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ESCOLA SUPERIOR DE TEOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
JEFERSON ANDRE SAMUELSSON
O SERMÃO E SEU LOCUTOR: ANÁLISE LINGÜÍSTICA E REFLEXÕES
SOBRE O LABOR HOMILÉTICO
São Leopoldo
2008
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1
JEFERSON ANDRE SAMUELSSON
O SERMÃO E SEU LOCUTOR: ANÁLISE LINGÜÍSTICA E REFLEXÕES
SOBRE O LABOR HOMILÉTICO
Dissertação de Mestrado
Para obtenção do grau de Mestre
em Teologia
Escola Superior de Teologia
Programa de Pós-Graduação
Teologia Prática
Orientador: Dr. Rodolfo Gaede Neto
São Leopoldo
2008
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2
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Ficha elaborada pela Biblioteca da EST
S193s Samuelsson, Jeferson Andre
O sermão e seu locutor : análise lingüística e
reflexões sobre o labor homilético / Jeferson Andre
Samuelsson ; orientador Rodolfo Gaede Neto. São
Leopoldo : EST/PPG, 2008.
149 f. ; il.
Dissertação (mestrado) Escola Superior de
Teologia. Programa de Pós-Graduação. Mestrado em
Teologia. o Leopoldo, 2008.
1. Pregação. I. Gaede Neto, Rodolfo. II. Título.
3
JEFERSON ANDRE SAMUELSSON
O SERMÃO E SEU LOCUTOR: ANÁLISE LINGÜÍSTICA E REFLEXÕES
SOBRE O LABOR HOMILÉTICO
Dissertação de Mestrado
Para obtenção do grau de Mestre
em Teologia
Escola Superior de Teologia
Programa de Pós-Graduação
Teologia Prática
Data: 18 de dezembro de 2008.
Rodolfo Gaede Neto Doutor em Teologia EST
________________________
Nelson Kirst Doutor em Teologia EST
________________________
Vilson Scholz Doutor em Teologia ULBRA / SEMINÁRIO CONCÓRDIA
________________________
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por ter me dado pais tão amáveis e dedicados, e dois
irmãos amorosos. Agradeço ao meu pai Delmar e à minha mãe Cecília que não
mediram esforços para que eu tivesse o privilégio de me dedicar aos estudos. O
pouco que sei, devo a eles. Também ao meu irmão Jorge que quer saber
quando serão as minhas férias ou quando me formarei para voltar para casa.
Tamm à minha irmã Grace que, além de zelar por sua própria família, seu
esposo Altair e seus filhos Laura e Felipe, preocupa-se comigo.
Agradeço aos meus dois orientadores. Ao professor Dr. Mauro Batista de
Souza por caminhar ao meu lado nos primeiros passos deste mestrado e ao
professor Dr. Rodolfo Gaede Neto por também estar ao meu lado nos últimos
passos desta etapa da caminhada.
Agradeço aos colegas tanto do mestrado quanto do doutorado por
compartilharmos as angústias e as alegrias da vida da academia. Agradeço, em
especial, ao Wilhelm Sell, amigo presente em todos os momentos e colega neste
mestrado.
Agradeço à Carmen Cenyra Gonçalves que, não tem sido minha
professora de Francês, mas tamm uma querida amiga e incentivadora da
viagem vagarosa pelo mundo dos livros.
Agradeço aos meus amigos, aos meus colegas pastores, aos meus irmãos
da IELB.
Agradeço à Escola Superior de Teologia (EST) e aos seus professores pela
acolhida pastoral que dispensaram a mim e dispensam a todos os seus alunos.
Por fim, agradeço aos cidadãos brasileiros que subsidiaram minha bolsa de
5
estudos no mestrado através do CNPq.
6
RESUMO
Esta dissertação versa sobre o sermão e seu locutor, o que envolve a
elaboração do sermão e a sua concretização oral na prédica. A maioria dos
pastores elabora um sermão semanal. Trata-se de um trabalho muito importante,
que despende muito tempo de estudo, reflexão, produção e exposição oral.
Assim, esta dissertação se estrutura em três partes. O primeiro capítulo trata do
sermão e daquilo que está subentendido na sua produção. Reflete-se sobre a
Homilética como área da Teologia que se preocupa com a proclamação da
Palavra de Deus. Apresentam-se as contribuições de homiletas e de pastores que
pesquisaram o assunto com um profundo amor pelas suas ovelhas. O segundo
capítulo versa sobre o sermão e seus aspectos linísticos, isto é, suas
características a partir de uma reflexão lingüística sobre texto, locutor, linguagem.
Por fim, o terceiro capítulo descreve a metodologia utilizada e as alises dos
sermões.
7
ABSTRACT
This dissertation is about the sermon and its preacher, concerning the writing
of the sermon and its delivery. Most pastors write a sermon every week. This is a
very important work that requires a lot of study, meditation, preparation and oral
delivery. Therefore this dissertation is divided in three parts. The first chapter
addresses the sermon and what is implied in its construction. There is a reflection
about Homiletics as the area of Theology that is connected with the proclamation
of God‟s word. We present the contributions of some homiletics scholars and
pastors that investigated the subject with a deep love for their flock. The second
chapter is about the sermon and its linguistic aspects, that is, its features as seen
from a linguistic viewpoint in terms of text, speaker and language. Finally, the third
chapter describes the methodology utilized and the analysis of the sermons.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10
1 O SERMÃO E A HOMILÉTICA ........................................................................................ 13
1.1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 13
1.2 A HOMILÉTICA ............................................................................................................ 14
1.2.1 A Ciência-Homilética ......................................................................................... 16
1.2.2 A Arte-Homilética ............................................................................................... 17
1.2.3 Agostinho e a Homilética ................................................................................... 18
1.2.4 A Nova Homilética ............................................................................................. 19
1.2.5 A Questão da Terminologia na Homilética ......................................................... 20
1.3 A CONGREGAÇÃO ....................................................................................................... 22
1.4 O SERMÃO ................................................................................................................. 24
1.4.1 Fonte ................................................................................................................. 26
1.4.2 Hermenêutica e Aplicação ................................................................................. 28
1.4.3 O Estilo.............................................................................................................. 32
1.4.4 O “Texto-Sermônico” ......................................................................................... 35
1.5 O PASTOR .................................................................................................................. 39
1.5.1 Autoridade ......................................................................................................... 43
1.5.2 As Intenções ...................................................................................................... 43
1.5.3 Conhecer os Ouvintes ....................................................................................... 44
1.6 CONCLUSÃO ............................................................................................................... 45
2 O SERMÃO E A LINGÜÍSTICA ....................................................................................... 47
2.1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 47
2.2 O SERMÃO ENQUANTO TEXTO ...................................................................................... 48
2.2.1 Os Textos e sua Funcionalidade ........................................................................ 52
2.2.2 Texto x Discurso ................................................................................................ 54
2.2.3 Posicionamentos Assumidos pelo Escritor ......................................................... 55
2.2.4 Características Textuais do Sermão................................................................... 56
2.3 LOCUTOR/ENUNCIADOR DO SERMÃO E A LINGUAGEM ...................................................... 62
2.3.1 A Linguagem ..................................................................................................... 62
2.3.2 Locutor/Enunciador............................................................................................ 65
2.3.3 A Teoria da Enunciação ..................................................................................... 66
2.3.3.1 Elementos Lingüísticos Observados nas Análises do Locutor ......................... 70
2.3.3.1.1 Relação: “Eu” e “Tu” .................................................................................... 70
2.3.3.1.2 Certeza x Possibilidade ................................................................................ 71
2.5 CONCLUSÃO ............................................................................................................... 72
3 ANÁLISE DOS SERMÕES E DISCUSO DOS DADOS ............................................... 74
3.1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 74
3.2 CORPUS PARA ALISE ............................................................................................... 75
3.3 ANÁLISES ................................................................................................................... 76
3.3.1 Sermão 1 (Advento) ........................................................................................... 76
9
3.3.1.1 Apontamentos sobre o Sermão ....................................................................... 76
3.3.1.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade ..................................................... 79
3.3.2 Sermão 2 (3º Domingo no Advento) ................................................................... 81
3.3.2.1 Apontamentos sobre o Sermão ....................................................................... 82
3.3.2.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade ..................................................... 84
3.3.3 Sermão 3 (Primeiro Domingo após o Natal) ....................................................... 86
3.3.3.1 Apontamentos sobre o Sermão ....................................................................... 87
3.3.3.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade ..................................................... 89
3.3.4 Sermão 4 (Epifania) ........................................................................................... 91
3.3.4.1 Apontamentos sobre o Sermão ....................................................................... 92
3.3.4.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade ..................................................... 93
3.3.5 Sermão 5 (2º Domingo após Epifania) ............................................................... 95
3.3.5.1 Apontamentos sobre o Sermão ....................................................................... 96
3.3.5.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade ..................................................... 98
3.3.6 Sermão 6 (5º Domingo após Epifania) ............................................................. 101
3.3.6.1 Apontamentos sobre o Sermão ..................................................................... 101
3.3.6.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade ................................................... 103
3.3.7 Sermão 7 (Quaresma) ..................................................................................... 105
3.3.7.1 Apontamentos sobre o Sermão ..................................................................... 106
3.3.7.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade ................................................... 107
3.3.8 Sermão 8 (6º Domingo após Pentecostes) ....................................................... 111
3.3.8.1 Apontamentos sobre o Sermão ..................................................................... 111
3.3.8.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade ................................................... 113
3.3.9 Sermão 9 (Pentecostes III) .............................................................................. 115
3.3.9.1 Apontamentos sobre o Sermão ..................................................................... 115
3.3.9.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade ................................................... 116
3.3.10 Sermão 10 (23º Domingo após Pentecostes) ................................................. 118
3.3.10.1 Apontamentos sobre o Sermão ................................................................... 118
3.3.10.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade ................................................. 119
3.4 CONCLUSÃO ............................................................................................................. 121
CONCLUSÃO .................................................................................................................. 124
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................ 129
ANEXOS .......................................................................................................................... 132
10
INTRODUÇÃO
Paulo escreve aos Coríntios que “aprouve a Deus salvar os que crêem pela
loucura da pregação."
1
A pregação, enquanto modo, não é loucura, mas o
conteúdo sim é loucura para os seres humanos. É a palavra da cruz que é loucura
para os que se perdem, todavia para os que são salvos, poder de Deus.
2
A loucura da pregação! Eis uma assertiva simples, mas que jamais, com
efeito, conseguir-se-á, neste mundo, compreender o seu profundo conteúdo. Além
disso, é outorgado aos seres humanos o privilégio de serem participantes nessa
louca empreitada. se afirmou que a Igreja cai ou se levanta pela pregação.
Verdade ou frase de efeito? Um cético dirá que a Igreja tem outras áreas tão
importantes quanto a pregação. Outros dirão que a missão é também importante.
Outros, ainda, dirão que cabe igualmente à Igreja um trabalho social. Outros,
ainda, defenderão a sistemática ou dogmática.
Assim, esta dissertação tamm aborda os aspectos que estão envolvidos
na elaboração do sermão e a sua concretização oral na prédica. A maioria dos
pastores elabora um sermão semanal. Trata-se de um trabalho muito importante
que despende muito tempo de estudo, reflexão, produção e concretização.
Quem dera chegasse um tempo em que a atividade pastoral pudesse ser
dividida numa congregação, tendo os pastores que se preocupar especificamente
com uma tarefa, explorando aquelas capacidades que receberam de Deus.
Aquele que possuísse as capacidades de oratória e retórica, preocupar-se-ia com
os estudos, com o sermão e a prédica. Aquele que possuísse a capacidade para
1
1 Coríntios 1.21.
2
1 Coríntios 1.18.
11
a música, preocupar-se-ia com as atividades litúrgicas e com o coral. Aquele que
possuísse a capacidade de ouvir, sem prejulgar, preocupar-se-ia com a visitação.
Aquele que possuísse a capacidade de administrar preocupar-se-ia com a
diaconia na Igreja.
A partir de determinado momento na história da Igreja um texto passou a ser
levado para o púlpito. Este texto se tornou peça preponderante nas prédicas
dominicais pelo menos nas Igrejas tradicionais. Essa prática não foi instituída por
Jesus. O relato bíblico expressa que Jesus acabou a leitura da passagem do livro
de Isaías, sentou-se, todos o olhavam fixamente, e começou a falar.
Qualquer texto ou qualquer discurso ou qualquer sermão é um modo de
ação. Nesse modo de ação, há marcas que trazem as representações do sujeito
que enuncia, as quais atestam o seu engajamento enunciativo com o dizer para
convocar o outro de sua alocução ao se anunciar. As marcas são de: pessoas,
tempo, espaço. Do mesmo modo, pode-se argumentar que o texto possui uma
forma de ação, isto é, o texto como uma enunciação se constitui por um ato
(prometer, sugerir, afirmar, interrogar, convidar, etc.), visando modificar uma
situão.
O problema que se apresenta para esta pesquisa é a dúvida a respeito da
“imagem” do locutor e a “imagem que este faz do alocutário(destinatário) nos
sermões publicados no livro “Portas Abertas mensagens para o culto”. O locutor
marca seu discurso predominantemente de maneira assertiva, isto é, um discurso
em ele assume o lugar da autoridade” ou marca pela possibilidade, isto é, a não
assertividade? E, de modo secundário, pergunta-se se estes sermões podem
abranger o pluralismo cultural brasileiro.
Trabalha-se com as seguintes hipóteses: O emissor (locutor) marca seu
discurso predominantemente no campo do saber, isto é, um discurso marcado
pela certeza. Ao assumir esse tipo de discurso, o locutor impõe o seu dizer ao seu
interlocutor. E, assim, o fazer, isto é, as ações propostas pelos verbos cabem ao
destinatário (alocutário).
Por outro lado, trabalha-se, tamm, com a hipótese de que o emissor
(locutor) marca seu discurso no campo do crer. Neste, não se impõe a opinião ou
finge não impor. ao leitor ou destinatário a possibilidade de aceitar ou não o
seu discurso. E, desse modo, o fazer cabe tanto ao que fala quanto aquele a
12
quem ele se dirige.
Tal demonstração possibilita a reflexão sobre o modo como os pastores se
expressam textualmente e traz subsídios para que os sermões, por eles escritos,
reflitam o seu contexto e tenham destinatários específicos, ou seja, sua própria
congregação, porque este aspecto de proximidade não pode ser negligenciado.
Ao mesmo tempo, o pluralismo brasileiro precisa ser levado em consideração,
quando séries de sermões são publicadas.
Assim, esta dissertação se estrutura em três partes. O primeiro capítulo trata
do sermão e daquilo que essubentendido na sua produção. Reflete-se sobre a
Homilética como área da Teologia que se preocupa com a proclamação; sobre as
contribuições de homiletas e de pastores que pesquisaram o assunto com um
profundo amor pelas suas ovelhas. O segundo capítulo versa sobre o sermão e
seus aspetos lingüísticos, isto é, suas características a partir de uma reflexão
lingüística sobre texto, locutor, linguagem. Por fim, o terceiro capítulo contém
aspectos metodológicos e as análises dos sermões.
13
1 O SERMÃO E A HOMILÉTICA
As minhas ovelhas ouvem a minha voz;
eu as conheço, e elas me seguem.
(Jo 10.27)
1.1 Introdução
A produção de livros e artigos que versam sobre Homilética, no âmbito do
luteranismo brasileiro, é pequena. O protestantismo luterano tem suas bases nos
seguintes princípios: somente Cristo, somente pela , somente a graça, somente
a Escritura. Esses princípios manifestam o conteúdo da . Todavia, o processo
de entrega desse conteúdo pouco é tratado.
Assim, este capítulo reflete sobre o sermão na perspectiva dos homiletas,
isto é, daqueles pastores e professores que se preocuparam em escrever sobre o
assunto. É grande a produção de outras Igrejas
3
sobre a preparação de sermões.
De modo nenhum foi possível, nesta reflexão, dar conta de tão vasta bibliografia.
Contudo, aquilo que se julgou imprescindível, levando em consideração a
proposta dessa dissertação, está nas páginas seguintes.
Desse modo, discorre-se sobre os olhares diferentes pelos quais se pode
investigar o trabalho homilético. Alguns trataram do labor homilético como arte.
Outros, ainda, estudaram-no como uma ciência. E, brevemente, destaca-se
Agostinho que foi o primeiro a escrever um tratado de Homilética. Além destes
3
Para citar algumas obras: CRANE, James. O sermão eficaz. Rio de Janeiro: JUERP, 1994./
BRAGA, James. Como preparar mensagens bíblicas. Miami: Editora Vida, 1989./ KOLLER,
Charles W. Pregação Expositiva sem anotações. São Paulo: Editora Mundo Cristão, 1995./
LACHLER, Karl. Prega a Palavra. São Paulo: Edições Vida Nova, 1990./ REIFLER, Hans Ulrich.
Pregação ao Alcance de todos. São Paulo: Edições Vida Nova, 1990./ As edições de Lições
aos meus alunos de Spurgeon, pela Publicações Evangélicas Selecionadas, etc.
14
aspectos gerais, contemplam-se também três campos semânticos, nos quais
estão presentes os elementos essenciais dessa área de conhecimento, isto é,
contemplam-se como tópicos separados o pastor na figura de emissor, a
mensagem que o emissor prepara e profere e a congregação na figura do ouvinte.
Sendo o fim último da pregação o ouvinte, inverteu-se a ordem. Depois de
considerações sobre a Homilética, trata-se primeiramente da congregação, depois
do sermão e, por último, do pastor. Nestes campos, estão envolvidas as
perguntas diretivas o que, quem, como, para que, onde e quando.
1.2 A Homilética
“Se a palavra de Deus é tão eficaz e o poderosa, como vemos o pouco
fruto da palavra de Deus?”
4
Sem dúvida nenhuma, esta é uma pergunta que o
poucos pastores fizeram a si mesmos. O Padre Vieira se aventurou a responder.
Em seu Sermão da Sexagésima, numa explanação da Parábola do Semeador,
ele apresenta, primeiramente, três princípios pelos quais julga o pouco fruto da
palavra de Deus no mundo: ou da parte do pregador, ou da parte do ouvinte, ou
da parte de Deus."
5
Segundo Vieira, da parte de Deus, não falta nem pode faltar. Esta
proposição é de fé."
6
Quanto aos ouvintes, já é um pouco diferente. Alguns
pastores julgam que a culpa é dos que ouvem. Todavia, “os ouvintes ou são maus
ou são bons; se são bons, faz neles fruto a palavra de Deus, se são maus, ainda
que não faça neles fruto, faz efeito."
7
Pois a semente nasce em todos os solos,
entre os espinhos, no caminho e nas pedras. Das três possibilidades sobrou o
pastor. E o leitor é tentado a colocar a culpa no pregador. Porque se não é Deus,
não é o ouvinte, pode ser o pastor. Este princípio ficará em suspenso, por
enquanto.
Apesar de a Homilética ser uma disciplina com sólidas bases bíblicas, os
pastores que escreveram manuais sobre essa matéria buscaram, em fontes
4
VIEIRA, Antônio. Sermões do Padre Antônio Vieira. Porto Alegre: L&PM, 2006, p. 23. O Padre
Antônio Vieira foi jesuíta, diplomata do Reino Português, conselheiro de reis, e perseguido pelo
Santo Ofício. Viveu de 1608 a 1697. O Sermão da Sexagésima foi escrito por Vieira em 1655.
5
VIEIRA, 2006, p. 24. O Padre Vieira ainda assevera que “nunca na Igreja de Deus houve tantas
pregações, nem tantos pregadores como hoje.”
6
VIEIRA, 2006, p. 25.
7
VIEIRA, 2006, p. 27.
15
distintas e mais variadas, aprimorá-la. Com certeza, ela bebeu e ainda bebe em
fontes além da Teologia. Para observar esse fato, basta perscrutar os livros e
artigos produzidos nesta área. Figuram retóricos, oradores, filósofos, sociólogos,
comunicadores, jornalistas, lingüistas, etc.
Os primórdios da Homilética encontram-se em Santo Agostinho. Dele é o
primeiro estudo sistemático a respeito da matéria “A Doutrina Cristã”. Como
ciência, tem sua origem nos conhecimentos deste pai da Igreja. Ele aplicou os
princípios da retórica na pregação cristã.
8
Mais tarde, semelhantemente, Broadus
afirmou que “a ciência da Homilética nada mais é do que a adaptação da rerica
às finalidades especiais e aos reclamos da prédica cristã."
9
A Homilética é, então, aquele ramo de estudo que se preocupa com a
proclamação da palavra de Deus. E esta, a pregação, “devia ser considerada a
mais nobre tarefa que existe na face da terra."
10
Pois, trata-se do meio pelo qual
Deus atinge o ser humano. Porque “agradou a Deus salvar aqueles que crêem
por meio da loucura da pregação (1 Coríntios 1.21).” Desse modo, tamm
expressam as Confissões Luteranas:
Institui Deus o ofício da pregação, dando-nos o evangelho e os
sacramentos, pelos quais, como por meios, o Espírito Santo, que
opera a fé, onde e quando lhe apraz, naqueles que ouvem o evangelho,
o qual ensina que temos, pelos méritos de Cristo, não pelos nossos, um
Deus gracioso, se o cremos.
11
Para Blackwood, a pregação é a “comunicação da verdade aos homens
mediante o homem."
12
Por isso ela requer a interpretação da vida hodierna a
partir da luz que hoje vem de Deus. Tanto no púlpito quanto na paróquia, o pastor
se esforça por interpretar a vontade de Deus para aqueles que buscam por
orientação
13
. No entanto, convém refletir sobre as seguintes palavras de Vieira:
“hoje pregam-se palavras e pensamentos, antigamente pregavam-se palavras e
8
COSTAS, Orlando. Comunicacion por medio de la predicación. Miame: Editorial Caribe, 1984,
p. 41.
9
BROADUS apud MORAES, Jilton. Homilética: da pesquisa ao púlpito. Recife: STBNB
Edições, 2000, p. 26. Jilton Moraes é Doutor em Teologia na área da Homilética. Pastor mais
de 30 anos e professor de Homilética há mais de 25 anos.
10
BLACKWOOD, Andrew Watterson. A preparação de sermões. Rio de Janeiro: Juerp/Aste,
1981, p. 15.
11
CONFISSÃO DE AUGSBURGO in: LIVRO DE CONCÓRDIA. São Leopoldo/Porto Alegre:
Sinodal/Concórdia, 1997, p. 30. A IELB subscreve esse artigo, bem como toda a Confissão de
Augsburgo.
12
BLACKWOOD, 1981, p. 15.
13
BLACKWOOD, 1981, p. 16.
16
obras."
14
Kirst, citando Lasswell, destaca que para entender o processo da
comunicação humana “é preciso estudar os seguintes estágios: quem diz o que
em que canal a quem com que efeito?” Mais tarde foram acrescidos mais dois
elementos: “com que intenções em que condições?”
15
Assim, concebendo a
Homilética como o ramo da Teologia que se preocupa com a proclamação da
palavra de Deus, esses elementos do processo comunicativo são igualmente
objetos de estudo da Homilética.
Na Homilética, o pastor tem a oportunidade de congregar e conhecer as
outras disciplinas que fazem parte do campo de estudo da Bíblia. Utiliza a
Hermenêutica, a Exegese, a Litúrgica, as Línguas bíblicas, a História Antiga, etc.
Por outro lado, permite a utilização de campos de saber que possibilitam uma
compreensão global do ser humano, tais como a filosofia, a antropologia, a
psicologia, a comunicação, etc. Além disso, proporciona um conhecimento
abrangente e preciso da língua na qual ele se dirige aos ouvintes. Entretanto,
críticos afirmam, segundo Larsen, que o esforço semanal do pastor na
preparação de sermões é um “desperdício de recursos humanos."
16
1.2.1 A Ciência-Homilética
Encarar a Homilética como ciência tem suas vantagens. Proporciona a
fixação de um objeto específico de estudo e a objetivação de métodos e de
técnicas para o trabalho. Contudo, de acordo com Blackwood, o ensino dela como
ciência, exercido por mãos erradas, contribuiu para o baixo nível do púlpito.
Porque
muitos dos que tentaram dominar a terminologia dessa ciência fizeram
aparecer um conjunto de moldes ou fórmulas em que vazavam material
para sermões. Sem terem culpa, estes jovens consideravam a
„elaboração de sermões‟ em termos de regras, e não de vida.
17
14
VIEIRA, 2006, p. 30.
15
KIRST, Nelson. Rudimentos de Homilética. São Leopoldo: Sinodal, 1996, p. 31. Nelson Kirst é
pastor da Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil (IECLB). Doutor em Antigo
Testamento. Foi professor de Antigo Testamento, Homilética e Liturgia na Escola Superior de
Teologia (EST).
16
LARSEN, David L. Anatomia da pregação: identificando os aspectos relevantes para a
pregação hoje. São Paulo: Vida, 2005, p. 11. David L. Larsen pastoreou igrejas por 32 anos. É
professor emérito na Trinity Evangelical Divinity School, em Illinois, EUA.
17
BLACKWOOD, 1981, p. 21.
17
Por outro lado, Kirst o labor da prédica na Igreja a partir da ciência da
Comunicação. Sua perspectiva, por isso, difere de outros manuais de Homilética.
Desse modo, para ele, a “Homilética é a ciência que se ocupa com a pregação
cristã e, de modo particular, com a prédica proferida no culto, no seio da
comunidade reunida."
18
Além disso, outros homiletas deram à pregação e, em conseência à
Homilética, um lugar singular. Pois, afirmam que, no ministério pastoral, muitas
são as atividades desenvolvidas, “nenhuma delas, porém, é tão importante,
exigente e intransferível quanto à pregação. Do púlpito a mensagem de Cristo é
proclamada, vidas são salvas e os salvos são doutrinados, edificados
equipados."
19
A pregação, portanto, é a tarefa mais importante do pastor e a que
deveria ter maior prioridade.
1.2.2 A Arte-Homilética
Em detrimento das desvantagens proporcionadas pela visão da Homilética
como ciência, encará-la como arte da pregação pode ajudar a remediar o rigor
técnico na elaboração de sermões, dando a estes beleza e, acima de tudo, vida.
Pois, a arte evoca o imaginário do ser humano e toca sua alma. Assim, “no estudo
da pregação, como arte, o futuro ministro aprende a usar a imaginação."
20
O Sermão da Sexagésima de Vieira também é um clássico sobre a arte da
pregação. É considerado, de acordo com Homero V. Araújo, “uma autêntica
„teoria da arte de pregar‟."
21
E, de fato, não foge ao comentário. Trata com uma
beleza singular do labor homilético. Mesmo que não tenha utilizado este termo
Homilética especificamente.
Para Moraes, a arte de pregar precisa ser buscada pelo pastor. Este precisa
crescer nela. O pregador deve ser hábil em contar histórias e, do mesmo modo,
quem quiser se desenvolver como comunicador da Palavra. Comunicador por
excelência era Jesus. Nos seus sermões, rememorava fatos da história e apelava
à imaginação dos ouvintes, atribuindo, assim, um novo sentido à mensagem por
18
KIRST, 1996, p. 9.
19
MORAES, 2000, p. 28.
20
BLACKWOOD, 1981, p. 22.
21
Homero V. Araújo é o escritor que fez a introdução ao livro com os três sermões do Padre
Vieira. (VIEIRA, 2006, p. 13)
18
ele proferida. “Usou da história do povo de Israel, da realidade do momento, da
natureza, dos problemas e conflitos vividos pelos ouvintes.”
22
No entanto, segundo Blackwood, imprescindível é que os pastores
considerem o sermão a sua principal tarefa. O conhecimento da Homilética e da
arte da pregação são importantes, mas o sermão deveria ser valorizado acima de
tudo. “O sermão constitui o principal produto dos labores do ministro, semana
após semana.”
23
Em virtude disso, para este autor, quando um discurso verbal
merecer ser chamado de sermão, certamente, satisfez as necessidades dos
ouvintes.
1.2.3 Agostinho e a Homilética
O primeiro a se preocupar e produzir sobre Homitica foi Santo Agostinho. É
dele o primeiro livro que, especificamente, versa sobre o assunto. Trata-se de um
manual de doutrina cristã. Ele foi um escritor muito frutífero. Produziu obras dos
mais variados gêneros e se interessava pelos gêneros. Mas, em sua grande
maioria, seus livros são profundamente ligados à Escritura Sagrada.
“A Doutrina Cristã”, que é seu manual, divide-se em quatro livros: o primeiro
é dedicado ao estudo das coisas, isto é, ao estudo da Suprema Coisa (Deus) e do
homem. O segundo trata dos sinais, pois a Escritura é um conjunto de sinais
escritos, isto é, de palavras”
24
e todas as palavras são de instituição humana. Já o
terceiro versa sobre regras de interpretação, destacando essencialmente
princípios para resolver as ambigüidades da Escritura de sentido próprio e, mais
complexas, de sentido figurado e apresenta o recurso à crítica textual: do
contexto e de cotejamento das traduções. Por último, o quarto livro é um tratado
de oratória sagrada. Uma obra que está calcada em expor duas questões
básicas: O que? e Como?
Para Rocha, o leitor contemporâneo não deve pensar que este livro seja um
longo tratado sistemático sobre regras de eloqüência eclesiástica. São, antes de
tudo, conselhos expostos de maneira clara e com muito trato.
25
Durante essa
22
MORAES, 2000, p. 152.
23
BLACKWOOD, 1981, p. 23.
24
AGOSTINHO, Santo. A Doutrina Cristã. São Paulo: Paulus, 2002, p. 15. Introdução ao texto.
25
ROCHA, Frei Hylton Miranda. Pelos Caminhos de Santo Agostinho. São Paulo: Loyola, 1989,
p. 153.
19
dissertação, Agostinho continua sendo citado e, mais especificamente, no
segundo capítulo, quando se tratar da linguagem, pois esse pai da Igreja se
preocupou com o assunto.
1.2.4 A Nova Homilética
Segundo Souza, no final dos anos 60, começa a ocorrer uma mudança de
paradigma no campo da Homilética. Até então, a ênfase era dada ao conteúdo. A
nova proposta enfatiza a forma, seguindo a orientação de modelos indutivo-
narrativas, e tem como foco aquele que ouve a pregação.
26
A Nova Homilética propõe uma inversão de diretrizes na pregação. Sua
proposta é assumir um padrão indutivo em detrimento do dedutivo. Este é o
padrão atualmente seguido pela maioria dos pastores. Segundo Larsen, “a
abordagem indutiva vai do particular para o geral, enquanto que na dedutiva o
orador vai do geral ao particular."
27
É melhor se concentrar nos fatos, e o nas
idéias ou nos temas.
O modelo homilético que Craddock compilou, conhecido como pregação
indutiva, tem por objetivo principal convidar as pessoas ouvintes a tomar
parte no desenrolar da prédica e permitir que haja espaço para que
cheguem às suas próprias conclusões.
28
Craddock, talvez, seja o maior defensor da pregação indutiva. A impressão
que se tem é que a Nova Homilética busca, basicamente, impulsionar a arte da
homilética, porém no sentido narrativo. Não começar pelo sentido da história e
explicar as suas partes, e chegar novamente a ele. Todavia, contar de tal modo a
história que os ouvintes possam, eles mesmos, concluir qual é o sentido.
O foco es em pregar como se se contasse uma história, o que se
tornou moda nos rculos protestantes, católicos romanos e judaicos.
Embora os expoentes dessa área reconheçam que ela ainda o foi
devidamente explorada, essa é a direção do momento. [...] O bode
expiatório, naturalmente, é o sermão didático e o discurso racionalista.
Ouvimos dizer que agora o estilo é mais importante do que o conteúdo
no que se refere ao significado.
29
De acordo com Souza, Craddock observou que um dos motivos pelos quais
26
SOUZA, Mauro B. A Nova Homilética: ouvintes como ponto de partida na pregação cristã.
In: Estudos Teológicos, v. 47, n. 1, p. 5-24, 2007, p. 6. Mauro B. Souza é pastor da IECLB, Doutor
em Teologia e foi professor de Homilética da EST.
27
LARSEN, 2005, p. 73.
28
SOUZA, 2007, p. 6.
29
LARSEN, 2005, p. 136.
20
o púlpito perdeu seu prestígio e seu poder na sociedade residia no fato de que a
forma e o conteúdo haviam sido separados. O pregador sabia o que pregar,
porém não dava muita atenção em como pregar. Esta foi uma forte crítica aos
seus colegas pregadores.
30
O que é essencialmente importante é que a prédica volta a ser entendida
como um acontecimento oral, e não mais meramente literário. Prédica é
um evento ela acontece no tempo (durante doze, quinze, vinte minutos
do culto, da missa, da celebração) e não no espaço (da página escrita de
quem prega). Prédica, é bom convencionar, passa a existir no
momento em que ela é “performada”.
31
Ainda, conforme Souza, o fator mais importante na defesa da Nova
Homilética, para Craddock, “tem a ver com o movimento que a prédica
desenvolve quando é „performada‟.”
32
Por ser a prédica um evento oral, “seu
potencial de eficácia depende muito do movimento que ela segue.” Pode seguir
um movimento dedutivo ou indutivo, como foi visto antes. No primeiro caso, parte-
se de uma afirmação geral e “e se move até as aplicações particulares ou
experiências concretas.” Por outro lado, no segundo caso, parte-se das
experiências concretas e aplicações particulares e se move até a afirmação ou
verdade geral."
33
A Nova Homilética, bem como sua defesa do movimento indutivo, pode ser
resumida com o que segue:
Mudança de dedutivo para indutivo, de retórica para poética, de espaço
para tempo, de literatura para oralidade, de prosa para poesia, de quente
para frio, de credo para hino, de ciência para arte, de lado esquerdo do
cérebro para lado direito, de proposição para parábola, de discurso direto
para indireto, de construção para desenvolvimento, de discursivo para
estético, de tema para evento, de descrição para imagem, de ponto para
evocação, de autoritário para democrático, de verdade para significado,
de relato para experiência.
34
1.2.5 A Questão da Terminologia na Homilética
Qualquer ciência ou campo de saber possui a sua terminologia. Algumas,
como a Medicina ou o Direito, têm um cabedal de termos em que o simples leitor
30
SOUZA, 2007, p. 8.
31
SOUZA, 2007, p. 9.
32
Esta palavra está entre aspas, porque, no modo proposto pelo professor, não existe em
português. [grifos meus]
33
SOUZA, 2007, p. 11.
34
LOWRY, Eugene L. The Revolution of Sermonic Shape. In: O´DAY, Gail R.; LONG, Thomas G.
(Ed.). Listening to the Word: Studies in Honor of Fred B. Craddock. Nashville: Abingdon Press,
1993. p. 96. Apud SOUZA, 2007, p. 17.
21
pode se perder, como num labirinto, se não tiver à mão um bom dicionário. E, não
raras vezes, são desenvolvidos dicionários específicos para cada cncia. Pode
acontecer que um verbete assuma designações diferentes em áreas distintas de
uma ciência em particular. Preservar a terminologia é sumamente imprescindível?
E por que não construir textos ditos “científicos” numa linguagem acessível a
qualquer leitor mediano?
A Teologia não foge à regra. Tamm tem uma terminologia muito rica. A
Homilética, de modo semelhante, possui a sua, queo é seguida rigorosamente.
Muitos termos são utilizados de maneira aleatória tanto por escritores como por
pastores. Um exemplo disso é o uso de: sermão, prédica, mensagem, homilia
para se referir tanto ao texto como à mensagem que o pastor profere no culto
público. Porém, neste caso, os termos fazem parte de um mesmo campo
semântico.
O termo que mais sofreu de maneira pejorativa foi “sermão”.
35
Observa-se
isso há não pouco tempo. Por isso, quiçá, seu uso esteja se dissipando. É comum
ouvir a expressão: “Lá vem o sermão! Knox atribui a reputação desta
importante palavra ao espírito de sua época em função das pessoas terem
assumido uma rebeldia maior contra a autoridade moral.
36
Atualmente, os termos
“mensagem e “prédica” estão sobrepujando aquele. Basta verificar os títulos
37
de
livros com séries de mensagens de épocas distintas. Caberia indagar o porquê
dessa mudança semântica e, em especial, o motivo da depreciação de
determinados termos.
Não sermão, mas tamm, segundo Larsen, a palavra “pregar”, no
dicionário Webster da língua inglesa, tem uma acepção tamm pejorativa, isto é,
“exortar de maneira intrusiva e enfadonha.”
38
O dicionário Aurélio de língua
portuguesa ainda não apresenta uma acepção dessa maneira para a palavra
pregar. Todos os sentidos atribdos ao verbete dizem respeito, em linhas gerais,
à proclamação em forma de sermão.
De acordo com Kirst, Homilética “vem da palavra grega HE HOMILIA. O
35
Esta dissertação opta pelo verbete sermão por sua ampla condição semântica. Abrange tanto
aquele texto preparado pelo pastor quanto à proclamação deste texto no púlpito.
36
KNOX, John. A integridade da pregação. São Paulo: ASTE, 1964, p. 82.
37
A publicação que se analisa nesta dissertação: Portas Abertas: mensagens para o culto (2006);
Dietrich Bonhoeffer: Prédicas e alocuções (2007).
38
LARSEN, 2005, p. 11.
22
verbo HOMILEIN significa „relacionar-se, conversar‟. HE HOMILIA designa, no
NT, „o estar juntos, o relacionar-se‟, e, nos primeiros séculos da era cristã, o termo
passa a ser usado para denominar a predica. Daí deriva a expressão
„homilética‟.”
39
O dicionário Aurélio define Homilética como “arte de pregar
sermões religiosos”. O vocábulo grego, homilia, conversação, com o passar do
tempo, adquiriu a significação de discurso religioso.
Carvalho, por sua vez, faz distinção entre homilia e sermão quanto a um
aspecto de formalidade. No que diz respeito a modalidades enunciativas, a
homilia é um tipo de oratória mais simples mais familiar, em muitos casos,
dialogal”. Enquanto o sermão, em contraste, “é um tipo de discurso composto
segundo as regras da rerica ou da oratória, e proferido de forma solene, a partir
do púlpito.”
40
Conforme Knox,
praedico forma latina que significa declarar em público, proclamar,
publicar. Geralmente se supõe que esse termo latino corresponde ao
grego prophêteuo, profetizar. Entretanto, prophêteuo e prophêteia, tal
como aparecem no Novo Testamento, são transliterados regularmente
nas versões latinas, aparecendo com o propheto e prophetia. Praedico
traduz kêrysso e praedicatio, kerygma; e essas palavras, tanto gregas
como latinas, denotam uma declaração blica, uma proclamação e, na
realidade, um anúncio no sentido mais simples e geral
41
.
A separação que segue quanto aos subtítulos em congregação, sermão e
pastor é uma maneira de explorá-los como unidades temáticas. Porém, a tarefa
de estudá-los como assuntos separados é quase impossível.
1.3 A Congregação
Não esmagará a cana quebrada,
nem apagará a torcida que fumega...
(Isaias 42.2)
A comunidade é composta pelas ovelhas. E o bom pastor conhece as suas
ovelhas e elas o conhecem. É através do exercício do ministério pastoral que o
pastor tem um conhecimento apurado das pessoas da sua comunidade. Não se
dissocia lpito da vida dos congregados. Por isso, para Moraes, “o trabalho do
púlpito se completa na visitação, no aconselhamento e na vivência diária com os
39
KIRST, 1996, p. 9.
40
CARVALHO, Dirce de. Homilia: a questão da linguagem na comunicação oral. São Paulo:
Paulinas, 1993, p. 22.
41
KNOX, 1964, p. 23.
23
paroquianos.”
42
Para Vieira, segundo sua interpretação, os apóstolos pregariam a todas as
nações do mundo. Muitas bárbaras e incultas. Por isso, encontrariam homens
“degenerados em todas as espécies de criaturas: haviam de achar homens
homens, haviam de achar homens troncos, haviam de achar homens pedra.
43
A
questão suscitada é: para os pregadores contemporâneos, ainda vale esta
interpretação?
De acordo com Kirst, “o efeito principal da prédica consiste em proporcionar
ao ouvinte um equilíbrio existencial-emocional, através do fortalecimento de
convicções fundamentais que ele considera essenciais para sua existência.”
44
Porque o ouvinte tende a buscar o fortalecimento de suas posições e
sentimentos.
45
Semelhantemente, expressa Blackwood que quando as pessoas
“vão à Igreja esperam a mensagem de Deus, de acordo com as suas
necessidades atuais de seus corações.”
46
Para ele, os nascidos depois da
Primeira Guerra Mundial têm sido instruídos a pensar a partir da imaginação ao
invés de pensar logicamente. Assim, ao irem à Igreja desejam que o pastor faça-
os ver o que diz. Sua maneira de falar e o conteúdo precisam pintar cenas em
suas mentes como as parábolas
47
narradas por Jesus, por exemplo.
É mais por causa dos ouvintes do que do pregador que a pregação existe.
Sem dúvida, não existe pregação sem ouvintes. Por isso, Kirst assevera que a
prédica precisa guiar-se pelos ouvintes. Ele lembra que Lutero não se cansava de
acentuar que “a perspectiva do ouvinte é um dos fatores determinantes da
prédica.” Para o reformador, de acordo com as circunstâncias e dependendo dos
ouvintes, o pastor deve “ameaçar, atemorizar, repreender, advertir, consolar,
reconciliar. “Deve-se ensinar e pregar aquilo que é conveniente e próprio, de
acordo com o tempo, o lugar e as pessoas.”
48
A finalidade da mensagem “visa mover a vontade do ouvinte à ação, o que
42
MORAES, 2000, p. 179.
43
VIEIRA, 2006, p. 20.
44
KIRST, 1996, p. 27.
45
KIRST, 1996, p. 25.
46
BLACKWOOD, 1981, p. 51.
47
BLACKWOOD, 1981, p. 55.
48
KIRST, 1996, p. 177.
24
talvez aconteça apenas no íntimo do coração.”
49
No entanto, para isso acontecer
o emissor precisa conhecer, de certa forma, quais são as expectativas do receptor
em relação ao emissor propriamente e também qual a imagem que ele mesmo
lança sobre o ouvinte. E, no caso da prédica, o ouvinte quer confirmação de suas
convicções e alento aos seus anseios. Mas, se as suas convicções são
frustradas, o ouvinte aceitará a mensagem se julgar legítimo e competente o
pregador.
50
O contrário também acontece. Frustradas serão as expectativas se o
ouvinte considerar o pastor um não pregador.
A verdadeira pregação ocorre quando se estabelece um diálogo entre pastor
e ouvintes. Quando o pastor consegue envolver suas ovelhas através do sermão.
Todavia, esse envolvimento na prédica, conforme Kirst, não pode ser captado de
forma satisfatória por pesquisas de comunicação. “O recolhimento, a meditação, o
silêncio, o ouvir e atentar, o querer-deixar-que-se-lhe-diga-algo, a oração, a
adoração, o louvor, tudo isso faz parte do culto (...), e a prédica se encontra
inserida dentro de tudo isso.”
51
A reflexão sobre os ouvintes não se esgota nesse ponto. O ouvinte está
presente na reflexão sobre o sermão, a seguir, e na reflexão sobre o pastor, mais
adiante.
1.4 O Sermão
“Sabem padres pregadores, por que fazem pouco abalo os nossos sermões?
Porque não pregamos aos olhos, pregamos só aos ouvidos.”
52
Pois, “o pregar que
é falar faz-se com a boca, o pregar que é semear, faz-se com a mão. Para falar
ao vento, bastam palavras, para falar ao coração, são necessárias obras.”
53
Será a monotonia um dos problemas que assolam o púlpito? De acordo com
Craddock, a monotonia “trabalha contra a , ao provocar pensamentos
contrários, ao embalar de um cochilo, ao cobrir a ocasião com uma cortina
desinteressante ou indiferente.”
54
Neste e em outros autores, a Homitica tem se
fortalecido. É preciso reforçar as técnicas criativas já há muito utilizadas, e investir
49
BLACKWOOD, 1981, p. 44.
50
KIRST, 1996, p. 43.
51
KIRST, 1996, p. 29.
52
VIEIRA, 2006, p. 33.
53
VIEIRA, 2006, p. 30.
54
CRADDOCK apud JAGNOW, 1997, p. 95.
25
em novas formas de sermão.
Talvez, seja oportuno, neste momento, trazer a resposta àquela pergunta
deixada em suspenso no início deste capítulo. A causa de tão pouco fruto da
pregação não está em Deus, não está nos ouvintes e não está nos pregadores de
acordo com Vieira. Está justamente nas palavras. É porque as palavras dos
pregadores são palavras, mas não são palavras de Deus. Falo do que
ordinariamente se ouve.”
55
As palavras de Deus, pregadas no sentido em que Deus as disse, o
palavras de Deus; mas pregadas no sentido que nós queremos, não são
palavras de Deus, antes podem ser palavras do Demônio.
56
Segundo Larsen, uma das maiores necessidades da Igreja atual é ter uma
pregação verdadeiramente bíblica.”
57
O sermão é uma expressão humana. Não é o arejamento da opinião do
pregador até mesmo opiniões acerca de assuntos importantes mas a
participação de suas convicções mais sérias e íntimas. É mais do que
isso; ele se atreve a crer e, na verdade, não pode deixar de crer que
tudo quanto declara tem vindo a ele, para ele mesmo, como sendo a
Palavra de Deus. Desse modo, tem ele o fardo de um senso único de
responsabilidade, elevado por um único senso de privilégio.
58
O conteúdo da pregação não é outro senão Jesus Cristo. Ele “é tudo o que
Deus tem a dizer, e tudo o que Deus tem a dizer se articula em Jesus Cristo.”
59
É
pela pregação
60
que se estabelece o elo entre Deus e as pessoas. “Sem a
pregação não há elo entre a Palavra, que é Cristo, e a fé.”
61
Por ser esse elo,
a pregação é um ato comunicativo. Tem como finalidade a comunicação
da Palavra de Deus aos homens. Comunicar é compartilhar, e em virtude
desse compartilhamento ter certos conceitos atitudes ou experiências
comuns com outras pessoas. Pregar é compartilhar a Cristo com outras
55
VIEIRA, 2006, p. 50.
56
VIEIRA, 2006, p. 51.
57
LARSEN, 2005, P. 31.
58
KNOX, 1964, p. 69. A alusão do autor vincula-se aos textos de Am 3.8 e 1Co 9.16.
59
KIRST, 1996, p. 11.
60
Segundo Ebeling, para Lutero, A pregação cristã é o acontecimento da distinção de lei e
evangelho. Para que não haja mal-entendido: a tarefa da pregação cristã não é, em primeiro lugar,
uma instrução sobre a diferenciação de lei e evangelho ela é isso, também, num plano
secundário. A tarefa da pregação cristã é, antes, a execução da distinção de lei e evangelho, o
processo duma luta na qual, sempre de novo, a distinção de lei e evangelho está em jogo e se
concretiza. Assim sendo, a efetiva diferenciação de lei e evangelho não é algo secundário e casual
no acontecimento da pregação, mas aquilo que propriamente deve acontecer nela. (EBELING,
Gerhard. O Pensamento de Lutero. São Leopoldo: Sinodal, 1986, p. 92.)
61
KIRST, 1996, p. 13.
26
pessoas e assim introduzi-las a uma relação íntima com Deus.
62
1.4.1 Fonte
63
Larsen destaca que
a fé histórica da igreja cristã é clara nesses assuntos, afirmando que a
Bíblia é a única fonte infalível de fé, doutrina e prática. Emil Brunner
ressaltou que o destino da Bíblia é o destino do cristianismo. O princípio
da Reforma era sola Scriptura. Nossa autoridade é a Bíblia.
64
Esse posicionamento é sentido em outros autores. É necessário concordar
com Kirst que “nem toda pregação cristã precisa ser textual; mas toda pregação
cristã precisa ser bíblica. É a Bíblia que o conteúdo à prédica sempre.
65
Semelhantemente, Knox assevera que usar “a Bíblia e até mesmo o seu uso em
larga escala o é suficiente para garantir que a pregação bíblica seja eficiente
ou mesmo autêntica. Tudo depende como nós a usamos.”
66
Para Kirst, é a pregação que origem ao Cristianismo e não um livro. E
modo mais antigo da pregação cristã é baseado em textos, conhecida por homilia,
e foi amplamente praticada nos primórdios da Igreja cristã.
67
Por exemplo, cita-se
o procedimento dos apóstolos. Em Atos, vislumbra-se a cena de Paulo entre os
judeus discorrendo sobre as Escrituras.
Paulo, segundo o seu costume, foi procu-los e, por três sábados,
arrazoou com eles acerca das Escrituras, expondo e demonstrando ter
sido necessário que o Cristo padecesse e ressurgisse dentre os mortos;
e este, dizia ele, é o Cristo, Jesus, que eu vos anuncio.
68
62
COSTAS, 1984, p. 33.
63
A IELB crê, ensina e confessa que somente os escritos proféticos e apostólicos do Antigo e
Novo Testamento são a única regra e norma segundo a qual devem ser ajuizadas e julgadas
igualmente todas as doutrinas e todos os mestres, conforme esescrito: „Lâmpada para os meus
pés é a tua palavra, e luz para os meus caminhos‟ (Sl 119.105). E São Paulo: „Ainda que um anjo
vindo do céu vos pregue diversamente, seja anátema‟ (Gl 1.8). (FÓRMULA DE CONCÓRDIA in:
LIVRO DE CONCÓRDIA, 1997, p. 499) Lutero tamm entendia que as Escrituras são a fonte
central do material homilético, bem como a base de toda a pregação. O princípio da Reforma
Sola Scriptura era inabalável e imuvel.” (PRIETO, 1997, p. 146) Desse modo, a fonte para a
pregação na IELB é, por certo, a blia. Em conseqüência, qualquer outro escrito, comentário ou
mesmo qualquer sermão deve estar subordinado à Escritura Sagrada. Ou a pregação é bíblica ou
não é. Pois sem a Palavra escrita nas Escrituras, lida, pregada e ouvida, Deus permanece um
Deus desconhecido.” Porque “um sermão não prega a Bíblia, mas o Cristo da Bíblia.(Cf.
PRIETO, 1997, p. 135-137)
64
LARSEN, 2005, p. 22.
65
KIRST, 1996, p. 46.
66
KNOX, 1964, p. 13.
67
KIRST, 1996, p. 49.
68
Atos, 17.2-3.
27
“O conteúdo da mensagem cristã provém das Escrituras.”
69
Jesus usou o
Antigo Testamento como base de sua mensagem. Procederam de modo
semelhante os primeiros pregadores após a ressurreição de Jesus.
Primeiramente, utilizavam os livros do Antigo Testamento e quando surgiram,
mais tarde, as cartas de Paulo os evangelhos passaram a utili-los na pregação.
Moraes afirma que “a Bíblia é a única fonte inesgotável de sermões. Sem ela
seria loucura qualquer pregador tentar falar tantas vezes por semana, levando
salvação e edificação em todos os momentos.”
70
A Bíblia é utilizada na pregação porque é a Literatura de Deus. “É literatura
de alta qualidade porque é nossa literatura e porque é, em sentido muito
verdadeiro e distinto, a literatura divina.”
71
Não esse aspecto divino, mas, na
tessitura da Literatura Universal, pode-se facilmente observar a presença da
literatura bíblica entranhada nos mais diversos romances e também na poesia.
72
Em virtude disso, talvez, Knox escreve:
Imagens e também concepções bíblicas m penetrado na urdidura e na
composição da cultura ocidental; a linguagem da blia não somente foi
o ingrediente básico na linguagem da liturgia e devão da Igreja, mas
tamm afetou profundamente tanto a nossa literatura em geral assim
como nossa linguagem comum.
73
Por outro lado, existem materiais secundários, fora da Bíblia, que auxiliam e
contribuem na elaboração de sermões, como por exemplo: a Literatura Religiosa
hinologia cristã, arqueologia, história da Igreja, obra missionária, livros
devocionais; e a Literatura não especificamente religiosa poesia, clássicos da
literatura, ficção. Na Literatura, o pastor pode descobrir interpretações
69
MORAES, 2000, p. 63.
70
MORAES, 2000, p. 71.
71
KNOX, 1964, p. 13.
72
Para citar alguns escritores brasileiros: Machado de Assis escreve um romance com o seguinte
título: Esaú e Jacó, no qual a estrutura bíblica de formação de uma nova “nação” aparece no
romance, sem falar nos personagens Pedro e Paulo, os quais possuem as mesmas características
psicológicas dos apóstolos. Outro ainda de Machado é o Memórias póstumas de Brás Cubas.
Neste, além de imeras referências bíblicas, figuram até as Confises Luteranas num
determinado momento. Além disso, outro é Menotti Del Pichia, o qual escreve um romance com o
título Salomé. Na apresentação, o escritor comenta que o escreveu a partir do relato bíblico da
morte de João Batista. O próprio Padre Vieira, citado neste trabalho, com seus sermões é
estudado na Literatura Brasileira com um dos primeiros e principais escritores do início da história
da Literatura do Brasil; Não obstante, citam-se, ainda, Rui Barbosa, Álvares de Azevedo, Augusto
dos Anjos etc. Semelhantemente, Larsen destaca que Shakespeare fez mais de 1200 referências
às Escrituras em suas 37 peças. (LARSEN, 2005, p. 112)
73
KNOX, 1964, p. 15.
28
impressionantes sobre o homem e sobre a vida na terra. Bem como conhecer os
seus pensamentos mais íntimos, suas indagações, suas angústias, etc.
A Literatura em geral pode auxiliar o pastor a conhecer o pensamento do ser
humano. A Teologia do pregador não pode ser uma teologia de contra capa, isto
é, uma teologia que se baseia apenas em resumos e pequenos comentários.
Porque
se o existe nenhuma diferença significativa entre a Bíblia e as Fabulas
de Esopo ou as tábuas de Joseph Smith, então estamos abandonados
em meio a uma desesperadora mistura de verdade e erro calculada para
fomentar a hesitação e o eqvoco nolpito. Privado de consenso
normativo quanto ao conteúdo autorizado, o pregador se volta para a
psicologia popular, para os acontecimentos atuais ou para as resenhas
de livros, visando alimentar o rebanho faminto com essas coisas.
74
O testemunho bíblico ainda é como sempre foi e será a fonte e o critério
para tudo o que se disser em nome de Deus e de Jesus Cristo na comunidade
cristã”.
75
O pregador, entretanto, assim como outros comentaristas, também é um
expositor do texto bíblico e pode, sem o devido cuidado, esconder ou deturpar
qualquer trecho da Bíblia.
Como, pois, podemos definir a pregação bíblica? [...] Podemos afirmar
primeiramente que a pregação bíblica é a que permanece próxima às
idéias bíblicas características e essenciais: a transcendência, a
santidade, o poder e soberania, o amor de Deus; sua exigência de
justiça ética; seu julgamento do pecado; a criação do homem, sua
condição de pecador; sua necessidade de perdão e liberdade. O
significado de Cristo como a vinda real de Deus para nossa história com
o auxílio de que precisamos; a eficácia da reconciliação e da redenção,
da vida, do gozo e da paz na nova comunidade do Espírito que Deus
criou através de Cristo e para a qual podemos entrar mediante a
condição única de penitência e fé. E, na pregação bíblica, essas idéias
não aparecerão simplesmente como tais não só como largas
concepções gerais mas sim como parte integrante no contexto
concreto da tradição e da vida eclesiástica. A pregação bíblica não se
preocupa com abstrações. era „existencialista‟ muito antes que os
filósofos começassem a empregar este termo. Na verdade, não foi mero
acidente que Kierkegaard, o pai do existencialismo moderno, tivesse sido
um pregador bíblico.
76
1.4.2 Hermenêutica e Aplicação
De acordo com Agostinho, conhecer os Livros Santos é a primeira coisa a
ser feita pelo pregador. Em seguida, estudar com cuidado os preceitos morais e
74
LARSEN, 2005, p. 23.
75
KIRST, 1996, p. 46.
76
KNOX, 1964, p. 21.
29
as regras de fé. Quanto às passagens obscuras, o pregador buscará o seu
entendimento pelas passagens mais claras que versam sobre o mesmo assunto.
Os obstáculos para a compreensão estão ocultos em signos desconhecidos ou
em signos de sentido figurado. Estes são próprios ou figurados. Os signos serão
figurados ou “metafóricos, quando as mesmas coisas, que denominamos com seu
termo próprio, são também tomadas para significar algo diferente.”
77
Por isso, uma das primeiras necessidades apontadas por Agostinho é
conhecimento das línguas bíblicas. “Para combater a ignorância dos signos
próprios, o grande remédio é o conhecimento das línguas.”
78
Contudo, para
aqueles que não as conhecem, a diversidade de traduções auxiliará na
compreensão do texto. Caso sejam cogitados erros de tradução ou erros
gramaticais, a solução será buscar os originais.
Duas coisas são importantes na exposição das Escrituras Sagradas segundo
Agostinho: “a maneira de descobrir o que é para ser entendido e a maneira de
expor com propriedade o que foi entendido.”
79
Para ele, ainda, “toda a doutrina
reduz-se ao ensino das coisas e dos sinais. Mas as coisas são conhecidas por
meio dos sinais.”
80
Larsen também concorda que a “primeira responsabilidade é
descobrir o que o texto quer dizer e, então, pregar o que ele diz.”
81
O tempo que separa o mundo contemporâneo do mundo dos tempos bíblicos
é muito grande. E o pastor tem a função de aproximar esses dois mundos, isto é,
precisa ler aqueles tempos idos e vertê-los, sem os deturpar, aplicando-os às
pessoas deste tempo. “A tarefa do pregador é estabelecer uma ponte entre a
Palavra e a congregação.”
82
A palavra escrita envolve cultura, língua, construção
semântica e sintática, pessoas, vida e morte, e a tarefa do intérprete, portanto, é
chegar antes do texto, na palavra, mas através do texto. O pastor é responsável
por construir uma ponte capaz de ligar os dois mundos. Fazer o elo entre o
mundo bíblico e o mundo moderno.”
83
Esse elo se alcança através de uma Hermenêutica sadia. Ela se tornou um
77
AGOSTINHO, 2002, p. 99.
78
AGOSTINHO, 2002, p. 100.
79
AGOSTINHO, 2002, p. 41.
80
AGOSTINHO, 2002, p. 42.
81
LARSEN, 2005, p. 64.
82
PRIETO, 1997, p. 134.
83
MORAES, 2000, p. 181.
30
ramo de estudo teológico muito amplo e especializado. Hoje é tratada no plural
hermenêuticas. Mas ela provém do vobulo grego ermeneúo que significa
interpretar. Eis o trabalho do pastor: transportar o conteúdo do texto até o leitor ou
até o ouvinte. Com efeito, afirma-se que a correta interpretação é imprescindível
para uma boa pregação. Uma má interpretação tem como resultado uma
pregação que não condiz com a Palavra de Deus. Por isso, Moraes destaca que
“a capacidade de interpretar corretamente o texto bíblico é fundamental para o
sucesso do sermão.”
84
Quando falamos de „sentido original‟ de uma passagem ou de seu
significado em seu „contexto original‟, deveríamos ter em mente não
apenas as suas relações lógicas dentro da sentença, parágrafo, capítulo
ou livro em que seja encontrado, mas tamm algo muito mais rico e
muito mais significativo. O „contexto original‟ não é mera forma de
palavras, mas sim a vida real da antiga comunidade religiosa em que
primeiramente o texto foi ouvido e conservado.
85
O pastor precisa saber o que está fazendo com o texto bíblico. Implica, pois,
conhecer a realidade na qual o texto foi produzido. O que este texto significou
para o seu escritor. Com que propósito escreveu, pensando nos seus ouvintes ou
leitores.
86
É preciso que pergunte quanto aos textos a serem estudados: “é esse o
sentido em que Deus os disse? É esse o sentido em que os entendem os padres
da Igreja? É esse o sentido da mesma gramática das palavras?”
87
O pastor precisa ser um homem do seu tempo. Cabe a ele conhecer a
literatura contemporânea, o que está acontecendo na ciência, seus avanços e
seus limites. Precisa posicionar-se acerca dos conflitos existentes entre a ciência
e a fé. “Ele precisa compreender ao máximo o espírito dos seus dias. Isso é certo,
porém, porque o seu povo é afetado pessoal e individualmente por esses
fatores.”
88
Para Moraes,
a pregação se torna relevante quando, com sua base bíblica, apresenta
um conteúdo contextualizado capaz de alcançar os ouvintes,
oferecendo-lhes fé para a sua dúvida, alimento para a sua fome,
esperança para o seu desespero, respostas para as suas indagações,
ânimo para o seu desânimo e conforto para a sua aflição. Para tanto, é
84
MORAES, 2000, p. 75.
85
KNOX, 1964, p. 43.
86
KNOX, 1964, p. 38.
87
VIEIRA, 2006, p. 52.
88
KNOX, 1964, p. 72.
31
necessário que o pregador considere a existência de duas diferentes
culturas: a das pessoas para quem o texto foi originalmente escrito e a
dos ouvintes na atualidade.
89
Então, quando o que é pregado aproxima-se do ouvinte, isto é, quando o
conteúdo, os conceitos e as idéias lhe tocam, ele pode dizer: “Deus falou ao meu
coração; a mensagem foi para mim.” Em virtude deste aspecto, “através da
aplicação, o ouvinte passa a se sentir parte do sermão.” Aplicar significa tornar o
sermão prático. Ela pode ser direta ou indireta. Pode ser direta como Natã fez
com Davi, dizendo-lhe: “você é esse homem.”
90
É preciso acomodar e adaptar o
sermão ao auditório para que faça sentido em sua vida, com o propósito de que
as palavras do pregador entrem “no mundo do ouvinte, para trazê-lo ao mundo da
mensagem pregada.”
91
Larsen argumenta que, às vezes, o pastor hesita em fazer determinada
aplicação por temer a repercussão. Muitos membros ficarão felizes se o pastor
ficar pregando sobre generalidades. As coisas permanecerão tranqüilas se for
proclamado o princípio geral do sétimo mandamento. Todavia, quando ele
começar a pregar contra o furto de materiais da firma, comum até entre os
membros da Igreja, ele terá sérios problema.”
92
A grande questão é a confusão que se tem entre o imperativo e o indicativo.
Segundo Blackwood, quando se prega baseado nos Evangelhos e se “o que
Jesus era, o que disse e fez e como sofreu”, é preciso se lembrar de fazer a
aplicação no indicativo presente. Pregar “acerca do Cristo vivo e soberano.”
93
Confundindo indicativo e imperativo, incorre-se no legalismo. Com vistas a esse
perigo na pregação, Kirst destaca o seguinte:
Legalismo acontece quando o indicativo ou o Evangelho não recebem
destaque suficiente em relação ao que a prédica traz como imperativo e
lei. Indícios bastante claros de legalismo na prédica são expressões
como “devemos”, “temos que” e similares. [...] Se a mensagem da
prédica aparece apenas como exincia, talvez até a mais radical, falta-
lhe justamente o cabo sustentador e libertador, do qual depende toda a
tensão. Então, ela apenas chicoteia e cansa.
94
De acordo com Kirst, a Palavra de Deus se veste de palavras humanas. E há
89
MORAES, 2000, p. 175.
90
2 Samuel 12.7.
91
MORAES, 2000, p. 176.
92
LARSEN, 2005, p. 93.
93
DENNEY apud BLACKWOOD, 1981, p. 58.
94
KIRST, 1996, p. 57.
32
somente um meio de saber se o palavras humanas ou divinas: “Jesus Cristo, a
Palavra, é o critério pala julgar o conteúdo da Escritura, ele também o é para
julgar o conteúdo da pregação da Igreja.”
95
1.4.3 O Estilo
De acordo com Agostinho, os objetivos de um discurso, em especial o
cristão, são: instruir, agradar e converter. Estes estão intimamente ligados aos
três estilos de oratória de então: simples, temperado e sublime. Cícero os
classificava assim. Numa única sentença, Agostinho os reproduz da seguinte
maneira:
ser eloqüente é ser capaz de falar para ensinar em estilo simples as
pequenas questões; para agradar, tratando questões médias, em estilo
temperado; e para converter, expondo grandes questões, em estilo
sublime.
96
O estilo é inerente ao pastor. Seu modo de se expressar revela seu estilo.
Não se dissociam a capacidade de refletir, pensar e sentir da habilidade de
expressar-se ou de comunicar-se. A clareza é a característica primordial do modo
de se comunicar do pastor. O ser humano pensa através das palavras. Se o
pastor não consegue escrever ou expressar-se clara e objetivamente, é possível
que seu pensamento, tampouco, esteja claro.
97
Essa perspectiva torna-se relevante quando o pastor utiliza o púlpito. Pois,
no púlpito as pessoas que estão ouvindo não têm a oportunidade de perguntar
para tirar suas dúvidas. Sair pela tangente, atribuindo tudo ao Espírito Santo é
uma maneira fácil de encarar os fatos. Porém, isso não exime o pastor de ruminar
para expor claramente.
Não o pastor Costas, mas outros m se preocupado com o como”. Esta
palavra, talvez, esteja sendo e muito negligenciada. O pregador necessita
preocupar-se com duas coisas principais: o que dirá e como o dirá. Pois, aquele
que prega pode pregar uma coisa e comunicar outra.
98
Além disso, outro
95
KIRST, 1996, p. 13. Lutero destaca que se Cristo deve ser o conteúdo da prédica a fonte para
pregação é, antes de mais nada, a Bíblia.” (KIRST, Nelson. Lutero, pregação e pregadores
pequena antologia de “falas a mesa”. Ano 21, especial, Estudos Teológicos, São Leopoldo:
Unisinos, 1981, p. 71)
96
AGOSTINHO, 2002, p. 242.
97
KNOX, 1964, p. 65.
98
COSTAS, 1984, p. 158.
33
elemento a ser acrescido ao como” diz respeito à criatividade. Esta tem a ver
com a forma, isto é, “como a criativa Palavra de Deus é proclamada e aplicada.”
99
O pastor criativo busca proclamar a Palavra de Deus de modo tal que a
impressão causada seja semelhante a uma boa notícia apresentada pela primeira
vez.
Para Maldonado, é por meio da narração que os fatos são expostos e
expressos na pregação de Jesus. Desse modo, é imprescindível, para ele, que na
pregação apareça o elemento narrativo. E um de seus cleos básicos deve ser
o relato, relato que mostre a realidade de tais fatos. Como? Com seu método
próprio: contando-os.” Por isso, “o pregador deve possuir a arte dos bons
narradores, dos antigos rapsodos populares que encantavam seus auditórios (e
os encantam ainda hoje em certas culturas) com a fascinação dos seus
relatos.”
100
O estilo é uma das circunstâncias referidas por Vieira. de ser cil e
natural, assim como o semear “é uma arte sem arte; cai onde cai.” Porque o
sermão, quando vir nascendo, “há de ter três modos de cair: de cair com
queda, há de cair com cadência, há de cair com caso.”
101
A queda é para as coisas porque hão de vir bem trazidas em seu lugar;
hão de ter queda. A cadência é para as palavras, porque não hão de ser
escabrosas nem dissonantes; hão de ter cadência. O caso é para a
disposição, porque de ser tão natural e tão desafectada que pareça
caso e não estudo.
102
A comunicação verbal, articulada por meio de palavras, pode ser escrita ou
falada. A prédica é, pois, uma comunicação falada.
103
O pregador se esforçará
para que sua mensagem seja objetiva. Quanto mais objetiva for a sua forma de
falar mais condições terá de alcançar o ouvinte, possibilitando a compreensão, a
assimilão e a introjeção de valores que lhe foram apresentados.
104
99
JAGNOW, 1997, p. 98.
100
MALDONADO, 1997, p. 72. A impreso do que se ouve nos púlpitos é exatamente contrária.
Esse aspecto do contador de histórias se perdeu. Hoje é possível ler e ouvir, ao mesmo tempo,
pois o pastor projeta seu sermão. No entanto, algo positivo, nesse sentido e que pode ser
resgatado para o púlpito, é o que pastores fazem no sermonete. Neste, eles o contadores de
histórias. Larsen acredita que um dia não haverá mais o pregador que os seus sermões
(LARSEN, 2005, p. 41).
101
VIEIRA, 2006, p. 35.
102
VIEIRA, 2006, p. 35.
103
KIRST, 1996, p. 32.
104
MORAES, 2000, p. 182.
34
A objetividade estará presente somente se o pregador souber onde quer
chegar. É necessário um propósito claro. Se o assunto não estiver limpo para si
mesmo, como será quando o expor aos seus ouvintes? Clareando o assunto, o
pregador, antes de proferir, analisará “frase por frase, palavra por palavra, tudo
quanto colocou no papel até então; é o momento de tornar cada frase e cada
palavra precisa e preciosa, de acordo com o propósito que pretende alcançar em
sua mensagem.”
105
É necessário que esteja claro, também, para aqueles pastores que escrevem
sua mensagem palavra por palavra, que sua produção não seja uma peça
literária. Justamente porque no culto não há, ainda, o costume dar ao ouvinte a
oportunidade de, talvez, perguntar o uso de determinada expressão ou o sentido
de uma palavra específica. Knox, enfaticamente, assevera que o sermão não é
ensaio literário; é ato oral de comunicação. E mesmo assim precisa ser preparado
cuidadosamente, não planejado em seu esboço de linhas gerais, mas
preparado até em sua linguagem.”
106
O sermão é o pregador pregando uma ação, não uma coisa. É um ato
de expressão e de comunicação pessoal, não um depósito de
experiência e reflexão prévias. É esse fato que torna tão dicil a
pregação de um sermão antigo. Sermão é uma criação pessoal, íntima,
pertencendo essencialmente ao próprio momento da pregação.
107
Na IELB, os pastores m o costume de escrever o seu sermão e levar o
manuscrito ao púlpito. Alguns lêem seu sermão palavra por palavra, outros em
apenas trechos, outros lançam os olhos de quando em vez sobre os parágrafos,
ainda outros, porém raros, levam somente um esboço. Este método de produzir
um texto e tê-lo no púlpito, segundo Costas, foi “introduzido durante o reinado de
Henrique VIII da Inglaterra.”
108
Para Costas, o estilo retórico é importante para a pregação. Por ser um
modo de encarnar os pensamentos por meio da linguagem oral ou escrita, de tal
modo que as palavras e giros reflitam exatamente os conceitos.
109
Segundo Cremona, em Agostinho, “o estilo possui um tom popular ou
elevado de acordo com o público ao qual se dirigia, ora à comunidade de Hipona,
105
MORAES, 2000, p. 218.
106
KNOX, 1964, p. 68.
107
KNOX, 1964, p. 68.
108
COSTAS, 1984, p. 168.
109
COSTAS, 1984, p. 183.
35
ora à de Cartago, ora à de camponeses ou à de pescadores.” Quanto ao modo de
falar, Cremona ressalta que Agostinho “falava lentamente, coloria com variações
de tom as diferentes partes da pregação.” Buscava ardentemente que os seus
ouvintes o compreendessem ao transmitir a verdade que nele habitava e da qual
tinha convicção. E, sobre seu estilo de escrita, ressalta-se que “pensar e escrever
eram ações simultâneas. Pensava para escrever e o fato de escrever solicitava o
pensamento.”
110
Blackwood, propositadamente, também preocupou-se com um aspecto
importante, quanto ao estilo, ligado a questões lingüísticas ou retóricas. Para ele,
o pastor precisa falar diretamente pela segunda pessoa.
Não temas usar o pronome pessoal „tu‟. Será sem dúvida maçante falar
todo o tempo usando a segunda pessoa, será mesmo impossível se
houver desenvolvimento de um tema, principalmente se for usada
constante e erradamente, pode dar a impressão de estar „recriminando‟
ou „ameaçando‟, e de o pregador estar se colocando num pedestal. No
entanto, tenho certeza de que é necessário nunca omitir interpelação
direta... Se não houver ao menos um único ponto em que possas dizer
„tu‟ não fizeste um sermão, mas um ensaio ou uma conferência.
111
O que importa para Agostinho, por exemplo,
é a maneira de dizer. Ora, assim como é preciso agradar ao auditório
para o manter na escuta, também é preciso convencê-lo para o levar à
ação. E assim como o auditório sente prazer se tu falas de modo
agradável, também ele se convence, se gostar do que lhe propões, se
temer aquilo de que o ameaças; se odiar o que reprovas; se abraçar o
que recomendas; se deplorar o que excitas a ser deplorado; se sentir
alegria com o que anuncias ser motivo de regozijo; se tiver piedade dos
que apresentas como dignos de piedade; se fugir dos que incitas a
evitar.
112
1.4.4 O “Texto-Sermônico”
113
Eis a produção normalmente semanal do pastor. Peça que contém em si,
como cerne, uma palavra de salvação. Um texto que tem como meta fazer o
Verbo de Deus se tornar carne na vida das pessoas. É necessário, em virtude
disso, buscar referenciais entre bons escritores. Foi isso que Blackwood fez. Para
um deles, “tornar-se autor é como tornar-se mãe. Deve haver um período de
concepção, gestação, esforço e dores de parto, com eventual parto... A vitalidade
110
Conforme CREMONA, 1990, p. 155-177.
111
FARMER apud BLACKWOOD, 1981, p. 183.
112
AGOSTINHO, 2002, p. 234.
113
O professor Mauro B. Souza sugere o uso de “texto-sermônico.
36
de um trabalho pode depender do tempo em que for mantido no consciente ou
inconsciente.”
114
O sermão escrito é diferente do pregado. Neste, o pastor colocará todas as
suas forças para que seu ouvinte entenda aquilo que quer dizer, porque não a
repetição de uma passagem ou de um parágrafo, a não ser por uma questão de
ênfase a ser dada. A repetição ocorre por uma vontade daquele que fala, porém
jamais pela motivação dos que estão ouvindo.
Além disso,
nas conversas cada um pode propor perguntas. Ao contrário, onde todos
se calam para escutar a um só, e voltam para ele o olhar atento, nem o
uso nem a conveniência permitem a alguém pedir explicações sobre o
que não compreendeu. Assim, quem fala deve tomar o maior cuidado de
vir em ajuda de quem se cala. Ordinariamente, o povo na sua avidez de
entender costuma dar demonstração, por seus movimentos, de que
compreendeu. Até que assim manifestem, é preciso voltar ao assunto,
variando as expressões de múltiplas maneiras.
115
Por outro lado, no sermão publicado, o leitor pode reler um parágrafo
quantas vezes achar necessário. Pode observar as divisões, o arranjo sintático do
texto e como são feitas as ligações de um tópico para outro. Tamm pode
considerar o desenvolvimento argumentativo, analisando se o sermão é plausível
ou não. Todavia, falta ao sermão publicado o restante do enredo. Pois, salvo seu
caráter especial, ele é gestado para fazer parte de um evento maior o culto
público. “O sermão o é um ato independente ou isolado, mas uma porção de
um grande todo.”
116
Ele precisa encaixar-se no culto como um todo.
O pastor escreve, ou melhor, deveria escrever com regularidade. Se puder
escrever de maneira clara, será capaz de falar claramente. Escrever, de modo
algum, é uma tarefa fácil. Um escritor de profissão pode até endereçar seu texto a
uma gama determinada de leitores. Entretanto, seu público não é uma
congregação específica. Ao pastor cabe escrever um sermão para ouvintes que
ele conhece e que ouvem a sua voz. Mais um detalhe: dentre os ouvintes, estão
pessoas de diferentes idades, de diferentes as raças, de classes sociais
diferentes, de profissões distintas, de níveis diversos de estudo, etc. Com efeito,
para o pastor vale o seguinte conselho:
114
POLLOCK apud BLACKWOOD, 1981, p. 139.
115
AGOSTINHO, 2002, p. 231.
116
PRIETO, 1997, p. 132.
37
Aprende a técnica de escrever e, tendo-a aprendido, procure esquecê-la.
Estude os princípios de construção, o valor da continuidade,... o episódio
revelador, o manuseio cuidadoso dos detalhes... O escrever real é o
mais difícil trabalho do mundo.
117
Para que ocorra a comunicação entre o pastor e seu ouvinte, é preciso que o
repertório de palavras ou signos seja comum. Ambos precisam falar a mesma
linguagem. A tarefa do pastor é mais onerosa, porque ele tem de conhecer a
linguagem do seu interlocutor. E, na maioria das vezes, adequar seu vocabulário
à compreensão do outro. No entanto, para Kirst, “a prática mostra que o emissor e
o receptor jamais dispõem de um repertório de signos perfeitamente igual. A
mesmo signos comuns a ambos podem ser compreendidos de modos diferentes.”
Em virtude disso, a comunicação mais favorável ocorre quando emissor e
receptor dispõem das mesmas experiências. As pessoas que vivenciam as
mesmas experiências vivenciam também, provavelmente, a mesma linguagem.
118
Semelhante é o pensamento de Costas. Segundo este, para uma boa
comunicação, é de extrema importância o encontro dos significados entre o
comunicador e receptor. Do contrário, este responderá a uma mensagem que
aquele não tinha a menor intenção de enviar. Esse encontro requer que o
comunicador tenha uma atitude responsiva às normas, aos moldes da experiência
e a compreensão que as pessoas têm de uma determinada situação
comunicativa.
119
Larsen, por sua vez, expressa que “em todas as eras, e a nossa
não é exceção, os comunicadores devem levar em conta as categorias e
configurações do pensamento dos ouvintes.”
120
Agostinho tamm destaca a necessidade de escolher as palavras para uma
boa comunicação.
Com efeito, de que serve a pureza da linguagem, se a inteligência do
auditório não acompanha? Não temos absolutamente nenhuma razão de
falar, se aqueles a quem nos dirigimos para nos fazer compreender não
compreendem o que dizemos. Portanto, o mestre evitará toda a palavra
que não ensine. Se ele puder, todavia, substituí-las por outras, corretas e
inteligíveis, ele as escolherá de preferência.
121
117
GLASGOW apud BLACKWOOD, 1981, p. 140.
118
Conforme KIRST, 1996, p. 35-40.
119
COSTAS, 1984, p. 205.
120
LARSEN, 2005, p. 18.
121
AGOSTINHO, 2002, p. 230.
38
Concordando-se com Moraes de que “o sermão tem a cara do pregador”
122
,
o que pode-se dizer daquele que prega um sermão que não é seu? Eis a ciência
do pregador, uma das circunstâncias referidas por Vieira. “O pegador há de
pregar o seu, e não o alheio.”
123
Porque o sermão terá de fato a cara do pastor
quando houver o seu sangue, o seu suor e as suas lágrimas na reflexão,
produção e proclamação.
Quando o pastor colocar sentimento no sermão que escrever, certamente o
sermão passará a adquirir colorido próprio.”
124
O esforço faz crescer. É preciso
colocar a mão no barro e fazer o vaso. Os primeiros sairão tortos, com alguns
buracos, com manchas, etc. Todavia, “como em qualquer outro gênero de obra de
arte, a beleza em palavras vem ao encontro daquele que busca algo diferente.”
125
O estilo de escrita do sermão é a fala cotidiana, mas é preciso zelar para
produzir bons parágrafos
126
.
Escrever como se estivesse falando. Esse processo
sedimenta-se com a prática. E, para o pastor, “torna-se imperioso dominar essa
técnica.”
127
Por isso, o estilo textual de um sermão é distinto de um ensaio. Além
de ter essa característica coloquial/falada, o sermão quer algo mais, busca levar o
ouvinte à ação. Visa uma mudança de hábito.
De acordo com Moraes,
o sermão, para causar impacto nos ouvintes, precisa de argumentação
lógica; palavras soltas e frases desconexas não produzem resultados
permanentes. O uso da lógica torna as afirmações da mensagem claras
e objetivas, possibilitando ao pregador demonstrar racionalmente a
exeqüibilidade de seus argumentos. O sistema de divisões em tópicos
completa esse trabalho, ajudando o pregador a melhor usar uma
argumentação lógica no púlpito.
128
A unidade é, também, um dos aspectos essenciais para um bom texto. Não
se escreve um sermão versando sobre matérias diversas. A falta de unidade e de
objetividade só tem um fim a prolixidade. A pesquisa para o sermão não
aparece em todos os seus aspectos numa peça somente.
122
MORAES, 2000, p. 49.
123
VIEIRA, 2006, p. 43
124
BLACKWOOD, 1981, p. 189.
125
BLACKWOOD, 1981, p. 190.
126
Segundo Blackwood, o parágrafo de um sermão deveria ter em torno de 100 palavras. Este
deveria começar com uma proposição clara e vigorosa. O restante das 100 palavras explanaria
essa proposição. Um bom parágrafo começa com clareza e termina com força. É importante que o
parágrafo tenha unidade de conteúdo e de forma (gramatical). (BLACKWOOD, 1981, p. 197).
127
KIRST, 1996, p. 95.
128
MORAES, 2000, p. 130.
39
Em Agostinho, o fio condutor que tem a propriedade da unidade é Cristo. Ele
faz descortinar o caminho. Desse modo, uma exposição das Escrituras visa, pois,
“fundamentar a fé, suscitar a esperança e alimentar o amor.” Outro princípio
importante está explícito na seguinte assertiva: “ser datado e situado.” Isto é, ser
um homem do seu tempo.
129
Para Moesch, Agostinho sem dúvida foi quem mais
acentuou o aspecto objetivo e subjetivo da pregação, isto é, Cristo é o sujeito
principal da pregação, o qual anuncia-se a si mesmo, pela boca do pregador.
130
Conforme Vieira, o problema é que não poucas vezes se levantam “muitos
assuntos, e quem levanta muita caça e não segue nenhuma não é muito que se
recolha de mãos vazias.”
131
de tomar o pregador uma matéria, de defini-la, para que se
conheça, de dividi-la, para que se distinga; de prová-la com a
Escritura, há de declará-la com razão; há de confirmá-la com o exemplo,
há de amplificá-la com as causas, com os efeitos, com as circunstâncias,
com as conveniências que se hão de seguir, com os inconvenientes que
se devem evitar. de responder às dúvidas, de satisfazer às
dificuldades; há de impugnar e refutar com toda a força da eloqüência os
argumentos contrários; e depois disto de colher, de apertar, de
concluir, há de persuadir, de acabar. Isto é o sermão, isto é pregar, e
o que não é isto, é falar de mais alto.
132
Semelhantemente, mas não com tamanha minúcia, cabe mais esse
conselho, trazido por Blackwood, de um escritor não ligado ao labor pastoral:
“certa vez alguém perguntou a O. Henry, qual o segredo para escrever um conto.
„É simples‟, respondeu com um sorriso, „basta pensar no fim, e construir a história
que conduza a ele‟.”
133
1.5 O Pastor
O orador se procura a si,
o pregador procura a Deus.
(Crisóstomo)
Quem é o pregador?
134
Uma pessoa como outra qualquer, chamada para
129
Conforme PAIVA, Introdução ao escrito: Instrução aos Catecúmenos, 1984, p. 14-17.
130
MOESCH, 1980, p. 50.
131
VIEIRA, 2006, p. 39.
132
VIEIRA, 2006, p. 40.
133
BLACKWOOD, 1981, p. 46.
134
Maldonado apresenta a seguinte tipologia dos pregadores evangélicos: Primeiro tipo
inclinação à ordem, tradicionais. Perigo de serem rígidos e conservadores. Repetem “ter que” e o
“hás de”. Suas pregações são pensadas, claras tematicamente; aprofundamento do pensar e do
crer. São normativos. („Compulsivo Obsessivo‟); Segundo tipo aberto à mudança, flexível, liberal,
dinâmico, sensível. Afirma a vida. É alegre e extrovertido. Fala da liberdade do cristianismo, da
esperança e das promessas. („Histérico‟); Terceiro tipo valoriza na pregação a transcendência
40
pregar a Palavra de Deus. Com que autoridade ele oficia um culto? Com que
autoridade ele sobe ao púlpito para proferir um sermão? Sermão este que
condena, que mata, que tira o véu das profundezas do coração humano e, por
outro lado, este mesmo sermão é portador de uma boa notícia, que tem um
convite único, cujas palavras são: vinde a mim todos que estais cansados e
sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de
mim, porque sou manso e humilde de coração, e achareis descanso para vossa
alma.”
135
Ou, ainda, “ninguém te condenou? [...] Nem eu tampouco te condeno;
vai e não peques mais.”
136
O pastor é uma pessoa. Por isso também é relevante pensar, quando se
estuda Homilética, o caráter pessoal da pregação. O pastor das ovelhas é
igualmente uma ovelha, incumbido da função de cuidar delas. Beecher destaca
que “a pregação requer „verdade por meio da personalidade‟.”
137
Os ministros
deveriam saber aquilo que lhes convém e o que não lhes convém fazer. Proceder
como Davi. Sair à luta com as suas próprias armas. Deixar de lado a armadura do
rei Saul. Assim, o pastor imprime um caráter inteiramente pessoal ao sermão que
escreve e depois profere.
De modo semelhante, escreveu o pastor Knox: “o pregador é uma pessoa
dirigindo-se a outras pessoas. Seu discurso vai direta e imediatamente a um
grupo de ouvintes, sendo tirado da experiência e compreensão pessoal.” Ele não
é um especialista em religião. É, isto sim, um ser humano
138
, com suas fraquezas
e seus medos, que reparte suas experiências e reflexões mais íntimas com outros
seres humanos. Como resultado, para Knox, a “pregação não é discurso sobre
das idéias e dos conhecimentos do racional. Vê a realidade de modo abstrato, teórico e conceitual.
É crítico, distante e frio, em relação a si mesmo. Tem dificuldade de relacionar-se com as outras
pessoas. („Esquizóide‟); Quarto tipo cheio de sensibilidade, sensível a tudo o que se diz em
relação ao amor, que compartilha e sabe dirigir-se ao tu, que busca e oferece aproximação e
proteção. Sabe sofrer. Tende a dobrar-se pacientemente. Fala da cruz de Cristo, das experiências
de obscuridade, da decepção e do desamparo. Com grande capacidade pastoral, é pastor nato.
(„Depressivo‟). (MALDONADO, Luis. A Homilia: pregação, liturgia, comunidade. São Paulo:
Paulus, 1997, p. 159ss)
135
Mateus 11.28,29.
136
João 8.10,11. Palavras que Jesus disse a uma mulher, trazida à presença dele pelos fariseus e
escribas, acusada de adultério.
137
BEECHER apud BLACKWOOD, 1981, p. 27.
138
Lutero disse o seguinte sobre suas fraquezas: “Quando dou uma preleção, faço o sinal da cruz
e fico pensando que nem Felipe, nem o Doutor Jonas, nem Pommer, nem qualquer outro bio
esno auditório e fico pensando que sou o sujeito mais inteligente a ocupar uma cátedra.
Recomendo que todos façam o mesmo, pois assim o medo passa e a gente consegue pregar ou
ler livremente.(KIRST, 1996, p. 185.)
41
religião, é uma pessoa religiosa falando.”
139
“Que é a voz humana? O que faz o homem quando fala?”
140
Além de muitas
outras reflexões, esta tamm tomou tempo de Agostinho. Principalmente porque
esta está diretamente ligada ao trabalho do pregador. Não somente com uma
preocupação de análise filosófica ou teológica, mas por uma preocupação
pastoral. Agostinho deixa claro que “o pregador é o que interpreta e ensina
141
as
divinas Escrituras.” Deve, por isso, ensinar o bem e refutar o mal. Sua tarefa é,
pois, “conquistar o hostil, motivar o indiferente e informar o ignorante sobre o que
deve ser feito ou esperado.”
142
Desse modo,
é preciso que o orador, capaz de discutir ou de falar se o com
eloqüência, ao menos com sabedoria , assuma esse trabalho de que
tratamos aqui, em vista de ser útil aos seus ouvintes. [...] Um homem fala
com tanto maior sabedoria, quando maior ou menor progresso faz na
ciência das santas Escrituras. E eu não me refiro ao progresso que
consiste em ler bastante as Escrituras, ou aprendê-las de cor, mas do
progresso que consiste em compreendê-las bem e procurar
diligentemente o seu sentido.
143
Jagnow, concluindo seu artigo, lembra que “a suficiência do pregador vem de
Deus, mas a sua eficiência também é fruto de dedicação pessoal inteligente e
criativa.”
144
Ele é, assim como todos os outros congregados, seus ouvintes,
“alguém que compartilha da comunhão dos santos.”
145
Para o Padre Vieira, “no pregador podem-se considerar cinco circunstâncias:
a pessoa, a ciência, a matéria, o estilo, a voz.”
146
Sobre a primeira circunstância,
“a definição do pregador é a vida e o exemplo. Por isso, Cristo no Evangelho não
o comparou ao semeador, senão ao que semeia.” Pois, “entre o semeador e o
que semeia há muita diferença.”
Em outras palavras, “o semeador e o pregador é
nome; o que semeia e o que prega é ação; e as ações são as que dão o ser ao
139
KNOX, 1964, p. 60.
140
CHRÉTIEN, Jean-Louis. Saint Augustin. Paris: Unversitaires France, 2002, p. 7.
141
Um exemplo disso foi o propósito de Esdras. Ele “tinha disposto o coração para buscar a Lei do
Senhor, e para a cumprir, e para ensinar em Israel os seus estatutos e os seus juízos.(Esdras
7.70)
142
AGOSTINHO, 2002, p. 211.
143
AGOSTINHO, 2002, p. 212.
144
JAGNOW, 1977, p. 111.
145
ACHTEMEIER apud JAGNOW, 1997, p. 112.
146
VIEIRA, 2006, p. 29.
42
pregador.”
147
Além disso, de acordo com Agostinho, o orar é a primeira condição para o
orador. Ele deve falar sobre justiça, santidade e virtude.
E não duvide que se pode fazê-lo e o quanto pode, consegui-lo, mais
pela piedade de suas orações do que por seus talentos de orador.
Assim, orado por si e por aqueles a quem falará, deve ser orante, antes
de ser orador. À medida que se aproxima a hora em que usa da
palavra e antes de tomá-la, que eleve sua alma sedenta a Deus, para
saber derramar para fora o que hauriu, e comunicar o de que se
impregnou.
148
Observam-se três aspectos importantes na afirmação de Agostinho. Que o
orador cristão, antes de tudo, deve orar por si mesmo e também por aqueles que
o ouvirão, para que haja concatenação das suas imagens, que deseja reproduzir
em palavras, com as imagens que suas palavras produzem na mente do seu
auditório. Outro aspecto, derramar o que hauriu, isto é, aquilo que questionou,
buscou, estudou com todas as forças e do qual, outro aspecto, finalmente se
impregnou, ou seja, absorveu e enraizou no seu coração e sua mente. Trata-se,
pois, de um trabalho de dedicação viva em função de seu ofício.
No entanto, nesse ofício a imagem pessoal é moldada aos olhos da
comunidade. E a imagem que a comunidade faz do pastor se constrói de
maneiras diferentes. O modo de se portar ao oficiar um culto. O modo de agir em
outros eventos de sua comunidade e de grupos da sociedade de que faz parte.
Tamm as idéias que defende e o modo como as defende. A partir disso, as
pessoas podem de um simples texto verter caracterizações de seu pastor e
atribuir-lhe uma determinada imagem. Como exemplo disso, tem-se o seguinte
relato: “Duas senhoras, comentando sobre o pastor que fará a pregação de
abertura no congresso de senhoras: „... é aquele um que só sabe xingar o
Governo, no Jornal Evangélico‟.”
149
A vida cotidiana do pastor influi também no modo como a comunidade ou
seus ouvintes recebem a mensagem por ele proferida. A imagem lançada pelo
pregador como pessoa tem influência sobre a receptividade do ouvinte.
150
Por
outro lado, o Padre Vieira argumenta que se a vida é apologia contra a doutrina,
147
VIEIRA, 2006, p. 30.
148
AGOSTINHO, 2002, p. 238.
149
KIRST, 1996, p. 43.
150
KIRST, 1996, p. 43.
43
se as palavras vão já refutadas nas obras, “se uma causa é o semeador e outra o
que semeia, como se há de fazer fruto?”
151
1.5.1 Autoridade
O pregador recebe autoridade de Deus para pregar. A autoridade não
provém das suas qualidades intelectuais ou da sua capacidade comunicativa ou
do seu poder de oratória. A autoridade vem da incumbência recebida de seu
Senhor.
152
A pregação recebe sua autoridade da parte de Deus. Ela tem um
caráter de autoridade, porque aquele que prega não é o pregador, senão Deus
através do pregador, de modo que a palavra pregada vem a ser verdadeiramente
a palavra de Deus.
153
Desse modo, a eficácia da pregação o depende unicamente do pregador.
Kirst destaca que o pastor não deve buscar “as causas da pouca eficácia”
154
de
sua prédica somente em si mesmo. O Espírito Santo também trabalha. Isto, no
entanto, não é motivo para que o pastor se desleixe no seu labor homilético. O
apóstolo Paulo expressa que se anuncia o evangelho, não tem de que se gloriar,
pois sobre ele pesa essa obrigação; porque ai dele se não pregar o evangelho!
155
Além disso, de acordo com Prieto, “o pregador deve se livrar da tola idéia de que
a sua pregação pode realizar alguma coisa no coração de seus ouvintes.”
156
Para Trillhaas, a prédica “é e permanecerá um vasto campo de derrotas
humanas, um jardim de equívocos humanos e, o que é pior, uma oportunidade
para triunfos humanos, por demais humanos.”
157
1.5.2 As Intenções
Quais o as intenções do pregador quando se dirige aos ouvintes? Onde
quer chegar com a comunidade, para onde pretende conduzi-la?
158
Estas são
questões relevantes que o pastor precisa fazer a si mesmo antes de escrever seu
151
VIEIRA, 2006, p. 33.
152
KIRST, 1996, p. 14.
153
COSTAS, 1984, p. 23.
154
KIRST, 1996, p. 23.
155
1 Coríntios 9.16.
156
PRIETO, Eli. A pregação: aspectos teológicos e práticos. In: A SEMENTE QUE GERMINA:
Ensaios Teológicos. São Leopoldo: Concórdia, 1997, p. 134. Eli Prieto é pastor da IELB, mestre
em Teologia e foi professor de Homilética no Seminário Concórdia.
157
TRILLHAAS apud KIRST, 1996, p. 13.
158
KIRST, 1996, p. 77.
44
sermão e proferi-lo, ou qualquer outra mensagem. A intenção servirá como um fio
condutor. Todavia, ela, muitas vezes, está implícita e depende da comunidade.
Como, então, utilizar um sermão em outro contexto e, ainda mais, produzido por
outro pastor? Pois, neste caso, existem implicações de estilo, vocabulário,
imagens, ilustrações, costumes e a própria maneira de construir o texto, tudo isso
em função da intenção ou objetivo. “Por bom que seja o sermão que um pregador
ouve ou lê, o melhor sermão para esse pregador pregar é aquele que ele mesmo
elaborou.”
159
Ainda, neste aspecto intencional, surge outra questão: Deve o pastor levar
em consideração as expectativas do ouvinte? Crisóstomo responde
enfaticamente: “o povo é que deve seguir o pregador, e não este, os desejos da
grande massa. Ele somente o conseguirá por meio de duas qualidades, a saber: o
desprezo de quaisquer elogios e a força da própria eloqüência.”
160
A palavra de Deus precisa falar ao pastor antes de ele falar aos ouvintes.
Pois, a boca fala do que está cheio o coração. Um coração sedento e cheio de
misericórdia alcança um ouvido semelhante. Desse modo, o pregador inteligente
pode ganhar o coração do ouvinte e conquistar sua atenção. Se não alcançar o
coração deles, jamais conseguirá a empatia daqueles a quem se dirige. E, em
conseqüência, as verdades mais duras e contundentes poderão ser ditas com
educação e cordialidade.
161
1.5.3 Conhecer os Ouvintes
“O pastor conhece as suas ovelhas e elas o conhecem.” Eis o paradigma do
trabalho pastoral. As ovelhas ouvem a voz do pastor e ele as chama pelo nome e
as conduz. O pastor vai adiante delas e elas o seguem, porque reconhecem a sua
voz.
162
O pregador terá condições de definir o que pregar, como e quando pregar,
conhecendo seus ouvintes e as suas necessidades.
163
Por isso, amar os ouvintes
159
MORAES, 2000, p. 49. Larsen ainda traz as palavras que uma senhora irlandesa disse ao seu
pastor: “Se o autor não consegue se lembrar de seu próprio sermão, como espera que nós
lembremos.” (LARSEN, 2005, p. 180)
160
CRISÓSTOMO, S. João. O Sacerdócio. Petrópolis: Vozes, 1979, p. 106.
161
MORAES, 2000, p. 188.
162
João 10.1-15.
163
MORAES, 2000, p. 34.
45
é o primeiro requisito. O bom pastor ama as suas ovelhas. “Qualquer pregador,
por mais que pense ter um bom sermão e saiba comunicar bem, se não amar
verdadeiramente aos seus ouvintes, só estará fazendo barulho.”
164
Ao pregador é indispensável ter uma visão clara das necessidades do
homem. Somos chamados para proclamar a mensagem a um mundo em
crise. Jamais o pregador deve perder de vista que o fim da pregação é
satisfazer as necessidades humanas com a apresentação da verdade
divina.
165
Jowett compara o trabalho do pastor ao do advogado. Talvez esta
consciência falte ao pastor: a iminente possibilidade de perda da causa. Porque
“se o advogado deve praticamente vencer o júri antes de o defrontar, pela
vitoriosa força e influência dos seus preparativos, será diferente com o pregador,
antes de procurar o veredicto da sua congregação?”
Com o pastor também as
causas são ganhas no escritório.
166
Mas, antes de qualquer desejo de exposição da Escritura, o pastor precisa
conhecer seu público. Uma forma de conhecê-lo, por exemplo, é visitá-lo, estar e
conversar com ele. Conhecer seus anseios, seus costumes, sua linguagem.
Conhecer o auditório em sua situação.
Paulo é exemplo de adaptação do discurso ao auditório. De acordo com
Larsen, Paulo, em Atenas, usou de um “argumento lógico e metódico para levar
os ouvintes de onde estavam para uma chamada ao arrependimento e um
posicionamento diante da ressurreição de Cristo (Atos 17.16-34).”
167
1.6 Conclusão
As considerações finais deste capítulo são gerais. Observou-se que a
Homilética é o ramo da Teologia que preocupa-se com a proclamação cristã.
Existem pesquisadores preocupados com a maneira de dizer a Palavra de Deus.
Mesmo que se preze pelo conteúdo, o como pregar e cnicas para desenvolver
uma relevante proclamação de Cristo às pessoas se encontram nos livros de
Homilética em sua grande maioria.
Tamm destacou-se que conhecimentos de outras áreas de saber são
164
MORAES, 2000, p. 35.
165
MORAES, 2000, p. 38.
166
JOWETT apud MORAES, 2000, p. 31.
167
LARSEN, 2005, p. 17
46
buscados e assimilados pela Homilética, principalmente as reflexões da Retórica
e da Comunicação. Porque o objetivo dos homiletas e pregadores não é senão
comunicar o Evangelho de Deus. Os desdobramentos que estão inseridos neste
objetivo são o cerne da reflexão da Homilética. Tem-se, então, um emissor que
igualmente é uma ovelha, isto é, um ser humano tirado do rebanho para, depois
de longa preparação consagrada e vida acadêmica, assumir o ofício de pregar o
Evangelho da Consolação aos seus semelhantes. Como ser humano, tem os
mesmos anseios, receios, medos e fraquezas daqueles que busca consolar.
O sermão por ele preparado e proclamado precisa ser a boa notícia do
Evangelho. Contudo, antes de tocar os ouvintes, ele tem de ser tocado por ela.
Porque se não for tocado, seu sermão pode não ser fruto daqueles três
elementos. Somente desse modo a Palavra de Deus fala pela personalidade do
ser humano.
O sermão, por isso, busca proporcionar tanto ao pregador como aos ouvintes
equilíbrio para sua existência, para suas emoções e fortalecer as convicções que
são essenciais para esta existência. A pregação existe em função dos ouvintes. É
justamente no sermão que estes elementos pastor, mensagem e congregação
pulsam. E a escolha das palavras e do modo de expor manifestam aspectos da
própria personalidade do pregador, bem como refletem a imagem”
168
que ele tem
daqueles a quem se dirige.
168
Tome-se imagem aqui em sentido metafórico.
47
2 O SERMÃO E A LINGÜÍSTICA
A originalidade não consiste em dizer algo novo,
mas em dizer algo antigo de forma nova.
(Goethe)
2.1 Introdução
Normalmente, os textos de Homilética trazem como ciências auxiliares ou
interdisciplinares a Sociologia, a Filosofia, a Ciência da Comunicação, mas a
Lingüística, salvo raríssimas exceções, não é mencionada. Talvez, porque os
homiletas pouco conhecem tão amplo campo de estudo da linguagem. Assim,
como a Teologia, a Lingüística possui vários ramos e tamm dialoga com as
ciências antes mencionadas. Ela proporciona diferentes olhares sobre o
fenômeno da comunicação ou a faculdade, apenas humana, de se comunicar
através da linguagem articulada.
Existe uma caracterização de tipos de sermões. A divisão clássica é em
sermão temático, sermão expositivo e sermão textual. Praticamente, todos os
manuais de Homilética se ocupam com essa categorização. Outros, ainda,
caracterizam de formas distintas a prédica, o sermão e a homilia como sendo
modos específicos de proclamação. Não é sob essa perspectiva que o assunto
será tratado aqui. Tratar-se-á do sermão enquanto produção textual e o lugar
assumido pelo locutor neste texto. Procura-se trazer reflexões lingüísticas que
possam contribuir para o estudo do sermão.
O sermão também é uma forma de manifestação que realiza-se pela
linguagem. Por isso, é relevante um estudo que procure levantar questões e
apontamentos sobre o sermão como um tipo de texto, passível de discussões a
partir de análises do discurso e análises textuais.
48
De acordo com Broadus, “a prédica é característica do cristianismo.” Ocorreu
e ocorre a observação de reuniões freqüentes e regulares de massas humanas
para se ouvir a instrução religiosa e a exortação como parte integrante do culto
divino.
169
A prédica é a proclamação da Palavra de Deus no culto. Normalmente,
é a exposição de um texto (sermão) anteriormente preparado. Nenhuma outra
religião observou o rigorosamente o espaço e lugar da prédica. Tamm
nenhuma outra religião deu tanto valor na preparação de pastores capacitados
para produzir sermões. A Teologia, como se observou no capítulo anterior,
instituiu uma disciplina específica, cujo principal objetivo é a pregação cristã e, de
modo especial, a elaboração de sermões.
Os ramos ligados à Lingüística como, por exemplo, a Semiótica têm figurado
em obras teológicas. Mas esses estudos estão voltados para questões
hermenêuticas e não propriamente à pregação. Neste capítulo, por isso,
observam-se reflexões que podem ser absorvidas da Lingüística para a
Homilética e para a Teologia como um todo. Pois, a palavra, a fala, a língua e a
linguagem são elementos extremamente importantes para a pregação cristã.
Especificamente, o sermão, que é tanto uma manifestação escrita quanto
verbal
170
, é assunto deste capítulo, bem como o papel importante do
enunciador.
171
Para analisar o locutor, optou-se pela Teoria da Enunciação,
porque ela é, talvez, o ramo da Lingüística que mais tem se preocupado com a
subjetividade do ser humano na linguagem.
2.2 O Sermão enquanto Texto
Buscando responder a pergunta o que é um texto, Ricoeur destaca que
chamamos texto a todo o discurso fixado pela escrita. Segundo esta
definição, a fixação pela escrita é constituída do próprio texto. Mas o que
é que, assim, é fixado pela escrita? Dissemos: todo o discurso. Significa
isto que o discurso teve, primeiro, que ser pronunciado física ou
mentalmente? Que toda a escrita foi, primeiro, pelo menos a título
potencial uma fala?
172
169
BROADUS, John A. O preparo e entrega de sermões. Rio de Janeiro: Casa Publicadora
Batista, 1960, p. 2.
170
Os homiletas têm optado denominar de Prédica a proclamação verbal no culto público. Que
não deixa de ser a realização oral do sermão previamente escrito.
171
Neste capítulo, procura-se observar a terminologia de cada área de conhecimento aqui
trabalhada. Quando se julgar necessário, os termos serão delimitados em nota de rodapé.
172
RICOEUR, Paul. Do Texto a Acção: Ensaios de Hermenêutica II. Portugal: Rés-Editora,
49
Assim sendo, qualquer discurso escrito é um texto e, por isso, pode ser
analisado, estudado e interpretado. Do mesmo modo, o sermão, quando fixado
pela escrita, torna-se um texto. Igualmente, pode-se dizer que o sermão é um
discurso que foi pronunciado física e mentalmente antes de ser fixado pela escrita
e que posteriormente será pronunciado num culto público.
Por outro lado, texto “não se remete prioritariamente à escrita.” Também é
necessário discernir entre texto e discurso como duas faces complementares de
um mesmo objeto comum. Para as gramáticas, o texto é uma “seqüência bem-
formada de frases ligadas que progridem para um fim.” No entanto, o texto vai
além dessa perspectiva gramatical. Ele revela-se como “uma unidade muito
complexa para ser fechada em tipologias e para que a coesão ou coerência
lingüística possam dar conta daquilo que faz sua unidade. Essas regras que
regulam um texto bem formado são relativas aos gêneros de discurso, isto é, às
práticas sócio-discursivas reguladas.
173
Segundo Barthes, “todo o texto é um tecido pré-construído, ou seja, formado
a partir de idéias herdadas, migradas de discursos anteriores.”
174
Essa
característica do texto enquanto tecido revela uma especificidade dos sermões,
pois o sermão é construído a partir de um texto bíblico, de idéias herdades de
fontes distintas e de interpretações que a Igreja de Cristo tem promovido durante
a sua história.
Por outro lado, para Halliday e Hassan
um texto é mais bem pensado não como uma unidade gramatical, mas
antes como uma unidade de tipo diferente: uma unidade semântica. A
unidade que o texto tem é uma unidade de sentido em contexto, uma
textura que expressa o fato de que ele se relaciona como um todo com o
ambiente no qual está inserido.
175
É de se observar que mesmo gramáticos, lingüistas e outros que teorizam
sobre o assunto levam em consideração o contexto em que a produção textual
está inserida. O sermão, por sua vez, de modo algum se distancia desses
aspectos, visto que é fruto da reflexão de uma pessoa pastor para ser
1986, p. 141.
173
CHARAUDEAU, Patrick. Dicionário de Análise do Discurso. São Paulo: Contexto, 2004, p.
466-467.
174
BARTHES apud CARVALHO, Dirce de. Homilia: a questão da linguagem na comunicação
oral. São Paulo: Paulinas, 1993, p. 102.
175
HALLIDAY e HASSAN apud CHARAUDEAU, 2004, p. 467.
50
entregue a outras pessoas sua comunidade. É um texto que revela uma
personalidade específica, um testemunho de fé único, para pessoas tamm
únicas e, mais, todas as condições de produção e de proclamação são únicas e
irrepetíveis.
A Lingüística Textual, todavia, toma o texto como ato de comunicar, que, de
um lado, apresenta uma organização linear (coesão) e, de outro lado, uma
organização o-linear (coerência, ligada a aspectos de ordem cognitiva e
pragmática). Ela privilegia a organização do co-texto e da coesão como coerência
lingüística.
O que faz com que um texto seja de fato um texto? Para Costa Val, o texto é
uma “unidade lingüística comunicativa básica.”
176
Ou seja, qualquer manifestação
oral ou escrita que comunique algo é um texto. Nesse mesmo sentido, Fávero
ressalta que ”o falante de uma língua sabe distinguir um texto coerente de um
aglomerado incoerente de enunciados.”
177
Ainda, seguindo o raciocínio de Costa Val, não determinação de sua
extensão em relação ao texto, pois consiste em qualquer enunciado significativo.
Mas há, além disso, de acordo com esta pesquisadora, três aspectos a serem
observados: Texto é unidade de linguagem em uso; texto é uma unidade
semântica; texto é uma unidade formal, material.”
178
Na primeira característica, estão em jogo fatores pragmáticos, pois neste
aspecto o texto é tratado sob o enfoque sociocomunicativo, ou seja, a relação
entre produtor e receptor. As intenções de ambos no ato comunicativo. Quanto ao
fator semântico, o texto precisa ser significativo e ser coerente. E, por último,
segundo Costa Val, o texto precisa ser coeso, precisa estar intimamente unido por
meio de mecanismos que formam elos entre palavras, frases, parágrafos, etc.
Essas características que permitem reconhecer um texto são chamadas de
textualidade. Mas divergências quanto à nomenclatura e divisão desta nos
diferentes autores. Contudo, de acordo com Costa Val, citando Beaugrande &
Dressler, podem-se enumerar sete fatores: coerência, coesão (aspecto material
conceitual e lingüístico do texto), intencionalidade, aceitabilidade,
176
COSTA VAL, Maria da Graça. Redação e Textualidade. São Paulo: Martins Fontes, 1994,
1994, p. 3.
177
FAVERO, Leonor Lopes. Coesão e Coerência Textuais. São Paulo: Ática, 1997, p. 7.
178
COSTA VAL, 1994, p. 3.
51
situacionalidade, informatividade e intertextualidade (aspectos pragmáticos
envolvidos no processo sociocomunicativo).
179
Além disso, na Semtica, o texto é, de um lado, objeto de significação com
uma estrutura interna que faz dele um todo de sentido e, de outro, um objeto de
comunicação entre dois sujeitos. No primeiro caso, análise interna, um nível
fundamental (significação como oposição semântica mínima); e um nível das
estruturas narrativas (transformações ocorridas no texto pela ação do sujeito; os
valores fundamentais são narrados a partir de um sujeito; e a narrativa se
constitui de quatro fases: manipulação, competência, “performance” e sanção).
Já, no segundo caso, análise externa, o nível discursivo que representa as
relações entre as instâncias da enunciação e os efeitos de sentido produzido.
Por outro lado, na Análise do Discurso, o texto é um objeto lingüístico que é
re-significado a partir de um dito contexto ideológico. Os sentidos são
determinados historicamente. O texto é uma unidade complexa de significação,
consideradas as condições de sua realização. É então uma unidade de análise
não formal, mas pragmática.”
180
Por último, na Teoria da Enunciação, o texto é um modo de ação. Nesse
modo de ação há marcas que trazem as representações do sujeito que enuncia e
atestam o seu engajamento enunciativo com o dizer para convocar o outro
(alocutário) de sua alocução ao se anunciar. As marcas são de: pessoa, tempo,
espaço, modalidades do enunciado, polifonia e modalizadores.
O texto pode ser visto sob três formas distintas a partir do que foi abordado:
como objeto de significação e a pergunta a ser respondida, neste caso, seria o
que o texto diz; como modo de ação, isto é, como o locutor faz escolhas para
dizer o que diz e a pergunta seria como o texto diz; e, por último, como objeto
lingüístico histórico, ou seja, a relação do texto histórico com o pré-construído no
contexto sócio-histórico e ideológico.
Em virtude disso, o sermão, que também é um texto, pode ser visto sob
essas três perspectivas: como um objeto de significação, como um modo de ação
e como um texto histórico construído em um determinado contexto sócio-histórico
179
COSTA VAL, 1994, p. 5.
180
ORLANDI, Eni Puccinelli. A linguagem e seu funcionamento: as formas do discurso.
Campinas: Pontes, 1996, p. 159.
52
e ideológico. No primeiro caso, o texto é objeto de estudo da Lingüística Textual.
Já, no segundo, é objeto da Teoria da Enunciação. E, no terceiro caso, o texto é
objeto da Análise do Discurso.
2.2.1 Os Textos e sua Funcionalidade
Os textos podem igualmente ser observados quanto ao ponto de vista
funcional. Procura-se “estabelecer funções com base na atividade linguageira, a
partir das quais as produções textuais podem ser classificadas segundo o pólo do
ato de comunicação em direção ao qual elas estão orientadas.”
181
Desse modo, existe o ponto de vista enunciativo, em que se busca
“descrever os gêneros considerando as características formais dos textos e
reunindo as marcas mais recorrentes.” Trata-se, segundo Beacco e Moirand
(1995), de evidenciar aquilo que é regular ou invariável nos discursos no nível de
sua estruturação longitudinal (por exemplo: estrutura do parágrafo) ou, ainda, no
nível de suas atualizações linguageiras (formas de indicações metadiscursivas,
formas da intertextualidade, formas de presença de enunciador e do ouvinte).
182
Além disso, o ponto de vista textual é aquele que se volta para a organização
dos textos e busca definir a regularidade composicional desses textos.
Por fim, o último ponto de vista é o comunicacional. Este possui orientações
diferentes. Para Bakhtin (1984), “os gêneros dependem da „natureza
comunicacional‟ da troca verbal‟, o que lhe permite distinguir duas grandes
categorias de base: produções „naturais‟, espontâneas, pertencentes aos „gêneros
primários‟ (aqueles da vida cotidiana), e produções „construídas‟,
institucionalizadas, pertencentes aos „gêneros secundários‟ (aquelas produções
elaboradas, literárias, científicas, etc.) que derivariam dos primários.”
183
Entretanto, para Maingueneau e Cossutta (1995), “trata-se de selecionar e
descrever „tipos de discurso que aspiram a um papel [...] fundador e que nós
chamamos constituintes‟, cuja finalidade simbólica é determinar os valores de um
certo domínio de produção discursiva. São constituintes essencialmente os
181
CHARAUDEAU, 2004, p. 250.
182
CHARAUDEAU, 2004, p. 250.
183
O sermão estaria entre uma produção natural e produção construída sob o olhar da perspectiva
de Bakhtin, porque ele é uma forma de produção que se aproxima da fala cotidiana (e não deveria
fugir deste aspecto) e também se aproxima de uma produção institucionalizada e construída.
53
discursos religioso, científico, filosófico, literário, jurídico, etc.” Ainda, para
Charaudeau (2000), trata-se de determinar os gêneros no ponto de articulação
entre „coerções situacionais determinadas pelo contrato global de comunicação‟,
„as coerções da organização discursiva‟ e „as características das formas textuais,
localizáveis pela recorrência das marcas formais.”
184
Não a Literatura e a Lingüística preocupam-se com a categorização dos
diferentes tipos de textos, mas na tradição Retórica estão as primeiras e
profundas contribuições. E não é por acaso que Agostinho, Broadus e outros,
como se observou no primeiro capítulo, asseveraram que no labor homilético se
aplicam os princípios retóricos. Aristóteles define a Retórica como a capacidade
de descobrir o que é adequado a cada caso com o fim de persuadir.”
185
É relevante esta definição de Retórica, porque ela enfatiza a capacidade de
descobrir o é que adequado em determinado ambiente para persuadir. A
persuasão é a finalidade, mas não se pode atingir esta finalidade, negligenciando
o primeiro passo, isto é, “descobrir o que é adequado”. Este aspecto é de capital
importância ao se pensar no sermão. Pois, o primeiro passo é tão importante
quanto a sua finalidade. Ou só se atingir os objetivos finais se o primeiro passo foi
dado. Isso quer dizer que um texto de sermão é elaborado com todo cuidado com
vistas a persuadir um grupo específico de pessoas. O assunto é perscrutado,
estudado, refletido, rascunhado, reescrito, etc. Além disso, o pastor treina para a
proclamação, buscando a entonação própria que quer dar a cada palavra e
organiza as palavras, as frases com vistas a sua própria manifestação.
Na Retórica, os neros basicamente são três: o gênero deliberativo
compreende o conselho e a discussão, por isso principal uso é para a assembléia.
O gênero judiciário, por sua vez, compreende a acusação e a defesa, então é
utilizado para o tribunal. O gênero epidítico, por outro lado, compreende o elogio e
a censura, por conseguinte seu uso está mais voltado para as cerimônias.
186
Entretanto, essa divisão da atividade social em assembléia, tribunal e
cerimônias, de acordo com Charaudeau, “é cio-histórica e, portanto, sujeita a
variação.”
Por isso, “se procurarmos articular formas lingüísticas menores e
184
Conforme CHARAUDEAU, 2004, p. 250-251.
185
ARISTÓTELES. Retórica. Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1998, p. 48.
186
ARISTÓTELES, 1998, p. 56.
54
funcionamentos sociais, situamo-nos ao nível dos gêneros menores (não
religioso, mas, por exemplo, o sermão; não a prosa administrativa, mas os
relatórios dos assistentes sociais).”
187
2.2.2 Texto x Discurso
Talvez, uma distinção possível e preferível seja a distinção de “texto e
discurso como duas faces complementares de um mesmo objeto comum.” Mas o
discurso está em vários campos de estudo e tem uma série de oposições
clássicas, tais como: o discurso é uma unidade lingüística constituída de uma
sucessão de frases (discurso x frase); a língua definida como sistema de valores
virtuais se opõe ao discurso que é o uso da língua em um contexto particular
(língua x discurso); o discurso é concebido como a inclusão de um texto em seu
contexto (discurso x texto); e um olhar lançado sobre um texto do ponto de vista
de sua estruturação „em língua‟ faz dele um enunciado, um estudo lingüístico das
condições de produção desse texto fará dele um discurso (discurso x
enunciado).
188
Diversas correntes pragmáticas sublinharam certo número de idéias-força
189
no que diz respeito ao estudo do discurso. Estas idéias predominantes aplicam-se
tamm quando se pensa no sermão como discurso, que é um texto em seu
contexto segundo a oposição (texto x discurso), assinalada no parágrafo anterior.
Apresentam-se a seguir algumas dessas idéias:
O discurso é orientado, “não somente porque é concebido em função
de um propósito do locutor, mas também porque ele se desenvolve no
tempo.” Assim, ele é construído em função de um fim;
190
O discurso é uma forma de ão, aqui, a partir de Austin (1962) e
depois Searle (1969), difundiu-se “a idéia de que toda enunciação
constitui um ato (prometer, sugerir, afirmar, interrogar...) visando
modificar uma situação;”
O discurso é interativo, em que a manifestação mais evidente de
187
CHARAUDEAU, 2004, p. 252.
188
Conforme CHARAUDEAU, 2004, p. 466-467.
189
Os comentários a seguir sobre as idéias-força são feitos cf. CHARAUDEAU, 2004, p. 168-172.
190
Este discurso orientado se aproxima daquele conceito de Retórica compilado por Aristóteles,
tratado no subtítulo anterior, isto é, no tópico os textos e sua funcionalidade.
55
interatividade é a conversação. Nesta, dois locutores coordenam
suas enunciações;”
O discurso é assumido, ou seja, somente é discurso se estiver
“relacionado a uma instância que, ao mesmo tempo, se põe como
fonte de pontos de referência pessoais, temporais, espaciais.”
Igualmente, mostra a atitude que o locutor adota em relação àquilo
que diz e a seu alocutário (processo de modalização);
O discurso que é regido por normas. Neste caso, o discurso é
submetido a normas sociais muito gerais; por outro lado, essa
atividade é regida por normas específicas. “Cada ato de linguagem
implica, ele mesmo, normas particulares; um ato aparentemente tão
simples como a permuta implica que o locutor ignora a resposta, que
essa resposta tem algum interesse para ele, que ele acredita que seu
destinatário pode dá-la;”
O discurso é assumido em um interdiscurso. O discurso, neste caso,
adquire sentido no interior de um universo de outros discursos,
através do qual ele deve abrir um caminho. “Para interpretar o menor
enunciado, é preciso colocá-lo em relação com todos os tipos de
outros, que se comentam, parodiam, citam...”
2.2.3 Posicionamentos Assumidos pelo Escritor
No que concerne ao sermão, estudo aqui proposto, o que interessa
principalmente são as atitudes dos espíritos criadores de onde nascem os
diferentes tipos de textos. Essas atitudes se configuram de quatro perspectivas
diferentes, assumidas pelo indivíduo. São elas:
a) O escritor se volta para o mundo exterior, focalizado como o espaço
das grandes ações, dos grandes acontecimentos, dos grandes gestos (=
o mundo épico dos heróis, dos santos, dos mártires).
b) O escritor mergulha em seu mundo interior, no mundo do “Eu”, mundo
da emoção, da beleza, do mistério, do enigma, do transcendente (= o
mundo lírico).
c) O escritor se volta para o mundo exterior, focalizado como o espaço
das relações humanas, do homem situado no dia-a-dia em face da
comunidade, reagindo a todos os problemas suscitados por esse
relacionamento com o “outro”, com o “Tu” que, somado ao “Eu”, resulta
no “Nós”, que constitui o mundo social.
56
d) O escritor se volta para a expressão literária que transfigurou em arte
o universo real. Para julgá-la, entendê-la ou conhecê-la melhor, ele a
perscruta analiticamente e, nesse instante, assume uma atitude crítica
própria do mundo da reflexão.
191
Das quatro perspectivas, a que mais chama a atenção é a terceira (em
relação à abordagem desta dissertação), pois nela o escritor volta-se para o
relacionamento humano. No que concerne ao sermão e sua produção, o pastor
volta-se para o dia-a-dia dos congregados da comunidade, onde as pessoas, nas
suas relações, envolvem-se em problemas, indagações em face do contato com o
seu semelhante. Como o sermão reflete esse convívio social?
2.2.4 Características Textuais do Sermão
O sermão é texto que documenta a expressão do pensamento reflexivo de
uma pessoa, isto é, do pastor. Seu conteúdo é variado. Pode conter determinadas
exortações ou, até mesmo, exigências por meio de um conteúdo legalista. Outra
questão é se serão seguidas ou não. Porém, o sermão não deixa de ser também
um texto que busca criar fatos sociais que afetam ações, direitos e deveres das
pessoas.
Por outro lado, “cada texto se encontra encaixado em atividades sociais
estruturadas e depende de textos anteriores que influenciam a atividade e a
organização social.” Por isso, segundo Bazerman,
cada texto bem sucedido cria para seus leitores um fato social. Os fatos
sociais consistem em ações sociais significativas realizadas pela
linguagem, ou atos da fala. Esses atos são realizados através de formas
textuais padronizadas, típicas e, portanto, inteligíveis ou gêneros, que
estão relacionados a outros textos e gêneros que ocorrem em
circunstâncias relacionadas. Juntos, os vários tipos de textos se
acomodam em conjuntos de gêneros dentro de sistemas de gêneros, os
quais fazem parte dos sistemas de atividades humanas.
192
Fatos sociais “são as coisas que as pessoas acreditam que sejam
verdadeiras e, assim, afetam o modo como elas definem uma situação.” O
exemplo disso é o seguinte: “Se as pessoas acreditam que seu país é ofendido ou
ameaçado por um outro país, elas podem até ir à guerra baseadas naquilo que
191
COELHO, Nelly Novaes. Literatura e linguagem: a obra literária e a expressão lingüística.
Petrópolis: Vozes, 1974, p. 41. Essas atitudes também se aproximam da tipologia proposta por
Maldonado conforme nota de rodapé 141.
192
BAZERMAN, 2005, p. 22.
57
acreditam ser um fato.”
193
os dois lados da mesma moeda. É assustador pensar no que pode um
pastor, equivocadamente, realizar, movendo outras pessoas a fazerem ou mover
para que façam sua vontade. A história é testemunha do que os homens
conseguiram fazer através da palavra. As maiores atrocidades foram motivadas
por discursos impetuosos. Todavia, a moeda possui o outro lado. Quantas coisas
fantásticas e maravilhosas foram feitas pela palavra. A palavra cria. Deus criou o
mundo e tudo o que nele existe por meio da Palavra. Deus se fez Palavra para
ser homem e habitar entre os homens.
Outro aspecto interessante em relação ao sermão e seus elementos de
textualidade é o da intertextualidade. Fenômeno presente que ocorre
constantemente em todos os sermões, porque os pastores não produzem a partir
do nada. Essa intertextualidade busca “criar uma compreensão compartilhada
sobre o que foi dito anteriormente e a situação social atual como se apresenta.
Ou seja, através de referências intertextuais o escritor tenta estabelecer fatos
sociais sobre os quais procura fazer uma nova afirmação.
194
A citação que segue, para exemplificar o fenômeno da intertextualidade, foi
extraída de um sermão que faz parte da publicação a ser analisada no terceiro
capítulo.
Lembrar a circuncisão e o nome Jesus é lembrar também de nosso
Batismo, de nosso nome e de nossa identidade. A antiga aliança (a
circuncisão) deixou de existir. A nova aliança pela ordem de Cristo em
Mateus 28.18-20 passou a ser cumprida. Através desse “lavar
regenerador e renovador do Espírito Santo”, conforme diz Tito 3.5, nos
tornamos filhos de Deus e herdeiros da vida eterna. Dessa forma,
“unidos pelo amor de Deus.”
195
Esse trecho possibilita observar muitas vozes
196
implícitas. Ou, em outros
termos, muita intertextualidade pela qual se busca uma nova afirmação de um
fato social passado. Na citação, o assunto tratado permeia o Antigo Testamento e
o Novo Testamento a antiga e nova aliança. O escritor do sermão, que é um
pastor, tenta reafirmar um discurso, ou formular um novo discurso a partir do
lembrar a circuncisão e o nome de Jesus é lembrar também de nosso Batismo,
193
BAZERMAN, 2005, p. 23.
194
BAZERMAN, 2005, p. 25.
195
PORTAS ABERTAS: mensagens para o culto”. Porto Alegre: Concórdia, 2006, vol. 10, p. 12.
196
Essa noção de vozes do discurso é trabalhada por Bakhtin.
58
de nosso nome e de nossa identidade.” Para ratificar este enunciado, ele traz
vários discursos de vozes diferentes. Primeiro quando fala da aliança (a
circuncisão)”; segundo, as palavras de Jesus Cristo registradas por Mateus (aqui
dois discursos: o de Jesus e o de Mateus que registrou as palavras de Jesus);
terceiro, as palavras de Tito; por fim, o discurso do unidos pelo amor de Deus”
que é a temática da IELB para o ano de 2007.
Caberia a seguinte pergunta: o que é do escritor/pastor, visto que nesse
pequeno trecho figuram tantos outros discursos. O sujeito autor está presente
justamente nas escolhas que faz ao formular seu texto. Essas escolhas são
marcas
197
pelas quais se depreende, de certa maneira, a “imagem” possível desse
sujeito presente no discurso e também a “imagempossível do seu alocutário. No
caso do sermão, é a imagem do locutor/pastor e do alocutário/congregação.
Um problema específico da escrita é que não como observar os gestos e
as atitudes do escritor, nem observar a recepção e nem mesmo os efeitos que
essa escrita, quando proferida, possa ter causado. Os reparos do que se escreve,
como acontece nas conversas cotidianas, acontecem se o texto é entregue
para uma revisão. Se isto não ocorrer, o que está dito está dito.
O sermão, sob essa perspectiva, levanta muitos questionamentos quando
proclamado em culto público. O culto, na maioria das vezes, quando não é um dia
especial festivo, é um acontecimento que ocorre de forma similar todos os
domingos. Com o sermão ocorre a mesma coisa. As pessoas estão familiarizadas
com um padrão de sermão. E se ele, aparentemente, funciona o normal é
continuar seguindo o modelo. Os pastores podem, assim, prever reações das
pessoas que ouvem seus sermões se seguirem esse padrão tão reforçado pela
história.
Por outro lado, o que o é um aspecto positivo, as pessoas podem prever o
que possivelmente ouvirão. Pois, como dominicalmente ouvem o mesmo modelo,
podem supor o que virá. Algumas expressões antecipam os momentos picos do
sermão, tais como: Estamos na época tal...; No tempo dos profetas era... agora,
nos dias de hoje; Deus prometeu para o povo de Israel... hoje, essa promessa
197
O ramo de estudo que trabalha com a subjetividade e intersubjetividade na linguagem é a
Teoria da Enunciação. É um ramo de pesquisa que entende o texto como uma forma de ação. No
texto, um eu (locutor) se institui como sujeito e, ao instituir-se, institui um tu (alocutário), mesmo
que fictício ou imaginário.
59
ainda vale, pois.... E a conclusão normalmente ocorre da seguinte maneira: Que
você...; Como os antigos, nós...; Que o Senhor conceda, faça, ajude, etc.
198
O
“que” é uma marca, um indicativo de que o final do sermão se aproxima.
Explorar esses padrões textuais ou essas características e conhecê-los bem
podem ajudar a produzir sermões mais “degustáveis” ou que mantenham ouvidos
em alerta. Porque o pensamento das pessoas deveria ser este: “o que vem
agora!? E não a afirmação cansada: agora vem isso!” Criatividade não é
sinônimo de dar “show” é, antes de tudo, fugir de maneira sutil dos padrões. Por
isso,
dê uma olhada em seus sermões do mês passado. Existem padrões que
persistem? É possível observar alguns sulcos ou valas com potencial de
se transformarem em nossas sepulturas? Uma das calamidades do
púlpito contemporâneo é a total previsibilidade. Isso é letal.
199
De acordo com Larsen, não se deveria enfeitar a conclusão com frases como
“agora, em conclusão” ou “fique comigo mais um pouco”. A mente humana parece
usar um pára-quedas e salta com a menor provocação. Tamm não se deve
bater no rebanho. Antes, é preciso ser vigoroso e questionador, mas não
combativo na conclusão.
200
Desse modo, correta é a afirmação de Bazerman que “a tipificação dá uma
certa forma e significado às circunstâncias e direciona os tipos de ação que
acontecerão.”
201
Além disso, cabe perguntar se existem leis impostas para o sermão
tradicional como o conhecemos? Onde, em determinada época, descobrimos o
seu tipo específico? Que importância tem um tipo específico de sermão para que
as novas construções o sigam?
Os ramos de estudos modernos da Lingüística (englobando as teorias, tais
como: Lingüística Textual, Teoria da Enunciação, Estruturalismo, Semiótica,
Análise do Discurso, etc.) preocupam-se com todos os aspectos da linguagem.
Trabalham com a língua, com a linguagem, com os discursos, com os textos, etc.
Desse modo, a Lingüística se interessa pelas manifestações da língua e da
linguagem do ser humano.
198
Expressões observadas em “PORTAS ABERTAS mensagens para o culto”.
199
LARSEN, 2005, p. 80.
200
LARSEN, 2005, p. 123.
201
BAZERMAN, 2005, p. 29.
60
O sermão possui um caráter único. Charaudeau enquadra a retórica cristã
dentro do gênero retórico. Desse modo, a reflexão sobre os gêneros não se limita
aos três gêneros retóricos apresentados anteriormente deliberativo, judicial e
epidíctico. Mas, preocupa-se, também, com uma reflexão de maneira sistemática
sobre novos gêneros que surgem na fala pública. Assim, fala-se de um gênero
predicador que constitui uma originalidade da Idade Média e dos tempos
modernos. Este gênero está “fundado sobre a letra e o espírito de um texto
sagrado, a pregação assegura a transmissão pública de uma mensagem religiosa
que diz respeito tanto aos costumes quanto à fé.” Além disso, a pregação,
segundo essa mesma concepção, “é acompanhada por uma mensagem político-
social cuja importância permanece primordial no mundo moderno, certamente
superior àquela do discurso político no sentido ocidental do termo.”
202
Ainda, de acordo com Charaudeau,
a Doutrina Cristã de Santo Agostinho (354-430) constitui um momento
essencial no desenvolvimento da pregação cristã, as primeiras obras
técnicas, conhecidas sob o nome de artes praedicandi, que aparecem
mais tarde, no século XIII. O sermão comenta e explica uma passagem
tirada da Bíblia ou dos Evangelhos com o auxílio de procedimentos
retóricos de divisão e de amplificação, enriquecido de exemplos e de
apelos às autoridades escolhidas em função de diferentes tipos de
auditórios (mulheres, estudantes, comerciantes...).
203
Tem-se, com efeito, neste aspecto, uma possível origem do que hoje se
conhece por sermão, regido por normas, mesmo se tratando da explicação de
uma passagem do texto bíblico. Por outro lado, Broadus destaca que, através de
um processo gradativo, ocorreu a “adaptação da retórica aos objetivos da prédica
cristã.” As primeiras prédicas cristãs comaram na Palestina. “Seus primeiros
pregadores e auditórios, sua formação e afinidades espirituais eram judaicas.”
Assim sendo, o padrão característico inicial de pregar foi aquele observado pelos
profetas do Antigo Testamento e pelo ensino rabínico.
204
Contudo, do mesmo modo como existem diferentes gêneros dentro do
gênero poesia, os sermões podem ser classificados dentro de um grande gênero.
É preciso encontrar um nome próprio para ele. Talvez, gênero predicador antes
mencionado. Dessa forma, tendo os sermões características diferentes, eles
202
CHARAUDEAU, 2004, p. 255.
203
CHARAUDEAU, 2004, p. 255.
204
BROADUS, 196, p. 9.
61
tamm podem ser classificados por gêneros menores ou tipos. Através da não
de gênero do discurso, o sermão se categoriza especificamente como um gênero
exclusivo e especial.
205
É fácil saber que um determinado texto pertence a um tipo familiar. De modo
semelhante, é cil perceber que o sermão tem características que lhe são
peculiares, as quais sinalizam o tipo de mensagem que está nele contido. Existem
características únicas, próprias do sermão que não fazem parte de outros textos.
Sob esse aspecto, segundo Larsen, “o sermão tem sido uma instituição central na
Igreja desde o princípio, além de ser um nero singular na expressão religiosa
mundial, ainda que o budismo e o islamismo tenham formas diferentes.”
206
O que se depreende, nesse sentido, é que os neros o estão presos a
formas clássicas e nem podem permanecer enjaulados. O perigo é tolher a
criatividade dos pastores e a criação diferenciada a partir dos gêneros. Ao se
levar em conta a divisão clássica de sermões expositivo, temático e textual e a
defesa ferrenha de um tipo
207
, tendo-o como o melhor, pode-se aprisionar a
criatividade dos pregadores.
O estímulo à criatividade parece ser uma das propostas da Nova
Homilética
208
, ou seja, a construção do sermão a partir de outro ponto de vista a
partir do ouvinte em que os indivíduos destinatários são o elemento mais
importante. Não sob a perspectiva de um modelo, mas em virtude do indivíduo.
O sermão é uma atividade socialmente organizada. Além de ser criado por
um indivíduo
209
, existe um momento específico para ele. Por outro lado, é
importante lembrar que o sermão se realiza plenamente numa comunicação
verbal falada e o emissor tem o dever de falar a linguagem do receptor para que
ocorra a comunicação. Por isso, de acordo com Kirst, a melhor comunicação
205
Tradicionalmente os livros de Homilética dividem os sermões em três tipos: o sermão tópico ou
temático (a partir de um assunto, o pregador busca textos bíblicos para formar o sermão; em
primeiro lugar vem o tema, depois o texto bíblico), o sermão textual (o assunto é tirado de um texto
bíblico pequeno; primeiro vem o texto e, depois, o tema), e o sermão expositivo (todas as idéias e
divisões provêm do texto bíblico, logo se organiza a partir de uma fatia maior do texto bíblico).
(MARINO, Robson Moura. A arte de pregar: a comunicação na homilética. São Paulo: Vida
Nova, 1999, p. 133-143)
206
LARSEN, 2005, p. 12.
207
Lachler faz defesa ferrenha do sermão expositivo, tendo-o como ideal em detrimento dos
outros tipos. (LACHLER, Karl. Prega a Palavra: passos para a exposição bíblica. São Paulo:
Vida Nova, 1995, p. 50)
208
SOUZA, Estudos Teológicos, 2007, v. 47, n. 1, p. 5-24.
209
No âmbito do Luteranismo, o sermão é produzido exclusivamente por pastores e pastoras.
62
ocorre onde emissor e receptor dispõem das mesmas experiências. Pessoas que
fazem experiências comuns falam (quase) a mesma linguagem.”
210
2.3 Locutor/Enunciador do Sermão e a Linguagem
2.3.1 A Linguagem
A língua muito tempo é objeto de investigação por parte do ser humano.
Muitos nomes importantes figuram entre aqueles que se aventuraram a estudá-la.
Desde a filosofia da linguagem (Platão, Aristóteles, Wittgenstein), passando por
gramáticos, historiadores (Bopp, Grimm, Schleicher), estruturalistas da lingüística
(Saussure, Jakobson, Trobetskoy), lingüística enunciativa (Benveniste),
antropólogos (Lévi-Strauss), psicanalistas (Freud, Jaques Lacan), etc.
211
A linguagem foi um assunto muito presente também na reflexão de
Agostinho. Ela é considerada como uma coisa, isto é, uma coisa como Deus ou
como homem, como “instrumento”, como uma instituição convencional humana.
Mas Agostinho tamm reflete sobre o comunicar-se pela linguagem. Esse é um
aspecto lembrado por outros homiletas, como Larsen que lembra que os pastores
precisam ser estudantes da linguagem, cuidadosos com a gramática e a sintaxe,
e precisam estar atentos aos assuntos relacionados ao seu idioma.
212
Agostinho diz “que o Senhor não busca o homem, como se não soubesse
onde ele está, mas fala por meio do homem, à maneira dos homens, e nos busca
assim com este modo de falar.”
213
Destaca um atributo divino de onisciência,
entretanto ressalta uma qualidade, por excelência de Deus, que o ser humano
tamm possui, isto é, sua capacidade de falar. Além disso, o ser humano é meio
pelo qual Deus fala aos seres humanos. Ressalta-se a fala, por excelência de
Deus, justamente porque em Deus existe a magnífica união da fala com a ação,
ambas são uma em Jesus. Pois, ”tão importante é a palavra no diálogo entre
Deus e o homem, que o próprio Deus se fez palavra em Jesus Cristo. Jesus é a
210
KIRST, 1996, p. 40.
211
WISSMANN, Liane Dal Molin. A problemática dos dêiticos e a categoria dos pronomes em
Jakobson e Benveniste. FORMAS E LINGUAGEM. Ano 2, nº 6, jul./dez, 2003, p. 49-58.
212
LARSEN, 2005, p. 181.
213
AGOSTINHO apud MOESCH, Olavo. A palavra de Deus: teologia e práxis da
evangelização. Petrópolis: Vozes, 1995, p. 23.
63
palavra por excelência.”
214
A definição de ser humano está intimamente ligada a sua capacidade de
falar. Ele foi definido de diferentes maneiras na história: como um “animal
racional”, como um ser livre”, como um “fabricante de instrumentos”, contudo,
nos últimos tempos, o ser humano passa a ser estudado e visto como um ser
“loqüente”
215
. Isto é, um ser que fala. Assim, Moesch assevera que falar e ser ser
humano vêm a ser o mesmo. Semelhantemente, antes deste padre, Barthes disse
o seguinte: “para ser homem, o homem precisa de uma linguagem, que dizer, da
própria cultura.”
216
Ou, ainda, que “não há sujeito fora da linguagem.”
217
A partir disso, Moesch trabalha essa intima relação do ser humano com a
palavra. Porque, segundo ele, é a palavra que coloca o ser humano “no limiar de
sua existência.” Por meio dela, acontece o ingresso do ser humano no mundo
humano. Ele não seria ser humano, “se não lhe fosse concedido falar.”
218
Mediante a palavra “o homem penetra no emaranhado do mundo e com
ela orienta sua inclinação interior a conhecer, interpretar, aprofundar,
ordenar, destinar. Mas isto não basta. Através da palavra, o homem
passa a morar em si mesmo e de certa forma se apropria de si. Falando,
ele se aventura em um universo interior e confuso, indistinto, múltiplo,
feito de enigmas e de incertezas; falando, ele procura sua
„autocompreensão‟, sempre necessita de ulterior busca. É este mistério
de ser-homem, nunca totalmente esgotado e expresso.
219
Essa observação de Moesch, em dizer que o ser humano “passa a morar em
si mesmoe em se aventurar em “um universo interior”, aproxima-se com a visão
de Benveniste
220
sobre a subjetividade na linguagem. Pois, para este lingüista, a
linguagem é a expressão de si mesmo. Conforme Moesch, ainda, “é a palavra
que permite ao homem sua inserção no mundo das relações humanas e sociais.
Pela palavra, o homem se comunica com o outro.” Apropriando-se do repertório
da língua o ser humano se desnuda. Pois falando o ser humano “profere palavras
que exprimem externamente o que ele pensa interiormente.” Assim como, na
comunicação, o comunicador transmite, antes de tudo, a si mesmo.
221
214
MOESCH, 1995, p. 23.
215
MOESCH, 1995, p. 24.
216
BARTHES, Roland. O rumor da língua. Lisboa: Edições 70, 1984, p. 87.
217
BARTHES, 1984, p. 88.
218
MOESCH, 1995, p. 24.
219
MOESCH, 1995, p. 25.
220
Lingüista estudado mais adiante.
221
MOESCH, 1995, p. 25.
64
A linguagem é entendida como um sistema de sinais artificiais e
convencionais com uma função comunicativa. Tem como característica principal a
intencionalidade, porque a linguagem busca expressar intenções, sentimentos,
idéias. Assim, ela é composta de sinais intersubjetivos que possibilitam a
comunicação entre os homens. Ela é um meio de expressar do homem.”
222
A linguagem comporta, pois, três elementos básicos: um sujeito falante que
exprime algo, um objeto de sua fala que é o seu conteúdo transmitido mediante a
palavra, e um interlocutor que é a pessoa a quem se destina a fala. Através da
linguagem, isto é, falando, o ser humano não apenas transmite e adquire
conhecimento, mas tamm transmite emoções, sentimentos, expressa a sua
interioridade, o seu estado de espírito e a maneira como se expressa, não apenas
o seu tom de voz, mas todo o seu modo expressivo corporal pode revelar uma
atitude de acolhida ou de rejeição.
Falar, pode-se dizer, é um buscar o outro. Um apelo ao outro, provocando
sua resposta, influindo sobre ele, atuando sobre ele, impressionando-o para
convencê-lo.”
223
Observando este aspecto, a palavra pode servir de meio de
manipulação, propagação de ideologias, como acontece através dos meios de
comunicação de massa. Pode levar o ser humano a não pensar por si mesmo,
todavia, muitas vezes, pode levá-lo a pensar o que um grupo quer que ele pense.
No entanto, Deus
usa sinais humanos para comunicar-nos a vida divina, seu amor e sua
misericórdia. Entre os muitos sinais humanos, que Deus usa para
comunicar-se conosco, salientam-se os sacramentos e a pregação. A
pregação é, antes de tudo, um acontecimento de comunicação. Em sua
estrutura formal não difere da comunicação humana em geral.
224
Estudos recentes de áreas diferentes que se preocupam, em certa medida,
com a comunicação (filosofia da linguagem, da comunicação, da antropologia, da
sociologia, da psicologia) têm demonstrado que o processo comunicativo não é
algo tão simples. Trata-se de um processo complexo que envolve diversos outros
fatores que não somente a fala em si mesma. A comunicação está inserida no
tempo, no espaço, na realidade do dia-a-dia das pessoas.
222
MOESCH, 1995, p. 26.
223
MOESCH, 1995, p. 29.
224
ZILLES apud MOESCH, 1995, p. 31.
65
2.3.2 Locutor/Enunciador
Pessoa ou persona possui diferentes sentidos, tais como personagem,
figura, mas suas origens estão na Tragédia e seu sentido quer dizer máscara.
Segundo Carvalho, isso não pode ser tomado de forma acidental na história.
Significa, portanto, dizer que
o homem, não somente hoje, é reconhecido como um „ator‟, ou seja, que
sempre e em todo lugar o ser humano está, de forma mais ou menos
consciente, representando um papel. E é exatamente nesse papel que
cada um se conhece a si mesmo.
225
Aludindo a Austin, Carvalho trata da relação entre emissor e receptor como
“uma forma de ação”. O que significa dizer que quando a pessoa utiliza a palavra,
seja escrita ou oral, age exercendo ações verbais sobre o outro ou outros.
226
Os
meios de comunicação em massa têm explorado esse „fazer‟ do enunciador sobre
o receptor.
As posturas enunciativas assumidas pelo locutor contribuem para que seja
possível descobrir quais ações ele exerce ou quer exercer sobre o outro. Pode-se,
de diferentes formas, avaliar a tomada de posição ou a imagem
227
assumida
pelo locutor, entretanto uma marca se julga especial: “a escolha de um modo de
dizer e não de outro, o que, naturalmente, está carregado de sentido e que, além
de definir o emissor, vai também produzir um efeito de sentido no receptor.”
228
Tratando da Ciência Literária, Barthes destaca que “toda a enunciação
supõe o seu próprio sujeito, quer esse sujeito se exprima de um modo
aparentemente direto, dizendo eu, ou indireto, designando-se ele, ou nulo.”
229
Em
virtude disso, não há como se pensar linguagem sem sujeito, diálogo sem pessoa,
discurso sem o locutor e o receptor, mesmo que este seja apenas uma imagem.
As pessoas ao se comunicarem são criadoras. Criam um “universo
discursivo”. De conformidade com suas intenções, colocam em seu discurso
sujeitos diferentes, personagens, vozes com os quais concordam ou não. O
locutor pode pôr em seu discurso outros locutores presentes ou não. Tamm
225
CARVALHO, 1993, p. 103.
226
CARVALHO, 1993, p. 100.
227
Trazendo ao bojo Véron, Carvalho atribui ao termo “imagem” o lugar que o locutor imputa a si
mesmo no discurso. Trata-se, pois, da relação do locutor com aquilo que ele diz. Por isso, é
preciso tomar imagem num sentido metafórico.
228
CARVALHO, 1993, p. 101.
229
BARTHES, 1984, p. 16.
66
pode até se reportar a si mesmo, bem como trazer a voz da opinião pública.
230
A escolha e o modo, portanto, de apresentar os conteúdos mostram,
claramente, o lugar que o enunciador propõe a seu destinatário. Vejamos
alguns detalhes: ao falar, o enunciador pode adotar uma forma didática
ou não, pode ter uma linguagem transparente ou demonstrar opacidade,
pode manter-se distante do receptor ou estabelecer com ele um diálogo,
pode ser objetivo nas suas colocações ou, então, demonstrar
cumplicidade, pode partilhar valores no nível do dito ou no modo de
dizer. O enunciador pode ainda definir o grau e o tipo de saber que ele
atribui a seu receptor por meio das escolhas efetuadas que, inclusive,
admite graduações.
231
Assim, o emissor e o receptor são duas entidades discursivas sem as quais
não acontece o diálogo. A Teoria da Enunciação tem como escopo o estudo
desse locutor e de sua subjetividade. Ela utiliza, para emissor e destinatário,
guardadas as devidas proporções conceituais, os termos locutor e alocutário.
Estes são tomados como pessoas, isto é, o “eu” e o “tu” do diálogo. O sujeito do
diálogo ou do discurso, ao mesmo tempo em que “constrói a própria imagem, ele
impõe, tamm, ao seu receptor uma imagem, atribuindo-lhe uma função e/ou
lugar social que o destinatário pode, ou não, aceitar.”
232
Por conseguinte, o
locutor, construindo a sua própria imagem, constrói ou define semelhantemente a
do seu destinatário. Por isso, optou-se por esta teoria para analisar o tipo de
marcação feita pelo locutor no texto. Pois, ela tem como objeto principal o estudo
da subjetividade do locutor na linguagem.
2.3.3 A Teoria da Enunciação
Émile Benveniste é o “principal representante do que se convencionou
chamar Teoria da Enunciação.”
233
Ele desenvolveu um modelo de análise voltado
à enunciação. Manteve as concepções saussurianas de estrutura, relação, signo,
etc., mas “apresentou meios de tratar da enunciação”, isto é, do homem na
língua.”
234
Semelhantemente, Barthes diz que
não atingimos nunca um estado em que o homem estivesse separado da
linguagem, que em seguida elaboraria para “exprimir” o que se passasse
230
CARVALHO, 1993, p. 102.
231
CARVALHO, 1993, p. 104.
232
CARVALHO, 1993, p. 104.
233
FLORES, Valdir do Nascimento; TEIXEIRA, Marlene. Introdução à Lingüística da
Enunciação. São Paulo: Contexto, 2005, p. 29.
234
FLORES e TEIXEIRA, 2005, p. 30.
67
em si: é a linguagem que ensina a definição de homem, não o
contrário.
235
Segundo Benveniste, o homem se constitui como sujeito na e pela
linguagem. Por isso, não se concebe o sujeito sem levar em consideração a
linguagem. Não se pode falar de um sem ter em mente a outra. São dois
elementos indissociáveis na enunciação. É no uso da língua que o homem se
expressa e deixa transparecer a sua subjetividade. Por subjetividade, entende-se
a capacidade do locutor para se propor como sujeito. No entanto, se vista
unicamente sob esse aspecto, num primeiro momento, pode-se dizer que existe
apenas uma instância, a instância do eu”. Somente a instância do locutor se
auto-afirmando.
236
Além disso, Benveniste expressa que a consciência desse locutor (de si
mesmo) só pode existir pelo contraste. O “eu” só existe em oposição ou se
dirigindo a alguém, um “tu”. Não a “ele” ou “outro”. Por isso, de acordo com este
lingüista, caem as velhas antinomias do “eu” e do “outro”, do indivíduo e da
sociedade. As instâncias de pessoa passam a ser a do eu e a do tu”.
Entretanto, essa instância de terceira pessoa como conhecemos não deixa de
existir, apenas assume um caráter de não-pessoa na Teoria da Enunciação. A
pessoa se constitui pela condição do diálogo. “Ele” não dialoga. Somente as duas
primeiras se constituem como pessoas, pois elas assumem essa condição.
Assim, Benveniste destaca que toda a linguagem organiza a noção de
pessoa por oposições: “uma correlação de personalidade, que opõe a pessoa
(“eu” ou “tu”) à não-pessoa (“ele”).” Por conseguinte,
a polaridade das pessoas, condição fundamental da linguagem, é
contudo muito particular, pois não comporta nem igualdade nem simetria;
ego tem sempre uma posição de transcendência em relação a tu, sendo
eu interior ao enunciado, enquanto tu lhe permanece exterior; e, contudo,
eu e tu são reversíveis, eu podendo sempre tornar-se tu, e
reciprocamente.
237
Entenda-se o “eu” como um “eu‟ lingüístico. Sua definição em Benveniste é
a-psicológica. “‟Eu nada mais é do que a pessoa que enuncia a presente
instância de discurso que contém a instância lingüística „eu‟.”
238
235
BARTHES, 1984, p. 20.
236
BENVENISTE, Émile. Problemas de Lingüística Geral I. Campinas: Pontes, 1995, p. 286.
237
BARTHES, 1984, p. 22.
238
BARTHES, 1984, p. 22.
68
O locutor para se instituir como sujeito faz uso da língua. A língua gravita no
campo das possibilidades, um campo virtual de palavras passíveis de uso. Melhor
dizendo, antes da enunciação ela é uma possibilidade.
239
Da língua, o locutor
escolhe o que lhe é pertinente. Nessas escolhas ele deixa marcas de sua
subjetividade. Mesmo ao usar o discurso de outro, o próprio recorte é uma
escolha. Os verbos que usará para introduzir um discurso, que não é seu,
declaram um determinado posicionamento. Pois, a enunciação é colocar em
funcionamento essa língua, através de um ato individual de utilização.
240
Esse ato individual de utilização pode ser estudado sob aspectos diferentes:
como uma realização vocal da língua; como uma conversão da língua em
discurso, buscando ver como o „sentido‟ se forma em „palavras‟”; ou, ainda, uma
abordagem que “consiste em definir a enunciação no quadro formal de sua
realização”, isto é, definir “os caracteres formais da enunciação a partir da
manifestação individual.” Esse quadro formal Benveniste o esboça em o Aparelho
Formal da Enunciação.
241
A enunciação nada mais é do que colocar a língua em funcionamento por um
ato particular de utilização. Por isso, enunciar é transformar individualmente a
língua mera virtualidade em discurso.”
242
E o aparelho formal da enunciação
“é fundamento estrutural de uso da língua.”
243
Logo, se o ato de utilização é
individual, cada vez que o locutor usa este aparelho se trata de um uso novo e
irrepetível. “Essa irrepetibilidade deve-se ao fato que jamais tempo, espaço e
pessoa [...] podem ser perenizadas no uso da língua.”
244
O ato individual do locutor, pelo qual se utiliza da língua, institui o lugar do
“eu”. O “eu” se apropria do aparelho formal da língua e, apropriando-se dela,
assume a posição daquele que se enuncia. Por outro lado, ele também institui o
outro diante de si, isto é, implanta o tu”, que é a outra pessoa do diálogo. Não
importa o grau dessa presença. Desse modo, toda a enunciação, seja explicita ou
implícita, postula um alocutário. A relação entre o “eu” e o “tu” não se produz a
não ser na e pela enunciação: o “eu” indica o indivíduo que profere a enunciação,
239
BENVENISTE, Émile. Problemas de Lingüística Geral II. Campinas: Pontes, 1989, p. 83.
240
BENVENISTE, 1989, p. 82.
241
BENVENISTE, 1989, p. 83.
242
FLORES e TEIXEIRA, 2005, p. 35.
243
FLORES e TEIXEIRA, 2005, p. 37.
244
FLORES e TEIXEIRA, 2005, p. 37.
69
e o “tu” indica o indivíduo que está presente na enunciação como alocutário.
O discurso na Enunciação pode ser entendido como um modo de ação.
Nesse modo de ação, marcas que fazem transparecer o sujeito que enuncia e
atestam o seu envolvimento enunciativo com o dizer para chamar, convocar,
indagar o “tu” (alocutário) de sua alocução ao se anunciar. Essas marcas são de:
pessoas, tempo e espaço (“eu”, “tu”, “agora”, “aqui”).
Destaca-se, ainda, que o locutor utiliza da língua para, de certa forma,
influenciar o comportamento do alocutário, seja este real ou imaginado, individual
ou coletivo.
245
As escolhas deixam, de algum modo, transparecer a sua “imagem”
de locutor e, igualmente, podem deixar transparecer a “imagemque ele tem do
seu alocutário. Pois, o que caracteriza a enunciação é essa relação de diálogo
com um parceiro, porque sempre um “tu”. Logo, o diálogo se constitui através
de dois parceiros. Estes figuram de maneira alternativa como protagonistas da
enunciação.
Para influenciar o pensamento do alocutário, o locutor tem a sua disposição
as condições necessárias através das grandes funções sintáticas, tais como: a
interrogação que de certa forma busca uma “resposta”; a intimação que inclui as
ordens e os apelos (imperativo, vocativo); e, menos evidente, a asserção que visa
comunicar uma certeza.
246
Além disso, para Benveniste, menos categorizável, existem as modalidades
formais:
uns pertencentes aos verbos, como os „modos‟ (optativo, subjuntivo) que
enunciam atitudes do enunciador do ângulo daquilo que enuncia
(expectativa, desejo, apreensão), outros à fraseologia („talvez‟, „sem
vida‟, „provavelmente‟) e indicando incerteza, possibilidade, indecisão,
etc., ou, deliberadamente, recusa de asserção.
247
Por fim, uma última abordagem a ser feita é sobre o tempo. Em especial o
tempo presente, pois, segundo Benveniste, denomina-se presente o tempo em
que se fala.”
248
Ele, ainda, faz a diferenciação de três tipos de tempo: lingüístico,
crônico (cronológico) e o físico. Mas o que nos interessa aqui é o tempo
lingüístico, por se tratar do tempo ligado ao exercício da fala e, também, pelo fato
245
BENVENISTE, 1989, p. 87.
246
BENVENISTE, 1989, p. 86.
247
BENVENISTE, 1989, p. 87.
248
BENVENISTE, 1995, p. 289.
70
de ser definido e organizado a partir do discurso. Quando o locutor utiliza a forma
do presente ou outra de igual valor, ele está situando o “acontecimento como
contemporâneo da instância do discurso que o menciona.” Além disso, este
presente é reinventado a cada vez que um homem fala porque é, literalmente, um
momento novo, ainda não vivido.”
249
2.3.3.1 Elementos Lingüísticos Observados nas Análises do Locutor
Benveniste a linguagem como um modo de ação. Expressa que o ser
humano dispõe de um aparelho formal da enunciação para, de algum modo,
influenciar o comportamento do alocutário. Três, para ele, são os modos básicos
pelos quais o locutor interpela o outro (seu alocutário): a interrogação em que
espera, de certa maneira, uma resposta ou, pelo menos, indaga seu alocutário
para que pense numa; a intimação em que a ordem e os apelos predominam com
modo imperativo; e a asserção na qual o locutor comunica uma certeza.
Além dos três modos básicos, o ser humano ao se expressar faz uso de
determinados auxiliares modais. Estudar a linguagem como uma apropriação da
língua oportuniza ao pesquisador observar esses modos de dizer através da
manifestação verbal ou escrita dos indivíduos. Existem marcas lingüísticas que
mostram como o autor se posiciona em relação ao que diz. A adesão do produtor
é sentida pelo interlocutor de formas distintas: ora situada no campo da certeza,
isto é, da asserção, ora no campo da possibilidade, isto é, da não asserção ou
incerteza.
2.3.3.1.1 Relação: “Eu” e “Tu”
Nas análises do terceiro capítulo, quanto ao locutor, busca-se, a partir de
uma leitura atenta do corpus, destacar as formas ou termos usados pelo locutor,
ao servir-se da língua, que expressam a sua relação com o “tu”. Esses usos
refletem, igualmente, a “imagem do seu parceiro da enunciação. Recortes são
feitos de trechos dos sermões para a observação desses elementos.
A enunciação não ocorre se não estiverem presentes essas duas instâncias
de pessoa. A instância do “eu” e a instância do tu”. Assim, a observação é feita
especialmente nos usos dos pronomes ligados a essas pessoas do discurso.
249
BENVENISTE, 1989, p. 75.
71
Tamm, é dada atenção à maneira como o locutor faz uso dos tempos e modos
dos verbos nessa relação.
2.3.3.1.2 Certeza x Possibilidade
Os dois grandes campos das modalidades de marcação são o da certeza e o
da possibilidade. Tamm são denominados de: eixo do crer e eixo do saber.
Situam-se, portanto, os enunciados nas categorias do certo (eixo do saber) e do
possível (eixo do crer). Assim, ao se manifestar, o locutor apresenta um maior ou
um menor grau de engajamento em relação à sua expressão tanto oral quanto
escrita. E, por isso, os dois eixos básicos são o do crer e o do saber.
Quando faz uso da possibilidade, o escritor ou o locutor não impõe sua
opinião ou finge não impor (eu creio, portanto é provável, é possível, é permitido).
ao leitor ou ao interlocutor ou ao alocutário a possibilidade de aceitar ou não o
seu discurso. Este é o campo da possibilidade. Os tempos e modos verbais
predominantes neste campo são o subjuntivo e o futuro do pretérito. Além disso,
observam-se expressões como: creio, penso, acho, pode, é possível, é provável,
provavelmente, possivelmente, talvez, parece que, etc.
250
Exemplifica-se isso da
seguinte forma:
Tudo pode ser assim, certamente não de forma plena, mas já com
bastante consistência e satisfação. Penso que é um pouco disso que
nos fala o apóstolo Paulo na epístola de hoje...
251
Quanto ao campo da certeza, o escritor ou o locutor obriga, de certo modo,
ao interlocutor ou ao alocutário a aderir ao seu discurso. Este é o campo do
saber. Os verbos estão predominantemente no indicativo. As expressões comuns
dos discursos neste eixo são: é certo, é preciso, é necessário, é impossível, é
proibido, é óbvio, não pode haver dúvidas, é dever de todo, certamente,
necessariamente, etc.
252
Exemplifica-se isso da seguinte forma:
Somos convidados a interferir na vida das pessoas, das instituições, nos
processos que fazem andar a história, para instaurar aquilo que é bom,
que é verdadeiro, que é digno, que é correto, que é puro, que é
agradável, que é decente. Não devemos, o podemos e,
certamente, não queremos nos omitir.
253
250
ABREU, António Soares. Curso de Redação. São Paulo: Ática, 2006, p. 60.
251
Exemplo retirado do sermão 2, conforme anexo.
252
ABREU, 2006, p. 60.
253
Exemplo retirado do sermão 2, conforme anexo.
72
Além do que foi exposto acima, dois auxiliares modais têm função
preponderante nos campos da certeza e da possibilidade, quais são: dever para a
certeza e poder para a possibilidade. De modo mais amplo, as modalidades
podem ser caracterizadas pelos verbos e pela fraseologia. Nesta, as expressões
comuns são: „talvez‟, „sem dúvida‟, „provavelmente‟, etc. Em ambos os aspectos,
o que se observa é a atitude do locutor frente ao que ele enuncia.
Há, ainda, outro aspecto importante que diz respeito aos tempos verbais que
caracterizam a atitude do locutor. Sua atitude pode ser a de relatar ou a de
comentar. Sob uma perspectiva argumentativa, o locutor utilizará o comentário.
Os tempos verbais característicos são o presente e o futuro. Por outro lado, a
narrativa assume predominantemente o passado. O futuro do pretérito, por sua
vez, nos comentários diminui a força argumentativa. Do mesmo modo que a
utilização do passado nos textos comentados reduz o comprometimento.
254
2.5 Conclusão
Pensar o sermão sob uma perspectiva diferente do que observa-se na
tradição homilética é arriscar um pouco. Pois, corre-se o risco de se cometer
equívocos. No entanto, o que fica de mais significativo, a partir dos apontamentos
feitos, é que o sermão pode ser estudado sob diferentes pontos de vista. No caso
desta dissertação é visto como um ato enunciativo caracterizado por marcas,
modos e padrões.
Parafraseando Bazerman, examinar o sermão sob a perspectiva da
textualidade permite ver a extensão e a variedade do trabalho escrito que se
requer dos pastores, e permite identificar o conhecimento desse tipo específico de
produção escrita e as habilidades de escrita necessárias para alguém realizar
esse trabalho. Examinar todos os elementos que envolvem a produção do sermão
permite compreender as interações práticas trabalhadas pelos pastores.
Compreender essas interações permite, também, ver como os pastores, ao
escrever qualquer novo texto, estão intertextualmente situados dentro de um
sistema, e como a sua escrita está direcionada e amparada por recursos
sistêmicos. A análise desses aspectos permitirá avaliar a eficiência e a
adequação de cada tipo de sermão (indutivo, dedutivo, com metáforas, sem
254
ABREU, 2006, p. 59.
73
metáforas, ilustrativos, expositivos, temáticos, etc.) e se é necessária alguma
mudança ou não.
255
O sermão é um dos elementos práticos mais importantes da Igreja. Palavra e
Sacramentos caminham juntos e m estreitos laços. Lutero chega a dizer que o
ministério da pregação é o ministério mais importante. É Deus quem atua em
ambos.
Ter isso em mente e usar de genialidade, dom dado por Deus aos seres
humanos, é uma das tarefas do pastor, porque isso faz parte do seu trabalho, e
de todos os cristãos, pois tamm são testemunhas. Desse modo, ser criativo
nem sempre é criar algo novo ou ser radical com os modelos pré-construídos,
mas pode ser, unicamente, dar outros contornos ou inovar a partir daquilo que já
existe.
Assim, a partir das considerações feitas neste capítulo sobre o texto e o
locutor, bem como os apontamentos feitos no primeiro capítulo, analisar-se-ão
alguns sermões no próximo capítulo, isto é, observar-se-ão o sermão enquanto
produção textual (aspectos gerais) e o lugar assumido pelo locutor nesse texto.
255
BAZERMAN, 2005, p. 43.
74
3 ANÁLISE DOS SERMÕES E DISCUSSÃO DOS DADOS
3.1 Introdução
Nos capítulos anteriores, observou-se, de certa maneira, o que envolvia a
produção de um sermão. um campo específico dentro da Teologia que se
preocupa com a comunicação na Igreja que é a Homilética. Esta tem se
preocupado mais com o sermão. Outro aspecto visto foi o destinatário do sermão.
Ele é projetado e feito para a comunidade, que é o fim do sermão. Ainda,
observou-se o que contém um sermão quanto ao seu conteúdo. Por último, no
primeiro capítulo, tratou-se do pastor que é o responsável direto, e nas Igrejas
tradicionais luteranas o único, por tal produção.
O segundo capítulo trouxe reflexões do sermão como uma manifestação
lingüística e suas características peculiares dentro da linguagem humana.
Tamm se refletiu sobre o locutor e o momento em que ele se apropria da
língua, como um momento único e irrepetível. E, de modo mais específico, traçou-
se os pressupostos da Teoria da Enunciação, cujo referencial norteia parte das
análises deste capítulo.
Desse modo, este capítulo, apresentará brevemente o corpus de análise e
logo a seguir as análises. Os sermões serão analisados separadamente. Assim,
nas análises, primeiramente serão observados, em linhas gerais, os seguintes
aspectos: organização do texto, ilustrações, intertextualidade
256
, coesão, assuntos
recorrentes, palavras-chave, terminologia, etc.; e, especificamente, a relação
entre o locutor e o alocutário (eu x tu), bem como a maneira de marcação do
256
Intertextualidade, nas análises, refere-se à utilização de outros textos bíblicos ou outras
citações que não sejam do texto-base.
75
discurso por parte do locutor, num segundo momento.
3.2 Corpus para Análise
O corpus de alise é composto de dez sermões retirados do livro Portas
Abertas: Mensagens para o culto”. Este material é publicado pela Editora da IELB
Editora Concórdia. O primeiro projeto contendo sermões teve início em 1975
com outro título Preciso Falar
257
. Este, por longo período, não foi publicado e
voltou a ser publicado em 1997, porém, com duas publicações distintas: uma para
sermões e outra para auxílios homiléticos. O objetivo primeiro do projeto era
auxiliar os pastores que possuíam múltiplas atividades e, às vezes, necessitavam
recorrer a um material pronto. Por isso, surgiu a primeira publicação com sermões
para momentos especiais.
Contudo, os livros tomaram outra forma: ao invés de apenas sermões
especiais, passaram a cobrir parcialmente o Ano Eclesiástico
258
, com sermões
preparados por pastores da IELB, seguindo a Série Trienal
259
adotada pela Igreja.
Desta série, optam por uma das leituras para produzir seu sermão.
O volume de onde são retirados os sermões que serve de corpus para esta
dissertação é o volume 10, publicado em 2006 para o ano de 2007, que tem como
tema geral Unidos pelo Amor de Deus. Ao todo são 35 sermões que preenchem,
parcialmente, o ano da Igreja.
O projeto Portas Abertas” tem dois objetivos: 1) Motivar os cristãos
luteranos a uma participação regular dos cultos, chamando a atenção
para as bênçãos e os privilégios do culto semanal; 2) Celebrar cultos
semanalmente em todas as congregações e pontos de pregação da
Igreja, com o auxílio de líderes leigos.
260
Depois da leitura de todos os sermões do livro Portas Abertas, ocorreu a
257
O Preciso Falar se tornou um livro de auxílios para a preparação de sermões, contendo
estudos sobre os textos bíblicos de cada domingo.
258
Tanto no Antigo Testamento como no Novo Testamento o povo de Deus seguia um calendário
religioso. Trata-se do calendário usado pela igreja que auxilia a determinar o tema e o propósito de
cada culto. Ele está centralizado na vida e obra de Jesus Cristo. O calendário divide-se em: Época
do Advento; época do Natal, época da Epifania, época da Paixão ou Quaresma; época da Páscoa;
época Pós-Pentecostes. (ZIMMER; SCHOROEDER; ZEMKE, 1988, p. 43-48).
259
Série Trienal é o nome dado a um conjunto de passagens bíblicas específicas para cada culto.
Ela divide-se em: Ano A, Ano B e A C. Essas leituras ocorrerão em todos os domingos dentro do
Ano Eclesiástico. Cada domingo possui quatro passagens bíblicas (Salmo, Antigo Testamento,
Evangelho e Epístola) que o lidas nos cultos. Isso pode ser observado em anexo nas
mensagens analisadas. Normalmente o pastor opta por uma passagem e prepara seu sermão.
260
Estes objetivos estão na capa do volume 10.
76
seleção do corpus específico para a análise. Ao todo são 10 sermões. Seguiu-se
dois critérios, basicamente, para a escolha: autores diferentes e períodos
distintos. Escolheu-se, também, o volume 10 por ser a publicação editada no
período em que se elaborou o projeto de pesquisa para esta dissertação. Além
disso, porque, quanto ao conteúdo e modo de exposição, estes sermões não
diferem em proporções maiores daqueles que muitos pastores pregam nas suas
comunidades. E porque a presente publicação envolve pastores da IELB.
3.3 Análises
261
3.3.1 Sermão 1 (Advento)
Este sermão foi escrito para o período de Advento
262
. O texto bíblico base é
de 1 Tessalonicenses 3.9-13
263
. O tema é “como esperamos a vinda de Cristo.”
3.3.1.1 Apontamentos sobre o Sermão
O sermão tem uma seqüência versículo bíblico e explicação, pode-se dizer
que está disposto em forma espiral. Numa breve introdução, apresenta-se o tema
em forma de pergunta. Procura-se respondê-la através de duas assertivas.
“Esperamos a vinda de Cristo perseverantes na verdadeira” (§3
264
) e “também
261
Todos os sermões analisados estão em anexo.
262
Advento: Trata-se de uma época que inclui quatro domingos. A palavra significa “chegar”,
“aproximar”. Neste período, a ênfase é a constante vinda de Jesus a nós. (ZIMMER, R. Allan;
SCHROEDER, George W.; ZEMKE, Herman J. O Culto Cristão. Porto Alegre: Concórdia, 1988,
p. 45). O advento é o período inicial do Ano Eclesiástico. Este tem sua formação até o ano 600. “A
comemoração do Advento remonta, provavelmente, o século IV, logo após a fixação da data de
nascimento de nosso Senhor Jesus. Como tempo de prepara, Advento sempre teve, na Igreja
Antiga, caráter idêntico ao da Quaresma: tempus clausum‟, destinado à penitência e ao jejum, se
bem que de forma abrandada. Sua duração original também era de 40 dias. O para Gregório
Magno determinou 4 domingos pra o Advento, bem como assentou o Primeiro Domingo de
Advento como o início do Ano Eclesiástico. Nesse período a Igreja se prepara para receber
aquele que vem em nome do Senhor. (GOERL, Otto A. Púlpito: estudos homiléticos. Porto
Alegre: Concórdia, 1967, p. 5.)
263
Para melhor entender esse texto, convém lê-lo desde o capítulo 2.17 e todo o capítulo 3. Pois
esse bloco expressa a preocupação de Paulo com os Tessalonicenses, do envio de Timóteo e das
notícias que este trouxe da viagem. Então, sim, a pergunta do versículo 9 e 10. Eis o texto base do
sermão: Pois que ações de graças podemos tributar a Deus no tocante a vós outros, por toda a
alegria com que nos regozijamos por vossa causa, diante do nosso Deus, orando noite e dia, com
máximo empenho, para vos ver pessoalmente e reparar as deficiências da vossa fé? Ora, o nosso
mesmo Deus e Pai, e Jesus, nosso Senhor, dirijam-nos o caminho até vós, e o Senhor vos faça
crescer e aumentar no amor uns para com os outros e para com todos, como também s para
convosco, a fim de que seja o vosso coração confirmado em santidade, isento de culpa, na
presença de nosso Deus e Pai, na vinda de nosso Senhor Jesus com todos os seus santos. (1 Ts
3.9-13)
264
Leia-se Parágrafo 3 deste sermão. Este mesmo procedimento é seguido em todos os sermões
77
esperamos pela vinda de Cristo progredindo na vida cristã” (§10). Este é, então, o
esboço básico do sermão. Apresenta-se uma pergunta e se divide a resposta em
duas partes. Também se traça um paralelo entre o que o texto expressa sobre os
cristãos de Tessalônica e “nós, cristãos do século 21” (§5). Essa seria a ponte
entre a Escritura Sagrada e o contexto contemporâneo. A ponte é um dos
elementos mais importantes de um sermão. Segundo Prieto, é tarefa do pregador
estabelecer uma ponte entre a Palavra de Deus e sua comunidade.
265
Nas primeiras palavras, contextualiza-se o período eclesiástico. Situa-se o
contexto litúrgico e a época do calendário da Igreja Advento. Este, sendo um
tempo de espera, conduz à temática do sermão (§2). Isto é importante, pois a
comunidade fica ciente do que será tratado.
Na primeira parte do texto, mais quatro perguntas são feitas. São elas:
temos a esperança na segunda vinda de Cristo? Estamos cientes de que Jesus
voltará? Será que nos lembramos de sua volta em nosso dia-a-dia? Ou,
simplesmente, nos esquecemos que Cristo disse que iria retornar a este mundo?
(§5) e “como Deus faz com que o sofrimento e a tribulação possam ser um
progresso em nossa vida espiritual? (§10). Por outro lado, na segunda parte,
figura um questionamento.
As perguntas, como se observou no segundo capítulo
266
, buscam de certa
forma uma “resposta”. Sua função é chamar a atenção da comunidade para o que
está sendo dito.
Outro aspecto relevante, mas que precisa ser cuidado, é o uso de algumas
palavras que se enquadram como terminologia. Por exemplo, numerologia,
astrologia, espiritismo, cristianismo e sacramentos (§s 6, 8 e 10). É de se
perguntar se as pessoas conhecem seu significado e também sua amplitude.
“Sacramento” é uma palavra comumente utilizada. Aparece em outros dos
sermões analisados. Quase sempre da seguinte forma: “pregação da Palavra e
sacramentos” ou como neste sermão: “estimular nosso interesse na pregação da
Palavra e a nossa participação nos sacramentos” (§10). De acordo com
Agostinho, o pastor evitará toda a palavra que não ensine. Se ele puder, todavia,
analisados. Os sermões estão em anexo com as indicações dos parágrafos.
265
PRIETO, 1997, p. 134.
266
Isso é tratado no tópico 2.3.3 sobe a Teoria da Enunciação.
78
substituí-las por outras, corretas e inteligíveis, ele as escolherá de preferência.
267
Moesch, abordado no segundo capítulo, diz que é pela palavra que o homem
se comunica. Mas na comunicação comum, o figuram palavras que
enquadram-se como terminologia. A não ser que ele pensa de maneira
terminológica. Porque, ainda de acordo com Moesch, o ser humano “profere
palavras que exprimem externamente o que ele pensa interiormente.” Assim
como, na comunicação, o comunicador transmite, antes de tudo, a si mesmo.
268
Além de se explorar o texto bíblico base, como está anunciado no cabeçalho,
há citações de outros textos bíblicos. Para falar sobre a certeza da volta de Cristo,
cita-se o texto de Hebreus 1.11
269
. Mas há um equívoco aqui, pois é Hebreus 11.1
que fala especificamente sobre a como “a certeza de que vamos receber as
coisas que esperamos”. Esse processo de explorar outros textos bíblicos é
chamado de intertextualidade. Através dela, busca-se estabelecer idéias ou
comprovar afirmações. Todo texto, de acordo com Barthes, é um tecido pré-
construído, isto é, formado a partir de idéias migradas de discursos anteriores.
270
Pode-se dizer que, por meio de referências intertextuais, o escritor tenta fazer
uma nova afirmação. No entanto, é preciso ter cuidado para o cometer
equívocos, pois o leitor ou ouvinte pode querer buscar aquela referência.
Outra citação indireta é de 1 Tessalonicenses 4.9 a 5.11. Isso ocorre no §13,
mas apenas o citados “os moralmente fracos”, “os desocupados” e
“desanimados”. É muito breve a referência. O leitor pode ler e abrir o texto bíblico
para conferir o contexto e reler esse trecho. Entretanto, o ouvinte do culto não tem
como fazer isso enquanto está ouvindo.
A linguagem desse sermão é simples. bastante repetição de palavras.
Por exemplo, Deus (16 vezes), Jesus (16 vezes). Jesus é tratado como Salvador
e Filho de Deus. Deus é aquele que ama e quer reparar as deficiências das
pessoas (§21). E o Espírito Santo (uma vez) pode operar a transformação da
tribulação para a esperança (§11). Mas aqui, na passagem do §10 para o §11
seria bom alguns comentários para que se possa saber o que é essa
267
AGOSTINHO, 2002, p. 230.
268
Cf. MOESCH, 1995, p. 25-26.
269
Eis o que consta no versículo 11: A terra e o céu vão acabar, mas tu viverás para sempre. Eles
ficarão velhos como roupa.
270
BARTHES apud CARVALHO, 1993, p. 102.
79
transformação.
Outras repetições constantes estão ligadas à esperança, que é a temática do
sermão, e ao sofrimento. A esperança se refere ao retorno de Jesus e o
sofrimento diz respeito ao desânimo, sofrimentos e dificuldades. Também a
moléstia ou o pecado é tratado como deficiência, tentação, desprezo e pouco
caso da Palavra de Deus, e a fé que se torna débil quando os cristãos se apegam
a numerologia, astrologia e espiritismo. A solução, para isso, está presente em:
cultos, estudos bíblicos e a Palavra de Deus. Por fim, o amor e o perdão são
salientados nos últimos parágrafos. O amor de Deus pelas pessoas foi
demonstrado no sacrifício, morte e ressurreição (§19). A condição para amar e
perdoar está intimamente ligada a Deus. “Só quem é amado por Deus pode amar
o próximo. Só quem é perdoado por Deus pode perdoar o próximo” (§20).
Cabe salientar, ainda, um elemento importante que precisa ser observado,
que é uso de traduções diferentes nos sermões. No mesmo sermão, ora se usa a
versão Almeida (Revista e Atualizada ARA) e ora a Nova Tradução na
Linguagem de Hoje (NTLH). Aspecto que, em questões lingüísticas, deveria ser
cuidado. Os pastores estão tão acostumados com a linguagem da ARA que, ao
fazer algumas referências, utilizam-se dela. No entanto, o sermão deveria
privilegiar apenas uma para se manter um padrão de linguagem. Às vezes,
tamm, aparecem pronomes não comuns do linguajar do dia-a-dia. Um exemplo
disso é “vossa fé” no §14. Isso, provavelmente, é fruto da contínua utilização da
versão ARA.
Se o estilo da escrita de um sermão deve ser o da fala cotidiana, talvez fosse
apropriado o uso da versão da NTLH. A menos que queira enfatizar algo ou
alguma palavra, mas é preciso dizer o motivo. Os sermões deveriam se aproximar
da fala comum. Esse processo se sedimenta com a prática. E, para o pastor é
imprescindível dominar essa técnica.
271
3.3.1.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade
272
Este sermão é predominantemente marcado pela primeira pessoa do plural
“nós” – naquilo que se refere à relação entre locutor e alocutário. Os únicos
271
KIRST, 1996, p. 95.
272
Esses aspectos são abordados, de modo específico, no tópico 2.3.3.1 do capítulo 2 sobre os
elementos lingüísticos que neste capítulo 3 seriam observados.
80
momentos em que a segunda pessoa está presente são: quando citações da
carta aos Tessalonicenses, figurando um “vossa fé” (§14); e o uso do “você” (§13
e §17).
Este é um locutor que aproxima-se em todos os aspectos do alocutário. Em
nenhum momento ele utiliza de modo distintivo a primeira pessoa “eu” , e nem
diretamente a segunda pessoa fazendo referência ao alocutário “tu”. Desse
modo, tanto um como o outro, textualmente, estão no mesmo plano. Pois, todas
as caracterizações e ações estão vinculadas à primeira pessoa do plural, isto é,
ao “nós”. Citam-se alguns trechos para exemplificar esse aspecto:
Mas, hoje temos que perguntar a nós, cristãos do século 21: temos a
esperança na segunda vinda de Cristo? Estamos cientes de que Jesus
voltará? Será que nos lembramos de sua volta em nosso dia-a-dia?
Ou, simplesmente, nos esquecemos que Cristo disse que iria retornar a
este mundo? (§5)
O sofrimento pelo qual passamos tem um propósito. Com certeza, ele
tamm é para o nosso progresso espiritual. (§9)
Ocorre o “nós” que é chamado inclusivo, pois estão englobados nele tanto o
locutor (“eu”) quanto o alocutário (“tu”). Como observa-se nas citações acima,
pelos elementos grifados, as mesmas ações e estados caracterizam o que fala e
aquele a quem o falante dirige-se. O efeito do texto seria totalmente diferente se,
no caso do §5, fosse escrito diretamente utilizando a segunda pessoa: Mas, hoje
você tem que perguntar a você mesmo, cristão do século 21: Você tem a
esperança na segunda vinda de Cristo? Você está ciente de que Jesus voltará?
Será que você se lembra de volta de em seu dia-a-dia? Ou, simplesmente, você
se esqueceu que Cristo disse que iria retornar a este mundo?
273
Não mudança quanto ao conteúdo, mas o efeito diretivo é
consideravelmente outro. Além disso, pensando que esse discurso pode ser
proferido no púlpito, qual versão teria mais alcance?
As expressões que imprimem o campo da asserção ou do saber e, por isso,
certeza, somam 78 elementos. Entre estes constam expressões de certeza,
verbos no presente e futuro do indicativo, como exemplo:
273
O §5 foi adaptado para mostrar as possibilidades de marcação do discurso e o quanto isso
pode dar outro sentido ao texto. Estas adaptações não serão feitas subseqüentemente nas
análises, mas o leitor pode fazê-las mentalmente para notar a distinção de sentido quando o
locutor assume determinado tipo de discurso.
81
Mais uma vez chegamos à época do calendário da Igreja chamada
advento: tempo no qual aguardamos ansiosos a vinda de Jesus Cristo
no dia de Natal. Advento é um tempo de espera... e como esperamos a
vinda de Cristo? (§2)
A nossa fé não é diferente dos tessalonicenses, ela tamm é fraca e
deficiente que precisa ser melhorada, isto é, fortalecida constantemente
pela Palavra de Deus. (§15)
Neste sermão, predomina o discurso da verdade. Estes trechos expressam a
atitude do locutor frente ao que está dizendo. “Chegamos”, “aguardamos”, “é
fraca”, e “precisa ser” não abrem possibilidade de questionamento. Isto é certo.
Essas escolhas quanto aos modos de escrever podem ser pensadas ou
simplesmente não. A pergunta que se faz é: ao escrever ou mesmo pregar o
pastor pára para pensar nesses aspectos? “Quero expressar certeza aqui?” Ou
“quero deixar a possibilidade de meus ouvintes pensarem e tirarem suas
conclusões a esse respeito?”
Porque, por outro lado, como ocorre neste mesmo sermão, figura também
um discurso no campo da possibilidade. O locutor crê naquilo que fala e, por isso,
é possível. O uso do auxiliar modalizador “pode” caracteriza esse tipo de modo de
dizer.
Quando desprezo e pouco caso para com a Palavra de Deus, pode
haver um enfraquecimento; a fé pode ir ficando cada vez mais fraca,
até que ela se extinga; até que ela se acabe por completo. (§16)
No entanto, é o amor de Deus, a fé em Cristo que nos capacita a amar o
nosso próximo. quem é amado por Deus pode amar o próximo.
quem é perdoado por Deus pode perdoar o próximo. O perdão que
Deus nos nos capacita a amar o nosso próximo. Amando o próximo,
tamm estaremos progredindo na vida cristã. (§20)
O locutor, quanto à fé, ao perdão e ao amor expressa-se através da
possibilidade. A “pode” enfraquecer e somente aquele que é amado por Deus
“pode” amar e perdoar o próximo. É claro que no segundo trecho existe a
alternância de modos de dizer em dois horizontes diferentes, isto é, quando trata-
se de Deus o discurso é o da certeza: “Só quem é amado”, “só quem é perdoado”
e é o perdão de Deus que “capacita” ao amor. Deus pode perdoar ou perdoa?
3.3.2 Sermão 2 (3º Domingo no Advento)
Este sermão, assim como o primeiro, foi escrito para o período de
82
Advento
274
, em especial para o terceiro domingo. O texto bíblico base para o
sermão é de Filipenses 4.9
275
. O tema é “Deus vem morar no meio do seu povo:
para dar nova vida; para estabelecer um reino de paz”.
3.3.2.1 Apontamentos sobre o Sermão
O texto-base de Filipenses 4.9 não é base para o sermão. Pois, neste texto
trata de se r em prática as coisas que se aprenderam do apóstolo Paulo. Além
disso, o tema proposto está muito mais ligado à temática do período do que ao
texto-base propriamente dito.
Ao observar o tema, espera-se que se respondam, talvez, as seguintes
perguntas: Deus vem morar de que modo? E como ele vai dar a nova vida e
estabelecer o reino de paz?
O sermão é um apanhado das leituras propostas para o dia. No §1, fala-se
que Deus está chegando, que o Natal está próximo, que Ele (Deus) não consegue
ficar indiferente ao sofrimento do homem e, por isso, assume a forma humana. No
§2, a alusão é feita ao texto de Isaías, do qual se extraiu o tema. Este sim poderia
ser o texto-base. Além disso, no §3, alude-se ao texto de Sofonias. que esses
textos são mencionados, seria importante resgatar trechos dessas leituras e
explorá-los, pois tamm são lidos durante o culto. Isso ajudaria a dar unidade ao
culto e às leituras. Por exemplo, o resgate do texto de Sofonias poderia ser feito
da seguinte forma: sua oferta é uma nova vida, assim como nós ouvimos na
leitura de Sofonias que dizia o seguinte: „Povo de Israel, cante louvores a Deus!
[...] O Senhor Deus anulou a sentença que havia contra vocês e afastou todos os
inimigos do seu povo. O Senhor, o Rei de Israel, está com vocês, e vocês não
precisam mais ter medo da desgraça‟” (Sofonias 3.14-15).
A “nova vida” e “reino de paz” do tema figuram no §3 e no §4
respectivamente. É neste último que, então, ocorre a referência explícita ao
274
Ver nota 271 sobre o período.
275
A partir do capítulo 4 desta carta, o apóstolo Paulo fala da saudade que sente dos filipenses e
pede que continuem vivendo unidos no Senhor. Nomina Evódia, Síntique e Clemente
especificamente. Então, dá mais alguns conselhos, tais como: tenham alegria, sejam amáveis com
todos, não se preocupem, orem sempre, encham as mentes com tudo que é bom e, o texto base
do sermão, ponham em prática o que receberam e aprenderam de mim. Penso que o versículo 8 e
9 deveriam ficar unidos como um único parágrafo. Eis o texto:“Ponham em prática o que vocês
receberam e aprenderam de mim, tanto com as minhas palavras como com as minhas ações. E o
Deus que nos dá a paz estará com vocês.” (Fp 4.9)
83
texto-base do sermão. Há, tamm, antes do parágrafo conclusivo, uma história,
como ilustração, que destoa do quadro geral do sermão.
Utilizar uma ilustração é sempre um perigo. Se ela é explorada com cuidado
para enfatizar o escopo do sermão, não tem problema nenhum. Não está em jogo
somente a unidade do sermão, mas também se é ou não coerente o uso de
determinada ilustração. O ouvinte sabe distinguir um texto coerente de um
conglomerado de enunciados.
Cabe lembrar aqui a definição de Aristóteles de retórica. Esta é a
capacidade de descobrir o que é adequado a cada caso com o fim de
persuadir.”
276
Pergunta-se, então: a historinha é adequada para a persuasão?
Sendo adequada, é preciso fazer alguns comentários. Falta uma transição
do §5 para o §6. O §5 termina com uma assertiva forte: “Não devemos, o
podemos e, certamente, não queremos nos omitir”. E, bruscamente, inicia-se a
historinha do §6. Essa quebra pode ser prejudicial para a compreensão. Além
disso, a amarração do que se viu no §6 com a conclusão, logo em seguida, do §7
é muito rápida. Para resolver o problema da transição, poder-se-ia proceder
assim: Para ilustrar o que acabo de dizer (repete-se algo do parágrafo anterior
que se quer enfatizar), vou contar a vocês a seguinte história”.
Não se observa, neste sermão, dificuldades em relação à terminologia.
Apenas algumas palavras que, provavelmente, não façam parte do mesmo
repertório do pregador, do leitor e do ouvinte. Kirst lembra que as pessoas que
vivenciam as mesmas experiências vivenciam tamm, provavelmente, a mesma
linguagem
277
. Assim, questiona-se o uso de palavras como: arrogância e
prepotência (§2), intransigência (§3), epístola (§4) e desventura (§5). Não se trata,
de modo nenhum, de pensar em uma possível ignorância do ouvinte, mas uma
verificação do ponto de vista comunicacional..
278
Ainda, sobre linguagem, é preciso mencionar a diferea lingüística entre a
historinha de ilustração e restante do sermão. Pois, no restante do sermão não
um rigor quanto ao uso dos tempos e modos verbais. Há, antes, uma mistura
bastante grande, aproximando-se da linguagem comum. Ao contrário disso, na
276
ARISTÓTELES, 1998, p. 48.
277
Conforme KIRST, 1996, p. 35-40.
278
Conforme capítulo 1, tópico 1.4.4 sobre o “texto-sermônico”, e capítulo 2, tópico 2.2.1 sobre os
textos e sua funcionalidade.
84
história, os tempos e modos verbais estão bem organizados. Por exemplo, um
tempo verbal que só se encontra em textos muito bem polidos, aparece na
história. Trata-se do pretérito mais-que-perfeito: “surgira e “fora” (§6). Parece
que, simplesmente, foi copiada de algum lugar.
Deus e Jesus são nomes recorrentes. O termo Deus aparece 9 vezes, mas
parece não haver cuidado no seu uso. Ora Deus é tratado como Senhor Todo-
Poderoso e Criador, ora como Jesus. O termo Jesus, por sua vez, aparece 3
vezes, mas tamm é tratado ora como Deus, ora como Senhor. Talvez, isso
possa causar confusão no ouvinte. O leitor pode ler e reler o sermão, porém o
ouvinte não.
Por outro lado, é relevante o modo como se procura fazer a ponte entre o
texto bíblico e o ouvinte, isto é, a aplicação. No §2, é dito que, ainda hoje, Deus
sente as nossas dificuldades, nossas angústias, nossos sofrimentos e se
entristece com isso.
3.3.2.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade
O locutor marca o seu discurso, no que tange à relação eu x tu, com a
primeira pessoa do plural, isto é, com o “nós”. “Nós somos contagiados com a
alegria da notícia dos anjos” (§1). Mais significativo nesta relação em que “eu” e
“tu” são um “nós” coletivo, é o seguinte trecho:
Ele sente como suas, ainda hoje, as nossas dificuldades, os nossos
sofrimentos, as nossas angústias, e se entristece com elas. Mas se
entristece também com a nossa arrogância, com a nossa prepotência,
com o nosso orgulho, com a nossa vaidade. Se entristece quando
somos maus, causando sofrimento e dor, aniquilando a preciosa vida
que ele criou. É por isso que Deus vem morar no meio do seu povo. E,
justamente por reconhecer nossa fragilidade e nossa total
incapacidade de mudar essa situação, queremos receber com todo o
carinho e consideração aquele que tudo pode renovar, restaurar e fazer
brilhar. (§2)
Locutor e alocutário o se distinguem quanto aos seus adjetivos. Ambos
têm dificuldades, sofrem, angustiam-se. Ambos, também, são arrogantes,
prepotentes, vaidosos e maus. E o convite inclui, igualmente, o locutor ao dizer
que “queremos receber”.
Outro trecho, ainda, quanto ao uso do “nós”.
(...) pois o Senhor vem a nós, nos ama e nos ajuda a ser amáveis com
todos. É por isso também que não nos preocupamos, a ponto de
perder a alegria, pois sabemos que o senhor está conosco e cuida de
85
nós, providenciando para que nada nos falte. É por isso também que
andamos em paz. (§4)
Esse modo de marcar o discurso, através do “nós”, percorre o sermão como
um todo. Existem apenas duas exceções. Uma usando o “vocês”, mas esta é da
citação do texto de Filipenses. No entanto, a outra exceção é mais significativa,
pois ressalta uma atitude de distinção entre eu” e “tu”. “Penso que é um pouco
disso que nos fala o apóstolo Paulo na epístola de hoje” (§ 4). “Eu” penso,
ressalta uma atitude de diálogo. Porque seria diferente se o locutor tivesse
enunciado assim: “É disso que nos fala o apóstolo Paulo.”
Os verbos “ser” e “estar” no indicativo presente figuram mais de 30 vezes
neste sermão. Isso já indica um discurso marcado pela certeza. Sem contar as
expressões de certeza e outros verbos no presente do indicativo.
Somos convidados a interferir na vida das pessoas, das instituições, nos
processos que fazem andar a história, para instaurar aquilo que é bom,
que é verdadeiro, que é digno, que é correto, que é puro, que é
agradável, que é decente. Não devemos, não podemos e, certamente,
não queremos nos omitir.
Além disso, outros verbos nesse pequeno trecho tamm estão no presente,
como: “fazem”, “devemos”, “podemos”, e “queremos”. Ambos no indicativo, dando
essa idéia de que o locutor marca sua fala pelo campo da certeza. Ainda, há um
“certamente”, advérbio que, igualmente, indica certeza. O discurso teria outro
sentido se, ao invés do “é”, figurasse um “pode ser”.
O cômputo de todos os verbos no presente do indicativo soma mais de 90
vezes. Expressões que indicam certeza, como certamente”, “não como...” “aí
está”, “é verdade...”, somam mais de 15 vezes. Outro aspecto que não pode ser
deixado de lado é o uso da negação como elemento argumentativo, pois o “não”
aparece 19 vezes neste sermão. Observe o seu uso na citação abaixo:
Não como ficar indiferente. o como não se emocionar. O Deus
Todo-Poderoso, Criador do céu e da terra, assume a forma humana,
para resgatar o seu povo. Ele não consegue ficar indiferente, porque é
Deus Santo, Todo-Poderoso, mas, acima de tudo, é Deus de amor. Ele
não consegue conviver com o sofrimento, por isso vem por amor e com
amor, para ensinar o caminho do amor. Vem para servir e, assim,
restaurar a vida bonita e plena que havia criado. Como não receber com
toda a consideração, carinho e alegria tão ilustre visitante?
No entanto, apesar de ser um discurso predominantemente marcado pela
asserção, em alguns pontos o locutor assume a atitude da incerteza, isto é,
86
utiliza-se de expressões e verbos num discurso da possibilidade. Isso acontece,
principalmente, através de um auxiliar modal ou modalizador. Os trechos em que
o locutor marca assim seu discurso são:
“Deus está morando no meio do seu povo”, este é o recado de Isaías. É
um recado cheio de consolo e esperança, onde a confiança pode ser
renovada. [...] E, justamente por reconhecer nossa fragilidade e nossa
total incapacidade de mudar essa situação, queremos receber com todo
o carinho e consideração aquele que tudo pode renovar, restaurar e
fazer brilhar. (§2)
O locutor não diz que a confiança é renovada e tamm não diz que não é
renovada, mas que ela “pode ser”. Igualmente, no final do parágrafo, “aquele que
tudo pode renovar, restaurar e fazer brilhar. E, logo abaixo, figura novamente
esse auxiliar modal, nos seguintes termos:
está justamente o princípio maior que pode fazer brotar e surgir o
Reino da paz, que todos nós tanto almejamos. Quem de nós não quer
viver num ambiente feliz, equilibrado, tranqüilo, de muita confiança e
cooperação? Que bom se nosso ambiente familiar fosse assim, que bom
se nosso ambiente profissional fosse assim, que bom se todos os
ambientes fossem assim, não é mesmo? Masé que está a beleza e a
radicalidade da mensagem cristã. Tudo pode ser assim, certamente
não de forma plena, mas já com bastante consistência e satisfação. (§4)
O locutor, falando desse modo, projeta coisas para o depois. Mas ele
enfraquece do discurso. Utilizando o auxiliar modal e o verbo no infinitivo, de
modo nenhum imprime a força de um verbo no futuro do indicativo. No entanto,
nessa atitude discursiva, o locutor não impõe o seu discurso ou, simplesmente,
finge não impor.
3.3.3 Sermão 3 (Primeiro Domingo após o Natal)
Este sermão foi escrito para o Primeiro Domingo após o Natal
279
. O texto
279
No Natal se comemora o nascimento de Jesus. De acordo com Goerl, a igreja primitiva,
especialmente no oriente, festejava o dia 6 de janeiro como um dia de duplo significado, isto é,
comemoravam o nascimento e o batismo de Jesus. Mais tarde, ocorreu a separação dos dois
acontecimentos e o nascimento passou a ser comemorado no dia 25 de dezembro. “Presume-se
que se deve o 25 de dezembro à intenção dos crentes de transformar o “dies solis invicti” dos
romanos (o sol começa a vencer o inverno) no dia do verdadeiro sol invicto, que veio para dissipar
com sua luz celeste as trevas do pecado.” O bispo Libério de Roma, em 353, comemorou o Natal
no dia 6 de janeiro, porém no ano seguinte, comemorou-o no dia 35 de dezembro. (GOERL, Otto
A. Púlpito: estudos homiléticos. Porto Alegre: Concórdia, 1967, p. 72) E a tônica do Primeiro
Domingo após o Natal varia de acordo com a Trienal. Ora a circuncisão de Jesus, ora a
apresentação de Jesus no Templo e o cântico de Simeão, e ora este de Lucas com Jesus entre os
mestres da lei.
87
bíblico base proposto é de Lucas 2.41-52
280
. Tem como tema: “aproveitando as
oportunidades”.
3.3.3.1 Apontamentos sobre o Sermão
Inicia-se o sermão com uma saudação carinhosa. “Unidos pelo amor de
Deus” é a temática geral do volume 10 do livro “Portas Abertas”, para o ano de
2007. É deste livro que extraiu-se os sermões para as análises.
Contextualiza-se, brevemente, o período do Ano Eclesiástico, pelo qual está
passando a Igreja. E, em seguida, aborda-se, diretamente, o texto base para o
sermão. Relata-se, em poucas palavras, o episódio da vida de Jesus e a
peregrinação que fazia parte da vida do povo de Israel. Além disso, fala-se da
Páscoa e o que ela representava para este povo. Esse aspecto elucidativo é
muito importante para situar o ouvinte.
Até a metade do sermão, trata-se do texto de Lucas e, implicitamente, faz-se
comentários no §4 sobre o texto de Mateus 6.21 “aquilo ao qual estamos
apegados, aquilo que vai dentro do nosso coração, define muitas vezes o lugar
em que costumamos estar”, que aparece novamente no §8.
Outros textos bíblicos (João 3.16 e Mateus 6.33) tamm estão presentes,
explicitamente, neste sermão, além do texto de Lucas. O que procura-se enfatizar
é aquilo que deve ser colocado em primeiro lugar, para aproveitar as
oportunidades. Mas isto somente percebe-se depois da segunda leitura.
Basicamente, este sermão trata do texto de Lucas, destacando que Jesus
aproveitou a oportunidade para estar no Templo junto com os mestres da lei. Esta
280
Esta perícope forma um bloco narrativo completo. Isto é, ela tem um inicio, uma tensão ou
conflito e a resolução do conflito. Diferentes são as perícopes das cartas pastorais, falta-lhe esse
enredo simples. No caso das cartas é preciso vê-las como um todo para encontrar a sua tensão.
Veja o texto. Todos os anos os pais de Jesus iam a Jerusalém pra a Festa da Páscoa. Quando
Jesus tinha doze anos, eles foram à Festa, conforme o seu costume. Depois que a Festa acabou,
eles começaram a viagem de volta para casa. Mas Jesus tinha ficado em Jerusalém, e os seus
pais não sabiam disso. Eles pensavam que ele estivesse no grupo de pessoas que vinha voltando
e por isso viajaram o dia todo. Então começaram a procurá-lo. Três dias depois encontraram o
menino num dos pátios do Templo, sentado no meio dos mestres da Lei, ouvindo-os e fazendo
perguntas a eles. Todos os que o ouviam estavam muito admirados com a sua inteligência e com
as respostas que dava. Quando os pais viram o menino, também ficam admirados. E a sua mãe
lhe disse: Meu filho, por que foi que você fez isso conosco? O seu pai e eu estávamos muito
aflitos procurando você. Jesus respondeu: Por que vocês estavam me procurando? Não sabiam
que eu devia estar na casa do meu Pai? Mas eles não entenderam o que ele disse. Então Jesus
voltou com os seus pais para Nazaré e continuava a ser obediente a eles. E sua mãe guardava
tudo isso no coração. Conforme crescia, Jesus ia crescendo também em sabedoria, e tanto Deus
como as pessoas gostavam cada vez mais dele.” (Lucas 2.41-52)
88
é a primeira parte. A segunda, por sua vez, trata de como “nós” estamos
aproveitando as oportunidades que Deus concede hoje em dia.
Fica claro que o tema, especificamente, passa a figurar no sermão somente
no §6 com uma pergunta: “Como nós aproveitamos as oportunidades que Deus
nos concede hoje em nossas vidas?” Este questionamento liga-se ao que foi
exposto até esta pergunta, porque, no final do §5, comenta-se que Jesus
“aproveitou a oportunidade de estar na casa do pai”.
Algumas ponderações sobre a presença de terminologia. Este sermão é
curto, porém alguns termos saltam aos olhos na leitura. Os termos são
explicados. Figuram no sermão: Verbo Eterno encarnado” (§4), “Ofício Profético,
Sumo Sacerdotal e Real” e “Grande Profeta” (§5).
Cabe salientar o comentário do Padre Vieira sobre a matéria a ser tratada no
sermão. Ele diz que o sermão deve conter uma matéria, que é preciso dividi-la
e explicá-la em todos os seus detalhes. Lutero também dizia que, quando subia
ao púlpito, tratava somente de uma coisa.
Agostinho também argumenta sobre a importância se tratar de um
assunto, mas variando as expressões. A citação a seguir consta no primeiro
capítulo, mas é importante trazê-la outra vez:
Quem fala deve tomar o maior cuidado de vir em ajuda de quem se cala.
Ordinariamente, o povo na sua avidez de entender costuma dar
demonstração, por seus movimentos, de que compreendeu. Até que
assim manifestem, é preciso voltar ao assunto, variando as expressões
de múltiplas maneiras
281
.
Talvez, seria necessário perguntar: quais as ligações do tema aproveitando
as oportunidades” com o episódio de Jesus junto aos mestres da lei, com os “três
ofícios” (§5), com mais importante”, com “maior tesouro” e com “em primeiro
lugar o Reino de Deus” (§7)? Além disso, a conclusão não retoma o texto-base
abordado no início, e exorta aos ouvintes a aproveitar as oportunidades para estar
na Igreja e testemunhar Jesus às pessoas, no trabalho, na família, na escola, etc.
Novamente, como no primeiro sermão analisado, a participação nos cultos e
sacramentos entram na pauta: aproveitar as oportunidades de “estar na „Casa do
Pai‟, onde Palavra e sacramentos (Batismo e Santa Ceia) são ministrados”.
Sobre as matérias a serem abordadas num sermão, o Padre Vieira, diz que
281
AGOSTINHO, 2002, p. 231.
89
de tomar o pregador uma matéria, de defini-la, para que se
conheça, de dividi-la, para que se distinga; de prová-la com a
Escritura, há de declará-la com razão; há de confir-la com o exemplo,
há de amplificá-la com as causas, com os efeitos, com as circunstâncias,
com as conveniências que se o de seguir, com os inconvenientes que
se devem evitar.
282
Por fim, apenas uma observação sobre a presença de um “viera” (§4), que é
um pretérito mais-que-perfeito, tempo verbal não comum na linguagem cotidiana.
3.3.3.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade
O locutor chama seus ouvintes de “amigos no Salvador Jesus”. Assim ele
inicia seu sermão. No §9, porém, refere-se aos ouvintes como “estimados
presentes”. Apesar de usar o “nós” em todo o sermão, estas duas expressões
amigos e estimados presentes transmitem mais polidez do que proximidade. De
modo distinto ocorre nos outros sermões analisados, pois usam-se palavras
como: irmãos, amados, etc.
Neste sermão, diferentemente dos primeiros, o locutor não trata da situão
em que ele mesmo e sua comunidade vivem. Não problema nenhum
aparentemente. A única coisa que importa é aproveitar as oportunidades. Os
momentos em que aparece a primeira pessoa do plural são os seguintes: “ainda
vivemos o clima festivo do Natal” (§2); “Aquilo ao qual estamos apegados,
aquilo que vai dentro de nosso coração, define muitas vezes o lugar em que
costumamos estar(§4); “como nós aproveitamos as oportunidades que Deus
nos concede hoje em nossas vidas?” (§6); e o mais significativo, quanto à
relação entre locutor e alocutário, é o §8.
Dentro em breve estaremos iniciando um novo ano. Certamente
teremos muitas oportunidades pela frente. Onde estiver o nosso
tesouro, estará também o nosso coração (Mt 6.21). Dentre as
oportunidades que se nos apresentarão no novo ano, precisamos estar
cientes do que é o “mais importante” e qual o “maior tesouro”, aquilo que
mais vale a pena para nós. Jesus diz no evangelho de Mateus 6.33:
“Portanto, ponham em primeiro lugar na sua vida o Reino de Deus e
aquilo que Deus quer, e ele lhes dará todas essas coisas. O “todas
essas coisasrefere-se às necessidades diárias para a vida de cada um
de nós, como a comida, bebida, roupas e tudo o que necessitamos
para a nossa vida. Tudo isso vem ao natural para aqueles que colocam
Deus em primeiro lugar em suas vidas. (§8)
Tudo isso está caracterizado pela primeira pessoa do plural, indicando que o
282
VIEIRA, 2006, p. 40.
90
“nós” inclui o locutor e aqueles que o estão ouvindo. Cabe ao “nós” aproveitar as
oportunidades de testemunhar. Aproveitemos tamm as oportunidades de
“testemunhar” de Jesus e do seu amor às pessoas que encontrarmos pelos
lugares por onde passarmos.”(§9)
Outro fator interessante é que os outros é que vivem desesperados,
desnorteados. São muitas as pessoas que pelo mundo a fora vivem
desesperadas, sem esperança alguma e completamente desnorteadas, muitas
delas acreditando em falsos mestres e falsas mensagens (§9). Ora, para
esse locutor, estes problemas não assolam internamente a sua comunidade.
O tempo presente é predominante neste sermão. Trata-se de um sermão
curto. Mesmo assim, giram em torno de 26 empregos do presente do indicativo. É
bastante comum também o recurso ao passado. Este enfraquece a
argumentação. Por outro lado, ao relatar, o locutor utiliza-se do presente e isso
imprime força argumentativa em alguns parágrafos, como este:
No texto do evangelho de hoje, Jesus, já com doze anos de idade, vai a
Jerusalém para a festa da Páscoa com os seus pais. Tal peregrinação
fazia parte da vida do povo de Deus do Antigo Testamento, lembrando a
maravilhosa libertação da escravidão vivida pelo povo no Egito. A festa
durava vários dias. Ao término deles, José, Maria e demais pessoas
voltam para Nazaré da Galiléia. Jesus permanece em Jerusalém sem
que eles o saibam. Os pais sentem a sua falta. Ao cabo de três dias, o
encontram no templo em Jerusalém, conversando com os mestres da
Lei. Jesus, questionado por Maria, responde: “Por que vocês estavam
me procurando? Não sabiam que eu devia estar na casa do meu Pai?”
(Lucas 2.49) (§3)
Contudo, isso parece não acontecer aleatoriamente e sem um cuidado
regular. Este sermão, da forma como está escrito, assemelha-se à linguagem
corriqueira, em que não o devido cuidado quanto ao uso dos tempos verbais.
Tamm é possível observar que o modo indicativo predomina. Esse aspecto
reforça o dado de que grande parte deste sermão é marcado pela asserção, isso
quer dizer que trata-se de um discurso marcado pela certeza. Como ocorre no
trecho a seguir:
Dentro em breve estaremos iniciando um novo ano. Certamente
teremos muitas oportunidades pela frente. Onde estiver o nosso
tesouro, esta tamm o nosso coração (Mt 6.21). Dentre as
oportunidades que se nos apresentarão no novo ano, precisamos estar
cientes do que é o “mais importante” e qual o “maior tesouro”, aquilo que
mais vale a pena para nós. 8)
Apesar de o futuro indicar uma possibilidade, pois não se conhece, ele
91
demonstra, tomado no indicativo, um discurso igualmente marcado pela certeza.
O locutor está certo disso, porque reforça o que está dizendo com um
“certamente” e um precisamos”. Logo, figura a necessidade. É curioso também
observar que, mesmo sendo um sermão curto em relação aos outros, pouco
ocorreu o uso do verbo ser, característica principal, no presente do indicativo, do
discurso da asserção.
Por outro lado, tamm é marcante o convite ou a exortação, principalmente,
quando o locutor aproxima-se do final do sermão. Momento em que chama a
atenção dos ouvintes com a expressão: “Estimados presentes!” 9). Seu uso na
primeira pessoa do plural não é tão forte quanto seu uso na segunda pessoa.
Estimados presentes! Aproveitemos bem as oportunidades que nos
sobrevirão no ano prestes a iniciar. Principalmente em estar na “Casa do
Pai”, onde Palavra e sacramentos (Batismo e Santa Ceia) são
ministrados. Aproveitemos também as oportunidades de “testemunhar”
de Jesus e do seu amor às pessoas que encontrarmos pelos lugares por
onde passarmos. Quem sabe na família, no trabalho, na escola, no ponto
de ônibus, numa fila qualquer, etc. (§9)
Em alguns sermões, ainda observa-se o imperativo através do “tu”. Mas,
agora, é mais corrente a utilização da forma imperativa por meio do “você” que
conjuga-se de modo diferente. Talvez, a chamada aos “estimados presentes”
exigisse a continuação de um discurso em segunda pessoa. Com o procedimento
seguido, pela primeira pessoa do plural, o locutor enfraquece o seu dizer. um
apelo, mas não tão incisivo.
3.3.4 Sermão 4 (Epifania)
Este sermão foi escrito para o período da Epifania
283
. Propõe-se como texto-
base Mateus 2.1-12
284
. Tem o seguinte tema: “seja a luz do mundo.”
283
A Epifania é celebrada no dia 6 de janeiro, 12 dias após a festa de Natal. O verbete provém do
grego “epipháneia” e quer dizer, na literatura profana: manifestação, aparecimento; superfície;
glória, dignidade; vinda dos deuses com o propósito de ajudar. No Novo Testamento, porém,
designa a manifestação de Jesus em glória por ocasião da primeira vinda (obra da salvação) e da
segunda vinda (manifestação final, juízo). A festa da Epifania começa na Igreja Oriental, onde
Clemente de Alexandria (150-217) registra o festejo do dia 6 de janeiro como data comemorativa
do nascimento de Jesus. Aos poucos, o Oriente passou a comemorar o nascimento de Jesus no
dia 25 de dezembro. O sermão mais antigo sobre Epifania é de Hipólito (nascido por volta de 160)
e trata do batismo de Jesus. A Reforma conservou o costume e as perícopes (Is 60.1-6 e Mt 2.1-
12) da Igreja Ocidental. (GOERL, Otto A. Púlpito: estudos homiléticos. Volume 2. Porto Alegre:
Concórdia, 1980, p. 9-10)
284
Esta perícope é uma narrativa completa. Tem o início com o nascimento, tem o impasse ou a
tensão com a preocupação de Herodes e seu pedido aos magos e tem a solução quando estes
92
3.3.4.1 Apontamentos sobre o Sermão
O sermão inicia-se por uma introdução que contém um relato sobre os
“descobrimentos”. Dedica-se um parágrafo para falar do período da Epifania.
Outro trata dos textos do dia e da temática da manifestação para, então, falar do
que propõe-se no tema. Três palavras ou três idéias figuram neste pequeno
sermão: “movimento”, “manifestação” e “luz”. Cada uma delas por si daria um
sermão. A palavra luz aparece em Isaías, mas o texto base é Mateus. Neste,
manifestação e “movimento”. E o sermão termina com um convite ao ouvinte para
que ele seja a luz do mundo.
Na introdução, comenta-se sobre a Idade Média. É muito breve a alusão,
pois mais de um minio de história é vertido em quatro linhas. Não parece ser
adequado, porque o que se narra no §2 diz respeito a outro período, e este não é
mencionado, que é a época dos descobrimentos, da invenção da imprensa, da
Reforma, por exemplo.
Falta, entretanto, a transição do §2 para o §3. Simplesmente sai da época
dos descobrimentos para dizer que “Epifania é algo sensacional” (icio do §3). É
claro que o restante dele trata, implicitamente, do que foi expresso nos dois
primeiros. Mas a amarração, através de repetições, poderia ser um bom recurso a
ser utilizado neste caso, pois o sermão é bastante curto.
Da passagem do §5 para o §6, a transição poderia ser da seguinte forma;
magos encontram a Jesus e voltam, avisados em sonho, por outro caminho. Trata-se de um texto
muito bonito e revelador da manifestação de Deus em Jesus. Veja o texto. “Jesus nasceu na
cidade de Belém, na região da Judéia, quando Herodes era rei da terra de Israel. Nesse tempo
alguns homens que estudavam as estrelas vieram do Oriente e chegaram a Jerusalém. Eles
perguntaram: Onde está o menino que nasceu para ser rei dos Judeus? Nós vimos a estrela
dele no Oriente e viemos adorá-lo. Quando o rei Herodes soube disso, ficou muito preocupado, e
todo o povo de Jerusalém também ficou. Então Herodes reuniu os chefes dos sacerdotes e os
mestres da Lei e perguntou onde devia nascer o Messias. Eles responderam: Na cidade de
Belém, na região da Judéia, pois o profeta escreveu o seguinte: “Você, Belém, da terra de Judá,
de modo nenhum é a menor entre as principais cidades de Judá, pois de você sairá o líder que
guiao meu povo de Israel.” Então Herodes chamou os visitantes do Oriente para uma reunião
secreta e perguntou qual o tempo exato em que a estrela havia aparecido; e eles disseram.
Depois os mandou a Belém com a seguinte ordem: Vão e procurem informações bem certas
sobre o menino. E, quando o encontrarem, me avisem, para eu também ir adorá-lo. Depois de
receberem a ordem do rei, os visitantes foram embora. No caminho viram a estrela, a mesma que
tinham visto no Oriente. Ela foi adiante deles e parou acima do lugar onde o menino estava.
Quando viram a estrela, eles ficaram muito alegres e felizes. Entraram na casa e encontraram o
menino com Maria, a sua mãe. Então se ajoelharam diante dele e o adoraram. Depois abriram os
seus cofres e lhe ofereceram presentes: ouro, incenso e mirra. E num sonho Deus os avisou que
não voltassem para falar com Herodes. Por isso voltaram para a sua terra por outro caminho.”
(Mateus 2.1-12)
93
“Assim como o apóstolo Paulo anunciou o evangelho a outro povo, você tamm
pode anunciar. Seja você...”
Um bom exemplo de conexão acontece na passagem do §6 para o §7. Veja-
se o final de um e o início do outro:
(§6) A lâmpada passa a brilhar, iluminar o ambiente, revelar o que há em
volta. Com sua ação, a lâmpada permite que as pessoas vejam, se
protejam, possam agir. (§7) Que você seja assim. Receba poder,
iluminação, força, perdão, amor, vida e vida eterna de Deus.
Relevante é a aluo feita sobre a temática das leituras do dia. Aparece
desse modo: “nos textos lidos hoje percebemos muita movimentação”.
Mencionam-se o Salmo, Isaías, o Evangelho e a Epístola, mas de cada um se
resgata um trecho para mostrar essa movimentação. Isso tamm é um modo de
dar unidade ao culto. Ou, pelo menos, dar unidade às leituras. Pois, o sermão não
está dissociado do culto, antes é uma parte dele.
Neste sermão, não se tem medo de usar a segunda pessoa. Talvez, seja
relevante lembrar uma citação feita no primeiro capítulo:
Não temas usar o pronome pessoal „tu‟. [...] tenho certeza de que é
necessário nunca omitir interpelação direta... Se não houver ao menos
um único ponto em que possas dizer „tu‟ não fizeste um sermão, mas um
ensaio ou uma conferência.
285
Por fim, é preciso dizer que os dois parágrafos introdutórios ficaram no ar. A
conclusão, que é um convite ou uma exortação, não retoma o que foi tratado no
início do sermão. Cabe, justamente aqui, conselho, trazido por Blackwood, que foi
mencionado no primeiro capítulo: “Certa vez alguém perguntou a O. Henry, qual o
segredo para escrever um conto. „É simples‟, respondeu com um sorriso, „basta
pensar no fim, e construir a história que conduza a ele.‟”
286
3.3.4.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade
Curiosamente, neste sermão, quase não figura a primeira pessoa do plural
“nós”. Apenas uma vez com o “percebemos” no parágrafo 5. Até o terceiro
parágrafo o sermão é construído em terceira pessoa. Esta é, por excelência,
plural, isto é, inclui tanto o “eu”, o “tu” e o “ele”. Por outro lado, é excludente
quando descreve-se algo ou se afirma algo que o “eu” ou o “tu” não se
285
FARMER apud BLACKWOOD, 1981, p. 183.
286
BLACKWOOD, 1981, p. 46.
94
enquadram naquela descrição.
Epifania é manifestação! Deus se manifesta, se apresenta, se revela, se
desnuda, apresenta sua intimidade diante dos olhos das pessoas. Quem
vê, sente, ouve, experimenta e aplica Deus ao seu viver, é alguém que
descobre a realidade do acolhimento maior. Esse alguém recebe e vive
o perdão procedente da cruz de Jesus Cristo. Quem percebe Deus,
percebe que vida além dessa vida. Percebe que a vida do além é
eterna. Percebe que no dia do Juízo Final os justos, além de
ressuscitarem corporalmente, não entrarão em julgamento. Todos que,
pela Fé, aceitam essas verdades sublimes, se alegram, festejam,
rejubilam e vibram intensamente. (§3)
Não somente o “quem” e o alguém”, mas toda a construção desse §3 está
na terceira pessoa. Aquele que percebe estas coisas alegra-se, festeja, rejubila e
vibra. O alocutário pode pensar se faz parte desse grupo ou não. Esse recurso de
argumentação também foi utilizado por Jesus, principalmente no Sermão do
Monte. Ele disse assim:
Vocês ouviram o que foi dito: “não cometa adultério.” Mas eu lhes digo:
quem olhar para uma mulher e desejar possuí-la já cometeu adultério no
seu coração. (Mateus 5.27-28)
No entanto, apesar da metade do sermão ser construído em terceira pessoa,
o restante está construído, preferencialmente, com a segunda pessoa do singular
“você”. O locutor fala diretamente e individualmente com o seu alocutário.
Deus, ao se manifestar, se expõe diante dos seus olhos. Deus também
quer ser exposto diante de todos os seres humanos. Deus quer que
você seja instrumento dele, para levar o nome de Jesus a todos.
Realidades que são descobertas e aceitas põem as pessoas em
movimento. (§4)
Que você, a partir de hoje, seja semelhante lâmpada. (§6)
Que você seja assim. Receba poder, iluminação, força, perdão, amor,
vida e vida eterna de Deus. E então que você não fique parado. Lance
luz de Deus sobre os outros. Seja você mais que a lâmpada. A lâmpada
não tem pernas para se deslocar, mas você tem pernas, sim. (§7)
Além disso, percebe-se a atitude da intimação
287
assumida pelo locutor em
relação ao alocutário de que este seja uma luz para o mundo, quando, nos
últimos três parágrafos, ele expressa-se da seguinte forma: “que você, a partir de
hoje, seja...” (§6); “que você seja assim.” (§7); e “que Deus se manifeste, através
de você...” (§8).
287
Conforme o tópico 2.3.3 sobre a Teoria da Enunciação, no segundo capítulo, a intimação
exprime um apelo, um convite, um chamado, etc.
95
Contudo, neste sermão, cabe exclusivamente ao “você” fazer. A ação cabe
ao alocutário. O locutor não se inclui nesta missão de ser luz para as outras
pessoas. Essa maneira de construção força ao discurso. O imperativo (“seja”,
“lance”, “transmita”, “diga”, “vá” §7) é anunciado aquele a quem o locutor dirige-
se. O locutor assume um lugar que o distingue do seu alocutário. No sentido de
que “eu” digo e “você” faz.
Com exceção dos primeiros dois parágrafos, que ensejam um breve relato e,
por isso, são tratados no passado, o restante do sermão é construído,
predominantemente, no presente do indicativo. Em alguns momentos do texto,
articula-se com o presente do subjuntivo. São aproximadamente 50 casos em que
o presente do indicativo é utilizado. Isso indica um texto marcado pela
assertividade. Tamm aparecem “é necessário” e “com certeza” que reforçam
esse lugar assumido pelo locutor. A seguir, apresenta-se o parágrafo mais
significativo na predominância do texto no presente.
Epifania é algo sensacional. Algo que vai colocar em movimento todos
que percebem a realidade da Epifania. Epifania é manifestação! Deus
se manifesta, se apresenta, se revela, se desnuda, apresenta sua
intimidade diante dos olhos das pessoas. Quem , sente, ouve,
experimenta e aplica Deus ao seu viver, é alguém que descobre a
realidade do acolhimento maior. Esse alguém recebe e vive o perdão
procedente da cruz de Jesus Cristo. Quem percebe Deus, percebe que
vida além dessa vida. Percebe que a vida do além é eterna. Percebe
que no dia do Juízo Final os justos, além de ressuscitarem
corporalmente, não entrarão em julgamento. Todos que, pela Fé,
aceitam essas verdades sublimes, se alegram, festejam, rejubilam e
vibram intensamente. (§3)
O locutor assume uma posição singularmente imperativa no §7. Essa forma
imperativa também caracteriza o discurso “autoritário”, isto é, o discurso da
certeza. Porém, o locutor comete um “deslize” no final deste parágrafo, pois ele
diz assim: “você pode falar com a boca, com gestos, a maneira de ser e de viver.”
De modo sutil, instaura-se o discurso da possibilidade, da incerteza neste sermão
predominantemente assertivo.
3.3.5 Sermão 5 (2º Domingo após Epifania)
Este sermão foi escrito para o período de Epifania
288
, especialmente para o
288
Ver nota 292 que versa sobre este período.
96
segundo domingo. Das leituras do dia, Lucas 4.14-21
289
é o texto-base para o
sermão. O tema é “a pregação do Messias vai ao encontro de todos”.
3.3.5.1 Apontamentos sobre o Sermão
O sermão tem sua estrutura a partir de duas frases. Elas são colocadas em
itálico para melhor visualização das partes. À primeira parte está vinculada a
seguinte frase: Jesus volta para a Galiléia onde começa o seu ministério” (§2). E
a segunda parte versa sobre o Espírito do Senhor o unge e também nos unge
para o serviço” (§11).
Alguns parágrafos o curtos. Nem são parágrafos propriamente ditos. Às
vezes, uma frase é colocada como um. Alguns são formados por três ou quatro
frases. Esse é um aspecto constante em, praticamente, todos os sermões. De
acordo com Blackwood, um bom parágrafo para o sermão deveria ter mais ou
menos 100 palavras. Uma proposição clara e vigorosa no início. E o restante das
palavras explanaria essa proposição. Começaria com clareza e terminaria com
força
290
. Além disso, seria importante que o parágrafo tivesse unidade de
conteúdo e de forma (gramatical).
Neste sermão, explana-se o texto de Lucas. Explica-se, inicialmente, o que é
uma sinagoga e como era o procedimento do culto naquele contexto. Tamm se
explica o fato de Jesus ter sido convidado para ler e, depois, explicar o texto que
havia lido. Isso poderia ser um único parágrafo, ao invés das divisões, conforme o
texto, em §4, §5 e §6.
Ainda, talvez, por ser um pouco mais longo, existe uma preocupação em
explicar termos, tais como: “ungido (§12), “ano da Graça” ou “Ano Aceitável do
Senhor” (§17). Além disso, procura-se fazer pontes, trançando-se paralelos entre
289
A demarcação desta perícope é intrigante, pois ela termina, podemos dizer, no momento do
impasse ou da tensão. Jesus acabou de ler, sentou-se e todos olhavam para ele sem desviar os
olhos. É claro que a mensagem central esnas palavras de Isaías que Jesus leu e na explicação
que ela dá nos versículos seguintes. Eis o texto: “Jesus voltou para a região da Galiléia, e o poder
do Espírito Santo estava com ele. As notícias a respeito dele se espalhavam por toda aquela
região. Ele ensinava nas sinagogas e era elogiado por todos. Jesus foi para a cidade de Nazaré,
onde havia crescido. No sábado, conforme o seu costume, foi até a sinagoga. Ali ele se levantou
pra ler as Escrituras Sagradas, e lhe deram o livro do profeta Isaías. Ele abriu o livro e encontrou o
lugar onde está escrito assim: “O Senhor me deu o seu Espírito. Ele me escolheu para levar boas
notícias aos pobres e me enviou para anunciar a liberdade aos presos, dar vista aos cegos,
libertar os que estão sendo oprimidos e anunciar que chegou o tempo em que o Senhor salvará o
seu povo.” Jesus fechou o livro, entregou-o para o ajudante da sinagoga e sentou-se. Todas as
pessoas ali presentes olhavam para Jesus sem desviar os olhos.” (Lucas 4.14-21)
290
BLACKWOOD, 1981, p. 197.
97
o que acontecia no tempo de Jesus e como isso se aproxima do nosso contexto.
Isso acontece quando se repete expressões como: “o Espírito do Senhor tamm
nos unge” (§11), “ainda hoje” (§16), “o Espírito do Senhor ainda hoje” (§18), etc.
No entanto, deveria haver um cuidado com as transições de um parágrafo
para outro ou mesmo quando se muda de assunto. Por exemplo, o “aqui” inicial
do §8 é estranho, pois refere-se ao texto bíblico e o à Igreja, da qual se estava
tratando no parágrafo anterior.
Utiliza-se de coisas, de necessidades concretas e até de elementos da
natureza do ser humano para explicar o que é a boa nova. Segue o trecho:
um emprego que chegou na hora do desespero para o desempregado. É
uma cesta de alimento que chegou na casa de quem está sofrendo
privações. É uma palavra amiga que chega na hora certa. É a Palavra de
Deus que chega ao faminto e sedento de Deus. É a vida vencendo a
morte. É mande ressurreição. É esperança nascendo nos corações
dos desesperançados. É sol nascendo, dissipando a escuridão, trazendo
a luz e alegria a nossa vida. (§12)
Quanto à linguagem, assim como em outros sermões, não há um cuidado
com a utilização das traduções. Quando a citação é direta, usa-se a NTLH, mas
quando a referência é indireta, o vocabulário é da ARA. Isso observa-se em todo
o sermão. Pode até não ser um problema, porém se a leitura é da NTLH e as
citações diretas também, as alusões indiretas, igualmente, deveriam ser.
Procedendo assim haveria unidade lingüística.
Neste sermão, especificamente, algumas das coisas que foram explicadas
dizem respeito à tradução da ARA ungido”, “Ano Aceitável do Senhor” , coisas
que na NTLH estão de modo simples. Ao utilizar-se a ARA, existe a possibilidade
de reproduzir-se seu modo de expressão. Isso pode ser observado em diferentes
momentos do texto, como por exemplo: “assentou-se para expor o que acabara
de ler” (§5), “salvação messiânica” (§10), “Espírito do Senhor” (§11), “boas novas
(§12), “libertar os cativos” (§13), Ano Aceitável do Senhor” (§16), “Bem-
aventurados” (§21), etc.
Observou-se, no primeiro capítulo
291
, que a comunicação ocorre onde os
significados são correspondentes entre o emissor e o destinatário. Se os pastores
sentem dificuldades com a linguagem e o vocabulário das traduções mais antigas,
o que pensar da congregação como um todo. O pastor dedicou, em tese, 4 a 5
291
Conforme tópico 1.4.4 sobre o “texto-sermônico”, do primeiro capítulo.
98
anos de sua vida num curso que tem como objeto de estudo a Escritura Sagrada.
As pessoas da comunidade não têm essa bagagem acadêmica teológica. Elas,
porém, lêem a Bíblia, na sua simplicidade, para o seu dia-a-dia. Para o pastor,
além de ser consolo para si mesmo, é ferramenta de trabalho.
Por fim, este sermão parece estar voltado para um contexto urbano, isso de
acordo com as referências feitas durante o texto. Figuram assuntos como: férias,
desemprego, cesta de alimento, etc. A sua simples aplicação em outro contexto
pode ser problemática.
3.3.5.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade
O locutor constrói seu texto ora com a primeira pessoa do plural (“nós”) ora
com a segunda do singular (“você”) no que se refere à relação do “eu” x “tu”. Mas,
quando utiliza o “nós”, o texto oscila entre o aspecto negativo e positivo. Aquilo
que não é bom e o que é bom.
Do mesmo modo, ainda hoje, a igreja, esta casa é local onde o povo se
reúne para ouvir Jesus falar. Pelo menos deveria ser este o grande
objetivo de estarmos aqui neste final de semana. Se olharmos a nossa
volta percebemos que muitos poderiam estar aqui hoje. Mas como
normalmente é um período de férias, as pessoas de um modo geral
tamm tiram férias do seu culto e adoração a Deus. (§7)
Observa-se uma inquietação do locutor, pois, ao falar do costume de outrora
e do que hoje acontece, ele expressa que a Igreja “é o local onde o povo se reúne
para ouvir Jesus. Pelo menos este deveria ser o grande objetivo de estarmos aqui
hoje”. O problema são os que não estão presentes.
E bem sabemos o que fizeram com Jesus em Nazaré. O expulsaram, o
colocaram fora da cidade, o levaram para um monte, para o jogarem
abaixo, mas ele passou entre eles e se retirou. Vemos em nosso texto
tamm que: (§10) O Espírito do Senhor o unge e também nos unge
para o serviço. (§11)
Tanto o locutor quanto o alocutário sabem o que os nazarenos fizeram com
Jesus. Também ambos são ungidos para o serviço. Este aspecto da unção para o
serviço é reforçado em outro parágrafo do sermão e, novamente, o “nós” é
utilizado.
O Espírito do Senhor ainda hoje continua nos ungindo para levar as
boas novas aos sedentos da Palavra de Deus. O texto nos mostra dois
tipos de pessoa. Aqueles que acham que Jesus está falando bonito, mas
que ele é um petulante em dizer que as Escrituras estão se cumprindo
nele. Estes se sentem irados e querem matar Jesus. Não são receptivos
às boas novas do Evangelho. (§18)
99
Há outro grupo a quem Jesus diz ser ungido para ministrar. São aqueles
que não têm uma vida digna, a rado povo, o resto. Essas pessoas
recebem a boa notícia e se abrem à novidade do Evangelho. (§19)
Como pode ser observado, o locutor utiliza o recurso da terceira pessoa e
atualiza o texto bíblico argumentando no presente. Começa com o nós” desse
modo: “o texto nos mostra dois tipos de pessoa”. E articula com a terceira pessoa
para mostrar os tipos de pessoas: aquelas que acham que Jesus é petulante e
aquelas que recebem a boa notícia.
Significativo, tamm, é o seguinte parágrafo:
A Palavra de Deus tem que entrar no ouvido e chegar ao coração.
Precisa queimar dentro de nós e nos inquietar para vivermos
diferentes. Dura coisa é quando nós nos tornamos indiferentes à
Palavra de Deus. Quando ela não queima dentro de nós. Quando ela
não provoca mais mudanças. Nos tornamos insensíveis à voz de
Deus. Às vezes até achamos que Deus não fala a nós e que o seu
Santo Espírito não está conosco, mas Deus não nos abandona. É a
nossa indiferença que não permite que ele fale aos nossos corações.
(§20)
Novamente, o diagnóstico e o consolo são feitos com o recurso da primeira
pessoa do plural (“nós”), incluindo o “eu(locutor) e o “tu” (alocutário). Pois, “nós”
nos tornamos indiferentes e, mesmo pensando assim, Deus não nos abandona.
Contudo, o recurso da segunda pessoa do singular. O locutor tamm
fala diretamente através do “você”.
Imagine você preso num quarto tendo o que comer e onde fazer suas
necessidades, mas não tendo a liberdade de sair quando quiser. O ser
humano não nasceu para viver preso.(§13)
Ele também vem dar vista aos cegos. Imagine vocês viverem sem
enxergar. Viverem dependendo dos outros. É muito triste. (§14)
Um recurso de aproximação do locutor em face do alocutário. Não se trata
de um imperativo, mas o esclarecimento de uma situação de prisão.
Este sermão é um pouco mais extenso. Por isso, o cômputo é maior. Os
verbos no presente do indicativo giram em torno de 90 vezes. Mesmo no relato,
que em princípio é composto no passado, o locutor argumenta utilizando o
presente. Os primeiros parágrafos dão exemplo desse aspecto.
Jesus volta para a Galiléia onde começa o seu ministério. (§2)
Após sua tentação, Jesus agora se dirige para a Galiléia e vai,
conforme o texto, no poder do Espírito. Em seguida, vai à cidade onde
se criou, onde viveu boa parte de sua vida Jesus está agora em
Nazaré. Vai para lá com o objetivo de levar a sua mensagem de vida e
100
salvação também para os seus. (§3)
O discurso é dinâmico e aproxima-se muito da linguagem cotidiana,
especialmente pela repetição do “vai” e do “agora” no trecho acima. Não o
agora se repete em todo o sermão, mas também é constante a repetição de “aqui”
e “ainda hoje”.
Observa-se, igualmente, a constância do presente do indicativo no parágrafo
a seguir:
Quem é que mais necessita das obas novas? Alguém que não tem
esperança, que está levando uma vida miserável em pecado, que não
saída para a sua vida. O Evangelho, a boa notícia, é tudo o que a
pessoa precisa para dar, por assim dizer, um novo rumo em sua vida, e
isso acontece quando a palavra o leva ao arrependimento e o conduz
ao caminho do perdão, vida e salvação. E isso se complementa
concretamente na vida do necessitado de muitas maneiras como um
emprego que chegou na hora do desespero para o desempregado. É
uma cesta de alimento que chegou na casa de quem está sofrendo
privações. É uma palavra amiga que chega na hora certa. É a Palavra
de Deus que chega ao faminto e sedento de Deus. É a vida vencendo a
morte. É manhã de ressurreição. É esperança nascendo nos corações
dos desesperançados. É sol nascendo, dissipando a escuridão, trazendo
a luz e alegria a nossa vida. (§12)
Esses usos do verbo no presente do indicativo refoam o discurso marcado
pela assertividade. O uso do verbo auxiliar “dever” e “precisar”. Além disso, o uso
do advérbio de negação (“não”) é um recurso utilizado pelo locutor. Esse advérbio
força a essa assertividade. O locutor diz: “não vê”, “não tem, não é”, “não
queima”, o desafia”, “não provoca”, não fala”, “não permite”, “Deus não nos
abandona”, etc. Isso pode ser visto no seguinte parágrafo:
A Palavra de Deus tem que entrar no ouvido e chegar ao coração.
Precisa queimar dentro de nós e nos inquietar para vivermos diferentes.
Dura coisa é quando nós nos tornamos indiferentes à Palavra de Deus.
Quando ela não queima dentro de nós. Quando ela não provoca
mais mudanças. Nos tornamos insensíveis à voz de Deus. Às vezes até
achamos que Deus não fala a s e que o seu Santo Espírito não está
conosco, mas Deus não nos abandona. É a nossa indiferença que não
permite que ele fale aos nossos corações. (§20)
Entretanto, mesmo sendo um discurso predominantemente assertivo,
aparece o discurso da possibilidade em dois momentos, são eles: “se olharmos a
nossa volta percebemos que muitos poderiam estar aqui hoje” (§7); e “estas
pessoas poderiam ser comparadas a crianças que, em determinado período de
suas vidas, em certa idade, passam pela fase do Por quê? Como? (§9). No caso
da primeira frase o locutor poderia ter utilizado “não estão”, pois a negação foi um
101
recurso bastante utilizado por ele no decorrer do sermão.
3.3.6 Sermão 6 (5º Domingo após Epifania)
Este sermão foi escrito para o período da Epifania
292
. O texto-base é Lucas
5.1-11
293
. E tem como proposta de tema “Jesus nos convida a pescar.”
3.3.6.1 Apontamentos sobre o Sermão
O sermão não apresenta uma estrutura fixa com divisões. Desenrola-se de
modo circular. Ora fala da pesca e da crise pela qual passaram os pescadores e
de seu desânimo, ora da crise e do desânimo que se abatem sobre as pessoas a
quem o sermão se dirige.
Um sermão, de acordo com Moraes, deveria ser organizado logicamente.
Para ele, a lógica torna as afirmações claras e objetivas, possibilitando ao
pregador demonstrar racionalmente a possibilidade de execução de seus
argumentos. Diz, ainda, que seguir um sistema de divisões em tópicos completa
esse trabalho, ajudando o pregador a melhor usar uma argumentação lógica no
púlpito.
294
Este sermão inicia falando de pesca frustrada como “uma experiência bem
desagradável” (§1) para introduzir o assunto e cativar a atenção do ouvinte. E,
292
Ver nota 292 sobre o período.
293
Esta perícope em termos narrativos está completa. Tem seus aspectos introdutórios com Jesus
e a multidão e o fim de uma noite frustrada de trabalho. Tem a tensão quando Jesus pede que
Pedro jogue as redes novamente na água. No entanto, o clímax desta perícope, na minha leitura,
não é a grande pesca, que é muitas vezes enfatizada, mas, antes, é quando Pedro de joelhos diz
a Jesus: “Senhor, afaste-se de mim, pois sou pecador!” E Jesus diz para ele não ter medo. Eis o
texto a seguir: Certo dia Jesus estava na praia do lago da Galiléia, e a multidão se apertava em
volta dele para ouvir a mensagem de Deus. Ele viu dois barcos no lago, perto da praia. Os
pescadores tinham saído deles e estavam lavando as redes. Jesus entrou num dos barcos, o de
Simão, e pediu que ele o afastasse um pouco da praia. Então sentou-se e começou a ensinar a
multidão. Quando acabou de falar, Jesus disse a Simão: “Leve o barco para um lugar onde o
lago é bem fundo. E então você e os seus companheiros joguem as redes para pescar.” Simão
respondeu: “Mestre, nós trabalhamos a noite toda e não pescamos nada. Mas, que o senhor
está mandando jogar as redes, eu vou obedecer.” Quando eles jogaram as redes na água,
pescaram tanto peixe, que as redes estavam se rebentando. Então fizeram um sinal para os
companheiros que estavam no outro barco a fim de que viessem aju-los. Eles foram e
encheram os dois barcos com tanto peixe, que os barcos quase afundaram. Quando Simão Pedro
viu o que havia acontecido, ajoelhou-se diante de Jesus e disse: “Senhor, afaste-se de mim, pois
eu sou um pecador!” Simão e os outros que estavam com ele ficaram admirados com a
quantidade de peixes que haviam apanhado. Tiago e João, filhos de Zebedeu, que eram
companheiros de Simão, também ficaram muito admirados. Então Jesus disse a Simão: “Não
tenha medo! De agora em diante você vai pescar gente.” Eles arrastaram os barcos para a praia,
deixaram tudo e seguiram Jesus. (Lucas 5.1-11)
294
MORAES, 2000, p. 130.
102
com o convite de Jesus a Pedro (“não temas, doravante serás pescador de
homens”), formulam-se duas perguntas diretas:
Você está se preocupando em pescar para o Reino de Deus? Nossa
congregação está preocupada em pescar pessoas? A época é propícia,
pessoas estão chorando, implorando pelo consolo e conforto que apenas
nós, cristãos, temos a oferecer. (§14)
A partir d, o discurso é mais direto no que diz respeito aos ouvintes. Em
relação a estes, procura-se fazer as pontes entre o texto lido e o contexto
presente. Exemplo disso é o §3 que diz assim:
Naquele momento, estavam com o mesmo desânimo de quem é atingido
pelo desemprego, pela diminuição do salário, pela falta de condições de
trabalho, seja na cidade, seja na agricultura, pelas brigas em família
por qualquer outro tipo de “crise”. (§3)
Procura-se, desse modo, fazer as conexões do sentimento de desânimo,
pelo qual estavam passando os personagens do texto de Lucas, com os possíveis
ouvintes ou leitores que também estejam desanimados.
Há, tamm, uma busca por aproximação entre o que produziu o sermão e o
que o lerá ou o ouvirá. As expressões seguintes revelam essa idéia: “Vejamos
como Pedro, Tiago e João reagiram...” (§6); Não sabemos se...” (§8); “Talvez a
crise tenha se abatido sobre você...” (§15); “Não vamos deixar que...” (§16); etc.
Seria apropriado, neste sermão, incluir elementos de transição em alguns
momentos. Um exemplo que necessitaria é: “E ele (o diabo) fica satisfeito
quando consegue derrubar alguém da antes ele não larga da sua presa.
Jesus Cristo tamm se aproxima das pessoas nos momentos de tribulação” (§5).
Neste caso, a segunda frase poderia ser escrita assim: “Mas Jesus Cristo, ao
contrário do Diabo, aproxima-se para...”
Não só neste sermão, mas tamm em outros figuram palavras entre aspas.
O que se quer com isso? Por exemplo, “crise” 8) e “Messias” (§7) estão entre
aspas. O ouvinte não se preocupará com estas coisas, pois não está lendo o
texto. O leitor, sim, pode perguntar-se: “Por que o pastor que escreveu este
sermão colocou palavras entre aspas?
Algo que chama a atenção é a menção sobre “sucesso profissional” no §11.
O sermão não está tratando do sucesso. Ao levar-se em conta todo o texto e a
proporção como os assuntos foram tratados, o tema deveria ser outro do que o
que foi proposto.
103
Até mesmo a história contada no §15, que versa sobre o desânimo,
precisaria ser observada com cuidado. Cabe a pergunta se essa história é
apropriada para este sermão. Mantendo-se a mesma, talvez fosse melhor uma
inversão, isto é, começar o §15 com a história e depois colocar no final as duas
primeiras frases deste parágrafo.
A seqüência dos parágrafos §17 e §18 ressalta ligação entre a narração
bíblica e o contexto presente. “Podemos seguir o exemplo dos primeiros cristão”
(§17).
Ainda, alguns comentários sobre questões de linguagem. Usa-se ora tua” e
ora “sua”. Um pretérito mais-que-perfeito também é registrado “fora” (§8). Além
disso, a citação direta do texto de Lucas é feita da ARA: “Não temas, doravante
serás pescador de homens” (§12). Esta versão pode até ser mais bonita e até,
talvez, mais impactante do que a da NTLH, porém o padrão em termos de
linguagem fica prejudicado.
3.3.6.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade
Neste sermão, o locutor oscila na forma de construção do texto. Ora ele
assume o discurso em primeira pessoa do singular, eu”; ora utiliza a primeira
pessoa do plural (“nós”); e ora fala diretamente ao alocutário, utilizando o “você
ou os pronomes “te” e “teu”.
Inicia o sermão de forma carinhosa e acolhedora, chamando seus
alocutários de “prezados irmãos e irmãs em Cristo” (§1). Neste parágrafo, institui
o “tu” de maneira explícita: “Pior se a pesca for a tua profissão e não um passa
tempo” 1). Além disso, nos dois parágrafos seguintes aparece o alocutário de
modo expresso:
Deus não vai dar muita importância se o teu esporte favorito é vôlei ou
futebol, se você veste roupas de cor verde, cinza ou roxa. No Juízo
Final, Deus vai te cobrar como e quantas vezes você foi pescar pessoas
para o Reino dele. (§13)
Você está se preocupando em pescar para o Reino de Deus? Nossa
congregação está preocupada em pescar pessoas? A época é propícia,
pessoas estão chorando, implorando pelo consolo e conforto que apenas
nós, cristãos, temos a oferecer. (§14)
O locutor e o alocutário são distintos em muitos momentos do sermão. A
cobrança é direta ao alocutário. Deus vai cobrar de “você”, não de “nós”. O locutor
(“eu”) está isento dessa cobrança. Em outro momento, vislumbra-se tamm essa
104
diferença, mostra que é freqüente a busca pelo pastor quando os membros da
comunidade passam por problemas, isto é, buscam o locutor.
Uma situação que se repete com mais freqüência em nossos dias é o
desabafo dos membros com o pastor: um estrabalhando meio
ano sem receber salário, outro foi demitido e não consegue outro
trabalho, outro recebeu a proposta de diminuição de salário. (§4)
Por outro lado, o discurso através do “nós” não é tão marcante. O locutor
utiliza esse modo para explicar e estabelecer pontes: “nossos dias” (§4),
“conseguiu para s morrendo na cruz” (§5), “vejamos como Pedro, Tiago e João
reagiram(§6), “soam para nós como palavras de salvação” (§9). Também parece
que o locutor quer animar a congregação para o trabalho da pesca e, nesse caso,
utiliza-se do discurso na primeira pessoa do plural:
Não vamos deixar que o desânimo tome conta da pesca do Reino de
Deus. Vamos nos encher da mesma admiração e fé que os pescadores
tiveram por Jesus. Vamos trabalhar duro nas horas boas de pesca. A
pesca de pessoas para o Reino de Deus depende da bênção de Jesus e
do trabalho árduo dos pescadores nós. E nas horas difíceis, quando o
mar não está muito para peixe, vamos orar a Jesus para que ele
abençoe nossa pescaria ele pode repetir aquela pesca maravilhosa.
(§16)
Neste parágrafo, locutor e alocutário estão juntos. No entanto, nos últimos
parágrafos do sermão o locutor assume um discurso de distinção novamente.
Prezados irmãos e irmãs no Senhor Jesus, convido vocês a sentirem
admiração e fé diante da maravilha que é ter Jesus com nosso Salvador,
que fez maravilhas em nossa vida. Convido vocês a trabalharem
arduamente nesta pescaria de pessoas para o Reino de Deus. A nossa
cidade oferece um ambiente extremamente propício para receber o
nosso testemunho e para que ocorra uma pesca maravilhosa. (§18)
Trata-se de um parágrafo em que aparecem as três pessoas. O locutor
convida o alocutário para testemunhar na “nossa” cidade.
Neste sermão, passado e presente se intercalam, isto é, há uma certa
igualdade no seu uso. O locutor marca, porém, o seu discurso no campo da
assertividade. Giram em torno de 50 os usos do presente de indicativo. Mesmo
privilegiando o passado, em alguns momentos relata o texto bíblico utilizando o
presente do indicativo.
Jesus convida os pescadores para voltarem ao trabalho e Pedro um
voto de confiança a Jesus. Ele joga as redes onde Jesus manda e o
resultado é fantástico: é preciso outro barco para dar conta de levar as
redes cheias de peixes para a margem, e os barcos quase afundam.
(§10)
105
Esse modo de atualização do texto bíblico força ao discurso, no sentido
de que não se trata apenas de um evento passado, mas um evento presente na
vida dos cristãos. Não na narrativa, mas também em quase todos os
parágrafos deste sermão esse recurso do verbo no presente acontece, reforçando
a predominância do discurso assertivo. Para exemplificar, mais dois parágrafos.
(§5) O pior de tudo é que o diabo usa estes momentos para tentar os
fiéis e abalar a fé no Salvador Jesus. E ele fica satisfeito quando
consegue derrubar alguém da fé antes ele não larga a sua presa.
Jesus Cristo também se aproxima das pessoas nos momentos de
tribulação. Ele oferece o perdão de pecados que ele conseguiu para nós
morrendo na cruz e o conforto de saber que, confiando nele, vamos
passar a eternidade no céu, onde não haverá problema algum.
(§19) Jesus está conosco. Ele o seu Reino de maneira maravilhosa e
traz felicidade e conforto nesta vida e na vida eterna aos que confiam
nele. Amém.
Todavia, o discurso da possibilidade figura em três parágrafos. O primeiro se
referindo ao que aconteceu com os personagens do texto bíblico
provavelmente não deram muito crédito para as palavras de Jesus, pois eles o
conheciam como um homem comum, um marceneiro (§7). Por outro lado, os
outros dois estão ligados diretamente com o alocutário.
Talvez a crise tenha se abatido sobre você e você esteja trazendo este
desânimo para sua pesca no Reino de Deus. O diabo é esperto em fazer
isto. (§15)
Podemos seguir o exemplo dos primeiros cristãos e ver que nossos
irmãos na são companheiros de pesca que podem nos ajudar na
tarefa de levar pessoas a Jesus. A união e a harmonia entre os fiéis
estão presentes numa Igreja empenhada na missão que Deus lhes deu.
(§17)
O locutor assume a possibilidade. Existe a possibilidade de a crise ter
abatido o alocutário e nós” (“eue “tu”) “podemos seguir o exemplo dos primeiros
cristãos”, e nossos irmãos “podem nos ajudar”.
3.3.7 Sermão 7 (Quaresma)
Este sermão foi escrito para a Quaresma
295
. O texto bíblico que serve de
295
A Quaresma é o período de quarenta dias que se inicia na quarta-feira de cinzas e vai aa
Páscoa. Originalmente, era o período de preparação para o Batismo, feito na Igreja antiga por
ocasião da Páscoa. A Quaresma, período de penitência e preparação, faz parte do ciclo da
Páscoa. No período da Quaresma, estão contidos 5 domingos, seguidos pela Semana Santa.
(ZIMMER; SCHOROEDER; ZEMKE, 1988, p. 47)
106
base é de Lucas 4.1-13
296
. E o tema proposto é “unidos pelo amor no caminho da
cruz”.
3.3.7.1 Apontamentos sobre o Sermão
Inicia-se o sermão com um relato muito comum no dia-a-dia das famílias
as mudanças de uma cidade para outra. Esse relato serve de ilustração para o
sermão, percorrendo quase todo o texto. Mas somente a partir do §9, metade do
sermão, que o texto bíblico base passa a ser trabalhado e pode-se sentir o cheiro
do tema.
O questionamento feito no §5 é bem oportuno. Estabelece-se a relação do
relato com a realidade da vida dos ouvintes. Diz assim: você já reparou como
esta história é bem parecida com a nossa vida em geral...” (§5). Esse modo de
expressar-se é típico da linguagem simples.
Uma preocupação que pode ser levantada é se o relato da menina perdida
tem relação com o “estar perdido” em função das tentações. A tentativa de
explorar o relato para chegar ao texto do Evangelho de Lucas e tratar da tentação
de Jesus é um caminho longo a ser percorrido.
Talvez, o tema poderia ser: “o que fazer quando se sentir perdido?” Mesmo
assim, neste caso, é preciso se lembrar de um conselho do Padre Vieira
levantar uma só caça e segui-la.
Como o objetivo destes sermões é servir de auxílio para cultos de leitura,
dirigidos por leigos, quando falta de pastores, quem sabe não seria mais
adequado permanecer no texto bíblico base, procurando explorá-lo.
296
A perícope da narrativa da tentação de Jesus é composta de três partes: Jesus cheio do
Espírito, após seu batismo, é levado para o deserto; é tentado pelo diabo; e deixado pelo Diabo. O
impasse ou a tensão, que se revela no diálogo entre Jesus e o Diabo, é o aspecto mais relevante
desta perícope. Eis o texto: Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do rio Jordão e foi levado pelo
Espírito ao deserto. Ali ele foi tentado pelo Diabo durante quarenta dias. Nesse tempo todo ele não
comeu nada e depois sentiu fome. Então o Diabo lhe disse: “Se você é Filho de Deus, mande
que esta pedra vire pão.” Jesus respondeu: “As Escrituras Sagradas afirmam que o ser humano
não vive só de pão.” Aí o Diabo levou Jesus para o alto, mostrou-lhe num instante todos os reinos
do mundo e disse: “Eu lhe darei todo este poder e toda esta riqueza, pois tudo isto me foi dado,
e posso dar a quem eu quiser. Isto tudo será seu se você se ajoelhar diante de mim e me adorar.”
Jesus respondeu: “As Escrituras Sagradas afirmam: Adore o Senhor, seu Deus, e sirva somente
a ele.” Depois o Diabo o levou a Jerusalém e o colocou na parte mais alta do Templo e disse:
“Se você é o Filho de Deus, jogue-se daqui, pois as Escrituras Sagradas afirmam: Deus mandará
que os seus anjos cuidem de você. Eles vão segurá-lo com as suas mãos, para que nem mesmo
os seus pés sejam feridos nas pedras. Então Jesus respondeu: – “As Escrituras Sagradas
afirmam: Não ponha à prova o Senhor, seu Deus.” Quando o Diabo acabou de tentar Jesus de
todas as maneiras, foi embora por algum tempo. (Lucas 4.1-13)
107
Cabe salientar, ainda, que procurou-se amarrar a história da introdução com
o assunto das tentações nos últimos parágrafos. Trata-se de um elemento
importante a ser observado ao se ter como foco o ouvinte. Os assuntos precisam
ter uma certa unidade.
Neste sermão, outros textos bíblicos são trazidos. Faz-se alusão aos
seguintes: 2 Timóteo 3.16; Deuteronômio 26.8-9; João 14.6; 1 João 1.7; Romanos
10.11 e 10.9; Salmo 119.105; e Filipenses 4.7. A única observação a ser feita
quanto a isso é o cuidado com a linguagem. Pois, também aqui o uma
padronização das citações. Ora a citação é da NTLH “Quem crer nele não fica
desiludido” (§12) , ora é da ARA “Ela é inspirada por Deus e útil para o ensino,
para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça (§10). Ainda,
sobre a linguagem, observam-se modos de expressão que poderia ser escritos de
outra maneira, por exemplo: “deparamo-nos” (§6) poderia ser “nós nos
deparamos”, que é um modo mais simples.
“Jesus carregou as nossas iniqüidades” (§11). Iniqüidade é uma palavra
bastante utilizada, mas seque aqueles que falam, aqueles que lêem e aqueles
que ouvem conhecem o seu real sentido. Não esta palavra, porém tantas
outras (pecado, mundo, carne, justificação, santificação, redenção, ressurreição,
imputar, deplorar, natureza humana, etc.) que os pastores estão acostumados a
repetir e repetir nos estudos, nos cultos, na prédica. Esse repertório é de fato
comum? Isso daria uma boa pesquisa de campo, que buscasse saber o que as
pessoas entendem sobre um determinado número de palavras. Mas o pastor
pode observar nas visitas e nas conversas qual é o vocabulário de sua
comunidade. Certamente, pode ter níveis diferentes, porém optará pelo mais
simples. Pois, com este, atingirá a todos.
3.3.7.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade
O assunto desse sermão é: estar perdido e onde ou como encontrar o
caminho. um relato de uma menina perdida numa nova cidade que encontra
sua casa porque tinha como referência a bela cruz que tinha a Igreja perto da sua
casa. Esse relato figura em todo o texto e serve de comparação em relação à vida
do locutor e do alocutário.
Você reparou como esta história é bem parecida com a nossa vida
em geral e especialmente quanto a nossa fé? Veja bem, é comum em
108
nossa vida estarmos perdidos em meio a nossas aflições e afazeres
diários. Às vezes tamm estamos perdidos em nossa vida pessoal,
familiar e profissional. E precisamos uma parada para avaliar, reavaliar e
recomeçar a vida. (§5)
O locutor chama a atenção dos alocutários de que a sua situação não é
muito diferente. Antes o relato estava sendo feito em terceira pessoa e no
passado. Agora a enunciação se configura de forma diferente. Um “tu é
postulado e colocado em igualdade com o “eu”. A marca é o uso constante da
primeira pessoa plural. Significativo, neste ponto do sermão, é o fato de que os
parceiros do diálogo estão na mesma situação: é comum em nossa vida
estarmos perdidos”.
Em relação a nossa vida de fé é a mesma coisa. Muitas vezes nos
apegamos a tantas coisas que já não sabemos ao certo o que é o mais
importante. Deparamo-nos com tantos caminhos que ficamos
confusos ou até mesmo nos distraímos com as vitrines de falsos
ensinos, perdendo-nos pelo caminho. Ou ainda procuramos seguir mais
de um caminho ao mesmo tempo, como se isto fosse possível. Não é.
(§6)
Na enunciação o locutor procura fazer do alocutário um participante do
diálogo. O assunto geral estar perdido continua. Às vezes, ficam confusos e
se distraem ou procuram seguir mais de um caminho. No entanto, há um sinal de
certeza na atitude do locutor, pois no final desse trecho figura um não é”. O “eu”
quer uma confirmação do “tu”. Este precisa assentir, mas o discordar do
discurso. Caso pudesse discordar a expressão poderia ser “é ou não é”.
Precisamos acima de tudo uma referência que nos possibilite vencer as
tentações e chegar à certeza da vida eterna, nosso único consolo nas
adversidades. (§8)
Ambos os parceiros transitam no mesmo campo estar perdido
297
. Os
protagonistas do sermão precisam de referência para vencer as tentações e
chegar à vida eterna.
Estamos entrando na Quaresma. Um tempo de parar para reordenar
nossa vida em todos os sentidos. Também e principalmente a nossa vida
de fé, cercada de tentações. Jesus no evangelho nos uma pista de
como vencê-las. (§9)
O locutor tamm localiza o seu discurso no tempo que é o da Quaresma.
Há uma concomitância de tempos: o tempo litúrgico, isto é, o tempo específico em
297
Não usamos o substantivo perdição porque é completamente diferente de estar perdido. E a
perdiçãoo é o sentido do texto.
109
que e encontra toda a Igreja, e o tempo do discurso ou da enunciação. A
Quaresma é esse tempo de estar pedido, em busca de caminho, vencendo as
tentações. encontramos o lar celeste quando trilhamos o caminho da cruz.
Jesus sabia disso” (§11).
Chega-se, então, a um condicional: Só... quando”. Essa condição está,
ainda, no âmbito dos parceiros. Tanto o locutor quanto o alocutário se encontram
na mesma condição: “encontramos” e “trilhamos”.
se chega ao céu passando pela cruz, a cruz de Cristo. E as
Escrituras Sagradas afirmam categoricamente: “Quem crer nele não
ficará desiludido.” (Romanos 10.11) Porque Jesus venceu até a cruz em
nosso lugar. (§12)
Esse trecho marca um momento de transição. No trecho anterior, o
condicional era para ambos, para o “eu” e para o “tu”. Agora se apresenta o
condicional não mais na primeira pessoa, mas na terceira pessoa, isto é, de um
discurso de não pessoa para introduzir uma mudança de atitude do locutor em
seu discurso. Os trechos abaixo explicitam isso:
Você está se sentindo perdido em sua vida diária e de fé? (§13)
Pare! Ouça nesta Quaresma as Escrituras falarem a respeito do acesso
ao Pai que Jesus Cristo abriu para você através do caminho da Cruz. A
Bíblia e as leituras da Quaresma lhe chamam para olhar para o alto
buscando a cruz. Assim como a menina, que pela cruz encontrou a
segurança do seu lar, tamm você se sentirá seguro nos braços do
Pai Celeste. Na Palavra você encontrará Jesus vencendo as tentações,
diabo, pecado e morte, em seu lugar. Ela será lâmpada para os teus pés
e luz para os teus caminhos (Salmo 119.105). (§14)
O discurso assume um caráter diretivo. Os parceiros assumem papéis
distintos na enunciação. O eu” é protagonista da enunciação, do discurso. O tu”
não é protagonista agora. Precisa ouvir, precisa se dar conta. Além dos
imperativos que assumem um aspecto de ordem, convite ou exortação, o
futuro que também assume esse sentido de imperativo.
As características igualitárias já não figuram mais. O “eu” chama o “tu
imperativamente para ouvir. Para ficar alerta e ouvir. A parceria assumiu um
caráter diferenciado daquilo que vinha acontecendo durante o sermão.
Ela foi auxiliada por alguém capaz de a encaminhar ao caminho da cruz.
Saiba que você e sua família o exatamente a seta que indica o
caminho da cruz de Jesus para muitos hoje em dia. (§15)
Depois de um discurso de parceria, pode-se dizer, entre locutor e alocutário,
110
a alocução toma um novo rumo. Os protagonistas estão em funções distintas. O
locutor assumiu o papel da enunciação e o alocutário passa a assumir o papel da
ação no dia-a-dia. “Você (alocutário) é a “seta que indica o caminho da cruz para
muitos. O tempo do trecho está no presente, indicando a iminência da ação.
Neste sermão oscilação quanto ao uso do verbo no tempo passado e
presente. No entanto, em sua maioria, os verbos estão conjugados no modo
indicativo. Este modo indica certeza. Os verbos no presente do indicativo figuram
em torno de 30 vezes.
Ela é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a
correção, para a educação na justiça diz Paulo a Timóteo (2 Timóteo
3.16). Ela nos mostra Jesus vencendo o próprio Mal. Porque nela Deus
revela seu plano, caminho e cuidado com o seu povo. (§10)
Outros elementos que mostram ser um sermão marcado pela assertividade
são: precisamos” (§5, §7, §8), (§11, §12), “categoricamente” 12), único
(§8, §11), etc.
Outro aspecto bastante recorrente neste sermão é o futuro. Tempo que pode
substituir o imperativo, pois o cumprimento de tal ordem é uma possibilidade.
Esse cumprimento e a ocorrência estão entregues ao tempo. O seu valor deriva
do alcance temporal. Da mesma forma, seu valor de verdade não pode expressar
uma realidade factual. Por isso, o discurso religioso está constantemente marcado
pelo presente.
Assim como a menina, que pela cruz encontrou a segurança do seu lar,
tamm você se sentirá seguro nos braços do Pai Celeste. Na Palavra
você encontrará Jesus vencendo as tentações, diabo, pecado e morte,
em seu lugar. (§14)
Acontece, por vezes, no final dos sermões o uso do futuro, isso ocorre para
indicar uma ação que “deverá” ser feita ou realizada pelos alocutários,
substituindo o imperativo.
Contudo, aparece tamm o discurso da possibilidade. Observa-se isso em:
podemos dizer que este estar perdido no dia-a-dia e na são as tentações que
enfrentamos constantemente. Elas podem até nos desviar da fé e do caminho da
salvação (§7). Mas é somente neste parágrafo que o verbo auxiliar “poder” é
utilizado.
111
3.3.8 Sermão 8 (6º Domingo após Pentecostes)
Este sermão foi escrito para o período de Pentecostes
298
. O texto-base é de
Lucas 9.51-62
299
. Tem como tema “seguir a Jesus – o desafio do discípulo”.
3.3.8.1 Apontamentos sobre o Sermão
Nos primeiros parágrafos, busca-se com uma ilustração traçar diferenças
entre o amor e a obrigação. Então, resgata-se o texto do Evangelho do dia,
explicando-o em partes. Entretanto, somente a segunda parte da perícope é
trabalhada no sermão. Apenas os três breves diálogos de Jesus com os seus
seguidores são abordados.
O §1 é uma saudação que está entre aspas. Este breve período busca
captar a benevolência ou a atenção do ouvinte. Às vezes, utiliza-se para dizer em
nome de que se está falando. Entretanto, como está em destaque (“...”), pode ser
uma citação. Se é de alguém, seria bom colocar o seu autor.
Algo que chama a atenção no inicio é o seguinte trecho:
Seguir a Jesus em amor é o desafio do discípulo fiel. Esta é a
exigência, porém não a obrigação. Pois o amor e a obrigação o
podem se encontrar, não andam juntos, se auto-excluem. (§2)
Logo depois, figura uma ilustração para mostrar a diferença. Mas, daí, a
298
O período Pentecostes inicia no timo domingo depois da Páscoa ou quinquagésimo dia após
a Páscoa, no qual se comemora a descida do Espírito Santo sobre os apóstolos. Este é o ciclo ou
tempo da Igreja. Pentecostes é a festa do Espírito Santo. (ZIMMER; SCHOROEDER; ZEMKE,
1988, p. 48)
299
Nesta perícope, Jesus está a caminho de Jerusalém. Há aspectos iniciais que contextualizam a
situação nos primeiros versículos. No entanto, mais de um momento de impasse. O primeiro é
o fato de Jesus não ser recebido num povoado de Samaria e a repreensão a Tiago e João. Depois
três impasses em três breves diálogos com homens que seguiam a Jesus. E a perícope termina
sem dar detalhes sobre esses personagens. Um novo parágrafo começa dizendo somente:
“depois disso...” Eis o texto deste sermão: Como estava chegando o tempo de Jesus ir para o céu,
ele resolveu ir para Jerusalém. Então mandou que alguns mensageiros fossem na frente. No
caminho eles entraram em um povoado da região de Samaria a fim de prepararem um lugar pra
ele. Mas os moradores dali não quiseram receber Jesus porque viram que ele estava indo para
Jerusalém. Quando seus discípulos Tiago e João viram isso, disseram: “O senhor quer que a
gente mande descer fogo do céu para acabar com estas pessoas?” Porém Jesus, virando-se para
eles, os repreendeu. Então ele e os seus discípulos foram para outro povoado. Quando Jesus e os
discípulos iam pelo caminho, um homem disse a Jesus: “Eu estou pronto a seguir o senhor para
qualquer lugar onde o senhor for.” Então Jesus disse: “As raposas tem as suas covas, e os
pássaros, os seus ninhos. Mas o Filho do Homem não tem onde descansar.” ele disse para
outro homem: “Venha comigo.” Mas ele respondeu: “Senhor, primeiro deixe que eu volte e
sepulte o meu pai. Jesus disse: “Deixe que os mortos sepultem os seus mortos. Mas você vá e
anuncie o Reino de Deus.” Outro home disse: “Eu seguirei o senhor, mas primeiro deixe que eu
vá me despedir da minha família.” Jesus respondeu: – “Quem começa a arar a terra e olha pra trás
não serve para o Reino de Deus.” (Lucas 9.51-62)
112
diferença é entre o “amor” e a “obrigação”. Entende-se, assim, o amor como
sinônimo de exigência. Entretanto, a distinção entre exigência e obrigação parece
ser muito tênue. A palavra exigência aparece aqui no início e somente volta a
aparecer no final. Talvez, fosse melhor manter a oposição entre o amor e a
obrigação durante todo o texto. Ou, quem sabe, fosse trabalhada com mais
cuidado a distinção entre exigência e obrigação.
Na ilustração do final do §2, o marido diz: “Por nada. Não fiz mais do que
minha obrigação!” E se fosse da seguinte forma: “Não fiz mais do me é exigido!”
Em termos gramaticais e semânticos, existem diferenças. Todavia, o sermão é
lido ou falado de modo rápido no culto para que se possam perceber essas
diferenças.
O dicionário Aurélio, de Língua Portuguesa, traz os verbetes exigência e
obrigação do seguinte modo: Exigência ato de exigir, pedido urgente ou
impertinente, e o verbo exigir tem as seguintes acepções reclamar em função
de direito legítimo ou suposto, ordenar, intimar, prescrever, determinar. Obrigação
imposição, preceito; dever, encargo, compromisso; benefício, favor; ofício,
emprego, profissão; tarefa, serviço, mister; escritura pela qual alguém se obriga a
pagamento de uma dívida, ao cumprimento de um contrato, etc.; e o verbo obrigar
tem as seguintes acepções pôr na obrigação, no dever, colocar como
imposição; mover, impelir, incitar; forçar, constranger, compelir; sujeitar, expor,
oferecer, etc.
Quem sabe, este não seria um caso em que o pastor poderia telefonar para
alguém da comunidade e perguntar se sabe diferenciar determinados termos, ou,
numa visita, conversar sobre o assunto e no sermão esmiuçar as dúvidas em
todos os detalhes.
um jogo de palavras que se fez no §3. “Amor e obrigação são como luz e
trevas. Onde um está o outro necessariamente desaparece”. Deste parágrafo
para o seguinte, seria apropriado algum elemento de transição, do tipo: “Em
função da diferença entre o amor e a obrigação, vamos observar o que aconteceu
com Jesus e seus seguidores”. Daí, sim, “no evangelho de hoje...” (§4).
De acordo com a disposição do texto, a frase final do §4 deveria estar no
início do §5. Pois, a repetição “seguir a Jesus requer...” ocorre no início do §7 e
do §12, como se fossem, provavelmente, divisões do sermão. Quando se está
113
falando, não tem problema, mas a organização do texto é importante.
Neste sermão, a intertextualidade ocorre, expressamente, de dois modos.
Citam-se dois textos bíblicos (Romanos 5.5 e Galatas 5.17), mas utilizou-se a
NTLH e não a ARA, como ocorreu com os sermões anteriores. Tamm o Livro
de Concórdia é citado para conceituação de Igreja (§10) e o livro O preço do
discipulado, mas deste se tira apenas uma frase para dizer o que é graça barata.
Poderia ser um pouco mais abrangente o comentário sobre este livro.
Novamente, como em outros sermões, pregação da palavra e administração
dos sacramentos (§10) figuram neste texto. Por que acontece esta constante
repetição?
Por fim, a ilustração do casamento, trazida no começo do sermão, não foi
retomada. Apenas retoma-se a idéia da exigência no final, dizendo que a
exigência não se cumpre pela obrigação, mas em amor” 13). E se repete, em
forma de bênção, a saudação inicial.
3.3.8.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade
Neste sermão, o locutor ora assume o discurso através da primeira pessoa
do singular (“eu”), ora pela primeira pessoa do plural (“nós”) e ora fala diretamente
ao seu alocutário, através da segunda pessoa do singular.
O “eu” do locutor está presente no início do sermão.
Se me pedissem para descrever Deus em uma palavra, diria: Amor.
Deus é amor! E esse amor tem um preço: O filho de Deus na cruz. [...]
Para ajudar na compreensão reflita comigo: (§2)
O locutor deseja que o alocutário o acompanhe no seu raciocínio. Não
nada de distinto entre o “eu” e o “tu”. Apenas é um modo chamar a atenção para
que o que está dizendo agora precisa ser acompanhado.
Ao tratar do sofrimento, o locutor convida o alocutário a cultivar a esperança
e o faz isso pela primeira pessoa do plural, dizendo:
Aliás, o próprio Cristo conheceu de perto a dor, o sofrimento e a própria
morte, para que, mesmo cercados de perigos e tribulações, cultivemos
a esperança. “Essa esperança não nos deixa decepcionados, pois Deus
derramou o seu amor em nosso coração, por meio do Espírito Santo que
ele nos deu.” (Romanos 5.5) (§5)
Em outro momento, o “nós” é utilizado para chamar a atenção, mas para um
aspecto negativo da vida da Igreja:
114
Aparentemente isso não nos diz respeito. Afinal de contas, nós
fazemos parte da Igreja, não é mesmo? Porém, nem sempre temos
clareza sobre o que é a Igreja. Não faltam imagens distorcidas. Por
exemplo: A Igreja é uma reunião de sócios. Ou: Quanto menos membros
incômodos a Igreja tiver, melhor. Então a solução é limpar o fichário. Ou
ainda: pensam que a finalidade maior da Igreja é prestar serviços aos
seus “associados”. (§8)
Nesse aspecto, estão o locutor e alocutário nas mesmas condições.
Entretanto, quando o desafio é lançado, não é utilizado o “nós” e sim o “tu”. O
locutor fala diretamente ao alocutário.
Já houve quem disse que os filósofos, no passado, se limitaram a
explicar o mundo, quando deviam tê-lo transformado. Isso se aplica em
parte à Igreja: Explicamos a perdição do mundo, acusando o seu
pecado; mas o que fazemos para que o mundo conheça o seu Salvador,
Jesus? Ouça o convite. Aceite o desafio: “Você vá e pregue o Reino de
Deus.” (§10)
O discurso deixa de ser em primeira pessoa do plural (“nós explicamos, mas
o que fazemos”) para ser através da segunda do singular, assumindo a forma
imperativa: você “ouça”, “aceite”, “vá” e “pregue”. Logo depois, novamente se
instaura o discurso com o “nós”. “Deus não faz exigências. Não maiores do que
conseguimos suportar” (§12).
A assertividade é predominante neste sermão. São mais de 50 verbos
conjugados no presente do indicativo. O que indica um sermão construído no
campo da certeza. Além disso, o locutor recorre a expressões como:
“necessariamente” (§3), “certas” (§8), “deve” (§11 e §12), “precisamos” (§12), etc.
No evangelho de hoje, Lucas registra a disposição de alguns em seguir
a Cristo e o convite de Jesus: Segue-me! Venha comigo! E contrasta o
amor e obrigação. “Venha comigo! “Segue-me”, diz Jesus. Mas por
amor, não por obrigação. E este amor é sacrifício, é doação, é
incondicional, é resultado da fé. Seguir a Jesus requer sacrifício! (§4)
Todavia, a imagem bíblica da Igreja é bem outra. “A Igreja é uma
sociedade de fé e do Espírito Santo nos corações(Livro de Concórdia).
A Igreja é reconhecida porque prega a palavra e administra os
sacramentos. A Igreja o os filhos de Deus, que manifestam o amor no
cumprimento dos mandamentos. A Igreja é testemunha do amor
perdoador de Deus em Cristo. A Igreja existe mais em função do mundo
do que de si mesma. 10)
O verbo ser no indicativo presente singular (“é”) reforça o aspecto assertivo
do texto. Não nestes trechos, mas em outros a escolha do locutor recai sobre
verbo ser tanto no singular quanto no plural. Observa-se também o uso dos outros
verbos no presente do indicativo. O locutor argumenta basicamente nesse estilo
115
em todo o sermão.
Neste sermão, o locutor recorre também ao imperativo. E o discurso da
possibilidade, de modo expresso, não figura neste sermão. Apenas o condicional
se me pedissem” (§2), e tamm uma frase que expressa certa incerteza do
locutor: “nem sempre temos certeza sobre o que é Igreja” (§9). Mas esta oração
está inserida em um parágrafo marcadamente assertivo.
3.3.9 Sermão 9 (Pentecostes III)
Este sermão foi escrito para o período de Pentecostes
300
. O texto-base é de
Lucas 11.1-13
301
. Tem como tema “o privilégio de poder falar com o Pai Celeste
por meio da oração.”
3.3.9.1 Apontamentos sobre o Sermão
Este sermão é relativamente curto. O pastor introduz seu discurso falando
em estar conectado que quer dizer “estar ligado na internet” (§1). Depois associa
isso à união com Deus que os cristãos têm através de Cristo. Faz isso explorando
o texto de Colossenses.
Em seguida, o texto do Evangelho é explicado (§3). Após isso, o ouvinte é
intimado ou convidado “a criar o hábito de orar” (§4). Por fim, apresenta-se uma
breve ilustração de um diálogo entre um atleta e seu pastor. E a conclusão é um
300
Ver nota explicativa 308 sobre o período.
301
Esta perícope apresenta um diálogo. um pedido de ensino e uma breve exposição sobre a
oração. A exposição de Jesus traz uma oração, uma ilustração, uma aplicação da ilustração e o
fecho com a mensagem consoladora de que dará o Espírito Santo aos que pedirem. Eis o texto:
Um dia Jesus estava orando num certo lugar. Quando acabou de orar, um de seus discípulos
pediu: “Senhor, nos ensine a orar, com João ensinou os discípulo dele”. Jesus respondeu:
“Quando você orarem, digam: „Pai, que todos reconheçam que o teu nome é santo. Venha o teu
Reino. -nos cada dia o alimento que precisamos. Perdoa os nossos pecados, pois s também
perdoamos todos os que nos ofendem. E não nos deixes que sejamos tentados‟.” Então Jesus
disse aos seus discípulos: “Imaginem que um de vocês vá a casa de um amigo, à meia-noite, e
lhe diga: „Amigo, me empreste três pães. É que um amigo meu acaba de chegar de viagem, e eu
não tenho nada para lhe oferecer.‟ “E imaginem que o amigo responda de dentro: „Não me
amole! A porta está trancada, e eu e os meus filhos estamos deitados. Não posso me levantar
para lhe dar os pães‟.” Jesus disse: “Eu afirmo a vocês que pode ser que ele não se levante
porque é amigo dele, mas certamente se levantará por causa da insistência dele e lhe dará tudo o
que ele precisar. Por isso eu digo: peçam e vocês receberão; procurem e vocês acharão; batam, e
a porta será aberta para vocês. Porque todos aqueles que pedem recebem; aqueles que pedem
recebem; aqueles que procuram acham; e a porta será aberta para quem bate. Por acaso algum
de vocês será capaz de dar uma cobra ao seu filho, quando ele pede um peixe? Ou, se o filho
pedir um ovo, vai lhe dar um escorpião? Vocês, mesmo sendo maus, sabem dar coisas boas aos
seus filhos. Quanto mais o Pai, que está no céu, da o Espírito Santo aos que lhe pedirem!”
(Lucas 11.1-13)
116
convite direto: “Que tal você fazer o pedido dos discípulos a Jesus em sua
primeira oração no dia de hoje: Senhor! Ensina-nos o hábito de orar?‟”(§6)
Primeiramente, destaca-se a tentativa de explorar o tema da relação entre
Deus e as pessoas através do meio de conexão que a internet proporciona. É
válida a iniciativa de inovar os modos de expressar o conteúdo da Palavra de
Deus. No entanto, esse livro de sermões “Portas Abertas” busca atingir todos
os contextos brasileiros e, nesse sentido, seu conteúdo também precisa levar isso
em consideração. A partir disso, é necessário pensar se a maioria das pessoas
sabe o que é Internet
302
. Também se elas sabem o que é uma “sala de bate-
papo”. Dependendo do contexto, é provável que esta ilustração não seja
apropriada.
Desse modo, é importante lembrar que estes sermões estão destituídos de
seu contexto original e aquele que, possivelmente, vier a utili-los precisa estar
ciente disso.
A passagem da conexão da internet para a conexão com Deus (§2 e §3) é
muito breve. Necessitaria de comentários adicionais, assegurando a amarração
entre os assuntos. Tamm, na parte conclusiva, precisaria fazer referência à
internet. Fala-se somente do hábito de orar.
Ocorre uma citação de Lutero sobre a explicação do Pai-Nosso. Nas
comunidades tradicionais da IELB, a grande maioria das pessoas decorou as
partes do Catecismo Menor. E, já que se está falando do orar e do Pai-Nosso, por
que o repetir uma porção maior da explicação para aguçar a memória dos
ouvintes.
Enfim, a ilustração do jovem com o seu pastor (§5) poderia ser uma forma de
expor o conteúdo do sermão com mais precisão. Mas ela é tratada muito
rapidamente. E, logo a seguir, o sermão termina com uma exortação ou convite.
3.3.9.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade
O locutor trata de três formas diferentes seu alocutário. Primeiramente, como
“caro irmão(§1) e segue o texto em terceira pessoa do singular; segundo, como
“caro amigo” (§4) e, ao contrário do primeiro, segue o texto em segunda pessoa
302
Perguntei para minha avó se ela sabia o que era internet e ela me respondeu: “Sei que falam
em internet, mas o sei o que é. Sei que tem no computador.”
117
do singular (“você”); e, terceiro, trata apenas como “você”.
(§1) Caro irmão: Hoje se ouve muito falar estar conectado na internet.
Estar conectado significa estar ligado na internet e poder usar os
recursos que a internet oferece às pessoas.
Caro amigo! O que você está esperando para criar o hábito de orar?
Deus, o nosso Pai celestial, está à espera de seu contato. (§4)
Por que, no segundo caso, quando acontece o questionamento, o é o
mesmo tratamento? Talvez, porque neste parágrafo o locutor dirige-se
diretamente utilizando a segunda pessoa e, além disso, entrará em cena um
discurso imperativo. São tratamentos distintos. De fato, o imperativo é o ponto
forte do §4.
Ele esà espera de seus pedidos. Ele espronto para ouvi-lo e se
alegra muito, quando vo se lembra de agradecer as bênçãos
recebidas diariamente. Se você ainda não tem o bito de orar, comece
hoje. Isto será uma grande bênção para a sua vida. Apresente a ele
suas dificuldades. Peça ajuda a Deus para seus problemas, ore pelos
familiares e amigos. Não esqueça de orar pela sua congregação, seu
pastor e demais líderes. Ore pelo seu país e todas as autoridades. Ore,
inclusive pelos seus inimigos, como Jesus o fez. Seja persistente como
Abraão ao orar por Sodoma. Deus Pai, que é muito generoso, irá
derramar muitas bênçãos sobre sua vida e cada vez mais você sentirá
prazer em falar com seu Pai celestial. (§4)
Ao alocutário, cabe o fazer. O imperativo destina-se ao alocutário. É
significativo, por outro lado, o uso do futuro como promessa de bênçãos aos que
pedirem ou orarem.
É necessário fazer o registro de que, neste sermão, utiliza-se a primeira
pessoa do plural (“nós”) somente uma vez. Nascemos espiritualmente mortos,
isto é, desconectados de Deus. Agora unidos com Deus através do perdão de
Cristo pode-se servir ao nosso Pai celestial” (§2).
Este sermão se constrói fortemente pelo presente do indicativo. Mesmo
sendo um sermão breve, os verbos no presente giram em torno de 35 usos.
É um momento de comunhão de Jesus com o Pai e o Espírito Santo. A
palavra do Pai mostra também o seu amor pelos seres humanos,
porque ele está satisfeito com a obra que o Filho veio realizar no mundo.
no evangelho de hoje, Jesus ensina aos discípulos invocar a Deus
como Pai. A comunhão que Jesus tem com o Pai também pode ter
aquele que crer em Jesus como Salvador enviado por Deus. Isto é um
incentivo para todos os filhos de Deus também seguirem o exemplo do
próprio Cristo e falar com ele através da oração. Afinal, os discípulos
pediram para ensinar-lhes o hábito de orar. Os seres humanos por causa
do pecado procuram colocar Deus a uma grande distância de suas
vidas. Jesus ensina aos discípulos a pensarem em Deus como sendo
118
tamm Pai deles. Um pai terreno é bondoso, segundo Jesus. Muito
mais é o Pai celestial. Lutero percebeu muito bem este pensamento de
Jesus, quando na explicação do Pai-Nosso diz: “Deus quer atrair-nos
carinhosamente.” (§3)
As citações dos eventos da narrativa bíblica, que é passada, são feitas no
presente. Isso, além de dar força ao texto, reforça o aspecto da assertividade,
reforça o discurso da certeza.
Entretanto, neste sermão, mesmo sendo breve, há incidência significativa do
discurso não assertivo, isto é, do discurso da possibilidade, especialmente no uso
do verbo auxiliar pode”. Observa-se, seu uso nos seguintes casos: estar ligado
na internet e poder usar os recursos” (§1);
Agora unidos com Deus através do perdão de Cristo pode-se servir ao
nosso Pai celestial. O filho de Deus pode realmente amar ao seu
próximo sem ter interesses próprios, porque está ligado a Deus através
da fé em Cristo. Estar ligado ao nosso Pai celestial proporciona ao filho
de Deus o privilégio de poder falar com ele através da oração. A oração
é “sala de bate-papo” com Deus (§2);
A comunhão que Jesus tem com o Pai também pode ter aquele que crer
em Jesus como Salvador enviado por Deus. [...] Aqui, pode-se afirmar
que Jesus ensina que Deus é um pai está à espera dos pedidos de seus
filhos 3).
Estas são partes do sermão que tratam da relação de Deus com as pessoas
e da relação do Filho de Deus com as pessoas. Todavia, nestes parágrafos, não
deveria vigorar o discurso da certeza?
3.3.10 Sermão 10 (23º Domingo após Pentecostes)
Este sermão foi escrito para o período de Pentecostes
303
. O texto-base é de
Lucas 18.9-14
304
. O tema proposto é “como nos posicionamos diante de Deus?”
3.3.10.1 Apontamentos sobre o Sermão
No primeiro parágrafo, apresenta-se brevemente o assunto do Evangelho e
303
Ver nota 308 sobre este período.
304
Esta perícope apresenta uma parábola de Jesus. Ele está discutindo com os fariseus e
ensinando seus discípulos. E aqui mostra magnificamente quem é perdoado, quem vai para casa
em paz com Deus. Eis o texto: Jesus também contou esta parábola para os que achavam que
eram muito bons e desprezavam os outros: “Dois homens foram ao Templo para orar. Um era
fariseu, e o outro, cobrador de impostos. O fariseu ficou de pé e orou sozinho, assim: „Ó Deus, eu
te agradeço porque não sou avarento, nem desonesto, nem imoral como as outras pessoas.
Agradeço-te também porque não sou com este cobrador de impostos. Jejuo duas vezes por
semana e te dou a cima parte de tudo o que ganho‟.” “Mas o cobrador de impostos ficou de
longe e nem levantava o rosto para o céu. Batia no peito e dizia: „Ó Deus, tem pena de mim, pois
sou pecador!‟” (Lc 18.9-14)
119
se faz uma pergunta direta: “Como você, caro irmão, se posiciona diante de
Deus?” (§1) Sem rodeios, vai-se diretamente ao texto.
Logo a seguir, explica-se a parábola, sua temática, seus personagens e as
atitudes dos personagens diante de Deus. Traça-se um paralelo entre os dois
exemplos da parábola e a “nossa postura diante de Deus” (§2). Conclui-se
enfatizando o procedimento do cobrador de impostos e que este foi em paz com
Deus para sua casa. Então, com um “se” (§9), elemento de condicionalidade,
chama-se a atenção do ouvinte para que pense na sua situação.
O texto do sermão segue a seqüência da parábola. Procura-se sempre fazer
a ponte entre os dois contextos (bíblico contemporâneo). Talvez, este seja o
sermão mais coerente com a proposta do livro. O texto é bem organizado. A
seqüência é simples e os parágrafos são bem formados. As frases estão
construídas de modo objetivo. E o vocabulário não é incomum.
Pode-se considerar este sermão um bom exemplo de unidade, em que se
trata de uma matéria. Todo o texto gira em torno da temática da parábola. No
§2, contextualiza-se o episódio em que Jesus contrasta as duas diferentes
atitudes. E os parágrafos seguintes (§3 e §4) tratam de cada personagem em
separado. Logo em seguida, o §5 começa com a seguinte frase: “os dois
exemplos são para refletirmos...” Assim, retoma-se o que tinha sido tratado
anteriormente e é feita a ponte com os ouvintes contemporâneos.
Apenas mais um comentário. A palavra publicano” (§2 e §4), que aparece
algumas vezes no sermão e a se explica seu sentido, o é da NTLH, mas da
ARA. Não haveria necessidade de explicá-la se se permanece com a tradução da
NTLH. Cabe salientar, ainda, que esses cobradores de impostos eram pessoas
nativas da comunidade local, isto é, faziam parte da mesma cultura religiosa.
Zaqueu e Mateus são dois exemplos desta classe de pessoas.
3.3.10.2 Locutor: Eu x Tu e Certeza x Possibilidade
O locutor ora utiliza o “nós e ora o “você”. Quando utiliza o “nós”, utiliza-o
para, primeiramente, um discurso explicativo: “como vemos nesta parábola, é um
defeito cil de perceber nos outros, mas que dificilmente percebemos em nós
mesmos.” (§1)
Por outro lado, ao utilizar o “você”, chama o alocutário à reflexão: Como
120
você, caro irmão, se posiciona diante de Deus? Com quais intenções você ora ao
Senhor?(§1). O alocutário precisa refletir sobre suas intenções ao orar.
Em outro parágrafo, o “nós” coloca o locutor e o alocutário no mesmo
patamar.
Os dois exemplos são para refletirmos sobre as nossas atitudes e
posturas diante de Deus. Será que a auto-suficiência do fariseu, muitas
vezes, não faz parte das nossas atitudes? Qual é o jeito de nos
dirigirmos a Deus? Com quais intenções s oramos a Deus? Pode
até ser que em nada nos identifiquemos com a atitude do fariseu. Mas
quando apenas lamentamos os problemas diante de Deus, podemos
estar ignorando o exemplo de humildade do publicano. E teremos
dificuldade de reconhecer nossa dependência de Deus, não daremos
sinal de arrependimento e deixaremos de confiar na misericórdia de
Deus. Um coração não arrependido não está preparado para falar com
Deus. (§5)
Além disso, a condição de pecador também é elemento comum de “nós”:
“cada um de nós, por natureza, é um pecador perdido e condenado, sem direito
à salvação. Deus nos salva por amor. Somos justificados diante de Deus e
salvos, se confiarmos em tudo o que Cristo fez por nós (§6).
Cabe frisar o elemento de condicionalidade presente em dois momentos do
texto. O primeiro, no parágrafo anterior, está na primeira pessoa do plural. O outro
se dirige diretamente ao alocutário: “Se você, caro irmão, confia na misericórdia...”
(§9). Mas não é distinção do fazer, como acontece em outros sermões.
Estabelece, sim, uma condição de que se existe a confiança, se existe fé, o
alocutário está em paz com Deus.
Em boa parte do texto, quando trata-se de relato, o locutor marca o discurso
no passado, é o que acontece quando algo é narrado. Ao fazer referência ao que
acontece com os personagens da parábola contada por Jesus, o locutor utiliza os
verbos no passado. Isso ocorre, especialmente, nos parágrafos 2, 3 e 4.
No entanto, ao aplicar a mensagem, o locutor faz uso do presente do
indicativo. Isso pode ser observado nos parágrafos 1, 5 e 6. Nestes predomina, na
aplicação, o discurso da assertividade. Para exemplificar:
Cada um de nós, por natureza, é um pecador perdido e condenado, sem
direito à salvação. Deus nos salva por amor. Somos justificados diante
de Deus e salvos, se confiarmos em tudo o que Cristo fez por nós. É
somente nele que devemos depositar nossa confiança. Como a nossa
salvação depende inteiramente de Deus, ninguém tem direito de se
gloriar diante de Deus, pois, ainda que façamos muitas boas obras, o
são elas que nos salvam. A nossa salvação está apenas em Jesus
Cristo, que morreu para nos salvar. (§6)
121
Salientam-se, ainda, outros elementos do discurso da certeza, tais como:
“somente”, “devemos”, “inteiramente” e “apenas”. Elementos estes que reforçam
esta característica da assertividade.
Figura, também, em um único momento, o discurso da possibilidade:
Pode até ser que em nada nos identifiquemos com a atitude do fariseu.
Mas quando apenas lamentamos os problemas diante de Deus,
podemos estar ignorando o exemplo de humildade do publicano. (§5)
Esse trecho vem logo após duas perguntas. Talvez, o locutor pensou ser
conveniente assumir uma postura de possibilidade. Cabe frisar que nesse
parágrafo o locutor marcou seu discurso pelo nós”, incluindo-se também nesta
incerteza.
3.4 Conclusão
Muitas considerações podem ser feitas com base nos apontamentos deste
capítulo. Brevemente, pode-se dizer que algumas coisas precisam ser
observadas. Como por exemplo: buscar um padrão de citação das traduções
bíblicas, privilegiar, quem sabe, apenas uma; observar até que ponto o tema é de
fato o fio condutor do sermão; verificar se a ilustração contribui para a temática,
mas com um papel subordinado; cuidar com as transições de um parágrafo para
outro, buscando amarrar os assuntos; observar, no recurso da intertextualidade,
se os textos trazidos para refoar afirmações do sermão em seu contexto original
têm ou não outro sentido daquele que se quer atribuir; cuidar com os pronomes
para, também, manter uma linguagem padronizada; tentar deixar de lado a
terminologia e as palavras rebuscadas; procurar construir parágrafos
consistentes, etc.
Em termos lingüísticos ou gramaticais, observou-se que o modo indicativo é
o dominante nos sermões. O subjuntivo aparece em todos, porém numa escala
consideravelmente menor do que o indicativo. O imperativo, no entanto, em
alguns nem aparece. Ao se observar as cartas pastorais de Paulo, ou mesmo os
discursos de Jesus, observa-se um uso mais acentuado do modo imperativo. Não
se pode confundir o imperativo no sentido teológico com o imperativo enquanto
modo gramatical. Este expressa as diversas maneiras que um verbo assume para
indicar atitudes da pessoa que fala. O gráfico abaixo mostra a proporcionalidade
do uso desses modos verbais nos sermões analisados:
122
0
20
40
60
80
100
120
140
160
180
Sermão
1
Sermão
2
Sermão
3
Sermão
4
Sermão
5
Sermão
6
Sermão
7
Sermão
8
Sermão
9
Sermão
10
Indicativo
Subjuntivo
Imperativo
Algo que chamou bastante a atenção foi, em termos de proporcionalidade,
uma freqüência maior da presença do termo “Deus”. Deus está mais presente nos
sermões do que Jesus. Se é comum na linguagem do dia-a-dia a repetição, e
esse elemento precisa ser incorporado na construção dos sermões, talvez fosse
necessário repetir ou enfatizar com mais constância Jesus, ou os nomes ou os
títulos a ele atribuídos. Jesus é o Deus que se fez carne, por conseguinte, ele
deveria ser primordial. Quem sabe, esta seja uma dificuldade na preparação dos
sermões, isto é, como fazer com que Jesus se torne carne no cotidiano das
pessoas. Assim, elaborou-se um gráfico para observar essa proporcionalidade:
5
10
15
20
25
30
Sermão
1
Sermão
2
Sermão
3
Sermão
4
Sermão
5
Sermão
6
Sermão
7
Sermão
8
Sermão
9
Sermão
10
Deus
Jesus Cristo
Espírito
Santo
Nenhum dos sermões analisados tem textos do Antigo Testamento como
base. Apenas dois deles estão baseados em Cartas de Paulo, o restante trata de
textos dos Evangelhos. É claro que o importante é a temática tratada na perícope,
mas, mesmo assim, é um dado que precisa ser pensado. Será que é mais fácil
pregar sobre Deus do que pregar sobre Jesus? O que dizer do Espírito Santo?
No decorrer das análises, trechos dos sermões foram extraídos onde as
pessoas da Trindade apareciam e o que se atribuía a elas. Também se recortou
123
trechos em que se tratava das pessoas (“nós” e “você”) com suas caracterizações
e suas funções, bem como trechos que tratavam de “outras” pessoas. Isso
mostrou o modo como os pastores têm apresentado essas “pessoas”. Esses
dados constam numa tabela em anexo.
Cada sermão é único e, por isso, possui um locutor único que se apropria da
língua em determinado momento para elaborar seu texto. Essas condições são
únicas e irrepetíveis. Cada sermão é a expressão de um locutor determinado, de
uma personalidade. Quando outra pessoa profere um sermão destes, ele assume
um “eu” que não é seu. Assume um repertório de palavras da língua que não foi
ele quem buscou ou quem atualizou. Igualmente, cada um dos sermões possui
características próprias. O arranjo das palavras é peculiar. Os modos de
marcação do discurso são distintos. Existe um contexto tanto temporal, pessoal
quanto espacial para a sua produção, e existe um alocutário específico que o
locutor tem em mente ao escrever.
124
CONCLUSÃO
Das hipóteses levantadas no início desta dissertação, uma pode ser
confirmada. O problema que apresentou-se para esta pesquisa era a dúvida a
respeito da “imagem” do locutor e a “imagem que este faz do alocutário nos
sermões publicados no livro Portas Abertas mensagens para o culto. Ou seja,
que lugar o locutor assume no sermão. Assume uma posição de certeza e
constrói seu sermão neste campo ou assume a posição da possibilidade,
marcando seu discurso pela não-assertividade.
A partir das análises feitas, observa-se que os sermões estão fortemente
marcados pela assertividade. O modo indicativo se faz presente numa
proporcionalidade muito maior do que os outros modos verbais. Isso é um dado
característico da assertividade. Além disso, dos dez sermões analisados, em
nenhum se sobressai a marcação pela possibilidade. Depreende-se disso que o
locutor sabe do que está falando. Está certo de que o seu discurso é verdadeiro.
No entanto, apesar dessa predominância, o locutor, em determinados momentos,
muda de campo ou de posição, marcando o texto pela possibilidade.
Somente em dois sermões, 3 e 8, não registro do discurso marcado pela
possibilidade. Ela aparece em todos os outros. Os assuntos tratados pela
possibilidade são variados. Como esse dado figura na maioria dos sermões,
caberia um estudo detalhado para saber quais são os conteúdos em que o locutor
deixa de lado a assertividade e passa para a não-assertividade. Esta
característica pode se revelar muito significativa.
Para citar alguns casos, a possibilidade está presente na relação de Jesus
com as pessoas, isso pode ser observado no sermão 9. Tamm nas coisas que
125
as pessoas podem ou não podem fazer ou que não fazem, nos sermões 6 e 10.
Mas, igualmente, a possibilidade aparece quando o assunto é a ação de Deus em
relação às pessoas, nos sermões 1 e 2. No sentido de que Deus pode fazer
determinada coisa. Por exemplo: Deus pode perdoar, Deus pode renovar, etc.
Na relação entre locutor e alocutário, a interrogação tem um papel muito
importante. Ela chama, convida o alocutário a pensar e acompanhar o
pensamento que está sendo desenvolvido. Ela pode ser utilizada tamm para
“atacar” diretamente seu interlocutor. Dos 10 sermões analisados, somente o
sermão 4 não contém esse recurso. Outro recurso é a intimação que ocorre
quando o locutor convida, apela, pede a reflexão ou mesmo ações do alocutário.
Esse apelo é um elemento recorrente nos sermões, basicamente todos dispõem
dessa característica.
A “imagem do alocutário está intimamente atrelada a do locutor. Pode-se
distingui-los, observando os papéis ou funções e as condições que o locutor
atribui a si e as atribuições que faz ao alocutário. Nas análises, percebe-se que o
discurso ora é marcado pela primeira pessoa do plural (“nós”), ora pela primeira
pessoa do singular (“eu”), e ora pela segunda pessoa do singular (“tu” ou “você”).
Quando o locutor usa o “nós”, ambos (locutor e alocutário) estão nas mesmas
condições, por exemplo: sofremos”, “nos angustiamos”, “somos tentados”, “o
desânimo se abate sobre nós”, “somos pecadores”, etc. Contudo, ao marcar o
sermão com o “eue o “você”, o locutor estabelece distinção. Nos sermões 4, 6,
7, 8 e 9, ao “você” recai a cobrança e a este cabem determinadas ações, isto é, o
fazer cabe ao alocutário.
A “imagemnão é caracterização psicológica ou física da pessoa, mas um
lugar assumido no discurso. A partir das análises, pode-se dizer que o locutor é
“autoritário”. Se ele é “autoritário”, aos ouvintes cabe aceitar o discurso ou não.
São raros os momentos em que ele se revela através do “eu”. Seu discurso é
regido, em sua maioria, na terceira pessoa do singular, pelo verbo ser no presente
do indicativo “é”.
Para estar mais próximo do alocutário, o locutor poderia perguntar às vezes:
“o que vocês acham?”; “será que podemos pensar isso sobre...?”; “não estou
certo disso, mas acho que pode ser assim.” Por que não falar sobre os anseios,
sobre as dúvidas corriqueiras? Por que não fazer as pontes também entre os
126
sentimentos de medo, apreensão, angústia dos personagens bíblicos com os
sentimentos dos ouvintes?
O pastor, ao produzir um sermão, tem em mente pessoas que conhece e
reflete um determinado momento histórico da sua própria vida, da vida da
comunidade, e o momento histórico pelo qual passa a humanidade. Estas
condições estão implícitas no trabalho reflexivo do pastor: quando ele medita na
Escritura Sagrada e busca fazer a ponte entre a Palavra de Deus e a sua
congregação; quando busca fazer o elo entre o mundo bíblico e o mundo
moderno; quando procura dar respostas a um contexto contemporâneo que exige
o seu posicionamento e o posicionamento de sua Igreja.
Exemplo disso foi a possibilidade de se observar nos sermões analisados a
presença da temática do desemprego como um problema que assola a vida das
pessoas.
A contextualização do sermão é muito importante, pois a pregação é a
“comunicação da verdade aos homens mediante o homem."
305
Por isso, ela
requer a interpretação da vida hodierna a partir da luz que hoje vem de Deus.
Assim, o sermão também precisa dar respostas às dúvidas do seu contexto. A
ciência avança de maneira estrondosa e algumas de suas manipulações afetam a
consciência das pessoas como um todo, mas, igualmente, afeta a consciência
das ovelhas do pastor. Elas, em virtude disso, necessitam ouvir a voz dele. Não a
voz de outro pastor, porém a voz que carrega uma personalidade, que é
expressão da experiência e da compreensão pessoal. O pastor deve pregar o que
é “seu” e não o que é alheio, como diz o Padre Vieira.
Conhecendo seus ouvintes, o pastor tem a oportunidade de conhecer o
repertório de vocabulário comum dentro da comunidade e circunvizinhança. No
entanto, esse repertório de palavras jamais conterá os mesmos significados, mas
o convívio aproxima o encontro dos sentidos. Esse encontro não acontece sem o
contato direto das pessoas envolvidas. Por isso, o sermão não é somente texto de
gabinete pastoral. É também vida em comunidade.
A língua é uma possibilidade que se realiza por um ato particular de
utilização. Cada pessoa transforma individualmente a língua. Cada locutor traz à
305
BLACKWOOD, 1981, p. 15.
127
tona o que é mera virtualidade. Sendo ato individual, cada vez que uma pessoa
se apropria de determinadas palavras é um ato novo, único e irrepetível, porque
jamais as condições de tempo, espaço e pessoa podem ser repetidas. Essas
instâncias jamais podem ser perenizadas no uso da língua.
Nesse sentido, um dos teólogos, abordados no primeiro capítulo, diz que o
sermão é uma criação pessoal, íntima, pertencendo essencialmente ao próprio
momento da pregação. Tamm disse que o pastor é uma pessoa. Existe
presença pessoal na pregação. As marcas do locutor, os arranjos das palavras,
as construções sintáticas, o uso dos tempos e modos verbais destacam uma
natureza determinada. O arranjo do sermão é de um “eu” específico. Este eu”
reflete, ora, medita, escreve, testemunha, proclama igualmente a sua experiência
pessoal. Fala daquilo de que está impregnado.
As verdadeiras ênfases são dadas na “oralização”, isto é, na fala lá do
púlpito. Se o pastor estiver, de fato, impregnado por aquilo que quer dizer, seu
corpo falará. Suas mãos, seus braços, seus gestos, sua postura, sua face e seus
olhos também falarão.
A publicação de sermões, em livro, é um excelente material de pesquisa.
Justamente para se observar como os pastores tratam dos diversos textos
bíblicos e qual seu testemunho relacionado a eles. De modo semelhante, pode
trazer ricas idéias para boas abordagens.
De modo algum esgota-se o assunto. Ao contrário, muitas perguntas
surgiram durante a pesquisa e carecem de respostas. Muitas destas precisam ser
buscadas. Tratando-se de Homilética, a prática pode ensinar muito mais que os
livros. Todo pregador precisa ser apegado às letras. Precisa remediar a coceira
dos dedos folheando as páginas de bons livros. Precisa ler, olhar e fitar o mundo
contido, expressa e tacitamente, no arranjo das palavras.
As últimas palavras, nesta dissertação, serão para dizer que o sermão, sob
um aspecto negativo, é uma oportunidade para triunfos humanos. Por outro lado,
sob uma perspectiva muito bonita, e por que não dizer positiva, o sermão também
é um lugar de derrotas humanas, um lugar de muitos equívocos humanos, um
lugar de aflição, um lugar de lágrimas, um lugar de aprendizagem, um lugar de
crescimento, mas, acima de tudo, é um lugar de consolo, um lugar de Salvação,
um lugar onde Deus, através da imperfeição humana, através de uma linguagem
128
imperfeita, revela seu Filho Jesus, que assumiu a imperfeição humana para se
fazer Palavra de vida. Mas, tamm, é através dessa linguagem imperfeita que
Espírito Santo realiza o milagre do pentecostes, em que cada um pode ouvir a
proclamação da Palavra de Deus na sua própria linguagem.
129
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132
ANEXOS
133
Anexo 1
Trindade e seres
humanos
Como aparecem nos sermões
Deus
(Sermão 1) “Deus faz com que o sofrimento e a tribulação sirvam para o
progresso em nossa vida espiritual; Deus fortalece nossa fé através da
tribulação; Deus mantém acesa a nossa esperança da salvação; Deus quer
reparar as nossas deficiências; ele mesmo nos oferece muitas oportunidades
de crescimento; O grande amor de Deus por nós foi demonstrado no
sacrifício, na morte e na ressurreição de Jesus Cristo”.
(Sermão 2) Deus vem morar no meio do seu povo: para dar nova vida; para
estabelecer um reino de paz; Deus Todo-Poderoso, Criador do céu e da
terra, assume a forma humana, para resgatar o seu povo; é Deus de amor;
não consegue conviver com o sofrimento; Deus está morando no meio do
seu povo; Ele sente como suas, ainda hoje, as nossas dificuldades; Deus
veio morar no meio do seu povo para consertar o coração do homem.
Somente o seu amor, que é nosso pela fé, pode transformar.
(Sermão 3) Deus em seu infinito amor, na pessoa de Jesus, veio visitar a
humanidade e trazer salvação”.
(Sermão 4) Deus se manifesta, se apresenta, se revela, se desnuda,
apresenta sua intimidade diante dos olhos das pessoas. Deus se manifesta
através de você.”
(Sermão 6) No Juízo Final, Deus vai te cobrar como e quantas vezes você
foi pescar pessoas para o Reino dele.
(Sermão 7) Deus revela na Escritura Sagrada seu plano, caminho e cuidado
com o seu povo”.
(Sermão 8) Deus é amor. Deus faz exigências. Não maiores do que
conseguimos suportar.
(Sermão 9) A palavra do Pai mostra também o seu amor pelos seres
humanos, porque ele está satisfeito com a obra que o Filho veio realizar no
mundo.
Jesus
(Sermão 1) Nosso Salvador; Morreu e ressuscitou; Voltará”.
(Sermão 3) Filho de Deus, o Verbo Eterno encarnado, nascido em Belém,
que veio unir céus e terra, estivesse na casa do Pai; Para efetuar e
redenção, Cristo tomou sobre si três ofícios: Ofício Profético, Sumo
Sacerdotal e Real”.
(Sermão 4) “Perdão procedente da cruz de Jesus Cristo; Grande Rei”.
(Sermão 5) As palavras de Jesus de certa forma ascendiam uma chama de
curiosidade. Sabemos o que fizeram com Jesus em Nazaré”.
(Sermão 6) Ele oferece o perdão de pecados que ele conseguiu para nós
morrendo na cruz e o conforto de saber que, confiando nele, vamos passar a
eternidade no céu, onde não haverá problema algum. As palavras que Jesus
dizia ao povo soam para nós como palavras de salvão, de certeza de dias
melhores sob as bênçãos de Deus. Jesus nosso Salvador. Jesus está
conosco. Ele o seu Reino de maneira maravilhosa e traz felicidade e
conforto nesta vida e na vida eterna aos que confiam nele”.
(Sermão 7) Cara a cara com Satanás, Jesus usou a arma do cristão para
todas as horas: a Escritura Sagrada. Ele colocou-se como o nosso único
caminho, verdade e vida (João 14.6). A cruz, sobre a qual ele carregou as
nossas iniqüidades, derramou o seu sangue para nos purificar de todo o
pecado (1 João 1.7). E assim nos trouxe a reconcilião com Deus, abrindo
o caminho que conduz à morada paterna, o céu.
(Sermão 8) Seguir a Jesus em amor é o desafio do discípulo fiel. Esta é a
exigência, porém não a obrigação. Seguir a Jesus requer doação. Seguir a
Cristo requer confiança. Seguir a Jesus requer sacrifício!
(Sermão 9) Jesus mostra Deus como sendo um pai à espera do filho
perdido. A comunhão que Jesus tem com o Pai também pode ter aquele que
crer em Jesus como Salvador enviado por Deus”.
134
Espírito Santo
(Sermão 1) Somente o Espírito Santo pode operar a transformação, isto é,
estimular o interesse na pregação e participação dos sacramentos”.
(Sermão 5) Espírito do Senhor o unge e tamm nos unge para o serviço.
O Espírito do Senhor ainda hoje continua nos ungindo para levar as boas
novas aos sedentos da Palavra de Deus. Ele está conosco”.
(Sermão 9) Espírito Santo revela a sua presença em forma de pomba e o
Pai através da voz.”.
Pessoas: “nós”
(Sermão 1) “Como esperamos a vinda de Cristo? (S1); Esperamos
perseverantes na fé verdadeira (S1); Estamos cientes de que Jesus voltará
ou esquecemos do que Cristo disse; O sofrimento pelo qual passamos tem
um propósito; O sofrimento pode estimular o nosso interesse na pregação da
Palavra e a nossa participação nos sacramentos; A nossa fé não é diferente
dos tessalonicenses, ela tamm é fraca e deficiente que precisa ser
melhorada, isto é, fortalecida constantemente pela Palavra de Deus; Temos
oportunidades diárias e semanais para fortalecermos a nossa fé;
conseguiremos amar o nosso próximo se estivermos unidos ao amor de
Deus”.
(Sermão 2) “Deus se entristece também com a nossa arrogância, com a
nossa prepotência, com o nosso orgulho, com a nossa vaidade. Se
entristece quando somos maus, causando sofrimento e dor, aniquilando a
preciosa vida que ele criou; nossa fragilidade e nossa total incapacidade de
mudar essa situação; Queremos recebê-lo plenamente; Receber com todo o
comprometimento e responsabilidade que de nós espera; sabemos que o
senhor es conosco e cuida de nós; Não devemos, não podemos e,
certamente, não queremos nos omitir ao sofrimento dos outros”.
(Sermão 3) Aquilo ao qual estamos apegados, aquilo que vai dentro de
nosso coração, define muitas vezes o lugar em que costumamos estar;
Como nós aproveitamos as oportunidades que Deus nos concede hoje em
nossas vidas?; Aproveitemos bem as oportunidades que nos sobrevirão no
ano prestes a iniciar; Principalmente em estar na “Casa do Pai”, onde
Palavra e sacramentos (Batismo e Santa Ceia) são ministrados.
Aproveitemos também as oportunidades de “testemunhar” de Jesus e do seu
amor às pessoas que encontrarmos pelos lugares por onde passarmos”.
(Sermão 4) Deus quer que você seja instrumento dele, para levar o nome
de Jesus a todos. Que você, a partir de hoje, seja semelhante lâmpada. Que
você seja assim. Receba poder, iluminação, força, perdão, amor, vida e vida
eterna de Deus. E então que você não fique parado. Lance luz de Deus
sobre os outros. Seja você mais que a lâmpada.
(Sermão 5) “A palavra de Deus Precisa queimar dentro de nós e nos
inquietar para vivermos diferentes. Nos tornamos insensíveis à voz de Deus.
É a nossa indiferença que não permite que ele fale aos nossos corações”.
(Sermão 6) Você está se preocupando em pescar para o Reino de Deus?
Nossa congregação está preocupada em pescar pessoas? A época é
propícia, pessoas estão chorando, implorando pelo consolo e conforto que
apenas nós, cristãos, temos a oferecer. Talvez a crise tenha se abatido
sobre você e você esteja trazendo este desânimo para sua pesca no Reino
de Deus. o vamos deixar que o desânimo tome conta da pesca do Reino
de Deus. Podemos seguir o exemplo dos primeiros cristãos e ver que nossos
irmãos na fé são companheiros de pesca que podem nos ajudar na tarefa de
levar pessoas a Jesus.
(Sermão 7) encontramos o lar celeste quando trilhamos o caminho da
cruz. Você está se sentindo perdido em sua vida diária e de fé? Pare! Ouça
nesta Quaresma as Escrituras falarem a respeito do acesso ao Pai que
Jesus Cristo abriu para você através do caminho da Cruz. A Bíblia e as
leituras da Quaresma lhe chamam para olhar para o alto buscando a cruz.
Saiba que você e sua falia são exatamente a seta que indica o caminho da
cruz de Jesus para muitos hoje em dia”.
(Sermão 8) “Nem sempre temos clareza sobre o que é a Igreja. Precisamos
lembrar que o Deus das exigências é também o Deus do amor, que perdoa,
135
que salva, que liberta, que sara”.
(Sermão 9) Nascemos espiritualmente mortos, isto é, desconectados de
Deus. Agora unidos com Deus através do perdão de Cristo pode-se servir ao
nosso Pai celestial. O que você está esperando para criar o hábito de orar?
Se você ainda não tem o bito de orar, comece hoje. Isto seuma grande
bênção para a sua vida. Apresente a ele suas dificuldades. Peça ajuda a
Deus para seus problemas, ore pelos familiares e amigos. Não esqueça de
orar pela sua congregação, seu pastor e demais líderes. Ore pelo seu país e
todas as autoridades. Ore, inclusive pelos seus inimigos, como Jesus o fez”.
(Sermão 10) É a velha mania da grandeza humana. Muitas pessoas têm
este grave defeito e não fazem questão de reconhecê-lo. E, como vemos
nesta parábola, é um defeito fácil de perceber nos outros, mas que
dificilmente percebemos em nós mesmos. Como você, caro irmão, se
posiciona diante de Deus? Com quais intenções você ora ao Senhor? Qual é
o jeito de nos dirigirmos a Deus? Com quais intenções nós oramos a Deus?
Pode até ser que em nada nos identifiquemos com a atitude do fariseu. Mas
quando apenas lamentamos os problemas diante de Deus, podemos estar
ignorando o exemplo de humildade do publicano. E aí teremos dificuldade de
reconhecer nossa dependência de Deus, não daremos sinal de
arrependimento e deixaremos de confiar na misericórdia de Deus. Cada um
de nós, por natureza, é um pecador perdido e condenado, sem direito à
salvação. Deus nos salva por amor. Somos justificados diante de Deus e
salvos, se confiarmos em tudo o que Cristo fez por nós. É somente nele que
devemos depositar nossa confiança. Como a nossa salvação depende
inteiramente de Deus, ninguém tem direito de se gloriar diante de Deus, pois,
ainda que façamos muitas boas obras, não são elas que nos salvam. A
nossa salvação está apenas em Jesus Cristo, que morreu para nos salvar.
Pessoas: “outros”
(Sermão 1) “Pessoas que confiam em numerologia, astrologia, espiritismo,
contatos com os mortos e em coisas materiais; Quando os cristãos se
apegam a estas coisas, esquecendo a esperança da vinda de Cristo, a fé se
torna débil e aparece o desânimo; Muitos pensam que o Cristianismo é um
milagre para tornar a vida miraculosamente fácil, sem sofrimento nem dor”.
(Sermão 4) Quem vê, sente, ouve, experimenta e aplica Deus ao seu viver,
é alguém que descobre a realidade do acolhimento maior. Esse alguém
recebe e vive o perdão procedente da cruz de Jesus Cristo. Quem percebe
Deus, percebe que vida além dessa vida. Percebe que a vida do além é
eterna. Percebe que no dia do Juízo Final os justos, além de ressuscitarem
corporalmente, não entrarão em julgamento. Todos que, pela Fé, aceitam
essas verdades sublimes, se alegram, festejam, rejubilam e vibram
intensamente.
(Sermão 5) O ser humano não nasceu para viver preso. A prisão é o pior
dos castigos que um ser humano ime ao outro ser humano. As pessoas
nessas condições perdem a sua dignidade e Jesus vem para dar essa
dignidade também ao ser humano caído em pecado que agora se arrepende
de seus pecados e o recebe com o Messias, o seu Salvador. Ainda hoje
existem muitas pessoas nessas condições que não têm direito às coisas
mais essenciais da vida. Jesus quer libertar a todos os oprimidos, seja uma
opressão de qualquer natureza, e por fim ele prega o ano da Graça. Muitas
pessoas vêm à igreja a cada domingo por costume, cantam, ouvem a
Palavra de Deus, mas essa não queima mais em seus corações, não
desafia para nada, porque se tornou indiferente à Palavra de Deus. A
Palavra entra por um ouvido e sai por outro.”
(Sermão 7) “É comum em nossa vida estarmos perdidos em meio a nossas
aflições e afazeres diários. Às vezes também estamos perdidos em nossa
vida pessoal, familiar e profissional. E precisamos uma parada para avaliar,
reavaliar e recomeçar a vida. Em relação a nossa vida de é a mesma
coisa. Muitas vezes nos apegamos a tantas coisas que já não sabemos ao
certo o que é o mais importante. Deparamo-nos com tantos caminhos que
ficamos confusos ou até mesmo nos distraímos com as vitrines de falsos
136
ensinos, perdendo-nos pelo caminho. Ou ainda procuramos seguir mais de
um caminho ao mesmo tempo, como se isto fosse possível.
(Sermão 8) Quantos procuram a Igreja pensando que com isso todos os
problemas da vida desaparecerão? Quantos pensam que o cristão não
enfrenta o desemprego, não sofre com enfermidades, não tem problemas
conjugais?
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Anexo 2
Sermão 1 (Portas Abertas, 2006, p. 5)
Período: Advento
Leituras bíblicas: Sl 25.1-9; Jr 33.14-16; 1 Ts 3.9-13; Lc 21.25-36 ou Lc 19.28-40
Texto-base: 1 Tessalonicenses 3.9-13
Tema: Como esperamos a vinda de Cristo?
(§1) Que o amor de Jesus Cristo, o nosso Salvador, nos acompanhe neste momento. Amém.
(§2) Mais uma vez chegamos à época do calendário da Igreja chamada advento: tempo no qual
aguardamos ansiosos a vinda de Jesus Cristo no dia de Natal. Advento é um tempo de espera... e
como esperamos a vinda de Cristo?
(§3) Esperamos a vinda de Cristo perseverantes naverdadeira.
(§4) Foi desta maneira perseverando na fé que os tessalonicenses esperaram pela vinda de
Cristo. E é por isso que Paulo diz no v. 7: “em todas as nossas dificuldades e sofrimentos o que
nos animou foi a fé que vocês têm”. Foi justamente a fé dos tessalonicenses com respeito ao
retorno de Cristo a este mundo que animou o apóstolo Paulo.
(§5) Mas, hoje temos que perguntar a nós, cristãos do século 21: temos a esperança na segunda
vinda de Cristo? Estamos cientes de que Jesus voltará? Será que nos lembramos de sua volta em
nosso dia-a-dia? Ou, simplesmente, nos esquecemos que Cristo disse que iria retornar a este
mundo?
(§6) Hoje em nosso meio existem pessoas que confiam em numerologia, astrologia, espiritismo,
contatos com os mortos e em coisas materiais.
(§7) Quando os cristãos se apegam a estas coisas, esquecendo a esperança da vinda de Cristo, a
fé se torna débil e aparece o desânimo, mas, ao focalizar a volta de Cristo, eles irão ter certeza
(Hebreus 1.11) de que, assim como Cristo morreu e ressuscitou, ele também voltará.
(§8) Muitos pensam que o Cristianismo é um milagre para tornar a vida miraculosamente fácil,
sem sofrimento nem dor. O propósito do Cristianismo não é evitar a dificuldade, mas produzir o
caráter adequado para enfrentá-la. Ele não torna fácil a vida, antes, procura fazer-nos bastante
grandes para a vida. Não nos oferece uma saída para os fardos da vida, mas nos fortalece para
enfrentá-los.
(§9) O sofrimento pelo qual passamos tem um propósito. Com certeza, ele também é para o nosso
progresso espiritual.
(§10) A pergunta aqui é: Como Deus faz com que o sofrimento e a tribulação possam ser um
progresso em nossa vida espiritual? A tribulação faz com que não nos apeguemos tanto às coisas
deste mundo, e desta maneira facilita o retorno à esperança da segunda vinda de Cristo. O
sofrimento pode estimular o nosso interesse na pregação da Palavra e a nossa participação nos
sacramentos.
(§11) Somente o Espírito Santo pode operar esta transformação em nós, pois, se dependesse de
nós, seres humanos pecadores, com certeza já o haveria esperança alguma para a nossa vida!
É através da tribulação que Deus fortalece a nossa fé. Deus tamm mantém acesa em nós a
esperança da nossa salvação, com a esperança pela sua segunda vinda. Por isso, Deus mesmo
nos leva a perseverarmos na fé.
(§12) Tamm esperamos pela vinda de Cristo progredindo na vida cristã.
(§13) Em 1 Tessalonicenses 3.10, diz: “Dia e noite pedimos a ele de todo o coração que nos deixe
ir vê-los pessoalmente para podermos completar o que ainda falta na fé que vocês tem.”
(§14) Com estas palavras, o apóstolo Paulo quer dizer que ele mesmo pediu a Deus para ir até
aos tessalonicenses, para completar o que por acaso faltava em vossa fé. O apóstolo Paulo usa
esta palavra no plural para indicar que há áreas específicas na qual a fé dos cristãos de
Tessalônica precisaria ser mudada. As áreas são indicadas adiante, os moralmente fracos (4.13
5.11), os desocupados (4.9-12), os desanimados (4.13 5.11).
(§15) A nossa fé não é diferente dos tessalonicenses, ela também é fraca e deficiente que precisa
ser melhorada, isto é, fortalecida constantemente pela Palavra de Deus.
(§16) Quando desprezo e pouco caso para com a Palavra de Deus, pode haver um
enfraquecimento; a pode ir ficando cada vez mais fraca, até que ela se extinga; até que ela se
acabe por completo. Mas, para que isto não aconteça; para que a nossa fé não se acabe, Deus
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quer reparar as nossas deficiências. Para tanto, ele mesmo nos oferece muitas oportunidades de
crescimento. Por exemplo, temos à nossa disposição cultos, estudos bíblicos, devoções. Temos
oportunidades diárias e semanais para fortalecermos a nossa fé em Cristo.
(§17) As tentações estão por todos os lados e, quando a nossa fé esenfraquecida, estamos
mais vulneveis aos ataques do diabo, do mundo e da nossa carne. É por isso que Paulo, no v.
12, pede a Deus que aumente o amor entre os tessalonicenses. Ele diz: “Que o Senhor faça com
que cresça cada vez mais o amor que vocês m uns pelos outros e por todas as pessoas, e que
esse amor se torne igual ao nosso amor por vocês!
(§18) Mas como conseguiremos amar ao nosso próximo desta maneira?
(§19) Só conseguiremos amar o nosso próximo se estivermos unidos ao amor de Deus e
confiarmos no presente que Deus deu à sua Igreja: o perdão dos pecados, a salvação eterna. O
grande amor de Deus por nós foi demonstrado no sacrifício, na morte e na ressurreição de Jesus
Cristo, que nos isenta de todas as nossas culpas; de todos os nossos pecados, tornando-nos aos
seus olhos santos; sem defeitos; sem erros, apesar de continuarmos sempre fazendo coisas
erradas. Deus, por intermédio de seu Filho Jesus, fez isso por nós, quando não merecíamos nada
de bom; muito pelo contrário, merecíamos somente a condenação; o castigo eterno.
(§20) No entanto, é o amor de Deus, a fé em Cristo que nos capacita a amar o nosso próximo.
quem é amado por Deus pode amar o próximo. quem é perdoado por Deus pode perdoar o
próximo. O perdão que Deus nos nos capacita a amar o nosso próximo. Amando o próximo,
tamm estaremos progredindo na vida cristã.
(§21) Portanto, Deus quer reparar as deficiências de nossa fé; Deus quer suprir as necessidades
de nossa fé com a certeza de seu perdão, para que esta certeza nos capacite a amar o nosso
próximo, progredindo, assim, em nossa vida cristã. E que o próprio Deus nos conceda que
esperemos pela vinda do nosso Senhor Jesus Cristo, perseverantes na fé verdadeira e
progredindo na vida cristã, certos de que a nossa redenção final se aproxima! Amém.
Sermão 2 (Portas Abertas, 2006, p. 7)
Período: 3º Domingo no Advento
Leituras bíblicas: Is 12.2-6; Sf 3.14-18a; Fp 4.4-7; Lc 3.7-18
Texto-base: Filipenses 4.9
Tema: Deus vem morar no meio do seu povo: para dar nova vida; para estabelecer um reino de
paz.
(§1) O Natal esàs portas. Deus vem chegando e mais uma vez somos contagiados com a
alegria da notícia dos anjos, que anunciam o nascimento de Jesus. Realmente é uma notícia
extraordinária e, certamente, todo cristão quer receber com carinho o seu Senhor e Salvador. Não
há como ficar indiferente. Não há como não se emocionar. O Deus Todo-Poderoso, Criador do céu
e da terra, assume a forma humana, para resgatar o seu povo. Ele não consegue ficar indiferente,
porque é Deus Santo, Todo-Poderoso, mas, acima de tudo, é Deus de amor. Ele não consegue
conviver com o sofrimento, por isso vem por amor e com amor, para ensinar o caminho do amor.
Vem para servir e, assim, restaurar a vida bonita e plena que havia criado. Como não receber com
toda a consideração, carinho e alegria tão ilustre visitante?
(§2) “Deus esmorando no meio do seu povo”, este é o recado de Isaías. É um recado cheio de
consolo e esperança, onde a confiança pode ser renovada. Deus não fica à distância, alheio aos
sofrimentos e às dificuldades humanas. Ele sente como suas, ainda hoje, as nossas dificuldades,
os nossos sofrimentos, as nossas angústias, e se entristece com elas. Mas se entristece também
com a nossa arrogância, com a nossa prepotência, com o nosso orgulho, com a nossa vaidade.
Se entristece quando somos maus, causando sofrimento e dor, aniquilando a preciosa vida que
ele criou. É por isso que Deus vem morar no meio do seu povo. E, justamente por reconhecer
nossa fragilidade e nossa total incapacidade de mudar essa situação, queremos receber com todo
o carinho e consideração aquele que tudo pode renovar, restaurar e fazer brilhar.
(§3) Queremos recebê-lo plenamente, com todos os seus benefícios e presentes, mas tamm
com todo o comprometimento e responsabilidade que de nós espera. Sua oferta é a de uma nova
vida, como o profeta Sofonias o anuncia no texto de hoje com toda a clareza. Mas para que esta
nova vida se estabeleça, a antiga precisa abrir espaço. A nova vida propõe a sinceridade, a
justiça, a honestidade, a correção, o respeito, o acolhimento, a inclusão, a cooperação, a partilha,
a amizade, ou seja, sentimentos e valores que brotam de um coração que aprendeu a amar. A
nova vida, que Deus misericordiosamente quer nos dar, não consegue conviver com a
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intolerância, com a intransincia, com a desonestidade, com o desrespeito, que são coisas que a
machucam e obscurecem. A nova vida propõe uma nova caminhada, num sincero propósito de
fazer as coisas direito, respeitando as pessoas, a natureza e a própria santidade de Deus.
(§4) Aí está justamente o princípio maior que pode fazer brotar e surgir o Reino da paz, que todos
nós tanto almejamos. Quem de nós não quer viver num ambiente feliz, equilibrado, tranqüilo, de
muita confiança e cooperação? Que bom se nosso ambiente familiar fosse assim, que bom se
nosso ambiente profissional fosse assim, que bom se todos os ambientes fossem assim, não é
mesmo? Mas é que está a beleza e a radicalidade da mensagem cristã. Tudo pode ser assim,
certamente não de forma plena, mas com bastante consistência e satisfação. Penso que é um
pouco disso que nos fala o apóstolo Paulo na epístola de hoje, quando diz: “Tenham sempre
alegria, unidos com o Senhor! Repito: tenham alegria! E é verdade, quando unidos com o Senhor,
não como não ter alegria, pois o Senhor vem a s, nos ama e nos ajuda a ser amáveis com
todos. É por isso também que não nos preocupamos, a ponto de perder a alegria, pois sabemos
que o senhor esconosco e cuida de nós, providenciando para que nada nos falte. É por isso
tamm que andamos em paz. Não de qualquer paz, mas daquela paz que vem da manjedoura,
que passou pela cruz e se apresentou vitoriosa no domingo de Páscoa. Trata-se da paz que vem
de Cristo, que nós é dada de graça e que nos garante o perdão e a vida em amor que dura para
sempre.
(§5) Qo bela, maravilhosa e consoladora mensagem temos mais uma vez revelada nos textos
de hoje. Mensagem que não permite que fiquemos imóveis, diante do sofrimento e da desventura
de tantos e tantos irmãos e irmãs. O convite do Senhor está feito através do apóstolo. “Ponham
em prática o que vocês receberam e aprenderam de mim.” (Filipenses 4.9) Trata-se de um convite
amoroso, cheio de estímulo para a promoção da vida e da paz. Somos convidados a interferir na
vida das pessoas, das instituições, nos processos que fazem andar a história, para instaurar aquilo
que é bom, que é verdadeiro, que é digno, que é correto, que é puro, que é agradável, que é
decente. Não devemos, não podemos e, certamente, não queremos nos omitir.
(§6) Conta a história que um pai teve que levar consigo o filho ainda criança para o escritório.
Surgira um imprevisto e agora o menino estava com ele em seu local de trabalho. Havia muito por
fazer, mas a criança queria atenção e companhia. O pai deu-lhe algumas tarefas a fim de entretê-
lo, mas com muita rapidez o menino completava todas elas. Ficou a pensar como poderia ocupar
o menino, a fim de poder fazer o seu trabalho. Viu então um grande calendário, no qual estava
desenhado um grande mapa do mundo. Pegou uma tesoura, cortou o calendário em centenas de
pedaços e disse ao menino: “Filho, sente-se aqui, junte os pedacinhos, encaixando todas as
pecinhas, e vamos ver se consegues conservar o mundo que recortei! O pai imaginou que o
menino levaria horas, mas para sua surpresa, em poucos minutos, o menino alegremente veio
correndo ao seu encontro. “Pai, já consertei o mundo. Todas as peças estão encaixadas!O pai,
completamente perplexo, verificou e percebeu que de fato o grande quebra-cabeça estava
montado. Mas como fora posvel? Então o menino lhe explicou que do outro lado do mapa havia
a figura de um homem simples e fácil de ser montado. “Pai, consertei o homem e, ao consertar o
homem, consertei o mundo!
(§7) Deus veio morar no meio do seu povo para consertar o coração do homem. Somente o seu
amor, que é nosso pela fé, pode transformar, dando nova vida e novo jeito de viver. Não outra
maneira. Não outro caminho. Por isso Jesus veio e por isso, mais uma vez, queremos recebê-
lo com muito amor. Queremos muito que ele, Jesus, conserte o nosso coração, para que
possamos ajudá-lo a consertar outros corações, na instauração de seu Reino, que não tem fim.
Esse é um serviço que vale a pena, um serviço que emociona, um serviço que faz brotar sorrisos,
na paz que vem do Senhor. Amem.
Sermão 3 (Portas Abertas, 2006, p. 105)
Período: Primeiro Domingo após o Natal
Leituras bíblicas: Sl 111; Jr 31.10-13; Hb 2.10-18; Lc 2.41-52
Texto-base: Lucas 2.41-52
Tema: Aproveitando as oportunidades
(§1) Amigos no Salvador Jesus, unidos pelo amor de Deus!
(§2) Ainda vivemos o clima festivo do Natal. Deus em seu infinito amor, na pessoa de Jesus, veio
visitar a humanidade e trazer salvação.
(§3) No texto do evangelho de hoje, Jesus, já com doze anos de idade, vai a Jerusalém para a
140
festa da Páscoa com os seus pais. Tal peregrinação fazia parte da vida do povo de Deus do
Antigo Testamento, lembrando a maravilhosa libertação da escravidão vivida pelo povo no Egito. A
festa durava vários dias. Ao término deles, José, Maria e demais pessoas voltam para Nazaré da
Galiléia. Jesus permanece em Jerusalém sem que eles o saibam. Os pais sentem a sua falta. Ao
cabo de três dias, o encontram no templo em Jerusalém, conversando com os mestres da Lei.
Jesus, questionado por Maria, responde: “Por que vocês estavam me procurando? Não sabiam
que eu devia estar na casa do meu Pai?” (Lucas 2.49)
(§4) Aquilo ao qual estamos apegados, aquilo que vai dentro de nosso coração, define muitas
vezes o lugar em que costumamos estar. Exemplo: Um jogador de futebol no estádio; um
mecânico na oficina; um padeiro na padaria. Não era de se estranhar que o Filho de Deus, o
Verbo Eterno encarnado, nascido em Belém, que veio unir céus e terra, estivesse na casa do Pai.
Jesus viera ao mundo com uma missão, conforme nos diz o evangelho de João 3.16: “Porque
Deus amou o mundo tanto, que deu o seu único filho, para que todo aquele que nele crer não
morra, mas tenha vida eterna.”
(§5) Para efetuar e redenção, Cristo tomou sobre si três ofícios: Ofício Profético, Sumo Sacerdotal
e Real. É justamente fazendo parte do seu ofício profético, isto é, de manifestação de palavras e
obras com Filho de Deus, que Jesus se encontra envolvido em nosso texto. Jesus, ouvindo e
interrogando os mestres da Lei, manifesta interação no saber. Logo mais, como o Grande Profeta,
ensina as multidões a respeito das cosias maravilhosas do Reino de Deus. Na viagem que Jesus
fez a Jerusalém, ele aproveitou a oportunidade de estar na casa do Pai.
(§6) Como nós aproveitamos as oportunidades que Deus nos concede hoje em nossas vidas?
Estar aqui no primeiro Domingo após o Natal e no término de mais um ano é aproveitar a
oportunidade de lembrar a vinda do Salvador Jesus ao mundo, bem como agradecer a Deus por
mais um ano que nos oportunizou passar sob sua sombra de proteção e amor.
(§7) Dentro em breve estaremos iniciando um novo ano. Certamente teremos muitas
oportunidades pela frente. Onde estiver o nosso tesouro, estará também o nosso coração (Mt
6.21). Dentre as oportunidades que se nos apresentarão no novo ano, precisamos estar cientes do
que é o mais importante” e qual o “maior tesouro”, aquilo que mais vale a pena para nós. Jesus
diz no evangelho de Mateus 6.33: “Portanto, ponham em primeiro lugar na sua vida o Reino de
Deus e aquilo que Deus quer, e ele lhes dará todas essas coisas.” O “todas essas coisasrefere-
se às necessidades diárias para a vida de cada um de nós, como a comida, bebida, roupas e tudo
o que necessitamos para a nossa vida. Tudo isso vem ao natural para aqueles que colocam Deus
em primeiro lugar em suas vidas.
(§8) Estimados presentes! Aproveitemos bem as oportunidades que nos sobrevirão no ano prestes
a iniciar. Principalmente em estar na “Casa do Pai”, onde Palavra e sacramentos (Batismo e Santa
Ceia) são ministrados. Aproveitemos tamm as oportunidades de “testemunhar” de Jesus e do
seu amor às pessoas que encontrarmos pelos lugares por onde passarmos. Quem sabe na
família, no trabalho, na escola, no ponto de ônibus, numa fila qualquer, etc. São muitas as
pessoas que pelo mundo a fora vivem desesperadas, sem esperança alguma e completamente
desnorteadas, muitas delas acreditando em falsos mestres e falsas mensagens.
(§9) Conhecedores da mensagem que liberta do pecado e nos une a Cristo mediante a fé,
aproveitemos as oportunidades, para que, conforme diz o profeta Jeremias 31.13, “trazer
verdadeira animação e alegria” para um mundo triste e sem esperança.
(§10) Vivamos sempre “aproveitando as oportunidades”.
(§11) Que Deus nos abençoe. Amém.
Sermão 4 (Portas Abertas, 2006, p. 13)
Período: Epifania
Leituras bíblicas: Sl 72; Is 60.1-6 (7-16); Mt 2. 2.1-12
Texto-base: Mateus 2.1-12
Tema: Seja a luz do mundo.
(§1) Num período da história da humanidade, conhecido como Idade Média, se pensava que o
mundo era plano, que a Terra era reta, chata. Se dizia que o mundo, repentinamente, acabava em
um precipício. Por isso, as pessoas não deveriam se aventurar, no sentido de afastar, do que era
considerado “o lugar seguro”. Muita gente nasceu, viveu e morreu pensando que essa era, de fato,
a verdade.
(§2) Com o passar do tempo, algumas pessoas começaram a observar certas características
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naturais e concluíram que a Terra era redonda. Concluíram que a Terra não tinha um precipício
final. Essas pessoas foram duramente criticadas e até punidas. Mas a certeza delas era maior do
que as ameaças recebidas. As pessoas que perceberam que a Terra era redonda se lançaram ao
mar, especialmente, e assim descobriram novos lugares, novos continentes, novos mares, novas
maneiras e formas de vida. A descoberta de uma nova realidade, a de que a Terra é redonda, fez
com que essas pessoas se pusessem a caminho. Elas não ficaram paradas no seu mundo, mas
descortinaram, alegres, novas fronteiras.
(§3) Epifania é algo sensacional. Algo que vai colocar em movimento todos que percebem a
realidade da Epifinia. Epifania é manifestação! Deus se manifesta, se apresenta, se revela, se
desnuda, apresenta sua intimidade diante dos olhos das pessoas. Quem vê, sente, ouve,
experimenta e aplica Deus ao seu viver, é alguém que descobre a realidade do acolhimento maior.
Esse alguém recebe e vive o perdão procedente da cruz de Jesus Cristo. Quem percebe Deus,
percebe que vida além dessa vida. Percebe que a vida do além é eterna. Percebe que no dia
do Juízo Final os justos, além de ressuscitarem corporalmente, não entrarão em julgamento.
Todos que, pela Fé, aceitam essas verdades sublimes, se alegram, festejam, rejubilam e vibram
intensamente.
(§4) Deus, ao se manifestar, se expõe diante dos seus olhos. Deus também quer ser exposto
diante de todos os seres humanos. Deus quer que voseja instrumento dele, para levar o nome
de Jesus a todos. Realidades que são descobertas e aceitas põem as pessoas em movimento.
(§5) Nos textos lidos hoje percebemos muita movimentação. Segundo o salmo, pessoas de longe
vêm e se curvam diante do grande Rei. Isaías afirma que os povos viram grande luz. Para ver e
ver bem, muitas vezes é necessário girar a cabeça, dar alguns passos, fixar o olhar. Tudo isso é
movimento. O Evangelho afirma que magos vieram de longe. Montaram camelos durante vários
dias. Os magos perguntaram, os magos se ajoelharam, os magos enfiaram mãos em sacolas e de
retiraram presentes, entregues a Jesus. Quando voltaram às suas terras, com certeza,
moveram lábios para falar de Jesus ao seu povo. Na epístola, o apóstolo Paulo diz que ele é
porta-voz de Deus junto aos gentios. Ou seja, o apóstolo vai a um outro povo, outra cultura, outras
pessoas para anunciar a revelação de Deus para todos.
(§6) Que você, a partir de hoje, seja semelhante lâmpada. Uma lâmpada, através dos cabos,
recebe energia elétrica. A lâmpada recebe poder, força. Com isso, a lâmpada não permanece
neutra e apagada. A lâmpada passa a brilhar, iluminar o ambiente, revelar o que há em volta. Com
sua ação, a lâmpada permite que as pessoas vejam, se protejam, possam agir.
(§7) Que você seja assim. Receba poder, iluminação, força, perdão, amor, vida e vida eterna de
Deus. E então que você não fique parado. Lance luz de Deus sobre os outros. Seja você mais que
a lâmpada. A lâmpada não tem pernas para se deslocar, mas você tem pernas, sim. a muitos
lugares escuros e transmita aos outros a luz de Deus. A lâmpada não tem boca para orientar os
que andam sob a sua luz, você sim, tem boca. Então fale de Jesus, diga palavras que edificam a
vida do seu semelhante. Você pode falar com a boca, com gestos, a maneira de ser de viver.
(§8) Que Deus se manifeste, através de você, a muitíssimas pessoas. Amém.
Sermão 5 (Portas Abertas, 2006, p. 16)
Período: 2º Domingo após Epifania
Leituras bíblicas: Sl 36.5-10 Is 62.1-1.5; 1 Co 12.12-21, 26-27; Lc 4.14-21
Texto-base: Lucas 4.14-21
Tema: A pregação do Messias vai ao encontro de todos.
(§1) Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém!
(§2) Jesus volta para a Galiléia onde começa o seu ministério.
(§3) Após sua tentação, Jesus agora se dirige para a Galiléia e vai, conforme o texto, no poder do
Espírito. Em seguida, vai à cidade onde se criou, onde viveu boa parte de sua vida Jesus está
agora em Nazaré. Vai para lá com o objetivo de levar a sua mensagem de vida e salvação
tamm para os seus.
(§4) Jesus vai à Sinagoga. A Sinagoga era uma casa de reunião, lugar de culto público dos
judeus. Aos sábados aquele que dirigia o culto poderia convidar um homem adulto para que
fizesse a leitura de uma passagem da Escritura e em seguida tinha a oportunidade de explicá-la.
(§5) Foi o que aconteceu com Jesus. Ele leu e depois como de costume assentou-se para expor o
que acabara de ler. As atenções agora se voltam para as suas palavras. Todos apreensivos para
ouvirem o que tinha a lhes dizer.
142
(§6) Muito mais por saberem que a sua fama se espalhara por toda a região. Além de estarem ali
para o culto semanal, a adoração do sábado, tinham diante deles Jesus.
(§7) Do mesmo modo, ainda hoje, a igreja, esta casa é local onde o povo se reúne para ouvir
Jesus falar. Pelo menos deveria ser este o grande objetivo de estarmos aqui neste final de
semana. Se olharmos a nossa volta percebemos que muitos poderiam estar aqui hoje. Mas como
normalmente é um período de férias, as pessoas de um modo geral também tiram férias do seu
culto e adoração a Deus.
(§8) Aqui uma das coisas que nos saltam aos olhos à primeira vista é admiração das pessoas
diante dos ensinos de Jesus na sinagoga. As pessoas maravilhavam-se nos seus ensinos.
(§9) As palavras de Jesus de certa forma ascendiam uma chama de curiosidade em suas
palavras. Queriam, de certa forma, saber de tudo o que levava as pessoas a ado-lo e admirá-lo
tanto. Estas pessoas poderiam ser comparadas a crianças que, em determinado período de suas
vidas, em certa idade, passam pela fase do Por quê? Como?
(§10) O texto que Jesus de Isaías diz que “O Senhor me deu o seu Espírito”, e no v. 21 ele diz
na parte final que “Hoje se cumpriu o trecho das Escrituras Sagradas que vocês acabam de ouvir”.
Referindo-se ao tempo de salvação messiânica que Jesus traz para a humanidade na continuação
do texto que não faz parte de nosso evangelho de hoje, Jesus passa a dizer que nenhum profeta é
bem recebido em sua própria terra. Ele passa a mostrar que o novo acontece no meio dos
estrangeiros, dos de fora, porque os de casa, os parentes, os conhecidos não dão valor a alguém
que eles conhecem. E bem sabemos o que fizeram com Jesus em Nazaré. O expulsaram, o
colocaram fora da cidade, o levaram para um monte, para o jogarem abaixo, mas ele passou entre
eles e se retirou. Vemos em nosso texto tamm que:
(§11) O Espírito do Senhor o unge e também nos unge para o serviço.
(§12) Ser ungido significa ser separado para realizar a obra de Deus. O v. 18 diz que “O Senhor
me deu o seu Espírito. Ele me acolheu para levar boas notícias aos pobres e me enviou para
anunciar a liberdade aos presos, dar vista aos cegos, libertar os que estão sendo oprimidos”.
Evangelho significa boas novas. Quem é que mais necessita das boas novas? Alguém que não
tem esperança, que está levando uma vida miserável em pecado, que não vê saída para a sua
vida. O Evangelho, a boa notícia, é tudo o que a pessoa precisa para dar, por assim dizer, um
novo rumo em sua vida, e isso acontece quando a palavra o leva ao arrependimento e o conduz
ao caminho do perdão, vida e salvação. E isso se complementa concretamente na vida do
necessitado de muitas maneiras como um emprego que chegou na hora do desespero para o
desempregado. É uma cesta de alimento que chegou na casa de quem está sofrendo privações. É
uma palavra amiga que chega na hora certa. É a Palavra de Deus que chega ao faminto e sedento
de Deus. É a vida vencendo a morte. É manhã de ressurreição. É esperança nascendo nos
corações dos desesperançados. É sol nascendo, dissipando a escuridão, trazendo a luz e alegria
a nossa vida.
(§13) O espírito também nos unge para libertar os cativos, libertar quem escativo fora de sua
terra exilado. Libertar quem está preso. O ser humano não se realiza só em ter o que comer. Ele
é ser criativo que precisa de sua liberdade. Imagine você preso num quarto tendo o que comer e
onde fazer suas necessidades, mas não tendo a liberdade de sair quando quiser. O ser humano
não nasceu para viver preso. A prisão é o pior dos castigos que um ser humano impõe ao outro
ser humano. As pessoas nessas condições perdem a sua dignidade e Jesus vem para dar essa
dignidade tamm ao ser humano caído em pecado que agora se arrepende de seus pecados e o
recebe com o Messias, o seu Salvador.
(§14) Ele tamm vem dar vista aos cegos. Imagine vocês viverem sem enxergar. Viverem
dependendo dos outros. É muito triste.
(§15) Ainda mais numa sociedade onde a doença era sinal de pecado. Sendo assim, ninguém
tinha compaixão de uma pessoa nessas condições, pois essa devia ser uma pessoa amaldiçoada
por Deus. E ele mostra o seu amor a estes em muitos milagres onde restabeleceu a visão àqueles
que não podiam ver.
(§16) Ele vem também para libertar aqueles que são logrados em seus direitos, que não têm o
direito de ir e vir. Ainda hoje existem muitas pessoas nessas condições que não têm direito às
coisas mais essenciais da vida. Jesus quer libertar a todos os oprimidos, seja uma opressão de
qualquer natureza, e por fim ele prega o ano da Graça. O Ano Aceivel do Senhor.
(§17) O ano da graça acontecia no AT de 7 em 7 anos, depois passou a ser de 50 em 50 anos.
Nesse ano não se podia plantar. A terra descansava. Quem era escravo por causa das suas
dívidas era posto em liberdade. A terra voltava para o seu antigo dono. Quem tinha vendido a sua
terra por problemas financeiros tinha ela de volta. Este era o ano da graça, o ano do perdão das
143
dívidas. As pessoas tinham oportunidade de começar de novo e de viver a solidariedade.
(§18) O Espírito do Senhor ainda hoje continua nos ungindo para levar as boas novas aos
sedentos da Palavra de Deus. O texto nos mostra dois tipos de pessoa. Aqueles que acham que
Jesus está falando bonito, mas que ele é um petulante em dizer que as Escrituras estão se
cumprindo nele. Estes se sentem irados e querem matar Jesus. Não são receptivos às boas novas
do Evangelho.
(§19) outro grupo a quem Jesus diz ser ungido para ministrar. São aqueles que não têm uma
vida digna, a ralé do povo, o resto. Essas pessoas recebem a boa notícia e se abrem à novidade
do Evangelho.
(§20) A Palavra de Deus tem que entrar no ouvido e chegar ao coração. Precisa queimar dentro
de nós e nos inquietar para vivermos diferentes. Dura coisa é quando nós nos tornamos
indiferentes à Palavra de Deus. Quando ela já não queima dentro de nós. Quando ela não provoca
mais mudanças. Nos tornamos insensíveis à voz de Deus. Às vezes até achamos que Deus não
fala a nós e que o seu Santo Espírito não está conosco, mas Deus não nos abandona. É a nossa
indiferença que não permite que ele fale aos nossos corações.
(§21) Muitas pessoas vêm à igreja a cada domingo por costume, cantam, ouvem a Palavra de
Deus, mas essa o queima mais em seus corações, não desafia para nada, porque se tornou
indiferente à Palavra de Deus. A Palavra entra por um ouvido e sai por outro. estão bem e a
boa notícia não é novidade em seus corações. Para os ouvintes da Palavra de Deus Jesus diz o
seguinte: “Bem-aventurados os que ouvem a Palavra de Deus e a praticam.” Am.
Sermão 6 (Portas Abertas, 2006, p. 22)
Período: 5º Domingo após Epifania
Leituras bíblicas: Sl 136; Is 6.1-8 (9-13); 1 Co 14.12b-20; Lc 5.1-11
Texto-base: Lucas 5.1-11
Tema: Jesus nos convida a pescar.
(§1) Prezados irmãos e irmãs em Cristo, passar uma tarde inteira pescando e não pegar nenhum
peixe é uma experiência bem desagradável. Pior ainda se a pesca for a tua profissão, e não
apenas um passatempo.
(§2) O texto bíblico conta que os pescadores Pedro, Tiago e João estavam lavando as redes
depois de voltar de uma noite inteira de trabalho frustrado. Como não haviam pescado nada,
preparavam as redes para pescar na noite seguinte, quem sabe teriam mais sorte?
(§3) Naquele momento, estavam com o mesmo desânimo de quem é atingido pelo desemprego,
pela diminuição do salário, pela falta de condições de trabalho, seja na cidade, seja na agricultura,
pelas brigas em família por qualquer tipo de “crise”.
(§4) Uma situação que se repete com mais freqüência em nossos dias é o desabafo dos membros
com o pastor: um está trabalhando meio ano sem receber salário, outro foi demitido e não
consegue outro trabalho, outro recebeu a proposta de diminuição de salário.
(§5) O pior de tudo é que o diabo usa estes momentos para tentar os fiéis e abalar a fé no
Salvador Jesus. E ele fica satisfeito quando consegue derrubar alguém da fé antes ele não
larga a sua presa. Jesus Cristo também se aproxima das pessoas nos momentos de tribulação.
Ele oferece o perdão de pecados que ele conseguiu para nós morrendo na cruz e o conforto de
saber que, confiando nele, vamos passar a eternidade no céu, onde não haverá problema algum.
(§6) Vejamos como Pedro, Tiago e João reagiram aos atos de Jesus: como o dia deles estava
perdido mesmo, não viram inconveniente algum em emprestar o barco para Jesus ensinar o povo
de um local de onde visse a todos mais facilmente.
(§7) Provavelmente não deram muito crédito para as palavras de Jesus, pois eles o conheciam
como um homem comum, um marceneiro. A identificação dele como o “Messias prometido por
Deus, como Salvador, como Senhor de nós e deles se daria apenas alguns meses mais tarde.
Jesus ainda era o visitante que veio da vila de Nazaré.
(§8) Não sabemos se, ao ouvir Jesus falar ao povo, eles acreditavam ou não que ele poderia
mudar sua situação de “crise”, mudar o fato de que seu trabalho fora um fracasso.
(§9) As palavras que Jesus dizia ao povo soam para nós como palavras de salvação, de certeza
de dias melhores sob as bênçãos de Deus. Mas, para aqueles pescadores, as palavras de Jesus
ainda soavam distantes, vazias. A única certeza que havia era que eles teriam de trabalhar duro
no dia seguinte para conseguir o pão de cada dia.
(§10) Jesus convida os pescadores para voltarem ao trabalho e Pedro um voto de confiança a
144
Jesus. Ele joga as redes onde Jesus manda e o resultado é fantástico: é preciso outro barco para
dar conta de levar as redes cheias de peixes para a margem, e os barcos quase afundam.
(§11) Foi providencial que eles nada pescassem a noite anterior, assim houve oportunidade para
Jesus agir na vida deles e mostrar a eles e a nós que o sucesso profissional não depende apenas
de trabalho árduo, mas também da bênção de Deus. Aqueles pescadores o foram preguiçosos
na pesca frustrada, mas faltou-lhes a bênção divina. Agora, com a bênção de Jesus, eles pegam
tanto peixe que todos ficam admirados.
(§12) Jesus diz ao assombrado Pedro: “Não temas; doravante serás pescador de homens.” A vida
deles iria mudar. Agora eles passariam a pescar homens, o que é a missão e a atividade básica
da Igreja. Esta é a minha atividade e missão, é atividade e missão de cada um aqui presente como
indivíduo e como congregação.
(§13) Deus não vai dar muita importância se o teu esporte favorito é vôlei ou futebol, se você veste
roupas de cor verde, cinza ou roxa. No Juízo Final, Deus vai te cobrar como e quantas vezes você
foi pescar pessoas para o Reino dele.
(§14) Você está se preocupando em pescar para o Reino de Deus? Nossa congregação es
preocupada em pescar pessoas? A época é propícia, pessoas estão chorando, implorando pelo
consolo e conforto que apenas nós, cristãos, temos a oferecer.
(§15) Talvez a crise tenha se abatido sobre você e voesteja trazendo este desânimo para sua
pesca no Reino de Deus. O diabo é esperto em fazer isto. Conta-se a história de que um dia
Satanás estava à beira da falência e pôs à venda todos os seus instrumentos de tentação. Um
pequeno objeto, em forma de cunha, tinha o preço mais alto. Quando lhe perguntaram o porquê,
Satanás respondeu: “Este é o desânimo. Quando consigo introduzi-lo no coração do cristão, sei
que em breve o terei ao meu lado.” O preço era o alto que Satanás ainda tem com ele o
instrumento e dele se serve em sua atividade nos dias de hoje.
(§16) Não vamos deixar que o desânimo tome conta da pesca do Reino de Deus. Vamos nos
encher da mesma admiração e fé que os pescadores tiveram por Jesus. Vamos trabalhar duro nas
horas boas de pesca. A pesca de pessoas para o Reino de Deus depende da bênção de Jesus e
do trabalho árduo dos pescadores s. E nas horas difíceis, quando o mar não está muito para
peixe, vamos orar a Jesus para que ele abençoe nossa pescaria ele pode repetir aquela pesca
maravilhosa.
(§17) Podemos seguir o exemplo dos primeiros cristãos e ver que nossos irmãos na fé são
companheiros de pesca que podem nos ajudar na tarefa de levar pessoas a Jesus. A união e a
harmonia entre os fiéis estão presentes numa Igreja empenhada na missão que Deus lhes deu.
(§18) Conclusão: Prezados irmãos e irmãs no Senhor Jesus, convido vocês a sentirem admiração
e fé diante da maravilha que é ter Jesus com nosso Salvador, que fez maravilhas em nossa vida.
Convido vocês a trabalharem arduamente nesta pescaria de pessoas para o Reino de Deus. A
nossa cidade oferece um ambiente extremamente propício para receber o nosso testemunho e
para que ocorra uma pesca maravilhosa.
(§19) Jesus esconosco. Ele dá o seu Reino de maneira maravilhosa e traz felicidade e conforto
nesta vida e na vida eterna aos que confiam nele. Amém.
Sermão 7 (Portas Abertas, 2006, p. 28)
Período: Quaresma
Leituras bíblicas: Sl 91; Dt 2.5-10; Rm 10.8b-13; Lc 4.1-13
Texto-base: Lucas 4.1-13
Tema: Unidos pelo amor no caminho da cruz.
(§1) Certa vez uma família mudou-se de cidade. E passaram a morar na mesma rua onde havia
uma linda igreja com uma grande cruz a apontar para o céu, a qual chamava a atenção dos que
passavam por ali.
(§2) Após alguns dias, vieram os tempos da escola. A pequena filha da família foi então conduzida
amorosamente para esta nova etapa de sua vida. Naquele primeiro dia, uma surpresa. As aulas
acabaram mais cedo do que o previsto. E a menina resolveu voltar sozinha para casa.
(§3) Distraída pelas vitrines, de repente viu-se perdida e pôs-se a chorar. Neste instante, uma
senhora vem em seu socorro, perguntando-lhe se seria possível ajudá-la. Sim! foi a resposta
da garota. Você sabe algo sobre a rua onde você mora? perguntou a senhora. Sim, nela tem
uma igreja com uma bela cruz respondeu a menina.
(§4) E foi assim que, em breves instantes, sua casa foi localizada, e ela colocada em segurança
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junto da sua família. Tudo isto graças à cruz da igreja que apontou o caminho.
(§5) Você reparou como esta história é bem parecida com a nossa vida em geral e
especialmente quanto a nossa fé? Veja bem, é comum em nossa vida estarmos perdidos em meio
a nossas aflições e afazeres diários. Às vezes também estamos perdidos em nossa vida pessoal,
familiar e profissional. E precisamos uma parada para avaliar, reavaliar e recomeçar a vida.
(§6) Em relação a nossa vida de fé é a mesma coisa. Muitas vezes nos apegamos a tantas coisas
que já não sabemos ao certo o que é o mais importante. Deparamo-nos com tantos caminhos que
ficamos confusos ou até mesmo nos distraímos com as vitrines de falsos ensinos, perdendo-nos
pelo caminho. Ou ainda procuramos seguir mais de um caminho ao mesmo tempo, como se isto
fosse possível. Não é.
(§7) Diante disso ficamos perdidos em busca de um sinal que nos reencaminhe à verdadeira.
que nos traga real consolo e orientação nas adversidades da vida. Podemos dizer que este
estar perdido no dia-a-dia e na fé são as tentações que enfrentamos constantemente. Elas podem
até nos desviar da fé e do caminho da salvação. Por isso precisamos vencê-las. Mas como?
(§8) Para vencê-las não basta uma pequena parada, nem qualquer resposta, nem qualquer
caminho ou orientação que aponte um objeto de fé qualquer. Precisamos acima de tudo uma
referência que nos possibilite vencer as tentações e chegar à certeza da vida eterna, nosso único
consolo nas adversidades.
(§9) Estamos entrando na Quaresma. Um tempo de parar para reordenar nossa vida em todos os
sentidos. Tamm e principalmente a nossa vida de fé, cercada de tentações. Jesus no evangelho
nos uma pista de como vencê-las.
(§10) Cara a cara com Satanás, Jesus usou a arma do cristão para todas as horas: a Escritura
Sagrada. Ela é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a
educação na justiça diz Paulo a Timóteo (2 Timóteo 3.16). Ela nos mostra Jesus vencendo o
próprio Mal. Porque nela Deus revela seu plano, caminho e cuidado com o seu povo. E como com
a sua força e com o seu poder ele fez milagres, maravilhas e livrou seu povo do Egito,
conduzindo-o à terra prometida (Deuteronômio 26.8-9). E como da mesma forma, com o mesmo
poder, ele quer também reconduzir-nos a um reencontro com o Pai Celeste, rumo à morada
paterna celestial.
(§11) encontramos o lar celeste quando trilhamos o caminho da cruz. Jesus sabia disso. Ele
colocou-se como o nosso único caminho, verdade e vida (João 14.6). Por isso, neste domingo
acompanhamos a primeira etapa da caminhada de Jesus rumo à cruz. A cruz, sobre a qual ele
carregou as nossas iniqüidades, derramou o seu sangue para nos purificar de todo o pecado (1
João 1.7). E assim nos trouxe a reconciliação com Deus, abrindo o caminho que conduz à morada
paterna, o céu.
(§12) Só se chega ao céu passando pela cruz, a cruz de Cristo. E as Escrituras Sagradas afirmam
categoricamente: “Quem crer nele não ficará desiludido.” (Romanos 10.11) Porque Jesus venceu
até a cruz em nosso lugar. E Paulo lembra na epístola: “Se você disser com sua boca: „Jesus é o
Senhor‟ e no seu coração crer que Deus ressuscitou Jesus, você será salvo.” (Romanos 10.9)
(§13) Você está se sentindo perdido em sua vida diária e de fé?
(§14) Pare! Ouça nesta Quaresma as Escrituras falarem a respeito do acesso ao Pai que Jesus
Cristo abriu para você através do caminho da Cruz. A Bíblia e as leituras da Quaresma lhe
chamam para olhar para o alto buscando a cruz. Assim como a menina, que pela cruz encontrou a
segurança do seu lar, tamm você se sentirá seguro nos braços do Pai Celeste. Na Palavra vo
encontrará Jesus vencendo as tentações, diabo, pecado e morte, em seu lugar. Ela será lâmpada
para os teuss e luz para os teus caminhos (Salmo 119.105).
(§15) A menina encontrou pela cruz o seu lar. Busque na cruz de Cristo também o seu. Ela foi
auxiliada por alguém capaz de lhe encaminhar ao caminho da cruz. Saiba que você e sua família
o exatamente a seta que indica o caminho da cruz de Jesus para muitos hoje em dia. Da
mesma forma, a congregação que está unida pelo amor de Deus ampara cada família mantendo
todos alicerçados em Jesus, a pedra angular. Para assim trilharem unidos e com segurança o
caminho da cruz rumo à eternidade, num mundo repleto de tentações. Amém.
(§16) Oração: Que a paz de Deus que vai muito além do nosso humano entendimento guarde os
nossos corações e mentes em Cristo Jesus. Amém. (Filipenses 4.7 adaptado)
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Sermão 8 (Portas Abertas, 2006, p. 43)
Período: 6º Domingo após Pentecostes
Leituras bíblicas: Sl 16; 1Rs 19.14-21; Gl 5.1,13-28; Lc 9.51-62
Texto-base: Lucas 9.51-62
Tema: Seguir a Jesus O desafio do discípulo.
(§1) “No amor a Deus, o povo de Deus vai ao encontro das promessas de Deus... Construindo o
ambiente de amor que afirma a união em amor.”
(§2) Se me pedissem para descrever Deus em uma palavra, diria: Amor. Deus é amor! E esse
amor tem um preço: O filho de Deus na cruz. Para que ninguém sofra com o peso dos seus erros,
mas receba o perdão de Deus. Seguir a Jesus em amor é o desafio do discípulo fiel. Esta é a
exigência, porém o a obrigação. Pois o amor e a obrigação não podem se encontrar, não
andam juntos, se auto-excluem. Para ajudar na compreensão reflita comigo: O casal está
completando dez anos de vida conjugal. Então o marido compra e entrega para a esposa um
buquê de flores. Ao receber as flores a esposa fica feliz e, emocionada, diz: “Que flores lindas,
assim como nosso amor. Muito obrigada.” Ao que o marido responde: “Por nada. Não fiz mais do
que minha obrigação!
3) Obrigação? Onde eso amor? Amor e obrigação o como luz e trevas. Onde um está o
outro necessariamente desaparece.
4) No evangelho de hoje, Lucas registra a disposição de alguns em seguir a Cristo e o convite
de Jesus: Segue-me! Venha comigo! E contrasta o amor e obrigação. “Venha comigo!“Segue-
me”, diz Jesus. Mas por amor, não por obrigação. E este amor é sacrifício, é doação, é
incondicional, é resultado da fé. Seguir a Jesus requer sacrifício!
5) Vejam: O primeiro candidato a discípulo ofertou um “lance”: “Estou pronto a seguir o senhor
para qualquer lugar onde o senhor for.” Este deve ter sido um sonhador, que só viu o lado
brilhante de seguir a Jesus. Jesus não recusa a oferta dele, porém dá a entender que não
encontrará no discipulado aquilo que procura.
6) Quantos procuram a Igreja pensando que com isso todos os problemas da vida
desaparecerão? Quantos pensam que o cristão não enfrenta o desemprego, não sofre com
enfermidades, não tem problemas conjugais? Jesus esclarece: “As raposas têm suas covas e os
pássaros os seus ninhos, mas o Filho do Homem o tem onde descansar.” Se foi assim com o
Mestre, não será diferente com seus discípulos. Aliás, o próprio Cristo conheceu de perto a dor, o
sofrimento e a própria morte, para que, mesmo cercados de perigos e tribulações, cultivemos a
esperança. “Essa esperança não nos deixa decepcionados, pois Deus derramou o seu amor em
nosso coração, por meio do Espírito Santo que ele nos deu.” (Romanos 5.5)
7) Seguir a Jesus requer doação. No relato de Lucas aparece um segundo candidato a
discípulo. Porém, a este Jesus convidou: “Venha comigo! “Primeiro deixe sepultar meu pai”, foi a
resposta daquele homem. Isso significava esperar pelo sepultamento de seu pai. Ou seja, um
adiamento por tempo indeterminado. Depois... Amanhã... Quando tiver tempo...
8) Certas são as palavras da Escritura: “O que a natureza humana quer é contra o que o Espírito
quer.” (Gálatas 5.17) Para a desculpa daquele homem Jesus sentencia: “Deixe os mortos
sepultarem seus próprios mortos. Você vá e pregue o Reino de Deus.”
9) Aparentemente isso não nos diz respeito. Afinal de contas, nós fazemos parte da Igreja, não é
mesmo? Porém, nem sempre temos clareza sobre o que é a Igreja. Não faltam imagens
distorcidas. Por exemplo: A Igreja é uma reunião de sócios. Ou: Quanto menos membros
incômodos a Igreja tiver, melhor. Então a solução é limpar o fichário. Ou ainda: pensam que a
finalidade maior da Igreja é prestar serviços aos seus “associados”.
10) Todavia, a imagem bíblica da Igreja é bem outra. “A Igreja é uma sociedade de fé e do
Espírito Santo nos corações” (Livro de Concórdia). A Igreja é reconhecida porque prega a palavra
e administra os sacramentos. A Igreja o os filhos de Deus, que manifestam o amor no
cumprimento dos mandamentos. A Igreja é testemunha do amor perdoador de Deus em Cristo. A
Igreja existe mais em função do mundo do que de si mesma.
(§11) Já houve quem disse que os filósofos, no passado, se limitaram a explicar o mundo, quando
deviam tê-lo transformado. Isso se aplica em parte à Igreja: Explicamos a perdição do mundo,
acusando o seu pecado; mas o que fazemos para que o mundo conheça o seu Salvador, Jesus?
Ouça o convite. Aceite o desafio: “Você vá e pregue o Reino de Deus.”
(§12) Seguir a Cristo requer confiança. É o que mostra o terceiro candidato a discípulo que propôs
seguir o Mestre, porém primeiro queria despedir-se de seus parentes e amigos. Deve fazer-nos
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pensar a resposta de Jesus: “Quem começa a arar a terra e olha para trás não serve para o Reino
de Deus.” A questão é amar menos. Amar menos os seus pais... Amar menos o seu trabalho...
Amar menos o seu dinheiro... Amar menos a criatura e amar mais o Criador. Lembram da história
da mulher de Ló. Ao olhar para trás demonstrou que estava presa às suas coisas, não aceitando a
ordem de Deus. Assim foi transformada em estátua de sal.
(§13) Deus faz exigências. Não maiores do que conseguimos suportar. A exigência não se cumpre
pela obrigação, mas em amor. Precisamos lembrar que o Deus das exigências é também o Deus
do amor, que perdoa, que salva, que liberta, que sara.
(§14) Há um livro intitulado O preço do discipulado. O autor fala da graça barata. Ele diz “a graça é
livre, mas o barata. Pois custou a vida do Filho de Deus”.
(§15) Que “no amor de Deus, o povo de Deus vá ao encontro das promessas de Deus...
Construindo o ambiente de amor que afirma a união familiar”. Amém.
Sermão 9 (Portas Abertas, 2006, p. 47)
Período: Pentecostes III
Leituras bíblicas: Sl 138; Gn 18.20-32; Cl 2.6-15; Lc 11.1-13
Texto-base: Lucas 11.1-13
Tema: O privilégio de poder falar com o Pai Celeste por meio da oração.
(§1) Caro irmão: Hoje se ouve muito falar estar conectado na internet. Estar conectado significa
estar ligado na internet e poder usar os recursos que a internet oferece às pessoas.
(§2) Assim pode se afirmar que o filho de Deus tamm es conectado com Deus. Em
Colossenses o apóstolo escreve: “Por estarem unidos com Cristo [...] somos libertados do poder
da natureza pecadora. Pois, quando vocês foram batizados, foram sepultados com Cristo e no
batismo também ressuscitado com ele por meio da fé que vocês m no grande Deus, o mesmo
que ressuscitou Cristo.” (Colossenses 2.11,12) Pelo Batismo os filhos de Deus foram conectados
ao Deus todo-poderoso. Desta forma se abre um mundo de possibilidades para o filho de Deus
como para uma pessoa que es ligada à internet. Nascemos espiritualmente mortos, isto é,
desconectados de Deus. Agora unidos com Deus através do perdão de Cristo pode-se servir ao
nosso Pai celestial. O filho de Deus pode realmente amar ao seu próximo sem ter interesses
próprios, porque esligado a Deus através da fé em Cristo. Estar ligado ao nosso Pai celestial
proporciona ao filho de Deus o privilégio de poder falar com ele através da oração. A oração é
“sala de bate-papo” com Deus.
(§3) O evangelho de hoje mostra Jesus tendo o seu momento de conversa com o seu Pai através
da oração e os seus discípulos pedindo para Jesus ensiná-los também a orar. Jesus orando era
algo que ocorria freqüentemente, conforme o relato dos evangelhos. O próprio Lucas registra que,
por ocasião de seu Batismo, Jesus estava orando e percebe-se que o Espírito Santo revela a sua
presença em forma de pomba e o Pai através da voz, que dizia: “Tu és o meu Filho querido e me
dás muita alegria.” (Lucas 3.22) É um momento de comunhão de Jesus com o Pai e o Espírito
Santo. A palavra do Pai mostra também o seu amor pelos seres humanos, porque ele es
satisfeito com a obra que o Filho veio realizar no mundo. no evangelho de hoje, Jesus ensina
aos discípulos invocar a Deus como Pai. A comunhão que Jesus tem com o Pai tamm pode ter
aquele que crer em Jesus como Salvador enviado por Deus. Isto é um incentivo para todos os
filhos de Deus também seguirem o exemplo do próprio Cristo e falar com ele através da oração.
Afinal, os discípulos pediram para ensinar-lhes o hábito de orar. Os seres humanos por causa do
pecado procuram colocar Deus a uma grande distância de suas vidas. Jesus ensina aos
discípulos a pensarem em Deus como sendo também Pai deles. Um pai terreno é bondoso,
segundo Jesus. Muito mais é o Pai celestial. Lutero percebeu muito bem este pensamento de
Jesus, quando na explicação do Pai-Nosso diz: “Deus quer atrair-nos carinhosamente.” Na
parábola do filho pródigo Jesus mostra Deus como sendo um pai à espera do filho perdido. Aqui,
pode-se afirmar que Jesus ensina que Deus é um pai que está à espera dos pedidos de seus
filhos. Por isso diz: “Peçam e vocês receberão, procurem e vocês acharão; batam, e a porta será
aberta para vocês. Porque todos aqueles que pedem recebem; aqueles que procuram acham; e a
porta será aberta para quem bate.” (Lucas 11.9,10)
(§4) Caro amigo! O que voestá esperando para criar o hábito de orar? Deus, o nosso Pai
celestial, está à espera de seu contato. Ele está à espera de seus pedidos. Ele espronto para
ouvi-lo e se alegra muito, quando você se lembra de agradecer as bênçãos recebidas diariamente.
Se você ainda não tem o hábito de orar, comece hoje. Isto será uma grande bênção para a sua
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vida. Apresente a ele suas dificuldades. Peça ajuda a Deus para seus problemas, ore pelos
familiares e amigos. Não esqueça de orar pela sua congregação, seu pastor e demais líderes. Ore
pelo seu país e todas as autoridades. Ore, inclusive pelos seus inimigos, como Jesus o fez. Seja
persistente como Abraão ao orar por Sodoma. Deus Pai, que é muito generoso, iderramar
muitas bênçãos sobre sua vida e cada vez mais você sentirá prazer em falar com seu Pai celestial.
(§5) Um jovem, que era um atleta, procurou o seu pastor queixando-se de que suas orações não
eram atendidas e que por isso não sentia nenhum desejo para orar. O pastor lhe perguntou: “Você
como atleta pratica esporte de vez em quando ou regularmente?” O jovem respondeu que
praticava esporte todos os dias. “Quando não tenho competições oficiais, treino com meus colegas
várias horas.” Então o pastor lhe perguntou: “Quanto à oração, você faz a mesma coisa?”
Encabulado o jovem admitiu: “Só de vez em quando.”
(§6) Que tal você fazer o pedido dos discípulos a Jesus em sua primeira oração no dia de hoje:
“Senhor! Ensina-nos o hábito de orar?” Amém.
Sermão 10 (Portas Abertas, 2006, p. 57)
Período: 23º Domingo após Pentecostes
Leituras bíblicas: Sl 34; Dt 10.12-22; 2 Tm 4.6-8, 16-18; Lc 18.9-14
Texto-base: Lucas 18.9-14
Tema: Como nos posicionamos diante de Deus?
(§1) O evangelho de hoje mostra que Jesus contou uma parábola “para os que achavam que eram
muito bons e desprezavam os outros” (v. 9). É a velha mania da grandeza humana. Muitas
pessoas têm este grave defeito e não fazem questão de reconhecê-lo. E, como vemos nesta
parábola, é um defeito fácil de perceber nos outros, mas que dificilmente percebemos em nós
mesmos. Como você, caro irmão, se posiciona diante de Deus? Com quais intenções você ora ao
Senhor?
(§2) A parábola que Jesus contou-nos quer ajudar na nossa postura diante de Deus. Ela fala de
dois personagens: um fariseu e um publicano. Os dois tiveram jeitos diferentes de se dirigir a
Deus. Uma das coisas que identificava os fariseus era o seu rigor para com a Lei. Eles se
achavam fieis cumpridores da Lei. Por isso eles tinham facilidade de enxergar defeitos na vida de
outras pessoas. Os publicanos eram os cobradores de impostos. Eram mal vistos pela sociedade
porque arrecadavam impostos para o governo romano e geralmente cobravam mais do que o
valor estipulado.
(§3) Os dois personagens foram ao templo para orar. O fariseu na sua oração elogiava a si
mesmo. Nada pedia a Deus e também nada agradecia. Louvava a sua própria justiça e assim
desprezava a justiça de Deus. Sua oração girava em torno do que ele fazia e em nada do que
Deus fazia por ele. Não tinha consciência dos seus pecados e não sentia necessidade de
arrependimento nem humildade e dependência diante de Deus. As obras que ele alegava fazer,
até eram boas. Mas ele queria se justificar diante de Deus por meio delas e não queria reconhecer
o seu o seu pecado e sua situação diante de Deus. Ao justificar-se, não se orientava pela Lei de
Deus, mas por aqueles que ele achava serem piores que ele. Ele não reconhecia nem o amor de
Deus e muito menos amava o seu próximo.
(§4) A atitude do publicano, ao contrário, era de humildade. Ele tinha clareza de que era pecador,
que necessitava da misericórdia de Deus. Ele permaneceu de pé, longe, não querendo ser notado.
Não levantou os olhos pra o céu porque lamentava o seu pecado e reconhecia a justiça de Deus.
Batia no peito em sinal de arrependimento. Ele o tinha nada a oferecer de justiça própria. Por
isso sua oração também era simples. Ele apenas pedia a compaixão de Deus, porque confiava na
misericórdia dele.
(§5) Os dois exemplos são para refletirmos sobre as nossas atitudes e posturas diante de Deus.
Será que a auto-suficiência do fariseu, muitas vezes, não faz parte das nossas atitudes? Qual é o
jeito de nos dirigirmos a Deus? Com quais intenções nós oramos a Deus? Pode até ser que em
nada nos identifiquemos com a atitude do fariseu. Mas quando apenas lamentamos os problemas
diante de Deus, podemos estar ignorando o exemplo de humildade do publicano. E teremos
dificuldade de reconhecer nossa dependência de Deus, não daremos sinal de arrependimento e
deixaremos de confiar na misericórdia de Deus. Um coração o arrependido não está preparado
para falar com Deus. E quem confia na sua própria justiça está condenando a si mesmo. Como diz
o profeta Isaías: “Todos nós nos tornamos impuros, todas as nossas boas ações o com trapos
sujos.” (Isaías 64.6)
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(§6) Cada um de s, por natureza, é um pecador perdido e condenado, sem direito à salvação.
Deus nos salva por amor. Somos justificados diante de Deus e salvos, se confiarmos em tudo o
que Cristo fez por nós. É somente nele que devemos depositar nossa confiança. Como a nossa
salvação depende inteiramente de Deus, ninguém tem direito de se gloriar diante de Deus, pois,
ainda que façamos muitas boas obras, não são elas que nos salvam. A nossa salvação está
apenas em Jesus Cristo, que morreu para nos salvar.
(§7) Assim, ao nos colocarmos diante de Deus, ele quer nosso retorno em arrependimento, nossa
inteira dependência nele e a nossa confiança na sua misericórdia.
(§8) Jesus conclui a parábola dizendo que o cobrador de impostos é que voltou em paz com Deus
para casa. Ele voltou em paz com Deus para casa. Ele voltou em paz porque confiou
completamente em Deus.
(§9) Se você, caro irmão, confia na misericórdia de Deus, coloca seus pecados diante de Deus,
com arrependimento e fé, crê na obra do Senhor Jesus por você, guarda no coração a certeza de
que está em paz com Deus. Amém.
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