Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS - UFPEL
INSTITUTO DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA
MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
ROBERTO VIEIRA JÚNIOR
DESENVOLVIMENTISTAS E AMBIENTALISTAS: a questão da silvicultura na região
sul do Rio Grande do Sul sob a ótica da teoria do discurso.
PELOTAS, ABRIL DE 2009.
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
ROBERTO VIEIRA JÚNIOR
DESENVOLVIMENTISTAS E AMBIENTALISTAS: a questão da silvicultura na região
sul do Rio Grande do Sul sob a ótica da teoria do discurso.
Dissertação de Mestrado apresentada no Programa de
Mestrado em Ciências Sociais e Política, da Universidade
Federal de Pelotas, como requisito parcial para a obtenção do
Título de Mestre em Ciências Sociais..
Orientador: Professor Doutor Daniel de Mendonça
PELOTAS, ABRIL DE 2009.
ads:
Banca examinadora:
Dr. Daniel de Mendonça (orientador/presidente)
Dr. Álvaro Augusto de Borba Barreto
Dra. Rosângela Marione Schulz
Dr. Léo Peixoto Rodrigues
À minha esposa, Cristiane Levien e meus filhos Rex
(in memoriam), Vicky, Bin Laden, Valquiria e
Scarlet.
AGRADECIMENTOS
Agradeço, de início, à Universidade Federal de Pelotas, instituição onde cursei minha
graduação, na Faculdade de Direito, e onde me foi possibilitada a oportunidade de ampliar
meus horizontes durante este curso de mestrado. Aos professores deste curso que, em suas
aulas, apresentaram-me um universo novo de saberes e idéias, meu muito obrigado.
Agradeço ao meu orientador, Dr. Daniel de Mendonça, que, além de me apresentar a obra
de Ernesto Laclau, acreditou em minha capacidade permitindo que eu fosse seu orientado,
defendendo esta idéia frente ao colegiado do curso. Por sua atenção, respeito e dedicação,
muitíssimo obrigado.
Aos meus pais que sempre incentivaram meus estudos, de todas as formas que lhe foram
possíveis, meu terno agradecimento.
Em especial, agradeço a minha esposa, Cristiane Levien, que sempre soube compreender
minhas convicções, incentivar meu crescimento e mostrar-me, a cada dia, que ainda existe
razão para existir. Por sua compreensão, companheirismo, sabedoria, amor e patrocínio minha
eterna gratidão.
RESUMO
VIEIRA JÚNIOR, Roberto. Desenvolvimentistas e Ambientalistas: a questão da
silvicultura na região sul do rio grande do sul sob a ótica da teoria do discurso.2009. 116f.
Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Universidade
Federal de Pelotas, Pelotas, RS.
Uma das formas de buscar a compreensão de posicionamentos e argumentos que sustentam
grupos sociais em suas inter-relações é analisar suas teses centrais e como elas se aproximam.
Esta aproximação de idéias faz com que estes grupos venham a ocupar posicionamentos em
torno de propostas que são comuns a eles. Embora, na maioria das vezes estes grupos busquem
objetivos diversos, e até mesmo contrários, por determinados períodos de tempo e em
determinadas conjunturas sociais, os meios para atingir estes objetivos podem ser os mesmos
para todos eles. Na questão que envolve o estabelecimento do ciclo produtivo da celulose,
principalmente nos municípios gaúchos de Pelotas, Arroio Grande e Herval, esta conjunção de
interesses que se tornam, em alguns pontos, comuns vem ganhando destaque neste início de
século. Para permitir uma análise mais acurada de tal situação, este trabalho de dissertação
utiliza-se da teoria do discurso, desenvolvida por Ernesto Laclau e Chantal Mouffe. Esta teoria
é um interessante meio para a análise e para a compreensão da constituição dos grupos que se
colocam contrários e favoráveis ao cultivo de eucalyptus ssp., além de permitir uma
interpretação da razões de seus objetivos nesta disputa por hegemonia.
Palavras-chave: Teoria do discurso. Silvicultura. Meio ambiente. Política. Celulose.
ABSTRACT
VIEIRA JÚNIOR, Roberto. Desenvolvimentistas e Ambientalistas: a questão da
silvicultura na região sul do rio grande do sul sob a ótica da teoria do discurso.2009. 116f.
Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Universidade
Federal de Pelotas, Pelotas, RS.
One way to get an understanding of positions and arguments that support social groups in their
inter-relationships is to analyze its central thesis and how they are approaching. This approach
means that ideas of these groups come to occupy positions around proposals that are common
to them. Although, in most cases these groups seek different goals, and even contrary, for
certain time periods and in certain social situations, the means to achieve these goals may be
the same for all. The issue which involves the establishment of the production cycle of pulp,
mainly in the cities of Pelotas, Arroio Grande and Herval, this combination of interests that
become, in some points, has gained common emphasis in the beginning of this century. To
allow a more accurate analysis of this situation, this dissertation work is the use of discourse
theory, developed by Ernesto Laclau and Chantal Mouffe. This theory is an interesting way to
analyze and to understand the formation of groups that arise to the contrary and favorable
growing of eucalyptus ssp., Permitting an interpretation of the reasons of their goals in this
competition for hegemony.
Keywords: Teoria do discurso. Silvicultura. Meio ambiente. Política. Celulose.
RESUMEN
VIEIRA JÚNIOR, Roberto. Desenvolvimentistas e Ambientalistas: a questão da
silvicultura na região sul do rio grande do sul sob a ótica da teoria do discurso.2009. 116f.
Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Universidade
Federal de Pelotas, Pelotas, RS.
Una forma de obtener una comprensión de las posiciones y argumentos que apoyan a los
grupos sociales en sus relaciones interinstitucionales para analizar su tesis central y la forma en
que se están acercando. Este enfoque significa que las ideas de estos grupos llegan a ocupar
posiciones en torno a propuestas que son comunes a ellos. Aunque en la mayoría de los casos
estos grupos buscan objetivos diferentes e incluso contrarias, para determinados períodos de
tiempo y en ciertas situaciones sociales, los medios para alcanzar esos objetivos puede ser el
mismo para todos. La cuestión que implica el establecimiento del ciclo de producción de pasta
de papel, principalmente en las ciudades de Pelotas, Arroio Grande y Herval, esta combinación
de intereses que se convierten, en algunos puntos, ha ganado importancia común en el inicio de
este siglo. Para permitir un análisis más preciso de esta situación, este trabajo de tesis es el uso
de la teoría del discurso, desarrollado por Ernesto Laclau y Chantal Mouffe. Esta teoría es una
manera interesante de analizar y comprender la formación de grupos que surgen a lo contrario
y cada vez más favorables de euclyptus ssp., lo que permite una interpretación de las razones
de sus objetivos en esta competición por la hegemonía.
Palabras-llave: Teoria do discurso. Silvicultura. Meio ambiente. Política. Celulose.
Lista de Figuras
Figura 1 Representação da cadeia equivalencial
“ambientalista”.................................................................... 60
Figura 2 Representação da cadeia equivalencial
“desenvolvimentista”........................................................... 73
Lista de Tabelas
Tabela 1 Indicadores financeiros de empresas de papel e celulose-2003
em milhões de reais.................................................................. 49
Tabela 2 Participação dos estados em produção de celulose-2002-em % 49
Tabela 3 Área total reflorestada pelo setor de celulose por estado-2003
em hectares............................................................................... 50
Tabela 4 Mão-de-obra empregada na atividade florestal-2001 –média.. 51
Tabela 5 Relação Município/área cultivada/renda líquida...................... 92
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABTCP – Associação Brasileira de Tanino Celulose e Papel
ADUFPEL – Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pelotas
AL/RS – Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul
AM – Amplitude Modulada
ANFP – Associação Nacional dos Fabricantes de Papel e Celulose
AZONASUL – Associação dos Prefeitos da Zona Sul
BNDE – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Sustentável
BR – Rodovia Federal
Bracelpa - Empresas Brasileiras de Celulose e Papel
CDL – Clube dos Dirigentes Logistas
CEA – Centro de Estudos Ambientais
CF – Constituição Federal
CIPEL – Centro das Indústrias de Pelotas
CONAFLOR – Comissão Coordenadora do Programa Nacional de Florestas
CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente
CPERS- Centro dos Professores do Estado do Rio Grande Do Sul
CUT – Central Única dos Trabalhadores
EIA – Estudo de Impacto Ambiental
EUA – Estados Unidos da América do Norte
FAMURS – Federação dos Municípios do Rio Grande do Sul
FAO – Organização para Agricultura e Alimentação
FEPAM – Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roesler
FLONA – Floresta Nacional
FNDF- Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal
GEAN – Grupo Ecológico Amantes da Natureza
IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis
IBDF – Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDESE – Índice de Desenvolvimento Saneamento e Saúde.
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
IRGA – Instituto Riograndense do Arroz
Kg – Quilo
MMA – Ministério do Meio Ambiente
MP – Ministério Público
MST- Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
ONG- Organização Não Governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
PND – Plano Nacional de Desenvolvimento
PNF – Plano Nacional de Florestas
PNPC - Plano Nacional de Papel e Celulose
PPCDA – Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia
PT – Partido dos Trabalhadores
RBS – Rede Brasil Sul de Comunicação
RIMA – Relatório de Impacto Ambiental
RS – Rio Grande do Sul
SBEF – Sociedade Brasileira de Engenheiros Florestais
SBS – Sociedade Brasileira de Silvicultura
SESI – Serviço Social da Indústria
SFB – Serviço Florestal Brasileiro
SINDUSCON – Sindicato da Indústria da Construção
SISNAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente
TAC – Termo de Ajustamento de Conduta
UFPel – Universidade Federal de Pelotas
UFSM – Universidade Federal de Santa Maria
US$ - Dólar norte-americano
VCP – Votorantin Celulose e Papel
LISTA DE ANEXOS
1 Fotos de culturas de eucalipto em assentamentos ocupados por integrantes do MST.
2 Fotos demonstrando o espaçamento utilizado nas culturas de eucalipto.
3 Fotos da Audiência Pública promovida pela VCP para divulgação de seu EIA/RIMA.
4 Questionários aplicados aos entrevistados.
5 Termos de Ajustamento de Conduta firmados entre a FEPAM e o MP.
6 Portaria 070/07 regrando a realização de Audiências Públicas.
7 Contrato firmado entre a VCP e instituições públicas federais para realização do EIA.
8 Informação do sitio oficial da SEMA informando sobre a aprovação do Zoneamento
Ambiental Para a silvicultura.
9 Publicação do INCRA destacando a inadequação do plantio de eucaliptos em
terras destinadas a assentamento agrário.
10 Folder EIA/RIMA do Projeto Losango (VCP)
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 016
CAPÍTULO II: A Teoria utilizada e seus conceitos básicos....................................... 026
2.1 Compreendendo a Lógica Discursiva...................................................................... 026
2.1.1 Da Identidade......................................................................................................... 027
2.1.2 Do Discurso............................................................................................................ 027
2.1.3 Do Ponto Nodal...................................................................................................... 029
2.1.4 Do Antagonismo.................................................................................................... 030
2.1.5 Da Hegemonia....................................................................................................... 031
2.2 Conceitos das Ciências Biológicas.......................................................................... 032
2.2.1 Da Ecologia............................................................................................................ 033
2.2.1.1 Conceito e Histórico........................................................................................... 033
2.2.1.2 Ecossistema ........................................................................................................ 034
2.2.1.3 Meio Ambiente (na ecologia)............................................................................. 034
2.2.1.4 Equilíbrio Ecológico........................................................................................... 035
2.2.1.5 Da Sustentabilidade, do Desenvolvimento e do crescimento.......................... 036
2.2.2 Da Biologia............................................................................................................. 036
2.2.2.1 Bioma................................................................................................................... 037
2.2.2.2 Entropia............................................................................................................... 037
2.3 Dos conceitos legais.................................................................................................. 038
2.3.1 Meio ambiente (na legislação).............................................................................. 038
2.3.2 Princípios do Direito Ambiental.......................................................................... 039
2.3.2.1 Princípio do direito ao meio ambiente sadio................................................... 040
2.3.2.2 Princípio da prevenção...................................................................................... 040
2.3.2.3 Princípio da função social da propriedade...................................................... 040
2.3.2.4 Princípio do direito ao desenvolvimento sustentável...................................... 040
2.3.2.5 Princípio da informação.................................................................................... 041
2.3.3 Estudo de Impacto Ambiental (EIA)................................................................... 042
2.3.4 Zoneamento Ambiental......................................................................................... 042
2.3.5 Licenciamento Ambiental..................................................................................... 043
2.4 Considerações........................................................................................................... 044
CAPÍTULO III: Histórico da Indústria de Papel e Celulose no Brasil.................... 046
3.1 Introdução................................................................................................................ 046
3.2 Momentos iniciais da indústria no Brasil.............................................................. 047
3.2.1 As décadas de 1930 a 1950................................................................................... 047
3.2.2 A década de 1960.................................................................................................. 048
3.2.3 A década de 1970.................................................................................................. 048
3.2.4 As décadas de 1980 e 1990................................................................................... 049
3.2.5 Situação da indústria nos primeiros anos do século XXI................................. 049
3.4 Aspectos institucionais............................................................................................ 052
3.5 O Brasil no cenário mundial do papel e celulose................................................. 055
3.6 Situação do mercado de celulose pós 2005........................................................... 056
3.7 A Votorantim Celulose e Papel.............................................................................. 057
3.8 Considerações.......................................................................................................... 058
CAPÍTULO IV : Três “tipos” ambientalistas............................................................ 060
4.1 Introdução................................................................................................................ 060
4.2 Ambientalistas “político-partidários”................................................................... 061
4.2.1 O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra....................................... 062
4.2.2 O Partido dos Trabalhadores............................................................................. 065
4.2.3 Central Única dos Trabalhadores/Centro dos Professores do estado do Rio
Grande do Sul............................................................................ ................................... 066
4.3 Ambientalistas “político-econômicos”................................................................... 067
4.3.1 Os arrozeiros......................................................................................................... 068
4.3.2 Os pecuaristas....................................................................................................... 069
4.4 Ambientalistas “político-sócio-ambientais”.......................................................... 070
4.5 Considerações.......................................................................................................... 072
CAPÍTULO V: Os “desenvolvimentistas”.................................................................. 073
5.1 Introdução................................................................................................................ 073
5.2 Elementos-momento do discurso “desenvolvimentista”...................................... 073
5.2.1 Os empresários...................................................................................................... 074
5.2.2 Os proprietários de terras.................................................................................... 077
5.2.3 Expectativa de geração de postos de trabalho por parte da população
economicamente ativa.................................................................................................... 078
5.2.4 Os Políticos............................................................................................................. 080
5.3 Considerações........................................................................................................... 082
CAPÍTULO VI: O embate discursivo.......................................................................... 083
6.1 Introdução................................................................................................................ 083
6.2 Os espaços de embate............................................................................................ 083
6.2.1 A mídia................................................................................................................... 083
6.2.2 As Audiências Públicas......................................................................................... 086
6.2.3 Os espaços institucionais...................................................................................... 088
6.3 Os embates............................................................................................................ 091
6.4 Considerações........................................................................................................ 099
CONCIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................... 102
REFERÊNCIAS............................................................................................................ 107
ANEXOS........................................................................................................................ 109
INTRODUÇÃO
Neste início de século, uma questão permeia todas as análises e estudos referentes ao
nosso tempo e suas vicissitudes: a questão ambiental. Vivemos em uma época, em que as
conseqüências das ações da humanidade no ambiente, no qual interage e existe, vêm se
mostrando catastróficas. Este fato, o de perceber que todas as práticas provocam no ambiente
uma modificação e que estas modificações afetam a humanidade de forma direta, fez com que
surgissem novas formas de olhar a existência humana e diferentes maneiras de tratar o nosso
modo de vida e suas implicações, mediatas e imediatas.
Ocorre que, estes diferentes modos de percepção das conseqüências de nosso modo
de vida, não impedem que a humanidade continue a buscar abastecer suas necessidades,
estando estas diretamente ligadas à nossa civilização e suas demandas por produtos acabados
e respectivas matérias primas. Um exemplo desta constatação, diz respeito ao abastecimento
de papel e celulose, produto e matéria-prima tão presentes em nosso cotidiano. Este trabalho,
por exemplo, embora escrito em um computador, foi finalmente impresso em folhas de papel,
reciclado, é verdade. Nossos livros, nossas avaliações acadêmicas, diversas embalagens,
filtros de café, enfim, uma enormidade de produtos de uso diário, têm por origem a celulose,
principalmente a celulose de fibra curta oriunda do eucalipto.
No início da primeira década do século XXI, a indústria de celulose voltou seus
olhos para o pampa, não somente para sua porção brasileira, mas também, uruguaia e
argentina. A demanda mundial cresce, e a região apresenta uma série de vantagens logísticas,
climáticas e de solo; que a tornam um dos melhores lugares do mundo para a produção da
matéria-prima (cavacos de madeira) e a transformação desta, em um produto de grande
aceitação no mercado (celulose branqueada). Este produto semi-acabado, será transformado
em papel (para impressão, embalagens, filtros, etc.) e atenderá parte da demanda mundial,
que, grande parte da produção destina-se ao mercado externo.
Até data recente, a maior parte da produção de matéria-prima para a indústria de
celulose, ocorria nos países do hemisfério norte. Os conflitos entre ambientalistas norte-
americanos e europeus e empresários do ramo papeleiro, aliado aos custos cada vez mais altos
para a produção de celulose nos países desenvolvidos, deslocou o foco destas indústrias para
o hemisfério sul. Além daqueles fatos, as terras mais baratas, o crescimento mais rápido das
árvores, clima favorável e a mão-de-obra pouco remunerada, fizeram da África do Sul e da
América Latina áreas de grande interesse para o investimento celulósico.
Para permitir uma produção com custos reduzidos, faz-se necessário aproximar a
produção da matéria-prima, seu beneficiamento e transformação nas fábricas. A matéria-
prima, tem por origem, as plantações de eucalipto que, nos países do Cone Sul, após sete anos
de cultura, serão convertidas em cavacos de madeira e transformadas em pasta de celulose nas
fábricas. Este processo, denominado ciclo produtivo da celulose, produz uma série de eventos
que resultam em um grande número de implicações no ambiente, impactos que, embora
estudados, ainda não permitem a obtenção de uma conclusão consistente quanto às suas
conseqüências a curto, médio e longo prazo. Esta escassez de conclusões origina-se do fato de
que, neste espaço geográfico, o pampa, o ciclo produtivo da celulose, possui características
próprias e exclusivas, que demandam um espaço de tempo consideravelmente grande para
serem apreendidas e permitirem uma compreensão dos elementos envolvidos e seus
comportamentos determinados pela ação do referido ciclo produtivo. Trata-se de um bioma
ainda não plenamente compreendido e que necessita de maiores estudos para possibilitar uma
conclusão mais aprofundada e satisfatória das implicações decorrentes de sua exploração para
o cultivo de árvores.
Desta realidade de mercado derivam várias e diversas compreensões acerca das
conseqüências da instalação do ciclo produtivo da pasta de celulose em uma região geográfica
como o pampa. Estas compreensões acabam por definir uma linha demarcatória principal que,
posiciona de um lado as opiniões favoráveis e de outro, as contrárias à implantação de tal
ciclo de produção. Esta separação dual entre as posições faz surgir um embate no seio da
sociedade, que permite ao observador mais atento, identificar as razões sustentadas por cada
grupo, e como este grupo, defende suas idéias em busca de fazer com que sua posição frente
ao tema, torne-se a posição aceita pela maioria da comunidade envolvida.
Isto é, o que ocorreu nas cidades da denominada “zona sul do Estado do Rio Grande
do Sul” de 2004 a 2007, quando uma grande empresa do setor de celulose e papel
(Votorantim Celulose e Papel) divulgou seu interesse de desenvolver nesta região do Brasil o
denominado “Projeto Losango”. Este projeto, de maneira simplificada, pretende produzir
pasta de celulose a partir de cavacos de madeira obtidos de árvores de eucalipto cultivadas em
propriedades, próprias e particulares, nas cidades incluídas no seu recorte geográfico.
Visando abastecer uma unidade de produção ainda não estabelecida, a empresa pretende
ocupar 200 mil hectares com uma produção de 4,2 milhões de metros cúbicos de madeira até
2012.
Este cenário de incertezas e divisão de opiniões propiciou a oportunidade para o
desenvolvimento desta pesquisa de mestrado, que se justifica, em primeiro lugar, por tratar de
um tema atual e cujas conseqüências se expressarão na vida cotidiana das comunidades
estudadas por período de tempo não estimado, mas que por certo, ultrapassará duas décadas.
1
Os estudos já existentes dão-se nas áreas da economia, geografia e ecologia, fazendo-se notar
a ausência de trabalhos nas áreas da ciência política e sociologia.
Em segundo lugar, a pesquisa se justifica por contribuir para uma melhor
compreensão da relação entre as forças da sociedade e sua representatividade no contexto
geral das comunidades estudadas. Em terceiro lugar, tratando-se de uma justificativa de
cunho metodológico, esta pesquisa busca enfocar o período inicial da instalação do ciclo
produtivo da celulose nas cidades incluídas no recorte geográfico a partir da ótica emprestada
pela análise dos discursos sustentados nos principais episódios, que se desenrolaram nos anos
incluídos no recorte temporal deste trabalho. Na busca dos sentidos dados por estes discursos,
a análise do discurso é uma metodologia útil para entender a relação destes sentidos com os
demais, como são construídos estes sentidos e como os mesmos objetivam obter hegemonia.
Aceitando a premissa de que as justificativas apresentadas são suficientes, faz-se
agora indispensável uma breve apresentação do problema que será enfrentado. A questão da
silvicultura será analisada nesta pesquisa tendo como recorte espacial as cidades de Arroio
Grande, Herval e Pelotas e definindo como recorte temporal o período compreendido entre
janeiro de 2004 e dezembro de 2007. No referido período nota-se claramente, nas cidades
onde se desenvolveu a pesquisa, a existência de dois pontos de fixação discursiva em torno
dos quais se constituíram cadeias articulatórias. Estas cadeias se caracterizam pelo
antagonismo frente ao tema silvicultura, sendo uma favorável e outra contrária ao
estabelecimento da cadeia produtiva da celulose. Temos, assim, a constituição de dois
discursos privilegiados que, condensam demandas sociais de grupos dispersos entre si, em
uma situação na qual a pretensão de uma grande corporação em explorar os recursos naturais
e econômicos dos municípios, constitui-se como corte antagônico, a separar as articulações
dos momentos em duas grandes cadeias equivalenciais.
Nesta disputa, tornou-se evidente a capacidade de a empresa Votorantin Celulose e
Papel (VCP) constituir um discurso que se pretende hegemônico na medida em que articula
outros discursos que, sem este ponto de fixação, ou nodal, não teriam intenção ou capacidade
de se articular entre si. Esta lógica discursiva permite ver com certa clareza a capacidade do
discurso “desenvolvimentista”, de simplificar as questões envolvidas ao cultivo do eucalipto e
1
O ciclo produtivo do eucalipto transcorre em sete anos, desde seu plantio até seu corte. A empresa informa que
em cada lavoura serão utilizados dois períodos, totalizando quatorze anos.
a cadeia produtiva de celulose, ao ponto de encontrar equivalências em demandas tão
diferentes, como será demonstrado no decorrer do trabalho.
Por outro lado, a constituição da cadeia equivalencial que se antagoniza ao discurso
“desenvolvimentista”, aqui denominada de “ambientalista”, também teve a capacidade de
articular elementos na lógica da equivalência. Equivalência esta, aparentemente representada
pela necessidade de preservar o ambiente para as presentes e futuras gerações, além de buscar
impedir o grande impacto negativo na sociedade e na economia que derivariam da
implementação das atividades econômicas ligadas ao ciclo produtivo da celulose, nos moldes
pretendidos pelo empreendimento da VCP.
Deste antagonismo, entre dois discursos e suas referentes cadeias equivalenciais,
surge o problema de pesquisa representado pelos questionamentos: 1) Como a silvicultura é
significada por cada uma das articulações discursivas, no recorte temporal 2004-2007 ? 2)
Qual é o sentido de desenvolvimento e de sustentabilidade fixado por cada uma das
articulações na mesma demarcação temporal 2004-2007 ? Responder a estas questões
constitui-se no objetivo central deste trabalho de pesquisa.
A hipótese central foi construída a partir da constatação da constituição de um
enfrentamento de sentidos e de posicionamentos políticos de grupos sociais, em torno da
questão da implementação do cultivo do eucalipto em propriedades rurais localizadas nos
Municípios de Pelotas, Herval e Arroio Grande.
De um lado, compondo uma cadeia equivalencial que gravita no apoio à silvicultura,
temos produtores rurais, sindicalistas (Força Sindical), trabalhadores desempregados,
políticos (prefeitos, vereadores e deputados) e parte da população destes Municípios, que
acreditam ser este cultivo, uma alternativa viável para o crescimento econômico da região.
Do outro lado, compondo a cadeia equivalencial que tem como referência a
discordância para com a silvicultura, estão os movimentos ambientalistas, compostos
principalmente por ONGs e organizações civis, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST), o Sindicato dos Professores do Rio Grande do Sul (CPERS), arrozeiros ,
políticos (vereadores e deputados majoritariamente de partidos políticos como o PT) e parte
da população preocupada com o equilíbrio do ambiente local.
Na exposição à sociedade dos motivos, que justificam os posicionamentos,
favoráveis ou contrários ao cultivo do eucalipto, são apresentadas razões genéricas. O grupo
que apóia a silvicultura apresenta o “desenvolvimento” da região como a explicação de seu
apoio à causa. o posicionamento oposto, tem como bandeira a “defesa do meio ambiente
ecologicamente equilibrado”.
Tem-se, portanto, como hipótese, a possibilidade de o primeiro grupo (denominado
aqui por “desenvolvimentistas”) unir-se em torno da idéia do próprio interesse, das seguintes
formas:
a) a exploração da terra na forma de monocultivo do eucalipto propicia, segundo a
empresa de celulose, excelentes ganhos e facilidade no manejo da cultura. Não
necessidade de mão-de-obra especializada e os insumos têm seu custo mitigado pela empresa
Votorantim Celulose e Papel. A mesma corporação assegura também a compra de toda a
produção;
b) a obtenção de postos de trabalho, ainda que temporário, apresenta-se como
alternativa de ocupação remunerada para parcela significativa da população que, ora se
encontra sem emprego. Os direitos trabalhistas e as condições de trabalho não são
consideradas como pontos importantes a serem levados em conta;
c) os políticos pretendem angariar apoio eleitoral e econômico dos produtores
rurais e da indústria papeleira. Esta alternativa parecia bastante plausível diante do horizonte
eleitoral, que se apresentava no período compreendido pelo recorte temporal da presente
pesquisa, que compreende o pleito eleitoral de 2008 com a disputa pelos cargos de Vereador e
Prefeito;
d) constitui-se uma cadeia equivalencial, onde o interesse particular, justifica as
citadas relações. O lucro e o ganho individual apresentam-se como força hegemonizante neste
sistema discursivo “desenvolvimentista”.
Diante desta perspectiva, a silvicultura toma o significado de ganho econômico e/ou
político no mesmo passo em que a idéia de crescimento econômico assume o significado de
desenvolvimento. Esta preocupação com o aspecto econômico acaba por justificar todas as
conseqüências implicadas em sua implementação, incluindo-se a questão do impacto
ambiental negativo e suas conseqüências sociais.
De modo semelhante, construiu-se a hipótese da constituição do sistema discursivo
contrário à silvicultura. Este, contrário ao cultivo de eucalipto, funda o seu discurso em três
pontos:
a) a instalação deste ciclo produtivo concentraria ainda mais o capital nas cidades
envolvidas e beneficiaria somente os grandes latifundiários e a empresa de celulose;
b) a monocultura facilitaria a ampliação dos latifúndios e enfraqueceria a agricultura
familiar, de especial interesse ao MST;
c) a implementação deste ciclo produtivo favoreceria, por algum tempo, os políticos
que apóiam a indústria papeleira, seja economicamente, seja pelo ganho político junto às
comunidades inicialmente “beneficiadas” com os trabalhos temporários.
Assim, a silvicultura toma como significado a concentração de renda e de prática
produtiva e econômica fomentada pelo grande capital, o que altera o perfil econômico dos
municípios atingidos, aumentando a desigualdade social. o “desenvolvimento” é
compreendido, pelos momentos equivalenciados nesta cadeia, como um fator que deve incluir
a redução da desigualdade social e o incentivo da permanência do pequeno agricultor na terra
produtiva. Se faz indispensável, para tanto, estreitar o vínculo do produtor com a terra como
fornecedora do seu sustento, utilizando-a de modo sustentável.
Na análise do discurso contrário ao cultivo da monocultura do eucalipto, foi
possível construir três “tipos” perceptivos, nos quais os momentos sustentam posições que se
equivalem em torno do discurso hegemônico aqui denominado “ambientalista”. São eles: os
ambientalistas “político-partidários”; os ambientalistas “político-econômicos” e os
ambientalistas “político-sócio-ambientais”:
No campo oposto, compondo os “tipos” perceptivos “desenvolvimentistas”, ou
seja, favoráveis ao cultivo do eucalipto e do ciclo produtivo da celulose, temos “proprietários
rurais”, empresários”, “políticos” e “parte da população com expectativa de geração de
postos de trabalho”.
Assim, de maneira inicial, a hipótese central desta dissertação de mestrado, afirma
que, a silvicultura tem seu sentido fixado pelo discurso “desenvolvimentista” como uma
oportunidade ímpar para o crescimento econômico dos Municípios, o que resultaria em
geração de trabalho e renda conjuntamente com uma maior circulação de dinheiro. Esta
conjugação de fatores redundaria em um ganho financeiro para todos os munícipes.
Em relação ao significante “desenvolvimento”, o presente discurso lhe atribui o
significado de crescimento econômico, ou seja, a sustentabilidade e a preocupação ambiental
são relegados a um patamar inferior na escala de interesses destes elementos-momento
favoráveis ao ciclo produtivo da celulose, onde a preocupação econômico-finaceira ocupa a
posição de destaque com primazia.
no discurso “ambientalista”, a silvicultura tem seu sentido fixado a partir da
afirmação de que, os impactos resultantes de sua implantação redundam em conseqüências
danosas para os municípios e sua população. A alteração da matriz produtiva, o incentivo ao
latifúndio, a concentração da renda e a alteração do ambiente são apontados como resultados
inafastáveis da implantação da silvicultura.
No que tange ao sentido dado ao “desenvolvimento”, esta cadeia discursiva lhe
atribui um significado mais amplo do que a cadeia discursiva antagônica. Neste discurso, o
“desenvolvimento” tem seu sentido fixado a partir de melhor qualidade de vida,
responsabilidade social, adequação na distribuição de terras e renda, além de uma
racionalização no uso dos recursos naturais ao modelo sustentável. Nesta forma de fixação de
sentido, o “desenvolvimento” não é considerado como um dos resultados da implantação do
ciclo produtivo da celulose de eucalipto pelos “ambientalistas”.
Assim, a hipótese central pode ser resumida da seguinte forma. O discurso
“ambientalista”, significa a silvicultura como uma oportunidade para a concentração de renda
e a dependência econômica a uma única fonte de produção de riqueza. Ao mesmo tempo, fixa
o significado do significante “desenvolvimento” como melhora na qualidade de vida,
responsabilidade social, distribuição de terras e sustentabilidade. Já o discurso
“desenvolvimentista”, significa a silvicultura como algo intimamente ligado ao aspecto
econômico, com conseqüências sociais colaterais. O incremento nas economias locais, a
geração de impostos e postos de trabalho são apontadas como conseqüências bem-vindas em
comunidades tão carentes. Quanto ao significante “desenvolvimento”, a este é fixado um
significado de crescimento econômico, sem o caráter da sustentabilidade.
Quanto ao referencial metodológico, a presente pesquisa foi realizada a partir dos
discursos dos momentos mais destacados em cada uma das duas cadeias equivalenciais
constituídas, tendo por ponto de partida, o corte antagônico representado pela instalação do
ciclo produtivo da celulose de eucalipto nos municípios do Estado do Rio Grande do Sul,
compreendidos na área de abrangência do Projeto Losango da empresa Votorantim. O suporte
metodológico e teórico é dado pela teoria do discurso desenvolvida por Ernesto Laclau e
Chantal Mouffe, cujas categorias, indispensáveis para a presente pesquisa, serão discutidas
em capítulo destinado especificamente para esta finalidade.
No que tange à escolha do corpus discursivo utilizado neste trabalho, cabe
destacar que o critério de seleção levou em conta a utilidade e a adequação de seu uso para
obtenção das informações necessárias para alcançar os objetivos e confirmação, ou não, da
hipótese construída para a realização desta dissertação de mestrado. Para tal, no processo de
seleção, foi levada em conta a utilidade e adequação do material no sentido de propiciar
elementos para a análise dos discursos e suas construções. Em uma primeira etapa, foram
selecionados textos e gravações de representantes dos elementos-momento integrantes das
cadeias articulatórias, analisadas como importantes, para este trabalho. Esta seleção levou em
conta a penetração na sociedade do meio de comunicação e a importância da manifestação na
busca do objetivo da cadeia discursiva que representava. Aqui, na seleção dos textos e
gravações vinculados na imprensa, foram utilizados empresas de comunicação locais - ou
seja, das cidades de Pelotas, Herval e Arroio Grande e estaduais como é o caso dos meios
de comunicação integrantes do Grupo RBS.
Em uma segunda etapa, foram colhidos depoimentos e manifestações obtidas em
eventos públicos, tais como audiências públicas, seminários e palestras, também com as falas
de pessoas envolvidas nos embates discursivos ocorridos durante o período compreendido
pelo recorte teórico desta dissertação.
Na terceira etapa, foram aplicados questionários, previamente elaborados, a
pessoas cujas funções ou ocupações relacionavam-se com as cadeias discursivas. Entre estas,
encontram-se: Vereadores, Prefeitos, Promotores de Justiça, representantes de movimentos
sociais e produtores rurais. Tornou-se possível, assim, a obtenção de manifestações mais
dirigidas e objetivas, de forma a permitir uma análise mais centrada de cada um dos
elementos-momento, constituintes tanto da cadeia articulatória “desenvolvimentista”, quanto
da “ambientalista”.
A presente dissertação pode ser dividida em três partes distintas. A primeira,
apresenta a introdução e os elementos teóricos utilizados na construção da análise dos
discursos referentes à silvicultura. A segunda, se constitui em um capítulo atinente ao
histórico da indústria de celulose no Brasil, importante para a compreensão do
desenvolvimento desta atividade e na evolução de seu perfil e interesses. Na terceira e última
parte, três capítulos apresentam os “tipos” de percepção utilizados para agrupar os elementos
discursivos “ambientalista” e “desenvolvimentista” e os embates discursivos que permitiram
uma melhor compreensão das construções articulatórias que compõem cada uma das cadeias
discursivas. A esta se soma a conclusão, que se constitui em um breve apanhado de todo o
trabalho e na demonstração da confirmação da hipótese apresentada.
Desta forma organizada, a presente dissertação apresenta em seu primeiro
capítulo um apanhado teórico indispensável para uma boa compreensão do texto. Nesta, são
apresentadas noções de elementos teóricos constitutivos da teoria do discurso (apresentada
por Ernesto Laclau e Chantal Mouffe), indispensáveis para a compreensão do marco teórico
principal da presente pesquisa. Ainda compondo este primeiro capítulo, temos elementos
conceituais da biologia e da ecologia, fundamentais para o entendimento de construções
discursivas analisadas. Por fim, neste primeiro capítulo, fechando o grupo de três bases
utilizadas ciências biológicas, sociais e jurídicas são apresentadas noções de conceitos
jurídicos que completam a base necessária para a boa compreensão do trabalho de dissertação
aqui apresentado.
O segundo capítulo constitui-se em um apanhado histórico da indústria de
celulose no Brasil. De seu surgimento nas décadas de trinta e quarenta do século XX,
passando por seu desenvolvimento nas décadas de setenta e oitenta, até seu ápice na década
de noventa do mesmo culo. O capítulo finda com uma análise desta indústria no início do
século XXI e seus horizontes para o futuro próximo. Este capítulo permite um melhor
entendimento da visão desta indústria e seus objetivos, auxiliando a uma reflexão sobre a
importância deste mercado para a economia nacional.
A construção de “tipos de percepção” dos elementos-momento que constituem a
cadeia equivalencial “ambientalista”: é disto que se ocupa o terceiro capítulo. A construção
dos “tipos” “político-partidário”, “político-econômico” e “político-sócio-ambiental” é um
artifício analítico que permite uma melhor compreensão das diferenças entre os elementos-
momento que constituem a cadeia discursiva “ambientalista”, bem como, auxilia na melhor
percepção das ligações equivalenciais, que estabelecem os vínculos discursivos nesta cadeia
de equivalências.
Neste mesmo sentido, o quarto capítulo é composto pela construção dos “tipos”
perceptivos “desenvolvimentistas”. Da mesma forma que os “tipos” perceptivos do capítulo
terceiro, estes também são um artifício analítico que busca auxiliar na compreensão das
diferenças e semelhanças entre os elementos-momento. No referido quarto capítulo, os
“tipos” são “empresários”, “proprietários de terras”, “políticos” e “parte da população com
expectativa de colocação no mercado de trabalho”.
o quinto capítulo busca realizar uma análise dos embates discursivos
oportunizados pela mídia, debates, audiências públicas e espaços institucionais. Trata-se de
analisar estas oportunidades privilegiadas onde a confrontação das idéias e posicionamentos
sustentados pelos elementos-momento permitiu uma análise mais acurada dos discursos,
permitindo testar a hipótese construída por esta dissertação em relação às cadeias discursivas
analisadas.
O último capítulo fecha esta dissertação com as conclusões e a elaboração da
verificação da hipótese, através da análise conjunta de todos os elementos-momento e suas
respectivas cadeias articulatórias, mediante o artifício analítico dos “tipos perceptivos”. São
estabelecidos os pontos de ligação entre estes elementos e desenvolvida a idéia da
constituição das cadeias discursivas, demonstrando, por fim, a satisfação dos objetivos gerais
e específicos do trabalho de dissertação.
Capítulo II
A Teoria utilizada e seus conceitos básicos:
O presente capítulo, pretende delimitar e estabelecer os pressupostos teóricos e
epistemológicos que serão apropriados na composição da dissertação de mestrado. Desta
forma, destaca-se a importância de apresentar as categorias de análise que serão utilizadas no
presente trabalho de pesquisa, desde noções apropriadas da teoria do discurso de Laclau e
Mouffe até noções das ciências naturais, como da biologia e ecologia, além das noções de
termos jurídicos utilizados pela legislação ambiental brasileira. No mesmo capítulo, será
apresentada a maneira como serão relacionadas as teorias oriundas das ciências sociais -
direito e sociologia - com conceitos, cuja origem, está nas ciências naturais - biologia e
ecologia e destas, com a questão da silvicultura nas cidades de Pelotas, Arroio grande e
Herval.
A humanidade vem enfrentando, há algum tempo, uma dicotomia que, de maneira
simplificada, confronta posicionamentos quanto à forma de exploração das riquezas naturais e
da apropriação da natureza pelo ser humano. Tal dualismo, pode ser representado pelos
posicionamentos desenvolvimentista e ambientalista, no que tange a base teórica que funda a
forma de analisar a questão da apropriação da natureza e da exploração das riquezas. No
Estado do Rio Grande do Sul, no início do século XXI, este dualismo tem se feito notar na
questão que envolve a cultura de árvores exóticas, como é o caso do eucalipto, principalmente
nas áreas circunscritas ao bioma pampa. Ocupando posicionamentos antagônicos quanto à
questão temos dois discursos, um favorável e outro contrário à silvicultura nos modos
propostos pela empresa interessada em desenvolver tal cultura.
Assim como, a teoria do discurso será utilizada para a fundamentação teórica,
também será utilizada como modelo para as análises empíricas que serão desenvolvidas nos
capítulos que se seguem. Destarte, torna-se imperativo discorrer, ainda o presente capítulo,
sobre a origem e as principais noções que constituem esta teoria de Laclau e Mouffe.
2.1 Compreendendo a lógica discursiva
Na teoria do discurso de Laclau e Mouffe, principal elemento na fundamentação
teórica da presente dissertação, a compreensão da lógica discursiva se faz imprescindível,
tanto no aspecto da materialidade quanto do funcionamento da construção do discurso. A
presente seção destina-se a discorrer sobre a constituição discursiva, dado o fato de ser ela
elementar para o entendimento de toda relação hegemônica na teoria.
2.1.1 Da identidade
O sentido de identidade apropriado pela teoria do discurso é de suma importância,
pois, segundo Laclau e Mouffe (1985), um discurso representa o momento no qual
identidades se modificam e se articulam entre si. Vem daí a necessidade de caracterizar o que
se está denominando de “identidade”. Em primeiro lugar é importante destacar que a idéia de
identidade infere a necessidade da diferença, ou seja, se não houver diferença estaremos
tratando do mesmo, pois, algo constitui sua identidade a partir da existência de outra
identidade distinta. De outra forma, no exemplo elementar, “A” o é, pois não é “B”, e “B”,
por sua vez, não é “A”; em razão de se diferenciar de “A” como também dos demais
elementos aos quais se compara, como “A” também se difere.
Atraindo a questão da identidade para o plano do sujeito, afirma-se que, este sujeito,
pode assumir diversas identidades. As identidades, que constituem o sujeito, serão
determinadas pelas posições ocupadas por aquele. Um indivíduo pode, em uma mesma
contingência, assumir várias identidades simultâneas conforme as posições que ocupa. É
possível um ser humano do sexo masculino ser pesquisador, mestiço, heterossexual e ateu.
Esta diversidade identitária será mais ou menos importante dependendo da luta política na
qual este sujeito está inserido. São as dimensões que a constituem na contingência de sua
individualidade. E, nesta contingência, ou seja, num dado lapso temporal, as várias
identidades lhe são constitutivas, o que não impede de forma alguma que, em um outro
momento, outras diferentes lutas políticas lhe confiram identidades diversas que venham se
somar as anteriormente mencionadas.
Conclui-se, portanto, que, por ser portador de várias identidades em potencial, o
sujeito jamais alcançará sua plenitude, de outro modo, nunca estará completamente
constituído. A partir da concepção de identidade, que afirma a incompletude perene do
sujeito, necessitamos buscar uma explicação para esta situação. Esta explicação, ou resposta
para a pergunta: “como se explica tal impossibilidade de completude?”, pode ser encontrada
na noção discurso formulada por Laclau e Mouffe (1985).
2.1.2 Do discurso
Existem várias concepções de discurso e de formação discursiva sustentadas por
diferentes autores, filósofos e pensadores. Por tal razão torna-se imperiosa a necessidade de
caracterizar melhor a noção de discurso utilizada por Laclau e Mouffe (1985). De pronto
podemos destacar o caráter material de um discurso, ou seja, na teoria do discurso aqui
discutida não qualquer distinção entre a prática e o discurso. De outro modo, não existe
aqui a noção que distingue o que é dito do que é feito, entre a práxise a verbis”, entre o
ideal e o real. Para Laclau, discurso é “todo o tipo de ligação entre palavras e ações que forma
totalidades significativas” (LACLAU, 2000a, p.10). Ainda no sentido de reforçar o
entendimento de que o discurso envolve não somente elementos da linguagem, os autores nos
ensinam que:
(...) os elementos lingüísticos e não lingüísticos não estão meramente justapostos, mas
constituem-se num sistema de posições diferencial e estruturado que é o discurso
(LACLAU E MOUFFE, 1985, p. 118).
Ainda neste sentido, os autores reafirmam o sentido fundamental desta materialidade
do discurso, ao rechaçarem concepções diversas da constituição discursiva, como a
concepção lingüística de Pêcheux,
2
e considerarem que não existe no social algo que, não
esteja sobredeterminado.
3
Em outra expressão, está constituído em uma ordem simbólica todo
o universo de objetos, tudo o que é nomeado, a universalidade que se conhece e se concebe.
(...) a) todo objeto está constituído como objeto de discurso, na medida em que este não é
dado fora da emergência da constituição discursiva; e b) que qualquer distinção entre o que
são usualmente chamados de aspectos lingüísticos e comportamentais de uma prática
social, ou é uma distinção incorreta, ou tem lugar como uma diferenciação com a produção
social de sentido, a qual está estruturada sob a forma de totalidades discursivas (LACLAU
e MOUFFE, 1985, p.107).
Passaremos, a partir do presente ponto, para a discussão do sentido de articulação na
teoria do discurso. Na presente teoria, articulação é toda prática que tem como resultado a
modificação das identidades dos elementos através do estabelecimento da relação entre eles.
Em uma articulação, o elemento deixa esta condição e assume a condição de momento
diferencial. Por sua vez, a articulação de momentos diferenciais tem por resultado necessário
a mudança de suas características que lhe eram próprias anteriormente à prática articulatória.
Para os autores:
No contexto dessa discussão, chamaremos articulação qualquer prática que estabeleça uma
relação entre elementos tal que suas identidades sejam modificadas como um resultado da
prática articulatória. A totalidade estruturada resultante da prática articulatória chamaremos
de discurso. As posições diferenciais, na medida em que estas apareçam articuladas em um
discurso, chamaremos de momentos. Em contraste, denominamos elemento qualquer
diferença que não esteja discursivamente articulada. (LACLAU e MOUFFE, 1985, p.105).
2
Para o autor, são noções implicadas no espaço discursivo: a materialidade (com sua natureza histórica e
lingüística), a estabilidade (nem sempre logicamente estabilizada), a ordem (contrapartida histórico-semântica
da organização) e o acontecimento (exterioridade que não está fora e é a ruptura com os sentidos estabelecidos.
(PÊCHEUX, 1990).
3
A noção de sobredeterminação parte da idéia de que tudo no social está sobredeterminado, ou seja, é uma
ordem simbólica que constitui o social. Para Althusser, é a partir da ideologia que se constitui esta ordem
simbólica. Ideologia é “(...) uma representação da relação imaginária dos indivíduos com suas condições reais de
existência” (ALTHUSSER, 1985, p. 85).
O resultado da prática articulatória, como vimos nas palavras dos autores, é o
discurso, embora o resultado não seja permanente em função da presença das categorias
filosóficas da contingência e da precariedade que são adotadas por Laclau e Mouffe e que
serão discutidas posteriormente.
Para destacar a característica da prática articulatória de construir novos sentidos de
forma contínua, devemos lembrar que, a transformação de elementos em momentos
caracteriza-se por uma incompletude
4
e, por conseqüência, a articulação nunca alcança um
sentido último, não é ela um complexo dado e necessário. Na seqüência lógica, temos que, a
estrutura discursiva fixa sentidos parciais permitindo que as diferenças sofram modificações
em suas relações. Como resultado, o discurso, ao unir as identidades, faz com que deixem em
suspenso seus sentidos prévios na relação articulatória estabelecida, enquanto assumem a
condição de momentos diferenciais na relação articulatória. Porém, as identidades se mantêm
como elementos diferentes entre si e diferentes da articulação. A condição de diferença é o
que permite que a prática articulatória se a partir das mesmas diferenças que se unem, de
forma precária e contingente, a um ponto nodal que possui a característica de expressar um
sentido comum a elas. A diferença, em suma, é o que permite a existência de uma articulação,
pois, como já visto anteriormente, não havendo diferença teríamos não uma relação de
articulação, mas sim, uma relação de simples igualdade.
2.1.3 Do ponto nodal
Na lógica da teoria do discurso, aqui abordada, a categoria de ponto nodal é de
importância fundamental para a prática articulatória. Tendo origem na psicanálise de Jacques
Lacan e apropriada por Laclau e Mouffe (1985), caracteriza-se como ponto privilegiado na
constituição discursiva por fixar o sentido da articulação, sem deixar de levar em conta sua
característica de precariedade e contingência. Segundo os autores, no sentido dado por Lacan,
os pontos discursivos privilegiados, ou pontos nodais, são:
(...) significantes privilegiados que fixam o sentido de uma cadeia significativa. Esta
limitação da produtividade da cadeia significativa estabelece as posições que fazem a
predicação possível – um discurso incapaz de gerar qualquer fixação de sentido é o
discurso do psicótico. (LACLAU e MOUFFE, 1985, p.112).
4
“(...) a transformação de elementos em momentos nunca é completa” (LACLAU e MOUFFE, 1985, p.121).
Assim, segundo Laclau, um discurso poderá ter a capacidade de reunir demandas, de
maneira contingenciada, que mesmo sem ter qualquer relação direta entre si, como também
em relação ao próprio discurso, mantêm precariamente uma relação de equivalência que tem
seu sentido de articulação estabelecido por um ponto nodal.
2.1.4 Do antagonismo
Das noções que compõem a teoria do discurso, a noção de antagonismo – ao lado da
noção de hegemonia está contida na dupla de elementos fundamentais desta pesquisa no
que tange ao seu marco teórico. A primeira, a noção de antagonismo, nos leva ao limite do
discurso, de onde se justifica sua condição central nesta teoria. A possibilidade da articulação
e do discurso repousa na existência de limites entre um discurso e outro, como também do
discurso em relação aos demais elementos do campo da discursividade. De outra maneira, “a
lógica relacional do discurso é levada até suas últimas conseqüências sem limitação por
nenhum exterior” (LACLAU e MOUFFE, 1985, p. 110). Toda relação de articulação está
contida no próprio discurso, mesmo quando altera suas características a partir de sua relação
com outros discursos. Estes limites se relacionam diretamente com a noção de antagonismo.
A existência da impossibilidade na construção do sentido objetivo da constituição
discursiva é representada pelo antagonismo. Neste ponto, precisaremos as noções de
precariedade e contingência já utilizadas neste capítulo. A precariedade no sistema discursivo,
tem sua justificação no fato de que, os sentidos nele constituídos, tendem sempre a alteração
em razão da relação deste discurso com os demais sistemas discursivos compreendidos no
campo da discursividade.
5
A contingência se caracteriza nesta relação, na medida em que não
como prever a produção de sentidos diversos no espaço social. Tanto a contingência
quanto a precariedade do discurso, sofrem a limitação do corte antagônico, corte este, que se
coloca além dos limites deste discurso e que ao mesmo tempo é sua negação. E é este corte
antagônico que acaba por impedir a expansão de sentidos de um discurso, ao mesmo tempo
em que, impede também, a sua constituição plena. Friza-se, em tempo, que esta relação
antagônica, ocorre, tendo por ponto de partida, um “exterior constitutivo” em constante
ameaça à existência de um “interior”.
O antagonismo, ao mesmo tempo em que é a condição de impossibilidade da
constituição de um discurso, pois bloqueia a expansão de sentidos do discurso que
antagoniza, é também a condição de possibilidade do discurso antagonizado, que se
constitui sob a existência ameaçadora do discurso antagônico. Segundo Laclau “(...) é a
presença do outro que me impede de ser totalmente eu mesmo. A relação não surge de
identidades plenas, mas da impossibilidade da constituição das mesmas” (LACLAU e
MOUFFE, 1985, p. 125).
2.1.5 Da hegemonia
No presente ponto do capítulo, passamos a discutir o segundo elemento da dupla de
noções fundamentais deste trabalho, no que concerne ao seu marco teórico principal, a noção
de hegemonia: “(...) entendo por hegemonia uma relação em que um conteúdo particular
assume, em certo contexto, a função de encarnar uma plenitude ausente” (LACLAU, 2002, p.
122)
Além de estar diretamente ligada à construção de uma ordem, pois, para Laclau e
Mouffe, uma relação hegemônica é uma relação de ordem, a hegemonia também pode ser
relacionada para analisar a ausência de ordem. Mas, no sentido a ser apropriado pela
dissertação, interessa-nos o sentido de ordem hegemônica.
Quando uma identidade, de forma precária e contingente, representa múltiplos
elementos em uma relação de equivalência, estamos diante de uma relação hegemônica. Ao
contrário da “falta constitutiva”
6
de Laclau, a hegemonia busca o preenchimento da plenitude
ausente da identidade, embora seja importante frisar, que, é justamente pela existência da
falta constitutiva, que a hegemonia tem lugar. Na existência da contingência é na
precariedade que a hegemonia encontra as condições que a tornam possível. Assim, no
processo de sua constituição, uma dada ordem hegemônica, tem como ponto de partida, certo
discurso que passa a representar outros discursos ou identidades. Este discurso que centraliza
é de onde parte esta organização, é o ponto nodal que fixa significados e articula elementos
que estavam dispersos e ausentes desta cadeia articulatória. Novamente estão presentes a
precariedade e a contingência nesta fixação de sentidos. No campo discursivo, portanto, a
hegemonia é o objeto de disputa entre os discursos que nele se encontram dispersos. Fixar a
significação de um conteúdo em torno de um ponto de fixação, ou nodal, é condição para a
hegemonia. Para Laclau:
5
Campo da discursividade é o espaço no qual os discursos disputam sentidos hegemônicos (MENDONÇA,
2006, p.70).
6
A noção de falta constitutiva incorpora em si a idéia das identidades que se constituem de forma incompleta
em função, dentre outras, da sua negação própria a partir de seu corte antagônico.
A necessidade e a objetividade do social dependem do estabelecimento de uma hegemonia
estável e os períodos de crise orgânica são aqueles em que se debilitam as articulações
hegemônicas básicas (...) (LACLAU, 1993, p. 45).
Longe de ser apenas utilizada como ferramenta ou categoria, Laclau chama-nos a
atenção para a idéia de que, as relações hegemônicas definem a própria relação política, ou
seja, estas relações desencadeiam efeitos políticos em nossas vidas.
7
Por fim, podemos afirmar que, na lógica articulatória da hegemonia, um discurso que
consegue atrair para sua órbita outros discursos que em princípio não se articulavam entre si,
constituindo ele mesmo em um ponto de fixação, é um discurso que alcançou o status de
hegemônico. Mas esta condição não confere a este discurso, que ora atingiu a hegemonia, a
capacidade de livrar-se dos limites de sua enunciação, nem também das características de
precariedade e de contingência da hegemonia.
Além destes elementos teóricos, que serão apropriados na dissertação, oriundos da
teoria do discurso de Ernesto Laclau e Chantal Mouffe, outros elementos teóricos serão
indispensáveis para o enfrentamento do problema proposto. Por abranger assuntos relativos
ao conflito sócio-ambiental concernente à questão da silvicultura, alguns conceitos e noções
da área das ciências biológicas serão também apropriados. Passamos, a discuti-los.
2.2 Conceitos das Ciências Biológicas
Neste ponto do capítulo, destinado a abordar o referencial teórico a ser utilizado
nesta dissertação de mestrado, após enfrentar as noções próprias da teoria do discurso de
Laclau e Mouffe, faz-se necessário discutir e abordar algumas noções próprias às áreas da
ecologia e da biologia, sem as quais muitos dos enfoques pretendidos por esta dissertação
restariam incompletos e até mesmo incompreensíveis. Por tratar-se de termos muitas vezes
utilizados de forma inapropriada e equivocada, é de suma importância estabelecer um liame
entre o conceito e a linha teórica que lhe atribui o significado. Isto em razão de que nas
ciências biológicas, como nas sociais, é comum um determinado termo adquirir significados
diversos. É de ressaltar, em tempo, que muitos conceitos são comuns à biologia e à ecologia,
já que a segunda, deriva da primeira.
7
Ernesto Laclau aponta quatro condições de hegemonia: a desigualdade de poder está constituída; existe
hegemonia somente com a supressão da dicotomia universalidade/particularidade; os significantes vazios são
requeridos em uma relação hegemônica; é no terreno da generalização das relações de representação como
elemento condicional para a constituição de uma ordem social que a hegemonia se expande. (LACLAU, 1998).
2.2.1 Da Ecologia
2.2.1.1 Conceito e histórico
Da afirmação pode-se concluir que, a ecologia pretende sua utilidade no estudo do
lugar no qual habitamos com especial atenção às relações estabelecidas entre os organismos
neste ambiente. Em razão da concepção, o ser humano em sua história, sempre manteve
interesse nestas relações, seja para dominar o ambiente em que vive, seja para conhecer suas
limitações e possibilidades enquanto habitante do planeta. Não obstante, após dominar o uso
do fogo, o que coincidiu com o início da civilização, o ser humano foi gradativamente se
convencendo de que dependeria menos do ambiente natural no suprimento de suas
necessidades cotidianas, esquecendo-se de que, a dependência da natureza persiste. Por tais
razões, pode-se depreender que, a humanidade sempre utilizou e desenvolveu a ecologia
durante todo o desenvolvimento de suas civilizações.
Segundo Eugene Odum:
A palavra Ecologia deriva do grego oikos, com o sentido de “casa”, e logos, significando
“estudo”. Assim, o estudo do “ambiente da casa” inclui todos os organismos contidos nela
e todos os processos funcionais que a tornam habitável. (ODUM 1981, p.1)
A ecologia é uma ciência que, além da biologia, utiliza-se de outras ciências, como
matemática, química, física e sociologia. Assim, é uma ciência que integra ciências naturais,
exatas e sociais, uma vez que, possui um enorme potencial para aplicação nos assuntos
humanos. Tais assuntos, geralmente englobam componentes das ciências naturais e sócio-
econômico-políticos. O vocábulo “ecologia”, tem origem recente, que teve seu uso
proposto pelo biólogo alemão Ernest Haeckel, em 1869. Antes, porém, obras de Aristóteles,
Hipócrates e outros filósofos da Grécia antiga, já continham referências ao tema da ecologia,
embora os gregos não dispusessem de um termo específico para designá-lo. A ecologia
somente passou a ser considerada como um campo distinto da ciência, aproximadamente em
1900, mas foi apenas nas décadas de 70 e 80 que passou a ocupar espaço no vocabulário
comum.
Embora radicada na biologia, a ecologia ganhou notoriedade e maioridade como
disciplina integradora essencialmente nova, unindo processos físicos e biológicos e servindo
de ligação entre outras ciências naturais e sociais. Hoje, se tornou comum a disposição de
cursos universitários de graduação e pós-graduação em ecologia, além de disciplina
integrante do currículo de outros cursos diversos.
2.2.1.2 Ecossistema
Dentre os conceitos que integram a ecologia, um dos mais importantes para esta
pesquisa é o conceito de ecossistema, ou sistema ecológico. Tal conceito, pode ser definido
por qualquer unidade, ou biossistema, que abranja a totalidade de organismos que funcionam
em conjunto em uma determinada área dada, em interação com o ambiente físico. Esta
interação se de forma que um fluxo de energia seja capaz de produzir estruturas bióticas
definidas e um ciclo de materiais entre as partes vivas e abióticas. Desta forma, o
ecossistema, é unidade funcional fundamental na ecologia, incluindo organismos e ambiente
abiótico de forma que um influencie as propriedades do outro, sendo um e outro necessário a
manutenção da vida.
O termo ecossistema, teve sua propositura inicial dada pelo ecologista britânico A.
G. Tansley, em 1935, embora seja um conceito bem mais antigo, que, mesmo na mais
remota história, pode-se encontrar alusões à idéia de unidade de organismos com o ambiente.
Esta unidade recebeu denominações como “biocenose” (MOBIUS, 1877) “microcosmo”
(FORBES, 1887), “biossistema” (THIENEMANN, 1939) e corpo bionenerte”
(VERNADSKY, 1945)
8
.
2.2.1.3 Meio ambiente (na ecologia)
Por sua vez, o conceito “meio ambiente”
9
é o que constitui o conjunto dos meios
naturais ou artificiais da ecosfera, onde o homem se instalou e que este, explora e administra,
bem como o conjunto dos meios não submetidos à ação antrópica, e que são considerados
necessários à sua sobrevivência. Segundo Vieira e Weber, estes meios são caracterizados:
(...) por sua geometria; seus componentes físicos, químicos, biológicos e humanos; e pela
distribuição espacial desses componentes; pelos processos de transformação, de ação ou de
interação envolvendo esses componentes e condicionando sua mudança no espaço e no
tempo; por suas múltiplas dependências relativamente às ações humanas; e finalmente por
sua importância tendo em vista o desenvolvimento das sociedades humanas.”. (VIEIRA e
WEBER, 1996.p. 24).
Segundo a concepção evocada, o campo de pesquisas ligadas ao meio ambiente,
abrangeria o conjunto das transformações da ecosfera consideradas como capazes de influir
na manutenção das condições prévias de sobrevivência da espécie humana em relação de
8
Todos in: ODUM(1981, p. 9).
9
Embora esta expressão tenha uma boa sonoridade, não é, contudo, a mais adequada posto que envolve em si
um pleonasmo, que meio” e “ambiente” são sinônimos. “Meio” é exatamente aquilo que envolve, ou seja, o
“ambiente”.
evolução comum com outras espécies vivas. Trata-se, portanto, de um conceito
evidentemente antropocêntrico.
Uma segunda concepção, concede ao conceito um enfoque mais amplo do que a
primeira. São incluídas noções que apontam para o valor da biosfera em si, de tal forma a
permitir uma formulação como a que segue:
O meio ambiente é o conjunto de agentes físicos, químicos e biológicos e de fatores sociais
suscetíveis de produzir um efeito direto ou indireto, imediato ou a longo termo sobre seres
vivos e as atividades humanas. (VIEIRA e WEBER,1996.p. 27.)
ainda outras concepções para o conceito de meio ambiente, como é o caso do
conceito legal. As concepções legais do conceito serão abordadas no tópico destinado às
noções jurídicas a serem utilizadas na presente dissertação.
2.2.1.4 Equilíbrio ecológico
O equilíbrio ecológico é um conceito que se soma aos demais apropriados da
ecologia na dissertação em tela. Para Odum:
Equilíbrio ecológico é o estado de equilíbrio entre diversos fatores que formam um
ecossistema ou habitat, suas cadeias tróficas, vegetação, clima, microorganismos, solo, ar,
água, que pode ser desestabilizado pela ação humana, seja por poluição ambiental, por
eliminação ou introdução de espécies animais e vegetais. (ODUM, 1981 p.35).
Assim, equilíbrio ambiental, ou ecológico, não tem entre seus significados o de
permanente inalterabilidade e imutabilidade das condições que são naturais à biosfera, pois no
sentido biológico, não é o equilíbrio
10
, a condição natural de um bioma. Mas isso, não deve
nos levar à errônea conclusão de que, a desestabilização causada pela ação antrópica não se
caracterize como uma ação, via de regra, deletéria para as condições e relações naturais do
ambiente impactado. Cabe por esta razão ao ser humano, a responsabilidade de contribuir,
sempre que possível, para minorar ou, idealmente, anular os riscos ao ambiente representados
por suas ações.
10
Na natureza cada espécie suas ambições limitadas por aqueles que as devoram, pela falta de nutrição ou
pelos incômodos metereológicos. Todo paraíso terrestre funciona como uma estufa munida de um termostato:
ele oscila, em cada um de seus parâmetros, entre dois limites próximos. (FRIEDEL, 1998, p. 194).
2.2.1.5 Da sustentabilidade, do desenvolvimento e do crescimento
Estes conceitos são comumente apropriados de formas diversas, seja na ecologia
como em outras áreas do conhecimento humano. Aqui, será utilizado o conceito mais
próximo da economia ecológica, onde sustentável é algo que permite que sejam atendidas
necessidades presentes sem que, com isso, sejam colocadas em risco, ou impedido, o
atendimento de necessidades futuras. Ao passo que, o desenvolvimento estaria vinculado à
idéia de implicação de mudanças na estrutura econômica e social, de forma a preservar a
possibilidade de atendimento de necessidades de mudanças futuras. Assim, depreende-se que,
trata-se de um conceito que se difere da idéia de crescimento econômico que significa uma
expansão na escala da economia que, provavelmente, não tem condições de se sustentar
ecologicamente.
Embora o termo “desenvolvimento sustentável”
11
seja aceito pela maioria dos
ecólogos, parece-nos um conceito redundante e inapropriado. Redundante pois, todo o
desenvolvimento, no sentido aqui utilizado, compreende como condição de seu
estabelecimento a conservação de recursos e meios para atendimento de necessidades futuras.
Inapropriado em razão de que, o mais cuidadoso desenvolvimento humano acabará por,
necessariamente, implicar cerceamento do atendimento de necessidades futuras, de modo que,
em se tratando de recursos naturais, estamos diante de algo finito no tempo e em quantidade.
Pelas razões aduzidas acima, e por compreendermos que, a palavra
“desenvolvimento” detém uma forte e inafastável conotação de crescimento econômico e
modernização uniforme, utilizaremos no texto desta dissertação de mestrado, o termo
“sustentabilidade” em detrimento da expressão “desenvolvimento sustentável”.
2.2.2 Da Biologia
Dentre as ciências naturais que emprestarão seus conceitos na construção da presente
dissertação, a biologia aporta uma contribuição teórica ímpar. Em primeiro lugar, a expressão
biologia nos remete ao conhecimento (logos) da vida (bio), ou seja, uma ciência natural que
tem por escopo, a análise e a compreensão das diversas formas de vida que são organizadas
em vários reinos. A biologia, como apontado anteriormente, é uma das ciências onde a
ecologia se encontra radicada.
2.2.2.1 Bioma
Na discussão sobre a silvicultura no Estado do Rio Grande do Sul, o termo “bioma
pampa” é largamente utilizado. Assim, se justifica que, uma breve discussão sobre o termo
seja aqui elaborada. A palavra “bioma”, tem por origem a expressão “bio” do grego bios que
traz por significado “vida” e “oma” que em biologia assume o significado de sistema, de onde
se pode depreender, de forma simplista, um sistema de vida. Na definição de ODUM (1981,
p. 54) temos: “(...) um grande biossistema regional ou subcontinental caracterizado por um
tipo principal de vegetação ou outro aspecto identificador da paisagem (...)”. É exemplo de
bioma o pampa, tipo de formação campestre em planície, com raros arbustos e pequenas
árvores, onde predominam as gramíneas perenes com folhas regulares característica da parte
meridional da América do Sul, compreendendo os territórios do Rio Grande do Sul, Uruguai
e Argentina.
2.2.2.2 Entropia
O enunciado da Lei Entropia pode ser descrito a partir da constatação de que
nenhum processo que implique em transformar a energia ocorre de forma espontânea, salvo
ocorra uma degradação da energia de forma concentrada para uma forma dispersa. Assim, a
entropia (que significa “em transformação”) é uma medida de energia não disponível que
resulta das transformações, sendo utilizada também como indicativa geral da desordem
associada com a degradação da energia. O entendimento da “Segunda Lei da
Termodinâmica” tem utilidade nesta dissertação na medida em que a compreensão de
desequilíbrio ambiental é comumente equivocada. Esta Lei, aponta para a quase contínua
existência de desequilíbrio energético nos ecossistemas, ainda que, este desequilíbrio,
apresente-se em níveis baixos. ODUM (1981) nos ensina que:
“Desta forma, os ecossistemas e os organismos são sistemas termodinâmicos
abertos, fora do ponto de equilíbrio, que trocam continuamente energia e matéria com o
ambiente para diminuir a entropia interna, à medida que aumenta a entropia externa.
(1981, p. 55)
11
Em 1987 foi publicado um relatório sobre meio ambiente e sua condição no mundo denominado Relatório
Brundtland, onde encontramos a expressão “desenvolvimento sustentável” em uma de suas primeiras aparições
no meio científico. (Martinez Alier, 2007, p. 47).
2.3 Dos conceitos legais
O aspecto jurídico e legal é uma das três bases do presente trabalho, são as outras
duas as ciências naturais e as ciências sociais. Vem daí a importância da indicação e
conceituação das noções legais que serão aqui apropriadas. Basicamente as noções obtidas da
legislação, da literatura jurídica e da jurisprudência, terão por origem principal, o ramo do
direito ambiental, que por sua vez, emana do direito administrativo. Por tratar-se de um
aspecto relativamente novo no direito brasileiro, muitas das noções aqui apresentadas são
potencialmente alvo de discordâncias e discussões em razão das diferentes interpretações da
norma. As interpretações que, ora serão utilizadas, pretendem-se fiadoras de uma visão não
antropocêntrica de análise, que, o caminho que será percorrido pela pesquisa, pretende
colocar a biosfera, compreendido aí o ser humano, como elemento central de justificação.
2.3.1 Meio ambiente (na legislação)
No direito positivo brasileiro, a conceituação de “meio ambiente” não se encontra
inculcada na Constituição Federal de 1988, embora utilize a expressão em seu texto por
repetidas vezes
12
sendo a primeira constituição brasileira a utilizar “meio ambiente” em seu
corpo.
13
O conceito, no Brasil, pode ser encontrado na Lei de Política Nacional do Meio
Ambiente, em seu artigo 3º, parágrafo I, como: “o conjunto de condições, leis, influências e
interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as
suas formas”. No mesmo diploma legal, pode-se encontrar ainda que o “meio ambiente” é
considerado como “um patrimônio público
14
a ser necessariamente assegurado e protegido,
tendo em vista o uso coletivo” (artigo 2º da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente).
Assim, podemos classificar o conceito de “meio ambiente” constante da legislação
brasileira, como antropocêntrico alargado, que coloca o ser humano não como destaque,
embora permaneça a humanidade como ponto fulcral da definição. Isto se torna evidente ao
incluir a lei (no sentido de conjunto total de regras de conduta humana) como elemento
integrante do conceito. Nota-se, portanto, um avanço no sentido em que uma
preponderância da complementariedade recíproca entre o ser humano e o meio ambiente
12
É exemplo desta utilização o artigo 225, cabeça, da CF: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
13
A expressão “ecológico” foi utilizada pela primeira vez no Brasil, em um texto constitucional, na Constituição
de 1969, através da Emenda Constitucional 1 de 1969.
14
A C.F. de 1988 alterou a qualificação do bem ambiental para “bem de uso comum do povo”, assim, nem a
pessoa privada, nem a pessoa pública, pode dispor da qualidade do meio ambiente já que esta não integra a sua
disponibilidade.
sobre a ultrapassada relação de sujeição e instrumentalidade. Afastou-se, desta maneira, o
legislador da visão utilitarista que denotava importância aos elementos naturais não em razão
de sua importância, mas em razão de sua utilidade econômica como insumos para o processo
produtivo.
2.3.2 Princípios do Direito Ambiental
No mundo do direito, uma diferenciação substancial entre regras e princípios. As
primeiras, têm por característica, um grau de abstração relativamente reduzido e uma maior
especificidade, os princípios, têm como característica singular, uma generalidade, ou seja,
possuem um maior grau de abstração. Além desta, outra diferença marcante reside no fato de
os princípios constituírem as bases do sistema jurídico, de onde advém a sua função
fundamentadora da ordem jurídica, são os princípios, nas palavras de Paulo Bonavides (2000,
p.228): “(...) premissas de todo um sistema que se desenvolve more geométrico. De modo
diferente das regras, que por seu tempo vigem, os princípios valem sendo os valores que
sustentam e governam a Constituição, a ordem jurídica e até mesmo o regime. No presente
trabalho, serão elencados apenas alguns princípios que, por suas utilidades teóricas, serão
apropriados no desenvolvimento desta dissertação.
15
Por fim, para melhor caracterizar os princípios, destacamos o ensinamento de Celso
Antônio Bandeira de Mello:
“Princípio, averbamos alhures, é, por definição, mandamento nuclear de um sistema,
verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas
compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e
inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que
lhe confere a tônica e lhe sentido humano. É o conhecimento dos princípios que preside
a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que por nome sistema
jurídico positivo. Violar um princípio é mais grave que transgredir uma norma. É a mais
grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio
atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores
fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço e corrosão de sua estrutura mestra.”
(MELLO, 1993, p. 408)
Assim, temos definida a importância dos princípios no direito brasileiro e sua
diferenciação do restante dos elementos do direito positivo. Porém, para esta dissertação, são
de diferencial interesse os princípios do direito ambiental brasileiro. Por esta razão, faremos
uma breve abordagem sobre o tema.
15
Vide MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 4ª edição, São Paulo: Malheiros,
1993, para maior detalhamento dos Princípios.
2.3.2.1 Princípio do Direito ao Meio Ambiente Sadio
Este princípio encontra-se intimamente ligado ao direito fundamental à vida em
razão da impossibilidade desta ocorrer, de maneira saudável, em um ambiente inapropriado.
Daí a necessidade de assegurar o direito a um ambiente sadio e hígido. Tal direito, está
reconhecido na Conferência das Nações Unidas de 1972, em seu Princípio de número 1, e foi
repisado na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992.
2.3.2.2 Princípio da Prevenção
Princípio que, trata de riscos ou impactos, já conhecidos pela ciência
16
. Seu objetivo
é o de atuar como balizador do desenvolvimento humano, gerando medidas que evitem
atentados ao ambiente, de molde a eliminar, reduzir ou impedir ações que possam alterar a
qualidade dos ecossistemas. Por óbvio, toda ação de fulcro ambiental deve primar pela
prevenção de modo a evitar a consumação de um dano eminente e, muitas vezes, irreversível.
2.3.2.3 Princípio da Função Social da Propriedade
Apesar de a Constituição Federal garantir o direito à propriedade como fundamental,
a mesma Carta Constitucional atribui também a esta propriedade a obrigação de cumprir com
sua função social. Assim, o fato de ser proprietário não permite que o indivíduo possa dela
fazer o que bem entender. O direito de propriedade deve ser exercido, não somente em
benefício de seu titular, mas em consonância com o interesse da coletividade. Dentre as
funções sociais da propriedade, inclui-se a sua função ambiental, daí alguns autores
utilizarem a expressão função cio-ambiental. São exemplos as condutas negativas de não
poluir, não impor maus tratos aos animais, como também, condutas positivas tais como,
averbar a reserva legal e recuperar área de preservação permanente. Este princípio, encontra-
se no artigo 170, III e VI da CF.
2.3.2.4 Princípio do Direito ao Desenvolvimento Sustentável
Deixando, momentaneamente, ao largo a discussão acerca da utilização adequada do
conceito de desenvolvimento e de sustentabilidade, o ordenamento jurídico brasileiro abarca
o direito ao desenvolvimento sustentável em seu arcabouço de princípios. Segundo a
Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, quando são atendidas as
necessidades do presente sem que com isso sejam comprometidas as necessidades futuras,
estaremos em acordo com o desenvolvimento sustentável. De outra banda, podemos
empregar como sentido a este princípio, o de melhorar a qualidade de vida humana atentando
para as limitações de capacidade de suporte dos ecossistemas.
O principal fundamento da idéia de desenvolvimento sustentável é o de que, a
sociedade humana não se restringe às gerações presentes concomitantemente com o
entendimento de que os recursos naturais têm como característica a finitude e a
exauribilidade. Nesta esteira, consta como Princípio de número 4 da ECO/92 o que segue:
A fim de alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção do ambiente deverá
constituir-se como parte integrante do processo de desenvolvimento e não poderá ser
considerada de forma isolada.
na legislação brasileira, pela primeira vez, na Lei 6.803/80, em seu artigo 1º,
surgiu a primeira referência a este princípio na compatibilização das atividades industriais
com o meio ambiente contida na referida lei.
2.3.2.5 Princípio da Informação
Em um Estado Democrático e de Direito, faz-se indispensável que todo cidadão
tenha acesso a informações que são fundamentais para a compreensão de como estão sendo
tratados assuntos de seu direto interesse. Em se tratando de um direito transindividual, como é
o caso do direito ao meio ambiente adequado, é de suma importância a obtenção de
informações sobre decisões que tenham repercussão na qualidade ambiental. O principal
expoente de tal princípio, encontra-se no artigo 225, parágrafo 1º, inciso IV da Constituição
Federal onde se encontra proclamada a publicidade do estudo de impacto ambiental,
garantindo ao público a prestação de informações relativas aos estudos sobre os quais se
basearão as autorizações e licenças, expedidas pelos órgãos blicos competentes, para a
realização de atividades potencialmente poluidoras.
Em tempo, cabe ressaltar que, em alguns casos, existe a previsão legal da realização
de audiências públicas como uma das etapas integrantes do processo de licenciamento
ambiental e de zoneamento ambiental, onde a participação popular junta-se ao direito a
informação.
16
Alguns autores separam a prevenção da precaução afirmando que a última deveria se referir às medidas
acautelatórias referentes à incerteza científica quanto aos efeitos negativos da ação.
2.3.3 Estudo de Impacto Ambiental (EIA)
Dentre os institutos jurídicos disponíveis para permitir a aferição estatal dos
possíveis impactos, que serão causados por um empreendimento, talvez o mais eficiente seja
o estudo de impacto ambiental (EIA). Trata-se de um pré-procedimento administrativo que,
tem como objetivo, realizar um profundo diagnóstico da atividade ou empreendimento que
pretende se realizar. O estudo envolve as conseqüências sócio-econômicas e biofísicas do
ambiente que serão provocadas pela atividade que pretende ser licenciada pelo órgão
ambiental competente. De vocação preventiva e precaucional, trata-se de um levantamento
que visa evitar que um projeto, que se justifica economicamente, venha a transformar-se em
algo que se mostra nefasto para o ambiente. Dentre as suas funções está a de avaliar os
impactos, definir e indicar as medidas mitigadoras e/ou compensatórias adequadas à
degradação que será provocada pela atividade em estudo.
O resultado deste estudo é o Relatório de Impacto no Meio Ambiente (RIMA),
documento que deverá estar à disposição de qualquer cidadão interessado, em atendimento ao
já mencionado Princípio da Informação.
As atividades presumivelmente poluidoras, estão elencadas em Resolução do
Conselho Nacional do Meio Ambiente, e, seus praticantes, são obrigados a realizar o
EIA/RIMA para a obtenção do Licenciamento Ambiental. Porém, nada impede que, se o
órgão ambiental competente assim entender necessário, outras atividades não constantes da
referida lista, sejam obrigadas a realizar o estudo para a obtenção do Licenciamento. No
Estado do Rio Grande do Sul, o EIA/RIMA encontra-se regulado pela Lei 11.520/00,
artigos 71 a 83, no denominado Código Estadual do Meio Ambiente.
Em sendo obrigatório, o EIA/RIMA será analisado e, atendidos os pressupostos
legais, aprovado. Esta aprovação, ou reprovação, fica adstrita ao estudo apresentado e não
poderá o órgão da administração pública basear e justificar sua decisão em fator externo ao
documento apresentado pelo empreendedor.
2.3.4 Zoneamento Ambiental
A divisão de um território em partes, nas quais certas atividades são permitidas e
outras interditadas, absoluta ou relativamente, tendo em vista o atendimento ao Princípio do
Desenvolvimento Sustentável, a critério do Poder Executivo, ou deste em conjunto com o
Poder Legislativo, é o que se denomina Zoneamento Ambiental. Tal instituto, encontra-se
previsto na Política Nacional do Meio Ambiente, artigo 9º, inciso II da Lei 6938/81. O
zoneamento pode dar-se em zonas urbanas, contido no Plano Diretor do Município, ou rural
como é o caso do Zoneamento Ambiental para a Silvicultura no Estado do Rio Grande do Sul.
As audiências públicas do referido zoneamento foram oportunidades ímpares, nas quais os
discursos quanto à silvicultura puderam ser analisados, fornecendo bons elementos para a
compreensão dos posicionamentos dos momentos em relação aos pontos de fixação
discursiva.
2.3.5 Licenciamento Ambiental
Segundo o artigo da Resolução 237/97 do Conselho Nacional do Meio
Ambiente, Licenciamento Ambiental é o:
(...) procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente
licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades
utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou
daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as
disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso.
Assim, Licenciamento Ambiental é um procedimento do Poder público, que impõe
condições para o exercício do direito de propriedade e de empreendimento, para que a função
social da propriedade e de empresa sejam observadas, sem menoscabar da função ambiental e
social agregada. Fica clara aqui a supremacia do interesse coletivo sobre o interesse
individual ao caracterizar-se a proteção ao ambiente, em acordo com o Princípio do
Desenvolvimento Sustentável.
Outro ponto a merecer destaque é o fato de que neste procedimento existe a previsão
legal da organização de audiências públicas, em atenção ao Princípio da Informação. Esta
previsão é um instrumento que possibilita o acompanhamento da função administrativa de
permitir e autorizar a realização de uma atividade que potencialmente gera riscos para o
ambiente e, consequentemente para a coletividade.
Embora existam outros elementos e conceitos jurídicos acerca do tema ambiental,
por tratar-se de uma pesquisa cuja dissertação não se pretende de cunho eminentemente
jurídico, que, tem seu fulcro na teoria do discurso, não será aqui exaurido o assunto.
Apenas foram discutidos alguns elementos da cultura jurídica que serão utilizadas no presente
trabalho, sem com isso desconsiderar a importância dos demais conceitos do Direito
Ambiental para a regulação da relação do homem com a natureza e suas conseqüências.
2.4 Considerações
Ao final do capítulo, faz-se necessário estabelecer relações entre os conceitos e
noções apresentados e o tema da presente dissertação. Evidentemente, estas conexões irão se
justificar com mais detalhes no discorrer do restante do texto, porém, preliminarmente, cabe
aqui tecer algumas considerações.
A silvicultura é um tipo de exploração agrícola que se caracteriza pelo cultivo de
espécies de árvores. Via de regra, este cultivo utiliza-se de espécies vegetais exóticas, ou seja,
plantas que não são encontradas naturalmente em nossos ecossistemas, mas sim, fruto da
intervenção do homem que as transfere de outros ambientes. Dentre estas espécies, a que se
encontra em maior processo de expansão de cultivo é o eucalipto. Este tipo de árvore possui
grande valor para a indústria de celulose, e por razões várias, que serão discutidas no
transcorrer deste trabalho, vem tendo sua produção expandida no Rio Grande do Sul.
Nas cidades de Pelotas, Arroio Grande e Herval, entre outras, a plantação de
eucaliptos vem sendo estimulada e realizada pela empresa Votorantim Celulose e Papel
(VCP), através do chamado “Projeto Losango”. Desde o anuncio do investimento nas cidades
e o anuncio da instalação de uma fábrica para a produção de pasta de celulose, um embate de
idéias e posicionamentos vem se sedimentando. Neste embate, vários grupos, de vários
segmentos da sociedade, têm tomado partido em uma das duas posições diante do tema
silvicultura: contrário ou favorável ao cultivo de eucalipto.
As justificativas e motivos para tais posicionamentos frente à questão são os mais
diversos, desde científico e técnico até justificativas políticas e econômicas. A compreensão
de tais justificativas e motivações pode se dar de muitas formas, partindo de várias posições
de observação e estudo. Dentre estas várias opções, a teoria do discurso de Ernesto Laclau e
Chantal Mouffe foi, por vários motivos, acolhida como instrumento hábil para uma boa
observação e discussão a fim de responder às perguntas formuladas como problemas de
pesquisa. Assim, os posicionamentos serão analisados, tendo por ponto de partida, os
discursos sustentados pelos elementos-momento frente à questão em tela.
Desta forma, a compreensão da lógica discursiva proposta por Laclau e Mouffe é um
fundamental instrumento para a o desenvolvimento e apreensão deste trabalho. A maneira
singular como as noções de identidade, discurso, ponto nodal, antagonismo e hegemonia, são
apresentadas pelos autores, permite que, sejam apropriadas nesta pesquisa de forma
adequada, buscando estabelecer as relações que fixam as ligações entre os grupos sociais que
se colocam contrários ou favoráveis ao cultivo em questão.
Em se tratando de uma questão que se apresenta tendo como corte antagônico o
estabelecimento do ciclo produtivo do eucalipto pela empresa VCP, estabelecem-se dois
discursos privilegiados, aqui caracterizados por ambientalista e desenvolvimentista, que
penetram o campo do ambientalismo e do crescimento econômico com compreensões opostas
de desenvolvimento e respeito para com o ambiente, caracterizando um antagonismo acerca
da compreensão de uma suposta realidade a respeito dos temas envolvidos na cadeia
produtiva da celulose.
Para a análise dos campos discursivos, torna-se imperativo compreender os sentidos
dados pelos momentos a cada um dos discursos privilegiados. Assim, temos de passar ao
terreno da ecologia e biologia para podermos contrapor conceitos sustentados por cada um
dos grupos sociais com os conceitos fornecidos pelas ciências naturais, conceitos estes,
apropriados pelos discursos a serem analisados.
Da mesma maneira, teremos de apropriar conceitos do Direito para
compreendermos os passos que são seguidos pelos empreendedores e pelos contrários ao
empreendimento para buscar na lei o atendimento de suas pretensões e o respeito aos seus
direitos particulares ou coletivos, além de analisar a utilização dos conceitos jurídicos por
cada elemento-momento nos discursos privilegiados.
Tem-se, assim, a articulação de três áreas do conhecimento humano, Ciências
Sociais, Ciências Naturais e Ciências Jurídicas, na análise que busca a compreensão do que
realmente move estes grupos sociais no estabelecimento, contingencial e precário, das cadeias
equivalenciais que se formam, tendo como ponto de fixação dois posicionamentos
antagônicos representados pelos discursos privilegiados do ambientalismo e do
desenvolvimentismo.
CAPÍTULO III
Histórico da Indústria de Papel e Celulose No Brasil
3.1 Introdução
Neste capítulo, serão apresentadas informações concernentes ao mercado de
celulose desde o século XIX, passando por seu desenvolvimento no Brasil na década de 1950,
até o ano de 2005, além de dados referentes ao mercado mundial de celulose, tanto de
eucalipto quanto de outras espécies vegetais. O objetivo principal desta parte do trabalho é
fornecer dados que permitam a comparação do mercado de celulose no Brasil até o ano de
2005 e os reflexos decorrentes da implementação da cultura do eucalipto no Rio Grande do
Sul. O ano de 2005, foi escolhido como período final em razão de apresentar dados referentes
ao ano de 2004, ano este, marco temporal inicial do recorte utilizado nesta pesquisa
abrangido.
Cumpre também frisar o fato de que, estes dados, são utilizados pelos elementos-
momento formadores da cadeia equivalencial, que busca a hegemonia do discurso favorável à
implantação da cadeia produtiva da celulose nas cidades, onde esta pesquisa se desenvolve.
Os ganhos na área econômica, a geração de empregos e a arrecadação de impostos, são
previstas tendo por base, estudos que lançam mão da retrospectiva histórica deste ciclo de
produção e sua repercussão, tanto no mercado interno como na produção destinada para
exportação. Assim, denota-se facilmente a importância desta prevê abordagem para a
construção da análise destes discursos.
Na parte final do capítulo, serão apresentados dados que já demonstram os resultados
do início da implementação do “Projeto Losango” nas áreas geográficas, objeto deste
trabalho. Tais dados são úteis para que se possa começar a mensurar os efeitos da silvicultura
no Estado do Rio Grande do Sul e no Brasil, nos anos de 2005 a 2007, no sentido de
referendar, ou não, os posicionamentos sustentados pelas cadeias discursivas em cada um dos
lados da fronteira dicotômica em apreço.
É merecedor de destaque, ainda, o fato de que, excluindo os impactos na geração de
empregos, de investimentos e área plantada, os demais resultados no mercado nacional e
mundial de celulose somente poderão ser constatados a partir da primeira colheita do
eucalipto plantado, prevista para o ano de 2010. Sempre destacando o recorte territorial, as
cidades de Pelotas, Arroio Grande e Herval, e temporal, período de janeiro de 2004 a
dezembro de 2007, utilizados nesta pesquisa.
3.2 Momentos iniciais da indústria no Brasil
A história da indústria de celulose e papel no Brasil pode ser dividida em quatro
grandes fases (Binotto, 2000). A primeira fase, remonta aos primórdios desta indústria no
país, tendo início no final do século XIX e terminando por volta de 1930. Na segunda fase,
quando a indústria começa a tomar forma e a crescer, cobre o período de 1930 a 1960. A
terceira fase é marcada pelos planos promovidos pelo Governo Federal para estimular a
indústria nacional e também um programa especial para a indústria de celulose e papel.
Compreende as décadas de 1960, 70 e 80. A quarta fase, tem como principal destaque a
mudança na atividade industrial brasileira com a chamada “abertura” nos anos 90, tendo por
termo final os primeiros anos da primeira década de 2000.
Até aproximadamente 1930, a produção de papel no Brasil utilizou somente
celulose importada e aparas
17
. O papel produzido era de baixa qualidade e não supria toda a
demanda interna. Por outro lado, os comerciantes, em grande parte imigrantes, importavam
papel acabado principalmente da Alemanha. Neste primeiro período, se registram as
primeiras fábricas de papel, com destaque para a Klabin Irmãos e Cia. (1889), a Leon Feffer e
Cia. (1923), que deu origem ao Grupo Suzano, e a Fábrica de Papelão Simão (1925). Os
reflorestamentos
18
, ou seja, o plantio de árvores exóticas
19
destinada à produção de celulose,
têm seus primeiros registros em 1903, em São Paulo.
3.2.1 As décadas de 1930 a 1950
O início da década de 1930 trouxe um período de crescimento e formação da
indústria nacional de celulose e papel. Grande parte desse desenvolvimento, deve-se à medida
protecionista do Governo Federal de Getúlio Vargas, possibilitando que os produtores
nacionais mantivessem o mercado interno cativo. É neste período que a matéria-prima do
papel, a celulose, começa a ser produzida internamente, mas sem atingir a auto-suficiência do
país neste produto. Em 1944 é fundada a Associação Nacional dos Fabricantes de Papel e
Celulose – ANFP, no Rio de Janeiro
20
.
Na década de 1950, inicia-se o estabelecimento das primeiras unidades destinadas à
produção de celulose. Os principais grupos nacionais instalados na primeira fase de
17
“Aparas” são os restos de madeira não utilizadas em sua aplicação inicial.
18
Aqui a idéia de reflorestamento é utilizada no sentido de plantar árvores sem levar em consideração a
necessidade de biodiversidade, caracterizando-se como monocultivo.
19
Denominam-se “exóticas” as espécies vegetais não nativas, ou seja, cujo bioma original não localiza-se na
área de cultivo.
20
Na década de 90 a associação recebe a atual denominação de Bracelpa (BINOTTO,2000).
industrialização de celulose e papel - os Grupos Klabin, Suzano e Simão - se consolidam
como grandes produtores. Além disso, grupos multinacionais, como Champion e Rigesa, se
instalam no país (Binotto, 2000).
As décadas de 1950 e 1960 são especialmente importantes para este setor, pois são
traçadas as primeiras linhas para sua atual configuração. Nos anos 1950, as empresas
começam a se integrar e, nos anos 1960, passam a ser constituídos os maciços florestais
21
.
3.2.2 A década de 1960
A década de 1960 é marcada pela forte atuação do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico - BNDE
22
. O BNDE apóia novos projetos de plantas industriais
com escala mínima de produção integrada com a celulose, sendo que, a própria base florestal
da empresa, deveria suprir no nimo 50% das necessidades da planta industrial. Inclui-se
nesses projetos o tratamento para a redução de efluentes tóxicos. Ocorre a instalação, no país,
de fornecedores de equipamentos e de serviços para operação industrial. Políticas
governamentais são anunciadas com incentivos para a formação de plantações e
reflorestamentos, em 1966, na forma de incentivos fiscais e financiamento a baixo custo. É
neste momento que surge a inovação tecnológica no uso de fibras para a produção de papel,
com o uso de fibra curta de eucalipto. Em 1967, a Aracruz foi a primeira a processar, em
escala industrial, a celulose de fibra curta de eucalipto. Dois grupos empresariais se destacam
no período 1950-70. Um deles é o grupo Klabin, de capital nacional, que se consolidou como
grande produtor de celulose e papel e se tornou líder absoluto da indústria no período. O
segundo é o grupo multinacional Champion
23
, que apresentou a mais rápida evolução no
período citado. Devido ao aproveitamento de espécies tropicais, o Brasil insere-se no
mercado internacional, além de ampliar consideravelmente a área de plantio.
3.2.3 A década de 1970
Em meados dos anos 1970, ocorre novo ciclo de expansão do setor. Com forte
incentivo do BNDE, este esforço consegue dobrar a produção interna, consolidar a indústria
nacional como forte produtora de celulose e papel e afirmar o uso da celulose de fibra curta.
A década de 1970 é lembrada pela sucessão de planos governamentais, visando ao
21
Grandes áreas contínuas e geralmente uniformes cultivadas com uma única espécie de árvore.
22
A partir de 1982, passou a ser denominado BNDES.
23
Atualmente parte do grupo International Paper, que uniu em 1999 a Champion International e Union Camp.
desenvolvimento da indústria brasileira. O II Plano Nacional de Desenvolvimento PND e o
I Plano Nacional de Papel e Celulose – PNPC foram lançados em conjunto no ano de 1974. O
governo pretendia, com os planos setoriais, aumentar a capacidade de produzir internamente
os bens que eram importados, como os bens de capital e insumos básicos. Assim, o governo
oferecia incentivo às exportações, financiamento para o desenvolvimento do complexo
industrial, incentivos para os reflorestamentos e para o desenvolvimento de tecnologia
nacional. Este foi, sem dúvida, um grande impulso para o fortalecimento da indústria nacional
de celulose e papel. Com a aceitação da celulose de fibra curta no mercado mundial, o Brasil
se especializa neste tipo de produto. No período 1974-79, houve expressivo aumento dos
investimentos estrangeiros, que contribuiu para que a base florestal destinada à indústria de
celulose e papel sofresse aumento significativo
24
.
3.2.4 As décadas de 1980 e 1990
Nos anos 1980, com o choque da dívida externa, o contexto de recessão e de
estímulo às exportações faz com que a alternativa para escoamento da produção seja os
mercados externos. Inicia-se a busca para fontes alternativas de energia para alimentar o setor
produtivo de papel. No ano de 1987 é lançado o II PNPC, com um novo ciclo de
investimentos para o setor.
Na década de 1990, a política governamental buscava inserir o país no mercado
internacional e minimizar o papel do Estado enquanto produtor de bens e serviços,
privilegiando sua função reguladora. Com a abertura comercial, a competição dos produtos
estrangeiros pressionaria as empresas nacionais a se modernizar, reduzir custos, aumentar a
produtividade e melhorar a qualidade dos produtos. Assim, além de se reestruturar, a indústria
brasileira teve que definir novas estratégias de desenvolvimento para atuar no mercado
interno.
3.2.5 Situação da indústria nos primeiros anos do século XXI
A indústria de celulose e papel no Brasil fechou o ano de 2004 contando com 220
empresas, faturamento anual de R$ 23 bilhões, arrecadação de R$ 2,2 bilhões de impostos e
24
As principais políticas governamentais implementadas na década de 1960/70 que favoreceram a indústria de
celulose e papel foram: 1) o estabelecimento de uma escala mínima de produção; 2) incentivos fiscais para
florestamentos e reflorestamentos; 3) créditos a taxas negativas de juros reais; e 4) participação acionária e
estatal e financiamento ao acionista.
aproximadamente 100 mil pessoas empregadas. O país ocupava a posição entre os maiores
produtores mundiais, com um total de 9,5 milhões de toneladas produzidas
25
.
A indústria de celulose se concentra em grandes produtores, com as dez maiores
empresas sendo responsáveis por mais de 80% da produção. No segmento papel, a
concentração é menor, com as dez maiores empresas ocupando pouco mais de 60% do
mercado. Em 2003, o grupo empresarial que obteve maior lucro com fabricação de papel e
celulose no país foi o grupo Klabin, seguido pelos grupos Aracruz e Votorantim(VCP).
TABELA 1 –
indicadores financeiros de empresas de papel e celulose - 2003 - em milhões reais.
EMPRESAS PATRIMÔNIO LÍQUIDO RECEITA LÍQUIDA LUCRO DO EXERCÍCIO
KLABIN 1.818 2.970 1.001
ARACRUZ 2.738 3.066 878
VOTORANTIM 3.415 2.926 853
G. SUZANO 2.319 2.478 587
CENIBRA 741 1.062 331
Fonte: ABTCP e Empresas, disponível em <www.abtcp.org.br/>, acesso em 21 de março de 2008.
A produção de celulose se concentra em alguns estados, destacando-se a região de
atuação da Aracruz e Veracel, o Espírito Santo e a Bahia, no que tange à celulose de fibra
curta.
TABELA 2 -
participação dos estados em produção de celulose - 2002 - em %
ESTADO FIBRA CURTA FIBRA LONGA
SÂO PAULO 36,64 5,60
ESPÍRITO SANTO 23,11
-
MINAS GERAIS 14,39
-
BAHIA 10,82
-
PARANÁ 03,31 32,62
RIO GRANDE DO SUL 01,45 03,03
SANTA CATARINA 00,66 54,85
TOTAL 89,48 96,10
Fonte: BRACELPA, disponível em <www.abtcp.org.br/m3.asp?cod_pagina=633>, acesso em 08 de abril de
2008.
25
Bracelpa, 2004
O setor de celulose e papel ocupa cerca de 1,5 milhão de hectares com plantio de
eucalipto e pínus. O eucalipto é a principal espécie florestal utilizada (75% do total) e a Bahia
é um estado que estava assumindo uma posição de liderança nesse sentido (20% do total),
perdendo apenas para São Paulo.
TABELA 3 -
área total reflorestada pelo setor de celulose e papel por estado/ha (31/12/2003)
Fonte: BRACELPA. Disponível em < www.sbs.org.br/estatisticas.htm >, acesso em 01 de abril de 2008
A atividade florestal empregava aproximadamente 30 mil pessoas no país, em 2005.
A Bahia era, então, o terceiro estado em número de empregados na atividade florestal,
destacando-se pela forma de contratação por terceiras.
ESTADO EUCALIPTO PINUS ARAUCÁRIA ACÁCIA OUTROS TOTAL
AMAPÁ 61.771 33.823 0 2.650 878 99.122
BAHIA 303.755 5.711 0 0 0 309.466
ESPÍRITO
SANTO
115.940 34 0 0 19 115.972
MARANHÃO 5.465 0 0 0 0 5.465
MINAS
GERAIS
150.976 2.890 446 0 1.923 156.235
MATO
GROSSO DO
SUL
56.478 0 0 0 0 56.478
PARÁ 40.355 2.429 0 0 0 42.784
PARANÁ 44.812 201.958 7.653 0 111 254.534
RIO GRANDE
DO SUL
43.895 8.802 603 7 51 53.357
SANTA
CATARINA
7.803 100.906 875 0 34 109.618
SÃO PAULO 312.939 35.913 79 0 314 349.245
TOTAL 1.144.189 392.467 9.656 2.657 3.329 1.552.276
TABELA 4 - mão-de-obra empregada na atividade florestal - 2001 - no médio de empregados
Fonte: BRACELPA, 2002. Disponível em < www.sbs.org.br/estatisticas.htm>, acesso em 12 de
março de 2008.
3.4 Aspectos institucionais
O modelo institucional do Setor Florestal Brasileiro tem linhas jurídicas originadas
nas décadas de 20 e 30 com a criação do Serviço Florestal e edição do primeiro Código
Florestal Brasileiro (1934), respectivamente. Em 1965, instituiu-se o Código Florestal, em
1966, surgiram os incentivos fiscais ao reflorestamento e, em 1967, foi criado o Instituto
Brasileiro de Desenvolvimento Florestal – IBDF e elaborada a legislação de proteção à fauna.
Os incentivos fiscais para reflorestamento no Brasil foram abolidos em 1987. Em janeiro de
1989 foi constituído o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis - IBAMA, assumindo as atribuições de rias outras instituições (IBDF,
Sudhevea, Sema e Sudepe) à luz do emergente preceito conservacionista, responsabilizando-
se pela fiscalização e pelo controle do cumprimento da legislação ambiental e das atividades
relacionadas com recursos naturais.
ESTADO PRÓPRIA COLIGADA TERCEIROS TOTAL
AMAPÁ 511 0 681 1.192
BAHIA 810 616 3.716 5.142
ESPÍRITO SANTO 461 0 3.039 3.500
MARANHÃO 103 0 0 103
MINAS GERAIS 651
2.978 3.629
MATO GROSSO DO
SUL
197 0 0 197
PARÁ 198 0 1.442 1.640
PARANÁ 1.155 747 2.829 7.731
RIO GRANDE DO
SUL
136 0 1.268 1.404
SANTA CATARINA 391 0 1.835 2.226
SÃO PAULO 2.765 0 4.475 7.240
TOTAL 7.378 1.363 22.263 31.004
A defesa do meio ambiente no Brasil, assim como a definição de novas políticas para
o setor, é tarefa do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, criado no início da
década de 80. Em 1992, criou-se o Ministério do Meio Ambiente – MMA, que tem a
responsabilidade de elaborar as políticas em vel federal; a implementação dessas políticas e
a fiscalização do cumprimento das leis são atribuições do IBAMA e dos órgãos ambientais
competentes estaduais e municipais.
A Constituição Federal de 1988, ao estabelecer a legislação concorrente, delegou
autonomia para que os Estados da Federação tenham suas próprias leis ambientais ou
florestais, desde que o sejam mais permissivas do que a lei federal. Dezessete estados
promulgaram suas leis ambientais, porém, na prática, a descentralização do comando e
controle da atividade florestal não ocorreu totalmente.
Em 1999, se resgatou o reconhecimento da importância das florestas na estrutura
organizacional da administração direta do Governo Federal, o que levou à criação da
Secretaria de Biodiversidade e Florestas no MMA, a quem cabe a proposição de políticas,
instrumentos e normas ambientais e a definição de estratégias para promover a gestão
compartilhada do uso sustentável dos recursos florestais.
O Programa Nacional de Florestas - PNF foi instituído pelo Decreto No 3.420, de 20
de abril de 2000, e lançado pelo Governo Federal em 21 de setembro do mesmo ano. Seu
objetivo geral é "a promoção do desenvolvimento sustentável, conciliando a exploração com
a proteção dos ecossistemas e a compatibilização da política florestal com os demais setores
de modo a promover a ampliação do mercado interno e externo e o desenvolvimento
institucional do setor".
Em fevereiro de 2004, o Governo Federal instalou a Comissão Coordenadora do
Programa Nacional de Florestas CONAFLOR, criada pelo Decreto Presidencial Nº.
4.864/2003 e composta por representantes de diversos ministérios e organismos
governamentais, além de representantes de entidades civis e dos segmentos que compõem o
setor de produção de base florestal. O principal objetivo é propor e avaliar medidas para que
sejam cumpridos os princípios e diretrizes das políticas públicas para o Setor Florestal, de
acordo com a Política Nacional do Meio Ambiente e com o Código Florestal. A criação da
CONAFLOR, reflete uma das recomendações do Congresso Florestal Brasileiro,
promovido pela Sociedade Brasileira de Silvicultura - SBS e pela Sociedade Brasileira de
Engenheiros Florestais - SBEF em agosto de 2003, no sentido de promover a efetiva
articulação das ações dos diferentes segmentos que compõem a atividade florestal para a
otimização dos esforços e alcance de resultados concretos e duradouros.
Em dois de março de 2006, foi promulgada a Lei 11.284, que dispõe sobre a
gestão de florestas públicas para produção sustentável; institui no âmbito do Ministério do
Meio Ambiente MMA, o Serviço Florestal Brasileiro SFB; cria o Fundo Nacional de
Desenvolvimento Florestal - FNDF; e delega aos órgãos estaduais competentes do Sisnama, a
prévia aprovação da exploração de florestas públicas e privadas.
A assinatura do Contrato de Gestão e Desempenho do Serviço Florestal Brasileiro,
tem o objetivo de assegurar ao novo órgão autonomia administrativa e financeira, que garanta
maior eficiência à execução das políticas nacionais de gestão de florestas públicas. Possibilita
também, que o Serviço Florestal tenha competência para elaborar editais e organizar
licitações de concessões em áreas de florestas públicas federais. O início do processo de
concessões florestais foi possível graças à aprovação dessa lei. O objetivo da nova lei é,
entre outros, impedir o processo de desmatamento e grilagem de terras públicas. Essas
medidas fazem parte de uma agenda do Governo Federal que inclui também o Plano de
Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia (PPCDA), que congrega 13
ministérios. Lançado em 2004, o plano reduziu a taxa de desmatamento na Amazônia legal
em 49%.
A primeira área a receber concessão florestal mediante licitação pública e pagamento
pelo uso dos recursos florestais está localizada dentro da Floresta Nacional do Jamari em
Rondônia - unidade de conservação federal de uso sustentável com 220 mil hectares. Desse
total, apenas 90 mil ha da Flona, cerca de 40%, serão manejados; os outros 60% têm outras
destinações como uso comunitário, conservação integral, mineração, entre outros. Esses 90
mil hectares serão repartidos em unidades de pequeno, médio e grande portes, a serem
licitadas separadamente e sob regras diferenciadas. A idéia é dar oportunidade de acesso a
produtores de diferentes escalas, cada um com direitos e obrigações próprias.
Em 22 de dezembro de 2006 foi promulgada a Lei Ordinária nº. 11.428, também
conhecida como a Lei da Mata Atlântica, que dispõe sobre a utilização e proteção da
vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica. A lei define e regulamenta os critérios de uso e
proteção do bioma, reduzido atualmente a 7,3% de sua vegetação original, além de
estabelecer uma série de incentivos econômicos à produção sustentável. Cria também
incentivos financeiros para restauração dos ecossistemas, estimula doações de iniciativa
privada para projetos de conservação, regulamenta o artigo da Constituição que define a Mata
Atlântica como Patrimônio Nacional, delimita o seu domínio, proíbe o desmatamento de
florestas primárias e cria regras para exploração econômica.
3.5 O Brasil no cenário mundial do papel e celulose
A produção e o consumo de papel no mundo se concentram nos EUA, na China e no
Japão, responsáveis por 47% da produção e por 52% do consumo de papel
(Valença e
Mattos, 2000.). O Brasil era, em 2005, o 11° produtor e consumidor mundial de papel,
participando com 4% da produção (8,2 milhões de toneladas em 2004) e com 1,5% das
exportações mundiais. A aceitação no mercado externo da fibra curta à base de eucalipto
(aproximadamente 70% da produção brasileira) foi muito importante para o sucesso das
exportações do país. No entanto, outros países, com destaque para a Indonésia, apesar de ter
tido sua legitimidade arranhada no mercado internacional por se utilizar no início de mata
nativa para produzir celulose, também vêm desenvolvendo novas técnicas de produção de
celulose e conquistando espaço no mercado internacional.
As dez principais empresas produtoras de papel no mundo são: International Paper e
Stora Enso disputando a liderança - seguidas de UPM Kymmene, Oji Corporate, Geórgia-
Pacific Corp., Weyerhaeuser Corp, NipponUnipac Holding, Smurfit-Stone Container Corp.,
Abitibi-Consolidated e Metsä Group. Ou seja, não aparece empresa brasileira alguma neste
rol.
O comércio global de papel movimentava aproximadamente 100 milhões de
toneladas anualmente, em 2005, sendo que o destinado para imprimir e escrever, embalagem,
imprensa e papel cartão são, ainda hoje, as principais categorias comercializadas
(respectivamente, 40%, 23%, 17% e 13% de contribuição sobre o volume total).
O Brasil é um importante fornecedor de papéis de imprimir e escrever não revestidos
e embalagens. Como importador, destacam-se as compras de papel de imprensa e papéis de
imprimir e escrever revestidos. As exportações brasileiras de celulose e papel em 2003 foram
de US$ 2,8 bilhões, representando 3,9% da balança comercial do país e um crescimento de
38% em relação a 2002
26
.
Em relação à celulose, o Brasil contribuiu em 2004 com 4% da produção mundial,
sendo o maior produtor mundial de celulose de eucalipto. O comércio internacional de
celulose era de 34 milhões de toneladas (celulose de mercado, dados de 2003). A fibra de
eucalipto participava com 6 milhões de toneladas das quais o Brasil contribuía com 55%.
No Brasil, a fibra curta representou 78% da produção de celulose e pasta em 2003, com 64%
do volume direcionado ao mercado externo. A fibra longa contribuiu com 17% da
produção, não sendo suficiente para cobrir a demanda interna. Os grupos Aracruz, Cenibra,
26
Valença, A. C. e Mattos, R. L. G. BNDES – O setor de celulose de papel no Brasil.
VCP, Suzano/Bahia Sul e Jarí concentram 93% da produção de celulose de mercado. Os
principais destinos das exportações brasileiras o: Europa (45%), Ásia (32%) e América do
Norte (19%). No período 1993/2003 a produção de celulose branqueada de eucalipto para
mercado teve um crescimento médio anual de 7,4%.
Em 2003, entraram em operação a nova linha de produção de celulose de eucalipto e
a modernização da máquina de papel da Ripasa, agregando, respectivamente, 145 mil
toneladas e 94 mil toneladas às capacidades anuais de celulose e papel da empresa. A Suzano
Bahia Sul colocou em operação, em 2007, uma nova linha de celulose com capacidade para 1
milhão de toneladas ao ano. E a Cenibra, que concluiu projeto de modernização
aumentando sua produção em 100 mil t/ano, também projeta a construção de uma nova linha
de celulose
27
. Em 2005, o grupo Suzano e a Votorantim Celulose e Papel adquiriram a
Ripasa, dividindo o comando da empresa com intenção de transformá-la num consórcio
(ainda sem prazo para esta mudança). Estima-se que nos próximos cinco anos a oferta de
celulose de fibra curta no mercado mundial aumente em 5,7 milhões de toneladas ao ano.
Desse total, 3,8 milhões deverão ser de fibra de eucalipto brasileiro e 550 mil de acácia da
Indonésia o restante de oferta será suprida por eucalipto do Chile e da Ásia, e acácia da
China.
3.6 Situação do mercado de celulose pós 2005
O mercado de celulose no Brasil vem aumentando anualmente por várias razões.
Uma delas é a demanda crescente de papel, não no mercado interno, como também, no
mercado externo. Esta demanda fez com que o Brasil produzisse 11.916.056 toneladas de
pasta de celulose, somente no ano de 2007 e 3.274.199 toneladas somente de janeiro a março
de 2008
28
. Esta produção de celulose permitiu a fabricação de 8.965.470 toneladas de papel
no ano de 2007. Para permitir esta produção, o Brasil dispunha, em 2006, de 1.667.000
hectares plantados com árvores destinadas para a produção de celulose, sendo que, cultivados
com eucalipto, tínhamos 1.320.481 hectares no mesmo ano
29
.
In <www.abcp.org.br> acesso 21 de março de 2005.
27
VALENÇA, A. C. e MATTOS, R. L. G. BNDES – O setor de celulose de papel
no Brasil. In <www.abcp.org.br> acesso 21 de março de 2005.
28
Dados disponibilizados pela Sociedade Brasileira de Silvicultura in <http://www.sbs.org.br/estatisticas.htm>.
Acesso em 02 de junho de 2008.
29
Dados disponibilizados pelo Instituto de Pesquisas Florestais in: <http://www.ipef.br/> . Acesso em 02 de
junho de 2008.
No Rio Grande do Sul, tínhamos em 2003 um total de 53.357 hectares cultivados
com árvores exóticas, sendo que, 43.895 plantadas com eucalipto
30
. Já em 2007, o Estado
gaúcho possuía um total de área plantada de 94.253 hectares, estando ocupadas pela cultura
do eucalipto uma área de 85.244 hectares. Ou seja, a área utilizada pela silvicultura quase
dobrou em 2 anos, com maior crescimento na cultura de eucaliptos. A área ocupada pela
silvicultura no estado em 2007 atingiu cerca de 0,77% de seu território total.
Em relação aos postos de trabalho gerados pela atividade silvícola, segundo dados
das empresas que atuam no ramo de celulose e pasta de celulose
31
, enquanto em 2001 foram
criados 31.004 postos de trabalho em todo o Brasil, em 2006 os trabalhadores no plantio e
manejo das plantações ocupavam aproximadamente 42.200 em todo o país, sendo 2100
postos, somente no estado gaúcho que em 2001 possuía 1.404 postos de trabalho neste ramo
de atividade que compõe a totalidade do ciclo produtivo do eucalipto.
3.7 A Votorantim Celulose e Papel
O Grupo Votorantim está em atividade 90 anos e atua nos mercados de cimento,
concreto, mineração, metalurgia, suco de laranja, especialidades químicas, energia elétrica,
setor financeiro e biotecnologia além do ramo de celulose e papel. Possui 60.000 funcionários
e investiu 3,5 bilhões de reais no mercado brasileiro, em 2006, em 8 unidades de negócio. No
mesmo ano, o grupo obteve um lucro líquido de 4,4 bilhões de reais e reverteu em ações
voltadas ao ambiente um total de 225 milhões de reais, também em 2006. Atua em 170
municípios em 22 Estados do Brasil.
No segmento de celulose e papel, o grupo possui 8634 funcionários, próprios ou
terceirizados, em 6 unidades de produção. Possui uma capacidade produtiva de 1,4 milhão de
toneladas/ano de celulose e 575 mil toneladas/ano de papel. O plano estratégico do grupo
prevê tornar-se um dos maiores participantes do mercado de celulose do mundo e atingir
faturamento de 4 bilhões de dólares até o ano de 2020. Possuía, em 2007, 93 mil hectares de
área destinada ao cultivo de eucalipto, sendo 81.848 hectares no Estado do Rio Grande do
Sul, mais 26.090 hectares
32
não próprios cultivados através do sistema de poupança
florestal
33
.
30
Dados disponibilizados pela BRACELPA. Disponível em < www.sbs.org.br/estatisticas.htm >, acesso em 01
de abril de 2008.
31
Eucalyptus Online Book & Newsletter http://www.eucalyptus.com.br/ . Acesso em 02 de junho de 2008.
32
Dados obtidos no folder “Metade Sul Estudo de Impacto Ambiental produzido pela VCP e distribuído na
Audiência Pública para publicidade do EIA/RIMA na metade sul.
33
Poupança Florestal é uma modalidade de exploração silvícola em que o produtor mantêm a propriedade da
terra e permite que o grupo empresarial realize o plantio, manejo e colheita.
No Rio Grande do Sul, a VCP pretende investir 2 bilhões de dólares sendo, 1,3
bilhões de dólares na indústria e 700 milhões de dólares na silvicultura. Deste montante, o
grupo havia investido 300 milhões de dólares até dezembro de 2007. Dos mais de 100 mil
hectares destinados para a atividade silvícola, 70 mil hectares já se encontravam plantados em
dezembro de 2007 e dos 2.300 empregos que serão gerados já haviam sido ocupados cerca de
171 postos de trabalho próprios e outros 992 terceiros, totalizando, no final do ano de 2007,
1.163 postos de trabalho
34
.
Ainda no Projeto Losango, a VCP pretende a instalação de uma fábrica de pasta de
celulose, a ser localizada em uma das margens do canal São Gonçalo, para beneficiar
aproximadamente 350 mil toneladas/ano de pasta de celulose branqueada, absorvendo a
produção local de eucalipto a partir de 2010. A escolha desta localização, tem por principal
motivo, a disponibilidade de grandes quantidades de água e o posicionamento estratégico
próximo à área produtora da matéria prima, o eucalipto, e o porto de Rio Grande, que servirá
de ponto para o escoamento da produção da pasta de celulose.
3.8 Considerações
Neste capítulo, foram demonstrados dados estatísticos que permitem uma visão do
desenvolvimento do ciclo produtivo do eucalipto no Brasil e no Estado do Rio Grande do Sul,
além de possibilitar uma análise do empreendimento papeleiro que está sendo desenvolvido
pela VCP no Estado Gaúcho. Demonstrou-se que o mercado de celulose e papel vem
aumentando no mundo todo e que a demanda para este insumo, a celulose, ganha em
tamanho, provocando uma pressão para uma maior matriz produtiva. Esta pressão de
crescimento acaba por provocar uma promessa por lucros e postos de trabalho, trazendo
consigo a expectativa de aumento na geração de impostos e uma maior arrecadação tributária
para os Municípios. No outro lado desta mesma moeda, este crescimento pressiona o
ambiente colocando em risco sua conservação e equilíbrio. Trata-se da velha lógica de
crescimento econômico que, se por um lado promove a geração de emprego e a circulação de
riqueza, por outro gera impactos ambientais que precisam ser considerados pelos governos e
população.
Neste embate de interesses, benefícios e prejuízos que se estabelece no espaço
discursivo, buscam a hegemonia os discursos do “sim para a silvicultura” e do “não para a
silvicultura”. Formam-se assim, cadeias equivalenciais que estabelecem núcleos em torno dos
34
Dados fornecidos pelo Senhor José Maria Mendes Arruda Filho, Diretor de Florestamento da VCP em 13 de
quais elementos discursivos se alinham, tendo por ligação, a preocupação para com as
conseqüências do empreendimento, “ambientalistas”, ou o regozijo com os ganhos que
esperam amealhar com o estabelecimento desta cadeia produtiva de celulose,
“desenvolvimentistas”. Os momentos envolvidos nestas cadeias discursivas, seus discursos e
motivações serão alvo de análise em capítulo próprio, destinado a estabelecer esta análise em
busca de uma melhor compreensão destes discursos e suas conseqüências nas sociedades
atingidas pelo empreendimento nas cidades de Pelotas, Herval e Arroio Grande. A
importância destes dados se encontra no fato de que são eles que fundamentam uma grande
parcela das justificativas sustentadas pelos elementos-momento que se colocam
equivalencialmente ligados no discurso favorável ao ciclo produtivo da celulose de eucalipto
naquelas cidades do estado gaúcho.
novembro de 2007 no programa “Pelotas 13 horas” na Rádio Universidade AM.
CAPÍTULO IV
Três “Tipos” de Ambientalistas
4.1 Introdução:
O enfoque ambientalista tem sido utilizado para várias finalidades e objetivos.
Não é o objetivo deste trabalho fazer juízo de valor sobre as posições e suas justificativas,
nem tampouco classificá-las com boas ou más. Nesta esteira, têm-se construído um critério
para caracterizar cada um dos momentos que compõem a cadeia equivalencial que se
constitui em torno do ponto nodal ambientalista, o “não para a silvicultura”. Aqui,
entendemos como mais adequada para a análise dos discursos os “tipos”
35
constituídos a
partir de sua relação com a população e seu objetivo que transparece como primordial na
formação de seu discurso.
Durante a análise dos dados colhidos na pesquisa, nas abordagens midiáticas e
principalmente nas entrevistas realizadas, foi possível construir três “tipos” perceptivos, nos
quais os grupos sustentam posições que se equivalem em torno de um discurso, que se
pretende hegemônico, aqui denominado ambientalista. Os três “tipos” podem ser
caracterizados como: “político-partidário”, “político-econômico” e “político-sócio-
ambiental”, em razão do padrão discursivo que produzem no espaço discursivo, como
veremos a seguir. Em cada um deles, é perceptível a presença de elementos éticos e
sistêmicos diversos, porém, todos conservam o posicionamento contrário à silvicultura nas
cidades abrangidas pelo corte geográfico estabelecido nas premissas desta dissertação de
mestrado.
Cabe ainda ressaltar, que outros modos de diferenciação entre os momentos são
possíveis. Porém, para o sentido aqui utilizado, parece-nos que esta forma de diferenciá-los
atende primeiro ao escopo da Ciência Política, que é a linha que o norte ao trabalho, e
segundo, por possuírem características marcantes apontadas pela análise dos discursos,
principal marco teórico da presente pesquisa. Também é de se destacar que os “tipos”, em
dadas circunstâncias, se entrecruzam e combinam, que não se encontram em estado puro,
mas sim, como resultado da forma de percepção do observador dos discursos.
35
“Tipo” é aqui utilizado como um conjunto de categorias para a classificação de elementos-momentos que, a
partir da observação de seus discursos e posicionamento nas cadeias equivalenciais, permitem a identificação de
que conservam algumas características comuns que permitem agrupá-los em razão das semelhanças na
construção discursiva frente ao tema silvicultura. É importante sempre levar em consideração as condições de
precariedade e contingência inerentes nesta análise.
Ainda é de se destacar que, como em toda cadeia de equivalências discursiva, os
momentos “ambientalistas” não se subordinam às pluralidades de demandas que compõem
esta articulação, mesmo que esta variabilidade de demandas seja condição para a existência
desta equivalência. Estes momentos, que aqui foram agrupados e denominados de “tipos”,
possuem demandas próprias que, embora bastante semelhantes em seus objetivos, acabam por
diferenciar-se quanto ao modo de identificar suas prioridades ambientais. Esta variabilidade
não impede a precária estabilidade destas demandas, permitindo que, estas ocorram dentro de
parâmetros estabelecidos para toda a cadeia equivalencial “ambientalista”.
Para auxiliar a uma melhor visualização da cadeia articulatória “ambientalista”, o
gráfico abaixo demonstra como se estabelecem as relações de equivalência entre os “tipos”
perceptivos – com seus elementos-momento - e o respectivo ponto nodal:
.
Fig. 1: Representação da cadeia equivalencial ambientalista.
4.2 Ambientalistas “político-partidários”
O primeiro “tipo” apreciado é também o que, de longe, se faz notar com maior
clareza. Desta forma, seus momentos se constituem como possibilidade de agregar uma
disputa político ideológica à construção do discurso “ambientalista” que busca sua
Ponto
Nodal
Ambientalista – “não à
silvicultura”
Político-partidários:
MST
PT
CUT/CPERS
Político-econômicos:
Arrozeiros
Pecuaristas
Político-sócio-ambientais:
ONGS
hegemonia. Em muitas situações, estes elementos-momentos têm demonstrado uma
característica de atribuir à disputa em tela um caráter fortemente partidário, o que caracteriza
a produção de um padrão de construção discursiva.
Nos dias atuais, o ambientalismo tem se associado ao movimento social e político
em todo o mundo. No aspecto estritamente político, a título de exemplificação da utilização
da preocupação ambiental na esfera partidária, tem-se um partido que se vincula claramente à
causa ambiental, sustentando não somente em seu estatuto
36
. Mas aqui, não tratamos desta
agremiação política somente, mas também, de outras organizações, partidárias ou não.
Este “tipo” tem se afastado de argumentos cnico-científicos na área da biologia
e ecologia, e se aproximado de argumentos ideológicos mais afeitos à disputa por votos,
destacadamente nos pleitos municipais e estaduais. É fácil perceber o objetivo de demonizar o
discurso antagônico e deificar o seu, sem com isso, apresentar necessariamente apreciações
que fundamentem seu posicionamento “favorável ao ambiente”, ao menos com justificativas
defensáveis fora dos limites da ideologia partidária. Tal “tipo” ambientalista” demonstra um
viés de esquerda, vinculado ao Partido dos Trabalhadores (PT), ao Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra (MST) e à Central Única dos Trabalhadores (CUT), para destacar
os mais influentes e visíveis. Além destes grupos, outros como o Centro dos Professores do
Rio Grande do Sul (CPERS/Sindicato), também vinculado à CUT, e a Via Campesina,
movimento de âmbito internacional ligado ao MST, complementam os momentos que podem
ser incluídos neste modelo, tendo por ponto de partida a forma de análise aqui utilizada. Cada
um deles sustenta seu discurso em uma prática e em uma fala fortemente ideológico-
partidária.
4.2.1 O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
Na prática, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), vem
demonstrando que, sua preocupação diante da questão da silvicultura, não se pauta pelo
ambientalismo (aqui utilizado em seu sentido original), haja visto que, durante o mês de abril
de 2007, este mesmo MST, realizou várias interdições em estradas na região das cidades de
Pelotas, Herval e Arroio Grande, nas rodovias BR 116, BR 392 e RS 602, onde reivindicavam
terras para assentamento, ao mesmo tempo, em que defendiam a idéia de que, a monocultura
do eucalipto, fortaleceria o latifúndio e o investimento do grande capital financeiro
37
.
36
Estatuto do Partido Verde em <http//:www.partidoverde.org.br>, acessado em 21 de abril de 2008.
37
Jornal Zero Hora edição de 13/04/2008, p. 39.
Assim, neste modo de agir, o movimento apresenta duas justificativas a sustentar a
posição contrária ao cultivo do eucalipto. Estas justificativas se encontram fundadas em uma
prática discursiva, que apresenta um viés político ideológico, condizente com o
posicionamento dos políticos do Partido dos Trabalhadores. O discurso se caracteriza
primeiro, pelo argumento de que, as mudanças sociais promovidas por este modelo de
“desenvolvimento”, trarão concentração de renda, aumentando a desigualdade regional, e,
segundo, o prejuízo que sofrerá a produção rural familiar, que as áreas cultivadas
impedirão a produção de subsistência e o comércio dos excedentes. Como se pode denotar do
exposto, a preocupação ambiental passa ao largo de tal construção discursiva.
A reforçar o entendimento exposto acima, cabe destacar o manifesto da Via
Campesina, que diz:
No Brasil as empresas que controlam o deserto verde m, total apoio do governo para
implantar fábricas de celulose e ampliar o plantio de madeiras. E, estas empresas vendem a
ilusão do progresso e de que qualquer pesquisa é favorável à humanidade. No entanto, o
que recebemos é o Brasil subordinado à tirania do mercado internacional. E o agronegócio
de exportação, baseado no uso intensivo de recursos naturais e na superexploração do
trabalho. Dizemos não à tudo isto. Queremos a que a organização da economia e da
sociedade tenha no centro o bem estar e a felicidade das pessoas e não o lucro de poucos.
(MANIFESTO DAS MULHERES CAMPONESAS - VIA CAMPESINA BRASIL, 9
mar 2006)
Ao demonstrar o modo de agir que materializa o discurso deste movimento social,
ocorreu a invasão do Horto Florestal Barba Negra, em março do ano de 2007, na localidade
de Barra do Ribeiro e de propriedade da empresa papeleira Aracruz Celulose. Na fala da
representante da Via Campesina e da Marcha Mundial da Mulher, Cristiane Campos,
podemos reconhecer que o interesse principal do movimento o se encontra no aspecto
ambiental, dado o fato de externar a diferença no relacionamento estabelecido com os
produtores de outra espécie de cultura silvícola, responsável por um impacto ambiental
negativo significativo:
“A Aracruz foi apenas um símbolo, representando a Stora Enso e a Votorantin. Essas três
empresas são muito diferentes daquelas que trabalham com a plantação de Acácia, por
exemplo, com as quais nós temos um bom diálogo.” (Entrevista dada por Cristiane Campos
ao programa “Cotidiano” da Rádio Pelotense AM, em 10/03/06).
Ainda, ao verificarmos o comportamento dos assentados no município de Arroio
Grande, temos a constatação de que, são comuns entre os assentados, a prática do
desmatamento, da queimada para a “limpeza” dos campos e a caça de animais silvestres
38
.
Tais práticas são identificadas nos boletins de ocorrência lavrados pela Brigada Militar e
pelos Termos de Ajustamento de Conduta celebrados pelos poluidores junto ao Ministério
Público naquele município
39
. Uma simples visita aos locais onde se encontram assentados os
militantes do MST permite, visualmente, constatar tais práticas comuns de desrespeito para
com o ambiente
40
. Soma-se a isso o fato de se encontrar áreas de assentamento cultivadas
com eucalipto
41
, como pode ser observado na BR 116 nas proximidades do entroncamento
para a localidade de Matarazzo, interior do município de Pedro Osório, ou nos assentamentos
nas margens da RS 602, próximo ao quilômetro 09, rodovia estadual que liga os municípios
de Arroio Grande e Herval
42
.
Um bom exemplo para demonstrar o discurso deste elemento-momento é a fala
do deputado estadual petista Frei Sérgio Görgen, parlamentar gaúcho ligado ao MST e Via
Campesina, quando do lançamento de uma cartilha explicativa entitulada por “O latifúndio do
eucalipto”:
Não podemos aceitar essa enorme concentração de terras nas mãos de apenas três
empresas. Hoje são 350 mil hectares, mas até 2017 a previsão é 1 milhão de hectares.
Diante disso, precisamos romper esse bloqueio do grande capital que não permite julgar os
problemas ambientais decorrentes dessas plantações. (Zero Hora 13/06/07)
Assim, resta possível a constatação de que, a preocupação para com a
conservação do ambiente, não se encontra entre as principais do referido movimento social.
Também é possível a constatação de que a articulação deste movimento com outros
momentos “ambientalistas”, possui ligações equivalenciais que os fazem úteis para que o
discurso contrário ao eucalipto busque sua hegemonia, ainda que o simples abandono da idéia
do monocultivo de eucalipto não resulte em conquistas para os agricultores ligados ao
movimento.
38
Boletim de Ocorrência nº 3987-001/07 e 3994-001/08
39
Informação obtida em entrevista com a Drª Cristiane Levien, titular da Promotoria de Justiça da comarca de
Arroio Grande-RS em 26 de abril de 2008.
40
O pesquisador reside na zona rural de Arroio Grande, junto a rodovia estadual RS 602, no distrito de Mauá,
nas proximidades de um assentamento de agricultores oriundos do MST, no local foram obtidas fotografias
(anexo x) que demonstram visualmente o sustentado no texto.
41
Cada família assentada pelo Incra no Estado ganha um lote de extensão entre 18 e 24 hectares, em média. Em
terrenos acidentados, chega a medir 28 hectares. No programa de fomento florestal promovido pela Votorantim
Celulose e Papel na região Sul, por exemplo, são negociados 10 hectares de cada agricultor, quase metade do
lote. Outras empresas do setor e bancos estaduais, como a Caixa RS, também oferecem crédito aos agricultores
para plantio de pinus e eucalipto.
42
Como pode ser observado nas fotografias (anexo 1) obtidas nos locais visitados durante o período de
elaboração desta pesquisa.
4.2.2 O Partido dos Trabalhadores
Ainda na esteira de caracterizar os momentos que se equivalem na construção
discursiva “ambientalista”, no “tipo” político-partidário, temos os partidos políticos e seus
representantes, com destaque especial ao Partido dos Trabalhadores. Nas discussões em torno
do Zoneamento Ambiental da silvicultura
43
, mais especificamente nas audiências públicas
promovidas pela Secretaria do Estado para o Meio Ambiente e Fundação Estadual de
Proteção Ambiental, ambas do Rio Grande do Sul, políticos do referido partido, como o
Vereador Ivan Duarte, do Município de Pelotas, reiteradas vezes têm demonstrado sua
preocupação com a monocultura de eucalipto. A preocupação do Vereador se deve, nas
palavras deste:
(...) principalmente pelo impacto resultante nas economias locais e na mudança nas
cadeias produtivas que deixarão a população à mercê de um único grupo econômico, além
de resultar em impactos ambientais significativos como a questão da água.
44
Nota-se aqui, uma preocupação principal para com a economia local e com a
concentração de poder nas mãos de poucos, e uma preocupação secundária para com os
resultados ambientais. Quando perguntado sobre os fundamentos de tal argumento, apresenta
justificativas fortes para a primeira, referente ao aspecto sócio-econômico, e nenhuma
fundamentada para a segunda, de fundo eminentemente ambiental e drico. A característica
nas falas dos ambientalistas desta categoria é precisamente a ausência de fundamentos
realmente ecológicos
45
e cientificamente plausíveis
46
. Em suas práticas, são raros os atos de
eminente preocupação ecológica, basta analisar os projetos de lei de fundo ambiental por
estes políticos apresentados em suas casas legislativas
47
. Trata-se de um discurso que não
apresenta manifestamente um conteúdo propriamente preocupado com o ambiente, mas tão-
somente como retórica político-partidária.
43
Em 20 de agosto de 2007, realizou-se a audiência pública na cidade de Pelotas-RS no Theatro Guarany. As
manifestações orais foram acompanhadas e gravadas pelo pesquisador.
44
Entrevista gravada da Rádio Pelotense AM, Programa “Cotidiano”, em 19/08/2007.
45
No sentido da ausência de significações respaldadas em uma visão não exclusivamente antropocêntrica, e no
sentido dado ao conceito de desenvolvimento, discutidos no capítulo teórico..
46
Sem uma teoria ou hipótese cientificamente construída.
47
No período referente ao recorte temporal desta pesquisa somente um projeto de lei (não aprovado) foi
apresentado pelas bancadas do PT nas três cidades constantes do recorte espacial do presente trabalho.
4.2.3 Central Única dos Trabalhadores / Centro dos Professores do Estado do Rio
Grande do Sul
A Central Única dos Trabalhadores vem participando da discussão quase sempre
representada pelo CPERS, seu filiado. Os professores do Estado do Rio Grande do Sul têm
apresentado uma preocupação maior para com os trabalhadores rurais sem terra, a
concentração de terras nas mãos de poucos e o enriquecimento do grande capital. Quanto ao
aspecto ambiental propriamente dito, apresenta os mesmos argumentos não justificados e
baseados em “achismos”
48
, que, não foram apresentados até o momento, estudos
habilitados para apontar os resultados no ambiente do cultivo. Certamente é uma das
primeiras oportunidades em que o CPERS vem demonstrar sua preocupação para com o
ambiente enquanto sindicato de professores, embora esta preocupação conste das finalidades
do Centro
49
. É evidente que existem professores ligados a este Centro que realmente possuem
posicionamento fortemente fundamentado frente à questão, porém, suas vozes não têm tido
espaço nas oportunidades em que a discussão foi aberta para a comunidade.
O que tem transparecido nos debates onde foi oportunizado ao CPERS apresentar a
posição que defende, é que a sua principal função diante da questão da silvicultura é a de
representar os interesses políticos de seus diretores vinculados à CUT e ao Partido dos
Trabalhadores
50
. Portanto, replicam em seu discurso o posicionamento e as justificativas
sustentadas por este modelo que, se apresenta com um forte viés político ideológico e que se
coloca bastante apartado da justificação “ambientalista”, utilizada por outros elementos-
momentos da mesma cadeia equivalencial discursiva. Este posicionamento, pode ser
verificado em panfletos da entidade (CUT), assinados por Regina Abrahão, Diretora do
Semapi (RS) e secretária de Políticas Sociais CUT-RS, onde consta:
Ao agricultor, expulso da terra pela monocultura, enganado e empobrecido restarão as
favelas das cidades e a lembrança do tempo em que seu horizonte era o verde pampa
gaúcho. (...) a silvicultura irá desconfigurar o horizonte da metade sul do RS, a celulose
transformada, clorada e purificada irá acrescentar mais-valia ao salário do trabalhador
europeu ou estadunidense, uma vez que o produto final será para exportação.(...) (Panfleto
CUT,20/05/07)
.
48
“... achamos que a cultura do eucalipto causará muitos impactos ambientais, qualquer um pode ver isso.” Fala
do representante do CPERS/Sindicato na audiência pública para tratar do zoneamento ambiental ocorrida em
dezembro de 2007 no Centro de Cultura Basílio Conceição de Arroio Grande-RS.
49
Estatuto Social do CPERS:
Art. - São finalidades do CEPERS/SINDICATO: l) a proteção do consumidor, do meio ambiente e do
patrimônio artístico, cultural, histórico, estético, turístico e paisagístico. In: <
www.cpers.com.br/portal2/estatuto/estatuto.pdf>.
50
Nas audiências públicas referentes à questão da silvicultura eram colocadas nas paredes dos locais de
ocorrência das mesmas, bandeiras da CUT, CPERS/Sindicato e do Partido dos Trabalhadores.
Não se trata de encontrar equívoco no fato de um sindicato de professores
demonstrar preocupação para com a causa ambiental e as conseqüências advindas da
instalação de um empreendimento do porte do Projeto Losango no ambiente. Trata-se de
buscar entender os verdadeiros motivos que trazem esta pauta para as discussões internas
deste sindicato e os interesses que se encontram velados em tais posicionamentos e atitudes.
Da análise do discurso sustentado pelo CPERS é possível conjecturar as motivações e
objetivos de tal posicionamento no espaço discursivo aqui analisado.
Conclui-se que, apesar de os momentos equivalerem-se na cadeia discursiva
ambientalista, e de serem importantes meios para buscar estabelecer a hegemonia deste
discurso, os que foram aqui caracterizados como “tipos ambientalistas político-partidários”,
não contribuem para a discussão da questão sob a ótica eminentemente “ambientalista”
51
. Isto
ocorre, na medida em que a demanda que os liga equivalencialmente aos demais elementos
que constituem a cadeia equivalencial do “não para a silvicultura”, parece ser a baseada na
luta política significada pela conquista de cargos eletivos, pelos candidatos agremiados nos
partidos da denominada “esquerda” brasileira, majoritariamente filiados ao Partido dos
Trabalhadores, não havendo uma preocupação marcante para com os efeitos ambientais
decorrentes do estabelecimento do ciclo produtivo do eucalipto, nas cidades alvo, da presente
dissertação.
4.3 Ambientalistas “político-econômicos”
Este “tipo” de percepção, o segundo de um total de três, tem como principal
característica o viés econômico que é perceptível na sua construção discursiva, tanto na
práxis como na verbis. Majoritariamente constituído por produtores rurais, com especial
destaque na atuação para os orizicultores e para os pecuaristas. Estes grupos vêm ocupando
espaços na mídia e nos debates sobre a silvicultura com uma postura contrária ao
monocultivo de eucalipto.
Em tempo, é de relevante importância destacar que, dentre os produtores rurais há os
que se colocam favoráveis à silvicultura. Estes proprietários rurais dispõem de terras
improdutivas em grandes extensões, aptas à plantação de eucaliptos e de grande interesse para
o Projeto Losango. Estes proprietários são, em sua grande maioria, integrantes da cadeia
51
que este discurso ao desenvolvimento um sentido mais complexo, que não privilegia somente o aspecto
do crescimento econômico, o que se mostra como principal traço de antagonismo frente ao discurso
“desenvolvimentista”.
equivalencial do “desenvolvimentismo”, portanto, se colocam em posição antagônica aos
orizicultores e bovinocultores.
Os produtores rurais, que se colocam na posição de contrariedade ao cultivo do
eucalipto em suas regiões, pautam sua fala pela alteração da matriz produtiva
52
e no impacto
negativo a ser suportado pelo ambiente, em razão do estabelecimento desta cultura silvícola.
Sustentam que, a silvicultura irá gerar impacto negativo no ciclo hidrológico e na demanda
por água, colocando em risco o equilíbrio no ambiente local
53
. Neste aspecto, sua
preocupação se justifica por duas razões: a primeira é o grande consumo de água em razão do
cultivo do arroz irrigado, cultura predominante principalmente no Município de Arroio
Grande; a segunda se caracteriza pela redução de áreas pastoreáveis para a bovinocultura,
que, segundo estes produtores, pode acabar por provocar a derrubada de áreas ainda nativas
para a criação de novas pastagens
54
.
Nota-se que, embora realmente conste uma possível interpretação ambiental nestes
discursos, resta fácil constatar que a justificativa também abarca uma eminente preocupação
com a produção destes ruralistas e seus lucros. Embora ocupem posição na cadeia
equivalencial do “não para a silvicultura”, ao lado de outros momentos discursivos
“ambientalistas”, a demanda que permite o estabelecimento destas equivalências transparece
seu viés econômico, que se sobrepõe sobremaneira ao viés preservacionista. Isto pode ser
constatado na práxis degradadora do ambiente levada a cabo por estes produtores que, na
maioria dos casos
55
, contradiz a verbis que sustentam tanto na mídia quanto nas audiências
públicas concernentes ao tema da silvicultura.
4.3.1 Os arrozeiros
Os arrozeiros são pródigos em promover impactos ambientais negativos,
principalmente em ecossistemas aquáticos e na ave fauna, que utilizam fertilizantes,
52
A economia da região está fortemente vinculada ao setor agropecuário, visto que os 3 municípios estudados
têm mais de 50% da sua renda gerada nesse setor.
53
Este argumento é o único sustentado pelos arrozeiros que permite incluir tal elemento-momento no “tipo” de
percepção “ambientalista”.
54
A pedido constante do jornal “Meridional” de Arroio Grande, pago pelo sindicato rural do município em
04/11/2007, p.3.
55
O plantio de arroz irrigado traz consigo a característica de demandar grandes quantidades de água. Este
recurso natural, na grande maioria das vezes, é obtido por bombas de sucção que retira de rios, canais naturais e
lagoas uma grande quantidade de água intervindo no fluxo natural destes mananciais hídricos. Além deste fato, a
sucção mata a fauna ictiológica e o uso de produtos químicos (fertilizantes e herbicidas) polui a água não
utilizada que, retornando aos mananciais, causa ainda mais degradação do ambiente.
herbicidas e fungicidas em grande escala em suas culturas
56
. O bombeamento de água, de
cursos de água e lagoas para a irrigação de seus cultivos, altera o curso dos rios e chega a
secar lagoas inteiras nos anos de estiagem. Além disto, as bombas de sucção, utilizadas para
bombear água para as lavouras acaba por gerar impactos na fauna ictiológica destes
mananciais de água.
A principal razão de os arrozeiros, enquanto momentos discursivos, estabelecerem
ligações equivalenciais entre suas demandas e as de outros momentos “ambientalistas” no
espaço do discurso é o risco de a cultura do eucalipto tornar-se campo de produção a cultura
hegemônica, a ponto de representar risco para a produção de arroz. Tal situação resultaria em
uma perda para os orizicultores, não somente na área de cultura
57
, como também, na disputa
de poder econômico e político nos municípios pesquisados.
4.3.2 Os pecuaristas
Quanto aos pecuaristas, sua preocupação ambiental passa ao largo do impacto do
gado nas matas nativas, no pisoteio de gramíneas e na contaminação do lençol freático pelas
fezes dos animais. Sabe-se também que, conforme dados divulgados pela Environmental
Justice Foundation; FAO/ONU - Food and Agriculture Organization órgão da Organização
das Nações Unidas, para a produção de 1 Kg de proteína animal são necessários 4 kg de
proteína vegetal. Em relação ao consumo de água, de acordo com o Relatório Unesco para o
Fórum Mundial da Água, enquanto que para produzir 1 kg de soja são dispendidos 500 litros
de água, para a produção de 1 kg de carne são utilizados 15 mil litros
58
. Estes dados
corroboram com a interpretação que indica uma preocupação mais econômica do que
preservacionista nos discursos destes produtores. Mesmo assim, este momento discursivo
ocupa o espaço discursivo equivalencialmente ligado ao ponto nodal “ambientalista” e suas
demais demandas.
A motivação aproxima-se da apresentada no discurso dos demais produtores rurais
integrantes da cadeia equivalencial do “ambientalismo”. Temem a perda de
representatividade nas esferas de decisão e de poder econômico em seus municípios, o
56
Os insumos utilizados para na cultura do arroz irrigado são demonstrados e indicados pelo IRGA- Instituto
Riograndense do Arroz . Para conhecer exemplos ver <www.irga.rs.gov.br>.
57
Somente no município de Arroio Grande são cultivados aproximadamente 35.000 hectares de arroz (fonte:
Prefeitura municipal de Arroio Grande, 2007).
58
in:< www.unesco.com>.
decréscimo na área para produção
59
, além de anteverem um provável decréscimo em seu
poder político.
Apesar deste posicionamento atual, alguns produtores pretendiam casar a produção
silvícola com a bovinocultura, na chamada atividade agrosilvopastoril. Tal casamento,
somente se demonstrou possível nos primeiros estágios de crescimento do eucalipto, quando
o sombreamento
60
não é ainda expressivo. Com o passar do tempo, e com o estágio de
crescimento mais desenvolvido, a sombra produzida pelas árvores impede a fotossíntese, o
crescimento de gramíneas torna-se inviável, impedindo a alimentação do gado e sua engorda
por meios naturais. A alimentação do rebanho, por outro meio, apresenta-se economicamente
desvantajosa, o que resulta na inadequação deste casamento, ao menos, nas áreas cultivadas
com eucalipto com o espaçamento
61
padrão.
4.4 Ambientalistas “político-sócio-ambientais”
O terceiro e último “tipo” perceptivo, embora com marcante posição
antropocêntrica
62
, aproxima-se bastante da idéia contida originalmente na expressão
“ambientalismo”. Os momentos discursivos que se equivalem no posicionamento “não para a
silvicultura” que se adequam nesta concepção de “modelos”, são geralmente ONGs que
possuem atuação na sociedade local sem nculos com outras entidades sindicais ou
partidárias. Seu discurso se caracteriza por um posicionamento cujos fundamentos e
justificativas encontram-se na preocupação para com o equilíbrio do ambiente, ainda que de
um ponto de vista evidentemente não biocêntrico
63
. Em razão de sua pouca disponibilidade de
dinheiro, estas instituições ou grupos passam a ter maiores dificuldades para disseminar suas
idéias dentre a sociedade, principalmente quando temos por contraponto a massiva
quantidade de propagandas e artigos dispostos na mídia em defesa da silvicultura, financiados
de diversas formas por vários entes públicos e privados.
Uma das mais importantes características deste “tipo” de percepção é a
preocupação em buscar, em fundamentos técnico-científicos e no estudo da implementação
deste ciclo produtivo em outros locais, justificativas e razões que possam ser úteis para
59
Em Arroio Grande os campos são ocupados por aproximadamente 180.000 cabeças de bovinos e ovinos.
(fonte: Secretaria da Agricultura de Arroio Grande, 2007).
60
Projeção da sombra produzida pela árvore, em anteposição ao sol, sobre o solo.
61
Espaço deixado entre as mudas de eucalipto quando de seu plantio. Na maioria das localidades visitadas este
espaçamento é de 3x3m e 3x2m.
62
Antropocentrismo é uma maneira de interpretar os fatos e significar os conceitos a partir da idéia de que o ser
humano é a medida de todas as coisas.
63
Biocentrismo é uma forma de significar conceitos tendo por norte a idéia de que a vida, em todas as suas
formas, deve ser a medida das coisas. Trata-se de um ponto de vista diametralmente oposto ao antropocentrismo.
demonstrar o receio de que o ambiente seja afetado de maneira desmesurada. Com pouco
espaço na mídia e com dificuldades até para organização e pessoal, estes momentos
discursivos sofrem com a desvantagem diante do poder de propaganda e da grande sedução
provocada na população local pelo gigantesco empreendimento e sua oferta de trabalho e
renda.
O ambientalista do CEA (Centro de Estudos Ambientais), Luiz Rampazzo,
demonstra a preocupação central deste elemento-momento, em uma das suas intervenções na
Audiência Pública realizada no Município de Arroio Grande:
Toda e qualquer prática da monocultura, ainda mais pela grande utilização de agrotóxicos,
os chamados venenos agrícolas, tem causado, de uma forma ou outra, grandes
desequilíbrios ambientais. Não pela infestação de besouros que nós temos visto nas
monoculturas de eucalipto, de pinus, e de acácia negra. Mas sinal desse desequilíbrio
também é a mortandade de abelhas, que isso é uma coisa que tem nos preocupado.
(Rampazzo, Luiz, 2007).
Embora ocupando a mesma cadeia equivalencial, os outros “tipos” de percepção,
na grande maioria das vezes, acabam por afetar negativamente os propósitos da percepção
“político-sócio-ambiental”. Esta afetação negativa pode ser percebida no fato de que os
demais “tipos”, que também se equivalem no discurso do “não para a silvicultura”, utilizam-
se de fundamentos e justificativas que raramente encontram abrigo no rol de argumentos dos
ambientalistas com preocupações eminentemente de fundo ecológico, social e
preservacionista. Estes últimos, buscam justificar seu posicionamento contrário à silvicultura,
tendo por principal razão a incerteza de que o impacto ambiental a ser gerado, poderá ser
mitigado e revertido pelo empreendedor. Não se colocam contrários em razão de disputas
político partidárias, nem encontram nas relações econômicas motivos para seu
posicionamento. Ao contrário, encontram no princípio da precaução
64
o motivo para
defenderem o bioma do que entendem como um empreendimento nocivo.
Este aspecto discursivo destes elementos-momento, que compõem a
cadeia articulatória “ambientalista”, aqui identificada pelo tipo de percepção como “político-
sócio-ambiental”, pode ser demonstrado pela fala da bióloga Luiza Chomenko:
A “metade sul” do Rio Grande do Sul corresponde aproximadamente aquilo que se
denomina bioma pampa, o qual é o único do Brasil que ocupa apenas um Estado brasileiro,
tendo especificidades e potencialidades imensas. Estes aspectos, muitas vezes, são
desconsiderados e, no caso específico da silvicultura, existem inúmeros estudos em centros
de pesquisas e de regulamentação legal, os quais ainda não estão concluídos. As empresas
vêm implantando seus cultivos sob o argumento de que, caso seja necessário,
64
Princípio de Direito Ambiental que exige uma comprovação científicamente sustentada de que a ação poderá
ser suportada pelo ambiente, ou ao menos mitigada em seus resultados danosos.
posteriormente poderão ser feitas correções, tendo uma abordagem no mínimo
questionável. (http://www.unisinos.br/ihuonline/, acesso em 09/03/07).
Nesta fala, é possível identificar não a preocupação para com as presentes e
futuras gerações, característica do sentido dado à sustentabilidade, como também, para com a
precaução no uso dos recursos naturais do bioma pampa, princípio este basilar em nosso
direito ambiental. Estes argumentos são difíceis de ser refutados pelas empresas, o que tem
sido possível identificar em seus documentos, sites e intervenções, tanto na mídia como nas
audiências públicas. Esta constatação será abordada com a profundidade devida no capítulo
destinado a analisar os embates entre os momentos “ambientalistas” e “desenvolvimentistas”.
4.5 Considerações
O intento de utilizar os “tipos” de percepção, visa permitir melhor compreender a
diversificação de justificativas utilizadas pelos momentos no discurso caracterizado pelo “não
para a silvicultura”. A compreensão destes “tipos” se faz necessária no sentido de buscar
separar as diferentes visões de mundo que, se equivalem neste ponto de fixação discursivo,
mantendo a equivalência em suas demandas na proteção do ambiente, sendo esta preocupação
primária ou secundária em seus objetivos. Nas análises das entrevistas e nas pesquisas em
edições da imprensa, que ocupam outro capítulo desta dissertação, serão melhor destacadas
estas diferenças, tornando mais claros os posicionamentos e suas motivações políticas e suas
conseqüências na busca destes momentos pela hegemonia de seu discurso.
CAPÍTULO V
Os “desenvolvimentistas”
5.1 Introdução
Diante da possibilidade da instalação de um grande ciclo produtivo, baseado na
monocultura de uma espécie vegetal exótica, o eucalipto, nas três cidades constantes no
recorte geográfico deste trabalho, Pelotas, Arroio Grande e Herval, caracterizou-se um corte
antagônico que, em cada uma das suas fronteiras, permitiu a formação de duas cadeias
discursivas que, através deste embate antagônico, buscam a hegemonia no espaço discursivo
em análise. Os grupos que se equivalem em cada um dos discursos, um favorável e outro
contrário a esta instalação, foram denominados para utilização nesta pesquisa como
“desenvolvimentistas” e “ambientalistas”, respectivamente.
No capítulo anterior, foi descrita uma análise dos elementos-momento que integram
a cadeia articulatória “ambientalista” e suas principais características discursivas. o
presente capítulo, destina-se a descrever os elementos-momento que compõem a cadeia
equivalencial “desenvolvimentista”, destacando suas justificativas e principais fundamentos
discursivos. Esta parte do trabalho começa por descrever os principais elementos-momento
deste discurso, passando por suas justificativas e acabando por identificar as demandas que
estabelecem as ligações equivalenciais entre os grupos que compõem esta cadeia discursiva.
5.2 Elementos-momento do discurso “desenvolvimentista”
Esta cadeia articulatória possui elementos-momento que, em regra, são bastante
distintos, mas que, diante deste corte antagônico, apresentam demandas que se equivalem
pelas mais diversas razões, tendo, todas elas, a característica de buscar a hegemonia do
discurso favorável ao ciclo produtivo de celulose de eucalipto. Estes elementos-momento
unem-se equivalencialmente pela lógica econômica, que todos os grupos que formam tais
elementos buscam uma melhora na sua renda e oportunidades econômicas diversas, como
poderá ser constatado no seguimento do texto. Produtores rurais, empresários, pretensos
futuros empregados e políticos encontram na instalação do ciclo produtivo de celulose de
eucalipto uma oportunidade de crescimento econômico que os une nesta cadeia equivalencial.
Tendo por base a necessidade que as cidades abrangidas pelo corte territorial desta pesquisa
apresentam em crescer economicamente, que todas as três possuem em comum um quadro
de estagnação histórica no aspecto econômico e social.
Pode-se identificar, pelo menos, quatro grupos ocupando posições nesta cadeia
equivalencial “desenvolvimentista”: os empresários locais, os proprietários rurais com áreas
utilizáveis para plantio de árvores, parte da população,que vislumbra neste ciclo produtivo
oportunidades de emprego, e os políticos, sejam eles detentores ou pretendentes de cargos
eletivos.
Para auxiliar a uma melhor visualização da cadeia articulatória
“desenvolvimentista”, a figura abaixo demonstra como se estabelecem as relações de
equivalência entre os “tipos” perceptivos com seus respectivos elementos-momento - e o
ponto nodal discursivo.
Fig 2: Representação da cadeia equivalencial Desenvolvimentista.
5.2.1 Os empresários
Nos municípios de Pelotas, Arroio Grande e Herval é visível a necessidade de novas
alternativas econômicas de geração de renda e trabalho. Esta necessidade pode ser
comprovada desde a análise dos resultados obtidos pelo censo do IBGE, pelo calculo e
comparação do IDESE
65
, e demonstrados no relatório final do estudo científico elaborado
pela Universidade Federal de Santa Maria em dezembro de 2006
66
.
65
O IDESE é um índice sintético, inspirado no IDH, que abrange um conjunto amplo de indicadores sociais e
econômicos classificados em quatro blocos temáticos: educação, renda, saneamento e domicílios e saúde. Esse
índice varia de zero a um e, assim como o IDH, permite que se classifique o Estado, os municípios ou os
Coredes em três níveis de desenvolvimento: baixo (índices até 0,499), médio (entre 0,500 e 0,799) ou alto
(maiores ou iguais que 0,800).
66
Impactos socioeconômicos da produção de celulose em larga Escala: o projeto da empresa votorantim na
metade sul (RS).
Ponto
Nodal Desenvolvimentista
Proprietários Rurais
Empresários:
CDL
Sinduscon
CIPEL
Políticos:
AZONASUL
FAMURS
AL/RS
Governo Estadual
Parte da População com
Expectativa de Geração de
Postos de Trabalho:
Força Sindical
A estagnação
67
na circulação de riquezas gera redução na capacidade de compra de
bens e serviços pela população, fato este que limita as possibilidades de crescimento dos
negócios comerciais estabelecidos e dificulta a abertura de novos negócios. Os empresários
locais, pequenos em sua grande maioria, desejam, muito, uma mudança no mercado. Uma
alternativa de mudança que surge no horizonte é a instalação do ciclo produtivo da celulose
de eucalipto, e ela é muito bem vista por este grupo. A economista Maria Benetti, da
Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul, ligada ao governo do Estado
assevera que:
As propriedades desta região do estado são, em geral, utilizadas pela pecuária extensiva,
muitas das quais exploradas com baixa produtividade, com potencial de exploração pela
silvicultura, de maneira adequada. (O Papel, março de 2007.)
As três cidades possuem características comuns, principalmente no que diz respeito à
sua matriz produtiva. Baseadas no setor primário de produção, estas cidades mantêm sua
matriz produtiva fortemente ligada à produção rural, seja ela agrícola ou de produtos de
origem animal. As indústrias, com exceção do município de Pelotas, não possuem grande
destaque nestas economias. Salvo o beneficiamento de arroz e o abate de bovinos, a cadeia
produtiva industrial vem sofrendo um decréscimo em sua influencia nas economias locais nas
últimas décadas.
O desemprego e a baixa arrecadação de impostos geram um quadro de grandes
dificuldades na satisfação da maior parte das necessidades básicas da grande maioria da
população. A baixa renda de seus habitantes, aliada ao grande índice de desemprego, dificulta
o crescimento em vários setores da economia, como no comércio por exemplo.
Os empresários são assim atingidos por uma coleção de fatores que contribuem para
o não crescimento do consumo, necessitando urgentemente de uma alternativa que gere
impacto em toda a economia local, de modo a alavancar um crescimento na capacidade de
consumo da população. A silvicultura é uma destas alternativas e, por esta razão econômica,
recebe o apoio irrestrito da quase totalidade dos empresários da região econômica em
questão.
No âmbito da constituição da cadeia discursiva “desenvolvimentista”, o grupo dos
empresários vem desempenhando um papel determinante. Seja em razão de seu poder
econômico, seja pela sua capacidade de influenciar a opinião pública, o discurso empresarial
pode ser considerado como o principal elemento-momento desta cadeia equivalencial
67
Este processo de estagnação pode ser verificado a partir da comparação dos dados estatísticos disponibilizados
discursiva. Este fato justifica-se na medida em que são os próprios empresários os
responsáveis pelo estabelecimento do ciclo produtivo da celulose de eucalipto na região, a
partir do anúncio do projeto losango pela empresa Votorantim.
Os Clubes dos Dirigentes Lojistas (CDLs) são as instituições utilizadas por este
grupo como canal de propagação de seu discurso desenvolvimentista. Em seus encontros,
internos ou abertos ao público, evidenciam a importância de uma modificação na cadeia
produtiva local, capaz de gerar empregos, aumentar a renda e a circulação de dinheiro,
fazendo assim, com que a capacidade média de consumo da população sofra um acréscimo
68
.
Este aumento na capacidade de consumo, por sua vez, permitira um maior consumo e,
conseqüentemente, um aumento nos lucros destes empresários do ramo do comércio.
Também os empresários da construção civil, que no Município de Pelotas integram o
Sindicato da Indústria da Construção (SINDUSCON), vislumbram um cenário promissor no
estabelecimento do ciclo produtivo da celulose na região, como pode ser constatado nas
manifestações na mídia local
69
. A possível vinda de trabalhadores,e o aumento na renda dos
empregados locais, deverá gerar um acréscimo na demanda por moradias, implementando o
mercado da construção. Este implemento levará à construção de novos imóveis e ampliação
dos existentes, possibilitando um aumento nos lucros destes empresários da construção
civil.
No âmbito industrial, além da própria planta de celulose, o acréscimo na capacidade
de consumo poderá incrementar a demanda e possibilitar o surgimento de novas indústrias na
região, objetivando atender a esta nova demanda por produtos disponíveis para consumo. O
Centro das Indústrias de Pelotas (CIPEL) tem demonstrado sua expectativa na concretização
deste cenário, seja em manifestações de sua presidência nas rádios, seja nas manifestações
reproduzidas em periódicos do Município de Pelotas (tens de provar a tua afirmação com
qualquer um dos meios indicados). Aqui, como nos demais subgrupos de empresários, a
expectativa por aumento nos lucros faz com que este elemento-momento seja um dos
principais defensores e divulgadores do discurso desenvolvimentista.
pelo IBGE, tais como renda per capta e PIB dos municípios da “metade sul”.
68
Estudo realizado pela Universidade Federal de Santa Maria aponta para um incremento no comércio e na
arrecadação de impostos nos municípios integrantes do Projeto Losango.
69
Programa Pelotas 13 Horas, Rádio Universidade AM, 04/04/2007.
5.2.2 Os proprietários de terras
A área rural dos municípios aqui abrangidos é caracterizada por grandes extensões
de terra - cujas propriedades, em geral, cabem a uma pessoa é, portanto, uma zona de
latifúndios. Estas grandes propriedades, para se tornarem produtivas, necessitam de um
investimento proporcional à área que ocupam e de um mercado que absorva sua produção.
Atualmente, grande parte da área rural destes municípios é ocupada pela criação extensiva de
rebanhos, de gado em sua esmagadora maioria. Trata-se de uma cultura que justifica
aparentemente a necessidade de grandes áreas, torna a terra produtiva e, comparativamente,
gera menos custos ao produtor rural. Ocorre que, o preço do produto vem sofrendo oscilações
no mercado, ao passo que, os insumos para a produção vêm sofrendo acréscimos em seu
custo, reduzindo assim, os lucros dos produtores.
Com a possibilidade de produzir eucalipto, o proprietário rural defronta-se com a
possibilidade de aumentar seus lucros, sem a necessidade de um aumento em seus
investimentos - dado o fato de que a cultura do eucalipto apresenta menor necessidade de
aporte de capital diante das demais culturas tradicionalmente desenvolvidas - além de contar
com a comercialização futura do produto assegurada pela empresa de beneficiamento de
celulose. Soma-se a isso, o baixo custo de manejo da cultura e a não necessidade de retirar
imediatamente o gado da área de plantio, já que os animais não se interessam pelo eucalipto
como alimento. Pode-se casar a produção em seus primeiros anos, facilitando a substituição
de uma cultura por outra. Mais um fator a contribuir é o aumento do preço do hectare de terra
gerado pela grande procura de terras, para o cultivo de eucalipto promovido pela empresa
VCP.
A demonstrar esta situação, as afirmações de Paulo Rogério Soares de Oliveira,
em sua tese de doutoramento, são explicativas:
Entende-se que a participação de produtores rurais na produção de madeira tem aspectos
importantes no que se refere à distribuição da renda gerada pelas indústrias de base, na
geração de trabalho e emprego e na redução da necessidade de concentração de mais terras
para atender à demanda industrial, e, diante do grande nível de ociosidade das terras em
diversas regiões onde a presença de indústrias florestais, a inclusão de produtores rurais
nesse processo atende uma demanda social. (Oliveira, Paulo Rogério Soares, 2007)
Todas estas facilidades fazem com que o produtor rural de grandes propriedades,
produtivas ou não, encontrem interesses econômicos em apoiar esta nova cultura. Trata-se de
uma oportunidade que se apresenta como uma saída momentaneamente lucrativa e animadora
para estes proprietários e que, ao que parece, não passará em vão, que mais de 70 mil
hectares já foram plantados com eucalipto nas áreas inclusas no Projeto Losango.
5.2.3 Expectativa de geração de postos de trabalho por parte da população
economicamente ativa.
A denominada “Metade Sul” do Rio Grande do Sul, é a parte mais pobre na
economia do Estado, embora detenha a maior parte do território
70
. É nesta “metade” que
encontramos os mais altos índices de desemprego e a menor renda per capta do Estado
71
. Mas
nem sempre foi assim. A economia passou de um período de destaque em meados da década
de 1970, para um período de empobrecimento que continua até hoje
72
. Este quadro faz com
que as oportunidades de trabalho se reduzam e basicamente se restrinjam ao comércio e
serviços, geralmente mal remuneradas e sem a mínima percepção de estabilidade. A
economia informal vem sofrendo grande incremento, sem com isso, melhorar a qualidade de
vida ou a geração de renda.
É neste quadro de dificuldades que a silvicultura vem se apresentar como uma
grande oportunidade de trabalho, melhor remunerado e com geração de renda aliada ao
crescimento econômico. Imediatamente, a grande maioria da população que se encontra na
economia informal ou desempregada, visualizou uma oportunidade ímpar para encontrar
emprego formal, com direitos trabalhistas respeitados e com melhor qualidade de vida. Esta
oportunidade garantiria uma melhor situação econômica para os que conseguirem participar
da produção ou beneficiamento, gerando novos postos de trabalho de forma direta ou indireta.
O anúncio de que, a atividade da silvicultura geraria mais de 34.000 empregos,
diretos e indiretos
73
, serviu como um incentivo para que parte da população antevisse a
melhoria na economia local e, consequentemente, a melhora na economia de cada família. A
oportunidade viria com as plantações e, posteriormente, com a fábrica. Cabe aqui ressaltar
que, em contrariedade com o anunciado pela reportagem do jornal A Evolução, de Arroio
Grande, o material fornecido pela própria VCP e intitulado “Metade Sul: Estudo de Impacto
Ambiental”, em sua página 5, informa a geração de 300 empregos diretos e 2.200 indiretos
entre os impactos econômicos gerados pelo Projeto Losango.
70
Os municípios da área de abrangência da VCP e fronteiriços são pequenos em termos de PIB e de população.
De um modo geral, em 2003, dos 29 municípios analisados apenas quatro deles se situam entre os 50 maiores
PIB do Estado, são eles: Rio Grande, Pelotas, Bagé e Dom Pedrito. Com relação à renda per capita, que é um
indicador de desenvolvimento, constatou-se que somente Aceguá está entre os 50 maiores do Estado, ao passo
que os maiores municípios, Pelotas e Rio Grande, ocupam a 45e 67ª posições no ranking estadual. Dados
obtidos junto ao IBGE.
71
Estudo de Impacto Ambiental, EIA/RIMAFLORESTAL (VCP), Volume I, Tomo I..
72
A pujança que a região observava na década de 1970 era tamanha que a revista Manchete, em sua edição 1073
de 1972, trazia suplemento bilíngüe de 35 páginas tratando do tema “Caminhos da Produção” onde a “Zona Sul”
era apontada como a “Califórnia Brasileira” em razão de se apresentar como uma então ótima localização para
investimentos em razão de toda a infra-estrutura e riqueza de produção que apresentava.
73
Jornal A Evolução, Arroio Grande, Sexta Feira, 30 de maio de 2008, p. 11.
Ocupando o posto de possível porta-voz deste grupo, a Força Sindical, aparece
como propagadora da idéia de que, a geração de empregos por parte do ciclo produtivo da
celulose, é uma das únicas alternativas presentes para a ocupação remunerada da mão-de-obra
ociosa nas cidades pertencentes ao recorte espacial da presente pesquisa. Este
posicionamento, e a sua respectiva defesa, vêm sendo observados nas audiências públicas,
como pode ser observado na Audiência Pública onde foi apresentado o Estudo de Impacto
Ambiental pela VCP
74
A importância desta organização, na defesa deste posicionamento, frente à
questão da silvicultura, destaca-se nas audiências públicas onde representantes da organização
sindical, identificados e uniformizados, tomam a quase totalidade dos espaços destinados ao
público, impedindo a participação de pessoas contrárias ao seu posicionamento e
monopolizando a possibilidade de manifestação. Tal situação pode ser observada em pelo
menos duas oportunidades.
A primeira oportunidade observada, na audiência pública promovida pela FEPAM e
destinada a discutir o zoneamento ambiental para a silvicultura (ocorrida em 17/08/2007 no
Theatro Guarany), vários ônibus levaram os manifestantes da Força Sindical para o local do
evento. Carros de som foram utilizados para propagandear o posicionamento desta central
sindical frente ao tema a ser discutido. Na oportunidade, os manifestantes demonstraram sua
indignação frente ao zoneamento ambiental apresentado, dado o fato de compreenderem que
tal regramento impediria uma maior área plantada. Ainda na compreensão deste grupo, esta
redução acarretaria em uma diminuição na oferta de postos de trabalho, principal bandeira da
central sindical em questão.
Em uma segunda oportunidade, agora no SESI/SENAT, também em Pelotas, na
audiência pública destinada a apresentar o Estudo de Impacto Ambiental do Projeto Losango,
a grande maioria dos assentos foram ocupados por manifestantes uniformizados, identificados
como representantes da Força Sindical. Nesta oportunidade, manifestaram seu apoio ao
Projeto Losango, baseados na interpretação de que tal empreendimento virá a gerar novas
oportunidades de ocupação remunerada e melhor qualificação da mão de obra a ser utilizada,
tanto na cultura do eucalipto, quanto na indústria de celulose.
Também o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Pelotas tem demonstrado seu
ponto de vista, segundo o qual, a instalação deste ciclo produtivo na região é uma das poucas
oportunidades de geração de postos de trabalho nas zonas rurais destes municípios. Este
74
Ver fotos no anexo 2.
posicionamento foi defendido por este sindicato nas Audiências Públicas e na mídia
radiofônica
75
.
É, portanto, no viés econômico que se encontra a justificativa para o apoio desta
parcela da população ao ciclo produtivo da celulose de eucalipto. É na promessa de empregos
e na geração de renda, enfim, na melhoria da qualidade de vida que se encontra a raiz desta
motivação que impulsiona tal grupo a filiar-se ao discurso desenvolvimentista.
5.2.4 Os políticos
A chamada classe política encontra no discurso “desenvolvimentista” uma série de
motivos que estimula sua articulação como elemento-momento nesta cadeia equivalencial. Os
políticos sabem que, sem dinheiro não como atender outras demandas sociais, que
dependem da arrecadação para implementarem mais projetos na administração dos
Municípios, basta observar as manifestações de governadores e prefeitos em qualquer lugar
do país. Uma cadeia produtiva que movimente riquezas, certamente gerará mais impostos,
assim, aumenta-se a arrecadação, aumentando a arrecadação temos, possivelmente, um novo
horizonte político e social. Surgem, deste modo, novas oportunidades de atendimento às
demandas sociais, atendimento este, que gera novas expectativas de votos e de futuras
eleições.
A classe política também vislumbra na silvicultura a oportunidade de ganhos
econômicos, seja com cargos políticos, seja com outras formas de arrecadação. É exemplo o
apoio dado pelas empresas aos candidatos a cargos públicos, em dinheiro ou em materiais de
campanha. Este fato permite que estas empresas possuam “lobistas” nas administrações
públicas Municipais e Estaduais, facilitando o tramite de processos administrativos e ao
surgimento de parcerias público-privadas.
Além disso, o posicionamento no “lado errado” da fronteira dicotômica, a partir do
ponto de vista do eleitorado, pode fazer de um candidato um potencial inimigo na busca por
empregos ou de uma maior circulação de riqueza. Os políticos tendem a buscar em sua base
eleitoral, argumentos para direcioná-lo na escolha do posicionamento no campo discursivo
que se apresenta. Na gica política, escolher o lado certo não significa escolher o que se
entende por mais adequado, segundo suas concepções, mas sim, escolher o que parece obter
maior respaldo em seu leque de possíveis eleitores.
75
Programa Cotidiano, Rádio Pelotense AM, 09/07/2006.
Este grupo tem espaços privilegiados para a promoção de seu posicionamento
discursivo frente ao tema “silvicultura”. Estes espaços permitem, na maioria das vezes, um
“monopólio da razão”. São exemplos destes espaços privilegiados a Associação de Prefeitos
da Zona Sul (AZONASUL) e a Federação de Municípios do Rio Grande do Sul (FAMURS).
No caso específico da AZONASUL, que era presidida em 2006/2007 pelo Prefeito
do Município de Arroio Grande, Jorge Cardozo (Jorginho) do PDT, ferrenho defensor do
Projeto Losango, o espaço representou uma trincheira da empresa dentro do espaço
institucional, que se tratava de uma associação de políticos com cargo eletivo, ou seja,
prefeitos. rias vezes a AZONASUL se utilizou da mídia, em suas várias formas, para
expressar seu apoio ao Projeto Losango da empresa VCP
76
. Também, não raras vezes, a
Associação de Prefeitos, veio a público para pressionar os órgãos responsáveis pelo
licenciamento ambiental da atividade silvícola, exigindo maior celeridade nos procedimentos
de liberação da referida autorização estatal
77
.
No âmbito do legislativo estadual, o foram poucos os esforços no sentido de
facilitar a instalação do Projeto Losango no Estado do Rio Grande do Sul. O discurso
desenvolvimentista estabeleceu muitas ligações equivalenciais entre elementos-momento
neste espaço legislativo. A comissão de desenvolvimento sustentável, presidida pelo deputado
pelotense Nelson Harter, foi um importante instrumento para o estabelecimento de novas
ligações equivalenciais e na conquistas de novos elementos-momento para a cadeia
equivalencial desenvolvimentista. O apoio deste deputado ao ciclo produtivo da celulose e à
empresa VCP transparece em suas falas:
“O povo do Rio Grande tem acompanhado, com enorme preocupação, a difícil situação
financeira enfrentada pelo Estado nos últimos anos. No momento em que o executivo
gaúcho sinaliza com uma política de redução de gastos e do déficit público, cria-se um
cenário mais propício para três grandes projetos de florestamento e celulose, com
investimento de aproximadamente R$ 10 bilhões de reais. Todavia, ações de caráter
político-ideológico estão colocando em risco a implementação desses projetos. (...) As
empresas de celulose acenam com mais de 100 mil empregos na região reconhecidamente
mais empobrecida do Estado. Estamos em condições de subtrair essa oportunidade dos
trabalhadores da Metade Sul?”” (Nelson Harter em sua intervenção na audiência pública de
apresentação do EIA/RIMA VCP, 2007).
Ainda no espectro político, na cadeia equivalencial “desenvolvimentista”, podemos
destacar os esforços do executivo estadual em aprovar medidas que visaram facilitar os
procedimentos licenciatórios, Da troca de ocupantes dos cargos de órgãos como, a FEPAM e
da Secretaria de Meio Ambiente (SEMA), a prática de processos licenciatórios que incluíam
76
Jornal Zero Hora, página central, Domingo 25/05/2008.
77
Carta Aberta da AZONASUL, no site www.azonasul.org.br visita em: 30/07/07.
procedimentos de relatório de impacto ambiental simplificado (RAS), tudo tendo por escopo
facilitar a implantação do Projeto Losango.
5.3 Considerações
Neste capítulo, objetivou-se traçar um perfil dos elementos-momento de maior
destaque neste discurso “desenvolvimentista”, assim como tentou-se o mesmo no que diz
respeito ao discurso antagônico, “ambientalista”. Para isso, lançou-se mão de características
que se repetem nos integrantes de cada grupo a fim de identificá-los com a cadeia
equivalencial a qual se ligam. É necessário destacar que estas características se repetem e se
cruzam, tornando muitas vezes difícil distinguir um grupo de outro. Porém, diante do recorte
temporal escolhido, levando em conta a precariedade e contingência, inseparáveis da análise
do discurso, estes elementos-momentos se mostram bem delimitados e caracterizados. Estas
constatações permitem a utilização desta compreensão da organização destes elementos-
momentos no espaço discursivo, como elementos-momento integrantes da cadeia
equivalencial favorável ao ciclo produtivo da celulose de eucalipto, posicionando-se, diante
do estabelecimento da fronteira dicotômica, no discurso “desenvolvimentista”.
CAPÍTULO VI
O embate discursivo
6.1 Introdução
No presente capítulo, iremos realizar a análise dos embates acontecidos entre os
elementos-momento constitutivos das cadeias equivalenciais que se alinham aos pontos
nodais pró e contra a instituição da cadeia produtiva da celulose, a partir do estabelecimento
do Projeto Losango da empresa VCP, nos municípios de Pelotas, Arroio Grande e Herval no
período de janeiro de 2004 a dezembro de 2007, o qual compreende esta pesquisa.
Os embates se deram em diferentes contingências e em espaços diversos. Dentre os
vários espaços que permitiram este embate discursivo, iremos deter a presente análise,
sobretudo, aos espaços da mídia, das audiências públicas e ao âmbito institucional. Estes
espaços foram destacados em razão de suas importâncias para o exercício da busca pela
hegemonia de cada um dos discursos e pela capacidade de influenciar a opinião pública,
permitindo tomada de posicionamento por parte da sociedade, diante das oportunidades de
divulgar os discursos antagonizados pelo corte antagônico constituído pela possibilidade do
estabelecimento deste ciclo produtivo.
6.5 Os espaços de embate
6.5.1 A mídia
A mídia, destacadamente os meios de comunicação aqui denominados de mídia
impressa (jornais), falada (emissoras de rádio) e audiovisual (emissoras de televisão), foi um
importante espaço para a divulgação dos posicionamentos, justificativas e meios para
obtenção da hegemonia pelos discursos em disputa. Obviamente, o espaço destinado para a
exposição das idéias não se deu de forma eqüitativa por várias razões. Dentre elas, as que
denotam maior destaque, são os poderes político, - que, aparentemente, os defensores da
monocultura do eucalipto contam com um número maior de políticos portadores de grande
representatividade junto ao eleitorado - e econômicos - em razão dos investimentos
destinados ao marketing social realizados pela VCP. Muitos políticos lançaram mão de sua
posição de destaque junto à mídia para defender e expor suas idéias sendo, na grande maioria
das vezes, defensores do discurso favorável ao eucalipto.
Por outro lado, o poder econômico é outra razão de relevante importância, que
muitos produtores rurais e empresários se utilizam de espaços pagos para defenderem seu
posicionamento frente ao tema da silvicultura, além do fato de possuírem maior penetração
nos meios de comunicação. A empresa VCP, por exemplo, utiliza-se de eventos diversos para
divulgar seu empreendimento e suas vantagens para as comunidades locais, sendo estes
eventos invariavelmente destacados pela dia, permitindo assim, um canal de
convencimento que subliminarmente leva à população uma promoção do empreendimento
silvícola, é o caso da distribuição de mudas nativas para a população das cidades envolvidas
no Projeto Losango. São merecedoras de destaque as quantias investidas pela empresa de
celulose em seu marketing social
78
, investimento este que proporciona grande visibilidade
midiática e gigantesco impacto positivo na opinião pública regional.
Ainda avaliando a desigualdade no uso dos espaços na mídia, cabe ressaltar o fato de
que as próprias empresas da área da comunicação defendem, em seus espaços editoriais, o
posicionamento favorável ao ciclo produtivo do eucalipto, posição esta justificada por várias
razões. Seja pelo aporte financeiro da empresa VCP, seja pela visão de que a geração de
renda poderá influenciar positivamente no poder de consumo da população, gerando maior
demanda de seus produtos. Destarte, a julgar pelas matérias e editoriais, lidas e pesquisadas, a
mídia (na sua grande maioria) vem se mostrando como mais um elemento-momento a compor
a cadeia equivalencial desenvolvimentista”. Trata-se de um setor muito importante nesta
cadeia equivalencial, dado seu caráter de formador de opinião e de sua capacidade ímpar de
influenciar a compreensão da população sobre a questão da silvicultura.
a cadeia equivalencial aqui denominada “ambientalista”, dispõe de menor espaço.
Seja pelos poucos recursos econômicos, ou em razão das formas de que se utiliza para
produzir fatos que justifiquem a notícia ou o espaço na mídia, este discurso foi perdendo seu
espaço nos meios de comunicação. Excluindo-se os eventos promovidos para o embate de
idéias, o espaço destinado ao discurso “ambientalista” foi muito inferior ao destinado a
propagandear o discurso “desenvolvimentista”. Este, talvez seja o fato preponderante que,
permite ao discurso favorável ao cultivo aproximar-se bastante da posição hegemônica no
espaço discursivo, em detrimento daquele que com ele se antagoniza.
78
Exemplos deste investimento em marketing social são os R$ 2 milhões destinados para a Bibliotheca Pública
Pelotense, o Programa de Educação Patrimonial em 5 Municípios, em 11 escolas, contando com 330 professores e
atingindo 454 alunos e a doação de áreas para Unidades de Conservação, como é o caso da Reserva Biológica do
Mato Grande (Arroio Grande/ Distrito de Santa Izabel). Em relação ao último exemplo, cabe destacar que trata-se
de área doada como parte do cumprimento de um Termo de Ajustamento de Conduta firmado pela empresa junto
ao Ministério Público Estadual.
Dentre os meios de comunicação passíveis de serem utilizados como fonte de dados
para a presente pesquisa, foram selecionados alguns em razão de sua penetração na sociedade,
circulação em mais de um município e por sua potencialidade em formar opinião.
Dentre os jornais impressos foram utilizados os semanários “A Evolução”, com sede
em Arroio Grande e circulação nas cidades de Arroio Grande e Herval, além de Pedro Osório,
Cerrito e Jaguarão, o “Correio do Sul”, também sediado na mesma cidade de Arroio Grande e
com circulação nas mesmas cidades do semanário “A Evolução”, o semanário “Meridional”,
com sede e circulação em Arroio Grande, além dos diários “Diário Popular”, impresso em
Pelotas e com circulação em toda a “zona sul” do Rio Grande do Sul e do diário “Zero Hora”,
impresso em Porto Alegre e com circulação estadual.
Neste setor da mídia escrita, em várias edições dos semanários e diários, podemos
notar o alinhamento dos editoriais com o discurso “desenvolvimentista”. Este posicionamento
diante deste embate, transparece com maior clareza e repetição nos diários “Zero Hora” e
“Diário Popular”. Ambos utilizam uma retórica que visa desqualificar os elementos momento
equivalencialmente ligados ao discurso “ambientalista”, justificando seu posicionamento na
premissa básica da necessidade urgente de crescimento econômico a todo e qualquer custo.
Um exemplo, que evidencia o posicionamento citado, é o da edição do jornal Zero Hora, que
publica números discrepantemente maiores do que os informados na página da AGEFLOR na
rede mundial de computadores
79
:
VCP - Votorantim Celulose e Papel - começou em novembro do ano passado o processo de
licenciamento socioambiental para a instalação de uma fábrica na Metade Sul, com início
das obras previsto entre 2009 e 2011. O local exato não está decidido, mas será no eixo Rio
Grande, Pelotas e Arroio Grande. O investimento, incluindo a base florestal, é estimado em
US$ 1,3 bilhão, com geração de 4 mil postos de trabalho. (ZERO HORA, 30 jul. 2006).
No concernente às emissoras de rádio, foram realizadas gravações de programas das
rádios “Pelotense AM”, uma das rádios mais antigas do Estado do Rio Grande do Sul, com
abrangência nos três municípios contidos no recorte espacial da pesquisa, da rádio “Difusora
AM”, de Arroio Grande e também captada em Herval e “Rádio Universidade de Pelotas
AM”, captada em duas das três cidades (Pelotas e Arroio Grande).
Nas emissoras de rádio, embora ainda prevalecendo o posicionamento
“desenvolvimentista”, em razão do maior espaço direcionado para este discurso seja em
razão dos eventos da VCP, seja em razão da visibilidade midiática dos políticos que o
79
Cerca de 8 mil novos postos de trabalho, entre empregos diretos e indiretos, serão criados no período de
instalação da fábrica e, a partir de sua operação, haverá a oferta de outros 2 mil empregos. (AGEFLOR, 2006).
sustentam os programas de debate e entrevistas possibilitaram um espaço mais eqüitativo
para o embate dos discursos. Dentre os programas que privilegiaram os debates, destacam-se
o programa “Jornal Regional” (da Rádio Pelotense) e o programa “Pelotas 13 horas” (da
Rádio Universidade de Pelotas), ambos com horário de apresentação por volta das 13h, de
segunda a sexta-feira. Ainda merecedor de destaque, em razão do espaço destinado às
exposições de idéias e ao embate discursivo, o extinto programa “Cotidiano”, apresentado de
segunda a sexta-feira, das 11h até às 12h, na “Rádio Pelotense”, foi um espaço que
possibilitou explanações de quase que todos os elementos-momento destacados nesta
pesquisa (ou seja: MST, CPERS, ONGS, Força Sindical, Políticos, Sindicatos Rurais, etc.).
Em relação às emissoras de televisão, foram obtidas informações na audiência das
emissoras “Nativa”, repetidora da Rede Record de televisão, com programação voltada para a
região onde se localiza o recorte espacial do presente trabalho, e da “RBS TV”, repetidora da
Rede Globo, também com programação local. Ambas as emissoras podem ser sintonizadas
em todos os três municípios já citados.
Nestes meios de comunicação de massa, o espaço destinado ao tema se restringe às
reportagens em telejornais e poucos comentários de relevo. Tanto nos comentários quanto nas
reportagens, o enfoque, via de regra, destaca o empreendimento silvícola como muito
importante para o “desenvolvimento” dos municípios beneficiados com áreas de cultivo. Por
outro lado, costumam desqualificar os elementos-momento formadores da corrente
equivalencial “ambientalista”, taxando-os de apoiadores do atraso econômico e
caracterizando-os como obstáculos ao “desenvolvimento”
80
.
6.5.2 As audiências públicas
Durante o processo de divulgação do interesse da empresa Votorantim Celulose e
Papel em implementar o plantio de eucaliptos em municípios da denominada “Zona Sul do
Estado”, surgiram espaços de discussão propiciados por instituições como a Fundação
Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler (FEPAM) e Secretaria Estadual do
Meio Ambiente (SEMA), além de outros eventos menores, como o seminário sobre a
silvicultura promovido pela Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pelotas
(ADUFPEL) e o Seminário para implantação da Reserva Biológica do Mato Grande,
80
Os ambientalistas estão gritando muitas coisas sem conhecimento técnico. Floresta consome menos água que
lavoura de arroz. Precisamos conhecer como ocorre a interação entre o florestamento e os ecossistemas locais
(...) Levando em consideração todas as práticas silviculturais e ecológicas para com os plantios florestais não se
espera que ocorram danos ambientais. Desconheço danos causados ao ambiente pelas plantações de eucalipto
no passado. ( Zero Hora, 08 jul. de 2006).
organizado e promovido pelo Grupo Ecológico Amantes da Natureza (GEAN), em Arroio
Grande . Nestes espaços, a comunidade foi levada a discutir o tema de interesse comum,
como as questões ambientais e os impactos na economia local. As primeiras audiências
públicas ocorreram em razão do Zoneamento Ambiental
81
para a silvicultura e,
posteriormente, ocorreram as Audiências Públicas obrigatórias ao processo de Licenciamento
Ambiental
82
do Projeto Losango. Foram acompanhadas as Audiências Públicas de
Zoneamento Ambiental ocorridas em Pelotas e Arroio Grande e, posteriormente as
Audiências Públicas para apresentação do Estudo de Impacto Ambiental realizado com o
intuito de obtenção do Licenciamento Ambiental pela VCP para o cultivo de eucalipto em
80.000 hectares próprios, em sua grande maioria, localizados nas três cidades incluídas no
recorte espacial desta pesquisa.
Somam-se a estes eventos os diversos seminários ocorridos em Pelotas e Arroio
Grande e as audiências públicas, destinadas a discussão do tema, promovidas pelas Câmaras
de Vereadores de Pelotas e Arroio Grande. Os embates nas Câmaras de Vereadores se
constituíram como espaços privilegiados para a percepção dos posicionamentos dos
vereadores frente ao cultivo de árvores para a produção de celulose e as percepções destes
sobre o assunto.
Embora possa parecer que estes espaços de embate sejam mais igualitários, isto não
se demonstrou na prática. Na audiência pública ocorrida em Pelotas (Agosto de 2007),
tratando do zoneamento ambiental para a silvicultura, o local utilizado para o evento (Theatro
Guarani) foi tomado por pessoas levadas pela Força Sindical. Levados por ônibus fretados
das cidades de Arroio Grande, Herval e outras próximas. Estas pessoas literalmente lotaram
os espaços do teatro desde muito cedo, impedindo assim o acesso de outros setores da
sociedade. Em frente ao local do evento, carros de som repetiam palavras de ordem contra o
zoneamento e favoráveis ao cultivo do eucalipto. Assim, dada a lotação da platéia por pessoas
favoráveis à silvicultura, não foi possível a ocorrência de debate. Toda e qualquer
manifestação que questionasse o cultivo do eucalipto era prontamente abafada por palavras de
ordem e por vaias da platéia
83
.
na audiência pública destinada a discutir o zoneamento ambiental de áreas
destinadas ao cultivo do eucalipto, realizada nas dependências do SESI/SENAT, em Pelotas,
os espaços foram novamente tomados pela gigantesca maioria uniformizada da Força
81
O Zoneamento Ambiental foi discutido no capítulo II, item 2.3.4.
82
O Licenciamento Ambiental foi discutido no capítulo II, item 2.3.3.
Sindical. A Brigada Militar barrou os militantes do MST e dificultou o acesso de
representantes do CPERS. Somente poucas pessoas contrárias à silvicultura, que passaram
despercebidas no rígido sistema de identificação e cadastramento
84
, conseguiram acompanhar
os trabalhos, mas sem a possibilidade de manifestação ou questionamentos. Esta dificuldade
deu-se em razão de que o cadastramento para manifestação oral exigia a comprovação, por
parte do participante, de sua qualidade de representante de uma das entidades cadastradas
no evento
85
. A exceção foi a manifestação de professores da Universidade Federal de Pelotas
que denunciaram o descumprimento do contrato feito pela VCP com a Universidade Católica
de Pelotas, para a realização de estudos que integraram o processo de Licenciamento
Ambiental
86
.
Como fica claro, a participação nestes eventos não se deu de forma livre e
democrática como determina o regramento legal que os rege. O aparato policial militar foi
utilizado para estabelecer a ordem, ainda que esta caracterizasse a impossibilidade de
manifestação de opiniões contrárias ao cultivo do eucalipto ou do esclarecimento de dúvidas
sobre este processo. Neste espaço, que deveria ser privilegiado no sentido de possibilitar o
debate entre os posicionamentos e o esclarecimento sobre o estabelecimento da monocultura
do eucalipto, suas conseqüências para o ambiente e para a comunidade das localidades onde
se desenvolveriam tal cultivo, se estabeleceu uma condição que o transformou em uma
oportunidade para a propaganda da empresa de celulose e seu projeto de “florestamento”, sem
o contraponto dos posicionamentos contrários ou questionamentos.
6.5.3 Os espaços institucionais
Por espaços institucionais, são aqui denominados, os expedientes para enfrentamento
dos posicionamentos, oportunizados internamente em instituições do Estado, sejam no
Executivo, Legislativo, Judiciário e também no Ministério Público. Estes espaços originam-se
de vários instrumentos disponibilizados pelos entes estatais para solução de conflitos, criação
83
O pesquisador esteve presente ao evento e realizou gravações de áudio que, embora prejudicada pelo ruído da
platéia, permitiu identificar a manifestação de parcialidade para com o discurso “desenvolvimentista”.
84
Conforme Portaria n° 070/2007 da FEPAM, art. 21. “Somente será permitido o acesso dos participantes na
Audiência Pública, mediante o preenchimento do formulário de inscrição (...)”.
85
Conforme Portaria n° 070/2007 da FEPAM, art. 19e parágrafos. “As inscrições para manifestações orais estarão
abertas desde o início da Audiência Pública (...) Parágrafo 2º (...) as inscrições para manifestações orais somente
serão aceitas mediante apresentação de credencial que comprove a legitimidade da representação.”
86
Segundo a manifestação dos representantes da UFPel, o contrato previa inicialmente o domínio público dos
resultados dos estudos. Porém o que ocorreu em realidade foi a obrigatoriedade em guardar sigilo sobre os
resultados que não fossem incluídos no EIA/RIMA apresentado ao órgão estadual competente. A cópia do
contrato firmado encontra-se no anexo 6 deste trabalho.
de regramentos jurídicos e exposição de interesses da administração pública Municipal e
Estadual.
Estes espaços, diferenciam-se das audiências públicas em razão de, embora também
promovidos pela administração pública, não permitem a participação de toda a comunidade.
Os embates se dão de maneira menos pública e com menor interferência da comunidade,
que esta, nestes espaços, é representada por políticos eleitos ou por profissionais que têm por
função defender os interesses difusos e coletivos da sociedade.
No âmbito do Executivo estadual, ocorreram vários fatos que evidenciam a
penetração deste embate na organização interna de Secretarias de Estado e órgãos de
fiscalização. O governo do Estado do Rio Grande do Sul, sob a chefia da Governadora Yeda
Crussius, tomou para si o posicionamento alinhado com o discurso “desenvolvimentista”. O
posicionamento pode ser observado nas falas da chefe do executivo, como na matéria do
jornal Zero Hora de 30/07/07 onde a governadora aduz :
(...) reitero que, com o apoio da sociedade, o governo do Estado deve proporcionar
condições para que os empreendimentos de base florestal se desenvolvam no Rio Grande
do Sul. ( Gov. Yeda Crussius, ZH, 30/07/07)
Em outra oportunidade, a Governadora Yeda Crussius afirmou:
Agora, existe um projeto que é o florestamento que se encaminha para a Região Sul aa
Região Oeste. Um projeto capaz de gerar investimentos maiores do que uma Ford. Projeta-
se algo como 3 bilhões de lares. (...) Então, em primeiro lugar, não somos hostis a
investimentos desse porte. Estamos falando da recuperação de uma área empobrecida, que
é a Região Sul e a Oeste. (...) A Metade Sul, sem dúvida, tem de voltar a crescer, e os
projetos de florestamento e fábricas de celuloses são estratégicos. O Estado dará apoio a
essas indústrias, sem deixar de lado a questãoambiental .( Governadora Yeda Crussius)
87
.
O mesmo também pode ser constatado nas exposições e justificativas do Secretário
estadual para o Desenvolvimento e Assuntos Internacionais, Nelson Proença, na Rádio
Universidade de Pelotas, durante o programa Pelotas 13 horas do dia 17/07/07:
“(...) o governo dá muita importância aos investimentos, especialmente os projetos de
florestamento, celulose e papel. Eles são estratégicos para a economia do Rio Grande do
Sul. São investimentos fundamentais que estão se desenvolvendo nas regiões
mais
deprimidas economicamente do Estado. Uma é a Metade Sul” (PROENÇA, 2007)
88
87
Afirmação feita pela governadora do RS Yeda Crusius, em entrevista ao jornal Extra Classe, ano 11, n.190, dez.
2006, disponível em:
http://www.sinpro-rs.org.br/extraclasse/dez06/entrevista.asp, acesso em 31 mar. 2007.
88
Informação retirada do endereço eletrônico:
http://www.estado.rs.gov.br/index.php?inc=noticias/noticias_view.php&notid=56094&menu=13&submenu=15
&editorias=39&vg=&vac=&corede=&opcaomenu=. Acesso dia 19 mar. 2007.
Ainda nas tratativas para flexibilizar e acelerar o processo de Licenciamento
Ambiental do Projeto Losango, o mesmo discurso continua como privilegiado. Para tal, o
governo estadual substituiu chefias de órgãos envolvidos no processo de licenciamento,
substituiu o Secretário do Meio Ambiente por um membro licenciado do Ministério Público
(Sr. Carlos Otaviano que anteriormente ocupava cargo no MP do Estado do RS,
desempenhando a função de Procurador de Justiça) e instituiu um novo modelo de
licenciamento ambiental, mais rápido e simplificado, exclusivo para projetos silvícolas.
O interesse do Executivo estadual na cadeia produtiva da celulose, transparece para a
sociedade, seja pela mídia, seja pela interpretação feita por pesquisadores e escritores ligados
ao tema:
O governo do Estado do Rio Grande do Sul vem apoiando fortemente os planos das
referidas empresas, considerando que a sua implementação implicaria a descoberta de uma
nova vocação para a Metade Sul do Estado, a qual levaria desenvolvimento econômico e
social além da geração de empregos e de renda (BUCKUP, 2006, p.34).
As alterações que objetivaram facilitar e dar celeridade ao cumprimento das
exigências legais para o licenciamento ambiental, acabaram por justificar a moção de uma
demanda jurídica, junto à Justiça Federal, buscando alterar a competência do licenciamento,
que vinha sendo realizado por órgãos estaduais, para o âmbito federal, mais precisamente:
passar a competência da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler
(FEPAM) para o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (IBAMA).
Tal Ação Civil Pública não logrou êxito. A competência para licenciar permaneceu a cargo
dos órgãos estaduais, satisfazendo os interesses dos elementos-momento do discurso
“desenvolvimentista”.
No que tange a atuação do Ministério Público Estadual, no concernente à matéria da
silvicultura, esta se demonstrou pífia e alinhada ao interesse da cadeia equivalencial
“desenvolvimentista”. Os indicativos que fundamentam esta compreensão são muitos, mas
dois, em específico, são os mais significativos.
O primeiro fato a justificar esta interpretação ocorreu em um Termo de Ajustamento
de Conduta (TAC)
89
, celebrado entre o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP/RS) e a
Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler (FEPAM) em 12 de maio
de 2006 (inquéritos civis 158/05, 159/05 e 51/06), sofrendo este TAC alterações em
algumas de suas cláusulas em outras três oportunidades, respectivamente em 19 de junho de
2006, 19 de abril de 2007 e 3 de maio de 2007. As referidas alterações fulminaram o objeto
principal do compromisso e claramente beneficiaram a FEPAM e, consequentemente, aos
empreendedores da silvicultura. Estes benefícios se materializam no fato de que, no último
aditamento do referido TAC, retirou-se da sua cláusula segunda a obrigação de permitir
autorizações para empreendimentos de silvicultura somente em áreas que tenham sido
objeto de cultivos agrícolas ou silviculturais, até que o zoneamento ambiental para a
silvicultura fosse aprovado pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente
90
.
O segundo fato que justifica a presente interpretação é a existência de um documento
interno ao MP/RS, que centraliza todas as demandas concernentes à silvicultura em Porto
Alegre, afastando assim, a ingerência dos promotores locais. Esta organização na tramitação
dos expedientes ligados ao cultivo do eucalipto interfere na independência dos Promotores, o
que acaba por afastar a demanda do profissional mais próximo ao problema. A razão desta
postura de centralização não encontra outra justificativa senão a de padronizar o
posicionamento da instituição, evitando assim, posicionamentos diversos oriundos das
interpretações singulares dos promotores locais.
6.6 Os embates
Os embates entre os porta vozes das cadeias discursivas, como citado, se deram
em vários espaços. Também é merecedor de destaque o fato de que o espaço da mídia foi o
que permitiu um embate mais aberto entre os elementos-momento equivalenciados em cada
uma das duas construções discursivas, estabelecidas e apartadas pelo corte antagônico
originado no empreendimento de celulose, denominado Projeto Losango, da empresa
Votorantim Celulose e Papel.
Neste seguimento, tomaremos como ponto de partida os argumentos sustentados pela
empresa, através de seus representantes, nos espaços de embate. Estes argumentos muitas
vezes foram repetidos por elementos-momento “desenvolvimentistas”, mas também serviram
para construção de outras falas destes mesmos elementos-momento.
O diretor florestal do Projeto Losango, José Maria de Arruda Mendes Filho, em
matéria publicada no jornal Diário Popular, de 25 de março de 2005, asseverou:
89
TAC é um instrumento utilizado no inquérito civil, como forma de solucionar, de maneira rápida e eficiente, os
problemas resultantes da prática de degradação (ou a eminência desta), evitando que o Poder Judiciário tenha de
intervir sempre que ocorrerem danos ao meio ambiente ou risco de sua ocorrência.
90
O TAC, referente aos Inquéritos Civis 158/05, 159/05, 160/05 e 51/06, e seus aditamentos constam, na sua
integralidade, do anexo 5.
Trata-se de um projeto para o futuro, pois o bebê que nasce hoje vai consumir, depois, o
papel das árvores agora plantadas. Neste tipo de empreendimento, não se pode esquecer do
meio ambiente, com sustentabilidade de negócios, incluindo a geração de renda aos
colaboradores do campo e competitividade empresarial em nível mundial. (Mendes Filho,
2005 in: Diário Popular, 25/03/05, p. 06)
O diretor florestal explicou, na mesma matéria, que a empresa quis que a população,
“(...) incluindo pequenos produtores e assentados (...)”, pudesse fazer parte do negócio.
Partindo de Pelotas, a equipe da VCP foi atrás de vilarejos escondidos pelo Rio Grande, onde
moram produtores rurais assentados e descendentes de imigrantes europeus, com a intenção
de mostrar a todos que a possibilidade de participar do Projeto Losango.
Com a idéia do projeto Poupança Florestal, a VCP conseguiu atrair 4 mil produtores
para o plantio de eucalipto voltado à produção de celulose. Assim, construiu, conforme
Mendes Filho, um futuro em comum para a empresa e os pequenos produtores florestais. Nas
palavras do mesmo diretor:
A fábrica do projeto Losango ainda não tem local definido, mas a estrutura, que está sendo
montada no Estado, surpreende pelo tamanho, a começar
pelo “berçário” de toda a fábrica
de celulose: o viveiro
91
.(Mendes Filho, 2005).
Como é possível depreender das palavras do diretor florestal da VCP, a empresa
pretende passar a idéia de que o empreendimento silvícola é uma atividade que tem
preocupações para com o ambiente e a população local. Também elenca os aspectos
tecnológicos e de desenvolvimento envolvidos no projeto em questão. Mas, o argumento que
estabelece equivalência entre o elemento-momento empresa e os demais elementos-
momentos da cadeia equivalencial “desenvolvimentista”, conjuntamente com a geração de
empregos, é a expressão, pronunciada por Mendes Filho: geração de renda para os
colaboradores do campo”. Esta expressão fundamenta o estabelecimento, no campo
discursivo, do ponto nodal “desenvolvimentista”, pois, transparece nesta cadeia discursiva o
significado de “crescimento econômico” dado ao significante “desenvolvimento”.
Colaborando com esta linha de percepção da constituição desta cadeia discursiva, em
matéria publicada no mesmo Diário Popular, em 09 de abril de 2006, o seguinte:
Daqui a sete anos vai dar para comprar um trator novo ou mais um pedaço de terra”,
comemora Granke. Quem também está feliz com a aposta é o casal Leonídia Frehuf e
Mário Farias Lemes, que plantaram oito hectares de eucalipto: “Foi muito bom, porque fiz
o curso e aprendi sobre meio ambiente. É importante deixar a área para preservação.
(Diário Popular, 09/04/06, p. 13)
91
Segundo dados fornecidos pela VCP Florestal, este viveiro tem a capacidade de produzir 30 milhões de mudas
por ano. Na prática, são 27 hectares de terreno, onde pequenos eucaliptos crescem em estufas com aquecimento,
teto retrátil e adubação eletrônica.
É de se notar o fato de que esta expectativa de crescimento econômico, ou de
melhores possibilidades de lucros na produção, liga equivalencialmente os elementos-
momento “desenvolvimentista”, estabelecendo uma relação entre as demandas dos grupos
que o compõe. Somam-se a esta fala as afirmações da criação de postos de trabalho e do
crescimento na renda dos municípios. Neste sentido, a divulgação na mídia do número de
postos de trabalho a serem criados pela atividade na região, cria a expectativa de novas
oportunidades:
Cerca de 8 mil novos postos de trabalho, entre empregos diretos e indiretos, serão criados
no período de instalação da fábrica e, a partir de sua operação, haverá a oferta de outros 2
mil empregos. (AGEFLOR, 2006 WWW.ageflor.com.br, visitada em 22/09/06).
Na página da VCP (www.vcp.com.br), o Projeto Losango traz, nos resultados
econômicos, que serão gerados pela empresa nas atividades florestais, 2,3 mil empregos
diretos e indiretos.
92
Na mesma esteira, os argumentos no sentido de estabelecer uma lógica discursiva
de equivalência entre os elementos-momento constituintes da parcela “desenvolvimentista”
do campo discursivo, permeiam as intervenções que versam sobre a geração de renda.
Segundo o Estudo de Impacto Ambiental realizado para empresa VCP, teríamos o seguinte
quadro referente à geração de renda em cada um dos três municípios estudados:
TABELA 5 –
Relação Município/área cultivada/renda líquida
Fonte: EIA/RIMA VCP FLORESTAL, Vol. I, Tomo I.
Em sentido contrário, os elementos-momento “ambientalistas” aduzem que o cenário
não será tão auspicioso quanto sustenta o discurso “desenvolvimentista”. Ao estabelecerem
uma ligação equivalencial com os elementos-momento percebidos como “tipo ambientalista
MUNICÍPIO ÁREA CULTIVA
DA
(ha)
RENDA
LÍQUIDA/ANO
(R$/ha.)
TOTAL (R$)
Arroio Grande 311,5 381,20 118.743,80
Herval 143,00 381,20 54.511,60
Pelotas 149,00 381,20 56.798,80
político-partidário”, os elementos-momento do “tipo político-sócio-ambiental” utilizam o
argumento que fixa um sentido quanto à geração de postos de trabalho. Ao mesmo tempo,
também estabelecem relação de equivalência para com os elementos-momento “político-
econômico”, ao fixarem um novo sentido na abordagem da questão da agropecuária
93
.
Exemplo deste fato, ocorreu na fala de um representante da Associação dos Docentes da
Universidade Federal de Pelotas (ADUFPEL), na ocasião da Audiência Pública ocorrida em
Pelotas, na qual sustentou que:
A substituição de outras culturas pela cultura do eucalipto deslocará outras atividades
agropecuárias, estas atividades juntas geram mais postos de trabalho permanentes do que o
“florestamento”. Conclui-se que esta atividade significará uma perda líquida de postos de
trabalho permanentes no setor agropecuário. (Audiência Pública EIA/RIMA VCP, 2007).
Neste mesmo sentido o deputado petista Dioniso Marcon, ligado ao Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra, falando em nome deste movimento em entrevista ao programa
“Cotidiano” da Rádio Pelotense AM, na manhã do dia 13/08/07, sustentava que a criação de
postos de trabalho pela silvicultura não é desconhecida pelo movimento, mas que a perda de
postos de trabalho, em razão da mudança na exploração da terra, não é levada em
consideração pela VCP. Nas palavras de Dioniso:
Nosso movimento luta por terra, mas também pelo emprego no campo. O eucalipto vai
desempregar muita gente que hoje trabalha na terra. A gente sabe que o eucalipto vai
empregar gente, mas a empresa não diz que serão menos pessoas do que as que trabalham
hoje. (Marcon, Programa Cotidiano/Rádio Pelotense AM 13/08/07)
A fala deste representante de um dos elementos-momento integrante da cadeia
equivalencial estabelecida pelo discurso “ambientalista”, encontra respaldo no estudo
realizado pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Departamento de Ciências
Econômicas do Centro de Ciências Sociais e Econômicas, denominado Impactos
Socioeconômicos da Produção de Celulose em Larga Escala: o Projeto da Empresa
Votorantim na Metade Sul (RS)”, coordenado pelo Dr. Clailton Ataídes de Freitas. Neste
trabalho, concluído em dezembro de 2006, os pesquisadores asseveram que:
(...) como não foi possível estimar a destruição de empregos em áreas de lavouras
permanentes, que na região chega a 15.637 hectares, provavelmente, o balanço geral do
número de empregos gerado poderá até ser negativo. (Freitas (coord.), 2006, p.104).
92
Considerando três cortes, de 7 em 7 anos, e a vida útil de 21 anos. No período, demandas de 112 dias/ homem,
com um total de 250 dias de trabalhado por ano. ( www.vcp.com.br. Acesso em 28/09/2007).
93
Cabe ressaltar que segundo a FAO a criação de animais, principalmente bovinos e suínos, para consumo
humano é uma das principais causas de emissão de gases causadores do “efeito estufa” (
Evaluación de
los recursos mundiales, FAO, 2005).
Mantendo a linha discursiva que questiona os postos de trabalho oriundos da
silvicultura com eucalipto, na audiência pública realizada na cidade de Arroio Grande, o
representante do Cpers, Antônio Andreazza sustentou que:
“Os empregos gerados são considerados, em grande parte, de baixa qualidade e, na maioria
das vezes, de caráter temporário, com baixos salários, más condições de alojamento e
alimentação, destacando-se pelo descumprimento da legislação trabalhista”. (Andreazza,
2007)
Tem-se, portanto, um forte contraponto à questão dos números e dos dados
referentes à geração de postos de trabalho propiciada pela instalação do ciclo produtivo da
celulose de eucalipto. Sendo este um dos principais motivos do estabelecimento das ligações
equivalenciais na cadeia articulatória do ponto nodal discursivo “desenvolvimentista”, que
o significado dado ao significante “desenvolvimento” tem o sentido de “crescimento
econômico”, este tema tornou-se o favorito nos embates entre os discursos que buscam a
hegemonia junto à sociedade. A geração de postos de trabalho e renda, necessariamente
acabam por servir de argumentos para a busca da hegemonia discursiva por parte dos
elementos-momento equivalencialmente ligados na cadeia discursiva “desenvolvimentista”.
Outro aspecto importante, nesta análise dos discursos, trata do significado dado à
expressão “desenvolvimento” pelos elementos-momento da cadeia discursiva
“ambientalista”, que assume um sentido diferente ao significado atribuído pela cadeia
antagônica “desenvolvimentista”. Para os “ambientalistas”, desenvolvimento engloba um
significado muito mais amplo do que somente o crescimento econômico, pois soma a este
crescimento a melhoria da qualidade de vida, distribuição de renda e o cuidado para com o
meio ambiente. Em outras palavras, para estes elementos-momento, o sentido de
sustentabilidade
94
está implícito no significado de “desenvolvimento”
95
.
É oportuno destacar, que esta produção de sentidos (parciais) e significados nada
mais é do que uma diferenciação estabelecida a partir das práticas realizadas por cada um dos
discursos limitados pelo corte antagônico, representado pelo estabelecimento do ciclo
produtivo em questão. São as práticas articulatórias dos elementos-momento que estabelecem
uma relação entre eles, modificando suas identidades.
O resultado desta prática articulatória, em sua totalidade estruturada, são os discursos
“ambientalista” e “desenvolvimentista” (sempre precários e contingentes) cujos pontos nodais
94
“Sustentável é o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das
gerações futuras de suprir suas próprias necessidades". (Primeira Ministra da Noruega Gro Brundland, ONU, 1987
in: www.sustentabilidade.com.br).
expressam um sentido comum a cada um dos momentos diferenciais das duas cadeias
equivalenciais antagônicas.
Resta-nos agora enfrentar a questão dos embates referentes ao sub-tema ambiente, o
qual é, segundo as falas dos integrantes da cadeia equivalencial “ambientalista”, o principal
ponto de discordância para com o discurso “desenvolvimentista”.
Antes de mais nada, cabe aqui ressaltar que, conforme a teoria utilizada neste
trabalho, o que é verbalizado (elemento lingüístico) não está meramente justaposto ao que
não transparece nas falas (elemento não lingüístico). Ao contrário, estabelecem, verbo e
prática, um sistema onde ocupam posições diferenciais de forma estruturada. Este sistema é
denominado por Laclau (1993) de discurso, conforme fora discutido no capítulo segundo
desta dissertação.
Retornando para o assunto ambiente, relembremos o afirmado por Mendes Filho,
diretor da VCP Florestal: “(...)Neste tipo de empreendimento, não se pode esquecer do meio
ambiente (...)”. Esta afirmação é emblemática por estabelecer um posicionamento, por parte
da empresa de celulose, de ocupada em solucionar possíveis resultados danosos ao ambiente
nas localidades na quais as etapas de seu ciclo produtivo serão desenvolvidas. Ainda no
material de divulgação da empresa VCP:
A iniciativa da VCP traz uma série de pontos que ainda trabalham a comunicação
com a sociedade. Uma das idéias consiste em estimular a consciência ambiental e mostrar que
o eucalipto não é nocivo à natureza. Para plantar, o produtor precisa passar por um curso de
três dias, no qual aprende a topografia de sua terra e entende por que é importante deixar
parte da mata nativa preservada em sua propriedade particular. (O Papel, 2007).
A idéia passada pelo material de propaganda da VCP é a de que os riscos ao
ambiente oriundos da silvicultura são mínimos e não justificam o posicionamento antagônico
do discurso “ambientalista”. Neste sentido, o material distribuído na Audiência Publica do
EIA/RIMA da VCP Florestal afirma:
Quem planta o eucalipto da VCP precisa deixar a mesma quantidade de terra
disponível para preservação compromisso existente também entre o pequeno agricultor e a
VCP em prol do meio ambiente. Além disso, no primeiro ano, quando o eucalipto ainda está
pequeno, os produtores recebem sementes de alimentos, como milho e batata doados pela
própria VCP, para que sejam plantadas entre as fileiras de eucaliptos. (O Papel, 2007).
95
Ver capítulo dedicado aos conceitos, item 2.2.1.5.
No mesmo sentido, estão as afirmações de cientistas, entre eles, um professor do
curso de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Santa Maria, que assevera que os
problemas ambientais apontados pelos “ambientalistas” devem ser observados e
questionados, não apenas aceitos como verdades absolutas:
Os ambientalistas estão gritando muitas coisas sem conhecimento técnico. Floresta
consome menos água que lavoura de arroz. Precisamos conhecer como ocorre a interação
entre o florestamento e os ecossistemas locais (...) Levando em consideração todas as
práticas silviculturais e ecológicas para com os plantios florestais não se espera que
ocorram danos ambientais. Desconheço danos causados ao ambiente pelas plantações de
eucalipto no passado. (SCHUMACHER, Zero Hora, 08 jul. de 2006)
.
Também o aspecto da evolução na cultura de árvores exóticas, segundo a empresa e
seus cientistas, colaboram para reduzir o impacto ambiental gerado pelo plantio destas
plantas. Conforme o Anuário Florestal de 2006, elaborado pela Associação Brasileira de
Produtores de Florestas Plantadas (ABRAF), que divulga as atividades do setor de florestas
plantadas no Brasil, as espécies a serem cultivadas possuem características que as diferem das
demais:
Atualmente, grande parcela das florestas plantadas de eucalipto é originária de plantios
clonais de alta produtividade (ou de semente melhorada, no caso dos pinus) com adaptação
e tolerância a fatores adversos de clima, solo, água, entre outros. Ao longo dos últimos
trinta anos, os ganhos em produtividade volumétrica, resultado dos trabalhos de pesquisa e
melhoramento genético nas florestas de eucalipto quase que triplicaram, e nas florestas de
pinus praticamente dobraram. (ANUÁRIO ESTATÍSTICO DA ABRAF, 2006, p.32).
Mantendo a linha que sustenta o discurso desenvolvimentista em relação à questão
ambiental ligada à silvicultura com eucalipto, Walter de Paula Lima escreveu no volume 29,
número 1 da publicação da Sociedade Brasileira de Ciências do Solo , em janeiro/abril 2004,
a seguinte constatação:
(...) em relação à eficiência do uso desse total de água, em termos da quantidade de madeira
produzida por unidade de água consumida na transpiração, na qual o eucalipto leva até
ligeira vantagem, ou seja, usa a água disponível de forma mais eficiente. (Lima, 2004 in:
Sociedade Brasileira de ciência do Solo, nº 1 janeiro/abril 2004, p. 29).
Vê-se, então, que a questão do consumo excessivo de água, um dos principais
argumentos do discurso contrário à silvicultura, encontra também posicionamentos diversos,
favoráveis ao incremento da referida cultura. Entre eles destaca-se o argumento que sustenta
que, as espécies de eucalipto desenvolvidas pela empresa de celulose, foram produzidas por
intermédio de transgenia. Neste processo de produção, as características ligadas à necessidade
de utilização de água pelas plantas teriam sido alteradas, permitindo um melhor
aproveitamento e reduzindo o consumo pelas árvores adultas.
Nos argumentos contrários, encontra-se um número também substancial de teses e
justificativas, muitas delas contrárias entre si, apesar de serem sustentadas por identidades
que compõem elementos-momento “ambientalistas”. Exemplo disso, no que concerne ao
consumo de água e suas conseqüências, é o texto de Verdum:
A água, colocada como um elemento extremamente importante para vida e para as próprias
atividades agropecuárias, é de alta qualidade, temos análises químicas e físicas que
comprovam isso, e vai servir para o crescimento dos eucaliptos, e essa é uma reflexão que
temos que fazer: vamos dar uma água de alta qualidade para produzir eucaliptos? E depois,
fazendo outra análise: existem períodos de escassez hídrica, embora não tenhamos uma
estação seca definida, mas temos vários períodos de seca e que certamente afetam o próprio
plantio de eucaliptos em determinada fase. Como são árvores de alto crescimento, a
demanda de água vai ser importante e maior. Com certeza, a introdução dessas
monoculturas afetará o manancial hídrico. (VERDUM, 2006, p.05).
Passando para outro campo de análise, vejamos o caso do argumento sustentado por
Luis Rampazzo, membro do Centro de Estudos Ambientais (CEA) de Pelotas, no que toca a
aspectos ambientais decorrentes da cultura de eucalipto:
(...) as monoculturas devem acelerar as mudanças climáticas, como o regime dos ventos.
(...) as mudas vão funcionar como barreiras, impedindo a circulação do vento, o que
poderia modificar a distribuição das chuvas. Isso mostra que os prejuízos das monoculturas
vão além do aspecto ambiental.” (Rampazzo, 2007. Audiência Pública / Arroio Grande)
Na mesma oportunidade, o representante de ONG apresenta outros argumentos, que
permitem o estabelecimento de uma ligação equivalencial entre os tipos “político-sócio-
econômico”, “político-partidário” e “político-econômico” na cadeia articulatória
“ambientalista”. Nesta fala, Rampazzo argumenta:
“O ambiental nunca vem sozinho. Quando um desastre ambiental, com certeza, s
vamos ter problemas sociais e econômicos muito grandes também, porque essa
monocultura do eucalipto da forma como está avançando ela começa, cada vez mais, a
diminuir a quantidade de possibilidade de terras para reforma agrária, para assentamento de
famílias, para plantios.” (Rampazzo, 2007. Audiência Pública / Arroio Grande)
Nota-se que aqui, o “ambientalista” estabelece um nexo de sentido que é aproveitado
por outros elementos-momento da mesma cadeia articulatória. Em outras palavras, esta
prática articulatória constrói sentidos que permitem unir MST, CUT/CPERS, PT e ONGs,
fazendo com que estas assumam a condição de momentos diferenciais, ao mesmo tempo em
que deixam em suspenso os sentidos previamente utilizados em razão da fixação de sentidos
resultante da estrutura discursiva que integram.
Na mesma esteira, porém representando outro elemento-momento percebido como
integrante do “tipo” “político-partidário”, o representante do Partido dos Trabalhadores (PT),
Ivan Duarte, citou passagem do denominado “Dossiê Deserto Verde”:
(...) problemas ambientais; concentração da terra, com expulsão imediata dos agricultores
que as venderam; dificuldade do avanço da Reforma Agrária; caracterização de um modelo
de concentração de terra, de capital e de renda; modelo exportador, contribuindo muito
pouco para os cofres públicos dos municípios e do
Estado; geração de poucos empregos;
vai gerar vazios populacionais, como no Estado do Espírito Santo em que a empresa
Aracruz Celulose está instalada desde a cada de 70 do século XX; os investimentos nas
grandes fábricas de celulose estão desvinculados da matriz produtiva já existente, instalada
na região. (DOSSIÊ SOBRE O DESERTO VERDE, 2006, p.13).
Novamente pode-se observar, no pronunciamento do vereador, a busca pelo
estabelecimento de ligações entre as demandas dos diferentes elementos-momento integrantes
da cadeia equivalencial do discurso “ambientalista”. Nota-se também, que a questão
ambiental, embora seja levada como bandeira pelos “tipos ambientalistas”, aqui passa quase
despercebida, dado o sentido parcialmente fixado pelo discurso dos “político-partidários”. As
questões agrária, de geração de emprego e concentração de terra/renda, encaixam-se nesta
fala, permitindo que, as identidades sejam modificadas numa relação entre elementos-
momento estabelecida por esta prática articulatória. Isto é possível em razão de que as
demandas dos elementos-momento “ambientalistas” encontram-se equivalencialmente ligadas
contra um discurso antagônico comum, estabelecido a partir do corte antagônico representado
pela possibilidade do estabelecimento da cadeia produtiva da celulose.
6.5 Considerações
O embate discursivo sobre os efeitos econômicos e sociais do monocultivo de
eucalipto em larga escala, no Brasil e em outros países da América do Sul como Uruguai e
Argentina - vai continuar por muitos anos. Tal afirmação, deve-se à constatação de que, os
argumentos utilizados pelos “desenvolvimentistas” e ambientalistas”, carecem de uma
justificação mais robusta em se tratando de uma cultura em larga escala sem precedentes nas
áreas pretendidas hoje, já que são reduzidos os estudos que avaliam as conseqüências desse
tipo de produção.
Normalmente, os “desenvolvimentistas” argumentam que a região é beneficiada pela
geração de emprego e renda. Entretanto, os mesmos “desenvolvimentistas” não apresentam
resultados de pesquisas que tenham experimentado a monocultura de árvores exóticas, como
o eucalipto, destinado à produção de celulose em regiões diversas das pretendidas nos dias
atuais. Trata-se de uma cadeia equivalencial, cujos sentidos são fixados com base nas
perspectivas apresentadas pela VCP, principal elemento desta cadeia articulatória.
Os “ambientalistas”, em qualquer um dos “tipos” de percepção adotados neste
trabalho, seguidamente se utilizam de pesquisas que fazem avaliações parciais da produção e
comparam os resultados com culturas temporárias. O problema da avaliação parcial está nas
diferentes demandas que o florestamento exige, que a vida do mesmo gira em torno de 21
anos (três cortes), e nos seus impactos. Assim, a fixação de sentidos propiciada pelo ponto
nodal “ambientalista”, encontra como principal justificação o risco da geração de danos
irreparáveis ao ambiente. A partir deste argumento, se estabelecem ligações de equivalência
que permitem o encadeamento dos elementos-momento que, em princípio, apresentavam
interesses diversos e, não raras vezes, antagônicos como no caso dos pecuaristas e
arrozeiros, diante da questão fundiária, e do MST.
Nos trabalhos utilizados pelos elementos-momento de cada um dos discursos, não se
avalia o desemprego gerado com a substituição de culturas por florestas, a redução na renda
do comércio local gerada pela redução nas demandas das culturas anuais (incluindo a
pecuária), a redução de demanda das famílias locais que venderam suas terras, a redução na
arrecadação de impostos, enfim, os problemas decorrentes da introdução de uma cultura
permanente que tem colheita de sete em sete anos.
Por outro lado, também são pouco substanciais os estudos e levantamentos de dados
acerca da geração de renda, implementação de postos de trabalho, impacto na geração de
impostos e implementação do setor do comércio local.
Sobre emprego e renda, existe uma necessidade urgente de estudos capazes de
contribuir para o entendimento da importância dessa atividade para a economia regional.
Nesse sentido, justifica-se uma pesquisa que avalie os impactos gerados pela produção de
eucalipto em larga escala.
Da mesma forma, no que tange à questão ambiental, não são apresentadas ou citadas
pesquisas que apontem os danos ambientais resultantes da cultura do eucalipto na região. São
utilizadas pesquisas realizadas em outras áreas do país e do mundo, onde os elementos
naturais e os biomas são muito diferentes dos característicos do pampa. Restaria para o
discurso “ambientalista”, a nosso ver, o argumento da necessidade de atentar para o princípio
da precaução
96
como elemento impeditivo ao estabelecimento deste ciclo produtivo.
96
Principio do direito ambiental já abordado no capítulo II, .
Portanto, em uma análise de conteúdo mais detida, ambos os discursos se
caracterizam por seus aspectos meramente retóricos, sem que se sustentem frente aos
questionamentos produzidos pelo presente estágio de ramos do conhecimento humano, tais
como biologia, ecologia, sociologia e jurídica. Nestas condições, o discurso
“desenvolvimentista” possui grande vantagem na construção da hegemonia no espaço
discursivo, visto que conta com o apoio das instituições em sua grande maioria, além dos
poderes político e econômico, majoritariamente integrados a cadeia equivalencial constituída
a partir do ponto nodal que estabelece o apoio ao ciclo produtivo da celulose nas cidades
incluídas no recorte geográfico desta pesquisa, integrantes da área de abrangência do “Projeto
Losango”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A denominada região sul do Estado do Rio Grande do Sul, localizada ao sul da
BR 293, que interliga os Municípios de Porto Alegre e Uruguaiana, embora tenha vivido
curtos períodos econômicos favoráveis, vivia no início deste século XXI, mais precisamente
entre os anos de 2004 e 2008, uma grave crise. Esta crise econômico-social, perdura por
longas cadas e as conseqüências podem ser observadas sem a necessidade de um esforço
maior. Os níveis de desemprego, a criminalidade, a baixa renda “per capita”, o baixo nível de
escolaridade, a saúde pública, o ficit de moradias e de leitos hospitalares, enfim, um sem
número de problemas que constituem o dia-a-dia de uma população que representa mais da
metade do total de habitantes do Estado do Rio Grande do Sul.
Neste contexto, as cidades de Pelotas, Arroio Grande e Herval, receberam a
notícia de que um grande empreendimento silvícola estava para se instalar naquela região. O
denominado Projeto Losango, da empresa Papeleira Votorantim (VCP), estava prestes,
segundo alguns, a alterar definitivamente o quadro econômico-social da região. Seriam
criadas novas e numerosas oportunidades, postos de trabalho diretos e indiretos, incremento
nas economias locais, investimentos nas áreas sociais, geração de renda e impostos. Tudo em
troca da instalação de um ciclo produtivo, que começava na plantação de árvores e terminava
na produção de papel.
Mas este era apenas um dos lados da questão “silvicultura”. Do outro lado, alguns
se perguntavam sobre o que viria junto com todas estas vantagens. A espécie a ser cultivada,
o eucalipto, geraria impactos ambientais significativos? Seria realmente bom para as cidades
depender de apenas uma cultura agrícola? Seriam mesmo criados tantos postos de trabalhos, e
os criados seriam duradouros ou apenas temporários? Estas e outras questões começaram a
eclodir nas conversas entre moradores, nas discussões dos políticos, na mídia e em toda a
opinião pública.
Diante desta realidade, surgiu a oportunidade de testar a utilidade da teoria do
discurso de Ernesto Laclau e Chantal Mouffe para analisar o embate que se apresentava entre
os posicionamentos frente ao tema silvicultura. De um lado, os que defendiam o implemento
da cultura do eucalipto - e seu ciclo produtivo - e de outro, os que discordavam e eram,
portanto, contrários à indústria de celulose e ao plantio do eucalipto.
Da oportunidade, desenvolveu-se esta dissertação de mestrado, buscando analisar
as construções discursivas independentemente da existência ou não de coerência entre os
discursos que se articulam e da correção ou não de seus posicionamentos, frente ao tema da
silvicultura. Tratava-se de um momento de possível mudança social e econômica, esta
possibilidade alterou o cotidiano das comunidades envolvidas, gerando expectativas e a
oportunidade de enunciação de novos discursos e possibilidades. Deve-se destacar ainda, a
contingência deste momento de embate discursivo; a presença deste fator é de importância
fundamental para a compreensão das manifestações e da própria existência das ligações
equivalenciais entre os momentos discursivos envolvidos, sejam eles grupos ou sujeitos
políticos.
A hipótese central do trabalho, apresentada na introdução, diz, resumidamente,
que o discurso “ambientalista” fixa sentido de sustentabilidade, econômica e ambiental, ao
significante “desenvolvimento”, enquanto que o discurso “desenvolvimentista” atribui, ao
mesmo significante, um sentido de crescimento econômico. No que toca à fixação de sentido
ao significante “silvicultura”, o discurso “ambientalista” lhe atribui um significado de
dependência econômica, concentração de renda e incremento na desigualdade social. Já o
discurso “desenvolvimentista”, fixa, para este mesmo ciclo produtivo, um sentido de geração
de renda, de emprego e de impostos, melhorando a qualidade e o padrão de vida das
comunidades envolvidas no projeto.
Nesse sentido, a hipótese central apresentada se confirmou na medida em que, no
desenvolvimento do trabalho de pesquisa, os significantes foram confirmados ao longo das
posições assumidas pelos discursos antagônicos. Esta contrariedade apresentava-se
fundamentada, salvo poucas exceções, em um viés político ideológico centrado na
discordância quanto à organização social das comunidades e a distribuição da riqueza. Mas,
este fato, sempre aparece subordinado aos interesses dos momentos equivalenciais em cada
uma das cadeias discursivas.
A problemática da pesquisa foi apresentada da seguinte maneira: frente à questão
do estabelecimento do ciclo produtivo da celulose no período de janeiro de 2004 a dezembro
de 2007, 1) como a silvicultura é significada por cada uma das articulações discursivas? 2)
Quais são os sentidos de desenvolvimento e de preocupação ambiental fixados por cada uma
das articulações?
Para responder as questões formuladas, inicialmente, delimitou-se e estabeleceu-
se pressupostos teóricos e epistemológicos a serem apropriados nesta dissertação. Estes
elementos teóricos foram buscados em diferentes áreas do conhecimento humano, como nas
Ciências Biológicas, Biologia e Ecologia, e nas Ciências Humanas, Ciências Jurídicas,
Ciência Política e Sociologia. Neste espaço, multidisciplinar, o maior destaque deve ser dado
à teoria do discurso de Ernesto Laclau e Chantal Mouffe, de onde foram tomadas emprestadas
diversas categorias de análise, que compõem a base teórica principal deste trabalho.
Na construção de um fundo histórico, desenvolveu-se um apanhado da história da
indústria de celulose no Brasil e no mundo, além de desenvolver-se uma breve análise
econômica deste setor produtivo. Também se construiu uma descrição da empresa VCP, sua
abrangência territorial e suas características administrativo-financeiras. Estes dados servem
de base para permitir uma melhor compreensão dos argumentos, no âmbito econômico, em
ambas as cadeias discursivas.
Em razão da constituição das ligações equivalenciais entre os elementos
discursivos em torno do ponto nodal “ambientalista”, foram construídos “tipos de percepção”
que possuem como utilidade permitir uma melhor classificação dos elementos-momento
constitutivos da cadeia equivalencial. Estes “tipos” foram construídos a partir da observação
da existência de características comuns que permitem agrupá-los em razão das semelhanças
na construção discursiva frente ao tema da silvicultura. Assim, equivalencialmente ligados ao
ponto nodal “ambientalista” construiu-se os “tipos de percepção” “político-partidário”,
“político-econômico” e “político-sócio-ambiental”. A caracterização e descrição dos
elementos-momento agrupados em cada um dos “tipos de percepção” e seus principais
argumentos discursivos permitem uma melhor compreensão das relações equivalenciais
estabelecidas entre estes elementos discursivos.
Em relação aos elementos-momento “desenvolvimentista”, o mesmo artifício foi
utilizado em busca da compreensão dos posicionamentos nas cadeias discursivas antagônicas
abarcadas por esta pesquisa.
Obviamente, é no embate discursivo que se torna mais interessante e
esclarecedora a análise do discurso. A práxis” e a “verbis podem ser confrontadas e
analisadas com maior riqueza de detalhes, permitindo uma melhor compreensão da
constituição das cadeias discursivas e as respectivas fixações de sentidos nas práticas
articulatórias. Os principais espaços que permitiram estes embates discursivos foram a mídia,
que foi utilizada como um meio prático e rápido para propagandear, principalmente, o
discurso “desenvolvimentista”; as audiências públicas, espaços pretensamente mais
democráticos e igualitários de exposição de idéias o que em alguns casos não ocorreu como
pode ser constatado e os espaços institucionais, espaços estes disponibilizados pelos
poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, além do Ministério Público.
Nestes espaços de confronto discursivo, foi possível visualizar que o discurso
“desenvolvimentista” possui maior penetração na opinião pública e, conseqüentemente, maior
adesão da população destas comunidades de Pelotas, Herval e Arroio Grande. Alguns fatores
podem ser apontados como justificativas deste fato: a ausência de um argumento com forte
capacidade de convencimento por parte dos elementos que constituem a cadeia discursiva
“ambientalista”, a situação econômica desfavorável dos municípios integrantes do recorte
espacial da pesquisa, a forte campanha midiática desenvolvida pela empresa VCP, o apoio da
maioria dos políticos da região, enfim uma gama de motivos que permitiram que a
implementação do ciclo produtivo de celulose nas cidades do sul do Rio Grande do Sul não se
encontra óbice na obtenção do apoio da grande parte das comunidades locais.
Atos do MST, como queimar plantações, destruir viveiros de mudas e invadir
propriedades cultivadas com eucalipto, apesar de em alguns assentamentos existirem
significativas plantações de eucalipto, somente contribuíam para com os argumentos
favoráveis à silvicultura.
Soma-se a estes motivos a atuação fia das instituições investidas legalmente da
obrigação de impedir empreendimentos que afrontassem os institutos legais vigentes. São
exemplos disto, a substituição da Secretária Estadual do Meio Ambiente por um promotor de
justiça licenciado - publicamente comprometido para com a silvicultura -, a omissão do
Executivo estadual em fazer valer a legislação ambiental e a centralização das ações do
Ministério Público Estadual em Porto Alegre.
O que restou como certo, é o fato de que, como em outras situações semelhantes,
o meio ambiente restou relegado ao segundo plano. Foi sobrepujado por questões político-
ideológicas, econômicas e sociais.
As plantações estavam consolidadas em fins de 2007, somente nos três
Municípios pesquisados, se somavam mais de 30.000 hectares de terras cultivadas com
eucaliptos, 20.000 hectares tinham sido licenciados e ainda não plantados. Um número
superior a 200 pessoas estavam empregadas em dezembro de 2007 no viveiro de mudas da
VCP. Mais de 350 pessoas trabalhavam no plantio e manejo do eucalipto no Município de
Arroio Grande, a maioria vinda de outros municípios. Discutia-se onde Rio Grande ou
Arroio Grande a fábrica para beneficiamento de celulose seria instalada até agosto de 2010.
Novos ventos de crescimento econômico e “desenvolvimento” sopravam nas cidades
incluídas no Projeto Losango. O “sim ao eucalipto” não encontrava mais obstáculos.
REFERÊNCIAS
ABRAF. Anuário Estatístico da ABRAF: ano base 2005. Brasília, 2006.
In.http://www.abraflor.org.br/estatisticas/anuario-ABRAF-2006.pdf. Acesso em 10 jul.2007.
ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos do estado. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal,
1985.
BINOTTO, José. A celulose no Brasil. São Paulo: Klabin, 2000.
BUCKUP, L. A importância das Zonas de Amortecimento in:
www.igre.org.br/amortecimento.htm
, 2006.
____________. As Monoculturas com Eucalipto e a Sustentabilidade. The Ecologist. 13
ed.2006.
CHOMENKO, L. O Pampa no Atual Modelo de Desenvolvimento Econômico. Revista do
Instituto Humanitas Unisinos (IHU–on-line): Unisinos, São Leopoldo/RS. Edição 190, 14
agos. 2006. Disponível em http://www.unisinos.br/ihuonline/uploads/edicoes/1158
343910.64pdf.pdf. Acesso em 09 mar.2007.
_______________.Monocultura é alto risco ao clima do planeta, alerta pesquisadora.
Disponível em http://www.sintrafesc.org.br/noticias_din.php?id=10321. Acesso em 02 mai.
2007.
LACLAU, Ernesto. Nuevas reflexiones sobre la revolucion de nuestro tiempo. Buenos
Aires : Nueva Visión, 1993.
____________. La Guerre dês identités.grammaire de lé’mancipacion. Paris: La
Decouverte, 2000a.
____________. Misticismo, retórica y política. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica,
2002.
____________; MOUFFE, Chantal. Hegemony and socialist strategy : towrds a radical
democratic politics. London: Verso, 1985.
MARTINEZ ALIER, Joan. O ecologismo dos pobres: conflitos ambientais e linguagens de
valoração. São Paulo: Contexto, 2007.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 4ª edição, São Paulo:
Malheiros, 1993
MENDONÇA, Daniel de. Democracia sem Democratas: Uma análise da crise política no
governo João Goulart (1961-1964). Tese de doutoramento, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, 2006.
ODUM, Eugene P. Ecologia. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1981.
OLIVEIRA, Paulo Rogério Soares de. Relação entre empresas florestais e comunidades do
entorno: proposta para superação de conflitos. Tese de Doutoramento defendida
apresentada à Universidade Federal de Viçosa, 2007.
PÊCHEUX, Michel. Contextos epistemológicos da Análise de Discurso. Trad. Eni Orlandi.
In: Escritos, n. 4. Campinas, SP: Labeurb/Nucredi – UNICAMP, 1999.
RIO GRANDE DO SUL: O RS Biodiversidade: Conservação da Biodiversidade como Fator
de Contribuição ao Desenvolvimento do Rio Grande do Sul. Disponível em:
http://www.biodiversidade.rs.gov.br/portal/index.php. Acesso em 20 dez.2006.
SÉRGIO, Frei (compilação). Dossiê Deserto Verde: o latifúndio do eucalipto, 2006 in:
www.natbrasil.org.br/Docs/Monoculturas/dossie_deserto_verde.pdf
.
VALENÇA, A. C. e MATTOS, R. L. G. BNDESO setor de celulose de papel no Brasil. In
<www.abcp.org.br> acesso 21 de março de 2005.
VERDUM, R. Etnodesenvolvimento: nova/velha utopia do indigenismo. Tese de
Doutoramento defendida no Centro de Pesquisas e Pós-Graduação sobre as Américas. Brasília:
Universidade de Brasília, 2006.
VERDUM, R. O Pampa. Ainda desconhecido. Revista do Instituto Humanitas Unisinos
(IHU–on-line): Unisinos, São Leopoldo/RS. Edição 190, 14 ago. 2006. Disponível em
http://www.unisinos.br/ihuonline/uploads/edicoes/1158343910.64pdf.pdf. Acesso em 28
mar.2007.
VIA CAMPESINA. O latifúndio do Eucalipto: Informações básicas sobre as Monoculturas
de árvores e as Indústrias de Papel. Porto Alegre/RS, mar. 2006.
VIEIRA, Paulo Freire e WEBER, Jacques (org.) Gestão de Recursos Naturais Renováveis e
Desenvolvimento: Novos desafios para a pesquisa ambiental. ed. São Paulo: Cortez
Editora, 1996.
ANEXOS
ANEXO 1
FOTOS DE CULTURA DE EUCALIPTOS EM ASSENTAMENTO DO MST
Foto de parte do assentamento Sant’ana, nas margens da RS 602 que liga os
Municípios de Arroio grande e Herval, mostrando ao fundo a cultura de
eucaliptos.
Fonte: Autor.
ANEXO 2
FOTOS DO ESPAÇAMENTO DA CULTURA DE EUCALIPTO VCP
Vista de uma área cultivada com eucalipto, que permite observar o
espaçamanto utilizado pela VCP no projeto losango. Cidade de Arroio Grande
(29/04/2007).
Fonte: Autor.
ANEXO 3
FOTOS DA AUDIÊNCIA PUBLICA PROMOVIDA PELA VCP PARA
DIVULGAÇÃO DE SEU EIA/RIMA PARA OS PLANTIOS DE EUCALIPTOS DO
PROJETO LOSANGO
Foto 1 :
Carro de som da Força Sindical em frente ao SESI/SENAT, em Pelotas, na ocasião da
realização da Audiência Pública para apresentação do EIA/RIMA da VCP
.
Fonte: Autor
Foto 2:
Estande da Força Sindical na parte interna do local onde se realizava a Audiência Pública para
apresentação do EIA/RIMA da VCP.
Fonte: Autor
Foto 3:
Credenciamento para acesso ao local da realização da Audiência Pública para apresentação do
EIA/RIMA da VCP.
Fonte: autor
Foto 4:
Vista interna parcial do local onde se realizava a Audiência Pública para apresentação do EIA/RIMA
da VCP, no ginásio do SESI/SENAT, em Pelotas
Fonte: autor
ANEXO 04
QUESTIONÁRIOS APLICADOS
QUESTIONÁRIO DESTINADO AO CPERS:
1. Cidade:
2. Nome do entrevistado:
3. Há quanto tempo está filiado ao CPERS?
4. Há quanto tempo participa da direção da CPERS?
5. Está vinculado a algum partido político? Qual?
6. Qual o nível de formação educacional?
7. Qual a sua função e onde a exerce?
8. Qual o interesse do CPERS na proteção do ambiente e há quanto tempo esta preocupação vem
sendo discutida internamente?
9. Como o CPERS contribui para a solução de questões ligadas ao ambiente urbano e rural?
10. Como se a relação do CPERS com os órgãos públicos responsáveis pela qualidade do
ambiente?
11. Como a silvicultura poderá influenciar a cadeia produtiva no município?
12. Na visão do CPERS, como se e se estabelece a relação entre a administração pública
estadual e local com a empresa Votorantin?
13. Quais as principais conseqüências, no entender da direção do CPERS, advirão da cultura do
eucalipto para o ambiente? E para a população local?
14. Levando-se em consideração as conseqüências citadas, a implementação do ciclo produtivo do
eucalipto na região resulta em algo positivo ou negativo? Pq?
15. Já visitou alguma área destinada à cultura do eucalipto? Onde?
16. Em caso de resposta positiva, o que foi alterado na área utilizada e em seu entorno?
QUESTIONÁRIO DESTINADO À CUT:
1. Cidade:
2. Nome do entrevistado:
3. Há quanto tempo está sindicalizado?
4. Há quanto tempo participa da direção da Força Sindical?
5. Está vinculado a algum partido político? Qual?
6. Qual o nível de formação educacional?
7. Qual o interesse da Força Sindical na proteção do ambiente e há quanto tempo esta
preocupação vem sendo discutida internamente?
8. Como a Força Sindical contribui para a solução de questões ligadas ao ambiente urbano e
rural?
9. Quais os impactos no ambiente mais comuns no município, em razão de atividades em que
trabalham filiados à Força Sindical?
10. Como se dá a relação da Força Sindical com os órgãos públicos responsáveis pela qualidade do
ambiente?
11. Como a silvicultura poderá influenciar a cadeia produtiva no município?
12. Na visão da Força Sindical, como se dá e se estabelece a relação entre a administração pública
local e a empresa Votorantin?
13. Existem trabalhadores que exercem suas atividades na cadeia produtiva da celulose filiados à
Força Sindical? Quais?
14. Quais as principais conseqüências, no entender da direção da Força Sindical, advirão da cultura
do eucalipto para o ambiente? E para a população local?
15. Levando-se em consideração as conseqüências citadas, a implementação do ciclo produtivo do
eucalipto na região resulta em algo positivo ou negativo? Pq?
16. Já visitou alguma área destinada à cultura do eucalipto? Onde?
17. Em caso de resposta positiva, o que foi alterado na área utilizada e em seu entorno?
QUESTIONÁRIO DESTINADO AO MST:
1. Cidade:
2. Nome do entrevistado:
3. Há quanto tempo está ligado ao MST?
4. Há quanto tempo participa da direção da MST?
5. Está vinculado a algum partido político? Qual?
6. Qual o nível de formação educacional?
7. Qual o interesse do MST na proteção do ambiente e quanto tempo esta preocupação vem
sendo discutida internamente?
8. Como o MST contribui para a solução de questões ligadas ao ambiente urbano e rural?
9. Como se a relação do MST com os órgãos públicos responsáveis pela qualidade do
ambiente?
10. Como o MST trata a questão ambiental nos assentamentos e quais os cuidados que a
organização toma para evitar condutas dos assentados que podem ser lesivas ao ambiente?
11. Como a silvicultura poderá influenciar a cadeia produtiva nos municípios?
12. Na visão do MST, como se e se estabelece a relação entre a administração pública estadual
e local com a empresa Votorantin?
13. Quais as principais conseqüências, no entender da direção do MST, advirão da cultura do
eucalipto para o ambiente? E para a população local?
14. Levando-se em consideração as conseqüências citadas, a implementação do ciclo produtivo do
eucalipto na região resulta em algo positivo ou negativo? Pq?
15. Já visitou alguma área destinada à cultura do eucalipto? Onde?
16. Em caso de resposta positiva, o que foi alterado na área utilizada e em seu entorno?
QUESTIONÁRIO DESTINADO AOS GOVERNOS MUNICIPAIS
:
1. Cidade:
2. Nome do entrevistado:
3. Cargo:
4. Há quanto tempo ocupa este cargo?
5. A qual partido político está vinculado?
6. Qual o nível de formação educacional?
7. Como o governo municipal enfrenta as questões ligadas ao ambiente urbano e rural?
8. Quais os impactos no ambiente mais comuns no município?
9. Quais são os cuidados tomados pela administração municipal para minorar ou compor estes
impactos?
10. Como a silvicultura poderá influenciar a cadeia produtiva no município?
11. Como se deu e se estabeleceu a relação entre a administração pública local e a empresa
Votorantin?
12. Quais as principais conseqüências, no entender da administração pública local, advirão da
cultura do eucalipto para o ambiente? E para a população local?
13. Levando-se em consideração as conseqüências citadas, a implementação do ciclo produtivo do
eucalipto na região resulta em algo positivo ou negativo? Pq?
14. Já visitou alguma área destinada à cultura do eucalipto? Onde?
15. Em caso de resposta positiva, o que foi alterado na área utilizada e em seu entorno?
QUESTIONÁRIO DESTINADO AOS PRODUTORES RURAIS
:
1. Nome:
2. Ramo de atividade:
3. Há quanto tempo desenvolve tal atividade?
4. Localização da propriedade:
5. Principal destinação da produção:
6. Qual o nível de formação educacional?
7. Quantas pessoas são empregadas nesta atividade produtiva?
8. Qual a importância do ambiente para esta atividade?
9. Quais os principais impactos no ambiente são gerados por esta atividade?
10. Quais são os cuidados tomados para minorar ou compor estes impactos?
11. Como a silvicultura poderá influenciar a atividade produtiva desenvolvida?
12. Pretende ou analisou a possibilidade de participar de alguma etapa da cadeia produtiva do
eucalipto?
13. Quais as principais conseqüências, no entender do entrevistado, advirão da cultura do eucalipto
para o ambiente? E para a economia local?
14. Levando-se em consideração as conseqüências citadas, a implementação do ciclo produtivo do
eucalipto na região resulta em algo positivo ou negativo? Pq?
15. Já visitou alguma área destinada à cultura do eucalipto? Onde?
16. Em caso de resposta positiva, o que foi alterado na área utilizada e em seu entorno?
QUESTIONÁRIO DESTINADO AOS SINDICATOS RURAIS:
1. Cidade:
2. Nome do entrevistado:
3. Denominação do sindicato:
4. Há quanto tempo participa do sindicato?
5. Está vinculado a algum partido político? Qual?
6. Qual o nível de formação educacional?
7. Como o sindicato contribui para a solução de questões ligadas ao ambiente urbano e rural?
8. Quais os impactos no ambiente mais comuns no município?
9. Como se a relação do sindicato com os órgãos públicos responsáveis pela qualidade do
ambiente?
10. Como a silvicultura poderá influenciar a cadeia produtiva no município?
11. Na visão do sindicato, como se e se estabelece a relação entre a administração pública local
e a empresa Votorantin?
12. Quais as principais conseqüências, no entender da direção do sindicato, advirão da cultura do
eucalipto para o ambiente? E para a população local?
13. Levando-se em consideração as conseqüências citadas, a implementação do ciclo produtivo do
eucalipto na região resulta em algo positivo ou negativo? Pq?
14. Já visitou alguma área destinada à cultura do eucalipto? Onde?
15. Em caso de resposta positiva, o que foi alterado na área utilizada e em seu entorno?
QUESTIONÁRIO DESTINADO AOS VEREADORES:
1. Cidade:
2. Nome do entrevistado:
3. Há quanto tempo é vereador?
4. Está vinculado a qual partido político?
5. Compõe base do governo ou oposição?
6. Qual o nível de formação educacional?
7. Como a câmara de vereadores contribui para a solução de questões ligadas ao ambiente urbano
e rural?
8. Quais os impactos no ambiente mais comuns no município?
9. Como se a relação da câmara de vereadores com os órgãos públicos responsáveis pela
qualidade do ambiente?
10. Como a silvicultura poderá influenciar a cadeia produtiva no município?
11. Na visão do vereador, como se e se estabelece a relação entre a administração pública local
e a empresa Votorantin?
12. Quais as principais conseqüências, no entender do vereador, advirão da cultura do eucalipto
para o ambiente? E para a população local?
13. Levando-se em consideração as conseqüências citadas, a implementação do ciclo produtivo do
eucalipto na região resulta em algo positivo ou negativo? Pq?
14. Já visitou alguma área destinada à cultura do eucalipto? Onde?
15. Em caso de resposta positiva, o que foi alterado na área utilizada e em seu entorno?
QUESTIONÁRIO DESTINADO ÀS ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS
:
1. Cidade:
2. Nome do entrevistado:
3. Nome da instituição:
4. Data de fundação da instituição:
5. Há quanto tempo participa da instituição?
6. Está vinculado a algum partido político?
7. Qual o nível de formação educacional?
8. Como a instituição contribui para a solução de questões ligadas ao ambiente urbano e rural?
9. Quais os impactos no ambiente mais comuns no município, na área rural?
10. Como se dá a relação da instituição com os órgãos públicos responsáveis pela qualidade do ambiente?
11. Como a silvicultura poderá influenciar a cadeia produtiva no município?
12. Na visão da instituição, como se e se estabelece a relação entre a administração pública local e a
empresa Votorantin?
13. Quais as principais conseqüências, no entender da instituição, advirão da cultura do eucalipto para o
ambiente? E para a população local?
14. Levando-se em consideração as conseqüências citadas, a implementação do ciclo produtivo do
eucalipto na região resulta em algo positivo ou negativo? Pq?
15. Já visitou alguma área destinada à cultura do eucalipto? Onde?
16. Em caso de resposta positiva, o que foi alterado, em razão da atividade ali desenvolvida, na área
utilizada? E no seu entorno?
ANEXO 5
TERMOS DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA FIRMADOS ENTRE O MP/RS E A
FEPAM
ANEXO 6
PORTARIA 070/07 FEPAM ESTABELECENDO REGRAS PARA REALIZAÇÃO DE
AUDIÊNCIAS PÚBLICAS
ANEXO 7
CONTRATO PARA REALIZAÇÃO DO EIA/RIMA DO PROJETO LOSANGO
ANEXO 8
APROVAÇÃO DO ZONEAMENTO AMBIENTAL PARA SILVICULTURA NO RIO
GRANDE DO SUL
ANEXO 9
MATÉRIA EM JORNAL INFORMATIVO DO INCRA:
“LIMITES PARA OS EUCALIPTOS”
ANEXO 10
FOLDER DISTRIBUIDO NA AUDIÊNCIA PÚBLICA PARA
DISCUSSÃO DO EIA/RIMA DO PROJETO LOSANGO (VCP)
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo