Segundo seus estudos, esses indígenas pertencem ao Grupo Ge, por
comporem seus nomes tribais com a palavra Gê (pai, chefe), assim os enquadrando
junto com os demais povos, que formavam o grupo Gê.
Ao nosso entender, um dos viajantes que, ao analisar os indígenas brasileiros
não contribui, ou mesmo, contrariou, a construção do mito do bom selvagem foi
Martius. Ele acreditava que os índios eram os remanescentes degenerados de
povos "superiores", que teriam construído cidades, monumentos, e teriam tido
códigos de conduta muito mais "evoluídos". Suas críticas à crença no “bom
selvagem” são explícitas:
”(...) Ainda não há muito tempo era opinião geralmente adotada que os
indígenas da América foram homens diretamente emanados da mão do
Criador. (...) Enfeitado com as cores de uma filantropia e filosofia
enganadora, consideravam este estado como primitivo do homem:
procuravam explicá-lo, e dele derivavam os mais singulares princípios para
o Direito Público, a Religião e a História. Investigações mais aprofundadas,
porém, provaram ao homem desprevenido que aqui não se trata do estado
primitivo do homem, e que pelo contrário o triste e penível (sic) quadro que
nos oferece o atual indígena brasileiro, não é senão o residuum de uma
muito antiga, posto que perdida história(...)”.
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A monografia de MARTIUS (1838), “Como se deve escrever a história do
Brasil”,
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aparece inserida numa preocupação com uma história que tomasse a idéia
de um passado nacional, comum a todos os “brasileiros” e que teve início com o
surgimento político do Brasil independente.
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MARTIUS, C. F. von - Como se deve escrever a História do Brasil, publicado com O Estado de
Direito entre os autóctones do Brasil. Belo Horizonte/São Paulo, Itatiaia/EDUSP, 1982. p. 75
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MARTIUS, C. F. von - Como se deve escrever a História do Brasil, publicado com O Estado de
Direito entre os autóctones do Brasil. Belo Horizonte/São Paulo, Itatiaia/EDUSP, 1982.
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Desde o período colonial, é possível encontrar escritos que foram chamados de histórias do Brasil
´, tais como relatos de administradores, missionários e viajantes que registraram os fatos ocorridos e
observações sobre a vida e os costumes dos habitantes do Brasil entre os séculos XVI ao XVIII.
Todavia, a preocupação com uma história que tomasse a idéia de um passado nacional é
engendrada de maneira pontual com o surgimento político do Brasil independente. A partir da criação
do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1838), é que se percebe mais claramente a
preocupação por parte da elite letrada e política com o projeto de formular uma história do Brasil,
acentuando-se as questões referentes à formulação de uma história pátria. Em um momento que a
elite dirigente buscava consolidar o Estado imperial, todas as questões relativas à história do Brasil
seriam cruciais para traçar a forma de se contá-la e a forma como os brasileiros se veriam a si
próprios. Para buscar as respostas a essas inúmeras questões, que o referido Instituto, propôs uma
premiação para quem respondesse sobre qual o melhor sistema para escrever a História do Brasil. O
ganhador do concurso foi von Martius, em contato com a voga da disciplina histórica na Europa,
particularmente na Alemanha e propôs uma história do Brasil que fosse ao mesmo tempo “filosófica”
e “pragmática”, tendo como eixo a formação de seu povo, incluindo nesta formação a “mescla das
raças”.