aglomerações humanas
do município”, possuindo as mais variadas origens: residencial, comercial, de
estabelecimentos de saúde, industriais, da limpeza pública, da construção civil e agrícolas.
195
Ressalte-se que o gerenciamento dos resíduos de origem não domiciliar (comercial, dos
serviços de saúde, industriais, da construção civil) são de responsabilidade do gerador, como
já foi explicitado na aplicação do princípio poluidor-pagador aos resíduos sólidos, e têm
previsão legal e normativa específica.
196
Para os fins desta pesquisa, os resíduos sólidos
urbanos aqui tratados são os residenciais, comerciais e os da limpeza pública.
Assim, essa complexidade e variedade dos resíduos sólidos são observadas também
nos seus aspectos normativos, já que o Brasil ainda não possui uma Política Nacional de
193
FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Lixo: limpeza pública urbana; gestão de resíduos sólidos sob o enfoque
do Direito Administrativo. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 3.
194
ZANTA, Viviana Maria; FERREIRA, Cynthia Fantoni Alves. Gerenciamento Interado dos Resíduos Sólidos
Urbanos. In: CASTILHOS JUNIOR, Armando Borges de (Coord.). Resíduos sólidos urbanos: aterro
sustentável para municípios de pequeno porte. Rio de Janeiro: ABES/RiMa, 2003. p. 1.
195
Ibidem. p. 3.
196
Vide item 3.2.3.
52
Resíduos Sólidos.
197
Além da Constituição Federal, o Brasil possui ampla legislação
ambiental, mas que não é suficiente para equacionar os problemas da gestão de resíduos
sólidos. Praticamente não existem leis específicas de Políticas de Gestão de Resíduos Sólidos
“que estabeleçam objetivos, diretrizes e instrumentos em consonância com as características
sociais, econômicas e culturais de Estados e municípios”.
198
Além dos dispositivos da Constituição Federal que preveem e instituem a proteção
ao meio ambiente e outros dispositivos mais abrangentes, também aplica-se, especificamente,
aos resíduos, a normatização federal abaixo listada:
Lei 5.318/1967 dispõe sobre a Política Nacional de
Saneamento e cria o Conselho Nacional de
Saneamento.
Portaria Ministerial nº 053/1979 estabelece normas aos projetos específicos de
tratamento e disposição de resíduos sólidos,
bem como a fiscalização de sua implantação,
operação e manutenção
Lei nº 6.938/1981 (regulamentada
pelo Decreto nº 99.274/1990 e
alterada pela Lei nº 7.804/1989)
dispõe sobre a Política Nacional de Meio
Ambiente, seus fins e mecanismos de
formulação e aplicação.
NBR nº 8.419/1984 (revisada em
1992)
dispõe sobre a apresentação de projetos de
aterros sanitários de resíduos sólidos urbanos.
NBR nº 8.849/1983 (revisada em
1985 e em 1992)
dispõe sobre a apresentação de projetos de
aterros controlados de resíduos sólidos
urbanos.
Lei 7.347/1985 disciplina a ação civil pública de
responsabilidade por danos causados ao meio
ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de
valor artístico, histórico, turístico e
paisagístico.
NBR nº 9.190/1985 dispõe sobre o acondicionamento de resíduos
sólidos em sacos plásticos.
NBR nº 9.191/1985 dispõe sobre a padronização de recipientes.
Resolução nº 001/1986, do
CONAMA
dispõe sobre os critérios básicos e diretrizes
gerais para o Relatório de Impacto Ambiental
– RIMA.
NBR nº 10.004/1987 (revisada em
2004)
dispõe sobre as definições e classificações de
resíduos sólidos.
NBR nº 10.005/1987 (revisada em
2004)
estabelece os procedimentos para obtenção de
extrato lixiviado de resíduos sólidos.
NBR nº 10.006/1987 (revisada em
2004)
estabelece os procedimentos para obtenção de
extrato solubilizado de resíduos sólidos.
NBR nº 10.007/1987 (revisada em
2004)
dispõe sobre a amostragem de resíduos.
NBR nº 7.501/1989 dispõe sobre o transporte de produtos
197
O PL nº 1991/ 2007, o projeto-de-lei sobre a Política Nacional de Resíduos Sólidos, tramita há 17 anos no
Congresso Nacional. Inicialmente, era um projeto sobre a política de resíduos hospitalares e, após, inúmeras
emendas, se transformou no PL nº 1991/2007.
198
ZANTA; FERREIRA, 2003, p. 4.
53
perigosos.
Lei 8.080/1990 dispõe sobre as condições para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, a
organização e funcionamento dos serviços
correspondentes.
Decreto nº 99.271/1990 estabelece as licenças ambientais: Licença
Prévia, Licença de Instalação e Licença de
Operação.
NBR nº 11.174/1990 estabelece os procedimentos de
armazenamento de resíduos classe II, não-
inertes, e III, inertes.
Resolução nº 006/1991 do
CONAMA
dispõe sobre a incineração de resíduos sólidos
provenientes de estabelecimentos de saúde,
portos e aeroportos.
Resolução nº 008/1991 do
CONAMA
dispõe sobre a vedação da entrada no país de
materiais residuais destinados à disposição
final e incineração no Brasil.
NBR 12.245/1992 estabelece os procedimentos para
armazenamento de resíduos sólidos perigosos.
Resolução nº 005/1993 do
CONAMA
estabelece definições, classificação e
procedimentos mínimos para o gerenciamento
de resíduos sólidos oriundos de serviços de
saúde, portos e aeroportos, terminais
ferroviários e rodoviários.
NBR nº 9.190/1993 dispõe sobre a classificação de sacos plásticos
para acondicionamento de lixo.
NBR 9.191/1993 dispõe sobre a especificação de sacos
plásticos para acondicionamento de lixo.
NBR nº 12.807/1993 dispõe sobre a terminologia dos resíduos de
serviços de saúde.
NBR 12.980/1993 dispõe sobre coleta, varrição e
acondicionamento de resíduos sólidos
urbanos.
NBR 13.055/1993 determina a capacidade volumétrica dos sacos
plásticos para acondicionamento de lixo.
NBR 7.500/1994 define símbolos de riscos e manuseio para o
transporte e armazenamento de materiais.
NBR nº 13.221/1994 (revisada em
2000)
estabelece os procedimentos para o transporte
de resíduos.
NBR nº 13.463/1995 estabelece a classificação utilizada na coleta
de resíduos sólidos.
Resolução nº 023/1996, do
CONAMA
regulamenta a importação e uso de resíduos
perigosos.
Lei Ordinária nº 787/1997 dispõe sobre o Programa de Prevenção de
Contaminação por Resíduos Tóxicos, a ser
promovido por empresas fabricantes de
lâmpadas fluorescentes, de vapor de mercúrio,
vapor de sódio e luz mista.
Resolução nº 229/1997, do
CONAMA
dispõe sobre a importação de desperdícios e
resíduos de acumuladores elétricos de
chumbo.
Resolução nº 237/1997, do
CONAMA
regulamenta os aspectos de licenciamento
ambiental estabelecidos na Política Nacional
de Meio Ambiente.
54
NBR 13.896/1997 estabelece critérios para o projeto, a
implementação e a operação de aterros de
resíduos não perigosos.
Resolução nº 258/1999, do
CONAMA (em processo de
revisão)
determina que as empresas fabricantes de
pneumáticos ficam obrigadas a coletar e dar
destinação final ambientalmente adequadas
aos pneus inservíveis.
Resolução nº 275/2001, do
CONAMA
estabelece código de cores para diferentes
tipos de resíduos na coleta seletiva.
Resolução nº 316/2002, do
CONAMA
dispõe sobre procedimentos e critérios para o
funcionamento de sistemas de tratamento
térmico de resíduos.
Resolução nº 330/2003, do
CONAMA
institui a Câmara Técnica de Saúde,
Saneamento Ambiental e Gestão de Resíduos.
Resolução nº 401/2008, do
CONAMA
estabelece os limites máximos de chumbo,
cádmio e mercúrio para pilhas e baterias
comercializadas no território nacional e os
critérios e padrões para o seu gerenciamento
ambientalmente adequado.
Resolução nº 404/2008, do
CONAMA
estabelece critérios e diretrizes para o
licenciamento ambiental de aterro sanitário de
pequeno porte de resíduos sólidos urbanos
Quadro 1 - Normatizações federais aplicáveis aos resíduos sólidos urbanos.
No Rio Grande do Sul, a legislação estadual possui alguns dispositivos aplicáveis aos
resíduos sólidos. A Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, de 1989, trata sobre o
saneamento básico (Seção II, do artigo 247 ao 249) e sobre o meio ambiente (Capítulo IV, do
artigo 250 ao 259), mas, basicamente, apenas repetem o texto da Carta Magna, com exceção
do artigo 247, que é mais explícito.
199
Leis estaduais também são aplicadas às questões dos resíduos, a saber:
Lei Estadual nº 6.503/1972 dispõe sobre a promoção, proteção e
recuperação da saúde pública, e trata, no
artigo 21, sobre a coleta, transporte e o
destino do lixo, que devem ser
processados “em condições que não
tragam malefícios ou inconvenientes à
saúde, ao bem-estar e à estética.
Decreto Estadual nº 23.430/1974 regulamenta a Lei nº 6.503/1972, em seu
art. 124, determina que o solo poderá ser
utilizado para destino final de resíduos,
199
“Art. 247: O saneamento básico é serviço público essencial e, como atividade preventiva das ações de saúde
e meio ambiente, tem abrangência regional. §1º - O saneamento básico compreende a captação, o tratamento e
a distribuição de água potável, a coleta, o tratamento e a disposição final de esgotos cloacais e do lixo, bem
como a drenagem urbana. §2º - É dever do Estado e dos Municípios a extensão progressiva do saneamento
básico a toda a população urbana e rural, como condição básica da qualidade de vida, da proteção ambiental
e do desenvolvimento social. §3º - A lei disporá sobre o controle, a fiscalização, o processamento e a
destinação do lixo, dos resíduos urbanos, industriais, hospitalares e laboratoriais de pesquisa, de análises
clínicas e assemelhados”. (grifou-se)
55
desde que essa disposição ocorra de
acordo com as normas técnicas e
mediante licença.
Lei Estadual nº 9.921/1993
(regulamentada pelo Decreto nº
38.356/1998 e que incorporou a NBR
nº 10.004/1987)
dispõe sobre a gestão dos resíduos sólidos
(Política Estadual de Resíduos Sólidos),
nos termos do artigo 247, parágrafo 3º, da
Constituição do Estado do Rio Grande do
Sul.
Lei Estadual nº 11.019/1997 dispõe sobre o descarte e destinação final
de pilhas que contenham mercúrio
metálico, lâmpadas fluorescentes, baterias
de telefone celular e demais artefatos que
contenham metais pesados no Estado.
Lei Estadual nº 11.520/2000 institui o Código Estadual do Meio
Ambiente.
Resolução nº 008/2000 (alterada pelas
Resoluções nº 091/2005, 130/2006,
143/2007, 144/2007, 145/2007,
148/2007, 149/2007, 155/2008), do
CONSEMA
cria, dentre outras, Câmara Técnica
Permanente de Resíduos Sólidos e dispõe
sobre sua composição.
Resolução nº 017/2001, do
CONSEMA
estabelece diretrizes para a elaboração e
apresentação de Plano de Gerenciamento
Integrado de Resíduos Sólidos.
Lei Estadual nº 12.037/2003 dispõe sobre a Política Estadual de
Saneamento.
Resolução nº 073/2004, do
CONSEMA
dispõe sobre a co-disposição de Resíduos
Sólidos Industriais em aterros de Resíduos
Sólidos Urbanos no Estado do Rio Grande
do Sul.
Resolução nº 109/2005, do
CONSEMA
estabelece diretrizes para elaboração do
Plano Integrado de Gerenciamento de
Resíduos da Construção Civil, a ser
elaborado pelos Municípios.
Quadro 2 - Normatizações estaduais sobre os resíduos sólidos urbanos
Em termos municipais, pesquisa realizada pela Federação das Associações dos
Municípios do Rio Grande do Sul – FAMURS, no período de novembro de 2004 a agosto de
2005, nos 496 municípios do Estado, constatou que 93,5% não possui legislação própria
quanto a resíduos,
200
devendo seguir, dessa forma, o estabelecido nas Resoluções do
CONAMA, legislações federais específicas e legislação estadual pertinente.
200
FUNDAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES DOS MUNICÍPIOS DO RIO GRANDE DO SUL. Resíduos Sólidos
Urbanos. Porto Alegre: FAMURS, 2005. p. 3.
56
3.3.2 Classificação e características dos resíduos sólidos urbanos
Diversas são as classificações dos resíduos sólidos, sendo estas baseadas em certas
características ou propriedades identificadas.
201
O certo é que a classificação (ou
classificações) dos resíduos é a primeira providência para o seu adequado gerenciamento,
202
tornando-o mais viável.
De acordo com a natureza do resíduo, Naime classifica-os quanto ao grau de
degradabilidade:
Facilmente degradáveis: matéria orgânica, que é o constituinte principal dos
resíduos sólidos de origem urbana; Moderadamente degradáveis: são os papéis,
papelão e material celulósico; na verdade, como hoje em dia existe um amplo
mercado para estes materiais para reciclagem, e por suas condições sociais, como
um exército de catadores disponíveis em todas as regiões metropolitanas, o país
recicla praticamente todo material desta natureza, incluindo outros itens;
Dificilmente degradáveis: são os resíduos têxteis, aparas e serragens de couro,
borracha e madeira, que hoje também são parcialmente reaproveitados; Não-
degradáveis: incluem vidros, metais, plásticos, pedras, terra e outros. Os metais são
amplamente reciclados, incluindo as embalagens de alumínio; os vidros e boa parte
dos plásticos, como polietileno de baixa densidade, também já são amplamente
reutilizados, assim como plásticos e pedras podem ser reaproveitados para
cominuição e utilização como subleito de pavimentos.
203
A NBR nº 10.004/1987 (“Resíduos Sólidos: Classificação”) classifica os resíduos
sólidos quanto a sua periculosidade, característica apresentada pelo resíduo quando suas
propriedades físicas, químicas e/ou infectocontagiosas representarem potencial risco à saúde
pública, “caracterizado pelo aumento de mortalidade ou incidência de doenças”,
204
e risco ao
meio ambiente, “para produtos que, quando manuseados de forma inadequada, podem causar
poluição dos meios físico ou biológico”
205
.
Como critérios da classificação dos resíduos quanto à periculosidade, a NBR nº
10.004/1987, elege: inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade e patogenicidade
(desta última, “excluídos os resíduos sólidos domiciliares e aqueles gerados em estações de
tratamento de esgoto sanitário”
206
). Conforme esclarece Naime, na impossibilidade de
enquadramento dos resíduos em pelo menos um dos critérios elencados, a própria NBR nº
10.004/1987 estabelece a necessidade de submeter amostras a ensaios tecnológicos, avaliando
201
ZANTA; FERREIRA, 2003, p. 6.
202
NAIME, 2004, p. 18.
203
Ibidem, p. 19.
204
Ibidem.
205
Ibidem.
206
Ibidem, p. 20.
57
as concentrações de elementos que lhe conferem periculosidade, segundo listas organizadas
pela NBR.
207
Para isso, a ABNT vinculou a NBR nº 10.004/1987 às NBRs nº 10.005/1987
(procedimento para obtenção de extrato lixiviado de resíduos sólidos), 10.006/1987
(procedimento para obtenção de extrato solubilizado de resíduos sólidos) e 10.007/1987
(amostragem de resíduos sólidos).
Assim, quanto a sua periculosidade, os resíduos sólidos podem ser classificados
como: I. Classe I – Perigosos e II. Não Perigosos. Os resíduos não perigosos são subdivididos,
ainda, em A. Não-inertes e B. Inertes.
I. Classe I – Perigosos: aqueles resíduos que apresentam quaisquer das características
a seguir: corrosividade, reatividade, inflamabilidade, toxicidade ou patogenicidade; ou quando
estão contidos nos Anexos A ou B da NBR nº 10.004/1987;
II. Classe II – Não Perigosos:
A. Não-inertes: aqueles que não se enquadram nas classificações de resíduos Classe I
– Perigosos ou de Classe II B – Inertes, nos termos da NBR nº 10.004/1987. Os resíduos
Classe II A – Não-inertes podem ter propriedades tais como: biodegradabilidade,
combustibilidade ou solubilidade em água. Grande parte dos resíduos não perigosos não-
inertes estão dispostos no Anexo H da NBR nº 10.004/1987;
B. Inertes: quaisquer resíduos que, quando amostrados de uma forma representativa,
segundo a NBR nº 10.007/1987, e submetidos a um contato dinâmico e estático com água
desionizada, à temperatura ambiente, conforme a NBR nº 10.006/1987, não têm nenhum de
seus constituintes solubilizados a concentrações superiores aos padrões de potabilidade de
água, excetuando-se aspecto, cor, turbidez, dureza e sabor, conforme a listagem nº 8 do
Anexo G da NBR nº 10.004/1987.
Tanto as características qualitativas quanto as quantitativas dos resíduos sólidos
variam de acordo com seus aspectos sociais, econômicos, culturais, geográficos, climáticos
etc, ou seja, os mesmos aspectos que caracterizam e diferenciam as comunidades entre si.
208
A
quantificação da geração de resíduos sólidos urbanos é baseada segundo índices relacionados
ao número de habitantes atendidos pelo sistema de coleta e ao volume de resíduos
produzidos.
209
A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, realizada em 2000 pelo Instituto
207
NAIME, 2004, p. 20..
208
ZANTA; FERREIRA, 2003, p. 7.
209
NAIME, op. cit., p. 30.
58
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indica que são produzidas mais de 228 mil
toneladas diárias de resíduos sólidos nos municípios brasileiros.
210
Qualitativamente, têm-se os aspectos físicos, químicos e (micro)biológicos dos
resíduos. A composição física (ou composição gravimétrica) dos resíduos sólidos, está
relacionada às porcentagens (geralmente, em peso) dos diversos materiais que os constituem.
Essa caracterização é muito importante para a definição de projetos econômicos e
ambientalmente adequados de gerenciamento de resíduos.
211
No caso de resíduos sólidos
urbanos, que normalmente são dispostos em aterros, os componentes comumente
descriminados são: matéria orgânica putrescível, metais, papel e papelão, plásticos, trapos,
vidro, borracha, couro, madeira etc.
O conhecimento das características químicas (componentes orgânicos, poder
calorífico, pH, composição química, relação teor de carbono/nitrogênio, sólidos totais fixos,
sólidos voláteis e teor de umidade) dos resíduos sólidos possibilita a seleção de processos de
tratamentos e técnicas de disposição final.
212
Os aspectos (micro)biológicos dos resíduos sólidos dizem respeito às frações
orgânicas presentes nos materiais residuais, guardando relação com sua decomposição
biológica.
213
Vários microorganismos decompositores são os responsáveis pela metabolização
dos resíduos sólidos, como fungos e bactérias, aeróbios e/ou anaeróbios, “cujo
desenvolvimento dependerá das condições ambientais existentes”.
214
Os resíduos sólidos
podem apresentar, ainda, microorganismos patogênicos (como, por exemplo, resíduos
contaminados por dejetos humanos ou de animais).
215
3.3.3 O papel dos responsáveis: Administração Pública e os cidadãos
O artigo 225 da Constituição Federal institui o dever de todos ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, e impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo
210
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa nacional de saneamento básico.
Rio de Janeiro: IBGE, 2000. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/pnsb/default.shtm> Acesso em: 04 dez.
2008.
211
NAIME, 2004, p. 31.
212
ZANTA; FERREIRA, 2003, p. 7.
213
NAIME, op. cit., p. 31-32.
214
ZANTA; FERREIRA, op.cit., p. 7.
215
Ibidem.
59
e preservá-lo para as presentes e as futuras gerações. Então, ao contrário do que grande parte
da sociedade ainda pensa, o dever de proteção ao meio ambiente não é obrigação somente do
Poder Público, mas também de toda a coletividade, toda a sociedade e de cada cidadão.
Poder Público e coletividade são co-responsáveis no dever de proteção ambiental.
Assim como é dever dos cidadãos cobrar e fiscalizar os atos da Administração Pública, esta
tem o importante papel de chamar a sociedade para assumir o seu papel de co-responsável na
busca de soluções para os problemas ambientais.
216
Em matéria de resíduos, o grande
problema é que as autoridades e a população ainda dão maior importância aos aspectos mais
visíveis dos resíduos, como varrição e coleta, do que à disposição final dos mesmos.
217
As mudanças sociais e o surgimento de novos riscos (abstratos) alertam também para
as questões que envolvem os resíduos sólidos. Para a Administração Pública, que está
estritamente vinculada à legalidade, o problema está em que as mudanças sociais são muito
mais rápidas do que as adequações legais e, muitas vezes, os problemas são muito mais
complexos do que as disposições contidas na legislação. Por essa razão, às vezes, o
Administrador Público defronta-se com obstáculos criados pela própria legislação ambiental,
cujas questões teóricas estão distantes da prática.
218
Dar solução e impedir que novos problemas ambientais se formem são obrigações de
todos que habitam o Planeta. Conforme Fritsch, “o meio ambiente precisa da colaboração e da
responsabilidade de todos, desde o munícipe até o Ministério Público, passando pelos órgãos
ambientais e pelas organizações não-govenamentais, bem como pelo Poder Judiciário”.
219
O
dever de proteção ambiental e combate à poluição é de todos, previsto na Constituição
Federal, que deixa, ainda, a cargo dos municípios legislar sobre assuntos de interesse local e
de organização de serviços públicos.
220
Por essa razão, a gestão de limpeza urbana e dos
resíduos sólidos gerados em seu território é de responsabilidade do município,
221
que deve
seguir as estratégias de gestão e gerenciamento de resíduos, atendendo aos objetivos do
conceito de preventividade objetiva do artigo 225 da Constituição Federal, evitando ou
reduzindo a geração de resíduos e poluentes prejudiciais ao meio ambiente e à saúde
pública.
222
216
FRITSCH, 2000, p. 19.
217
Ibidem, p. 59.
218
Ibidem, p. 71.
219
Ibidem.
220
“Art. 30: Compete aos Municípios: I – legislar sobre assuntos de interesse local; [...] V – organizar e prestar,
diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse loca, incluído o de
transporte coletivo, que tem caráter essencial; [...]”.
221
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2000.
222
ZANTA; FERREIRA, 2003, p. 9.
60
No que tange às obrigações da população, esta precisa ser educada no que concerne
ao meio ambiente, devendo assumir sua cota de responsabilidade no enfrentamento do
problema.
223
Assim, programas de Educação Ambiental devem ser realizados junto à
comunidade, nas escolas, nas empresas, nos estabelecimentos comerciais, não somente por
iniciativa governamental, mas também pela própria comunidade, no sentido de conscientizar a
população da necessidade de reduzir a produção de lixo e incentivar a reciclagem e o
aproveitamento de resíduos.
224
Aliás, o princípio da educação ambiental está expressamente
previsto no inciso VI do parágrafo 1º do artigo 225 da Constituição Federal.
225
Exemplo da atuação da população na gestão dos resíduos sólidos urbanos está na
separação dos resíduos domésticos, já que o reaproveitamento e a reciclagem só podem ser
efetivados se a coleta seletiva for realmente eficiente, ou seja, se os resíduos estiverem
realmente separados, sem que resíduos orgânicos ou contaminados tenham contato com os
resíduos “secos”, que podem ser reaproveitados.
3.3.4 Coleta seletiva de resíduos nos municípios brasileiros
A realidade social atual é a de que a extração de recursos naturais para a produção de
bens de consumo está acima da capacidade de suporte do planeta e de que a produção de
resíduos sólidos é cada vez mais crescente e a sua destinação ainda é inadequada na grande
maioria dos municípios brasileiros, além da dificuldade de encontrar áreas para a sua
disposição e tratamento. Enfrentar essa realidade passa, necessariamente, por necessidades de
mudanças nos padrões de produção e consumo, e também pela coleta diferenciada ou seletiva
e reaproveitamento ou reciclagem de todos os tipos de resíduos sólidos.
226
A coleta seletiva consiste na separação, na fonte geradora, de materiais que podem
ser reaproveitados ou reciclados,
227
configurando-se como uma das primeiras ações que
compõem o GIRSU, que passa pelas etapas de redução na fonte, reaproveitamento
223
FRITSCH, 2000, p. 71.
224
Ibidem, p. 62-63.
225
“Art. 225: [...] parágrafo 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: [...] VI –
promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação
do meio ambiente; [...]”.
226
BESEN, Gina Rizpah. Programa de Coleta Seletiva de Londrina: caminhos inovadores rumo à
sustentabilidade. In: JACOBI, Pedro (Org.). Gestão compartilhada dos resíduos sólidos no Brasil: inovação
com inclusão social. São Paulo: Annablume, 2006. p.109.
227
Ibidem.
61
(reutilização, reciclagem e a recuperação), tratamento e disposição final.
228
Os benefícios da
coleta seletiva podem ser muitos: redução dos resíduos na fonte geradora, reaproveitamento e
reciclagem de matérias-primas (com a consequente economia dos bens naturais esgotáveis),
geração de renda com inclusão social,
229
minimização do impacto ambiental causado pelos
sistemas de disposição final (consequentemente, diminuição da poluição do solo, das águas e
do ar), aumento da vida útil dos aterros sanitários, etc.
230
No entanto, apesar de todos esses benefícios, dos 5.507 municípios brasileiros,
apenas 405 (7%) têm programas de coleta seletiva, segundo os dados da Pesquisa Ciclosoft
2008, do Compromisso Empresarial para Reciclagem – CEMPRE.
231
Referida pesquisa
constatou, ainda, que apenas 14% da população brasileira (cerca de 26 milhões de pessoas)
têm acesso à coleta seletiva. Dos 405 municípios que realizam coleta seletiva, 43% (174)
possuem cooperativas de catadores, 49% (201) realiza a coleta porta a porta e 26% (105)
possui Posto de Entrega Voluntária (PEVs). No Rio Grande do Sul, pesquisa da FAMURS
sobre resíduos sólidos urbanos, realizada em 2005, indica que 36,7% dos municípios do
Estado implantaram coleta seletiva.
A coleta seletiva, como visto, protege o meio ambiente, mas uma explicação para
esse número tão pequeno de municípios que a realizam reside no seu custo. A Pesquisa
Ciclosoft do CEMPRE constata que o custo com a coleta seletiva é de US$221,00 por
tonelada, cinco vezes maior que o custo por tonelada da coleta convencional. Esse custo vem
diminuindo ao longo dos anos. Em 1994, o custo da coleta seletiva era dez vezes maior que o
custo da coleta convencional, ou seja, hoje, esse custo está reduzido à metade.
232
Importante destacar que a coleta seletiva não deve ser confundida com o processo de
reciclagem. A coleta seletiva é apenas parte do processo de reciclagem, que abrange outras
etapas, tais como triagens, limpeza, beneficiamento, acumulação em quantidades compatíveis
com o aproveitamento, transporte final e processamento em instalações adequadas.
233
Dessa
forma, o custo da coleta seletiva não deve ser levado em consideração somente do ponto de
vista da Administração Pública, mas de todo o processo, incluída a economia de energia,
228
ZANTA; FERREIRA, 2003, p. 9-10.
229
A “catação”, que antes era procedida de forma desordenada e por pessoas extremamente pobres, à margem de
uma estruturas sanitárias adequadas, constituiu-se em meio de sobrevivência, tornando a coleta seletiva
estruturada, com separação e classificação de resíduos, em atividade economicamente significativa.
(FRITSCH, 2000, p. 30.)
230
BESEN, 2006, p. 110.
231
COMPROMISSO EMPRESARIAL PARA RECICLAGEM (CEMPRE). Pesquisa Ciclosoft. Rio de Janeiro:
CEMPRE, 2008. Disponível em: <http://www.cempre.org.br/ciclosoft2008> Acesso em 18 nov. 2008.
232
Idem.
233
CALDERONI, Sabetai. Os bilhões perdidos no lixo. São Paulo: Humanitas, 1998. p. 41.
62
economia de espaço nos locais de destinação final, melhoria da saúde pública, etc.
234
Ou seja,
os ganhos não devem apenas ser considerados sob o ponto de vista econômico, mas também,
e principalmente, sob o ponto de vista da proteção do meio ambiente e dos recursos naturais.
Como vantagens da coleta seletiva podemos apontar: a boa qualidade dos materiais
recuperados, uma vez que estão menos contaminados por outros materiais presentes nos
resíduos; a estimulação da cidadania, já que a participação popular reforça o espírito
comunitário; a maior flexibilidade, uma vez que pode ser feita em pequena escala e ampliada
gradativamente; a formação de parcerias entre catadores, empresas, associações ecológicas,
escolas, etc; a redução do volume de resíduos que deve ser encaminhado à disposição final.
Ao contrário, como desvantagens apontam-se: a necessidade de caminhões especiais que
devem passar em dias diferentes dos da coleta convencional, aumentando os custos de coleta e
transporte; a necessidade de centro de triagem onde os recicláveis são separados por tipo.
235
Assim, Fernandes destaca que:
O Município deve conscientizar-se de que, embora a reciclagem e a coleta seletiva
não lhe interessem imediatamente, pelos altos custos iniciais, os benefícios destas, se
incentivadas, refletirão no meio ambiente, que é dever do Município proteger por
disposição constitucional [...].
236
Assim, pode-se entender a coleta seletiva como uma das fases do processo de
reciclagem de resíduos sólidos, consistindo numa forma organizada de classificação e
separação para o seu futuro aproveitamento. Como sujeitos responsáveis por essa separação e
a coleta temos todos os cidadãos, toda a sociedade civil organizada e a Administração
Pública.
3.3.5 Programa de reciclagem: reutilização, reciclagem e tratamento de resíduos
Nos termos do inciso V do artigo 2º da Resolução nº 307, do CONAMA, o
gerenciamento de resíduos é o sistema de gestão que visa reduzir, reutilizar ou reciclar
resíduos, “incluindo planejamento, responsabilidades, práticas, procedimentos e recursos para
234
FERNANDES, 2001. p. 99.
235
PEREIRA, Romilson Rodrigues. apud FERNANDES, 2001, p. 101.
236
Ibidem, p. 103-104.
63
desenvolver e implementar as ações necessárias ao cumprimento das etapas”.
237
A “política
dos 3R” (reduzir, reutilizar e reciclar), aplicada na referida Resolução, é a premissa para a
efetivação de um sistema de gerenciamento e gestão de resíduos sólidos urbanos.
238
Após a etapa de não geração de resíduos, que deve ser sempre a primeira premissa
para um sistema de gestão de resíduos, passas-se à etapa de redução, ou seja, de diminuição
na geração de resíduos. Como próximo nível de gestão de resíduos, tem-se a reutilização, que
“é o processo de reaplicação de um resíduo, sem transformação do mesmo”,
239
nos termos do
inciso VI do artigo 2º da Resolução nº 307/2002, do CONAMA.
Naime discorre sobre a reutilização de resíduos:
Todos os materiais que podem ser utilizados novamente com a mesma ou com outra
finalidade, ainda que isto signifique o aumento de dificuldades em operações, devem
ser práticas estimuladas; por exemplo, potes de vidro e embalagens plásticas podem
ser reutilizadas para armazenamento de materiais ou guarda de pequenos objetos,
livros usados podem ser doados ou vendidos, madeira pode ser reaproveitada ou
empregada como lenha se não estiver contaminada. Um número infinito de outros
exemplos demonstra que o importante é a pré-disposição de reutilizar os materiais
sempre que for possível.
240
Então, na reutilização, tem-se o uso direto dos “resíduos” como produtos, às vezes
necessitando, como por exemplo, no caso de embalagens de vidro, de procedimentos de
limpeza, como lavagem e/ou esterilização para o seu reuso. Na recuperação, tem-se a extração
de certas substâncias do resíduo,
241
ou seja, o resíduo é reutilizado, mas não exatamente na
sua condição ou forma inicial, como por exemplo, quando um móvel é descartado e alguma
reforma é realizada para que possa ser utilizado novamente.
A reciclagem consiste no “processo de transformação dos resíduos com o objetivo de
inseri-los novamente como matéria-prima na cadeia produtiva”.
242
Segundo Naime, no Brasil,
há verdadeiras cadeias produtivas assentadas na reciclagem de materiais, cujos dados indicam
que a economia de energia no processo de beneficiamento pode atingir valores superiores a
80% da energia gasta originalmente.
243
237
CARDOSO, Artur Renato Albeche. Termos técnicos e capitulação jurídica sobre resíduos urbanos,
industriais e de serviços de saúde. Porto Alegre: Fabris, 2005. p. 37.
238
Conforme Maria Alexandra Aragão, no direito europeu, os níveis de gestão de resíduos sólidos podem ser
assim enumerados: 1) prevenção (ou seja, não geração), 2) redução da produção, 3) redução da nocividade dos
resíduos (pela reutilização), 4) pela alteração dos processos produtivos, 5) adoção de tecnologias mais limpas,
6) sensibilização dos agentes econômicos e consumidores, 7) valorização (ex.: reciclagem) e 8) eliminação
adequada. (ARAGÃO, 2003, p. 34-35)
239
CARDOSO, op. cit., p. 64.
240
NAIME, 2004, p. 33.
241
ZANTA; FERREIRA, 2003, p. 13.
242
Ibidem.
243
NAIME, op. cit., p. 33-34.
64
Sob todos os aspectos, a reciclagem é um processo que traz imensas vantagens à
humanidade e ao meio ambiente, mas para atestar a sua viabilidade é preciso fixar os
parâmetros social, político, físico e econômico no caso concreto. Além de economizar
energia, reciclar conserva os recursos naturais, protege o meio ambiente, traz benefícios
econômicos e polui menos o ambiente, já que a produção da matéria virgem produz muito
mais resíduos do que a produção a partir da reciclagem
244
(no caso de alumínio, por exemplo,
essa produção de resíduos é 95% menor em relação ao ar e 97% menor em relação à água
245
).
Cardoso explica que tratamento de resíduo, nos termos do item 1.6, da Resolução nº
33/2003, da ANVISA:
Consiste na aplicação de método, técnica ou processo que modifique as
características biológicas ou a composição dos resíduos sólidos, que leve à redução
ou eliminação do risco de causar doença. O tratamento pode ser aplicado no próprio
estabelecimento gerador ou em outro estabelecimento, observadas nestes casos, as
condições de segurança para o transporte entre o estabelecimento gerador e o local
do tratamento.
246
Nesse contexto, sistema de tratamento de resíduos é o “conjunto de unidades,
processos e procedimentos que alteram as características físicas, químicas ou biológicas dos
resíduos e conduzem à minimização do risco à saúde pública e à qualidade do meio
ambiente”.
247
Mas o processo de reciclagem envolve questões complexas e é ilusório, no
entendimento de Fernandes, defender a auto-sustentação econômica da limpeza urbana a
partir do processo de reciclagem.
248
No contexto de uma comunidade engajada no processo de
reciclagem, participando ativamente na coleta seletiva, suas premissas até são verificadas e
realizadas, e, muitas vezes, até superam os custos da coleta e transporte. O problema está nos
grandes centros urbanos, em que a individualidade e a falta de tempo dos cidadãos, inclusive
para se preocupar com questões ambientais e de limpeza urbana, demonstram a falta de
engajamento nos processos de separação de resíduos, coleta seletiva e destinação adequada.
249
Mesmo assim, é preciso avaliar os benefícios do processo de reaproveitamento e tratamento
de materiais não apenas sob o ponto de vista econômico, mas também sob o ponto de vista da
proteção e qualidade ambiental.
244
FERNANDES, 2001, p. 94-96.
245
CALDERONI, 1998, p. 37.
246
CARDOSO, 2005, p. 69.
247
Ibidem, p. 65.
248
FERNANDES, op. cit., p. 97.
249
Ibidem, p. 97-99.
65
A valorização de resíduos deve ser sempre uma alternativa anterior à sua eliminação,
podendo trazer diversos benefícios, tais como: redução da poluição, proteção dos recursos
naturais, geração de emprego e renda e aumento da vida útil dos sistemas de disposição final.
Após as etapas de reaproveitamento e tratamento, os resíduos gerados a partir daí deverão ser
encaminhados à destinação final.
3.4 MÉTODOS DE DISPOSIÇÃO FINAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS E OS
RISCOS INERENTES A CADA TIPO
A disposição final de resíduos é o seu depósito em um corpo receptor, que
geralmente é o solo, a longo prazo ou em caráter permanente, nos termos da NBR nº
10.703/1989. Infelizmente, a legislação brasileira ainda não contém dispositivos eficazes para
coibir a maioria dos produtores de resíduos, prevalecendo a lógica de que o consumidor se
interessa apenas pela facilidade na compra e o produtor não tem de dar destinação final a
todos os resíduos que gera desnecessariamente. Mesmo com programas de educação
ambiental (insuficientes, na verdade) e os esforços no alcance da conscientização da
população sobre a questão dos resíduos, a grande maioria dos consumidores ainda compra o
que encontra à disposição, custa menos e facilita a vida, sem se preocupar com as
conseqüências dessa operação.
250
Proteger o meio ambiente nem sempre é oneroso e trabalhoso, mas sempre depende
(além de ser um dever) da participação de toda a comunidade. Sobre a problemática da
destinação final dos resíduos sólidos, o problema parece ainda mais grave. As cidades quase
nunca possuem local adequado, dentro dos requisitos e limites legais: ou falta espaço, ou a
área não pode ser utilizada justamente por razão de proteção ambiental, além da proximidade
do local dos núcleos populacionais.
251
Nesse contexto, os diversos tipos de métodos de
disposição final de resíduos sólidos existentes, nem sempre ambientalmente adequados, e suas
conseqüências, serão analisados um a um nos itens que seguem.
250
FRITSCH, 2000, p. 117.
251
Ibidem, p. 117-118.
66
3.4.1 Tratamento da fração orgânica por processos biológicos: compostagem e digestão
anaeróbia
O tratamento da fração orgânica de resíduos sólidos urbanos, através de métodos
biológicos, permite a obtenção de composto orgânico adequado para ser utilizado na
agricultura, como fertilizante. Uma estação desse tipo de tratamento pode ser utilizada nos
métodos de compostagem e digestão anaeróbia.
Na digestão anaeróbia, a degradação da matéria orgânica é feita através da utilização
de microorganismos anaeróbios, “isto é, um meio isento de oxigênio e por via úmida, com os
parâmetros temperatura e percentagem de umidade a serem devidamente controlados”.
252
Nesse processo, ocorre a formação do biogás, que poderá ser utilizado como fonte energética,
ligado a uma turbina e produzindo energia elétrica, a exemplo do que ocorre no sistema de
gestão e tratamento dos RSU de Lisboa, Portugal.
253
Nos termos da NBR nº 10.703/1989, compostagem é o processo biológico pelo qual a
matéria orgânica existente nos resíduos sólidos é digerida pela ação de microorganismos
aeróbios, normalmente já presentes nos próprios resíduos, produzindo o composto orgânico
(comumente denominado adubo ou fertilizante
254
), que, geralmente, é utilizado na melhora
das propriedades do solo para fins agrícolas.
255
Segundo a Resolução nº 33/2003, da ANVISA
(APÊNDICE V), compostagem consiste no:
Processo de decomposição biológica de fração orgânica biodegradável de resíduos
sólidos, efetuado por uma população diversificada de organismos em condições
controladas de aerobiose e demais parâmetros, desenvolvido em duas etapas
distintas: uma de degradação ativa e outra de maturação”.
Segundo Fernandes, o Brasil apresenta um volume de resíduos bastante orgânico,
(característica decorrente da sua ainda baixa industrialização, ao contrário do que ocorre em
países europeus e nos Estados Unidos), o que faz com que a maior preocupação no que se
refere à destinação final de resíduos sejam justamente os resíduos urbanos.
256
A compostagem
mostra-se como um “aproveitamento inteligente” dos resíduos orgânicos (exemplos: cascas de
252
PUNA, Jaime Filipe Borges; BAPTISTA, Bráulio dos Santos. A gestão integrada de resíduos sólidos
urbanos: perspectiva ambiental e econômico-energética. Revista Química Nova, v. 31, n. 3, p. 645-654, 2008.
Disponível em: <http://www.scielo.gov.br> Acesso em: 17 dez. 2008. p. 647.
253
Ibidem, p. 647-648.
254
FERNANDES, 2001, p. 88.
255
CARDOSO, 2005, p. 32-33.
256
FERNANDES, op. cit., p. 43-44.
67
frutas e verduras, esterco de animais, serragem etc), através da sua transformação em adubo
ou fertilizante (composto orgânico). Entretanto, a principal vantagem da compostagem não é a
produção de composto orgânico, e sim a redução do espaço necessário para os locais de
destinação de resíduos sólidos e o aumento da qualidade e preço dos materiais destinados ao
reaproveitamento e reciclagem.
257
O processo de compostagem pode dar-se de duas maneiras: a compostagem natural,
que é o método mais barato e que exige muito pouca infra-estrutura, recomendável para
municípios com menos de 200 mil habitantes; e a compostagem acelerada, que é mais
complexa, pois exige equipamento e metodologia especiais. No primeiro processo, o
composto orgânico demora de dois a quatro meses para ser produzido; no segundo, o
composto orgânico é processado em poucos dias.
258
Para a implementação e funcionamento da produção, através da compostagem, como
método de disposição de resíduos orgânicos sanitariamente adequado, é preciso que três
procedimentos sejam desenvolvidos: a coleta seletiva (que aumenta tanto a qualidade dos
compostos orgânicos quanto dos resíduos recicláveis), o aprimoramento da seleção e catação
de resíduos, e a instalação de usinas de tratamento (usinas de compostagem). Há estimativas
de que menos de 3% dos resíduos coletados no Brasil vão para usinas de compostagem.
259
As desvantagens desses processos estão no fato de que, quando implantados com
técnicas incorretas causam riscos às áreas vizinhas, como doenças causadas pela proliferação
de insetos e roedores (vetores), além da produção de compostos de baixa qualidade e
contaminados com metais pesados, caso haja falhas na separação dos resíduos.
260
Em
contrapartida, as vantagens residem no aproveitamento do material orgânico que seria
simplesmente desperdiçado e ocuparia espaço nos aterros sanitários, diminuindo a sua
capacidade.
257
FERNANDES, 2001, p. 88-89.
258
.Ibidem.
259
Ibidem, p. 89-92.
260
FADINI, Pedro Sérgio; FADINI, Almerinda Antonia Barbosa. Lixo: desafios e compromissos. Cadernos
Temáticos de Química Nova na Escola, Edição Especial, maio 2001. Disponível em:
http://qnesc.sbq.org.br/online/cadernos/01/lixo.pdf.> Acesso em: 02 dez. 2008. p. 12.
68
3.4.2 Lançamento a céu aberto
É a forma mais simples e primitiva de disposição final de resíduos. É o simples
lançamento de resíduos sólidos “de qualquer natureza, com qualquer grau de periculosidade e
potencial de contaminação, a céu aberto, em terrenos baldios ou áreas periféricas,
especialmente destinadas para esta finalidade”,
261
sem qualquer tipo de medida para evitar a
ocorrência de danos ambientais. Esses locais são chamados “aterros de lixo”, e vulgarmente
são denominados “lixões”.
É o método de disposição final mais prejudicial ao homem e ao meio ambiente. No
entanto, ainda é o mais utilizado no Brasil.
262
A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico,
realizada pelo IBGE, em 2000, apontou que 63,3% dos municípios brasileiros utilizam os
“lixões” como locais de disposição de seus resíduos. No Rio Grande do Sul, dados da
FAMURS indicam que 11,9% dos municípios gaúchos destinam seus resíduos a “lixões”
263
,
mas a própria pesquisa indica que o levantamento de dados não foi supervisionado pelos
parceiros da pesquisa (o questionário foi enviado por email e respondido da mesma forma). A
mesma pesquisa classifica essa situação de destinação final de resíduos sólidos urbanos como
inadequada.
Nesse método de disposição final nem é necessário falar em riscos ao meio ambiente,
pois a sua existência causa danos de proporções imensas ao meio ambiente físico (geologia,
solos, águas superficiais e subterrâneas, geomorfologia e clima), biológico (flora e fauna) e
também ao meio ambiente antrópico (que sofreu interferência do homem). Considerando a
saúde pública, esta forma de disposição final de resíduos estimula a proliferação de vetores de
doenças (moscas, mosquitos, baratas, ratos e germes patológicos), gera maus odores e
gravíssimas contaminações às águas superficiais e subterrâneas. Os lixiviados (misturas de
chorume resultante da degradação da matéria orgânica) contaminam o solo e também os
lençóis freáticos, causando diversos danos não somente ambientais, mas também à saúde
pública, além dos gases produzidos, que causam a poluição do ar e geram risco de
incêndios.
264
Ainda, o fim de operação de um “lixão” não cessa o conjunto de problemas que esse
método de destinação final de resíduos pode causar. A geração de chorume, por exemplo,
261
NAIME, 2004, p. 35.
262
FERNANDES, 2001, p. 42.
263
FUNDAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES DOS MUNICÍPIOS DO RIO GRANDE DO SUL, 2005, p. 9.
264
NAIME, op. cit., p. 35.
69
pode alongar-se por mais de quinze anos após o final da deposição de lixo, dependendo de
vários fatores. Assim, são necessárias medidas de remediação, ou seja, medidas de proteção
posteriores ao funcionamento e fechamento dos “lixões”. Ocorre que essas medidas de
remediação, mesmo que atenuem os impactos causados pelo lançamento de resíduos a céu
aberto, são dispendiosos e não solucionam todos os danos causados ao meio ambiente e à
saúde pública.
265
O lançamento de resíduos a céu aberto, diretamente no solo, sem qualquer tipo de
tratamento, é um método que demonstra a sua má gestão, pois cria riscos (na verdade, já cria
danos) para a água, o ar, o solo, a fauna, a flora, a saúde, além de causar odores desagradáveis
e danificar a paisagem. É um método, no mínimo, irresponsável. Dispor de resíduos
diretamente no solo é cometer um grave dano (e até mesmo um crime) ambiental, com
consequências gravíssimas ao meio ambiente.
3.4.3 Aterro controlado
É uma variável da prática de dispor os resíduos sólidos diretamente no solo,
lançando-os a céu aberto.
266
No aterro controlado, há disposição de resíduos sólidos urbanos
diretamente nos solos, “com precauções tecnológicas executivas no desenvolvimento do
aterro”,
267
que consistem no recobrimento diário dos resíduos com argila ou serragem,
268
“de
forma a evitar o desenvolvimento dos ciclos de moscas, e medidas de drenagem que
aumentam a segurança do local e minimizam os impactos ambientais com riscos à saúde
pública”.
269
Entretanto, conforme alerta Fernandes, esta cobertura diária com material inerte é
realizada de maneira aleatória e não resolve satisfatoriamente os problemas de poluição
gerados pelos resíduos sólidos, uma vez que essas “medidas tecnológicas executivas” não
levam em consideração os mecanismos de formação de líquidos e gases.
270
Embora os aterros
controlados apresentem vantagens sobre o simples lançamento de resíduos a céu aberto, os
265
POSSAMAI, Fernando Pagani et al. Lixões inativos na região carbonífera de Santa Catarina: análise dos
riscos à saúde pública e ao meio ambiente. Revista Ciência & Saúde Coletiva. Disponível em:
<www.scielo.gov.br> Acesso em: 12 dez. 2008.
266
FERNANDES, 2001, p. 42.
267
NAIME, 2004, p. 35.
268
FERNANDES, op.cit., p. 42.
269
NAIME, op. cit., p. 36.
270
FERNANDES, op. cit., p. 42.
70
procedimentos adotados não são suficientes para a sua disposição final ambientalmente
adequada
271
e, portanto, não podem e não devem ser considerados como solução definitiva
para o correto equacionamento de disposição final de resíduos sólidos, uma vez que é grande
seu potencial de impacto ambiental, principalmente no que se refere à poluição das águas
superficiais e subterrâneas e do solo.
A cobertura diária com material inerte é realizada sobre os resíduos, minimizando a
proliferação de vetores e diminuindo os odores desagradáveis, mas como a NBR nº
8.849/1983, que dispõe sobre a apresentação de projetos de aterros controlados de resíduos
sólidos urbanos, não prevê a impermeabilização do solo, implantação de sistema de coleta e
tratamento de líquidos percolados e de sistema de drenagem de gases, os riscos de
contaminação de lençol freático e de contaminação do solo são altíssimos. As recomendações
técnicas previstas na NBR nº 8.849/1983 são simplificadas e possuem menores exigências
para proteção ambiental, ainda mais se comparadas às exigências para implantação de aterro
sanitário, como se verá no próximo item desta pesquisa.
Dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, de 2000, indicam que 18,4% dos
municípios brasileiros dispõem seus resíduos sólidos em aterros controlados. No Rio Grande
do Sul, dados da FAMURS indicam que esta modalidade de disposição final de resíduos
sólidos urbanos está presente em 18,7% dos municípios gaúchos,
272
classificando-a, ainda,
como “aceitável”. Essa “aceitabilidade”, na verdade, ocorre em comparação à disposição de
resíduos em “lixões”, tendo em vista que os aterros controlados produzem menos
consequências ambientais negativas que os “lixões”, mas, ainda assim, não são
ambientalmente adequados e desencadeiam diversas formas de degradação ao meio ambiente.
3.4.4 Aterro sanitário
Para os aterros sanitários, só deverão seguir os resíduos que já tiveram esgotadas as
possibilidades de tratamento, aproveitamento e reciclagem. Assim, dando continuidade, aterro
sanitário, nos termos das NBRs nº 8.419/1984 (revisada em 1992) é:
271
NAIME, 2004, p. 36.
272
Importante lembrar, mais uma vez, que a pesquisa de Resíduos Sólidos Urbanos da FAMURS não teve
supervisão não coleta de dados, uma vez que cada Prefeitura Municipal recebeu e enviou o questionário pela
Internet.
71
O método de disposição final de resíduos sólidos (lixo) no solo, sem causar danos ao
meio ambiente ou à saúde pública, utilizando processos de engenharia para confinar
os resíduos sólidos na menor área possível, cobrindo-os, por exemplo, pelo menos
uma vez por dia. No projeto, execução e conservação de um aterro sanitário, devem
ser tomados cuidados, particularmente para evitar a poluição das águas superficiais e
subterrâneas[...].
273
Nos termos da NBR nº 10.703/1989, item 2.72 (praticamente repetida na Resolução
nº 33/2003, da ANVISA), aterro sanitário é a forma de destinação final de resíduos sólidos
urbanos no solo, através de confinamento em camadas cobertas com material inerte, segundo
normas específicas, de modo a evitar danos ou riscos à saúde e à segurança, minimizando os
impactos ambientais. Mesmo com a utilização de técnicas de engenharia tendentes a evitar os
impactos ambientais decorrentes dos resíduos sólidos, os aterros sanitários trazem riscos ao
meio ambiente, principalmente de contaminação do solo e de lençol freático pela produção de
chorume e líquidos percolados.
Outra desvantagem dos aterros sanitários é a desvalorização da região ao seu redor e
a má recepção e incorreta percepção das comunidades populacionais da região no que tange
ao objetivo e funcionamento da unidade de tratamento de RSU, assim como o ruído
proveniente dos equipamentos mecânicos e do intenso tráfego de caminhões de descarga dos
RSU. Ainda, o risco de acidentes graves nas estações, que podem afetar a segurança dos
trabalhadores.
274
A verdade é que, se não houver controle e monitoramento, o aterro sanitário
pode produzir os mesmos riscos gerados pela disposição de resíduos diretamente no solo
(“lixões”).
275
A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, do IBGE, estima que apenas 13,8% dos
municípios brasileiros possuem aterros sanitários. Já a pesquisa da FAMURS, sobre Resíduos
Sólidos Urbanos, constata que no Estado do Rio Grande do Sul, 59,4% dos municípios
possuem aterros sanitários, cuja situação é considerada adequada para a destinação de
resíduos sólidos. Conforme salientado por Naime, o argumento atenuante para o baixo índice
de municípios que possuem aterros sanitários é que os grandes e médios municípios do país
encontram-se nesta situação, minimizando a quantidade de resíduos que não encontram
disposição adequada.
276
Corroborando esse argumento, a PNSB, do IBGE, indica que 47,1%
dos resíduos sólidos urbanos (em peso) do país são dispostos em aterros sanitários.
As características físicas, químicas e biológicas dos resíduos urbanos têm
composição complexa e são influenciadas pelas condições sociais, econômicas e culturais de
273
CARDOSO, 2005, p. 26-27.
274
PUNA; BAPTISTA, 2008, p. 650.
275
FADINI; FADINI, 2008, p. 12.
276
NAIME, 2004, p. 36.
72
cada região.
277
Essa grande variedade física, química e biológica é objeto de evoluções
complexas, influenciadas por agentes naturais (chuva e micro-organismos). A evolução dos
resíduos sólidos urbanos em aterro sanitário é um fenômeno global, que, via de regra, conduz
à formação de lixiviados e gases: os principais vetores da poluição em aterros sanitários, que
geram riscos de contaminação do solo e do lençol freático, e de poluição do ar.
278
Com o intuito de evitar a ocorrência de impactos ambientais, os aterros sanitários
devem possuir: sistema de drenagem superficial, que tem como função evitar a entrada de
água de escoamento superficial, que além de aumentar o volume de lixiviados, gera erosão,
que pode causar a destruição da camada de cobertura dos resíduos; sistema de drenagem de
lixiviados, que devem ser canalizados para fora do sistema de disposição final a fim de
receberem tratamento adequado; sistema de tratamento de lixiviados, que se constituem em
efluentes altamente poluentes e que não podem ser descartados no meio ambiente;
impermeabilização de fundo e de laterais, tendentes a evitar a poluição do solo e das águas
superficiais e subterrâneas; sistema de drenagem de gases, para evitar que os gases formados
dentro dos aterros sanitários (principalmente metano e dióxido de carbono) causem incêndios,
além de ocupar espaço; sistema de cobertura, com a função de eliminar a proliferação de
vetores, diminuir a taxa de formação de lixiviados, reduzir a exalação de odores e impedir a
saída descontrolada de gases.
279
Para Naime, a adoção da disposição final de resíduos sólidos urbanos em aterros
sanitários “é o método com melhor relação de custo benefício para os países em
desenvolvimento”, como o Brasil. Na Europa e na América do Norte, as soluções são de outra
ordem, tais como incineração, aterros de geração de energia e bancos de resíduos,
principalmente no caso de resíduos industriais.
280
Em Portugal, aterro sanitário ainda tem sido
considerado como a melhor solução de eliminação de resíduos.
281
277
NAIME, 2004, p. 36.
278
CASTILHOS JÚNIOR, Armando Borges de et al. Principais Processos de Degradação de Resíduos Sólidos
Urbanos. In: CASTILHOS JÚNIOR, Armando Borges de (Org.). Resíduos sólidos urbanos: aterro sustentável
para municípios de pequeno porte. Rio de Janeiro: ABES/RiMa, 2003. p. 19-20.
279
Ibidem, p. 63-65.
280
NAIME, op. cit., p. 37-38 e p. 40.
281
ARAGÃO, 2003, p. 45.
73
3.4.5 Tratamento térmico de resíduos
A Resolução nº 316/2002, do CONAMA, no inciso III, do seu artigo 2º, estabelece
que o tratamento térmico de resíduos “é todo e qualquer processo cuja operação seja realizada
acima da temperatura mínima de oitocentos graus Celsius”. No Rio Grande do Sul, pelo
disposto na Resolução nº 009/2000, do Conselho Estadual de Meio Ambiente - CONSEMA,
em seu item 3.4, entende-se que a incineração é o processo de oxidação térmica à alta
temperatura que destrói e reduz o volume de materiais ou substâncias.
282
A NBR nº
11.175/1990 dispõe sobre incineradores, que se configuram como quaisquer dispositivos,
aparatos, equipamentos ou estruturas usadas para a oxidação à alta temperatura, que destrói ou
reduz o volume ou recupera materiais ou substâncias.
Segundo Cardoso, incineração é o:
Processo de queima dos resíduos sólidos, semi-sólidos e semi-líquidos, como o lixo
em geral e o lodo proveniente de estação de tratamento de águas residuárias, com o
objetivo, entre outros, de reduzir o volume dos resíduos e de minimizar seus efeitos
sobre o meio ambiente. Normalmente é feita em instalações próprias, denominadas
incineradoras, providas de equipamentos contra a poluição do ar. Além dos resíduos
gasosos, nestes incineradores ficam resíduos líquidos, geralmente bastante
poluidores, que necessitam de tratamento e/ou disposição adequada.
283
Em termos de prevenção de danos ambientais, “pretende-se que a incineração não
resulte numa mera transferência de poluição dos resíduos para o ar, a água ou o solo”
284
, nas
palavras de Aragão. É um método de alto custo devido a utilização de equipamentos
especiais, com capacidade de produzir altas temperaturas (de 800 a 1.000 ºC) em condições
seguras, a fim de reduzir o peso (em até 70%) e o volume (em até 90%) dos
resíduos.
285
Existem alguns incineradores em operação no Brasil, mas há uma intensa
discussão e polêmica entre os especialistas acerca de suas vantagens e desvantagens.
286
Além
da utilização de equipamentos especiais, o alto custo do sistema se deve à necessidade de
manutenção rigorosa e constante.
282
Atente-se para o fato de que essa queima de resíduos é feita respeitando os padrões e procedimentos impostos
pelas normas aplicáveis. A simples queima de resíduos, feita, por exemplo, ao ar livre, sem respeito à
normatização,não se constitui em processo de incineração, configurando-se, inclusive, como prática
condenável, que produz graves danos ao meio ambiente, principalmente a poluição do ar.
283
CARDOSO, 2005, p. 41.
284
ARAGÃO, 2003, p. 44.
285
FADINI; FADINI, 2001, p. 13.
286
NAIME, 2004, p. 58.
74
É um processo indicado para o caso de grande quantidade de resíduos sépticos e/ou
perigosos ou quando existem grandes distâncias a serem percorridas entre a coleta e a
disposição final, e o volume de resíduos é rico em materiais secos comburentes. Outra
circunstância que recomenda a incineração é a dificuldade de encontrar áreas para aterros, o
que ocorre em países da Europa, por exemplo.
287
Tem-se conhecimento de que o processo de incineração produz gases de combustão,
além de produzir partículas que não são retidas por lavadores de névoa, precipitadores e
filtros, além de outros problemas advindos principalmente da baixa qualificação da mão de
obra.
288
Os riscos produzidos pelos processos de incineração são a possibilidade de
lançamento de diversos gases poluentes (tóxicos) e fuligem na atmosfera, assim como as
cinzas decorrentes do processo concentram substâncias tóxicas com potencial de
contaminação do ambiente.
289
A Pesquisa sobre Resíduos Sólidos, da FAMURS, informa que, devido ao alto custo
e à dificuldade de cumprir os parâmetros estabelecidos, o Estado não possui nenhuma central
de incineração de resíduos sólidos urbanos, mas possui pontos de incineração de resíduos
industriais e de saúde em 131 municípios.
290
Sobre a incineração dos resíduos de saúde, o
CONSEMA do RS editou a Resolução nº 009/2000.
A evolução dos sistemas de tratamento térmico de resíduos sólidos se direciona para
as modernas técnicas de dissociações moleculares, dentre elas o plasma. Naime explica que:
O estágio de plasma é considerado o quarto estágio da matéria. É constituído de um
gás ionizado que, segundo o grau de aquecimento, gera um movimento térmico dos
átomos próprio, podendo gerar enfraquecimento e rompimento das ligações que
determinam a estrutura das substâncias.
291
Na Europa, já estão testando equipamentos de incineração baseados neste princípio
físico, que alcança temperaturas elevadíssimas, entre 5.000 e 50.000 graus Celsius, o que
permite a passagem da matéria pelos estágios sólido, líquido e gasoso, respectivamente, até
chegar no estágio de plasma. A grande vantagem da utilização desta técnica de tratamento
térmico em relação aos resíduos é que não ocorre a queima convencional da incineração, mas
sim uma “dissociação molecular” dos componentes atômicos da matéria, o que não gera os
compostos tóxicos e perigosos provenientes da combustão, tais como dioxinas, furanos etc. É
287
ARAGÃO, 2003, p. 43-45.
288
NAIME, 2004, p. 58.
289
FADINI; FADINI, 2001, p. 12.
290
FUNDAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES DOS MUNICÍPIOS DO RIO GRANDE DO SUL, 2005, p. 11.
291
NAIME, op. cit., p. 59.
75
uma forma de produção de energia limpa e grande redução do volume dos resíduos
tratados.
292
Ao final da conceituação e classificação dos métodos de disposição final de resíduos
sólidos urbanos, bem como da descrição dos riscos ecológicos de cada um, chega-se ao final
deste terceiro capítulo e passa-se à fase de análise da melhor tecnologia disponível como
medida preventiva ambiental, especificamente na matéria de resíduos sólidos urbanos.
292
NAIME, 2004, p. 60.
4 GESTÃO DOS RISCOS NA DISPOSIÇÃO FINAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS
URBANOS
O Brasil não possui uma Política Nacional de Resíduos Sólidos, como já referido
diversas vezes no texto, assim como a grande maioria dos Estados e Municípios brasileiros
não possui legislação específica acerca dos resíduos sólidos urbanos. A Constituição Federal,
em seu artigo 30, incisos I e V,
293
determina que compete aos Municípios legislar sobre os
assuntos de interesse local, bem como organizar e prestar os serviços públicos de interesse
local. Dentre estes assuntos e serviços estão aqueles referente aos resíduos sólidos urbanos,
incluindo-se a coleta, o transporte, o armazenamento, a destinação final e etc, não só pela
disposição constitucional, mas também por prática histórica, como referido na Pesquisa
Nacional de Saneamento Básico, do IBGE.
294
Para uma Política de Resíduos Sólidos Urbanos, tanto em nível nacional como
também nos níveis estadual e municipal, as normatizações e legislações devem levar em
consideração métodos e procedimentos para a Gestão e Gerenciamento Integrado dos
Resíduos Sólidos Urbanos, que podem ser conceituados como níveis de gestão de resíduos
sólidos, como serão expostos no item 4.1. Essas diretrizes e estratégias de gestão e
gerenciamento de resíduos devem ter como objetivo atender os conceitos de prevenção e
correção de danos ambientais.
4.1 NÍVEIS DE GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS
Muito embora a via mais adequada para solucionar as questões referentes aos
resíduos sólidos só possa ser reconhecida e indicada no caso concreto, é possível estabelecer
uma “hierarquia apriorística”,
295
ou seja, níveis de gestão e gerenciamento que servem como
ponto de partida para uma análise concreta das situações referentes a resíduos. Estabelecer
níveis de gestão de resíduos possibilita traçar um Plano de Gerenciamento Integrado de
293
“Art. 30: Compete aos Municípios: I – legislar sobre assuntos de interesse local; [...] V – organizar e prestar,
diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de
transporte coletivo, que tem caráter essencial; [...].”
294
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. 2000.
295
ARAGÃO, 2003, p. 34.
77
Resíduos Sólidos Urbanos: após a análise do caso concreto envolvendo resíduos, aplicam-se
os níveis de gestão para solucionar o(s) problema(s) em concreto.
A sigla dos 3R: reduzir, reutilizar e reciclar foi o primeiro sistema de nivelamento na
gestão de resíduos de que se tem conhecimento, ou, conforme conceitua Aragão, foi “a
primeira hierarquia das opções de gestão de resíduos”.
296
No Brasil, não existe um diploma
legal que declare expressamente quais devem ser esses níveis de gestão de resíduos, mas
podemos extraí-los dos estudos e pesquisas já realizados no campo da Gestão Integrada de
Resíduos Sólidos Urbanos, inclusive do que já foi exposto neste trabalho. Existem algumas
obras e artigos científicos que tratam especificamente deste tema e que serão vistos no
decorrer deste item.
Os níveis de gestão de resíduos sólidos urbanos podem ser resumidos da seguinte
forma: 1. prevenção de resíduos, 2. redução da produção e da nocividade dos resíduos, 3.
compostagem dos resíduos orgânicos, 4. reutilização de resíduos, 5. reciclagem, 6. utilização
de resíduos como fonte de energia, e 7. disposição final adequada. Observe-se que essa ordem
de níveis ou hierarquias de gestão de RSU destaca a primazia absoluta da prevenção (itens 1 e
2), e deve priorizar as formas de valorização (itens 3, 4, 5 e 6), sempre anteriores à
eliminação. É claro que, como já destacado em outros momentos do texto, a valorização em
detrimento da eliminação deve ser avaliada no caso concreto, pois nem sempre representa a
melhor solução econômica e ambiental.
1. Prevenção de resíduos: no item 3.2.1 deste texto, já tratou-se da prevenção de
resíduos, caracterizada por ações anteriores à existência de resíduos, ou seja, prevenção de
resíduos nada mais é do que evitar que resíduos sejam gerados. No caso dos resíduos sólidos
urbanos (residenciais, comerciais, da limpeza pública urbana), a prevenção de resíduos pode
ser obtida através da ação dos próprios cidadãos, que devem evitar o desperdício e
consequente produção de resíduos nas suas próprias casas, locais de trabalho e relações
comerciais, como, por exemplo, realizando o aproveitamento de materiais orgânicos que
seriam simplesmente jogados fora e a compra de produtos que tenham menor volume e
quantidade de embalagens.
A prevenção de resíduos sólidos urbanos depende verdadeiramente de uma alteração
no padrão de consumo da sociedade. Deve ser promovida a minimização na geração de
resíduos e deve-se incentivar o consumo de produtos que estejam ambientalmente adequados
296
ARAGÃO, 2003, p. 34.
78
(que possuam menos embalagens, sejam de materiais reciclados ou recicláveis, etc).
297
É
realmente uma questão de mudança de comportamento e de perspectivas.
2. Redução da produção e da nocividade de resíduos: a sigla 3R, mundialmente
conhecida, tem como primeiro lema reduzir. Nesse sentido, a redução não deve ser apenas de
produção de resíduos, mas também da nocividade dos resíduos produzidos, através da
alteração dos processos produtivos e da adoção de tecnologias mais limpas.
Após a não produção de resíduos (prevenção de resíduos), passamos à etapa de
diminuição de produção de resíduos nos processos produtivos. Através de mudanças nos
processos de produção com o intuito de minimizar a geração de resíduos, evita-se o
desperdício de matérias-primas, assim como reduz-se a quantidade de produtos descartáveis e
outros procedimentos nessa direção.
298
A adoção de tecnologias mais limpas nos processos de
produção pode até ser simplesmente a minimização ou eliminação de resíduos e emissões nas
suas fontes, ao invés de tratá-las apenas após sua geração,
299
diminuindo-se, assim, a
nocividade dos resíduos gerados.
3. Compostagem dos resíduos orgânicos: este nível de gestão de resíduos sólidos
urbanos já foi tratado no item 3.4.1, nos termos da NBR nº 10.703/1989, da ABNT, e da
Resolução nº 33/2003, da ANVISA (APÊNDICE V). A compostagem é um processo
biológico no qual efetua-se a degradação da matéria orgânica por digestão aeróbia, com o
objetivo de produção do composto orgânico, para ser utilizado na agricultura como
fertilizante. O principal fator para a obtenção de um composto orgânico de boa
qualidade/adequado está na separação da matéria orgânica da matéria que poderá ser
reaproveitada ou reciclada.
300
Mais uma vez, está-se diante da importância da separação de resíduos e da coleta
seletiva. A coleta seletiva é realizada pelos governos municipais, que devem dar destinação
adequada aos resíduos sólidos urbanos, mas o procedimento de separação dos resíduos tem
que ser realizado por todos os cidadãos, em todos os locais em que lidem com resíduos
orgânicos e resíduos secos/recicláveis. A participação da sociedade é fundamental. Dessa
forma, resíduos orgânicos que iriam para locais de disposição final de resíduos são
reaproveitados como composto orgânico, não ocupando o espaço que ocupariam nos locais de
297
ZANTA; FERREIRA, 2003, p. 12.
298
NAIME, 2004, p. 33.
299
BERKEL, René van. Fostering cleaner production in developing countries: example results and experiences
from India and China. [s/e], University of Amsterdam, apr. 4., 1995 (mimeo) apud LEMOS, Ângela Denise
da Cunha. A produção mais limpa como geradora de inovação e competitividade: o caso da Fazenda Cerro do
Tigre. Porto Alegre: 1998. 181 p. Dissertação (Mestrado em Administração) – Programa de Pós-Graduação
em Administração, UFRGS, 1998. p. 18-19.
300
PUNA; BAPTISTA, 2008, p. 646.
79
destinação final, aumentando sua vida útil, diminuindo os riscos de contaminação pela
produção de chorume e, ainda, aumentando a qualidade dos produtos recicláveis ou
reaproveitáveis.
4. Reutilização de resíduos: tratada neste trabalho também no item 3.3.5, seguindo os
termos da Resolução nº 307, do CONAMA. A reutilização de resíduos é a primeira etapa de
reaproveitamento de resíduos, que engloba também as ações de reciclagem e recuperação.
301
Na reutilização, os resíduos estão prontos para reuso, com a mesma ou outra finalidade, sem
que haja um processo transformador de suas características,
302
necessitando apenas de
procedimentos de limpeza, lavagem e esterilização, como nos casos de embalagens de vidro,
por exemplo.
303
A reutilização de resíduos comporta ações corretivas cujos benefícios gerados são,
além da sua valorização, os ganhos para o meio ambiente: redução do uso dos recursos
naturais e da degradação, aumento das oportunidades de emprego e renda e, não menos
importante, aumento da vida útil dos sistemas de disposição final, a exemplo dos resíduos
orgânicos destinados à compostagem.
No caso dos resíduos sólidos urbanos, o papel de toda a sociedade, formada pelos
consumidores, é fundamental, tendo em vista que representam o fim da linha da cadeia
econômica e produtiva, e detêm o dever de realizar o retorno dos produtos em fim de vida,
visando a sua valorização.
304
Esse “retorno” não deve ser interpretado restritivamente. Essa
expressão deve ser entendida como a reinserção da matéria na cadeia produtiva/de consumo,
através da reutilização, da reciclagem, do tratamento, qual seja o caso, evitando-se o
desperdício de matérias e o aumento de causas de danos ambientais.
5. Reciclagem: especificamente tratada no item 3.3.5, a reciclagem consiste num
processo de transformação dos resíduos, que tem por objetivo a sua re-inserção na cadeia
produtiva, como matéria-prima.
305
A contrário do que ocorre na reutilização, na reciclagem
um processo produtivo em que sua composição inicial é alterada, transformando-os, mais uma
vez, em matérias-primas que poderão ser utilizadas em novos objetos, utensílios, obras,
construções, etc.
A reciclagem, assim como a reutilização e a compostagem, contribui com o meio
ambiente. As principais vantagens da reciclagem para o meio ambiente são: a economia de
301
ZANTA; FERREIRA, 2003, p. 9.
302
NAIME, 2004, p. 33.
303
ZANTA; FERREIRA, op. cit., p. 13.
304
ARAGÃO, 2003, p. 65.
305
Ibidem.
80
energia nos processos de produção (que pode chegar a 80% se comparada à matéria virgem,
original), a conservação dos recursos naturais, a redução da poluição e dos danos ambientais,
já que a produção da matéria virgem produz muito mais resíduos do que a produção a partir
dos recicláveis
306
, sem esquecer do aumento do tempo de vida útil dos locais de destinação
final dos resíduos, além dos benefícios econômicos, pois, matérias que seriam simplesmente
jogadas fora, destinadas aos locais de deposição final de resíduos, são novamente postas no
mercado.
Os resíduos sólidos urbanos são constituídos, principalmente, de matéria orgânica,
mas também comportam um considerável volume de materiais recicláveis, tais como:
plástico, papel e papelão, vidro e metais, que são o “carro-chefe” da reciclagem no Brasil,
segundo Naime.
307
Dados do CEMPRE
308
indicam que apenas 12% dos resíduos sólidos
urbanos produzidos no Brasil são reciclados e, a cada ano, o Brasil perde R$ 8 (oito) bilhões
com os resíduos que não são reciclados.
309
Mais uma vez, demonstrada a importância do
processo de reciclagem em termos sociais, ambientais e econômicos. E o primeiro passo nesse
processo é dado pelos próprios cidadãos, que devem fazer a separação dos seus resíduos
domésticos, segregando-os na origem e participando ativamente do sistema de coleta seletiva.
6. Utilização de resíduos como fonte de energia: esse nível de gestão de resíduos
sólidos urbanos já é comum nos países desenvolvidos da Europa e da América do Norte, mas
no Brasil, país ainda em desenvolvimento, cuja realidade social, econômica e ambiental
(principalmente no que diz respeito aos sistemas de gestão de resíduos sólidos urbanos) é
complexa e, por vezes, caótica e desestruturada essa realidade não é trabalhada.
310
Utilizar
resíduos como fonte energética é mais uma forma de não desperdiçar matérias que podem ter
outra utilidade que não seja a simples disposição para degradação. Pode-se citar, a digestão
anaeróbia, a incineração e os aterros sanitários como métodos de utilização de resíduos como
fonte energética.
A digestão anaeróbia é um processo semelhante à compostagem, que também pode
produzir composto orgânico, mas a degradação da matéria orgânica é feita através da
utilização de micro-organismos anaeróbios (meio isento de oxigênio e por via úmida). Neste
processo, ocorre a formação de biogás, que pode ser utilizado como combustível para auto-
306
FERNANDES, 2001, p. 94-96.
307
NAIME, 2004, p. 100.
308
COMPROMISSO EMPRESARIAL PARA RECICLAGEM, 2008.
309
Sobre esse assunto, a já citada obra de CALDERONI, 1998.
310
NAIME, op. cit., p. 53.
81
consumo da instalação e até mesmo exportado para a rede elétrica, podendo abastecer
determinadas comunidades.
311
Os resíduos sólidos urbanos também podem ser utilizados como combustíveis em
processos de incineração, que efetua a sua queima por combustão. Este processo também
pode produzir energia elétrica para auto-consumo da instalação e para o abastecimento
externo. Importante ressaltar “que, de toda energia elétrica produzida numa central de
incineração, 10 a 15% são suficientes para auto-sustentar a própria central, sendo o restante
(cerca de 80%) passível de ser enviado para a rede elétrica”.
312
Nos aterros sanitários, 33 a 40% do biogás produzido pode ser fonte de energia
elétrica, se extraído para motores geradores. Em Portugal, existem diversas centrais de energia
gerada por resíduos sólidos urbanos.
313
Essa realidade ainda não é visualizada no Brasil, mas
as possibilidade existem e a realização depende do desenvolvimento nacional da gestão de
resíduos sólidos urbanos.
7. Disposição final adequada: as modalidades de disposição final de RSU foram
especificamente tratadas no item 3.4, e, do que foi exposto, é possível concluir que podem ser
considerados métodos de disposição final de RSU adequados os aterros sanitários e as centrais
de tratamento térmico, desde que atendam aos padrões ambientais determinados nas
normatizações existentes. O lançamento a céu aberto, nos chamados lixões, e os aterros
controlados não são formas ambientalmente saudáveis e corretas de deposição de resíduos,
pois suas consequências são diretas e altamente poluentes.
Este nível deve ser o último num sistema de gestão e gerenciamento de resíduos
sólidos urbanos, em que a prevenção e a valorização têm prioridade sobre a eliminação. Claro
que a viabilidade do cumprimento destas etapas na hierarquia da gestão de RSU deve ser
avaliada no caso concreto, na realidade em que se pretende implementar um plano integrado
de gestão de RSU. Deve-se passar pelas etapas de avaliação, comunicação e gerenciamento
dos riscos ambientais
314
gerados pelos níveis anteriores até chegar ao nível de disposição
final. Aliás, o procedimento de avaliação, comunicação e gerenciamento deve ser realizado,
individualmente, em todos os níveis de gestão de RSU, avaliando-se os custos e benefícios de
cada fase; avaliando-se a possibilidade, a viabilidade de cada nível na situação fática.
A elaboração de um Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos Urbanos mostra-
se necessária como um guia, um facilitador das soluções que envolvem esses resíduos. Uma
311
PUNA; BAPTISTA, 2008, p. 646-647.
312
Ibidem, p. 647.
313
Ibidem, p. 649.
314
SILVA, 2005, p. 49.
82
Política de Resíduos Sólidos Urbanos deve prever, dispor e fundamentar suas questões,
atuando como um instrumento amplo nos problemas que envolvam RSU. Mas cada caso de
gestão de RSU deve ser individualmente avaliado, dentro da real situação apresentada pela
comunidade ou município que se pretenda gerenciar. A partir do levantamento dos dados
desse município e de seu diagnóstico ambiental é possível traçar um plano de ação de
gerenciamento de RSU.
Depois de todo este processo, finalmente chega-se ao momento de disposição final
dos resíduos sólidos urbanos. No processo de definição do método de disposição final mais
adequado (lembrando-se que prevenção tem prioridade sobre a correção de riscos e de danos
ambientais), deve-se levar em conta o que se denomina melhor tecnologia disponível,
expressa em alguns diplomas legais brasileiros, mas não especificamente quanto aos resíduos
sólidos. O conceito de melhor tecnologia disponível, que pode ser aplicado como medida
preventiva no que diz respeito à responsabilidade civil ambiental, será especificamente
trabalhado no próximo item, 4.2.
4.2 MELHOR TECNOLOGIA DISPONÍVEL COMO MEDIDA PREVENTIVA
AMBIENTAL
4.2.1 Medida preventiva ambiental
A responsabilidade ambiental objetiva da sociedade de risco demarca também uma
“reconfiguração do ilícito”, ampliando o seu sentido e desvinculando-o do dano como
pressuposto configurador do ilícito civil. Portanto, ilícito e dano não se confundem: “enquanto
o primeiro estabelece a contrariedade ao direito, o segundo prevê a lesão a um interesse
juridicamente tutelado”.
315
Essa situação leva à aplicação da responsabilidade sem dano (atual
e concreto), que, em matéria ambiental estaria prevista “naqueles casos em que o ilícito
estabelece um custo social em decorrência direta de sua transtemporalidade ou a ocorrência de
um dano”.
316
Ou seja, nos casos de dano (artigo 14, §1º, da Lei nº 6.938/1981) ou de produção
de riscos intoleráveis (artigo 225 da Constituição Federal e artigo 187 do Código Civil).
315
CARVALHO, 2008, p. 146.
316
Ibidem, p. 147.
83
É o “dever de preventividade objetiva” imposto pelo artigo 225 da Constituição
Federal a fundamentação para imposição de medidas preventivas não só quando os riscos
ambientais são conhecidos, concretos, mas também quando são riscos abstratos,
desconhecidos, capazes de configuração em dano ambiental futuro. A nova teoria do risco,
aliada à abertura trazida pelo artigo 187 do Código Civil, estabelece que “a produção de
riscos ambientais intoleráveis por determinada atividade enseja a imposição de medidas
preventivas ao agente que desenvolve a atividade perigosa, sem a necessidade de
concretização do dano ambiental” (grifo do autor).
317
Dá-se, dessa maneira, efetividade ao
caráter preventivo lato sensu do direito ambiental.
Nesse sentido, as medidas preventivas ambientais são tanto aquelas que devem ser
adotadas antes da produção de dano, quando se configura o risco ambiental (concreto ou
abstrato), quanto aquelas adotadas depois do evento danoso, com o fim de prevenir, de evitar
danos de maior dimensão.
318
No direito brasileiro, as medidas preventivas estão previstas na
Lei nº 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública), que estabelece, no artigo 3º, que a demanda
jurisdicional pode ter como objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.
319
Essas medidas ambientais preventivas configuram-se em ações ou não-ações
impostas àqueles que desenvolvem atividades potencialmente poluidoras, causadoras de
riscos ao meio ambiente. Para Marinoni, a “efetividade do direito ambiental depende de
prestações do Poder Público para a proteção e prevenção do bem ambiental”.
320
Essas
prestações do Poder Público, em matéria ambiental, recaem sobre o particular que desenvolve
atividade potencialmente poluidora. Dessa forma, cabe a imposição de medidas (preventivas),
a fim de evitar a concretização de danos ambientais.
Essas medidas preventivas lato sensu (prevenção stricto sensu e precaução) poderão
ser positivas ou negativas, ou seja, poderão se traduzir em obrigações de fazer (ação) ou
obrigações de não fazer (não-ação). Exemplo de medida ambiental preventiva positiva é a
obrigação de realização de estudo de impacto ambiental (EIA), já como medida ambiental
preventiva negativa pode ser citada a proibição de construção em determinado local.
317
CARVALHO, 2008, p. 150.
318
GOMIS CATALÁ, 1998, p. 80.
319
“Art. 3º: A ação civil pública poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação
de fazer ou não fazer”.
320
MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processual e tutela dos direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004. p. 334.
84
4.2.2 Diretiva 96/61, do Conselho da Comunidade Européia: definição de melhores
técnicas disponíveis
À primeira vista, o termo melhor tecnologia disponível parece muito fácil de ser
entendido, ou melhor, parece auto-explicável: o que de melhor existe naquele campo da
tecnologia, naquela área do conhecimento, a tecnologia mais moderna, a última tecnologia
lançada. Por vezes, esse conceito é mesmo auto-explicável e, consequentemente, auto-
aplicável, mas somente por vezes. Em linhas gerais, a melhor tecnologia disponível não
corresponde diretamente à tecnologia mais avançada, àquela de última geração, como será
compreendido no decorrer deste item.
A utilização do termo e da prática da melhor tecnologia disponível vem sendo
largamente aplicada, em diversos setores da indústria, da educação, da economia, etc. Muitas
vezes, não é exatamente essa a expressão empregada, ou nem ao menos se emprega uma
expressão para essa prática, mas é o seu sentido que se quer alcançar. Deixando de lado a sua
utilização em outros campos do conhecimento que não o do direito ambiental, far-se-á uma
análise da sua utilização no controle da poluição, especificamente na gestão de resíduos
sólidos urbanos e, mais esmiuçadamente, no tocante à destinação final desses resíduos.
O Conselho da Comunidade Européia, ao fazer diversas considerações preliminares a
respeito dos objetivos e princípios da política comunitária para o ambiente (prevenção,
controle e eliminação da poluição, com intervenção prioritária na fonte), das exigências das
normas de qualidade ambiental e da evolução do progresso técnico, adotou a Diretiva 96/61,
editada em 24 de setembro de 1996, relativa à prevenção e controle integrados da poluição.
321
Em seu artigo 1º,
322
a Diretiva estabelece o seu objetivo e o seu âmbito de aplicação, que
atingem também a gestão de resíduos e os locais para instalações de sua destinação, nos
termos do ANEXO I, item 5 e seguintes. Seu artigo 2º, apresenta a seguinte definição, dentre
outras:
321
CONSELHO DA COMUNIDADE EUROPÉIA. Directiva 96/61/CE do Conselho 24 de Setembro de 1996
relativa à prevenção e controlo integrados da poluição. Disponível em: <http://eur-
lex.europa.eu/LexUriServ.do?uri=CELEX:31984L0360:PT:HTML> Acesso em: 07 jan. 2009.
322
“Artigo 1º - Objectivo e âmbito de aplicação: A presente directiva tem por objecto a prevenção e controlo
integrados da poluição proveniente das actividades constantes no Anexo I e prevê medidas destinadas a evitar
e, quando tal não seja possível, a reduzir as emissões da referidas actividades para o ar, a água e o solo,
incluindo medidas relativas aos resíduos, de modo a alcançar-se um nível elevado de protecção do ambiente
considerado no seu todo, sem prejuízo da Directiva 83/337/CEE e das outras disposições comunitárias na
matéria.”
85
[...] 11. ‘Melhores técnicas disponíveis’, a fase de desenvolvimento mais eficaz e
avançada das actividades e dos respectivos modos de exploração, que demonstre a
aptidão prática de técnicas específicas para constituir, em princípio, a base dos
valores-limite de emissão com vista a evitar e, quando tal não seja possível, a reduzir
de em modo geral as emissões e o impacto no ambiente no seu todo. [...] (grifou-se)
Dando continuidade à definição da expressão melhores técnicas disponíveis, o artigo
2º da referida Diretiva desmembra os termos que a compõem, explicado-os em separado:
[...] Entende-se por: ‘técnicas’, tanto as técnicas utilizadas como o modo como a
instalação é projectada, construída, conservada, explorada e desactivada,
‘disponíveis’, as técnicas desenvolvidas a uma escala que possibilite a sua aplicação
no contexto do sector industrial em causa, em condições econômica e tecnicamente
viáveis, tendo em conta os custos e os benefícios, quer essas técnicas sejam ou não
utilizadas ou produzidas no território do Estado-membro em questão, desde que
sejam acessíveis ao operador em condições razoáveis, ‘melhores’, técnicas mais
eficazes para alcançar um nível geral elevado de protecção do ambiente no seu todo;
[...]. (grifou-se)
Diante dessas definições é possível verificar que a melhor tecnologia disponível
varia, ou seja, cada caso em concreto é que vai ser a base de decisão para a tecnologia (a
melhor tecnologia disponível) que deverá ser adotada. “É uma fórmula bem aberta, com uma
notável margem de imprecisão”,
323
como bem colocado por Pardo. É claro que devem existir
normas gerais, de técnicas mínimas a serem utilizadas, sempre visando a proteção do meio
ambiente e priorizando as ações preventivas, de correção dos riscos e danos na fonte geradora.
Mas só através da análise casoística é que se poderá definir qual(is) a(s) melhor(es) técnica(s)
disponível(is) naquela situação, levando-se em conta uma série de fatores ambientais,
econômicos e tecnológicos. Deve haver um equilíbrio entre os custos e os benefícios, que não
devem ser considerados somente em sua expressão econômica/monetária, mas,
principalmente, em suas expressões ambiental e social.
A questão é que não há definição precisa do que sejam as melhores técnicas
disponíveis, nem deve haver um esforço semântico na sua interpretação. Importa compreender
que não se trata de constatar quais as novas medidas corretoras ou redutoras de contaminações
ou riscos ambientais foram desenvolvidas pelo progresso técnico, mas sim de fixar, com
maior segurança, os critérios em virtude dos quais a incorporação dessas medidas (novas
tecnologias, melhores tecnologias, tecnologias mais avançadas) resulta obrigatória e em que
condições.
324
Essa importância é observada ainda com mais visibilidade no caso de atividades
e instalações que tiveram seu funcionamento autorizado quando tais meios técnicos (essas
323
PARDO, 1999, p. 95. (Tradução livre)
324
Ibidem.
86
melhores tecnologias) ainda não estavam disponíveis.
325
No caso de novas instalações, a
exigência de medidas preventivas aos riscos e danos ambientais é mais simples, pois as novas
tecnologias já existem, já podem ser exigidas, sem que haja necessidade de
correção/modificação numa situação pré-estabelecida.
Em muitos países europeus, as normas de qualidade ambiental baseadas nas
melhores técnicas disponíveis já preveem as situações de atuação quando novas tecnologias
surgem, cobrindo as novas instalações e também as autorizadas anteriormente. Quando essas
normas específicas não existem, cabe à aos órgãos administrativos e judiciais o papel de
decidir quando e como as melhores técnicas disponíveis devem ser adotadas.
326
No Brasil, não
existe uma norma ambiental geral, ainda mais especificamente à gestão e destinação de
resíduos, que preveja a aplicação de melhor tecnologia disponível como medida preventiva
aos riscos ambientais, mas já existem algumas normatizações que a introduzem no
ordenamento jurídico, como será explorado no item 4.2.3.
No caso da Diretiva 96/61 da Comunidade Européia, esses fatores, ou padrões, ou
medidas, ou considerações, enfim, esses elementos de análise dos custos e benefícios para a
definição da melhor tecnologia disponível aplicável à determinada instalação potencialmente
poluidora (como no caso dos locais de destinação final de resíduos sólidos urbanos) estão
definidos e dispostos em seu ANEXO IV, na seguinte ordem:
Elementos a ter em conta em geral ou em casos específicos na determinação das
melhores técnicas disponíveis, na acepção do ponto 11 do artigo 2º, tendo e conta
os custos e benefícios que podem resultar de uma acção e os princípios de
precaução e de prevenção: 1. Utilização de técnicas que produzem poucos
resíduos; 2. Utilização de substâncias menos perigosas; 3. Desenvolvimento de
técnicas de recuperação e reciclagem das substâncias produzidas e utilizadas nos
processos, e eventualmente, dos resíduos; 4. Processos, equipamentos ou métodos de
laboração comparáveis que tenham sido experimentados com êxito à escala
industrial; 5. Progresso tecnológico e evolução dos conhecimentos científicos; 6.
Natureza, efeitos e volume das emissões em causa; 7. Data de entrada em
funcionamento das instalações novas ou já existentes; 8. Tempo necessário para a
instalação de uma melhor técnica disponível; 9. Consumo e natureza das matérias-
primas (incluindo a água) utilizadas nos processos e eficiência energética; 10.
Necessidade de prevenir ou reduzir ao mínimo o impacto global das emissões e dos
riscos para o ambiente; 11. Necessidade de prevenir os acidentes e reduzir as suas
conseqüências para o ambiente; 12. Informações publicadas pela Comissão ao
abrigo do nº 2 do artigo 16º ou por organizações internacionais. (grifou-se)
Do exposto, extrai-se que há uma orientação da Diretiva, mas a solução “ideal” deve
ser encontrada e definida pelos órgãos administrativos e judiciais no caso concreto,
contrabalanceando os custos econômicos e a viabilidade técnica para aplicação das novas
325
PARDO, 1999, p. 95-98.
326
Ibidem. p. 99.
87
medidas, tomando-se em consideração os custos e os benefícios. Vale lembrar que, nessa
seara de custos e benefícios, não devem ser levados em consideração somente os aspectos
monetários/econômicos, mas muito mais os aspectos de proteção ao meio ambiente, visto que
o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito e dever de todos.
Ponto que merece destaque é a nota introdutória do ANEXO IV da Diretiva, que
dispõe que devem ser considerados os princípios da prevenção e da precaução, estabelecendo,
assim, as melhores técnicas disponíveis como medidas preventivas lato sensu de proteção
ambiental. Não restam dúvidas de que a melhor tecnologia disponível deve ser adotada como
medida preventiva de riscos e danos ambientais. Como veremos mais adiante, são também
medidas preventivas no último estágio de gestão de resíduos sólidos urbanos: a destinação
final.
4.2.3 Contextualização da melhor tecnologia disponível no direito brasileiro
Embora a utilização da melhor tecnologia disponível não seja difundida no direito
ambiental brasileiro, não sendo encontrada decisão jurisprudencial alguma (nem doutrina ou
pesquisa afim) que a leve em consideração como medida preventiva de proteção ambiental,
existe previsão expressa a seu respeito na normatização ambiental pátria. O CONAMA editou
Resoluções que tratam do assunto (Resoluções nº 316/2002 e 357/2005), assim como foi
encontrada legislação estadual (São Paulo) sobre o tema, análise que será realizada e
contextualizada individualmente logo adiante.
A Resolução nº 316/2002, do CONAMA, que dispõe sobre procedimentos e critérios
para o funcionamento de sistemas de tratamento térmico de resíduos, levando em
consideração, dentre outros fatores, que o princípio da precaução é o fundamento do
desenvolvimento sustentável, e que os sistemas de tratamento térmico de resíduos são fontes
potenciais de risco ambiental e de emissão de poluentes perigosos, podendo constituir
agressão à saúde e ao meio ambiente caso não sejam corretamente instalados, operados e
mantidos, dispõe:
Artigo 2º: Considera-se, para os fins desta Resolução:
I – Resíduos: os materiais ou substâncias, que sejam inservíveis ou não passíveis de
aproveitamento econômico, resultantes de atividades de origem industrial, urbana,
serviços de saúde, agrícola e comercial dentre os quais incluem-se aqueles
88
provenientes de portos, aeroportos e fronteiras, e outras, além dos contaminados por
agrotóxicos;
II – Melhores técnicas disponíveis: o estágio mais eficaz e avançado de
desenvolvimento de diversas tecnologias de tratamento, beneficiamento e de
disposição final de resíduos, bem como das suas atividades e métodos de operação,
indicando a combinação prática destas técnicas que levem à produção e emissões em
valores iguais ou inferiores aos fixados por esta Resolução, visando eliminar e, onde
não seja viável, reduzir as emissões em geral, bem como os seus efeitos no meio
ambiente como um todo;
III – Tratamento Térmico: para os fins desta regulamentação é todo e qualquer
processo cuja operação seja realizada acima da temperatura mínima de oitocentos
graus Celsius. (grifou-se)
Note-se que a redação do inciso II do artigo 2º, no que diz respeito à definição de
melhores técnicas disponíveis aplicáveis aos resíduos, é uma adaptação do conteúdo do artigo
2º da Diretiva 96/61 do Conselho da Comunidade Européia. A partir daquele conceito, mais
amplo, o conceito da Resolução foi editado, aplicado para o método de disposição final de
resíduos. E, muito embora a Resolução nº 316/2002, do CONAMA, disponha especificamente
de tratamento térmico de resíduos (incineração), o conteúdo a respeito de melhores
tecnologias disponíveis é perfeitamente aplicável a todos os métodos de disposição final de
resíduos sólidos (inclusive os resíduos urbanos)
327
, estudados individualmente no item 3.4
(lançamento a céu aberto, aterro controlado, aterro sanitário, compostagem, incineração).
Em continuidade ao estabelecido no artigo 2º, o artigo 4º da Resolução, estabelece
que “a adoção de sistemas de tratamento térmico de resíduos deverá ser precedida de um
estudo de análise de alternativas tecnológicas que comprove que a escolha da tecnologia
adotada está de acordo com o conceito de melhor tecnologia disponível”. (grifou-se) Fica
estabelecida, obrigatoriamente, que a incineração de resíduos, de qualquer natureza, deve ser
realizada depois de eleita a melhor tecnologia disponível para aquele caso. Não é apenas uma
orientação, mas um dever, uma obrigação neste método de disposição de resíduos.
Se dentro de um método de disposição final deve ser aplicado o uso da melhor
tecnologia disponível como medida preventiva de proteção ambiental, parece, no mínimo,
razoável, que essa medida preventiva seja aplicada a todos os métodos de disposição final de
resíduos, inclusive os urbanos. Aliás, a Resolução nº 316/2002, do CONAMA, abre um
precedente jurídico ambiental, ou seja, abre a possibilidade de que esse fato material anterior
seja utilizado como base para outros fatos posteriores:
328
o fato da melhor tecnologia
disponível ser utilizada como medida preventiva nos sistemas de tratamento térmico de
resíduos (um dos métodos de disposição final de resíduos) gera a possibilidade desta mesma
327
Prova disso é que o inciso I, do artigo 2º da Resolução também inclui os resíduos sólidos urbanos em seu
conceito.
328
SILVA, 1995, v. 4, p. 416.
89
técnica jurídica ser utilizada em situações semelhantes, posteriores. Assim, nas decisões
legislativas, administrativas e judiciais envolvendo situações de disposição final de resíduos, é
possível invocar a melhor tecnologia disponível como medida preventiva ambiental, tendente
a evitar a concretização dos danos ambientais futuros, como tratar-se-á especificamente no
próximo item, 4.2.4.
Em 2005, “considerando que a água integra as preocupações do desenvolvimento
sustentável”, baseado em princípios como a prevenção, a precaução e o poluidor-pagador, o
CONAMA editou a Resolução nº 357, que dispõe sobre a classificação dos corpos de água e
diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e padrões
de lançamento de efluentes, e dá outras providências. O inciso II, do parágrafo único, do
artigo 24
329
(situado no Capítulo IV: Das Condições e Padrões de Lançamento de Efluentes)
estabelece que, a qualquer momento, o órgão ambiental poderá “exigir a melhor tecnologia
disponível para o tratamento dos efluentes, compatível com as condições do respectivo curso
de água superficial, mediante fundamentação técnica”. (grifou-se)
Mais uma vez, o CONAMA edita uma Resolução que dispõe, em seu conteúdo,
sobre melhor tecnologia disponível. Melhor: mais uma vez, o CONAMA edita uma
Resolução que contém melhor tecnologia disponível como medida preventiva ambiental para
o tratamento de resíduos, afinal, os efluentes são resíduos líquidos. O interessante é que a
Resolução nº 357/2005 não define o que seja melhor tecnologia disponível. Muito
provavelmente isso ocorre porque já existe um precedente (a Resolução nº 316/2002) que
conceitua, explica e indica as situações de aplicação da melhor tecnologia disponível.
Nessa esteira, não somente ao tratamento dos resíduos sólidos pode-se aplicar a
melhor tecnologia disponível como medida preventiva de riscos e danos ambientais. E, nesse
sentido, pode-se entender também que as melhores técnicas disponíveis devem ser aplicadas
não somente dentro dos sistemas dos métodos de disposição final de resíduos,
individualmente e isoladamente colocados; mas também deve-se utilizar esta técnica antes,
quando da eleição do método de disposição final: se será a compostagem, a utilização de
aterros controlados ou sanitários, lançamento a céu aberto, a incineração. Enfim, no processo
de gestão dos resíduos sólidos urbanos, quando chega-se à última etapa, da disposição final,
329
“Artigo 24: Os efluentes de qualquer fonte poluidora somente poderão ser lançados, direta ou indiretamente,
nos corpos de água, após o devido tratamento e desde que obedeçam às condições, padrões e exigências
dispostos nesta Resolução e em outras normas aplicáveis. Parágrafo único: O órgão ambiental competente
poderá, a qualquer momento: I – acrescentar outras condições e padrões, ou torná-los mais restritivos, tendo
em vista as condições locais, mediante fundamentação técnica; e II – exigir a melhor tecnologia disponível
para o tratamento dos efluentes, compatível com as condições do respectivo curso de água superficial,
mediante fundamentação técnica”. (grifou-se)
90
deve-se levar em consideração qual a melhor tecnologia disponível para aquele caso, para a
disposição dos resíduos urbanos daquela região, daquele município, daquela comunidade.
A Lei Estadual nº 1.817/1978 (alterada pela Lei Estadual nº 11.243/2002), que
estabelece os objetivos e as diretrizes para o desenvolvimento industrial metropolitano e
disciplina o zoneamento industrial, a localização, a classificação e o licenciamento de
estabelecimentos industriais na Região Metropolitana da Grande São Paulo, dispõe, no caput
do seu artigo 15:
Artigo 15: Na implantação, alteração de processo produtivo e ampliação de área
construída de estabelecimentos industriais com atividades classificadas com IN e IA
na Região Metropolitana da Grande São Paulo, deverão ser adotados sistemas de
controle de poluição baseados na melhor tecnologia prática disponível, de modo
a garantir adequado gerenciamento ambiental das fontes estacionárias e
preservação da qualidade do meio ambiente. (grifou-se)
Apesar de não trazer uma definição ou distinguir elementos que identifiquem o que
seja melhor tecnologia disponível, o artigo 15 da referida Lei Estadual de São Paulo se refere
a melhor tecnologia prática disponível, para garantir adequado gerenciamento ambiental e
preservação da qualidade do meio ambiente. A inserção da palavra “prática” na expressão em
análise dá mais força à ideia de que a tecnologia utilizada deve ser aquela que equilibre os
custos e benefícios, não só econômicos mas também ambientais, com o fim de eliminar ao
máximo os riscos e danos ao meio ambiente. É feliz o acréscimo feito pela lei estadual
paulista, pois prática tem como sentido aplicação da teoria, aumentado a noção de caso
concreto, de aplicação da tecnologia mais adequada àquela situação fática. É o que se verifica
também no inciso II, do artigo 2º, da Resolução nº 316/2002, do CONAMA, quando se refere
a “combinação prática destas técnicas”.
O artigo 15 da Lei Estadual nº 1.817/1978 refere-se a sistemas de controle de
poluição de áreas industriais na Região Metropolitana da Grande São Paulo. É mais uma
normatização de prevenção de danos ambientais, já que a poluição é uma das formas de dano
ambiental, que, inclusive, é o que dá suporte para a definição de dano ao meio ambiente, nos
termos do inciso III, do artigo 3º, da Lei nº 6.938/1981.
330
Mesmo não sendo uma legislação
que trate especificamente de resíduos, esta Lei Estadual também reforça a ideia de aplicação
da melhor tecnologia disponível como medida preventiva na destinação de resíduos sólidos
urbanos, em razão desta ser uma manifestação prática do dever de preventividade objetiva
estabelecido no artigo 225 da Constituição Federal. E isto ocorre justamente por ser uma lei
330
Sobre o conceito de poluição, ver item 2.2.1.
91
de proteção ambiental, de controle da qualidade ambiental, preocupação que deve ocorrer em
todos os âmbitos, todos os setores, todas as normatizações que tratem de direito ambiental.
Após a análise das normatizações pátrias que dispõem sobre melhor tecnologia
disponível, bem como da sua conceituação e contextualização na realidade sócioambiental
nacional, pode-se passar à sua construção estrutural como medida preventiva de riscos e
danos ambientais na destinação final de resíduos sólidos urbanos, última etapa na gestão dos
resíduos sólidos urbanos.
4.2.4 Aporte jurídico para imposição da melhor tecnologia disponível como medida
preventiva ambiental
Mesmo sendo poucas as previsões no direito brasileiro, possibilitam constatar que
existe aporte jurídico para impor a melhor tecnologia disponível como medida de proteção
ambiental, embora ainda não exista uma previsão normativa específica expressa. Assim como
a incerteza científica não pode ser compreendida e tratada como incerteza jurídica, a falta de
previsão legal expressa, a falta de um dispositivo, não pode simplesmente ensejar a omissão
do direito, não pode se configurar na premissa de que o que não está previsto expressamente
não é tutelado.
Ora, nem só de regras expressas é composto o ordenamento jurídico. E, em se
tratando do meio ambiente, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
cuja manutenção do equilíbrio não é somente direito mas também dever de todos, sua
proteção não pode ser feita apenas através de regras expressas. Deve-se lembrar que o
processo de elaboração de leis é lento e o melhor exemplo para ilustrar essa situação é o
Projeto de Lei nº 1991/2007, sobre a Política Nacional de Resíduos Sólidos, que tramita no
Congresso Nacional há mais de 17 anos. Além disso, a sociedade atual é altamente dinâmica e
suas estruturas sociais, ambientais e econômicas estão em constante processo de mudança.
Enquanto isso ocorre, e não existe legislação, o direito não pode apenas se abster de
solucionar os novos conflitos que vão surgindo. O meio ambiente, cujos recursos naturais são
finitos, não pode esperar. A espera implica, na maioria das vezes, na irreversibilidade dos
danos ambientais.
92
Deve-se lembrar que o ordenamento jurídico é composto de normas, que, por sua
vez, são compostas de regras e princípios. Na falta de regras expressas, o ordenamento possui
princípios, normas que lhe são hierarquicamente superiores.
Os princípios não estão necessariamente expressos, ou seja, não é preciso que haja
um dispositivo textual para a identificação de um princípio. Assim ocorre com os princípios
de direito ambiental tratados especificamente no item 2.3 e os princípios de direito ambiental
aplicáveis diretamente aos resíduos tratados no item 3.2: a maioria daqueles princípios não
está expressamente identificado em dispositivos das codificações ambientais, mas seu
conteúdo e sentido normativo estão ali, presentes, a exemplo do dever de preventividade
objetiva contido no caput do artigo 225 da Constituição Federal.
E é exatamente do dever de preventividade objetiva que emana a capacidade jurídica
de imposição da melhor tecnologia disponível como medida preventiva para proteção
ambiental. “Utilizar o estágio mais eficaz e avançado de desenvolvimento de diversas
tecnologias”, nos termos do inciso II do artigo 2º da Resolução nº 316/2002, do CONAMA,
“tendo em conta os custos e benefícios que podem resultar de uma ação e os princípios da
precaução e prevenção”, nos termos do ANEXO IV da Diretiva 96/61 do Conselho da
Comunidade Européia, traduz exatamente o conceito de melhor tecnologia disponível.
É nos princípios da prevenção e precaução (dever de preventividade objetiva) que
reside a capacidade jurídica de imposição da melhor tecnologia disponível nas situações que
envolvam o meio ambiente e, mais especificamente, nas situações que envolvam a disposição
final de resíduos. Esse conceito está expresso no inciso II do artigo 2º da Resolução nº
316/2002, do CONAMA, mas mesmo que não estivesse, é nos conceitos de prevenção e
precaução que essa imposição está consubstanciada. O dever de preventividade objetiva é um
dever de proteção ao meio ambiente, um dever de evitar que danos ambientais se concretizem.
A não imposição da melhor tecnologia disponível implica em assumir riscos de que ocorra a
poluição/degradação ambiental.
Quando já existe conhecimento técnico e científico sobre as consequências negativas
geradas pelo exercício de certas atividades, está-se diante de riscos concretos, sobre os quais
incide o princípio da prevenção. Quando essas possíveis consequências não são conhecidas,
lida-se com riscos abstratos, sobre os quais incide o princípio da precaução. Evitar a
concretização desses riscos (concretos e/ou abstratos) em verdadeiros danos ambientais,
muitas vezes, configura-se como o único meio de efetiva proteção ambiental, pois há danos
que são simplesmente irreversíveis e, portanto, irreparáveis. Nesses casos, a única forma de
proteger o meio ambiente de degradação/poluição é justamente evitar que os danos ocorram, o
93
que pode acontecer através da imposição da melhor tecnologia disponível como medida
preventiva de proteção ambiental nas atividades que atinjam, direta ou indiretamente, o meio
ambiente.
4.3 MELHOR TECNOLOGIA DISPONÍVEL COMO MEDIDA PREVENTIVA NA
ELEIÇÃO DO MÉTODO DE DISPOSIÇÃO FINAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS
4.3.1 Eleição do método de disposição final de RSU
No item 3.4 foram descritos os métodos de disposição final de resíduos sólidos
urbanos e elencados os riscos ambientais inerentes a cada tipo. Dispor de resíduos, ou seja,
encaminhar resíduos ao local destinado à sua eliminação, causa riscos de degradação/poluição
ao meio ambiente, e determinados métodos superam a possibilidade de causar riscos,
provocando verdadeiros danos ambientais ao solo, ao ar, às águas, à saúde pública, etc.
Assim, não resta a menor dúvida de que as modalidades de destinação final de resíduos são
passíveis de causar danos ao meio ambiente.
Conceituada e contextualizada a melhor tecnologia disponível (ou melhores técnicas
disponíveis) na realidade jurídica ambiental pátria, assim como demonstrada a capacidade
jurídica para sua imposição como medida preventiva de proteção ambiental, necessária a
demonstração dessa capacidade no que diz respeito aos métodos de disposição final de
resíduos sólidos urbanos. Na eleição do método de disposição final, já é possível lançar mão
da melhor tecnologia disponível, já é possível a sua aplicação. Essa possibilidade fica mais
clara à luz do disposto no inciso II do artigo 2º da Resolução nº 316/2002, do CONAMA, ao
definir melhores técnicas disponíveis como “o estágio mais eficaz e avançado de
desenvolvimento de diversas tecnologias de tratamento, beneficiamento e de disposição final
de resíduos [...]”. (grifou-se)
Nesse ponto da pesquisa, exclui-se o método de tratamento da fração orgânica por
processos biológicos (compostagem e digestão anaeróbia), que se identifica muito mais como
uma forma de reaproveitamento e tratamento de resíduos do que como forma de destinação
final, já que se destina à produção de composto orgânico (adubo, fertilizante) a partir de
resíduos orgânicos putrescíveis (restos e cascas de frutas, verduras e legumes “in natura”,
94
cinza, serragem, flores, podas de árvores etc). Além do mais, o encaminhamento de resíduos
orgânicos para usinas de compostagem ou digestão anaeróbia é muito mais importante como
forma de aumentar o tempo de vida útil dos locais de destinação dos resíduos, já que, dessa
forma, esses resíduos não são para lá enviados.
331
Dos métodos de disposição final de RSU elencados no item 3.4, os mais utilizados
nos municípios brasileiros, segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico,
332
são o
lançamento a céu aberto (63,3%), os aterros controlados (18,4%) e os aterros sanitários
(13,8%). Desses três métodos, o único considerado adequado é a disposição de RSU em
aterros sanitários, que são construídos “segundo técnicas de engenharia de modo a não
prejudicar o meio ambiente e a saúde pública”.
333
O método do tratamento térmico, embora
seja considerado adequado, desde que obedeça aos regramentos específicos a fim de evitar
danos ambientais, praticamente não é utilizado nos municípios brasileiros para a destinação de
RSU, devido ao alto custo para sua operação, como será visto mais adiante no texto. Tem-se
também o super avançado método do plasma
334
, que nem ao menos é conhecido no Brasil.
O lançamento a céu aberto é a forma mais primitiva e prejudicial ao homem e ao
meio ambiente, embora ainda seja a mais utilizada nos municípios brasileiros.
335
Trata-se,
simplesmente, do lançamento de quaisquer resíduos, de qualquer natureza, diretamente no
solo, sem que seja tomada nenhuma medida de proteção ambiental. Ou seja, o lançamento a
céu aberto, nos locais comumente conhecidos como “lixões”, nada mais é do que uma forma
de degradação ambiental. Nem deveria ser reconhecida como método de disposição de RSU,
pois não causa somente riscos ao meio ambiente, causa, diretamente, verdadeiros danos
ambientais, de consequências visíveis e imediatas.
Dispor de resíduos em qualquer local, sem os devidos cuidados, causa problemas de
poluição ambiental em águas, solo e ar, e agravos à saúde pública,
336
tendo em vista que
estimula a proliferação de vetores de doenças. É uma prática, no mínimo, irresponsável, como
já expusemos no item 3.4.2, e, pode-se dizer que é uma prática condenada e nem deveria ser
levada em consideração como “tecnologia” quando da eleição de forma de disposição final de
RSU nos municípios. Na eleição de melhor tecnologia disponível, os “lixões” simplesmente
não deveriam ser entendidos como possibilidade de disposição de resíduos. Ponderando
custos e benefícios, econômicos, socais e ambientais, simplesmente não é possível chegar à
331
FERNANDES, 2001, p. 88-89.
332
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2000.
333
ZANTA; FERREIRA, 2003, p. 13.
334
Vide item 3.4.5, parte final.
335
FERNANDES, op. cit., p. 42.
336
CARDOSO, 2005, p. 25.
95
conclusão de que “lixão” é uma opção razoável para a disposição final de resíduos. Afinal,
qual é vantagem de poluir o lençol freático que abasteceria toda uma comunidade, quando
não, um município? Qual a vantagem da proliferação de vetores de doenças como, por
exemplo, a leptospirose? Os custos para despoluição dessas águas não é muito maior do que a
tomada de decisão que evite esse dano? Os problemas e custos com saúde pública, pelo surto
de doenças causadas por vetores, não são muito mais altos do que as medidas preventivas à
proliferação de doenças?
No caso dos aterros controlados, que também consistem em disposição dos RSU
diretamente no solo, os riscos e danos são atenuados por algumas precauções técnicas no
desenvolvimento desses locais.
337
Mas essas “precauções técnicas” nada mais são do que o
recobrimento diário dos resíduos com material inerte, feita de maneira aleatória, e sem levar
em consideração a formação de líquidos e gases.
338
São medidas que minimizam a proliferação
de vetores e a poluição do ar, mas esses mecanismos não são suficientes para uma disposição
final de RSU ambientalmente adequada.
339
É grande o seu potencial de causar impactos
ambientais às águas e ao solo, tendo em vista que, na implantação de aterros controlados não
existe previsão de impermeabilização do solo nem sistemas de coleta de tratamento de
líquidos nem sistema de drenagem de gases, segundo as disposições da NBR nº 8.849/1983.
Os aterros controlados estão presentes em 18,4% dos municípios brasileiros, segundo
dados da última PNBS.
340
Ainda que produzam menos consequências degradantes do que os
“lixões”, não podem ser considerados ambientalmente adequados, pois os seus riscos de
danos ao meio ambiente são facilmente identificáveis. No máximo, dependendo da análise
concreta do caso, podem ser considerados “aceitáveis” em determinados casos concretos,
ponderando-se os custos e benefícios e o dever de preventividade objetiva ambiental.
Utilizando-se a melhor tecnologia prática disponível como medida preventiva na eleição do
método de disposição de RSU é preciso analisar e ponderar os custos e benefícios da escolha
por um aterro controlado (ou aterro sanitário, como se verá adiante).
Em se tratando de aterros sanitários (item 3.4.4), já tem-se uma situação considerada
ambientalmente adequada para a disposição de RSU. Nos termos das NBRs nº 8.419/1984 e
9.896/1993, aterro sanitário é o método de disposição final de resíduos sólidos no solo, sem
que, para isso, cause danos ao meio ambiente ou à saúde pública. Para tanto, na elaboração e
implantação de aterros sanitários utilizam-se processos de engenharia para realizar o
337
NAIME, 2004, p. 35.
338
FERNANDES, 2001, p. 36-42.
339
NAIME, op. cit., p. 36.
340
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2000.
96
confinamento dos resíduos na menor área possível. Essas técnicas de engenharia, que têm o
intuito de evitar a ocorrência de impactos ambientais, consistem em: sistema de drenagem
superficial, sistema de drenagem de lixiviados, sistema de tratamento de lixiviados,
impermeabilização de fundo e de laterais, sistema de drenagem de gases e sistema de
cobertura.
341
Além da adoção destas técnicas, se não houver controle e monitoramento, os
aterros sanitários podem produzir os mesmos riscos gerados pelos métodos inadequados de
disposição de RSU, tais como os “lixões” e os aterros controlados.
342
Assim, desde que
cumpram as exigências sanitárias adequadas, a fim de evitar a ocorrência de danos
ambientais, os aterros sanitários são considerados forma ambientalmente adequada de
disposição final de RSU.
Utilizando-se a melhor tecnologia disponível como medida preventiva na eleição do
método de disposição de final de RSU, pode-se chegar à conclusão de que ao aterros
sanitários são “tecnologias” mais avançadas do que os “lixões” e os aterros controlados, cujos
riscos de causarem danos ao meio ambiente são concretos e possíveis, dada a forma como os
resíduos são ali destinados. Os riscos, nos aterros sanitários, desde que sejam tomadas as
precauções exigidas, têm probabilidade muito menor de ocorrência. Ainda, caso aconteça
algum tipo de impacto ambiental causado por aterro sanitário, o próprio sistema, que prevê
técnicas de engenharia, tem muito mais condições de reversibilidade dos danos. Sobre os
aterros sanitários como melhor tecnologia disponível, trataremos especificamente adiante, no
item 4.3.3.
Quanto à incineração, tratamento térmico, que consiste na queima de resíduos a
temperaturas superiores a 800 graus Celsius, nos termos do inciso III do artigo 2º da
Resolução nº 316/2002, do CONAMA, existe uma polêmica muito grande entre os
especialistas acerca dos seus benefícios e malefícios.
343
É um método com custo muito alto, já
que utiliza equipamentos especiais, capazes de produzir altíssimas temperaturas em condições
seguras, a fim de reduzir o peso e o volume dos resíduos.
344
Além disso, os custos são altos
devido à necessidade de manutenção constante e também rigorosa.
Quanto aos riscos causados pelos processos térmicos, o CONAMA estabelece
previamente, na Resolução nº 316/2002, “que os sistemas de tratamento térmico de resíduos
são fontes potenciais de risco ambiental e de emissão de poluentes perigosos (por exemplo,
lançamento de gases tóxicos e fuligem na atmosfera) [...] podendo constituir agressão à saúde
341
CASTILHOS JÚNIOR, 2003, p. 63-65.
342
FADINI; FADINI, 2001, p. 12.
343
NAIME, 2004, p. 58.
344
FADINI; FADINI, op. cit., p. 13.
97
e ao meio ambiente se não forem corretamente instalados, operados e mantidos”. Devido aos
altos custos e aos graves riscos de poluição do ar, assim como a dificuldade de cumprimento
dos parâmetros estabelecidos, o Estado do Rio Grande do Sul não possui nenhuma central de
incineração de RSU, mesmo o CONSEMA tendo editado Resolução que a normatiza,
345
assim
como praticamente não se tem notícias de centrais incineradoras de RSU em outros estados
brasileiros. Dessa forma, o processo de incineração acaba indicado para situações de grandes
quantidades de resíduos perigosos ou quando existem grandes distâncias a serem percorridas
entre os locais de coleta e aqueles de deposição final, assim como para os locais em que se
tem dificuldade de encontrar áreas para a instalação de aterros, como ocorre em países
europeus.
346
O avançadíssimo método de incineração através de plasma, que “é considerado o
quarto estágio da matéria”,
347
é tida como a técnica mais moderna em termos de disposição
final de resíduos, atingindo temperaturas entre 5.000 e 50.000 graus Celsius. Consiste na
dissociação molecular das estruturas da substâncias, como explica Naime:
A grande vantagem da utilização do plasma em relação aos resíduos de uma forma
geral, é que não ocorre combustão convencional, como na incineração, não havendo
queima dos componentes dos resíduos, pois o que ocorre é uma ‘dissociação
molecular’ em componentes atômicos elementares, não gerando compostos
perigosos provenientes da combustão, como dioxinas, furanos e outros.
A tecnologia do plasma permite grandes vantagens, pois produz energia limpa a um
custo competitivo, com grande eficiência energética e redução de volume dos
materiais tratados”.
348
Apesar de ser uma técnica avançadíssima e sua aplicação ter se iniciado na década de
1960, ainda é pouco difundida. O material transformado através da técnica do plasma se
constitui de gases que podem ser utilizados na co-geração de energia e sólido vítreo, sem
causar agressão ao meio ambiente. Esse sólido vítreo formado é semelhante ao vidro
vulcânico, rocha formada “num estágio radical de choque térmico na extrusão de lavas
balsáticas, onde a estrutura é microcristalina”.
349
No Brasil, a técnica de plasma não é
utilizada como método de disposição final de resíduos, o que já ocorre em países da Europa.
Feitas as considerações acerca dos métodos de disposição final, dos riscos que cada
tipo representa para o meio ambiente e a saúde pública, das vantagens e desvantagens que
podem acarretar, necessária a sistematização da melhor tecnologia disponível no momento da
345
FUNDAÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES DOS MUNICÍPIOS DO RIO GRANDE DO SUL, 2005. p. 11.
346
ARAGÃO, 2003, p. 43-45.
347
NAIME, 2004, p. 59.
348
Ibidem, p. 60.
349
Ibidem, p. 60-61.
98
escolha, ou seja, da eleição do método de disposição final que será utilizado. Quem deve
escolher, em que momento e como? É o que será discutido no próximo tópico.
4.3.2 Aplicação da melhor tecnologia disponível na eleição do método de disposição final
de RSU
Conhecidas as possibilidades, os métodos disponíveis para dispor de resíduos, é
preciso decidir qual será utilizado, dentro dos limites não somente legais, mas dos limites
éticos ambientais, considerando os princípios da prevenção e da precaução, e do
desenvolvimento sustentável. Além do mais, o método eleito deve levar em consideração e
atender às peculiaridades locais e regionais (mais um ponto de ponderação de custos e
benefícios da melhor tecnologia disponível). Ainda, o artigo 4º da Resolução nº 316/2002, do
CONAMA, dispõe que “a adoção de tratamento térmico de resíduos deverá ser precedida de
um estudo de análise de alternativas tecnológicas que comprove que a escolha da tecnologia
está de acordo com o conceito de melhor tecnologia disponível”.
Aplicando-se o conteúdo deste artigo à eleição do método de disposição de resíduos,
tem-se que deverão ser realizados estudos técnicos, transdisciplinares, que comprovem qual a
melhor tecnologia disponível para aquele caso, levando-se em consideração o dever de
preventividade objetiva (princípios da prevenção e da precaução), a análise dos custos e
benefícios, econômicos e ambientais, e os valores-limite de emissões, com vista a evitá-las,
ou, quando não seja possível, reduzi-las ao máximo, de modo a minimizar tanto quanto
possível os impactos ao meio ambiente, nos termos do item 11 do artigo 2º da Diretiva nº
96/61 do Conselho da Comunidade Européia.
Talvez o mais considerável aqui seja novamente o conceito de disponíveis, porque
não basta que as técnicas sejam as melhores existentes, as mais avançadas apresentadas pelo
conhecimento técnico-científico. É preciso que sejam aquelas que estejam disponíveis,
possíveis de aplicação naquele contexto social. Ou seja, as técnicas aplicadas (ou no caso de
disposição final de resíduos, os métodos) devem ser aquelas acessíveis àquele local, àquela
região, que estejam em condições econômicas e tecnicamente viáveis, tendo em conta os
custos e os benefícios. Assim, como bom exemplo, temos que a tecnologia de plasma é uma
tecnologia muito melhor, muito mais avançada na disposição final de resíduos, pois produz
energia limpa e, como chega a um quarto estágio da matéria (não é sólido, líquido nem
99
gasoso) não polui o meio ambiente, já que o que ocorre é uma dissociação de moléculas e não
a simples queima dos resíduos. Mas essa tecnologia nem ao menos existe no Brasil, ou seja,
não está disponível para utilização aqui. Decidir que deve ser utilizado o método de plasma na
disposição final de RSU não corresponde à melhor tecnologia disponível, pois não há
viabilidade na sua aplicação no nosso país: além de não termos conhecimento técnico sobre o
método, não temos condições econômicas para sustentá-lo.
A Diretiva 96/61 do Conselho da Comunidade Européia estabelece, ainda, outros
artigos que mostram qual deve ser o processo de decisão nessa eleição. O artigo 3º, que
estabelece os princípios gerais das obrigações fundamentais do operador, determina que as
autoridades competentes devem se certificar de que “a) sejam tomadas todas as medidas
preventivas adequadas contra poluição, designadamente a utilização das melhores técnicas
disponíveis”.
350
Ainda, o artigo 4º, que dispõe sobre o licenciamento de novas instalações,
determina que os seus Estados-membros tomam as medidas necessárias para que nenhuma
nova instalação seja explorada sem que sua licença seja concedida em desacordo com os
preceitos de prevenção da Diretiva.
Neste mesmo sentido está o parágrafo 1º do artigo 15 da Lei Estadual nº 1.817/1978
(São Paulo), ao determinar que a adoção da melhor tecnologia prática disponível, preconizada
em seu caput, deverá ser exigida no processo de licenciamento ambiental pelo órgão
competente. Do que se pode depreender dos diplomas legais citados, a determinação de
adoção da melhor tecnologia disponível na eleição do método de disposição final de RSU
deve ocorrer no momento do licenciamento. Mas isso ocorre para novas instalações e, no caso
dos RSU, para os novos sistemas de disposição, quando os municípios forem implantar novo
local para destinação, nova licença.
E o que ocorre nas instalações de disposição já instaladas? Quem decide sobre elas?
E mais uma questão: os parágrafos anteriores tratam de situações que estão previstas em
normatizações, mas o Brasil não possui legislação que determine que a melhor tecnologia
disponível deve ser empregada como medida preventiva na eleição de método de disposição
final de resíduos. É justamente por essa questão e pela passagem da sociedade industrial à
sociedade de risco, sem que o ordenamento jurídico tenha sofrido modificações que abarquem
as novas situações que necessitam da tutela do Direito, inclusive os RSU, que cresce a cada
dia, que faz-se necessária uma mudança na mentalidade dos operadores do Direito, uma
mudança na estrutura das decisões judiciais dos Tribunais pátrios, uma mudança na
350
Mais uma vez, colocada melhor tecnologia disponível como medida preventiva de controle de poluição e
degradação ambiental, a fim evitar a ocorrência de dano.
100
jurisprudência nacional, que deve estar embasada nos princípios da prevenção e da precaução,
da responsabilidade, do desenvolvimento sustentável, dentre outros. O meio ambiente já não
pode esperar permaneçam em tramitação por mais de dezessete anos.
Isto posto, cabe, então, aos órgãos legislativos, administrativos e judiciais nacionais
decidir sobre a aplicação da melhor tecnologia disponível como medida preventiva ambiental.
É através dessas decisões que esta medida preventiva pode ser inserida no direito ambiental
brasileiro, enquanto não se editam normatizações que tratem especificamente do tema. É “o
Direito aplicado com sabedoria”, segundo De Plácido e Silva, que prossegue:
Assim é que se entende a jurisprudência como sábia interpretação e aplicação das
leis a todo os casos concretos que se submetam a julgamento da justiça. Ou seja, o
hábito de interpretar e aplicar as leis aos fatos concretos, para que, assim, se
decidam as causas.
Desse modo, a jurisprudência não se forma isoladamente, isto é, pelas decisões
isoladas. É necessário que se firme por sucessivas e uniformes decisões,
constituindo-se em fonte criadora do Direito e produzindo um verdadeiro jus novum.
É necessário que, pelo hábito, a interpretação e explicação das leis a venham
formar.
351
Para tanto, as decisões jurisprudenciais acerca da melhor tecnologia como medida
preventiva de proteção ambiental devem estar consubstanciadas em dois aspectos, já
estudados nos itens 2.5.1) responsabilidade sem danos e os riscos ambientais configuradores
do ilícito ambiental e 2.5.2) princípio da proporcionalidade e medidas preventivas na gestão
de riscos ambientais.
A responsabilidade sem danos desvincula a concretização de um dano e a
comprovação de culpa para configuração do ilícito civil. Em matéria ambiental, está
justificada pelo disposto nos artigos 225 da Constituição Federal e 187 do Código Civil, que
superam a noção clássica de que o ilícito civil guarda relação com suas consequências
patrimoniais negativas. Os novos problemas ambientais da sociedade de risco não estão
abrangidos somente por essa noção e vão muito além dos deveres de reparação e indenização.
Considerando o dever de preventividade objetiva do artigo 225 da Constituição
Federal, a produção de riscos intoleráveis configura-se como um ilícito ambiental em razão
dos seus custos para a sociedade. Assim, mesmo que não seja concretizado um dano
ambiental, medidas preventivas devem ser tomadas a fim de evitar a ocorrência de dano
ambiental futuro, entendido como todos os riscos ambientais que, por sua intolerabilidade, são
considerados ilícitos, justificando, assim, a imposição de medidas preventivas, previstas no
351
SILVA, 2005, v. 3, p. 34.
101
artigo 3º da Lei nº 7.347/1985, ao determinar o cumprimento de obrigação de fazer ou não
fazer.
Verificada a alta probabilidade da concretização dos riscos em danos (e nos casos
dos sistemas de disposição final de resíduos, essa verificação não encontra dificuldades, já
que os riscos são conhecidos, são concretos), assim como a sua gravidade e a possibilidade de
irreversibilidade desses riscos, deve-se impor medidas preventivas de proteção ambiental.
Excedido o grau de tolerabilidade do meio ambiente, configurado o ilícito ambiental.
352
Tem-se que o princípio da proporcionalidade
353
(relação de custo/benefício) é o que
orienta a imposição de medidas preventivas (tais como a melhor tecnologia disponível) como
consequência jurídica dos riscos ilícitos, intoleráveis ao meio ambiente. As medidas
preventivas impostas devem ser proporcionais à proteção necessária.
354
Nesse sentido, a
aplicação da melhor tecnologia disponível na eleição do método de disposição final de RSU
mostra-se como medida preventiva proporcional (juízo de probabilidade/improbabilidade da
ocorrência de danos, risco/benefício do método escolhido e reversibilidade/irreversibidade
dos danos) à proteção ambiental pretendida: seu fim é a eliminação dos riscos, e, quando esta
não for possível, a redução das emissões poluentes nos sistemas de deposição de resíduos.
Conhecidas as possíveis consequências negativas ao meio ambiente de determinados métodos
de disposição final, mostra-se perfeitamente proporcional a imposição de melhor tecnologia
disponível como medida de proteção, de prevenção.
4.3.3 Aterro sanitário como melhor tecnologia disponível de disposição final de RSU no
Brasil
A nova configuração do sentido de ilícito ambiental desvincula o seu conceito do
sentido de dano como pressuposto para configuração do ilícito civil. Ilícito estabelece
contrariedade ao direito, enquanto dano é traduzido em lesão a um interesse jurídico. Para a
configuração de um ilícito ambiental não há, necessariamente, a configuração de um dano ao
meio ambiente. A aferição de risco ambiental (tanto concreto quanto abstrato) já estabelece
352
CARVALHO, 2008, p.147-157.
353
Vide item 2.5.2.
354
CARVALHO, op. cit., p. 157.
102
contrariedade ao direito. Essa ideia é extraída da análise conjunta do artigo 225 da
Constituição Federal e do artigo 187 do Código Civil.
O artigo 225 da Constituição estabelece o dever de preventividade objetiva na
proteção do meio ambiente, ou seja, a obrigação de adotar medidas antecipatórias que tenham
o fim de evitar que o meio ambiente sofra prejuízos. O direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, estabelecido no caput do referido artigo, estende-se além das
gerações presentes: deve alcançar também as gerações futuras. Esse sentido, aliado ao que
dispõe o artigo 187 do Código Civil: “também comete ato ilícito o titular de um direito que,
ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social,
pela boa-fé ou pelos bons costumes”, estabelece a configuração também do risco como ilícito
ambiental.
Considerado o “dever de preventividade objetiva” imposto pelo artigo 225 da
Constituição Federal, a violação desse dever “a partir da produção de riscos intoleráveis
acarreta a configuração de um ilícito ambiental em razão dos custos sociais decorrentes da
generalização destes na sociedade (pós-) industrial”.
355
A abertura do sentido da ilicitude civil
trazida pelo Código Civil de 2002 (desvinculação de ilícito a dano/lesão) demonstra que “o
dano ambiental futuro é verdadeira fonte de obrigação civil, que resulta em tutela diversa da
mera indenização ou reparação, atuando por meio da imposição de medidas preventivas.”
(grifo do autor)
356
A nova teoria do risco (abstrata) e o conteúdo do artigo 187 do Código
Civil estabelecem que os riscos intoleráveis produzidos por certa atividade ensejam a
imposição de medidas preventivas, evitando, assim, a concretização desses riscos em danos
ambientais.
Essas medidas preventivas, já referidas e explicadas diversas vezes no conteúdo
deste trabalho, mais especificamente no item 4.1.1, são obrigações de fazer e de não fazer, de
caráter mandamental (de mandamento, ordem) ou de caráter inibitório, para fins de
impossibilitar a concretização de danos ambientais, ou, no mínimo, reduzir a sua
probabilidade de ocorrência, restringindo a sua potencialidade.
Em matéria de resíduos sólidos urbanos, os riscos intoleráveis ao meio ambiente são
riscos desnecessários, tendo em vista que os riscos causados pelos métodos de disposição
final são, em sua maioria, conhecidos ou, pelo menos, de projeção e consequências
calculáveis. Cada método de disposição final acarreta riscos ao meio ambiente, conforme
descritos nos subitens do item 3.4. Em determinados métodos de disposição, como o
355
CARVALHO, 2008, p. 149.
356
Ibidem, p. 150.
103
lançamento a céu aberto, por exemplo, esses riscos e, muitas vezes, verdadeiros danos
ambientais, são absolutamente intoleráveis e desnecessários, na medida em que já existe
melhor tecnologia disponível para a disposição final de RSU.
O lançamento a céu aberto e os chamados aterros controlados, além de produzirem
riscos (que, na maioria das vezes, se convertem em danos) intoleráveis ao meio ambiente, são
absolutamente desnecessários. Na questão dos métodos de disposição final de RSU, a melhor
técnica disponível pode ser traduzida na ideia da técnica que causa menos riscos ao meio
ambiente ao mesmo tempo em que alia condições econômicas para a sua instalação, conforme
os preceitos do item 11 do artigo 2º da Diretiva 96/61 do Conselho da Comunidade Europeia.
Naime entende que “a adoção da disposição final em aterros sanitários é o método
com melhor relação de custo-benefício para os países em desenvolvimento”,
357
como é o caso
do Brasil. Os aterros sanitários (item 3.4.4) estabelecem processos de engenharia sanitária,
sem causar danos ao meio ambiente, nos termos das NBRs nº 8.419/1984 (revisada em 1992),
9.896/1993 e da Resolução nº 404/2008, do CONAMA. Esta última estabelece critérios e
diretrizes para o licenciamento ambiental de aterro sanitário de pequeno porte de resíduos
sólidos urbanos, aliando condições de proteção ao meio ambiente aos poucos recursos
econômicos destinados ao tratamento e disposição dos resíduos nos municípios brasileiros.
Do exposto sobre os métodos de disposição final de RSU e dos riscos causados por
cada método, pode-se concluir que os aterros sanitários traduzem a noção de melhor
tecnologia disponível de destinação final de resíduos sólidos urbanos. Na ordem gradual dos
métodos de disposição, excetuando-se a compostagem para os resíduos orgânicos, tem-se o
lançamento a céu aberto e depois os aterros controlados, que, como já visto, causam riscos
intoleráveis e desnecessários ao meio ambiente, configurando-se, muitas vezes, em
verdadeiros crimes ambientais. Seguindo essa ordem, tem-se os aterros sanitários e os
tratamentos térmicos. Os tratamentos térmicos ainda são muito despendiosos e, no Brasil
ainda são pouco utilizados, tendo em vista os custos e as dificuldades de operação. Assim,
seguindo o entendimento de Naime, os aterros sanitários são a melhor tecnologia disponível
de disposição final de resíduos sólidos urbanos no Brasil.
Seguindo o raciocínio de dever de preventividade objetiva do artigo 225 da
Constituição Federal, aliado ao conceito de ilícito civil (contrariedade ao direito) do artigo
187 do Código Civil, chega-se à necessidade de imposição de medidas preventivas de
proteção do meio ambiente. A imposição de utilização de melhor tecnologia disponível na
eleição do método de disposição final de RSU é uma medida preventiva ambiental, é uma
357
NAIME, 2004, p. 37.
104
obrigação de fazer que deve ser imposta aos responsáveis pelos sistemas de deposição de
resíduos.
O sistema de destinação final de resíduos a ser formado deverá, no mínimo, ser um
aterro sanitário. Para os sistemas de destinação já em operação e que não estiverem de acordo
com esses preceitos mínimos de proteção ambiental, os operadores do direito devem empregar
uma posição preventiva no sentido de determinar medidas (obrigações de fazer ou não fazer)
destinadas a minimizar (quando não for possível eliminá-las por completo) os seus efeitos
negativos.
5 CONCLUSÃO
O direito ambiental enfrenta, hoje, riscos de efeitos globais e atemporais. Superada a
sociedade industrial, cujos riscos ao homem individualmente considerado, ao meio ambiente e
à saúde pública são conhecidos e determináveis, chega-se à atual sociedade de riscos, cujos
efeitos são abstratamente considerados, já que são imprevisíveis e ultrapassam fronteiras.
Além disso, está-se diante do conhecimento de que muitas consequências negativas são
irreversíveis, e o meio ambiente, cujos recursos naturais são esgotáveis, ao contrário do que já
se imaginou, já não pode suportá-las.
Diante dessa nova realidade, é preciso que o direito ambiental, através do instituto da
responsabilidade civil, seja instrumento não apenas corretivo ou reparador de danos
ambientais, mas muito mais instrumento de prevenção de riscos e danos. O artigo 225 da
Constituição Federal impõe como dever de todos (não apenas do Poder Público) a defesa e a
proteção do meio ambiente (princípio da prevenção lato sensu / dever de preventividade
objetiva), bem comum de todos e essencial à sadia qualidade de vida, para as presentes e as
futuras gerações (princípio da solidariedade intergeracional).
Assim, as incertezas técnicas e científicas trazidas pela sociedade de riscos não
podem se tornar também incertezas jurídicas. O direito deve agir como instrumento de
prevenção ambiental. Portanto, o modelo de responsabilidade ambiental cuja atuação é
somente posterior à ocorrência de danos, é absolutamente ultrapassado. Mais: o modelo que
prevê apenas os riscos concretos, cujos efeitos negativos são conhecidos, também já está
obsoleto. Em virtude da nova teoria do risco (abstrato) e da impossibilidade de conhecimento
das consequências negativas futuras do desenvolvimento de determinadas atividades, a
responsabilidade ambiental deve ser instrumento de prevenção ao dano ambiental futuro.
A responsabilidade ambiental da sociedade de riscos inaugura também uma nova
configuração do ilícito (artigo 187 do Código Civil), desvinculando o seu sentido do sentido
do dano. Ou seja, dano é uma coisa (lesão a bem juridicamente tutelado) e ilícito é outra:
contrariedade ao direito. Assim, a sociedade se depara com a aplicação / imposição da
responsabilidade ambiental sem dano (atual e concreto), nos casos de produção de riscos
ambientais intoleráveis (artigos 225 da Constituição Federal e 187 do Código Civil), que
podem ser tanto concretos quanto abstratos, além, é claro, da possibilidade de
responsabilidade tradicional (de dano, nos termos do parágrafo 1º do artigo 14 da Lei nº
6.938/1981). Nesse sentido, as medidas preventivas ambientais (obrigações de fazer ou não
106
fazer) são aquelas que devem ser aplicadas antes da produção de dano ambiental, quando
constatada a configuração de risco ambiental (concreto ou abstrato) intolerável, que se traduz
em ilícito ambiental.
358
Para a configuração da intolerabilidade de um risco ambiental deve
ser feita a equação entre a probabilidade de sua ocorrência e a magnitude de suas
consequências: a ilicitude do risco ambiental (risco ambiental ilícito, ou seja, dano ambiental
futuro) dependerá da constatação de sua alta probabilidade de ocorrência no futuro e da sua
magnitude, o seu alcance, a sua gravidade. Ainda, a medida preventiva imposta deve ser
proporcional ao risco (ou dano) produzido pela atividade (binômio adequação/necessidade do
princípio da proporcionalidade).
Em se tratando dos resíduos sólidos urbanos, as questões de degradação ambiental
são, inevitavelmente, visíveis e latentes, já que toda e qualquer atividade humana produz
resíduos. O avanço tecnológico aumenta o padrão de consumo, produzindo cada vez mais um
número maior de resíduos desnecessários. Nos centros urbanos, cujos espaços são limitados,
as consequências negativas da disposição irregular de resíduos são mais facilmente
observadas e sentidas. Por essa razão, há necessidade de tratamento jurídico diferenciado para
os resíduos. Ocorre que o Brasil não possui uma Política Nacional de Resíduos Sólidos (cujo
Projeto de Lei tramita há mais de dezessete anos), assim como a grande maioria dos
municípios brasileiros não possui leis específicas que tratem da questão dos resíduos e seus
riscos para o meio ambiente.
Os resultados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, realizada pelo IBGE, em
2000, revela que 81,7% dos municípios brasileiros dispõe irregularmente de seus resíduos
sólidos urbanos, encaminhando-os para “lixões” ou aterros controlados, causando enormes
riscos ao meio ambiente, tais como poluição do ar, do solo e das águas. Assim, a porcentagem
de municípios que encaminha seus resíduos para locais considerados adequados é muito
pequena, não alcançando nem ao menos 20%. Não é preciso grande esforço para constatar
que a situação da disposição final dos RSU no Brasil é gravíssima e requer providências
imediatas.
O dever de preventividade objetiva do artigo 225 da Constituição Federal deve se
estender a todo e qualquer tipo de proteção ao meio ambiente, inclusive à problemática dos
resíduos sólidos urbanos. Violado esse dever, devem ser impostas medidas preventivas, a fim
358
Válidas, mais uma vez, as palavras de Carvalho: “Em havendo violação do dever de preventividade objetiva
constitucionalmente garantido pelo art. 225, estaremos diante do que o art. 187 do Código Civil estabelece como
o exercício de um direito que, por exceder manifestamente os limites impostos pelo seu fim social (matéria
ambiental), é considerado ilícito (sem a necessidade de ocorrência de dano, mas apenas de sua mera
probabilidade).” (grifos do autor) (CARVALHO, 2008, p. 168)
107
de evitar a probabilidade de ocorrência de um dano ambiental. Os métodos de disposição final
de RSU trazem diversos riscos ao meio ambiente, conforme listados e expostos no terceiro
capítulo (3.4.1, 3.4.2, 3.4.3, 3.4.4 e 3.4.5); riscos estes que, além de intoleráveis, pela
magnitude e probabilidade de sua ocorrência, são desnecessários, em virtude da possibilidade
de imposição de medida preventiva na eleição do método de disposição final de RSU a ser
utilizado.
A medida preventiva em questão é a imposição de melhor tecnologia disponível, que
é a fase mais eficaz e avançada das atividades e dos seus respectivos modos de exploração,
que demonstre a aptidão prática para a sua utilização. Ou seja, as melhores técnicas
disponíveis ou a melhor tecnologia disponível, que varia no caso concreto, é a base da decisão
da tecnologia/método que deverá ser adotado. É na análise do caso concreto que se chega à
melhor tecnologia disponível para determinada situação.
Em se tratando da eleição do método de disposição final de RSU, devem ser levados
em consideração as possibilidades técnicas, econômicas e, principalmente, aquelas que
causem o menor impacto ao meio ambiente, que gerem o menor grau possível de risco.
Melhor tecnologia disponível não se confunde com tecnologia mais moderna. Assim, bem
aplicada a terminologia da Lei Estadual paulista nº 1.817/1978, que se refere a “melhor
tecnologia prática disponível”. Na eleição do método de RSU a ser desenvolvido devem ser
levados em consideração os custos e benefícios (não só econômicos, mas também e,
principalmente, ambientais) e o dever de preventividade objetiva (princípios da prevenção e
da precaução) do artigo 225 da Constituição Federal.
Dessa maneira, o aporte jurídico para imposição de melhor tecnologia disponível
como medida preventiva ambiental na eleição do método de disposição final de RSU já existe
no direito brasileiro (artigo 225 da Constituição e artigo 187 do Código Civil, reforçado pelas
Resoluções 316 e 357, do CONAMA) e deve ser aplicado nas decisões judiciais (e legislativas
e administrativas) que envolvam os sistemas de destinação de resíduos. No momento da
implementação do sistema de destinação final, deve ser ponderada qual a melhor tecnologia
disponível para aquele caso.
Embora não exista norma específica impondo a melhor tecnologia disponível, o
dever de preventividade objetiva do artigo 225 da Constituição nos informa dois princípios
basilares de direito ambiental: o princípio da prevenção e o princípio da precaução. Assim, é
dever implementar medidas preventivas ambientais, a fim de proteger o meio ambiente. Dessa
forma, os princípios de direito ambiental, que são normas hierarquicamente superiores às
108
regras e, cuja abrangência não se restringe às situações previstas em lei, não só autorizam
como impõem medidas preventivas ambientais.
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